turismo - África 21 Online

Transcrição

turismo - África 21 Online
MOÇAMBIQUE
Assassínio de Gilles Cistac
ainda por explicar
BRASIL
Dilma Rousseff
resiste ao cerco
ANGOLA
OGE aprovado
no Parlamento
Nº 95 - abril 2015 – 500 Kz / 4 USD / 3 € / R$ 15
TURISMO
A atração por África
A modesta fatia
que o continente ocupa
no turismo mundial
está a engordar
com os visitantes
a diversificarem
os seus destinos
África21– abril 2015
1
2
abril 2015 –
África21
África21– abril 2015
3
sumário
Angola tem OGE revisto
aprovado no Parlamento
África e o turismo
33
20
Em 2013 o continente africano recebeu globalmente 53 milhões de turistas, apesar
da instabilidade política e dos conflitos armados em alguns países
Miguel Correia e Natacha Mosso
O assassinato de Gilles Cistac
40
O atentado que matou o constitucionalista Gilles Cistac é visto por muitos como
um ataque à liberdade de expressão em Moçambique
Emanuel Novais Pereira
África21 Revista de Política, Economia e Cultura
Propriedade Nova Movimento, Lda
Sociedade de Marketing, Comunicação e Cultura
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Bairro do Maculusso – Luanda, Angola
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Editada por Movipress
Uma divisão da Nova Movimento, Lda
Diretor Carlos Pinto Santos
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Técnica Comercial Yuma Traça
Assistente Direcção Comercial Patrícia Filipe
Representação em Portugal Triangulação, Lda
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Apartado em Lisboa: 19059
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4
abril 2015 –
África21
Representação no Brasil
Belisan Editora, Comércio e Serviços Ltda [email protected]
Redação de Angola
Adriano de Sousa, Alberto Sampaio, Carlos Severino,
Luís Ramiro, António Dombele, Pedro Kamaka,
Ruben Kamaxilu e Teixeira Cândido
Redação de Portugal João Carlos, Miguel Correia,
Nicole Guardiola, Nuno Macedo e Teresa Souto
Redação do Brasil Carlos Castilho e João Belisario
Colaboradores permanentes Almami Júlio Cuiaté
(Bissau), Augusta Conchiglia (Paris), Charles Shorungbe
(Lagos), Emanuel Novais Pereira (Maputo), Fernando
Lopes Pereira (Bissau), Gaye davis (Pretória), Gláucia
Nogueira (Praia), Itamar Souza (Nova Iorque), João Vaz
de Almada (Maputo), Juvenal Rodrigues (São Tomé),
Luís Costa (Washington), Manrique S. Gaudin (Buenos
Aires), Natacha Mosso (Praia), Paul Cooper (Houston),
Rodrigues Vaz (Lisboa) e Valerie Thorin (Paris)
Colunistas Alves da Rocha, Conceição Lima, Corsino
Tolentino, Fernando Pacheco, Germano Almeida, João
Melo, José Carlos de Vasconcelos, Luís Cardoso, Mallé
Kassé, Odete Costa Semedo e Pepetela Fotografia
Agência Angop, Agência Lusa, Agência France
Para a economia voltar a funcionar, espera-se que
o Governo retome os contratos mantidos com as
empresas privadas
Carlos Severino
A luta que Dilma
tem de enfrentar
64
O escândalo da Petrobras serviu aos partidos da
oposição para exigir a destituição da Presidente
do Brasil, mas Dilma Rousseff prepara um pacote de leis contra a corrupção
Carlos Castilho
Presse, Arquivo África21, Arquivo Digiscript,
Fernanda Osório, Jornal de Angola e Ruth Matchabe
Projeto gráfico, paginação e pré-impressão Digiscript
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Publicidade em Angola Movimídia
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aos leitores
África ganha espaço
o turismo mundial
6 Entrevista
António Luvualu de Carvalho
A paz e estabilidade na Região dos Grandes Lagos
é crucial para Angola
João Carlos
36 CRÓNICA DA TERRA
Fernando Pacheco
44 OPINIÃO
Mallé Kassé
46 TUNÍSIA Atacada pelo Estado Islâmico
Nicole Guardiola
48 ÉBOLA Lições a aprender
Nicole Guardiola
52 OPINIÃO
Carlos Lopes
54 GUINÉ-BISSAU Doadores e desenvolvimento sustentável
Almami Cuiaté
60 CABO VERDE Reconstruir depois do vulcão
Natacha Mosso
66 BRASIL Cotas raciais e sociedade
João Belisario
70 américa latina Reforma dos serviços secretos
Manrique S. Gaudin
74 CPLP Potencial energético comum
João Carlos
84 UCCLA 30 anos de atividade
João Carlos
95 MEMÓRIA Herberto Hélder
Zetho Gonçalves
Rubricas
11 Antena21
18 Gente
72 Empresas & Negócios
78 Insumos
86 Cults
90 Livro do Mês
92 Ver, Ouvir Ler
Crónicas
39 Pepetela
57 Odete Costa Semedo
63 Germano Almeida
69 Muniz Sodré
96 João Melo
A cota de África no turismo
mundial não vai além de três
por cento. Apesar de ser o
continente que menos turistas
acolhe, ultrapassou
recentemente a bitola dos 50
milhões de visitantes por ano.
Estudos credíveis de
instituições internacionais
[email protected]
referem que o crescimento
desta marca tende a aumentar em muitos países
africanos, excluindo aqueles demasiado afetados pela
instabilidade política e nos conflitos militares internos
ou fora das suas fronteiras.
O turismo em África tem muito para oferecer.
Capacidades que não se confinam às paisagens naturais,
praias, vida selvagem, gastronomias distintas. E civilizações
e culturas milenares, patentes nos 129 sítios considerados
património mundial que se podem apreciar em 37 países.
Nos dias de hoje, os principais destinos do viajante
em busca de lugares apreciáveis estão em Marrocos,
Egito, África do Sul, Zimbabwe e Tunísia. Mas há
outros países que sobem na escala do turismo, graças às
apostas de investimentos em infraestruturas básicas,
como sejam Angola, Cabo Verde, Moçambique e
República Democrática do Congo.
No entanto, na Tunísia, incluída no grupo dos
países mais visitados, onde o turismo representa
o principal contributo para a sua economia, tudo pode
ter sido subvertido em 19 de março. Dia em que o
Museu do Bardo (o segundo maior museu africano)
de Tunes sofreu o atentado que provocou a morte de 20
turistas estrangeiros, revindicado pelo Estado Islâmico.
Recuperado da abortada «primavera» de 2011,
o país magrebino superou ao longo de quatro anos o
ciclo violento de crises sociopolíticas e a transição
para a democracia fez-se de modo quase pacífico,
contrastando com as outras nações árabes. A poucas
horas de voo da Europa, de onde chegam mais de
cinquenta por cento dos turistas, a Tunísia oferece-lhes
um povo acolhedor crente de que as manifestações
de radicais religiosos estariam controladas. Dois dos
autores eliminados do atentado eram jovens tunisinos
jiadistas regressados da Síria ou Iraque.
O futuro próximo dirá se o turismo africano vai
ficar na mira dos terroristas assassinos, sejam eles do
Boko Haram ou do Estado Islâmico.
Carlos Pinto Santos
África21– abril 2015
5
Entrevista António Luvualu de Carvalho, professor e analista político
dr
“A paz para a RDC também é prioridade
para a diplomacia angolana”
6
abril 2015 –
África21
Angola está mais que preparada para responder aos desafios que impõe o
esforço para a paz e estabilidade na Região dos Grandes Lagos, diz o professor na Universidade Lusíada de Angola. Para este académico, o combate
contra o Boko Haram exige apoio da solidariedade internacional.
João Carlos
África21 Que avaliação faz ao esforço para a melhoria do sistema de ensino em Angola? As políticas públicas estão no bom sentido?
Com certeza absoluta. Acredito que está a ser feito
um grande esforço por parte do Governo central,
porque se nos atermos às estatísticas, em abril de
2002, quando o país conseguiu a paz final com a assinatura do Memorando de Luena, tínhamos perto de
30 mil estudantes universitários. Ou seja, 13 anos
depois, vemos que houve um aumento significativo.
Muita gente necessitava de estudar e de ter conhecimentos e, agora, o Governo e as universidades privadas, que também são atores importantes, estão muito
preocupados em apostar na qualidade.
Temos visto o Ministério do Ensino Superior a
tomar medidas positivas, exigindo corpos docentes
melhor qualificados para que tenhamos também
alunos mais bem preparados. O Governo lançou o
Plano Nacional de Desenvolvimento, que contempla
um Programa Nacional de Formação, que visa acima
de tudo diferenciar os docentes nacionais para que
tenhamos também discentes diferenciados.
Foi uma aposta certa e agora novos caminhos
abrem-se também à formação profissional, com cursos mais profissionalizantes, para que o país tenha
bases sólidas que garantam o seu desenvolvimento.
Angola necessita de muitos recursos humanos
qualificados. Será possível expandir as universidades por todo o país como meio para o desenvolvimento científico e da inovação tecnológica?
Se não estou errado, já temos pelo menos uma
universidade em todas as 18 províncias. Sendo mais
otimista, há universidades do Estado em todas as regiões académicas, mas também já existe um empreendedorismo mais ativo com vários empresários a
apostarem no setor privado. Por exemplo, falo da
Universidade Lusíada onde trabalho; temos estruturas em Cabinda, Luanda, Benguela, Zaire, Lobito e
Lunda Sul. O mapa vai crescendo. Outras universidades privadas vão também fazendo o seu papel.
Temos que apostar muito fortemente na formação. Aliás, países que conseguiram um desenvolvimento sustentável fixo, como Japão, Correia
do Sul, e Portugal, assim o fizeram. A aposta no
capital humano será um fator decisivo para garantir a continuidade do crescimento económico
do país, porque a formação científica é a base do
desenvolvimento.
Ultrapassado o diferendo político-diplomático
luso-angolano, e uma vez que se prevê a realização
da cimeira bilateral ao mais alto nível, considera
que é possível alargar ainda mais a cooperação
entre Angola e Portugal?
Acredito que sim. A recente visita a Angola do
ministro português Rui Machete foi prova de que
estava «enterrado o machado» que ainda separava
algumas partes, porque, como digo sempre, as
relações entre os Estados poderão ter registado um
resfriamento em 2013, mas as relações entre os
dois povos continuaram. Angola continua a ser um
parceiro estratégico para Portugal. É o maior parceiro comercial em África.
Deve-se incrementar a cooperação na área dos
vistos. A área da saúde também deve merecer
maior cooperação. Os hospitais privados portugueses têm tido, acima de tudo, uma grande base
de clientes angolanos. Agora, espera-se que os
hospitais privados possam deslocalizar-se para
Angola e levar o seu saber fazer para servir mais as
populações. Na área da educação, Portugal continua a ser um parceiro privilegiado e estratégico.
Na agricultura, também podemos contar com a
experiência portuguesa. No ramo das ciências e
da investigação biomédica podemos desenvolver
ainda mais a cooperação para que algumas doenças raras possam ser combatidas. E uma área
sempre plausível é o turismo. Podemos aprender
muito com os operadores turísticos portugueses
para explorar ao máximo as grandes potencialidades angolanas.
África21– abril 2015
7
A crise económica provocada pela queda do preço
do petróleo tem suscitado algum receio por parte
de investidores estrangeiros, nomeadamente
portugueses, pelo potencial reflexo nos negócios.
Justifica-se este receio?
Os receios de alguns empresários portugueses são
justificáveis na medida em que muitos deles fizeram
uma forte aposta no desenvolvimento das respetivas
empresas e indústrias, a contar com a tendência de
crescimento do mercado angolano. Num primeiro
momento, muito antes desta crise económica no
mercado internacional, o Governo de Angola tinha
lançado a nova Pauta Aduaneira, em março de
2014, que já regulamentava a entrada no país de alguns produtos que tinham sofrido aumentos substanciais nos seus custos de importação.
Na altura, foi feito um desafio a muitos empresários, não só portugueses, de deslocalização das suas
DR
“Há países
dos Grandes
Lagos que,
desde 2005, não
regularizam
a situação
das suas
quotas na
organização”
DA URSS A PROFESSOR UNIVERSITÁRIO
Não revela a idade. Prefere dizer que está na fase intermédia, entre a idade de
Cristo e os 40 anos. «O local de nascimento também está envolvido em mistério».
Os pais estudavam na URSS. Estava sempre dividido entre Luanda e Moscovo,
Minsk (Bielorússia) e Yarkov, na Ucrânia. Só em 1994, regressa definitivamente a
Angola com a mãe. Fixaram-se na província da Huíla, onde frequentou a Escola
Mandume e André Mufaio, e depois a Escola Portuguesa do Lubango. Licenciou-se em Relações Internacionais na Universidade Lusíada de Angola (ULA).
Em 2005, quando frequentava o 3.º ano do curso, é selecionado como monitor. Assim começa a sua carreira, tendo passado também pelo Centro Desportivo
e Cultural da ULA. Em 2008, parte com destino a Portugal para fazer mestrado,
regressando dois anos depois a Luanda, após a defesa da dissertação sobre
«Angola, Economia e Petróleo, 2002-2010», que deu título ao seu primeiro livro.
Entretanto, assumiu o cargo de coordenador do curso de Relações Internacionais na ULA. Foi diretor do Gabinete do Centro de Estudos de Investigação
Científica e pós-Graduções e é agora professor na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas e diretor do Gabinete de Cooperação e Relações Institucionais
da ULA. Agora é convidado da Universidade Lusíada de Lisboa para dar aulas
no âmbito de uma pós-graduação euro-afro-americana, mantendo a colaboração com aquele centro de investigação científica.
Tem vários livros publicados: A Nova Política Externa de Angola no Contexto
Internacional (obra coletiva), União Africana, Quo Vadis? e Angola - Um Actor
Importante no Peace-making e Peace-keaping em África.
8
abril 2015 –
África21
indústrias, porque assim também iriam garantir mais
postos de trabalho para os angolanos. Com a queda
do preço do barril de petróleo no mercado internacional houve a necessidade de fazer uma reestruturação
na economia nacional e, claro, o Ministério do
Comércio tomou as medidas que conhecemos e alguns empresários portugueses sentem-se limitados
em poderem exportar para Angola porque foram fixadas algumas cotas de importação – aliás como
existem também na União Europeia.
De toda a forma, é uma crise que desperta para
a necessidade de medidas de diversificação da
economia visando reduzir a dependência do
petróleo?
Sim. António Agostinho Neto dizia que a agricultura
é a base e a indústria um fator estratégico. Sempre
seguimos este ditado. Agora, mais do que nunca, deve-se apostar na diversificação da economia e a importação de indústria para instalação em Angola é
certamente um fator estratégico.
O que se pretende é criar novos fatores de
produção para garantir mais emprego e fazer com
que o país se torne autossustentável e desenvolvido
o suficiente para que, quando haja estas crises nos
mercados internacionais, não possamos viver
como um país que tem a doença holandesa.
O próprio FMI disse claramente que Angola não
precisava de um resgate para a sua economia, mas
de implementar medidas que passem, por exemplo, pela redução dos subsídios aos combustíveis.
Porque acredita-se que o país tem potencial não só
no ramo das energias renováveis e não renováveis
como no ramo da agricultura e da indústria.
Considera que a crise na região dos Grandes Lagos, nomeadamente na República Democrática
do Congo, é uma ferida difícil de sarar?
Tem havido desenvolvimentos positivos. Desde
que assumiu em 15 de janeiro de 2014 a presidência da Conferência Internacional sobre a Região
dos Grandes Lagos (CIRGL), Angola conseguiu
redinamizar esta organização e levar alguma paz
aos Grandes Lagos, embora não seja ao nível que se
pretende. Em março de 2014, Angola conseguiu,
juntamento com as Nações Unidas e as autoridades da RDC, o desmantelamento do grupo rebelde
M23, mas infelizmente renasceram as Forças
Democráticas para a Libertação do Rwanda, que
até agora continuam a ser combatidas na via diplomática como a nível local para que desarmem e
deixem as populações em paz. A paz para a RDC é
também uma prioridade para a diplomacia angolana,
porque, como sabemos, Angola e a RDC partilham
a 13.ª maior fronteira do mundo. Tendo paz na
RDC haverá também paz em Angola.
A 11 de março terminou em Luanda o X Fórum
dos Ministros dos Negócios Estrangeiros da CIRGL.
Enquanto presidente da organização e no âmbito
da sua permanência no Conselho de Segurança da
ONU, Angola tem colocado a região na agenda internacional para que seja possível aplicar o Pacto de
Defesa, Segurança e Estabilidade dos Grandes Lagos,
que diz que nenhum país membro pode atacar ou
desestabilizar outro país. E o que a ONU constatou é
que havia indícios fortes de que países como Rwanda
e Uganda estariam a fazer vista grossa aos rebeldes que
atacassem a RDC. Não é isso que se pretende.
Estivemos com o Presidente José Eduardo dos
Santos na RDC, vimos que é um país que quer
crescer, tem potencialidades e vamos aguardar que as
partes em conflito, os rebeldes e o Governo, possam
chegar a uma plataforma de entendimento.
Mas ainda existem muitos fatores de bloqueio,
difíceis de se ultrapassar até que Angola deixe a
presidência em 2016?
A questão fundamental, como constatamos na
RDC, é para onde é que vão os rebeldes das Forças
Democráticas para a Libertação do Rwanda. Onde
é que serão enquadradas estas pessoas? Sabemos
que é uma fação que advém do genocídio do Rwanda,
de 1994. Não são nem queridos no Rwanda nem
bem-vindos na RDC. Estão a viver ilegalmente na
RDC há 21 anos. Portanto, criando-se uma zona
pacífica para lá viverem o que é que iriam desenvolver depois? É que as Forças Democráticas para
a Libertação do Rwanda também não querem seguir um roteiro para a paz porque são forças potencialmente belicistas.
Espera-se que até Angola abandonar a presidência da organização já tenha sido encontrada uma solução. Sabe-se que o modelo de paz em Angola só deu
certo porque o Governo abriu mão de tudo, reintegrou todas as forças, não só da UNITA, e é isso que se
espera que a RDC, Rwanda ou Uganda façam.
Nesta fase de contenção financeira, Angola estará
em condições de vencer os desafios que se lhe colocam para a pacificação efetiva na região, dado os
custos que isso implica?
Angola está a racionalizar os seus recursos, mas também está preparada para enfrentar estes desafios, a
nível interno e externo. Apesar de estar a reestruturar
a sua economia, o Governo não abriu mão face aos
desafios nos Grandes Lagos. Mas também não vamos
querer que suporte sozinha a carga de 14 países membros, além dos países observadores.
Há países dos Grandes Lagos que, desde 2005,
não regularizam as suas quotas. A conjuntura internacional está difícil para todos e tem de haver empenho
de todos para vencer os desafios. A organização é hoje
mais saudável e acredita-se que o país que suceder a
Angola, pensamos que venha a ser o Quénia, consiga
manter esta dinâmica.
Indo mais para Norte, na Nigéria, temos o drama
do terrorismo alimentado pelos radicais extremistas do Boko Haram. É um problema que deve
merecer uma resposta veemente de todos os países
africanos?
Não é um problema só da Nigéria. É um problema
transfronteiriço. O grupo já ameaça o Chade e quer
ameaçar o Níger. Nos Camarões tem havido combates nas florestas. O Boko Haram chegou a fazer vítimas, inclusive raptou reféns, atingindo também familiares dos membros do Executivo camaronês.
É muito preocupante porque o fenómeno
pode alastrar-se e deixar de ser uma questão só da
CEDEAO (Comunidade Económica e de Desenvolvimento dos Estados da África Ocidental) para
passar a ser também uma questão da CEEAC (Comunidade Económica dos Estados da África Central). E quando é assim constitui perigo para os países dos Grandes Lagos ou da África Central, da qual
Angola também faz parte. A solidariedade africana
tem que se fazer sentir. Já foi aprovado um contingente africano para ajudar as autoridades nigerianas
a combater o Boko Haram.
O grupo radical tem feito atos muito sangrentos, condenáveis a todos os níveis. Uma das grandes
críticas feitas a nível internacional é que o combate
no plano interno não tem sido aquilo que se espera.
Espera-se por uma maior pro-atividade das autoridades da Nigéria.
A recente aliança ao Estado Islâmico não justificaria uma maior solidariedade ou apoio internacional pela sua ligação ao terrorismo?
Naturalmente. O Estado Islâmico tem feito ações
horríveis, inclusive destruindo património da humanidade. O facto do seu líder Muhammad Abubakar
Shekau ter feito juramento de prestar lealdade ao
Estado Islâmico é uma questão ainda mais preocupante.
Talvez os EUA engajem mais esforços no combate ao
Boko Haram. A resposta da comunidade internacional tem sido assimétrica nestas questões. O Boko Haram massacra milhares de pessoas e a comunidade internacional não reage tão energicamente como, por
exemplo, aos atentados do Charlie Hebdo em Paris.
Não vemos a mesma solidariedade em África, na
mesma proporção com que foi feita em França.
“Com a queda
do preço
do barril
de petróleo
no mercado
internacional
houve
necessidade
de fazer uma
reestruturação
na economia
nacional”
“Espera-se
uma maior
pró-atividade
das autoridades
da Nigéria,
porque o Boko
Haram
é uma enorme
ameaça”
África21– abril 2015
9
Onde os seus negócios acontecem!
FEIRAS MAIO - AGOSTO 2015
4 º S AL ÃO I N T E R N AC I O N AL D AS
T E C N O LO G I AS D E I N F O R MA Ç Ã O
ANGOLA 2015
E C O MU N I C A Ç Õ E S D E A N GO L A
O DESAFIO DO SECTOR DAS TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO
NO CONTEXTO DA DIVERSIFICAÇÃO DA ECONOMIA
5ª EDIÇÃO DA FEIRA INTERNACIONAL DE TECNOLOGIAS AMBIENTAIS
PROMOVER AS NORMAS AMBIENTAIS EM
TODOS OS SECTORES DA ECONOMIA
5
14 ‐ 17 MAIO
INSTALAÇÕES DA FILDA
LUANDA
04 ‐ 07 JUNHO
INSTALAÇÕES DA FILDA
LUANDA
21 ‐ 26 JULHO
INSTALAÇÕES DA FILDA
LUANDA
FILDA 40 ANOS DE INDEPENDÊNCIA DE ANGOLA
2ª
“A Vida Faz-se nos Municípios”
5
06 ‐ 09 AGOSTO
INSTALAÇÕES DA FILDA
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10
abril 2015 –
África21
O meu Governo não irá permitir que se
incite ao ódio contra outras comunidades
contas de apoiantes no Twitter
tinha o Estado Islâmico
no final de 2014
NARENDRA MODI, primeiro-ministro indiano
DR
Importação de armas em África
aumentou 45% numa década
As importações de armas em África aumentaram 45%
entre 2005 e 2014. Os dados são do Instituto Internacional de Pesquisas da Paz de Estocolmo. Os três maiores
importadores foram a Argélia (30%), Marrocos (26%) e
Sudão (6%). A África Subsariana foi responsável por
42% das importações de todo o continente.
Neste período, as importações da Argélia aumentaram 3%; mas as do segundo país que mais importou,
Marrocos, subiram onze vezes. Em 2014, as principais
entregas à Argélia incluíram um porta-helicópteros da Itália, o último lote de 48 sistemas de defesa aérea da
Rússia e cerca de 50 canhões automáticos chineses.
Enquanto isso, Marrocos recebeu uma fragata de França.
Ambos têm ainda grandes encomendas em curso.
Já a Nigéria e os Camarões receberam armas de diversos fornecedores tendo em conta a urgência de melhorarem o seu equipamento para enfrentarem o Boko
Haram. Em 2014, estes dois países pediram e receberam helicópteros da China e da Rússia, e veículos blindados da China, da República Checa, da África do Sul e da
Ucrânia. O Canadá também forneceu veículos blindados,
mas com produção feita localmente (na Nigéria) ou nos
Emirados Árabes Unidos.
No sentido inverso, entre 2010 e 2014 o continente
africano foi responsável por 9% de todas as exportações
de armas. Os Estados Unidos continuam a ser o maior
exportador mundial, seguidos por Rússia, China, Alemanha
e França. Juntos, estes cinco países foram responsáveis
por 74% do volume de exportações de armas.
Angola ratifica o tratado
de proibição total de ensaios nucleares
DR
Antena21
“
46 mil
Angola tornou-se o 164.º Estado a ratificar o Tratado de Proibição
Total de Ensaios Nucleares (CTBT). O instrumento de ratificação foi
depositado em Nova Iorque a 20 de março. Luanda assinara o
CTBT em 27 de setembro de 1996, apenas três dias após a abertura do
tratado para assinatura. A ratificação segue-se ao anúncio feito pelo
país, em setembro de 2013, durante a Conferência sobre o artigo XIV,
de que o Conselho de Ministros angolano havia enviado o CTBT
para a Assembleia Nacional, em abril desse ano, para aprovação e
ratificação. Angola também tem mostrado o seu apoio ao Tratado ao
votar regularmente a favor do CTBT, na Assembleia Geral das Nações
Unidas.
Em África, apenas três países não assinaram ainda o tratado –
Maurícias, Sudão do Sul e Somália –, e oito países terão ainda de o
ratificar: Comores, República do Congo, Egito, Guiné Equatorial,
Gâmbia, São Tomé e Príncipe, Suazilândia e Zimbabwe.
O CTBT proíbe todas as explosões nucleares, em qualquer lugar e por qualquer pessoa ou entidade. A CTBTO, organização
responsável pelo tratado, tem vindo a construir um Sistema Internacional de Monitorização para se certificar de que nenhuma explosão
nuclear passe despercebida. Atualmente, cerca de 90% da rede foi
implantada, incluindo 31 estações em 22 países africanos. Os dados da monitorização por parte da CTBTO são também usados para
fins que não a verificação, como a monitorização de sismos, o alerta
para maremotos e a deteção de radioatividade após acidentes
nucleares.
África21– abril 2015
11
556 mil milhões
de dólares é quanto têm os dez homens
mais ricos do mundo, valor que corresponde
à soma das 78 economias mais pequenas
do planeta, segundo a revista Forbes
“
Cada degola, cada estátua destruída e cada
burka deveriam mostrar à Europa quem é o inimigo,
o radicalismo islâmico
FERREIRA FERNANDES, jornalista português
JOÃO GOMES/JORNAL DE ANGOLA
A Consumare - Organização Internacional de Associações de
Consumidores de Língua Portuguesa promove este ano um inquérito a todos os associados, que contribuirá para a realização
de um curso de formação intensiva, destinado aos técnicos das
associações membros. Está igualmente prevista a realização de
estudos aplicados à defesa dos consumidores nos países
membros.
A organização, criada em maio de 2014 em Lisboa e presidida
por Portugal, tem já como instrumento de aproximação o site
www.consumare.pt, aberto a todos que pretendam informação,
partilha e troca de legislação, atividades e projetos. Um dos seus
objetivos é ajudar a fortalecer a defesa do consumidor nos países
e territórios de língua oficial portuguesa com vista a aumentar a
participação cidadã, bem como fomentar a cooperação em várias
atividades inerentes a esta área. No seu primeiro ano de existência, a Consumare assinalou a data de 15 de março, Dia Mundial
dos Direitos do Consumidor, ao sublinhar a importância da criação e da consolidação de uma organização comum nos países
lusófonos de defesa dos direitos dos consumidores.
São fundadores oito associações lusófonas, entre as quais a
Federação Angolana de Associações de Consumidores, que preside a Assembleia Geral. Incluem o grupo a Proteste – Associação Brasileira de Defesa do Consumidor, a Associação Para a
Defesa do Consumidor de Cabo Verde e de Portugal, a Associação do Consumidor de Bens e Serviços da Guiné-Bissau, bem
como Associação Moçambicana para o Estudo e Defesa do Consumidor e a Associação São Tomense de Defesa do Consumidor,
sendo Macau o primeiro membro observador.
12
abril 2015 –
África21
TRACEY NEARMY/EPA
Consumare na defesa dos consumidores
e por uma participação cidadã
Vencer a pobreza
para salvar os elefantes de África
Dentro de cinco anos será talvez demasiado tarde para salvar
o elefante em África, alertam os defensores da fauna selvagem ameaçada de extinção, reunidos pela segunda vez no
mês de março em Gaborone, capital do Botswana.
Em 2006 a população africana de elefantes selvagens tinha sido avaliada em 550.000. Em 2013, aquando da primeira
conferência internacional sobre o tema, só restavam 470.000.
Apesar do plano de emergência então aprovado pelos países
africanos, a hecatombe continuou. Com 25.000 a 30.000 elefantes abatidos todos os anos por caçadores furtivos, a taxa
de mortalidade ultrapassa, a partir daqui, o ritmo de reprodução da espécie. O declínio é particularmente rápido na África
do Leste, sobretudo no Quénia e Tanzânia. O que significa
que o elefante selvagem poderá desaparecer dentro de dez a
vinte anos.
Segundo o ministro do ambiente do Botswana, Elias Matosi,
a caça furtiva e o tráfico do marfim são controlados por organizações criminosas internacionais que aproveitam os conflitos, as desordens sociais e a corrupção para prosperar.
Um estudo apresentado por Julian Blanc, representante
da CITES (Convenção Internacional contra o tráfego de espécies em perigo), mostra que os sítios onde se regista a maior
diminuição do número de elefantes são também os que têm a
mais elevada mortalidade humana, índice de pobreza extrema. A erradicação da miséria é parte inseparável da estratégia
para salvar os elefantes, concluiu.
“
2987
As mulheres estão fartas de serem
apenas apoiantes, não somos pom-pom girls
RDC denuncia ingerências políticas
A embaixada dos Estados Unidos reconheceu ter financiado um encontro entre jovens ativistas sobre a boa governação e a democracia, que
se efetuou em Kinshasa, na República Democrática do Congo, a 15 de
março, e durante o qual dezenas de pessoas, algumas das quais estrangeiras, e um diplomata americano foram detidos. Os jornalistas e o
diplomata foram libertados de imediato. Três senegaleses do movimento cívico «y’en a marre» (estamos fartos) e um burquinabê membro do
«balai citoyen» (vassoura cidadã), organizadora do levantamento popular que provocou a queda do Presidente Blaise Compaoré, foram expulsos a 18 de março. No mesmo dia, seis militantes e rappers congoleses
foram libertados, mas outros sete continuam presos acusados de preparar «atos de violência». Desde o início do ano, o governo de Kinshasa
tem denunciado ingerências estrangeiras na vida política nacional em
plena crise de preparação das próximas eleições presidenciais. Depois
de conseguir a partida de altos dirigentes da Missão da ONU (MONUSCO),
exige agora o fim da intervenção da ONU em curso desde 1999, enquanto o enviado especial do secretário-geral, o alemão Martin Kobler,
e 170 organizações da sociedade civil defendem que os capacetes
azuis devem permanecer pelo menos até às eleições.
…e teme ataques jiadistas
Jovens muçulmanos estariam a ser recrutados no Kivu do Sul para ir
combater no Norte e receber treino terrorista da ADF-Dalu, guerrilha
ugandesa há muito implantada no Leste da RDC, segundo revelou a
jornalista belga Colette Braeckman, citando fontes dos serviços secretos congoleses. Criada na década de 1990 pela fusão de dois grupos
armados que lutavam contra o regime do presidente Yoweri Museveni,
a ADF (sigla inglesa para Aliança das Forças Democráticas) figura
desde 2001 na lista das organizações terroristas elaborada pelo Departamento de Estado dos EUA. É dirigida desde 2007 por Jamil Mukulu,
um cristão convertido ao islão. É atualmente constituída em exclusivo
por islamistas radicalizados em contacto com os «shebab» da Somália
e os jiadistas do Quénia. Outros muçulmanos congoleses radicalizados
estariam a participar na reorganização do M23, a rebelião derrotada em
2013 no Leste da RDC, cujos ex-combatentes encontram-se refugiados
no Uganda. As notícias da expansão do terrorismo jiadista na Região
dos Grandes Lagos e da presença de somalis nas fileiras da ADF não
são novas mas até agora os serviços secretos ocidentais não as levaram a sério. Como no caso da República Centro-Africana garantem não
existirem indícios de radicalização religiosa entre a minoria muçulmana
e acusam Kampala e Kinshasa de invocar esta pretensa ameaça de
forma a obter apoios para os respetivos regimes.
REMI SONAIYA, primeira mulher candidata
à presidência da Nigéria
DR
deputados têm assento
no Congresso Nacional Chinês,
o maior parlamento do mundo
Coronel Vasco Lourenço, capitão de Abril e presidente da 25 A
Portugal em busca
da cidadania e utopia
Organizado pela Associação 25 de Abril (25 A) e enquadrado
nas comemorações do quadragésimo aniversário da revolução portuguesa de 1974, o «Congresso da Cidadania», realizado na Fundação Gulbenkian em Lisboa a 13 e 14 de
março, teve como objetivo declarado «debater o presente e o
futuro para melhorar a qualidade da nossa democracia»
e «obrigar os governantes a respeitar a dignidade dos portugueses enquanto cidadãos e a dignidade de Portugal no
mundo». O título escolhido era «Rutura e Utopia para a Próxima Revolução Democrática» e durante dois dias várias
dezenas de oradores subiram à tribuna para expor as suas
propostas em torno de três temas: «Regeneração do sistema
político», «Rumo estratégico para Portugal» e «Recuperação
da economia. Devolver a esperança e preparar o futuro».
A participação excedeu as expectativas dos organizadores e o coronel Vasco Lourenço, capitão de Abril e presidente
da 25 A, resumiu com frontalidade o sentimento geral quando
afirmou que «chegou o momento de dar um valente murro na
mesa». Como nos outros países europeus sujeitos a drásticas curas de austeridade, Portugal aspira a mudanças políticas, económicas e sociais, mas ao contrário do que acontece
na Grécia, Espanha ou França, o desejo de rutura permanece ultraminoritário, como os partidos e organizações cívicas
que participaram mais ativamente no congresso. A atual
maioria, o Governo e o Presidente foram os bombos da festa,
os partidos da oposição clássica, socialista e comunista ficaram prudentemente à margem. No público e entre os oradores – incluindo vários protocandidatos às próximas eleições presidenciais como Carvalho da Silva e Sampaio da
Nóvoa – predominavam os cabelos brancos, confirmando
que se vier a acontecer uma nova revolução seguirá
outros caminhos.
África21– abril 2015
13
LUANDA
Lojas Africana
Mutamba – Rua Rainha Ginga (junto à sede da Sonangol)
Hotel Skyna (hall do hotel)
Av. dos Combatentes (junto ao restaurante Ritz)
Shopping do Belas (junto à zona da restauração)
Maianga – (junto à rotunda da Martal)
Outros revendedores
Bombas Aeroporto Internacional 4 de Fevereiro
Bombas da Corimba
Bombas Embarcadouro do Mussulo
Casa dos Frescos Atrium - Junto ao Nova Vida
Casa dos Frescos Baixa Mutamba
Casa dos Frescos Brisas Talatona - Junto à Universidade Oscar Ribas
Casa dos Frescos Conchas Talatona - Junto à sede do Banco BIC
Casa dos Frescos Vila Alice - Junto ao Cine Atlântico
Cita Café dentro da Hyundai - Rua Rainha Ginga
Pastelaria Vouzelense
Gestoffice - Junto à Universidade Lusíada (Ex-Papelaria Fernandes)
Greenspot - Dentro do supermercado Max (Morro Bento)
Galeria Hotel Alvalade
Hotel Epic Sana Mutamba
Quiosque Las Palmas - dentro do Aeroporto Inter. 4 de Fevereiro
Supermercado Valoeste
Shopping Carmo – B. Marianga, perto da antiga Embaixada da África do Sul
Galeria Hotel Trópico
Livraria Mensagem Rua do 1º Congresso do MPLA Mutamba
Livraria Nguvulu - Vila de Viana – Junto à Igreja Católica
Star Angola (Viana) Rua Comandante Valódia, prédio da Conservatória
Livraria Sá da Bandeira – Maculusso
Pastelaria Snack das Quatro - Talatona
Livraria Papelaria Mestria – Kinaxixi, junto à farmácia do Kina Xixi
Supermercado Jofrabo – Maculusso, junto à Liga Africana
Universidade Metropolitana Bairro
Livraria Lello Mutamba - Perto da Sonangol
Distribuidora News Praia do Bispo - Perto do Mausoléu
LUBANGO
Livraria Lello
Centro Comercial Millennium
Livraria Texto Editores
HUAMBO
Ludim Centro Comercial – Cidade Alta - Rua Imaculada Conceição
Mercado Central da Baixa
BIÉ
Praça da Pouca Vergonha
BENGUELA
Supermercados Martins e Neves
Restaurante Tudo na Brasa
Pastelaria Flamingo
CAB (Café da Cidade)
LOBITO
Livraria Independência - Bairro 28, junto ao mercado
NAMIBE
Futuro sem limites FASHION, Lda.
