universidade federal do rio de janeiro

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universidade federal do rio de janeiro
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO - UFRJ
INSTITUTO DE ESTUDOS DE SAÚDE COLETIVA - IESC
CURSO DE MESTRADO EM SAÚDE COLETIVA
VINÓLIA BARBALHO DO NASCIMENTO
Estudo do Processo de Trabalho nas Cooperativas de Material
Reciclável e Efeitos à Saúde em decorrência do manuseio de
produtos químicos.
Rio de Janeiro
2010
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO - UFRJ
INSTITUTO DE ESTUDOS DE SAÚDE COLETIVA - IESC
CURSO DE MESTRADO EM SAÚDE COLETIVA
VINÓLIA BARBALHO DO NASCIMENTO
Estudo do Processo de Trabalho nas Cooperativas de Material
Reciclável e Efeitos à Saúde em decorrência do manuseio de
produtos químicos.
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da
Universidade Federal do Rio de Janeiro, como
requisito parcial à obtenção do título de Mestre
do Curso de Saúde Coletiva.
Orientadora: Drª. Heloisa Pacheco-Ferreira
RIO DE JANEIRO
2010
N244
Nascimento, Vinólia Barbalho do.
Estudo do processo de trabalho nas cooperativas de
material reciclável e efeitos à saúde em decorrência do
manuseio de produtos químicos/ Vinólia Barbalho do
Nascimento. – Rio de Janeiro: UFRJ/ Instituto de Estudos em
Saúde Coletiva, 2010.
118 f.: il. ; 30cm.
Orientador: Heloisa Pacheco-Ferreira.
Dissertação (Mestrado) - UFRJ/Instituto de Estudos em
Saúde Coletiva, 2010.
Referências: f. 101-108.
1. Resíduos sólidos. 2. Resíduos químicos. 3. Lixo. 4. Saúde
do trabalhador. 5. Saúde pública. 6. Saúde ambiental. 7. Meio
ambiente. I. Pacheco-Ferreira, Heloisa. II. Universidade
Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Estudos em Saúde
Coletiva. III. Título.
CDD 614.76
VINÓLIA BARBALHO DO NASCIMENTO
Estudo do Processo de Trabalho nas Cooperativas de Material
Reciclável e Efeitos à Saúde em decorrência do manuseio de
produtos químicos.
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da
Universidade Federal do Rio de Janeiro, como
requisito parcial à obtenção do título de Mestre
do Curso de Saúde Coletiva.
Aprovada em: 30 de junho de 2010.
Banca Examinadora:
______________________________________
Profª Drª Heloisa Pacheco-Ferreira – IESC/UFRJ
Orientadora
______________________________________
Profª Drª Ana Maria Cheble Bahia Braga – ENSP/FIOCRUZ
Membro
______________________________________
Profª Drª Kátia Regina de Barros Sanches – IESC/UFRJ
Membro
______________________________________
Prof. Dr. Volney de Magalhães Câmara – IESC-UFRJ
Membro
______________________________________
Prof. Dr. Luiz Carlos Fadel de Vasconcellos – ENSP/FIOCRUZ
Membro - Substituto
______________________________________
Proª Drª Marisa Palácios da Cunha e Melo de Almeida Rego – IESC/UFRJ
Membro - Substituto
Dedicatória
À minha Mãe, mulher batalhadora e guerreira, que me ensinou, com seu
amor incondicional, a enfrentar os obstáculos e encarar os desafios da
vida;
À minha filha, minha melhor obra, minha companheira, minha maior
incentivadora e que soube em todos os momentos respeitar e
compreender a minha vontade de realizar este estudo.
Às minhas adoradas irmãs Vitória Régia e Teresinha, por fazerem parte da
minha vida;
Aos meus adorados irmãos José Advan e Sávio por acreditarem em mim;
Aos meus queridos sobrinhos Barbara Sayuri, Stephanie Hortência, Bruno
Barbalho e Mariana Úrsula.
A todos os trabalhadores, homens e mulheres combatentes, que lidam
diariamente com os resíduos sólidos.
Agradecimentos
A Deus, por me conferir persistência e coragem para encarar novos
desafios;
À minha família, base da minha formação e que sempre me apoiou e
incentivou a buscar novos caminhos;
À minha filha que se dedicou com carinho, lendo inúmeras vezes este
trabalho e fazendo as correções ortográficas, sempre estando presente com
seu apoio e incentivo;
Aos trabalhadores cooperados e gestores das cooperativas, pela
solicitude, acolhida e permissão para a concretização das entrevistas e
observações;
À minha orientadora, Drª Heloisa Pacheco-Ferreira, pela dedicação do seu
tempo, pelo carinho, pelo incentivo, e por enfatizar que “a universidade é um
espaço que tem por natureza a convivência das diversidades, a partir do
diálogo e do respeito mútuo (...)”;
A todos os professores do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva –
IESC/UFRJ, que contribuíram para o meu aperfeiçoamento acadêmico;
A todos os membros da Banca de Qualificação e Defesa que contribuíram
para o resultado final deste trabalho;
A todos aqueles que, de forma direta ou indireta, contribuíram para a
realização e finalização deste Estudo;
A todos o meu obrigado e o meu carinho especial.
Catadores de lixo
Apesar da miséria da matéria
Que os consome com sede e fome
Persiste a dignidade pulsante
De lutar pela vida com honestidade
Na riqueza do lixo, impropriedade,
Transformar sua verdade,
Em alimento d'existência,
Em caminho e rumo,
Em arte e beleza...
Em sobrevida possível, única certeza...
Em desafio único pra se manter a decência,
Em guerrear constantemente
Que os leve avante...
D'um altar e precipício
D'onde vem o sustento, a esperança...
N'outras a morte ou o perigo...
Fazem pra si e por todos como cidadão
Que não esperam pelo governo hoje tão ausente
Que se promove na dor e abandono das gentes.
Mônica Christi
Lista de Figuras
Figura 1
Cadeia Produtiva da Reciclagem
35
Figura 2
Incinerador instalado na Alemanha
41
Figura 3
Cooperativa nº 1. Quantidade de pneus armazenados
para comercialização
Cooperativa nº 1. Quantidade de lixo a ser triada.
62
Cooperativa nº 1. Dejetos a serem recolhidos pela
COMLURB
Cooperativa nº 1. Galpão Óleo Combustível.
64
e
68
e
71
e
72
e
73
Figura 11
Cooperativa nº 1. Área externa da Cooperativa
Caminhões do projeto “Cata Rio Solidário”.
Cooperativa nº 2. Cartuchos de impressoras
copiadoras
Cooperativa nº 2. Cartuchos de impressoras
copiadoras
Cooperativa nº 2. Cartuchos de impressoras
copiadoras
Cooperativa nº 3. Quantidade de lixo a ser triada.
Figura 12
Cooperativa nº 3. Quantidade de lixo a ser triada.
75
Figura 13
76
Figura 17
Cooperativa nº 3. Catadora de Rua. Complexo da
Maré
Cooperativa nº 3. Catadora de Rua. Complexo da
Maré
Cooperativa nº 3. Barreira de Contenção - Canal do
Cunha
Cooperativa nº 3. Barreira de Contenção - Canal do
Cunha
Cooperativa nº 4. Resíduos a serem triados
Figura 18
Cooperativa nº 4. Bombona com óleo usado
80
Figura 19
Cooperativa nº 2. Cooperada com braços
queimados/Cicatrizes
Cooperativa nº 2. Cooperada com braços
queimados/Cicatrizes
90
Figura 4
Figura 5
Figura 6
Figura 7
Figura 8
Figura 9
Figura 10
Figura 14
Figura 15
Figura 16
Figura 20
63
65
74
76
77
77
79
91
Lista de Tabelas e Quadros
Quadro 1
Classificação dos Resíduos Sólidos
29
Tabela 1
Disposição do volume de lixo coletado, por tipo
31
de disposição final, Brasil, 2000.
Tabela 2
Aspectos da Legislação sobre resíduos sólidos
41
nos Estados Unidos, Japão e Países europeus
Quadro 2
Tipos de resíduos manuseados nas Cooperativas
estudadas.
60
Lista de Abreviaturas e Símbolos
ABNT
ANCINE
BNDES
CBO
CEMPRE
CEPEL
CIAW
CIISC
COMLURB
CONAMA
COPPE
CPRM
CREA
Dataprev
DBO
DQO
ECT
EPIs
EU
EUA
EVA
FEBRACOM
FEEMA
HCE
HDPE
HPAs
IBGE
IBM
IBMEC
IEF
IESC
INEA
INSS
IPT
ITCP
LAMSA
MGIRS
MNCR
MS
NBR
– Associação Brasileira de Normas Técnicas
– Agência Nacional do Cinema
– Banco Nacional de Desenvolvimento
– Classificação Brasileira de Ocupação
– Compromisso Empresarial para Reciclagem
– Centro de Pesquisas de Energia Elétrica
– Centro de Instrução Almirante Wandenkolk
– Comitê Interministerial da Inclusão Social de Catadores
de Lixo
– Companhia Municipal de Limpeza Urbana
– Conselho Nacional do Meio Ambiente
– Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e
Pesquisa de Engenharia
– Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais
– Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e
Agronomia
– Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência
Social
– Demanda Bioquímica de Oxigênio
– Demanda Química de Oxigênio
– Empresa de Correios e Telégrafos
– Equipamentos de proteção individual
– União Européia
– Estados Unidos da América
– Acetato de Etilvinila
– Federação das Cooperativas de Catadores de Materiais
Recicláveis
– Fundação Estadual de Engenharia e Meio Ambiente
– Hospital Central do Exército
– Polietileno de alta densidade
– Hidrocarbonetos Policíclicos Aromáticos
– Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
– International Business Machines
– Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais
– Instituto Estadual de Floresta
– INSTITUTO DE ESTUDOS EM SAÚDE COLETIVA
– Instituto Estadual do Ambiente do Rio de Janeiro
– Instituto Nacional de Seguridade Social
– Instituto de Pesquisa Tecnológica
– Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares
– Linha Amarela AS
– Manual de Gerenciamento Integrado de resíduos sólidos
– Movimento Nacional dos Catadores de Materiais
Recicláveis
– Ministério da Saúde
– Normas Técnicas Brasileiras
NUCLEP
OMS
OS
PET
PET
PNSB
PP
RICAMARE
RIMA
RNProve
SERLA
UFRJ
USP
– Nuclebrás Equipamentos Pesados S.A
– Organização Mundial de Saúde
– Poliestireno
– Politereftalato de etileno
– Polietileno tereftalato
– Pesquisa Nacional de Saneamento Básico
– Polipropileno
– Rede Independente de Catadores de Materiais
Recicláveis do Estado Rio
– Relatório de Impacto Ambiental
– Rede Nacional de Empreendimentos Solidários do
PROVE
– Superintendência Estadual de Rios e Lagos
– Universidade Federal do Rio de Janeiro
– Universidade de São Paulo
Resumo
Nascimento, V.B. do. Estudo do processo de trabalho nas cooperativas de
material reciclável e efeitos à saúde em decorrência do manuseio de produtos
químicos. 2010. 118 f. Dissertação (Mestrado em Saúde Coletiva) – Instituto de
Estudos em Saúde Coletiva, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de
Janeiro, 2010.
As questões relacionadas aos resíduos sólidos abrangendo todas as etapas de
produção, da coleta ao descarte final, têm sido um entrave nas diversas esferas –
política, econômica, social, cultural e ambiental – da sociedade contemporânea. Este
estudo ressalta os problemas vividos pela classe de trabalhadores, vinculados a
cooperativas de materiais recicláveis, que manuseiam resíduos sólidos em
condições adversas de trabalho. Nesta pesquisa analisam-se os processos de
trabalho dos sujeitos que lidam, diariamente, com resíduos de origem química, bem
como as conseqüências à saúde dos trabalhadores advindas desse processo. O
caminho trilhado neste trabalho é o campo da saúde do trabalhador, incorporando a
temática saúde e ambiente para revelar os riscos a que estão expostos.
Apresentam-se a definição e classificação de resíduos sólidos e químicos, a
problemática sócio-econômica dos cooperativados e a inserção social. São
enfatizadas, ainda, as questões ambientais decorrentes da produção e da
disposição inadequadas dos resíduos sólidos e traça-se um panorama das medidas
adotadas em países da União Européia, Estados Unidos da América (EUA) e Japão.
Conclui-se, então, que as questões que envolvem a gestão dos resíduos sólidos
consistem em um grave problema de saúde pública ao impactar o meio ambiente e a
saúde do trabalhador e da população em geral.
Palavras-Chave: 1. Resíduos sólidos; 2. Resíduos químicos; 3. Lixo; 4. Saúde do
trabalhador; 5. Saúde coletiva; 6. Meio ambiente.
Abstract
The issues related to the solid residues that involve all the production’s steps, from
the collection to the final discard, have been an obstacle at the various contemporary
societies’ contexts – political, economic, social, cultural and environmental. This
review highlights the problems experienced by the working class, bound to recyclable
material’s cooperatives, which manipulates solid residues under adverse working
conditions. In this research they are analyzed the work systems of the workers that
daily deal with residues that come from chemical, as well as the consequences
derived from this process to the health of these people. The trodden path in this
study is the worker’s health area and it puts together health and environment to show
the risks to which the subjects are exposed. They are presented the solid residues’
and chemicals’ definition and classification, the cooperative workers’ socio-economic
problematic is discussed and also their social insertion. The environmental questions
arisen from inadequate production and disposition of the solid residues are
emphasized and a panorama of the measures adopted by European Union, USA and
Japan is described. It’s concluded, then, that the questions associated to the
management of the solid residues consist into a serious public health problem once
they affect the environment as well as the worker’s and the population’s health.
Key-Words: 1. Solid residues; 2. Chemical residues; 3. Waste; 4. Worker’s Health; 5.
Public health; 6. Environment
Sumário
1. Apresentação
17
2. Introdução
20
2.1 – O Cenário
20
2.2 – Ambiente de trabalho. Sustentável?
