2 Mb - La France au Portugal
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BARREIRO INCÓGNITA PERSISTE Os volumes de dragagem necessários e decisivos à plena utilização do futuro Terminal do Barreiro continuam a provocar as mais contraditórias opiniões. Pág.30 ABRIL 2015 · MENSAL · EDIÇÃO Nº9 · 3,5 EUROS · DIRECTOR GONÇALO MAGALHÃES COLLAÇO J O R N A L DA LIGA MOCHE Teresa Bonvalot e Tiago Pires em grande na Ericeira. Pág.40 POTÊNCIA MARÍTIMA EM GESTAÇÃO FRANÇA Tradicionalmente dividida entre ser a Potência Continental que foi e a grande Potência Marítima que nunca chegou ser, a França acentua hoje, dois séculos depois de Trafalgar, o seu pendor marítimo. Em novos mas talvez não menos decisivos moldes. Sim, vale a pena revisitar os velhos Gauleses. Pág.18 DIREITO ENTRE A EXALTAÇÃO E A APREENSÃO COLÓQUIO Determina o Direito as formas de relação dos homens entre si e as formas de relação dos homens com o mundo e o Decreto-Lei 38/2015 as possibilidades de relação dos homens com o Mar Português. Importa saber o que nos espera. Pág.08 ALFEITE E PENICHE SINAIS DE RECUPERAÇÃO NPL Siroco CONSTRUÇÃO NAVAL O Alfeite vai construir novas Lanchas SalvaVidas, insubmergíveis. Os renovados Estaleiros Navais de Peniche, agora sob comando da AMAL, assinaram um acordo com a SWB Seismic Wokboats. Talvez sinais de real mudança de ciclo. Pág.15 MINISTRO DA DEFESA SUSPENDE AQUISIÇÃO DESSALINIZAÇÃO A REVOLUÇÃO DECISIVA A aquisição do Navio Polivalente Logístico francês Siroco parecia já um negócio pacífico e mais ou menos fechado. Em reunião de Chefes de Estado-Maior, Marinha, Exército e Força Aérea concordaram e reconheceram os benefícios para a Esquadra em termos de polivalência e equilíbrio. Porém, as críticas surgidas de alguns sectores políticos parecem terem levado o Ministro da Defesa a suspender a operação. Pág.04 UMA EMPRESA HOLANDESA, A SALTECH, REVOLUCIONOU A TECNOLOGIA e outra empresa americana, a STW , massifica agora a sua utilização, permitindo reduzir custos a quase um terço e obter uma eficiência perto dos 97%. Uma revolução. Pág.37 França VIVE LA FRANCE Potência marítima em gestação Potência Continental por tradição, a França nunca se afirmou como a Potência Marítima que poderia ter sido. No entanto, e ainda hoje, em muitos aspectos, continua na vanguarda tecnológica na área da economia do mar Nas vésperas da Revolução, a França dispunha da mais poderosa Armada da Europa, ou seja, do Mundo. Trafalgar seria no entanto fatal a quaisquer pretensões talassocráticas gaulesas e mesmo os almirantes, a partir desse momento, não só perderam toda a consideração e respeito militar como social, passando quase a ser tido por legítimo menosprezá-los, senão mesmo execrá-los, sem grande exagero, em público. A divisão, intrínseca e enraizada, entre ser uma pura potência continental ou também uma potência marítima, acentuou-se e, de algum modo, ainda hoje perdura e se manifesta como a grande dicotomia francesa. Em 2009 surgiu mesmo um livro, escrito por Philippe Folliot e Xavier Louy, intitulado, «France-sur-Mer un empire oublié», onde se defende a ideia de a França poder vir, e dever vir, a tornar-se a maior Potência Marítima Mundial até 2058, expondo-se além do porquê também o como. De facto, com a segunda maior área marítima do mundo, a França faz hoje parte dos países com uma visão oceânica global e o conjunto de competências científicas, técnicas e industriais ligadas à economia do mar colocam as suas empresas num lugar cimeiro a nível mundial. Possui a segunda maior Armada europeia, logo a seguir ao Reino Unido, onde se inclui um Porta-Aviões e 3 Porta-Helicópteros, 4 Submarinos Nucleares Lança Mísseis mais 3 Submarinos Nucleares de Ataque, 8 Destroyers Lança Misseis e 8 Fragatas/Corvetas Lança Mísseis, para além de múltiplos outros sistemas e ainda 211 aeronaves de várias categorias. A CMA CGM é o terceiro maior transporta- Entre as novas áreas de afirmação de França na área marítima, a tecnologia das energias renováveis marinhas é uma delas, com especial destaque para as eólicas offshore 18 dor de contentores do mundo, logo a seguir à MAERSK e à MSC, conta igualmente com a maior empresa do mundo de Serviços Offshore, a Bourbon, uma das maiores, senão mesmo a maior empresa na área Sísmica, a CGG, com uma frota de 14 navios, a segunda maior empresa do mundo de Cabos Submarinos, a Alda Marine, além de se encontrar hoje igualmente na vanguarda do desenvolvimento de novas plataformas nas área das Energias Renováveis Marinhas e, apesar de a frota ter sido reduzida a metade nos últimos 25 anos, mesmo numa Europa dominada pela Noruega e Espanha, também aí não fazem absoluta má figura, tudo isto representando em 2013, juntando ainda a construção naval militar e civil, em particular Cruzeiros, e alguma outra de nicho e mais especializada, um volume de negócios, excluindo o sector do turismo, na ordem dos 65 mil milhões de euros com 304 mil empregos, superior ao da Banca (203 900) e mesmo ao da indústria automóvel (224 mil). E no entanto, como Potência Continental que também é, a sua fragilidade vê-se noutros aspectos. O tráfego mundial de mercadorias ultrapassa hoje os 10 mil milhões de toneladas e aproximadamente 90% deste total é transportado por mar. Neste vasto e complexo sistema de transporte e logística, os portos desempenham um papel chave. Se analisarmos a hierarquia dos maiores portos por volume de tonelagem, França, a quinta economia a nível mundial e o segundo país no mundo com maior jurisdição de área marítima, não posiciona nenhum dos seus portos na lista dos ciquenta maiores do mundo. Na lista mais restrita dos dez maiores, oito localizam-se na China e uma noção mais precisa desta hierarquia por milhões de tonelagem, (Mt), revela que os dois maiores portos do mundo Ningbo (810Mt) e Xangai (776Mt) rivalizam facilmente com o terceiro lugar ocupado por Singapura (560Mt), e o nono por Roterdão (440 Mt), que em 2002 ocupava o primeiro lugar. A grande distância ficam Marselha (80Mt), o maior porto francês, e o Le Havre (68 Mt), o maior porto francês de tráfego de