Livraria Texto Editores
H30/cita na Rua 14 de Abril
Cantinho do Saber
14
abril 2015 –
África21
5 milhões
de engenhos explosivos terrestres
foram retirados em Angola desde 2002,
revelou João Baptista Kussumua,
ministro da Assistência e Reinserção Social
Ébola soma e segue
O surto de ébola já fez mais de 10.000 vítimas (10.200 até 19
de março) na África Ocidental e a epidemia parece voltar a
disparar na Serra Leoa e na Guiné Conacri. O aparecimento
de novos focos sem contactos com pessoas contaminadas ou
próximas de doentes coloca de maneira mais aguda a questão da identificação do vetor de transmissão do vírus ao homem. Enquanto não for conhecido, a epidemia não poderá
ser dada como controlada e corre o risco de se tornar endémica segundo os especialistas em virologia.
Na Libéria, país onde o ébola fez o maior número de mortos, um novo caso de contaminação foi detetado 27 dias depois
do último e quando as autoridades se preparavam para declarar o país «livre de vírus». Na Serra Leoa, com o maior número
de pessoas contaminadas até à data, foi decretado o recolher
obrigatório em Freetown e no norte do país de 27 a 29 de
março. Durante 72 horas, 2,5 milhões de pessoas foram obrigadas a permanecer em casa enquanto equipas sanitárias visitavam casa por casa para detetarem eventuais doentes. É na
Guiné Conacri, de onde partiu a epidemia, que a situação é
mais preocupante dada a disseminação dos novos focos de
infeção por todo o país. Apesar disso, os governos ocidentais e
as grandes ONG estão a repatriar militares e voluntários.
A missão militar americana na Libéria terminou a 26 de março
(ver artigo sobre o ébola nesta edição).
dr
Postos de Venda
da Revista África21
1000 milhões
dr
de pessoas no mundo nunca tiveram acesso
à medicina moderna, de acordo com a OMS
Muhammadu Buhari venceu as eleições presidenciais
Muhammadu Buhari é o novo Presidente da Nigéria
O candidato da oposição, Muhammadu Buhari, venceu as eleições da Nigéria, realizadas a 28 e 29 de março, tendo obtido 53,95% dos votos, enquanto o atual Presidente
Goodluck Jonathan não conseguiu mais de 44,96%. Entre ambos houve uma diferença
de cerca de 2,5 milhões de votos.
Ao fim de três derrotas, em 2003, 2007 e 2011, Buhari (72 anos), antigo general e
ex-Presidente de um governo militar nos anos de 1980, de etnia peul e originário do
Norte, de maioria muçulmana, prometeu livrar os nigerianos da corrupção, que é considerada um dos piores males da primeira potência económica de África.
É a primeira vez que no país um Presidente deixa o poder pela vontade expressa da
população nas urnas. O Partido Democrático do Povo, de Jonathan, estava no poder
desde o fim do regime militar, em 1999, mas tem vindo a perder popularidade devido sobretudo a escândalos de corrupção. Simultaneamente, tem sido fortemente criticada,
dentro e fora do país, a «inação» do atual Presidente perante as ofensivas do Boko Haram, a seita islamista nigeriana cujos crimes e atrocidades ultrapassam os de todas as
outras organizações terroristas, incluindo o Estado Islâmico de que se declarou vassalo.
Na reta final da campanha, Goodluck Jonathan (cristão) multiplicou as declarações
otimistas acerca de derrota iminente do Boko Haram. Mas a afirmação de que «menos de
um mês» seria necessário para completar a tarefa não convenceu ninguém. Buhari, agora
eleito, diz que se converteu à democracia e promete acabar com a insurgência islamista.
Apesar da insegurança, das tensões sociais e das greves provocadas pela queda
do preço do petróleo e da crise económica galopante, a comissão nacional eleitoral garante ter feito «tudo o que era humanamente possível» para garantir um escrutínio
«credível», incluindo nos campos de deslocados. Há, no entanto, receios de que os resultados possam criar nova instabilidade no país. Mesmo antes das eleições, duas das
organizações regionais africanas de que fazem parte quatro dos PALOP, a CEDEAO
(Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental) e a CEEAC (Comunidade
Económica dos Estados da África Central) convocaram uma cimeira conjunta para 7 e 8
de abril. Oficialmente tratar-se-á de afinar a estratégia anti-Boko Haram. Mas é a situação do gigante regional que está no centro das preocupações.
A Nigéria será o tema em destaque da próxima edição da África21.
“
O preço do metro quadrado na Baía de
Luanda está seguramente no top-5 a nível mundial
e há procura para projetos ainda em papel
JOAQUIM FITAS, presidente executivo da construtora Soares da Costa
Justiça e política
nas condenações de Simone
Gbagbo e Karim Wade
Um tribunal de Abidjan condenou a 9 de março
Simone Gbagbo, mulher do ex-Presidente da
Costa do Marfim, a 20 anos de cadeia por «atentado contra a autoridade do Estado, participação
num movimento insurrecional e perturbação da
ordem pública». O Tribunal Penal Internacional
(TPI) queria julgar a ex-primeira-dama pela sua
participação nos atos de violência pós-eleitorais de
2011, que causaram mais de 3000 mortos, mas as
autoridades marfinenses recusaram a sua
extradição.
Detida com Laurent Gbagbo a 11 de abril de
2011, Simone foi desterrada para Odienne, no
Norte do país, enquanto o ex-Presidente era levado para Haia onde aguarda o veredicto do TPI.
O processo de 78 altos dirigentes do antigo regime
– incluindo vários ex-ministros, a mulher e um filho
de Laurent Gbagbo – durou dois meses e resultou
em pesadas condenações. Combativa, a «dama
de ferro», que os seus admiradores chamam de
«mama» e os adversários de «bruxa», diz-se vítima de um processo político e disposta a continuar
a batalha para levar perante a justiça os «cúmplices» do Presidente Ouattara que continua a considerar como um «usurpador».
A justiça senegalesa teve também mão pesada para outro ex-poderoso que deixou de o ser,
Karim Wade, filho do ex-Presidente Abdoulaye
Wade. Acusado de enriquecimento ilícito e preso
pouco depois do pai ter perdido as eleições de
2012, acaba de ser condenado a seis anos de
prisão e ao pagamento de uma multa de 210 milhões de dólares. O seu pai tinha regressado ao
Senegal para mobilizar a opinião e Karim tinha
sido designado a 21 de março candidato do Partido Democrático Senegalês, a formação fundada
por Abdoulaye Wade às próximas eleições presidenciais. Segundo o PDS, o processo foi uma paródia de justiça destinado a assassinar politicamente o seu candidato e provável vencedor.
África21– abril 2015
15
“
750 milhões
Sou africano com muito orgulho. Roubaram-nos
o nosso passado, tentaram roubar a nossa história,
mas a nossa cultura é só nossa
Cidades africanas lançam
prémio José Eduardo dos Santos
A União das Cidades Africanas e a revista britânica African
Business vão lançar em abril o «Prémio Africano José Eduardo
dos Santos», para homenagear presidentes de câmaras,
governadores de cidades de África e outras individualidades
que se destacarem «nas boas práticas a nível da gestão
urbana». O lançamento do prémio vai ocorrer entre 29 e 30
de abril, durante a realização de um fórum sobre infraestruturas em África.
Este anúncio foi feito pelo ministro do Urbanismo e da
Habitação, José António da Conceição e Silva, numa entrevista à exclusiva à Angop, para abordar o estado do setor
no país e o balanço de 40 anos de independência. Para o
ministro, a criação da distinção com a designação José
Eduardo dos Santos «revela, por si só, o reconhecimento
da comunidade internacional daquilo que Angola tem estado
a gizar na área de urbanismo e habitação», algo «encabeçado pelo Presidente da República». O prémio vai ter periodicidade anual e abrange vários países.
Combate à raiva custa milhões por ano
Mais de 235 mil cães, gatos e macacos vão ser vacinados contra
a raiva em Luanda, numa tentativa das autoridades sanitárias
para conter o surto de uma doença que só em vacinas poderá
custar anualmente seis milhões de dólares. Só na província
capital já morreram 34 pessoas por raiva desde o início do ano,
92% dos casos envolvendo menores de dez anos. No mesmo
período, em toda a província, foram notificados 4290 casos de
mordedura por animais.
«Podemos facilmente prevenir a raiva através de campanhas regulares de vacinação e de sensibilização comunitária,
mas cujo impacto na vida das populações já se tornou um sério
problema de saúde pública», alertou o representante da Organização Mundial de Saúde (OMS) em Angola, Hernando Agudelo.
A organização diz que o tratamento para a doença é 100 vezes
mais dispendioso que a vacina.
«Em todos os municípios de Luanda a taxa de letalidade foi de
100%, e as autoridades estão particularmente preocupadas porque 80% das vítimas abandonam o tratamento», reconhece a
OMS. A organização estima que o África registe uma média de 24
mil mortes anuais por raiva, mais de 90% dos casos provocados
pela mordedura de cães raivosos e em áreas urbanas.
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abril 2015 –
África21
HICHAM AYUCOUCH, cineasta marroquino,
vencedor do festival de cinema de Ouagadougou 2015
FRANCISCO BERNARDO/JORNAL DE ANGOLA
de pessoas não tem acesso a água potável,
325 milhões das quais
vivem na África Subsariana
Denis Sassou Nguesso fez visita oficial de três dias a Angola
Angola e República do Congo
eliminam vistos de entrada
Angola e República do Congo assinaram em março vários acordos de
cooperação, incluindo sobre a supressão recíproca de vistos de entrada
em passaportes diplomáticos e de serviço. Os acordos foram assinados
durante a visita oficial de três dias que o Chefe de Estado congolês, Denis
Sassou Nguesso, efetuou a Angola.
De acordo com o diretor para África e Médio Oriente do ministério angolano das Relações Exteriores, Joaquim do Espírito Santo, as relações
entre Angola e Congo «são de longa data e estão alicerçadas na longa
história de libertação dos povos africanos, de independência política e afirmação económica no contexto das Nações». Para o diplomata, os dois
países vivem uma fase importante na sua política ativa, em que todos os
esforços concorrem para o desenvolvimento económico e social, com vista
à criação de condições para o bem-estar das suas populações e para o
desenvolvimento dos dois países.
Um ano de africa21online.com
O portal africa21online.com celebra um ano de atividade. Lançado a 1 de
abril de 2014, 0.afirmou-se já como um meio online de referência na abordagem jornalística em língua portuguesa ao continente africano. O portal já
colocou online 10.150 peças, entre notícias, entrevistas, reportagens e estudos sobre os mais diversos temas. Os especiais sobre o ébola, as eleições na Guiné-Bissau, a CAN, o petróleo, a aviação em África, o turismo
ou as eleições na Nigéria têm merecido uma atenção especial de quem
acompanha o projeto. A abordagem ao vírus do ébola já contou, até hoje,
com mais de 250 notícias e reportagens, com a redação do portal a acompanhar com particular atenção as incidências da doença e os avanços em
termos de investigação médica. Segundo as estatísticas, o portal tem uma
audiência essencialmente angolana, portuguesa e brasileira, embora também apresente um número elevado de leitores em Moçambique, Cabo
Verde, África do Sul, Grã-Bretanha e Estados Unidos.
“
225
A dedicação do povo namibiano à paz e à
estabilidade tornou possível este prémio
feiticeiros e adivinhos foram detidos
numa megaoperação na Tanzânia
para travar assassinatos
e ataques contra pessoas albinas
HIFIKEPUNYE POHAMBA, presidente da Namíbia
que recebeu o Prémio Mo Ibrahim, de Excelência na Liderança Africana
YAHYA ARHAB/EPA
«Bartolomeu Dias»
em São Tomé e Príncipe
A fragata Bartolomeu Dias, com 172 militares da Marinha
Portuguesa, escalou São Tomé e Príncipe, em meados
de março, numa missão abrangente que incluiu a formação dos efetivos do país africano. A operação denominada Mar Aberto «traduz o empenho de Portugal no fortalecimento das relações de cooperação e confiança entre os
PALOP e tem por finalidade cooperar no desenvolvimento
de atividades tendentes à edificação de capacidades próprias dos países parceiros, no quadro da estrutura superior das Forças Armadas, dos sistemas de segurança
marítima e de autoridade marítima».
Comandada pelo capitão Paulo Cavaleiro Ângelo, a
presença da fragata no arquilélago permitiu realizar instruções e treino em terra no domínio das operações de
busca e salvamento marítimo e de vigilância e fiscalização, assim como ações de formação na área específica
das operações de mergulho. Os militares da Guarda
Costeira local também participaram em ações de treino
de perícias de marinharia, abordagem e recuperação de
náufragos, incluindo todas as disciplinas relacionadas
com a segurança marítima. No âmbito do exercício internacional Obangame Express, que se realizou após a
iniciativa Mar Aberto, a fragata portuguesa embarcou, de
19 a 20 de março, uma equipa de militares da Guarda
Costeira santomense, numa operação de treino dos
parceiros regionais no combate às ameaças marítimas e
à promoção da cooperação entre países africanos, europeus e os Estados Unidos da América.
Ataque a uma mesquita em Sanaa
PAULO CORDEIRO/LUSA
A(s) guerra(s) do Iémen
A Arábia Saudita começou a 25 de março a bombardear as posições
ocupadas pelos rebeldes hutis e os partidários do ex-Presidente do Iémen Ali Abdallah Saleh (derrubado em 2011), que se apoderaram em
fevereiro da capital Sanaa e ameaçavam conquistar o porto estratégico
de Áden, à entrada do mar Vermelho.
A ofensiva saudita recebeu imediatamente o apoio das monarquias sunitas da região e também do Egito, Turquia, Sudão, Paquistão e dos Estados Unidos. Riad alega que a intervenção por agora aérea, mas que pode
levar à intervenção de tropas terrestres, responde ao apelo do presidente
Abd Rabo el-Mansur, reconhecido pela ONU e pela comunidade internacional. Mas as declarações dos líderes da coligação – que não esperaram pela
luz verde da Liga Árabe ou do Conselho de Segurança – mostram que esta
manifestação de força tem como alvo principal o Irão, acusado de apoiar os
hutis (minoria do norte do Iémen que pratica o zaidismo, ramo dissidente do
xiismo). Os especialistas temem que esta «guerra por procuração» entre a
Arábia Saudita e o Irão em solo iemenita tenha as mesmas consequências
que no Iraque e na Síria e que o acirrar da violência sectária entre sunitas e
xiitas faça o jogo dos salafistas e outros jiadistas que se reclamam do Estado
Islâmico (EI), que consideram os monarcas e outros dirigentes sunitas como
«heréticos» e idolatras.
Até recentemente, a ameaça terrorista no Iémen era representada pela
Al-Qaeda na Península Arábica (AQPA), considerada como o ramo mais
ativo da organização fundada por Bin Laden. Os Estados Unidos realizam
há anos bombardeamentos contra posições da AQPA no sul do Iémen com
a anuência da Arábia Saudita e das outras monarquias sunitas da região,
também elas ameaçadas pela Al-Qaeda. Mas os atentados de 20 de março
contra três mesquitas em Sanaa reivindicados pelo EI, que causaram 142
mortos e três centenas de feridos, revelam que aqui como no resto da nebulosa terrorista o EI está a ganhar terreno em detrimento da Al-Qaeda.
África21– abril 2015
17
“
Não haverá estado palestiniano enquanto eu
estiver no poder
BENJAMIN NETANYAHU, primeiro-ministro de Israel
Namíbia festeja
25 anos de independência
e sucessos
As comemorações do 25.º aniversário da independência da Namíbia a 21 de março coincidiram com
a tomada de posse do presidente eleito em dezembro, Hage Geingob, e com a homenagem ao
presidente cessante Hifikepunye Pohamba, galardoado em março com o prémio Mo Ibrahim, pela
boa governação em África.
O galardão instituído pela fundação criada
pelo magnata sudanês das telecomunicações Mo
Ibrahim é o mais valioso do mundo já que além do
prémio de cinco milhões de dólares atribui ao estadista recompensado uma renda vitalícia de
200.000 dólares/ano. Considerado como uma espécie de «complemento de reforma» para os
Chefes de Estado que se retiram passado o prazo
constitucional previsto, o prémio Mo Ibrahim foi
atribuído pela primeira vez em 2007 ao ex-Presidente moçambicano Joaquim Chissano e em 2008
ao botsuanês Festus Mogae. O cabo-verdiano
Pedro Pires foi agraciado em 2011 e desde então
o prémio ficou vacante, considerando o júri que
nenhum Chefe de Estado africano preenchia os
seus critérios de atribuição.
Elogiado pela sua modéstia e moderação,
Pohamba, de 80 anos, é um histórico da SWAPO,
o partido no poder na Namíbia desde a independência. Fez toda a sua carreira política na sombra
de Sam Nujoma, o pai fundador e o seu «sucessor
natural» em 2004 quando Nujoma renunciou a
candidatar-se a um quarto mandato. O seu sucessor foi primeiro-ministro da Namíbia durante 15
anos, sob o mandato de Nujoma e de novo desde
2012. Três anos mais novo que Pohamba, Geigob
tem um perfil muito diferente. Formado em ciência
política nos EUA, onde se exilou em 1964, fez
carreira na ONU só regressando ao país em 1989
para participar na primeira campanha eleitoral.
O Presidente José Eduardo dos Santos, que
se deslocou a Windhoek para as comemorações,
lembrou os «enormes sacrifícios» que a independência da Namíbia custou a Angola.
18
abril 2015 –
África21
Gente
REMI SONAIYA Primeira mulher candidata à presidência da Nigéria nas eleições de março, diz que as
mulheres africanas estão fartas de só serem chamadas para fazer parte das «claques». Esta professora
reformada (60 anos) não tinha a menor possibilidade de
vencer num país onde as mulheres ocupam lugares de responsabilidade, no governo e nos negócios, mas são politicamente subalternizadas. O clientelismo, os milhões gastos pelos grandes partidos em publicidade, comícios e «prendas» deturpam a livre expressão da vontade eleitoral.
«Pedem-me dinheiro em todo o lado. É lamentável mas é a realidade que
sempre existiu aqui», diz. Sem acesso aos grandes meios de comunicação
Remi Sonayia e o seu partido Kowa recorreram às redes sociais e ao porta-a-porta para fazer passar a sua mensagem centrada na dignidade, igualdade,
resolução dos problemas sociais e luta contra a corrupção.
ANGÉLIQUE KIDJO Esta cantora e compositora originária do Benim foi premiada com o seu segundo
Grammy, pelo álbum Eve, descrito como uma homenagem às mulheres africanas. «Para mim, a música
é uma arma de paz, e hoje mais do que nunca, como
artistas temos um papel a desempenhar na estabilidade do mundo», disse ao receber o prémio em fevereiro. Kidjo é também uma reconhecida ativista, defensora
dos direitos das mulheres, tendo participado em diversas iniciativas para
consciencializar o mundo para problemas como o tráfico de crianças, mutilação genital feminina, discriminação sexual e VIH/sida. «Para mim o silêncio
mata. Muita da violência contra as mulheres continua porque elas a silenciam», afirma. Na música, é conhecida pela forma como se movimenta entre
diferentes géneros musicais, do afropop aos estilos latinos, passando pelo
gospel e pelo jazz. É reconhecida pela imprensa internacional como «diva» de
África, ícone do continente e personalidade inspiradora.
THIKRA ALWASH Doutorada em engenharia civil, é a
primeira mulher a liderar a Câmara de Bagdade nos
1252 anos da cidade. É vista como uma tecnocrata,
sem afiliações partidárias, e dirigia até agora o departamento de projetos do Ministério da Educação
do Iraque. Thikra Alwash foi nomeada para o cargo
pelo primeiro-ministro Haider al-Abadi, de forma a
substituir Naeem Aboub, figura que não colhia a simpatia
da opinião pública. A escolha de uma mulher é vista como um ato importante,
num país onde existem apenas duas ministras em 29 pastas, e no Parlamento, das 83 deputadas com assento, apenas 22 foram eleitas. Thikra Alwash é
também a única mulher a presidir a uma câmara de uma capital de um país
da Liga Árabe. Para o seu mandato, a engenheira quer sobretudo empenhar-se na recuperação geral de Bagdade. A cidade surge no último lugar da lista
sobre qualidade de vida em cidades, da consultora Mercer.
África21– abril 2015
19
o turismo em áfrica
O gradual crescimento
do turismo em África
Paisagens naturais que vão da savana às
altas montanhas, passando por praias e alguns dos mais carismáticos rios e lagos do
mundo. Uma diversidade cultural imensa,
a vida selvagem no seu esplendor, um mundo rural preservado e cidades com arquiteturas de várias épocas e estilos. Uma pluralidade linguística com milhares de línguas
e dialetos, uma gastronomia que explora a
essência dos ingredientes e o peso da história de um continente que foi o berço da humanidade e onde se ergueram civilizações
20
abril 2015 –
África21
como a do antigo Egito. As potencialidades
são muitas e estão bem expressas nos 129
sítios considerados Património Mundial,
localizados em 37 países.
África oferece muito. Mas ainda recebe
poucos turistas. O continente apenas acolhe cerca de três por cento do turismo mundial. A falta de estratégias para a afirmação
nos mercados internacionais, infraestruturas deficientes, a instabilidade política e os
conflitos militares em diversos países têm
contribuído para que o setor não correspon-
da ainda às expectativas e desejos de muitos
países. No entanto, tem vindo nos últimos
anos a ganhar novos visitantes. Entre 1990
e 2012 registou um aumento de 300% e
2014 trouxe um novo incremento. Reflexo desta tendência é a presença dos grandes
grupos hoteleiros, que na África Subsariana
se intensificou quase 30% em 2014.
Hoje, os principais destinos turísticos
são Marrocos, África do Sul, Egito, Tunísia
e Zimbabwe. Mas há países em ascensão,
como Cabo Verde, e outros que estão a fa-
zer apostas fortes para o futuro. É o caso de
Angola. O investimento é generalizado, e
Estados como a RDC ou a Serra Leoa receberam no ano passado os primeiros grandes
hotéis. O setor emprega, atualmente, cerca
de 2,2 milhões de pessoas em todo o continente e a conclusão de que o desenvolvimento de um turismo sustentável pode
contribuir para o progresso e para a coesão
social é hoje consensual.
Miguel Correia e Natacha Mosso
África21– abril 2015
21
o turismo em áfrica
Um continente em busca
O turismo em África há muito que se baseia na exploração das
belezas naturais e na sua inigualável vida selvagem, apesar da
ameaça da caça, de alguns conflitos armados e das alterações
climáticas que põem em causa a sua sustentabilidade. Embora
seja o continente que menos turistas recebe, os últimos anos têm
revelado um aumento sustentado de visitantes e uma significativa
melhoria das infraestruturas e de opções turísticas. A marca dos
50 milhões de turistas por ano já foi ultrapassada.
«O
Karnak era menor do que
o Papyrus ou o Lótus, navios da Primeira Catarata,
grandes de mais para passar pelos canais da
represa de Assuão. Os passageiros subiram
para bordo, indo logo procurar as suas acomodações. Como o navio não estava cheio,
muitos tinham cabines no tombadilho de
passeio. Toda a parte fronteira desse tombadilho era ocupada por um salão envidraçado, onde os passageiros podiam sentar-se
para admirar o rio. No tombadilho de baixo, ficava a sala de fumo e o pequeno salão,
e no tombadilho inferior a sala de jantar.
Deixando as malas na cabina, Poirot voltou
ao tombadilho, para apreciar a partida, indo
dr
Há inúmeros
parques nacionais
por todo o continente
que permitem a
realização de safaris
22
abril 2015 –
África21
reunir-se a Rosalie, que estava debruçada na
amurada».
O barco afasta-se então lentamente do
cais e desliza pelas águas tranquilas do rio
Nilo. Lá dentro está prestes a dar-se um
drama, num dos romances mais famosos da
escritora inglesa Agatha Christie, Morte no
Nilo, publicado em 1937. O Egito está lá,
nas suas páginas. Tal como uma África então muito em voga, a do antigo Egito dos
faraós e toda a riqueza do seu passado.
Esta era uma das atrações do continente
de finais do século XIX até meados do século XX, então acessível aos europeus, que
juntamente com os norte-americanos eram
os principais clientes da oferta de uma
África ainda colonial. A outra que marcava
forte presença retratou-a, por exemplo, Ernest Hemingway, no seu As Verdes Colinas
de África. Nas quatro partes em que se divide o livro, o escritor revela-se a si próprio
através de relatos de caçadas. Caçadas numa
savana ali tão bem retratada, com todos os
seus encantos e vicissitudes. Caçadas que
eram procuradas por muitos, o que aliás
contribuiu para o declínio de muitas espécies e a quase extinção de algumas.
Hoje o continente é em termos turísticos muito mais do que um passado faraónico ou o chamamento para uma caçada.
A pluralidade da oferta é explorada por diversos países, principalmente pelos que têm
tido condições e estabilidade política nas
últimas décadas e que apostaram neste setor,
alguns deles já com forte expressão ainda na
época colonial. Marrocos, África do Sul ou
Tunísia são alguns exemplos.
Atualmente, cerca de 2,2 milhões de
pessoas trabalham na área, o que representa
5,3% da força de trabalho no norte do
continente e 2,4% na África Subsariana,
segundo dados referentes a 2014 do African
Tourism Monitor, a publicação anual sobre
turismo editada pelo Banco Africano de
Desenvolvimento, Associação de Viagens
de África e pela Casa de África da Universidade de Nova Iorque.
do turismo
São diversos os países a apresentarem
um aumento sustentado do número de visitantes e a Organização Mundial do Turismo (OMT) apontou um crescimento para
o continente de 5% em 2013. No ano passado as estatísticas voltaram a registar um
novo aumento, embora ainda não tenham
sido divulgados números oficiais. No total,
o impacto foi de 53 milhões de turistas em
2013 e mais de 34 mil milhões de dólares na
economia dos diversos Estados.
Marrocos, África do Sul, Egito, Tunísia
e Zimbabwe são, por esta ordem, os destinos mais procurados. Mas há países que
começam a dar nas vistas e a surgir com
mais presença nos catálogos das agências
internacionais. São, por exemplo, os casos
de Moçambique, Cabo Verde, Uganda,
Gana, Gâmbia ou, mesmo de forma ainda
suave, o Sudão ou o Togo, além de outros
que há muito potenciam as suas mais-valias,
principalmente naturais, como o Quénia ou
a Tanzânia, com o seu Serengueti, palco de
dezenas de documentários. Estes dois últimos têm sabido explorar as suas belezas naturais, que vendem através dos mais diversificados pacotes turísticos.
Segundo dados de 2013 da OMT,
apenas 6% dos turistas são do continente.
Cerca de 52% são europeus, 22,9% da
América do Norte, 10% das Caraíbas e
América do Sul e 3,6% do Médio Oriente,
o que obriga a que usem essencialmente o
avião como meio de transporte. Tal facto é
ainda um condicionador do desenvolvimento do turismo africano, pois há menos
companhias a voar para África do que para
outros continentes, menos ligações e, consequentemente, tarifas mais elevadas. No entanto, também neste aspeto o cenário tem
evoluído na última década, com a melhoria
de muitas companhias de aviação africanas e
o aumento de rotas aéreas por parte de
transportadoras dos grandes mercados de
proveniência de turistas, como a Europa.
As potencialidades
Mas se as estatísticas registam um crescimento, a verdade é que o continente ainda é
o que menos turistas recebe, com apenas
3% do total mundial. Um número aproximado ao que recebeu, por exemplo, no ano
passado a Itália (47 milhões), e inferior aos
da China (55 milhões) ou de Espanha (60
milhões).
Em termos regionais, as alterações políticas vividas nos últimos anos no Norte de
África, e toda a agitação social e económica
que provocaram, acabaram por afetar o
mercado turístico. Reflexo disso mesmo foi
a quebra do número de quartos. Enquanto
na África Subsariana estes aumentaram
quase 30%, no Norte houve uma redução
de 10%. No entanto, com exceção de alguns países, como a Líbia, 2014 já trouxe
um crescimento e 2015 promete seguir a
mesma tendência.
A Tunísia procura ressuscitar o turismo,
após anos de instabilidade política e social.
Os constrangimentos financeiros têm dificultado
a estratégia do Governo, mas a proximidade
com a Europa e a qualidade das infraestruturas
tem ajudado na captação de turistas, estratégia
que pode, no entanto, ter sido beliscada com
o recente atentado no Museu do Bardo em Tunes
África21– abril 2015
23
CURIOSIDADES
dr
o turismo em áfrica
África recebeu 53 milhões de visitantes
em 2013, o que corresponde
a 3% dos turistas mundiais
O número de turistas em África
aumentou, segundo o Banco Mundial,
300% entre 1990 e 2012
Segundo o African Tourism Monitor,
em 2014 trabalhavam cerca de 2,2
milhões de pessoas na área do turismo
Em 2013, a maioria dos turistas que visitou
África foram europeus: 52% do total
O turismo angolano dá atualmente
emprego a cerca de 200 mil pessoas
O destino africano mais procurado
em 2013, último ano em que
há dados oficiais, foi Marrocos,
com 10,05 milhões de turistas
39,1% dos turistas que visitaram
o Egito em 2014 eram do Leste Europeu
Angola pretende captar, em 2020, cerca
de 4,7 milhões de turistas, segundo o
Instituto de Fomento Turístico de Angola
Um dos mais conhecidos parques
nacionais de África, o Serengueti, ocupa
uma área que equivale a 14% do país
em que se situa, a Tanzânia
Londres foi em 2014 a cidade
mais visitada do mundo,
com 18.690.000 de visitas
5700 passageiros embarcam
num avião a cada minuto
Um dos ex-líbris do continente é o Monte
Kilimanjaro, com a sua neve no topo.
No entanto, perdeu 85% da cobertura
branca no último século, passando
de 12 km2 para apenas 2 km2
24
abril 2015 –
África21
O número de turistas que simplesmente
procura as belezas naturais do continente
tem aumentado nos últimos anos
A mais-valia a diversos níveis que o turismo pode trazer aos países e às suas populações tem sido nos últimos anos reconhecida por inúmeras entidades internacionais e
governos. E as potencialidades do continente em termos turísticos estão bem patentes
nos 129 sítios considerados Património
Mundial pela Organização das Nações
Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), localizados em 37 países.
África do Sul, Marrocos, Etiópia, Egito,
Quénia, Senegal, Tanzânia e Tunísia são os
países com mais locais classificados, todos
eles com mais de cinco. Já doze Estados, incluindo Cabo Verde (Cidade Velha) e
Moçambique (Ilha de Moçambique) apenas
têm um. Curiosamente, e demonstrando a
expressão do património cultural por todo o
continente, há mais locais classificados como
Património Cultural do que Natural. Com
algumas exceções devido a conflitos armados, todos eles são presença forte nos itinerários turísticos de cada um dos países.
Uma das imagens que África necessita
vencer aos olhos do mundo é a de ser encarada como um todo. Visão que em parte ficou da época colonial, acaba por afetar a
afirmação da diferença, essencial em turismo. Mas há estratégias para a afirmação do
setor que são gerais, segundo o Africa
Tourism Monitor, e que vão ao encontro de
um turismo inclusivo. A melhoria da cadeia
de fornecimento alimentar, investindo-se no
acesso direto a fornecedores locais, como
agricultores e pescadores; o investimento nas
populações com baixos rendimentos, através
de formações e estágios no sentido de as
preparar para trabalhar na área; o apoio a
dr
No Quénia, 9% da população ativa
trabalha na área do turismo,
que contribui com 12% para o PIB do país
artistas através de infraestruturas, mercados,
formação, marketing e comunicação ou
ainda o apoio a produtores locais, nomeadamente na área da alimentação, integrando-os como parte do produto turístico.
A inclusão social e o turismo sustentável
acabam por ser hoje prioridades em muitos
países emergentes, e Zimbabwe, Ruanda,
Uganda e Gâmbia são considerados casos
de sucesso de boas práticas, segundo o
Africa Tourism Monitor 2014.
Mais do que caçadas e safaris
Fotografias do então rei espanhol Juan
Carlos a caçar elefantes em África correram
o mundo em 2012. O incómodo com o
acontecimento foi grande e este foi mais um
passo que contribuiu para a decisão da sua
abdicação. Um século antes, tal acontecimento não teria abanado a sociedade espanhola e espantado o mundo. A caça grossa
era incentivada, embora controlada por diversos decretos, mas a preservação da vida
Os turistas estão a regressar aos poucos ao Egito,
após a revolução que afastou Hosni Mubarak do
poder. Apesar das tensões políticas ainda existentes,
o número de visitantes no terceiro trimestre do ano
passado subiu 70% face a igual período de 2013.
O antigo Egito
continua a cativar
um elevado número
de turistas,
principalmente
da Europa de Leste
selvagem, com algumas exceções, tinha
pouca expressão. Na prática, a regulamentação acabava por ser mais uma ferramenta do
domínio colonial sobre a população local,
nomeadamente sobre a gestão dos recursos
alimentares, bem como do marfim ou peles.
Nessa época, a atração turística passava pela
organização de caçadas.
«O animal surgiu no regato baixo e
pedregoso. Naquele momento apenas
pensava em que era perfeitamente possível
alvejá-lo mas para isso era necessário alcançá-lo e ultrapassá-lo; alcancei-o, ultrapassei-o e disparei. Ouvi o ruído da bala e como o
animal seguia a trote, esta pareceu explodir
mais à frente. Com um resfolgar sibilante
caiu prostrado, esparrinhando água e roncando». Assim escrevia Ernest Hemingway,
em As Verdes Colinas de África. Assim se
caçava então. E continua-se a caçar. Se a
caça furtiva é um problema, a caça legal é
uma solução turística para diversos países e,
por vezes, para o próprio controlo das espé-
cies. Embora contestada por muitos, nomeadamente por associações conservacionistas, é praticada em diversos Estados,
como na África do Sul.
Contudo, hoje, muitos governos agem
no pressuposto de que um elefante vale
muito mais vivo do que morto, e a natureza,
os safaris e a atração do mundo selvagem e
de toda a sua diversidade são o grande cartão-de-visita de África. Não é por acaso que
a maioria dos documentários sobre vida
selvagem é produzida em solo africano.
É onde se encontram os grandes mamíferos,
como os big five (leão, elefante, rinoceronte,
leopardo e búfalo), onde está grande parte
dos grandes predadores e tem ainda vastos
territórios que podem ser explorados.
