Estudo sobre o Impacto Ambiental do Hotel de Selva Flutuante na

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Estudo sobre o Impacto Ambiental do Hotel de Selva Flutuante na
Estudo sobre o Impacto Ambiental do Hotel de Selva
Flutuante na Amazônia:
o caso do Hotel Arara
Michelle Muniz Araújo1
Carlossandro Carvalho Albuquerque2
Resumo:
Atualmente na Amazônia, tem crescido de forma acelerada o número de hotéis de
selva flutuantes, como incremento ao turismo ecológico. Mas, esses empreendimentos se não
bem planejados e estruturados tendem a causar graves impactos ao meio ambiente. Com o
objetivo de diagnosticar os impactos ambientais do hotel de selva flutuante na Amazônia foi
realizado o estudo de caso no hotel Arara, sendo utilizada como metodologia, a pesquisa do
tipo exploratória e o método dedutivo. Os principais resultados obtidos foram as
identificações dos impactos ambientais causados pelos atrativos do empreendimento e por sua
infra-estrutura física, incluindo o seu sistema de água; de esgoto; fossa; resíduos sólidos e tipo
de energia utilizada.
Palavras-Chave:
Turismo - Impacto Ambiental
Hotel Flutuante
Amazônia
Introdução
O turismo é uma prática que está relacionada diretamente ao meio ambiente, já que
este constitui a área de desenvolvimento daquele. Mas essa relação que deveria ser
harmoniosa passou por muitas fases de desgaste. O primeiro período caracterizou-se pela
descoberta da natureza, o segundo pela despreocupação com a proteção ambiental, o terceiro,
o mais catastrófico de todos, pela dominação brutal do turismo sobre a natureza e, em muitos
países, já se vive o quarto período, onde o homem passou a respeitar e preservar o ambiente.
Nesta última fase, houve o surgimento do chamado turismo ecológico, em que as pessoas
sentem a necessidade de entrar em contato direto com a natureza, e para isso buscam lugares
que possuam florestas com grande diversidade de fauna e flora. É nesse contexto que a
Amazônia entra na rota mundial do turismo.
Com o aumento do fluxo de turista para a região Amazônica, os empresário procuram
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Aluna do 4º período do curso de turismo da Universidade do Estado do Amazonas. Bolsista da FAPEAM.
Professor do curso de turismo da Universidade do Estado do Amazonas.
atender a demanda e criam os hotéis de selva flutuantes, que são empreendimentos
construídos na margem de rios ou sobre águas de um lago amazônico. Esses hotéis se não
bem estruturados causam graves impactos ambientais como: Contaminação das fontes e dos
mananciais de água doce perto dos alojamentos, provocada pelo lançamento de esgoto e lixo
in natura nos rios; Poluição sonora provocada pelos motores dos barcos e pelos geradores que
provêm energia elétrica para os lodges; Acúmulo de lixo nas margens dos caminhos;
Alargamento e pisoteio da vegetação das trilhas, dentre vários outros.
Com o intuito de avaliar esses impactos, foi realizado um estudo de caso no hotel de
selva flutuante Arara Amazon Resort, localizado à margem esquerda do igarapé do Arara,
afluente do Rio Negro, a sessenta minutos de Manaus. Com os dados recolhidos no
empreendimento foi possível analisar os impactos ambientais causados pelos seus atrativos
turísticos e pela sua infra-estrutura, incluindo o sistema de água; de esgoto; fossa, resíduos
sólidos e tipo de energia utilizada.
Desenvolvimento
O meio ambiente, em muitos casos, é um componente impulsionador do deslocamento
das pessoas para outras regiões, visto que, boa parte da população viaja para contemplar belas
paisagens, conhecer edificações monumentais e participar do cotidiano e da cultura dos mais
diversos povos.
O ambiente natural constitui um elemento de destaque do produto turístico, mas, ainda
assim, a relação entre ambos não tem se caracterizado por um processo harmonioso. Vários
estudos desenvolvidos na França pelo Ministère de L Environnement/ Tourisme (1992) apud
Ruschmann (1997, pág. 20 e 21) apresentam quatro fases no relacionamento do turismo e do
meio ambiente e assim as descrevem:
A primeira fase se caracterizou pela
descoberta da natureza e das
comunidades receptoras [...] Trata-se da fase do relacionamento e dos
primeiros equipamentos turísticos.