contentores. Em termos de tráfego marítimo, a Ásia e em particular a China, com forte orientação exportadora, alteraram o equilíbrio das velhas rotas ou “corredores” estabelecidos há mais de um século. Em poucos anos a fachada Atlântica, centro de gravidade do tráfego mundial, perdeu para o Pacífico, e os canais do Suez e Panamá, concebidos, construídos e controlados pelo Ocidente, foram ultrapassados em termos de volume de tonelagem por Ormuz e Malaca, onde transitam mais de 80% do petróleo destinado à China. Se nos centrarmos só na Europa a situação dos portos franceses também não melhora e várias questões se colocam. Como é possível o porto de Marselha, que durante anos ocupou Dossier Especial França antecipou-se no gigantismo dos navios mas, como muitos pioneiros, sofreu também com o facto de o mercado ainda não estar maduro nem prepado para essa nova era a segunda posição na Europa, atrás de Roterdão, e que, no Mediterrâneo, foi considerado o Europorto do Sul pelo domínio nessa área geográfica, seja hoje ultrapassado por Algeciras, Valência e até mesmo Génova? Como se explica que Marselha nos últimos trinta anos tenha perdido entre 80 a 90 milhões de toneladas quando no mesmo período o transporte marítimo mundial triplicou em volume? Ou que, no seu conjunto, os portos da França Metropolitana, em 2012, tenham movientado, em termos de tonelagem, um valor inferior ao pico de 1979? Decisões governamentais, como a do General de Gaulle em 1966 de retirar o país da NATO, cujas ligações marítimas asseguradas por Le Havre, Nantes e Saint-Nazaire passaram para Roterdão, Hamburgo e Antuérpia, à incapacidade dos portos franceses se adaptarem ao rápido desenvolvimento da contentorização, fazem parte do rol de críticas. Mas abordar estas questões de forma simples sem ter em conta a complexidade do assunto é enveredar por uma abordagem perigosa. Em 1979, André Vigarié, um especialista na matéria, escrevia que «la maritimisation croissante de l’économie mondiale contemporaine où, seul, le navire permet de triompher de l’espace-coût», e revelava como o país estava ciente de que o transporte marítimo era parte integrante do crescimento económico. Nas décadas que se seguiram ao pós-guerra, a França foi pioneira, a par com o Japão, na construção de navios de grande porte, que serviam uma economia de escala que começava a surgir. Em 1977 o maior petroleiro do mundo - Pierre Guillaumat - era lançado ao mar, para vir a ser desmantelado em 1983. Sem clientes, pela limitação dos portos que podiam receber estes navios, a era do gigantismo das décadas de 1960 e 1970 parecia condenada. Mas uma verdadeira revolução iniciava-se com a contentorização, e em todo o mundo portos, canais, navios adaptavam-se ao crescimento destes gigantes que todos os anos testam novos limites. Em 2013, a Maersk inaugurou uma série de navios baptizados “Triple E” - eficazes, económicos, ecológicos - com uma capacidade de 18 000 TEU que entretanto já foram ultrapassados para os 20 000 TEU. Se hoje as economias de escala obrigam a que o tráfego marítimo seja cada vez mais especializado e de dimensões gigantes a França pioneira no aumento da capacidade de carga e na especialização de navios viu-se condenada pelo seu avanço no tempo, como tantas vezes sucede às melhores ideias. Hoje, reformas como a de 2008, assentam na cooperação entre os grandes portos marítimos com a criação de órgãos como o conselho de coordenação do Sena e do Atlântico. O objectivo é facilitar as dinâmicas quer do eixo fluvial como de fachada. Cooperação e governance, são as grandes apostas do país para recuperar o atraso e posicionar-se a nível mundial. França é hoje um dos países com visão oceânica global e as empresas da economia do mar estão em lugar cimeiro 19 França JEAN FRANÇOIS BLAREL França é uma potência económica marítima Presente em todos os oceanos, com excepção do Árctico e dispondo da segunda maior área marítima do mundo, a França, como nos diz o seu Embaixador em Portugal, Jean François Blarel, centra cada vez mais o seu futuro no mar, desenhando a respectiva estratégia para afirmar-se como uma grande potência marítima europeia e mundial do futuro Qual a visão de França dos assuntos e economia do mar enquanto nação com a segunda maior área marítima do mundo? A zona económica exclusiva (ZEE) da França estende-se por mais de 11 milhões de kms2 repartidos por todos os oceanos – excepto o Árctico – nomeadamente graças aos seus territórios ultramarinos, o que a torna o 2.° maior domínio marítimo mundial logo a seguir aos Estados Unidos. Além disso, a França Metropolitana, dita Metrópole, apresenta a particularidade única na Europa de beneficiar de três faixas marítimas que são a Mancha, o Oceano Atlântico e o Mar Mediterrâneo. Esta geografia excepcional contribui para fazer da França uma importante potência económica (o mar gera 300 mil empregos directos e a França conta com várias empresas leaders mundiais no sector marítimo), mas também científica (a França representa, por si só, 10% da biodiversidade do planeta e 20% dos atóis) cultural, militar, linguística assim como regional (a França participa nos fora regionais no Oceano Índico, nas Caraíbas e no Pacífico). Enquanto grande nação marítima, a França assume plenamente as suas responsabilidades internacionais, que vão do domínio da segurança ao desenvolvimento sustentável; sobre este último ponto, a França tenciona trabalhar em prol do desenvolvimento de um crescimento azul a nível mundial – à semelhança da dinâmica em curso à escala europeia –, que constitui um dos desafios associados à COP 21 que se realizará em Paris no próximo mês de Dezembro. Quais as principais políticas em desenvolvimento tendo em vista a afirmação de França como nação marítima? Nestes últimos anos, a França empenhou-se 20 O Embaixador Blarel, um forte dfensor da França Marítima profundamente numa política marítima nacional dita «integrada», que visa ultrapassar as abordagens sectoriais graças a uma visão global das políticas públicas, a fim de optimizar a exploração sustentável do mar e do litoral