Se em relação a safaris a oferta é imensa,
há dois parques que se têm destacado: Kruguer, na África do Sul, e o Serengueti, na
Tanzânia. Este último ocupa 14% do território do país e alberga os maiores mamíferos
do planeta, que podem ser fotografados.
Para os amantes dos safaris, os dois revelam
diferenças. O Serengueti destaca-se pela
migração dos gnus e zebras, algo que com
tal dimensão só existe neste parque. Por
outro lado, no Kruguer é mais fácil encontrar rinocerontes, além de animais raros,
como os cães selvagens. A própria paisagem
é diferente. O Serengueti apresenta-nos
uma paisagem mais despida, enquanto o
Kruguer destaca-se pela vegetação, que na
época das chuvas toma conta das vistas.
Diferenças também nas acessibilidades e
nos preços, tudo mais em conta no parque
sul-africano. Quem visita os dois não hesita: o Kruguer é um parque fácil e acessível,
o Serengueti, se vivido na sua plenitude,
bem mais duro. Até nas doenças: se o risco
de se apanhar malária existe em ambas as
regiões, no Serengueti as probabilidades
são bem maiores.
Se os safaris nos diversos parques naturais e a vida selvagem, seja nas savanas, seja
nas altas montanhas, ainda se apresentam
como um dos principais polos de atração, e
são cada vez mais exploradas com mais e
melhor oferta de infraestruturas e programas, há novas áreas a emergir, como o turismo cultural. Exemplo recente e já com sucesso é o roteiro turístico lançado na África
do Sul, que segue a história de Nelson
Mandela. Denominado «Madiba Inspired
Tourist Attractions», leva os visitantes a alguns dos lugares mais marcantes da vida
de Mandela, que morreu em dezembro de
2013. O roteiro passa por diversos locais,
incluindo a prisão da ilha de Robben, onde
o estadista esteve 27 anos encarcerado, ou a
sua casa no Soweto. Aliás, o ministro do
turismo sul-africano, Marthinus van
Schalkwyk, realçava no ano passado o facto
de Mandela, por si só e devido às políticas
seguidas desde que foi eleito Presidente, ter
contribuído de forma decisiva para o crescimento do turismo no país. «Mandela deixou um grande legado para o nosso turismo, estimulando pessoas de todos os países
a visitarem o destino por conta própria»
afirmou, destacando: «Foi graças à sua visão
e aos seus princípios que a nossa indústria de
turismo se desenvolveu tanto».
O sucesso sul-africano
O site de turismo TripAdvisor elegeu em
2014, mediante votação dos seus visitantes,
África21– abril 2015
25
A última década
trouxe a construção
de diversos
empreendimentos
turísticos
em vários países
As florestas do Uganda abrigam
duas das grandes atrações do país,
os chimpanzés e os gorilas
A recuperação do Parque Nacional da Gorongosa
O Parque Nacional da Gorongosa, em Moçambique, já teve uma das maiores concentrações de leões de África, cerca de seis mil elefantes, mais de três mil hipopótamos e dois mil impalas. Hoje os números são claramente outros, embora tenham
vindo a aumentar nos últimos anos, depois da razia da Guerra Civil que o afetou
gravemente. Os tempos são de otimismo e o turismo é uma das alavancas de um
projeto que também conta com as áreas da preservação e investigação.
Situado no centro de Moçambique, perto da Beira, o parque, gerido pela Fundação Kerr, tem hoje cerca de quatro mil quilómetros quadrados, com uma zona tampão de 3300, e inclui desde 2010 a importante serra da Gorongosa, interessante
pelas suas características naturais e biodiversidade. Num país com uma fauna bravia riquíssima, e com diversos parques e reservas naturais, a Gorongosa destaca-se
pela forma como se tem desenvolvido, e é hoje local de destino de turistas de todo o
mundo e de múltiplos projetos de pesquisa científica e preservação da vida animal.
26
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África21
dr
os 25 melhores destino do mundo. Cidade
do Cabo, na África do Sul, e Marraquexe, em
Marrocos, são as presenças africanas, numa
lista dominada por destinos europeus.
A nação arco-íris tem estado, nos últimos anos, regularmente em destaque nos
media. A BBC Travel selecionou cinco cidades do mundo que estão a ganhar espaço
na lista das melhores para visitar, mas que
ainda não fazem parte das escolhas dos turistas. Joanesburgo aparece em primeiro
lugar, realçando a BBC o facto de ter deixado o apartheid para trás e de se ter conseguido impor como uma cidade com múltiplas ofertas.
A África do Sul apresenta-se no continente como o país com mais infraestruturas
dr
o turismo em áfrica
turísticas, que explora as potencialidades
existentes nesta área, dada a diversidade e
qualidade da oferta. Das praias aos safaris
nos grandes parques, passando pela vivência
em algumas cidades e pelo turismo cultural,
com inúmeros museus – com destaque para
o Museu do Apartheid –, a nação de Mandela dá cartas neste setor. Com a vantagem
de possuir sistemas de saúde e de transportes
de qualidade, questão considerada por
muitos na hora da escolha. É também neste
país que se realiza o maior evento do setor
em África, a Feira Internacional de Turismo, com palco em Durban, no mês de
maio, que todos os anos conta com centenas
de expositores de todo o continente.
Mas se a indústria turística tem estado
em ascensão no país, tem havido momentos menos felizes. A Copa de 2010 foi um
deles, com o total de visitantes bastante
abaixo do previsto. A meta apontava para
450 mil, mas o número de turistas ficou-se pelos 310 mil, o mais baixo registado
desde a Copa de 1994, nos Estados Unidos da América.
O turismo de nichos
Costuma dizer-se que um turista tem locais que pode ou não optar por visitar. Há
lembranças que pode ou não levar. Mas se
há algo a que não pode fugir são refeições.
A gastronomia é encarada como um importante fator em termos turísticos. Além
do retorno financeiro, a restauração pode
contribuir para a inclusão social e para o
dr
Após décadas em que se privilegiavam as caçadas, hoje as
máquinas fotográficas e os binóculos dominam as savanas
Por vezes esquecido, o Botswana apresenta diversos
argumentos turísticos. País conhecido pelos seus
diamantes, alberga o parque que apresenta o maior
número de elefantes do mundo, o Chobe National
Park, além de uma das maiores reservas de caça
africanas, a Central Kalahari Game Reserve.
desenvolvimento de regiões mais afastadas dos grandes centros. O facto de poder
ser explorada, em muitos casos, com pequenos investimentos, facilita a sua exploração por núcleos familiares, nomeadamente em locais rurais.
Segundo um estudo da Associação Internacional de Turismo Alimentar
(WFTA), o valor acrescentado de uma estratégia de turismo alimentar aumenta a
chegada de turistas e o dinheiro despendido
por estes, adiantando a WFTA que apenas
8,1% dos entrevistados num inquérito valorizam a comida gourmet, o que facilita os
investimentos em comida local, simples, em
que se privilegia os pratos regionais e o respetivo saber fazer das pessoas.
De facto, a expansão da indústria turística tem trazido com ela novas estratégias para captar visitantes e o turismo de
nichos começa a ter expressão. O turismo
gastronómico, mas também o turismo
aventura, o turismo rural, o turismo para
a diáspora ou o crescente turismo de saú-
de são opções em diversos países. De
acordo com o Banco Africano de Desenvolvimento, os investimentos nestas áreas
têm aumentado significativamente na última década.
Mas embora o continente venha a
afirmar-se de forma crescente em termos
turísticos, muitos dos seus Estados continuam a ocupar os lugares cimeiros na lista
de países menos visitados do mundo, segundo dados estatísticos da OMT e da
ONU. Estão lá, por exemplo, a Somália, o
Chade, a Líbia ou a Guiné Equatorial. Os
conflitos armados, a instabilidade política
de alguns Estados e as acessibilidades continuam a ser o calcanhar de Aquiles para a
generalidade dos países africanos, que para
se afirmarem em termos mundiais têm que
vencer mercados mais acessíveis, que apresentam uma indústria turística mais desenvolvida, preços mais baixos e maior número de ligações aéreas.
Miguel Correia
Quando está ameaçado
um dos cartões-de-visita
A convivência entre o Homem e os animais
selvagens nunca foi pacífica e mais difícil se
tem tornado à medida que os seres humanos vão conquistando território a inúmeras
espécies. O caso dos elefantes é o mais
notório, pois é com facilidade que estes invadem o espaço ocupado pelo homem, nomeadamente as suas culturas. Se a vida
selvagem e os safaris são um dos cartões-de-visita do continente, a verdade é que
este se encontra ameaçado.
A caça ilegal há muito que é um problema
em África, principalmente em relação aos big
five (leão, elefante, rinoceronte, leopardo e
búfalo). Parte desta caça procura fins comerciais ou desportivos, outra visa matar e afastar
animais selvagens de zonas habitadas e dos
recursos agrícolas. Na Etiópia são frequentes
as caçadas organizadas por agricultores. E em
outros países, como Angola e Moçambique, é
costume matarem-se animais que se aventuram até zonas habitadas ou cultivadas.
Paralelamente a estas questões, o acesso a recursos escassos, como a água, também tem sido alvo de disputas e atenção das
autoridades de diversos países. Há fontes de
água que servem humanos e animais, com
todas as situações de tensão que tal implica.
No Quénia, a solução passou pela construção de 400 km de cerca eletrificada, que
percorrem o Parque Nacional de Aberdare,
onde se encontram locais que pelas características do terreno recebem muita chuva. A
rede permite que os cerca de 40 mil agricultores da região semeiem e criem os seus animais em segurança.
Os números da caça ilegal têm aumentado exponencialmente. Se em 2007 foram
abatidos 13 rinocerontes, este ano o número
está nos três por dia. Se em 1979 havia um
milhão e meio de elefantes, hoje não passam
dos 500 mil, com algumas populações mais
isoladas em risco de extinção. Há cinco anos
que o nascimento de paquidermes não chega
para repor a população, apontando as organizações conservacionistas para uma média de
um elefante morto a cada 15 minutos. Para
agravar a situação, as alterações climáticas
afetam já a biodiversidade no continente,
questão que continua a não ser alvo da devida
atenção internacional.
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27
o turismo em áfrica
Angola colocou o turismo como uma das prioridades na sua
estratégia para diversificar a economia. O setor emprega hoje mais
de 200 mil pessoas e movimentou dois mil milhões de dólares em
2014. O país recebeu cerca de 600 mil turistas no ano passado,
mas a aposta do Executivo passa por atrair 4,6 milhões em 2020,
o que significará 3% do Produto Interno Bruto.
O renascimento
do turismo em Angola
Baía de Luanda
«A
próxima grande fronteira
do turismo mundial». A frase
chega-nos através das páginas do jornal britânico The Guardian, e
espelha as potencialidades de Angola, mas
também a aposta que o Governo tem feito
nos últimos anos no setor. A reportagem
sobre o país e o seu turismo salientou
como área de referência o turismo de natureza, mas também a pesca desportiva ou o
golfe. Os jornalistas britânicos partiram à
descoberta do rio Kwanza, «longe da agitação da capital», explorando também o
Parque Nacional da Kissama, localizado a
75 quilómetros de Luanda, e onde é possível encontrar elefantes, girafas, gnus ou
macacos.
As referências elogiosas do The Guardian dificilmente poderiam ter sido escritas há uns anos, quando o país se encontrava em guerra civil. Com a paz veio a
construção de novas infraestruturas, como
aeroportos, a reabertura de linhas de caminho-de-ferro, a melhoria das estradas, a
edificação de unidades hoteleiras, novas
unidades de ensino e a melhoria da restauração. A qualidade de vida das populações
melhorou de forma substancial e, consequentemente, a capacidade de Angola para
desenvolver a área turística. O país abriu-se a si próprio e ao mundo.
O número de turistas tem aumentado
nos últimos anos e a aposta do Governo
28
abril 2015 –
África21
passa por chegar aos 4,6 milhões de entradas em 2020, o que representará 3% do
Produto Interno Bruto (PIB), contra os
atuais 0,34%. O aumento de visitantes
tem sido galopante desde o início do século. Em 1999, o seu número não ultrapassou os 45 mil, em 2003 pouco passou dos
cem mil (106.625) e em 2004 chegou aos
194 mil. No ano passado, o número mais
do que triplicou em relação há dez anos
somando 650 mil turistas.
Segundo os últimos dados do Ministério da Economia, o país conta atualmente
com 183 hotéis e 88 aldeamentos, num
total de 17.885 camas. Números bem distantes dos verificados no final da época
colonial, quando apenas existiam 57 unidades hoteleiras e um número de camas
que não chegava às quatro mil.
«O turismo em Angola registou um
crescimento significativo nunca antes visto, mesmo durante o período colonial». As
palavras são de Eugénio Clemente, diretor-geral do Instituto de Fomento Turístico
de Angola (INFOTUR), que realça: «Em
12 anos de paz foram construídos 96 hotéis, 188 pensões e 160 agências de viagens
nas 18 províncias, além de outros serviços
que estão associados à indústria». Mas na
sua opinião é necessário fazer mais: «É
preciso articular outros setores de produção nacional de forma a reduzir os custos
de alguns serviços».
De facto, além da necessária construção
de algumas infraestruturas e da melhoria de
outras, os elevados custos de alguma da
oferta são um entrave ao desenvolvimento
do turismo, nomeadamente do interno, que
representa dois terços do movimento de
turistas no país. Luanda é das cidades mais
caras do mundo e a hotelaria tem ainda
preços muito elevados se comparada com
outros mercados.
De acordo com o Plano Diretor do
Turismo, o objetivo passa por explorar os
países da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC), mas partir também para mercados mais globais,
com especial atenção ao Reino Unido,
França, Alemanha e Estados Unidos, além
de Portugal, que continua a contribuir com
um número significativo de turistas.
A forma como o país esteve presente na
Bolsa de Turismo de Lisboa (BTL), realizada em fevereiro, demonstra a importância
que o setor tem hoje na estratégia de desenvolvimento de Angola. Além de outros
destinos, o pavilhão, um dos maiores do
A estratégia para
captação de turistas
passa pela valorização
das belezas naturais
do país
dr
Como forma de afirmação do setor, o
INFOTUR assumiu uma estratégia de estabelecimento de parcerias com entidades estrangeiras. As diretrizes estão no Plano Nacional de Desenvolvimento do Turismo,
aprovado em 2011, e passam pela formação
adequada de recursos humanos. «Com as
parcerias, o Instituto de Fomento Turístico
de Angola pretende elevar as competências
dos gestores e acabar com o grande número
de gestores estrangeiros», afirmou Eugénio
Clemente.
O interesse das companhias de aviação
«Angola é um destino que começa a dar
passos na indústria turística e que hoje já
possui infraestruturas que nos garantem
dr
certame, divulgou as suas Sete Maravilhas
Naturais, recentemente eleitas. As Quedas
de Calandula (Malanje), a Floresta de
Maiombe (Cabinda), a Lagoa do Carumbo
(Lunda Norte), as Grutas do Nzenzo
(Uíge), o Morro do Moco (Huambo), as
Quedas do rio Chiumbe (Lunda Sul) e a
Fenda da Tundavala (Huíla) representaram, desta forma, as belezas naturais do
país. O pavilhão destacava ainda as Quedas
de Mupa (Huambo) e do Binga (Cuanza
Sul), a Serra da Leba (Namibe), assim como
as Pedras de Pungo Andongo e o Parque
Nacional de Cangandala (ambos em Malanje), além de aspetos relacionados com a
sua história, cultura e tradições. Uma declarada aposta no turismo de natureza.
qualidade e bons momentos de lazer», afirma António Cruz, da agência Abreu, uma
das marcas de referência do setor em Portugal, um dos principais mercados emissores
de turistas para o país.
O recente interesse das próprias companhias de aviação apresenta-se como mais
um fator demonstrativo do despertar de
Angola em termos internacionais. É certo
que parte da viabilidade das novas rotas é
fruto da circulação de empresários e trabalhadores, mas os turistas começam a ganhar
espaço nos aviões. Qatar Aiways, Turkish
Airlines e Singapore Airlines são três companhias que manifestaram recentemente
interesse em voar para Luanda, onde já
operam, entre outras, a South African Airlines, Air Namibia, Ethiopian Airlines, TAP
(Portugal), Air France, British Airlines,
Para o britânico
The Guardian,
Angola é a próxima
grande fronteira
do turismo mundial
KLM (Holanda), Lufthansa (Alemanha),
Iberia (Espanha), Brussels Airlines (Bélgica)
e Fly Emirates (Arábia Saudita).
Uma das áreas ainda por explorar,
mas a que o Executivo tem dado atenção,
é a dos navios de cruzeiro, que têm gradualmente vindo a aumentar as suas passagens pelo país, embora tal esteja dependente da melhoria das condições de
acolhimento dos navios nos portos nacionais e da capacidade de atração junto das
companhias privadas.
Certa é a aposta no importante mercado do turismo interno, como afirmou
recentemente Pedro Mutindi, ministro
da Hotelaria e Turismo à imprensa: «Estamos convencidos que podemos implementar um verdadeiro programa de turismo interno e turismo social, capaz de
criar mobilidade turística interna, por via
de programas de excursionismo, caravanismo e de campismo».
Miguel Correia
África21– abril 2015
29
Cabo Verde
dr
o turismo em áfrica
quer continuar a crescer
Depois de um 2014 em queda, o turismo no arquipélago começa
a dar sinais de retoma com o anúncio de novos projetos
O
aumento do iva e a introdução
da taxa turística foram fatores
determinantes para a queda do
setor considerado o motor da economia
cabo-verdiana. Depois de um 2013 auspicioso, com o arquipélago a ser classificado
pelo Índice de Competitividade de Viagens e Turismo anual como o país africano
a registar o maior aumento de chegadas de
turistas internacionais, com um acréscimo de 27%, colocando-o no primeiro
lugar enquanto destino turístico entre os
PALOP, terceiro na CPLP e quarto na
região da África Subsariana, em 2014 o
fluxo turístico abrandou. Ainda assim, não
começou mal, já que até junho o número
de hóspedes que deu entrada nos estabelecimentos hoteleiros aumentou 4,3%,
comparado com o mesmo período do ano
anterior.
Mas foi a partir do segundo semestre
que o canário se inverteu significativamente. A queda foi de tal forma acentuada que
agravou as contas externas, de acordo com
o último relatório de 2014 do Banco de
Cabo Verde (BCV) sobre os Indicadores
Económicos e Financeiros. Além dos fatores apontados, o relatório fez saber que a
concorrência de mercados próximos teve
igualmente um peso na queda do fluxo
turístico no arquipélago. Segundo o Banco Central, os mercados considerados
concorrentes de Cabo Verde, nomeadamente Tunísia e Egito, entraram em processo de franca recuperação e lançaram-se
numa forte campanha de promoção, uma
disputa que o país não pôde acompanhar
devido aos custos mais elevados «agravados pela harmonização e alargamento da
base de incidência do Imposto sobre o
30
abril 2015 –
África21
Valor Acrescentado (IVA), bem como pela
introdução da taxa turística».
Sinais de retoma
Os novos investimentos para as ilhas do Sal
e da Boa Vista – consideradas as duas ilhas
mais procuradas pelos turistas – demonstram a retoma da confiança no mercado
turístico-imobiliário e anima as autoridades
nacionais.
O Mélia Dunas Beach Resort & Spa,
da holding inglesa The Resort Group, inaugurado em outubro de 2014, o lançamento
da primeira pedra para a construção do
Hotel Hilton, a construção do Lhana Beach
Hotel, do grupo Meliá Hotels International, todos no Sal, o anúncio, por parte da
Sociedade de Desenvolvimento Turístico
das Ilhas de Boa Vista e Maio (SDTIBM)
de dois novos projetos a arrancarem no segundo semestre deste ano são sinais que
para o chefe do governo cabo-verdiano, José
Maria Neves, representam «uma clara retoma de investimentos turísticos em Cabo
Verde» e um «aumento de confiança por
parte dos investidores».
«Isto é importante para Cabo Verde,
para o crescimento da nossa economia e
importante para a geração de empregos.
Na medida em que tivermos mais hotéis,
Cabo Verde ocupa
o primeiro lugar
no destino turístico
nos PALOP, é o terceiro
na CPLP e o quarto
na África Subsariana
Ilha da Boa Vista
mais resorts, teremos mais possibilidades de
gerar mais empregos, particularmente para
os jovens cabo-verdianos. Os dados aqui
apresentados mostram que vamos ter mais
700 empregos, aspeto importante, já que a
Escola de Hotelaria e Turismo de Cabo
Verde e a Direção-Geral do Turismo vão
colaborar com o The Resort Group na
formação de jovens cabo-verdianos para
ingressarem no mercado de trabalho», ressalvou Neves.
Relativamente aos investimentos para
o Sal, trata-se de projetos que, de acordo
com José Maria Neves, irão ter um significativo impacto no contexto socioeconómico da ilha. Só o Mélia Dunas Beach Resort,
o maior hotel-resort construído em Cabo
Verde, e orçado em aproximadamente 127
milhões de dólares, tem capacidade para
receber à volta de 100 mil turistas por ano
e emprega 700 funcionários, na sua maioria nacionais, o que representa uma massa
salarial de cerca de 6 milhões de dólares.
Além disso, anualmente deve receber em
média 86 mil turistas, alcançando um volume de negócios de 48 milhões de dólares, fazendo com que o Estado de Cabo
Verde arrecade perto de 20 milhões de
dólares em receitas.
No caso da Boa Vista, a SDTIBM
afiança que dois novos projetos a arrancar
este ano representam um acréscimo de
1500 quartos e investimentos estimados em
42 milhões de dólares. O presidente do
conselho de administração daquela instituição, Avelino Bonifácio, revela que a
SDTIBM espera ainda fechar acordos para
mais dois ou três novos projetos, «que deverão arrancar, provavelmente em 2016, representando mais de mil novos quartos e
investimentos que poderão oscilar entre 42
a 53 milhões de dólares». Bonifácio não
avança com os nomes dos investidores, mas
sabe-se que um forte grupo hoteleiro, o
Summerset Continental, do Dubai, está
interessado em investir num hotel de alto
standard com 149 quartos na Praia de Chave, considerada uma das áreas privilegiadas
para investimentos turísticos. Quanto à ilha
do Maio, Bonifácio prevê que com a construção de um porto de longo curso e do aeroporto internacional, poderão arrancar um
ou dois investimentos ainda este ano e mais
dois em 2016.
Ainda assim, o presidente da Câmara
do Turismo de Cabo Verde (UNOTUR)
defende que o arquipélago deve deixar de
apostar apenas no turismo de sol e praia,
passando a optar por um modelo multifacetado. Gualberto do Rosário considera que o
modelo atual do turismo é «volátil, de baixo
valor acrescentado e altamente concentrado
num único operador que detém 70% da
quota do mercado». E sugere que, face a
cenários promissores do crescimento sustentado do turismo no horizonte de 2030, o
arquipélago mude de enfoque e integre na
sua oferta turística a história, a cultura e a
natureza. Para o presidente da UNOTUR
será este o modelo que vai permitir a Cabo
Verde ter uma imagem de marca, e fazer
com que o seu turismo seja conhecido pela
singularidade e genuinidade daquilo que
oferece. Paralelamente, defende que este
novo modelo que propõe tenha como pilares um Estado promotor, regulador e parceiro que aposte efetivamente na promoção
da iniciativa empresarial endógena.
O turismo de cruzeiro
no arquipélago
tem registado
um expressivo
aumento desde 2013
Turismo de cruzeiro
Um segmento do turismo cabo-verdiano
em desenvolvimento é o do turismo de
cruzeiro que regista um expressivo aumento
desde 2013. De acordo com os dados apresentados pelo Plano Estratégico do Turismo
de Cruzeiro, o ano de 2013 apresentou valores superiores aos esperados para o turismo de cruzeiros do país, com um crescimento de 111% face a 2012 no que respeita
ao número de passageiros. Nesse ano, este
segmento cresceu em todos os portos de
Cabo Verde, com um aumento de 96% de
navios e 98% de passageiros, representando
um total de 75 mil visitantes. Já em 2014,
dados da Empresa Nacional de Portos de
Cabo Verde (Enapor) indicam que os diferentes portos do arquipélago foram escala
para 157 navios de cruzeiro, que trouxeram
de janeiro a maio mais de 45 mil turistas.
Porto Grande, na ilha de São Vicente, continua a liderar os indicadores de turismo de
cruzeiros do país, mas nos últimos anos tem
visto reduzir-se o seu peso no total, devido
ao aumento de tráfego nas restantes ilhas,
nomeadamente as de Santiago e Santo
Antão.
Natacha Mosso
África21– abril 2015
31
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DOMBELE BERNARDO/JORNAL DE ANGOLA
Economia à espera do Estado
Agora que o orçamento de 2015 revisto foi aprovado
pelos parlamentares, espera-se que a economia retome
o seu funcionamento normal, embora todos os atores
tenham de ajustar-se aos profundos cortes adotados
O
orçamento de 2015 revisto,
em função da queda do preço
do petróleo no mercado internacional, foi aprovado a 19 de março,
com os votos favoráveis não só do MPLA,
partido no poder, mas também da oposicionista FNLA. Os outros três partidos
da oposição com assento na Assembleia
Nacional (UNITA, CASA-CE e PRS),
previsivelmente, votaram contra.
Espera-se, assim, que a partir de abril
os ministérios e outros órgãos do Estado
Carlos Severino
retomem os contratos que forem mantidos
com as empresas privadas, voltando a pôr a
economia a funcionar. Até ao mês passado,
esses órgãos apenas receberam fundos para
pagar aos seus funcionários e outras despesas correntes. O Estado é o maior cliente
do país, o que torna o setor privado largamente dependente dos contratos públicos.
Como a África21 noticiou na edição anterior, todos os ministérios foram orientados para reduzir cerca de 60% desses contratos, devido aos cortes orçamentais.
Uma preocupação particular dos
empresários é saber quando e como serão pagas as dívidas em atraso. Aproximadamente desde setembro do ano passado, várias companhias deixaram de
receber quaisquer pagamentos, o que
afeta sobretudo as pequenas e médias
empresas. Algumas delas já esgotaram as
suas reservas, não pagando salários desde
o início deste ano. De igual modo, estão
sem condições de honrar os seus compromissos fiscais e laborais.
Pequenos e médios
empresários clamam pelos
pagamentos do Estado
para saírem do sufoco
África21– abril 2015
33
A África21 quis saber junto do Ministério das Finanças quando é que essas
dívidas começarão a ser pagas. Para isso,
contactou por email o Gabinete de Comunicação e Imagem do referido organismo,
no passado dia 23 de março, mas até ao
fecho da presente edição não recebeu
qualquer resposta, nem sequer a acusar a
receção do email.
Contenção e especulação
Em 2 de março, o Diário da República
publicou as medidas adotadas pelo Governo para enfrentar a atual crise financeira.
As mesmas foram agrupadas em quatro tipos de ações: conjunturais, estruturais, administrativas e metodológicas e políticas e
diplomáticas.
Entre as medidas conjunturais, e além
da revisão do orçamento, já consumada,
destacam-se ainda a manutenção da estabilidade geral dos preços, o controlo das reservas internacionais de maneira a cobrir
no mínimo cinco meses de importações, a
diminuição da despesa pública, a garantia
do funcionamento normal da administração pública, saúde, educação, assistência e
proteção social, forças armadas e serviços
de segurança, a manutenção de recursos
para realizar 54 programas de caráter social
e, finalmente, o aumento das receitas não
petrolíferas em 900 milhões de dólares.
No plano estrutural, as medidas anticrise contemplam a manutenção do ritmo de
crescimento da economia e o aceleramento
da diversificação económica. Relativamente
ao primeiro objetivo, as autoridades estimam ser possível um crescimento de 6%,
ao contrário da maioria dos organismos internacionais, que o situam entre os 2% e os
4%. Quanto à diversificação económica, é
de realçar a mobilização de fundos internos
e externos para apoiar «projetos empresariais privados dirigidos» em setores produtivos não petrolíferos (agricultura, pescas, in-
34
abril 2015 –
África21
Comunicação do Governo
sobre a crise parece
incapaz de conter
onda pessimista
dústria, comércio, transportes e logística, e
hotelaria e turismo).
As medidas preveem também ações no
domínio externo, em especial a busca de
novos financiamentos e a renegociação dos
atuais acordos de dívida. Espera-se que
isso, aliado à comercialização interna de
títulos do Tesouro, já em curso, possibilite
a cobertura do défice orçamental, fixado
em 7% do Produto Interno Bruto (PIB).
De destacar, ainda, o reconhecimento,
por parte das autoridades, da necessidade de
incluir no pacote de medidas para fazer face
à crise «uma campanha de marketing e esclarecimento». Contudo, até agora, nada
indica que essa campanha esteja em andamento e, caso esteja, os seus resultados não
são visíveis. Assim, persiste entre os analistas
e os agentes económicos, sobretudo, um
clima de insegurança e pessimismo, gerador
de fenómenos e comportamentos que podem agravar a crise, em vez de reduzi-la.
Um desses fenómenos é o aumento da
especulação cambial no mercado negro.
Com efeito, o dólar na rua desvalorizou-se
cerca de 50% em três meses (janeiro a
março). Rumores não confirmados apontam para o suposto envolvimento de funcionários e responsáveis de bancos comerciais nessa ação. O Banco Nacional de
Angola (BNA), questionado por esta revista, diz desconhecer qualquer envolvimento
de funcionários bancários no mercado negro de divisas, mas pede a quem souber de
quaisquer factos que o comprovem que os
denunciem aos órgãos competentes.
O Gabinete de Comunicação e Imagem do BNA escreveu o seguinte, em
email dirigido à África21: «O BNA tem o
controlo da emissão monetária em kwanzas, por ser o banco emissor da moeda nacional, mas não tem o controlo das divisas
que circulam no mercado paralelo, porque, primeiro, não é o banco emissor dessas divisas e, segundo, não é sua função
controlar as divisas que cada indivíduo
possui. As divisas entram no país por várias
fontes e tendem a cambiar-se no mercado
paralelo porque existe de facto uma oportunidade de ganho».
BNA liberaliza importação de
divisas para aliviar pressão
Acrescenta a referida fonte: «O BNA
não tem conhecimento de práticas fraudulentas por parte de funcionários de bancos
comerciais que possam estar a injetar dólares no mercado paralelo a partir de divisas
que os bancos adquirem no mercado oficial. Entretanto, o BNA não exclui a possibilidade da existência de tais práticas que
lesam os interesses nacionais e afetam negativamente a economia e solicita, por isso,
a quem tiver conhecimento e estiver em
posse de provas efetivas de tais práticas que
as denuncie junto das autoridades policiais, em particular a polícia económica».
De notar que, em março, a diferença
entre a taxa de câmbio oficial e a do paralelo acentuou-se um pouco mais, sobretudo
em Luanda, pois, por um lado, o BNA
realizou menos leilões de divisas e, por outro, as divisas vendidas foram priorizadas
para as importações e não para as necessidades dos particulares (férias, estudos, saúde, etc.). Entretanto, o banco central acaba
de liberalizar a importação de divisas por
parte dos bancos comerciais, o que, espera-se, pode aliviar um pouco a atual pressão
sobre as mesmas.
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Á–frica
– abril
África21
DEZ 21
2014
/ JAN 2015
35
73
crónica da terra
Políticas públicas
e igualdade de oportunidades
Desde 1999, a CEAST – Conferência Episcopal de Angola e S. Tomé e o Mosaiko – Instituto para a Cidadania, duas das instituições mais credíveis do país,
ambas ligadas à Igreja Católica, têm vindo a organizar quadrienalmente, com
notável regularidade, o que é conhecido por Semana Social Nacional.
Fernando Pacheco
T
Fernando Pacheco é o
coordenador do OPSA
36
abril 2015 –
rata-se de um dos raros espaços de estudo
e reflexão pluralista onde, com elevada qualidade, cristãos e não-cristãos debatem temas socialmente
relevantes que possam concorrer para a tomada de
consciência de responsabilidades sociais – e políticas,
acrescento eu – para a colaboração institucional em
busca de um futuro melhor.
A edição deste ano teve como pano de fundo a
igualdade de oportunidades. Como foi dito, não se
deve dar de favor, como é recorrente em Angola por
parte do governo a todos os níveis, o que é devido
por justiça. Daí a importância do entendimento do
conceito de «igualdade de oportunidades» para o
qual foi muito importante a apresentação de um
texto do professor Alfredo Bruto da Costa. Este
prestigiado professor universitário português foi
ministro dos Assuntos Sociais do governo de Maria
de Lourdes Pintassilgo (final dos anos 70), membro
do Conselho dos Direitos Económicos, Sociais e
Culturais do Conselho da Europa e atualmente integra o Conselho de Estado em Portugal. Infelizmente, por motivos de saúde, não pôde estar presente para apresentar o texto de viva voz.
Hoje é pacífica a ideia de que o conceito de desenvolvimento inclui não apenas o crescimento,
mas também a distribuição, e parece haver cada vez
mais interesse por parte de estudiosos e de agências
internacionais, como o Banco Mundial, pela questão da desigualdade, principalmente de rendimentos. A distância entre ricos e pobres, em quase todos
os países, tem-se alargado nas últimas décadas.
Num relatório divulgado em janeiro, a OXFAM
previa que, ao ritmo atual, 2016 poderá ser o ano
em que a riqueza de 1% da população mundial
poderá ultrapassar a acumulada pelos outros 99%.
África21
Mas é igualmente importante aprofundar a
compreensão da desigualdade. Bruto da Costa socorre-se também do Banco Mundial (Relatório sobre o
Desenvolvimento Mundial, de 2006) para argumentar
que oportunidades desiguais conduzem a resultados
desiguais e reforçam o poder político desigual, e este,
por sua vez, modela instituições e políticas que tendem a promover a persistência das condições iniciais,
ou seja, a bloquear a mobilidade social.
Estratégia de reconciliação e reconstrução
Estas considerações vão ao encontro das minhas
reflexões sobre a situação da desigualdade e das políticas públicas que o Executivo angolano tem adotado desde 2002.
Apesar de parecer repetitivo dizê-lo, a paz representou uma excelente oportunidade para desenho e
concretização de um projeto nacional inclusivo, que
acabou por se perder porque a estratégia de reconciliação e reconstrução adotada foi errada – e há
muita gente que concorda comigo com base em
argumentos muito sólidos.
Inicialmente, as coisas pareciam bem delineadas. Acreditou-se que seria possível encontrar um
razoável equilíbrio entre direitos políticos e cívicos, por um lado, e direitos económicos e sociais,
por outro, que tem sido crucial nos países com
sucesso em matéria de democracia e desenvolvimento. Porém, algumas mudanças no contexto
provocaram uma inflexão que resulta numa sucessão
de equívocos que estão a conduzir o país para uma
situação social, e mais tarde política, difícil de sustentar. Entre tais mudanças, não pode deixar de
ser destacada o aumento da produção de petróleo
em paralelo com a subida do preço no mercado
DOMBELE BERNARDO/JORNAL DE ANGOLA
internacional, que aceleraram sintomas e os efeitos
da chamada doença holandesa.
O partido no poder elaborou uma agenda nacional de consenso que, apesar de pouco consensual, poderia ter representado uma base minimalista de entendimento, mas rapidamente ela
desapareceu do léxico político. A partir dessa altura, passou-se à confrontação e à redução de todos
os espaços pluralistas. A atividade da sociedade civil que sobreviveu tem vindo a ser fortemente
condicionada. A comunicação social pública está
ao serviço do partido no poder e a privada praticamente nas mãos de grupos direta ou indiretamente
ligados a esse partido.
A estratégia adotada subalternizou o reforço das
capacidades individuais e institucionais, sobrevalorizou a construção de infraestruturas e alimentou a
corrupção. Não foi, claramente, o melhor caminho
para se conseguir uma acumulação primitiva do
capital mais abrangente e equilibrada.