23
2.3 – Lixo e suas nuances – definição e classificação
26
2.4 – Resíduos Químico-Perigosos
35
2.5 – Lixo, outras visões: Europa, Estados Unidos e Japão
39
2.6 – Cooperativas de Materiais Recicláveis–Trabalho Precarizado
47
2.6.1 – As Cooperativas em foco
2.7 – Objetivos
50
50
2.7.1 – Geral
50
2.7.2 – Específicos
51
3. Método e Análises
53
3.1 – Metodologia qualitativa, exploratória e descritiva
53
3.2 – Coleta de Dados
54
3.3 – Referências e Trabalho de Campo
56
3.4 – Público Alvo
57
3.5 – Cuidados Éticos
58
4. Resultado e Discussão
60
4.1 – Cooperativa nº 01 – de Materiais Recicláveis
61
4.2 – Cooperativa nº 02 – de Materiais Recicláveis
68
4.3 – Cooperativa nº 03 – de Materiais Recicláveis
73
4.4 – Cooperativa nº 04 – de Materiais Recicláveis
78
4.5 – Caracterização dos resíduos manuseados nas Cooperativas
81
4.6 – Catador e Triador de materiais recicláveis: profissão ou
exclusão?
4.7 – Perfil
83
4.8 – Trajetórias vulneráveis
89
5. Conclusões e Recomendações
6. Referências
87
97
102
7. Apêndice
111
7.1 – Apêndice A – Roteiro de Entrevista - Cooperativa
111
7.2 – Apêndice B – Roteiro de Entrevista - Cooperado
114
7.3 – Apêndice C – Termo de Participação e Consentimento
118
7.4 – Apêndice D – Carta de apresentação
119
1. APRESENTAÇÃO
17
1. Apresentação
Esta pesquisa teve como propósito analisar o cenário do trabalho dos
catadores de materiais recicláveis na cidade do Rio de Janeiro que manuseiam
produtos químicos, apresentando uma interface com as condições sociais,
ambientais e de saúde dessa população.
No decorrer desse estudo, a autora pode vivenciar momentos ímpares
relacionados à sistematização do trabalho e questionamentos advindos de quais
passos poderiam ser trilhados para se obter maiores e melhores informações. Foram
momentos intensos de aprendizados e conhecimentos frente a uma realidade de
exclusão social.
Neste cenário, a adoção de uma postura que mesclasse
sensibilidade, devaneios e realidade teve que ser trabalhada para se enfrentar a
pesquisa que, de acordo com (Santos, 2001), deve ser vivida e enfrentada sem
sofrimento.
Nesse intuito, esse trabalho pretende ressaltar os problemas vividos pela
classe de trabalhadores que lidam diariamente com material reciclável, sem
condições adequadas de trabalho e, na maioria das vezes, sem o conhecimento
necessário para manusear certas substâncias químicas encontradas nos resíduos
sólidos manejados em seus postos de trabalho. Reflexões serão necessárias para
se tomar uma postura de transformação que ensejem em ações de cunho político e
ambientalmente sustentáveis, frente aos problemas pautados pela conjuntura
econômica e socioambiental da sociedade pós-moderna.
Os vários estudos realizados após a ECO 92 evocam a atenção para uma
avaliação e mudanças de posturas que venham alterar os diagnósticos ambientais.
Dentre eles, está a diminuição do consumo. O documento elaborado durante a
realização
da
Conferência
das
Nações
Unidas
sobre
Meio
Ambiente
e
Desenvolvimento, Rio ECO 92, que resultou na Agenda Global 21, expressa, no seu
capítulo 4, que: “As principais causas da deterioração ininterrupta do meio ambiente
mundial são os padrões insustentáveis de consumo e produção, especialmente nos
países industrializados, motivo de séria preocupação. Tais padrões de consumo e
produção provocam o agravamento da pobreza e dos desequilíbrios.”
18
O que se pressupõe, nesta pesquisa, é analisar os processos de trabalho dos
sujeitos que lidam, diariamente, em cooperativas de material reciclável, com
resíduos de origem química, bem como as conseqüências à saúde destes
trabalhadores advindas desse manuseio.
Nesta perspectiva, esta dissertação esboça os conceitos de lixo, resíduos
sólidos e substâncias químicas; a trajetória das cooperativas de materiais
recicláveis; o perfil dos catadores e a luta destes por dignidade e inserção na
sociedade como parte integrante do sistema econômico. Além disso, focaliza os
conceitos e paradigmas da saúde coletiva na saúde do ambiente e dos indivíduos
que integram este grupo de trabalhadores.
Os conceitos de saúde e ambiente serviram de fundamentos para delinear o
cenário real resultante do modo de produção e consumo desenfreado da nossa
sociedade. A apresentação do diagnóstico e produção de resíduos sólidos foram as
bases para o questionamento dos problemas ambientais decorrentes da produção e
geração de resíduos.
2. INTRODUÇÃO
20
2. Introdução
2.1 – O Cenário
“O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem.”
Manuel Bandeira
O crescimento da população, a economia do mundo globalizado e o
consequente consumo desenfreado da sociedade moderna têm acarretado a
produção exorbitante de lixo, resultado do modo de vida atual que estimula o uso de
produtos com embalagens descartáveis, de fácil manuseio e praticidade. A corrida
pela introdução de novos processos produtivos tem como resultado a poluição do
solo, da água, dos alimentos e do ar, além de contribuir para a rápida disseminação
de múltiplos riscos para o meio ambiente, para a sociedade em geral e,
principalmente, para a saúde dos trabalhadores expostos (Gouveia, 1999, p. 57).
Essas ameaças, de natureza física, química e biológica, causadas por diversos atos,
inclusive
pelo
descarte
inadequado
de
resíduos
perigosos,
propagam-se
rapidamente por inúmeras rotas, sendo, na maioria das vezes, as responsáveis por
acidentes e por doenças ocupacionais e ambientais.
Nos últimos anos, os problemas decorrentes e relacionados aos resíduos
sólidos urbanos despertaram o interesse de estudiosos de diversas áreas do
conhecimento
–
meio
ambiente,
saúde
do
trabalhador,
ciências
sociais,
epidemiologia, dentre outras -, na busca de alternativas e tecnologias que venham,
senão sanar, ao menos minimizar os impactos causados ao meio ambiente e à
saúde da população (Ferreira, 1997, p. 08).
Para Porto-Gonçalves et al (2004, p. 18), a problemática ambiental não pode
ser considerada apenas como uma questão de ordem ética, filosófica e política em
detrimento de soluções práticas e técnicas. Deve ser, portanto, ativa e não
meramente passiva. Dessa forma, o cuidado e a responsabilidade com os resíduos
sólidos merecem ter sua importância destacada. Essa questão convida a buscar
21
alternativas que visem a preservação ambiental. Todavia, o esclarecimento das
questões ambientais depende de uma articulação ético-política englobando três
registros ecológicos: o meio ambiente, as relações sociais e a subjetividade humana
(Guattari, 1989, p.).
Segundo Câmara e Tambellini (2003, p. 96), ainda existe uma lacuna na
Saúde Ambiental que deve ser explorada, estando aí inserida a pesquisa aos
poluentes químicos ambientais que causam doenças aos trabalhadores e à
população em geral, considerando-se o grande número de substâncias químicas
utilizadas nos diversos setores econômicos.
Face à deterioração ambiental e à enorme produção de resíduos sólidos, há
uma necessidade progressiva de se reduzir os riscos ao meio ambiente e à saúde,
um desafio que se coloca no centro das discussões contemporâneas. A agenda
social e política foca suas ações, então, no propósito de viabilizar a reciclagem de
materiais que podem e devem retornar à cadeia de produção/consumo. Para tanto,
faz-se necessária a adequada destinação desses resíduos, bem como a adoção de
meios para a redução da quantidade a ser depositada em aterros, a ser destinada a
incineradores ou a cooperativas de materiais recicláveis.
Os locais de despejo e de disposição dos resíduos sólidos, sejam lixões,
sejam aterros controlados ou aterros sanitários, têm tido maior atenção nos últimos
tempos por parte dos governos e até mesmo da sociedade na busca de alternativas
adequadas para se evitar que os danos decorrentes da poluição e da proliferação de
vetores, gerados pelo descarte de todo tipo de material, venham afetar, ainda mais,
o meio ambiente, o solo, os meios hídricos, o ar e, principalmente, a saúde humana.
Segundo Celere et al (2007, p. 940), os lixões, os aterros controlados e os aterros
sanitários não podem ser o destino final irrestrito para todas as substâncias
encontradas nos resíduos sólidos, pois devem-se considerar a composição físicoquímica, a resistência e a persistência dessas substâncias, destinando, a muitas, um
tratamento discriminado.
As pesquisas realizadas acerca da temática dos resíduos sólidos têm se
voltado mais para questões ambientais, formas inadequadas de descarte, diferenças
e semelhanças entre os diversos tipos de resíduos, tipos de materiais recicláveis e
suas comercializações, trajetórias de vida dos catadores de materiais recicláveis e
mecanismos de exclusão e visibilidade destes na sociedade (Gonçalves, 2004, p. 1).
Tais trabalhos apresentam um caráter filosófico, social e ambiental, constatando-se
22
a falta de um aprofundamento no tocante à Saúde Pública e, principalmente, no
campo da Saúde do Trabalhador (Ferreira e Anjos, 2001, p. 690).
Questiona-se, então, em quais condições de trabalho esses catadores
desenvolvem suas atividades, considerando que:
“(...) por condições de trabalho é preciso entender, antes de tudo,
ambiente físico (temperatura, pressão, barulho, vibração, irradiação,
altitude, etc), ambiente químico (produtos manipulados, vapores e gases
tóxicos, poeiras, fumaças, etc), o ambiente biológico (vírus, bactérias,
parasitas, fungos), as condições de higiene, de segurança, e as
características antropométricas do posto de trabalho (...)” (Dejours, 1992, p.
25).
Para Tambellini e Câmara (1998, p. 52), o grau de saúde de um grupo de
indivíduos é proporcional ao meio em que vivem e às suas relações de produção,
podendo cada indivíduo, mesmo em coletividade, apresentar graus diferenciados de
exposições a agentes, cargas e riscos. O foco da saúde deve, portanto, ser
direcionado para as questões das relações entre produção, ambiente e saúde.
Buscando compreender este universo diferenciado, as observações e
análises neste estudo seguirão o rumo do coletivo dos trabalhadores vinculados às
cooperativas associadas à Rede Nacional do PROVE.
Diante de todo o contexto que envolve as questões ambíguas relacionadas
aos resíduos sólidos e às condições em que o trabalho de seleção dos materiais
passíveis de reciclagem é realizado, respostas serão buscadas para algumas
indagações. Em que condições de trabalho são exercidas essas atividades? Quais
os riscos iminentes? De que doenças esses trabalhadores são acometidos? Quais
as doenças prevalentes decorrentes da exposição a resíduos químicos? Como
esses trabalhadores lidam com o processo de doença? Essas são as questões que
não permitem calar. Assim, o trabalho será realizado com as pessoas que fazem a
triagem de material reciclável de 04 (quatro) Cooperativas de Catadores de Materiais
Recicláveis, localizadas no município do Rio de Janeiro/RJ e associadas à Rede
Nacional do PROVE (RNProve). Para tanto, serão analisados os discursos pessoais
e privados acerca de doenças que esclareçam aspectos relacionados ao contexto
grupal, coletivo (Herzlich, 2004, p. 386).
O interesse pelo tema surgiu após a minha nomeação, em janeiro de 2007,
como Presidente da Comissão da Coleta Seletiva Solidária no Observatório
23
Nacionala. Tal atribuição teve como objetivo atender o disposto no Decreto nº 5.940,
de 25 de outubro de 2006, que instituiu
“a separação dos resíduos recicláveis descartados pelos órgãos e
entidades da administração pública federal direta e indireta, na fonte
geradora, e a sua destinação às associações e cooperativas dos catadores
de materiais recicláveis”. (Decreto nº 5.940/06)
Com poucos conhecimentos necessários para assumir a responsabilidade
naquele momento delegada, tive que adentrar por novos caminhos que não
imaginava serem tão curiosos, envolventes e estarrecedores. Por ser tão complexa
e ambígua, a problemática me encorajou a trilhar novas fronteiras em busca de
conhecimento que, de alguma forma, venha contribuir para a melhoria da qualidade
de vida dos sujeitos que lidam com os resíduos sólidos.
Para um melhor embasamento do assunto, visitaram-se várias cooperativas a
fim de conhecer a realidade no local de trabalho, observando a rotina vivida por
esses trabalhadores, os ambientes e os processos de trabalho, uma vez que sem
essa visão não se poderia prosseguir nos objetivos pretendidos. Valendo-se das
afirmações de Augusto (2005, p. 10), o profissional que se dispõe a discutir sobre as
questões coletivas deve, obrigatoriamente, integrar-se ao ambiente como um
membro dessa coletividade para compreender melhor o processo saúde-doença e
os fatos causadores das nocividades ambientais, propondo uma atuação efetiva
para a obtenção de meios que protejam a saúde do coletivo a que se dispôs a
estudar. Além disso, buscou-se não somente uma vasta referência bibliográfica, mas
também participar de vários eventos sobre a reciclagem de resíduos sólidos. Nesses
momentos, teve-se a oportunidade de conhecer os atores dos processos, as suas
realidades, as suas demandas e as suas reivindicações na busca de melhores
condições de trabalho.
2.2 – Ambiente de trabalho. Sustentável?
Para a Organização Mundial de Saúde (OMS) o ambiente é definido como “a
totalidade de elementos externos que influem nas condições de saúde e qualidade
de vida dos indivíduos ou de comunidades”. Essa noção de ambiente, segundo
a
Unidade de Pesquisa integrante da estrutura básica do Ministério da Ciência e Tecnologia.
24
Barcellos (2002, p.315), é mais operacional que teórico, na medida em que não se
considera a dinâmica do ambiente em si (elementos físicos, sociais e biológicos),
mas apenas sua interação com as populações humanas. Sendo constituído por
elementos externos aos indivíduos, o ambiente não pode ser tomado como uma
característica desses indivíduos, mas algo externo a ele.
