revista impressa - Faculdade Guarapuava

Transcrição

revista impressa - Faculdade Guarapuava
1
Diálogos Multidisciplinares
Desenvolvimento Regional e
Sustentabilidade
Revista Científica do Iº Seminário de Pesquisa, Iniciação Científica e Extensão
da Faculdade Guarapuava
Nº 1 – ANO 1 – 2011
APOIO
2
UNIÃO DE ENSINO E CULTURA DE GUARAPUAVA - UNIGUA
Cleri Becher de Mattos Leão
Diretora Presidente
Leonardo Becher de Mattos Leão
Diretor Administrativo
FACULDADE GUARAPUAVA - FG
Carlos Alberto Ferreira Gomes
Diretor Geral
COORDENAÇÕES DOS CURSOS DE GRADUAÇÃO
ADMINISTRAÇÃO
CIÊNCIAS AMBIENTAIS
GESTÃO DE RECURSOS HUMANOS
Jair Vedoia da Silva
Luciana Bortoncello Lorenzetti Andrade
CIÊNCIAS CONTÁBEIS
Rita Maria Gonçalves Felizardo
CIÊNCIAS SOCIAIS
Cerize Nascimento Gomes
DIREITO
Daniel Tille Gaertner
ENGENHARIA CIVIL
ENGENHARIA ELÉTRICA
Edson Luiz Schultz
3
REVISTA CIENTÍFICA
DIÁLOGOS MULTIDISCIPLINARES
Artigos Científicos
ANO I – Nº 1 - 2012
CONSELHO EDITORIAL
Prof. Dr. Carlos Alberto Ferreira Gomes
Prof. Dr. Carlos Roberto Alves
Profª. Dra. Rosimeri Moreira
Prof. Ms. Sérgio Cristovão Zarpellon
Prof. Ms. Claudio Roberto Shimanoe
Profª Ms. Cerize Nascimento Gomes
Prof.Ms. Ernando Brito Gonçalves Júnior
Prof. Ms. Luiz Fernando Machado Kramer
CAPA
Dafne Breda
Revista Eletrônica
Cássio Winkler
GOMES, Cerize Nascimento e GONÇALVES Jr. Ernando Brito
(Org.). Diálogos Multidisciplinares. Guarapuava (PR): Gráfica
Impresset. Ano 1, Nº 1, 2011.
Publicação: Faculdade Guarapuava. Apoio: Fundação
Araucária de Apoio ao Desenvolvimento Científico e
Tecnológico do Paraná e Secretaria de Estado da Ciência,
Tecnologia e Ensino Superior.
Palavras- Chave: Desenvolvimento Regional. Sociedade.
Sustentabilidade. Meio-Ambiente.
4
APRESENTAÇÃO
A publicação do primeiro número da revista científica Diálogos
Multidisciplinares é um convite ao debate dos temas sociais, políticos,
econômicos e culturais, tanto em nível regional quanto global.
O trabalho de pesquisa apresentado nesta edição é o resultado
obtido com a realização do 1º Seminário de Pesquisa, Iniciação Científica e
Extensão da Faculdade Guarapuava (FG), realizado em outubro de 2011,
com a temática Desenvolvimento Regional e Sustentabilidade.
Estamos tentando fazer a nossa parte. O governo do Paraná, por
meio da Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior
(SETI), vem apoiando programas de pesquisa próprios para o
desenvolvimento estadual, razão pela qual a FG obteve o apoio da
Fundação Araucária, o maior organismo de fomento à pesquisa do Estado.
Com isso é possível dar maior visibilidade à produção científica dos
professores, estudantes e pesquisadores da FG e de outras instituições
interessadas em fomentar o debate sobre meio ambiente, sustentabilidade,
agricultura, educação, economia solidária, iniciativas culturais e outros temas
que possam contribuir com o desenvolvimento da nossa região e melhores
condições de vida para a população.
O objetivo dos mantenedores, a União de Ensino e Pesquisa de
Guarapuava (UNIGUA) e da direção da FG é o de levar a ciência e a
tecnologia que são produzidas no espaço acadêmico para todos os
municípios da região de abrangência da Faculdade.
Assim sendo, estamos lançando com esta revista o esboço de um
projeto de desenvolvimento regional. Em nosso entendimento, isso é o que
deve ser feito para o surgimento de novos espaços de cidadania e de
participação democrática. Tudo para que as novas gerações tenham
alternativas para construir um mundo melhor.
Prof. Dr.Carlos Alberto Gomes
Diretor Geral
5
SUMÁRIO
Conteúdo
MULTIFUNCIONALIDADE DA AGRICULTURA FAMILIAR NA REGIÃO
DE GUARAPUAVA: ESTUDO DE CASO DA FAMÍLIA PEREIRA - LUIZ
FERNANDO KRAMER E JORGE LUIZ FAVERO
7
O DIREITO SOCIOAMBIENTAL - ALAIM GIOVANI FORTES STEFANELLO
23
CONSERVAÇÃO DO SISTEMA FAXINAL: UMA QUESTÃO DE POLÍTICA
PÚBLICA - ELIANE CRESTIANE LUPEPSA COSTENARO
34
A LEGISLAÇÃO AMBIENTAL FAVORECE A ADOÇÃO DE ESTRATÉGIAS
EMPRESARIAIS DE INOVAÇÃO AMBIENTAL? - CARLA MARLANA
ROCHA
52
O CARVÃO VEGETAL COMO RECURSO INDUSTRIAL RENOVÁVEL E
SUA IMPORTÂNCIA PARA A INCLUSÃO SOCIAL E O MEIO-AMBIENTE
- CARLOS ROBERTO ALVES
64
INFLUÊNCIA DO COBRE NO CRESCIMENTO E NO TEOR DE
PIGMENTOS DE PISTIA STRATIOTES L. - CAMILLE GOES CORDEIRO 69
DESENVOLVIMENTO LOCAL: OS DESAFIOS DA AGRICULTURA
FAMILIAR PARA SUA PERMANÊNCIA NO CAMPO - ADRIANA SENETRA
E DIENIFFER TALINE SCHNELL
73
O RECONHECIMENTO DO DIREITO À ALIMENTAÇÃO COMO DIREITO
FUNDAMENTAL : A SEGURANÇA ALIMENTAR COMO MÉTODO PARA A
EFETIVAÇÃO DESSE DIREITO NA REGIÃO DE GUARAPUAVA MARIANA ROCHA MALHEIROS
86
INFLUÊNCIA DE PLANTAS DE COBERTURA NAS PROPRIEDADES
FÍSICAS DE UM LATOSSOLO COMPACTADO - EMANUEL SANCHEZ,
ALINE MARQUES GENU E MÁRCIO FURLAN MAGGI
103
6
ANÁLISE DAS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS PARA O
CURSO DE PEDAGOGIA: PEDAGOGIA DA TERRA OFERTADA PELA
UNIOESTE (FB/PR) E O CURSO DE PEDAGOGIA DA UNICENTRO
(GUARAPUAVA / PR) - VIVIANE SILVEIRA BATISTA
132
A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE DA TERRA E A EXPERIÊNCIA
DE REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA DO MUNICÍPIO DE CANDÓI-PR DÁRIO MIRANDA ALMEIDA
160
EDUCAÇÃO AMBIENTAL: INSTRUMENTO PARA A FORMAÇÃO DA
CIDADANIA - RUBIARA APARECIDA MELO
168
O PERFUME DAS PITANGUEIRAS DE TURVO (PR) IMPRESSÕES SOBRE
A PARCERIA ENTRE A COOPAFLORA DE TURVO (PR) E NATURA DO
BRASIL - DÉBORA MACHADO E CERIZE NASCIMENTO GOMES
184
ALGUMAS REFLEXÕES (IN)CONVENIENTES - FERNANDO POLLI ALVES
196
O MUNICÍPIO DE TURVO E O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL A
PARTIR DO ESTUDO BIOGRÁFICO DE BERNARDO HAKVOORT ROKELY SHEIFITER RAMOS
218
ESTUDO DE CASO SOBRE A MESORREGIÃO CENTRO-SUL DO
PARANÁ : ÍNDICES DE DESENVOLVIMENTO DOS MUNICÍPIOS DA
REGIÃO DE GUARAPUAVA - CERIZE NASCIMENTO GOMES E CARLOS
ALBERTO GOMES
236
PROJETO DE GERAÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA A PARTIR DE
ENERGIA SOLAR E EÓLICA PARA ATENDER CONSUMO RESIDENCIAL
- ALESSANDRO RICARDO KARAM, RENAN APARECIDO BAZZA,
ARMINSON MICHEL ERDMANN E GILSON AUDA
258
PROJETO PARA CONTENÇAO DE TALUDES COM PNEUS INSERVÍVEIS
- BRUNA CAITANO ORIZIO, TALITA GADENS ROSÁRIO E DOUGLAS
RODRIGUES LEONEL
263
PROJETO DE UM GERADOR TESLA - JUAN VILALBA, DENILSON
CAMARGO E ZÉ KLEITON KLOSSNIAK
266
7
MULTIFUNCIONALIDADE DA AGRICULTURA FAMILIAR
NA REGIÃO DE GUARAPUAVA: ESTUDO DE CASO DA
FAMÍLIA PEREIRA
Prof. Ms.Luiz Fernando Machado Kramer
Ciências Ambientais – FG
Prof. Dr. Jorge Luís Favero
Agronomia – UNICENTRO
RESUMO: A multifuncionalidade surge como uma nova forma de pensar a
agricultura, consistindo na idéia de que esta desempenha outras funções além da
produção de alimentos e fibras. O Objetivo deste artigo é analisar a aplicabilidade
do conceito da multifuncionalidade da agricultura em uma unidade de agricultura
familiar na região de Guarapuava – Paraná. Foi escolhido a UPVF – Unidade de
Produção e Vida Familiar - da família Pereira, localizada no município de
Guarapuava, na localidade denominada Chapada do Jordão, às margens da PR
170, Km 10. Como resultado o estudo demonstrou a existência de funções chaves
da multifuncionalidade. Nos aspectos da contribuição à segurança alimentar, o
principal foco detectado foi a auto-sustentação da propriedade, pois além da
produção de alimentos para o mercado local, há também, uma dinâmica de
produção de outros alimentos para a subsistência da família e da propriedade, pois
aproximadamente 95% das necessidades básicas da família estudada são supridas
com produtos da própria propriedade e os 5% restantes são adquiridos no mercado
local.A preocupação e o cuidado do meio ambiente está presente na UPVF da
família Pereira, pois dois 35 ha da propriedade, mais de 50% estão preservados.
Além da preservação do remanescente de Mata Atlântica presente na propriedade,
a família busca utilizar-se de práticas menos impactantes ao meio ambiente. A
função econômica e social da propriedade foi demonstrada por uma grande
eficiência do sistema produtivo, aliado ao processamento de produtos a nível de
propriedade, possibilitando uma maior agregação de valor, com a capacidade de
gerar emprego e renda, com a reprodução social e cultural das família .
Palavras-Chave: reprodução social, agroecologia, unidade de produção.
INTRODUÇÃO
A multifuncionalidade surge como uma nova forma de pensar a
agricultura, consistindo na idéia de que esta desempenha outras funções
além da produção de alimentos e fibras. Há algum tempo, a visão que se
8
tinha do setor era de simples produtora de alimentos, mas hoje, a agricultura
abriga em seu pensar, além da produção de gêneros, outros benefícios para
a sociedade como a preservação do meio-ambiente, a segurança alimentar,
a manutenção do patrimônio cultural do campo, e a geração de empregos.
O Objetivo deste estudo é analisar a aplicabilidade do conceito da
multifuncionalidade da agricultura em uma unidade de agricultura familiar na
região de Guarapuava – Paraná.
1. METODOLOGIA
O presente estudo de caso buscou identificar um núcleo familiar em
que pudesse ser analisado o conceito de multifuncionalidade da agricultura
na região de Guarapuava - PR. A escolha da Unidade de Produção e Vida
Familiar1 - UPVF da família Pereira foi proposital, visto que, a família tem um
histórico de participação no movimento “agroecológico”, sendo a propriedade
referência na região, não apenas do ponto de vista produtivo, mas
especialmente sob a ótica social, ambiental e econômico.
A UPVF está localizada no município de Guarapuava, na localidade
denominada Chapada do Jordão, às margens da PR 170, Km 10. Possui
uma área total de 35 ha, sendo que a sua superfície é composta de 20 ha
como área de preservação e aproximadamente 15 ha utilizados para cultivos
e criações.
Para esse estudo de caso foi utilizado como referência de análise o
conceito de multifuncionalidade da agricultura, analisando a contribuição a
segurança alimentar, a preocupação com a questão ambiental, a
contribuição da propriedade com a geração de emprego e renda e a
manutenção da identidade social, e por último a análise da viabilidade
econômica dessa propriedade.
1
Adotamos a terminologia UPVF – Unidade de Produção e Vida Familiar, pois se entende
que o rural não é apenas espaço de produção, mas sim, espaço de reprodução dos
aspectos culturais, sociais e econômicos das famílias que ali vivem.
9
2. CONCEITOS E ORIGEM DA MULTIFUNCIONALIDADE
De acordo com Flexor (2007) A noção de multifuncionalidade da
agricultura familiar representa uma tentativa de reconhecer que os
estabelecimentos agrícolas e, portanto, os agricultores que neles vivem e
estabelecem suas estratégias familiares desempenham funções sociais não
exclusivamente produtivas e mercantis. Para Ribeiro (2007), a visão de
multifuncionalidade da agricultura surgiu na França, no século XX, e se
difundiu pela Europa. Miranda e Adib (2001) complementa descrevendo que
as noções de multifuncionalidade da agricultura, nova ruralidade e
desenvolvimento sustentável surgiram, de maneira simultânea, nos anos 90,
na Europa e América Latina, e coincidem naquilo que pretendem construir:
marcos renovados para a definição de políticas públicas que levem ao
desenvolvimento rural de forma sustentável. Num contexto mundial marcado
pela globalização, no entanto, os princípios que os fundamentam são
específicos e estão marcados pela história econômica e social das regiões
onde foram elaborados.
Para o mesmo autor as discussões em torno da multifuncionalidade
da agricultura têm origem no reconhecimento do papel da agricultura e de
suas múltiplas relações com outros setores e atores sociais, ou seja, numa
nova forma de pensar a função da agricultura além da produção de
alimentos e de matéria-prima. O ápice dessa discussão se deu durante os
debates realizados na Conferência Eco-92, no Rio de Janeiro, em que se
reconheceu o aspecto multifuncional da agricultura, particularmente com
respeito à segurança alimentar e à sustentabilidade ambiental. Com essa
nova visão, começa cair por terra o modelo tradicional da agricultura
produtivista, ligada ao crescimento econômico, mais voltado à produção e ao
aumento da produtividade, visando ao fornecimento de alimentos e matériasprimas de baixo custo e ampliação de divisas. Na seqüência, em 1998, a
Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OECD)
reconhece que, além de sua função primária de produção de alimentos e
fibras, a atividade agrícola pode também moldar a paisagem, prover
10
benefícios ambientais, como conservação dos solos, gestão sustentável dos
recursos naturais renováveis e preservação da biodiversidade, e contribuir
para a viabilidade socioeconômica em várias áreas rurais.
De acordo com Miranda (2001), a amplitude multifuncional da
agricultura vem sendo discutida pela Organização das Nações Unidas para
Agricultura e Alimentação (FAO), que classifica as funções nas seguintes
categorias:
a) Função ambiental: está vinculada à conservação dos recursos
naturais e recuperação ambiental. É relativa a forma como todos os
sistemas agrícolas e de aproveitamento da terra repercutem
diretamente nos componentes e funcionamento das ecologias
locais.
Nesse
sentido,
são
particularmente
importantes
as
contribuições da agricultura para a biodiversidade, degradação dos
solos, desertificação, dentre outros.
b) Função econômica: a agricultura continua sendo uma força
importante para sustentar o funcionamento e crescimento das
economias
dos
países,
inclusive
aqueles
altamente
industrializados. O investimento pode gerar efeitos econômicos,
tanto nas atividades iniciais quanto finais do ciclo produtivo, para si
mesma e para outros setores. Pelo lado da demanda, a agricultura
requer insumos, mão-de-obra, serviços e capital financeiro. Pelo
lado da oferta a agricultura fornece produtos que são elaborados,
transportados, comercializados e distribuídos.
c) Função social: a manutenção e dinamismo das comunidades rurais
são fundamentais para sustentar e melhorar a qualidade de vida e
para garantir a sobrevivência da população rural. O aproveitamento
dos conhecimentos locais e o fortalecimento das relações sociais
são fundamentais para o futuro das comunidades rurais. A
viabilidade social compreende a manutenção do patrimônio cultural:
muitas sociedades se identificam fortemente com suas origens
históricas nas comunidades agrárias e nos estilos de vida rural.
3. AGRICULTURA FAMILIAR E A MULTIFUNCIONALIDADE
11
Conforme o Censo de Agropecuário 1996 existem no Brasil 4.139.369
estabelecimentos rurais familiares (segundo a metodologia utilizada por
INCRA/FAO), ocupando uma área de 107,8 milhões de hectares. Por outro
lado, há 554.501 estabelecimentos patronais, ocupando uma área de 240
milhões de hectares. Os agricultores familiares representam 85,5% do total
de estabelecimentos, ocupam 30,5% da área e são responsáveis por 37,9%
do Valor Bruto da Produção Agropecuária Nacional (VPB), apesar de
receberem apenas 23,5% do financiamento destinado à agricultura. A região
de Guarapuava de acordo com Favaro (2005) é composta de 12 municípios,
possuindo um total de 23.735 estabelecimentos rurais. Destes, 21.431 são
considerados estabelecimentos familiares, ou seja, 90,29%.
3.1. As funções múltiplas da agricultura familiar
Conforme
Soares
(2001)
na
discussão
do
conceito
de
multifuncionalidade na agricultura familiar identificam-se as seguintes
funções chaves; contribuição à segurança alimentar; função ambiental;
função Econômica; função Social.
3.1.1 Contribuição à segurança alimentar
A segurança alimentar e nutricional significa garantir a todos o acesso
a alimentos básicos de qualidade, em quantidade suficiente, de modo
permanente e sem comprometer o acesso a outras necessidades
essenciais, com base em práticas alimentares saudáveis. Contribuindo,
assim, para uma existência digna, em um contexto de desenvolvimento
integral da pessoa humana. A agricultura familiar estabelece várias relações
com a segurança alimentar. A mais lembrada é como provedora de alimentos
para a sociedade
Com base no Censo de 1995/96, os agricultores familiares produzem
24% do VPB da pecuária de corte, 54% da pecuária de leite, 58% dos
12
suínos, 40% das aves e ovos, 33% do algodão, 72% da cebola, 67% do
feijão, 97% do fumo, 84% da mandioca, 49% do milho, 32% da soja, 46% do
trigo, 58% da banana e 25% do café. A importância da agricultura familiar
para a segurança alimentar vai além da produção primária. Sua
característica de distribuição de renda e geração de empregos possibilita
que milhões de pessoas tenham condições de acessar os alimentos. Enfim,
é estratégico o papel desempenhado pela agricultura familiar para a
segurança alimentar. Tanto pelo lado da produção de alimentos quanto pelo
efeito distribuidor de renda deste setor da agricultura, criando condições
para o acesso ao alimento.
3.1.2. Agricultura familiar e a função ambiental
A agricultura familiar tem um papel ímpar no que se refere à função
ambiental da agricultura por diversas razões a agricultura familiar tem
melhores condições para um desenvolvimento sustentável do ponto de vista
ambiental. Para Soares (2007),
seu funcionamento econômico não se fundamenta na
maximização da rentabilidade do capital e na geração do lucro a
curto prazo, mas está orientado para o atendimento das
necessidade da família e para a manutenção a longo prazo das
potencialidades produtivas do meio natural, percebido como um
patrimônio familiar; por sua própria vocação de unidade de
produção e consumo, a agricultura familiar valoriza a diversidade
através de policultivos e criações distribuídos de forma equilibrada
no tempo e espaço; a unidade de produção familiar, quer por sua
extensão quer pela forma de organização do trabalho, favorece
maiores cuidados técnicos nas operações de manejo, na medida
em que aquele que toma as decisões é também o que as coloca
em prática; enraizada em um meio físico conhecido e sob
controle, a agricultura familiar mantém uma relação positiva com o
território, o que se revela, sobretudo, na capacidade de valorizar
as potencialidades próprias aos ecossistemas naturais em que
está inserida, inscrevendo estas potencialidades em suas
estratégias de reprodução econômica.
A função ambiental é um bem público que a agricultura familiar produz
para a sociedade (e tem potencial de produzir muito mais se converter seu
13
modelo de produção em direção à agroecologia).
Gliessman (2000) afirma que:
a agroecologia proporciona o conhecimento e a metodologia
necessários para desenvolver uma agricultura que é
ambientalmente
consistente,
altamente
produtiva
e
economicamente viável. Ela abre a porta para o desenvolvimento
de novos paradigmas da agricultura, em parte porque que corta
pela raiz a distinção entre a produção de conhecimento e sua
aplicação. Valoriza o conhecimento local e empírico dos
agricultores, a socialização desse conhecimento e sua aplicação
ao objetivo comum da sustentabilidade.
A Agroecologia, a partir de um enfoque sistêmico, adota o
agroecossitema2 como uma unidade de análise, tendo como propósito, em
última instância, proporcionar as bases científicas (princípios, conceitos e
metodologias) para apoiar o processo de transição do atual modelo de
agricultura convencional para estilos de agricultura sustentável.
3.1.3. A agricultura familiar e a função econômica
A agricultura familiar responde por uma parte importante desta
contribuição. Como já dissemos, apesar de ocupar somente 30,5% da área e
receber somente 25,3% do financiamento da produção, a agricultura familiar
é responsável por 37,9% do Valor Bruto da Produção Agropecuária Nacional,
isto corresponde a R$ 18,1 bilhões. Nas regiões Norte e Sul mais de 50% do
VPB é produzido em estabelecimentos familiares.
Segundo o estudo do INCRA/FAO (2000) “a Renda Total por hectare
demonstra que a agricultura familiar é muito mais eficiente que a patronal,
produzindo uma média de R$ 104,00/ha/ano contra apenas R$ 44,00 ha/ano
pelos agricultores patronais”. Esta maior eficiência ocorre em todas as
2
Agroecossistema é a unidade fundamental de estudo, nos quais os ciclos minerais, as
transformações energéticas, os processos biológicos e as relações socioeconômicas são
vistas e analisadas em seu conjunto. Sob o ponto de vista da pesquisa agroecológica, seus
objetivos não são a maximização da produção de uma atividade particular, mas a
otimização do agroecossistema como um todo, o que significa a necessidade de uma maior
ênfase no conhecimento, na análise e na interpretação das complexas relações existentes
entre pessoas, os cultivos, o solo, a água e os animais (ALTIERI, 2002).
14
regiões.
3.1.4. A agricultura familiar e a função social
A agricultura familiar é a principal geradora de postos de trabalho no
meio rural brasileiro. Mesmo dispondo de 30 % da área, é responsável por
76,9% do pessoal ocupado. Entre os agricultores patronais são necessários
em média 67,5 ha para ocupar uma pessoa, enquanto entre os familiares
são necessários 7,8 ha para ocupar uma pessoa.
Como visto, a agricultura familiar brasileira cumpre múltiplas funções
para a sociedade, indo muito além da mera produção primária. O
reconhecimento da multifuncionalidade da agricultura familiar pode significar
que seu tratamento não pode ser unicamente comercial, ou de mercado. A
agricultura familiar provê um conjunto de serviços e bens públicos, tangíveis
e intangíveis, de elevado valor para a sociedade em geral. Os meros
instrumentos de mercado não são suficientes para dar conta da
complexidade do desenvolvimento da agricultura familiar em seus diversos
aspectos.
4. A UNIDADE DE PRODUÇÃO E VIDA FAMILIAR DA FAMÍLIA PEREIRA
A UPVF é formada por um “coletivo familiar”, ou seja, país e filhos que
optaram em não dividir a propriedade e realizam a produção de forma
conjunta. Nesse “coletivo familiar” podemos identificar três núcleos
familiares: Núcleo 1 composto pelos pais (patriarca e matriarca) e mais dois
filhos; núcleo 2 composto por filho mais esposa e dois netos e; o núcleo 3
composto pelo filho, esposa e dois netos.
Um dos membros do núcleo 2 possui atividade remunerada não
agrícola, sendo este, funcionário público estadual, mesmo assim, despende
parte do tempo em atividades produtivas na UPVF. Do “coletivo familiar’,
apenas 6 membros dedicam tempo integral as atividades agropecuárias, os
demais estão em idade escolar e não realizam atividades relacionadas a
15
produção.
A principal atividade econômica da UPFV dos Pereiras está na
produção, beneficiamento e comercialização de mandioca (Manihot
esculenta).
4.1. Contribuição da família Pereira para a segurança alimentar
A dimensão da importância de famílias de agricultores, como os
Pereira, para a segurança alimentar, vai além da simples produção de
gêneros alimentares primários. A possibilidade de distribuição de renda,
pelas atividades desenvolvidas, envolvendo um número significativo do
grupo familiar, propicia condições para que a família tenha acesso a
aquisição de outros bens de consumo que não são produzidos por eles.
Mas, o foco central está na auto sustentação da propriedade. Além da
produção da mandioca, para o mercado local, há também, uma dinâmica de
produção de outros alimentos para a subsistência da família e da
propriedade. Essa característica lhes permite potencializar o uso de todos os
recursos disponíveis na UPVF.
Os principais produtos cultivados são: milho, feijão, arroz, hortaliças e
outros tradicionalmente cultivados na região, além da criação de suínos e
aves. Há uma preocupação, por parte da família, de recuperar espécies
alimentícias que faziam parte da cultura e da base alimentar da maioria das
famílias de agricultores da região, mas, com o processo de modernização da
agricultura, acabou perdendo-se o hábito de cultivar e/ou criar diversas
espécies como o centeio, trigo, batata, abóbora, etc. Aproximadamente 95%
das necessidades básicas da família estudada são supridas com produtos
da própria UPVF e os 5% restantes são adquiridos no mercado local.
Um aspecto positivo do ponto de vista da segurança alimentar tratase do conhecimento e do controle da qualidade dos alimentos produzidos na
UPVF. Isto proporciona à família uma diversidade de consumo de produtos
com alto valor biológico, isento de produtos químicos ou quaisquer outros
elementos prejudiciais à saúde e ao meio ambiente. Essa preocupação está
16
presente em todos os membros da família, no cuidado da alimentação e
também aos relacionados a preservação ambiental.
Essa característica da família tornou-a referência para os agricultores
familiares na região. Além da troca de conhecimentos entre outros
agricultores e a família, há ainda um estímulo à troca de germoplasma entre
eles. Essa prática era comum entre as famílias de agricultores, a qual
possibilitava a difusão de várias espécies cultivadas. A recuperação, ou
normalmente chamado de resgate, de variedades crioulas, por parte da
família Pereira e de outros, motivou a Fundação Rureco3 a apoiar iniciativas
nesse sentido e, até mesmo, em montar um banco de germoplasma em
parceria com a Universidade Estadual do Centro Oeste - UNICENTRO.
4.2. A família Pereira e a preocupação com a questão ambiental
A preocupação com o cuidado ao meio ambiente está presente na
UPVF da família Pereira. Dos 35 ha da propriedade, mais de 50% estão
preservados. Além da preservação do remanescente de Mata Atlântica
presente na propriedade, a família busca utilizar-se de práticas menos
impactantes ao meio ambiente, valorizando a diversidade através de
policultivos e criações; práticas de conservação de solo como rotação de
culturas e plantio direto; proteção dos mananciais; uso de técnicas
“agroecológicas” na prevenção e controle de insetos com potencial de dano
econômico e de doenças às plantações, além da implantação de áreas de
Sistemas Agroflorestais – SAF’s.
Fica demonstrado, portanto, que a prática utilizada pela Família na
UPVF, está orientada pelos princípios da Agroecologia, e não apenas no viés
orgânico,
pois
entendem
que
este
último,
tem
se
preocupado
prioritariamente em atender um nicho de mercado que paga um grande ágio
3
A Fundação RURECO é uma ONG de assessoria a agricultores familiares e suas
organizações na região Centro Oeste do Paraná. Suas ações são orientadas pelos
princípios da Agroecologia. Nos últimos anos a RURECO vem estimulando as famílias de
agricultores no “resgate” e difusão de variedades crioulas, através de trocas e partilha de
sementes.
17
aos produtos orgânicos, atendendo assim, principalmente a dimensão
econômica, relegando a dimensão social e ambiental a um segundo plano,
não construindo sistemas sustentáveis.
4.3 . A viabilidade econômica da família Pereira
Toda e qualquer atividade agrícola, que pretenda ser sustentável
precisa mostrar a sua viabilidade econômica. Isto porque existe a demanda
de manutenção das necessidades básicas da família, para o acesso a bens
e serviços, como atendimento à saúde de qualidade, vestuário, transporte,
saneamento básico, acesso às manifestações culturais, etc. Enfim, a
garantia de um estilo de vida simples, porém integral, com as conquistas que
a humanidade já realizou e que devem, de forma eqüitativa, ser alcançada
por todos.
Para demonstrar a dinâmica econômica da UPVF da família Pereira,
tomou-se como parâmetro uma Planilha de custos de produção de mandioca
em 01 ha da propriedade, no período de 01 ano. Atualmente a família cultiva
5 ha de mandioca. Importante ressaltar que a família estabelece o ciclo
produtivo da mandioca por um período de 18 meses, sendo que algumas
variedades podem ter um ciclo produtivo de até 24 meses.
Para a formação do custo de produção levou-se em consideração três
fatores preponderantes: mão-de-obra, insumos e processamento. O cálculo
da mão-de-obra utilizada (Quadro 1) está baseado na produção de 20
toneladas de mandioca, considerando apenas uma unidade de trabalho
familiar (UTF). Sendo assim, para produção de 20.000 quilos foram
utilizados aproximadamente 2 horas de gradagem com tração animal, 16
horas (dois dias) para o corte e armazenamento da rama, 40 horas (5 dias)
para picar a rama, preparar cova e realizar o plantio, 4 horas para aplicação
do biofertilizante. Considerando que são realizadas 3 capinas com duração
de aproximadamente 4 dias cada uma, dentro do todo o ciclo são utilizados
12 dias no total para esta atividade. Para a colheita a mão-de-obra
despendida é de 12 dias.
18
Quadro 1. Custo de Mão-de-obra e Insumos para produção de 1 hectare de
mandioca no sistema “agroecológico”
0,25
Custo Unitário
(R$)
20,00
Custo total
(R$)
5,00
Dia
2,00
20,00
40,00
Dia
5,00
20,00
100,00
Aplicação biofertilizante
Dia
0,50
20,00
10,00
Capinas (03 x)
Dia
12,00
20,00
240,00
Colheita (±57
Dia
12,00
20,00
240,00
Unidade
Quantidade
Litro
1,5
Custo Unitário
(R$)
0,17
Custo total
(R$)
0,26
Mão-de-obra
Unidade
Quantidade
Gradagem tração animal
Dia
Corte e armazenamento
da rama
Picar rama, preparar
cova e plantar
carroçadasx06carr/dia)
Custos
Biofertilizante foliar (02
aplicações)
Total
635,26
Custo por tonelada: R$ 31,76
Fonte: RURECO, 2007.
Considerando ainda o valor do dia de trabalho trazido pela planilha
em estudo, é de R$ 20,00 (vinte reais) e ainda que para a realização as
atividades mencionadas foram utilizados 31,75 dias, tem-se o custo total da
mão-de-obra para a produção de R$ 635,00 (seiscentos e trinta e cinco
reais).
Outro fator importante na composição do custo da produção trata-se
da utilização do biofertilizante foliar. Esse procedimento fora adotado em
número de duas vezes no ciclo produtivo, sendo utilizado em média 1,5 litros
para hectare, com custo de R$ 0,17 (dezessete centavos de reais) por litro,
perfazendo um custo total de insumos R$ 0,26 (vinte e seis centavos de
reais).
O custo ínfimo do biofertizante utilizado se dá em razão da produção
19
do mesmo utilizar recursos e energia disponíveis na própria UPVF.
E, por fim, para chegar ao custo total de produção, são analisados os
gastos com o processamento e entrega do produto (Quadro 2). A
propriedade processa e vende em feiras livres e aos supermercados locais,
a mandioca descascada, embalada e congelada, com a marca Chapada.
Para uma quantidade de 20 toneladas brutas (com casca), tem-se 12
toneladas beneficiadas, que são embaladas em 20 mil pacotes de 600
gramas cada.
Cada pacote custa R$ 0,28 (vinte e oito centavos de reais) perfazendo
R$ 5.600,00 (cinco mil e seiscentos reais). O frete até o mercado
consumidor é de 0,22 (vinte e dois centavos de reais) por embalagem que
representa 15% do preço de venda, totalizando R$ 4.400,00 (quatro mil e
quatrocentos reais). Para realizar esse processamento são necessários 150
dias de trabalho de uma UTF, remunerados a R$ 20,00 que totalizam R$
3.000,00 (três mil reais), perfazendo um total de custo de processamento de
R$ 13.000,00 (treze mil reais).
Quadro 2. Custo do processamento da mandioca.
Custos
Trabalho no processamento
(descascar, embalar e
condicionar)
Embalagem
Frete
Unidade
Quantidade
Dias
150,00
Custo
Unitário (R$)
20,00
Embalagem
%
Total
20.000
15,00
0,28
0,22
Custo total
(R$)
3.000,00
5.600,00
4.400,00
13.000,00
Fonte: RURECO, 2007.
Assim somando-se os custos da mão-de-obra para a produção R$
635,00, mais os custos dos insumos R$ 0,26 e mais os custos do
processamento R$ 13.000,00, tem-se um custo total no importe de R$
13.635,26.
Importante observar que o custo médio de produção, nesse sistema
agroecológico, é de aproximadamente R$ 32,00 por tonelada. Se
compararmos esses custos com o do sistema convencional de produção, há
20
uma diferença enorme. Segundo Fukuda e Otsubo (2003), o custo médio de
produção para o sistema convencional é da ordem de R$ 108,15, para uma
produção estimada de 20 t/ha, a mesma produção utilizada nesse estudo.
Nesse sistema são utilizados insumos modernos como fertilizantes,
defensivos e mecanização, mas o plantio, tratos culturais e fitossanitários e a
colheita são realizados manualmente.
Isso demonstra uma maior eficiência econômica do sistema produtivo
agroecológico. Com o processamento desse produto, há uma agregação de
valor. A mandioca sendo comercializada na forma de raiz, obtém uma
remuneração média de R$ 0,60 /Kg, enquanto o produto já processado o
preço pago é de R$ 1,45 por embalagem de 600 gramas.
Fica demonstrado, portanto, a viabilidade econômica da atividade em
estudo, tendo em vista que as 12 toneladas de mandioca processada,
vendidas um preço de R$ 1,45 geram uma renda bruta de R$ 29.000,00,
deduzindo-se os custos de produção no valor de 13.635,26, tem-se uma
renda líquida de R$ 15.364,74 por hectare por ano.
4.4.
A geração de emprego e renda e a manutenção da identidade
social da família Pereira
A função social da UPVF dos Pereira está expressa principalmente no
que se refere ao “coletivo familiar”, tendo em vista que a família optou em
manter seus membros na UPVF buscando para tanto, desenvolver uma
atividade produtiva capaz de gerar renda aos mesmos, evitando assim, o
êxodo.
A capacidade de gerar emprego e renda na propriedade possibilita a
reprodução social e cultural das famílias que vivem na UPVF. A preservação
dos hábitos alimentares, da diversificação, do cuidado ao meio ambiente,
são fatores observados na UPVF, mas, no entanto, são incomensuráveis,
tanto para os membros da família como para o conjunto da sociedade.
A manutenção do tecido social e cultural não está relacionado apenas
na reprodução socioeconômica da família, mas também está relacionado a
21
identidade social, ou seja, a identidade de “agricultores familiares’. Isto
porque, para os membros da família, a agricultura é vista como um modo de
vida e não simplesmente como uma atividade econômica.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estudo de caso da UPVF – Unidade de Produção e Vida Familiar da família Pereira sobre a presença da multifuncionalidade na agricultura
demonstrou a existência das principais funções chaves.
Nos aspectos da contribuição à segurança alimentar,
foco
detectado
é a
auto sustentação da propriedade, pois
o principal
além da
produção de alimentos, para o mercado local, há também, uma dinâmica de
produção de outros alimentos para a subsistência da família e da
propriedade, pois aproximadamente 95% das necessidades básicas da
família estudada são supridas com produtos da própria propriedade e os 5%
restantes são adquiridos no mercado local. Essa característica lhes permite
potencializar o uso de todos os recursos disponíveis na propriedade.
Outro ponto que deve ser salientado em relação à contribuição a
segurança alimentar é o
conhecimento e o controle da qualidade dos
alimentos produzidos na propriedade . Isto proporciona à família uma
diversidade de consumo de produtos com alto valor biológico, isento de
produtos químicos ou quaisquer outros elementos prejudiciais à saúde e ao
meio ambiente.
A preocupação e o cuidado do meio ambiente está presente na UPVF
da família Pereira. Dos 35 ha da propriedade, mais de 50% estão
preservados. Além da preservação do remanescente de Mata Atlântica
presente na propriedade, a família busca utilizar-se de práticas menos
impactantes ao meio ambiente, valorizando a diversidade através de
policultivos e criações; práticas de conservação de solo como rotação de
culturas e plantio direto; proteção dos mananciais; uso de técnicas
“agroecológicas” na prevenção e controle de insetos com potencial de dano
econômico às plantações e de doenças das plantas, além da implantação de
22
áreas de Sistemas Agroflorestais – SAF’s.
A função econômica e social da propriedade foi demonstrada por
uma grande eficiência do sistema produtivo aliado ao processamento de
produtos a nível de propriedade possibilitando uma maior agregação de
valor, com
a capacidade de gerar emprego e renda possibilitando
a
reprodução social e cultural das famílias que vivem na UPVF. A preservação
dos hábitos alimentares, da diversificação, do cuidado ao meio ambiente,
foram
fatores observados na Unidade de Produção e Vida Familiar no
estudo de caso sobre a Família Pereira .
REFERÊNCIAS
ALTIERI, M. Agroecologia: bases científicas para uma agricultura sustentável.
Guaíba: Agropecuária, 2002.
CARNEIRO, M. J.; MALUF, R. S. (org). Para Além da produção:
multifuncionalidade e agricultura familiar. Rio de Janeiro: MAUAD, 2003.
FAVARO, J. L.; SALVADOR, E. D.; FAVARO JUNIOR, J. L. A presença da
Agricultura Familiar na região de Guarapuava –PR. In: Semana de Estudos
Agronômicos da UNICENTRO, 2, 2004, Guarapuava: UNICENTRO, 2004 pg. 1119.
GLIESSMAN, S. R. Agroecologia: processos ecológicos em agricultura
sustentável. Porto Alegre: Ed. Universidade/UFRGS, 2000.
SITOGRAFIA
FLEXOR, G. Agricultura Multifuncional e Meio Ambiente: especificidade
territorial e conflitos em torno dos Recursos Naturais no Município de Paraty.
Disponível em: <www.ebapei.fgv.br/radma/doc/Sma/Sma-032.pdf > Acesso em:
Novembro 2007.
FUKUDA, C.; OTSUBO, A. A.. Cultivo da mandioca na região Centro Sul do
Brasil. In: sistema de Produção, 7 – Embrapa Mandioca e Fruticultura. Versão
eletrônica. Disponível em:
<http://sistemasdeproducao.cnptia.embrapa.br/FontesHTML/Mandioca/mandioca_c
en trosul/ index.htm.> Acesso em Novembro de 2007.
MIRANDA, C. L.; ADIB, A. R. Multifuncionalidade e desenvolvimento rural
sustentável.
Disponível
em:
<www.iica.orgbr/docs/noticia/multifuncionalidadedesenvolvim
entoRuralSustentavel_artigo revista/Marco Social.pdf>. acesso em: Outubro 2007.
RIBEIRO, D. M. G. A Multifuncionalidade da agricultura e o aproveitamento
dos recursos naturais: preocupação legítima ou protecionismo disfarçado?
Disponível
em:
<www.compedi.org/manaus/arquivo/anais/daniela%20menengoti%gonçalves%20rib
ei ro.pdf> acesso em Outubro 2007.
SOARES, A. C. A multifuncionalidade da agricultura familiar. Disponível em
23
<www.grupocholavi.org/php/doc/documentos/multifuncionalidade.pdf> acesso em
Outubro 2007.
OUTRAS FONTES
INCRA/FAO Novo Retrato da Agricultura Familiar: O Brasil Redescoberto.
Brasília:MDA, 2000.
O Direito Socioambiental
Prof. Ms. Alaim Giovani Fortes Stefanello
Doutorando em Direito Socioambiental – PUC/PR
Mestre em Direito Ambiental –UEA/AM
Membro da Comissão de Direito Ambiental da OAB/PR
RESUMO: O caminho histórico evolutivo do direito ambiental ao direito
socioambiental é o escopo do presente artigo. O respeito e preocupação crescente
à proteção do meio ambiente faz parte da compreensão e busca de uma sadia
qualidade de vida, o que foi traduzido pelo legislador num capítulo da Constituição
Federal de 1988 dedicado ao assunto. Ao analisar tais questões, o artigo apresenta
conceitos jurídicos do meio ambiente e sua evolução como direito humano
fundamental, evidenciando uma nova problemática jurídica a ser explorada.
Palavras-Chave: Direito Ambiental. Direito Socioambiental. Meio Ambiente.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho objetiva resgatar de forma sucinta o histórico
acerca da legislação sobre o meio ambiente, seja no âmbito nacional quanto
internacional, bem como destacar a transição do direito ambiental para o
direito socioambiental.
Também será analisado o conceito de meio ambiente sob o aspecto
jurídico, apresentando as principais definições encontradas na doutrina
jurídica e na legislação específica.
O tema abordado possui relevância social atual, uma vez que o meio
ambiente cada vez constitui-se em preocupação tanto da sociedade quanto
24
dos governos, uma vez que a sua manutenção tem direta relação com uma
maior ou menor qualidade de vida no planeta.
Assim, do meio ambiente natural, considerado como a natureza em
seu estado puro composto pelas plantas,animais e minerais (lato sensu),
parte-se hoje para o meio ambiente modificado, também conhecido como o
meio ambiente artificial ou construído, a exemplo das cidades, ambos sendo
objeto de preocupação por parte do direito.
De igual forma o meio ambiente cultural, aquele onde a cultura em
seus mais diversos aspectos (material e imaterial) constitui o ambiente, bem
como o meio ambiente do trabalho, onde se desenvolvem as relações
laborais, ganham destaque no estudo das ciências jurídicas.
Assim, o presente artigo apresenta um pouco da preocupação com o
meio ambiente do ponto de vista jurídico, o que fez como o direito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado e essencial à sadia qualidade devida,
nos termos da Constituição Federal de 1988, fosse considerado como um
direito humano fundamental.
1. PRINCIPAIS MARCOS JURÍDICOS DO DIREITO AMBIENTAL AO
SOCIOAMBIENTAL
Visitando os principais fatos históricos do direito ambiental percebe-se
que surgem as mais diversas correntes teóricas procurando estabelecer um
marco inicial, ou, então, demonstrar quais foram as primeiras leis produzidas
que já tratavam do assunto.
No entanto, na maioria das vezes as leis mais antigas que tratam
acerca da temática abordada não se traduzem em marcos temporais de um
verdadeiro surgimento do novo ramo do direito, mas, sim, de legislações
esparsas que tratavam de temas específicos conforme a conveniência da
época.
No âmbito internacional, conforme explica Marcelo Dias Varella, a
evolução do direito ambiental internacional não é nem lógica, nem linear. É
um ramo do direito desordenado em razão de vários fatores, dentre eles
25
destaca-se a impossibilidade de identificar uma instituição coordenadora das
normas internacionais, o que faz existir várias instituições que regulam
diferentes acordos de modo heterogêneo4.
Assim, de forma pontual e com diferentes interesses, pode-se
mencionar como precursoras a Convenção de 1933 relativa a preservação
da fauna e da flora nos seus estados naturais; a Convenção de 1940 sobre a
proteção natural e a proteção da vida selvagem no hemisfério ocidental; a
Convenção internacional de 1946 sobre a regulamentação da pesca da
baleia; a Convenção internacional para a proteção dos vegetais em 1951; a
Convenção sobre o alto mar em 1958, dentre outras menos expressivas mas
que também tratam do assunto.
No entanto, de grande importância e como verdadeiro marco jurídico
e histórico é a Declaração de Estocolmo, conforme assinala Plauto Faraco
de Azevedo ao afirmar que o surgimento do direito ambiental, no mundo e no
Brasil, liga-se à idéia de defesa, promoção e preservação da vida, valor que
permeia todas as normas ambientais, "nacionais e internacionais, a partir da
Convenção de Estocolmo, de 1972, cujos dispositivos constituem o primeiro
grande brado de alerta contra a poluição e destruição do ambiente"5.
A Declaração de Estocolmo sobre o meio ambiente busca a
preservação e melhoria do ambiente humano por meio de vinte e três
princípios que tratam de direitos humanos, direito ao desenvolvimento
econômico e social e meio ambiente.
Evidencia-se, no campo internacional, a influência da Declaração de
Estocolmo nas políticas ambientais de vários países. Assim, conforme relata
Marcelo Dias Varella, é nesta época que os países escandinavos e a
Alemanha criam o Ministério do Meio Ambiente, seguidos pelos Estados
Unidos e Inglaterra. Apenas quatro anos depois, outros países europeus vão
criar seus Ministérios, demonstrando uma tomada de consciência crescente
4
VARELLA, Marcelo Dias. Direito Internacional Econômico Ambiental. Belo Horizonte: Del
Rey, 2003, p. 24.
5
AZEVEDO, Plauto Faraco de. Ecocivilização: ambiente e direito no limiar da vida. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2005, p.93.
26
com os problemas ambientais6.
Também importante foi a Conferência do Rio de Janeiro sobre o meio
ambiente e desenvolvimento de 1992, de onde resultou a Convenção sobre
a Diversidade Biológica.
A realização da Eco 92 foi sugerida no relatório da Comissão Mundial
sobre Meio Ambiente da Assembléia Geral das Nações Unidas, criada em
1983, sob a presidência da Norueguesa Gro Harlem Brundtland, razão pela
qual o relatório da referida comissão tornou-se mundialmente conhecido
como Relatório Brundtland.
A Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) foi assinada pelo
Brasil durante a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e
Desenvolvimento, a ECO/92, realizada entre os dias 3 a 14 de junho de
1992 no Rio de Janeiro, que estabeleceu importantes regras e princípios
internacionais de proteção à biodiversidade. Configura-se num dos tratados
internacionais de maior importância na regulamentação do acesso e
utilização da biodiversidade.
O artigo 2° da CDB, traz a definição de biodiversid ade como sendo a
variabilidade de organismos vivos de todas as origens, compreendendo,
entre outros, os ecossistemas terrestres e marinhos, outros ecossistemas
aquáticos e os complexos ecológicos de que fazem parte, envolvendo,
ainda, a diversidade dentro de espécies, entre espécies e de ecossistemas.
Rafael de Paiva Salomão explica que, "em outras palavras, a
diversidade biológica refere-se à variedade de vida sobre o planeta (flora,
fauna e microorganismos)" 7, bem como às diversas comunidades humanas
existentes nestes ecossistemas.
No âmbito nacional, conforme assinalou Guilherme Purvin de
Figueiredo, vigiam desde 1521 as Ordenações Manuelinas, que continham
algumas
disposições
de
caráter
protecionista.
Prossegue
o
autor
relembrando que em 1830 foi promulgado o Código Criminal que estabelecia
6
VARELLA, Marcelo Dias. Direito Internacional Econômico Ambiental. Belo Horizonte: Del
Rey, 2003, p. 24.
27
em seu artigo 178 e 257 as penas para quem efetivasse o corte ilegal de
madeiras8.
Como pode se perceber, no entanto, trata-se de legislação específica
criada dentro de um contexto casuístico de então, objetivando proteger os
interesses econômicos e não os ambientais.
É a década de 1930, porém, que ganha destaque na produção de
normas legislativas com temas ambientais mais específicos, quando surge,
no Brasil, o primeiro Código Florestal, instituído pelo Decreto 23.793, de 23
de janeiro de 1934, o primeiro Código das Águas, por meio do decreto
24.643, de 10 de julho de 1934 e o Código de Mineração, instituído pelo
decreto-lei 1.985, de 29 de janeiro 1940. Trata-se de um período de
consolidação da legislação ambiental no Brasil, conforme explica Hermann
Benjamin9:
Tirante uma ou outra providência legislativa de regência dos
recursos naturais no período colonial e Império, a tutela
legal do ambiente no Brasil tem início, de modo
fragmentário, na década de 30 do século passado, ganha
fôlego nos anos 60 e se consolida nas décadas de 80 e 90.
Já na década de 1980 os mais variados segmentos da sociedade
despertaram para a importância do meio ambiente para a sobrevivência
humana. Para Laymert Garcia dos Santos, “em meados de 1980 o
desmatamento propulsou a floresta amazônica para o centro do debate
ecológico mundial”10.
Em 31 de agosto de 1981 surge a Lei 6.938, que instituiu a Política
Nacional do Meio Ambiente e constituiu-se num marco importante da
7
SALOMÃO, Rafael de Paiva. Biodiversidade e Amazônia. Revista Ciência Hoje. Rio de Janeiro,
agosto de 2003, p.32.
8
FIGUEIREDO, Guilherme José Purvin de. A questão ambiental no direito brasileiro.ln: KISHI,
Sandra Akemi Shimada. SilVA, Solange Teles da. SOARES, Inês Virgínia Prado. (org). Desafios do
Direito Ambiental no Século XXI. Estudos em homenagem a Paulo Affonso leme Machado. São
Paulo: Malheiros, 2005, p. 489.
9
BENJAMIN, Antônio Herman. O meio ambiente na Constituição Federal de 1988 (p.363-398). In:
KISHI, Sandra Akemi Shimada. SILVA, Solange Teles da. SOARES, Inês Virgínia Prado.
(organizadores). Desafios do Direito Ambiental no Século XXI. Estudos em homenagem a Paulo
Affonso Leme Machado. São Paulo: Malheiros, 2005, p.370.
10
SANTOS, Laymert Garcia dos. Quando o conhecimento científico se torna predação hight-tech:
recurso genético e conhecimento tradicional no Brasil. In: Semear outras soluções: os caminhos da
28
legislação ambiental, fortalecendo o surgimento do Direito Ambiental no
Brasil, um dos mais novos ramos do direito. Neste sentido, João Carlos de
Carvalho Rocha destaca:
[...]o direito ambiental, em particular, não é novo apenas por dispor
juridicamente sobre fatos que até período recente eram invisíveis
para o Direito, mas por exigir uma postura metodológica
diferenciada. Neste sentido ganha relevância o caráter
interdisciplinar desse novo ramo do Direito e a contribuição direta
11
de diversas Ciências para sua conformação .
Em decorrência de todos estes movimentos históricos e sob forte
influência das organizações não governamentais, da comunidade científica e
sociedade civil organizada, começa-se a discutir o meio ambiente como um
direito fundamental.
Essa mobilização resultou num capítulo inteiramente dedicado a
questões ambientais na Constituição Federal, o qual consagra o direito de
todos os brasileiros ao meio ambiente equilibrado, considerado bem de uso
comum do povo, essencial à qualidade de vida saudável.
Como se pode observar, o estudo do direito ambiental incorpora em
seu discurso o foco principal no ser humano, uma vez que a diversidade
biológica é fonte de vida, derivando da sua manutenção e utilização uma
maior ou menor qualidade de vida.
Assim, podemos afirmar que o amadurecimento dos direitos humanos
ocorreu com a Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948,
consolidando o tema no âmbito internacional. De outro lado, a Declaração de
Estocolmo sobre o Meio Ambiente de 1972 representa para o Direito
Ambiental um marco de conscientização sobre a preservação da natureza
aliado ao direito de desenvolvimento econômico e social.
A Constituição Federal de 1988 reflete amadurecimento desse diálogo
no Brasil, consagrando como princípio fundamental da República a
biodiversidade e dos conhecimentos rivais. SANTOS, Boaventura de Souza (org). Rio de Janeiro:
Editora Civilização Brasileira, 2005, p. 140.
11
ROCHA, João Carlos de. Formação e transformação do conhecimento jurídico ambiental (p.579597).In: KISHI, Sandra Akemi Shimada. SILVA, Solange Teles da. SOARES, Inês Virgínia Prado.
29
dignidade da pessoa humana e elevando o meio ambiente ao nível maior
das leis nacionais, como bem de uso comum do povo.
A rica complexidade de direitos que foram alçados ao nível
constitucional fez emergir pontos comuns entre os diferentes movimentos
sociais,
como,
por
exemplo,
movimentos
de
direitos
humanos,
ambientalistas, indígenas, etc.
Nas palavras de Carlos Frederico Marés de Souza Filho, foi nesse
momento que os integrantes de movimentos indígenas uniram-se a
ambientalistas ampliando o horizonte dos direitos coletivos indígenas para
sua verdadeira dimensão: “direito dos povos, direito das diferenças, ao
mesmo tempo em que ampliasse a idéia de proteção ambiental, retirado dela
o aspecto negativista, anti-humano, para dar-lhe um sentido de direito
coletivo dos povos”.
Surgiu, assim, o socioambientalismo e o direito socioambiental, ponto
de partida para uma releitura contemporânea e uma interpretação sistêmica
dos “novos direitos” emergentes do texto constitucional, evidenciando a
interdependência existente entre meio ambiente, cultura, desenvolvimento
sustentável, povos indígenas, dignidade da pessoa humana, função social,
direitos humanos e direito ao desenvolvimento nos seus vários aspectos,
abrindo espaço para falarmos em direitos da sociobiodiversidade.
2. A DEFINIÇÃO JURÍDICA DE MEIO AMBIENTE
O direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado
como um fator essencial à sadia qualidade de vida já está consolidado no
ordenamento jurídico pátrio. Decorridos mais de vinte anos da promulgação
da Constituição Federal de 1988, pode-se afirmar que o capítulo que trata do
meio ambiente constitui-se no principal referencial jurídico acerca do tema.
O Direito Ambiental funda-se na lógica da defesa da vida humana
como escopo maior, uma vez que preservar o meio ambiente em que
(organizadores). Desafios do Direito Ambiental no Século XXI. Estudos em homenagem a Paulo
Affonso Leme Machado. São Paulo: Malheiros, 2005, p.586.
30
vivemos para as gerações presentes e futuras significa assegurar a
manutenção das condições de existência humana.
A relação do direito à vida com o direito ao meio ambiente sadio é
facilmente exemplificada na qualidade da água para consumo, no ar afetado
pela poluição, na biosegurança e manipulação genética para produzir
alimentos, etc.
Em muitos lugares do planeta já não existe água apropriada para o
consumo humano e, mesmo no Brasil, onde estão localizadas as maiores
bacias hidrográficas do mundo, ainda existem pessoas sem acesso à água
potável e com graves problemas de saúde em razão disso.
Evidencia-se, pois, que o direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado não implica apenas em manutenção das condições de vida
humana, mas, igualmente importante, em garantir que a fruição coletiva dos
bens ambientais possa estar ao alcance da coletividade, conferindo eficácia
ao princípio da dignidade da pessoa humana.
Tal acesso aos bens ambientais que compõem a biodiversidade
brasileira e que asseguram uma sadia qualidade de vida é visto por Paulo de
Bessa Antunes como um direito humano fundamental. Vejamos:
No regime constitucional brasileiro, o próprio caput do artigo 225
da Constituição Federal impõe a conclusão de que o Direito
Ambiental é um dos direitos humanos fundamentais. Assim é
porque o meio ambiente é considerado um bem de uso comum
do povo e essencial à sadia qualidade de vida. Isto faz com que o
meio ambiente e os bens ambientais integrem-se à categoria
jurídica da res comune omnium. Daí decorre que os bens
ambientais - estejam submetidos ao domínio público ou privado 12
são considerados interesse comum .
Na mesma linha de raciocínio, Sando Nahmias Melo afirma que o
direito à vida tem recebido tratamento amplo, de onde deriva a concepção
do direito ao meio ambiente como extensão do direito à vida, uma vez que
este não se restringe apenas a idéia de não morrer, mas sim de viver com
12
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2006, p. 19.
31
qualidade e dignidade, aspectos inseparáveis do meio ambiente saudável13.
Assim, sem pretender estabelecer definições e conceitos de forma
absoluta, uma vez que os mesmos estão numa constante e dinâmica
construção epistemológica e social, entendemos por meio ambiente o
complexo
de
elementos
que
possibilitam
a
existência
humana,
compreendendo a relação do ser humano com a natureza que o cerca nos
aspectos físico, químico, biológico, cultural e espiritual, onde a referência
central deve ser sempre o ser humano.
Em sentido semelhante, para Cristiane Derani o meio ambiente deixase conceituar como um espaço onde se encontram os recursos naturais,
inclusive
aqueles
já
reproduzidos
(transformados)
ou
degenerados
(poluídos) como no caso do meio ambiente urbano14.
O legislador, por sua vez, definiu meio ambiente na Lei da Política
Nacional do Meio Ambiente17, Lei nº. 6.938, de agosto 1981, como o
conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química
e biológica, que abriga todas as formas de vida.
A definição de meio ambiente, contudo, tem gerado polêmica na
teoria do direito. Para Celso Fiorillo a expressão meio ambiente é
redundante, em razão de ambiente já trazer em seu conteúdo a idéia de
âmbito que circunda, sendo desnecessária a complementação pela palavra
meio15.
Para José Afonso da Silva a palavra ambiente indica a esfera, o
círculo, o âmbito que nos cerca, em que vivemos. Em certo sentido,
portanto, nela já se contém o sentido da palavra meio. Para o autor, até se
pode reconhecer que na expressão meio ambiente se denota certa
redundância, advertida por Ramón Martín Mateo, ao observar que se utiliza
decididamente a rubrica Derecho Ambiental em vez de Derecho dei Medio
Ambiente, abandonando uma prática lingüística pouco ortodoxa que utiliza
13
MELO, Sandro Nahmias. Meio Ambiente do Trabalho – Direito Fundamental. São Paulo, LTR
Editora, 2001, p. 114.
14
DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. 2. ed. rev. São Paulo: Max Limonad, 2001, p.
74-75.
32
cumulativamente expressões sinônimas ou, ao menos, redundantes, no que
incide o próprio legislador16.
Em contraposição à suposta redundância manifestada nas opiniões
acima, Osório Fonseca diverge, explicando que:
A expressão meio ambiente, não é um termo redundante [ ... ]
Essa expressão insere a palavra meio com a conotação
geométrica de volume, superfície ou área, sugerindo a existência
de um objeto de referência. Adicionalmente, a palavra ambiente,
que compõe a expressão, tem origem na preposição latina amb
que quer dizer ao redor, à volta, e no verbo ire que significa ir, e
de cuja conjunção resultou o termo ambire que expressa a idéia
de ir ou estar à volta de um determinado elemento, figurando uma
referência espacial.
Ainda, segundo o autor, ao fazer menção à expressão meio ambiente,
o referencial geométrico é a natureza e o entorno complexo, mas a
referência essencial é o homem que está inserido, cercado, envolvido, como
ser concreto, como objetivo central do meio e que deve ser o alvo principal
dos programas de governo.
Concordamos com a posição acima exposta, pois não podemos
perder de vista o ser humano como referência essencial neste contexto.
Em sentido complementar, Cristiane Derani afirma que é importante
“ressaltar que esse conceito de meio ambiente não se reduz a ar, água,
terra, mas deve ser definido como o conjunto das condições de existência
humana, que integra e influencia o relacionamento entre os homens, sua
saúde e seu desenvolvimento"17.
Tal análise torna-se necessária não apenas para fins de conceituação,
mas, principalmente, para entendermos a complexa relação do ser humano
com o meio ambiente. Em decorrência desta relação resultou a construção
do meio ambiente ecologicamente equilibrado como um direito fundamental.
15
FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 5ª ed. São Paulo,
Editora Saraiva, 2004. P.19.
16
SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p.
19
17
DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. 2. ed. rev. São Paulo: Max Limonad, 2001, p.
33
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Assim, percebe-se que em que pese toda a legislação existente
acerca da proteção do meio ambiente, a Constituição Federal de 1988
constitui-se no grande referencial teórico do direito ambiental, uma vez que
marca a transição do direito ambiental para o socioambiental, trazendo a
preocupação da proteção ambiental para as gerações presentes e futuras,
no intuito de preocupar-se com a qualidade de vida humana.
A
conceituação
jurídica
de
meio
ambiente
foi
apresentada
formalmente em 1981, na Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (6.938),
tendo evoluído na doutrina e inclusive gerado polêmica.
No entanto, por mais que a teoria jurídica tente conceituar o meio
ambiente, a complexidade da realidade sempre esta à frente da definição,
ocasionando novas discussões teóricas que apontam os caminhos para
onde o direito ambiental seguirá.
De qualquer forma, a definição legal trazida em 1981 possui sua
importância na medida em que facilita aos operadores do direito delimitar na
prática os espaços de atuação e resolução dos conflitos, uma vez que o
meio ambiente passa a ser de responsabilidade de todos, nos termos da lei
maior do país.
REFERÊNCIAS
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. Rio de Janeiro: Editora Lumen
Juris, 2006.
AZEVEDO, Plauto Faraco de. Ecocivilização: ambiente e direito no limiar da
vida. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005.
BENJAMIN, Antônio Herman. O meio ambiente na Constituição Federal de 1988
(p.363-398). In: KISHI, Sandra Akemi Shimada. SILVA, Solange Teles da. SOARES,
Inês Virgínia Prado. (organizadores). Desafios do Direito Ambiental no Século
XXI. Estudos em homenagem a Paulo Affonso Leme Machado. São Paulo:
74-75.
34
Malheiros, 2005.
DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. 2. ed. rev. São Paulo: Max
Limonad, 2001.
FIGUEIREDO, Guilherme José Purvin de. A questão ambiental no direito
brasileiro.ln: KISHI, Sandra Akemi Shimada. SilVA, Solange Teles da. SOARES,
Inês Virgínia Prado. (org). Desafios do Direito Ambiental no Século XXI. Estudos
em homenagem a Paulo Affonso leme Machado. São Paulo: Malheiros, 2005.
FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 5ª ed.
São Paulo, Editora Saraiva, 2004.
MELO, Sandro Nahmias. Meio Ambiente do Trabalho – Direito Fundamental. São
Paulo, LTR Editora, 2001.
ROCHA, João Carlos de. Formação e transformação do conhecimento jurídico
ambiental (p.579-597).In: KISHI, Sandra Akemi Shimada. SILVA, Solange Teles da.
SALOMÃO, Rafael de Paiva. Biodiversidade e Amazônia. Revista Ciência Hoje.
Rio de Janeiro, agosto de 2003.
SANTOS, Laymert Garcia dos. Quando o conhecimento científico se torna
predação hight-tech: recurso genético e conhecimento tradicional no Brasil. In:
Semear
outras
soluções:
os
caminhos
da
biodiversidade
e
dos
conhecimentos rivais. SANTOS, Boaventura de Souza (org). Rio de Janeiro:
Editora Civilização Brasileira, 2005.
SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. 5. ed. São Paulo:
Malheiros, 2004.
SOARES, Inês Virgínia Prado. (organizadores). Desafios do Direito Ambiental no
Século XXI. Estudos em homenagem a Paulo Affonso Leme Machado. São Paulo:
Malheiros, 2005.
STEFANELLO, Alaim Giovani Fortes. Diálogos entre direitos humanos,
sociobiodiversidade e propriedade intelectual. In: Revista Veredas de Direito
Ambiental e Desenvolvimento Sustentável. Belo Horizonte, v.7, n. 13/14, 2010.
VARELLA, Marcelo Dias. Direito Internacional Econômico Ambiental. Belo
Horizonte: Del Rey, 2003.
CONSERVAÇÃO DO SISTEMA FAXINAL: UMA QUESTÃO DE
35
POLÍTICA PÚBLICA
Eliane Crestiane Lupepsa Costenaro
Mestranda em História Cultural – Unicentro
Ciências Sociais – FG
RESUMO: Este artigo foi elaborado com o objetivo de analisar de que modo a
Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades
Tradicionais – PNPCT veio a contribuir na reafirmação de identidade dos
faxinalenses, que passaram a ser considerados como povos tradicionais e se de
fato tal política corresponde ao propósito de permanência do sistema faxinal. São
consideradas as questões concernentes às relações de organização social e
identidade nos territórios denominados faxinais. As discussões que norteiam este
estudo se referem, sobretudo, às de ordem cultural e política. Pretende-se
compreender a organização social e a identidade, especialmente, no Faxinal
Marcondes Almeida França, localizado em Prudentópolis (PR) e no âmbito das
políticas públicas, analisar a medida de efetivação da democracia participativa em
prol da preservação destes povos.
Palavras-chave: Identidade. Território. Faxinal. Prudentópolis.