A segunda fase, caracterizada por um turismo dirigido a elitista. Não
havia a preocupação com a proteção ambiental e a intensificação da
demanda estimulou as construções e o boom imobiliário [...]
A terceira fase corresponde ao turismo de massa. A demanda turística dos
países desenvolvidos cresce em ritmo muito rápido e as localidades
turísticas vivem uma expansão sem precedentes [...] Esse período é o mais
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devastador e se caracteriza pelo domínio brutal do turismo sobre a natureza
e as comunidades receptoras [...]
Essa terceira fase foi catastrófica para o meio ambiente, já que possibilitou a
destruição de grandes extensões de áreas naturais por todo o mundo, acarretando problemas
relacionados com a contaminação do lençol freático, produção de toneladas diárias de lixo,
compactação do solo, soterramento de ecossistemas, mananciais, fontes naturais e incremento
nas erosões de solos e praias.
Devido a essas problemáticas, vários países adotaram medidas para diminuir o fluxo
de turistas em massa, a fim de preservar os seus ecossistemas. Nesse período é que, segundo o
Ministère de L Environnement/ Tourisme (1992) apud Ruschmann (1997, pág. 21), surge a
quarta fase do relacionamento do turismo com o meio ambiente:
Depois da metade dos anos 80, distingue-se um outro período, no qual as
práticas turísticas e de lazer da fase precedente perde a sua amplitude. O
turismo de natureza ou turismo ecológico ocorre na maioria das localidades
turísticas estabelecidas e, nas novas, evita-se a ocupação de todos os
espaços [...] Trata-se, portanto, da renovação do turismo, cuja clientela
busca a calma, as aventuras e o conhecimento mais profundo das regiões
visitadas.
Com a conscientização de parcela da população e do próprio trade turístico, da
importância de preservar o ambiente natural, cresce a necessidade humana de maior contato
com a natureza, e a atividade turística em espaços naturais também cresce. Sendo assim, áreas
conhecidas mundialmente pela riqueza de seus ecossistemas, como o Pantanal e a Amazônia,
ganham destaque entre as principais rotas desse segmento turístico.
Amazônia, a partir da década de 90, é descoberta pelos turistas estrangeiros e
nacionais como recanto de uma das mais belas paisagens naturais, e detentora de ricas
espécies de fauna e flora.
Os empresários percebendo o aumento do fluxo de turistas interessados em conhecer a
região, criam os chamados Hotéis de Selvas ou Lodges, que são empreendimentos construídos
no meio da floresta, na margem de rios ou sobre águas de um lago amazônico. Estes oferecem
aos visitantes os mais diversos atrativos, como: caminhadas em trilhas, apreciação da fauna e
flora local, exploração dos igarapés e igapós, excursão noturna com focagem de jacaré,
pescaria, técnicas de sobrevivência na selva, visitas a aldeias indígenas, dentre outros.
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Por serem empreendimentos de hospedagem com vasta gama de atrações, os hotéis de
selva flutuantes, em sua maioria, possuem infra-estruturas complexas, que se não bem
planejadas podem causar impactos negativos ao meio ambiente. Dentre os principais impactos
no meio natural, citados por Ruschmann (1997), estão:
Desmatamento para a construção dos lodges e de equipamentos de apoio.
Apesar dos hotéis serem flutuantes, muitas vezes, são construídos equipamentos de
apoio em terra firme, que precisam ser bem planejados para evitar o desmatamento em
excesso.
Descaracterização da paisagem pela construção de equipamentos cuja arquitetura,
materiais e estilo contrastam com o meio natural.
Os lodges precisam ser construídos com materiais que não agridam visualmente a
região, afinal eles são criados para integrar o homem com o meio ambiente.
Contaminação das fontes e dos mananciais de água doce perto dos alojamentos,
provocada pelo lançamento de esgoto e lixo in natura nos rios.
Trata-se de um dos pontos mais importantes a ser observado nos hotéis de selva
flutuantes, uma vez que estes ficam localizados sobre a água, correndo o risco de contaminála de forma mais agressiva que um empreendimento em terra firme.