O ambiente deve ser estruturado por processos sociais, políticos, culturais e
tecnológicos e deve ser entendido como espaço geográfico ocupado e transformado
pelo ser humano (Augusto, 2005, p.11). Assim, o ambiente pode ser entendido como
o conjunto de condições materiais, socioculturais, psicológicas e morais que
envolvem pessoas e as ações decorrentes de seus atos.
O efeito na saúde provocado pelas condições ambientais em que as
atividades laborais são exercidas vem sendo questionado desde a época de
Hipócrates. Segundo Rego (2006,p.234), na obra hipocrática intitulada, “Ares, Águas
e Lugares”, Hipócrates “correlaciona o ambiente aos diferentes quadros nosológicos
e características populacionais, incluindo em sua análise, inclusive, aspectos das
atividades cotidianas, numa interessante e rica descrição dos efeitos ambientais na
saúde de indivíduos e populações”.
O impetuoso processo de industrialização e urbanização desencadeados nos
séculos XIX e XX contribuiu, de forma marcante, para os problemas ambientais e de
saúde pública vividos na atualidade. As ações de prevenções e preocupações
sanitárias estavam vinculadas à teoria dos miasmas, em que a sujeira e os odores
deveriam ser eliminados para se evitar a disseminação de doenças.
A higiene
passou a ser uma estratégia para a saúde da população, combinada com o controle
dos espaços público-urbanos, incluindo ruas, moradias, locais de despejos de lixo,
sujeiras em geral e toxicidade e de grupos focais que ofereciam perigos à população
devido à sujeira que apresentavam, estando incluídos os pobres, as minorias étnicas
e algumas classes de trabalhadores (Freitas, 2003, p.139).
Ainda de acordo com Freitas (2003, p.139), as questões relacionadas à saúde
passam a compor as pautas de reivindicações dos movimentos sociais surgindo,
nesse momento, a compreensão da crise sanitária como processo político e social,
passando a ser denominada como medicina social. A partir de então, a política
aparece como principal recurso de mudança e transformação da realidade da saúde,
o ambiente deixa de ser um objeto medicalizável por meio de normatização e de
práticas aplicada no âmbito individual.
25
Para Minayo, (2008, p. 249), as doenças, do ponto de vista da sociedade,
estão conectadas à saúde, como um processo vivificante ou como uma ação ligada
a fatores endógenos ou exógenos para a sua manifestação. As doenças nas
sociedades ocidentais contemporâneas, ainda segundo Minayo (2008, p. 249), estão
assim correlacionadas,
“os fatores endógenos do adoecimento são representados como processos
biológicos funcionais, orgânicos ou como lesões que ocorrem nos
indivíduos por sua carga hereditária ou por descuido com a saúde. Os
fatores exógenos são explicados pelo estilo de vida e pela relação dos
cidadãos com o ambiente”.
A relação entre saúde e ambiente começa a se entrelaçar somente a partir de
meados do século XX, quando os ambientes passam a ser focados como uma
questão de saúde pública, surgindo aí a definição da Organização Mundial de Saúde
(OMS), onde:
“Saúde ambiental é o campo de atuação da saúde pública que se ocupa
das formas de vida, das substâncias, e das condições em torno do ser
humano, que podem exercer alguma influência sobre a sua saúde e o seu
bem-estar” (MS, 1999).
Partindo dessa premissa, a OMS passa a encarar a saúde ambiental como:
“... todos aqueles aspectos da saúde humana, que estão determinados por
fatores físicos, químicos, biológicos, sociais e psicológicos no meio
ambiente. Também se refere à teoria e prática de valorar, corrigir, controlar
e evitar aqueles fatores do meio ambiente que, potencialmente, possam
prejudicar a saúde de gerações atuais e futuras” (MS, 1999).
Além do compromisso político, insere-se no contexto a responsabilidade de
todos por um ambiente saudável e sustentável a ser apresentado aos nossos
descendentes.
Documento elaborado pelo Ministério da Saúde (MS) (Brasil, 2007, p. 18)
enfatiza que, com o objetivo de se ampliar o conceito de saúde como prática social,
pode-se verificar a estreita ligação entre os diversos estágios que incluem os
indivíduos, as organizações, os grupos populacionais e os conflitos instaurados com
o meio ambiente. Com este foco, atos de cooperação, solidariedade e transparência
precisam ser resgatados. A promoção da saúde não deve ser um rol de
procedimentos e dicas para capacitar indivíduos e organizações que pretendam
26
controlar os determinantes das condições de saúde de grupos específicos (Brasil,
2007, p. 18).
As políticas do MS (Brasil, 2007, p. 19), focando o fortalecimento da
promoção da saúde, propõem alguns caminhos que deverão ser pensados e
seguidos, tais como, “a) estabelecimento de políticas públicas integradas; b)
promoção e responsabilidade social; c) criação de ambientes saudáveis que apóiem
o bem-estar humano; d) influências políticas de desenvolvimento econômico que
promovam ganhos em saúde; e) fortalecimento da ação social participativa para a
saúde; f) estímulo para o desenvolvimento das capacidades e dos potenciais
individuais de grupos populacionais (empoderamento social); g) utilização dos meios
de comunicação como veículo de prevenção e promoção da saúde; e h)
reorientação das práticas de saúde, englobando a promoção da saúde”.
Diante de toda a problemática instaurada acerca das questões ambientais
que afetam diretamente grupos de indivíduos, principalmente aqueles mais
vulneráveis, faz-se necessária a adoção de medidas, de caráter privado para o
público, incluindo a proteção e conservação dos recursos naturais, a fim de se
contribuir para a minimização dos danos causados ao meio ambiente e à saúde
humana.
2.3 – Lixo e suas nuances - definição e classificação
Várias definições são utilizadas para os termos lixo e resíduos sólidos e,
pesquisadores do assunto, tais como Guatarri (1989), Rezende (2006), Ferreira
(2001), Porto (2004), dentre outros, têm utilizado com maior freqüência o termo
“resíduos sólidos” em substituição a lixo. Será adotada, também, essa terminologia.
Os resíduos sólidos podem ser definidos como materiais constituídos de
vários elementos, portanto, heterogêneo e inerte, de natureza mineral ou orgânico.
São materiais resultantes das atividades humana e da natureza e, na sua maioria
podem ser transformados para uma nova utilização contribuindo assim, para a
proteção à saúde pública e para as questões dos recursos naturais. Outra definição
para lixo, segundo o Manual de Gerenciamento Integrado de Resíduos Sólidos
(MGIRS) (MGIRS, 2001, p. 25), é “todo material sólido ou semi-sólido indesejável e
27
que necessita ser removido por ter sido considerado inútil por quem o descarta em
qualquer recipiente destinado a este ato”.
Segundo a Associação Brasileira de Normas Técnica (ABNT), por meio da
Norma Brasileira (NBR) 10.004/2004, os resíduos sólidos são definidos como:
“Resíduos nos estados sólido e semi-sólido, que resultam de atividades de
origem industrial, doméstica, hospitalar, comercial, agrícola, de serviços e
de varrição. Ficam incluídos nesta definição os lodos provenientes de
sistemas de tratamento de água, aqueles gerados em equipamentos e
instalações de controle de poluição, bem como determinados líquidos cujas
particularidades tornem inviável o seu lançamento na rede pública de
esgotos ou corpos de água, ou exijam para isso soluções técnica e
economicamente inviáveis em face à melhor tecnologia disponível“
E, ainda de acordo com a NBR 10.004/2004, os resíduos sólidos são
classificados conforme segue:
a) resíduos classe I – Perigosos:
Aqueles que apresentam periculosidade, que podem causar riscos à saúde
pública ou ao meio ambiente, compreendendo inflamabilidade, corrosividade,
reatividade, toxicidade e patogenicidade. Se manuseados ou descartados de
forma inadequada, causam efeitos adversos ao meio ambiente. As pilhas e
baterias estão aqui classificadas devido à sua composição química que pode
apresentar os elementos como chumbo, níquel, cádmio, mercúrio, lítio, zinco,
manganês e seus compostos.
Os óleos lubrificantes usados, os fluidos e óleos hidráulicos usados e as
graxas são resíduos tóxicos devido à grande quantidade de elementos
químicos que os constituem. Segundo a NBR 10.004/2004, os constituintes
perigosos desses resíduos estão classificados como “não aplicável” - termo
utilizado para os resíduos perigosos que contêm grande número de
constituintes perigosos ou pelo resultado tóxico da totalidade dos elementos
neles contidos.
b) resíduos classe II – Não perigosos:
Resíduos classe II A:
28
Não
inertes:
Podem
ter
propriedades
de
biodegradabilidade,
combustibilidade ou solubilidade em água; apresentam a possibilidade de
causar danos à saúde e ao meio ambiente;
Resíduos classe II B:
Inertes e incombustíveis: Não oferecem riscos à saúde nem ao meio
ambiente.
Assim, “lixo” é a totalidade de resíduos sólidos derivada das ações humanas,
podendo ser classificado como lixo urbano, domiciliar, comercial, público, especial,
industrial, de serviços de saúde, atômico, espacial e radioativo, estando distribuídos
em dois grandes grupos: Orgânicob e inorgânicoc, (Rezende, 2006, p. 589). Nesse
contexto, estão inseridos os restos de produtos químicos de empresas e indústrias
que são, na maioria das vezes, descartados sem o rigor necessário para esse fim e
sem a adoção do “manifesto de resíduos”, conforme determinado pela Resolução do
Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) nº 313/2002.
A fiscalização, quanto ao destino desses resíduos, no Estado do Rio de
Janeiro, é de responsabilidade do Instituto Estadual do Ambiente (INEA), órgão
vinculado à Secretaria de Estado do Rio de Janeiro. Criado em 2007, o INEA tem a
missão de proteger, conservar e recuperar o meio ambiente visando o
desenvolvimento sustentável. As ações que eram desenvolvidas pela Fundação
Estadual de Engenharia e Meio Ambiente (FEEMA), pela Superintendência Estadual
de Rios e Lagoas (SERLA) e pelo Instituto Estadual de Florestas (IEF) foram
unificadas e ampliadas pelo INEA. Assim, a fiscalização que era realizada pela
Fundação Estadual de Engenharia e Meio Ambiente (FEEMA), que admitia não
possuir condições operacionais para a correta monitorização (Acselrad, 2006, p.
122), passa a partir de então a ser de responsabilidade do INEA.
b
Restos de animais e vegetais. Esse lixo é composto por folhas, galhos, materiais provenientes da
limpeza de nossas casas, restos e sobras de alimentos e que, após coletado pode ser transformado
em composto orgânico (adubo).
c
Restos de materiais sem vida, inanimados. Lixo inorgânico inclui todo material que não possui
origem biológica ou que foi produzido por meios não-naturais, como plásticos, produtos de metal,
vidro, detergentes, etc.
29
Os resíduos sólidos são classificados de várias maneiras, sendo as mais
comuns e utilizadas, quanto aos potenciais riscos de contaminação ao meio
ambiente e à saúde humana e quanto à sua origem e natureza. Segundo o
Compromisso Empresarial para Reciclagem (CEMPRE), os resíduos sólidos estão
classificados de acordo com o quadro 1.
O CEMPRE é uma associação, fundada em 1992, sem fins lucrativos, que
tem como objetivo promover a reciclagem ressaltando o conceito de gerenciamento
integrado do lixo, além de adotar ações para a conscientização da sociedade sobre
a redução, reutilização e reciclagem dos resíduos sólidos. Os programas de
conscientização são orientados para prefeitos, gestores de empresas, acadêmicos
de Organizações não-governamentais.
Quadro 01 – Classificação dos resíduos sólidos
CLASSIFICAÇÃO DOS RESIDUOS SÓLIDOS
Secos
Quanto à Natureza Física
Quanto à Composição Química
Quanto aos Riscos Potenciais ao
Meio Ambiente
Quanto à Origem
Molhados
Matéria Orgânica
Matéria Inorgânica
Resíduos Classe I – Perigosos
Resíduos Classe II – Não perigosos:
Resíduos classe II A – Não Inertes
Resíduos classe II B – Inertes
Doméstico, Comercial e Público
Serviços de Saúde e Resíduos Especiais
Pilhas e Baterias
Lâmpadas Fluorescentes
Óleos Lubrificantes e Pneus
Embalagens de Agrotóxicos
Radioativos
Construção Civil/Entulho
Industrial, Portos, Aeroportos e Terminais
Rodoviários e Ferroviários
Agrícola
Fonte: IPT/CEMPRE, 2000
O lixo pode ainda ser classificado de acordo com a sua natureza e origem e,
segundo o Manual de Gerenciamento de Resíduos Sólidos (2001, p. 26), está assim
apresentado:
1. Doméstico ou Residencial: Decorrentes das atividades diárias de
casas, condomínios, apartamentos e demais moradias;
30
2. Comercial: Resultantes de atividades comerciais e de acordo com o
ramo exercido;
3. Público: Os resíduos de logradouros públicos compreendem folhas,
galhas, poeira, terra e areia e todos os materiais descartados
indevidamente pela população;
4. Domiciliar Especial: São os entulhos de obras, pilhas e baterias,
lâmpadas fluorescentes e pneus;
5. Fontes Especiais: Resíduos que, por suas características peculiares,
carecem de cuidados especiais no manejo, acondicionamento,
transporte, armazenamento e disposição final.
Neste grupo, estão
inseridos o lixo industrial, o radioativo, o de portos, aeroportos e
terminais rodoferroviários, o agrícola, e os de serviços de saúde.
Tão importantes quanto a classificação são o manejo, o processamento e,
principalmente, a forma de disposição final da grande quantidade de resíduos que é
gerada diariamente de toda natureza e origem. O consumo desenfreado de produtos
industrializados e descartáveis, característico da sociedade pós-moderna contribui
para o aumento considerável de resíduos que, se descartados de forma inadequada,
irão, consequentemente, provocar uma série de problemas ambientais e à saúde
pública.
Os resíduos sólidos urbanos produzidos diariamente no Brasil são destinados
aos seguintes locais:
1. Lixão ou descarga a céu aberto: disposição dos resíduos sem
nenhuma medida de proteção ambiental ou à saúde pública, (Mariga,
2005, p. 184). O lixão, além de não atender às normas de proteção
ambiental, é um ambiente propício à proliferação de vetores
responsáveis pela transmissão de várias doenças, dentre elas:
meningite, leptospirose, raiva, peste bubônica. Como não há controle,
os lixões contaminam o solo e o lençol freático pela ação do chorume.