INTRODUÇÃO
Este texto diz respeito a um estudo elaborado com o objetivo de se
compreender como se deu o processo de inserção dos faxinalenses na
esfera das políticas públicas e a repercussão disso na qualidade de vida
desses povos, bem como, na organização social e reafirmação de sua
identidade. Para esta pesquisa, priorizou-se o Faxinal Marcondes Almeida
França, localizado na Colônia de Jesuino Marcondes, interior do município
de Prudentópolis (PR). Tal objetivo não poderia ser pretendido sem que se
estabelecesse e definisse alguns conceitos, como o de território e
identidade. Porém, primeiramente é necessário explicitar o que se entende
por Faxinal e a noção de política pública aqui empregada.
O faxinal possui características próprias que o diferenciam. As terras
de criar são separadas das terras de plantar por cercas.
“A cerca de
madeira lascada, principalmente a imbuia e o pinheiro constituem a
“tecnologia” utilizada para a construção e manutenção dos cercamentos nos
36
faxinais” (LUPEPSA, 2008, p. 195). Além disso, o faxinal pode ser entendido
pelo seu sistema. De acordo com o artigo 1º do Decreto Estadual de 1997,
entende-se por Sistema Faxinal:
O sistema de produção camponês tradicional, característico da
região Centro-Sul do Paraná, que tem como traço marcante o uso
coletivo da terra para produção animal e a conservação ambiental.
Fundamenta-se na integração de três componentes: a) produção
animal coletiva, à solta, através dos criadouros comunitários; b)
produção agrícola - policultura alimentar de subsistência para
consumo e comercialização; c) extrativismo florestal de baixo
impacto – manejo de erva-mate, araucária e outras espécies
nativas (DECRETO 3446, 1997).
É importante ressaltar que o sistema Faxinal possui um princípio de
produção próprio, de caráter sustentável. Para Chang (1985), o sistema
faxinal tem vários componentes, dentre eles, a produção animal, por meio da
criação doméstica, em que os animais são utilizados tanto para o trabalho,
quanto para o consumo próprio, na técnica "à solta" em criadouros comuns.
Dentre os animais destacam-se os eqüinos, suínos, caprinos e as aves
domésticas. Ainda há as lavouras de subsistência circunvizinhas ao
criadouro, destacando-se o milho, feijão, arroz, batata e a cebola e; a coleta
da erva-mate, que desempenha um papel de renda complementar. Hoje,
pode-se dizer que o fumo desempenha melhor este papel do que a ervamate.
A forma de organização faxinalense é destacada “pelo seu caráter
coletivo no uso da terra para a produção animal. A instância do comunal é
consubstanciada,
nesse
sistema,
em
forma
de
criadouro
comum”
(DECRETO, 1997). Criadouro este que ilustra o uso do espaço e contribui
para a configuração do território faxinalense. A compra constante das suas
extensões de terras por proprietários acabou por comprometer a
abrangência territorial, eminentemente moldada pelo Sistema Faxinal.
Nestes
termos,
entende-se
que
esta
conformidade
desse
sistema
caracteriza-se pelo uso comunitário do espaço por todos os faxinalenses que
ali vivem, sem que necessariamente devam ser proprietários legais. Assim, é
fácil que esta conformidade abale-se e a estrutura do Faxinal seja afetada
37
internamente.
A partir da perspectiva das políticas públicas, tem-se maior destaque
a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e
Comunidades Tradicionais – PNPCT. Instituída pelo Decreto Nº 6.040, de 07
de Fevereiro de 2007 - DOU 08.02.2007. De acordo com este Decreto que a
instituiu, seu objetivo geral é o de promover o desenvolvimento sustentável
dos Povos e Comunidades Tradicionais, com ênfase no reconhecimento,
fortalecimento e garantia dos seus direitos territoriais, sociais, ambientais,
econômicos e culturais, com respeito e valorização à sua identidade, suas
formas de organização e suas instituições. O setor social que mais lutou em
prol dessa política de amparo a esses povos denominados tradicionais se
trata principalmente dos próprios faxinalenses, quilombolas e indígenas,
enquadrados nessa categoria, denominada “tradicional”. Com vistas a
envolverem-se com a organização da questão de terras e das condições de
vida dos faxinalenses, órgãos governamentais e não governamentais
também interferiram. Como exemplo houve a criação da “Rede Faxinal”
criada em julho de 2004 para atuar na defesa e promoção das terras e povos
do Faxinal. Esta rede envolve órgãos do governo, de instituições de ensino e
de organizações não governamentais.
Não obstante, é importante destacar a noção de política pública aqui
empregada. Compartilha-se da definição de Di Giovanni, para ele:
A política pública como uma forma, contemporânea de exercício
do poder nas sociedades democráticas, resultante de uma
complexa interação entre o Estado e a sociedade, entendida aqui
num sentido amplo, que inclui as relações sociais travadas
também no campo da economia. Penso, também, que é
exatamente nessa interação que se definem as situações sociais
consideradas problemáticas, bem como as formas, os conteúdos,
os meios, os sentidos e as modalidades de intervenção estatal (DI
GIOVANI, 2009, p. 3).
Isso implica considerar que uma política pública não se restringe
meramente a intervenção do Estado numa situação problemática. De acordo
com Pereira (2008), “implica, simultaneamente, intervenção do Estado,
envolvendo diferentes atores (governamentais e não-governamentais), seja
38
por meio de demandas, suportes ou apoios, seja mediante o controle
democrático já referido” (p. 96).
A política pública corresponde, portanto, a uma forma de interação
entre o Estado e a sociedade, nesse sentido, compete às organizações
governamentais e não governamentais em conjunto com os faxinalenses
constituírem
planos
de
desenvolvimento,
fóruns
e
comissões
organizacionais, como instrumentos para manter tal implementação
governamental, que inclui além do amparo jurídico, uma ajuda de custo aos
faxinalenses por meio do repasse do ICMS Ecológico; garantido a partir da
implementação da PNPCT. O ICMS Ecológico trata-se de um recurso que é
repassado na forma de materiais que beneficiam as comunidades
faxinalenses, tudo dentro do plano de aplicação feito por elas. Nenhuma
comunidade recebe dinheiro, mas sim, bens materiais. Como exemplos
desses materiais têm-se auxílio financeiro para a manutenção das cercas,
mata-burros, bueiros, e outras atividades que têm sido oferecidas aos
faxinalenses como inseminação artificial aos animais, cursos, reativação de
viveiros na comunidade.
Em Prudentópolis, “todos os faxinais possuem representantes eleitos
pela comunidade que fazem a ligação entre a secretaria do meio ambiente e
os faxinalenses” (JORNAL PRESERVAÇÃO, nov. 2006). A idéia é que todos
os faxinais constituam conselhos devidamente registrados, com normas a
serem seguidas. O sentido de política pública, aqui empregado pode
associar-se à noção de Democracia, sobretudo a participativa. A palavra
“Democracia” possui uma carga valorativa significativa, sendo utilizada como
sinônimo de “bem estar coletivo”, como um mundo ideal construído com a
participação de todos, para uma harmoniosa “justiça social”. Democracia
trata-se de um conceito histórico, e dependendo do grau de participação do
povo e do objetivo do Estado, este terá uma denominação e a Democracia
será exercida em maior ou menor grau. De acordo com Furrer (2006), a
Democracia Participativa, utiliza-se de mecanismos que proporcionam ao
povo um engajamento nas questões políticas. Ela também legitima questões
de relevância para a comunidade, através de uma participação direta, seja
39
pela iniciativa popular, audiência pública, consultas ou qualquer outra forma
de manifestação popular.
No caso do Faxinal Marcondes Almeida França – Prudentópolis (PR),
a luta em defesa do sistema se sustenta pelos faxinalenses que perfazem
quarenta e uma famílias permanentes nas áreas do Faxinal integradas. Na
década de 1980 a área do criadouro comum abrangia aproximadamente 200
alqueires, incluindo a área de Jesuíno Marcondes. Em 2007, um
levantamento da Secretaria Municipal do Meio Ambiente aponta 53,5
alqueires destinados ao criadouro comum, o que indica uma considerável
diminuição desta área.
Antes de discorrer a cerca da organização social do Faxinal
Marcondes Almeida França cumpre-se destacar a localização do município
de Prudentópolis, bem como, ressaltar alguns aspectos históricos de seu
povoamento, inclusive da região em questão. O processo de povoamento é
fortemente associado ao contexto da imigração em fins do século XIX.
Prudentópolis ocupa uma área de aproximadamente 2.308 km², localizandose ao lado da BR-373 entre Ponta Grossa e Guarapuava, no Paraná (IBGE,
2010).
Em fins do século XIX milhares de ucranianos transferem-se para o
Brasil fixando-se, sobretudo, no Estado do Paraná. A respeito desse
contexto, marcado pelas ondas imigratórias, Andreazza (1999) considera
que existem fatores de atração e repulsão que contribuíram para a condução
destes imigrantes ao Brasil. “De atração desenvolvida nos locais de adoção
dos emigrados e repulsão, gerada pelas nuanças conjunturais dos países de
onde se deslocam os imigrantes” (p. 44). Dentre estes dois fatores, pode-se
destacar
a
decadência
do
sistema
escravista,
a
necessidade
de
trabalhadores livres para as lavouras no Brasil e os conflitos internos no
continente europeu. O auge do processo imigratório ocorreu em 1895
(ZAROSKI, 2001). O principal aspecto que contribuiu para a vinda desses
imigrantes ao Brasil refere-se à política imigratória com o intuito de substituir
a mão de obra escrava e ocupar os territórios brasileiros, sob a afirmativa,
por parte do Governo, de estarem vazios inabitáveis. Sobre a política
40
imigratória, de acordo com (BURKO, s/d), em 1890 foi regulada a entrada
dos imigrantes e a eles distribuídos lotes de terras nas colônias
estabelecidas pelo Governo Federal, de acordo com as administrações
estaduais.
No século XIX, as características do Paraná apresentavam-se
vinculadas a uma baixa densidade demográfica. Também havia o argumento
político favorável à imigração, referente à necessidade de diversificar a
produção que era baseada no tropeirismo, madeira e erva-mate, para não se
correr o risco de haver uma crise de abastecimento de alimentos. “A
distribuição de pequenos lotes aos imigrantes, formando colônias próximas,
favoreceu a formação de uma nova classe social, a de pequenos
proprietários de terras” (BATISTA, 2009, p. 32). Além disso, de acordo com
Hanicz (2010), ao receberem esses lotes os ucranianos passaram a
demarcar seus limites territoriais e simbólicos, o que pressupunha a
organização das propriedades, do mundo religioso e cultural. “É no interior
desse espaço que o imigrante vai viver a sua religião, falar a língua materna,
preparar alimentos da culinária tradicional, ornamentar a casa com os seus
santos e decorá-la com elementos de sua cultura” (p. 4). Em Prudentópolis
os imigrantes ucranianos chegaram num número significativo, sobretudo, em
1896 e 1897 sendo que a maioria dos cerca de 20 mil que chegaram seguiu
para os arredores de Curitiba, Prudentópolis e Marechal Mallet. Atualmente,
boa parte da população prudentopolitana é descendente de ucranianos,
pois, mesmo em 1995 há afirmativas dessa informação: “Comunidades
ucranianas são encontradas em cidades como Prudentópolis (75% da
população), Curitiba, Apucarana, Guarapuava, Dorizon, Ivaí, Irati, Pato
branco (BOLETIM ROMÁRIO MARTINS, 1995, p. 12). Nesse contexto da
colonização, a formação da Vila de Jesuíno Marcondes, assim como as
demais colônias, vincula-se a um processo de divisão de terras do Governo
aos imigrantes, sendo que uma das formas era por meio de concessão.
As
terras
do
Paraná
fazem
parte
de
uma
conjuntura
de
desmembramento e classificação feita pelas companhias colonizadoras que
aliavam os seus interesses aos anseios do Governo, já que, de acordo com
41
Andreazza (1999) no Brasil, os governos, federal e estadual autorizavam
empresas particulares a realizarem o transporte de emigrantes que,
chegados ao Rio de Janeiro, tomariam seus destinos. Além disso, “nas
colocações dos Presidentes de Província e dos Governadores do Paraná
são recorrentes posicionamentos que denotam o anseio governamental por
força de trabalho com vistas ao povoamento e desenvolvimento econômico
do território” (ANDREAZZA, 1999, p. 44). De acordo com Lupepsa (2010),
estes anseios do Governo além do interesse pela força de trabalho e pelo
povoamento, pressupunham também uma mudança na estrutura agrária.
Pode-se dizer que a imigração veio ao encontro desse planejamento político
das autoridades em substituir a estrutura agrária cabocla pela européia. “As
autoridades alimentavam a esperança de que a estrutura da agricultura
paranaense fosse modificada [...] Os colonos europeus teriam a missão de
compensar o atraso e as técnicas elementares utilizadas pelo elemento
local, ou seja, o caboclo” (CHANG, 1985, pag. 34).
Nesse contexto, em Prudentópolis, as terras foram divididas em
linhas, cada uma delas recebeu um nome, algumas em homenagem a certas
regiões principais da Europa, meses do ano e “importantes” nomes
brasileiros. Sobre tais aspectos, Zaroski (2001) afirma que, “ao longo dessas
linhas mediam-se chácaras de 10 a 12 alqueires as quais eram entregues
aos imigrantes para o desbravamento e o plantio” (p. 11).
Estas linhas
implicavam para estes imigrantes uma forma de se viver vinculada a terra e
a natureza, peculiar a eles. A colonização de Jesuíno Marcondes, onde se
situa o Faxinal Marcondes Almeida França, iniciou logo após o Governo ter
comprado terras de um grande proprietário, Baldoino Antonio Pereira, e as
distribuído aos imigrantes, ainda como pressupunha a Lei de Terras, como
se pode perceber no Jornal Prácia18:
O Governo Federal deu margens ao Governo Paranaense para
comprar terras e distribuir aos imigrantes, os quais trabalhavam a
terra para tirar seu sustento e dar uma pequena contribuição ao
Governo. Como os imigrantes continuavam chegando e havia
18
Na língua ucraniana Prácia significa trabalho.
42
trinta colônias, viu-se a necessidade de comprar mais terras a
eles. Foi aí que o governo do Paraná adquiriu as terras de
Baldoino Antonio Pereira, onde atualmente se situa Jesuino
Marcondes, para distribuir a esses imigrantes. Eles derrubaram as
matas e instalaram uma vila, repartindo a terra em lotes e se
instalaram. Como ali se tornou um aglomerado maior de
imigrantes acabaram atraindo outros das colônias vizinhas, tais
como, de Rio Preto, Linha Mauricio Fravre, Visconde de
Guarapuava, Linha Nácar. Mais tarde a colônia de Jesuíno
Marcondes cresceu a ponto de dividir-se em 1ª Linha, 2ª Linha e
3ª Linha. Com o ganho dessas terras eles trabalhavam na lavoura
no cultivo de alimentos. (JORNAL PRÁCIA, dez. 2007, p. 4).
Nesta conjuntura é que se insere, em grande parte, a formação das
colônias em Prudentópolis, onde os lotes foram divididos e ocupados, e à
medida que os seus colonizadores trabalhavam nas terras as tornavam
agricultáveis numa produção de subsistência e também para o mercado
consumidor.
A maneira de integração das famílias do Faxinal Marcondes Almeida
França corresponde a uma organização social e política por meio da
Associação. Os faxinalenses possuem uma Associação desde o ano de
2004, ela representa os anseios dos faxinalenses, tais como os que
aparecem na Escritura Pública de Contrato de comprometimento com as
áreas deste Faxinal, assinada por seus integrantes em 1987. Os anseios dos
faxinalenses também indicam uma transformação na forma de organização,
baseada nos costumes, que passaram para os documentos escritos. Esta
“escritura pública” pressupõe uma tentativa para que os faxinalenses se
comprometam a continuar respeitando os mesmos costumes de seus
antepassados. Conforme segue as seis cláusulas desta escritura:
I- Os contratantes são proprietários e possuidores de várias áreas
de terras de faxinais, com um total de mais ou menos duzentos
(200) alqueires, situados na Linha Jesuino Marcondes, desta
comarca e município de Prudentópolis, Estado do Paraná. II –
Nesta data, os contratantes obrigam-se entre si a considerar suas
áreas como um criador comum, conservando as cercas, cercas
que deverão ser revisadas de seis (6) em seis (6) meses, e dessa
forma todos ficam obrigados a conservar o criador. III – Para
evitar a interferência de terceiros no criador, dando origem a
problemas contrários aos interesses da totalidade dos
contratantes, ficam os signatários deste contrato, em caso de
alguns deles resolver vender sua área, obrigados a oferecê-la aos
demais contratantes, pelo preço do comércio. Em caso de
43
dificuldade do interessado na venda em conversar com a maioria
dos contratantes sobre a transferência de sua área, deverá
explicar os motivos, oferecendo-a a todos na pessoa de Inspetor
municipal. IV – Cada um dos contratantes obriga-se por si e por
seus sucessores a não mudar o destino de suas áreas de criador
para o de cultura. V – O contratante que desobedecer às
cláusulas deste contrato ficará obrigado a responder em Juízo por
indenização. VI – Por estarem certos, combinados e contratados
assim este contrato na presença de duas testemunhas. Valor CZ$
300.000.00. Prudentópolis, 21 de agosto de 1987 (ESCRITURA
PÚBLICA DOS FAXINALENSES, 1987).
A partir da leitura deste documento percebe-se que os interesses dos
proprietários faxinalenses vão além da preocupação com a propriedade das
terras do Faxinal, implica também, numa preservação de sua cultura, ou
seja, do criadouro comum, da conservação das cercas, enfim, de um modo
de vida e trabalho baseado na organização consuetudinária em que
predomina o interesse de subsistência dos faxinalenses e do próprio
Sistema Faxinal. Além disso, este documento demonstra uma forma de
resistência, embora pouco eficiente, dos faxinalenses quando eles se
comprometem a vender suas terras para pessoas que não tenham o intuito
de “mudar o destino de suas áreas de criador para o de cultura”, cláusula
esta difícil de ser cumprida, uma vez que os interesses particulares e
econômicos mudam. “Ao planejar o território, a sociedade traça políticas de
desenvolvimento econômico, regional e também ambiental nas quais, de
modo geral, os objetivos econômicos de crescimento e sustentabilidade do
consumo, são preponderantes” (FAJARDO, 2008, p. 58). Os faxinalenses
concebem a terra do criadouro de maneira coletiva, embora ela seja até
certo ponto particular e permite, em certa medida que pessoas desprovidas
de posse da terra, também possam usufruir o espaço. O plantio das
lavouras, nas terras de plantar, pode ocorrer de maneira particular, por
membros de uma única família ou coletiva nos chamados puxirões ou
mutirões.
Entre os documentos da Associação do Faxinal Marcondes Almeida
França,
aparecem
abaixo-assinados,
explicitando
um
permanência da comunidade tradicional, conforme segue:
interesse
de
44
Nós abaixo-assinados vimos por meio deste, expor nossa
intenção coletiva de permanecermos como comunidade
tradicional na forma de um criador comunitário, conforme nossa
experiência histórica que já completa mais de 100 anos de
existência nestas terras de uso comum no município de
Prudentópolis – PR (REGISTRO DA COMISSÃO DO FAXINAL
MARCONDES ALMEIDA FRANÇA).
Ainda neste documento seguem as assinaturas dos faxinalenses. A
escritura
de
1987,
esta
certidão
e
as
comissões
constituídas
e
regulamentadas a partir do ano de 2004, indicam a preocupação com a
preservação do Faxinal, bem como, a apreensão das leis estaduais que
amparam os Faxinais, estas que compreendem as comunidades tradicionais
como,
grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como
tais, que possuem formas próprias de organização social, que
ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para
sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica,
utilizando conhecimentos, inovações e práticas geradoras e
transmitidas pela tradição. (DECRETO, 6.040, 2007).
A apreensão de tais leis e o cumprimento das obrigações nelas
previstas representam a garantia para que as famílias faxinalenses possam
usufruir dos recursos que possam ser gerados desta interação entre o
Estado e a sociedade. Percebe-se que desde o promulgamento desses
Decretos, os faxinalenses passaram a se enxergarem como povos
tradicionais e a se tornarem mais participativos na constituição de comissões
e na reivindicação de seus direitos. Isso pressupõe uma reafirmação de
identidade por parte desses povos.
Os conceitos de identidade e de território mostram-se pertinentes para
auxiliar na compreensão do sentimento de pertencimento dos faxinalenses
ao faxinal. De acordo com Pesavento:
Enquanto representação social, a identidade é uma construção
simbólica de sentido, que organiza um sistema compreensivo a
partir da idéia de pertencimento. A identidade é uma construção
imaginária que produz a coesão social, permitindo a identificação
da parte com o todo, do indivíduo frente a uma coletividade e
estabelece a diferença (PESAVENTO, 2003, p. 90).
Houve, por outro lado, um direcionamento aos valores de grupos
45
particulares, em períodos e locais específicos. Deste modo, entram em cena
as categorias explicativas de caráter regionalizado, em que as diferenças
culturais assumem uma importância maior do que os elementos políticos e
econômicos. As interpretações e a abrangência simbólica passam a fazer
parte de um campo comum sobre o qual os pesquisadores sociais se
debruçam, propiciando também uma multiplicação dos possíveis objetos de
estudo. Isso pressupõe um jeito diferente de pensar a cultura e considerá-la
como um conjunto de significados que os homens constroem e compartilham
para explicar o mundo. As interpretações e abrangência simbólica se
inserem tanto no campo da História Cultural, como da História Social. Falcon
(2002) identifica o momento de aproximação desses dois campos a partir da
década de 1970, contexto caracterizado pela divulgação de novas
abordagens e concepções teóricas que contribuíram significativamente para
o surgimento de novas orientações associadas à cultura.
Essas novas orientações voltadas para o cultural decorreram em
boa medida das questões propostas, a partir das premissas muito
diferentes entre si, por autores como Foucalt e Thompson. Esse
último, sobretudo, mais ligado ao grupo de historiadores marxistas
ingleses voltados para a História Social, sublinhou a importância
dos elementos culturais como constitutivos, essenciais da própria
realidade social [...] À ampliação do conceito de História Cultural
correspondeu quase simetricamente, a do conceito de História
Social [...] Nesse novo panorama, marcado pela preeminência do
social e do cultural, existem certamente muitas questões ainda
pendentes, sobretudo as novas abordagens e os novos objetos,
mas acima de tudo os novos problemas. (FALCON, 2002, ps. 1214)
É na esfera do cultural e do social que se pode situar este estudo,
considerando como objeto principal, o Faxinal Marcondes Almeida França. O
fato desse faxinal comportar marcas que suscitam sentimento de
pertencimento, portanto, identidade, permite com que o espaço se organize
e funcione tal qual um ambiente propício onde um determinado grupo social
pode criar e utilizar, segundo suas intenções e necessidades, um variado
conjunto de representações e imagens que lhes possibilite formar para si e
para os outros uma identidade também atrelada ao território.
46
Ambos os conceitos, territorialidade e identidade podem aplicar-se
ao indivíduo ou ao conjunto social e são, portanto, suscetíveis de
analisar-se em diferentes escalas – local, regional, nacional. Podese analisá-las em termos de continuidade ou descontinuidade
espacial [...] O sentido de pertença, de identidade regional, de
tomada de consciência regional define a territorialidade regional.
Tais conceitos permitem definir: territórios de identidade, territórios
de pertença, terrritórios de referência e territórios de ação
(SANTOS, 2006, p. 262)
Os faxinalenses encontram-se inseridos em seu território de pertença
e procuram organizá-lo de acordo com os seus interesses. Os conceitos de
identidade e de território que auxiliam na compreensão da relação dos
indivíduos com o seu espaço de pertencimento, foram inseridos no contexto
atual por estudiosos como Araujo e Haesbaerth:
Se na atualidade, a estrutura de construção identitária muda pela
explosão da autonomia das esferas culturais, as idéias de EstadoNação, de classe e de indivíduo, matrizes identitárias do mundo
moderno, se redefinem ou perdem parte dos papéis que antes
exerciam. A idéia de Estado-Nação é posta em questão, por um
lado, em conseqüência da perda do poder de gestão interna e de
representação dos Estados, com o transpassamento de suas
fronteiras territoriais pelos fluxos econômicos e informacionais; e,
por outro, pela reconstrução de tradições étnicas, numa lógica que
opera sob a tensão da afirmação da diferença e da
homogenização, mas que, mesmo por vezes apropriada como
estratégia de resistência [...] Juntamente com
essa
problematização da idéia de Estado-Nação, entra também em
debate uma determinada cncepção de território, moldada pela
continuidade e pela fixidez, e por relações definidas e estáveis
com grupos identitários ou instâncias de poder (ARAÚJO e
HAESBAERTH, 2007, os. 9-10).
As questões referentes aos faxinais foram, em boa medida, geradoras
de conflitos, sobretudo em virtude da disparidade das opiniões referentes à
preservação ou abolição do sistema. A partir do momento em que os
conflitos por terras e que as lutas em prol do reconhecimento dos povos
tradicionais, tornou-se constante, surge a PNPCT que soa como um direito
conquistado pelos faxinalenses, como um avanço significativo para a
preservação de sua cultura.
De acordo com o Decreto que instituiu a PNPCT, seu objetivo geral é
o de promover o desenvolvimento sustentável dos Povos e Comunidades
Tradicionais, com ênfase no reconhecimento, fortalecimento e garantia dos
47
seus direitos territoriais, sociais, ambientais, econômicos e culturais, com
respeito e valorização à sua identidade, suas formas de organização e suas
instituições. A PNPCT é fruto de um processo de tentativa de garantias aos
faxinalenses que se iniciou em tempos ainda remotos, no caso do Faxinal
Marcondes Almeida França, sua tentativa remonta à década de 1980, como
demonstra a Escritura Pública de Contrato, recém citada. Contudo, no
âmbito democrático, pode-se afirmar que este processo só teve início por
meio de Decretos, inicialmente com a criação das Áreas Especiais de Uso
Regulamentado – ARESUR, em 199719. De acordo com os artigos desse
Decreto, estas áreas especiais abrangem porções territoriais do Estado
caracterizadas pela existência do modo de produção denominado "Sistema
Faxinal", com o objetivo de criar condições para a melhoria da qualidade de
vida das comunidades residentes e a manutenção do seu patrimônio
cultural, conciliando as atividades agrosilvopastoris com a conservação
ambiental, incluindo a proteção da araucária.
Posterior a este Decreto é instituído outro,20 que altera a
denominação, competência e composição da Comissão Nacional de
Desenvolvimento Sustentável das Comunidades Tradicionais e dá outras
providências. Neste aparecem as disposições dessa Comissão, já instituída
em 27 de dezembro de 2004. A ela compete coordenar e acompanhar a
implementação PNPCT e zelar pelo seu pleno funcionamento por meio de
ações necessárias para a articulação, execução e consolidação de políticas
relevantes para o desenvolvimento sustentável de povos e comunidades
tradicionais, estimulando a execução destas ações e a participação da
sociedade civil.
Estes decretos e a instituição da PNPCT representam a garantia do
cumprimento de ações favoráveis à preservação dos faxinais, modo de
organização
familiar
típico
da
região
Centro-sul
do
Paraná.
Em
contrapartida, cumpre aos faxinalenses organizarem-se por meio da
constituição de uma Associação, de comissões, de meios organizacionais e
19
Decreto nº 3446 - 14/08/1997. Publicado no Diário Oficial Nº 5067 de 14/08/1997.
48
legais que abranjam seus anseios e o cumprimento da aplicação de recursos
à comunidade. Na perspectiva da política pública, esta trama suscita a
interação complexa do Estado com a sociedade, aqui no caso, representada
pelos faxinalenses.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir do momento em que surgiu esta interação, entre o Estado e
os faxinalenses, os faxinais adquiriram auxílio financeiro, o ICMS Ecológico
é o melhor exemplo disso. Pode-se afirmar que a reafirmação de identidade
dos faxinalenses teve um grau significativo de contribuição da PNPCT, pois,
logo após a sua implementação, os faxinalenses passaram a se enxergar
como povos tradicionais e adquiriram uma postura ainda mais participativa,
podendo ser associada à noção de Democracia participativa.
O faxinal é, portanto, marcado pela utilização e responsabilidade
coletiva do que nele existir, principalmente as cercas e os animais. Restringir
esta marca implica em comprometer o caráter do Faxinal. Deste modo, “os
atores se vêem confrontados com necessidades que passam pela defesa de
um território, enquanto expressão da manutenção de um modo de vida, de
recursos vitais para a sobrevivência do grupo, de uma identidade ou de
liberdade de ação” (SOUZA, 2001, os. 109-110). Nestes termos, o que é vital
para os faxinalenses é poder soltar animais e até plantar na terra que não é
legalmente sua, é poder usufruir a mata, apanhando seus frutos e a lenha
disponível, além disso, todos podem compartilhar da mesma fonte de água,
já que saneamento básico é precário e em certas localidades simplesmente
não há.
A organização social sobre a área do Faxinal Marcondes Almeida
França evidencia-se nas tentativas dos faxinalenses em manter o criadouro
comunitário e isso se expressa também nos documentos da Associação do
Faxinal. O criadouro representa a principal característica do espaço e do
20
Decreto de 13 de julho de 2006.
49
grupo e isso se reflete na clara tentativa de conservação do mesmo e no
respeito atribuído aos animais deste criadouro. Para isso a Associação do
Faxinal exerce um papel: “A Associação ajuda pra gente ser sempre unido,
arrumar cercas, cuidar melhor dos bichos, mais pra manter o Faxinal
mesmo, mas pra outra coisa não serve” (ATA DA ASSOCIAÇÃO, 2007). A
intenção de se manter o Faxinal, ainda que por meio de normas facilmente
passíveis de serem ou não cumpridas, reforça o sentido de pertencimento
deste grupo que prioriza a vida faxinalense, ainda que de maneira
sustentável, praticando uma agricultura de subsistência e tentando explorar
os recursos, mesmo ínfimos, que o espaço pode oferecer.
REFERÊNCIAS
ANDREAZZA, Maria Luiza. O paraíso das delícias: um estudo da imigração
ucraniana 1895-1995. Curitiba: Aos Quatro Ventos, 1999.
ARAUJO, Frederico G. Bandeira de, HAESBAERTH, Rogério. (Orgs). Identidades
e territórios: Questões e olhares contemporâneos. Rio de Janeiro: Access, 2007.
BATISTA, Fábio Domingos; Imaguire, Marialba Rocha Gaspar; Corrêa, Sandra
Rafaela Magalhães. Igrejas ucranianas: arquitetura da imigração no Paraná.
Curitiba: Instituto Arquibrasil/Petrobrás Cultural, 2009.
BURKO, P. Valdomiro N. (OSBM – Ordem de São Basílio Magno) A imigração
ucraniana no Brasil. 2ª ed., Curitiba, s/e.
CHANG, M. Y. Sistema Faxinal: Uma Forma de Organização Camponesa em
Desagregação no Centro-Sul do Paraná. (Dissertação de Mestrado de economia).
UFRRJ. Rio de Janeiro, 1985.
DI GIOVANNI, Geraldo. As estruturas elementares das políticas públicas. Caderno
de pesquisa Nº 82, Unicamp: NEEP, 2009.
FAJARDO,
Sergio.
Territorialidades
corporativas
no
rural
paranaense.
Guarapuava: Unicentro, 2008.
FALCON, Francisco José Calazans. História cultural: uma visão sobre a
sociedade e a cultura. Rio de Janeiro: Campus, 2002.
HORBATIUK, Paulo. Imigração Ucraniana no Paraná. Porto Alegre, 1983.
LUPEPSA, Eliane Crestiane. Práticas culturais de imigrantes ucranianos. In:
50
SOCHODOLAK, Hélio e CAMPIGOTO, José Adilçon (Orgs.). Estudos em História
Cultural na Região Sul do Paraná. Guarapuava: Unicentro, 2008.
PEREIRA, Potyara Amazoneida. Discussões conceituais sobre política social como
política pública e direito de cidadania. In: Política social no capitalismo:
tendências contemporâneas. Ivanete Boschetti et all (orgs.) São Paulo: Cortez,
2008.
PESAVENTO, Sandra Jatahy. História e história cultural. Belo Horizonte:
Autêntica, 2003.
SOUZA, Marcelo José Lopes de. O território sobre espaço e poder, autonomia e
desenvolvimento. In: CASTRO, Iná Elias, GOMES, Paulo C. C. e CORRÊA,
Roberto Lobato (Orgs.). Geografia: conceitos e temas. Rio de Janeiro: Bertrand,
Brasil, 2001.
ZAROSKI, Nelson Gilmar. A utilização do tempo pelos imigrantes ucranianos
de
Prudentópolis
1940-1960.
Curitiba,
2001.
(Monografia
de
História),
Universidade Federal do Paraná.
SITOGRAFIA
BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE): Banco de dados.
Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/htm1>. Acesso em: 03/09/2011.
FURRER,
Luiz
Ernesto.
Democracia
não
participativa.
Disponível
em:
<http://www.
advogado.adv.br/artigos/2006/luizernestofurrer/democracianaoparticipativa.
htm>.
Acesso em: 05/08/2011.
REDE
FAXINAL.
Disponível
em:
http://redefaxinal.tripod.com.
Acesso
em:
07/07/2011.
OUTRAS FONTES
ATA DA ASSOCIAÇÃO DO FAXINAL MARCONDES ALMEIDA FRANÇA, 2007.
BOLETIM INFORMATIVO DA CASA ROMÁRIO MARTINS. In: BORUSZENKO,
Oksana. Os Ucranianos. 22. ed. Curitiba: Fundação Cultural de Curitiba, v.22,
n.108, out. 1995.
DECRETO 3446 – 14/08/1997. Publicado no Diário Oficial Nº 5067.
DECRETO de 13 de julho de 2006.
51
DECRETO Nº 6.040, de 07 de Fevereiro de 2007 - DOU 08.02.2007.
ESCRITURA PÚBLICA DE CONTRATO DE COMPROMETIMENTO ENTRE OS
FAXINALENSES DE MARCONDES, miméo, s/e, 1987.
LUPEPSA, Eliane Crestiane; SHÖRNER, Anselmo. Organização socioespacial:
faxinalenses e agricultores Jesuíno Marcondes, Prudentópolis/PR (1987-2007). In:
Revista Tempo, Espaço e Linguagem (TEL), v. 1, n. 3, set./dez. 2010.
JORNAL PRÁCIA (Trabalho). - Prudentópolis – Marcondes comemorou 100
anos de sua existência. Prudentópolis, 01 a 15 de dezembro de 2007. Nº 23
(6292). Tradução Marina Denczuk.
JORNAL PRESERVAÇÃO. Um novo olhar sobre os faxinais de Prudentópolis.
Informativo da Secretaria Municipal do Meio Ambiente. Prudentópolis-PR. Ano I.
Edição nº 4. Novembro/2006.
REGISTRO DA COMISSÃO EM DEFESA DO FAXINAL MARCONDES ALMEIDA
FRANÇA, 2007.
Figura 1 - Sede da Associação do Faxinal Marcondes Almeida França –
Prudentópolis/PR. Fotografada em 17/02/2010.
52
A LEGISLAÇÃO AMBIENTAL FAVORECE A ADOÇÃO DE
ESTRATÉGIAS EMPRESARIAIS DE INOVAÇÃO
AMBIENTAL?
Carla Marlana Rocha
Direito - FG
Secretariado Executivo – Unicentro
Orientadora – Profª. Ms. Marlete Beatriz Maçaneiro
RESUMO: O presente trabalho procurar examinar a influência da legislação
ambiental na formulação de estratégias de inovação ambiental por parte das
empresas. Trata-se de um estudo preliminar, a partir de um levantamento teórico,
baseado na literatura e legislação/normas ambientais, decorrente do Projeto de
Iniciação Científica da Unicentro, intitulado “Estratégias de inovações ambientais:
mapeamento e análise da influência da legislação ambiental nas estruturas internas
das organizações”. Procurou-se, aqui, investigar se a legislação ambiental
influência a adoção de estratégias de inovação ambiental por parte das empresas.
Com efeito, apresentam-se um estudo sobre as estratégias ambientais e, por
conseguinte, um exame da legislação ambiental brasileira no sentido de entender a
natureza das pressões e dos estímulos a inovações ambientais. Constatando-se,
portanto, que as regulamentações não somente favorecem a implantação de
estratégias empresariais como também refletem na seara da competitividade.
Palavras-chave: Estratégias Ambientais. Legislação Brasileira. Tecnologias end-of
pipe. Tecnologia Limpa.
INTRODUÇÃO
A presente pesquisa apresenta o desenvolvimento teórico do trabalho
científico intitulado “Estratégias de inovações ambientais: mapeamento e
análise da influência da legislação ambiental nas estruturas internas das
organizações”. Esta investigação decorre do Projeto de Iniciação Científica
(IC) da Universidade Estadual do Centro-Oeste - Unicentro, financiado pela
53
Fundação Araucária.
Este trabalho tem como objetivo desvelar a influência da legislação
ambiental na incorporação de estratégias de inovação ambiental, elucidando
a legislação brasileira e algumas estratégias. Buscando assim, extrair a
interface entre as duas. Procura-se, aqui, apresentar alguns resultados
preliminares (documentais e bibliográficos) alcançados no referido projeto de
pesquisa; os dados primários (pesquisa de campo – a qual será realizada
nas empresas IBEMA e Norske Skog – ambas as indústrias de papel e
celulose) serão ainda levantados e apresentados como resultado final do
projeto de IC.
A consciência cultural da sociedade, em relação ao meio ambiente,
fez com que emanassem leis com previsões de minimização de resíduos por
parte das empresas (OLIVEIRA et al, 2007). E ainda, fez com que a própria
sociedade almeje por uma sustentabilidade, de modo que as transações
comerciais passaram a exigir o selo verde.
No cenário organizacional, tem-se vislumbrado a figura da inovação
ambiental, como diferenciais competitivos, as empresas têm se voltado a
valores relacionados à responsabilidade social e valoração de ações de
preservação do meio ambiente. Devido ao rigor das legislações que obrigam
as empresas a se adaptarem a formas de trabalhar diferente do que vinham
praticando anteriormente ou pela conscientização, as empresas não podem
mais deixar de lado tais questões (SCHENINI, 2005). Neste sentido, qual é a
influência das leis na seara das estratégias de inovações ambientais
adotadas pelas empresas?
Desta forma, a importância deste tipo de pesquisa justifica-se pela
necessidade que há na área de Secretariado Executivo em se debater temas
contemporâneos ligados às relações científicas e culturais da profissão.
Os dados preliminares apresentados nesta pesquisa são de caráter
descritivo–exploratório e de cunho qualitativo, que busca valorizar a
densidade e qualidade das informações obtidas por meio de dados
levantados (MARCONI;LAKATOS, 2010). O presente trabalho expõe
exclusivamente resultados das duas primeiras fases da pesquisa de IC
54
(documental e bibliográfica) ficando a terceira fase (pesquisa de campo)
para a conclusão do projeto.
Na primeira etapa pesquisa bibliográfica foram utilizados teorias de
Gestão Ambiental, no âmbito das estratégias de inovação, em que se
buscou elucidar as formas de adoção das mesmas. No que tange a segunda
etapa pesquisa documental, fez-se uma análise da legislação ambiental
brasileira, em que se procurou elucidar as consequências de tais previsões.
1. GESTÃO
AMBIENTAL
E
ESTRATÉGIAS
DE
INOVAÇÃO
TECNOLÓGICA
Conceitualmente, a estratégia pode ser entendida como “(...) o padrão
ou plano que integra as principais metas, políticas e seqüências de ações de
uma organização em um todo coerente.” (MINTZBERG e QUINN, 2001, p.
20). A concepção e a implementação da estratégia de inovação ambiental de
uma empresa deve levar em contar a sua organização interna (dotação,
controle e planejamento do uso dos recursos internos) e suas relações com
o meio ambiente (governos, mercados, sociedade e natureza) (ANDRADE et
al., 2003; BARBIERI, 2007).
A estratégia de inovação busca reverter os problemas ambientais em
vantagens para o negócio atual ou futuro de uma empresa com o
aproveitamento das oportunidades tecnológicas e a proteção contra as
ameaças advindas de questões ambientais existentes ou que poderão
ocorrer no futuro. E ainda, para Porter (1999), o investimento em gestão
ambiental pode reduzir os custos de produção em médio e longo prazo,
porque evita o desperdício e ineficiências no consumo de energia e
matérias-primas, além de melhorar a imagem da empresa e seus produtos
junto aos consumidores.
Na
literatura
sobre
Economia
Industrial,
a
corrente
teórica
institucionalista-shumpeteriana enfatiza a análise dinâmica ou sistêmica da
competição, cujas empresas são vistas como um organismo vivo em
permanente mutação que sofre influências (pressões) do ambiente no qual
55
está inserida, mas também é capaz de transformá-lo (mercados, indústrias e
tecnologias)
a
partir
da
introdução
de
inovações
tecnológicas
(HASENCLEVER e TIGRE, 2002).
O desenvolvimento e a adoção de inovações envolvem custos
irrecuperáveis (sunk costs) decorrentes do processo de acumulação (fluxo
contínuo de dispêndios em pesquisa e experimentação) de conhecimentos
interno e externo à empresa. A introdução de inovações tecnológicas
depende, de um lado, das formas de organização da inovação nas
empresas, em particular a coordenação interna exercida pela implementação
de estratégias de inovação, e, de outro, das formas de organização externas
adotadas pelas empresas para acessar e difundir as inovações surgidas no
ambiente tecnológico, em termos de normas técnicas e padrões de
comportamento humano. A literatura econômica reconhece que certas
normas técnicas são impostas pela regulamentação, pois nem sempre o
mercado é o agente mais eficiente para permitir uma maior harmonia entre
os interesses dos produtores e consumidores (HASENCLEVER e TIGRE,
2002).
Neste sentido, a política ambiental pode ser, ao mesmo tempo, uma
pressão e um incentivo para as empresas inovarem. No debate a respeito da
relação entre competitividade e preservação do meio ambiente, a análise
chamada “hipótese de Porter” (ANSANELLI, 2003; YOUNG e LUSTOSA,
2001), que focaliza a poluição gerada pelas empresas, torna-se uma
abordagem importante para se entender as questões relacionadas à solução
de problemas ambientais. Porter (1999), considerando a poluição gerada
pelas empresas, argumenta que a imposição de padrões ambientais pela
regulamentação
governamental
pode
representar
uma
oportunidade
(estímulo) para as empresas adotarem inovações tecnológicas, tornando-se,
assim, uma fonte importante de vantagem competitiva. As empresas
poderiam perceber nas regulamentações ambientais um desafio para
desenvolver soluções inovadoras e, portanto, melhorar sua competitividade,
haja vista que a poluição é, muitas vezes, um desperdício econômico.
Importantes benefícios, em termos de inovações tecnológicas, podem
56
ser obtidos da regulação ambiental, que são traduzidos em inovações de
processo e produto, tais como economias de materiais (reciclagem, p.e.),
aumento nos rendimentos do processo, menos paralisações, menor
consumo de água e energia, redução dos custos de armazenamento,
eliminiação/redução de atividades de descartes, redução do custo do
produto e da embalagem, maior segurança, redução do custo do descarte
pelo cliente (ANSANELLI, 2003).
Porter (1999) classifica a inovação resultante da regulação ambiental
em duas categorias: (1) tecnologias end-of-pipe (tecnologias de final de ciclo
de produção) - tecnologias que minimizam o custo de tratamento da
poluição, no final do ciclo produtivo e (2) clean techonologies (tecnologia
limpa) - tecnologias que atacam as causas básicas da poluição a partir da
melhoria dos recursos, em todo o ciclo de produção. As primeiras baseiamse na captação dos recursos incorporados na poluição e sua conversão em
algo de valor (reciclagem, melhoria de tratamento secundário, etc.),
enquanto que as segundas incluem a utilização mais eficiente de insumos
específicos, aumento do rendimento e melhorias dos produtos (substituição
de insumos, alterações no processo produtivo, menor consumo de energia,
etc.). (ANSANELLI, 2003)
Nesta perspectiva, Barbieri (2007) aponta três diferentes abordagens
pelas quais uma empresa pode enfrentar os problemas ambientais
decorrentes das suas atividades: controle de poluição, prevenção da
poluição e incorporação dessas questões na estratégia empresarial. Cada
uma dessas abordagens consistem em fases de um processo de
implementação gradual de práticas de gestão ambiental numa dada
empresa (BARBIERI, 2007) ou estratégias diferenciadas de gestão
ambiental, conforme os seus elementos estratégicos genéricos, delineados
de acordo com o setor econômico ou ramo de negócios no qual as empresas
estão agrupadas (ANDRADE et al., 2003).
Estes tipos de abordagens estão resumidamente apresentados do
Quadro 1. Dependendo da forma que a empresa aborda os problemas
ambientais, definem-se, assim, padrões distintos de comportamento das
57
empresas, em termos de soluções tecnológicas. Por exemplo, a estratégia
de “controle de poluição” caracteriza uma prática de adoção de tecnologia
end-of-pipe, enquanto a implementação de estratégia de “prevenção da
poluição” constitui uma ação típica de aplicação de tecnologias limpas em
todo o ciclo produtivo.
Quadro 1 - Gestão ambiental na empresa – Abordagens
Características
Preocupação básica
Controle da
poluição
Cumprimento da
legislação e
respostas às
pressões da
comunidade
Abordagens
Prevenção da
poluição
Uso eficiente dos
insumos
Estratégica
Competitividade
Postura típica
Reativa
Reativa e proativa
Reativa e proativa
Ações típicas
Corretivas
Uso de tecnologias
de remediação e de
controle no final do
processo (end-ofpipe)
Aplicação de
normas de
segurança
Corretivas e
preventivas
Conservação e
substituição de
insumos
Uso de tecnologias
limpas
Percepção dos
empresários e
administradores
Custo adicional
Redução de custos e
aumento da
produtividade
Corretivas,
preventivas e
antecipatórias
Antecipação de
problemas e captura
de oportunidades
utilizando soluções
de médio e longo
prazos
Uso de tecnologias
limpas
Vantagens
competitivas
Envolvimento da alta
administração
Ações envolvidas
Esporádico
Periódico
Ações ambientais
confinadas nas
áreas geradoras de
poluição
Crescente
envolvimento de
outras áreas como
produção, compras,
desenvolvimento de
produto e marketing
Fonte: Barbieri (2007), p. 119.
Permanente e
sistemático
Atividades
empresariais
Disseminadas pela
organização
Ampliação das
ações
ambientais para toda
a cadeia produtiva
58
A abordagem de controle de poluição prima pelo estabelecimento de
práticas impeditivas dos efeitos da poluição gerada por um dado processo
produtivo, em que se controla a poluição sem alterar significativamente os
processos e produtos que as produziram. Portanto, as ações ambientais da
empresa resultam de uma postura reativa sobre os efeitos negativos de seus
produtos e processos produtivos mediante soluções pontuais (BARBIERI,
2007). Do ponto de vista empresarial, tal abordagem implica elevação dos
custos de produção que não agregam valor ao produto e que dificilmente
podem ser reduzidos face às exigências legais. Além disso, sob a
perspectiva ambiental, o controle de poluição, embora seja fundamental, é
deficitário e insuficiente, visto que são voltados apenas para um lado do
problema, o da poluição.
A prevenção da poluição pode ser entendida como uma atuação
sobre os produtos e processos produtivos com o desiderato de prevenir a
geração de poluição, de modo a poupar materiais e energia em diferentes
fases do processo de produção e comercialização. Para tanto, isso requer
mudanças em processos e produtos a fim de reduzir ou eliminar os rejeitos
na fonte, antes que eles sejam produzidos e lançados ao meio ambiente.
Segundo Barbieri (2007), a prevenção da poluição aumenta a produtividade
da empresa, pois a redução de poluentes na fonte significa recursos
poupados, o que permite produzir mais bens e serviços com menos
insumos.
A
abordagem
estratégica
desenvolve-se
com
escopo
no
estabelecimento de objetivos e ações que alcancem efeitos no ambiente de
negócio em que a empresa atua ou pretende atuar, colocando-a numa
posição de vantagem. O que para Porter (1999) significa desempenhar
atividades diferentes dos rivais ou desempenhar as mesmas atividades de
modo diferente. Logo, tal abordagem procura aproveitar oportunidades
mercadológicas e neutralizar ameaças decorrentes de questões ambientais
existentes ou que poderão ocorrer no futuro.
A estratégia ambiental, na óptica organizacional, está estreitamente
59
relacionada ao seu potencial de poluição. Para Donaire (1995), se este
potencial é alto, sua importância na estratégia é vital e sua correta avaliação
torna-se uma questão de sobrevivência, seja a curto ou longo prazo.
Nesse contexto, no caso do segmento de papel e celulose, cujas
empresas
são
responsáveis
por
impactos
ambientais
de
extrema
intensidade, Andrade et. al. (2003),
propõem que as empresas estabeleçam suas estratégias ambientais visando
o seguinte rol exemplificativo:
a) Minimização de impactos danosos ao meio ambiente, tanto presentes
como futuros;
b) Eliminação de questões legais com o governo em suas diferentes
esferas, adotando estratégia ambiental, portanto, de estrita observância
à legislação vigente;
c) Redução de dispêndios com insumos produtivos (matérias-primas,
consumo de energia, serviços contratados) por meio da racionalização
de seus métodos operacionais aplicados às fontes de suprimento;
d) Eliminação de efeitos ambientais indesejáveis provocados pela geração
de resíduos e sucatas, por meio de adoção de instalações e
equipamentos de tratamento e eliminação desses elementos no
ambiente;
e) Maior interação com a comunidade, visando preservar a imagem da
organização em bom conceito, em face das crescentes preocupações
preservacionistas por parte dos membros da sociedade.
Com efeito, extrai-se que, além da adoção da abordagem estratégicas
(reversão de problemas em vantagens), as empresas de papel e celulose
devem aplicar tecnologias limpas (economia de materiais, aumento nos
rendimentos do processo, menos paralisações, menor consumo de água
energia, eliminação/redução atividades de descarte, etc.) e, inclusive,
incorporarem o processo de prevenção de poluição, desde a extração de
madeira para a fabricação do papel até a liberação de dioxina advinda do
60
branqueamento com cloro. Porter (1999) sugere, por exemplo,
como
solução inovadora, a melhoria dos processos de cozimento e lavagem,
eliminação do cloro pelo uso de oxigênio, ozônio ou peróxido na lavagem e
processo de ciclo fechado, obtendo-se, desta forma, melhoria de processos
e produtos sustentáveis.
2. A LEGISLAÇÃO AMBIENTAL BRASILEIRA
A legislação ambiental brasileira começa a ganhar nuances na década
de 1930 com a promulgação de alguns códigos, como, por exemplo, Código
de Caça (Dec. 23.672/34), Código Florestal (Dec. 23.7693/34), Código de
Minas (Dec. 24.642/34) e Código de Águas (Dec. 24.642/34). Esta fase fica
marcada pelo desiderato dos efeitos sobre os recursos naturais por meio de
gestões setoriais.
Em um segundo momento, com a Conferência de Estocolmo de 1972,
o governo brasileiro posiciona-se a favor do desenvolvimento econômico e
não apresenta grandes mudanças no cenário político ambiental. Contudo, a
ausência de preocupações com o meio ambiente, desencadeou danos, o
que levou o poder público a adotar uma nova postura. Em 1973, o Executivo
Federal cria a Secretaria Especial do Meio Ambiente e os diversos estados,
por sua vez, criam suas agências ambientais especializadas, como, por
exemplo, o Cetesb no Estado de São Paulo.
Todavia, só no início de 1980 é que os problemas ambientais deixam
de ser percebidos de modo isolados (repartidos em solo, ar e água) e
passam a ser compreendidos de forma generalizada e interdependente. Isso
refletiu em uma legislação segmentada, como, por exemplo, o Decreto-lei
1.413/75 que dispõe sobre o controle da poluição do meio ambiente
provocada por atividades industrial e a Lei 6.803/80 que prevê sobre as
diretrizes básicas para o zoneamento industrial nas áreas críticas de
poluição.
2.1. Política nacional do meio ambiente
61
Foi somente com a Lei 6.938/81, a qual disciplina a Política Nacional
do Meio Ambiente (PNUMA) e institui o Sistema Nacional do Meio Ambiente
(SISNAMA), que o Brasil adota uma legislação relevante, apta a repercutir
efetivamente
nos
ambientes
organizacionais,
integrando
as
ações
governamentais dentro de uma abordagem sistêmica. Nas palavras Antunes
(1999, p. 65), “a PNUMA deve ser compreendida como o conjunto de
instrumentos legais, técnicos, científicos, políticos econômicos destinados á
promoção do desenvolvimento da sociedade e economias brasileiras”.
Portanto, diz-se que a política nacional do meio ambiente tem por
objetivo a harmonização do meio ambiente com o desenvolvimento
socioeconômico (SIRVINKAS, 2011). Neste contexto, a harmonização
consiste na conciliação do meio ambiente, de um lado, com a garantia de
desenvolvimento sustentável, de outro, objetivando assegurar condições
necessárias ao progresso industrial aos interesses da segurança nacional e
à proteção da dignidade da vida humana.
A PNUMA é concebida como um divisor de águas, pois se deixou de
preconizar a emissão poluente tolerada, passando-se, assim, a consagrar
que mesmo o resíduo poluente, tolerado pelos padrões estabelecidos,
poderá causar um dano ambiental e, portanto, sujeitar o causador do dano
ao pagamento de indenização. Ou seja, uma empresa pode estar atendendo
aos limites máximos de poluição legalmente impostos e, assim mesmo,
estarem sendo imputadas por danos residuais causados. Adota-se aqui, a
responsabilidade objetiva, a qual dispensa a comprovação de culpa, sendo
somente probatório o nexo de causa e o efeito entre a atividade da empresa
e um determinado dano ambiental; portanto, basta que a uma empresa
produza um dano, atendendo ou não aos padrões previstos para as
emissões poluente.
2.2. Constituição Federal
Elucidado os contornos do novo tratamento legal dado ao meio
62
ambiente, a Constituição Federal, promulgada em outubro de 1988, dedica
um capítulo inteiro ao meio ambiente, o Capítulo VI, salvaguardando-o como
um dos seus princípios, ao estabelecer em seu Art. 225 “Todos tem direito ao
meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e
essencial à sadia qualidade de vida, impondo ao Poder Público e a
coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras
gerações.” Nossa Constituição denota ainda os mecanismos para a defesa
da natureza, como, por exemplo, a ação popular em que qualquer cidadão
tem o direito de propô-la para defender o meio ambiente, além de um
alargamento da autonomia do Ministério Público na defesa de questões
socioambiental.
2.3. Sanções criminais
Na seara criminal, a lei disciplinadora é a Lei nº 9.605/98 estabelece
as sanções criminais aplicáveis às atividades lesivas ao meio ambiente. Esta
lei objetiva a responsabilização criminal do poluidor, sem qualquer prejuízo
da aplicação da lei 6.938/81, visto que esta repercute na esfera civil e
preconiza a responsabilidade objetiva. Dissidente da sanção criminal, em
que a responsabilidade ocorre de acordo com o grau de culpa do agente.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Quando se fala em fatores que induzem as empresas a adotarem
posturas sustentáveis, não se pode olvidar o liame entre a legislação
ambiental e a implantação de estratégias ambientais por parte das
empresas.
Visto que as leis são coercitivas, de modo que obrigam as
empresas a mudarem seu comportamento em relação ao meio ambiente.
Assim, a legislação cria pressões que motivam a adoção de estratégias de
inovação ambiental. Todavia, para que isso efetivamente ocorra é
imprescindível que as empresas compreendam as regulamentações legais
63
como um desafio, com vistas a buscarem desenvolver soluções inovadoras.
Cabe também pontuar que incorporação de estratégias empresariais
de inovação possibilita a transcendência do cumprimento legal, refletindo na
competitividade. Tal medida implica benesse de utilização de insumos
(como, por exemplo, matérias–primas, energia e trabalho) de modo mais
produtivo, reduzindo custos e compensando os gastos dos investimentos
ambientais.
Portanto, a legislação ambiental pode vir a estimular e determinar a
estratégia de inovação ambiental, desde que focalize resultados e metas,
orientando as empresas a inovar. Cabe à organização, por sua vez, assimilar
essa pressão e traduzi-las em melhoria de produtividade e redução de
desperdícios.
REFERÊNCIAS
ANDRADE, R. O. de B; CARVALHO, A. B; TACHIZAWA, T. Gestão ambiental:
enfoque estratégico aplicado ao desenvolvimento sustentável. 2.ed. São Paulo:
Pearson Education do Brasil, 2002.
ANTUNES, P. B. Direito ambiental. 3ºed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1994.
BARBIERI, J.C. Gestão ambiental empresarial: conceitos, modelos e
instrumentos. 2º.ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
DONAIRE, D. Gestão ambiental na empresa. São Paulo: Atlas, 1995.
HASENCLEVER, L.; TIGRE, P. Estratégias de inovação. In KUPFER, D;
HASENCLEVER, L. Economia industrial. Rio de Janeiro: Elsevier. 2002, p. 431447.
OLIVEIRA, M. R. et al. Gestão Estratégica para o desenvolvimento sustentável.
Ponta Grossa: UEPG, 2007.
MARCONI, M. de A.; LAKATOS, E. M. Fundamentos de metodologia cinetífica. 7
ed. São Paulo: Atlas, 2010.
MINTZBERG, H.; QUINN, J. B. O processo da estratégia. 3. ed. Porto Alegre:
Bookman, 2001.
PORTER, M. E. Competição on competition: estratégias competitivas essenciais.
10.ed. Rio de Janeiro: Campus, 1999.
SCHENINI, P. C. Gestão empresarial sócio ambiental. Florianópolis: Sophos,
2005.
SIRVINSKAS, L.P. Manual de direito ambiental. 9.ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
OUTRAS FONTES
ANSANELLI, S. L. M. Mudança Institucional, Política Ambiental e Inovação
Tecnológica: caminho para o desenvolvimento econômico sustentável?. In: VIII
64
Encontro Nacional de Economia Política, 2003, Florianópolis. Anais do VIII
Encontro Nacional de Economia Política, 2003.
BRASIL. Lei 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre Política Nacional do
Meio Ambiente, seus afins e mecanismos de formulação e aplicação e dá
outras providências. Brasília, DOU de 02/9/1981
______. Constituição Federal, 1988, art. 225.
_____. Lei 9.606 de fevereiro de 1998. Dispõe sobre sanções penais e
administrativas derivadas de conduta e atividades lesivas ao meio ambiente e
dá outras providências. Brasília, DOU de 13/2/1998.
YOUNG, C.E.F; LUSTOSA, M.C.J. Meio ambiente e competitividade da indústria
brasileira. In: Revista de Economia Contemporânea. Rio de Janeiro, v. 5, ed.
especial, 2001.
O CARVÃO VEGETAL COMO RECURSO INDUSTRIAL
RENOVÁVEL E SUA IMPORTÂNCIA PARA A INCLUSÃO
SOCIAL E O MEIO-AMBIENTE
Prof. Dr. Carlos Roberto Alves
Faculdade Guarapuava – PR
RESUMO: O presente artigo avalia a importância da produção do carvão
vegetal para a indústria brasileira e seus benefícios para o meio-ambiente. Estudase também os aspectos relacionados à possibilidades de inclusão social por meio
de projetos relacionados aos recursos de fontes renováveis. Observa-se também o
desenvolvimento de recursos tecnológicos para a obtenção do carvão vegetal.
Palavras-chave: Carvão vegetal, renovável, meio-ambiente, inclusão
social.
A produção do carvão vegetal influencia diretamente o plantio de
florestas para a sua sustentabilidade, que por sua vez, proporciona
resultados positivos, com destaque, à geração de empregos e aos
benefícios
para
o
meio-ambiente,
quando
comparado
ao
uso
de
combustíveis fósseis.
O consumo de carvão vegetal no Brasil, no ano de 2008, foi de
aproximadamente 33,0 milhões de m3 ou o equivalente a 7,6 milhões de
toneladas (1 m3 equivale aproximadamente 0,230 ton), conforme dados da
Associação Mineira de Silvicultura, (AMS, 2009). O carvão vegetal é
empregado principalmente como termo redutor na siderurgia e como fonte
65
energética para variados fins, sendo obtido de madeira retirada de florestas
nativas e de reflorestamento. A Tabela 01 apresenta a seguir, para o período
compreendido, do ano de 1991 ao ano de 2008, a relação em percentual
entre a madeira nativa e a de reflorestamento, utilizada na produção do
carvão vegetal. No período de 1991 a 2001, houve uma forte tendência de
redução do uso de madeira nativa e aumento de madeira proveniente de
reflorestamentos, destacando-se entre o ano de 1994 ao ano de 2001 uma
preponderância da madeira plantada em relação à madeira de floresta
nativa. A partir do ano de 2001, essa a relação tendeu a se reduzir
novamente, e no ano de 2004, a quantidade de madeira nativa ultrapassou a
madeira de reflorestamento. Durante o ano de 2005 a 2008, observou-se um
equilíbrio de consumo entre as duas fontes.
TABELA 01 – Origem do carvão vegetal consumido no Brasil
Fonte – AMS, 2009
O consumo de carvão vegetal no Brasil é representado por diversos
segmentos e vale destacar entre esses o setor de siderurgia. O maior
consumidor de carvão vegetal é o estado de Minas Gerais, em virtude do
grande número de siderúrgicas instaladas naquele estado. O consumo
66
nesse estado, no ano de 2001, foi de 17,1 milhões de m3 ou 3,9 milhões de
toneladas, o que representou 65,3% do total consumido, enquanto que os
estados do Amapá e Pará, consumiram juntos 19,1% e os estados de São
Paulo, Rio de janeiro, Espírito Santo, Bahia, Mato Grosso do Sul e demais
estados,
consumiram
2,9%,
1,4%,
4,2%,
1,8%,
1,2%
e
4,1%,
respectivamente.
No ano de 2005, o plantio para a produção de carvão vegetal para o
estado de Minas Gerais, concentrou cerca de 83,6 % dos 115.580 hectares
de florestas energéticas do pais, atendendo a 69% da demanda (IBGE,
2005).
O Brasil e a Austrália são países que ainda mantêm uma
significativa produção de carvão vegetal para fins industriais. A África
também produz carvão, mas, principalmente, para uso doméstico e de forma
não sustentável. O carvão vegetal brasileiro é geralmente produzido em
fornos de alvenaria usando lenha de origem nativa ou de reflorestamento,
nesse último caso lenha de eucalipto. O processo, segundo Almeida (1982),
consiste numa forma tradicional de produção de um insumo energeticamente
mais rico do que a lenha in natura e, tem uma eficiência média em torno de
24% em relação ao peso da lenha seca.
Enquanto, a Europa abandonou definitivamente a siderurgia a
carvão vegetal, substituída pela siderurgia a carvão mineral, no Brasil a
utilização do carvão vegetal continuou a renovar-se tecnologicamente,
apoiada na ampla disponibilidade de mão-de-obra e de terras apropriadas à
exploração florestal e, principalmente, no alto rendimento da floresta tropical,
vinte ou trinta vezes superior ao que se podem obter nas regiões
temperadas e frias do Hemisfério Norte (BRITO,1990, p.47-51).
Conforme relatório da AMS, 2009, é importante destacar que a
siderurgia a carvão vegetal brasileira depende da cadeia produtiva de base
florestal, e isso se reflete como um fator de inclusão social na medida em
que gera empregos e renda em todas as camadas sociais. Vale ressaltar
ainda, que todos os vegetais em processo de crescimento retiram gás
67
carbônico da atmosfera, e num sistema de rendimento sustentável, tem-se a
relação de que a cada hectare em processo de colheita, existem seis em
fase de crescimento, retirando carbono da atmosfera e amenizando as
variações climáticas.
O relatório do Ministério das Minas e Energias, (MME, 2011),
apresenta os dados das fontes internas de geração de energia que são
utilizadas no Brasil, com destaque para a energia gerada através do petróleo
e derivados, com a participação de 37,7% do total gerado de energia,
seguido das fontes de biomassa e hidráulica que juntas, correspondem a
55,3% de toda oferta de energia do Brasil. A biomassa apresenta na sua
composição, 31% de lenha, 57% de produtos da cana, e o restante de outras
fontes.
FIGURA 02 – OFERTA INTERNA DE ENERGIA NO BRASIL
Fonte: MME, 2011
Alves (2003, p. 2) destaca a importância de se aproveitar os gases
que são eliminados no processo de combustão da madeira, em função das
suas características químicas. Os condensados após tratamento podem ser
utilizados como substitutos de alguns derivados de petróleo e, portanto, tem
grande importância comercial. Uma aplicação importante é a de substituir o
fenol e parte do formol que são utilizados na síntese de resinas fenólicas. As
68
resinas fenólicas são utilizadas na fabricação de cola amplamente usadas na
fabricação do compensado, que por sua vez, serão aplicadas na construção
civil.
Portanto, não há dúvida da grande importância da produção do
carvão vegetal para a indústria brasileira e, pelos efeitos positivos que
decorrem de sua produção, possibilitando a inclusão social, benefícios para
o meio-ambiente e, por ser um
recurso
de fonte renovável.
O
desenvolvimento de recursos tecnológicos para a obtenção do carvão
vegetal, atualmente disponíveis e, a conscientização ambiental que se forma
de maneira irreversível, traz para a sociedade amplos benefícios.
REFERÊNCIAS
Almeida, M.R. Recuperação de alcatrão em fornos de alvenaria, in: Produção e
utilização do carvão vegetal, BH, Cetec, 1982. p.181-188
Alves, Carlos Roberto. Utilização de frações de alcatrão vegetal na síntese de
resinas fenólicas para substituição parcial de fenol e formaldeído. Tese de
doutorado, UFPR, 2003
Brito, J.O. Comportamentode madeiras naturais do Maranhão frente ao
processo de destilação seca. Brasil Florestal, p.47-51, março, 1981.