Poluição sonora provocada pelos motores dos barcos e pelos geradores que provêm
energia elétrica para os lodges.
Devido a sua localização, um dos usos de energia elétrica mais viável para este tipo de
hotel, é o gerador. Este, por sua vez, causa um barulho que pode provocar, dentre outros
danos ao ambiente, a fuga de animais.
Acúmulo de lixo nas margens dos caminhos e das trilhas.
Coleta e destruição da vegetação às margens das trilhas e dos caminhos na floresta
Alargamento e pisoteio da vegetação das trilhas e dos caminhos
A maioria dos empreendimentos de selva, mesmo os flutuantes, oferece passeios em
trilhas e estas, se não bem estruturadas e monitoradas, podem sofrer sérios impactos, dentre
eles, o acúmulo de lixo causado por visitantes não sensibilizados; coleta da vegetação para
levar como souvenir; alargamento, pisoteio e desgaste da trilha.
Turistas que alimentam animais mais dóceis com produtos contendo conservantes
Caça e pesca ilegais, em locais e épocas proibidas.
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Outro dano comumente causado ao ambiente natural, diz respeito aos animais, que
sofrem com a invasão humana ao seu hábitat, seja com os ruídos, com a alimentação
industrializada, ou com a caça e pesca ilegal.
Todos esses impactos citados ocorrem quando não há um desenvolvimento sustentável
por parte do empreendimento de selva. E desenvolvimento sustentável é entendido pela
Comissão Mundial sobre Meio Ambiente (In: Ruschmann, 1997, pág.109) como:
Um processo de transformação, no qual a exploração dos recursos, a direção
dos investimentos, a evolução da orientação tecnológica e a mudança
institucional se harmonizam e reforçam o material presente e futuro, a fim
de atender às necessidades e aspirações humanas.
O Arara Amazon Resort é um hotel de selva flutuante localizado à margem esquerda
do igarapé do Arara, afluente do Rio Negro, a sessenta minutos de Manaus. O
empreendimento possui 12 suítes - sendo 6 duplos e 6 triplos, com capacidade total de 36
pessoas - com ar-condicionado, frigobar, televisão, telefone e varanda com vista para a
floresta e o igarapé do Arara. Possui ainda restaurante com capacidade para 50 refeições
simultaneamente, bar, sala de estar, sala de jogos e piscina.
Dentre seus principais atrativos estão:
Pescaria;
Focagem de jacaré;
Caminhada em trilha, que gera como impacto ambiental, pinturas e rasuras nas
árvores, causadas por turistas que querem deixar a sua marca; lixo abandonado nas
margens da trilha, e pisoteio na vegetação;
Rapel, gerador de impacto na vegetação pelo apoio e ancoragem que os visitantes
fazem para conseguir descer o morro, onde a atividade é praticada;
Passeio em canoas motorizadas, que gera uma constante poluição sonora, assustando
os animais e provocando sua fuga de ninhos e refúgios;
Ponte de corda e Tirolesa, que estão posicionadas de uma extensão a outra do rio,
permanecendo fixadas no lugar e gerando uma descaracterização da paisagem natural.
Com a finalidade de evitar a poluição do rio, o hotel possui uma caixa coletora
flutuante onde são despejados todos os dejetos oriundos das pias, chuveiros e sanitários. A
caixa possui uma bomba centrífuga que faz uma sucção dos dejetos e, através de uma
conexão, envia para uma fossa séptica em terra firme. Segundo o site Wikipédia, a fossa
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séptica é uma benfeitoria fundamental no combate a doenças, vermisoses e endemias (como a
cólera), pois evita o lançamento dos dejetos humanos diretamente em rios, lagos, nascente ou
mesmo na superfície do solo.
Como destinação dos resíduos sólidos, o hotel utiliza o seguinte esquema: o material
alumínio é vendido; os materiais de vidro e plástico são depositados numa coletora pública
em Manaus, e o material orgânico é jogado num aterro de diminutas dimensões em terra
firme. Segundo a LRQA (Lloyd's Register Quality Assurance) o aterro é a opção paliativa de
maior impacto ambiental, que apresenta risco permanente de contaminação do solo e do
lençol freático, além de potencial foco de riscos à saúde pública.