31
2. Aterro controlado ou lixão controlado: os resíduos dispostos são
cobertos por uma camada de terra, o que beneficia apenas a poluição
visual, mas provoca os mesmos males do lixão.
3. Aterro sanitário e aterro energético: é o processo mais avançado e
legal de disposição final dos resíduos sólidos, uma vez que seguem
critérios de engenharia e normas operacionais específicasd. O lixo é
confinado de forma segura, o solo é impermeabilizado; existe o
controle da poluição ambiental; há a proteção ao meio ambiente e não
há riscos à saúde pública e à segurança; e os gases e líquidos
produzidos são controlados. Esse tipo de aterro tem vida útil e deve ser
desativado após o período determinado.
Levantamentos realizados pela Pesquisa Nacional de Saneamento Básico
(PNSB) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) (PNSB, 2000),
indicam que a situação da destinação final de resíduos sólidos no País está
distribuída conforme disposto na tabela 1.
Tabela 1 – Disposição do volume de lixo coletado,
por tipo de disposição final, Brasil, 2000.
LOCAIS DE DISPOSIÇAO
% de lixo disposto
Aterro Sanitário
47,1
Aterro controlado
22,3
Lixões
30,5
Fonte: IBGE/PNSB, 2000
Considerando os dados acima, conclui-se que apenas 47,1% do total de
resíduos coletados no país têm uma destinação correta a aterros sanitários e que
52,8% são dispostos de forma inadequada, implicando, assim, sérios riscos ao meio
ambiente e graves conseqüências à saúde pública.
d
NBR Nº 8.419, da ABNT (1984).
32
Dados da Companhia Municipal de Limpeza Urbana (COMLURB) mostram
que na cidade do Rio de Janeiro são coletadas, diariamente, cerca de 8.800
toneladas de lixo domiciliar e demais resíduos produzidos em toda cidade. Desse
total, 60% representam a quantidade de lixo domiciliar. A média de produção diária
por pessoa é de 1,505 kg/habitante por dia. Do total de lixo recolhido, por dia, do Rio
de Janeiro, cerca de 6.700 toneladas são despejadas no Aterro metropolitano de
Gramacho, situado no bairro de Jardim Gramacho, município de Duque de Caxias.
Esse aterro, inicialmente, foi projetado como aterro sanitário, mas funcionou como
lixão até meados de 1990. A partir de 1996, após pressão de várias entidades,
inclusive do Ministério Público, a COMLURB resolveu terceirizar a gestão do aterro,
ocorrendo assim, investimentos para a transformação do mesmo em aterro sanitário,
(Porto et al, 2004, p. 1504).
O Gerenciamento integrado dos resíduos sólidos requer uma articulação com
ações normativas, operacionais, financeiras e de planejamento, fundamentada em
práticas sanitárias, ambientais e econômicas envolvendo todo o processo, de forma
criteriosa, desde a sua geração até a sua disposição final (Ferreira et Tabourgi,
2009, p. 160). O descarte inadequado dos resíduos sólidos, portanto, sem critérios
específicos, provoca um impacto ambiental que não só afeta o ecossistema, como
também o bem-estar da população circunvizinha.
Para Leff (2009, p. 57) a adoção de práticas com sustentáculos ecológicos
não são suficientes para a resolução dos problemas ambientais. Atos de inovação
tecnológica para reciclagem de rejeitos contaminantes, de incorporação de normas
ecológicas ao agente econômico ou de valorização do patrimônio dos recursos
naturais não são suficientes para um desenvolvimento sustentável. Necessário se
faz reconhecer a importância da multiplicidade étnica e cultural da humanidade
visando um resultado harmônico com a natureza.
Segundo a resolução CONAMA 01/86, o impacto ambiental é caracterizado
como qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio
ambiente, motivada por diversos tipos de matéria ou energia, resultantes das
atividades humanas que, de forma direta ou indireta, venham afetar:
I – a saúde, a segurança e o bem-estar da população;
II – as atividades sociais e econômicas;
III – a biota;
33
IV – as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; e
V – a qualidade dos recursos ambientais.
Essa resolução determina, em seu artigo 2º, que o licenciamento de
atividades modificadoras do meio ambiente, onde se incluem a construção de
aterros sanitários, o processamento e a destinação final de resíduos tóxicos ou
perigosos, dependerá da elaboração de estudos que culminem no Relatório de
Impacto Ambiental (RIMA), devendo este ser submetido à aprovação do órgão
estadual competente. Essas medidas objetivam acompanhar as etapas de
planejamento e implantação das atividades, avaliando sistematicamente os impactos
gerados nas fases iniciais e de operação. Contempla também a limitação da área
geográfica a ser direta ou indiretamente afetada.
Nos últimos anos, a legislação ambiental brasileira, além de focar o
gerenciamento dos resíduos sólidos, tem se voltado para as condutas e atividades
que venham danificar o meio ambiente, conforme disposto no artigo 54 da Lei nº
9.605/98. Essa Lei estabelece sanções penais e administrativas frente a condutas e
atividades lesivas ao meio ambiente.
Pesquisas realizadas (Sisinno et al, 1996; Jucá, 2002, Ferreira, 2001; Porto,
2004) em diversas áreas de descarte de resíduos sólidos demonstram altos níveis
de contaminação ambiental que interferem diretamente na saúde das populações
provocando efeito adversos e muitas vezes irreversíveis. Essa vulnerabilidade é
ainda maior para os que estão inseridos nessas áreas, manuseando todo tipo de
material, orgânico e inorgânico, seja em lixões a céu aberto, seja em aterros
controlados e/ou sanitários, seja em cooperativas de material reciclável. Esses
trabalhadores representam o último nível de estratificação social, com baixo nível de
escolaridade, desqualificados para o mercado de trabalho e marginalizados por
políticas econômicas sociais excludentes.
Segundo Sisinno et al (1996, p. 523), os estudos que analisam os níveis de
contaminação e poluição ambiental em locais de evacuação de resíduos sólidos e os
consequentes efeitos à saúde da população circunvizinha estão arrolados, dentre
outras questões, de significativa relevância envolvendo conflitos sociais, ambientais,
sanitários, políticos e econômicos. Para a pesquisadora, esses estudos devem servir
como sinais de alerta para que os problemas decorrentes do lixo não sejam
colocados ao acaso e não caiam no esquecimento dos responsáveis, evitando que
34
esses locais tenham um estilo de vida degradante resultante de condições
discriminativas.
A gestão integrada dos resíduos sólidos se transforma em uma ferramenta
poderosa e eficaz no contexto brasileiro frente à enorme quantidade de resíduos
gerados diariamente no Brasil e frente à falta de políticas e de investimentos
públicos compatíveis com essa problemática, (Jucá, 2002, p. 17). A adaptação dos
resíduos sólidos a uma nova utilização – reciclagem – torna-se um caminho
conveniente à minimização dos problemas ambientais, à redução do lixo e,
principalmente, à geração de renda e resgate da cidadania de uma parcela da
população brasileira, consistindo em uma atividade emergente à preservação
ambiental e em um meio de sobrevivência para os catadores de lixo.
Gonçalves (2004, p.27) define uma cadeia produtiva de reciclagem
preenchida por vários elementos e percursos. Para a pesquisadora, essa cadeia tem
sua gênese no produto, componente principal do consumo, e sua finalização no lixo,
dado o comportamento consumista da nossa sociedade. Dessa forma, o descarte é
a própria produção de lixo e este terá vários destinos de acordo com as práticas e
políticas adotadas pela comunidade que o descartou. Nos ambientes de destinação
final do lixo, encontramos os profissionais que coletam, classificam e separam o
material misturado.
Os catadores vinculados às cooperativas ou com atuação
autônoma negociam o material coletado para atravessadores, os quais, por sua vez,
revendem para a indústria. A indústria reprocessará o material reciclável, produzindo
um novo produto que retornará ao ciclo do consumo.
O debate sobre a problemática dos resíduos sólidos está enfatizado na
Agenda 21, desde a sua geração até a sua disposição final, o que vem afirmar a
relevância do tema e a necessidade de uma atenção especial para as questões
ambientais e o conseqüente desfecho para a saúde. A redução do lixo ao mínimo
possível, a máxima reutilização de produtos e embalagens, a reciclagem
ambientalmente correta dos resíduos, a definição de áreas para o descarte
ambientalmente sustentável, a ampliação dos serviços e a adoção de políticas
adequadas, eficientes e eficazes tendem a resultar em um desenvolvimento
sustentável focado no meio ambiente e na saúde humana.
35
Figura 1 – Cadeia Produtiva da Reciclagem
PRODUTO
CONSUMO
DESCARTE
LIXO
LIXOES
USINAS
ATERROS
CATADORES DE MATERIAIS
RECICLAVEIS
COMÉRCIO
INDÚSTRIA
ATRAVESSADORES
Fonte: Gonçalves (2004, P.28).
Para Pacheco-Ferreira (2005, p. 41), a luta por um ambiente ecologicamente
responsável deve contrapor-se à visão empresarial e ser focado em projetos
voltados para a qualidade de vida da população e a preservação do meio ambiente,
observando-se que os aspectos sociais e culturais das populações devem ser
conservados. Essa luta deve se guiar pelos critérios universais de desenvolvimento
sustentável, equidade social, atitudes e educação ambiental, compartilhamento de
tecnologias, dentre outros. Todos pautados em uma prática ética e social de
cidadania.
2.4 – Resíduos Químico-Perigosos
Grande quantidade de produtos químicos tóxicos é descartada, diariamente,
no lixo doméstico. As substâncias químicas presentes em muitos produtos, como os
metais pesados zinco, chumbo e manganês encontrados em pilhas comuns, além de
substâncias perigosas como o cádmio, o cloreto de amônia e o negro acetileno
apresentam riscos potenciais à saúde pública e ao meio ambiente.
Os resíduos tóxicos comumente encontrados no lixo urbano, na sua maioria,
são provenientes das pilhas não-alcalinas, baterias, restos de tintas e solventes,
remédios vencidos, inseticidas, produtos de limpeza, produtos eletroeletrônicos,
dentre outros. A separação adequada e o acondicionamento desses materiais deve
ser cuidadosa e diferenciada para se evitar a contaminação do solo, do lençol
36
freático e a contaminação humana. Segundo Rezende (2006, p. 589), os resíduos
eletrônicos ou `lixo digital´, provenientes do acelerado desenvolvimento da
tecnologia da informação, podem causar graves e sérios problemas para o ambiente
e para a saúde do homem devido à quantidade de metais pesados presentes em
suas composições.
A Associação Brasileira de Normas Técnicas, através da Norma Brasileira
(NBR 10.004/2004), esclarece que os resíduos tóxicos “podem apresentar riscos à
saúde pública, provocando ou contribuindo para um aumento da mortalidade ou
incidência de doenças, e/ou apresentar efeitos adversos ao meio ambiente, quando
manuseados ou dispostos de forma inadequada”. Essa norma classifica os resíduos
sólidos quanto à sua periculosidade, observando os potenciais riscos ao meio
ambiente e à saúde pública para um adequado gerenciamento.
A classificação da periculosidade é determinada em decorrência das
substâncias identificadas em testes laboratoriais complementares, considerando-se
os parâmetros químicos analisados nos lixiviados e solubilizados dos resíduos
(Sisinno, 2003, p. 370). Essa classificação contribui para a forma de gerenciamento
adequado dos resíduos, facilitando o seu correto manuseio, transporte adequado,
armazenamento e tratamento ou destinação final que contribuam para a qualidade
do meio ambiente e para a saúde da população em geral.
O contato e a exposição a diversos resíduos químicos podem levar o
indivíduo a um nível de toxicidade aguda ou crônica, diferindo de indivíduo para
indivíduo devido à susceptibilidade de cada um. Uns, respondem a doses muito
baixas, outros necessitam de doses mais elevadas para apresentar algum sintoma.
A toxicidade é uma resposta biológica à exposição a um ou a vários compostos
químicos e/ou seus metabólitos (Ghiselli e Jardim, 2007, p. 696). Para esses
autores,
algumas
substâncias,
conhecidas
mundialmente
como
“endocrine
disruptors” ou como “endocrine disrupting”, interferem no funcionamento natural do
sistema endócrino, além de causar cânceres e afetar o sistema reprodutivo.
Harris e Blain (2004, p. 30) enfatizam que altas doses de uma substância
química tóxica podem levar o indivíduo a uma aguda resposta tóxica, mas as
exposições prolongadas a baixas concentrações podem apenas causar um lento
desenvolvimento de uma resposta crônica. Portanto, as circunstâncias da exposição
e o nível de toxicidade do elemento é que determinará o maior risco. Vários
elementos que apresentam indícios de causar alterações no sistema endócrino são
37
encontrados facilmente nos resíduos sólidos. Assim, os trabalhadores que
manuseiam esses materiais estão passíveis e vulneráveis à contaminação.
Estudos realizados por Sisinno et al (2003, p.675), concluem que foram
encontrados, em amostras analisadas de resíduos sólidos, vários Hidrocarbonetos
Policíclicos Aromáticos (HPAs) - substâncias lipofílicas, persistentes, que se
distribuem de acordo com as condições físico-químicas de cada ambiente -, sendo
prevalentes o benzo[a]pireno, fluoranteno e criseno. A identificação dessas
substâncias nos resíduos indica a periculosidade existente, confirmando assim a
necessidade de ações adequadas no gerenciamento desse resíduo.
O descarte final dos resíduos sólidos suscita controvérsias quanto à sua
classificação e à sua real capacidade de contaminação devido aos iminentes riscos
para o meio ambiente e para a saúde humana, (Ferreira, 1995, p. 316), pois quanto
mais perigosos, maiores deverão ser os cuidados com o acondicionamento e com o
destino final adequado. Nessa mesma linha, os resíduos químicos devem ser
tratados com rigor, considerando-se os riscos que esses produtos apresentam.