SITOGRAFIA
Associação Mineira de Silvicultura (AMS). Florestas Energéticas No Brasil,
Disponível em:
<http://www.silviminas.com.br/Publicacao/Arquivos/publicacao_585.pdf> Acesso
em, 05/10/2011.
Ministério das Minas e Energia (MME). Resenha Energética Brasileira, Disponível
em: <http://www.mme.gov.br/mme/menu/todas_publicacoes.html>. Acesso em,
06/10/2011
OUTRAS FONTES
IBGE. Produção da Extração Vegetal e da Silvicultura, 2005
69
Influência do cobre no crescimento e no teor de
pigmentos de PISTIA STRATIOTES L.
Camille Goes Cordeiro
Orientadora: Patrícia Carla Giloni-Lima
Co-orientador: Vanderlei Aparecido de Lima:
Setor de Ciências de Agrárias e Ambientais
Biologia - Unicentro
RESUMO: O objetivo deste trabalho foi avaliar a influência do cobre no crescimento
e no teor de pigmentos clorofilianos em Pistia stratiotes. As plantas foram
submetidas às concentrações de 2,0; 3,2; 6,0; 8,8 e 10,0 µgCu L¯¹, com tempos de
exposição de 5, 7, 13, 18 e 21 dias. O diâmetro variou de 6,49 a 9,38 cm, oscilação
de 4 a 8 folhas por indivíduo e a massa fresca ficou entre 2,95 e 6,54 g. O teor
médio de pigmentos com 14 dias demonstrou uma tendência ao decréscimo com o
aumento da concentração.
Palavras-chave: Alface D’água. Clorofila. Diâmetro Planta. Massa Fresca. Metal.
INTRODUÇÃO
As macrófitas aquáticas representam as plantas mais utilizadas como
instrumento para a absorção de metais da água. A utilização de Pistia
stratiotes como biorremediador no tratamento de águas residuárias tem sido
mais comum do que seu uso em testes de toxicidade, onde a bioacumulação
é o fator mais amplamente investigado (KLUMPP et al., 2002; MAINE et al.,
2004).
O efeito fitotóxico dos metais no crescimento vegetal tem sido
amplamente
estudado
em
muitas
espécies
vegetais
de
interesse
agronômico, plantas aquáticas, briófitas e algas (PANDA; CHOUDHURY,
2005). A degradação de pigmentos clorofilianos pode diminuir a eficiência
fotossintética das plantas, a qual pode refletir numa redução do seu
crescimento (UPADHYAY; PANDA, 2005).
Desta forma, o objetivo deste trabalho foi avaliar a influência do cobre
no crescimento, investigando o número de folhas, o diâmetro da planta e a
70
variação na massa fresca, bem como o teor de pigmentos clorofilianos em
Pistia stratiotes, submetidas a diferentes concentrações de metais em
diferentes tempos de exposição.
1. MATERIAL E MÉTODOS
As plantas de P. stratiotes provenientes de Itanhém (litoral paulista)
foram cultivadas no Centro de Recursos Hídricos e Ecossistemas Aquáticos
(CRHEA) da EESC-USP-SC.
O cultivo foi estabelecido em caixas de água com capacidade de 1000
L, às quais foram adicionados 45 L de terra vegetal e cerca de 400 g de
adubo (N:P:K, na proporção de 14:12:4) diluídos em aproximadamente 800 L
de água. O pH foi mantido em torno de 7,0 sendo ajustados com o uso de
NaOH 1N. Foram utilizados nos testes, indivíduos que apresentaram 5-6 cm
de altura, e entre 3 e 5 folhas. Os testes foram montados em recipientes
plásticos com 2 litros de capacidade, e em cada recipiente foram colocados
3 indivíduos em 1 litro de solução nutritiva de Odjegba e Fasidi (2004). As
soluções de cobre foram preparadas com concentrações iguais a 2,0; 3,2;
6,0; 8,8 e 10,0 µg L¯¹, com tempos de exposição de 5, 7, 13, 18 e 21 dias de
exposição.
Foram avaliadas as seguintes características após os 21 dias de
exposição: diâmetro, número de folhas, massa fresca. O teor de pigmentos
clorofilanos (clorofila a, b e total), analisado segundo a metodologia proposta
por Porra et al. (1989) foi avaliado com 14 dias de exposição ao metal.
2. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Durante o experimento foi analisado o número de folhas, o diâmetro e
a massa foliar de plantas de Pistia stratiotes contidas em diferentes
concentrações de cobre no espaço de 5, 7, 13, 18 e 21 dias. A tabela 1
apresenta os valores médios dos parâmetros de crescimento analisados.
O diâmetro das plantas submetidas a uma concentração de 3,2 µg L⁻¹
de cobre é maior que o das plantas do controle. Porém, em concentrações a
71
partir de 6,0 µg L⁻¹ é notória uma queda no diâmetro se comparado ao da
concentração de 3,2 µg L⁻¹. Evidenciando, portanto que o acúmulo do cobre
por Pistia stratiotes, pode ser limitante ao crescimento.
Tabela 1. Diâmetro médio das plantas, número de folhas e massa fresca das
plantas de P. stratiotes após 5 a 21 dias de exposição a concentrações de
cobre de 2,0 a 10,0 µg L-1.
Tempo de
Exposição
(dias)
5
7
13
18
21
0,0
7,45
7,50
7,98
8,88
7,62
5
7
13
18
21
4,83
5,33
5,83
6,50
7,00
5
7
13
18
21
3,45
3,68
5,00
4,81
5,07
Diâmetro da Planta
Concentração de Cobre (µ
µg L-1)
2,0
3,2
6,0
8,8
6,49
8,50
8,20
7,43
7,60
8,25
8,15
7,67
7,98
9,00
8,77
7,88
8,65
9,00
9,38
8,63
7,37
8,40
8,30
7,62
Número de Folhas
5,17
5,67
5,33
5,50
4,83
5,67
5,83
6,00
5,50
6,33
6,33
6,50
6,83
8,00
7,67
7,50
6,83
7,83
7,17
7,67
Massa Fresca (g)
3,34
3,68
3,80
3,46
3,75
4,06
4,25
3,77
4,89
5,60
5,71
5,45
5,01
5,48
5,76
5,20
5,51
6,11
6,54
4,76
10,0
7,05
6,95
7,67
8,60
8,10
4,83
4,83
6,00
7,17
7,83
2,95
3,26
4,65
4,69
5,49
Em se tratando do tempo de exposição ao cobre o diâmetro nas
concentrações 3,2, 6,0 e 10,0 µg L⁻¹, após sete dias de experimento,
diminui, mas depois aumenta. Além disso, em todas as concentrações,
inclusive no controle, o diâmetro diminui nos últimos três dias (entre 18 e 21
dias). Mostrando a capacidade máxima de tempo que esta macrófita tolera
ficando exposta ao cobre.
Ao se observar a média do número de folhas pode-se constatar que
não houve uma diferença relevante entre as concentrações e os tempos de
exposição, variando entre quatro e oito folhas por planta de P. stratiotes. A
partir desse resultado verifica-se que o número de folhas não é um bom fator
para indicar a tolerância desta macrófita ao cobre, assim como observado
72
por Masutti et al. (2006), ao avaliar a tolerância da mesma espécie ao
cromo.
Analisando as médias, de modo geral, ao longo do tempo
praticamente todas as massas aumentaram, com exceção do controle e das
concentrações com 3,2 e 8,8 µg L¯¹ de cobre, com 18 dias de experimento,
sendo que nesta última concentração, com 21 dias também ocorreu uma
diminuição na massa.
A variação no teor de pigmentos: clorofila a (Chl a), clorofila b (Chl b)
e clorofila total (Chl total) pode ser observada na figura 1.
Figura 1.Variação no teor de pigmentos clorofilianos de P. stratiotes com 14
dias de exposição ao cobre (2,0 a 10,0 µg L-1).
Vajpayee et al. (2000), estudaram os efeitos das concentrações de 1,
10, 20, 40, 100 e 200 mg de Cr (VI) sob 4, 6 e 12 dias de exposição ao metal
sobre o teor de clorofila nas folhas de Nymphaea alba L. Os autores
relataram que houve uma diminuição do teor de clorofila em todas as
concentrações testadas em relação ao controle.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A análise do diâmetro, do número de folhas e da massa fresca
permitiu avaliar os limites máximos de acumulação de cobre que a macrófita
Pistia stratiotes é capaz de suportar. Apesar da sua capacidade de
73
tolerância, a redução no teor médio dos pigmentos clorofilianos indica que
pode estar havendo redução na sua taxa fotossintética, apesar de ser
considerada um dos organismos mais adequados a ser utilizado sistemas
que visem à despoluição de ambientes aquáticos.
REFERÊNCIAS
KLUMPP, A., Bauer, K., Franz-Gerstein, C., Menezes, M. Variation of nutrient and
metal concentrations in aquatic macrophytes along the Rio Cachoeira in Bahia
(Brazil). Environmental International, 28, 165, 2002.
MAINE, M.A., Suñe, N.L., Lagger, S.C. Chromium bioaccumulation: comparison of
the capacity of two floating aquatic macrophytes. Water Resouces, 38, 1494, 2004.
Masutti, M. B. Distribuição e efeitos de cromo e cobre em ecossistemas aquáticos:
Uma análise laboratorial e “in situ” (experimentos em micro e mesocosmos). Tese
de Doutorado, Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo,
2004.
MASUTTI, M.B., Espíndola, E.L.G., Nogueira, M., Simões, F.C.F. Sensibilidade a
Cobre e Cromo por Oreochromis niloticus e Pistia stratiotes. J. Braz. Soc.
Ecotoxicol., 1, 37, 2006.
PANDA S.K.; Choudhury, S. Chromium stress in plants. Braz Soc Plant Physiol 17,
95, 2005.
PORRA, R. J.; THOMPSON, W. A.; KRIEDEMANN, P. E. Determination of accurate
extinction coefficients and simultaneous equations for assaying chlorophylls a and b
extracted with four different solvents: verification of the concentration of chlorophyll
standards by atomic absorption sprectroscopy. Biochimica et Biophysica Acta 975,
384, 1989.
UPADHYAY, R. K.; PANDA, S. K. Copper-induced growth inhibition, oxidative stress
and ultrastructural alterations in freshly grown water lettuce (Pistia stratiotes L.). C.
R. Biologies 332, 623, 2009.
VAJPAYEE, P., SHARMA, S. C., TRIPATHI, R. D., RAI, U. N., YUNUS, M.
Bioaccumulation of chromium and toxicity to photosynthetic pigments, nitrate
reductase activity and protein content of Nelumbo nucifera Gaertn. Chemosphere v.
39, p. 2159-2169, 1999.
DESENVOLVIMENTO LOCAL: OS DESAFIOS DA
AGRICULTURA FAMILIAR PARA SUA PERMANÊNCIA NO
CAMPO
Adriana Senetra
Dieniffer Taline Schnell
Mestrado em Gestão do Território - UEPG
74
RESUMO: Este artigo tem como principal objetivo compreender como a agricultura
familiar em regime de pequenas propriedades, prática típica de localidades
interioranas do Paraná, se transforma e vem se mantendo no contexto atual. Nisso
implica também considerar os desafios para o desenvolvimento local frente ao
mundo capitalista contemporâneo. A pesquisa parte do levantamento bibliográfico e
leituras pertinentes à composição da agricultura familiar e do apontamento de
políticas públicas que contribuem para a permanência dessa prática na
contemporaneidade. Partimos da hipótese de que há fatores favoráveis ao
desenvolvimento local no meio rural, com ênfase a programas de auxílio,
associados à política pública como o PRONAF.
Palavras-chave: Agricultura familiar. Capitalismo. Desenvolvimento local.
INTRODUÇÃO
As dinâmicas do capitalismo atuam na contemporaneidade em
todas as esferas da sociedade. Neste trabalho serão ressaltados alguns
pontos principais do contexto histórico do capitalismo, brevemente como
surgiu, como ocorrem estas dinâmicas no espaço rural, envolvendo os
atores sociais, aqui considerados como os pequenos proprietários agrícolas.
Destaca-se a pequena propriedade, e a prática da agricultura familiar.
Pretende-se compreender o modo como esta prática sobrevive e se
transforma na atualidade. No capitalismo o processo age no setor
econômico, social e até mesmo cultural, pois todas as ações realizadas
dependem de financiamento, de capital. E toda ação capitalista tem por
principal objetivo a obtenção do lucro, e detenção do mesmo, como
regulador de todos os processos sociais. A modernização nasceu dessa
necessidade de ampliação do poder capitalizado, sendo o principal objetivo
aumentar os lucros e diminuir os gastos, principalmente nos setores de
produção. Neste processo, os vários setores da sociedade foram inundados
por inúmeras transformações e adequações conforme o mercado mundial
exigia.
E no meio rural este processo não deixaria de atuar, já que a
modernização esta intimamente ligada ao desenvolvimento, ou o mesmo
surge através do moderno. Sendo, portanto, o meio rural um local marcado
pela heterogeneidade, estes processos não desencadeiam as mesmas
75
reações, já que aqui se trata primeiramente da agricultura familiar, e seu
papel perante estes sistemas econômicos, onde a mesma esta inserida.
1. CAPITALISMO X DESENVOLVIMENTO
O processo do capitalismo atua nos setores econômico, social e
cultural, pois, todas as ações realizadas dependem de financiamento. Esta
ação capitalista age como regulador de todos os processos sociais. A
modernização
nasceu
dessa
necessidade
de
ampliação
do
poder
capitalizado, sendo o principal objetivo aumentar os lucros e diminuir os
gastos, principalmente nos setores de produção. Neste processo, os vários
setores da sociedade foram inundados por inúmeras transformações e
adequações conforme o mercado mundial exigia.
E dentre os marcos mais importantes da evolução do capitalismo e
sua mundialização, a revolução industrial inaugurou no último quarto do
século XVIII uma nova fase no capitalismo, onde a partir daí novos ganhos
significativos de produtividade de trabalho só poderiam ser atingidos se o
corpo humano pudesse ser substituído por um mecanismo muito mais
poderoso. As novas técnicas de produção são tão superiores em relação às
antigas que o pequeno empreendedor acaba sendo totalmente expulso de
um ramo após o outro. Assim, muitos camponeses perdem suas terras e
emigram para a cidade se proletariando. Desta forma, o grande avanço
técnico passou a exigir capitais crescentes para sua aplicação.
Mas, a forma organizacional e a técnica de produção em massa
padronizada em grandes volumes não foram muito bem aceitas e
convertidas com facilidade para o sistema de produção flexível que agora
trabalha num sistema de produção manufatureira, com variedade de bens e
preços baixos (HARVEY, 1993). E através desta nova configuração do
sistema de produção pode não parecer, mas o capitalismo está se tornando
cada vez mais organizado devido à dispersão e da mobilidade geográfica às
respostas dos sistemas de produção e consumo.
76
Desde então, as trocas mercantis passaram a ser planetárias e
nenhum país escapa desta realidade. A globalização se efetua
por uma globalização dos mercados, inclusive no âmbito dos
bens culturais (WARNIER, 2000, pág.65).
Todas essas mudanças e sistemas ocorrendo, gera pontos
negativos para a sociedade e diante disso, segundo Peet (2007),
flexibilidade do mercado de trabalho significa, “atacar os sindicatos, pagar
salários mais baixos e eliminar as poucas leis que possam existir para
proteger os trabalhadores” (pág. 21). Nessa perspectiva, vivencia-se hoje um
mundo altamente competitivo, no que diz respeito aos campos produtivos e
de conhecimento, das políticas governamentais e da promoção de valores
culturais. Fatores como:
A formação de um mercado de ações global, de mercados futuros
de mercadorias e (até de dívidas) globais, de acordos de
compensação recíproca de taxas de juros e moedas, ao lado da
acelerada mobilidade geográfica de fundos significou, pela
primeira vez, a criação de um único mercado mundial de dinheiro
e de credito (HARVEY, 1993, pág.152).
A estrutura deste sistema financeiro global torna-se muito
complexo. Os bancos, corretoras, financiamentos, por exemplo, tornaram-se
funções muito poderosas. Os novos mercados de produtos, de ações, de
moedas e também de dívidas espalharam-se por todo o mundo. O uso de
computadores
e
das
telecomunicações
eletrônicas
teve
um
papel
fundamental na coordenação dos fluxos financeiros, quebrando barreiras de
ordem temporal, espacial e de moedas. Nesse sentido, Harvey (1993) afirma
que, “esse espantoso mundo das altas finanças envolve uma variedade
igualmente espantosa de atividades entrelaçadas [...]” (pág.154). Nesse
contexto deu-se ênfase, às descobertas de maneiras alternativas de obter-se
lucro. As estratégias de interesses corporativos variam da contabilidade à
monitoração de mercados internacionais, neste sentido buscando tirar
proveito das variações dos valores das moedas e das taxas de juros.
Atualmente cabe ao Estado regular o capital corporativo no interesse da
nação e também ao interesse nacional, criar condições para atrair o capital
77
financeiro global. Para comprovar isso, sem dúvida podemos citar a teoria do
poder da elite que diz, segundo PEET (2007), “os governos agem no
interesse do capital” (pág. 24).
É pertinente ressaltar que as tendências organizacionais e de
acumulação capitalista que Marx relatava em suas obras, sendo estas ainda
hoje
peças
fundamentais
de
todo
modo
capitalista
de
produção
características da acumulação flexível. Segundo Marx, o sistema capitalista
não garante meios de subsistência a todos os membros da sociedade, ou
seja, gera desigualdades. Assim a sociedade como um todo sofre as
conseqüências, Quem não é dono dos meios de produção é obrigado a
trabalhar em troca de um salário, nesse sentido já se percebe as
desigualdades. Muitos trabalhadores não têm acesso a produtos que eles
mesmos ajudaram a produzir. Conforme Peet (2007), “democracia,
emancipação, desenvolvimento, progresso são belos princípios corrompidos
pela forma social adotada pela modernidade – quer dizer, capitalismo” (pág.
34).
Mesmo no contexto atual a discusão de desenvolvimento não
encontra um conceito definido. Defendido por vários autores basicamente
como o desenvolvimento ligado à modernização e esta ligada ao
capitalismo, dando a entender que uma é complemento da outra. Lipietz
(1991)
defende
que
são
vários
elementos
que
constituem
o
desenvolvimento, a acumulação como resultado da regulação, tendo como
base a organização, ou seja, é o conjunto que constitui um modelo de
desenvolvimento, e não propriamente o desenvolvimento.
Mas as estratégias de desenvolvimento só se constituem com os
processos de modernização, de acordo com Furtado (1992) In___ Maluf,
(2000), nas teorias de desenvolvimento, a assimilação de novas técnicas e o
aumento da produtividade conduz à melhoria do bem-estar de uma
população com crescente homogeneização social, e ao contrário a teoria do
subdesenvolvimento, os processos citados anteriormente não levaram a
homogeneização social, ainda que tenham elevado o nível médio de vida.
Sobre
esses
argumentos
Lipietz
(1991)
afirma,
“um
modelo
de
78
desenvolvimento só consegue vingar se suas promessas coincidem com
certa concepção possível de felicidade (pág. 29)”. Isso faz com que muitas
culturas se percam, muitos usos e costumes de povos se percam, sob a
influência globalizada de estilos, lugares, imagens, viagens internacionais, e
pela mídia, e segundo Hall (2006), causa o fenômeno de identidades
desvinculadas - desalojadas dentro desse mundo tendencioso e consumista.
2. AGRICULTURA FAMILIAR E DESENVOLVIMENTO LOCAL
Diante do exposto acima, em relação
ao
capitalismo e
principalmente o desenvolvimento presente nas dinâmicas sociais e sua
influencia global, não deixaríamos de inter relacionar com o tema do
trabalho, ou seja, a agricultura familiar e as alternativas encontradas para
resistir às mudanças frenéticas.
Portanto, no espaço rural, o desenvolvimento não poderia estar
de fora, já que as transformações que acontecem nos sistemas econômicos
também afetam o rural, direta ou indiretamente. No Brasil, o campo foi
entendido como local exclusivo do desenvolvimento agropecuário, até
recentemente (NEVES, 2007). Conforme Wanderley (2000),
Nas sociedades modernas, o desenvolvimento dos espaços
rurais dependera, não apenas do dinamismo do setor agrícola,
porém, cada vez mais, da sua capacidade de atrair outras
atividades econômicas e outros interesses sociais e de realizar
uma profunda “ressignificação” de suas próprias funções sociais
(pág. 4).
Ou seja, desenvolvimento é igual à atração, que será igual a
outras atividades. E, “quanto maior a identidade, a institucionalidade ou o
capital humano, mais possibilidades de desenvolvimento” (GOMEZ, 2007,
pág. 51). Além desses fatores, há outros conforme Pires (2007), “valores
sociais também desempenham papéis preponderantes nos processos
nacionais de desenvolvimento” (pág. 62). Necessitando, portanto, atribuir ao
meio rural atividades diversificadas daquelas praticadas, como por exemplo,
79
uma única cultura ou agropecuária.
Atualmente, essas mudanças estão ocorrendo principalmente nas
pequenas propriedades, na agricultura familiar que
corresponde à
capacidade de o produtor criar situações que o coloquem em vantagens
frente aos padrões de competitividade (NEVES, 2007). Estas situações são
realizadas em primeiro plano, para sua própria subsistência, ou seja,
incorporar atividades para sua sustentabilidade e de seus familiares e, além
disso, complementar sua renda quando as atividades agrícolas não
conseguem suprir o sustento do agricultor. Esta prática é considerada uma
relativa autonomia em relação à sociedade global, que também pode
abranger outros vieses, conforme Wanderley (2001) “a autonomia é
demográfica, social e econômica” (pág. 24).
E em relação ao pequeno proprietário, é difícil caracteriza - lo
mesmo estatisticamente com dados numéricos fundados em área apropriada
ou volume de produção, porque as condições no contexto brasileiro variam
consideravelmente de uma região para a outra região, de um gênero de
cultura para outro. Mas de uma forma geral, podemos considerar pequeno
proprietário - como um lavrador de pequenas posses, que trabalha ele
mesmo na sua propriedade, ajudado pela família e quando muito recebe
ajuda de pessoas que socialmente não pertencem a uma categoria muito
diversa da dele. Neste contexto ainda se insere o agricultor familiar que
também é considerado um pequeno proprietário, e seu conceito de maneira
genérica é entendida como “aquela em que a família, ao mesmo tempo em
que é proprietária dos meios de produção, assume o trabalho no
estabelecimento produtivo” (WANDERLEY, 2001, pág. 23). Contudo, essa
categoria assume, no tempo e no espaço, uma grande diversidade de
formas sociais (WANDERLEY, 2001).
O espaço rural é caracterizado como um meio de exploração
agrícola, um espaço que se opõe ao urbano (FAJARDO, 2005). No espaço
rural, há as interações com o meio, pois o homem necessita dos recursos
naturais para a própria produção agrícola, e o solo é à base dessa produção.
Mas segundo Fajardo (2005) “ele não pode existir fora das condições
80
naturais (...) comportando uma maior parte de elementos naturais como
relevo, clima, solo, águas, vegetais e animais” (p. 33). Porém, esta interação
gera impactos ao meio ambiente, e quando empregada em larga escala, as
produções agrícolas ocasionam grandes danos para esses recursos, já na
produção agrícola em menor proporção, sob os preceitos de uma produção
sustentável, ainda há um equilíbrio e um controle neste meio.
Com o avanço da agricultura, a modernização de equipamentos e
incentivos políticos para a prática da agricultura em larga escala, o pequeno
proprietário que não possui recursos suficientes para acompanhar as
transformações do campo, acaba sendo excluído. Mas isto ocorre
principalmente nos países em desenvolvimento onde suas economias são
voltadas para os setores que oferecem mais lucros, conforme Gonçalves
(2008):
Em economias periféricas como Latino-Americana, em especial
em economias como a do Brasil, manteve-se a tradição da
concentração fundiária e o controle e força política da elite
nacional, pois pouco se avançou no sentido da justa distribuição
da terra e na promoção da agricultura camponesa. Pelo contrário,
reforçou-se seu processo de exclusão e priorizou-se um
desenvolvimento acelerado do capitalismo no campo, do trabalho
assalariado e das grandes propriedades do agronegócio (Pág.
15).
Em um breve relato histórico sobre a pequena propriedade no
Brasil, será possível, portanto, compreender melhor a temática em que este
trabalho norteia e as razões pela qual foi optado em discursar neste
momento, e principalmente em notar como o agricultor familiar encontra
dificuldades em promover o desenvolvimento local, pois, se trata de fatores
históricos, e não só econômicos ou sociais.
A pequena propriedade no Brasil foi implementada em decorrência
de fatores políticos e econômicos ocorridos no país e em âmbito mundial, o
principal fator foi o incentivo à imigração, para o povoamento do território
nacional, destacamos o paranaense. Em relação à pequena propriedade
agrária, a ação pioneira na agricultura, coube invariavelmente ao grande
domínio, à grande propriedade. Esta última que se instala primeiro, é a que
81
abre as frentes de exploração, ao contrário da pequena lavoura originária
quase sempre do retalhamento de antigas fazendas.
Este retalhamento se deu a partir da vinda da corte ao Brasil,
mostrando-se a necessidade de implantação da pequena propriedade, pois
esta “devia desenvolver-se ao lado da grande propriedade, ser subsidiária
desta e não concorrer com ela no mercado de trabalho” (PETRONE, 1984,
p.17). Além disso, posto em prática a idéia, juntamente com um interesse
maior – a ocupação do território, fixação da nação e a fiel representação de
“poder sobre a nova nação”. Sobre a política imigratória no contexto do
século XIX, Burko afirma que:
Foi nos primórdios do vigente regime republicano que a política de
imigração e colonização teve o seu pleno desabrochar. Um
decreto do Governo provisório, baixado em Junho de 1890, que
vigorou por quatro anos, regulava a entrada dos imigrantes,
concedendo-lhes
passagem
gratuita
com
subvenções
conseqüentes às Companhias marítimas para o seu transporte e
distribuindo aos recém-chegados lotes de terras nas colônias
estabelecidas pelo Governo Federal, de acordo com as
Administrações estaduais. Esse serviço era desempenhado pelo
Inspetorado Geral de Terras e Colonização, em colaboração com
delegacias dos respectivos Estados. (BURKO, S/D, pag. 43-44)
A pequena propriedade passa a ocupar então os “espaços vazios”.
Estes espaços são denominados no âmbito político ou pelo Governo como
vazios demográficos, “no discurso português, porque a região já era
ocupada pelos indígenas” (SILVA, 2007, p.45). Esta denominação de vazios
demográficos ou sertão (BERNARDES, 1952) é um argumento favorável à
ocupação do Paraná pelos imigrantes. De acordo com Lupepsa (2010),
estes anseios do Governo além do interesse pela força de trabalho e de um
povoamento e transformação territorial, pressupunham também uma
mudança na estrutura agrária:
As autoridades alimentavam a esperança de que a estrutura da
agricultura paranaense fosse modificada pelos imigrantes
europeus, portadores de tradições e técnicas mais evoluídas. Os
colonos europeus teriam a missão de compensar o atraso e as
técnicas elementares utilizadas pelo elemento local, ou seja, o
caboclo. (CHANG, 1985, pag. 34)
82
Nesse processo de ocupação, a terra foi sendo valorizada e seus
proprietários passaram a compor uma camada intermediária entre os
latifundiários e os escravos, incorporando ao mesmo tempo o mercado
consumidor e a mão-de-obra. Também coube a esta camada diversificar a
produção agrícola para abastecer os grandes domínios monocultores e as
populações urbanas, pois a grande propriedade se ocupava da produção
para o mercado de exportação.
E diferentemente da agricultura patronal, onde a atividade se torna
um negócio, uma especulação, como seria outra atividade qualquer,
comercial ou financeira, este não se liga a terra. O agricultor de pequena
propriedade, ao contrário, para ele a terra é o centro de suas atenções, não
com vistas apenas a um momento de sua vida, mas visando também uma
série interminável de sucessores que virão depois dele. Atribuindo a isto,
Wanderley (2001) defende:
Para além da garantia da sobrevivência no presente, as relações
no interior da família camponesa têm como referência o horizonte
das gerações, isto é, um projeto para o futuro. Garantindo a essa
as condições de sua sobrevivência (pág. 27).
No cenário nacional, tomando como exemplo e reforçando a tese
da pequena propriedade, o Estado do Paraná, antes da colonização
européia,
apresentava
dinâmicas
bem
particulares,
com
baixíssima
densidade demográfica e baixa produção na agricultura. Poderíamos dizer
que os lugares onde foram estabelecidos os colonos se assemelham a um
mundo descrito por Santos (2006) como: “um mundo sem movimento, um
mundo lento, estável” (pág.14-15). As relações sociais presentes eram
pouco numerosas, e eram também relações simples e pouco densas,
(SANTOS, 2006), ou seja, o funcionamento dessas colônias estava ainda
muito ligado às condições naturais destes lugares.
Um dos fatores limitantes para o desenvolvimento das colônias
agrícolas é o “isolamento geográfico”, reforçado pelas condições físico-
83
geográficas dos lugares para os quais os colonos europeus foram
encaminhados, ou seja, lugares cuja morfologia do relevo dificultava a
abertura de estradas, o acesso aos núcleos coloniais, o trabalho na
agricultura e a saída desses colonos e de seus produtos para outros lugares.
Porém,
muitos
colonos
resolveram
com
iniciativas
próprias
essas
dificuldades. Com iniciativas associativas, mantinham uma vida religiosa,
escolas para os filhos e acima de tudo, trabalhavam em comunidade,
diminuindo o tempo da plantação e da colheita para todos.
Este modo de vida dos agricultores resiste até os dias atuais e o
fato de não conseguirem promover o avanço tecnológico em suas áreas é
que os torna peculiares. A agricultura familiar em regime de pequenas
propriedades, atualmente, tem apoios favoráveis à sua permanência. E uma
das razões explica Oliveira (1996) “são esses estabelecimentos camponeses
que respondem por mais de 70% do volume total da produção agropecuária”
(pág. 468).
No caso dos pequenos agricultores contam com inúmeras
iniciativas, porém destacamos o incentivo de créditos agrícolas, melhor
representado pelo Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura
Familiar (PRONAF). O PRONAF contribui à obtenção de créditos dos
pequenos agricultores que detém de poucos recursos econômicos, e possui
uma pequena propriedade de produção voltada para subsistência. Estes
recursos incentivam os produtores a permanecerem no campo, criarem
novas formas de produção, desenvolver associações, que os beneficiem em
conjunto, elaborando atividades até mesmo, coletivas.
Além de considerarmos a política pública - que no caso referimos
o PRONAF - como um fator preponderante que contribui para a permanência
dos agricultores no campo tem-se ainda, alternativas que auxiliam nesse
propósito de conservação. Contudo, a política pública corresponde, portanto,
a uma forma de interação entre o Estado e a sociedade, nesse sentido,
compete às organizações governamentais e não governamentais em
conjunto com os atores sociais - pequenos agricultores - constituírem planos
de desenvolvimento locais.
84
Esses atores se deparam com caminhos diversificados aos
praticados no campo, vê-se em muitos casos que prática tradicional da
agricultura já não é tão prevalecente, um exemplo recente disso, é a
disseminação
do
turismo
rural e
inclusive
a
agricultura
orgânica,
representando uma garantia a mais de lucro para o agricultor e sua família,
além de promover a valorização da cultura local, principalmente no que
tange à sua forte ligação com a terra e o seu sentido de pertencimento a ela.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por meio desse trabalho nos propusemos a analisar a questão
correspondente ao desafio de permanência do homem no campo como uma
difícil meta no contexto do capitalismo, partindo de autores que contribuíram
para esta temática. Com a intenção de fazer algumas reflexões a cerca da
postura do pequeno agricultor na atualidade, e a partir dessa temática
contribuir para estudos futuros, já que este é um tema que não se encerra
apenas nas questões aqui destacadas.
O regime do capitalismo, abordado sucintamente nesse trabalho
possui dinâmicas complexas, foi enfatizada principalmente a participação
dos agentes no meio rural, como tentativas de valorização da sua terra e
permanência, marcadas pela agricultura familiar. Esses aspectos nos
permitiram investigar como ainda se mantêm práticas tradicionais de
subsistência, mesmo com a crescente corrida em busca do lucro do
capitalismo já enraigado também no campo.
Constata-se, por fim, que estes espaços rurais locais, sofreram
transformações, foram atingidos pelo capitalismo, no primeiro momento se
tornaram excluídos, por não acompanharem as transformações, ou seja, a
modernização do campo. Porém, com incentivos e políticas públicas
voltadas ao setor e principalmente a crescente valorização da diversidade e
heterogeneidade, que estes espaços locais fornecem este cenário começou
a mudar. Os incentivos fiscais/econômicos recebidos, por meio de
programas como o PRONAF, direcionaram estes agentes, para sua própria
85
organização através de associações, cultivos de produtos diferenciados,
práticas agrícolas que não demandam de elevada mão-de-obra. A agricultura
familiar gera a sustentabilidade, pois, vai atender a mercados consumidores
que valorizam produtos distintos, tais como os orgânicos, o turismo rural
também se destaca como alternativa de aproveitamento do espaço rural.
REFERÊNCIAS
BURKO, P. Valdomiro N. (OSBM – Ordem de São Basílio Magno) A imigração
ucraniana no Brasil. 2ª ed., Curitiba, s/d.
GOMEZ, J. R. M. Desenvolvimento em (des)construção: provocações e questões
sobre desenvolvimento e geografia. In: FERNADES, B. M; MERQUES, M. I. M;
SUZUKI, J. C, (orgs). Geografia Agrária: teoria e poder. 1º edição. São Paulo:
Expressão Popular, 2007.
GONÇALVES, Sérgio. A luta na Terra. Os assentamentos do MST e o
desenvolvimento do município de Querência do Norte/ PR. Presidente Prudente,
2008.
HARVEY,D. A transformação político – econômico do capitalismo no final do século
XX.In:______. Condição pós – moderna. São Paulo: Loyola,1993. pg.115 – 184.
HESPANHOL, A. N. O desenvolvimento do campo no Brasil. In: FERNADES, B. M;
MERQUES, M. I. M; SUZUKI, J. C, (orgs). Geografia Agrária: teoria e poder. 1º
edição. São Paulo: Expressão Popular, 2007.
LIPIETZ, Alain. Audácia: uma alternativa para o século 21. São Paulo: Editora
Nobel, 1991.
MALUF, R. S. Atribuindo sentido(s) á noção de desenvolvimento econômico.
Estudos Sociais e Agricultura. 2000, pág. 53-86.
NEVES, D. P. Agricultura familiar: quantos ancoradouros! In: FERNADES, B. M;
MERQUES, M. I. M; SUZUKI, J. C, (orgs). Geografia Agrária: teoria e poder. 1º
edição. São Paulo: Expressão Popular, 2007.
OLIVEIRA, Ariovaldo V. de. Agricultura Brasileira: transformações recentes. In:
ROSS, J. L. S (org). Geografia do Brasil. São Paulo: Edusp, 1996.
PEET, R. Imaginários de Desenvolvimento. In: FERNADES, B. M; MERQUES, M. I.
M; SUZUKI, J. C, (orgs). Geografia Agrária: teoria e poder. 1º edição. São Paulo:
Expressão Popular, 2007.
PETRONE, M. T. S. O imigrante e a pequena propriedade. São Paulo:
Brasiliense. 1984.
PIRES, E. L. S. As lógicas espaciais e territoriais o desenvolvimento: delineamento
preliminar dos aspectos históricos, teóricos e metodológicos. In: FERNADES, B. M;
MERQUES, M. I. M; SUZUKI, J. C, (orgs). Geografia Agrária: teoria e poder. 1º
edição. São Paulo: Expressão Popular, 2007.
SANTOS, M. O Dinheiro e o Território. In: SANTOS, M; BECKER. B, (orgs).
Território, Territórios: ensaios sobre o ordenamento territorial. Rio de Janeiro:
DP&A, 2006.
SILVA, Marcia da. Análise política do território: poder e desenvolvimento no
Centro-Sul do Paraná. Guarapuava: Unicentro, 2007.
86
WALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. 11º edição. Rio de
Janeiro: DP&A, 2006.
WANDERLEY, M. N. B. A emergência de uma nova ruralidade nas sociedades
modernas avançadas – o “rural” como espaço singular e ator coletivo. Estudos
Sociais e Agricultura. 2000, pág. 53-86.
____________________. Raízes Históricas do Campesinato Brasileiro. In:
TEDESCO, I. (org). Agricultura Familiar: realidades e perspectivas. 3º Ed. Passo
Fundo: UPF, 2001.
WARNIER, Jean-Pierre. A mundializacao da cultura. São Paulo: EDUSC, 2000.
OUTRAS FONTES
BERNARDES, Nilo. Expansão do povoamento no Estado do Paraná. Revista
Brasileira de Geografia. Rio de Janeiro, n. 14, out/dez., 1952.
CHANG, M. Y. Sistema Faxinal: Uma Forma de Organização Camponesa em
Desagregação no Centro-Sul do Paraná. (Dissertação de Mestrado de economia).
UFRRJ. Rio de Janeiro, 1985.
FAGARDO, S. Paisagem Rural e Território Econômico: possibilidades de leitura
do espaço geográfico. In: XIV Semana de Geografia, número 3, 2005, Guarapuava.
Anais. Guarapuava: UNICENTRO, 2005. p. 31-39.
LUPEPSA, Eliane Crestiane; SHÖRNER, Anselmo. Organização socioespacial:
faxinalenses e agricultores Jesuíno Marcondes, Prudentópolis/PR (1987-2007). In:
Revista Tempo, Espaço e Linguagem (TEL), v. 1, n. 3, set./dez. 2010.
O RECONHECIMENTO DO DIREITO À ALIMENTAÇÃO
COMO DIREITO FUNDAMENTAL : A SEGURANÇA
ALIMENTAR COMO MÉTODO PARA A EFETIVAÇÃO DESSE
DIREITO NA REGIÃO DE GUARAPUAVA
Mariana Rocha Malheiros
Direito – FG
RESUMO: O presente trabalho trata do direito a alimentação e da segurança
alimentar como maneira para efetivar esse direito. Primeiramente analisa-se a atual
conjuntura mundial, através do neoliberalismo e as conseqüências de tal ordem
mundial, que são fundamentais para manter a fome no mundo. Em seguida avaliase o avanço do direito a alimentação no Brasil e sua previsão constitucional, bem
como o conceito de segurança alimentar e suas implicações na produção de
alimentos saudáveis. Por fim, abordam-se as decisões das conferências municipal
e regional sobre segurança alimentar.
87
Palavras-chave: Alimentação. Direito Fundamental. Segurança Alimentar. Direitos
Humanos.
INTRODUÇÃO
A alma da fome é política.
Herbert José de Souza, Betinho
É desnecessário discutir-se a importância de uma alimentação
adequada para os seres humanos. É unânime que o homem só desenvolvese com uma alimentação sadia, dentro dos padrões nutricionais, não
somente durante a infância, mas por toda a sua vida. Para ter seu direito à
vida preservado é imprescindível que o ser humano possa alimentar-se.
Tal ideia é unânime, e qualquer pessoa, independente se possui uma
formação acadêmica, sabe que a alimentação adequada é a base de
qualquer desenvolvimento sadio, físico e mental, de um ser humano.
Todavia, milhões de pessoas (inclusive no Brasil) passam fome.
Os dados são assustadores. A cada 5 (cinco) segundos uma criança
com idade inferior a 10 (dez) anos morre diretamente de fome, ou por
doenças relacionadas a uma má alimentação21.
Na África subsaariana, o continente mais devastado pela fome, 34% da
população padece do que se considera “fome extrema”, com uma ração
diária de menos de 300 (trezentas) calorias por dia22.
O Brasil, apesar de nos últimos anos se empenhar na erradicação da
fome e da miséria como uma de suas principais metas, também traz dados
que não são animadores. De três brasileiros, um é desnutrido e 16
(dezesseis) milhões de pessoas vivem com 250 calorias por dia, o que está
bem aquém dos 1,9 quilocalorias recomendado pela ONU para uma
21
ZIEGLER, Jean. Fome e Direitos Humanos. Disponível em
http://www.ecodebate.com.br/2008/04/19/fome-e-direitos-humanos-artigo-de-jean-ziegler/ Acesso em
09.10.2011.
22
Ibidem.
88
alimentação adequada à um ser humano23.
O que se verifica é que combater a fome, tanto faz se esse combate é a
nível mundial ou no Brasil enquanto política de Governo e/ou Estado, não é
somente proporcionar um prato de alimentos para um faminto. Combater a
fome é, sobretudo, distribuir a renda de forma igualitária (ou menos
desigual), formular estratégias que proporcionem sustentabilidade aos povos
devastados pela falta de alimentos e, ainda, preservar o meio ambiente para
as futuras gerações, garantindo assim que todos tenham o seu direito aos
alimentos preservado.
Todavia, surge logo o questionamento: como proporcionar alimentação
adequada e sustentabilidade econômica e ambiental?
A Lei Federal 11.34624, sancionada em 15 de setembro de 2006 pelo expresidente Luis Inácio Lula da Silva, criou o Sistema Nacional de Segurança
Alimentar – SISAN, com o intuito de assegurar o direito humano à
alimentação adequada.
Todavia, a própria Lei é clara ao afirmar a necessidade de preservação
da autonomia dos povos, respeitando suas múltiplas características
culturais, além claro da conservação da biodiversidade e da utilização
sustentável dos recursos, e isso é possível na região de Guarapuava
Assim, o presente trabalho objetiva demonstrar a possibilidade de
eliminar a fome da região de Guarapuava, mantendo a sustentabilidade
econômica e ambiental, proporcionando ainda a emancipação econômica de
diversas famílias.
Para tanto esse trabalho faz uma análise de conjuntura da atual situação
mundial em relação ao problema da fome. Por que não há uma solução para
esse problema? É possível alimentar os sete bilhões de habitantes do
planeta?
Posteriormente, se tratará do direito à alimentação no Brasil a luz da
23
TORRES, Bárbara. Fome é violação dos direitos humanos, denuncia relator especial da ONU.
Disponível em http://noticias.uol.com.br/lusa/ultnot/2002/10/15/ult611u14980.jhtm Acesso em
09.10.2011.
24
Lei Federal 11.343/2006. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato20042006/2006/Lei/L11346.htm Acesso em 08.10.2011.
89
Emenda Constitucional 64 de 4 de fevereiro de 2010 e da Lei 11.346, bem
como a sua relevância enquanto direito social positivado.
Em seguida, se trará a conceituação de segurança alimentar e porque é
medida que se mostra adequada para solucionar esse grave mal que assola
a comunidade mundial.
Depois, o presente trabalho trará as propostas das Conferências
Municipal e Regional de Segurança Alimentar realizadas neste ano, em
Guarapuava, com ideias concretas sobre segurança alimentar e quem pode
aplicar essas medidas na região.
1. VERGONHA MUNDIAL
“A alma da fome é política!” Tal afirmativa dita pelo sociólogo Herbert
José de Souza, o Betinho, define a maior causa da fome de milhões de
pessoas por todo o mundo. Entretanto, o termo “política” não pode ser visto
unicamente como uma questão de Política de Governo, envolvendo somente
as forças político - partidárias de um Estado.
Se assim fosse, o problema, possivelmente, seria solucionado de forma
simples: eleições democráticas, em que homens e mulheres seriam eleitos
por uma maioria que os legitimaria no Poder e então, poderiam eliminar de
uma vez por todas essa mazela que assola grande parte da população
mundial.
Claro, a corrupção nos governos também é fator que agrava muito a
situação dos famintos em todo o planeta, e mesmo em outras épocas é
possível vislumbrar tal constatação. O Baile da Ilha Fiscal, realizado no Rio
de Janeiro em 9 de novembro de 1889 é uma das maiores provas de tal fato.
No último baile da monarquia havia na ceia sorvete (o que era uma
novidade para a época), aves exóticas como inhambus, faisões e macucos,
além de duas bandas militares que animaram o baile por toda a noite, 80
caixas de champanhe e 10 mil litros de cerveja. Apurou-se que foi gasto 100
contos de réis, destinados, originalmente, a socorrer os flagelados pela seca
90
no Ceará, segundo o historiador Milton Teixeira25 (2006, p. 22).
Entretanto, o que se observa, é que independente de governos, a fome é
um problema que faz parte do cotidiano da maioria dos países,
principalmente os chamados países de periferia (inclusive o Brasil).
Então, por que a alma da fome é política?
As políticas de governo, no atual mundo globalizado, estão intimamente
ligadas às políticas econômicas. Estas são ditadas pelas grandes empresas
neoliberais, detentoras da maior parte do capital mundial. O neoliberalismo
está presente em todas as decisões mundiais. Frei Betto, em A Mosca Azul,
conceitua
O neoliberalismo teve como parteiro o Consenso de Washington –
a globalização do mercado “livre” e, segundo conveniências, do
modelo norte-americano de democracia (jamais exigidos aos
países árabes fornecedores de petróleo e governados por
oligarquias favoráveis aos interesses da Casa Branca). Ele
apregoa a exclusão do Estado da produção de riquezas e da
administração de serviços. Ao Estado caberia zelar pelos
interesses privados, defender o patrimônio particular, dirimir
contendas e distribuir o excedente. Sobretudo, manter ativas as
forças policiais e militares em defesa dos “sacrossantos direitos”
do capital privado, assegurando ao mercado predominância sobre
as demandas sociais. Assim, quanto mais se transferem
instituições da esfera pública às mãos da iniciativa privada, tanto
mais se considera o Estado “moderno”. Privatizar, eis o
fundamento do neoliberalismo (2006, p. 133 e 134)
A partir das ideias do autor, se pode pressupor que as corporações
neoliberais não possuem compromisso social com um povo em um
determinado Estado. Assim, elas visam somente atingir suas metas de
lucros, não se importando nenhum pouco se o povo de um determinado país
está bem ou não. O melhor exemplo é o caso dos diamantes em Serra Leoa.
O país é um dos maiores produtores de diamantes do mundo, o maior
símbolo de riqueza, luxo e ostentação; todavia, laconicamente, ocupa o
último lugar no ranking da ONU no IDH – Índice de Desenvolvimento
Humano. A expectativa de vida em Serra Leoa é de 35 anos e mais da
25
O Último Baile da Monarquia. Revista Aventuras Na História. Edição 36. Agosto/2006. Editora
Abril.
91
metade da população vive abaixo da linha de pobreza26.
Arrasado por uma guerra civil, o país assiste diariamente o
contrabando de diamantes. Assim, grandes empresas compram diamantes
muito mais baratos e os repassam aos consumidores com um valor
extremamente alto, com grandes lucros; e enquanto isso, o povo de Serra
Leoa padece, sem condições de sobrevivência.
Com muita propriedade, Jean Ziegler, sociólogo suíço e relator
especial da ONU sobre o direito à alimentação, explica o que acontece hoje
em Serra Leoa e em grande parte dos países do planeta
(...) este massacre cotidiano devido à fome não obedece a
nenhuma fatalidade. Por trás de cada vítima há um assassino. A
atual ordem mundial não é apenas mortífera, mas também
absurda. O massacre está instalado numa normalidade imóvel.
A equação é simples: quem tem dinheiro come e vive. Quem não
tem sofre, torna-se inválido e morre. Não existe a fatalidade.
27
Qualquer morte por fome é um assassinato .
Não há interesse dos novos donos da ordem econômica em resolver
a situação dos milhões de famintos em todo o mundo. No caso de Serra
Leoa é possível entender tal situação porque, no momento em que há a
promoção de um povo e o seu governo passa a ser cumpridor dos Direitos
Humanos, torna-se mais
difícil para
uma empresa
(principalmente
estrangeira) explorar as riquezas deste povo.
No momento que Serra Leoa tiver seu povo alimentado e
emancipado, com um Governo que promova a dignidade humana e políticas
públicas sociais, o combate ao contrabando de diamantes tornar-se-ia uma
conseqüência de sua soberania e para explorar as minas, as multinacionais
terão que investir no país, o que diminuiria muito os seus lucros.
Numa análise sem emoção da atual ordem mundial, o que se verifica
é que a Declaração Universal de Direitos Humanos é violada diariamente de
26
CANDELORI, Roberto. Resumão/Atualidades: Os diamantes de Serra Leoa. Disponível em
http://www1.folha.uol.com.br/folha/educacao/ult305u2263.shtml Acesso em 08.10.2011
27
ZIEGLER, Jean. Fome e Direitos Humanos. Disponível em
http://www.ecodebate.com.br/2008/04/19/fome-e-direitos-humanos-artigo-de-jean-ziegler/ Acesso em
09.10.2011.
92
forma deliberada. A fome no mundo não é um acaso do destino ou então a
falta de vontade de um povo para trabalhar e muito menos uma loteria
genética, em que a natureza destinou privilégio para uns e para outros não.
A fome no mundo é fruto da ganância de seres humanos que para
conseguir atingir suas metas de lucro e poder permitem que outros seres
humanos, idênticos em dignidade, tenham violados seus principais direitos, e
talvez o mais elementar de todos, o de subsistir e por conseqüência, viver.
A situação apresentada torna-se ainda mais absurda se for levada em
consideração a forma como atuam as forças agrícolas de produção.
Conforme Jacques Diouf,
dirigente da FAO – Organização das Nações
Unidas para Agricultura e Alimentação, com o atual desenvolvimento da
agricultura por todo o mundo, o planeta Terra poderia alimentar, sem maiores
problemas, 12 bilhões de seres humanos, o que significa o dobro da atual
população mundial (cerca de 6 bilhões de pessoas)28.
Zelando exclusivamente pelas leis de comércio, sem levar em
consideração as questões das populações locais, a OMC – Organização
Mundial do Comércio – mostra-se omissa quanto aos milhões de seres
humanos que passam fome por todo o mundo. Isso sem falar nas
legislações de cada país, com poucos programas sociais para combater a
fome e incentivo ao neoliberalismo. Seres humanos não são mais seres
humanos, são meros consumidores. A humanidade pode ser dividida em:
quem possui poder aquisitivo e quem não possui poder aquisitivo.
No último ano do século XX, a CNBB – Conferência Nacional dos
Bispos do Brasil, juntamente com as demais igrejas cristãs membros do
CONIC – Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil, lançou a
Campanha da Fraternidade com o tema “Dignidade Humana e Paz” e o lema
“Novo Milênio sem exclusões” onde, de forma corajosa, afirmou
(...) toda a humanidade, atualmente, e assim também nosso País,
28
Apud ZIEGLER, Jean. Fome e Direitos Humanos. Disponível em
http://www.ecodebate.com.br/2008/04/19/fome-e-direitos-humanos-artigo-de-jean-ziegler/ Acesso em
09.10.2011.
93
está nas mãos do capital financeiro internacional, concentrado nas
mãos de poucos. Esse capital tem sede em alguns países muito
ricos, e é favorecido por seus governos. Não aceita normas e
limites e exige liberdade absoluta de ação em todo o mundo. Para
servi-lo, as nações devem renunciar à sua soberania, as pessoas
devem renunciar aos seus direitos, de modo especial aos
trabalhistas.
Ora, se a pessoa humana só vale se é produtora e consumidora,
todos que não possuem este perfil são descartáveis. Quando
muito, admite-se a adoção de políticas compensatórias, para que,
antes de morrerem, não se revoltem e criem embaraços ao
avanço da nova cultura globalizada do capital financeiro
internacional (CONIC, 2000, p. 95).
Os direitos humanos, positivados ou não, estão sendo violados pelos
detentores do capital, que mantém políticas compensatórias para evitar
alterações no status quo e assim, permanecerem com sua política financeira
de dominação e exploração.
E se a alma da fome é política só há uma maneira de combatê-la:
com ações políticas afirmativas.
2. DIREITOS HUMANOS E DIREITOS FUNDAMENTAIS
Antes de tratar propriamente do direito à alimentação, previsto na
Constituição Federal, é importante tratar da diferença entre Direitos
Humanos e Direitos Fundamentais.
É difícil conceituar direitos humanos tendo em vista todas as mudanças
que esses direitos sofreram ao longo da história, além do mais, apesar da
universalidade dos direitos humanos ser uma característica essencial, os
mesmos podem variar de cultura para cultura, povo para povo.
Para os cristãos todos os homens são iguais em direito porque todos
são filhos do mesmo Deus, portanto irmãos, prevalecendo assim, para todos
a universalidade de todos os direitos. Os materialistas, ou sem religião, ou
adeptos de uma religião não cristã, tendem ao mesmo conceito; todavia o
justificam na natureza humana e alguns na razão humana. Como todos são
humanos, cabe a todos os mesmos valores graças a natureza ou a razão,
pura e simples, que fez a todos seres humanos.
94
Essas definições não convencem porque são ideias que foram impostas
por pessoas que definiram valores que beiram ao maniqueísmo no mundo
ocidental. Os seres humanos não são iguais porque são filhos de Deus ou
porque sua natureza humana os torna iguais. Os seres humanos são iguais
e justificam essa igualdade num ser superior ou na sua natureza. Em
síntese, a igualdade é um valor que nos foi passado. Se hoje se considera
homens e mulheres iguais a luz do direito é porque em algum momento
alguém definiu que homens e mulheres são iguais.
Encontra-se na definição de direitos humanos por um viés antropológico,
na visão de Luiz Eduardo Soares, a melhor resposta: “direitos humanos são
a tradução prática, política e jurídica, de valores de nossa cultura ocidental,
de origem humanista e vocação universalista” (apud ALENCAR, 2002, p.
76).
Ou seja, Direitos Humanos são valores da cultura Ocidental. Mas não
são simplesmente valores. São o que de melhor foi produzido em todo o
pensamento ocidental.
Claro que o conceito ainda é falho ao colocar a cultura ocidental como
superior em relação a outras culturas, como a cultura oriental e islâmica,
mas os Direitos Humanos representam o que de melhor foi produzido em
todo o tempo de evolução do pensamento Ocidental. Por tal razão, não cabe
adotar uma postura arrogante frente a outras culturas, mas se for possível,
se deve convencer os outros que os valores são válidos e podem servir de
acréscimo às outras culturas.
Para Flores “os direitos humanos compões uma racionalidade de
resistência, na medida em que traduzem processos que abrem e consolidam
espaços de luta pela dignidade humana” (apud Piovesan, 2011, p. 36).
Assim, por exemplo, é possível justificar a luta pacífica contra o
apedrejamento de mulheres nos países islâmicos. Felizmente, no Ocidente a
diferença entre homens e mulheres diminuiu significativamente nos últimos
anos de modo que, se os muçulmanos se convencerem da melhoria no
mundo ocidental, devem parar de aplicar a lei de apedrejamento de
mulheres em casos de adultério, justificando-se assim, a intervenção junto a
95
cultura muçulmana para preservar a dignidade feminina.
Por fim, Nino afirma que “os direitos humanos são uma construção
consciente vocacionada a assegurar a dignidade humana e a evitar
sofrimentos, em face da persistente brutalidade humana (apud Piovesan,
2011, p. 36). Partindo-se da premissa que Direitos Humanos são valores
ocidentais com força universal a fim de promover o que há de melhor no
homem e, por consequencia, sua dignidade, é preciso diferenciá-los dos
Direitos Fundamentais.
Para Sarlet os direitos fundamentais são
(...) direitos do ser humano reconhecidos e positivados na esfera
do direito constitucional positivo reconhecidos e positivados na
esfera do direito constitucional de determinado Estado, ao passo
que os direitos humanos são reconhecidos nos documentos de
direito internacional, tendo validade universal para todos os povos
e tempos (...) (apud MANIGLIA, 2008, p. 69).
Assim, é possível concluir que os direitos fundamentais também são
direitos humanos, porém estão positivados na Constituição de um Estado,
respeitando os valores (cultura) do seu povo.
4. O DIREITO À ALIMENTAÇÃO
O direito a alimentação já é reconhecido como um direito humano; o
Brasil, porém, o transformou num direito fundamental.
Ao inserir o termo “alimentação” no artigo 6º da Constituição Federal,
através da Emenda 64, de 4 de fevereiro de 2011, o Brasil demonstrou o
valor que considera a referido direito.
Nas palavras de Alexandre de Moraes:
Direitos Sociais são direitos fundamentais do homem,
caracterizando-se como verdadeiras liberdades positivas, de
observância obrigatória em um Estado Social de Direito, tendo por
finalidade as melhorias de qualidade de vida aos hipossuficientes,
visando a concretização da igualdade social, e são consagrados
como fundamento do Estado Democrático, pelo artigo 1º, IV, da
Constituição Federal (2008, p. 193).
Um Estado Social de Direito precisa garantir que seus cidadãos
96
possuam condições básicas de vida a fim de que possam ter os seus direitos
fundamentais garantidos.
Desde o início do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva,
em janeiro de 2003, o Programa Social “Fome Zero” visa eliminar todas as
formas de pobreza e miséria existentes no país.
O programa possui muitas falhas, como por exemplo, a não
emancipação
das
famílias
assistidas
pelo
Programa,
que
são
completamente dependentes do auxílio que recebem do Governo.
Todavia, com o programa, mostrou-se como é importante combater a
pobreza e a fome no Brasil. Em títulos de números, dos 12% da população
que viviam em estado de pobreza extrema, 7, 2% deixaram esse estado
miséria absoluta durante os 8 anos do Governo Lula29.
Hoje, porém, é preciso pensar em maneiras de aperfeiçoar o combate
a fome, tornando as famílias independentes, ou seja, na linguagem popular
seria o famoso jargão “ensiná-las a pescar”.
Os méritos aos programas sociais, que foram ampliados no Governo
Lula, são grandes, mas agora se tornam insuficientes para atender a
população brasileira.
5 . SEGURANÇA ALIMENTAR
Analisando por esse aspecto, a segurança alimentar se torna uma
alternativa viável para garantir que todas as pessoas possam se alimentar
no Brasil.
Segurança alimentar é um conceito que amplia o direito à alimentação:
Alimentar-se é um ato que projeta mais que sobrevivência, é uma
permissão a uma vida saudável e ativa, dentro dos padrões
culturais de cada país, com qualidade que propicie nutrição e
prazer, e os produtos alimentícios devem ser inspecionados por
órgãos responsáveis, que devem zelar continuamente por sua
oferta e sua segurança às populações (MANIGLIA, 2008, p. 123).
A segurança alimentar não consiste unicamente em garantir a
29
KEHL, Maria Rita. Dois pesos... .Disponível em http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/mariarita-kehl-dois-pesos.html. Acesso em 15.10.2011.
97
alimentação para todos os seres humanos, mas também que essa
alimentação seja saudável, dentro dos padrões nutricionais e que as
diversas culturas consigam manter suas raízes culturais, respeitando o meio
ambiente.
Nas palavras de Borges segurança alimentar é sintetizada como “(...)
garantia de que todas as pessoas humanas tenham a todo momento, acesso
material e econômico aos alimentos que necessitam para levar uma vida
ativa e saudável.” (2007, p. 1017)
O conceito de segurança alimentar foi evoluindo com o passar do
tempo, tanto no seu aspecto nutricional, como a qualidade do alimento
ofertado e balanceamento da dieta, quanto nas atividades do Estado em
proporcionar políticas públicas garantindo aos cidadãos dos diversos cantos
do Brasil saneamento básico, saúde pública, incentivo ao aleitamento
materno e até mesmo carinho no preparo de alimentos.
Todavia, é preciso reconhecer a segurança alimentar não como a
caridade de um governo ou de Instituições não governamentais que
trabalham com a questão. Segurança alimentar é um direito de todos os
cidadãos e deve ser proporcionado a todos poder alimentar-se de forma
saudável e sustentável, tanto do ponto de vista econômico e ambiental,
quanto do ponto de vista nutricional.
Falar em segurança alimentar consiste em pensar na forma como
será produzida a alimentação que irá chegar na mesa de todos os brasileiros
por um viés econômico, quanto na qualidade desses alimentos, se de fato
cumprem a função de suprir as necessidades nutricionais dos seres
humanos.
6.
SUSTENTABILIDADE
ECONÔMICA
E
AMBIENTAL
NA
SEGURANÇA ALIMENTAR
A sustentabilidade econômica e ambiental não encontra respaldo nas
grandes propriedades de terra. Na visão de Maniglia:
98
O latifúndio é a expressão da opressão; por meio dele, dá-se a
concentração de terras, a dominação no setor rural, a
monocultura, a economia de exportação. Lutar contra ele é lutar
contra a fome, a favor da igualdade, da liberdade e da democracia;
é a luta pela busca da solidariedade. A luta pela terra traz a
mancha do sangue do vitimado, que nada mais faz do que clamar
por direitos constitucionalmente garantidos, tanto no artigo 5º
(direitos e garantias individuais) como nos assuntos pertinentes a
questão agrária (arts. 184 a 191 da Carta Magna de 1988) (2008,
p. 89).
De fato, o latifúndio se mostra um dos principais responsáveis pela
fome que assola o campo e a cidade. A falta de terra para trabalhar
transforma o homem do campo num retirante, sendo uma das principais
causas do êxodo rural.
Tais propriedades ferem um dos mais significativos princípios do
Direito Agrário, o Princípio da Justiça Social, que consiste
(...) na obrigação do Estado em promover as reformas de base na
política agrária para proporcionar aos homens do campo mais
dignidade pela iniciativa privada, mais cidadania, mais mercado de
trabalho, melhor condição de vida com a distribuição de renda,
que entre outros, são os fundamentos da ordem econômica e
social do País (...).
A justiça social é toda iniciativa ou
providência enviada no sentido de melhorar a condição de vida
das pessoas no uso e gozo de seus direitos fundamentais
(BORGES, 2007, p. 67).
Existem muitas terras que estão nas mãos de poucas pessoas e
muitos que não possuem terra nenhuma para trabalhar.
E
além
desse
problema social, o latifúndio demonstra não ser uma alternativa viável para a
questão ambiental, já que há o predomínio da monocultura e o uso abusivo
de agrotóxicos, tornando mais barato o custo da produção agrícola e até o
uso de sementes transgênicas, ferindo expressamente o princípio da
Precaução, previsto no Direito Ambiental.
Ainda, as monoculturas dos latifúndios são para exportação, não
integrando o mercado interno, prejudicando muito na produção de alimentos
para o consumo da população local.
circunstancias, é a agricultura familiar.
O que se mostra viável, diante das
99
O artigo 3º da Lei Federal 11.326 de 24 de julho de 200630conceitua
agricultura familiar:
o
Art. 3 Para os efeitos desta Lei, considera-se agricultor familiar e
empreendedor familiar rural aquele que pratica atividades no meio
rural, atendendo, simultaneamente, aos seguintes requisitos:
I - não detenha, a qualquer título, área maior do que 4 (quatro)
módulos fiscais;
II - utilize predominantemente mão-de-obra da própria família nas
atividades
econômicas
do
seu
estabelecimento
ou
empreendimento;
III - tenha percentual mínimo da renda familiar originada de
atividades
econômicas
do
seu
estabelecimento
ou
empreendimento, na forma definida pelo Poder Executivo;
o
§ 1 O disposto no inciso I do caput deste artigo não se aplica
quando se tratar de condomínio rural ou outras formas coletivas de
propriedade, desde que a fração ideal por proprietário não
ultrapasse 4 (quatro) módulos fiscais.
o
§ 2 São também beneficiários desta Lei:
I - silvicultores que atendam simultaneamente a todos os
requisitos de que trata o caput deste artigo, cultivem florestas
nativas ou exóticas e que promovam o manejo sustentável
daqueles ambientes;
II - aqüicultores que atendam simultaneamente a todos os
requisitos de que trata o caput deste artigo e explorem
reservatórios hídricos com superfície total de até 2ha (dois
hectares) ou ocupem até 500m³ (quinhentos metros cúbicos) de
água, quando a exploração se efetivar em tanques-rede;
III - extrativistas que atendam simultaneamente aos requisitos
previstos nos incisos II, III e IV do caput deste artigo e exerçam
essa atividade artesanalmente no meio rural, excluídos os
garimpeiros e faiscadores;
IV - pescadores que atendam simultaneamente aos requisitos
previstos nos incisos I, II, III e IV do caput deste artigo e exerçam a
atividade pesqueira artesanalmente.
V - povos indígenas que atendam simultaneamente aos requisitos
previstos nos incisos II, III e IV do caput do art. 3º;
VI - integrantes de comunidades remanescentes de quilombos
30
Lei Federal 11.326/2006. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato20042006/2006/Lei/L11326.htm Acesso em 11.10.2011
100
rurais e demais povos e comunidades tradicionais que atendam
simultaneamente aos incisos II, III e IV do caput do art. 3º. (...)
A agricultura familiar não se realiza em grandes propriedades de terra,
mas em pequenas propriedades, valorizando o trabalho de toda a família,
mantendo assim também a cultura do campo e apresentando um modelo
sustentável de produção de alimentos.
O produto que chega às mesas das famílias urbanas é, em sua
grande maioria, produto da agricultura familiar. Todavia, a fim de melhorar o
sistema, necessário se faz pensar também em cooperativismo entre as
famílias, favorecendo ainda mais o trabalho entre os agricultores.
A própria
Lei
11.326/2006,
no
mencionado
artigo,
fala
do
cooperativismo entre as famílias a fim de aumentar e melhorar a produção
no campo. Assim o campo se torna auto-sustentável, e a cidade consome
alimentos ricos em nutrientes e que preservam o meio ambiente.