e a preservação da sua biodiversidade excepcional. Esta política, coerente com o Livro Azul adoptado pela União Europeia em 2007, traduziu-se, a nível nacional, nas leis «Grenelle» 1 e 2 e, posteriormente, nos compromissos assumidos no âmbito da consulta pública, lançada em 2009, que acompanhou o «Grenelle do Mar», e que levaram a França a elaborar uma Estratégia Nacional para o Mar e para o Litoral. Em 2013, foi criado o Conselho Nacional Mar e Litorais, instância de reflexão encarregada de assegurar a implementação desta estratégia. Realizam-se também, há mais de 10 anos, os Encontros do Mar e do Litoral («Assises de la mer et du litoral») que reúnem todos os actores económicos e políticos ligados ao mar. A França zela igualmente por uma articulação coerente entre as diferentes escalas de intervenção: a nível operacional alargou a sua nova política integrada às zonas costeiras e às bacias marítimas. Dentro desta mesma dinâmica, a França fixou para 2015 vários prazos em torno de três prioridades, designadamente: o crescimento e o emprego; a protecção do ambiente marinho e a exploração sustentável dos recursos; a investigação, a inovação e o ensino na área marítima. A França investe em particular no domínio da investigação e da inovação marinha e marítima, para o qual dispõe de um potencial científico e industrial de relevo (3000 pessoas ao serviço do IFREMER (Instituto Francês de Investigação e de Exploração do Mar), do CNRS (Centro Nacional de Investigação Científica), mas também no seio das universidades francesas. A França continua a multiplicar as iniciativas neste domínio, nomeadamente através : i) do “Concurso mundial da Inovação” lançado em 2014 e que tem entre as suas ambições a valorização das riquezas marinhas, em torno de eixos promissores tais como os recursos minerais e a dessalinização da água do mar; ii) do lançamento, em 2005, de pólos de competitividade no domínio do mar com vocação mundial (na região da Bretanha e no Mediterrâneo estes pólos permitiram, através dos seus mais de 600 membros, acompanhar e certificar 359 projectos que representam um orçamento global de mais de mil milhões de euros); iii) do «Programa de Investimentos de Futuro», iniciado em 2010, que dá especial ênfase às energias marinhas renováveis (EMR) e aos «navios do futuro», mas também às biotecnologias e aos recursos biológicos assim como ao conhecimento dos oceanos; iv) do projecto «França Energias Marinhas», lançado em 2012 e actualmente designado por «Institutos para a Transição Energética» (estruturados em torno de um vasto consórcio de empresas, de organismos de investigação e de colectividades territoriais, estes institutos devem contribuir para a colocação no mercado, por parte dos industriais franceses, de uma série de tecnologias no domínio das energias eólica offshore, das ondas, das correntes marítimas e da energia térmica dos oceanos ); v) o programa industrial “Navio do Futuro” (sob a tutela do Conselho de Orientação da Investigação e da Inovação para a Construção e Actividades Navais – CO- Dossier Especial RICAN – criado em 2009 para desenvolver navios mais ecológicos e mais seguros). Quais os principais sectores marítimos franceses e quais os factores determinantes de sucesso? As principais actividades da economia marítima francesa incluem, além da indústria turística, a pesca e a aquacultura, o transporte marítimo e fluvial, a construção e reparação navais, as actividades portuárias e o sector das energias offshore. Em primeiro lugar, destaca-se a pesca francesa que ocupava, em 2012, o 4.° lugar da UE com cerca de 10% das capturas realizadas. As pescas marítimas, a aquacultura (com destaque para a ostreicultura, sendo que a França é o 1.° produtor europeu de ostras) e a transformação dos produtos do mar fazem parte da cultura e da identidade marítimas da França. O sector da marinha mercante abrange, por sua vez, 900 navios operados por empresas francesas, que vão desde as PME especializadas aos grandes grupos mundiais (a CMA/CGM possui, por exemplo, 650 escritórios e 440 navios em todo o mundo, que são fonte de rendimento de milhares de pessoas). No que respeita ao tráfego de mercadorias, quatro grandes portos marítimos da Metrópole (Marselha, Le Havre, Dunquerque e Nantes) estão entre os 25 principais portos europeus. Salientaria que o Estado francês assinou contratos com as suas regiões para o período 2015-2020 que prevêem investimentos de mais de mil milhões de euros nos principais portos para melhorar e expandir as infra-estruturas portuárias assim como os seus acessos. Quanto à indústria naval francesa, esta apresenta um volume de negócios de 10 mil milhões de euros (dos quais 4 mil milhões provenientes da exportação) e emprega cerca de 70 000 pessoas, ocupando assim actualmente o 6.° lugar mundial. Esta indústria estrutura-se à volta dos estaleiros STX de Saint-Nazaire e do grupo industrial francês DCNS, assim como de um conjunto de subcontratantes e de fabricantes dinâmicos que oferecem uma vasta gama de actividades de construção, de reparação e de transformação de navios, e que também inclui as tecnologias offshore. Por seu lado, a exploração dos grandes fundos marinhos é promissora: em Novembro de 2014, a Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos e o IFREMER assinaram um contrato para explorar os jazigos de sulfuretos polimetálicos no Atlântico Norte. A França prepara também uma exploração da plataforma continental, respeitadora do meio ambiente, ao largo das ilhas de Walis e Futuna. A França dispõe ainda de um forte potencial de desenvolvimento das EMR no seu território, se considerarmos os seus recursos naturais e as suas reconhecidas competências na área tecnológica. Actualmente ainda não existem parques de produção em funcionamento em França, com a excepção notável da fábrica de energia das ondas de Rance, na Bretanha, em funcionamento desde 1966. Mas estão em curso diversos projectos de demonstração. O projecto de lei relativo à transição energética para o crescimento verde, adoptado no Senado no passado dia 3 de