Materiais perigosos, tais como solventes, ácidos, pesticidas, tintas e produtos de
limpeza podem ser encontrados facilmente nos lixos domésticos e urbanos. Por não
haver um tratamento específico na fonte geradora, esses componentes são
manuseados normalmente por aqueles que estão na cadeia da reciclagem.
A falta de conhecimento acerca dos graves problemas que as substâncias
químicas podem causar à saúde leva os trabalhadores a ignorar sinais e sintomas
que se manifestam em decorrência da exposição a que estão submetidos nos
ambientes de trabalho. Segundo Pacheco-Ferreira (2009, p. 578), a exposição a
agentes tóxicos pode causar danos ao sistema nervoso central e periférico
desenvolvendo
encefalopatias
e
desajustes
neuropsicológicos,
tais
como:
“desordens afetivas, diminuição da memória e da atenção, fadiga, distúrbios visuais,
entre outros”, além de dormência e perda progressiva da coordenação motora. Os
efeitos a essas exposições podem ser reversíveis ou irreversíveis, dependendo do
nível e do tempo de exposição.
O conhecimento do nível de toxicidade dos diversos elementos encontrados
nos resíduos sólidos possibilita o manejo adequado, o controle da exposição dos
trabalhadores a esses elementos e um destino diferenciado dos demais objetos. No
caso dos trabalhadores que lidam com os resíduos sólidos, a falta de consciência
dos riscos aos quais estão expostos os leva a se posicionar de forma pacífica a
38
qualquer ameaça à saúde. Para Giddens (1991, p. 42), a falta de consciência de
uma ameaça pode levar o sujeito a assumir ações ou sujeitar-se a situações
arriscadas, considerando, ainda, que o risco não é somente uma questão de ação
individual, mas que pode afetar coletivamente outros indivíduos.
De acordo com Asmus et al (2009, p. 550), o conceito de risco em saúde do
trabalhador é,
“toda e qualquer possibilidade de que algum elemento ou circunstância
existente num dado processo e ambiente de trabalho possa causar dano à
saúde, seja através de acidentes, doenças ou do sofrimento dos
trabalhadores, ou ainda através da poluição ambiental”.
Os fatores de riscos podem ser classificados como químicos, biológicos,
físicos, ergonômicos, mecânicos. Além disso, a organização do trabalho, ou fatores
psicossociais, contribui para os efeitos de avaliação e prevenção da saúde do
trabalhador, tanto em nível coletivo quanto em nível individual. Para uma
investigação de exposição ocupacional, o profissional de saúde deve estar
embasado dos fatores e condições de riscos aos quais o trabalhador está
submetido.
No campo da saúde ambiental, a pesquisa sobre poluentes químicos e
causadores de doenças carece de prioridade devido ao grande número de
substâncias químicas que são utilizadas em quase todas as atividades econômicas.
Tais poluentes provocam efeitos adversos à saúde dos trabalhadores e à sociedade
em geral, (Câmara e Tambellini, 2003, p. 96). Esses autores enfatizam que na
avaliação à exposição e aos efeitos desses poluentes existe uma ausência ou
precariedade dos conhecimentos toxicológicos, metodológicos e tecnologias
complexas e, ainda, de técnicas para monitoramento ambiental que são descartadas
das rotinas das equipes técnicas. Segundo Pinto Júnior e Braga (2009, p. 2011), o
campo da saúde do trabalhador ainda não foi incorporado totalmente pelo SUS, uma
vez que poucos são os profissionais com capacitação adequada, principalmente em
toxicologia, para identificar nexos causais decorrentes da exposição a substâncias
químicas.
O estudo realizado por Ferreira et al ( 2001, p. 692) constatou uma grande
variedade de elementos químicos nos resíduos sólidos urbanos, merecendo
destaque a quantidade de pilhas, baterias, óleos e graxas, pesticidas/herbicidas,
39
solventes e tintas, produtos de limpeza, cosméticos, remédios e aerosóis. Muitos
desses resíduos são perigosos e têm efeitos nocivos à saúde humana e ao meio
ambiente. Chumbo, cádmio e mercúrio, metais pesados com efeitos cumulativos,
podem causar várias doenças, de distúrbios no sistema nervoso ao saturnismo. Os
pesticidas e herbicidas, por sua alta solubilidade, podem ocasionar intoxicações
agudas, além de serem também neurotóxicos.
2.5 – Lixo, outras visões: Europa, Estados Unidos e Japão
As questões concernentes à gestão dos resíduos sólidos urbanos
apresentam-se
de
forma
contundente
em
quase
todas
as
sociedades
contemporâneas. O processo de industrialização e a aglomeração de pessoas nos
grandes centros urbanos propiciaram o incremento em quantidade de alimentos e de
inúmeros
produtos
para
atender
às
necessidades
de
uma
sociedade
progressivamente consumista e alienada dos problemas decorrentes do aumento do
consumo no panorama mundial. Essa postura é a principal responsável por acelerar
o processo de transformação da matéria-prima em resíduos a serem descartados, o
que caracteriza a insustentabilidade entre o tripé produção, consumo e geração de
lixo.
Embora em maior proporção, o continente europeu, como o Brasil, vem
sofrendo as conseqüências da grande produção de resíduos. Tal superlativação
reside não apenas no fato de a Europa ser muito povoada, o que contribui para o
aumento da produção de resíduos, mas também na falta de espaços para a
manutenção e criação de novos aterros sanitários. Essas questões têm sido uma
preocupação em todo o continente, obrigando a comunidade européia a determinar
normas que controlem a produção de lixo.
Essa situação levou a União Européia (UE) a exigir que os países membros
adotem medidas para diminuir a produção de resíduos sólidos, cuja meta consiste
na redução de 35% do total de lixo a serem destinados a aterros, tendo como base o
ano de 1995, a ser atingida até 2020. Para o alcance dessa meta, a UE começou a
restringir o uso de aterros, considerando os diversos problemas que estes causam
ao meio ambiente e à saúde da população (GLOBO ONLINE, 2008).
40
O procedimento mais adotado para o descarte de resíduos sólidos na Europa
e nos Estados Unidos é a incineração. Países como Japão e Alemanha e vários
estados do leste dos Estados Unidos utilizam os vapores resultantes da incineração
dos resíduos para movimentar turbinas que podem gerar eletricidade utilizada para o
aquecimento ou refrigeração de residências (Ferreira et Tambourgi, 2009, p. 159).
Segundo Ferreira e Tambourgi (2009, p. 159), os países europeus que
adotam o processo de incineração dos resíduos sólidos aplicam o conceito de
responsabilidade compartilhada entre as esferas públicas e privadas. Essa postura
envolve o poder público com políticas adequadas, permitindo englobar ações de
controle, de fiscalização e de programas de conscientização da população. As
empresas privadas mantêm-se responsáveis pela incineração, cabendo à indústria o
compromisso de gerar produtos recicláveis que retornem à cadeia de consumo, e à
sociedade, orientada pelo poder público, a participar do processo de separação dos
resíduos gerados.
Em vários países europeus, como na Alemanha, Holanda e Dinamarca, não
existem mais lixos sem processamento prévio dispostos em aterros sanitários, pois
suas legislações não permitem tal prática. Na Alemanha e Holanda, menos de 5%
dos resíduos são aterrados, uma vez que a prioridade no tratamento é a reciclagem,
correspondendo, em alguns casos, a cerca de 50% do lixo produzido. O restante do
lixo não reciclado segue para incineração. A Alemanha contém cerca de 70 usinas
de incineração, de grande porte (figura 2) e a França, 100, perfazendo um total de
mais de 400 usinas em todo o continente europeu (Coraça, 2010). A utilização dessa
tecnologia exige investimentos de grande monta. Todavia, esse obstáculo pode ser
superado por meio de legislação apropriada no tocante à vigilância, fiscalização e
monitoramento e por meio de parcerias entre entidades públicas e privadas que
visem economia de escala e benefícios para o meio ambiente e para a saúde da
população.
Os países membros da Comunidade Européia adotam o determinado na
Diretiva 96/61/CE e nas Diretivas Comunitárias 94/67/CEE e 94/62/CEE, que
dispõem sobre prevenção e controle integrado da contaminação ambiental,
incineração de resíduos perigosos e parâmetros a serem utilizados para as
embalagens e seus resíduos, respectivamente. A legislação referente aos resíduos
sólidos em vários países europeus e nos Estados Unidos encontra-se em estágio
avançado, havendo prioridade aos princípios dos 3 R´s – Reduzir, Reutilizar e
41
Reciclar, em detrimento à destinação a incineradores ou a aterros (Xavier et al,
2006).
Na Tabela 2, pode-se observar o avanço da legislação relativa aos resíduos
sólidos em alguns países europeus, nos Estados Unidos e no Japão.
Figura 2 - incinerador Instalado na Alemanha
Fonte: Ferreira et Tambourgi, 2009
Tabela 2: Aspectos da legislação sobre resíduos sólidos nos Estados
Unidos da América, Japão e em Países Europeus
PAÍSES
LEGISLAÇAO
EUA
Coleta seletiva e postos de entrega voluntária. Em alguns
estados, há a exigência de, no mínimo, 25% do material reciclado
nas embalagens, como na Califórnia; a implantação do programa
de reciclagem de embalagens de óleo lubrificantes usados
(Carolina do Sul); a inclusão de metas de porcentagem de
reciclagem.
JAPAO
Em 1993 foi aprovada a Lei básica do meio ambiente, que
considera estratégias de prevenção e controle ambiental. Adota o
Princípio do poluidor-pagador. Em 1997, entrou em vigor a Lei
para promoção de coleta seletiva e reciclagem de recipientes e
embalagens.
Cont...
42
Continuação
PAÍSES
LEGISLAÇAO
ALEMANHA
Promulgou em 1991 a Lei Töpfer, que regulamenta sobre a
reutilização das embalagens, conferindo prioridade à reciclagem e
responsabilizando todos os setores da indústria e os
consumidores pela separação e reciclagem. Sistema de coleta:
retorno com depósito autorizado gerenciado pela DSD (Duales
System Deutschland); Eco-selo – Green Dot (exigido desde
1993). Neste país, a reciclagem energética não é autorizada.
AUSTRIA
Desde 1992, todas as embalagens plásticas contendo bebidas
estão sujeitas a um imposto equivalente a R$ 0,66. Contribuições
com valores menores, no entanto, são cobradas para recipientes
não-retornáveis e de vidro. Sistema de coleta: retorno com
depósito autorizado. Gerenciado pela ARA (Altsoff Recycling
Austria), equivalente ao DSD alemão.
BELGICA
Há um acordo voluntário, desde 1990, entre as indústrias e o
Estado, com o objetivo de atingir o percentual de material
incinerado para 66% e a reciclagem para 28%. Existe a cobrança
da Eco-taxa e Eco-selo – Green Dot, além de sistema de retorno
com depósito autorizado.
DINAMARCA
Primeiro país europeu a estabelecer leis para coleta e reciclagem
de embalagens em 1984. A produção interna de bebidas, como
cerveja e refrigerante, é feita em garrafas retornáveis. Adota a
reciclagem energética para resíduos sólidos domiciliares; Ecotaxa e Eco-selo.
ESPANHA
Em 2002, foi promulgada a Lei 16/2002 para prevenção e controle
integrados da contaminação. Desde 1988, vigora a R.D. 833/88
que determina os métodos de caracterização dos resíduos tóxicos
e perigosos. Em 2002, através da ordem MAM/303/2002 foram
definidos os padrões operacionais de valorização e eliminação de
resíduos e a lista européia de resíduos. O procedimento de
instalação para incineração de resíduos foi regulamentado em
2003 através da R.D. 653/2003. Adota-se o princípio das Ecotaxas.
FRANÇA
Desde 1993 exige-se dos fornecedores de produtos embalados a
recuperação de suas embalagens. A reciclagem energética é
autorizada. Há sistema de coleta (Eco-Emballages S.A.) e Ecoselo (Point Eco-Emballages, equivalente ao Green Dot).
Cont...
43
Continuação
PAÍSES
LEGISLAÇAO
HOLANDA
Possui um acordo voluntário denominado Covenant, firmado entre
o governo holandês e as indústrias de embalagens, que deu
origem a uma associação conhecida como Verpakkingen, cujas
normas buscam reduzir a quase zero a disposição de resíduos ou
incineração que não sejam para a geração de energia, buscando
elevar o percentual de reciclagem de embalagens para 75%.
ITÁLIA
Em 1988, foram instituídos consórcios obrigatórios para coleta de
materiais de embalagem e programa de reciclagem. A legislação
ambiental italiana tem sido fortalecida desde 1990. Neste ano, foi
estabelecida uma legislação específica que implica taxas nas
sacolas de shopping (equivalente a R$ 0,12 para cada saco não
biodegradável) e para cada container de líquidos. A partir de
1991, todo material utilizado na fabricação de embalagens passou
a ser especificado. Permite-se a reciclagem energética de apenas
20% do lixo.
PORTUGAL
Acordos voluntários entre indústria e governo.
REINO UNIDO
Desde 1992, possui um acordo entre alguns setores da indústria
para tentar encontrar soluções comuns ao problema das
embalagens. Possui Eco-taxas. A legislação não faz distinção
entre
resíduos
de
embalagens
doméstica
e
industrial/comercial/institucional (ICI). Há, entretanto, a divisão de
responsabilidades entre fabricantes, conversores, embaladores e
vendedores.
SUÉCIA
Eco-taxa – embalagens one-way; Eco-selo e Sistema de coleta:
retorno com depósito autorizado.
SUIÇA
Desde 1985 foi determinado que 80 a 85% dos não-recicláveis
deveriam ser incinerados e o restante dos resíduos destinado a
aterros. Possui uma legislação severa sobre embalagens desde
1988, proibindo PVC e latas. Em 1991, entrou em vigor a
legislação que proíbe embalagens descartáveis de bebidas que
contenham menos de 400 ml. Eco-taxa para garrafas PET. Nessa
época, foram definidas algumas metas de reciclagem, como vidro
em 72%, PET em 54% e lata de alumínio em 69%, sendo que
todas as metas estabelecidas têm sido alcançadas e excedidas
voluntariamente.