Esse modelo pode ser uma alternativa para resolver a questão da
fome, não só na região de Guarapuava, mas, inclusive, por todo o mundo, já
que valoriza a cultura local consegue suprir as necessidades de cada região.
Aí entra a questão de produção local. Para preservar o meio
ambiente, devem-se atender prioritariamente as necessidades locais. A
produção em massa de alimentos para a exportação também é um fator de
destruição ambiental muito sério.
Ainda, Maniglia coloca que “o homem rural deve cuidar de manter sua
atividade de acordo com o que a natureza lhe oferece, promovendo
progresso para a comunidade, por meio de exploração racional de seus
meios (2008, p. 97)”.
Não há grandes alterações naturais quando o homem respeita a
natureza, e assim, todos podem viver dela.
Assim, segurança alimentar passa pela distribuição de terra e
incentivo à agricultura familiar, proporcionando a todos o direito a
alimentação de forma ampla.
101
7. AS
CONFERÊNCIAS
DE
SEGURANÇA
ALIMENTAR
NO
MUNICÍPIO DE GUARAPUAVA31
A
Primeira
Conferência
de
Segurança
Alimentar
realizada
em
Guarapuava traçou como um dos objetivos do município o incentivo à
agricultura ecológica, com o “corte” de incentivos fiscais a todos os
agricultores que utilizam agrotóxicos na produção de alimentos e ainda
voltou a tratar da questão da limitação à propriedade, que foi tratada em
2010 por todo o Brasil e ainda tratou da importância de incentivar o
cooperativismo entre os agricultores, sendo que cabe ao Estado nos três
âmbitos (municipal, estadual e federal) o sistema de crédito ao pequeno
agricultor.
A Conferência Regional, também realizada em Guarapuava, ratificou as
propostas e ainda mencionou a importância de fortalecer os conselhos de
Segurança Alimentar, sendo que os mesmos devem estar presentes em
todos os municípios, ainda foi tratado que as políticas de meio ambiente
devem estar integradas as políticas de alimentação, sendo que ambas
devem estar juntas.
O que se verifica é que a Lei 11.346/2006 e a Emenda 64 da
Constituição Federal já mostram o compromisso que governo e população
estão assumindo para eliminar de uma vez por todo o mal que assola grande
parte do país e da região de Guarapuava: a fome.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Existem diversas soluções para a fome em todo o planeta e,
principalmente para toda a região de Guarapuava, responsável por boa parte
da produção agrícola e da pecuária do Estado do Paraná. A criação do
Conselho Municipal de Segurança Alimentar, com orçamento próprio, deve
ser o fermento para que surjam alternativas para melhorar a situação no
31
Informações prestadas por Eliana Aparecida Rosa Bisol, Assistente Social do Ministério Público do
Paraná em Guarapuava/PR e delegada pelo Poder Público em ambas as conferências.
102
campo, evitando o êxodo rural e promovendo a agricultura familiar
cooperativada.
O fim da mercantilização dos alimentos é uma das alternativas para todo
o mundo. Também é dever de todas as nações zelar pela qualidade dos
alimentos que chegam a todas as mesas.
Eliminar a fome é algo fundamental para o desenvolvimento da região e
se as propostas das conferências relacionadas ao tema forem efetivadas
acredita-se que será possível a concretização de tal ideal, o que significa
que será viável a existência de uma sociedade na qual todas as pessoas
possam ser bem alimentadas.
REFERÊNCIAS
ALENCAR, Chico e outros. Direitos mais humanos. 2ª ed. Rio de Janeiro:
Garamond, 2002.
BETTO, Frei. A Mosca Azul. Rio de Janeiro: Rocco, 2006.
BORGES, Antonino Moura. Curso Completo de Direito Agrário. 2ª ed. Leme/SP:
Edijur, 2007.
CONIC. Dignidade Humana e Paz: Novo Milênio sem exclusões. São Paulo:
Editora Salesiana Dom Bosco, 2000.
MANIGLIA, Elisabeth. As interfaces do Direito Agrário e dos Direitos Humanos
e a Segurança Alimentar. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2009.
MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 23ª ed. São Paulo: Atlas, 2008.
PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e Justiça Internacional. 2ª ed. São Paulo:
Saraiva, 2011.
VADE MECUM 2011. 12ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
SITOGRAFIA
CANDELORI, Roberto. Os diamantes de Serra Leoa. Disponível em
http://www1.folha.uol.com.br/folha/educacao/ult305u2263.shtml Acesso em
08.10.2011
KEHL, Maria Rita. Dois pesos... .Disponível em http://www.viomundo.com.br/voceescreve/maria-rita-kehl-dois-pesos.html. Acessado em 15.10.2011.
BRASIL, Lei Federal 11.326/2006. Disponível em
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11326.htm /
BRASIL, Lei Federal 11.343/2006. Disponível em
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/Lei/L11346.htm Acesso
em 08.10.2011. Site acessado em 08 de outubro de 2011.
TORRES, Bárbara. Fome é violação dos direitos humanos. Disponível em
http://noticias.uol.com.br/lusa/ultnot/2002/10/15/ult611u14980. Acesso em 08 de
outubro de 2011.
103
ZIEGLER,
Jean.
Fome
e
Direitos
Humanos.
Disponível
em:
http://www.ecodebate.com.br/2008/04/19/fome-e-direitos-humanos-artigo-de-jeanziegler/ Acessado em 08 de outubro de 2011.
INFLUÊNCIA DE PLANTAS DE COBERTURA NAS
PROPRIEDADES FÍSICAS DE UM LATOSSOLO
COMPACTADO.
Prof. Ms. Emmanuel Sanchez - FG
Profª Draª Aline Marques Genú – UNICENTRO
Prof. Dr. Márcio Furlan Maggi- UNIOESTE
RESUMO: As alterações das propriedades físicas dos solos afetam a produtividade
das culturas comerciais, dificultando a conquista da sustentabilidade pelas
propriedades agrícolas. A utilização de plantas de cobertura para melhoria em solos
compactados é devido a agirem como subsoladores naturais. Este trabalho
objetivou verificar a influência de quatro espécies de plantas utilizadas como
cobertura de solos: ervilhaca (Vicia sativa L.), nabo forrageiro (Raphanus
sativus L.), azevém (Lolium multiflorum Lam.) e aveia preta (Avena strigosa
Schreb), nas propriedades físicas de um Latossolo Bruno distrófico (LBd)
compactado mecanicamente. Foi desenvolvido em Guarapuava, PR, no Campus
CEDETEG da Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO). Observou-se
que a utilização de plantas de cobertura em solos compactados, logo no primeiro
ciclo de cultivo, pode promover uma diminuição na densidade do solo na camada
superficial de 0,0 a 0,10m; no entanto, a macroporosidade, microporosidade e
porosidade total do solo não sofreram modificações. Também não promoveram
mudanças significativas na resistência a penetração do solo, sendo os maiores
valores encontrados nas camadas de 0,10 a 0,30 m.
Palavras-Chave: Densidade. Compactação de Solos. Plantas de Cobertura.
INTRODUÇÃO
A compactação do solo é o processo pelo qual as partículas do solo e
104
agregados são rearranjados, tendo estes últimos sua forma e tamanho
alterados. Este rearranjo resulta no decréscimo do espaço poroso e aumento
da densidade (HAMZA e ANDERSON, 2005). A compactação pode alterar o
fluxo de água no solo, reduzir a produtividade da área e aumentar os níveis
de erosão, uma vez que, geralmente, reduz a taxa de infiltração,
aumentando o escorrimento superficial, pois a difusão da água depende do
tamanho dos poros (SEIXAS, 2000).
A compactação é um processo que pode ocorrer tanto na superfície
como no subsolo, resultante do histórico de tensões recebidas em uma área,
através da mecanização ou pelo pisoteio animal, sendo que, segundo
Reichert et al. (2003), a principal causa da compactação dos solos agrícolas
é o tráfego de máquinas em operações de preparo, semeadura, tratos
culturais e colheita, principalmente quando o teor de umidade é inadequado
para estas operações (SECCO, 2003; STRECK, 2003).
O processo de reconstrução da estrutura do solo compactado, afirma
Rossello (2001), pode demandar prolongados períodos de tempo, tornandose necessário encontrar formas de acelerar estes processos de longo tempo,
para assegurar a viabilidade de um sistema de produção, e uma destas
formas seria o afrouxamento mecânico do solo, preservando a palhada
superficial e minimizando os efeitos negativos dos agentes erosivos. Outro
enfoque, segundo o autor, seria a exploração das capacidades de certas
plantas para desenvolver sistemas de raízes extensas mesmo em solos
compactados.
As culturas utilizadas como coberturas protetoras dos solos,
desempenham importante função na recuperação ou manutenção das
qualidades físicas do solo, porque podem modificar as variações de
temperatura no interior do solo, particularmente próximo da superfície,
podendo alterar consideravelmente o ambiente para o desenvolvimento da
sua flora e fauna. Inclusive são promotoras do aumento da macro e micro
porosidade através da descompactação, além de incorporarem grande
quantidade de matéria orgânica contribuindo, através da biomassa
105
produzida, para o sequestro e fixação de carbono no solo ( FRANCHINI,
2008).
Assim, se pode considerar que a descompactação do solo pode ser
de forma mecânica e/ou biológica (CAMARGO e ALLEONI, 1997). Estes
autores afirmam que as principais medidas mecânicas são a aração e a
escarificação; sendo que, na forma biológica é utilizada a rotação de culturas
com espécies que podem agir como subsoladores naturais, as quais
possuem um sistema radicular agressivo capaz de romper camadas
impeditivas, onde não há preparo do solo, sendo o controle das plantas
invasoras realizado com herbicidas e a semeadura feita com equipamentos
especialmente desenvolvidos para o sistema utilizado. As plantas de
cobertura da família das Fabaceas (leguminosas) e Poaceas (gramíneas)
têm um papel muito importante em todo este processo, não só pela massa
de palhada produzida, mas também na possível melhoria das propriedades
físicas, químicas e biológicas do solo.
O conhecimento e o entendimento da compactação do solo e suas
conseqüências ao sistema produtivo, assim como dos efeitos de
determinadas plantas de cobertura numa possível melhoria das condições
físicas deste solo, é de grande importância na busca do retorno deste solo
às condições ideais para desenvolvimento das culturas comerciais.
1. PROPRIEDADES FÍSICAS DO SOLO
Os solos são constituídos de uma mistura de partículas sólidas de
natureza mineral e orgânica, também de ar e água, formando um sistema
trifásico, sólido, gasoso e líquido. As partículas da parte sólida variam em
tamanho, forma e composição química, sendo sua combinação o que forma
a matriz do solo. A distribuição quantitativa das partículas de areia, silte e
argila desta composição da matriz, constituem a textura do solo, que é uma
das características físicas mais estáveis. Esta fase sólida mineral do solo,
composta de partículas de areia, silte e argila, normalmente, se encontram
reunidas pela ação de agentes cimentantes, formando as unidades
106
estruturais do solo. Os principais agentes cimentantes das partículas são os
minerais de argila, a matéria orgânica e os óxidos de ferro e alumínio
(CAMARGO e ALLEONI, 1997).
A matéria orgânica do solo é formada por resíduos vegetais e animais
que são decompostos por microorganismos, formando o húmus, que
participa da estruturação do solo e da retenção de água (LEPSCH, 2002). A
fração orgânica ocorre no solo em diferentes estágios de decomposição,
contando, ainda, com organismos vivos e em atividade (REICHARDT, 1990).
A parte líquida do solo é denominada por solução do solo, composta
de
água,
sais
minerais
e
componentes
orgânicos
coloidais,
cuja
concentração varia de solo para solo e com o teor de água. A parte gasosa é
o ar do solo, que é diferenciado do ar atmosférico devido à respiração das
raízes e dos organismos do solo, sendo composta principalmente por
oxigênio, gás carbônico e nitrogênio (REICHARDT e TIMM, 2004).
Afirma Prevedello (1996) que, para desenvolver e manter um solo
produtivo, bem como adequar determinadas estratégias de manejo, é
importante que sejam analisadas as propriedades físicas e quimicas dos
solos, na medida em que elas afetam a resposta das culturas.
1.1. Porosidade do solo
O arranjo destas partículas sólidas do solo, em vários tipos de
agregados, forma a estrutura do solo, que apresenta uma porosidade,
dividida em macroporos e microporos. Segundo Curi et al. (1993), a
porosidade do solo corresponde ao volume do solo não ocupado por
partículas sólidas, incluindo todo o espaço poroso ocupado pelo ar e água.
Este volume resulta na porosidade total do solo, subdividida em macroporos
e microporos. Entre as partículas maiores, como a areia ou entre agregados,
predominam poros grandes (macroporos); entre partículas pequenas, como
a argila, predominam poros pequenos (microporos) (VIEIRA et al., 1988).
Segundo Lima e Lima (1996) os macroporos são responsáveis pela aeração,
movimentação de água e penetração de raízes, e os microporos pela
107
retenção de água no solo.
A porosidade do solo e a relação entre a macroporosidade e
microporosidade são fatores importantes para a avaliação da estrutura do
solo. Em solo compactado o numero de macroporos é reduzido, os
microporos são em maior quantidade e a densidade também é maior
(JIMENEZ, 2008). Ademais, segundo Beutler e Centurion (2003), a
quantidade de macroporos influencia no crescimento das raízes e na
absorção de água e nutrientes, e sua redução induz ao crescimento lateral
de raízes, que diminuem seu diâmetro a fim de penetrarem nos poros
menores.
A compactação do solo está indiretamente ligada à estrutura,
influenciando, principalmente, na formação e estabilidade dos agregados.
Como o solo é um material poroso, por compressão, a mesma massa de
material sólido pode ocupar um volume menor. Isto afeta sua estrutura
definindo a quantidade, o tamanho, o formato e a orientação de espaços
vazios no solo e, consequentemente, a relação entre macro e microporos e a
continuidade da macroporosidade (REICHARDT, 1990). Essa modificação
pode ser atribuída à diminuição da porosidade total e da macroporosidade
(RICHART et al., 2005) e ao aumento da microporosidade (MACHADO e
FAVARETTO, 2006).
1.2. Densidade do solo
A densidade do solo é um importante atributo físico dos solos, por
fornecer indicações a respeito do estado de sua conservação, sobretudo em
sua influência em propriedades como infiltração e retenção de água no solo,
desenvolvimento de raízes, trocas gasosas e suscetibilidade deste solo aos
processos erosivos, sendo muito utilizado na avaliação da compactação dos
solos (GUARIZ et al., 2009). A elevação da densidade do solo prejudica o
desenvolvimento
das
plantas,
ocasionando
aumento
da
resistência
mecânica à penetração de raízes, altera a movimentação de água e
nutrientes e a difusão de oxigênio e outros gases, levando ao acúmulo de
108
gás carbônico na área radicular (MAPFUMO ET al., 1998; ISHAQ ET al.,
2001).
A densidade do solo é dependente do espaço poroso, portanto, solos
com maior porosidade têm menor densidade de solo, e dessa maneira,
todos os fatores que interferem no espaço poroso irão interferir na densidade
do solo (MACHADO e FAVARETTO, 2006), como a natureza, a dimensão
das partículas e a forma como se acham dispostas (CAMARGO e ALLEONI,
1997).
1.3. Estrutura do solo
Além dos aspectos de textura, densidade e porosidade, os solos
possuem uma macroestrutura que resulta da disposição das partículas
individuais em aglomerados com formas e tamanhos variados, chamados de
agregados, ou estrutura do solo.
A estrutura do solo está relacionada com praticamente todos os
fatores que agem sobre ele, como suprimento de água e aeração,
disponibilidade de nutrientes, atividade microbiana, penetração de raízes e
outros (REINERT e REICHERT, 2006). Estes mesmos autores afirmam que,
um solo bem estruturado apresenta poros adequados para entrada de ar e
água no solo; porosidade suficiente para que a água se movimente através
do solo, sendo disponível para as culturas, assim como permita uma boa
drenagem do solo; porosidade adequada para o crescimento das culturas
após a germinação das sementes, permitindo que as raízes explorem um
maior volume de solo em busca de ar, água e nutrientes; e resistência à
erosão pela alta agregação deste solo.
A perda destas condições, segundo Tormena et al. (1998-b), pode
ocorrer pelas práticas de manejo, influenciando a produtividade das culturas
por meio das modificações na disponibilidade de água, na difusão do
oxigênio e na resistência do solo à penetração das raízes. Conforme Silva et
al. (2004) a utilização intensiva de máquinas e implementos agrícolas tem
109
contribuído para modificar as propriedades físicas e dinâmicas dos solos,
tendo despertado o interesse dos pesquisadores por estudos de
compactação e dinâmica do solo.
2. A COMPACTAÇÃO DOS SOLOS AGRÍCOLAS
O sistema radicular das culturas exige um suprimento adequado de
oxigênio para manter seu funcionamento fisiológico, pois as raízes realizam
trocas gasosas por meio de um sistema poroso que também deve assegurar
um suprimento adequado de nutrientes e água (TORRES e SARAIVA,
1999).
Autores como Tavares et al. (2008), definem compactação do solo
como a redução do volume por ação de pressão externa, como tráfego de
máquinas, implementos agrícolas ou pressão de cascos de animais, sendo
que a profundidade varia com a causa, e para as máquinas em geral é de
acordo com a profundidade de ação dos implementos (cerca de 20-30 cm).
As operações com máquinas agrícolas pesadas também foram comentadas
por Hakansson e Reeder (1994), salientando que existem várias técnicas
mecânicas capazes de reduzir a compactação do solo, entretanto sua
utilização normalmente é de custo elevado e raramente são capazes de
corrigir totalmente os efeitos da compactação. Os autores recomendam
evitar a compactação através da minimização do carregamento mecânico
sobre o solo, do que periodicamente descompactá-lo. Salientam ainda que,
caso sejam aplicadas cargas excessivas após feita a descompactação do
solo, este novamente apresentará compactação sub-superficial.
O estado de compactação do solo tem sido avaliado por meio de
diversos parâmetros físicos, tais como: densidade do solo, porosidade total,
relação de vazios, resistência do solo a penetração das raízes, entre outros
(IMHOFF et al., 2001).
A recuperação das propriedades físicas do solo pode ser através de
métodos mecânicos, com máquinas e implementos agrícolas; assim como
por métodos chamados por biológicos, devido a serem utilizadas plantas e
110
matéria orgânica para realizarem as correções necessárias nestas
propriedades. Vários pesquisadores como Albuquerque et al. (1995);
Cattelan et al. (1997) e Silva e Mielniczuk (1997) ressaltam a importância da
adoção de sistemas que envolvam menos mobilização do solo tais como:
cultivo mínimo e semeadura direta, associados à rotação de culturas e à
utilização de plantas de cobertura de inverno, na melhoria dos atributos
físicos do solo. Inclusive Albuquerque et al. (1995) afirmam que são
necessários de três a quatro anos sob condições deste manejo, para o solo
desenvolver uma porosidade mais favorável ao crescimento de raízes.
3. PLANTAS DE COBERTURA
As plantas de cobertura do solo entram no processo de produção
proporcionando efeitos positivos, como supressão de plantas daninhas,
conservação da umidade do solo, acúmulo de nutrientes na superfície e
controle da erosão (SANTOS e REIS, 2001).
Atualmente, o conceito de plantas de cobertura tem evoluído para,
não somente a incorporação da massa produzida, mas também, como
participante do processo de conservação do solo, através da prática de
rotação de culturas, sucessão ou consorciação, sendo deixada na superfície
do solo, sem incorporação, e deste modo visando a proteção do solo contra
as variações de temperatura, impacto da gota da chuva e ação dos ventos
(TAVARES et al., 2008).
Segundo Capeche et al. (2008) e Rossi (2002), os benefícios das
plantas de cobertura podem ser vários, como a manutenção de elevadas
taxas de infiltração de água pelo efeito combinado do sistema radicular e da
cobertura vegetal; promover grande e contínuo aporte de massa vegetal ao
solo, de maneira a manter, ou até mesmo elevar o teor de matéria orgânica;
atenuar a amplitude térmica e diminuir a evaporação; possuem sistema
radicular agressivo que rompe camadas compactadas e promove aeração e
estruturação das partículas, induzindo ao “preparo biológico do solo”;
111
promove a reciclagem de nutrientes e diminui sua lixiviação; a adição de
nitrogênio ao solo através da fixação biológica por parte das leguminosas;
reduz a população de ervas daninhas através do efeito supressor e/ou
alelopático,
devido
ao
rápido
crescimento
inicial
e
exuberante
desenvolvimento da massa vegetal e apresenta múltiplos usos na
propriedade.
4. CARACTERIZAÇÃO DO LOCAL DO EXPERIMENTO
O experimento foi conduzido no município de Guarapuava, estado do
Paraná, Brasil, no Terceiro Planalto Paranaense a 1.200 m de altitude, na
Microrregião Homogênea Campos de Guarapuava da região Centro-Sul
Paranaense, dentro do Campus CEDETEG – UNICENTRO, no campo
experimental do curso de Agronomia, na Unidade de Pesquisa da Batata e
Microclima, cujas coordenadas são 25° 23’ 42’’ S e 51° 27’ 28’’ W. O clima
pela classificação de Köeppen, é do tipo Cfb, mesotérmico, úmido, sem
estação seca e com verões frescos, com temperatura média anual de 17°C,
a precipitação média anual é de 1.961 mm e a média anual da umidade
relativa do ar é de 78% (TOMAZ e VESTENA, 2003; IAPAR, 2000).
5. CARACTERIZAÇÃO DAS ESPÉCIES UTILIZADAS
Sabendo dos hábitos das plantas de cobertura, quatro espécies foram
escolhidas para o estudo, sendo duas gramíneas (Poáceas) e duas
leguminosas (Fabáceas). A aveia preta (Avena strigosa Schreb) é uma
planta da família das gramíneas, rústica, exigente em água, com excelente
capacidade de perfilhamento, produção de massa verde e resistente a
pragas e doenças (MONEGAT, 1991). O plantio é realizado entre abril e
meados de maio na região sul, sendo a quantidade de sementes entre 60 a
80 Kg por hectare, e feita em sulcos espaçados de 17 a 30 cm, com
população média de 300 plantas m-2 e as sementes distribuídas a uma
profundidade máxima de 5 cm (MONEGAT, 1991). Este autor informa que
esta cultura atinge uma cobertura plena do solo entre 45 a 60 dias, e inicia
112
sua floração aos 100 dias.
O azevém (Lolium multiflorum Lam.) é uma gramínea anual,
cespitosa, que possui folhas finas e tenras, cujo porte chega a atingir 1,2
metros de altura (MONEGAT, 1991). É rústica, agressiva e perfilha em
abundância, razão pela qual é uma das gramíneas hibernais mais cultivadas
no sul do país, tanto para corte como para pastagens, sendo adaptada a
temperaturas baixas (não resiste ao calor), desenvolvendo-se somente
durante o inverno e a primavera (EMBRAPA, 2006). Devido a sua grande
capacidade de ressemeadura natural, permanece na área de um ano para
outro, sendo a época de plantio concentrada entre março e abril, com
espaçamento de 20 cm entre-linhas, utilizando entre 20 a 30 quilos por
hectare, atingindo uma cobertura plena do solo entre 50 a 60 dias, iniciando
sua floração aos 100 dias. (EMBRAPA, 2006; MONEGAT, 1991).
O nabo forrageiro (Raphanus sativus L.) é uma planta da família das
Crucíferas, muito utilizada para adubação verde no inverno, sendo uma
planta muito vigorosa, que em 60 dias cobre cerca de 70% do solo (COSTA,
1992). Seu sistema radicular é pivotante, bastante profundo, atingindo em
média 40 cm, com o florescimento ocorrendo entre 65 a 75 dias após o
plantio, atingindo sua plenitude aos 100 dias, com a altura variando de 1,00
a 1,60 m e, devido ao seu rápido crescimento, compete com as ervas
daninhas invasoras desde o início, diminuindo os gastos com herbicidas ou
capinas, o que facilita a cultura seguinte (MONEGAT, 1991). Produz grande
volume de palha para a prática do plantio direto, sendo a recomendação de
semeadura entre 15 – 20 kg ha-1 de sementes, e por isso, é importante para
a rotação de culturas (COSTA, 1992).
A ervilhaca comum (Vicia sativa L.) é uma leguminosa forrageira
muito utilizada como adubo verde, pois permite consórcio com gramíneas,
produz forragem de elevado teor proteico e de boa palatabilidade
(MONEGAT, 1991). Recomenda-se 30-80 kg ha-1 de sementes (produção de
sementes e adubação verde respectivamente), sendo o espaçamento de 50
cm entre linhas com 100 a 120 sementes m-2 (EMBRAPA, 2006; MONEGAT,
113
1991).
6. PREPARO DA ÁREA
Todas as parcelas dos tratamentos foram submetidas ao tráfego de
trator, em seis passadas (tráfego cumulativo) consecutivas do rodado por
uma mesma linha, e repetido sucessivamente para toda a área do
experimento. Calculou-se a pressão de contato com o solo, através da
divisão da carga atuante sobre os pneus de tração pela sua respectiva área
de contato. O carregamento sobre os pneus do trator foi obtido por meio de
cálculo da distribuição do peso do mesmo sobre os eixos dianteiro e traseiro,
devido ao trator utilizar a tração nos quatro pneus. A área de contato entre o
pneu e o solo foi determinada utilizando-se a metodologia proposta por Trein
(1995), a qual consta da marcação com cal o entorno do pneu. A área de
contato do pneu (estático) com o solo vem a ser obtida pelo cálculo de área
(base x altura) da marcação de cal numa superfície plana, resultando neste
caso em 995,31 cm2. O trator utilizado na compactação da área
experimental foi da marca VALMET, modelo 885-S Premium, 4x4 com tração
nos quatro rodados, peso total de 5978 Kg. O trator contava com 6 lastros
dianteiros de 37,5 Kg. A pressão de inflação dos pneus foi a recomendada
pelo fabricante (125 kPA). Como resultado obteve-se uma pressão de
contato do pneu com o solo de 147,25 kPA, repetidas em seis passadas
consecutivas em cada linha do experimento, cobrindo completamente toda a
área.
7. DELINEAMENTO EXPERIMENTAL E VARIÁVEIS AVALIADAS
O delineamento experimental utilizado foi em blocos ao acaso com 5
repetições, dividido em 20 parcelas com 5,0 x 4,0 metros (20 m2 cada) com
espaçamento de 1,5 metros entre tratamentos e 2,0 metros entre blocos.
Após a compactação mecânica com trator, foram retiradas duas
amostras em cada parcela nas profundidades de 0,0 a 0,10 e 0,10 a 0,20m,
totalizando 40 amostras com estrutura não deformada. No período de
floração, em cada parcela, devido às culturas terem atingido neste momento
114
seu maior desenvolvimento da parte aérea e radicular, foi realizada uma
nova coleta de amostras não deformadas com mesmo procedimento
anterior.
As amostras de solo foram saturadas por vinte e quatro horas em
bandeja com uma lâmina de água cobrindo 2/3 de sua altura. Em seguida
foram pesadas e submetidas ao potencial de -0,006 MPa (sucção leve) em
uma mesa de tensão adaptada de Klein (2008), drenando assim a água
contida nos macroporos. As amostras foram novamente pesadas e
colocadas em estufa para secagem a 105°C por 24 hor as, sendo novamente
pesadas, já sem nenhuma umidade, e todos os dados foram submetidos às
equações especificas.
As análises laboratoriais físicas foram realizadas no laboratório de
solos do Campus CEDETEG, departamento de Agronomia, para obtenção
dos seguintes dados: densidade do solo, microporos, macroporos e
porosidade total, utilizando o Método do anel volumétrico (Anel de Kopecky)
submetido a Mesa de Tensão (EMBRAPA, 1997; KLEIN, 2008).
Os dados obtidos de laboratório foram submetidos às seguintes
equações:
-3
Densidade (g cm ) = Ms / Vt ..........................................................(equação 1)
Na qual: Ms = peso da amostra seca a 105 ºC, sem o cilindro, Vt= volume da
amostra.
-3
Microporosidade (g cm ) = (Ma – Ms) / Vt ...................................(equação 2)
Na qual: Ma = peso da amostra após ser submetida a uma tensão de 60cm de
coluna de água, Ms = peso da amostra seca a 105 ºC, e Vt = volume da amostra.
-3
Macroporosidade (g cm ) = (Mt – Ma) /Vt.......................................(equação 3)
Na qual: Mt = peso da amostra saturada, Ma = peso da amostra após submetida a
mesa de tensão, e Vt = volume da amostra.
-3
Porosidade total (g cm ) = macroporosidade + microporosidade....(equação 4)
Em cada parcela, após a floração das culturas, momento em que
115
estas atingiram seu maior crescimento vegetativo e por ser o estágio de
desenvolvimento em que deve ser realizado seu corte para o plantio da
cultura comercial, foi avaliada a resistência a penetração utilizando o
aparelho Penetrômetro de Impacto, Modelo IAAP/PLANALSUCAR-STOLF
(STOLF, 1998), com três leituras por parcela para obter um melhor
comparativo entre os pontos de penetração, e cada leitura em cinco níveis
de profundidade exigidos pelo programa de cálculo, fornecendo os dados
que foram digitados no PNRT – Programa para Cálculo da Resistência do
Solo ao Penetrômetro de Impacto – SCS-IAC, que gerou um arquivo com as
resistências de 0 a 0,50m em MPa (PNRT, 1991). Nas leituras realizadas a
umidade gravimétrica do solo se situava em 29%, obtida através de 5
amostras de solo, coletadas até 0,40m de profundidade, sendo pesadas
como vieram do campo e submetidas a secagem a 105 ºC até a
estabilização do peso. A diferença forneceu o percentual de umidade
existente nas amostras.
8. ANÁLISES ESTATÍSTICAS
As análises estatísticas foram realizadas com o auxílio do Software
ASSISTAT (SILVA, 2011). Inicialmente os resultados obtidos foram
submetidos ao teste de Bartlett para verificar sua homogeneidade,
confirmando que todas as variâncias eram homogêneas, a seguir foram
submetidos a analise de variância com o propósito de conhecer as
diferenças significativas entre os tratamentos pelo procedimento ANOVA.
Os efeitos dos tratamentos sobre as propriedades físicas do solo
foram avaliados pela análise da variância segundo o delineamento de blocos
casualizados, por camada de solo, e entre os momentos da compactação e
da floração. A diferença entre as médias de tratamentos foi avaliada pelo
teste de Tukey, ao nível de 1% e 5% de probabilidade, comumente utilizado
em trabalhos similares. Comparou-se os efeitos promovidos pelas culturas
(tratamentos),
na
densidade,
macroporosidade,
microporosidade
e
porosidade total, e também entre as médias no momento da compactação
mecânica e no momento da floração. Quanto à resistência do solo,
116
comparou-se somente as médias dos efeitos promovidos pelas culturas
(tratamentos) no momento da floração, buscando a espécie que mais
promove melhorias no solo em relação a este atributo.
9. RESULTADOS E DISCUSSÃO
9.1. Densidade do Solo
Nos dados da tabela 1, são apresentadas as densidades no momento
da compactação e os efeitos dos diferentes tratamentos nas duas
profundidades avaliadas. Pode-se observar nas camadas de 0,0 a 0,10m e
de 0,10 a 0,20m, que todos os tratamentos (dados colocados na linha)
obtiveram resultados dentro da média, demonstrando que as espécies
utilizadas, em seu primeiro ciclo de cultivo, promoveram efeitos similares na
densidade do solo, não havendo possibilidades de escolher as espécies
mais efetivas na melhoria deste atributo físico do solo.
Tabela 1. Densidade do solo em função das plantas de cobertura e camada avaliada.
Plantas de cobertura
Azevém
Aveia
Nabo
Ervilhaca
-3
Densidade do solo (g cm )
Camada 0 – 0,10 m
1
3
Compactação
2
Tratamento
1,169 a A
1,175 a A
1,165 a A
1,163 a A
1,111 a B
1,118 a B
1,104 a B
1,121 a B
Camada 0,10 – 0,20 m
1
Compactação
2
Tratamento
0,907 a A
0,954 a A
0,973 a A
0,945 a A
0,963 a A
0,950 a A
0,970 a A
0,958 a A
1
Após compactação mecânica; 2Após o florescimento das culturas; 3Médias
seguidas pela mesma letra minúscula nas linhas, e maiúsculas nas colunas, dentro
de cada camada, não diferem significativamente entre si, pelo teste de Tukey
(p<0,01).
Quando relacionamos os resultados dos tratamentos, na camada de
0,0 a 0,10m com a densidade no momento da compactação (dados
117
colocados na coluna), verificamos uma redução média de 4,6% na
densidade do solo, nesta profundidade, após o ciclo das culturas de
cobertura.
Assim, a densidade não foi estatisticamente diferente entre os
tratamentos, nas duas camadas avaliadas (0,0 a 0,10m e 0,10 a 0,20m),
mas observa-se que na camada de 0,0 a 0,10m houve tendência de
diminuição na densidade quando comparada com o momento da
compactação, enquanto que nas demais camadas, houve manutenção da
densidade do solo neste período. Enquanto as densidades maiores em
superfície podem ser devido ao trânsito de máquinas, a sua diminuição após
o ciclo das plantas de cobertura, indica uma melhoria na qualidade física do
solo decorrente possivelmente da atividade da fauna edáfica e das raízes, as
quais atuam na formação de canais (COSTA et al., 2003). Estes resultados
para densidade são semelhantes aos obtidos por Albuquerque et al. (1995) e
Bertol et al. (2000).
Os resultados obtidos por Jimenez et al. (2008) e Muller et al (2001),
estudando a massa de matéria seca de raízes de plantas de cobertura,
observaram que para todas as espécies estudadas, e em todas as
densidades, ocorreu maior concentração de raízes na camada superior (0,0
a
0,15m
profundidade).
Os
mesmos
autores
avaliaram
que
este
comportamento ocorre quando existem restrições ao crescimento radicular
em subsuperficie. Outros trabalhos também relatam o acúmulo de raízes
acima da camada compactada, entre eles os de Alvarenga et al. (1996),
Silva e Rosolem (2002) e Gonçalves (2005); observando que as mudanças
nas condições físicas do solo, em subsuperficie, são limitantes à penetração
de raízes, concentrando-as próximas a superfície.
Segundo Capeche et al. (2008) as plantas de cobertura possuem
sistema radicular agressivo que rompe camadas adensadas, promovendo
aeração e estruturação das partículas do solo. Este fato também foi
constatado por Reinert et al. (2008), onde verificou uma redução da
densidade do solo pelo uso de plantas de cobertura apenas na camada mais
118
superficial, assim como Franchini et al. (2009) evidenciou que é possível
descompactar camadas de solo, sem intervenção mecânica e, deste modo,
aumentar o desenvolvimento radicular e a disponibilidade hídrica para a
soja.
Estudos realizados por Costa et al. (2003) em Latossolo Bruno,
constataram que a adoção do sistema de plantio direto (que utiliza as
plantas de cobertura como técnica de cultivo) promoveu uma melhoria nas
propriedades físicas do solo, evidenciando uma diminuição de 9% (de 1,08
para 0,99 Mg m-3) na densidade do solo em subsuperfície (0,10 – 0,20m).
Já em pesquisas realizadas por Aguiar et al. (2010), onde foi feita a
aração com incorporação da biomassa das plantas de cobertura ao perfil,
não foram observadas diferenças significativas para densidade do solo,
entre as profundidades de 0,0-0,10m; 0,10-0,20m; 0,20-0,30m, e para as
diferentes plantas; estes pesquisadores não encontraram resultados que
favoreçam a ação das plantas.
Em trabalho realizado por Cubilla et al. (2002), também não se
verificou efeito significativo nos valores de densidade do solo para diferentes
sistemas de sucessão-rotação de culturas ao final de três anos. Assim como
as pesquisas apresentadas por Abrão et al. (1979), que verificaram maior
densidade do solo em subsuperficie ( 0,10 a 0,30m) sob plantio direto.
Todavia, os autores consideram que o beneficio da inclusão de plantas de
cobertura está ligado principalmente a criação de poros biológicos de alta
funcionalidade na aeração e infiltração de água no solo.
Sendo conhecida a classe textural do solo estudado, é possível
estabelecer parâmetros de valores de densidade considerados limitantes à
produtividade agrícola, como apresentado por Lima et al. (2007), que
considerou estando entre 1,25 a 1,30 Mg m-3 para solos argilosos; e Reinert
e Reichert (2001) estabeleceram os valores críticos de densidade para
culturas comerciais em solos argilosos em 1,45 Mg m-3. Observa-se na
tabela 1 que mesmo após a compactação mecânica o valor máximo de
119
densidade atingido foi de 1,17 Mg m-3 na camada superficial de 0,0 a 0,10m,
o que demonstra não terem sido atingidos os referidos valores críticos, mas
possivelmente já promoveram uma redução no elongamento das raízes.
9.2. Porosidade do solo
As tabelas 5, 7 e 8 mostram os resultados da porosidade do solo,
divididas em volume de macroporos, volume de microporos e porosidade
total. Nas camadas de 0,0 a 0,10m e 0,10 a 0,20m de solo, os dados
demonstram que todos os resultados dos tratamentos não tiveram
diferenças significativas, tendo um ciclo de culturas de coberturas de
inverno, até o momento de sua floração, não produzindo nenhuma alteração
verificada.
Como observado por Ferreira et al. (2000) a melhoria na estrutura do
solo promovida pelas plantas de cobertura, resulta em benefícios quanto à
porosidade e aeração do solo, bem como na capacidade de retenção de
água no solo, somente após a decomposição das raízes, formando-se
galerias no solo e facilitando a infiltração da água das chuvas. Segundo
Abreu (2000), a quantidade de poros que as raízes formam, é em razão da
decomposição das mesmas, e são mais estáveis, e o processo de
decomposição e a ação dos microorganismos criam um material cimentante
que os torna mais estáveis que os formados por processos de
descompactação mecânica.
Tabela 2. Macroporosidade em função das plantas de cobertura e camada
avaliada.
Plantas de cobertura
Azevém
Aveia
Nabo
Ervilhaca
3
-3
Macroporosidade (cm cm )
Camada 0 – 0,10 m
1
Compactação
2
Tratamento
3
0,123 a A
0,134 a A
0,142 a A
0,136 a A
0,122 a A
0,126 a A
0,120 a A
0,108 a A
Camada 0,10 – 0,20 m
120
1
Compactação
2
Tratamento
0,169 a A
0,172 a A
0,159 a A
0,168 a A
0,129 a A
0,152 a A
0,133 a A
0,127 a A
1
Após compactação mecânica; 2Após o florescimento das culturas; 3Médias
seguidas pela mesma letra minúscula nas linhas, e maiúsculas nas colunas, dentro
de cada camada, não diferem significativamente entre si, pelo teste de Tukey
(p<0,05).
.
Conforme tabela 2, verificamos o pequeno volume de macroporos
(média de 0,119 cm3 cm-3) na camada de solo de 0,0 a 0,10m, e próximo do
limite crítico restritivo para o desenvolvimento radicular das culturas,
conforme apontado por Andrade e Stone (2009), de 0,100 cm3 cm-3. Estes
resultados são corroborados por Giarola et al. (2007), que indicam que uma
pequena proporção de macroporos encontrada no solo, sugere a ocorrência
de problemas de compactação e que, até o momento, o manejo adotado
ainda não contribuiu para a recuperação da estrutura do solo. Segundo
Souza et al. (2005), a redução nos macroporos tem grande efeito sobre o
desenvolvimento radicular das plantas por imprimir ao solo condições de
baixa aeração.
Um solo ideal para a produção agrícola deve apresentar porosidade
total próxima a 0,50 cm3 cm-3 e uma distribuição percentual de 34% de
macroporos e 66% de microporos (ANDRADE E STONE, 2009). Kiehl (1979)
já afirmava que, idealmente, um solo deve possuir 50% do seu volume
ocupado por poros; deste volume, 1/3 deve corresponder aos macroporos e
2/3 aos microporos, e 50% de sólidos (45% de matéria mineral e 5% de
matéria orgânica), e, concordando com Brady e Weil (2002), também
consideram a relação micro/macroporos ideal para as culturas agrícolas em
2:1 (tabela 3).
Os baixos valores de macroporosidade e altos valores na relação
micro/macroporos implicam em uma aeração deficiente do solo, o que
seguramente prejudica o desenvolvimento das culturas. Tomando estes
dados como referência para analise, pode-se observar que o solo do local do
experimento sofreu modificações com o decorrer dos cultivos anteriores,
121
assim como um forte impacto causado pelas passadas do trator,
demonstrado pelos atuais valores de densidade e porosidade.
Tabela 3. Relação Micro/Macroporos no solo, em função das plantas de cobertura e
camada avaliada.
Plantas de cobertura
Azevém
Aveia
Nabo
Ervilhaca
Relação Micro/Macroporosidade
Camada 0 – 0,10 m
1
Compactação
2
Tratamento
3,9 : 1
3,6 : 1
3,3 : 1
3,5 : 1
4,0 : 1
3,8 : 1
4,0 : 1
4,5 : 1
3,2 : 1
3,4 : 1
4,3 : 1
3,6 : 1
3,0 : 1
3,1 : 1
4,0 : 1
4,2 : 1
Camada 0,10 – 0,20 m
1
Compactação
2
Tratamento
Proporção ideal de 2:1 segundo Kiehl (1979) e Brady e Weil (2002).
compactação mecânica; 2Após o florescimento das culturas;
1
Após
Assim, a proporção média ideal de macroporos para as camadas de
0,0 a 0,10m e 0,10 a 0,20m, provavelmente seriam respectivamente de
0,200 cm3 cm-3 e 0,230 cm3 cm-3. No entanto tem-se os dados de 0,119 cm3
cm-3 e 0,150 cm3 cm-3 respectivamente (tabela 2), sendo uma redução média
de 38% no volume ideal de macroporos para este tipo de solo.
Já no volume de microporos encontrados (tabela 4), onde o ideal para
as camadas amostradas seria de 0,390 cm3 cm-3 e 0,440 cm3 cm-3
respectivamente, encontramos o volume de 0,480 cm3 cm-3 e 0,510 cm3 cm3
, um aumento médio de 20 % no volume considerado ideal dos microporos,
sendo também um indicativo de solo compactado. Este resultado é
corroborado nos estudos de Boeni (2000), que, trabalhando com Latossolo
Vermelho e Argissolo Vermelho trafegados por trator, encontrou redução da
porosidade total e aumento da microporosidade. Assim como, Moraes et al.
(1995), também observou que a porosidade total teve um decréscimo com a
122
elevação do nível de compactação, e Tormena et al. (1998-a), trabalhando
com Latossolo Vemelho-Escuro, argiloso, submetido a tráfego cumulativo,
observou que houve redução, em média, de 24% do volume de poros, e o
volume de microporos teve um acréscimo médio de 10%.
Tabela 4. Microporosidade em função das plantas de cobertura e camada
avaliada.
Plantas de cobertura
Azevém
Aveia
Nabo
Ervilhaca
3
-3
Microporosidade (cm cm )
Camada 0 – 0,10 m
1
Compactação
2
Tratamento
3
0,480 a A
0,481 a A
0,478 a A
0,480 a A
0,486 a A
0,485 a A
0,479 a A
0,492 a A
0,543 a A
0,543 a A
0,560 a A
0,544 a A
0,527 a A
0,532 a A
Camada 0,10 – 0,20 m
1
Compactação
2
Tratamento
0,536 a A
0,537 a A
1
Após compactação mecânica; 2Após o florescimento das culturas; 3Médias
seguidas pela mesma letra minúscula nas linhas, e maiúsculas nas colunas, dentro
de cada camada, não diferem significativamente entre si, pelo teste de Tukey
(p<0,05).
A utilização de plantas de cobertura não promoveu alterações nestes
atributos físicos do solo (porosidade total, micro e macroporosidade),
ocorrendo somente o arranjo natural das partículas, não sendo reflexo das
práticas de manejo com estas plantas. Resultado similar ao obtido por
Aguiar et al. (2010), que mesmo com a incorporação da biomassa das
plantas de cobertura, não foram observadas diferenças significativas para a
porosidade total, macroporosidade e microporosidade.
Tabela 5. Porosidade total em função das plantas de cobertura e camada avaliada.
Plantas de cobertura
Azevém
Aveia
Nabo
Ervilhaca
3
-3
Porosidade total (cm cm )
123
Camada 0 – 0,10 m
1
Compactação
2
3
0,603 a A
0,609 a A
Tratamento
0,616 a A
0,620 a A
0,616 a A
0,612 a A
0,600 a A
0,601 a A
0,712 a A
0,702 a A
0,689 a A
0,696 a A
0,688 a A
0,669 a A
0,669 a A
0,664 a A
Camada 0,10 – 0,20 m
1
Compactação
2
Tratamento
1
Após compactação mecânica; 2Após o florescimento das culturas; 3Médias
seguidas pela mesma letra minúscula nas linhas, e maiúsculas nas colunas, dentro
de cada camada, não diferem significativamente entre si, pelo teste de Tukey
(p<0,05).
9.3. Resistência do solo a penetração
A avaliação do solo quanto a sua resistência a penetração é
apresentada na tabela 6. Observa-se que os maiores valores de resistência
ocorreram nas camadas de 0,10 a 0,30m evidenciando que nestas camadas
ocorreu acúmulo das tensões impostas pela compactação mecânica,
promovendo a compactação do solo. Esta é uma camada característica de
impedimento, tanto para o crescimento e penetração de raízes, como para
infiltração de água no solo. Estes resultados são semelhantes aos
encontrados por Tormena et al. (1998-a), onde foi verificado que a
resistência do solo em plantio direto, demonstrou efeitos do tráfego até a
profundidade de 0,35m.
Não foram encontradas diferenças entre as médias de resistência do
solo em cada camada avaliada individualmente. Os tratamentos com plantas
de cobertura de inverno não promoveram mudanças significativas na
resistência do solo nas camadas individuais de 0,0 a 0,50m, não sendo
assim verificados resultados que possam demonstrar quais espécies seriam
mais eficientes para promover uma melhoria deste atributo físico do solo, já
no primeiro ciclo de cultivo.
Tabela 6. Resistência do solo e camada avaliada, em função das plantas de
cobertura de inverno após o florescimento. Umidade gravimétrica de 29%.
124
Plantas de cobertura
Camada (m)
Azevém
Aveia
Nabo
Ervilhaca
Resistência do solo a penetração (MPa)
0,00 – 0,10
0,906 a
0,814 a
0,846 a
0,882 a
0,10 – 0,20
1,274 a
1,334 a
1,282 a
1,362 a
0,20 – 0,30
1,094 a
1,004 a
1,058 a
1,046 a
0,30 – 0,40
0,916 a
0,914 a
0,836 a
0,910 a
0,40 – 0,50
0,922 a
0,922 a
0,898 a
0,918 a
Médias seguidas pela mesma letra nas linhas, dentro de cada camada, não
diferem significativamente entre si, pelo teste de Tukey (p<0,05).
Estudos afirmam que a resistência do solo pode ser diminuída com
vários cultivos de plantas de cobertura em anos sucessivos, pois segundo
Reinert et al. (2008), foi verificado em seus trabalhos, uma redução da
densidade do solo pelo uso de plantas de cobertura apenas na camada mais
superficial, assim como Franchini et al. (2009) evidenciou que é possível
descompactar camadas de solo, sem intervenção mecânica e, deste modo,
aumentar o desenvolvimento radicular e a disponibilidade hídrica para a
soja. Debiase (2008), relatou a eficiência das plantas de cobertura do solo
na redução da compactação do solo, após quatro anos de condução de
experimento em Argissolo, anteriormente degradado fisicamente pelo
pisoteio animal.
A resistência apresentada nas camadas de solo de 0,10 a 0,20m e
0,20 a 0,30m ficou entre 1,313 MPa e 1,050 MPa respectivamente, mesmo
após o ciclo destas culturas de cobertura, o que pode ter afetado o
crescimento destas plantas, conforme os resultados obtidos por Cintra e
Mielniczuk (1983) citado por Cubilla (2002), que encontraram uma redução
de 50% no comprimento radicular de várias culturas, quando a resistência à
penetração foi de 1,1 MPa, em um Latossolo Vermelho-Escuro, de
característica muito argilosa, similar ao Latossolo Bruno estudado, indicando
125
que, nessa situação, a produtividade das plantas pode ser reduzida. Isso
sugere que a compactação mecânica do solo causa efeitos detrimentais na
sua estrutura, principalmente abaixo da camada de 0,15m, sinalizando
maiores cuidados com as operações realizadas com tratores.
Esta camada mais compactada poderá continuar promovendo
impedimentos às culturas comerciais, o que pode ser observado também em
estudo de Foloni et al. (2000), onde consideram que a utilização de plantas
de cobertura pode ser uma alternativa para os sojicultores com problemas
de compactação no solo. Estes autores avaliaram comparativamente o
desempenho da soja e de cinco leguminosas quanto ao potencial destas
como descompactadoras do solo. O experimento foi realizado em casa de
vegetação e verificaram que tanto a soja e as leguminosas utilizadas foram
significativamente sensíveis ao aumento da compactação do solo quanto ao
crescimento radicular. Assim como Dexter (2004) afirma que, a resistência
do solo juntamente com a densidade do solo, são atributos físicos que
influenciam diretamente o crescimento das raízes e, conseqüentemente, a
parte aérea das plantas. Quando aumenta a resistência à penetração do
solo, o sistema radicular apresenta desenvolvimento reduzido, podendo
comprometer a produtividade da área.
Os diferentes níveis de compactação deste solo podem ter
afetado o crescimento do sistema radicular das culturas de inverno, como
constatado por Jimenez et al. (2008), que verificaram uma influencia no
crescimento de raízes de plantas de cobertura, concentrando-as na camada
superior, devido a presença de compactação em um Latossolo Vermelho.
Assim como Santos et al. (2009), em uma área de Latossolo VermelhoAmarelo, afirmam que o aumento da densidade do solo restringe o
crescimento radicular à medida que a raiz encontra poros menores e em
menor número, e Foloni et al. (2006), complementam a ação destas culturas,
afirmando que as espécies vegetais com sistema radicular agressivo e
abundante provocam desarranjos no solo ao penetrar camadas com alta
resistência mecânica e, ao sofrer decomposição, deixam canais que
126
contribuem para a infiltração de água e difusão de gases, melhorando a
qualidade física do solo para as próximas culturas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A utilização de plantas de cobertura em solos compactados, logo no
primeiro ciclo de cultivo, pode promover uma diminuição na densidade do
solo na camada superficial de 0,0 a 0,10m; no entanto, a macroporosidade,
microporosidade e porosidade total do solo não sofreram alterações neste
período.
Não houve diferença significativa entre os resultados de resistência
do solo em relação às espécies de cobertura, não sendo assim verificadas
alterações que demonstrem quais espécies promovem melhorias deste
atributo físico do solo, já no primeiro ciclo de cultivo. Os maiores valores de
resistência à penetração foram encontrados nas camadas de 0,10 a 0,30 m,
caracterizando a formação de uma camada compactada em subsuperficie.
Os tratamentos realizados com plantas de cobertura de inverno não
apresentaram diferenças que possam apontar para a espécie mais eficiente
para agir na melhoria de um solo compactado já em seu primeiro ciclo de
cultivo, e anteriormente à decomposição de suas raízes. Estudos repetidos
sucessivamente em vários anos, no mesmo local, poderiam esclarecer
melhor
estas
possíveis
influências
das
plantas
de
cobertura
nas
propriedades físicas avaliadas.
REFERÊNCIAS
ABRÃO, P. U. R.; GOEPFERT, C. F.; GUERRA, M.; ELTZ, F. L. F. e CASSOL, E.
A. Efeitos de sistemas de preparo do solo sobre características de um Latossolo
Roxo distrófico. Revista Brasileira de Ciência do Solo, 3:169-172, 1979.
ABREU, S. L. Propriedades hídricas e mecânicas afetadas por sistemas de manejo
e variabilidade espacial de um argissolo. 2000, Santa Maria, Tese de Mestrado,
Universidade Federal de Santa Maria, 2000. 65 p.
AGUIAR, R. A.; MOREIRA, J. A. A.; STONE, L. F.; BERNARDES, T. G.; JESUS, R.
P. Sustentabilidade de sistemas orgânicos com plantas de cobertura na cultura do
arroz, por meio de alterações físicas do solo, Revista Pesquisa Agropecuária
Tropical, UFG, Goiânia, v.40, n.2, p. 142-149, 2010.
127
ALBUQUERQUE, J. A.; REINERT, D. J.; FIORIN, J. E.; RUEDELL, J.; PETRERE,
C. e FONTINELLI, F. Rotação de culturas e sistemas de manejo do solo – efeito
sobre a forma da estrutura do solo ao final de sete anos. Revista Brasileira de
Ciência do Solo, 19:115-119, 1995.
ANDRADE, R. S.; STONE, L. F. Índice S como indicador da qualidade física de
solos. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental, Campina Grande,
PB, V.13, n.4, p.382-388, 2009.
BEUTLER A.N.; CENTURION, J.F. Efeito do conteúdo de água e da compactação
do solo na produção de soja. Pesquisa Agropecuária Brasileira, 38:849-856,
2003.
BERTOL, I.; SCHICK, J.; MASSARIOL, J. M.; REIS, E. F. e DILY, L. Propriedades
físicas de um Cambissolo Húmico álico afetadas pelo manejo do solo. Ciência
Rural, 30:91-95, 2000.
BOENI, M. Comportamento mecânico de solos escarificados em função do
teor de água e pressão de inflação dos pneus do trator. 2000. 111p.
Dissertação (Mestrado em Agronomia) – Universidade Federal do Rio Grande do
Sul.
BRADY, N. C.; WEILL, R. Y. The nature and properties of soils. 13 ª edição. New
Jersey: Prentice Hall, 2002. 958p.
CAMARGO, O. A.; ALLEONI, L. R. F. Compactação do
desenvolvimento das plantas. Piracicaba, São Paulo, 1997. 132p.
solo
e
o
CAPECHE, C. L. et al. Estratégias de recuperação de áreas degradadas,
EMBRAPA, Rio de Janeiro, 2008.
CATTELAN, A. J.; GAUDÊNCIO, C. A.; SILVA, T. A. Sistemas de rotação de
culturas em plantio direto e os organismos do solo, na cultura da soja, em Londrina.
Revista Brasileira de Ciência do Solo, Campinas, v.21, p.293-301, 1997.
CINTRA, F. L. D. e MIELNICZUK, J. P. Potencial de algumas espécies para a
recuperação de solos com propriedades físicas degradadas. Revista Brasileira de
Ciência do Solo, 7:197-201, 1983.
COSTA, M. B. B. da et al. Adubação Verde no Sul do Brasil. AS-PTA, Assessoria
e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa. 1992. 346p.
COSTA, F. S.; ALBUQUERQUE, J. A.; BAYER, C.; FONTOURA, S. M. V.;
WOBERTO, C. Propriedades físicas de um Latossolo Bruno afetadas pelos
sistemas plantio direto e preparo convencional, Revista Brasileira de Ciência do
Solo, vol. 27 n.3, Viçosa, 2003.
CUBILLA, M. M. A.; REINERT, D. J.; AITA, C.; REICHERT, J. M. e RANNO, S. K.
Plantas de cobertura do solo em sistema de plantio direto – uma alternativa para
aliviar a compactação. Universidade Federal de Santa Maria, Dep. de Solos, CCR,
CNPQ, Santa Maria-RS, 2002, e XIV Reunião Brasileira de Manejo e Conservação
do Solo e da Água. Cuiabá, MT, 2002.
CURI, N.; LARACH, J. O. I.; KAMPF, N.; MONIZ, A. C.; FONTES, M. E. F.
Vocabulário da ciência do solo, Sociedade Brasileira de Ciência do Solo,
Campinas, 1993, 90p.
DEBIASE, H. Recuperação física de um argissolo compactado e suas
implicações sobre o sistema solo-máquina-planta, 2008. 263 f. Tese
128
(Doutorado) – Programa de Pós-graduação em Ciência do Solo, Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2008.
DEXTER, A. R. Soil physical quality. Part I. Theory, effects of soil texture, density,
and organic matter, and effects on root growth. Geoderma, v.120, p.201-214, 2004..
EMBRAPA Gado de Leite, Instrução Técnica para o produtor de leite, Maurílio
José Alvim, Juiz de Fora – MG, 2006.
EMBRAPA, Centro Nacional de Pesquisas de Solos. Sistema brasileiro de
classificação de solos. Brasília, SPI, 1999. 412p.
EMBRAPA, Manual de Métodos de Análise de Solo, 2ª ed. rev.atual.- Rio de
Janeiro, 1997. 212p.
FERRAZ, R. P. D. et al., Fundamentos de morfologia, pedologia, física e
química do solo de interesse no processo de recuperação de área degradada,
EMBRAPA, Rio de Janeiro, 2008.
FERREIRA, T. N.; SCHWARZ, R. A.; STRECK, E. V. Solos: manejo integrado e
ecológico – elementos básicos. Porto Alegre: EMATER/RS, 2000. 95p.
FOLONI, J. S. S.; LIMA, C. L. de; BULL, L. T. Crescimento radicular da soja e de
cinco adubos verdes em função da compactação do solo. In: REUNIÃO
BRASILEIRA DE MANEJO E CONSERVAÇÃO DO SOLO E DA ÁGUA, 13., 2000,
Ilhéus. Resumos. Ilhéus. CEPLAC, 2000.CD.ROM. Ref. T.200.
FOLONI, J. S. S.; LIMA, S. L.; BÜLL, L. T. Crescimento aéreo e radicular da soja e
de plantas de cobertura em camadas compactadas de solo. Revista Brasileira de
Ciência do Solo, Viçosa, v.30, n.1, p.49-57, 2006.
FRANCHINI, J. C.; DEBIASI, H.; COSTA, J. M. Rotação de culturas: prática que
confere maior sustentabilidade à produção agrícola no Paraná. IPNI –
International Plant Nutrition Institute – Brasil, Informações Agronômicas, n.134 –
Junho 2011.
FRANCHINI, J. C.; DEBIASI, H.; NEPOMUCENO, A. L.; FARIAS, J. R. B. Manejo
do solo para redução das perdas de produtividade pela seca. Publicação Embrapa
Soja, Londrina, PR, 2009.
FRANCHINI, J. C.; SARAIVA, O. F.; DEBIASI, H.; GONÇALVES, S. L.
Contribuição de sistemas de manejo do solo para a produção sustentável da
soja. Londrina: Embrapa Soja, 2008. 12 p. (Embrapa Soja. Circular Técnica 58).
GIAROLA, N. F. B.; TORMENA, C. A.; DUTRA, A. C. Degradação física de um
Latossolo Vermelho utilizado para a produção intensiva de forragem, Revista
Brasileira de Ciência do Solo, v.31 n.5, Viçosa, 2007.
GONÇALVES, W. G. Sistema radicular de plantas de cobertura sob efeito de
compactação do solo. Rio Verde: FESURV, 2005. 31p.
GUARIZ, H. R. et al. Variação da umidade e da densidade do solo sob
diferentes coberturas vegetais. Anais do XIV Simpósio Brasileiro de
Sensoriamento Remoto, Natal, Brasil, 25-30 abril de 2009, INPE, p. 7709-7716.
HAKANSSON, I.; REEDER, R. C. Subsoil compaction by vehicles with high axle
load-extent, persistence and crop response. Soil & Tillage Research. Amsterdam,
v.29, p.277-304, 1994.
HAMZA, M.A.; ANDERSON, W.K. Soil compaction in cropping sistems: A review of
129
the nature, causes and possible solutions. Soil and Tillage Research, Amsterdan,
v.82, p.121-145, 2005.
IAPAR, Mapa de Solos do Estado do Paraná: Legenda Atualizada, Rio de janeiro:
Embrapa Florestas: Embrapa Solos: Instituto Agronômico do Paraná, 2008.
IAPAR, Instituto Agronômico do Paraná. Cartas climáticas do Paraná. Londrina,
2000. v.1.0. CD ROM.
IMHOFF, S.; PIRES DA S. A.; JUNIOR, D. M. De S.; TORMENA, C. A.
Quantificação de pressões críticas para o crescimento das plantas. Revista
Brasileira de Ciência do Solo, 25:11-18, 2001.
IPARDES, Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social.
Localização
do
município
de
Guarapuava.
Disponível
em
<http://www.ipardes.gov.br>. Acesso em 10 dez 2007.
ISHAQ, M.; IBRAHIM, M.; HASSAN, A.; SAEED, M.; LAL, R. Subsoil compaction
effects on crops in Punjab, Pakistan: II. Root growth and nutrient uptake of wheat
and sorghum. Soil and Tillage Research, Amsterdan, v.60, n.1, p.153-161, 2001.
JIMENEZ, R. L. et al. Crescimento de plantas de cobertura sob diferentes níveis de
compactação em um latossolo vermelho. Revista Brasileira de Engenharia
Agrícola e Ambiental, UFCG, v.12, n.2. p.116-121, 2008.
KAY, B. D. Rates of change of soil structure under different cropping systems. Adv.
Soil Sci. v.12, p. 1-41, 1990.
KIEHL, E. J. Manual de Edafologia: relações solo-planta. São Paulo: Ceres, 1979.
262p.
KLEIN, V. A., Física do Solo. Passo Fundo-RS, Ed. Universidade de Passo Fundo,
2008. 212p.
LEPSCH, I. F. Formação e conservação dos solos. Uberlândia: Oficina dos
textos, 2002. 178p.
LIMA, V. C.; LIMA, J. M. J. C. Introdução à pedologia. Curitiba, Universidade
Federal do Paraná, Dep. de Solos e Engenharia Agrícola, 1996.
LIMA, C. L. R.; PILLON, C. N.; LIMA, A. C. R. Qualidade Física de Solo:
Indicadores Quantitativos, Embrapa Clima Temperado, Pelotas, 2007, 25p.
MACHADO, A. de M. M.; FAVARETTO, N. Atributos físicos do solo relacionados ao
manejo e conservação dos solos. In: LIMA, M. R. et al. Diagnóstico e
recomendações de manejo do solo: aspectos teóricos e metodológicos. Curitiba:
UFPR/ Setor de Ciências Agrárias, 2006. p. 234-254.
MAPFUMO, E.; CHANASYK, D. S.; BARON, V. S.; Forage growth and yield
components as influenced by subsurface compaction. Agronomy Journal,
Madison, v.90, n.4, p.805-812, 1998.
MONEGAT, C. Plantas de cobertura do solo; características e manejo em
pequenas propriedades. Chapecó/SC, 1991. 337 p.
MORAES, M. H. et.al. Efeitos da compactação em algumas propriedades físicas do
solo e seu reflexo no desenvolvimento das raízes de plantas de soja. UNESP,
Bragantia, Campinas, 1995.
PNRT – Programa para Cálculo da Resistência do Solo ao Penetrômetro de
130
Impacto – SCS- IAC, STOLF, R. Teoria e teste experimental de fórmulas de
transformação de dados de penetrômetro de impacto em resistência do solo.
Revista Brasileira de Ciência do Solo, Campinas, 15(3): 229-235, 1991.
PREVEDELLO, C. L. Física do solo com problemas resolvidos. Curitiba,
SAEAFS, 1996, 446 p.
REICHARDT, K. A água em sistemas agrícolas. São Paulo: Editora Manoele Ltda,
1990. 188 p.
REICHARDT, K; TIMM, L. C. Solo, planta e atmosfera: conceitos, processos e
aplicações. Barueri, SP: Editora Manoele Ltda, 2004. 478 p.
REICHERT, J. M.; REINERT, D.J.; BRAIDA, J.A. Qualidade dos solos e
sustentabilidade de sistemas agrícolas. Ciência & Ambiente, v.27, p.29-48, 2003.
REINERT, D. J. E REICHERT, J. M. Propriedades físicas de solos em Sistema
de Plantio Direto Irrigado. In: CARLESSO, R.; PETRY, M.; ROSA, G. E
CERETTA, C. A. Irrigação por Aspersão no Rio Grande do Sul, Santa Maria, 2001.
p.114-131.
REINERT, D. J. et al. Limites críticos de densidade do solo para o crescimento de
raízes de plantas de cobertura em argissolo vermelho. Revista Brasileira de
Ciência do Solo, Viçosa, v. 32. n. 5, 1805-1816, 2008.
RICHART, A.; TAVARES FILHO, J.; BRITO, O. R.; LLANILLO, R. F.; FERREIRA, R.
Compactação de solo: Causas e efeitos. Ciências Agrárias, Londrina, v. 26, n. 3, p.
321-344, 2005.
ROSSELLO, D. L. R. coord. Siembra Direta em el Cono Sur, Montevideo:
PROCISUR, 2001. 450p.
ROSSI, F.; VALLE, J. C. V.; VALLE, C. R. P. Como tornar sua fazenda orgânica,
Viçosa-MG, CPT, 2002. 364p.
SANTOS, H. P.; REIS, E. M., Rotação de culturas em plantio direto. Passo
Fundo: Embrapa Trigo, 2001. 212 p.
SANTOS, L. N. S. et al. Avaliação de atributos físicos de um Latossolo sob
diferentes coberturas vegetais em Alegre (ES). Engenharia Ambiental, Espírito
Santo do Pinhal, v.6, n.2, p. 140-149, 2009.
SEAB-DERAL. Secretaria de Estado da Agricultura e do Abastecimento,
departamento de Economia Rural, IAPAR, SIMEPAR, Precipitações Mensais em
mm, atualização em 10-06-2011.