Regresso ao texto de Bruto da Costa e para
aquilo que ele sublinha com base no relatório do
Banco Mundial referido. Primeiro, os diferentes tipos de desigualdade (políticas, económicas e socioculturais) interagem entre si e isso modela as instituições e as regras da sociedade. Segundo, o
funcionamento das instituições afeta as oportunidades e a capacidade de prosperar das pessoas. Terceiro, a desigualdade de oportunidades económicas
reforça o poder político desigual, que, como se viu,
modela instituições e políticas que bloqueiam a
mobilidade social, pois tendem a promover a persistência das condições iniciais.
Daí a pertinência da citação do Papa Francisco
no Gáudio do Evangelho, utilizada pelo professor
Há crianças
que não vão
à escola por
não terem
agasalho
ou roupa que
as proteja da
chuva, como
pessoalmente
pude constatar
A comunicação
social pública
angolana está
ao serviço
do partido
no poder
e a privada
praticamente
nas mãos de
grupos direta
ou indiretamente
ligados
a esse partido
Bruto da Costa: «Enquanto não forem radicalmente solucionados os problemas dos pobres, renunciando à autonomia absoluta dos mercados e da especulação financeira e atacando as causas estruturais
da desigualdade social, não se resolverão os problemas do mundo e, em definitivo, problema algum.
A desigualdade é a raiz dos males sociais».
No caso angolano, tudo isto se aplica, pelo menos com muita frequência, aos membros de partidos
da oposição, aos empresários que não são militantes
do partido no poder e às organizações da sociedade
civil que se reclamam independentes do poder constituído. E aplica-se também a crianças de um município qualquer do interior que, para além de terem
péssimos professores, por vezes não vão à escola por
não terem agasalho ou roupa que as proteja da chuva,
como pessoalmente pude constatar. Tais crianças
não terão as mesmas condições de partida, nem as
mesmas oportunidades que terão as da mesma idade
que frequentam o novo e caríssimo Colégio Angolano de Talatona.
Também penso nisso ao constatar a dificuldade dos apoiantes do Executivo em lidar com as
críticas. O trabalho de académicos sérios que estudam Angola e concluem que a política de reconstrução do Executivo poderia ser mais assertiva, não
pode ser confundido com «politiquice» barata,
que leva jornalistas e por vezes intelectuais de renome a associarem imediatamente, de acordo com
a teoria da conspiração tão do agrado desse tipo de
pessoas, tais académicos a figuras e acontecimentos do passado, que tendem a ter cada vez menos
importância para a solução dos novos problemas
do país. Para bem de todos, é preciso sair com urgência deste patamar.
África21– abril 2015
37
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abril 2015 –
África21
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A crónica de Pepetela
A
Diversificar ou atualizar?
doramos slogans, comprazemo-nos com eles.
Por isso, eles vão mudando, conforme as modas
ou conforme o entendimento do chefe. Os últimos
foram «O resgate dos valores morais» e «Contra a violência doméstica». Antes houve «A municipalização»
disto e daquilo. Sem que se visse qualquer alteração da
situação, em qualquer dos casos.
O mais interessante talvez tenha
sido o do «resgate dos valores morais»,
apanhado de um discurso do Presidente
da República, o qual nunca é citado assim, simplesmente, mas com todos os
títulos e nomes, começando por Sua
Excelência. Nessa fase do «resgate»
chegou a haver seminários, reuniões
por todo o lado, palestras, entrevistas a
sociólogos, sacerdotes, psicólogos, políticos. Meses a fio. A única vantagem
que vejo nessa campanha durando mais de um ano foi
que hoje as diferentes jotas devem ter vergonha de
repetir as «maratonas» (como chamavam então) regadas a cerveja quase de borla, nacional ou estrangeira,
para arregimentarem seguidores para comícios políticos das suas cores. Como uma das necessidades do
«resgate» era combater a tremenda onda de alcoolismo grassando na juventude (e não só), hoje fica mal
promover uma maratona dessas. Infelizmente também não há das outras, onde se corre, o que seria bom
para a saúde pública.
Atualmente, por causa do há muito anunciado
abatimento do preço do petróleo, voltou-se a um antigo «Diversificar a Economia», vindo dos tempos da
independência. De vez em quando aparecia em algum discurso, sempre orientador, mas esquecido no
momento dos canapés e bebidas. Agora veio para ficar
e se espalhar mais depressa que um vírus. E não discordo, tem de se recorrer a ele, mesmo a sério. Desta
vez vai para lá do discurso, esperamos, com a nossa
habitual capacidade de acreditar.
Ultrapassou o texto oficial e os editoriais de órgãos de informação para entrar na entrevista económica e não económica, conversas de quintal, discussões nos candongueiros, até mesmo numa aula
qualquer. Aconteceu na inauguração de uma escola
primária num kimbo, em que o responsável que cortou a fitinha (ah, as fitinhas!) logo proclamou que
aquela escola era um exemplo de como se diversificava
a economia. Fiquei quase catatónico e até hoje não
compreendi onde o discursante queria chegar. Aposto
que ele também não. Comigo alguns milhares que
ainda prestam atenção à propaganda, tentando decifrar a notícia aí escondida. Vai acontecer em breve
quando houver um jogo de futebol
importante, será um acontecimento de
diversificar a economia, claro.
O slogan funciona pois como um
gancho. Daqueles de alpinista, que se
atira na esperança de apanhar alguma
rocha que trave a queda iminente. É o
gancho do discurso. Se alguém não
sabe como terminar uma fala, a parte
mais difícil sendo o final, como todos
sabemos, atira-se o gancho. O de agora
é «diversificar a economia». Permite
mais umas frases que milhares repetiram antes de nós,
mas não faz mal, o que interessa é parecer de palavra
fácil, pois ninguém já escuta o sentido das palavras.
No entanto, há gente criativa. Assim acontece
com o meu amigo Laurindo, amputado de uma perna, que vive de pedir esmola num semáforo da cidade.
Sempre que sou obrigado a parar no sinal, dou-lhe
uma nota de 100 kwanzas. Ontem, ele disse, temos de
diversificar, mano. Diversifica-me masé aí 200 kwanzas. Já estava o sinal verde mas procurei o correspondente para lhe dar. O Laurindo está cheio de razão,
diversificar é apenas outra forma de dizer «atualiza o
discurso». Porque os 200 que lhe dei ontem significam os 100 que lhe dava há anos, com o custo de vida
a disparar. Tudo sempre por causa da crise.
Os ganchos, esses, estão para ficar.
O Laurindo está cheio de razão,
diversificar é apenas outra forma
de dizer «atualiza o discurso»
África21– abril 2015
39
Mais do que um ataque dirigido a Gilles Cistac,
o assassínio do constitucionalista franco-moçambicano
foi interpretado pela opinião pública como uma ofensiva
contra a liberdade de expressão em Moçambique
EMANUEL NOVAIS PEREIRA
moçambique
Emanuel Novais Pereira MAPUTO
GILLES CISTAC
O misterioso homicídio
de um “mártir da liberdade”
À
s primeiras horas da manhã do
dia 3 de março, em que viria a ser
morto a tiro, Gilles Cistac (53
anos) cumpria um hábito diário: pequeno-almoço tomado no restaurante ABFC, na
interseção da Av. dos Mártires da Machava
com a Av. Eduardo Mondlane, dentro da
chamada zona nobre da capital moçambicana. Um táxi descaracterizado esperava-o
à porta. A próxima paragem seria na Procuradoria da República da Cidade de Maputo, onde o académico ia dar seguimento
à queixa-crime que tinha formalizado, dias
antes, contra um desconhecido, que na
rede social Facebook usava o pseudónimo
«Calado Calachinicov».
«Dos mesmos comentaristas já senti
sinais de intolerância política, académica e,
até, de racismo. Ignorei-os. Agora, aparecem a acusar-me da prática de atos criminosos. Acho que já basta», declarou, a propósito da queixa, Gilles Cistac ao
semanário Savana (editado em Maputo),
naquela que foi a sua última entrevista a
um órgão de comunicação social.
Na sua conta pessoal, entretanto desativada, «Calado Calachinicov» publicou
um texto em que acusava Cistac de ter obtido a nacionalidade moçambicana, em
2010, de forma fraudulenta, sublinhando
40
abril 2015 –
África21
que os pronunciamentos públicos do investigador favoráveis à pretensão da Renamo,
o maior partido da oposição, de criar províncias autónomas visavam instigar a violência e a divisão do país.
Na sequência das eleições gerais em15
de outubro e depois de ter visto rejeitados
todos os pedidos de anulação dos resultados, que alega serem fraudulentos, Afonso
Dhlakama, líder da Renamo, iniciou uma
espécie de campanha pós-eleitoral pelas
províncias em que obteve melhores resultados do que o candidato presidencial da
Frelimo, Filipe Nyusi. Perante multidões,
Dhlakama começou por exigir a criação de
regiões autónomas nas províncias em que
saiu vencedor, o que vários políticos e analistas ligados à Frelimo, no poder há 40
anos, defendiam ser inconstitucional.
Com aparente indiferença a esta pretensão da Renamo, uma vez que não se lhe
conhecem ligações a este partido, Gilles
Cistac atrairia a atenção dos meios de comunicação social ao afirmar que a exigência
seria constitucional, desde que substituída
pela designação de «províncias autónomas», numa opinião que fundamentava
com os artigos sobre a categoria das autarquias locais. Na prática, o constitucionalista entendia que a transformação das pro-
víncias em autarquias locais não impunha
alterações na Constituição moçambicana.
Se na calada muitos o criticaram por esta
posição, outros tantos, como o porta-voz
da Frelimo, Damião José, não se abstiveram de o fazer em público. «Será que o
académico Cistac, se estivesse na Argélia ou
na França, teria a coragem de assumir a
postura que tem estado a assumir, que é
uma ofensa e desafio aberto à vontade do
povo moçambicano?», questionou Damião
José, durante uma conferência de imprensa, no final de fevereiro.
Ao estilo de Al Capone
Naquela terça-feira, o taxista de Gilles
Cistac não o esperava sozinho. Dentro de
um carro, quatro homens aguardavam
que o académico entrasse no táxi. Assim
que o fez, o som dos disparos de uma
metralhadora automática ecoou pela avenida que homenageia o primeiro presidente da Frelimo. Cistac ainda consegue
sair do banco traseiro do carro, mas acaba
Manifestação pacífica em Maputo reuniu centenas de pessoas no local onde Gilles Cistac sofreu o atentado
por desfalecer na rua, rolando em agonia
até se imobilizar de bruços. Uma mancha
de sangue alastra-se nas costas da camisa
de tom bege que veste. Captada com um
telemóvel, a imagem difunde-se vertiginosamente pelas redes sociais e há de ser
destacada na capa de grande parte dos
jornais do dia seguinte.
Três quarteirões separam o restaurante ABFC do Hospital Central de Maputo, mas o constitucionalista só seria levado para a unidade de saúde 40 minutos
depois do atentado, na mesma altura em
que a polícia chega ao local. À porta do
bloco operatório do hospital afluem amigos, académicos, representantes de organizações da sociedade civil, políticos de
partidos da oposição, jornalistas. As primeiras teorias sobre as razões do ataque
começam-se a formar e, com maior ou
menor emotividade, todas parecem convergir: este foi um crime motivado pela
opinião de Cistac favorável à criação das
províncias autónomas.
Em diferido, os testemunhos recolhidos pelos jornalistas vão entrando nos noticiários da hora de almoço das televisões
moçambicanas. Na estação privada STV,
um advogado comenta em estúdio o atentado e estabelece uma relação com as declarações do bastonário da Ordem dos Advogados de Moçambique, Tomás Timbane,
que, no dia anterior, durante a cerimónia
de Abertura do Ano Judicial e perante o
Presidente moçambicano, Filipe Nyusi,
havia apontado duras críticas à atuação
«arbitrária» das autoridades policiais, «um
dos elos mais fracos do Estado».
“Já senti sinais
de intolerância política,
académica e até de
racismo”, tinha declarado
Gilles Cistac, dias antes,
na entrevista ao Savana
De um Conselho de Ministros interrompido, chega a declaração titubeante do
conselheiro António Gaspar, que condena
«o ato macabro» em nome do Governo e
apela aos clínicos para que «tudo façam para
salvar a vida de um homem vítima de um
ato sem justificação». O apelo será em vão e,
quando é transmitido, já o diretor do HCB,
João Fumane, declarara o óbito de Gilles
Cistac, que «não resistiu», dada a «gravidade
dos ferimentos e a grande quantidade de
sangue que perdeu».
Os danos colaterais de uma execução pública
Em catadupa, a condenação do homicídio
chega de todos os quadrantes da sociedade:
«crime bárbaro», «intolerância política»,
«voz da liberdade silenciada», «substituição
do diálogo pela inteligência das balas»,
«vergonha nacional». Procuram-se culpados e estabelece-se um padrão. São recordados os que perderam a vida em situações
semelhantes, «em nome da liberdade», e à
cabeça surge o caso do jornalista Carlos
África21– abril 2015
41
EMANUEL NOVAIS PEREIRA
Cardoso, morto a tiro, em 2000, não
muito longe do local onde Cistac sofreu o
atentado.
A polícia convoca a imprensa e declara
que «os criminosos eram em número de
quatro, sendo três de raça negra e um branco». Em alguns jornais, a versão é desmentida pelos testemunhos recolhidos pelos jornalistas no local: dentro do carro não seguia
nenhum homem caucasiano. São também
elencados os homicídios que ficaram sem
culpados, o último dos quais do juiz Dinis
Silica, baleado em 8 de maio de 2014, à luz
do dia, junto a uma esquadra, em pleno
centro da capital. A capacidade de investigação da polícia é posta em causa.
Durante os dias seguintes, a contestação chega às ruas, primeiro com uma manifestação reprimida pela polícia antimotim na cidade da Beira, porque «não foi
autorizada», depois com uma marcha pacífica em Maputo, que termina a meio,
também com a intervenção da Força de
O constitucionalista
entendia que a
transformação das
províncias em autarquias
locais não impunha
alterações na constituição
moçambicana
42
abril 2015 –
África21
EMANUEL NOVAIS PEREIRA
A chegada de Rosimele Cistac, filha do académico (à esquerda), foi o momento mais emotivo da manifestação
Após as eleições
de 15 de outubro, Afonso
Dhlakama iniciou uma
campanha pós-eleitoral
pelas províncias
onde obteve melhores
resultados do que
candidato presidencial
da Frelimo, Filipe Nyusi
Estudantes de Gilles Cistac conduziram a manifestação até à Faculdade de Direito, da UEM. A marcha
seria depois reprimida pela FIR quando seguia para a Praça da Independência
Intervenção Rápida (FIR), porque a organização não tinha autorização para a parte
final do percurso.
Num contexto de protesto contra o
alegado ataque à liberdade de expressão
que se diz que a morte de Cistac representou, a opinião pública serve-se destas intervenções policiais para justificar a mensagem que alguém escreveu num cartaz e
afixou à porta da Faculdade de Direito da
Universidade Eduardo Mondlane, onde o
académico lecionava: «Em Moçambique
não existe liberdade de expressão».
Um homicídio por explicar
Embora a opinião de Gilles Cistac sobre a
legalidade da criação das províncias autónomas possa ser entendida como contro-
versa, certo é que o próprio Presidente
moçambicano sugeriu, durante o encontro
com Afonso Dhlakama, em fevereiro, que
a Renamo apresentasse a sua proposta ao
Parlamento, para que fosse votada, o que,
entretanto, o partido já fez. A votação deverá acontecer durante o mês de abril e
promete estar ladeada de um grande mediatismo, decorrente da pressão e das
ameaças de instabilidade que Dhlakama
tem espalhado nos comícios populares que
tem promovido na região Centro e Norte.
E é neste contexto, com a imagem do
poder político inevitavelmente afetada pelos estilhaços do homicídio, que uma pergunta se forma em todos os círculos de
opinião: a quem serviu a morte de Gilles
Cistac?
O SAPO DEU O SALTO.
Quando o SAPO dá o salto a internet dá o salto. Quando o SAPO dá o salto
a tecnologia dá o salto. A informação dá o salto, o país dá o salto, o mundo
dá o salto. O SAPO deu o salto para uma imagem mais moderna, mais
simples de navegar e com novos conteúdos. Vamos todos dar o salto?
DÁ O SALTO EM SAPO.AO
África21– abril 2015
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a opinião de mallé kassé
Uma República sem republicanos!
O fim do ano de 2014 e o início de 2015 revelaram aos senegaleses que viveram sempre numa «república» dirigida por antirrepublicanos: dois presidentes profundamente enraizados em valores tradicionais estruturantes de uma
sociedade senegalesa que muitos pensavam ultrapassada pela mentalidade da
«elite moderna». O despertar foi doloroso!
N
Mallé Kassé é docente
da Universidade Cheikh Anta
Diop (UCAD) de Dakar
44
abril 2015 –
uma grande operação de marketing,
o ex-Presidente Abdou Diouf, secretário-geral da Organização Internacional da Francofonia, aproveita a cimeira organizada em finais de
novembro em Dakar para lançar o seu livro Mémoires (Memórias), publicado pelas edições Seuil.
Como se pode imaginar, tornou-se o tema do
momento: uns achavam deselegante o momento
escolhido para «vender», outros achavam bem que
o autor tivesse feito coincidir o lançamento do livro com o fim do mandato na OIF e o fim da sua
vida pública.
Rapidamente, a leitura de Mémoires mostrou a
inutilidade desse debate, porque os senegaleses
descobriram o carácter «elevado» do conteúdo do
livro. Diouf, Presidente de 1981 a 2000, tratava
mais de problemas pessoais (o que um ministro
dizia sobre um outro, como X conseguiu seduzir a
esposa de Y para casar com ela, etc.).
Porém, o autor revelou indiretamente que a
sociedade senegalesa não tinha acabado com os
velhos demónios da divisão social em castas. Senghor, ao escolher Diouf como sucessor, deu-lhe
três nomes como possíveis primeiros-ministros.
Segundo Diouf, a esposa de Senghor, Colette,
uma francesa de origem, pergunta ao marido porque é que propôs os três; Senghor responde: «Colette, proponho-lhos porque eles nunca poderão
criar-lhe problemas no sufrágio universal». Comentário de Diouf: «Colette conhecia bem a sociedade senegalesa e sabia que os três eram gente
de baixa casta»! Será uma convicção de Diouf ou
simplesmente uma constatação relativa às tradições da sociedade senegalesa?
A sociedade senegalesa tradicional foi historicamente regida por um sistema rígido de castas;
grosso modo havia os aristocratas, as classes trabalhadoras ou «castas» e os «escravos». Sob a autoridade colonial, especialmente a da França com a
África21
sua política de assimilação, a educação foi oferecida, e até imposta, aos detentores do poder tradicional com a instauração da «escola dos filhos de
chefes». Na altura, muitos chefes recusavam mandar os filhos à escola francesa por medo de compromisso com o sistema estrangeiro e, no lugar dos
filhos, eles enviavam os filhos dos subalternos.
O resultado foi a formação de muitos jovens tidos
como «castados». A sociedade tradicional não tinha nenhuma consideração pelas castas trabalhadoras (artesãos, pescadores, etc.), produtoras de
riqueza e bases do bem-estar económico e social.
O islão e o cristianismo não conseguiram pôr cobro a essa divisão e acabaram por acomodar-se.
Muitos dramas foram vividos por causa desse
problema de castas. Muitos estratagemas foram
encontrados. Num contexto de «não ditos», os filhos «de castas» viram-se obrigados a criar família,
casando com estrangeiro(a)s ou pessoas de «sangue
misturado» que não estavam condicionadas por
esse tipo de consideração.
A escola pública, ao dar as mesmas oportunidades às crianças, visava apagar as «diferenças resultantes do nascimento». O lema do Senegal independente traduz esse desejo de unidade de
todos: «Um povo, um objetivo, uma fé».
Desde o derrube de Diouf, os demónios adormeceram e despertaram recentemente com o discurso seguinte: «É um descendente de escravos. Os
aldeões tiraram-no de lá... Os proprietários da família dele continuam vivos. Ele sabe que é escravo
deles. Vocês, senegaleses, podem aceitá-lo como
chefe, eu nunca aceitarei. O meu filho nunca
aceitará. Em outras situações, tê-lo-ia vendido».
Estas palavras não datam de há séculos longínquos, mas de 23 de fevereiro de 2015 (cf. os 15
diários senegaleses de 24 do mesmo mês) e foram
proferidas pelo ex-Presidente Abdoulaye Wade,
falando do atual presidente Macky Sall.
CEMIL OKSUZ/ANADOLU AGENCY
Preparação de tecidos para os boubous, vestuário tradicional do Senegal
O autor desse discurso disse ser o africano mais
diplomado do Cairo ao Cabo. O certo é que, em
pleno século XXI, está atolado na lama da hierarquia social pré-colonial.
A explicação de Diouf, a reação de Wade,
porque ao filho, antigo ministro «do céu e da terra», foram pedidas contas no Tribunal, são reveladoras da complexidade da mente da elite africana,
em geral, oeste-africana em particular.
O saber adquirido na escola ocidental não parece ter tido uma ação profunda na personalidade.
O saber aparece aqui como um instrumento, uma
vassoura que se deita fora depois de se limpar superficialmente a entrada da casa. A dimensão
transformadora, subversiva do saber académico é
abafada porque vivemos numa sociedade com
uma força de inércia insuspeita: basta ver a postura
dos grandes quadros do Estado perante o canto do
griot falando da coragem imaginária dos antepassados! Muito dinheiro é ostensivamente distribuído pelo descendente da nobreza inventada e ali
cantada!
Num espaço normal, avaliando o mérito e o
desempenho dos cidadãos, o atual Presidente mereceria louvores por ter vencido obstáculos apesar
A sociedade
senegalesa
tradicional foi
historicamente
regida por um
sistema rígido
de castas
da pobreza da família (o pai foi guarda noturno
numa escola) e conseguido ser chefe dos 13 milhões de senegaleses. Sinal de que a inteligência é
igualmente partilhada em todas as camadas sociais; sinal de que a escola pública, hoje sabotada
por políticas liberais, deve permanecer um santuário cuidado, porque é capaz de produzir valores
esclarecidos, de dar uma formação a todos os filhos
e filhas de um país, abrindo assim todas as oportunidades contra todos os obscurantismos.
O interesse da reação de dois dirigentes que
recorrem, em certas situações, a valores não republicanos, apesar de dirigirem uma República, reside na chamada de atenção para o exercício do poder por estes lados. A relação com o passado, a
relação com o saber, a relação com o tempo merecem uma reflexão contínua para compreender a
nossa elite dilacerada entre um passado idealizado
e um presente frustrado. O nosso problema hoje
não é um problema de dinheiros, de recursos, mas,
antes, um «concertar» das nossas mentes para termos a capacidade de pensar e de ler a nossa história, termos a coragem de olhar para o espelho e tirarmos toda a sujidade coberta pelos fatos e
boubous (túnicas) do último grito.
África21– abril 2015
45
MOHAMED MESSARA/EPA
Protesto frente ao Museu do Bardo, no dia a seguir ao atentado
tunísia
“Somos todos tunisinos”
O ataque de 18 de março contra o Museu do Bardo em Tunes,
que causou a morte de 20 turistas estrangeiros, não é apenas o mais
mortífero registado neste país do norte de África desde 2002, quando um kamikaze fez explodir uma cisterna de gás contra a sinagoga
da ilha de Djerba. Ao revindicar a autoria do atentado de Tunes,
o Estado Islâmico lançou um aviso ao mundo inteiro e fez subir a
fasquia da «guerra contra o terrorismo» na Europa e não só.
Nicole Guardiola
O
atentado de Tunes revela um
nível de sofisticação no planeamento e execução da operação
muito superior aos anteriores ataques terroristas na Tunísia, reivindicados por grupos
ou indivíduos ligados aos Irmãos Muçulmanos ou à Al-Qaeda.
O alvo, data e hora da carnificina foram
cuidadosamente escolhidos para provocar o
maior impacto sobre as opiniões públicas
46
abril 2015 –
África21
do Magrebe e dos países de origem das vítimas e os maiores danos políticos e económicos à Tunísia, único país árabe a ter conseguido até agora transições quase pacíficas da
ditadura para a democracia e de um governo de maioria islâmica para outro de orientação laica.
Joia do património nacional e sítio mais
visitado pelos turistas de passagem pela capital tunisina, o Bardo é o segundo maior
museu de África e da bacia Mediterrânica.
As suas coleções arqueológicas, instaladas
num palácio construído no século XV, retratam a história da Tunísia ao longo de
vários milénios e através de várias civilizações, fenícia, cartaginense, romana, cristã e
islâmica. Para os tunisinos, é o símbolo de
uma identidade nacional forte e original,
que não pode ser reduzida ao carácter predominantemente árabe e muçulmano da
sociedade atual.
O museu situa-se a escassas dezenas de
metros da sede do Parlamento tunisino, no
interior do mesmo recinto e protegido pelos
mesmos guardas e sistema de segurança.
Na hora do ataque estava em curso uma
sessão parlamentar dedicada ao exame das
estratégias antiterroristas, que incluía a audição de altos responsáveis das forças armadas
e de segurança.
A data também não parece ter sido escolhida ao acaso. O 20 de março é a festa nacional da Tunísia, comemorativa da independência alcançada em 1956. São as
primeiras comemorações organizadas depois da vitória eleitoral do partido laico
Nidda Tounés e a laboriosa formação de
O Museu do Bardo
é o símbolo da
nacionalidade tunisina
que não se reduz ao carácter
predominantemente
árabe e muçulmano
da sociedade atual
cionam o atentado de Tunes com o de Paris
contra o Charlie Hebdo, através da figura de
Bubaker al Hakim, um franco-tunisino,
conhecido desde 2003 pelos serviços antiterroristas, que seguiram a sua pista do Iraque à Líbia, passando pelas prisões sírias e
francesas.
Em todo o caso, fica de novo evidenciado o perigo que representa o regresso aos
países de origem de milhares de jiadistas recrutados para combater os «infiéis» e os
«maus muçulmanos» na Síria e no Iraque.
Os tunisinos seriam os mais numerosos,
entre 3000 e 5000, um terço dos voluntá-
SALAH HABIBI/AFP
um governo de união nacional entre este e
os islamistas do Ennahda. O novo chefe da
diplomacia tunisina, Taieb Baccouche, intelectual e sindicalista, ex-dirigente da
UGTT, encontrava-se em Paris para preparar a visita de Estado do Presidente Beji
Caid Essebsi a França, agendada para 7 e 8
de abril.
Com este ataque, os terroristas mataram
vários coelhos de uma só cajadada, como se
diz vulgarmente. Não só reafirmaram a sua
vontade totalitária em relação a qualquer
expressão cultural e identitária alheia à sua
conceção sectária do Islão (patente já em
outras destruições do património da humanidade, no Afeganistão, no Mali, no Egipto
e mais recentemente no Iraque) como um
ódio cego que não poupa civis desarmados
(turistas) de qualquer nacionalidade e obediência religiosa (muçulmanos incluídos),
mulheres e crianças. Evidenciaram também
a sua capacidade operacional, visando a cabeça do poder político democrático – representado pelos parlamentos eleitos que os
radicais islamistas consideram ímpios e
Turistas a serem evacuados do Museu do Bardo
contrários à lei divina – apesar dos controlos
e aparatos policiais e militares.
A identidade dos autores materiais do
atentado, se vier a ser confirmada, está
também carregada de ameaças. Segundo as
autoridades tunisinas, Yassine Abidi e Hatem Khachnaoui, os dois assaltantes mortos,
eram «extremistas salafistas que deixaram a
Tunísia em dezembro e foram treinados na
Líbia». Informações não confirmadas rela-
rios estrangeiros nas fileiras do Estado Islâmico, mas nenhum país no mundo escapa
ao fenómeno. A importância do papel da
internet e das redes sociais na propaganda
do Estado Islâmico e o profissionalismo e a
sofisticação dos seus agentes fazem com que
a ameaça seja agora global e muito difícil de
detetar e neutralizar.
Outra dimensão a ter em conta é a capacidade dos jiadistas de «golpear onde mais
dói», ou seja, alvos suscetíveis de afetar gravemente as economias dos países-alvo, aumentando em consequência a miséria e os
sentimentos de injustiça e revolta no seio
das respetivas populações, em particular
entre os jovens. A indústria petrolífera, outrora poupada pelos terroristas na Argélia e
no Sinai, e o turismo, no caso do Egito e
agora da Tunísia, estão doravante sob a mira
dos jiadistas na sua estratégia de destruição
das estruturas nacionais dos Estados.
Os tunisinos perceberam instintivamente o sentido do ataque e reagiram de
imediato, entoando o hino nacional, aplaudindo as forças de segurança e manifestando-se nas ruas de Tunes com a bandeira
nacional para exigir a formação de uma
«frente patriótica antiterrorista».
Na Europa também a emoção é grande,
não apenas pela identidade da maioria das
vítimas do atentado de Tunes mas pela
confirmação da existência de metástases do
cancro do Estado Islâmico na Líbia e no
Magrebe, a escassas centenas de quilómetros
das costas meridionais de Itália. Mas, infelizmente, as primeiras reações apontam para
o reforço das medidas securitárias e das limitações à circulação de pessoas e bens entre as
duas margens do Mediterrâneo. Os tunisinos estão particularmente amargos face aos
efeitos previsíveis do atentado de Tunes sobre o turismo, principal fonte de riqueza e
de empregos da economia nacional, que
dava sinais de recuperar da crise consecutiva
à revolução de 2011. Dizem que os apoios
prometidos pelos Estados Unidos e a União
Europeia à jovem e frágil democracia tunisina tardam a ser concretizados apesar dos
especialistas reconhecerem que a guerra
contra o terrorismo não pode ser ganha
barricando-se de forma irracional atrás das
fronteiras e aumentando o arsenal de meios
de vigilância e repressão posto à disposição
dos serviços policiais. «A Tunísia está disposta a colaborar com os países vizinhos e
com a União Europeia na luta contra o terrorismo porque combatemos um inimigo
comum», disse o primeiro-ministro Habib
Essid.
Mas é de união e desenvolvimento inclusivo e solidário que o mundo carece para
atacar o mal pela raiz, e estes objetivos estão
longe de figurar entre as prioridades da
geopolítica mundial.
África21– abril 2015
47
AHMED JALLANZO/EPA
ébola
A epidemia do ébola contribuiu para o lançamento da campanha sanitária universal
Que saúde pública
depois da epidemia?
O ébola já matou mais de dez mil pessoas na África Ocidental
e continua a matar na Guiné Conacri e na Serra Leoa, mas
o contágio declina e o risco de pandemia parece agora afastado
Nicole Guardiola
N
a conferência internacional de Bruxelas em 3 de março,
coorganizada pela União Europeia e Nações Unidas, falou-se sobretudo
do futuro «depois do ébola». Os governos
dos três países africanos mais afetados –
Guiné Conacri, Libéria e Serra Leoa – fixaram como objetivo «zero novos casos
até meados de abril». Alpha Condé, Pre-
48
abril 2015 –
África21
sidente da Guiné Conacri, pediu um
«plano Marshall» para ajudar a África
Ocidental a reconstruir-se «como depois
de uma guerra».
Para os doadores, que no pico da epidemia tinham prometido 4900 milhões de
dólares, não é preciso angariar mais dinheiro. Do que se trata agora é de assegurar que
os fundos são devidamente aplicados.
«Temos a prova de que o ébola pode ser
vencido», diz a Organização Mundial de
Saúde (OMS) que considera, no entanto,
que a batalha não está definitivamente ganha. A imprensa e a opinião pública internacional já viraram a página e começam a esquecer o pânico de há uns meses. O alívio é
compreensível. Mas de que servirá ter gasto
centenas de milhões de dólares para erradicar
o ébola se tudo fica como dantes e dentro de
meses ou anos outra epidemia ainda mais
mortífera se propaga pelo mundo inteiro?
Aprender com os erros
Em relação a este surto, a resposta local, regional e internacional foi a melhor possível?
Muitas das vítimas não poderiam ter sido
salvas? Noel Tordo, responsável pelas estratégias antivirais no Instituto Pasteur de
Paris, ao qual pertence o laboratório que
identificou o ébola nas amostras colhidas na
Guiné Conacri em março de 2014, afirma
que «ninguém foi particularmente brilhante». A lista das «falhas», atrasos e erros de
diagnóstico cometidos pelas autoridades
nacionais, a OMS, as ONG e a comunida-
Instituto Americano das Alergias e Doenças
Infecciosas (NIAID), que foram autorizados pela OMS a experimentar as suas vacinas, a partir de novembro de 2014 na Guiné Conacri e de fevereiro deste ano na
Libéria. As experiências foram promissoras
mas os resultados podem ser inconclusivos
se, como nos casos anteriores, este surto se
extinguir «naturalmente» por interrupção
da cadeia de transmissão.
Serão os governos africanos, a começar
pelos da Guiné Conacri, Libéria e Serra
Leoa, os únicos ou os principais responsáveis pelas dimensões da tragédia? A maioria
dos analistas afirma que um surto deste género tem pouca probabilidade de se repetir
A imprensa e a opinião
pública internacional
já viraram a página
e começam a esquecer
o pânico de há uns meses
AHMED JALLANZO/EPA
de internacional em geral é longa e deu azo
a polémicas e trocas de acusações.
A correção dos erros mais flagrantes estará na origem do atual refluxo, mas ficaram
sem resposta questões essenciais. Continua
por identificar o vetor de transmissão do
vírus ao homem, o que inviabiliza a adoção
de estratégias específicas para evitar novos
surtos, como a vacinação das populações em
risco. Por outro lado, não existe nenhum
tratamento preventivo ou curativo específico contra o ébola ou outras febres hemorrágicas semelhantes, o que resulta da orientação e do financiamento dados à investigação
científica no domínio da saúde. Não havendo motivação do setor privado para encontrar medicamentos para muitas das doenças
infecciosas tropicais, o essencial das pesquisas científicas sobre os vírus desenvolveu-se
nas últimas décadas no âmbito da guerra
bacteriológica e da luta antiterrorista.
A epidemia do ébola acelerou os resultados alcançados pela Agência de Saúde Pública do Canadá e pela firma britânica GSK
(GlaxoSmithKline), em colaboração com o
Vacinas experimentais foram autorizadas na Libéria e na Guiné Conacri
em África ou em qualquer outra latitude.
Dizem que os três países em causa estavam
particularmente vulneráveis face a um vírus
desconhecido na região porque são os mais
pobres, com índices de desenvolvimento
humano (IDH) dos mais baixos do mundo e serviços de saúde quase inexistentes,
devido a décadas de ditadura (no caso da
Guiné Conacri) e às guerras civis que dilaceram a Libéria e a Serra Leoa. Azar da história
e infeliz coincidência de que a chamada comunidade internacional não teria nenhuma
culpa.
Os resultados de um estudo realizado
pelos departamentos de sociologia das universidades de Cambridge e Oxford e pela
London School of Hygiene and Tropical
Medicine, publicados em dezembro, apontam em sentido oposto, responsabilizando o
FMI e as condições de crédito impostas a
estes países entre 1990 e 2014. Segundo os
autores «os sistemas de saúde foram enfraquecidos pela exigência de reformas económicas, redução das despesas públicas e dos
salários da função pública, bem como a liberalização dos sistemas de saúde», exigências
reiteradas em 2013, ano em que o FMI se
opôs ao «aumento das despesas sociais apesar das necessidades gritantes».
O FMI rejeita estas acusações mas são
cada vez mais numerosas as vozes que acusam as instituições financeiras internacionais e as suas políticas liberalizantes e de
privatizações de serem responsáveis pelo
brutal agravamento das carências e desigualdades no acesso aos cuidados de saúde.