Fonte: Xavier et al, 2006 (Adaptada)
Observa-se na tabela acima que a maioria dos países europeus adota a Ecotaxa e/ou Eco-selo como um meio adequado ao gerenciamento dos resíduos
44
sólidos, podendo-se constatar, ainda, que em quase todos os países citados na
tabela nº 2, foram estipuladas metas para o aumento do processo de reciclagem.
Nas referências estudadas acerca da problemática dos resíduos sólidos nos
EUA, no Japão e na Comunidade Européia, não se constata menção alguma a
trabalhadores envolvidos no processo de reciclagem. Quando citados os meios
adotados para esse fim, fala-se em empresas de cunho privado, subentendendo-se
que trabalhadores estejam vinculados a esse processo, porém não há nenhuma
alusão direta.
A Diretiva 2006/12/CE do Parlamento Europeu e do Conselho determina que
os Estados membros tomem medidas adequadas quanto à prevenção e redução da
produção ou da nocividade dos resíduos para, posteriormente, haver a sua
valorização para a reciclagem, reutilização, recuperação ou outras formas que
desencadeiem matérias-primas secundárias. No que tange aos trabalhadores, no
entanto, o que se observa é que, para obtenção dos resultados previstos, as
autoridades competentes deverão estabelecer planos que incidam, dentre outras
questões, sobre “... as pessoas singulares ou coletivas habilitadas a proceder à
gestão dos resíduos”.
Segundo Barbosa et al (2008, p. 182), serão descritas, abaixo, as diversas
formas adotadas em vários países na condução das questões pertinentes à gestão
ambiental dos resíduos sólidos:
a)
Japão: Prevalece a incineração; focaliza a redução dos
resíduos; garrafas de vidro e eletrodomésticos são reciclados por
empresas privadas; a política dos governos municipais é a de não
gastar com reciclagem de vidros, papeis, plásticos, etc; o setor
privado ajuda o governo municipal na redução dos resíduos;
b)
Alemanha: País pioneiro no equacionamento da questão dos
resíduos sólidos; adota o princípio de valorização dos resíduos antes
da eliminação; Lei de 86 estabeleceu a minimização e eliminação de
resíduos;
45
c)
França: O gerenciamento dos resíduos é de responsabilidade
das autoridades locais ou entidades autorizadas, porém o de
resíduos perigosos é de responsabilidade de empresas privadas;
d)
Espanha:
Ações
estão
sendo
implementadas
para
o
cumprimento das regras estabelecidas pela União Européia; a Lei
10798 prevê planos nacionais de resíduos, admite que entidades
locais possam elaborar seus próprios planos e regula as atividades
dos produtores, importadores, comerciantes e qualquer pessoa que
introduza no mercado produtos geradores de resíduos;
e)
Canadá: Cada província tem autonomia para editar e adotar
medidas que visem o meio ambiente existindo uma diversificação de
ações; implementação de campanhas educativas para adesão da
população à coleta seletiva, reciclagem e compostagem; em
algumas províncias, a reciclagem do óleo é obrigatória; há adoção
do sistema de depósito/retorno (baterias, pilhas, pneus, etc);
f)
Estados Unidos: Adoção do princípio poluidor-pagador ou da
responsabilidade; Lei Federal de 1976 (Federal Solid Waste
Disposal
act),
respondeu
pelo
financiamento
de
inventários
estaduais de aterros sanitários e lixões; a Lei de Conservação e
Recuperação (Resource Conservation na Recovery Act) de 1976,
garantiu a disposição segura dos resíduos perigosos, remetendo à
EPA – Agência de Proteção Ambiental (Environmental Protection
Agency) um rol de padrões relacionados à gestão dos resíduos
perigosos e não-perigosos.
Analisando as políticas adotadas nos países supracitados, constata-se a
presença efetiva do poder público com ações e sanções nos diversos segmentos
que envolvem a gestão dos resíduos. Muitas leis estabelecem medidas de controle e
de fiscalização a fim de assegurar a preservação do meio ambiente e do bem-estar
da sociedade, bem como a minimização da utilização de matérias primas. Todavia,
46
no tocante aos trabalhadores envolvidos no processo de reciclagem, há pouca
menção tanto ao processo de trabalho quanto à saúde desses trabalhadores.
A adoção do processo de incineração de resíduos requer uma avaliação
criteriosa, considerando que esse procedimento contribui para a emissão de grande
quantidade de dioxinas e de outros compostos químicos que são lançados ao meio
ambiente. As dioxinas, subprodutos industriais, são substâncias aromáticas e,
portanto, potencialmente carcinogênicas (Alves, 2007, p. 1008). Além da dioxina,
são lançados na atmosfera gases estufa, devido à enorme combustão de
componentes orgânicos. Nas três últimas décadas, foram verificadas concentrações
significativas de dióxido de carbono na camada atmosférica. As conseqüências
desse aumento afetam o meio ambiente de forma assustadora comprometendo a
biodiversidade (Singer, 2004, p. 25).
Segundo Singer (2004, p. 28), a Convenção Básica das Nações Unidas sobre
as mudanças climáticas, aprovada em 1992 e acatada por 181 governos, sugere
que os signatários promovam ações para a redução da emissão de gases que
provocam o efeito estufa, com equidade e de acordo com a capacidade de cada um.
Os países em desenvolvimento foram poupados dessa meta, garantindo a estes o
direito do desenvolvimento sustentável. Essa convenção adotou o “princípio da
precaução”, a fim de se evitar os perigos irreversíveis, mesmo que ainda necessitem
de um caráter científico. No Protocolo de Quioto foram estabelecidas metas, após
varias negociações governamentais, para que os países da União Européia e os
Estados Unidos reduzam seus níveis de emissão de gases estufa entre 8 e 7 por
cento, respectivamente, até 2012, adotando-se os índices de 1990.
O Brasil, como signatário da Convenção de Estocolmoe, assumiu o
compromisso de reduzir a emissão de poluentes orgânicos persistentes que afetam
o meio ambiente e ameaçam a saúde humana. Para tanto, será necessária
capacidade técnica e estrutural para identificar as fontes e quantificar as emissões
objetivando o atendimento dessas metas. Nessa linha, o Brasil deve adotar medidas
adequadas para a gestão dos resíduos sólidos com ações que coadunem com o
previsto naquela Convenção.
e
Essa Convenção estabelece a eliminação gradual de um grupo de 12 substâncias, entre elas
dioxinas e furanos.
47
2.6 – Cooperativas de Materiais Recicláveis – Trabalho Precarizado
O movimento cooperativista é fundamentado na reunião de pessoas que
buscam suprir, conjuntamente, as necessidades do grupo, além de buscar a
prosperidade econômica e a gestão coletiva dos empreendimentos pretendidos.
Com essa visão, o cooperativismo sugere uma alternativa socioeconômica justa e
equilibrada entre seus membros. As Cooperativas de materiais recicláveis seguem
esses mesmos princípios, mas privilegia as relações de trabalho, o caráter
autogestionário e a emancipação dos cooperados tendo como sustentáculo o
movimento da Economia Solidáriaf.
Segundo Culti (2000, p.2), o cooperativismo está voltado para as causas que
trazem o autodesenvolvimento e que valorizam o ser humano, capacitando-o e
inserindo-o nas dimensões econômicas, sociais e culturais. É uma estrutura que,
apesar de surgir com o capitalismo, apresenta-se com um caráter participativo,
democrático e equânime, objetivando atender ao conjunto de interesses e anseios
de grupos específicos de trabalhadores.
Lima (2009, p. 113) questiona:
“Em que medida, a vinculação junto a cooperativas (grifos nossos),
representa passos na direção de autonomia e possibilidade de
emancipação dos trabalhadores, ou mais uma artimanha do capital para a
precarização das relações de trabalho, ou, ainda, simplesmente uma forma
secundária de organização do trabalho e mesmo uma alternativa de
emprego?”.
Para Culti (2000, p.2), a precarização e a exclusão do mercado formal de
trabalho, decorrentes das novas tecnologias e das práticas neoliberais, levaram
muitos trabalhadores a buscarem alternativas, surgindo aí, as organizações em
cooperativas, em associações, em clubes de trocas ou em redes não monetárias,
com sistemas autogestionários, que consistem em uma forma de buscar a inserção
no mundo do trabalho.
Muitas cooperativas tiveram o apoio de incubadoras que passaram a
organizar esses trabalhadores em associações ou em cooperativas, tendo como
f
Economia Solidária é um movimento social que luta pela mudança da sociedade, por uma forma
diferente de desenvolvimento, que não seja baseado nas grandes empresas nem nos latifúndios com
seus proprietários e acionistas, mas sim um desenvolvimento para as pessoas e construída pela
população a partir dos valores da solidariedade, da democracia, da cooperação, da preservação
ambiental e dos direitos humanos, (Bertucci et al, 2010, p. 14).
48
propósito a melhoria das condições de trabalho, uma vez que esses indivíduos
deixam os lixões ou a catação na rua. Nesse sentido, torna-se evidente a vantagem
obtida com a saída da situação de precariedade anterior, elevando-se a um degrau
na escala de instabilidade e insuficiências para uma vida digna e equilibrada. A
melhoria se apresenta dentro do contexto de vida desses indivíduos (Lima, 2009, p.
122).
As primeiras cooperativas de reciclagem de lixo começaram a surgir no Brasil
a partir de 1985 (Medeiros e Macêdo, 2006, p. 66). A organização desses
trabalhadores visa o fortalecimento da categoria e o poder de negociação dos
materiais recicláveis, pretendendo melhor competitividade, aumento da oferta e
garantia na negociação. Além disso, a cooperativa torna-se, também, palco de luta
dos trabalhadores por melhores condições de trabalho, levando ao protagonismo
dos mesmos na sociedade.
Na busca de melhor organização e objetivando um comércio mais equilibrado
e justo na venda dos materiais selecionados, várias cooperativas se unem em redes
para agregar valores aos seus produtos e valorizar o trabalho dos seus cooperados.
Como exemplo, podemos citar a Rede Nacional de Empreendimentos Solidários do
PROVE – Rede Nacional do Prove/RNProve, que foi constituída em 07 de maio de
2009, sob a forma de Associação, qualificada como pessoa jurídica de direito
privado, sem fins lucrativos e não-econômicos. Atualmente, a rede conta com 37
(trinta e sete) cooperativas associadas. Destas, 21 (vinte e uma) estão legalizadas
juridicamente e 16 (dezesseis) em fase de legalização. Segundo informações
obtidas pela presidente da RNProve, cada cooperativa associada, conta, em média,
com 20 (vinte) cooperados.
Dentre as várias finalidades da Rede Nacional do PROVE, destacam-se a
promoção da gestão sustentável de iniciativas de interesse coletivo, de modo a
garantir a aplicação de conhecimentos e o desenvolvimento equilibrado e
harmonizado com interesses econômicos, sociais e ambientais. Focaliza, ainda, as
questões relativas à promoção da saúde dos agentes envolvidos quanto aos direitos
e valores humanos e éticos, e à preservação do meio ambiente e da saúde física e
mental.
Para Bosi (2008, p.67), além das questões emancipatórias e de valorização
dos catadores, o comércio de resíduos sólidos recicláveis vem se tornando uma
49
atividade rentável. Nesse sentido, a organização desses indivíduos em cooperativas
ou associações se mostrou um caminho viável.
O trabalho desenvolvido nas cooperativas de materiais recicláveis é relevante
tanto para a cadeia produtiva quanto para o meio ambiente, uma vez que a
segregação desses materiais diminui a quantidade de resíduos a serem destinados
a lixões, a aterros sanitários ou a aterros controlados. Todavia, apesar da importante
tarefa desenvolvida, os profissionais que vivem do lixo – catadores, coletores e até
engenheiros sanitaristas – sofrem os estigmas da sociedade; são tidos como os
“descartáveis”. Prova disso foi a experiência vivida pelo psicólogo social Fernando
Braga da Costa, que, fingindo-se de gari, varreu as ruas do campus da Universidade
de São Paulo (USP) e não foi reconhecido, sequer cumprimentado. Para o
pesquisador ficou comprovado que a sociedade vê apenas a função exercida pela
pessoa e não o sujeito em si. Sua tese abordou a percepção humana prejudicada e
condicionada à divisão social do trabalho (Velloso, 2008, p. 1958).
Estudos apontam que as atividades desenvolvidas junto às cooperativas e
associações buscam identificar os processos que geram ou contribuem para a
vulnerabilidade dos trabalhadores, pois organizados em cooperativas, compartilham
os conhecimento adquiridos no dia-a-dia, tornando-se atores das suas histórias. De
posse do saber, podem intervir e transformar os fatos reais dos seus processos de
trabalho e definir prioridades, implicando a elaboração de estratégias que visem a
melhoria da qualidade do processo de trabalho em defesa da saúde grupal (Lacaz,
2007, p.760; Dall`Agnol e Fernandes, 2007, p. 731).
Diante do debate ecológico e do desenvolvimento sustentável a gestão
racional dos resíduos sólidos passou a ter destaque ganhando visibilidade na
sociedade e atribuindo à reciclagem um status ambiental e sócio-economicamente
corretos (Eigenheer et al, 2005, p. 10). Para esses autores,
“a reciclagem é hoje um procedimento industrial de reaproveitamento da
matéria-prima para a produção de novos produtos (similares ou não). Já a
coleta seletiva é um procedimento que facilita a reciclagem industrial, mas
não só ela como também o reaproveitamento da fração orgânica por meio
da compostagem, a geração de energia a partir do lixo e mesmo a
reutilização de inúmeros materiais”.
Frente às dificuldades vivenciadas pelos trabalhadores no contexto de falta de
um emprego formal, muitos se inserem no processo de catação e classificação dos
50
resíduos sólidos na busca de um atributo que lhes assegure, na sociedade, um
espaço como cidadãos e como parte integrante desta. Todavia, as condições a que
estão expostos em seus ambientes de trabalho, manuseando todo tipo de material,
não lhes permite concretizar esse anseio. A repulsa que a sociedade tem pelo lixo é
estendida àqueles que labutam com tais materiais. Todas essas questões, somadas
às adversidades encontradas nos postos de trabalho, culminam com a certeza de
um trabalho precarizado.