Março, prevê, assim, um objectivo de 32% de energia renovável no consumo final de energia até 2030, dos quais 15% de EMR. Por sua vez, o aproveitamento da energia eólica offshore é muito promissor tendo em conta que a França dispõe A França investe em particular no domínio da investigação e da inovação marinha e marítima 21 França do segundo maior potencial eólico marinho da Europa logo a seguir ao Reino-Unido. Embora a fase de exploração comercial ainda não tenha começado, os primeiros projectos de parques eólicos offshore já foram lançados: em 2013 e 2014 foram adjudicados dois concursos, sendo que o segundo projecto, com início de construção previsto para 2019, conta com a participação da EDP Renováveis que se associou para o efeito com a GDF Suez, a Neoen Marine e a Areva. A inauguração, em Dezembro último, de duas fábricas da Alstom em Saint-Nazaire para fabrico de geradores e naceles para as eólicas offshore marcou, por sua vez, o início do desenvolvimento industrial das EMR em França. Por fim, a França possui um grande potencial na área da energia das correntes marítimas e irá dispor, em breve, de uma zona piloto no Raz Blanchard (Normandia). Existe ainda um projecto de instalação de uma central de energia térmica dos oceanos na ilha da Martinica, com arranque previsto para 2018. Qual a política francesa de cooperação com terceiras nações na área marítima? A França prossegue inúmeras acções de cooperação na área da preservação dos espaços marítimos e na sua valorização económica. Muitas dessas acções são desenvolvidas entre as colectividades territoriais das zonas costeiras fronteiriças, enquadrando-se em parte nas políticas europeias. Na área do transporte marítimo, a França tem dado especial importância ao desenvolvimento das auto-estradas do mar a fim de reduzir o congestionamento das suas infra-estruturas rodoviárias e melhorar o desempenho ambiental do conjunto do sistema de transportes. Em 2009, a França e a Espanha concluíram, por exemplo, um acordo internacional para desenvolver dois serviços na sua costa atlântica (Nantes-Gijón e Nantes-Vigo), com vista a limitar o tráfego de veículos pesados em trânsito nos seus eixos rodoviários. Três projectos de auto-estradas do mar entre Portugal e França também foram identificados (Brest-Leixões e Rouen-Leixões na costa Atlântica; Marselha-Sines no Mediterrâneo) mas ainda não avançaram. No domínio da protecção do ambiente marinho, o Parque Marinho Internacional do Estreito de Bonifácio, entre a Córsega e a Sardenha, foi criado sob a forma de um Agrupamento Europeu de Cooperação Da construção naval às plataformas multiusos, cabos submarinos ou mineração de fundos marinhos, a tecnologia francesa continua na vanguarda mundial Territorial. Destacaria ainda o Arco Manche, espaço geográfico que compreende o conjunto dos territórios franceses e britânicos desta zona, que se tornou, em 2003, um projecto político no âmbito do qual se desenvolvem iniciativas em numerosos domínios susceptíveis de serem financiados por fundos europeus. Na área da prevenção de riscos e de luta contra a poluição marítima, o Estado francês é ainda parte na Convenção de Cartagena – Mar das Caraíbas e Golfo do México –, na Convenção de Nairóbi – África Oriental – ou, ainda, no programa internacional PACPOL – Pacific Ocean Pollution Prevention Programme. Como perspectiva uma possível cooperação França-Portugal na área marítima? A colaboração franco-portuguesa no domínio das ciências marítimas é rica pela sua longa tradição e por muitas campanhas oceanográficas efectuadas pelo IFREMER em parceria com peritos portugueses. O 3° encontro de alto nível franco-português, de 22 de Fevereiro de 2008, precisamente dedicado ao mar, foi uma oportunidade para aprofundar a cooperação em muitos domínios (alterações globais; biodiversidade e funcionamento dos ecossistemas; observação sustentada dos processos sísmicos e vulcânicos e vigilância a longo prazo dos ecossistemas marinhos profundos; contaminação do meio marinho e das zonas costeiras; bases científicas para uma política A colaboração franco-portuguesa no domínio das ciências marítimas é rica pela sua longa tradição e por muitas campanhas oceanográficas efectuadas 22 marinha integrada; formação avançada de recursos humanos). Esta cooperação voltou a ser dinamizada pela declaração franco-portuguesa aquando do encontro de alto nível de 7 de Maio de 2010 (participação do IFREMER no desenvolvimento de um programa de investigação nos Açores sobre os recursos biológicos e minerais em águas profundas) e pela assinatura, em 2011, de um acordo de parceria entre a Agência Nacional de Investigação francesa e a Fundação para a Ciência e a Tecnologia portuguesa. A cooperação franco-portuguesa passa também pelo apoio da França à mobilidade dos jovens investigadores portugueses: todos os anos, através de programas bilaterais, a França apoia mais de 30 projectos de mobilidade, alguns dos quais ligados ao mar. E, por fim, esta cooperação traduz-se pela organização de eventos e de intercâmbios frutuosos: a 26 de Maio de 2014 realizou-se na Fundação Calouste Gulbenkian uma conferência co-organizada pelo Instituto Francês de Portugal (IFP) intitulada: «Oceanos: de um ambiente frágil a recurso sustentável» com a participação de vários peritos portugueses e franceses. Em Novembro de 2014, o navio de exploração francês TARA, que efectua expedições científicas consagradas à defesa ambiental dos oceanos desde 2003, fez duas escalas em Portugal possibilitando encontros com investigadores portugueses e a realização de conferências. Assinalo ainda que em Novembro de 2015, o IFP co-organizará com a associação WavEC –Offshore Renewables uma conferência sobre as energias marinhas renováveis, que incluirá mesas redondas dedicadas à inovação técnica e encontros entre empresas do sector. Como vê o desenvolvimento das políticas europeias no domínio marítimo? Todas as políticas da UE relativas ao mar convergem na política marítima integrada (PMI), Dossier Especial a qual defende uma abordagem global de uma grande variedade de domínios