SECCO, D. Estados de compactação de dois latossolos sob plantio direto e suas
implicações no comportamento mecânico e na produtividade das culturas. Tese
(Doutorado em Ciência do Solo), Universidade Federal de Santa Maria, Santa
Maria, 2003. 108p.
SEIXAS, F. Compactação do solo devido à colheita de madeira. Tese livre
docência, Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, Piracicaba, 2000. 75p.
SILVA, I. F.; MIELNICZUK, J. Avaliação do estado de agregação do solo afetado
pelo uso agrícola. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v.21, p.313-319, 1997.
SILVA, F.A.S. Assistência estatística – ASSISTAT versão 7.6 beta (2011),
Departamento de Engenharia Agrícola do CTRN, Universidade Federal de Campina
Grande – Campus de Campina Grande – PB. Disponível em
131
<http://www.assistat.com>, 2011.
SILVA, R. B.; DIAS JUNIOR, M. S.; SANTOS, F. L.; FRANZ, C. A. B. Resistência
ao cisalhamento de um Latossolo sob diferentes usos e manejo. Revista Brasileira
de Ciência do Solo, Viçosa, v.28, p. 165-173, 2004.
SILVA, R. H.; ROSOLEM, C. A. Crescimento radicular de soja em razão da
sucessão de cultivos e da compactação do solo. Pesquisa Agropecuária
Brasileira, v.37, n.6, p.855-860, 2002.
SOUZA, E. D.; CARNEIRO, M. A. C.; PAULINO, H. B. Atributos físicos de um
Neossolo Quartzênico e um Latossolo Vermelho sob diferentes sistemas de
manejo. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v.40, n.11, 2005.
SOIL SURVEY MANUAL. USDA. Disponível em: <http://soils.usda.gov> . Acesso
em: 05 jul 2008.
STOLF, R. Teoria e teste experimental de fórmulas de transformação dos dados de
penetrômetro de impacto em resistência do solo. Revista Brasileira de Ciência do
Solo, v.22, p. 189-196, 1998.
STRECK, C. A. Compactação do solo e seus efeitos no desenvolvimento radicular e
produtividade da cultura do feijoeiro e da soja. Dissertação (Mestrado em Ciência
do Solo) Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, 2003. 83p.
TAVARES, R. L. et al. Curso de recuperação de áreas degradadas: a visão da
Ciência do Solo no contexto do diagnóstico, manejo, indicadores de monitoramento
e estratégias de recuperação. Manual publicado pela EMBRAPA – Rio de Janeiro,
2008. 228p.
THOMAZ, E. L.; VESTENA, L. R. Aspectos climáticos de Guarapuava – PR.
Guarapuava, 2003.
TORMENA, C. A.; ROLOFF, G.; SÁ, J. C. M. Propriedades físicas do solo sob
plantio direto influenciadas por calagem, preparo inicial e tráfego, Revista
Brasileira de Ciência do Solo, 22:301-309, 1998-a.
TORMENA, C. A.; SILVA, A. P.; LIBARDI, P. L. Caracterização do intervalo hídrico
ótimo de um Latossolo Roxo sob plantio direto, Revista Brasileira de Ciência do
Solo, 22:573-581, 1998-b.
TORRES, E.; SARAIVA, O. F. Camadas de impedimento mecânico do solo em
sistemas agrícolas com a soja. Londrina: Embrapa Soja, 1999. 58 p. (Embrapa
Soja, Circular Técnica, 23).
TREIN, C. R. The mechanics of soil compaction under wheels. 1995, Tese de
Doutorado – Cranfield University, Silsoe.
VIEIRA, L. S.; SANTOS, P. C. T. C. dos; VIEIRA, N. F. Solos: propriedades,
classificação e manejo. Brasília: MEC/ABEAS, 1988.
WILDNER, L. P.; MIOTTO, A.; FURLANETTO, D. Produção de fitomassa para
adubação verde e cobertura do solo. III Semana de Estudos Agronômicos da
Unicentro, Guarapuava/Irati, n.02, p.115-128, 2006.
132
Análise das Diretrizes CURRICULARES NACIONAIS PARA
O CURSO DE PEDAGOGIA: PEDAGOGIA DA TERRA
OFERTADA PELA UNIOESTE (FB/PR) E O CURSO DE
PEDAGOGIA DA UNICENTRO (GUARAPUAVA / PR).
Viviane Silveira Batista32
Pedagogia – Unicentro
Ciências Sociais - FG
RESUMO: Nesse artigo apresentamos o histórico do curso de Pedagogia no Brasil,
desde sua criação até os dias atuais, bem como a análise das Diretrizes
Curriculares Nacionais para o curso de Pedagogia no Brasil, buscando perceber
como as mesmas se consolidam em diferentes cursos de Pedagogia, em diferentes
momentos, a saber: Pedagogia ofertado pela UNIOESTE (FB/PR) e o curso de
Pedagogia da UNICENTRO (Guarapuava / PR), com ênfase para a educação no
campo. A pesquisa teve abordagem qualitativa, utilizando-se de documentos
oficiais como o Projeto Político Pedagógico e matriz curricular, cedidos pelas duas
instituições participantes da pesquisa e de consultas bibliográficas.
Palavras-Chave: Pedagogia. Identidade. Diretrizes Curriculares. Projeto Político
Pedagógico..
INTRODUÇÂO
Desde a criação o curso de Pedagogia no Brasil, em 1939, vem se
buscando delinear o papel do pedagogo e a identidade do curso. Apesar das
várias transformações na legislação e regulamentação que o curso tem
perpassado parece não haver consenso entre os educadores sobre essas
questões.
32
Graduada em Pedagogia e Serviço Social pela UNICENTRO. Pós – graduada em Formação de
Professores para Docência do Ensino Superior pela UNICENTRO. E graduanda do curso de Ciências
Sociais pela Faculdade Guarapuava.
133
Buscamos com esse estudo33, fazer uma retrospectiva histórica do
curso de pedagogia no Brasil desde a criação do curso até a aprovação das
diretrizes nacionais, com o objetivo de compreender como as mesmas se
consolidam nos
cursos de Pedagogia, a saber: o curso oferecido pela
UNICENTRO (Guarapuava/PR) e pela UNIOESTE (Francisco Beltrão/PR).
A pesquisa pretende responder às seguintes questões: O que é
Pedagogia, em que momento histórico ela se configura em nosso país?
Como se deu a construção das Diretrizes Curriculares Nacionais? Quais
direcionamentos curriculares esses documentos propõem para o curso? De
que forma o curso, objeto da pesquisa, atende às determinações das
Diretrizes Curriculares?
Esse artigo está estruturado em três partes: na primeira parte
apresentamos o histórico do curso no Brasil, abordando desde seu processo
de criação e legitimação até a aprovação das Diretrizes Curriculares
Nacionais. Na segunda parte analisamos os documentos das Diretrizes
Curriculares, e seu processo de construção. E na terceira parte
apresentamos os cursos participantes da pesquisa, avaliando de que forma
cada curso dentro de sua especificidade consegue contemplar as Diretrizes
Curriculares.
A palavra Pedagogia está ligada nas suas origens à Grécia antiga. Os
escravos gregos que levavam as crianças para o local da relação de ensinoaprendizagem eram chamados de “paedagogatus”. Não era exclusivamente
um instrutor, ao contrário, era um condutor, alguém responsável pela
melhoria da conduta geral do estudante, moral e intelectual. Somente com o
passar do tempo, esse termo passou a ser utilizado para designar as
reflexões feitas em torno da educação formal.
33
A construção desse artigo só foi possível, devido à grande colaboração das instituições,
Universidade Estadual do Centro Oeste (UNICENTRO) e também da Universidade Estadual
do Oeste do Paraná (UNIOESTE), que gentilmente cederam todas as documentações
necessárias, como o Projeto político Pedagógico e a Matriz Curricular dos cursos de
Pedagogia, para realização da pesquisa.
134
A Grécia clássica pode ser considerada o berço da Pedagogia, até
porque é justamente lá, que tem início as primeiras reflexões acerca da ação
pedagógica, que vão influenciar por séculos a educação e a cultura
ocidental.
Saviani34 (2008, p. 4), ao referir-se ao termo destaca que:
É interessante observar que a passagem do grego para a língua
latina deu origem a “paedagogatus”, substantivo masculino da
quarta declinação que significa educação, instrução;”paedagogus“
e “paedagoga”, com o sentido de pedagogo, preceptor, mestre,
guia, aquele que conduz.
Para Libâneo (2006, p.850) a Pedagogia é uma ciência da prática,
que tem como objeto de estudo a educação enquanto prática social para
a construção de saberes. Kowarzik apud Libâneo (idem) entende a
Pedagogia como sendo:
Ciência da e para a educação, portanto é a teoria e a prática da
educação. Investiga teoricamente o fenômeno educativo, formula
orientações para a prática a partir da própria ação prática e
propõe princípios e normas relacionados aos fins e meios da
educação. Franco (2003a, p. 83-86), ao refletir sobre o conceito
de pedagogia na perspectiva dialética, afirma que o objeto da
pedagogia "é o esclarecimento reflexivo e transformador da
práxis educativa", de modo que a teoria pedagógica se constitui
interlocutora interpretativa das teorias implícitas na práxis do
educador e, também, a mediadora de sua transformação para fins
cada vez mais emancipatórias.
A concepção de Educação concebida como prática humana
direcionada por uma determinada concepção teórica é compartilhada
também por Luckesi (1994, p. 21), que afirma que a “prática pedagógica está
articulada com uma pedagogia, que nada mais é que uma concepção
filosófica da educação”. Tal concepção ordena os elementos que direcionam
a prática educacional.
A educação deve ser considerada como um processo histórico em
135
que o indivíduo faz parte à medida que produz e se apropria de
conhecimentos. A educação é um processo muito complexo e para
compreendê-la a Pedagogia busca outras áreas do conhecimento como a
Sociologia, Filosofia, Psicologia, História e outras.
Há muitas polêmicas sobre a natureza da Pedagogia, no que se
refere ao seu caráter teórico-prático. Sapelli (2006, p. 11) afirma que:
A Pedagogia não se dilui nas ciências da Educação, mas se
afirma como ciência prática e normativa. Prática, pois se preocupa
com uma aplicação imediata; e normativa, porque tem a
preocupação de produzir diretrizes pragmáticas para a educação.
Assim, chegamos à conclusão de que a Pedagogia é uma ciência
prática, diferentemente das demais, porque, segundo Pimenta
(2001, p. 57) “parte da prática e a ela se dirige”. Diante dessas
constatações também precisamos levantar a questão da
identidade do pedagogo.
A Pedagogia é considerada como uma ciência teórico-prática, pois ao
mesmo tempo em que investiga a educação, contribui para modificar as
práticas educativas. Se a Pedagogia se caracteriza como ciência “então o
pedagogo é um cientista da Educação e como tal deve refletir
sistematicamente sobre a educação para intervir intencionalmente sobre
ela”. (SAPELLI, 2006, p.11)
O pedagogo para dar conta de todas as questões da Pedagogia necessita
ser um “especialista”. De que forma os cursos de Pedagogia estão sendo
direcionados para formar esse profissional atualmente? Qual é a concepção
de homem, sociedade, conhecimento, os cursos estão desenvolvendo em
seus alunos? E que profissionais realmente estão sendo formados ao
concluírem o curso de Pedagogia em nossas faculdades e Universidades?
1. A HISTÓRIA DO CURSO DE PEDAGOGIA DO BRASIL
O curso de Pedagogia, segundo Silva (2006), foi criado no Brasil por
meio da organização da Faculdade Nacional de Filosofia, da Universidade
34
Em Saviani (2007) há outros elementos sobre a história da Pedagogia.
136
do Brasil, pelo Decreto lei n°. 1.190, de 4 de abri l 1939. Essa faculdade
visava dupla função: de formar bacharéis e licenciados para áreas de
Filosofia, Ciências, Letras, e a área da Pedagogia, seguindo a fórmula
conhecida como "3+1", ou seja, os alunos que concluíssem o bacharelado,
deveriam posteriormente cursar em mais dois anos o curso de Didática, para
que fosse conferido o diploma de licenciado.
O curso ficou seriado e a matriz curricular do curso estava organizada
da seguinte forma: Complementos de Matemática (1ª série), História da
Filosofia (1ª série), Sociologia (1ª série), Fundamentos Biológicos da
Educação (1ª, 2ª e 3ª séries), Estatística Educacional (2ª série), História da
Educação (2ª e 3ª séries), fundamentos Sociológicos da Educação (2ª série),
Administração Escolar (2ª e 3ª séries), Educação Comparada (3ª séries),
Filosofia da Educação (3ª séries). E para alcançar o diploma de licenciado,
o bacharel em Pedagogia deveria cursar mais um ano do curso de Didática
constituído pelas disciplinas de Didática Geral e Didática Especial. (SILVA,
2006)
Silva (2006) aponta desde a gênese da criação dificuldades em definir
a identidade do curso a fim de justificar sua existência, e alguns dilemas,
como por exemplo, a criação de um bacharel em Pedagogia, mas sem a
distinção de elementos que pudessem caracterizar esse novo profissional e
sua função no mercado de trabalho.
Essa indefinição em que o pedagogo poderia optar pelo bacharelado
ou licenciatura, sem apresentar uma definição para as funções, traz à tona
uma preocupação que ainda permeia as discussões referentes à Educação
que é quanto à questão da identidade do Pedagogo. (SILVA, 2006)
Ao bacharel em Pedagogia atribuia-se o trabalho intelectual para o
exercício de altas atividades culturais, de ordem desinteressada ou técnica.
Também para assumir cargos técnicos de educação do Ministério de
Educação era necessário apresentar essa formação. E ao licenciado caberia
apenas o ofício de ministrar aulas, um campo não exclusivo dos pedagogos,
uma vez que, pela Lei Orgânica do Ensino Normal, para lecionar nesse
curso era suficiente o diploma de ensino superior. (SILVA, 2006)
137
Saviani (2008 p. 43) salienta que o perfil do pedagogo “estaria
supostamente definido”, tendo o bacharel como técnico que não apresentava
definição de suas funções e ao licenciar-se atuaria como professor, mas isso
não aconteceu. Essa estrutura do curso permaneceu até a aprovação da
primeira LDB, em dezembro de 1961.
A estrutura do curso de Pedagogia na década de 60, mesmo com o
Parecer do CFE n. 251/62, apesar de várias discussões que ocorreram em
função do Congresso Estadual de Estudante de Pedagogia, no ano de 1967,
na cidade de Rio Claro, no estado de São Paulo, pouco mudou. Na época os
alunos participantes do congresso, afirmaram que o curso apresentava um
“currículo enciclopédico”, o qual acabava favorecendo para a perda do
campo profissional pedagógico, por oferecer insuficiente capacitação.
(SILVA, 2006)
Várias polêmicas referentes à identidade do curso novamente
voltaram a ser discutidas. Dentre elas apontada por SAVIANI (2008, p. 42),
no Parecer do CFE n. 251/62 estava a questão da manutenção ou extinção
do curso:
A tendência que se esboça no horizonte é a da formação dos
professores primários em nível superior e a formação de
especialistas em educação em nível de pós-graduação, hipótese
que levaria à extinção do curso de Pedagogia.
O que estava em pauta nas discussões era a atuação do pedagogo
apenas como professor primário, e quanto à formação do especialista não
docente, deveria ser feita em nível de pós-graduação, o que caracterizaria o
fim da graduação pela limitação da função.
É importante ressaltar que
neste período o país estava passando por uma crise política, econômica e
social, e que refletiu no sistema educacional a partir de 64, com a Ditadura
Militar, reestruturando-se o sistema educacional brasileiro que ganhou o
caráter de
instrumento de controle da sociedade civil, estabelecendo a
relação da educação com a produção tecnicista. Germano (1993, p. 133 )
afirma que:
138
A política educacional do regime militar vai se pautar ainda, do
ponto de vista teórico, na economia da educação de cunho
liberal, responsável pela elaboração da chamada ”teoria do
capital humano”. Neste sentido tenta estabelecer uma relação
direta, imediata e mesmo de subordinação da educação à
produção.
Isso teve conseqüência na definição da identidade do curso de
Pedagogia. A partir da Reforma Universitária, aprovada em 28 de fevereiro
de 1968, com a lei federal 5.540, adotou-se os princípios de racionalidade,
eficiência e produtividade no trato superior. E a função da escola passou a
ser a formação técnica além de suas funções tradicionais.
Em conseqüência temos, segundo Silva (2006), o espaço ganho para
o profissional técnico, e a formação dividida em dois: um profissional
“educador especialista” e outro “técnico em educação”, realizado por meio
de um curso dividido em dois ciclos, o básico e o profissional, ou seja,
separou-se a formação em preparar o profissional que planeja e o que
executa.
Assim, com a Resolução n º 252/69, ocorreu a regulamentação das
habilitações. O que se defendia era a fixação de conteúdos e duração
mínimos para serem observados na organização do curso.
Segundo
Scheibe (1999, p. 5), a divisão dos conteúdos deu-se da seguinte maneira:
Baseou-se na concepção de que as diferentes habilitações
deveriam ter uma base comum de estudos, constituída por
matérias consideradas básicas à formação de qualquer
profissional na área, e uma parte diversificada, para atender às
habilitações específicas. A base comum foi composta pelas
seguintes disciplinas: sociologia geral, sociologia da educação,
psicologia da educação, história da educação, filosofia da
educação e didática.
No final da década de 1970, os professores e estudantes
universitários se organizaram para tentar interferir no processo de reforma
do curso ainda que meio às escondidas, pois o momento político vigente,
não permitia a democracia, criticidade e questionamentos.
Foi a partir das indicações apontadas pelos pareceres 67/75 e 70/76,
que os participantes da I Conferência Brasileira de Educação, realizada na
PUC de São Paulo, organizaram uma mobilização nacional visando interferir
139
no rumo do processo de discussões. Criou-se o Comitê Nacional Pró
Reformulação dos cursos de formação de Educadores, com a participação
de integrantes de várias partes do país que logo induziu à criação de
comitês Regionais. (SILVA, 2006, p. 63).
No I Seminário de Educação Brasileira realizado no ano de 1978, na
Universidade de Campinas, com a participação de estudantes universitários,
buscou-se discutir o processo de estudos pedagógicos do curso.
Nessa década, o Movimento dos Educadores, por meio de
manifestações públicas, debates, embates, ganhou forças, e buscou a
redefinição da identidade do curso de Pedagogia.
Havia a pretensão de apresentar uma proposta nacional para o curso
de Pedagogia, que rompesse com o currículo mínimo e ainda mantivesse a
base da identidade do profissional da educação centrado na docência.
(AGUIAR, 2006)
A partir de 1990, o foco das discussões da Associação Nacional pela
Formação dos Profissionais da Educação – Anfope, o Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas Pedagógicas (Inep/MEC), e educadores passou a ser a
formação de educadores.
Entende-se que este movimento, só é possível, com a reformulação
do curso de Pedagogia buscando a defesa de uma política global de
formação dos profissionais da educação que contemple desde a formação
inicial, plano de carreira e salário, e formação continuada. (SCHEIBE &
AGUIAR, 1999)
A nova LDB (Lei de Diretrizes e Bases) da educação, aprovada no
ano de 1996, trouxe novamente o curso de Pedagogia à pauta das
discussões e, com ela, a questão da identidade. Desta vez envolvida com
novas questões como, por exemplo, a manutenção do curso normal superior
destinado à formação de docentes para a Educação Infantil e do Ensino
Fundamental. (SILVA, 2006)
Diante da nova problemática, no ano de 1997, por meio do edital n. 4
/97, o MEC (Ministério da Educação e da Cultura), solicitou à Secretaria de
Educação Superior (SESu), propostas para as novas Diretrizes Curriculares
140
dos cursos superiores para serem elaboradas pelas Comissões de
Especialistas do Ensino das diferentes áreas do conhecimento, entre elas a
do curso de Pedagogia. (SILVA 2006, p.67)
Outro marco importante na elaboração das Diretrizes se deu no ano
de 1998, quando a Comissão de Especialistas de Pedagogia desencadeou
um processo de discussão em todo o país, contando com a colaboração de
cursos e entidades importantes, como a Associação Nacional pela Formação
dos Profissionais da Educação (ANFOPE), Fórum de Diretores das
Faculdades de Educação das Universidades (FORUMDIR), Associação
Nacional de Política e Administração da Educação (ANPAE), Associação
Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPED), Centro de
Estudos & Sociedade (CEDES) e Executiva Nacional dos Estudantes de
Pedagogia, tendo como resultado a elaboração do Documento das Diretrizes
Curriculares do Curso de Pedagogia e seu encaminhamento ao CNE, em
maio de 1999. (AGUIAR, 2006)
No ano de 1999 uma proposta foi apresentada pela Comissão de
Especialista do Ensino de Pedagogia (CEEP). Nela apresentava-se uma
concepção de docência que se estendia para além do magistério, acabando
com a dicotomia entre a licenciatura e o bacharelado, instituindo o fim das
habilitações,
defendendo
a
flexibilização
do
currículo,
como
uma
necessidade diante da realidade brasileira, e outras questões relevantes que
detalhamos mais adiante ao nos referirmos aos conteúdos.
Desde o encaminhamento da proposta, em maio de 1999, até o mês
de abril de 2005, o Ministério de Educação e Conselho Nacional de
Educação não se manifestaram a respeito da regulamentação do curso.
Questões referentes à regulamentação do curso só apareceram de forma
indireta, conforme aponta Scheibe (2007), de carona, no bojo das
normatização do Curso Normal Superior e das Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Formação de Professores em Nível Superior, em Cursos
de Licenciatura de Graduação Plena.
Foi exatamente no dia 17 de março de 2005, após anos de
expectativa, que o Conselho Nacional de Educação (CNE) divulgou a
141
proposta para que ocorresse a sua apreciação pela sociedade civil. Após a
divulgação da proposta houve novas mobilizações de educadores, pelo fato
do documento apresentar “Diretrizes claramente identificadas com o Curso
Normal Superior”, o que resultou em manifestações e um documento
assinado pela ANFOPE, ANPED e CEDES, enviado ao Conselho Nacional
de Educação com solicitação de uma audiência pública antes da aprovação
definitiva das Diretrizes. (SCHEIBE, 2007)
As Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de Pedagogia, após
muitas discussões foram aprovadas por meio do Parecer CNE/CP n. 5/CP,
reexaminado pelo parecer CNE/CP N. 3/2006, aprovado em 21 de fevereiro
de 2006 e homologado pelo ministro de Educação em 10 de abril de 2006.
(BRASIL, 2006)
Mesmo com a aprovação das novas Diretrizes Curriculares Nacionais
para o curso de Pedagogia, o problema da identidade do curso ainda é forte
e está sendo discutido por vários estudiosos da área. O próprio MEC tem
demonstrado dificuldades em decidir sobre qual identidade o curso vai
defender.
2.1. Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de Pedagogia.
Os profissionais que trabalharam inicialmente na elaboração da
proposta, foram selecionados por especialistas do MEC, nomeados pela
portaria SESu/MEC n.146 de 10 de março de 1998, e composta por
professores vinculados ao ensino superior por meio das faculdades e
universidades brasileiras. Os profissionais eram Celestino Alves da Silva
(Universidade
Estadual
Paulista
–
Unesp/Marília);
Leda
Scheibe,
(Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC); Márcia Ângela Aguiar
(Universidade Federal de Pernambuco – UFPE), Tizuko Morchida Kishimoto
(Universidade de São Paulo – USP) e Zélia Mileo Pavão (Pontifícia
Universidade Católica – PUC/PR).
A proposta então elaborada pela CEEP, foi encaminhada em 1999
142
para a Sesu/Mec, a qual não teve receptividade positiva, e acabou não
sendo enviada ao CNE, até que fosse aprovada a regulamentação para o
Curso Normal Superior. Houve a alegação de que a proposta elaborada
entraria em confronto com a indicação da LDB/96 que em seu artigo 63,
estabelecia a figura dos Institutos Superiores de Educação, destinando aos
Cursos Normais Superiores, “a formação de docentes para a educação
infantil e para as primeiras séries do ensino fundamental". Então a SESu e a
Secretaria de Ensino Fundamental, optaram em aguardar a regulamentação
do curso para enviá-la ao CNE. (SCHEIBE, 2007)
Em 08 de maio de 2001, tivemos o Parecer do CNE N.º: 009/2001,
que regulamentou com a atribuição de 16 Artigos, a Proposta de Diretrizes
para a Formação de Professores da Educação Básica, em cursos de nível
superior. Segundo o Parecer 009/2001. (p. 4) buscava:
Construir sintonia entre a formação inicial de professores, os
princípios prescritos pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional/LDBEN, as normas instituídas nas Diretrizes Curriculares
Nacionais para a educação infantil, para o ensino fundamental e
para o ensino médio, e suas modalidades, bem como as
recomendações constantes dos Parâmetros e Referenciais
Curriculares para a educação básica elaborados pelo Ministério da
Educação.
A organização curricular, dos cursos de licenciatura deveria seguir a
Lei nº. 9.394/96 (LDB), incluindo questões como diversidade, enriquecimento
cultural, práticas investigativas, elaboração e a execução de projetos e o uso
de tecnologias da informação e da comunicação e de metodologias,
estratégias e materiais de apoio inovadores. (CNE/CP 009/2001)
A questão da carga horária que os cursos de Licenciatura Plena
deveriam cumprir instituiu-se com a Resolução CNE /CP 2 de 19 de
fevereiro de 2002, a qual definiu a carga horária mínima em 2.800 (duas mil
e oitocentas) horas, das quais: 400 (quatrocentas) horas de práticas, 400
(quatrocentas) de estágio curricular supervisionado, 1.800 (mil e oitocentas)
horas para se trabalhar conteúdos científico-cultural e 200 (duzentas) horas
para outras atividades acadêmico-ciêntifico-cultural. Esse total deve ser
vivenciado ao longo do curso obedecendo a LDB, que determina 200
143
(duzentos) dias letivos, no mínimo de 3 (três) anos. (CNE /CP 02/2002)
Um dos vários cursos regidos por essas diretrizes foi o curso de
Pedagogia para Educadores do Campo, que foi implementado no segundo
semestre de 2004, no Campus Francisco Beltrão-PR, na modalidade de
Licenciatura, num sistema diferenciado, turma única, em regime de
alternância, ofertando 50 vagas, que segundo Rabelo (2008) atendia apenas
10% da demanda dos movimentos Sociais, que apresentavam uma
demanda de pelo menos 520 professores e professoras, em processo de
formação, e que aguardavam pela aprovação do curso.
O curso nasceu devido à persistência dos movimentos sociais
populares do campo, em oposição ao modelo neoliberal que estava sendo
implementado, e conseqüentemente
avanço da produção capitalista,
expulsão do povo do campo, para a chegada do agronegócio responsável
pela concentração da terra, de renda e do poder. Nesse contexto, os
movimentos sociais buscam organizar suas bases, buscando uma boa
qualificação interna para seus integrantes, que estivesse vinculada à
formação política e ideológica, com respalto na produção do conhecimento,
tendo como base a “prática social dos sujeitos envolvidos” . (RABELO, 2008,
pg. 23)
No ano de 1997, iniciava no Rio Grande do Sul , o primeiro curso de
Pedagogia da Terra. No ano de 1998 a Universidade Federal do Paraná
(UFPR), se interessou pela criação do curso, mas propôs que o curso fosse
realizado a distância, por teleconferência, sendo rejeitado pelas movimentos.
Em 1999, foi a vez da Universidade Estadual de Ponta Grossa( UEPG)
retomar as negociações, porém, não havia interesse da mesma em ofertar o
curso. No mesmo ano a Universidade Estadual de Maringá (UEM) iniciou o
processo de negociação, construindo o Projeto Político Pedagógico, sofreu
repressão tanto internamente quanto da sociedade agrária, não aceitou a
proposta de formação dos Movimentos Socais Populares.
A participação da UNIOESTE se deu a partir de um processo de
greve, de 2001 a 2002 e um grupo de servidores da UNIOESTE, se
organizaram para discutir o papel e o compromisso social da Universidade
144
na região. Em março de 2002, ocorreu uma reunião com as entidades que
tiveram participação ativa na greve, objetivando organizar o Fórum De Lutas
Em Prol Da UNIOESTE. e o fruto dessa reunião foi a realização de um
Seminário para discutir a Questão Agrária. (RABELO, 2008)
Em 02 de agosto de 2002, com a presença de representantes de
vários campi da UNIOESTE e de setores organizados dos movimentos
sociais, iniciou a tarefa primordial, de elaboração de um projeto para a
formação de educadores para o campo. Os colegiados dos vários campi
foram consultados, e muitos professores se manifestaram favoráveis à
participação no projeto. Então, no dia 09 de novembro de 2002, em
Cascavel, foi realizada uma reunião com representantes de professores dos
Campus de Francisco Beltrão, de Cascavel e de Toledo,e assim foi criado o
curso. (UNIOESTE, 2004)
A duração do curso foi de 4 anos, com uma carga horária total de
2.800 horas-aula, conforme delibera a
Resolução CNE /CP 2 de 19 de
fevereiro de 2002. O grau obtido foi de licenciado em Pedagogia, e
apresentou uma formação diferenciada além da escola,
preocupando-se
com a formação política e pedagógica ligada à compreensão da realidade.
A matriz curricular do curso era composta das seguintes disciplinas:
No 1º ano - Linguagens: produção e recepção, Sociologia Rural, História da
Educação, Psicologia da Educação, Teorias e Práticas de Ensino dos Anos
iniciais do Ensino Fundamental, Filosofia da Educação e Estágio
supervisionado. 2º Ano: Pesquisa, Educação Popular, Sociologia da
Educaçã, História da Educação II, Teorias e Práticas de Ensino dos Anos
Iniciais do Ensino Fundamental II, Alfabetização, Organização do Trabalho
Pedagógico, Gestão Escolar e Estágio Supervisionado II . 3º Ano: Política
Educacional Brasileira, Movimentos Sociais e o Campo, Teorias do
Currículo, Alfabetização de Jovens e Adultos, Fundamentos da Didática,
Literatura Infantil, Teorias e Práticas da Educação de Jovens e Adultos e
Estágio Supervisionado III. 4º Ano:
Pesquisa I , Construção Social da
Infância e Educação Infantil, Educação e Saúde, A Questão Agrária e o
Capitalismo,
Teorias e Práticas de Ensino dos Anos iniciais do Ensino
145
Fundamental III , Educação Ambiental , Trabalho e Educação ,
Estágio
Supervisionado IV. (UNIOESTE, 2004)
Podemos perceber que há uma preocupação maior em atuar nos
anos iniciais do ensino fundamental, educação da infância, de jovens e de
adultos, buscando articular a teoria e a prática, adotando disciplina de
Estágio Supervisionado em todos os anos do curso, totalizando 400 horas.
O Curso de Pedagogia para Educadores do Campo tem a pretensão
em formar um profissional que tenha a capacidade de trabalhar além do
conhecimento sistematizado, segundo o Projeto Político Pedagógico do
curso (UNIOESTE, 2004, p. 10), objetivando:
Fortalecer a formação teórico-prática do Educador do Campo para
os Anos Iniciais do Ensino Fundamental; Vincular a formação do
Educador do campo à dinâmica sócio-histórica das populações do
campo; Desenvolver um trabalho de reflexão e ação sobre o
espaço organizacional do campo e da escola do campo. Garantir
aos profissionais da Educação do Campo um nível de formação
pedagógica interdisciplinar, buscando superar a fragmentação dos
conhecimentos no âmbito da educação;integrar momentos de
formação teórico-práticos na formação do pedagogo do campo
durante todo o curso, valorizando os eixos do ensino, pesquisa e
extensão.
O curso buscava articular a teoria e prática, possibilitando o envolvimento na
construção pedagógica do curso, de forma a ajudar na construção de sujeitos
capazes de refletir sobre a atuação do movimento e da sociedade, nos processos
de formação nas famílias e comunidades do campo, com a perspectiva de
fortalecer os seus projetos de vida. Tratou-se da formação de pedagogos que
consigam construir uma educação dos povos do campo na perspectiva do sujeito
histórico capaz de edificar o desenvolvimento sustentável do campo. Os pricipais
objetivos, segundo Rabelo (2008, p. 34) eram:
a) Qualificação do trabalho pedagógico; b) construção de métodos
articulados ao trabalho e à vida do campo; c)desenvolvimento de
uma formação que forme sujeitos críticos e criativos; d)
valorização e qualificações das ações do campo; e) formação de
sujeitos com domínio teórico e prático da educação e dos
processos da agricultura.
146
O curso da Pedagogia para Educadores do Campo35, objetivava
formar em nível superior, docência dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental
– educação da infância e de jovens e adultos, educadores com competência
técnica e compromisso político para atuar em Assentamentos de Reforma
Agrária, nas comunidades de resistência e outros espaços de atuação dos
Movimentos Sociais do campo.
As disciplinas do curso estavam organizadas em três eixos: formação
geral, proporcionando uma formação básica em Educação; a formação
diferenciada que destina mais da metade da carga horária do curso com o
total de 1330 horas, contemplando a teoria e a prática dos anos iniciais,
Alfabetização e Educação dos Jovens e Adultos Educação Popular e Estágio
Supervisionado .
É muito interessante analisarmos todo o processo histórico da
construção do curso Pedagogia para Educadores do Campo, visto que se
deu de forma coletiva, com os movimentos sociais, a partir de uma gestão
colegiada. O perfil dos alunos que freqüentou também foi diferenciado, pois
tratava-se de professores que já atuam na área e que são militantes de
Movimentos Sociais.
Enquanto o curso de Pedagogia para Educadores do Campo foi
orientado pela legislação anterior a 2006, o curso de Pedagogia da
UNICENTRO (turma 2009) está sustentado nas Diretrizes Curriculares
Nacionais de 2006. Para analisar o curso da UNICENTRO, selecionamos
alguns pontos das Diretrizes (2006): identidade do curso, princípios, campo
de atuação e organização curricular. As principais mudanças se referem às
características esperadas do egresso e à carga horária.
No documento das Diretrizes, a questão da identidade do curso que é
a docência, está descrita no artigo 2º, e determina que:
As Diretrizes Curriculares para o curso de Pedagogia aplicam-se à
formação inicial para o exercício da docência na Educação Infantil
e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino
Médio, na modalidade Normal, e em cursos de Educação
35
Para aprofundar o entendimento sobre a Educação do Campo verificar: Neto (1999), Martins
(2004), SOUZA (2006), Caldart(2007) e Santos (2008).
147
Profissional na área de serviços e apoio escolar, bem como em
outras áreas nas quais sejam previstos conhecimentos
pedagógicos. (BRASIL, 2006 )
Para FERREIRA (2006), essas determinações indicam que o curso
deverá abranger “integradamente a docência, a participação da gestão e
avaliação dos sistemas e das instituições de ensino em geral, a elaboração,
a execução, o acompanhamento de programas e as atividades educativas".
O que resultará em uma ampliação da atuação do profissional e
conseqüentemente necessitará de uma formação concisa, para dar conta da
abrangência profissional.
No artigo 3º das Diretrizes, são apresentados os princípios para a
consolidação do exercício profissional:
Art. 3º O estudante de Pedagogia trabalhará com um repertório de
informações e habilidades composto por pluralidade de
conhecimentos teóricos e práticos, cuja consolidação será
proporcionada no exercício da profissão, fundamentando-se em
princípios
de
interdisciplinaridade,
contextualização,
democratização, pertinência e relevância social, ética e
sensibilidade afetiva e estética.
Neste mesmo parágrafo mais três itens são apresentados de forma
central para a formação do pedagogo:
I - o conhecimento da escola como organização complexa que tem
a função de promover a educação para e na cidadania; II – a
pesquisa, a análise e a aplicação dos resultados de investigações
de interesse da área educacional; III – a participação na gestão de
processos educativos e na organização e no funcionamento de
sistemas e instituições de ensino.
Esses princípios apresentados exigem que, a atuação do pedagogo
perpasse os conhecimentos da área pela gestão, formação para cidadania,
que abarca a política, o planejamento e a avaliação, novamente
potencializando as funções do profissional.
Essa ampliação do campo do pedagogo fica explícita também no
artigo 5º, no qual são apresentadas as habilidades que os egressos do
curso de Pedagogia devem apresentar.
148
Art. 5º O egresso do curso de Pedagogia deverá estar apto a:Iatuar com ética e compromisso com vistas à construção de uma
sociedade justa, equânime, igualitária;I I- compreender, cuidar e
educar crianças de zero a cinco anos, de forma a contribuir, para o
seu desenvolvimento nas dimensões, entre outras, física,
psicológica, intelectual, social; III - fortalecer o desenvolvimento e
as aprendizagens de crianças do Ensino Fundamental, assim
como daqueles que não tiveram oportunidade de escolarização na
idade própria;IV - trabalhar, em espaços escolares e nãoescolares, na promoção da aprendizagem de sujeitos em
diferentes fases do desenvolvimento humano, em diversos níveis
e modalidades do processo educativo; V - reconhecer e respeitar
as manifestações e necessidades físicas, cognitivas, emocionais,
afetivas dos educandos nas suas relações individuais e coletivas;
VI - ensinar Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, História,
Geografia, Artes, Educação Física, de forma interdisciplinar e
adequada às diferentes fases do desenvolvimento humano; VII relacionar as linguagens dos meios de comunicação à educação,
nos processos didático-pedagógicos, demonstrando domínio das
tecnologias de informação e comunicação adequadas ao
desenvolvimento de aprendizagens significativas; VIII - promover e
facilitar relações de cooperação entre a instituição educativa, a
família e a comunidade; IX - identificar problemas socioculturais e
educacionais com postura investigativa,integrativa e propositiva
em face de realidades complexas, com vistas a contribuir para
superação de exclusões sociais, étnico-raciais, econômicas,
culturais, religiosas, políticas e outras; X - demonstrar consciência
da diversidade, respeitando as diferenças de natureza ambientalecológica, étnico-racial, de gêneros, faixas geracionais, classes
sociais, religiões, necessidades especiais, escolhas sexuais, entre
outras; XI - desenvolver trabalho em equipe, estabelecendo
diálogo entre a área educacional e as demais áreas do
conhecimento; XII - participar da gestão das instituições
contribuindo para elaboração, implementação, coordenação,
acompanhamento e avaliação do projeto pedagógico;XIII participar da gestão das instituições planejando, executando,
acompanhando e avaliando projetos e programas educacionais,
em ambientes escolares e não-escolares; XIV - realizar pesquisas
que proporcionem conhecimentos, entre outros: sobre alunos e
alunas e a realidade sociocultural em que estes desenvolvem suas
experiências não escolares; sobre processos de ensinar e de
aprender, em diferentes meios ambiental- ecológicos; sobre
propostas curriculares; e sobre organização do trabalho educativo
e práticas pedagógicas; XV - utilizar, com propriedade,
instrumentos próprios para construção de conhecimentos
pedagógicos e científicos; XVI - estudar, aplicar criticamente as
diretrizes curriculares e outras determinações legais que lhe caiba
implantar, executar, avaliar e encaminhar o resultado de sua
avaliação às instâncias competentes. (BRASIL, 2006)
Para Libâneo,
as atribuições apresentadas pelo documento
são
passíveis de crítica porque criaram expectativas de formação de um
superprofissional. São descrições em que se misturam objetivos, conteúdos,
149
recomendações morais, gerando superposições e imprecisões quanto ao
perfil do egresso (LIBANEO, 2006,p.4).
Percebemos no Artigo 5º, ratificando a crítica feita por Libâneo, que
há o esboço de um superprofissional. Um curso de quatro anos, por mais
consistente que seja não dá conta de tal formação.
O artigo 6º, contempla a estrutura curricular do curso, que está
dividido em três núcleos: o Núcleo de Estudos Básicos, visando
demonstrar as realidades educacionais de forma crítica e reflexiva. O
Núcleo de Aprofundamento e Núcleo de Diversificação de Estudo,
voltado para a atuação profissional, bem como projeto pedagógico das
instituições; e o de Estudos Integradores, buscando o enriquecimento
curricular por meio de projetos de pesquisa e extensão.
Para Libâneo (2006), os núcleos de estudos foram apresentados de
forma repetitiva, confusa e imprecisa, em que supostamente se incluem
disciplinas e atividades curriculares, que não estão claras.
Já segundo Saviani (2008, p. 66), há uma preocupação em se
detalhar as disciplinas que fazem parte das tarefas dos núcleos:
Estudo da Didática, de teoria e metodologias pedagógicas, de
processo de organização do trabalho docente; em seguida, faz-se
referencia á “decodificação e utilização de códigos de diferentes
linguagens utilizadas por crianças, além do trabalho didático com
conteúdos, pertinentes aos primeiros anos de escolarização,
relativos à Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, História e
Geografia, artes e Educação Física.
Saviani (2008, p.67), ainda completa sua análise sobre as Diretrizes,
afirmando que elas apresentam um paradoxo, sendo ao mesmo tempo
“extremamente restritas no essencial e assaz excessivamente no acessório”,
ou seja, elas contemplam várias questões de pluralidade de visão de mundo
e culturais, diversidades étnico-raciais, interdisciplinaridade, conhecimento
ambiental – ecológico entre outras, deixando de lado espaços para a
configuração de um campo teórico prático, dotado de conhecimentos e
experiências resultantes do processo da história.
Há também preocupação com a definição da carga horária mínima e
150
distribuição no curso, que é tratado pelo artigo 7°.
O curso de Licenciatura em Pedagogia terá a carga horária mínima
de 3.200 horas de efetivo trabalho acadêmico, assim distribuídas: I 2.800 horas dedicadas às atividades formativas como assistência a
aulas, realização de seminários, participação na realização de
pesquisas, consultas a bibliotecas e centros de documentação,
visitas a instituições educacionais e culturais, atividades práticas de
diferente natureza, participação em grupos cooperativos de
estudos; II - 300 horas dedicadas ao Estágio Supervisionado
prioritariamente em Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino
Fundamental, contemplando também outras áreas específicas, se
for o caso, conforme o projeto pedagógico da instituição; III - 100
horas de atividades teórico-práticas de aprofundamento em áreas
específicas de interesse dos alunos, por meio, da iniciação
científica, da extensão e da monitoria.
Amplia-se o mínimo de 2.800 horas definidas anteriormente para o
curso de Licenciatura da Graduação Plena, para 3.200 horas, que devem ser
distribuídas em 2.800 horas de atividades formativas envolvendo seminários,
pesquisa e atividades práticas. Para o Estágio Supervisionado 300 horas
que devem ser realizadas na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino
Fundamental e outras áreas desde que contemple o Projeto Político
Pedagógico do curso. E mais 100 horas a serem desenvolvidas pelos alunos
em atividades teórico – práticas de seu interesse, envolvendo iniciação
científica, extensão e monitoria. (BRASIL, 2006)
O curso de Pedagogia ofertado pela UNICENTRO (turma 2009) em
Guarapuava, pauta-se nas atuais Diretrizes. O curso foi criado em 20 de
novembro de 1975, e funciona em regime anual, com a duração de 4 anos,
oferecido pela instituição nos períodos matutino e noturno.
Pode-se dizer que o curso de Pedagogia, na UNICENTRO, conforme
o seu
Projeto Político Pedagógico (2008, p.04), “foi marcado por uma
trajetória histórica constituída de mudanças, ora provocadas pelo mercado
de trabalho, ora pela legislação, que resultaram na elaboração do projeto
atual” .
A partir de 1996, com a LDB 9.394/96, a organização do curso foi
centrada na formação de licenciados para o Magistério dos Anos Iniciais do
Ensino Fundamental, e foi introduzindo as habilitações de Educação Infantil
151
e Supervisão Escolar, além das que já existiam no curso, para cumprir as
determinações da legislação. No ano 2000, o curso sofreu alterações,
incluindo a habilitação de Educação Inclusiva, afim de formar profissionais
para atuar na Educação Especial.
A partir de 2005, o departamento do curso reiniciou um novo processo de
estudo do curso, procurando “acompanhar a flexibilização requerida pelo
mercado de trabalho e pelas discussões preliminares acerca de propostas
para
as
Diretrizes
Curriculares
sobre
a
formação
do
pedagogo”
(DEPED/UNICENTRO, 2008, p. 05). Em conseqüência, as habilitações
deixaram de fazer parte da graduação, passando a existir somente em nível
de pós-graduação e a centralidade do curso passou a contemplar a docência
e a gestão educacional em instituições escolares e não escolares,
enfatizando a pedagogia como ciência da educação e da formação de
professores.
Com as Diretrizes Curriculares Nacionais de 2006, o curso de
Pedagogia não se alterou de forma muito significativa.
2.2. A questão da identidade do pedagogo no curso de Pedagogia da
UNICENTRO.
A questão da identidade do pedagogo prevista no artigo 2º das Diretrizes
Curriculares Nacionais, defende a docência como centralidade na Educação
Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino
Médio, na modalidade Normal, e também em instituições não escolares.
O Curso da Pedagogia da UNICENTRO, em conformidade com o
documento prevê: formar para a “Docência nos anos iniciais, na educação
infantil, nas disciplinas pedagógicas do ensino médio, modalidade normal,
mas acrescenta a formação em Gestão educacional, em instituições
escolares e não-escolares, conforma o Projeto Político Pedagógico (2008):
O profissional formado no Curso de Pedagogia do Campus Santa
Cruz da UNICENTRO, em fase de formação inicial, habilita-se, na
ênfase desta formação, para atuar na Educação Formal, em
ambientes escolares e não escolares contribuindo para o
desenvolvimento da própria Pedagogia como Ciência da
152
Educação. Os focos principais do processo de formação (e
conseqüente atuação) do (da) Pedagogo (a) são a docência e a
gestão educacional, tendo a pesquisa como princípio formativo,
articulada ao ensino e à extensão.
Um dos conflitos existentes no curso, refere-se à atuação do
pedagogo em instituições não-escolares. O que se entende por instituições
não-escolares? E qual será a atuação no pedagogo nestas instituições?
Segundo o PPP do curso (DEPED/UNICENTRO, 2008, p. 29), essas
instituições seriam “empresas, hospitais, secretarias de escola, ONGs, etc.”
E a atuação se dá de forma: (IDEM, p. 33)
Integradora das diversas funções do trabalho pedagógico e dos
processos educativos, escolares e não escolares, bem como
análise, implementação, acompanhamento e avaliação de
políticas públicas e institucionais na área de educação.
Será que nas empresas, hospitais, Ongs, existirá meios de o
pedagogo propor e desenvolver trabalhos pedagógicos envolvendo a
educação? Ou apenas estaria desenvolvendo funções administrativas ou de
Recursos Humanos, que foge da função do pedagogo e da Docência.
Na matriz curricular do curso há disciplinas que contemplam a Gestão
nas Instituições Escolares e Não Escolares perfazendo um total de 102
(cento e duas) horas, e o Estágio Supervisionado em Gestão nas instituições
escolares e não escolares 136 (cento e trinta e seis) horas, totalizando 238
(duzentos e trinta e oito) horas. O que nos leva a refletir sobre o pouco
número de horas destinado para esse campo que além de não apresentar
uma definição clara da função, acaba por comprometer a qualidade da
atuação do pedagogo.
2.3. Princípios para consolidação e o exercício da profissão
No artigo 3º tocante aos princípios da consolidação do exercício
profissional
a
Diretriz
prevê
a
questão
da
interdisciplinaridade,
contextualização, democratização, pertinência e relevância social, ética e
153
sensibilidade efetiva e estética. O curso da UNICENTRO, (p. 08) determina
em conformidade com a Diretriz como princípios:
Conhecimento como construção sócio-histórica e cultural; relação
teoria e prática ao longo do curso; a pesquisa como princípio
científico e educativo; a gestão democrática; compreensão das
diferenças presentes na sociedade, abrangidas pelas noções de
interculturalismo e inclusão; concepção de sociedade com mais
justiça social; defesa do público como instância de construção de
conhecimento comprometido com a sociedade; defesa da
cidadania.
Os princípios que as Diretrizes apontam, e que o curso de Pedagogia
adotam, são reflexos do contexto social e econômico em que estamos
inseridos. Nos dias atuais, em que a discrepância social aumenta, e com ela
vários problemas como a violência, injustiça, preconceito, é bonito e esta na
“moda” falarmos em defesa da cidadania, direitos sociais, democratização,
ética, etc,
Ao fazermos um paralelo com o curso de Pedagogia para
Educadores do Campo, verificamos que os princípios defendidos pelo
curso são outros, consideram: “As pedagogias do Movimento; A Formação
e a prática; A pesquisa como princípio educativo; Avaliação emancipatória;
Organização social dos educandos no curso: Tempos/Espaços Educativos;
Gestão Participativa; Equipes de Trabalho”. A fim de dar conta dos
prinípios apresentados, baseam-se na concepção do materialismo
histórico-dialético de orientação marxista, procurando trabalhar a matriz
currícular nas relações de produção, buscando de oferecer uma formação
sócio-cultural e política. (UNIOESTE, 2004)
2.4. Aptidões que o egresso do curso deve apresentar.
Assim como nas Diretrizes em que encontrarmos uma lista de 16
atribuições ao
egresso
do
curso, em que
o definiria
como um
superprofissional, o curso de Pedagogia da UNICENTRO, segundo seu
Projeto Político Pedagógico (2008, p.18) apresenta uma listagem extensa de
atribuições.
154
Esse perfil, assim, definido, considerando-se a função de docente
e a de gestor educacional, abrange, ainda, aspectos como a
Capacidade de articular a ação-reflexão, Promoção de processos
investigativos nos diversos campos educacionais, de forma a
subsidiar o aprimoramento teórico-metodológico dos professores,
pela sistematização de estudos, troca de experiências e debates,
visando à socialização e produção do conhecimento e formação
do cidadão;Conhecimento, compreensão e observação dos
preceitos constitucionais e da legislação educacional em vigor;
Postura ética e profissional, com responsabilidade social, que
contribua para a construção de uma sociedade includente, justa e
igualitária;
Mobilização e integração de conhecimentos,
capacidades e tecnologias para intervir qualitativamente em
situações pedagógicas concretas, visando à formação e promoção
dos educandos;
Implementação de mecanismos de
acompanhamento e avaliação do trabalho pedagógico escolar
pela comunidade interna e externa; Orientação dos processos de
elaboração e concretização dos planejamentos de ensinoaprendizagem, junto ao coletivo de professores da escola,
incluindo-se a organização de conselhos e assembléias de classe,
de forma a propiciar a reflexão-ação sobre o trabalho pedagógico
desenvolvido em sala de aula; Incentivar e promover atividades
concernentes à gestão democrática como a participação em
atividades do conselho escolar, associação de pais e professores,
reuniões pedagógicas e grupos de estudos; Participação em
atividades em âmbitos não escolares tais como: sindicatos,
conselhos tutelares, organizações não governamentais, entre
outras;
Capacidade de análise para gestar os processos
escolares e não escolares que estejam relacionados ao ato
pedagógico, ao trabalho educacional e a articulação entre
educação formal, não formal e informal, promovendo o exercício
profissional do Pedagogo centrado na sua função de compreender
o processo educacional também em contextos além dos
ambientes escolares;
Muitas habilidades aparecem como se fosse possível desenvolver no
aluno todas essas atribuições que o Projeto Político Pedagógico do curso
aponta, em apenas quatro anos. A matriz curricular, por mais que apresente
uma gama de 33 disciplinas, ainda seria insuficiente para desenvolver todos
esses quesitos. A carga horária também deveria ser revista, pois a disciplina
de estágio supervisionado, por exemplo, com um total de apenas 374 horas,
não seria suficiente para dar conta de todas todo o processo pedagógico
educacional
referente
à
Educação
Infantil,
Alfabetização,
Ensino
Fundamental, Jovens e Adultos, Educação Especial, Gestão e ainda atuar
em instituições não escolares.
155
2.5.
A estrutura do curso
O documento sugere a organização da estrutura do curso no artigo 6º,
em três núcleos de estudos: básico, de aprofundamento e diversificação de
estudos. O curso da UNICENTRO organiza a categorização de disciplinas
do Currículo Pleno da seguinte maneira: disciplinas obrigatórias de formação
básica, disciplinas obrigatórias complementares disciplinas obrigatórias
profissionalizantes.
No núcleo de estudos básicos segundo as Diretrizes, deve conter
disciplinas que contemplem a ”literatura pertinente a realidade da sociedade
educacional, por meio de reflexões e ações críticas”. E a Pedagogia da
UNICENTRO, apresenta as disciplinas obrigatórias de formação básica, que
possibilita o aprofundamento da realidade educacional a partir das seguintes
disciplinas: Fundamentos Filosóficos da Educação, Fundamentos Históricos
da Educação, Psicologia da Educação I, Sociologia da Educação I,
Fundamentos Filosóficos da Educação Brasileira, História da Educação no
Brasil, Psicologia da Educação II, Sociologia da Educação II, Pesquisa em
Educação I, Pesquisa em Educação II, Pesquisa em Educação III – TCC,
Teoria e Metodologia da Educação Especial e Inclusiva,Fundamentos da
educação infantil.
O Núcleo de Aprofundamento e Diversificação de estudo, das
Diretrizes prevê a atuação profissional, conforme o Projeto Político
pedagógico de cada curso. E nesta perspectiva o curso da UNICENTRO,
apresenta as Disciplinas obrigatórias profissionalizantes: Introdução à
Pedagogia: organização do trabalho pedagógico, Teoria e Metodologia da
Alfabetização, Teoria e Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa, Teoria
e Metodologia do Ensino de Ciências Naturais e Matemática, Metodologia da
educação infantil Teoria e Metodologia do Ensino da Geografia e História,
Didática, Educação de jovens e adultos, Estágio supervisionado na
educação infantil, Estágio supervisionado nos anos iniciais, Teoria e
Metodologia da Educação Física, Teoria e Metodologia do Ensino da Arte,
Estágio Supervisionado nas disciplinas pedagógicas do ensino médio,
156
Estágio Supervisionado em gestão nas instituições escolares e não
escolares, estão nas Instituições Escolares e Não Escolares.
E o terceiro Núcleo de Estudos Integradores, da Diretriz propõem que
“deve proporcionar o enriquecimento curricular”. Nesta perspectiva a
UNICENTRO apresenta as Disciplinas obrigatórias complementares: Novas
Tecnologias Aplicadas à Educação, Currículo da educação básica, Políticas
Educacionais, Org. e Funcionamento da Educação Básica, Noções de língua
brasileira de sinais – Libras e Planejamento e avaliação.
Como podemos analisar as disciplinas que compõem a matriz
curricular do curso de Pedagogia, são numerosas e buscam dar conta de
todas as atribuições que o curso propõem, porém a carga horária destinada
as mesmas não é suficiente para garantir aproveitamento e aprofundamento
dos conteúdos. A questão da carga horária de cada disciplina acaba levando
a um trabalho aligeirado e superficial do conteúdo. Percebemos no conjunto
das disciplinas uma preocupação em ampliar o estudo dos fundamentos e
também uma atenção maior à Educação Infantil. Houve também, apesar das
polêmicas a introdução da disciplina de Educação de Jovens e Adultos.
2.1.
A carga horária do curso.
Com a aprovação das diretrizes a carga horária do curso passou a ser
de no mínino 3.200 horas que deve ser distribuída em: 2.800 horas de
atividades formativa, 300 horas para o Estágio Supervisionado e 100 horas a
serem desenvolvidas pelos alunos em atividades teórico recebem uma
distribuição um pouco diferenciada no curso da UNICENTRO sendo 2663
atividades formativa, 200 Atividades complementares e 350 para o estágio
supervisionado, totalizando 3213 horas.
Quando analisamos a Pedagogia para Educadores do Campo da
UNIOESTE, é interessante observamos que a maior carga horária foi
destinada para as disciplinas relacionadas com a teoria e a prática. Para o
estágio supervisionado foi destinado um total de 400 (quatrocentas) horas, e
que a carga horária total do é de apenas 2800 horas.
157
O curso de Pedagogia da UNICENTRO, na busca de formar um
profissional para além das práticas docentes, polivalente, acaba por
fragmentar sua carga horária, apresentado várias disciplinas com poucas
horas destinadas às mesmas. Considerando que a maior demanda dos
egressos da UNICENTRO ainda é atuar em instituições de ensino na rede
particular e municipal, o estágio supervisionado nessa modalidade tem sua
carga horária de 68 horas nos anos iniciais, 68 horas na Educação Infantil,
68 horas em Educação para Jovens e Adultos, e destinou-se 136 horas para
Gestão em instituições não escolares.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao retratarmos a contextualização histórica do curso de Pedagogia no
Brasil, marcado pela dicotomia entre o licenciado e o bacharelado,
percebemos claramente a indefinição da função e do papel do pedagogo,
que perpassa várias modificações históricas, de legislação e concepções
educacionais, e que atualmente ainda está em discussão. Há tentativas de
extremos opostos: de minimizar o papel do papel do pedagogo e de torná-lo
um super profissional. Essas mudanças estão intimamente ligadas às
mudanças do contexto social que cobram da escola respostas diferentes.
Assim, mesmo com a aprovação das Diretrizes Curriculares Nacionais
para o curso de Pedagogia, a questão da identidade não foi resolvida.
Podemos considerar que houve avanços e retrocessos no longo caminho
percorrido, marcado por lutas, reivindicações dos movimentos estudantis, e
professores e de entidades educacionais, por meio de discussões e
mobilizações até a aprovação das atuais Diretrizes, em 2006.
Por mais que as Diretrizes apresentem a questão da Docência nos
anos iniciais e ensinos fundamentais, em instituições escolares e não
escolares, caracteriza o pedagogo, como um profissional polivalente,
multifuncional
que
deve
apresentar
uma
série
de
habilidades
e
competências, para servir às necessidades do mercado de trabalho. Temos
então a seguinte preocupação: de que forma as faculdades, os institutos e
158
universidades, estão trabalhando para desenvolver em seus alunos essas
super atribuições?
E interessante ressaltarmos que as Diretrizes Curriculares não são
fechadas e possibilitam abertura para que cada curso possa atender sua
especificidade conforme a demanda de cada instituição de ensino. Essa tem
sido uma característica bem presente na legislação brasileira nas últimas
décadas.
Em relação aos cursos analisados, podemos perceber como diferença
marcante, além da ampliação da carga horária e da mudança nas
disciplinas, o compromisso classista assumido por um e outro. O curso da
UNICENTRO não explicita claramente sua opção. Já o da UNIOESTE
explicita sua opção pela classe trabalhadora, especialmente, aquela que vive
no campo. Essa reflexão nos leva a analisar com veemência a necessidade
de aprofundar as discussões acerca da não neutralidade da Universidade e
do papel político que ela consolida na formação de professores. Essa
formação exige que se construam elementos tanto técnico-científicos como
de caráter político-classista. Afinal, a serviço de quem a Universidade está?
REFERÊNCIAS
AGUIAR, M.S et al. Diretrizes curriculares do curso de pedagogia no Brasil:
disputas de projetos no campo da formação do profissional da educação.In:
Educação e Sociedade. Campinas. v.27, n. 96, p. 819-842. out. 2006.
BELLO, José Luiz de Paiva. O fim da Pedagogia. Rio de Janeiro, 2003.
Disponível em: www.pedagogiaemfoco.com.br. Acesso em: 06 de fevereiro de
2009.
BRASIL, CNE. (2002) “ Resolução CNE/CP 2/2002”, de 19/02/2002. Diário Oficial
da União, de 04/03/2002, Seção 1, p.9. Disponível também em: http://
portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/rcp01_06.pdf
BRASIL, CNE. (2006) “ Resolução CNE/CP 1/2006”, de 15/05/2006. Diário Oficial
da União, portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/CP022002.pdf.
CALDART, Roseli. Intencionalidade na formação de educadores do campo:
Reflexões desde a experiência do curso “ Pedagogia da Terra da Via Campesina.In:
Cadernos do Iterra Veranópolis. Ano VII – nº. 11, p. 9- 52, 2007
DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÂO. Projeto Político Pedagógico. Guarapuava:
159
UNICENTRO, 2008.
FERREIRA. N. S. C. Diretrizes curriculares para o curso de pedagogia no
Brasil: a gestão da educação como gérmen da formação. In: Educação e
Sociedade. Campinas, v. 27, n.97,p. 1341 – 1358, set./dez. 2006.
GERMANO, J. W. Estado Militar e educação no Brasil (1964-1995). São Paulo:
Cortez, 1993.
LIBÂNEO. J. C. Diretrizes curriculares da pedagogia: imprecisões teóricas e
concepção estreita da formação profissional de educadores. In: Educação e
Sociedade. Campinas, v.27, n.96, p. 843 – 876, out. 2006.
LUCKESI, C. C. Filosofia da educação. São Paulo: Cortez, 1994.
MACIEL, M. F. O curso de Pedagogia na Universidade Estadual do Centro
Oeste – UNICENTRO. Guarapuava: UNICENTRO, 2008. Mimeo.
MARTINS. F. J. Gestão democrática e ocupação da escola: o MST e a
educação. Porto Alegre: EST, 2004.
NETO, Luiz Bezerra. Sem – Terra Aprende e Ensina: Estudos sobre as Práticas
Educativas do Movimento dos Trabalhadores Rurais. Campinas - São Paulo:
Autores Associados, 1999.
PRÓ-REITORIA DE GRADUAÇÃO. Projeto Pedagógico Do Curso Especial
Depedagogia Para Educadores Do Campo. Cascavel: UNIOESTE, 2004.
RABELO, A. K et al. Vivências e Práticas Pedagógicas: Sistematizando a turma
Antônio Gramsci. Cascavel: Universidade Estadual do Oeste do Paraná, 2008
SANTOS. C. A. (org). Educação do Campo: Campo – políticas Públicas –
Educação. Brasília: Incra; MDA, 2008.
SAPELLI, M.L. Dialetizando A Didática. CASCAVEL, 2006. Mimeo
SAVIANI, D. História das idéias pedagógicas no Brasil. Campinas – SP: Autores
Associados, 2007.
_____. A pedagogia no Brasil: História e Teoria. Campinas – SP: Autores
Associados, 2008.
SCHEIBE, L ; AGUIAR, Márcia Ângela da S. Formação de profissionais da
educação no Brasil: O curso de pedagogia em questão. In: Educação e
Sociedade. Campinas, v.20, n.68, p. 278-298, Dec. 1999.
SCHEIBE, L. Diretrizes Curriculares para o curso de Pedagogia: trajetória
inconclusa.In: Caderno de Pesquisa. Campinas, v. 37 n.130, p. 43-62, jan./abr.
2007.
160
SILVA, C. S. B. Curso de pedagogia no Brasil: História e identidade. 3. ed.
Campinas – SP: Autores Associados, 2006.
SOUZA. M. A. Educação do Campo: propostas e práticas pedagógicas do MST.
Petrópolis, RJ: Vozes, 2006.
A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE DA TERRA E A
EXPERIÊNCIA DE REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA DO
MUNICÍPIO DE CANDÓI-PR
Dário Miranda Almeida
Ciências Sociais – FG
Orientadores: Profª Ms. Cerize Nascimento Gomes
Prof. Rafael Morgentale Disconzi
RESUMO: A questão social da propriedade da terra é o foco de estudo da
presente pesquisa com estudo de caso sobre o Programa de Regularização
Fundiária em desenvolvimento no município de Candói – Pr. O processo envolve
104 ações de usucapião movidas por 89 famílias de agricultores cadastradas no
relatório analítico de domicílios do governo Federal. O Programa de Regularização
Fundiária desenvolve-se a partir de parceria entre a Prefeitura Municipal de Candói
e o Instituto de Terras e Cartografias – ITC que efetuou a medição da área, de
977.4315 hectares que deverá integralizar a posse de terras para as famílias de
agricultores autoras das ações de usucapião.
Palavras-chave: Terra. Regularização Fundiária. Usucapião. Questão
Agrária.
INTRODUÇÃO
A proposição desta pesquisa está relacionada ao acompanhamento
do programa de regularização fundiária, que está em desenvolvimento no
Município de Candói (PR), por meio do qual famílias de agricultores das
localidades de Barreiro, Cavernoso, São Roque, Vila Tomé, Retiro e do
Assentamento São João Batista, devidamente cadastradas no Relatório
Analítico
de
Domicílios
do
Governo
Federal,
deverão
receber
a
documentação de posse de terra, devidamente regularizada.
A relevância social desse programa, bem como o fato de ser uma
161
iniciativa inédita no Estado do Paraná, chamou a atenção para a
necessidade de estudos de natureza acadêmica sobre a questão. Segundo
informações da Assessoria de Comunicação Social da Prefeitura de Candói ,
o processo envolve
proprietários, testemunhas e confrontantes, que
ingressaram com 104 ações de usucapião, pertencentes ao Programa de
Regularização Fundiária do Município de Candói, em parceria com o Instituto
de Terras e Cartografias – ITC que efetuou a medição da área, de 977.4315
hectares que deverá integralizar a posse de terras para 89 famílias de
agricultores, na primeira etapa do programa.
O trabalho de Regularização Fundiária está sendo realizado pela
Prefeitura Municipal de Candói , através da
Secretaria Municipal de
Agricultura a fim de documentar áreas que não possuem escrituras públicas
ou matrículas, ou seja, áreas das quais o produtor só tem a posse da terra
sem o documento – o que impede tais agricultores de obter financiamentos
ou quaisquer subsídios governamentais para o desenvolvimento de
programas agrícolas.
Por meio deste estudo pretende-se realizar o registro e o perfil das
famílias envolvidas nesse processo de regularização fundiária, juntamente
com a reunião de fontes documentais que possam ser importantes para a
compreensão dos procedimentos legais relacionados à essa questão
agrária, além do cadastramento de fontes orais, a partir de entrevistas com
agricultores, técnicos agrícolas e pessoas que vivenciam esse processo.