Zaneti et al (2009, p. 180) afirmam que estes grupos
sociais buscam construir alternativas de sobrevivência, “nas brechas do rolo
compressor do sistema dominante”.
2.6.1 – As Cooperativas em foco
No início da pesquisa, optou-se por trabalhar com três cooperativas de
materiais recicláveis, associadas à Rede Nacional do PROVE. Entretanto, no
decorrer do trabalho de campo, houve a necessidade de alterar a programação e
acrescentar mais uma cooperativa ao escopo por considerar pertinentes as
informações obtidas de alguns entrevistados e da própria Rede Nacional do PROVE
de que a Cooperativa nº 04 possuía características adequadas ao nosso estudo.
Assim, decidiu-se trabalhar com quatro Cooperativas.
2.7 – Objetivos
2.7.1 – Geral
Analisar os processos de trabalho dos agentes que lidam com materiais
recicláveis de origem química, em sua relação com a saúde, e que desenvolvem
suas atividades em 04 (quatro) Cooperativas de Catadores de Material Reciclável,
localizadas no Município do Rio de Janeiro/RJ e associadas à Rede Nacional do
PROVE, identificando os riscos à saúde e suas conseqüências.
51
2.7.2 - Específicos
1.
Descrever os ambientes de trabalho das 04 (quatro) cooperativas;
2.
Caracterizar os processos de trabalho das 04 (quatro) cooperativas;
3.
Identificar os riscos à saúde presentes nos processos de trabalho;
4.
Analisar os processos de trabalho dentro das cooperativas.
5.
Caracterizar o material recebido, a título de doação, por instituições
que destinam o seu lixo em atendimento ao disposto no Decreto nº
5.940/2006, do Governo Federal.
3. Método e Análises
53
3. Método e Análises
3.1 – Metodologia qualitativa, exploratória e descritiva
Para o alcance dos objetivos da presente investigação foi utilizada a
abordagem da metodologia qualitativa, exploratória e descritiva. Essa escolha é
justificada pelo fato de o tema proposto estar relacionado a fatores sócioeconômicos, sócio-culturais, políticos e ideológicos. Este estudo contempla
situações específicas que estão imbricadas no dia-a-dia dos trabalhadores que
desenvolvem atividades em cooperativas de materiais recicláveis, lidando com
resíduos de origem química, e discute o conjunto de fatores que circundam e
potencializam os riscos à saúde presentes nos processos de trabalho dessa
coletividade.
Essa metodologia permite compreender o significado que as pessoas
atribuem às suas experiências do mundo social, bem como a maneira como elas
apreendem este mundo (Pope e Mays, 2009, p.11). Para Minayo (2008, p.23), a
pesquisa qualitativa “visa compreender a lógica interna de grupos, instituições e
atores quanto a: a) valores culturais e representações sobre sua história e temas
específicos: b) relações entre indivíduos, instituições e movimentos sociais; c)
processos históricos, sociais e de implementação de políticas públicas e sociais.”
Com esse entendimento, busca-se explorar os caminhos percorridos pelos
catadores cooperativados.
Esse tipo de pesquisa intensifica a complexidade dos fenômenos, fatos e
processos exclusivos de grupos determinados, enfatizando os “valores, crenças,
representações, hábitos, atitudes e opiniões” (Minayo, 1993, p. 247). Ainda segundo
Minayo (2008, p. 57), o método qualitativo é aplicado ao entendimento da história,
das relações, das representações, das percepções e das opiniões, resultados dos
entendimentos definidos pelos homens, relativos ao seu modo de viver, de como
constroem seus caminhos e o seu caminhar, como sentem e pensam, permitindo
apresentar processos e significados que ensejem melhoras em seus postos de
trabalho.
54
O tema abordado nessa pesquisa possibilita a tomada de direções em
diversos âmbitos. Todavia, optou-se por trilhar o campo da saúde do trabalhador,
incorporando a temática saúde e ambiente, para revelar os percalços a que estão
expostos os trabalhadores que lidam com materiais recicláveis, principalmente com
os que contêm substâncias químicas.
3.2 – Coleta de Dados
As coletas de dados ocorreram entre os meses de dezembro de 2009 a
março de 2010 e foram realizadas nas dependências das cooperativas, tendo sido
uma por vez. O período de estada em cada cooperativa para obtenção das
informações teve duração de aproximadamente oito horas diárias, tendo ocorrido
cerca de duas a três visitas em cada cooperativa. As primeiras medidas adotadas
para a obtenção dos dados foram as visitas para avaliação e compreensão dos
ambientes e dos processos de trabalho.
Foi privilegiado o próprio ambiente de trabalho dos sujeitos como o local
adequado para a obtenção dos dados, uma vez que o ambiente natural de trabalho
é o espaço onde ocorrerá a observação, permitindo identificar os fenômenos
decorrentes do processo saúde-doença e ensejando encontrar alternativas para
melhorar a qualidade de vida dos trabalhadores em foco (Turato, 2005, p. 510).
Para o acesso às cooperativas, houve a necessidade de atender a uma
reivindicação da Rede Nacional do Prove que consistiu na elaboração de Termo de
Cooperação firmado entre o Instituto de Estudos em Saúde Coletiva (IESC) da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e aquela organização. Assim, foram
estabelecidas as normas básicas e condições gerais que regulamentaram as
relações entre as duas instituições no que concerne à cooperação para a pesquisa
em Saúde Coletiva. Por meio da coleta de dados e análises dos processos de
trabalho dos associados da Rede, foram identificados os riscos e as conseqüências
à saúde dos trabalhadores que atuam em cooperativas de material reciclável
associadas à Rede Nacional do PROVE.
A demanda do termo de cooperação partiu da direção da Rede Nacional do
Prove, em decorrência da necessidade de se realizar trabalhos continuados que
possam contribuir para a melhoria da qualidade de vida dos sujeitos que lidam com
55
os resíduos sólidos, principalmente, com aqueles de origem química. Por outro lado,
ao se identificar trabalhadores expostos a substâncias químicas, faz-se necessário o
monitoramento periódico dos ambientes e dos trabalhadores.
O termo de cooperação foi aprovado, após justificativa elaborada pela Direção
do IESC/UFRJ, na Sessão Ordinária da Congregação do Instituto de Estudos em
Saúde Coletiva - IESC/UFRJ, ocorrida em 06 de outubro de 2009 e assinado pelas
partes em 26 de novembro de 2009.
A coleta de dados foi realizada através de roteiros para entrevista semiestruturados, destinados aos gestores das Cooperativas (apêndice A) e aos
cooperados (apêndice B). Todos os roteiros foram aplicados no próprio ambiente de
trabalho dos agentes desta pesquisa e durante o expediente de exercício dos
mesmos, com a devida anuência e autorização para a utilização dos dados obtidos e
observados. Os trabalhadores entrevistados não foram identificados. As entrevistas
foram realizadas pessoalmente pelo pesquisador.
Os roteiros destinados aos cooperados foram elaborados para traçar um perfil
do trabalhador quanto à sua condição sócio-econômica; à situação de trabalho para
se compreender os processos desenvolvidos; ao estado de saúde; ao manuseio e à
exposição aos diversos tipos de resíduos, principalmente aos químicos e suas
conseqüências à saúde. Por fim, foram abordadas as relações entre as atividades
desenvolvidas e o adoecimento. Todas essas questões foram trabalhadas de forma
a instigar o entrevistado a contribuir além daquilo que lhe fora perguntado. Nos
roteiros utilizados para os gestores procurou-se, além de traçar as características da
cooperativa, identificar os tipos de materiais recebidos e negociados e abordar as
relações de trabalho, incluindo a percepção do gestor quanto aos processos e riscos
decorrentes do trabalho.
Os instrumentos utilizados para obtenção de dados, tanto dos gestores
quanto dos
cooperados foram
adaptados
dos
trabalhos realizados
pelos
pesquisadores Ferreira (1997, p. 194-205) e D´Acri (2002, p. 159-179).
Procurou-se, por meio do diálogo, estabelecer um clima de confiança, no qual
os preconceitos e desconfianças com relação ao nosso trabalho fossem descartados
e os entrevistados tivessem segurança quanto às nossas pretensões na pesquisa.
Não foi difícil encontrar em todas as cooperativas trabalhadores reticentes a esta
pesquisa, pois muitos afirmaram que os estudos, pesquisas, propostas de melhorias,
56
são muitas, mas que nada tem acontecido para a melhoria das condições de
trabalho desses sujeitos.
No transcorrer das entrevistas, optou-se por um conjunto de procedimentos
que viabilizasse a obtenção das informações, tais como: memorização das falas com
registro posterior às conversas, notas durante as entrevistas, gravações com
transcrições pósteras, uso de diários e fotografias do local, quando autorizadas.
Todas essas etapas foram vividas e presenciadas pela pesquisadora que optou por
participar pessoalmente desses momentos, objetivando colher, com a melhor
exatidão e fidedignidade, as informações prestadas pelos interlocutores. Nesses
instantes a pesquisa foi enriquecida pelas observações dos atos, sentimentos,
gestos e olhares que muito expressavam e falavam. Como, segundo Minayo (2008,
p. 335), define: “Vivenciar é diferente de ouvir, falar, de deduzir ou de intuir”.
Atentou-se para, no início do diálogo, apresentar aos interlocutores o objetivo
da pesquisa, pontuando os motivos que nos levaram a fazer este trabalho, numa
linguagem acessível e clara, respeitando aqueles que, por quaisquer motivos, não
dominam a linguagem científica. As entrevistas ocorreram nos meses de janeiro a
março de 2010.
O anonimato e o sigilo foram garantidos a todos os que se propuseram a
contribuir com os dados que balizaram o trabalho, ficando claro que os nomes e
pseudônimos não seriam utilizados como forma de identificação na pesquisa nem
nos resultados do estudo. Foi esclarecido, ainda, que as informações fornecidas não
seriam usadas para, em momento algum, prejudicar o informante.
3.3 – Referências e Trabalho de Campo
Este estudo se apropriou de diversas bibliografias já existentes sobre o
assunto, abrangendo livros e artigos científicos, tendo sido enriquecido com a
pesquisa de campo e a observação dos processos de trabalho dos sujeitos
selecionados. Dentre os diversos materiais analisados na pesquisa, foram utilizados
artigos de vários jornais, informações de sítios eletrônicos, relatórios do Movimento e
do Congresso Nacional de Catadores.
A análise da pesquisa foi enriquecida pela observação subjetiva do
pesquisador no ambiente de trabalho dos pesquisados, no intuito de colher detalhes
57
nas falas, nos gestos e nas expressões dos entrevistados e de obter orientações
quanto ao caminho a ser seguido no decorrer do trabalho, (Minayo 1993, p. 246).
3.4 – Público Alvo
O principal critério para a escolha das cooperativas foi consoante com a
natureza dos resíduos sólidos. Como a análise e o estudo foram norteados para os
resíduos químicos e suas implicações na saúde dos trabalhadores que manejam
materiais recicláveis, optou-se, a princípio, dentre às trinta e sete cooperativas
apresentadas pela Rede Nacional do PROVE, por três que recebem e manuseiam
diferentes tipos de lixo químico ou contaminante. No transcorrer da pesquisa, foi
acrescentada mais uma cooperativa que passou a lidar com produtos de natureza
química. Essa informação foi obtida com os cooperados entrevistados.
A população estudada foi constituída por trabalhadores vinculados a quatro
cooperativas de materiais recicláveis, associadas à Rede Nacional do PROVE,
perfazendo, aproximadamente, um total de oitenta trabalhadores, uma vez que cada
uma das cooperativas conta com cerca de vinte cooperados.
Entretanto, foram elencados e priorizados outros critérios, sem os quais a
pesquisa se inviabilizaria. No primeiro, observou-se a quantidade de cooperados
vinculados a fim de garantir as analises das condições e dos processos de trabalho.
No segundo, a prioridade foi quanto à localização das cooperativas, de modo a
assegurar o deslocamento para a pesquisa de campo. Por fim, e talvez mais
importante, foi considerada a receptividade da proposta de trabalho por parte dos
dirigentes das cooperativas.
Os sujeitos participantes dessa investigação foram os cooperados vinculados
às quatro cooperativas associadas da RNProve. Todos os cooperativados foram
convidados para entrevista. Todavia, aqueles que não quiseram participar tiveram
seus desejos atendidos e respeitados. Os que concordaram e se dispuseram a
colaborar com a pesquisa assinaram o termo de participação e consentimento,
apêndice C.
A população estudada foi composta por oito gestores representantes das
quatro cooperativas e por trinta e quatro cooperativados. O grupo dos cooperados
continha vinte e um do gênero feminino e treze do gênero masculino. No dos
58
gestores, havia cinco de gênero feminino e dois do gênero masculino. Esses sujeitos
serão identificados nessa pesquisa de acordo com a definição abaixo:
a) Cooperativa: nº 01,
Gestores: G1.1, G1.2, G1.3
Cooperados: C1.1, C1.2, C1.3, C1.4, C1.5, C1.6, C1.7, C1.8, C1.9 e C1.10
b) Cooperativa: nº 02,
Gestores: G2.1
Cooperados: C2.1, C2.2, C2.3, C2.4, C2.5, C2.6, C2.7
C) Cooperativa: nº 03,
Gestores: G3.1 e G.3.2
Cooperados: C3.1, C3.2, C3.3, C3.4, C3.5, C3.6, C3.7, C3.8
D) Cooperativa: nº 04,
Gestores: G4.1 e G.4.2
Cooperados: C4.1, C4.2, C4.3, C4.4, C4.5, C4.6, C4.7, C4.8, C4.9
Quanto aos gestores, procurou-se entrevistar todos aqueles a quem se teve
acesso - presidentes, secretários executivos, diretores administrativos e financeiros,
etc -, sempre respeitando a disponibilidade de tempo e vontade de contribuir com as
informações solicitadas. Esse grupo, ao concordar com a entrevista, assinou,
também, o termo de participação e consentimento. No total, foram entrevistados oito
gestores do total de quatro cooperativas.