relacionados com o mar. A PMI assenta na ideia de que, através da coordenação das suas políticas, a UE pode retirar maiores benef ícios dos mares e dos oceanos, diminuindo simultaneamente o impacto ambiental. A PMI já permitiu alcançar alguns objectivos concretos, nomeadamente que a Comissão Europeia lançasse uma série de acções específicas, como por exemplo: o incentivo ao desenvolvimento de PMI nacionais; o desenvolvimento de uma Estratégia Europeia para a Investigação Marinha e Marítima; a definição das bases para uma reflexão mais profunda sobre o papel da UE no Árctico; a identificação dos desafios a enfrentar para explorar o potencial europeu de produção de energia eólica marinha; a elaboração de projectos de roteiros para o ordenamento do espaço marítimo e para a vigilância do domínio marítimo da UE; um programa de acção tendo em vista a criação de um espaço europeu de transporte marítimo sem barreiras; ou ainda de um impulso para uma melhor governação no Mediterrâneo. A PMI está também na origem de uma estratégia para a região do Mar Báltico (primeiro passo para a execução regional da PMI) e foi ainda objecto de uma comunicação da Comissão sobre a sua dimensão internacional, que complementa as iniciativas regionais anteriores. Quais entende serem as principais tendências de desenvolvimento na área marítima a breve prazo e quais as suas principais preocupações? A França está particularmente empenhada na preservação do meio marinho, em todos os seus aspectos. A França esforça-se nomeadamente em desenvolver uma pesca e uma aquacultura sustentáveis e também trabalha para a preservação da biodiversidade marinha, através de uma estratégia para as zonas marinhas protegidas (nomeadamente com a criação, em 2010, do santuário de Agoa para a protecção de mamíferos marinhos nas Antilhas ou, em 2014, do parque marinho de Arcachon e do parque natural do Mar de Coral na Nova-Caledónia – uma das maiores zonas marinhas protegidas do mundo). O projecto de lei sobre a biodiversidade, que será submetido ao Parlamento esta Primavera, prevê medidas de protecção adicionais. A luta contra as alterações climáticas, no ano em que se realiza a COP21 em Paris, é evidentemente um desafio essencial para os oceanos. Não podemos esquecer que os oceanos absorvem cerca de um quarto das emissões de carbono libertadas para a atmosfera pela actividade humana, desempenhando, assim, um papel regulador determinante nas alterações climáticas. Contudo, o aumento das emissões de CO2 (que se traduz numa acidificação das águas), além da sobreexploração dos recursos e da poluição, diminuem a capacidade de adaptação dos ecossistemas marinhos às mudanças climáticas presentes e futuras. A luta contra a pirataria e a pesca ilegal são outras preocupações essenciais da França no domínio marítimo: o aumento dos fluxos marítimos, a vulnerabilidade dos espaços marítimos e a internacionalização de inúmeras actividades ilícitas constituem desafios importantes, em particular à soberania dos Estados. A França, que esteve na origem das primeiras iniciativas europeias de luta contra a pirataria, em 2007, continua naturalmente muito empenhada em combater este tipo de ameaças. 23 França GICAN Um milhão de euros para promover a indústria naval francesa Hugues du Plessis D’Argentré, Director-geral do GICAN, não hesita em enaltecer a tecnologia de ponta da indústria naval francesa, nem se surpreende assim quando o jornal “Les Echos” perspectiva um crescimento na ordem dos 20%, em 2015, para os estaleiros navais franceses. Muito acima, naturalmente, de qualquer outra indústria O que é o GICAN? O GICAN, Groupement des Industries de Construction et Activités Navales, é uma organização que congrega a quase totalidade de todas as empresas francesas de uma forma ou doutra relacionadas com a construção naval e a reparação naval, algumas de dimensão internacional, ou seja grupos multinacionais como a Thales, para dar só um exemplo, mas na sua esmagadora maioria PME, ou seja, Pequenas e Médias Empresas. Estamos a falar, ao todo, de cerca de 170 membros, indo desde a construção naval militar mais avançada à construção civil, onde se encontram também desde os maiores construtores de cruzeiros até pequenos construtores de navios de pesca e de recreio. O GICAN é, de algum modo, o herdeiro da antiga Câmara Sindical da Construção Naval. O centro da actividade são, de facto, os estaleiros navais. Porém, como se sabe, não existem hoje muitos estaleiros navais em França. Existem essencialmente dois grandes grupos, o Grupo DCNS, militar, e o Grupo STX, civil. Depois existem talvez mais uns 15, bem mais pequenos mas que mesmo assim têm o seu negócio, essencialmente na área civil porém também um pouco, nalguns casos, na área militar, como os conhecidos Piriou, Ocean ou Socarenam, em Bolonha, que constroem navios civis e militares, como por exemplo Lanchas de Vigilância Costeira para a Marinha Belga, entre outros. Os Estaleiros de Saint Nazaire da STX não constroem também navios militares? Sim, é um facto, como os famosos BPC, des24 tinados em princípio à Marinha Russa e que enfrentam agora as dificuldades que todos conhecemos, fragatas e outros navios de combate e vigilância, mas sempre por subcontratação do Grupo DCNS. Na verdade, a grande especialização dos Estaleiro do Grupo STX de Saint Nazaire são os cruzeiros. No cômputo geral, como vê a evolução do mercado da construção naval na Europa em geral e em França em particular? Melhor do que eu, tenho aqui um exemplar do “Les Echos” onde se apresentam as perspec- tivas de crescimento para 2015 das várias indústrias em França, onde se afirma um crescimento expectável na área da construção naval na casa dos 20%. Mais, muito mais do que a aeronáutica, com um crescimento expectável na ordem dos 5%, por exemplo. O mercado dos navios civis está indiscutivelmente a crescer e vai continuar a crescer também em 2016, como o próprio mercado de cruzeiros, gerando excelentes oportunidades de negócio. Os estaleiros estão neste momento completamente ocupados com as encomendas colocadas e todos os