Diante da diversidade de fontes disponibilizadas pela pesquisa, pode-se
ainda viabilizar a produção de arquivo fotográfico e referencial bibliográfico
relacionado à questão agrária, social e econômica.
O acompanhamento desse processo de regularização fundiária,
permitirá a construção de parâmetros e concepções que poderão servir
como referência para outros processos da mesma natureza, que venham a
ser desenvolvidos em outras regiões do Paraná, ou até mesmo de outros
Estados.
O objetivo geral deste trabalho de iniciação científica é o de fomentar
pesquisa sobre o
programa de regularização fundiária
que está em
162
desenvolvimento no Município de Candói (PR), por meio do qual famílias de
agricultores devidamente cadastradas no relatório analítico de domicílios do
governo Federal, deverão receber a definitiva documentação de posse da
terra, devidamente regularizada.
Entre os objetivos específicos encontram-se os de apresentar o modelo
de regularização fundiária em desenvolvimento no município de Candói
(PR); acompanhar a regularização de posse da terra para as famílias de
diversas localidades do município; pesquisar o perfil econômico e social e a
procedência das famílias que participam do Programa de Regularização
Fundiária em Candói; identificar os benefícios advindos com a regularização
de posse da terra e o de promover a divulgação dos resultados gradativos
e/ou parciais desta pesquisa em eventos de natureza científica.
1. A QUESTÃO AGRÁRIA NO BRASIL
A questão agrária é uma das ramificações da pesquisa sociológica
que conquistou expressão acadêmica na primeira metade do século XX na
Europa e nos Estados Unidos. Maria Yeda Linhares avalia que ela ganha
destaque com o surgimento dos primeiros estudos relacionados às técnicas
de trabalho agrícola e às relações do homem com a natureza e com a
descrição de modos de viver distintos dos modelos visíveis na sociedade
urbana e industrial. No Brasil esse modelo de pesquisa só se tornaria visível
a partir da década de 1970 quando historiadores, economistas e cientistas
sociais lançaram novos olhares sobre a história da agricultura (LINHARES,
1997, p.165):
Somente em final de 1976, colocou-se perante historiadores
e cientistas sociais do país uma proposta que, uma vez
seguida e desenvolvida, seria o ponto de partida para novos
enfoques no campo da história da agricultura (...) Nessa
ocasião apresentou-se um programa de pesquisa que tinha
por objetivo fazer um amplo inventário de fontes localmente
existentes, de modo a serem tratadas nos moldes da história
serial, e passíveis pois de serem organizadas em séries
homogêneas, extensas e significativas. (LINHARES, 1997,
p.170 e p.171)
163
Entre as fontes de pesquisa apresentadas aos cientistas sociais a
autora relaciona as de natureza jurídica (inventários, tutelas, escrituras,
testamentos, registros paroquiais, lista de votantes e processos-crime) e as
de natureza eclesiástica (registro de batismos, casamentos, processos
diversos) e as de natureza fiscal ou oficial (relatórios, correspondências,
legislação, estatísticas e contabilidades). Segundo ela, a catalogação de
fontes novas ou antigas demonstra que a questão agrária não pode ser
separada da agricultura, atividade que durante a maior parte da história
“congregou homens e mulheres, constituindo-se como principal fonte de vida
e de trabalho” (1997,p.166).
Desse modo surgiram os primeiros estudos para especificar as linhas
de pesquisa voltadas para a agricultura, privilegiando-se as práticas
agrícolas, ciências e técnicas agrícolas, modos de produção e meioambiente. Apenas num segundo momento, Linhares observa que foram
privilegiadas questões como as condições de vida e o cotidiano dos
trabalhadores rurais e o impacto social da introdução de tecnologias
agrícolas:
Como se tem ressaltado tantas vezes, a história da gente
comum que trabalha, come e dorme, gera filhos e saberes
variados, e que na sua faina cotidiana transforma a natureza
ao criar meios de subsistência e técnicas, custou a entrar
nas preocupações do pesquisador como objeto de estudo
(LINHARES, 1997, p.165).
Num terceiro momento, a abordagem da questão agrária, teria
tomado como referência a história econômica (1997,p.168), colocando em
evidência estudos de Caio Prado Júnior, Celso Furtado e outros autores que
analisam a transição do capitalismo para sua base agrária, bem como sua
intervenção sobre a pequena agricultura. Tais autores definiram três
questões fundamentais para a compreensão da história agrária no Brasil:
primeiramente em escala regional, a terra tornou-se escassa diante do
crescimento
populacional
e
das
pressões
socioeconômicas,
com
favorecimento do êxodo rural; em seguida , a questão agrária seria afetada
164
com a intensificação do uso da terra, aumento de insumos, mercantilização
e reorganização das unidades de produção com objetivo de atender a
mercados diversos; finalmente, a questão agrária é afetada historicamente e
socialmente com base na concentração das terras,
monopolização dos
lucros e permanência da exploração da mão de obra. (1997, p. 181-182)
2. MODERNIZAÇÃO AGRÍCOLA E QUESTÃO AGRÁRIA NO
PARANÁ
A partir dos anos de 1970 o Paraná atravessou a fase de superação
do modelo agrícola tradicional mediante a adoção de um projeto de
modernização do setor agrícola, com vistas a tornar a produção mais
dinâmica e diversificada, mediante processo de mercantilização da
agricultura.
Por
modernização,
entendia-se
o
equipamentos agrícolas, adubos, defensivos, etc.
uso
crescente
de
Dados do Instituto
Paranaense de Agricultura e Desenvolvimento Social – IPARDES, mostram
que apenas entre 1971 e 1978 foram vendidos no Estado 63.024 tratores e
a
produção
de
soja,
cana
de
açúcar,
milho
e
arroz
aumentou
consideravelmente (IPARDES, 2006, p.26).
Outro fator citado no documento do IPARDES, são as formas de
organização consideradas mais avançadas, como é o caso das cooperativas
que passam a intermediar as relações entre a agricultura, o comércio e a
indústria, potencializando a capacidade de crédito agrícola. A soma de tais
fatores permitiu um ordenamento da produção em diversas regiões do
Estado.
Observa-se, no entanto, que tal desenvolvimento tem dois eixos
distintos. O primeiro concentra áreas consideradas dinâmicas, mercantis e
em processo de transformação acelerada, com tendência à concentração da
propriedade que se torna mais visível a partir da década de 1970 (2006,
p.38). O segundo eixo é representado por áreas tradicionais, formadas por
pequenos produtores com precário acesso aos meios de transportes, vias de
comunicação e relações com o mercado, características essas que gestam
165
espaços marginais de desenvolvimento social e econômico, bem como de
acesso à terra (IPARDES, 2006, p.66).
Mesmo com técnicas tradicionais, baixa produtividade e pouco poder
aquisitivo, até o final da década de 1970, alguns pequenos agricultores
ainda tinham em seu pequeno pedaço de terra a possibilidade de diversificar
a produção e eram responsáveis pela geração de quase tudo o que
consumiam. Segundo o IPARDES, as vias de transporte que ligaram regiões
e mercados, obrigaram essas áreas antes marginalizadas a adotar modelos
e técnicas próprios do surto desenvolvimentista paranaense que tinha na
agroindústria sua principal base econômica.
Alguns estudiosos entendem que essa relação tornou a agricultura
subordinada ao desenvolvimento industrial, e que esta pode ser vista desde
1970, como um mero aspecto da economia nacional comandado pela
demanda industrial. Sobre esse período, Fábio Alves em Direito agrário e a
política fundiária no Brasil, escreve:
O processo de modernização da agricultura intentado
pela ditadura militar- concentrador e excludente –
deixa à margem expressivo número de trabalhadores,
além daqueles que perderam suas terras para bancos
ou se viram obrigados a entregá-las aos grandes
empresários agroexportadores.(ALVES, 1995, p.150)
O autor menciona também aqueles que foram
atingidos pelos
projetos de hidrelétricas, como os expropriados da Itaipu e antigos
arrendatários, que em virtude da sua situação, teriam reorganizado os
movimentos de luta pela terra. Alves diz que em 1981 começou a ressurgir o
Movimento Sem terra, que se consolida em 1984 no Oeste paranaense e
realiza em 1985, em Curitiba o seu primeiro congresso. (ALVES, 1985,
p.150-151). Essas ações sociais são objeto de estudos sobre as condições
de vida dos pequenos agricultores em uma das maiores regiões produtoras
de grãos do Sul do Brasil.
Ao escrever sobre esse período o engenheiro agrônomo Valdemar
Arl, do Centro de Assessoria e Apoio dos Trabalhadores Rurais – CEPAGRI,
observar que entre as conseqüências desse modelo foi nefasta para a
166
agricultura familiar, porque entre os anos de 1960 e 1980 ocorreu no Estado
o maior registro de concentração de terra e de desgaste do solo, por meio
do direcionamento do crédito para médias e grandes propriedades.
Segundo o agrônomo, o pequeno agricultor foi prejudicado e marginalizado,
enquanto cresciam as grandes agroindústrias, ao mesmo tempo em que o
uso do agrotóxico aumentou significativamente, contribuindo para a poluição
de solos, de águas e até mesmo dos alimentos com reflexos em toda a vida
do homem (ARL, 2001, p.34).
Conforme as estatísticas apresentadas pela CEPAGRI sobre o exôdo
rural - até 1960, 64% da população vivia na área rural e no final dos anos de
1980 apenas 25% da população permanecia no campo. Assim sendo, pela
presente pesquisa investigar-se-á a história das famílias que militam pela
regularização fundiária no Município de Candói, para configurar se elas
estão ou não relacionadas aos dados até então expostos pelas
universidades e pelos institutos de pesquisa do Paraná.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Para o desenvolvimento e conclusão do presente projeto de pesquisa e
de iniciação científica serão tomadas as medidas necessárias para que seja
realizado um trabalho que trate sobre a questão social da propriedade da
terra, tomando-se como exemplo o Programa de Regularização Fundiária do
Município de Candói (PR), no qual vem ocorrendo o primeiro processo do
gênero no Brasil.
Para o encaminhamento da pesquisa foram arroladas até o momento
da produção deste artigo
importantes fontes
documentais que deverão
fornecer o devido embasamento em prol do desenvolvimento deste trabalho,
tais como o Relatório Analítico de Domicílios e Pessoas Cadastradas anexo
ao Cadastramento Único para Programas Sociais do Governo Federal da
Caixa Econômica Federal e do
Ministério do Desenvolvimento Social e
Combate à Fome. Serão analisadas também as
informações e os dados
que foram expedidos pela Secretaria Municipal de Agricultura da Prefeitura
167
de Candói.
Outra fonte considerável tem natureza cartográfica e diz respeito ao
mapeamento da área que será objeto de regularização fundiária. Nesse
sentido serão acrescentados aos documentos de pesquisa, os mapas que
acompanham o processo e que foram produzidos pelo Instituto de Terras e
Cartografia – ITC, acrescentando-se ainda a relação de agricultores autores
da ação de usucapião que deverão ser beneficiados com o Programa de
Regularização Fundiária do governo Federal.
Com a finalidade de promover o devido estudo sobre o Programa de
Regularização Fundiária e de recompor a história e a situação social das
famílias autoras das ações de usucapião serão utilizados métodos de
pesquisa bibliográfica, documental, comparativa, qualitativa e de campo.
Será procedente também o uso das técnicas de pesquisa oral por meio de
entrevistas com as famílias autoras das ações de usucapião e com
representantes dos organismos públicos envolvidos.
A partir desses procedimentos e de um estudo de caso com o a
verificação do histórico dos agricultores familiares envolvidos nesse
processo, procurar-se-á estabelecer os trâmites legais e os resultados
sociais de um programa de regularização fundiária inédito no país e que vem
ocorrendo de forma pioneira na mesorregião de Guarapuava.
4. REFERÊNCIAS
ALVES, Fábio. Direito agrário e política fundiária no Brasil. Belo Horizonte:
Editora Del Rey, 1995.
ARL, Valdemar. Agricultura familiar: terra, alimento e vida. Passo Fundo-RS:
Berthier, 2001.
LINHARES, Maria Ieda. História Agrária. In CARDOSO, Ciro Flamarion. Domínios
da História: Ensaios de teoria e metodologia. Rio de Janeiro: Elsevier, 1997.
LINHARES, Temístocles. Paraná vivo. Curitiba: Imprensa Oficial. 2000.
IPARDES. Paraná Economia e Sociedade. 2ª edição. Curitiba: Ipardes, 2006.
MARES, Carlos Frederico. Função social da propriedade.
FONTES DOCUMENTAIS
CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - Relatório Analítico de Domicílios e Pessoas
Cadastradas – Cadastramento Único para Programas Sociais do Governo Federal
168
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome – Prefeitura Municipal de
Candoi
PREFEITURA MUNICIPAL DE CANDÓI - Mapas da região constante do projeto de
regularização fundiária ; Informações e entrevistas – Assessoria de Comunicação
Social de Candói; Relação de agricultores que serão beneficiados com o Programa
de Regularização Fundiária do Município de Candói – Secretaria Municipal de
Agricultura.
EDUCAÇÃO AMBIENTAL: INSTRUMENTO PARA A
FORMAÇÃO DA CIDADANIA
Rubiara Aparecida Melo
Especialista em Gestão Escolar
Orientadora: Profª.Ms.Déa Maria Ferreira Silveira
RESUMO: O presente artigo apresentará ao leitor a importância de
um estímulo à conscientização e conservação do meio ambiente e da
implementação de políticas públicas que estimulem a educação ambiental.
Estudam-se as relações entre cidadania, educação e meio-ambiente e sugere-se a
adoção de processos de aprendizagem alternativos que valorizem o pensamento
crítico, a consciência ambiental, a postura ética e a responsabilidade social.
Discorre-se sobre o histórico e o percurso da educação ambiental e busca-se
promover conceitos e princípios relcionados ao desenvolvimento da consciência
ambiental no Brasil.
Palavras-Chave:
Educação
Ambiental.
Cidadania.
Consciência
Ambiental.Parâmetros Curriculares.
INTRODUÇÃO
Os problemas ambientais tão discutidos atualmente, não são
algo recente, mas sim acontecimentos decorrentes do longo processo
evolutivo e civilizatório gerado pela humanidade.
Desde a Pré-História período no qual surge o homem e
aprendeu a retirar da natureza seu meio de sustento através das atividades
de coleta, caça e pesca, até passar a garantir seu sustento com a agricultura
fixada em áreas férteis às margens de grandes rios, abrindo caminho para a
formação de organizações de estruturas sociais cada vez mais complexas
através da transformação natural, social, cultural e ético.
169
Através da expansão marítima européia e a revolução
comercial começou uma ampliação desenfreada dos espaços locais e por
consequência disso uma ampla degradação do solo. O crescimento
desorganizado da indústria e da urbanização, partindo da Revolução
Industrial, levou a sufocar o meio ambiente propiciando os primeiros sinais
de extinção de espécies decorrentes da ação humana, além de secamento
de lagos e rios, o aquecimento global que é capaz de confinar grandes
quantidades de poluentes numa estreita camada da atmosfera e alterações
no clima do planeta.
A prepotência e a arrogância com que o homem tratava o seu
meio tornava-o cego ao óbvio: os recursos ambientais são finitos, limitados e
estão dinamicamente inter-relacionados. Pedrini (1997, p.21).
Ao longo de sua história o relacionamento entre o homem e a
natureza tem causado inúmeros prejuízos ao meio ambiente, mesmo assim
as preocupações com essas questões ficavam restritas apenas a um
pequeno número de estudiosos e intelectuais admiradores da natureza, mas
após a II Guerra Mundial, principalmente na segunda metade do século XX é
que os problemas ambientais passaram a serem encarados como algo que
realmente deveriam ser levados em conta pelo homem.
1.
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
1.1
Surgimento e trajetória internacional da educação
ambiental
No final da década de 60 e início dos anos 70, as questões
sobre o meio ambiente passam a ser discutidas e o modelo capitalista
também passa a ser questionado, pois o homem percebeu a necessidade de
se tomar providências e tentar melhorar a sua relação com a natureza, a
partir disto é que começa a se falar em Educação ambiental (E A). Alguns
eventos internacionais que apontam a Educação Ambiental como estratégia
170
de preservação foram realizados e tiveram participação importante em sua
construção.
A Conferência de Estocolmo foi realizada na Suécia em 1972 e
trouxe dois importantes marcos para o desenvolvimento de uma política
mundial de proteção ambiental que foi a criação do Programa das Nações
Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), com sede em Nairóbi (Quênia) e a
recomendação para a criação do Programa Internacional de Educação
Ambiental (PIEA), que sugeriu que a educação ambiental fosse promovida
para combater a crise do meio ambiente. O Plano de Ação da Conferência
de Estocolmo foi à de que se deve educar o cidadão para solução dos
problemas ambientais. Pode se dizer que aí inicia o que se convencionou
chamar de Educação Ambiental.
O efeito dessa conferência no Brasil foi às pressões do Banco
Mundial e de instituições ambientais atuantes no país, é criada em 1973 a
Secretaria Especial do Meio Ambiente/SEMA pela Presidência da República
no âmbito do Ministério do Interior, que deveria orientar a gestão integrada
do ambiente.
Como uma devolutiva às recomendações da Conferência de
Estocolmo, em 1975 a Organização das Nações Unidas (UNESCO)
promoveu em Belgrado, na Iugoslávia (hoje Sérvia e Montenegro), um
encontro Internacional em Educação Ambiental onde foi criado o PIEA e foi
elaborada a Carta de Belgrado que segundo Dias (2003, p. 101) iria
constituir num dos documentos mais lúcidos sobre a questão ambiental na
época.
Em 1977, na cidade de Tbilisi, ex-União Soviética, ocorreu a
Conferência Intergovernamental sobre Educação Ambiental, considerado o
mais importante evento internacional em favor da educação ambiental até
então. Nessa conferência foram definidos os objetivos e as características
da EA. A declaração de Tbilisi, a exemplo das manifestações internacionais
anteriores, entendeu que a educação ambiental deveria ser o resultado de
uma reorientação e articulação de diversas disciplinas e experiências
educativas, que facilitassem a visão integrada do ambiente (Dias, 2003).
171
Nessa conferência foram elaboradas 41 recomendações que constituem
planos de ações para a EA, destacam os objetivos e os princípios
norteadores da educação ambiental.
Entre 17 a 21 de agosto de 1987, realizou-se em Moscou a II
Conferência Mundial para discutir sobre Educação Ambiental, visando fazer
uma avaliação do desenvolvimento da EA desde a Conferência de Tbilisi. As
prioridades advindas da Conferência de Moscou tinham como meta apontar
um plano de ação para a década de 90, considerando que houve um
processo de conscientização gradual, no âmbito mundial e individual, do
papel da educação em compreender, prevenir e resolver problemas
ambientais. O Congresso de Moscou chegou à conclusão de que a EA
deveria preocupar-se com a promoção de conscientização e transmissão de
informações, desenvolvimento de critérios e padrões, orientações para a
resolução de problemas e tomada de decisões. Portanto, objetivar
modificações comportamentais de ordem cognitiva e afetiva.
1.2.
Trajetória da educação ambiental no Brasil
Uma das primeiras legislações que considera a Educação
Ambiental é o Código Florestal instituído pela Lei n. 4774 de 1.965, onde seu
Artigo 43 estabelece a semana florestal a ser comemorada de forma
obrigatória nas escolas e estabelecimentos públicos. Mas a primeira vez que
a EA aparece na legislação de modo integrado foi com a Lei n. 6.938 de
1981 que institui a Política Nacional de Meio Ambiente. Essa lei situa a
Educação Ambiental como um dos princípios que garantem a preservação, a
melhoria e a recuperação da qualidade do meio ambiente.
Posteriormente
com
a
Constituição
Federal
de
1988,
reconhece o direito constitucional de todo o cidadão brasileiro à Educação
Ambiental onde contém o Capítulo VI sobre o meio ambiente em seu Art.
225, parágrafo 1º, inciso VI: “Promover a educação ambiental em todos os
níveis de ensino e a conscientização para a preservação do meio ambiente”.
172
Com a Lei 7335 de 1989 cria-se o Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) que tem a
finalidade de formular, coordenar e executar a política nacional de meio
ambiente.
Apesar de todas as criações de leis o Brasil ainda não tinha
uma total consciência sobre o meio ambiente, o país só começou a
apresentar consciência ambiental a partir da década de 90, onde o Ministério
da Educação passou a enfatizar a importância do ensino de educação
ambiental.
Em 1992, no Rio de Janeiro aconteceu a Conferência da ONU
sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (UNCED), onde representantes
de quase todos os países do mundo reuniram-se para decidir medidas para
conseguir diminuir a degradação ambiental e garantir a existência de outras
gerações. A intenção,
nesse
encontro,
era
introduzir
a
ideia
do
desenvolvimento sustentável, um modelo de crescimento econômico menos
consumista e mais adequado ao equilíbrio ecológico, Nesta Conferência foi
elaborada a Agenda 21 é um programa de ação que viabiliza o novo padrão
de desenvolvimento ambientalmente racional, que foi considerada muito
importante para a EA como ressalva Dias (2003, p.50):
Nessa conferência, reconhece-se a insustentabilidade do modelo
de ‘desenvolvimento’ então vigente. O desenvolvimento
sustentável é visto como o novo modelo a ser buscado. Nomeia-se
a Agenda 21 como um Plano de Ação para a sustentabilidade
humana. Reconhece-se a Educação Ambiental como o processo
de promoção estratégico desse novo modelo de desenvolvimento.
Durante a ECO/92, o MEC, promoveu em Jacarepaguá um workshop
com o objetivo de socializar os resultados das experiências nacionais e
internacionais de EA e desse workshop foi criada a Carta Brasileira para a
Educação Ambiental, que reconhece que a EA é um dos instrumentos mais
importantes
para
viabilizar
sobrevivência do planeta
a
sustentabilidade
como
estratégia
de
173
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), Lei n.9394
(BRASIL, 1996), reafirma os princípios definidos na Constituição com
relação à Educação Ambiental, estabelecendo que a EA deva ser
considerada na concepção dos conteúdos curriculares de todos os níveis de
ensino sem constituir disciplina específica, implicando desenvolvimento de
hábitos e atitudes para o exercício da cidadania.
Um avanço significativo
no âmbito da educação formal foi a criação dos Parâmetros Curriculares
Nacionais - PCNs, definidos pelo MEC com a colaboração de especialistas,
instituições e entidades de estudos e pesquisas educacionais, em 1998. Os
PCNs foram desenvolvidos com o objetivo de fornecer orientação para os
professores com a proposta de que eles sejam utilizados como instrumento
de apoio às discussões pedagógicas.
Em abril de 1999 foi promulgada a Lei n.9.795, (BRASIL,
1999), que institui a Política Nacional de Educação Ambiental, onde são
definidos os princípios relativos à Educação Ambiental que deverão ser
seguidos em todo o país. A Política Nacional de Educação Ambiental
estabelece que todos têm direito à EA e que cabe às instituições educativas,
promover essa dedicação de forma integrada aos programas educacionais
que desenvolve.
No
ano
de
2004,
foi
realizado
o
primeiro
Encontro
Governamental Nacional sobre Políticas Públicas da Educação Ambiental,
com a participação de dirigentes e técnicos das áreas de meio ambiente e
de educação das três esferas de governo, ampliando a integração entre o
setor educacional e ambiental em torno da gestão pública da EA no Brasil.
Esse encontro teve por objetivo, a elaboração de propostas para articular,
fortalecer e enraizar a EA.
Como se pode observar existe uma história que retrata a
caminhada rumo a necessidades da educação ambiental. Hoje no Brasil o
ensino está estabelecido nos currículos escolares, mas muitos estudiosos
acreditam que se deva estar presente em todos os espaços que educam o
cidadão, pois dessa forma pode ser feita uma educação ambiental não só
174
nas escolas, mas em toda a comunidade, desde o seio da família até a
sociedade em geral. A história da Educação Ambiental no Brasil ainda tem
muito para caminhar e evoluir para se ter de fato algo concreto e que
realmente faça a diferença no exercício da cidadania.
2.
EDUCAÇÃO AMBIENTAL E CIDADANIA
A questão ambiental está cada vez mais presente no dia-dia da
população de nossas cidades, principalmente no que se refere ao desafio de
preservar a qualidade de vida. Apesar disso, ainda está distante de ter uma
consciência ambientalmente correta.
Isso implica em reinserir o homem no meio, ou seja, perceber
que a vida humana somente será qualificada, equilibrada, se estiver em
harmonia com seu meio ambiente.
O
crescimento
populacional,
o
acelerado
processo
de
urbanização das últimas décadas, bem como os padrões de consumo e o
modo de vida que estamos vivendo geraram um aumento na demanda por
recursos naturais para suprir nossas necessidades humanas. Todos têm
sido afetados pelos problemas, principalmente os setores mais carentes da
população, pois somente uma pequena parte da população do mundo
usufrui os benefícios desse sistema. A desigualdade é o problema
“ambiental’ mais importante do planeta; é também seu maior problema no
rumo ao desenvolvimento. (Beck, 1999 apud Loureiro, 2002, p.124).
Nesses tempos em que a informação assume um papel cada
vez mais relevante com a mídia, a Internet e utilizando desses meios à
educação ambiental pode ser um caminho para a possibilidade de motivar e
175
tocar as pessoas para transformar as várias formas de participação na
defesa da qualidade de vida.
Dessa maneira a problemática ambiental produz um tema
muito importante para aprofundar a reflexão e a prática em torno das ações
causadas pelos crescentes agravos ambientais. Pois não basta apenas o
homem querer proteger a natureza, preservando espécies de animais e
vegetais, mesmo sendo essa uma questão muito importante, mas sim ter a
possibilidade de entender que o consumo excessivo dos recursos naturais, o
atual sistema econômico e também cultural é que determinam uma nova e
urgente postura perante essa problemática e a educação é a ponte para
esse entendimento. Dias (2003, p. 109) destaca:
Não se pode compreender uma questão ambiental sem as suas
dimensões políticas, econômicas e sociais. Analisar a questão
ambiental apenas do ponto de vista “ecológico” seria praticar um
reducionismo perigoso, no qual as nossas mazelas sociais
(corrupção, incompetência gerencial, concentração de renda,
injustiça social, desemprego, falta de moradias e de escola para
todos, menores abandonados, fome, miséria, violência e outras)
não apareceriam. Essas mazelas, por sua vez, são criadas pelo
modelo de desenvolvimento econômico adotado, que visa,
apenas, à exploração imediata, contínua e progressiva dos
recursos naturais (e das pessoas), cujo lucro do uso predatório vai
para as mãos de uma pequena parcela da sociedade.
Podemos perceber que não basta apenas tomar atitudes dadas
como corretas, como separar o lixo, jogar o papel da bala na lata de lixo se
não entender o que está por trás da indústria que produziu esse produto, o
valor consumista que é responsável por esse crescimento de lixo produzido
pelo homem que está poluindo e afetando nosso meio ambiente.
Assim, a educação ambiental deve ser entendida como educação
política, no sentido de que ela reivindica e prepara os cidadãos
para exigir justiça social, cidadania nacional e planetária,
autogestão e ética nas relações sociais e com a natureza. A
Educação ambiental como educação política enfatiza antes a
questão “por que” fazer do que “como” fazer. Considerando que a
educação ambiental surge e se consolida num momento histórico
de grandes mudanças no mundo ela tende a questionar as opções
políticas atuais e o próprio conceito de educação vigente,
176
exigindo-a, por princípio, criativa, inovadora e crítica. (Reigota,
1994, p.10).
Os impactos negativos dos problemas ambientais resultam
principalmente da precariedade dos serviços e da omissão dos poderes
públicos em relação à prevenção das condições de vida da população, mas
também é reflexo do descuido e da omissão dos próprios moradores,
principalmente nos bairros mais carentes, aonde a educação não chega de
maneira eficiente como deve ser.
Partindo desse princípio podemos observar nas figuras
seguintes, pontos diferentes da cidade de Guarapuava, a discrepância dos
problemas ambientais urbanos, onde no centro da cidade a limpeza, a
ordem e a preservação do meio ambiente encontram-se bem cuidada, mas
por outro lado em uma vila, onde predomina a pobreza, as mesmas pessoas
que fazem a coleta do lixo de forma seletiva deixam restos na rua a céu
aberto poluindo o meio em que vivem. Essa atitude
interfere de forma
significativa na qualidade de vida da cidade e parte da responsabilidade
deve-se ao poder público que não disponibiliza melhores condições de
trabalho para os catadores de lixo.
Isso significa que enquanto o centro da cidade é limpo e
aparentemente bem cuidado, na periferia a realidade é diferente e em alguns
locais crescem os redutos de lixo a céu aberto, conforme ilustrado nas
fotografias que seguem:
FIGURA 1 – Lago das Lágrimas, Guarapuava-PR Foto:
Rubiara Melo
177
FIGURA 2 – Avenida Manoel Ribas, Guarapuava- PR –
Foto – Rubiara Melo
FIGURA 3 – Vila São Miguel, Guarapuava-PR
Foto – Rubiara Melo
178
Esta postura não deve ser considerada responsabilidade
exclusiva da população. Ela ocorre principalmente pela falta de informação,
de consciência ambiental, de políticas públicas e de práticas comunitárias
baseadas na participação e no envolvimento dos cidadãos. Nesse sentido a
educação ambiental é um instrumento para essa ligação.
A relação entre meio ambiente e educação para a cidadania
assume um papel cada vez mais desafiador, demandando a
emergência de novos saberes para apreender processos sociais
que se complexificam e riscos ambientais que se intensificam. As
políticas ambientais e os programas educacionais relacionados à
conscientização sobre a crise ambiental demandam cada vez mais
novos enfoques integradores de uma realidade contraditória e
geradora de desigualdades que transcendem a mera aplicação
dos conhecimentos científicos e tecnológicos disponíveis. (Jacobi,
2003)
Este desafio está na formulação de políticas publicas voltadas
para o meio ambiente que sejam críticas e inovadoras. Assim, a educação
ambiental deve ser acima de tudo um ato político voltado para transformar a
sociedade, enfocando uma maneira de ação que relacione o homem com a
natureza, propiciando também recursos para instigar a compreensão da
importância de se evitar a degradação do nosso planeta e eliminar o impacto
negativo que existe nas relações sociais, ou seja, se faz necessário que a
educação que é passada para o aluno lhe de condições para que ele se
torne capacitado para desenvolver atos que possam melhorar a sua
qualidade de vida e da comunidade que ele está inserido.
179
Precisamos considerar com grande importância o tema
ambiental tornando-o parte integrante da visão de mundo, a escola deverá,
ao longo do ensino, oferecer meios efetivos para que cada aluno
compreenda os fatos naturais e humanos a esse respeito, desenvolva suas
potencialidades e adote posturas pessoais e comportamentos sociais que
lhe permitam viver numa relação construtiva consigo mesmo e com seu
meio, colaborando para que a sociedade seja ambientalmente sustentável e
socialmente justa. Mas para isso é preciso que a educação ambiental use
uma linguagem que seja acessível para as pessoas que ela quer atingir,
dessa forma a educação formal e informal vem como mais um instrumento
para auxiliar a educação ambiental utilizando os espaços da vida social, com
diferentes componentes, metodologias e formas de ação. A partir da
realidade do aluno é possível estabelecer ligações entre o que ele aprende e
o que já conhece e aplicar subsídios que façam com que ele entenda e
englobe todo esse conhecimento desencadeando experiências e vivências
para começar a criar uma consciência para formá-lo um cidadão reflexivo e
ativo ajudando na proteção e preservação de todas as manifestações de
vida de nosso mundo para garantir as condições para que ele prospere em
toda beleza e diversidade.
A educação ambiental é uma forma de educação que exige a
participação efetiva dos cidadãos nas discussões que envolvem a
problemática, estabelecendo relação entre o homem e a natureza e, acima
de tudo, estimular e fortalecer a participação social consolidando e
fortalecendo a cidadania para a população como um todo, e não para um
grupo específico.
Devem-se lembrar, acima de tudo, que o processo educativo não
é neutro e objetivo, destituído de valores, interesses e ideologia.
Ao contrário, a educação é uma construção social repleta de
subjetividade, de escolhas valorativas e de vontades políticas,
dotadas de uma especial singularidade, que reside em sua
capacidade reprodutiva dentro da sociedade. Ela significa,
portanto, uma construção social estratégica, por estar diretamente
envolvida na socialização e formação dos indivíduos e de sua
identidade social e cultura. (Lima, 2002, p. 120).
180
Na I Conferência Nacional de Educação Ambiental realizada
em Brasília em 1997 foi redigido a Declaração de Brasília para a Educação
Ambiental. Neste documento são apresentados diagnósticos da situação da
EA e também são apresentadas recomendações visando à melhoria do
processo de desenvolvimento. O tema 5 diz respeito à educação ambiental,
ética e formação da cidadania e Dias (2003, p. 192) cita alguns trechos das
recomendações da Declaração:
Promover sistematicamente seminários, encontros, congressos,
reuniões nos níveis municipal, estadual e federal, com ampla
participação das comunidades, a fim de estabelecer as relações
entre educação ambiental e cidadania.
Mas como relacionar a educação ambiental com a cidadania?
Cidadania tem a ver com pertencer a uma coletividade e criar identidade
com ela, ou seja, engloba um conjunto de valores sociais que determinam o
conjunto de deveres e direitos de um cidadão. A educação ambiental, como
formação e exercício de cidadania, tem a ver com uma nova forma de
encarar a relação do homem com a natureza, baseada numa nova ética, que
pressupõe outros valores morais e uma forma diferente de ver o mundo e os
homens. A Lei N° 9.795 de 27 de abril de 1999 em se u Art. 2° afirma: "A
Educação Ambiental é um componente essencial e permanente da
educação nacional, devendo estar presente, de forma articulada, em todos
os níveis e modalidades do processo educativo, em caráter formal e nãoformal.
A educação ambiental deve ser encarada como um processo
contínuo de aprendizagem que ensina a valorizar as diversas formas de
conhecimento transformando pessoas em cidadãos conscientes em relação
à comunidade que ele vive e todo o restante do mundo.
Hoje a EA tem uma visão um pouco mais realista de sua
situação, buscando um equilíbrio entre o homem e o meio ambiente entende
que a realidade da educação está envolvida num complexo contexto
marcado pelas estruturas do neoliberalismo, do egocentrismo, o que importa
181
é o seu benefício próprio, fazendo com que a educação se volte mais para
as necessidades do mercado e do desenvolvimento econômico.
Mesmo com esses problemas, vários esforços foram feitos para
que haja uma solução, principalmente a partir dos anos 90 onde o Brasil teve
um grande impulso ambientalista, tanto nas políticas públicas como nas
organizações da sociedade civil. Surgindo várias teorias sobre a educação
ambiental. O Brasil possui legislação sobre o tema e incorpora essa
educação nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs).
Os PCNs de certa maneira vieram legitimar o que muitos
professores da área já vinham fazendo em seus trabalhos referentes às
práticas de educação ambiental.
Diante de um processo de implementação efetiva da educação
ambiental nas escolas, é evidentemente que se trabalhe através da
cooperação, participação e pela geração de autonomia dos atores
envolvidos. A escola é o local em que a interação social está em evidência e
onde o aluno dará continuidade para o seu processo de socialização. É na
escola que aprendemos os valores da sociedade. Comportamentos
ambientalmente corretos devem ser aprendidos na prática, no cotidiano da
vida escolar, contribuindo para a formação de cidadãos responsáveis assim
como na comunidade onde vivem.
A educação formal através da escola tem um papel de grande
valia para entender as questões ambientais, pois dela se pode compartilhar
do cotidiano de várias pessoas e dessa maneira possibilita que alunos e
professores exerçam sua cidadania tendo a noção de seus direito e deveres.
A Educação Ambiental é um processo no qual todos somos
aprendizes e mestres. Os bons mestres sempre foram aprendizes
até alcançarem a maestria de artes e ofícios. Mas esse processo
de transmissão de saberes sempre se deu no âmbito de relações
de poder daquele que detém um saber; de relações de dominação
professor-aluno; de relações de autoridade e de prestigio
exercidas na busca de apropriação de um saber codificado,
182
certificado. (...) a partir do saber e da identidade que se forjam e
se incorporam ao ser de cada indivíduo e de cada cultura. (Leff,
2001, p. 218)
Dessa forma se entende que deve ocorrer uma mudança
cultural para que todo esse processo venha a ter efeito e o trabalho do
professor seja realmente valorizado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A questão ambiental, nos últimos anos, tornou-se uma preocupação
mundial. A grande maioria das nações do mundo reconhece a importância e
emergências dos problemas ambientais. Entretanto, a complexidade desses
problemas, exige medidas sérias, que devem ser tratadas de forma global,
considerando que a degradação ambiental é resultado de um processo
social, determinado pelo modo como a sociedade apropria-se dos recursos
naturais. O modo como se dá o crescimento econômico compromete o meio
ambiente e prejudica o próprio desenvolvimento.
Com base nas revisões bibliográficas foi possível perceber que
para a educação ambiental realmente gerar frutos positivos com relação ao
meio ambiente ela deve ser um processo permanente que deve trabalhar a
educação junto com a cidadania possibilitando a participação da sociedade
concretizando uma proposta de sociabilidade, baseada na educação para a
participação e para a preservação ou recuperação do meio-ambiente.
O desafio da construção de uma cidadania mais intensa se
forma como um ponto imprescindível para constituir e fortalecer pessoas
conscientes dos seus direitos e deveres, que como cidadãs possam assumir
responsabilidades sociais e abrir novos espaços de participação social.
Diante do estabelecimento de parâmetros curriculares que
permitem aos educadores a adoção de temas transversais voltados para o
meio-ambiente é preciso estar sempre edificando novos paradigmas para a
183
educação com articulação entre os espaços formais e não-formais que
primem pela aproximação da escola com a comunidade em que se insere.
É preciso ainda entender a importância de
um planejamento
integrado de atividades curriculares e extracurriculares para a construção
coletiva e democrática do projeto político-pedagógico, fazendo da educação
ambiental um componente para a conscientização de cidadania através da
mudança de comportamento na relação do homem com a natureza.
Por fim, cabe destacar que é através de uma educação de
qualidade, disponível para todos e não só para uma parcela elitista, que se
podem apresentar condições para que haja uma conscientização ambiental
verdadeira. A educação é o primeiro passo para poder começar a reverter o
excesso de consumo que está impregnado em nossa sociedade e
estabelecer uma nova ética, uma mudança de comportamento para a
melhoria da nossa região, do nosso país e do nosso planeta.
REFERÊNCIAS
DIAS, Genebaldo Freire. Educação ambiental: princípios e praticas. 8. ed. São
Paulo: Gaia, 2003.
GUIMARÃES, Mauro. A dimensão ambiental na educação. Campinas, Papirus.
1995.
LEFF, Enrique. Epistemologia ambiental. São Paulo: Cortez, 2001.
LIMA, G. F. da C. Crise ambiental, educação e cidadania: os desafios da
sustentabilidade emancipatória. In: LOUREIRO, C. F. B.; LAYRARGUES, P.
P.; CASTRO, R. S. (orgs). Educação ambiental: repensando o espaço da
cidadania. São Paulo: Cortez, 2002.
LOUREIRO, C. F. B.; LAYRARGUES, P. P.; CASTRO, R. S. (orgs). Educação
ambiental: repensando o espaço da cidadania. São Paulo: Cortez, 2002.
MEDINA, Naná Mininni; SANTOS, Elizabeth da Conceição. Educação ambiental:
uma metodologia participativa de formação. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 2001.
PEDRINI, A. G. (org). Educação ambiental: reflexões e práticas contemporâneas.
4.ed. Petrópolis, Vozes. 2001
REIGOTA, Marcos. O que e educação ambiental. São Paulo: Brasiliense, 1994.
184
SITOGRAFIA
BRASIL (199). Lei n. 9795 de 27 de abril de 1999. disponível em
http://www.mma.gov.br/sitio/index.php?ido=conteudo.monta&idEstrutura=20&idCont
eudo=967. Acessado em 20 de Setembro de 2010.
JACOBI, Pedro. Meio ambiente, educação e cidadania: desafios da mudança.
Disponível em <http//www.ufmt.br/gpea/pub/Jacobi_meio%20cidadania-%202005senac.pdf>. Acesso em 20 de setembro de 2010.
O PERFUME DAS PITANGUEIRAS DE TURVO (PR)
IMPRESSÕES SOBRE A PARCERIA ENTRE A COOPAFLORA
DE TURVO (PR) E NATURA DO BRASIL
Débora Machado
Profª Ms. Cerize Nascimento Gomes
Ciências Sociais - FG
RESUMO: A presente pesquisa trata-se de um estudo sobre a parceria realizada
entre a Cooperativa de Produtos Agroecológicos e de Artesanato (COOPAFLORA)
de Turvo (PR) e a Natura do Brasil. Sabendo-se que a Cooperativa fornece mais de
25 espécies de plantas para a empresa de cosméticos, optou-se por centrar o foco
da pesquisa nos produtos da linha Natura Ekos Pitanga para a promoção de um
registro de impressões e expectativas relativas ao desenvolvimento desse
programa de sustentabilidade e do seu projeto com os agricultores familiares do
Município de Turvo.
Palavras-chave: Ecodesenvolvimento. Floresta. Recursos Naturais. Cosméticos.
Consciência Planetária.
INTRODUÇÃO
É das mãos generosas das mulheres de Turvo que tem início a alquimia
que gera a beleza e o encantamento. Maria Celeste Corrêa
O perfume está relacionado aos mais diversos aspectos, entre eles o
histórico, o cultural e o geográfico. Esse é o caso das cerejeiras do Japão e
dos girassóis da Rússia. Talvez esse seja o caso da região de Guarapuava
185
que pode estar transformando o Brasil no país que venha a ser reconhecido
pelo perfume característico de pitanga, um fruto próprio da região sul do
Brasil e muito comum nos municípios do Centro-Oeste do Estado.
As pitangueiras que antes eram cultivadas por sua beleza e pelo
sabor inconfundível dos seus frutos, na região de Turvo transformaram-se
em uma fonte de trabalho e de geração de renda que provocou uma
verdadeira revolução na vida das produtoras rurais do município. Após
enfrentarem todas as agruras de parir um projeto de ecosustentabilidade, o
trabalho dessas mulheres tornou-se referência
a partir do lançamento
nacional de produtos como sabonetes, loções, óleos, xampus e hidratantes
com perfume das pitangueiras entre as quais muitas haviam crescido e
outras meninas continuavam a crescer.
Para falar sobre esse modelo de sustentabilidade, o presente estudo
concentra-se sobre a parceria realizada entre o Instituto Agroflorestal
Bernardo Hakvoort (IAF) e a Cooperativa de Produtos Agroecológicos,
Artesanais e Florestais de Turvo – Coopaflora
com a Natura do Brasil,
especificamente no que diz respeito aos cosméticos e chás lançados a partir
de óleos, essências e aromas cuja matéria prima procede da região CentroOeste do Paraná.
1. FLORESTA DE ARAUCÁRIAS
A presente pesquisa busca convalidar a importância da floresta de
pinheiros (araucária angustifolia) para o histórico de ecodesenvolvimento
regional e tem como região de estudo o município de Turvo (PR). Essa
preocupação surgiu porque dentro da floresta com araucárias, os
tradicionais pinheiros do Paraná, abriga-se uma rica biodiversidade, que com
os projetos adequados pode apresentar soluções simples para a geração de
emprego e renda, e, ao mesmo tempo indicar novos caminhos para os
programas de sustentabilidade.
186
Em pesquisa realizada sobre o município de Turvo (PR), Maria
Celeste Corrêa, no livro O uso sustentável dos recursos Naturais na floresta
com araucária, escreve que primeiramente o que chamou a atenção dos
ambientalistas em Turvo foram os bosques de pinheiros.
Segundo ela, isso ocorreu porque as reservas de araucária
“constituem um dos mais raros e ameaçados biomas do planeta” (CORREA,
p.6). O estudo realizado demonstrou que o Paraná, Estado presenteado com
a maior concentração de florestas com araucária do Brasil detinha na
primeira década do século XXI apenas 0,8% dos seus recursos originais.
Conforme a autora
“depois de uma brutal exploração de seus
recursos naturais ao longo do século XX, o bioma quase desapareceu por
completo” (CORREA, p.6) . Diante do quadro verificado no município de
Turvo, que possui uma das maiores reservas de araucárias do Estado, a
pesquisadora conta que o IAF chamou a atenção da
The Nature
Conservancy (TNC), organização que investiu na criação de um programa
para manter os agricultores em suas terras e incentivar a geração de renda
por meio de projetos de sustentabilidade, com o objetivo de promover a
restauração e a conservação da floresta natural. Sobre a TNC ela explica:
Fundada em 1951, a TNC está presente em 32
países. A organização mundial é lider na
conservação dos recursos naturais ecologicamente
importantes para a vida e as pessoas. Ao longo de
sua trajetória a The Nature Conservancy já
contribuiu para a proteção de mais de 47 milhões de
hectares, sempre atuando em áreas com altos
índices de diversidade biológica e cultural.”
(CORREA, 2010, p.8)
2. PARCERIA COM A NATURA
Os estudos feitos sugerem também que os projetos do IAF e da
Coopaflora tornaram-se referencia nacional porque combinam uma série de
experiências e de atividades dentro das propriedades rurais, ao mesmo
tempo em que valorizam os saberes e as práticas dos agricultores familiares.
187
Rodrigo de Próspero, engenheiro florestal da Natura do Brasil considerou
que esses foram os aspectos que chamaram a atenção da empresa para oi
desenvolvimento de parceria com a Coopaflora de Turvo.
A
pesquisadora
Maria
Celeste
Corrêa
também
enalteceu
a
importância dessa postura assumida pela cooperativa:
Por não agredirem a natureza e conservarem a
floresta, os produtores de Turvo conseguiram
se tornar fornecedores de uma das maiores
indústrias de produtos de beleza do País, com
25 espécies de planta. A Natura transforma
folhas e flores em essências, aromas, óleos e
outros ingredientes que compõem hidratantes,
sabonetes, xampus, condicionadores e muitos
outros produtos. (CORREA, 2010, p.27)
O óleo essencial extraído das folhas de pitangueiras de Turvo são
transformados em caixas presenteáveis e cada lançamento é comemorado
com uma campanha de marketing que lembra as origens do produto e a
parceria com a Coopaflora.
188
FIGURA 1 – Campanha presenteável da linha Natura Ekos Pitanga.
Disponível em http://scf.natura.net/produtos/naturaekos/pitanga/frescorekospitanga.
Acessado em 16 de outubro de 2011.
Ao acompanhar a metodologia de divulgação e de recepção dos
produtos feitos à base de pitanga pela Natura, Ekos Pitanga, percebeu-se
que a campanha foi gradativa e constante. O prospecto feito em 2011 “A
floresta está em você” foi ilustrado por fotografias do fruto das pitangueiras
e dos produtos Natura, bem como por fotos dos agricultores familiares de
Turvo seguidos pelo texto:
Você é a obra mais perfeita da natureza. Todos os
seus milagres, todos os mistérios estão
reproduzidos em você. Todo conhecimento. Preste
atenção nas vozes dos pássaros, das árvores, dos
rios dentro de você. Você é responsável por suas
189
escolhas. Siga sua sabedoria. (NATURA EKOS,
2011)
D
A motivação diante da legitimidade que os cosméticos de pitanga
alcançaram e pela abertura de mercado internacional propiciada pela Natura
aos produtos da linha Natura Ekos Pitanga, referenda o trabalho realizado
em Turvo como exemplo que implica diretamente no
conceito mais amplo
de desenvolvimento sustentável uma vez que os agricultores familiares
responsáveis pela colheita, embalagem e distribuição da matéria-prima
encaminhada para São Paulo, passam constantemente por cursos de
aperfeiçoamento promovidos pela Natura.
3. DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
Segundo estudos feitos por Moacir Gadotti no livro Pedagogia da
Terra, o termo sugere que esse tipo de desenvolvimento é um processo
integral que inclui dimensões culturais, éticas, políticas, sociais, ambientais,
e também, mas não só econômicas.(GADOTTI, 2000, p.57). O autor
relaciona tal processo ao desenvolvimento humano com equidade e
participação. Sobre isso, ele escreve:
As Nações Unidas, nos últimos anos passaram a
usar a expressão “desenvolvimento humano” como
indicador de qualidade de vida fundado nos índices
e saúde, longevidade, maturidade psicológica,
educação, ambiente limpo, espírito comunitário e
lazer criativo, que são também os traços de uma
sociedade sustentável. (GADOTTI, 200, p.58)
Ao relacionar sustentabilidade aos Índices de Desenvolvimento
Humano (IDH), o autor promove uma reflexão bastante interessante para a
região de Guarapuava, a qual segundo os dados do Instituto Paranaense de
Desenvolvimento Econômico e Social (IPARDES), corresponde aos mais
baixos IDHs do Estado. Esses dados sugerem que o desenvolvimento
humano advoga que as questões sociais e econômicas são inseparáveis das
questões ambientais.
190
Isso significa que para Gadotti o sonho de um capitalismo ecológico é
insustentável (GADOTTI, p.59) e só se mantem por meio de uma visão
colonizadora que relaciona o conceito de desenvolvimento a um padrão de
industrialização e de consumo que faz com que as pessoas acreditem que a
felicidade só será
possível pela aquisição e pela acumulação de bens
materiais (GADOTTI, p.60).
Segundo o autor, os países centrais ricos, com base em uma
ideologia própria de desenvolvimento, fazem com que os países periféricos
aceitem políticas econômicas com consequências trágicas como o aumento
da miséria, do desemprego e da violência.
Nesse cenário a manutenção de políticas próprias para a agricultura
familiar é responsável pela elaboração de uma nova consciência ecológica.
Em torno de cooperativas, como é o caso da Coopaflora, os cooperados
desenvolvem projetos e estabelecem parcerias que tornam-se modelos de
alternativas
viáveis
tanto
social
quanto
economicamente.
Sobre
a
necessidade de preservação dessas experiências, Corrêa comenta:
As comunidades de agricultores vêm sofrendo
pressão para converter as áreas de faxinais em
monoculturas. Isso exterminaria os últimos
remanescentes da floresta com araucária da região,
provocaria o aniquilamento de muitas espécies
animais e vegetais e, ainda, levaria ao
desaparecimento de um importante processo social,
cultural e econômico relacionado ao uso da terra.
Portanto, é absolutamente fundamental que esses
modelos de produção viáveis, tanto do ponto de
vista social quanto ambiental, sejam alvo de
iniciativas que possam torná-los também mais
interessantes do ponto de vista econômico,
garantindo a sua perpetuação. (CORREA, 2010,
p.7)
Ainda sobre o modelo de Turvo considere-se que, conforme os
pesquisadores da Universidade Federal do Paraná, Luiz Antonio Biasi e
Cíceo Deschamps o Brasil ainda tem pouca expressão no mercado
internacional de óleos esseciais:
191
O mercado internacional de óleos essenciais
movimenta anualmente aproximdamente 1,8 bilhões
de dólares, e a participação brasileira nesse
mercado é pequena, de apenas 0,1%, concentrada
basicamente sobre os óleos citrícos, que são
subprodutos da produção de suco de laranja. (BIASI
e DESCHAMPS, 2009, p.7)
Os autores destacam que a biodiversidade brasileira é pouco
explorada em relação à composição química da sua flora e que a ciência
ainda está em fase embrionária nessa área que deve ser bastante
promissora para a economia nacional:
Os óleos essenciais, além da indústria de
perfumaria e cosméticos, possuem uma vasta
possibilidade de utilização. São fonte de matériaprima na indústria farmacêutica, na de produtos de
higiene e limpeza, de alimentos, de tintas e também
na agricultura, para o controle biológico de doenças
e pragas. BIASI e DESCHAMPS, 2009, p.7)
Francisco Gutierrez, no livro Pedagogia para o Desenvolvimento
Sustentável, lista as características que apontam para formas de gestão
ambientalmente corretas ou sustentáveis. São elas a promoção da vida, o
equilibrio dinâmico, a preservação dos ecossistemas, a consciência ética e
ecológica, o abandono do paradigma técnico em nome da racionalidade
intuitiva e finalmente o desenvolvimento de uma consciência planetária.
(GUTIERREZ,1996, p.3).
Gustavo
Costa
Lima
ao
estabelecer
os
princípios
do
ecodesenvolvimento define os seguintes pressupostos: 1) a satisfação das
necessidades básicas da população; 2) a solidariedade com as gerações
futuras; 3) a participação da população envolvida; 4) a preservação dos
recursos naturais; 5) um sistema social com garantia de emprego, segurança
social e respeito à diversidade cultural; 6) programas de educação
adequados aos projetos de ecodesenvolvimento (LIMA, 1997, p.210).
4. PROGRAMAS E METAS DA COOPAFLORA
192
Em 2006, foi assinado decreto que criou a Política Nacional de
Plantas Medicinais, como parte das políticas públicas de saúde, meio
ambiente, desenvolvimento econômico e social. O que possibilitou a criação
do Programa Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos (PNMF), que
tem como objetivo ampliar a produção e o comércio, bem como melhorar o
acesso da população as plantas medicinais e fitoterápicos ( REDE
REPARTE, 2011). Na pauta dos programas governamentais consta também
a promoção da segurança alimentar e nutricional, o uso sustentável da
biodiversidade
e a valorização e preservação do conhecimento das
comunidades e povos tradicionais.
A Rede Parceiros da Terra – Rede Reparte, é uma entidade sem fins
lucrativos, fundada com o propósito de contribuir para a construção e gestão
de programas e projetos voltados para o desenvolvimento sustentável das
suas filiadas. Segundo informações da Rede:
O Paraná é responsável por 90% da produção brasileira de
plantas medicinais. São 15 mil toneladas/ano, retiradas de
uma área de três mil hectares, com a participação de 1.100
agricultores familiares na atividade. O restante da produção
vem do Rio Grande do Sul, de Santa Catarina e de São
Paulo. O Estado tem tradição no cultivo de plantas
medicinais. Há mais de um século, a cultura de camomila foi
introduzida pelos imigrantes europeus na Região
Metropolitana de Curitiba. O cultivo comercial passou a ser
estruturada há 40 anos, é alternativa de renda para o
período de inverno. Hoje, 19 espécies ocupam 92,5% da
área destinada ao cultivo de espécies medicinais,
aromáticas e condimentares no Paraná. A camomila, cujo
mercado cresce de 5% a 10% ao ano, tem grande
expressão pelo valor econômico-social e número de
produtores envolvidos. (REDE REPARTE, 2011)
Roseli Eurich, agricultora familiar e uma das pessoas que sempre esteve
frente a direção da Coopaflora explica a importância do programa que é
desenvolvido em Turvo e que serve de modelo para vários municípios do
Paraná e do Brasil:
Toda a produção é agroecológica, com certificação orgânica
pela Ecocert. Roseli lembra que a propriedade conta com
70% de cobertura vegetal. Permite agregar valor em
193
pequeno espaço de 1 hectare. O cultivo de plantas
medicinais também contribui para a preservação da mata. A
diversidade de culturas assegura, em caso de mau tempo,
como geadas, mais opções de comercialização. (EURICH,
entrevista, 2011)
Além da Natura a Coopaflora mantém hoje parcerias com o The Nature
Conservancy (TNC), o Serviço Brasileiro de Apoio as Micro e pequenas
empresas (SEBRAE) e o Ministério de Turismo. No site da Cooperativa a
diretoria destaca a expansão do projeto que já envolve atualmente oito
municípios.
Entre as ações da Cooperativa estão:
Organizar o processo de comercialização de plantas
medicinais aromáticas e condimentares, além dos demais
produtos oriundos da floresta, através da agricultura familiar
sustentável. Além disso, a Coopaflora ainda busca a
inclusão de agricultores familiares de mais oito municípios
da Região Central do Estado, aumentando assim a oferta de
produtos, através da comercialização justa e solidária de
produtos orgânicos certificados, e produzidos de forma
sustentável, possibilitando desta forma, a recuperação e
conservação da Mata Atlântica. (COOPAFLORA, 2011)
Eurich relata que todos os agricultores familiares envolvidos no
processo de produção de plantas medicinais da Cooperativa têm profundo
comprometimento com a preservação do meio ambiente, e que por isso
adotam o uso de tecnologias não poluentes e exigem de seus fornecedores
a mesma conduta.
Entre as metas definidas pela direção e pelos associados estão:
Fixar a marca Arvoredo Brasil, bem como proporcionar o
aumento produtivo de produtos orgânicos beneficiados da
Região Centro Sul do Paraná; consolidar a agricultura
familiar orgânica sustentável na região, contribuindo desta
forma para a inclusão de famílias produtoras no mercado
formal; aumentar a renda e qualidade de vida das famílias;
contribuir diretamente para a manutenção e conservação da
Floresta Ombrófila Mista; fornecer aos seus consumidores
produtos com procedência garantida e reconhecida, além de
disponibilizar um alto valor biológico; propiciar a
continuidade dos trabalhos desenvolvidos na região, através
do incentivo e oportunidades aos jovens rurais que fazem
parte das comunidades rurais da região de abrangência
194
desenvolver
uma produção sustentável, baseada na
comercialização justa e solidária para a agricultura familiar.
(COOPAFLORA, 2011)
Segundo informações da Rede Reparte em 2010, o Ministério do
Desenvolvimento Agrário (MDA), por meio da Secretaria da Agricultura
Familiar (SAF), lançou Chamada de Projetos para a contratação de projetos
na área de plantas medicinais e fitoterápicos, que selecionou o Instituto
Agroflorestal Bernardo Hakvoot (IAF) e a entidade Produtores Associados
para Desenvolvimento de Tecnologias Sustentáveis (Sustentec). (REPATE,
2011) Os projetos selecionados devem desenvolver ações voltadas para
estruturar e fortalecer redes de negócios sustentáveis de plantas medicinais
com foco no arranjo produtivo local e promoção de geração de renda e
agregação de valor.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Instituto Agroflorestal Bernardo Wakvoorth (IAF) e a Cooperativa de
Produtos Agroflorestais e de Artesanato (COOPAFLORA), instituídos no
município de Turvo, a partir dos anos de 1990 foram responsáveis pela
campanha de preservação de uma das maiores reservas de araucárias do
Estado. O trabalho dessas entidades ambientais que atuavam em prol da
agricultura familiar e do desenvolvimento sustentável chamou a atenção de
de vários organismos públicos, organizações não governamentais e
empresas particulares.
Entre as instituições que tomaram conhecimento do trabalho realizado
em Turvo está a The Nature Conservancy (TNC), organização internacional
que investiu na criação de um programa para manter os agricultores em
suas terras e incentivar a geração de renda por meio de projetos de
sustentabilidade, com o objetivo de promover a restauração e a conservação
da floresta natural.
195
Os estudos feitos para o desenvolvimento do presente artigo
confirmam que os projetos do IAF e da Coopaflora tornaram-se referencia
nacional a partir da combinação de uma série de experiências e de ações
realizadas dentro das propriedades rurais, ao mesmo tempo em que foram
valorizados os saberes e as práticas dos agricultores familiares.
A política de não agressão a natureza e conservação das florestas
regionais, fez com que os produtores de Turvo conseguissem se tornar
fornecedores de uma das maiores indústrias de produtos de beleza do País,
a Natura do Brasil, com fornecimento de 25 espécies de plantas
transformadas em perfumes, cremes e chás.
O foco da presente pesquisa foi a transformação de folhas e flores de
pitanga em essências, aromas, óleos e outros ingredientes que compõem
hidratantes, sabonetes, xampus, condicionadores e muitos outros produtos
da linha Natura que são comercializados no Brasil e no exterior.
Concluindo, considera-se que como
a biodiversidade brasileira é
pouco explorada em relação à composição química da sua flora e como a
ciência ainda está em fase embrionária na extração de óleos essenciais o
programa desenvolvido pelo IAF e pela Coopaflora representam a vitória de
um desafio imposto aos agricultores familiares da região de Guarapuava que
tem agora um longo e promissor caminho a sua frente.
Conclui-se com a expectativa das autoras de que essa experiência
seja
um
modelo
para
todos
aqueles
que
desejam
investir
em
desenvolvimento sustentável e na agricultura familiar.
REFERÊNCIAS
BARRERE, Martine (org). Terra, patrimônio comum: A ciência a serviço do meio
ambiente e do desenvolvimento. São Paulo: Nobel, 1992.
BECKER, Dinizar Fermiano (org). Desenvolvimento sustentável: Necessidade
e/ou possibilidade? Santa Cruz do Sul (RS): EDUNISC, 1997.
196
CAVALCANTI, C. (org.). Sociedade e natureza: estudos para uma sociedade
sustentável. São Paulo: Cortez; Recife: Fundação Joaquim Nabuco, 1998.
GADOTTI, Moacir. Pedagogia da Terra: Ecopedagogia e educação sustentável.
São Paulo: Peirópolis, 2000.
SITOGRAFIA
http://www.arvoredobrasil.com.br Acessado em 16 de maio de 2011.
http://www.ecocert.com.br Acessado em 16 de maio de 2011.
http://www.redereparte.org.br Acessado em 21 de outubro de 2011
http://scf.natura.net/produtos/naturaekos/pitanga/frescorekospitanga Acessado em
16 de outubro de 2011.
OUTRAS FONTES
DE PROSPERO, Rodrigo – Entrevista com o engenheiro florestal da Natura do
Brasil realizada no dia 19 de outubro de 2011.
EURICH, Roseli – Entrevista com agricultora familiar da Cooperativa de Produtos
Agroecológicos e Artesanais de Turvo, realizada em 16 de outubro de 2011(PR)
ALGUMAS REFLEXÕES (IN)CONVENIENTES
Fernando Polli Alves
Administração - FG
Orientador: Prof. Dr. Carlos Alberto Gomes
RESUMO: O objetivo deste artigo é analisar aspectos da sociedade de consumo e
seu impacto sobre o meio ambiente, ao mesmo tempo em que se propõe uma
redução do consumo por meio de planejamentos locais e/ou regionais que possam
provocar reflexos no contexto global, levando-se em conta seus efeitos na
economia, no cotidiano dos indivíduos e no meio ambiente. Um dos propósitos
deste artigo é a reflexão sobre o comportamento da média e sua influência sobre a
patologia que as pessoas desenvolveram nas últimas décadas em relação ao poder
de compra, troca e consumo.
Palavras-Chave: Economia. Consumo. Mídia. Meio Ambiente. Sustentabilidade.
1. INTRODUÇÃO
Em nada mais o homem apresenta-se ainda hoje
tão próximo do macaco quanto na prática do comércio.
Elias Canetti
Por meio deste projeto apresenta-se uma reflexão sobre a sociedade
197
de consumo e seus impactos sobre o meio ambiente e os grupos culturais
regionais ou periféricos. Observa-se inicialmente que dentro de um contexto
histórico desde o advento da Revolução Industrial, do fim do século XVIII até
a primeira década do século XXI, o onda tecnológica desenvolve-se de
forma vertiginosa, refazendo e recriando estilo de vida e necessidades
humanas. A evolução dos artefatos tecnológicos conquista velocidade cada
vez maior e mercados cada vez mais globais. A primeira impressão que se
tem diante das novas tecnologias é que a criatividade e a audácia humana
desconhecem limites.
Essa gigantesca revolução tem seu preço e seu custo é alto para o
planeta e para a humanidade. Junto ao progresso vem o acumulo dos níveis
de carbono na atmosfera, os oceanos ficam mais ácidos, eventos climáticos
extremos se tornam rotina, enfim, o mundo aquece e sofre mudanças
inimagináveis.
Neste artigo procura-se refletir sobre os piores cenários futuros,
descritos por Al Gore em seu livro Uma Verdade Inconveniente e por Fritjof
Capra no livro Ponto de mutação. Ambos os autores descrevem cenários
apocalípticos relacionados à poluição e ao caos ambiental e propagam
atitudes radicais ou inconvenientes que possam mudar o comportamento do
homem e sua relação com a natureza.
Dialoga-se também com Oliviero Toscani por meio da obra A
publicidade é um cadáver que nos sorri e Elias Canetti em Massa e poder.
Os dois autores suportam o debate sobre a intervenção da mídia e mais
especificamente da
propaganda sobre o comportamento humano em
relação ao consumo.
Referenciam-se ainda outros autores como John Maynards Keynes,
Domenico de Masi e João Ricardo Torres Souza da Motta, entre outros
intelectuais preocupados com as questões econômicas e comportamentais
em nível global.
O objetivo proposto é o de é analisar e criticar o cenário ambiental
global e apresentar algumas idéias sobre a redução planejada do consumo ,
levando-se
em conta seus efeitos sobre a
economia, o cotidiano dos
198
indivíduos e o meio ambiente.
1. O CONSUMO E A SOCIEDADE
1.1.
Sentimento de Manada
O “sentimento de manada” descrito por João Ricardo Torres Souza da
Motta no livro As crises econômicas mundiais é uma alusão à teoria de John
Maynards Keynes, economista britânico formado em Cambridge e um dos
mais influentes intelectuais do século XX. O autor era defensor da teoria do
pleno emprego como fator indispensável para a estabilidade econômica do
sistema capitalista.
Ao analisar o comportamento humano em relação ao consumo
Keynes observou a existência do chamava de “espírito animal” ou
“sentimento de manada”, o que
era por ele definido como um tipo de
comportamento impulsivo, capaz de fazer com que as pessoas se
movimentassem mais por instinto que por inteligência, de forma coletiva.