Por uma cobertura sanitária universal
Sob o pretexto de combater os défices e o
desperdício, os serviços públicos de saúde
foram sujeitos a «curas de austeridade» que
privam as populações mais carenciadas de
acesso aos cuidados primários; as ajudas externas foram canalizadas de preferência para
as ONG e outras organizações privadas,
alegadamente melhores gestoras; a própria
OMS, financiada a 80% por contribuições
voluntárias dos governos e fundações privadas, tem visto o seu orçamento «encolher»
drasticamente desde 2008 e é acusada de ser
manipulada pelos grandes grupos farmacêuticos e as fundações privadas.
África21– abril 2015
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JULIEN WARNAND/EPA
Os Presidentes Alpha Condé (Guiné Conacri) e Ellen Johnson Sirleaf (Libéria) na conferência internacional sobre o ébola realizada na Bélgica
Preocupações de eficiência e sustentabilidade económica levaram a ONU a abdicar
do princípio da «saúde para todos» definido
em 1978 em Alma Ata, como um direito
humano fundamental e inalienável. Em
consequência, os Objetivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM) incluíram metas precisas e quantificáveis em matéria de
saúde materno-infantil e de combate às
grandes pandemias (sida, malária, tuberculose). As ajudas ao desenvolvimento e a
cooperação internacional seguiram o mesmo roteiro, contribuindo para desarticular
ainda mais os sistemas públicos de saúde
dos países africanos.
Foi o fracasso destas políticas e as reformas empreendidas por vários países, tendo
como objetivo a cobertura sanitária universal, que levaram a ONU e o Banco Mundial
a mudar de paradigma. Em dezembro de
2012, a assembleia-geral da ONU aprovou
uma resolução a favor da cobertura sanitária
universal e propôs a sua inscrição nos ODM
para o período 2015-2030.
Em dezembro de 2014, a primeira
«jornada mundial da cobertura sanitária
universal», coorganizada pela OMS, o
Banco Mundial e a Fundação Rockfeller,
lançou uma coligação mundial para acelerar o acesso de todos a cuidados de saúde
de qualidade. A epidemia do ébola na
50
abril 2015 –
África21
África Ocidental é expressamente apontada como um dos motivos para o lançamento desta campanha mundial. Segundo
Margaret Chan, diretora-geral da OMS,
ficou provado que «para se poder detetar
com rapidez as situações anómalas, há que
oferecer cuidados de saúde de boa qualidade e a preços acessíveis a todos e não apenas
às populações abastadas das zonas urbanas;
é preciso dispor de infraestruturas, pessoal
devidamente formado, equipado e abastecido com medicamentos e meios de diagnóstico rápidos e fiáveis, e criar redes de
informação capazes de orientar as estratégias e de mobilizar os recursos necessários
sempre e em todo o lado».
Os objetivos são ambiciosos, a questão
do financiamento permanece em aberto.
O mercado e a iniciativa privada não funcionam, no entender do britânico Robert
Yate. O economista consultor do governo
de Londres e da OMS estima que «a chave
está num financiamento público e obrigató-
A maioria dos analistas afirma
que um surto deste género
tem pouca probabilidade
de se repetir em África
ou em qualquer outra latitude
rio» e num sistema universal em que os «os
ricos pagam pelos pobres» e os países mais
desenvolvidos pelos mais frágeis ou sinistrados. A batalha é política e até agora o fiel da
balança pendeu a favor das teses liberais segundo as quais cada um deve ser responsável pela sua própria saúde e o serviço público de saúde deve obedecer ao princípio do
utilizador-pagador.
O ébola veio lembrar que, face à doença
como face às alterações climáticas, «estamos
todos no mesmo barco», os vírus não conhecem fronteiras e nem os países mais desenvolvidos podem garantir a 100% a segurança dos seus cidadãos contra a ameaça de um
vírus ou bactéria desconhecida que a globalização fez surgir da selva africana, amazónica
ou asiática onde estava escondido.
Se a comunidade internacional ignora
as lições do ébola talvez outra epidemia
ainda mais mortífera a obrigue a encarar o
desafio da saúde para todos. Segundo os
epidemiologistas poderia ser a SARS (Síndrome respiratória aguda severa). Causada
por um coronarovirus detetado na China em
2002, causou 700 mortos em três dezenas
de países de todos os continentes em 20032004. Um vírus da mesma família surgido
em 2013 na Arábia Saudita causou até hoje
três centenas de mortos em 15 países e
continua ativo.
África21– abril 2015
51
a opinião de carlos lopes
A anulação da dívida externa
dos países afetados pelo ébola
é a melhor solução possível
Q
uase um ano volvido sobre a epidemia de
ébola mais mortífera a que se assistiu até hoje,
finalmente se vislumbra uma luz ao fundo do túnel
relativamente ao recuo da doença na Guiné Conacri,
Libéria e Serra Leoa. No entanto, apesar das respostas
atualmente em curso, a batalha encontra-se longe
de estar ganha – o próximo obstáculo a vencer é o de
conter os devastadores efeitos socioeconómicos da
epidemia nos três países.
Em 2013, as perspetivas económicas dos países
afetados afiguravam-se promissoras, no seguimento
de reformas então levadas a cabo. A Serra Leoa e a
Libéria, por exemplo, eram consideradas a segunda
e a sexta economias mais dinâmicas do mundo: o
impacto duro do ébola refreou a recuperação económica pós-conflito nestes países e ameaça agora,
por sua vez, a retoma das conquistas nos planos
económico e social.
Antes do surgimento do vírus do ébola, as taxas
de crescimento em 2014 na Guiné Conacri, Libéria
e Serra Leoa estimavam-se, respetivamente, em
4,5%, 5,9% e 11,3% comparativamente aos 1,3%,
1% e 6,6% pós-ébola. Este foi o resultado de um
decréscimo das vendas, das atividades nos restaurantes e hotéis, da redução dos transportes públicos,
das quedas no setor da construção e na diminuição
da presença de empresas estrangeiras: as repercussões fizeram-se sentir numa baixa da procura de
serviços e na desaceleração das atividades comerciais
afins. Os preços dos bens de primeira necessidade
acabaram por aumentar na medida da redução das
provisões de géneros alimentares e dos empregos
Carlos Lopes é secretário
executivo da UNECA Comissão Económica para
África das Nações Unidas
52
abril 2015 –
Antes da epidemia do ébola,
Serra Leoa e a Libéria
eram consideradas a segunda
e a sexta economias
mais dinâmicas do mundo
África21
perdidos. Acresce ao que acaba de descrever-se as
restrições nacionais aos transportes aéreos, marítimos e terrestres, bem como o encerramento das
fronteiras que afetaram seriamente o comércio entre
os países vizinhos e a nível internacional, de uma
maneira geral.
Os resultados nas finanças públicas dos países
afetados são devastadores, tendo causado a redução
das receitas fiscais e um aumento das despesas, em
particular no setor da saúde. Desta forma, assiste-se
ao agravamento do défice orçamental e, consequentemente, ao enfraquecimento das capacidades do
governo na contenção da doença e no reforço da
economia através de medidas de incentivo orçamental. Se sérias contramedidas não forem adotadas, a desaceleração económica vai permanecer.
O apoio da comunidade internacional é importante e necessário para a resolução das lacunas financeiras. Contudo, grande parte deste apoio traduz-se em empréstimos, o equivalente ao
subsequente avolumar do fardo da dívida externa
dos três países afetados. A título de exemplo, no final de novembro de 2014, dos 157.111.429 milhões
de dólares em compromissos adicionais que foram
aprovados pela Libéria, 60% dos 60.604.272 milhões
que foram pagos são empréstimos. Se a isto se
acrescentar a dívida externa da Guiné Conacri, da
Libéria e da Serra Leoa, que em 2013 ascendia a 1,2
mil milhões, 542 milhões e 1,4 mil milhões de dólares, respetivamente, estamos a falar de um total de
3,1 mil milhões de dólares. Este montante representa aproximadamente 190%, 320% e 180% das exportações destes países e ilustra de forma clara que
as exportações estão muito abaixo dos títulos de dívida, isto quando o fardo da dívida externa destes
países é já bastante pesado. Cumulativamente ao
aumento das respetivas dívidas na ausência de fluxos financeiros cruciais (o que se traduz em sobre-endividamento), estes países não estarão à altura de
recuperar dos respetivos atrasos e de, portanto, satis-
BRIGITTE MARCON/BIOSPHOTO/AFP
fazer as necessidades orçamentais e de equilibrar a
balança de pagamentos.
A anulação da dívida – o alívio crucial
O apelo da Comissão Económica das Nações Unidas
para África no que toca à anulação da dívida externa
dos três países mais afetados pela epidemia do ébola
dar-lhes-á a margem de manobra de que necessitam
para enfrentar os complexos desafios socioeconómicos com que neste momento se defrontam.
A medida da anulação da dívida externa já foi
anteriormente aplicada para apoiar países gravemente afetados por choques súbitos, como catástrofes naturais ou epidemias. O Haiti, por exemplo,
beneficiou neste sentido depois do terramoto de
2010. A anulação da dívida externa destes três países
trazer-lhes-á a possibilidade de reorientar e investir
os recursos financeiros destinados ao reembolso da
dívida com vista a reforçar os frágeis sistemas de
saúde nos meios rurais e urbanos, incluindo neste reforço a capacitação de profissionais de saúde. Os setores estratégicos da economia mais seriamente afetados que beneficiarão da anulação da dívida serão os
Na ausência de fluxos
financeiros cruciais,
estes três países não estarão
à altura de recuperar
dos respetivos atrasos
da educação, da agricultura e segurança alimentar e
o setor dos serviços.
Uma maior capacidade orçamental permitirá
que os três países, indubitavelmente, atinjam os
seus objetivos de desenvolvimento social e económico a longo-prazo no contexto da agenda de desenvolvimento pós-2015, além de reforçar os seus
crescimentos e perspetivas de retoma económica, o
que resultará no reembolso regular da dívida.
A boa notícia é a de que o apelo à anulação da
dívida externa não caiu no vazio, na medida em
que grandes instituições internacionais como a
União Africana e, mais recentemente, o Fundo
Monetário Internacional (FMI) já iniciaram conversações. A ação do FMI (que se traduziu num
apoio de 100 milhões de dólares para alívio da dívida dos três países em questão nos próximos dois
anos, graças a um fundo de afetação especial para a
prevenção e intervenção em caso de catástrofe)
constitui já um primeiro passo, e apreciado, no
processo de anulação da dívida. Significa não apenas um precedente – oferece a possibilidade de
uma abertura para acordos similares com outros
credores bilaterais e multilaterais.
Uma oportunidade justa para a planificação a
longo-prazo da retoma económica necessita de uma
base sólida. As declarações sobre a anulação da dívida já estão feitas. Agora é tempo de agir. É a melhor
solução possível.
Artigo publicado no Le Monde Afrique, a 17 de fevereiro de 2015
África21– abril 2015
53
guiné - bissau
ARQUIVO ÁFRICA21
IAN LANGSDON/POOL
Uma esperança chamada mesa redonda
José Mário Vaz
Macky Sall
Nunca uma conferência internacional de apoio ao país gerou
tanta expectativa e adesão interna e externa, como a reunião de
25 de março em Bruxelas, alvo de uma campanha de promoção
e exposição mediática sem precedentes
Almami Júlio Cuiaté BISSAU
N
o quinto encontro deste género, a primeira coisa que chamou a atenção na mesa redonda
na capital da Europa comunitária foi a extensão e grandeza da comitiva guineense,
composta por mais de quarenta personalidades dos três órgãos de soberania, de diversas sensibilidades políticas e de vários
setores da sociedade civil, encabeçada pelo
Presidente José Mário Vaz.
A deslocação do Chefe de Estado não
estava inicialmente prevista, mas a presença do seu homólogo senegalês Macky Sall,
cuja intervenção para sensibilizar os decisores franceses a apoiarem o evento ele solicitou, podia deixá-lo mal na fotografia se
não fosse. A pletórica composição da dele-
54
abril 2015 –
África21
gação vinda de Bissau destinava-se a enviar
aos doadores uma forte mensagem de
consenso nacional à volta da iniciativa e da
visão e estratégia de desenvolvimento até
2025, documentos examinados na conferência. E de que este é o momento oportuno para a comunidade internacional dar a
mão à Guiné-Bissau e fornecer-lhe os fundos indispensáveis à implementação da sua
agenda de reformas, sobretudo as definidas
como prioritárias e estruturantes de curto/
médio prazos. Entre estas, saliente-se a
modernização dos cruciais setores de segurança, justiça, administração e energia,
para permitir ao país superar as suas fragilidades, consolidar a estabilidade das instituições democráticas repostas com as elei-
ções de abril/maio de 2014, a fim de poder
diversificar e redinamizar a sua economia e
combater a pobreza a longo prazo.
O início da transição
Em causa está a mobilização de mais de dois
mil milhões de dólares, para custear mais de
200 projetos e outras iniciativas, cuja execução os dirigentes guineenses acreditam que
poderá determinar o início da «transição do
país para uma sociedade próspera e segura».
Contudo, tal como assinalou o ministro da
Economia e Finanças guineense, Geraldo
Martins, além de mobilizar recursos, as autoridades de Bissau procuram ainda «federar
vontades à volta da visão estratégica de desenvolvimento», uma visão própria, validade em amplos fóruns nacionais, com a contribuição da diáspora, e sem a tutela
internacional. Otimistas, apostam sobretudo na disponibilidade das organizações
multilaterais, e têm motivos para isso, uma
vez que o entendimento dos seus parceiros
externos também é de que este é o timing
apropriado para o «empurrão» que o país
precisa para acabar com o ciclo de instabili-
dade e entrar nos eixos. E estão dispostos a
dar um tratamento de exceção à singular situação da Guiné-Bissau.
Isto é o que explica, em parte, o facto da
União Europeia – o principal parceiro
multilateral do país – ter arcado com o essencial das despesas do evento, incluindo as
faturas de viagem e estadia dos numerosos
participantes e convidados guineenses. E
justifica também o nível e a variedade dos
representantes das organizações financeiras
internacionais e de outros parceiros tradicionais da Guiné-Bissau e investidores convidados à conferência, que ultrapassaram
duas centenas.
O secretário-geral das Nações Unidas
endereçou uma mensagem à conferência,
lida por um dos seus adjuntos, o subsecretário-geral e chefe do Departamento de Assuntos Políticos da ONU, o diplomata
norte-americano Jeffrey Feltman. Mas não
se trata apenas de uma questão de dinheiro.
Para o chefe do Governo guineense, Domingos Simões Pereira, a mesa redonda
poderá ser considerada «um sucesso» se os
parceiros considerarem os projetos coerentes, exequíveis e credíveis, seja qual for o valor angariado.
Por seu lado, o Chefe de Estado, Mário Vaz, defende que o ideal seria obter
maior percentagem de fundos na modalidade de ajuda pública ao desenvolvimento,
porque se forem sob a forma empréstimos,
a sua aplicação teria de garantir retorno,
caso contrário, o ônus dos erros de sua
gestão recairia sobre as futuras gerações.
Embora o programa da conferência tenha
previsto uma sessão de pledging, de declaração de intenções dos doadores, o Governo
entende que é depois da mesa redonda que
realmente tem lugar a mobilização de recursos, com a negociação dos engajamentos feitos na conferência. Bastante decisivo
será nomeadamente a conferência de investidores, nos próximos meses, na capital
guineense, em que estará na mesa o alinhavar de projetos concretos, alinhados com
os principais eixos do programa do Governo (2014/18), entre os quais a boa-governação, a infraestruturação, a agroindústria
e o desenvolvimento de polos urbanos nas
regiões do interior.
Um dos pontos fortes e simultaneamente uma incógnita das propostas levadas
a Bruxelas é a promessa de fazer da biodiversidade a imagem de marca da estratégia de
desenvolvimento guineense, impondo a
gestão racional dos recursos naturais como
elemento transversal das políticas públicas
em todas as esferas de atividade.
Novo ministro da Administração Interna três meses depois
Foram precisos pouco mais de três meses para o Presidente e o primeiro-ministro se
entenderem sobre o perfil do novo ministro da Administração Interna, pasta sem titular
nomeado desde novembro último, a seguir à demissão de Botche Candé, apanhado
nas malhas da sensível questão da presença de elementos da rebelião do Casamansa
em território da Guiné-Bissau. Desde então, o Chefe de Estado e de Governo mantiveram um braço de ferro para colocar no lugar uma personalidade da sua preferência, e
só a pressão de ter que garantir uma imagem de coesão nacional nas vésperas da
mesa redonda com os doadores é que forçou a encontrar um nome de consenso, Octávio Alves, um jurista e técnico sénior do Ministério dos Negócios Estrangeiros, onde
tem a categoria de embaixador.
Alves (55 anos), é um ex-aluno da Escola Piloto de Conacri, o viveiro de quadros
do PAIGC, e cursou Direito em Lisboa. Tem a reputação de profissional competente e
rigoroso, algo distante das lides políticas (nas presidenciais de 2014 apoiou o candidato
independente Paulo Gomes), pelo que a sua escolha mereceu tanto a aceitação da
Presidência da República como da Primatura. Possui ainda o mérito de conhecer bem
a casa, onde já tinha estado, como secretário de Estado da Ordem Pública, no Governo
do deposto primeiro-ministro Carlos Gomes Júnior, período em que lidou estreitamente
com a crucial reforma do setor da segurança. Antes, Octávio Alves dirigiu o Tribunal de
Contas e o Ministério Público.
Um país santuário
da biodiversidade
A criação de riqueza em estreita harmonia com a valorização durável dos ecossistemas marinhos e terrestres é um dos
eixos transversais da visão estratégica
apresentada pelo Governo guineense na
recente mesa redonda. Bissau quer fazer da conservação da biodiversidade a
sua imagem de marca, por constatar que
hoje e amanhã a sua economia dependerá da gestão criteriosa dos recursos
naturais renováveis, exigência também
ditada pelas alterações climáticas.
Em questões ambientais, a Guiné-Bissau é uma referência. As áreas protegidas ocupam 15%, e este ano vão
passar para 26%, com a particularidade
de as populações residentes nesses territórios serem livres de explorar os diversos recursos ai disponíveis, mas de forma racional. Os mangais, vegetação da
orla marítima onde se reproduzem várias
espécies piscatórias, cobrem 8% do
país, a maior proporção mundial. O arquipélago dos Bijagós, no Sul, com as
suas 80 ilhas, foi classificado como reserva da Biosfera pela Unesco.
Colocar a biodiversidade no centro
do desenvolvimento é uma ideia atrativa,
mas na prática requer vontade política
para aplicar a legislação neste domínio,
assim como recursos para a sensibilização da população e dos decisores. Implica igualmente estudos, estatísticas e
seguimento, condições que, para Alfredo
Silva, diretor-geral do Instituto da Biodiversidade e Áreas Protegidas (IBAP)
ainda estão por garantir. Porém, este
responsável reconhece que a situação
começa a mudar para melhor.
África21– abril 2015
55
PLANO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO
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Um plano grandioso para um
país que pensa em grande.
abril 2015 –
África21
Consolidar a reforma do sector judicial, tornando-o mais ágil e moderno para
garantir o acesso dos cidadãos ao direito e à justiça, é um dos propósitos do
Plano Nacional de Desenvolvimento, PND. Entre os objectivos está o de
assegurar a cidadania plena através da universalização do registo civil
de nascimento e do acesso a documentos básicos como o
bilhete de identidade. Com as acções do PND para esse
sector, mais um milhão e meio de cidadãos e cidadãs
passarão também a ter bilhete de identidade. Para
além de modernizar e informatizar os serviços
notariais, está previsto o aumento do número de
conservadores e notários, bem como o de oficiais de
registo.
A crónica de Odete Costa Semedo
D
Por detrás da pobreza extrema,
há bovinos e caprinos!
cabeças de suíno, ou rebanhos de ovelhas, não significa estar
e há décadas para cá, muitos países africanos fofora do perigo da pobreza.
ram levados a assumirem sugestões de estratégias
Eis mais uma daquelas minhas dúvidas crónicas: como
para a redução da pobreza das suas populações, ou para o
transformar os bens ou as reservas de riquezas da nossa gente
seu desenvolvimento.
em algo que beneficie e torne digna a vida das famílias que
Hum... vem aí mais uma das minhas lembranças! E
possuem esses bens? Porquanto não é raro
peço desculpa àqueles que a memória do
encontrarmos nos arredores de Bissau, Biompassado choca, ainda que se trate de pretéribo, Oio, Bafatá ou Cacheu, crianças dos sete
tos bem recentes. Entre os anos oitenta e
aos onze anos montadas em bois, levando-os
noventa, esteve na moda o Programa de
ao pasto e orientando-os, com assobios e urAjustamento Estrutural, o famoso PAE, que
ras, para os bebedouros naturais, os pequenos
subalternizou a área social em favor dos selagos que entrecortam alguns desses lugares.
tores económico e financeiro. A organização
Durante a transumância, muitas crianças
da Banca & companheiros de fila ditaram as
são privadas de irem à escola, para acomparegras, subtilmente, e muitos foram atrás da
nharem os pais na pastorícia. Esses gados são
dita estratégia para concluírem, alguns anos
[email protected]
bens, tal como as malas de panos de pente e
depois, que o programa foi mais forma e
os fios de ouro são reservas familiares que podem reverter-se a
formalidades do que conteúdo e substância para fomentar
favor dos membros desse agregado.
o desenvolvimento.
Porém, nunca se questionou, nos inquéritos sobre a poNo momento da adesão, entendeu-se que o PAE podia
breza, como são utilizados esses bens e como fazer essas reserser determinante para se atingir o desenvolvimento dos países
vas se reverterem em favor das famílias que as possuem. Sabeafricanos ao sul do Sara. Porém, o processo de busca desse
-se que, entre os vários grupos étnicos, os bens são guardados
desenvolvimento foi concebido com os olhos postos na esfera
para a celebração da morte.
económica, assente em premissas rígidas como o estabeleciÉ durante o choro que centenas de panos são colocados
mento das taxas de utilização dos serviços sociais básicos, exno caixão e uns tantos são doados aos filhos, sobrinhos e netos
tinção ou redução de certos subsídios, despedimentos de
do defunto; é durante esse ritual que dezenas de bovinos e
funcionários públicos, privatizações de empresas estatais, encaprinos são abatidos, e tudo em nome de um choro gordo,
tre outras medidas severas que acabaram por limitar os resulonde o lema é beber e comer com fartura, num puro ato de
tados do Programa.
celebração da morte.
Anos se passaram, chuva vai, chuva vem (até parece uma
Mas voltemos ao inquérito sobre a pobreza, ao questionahistória, mas tenho de cronicar este assunto desta forma), eis
mento sobre os gastos feitos durante as cerimónias fúnebres, a
que apareceu de novo a Banca & companheiros de fila para
origem dessas despesas para, a seguir, apontar a necessidade de
apresentarem a esses mesmos países o caminho para se sair do
se mudarem os parâmetros de interpretação da pobreza.
buraco em que se enfiaram durante os anos do Programa.
A partir daqui, confesso a minha dificuldade de enconPois é. Muita gente deixou de ir aos centros de saúde,
trar um caminho para encorajar as pessoas a utilizarem as
optando pelos curandeiros, onde pagam com galos ou panos
suas riquezas, também, em favor da dignificação e celebrade pente. As empresas privatizadas passaram a ser tudo, meção da vida humana! Pois, por detrás da pobreza há riquenos a alternativa para a revitalização do mercado e criação de
zas ocultas!
emprego. Umas viraram armazéns, outras, depósitos de
ferro-velho.
Tempos depois, em sinal de mea culpa, uma nova fórmula: a estratégia para diminuir a pobreza. Os técnicos foram
treinados para medir a penúria, as fichas de inquérito elaboradas e os profissionais puseram pés à obra. Percorreram o país
de lés a lés para, no fim, concluírem que, afinal, somos todos
pobres; que ter cabeças de gado, chiqueiro com dezenas de
Sabe-se que entre os vários grupos
étnicos os bens são guardados
para a celebração da morte
África21– abril 2015
57
são tomé e príncipe
Adaptação às mudanças climáticas
Há diversos indicadores de que o clima em São Tomé e
Príncipe está a sofrer profundas alterações
Juvenal Rodrigues, SÃO TOMÉ
O
s padrões de precipitação,
o tempo e as características do
gravanito (período seco na estação das chuvas) e da gravana (estação seca),
a subida do nível do mar, as tempestades
costeiras e a erosão que se assiste na marginal, são indicadores de que o clima em São
Tomé e Príncipe está a mudar. As alterações climáticas estão, por isso, a ser integradas nas várias estratégias e programas de
desenvolvimento. De salientar que São
Tomé e Príncipe já fez o Plano Nacional
de Ação para a Adaptação (NAPA).
Nesse sentido, foi organizada uma ação
de formação prática de duas semanas, destinada a técnicos de diversos setores de organismos centrais, locais, regionais e representantes da sociedade civil, com o objetivo de
ANDRÉ KOSTERS/LUSA
As mudanças climáticas
estão a ser integradas nas
estratégias e programas
de desenvolvimento do país
sensibilizá-los para que apliquem uma «lente climática», ou seja, que tenham em conta
«as possíveis soluções para esses impactos»
nos programas de desenvolvimento.
«A formação foi montada com base
num Plano Nacional de Desenvolvimento
de um país fictício, que é o Zanadu, e as
pessoas aqui representam entidades gestoras da água, da agricultura, trabalham para
esses ministérios ou são um grupo de consultores que tem de identificar os impactos, os sistemas de interesses e depois as
soluções para esses problemas, bem como
todos os atores envolvidos», explicou Inês
Mourão, uma das consultoras da Chaos, a
ONG que está a executar a formação.
A ação incluiu a avaliação da viabilidade das opções de adaptação. Estas soluções
foram apreciadas do ponto de vista custo/
benefício, custo/eficácia e selecionadas
para se desenhar um projeto. «Com base
em tudo isto, culminamos com as opções
dentro do que é um formulário de projeto
que poderia ser de uma Direção-geral do
Ambiente, de uma Direção do Plano e Finanças ou que uma ONG poderia apresentar para fazer face a esses problemas»,
disse a responsável à África21.
Por outro lado, a razão fundamental da
existência desta capacitação sobre a integração da adaptação às mudanças climáticas nos planos de desenvolvimento «é justamente evitar que continuemos a ter
projetos a nascerem e a morrerem sem que
haja um programa ou uma visão de longo
prazo de questões que têm a ver com mudanças climáticas», como sublinhou Adérito Santana, especialista santomense em
mudanças climáticas.
Inês Mourão defende que «o importante é tornar as estratégias, os planos e os
projetos à prova do clima. É reconhecido
que as mudanças climáticas são uma das
principais ameaças aos objetivos do desenvolvimento. O clima hoje é completamente diferente. Estamos habituados a planear
de uma determinada maneira, sem ter esses
fatores em conta e queremos que as pessoas
saiam daqui com essa sensibilidade».
O projeto, financiado pelo Fundo
português do Carbono, tem enquadramento regional. É compartilhado com
Moçambique e Cabo Verde. A finalidade é que venha a haver uma troca de experiências.
58
abril 2015 –
África21
PLANO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO
Um plano grandioso para um
país que pensa em grande.
Aumentar a disponibilidade, nos pontos de venda, de bens
essenciais produzidos no país é uma das estratégias do Plano
Nacional de Desenvolvimento. Até 2017, Angola pretende
desenvolver e manter um conjunto de infra-estruturas
logísticas e de distribuição que possibilite o abastecimento
de produtos nacionais em todas as províncias. Para além de
aumentar o número de estabelecimentos comerciais, o PND
vai assegurar a existência de reservas alimentares estratégicas,
bem como incentivar o comércio rural e a criação de novos
empregos.
África21– abril 2015
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JOÃO RELVAS/EPA
Começar de novo
cabo verde
A reconstrução de Chã das Caldeiras, património natural
de Cabo Verde, completamente devastado pela última
erupção vulcânica, deve integrar um processo de estratégia
de desenvolvimento do país e da ilha do Fogo e não apenas
dessa localidade
Natacha Mosso PRAIA
O
vulcão acordou e, com ele,
as potencialidades adormecidas
do Fogo. Foi neste tom que
Luís Pires, presidente da Câmara Municipal de São Filipe, justificou a necessidade de se fazer uma aposta num desenvolvimento mais amplo, que seja integrador
60
abril 2015 –
África21
de todas as potencialidades da ilha e não
apenas da localidade de Chã das Caldeiras, no fórum «Reconstrução da ilha do
Fogo», realizado no mês de março, na
cidade de São Filipe.
«O Fogo tem grandes potencialidades
nos domínios agroindustriais, turísticos e
culturais. Estamos numa ilha com uma
terra extraordinariamente fértil, com características microclimáticas especiais,
produzindo curiosamente uma diversidade impressionante de produtos. É um
privilégio, uma dádiva da natureza, termos nestas terras lávicas e, ao mesmo
tempo, frutas tropicais, temperadas e
mediterrânicas. Transformar a ilha em
terras do vinho é possível. Urge, por isso,
um plano a sério para a promoção da rota
do vinho, a partir de Chã de Caldeiras»,
disse Luís Pires. O autarca defende, em
paralelo, um plano «a sério» para promover as rotas das montanhas, tendo o vulcão e a paisagem lunar de Chã de Caldeiras como singulares produtos do turismo
cabo-verdiano, do café e dos sobrados.
Para que isso seja alcançado, exige-se
algumas medidas prioritárias e urgentes,
como o estabelecimento de linhas de
crédito com juros bonificados para os
agricultores, aposta nas energias renováveis, criação de meios de escoamento de
produtos, transporte com melhores tarifas
e previsibilidade e investimentos com
repercussão no turismo.
Tendo a erupção vulcânica revelado
algumas insuficiências em matéria de segurança e proteção civil, o fórum serviu
também para se elencar as ações que visam aumentar a capacidade de resposta
em situações de catástrofes naturais.
A começar pela monitorização da movimentação do vulcão, estendendo-se à
formação das comunidades sobre a forma como devem lidar com situações de
risco, a inclusão no ensino de temas associados a calamidades naturais e seus
riscos, criação de condições para construção de mais uma via de acesso a Chã
das Caldeiras – por razões de emergência
ou para a circulação de pessoas e bens – e
a operacionalização do aeródromo dos
Mosteiros com obras de melhoria e sua
transformação em Heliporto de apoio ao
Serviço Regional da Proteção Civil.
Novo assentamento
Considerada a maior expectativa do fórum, a construção do novo assentamento depende, segundo o primeiro-ministro, José Maria Neves, de um novo
estudo para definir a melhor zona de
realojamento para os deslocados de Chã
das Caldeiras, que tenha em conta os
riscos e aspetos técnicos, devendo os resultados ficar concluídos até ao final de
março. Trata-se, porém, de uma matéria
que não é consensual.
Para Mustafa Eram, guia e morador
da Chã das Caldeiras, é viável reabitar na
caldeira do vulcão, alegando que existem
espaços seguros para o regresso das pessoas. Já Carlos Pina, geógrafo, especialista
em planeamento regional e um dos oradores do fórum, entende que o novo assentamento populacional deve ser construído
no município de Santa Catarina, por ser o
local que garante melhores acessibilidades
e permite a construção de todas as infraestruturas sociais, o que, em sua opinião,
vai criar uma nova dinâmica económica
nas zonas próximas.
Entretanto, um inquérito de opinião
levado a cabo pelo Instituto Nacional de
Meteorologia e Geofísica revelou que a
maioria dos inquiridos, todos antigos
moradores e deslocados de Chã, prefere
que o novo assentamento seja edificado
numa localidade próxima à Chã das Caldeiras, seguido de um número que opta
por viver no município de São Filipe.
Enquanto isso, 110 casas construídas
aquando da erupção vulcânica de 1995 serão reabilitadas e será criado um mecanismo
de compensação para as pessoas que perderam os seus bens na erupção. Por se tratar de
uma zona com elevado potencial agrícola,
particularmente a produção da uva utilizada
no fabrico do vinho da região, o Ministério
do Desenvolvimento Rural fez saber que
“É um privilégio, uma
dádiva da natureza, termos
nestas terras lávicas frutas
tropicais, temperadas
e mediterrânicas”, afirmou
Luís Pires, presidente
da Câmara Municipal
de São Filipe
serão criadas todas as condições para a sua
produção até à construção da nova adega –
a anterior foi consumida pelas lavas. Até lá,
a Associação de Solidariedade e Desenvolvimento Económico, proprietária de uma das
adegas, disponibilizou-se a ceder espaços e
equipamentos para todo o processo de produção da última colheita. Mas ao que tudo
indica esta hipótese não é do interesse dos
viticultores de Chã das Caldeiras. Através
do seu representante, David Montrond,
solicitaram o apoio do Governo na identificação de uma solução já que se aproxima a
época da colheita da uva.
«Precisaremos de um lugar, ainda
que provisório, com as mínimas condições para produzirmos o nosso vinho e
para salvar a produção do ano», defen-
Os países lusófonos foram
os primeiros a responder
aos apelos das autoridades
cabo-verdianas
deu o viticultor, para quem uma solução
definitiva demoraria mais tempo. Onda de solidariedade
No arquipélago, foram várias as iniciativas
individuais e coletivas de angariação de dinheiro e géneros, para apoiar as vítimas da
erupção vulcânica que fez desaparecer
Portela e Bangaeira, os dois povoados que
integravam Chã das Caldeiras. Diversos
países responderam aos apelos das autoridades cabo-verdianas para acudirem às
populações deslocadas, tendo sido os países lusófonos os primeiros a agir.
Portugal enviou a fragata Álvares Cabral com equipamento de telecomunicações, um helicóptero, camas, cobertores e
máscaras respiratórias, e apoiou a monitorização da erupção. De Angola chegaram
apoios e donativos no valor de sete milhões de dólares, traduzidos em meios de
biossegurança, comunicação, géneros alimentícios, equipamentos e materiais de
emergência. Luanda cedeu ainda três especialistas da proteção civil e um de reinserção social. A Guiné-Bissau doou 75
mil dólares, São Tomé e Príncipe fez uma
doação individual por parte dos membros
do governo, de 20% dos seus salários,
enquanto Timor-Leste apoiou com 500
mil dólares. A Comunidade Económica dos
Estados da África Ocidental (CEDEAO)
avançou com uma contribuição de 13 mil
dólares e apelou aos países membros para
assistirem Cabo Verde.
O chefe do governo cabo-verdiano
garantiu rigor e transparência na gestão
dos recursos arrecadados, tendo assegurado que nenhum centavo será desviado
para outros fins que não seja a reconstrução da ilha do Fogo. O Executivo irá
publicar, trimestralmente, e em todos os
jornais do país, a relação dos recursos
recebidos e a sua aplicação, para conhecimento da população em geral.
A erupção de 23 de novembro afetou
toda a população de Chã das Caldeiras, com
a destruição total de 260 das casas dos povoados de Portela e Bangaeira, e de escolas,
hotéis, centro de saúde e estradas. As lavas
cobriram uma área com cerca de 520 hectares, 120 dos quais são terras agrícolas. Cerca
de 2000 pessoas foram evacuadas e realojadas em centros de acolhimento.