A água utilizada no empreendimento vem de poço artesiano também em terra firme.
Ela é bombeada do poço para uma caixa d água a 6 metros de altura, com capacidade de 3000
litros, e através de uma tubulação abastece todo o hotel.
Como fonte de energia, o hotel utiliza gerador a diesel, que fica ligado cerca de 10
horas na baixa temporada, e no mínimo 15 horas na alta temporada, gerando uma constante
poluição sonora que afeta diretamente a fauna e flora existente no local. Os animais se
estressam e se afastam do seu hábitat natural, e as plantas podem levar um tempo maior para
desenvolver seu crescimento natural.
Dentre as propostas de ações mitigadoras para o empreendimento estão: a substituição
do gerador, pela fonte de energia alternativa fotovoltaica, que produz eletricidade diretamente
dos elétrons liberados pela interação da luz do sol com certos semicondutores e a substituição
do aterro pela compostagem que se caracteriza pelo processo de transformação de materiais
grosseiros, em materiais orgânicos utilizáveis na agricultura.
Considerações Finais
Toda atividade econômica e/ou social causa algum impacto ao meio ambiente, e o
turismo não é uma exceção a essa regra. Quanto mais próxima da área natural se desenvolver
essa atividade, ainda maior o risco de impacto na localidade, caso dos hotéis de selva
flutuantes na Amazônia.
Estes empreendimentos têm contato direto com o recurso hídrico, com a floresta, e
com espécies da fauna e flora, por isso, se não bem estruturados e planejados, tendem a poluir
e degradar o ambiente natural.
O Arara Amazon Resort é um hotel, que de acordo com o Gerente Ronaldo Medeiros,
tem uma grande preocupação com a preservação ambiental, e isto pode ser percebido através
da implantação da caixa coletora com conexão para a fossa séptica, impedindo a poluição do
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rio; do recolhimento dos materiais de alumínio, plástico e vidro para depósito em uma
coletora pública de Manaus; e da presteza dos funcionários em limpar periodicamente as
trilhas e solicitar aos visitantes que não depredem o patrimônio natural.
Mas, algumas ações ainda precisam ser tomadas para evitar os impactos reais que o
empreendimento causa, como por exemplo, a mudança na forma de geração de energia e
destinação dos materiais orgânicos; medidas de proteção ambiental na utilização de alguns
atrativos, como o rapel que utiliza a vegetação como apoio, contrariando as recomendações da
FEMERJ, para adoção do mínimo impacto na prática do rapel; e etc.
O Arara Amazon Resort é um empreendimento com infra-estrutura e atrativos muitos
interessantes, e a partir do momento que redirecionar alguns de seus pontos negativos,
conseguirá ter uma relação mais harmoniosa com o ambiente em que está inserido.
Referências Bibliográficas
FARIA, Ivani Ferreira de (coord). Turismo: Sustentabilidade e novas territorialidades.
Manaus: Universidade do Amazonas, 2001.
RODRIGUES, Adyr Balastreri (org). Turismo e Ambiente: Reflexões e Propostas. 2ª ed.
São Paulo: Hucitec, 2000.
RUSCHMANN, Doris Van de Meene. Turismo e Planejamento Sustentável: a proteção do
Meio Ambiente. São Paulo: Papirus, 1997.
Fontes Eletrônicas:
CAMPOS, Angelo Mariano Nunes. O ecoturismo como alternativa de desenvolvimento
sustentável. Disponível em: <http://revistaturismo.cidadeinternet.com.br/artigos/ecodesenvsust.html>. Acesso em 12/05
GONÇALVES, Aline Cristina: SPOLADORE, Ângelo. Impactos Ambientais do Turismo.
Disponível em: <http://www.igeo.uerj.br/VICBG-2004/Eixo2/e2_textosnu5.htm>. Acesso
em: 12/05
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http://www.lrqa.com.br/noticias/artigos_view.asp?id=27. Acesso em 07/06/06
http://www.planetaorganico.com.br/composto.htm. Acesso em 18/07/06
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