Segundo Keynes:
Além da instabilidade devida à especulação, existe a
instabilidade inerente à natureza humana, de modo que
uma grande proporção de nossas atividades positivas
depende mais do otimismo espontâneo do que de
expectativas matemáticas, quer sejam morais, hedonísticas
ou econômicas. Provavelmente, a maior parte das nossas
decisões de fazer algo positivo, cujas consequências
somente serão completamente conheci-das muitos dias
depois, só pode ser tomada como resultado dos espíritos
animais - um estímulo espontâneo para a ação, em vez da
inação - e não como resultado de uma média ponderada
dos benefícios multiplicada pela probabilidade". (KEYNES,
1982, p.167)
O termo “sentimento de manada” foi traduzido pela vanguarda
intelectual a partir dos anos de 1970 como próprio para definir a sociedade
de consumo. O mesmo era utilizado para definir a onda de consumismo
vivida depois da década de 1950, considerada “os anos de ouro do
capitalismo”.
O movimento da contracultura emergiu entre as décadas de 1960 e
199
1970, o qual se manifestou radicalmente contra o envolvimento dos Estados
Unidos na Guerra do Vietnã, a presença da Inglaterra na Índia e a ocupação
da África por diversos países industrializados (MOTTA,2010, p.164). Além
disso, os jovens adeptos da contracultura protestavam contra o consumismo
da sociedade capitalista, a acumulação burguesa e a imposição dos valores
culturais europeus e norte-americanos sobre as nações periféricas.
O movimento, formado por hippies, ativistas sociais e ambientalistas,
acusava os consumidores de estarem reagindo exatamente como bandos de
animais que agiam por impulso sem o uso da razão, ou seja, que tinham o
comportamento, definido por Keynes como um estímulo ou um impulso para
a ação, sem qualquer ponderação sobre osbenefícios ou prejuízos pessoais
ou globais advindos de suas atitudes.
1.2. A patologia do consumo
Um dos propósitos deste artigo é a reflexão sobre o excesso ou a
patologia que as pessoas desenvolveram a partir das três últimas décadas
do século XX em relação ao poder de compra, troca e consumo.
Inicialmente observa-se que com a crescente evolução da tecnologia
e mais máquinas fazendo o trabalho humano, a expectativa dos estudiosos
era que houvesse uma redução do tempo que as pessoas passavam
trabalhando exigindo assim, um acréscimo de atividades nas lacunas dos
horários extraídos do mundo do trabalho que poderiam ser dedicados ao
lazer, cultura, educação e cuidados próprio e com familiares.
Porém nada disso aconteceu. Se para alguns setores o trabalho
diminuiu, aumentaram as preocupações e as necessidades da vida
moderna. Esse processo interminável de trocas de bens e serviços significa
para o trabalhador não apenas a necessidade de
uma profissão, mas
também o acumulo de dois ou mais empregos, além de atividades extras
para suportar as necessidades impostas pelo mercado e pela família. Sobre
esse fato Domenico de Masi, em O ócio Criativo, escreve:
200
Não acredito que um homem “acumule um outro emprego”
só em benefício próprio. O salário dobrado serve também
aos familiares, muitas vezes mais consumistas que ele. (DE
MASI, p.203)
Para o autor a obtenção de recursos para a
aquisição de bens
materiais deixou de ser um aspecto da vida familiar para transformar-se em
seu principal objetivo. Os casais desenvolvem um tipo de neurose em
relação ao seu poder de aquisição que resulta no fim
das relações
familiares e na adesão ao universo da mídia e do mercado. Sobre essa
necessidade Elias Canetti, em Massa e poder, esclarece:
O amontoado de moedas é, desde tempos remotos e junto
à maioria dos povos, conhecido por tesouro. (...) Não
apenas aquele que passa a vida inteira esperando encontrar
um tesouro, mas também aquele que o acumula imagina
que ele vá crescer cada vez mais, e faz de tudo para que
isso aconteça. Não há dúvida de que, para alguns homens
que vivem apenas para o seu dinheiro , o tesouro ocupa o
lugar da massa humana. Encaixam-se aí muitas das
histórias dos avarentos solitários; eles são a continuação
mítica dos dragões dos contos infantis, para os quais a
vigilância, a contemplação eo cuidado de um tesouro
constituíam o conteúdo único de suas vidas. (CANETTI,
1995, p.183)
Descrevendo a importância que o “tesouro” representado por moedas
tem para as pessoas, Canetti disserta sobre sua relação com o trabalho e o
consumo:
A grande maioria das pessoas, mesmo nos países
tecnicamente mais desenvolvidos, é remunerada de acordo
com suas horas de trabalho, e o montante dessa
remuneração movimenta-se numa ordem que, em quase
toda parte, é concebida ainda sob a forma de moedas.(...)
Trocar dinheiro, na condição de um fenômeno cotidiano,
está entre os mecanismos mais frequentes e mais simples
de nossa vida, um mecanismo que toda criança aprende o
mais cedo possível. (CANETTI, 1995, p.183)
A própria imagem da família é, para o autor, relacionada ao processo
de ampliar o “tesouro” . “A imagem que se forma de família diante dos olhos
quando se pensa na famíla é a de pais e filhos reunidos em torno de uma
mesa” (CANETTI, 1995, p.220). Note-se aqui que quanto maior e mais
201
servida a mesa, maior é o poder ou o status da família e consequentemente
maior é o seu “tesouro” acumulado. Para o autor o ideal de trabalhar para o
sustento da família teria se transformado nas últimas décadas do século XX
em “mera propaganda do egoísmo mais deslavado” :
Dura e rija a família se torna quando veda a outros sua
comida; aqueles dos quais tem que cuidar oferecem um
pretexto natural para a exclusão dos demais. (...) as
crianças servem como mera propaganda do egoísmo
deslavado. As pessoas economizam “por seus filhos”,
deixando que os outros passem fome. Na realidade , porém,
o que ocorre é que, assim procedendo ficam com tudo para
si pela vida toda. (CANETTI, 1995, p.221) Grifo nosso.
Nesse contexto em que a melhor mesa, a mais bem servida, a que
possui iguarias mais caras e mais atuais representa o ideal de família bem
sucedida, o que fica em destaque é o poder de compra, é a capacidade de
consumo. Desse modo o ato de comprar ou comerciar torna-se evidemente
um sinal de poder. Canetti diz também que o ato de obter ou de capturar, de
agarrar e de possuir faz parte de um dos mais antigos rituais do homem e
que desde os tempos primitivos ao ficar em pé o ser humano aprendeu a
usar as mãos para trabalhar, obter, ceder, trocar e conquistar:
O comércio consiste em se dar algo definido por aquilo que
se recebe. Uma das mãos segura tenazmente o objeto com
o qual deseja seduzir o interlocutor a comerciar. A outra se
estende ansiosa em busca de um segundo objeto que
gostaria de trocar (...). Tão logo esta o toca, a primeira solta
o que era sua propriedade – e não antes, do contrário
poderia perdê-lo por completo. (...) ao comerciar ele dá
continuidade, sob a forma de uma atitude psíquica, a um de
seus movimentos mais antigos. Em nada mais o homem
apresenta-se ainda hoje tão próximo do macaco quanto na
prática do comércio. (CANETTI, 1995, 2011)
Pondera-se sobre o peso da critica feita pelo autor sobre as massas
humanas e sua vontade desmesurada de auto-proteção e de crescimento
sem limites. Sobre isso ao apresentar o livro de Canetti, Francisco Foot
Hardman diz que o mérito da obra esta no fato do autor perguntar-se todo o
tempo, “se os homens, algum dia, terão tempo, dignidade e saber para
202
tornarem-se de fato humanos”.
Crítica muito parecida, porém mais contudente sobre a ânsia de
consumo é feita por Oliviero Toscani, autor do bestseller A publicidade é um
cádaver que nos sorri argumenta que os índices de depressão, estresse e
patologias atuais evidenciam que a felicidade das propagandas de
margarina não existe na vida real. Ele explica que a propaganda é uma
indústria especializada em vender coisas em grande parte desnecessárias e
que justamente por isso precisa de um investimento inimaginável que lhe
possibilite criar nos expectadores a necessidade dos produtos lançados no
mercado capitalista para que então estes sejam devidamente consumidos.
Sobre a propaganda Toscani argumenta:
É preciso seduzir o grande público com um modelo de
existência cujo padrão exige uma renovação constante do
guarda-roupa,
dos
móveis,
televisão,
carro,
eletrodomésticos, brinquedos das crianças, todos os objetos
do dia-a-dia (...). Os nazistas inventaram a propaganda
publicitária da alegria ariana com filmes e série de fotos que
louvavam um estilo de felicidade escoteira, corpo esculpido
e desnudo, beleza loura, alegria de fazer parte de um grupo,
grandes emoções simples, culto do natural e do autêntico,
céu sem nuvens, veículos poderosos. (TOSCANI, 1996,
p.27 e 31)
Nesse sentido, Toscani sugere que a propaganda é uma máquina de
criar desejos e de criar infelicidades. Isso porque é fato que se as pessoas
estão satisfeitas e felizes com o que tem, não precisam comprar mais nada,
desta forma, o capitalismo com suas diversas possibilidades gestou uma
sociedade neurótica e infeliz que acredita que só obterá a felicidade se tiver
um carro, um tênis, uma calça e um relógio desta ou daquela marca, usada
por este ou aquele famoso.
Analisando-se o pensamento do autor, compreende-se que a
propaganda induz o sexo feminino a acreditar, desde a mais tenra idade,
que beleza, sucesso e satisfação também podem ser adquiridos como
empanados ou repolhos em prateleiras de cosméticos ou em casos mais
graves por meio de cirurgias e implantes para ficar maior aqui ou menor ali,
203
mais reto à esquerda ou mais curvo à direita. E do mesmo modo o sexo
masculino também cresce afetado pelo estimulo midiático, acreditando
desde sua meninice que só conquistará a mulher dos seus sonhos, a
profissão ou a vitória em seus empreendimentos se possuir um carro x,
fumar um cigarro y e beber uma cerveja tal.
Esse tipo de crença no universo da propaganda fortalece o que se
convencionou chamar de sociedade de consumo.
1.3. Reflexões sobre a felicidade
Os questionamentos sobre os motivos que levam os seres humanos a
agir por impulso como grupos desprovidos de poder crítico ou sobre como se
desenvolve nas pessoas o
tal “sentimento de manada” fazem com que
surjam mais perguntas que respostas: Que sociedade construiu o mundo
ocidental capitalista? Por que so longo de suas vidas as pessoas trabalham
oito horas e passam mais quatro estudando? Por que os pais deixam a
criação dos seus filhos de lado para se dedicar exclusivamente ao trabalho?
Por que uma reunião da diretoria ou uma prova de teoria ou cálculo é mais
importante que estar ao lado de uma pessoa querida que não esteja bem de
saúde?
Por que ter dois empregos e ainda fazer um ‘bico’ no fim de
semana? Por que estudar, trabalhar e dedicar a vida a correr atrás de
dinheiro?
A resposta mais honesta é que as pessoas fazem tudo isso apenas
para consumir porque para elas comprar é o principal símbolo de poder na
sociedade capitalista.
Para isso a mídia por meio da publicidade, cria necessidades
permanentes a fim de que todos trabalhem cada vez mais para desfrutar de
tudo que o mercado oferece. Desse modo alimenta-se a ilusão de que ter é
sinônimo de felicidade. Como quanto mais se trabalha, mais se tem,
imagina-se que desse modo é fácil ser mais feliz e ter mais poder.
Verifica-se
ainda
que
esse
pensamento
é
financiado
corporações mais diversas e por todos os governos do Ocidente
pelas
que
204
estimulam as pessoas para que trabalhem e consumam cada vez para que
a roda da economia capitalista continue a girar. Por fim, os meios de
comunicação, cada vez mais presentes no cotidiano das pessoas as incitam
a comprar e a consumir de forma patológica, incontrolável e insustentável.
Em O lado sombrio do crescimento, capitulo do livro Ponto de
Mutação, Fritjof Capra fala sobre esse desequilíbrio ambiental e cultural e
sobre os sintomas doentios da sociedade capitalista contemporânea:
O excessivo crescimento tecnológico criou um meio
ambiente no qual a vida se tornou física e mentalmente
doentia. Ar poluído, ruídos irritantes, congestionamentos de
tráfego, poluentes químicos, riscos de radiação e muitas
outras fontes de estresse físico e piscológico passaram a
fazer parte da vida cotidiana da maioria das pessoas.
(CAPRA, 1982, p.226) Grifo Nosso.
Sobre o que diz respeito à saúde pública o autor considera ainda que:
Esses múltiplos riscos para a saúde não são apenas
suprodutos casuais do progresso tecnológico; são
características integrantes de um sistema econômico
obcecado com o crescimento e a expansão, e que continua
a intensificar sua alta tecnologia numa tentativa de aumentar
a produtividade.(CAPRA, 1982, p.227)
Alguns poderão questionar o subtítulo desta argumentação, por conta
do fato que a abordagem é sobre a felicidade humana e discorre-se sobre
questões tão alarmantes. Porém os riscos para a sobrevivência humana,
decorrentes da poluição ambiental por meio de resíduos químicos tóxicos
são relacionados pelo autor de forma bastante clara:
Os vertedouros de lixos químicos tóxicos poluem massas de
águas e infiltram-se em quintais gerando fumaças tóxicas
que causam entre os residentes na área, elevadas taxas de
defeitos congênitos, lesões renais e hepáticas, dificuldades
respeiratórias e vários tipos de câncer. (CAPRA, 1982,
p.227)
Além do quadro assustador para a saúde humana, ele alerta sobre a
situação em que se encontra o planeta Terra:
Além dos riscos para a saúde que podemos ver, ouvir e
205
cheirar existem outras ameaças ao nosso bem-estar que
podem ser muito mais perigosas porque nos afetaraão
numa escala muito maior, no espaço e no tempo. A
tecnologia humana está desitengrando e perturbando
seriamente os processos ecológicos que sustentam nosso
meio ambiente natural e que são a base da nossa
existência.(CAPRA, 1982, p.227)
Diante desses fatos e das leituras feitas para o desenvolvimento do
presente artigo, no lugar do encontro de respostas, somos invadidos por
questionamentos ainda maiores: Quem tornou o mundo assim? Como surgiu
o consumo desenfreado, a poluição, o estresse e a depressão? Como se
criou uma sociedade instintiva, manipulada e doente? Como foram criados
os jovens atiradores que invadem salas de aulas e sessões de cinema
matando crianças? Por que as prisões estão superlotadas de jovens
viciados? Como será o comportamento das crianças que têm por mãe uma
televisão, por pai um computador e por irmão um vídeo-game? Como uma
pessoa poderá sentir-se importante e amada cercada por seres sem tempo e
sem sonhos? Como os homens e as mulheres encontrarão a plenitude se
estão repletos de vazio, ansiedade, desejo de consumo e solidão?
Infelizmente todos esses questionamentos exigem maior tempo, mais
leitura, muita reflexão e desenvolvimento de espírito crítico. Como a maioria
das pessoas não está interessada ou não tem tempo para encontrar
respostas para tais indagações elas permanecem em aberto. Desse modo
considera-se que o ideal de felicidade descrito pelos filósofos clássicos,
modernos e contemporâneos fica cada vez mais distante da realidade no
mundo massificado pelo poder midiático e econômico.
2. MENOS É MAIS
2.1. Menos coisas e mais valores
A frase “menos é mais” começou a ser utilizada pelos ambientalistas
no fim do século XX e tornou-se um slogan do século XXI. Essas três
palavras são bastante profundas dentro de um contexto no qual as pessoas
julgam que para ser alguém é preciso ter cada vez mais. Esse slogan nos
206
faz pensar sobre a atualidade da redução e na lei do menos: menos
consumo, menos lixo, menos roupas, menos sapatos, menos complicações,
etc.
Ao mesmo tempo o slogan que sugere menos coisas e mais valores,
nos faz substituir vários itens por um ou dois: menos monografias e mais
artigos, menos filmes e mais realidade, menos dinheiro e mais saúde, menos
posses e mais liberdade, menos consumo e mais felicidade.
Uma indagação (in) conveniente seria como uma grande redução do
consumo ocorreria e como impactaria na vida das pessoas? Ora, a redução
do consumo, segundo a maioria dos estudiosos, seria o fim do emprego e do
sistema capitalista. Tal indagação se faz mais urgente quando colocada
frente as fortes ondas de consumo e a crise iniciada em 2008, que continua
assolando os países centrais de forma avassaladora na segunda década do
século XXI.
Essa crise sugere que é preciso identificar novas formas de vida e de
trocas, ou seja, é preciso uma nova cultura global que leve em conta que a
dignidade das pessoas e que desperte valores sociais e humanos que não
se medem por acres de terra, títulos acadêmicos, empregos, carros, roupas
e quaisquer tipos de posse.
Para expressar esse pensamento, dialoga-se com a Grécia clássica,
por meio da filosofia de Socrátes, um pensador que, defendia em seus
escritos que as virtudes são as maiores riquezas, além de elementos
indispensáveis para a felicidade humana:
Outra coisa não faço senão andar por aí, persuadindo-vos,
moços e velhos, a não cuidar tão aferradamente do corpo e
das riquezas, como de melhorar o mais possível a alma,
dizendo-vos que dos haveres não vem a virtude para os
homens, mas da virtude vêm os haveres e todos os outros
bens particulares e públicos. (SOCRÁTES, p.40, 1996).
A partir das idéias desse filósofo clássico, pode-se afirmar que
a
verdadeira riqueza de um povo não esta no ouro ou na quantidade de terras
de sua nação, nem mesmo em sua tecnologia ou em seus campos
petrolíferos, mas sim na sabedoria com que tratam todos estes fatores.
207
2.2.
Sobre o ócio criativo
No artigo, Saiba o que é e pratique o ócio criativo, a psicóloga Monica Aiub
destaca a etimologia da palavra ócio, recompondo sua descrição do
dicionário Aurélio que explica o ócio como sendo : 1. Descanso do trabalho,
folga, repouso; 2. Tempo que se passa desocupado; vagar, quietação, lazer,
ociosidade; 3. Falta de trabalho; desocupação, inação, ociosidade; 4.
Preguiça, indolência, moleza, mandriice, ociosidade; 5. Trabalho mental ou
ocupação suave, agradável.
Ao ler tal significado Aiub pondera sobre a distancia entre o que se
traduz etimologicamente a respeito do ócio e o que ele realmente significa
para a sociedade capitalista:
O advento da sociedade capitalista exige a ampliação dos
negócios. Vindos de uma classe habituada a trabalhar, os
burgueses valorizam o trabalho braçal, a técnica. O
trabalhador vende sua força de trabalho, e institui-se a
moral do trabalho produtivo e do tempo útil, incutindo no ser
humano uma espécie de “relógio moral”. É preciso dedicarse a um trabalho que se transforme em mercadoria e traga
lucros. O trabalho intelectual, anteriormente valorizado,
passa a ser indigno; o ócio, antes necessário, passa a ser
motivo de exclusão social. (AIUB, 2011)
Sobre essa inversão de valores e de conceitos, a autora escreve
ainda que após uma via inteira de trabalho, já aposentadas, as pessoas
ainda não se sentem bem com o tempo que possuem para lazer e descanso:
Já atendi muitos aposentados que passaram a vida
trabalhando, sofrendo cotidianamente com um trabalho
“torturante”, sonhando com a aposentadoria. Logo após os
primeiros dias de aposentadoria, entraram em depressão,
adoeceram. A sensação de inutilidade, de peso social tomou
conta de algumas dessas pessoas. Outros, apesar de se
sentirem bem com o fato de não necessitarem mais
trabalhar diariamente, sentiam-se envergonhados por sua
“ociosidade”, ainda que estivessem repletos de atividades
de lazer. Outros trouxeram como causa de seu sofrimento o
fato de serem “obrigados” pela idade a uma aposentadoria
compulsória, apesar de amarem seu trabalho e não
saberem viver sem ele. (AIUB, 2011)
208
A partir dessas reflexões Aiub sugere que é necessário romper a
dissociação existente entre trabalho, lazer, conhecimento, realização.
Segundo ela não é preciso trabalhar oito horas, dormir oito horas e ter oito
horas de ócio, mas sim incluir, no cotidiano, atividades que reúnam o
descanso, o lazer, o trabalho e a aprendizagem.
O autor italiano De Masi defende um retorno ao pensamento grego
sobre o ócio criativo. Esse propósito parece inusitado uma vez que sugere a
uma sociedade atribulada e complexa o dever de não fazer nada, de parar
para ficar simplesmente pensando sobre a própria vida ou sobre o universo.
Ele compreende ainda que o ócio criativo deva ser apreendido pela
sociedade capitalista não apenas em nome da da arte, da filosofia ou da
literatura, mas em benefício da própria preservação daquilo que nos faz
humanos. Argumenta ele:
O ócio criativo obedece a regras completamente diferentes.
É o alimento da ideação. E uma matéria-prima da qual o
cérebro se serve. Do mesmo modo que a máquina usava
matérias-primas como o aço e o carvão, transformando-as
em bens duráveis, o cérebro precisa do ócio para produzir
idéias. (...) E as idéias são necessárias ao desenvolvimento
da sociedade. Do mesmo modo que dedicamos tanto tempo
e atenção para educar os jovens para trabalhar, precisamos
dedicar as mesmas coisas e em igual medida para educálos ao ócio. (DE MASI, 200,p.223)
Ao reduzir o ritmo de consumo acredita-se que haverá tempo maior
para que as pessoas façam o que lhes agrada e satisfaz. De Masiipropõe
momentos de descanso que possibilitem o despertar do
ócio criativo .
Segundo ele esse ócio positivo que possibilita a criação de alternativas
viáveis para a sociedade e para o meio ambiente não despertará enquanto o
tempo livre das pessoas não for melhor utilizado.
Isso significa que enquanto os individuos contentarem-se em passar o
pouco tempo livre que possuem acomodados em seus sofás confortáveis,
assistindo televisão e digerindo uma programação que vise apenas o
entretenimento, e a massificação, enquanto abrir mão da convivência com
os familiares e amigos reais em nome dos contatos promovidos pelas redes
209
sociais, a única possibilidade de descanso merecerá cada vez mais o rótulo
de fuga da realidade e o seu resultado será uma massificação cada vez
maior.
O ócio proposto por De Mais é aquele que emerge do silêncio, da
desconexão e da solidão. É o ócio que desperta quando os seres desligam
seus circuitos dos veículos midiáticos. É o ócio que se dá ao comtemplar a
natureza por varias horas; ao fazer uma pescaria – mesmo sem peixes com os familiares; ao brincar com as crianças; ao ouvir e analisar a letra de
uma musica que tenha mais de vinte palavras; ou ao se envolver em um
dialogo despropositado com quem quer que seja. Todas essas situações se
encontram atualmente em vias de extinção.
Compreende-se que para De Masi uma redução do consumo não
seria um retrocesso para a sociedade, uma vez que representaria uma
evolução, não tecnológica, mas sim uma humana.
Nesse contexto percebe-se que neste início de século XXI as pessoas
não precisam passar pelas mais sofridas situações descritas por seus avós
porque são detentoras de avançadas tecnologias e de conhecimentos
científicos que não se comparam aos de um passado próximo. Contudo,
entende-se é preciso estimular as novas gerações para que compreendam
os mais nobres sentimentos vistos nos olhos dos mais velhos e que desejem
herdar sua dignidade e sua nobreza.
Para que isso ocorra será preciso criar meios para reavivar os
sentimentos que nos tornam humanos e que vem sendo gradativamente
sufocados pela sociedade capitalista.
Quando o assunto é a valoração da nossa humanidade diante do
valor de mercado, vale salientar que nos dias atuais muitos pais podem
comprar um carro com controle remoto para os filhos, mas poucos tem
disponibilidade para construir junto com os filhos um carrinho de rolimã. As
meninas retratam-se a si mesmas nas redes sociais como bonecas de última
geração mas já não fazer bonecas de pano com suas avós nem bordam
telas com suas mães. Os jovens comunicam-se com pessoas que vivem em
continentes distantes em vários idiomas mas já não conseguem dialogar
210
com seus pais.
Infelizmente – caso não haja mudança de hábitos - a alegria da
reunião em torno de brinquedos e objetos de artesanato confecionados em
família, a beleza de um diálogo franco e despretencioso entre pais e filhos,
jamais fará parte das memórias das crianças do século XXI.
Essa afirmação é feita com base no fato que disponibilidade e
dedicação, companheiros e brincadeiras não podem ser comprados em
lojas, nem consumidos em grupos enquanto as pessoas não tiverem tempo
e saúde para conviver com familiares e amigos. Sobre esse afastamento,
De Masi comenta:
Transmitem aos mais jovens um estilo de vida baseado na
subordinação, em vez da dignidade, e também uma gestão
arcaica dos tempos e espaços, recorrendo à chantagem
psicológica: ou você se comporta dessa maneira, ou não
terá nunca uma boa carreira. (...) Depois que se aposentam,
têm ainda vinte ou trinta anos de vida diante de si, mas são
desadaptados da vida privada e familiar, e portanto sua
velhice será feita só de solidão e saudosismo.(DE MASI,
2000, p.225)
Tais idéias vem sendo motivo de debates para todos aqueles que
acreditam que a redução do consumo e a busca de novos valores são
alternativas que podem mudar radicalmente o quadro atual e transformar
uma sociedade consumista, fria, irracional e vazia em uma comunidade na
qual os maiores valores não sejam representados pelos zeros a direita, mas
sim pela dignidade, o respeito ao próximo e ao meio ambiente.
Essa mudança de valores tão necessária para o sucesso de qualquer
programa de sustentabilidade em nível local ou global, e que exige apenas
amor a vida que se tem e ao mundo em que se vive, parece a primeira vista
impossível quando colocada em confronto com a realidade insustentável que
foi contruída para os seres humanos e para o planeta.
3. CAPITAL AMBIENTAL E HUMANO
Justifica-se pelo encaminhamento deste artigo que a impressão de
211
uma velocidade cada vez maior à sociedade de consumo repousa sobre a
idéia de que ao reduzir o consumo, reduz-se a oferta de trabalho e também
os salários, o que implicaria automaticamente na diminuição do poder de
consumo de parte considerável da população que seria relegada ao
empobrecimento de suas condições de vida.
Sobre a pobreza , a Organização das Nações Unidadas (ONU) utiliza
a faixa de US$ 2 dólares por dia por pessoa como linha de pobreza e de
US$ 1 dólar por dia por pessoa como linha de miséria. Segundo os autores
liberais a redução do consumo fará com que bilhões de pessoas se tornem
pobres ou miseraveis, segundo os padrões atuais (ONU, 2011).
Mas seria o dinheiro a unica maneira de conceber se uma pessoa é
pobre ou rica? Mansões, terras, carros e tecnologia de última geração são
fatores fundamentais para a felicidade? O sucesso financeiro de alguns em
um mundo no qual muitos ou a maioria são pobres ou miseráveis pode ser
considerado justo? É possível medir os valores humanos além do papel do
dinheiro e dos titulos de propriedade?
Al Gore, no livro Uma verdade inconveniente
explica que a raça
humana tem um penhasco mais a frente em sua jornada, contudo muito
pouco é feito a respeito disso. O
aquecimento global vem elevando as
temperaturas globais, estudos desenvolvidos pelos mais respeitados
climatologistas do mundo comprovam a veracidade do efeito estufa.
As medições relativas à temperatura no hemisfério norte nos últimos
mil anos são bastante preocupantes. Os dados por ele descritos foram
obtidos a partir de medições realizadas em geleiras no hemisfério norte.
Esse procedimento é o que os cientistas chamam de “testemunho do gelo”,
são medições precisas e confiáveis. Também derivam do gelo as medições
de carbono na atmosfera, relativas aos últimos 650 mil anos. (AL GORE,
p.47)
Segundo o autor mesmo com grandes eventos, como explosões de
super vulcões ou queimadas continentais, ocorridos nos últimos 650 mil
anos, os níveis de carbono nunca estiveram tão altos. Os níveis de CO2
mantiveram se em 280 ppm ( parte por milhão) até o inicio da revolução
212
industrial, sendo que os níveis atuais são de 380 ppm. Medições diretas na
atmosfera são realizadas desde 1958 no Havai, elas mostram o aumento de
carbono ano a ano na atmosfera. Al Gore acredita que se mudanças rápidas
não forem realizadas os índices chegaram á 600 ppm em 2050, algo nunca
visto na história humana. (AL GORE, p. 58) Junto do acumulo de CO2, vem
o aumento da temperatura. Temperatura que neste século registrou elevação
de meio grau, considerando os dados dos últimos mil anos. Sobre esses
índices, leia-se:
Meio grau pode parecer pouco, mas foi o suficiente para
gerar ondas de calor tão intensas que mataram mais de 35
mil pessoas na Europa em 2005 quando foram registradas
as maiores temperaturas já catalogadas. Sabe-se que além
da atmosfera, os oceanos também aquecem, gerando mais
furacões e de maior intensidade. Sobre isso a última década
nos mostrou a maior série de furações registradas e
provavelmente a maior da história humana. Até mesmo o
atlântico sul, que até o momento nunca tinha registrado um
furacão, foi atingido pelo Catarina em março de 2004.
Também em 2004 foi quebrado o recorde de tornados nos
EUA. (COSMOBRAIN, 2011)
No Brasil o maior problema são as chuvas. Elas promoveram o caos
em Santa Catarina, Rio de Janeiro e no litoral paranaense, provocando
gigantescos deslizamentos e perca de milhares de vidas na ultima década.
No que diz respeito as grandes tempestades, tanto no atlântico como no
pacifico, aumentaram em duração e intensidade, desde a década de 1970,
em cerca de 50%. ( COSMOBRAIN, 2011)
Para Al Gore as tempestades são apenas uma fração do problema,
praticamente todas as geleiras de montanha do planeta estão derretendo em
ritmo acelerado. Na Ásia, as geleiras do Himalaia sofreram forte redução,
estas geleiras fornecem boa parte da água para 40% da população mundial,
sua redução provocará sede e fome (AL GORE, 2006). Isso significa que
não apenas a redução de consumo pode provocar o aumento dos índices de
pobreza e de miserabilidade, mas que o caos ambiental ameaça todas as
pessoas em todos os países da Terra.
Isso tudo lembra o discurso de uma jovem, em uma conferencia da
213
ONU
dos
anos
90
no
Rio
de
janeiro
(http://www.youtube.com/watch?v=kJzTZvAJf3c ) ela procurava alertar os
governantes sobre os problemas relacionados ao aquecimento global. Em
seu discurso a jovem lembrava que antes de eles serem lideres de suas
nações, eles eram lideranças familiares e comunitárias , e que deveriam
pensar no futuro de seus filhos e netos. Ela concluiu afirmando que o
aquecimento global atingirá a todos de formas diferentes. Alguns países
centrais poderão desaparecer e haverá grandes perdas nos países
periféricos.
3.1.
Há
Uma solução
quem acredite que a tecnologia irá dar cabo de todos os
problemas de aquecimento do planeta. Diversas midias apresentam
soluções futuristas para todos os problemas do efeito estufa. Entre os
exemplos estão cidades envoltas em cúpulas, espelhos espaciais que
refletem a luz solar, grandes diques que conteriam inundações ou biodiesel
limpo.
Mas enquanto essas tecnologias não estiverem disponíveis qual é a
melhor opção? Empurrar esta conta para os filhos e netos é a atitude certa?
E se a tecnologia der conta de todos os problemas, essa solução será para
todos? Alternativas que servem para os países centrais poderão ser
adotadas pelos países periféricos?
A redução do consumo impacta diretamente nas emissões de Gases
do Efeito Estufa (GEE), isso é importante quando se fala em redução dos
itens supérfluos para nossa subsistência. Isso significa que se as pessoas
reduzirem o consumo em 50%, por exemplo, a redução dos GEE será bem
mais expressiva que 50%. (COSMOBRAIN, 2011)
Outro ponto a ser debatido é quanto ao aumento da população
mundial. Políticas de controle populacional já são realidade na China mesmo
que essa atitude caminhe contra o que pensa a maioria das religiões. Não
214
existem mais terras disponíveis para colonização. A Amazônia é a última
floresta preservada. Outros
planetas são
distantes
e
inóspitos, a
humanidade não tem para onde fugir, ou cuida deste planeta ou compromete
as futuras gerações e deixa problemas gravíssimos para nossos filhos e
netos.
A redução do consumo parece ser a solução mais eficaz e mais
simples. O modelo de sustentabilidade necessário exige que uma empresa
anule praticamente todas as emissões de gases do efeito estufa causadas
por conta de seu produto, até mesmo a do carro de seu cliente que foi até o
supermercado comprar seu produto, além da garantia de matéria prima
limpa para seu produto por mil anos (COSMOBRAIN, 2011). Ou seja, isto é
praticamente impossível.
Se não bastasse a concorrência desleal, as injustiças e a poluição
causadas pelo sistema capitalista, governos tem que intervir arduamente e a
altos custos na economia, a fim de estabilizar o mercado em períodos de
crise.
A economia liberal vem sendo colocado à prova desde seus
primórdios, os períodos de crises mundiais como a de 1929 ou mais
recentemente com a recessão de 2009 que atingiu o epicentro do sistema
capitalista, ou seja, os países mais ricos da América do Norte e da Europa.
Ao pesquisar sobre o assunto, o economista João Ricardo Torres
Souza da Motta, no estudo intitulado As crises econômicas Mundiais, analisa
que a “ilusão de prosperidade” gestada pelo acumulo de riquezas não foi
suficiente para prevenção dos efeitos recessivos. Segundo ele as políticas
adotadas pelos governos não tiveram competência para “domar o fantasma
das crises e de tempos em tempos, mudanças bruscas no padrão de
executivas vem propagado a desordem no sistema econômico mundial”
(MOTTA, 2010 p.3 ).
O autor considera que a alternância entre períodos de aparente
prosperidade seguidos de crises cada vez mais volumosas chama atenção
para um fato, em algum momento os governos e a sociedade civil perderão
o controle da situação, ou seja, hora virá em que a crise do sistema
financeiro estará fora de controle:
215
As crises mostraram-se presentes e com um
agravante perigoso: a velocidade de propagação e a
intensidade da movimentação dos fluxos financeiros
tornaram virtualmente impossível o seu controle a
partir de sua deflagração. (MOTTA, 2010, p.3 )
Ao refletir sobre o significado da sobrevivência em um cenário de
instabilidade econômica cada vez maior, é preciso colocar em questão o
trabalho, a moradia, o meio ambiente, o acesso à saúde e à educação, isso
sem falar em cultura, lazer e segurança. A simples idéia de que o capitalismo
pode entrar ou que já teria entrado em colapso e que toda a economia
mundial pode estar caminhando ladeira abaixo até ficar fora do controle do
governo e da sociedade global deve causar calafrios em todos aqueles que
acreditavam caminhar com os pés no chão rumo a um destino sem abismos
ou tempestades. Nesse sentido as crises financeiras tatuam a incerteza e a
insegurança como marcas registradas do século XXI.
Motta argumenta que diante de crises cada vez maiores, surge a
necessidade
de
apontar
culpados.
Mesmo
especialistas sugerem que entre os principais
com
divergências,os
vilões aparecem o
clientelismo do capital, a fraqueza dos países asiáticos, o imperalismo dos
Estados Unidos e da Europa, o Fundo Monetário Internacional, bem como o
despreparo dos países emergentes e periféricos para recepção do fluxo de
capitais externos. Além desses fatores, o pesquisador pontua também a
própria natureza humana como um dos elementos sugeridos pelos
estudiosos como geradores da crise:
Algumas das principais causas da crise parecem
ser, de fato, a própria natureza humana. O fator
psicológico vem aumentando o seu grau de
importância na explicação para a velocidade de
propagação das crises, em uma espécie de
“sentimento de manada” que varre os mercados
com otimismo ou pessimismo exagerados (MOTTA,
2010, p.18).
Para o economista as crises internacionais do século XXI indicam que
“a moeda eletrônica e o mercado de títulos acumularam excessivo poder e
216
ameaçam hoje a soberania dos governos nacionais e os interesses
econômicos de diversos países” (MOTTA, p.7). Diante do retrocesso em
aspectos fundamentais dos direitos humanos e sem condições de manter os
índices de empregabilidade, a partir da paisagem estadunidense e européia,
o pesquisador aconselha que sejam tomadas medidas radicais e novas
atitudes para transformar um estilo de vida consumista em um modelo que
possa assegurar condições de vida dignas para as futuras gerações.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A antecipação dos fatos é algo próprio do ser humano. Cientistas
fazem projeções, elaboram previsões e criam cenários. Isso acontece para
que os seres humanos possam vislumbrar o futuro, antecipar os fatos e
evitar ou preparar-se para catástrofes eminentes.
As projeções descritas pelos autores referenciados
neste artigo
alertam que dezenas de milhões de pessoas terão que deixar seus lares por
conta da elevação dos oceanos, o mapa mundi terá que ser redesenhado e
parte do mundo que conhecemos estará submerso pelos mares em 2050.
Quanto à emissão de Gases do Efeito Estufa (GEE), é coerente
afirmar que o aquecimento do planeta é um fato consumado. O planeta está
mais quente e irá aquecer ainda mais. Mesmo que cessem imediatamente
as emissões de GEE a humanidade sofrerá por décadas as suas
conseqüências.
Ações para combater o aquecimento do planeta já foram tomadas,
mas não resolvem nem uma parcela do problema. A tão propagada
sustentabilidade ainda é uma utopia diante dos moldes tecnológicos e de
consumo atuais. O modelo capitalista procura readaptar ou readequar os
projetos de sustentabilidade e essa atitude impede o surgimento de uma
sociedade sustentável.
O aquecimento global ira tornar mais difícil nossa vida no planeta.
Com a elevação dos oceanos, secas e inundações, furacões e ciclones,
milhões de pessoas serão obrigadas a migrar. Essas migrações poderão
217
gerar disputas inimagináveis por territórios e alimentos.
Contudo, mesmo diante dos dados apresentados pelos cientistas
ambientais, percebe-se que uma redução do consumo, apesar de ser uma
idéia simples e uma alternativa coerente, é descartada porque cairia como
uma bomba sobre a economia capitalista.
Outro fator é puramente intelectual os governos e as corporações
ainda não entenderam um principio básico: a economia, o sistema
capitalista, as empresas e os governos, foram criados para facilitar e
promover a existência humana
e sua subsistência neste planeta. Isso
significa que sempre que a humanidade e a Terra forem ameaçadas deverão
ser tomadas as providencias para evitar o caos.
Consequentemente diante de um sistema capitalista que promove o
consumismo e a crescente destruição do planeta e da saúde humana, as
instituições capitalistas deveriam abrir mão dos agentes de poluição e de
intoxicação que acabam com a saúde do planeta e das pessoas.
Diante dos desastres ambientais e das epidemias de doenças que
assolam a humanidade, acredita-se que a
redução do consumo é uma
alternativa viável. A conta fecha: consome-se menos, ganha-se menos,
trabalha-se menos e vive-se mais. Mesmo que as ações nefastas do efeito
estufa ainda sejam visíveis por décadas.
Na conclusão deste estudo muitas perguntas continuam sem as
devidas respostas e muitos questionamentos pairam no ar. Porém, antes de
limitar este trabalho e os objetivos por ele propostos, acredita-se que o
enfoque utilizado amplia o poder de reflexão e de crítica dos interessados no
tema propondo-lhes novos desafios e novas questões:
o que poderá
acontecer se a civilização não buscar o bom senso e o entendimento diante
dos problemas ambientais regionais e globais? Se por ventura as questões
ambientais forçarem a redução do consumo e a adoção de programas de
sustentabilidade como reagirão os governos, as corporações e as mídias ?
Uma redução do consumo se faz realmente necessária? Existe uma solução
mais simples, eficaz e rápida? Se esta não é uma solução viável, qual seria?
A proposta de conclusão deste trabalho é que tais questionamentos
218
permitam a abertura de novos e freqüentes debates sobre um tema que
interessa a maioria da população e que está cada vez mais infiltrado na
agenda de debates do século XXI.
REFERÊNCIAS
AL GORE, Albert. Uma Verdade Inconveniente. Barueri SP. Manole, 2006.
CANETTI, Elias. Massa e poder. São Paulo: Cia das Letras, 1995.
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação: a ciência, sociedade e a cultura emergente.
São Paulo: Cultrix, 1982.
DE MASI, Domenico. O ócio Criativo. Rio de Janeiro: Sextante, 2000.
KEYNES, John Maynardes. Teoria geral do emprego, do juro e da moeda. São
Paulo: Atlas, 1982.
MOTTA, João Ricardo Torres Souza da.As crises Econômicas Mundiais. Brasilia:
Consultoria Legislativa, 2010.
RODRIGUES, Huberlan (org.) Referências conceituais para ações integradas:
uma tipologia da autogestão. Brasília:MTE//IIPEA//ANPEC, 2003.
TOSCANI, Oliviero. A publicidade é um cadáver que nos sorri. 2ª. Edição, Rio de
Janeiro: Ediouro, 1996.
SITOGRAFIA
AIUB, Mônica. Saiba o que é e pratique o ócio criativo. Disponivel em :
http://www2.uol.com.br/vyaestelar/ocio_criativo.htm. Acessado em 21 de setembro
de 2011.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU) – Disponível em:
http://www.cosmobrain.com.br/cosmoforum/viewtopic.php?f=23&t=3203&start=60.
Acesssado em 14 de setembro de 2011.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU) – VÍDEO. Disponível em:
(http://www.youtube.com/watch?v=kJzTZvAJf3c. Acessado em 23 de setembro de
2011.
O MUNICÍPIO DE TURVO E O DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL A PARTIR DO ESTUDO BIOGRÁFICO DE
BERNARDO HAKVOORT
1977-1997
Rokely Scheifiter de Ramos
História - UNICENTRO
Orientador : Prof. Dr. Ariel José Pires
219
RESUMO: O estudo proposto tem por objetivo, a partir da biografia de Bernardo
Hakvoort e de seus projetos para o desenvolvimento sustentável do município de
Turvo, reconstituir as premissas básicas de seu pensamento, o que envolve
compreender o contexto histórico em que o mesmo estava inserido. Tendo em vista
a seguinte problemática: a produção agrícola dominante das monoculturas, a
conseqüente concentração de renda, e a destruição ambiental. Este artigo utiliza a
metodologia da história biográfica para colocar em evidencia o trabalho iniciado
pelo biografado no município de Turvo para a preservação dos remanescentes
naturais.
Palavras-chave: Biografia. Meio Ambiente. Desenvolvimento Sustentável.
Agricultura Familiar. História.
INTRODUÇÃO
Deus criou um belo jardim de Araucárias no município de Turvo.
É responsabilidade de todos respeitar e manter essa obra do senhor.
Bernardo Hakvoorth
Neste início do século XXI, as questões ambientais estão sendo
colocadas em primeiro plano no debate sócio-político. Em nível mundial,
presenciamos uma intensa discussão acerca da queima de combustíveis
fósseis e seus malefícios, no cenário nacional a discussão vai além da busca
por sugestões para os problemas ambientais que estão sendo evidenciados.
Buscam-se também alternativas para diminuir o índice de pessoas que
passam fome.
Paradoxalmente, nesse país de grande produção agrícola considerado
o “celeiro do mundo”, torna-se necessário o incentivo à agricultura familiar e
ao desenvolvimento sustentável com propostas de produção sem insumos
poluidores.
A presente pesquisa procura referendar esse processo, tomando por
base projetos desenvolvidos no município de Turvo, entre 1977 e 1997, por
meio de um estudo biográfico sobre o ambientalista holandês Bernardo
Harkvoort, cuja atuação para a recuperação e utilização sustentável do
ecossistema, transformou-se em referência para todo o Paraná.
Ao promover a introdução deste trabalho, é necessário que se recorde,
220
que a partir de 1950, o Brasil começou a desenvolver sua indústria pesada
ou de base, e que o desenvolvimento industrial desse período combinou
investimentos estatais em setores estratégicos como a siderurgia e a
geração de energia com investimentos estrangeiros. A mudança capitalista
que se processava no Brasil visava uma maior inserção na economia
mundial exigindo que se aumentassem as exportações em nome do
desenvolvimento econômico brasileiro, repetindo um modelo clássico
bastante criticado pelo historiador Caio Prado Júnior na obra História
Econômica do Brasil (1998).
O sociólogo Octávio Ianni, em O ciclo da revolução burguesa, analisa
que nesse contexto de mudança capitalista iniciou-se uma “política de
modernização”, que visava tornar a agricultura brasileira mais dinâmica e
produtiva, por meio de financiamentos agrícolas, para serem investidos em
equipamentos modernos. Mas, a política modernizadora não levou em conta
as implicações sociais que esse processo acarretaria. A introdução de novas
tecnologias no cultivo agrícola gerou uma redução de mão-de-obra e
conseqüente êxodo rural, além disso, excluiu os pequenos proprietários
desse processo, sendo que essa modernização contribuiu para fortalecer a
concentração de renda. Segundo ele:
O processo histórico da revolução burguesa
brasileira relaciona-se com o problema da formação
de uma economia capitalista. Trata-se de
caracterizar a feição autoritária adquirida pela
revolução burguesa no Brasil. Trata-se de uma
sociedade na qual a passagem para o capitalismo
ocorre sem alteração na estrutura agrária.
(IANNI,1984, p. 31).
Essa política agrícola privilegiou na segunda metade do século XX, a
grande e a média propriedade com créditos, em detrimento dos pequenos
agricultores. Ianni observa que:
Todas as grandes alternativas concretas vividas pelo
nosso país, direta ou indiretamente, aquela
transição (Independência, Abolição, República,
modificação do bloco de poder em 30 e 37,
passagem para um novo patamar de acumulação
221
em 64), encontraram uma resposta na qual a
conciliação “pelo alto”, não escondeu jamais a
intenção explicita de manter marginalizados ou
reprimidos, de qualquer modo, fora do âmbito das
decisões – as classes e camadas sociais “de baixo”.
(IANNI, 1984, p. 31).
É frente a essa problemática, que evidencia a utilização inadequada
dos recursos ambientais e de uma política agrícola excludente, que
empreendemos o presente estudo, onde, procurar-se-á relatar brevemente a
atuação de Bernardo Hakvoort no Município de Turvo e sua intervenção
sobre a sociedade local. Para tanto, apresentaremos uma visão panorâmica
da sociedade, bem como da relação do biografado com a mesma – sua
participação em movimentos sociais, na estruturação de sindicatos,
associações e demais projetos que visavam o desenvolvimento local.
O foco geográfico da pesquisa será o município de Turvo, ao qual
remeter-se-á com o intuito de compreendê-lo enquanto cenário dinâmico,
não só do biografado, mas da coletividade da qual faz parte. O recorte
temporal está centrado entre os anos de 1977 - referente à chegada de
Hakvoort no município - e de 1997 - ano de seu falecimento.
Recorda-se ainda que o município no período abordado vivenciava o
momento de sua emancipação política, a corrida pela madeira –
principalmente a araucária, e pela erva-mate, enquanto buscava a formação
de uma identidade local e sobretudo, o progresso econômico.
Tendo em vista tal contexto algumas perguntas poderão ser colocadas
para problematizar o assunto: que motivos o teriam levado a acreditar no
desenvolvimento sustentável, justamente em um momento histórico em que
a mentalidade humana ainda estava impregnada pelos ideais iluministas
como o de progresso? Em um momento em que a população turvense e
paranaense em geral estavam vivenciando a corrida pela madeira? Em que
se baseavam e qual a importância de seus projetos para o desenvolvimento
local da época?
É na busca de levantar hipóteses para responder a essas e outras
perguntas, para refletir sobre o desenvolvimento auto-sustentável, a
222
viabilidade da agricultura familiar dentro do modo de produção capitalista e
sobre a importância da consciência ambiental nos dias atuais que conduzirse-á este trabalho. Destaca-se ainda como justificativa para a escolha desse
tema a escassez de produção historiográfica sobre o município.
Como referencial básico para esse estudo utilizar-se-á a obra: Turvo no
caminho do desenvolvimento sustentável de autoria do biografado,
entrevista com Agnes Vercauteren Hakvoort, e fontes documentais dos
arquivos: do sindicato dos trabalhadores de Turvo, da Associação dos
Hortifrutigranjeiros e do Instituto Agroflorestal Bernardo Hakvoort.
2. A REDESCOBERTA DA HISTÓRIA BIOGRÁFICA
Ao optar pelo tema em questão torna-se necessário fazer uma breve
releitura sobre o estudo biográfico, que durante um bom tempo foi relegado
a um segundo plano por muitos historiadores.
Na transição do século XX para o século XXI, percebe-se um
redespertar, ou como denominaram alguns autores um retorno do gênero
biográfico, que ressurge com uma nova roupagem, não se restringe apenas
em revelar o sujeito através de uma narrativa linear. Sobre essa nova
roupagem, comentou Francisca Nogueira de Azevedo, na obra Biografia e
gênero:
Hoje a biografia é um modelo de escrita da história nitidamente
definida. Há uma metodologia explicitada na qual a biografia não se destina mais ao
julgamento feito por seus autores, mas sim a uma construção relevante sobre hipóteses
cujos pressupostos serão confirmados ou não. Seu objetivo fundamental é levar a
compreensão da época que, como a montagem de um quebra-cabeça, pouco a pouco
vai revelando o que permanente, indicando as diferenças, permitindo perceber a
realidade dos problemas sociais através do concreto de uma vida. (AZEVEDO, 2000. p.
133).
Assim sendo, torna-se fundamental para o desenvolvimento de um estudo
biográfico a observação feita por Pierre Bourdieu, de que não se pode tratar
a vida como um relato coerente de uma seqüência de acontecimentos, pois
223
tal procedimento equivaleria a reduzir a vida ao que ele chama de “ilusão
biográfica”.
Tentar compreender uma vida como uma série única e por
só suficiente de acontecimentos sucessivos, sem outro
vinculo que não a associação a um “sujeito” cuja constância
certamente não é senão aquela de um nome próprio, é
quase tão absurdo quanto tentar explicar a razão de um
trajeto de um metro sem levar em conta a estrutura da rede.
(BOURDIEU, 1998. p.189)
Além dessas noções - do que o estudo biográfico pretende ser hoje, e
do que ele não pode vir a ser, há que se articular outros conceitos que
servirão de base para a compreensão do tema proposto. Procurar-se-á
interligar a história de vida do biografado, relacionando-a com o que o
município de Turvo possui hoje em termos de desenvolvimento sustentável,
incluindo-se aí a sua relevância para desenvolvimento da agricultura familiar,
para a recuperação e utilização sustentável, e a própria atuação do Instituto
Agroflorestal Bernardo Harkvoort.
3. O BIOGRAFADO
O biografado, Bernardo Hakvoort, produtor rural, engenheiro formado
pela Escola Superior de Águas, Solos e Florestas da Holanda, especializado
em Planejamento e Política de Desenvolvimento Rural, com estágios e
cursos em Israel, Oklahoma (EUA), Portugal, Alemanha e Suíça foi cofundador da Pastoral Rural da Diocese de Guarapuava, da Associação dos
Hortifrutigranjeiros de Turvo, Sindicato dos trabalhadores rurais de Turvo,
Fundação para o Desenvolvimento Econômico Rural da Região CentroOeste do Paraná (Fundação RURECO) e do Instituto Agro Florestal
(IAF).(PREFEITURA MUNICIPAL DE TURVO, 1987).
Em sua obra “Turvo no caminho do desenvolvimento sustentável”
publicada após a sua morte, o autor apresenta suas idéias para o
desenvolvimento de Turvo, para ele o desenvolvimento tem que ter quatro
esteios como base: a fé (ética, moral), a saúde, o ensino e a economia (a
224
produção).
A principal militância de Hakvoort foi nas áreas social e econômica,
estudar sobre sua vida, seus pensamentos compreende também perceber o
momento histórico no qual estava inserido, o seu envolvimento com o
contexto pode revelar muito sobre a história dessa época.
Hakvoort era filho de agricultores, nasceu na região leste da Holanda
em 04/10/1949, ajudava na agricultura e nas criações com seus pais, na
juventude, como membro de um grupo de jovens, ajudou na organização da
juventude rural da sua comunidade e região, e trabalhou na organização da
Juventude Rural do seu país participando de vários intercâmbios em
diversos continentes. Seguindo a tradição agrícola da sua família foi para a
Universidade e se formou em Engenharia Agrícola e Recursos Hídricos.
Chegou em Turvo em 1977, com sua esposa Agnes Vercauteren
Hakvoort, seu primeiro trabalho foi visitar as comunidades em companhia do
Padre João Adolfo Barendse, conhecendo a situação de cada uma, em
seguida passou a implantar nas comunidades campos demonstrativos de
como melhorar a produção das lavouras tradicionais de milho e feijão, ao
mesmo tempo em que junto com sua esposa começava a organizar grupos
de jovens e de mulheres enviando lideranças para curso de formação
(HAKVOORT, 1998).
Em entrevista temática realizada com Agnes Vercauteren Hakvoort em
06/07/2007, ela nos relatou que quando chegaram na região de Turvo, a
comunidade recepcionou-os com uma festa, lembrou com entusiasmo que
“no início o povo estava esperando que fizéssemos milagres, mas a gente
não conhecia a realidade aqui, então na verdade nos primeiros dias, o
trabalho era visitar as comunidades com o Padre, e aprender muito; o que
era um pé de mandioca, todas as culturas aqui, e aprender o português que
era muito difícil”. Agnes o conheceu em Portugal, em 1973, nesse momento
ele estava muito envolvido com grupos de jovens, e se preocupava em
demasia com problemas ambientais em nível mundial.
Sobre a vinda para o Brasil relata:
225
Tínhamos vontade de vir para América Latina, nesse
período encontramos uma carta do Padre João Adolfo
Barendse, que pedia um casal para fazer parte de um
trabalho que já estava sendo realizado em Turvo, ele queria
um engenheiro agrônomo para trabalhar, já haviam
procurado no Brasil, mas como no momento vivia-se a
revolução verde, os agrônomos eram muito procurados,
nenhum queria vir para o Turvo (VERCAUTEREN,
Entrevista Temática, 06/07/2007).
Um ano depois foi organizada a Associação dos Hortifrutigrangeiros de
Turvo que, segundo ela a aassociação tinha “no mínimo vinte sócios, desde
o início então a associação tinha um departamento de provisão, outro
administrativo e outro que era mais a parte educativa, nós trabalhávamos
com os jovens e com as mulheres organizando cursos”. Sobre a
comercialização destaca que:
Naquela época estavam fazendo o asfalto, tinha uma vila
grande de operários, um acampamento onde moravam mais
de 18 famílias, então eles precisavam comprar as coisas,
organizamos uma feira e todo sábado tinha lá então
verduras, ovos, leite (...) tinha de tudo lá, era bem animada
aquela feira, muitos anos ela funcionou. ( VERCAUTEREN,
entrevista temática 06/07/2007)
Hakvoort dava apoio técnico a esses pequenos produtores, ensinava
como utilizar melhor o solo, horticultura, a fazer adubo orgânico... Quando
chegou utilizava-se ainda a técnica da queimada e a produção apresentava
pouca diversidade, era basicamente composta pelo cultivo do milho e feijão.
A partir da criação da associação passou-se a incentivar outros cultivos e
criações, como frangos. Nesse momento a associação estabeleceu vínculos
com a Batavo e na medida que a produção foi aumentando a sobra foi sendo
levada para Guarapuava.
Agnes conta-nos que o trabalho desenvolvido por ela e seu esposo não
se restringia ao município de Turvo:
Bem, a gente sempre teve não só trabalho aqui no Turvo,
mas através da igreja ligada a outras paróquias aqui na
região através da pastoral rural, a pastoral rural reunia
pessoas da região mas também do Paraná inteiro, promovia
226
cursos para liderança e nesses encontros o pessoal
começou a olhar e perceber que o Turvo estava se
organizando, alguns agricultores estavam conseguindo
progredir. Então Nova Tebas foi o segundo município a se
organizar, o padre pediu para gente organizar um casal para
eles começar também esse trabalho, então veio um casal
da Bélgica para trabalhar lá. Depois foi Laranjeiras e
Pinhão, criou-se uma associação em Pitanga, e Bernardo
passou então a desenvolver um trabalho mais na região,
com a pastoral rural ajudando a organizar as associações e
também
os
sindicatos
de
trabalhadores
rurais.
(VERCAUTEREN, entrevista temática 06/07/2007)
A entrevistada relatou ainda que a partir de então as pessoas passaram
a sentir necessidade de uma organização que pudesse dar apoio ao
trabalho, que estava se desenvolvendo, criou-se então a Fundação
RURECO, da qual Hakvoort foi o primeiro coordenador. Segundo ela:
Ele só deixou a Fundação para se dedicar à preservação
das araucárias, em especial no Turvo, organizou daí o
Instituto Agroflorestal (IAF) que tinha como objetivo a
preservação da mata araucária e a sobrevivência dos
agricultores. O instituto contava com a participação de
agricultores familiares, envolvia os índios e tinha vários
sócios não só do Turvo, mas de uma região mais ampla,
técnicos, agricultores e várias pessoas envolvidas com a
mata. E aí em 1997, quando Hakvoort era coordenador do
IAF, ele faleceu. (VERCAUTEREN, entrevista temática
06/07/2007) Grifo Nosso
Após sua chegada ao município, com a criação da Associação dos
Hortifrutigranjeiros de Turvo, passou-se a incentivar a diversificação,
organizar a produção e estimular o mercado de produtos regionais. Para isso
criou a Feira Livre de Turvo e estimulou diversos agricultores para que
vendessem nas feiras de outros municípos, entre eles Pitanga e
Guarapuava.
Hakvoort buscou convênios para viabilizar a compra de insumos e a
venda da produção, estabeleceu convênio com a BATAVO, com a COAMIG
e a CTP – o que garantiu o início da produção de frangos, o custeio da
gerência, o treinamento de agricultores e, principalmente, o crescimento do
movimento associativista em Turvo. Conseguiu, também, convênio com o
governo do Estado e a implantação do escritório da ACARPA, em Turvo;
227
estabeleceu convênio com o Instituto Cristão de Castro conseguindo bolsas
de estudo para jovens estudantes. Com tal assessoria a Associação se
fortaleceu, tendo uma boa equipe técnica para assistência às comunidades e
aos clubes de mães. (HAKVOORT, 1998).
Entre 1979 a 1990 trabalhou como coordenador e membro da Pastoral
Rural na região, promovendo cursos e seminários de formação de
lideranças, apoiando a organização de entidades nos demais municípios da
região, assim surgiram as Associações de lavradores e Sindicatos de
Trabalhadores Rurais de Nova Tebas, Pitanga, Laranjeiras do Sul e Pinhão.
Em 1986 foi constituída em Turvo a Fundação para o Desenvolvimento
Econômico Rural do Centro-Oeste do Paraná (RURECO), cuja atuação foi
regionalizada e tornou-se bastante representativa em termos políticos,
econômicos e sociais.
Em 1992 Bernardo deixou a coordenação da Fundação Rureco e
dedicou-se a estudar os problemas da agricultura no Estado e no País, esse
trabalho levou tempo, mas deu origem a Campanha Nacional em Defesa da
Agricultura Familiar, refletida nas mobilizações nacionais de agricultores nos
gritos da Terra I, II e III. Em 1995, voltou a trabalhar com especial olhar para
o Turvo e fundou o Instituto Agroflorestal.
Dedicou-se em escrever e sugerir propostas de políticas públicas e
idéias para planos de governo. Sonhava em formar uma Associação de
Proprietários de Terras com Florestas, fazia parte do conselho de
desenvolvimento do município e viveu com entusiasmo a constituição da
Cooperativa de Crédito com Interação Solidária,
a terceira CRESOL da
região.
De acordo com a entrevistada:
Bernardo queria ver o Municipio como um exemplo de
município, com uma riqueza enorme de natureza e queria
ver todo mundo reunido com esse ideal, por isso que ele
escreveu aquele livro, ele queria deixar um tipo de desafio
para quem viesse a trabalhar e a governar em Turvo”.
(VERCAUTEREN, Entrevista Temática, 06/07/2007).
228
Ao lado do desenvolvimento econômico o biografado desejava um
município agradável de viver, com esse intuito escreveu um livro onde
deixou registrada sua visão humana, espiritual, ética e moral; suas idéias e
propostas para resolver os problemas, para melhorar a qualidade de vida
das pessoas, embelezar a cidade e manter viva a memória de Turvo.
Durante seu depoimento a entrevistada confessou que Hakvoort além
da agricultura, gostava ainda de música clássica, de ler bons livros sobre
assuntos diversos, dos serviços de marcenaria e construção e até mesmo de
fazer brinquedos para as crianças. Segundo ela, ele se preocupava muito
com as relações familiares e com o desenvolvimento da região, seus
projetos tinham um fundo político e econômico, mas ele estava sempre
atento às questões relacionadas à saúde e à educação.
Para a entrevistada
muita coisa não está como ele sonhava, mas
observou que muito do que se iniciou teve continuidade. O biografado
desenvolveu muitas idéias para melhorar as condições de vida e
desenvolvimento da sociedade regional, algumas colocadas em prática e
outras que sobrevivem na sua obra como um plano de desenvolvimento que
pode ser adotados pelos herdeiros de suas crenças.
4. DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
Um dos conceitos nucleares que há que se articular é o de
desenvolvimento sustentável, segundo, Norbert Fenzl Doutor em Geologia e
Geoquímica Ambiental, Coordenador do Núcleo de Meio Ambiente (NUMA),
de um modo geral o desenvolvimento sustentável articula-se levando em
conta as seguintes metas e objetivos básicos: a taxa de consumo de
recursos renováveis não deve ultrapassar a capacidade de renovação dos
mesmos; a quantidade de rejeitos produzidos não deve ultrapassar a
capacidade de absorção dos ecossistemas; os recursos não renováveis
devem ser utilizados somente na medida em que podem ser substituídos por
um recurso equivalente renovável. O autor conclui que “resumindo podemos
dizer que em última instância, o conceito de desenvolvimento sustentável
229
descreve um processo socioeconômico, ecologicamente sustentável e
socialmente justo” (FENZL).
Dessa forma, o desenvolvimento auto-sustentável coloca-se não só
como uma alternativa para a agricultura, mas também para contornar os
graves problemas sociais e ambientais, característicos do atual modo de
produção capitalista.
Entendendo-se que o Paraná é um dos maiores produtores agrícolas
do Brasil e se destaca no que diz respeito ao desenvolvimento sustentável e
a agricultura familiar. Desde o princípio da colonização do Brasil, a
agricultura familiar, ainda que não conceituada devidamente parece ter uma
importância
muito
vasta
no
que
diz
respeito
à
sobrevivência
e
desenvolvimento do campo. Porém foi só no final da década de 1970, que se
iniciou na região centro-oeste do Paraná um trabalho de organização dos
agricultores familiares, foi uma tentativa para melhorar o desenvolvimento
local, assessorado por pastorais católicas, tais como: Pastoral Rural, e
Fundação RURECO.
No município de Turvo essa organização tornou-se visível a partir de
1977,
com a vinda do casal Bernardus Henricus Franciscus Hakvoort e
Agnes Vercauteren Hakvoort, que passam a organizar e assentar as bases
para a formação de uma associação para representar e organizar os
pequenos produtores. O município nessa época não contava com nenhuma
assistência ou orientação técnica de qualquer órgão à agricultura, quer
Estadual ou de cooperativas regionais, Bernardo e Inês (como eram
chamados) passaram a promover reuniões para a conscientização dos
agricultores.
O biografado em sua obra Turvo no caminho do desenvolvimento
sustentável, expressa sua concepção sobre desenvolvimento sustentável, ao
abordar sobre religião nos passa o seu parecer sobre como deve ser o
desenvolvimento, segundo ele é impossível proceder com um plano de
desenvolvimento desvinculado da religiosidade, o uso indiscriminado de
agrotóxicos na agricultura bem como a destruição das florestas é entendida
por ele como um desajuste entre o homem e o conjunto da Criação, criador
230
e criação devem estar ligados para o bem comum.
O autor escreve sobre a importância e o sentido da religião, no entanto
não faz apologia a nenhuma religião em específico, ao contrário considera
que as religiões são caminhos diferentes que convergem para o mesmo
ponto, e que sendo assim não há importância em seguirmos por caminhos
diferentes desde que alcancemos o mesmo objetivo, seu trabalho levou em
conta o ecumenismo, como citou Agnes em entrevista:
Ele sempre se interessou muito pela questão da origem do
cristianismo, na verdade ele fez um curso na Holanda de
licenciatura para dar aula de religião, mas na verdade era
mais uma busca pessoal para achar resposta de quem é
Jesus, da onde que veio, por que a igreja? Porque as
religiões? Então ele se interessava muito por isso. Embora
que, por outro lado, aqui no Turvo ele procurava muito o
ecumenismo, então ele se dava muito bem com todas as
igrejas, uma relação boa com a igreja presbiteriana,
luterana, católica. Ele sempre procurou aproximar muito as
pessoas, acho que isso foi uma característica muito forte do
Bernardo tanto a partir das igrejas quanto entre pequenos e
grandes produtores, em beneficio da mata ele conseguia
conversar com todo mundo, com os políticos dos vários
partidos, com as serrarias, com os proprietários das terras,
com os pequenos agricultores, ele conseguia trazer todo
mundo e achava que era importante que todos tivessem o
mesmo objetivo de tentar preservar esse patrimônio que
Turvo ainda possuía.(VERCAUTEREN, Entrevista Temática,
06/07/2007).