África21– abril 2015
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62
abril 2015 –
África21
A crónica de Germano Almeida
Q
As gargalhadas
do meu defunto primo
Olhei para ele aflito, mas ele limitou-se a apontar-me
uando vi metade da cabeça do meu primo surgir
a marquesa: baixe as calças e deite-se. Posição de galinha
assim de repente na porta entreaberta da minha
assada! A sua voz era calma, educada, via-se que estava
loja (é como chamo ao espaço onde vendo os meus serhabituado àquelas lides. Eu sorria constrangido enquanviços de advogado), acreditei estar a ser confrontado
to descia as calças, atrapalhado com o sacom o seu fantasma. É isso, pensei, esse
pato. Não precisa tirar o sapato, disse endoido morreu e agora vem pregar-me
quanto calçava as luvas. Devo ter fechado
partidas. É que ele tinha embarcado oito
os olhos porque só senti que delicadamendias antes, numa viagem que pretendia de
te me espetava e escarafunchava. Durou
muitos dias, talvez meses ou mesmo anos.
um bocado que pareceu uma eternidade e
Vou fazer uma revisão completa à máquiquando ele retirou o dedo e achei que já
na, disse à despedida (ele considera que
podia levantar-me, ele ordenou. Agora
um hospital não é muito diferente de uma
ponha-se na posição em que a Alemanha
oficina de mecânica e bate-chapa), trocar as
de Hitler perdeu a guerra!
peças que podem ser substituídas, atamanPor um momento hesitei, mas depois
car as outras para as quais ainda não há [email protected]
reconsiderei. Se já me tinha posto na posiplentes e no fim concluir tudo com uma
ção de galinha assada, que poderia custar perder a guerra
pequena cirurgia plástica, coisa breve, apenas esticar um
como a grande Alemanha, até que poderia ser apenas
pouco a pele do rosto, sempre sonhei ter nascido chinês.
uma nostálgica recordação histórica, sobretudo agora
Não fiz comentários, cada um gasta o seu dinheiro
que a Sra. Merkel levava de vencida toda a Europa e o
como melhor lhe aprouver. Vou sentir a tua falta, disseresto do mundo, não com os canhões Berta ou Dora,
-lhe, não fiques por lá, olha que aqui é que é a nossa taantes com simples austeridade económica. Dobrei-me,
padinha. Ele ria-se: Não fico não, disse, sou como o
pois, à vontade do tratador e mais uma vez sujeitei-me à
Romeu do Almeida Garrett, vivo ou morto, hei de volsua opressão que ele praticava com uma espécie de maltar. E agora voltava morto. Vade retro, estiquei-lhe a
doso deleite. Ah vida, pensava de joelhos e cabeça dobramão esquerda fazendo figa canhota, fui teu primo e
da sobre a marquesa como numa oração, como é duro o
amigo, mas já não tens parte neste mundo, procura o teu
teu aguilhão!
lugar no espaço superior.
Mas finalmente ele cansou-se, deu por terminada a sua
Mas em vez disso ele aproximou-se de mim ainda em
tarefa e mandou-me levantar e vestir. Pelo menos já me
gargalhadas: Apalpa-me, disse estendo-me a mão, sou
livrei deste exame que será talvez o mais incómodo, pensaeu, teu primo, em carne e osso. Apalpei, era mesmo ele.
va enquanto me compunha. Mas quando me disse que
Então posso abraçar-te, perguntei apenas por descargo
não tinha encontrado nada do que esperava, pelo que eu
de consciência. Podes, respondeu abraçando-me com
deveria regressar uma semana depois para nova sessão,
força, não há nada no mundo que se compare a estes
despedi-me dele e dali segui para uma agência de viagens.
grãozinhos de terra, concluiu.
E aqui me tens, se não inteiro, pelo menos ainda vivo.
Mas eu estava curioso. Partindo do principio de que
estás mesmo vivo, disse-lhe, diz-me então o que aconteceu para teres regressado tão rápido, tu que ias para meses, se não anos. Hei de contar-te, ainda que coberto de
vergonha e humilhação, disse ele, sabes, a primeira, e
única, aliás, consulta que fiz foi com o urologista. Homem de meia-idade, muito correto. Certamente que não
é a primeira vez que vem a este tipo de consulta, começa.
Bem, por acaso é a primeira vez. Errado, na sua idade já
devia ter feito pelo menos uns dez toques, vou ter que o
examinar, ver como está a sua próstata.
Devo ter fechado os olhos porque
só senti que me espetava
e escarafunchava delicadamente
África21– abril 2015
63
brasil
As manifestações antigovernamentais de 15 de março pretendiam ser uma espécie de terceira volta das eleições presidenciais de 2014, mas apesar da presidente Dilma Rousseff ter conseguido sobreviver a um desafio direto ao seu
mandato, os protestos foram suficientemente numerosos e generalizados para
transformá-la numa virtual refém política da classe média urbana brasileira.
Carlos Castilho FLORIANÓPOLIS
Manifestações de rua
agravam indefinições políticas
O
brasil está definitivamente dividido
entre petistas e antipetistas num antagonismo difícil de ser enquadrado nas linhas
clássicas da lógica partidária. Os seguidores do Partido
dos Trabalhadores, ao qual Dilma Rousseff é filiada,
defendem a presidente, mas são contra o programa de
austeridade econômica que ela implantou no seu segundo mandato e exigem uma reforma política que
acabe com a corrupção nas campanhas eleitorais. Já o
Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), o
partido Democratas (DEM) e o Partido Socialista
Brasileiro (PSB) querem a saída da chefe de governo,
mas defendem o programa de ajuste econômico e
também condenam a corrupção.
A oposição procurou dar um caráter plebiscitário
às manifestações convocadas pela internet por um
grupo de organizações desconhecidas para a esmagadora maioria dos brasileiros. A contagem do número
de participantes ganhou características de apuração de
votos, só que os resultados pecaram pela falta de exatidão. O diário O Globo, crítico do governo de Dilma
Rousseff, disse que a polícia estimou em 2,3 milhões
o total de participantes em 150 cidades brasileiras.
A TV Globo, do mesmo grupo jornalístico, reproduziu declarações de organizadores dos protestos afirmando que 2,9 milhões de pessoas foram às ruas no
domingo em que os antipetistas se vestiram de verde e
amarelo (cores nacionais) em todo o país.
Além da polêmica terceira volta (terceiro turno no
jargão brasileiro) o outro motivo de tensão era a possibilidade de atos de violência já que a polarização e radi-
64
abril 2015 –
África21
calização das paixões políticas atingiram níveis críticos
nas semanas anteriores às manifestações, depois da sucessão de denúncias sobre o envolvimento de altos
funcionários da estatal Petrobras no financiamento
ilegal de partidos que apoiam o governo Dilma. Outro
fator foi a intensa mobilização de grupos políticos ultraconservadores a favor do impedimento (impeachment)
imediato da presidente e da insistência de uma minoria
radical em cobrar a volta dos militares ao poder.
Bombeiros petistas e antipetistas
Havia o temor de confrontos violentos entre petistas e
antipetistas nas ruas de São Paulo, a cidade mais polarizada politicamente na atual conjuntura brasileira.
Os petistas realizaram em 13 de março marchas na
capital paulista e em várias outras cidades brasileiras,
tornando público o seu desafio à campanha dos antipetistas para desestabilizar o governo Dilma. Mas o pior
não aconteceu para alívio dos dois lados já que entre a
marcha dos petistas e os protestos dos antipetistas, surgiram vários «bombeiros» em ambos os lados procurando esfriar a temperatura política.
Os partidos de oposição ao governo trataram de
desvincular-se tanto da campanha a favor do impedimento da presidente como dos apelos a um novo
golpe militar no Brasil. Os ex-ministros do Supremo Tribunal Federal, Ayres Britto e Carlos Velloso,
afirmaram respectivamente que não há base jurídica
real para propor um afastamento da presidente, e
que um eventual retorno dos militares ao poder é
inconstitucional.
Pelo menos dois milhões de brasileiros saíram à rua em protesto
No lado o Partido dos Trabalhadores, o ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva amenizou sua retórica
confrontacionista ao mesmo tempo em que porta-vozes
da presidente adotaram um perfil conciliador, afirmando que os protestos oposicionistas foram legítimos e que
o governo iniciará um diálogo com a oposição. Nada de
muito concreto em termos de iniciativas novas, fato que
pode ser explicado pela existência de fortes rumores sobre
divergências entre a presidente Dilma e seu antecessor,
Lula da Silva. O pomo da discórdia estaria na política de
ajuste fiscal, na estratégia de combate à corrupção e ao
temor de que a reduzida agressividade política da presidente comprometa irremediavelmente a volta de Lula ao
poder nas eleições presidenciais de 2018.
Os protestos de 15 de março mostraram o alto
grau de insatisfação da classe média brasileira que saiu
às ruas na proporção de cinco pessoas para cada participante das marchas petistas, integradas basicamente
por sindicalistas, estudantes, agricultores sem terra e
baixa classe média, a principal beneficiária dos programas de redistribuição de renda adotados pelos governos do Partido dos Trabalhadores desde 2002. A insatisfação dos oposicionistas esbarra, no entanto, na
ausência de propostas concretas e objetivas para acabar
com o impasse entre governo e oposição.
O quadro político brasileiro provavelmente não
mudará rapidamente porque a situação é bem mais
complexa do que imaginam os oposicionistas. Para o
governo deixar de ser refém da insatisfação popular,
este necessita de resultados econômicos rápidos e capazes de reduzir o aumento generalizado de preços.
A oposição
procurou dar
um caráter
plebiscitário às
manifestações
convocadas
pela internet
Precisa também reformar o sistema de financiamento
de campanhas eleitorais para impedir doações ilegais
de empresas a partidos políticos, e punir os responsáveis pela lavagem de dinheiro gerado pelo superfaturamento de obras públicas que vai para contas ilegais
em paraísos financeiros.
A recuperação da economia não tem prazo
realista para produzir resultados animadores porque depende:
a) Da situação internacional, especialmente do
petróleo;
b) Do fim da seca que provocou aumentos de até
66% nas contas de luz dos brasileiros;
c) Do restabelecimento da confiança dos empresários privados na política econômica do governo.
Por seu lado, a reforma política depende da
aprovação de projetos pelo Congresso brasileiro,
onde o governo é minoritário, desde que ficou clara
a «traição» do Partido do Movimento Democrático
Brasileiro (PMDB), que teoricamente é aliado de
Dilma mas na prática obstrui os projetos governistas,
na Câmara de Deputados e no Senado.
O julgamento dos funcionários e políticos envolvidos no escândalo de propinas da Petrobras só deve
começar em maio ou junho e vai se prolongar pelo
menos até dezembro ou janeiro de 2016. Assim, o
governo dificilmente terá resultados palpáveis capazes
de atenuar a irritação da classe média urbana antes do
final do ano, o que implica um longo período de instabilidade política com risco de gerar um perigoso clima de ingovernabilidade.
África21– abril 2015
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brasil
Instituído no Brasil em 2002 pela Universidade do Estado
do Rio de Janeiro, em 2004 pela Universidade de Brasília e
a partir de 2012 pela maioria das universidades federais, o
sistema de cotas raciais aos poucos se estende a outros setores
da sociedade e, em breve, o Brasil deverá adotar a política de
cotas em todo o poder judiciário
João Belisario RIO DE JANEIRO
Supremo Tribunal Federal do Brasil
adota cotas raciais
A
previsão foi feita pelo presidente
do Supremo Tribunal Federal
(STF), Ricardo Lewandowski, em
março, quando assinou uma resolução que
estabelece cotas raciais nos concursos públicos para cargos efetivos no STP e no Conselho Nacional de Justiça (CNJ). A resolução ora assinada regulamenta a lei, aprovada
pelo Congresso em 2014, que determina a
reserva de 20% de vagas para negros em
concursos públicos sempre que o número
de vagas for superior a três. A lei aplica-se a
concursos realizados no âmbito da administração pública federal, das autarquias, fundações públicas, empresas públicas e sociedades de economia mista controladas pela
União. Lewandowski acredita que o exemplo deverá ser seguido por outros tribunais.
Alguns estão discutindo o tema e em breve
o assunto deverá ser submetido ao CNJ.
Poderão concorrer a estas vagas os
candidatos que se autodeclararem negros
ou pardos no ato da inscrição no concurso
público, conforme o quesito cor ou raça
usado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
Dados do Ministério da Educação
(2013), veiculados num estudo publicado
na revista Fórum, sobre os dez anos das cotas raciais para as universidades públicas,
mostram que após adesão de algumas uni-
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abril 2015 –
África21
versidades ao sistema de cotas a percentagem de negros que cursam ou concluíram
um curso superior no Brasil passou de 4%
em 1997 para 19,8%, em 2013 (trata-se da
etapa em que se verificou maior evolução da
taxa da população negra, cerca de 200%),
com destaque para a ação desenvolvida pela
Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(UERJ). Passados dez anos, 32 das 38 universidades estaduais (provinciais) já adotaram modelos de ações afirmativas.
A maioria das universidades federais só
adotou o sistema de cotas em 2012, quando
foi aprovada a lei que as obriga a destinar
50% das matrículas a estudantes que se autodeclaram negros, pardos ou índios, os de
baixa renda ou os que tenham feito integralmente o ensino médio em escolas públicas.
Em 2013 o número de vagas disponível para
cotistas era de 188 mil. Na edição de 2014 do
Exame Nacional do Ensino Médio (Enem)
58,85% dos inscritos se declararam negros
enquanto no Programa Universidade para
Todos (PROUNI) chegavam a 51,73%.
A política de cotas foi sem dúvida a
principal responsável pela evolução positiva
da participação de negros e índios no ensino
superior, criando oportunidades, diminuindo as desigualdades entre os diferentes grupos raciais que compõem o mosaico populacional brasileiro, mas ainda é preciso
Ricardo Lewandowski, presidente do STF
vencer muitas resistências e, segundo representantes de movimentos sociais, avançar
para as universidades que ainda não adotaram o sistema, entre elas duas das consideradas as melhores e maiores do Brasil: a USP e
a UNICAMP.
Grande melhoria da situação social
dos afrodescendentes
Os indicadores construídos a partir do censo de 2010 feito pelo IBGE e a Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios
(PNAD), em 2001 e 2012, reproduzidos
no livro «Situação social da população negra
por estado», editado pelo Instituto de pesquisa econômica aplicada e pela secretaria
de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), confirmam que a população
JOSÉ CRUZ/AGÊNCIA BRASIL
manteve-se relativamente alta a disparidade
entre brancos e negros na população com
renda per capita familiar acima de um e
meio salário mínimo se mesmo com alguma redução das desigualdades. Em 2001
estavam nesta faixa 23,3% dos brancos e
6,5% dos negros. Em 2012, estas percentagens chegavam a 36% entre os brancos e
15,6% entre os negros.
Entre 2001 e 2012 verificou-se um notável progresso em matéria de condições de
habitação, com redução no padrão de desigualdade racial por situação de moradia.
Os negros apresentaram uma evolução mais
pronunciada do que os brancos, e as regiões
não metropolitanas uma evolução mais
acelerada que as metropolitanas. Quanto ao
mercado de trabalho, que mostrou uma
evolução positiva em todo o país, a população negra também se beneficiou das políticas sociais adotadas.
Segundo a publicação da SEPPIR,
«houve redução da desigualdade racial no
acesso a melhores ocupações, com sensível
aumento de renda. Contudo, as característi-
A política de cotas foi a
principal responsável pela
evolução positiva da
participação de negros e
índios no ensino superior
negra brasileira, que em 2013 representava
53% do total (negros e pardos), deixou de
estar concentrada entre os mais pobres.
A parcela com menos de meio salário
mínimo passou de 65,8% em 2001 para
38,6% em 2012, embora ainda seja maioritária entre os pobres. Em 2012, o total
de brancos nesta faixa de renda era de
19,2%. Na categoria intermédia, de meio
a um e meio salário mínimo, e que segundo a definição brasileira supera a pobreza,
brancos e negros tinham em 2012 uma
participação muito próxima, 44,9% e
45,8%, respetivamente.
A redução da pobreza e também da desigualdade neste período estendeu-se a todas
as raças, sobretudo para a população negra.
Segundo a publicação, entre 2001 e 2012
cas da ocupação e da remuneração ainda
são, indiscutivelmente, a arena na qual os
negros encontram as maiores desvantagens,
refletindo os efeitos do racismo e da discriminação nas condições de inserção. Os negros ainda ocupam posições mais precárias,
recebem remunerações menores e são mais
afetados pela desocupação.
Comparando 2001 e 2012, nota-se
uma grande redução na proporção de desocupados em todas as faixas de idade, mas
não nas desigualdades. Entre os trabalhadores negros de 22 a 29 anos a taxa de desocupação permaneceu 31% superior à dos
brancos e entre os trabalhadores de 45 a 60
anos a taxa dos negros passou a ser 21%
superior à taxa dos brancos, que em 2001
era de 16%. O estudo revela também que
houve uma melhoria geral nos rendimentos
entre 2001 e 2012, inclusive com avanço na
renda dos negros, insuficiente, no entanto,
para eliminar as desigualdades. Em 2012 o
valor obtido pelos negros nunca foi superior
a 62,9% do que é pago aos brancos.
Quanto à escolaridade, considerando a
população com mais de 15 anos, em 2012,
23% dos brancos tinham menos de quatro
anos de estudo; entre os negros, este percentual atingiu 32,3%.
Em 2001, a população branca com
nove anos ou mais de estudo era de 39,8%
e subiu para 55,5% em 2012; na população
negra, o mesmo indicador passou de 22,5%
para 41,2%. A proporção de pessoas brancas com doze anos ou mais de estudo cresceu de 13,3% para 22,2%, enquanto entre
os negros aumentou de 3,5% para 9,4%.
No ensino médio a desigualdade entre
brancos e negros também sofreu relevante
redução: em 2001, a frequência líquida dos
brancos era o dobro da dos jovens negros e
em 2012 a diferença passou a ser de um
quarto. No ensino fundamental, as taxas de
escolarização líquida praticamente se igualaram em 2012.
Além das ações afirmativas para a promoção da igualdade de oportunidades no
ensino superior, Luiza Bairros, ex-ministra
da secretaria de Políticas de Promoção da
Igualdade Racial da Presidência da República, afirmou, na apresentação do livro,
que a melhora nas condições de vida de
mulheres e homens negros verificada nos
últimos anos se deve ao «efeito combinado
de iniciativas governamentais que sustentam a política de promoção da igualdade
racial, a partir de outras duas dimensões
principais: políticas socioeconômicas gerais que impulsionam a inclusão da população negra, com destaque para a expansão
do mercado de trabalho formal, a política
de valorização do salário-mínimo e a ampliação da cobertura da previdência social e
dos programas de redução da pobreza;
ações para o atendimento a direitos básicos
da população negra, por meio da incorporação da perspetiva racial na execução de
políticas setoriais, como previsto no Programa Brasil Quilombola e no Plano Nacional de Desenvolvimento Sustentável
dos Povos e Comunidades Tradicionais de
Matriz Africana».
África21– abril 2015
67
O PROFIR constitui uma das componentes
do Programa de Industrialização de Angola
2013-2017 e agrega um conjunto de medidas
e um plano de acção que, de forma articulada
com outros programas em curso ao nível local,
concorrem para o fomento da pequena
indústria rural.
O PROFIR tem como objectivo estimular
os empresários, camponeses e pequenos
agricultores a criar pequenas indústrias
enquanto importante alavanca de diversificação
das oportunidades de emprego e a melhoria
da qualidade de vida nos municípios, bem
como gerar rendimento das comunidades
no meio rural e dinamizar a economia local.
MINISTÉRIO DA INDÚSTRIA
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abril 2015 –
África21
A crónica de Muniz Sodré
I
Um samba que destoa na avenida
magine-se uma África representada por imagens
do homem de Neandertal (que, aliás, não é originário dali), acompanhadas por alas de indivíduos riquíssimos, cobertos de marfim, ouro e pedras preciosas,
chegando ao Brasil em navios também deslumbrantes,
sem os tormentos da escravidão. Assim desfilou a imaginação da escola de samba Beija-Flor, sediada na cidade fluminense de Nilópolis, para sagrar-se vencedora no torneio das escolas do
carnaval carioca deste ano.
Observa o escritor nigeriano Wole
Soyinka, Prêmio Nobel de Literatura em
1986: «Sempre que vou ao Brasil tenho a
impressão de que uma parte do país pensa
‘não temos nada a ver com a herança africana’». Soyinka tem razão ao falar de «uma
parte» apenas, porque oficialmente o Brasil é
o único país latino-americano com um dispositivo legal (Lei 10639/09) que obriga a sociedade inteira
a assumir a herança cultural africana como uma precondição essencial do desenvolvimento do conhecimento.
É uma lei acatada, mas não cumprida: a África que
costuma desfilar no carnaval é a do desconhecimento.
É difícil meter na cabeça dos carnavalescos cariocas
qualquer noção de realidade africana. Até aí parecem
admissíveis os absurdos históricos e antropológicos,
considerando-se o grau de liberdade ficcional das escolas de samba com relação aos seus temas.
Este ano, porém, o exagero na dose foi além de todas as medidas. Subvencionado por dez milhões de
reais [cerca de três milhões de dólares], o enredo da
Beija-Flor homenageava a África na figura da Guiné
Equatorial, uma ditadura de quase quatro décadas,
violadora dos direitos humanos e campeã, não da alegria, mas da opressão econômica e política de seu povo.
E assim, de repente, um mal-estar público, que normalmente poderia dissipar-se nas Cinzas da Quaresma,
ganhou foros de questão cultural, política e moral, com
repercussão continuada na grande imprensa brasileira.
Cultural: As escolas de samba constituem uma singularidade cultural que resultou da coalizão de músicos
negros com moradores de bairros pobres do Rio de Janeiro. Mas o atual excesso de efeitos de show business e a
hipertrofia do dinheiro atuam na contracorrente dessa
singularidade.
Política: Enquanto espetáculo central da maior
festa popular do país, com dinheiro público investido,
o desfile das escolas de samba está sujeito a pressões de
várias ordens.
Moral: É longa a história do patrocínio de contraventores (bicheiros e, depois, traficantes de drogas) ao
desfile. Não apenas isso: gente saída dos porões de tortura e matança do regime militar dirigiu abertamente o
espetáculo. Por que todo o clamor midiático de agora a
propósito dos dez milhões doados pela
Guiné Equatorial à Beija-Flor?
Possivelmente pela grande visibilidade midiática daquilo que o grego antigo
chamava de hubris, a desmedida, a ser
punida pelos deuses.
Em primeiro lugar, o exagero da dissipação de riquezas por parte de Teodoro
Obiang Mangue, o Teodorin, filho do
ditador Teodoro Obiang Nguema Mbasogo. Em segundo, o contraste entre a
riqueza do país e as más condições de vida da população. Sabe-se que o dinheiro doado à Beija-Flor seria
suficiente para abastecer de água potável Malabo, a capital federal, onde menos da metade da população tem
acesso ao líquido, e dez por cento das crianças morrem
antes de completar cinco anos. Não há imprensa livre,
nem rádio, nem tevê. Universidade? Existe uma, sim,
mas sem eletricidade e sem alunos.
Com carnaval e tudo, o Brasil encara atualmente,
além de maus prognósticos financeiros, uma crise moral espelhada em escândalos de corrupção generalizada.
Empresários e políticos estão sendo postos na cadeia.
E agora pairam suspeitas sobre os canais escusos do dinheiro de Teodoro Mangue para chegar à escola de
samba. Aos olhos da esfera pública brasileira, tudo isso
é demais – é a hubris temida pelo velho grego.
O indigno que vem de fora junta-se ao podre que
exala de dentro.
Sabe-se que o dinheiro doado
à Beija-Flor seria suficiente para
abastecer Malabo de água potável
África21– abril 2015
69
américa latina
IVAN FERNÁNDEZ/EPA
Labirintos dos serviços secretos
Milhares de pessoas juntaram-se na Plaza de Mayo, em Buenos Aires, para protestar contra a morte do procurador Alberto Nisman
A tortuosa história dos serviços secretos americanos parece ter
começado a percorrer o caminho da sua restruturação. Embora
por enquanto as mudanças pareçam apenas formais, no Perú
e na Argentina procura-se tornar transparente o trabalho dos
espiões. A Colômbia já tivera que fechar a sua agência em 2011
e o Chile fez uma espécie de modificações em 2004.
Manrique S. Gaudin BUENOS AIRES
U
ma sucessão de incapacidades e
de intromissões grosseiras na vida
democrática de diferentes países
americanos detonou, em princípios do ano,
quando se soube que os dispendiosos serviços de inteligência não eram outra coisa que
uma perigosa base operativa de espiões in-
70
abril 2015 –
África21
ternos ou de meros serventes que se ofereciam à melhor oferta e para qualquer tarefa.
Desde então, iniciou-se um processo de revisão que, embora sem responder primeiro
às perguntas centrais de «porquê» e «para
quê», se destina a «restruturar, reforçar e
profissionalizar» – os três termos são idên-
ticos – as agências de espionagem da Argentina e do Perú.
Com uma demora inocultável, os governos dos dois países prosseguiram um
caminho que tinha começado a ser percorrido pela Colômbia em 2011 e que
fora precedido por uma farsa de reorganização imposta no Chile em 2004, quase
um quarto de século depois do fim da
ditadura civil-militar liderada pelo general Augusto Pinochet (1973-1990).
A partir de 15 de janeiro, uma sucessão de publicações da imprensa peruana
mostrou que a Direção Nacional de Inteligência (DINI) se dedicava a espiar políticos – incluindo a vice-presidente Marisol
Espinoza e o ex-Presidente Alan García –,
jornalistas e líderes sindicais. Três dias
depois, na Argentina, aparecia morto o
procurador Alberto Nisman, encarregue
Por cada viagem que
realizava com proteção
militar, o piloto peruano
Sal y Rosas recebia do
cartel mexicano de Tijuana
apenas 80 mil dólares
da paralisada investigação a um atentado
terrorista perpetrado em 1994 contra a
AMIA, uma entidade da comunidade judaica, em que morreram 85 pessoas.
Soube-se então que Nisman era manipulado pelos espiões da CIA que operavam a
partir da chamada «missão» na embaixada
dos Estados Unidos, mas também pelo
chefe dos serviços secretos Antonio Stiusso, o mais antigo agente da Secretaria de
Inteligência do Estado (SIDE). Por razões
ainda não percebidas, Stiusso e os seus
amigos da CIA usavam Nisman para travar a causa e encobrir os autores do maior
atentado terrorista da história argentina.
Não menos turvo era o papel dos espiões peruanos dedicados a intrometer-se
na vida privada dos seus compatriotas.
Depois das denúncias na imprensa, soube-se também que durante quatro anos pelo
menos três agentes da secreta naval forneceram abundante informação confidencial
a um grupo de supostos empresários pesqueiros italianos que, na realidade, eram
espiões do Chile, um país com o qual até
janeiro do ano passado o Perú disputava as
suas fronteiras marítimas no Tribunal Internacional de Justiça de Haia. «Tínhamos
salários muito baixos e por cada relatório
os italianos [os chilenos] davam-nos 200
dólares», assim se justificou um dos implicados. Não foi essa a mais patética das declarações. Outro dos agentes perguntou:
«se tantos camaradas trabalham para as
empresas multinacionais porque não podíamos nós aumentar os nossos rendimentos dando informações aos italianos [aos
chilenos]?».
Ao Presidente peruano, Ollanta Humala, não lhe restou outra alternativa senão anunciar o «encerramento da DINI
por 180 dias, a fim de restruturá-la, refor-
çá-la e profissionalizá-la». Anunciou-o a 9
de fevereiro, e logo a 12 soube-se o nome
do encarregado da tarefa. Trata-se de José
Martín Sal y Rosas, um ex-camarada de
Humala no exército e na Escola das Américas dos Estados Unidos, uma entidade de
fama criminal mais conhecida na América
Latina como a «Escola dos Ditadores».
Piloto com larga experiência, Sal y
Rosas foi condenado a nove anos de prisão por colaborar com os narcotraficantes
do cartel mexicano de Tijuana, depois de
se ter provado que utilizava aviões Antonov do exército para transportar cocaína
peruana destinada ao México. Por cada
viagem que realizava com proteção militar, o cartel de Tijuana pagava-lhe 80 mil
dólares, apenas isso. A pena começou a
ser cumprida em 2007, no entanto, ao
fim de quatro anos, num belo dia e sob a
maior discrição, foi libertado e nomeado
chefe da DINI, onde administra os 7,6
milhões de dólares anuais de gastos confidenciais da Direção.
Este «contratempo» – a divulgação de
que Sal y Rosas dirigiria a restruturação
da DINI – obrigou a prolongar o período
de encerramento da agência, de 180 para
240 dias, mas ele manter-se-á responsável
por essa tarefa.
Debate público na Argentina
Na Argentina o processo é mais transparente. O Governo enviou ao Congresso o
projeto de lei que dissolve a SIDE e cria a
Agência Federal de Inteligência (AFI).
Além disso, deu à sociedade civil a possibilidade de expor propostas numa audiência pública. Os únicos que se nega-
O governo argentino
enviou para o Congresso
um projeto de lei
transparente
que dissolve a SIDE
e cria a Agência Federal
de Inteligência
ram a participar no processo deliberativo
foram os deputados da oposição, que sem
nenhuma razão aparente recusam fazer
parte de qualquer ato oficial e até garantem que, se alguma vez chegarem ao governo, anularão todas as leis democraticamente aprovadas desde maio de 2003,
quando assumiu o poder Néstor Kirchner, marido e antecessor da atual Presidente Cristina Fernández.
Apesar da maior transparência, no entanto, todo o pessoal da ex-SIDE, com a
sua antiguidade, e sobretudo com os vícios
que lhes permitiram sobreviver a todos os
regimes e a todos os presidentes, passam a
integrar os quadros da futura AFI.
O modelo proposto no projeto de
«restruturação, reforço e profissionalização» do Governo argentino tem gigantescas diferenças com o atual, estipulado por
igual para todos os países americanos desde
o fim da II Guerra Mundial quando, no
quadro na Guerra-fria, os Estados Unidos
impuseram um esquema de defesa e inteligência adequado aos seus interesses, «algo
assim como umas mini-CIA, com os seus
objetivos e a sua corrupção», disse o politólogo argentino Óscar Laborde.
Timidamente, no Chile e no Uruguai,
muitas vozes reclamam que se comece a
falar do tema, tomando como ponto de
partida o modelo argentino. Há vários aspetos que atraem os setores progressistas de
ambos os países. A liquidação da SIDE traz
consigo a proibição aos futuros serviços
secretos de participar em qualquer atividade relacionada com a repressão e utilização
(dos espiões) como força policial, e só se
aplicará a inteligência criminal quando
obedecer a um pedido judicial expresso
relativamente a uma causa específica.
Os valores concedidos aos organismos dos
serviços secretos serão públicos e apenas
serão confidenciais os que estejam relacionados com o cumprimento de ações relacionadas com serviços secretos.
O projeto estabelece em 15 anos o prazo para a divulgação dos arquivos mas, no
que representa um grande avanço a favor
dos direitos civis, qualquer pessoa com interesse legítimo poderá pedir a disponibilização imediata de informação que a afete.
África21– abril 2015
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empresas
&
negócios
NÚMEROS E FACTOS DO UNIVERSO SONANGOL
2014, um ano difícil para a petrolífera
Apresentação dos resultados da Sonangol
Flutuações na produção de petróleo e a baixa do preço do
barril contribuíram para uma redução dos resultados de 2014
da petrolífera angolana
Adriano de Sousa
A
quota-parte da Sociedade Nacional de Combustíveis de Angola
(Sonangol) na produção nacional de petróleo bruto subiu de 9%, em
2013, para 13% em 2014. No entanto,
essa subida foi, de forma drástica, inversamente proporcional aos resultados financeiros. De forma pragmática, Fran-
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abril 2015 –
África21
cisco de Lemos, presidente do Conselho
de Administração da petrolífera angolana, referiu-se ao ano de 2014 como um
ano «bastante difícil» para o grupo, devido a um conjunto de fatores. «Tivemos
resultados negativos em algumas empresas, mas noutras tivemos resultados positivos. Não é uma situação de estranhar,
porque nós já esperávamos. No geral, o
ano foi difícil», disse Francisco de Lemos, numa conferência de imprensa
realizada em Luanda para apresentação
dos resultados anuais do grupo.
No final de 2014, a Sonangol apresentou um resultado líquido de 710,3
milhões de dólares, contra os três mil
milhões de dólares alcançados no ano
anterior, o que representa uma descida
de 77%. As perdas foram justificadas
com as flutuações do mercado, a baixa
do preço do barril e com a redução da
produção petrolífera.
«Nós experimentámos dois períodos
que se revelaram cruciais para o nosso
PAULINO DAMIÃO/JORNAL DE ANGOLA
angolana
desempenho. De janeiro a junho de
2014 experimentámos uma queda acentuada que atingiu a sua média diária
mais baixa no mês de março. Essa média
foi de 1.474.066 barris de petróleo por
dia. Os efeitos dessa redução foram parcialmente compensados com a variação
positiva do preço do petróleo. Após junho de 2014, a entrada em produção do
campo Clov, no Bloco 17, e do campo
Polo Oeste, em novembro do mesmo
ano, permitiram a recuperação da produção para cerca de 1.800.000 barris/
dia. Nesse mesmo período, observou-se
uma redução abrupta do preço médio de
venda. De 110 dólares em junho, a mé-
dia mensal reduziu-se para 57 dólares o
barril em dezembro», explicou o PCA da
Sonangol.
Dito de outra forma, no período do ano
em que a Sonangol teve os níveis de produção mais baixos, registaram-se, no mercado,
preços mais elevados, e, no segundo período
do ano, quando a produção aumentou os
preços baixaram consideravelmente.
Segundo Anabela Fonseca, administradora da Sonangol, os maiores clientes da
petrolífera no ano de 2014 foram a Unitec,
da China, que comprou à Sonangol
82.470.249 barris, o equivalente a 32,6%
das exportações da Sonangol. A BP comprou 20.869.934 barris (8%) e a Shell
9.287.217 barris. No que respeita ao destino das exportações, os países que mais
compraram o petróleo angolano foram a
China, Índia, Espanha, Canadá e Taiwan.
Para o continente asiático seguiram
169.618.704 barris, enquanto para os Estados Unidos, no ano passado foi enviado
apenas o equivalente a 3% das exportações
de petróleo, um total de 7.616.341 barris
(cerca de oito carregamentos).
Além da exportação do petróleo
bruto, Anabela Fonseca lembrou que a
Sonangol tem a sua atividade internacional de exportação do produto refinado. Neste âmbito, a concessionária angolana exportou para São Tomé e
Príncipe gasóleo, gasolina, e JET 1 em
pequenas quantidades. Exportou igualmente nafta e fuel, assim como uma pequena quantidade de gás butano e propano proveniente da Sonagás.
Metas para o futuro
Sobre o futuro, o presidente do Conselho de Administração da Sonangol
apontou uma meta de produção de dois
milhões barris por dia, além do alcance
de um rácio de reservas/produção de
PAULINO DAMIÃO/JORNAL DE ANGOLA
As perdas foram justificadas com as
flutuações do mercado, baixa do preço
do barril e redução da produção petrolífera
Francisco Lemos, presidente do Conselho de
Administração da Sonangol
pelo menos 20 anos. É esperança da petrolífera atingir o patamar, em 2020, de
uma quota de mercado de produção
própria correspondente a 20% da produção nacional de petróleo bruto. Outro
dos objetivos delineados é a manutenção
da liderança no mercado de refinados de
petróleo bruto e gás, não inferior a 65%,
como indicou Francisco de Lemos.
Foram também definidos como objetivos fundamentais da estratégia de afirmação e desenvolvimento da Sonangol o início da construção das unidades de processo
industrial da Refinaria do Lobito, em
2015, e a conclusão, em 2016, da construção do Terminal Oceânico da Barra do
Dande, com capacidade para 640.000
metros cúbicos de combustíveis e gás butano. A finalização dos parques de combustíveis no Soyo, Lubango e Namibe também
integra os planos da maior empresa angolana. A Sonangol prevê ainda a aquisição
de quatro navios Suezmax (petroleiros
com capacidade de grande armazenamento apropriados para navegar no Canal de
Suez), dois dos quais já se encontram em
construção. Ainda para 2015 está em
perspetiva a construção dos edifícios sede
da Sonangol em Cabinda, Soyo, Malange,
Lobito, Huambo e Lubango.