dias há novas encomendas, para navios médios, para navios de pesca, vigilância, segurança, logística… Enfim, todos os dias há novas encomendas, todos os dias se abrem novas possibilidades e novos mercados. Como se explica o êxito da indústria naval francesa? Como se explica? Pela eficiência, antes de mais. Os estaleiros navais franceses evoluíram muito nos últimos anos, tanto em termos de evolução industrial como tecnológica e mesmo em termos informáticos. Sofreram uma completa revolução, mesmo. Se visitarmos hoje os estaleiros asiáticos, mesmo os da Rússia ou da Turquia, as diferenças são abissais. Nesses encontramos muitas pessoas a trabalhar, como nos velhos tempos. Em França é diferente, completamente diferente. Estão já, realmente, no séc. XXI. Se visitarmos os estaleiros da STX, os Estaleiros do Atlântico, tudo assenta na informática, na robotização, na automatização, nos mais avançados sistemas industriais de construção, tudo muito bem pensado, a funcionar muitíssimo bem, do modo mais eficaz e eficiente, mantendo-se todavia todos os processos em permanente revisão em busca de melhorias, optimização de processos e maxi- Dossier Especial do-se mesmo um crescimento anual na ordem dos 10% ao longo dos próximos anos. É brutal. mização de resultados, sempre possíveis. Por outro lado, mas não sem deixar de estar relacionado, somos igualmente muito bons no que vulgarmente se designa como “valor-acrescentado”. Ou seja, na construção e equipamento dos navios mais complexos, onde a capacidade tecnológica marca toda a diferença, desde navios de instalação de cabos submarinos, navios hidrográficos, mesmo na área militar, como navios anti-submarinos, para dar apenas um mínimo de exemplos, continuamos, de facto, a sermos os melhores e os mais sofisticados. Significa isso que, nesse domínio, não temem para já a concorrência asiática? A China está cada vez melhor e será cada vez melhor. Mas nós também. E se nos copiam a tecnologia, copiam-nos a tecnologia de ontem. É um desafio, com certeza. Temos de estar e nos mantermos sempre à frente e também por isso mesmo é que a inovação e as políticas de inovação são um elemento tão fundamental… O GICAN ajuda também as empresas na área da inovação? Sim, mas o mais importante é conseguirmos estabelecer, como tem sido conseguido, um ambiente de inovação, de permanente procura da inovação. Por exemplo, em conjunto com o Governo discutimos alguns projectos específicos, como o caso do projecto do “Navio do Futuro” e do “Navio Ecológico”, desenvolvidos posteriormente com investimento igualmente conjunto, com participação do Governo e das empresas. Muitos projectos vêm de propostas directas do Governo, mas muitos outros são propostos pelas empresas. A procura e a oferta nunca podem encontrar-se desfasadas, têm de ir sempre a par. Por isso mesmo também é tão importante, em termos de inovação, essa estreita colaboração entre Governo e empresas. E essa colaboração tem sido fácil de conseguir? Em França, como noutros países, as empresas são um pouco reticentes a partilhar. Querem inovar, mas querem proteger-se também. Os franceses não são os melhores a criarem equipas colectivas, embora seja cada vez mais necessário trabalhar em rede. Por outro lado, há igualmente bons exemplos de sucesso que demonstram possibilidade de serem bem-sucedidos sozinhos. O que não ajuda, tanto mais quanto, em França, a cultura é muito individualista. O GICAN, porém, tendo também como objectivo promover essa colaboração, tem conseguido alterar um pouco o panorama, tendo em vista, por exemplo, a exportação e internacionalização das empresas francesas, do que podemos designar como French Team. Para conquistarmos um mercado, é sempre melhor conseguirmos chegar em conjunto do que dispersos. Nesse âmbito, qual o papel do GICAN? No estrangeiro, promovemos e organizamos o Pavilhão Francês e consequente participação dos nossos associados nos diversos salões que vão ocorrendo ao longo dos anos um pouco por todo o mundo, de Singapura aos Emirados Árabes Unidos, nos Estados Unidos da América ou seja onde for. Em território nacional, somos os grandes responsáveis pelo Salão Euronaval, militar, e pelo Euromaritime, civil. Em França, como noutros países, as empresas são um pouco reticentes a partilhar. Querem inovar, mas querem proteger-se também Quais são os principais mercados de internacionalização para a indústria naval francesa? O mercado é mundial. Todavia, há geografias mais propícias, ou mais abertas, ou mais imediatas. África, por exemplo, é um bom mercado. Embora com meios disponíveis relativamente escassos, encontra-se em grande expansão e as oportunidades são realmente inúmeras pelas necessidades existentes em termos de vigilância marítima, uma questão cada vez mais decisiva e mesmo crucial, conduzindo com toda a certeza ao crescimento do mercado, mesmo da sua explosão. Depois, se formos para o Sudeste Asiático, para além da vigilância marítima, da luta contra o terrorismo e a pirataria e da protecção dos cargueiros, vemos as respectivas nações a necessitarem de armadas bem organizadas e coerentes, onde falamos não apenas de navios, mas também de Sistemas de Comando e Controlo, de armadas em que os navios têm capacidade de falar, de cooperar e actuar em conjunto, para já não falar das enormes oportunidades abertas pela exploração de petróleo e gás natural offshore. E se olharmos em simultâneo para o mercado civil, para o mercado de cruzeiros, vemos um mercado, ainda na Ásia, a crescer extraordinariamente à medida da própria expansão da classe média chinesa, contabilizan- E também fazem diplomacia económica, se assim se pode dizer? Sim, fazemos diplomacia económica, em conjunto e estreita cooperação com os diplomatas franceses, convencendo-os, antes de mais, das extraordinárias capacidades da indústria naval francesa e, igualmente, um pouco de lóbi. Haverá países que o fazem melhor do que nós, mas em todo o caso fazemo-lo e fazemo-lo cada vez mais, dando a imagem de, em França, todos trabalharem em conjunto, em cooperação, tanto as empresas entre si como entre