Quanto à preservação ambiental, a principal preocupação do
biografado era com a Araucária, abundante no município na época, mas que
sofria uma grande devastação, pois o período abordado era de grande
procura, vale lembrar que em 1987 dez anos após a chegada de Hakvoort, o
município contava com aproximadamente vinte serrarias, um grande número
se levarmos em conta a população da época. Em sua obra ao falar sobre a
industrialização, faz algumas críticas às madereiras e propõe que a madeira
seja utilizada de forma a gerar mais renda e mais empregos, porém sem
agredir e destruir o meio ambiente.
No sentido de estimular projetos de
preservação das florestas e
intimidar o corte indiscriminado de madeira sugere a criação de incubadoras
tencolológicas que acompanhassem par e passo os programas de
231
beneficiamento das madeiras no município.
Tais incubadoras deveriam ser colocadas em terrenos para indústrias
perto do Turvo e outras nos distritos, aliás, o seu programa de
desenvolvimento num todo era para uma industrialização descentralizada,
que atingisse a todos, isso se justifica no fato de acreditar no
desenvolvimento que leva em conta a família e a preservação ambiental.
Segundo esse pensamento, automaticamente o dinheiro ganho na
indústria possibilitaria mais investimentos nas chácaras, a agricultura familiar
ajudaria a pequena indústria com a mão-de-obra e a indústria à agricultura
familiar garantindo uma renda extra, e a permanência das famílias no
campo.
No município de Turvo houve e ainda há uma grande emigração de
jovens devido à falta de perspectiva e de emprego, se analisássemos mais a
fundo verificaríamos que a população principalmente interiorana é hoje na
sua maioria formada por pessoas mais velhas.
A economia de Turvo caracteriza-se pela agropecuária e a indústria
madeireira, ao mesmo tempo em que apresenta umas das maiores
produções de erva mate da região centro-oeste. No entanto não havia
nenhum tipo de planejamento para extração controlada dessas espécies e
essa foi uma das grandes preocupações de Hakvoort, gerar renda, e manter
as pessoas em seu ambiente cultural, com melhores condições de vida e
fazendo uso adequado desse habitat.
Ao tratar da industrialização não se esqueceu da indústria de
confecção e de artesanato. A comunidade indígena tinha uma produção
artesanal riquíssima, destaca o trabalho com ferraria, calçados e artesanatos
em couro, além das costureiras, bordadeiras. Trabalhos como, os de
marceneiros,
carpinteiros,
pedreiros,
deveriam
ser
preservados
e
valorizados, jovens e adolescentes poderiam ter aulas com as pessoas do
município que eram detentoras de conhecimentos e de práticas tradicionais
do.
Para que esse projeto fosse adiante logo Hakvoorth
reconheceu a
importância do apoio da administração pública. Tais eventos seriam
realizados através da promoção de cursos, treinamentos e incentivos para
232
ampliação da atividade já existentes. Tais ações promoveriam ainda a
instalação de novas indústrias em Turvo.
O biografado evidenciava o interesse da população do município em
produzir leite, erva-mate e peixes, que para ele eram excelentes culturas
especialmente para pequenas e médias propriedades, para propriedades
com faxinal e com cobertura florestal, podendo ser combinadas com um
bom projeto de incentivo e de captação de recursos. Orientava ainda, as
pessoas sobre como e o que fazer para ter maior produção levando em
conta as preservações culturais e ambientais.
No pensar de Hakvoort a agricultura familiar era um privilégio para o
município. Segundo ele essa forma de agricultura já havia mostrado sua
importância a nível mundial, por oferecer produtos mais saudáveis e baratos,
proporcionando emprego para muitas pessoas, enquanto que as grandes
empresas rurais acabam optando por um pacote tecnológico que como
sabemos requer menos mão de obra, mais agrotóxicos e que afeta
diretamente os ecossistemas.
Em sua opinião os governos municipais, estaduais e federais estão
cheios de boas razões econômicas, ecológicas e sócio-culturais para que
realizem investimentos na agricultura familiar.
5. O BIOGRAFADO COMO SEMEADOR
O Instituto AgroFlorestal Bernardo Hakvoort (IAF), surgiu com a missão
de promover a conservação e enriquecimento dos remanescentes florestais,
bem como para a recuperação dos ambientes florestais já degradados, e
buscar a melhoria das condições de vida das famílias agricultoras que ali
residem, produzem e vivem, através do desenvolvimento da agricultura
familiar
sustentável,
baseada
na
agroecologia
(INSTITUTO
AGROFLORESTAL BERNARDO HAKVOORT). Atualmente desenvolve
vários projetos, organiza os Agricultores em grupos ou cooperativas, dando
sustentação para o desenvolvimento desses.
Hakvoort sempre insistia que: “(...) não podemos pensar pequeno, no
sentido de atingir poucos produtores, precisamos pensar grande; montar um
projeto que atinja o município inteiro” (HAKVOORT, 1998, p.10). E assim o
233
Instituto vem procurando estimular à produção a preservação com o intuito
de promover o desenvolvimento ecologicamente e socialmente correto do
município.
Ao narrar o que presenciava no município, Hakvoort chama atenção
para os projetos ecológicos e sua importância para o futuro da região:
Terra dos pinheirais até quando? Quando cheguei no Turvo,
20 anos passados, Turvo era rodeado por Pinheirais
fechados. Ninguém imaginava que isto iria mudar. Nos
últimos anos estão surgindo grandes “buracos” dentro desta
bela floresta. Os Pinheirais de Turvo estão ameaçados com
o desaparecimento. O rápido corte da floresta está se
tornando um desastre ecológico, econômico e sóciocultural. Sem as florestas de araucárias, Turvo não tem
futuro. Turvo esta matando a galinha que poderia botar ovos
de ouro. (HAKVOORT, 1998, p.35)
Sua atuação despertou a preocupação de algumas lideranças que
resolveram criar uma Organização Não Governamental, o IAF, que tinha por
objetivo apoiar a Agricultura Familiar na área agroflorestal, junto com os
proprietários das florestas e faxinais achar caminhos para a preservação
com uso deste importante ecossistema. Ao entender que a preservação não
é só responsabilidade dos proprietários, mas também de toda comunidade, o
Instituto desenvolve sistemas de manejo que aumentam a renda por alqueire
e passa a pesquisar alternativas que aumentem a renda dos proprietários
das florestas.“Vamos trabalhar juntos, para garantir que isto se torne
realidade. Deus criou este belo jardim das Araucárias. É responsabilidade de
todos nós respeitar e manter esta obra do senhor”.(HAKVOORT,1998, p.36).
Com relação à preservação das florestas e faxinais (muito presentes
ainda no município), destaca a importância de apoiarmos as pessoas que
fazem o possível para preservar as últimas florestas da araucária, para que
possa haver a preservação é preciso aumentar a renda na propriedade, mas
isso levando em conta todos os fatores que compõem a sustentabilidade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Após esta breve pesquisa sobre alguns aspectos da vida e do trabalho
de Bernardo Hakvoort em prol do desenvolvimento sustentável e da
234
agricultura familiar no município de Turvo, percebe-se que o biografado foi
um estudioso do município. Estudou seus aspectos geográficos como clima,
solo e relevo, além dos aspectos sociais, culturais e econômicos.
Era também um memorialista, afinal todo seu trabalho foi feito com um
olhar para o passado, com ênfase sobre as tradições e as técnicas utilizadas
pelos agricultores com o intuito de utilizá-las e preservá-las.
Foi ainda, um político, no sentido em que buscou representar a
população e lutar pelos seus interesses. Pode ser considerado também um
crítico pois conseguia vislumbrar as diferenças sociais e os conflitos da
sociedade na qual estava inserido.
A partir de seus escritos percebe-se sua preocupação com o turismo
em Turvo. Hakvoort acreditava que o município tinha possibilidade de se
tornar um dos mais importantes centros turísticos do Sul do País, pensava
em turismo de saúde – em virtude da rica flora de plantas medicinais.
Para atrair o interesse das pessoas de outras regiões ele acreditava
ser necessária uma ampla divulgação com fotografias das belas florestas de
araucárias e dos campos cobertos de camomila e outras ervas medicinais.
O aspecto histórico também era valorizado por Hakvoorth que costuma
dizer que Turvo era um município com uma população que tem uma rica
história e que era muito interessante falar com pessoas que ainda sabiam
como tinham vivido os seus antepassados. Em seu livro descreveu que
muitos moradores do município relatavam histórias de pais e avôs que
vieram da Europa. Outros relatavam casos de mestiçagem de imigrantes
europeus com os indígenas e abordavam o encontro dessas culturas
distintas.
O ambientalista gostaria de ter trabalhado na elaboração de um livro
sobre a história do Turvo, e queria que o mesmo fosse feito através da
pesquisa oral. Defendia também a implementação de um museu onde
ficariam guardados quaisquer “documentos” do passado: fotos, ferramentas,
pilões, rodas de água, carroças, etc, com espaço para todas as etnias
radicadas no Município. Seu interesse pela história leva em conta todas as
classes, etnias, e todos os aspectos, ou seja, valoriza coisas pequenas e
235
cotidianas, não fica só na história do desbravador ou da emancipação
política.
Em sua obra apresentou idéias que a seu ver poderiam tornar o Turvo
um município bonito e típico no meio dos pinheirais, com qualidade de vida e
e um grande histórico de preservação da sua história e do meio ambiente,
pretensão possível a seu ver, se houvesse interesse comum.
Esses são alguns aspectos que pudemos esboçar no espaço de um
artigo. O presente estudo não tem a pretensão de ser completo, todavia
aspira contribuir para a produção historiográfica de Turvo e suscitar novos
debates sobre os assuntos apresentados neste artigo e sobre a importância
da história biográfica ou da história de vida de pessoas como Bernardo
Hakvoorth.
REFERÊNCIAS
BARCELOS, Cezar Augusto; AZEVEDO, Francisca Nogueira e outros. Questões
de teoria e metodologia da história. Biografia e gênero. UFRGS, 2000.
BOURDIEU, Pierre. A ilusão biográfica. In: FERREIRA, M.; AMADO, J. Usos e
abusos da história oral. Rio de Janeiro: FGV, 1998.
HAKVOORT, Bernardo. Turvo no caminho do desenvolvimento sustentável.
Guarapuava: Editora da Unicentro, 1998.
IANNI, Octavio. O ciclo da revolução burguesa. Rio de Janeiro: Editora Vozes,
1984.
PRADO JUNIOR, Caio – História Econômica do Brasil. São Paulo: Editora
Brasiliense, 1997.
PREFEITURA MUNICIPAL DE TURVO. Turvo Cidade dos Pinheirais. Londrina:
Gráfica Modelo, 1987.
SITOGRAFIA
FENZL, Norbert. Desenvolvimento Sustentável e a Agenda 21. Disponível em:
<www.ufpa.br/amazonia21/publicacoes/agenda21>. Acesso em: 05 de jan. de 2007.
INSTITUTO AGROFLORESTAL BERNARDO HAKVOORT. Disponível em :
<http://www.institutoagroflorestal.org.br>. Acesso em: 25 de set. de 2007.
OUTRAS FONTES
VERCAUTEREN HAKVOORT, Agnes. Entrevista temática concedida em 06 de
jul. de 2007.
236
ESTUDO DE CASO SOBRE A MESORREGIÃO CENTRO-SUL
DO PARANÁ : ÍNDICES DE DESENVOLVIMENTO DOS
MUNICÍPIOS DA REGIÃO DE GUARAPUAVA
Profª.Ms. Cerize Nascimento Gomes - FG
Prof. Dr. Carlos Alberto Gomes - FG/UNICENTRO
RESUMO: Pretende-se com este artigo explorar dados divulgados pelo
Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (IPARDES) sobre a
Mesorregião Centro-Sul, que tem como pólo a cidade de Guarapuava. Serão
abordados também aspectos históricos e índices regionais que contenham
informações específicas sobre os municípios regionais e aspectos variados.
Averiguam-se também os movimentos sociais rurais existentes na Mesorregião. O
objetivo deste estudo é chamar a atenção da comunidade acadêmica para a
necessidade de conhecer a realidade social, econômica, cultural e política da região
de abrangência na qual se insere. Os dados apresentados devem exercer a função
de promover reflexões e debates com a finalidade de promover programas, projetos
e políticas públicas com poder de intervenção sobre a sociedade regional.
Palavras-Chave: Região. Contexto. Sociedade. Índices. Desenvolvimento.
INTRODUÇÃO
Este artigo é fruto de um trabalho de pesquisa realizado sobre os
dados referentes à mesorregião Centro-Sul do Paraná, da qual Guarapuava
é a cidade pólo. O objetivo que move esta pesquisa está relacionado à
desinformação ou desconhecimento sobre os índices de desenvolvimento
regional, sobre os quais se procurou realizar um trabalho bastante específico
que possa contribuir com novos estudos e propiciar a reflexão sobre a
necessidade de políticas públicas e programas sociais próprios para a região
contextualizada.
Para enriquecimento das informações sobre os municípios
apresentados
dados
do
Instituto
Paranaense
de
são
Desenvolvimento
Econômico e Social (IPARDES) e outros referenciais
considerados
importantes como o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e o Índice de
Gini, este último responsável pela identificação da desigualdade na
distribuição de renda.
237
Desse modo, este estudo pode ser útil para a promoção de um banco
de dados ou de uma rede de índices regionais que possam oferecer
contribuições no que diz respeito à elaboração de projetos de pesquisa e de
políticas
públicas
que
permitam
aos
professores,
estudantes
e
pesquisadores a intervenção sobre a sua realidade social. Para que isso
ocorra, é preciso, porém, algumas informações mais complexas que
permitam que os conhecimentos adquiridos na academia possam ter
aplicabilidade sobre o contexto social.
Considerando-se que os municípios regionais possuem os menores
índices de desenvolvimento humano do Paraná, e uma das maiores taxas de
desigualdade social, nos mais diversos aspectos. Esta pesquisa tem os
objetivos de aliar as teorias à práxis e de atuar no sentido de promover
projetos próprios em prol do desenvolvimento de ações que permitam a
intervenção acadêmica e social sobre a região de Guarapuava.
1. HISTÓRIA E DIVERSIDADE REGIONAL
Os estudos sobre a sociedade regional sugerem que algumas das
maiores distorções regionais podem ser compreendidas a partir da
combinação de dois tipos de fatores: os relativos ao processo de
colonização e de ocupação da terra e aqueles relacionados à dinâmica
sócio-cultural do desenvolvimento regional com tardia implantação e lento
desenvolvimento do ensino superior na região.
A historiadora Gracita Gruber Marcondes,
História de luta e trabalho, relata que com uma
no livro
Guarapuava:
área primitiva de 175.000
km2 , Guarapuava foi nos século XIX e XX, o maior município do Brasil . O
território fazia limite com o rio dos Patos (Ivaí) até o rio Paraná, de
Corrientes (Argentina) e dali até Goyo-En (Uruguai) até os Campos de São
João (Porto União). Seu povoamento foi o resultado de um processo
histórico iniciado no século XVIII, pela Real Expedição de Conquista e
Povoamento dos Campos de Guarapuava.(MARCONDES, 1998, p.70 e 71).
238
1.1.
Encontros étnicos
A partir de 1770, as terras até então habitadas por tribos indígenas
foram colonizadas pelos portugueses e pelos espanhóis. Colônias francesas
também foram estabelecidas na região. Estudos históricos confirmam que
enquanto
alguns grupos indígenas receberam
pacificamente os
colonizadores, outros ofereceram resistência à colonização européia.
A antropóloga Kumiye Tommasino, do Programa de Estudos de
Populações da Universidade Estadual de Maringá (UEM),
confirma a
presença dos kaingang e xokleng no planalto no sul do país, em áreas de
florestas subtropicais e de araucária, desde o Estado de São Paulo aos
estados da Região Sul. Ela
relata que quando as primeiras expedições
chegaram aos campos de Guarapuava, provocaram violentas reações por
parte dos habitantes kaingang e xokleng. Conta ela:
Foram onze expedições organizadas entre 1768 e
1774, pelo Tenente-coronel Afonso Botelho com o
objetivo de reconhecer e tomar posse das pastagens
naturais existentes no interior da Província. Em 1770,
a expedição comandada pelo Tenente Bruno Costa
chegou aos campos de Koran-bang-rê (atual
Guarapuava). Mais duas chegaram em 1771, uma
comandada pelo sertanista Martins Lustosa e outra
pelo Tenente Cândido Xavier. Os armamentos
incluíam peças de artilharia e todas as armas de
guerra da época (TOMASSINO, 2001, p.2).
Segundo a pesquisadora, a morosidade da conquista dos campos de
Guarapuava pode servir como elemento para confirmar a defesa que os
povos indígenas fizeram de seus territórios na região:
As reações dos índios foram violentas, marcadas por
ataques de ambas as partes, apesar da estratégia
dos brancos em angariar a confiança dos índios
levando-lhes presentes. Todas as expedições tiveram
de abandonar os Campos Gerais e só 40 anos mais
tarde retornaram, tendo maior sucesso no século XIX.
(...) A ocupação dos Campos Gerais foi retomada em
1810, quando nova expedição retornou para os
campos de Koran-bang-rê, com o claro objetivo de
obter a vitória contra os índios. Não se tratava mais
de escravizar índios ou vendê-los como escravos,
mas sim de conquistar suas terras, primeiro as áreas
de campos que podiam imediatamente servir como
239
pastagens para os rebanhos que acompanhavam as
expedições. Depois de três meses de guerras e
batalhas sangrentas, os Kaingang dos Koran-bang-rê
foram derrotados pelas tropas comandadas por Diogo
Pinto de Azevedo. (TOMASSINO, 2001,P.3)
A figura a seguir reproduzida faz parte de uma série de pinturas
realizadas durante as primeiras expedições feitas aos campos de
Guarapuava e que são bastante reveladoras sobre os primeiros contatos
entre os povos indígenas e os colonizadores europeus.
FIGURA 1
Tela em guache e aquarela, de autoria de José Miranda. Feita no século XVIII durante as
tentativas
de
colonização
dos
campos
de
Guarapuava.
Disponível
em:
pib.socioambiental.org/pt/povo/kaingang/287 . Acessado em 15 de agosto de 2010.
Mesmo com as dificuldades inerentes ao processo de conquista e
ocupação dos campos de Guarapuava, Marcondes (1998) argumenta que os
colonizadores aos poucos estabeleceram convivência com
os povos
indígenas e que muitos dos seus usos e costumes estão presentes no
cotidiano regional. Ela menciona alguns exemplos de costumes deles
herdados:
Entre outros cita-se o uso do mate frio (tererê), em
240
Cia de porungo; da carne sem tempero e assada na
brasa (no espeto ou no moquém, isto é, grelha de
varas); do poncho como agasalho para o frio (curucachá); o uso da rede e dos ranchos de chão batido;
a conservação da carne pela defumação e a
conservação do pinhão pela água corrente. (...)
Herdamos também os alimentos derivados de milho
(farinha de beiju, canjica, fubá e pipoca) e farinha de
pau (mandioca). A
cura de doenças pelo poder
medicinal das plantas, o uso do banho diário (...). (
MARCONDES, 1998,p.45 e 46)
A autora destaca ainda outros costumes e práticas culturais que
permanecem até os dias atuais, relacionando entre os mesmos o artesanato
de cestaria, inúmeros nomes próprios, como o próprio nome da cidade,
denominação de aves e de plantas, práticas como o mutirão e a queimada.
Referencia também brincadeiras infantis.
1.2.
Tropeiros e imigrantes
Os tropeiros de Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul tinham
a região como rota de passagem e influenciaram a formação regional. Eram
na sua maioria descendentes de portugueses, poloneses, italianos e
ucranianos. Desde o final do século XIX, constantes levas de imigração
trouxeram ainda suábios, libaneses, japoneses e espanhóis. Ao mesmo
tempo uniram-se aos europeus, povos árabes e asiáticos. Juntamente com
remanescentes de tribos indígenas e grupos africanos, fariam surgir uma
das regiões com maior diversidade étnica do Paraná.
O encontro entre tais etnias gestou um povo multifacetado, com um
repertório cultural vasto e sincrético, que faz parte do cotidiano da população
e que pode ser observado por meio de eventos culturais, gastronômicos e
religiosos, constantes do calendário dos municípios regionais.
O município de Pinhão realiza todos os anos a Festa do Pinhão; em
Entre Rios ocorre a Festa da Cevada, em Candói a Festa do Xarque e nas
aldeias indígenas a Festa do Milho, entre outras. Toda essa mistura de
cores, folclore, músicas, danças, lendas, pratos, crenças e gentes concede
à região um jeito próprio de ser e de viver, no qual o sincretismo cultural,
gastronômico e religioso se revela no cotidiano da população.
241
1.3.
Presença indígena
Atualmente, 32 mil indivíduos se identificam como índios no Estado do
Paraná, e desses, 14 mil residem em aldeias indígenas, conforme dados
elaborados a partir do Censo 2010. A informação é do Centro de Apoio
Operacional das Promotorias de Proteção às Comunidades Indígenas
(CAOP/MP, 2011). Os indígenas paranaenses ocupam uma área de
85.264,30 hectares de terras,
distribuída em 17 unidades de Terras
Indígenas (TI) que abrigam as etnias Kaingang, Guarani e remanescentes
do povo Xetá.
FIGURA 2
Mapa da distribuição das Terras Indígenas (TI) do Estado do Paraná. Disponível em:
http://www.indigena.caop.mp.pr.gov.br/modules/noticias/article.php?storyid=16.
Arquivo
acessado em 22 de setembro de 2011.
No que diz respeito às Terras Indígenas (TI), sob cuidados da
Fundação Nacional do Índio (FUNAI) de Guarapuava, estão as de Palmas,
242
situadas no município de Palmas(PR), e Abelardo Cruz (SC), com uma
população de 550 habitantes de origem kaingang e uma área de terras de
2.944 hectares; a de Ocoy, no município de São Miguel do Iguaçu, com
quase 200 habitantes de origem guarani, com uma área de 231,88 hectares;
a TI de Ivaí, localizada nos municípios de Manoel Ribas e Pitanga, com 800
habitantes de origem kaingang e uma área de 7.306,34 hectares; a reserva
de Rio D’Areia, no município de Inácio Martins, com uma população quase
100 habitantes de origem guarani, e uma área de terras de 1.280,56
hectares; a aldeia de Faxinal, no município de Cândido de Abreu com quase
500 habitantes de origem kaingang,
vivendo em uma área de terra de
2.049,89 hectares.
Além dessas terras indígenas, a Funai de Guarapuava responde
também pela TI de Rio das Cobras, a maior do Estado, com mais de 2.600
habitantes de origem kaigang, guarani e xetá, vivendo em uma área de
18.681, 98 hectares, dividida em nove aldeias indígenas. Duas outras
grandes aldeias encontram-se sob a mesma jurisdição: a TI de Marrecas
nos municípios de Guarapuava e Turvo, com cerca de 400 habitantes de
origem kaingang, com uma área de 16.538, 58 hectares
e
de
Mangueirinha, com mais de 1.500 habitantes de origem kaingang e guarani
e uma área de terras de 17.308,07 hectares.
Além de práticas agrícolas, o artesanato com base na cerâmica e na
cestaria representa uma fonte de renda para os indígenas. Cestos, colares e
acessórios,
vasos e panelas de barro modelado, bichos talhados em
madeira são típicos da região. Pintura e desenhos abstratos são usados
para colorir seus trabalhos.
O repertório de lendas relacionadas aos povos indígenas é bastante
amplo. A luta pela terra e a guerra contra os colonizadores
envolvem
personagens estudados nos livros de história regional, mesmo assim a
presença dos grupos indígenas é pouco valorizada e sua história pouco
explorada. A Secretaria de Estado da Educação confirma que:
O Estado tem 27 escolas em áreas indígenas, 21
municipais, quatro federais e duas estaduais. Dos
243
2.035 alunos indígenas, 1.482 estão cursando de 1ª a
4º série; 223 estão na pré-escola; 120 cursam de 5ª a
8ª séries; 60 estão no ensino médio; e, 25 índios
fazem cursos superiores. São 150 professores, dos
quais, 83 são kaingangs e guaranis. (SEED/PR, 2011)
As políticas públicas voltadas para as aldeias são raras e os
programas sociais insuficientes. Nesse sentido, as Instituições de Ensino
Superior (IES),
poderão contribuir para a promoção de pesquisas e
projetos específicos sobre as populações indígenas.
1.4.
Comunidades quilombolas
O Programa Brasil Quilombola luta pela promoção da igualdade racial
e pela regularização de territórios quilombolas , além da identificação de
“terras de faxinais” e outras comunidades tradicionais . Trata da definição de
questões, cujo impacto social resulta na inserção dos agricultores para que
com suas terras regularizadas, tenham acesso às políticas agrícolas de
crédito, previdenciárias e fiscais, dos governos Estadual e Federal.
Estudiosos
definem
quilombo
como
forma
de
organização
sociopolítica, com conceito de resistência, para além do contexto da
escravidão, estendendo-o às dinâmicas étnicas pela posse da terra, ocorrida
após a abolição. No Paraná existem comunidades quilombolas em pelo
menos 16 municípios . No Centro-Sul elas se encontram em Guarapuava,
Candói, Palmas e Turvo. A comunidade mais conhecida é a de Invernada
Paiol de Telha Fundão:
A comunidade de Invernada Paiol da Telha está
localizada em Guarapuava, no estado do Paraná. Ela
é composta por 200 famílias. Foi o primeiro quilombo
reconhecido no Paraná pela Fundação Cultural
Palmares, o que aconteceu em 2005. A padroeira da
comunidade é Nossa Senhora das Graças. A
comunidade está dividida em quatro núcleos urbanos, assentamento, Pinhão e Reserva do Iguaçu.
É com o que cultivam em roças que os quilombolas
sobrevivem neste local. As condições de vida aqui
são precárias: não há telefonia pública ou energia
elétrica e o transporte público está disponível apenas
três vezes por semana.(…) Não existe escola na
comunidade e as crianças e os jovens frequentam
estabelecimentos de ensino da Colonia Vitória, no
244
distrito de Entre Rios. (FUNARTE, 2010)
Conforme o fascículo 11, da Nova Cartografia Social dos Povos e
Comunidades Tradicionais do Brasil, publicado em 2008, com ISBN 8586037-20-6, disponibilizado pelo Governo Federal , a Invernada Paiol de
Telha, também conhecida por Fundão cuja área é de 29.778.000 m2, é parte
da fazenda Capão Grande, situada no Distrito de Pedro Lustosa, Município
de Reserva do Iguaçu, Comarca de Pinhão. (HARTUNG, 2008)
Essa comunidade vive um histórico de resistência e luta por uma área de
terras herdadas por meio de testamento feito por Balbina Francisca de
Siqueira, que teria deixado aos seus escravos uma área de 3.600 hectares,
na década de 1860, sendo essa área motivo de disputa entre negros e
colonizadores, praticamente desde que o testamento foi lido.
Segundo a antropóloga Mirian Hartung, as famílias não só residiam nas
terras como dela retiravam o seu sustento, praticando uma agricultura de
subsistência juntamente com a criação de animais destinados ao consumo
da comunidade. Durante quase um século, os herdeiros e as gerações que
se seguiram residiram comunitariamente na área recebida em 1866,
conforme se pode verificar na Certidão emitida em 1977 pela Vara Cível da
Comarca de Guarapuava (HARTUNG, 2008).
No fascículo, a autora relata que em 1940
a comunidade entrou com
um processo reivindicando a reintegração das terras que haviam sido
desmembradas. Na década de 1960, as terras continuaram a ser divididas,
contrariando a cláusula de inalienabilidade que consta no testamento e
novos processos foram impetrados pela comunidade. Para a antropóloga, a
luta pela posse da terra aprofundou-se após esse processo, que reduziu a
área original de 3.600 hectares para 1.245 hectares.
Sobre a organização dos quilombolas, o pesquisador Valmir Jocoski, em
Estudos sobre a organização política e a
representatividade social da
Comunidade Quilombola Invernada Paiol de Telha Fundão, escreve:
Politicamente, sabe-se que a partir de 1995, a
Comissão Pastoral da Terra – CPT, incentivou a
245
formação de uma associação com a finalidade de
organizar legalmente as ações comunitárias, o que
teria resultado na criação da Associação PróReintegração da Invernada Paiol de Telha,
comunidade para descendente de escravos,
definida como - Associação Civil sem fins lucrativos
sob a inscrição 01.194.255/001-03, com endereço à
o
o
Rua XV de Novembro, N 3466, 4 andar, sala 404,
Guarapuava-Paraná. (JOCOSKI, 2011, p.98)
Sobre o apoio
de entidades estaduais, regionais e municipais,
Jocoski realizou uma pesquisa sobre os quilombolas e averiguou algumas
das principais manifestações recebidas:
Nos primeiros passos da pesquisa foram
encontradas evidencias sobre o apoio de várias
entidades estaduais, principalmente sindicais, que
teriam se manifestado em prol da causa dos
quilombolas de Paiol de Telha, entre elas a
Associação de Professores do Paraná (APP –
Sindicato), Sindicato dos Bancários de Curitiba;
ACNAP (Associação Cultural Negritude e Ação
Popular); Comissão Pastoral da Terra, SISMMUC
(Sindicato dos Servidores Municipais de Curitiba),
Instituto Afro-brasileiro, setorial de negros e negras
do PT, Coletivo de Mulheres Negras. Além dessas
entidades, na região de Guarapuava, a Associação
de Paiol de Telha teria conseguido o apoio da
Pastoral da Terra, Pastoral Operária e Pastoral da
Criança, do Diretório Municipal do PT, da
Associação de Famílias de Trabalhadores Rurais de
Pinhão- AFATRUP, do Sindicato dos Servidores
Públicos e Professores Municipais de Guarapuava e
do Núcleo Sindical da APP - Sindicatos. (JOCOSKI,
2011, p.98)
O apoio das instituições nominadas tem o objetivo de
movimento
quilombola,
porém,
mesmo
com
muitas
fortalecer o
décadas
de
enfrentamento judicial, a conquista do documento de reintegração e de
posse da área é uma demanda difícil.
Importa saber que, sem a posse da terra reivindicada, os habitantes de
Paiol de Telha Fundão não podem dispor de crédito e nem participar de
programas executados pelos organismos públicos, o que torna inviáveis os
projetos da comunidade.
246
2. A QUESTÃO AGRÁRIA E OS MOVIMENTOS SOCIAIS
A região de Guarapuava é uma das maiores produtoras de trigo, soja,
milho, batata-inglesa, cevada e feijão do Brasil. A criação de gado de corte
e leiteiro, ovinos, caprinos, eqüinos e aves também faz da região, uma
referência econômica
para o Brasil. Tecnologias européias são usadas
pelos criadores.
Porém, mesmo com toda essa produtividade agrícola, a mesorregião
tem os menores Índices de Desenvolvimento Humano – IDH, do Estado e a
cidade pólo
de Guarapuava é envolta por um cinturão de pobreza e
problemas sociais que estimulam o surgimento de movimentos populares .
A questão agrária, é uma das maiores causas de conflitos regionais e
contempla, além da luta de povos indígenas e quilombolas, grupos de
agricultores que vivem em sistema de faxinais, posseiros e sem terras.
FIGURA 3
Mapa constante do arquivo da Comissão Pastoral da Terra (CPT), Regional do Paraná. A
maior parte dos assentamentos foi feita no Centro e no Centro-Sul paranaense, a região
mais pobre do Estado. Disponível em : http://www.cpt.org.br - Acessado em 10 de junho de
2010.
247
A política agrária possibilitou o crescimento de latifúndios e
a
mecanização dessas propriedades promoveu ao longo dos anos a migração
de pequenos agricultores para a área urbana, na qual ocuparam a periferia
e passaram a viver em condições de extrema pobreza.
A organização dos pequenos agricultores, a partir dos anos de 1980
, fez com que a região, juntamente com o Sudoeste do Paraná, se tornasse
cenário de ressurgimento do Movimento Sem Terra – MST. Associações,
cooperativas e sindicatos foram instituídos para defender a sustentabilidade,
a agroecologia e a autonomia de pequenos produtores. O exemplo dos
faxinalenses de Turvo e dos posseiros de Pinhão, bem como dos
agricultores familiares organizados em
Associações de Pequenos
Agricultores - APAS são comuns na região.
Um dos melhores exemplos desse tipo de associação é o da
Cooperativa de Produtos Agroecológicos e de Artesanato ( COOPAFLORA),
do município de Turvo. A mesma é
responsável pela produção e
comercialização de ervas medicinais e atua também com programas de
preservação de plantas características da floresta regional, algumas das
quais são comercializadas também para manipulação de cosméticos. A
produção da cooperativa é comercializada em nível nacional e internacional.
Com todos esses movimentos, a Comissão Pastoral da Terra (CPT)
realiza anualmente aproximadamente 16 romarias da terra na região,
reunindo agricultores de vários movimentos e municípios, com organizações
sociais e pastorais. O interesse da
CPT é preservar também a cultura
dessas pessoas e desses movimentos. Com esse fim, reúne agricultores
para realizar o que chama de mística da terra, uma manifestação na qual
se celebra a vida do camponês, bem como sua reza, sua arte, sua luta, sua
alegria e sua dor, seus costumes e suas tradições. (CPT, 2010).
3. A MESORREGIÃO CENTRO-SUL
A mesorregião Centro-Sul do Paraná abrange 29 municípios de três
248
microrregiões (Guarapuava, Pitanga e Palmas) e uma população estimada
em
533.317 pessoas. Sua área territorial é de 26.409,78 km². O maior
núcleo urbano dessa divisão político-administrativa é Guarapuava, sede da
mesorregião.
Os municípios da região de Laranjeiras do Sul, apesar de
pertencerem geograficamente a Mesorregião de Pato Branco, realizam com
Guarapuava uma série de projetos e convênios comuns, o que amplia a
atuação regional para aproximadamente 40 municípios o que representa
uma população estimada em um milhão de habitantes.
A relação de Guarapuava com essa vasta região está relacionada à
sua grande área primitiva, da qual se emanciparam os municípios em
questão. Essa antiga ligação territorial se manifesta atualmente em termos
políticos, econômicos e sociais que precisam de
projetos comuns para
promover ações entre os diversos municípios regionais.
FIGURA 4
249
Mapa expandido da região de abrangência de Guarapuava com os municípios
pertencentes à região de Laranjeiras do Sul. ( Dados cartográficos consultados em 2011)
Todos os municípios da Centro-Sul apresentam IDH abaixo da média
paranaense, sendo o índice de renda per capita o que registra condições
mais críticas. A dificuldade de geração de emprego faz com que 1/3 das
famílias encontre-se em situação de pobreza. Sete dos dez municípios mais
pobres do Paraná situam-se no Centro-Sul do Estado.
Dez (10) entre os trinta (30) municípios com menor IDH no Paraná
pertencem a mesorregião de Guarapuava. São eles: Mato Rico, Reserva do
Iguaçu, Laranjal, Santa Maria do Oeste, Cândido de Abreu, Rio Bonito do
Iguaçu, Palmital, Altamira do Paraná, Goioxim e Cantagalo.
4. DADOS REGIONAIS DO IPARDES
Os dados que serão mencionados em seguida servem como indicador
250
dos problemas sociais representados pelas
graves distorções regionais
apontadas pelo Índice de Gini e o IDH regional. Analisando-se os dados
estudados, juntamente com as informações do IPARDES, pode-se afirmar
que a mesorregião Centro-Sul é marcada por fortes desigualdades entre as
cidades e a população, o que define a estrutura econômica e as relações de
trabalho da região.
Pessoas em situação de pobreza integram a população calculada em
função da renda familiar per capita de até 1/2 salário mínimo. Os dados
referentes à Situação de Pobreza são provenientes dos microdados do
Censo Demográfico (IBGE) e das tabulações especiais feitas pelo IPARDES.
Sua composição social incorpora dois segmentos sociais marcados
por lutas para superar a pobreza: 60% das áreas indígenas e 40% das áreas
de assentamento do Estado do Paraná. (IPARDES, 2004).
O total de famílias pobres no Centro-Sul representa mais de 20% da
população estadual. Deste percentual, mais de 65% residem em áreas
urbanas. Segundo informações da seção das Famílias Pobres no Paraná
(IPARDES, 2004), o município de Guarapuava é considerado com elevado
contingente de pobres, menor ou igual a 40% do total de famílias.
Entre os municípios que formam a mesorregião Centro-Sul, Turvo,
Boa Ventura de São Roque, Candói, Cantagalo, Santa Maria do Oeste,
Palmital, Pitanga e Pinhão – são considerados municípios críticos, pois
apresentam mais de 40% do total de famílias pobres.
4.1.
Mapeamento social
Os municípios de baixo grau, considerados passíveis de intervenção
social em virtude do baixo IDH e do alto índice de desigualdade social são:
Mato Rico, Palmital, Santa Maria d’Oeste, Boa Ventura de São Roque,
Turvo, Campina do Simão, Goioxim, Cantagalo, Marquinho, Laranjal, Nova
Laranjeiras, Espigão Alto do Iguaçu, Quedas do Iguaçu, Rio Bonito do
Iguaçu, Porto Barreiro, Coronel Domingos Soares, Honório Serpa,
Clevelândia, Inácio Martins. Tais municípios mantém até 60% das pessoas
251
em domicílios rurais.
FIGURA 5
O mapa de famílias pobres apresenta os aspectos mais relevantes nas cores mais
escuras. A mesorregião de Guarapuava tem os maiores índices de pobreza (IPARDES,
2004)
Os municípios de tipologia médio baixo possuem baixa densidade. O
crescimento da população é negativo e com dependência urbana, ocupação
no campo e moradia urbana. Entre esses estão: Pinhão, Reserva do Iguaçu,
Mangueirinha, Candói, Laranjeiras do Sul, Virmond e Pitanga.
No município classificado como médio, Foz do Jordão, mais próximo
de Guarapuava, existem boas condições de saneamento, economia voltada
à agricultura, baixa densidade demográfica e boas condições de moradia. Já
em relação os municípios classificados com desenvolvimento médio alto,
Guarapuava e Palmas, são considerados casos isolados.
FIGURA 6
252
O mapa informa o grau de urbanização das regiões. As cores claras representam os
municípios com menores índices de investimentos em infraestrutura urbana. A região de
Guarapuava tem os piores desempenhos do Estado.
FIGURA 7
O mapa reproduz nas cores claras os municípios sem banheiro interno e sem infraestrutura sanitária. A região mais clara do mapa reflete os maiores problemas, ou seja, a
Mesorregião de Guarapuava. (IPARDES, 2004)
253
FIGURA 8
O Índice de Gini representa o nível de concentração de renda e identifica os níveis
de desigualdade social. As cores escuras refletem as áreas com maior concentração de
renda e altas taxas de pobreza.. A região de Guarapuava demonstra o maior índice do
Estado. (IPARDES, 2004)
O Coeficiente de Gini é um parâmetro internacional usado para medir
a desigualdade de distribuição de renda entre os países. O coeficiente varia
entre 0 e 1, sendo que quanto mais próximo do zero, menor é a
desigualdade de renda num país, ou seja, melhor a distribuição de renda.
Quanto mais próximo do um, maior a concentração de renda num país. O
Índice de Gini do Brasil demonstra que nosso país tem uma alta
concentração de renda. No Paraná, a região de Guarapuava é a que
apresenta a maior desigualdade social do Estado.
Essa
realidade
extrapola a beleza dos aspectos físicos e os
excelentes índices de produtividade agrícola e pecuária, porque uma vez
que a geração de renda está concentrada nas mãos de poucas famílias, a
pobreza recai sobre o
universo social, no qual é
representada por
subnutrição, desemprego, falta de habitação, saúde e educação.
254
5. REPRESENTATIVIDADE POLÍTICA E SOCIAL
As Associações de Municípios do Paraná (AMP) são entidades
representativas dos municípios, habilitadas para integrar órgãos colegiados
da administração pública estadual ou indicar seus representantes, bem
como firmar convênios com o poder público estadual nos diversos setores de
atividades da administração pública.
Existem 18 associações do gênero no Estado do Paraná, integrando
praticamente todos os municípios em torno de ações e projetos coletivos.
Há muitos anos o município de Guarapuava não participa ativamente
de nenhuma dessas associações. Seu histórico é de práticas políticas
isolacionistas.
Já os Arranjos Produtivos Locais (APL) são concentrações de
indústrias de um mesmo segmento ou de atividades complementares em
uma mesma região. Os APLs propiciam ações conjuntas, como compra de
matérias-primas,
consórcios
para
exportação,
compartilhamento
de
tecnologias e capacitação de mão-de-obra.
Sobre a importância dos APLs o site oficial da Rede de Arranjos
Paranaense informa:
A Rede Paranaense de Apoio aos Arranjos
Produtivos Locais (Rede APL Paraná) é formada por
instituições do Governo estadual, Sistema FIEP,
Sebrae-PR, BRDE, Banco do Brasil, Bradesco,
IBQP e Curitiba S.A. Tem como objetivo
proporcionar maior articulação entre os diversos
atores que realizam ações nos APLs.A implantação
e consolidação dos APLs é fundamental ao
desenvolvimento pretendido para o Estado. Para
isso é necessário estruturar planos, estudos e ações
de apoio e promoção ao desenvolvimento de
empresas/instituições que estejam localizadas em
regiões com clara especialização produtiva, de
modo a permitir maior efetividade e melhores
resultados econômicos dos APLs.(Rede APL
Paraná, 2011).
O resultado da organização de APLs é que as indústrias ganham em
escala, reduzem custos e conseguem ser mais competitivas. Atualmente o
Paraná tem 22 APLs consolidados, que geram mais de 60 mil empregos.
255
Guarapuava não integra nenhum arranjo produtivo em prol do
desenvolvimento industrial.
FIGURA 9
Mapeamento dos Arranjos Produtivos Locais (APL) feitos pela Secretaria de Estado da
Indústria e do Comércio (GOVERNO DO ESTADO, 2006).
Dados sobre as 10 maiores economias do Paraná publicados em 2006
pelo IPARDES, colocavam Curitiba em primeiro lugar com um Produto Bruto
(PIB) de R$ 32.153.307 mil correntes e uma participação de 23,5 % . Em
segundo lugar, o município de Araucária, com R$8.437.759 de PIB e
256
participação de 6,2%. Em terceiro lugar está São José dos Pinhais, com R$
7.034.113 e uma participação de 5,1% no PIB. Em quarto lugar, Londrina
com R$6.612.093 e uma participação de 4,8% no PIB do Estado.
A partir das cinco maiores economias, a participação no PIB nos outros
cinco municípios que seguem é relacionada a partir de 4,0%, a saber: em
quinto lugar, Foz do Iguaçu, com R$5.467.714 e 4,0% de participação. Em
sexto lugar, Maringá, com R$ 5.275.927 mil correntes e 3,9% de
participação. Em sétimo lugar está Ponta Grossa, com R$ 4.382.467 e 3,2%.
Em oitavo lugar, Paranaguá, com R$4.125.923 e 3,0%. Em nono lugar,
Cascavel, com R$3.229.991 e uma participação de 2,4%. Finalmente, em
décimo lugar, com R$1.908,615 mil correntes, aparece o município de
Guarapuava, com 1,4% de participação no PIB do Estado.
Tais índices demonstram que em Guarapuava, as ocupações
industrial e terciária não têm alcançado dinamismo suficiente para gerar
emprego e
absorver a população economicamente ativa. O município
apresenta uma alta taxa de desemprego. Sua população abaixo da linha de
pobreza é estimada em 24,85%. O Índice de Gini é de 0,640 (2006).
Apesar dos dados utilizados serem em sua maioria de 2004, 2006 e
2008, isso não significa que houve tempo para grandes transformações no
quadro regional e municipal. Isso significa que em termos comparativos,
mesmo com algumas pequenas mudanças, o contexto deve manter o
mesmo padrão de desenvolvimento.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Marcada por características que elevam sua desigualdade econômica
e social, a Mesorregião Centro-Sul, tem Guarapuava como cidade pólo. A
região convive com grandes distorções, apresenta o maior índice de famílias
pobres e o menor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do Estado.
A baixa geração de emprego faz com que 1/3 das famílias encontrese em situação de pobreza. Sete dos 10 municípios mais pobres do Paraná
pertencem a mesorregião estudada. 10 entre os 30 municípios com menor
257
IDH no Paraná pertencem a mesorregião em questão. Os casos de
municípios com alto grau de desenvolvimento são isolados e estão
relacionados a dois municípios, Guarapuava e Palmas.
Todos os aspectos positivos da região: índices de produtividade agrícola,
pecuária qualificada internacionalmente, riqueza histórica, potencial étnico,
diversidade cultural, movimentos sociais expressivos, programas de
sustentabilidade ambiental e agrícola perdem o sentido diante da divulgação
das informações e dos índices que colocam em evidência os aspectos
negativos da mesorregião. Os mais preocupantes estão relacionados aos
direitos básicos do ser humano: habitação, educação e saúde.
A manutenção da linha de pobreza e a baixa renda per capita são
sinônimos da resistência e da luta de grupos sociais e de comunidades
excluídas que lutam por melhores condições de vida e que sonham com
melhores dias.
O desemprego e o baixo poder aquisitivo da população estão
relacionados à falta de infra-estrutura urbana, falta de representatividade
política e social e também à falta de investimentos em arranjos produtivos
locais que pudessem estimular o desenvolvimento industrial da região.
Todas essas características apontam para a abertura existente aos
mais diversos campos de pesquisa acadêmica, com oportunidade para
desenvolvimento de novas temáticas, formação de grupos de estudos e
intercâmbio com universidades, fundações e institutos de pesquisa.
A conclusão é que as instituições de ensino superior e de pesquisa
devem assumir a linha de frente na apresentação de projetos que possam
efetivar novas perspectivas e articular parcerias entre a sociedade civil e as
esferas governamentais, municipal, estadual e federal.
Conclui-se que, apenas por meio do desenvolvimento de programas
próprios para a mesorregião de Guarapuava poderá ocorrer a devida
intervenção e a necessária transformação da região por meio de políticas
públicas e ações sociais comprometidas e competentes.
REFERÊNCIAS
258
HARTUNG, Mirian. Nova Cartografia Social das Comunidades Tradicionais
do Brasil – Invernada Paiol de Telha Fundão. Fascículo 11. Curitiba: SEED/PR,
2008.
JOCOSKI, Valmir.
Estudos sobre a organização política e a
representatividade social da Comunidade Quilombola Invernada Paiol de
Telha Fundão. Revista Contato Social. Guarapuava: Faculdade Guarapuava, 2011,
p.97 a 103. Disponível em: http://www.faculdadesguarapuava.br.
MARCONDES, Gracita. Guarapuava: História de luta e trabalho.
Guarapuava: Unicentro, 1998.
SITOGRAFIA
TOMASSINO, Kimiye. Kaingang: histórico do contato. Maringá: UEM, 2001.
Disponível em: http://pib.socioambiental.org/pt/povo/kaingang/287. Acessado em
21 de setembro de 2010.
OUTRAS FONTES
CENTRO DE APOIO OPERACIONAL DAS PROMOTORIAS DE PROTEÇÃO ÀS
COMUNIDADES INDÍGENAS
COMISSÃO PASTORAL DA TERRA - REGIONAL DO PARANÁ
FUNDAÇÃO NACIONAL DE ARTES (FUNARTE)
PROGRAMA BRASIL QUILOMBOLA
REDE DE ARRANJOS PRODUTIVOS LOCAIS PARANÁ
SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO – SEED/PR. Educação indígena.
Projetos de pesquisa experimental das engenharias Civil e
Elétrica em prol do desenvolvimento sustentável
PROJETO DE GERAÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA A PARTIR
DE ENERGIA SOLAR E EÓLICA PARA ATENDER CONSUMO
RESIDENCIAL
Alessandro Ricardo Karam
Renan Aparecido Bazza
Arminson Michel Erdmann
Gilson Auda
Engenharia Elétrica – FG
259
Orientador : Prof. Ms. Edson Luiz Schultz
RESUMO : O presente trabalho visa demonstrar a utilização de gerador eólico e/ou
gerador fotovoltaico de pequeno porte para suprir parte ou totalmente a energia
elétrica consumida em uma residência, reduzindo custos sem causar danos ao
meio ambiente. Esses sistemas se tornam eficientes principalmente se a aplicação
for para lâmpadas LED (Diodo Emissor de Luz) que tem baixo consumo
aumentando a eficiência energética da residência.
Palavras-chave : Energia. Eletricidade. Consumo. Gerador. Meio Ambiente.
INTRODUÇÃO
Considerando-se que atualmente a demanda de energia elétrica é
alta e tende aumentar, que grande parte da energia mundialmente gerada é
a custo de combustíveis fósseis e em nosso planeta já evidenciamos em
alguns lugares danos ao meio ambiente e ao ser humano devido a poluição
emitida por esses tipos de geradores de energia, portanto, a busca de novas
fontes alternativas limpas e renováveis se faz necessária para a minimização
dos efeitos decorrentes dessa situação.
No Brasil observa-se que ainda não é tão impactante a utilização de
geração a partir de combustíveis fósseis. A hidroeletricidade ainda é a
principal fonte de energia explorada, porém, os recursos hídricos estão se
esgotando, grandes usinas já não são mais autorizadas devido ao impacto
ambiental
por
inundarem
grandes
áreas,
causando
prejuízos
incomensuráveis para a fauna e a flora.
Com a conseqüente diminuição da geração hidrelétrica, outra fonte
deve ser explorada e a tendência é a utilização das termelétricas a gás
natural, uma vez que as mesmas poluem menos que óleo combustível e
carvão mineral.
Analisando-se tal cenário, surge uma proposta interessante e que já
vem sendo utilizada de forma alternativa em vários países europeus e
atualmente nos EUA: a casa sustentável ou casa verde ou green house, que
consiste em uma residência que aproveita os recursos naturais para se
manter em termos de energia, utilizando-se da força dos ventos e da luz e
260
calor solar. Aliado a esse tipo de geração de energia, pode-se melhorar a
eficiência energética utilizando-se parte da iluminação da casa através da
tecnologia LED.
5. MATERIAIS E MÉTODOS
A metodologia proposta para o desenvolvimento da pesquisa para
este projeto terá como base a pesquisa aplicada cujo trabalho deverá ser
dividido em três etapas:
a) A
pesquisa
aplicada ou
pesquisa tecnológica
irá
definir
conhecimentos básicos para a aplicação prática, a qual será focada para a
solução de problemas específicos de acordo com o interesse do projeto.
Reconhecendo, portanto, que a pesquisa aplicada para este projeto e as
áreas afins resultará em benefício para todos da comunidade acadêmica e
em geral.
b) Pesquisa bibliográfica é o primeiro passo para entender um tema e
para a construção efetiva do saber de um determinado assunto. Os
objetivos, geral e específicos da presente pesquisa, estão ligados
diretamente à relevância do tema e portanto estão relacionados com a
profundidade que os acadêmicos proponentes deste projeto irão tratar das
suas fontes e dos métodos científicos que serão utilizados para o
desenvolvimento da pesquisa.
c) Em um terceiro momento, aplicar-se-á a pesquisa experimental, a
qual permitirá que o projeto seja desenvolvido e construído por meio de
protótipos próprios para comparações entre a teoria e a prática.
6. RESULTADOS E DISCUSSÕES
O projeto acadêmico em questão consiste em desenvolver um
gerador eólico portátil, utilizar-se de um gerador fotovoltaico para pequenas
cargas e desenvolvimento de lâmpada led para agregar-se a residência que
261
se utilizará dessa tecnologia, a fim de reduzir o consumo e tornar viável a
instalação desses geradores.
As características deste projeto são:
a) Fornecer uma tensão de alimentação de aproximadamente 12Vcc nos
terminais dos geradores.
b) Acumular a energia gerada pelos geradores em baterias;
c) Distribuir a energia acumulada nas bateria para um sistema de
iluminação utilizando o
L.E.D( Diodo emissor de Luz) no período
noturno e demais cargas de baixo consumo.
2.2.
Potencial eólico
No Brasil, o potencial eólico é favorável para expansão de energia
através do vento. Localmente, Guarapuava que está situada a 1070m acima
do nível do mar, foi selecionada para a estatística descritiva dos ventos na
área central do Paraná, segundo Rafael Cabral Gonçalves (2010). Nos
meses de julho a setembro, a velocidade média dos ventos é de 16,8m/s e
de outubro a dezembro é de 17,3m/s. Nos meses de abril a junho, é de 14,3
m/s e de janeiro a março é de 14,7 m/s. Isto indica que a região de
Guarapuava é favorável para a construção de geradores eólicos.
2.3.
Potencial fotovoltaico
Devido a energia solar ser uma fonte inesgotável, limpa e disponível o
ano todo no globo terrestre, torna-se uma opção para conversão de energia
luminosa em elétrica. Potencial esse que pode ser explorado de forma
sustentável sem que cause danos ao meio ambiente.
262
2.4.
Geradores
O sistema eólico é composto por uma hélice que utiliza a energia dos
ventos para movimentar-se e transmitir essa energia cinética a um gerador
que converterá a energia mecânica em elétrica
O gerador fotovoltaico utiliza-se diretamente da luz solar que é
captada pelas placas solares e através de um efeito chamado fotovoltaico,
que transforma a energia luminosa em elétrica.
2.5.
Armazenamento da energia elétrica
A energia gerada será acumulada em uma ou mais baterias que serão
fontes das cargas associadas a essas. Para o nosso projeto utilizaremos
baterias de 12 Vcc de tensão e 4,5 A/H de capacidade de corrente em uma
hora.
2.6.
Sistemas de iluminação
A tecnologia de iluminação para esse projeto será a partir de lâmpadas
LED (Diodo Emissor de Luz) devido o baixo consumo, tornando viável o tipo
de geração.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O objetivo principal desse projeto é mostrar a viabilidade da utilização
de fontes alternativas, bem como cargas de baixo consumo para atender as
necessidades do consumidor de uma forma sustentável e limpa.
Por meio de iniciação e capacitação científica, os acadêmicos da
Faculdade Guarapuava poderão se
posicionar um passo a frente em
relação ao futuro, no qual certamente haverá escassez energética a partir
das fontes tradicionais.
263
Desse modo, por meio da atuação de professores e estudantes do
Curso de Engenharia Elétrica, pretende-se contribuir significativamente com
novas ações ambientais que possam prevenir o desgaste de recursos
indispensáveis à vida humana.
REFERÊNCIAS
PALZ, Wolfgan. Energia Solar e Fontes Alternativas. Curitiba: Hemus SA, 2002.
BONJORNO, José Roberto. Física 3 Eletricidade – Editora FTD, 1992 volume 3;
PROJETO PARA CONTENÇAO DE TALUDES COM PNEUS
INSERVÍVEIS
Bruna Caitano Orizio
Talita Gadens Rosario
Douglas Rodrigues Leonel
Engenharia Civil – FG
Orientador – Prof. Edson Schultz
RESUMO: Este trabalho define brevemente o que são taludes e o que é contenção,
além de apresentar a utilização de pneus inservíveis como alternativas aos
métodos já utilizados na contenção de taludes, apresentando-se menos impactante
ao meio ambiente e de baixo custo, resolvendo também um problema de descarte
de resíduos. Por fim são apresentados dois casos, já estudados, em que os pneus
são usados para a contenção de taludes.
Palavras-Chave: Taludes. Contenção. Resíduos. Pneus.
INTRODUÇAO
Com a atual industrialização, a geração de pneus inservíveis vem
crescendo a cada dia no mundo todo. O pneu é um resíduo de difícil
degradação e leva cerca de 150 anos para se decompor. Fontes revelam
que cerca de 2 milhões de novos pneus são fabricados todos os dias no
mundo. Isto quer dizer que anualmente são fabricados 730 milhões de novos
pneus. Ao mesmo tempo, cerca de 800 milhões de unidades são
transformadas em sucata por ano.
264
Todo esse detrito é depositado em lixões, aterros, terrenos baldios e
em locais abertos, formando grandes pilhas e acumulando água da chuva,
tornam-se um lugar propicio a proliferação e reprodução de mosquitos
Aedes aegypti, transmissor da febre amarela e da dengue.
Em 1999 entrou em vigor a resolução n°258 do Consel ho Nacional do
Meio Ambiente – CONAMA, que proibiu o descarte inadequado de pneus
inservíveis e obrigou empresas e fabricantes a darem um destino adequado
ao rejeito existente em território nacional. Dessa forma, as empresas, com a
ajuda de órgãos não governamentais ou por iniciativa própria, foram
obrigadas a implantar alternativas ambientalmente corretas de destinação
aos pneus inservíveis.
A necessidade de se desenvolver novos métodos para o proveitamento
do material vem crescendo. Com o avanço da tecnologia, novas alternativas
foram surgindo para o aproveitamento dos pneus. Uma técnica bastante
promissora que tem sido utilizada, ainda que em pequena escala, é a
utilização na contenção de taludes. O uso deste método é de grande
vantagem, pois o material é de grande eficiência mecânica e de baixo custo.
Na grande maioria das vezes o material pode ser obtido de forma gratuita
trazendo como alternativa um custo/benefício bastante atrativo.
Além disso, a técnica contribui para a preservação do meio ambiente,
visto que possui um alto consumo de pneus, contribuindo assim, para a
redução do rejeito no meio ambiente.
Talude pode ser definido como uma superfície inclinada que delimita um
maciço terroso ou rochoso. A contenção, segundo Ranzini (1998, apud Silva,
2006, p.49) “é todo elemento ou estrutura destinado a contrapor-se a
empuxos ou tensões geradas em maciço cuja condição de equilíbrio foi
alterada por algum tipo de escavação, corte ou aterro. A contenção é feita
pela introdução de uma estrutura ou de elementos estruturais compostos,
que apresentam rigidez distinta daquela do terreno que conterá”.
1. DESENVOLVIMENTO
O aumento da urbanização e do desenvolvimento de áreas sujeitas
265
a escorregamentos, o desflorestamento continuo destas áreas e o aumento
das taxas de precipitação causadas pelas mudanças do clima, geram
desastrosas conseqüências acarretadas pelos escorregamentos, isso fez
com que o estudo dos processos de instabilidade de taludes e suas formas
de contenção sejam cada vez mais necessários.
Os escorregamentos
geram custos, que por sua vez podem ser diretos ou indiretos. Os diretos
são as reparações dos danos, os indiretos são os mais preocupantes, pois o
local pode perder a produtividade industrial agrícola e florestal, o potencial
turístico, as propriedades perdem seus valores, e também a perda de vidas
humanas, invalidez física ou trauma psicológico em moradores dos locais
afetados.
Para que a obra de estabilidade de taludes alcance seus objetivos
são necessários cuidados como estudo de investigação do solo, elaboração
de projeto, e também, deve haver boa execução de acordo com o
conhecimento deste e daquele. No trabalho presente foram estudados dois
casos de contenção.
1.1. Caso 1
O estudo foi realizado na Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Foi
construído um muro com malha de pneus usados, de 0,6m de diâmetro e
0,2m de largura da banda de rolamento, amarrados entre si e em camadas
horizontais. A parte interna da malha foi preenchida com solo compactado,
em 4 diferentes tipos de seções.
A seção A foi composta por pneus amarrados com corda de
propileno contendo 6 pneus na base subindo até 4 no topo. A seção B se
diferenciava por ser feita com pneus cortados com uma só banda lateral. A
seção a C era igual a B, com a diferença de ser amarrada com arame tipo
Maccaferri, e a seção D diferiu da B por utilizar 3 pneus na base e, ao invés
de diminuir até o topo, foi constante.
A técnica mostrou grande resistência ao cisalhamento do solo e,
utilizou instrumentos, como inclinômetros e extensômetros magnéticos, para
monitorar os movimentos horizontais e verticais e células de pressão, para
medir tensões horizontais.
266
1.2. Caso 2
Estudo sobre um muro de solo pneus executado no interior do Estado
de São Paulo por uma borracharia, construído acerca de 25 anos, sendo
desconhecida elaboração de projeto e, motivos de sua execução.
Esse estudo teve como objetivo mostrar uma obra bem executada e
que vem recebendo manutenção eficiente. Uma construção realizada na
principal entrada da cidade que se mostra de boa durabilidade, economia e
beleza.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O objetivo principal desse projeto é mostrar a viabilidade da
utilização de pneus na contenção de deslizamento de encostas, ou seja, não
tratar o pneu como lixo, mas sim como elemento útil na preservação e
conservação do meio ambiente e também na proteção das vidas de pessoas
que vivem em áreas consideradas de risco pela defesa civil.
REFERÊNCIAS
SILVA, Daniella Fernanda Machado. CONTENÇAO DE TALUDES COM PNEUS: UMA
ALTERNATIVA ECOLOGICA E DE BAIXO CUSTO. São Paulo: Universidade Anhembi
Morumbi, 2006
DYMINSKI, Andrea Sell. Notas de Aula - Estabilidade de Taludes. Noções de estabilidade
de taludes e contenção. UFPR
PROJETO DE UM GERADOR TESLA
Prof. Juan C. Villalba - FG
Denilson J. Camargo
Ze Kleiton Klossniak
267
Engenharia Elétrica - FG
PALAVRAS CHAVE: Bobina de Tesla. Transformador. Transmissão de
energia.
INTRODUÇÃO
A bobina de Tesla ou transformador Tesla é uma invenção do final do
século XIX, de autoria de Nikola Tesla (1856-1943). Tesla foi um engenheiro
de etnia sérvia que atuou nos campos da engenharia mecânica e
eletrotécnica. É considerado como sendo um dos maiores inventores da
humanidade. Entre suas contribuições podemos citar a descoberta do rádio,
raio X (8 anos antes de Röentgen), a corrente alternada, desenvolvimento
dos modernos motores elétricos (CA), a construção de lâmpadas
fluorescentes, distribuição de energia sem fio, dentre outras que ainda
utilizamos hoje em dia.A distribuição de energia sem fio foi o que ele
consideraria seu maior trabalho, mas, nunca conseguiu finalizá-lo. Trata-se
da transformação de energia de algumas centenas de volts para milhares de
volts. Tesla construiu um enorme transformador nos EUA (Torre de
Wanderclyff), e conseguiu acender lâmpadas a cerca de 1 km do
transformador sem a utilização de cabos elétricos.
O transformador de Tesla é constituído de um transformador ou uma
série de transformadores com núcleo de ar, ligados à um capacitor (ou
associação de capacitores) carregado a uma tensão de cerca de 5- 30 kV se
descarregando sobre uma bobina primária através de um faiscador. A bobina
primária possui poucas espiras de fio grosso (1-20), podendo ser cilíndrica,
plana ou cônica, e é montada próxima à base da bobina secundária. O
circuito secundário é formado por uma bobina secundária cilíndrica maior do
que a primeira contendo aproximadamente 1000 espiras. Esta é montada
centrada sobre a bobina primária, que ressona com sua própria capacitância
distribuída e com a capacitância de um terminal montado no topo da bobina.
Estas capacitâncias distribuídas dependem apenas da geometria do
268
sistema, e formam a capacitância secundária. A figura 1 ilustra um exemplo
de circuito para o transformador Tesla.
Figura 1: Circuito convencional de um Transformador Tesla
1. MATERIAIS E MÉTODOS
Após essa avaliação pesquisamos vários projetos, para avaliar qual
seria viável para trabalharmos e construir o nosso projeto.
Dentre os estudos realizados, à conclusão é que a maior dificuldade
que teremos é conseguir a fonte (transformador) que irá gerar alta tensão na
saída que vai alimentar a bobina primária.
Algumas opções são construir uma fonte com fly-back ou usar uma
fonte de microondas, também temos a opção de utilizar um transformador de
neon.
A princípio decidimos optar em utilizar um transformador de
microondas. Após essa definição, iremos correr atrás para conseguir esse
transformador e estudar o mesmo como funciona e como aplicá-lo no
projeto.
Também definimos a sequência dos próximos passos a serem dados,
após concluído o estudo do transformador do microondas.
Os passos a seguir foram definidos da seguinte forma:
• Adquirir o transformador de microondas, estudar como funciona e
como aplicá-lo no projeto.
269
• Definir o projeto que iremos fazer e verificar os materiais que serão
utilizados
• Levantar os custos dos materiais que utilizaremos no projeto.
• Definir como iremos comprar os materiais, prazo de compra e como
dividir as despesas.
• Estudar o projeto (funcionamento, montagem e testes a serem
realizados)
• Iniciar a montagem do projeto
• Realizar os primeiros testes
2. DESENVOLVIMENTO DO PROJETO
Portanto no presente trabalho, estão sendo utilizados 3 transformadores
ligados em paralelo (de micro ondas), 4 capacitores de alta tensão
associados em paralelo, um interruptor simples, esfera de irradiação do tipo
gerador de Van der Graaf, faiscador ajustável, uma resistência de 33 kohms,
um indutor de alta tensão de alta frequência e uma bobina de tesla e coolers
para refrigeração do sistema. Para acomodação do circuito construiu-se uma
caixa de mdf. Até o presente momento foram realizados os testes com os
componentes e iniciou-se a montagem do circuito. Testes do sistema estarão
sendo realizados em breve.
REFERÊNCIAS
QUEIROZ, A. C. M., Bobina de Tesla.
Disponível em: http://www.coe.ufrj.br/~acmq/tesla/BobinadeTesla.pdf, Acessado em
10/10/2012.
Disponível em : http://pt.wikipedia.org/wiki/Nikola_Tesla. Acessado em 10/10/2012.
Disponível em : www.coe.ufrj.br/~acmq/tesla/tefp.html. Acessado em 10/10/2012

Documentos relacionados