África21– abril 2015
73
dr
cplp
Países lusófonos reivindicam
lugar no mapa da energia mundial
Estima-se que o potencial energético dos países lusófonos, em
2015, corresponda em conjunto ao sétimo maior produtor do
mundo de hidrocarbonetos. Os decisores consideram que o setor
poderá contribuir para o reforço da influência dos «nove» na cena
internacional. Em junho, discutem como beneficiar melhor dos
recursos para um desenvolvimento sustentável.
João Carlos
O
potencial existente em cada
um dos países da CPLP, ainda
que a escalas diferentes, é de
grande relevância e constitui um valor
acrescentado que pode ajudar a reforçar a
sua posição a nível mundial. As fontes não
renováveis, como o petróleo, gás natural e
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março 2015 –
África21
carvão, bem como as renováveis que incluem a biomassa, hídrica, biocombustíveis, eólica e solar, constituem uma enorme base para a configuração de um
modelo de desenvolvimento sustentável
dos países deste bloco de descontinuidade
geográfica.
Nas últimas décadas, foram feitas novas descobertas de energias fósseis. Um
grupo considerável de empresas em países
como Portugal, Brasil, Angola e Moçambique já atua neste domínio, por impulso
também do dinamismo gerado pela evolução tecnológica.
Angola e Brasil ocupam uma posição
inquestionável na produção e exportação
de petróleo. Apesar de algum abrandamento nos investimentos, as metas de
produção angolana continuam elevadas e
as «perspetivas largamente positivas», com
previsão de ultrapassar os dois milhões de
barris/dia em 2018, de acordo com o mais
recente relatório da Business Monitor Internacional (BMI).
No entanto, muitos empresários com
presença em Angola manifestaram alguma
Muitos empresários
presentes em Angola
manifestam reserva com
os reflexos negativos da
queda do preço do petróleo
na economia do país
reserva em relação aos reflexos negativos da
queda do preço do petróleo na economia
angolana. Mas analistas consideram oportuna esta situação conjuntural para que o
país possa refletir se deve continuar a depender em grande medida do petróleo ou
se vai investir noutras fontes de rendimento, apostando no setor do oil&gas e no
fomento, por exemplo, da indústria
petroquímica.
Moçambique, cuja economia deverá
crescer este ano 7,5%, continua a viver o
boom no setor do carvão e gás natural, que
tem conhecido nos últimos anos um grande desenvolvimento. As recentes descobertas colocam o país da África Austral na rota
do mercado mundial do gás, pela apetência que tem suscitado junto de várias
multinacionais.
Apenas um exemplo, o potencial energético identificado no âmbito do projeto
de cooperação entre Portugal e Moçambique acabou por influenciar a Agência Internacional de Energias Renováveis, que
está a desenvolver a sua massificação. Presentemente, mais de cem países associaram-se ao projeto. Em 2009, entre 2,4% e
2,8% da produção mundial de energia
primária (fóssil e renovável, respetivamente) vieram dos referidos países, estimando-se que, em 2015, estes ocupem a posição
de sétimo maior produtor mundial de hidrocarbonetos. As previsões da organização indicam que, em 2025, a produção no
conjunto dos países da CPLP poderá ocupar o quarto lugar a nível global.
Mercado europeu alicia lusófonos
Olhando para o bloco europeu e para o
mundo, Portugal considera que não há
mercado interno de energia sem interligações. Esta visão é sustentada a nível oficial
uma vez que o país ambiciona reforçar a sua
posição como exportador de energias renováveis para o centro da Europa, levando a
que a União Europeia (UE) possa também
substituir alguma da sua dependência energética do gás da Rússia por outras rotas e
outras fontes de abastecimento.
Daí o repto lançado por Jorge Moreira
da Silva, ministro português do Ambiente,
Ordenamento do Território e Energia.
«Nesse sentido, esta é uma oportunidade
para vários países da CPLP», que podem
utilizar os terminais de Sines e outras plataformas da Península Ibérica como canais
alternativos de entrada de gás na UE. Com
as condições que já reúne, o Porto de Sines
é assim apontado como possível porta de
entrada das exportações de todos os países
da Comunidade.
O grupo agora alargado à Guiné Equatorial, pode constituir-se num bloco de
peso e reforçar a sua influência na cena internacional, como sublinha Murade Murargy, Secretário Executivo da CPLP.
O diplomata moçambicano ao serviço dos
«nove» fala de «soberania energética da
CPLP» como um dos vetores do desenvolvimento, reconhecendo a importância
geopolítica, geoestratégica e geoeconómica
dos recursos energéticos ainda por explorar
devidamente.
Declaração de Cascais define estratégias
Atentos a esta realidade, governantes, académicos, empresários e especialistas dos
países lusófonos reúnem-se em Portugal,
no mês de junho, para debater o valor
económico do setor e as soluções energéticas adequadas. A I Conferência sobre
Energia para o Desenvolvimento da
CPLP, que se realiza entre 23 e 25 de junho no Centro de Congressos de Cascais,
pretende consolidar a articulação de uma
primeira visão de conjunto nesta área
estratégica.
A conferência é antecedida da I Reunião de Ministros da Energia, a 23 de junho, também em Cascais, somando contribuições oportunas que vão ajudar a
caracterizar a tal visão sobre a realidade
atual do mundo da energia nos países do
grupo. Por esta via, os principais atores
nesta operação querem criar as condições
para que a CPLP tenha uma voz cada vez
mais forte no debate sobre energia a nível
global. A discussão, como propõe Portugal, não deve cingir-se ao plano político e
científico. «É importante que a isto esteja
associada uma oportunidade de cooperação empresarial», referiu Moreira da Silva
no ato de apresentação pública das várias
iniciativas ligadas ao tema, previstas para os
próximos meses.
Salimo Abdula, presidente da Confederação Empresarial da CPLP, insiste no
Moçambique, cuja
economia deverá crescer
este ano 7,5%, continua
a viver o boom no setor
do carvão e gás natural
papel do setor privado na concretização de
políticas de desenvolvimento através de
soluções adequadas, apontando que é preciso saber usar a energia como fonte geradora de negócios e emprego duradouro.
Por outras palavras, o desafio é valorizar o
potencial existente, tornar o setor mais
atrativo e competitivo, equacionando o
lugar da CPLP no xadrez mundial. Por
outro lado, como defende Abdula, é preciso torná-lo mais sustentável no plano do
desenvolvimento económico e social em
benefício das populações dos países do
grupo.
Os resultados destes eventos serão
igualmente úteis para o diálogo internacional, que decorre até ao final deste ano, sobre as alternativas energéticas. A conferência acontece numa altura crucial e
pertinente em que também se discutem os
Objetivos de Desenvolvimento do Milénio pós-2015. Porque, tal como a água, a
energia faz parte de uma das pré-condições
para o desenvolvimento e inclusão social
sustentáveis. É provável que das conclusões
de Cascais vingue a ideia de criação de um
consórcio petrolífero da CPLP, proposta
antes formulada por Timor-Leste.
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75
publirreportagem
José Alcouce, chefe de cozinha
Sabores da Terra
encantam Luanda
Foi inaugurado a 27 de janeiro, já se afirmou pela
sua qualidade e oferece serviços de restauração,
padaria e pastelaria. Está aberto toda a semana,
emprega 40 pessoas, e é procurado por diversos
tipos de clientes.
O serviço de qualidade é uma das mais-valias do Sabores da Terra
O
restaurante Sabores da Terra, situado na baixa de Luanda, não
se distingue apenas pela sua
gastronomia variada, excelência no serviço
ou pela competência dos seus profissionais,
mas também pela sua beleza e elegância.
Inaugurado a 27 de janeiro, o espaço
tem atraído um público variado, sobretudo
76
abril 2015 –
África21
o da classe laboral. «O nosso restaurante
está aberto a todos os interessados. Sabemos que estamos numa zona em que se
encontram instaladas muitas empresas e
preocupamo-nos em atender também este
público. Especificamente para as empresas,
nós confecionamos pratos rápidos, um de
peixe e outro de carne. Deste modo, quem
trabalha pode vir cá almoçar e fazê-lo comodamente em uma hora, mais ou menos,
que é geralmente o tempo disponível para
almoço», explicou João Carlos Duarte, um
dos sócios do estabelecimento.
Embora esteja numa zona também
residencial, são mais os trabalhares que
afluem ao restaurante, compreendendo
A oferta é variada e um
dos pontos fortes é o pão,
já distribuído para outros
estabelecimentos
tudo para garantir a excelência e qualidade
que os nossos clientes merecem».
Inaugurado a 27 de janeiro,
o restaurante tem atraído
muitos clientes
cerca de 80% da clientela. «Se assim não
fosse, nos fins-de-semana, que são os dias
em que não há atividade empresarial, devíamos ter uma afluência maior, o que não
acontece», justificou.
Quanto ao atendimento, João Duarte
garante que é o melhor que se pode encontrar em Luanda. «Nós recrutámos pessoas
que vêm de outros restaurantes e pastelarias, embora tenhamos dado oportunidade
a pessoas que nunca trabalharam. Apesar
disso, contratámos ainda um formador que
direciona e instrui os nossos funcionários.
Temos também um acompanhamento
constante por parte dos que têm mais experiência sobre aqueles menos experientes,
Uma padaria de eleição
O restaurante Sabores da Terra dá emprego direto a 40 pessoas, dos quais «99%
são nacionais». Nesta fase inicial o pessoal
trabalha em dois turnos e a casa está aberta
de segunda a segunda, a servir pequenos-almoços, lanches, almoços e jantares.
Todavia, um dos pontos fortes do restaurante e que tem enchido de orgulho os
seus proprietários é a sua padaria. Sabores
da Terra é um dos poucos – senão o único
– com serviço próprio de padaria à escala
industrial. A padaria atende não só o restaurante, mas também algumas empresas
e até outros restaurantes, que solicitam a
sua oferta. «Nós fazemos todo o tipo de
pão, incluindo o integral, e brevemente
vamos avançar para o pão de sementes.
Quanto a bolos temos uma oferta diversificada, desde bolos para casamentos ou
aniversários, a pastéis, entre outros», detalhou João Duarte. O Sabores da Terra está
aberto entre as 6h30 e as 22h e dispõe de
88 lugares sentados.
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insumos
Bolsa de Casablanca no top-50
das praças financeiras internacionais
ABB constrói central elétrica a carvão
na África do Sul
A 17.ª edição do Global Financial Center Índex (GFCI), elaborado
pelo think-tank londrino Y/Zen, coloca a bolsa de Casablanca no
42.º lugar entre 187 centros financeiros mundiais. A praça marroquina, que progrediu nove lugares em relação ao índice anterior,
mantém o segundo lugar em África atrás de Joanesburgo (32.º no
ranking) e à frente da Maurícia. Nova Iorque, Londres, Hong
Kong, Singapura e Tóquio lideram a classificação. O GFCI avalia a
competitividade das praças financeiras a partir de dados que medem
o clima dos negócios, o desenvolvimento do setor financeiro, o estado das infraestruturas e o nível do capital humano disponível, e
mediante uma sondagem junto de 3500 profissionais do setor.
O grupo tecnológico suíço-sueco ABB assinou com a
Eskom, empresa pública de eletricidade da África do Sul,
um contrato de 160 milhões de dólares para equipar uma
central elétrica a carvão com os sistemas de última geração. A central termoelétrica de Kusile, atualmente em
construção, terá uma produção de 4800 MW e será a
quarta maior do mundo. A ABB será responsável pelo
desenvolvimento, instalação, arranque e otimização da
central. Esta nova geração de centrais a carvão é mais eficiente e liberta menos gases com efeito de estufa que as
centrais clássicas.
Noventa por cento da energia produzida pela Eskom
deriva de centrais a carvão, único combustível fóssil existente na África do Sul. A insuficiência da produção elétrica afeta gravemente a economia sul-africana e a entrada
em funcionamento da central de Kusile destina-se a minorar os problemas causados pelos cortes de energia.
A ABB é um dos líderes mundiais do setor das novas tecnologias energéticas e já equipou outras centrais na África
do Sul, Lesotho, Malawi, Botswana, Zâmbia, Zimbabwe
e República Democrática do Congo.
C
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abril 2015 –
África21
M
Y
CM
MY
CY CMY
K
DR
Uma nova capital
para o Egito
O governo egípcio apresentou os planos da
nova capital a construir em cinco anos entre
as cidades do Cairo e Suez e que oferecerá
uma melhor qualidade de vida a cinco milhões de habitantes. O projeto apresentado
pelo ministro da Habitação, Mustafa Kamal Madbuli, será 12 vezes maior que Manhattan, três vezes maior que Washington,
o seu aeroporto internacional será maior
que os de Singapura e Londres. Além do
Governo, do Parlamento e das embaixadas
a nova metrópole incluirá 2000 estabelecimentos de ensino e 300 hospitais.
A construção da primeira fase levará entre cinco e sete anos e custará 45 mil milhões
de dólares. A decisão foi tomada tendo em
conta a saturação da aglomeração do Cairo
cuja população de 18 milhões de habitantes
deverá duplicar nos próximos 20 anos.
A nova capital – que não tem ainda
nome – faz parte de um pacote de projetos
de investimentos que o Governo egípcio
apresentou aos potenciais investidores
numa reunião em Charm el Cheik de 13 a
15 de março. A Arábia Saudita, os Emirados Árabes e o Koweit prometeram 12 mil
milhões de dólares, dos quais três mil milhões em depósitos no Banco Central do
Cairo e o restante em investimentos nos mais
variados setores. Mas o Egito pretende diversificar as suas fontes de financiamento.
O chefe da diplomacia norte-americana,
também presente em Charm el Cheik, apelou à comunidade internacional e aos mercados para apostarem na economia egípcia.
Ampliação do porto português de Sines
A sociedade PSA de Singapura, que gere o terminal de contentores do porto de Sines,
vai investir 40 milhões de dólares em obras de ampliação que farão do porto de águas
profundas do sul de Portugal o terceiro da península ibérica, atrás de Valência e Algeciras (Espanha). Sines irá também subir no ranking europeu, passando do atual
vigésimo lugar para o oitavo, depois de Roterdão, Hamburgo e Antuérpia mas à
frente de Barcelona e Génova. Um projeto mais ambicioso, avaliado em 130 milhões, teve de ser abandonado após o fracasso das negociações entre três grandes armadores mundiais (Maersk, CMA/CGM e MSC) provocado pela oposição da
China à construção em Sines de um novo cais com capacidade para receber ao mesmo tempo três porta-contentores gigantes. O projeto inicial devia fazer de Sines uma
escala das rotas marítimas entre a Europa, Ásia e Américas.
DR
Série televisiva angolana Windeck
conquista públicos africanos
Lançada em Luanda
em julho de 2012, a
produção da firma
Semba Comunicação é
atualmente difundida
um pouco por todo o
continente, como na
Costa do Marfim, Gabão, Quénia e Senegal,
em versão original com legendas em francês ou inglês. Amor, sexo, homossexualidade, dinheiro, moda e glamour são os ingredientes desta produção que conta com
a participação nos papéis principais de personalidades famosas do mundo da moda
e do cinema lusófono como Micaela Reis (ex-miss Angola em Portugal), os manequins Celso Roberto e Fredy Costa e os atores Ery Costa e Grace Mendes. O argumento não é muito original e segue as receitas das telenovelas brasileiras, mas a série
deslumbrou os telespectadores africanos com as imagens de uma Angola ainda
largamente desconhecida: paisagens fascinantes, interiores luxuosos das moradas
do jet-set local, banda sonora que inclui velhos sucessos da música popular angolana
e o célebre kuduro.
África21– abril 2015
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insumos
Etiópia vai ter maior barragem hidroelétrica africana
DR
Os presidentes do Egito e do Sudão e o primeiro-ministro etíope assinaram a 23 de março um
acordo de princípio sobre a partilha das águas
do Nilo. Os etíopes chamam-lhe «Barragem do
grande renascimento» e esteve à beira de causar
uma guerra entre o Egito e a Etiópia. Construída sobre o Nilo Azul, que fornece 85% da água
que abastece o Sudão e o Egito, situados a jusante, será a maior de África (três vezes maior
que a de Assuão no Egito) e a terceira maior do
mundo. Os custos – avaliados em 4500 milhões
de dólares – serão inteiramente suportados pelo
Estado etíope mediante um empréstimo interno. Os trabalhos deverão estar concluídos em
2017 e a central eléctrica produzirá 6000 MW.
Além de cobrir as necessidades energéticas da A barragem do grande renascimento
Etiópia permitirá exportar eletricidade para os países vizinhos, do Nilo à entrada no território egípcio, garantido por tratados
gerando receitas anuais de 700 milhões de dólares.
internacionais. O acordo assinado sela a reconciliação entre os
O Egito opunha-se à construção desta barragem alegando dois países e a espetacular melhoria das relações entre o Egito
que o seu enchimento – que levará três a cinco anos – e a uti- e os países da bacia do Nilo desde a chegada ao poder do prelização de uma parte da água para a irrigação afetaria o caudal sidente Abdel Fattah al-Sissi.
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África21
DR
Tidjane Thiam
Credit Suisse com Big Boss africano
O grupo financeiro helvético Credit Suisse, um dos maiores
do mundo, anunciou a 10 de março a nomeação de Tidjane
Thiam para o cargo de presidente executivo. Nascido em
1962 na Costa do Marfim, diplomado na Escola de Minas
de Paris, enquanto ministro marfinense do Planeamento e
do Desenvolvimento (1998-99), levou a cabo um ambicioso
plano de privatizações. Exilado em Paris apés o golpe de Estado do general Guei, ocupou cargos de responsabilidade em
vários grupos privados na capital francesa. Em 2007 parte
para Londres e em 2009 é nomeado presidente executivo da
companhia de seguros britânica Prudential, cargo que ocupa
até agora, sendo o primeiro negro a liderar uma das empresas
líderes do FTSE-100.
Fundado no século XIX, em Zurique, o Credit Suisse, especializado na gestão de fortunas e investimentos,
está presente em 50 países e emprega mais de 45.000
pessoas. Realizou em 2014 lucros superiores a 2000 milhões de dólares. Tidjane Thiam substituirá em junho o
atual presidente executivo, o americano Brady Dougan,
que foi afastado em consequência do escândalo que obrigou o Credit Suisse a pagar uma multa de 2,5 mil milhões
de dólares nos Estados Unidos, depois de ter sido acusado
de ajudar os seus clientes em operações de evasão fiscal.
Navios franceses para Moçambique
Os estaleiros Constructions Mecaniques de Normandie
(CMN) de Cherburgo estão em vias de realizar um desafio
técnico e comercial: a entrega em dois anos dos 30 navios
encomendados por Moçambique em 2013. A primeira entrega a realizar em abril é constituída por 24 barcos de pesca
(arrastões). Três trimarãs serão entregues em junho à Guarda
Costeira e três lanchas de interceção em setembro. O cumprimento dos prazos era uma das condições essenciais do
contrato de 200 milhões de dólares, mas a rapidez da sua
execução vai permitir também libertar espaço para a construção de navios encomendados por outros países nomeadamente africanos.
ANGOLA E MOÇAMBIQUE Um relatório do Banco Nacional do
Qatar coloca Angola e Moçambique entre os seis países mais
promissores em 2015 para os investidores globais. A estes somam-se o Quénia, Nigéria, Tanzânia e Uganda, todos considerados pelo banco como «diamantes económicos reais». Os aspetos positivos não escondem, no entanto, «os variados riscos
que os investidores têm de enfrentar», como «problemas de
segurança, maus ambientes empresariais, fraca implementação
de projetos e dúvidas sobre a sustentabilidade dos défices orçamentais e da dívida pública».
BANCO DE DESENVOLVIMENTO DE ANGOLA O BDA financiou 863 projetos ligados aos setores de agricultura, indústria, comércio e serviços, entre 2006 e 2014. A indústria absorveu 51% do crédito, a agricultura 35% e o setor dos serviços
14%. O administrador executivo do BDA, Walter Barros, indicou que a evolução total do crédito foi realizada por intermédio
de operações diretas e indiretas, cofinanciamentos e crédito
agrícola de investimento.
NOVO BANCO INTERNACIONAL Brasil, Dinamarca, Holanda
e Rússia anunciaram a decisão de aderir ao Banco Asiático de
Investimento em Infraestruturas (AIIB) proposto pela China.
Com estas adesões, são já 42 os fundadores da nova instituição
financeira internacional. Lançado em outubro passado em Pequim por 21 países asiáticos, o AIIB foi visto por analistas ocidentais como um desafio à atual ordem financeira internacional,
dominada pelos Estados Unidos e a Europa, e uma tentativa de
criar uma alternativa chinesa ao Fundo Monetário Internacional e
ao Banco Mundial.
ANGOLA-JAPÃO O Ministério da Economia de Angola em
parceria com a Embaixada de Angola no Japão organizaram em
março o Fórum Económico Angola-Japão que contou com a
presença de 37 empresas e de 118 empresários provenientes
do país asiático. O evento pretendeu promover as potencialidades de investimento em Angola e desenvolver alicerces para a
criação de parcerias. Atualmente operam em Angola oito empresas japonesas. Angola compra maquinaria, equipamentos e
veículos ao Japão, enquanto este é comprador de petróleo e gás
angolanos.
GRUPO PESTANA O maior grupo hoteleiro português abrirá
em 2017 um hotel em Marraquexe. É o segundo do grupo em
Marrocos, depois de Casablanca, inaugurado em 2013.
O projeto, que fará a recuperação do antigo Club Med, resulta de uma parceria com a Caisse de Dépôt et de Gestion,
maior investidor institucional de Marrocos, estabelecida ao
fim de nove meses de negociações. Com este hotel, o Pestana somará um total de dez unidades hoteleiras em África.
África21– abril 2015
81
MOÇAMBIQUE
BRASIL
Assassínio de Gilles Cistac
ainda por explicar
Dilma Rousseff
resiste ao cerco
Seja assinante
ANGOLA
OGE aprovado
no Parlamento
A Nova Movimento – empresa angolana proprietária da África21 – montou
um sistema de recolha de assinaturas regionalizado, a fim de poder atender
melhor, com mais rapidez e de maneira mais vantajosa, os diferentes assinantes da revista.
Assim, as assinaturas serão recolhidas, conforme os casos, em três centros:
Luanda, Lisboa e Rio de Janeiro. Com exceção dos assinantes de Angola e Brasil, todos os demais receberão o seu exemplar pelo correio a partir de Lisboa.
Como os custos de envio também são variáveis, conforme as re­giões,
o preço das assinaturas é igualmente regionalizado.
Eis, a seguir, um quadro explicativo, com a tabela de preços
das assinaturas e com os detalhes acerca dos centros onde os pagamentos
deverão ser feitos, conforme os endereços dos assinantes.
Nº 95 - ABRIL 2015 – 500 Kz / 4 USD / 3 € / R$ 15
TURISMO
A atração por África
A modesta fatia
que o continente ocupa
no turismo mundial
está a engordar
com os visitantes
a diversificarem
os seus destinos
TABELA DE ASSINATURAS
REGIÃO
SEMESTRAL
ANUAL
BANCO
Angola
KZ 6.000
KZ 10.000 Keve
Brasil
R$ 120
R$ 200
Portugal
€ 20
€ 35
União Europeia
€ 30
€ 55
Resto do mundo USD 60
SWIFT
BRDKAOLU 809026
ITAÚ
Millennium BCP
CONTA
69854-5
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82
abril 2015 2014
novembro
– África
– África
21 21
press release
n CUPIDO ANGOLA E BANCO
DE INVESTIMENTO RURAL
A Cupido Angola foi a agência escolhida
para desenvolver a campanha de lançamento do Banco de Investimento Rural
(BIR), o mais recente projeto bancário angolano, especializado no financiamento de
atividades e projetos ligados ao agronegócio. A campanha será focada num conceito
institucional e terá uma estratégia multimeios. De acordo com Leandro Laborinho,
CCO da Cupido Angola, «o timing de lançamento deste projeto é ideal, visto a diversificação de investimentos e o agronegócio
serem no momento prioridade do Executivo e dos empresários». Com a primeira
agência na cidade de Malanje e escritório
de representação em Luanda, o BIR oferece produtos e serviços a empresas e empresários nas áreas da agricultura, pecuária, avicultura, agroindústria e aquicultura.
O plano de expansão do BIR inclui as províncias do Kwanza Norte, Kwanza Sul,
Bengo e Uíge.
n CONFERÊNCIA
DE RISK & COMPLIANCE PARA
ENTIDADES FINANCEIRAS
A gestão do risco operacional e a crescente pressão legal e regulamentar exigem
que os profissionais do setor bancário e
segurador estejam constantemente atualizados. Face à crescente necessidade de
um constante update de informação prática
e de partilha de experiências na área financeira, o iiR Angola prepara em conjunto
com os profissionais da banca e seguros, a
1.ª Conferência de Risk & Compliance a
realizar a 21, 22 e 23 de abril em Luanda.
O dia 21 será dedicado aos Hot Topics de
Corporate Governance, Compliance, Gestão de Riscos e Auditoria Interna, com a
participação das autoridades de supervisão
do setor bancário e segurador e de reputados profissionais do setor financeiro em
Angola. O seminário Forensic Control realiza-se a 22 e 23 de abril, dois dias intensivos de formação sobre Fraude em Entidades Financeiras.
n NÓS SOMOS ENERGIA
Trata-se de um
programa educativo sobre as fontes
de energia limpas
e eficiência energética, para crianças do 4.º ano de
escolaridade, criado pela Cabeólica
e pelo ECREEE –
Centro para as Energias Renováveis e Eficiência Energética da CEDEAO, contando
com o apoio do Ministério da Educação e
do Desporto e da Direção-geral de Energia
de Cabo Verde. Este projeto pretende dar
a conhecer, de forma didática e divertida,
as diferentes fontes de energia, os impactos que provocam no meio ambiente e
sensibilizar as crianças para uma utilização
mais racional da energia elétrica. Nós Somos Energia pretende ainda promover alterações de comportamentos para fomentar a eficiência energética e valorizar os
recursos naturais existentes no país. Iniciada em março, abrange cerca de 80 alunos
de São Vicente. Em abril o projeto será
estendido a outras escolas do país.
n PROTTEJA SEGUROS, NOVO
OPERADOR NO MERCADO ANGOLANO
A Protteja Seguros iniciou a sua atividade
em 2014 com a introdução do Seguro Automóvel e do Seguro de Viagem. Em 2015
a seguradora pretende conquistar a confiança do mercado angolano, abrir mais
agências em Luanda e nas restantes províncias. Ao longo do ano, a empresa espe-
ra disponibilizar mais três seguros: o Seguro contra Acidentes de Trabalho, o Seguro
contra Incêndios e Outros Danos, e o Seguro de Responsabilidade Civil. «Temos a
certeza que este setor pode ser um motor
para o desenvolvimento económico do
país», referiu Agostinho Kapaia, PCA da
Protteja Seguros. A nova seguradora foi
apresentada oficialmente em fevereiro,
pelo presidente da Associação das Seguradoras de Angola, Aguinaldo Jaime, numa
cerimónia em que participaram José António da Conceição e Silva, ministro do Urbanismo e Habitação, e José Pedro de Morais, governador do Banco Nacional de
Angola.
n PROVA DE VINHOS DA DÃO SUL
EM LUANDA
O vinho Cabriz Colheita Selecionada, da
região portuguesa do Dão, foi dado a provar em Luanda a 11 de março por iniciativa
da empresa Dão Sul. Além deste, foram
apresentados pelo enólogo Osvaldo Amado
outros dois vinhos do Dão e da região da
Bairrada e outro do Alentejo. «Todos são
vinhos de estrutura média, acidez média e
álcool médio e adaptam-se muito bem às
iguarias angolanas», disse o enólogo.
A Dão Sul detém marcas como a Quinta de
Cabriz, Casa de Santar, Herdade Monte da
Cal, Quinta do Encontro, Paço dos Cunhas
de Santar e, no Brasil, a Vinícola Santa
Maria. Desde 2011 que Osvaldo Amado é
diretor de enologia da empresa. Além de
presidente de júri em diversos concursos
de vinhos, o enólogo já foi responsável por
vários projetos nesta área e soma mais de
400 milhões de garrafas produzidas e cerca de 900 medalhas de Ouro e Prata em
distinções nacionais e internacionais.
África21– abril 2015
83
anos da uccla
DR
30
Iniciada em 2014, em Coimbra – uma das
cidades portuguesas que forjou muitos dos
líderes africanos das antigas colónias –, a
homenagem aos que lutaram pela liberdade
e autodeterminação dos seus povos conhece
o seu auge em maio, mês de África. A União
das Cidades Capitais de Língua Portuguesa,
que assinala 30 anos de existência, realiza em
Lisboa uma grande conferência para evocar
a memória dos antigos associados da Casa
dos Estudantes do Império.
João Carlos
Luís de Almeida e Manuel Lima
Lisboa rende homenagem
à luta pela liberdade e independências africanas
E
dmundo Rocha traz consigo em
algumas folhas de papel as memórias escritas do seu tempo de jovem
ativista na Casa dos Estudantes do Império
(CEI) para partilhar com o público. Manuel dos Santos Lima, escritor e professor
catedrático, recorda com factos e evidências
os difíceis anos de 1950-60, marcados pela
ditadura salazarista e por vários episódios
que retratavam o desprezo da sociedade colonial portuguesa pelos negros vindos de
África para estudar na então Metrópole.
«Não podíamos frequentar todos os
mesmos sítios fora da Casa dos Estudantes
do Império», recorda, apenas para dar um
exemplo. «Enquanto os estudantes angolanos de pele escura tinham uma média de
mesada mensal entre mil e 1500 escudos, os
mais claros recebiam até 3500 escudos».
Ambos angolanos, estes dois veteranos
têm em comum o destino de terem vivido
aquele período conturbado, sustentado
pelo regime colonial português, e de terem
servido na clandestinidade a causa nacionalista, cujo espírito foi determinante para a
luta pelas independências dos territórios
então considerados portugueses. «Havia
84
abril 2015 –
África21
plena consciência de que a independência
seria o caminho a seguir», precisa o docente
do Instituto Superior Politécnico Lusíadas
do Huambo. «Até porque por toda a parte
se falava disso. Também nas Nações Unidas, o bloco afro-asiático fazia valer esse
ponto de vista», lembra.
Já nos anos 50, era tema de conversa.
Conta o jornalista Carlos Veiga Pereira, que
confidenciava ideias sobre o assunto com o
seu grande amigo e colega de quarto em
Coimbra, António Agostinho Neto, proclamado em 1975 o primeiro Presidente de
Angola independente.
Tanto Edmundo Rocha, um dos dirigentes do Movimento dos Estudantes Angolanos (MEA), como Manuel Lima, que viria
a ser o primeiro comandante do Exército
Popular de Libertação de Angola, incluem a
lista de cerca de cem jovens africanos que fugiram de Portugal de forma organizada, escapando à perseguição da PIDE. Foi determinante para essa fuga o papel desempenhado
pelo MEA, apoiado por uma organização
protestante com sede em Paris, por três
agentes da CIA e pelo governo francês, segundo revelou o médico angolano no debate
realizado, em fevereiro, no Parlamento português, por impulso de Vítor Ramalho, secretário-geral da União das Cidades Capitais
de Língua Portuguesa.
De Coimbra a Lisboa
A instituição dirigida por este luso-angolano
está desde outubro de 2014, com o evento
lançado em Coimbra, empenhada em preservar a memória coletiva e render a merecida homenagem àqueles homens e mulheres
que, com a sua coragem, inteligência e determinação, levaram a bom porto a causa da
liberdade e forjaram as condições para a autodeterminação dos povos sob a dominação
e repressão colonial. «Com a sua cantina, lar
e posto médico, a CEI – cuja sede era no
edifício na Avenida Duque d’ Ávila, n.º 23,
na esquina com a Rua Dona Estefânia – foi,
entre 1944 e 1965, uma âncora para muitos
dos jovens vindos de África e da Ásia. Mais
do que isso, e ao arrepio dos desígnios oficiais, estimulou a troca de ideias entre jovens
que sonhavam com o fim da discriminação
racial e da desigualdade social». São palavras
de Vítor Ramalho proferidas em Coimbra,
onde funcionou uma delegação da CEI.
DR
Melhorar a qualidade
de vida das populações
Edmundo Rocha e Vítor Ramalho
A Casa foi criada pelo regime português
para melhor controlar os estudantes que vinham das colónias. Mas, «face à recusa de
Salazar em aceitar o princípio da autodeterminação das colónias portuguesas, muitos
jovens associados da CEI promoveram atividades culturais e políticas como forma de
exprimir os seus anseios – a libertação dos
territórios de que eram originários e o direito dos seus povos de conduzir livremente os
seus destinos», lembrou Vítor Ramalho.
De várias gerações, figuras como Amílcar Cabral, Agostinho Neto, Lúcio Lara,
França Van-Dúnem, Pascoal Mocumbi,
Mário Machungo, Joaquim Chissano, Pedro Pires, Miguel Trovoada, Alda do Espírito Santo, João Vieira Lopes, Pepetela e
Gentil Viana, entre muitos outros que fizeram parte do Movimento Associativo Estudantil, «são personalidades incontornáveis e
referências obrigatórias», como aludiu o
coordenador das homenagens em nome da
Comissão organizadora.
Exemplo para os jovens africanos
Por Lisboa ter sido a sede da CEI – justifica
Vítor Ramalho –, a cidade sente-se no dever
de prestar esta homenagem aos antigos associados da Casa. Em maio, de 22 a 25, tem
lugar na Fundação Calouste Gulbenkian
um colóquio sobre a CEI, que reunirá em
Lisboa os antigos associados que exerceram
funções de primeiro-ministro ou cargos de
Presidente da República, como Fernando
França Van-Dúnem (Angola), Pascoal
Mocumbi, Mário Machungo e Joaquim
Chissano (Moçambique), Miguel Trovoada (São Tomé e Príncipe), Pedro Pires
(Cabo Verde) e ainda Jorge Sampaio (Portugal). Por razões de saúde, a viúva Maria
Eugénia Neto, que representaria Agostinho
Neto, não estará presente no evento, o qual
marca o encerramento da homenagem, que
acontece no mês dedicado a África e no ano
de celebração dos 40 anos de independência
dos países africanos lusófonos.
No dia 21, é inaugurada uma exposição
documental sobre a CEI, nos Paços do
Concelho da Câmara Municipal de Lisboa,
que também evocará o 30.º aniversário da
constituição da UCCLA. «Um valioso espólio, ainda desconhecido, que permitirá
rever a memória», diz Vítor Ramalho.
Segundo Edmundo Rocha, a atitude dos
estudantes da CEI de participação ativa na luta
antifascista e anticolonialista pode servir de
exemplo às juventudes africanas dos países de
língua oficial portuguesa, dedicando-se à
construção dos seus países num quadro democrático, de progresso e de liberdade. Por seu
lado, Luís de Almeida, embaixador de Angola
na CPLP, exortou, no debate realizado no
Parlamento português, à união e irmandade
entre os africanos e portugueses, sobrepondo-se a eventuais contingências políticas, seguindo o espírito que orientou a CEI e a ex-CONCP (Conferência das Organizações
Nacionalistas das Colónias Portuguesas).