estas e o Governo, porque na verdade temos uma boa indústria e construímos excelentes navios. Qual o orçamento global anual do GICAN para a promoção de todas essas actividades? O orçamento global encontra-se na ordem do milhão de euros. De onde vem o financiamento, do Governo também? Nada do Governo. Não recebemos qualquer subvenção do Governo. O orçamento é inteiramente financiado pelas empresas, pelas rendas imobiliárias de que dispomos e pelos salões que organizamos. E o GICAN não está a pensar estender as suas actividades a outras áreas, como por exemplo às novas plataformas offshore ou energias marinhas renováveis, para dar apenas breves exemplos? Isso já sucede, uma vez que muitos dos construtores navais estão também a produzir equipamentos para as energias renováveis, entre outras áreas. O âmbito do GICAN não envolve apenas navios, mas verdadeiramente todo o tipo de plataformas marítimas e tudo o que lhes está associado, desde plataformas marítimas multiusos, plataformas petrolíferas, plataformas de energias renováveis, das eólicas à energia térmica, enfim, tudo quanto se encontre nesse quadro. Os navios ainda correspondem a cerca 80% das actividades dos nossos associados, mas dentro de 10 anos tudo será, evidentemente, muito mais equilibrado. E não nos podemos esquecer que tanto o Grupo DCNS, como o Grupo STX estão já também envolvidos nessas áreas. 25 França ECOSLOPS Empresa inovadora escolheu Sines Venda de combustível naval reciclado resultante dos resíduos do transporte petrolífero é uma oportunidade de 15 milhões de euros A Ecoslops desenvolveu uma tecnologia inovadora para transformar os resíduos dos petroleiros resultantes do transporte marítimo (slops e sludge, ou lodo e água em português) em novos combustíveis navais reciclados. A primeira unidade da Ecoslops, instalada em Sines, já está operacional, tendo o primeiro teste de performance decorrido no final de Fevereiro no qual validaram a qualidade dos dois produtos que desenvolveram. A unidade de tratamento de slops e sludge custou 17 milhões de euros, um custo mais elevado do que esperavam devido a ter sido o primeiro posto de tratamento a uma escala funcional e o facto de ter demorado muito tempo. Destes 17 milhões, seis milhões de euros foram financiados pela União Europeia através do QREN. A solução encontrada pela Ecoslops permite recuperar 80% do produto sob a forma de combustíveis navais reciclados. A fábrica tem uma capacidade de produção de 80 toneladas por dia de combustíveis navais, que podem ser vendidos no mercado internacional a um preço médio de 600 dólares por tonelada, o que revela uma oportunidade de mercado dos combus- tíveis navais na ordem dos 15 milhões de euros por ano, embora este valor esteja dependente do preço do crude no mercado global. Estes combustíveis estarão disponíveis para venda directamente no porto de Sines. «Sines acolheu-me de braços abertos», explica Michel Pingeot, presidente da Ecoslops, e é um porto «com uma bela posição sobre o Atlântico», com uma administração muito dinâmica, que ganhará ainda mais valor caso o projecto de construção da ferrovia entre Sines e Madrid avance. Sines está ainda na rota dos porta-contentores que, vindos do Pacífico, passam pelo canal do Panamá e que têm como destino o Mediterrâneo. «Penso que Sines terá um belo futuro», afirma Michel, que espera que, com o aumento do tráfego em Sines, a Ecoslops tenha mais matéria-prima. A matéria-prima da Ecoslops será o combustível dos navios que passem por Sines e outros colectados noutros portos, mas daqui a três ou quatro anos a Ecoslops espera que mais de metade da matéria-prima será assegurada pelo porto de Sines. A próxima etapa em Sines é entrar numa produção industrial a 50% de capacidade e o objectivo é que na segunda quinzena de Abril a unidade esteja a produzir a 100% de capacidade. Actualmente estão em negociações para comprar matéria-prima em vários portos. A empresa irá criar 45 postos de trabalho em Sines e tenciona reproduzir esta infra-estrutura noutros portos como Costa do Marfim e SingaA solução desenvolvida pela Ecoslops permite recuperar cerca de 80% da matéria-prima utilizada em combustíveis navais reciclados, prevendo-se a entrada em plena produção da fábrica de Sines já em Abril pura. Recentemente, a Ecoslops estreou-se na bolsa de Paris com sucesso, tendo conseguido arrecadar cerca de 18 milhões de euros. A poluição marítima devido aos carbonetos residuais do transporte petrolífero é um problema ainda por resolver e com tendência para se agravar. A convenção marítima MARPOL 73/78 teve por objectivo preservar o ambiente marinho pela eliminação completa de poluição por óleo e outras substâncias prejudiciais, mas só nas últimas duas décadas é que a União Europeia começou a criar legislação com o ob26 Dossier Especial jectivo da eliminação da poluição marinha por óleo. Todavia, apesar da legislação em vigor, Michel Pingeot, engenheiro com 40 anos de experiência na área de refinação do petróleo e presidente da Ecoslops, apercebeu-se do valor destes resíduos captados nos portos. Em 2005, Michel Pingeot começou a trabalhar no projecto da Ecoslops, mobilizando uma equipa de engenheiros que em 2008 identificou uma solução tecnológica. Em 2009 instalaram um projecto-piloto em Malta para testar a tecnologia, tendo concluído no final desse ano a viabilidade da tecnologia. Malta foi escolhida devido à sua posição no Mediterrâneo, mas infelizmente a autoridade maltense não autorizou a instalação da infra-estrutura da Ecoslops numa escala comercial, devido à aposta do país no turismo. Durante as operações de limpeza dos tanques, os resíduos de óleo que permanecem neles depois da descarga misturam-se com a água do mar e sedimentos, que têm um grande valor se houver uma tecnologia para reaproveitar estes resíduos. Michel identificou uma necessidade de encontrar uma tecnologia inteligente e prática para recolher a água, os sedimentos e os hidrocarbonetos. A Ecoslops recolhe os sludge e slops, misturas de hidrocarbonetos, sedimentos sólidos e netos. Este equipamento é muito