Esta «grande homenagem», como
faz questão de sublinhar Vítor Ramalho, acontece no ano de celebração
dos 30 anos de existência da UCCLA, que, desde a sua criação, tem
trabalhado no sentido de aproximar
cada vez mais as cidades dos países
membros. A instituição, que conta
com cerca de 40 empresas associadas, intervém no domínio da cooperação descentralizada, promovendo
o desenvolvimento económico, empresarial e a cultura lusófona, assim
como a formação profissional, as finanças, o urbanismo e património, o
saneamento e ambiente, e a educação e saúde. Entre os projetos, participou na reabilitação de edifícios em
Díli (Timor-Leste), da marginal da
Cidade da Praia (Cabo Verde), onde
também interveio, no ano passado,
em iniciativas para o abastecimento
de água a 13 bairros pobres, através
de uma candidatura apresentada à
União Europeia (UE), com o apoio do
Instituto Camões. Na cidade de São
Tomé, decorrem trabalhos de saneamento básico, também no âmbito de
um projeto apoiado pela UE. Igual
ação foi desenvolvida para a limpeza
da capital guineense, Bissau, tendo o
país beneficiado de outro projeto de
fomento ao empreendedorismo na
área da apicultura.
Além de uma possível participação na organização da toponímia de
Luanda, técnicos da UCCLA realizam no município de Cazenga, em
Angola, o levantamento das necessidades em matéria de saneamento
básico. A 28 e 29 de abril, Luanda
acolhe o 2.º Fórum sobre Investimentos em Infraestruturas em África, do
qual a UCCLA é uma das entidades
parceiras. Será uma «excelente plataforma» para o debate de soluções
visando responder ao alerta dado
pelas Nações Unidas, de que as populações urbanas do continente africano vão aumentar em cerca de 50%
até 2030 e que poderá existir a necessidade de construção de novas
cidades.
África21– abril 2015
85
cults
Fundação Sindika Dokolo
a inauguração da exposição «You Love Me,You Love Me
Not» que reúne na Galeria Municipal Almeida Garrett do
Porto, até 17 de maio, uma seleção de obras da sua coleção africana
de arte contemporânea, Sindika Dokolo, fundador e presidente da
Fundação que leva o seu nome, anunciou o arranque de «uma
parceria a longo prazo, de dois, três anos» entre Luanda e o Porto.
Após a exposição, outros projetos serão desenvolvidos ainda este
ano nas áreas da música e do teatro. O intercâmbio cultural patrocinado pela Fundação e a Câmara Municipal do Porto prevê a
criação de residências artísticas que permitam a artistas portugueses
viverem experiências africanas e vice-versa. O presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, e o vereador da cultura, Paulo Cunha e
Silva, afirmam que a iniciativa vem preencher uma lacuna no património cultural da cidade. A autarquia atribuiu por unanimidade
a medalha de mérito no grau de ouro a Sindika Dokolo.
Natural do ex-Zaire (hoje RDC) e casado com Isabel dos
Santos, filha do Presidente angolano, Dokolo tem créditos firmados no mundo das artes. Começou a sua coleção – considerada
como uma das maiores de arte africana – aos 15 anos. O espólio
da Fundação que criou em 2003 inclui 5000 peças de 140 artistas originários de 28 países africanos e da diáspora. Em 2006,
criou em Luanda a primeira Trienal africana, evento que deverá
DR
N
lança ponte cultural entre Luanda e Porto
Sindika Dokolo na inauguração da exposição «You Love Me,You Love Me Not»
ter a 3.ª edição este ano e contará pela primeira vez com uma
importante participação moçambicana.
Sindika Dokolo é também o principal patrocinador da Feira
Internacional de arte africana contemporânea «1:54», fundada
pela marroquina Touria El Glaoui. Depois de duas edições em
Londres a «1:54» (pelos 54 estados africanos) estreia-se este ano
em Nova Iorque de 15 a 17 de maio. Aceita com humor o facto
de ser mais conhecido em Portugal como «o marido de Isabel dos
Santos» que por mérito próprio. «Às vezes orgulho-me de ser ela
a minha mulher», disse após a inauguração e garantiu em tom de
brincadeira que a exposição não constitui «uma OPA mais ou
menos amigável sobre a cultura portuguesa».
Manuela Margarido
DR
recordada em exposição fotográfica
A
poetisa e nacionalista Manuela Margarido
foi homenageada numa exposição fotográfica no Arquivo Histórico. As «Memórias Póstumas» são fotos tiradas por Maria José Palla e
pontuadas com alguns poemas da intelectual
santomense. Manuela Margarido, que esteve
exilada em Paris durante o período colonial, foi
após a independência embaixadora de São Tomé
e Príncipe em Bruxelas e junto de várias organizações internacionais e uma grande divulgadora da
cultura santomense na Europa. Nasceu na roça
Olímpia, na ilha do Príncipe, em 1925, e faleceu
em Lisboa a 10 de março de 2007.
86
abril 2015 –
África21
Documentos e fotos inéditas
P
de Lúcio Lara em novo livro
artindo de uma detalhada pesquisa iniciada há cerca de seis anos pela Associação
Tchiweka de Documentação (ATD), foi lançado em março, no Museu de História
Militar, em Luanda, o livro 1961 - Memória de um ano decisivo. A publicação contém
documentos e fotos inéditas do acervo de Lúcio Lara “Tchiweka”, um dos principais líderes da luta pela independência de Angola, bem como testemunhos de outros nacionalistas
angolanos e seus apoiantes antifascistas em Portugal e noutros países, sobre o desencadear
do combate que conduziria à derrubada do último império colonial.
«A leitura desta obra gera emoções e obriga-nos a reviver a chama do protesto que
galvanizou milhares de nacionalistas de diferentes matizes políticas que, enjaulados pela
PIDE na luta clandestina ou empunhando armas nas matas, lançaram as sementes da
inesquecível gesta da libertação de Angola das grilhetas do ocupante português», afirmou
o jornalista Gustavo Costa, que fez a apresentação da obra. «É uma arma poderosa, que
resistiu a todas as tentativas de rasura da história da independência e mesmo a certas correntes negacionistas, que gostariam de ver triunfada aqui uma narração ‘descafeinada’».
Atualmente, a ATD está a desenvolver um extenso e minucioso projeto de recolha de
testemunhos orais e que têm como um dos objetivos a realização de um documentário em
vídeo sobre a luta e a conquista da independência de Angola. Segundo o general Paulo Lara,
diretor e mentor do projeto «Angola - Nos trilhos da Independência», este filme deverá estrear-se em 2015, durante as comemorações dos 40 anos da independência angolana.
História Militar
de Angola
C
oncebido com a perspetiva de dotar as Forças Armadas Angolanas (FAA) de uma obra de
referência sobre o percurso histórico-militar de Angola, de modo a facilitar o seu entendimento e estudo a todos os níveis, o livro História Militar de Angola é um trabalho pioneiro
nesta matéria. Será apresentado a 7 de maio, no Memorial António Agostinho Neto, em
Luanda, numa ação conjunta do Departamento de Estudos e Investigação Militar do Estado
Maior General das FAA, conjuntamente com a Editorial Kilombelombe, com a pompa e
circunstância que merece.
Colaboraram na sua feitura os militares António Edilson Wanandumbo, António Borges
Paquise, Maria Quarta Punza, Silvestre António Francisco, Pungula Fernando Manuel, Joaquim Rufino Mbeça França e Justino da Glória Ramos, que foram coordenados pelo tenente-general das FAA Miguel Júnior, doutorado em História, que assina o primeiro capítulo,
«A guerra na África Central Ocidental (do século XVI ao século XIX)», e Manuel Maria Difula, igualmente doutorado em História e professor titular da Universidade Agostinho Neto.
Como lembra no prefácio o general Nunda, «a História de Angola é uma história de
guerras, resistências e embates», pelo que «esta obra de História é bem-vinda pois ela colmata
o vazio que se fazia sentir no seio das FAA e representa um meio para se aprofundar o conhecimento a respeito da História Militar de Angola», que cada vez mais é imprescindível, pois
foram estas guerras e conflitos que configuraram Angola como espaço territorial único e no
qual passaram a coabitar os povos oriundos dos antigos reinos africanos.
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cults
DR
Revelações angolanas
Uma criação da angolana Nadir Tati
N
na Moda Lisboa 2015
adir Tati surpreendeu ao desafiar o público português na última edição da
Moda Lisboa 2015 com a sua mais recente coleção dedicada à liberdade e aos 40
anos de independência de Angola. A mais internacional dos estilistas angolanos apresentou uma produção inovadora, elegante, diferenciada pelos tons alegres de tecidos
marcadamente africanos, arrancando vivos aplausos dos curiosos no final da
passarelle.
Entre as estreias nesta 44.ª edição da Lisboa Fashion Week, sob a temática
«Curiouser», a designer foi uma das principais atrações do evento, que decorreu entre
13 e 15 de março em três espaços distintos: Pátio da Galé, Casa da Balança da Marinha Portuguesa e Salão Nobre dos Paços do Concelho. Foram ao todo mais de 21
desfiles, nos quais se mostraram as tendências de criadores portugueses e internacionais para o inverno de 2016.
Outras duas estreias no certame foram as jovens angolanas Ana Cristina e Rufane
Tomás, que também participaram no «Portugal Fashion Fall Winter 2015-2016» e
assim se lançam na moda em busca do sucesso. O sonho de ambas as manequins,
descobertas pela agência Dabanda, é fazer passerelles em cidades como Londres, Milão, Paris e Nova Iorque. Para isso, disseram à África21, é muito importante passar
por Lisboa, como porta de entrada e de descoberta de outros mercados.
Feijão N´Água
santomense Alice Goretti Pina é um dos premiados com
a bolsa «Criar Lusofonia» pelo projeto literário Feijão
N’Água, Pagá Dêvê, Lujá Bôtê e Outros Contos de se Ler a desenvolver em São Tomé e Príncipe. A jovem escritora, radicada em Lisboa, está entre os três selecionados do concurso
deste ano, promovido pelo Centro Nacional de Cultura com
o apoio da Direção-geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas de Portugal, na área de criação e investigação literárias.
«Será uma obra baseada nas lendas e crenças com expressão
em São Tomé e Príncipe». A ideia, explica a autora, «é a de
criar uma narrativa a partir do universo do oculto e da oralidade, tendo como referência rituais de cura ou de apaziguamento como o ‘Pagá Dêvê’ (em São Tomé) e, de igual modo,
estórias como a do feitiço ‘Feijão n’Água’ e a lenda da senhora
Luzia Botelho (Lujá Bôtê) de que muito falam os mais idosos
na ilha do Príncipe».
Goretti Pina também aceitou o desafio do grupo HBD para
colaborar num outro projeto literário com o título Contextos de
São Tomé e Príncipe, que visa apoiar causas sociais no país, mais
88
abril 2015 –
África21
arquivo áfrica21
A
e outros contos de se ler
Alice Goretti Pina
concretamente na ilha onde nasceu a escritora. O programa
«Criar Lusofonia» nasceu em 1995 e tem por objetivo a atribuição de bolsas no domínio da escrita para estadas em países da
Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, pretendendo-se
criar oportunidades de contacto aprofundado com outros países
lusófonos aos criadores/investigadores de língua portuguesa a
fim de produzirem uma obra.
África21– abril 2015
89
livro do mês
Cheikh Anta Diop
editado em português
Tarde, mas não a más horas, foi finalmente
publicada em Portugal, sob o beneplácito da
Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Agostinho Neto (UAN), de Luanda,
uma obra do historiador e filósofo senegalês
Cheikh Anta Diop, A unidade cultural da
África Negra, editada pela primeira vez em
Paris em 1959.
Rodrigues Vaz
I
ntegrada na coleção «reler áfrica», coordenada por
Victor Kajibanga, da UAN, a primeira publicação de uma
obra do mais importante investigador africano do século
XX, a que se seguirão outras de temáticas africanas no domínio
das Ciências Sociais e Humanas, pretende colmatar a lacuna do
mercado editorial dos países de língua oficial portuguesa, que era
a ausência de obras de referência neste campo do saber humanístico. Como acentua o coordenador, «Publicar e divulgar conhecimentos e saberes sobre África é um desafio que a coleção abraça,
contribuindo para a construção de uma nova epistemologia e
uma nova hermenêutica dos estudos africanos no espaço lusófono, livre de estereótipos e de um olhar folclórico e exótico».
Resultado de uma vasta erudição do autor e profundo estudo sistemático à história e cultura africana, o livro apresenta
uma tese a favor do que se considera ser a unidade cultural da
África negra que, deste ponto de vista, «permaneceu viva sob
ilusórias aparências de heterogeneidade». Cheikh Anta Diop
apresenta assim uma das teses centrais que suportou a ideia de
uma Unidade Africana, de âmbito político, e que esteve na
base do sonho pan-africano de uma União Africana. É considerado um dos mais influentes e originais pensadores africanos do século XX e esta é uma das suas obras fundamentais.
Apoiando-se em citações de autores antigos como Heródoto e Estrabão para ilustrar a sua teoria, segundo a qual os
antigos egípcios apresentavam os mesmos traços físicos que os
africanos negros de hoje (cor da pele, aspeto do cabelo, do
nariz e dos lábios), Diop desenvolve de uma maneira muito
peculiar uma interpretação de dados de ordem antropológica,
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abril 2015 –
África21
como o papel do matriarcado, e de ordem arqueológica, que o
levaram a concluir que a cultura egípcia é uma cultura negra.
No plano linguístico, considerou igualmente, em particular,
que o wolof, hoje falado na África Ocidental, é foneticamente
aparentado com a língua egípcia antiga.
Regime matriarcal e poligamia
Subintitulada Esferas do Patriarcado e do matriarcado na Antiguidade Clássica, a obra desenvolve prioritariamente este tema,
e sobre o regime matriarcal conclui que é geral em África, quer
na Antiguidade quer nos nossos dias, mas que este traço não
resulta de uma ignorância do papel do pai na conceção da
criança. «O culto fálico que é corolário do regime agrícola
(pedras erguidas, obeliscos do Egito, templos da Índia do sul)
comprova-o largamente; este demonstra que no momento em
que a humanidade arcaica optava pela filiação matrilinear, a
mesma tinha conhecimento do papel fecundante do pai. Em
nenhum dos regimes descritos no berço meridional se negligencia sistematicamente o parentesco patrilinear».
Reconhecendo, entretanto, que a tendência atual da evolução
interna da família africana se orienta para um patriarcado mais ou
menos atenuado pelas origens matriarcais da sociedade, considera
que não é demais realçar o papel desempenhado, nesta transformação, por fatores externos, tais como as religiões, Islão e Cristianismo, e a presença temporária da Europa em África.
Sobre a poligamia, depois de citar Engels, que salientava
ser um regime praticado pelas classes sociais elevadas de todos
os países, talvez não em graus diferentes, mas sob formas dife-
rentes, considerava, por outro lado, que tinha tendência a generalizar-se, «sem nunca deixar de representar o indício de um
estatuto social», estando ligada também à divisão do trabalho
socialmente aceite que reserva ao homem as tarefas arriscadas,
de poder de força e de resistência.
Salientando que «A África Negra é uma das regiões do
mundo em que o homem é o mais pobre, isto é, possui menos
atualmente; porém, é a única região do mundo onde a miséria
não existe apesar desta pobreza, em resultado da existência de
uma solidariedade de direito», Diop denuncia com particular
acuidade a visão deturpada e deturpadora do europeu que
viajava por África períodos curtos e pensava que já sabia tudo
sobre o continente negro, muitas vezes apenas considerações
subjetivas sem lastro científico, como muitos queriam fazer
parecer. Por isso é que ele apelava aos intelectuais africanos,
no prefácio à primeira edição desta obra, em 1959, «para estudarem o passado não para nele se comprazerem, mas para dele
extraírem lições ou, ainda, para se afastarem dele com conhecimento de causa, caso seja necessário. Só um verdadeiro conhecimento do passado é passível de manter na consciência o
sentimento de uma continuidade histórica, indispensável para
a consolidação de um estado multinacional».
Investigador multifacetado habitado por um problema
principal, o de afirmar a função civilizadora dos africanos na
Cheikh Anta Diop é considerado
um dos mais influentes pensadores
africanos do século XX e esta
é uma das suas obras fundamentais
História, Cheikh Anta Diop foi pioneiro em demonstrar que
o continente negro é o berço da Humanidade e que foi o
Egito negro que inventou as ciências e as técnicas, as matemáticas e a filosofia, a escrita e a religião, repondo a verdade toldada durante muito tempo pelo «mito do negro» ignorante e
fora da História. No entanto, embora restitua ao negro a sua
memória, anuncia também o fim das certezas e abre novos
caminhos para a investigação em África e sobre África, para
além dos contributos africanistas.
A finalizar, preconiza que se pode deduzir «que a maior
parte dos futuros sábios africanos, tendo em conta o seu passado
cultural, pertencerão sobretudo à categoria dos que adotam
uma perspetiva otimista refletida». Por isso, «talvez estes venham a considerar que, quando a humanidade estiver concretizada, ao invés de morrer de tédio na mais completa ociosidade,
o homem aperceber-se-á que a sua tarefa apenas começou.
Descobrirá, então, que lhe é inteiramente possível, muito antes
de 15 biliões de anos de reflexão, domesticar o sistema solar e
dominá-lo até ao planeta periférico de Plutão, de modo praticamente eterno». «O universo do futuro estará, muito provavelmente, impregnado pelo otimismo africano», conclui.
Cheikh Anta Diop
Nascido em 29 de dezembro de 1923 em
Thieytou (Senegal), faleceu em 7 de fevereiro de
1986 em Dakar. Foi essencialmente historiador
e antropólogo, que estudou as origens da raça
humana e a cultura africana pré-colonial, tendo
sido considerado um dos
maiores historiadores
africanos do século XX,
embora tenha feito uma
especialização em física nuclear, no Laboratório de Química
Nuclear do Colégio de França, formação pluridisciplinar de
que se serviu para combinar vários métodos de abordagem.
Nos seus estudos, enfatizou a contribuição da África e, em
particular, da África negra, para a cultura e a civilização mundiais. Ficou conhecido como um dos pais do Pan-africanismo,
foi o precursor da Egiptologia na África e um dos maiores
pesquisadores do continente. Foi responsável pelas pesquisas científicas sobre a negritude do Egito Antigo, que revolucionou a história da África e do mundo.
Obras principais: Nations nègres et culture : de l’antiquité
nègre égyptienne aux problèmes culturels de l’Afrique noire
d’aujourd’hui, (1954); A unidade cultural da África Negra,
(1959); L’antiquité africaine par l’image, L’Afrique noire précoloniale. Étude comparée des systèmes politiques et sociaux
de l’Europe et de l’Afrique noire de l’antiquité à la formation
des États modernes, (1960); Les fondements culturels techniques et industriels d’un futur État fédéral d’Afrique noire, Antériorité des civilisations nègres, mythe ou vérité historique?
(1967); Parenté génétique de l’égyptien pharaonique et des
langues négro-africaines (1977); Civilisation ou barbarie,
(1981); Nouvelles recherches sur l’égyptien ancien et les langues africaines modernes, Présence Africaine, Paris, (1988).
Obra póstuma.
Um reparo: a tradução revela alguns erros de palmatória
absolutamente evitáveis, como chamar a África um país (pág.
148), e adjetivar como armada «etiópia», quando na mesma
página havia – bem empregue – a palavra etíope. Os patronímicos dos historiadores Varrão e Estrabão são desde há muito
tempo assim reconhecidos, não se utilizando os seus correspondentes em francês, até porque são latinos.
A unidade cultural da África Negra
Cheikh Anta Diop
Pedago – Luanda e Lisboa
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Cuito Cuanavale: Crónica de uma Batalha
Rubén Jiménez
Mayamba Editora, 2015, Angola
Cuito Cuanavale: Crónica de uma Batalha conta-nos ao
pormenor, pela voz de um oficial das forças internacionalistas
cubanas, Rubén Jiménez, um dos episódios mais marcantes da
Guerra Civil em Angola e da participação da África do Sul, ao
lado da UNITA. Entre 15 de novembro de 1987 e 23 de
março de 1988, Cuito Cuanavale assistiu ao maior confronto
militar da Guerra Civil. O local da batalha foi o sul do país, na
província de Cuando-Cubango, onde os exércitos das Forças
Armadas Populares de Libertação de Angola e Cuba se
opuseram aos da UNITA e ao exército sul-africano. Foi a
batalha, até então, mais prolongada que teve lugar no
continente africano desde a Segunda Guerra Mundial.
O conflito deixou marcas no exército e no Governo da África
do Sul, o que contribuiu para a alteração da correlação de forças
na região austral do continente, tornando-se esta batalha um
ponto de viragem decisivo na guerra que se arrastava há longos
anos. Por outro lado, os
acontecimentos contribuíram para
que o regime do apartheid aceitasse a
assinatura dos Acordos de Nova
Iorque, que deram origem à
implementação da resolução 435/78
do Conselho de Segurança da ONU,
levando à independência da Namíbia
e ao fim do regime de segregação
racial na África do Sul. Um livro que
nos transporta para a época e para os
acontecimentos, na primeira pessoa.
92
abril 2015 –
África21
História, mistério e emoção
numa obra que se passeia
no Egito. A professora Emily,
especialista em história
das religiões, adquire um
antigo manuscrito para a
universidade sem saber o seu
verdadeiro significado. Mas vai
ter de descobrir rapidamente
a importância, pois tem um
grupo de criminosos no seu
encalço. A chave para resolver
o mistério encontra-se algures
no deserto e Emily vai ter de
ser a primeira a encontrá-la.
Entretanto, em Chicago, uma
perigosa seita monta um
atentado em larga escala. Os
seguidores acreditam que o
mundo está podre, marcado
pelo materialismo. A libertação
pela morte é o único caminho.
Os preparativos estão em
marcha para desencadear o
caos na cidade. Falta apenas
um elemento, que tem estado
guardado ao longo de vários
séculos. Quando o caminho
da professora universitária
se cruza com o do líder da
seita, a narrativa ganha novos
contornos. Será que vai ser
possível impedir aqueles
homens de transformarem
uma antiga promessa numa
enorme destruição? A obra
é baseada em factos e
descobertas reais.
O Escriba
A. M. Dean
Clube do Autor, Lisboa, março
de 2015
Chama-se Dicionário de
Siglas e Abreviaturas
Angolanas e é uma
observação, um levantamento,
uma inventariação que entrou
fundo na língua portuguesa e
na forma como esta é usada
na prática na sociedade
angolana. Um trabalho que
reflete um estudo cuidado e
sistemático da criatividade
local, ao registar um número
elevado de siglas e acrónimos
que consubstanciam a
existência de um novo país, a
Angola independente, usando,
de modo renovador, a língua
portuguesa. O dicionário,
realça o prefácio, «acaba por
demonstrar a vitalidade da
língua portuguesa em Angola,
na medida em que ela tem
vindo a ser cada vez mais
utilizada pelos angolanos e
angolanas para criarem e
recriarem novos conceitos,
novas maneiras de sentir,
falar, escrever e estar em
língua portuguesa».
Dicionário de Siglas e
Abreviaturas Angolanas
Alexandre Mavungo Chicuna
Edições Colibri, março de
2015
Na década de sessenta,
Boubacar Traoré ganhou
protagonismo no Mali, pela
sua fusão de blues com
os sons malianos. Neste
novo álbum, o músico
reúne uma equipa eclética,
incluindo Ballake Sissoko,
Na kora e Vicent Bucher, e
parte à descoberta de uma
sonoridade mais partilhada
com outros músicos. Traoré
tem tido um percurso curioso.
Apesar de se ter tornado
assíduo nas rádios do Mali,
não fazia produções em
estúdio. Mais tarde, depois
do golpe de Estado de
1968, o músico, visto como
apoiante do regime anterior,
desapareceu dos ouvidos
do público. Só em 1990
lança o seu primeiro álbum,
Mariama, um trabalho a solo.
Desde então passou a viver
da sua música, mergulhado
na sua alma melancólica,
algo serena, como as suas
canções vão revelando.
Mbalimaou é o nono álbum.
Todas as composições são
suas, o registo é intimista e as
tradições locais estão lá. Um
trabalho que não rompendo
com o passado, traz novos
sons ao seu reportório.
Mbalimaou
Boubacar Traoré
Dobet Gnahoré canta sobre a
união das mulheres e África.
Descreve a imagem da mulher
enquanto força unificadora,
por muitas gerações e
para além do preconceito.
Descreve as mulheres que
a tocam. Vencedora de um
prémio Grammy com Palea
em 2010, Dobet Gnahoré é
um dos talentos mais frescos
na música africana atual.
Canta em sete línguas e adota
raízes e estilos musicais
oriundos da Costa do Marfim,
Congo, Camarões e de todo o
oeste africano. No seu quarto
álbum, Na Drê volta inspirada.
Acompanhada por Colin
La Roche de Féline, Clive
Govinden, e Boris Tchango,
além de Lokua Kanza e Paco
Sery em duas das faixas do
álbum, Ghanoré encarrega-se
da composição de todas as
músicas, apresentando visões
profundas de uma África
repleta de alegrias e tristezas,
conduzidas por ritmos fortes e
otimistas.
Na Drê
Dobet Gnahoré
Cansado da vida académica,
George, um respeitado
cientista africano e professor
residente em Roterdão, vê-se
preso na sua rotina. A morte
de um velho amigo, que
coordenava uma estação
de investigação na Guiné
Equatorial, parece ser
o incentivo que George
precisava para deixar a
academia e regressar às suas
origens africanas. Depois de
chegar à Guiné Equatorial,
encontra a estação num
estado decadente, mas
conhece um rapaz, Jimmy,
que, com o seu positivismo,
consegue abrir os olhos
exaustos de George. George
vai-se familiarizando com
o Jimmy, enquanto este vai
desempenhando o papel de
casamenteiro entre George
e Corina, responsável pelo
orfanato local. No entanto,
com a chegada repentina de
um amigo de longa data que
carrega um segredo e vai
invadindo as suas rotinas,
vão percebendo que na vida
existem desafios realmente
difíceis de ultrapassar.
Where The Road Runs Out
Rudolf Buitendach
Elenco principal: Isaach De
Bankole, Juliet Landau, Stelio
Savante, Sizo Motsoko.
Género: Drama/Romance
Uma rapariga, Hirut, dirige-se
para casa, depois da escola,
quando um grupo de homens
a cavalo a cercam e raptam.
Hirut pega numa espingarda
e tenta escapar, mas acaba
por alvejar o seu suposto
futuro marido. Na sua aldeia,
a prática de sequestro e
casamento forçado é comum
e é uma das tradições mais
antigas na Etiópia. Meaza
Ashenafi, uma jovem e tenaz
advogada, vem da cidade
para representar Hirut e
defender a tese de que a
rapariga agiu em autodefesa.
Meaza entra ousadamente
em colisão com a autoridade
civil, rígida e dominada
pelo poder dos costumes,
arriscando o seu trabalho para
salvar a vida de Hirut. Abaixo
da camada dos costumes
socialmente respeitados e
cultivados, a força patriarcal
continua a ter como
consequência as condições
opressoras em relação às
mulheres, o que este filme,
baseado numa história real,
reflete. O realizador etíope,
Zeresenay Berhane Mehari,
retrata com uma estranha
beleza, a complexidade da
transformação de um país
em direção à igualdade de
direitos, bem como a geração
determinada a consegui-la.
Difret
Zeresenay Berhane Mehari
Elenco: Meron Getnet,Tizita
Hagere, Rahel Teshome
Género: Documentário
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PLANO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO
Um plano grandioso para um
país que pensa em grande.
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O Plano Nacional de Desenvolvimento, PND, abrange um
conjunto de acções para incentivar o desenvolvimento
sustentável do sector hoteleiro e turístico no nosso país. São
investimentos que vão garantir uma nova política para o sector,
permitindo o surgimento de uma oferta turística diversificada
que integre praias, património cultural, desporto, ambientes
naturais e lazer. Como resultado, Angola vai aumentar o
número de unidades hoteleiras, incrementando a criação
de empregos no sector e o número de visitantes.
memória
HERBERTO HELDER (1930-2015)
A poesia é feita contra todos
Alfredo Cunha/lusa
M
eu muito caro Herberto,
Escrevo-lhe agora para esse destino a
fogo alto, e largo e forte e lento, que
você, incorruptível, intransigente e sem nenhuma
concessão a outra «delicadeza demoníaca» que não a
da paixão, a si mesmo se impôs. E o sopro, tantas
vezes por si convocado nos alicerces da voz e das
caligrafias dela pela escrita adiante, veio em crescendo de vendaval na noite dessa terrível segunda-feira
e por todo o dia e noite seguintes, varrer os arvoredos e os espaços. E eu vi o ouro límpido e magnificente levantado dos astros arder como sói dizer-se
que a paixão queima, rejubilante e soberana. Havia
um frio de nórdicas europas (essas, de que você foi
«ocasional viajante»), destinado a limpar um pouco
do excesso de cinzento das cabeças deste medievo
futurismo vigente. Não houve porém notícia de
uma única cabeça desorbitada, sequer o terceiro dia
trouxe mais limpidez ou sábia delicadeza de paixão
e Poema a este mundo «súbito e interminável», para
louvar nele a sua «profana sacralidade».
O privilégio da Amizade é um dom de permanente reelaboração, de implacável reescrita. Um
culto libertário do humor, que em si é um outro
modo de carregar e fazer transbordar de Poema
Contínuo todo e qualquer «real quotidiano». Oiço
aqui a sua gargalhada sonora, viva, longamente
movendo gestos e corpo. Gargalhada de quem ama
visceralmente a Vida e a tenebrosa beleza que lhe é
necessário extirpar, a haustos de fogo e água-viva.
Assim nos fomos movendo, de um para o outro,
com Angola de permeio. E esse seu modo inaugural
e desconcertante de a ela chegar: «Como desconhecer bem a cidade de Luanda», para dela se enamorar
em Olga Lima, arrebatado pelos vastos, inapreensíveis horizontes de matos, cidades e vilas, que não
apenas os da baía luandina e seus arredores de
praias, ilhas, Miradouro da Lua.
Era quando, na plateia dos nossos vespertinos
«escritórios» lisboetas (Bar Expresso e Solar dos Galegos), não havia opinadores precipitados a interromperem-nos a memória e as vozes, que encetávamos
périplos por esses matos e a sua Luanda, ao mesmo
tempo que cimentávamos a nossa Amizade «por entre trocas e baldrocas de livros e fotocópias».
Conta-me você como, depois de ter deixado de
escrever em 1968, voltou por Antropofagias ao Poema. Era uma tarde setembrina e luandense de 1971,
instigado pelo pedido de colaboração, vindo de Moçambique através de Rui Knopfli e João Pedro Grabato Dias, para a revista Caliban. (Moçambique
aonde você não chegou, por Luanda se ter perdido
em si nos trocados para o resto da marítima viagem.)
Quedou-se pela Notícia, entre velhos companheiros do Café Gelo, exercendo aí a reportagem, a entrevista, a tradução de notícias em estado de humor negro, ou, ainda, a redação hílare de horóscopos e do
chamado correio sentimental.
Angola entrara na sua vida pela Amada, pela paixão, e por esse mundo que você continuará a nomear,
criando-o desde as mais fundas raízes e do mais fértil
do seu húmus, para um esplendor de metáfora que
nada tem para (se) explicar: inteligência primeva e
jubilosa da paixão apoderando-se do ritmo súbito
conquistado. Mas é muito conveniente ler tudo isso
com olhos perscrutadores. Em si não «acabou a inspiração, essa fulminante aliança entre a experiência e a
consciência». Em si começa a levitação da brasa viva
dos astros sobre a noite inaugural de um permanente
Amor em Visita, «admirável atentado contra as coisas
planamente narráveis da vida».
O privilégio
da Amizade
é um dom
de permanente
reelaboração,
de implacável
reescrita
Zetho Cunha Gonçalves
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Última página
É o capitalismo,
estúpidos!
[email protected]
João Melo
Q
uem o ignora deve reler a história. O nascimento
do capitalismo foi acompanhado, em todo o lado, por
uma generalizada e comprovada ocorrência de abusos,
oportunismos, aproveitamentos, espoliações e crimes.
Originariamente, portanto, não há capitalismo assético.
Ao contrário do que pensam alguns, ingenuamente, isso não
é válido apenas para os séculos XVIII ou XIX. O Prémio Nobel
de Economia Paul Krugman, por exemplo, explica como se
formaram as elites económicas em Israel: «As oligarquias israelitas devem a sua posição não à inovação ou à sua capacidade
empreendedora, mas ao seu sucesso em controlar os negócios
privatizados nos anos 80, mantendo atualmente a sua posição
devido à influência junto do governo, combinada com o controlo dos principais bancos».
Ora, se isso é assim, por que razão certos representantes
das elites ocidentais, arvorando uma pretensa superioridade
moral que não é preciso recuar no tempo para desmentir categoricamente, perdem tempo a tentar denegrir os capitalistas
africanos?
No caso de alguns deles, originários da esquerda e da extrema-esquerda europeia, é confrangedor vê-los esquecer os manuais em que fizeram a sua formação política e onde o processo
de formação histórica do capitalismo está claramente explicado.
A questão é que já se acomodaram ao capitalismo existente nos
seus países, fingindo esquecer como se formaram, historicamente, os «seus» capitalistas (alguns deles ex-escravocratas, como, segundo a historiadora Aurora Ferreira, as famílias portuguesas ligadas ao banco Fonsecas & Burnay).
Os capitalistas angolanos em formação são um dos alvos
preferidos dos ataques desses representantes das elites ocidentais, em especial portugueses, quer vivam no Rossio ou em
Oxford. As suas recorrentes campanhas a propósito da identidade dos capitalistas angolanos e da origem dos seus fundos,
além de ocultarem (mal) os seus complexos neocoloniais,
apenas servem para nos distrair daquela que deve ser, na atual
etapa histórica, a preocupação principal da sociedade angolana em relação àqueles: exigir deles uma atitude construtiva,
que contribua para a edificação de um país realmente bom
para todos viverem.
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Serei frontal: neste momento, só me preocuparia se a origem
dos fundos dos capitalistas do meu país fosse, por exemplo, o
negócio da droga, o tráfico de seres humanos, o terrorismo, a
prática de crimes de sangue ou o roubo, no sentido literal da
palavra. Quanto à «soft corruption», conceito que, como escrevi
atrás, Krugman aplica a Israel (apoio ou favorecimentos do Estado, uso de informações privilegiadas, ajustes diretos, etc.), considero-a o único caminho historicamente possível para o surgimento de uma burguesia nacional em todos os países onde a
introdução do capitalismo foi forçada por fatores externos.
É bom lembrar que o colonialismo português tudo fez (até
cortar a cabeça de proprietários agrários nativos) para impedir o
surgimento de uma burguesia angolana.
Alcançada a independência, em 1975, e adotado o modelo
capitalista, quinze anos depois, só o Estado estava e ainda está em
condições de promover o surgimento dessa burguesia. Caso
contrário, a economia continuaria totalmente dominada por
estrangeiros.
O que, como cidadão, exijo dos capitalistas angolanos é que
tenham uma visão verdadeiramente nacional, patriótica e de
longo prazo. Assim, espero que não se limitem a ser comissionistas e rentistas, investindo sobretudo na produção, gerando empregos, respeitando e valorizando os trabalhadores, contribuindo
para a resolução dos problemas básicos da população e para o
surgimento de uma classe média alargada e forte, apostando, visionariamente, na educação (como fizeram as elites asiáticas) e na
saúde e apoiando a inovação.
De igual modo, sugiro-lhes (gratuitamente) que deixem de
concentrar todos os negócios nas suas mãos, dando espaço a
outros interessados em ser empresários e/ou cruzando interesses
com candidatos a capitalistas de outras origens familiares, regionais ou políticas e, por último, que promovam iniciativas altruístas sistemáticas e estruturais. Isso é do seu interesse político,
económico e de segurança.
Só o Estado está em condições
de promover a criação
de uma burguesia nacional
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