semelhante à unidade de destilação de uma refinaria, daí a experiência de Michel Pingeot. Com 100 toneladas de produto seco final, conseguem extrair em média 40 toneladas de hidrocarbonetos, 57 toneladas de água e três toneladas de sedimentos. Dessas 40 toneladas de hidrocarbonetos, a Ecoslops consegue chegar a quatro tipos de produtos finais: 3% servem para fornecer energia ao próprio sistema, 50% (20 toneladas) servem para produção de A matéria-prima da Ecoslops será o combustível dos navios que passem por Sines e outros colectados noutros portos água, a bordo dos navios, terminais petrolíferos ou porta-contentores. Estes produtos passam por várias fases de separação em diferentes unidades de separação através da temperatura e centrifugação, o que permite efectivamente separar a água, os sedimentos e os hidrocarbo- dois combustíveis navais, 30% servirão para um combustível naval diferente mas de boa qualidade, restando apenas um resíduo que representa 17% e que neste momento a Ecoslops analisa para o poder valorizar e diminuir esta percentagem de resíduo para 5%. Ajudas à Navegação Tel.: (+34) 933 601 101 www.almarin.es Movimentação de Cargas Tel.: (+351) 214 690 341 www.almovi.pt Marinas e Docas Tel.: (+351) 214 692 024 www.lindley.pt Grupo Lindley Há 85 anos a ligar a terra e o mar 27 França CROISIEUROPE Mais dois cruzeiros fluviais no Douro A CroisiEurope espera aumentar a facturação nos próximos anos em Portugal graças às duas novas aquisições para a sua frota A evolução do mercado dos cruzeiros fluviais em Portugal vai «de vento em popa», afirma Humberto Tenazinha, responsável pelas operações da CroisiEurope em Portugal, esperando a empresa aumentar a facturação graças ao reforço de navios que irão fazer nestes dois anos, mantendo a sua taxa de ocupação nos 87%. A CroisiEurope, empresa francesa sediada em Estrasburgo, oferece cruzeiros no Douro. «A grande mais-valia do Douro é o vinho, a gastronomia e a paisagem», refere Humberto Tenazinha. A empresa ambiciona, nos próximos anos, manter a sua taxa de ocupação da cabine dos navios nos 87% (82% de ocupação dos passageiros). O volume de facturação anual em Portugal da CroisiEurope ultrapassa os 11 milhões de euros: no ano de 2014, a CroisiEurope embarcou cerca de 17 mil pessoas em Portugal, as quais pagam em média 650 a 700 euros por viagem. Humberto Tenazinha indica ainda que, indirectamente, devido aos abastecimentos necessários para operar o cruzeiro (como a alimentação), a empresa tem contribuído para criar valor nas comunidades locais através do pagamento a fornecedores. Em Portugal, a empresa emprega cerca de 107 funcionários, dos quais 99 são portugueses. 28 Quando houve mudança de gerações na administração da empresa francesa CroisiEurope, a empresa considerou Portugal, mais especificamente o Douro, como destino, numa estratégia de diversificação do produto a partir da abertura de actividade noutros rios. Devido à crescente procura, a CroisiEurope decidiu há dois anos encomendar dois novos navios para o Douro: o navio Gil Eanes, que começou a ser construído em 2014 e chegou em Março 2015, e o navio Miguel Torga, que vai chegará em 2016. A empresa francesa tem vindo a procurar novos mercados, tendo iniciado actividade recentemente no Cambodja com a A construção dos navios é financiada com capitais próprios, em estaleiros belgas, detidos em parte pela CroisiEurope reparação de um navio. «Há mercados que não são minimamente voltados para o turismo fluvial», explica Humberto Tenazinha. Mas em Portugal, as ofertas para cruzeiros fluviais «são tantas como para o turismo de cruzeiro de mar» para clientes de nacionalidade maioritariamente francesa, alemã, suíça e escandinava, seguida da inglesa e americana. A empresa tem uma base de clientes muito fiéis à marca, dependendo das agências de viagens e dos operadores em apenas 4% das suas reservas, sendo que a agência Abreu, como representante da CroisiEurope em Portugal, comercializa cerca de 2% das reservas, mas vende mais do que muitos operadores espanhóis. «O nosso cliente faz em média 5,2 cruzeiros, podemos dizer que o cliente é nosso», refere Humberto. Os clientes chegam até à CroisiEurope através do seu website, publicidade, de reservas feitas directamente nos 14 escritórios da CroisiEurope ou reconhecendo os seus navios. A construção dos navios é financiada com capitais próprios e é feita em estaleiros na Bélgica, detidos em parte pela CroisiEurope, ou em Saint-Nazaire, em França, porque a empresa «a par da Coreia, é dos melhores construtores navais do mundo», explica Humberto Tenazinha. Um dos cruzeiros que fazem no Douro une duas cidades classificadas como património pela UNESCO: Porto e Salamanca, iniciando viagem no Porto, percorrendo 210 quilómetros e passando por cinco barragens. Todos os navios da CroisiEurope navegam com a bandeira UNESCO e por cada passageiro que embarca dos navios, a empresa contribui financeiramente para a mesma organização. A CroisiEurope tem parcerias com a agência Abreu, com a empresa RodoNorte do grupo Santos para assegurar transporte para as excursões dos passageiros (uma média de 12 autocarros por dia) e com fornecedores como a Galp. As operações da CroisiEurope em Portugal iniciaram-se em 2002 com o navio Vasco da Gama, seguido em 2003 pelo navio Fernão de Magalhães e em 2004 pelo navio Infante Dom Henrique. Em 2005 a empresa iniciou actividade em Sevilha, num percurso que engloba também uma passagem pelo Guadiana e pelo mar, por se tratar de um barco misto (Classificação zona D), mas que não se pode afastar de uma determinada distância da costa. A CroisiEurope tem apenas um navio de mar na Croácia. A CroisiEurope, que se especializa nos cruzeiros fluviais, tem 40 anos e é de cariz familiar, com base em Estrasburgo. A empresa conta com 44 navios em praticamente todos os rios da Europa, tendo o mais velho navio apenas 17 anos. «Oferecemos um produto de qualidade, que é o mesmo tipo de serviço em qualquer rio» da Europa, explica Humberto Tenazinha. A CroisiEurope conta ainda com 1700 funcionários em todo o mundo.