3.5 – Cuidados Éticos
Essa pesquisa obedeceu aos princípios éticos e às normas determinadas pela
Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, que regulamenta a realização
de pesquisa envolvendo seres humanos, tendo sido aprovada pelo Comitê de Ética
em Pesquisa do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva, da UFRJ, por meio do
parecer CEP/IESC-UFRJ nº 07/2010, datado de 03 de Fevereiro de 2010.
4. Resultados e discussão
60
4. Resultados e discussão
“Ó, mundo tão desigual
Tudo é tão desigual
Ó, de um lado este carnaval
Do outro a fome total...”
(Gilberto Gil)
No quadro 2, são apresentados os tipos de resíduos manuseados diariamente
nessas cooperativas.
Quadro 2 – Tipo de Resíduos manuseados nas Cooperativas estudadas
Materiais
Coop. Coop. Coop. Coop.
Nº 01 Nº 02 Nº 03 Nº 04
Baterias
Sim
Sim
Sim
Sim
Bombonas
Não
Sim
Não
Não
Cápsula de míssil
Não
Sim
Não
Não
Cartuchos de impressoras
Não
Sim
Não
Não
Chapas e Produtos de Revelação
Não
Sim
Não
Não
Copos descartáveis
Sim
Sim
Sim
Sim
Embalagens de produtos de limpeza
Sim
Sim
Sim
Sim
Embalagens plásticas de óleo Diesel e graxa
Sim
Não
Não
Não
Garrafas de água
Sim
Sim
Sim
Sim
Garrafas tipo PET - Polietileno tereftalato
Sim
Sim
Sim
Sim
Jornais
Sim
Sim
Sim
Sim
Latas de tintas
Sim
Sim
Sim
Sim
Livros
Sim
Sim
Sim
Sim
Material não separado – lixo contendo matéria Sim
Não
Sim
Sim
orgânica (residências e de condomínios)
Óleo vegetal
Sim
Sim
Sim
Sim
Papel Branco
Sim
Sim
Sim
Sim
Papel comum
Sim
Sim
Sim
Sim
Papelões
Sim
Sim
Sim
Sim
Pilhas
Sim
Sim
Sim
Sim
Plásticos tipo EVA - Poliacetato de Etileno Vinil
Sim
Sim
Sim
Sim
Pneus usados
Sim
Não
Não
Não
Revistas
Sim
Sim
Sim
Sim
Sucatas – Material eletroeletrônico
Sim
Sim
Sim
Sim
Sucatas de ferro
Sim
Não
Sim
Sim
Vidros em Geral
Sim
Sim
Sim
Sim
Fonte: elaborado pelo autor
61
4.1 – Cooperativa nº 01 - Cooperativa de Materiais Recicláveis.
A Cooperativa nº 01 foi criada em 1999 e ocupa um galpão de 760 metros
quadrados, situado em Bonsucesso, no Complexo da Maré, cuja densidade
populacional é de cerca de 200 mil pessoas. Essa cooperativa possui em seu
quadro trinta cooperativados e emprega mais trinta pessoas na triagem e
beneficiamento básico dos materiais recebidos a título de doação de instituições
públicas, de empresas, da COMLURB e dos trazidos pelos catadores. O
beneficiamento consiste na separação, classificação, prensagem e enfardamento
dos recicláveis, dentre embalagens de Polietileno tereftalato (PET), Tetra Pak, latas
de alumínio, papel, papelão, revistas, jornais, vidro, plástico e metais, perfazendo
uma média de 80 toneladas de material por mês.
Objetivando a divulgação da prática de coleta seletiva de lixo, a Cooperativa
nº 01 promove palestras e presta consultoria para escolas, condomínios, empresas,
associações de moradores e diversas instituições. Para o seu Presidente, "a
reciclagem não é um modismo, e não existe faculdade para isso. Portanto, é nossa
responsabilidade divulgar e educar a população", G1.1.
A idéia e o projeto de fundar uma cooperativa de material reciclável, a
Cooperativa nº 01, surgiram após a longa experiência, do atual presidente, adquirida
durante os 23 anos que trabalhou na indústria plástica. Atualmente, o principal
apoiador das atividades dessa Cooperativa é a empresa Coca-Cola.
Outro importante projeto desenvolvido pela Cooperativa nº 01, é o
DisquePneu. Esse projeto foi uma iniciativa da Secretaria Estadual do Ambiente e
dessa Cooperativa, sob o apoio dos postos da BR Distribuidora. O programa de
reciclagem de pneus usados, no Estado do Rio de Janeiro, foi lançado em novembro
de 2007 e tem como pressuposto não apenas limpar o meio ambiente, mas também
combater um dos grandes criadouros do mosquito transmissor da dengue.
Os pneus, recolhidos por essa Cooperativa têm como destino final a
reciclagem, resultando em subprodutos como solas de sapatos, dutos de águas
pluviais, tapetes para automóveis, pisos industriais e asfalto-borracha que, segundo
os diretores da Cooperativa, é mais resistente, flexível e absorve melhor a poluição
sonora provocada pelo tráfego de veículos. Os pneus ficam armazenados em local
62
aberto, por um período de aproximadamente dois meses, até se atingir numa
quantidade razoável para a venda, conforme podemos verificar na figura 3.
Os trabalhadores desenvolvem seus trabalhos em galpões cobertos ou em
espaços abertos. Quando necessário, trabalham no pátio sujeitos ao sol e à chuva.
A Cooperativa nº 01 está equipada com três prensas, três balanças, dois
computadores e possui um caminhão para a coleta e transporte do material.
Figura 3 – Cooperativa nº 1. Quantidade de pneus armazenados para
comercialização.
Fonte: Autora
Os materiais recebidos e manipulados nessa Cooperativa, com maior
freqüência e quantidade, são papel, papelão, plásticos de vários tipos, vidro, ferro,
copos descartáveis de Polipropileno (PP) e Poliestireno (PS), material eletroeletrônico (high tech), pneus usados e embalagens plásticas de óleo diesel,
combustível e graxas. Esses materiais vêm de diversas fontes, como Banco Itaú,
International Business Machines (IBM), Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais
IBMEC, Prosint Química – Petróleo e derivados, órgãos do governo - Eletrobrás
Furnas, Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência Social (Dataprev),
Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), Banco Nacional de Desenvolvimento
(BNDS) e Centro de Pesquisas de Energia Elétrica (CEPEL) - e de quatro
63
condomínios residenciais. Junto ao material recebido vem todo tipo de resíduos,
dentre eles os passíveis de reciclagem, além da grande quantidade de lixo “in
natura”.
Observou-se, em vários locais da cooperativa, grande quantidade de papéis
higiênicos e papeis toalha usados, dentre os materiais a serem manipulados pelos
trabalhadores e também espalhados pelo chão, o que torna o local mais insalubre.
Comumente foram vistas pessoas transitando sobre esses resíduos. Nos ambientes
da cooperativa existem várias pilhas de sacos de materiais, conforme visualizados
na figura 4, que estão prontos para o início do processo de triagem.
Figura 4 – Cooperativa nº 1. Quantidade de lixo a ser triada.
Fonte: Autora
A Cooperativa nº 01 possui três principais ambientes de trabalho, conforme
segue:
a) Galpão, denominado de produção.
Nesse local trabalham os cooperados e pessoas contratadas que fazem a
triagem dos materiais recicláveis. As tarefas são divididas de acordo com a
capacidade de cada um e por função. Uma cooperada é responsável pela
64
coordenação e divisão de tarefas. Ordena e controla os resíduos que vão para as
mesas de triagem, acompanha a destinação dos recicláveis, por tipo, para a
prensagem, enfardamento, pesagem e empilhamento, e organiza o descarte do
material considerado lixo. Os rejeitos são colocados para fora do galpão, onde são
recolhidos pela COMLURB, conforme disposto na figura 5.
Durante
as
entrevistas,
constatou-se
grande
quantidade
de
ratos
(camundongos/catitas) no interior do galpão, passando por entre os objetos
manuseados durante o processo de triagem. Facilmente podem-se perceber fezes e
urinas desses animais. Segundo informações dos cooperativados, a COMLURB
frequentemente realiza dedetização e desratização do local, mas é impossível a
exterminação desses animais.
Figura 5 – Cooperativa nº 1. Dejetos a serem recolhidos pela COMLURB.
Fonte: Autora
Nesse setor trabalham aproximadamente quinze pessoas em sua maioria
mulheres. O trabalho é realizado em pé e todos obedecem a uma carga horária de
oito horas diárias. Apesar de os dirigentes da cooperativa informarem que fornecem
equipamentos de proteção individual – EPIs (capacete, máscaras, avental e luvas de
65
borracha resistente), verificou-se que a maioria dos trabalhadores usavam apenas
luvas de látex, e somente uma cooperada usava botas.
b) Galpão – Óleo combustível
Neste galpão não foi autorizada a entrada da pesquisadora. Apesar de
permanecer na porta de entrada, pode observar que o recinto é totalmente inebriado
de óleo combustível e de graxa. Os trabalhadores que fazem o processo de triagem
de embalagens plásticas de produtos combustíveis (óleo, graxas, ceras e filtros de
óleo) têm os seus corpos e vestimentas repletos de óleo. Esse fato foi constatado no
momento da entrevista realizada com os trabalhadores que atuam nesse setor.
O forte cheiro dos produtos, o elevado nível de temperatura e a iluminação
precária contribuem para um ambiente de trabalho mais sombrio, insalubre e
periculoso. Foram notados, quando da visita, vários tonéis e baldes que, geralmente,
são utilizados para acondicionamento de óleos combustíveis e lubrificantes. Nesse
recinto existia, ainda, grande quantidade de sacos com materiais a serem triados
(figura 6).
Figura 6 – Cooperativa nº 1. Galpão Óleo
Combustível.
Fonte: Autora
66
Os equipamentos de proteção individual utilizados são as luvas de borrachas
e botas que de pouco ou nada adiantam para se evitar o contato direto com os
produtos químicos. O processo de separação dos recipientes é precário. Os
trabalhadores têm que jogar, a uma altura de aproximadamente 1,5 m, os frascos e
filtros de óleo, o que justifica o fato de as sobras dos produtos jorrarem pelos ares
não só derramando-o pelo chão, mas também respingando nos próprios
trabalhadores e em suas roupas. Na figura 6 observa-se que o chão tem uma cor
escura. Isso se dá pela grande quantidade de óleo combustível que é derramada no
decurso da classificação e separação dos frascos usados.
Os gestores informaram, que nesse ambiente trabalham, em média, dez
profissionais, dentre homens e mulheres. Na ausência de um trabalhador ou quando
a demanda de trabalho aumenta, fato que ocorre com freqüência, outro cooperado
do setor de produção é remanejado para executar as atividades, evitando, assim,
que haja uma queda no rendimento do trabalho. Dessa forma, chega-se à conclusão
de que não só os trabalhadores fixos estão expostos, mas também aqueles que se
revezam entre o setor chamado de produção e o do Galpão do óleo.
A Resolução Conama nº 362, de 23 de junho de 2005, dispõe sobre a coleta e
destinação final, incluindo a reciclagem e o rerrefino do óleo lubrificante usado ou
contaminado por considerar que o uso prolongado desse produto resulta na sua
degradação
parcial,
formando
ácidos
orgânicos
e
compostos
aromáticos
polinucleares com potencialidades carcinogênicas e, ainda, por ser classificado pela
ABNT-NBR 10004 como resíduo perigoso por apresentar toxicidade.
Essa legislação preocupa-se apenas com o destino a ser dado ao óleo após o
uso, não havendo nenhuma diretriz que norteie o manuseio, descarte e
reprocessamento das embalagens que acondicionam esse óleo. Essas embalagens
de plástico de Polietileno de alta densidade (HDPE) contaminadas pelo óleo
lubrificante e por restos dos produtos que permanecem no final dos recipientes são
manuseadas diariamente na Cooperativa nº 01.
Segundo os dirigentes da cooperativa, todos os cooperativados contribuem
para o INSS e quando algum cooperado necessita de afastamento para tratamento
de saúde, por até 15 dias, este participa normalmente do rateio como se estivesse
trabalhando. Quando perguntados sobre quais são os riscos decorrentes do trabalho
e quais são as doenças que podem ser adquiridas no exercício das tarefas, os
dirigentes informaram que existem muitos, pois trabalham com todo tipo de material
67
contaminado e que a doença mais prevalente é a de pele, as dermatoses. Outra
questão que enfatizaram foi o grande numero de faltas, absenteísmo, devido ao
alcoolismo.
c) Galpão central “Cata Rio Solidário”
Embora não tenha sido permitido o acesso às dependências desse galpão,
pode-se observar a grande quantidade de materiais armazenados, principalmente,
papéis e papelões, ao chegar à entrada. Esses resíduos são enviados por várias
cooperativas do município do Rio de Janeiro que são associadas à Rede de
Cooperativas denominada Central “Cata Rio Solidário”. Essa associação visa
negociar, de forma mais lucrativa e eficaz, os materiais encaminhados pelas
cooperativas, partindo do pressuposto de que, quanto maior a quantidade, melhor o
poder de barganha na transação financeira. O presidente da Rede justifica:
“juntamos todo o material, negociamos em bloco com a indústria e o dinheiro
arrecadado é dividido, proporcionalmente, entre as cooperativas”, (G1.1).
A Central possui, atualmente, três caminhões que foram doados pela
Petrobrás (um quarto caminhão doado foi vendido para formar um capital de giro).
Esses caminhões são emprestados, de acordo com um cronograma semanal, para
as cooperativas da Rede que não dispõem de meios próprios para transportar os
materiais recebidos das diversas instituições com as quais mantêm parceria. A maior
parte do material recebido é comercializada em São Paulo, onde os preços são mais
vantajosos. “Vamos aproveitar essa união para dar dois importantes passos que são
muito difíceis para as cooperativas isoladamente: acessar as linhas de crédito do
BNDES, pois a central está totalmente documentada para isso, e buscar grandes
volumes junto aos órgãos do governo, usando o incentivo do Decreto nº 5.940, do
governo federal”, planeja o gestor G1.1.
Na figura 7, é apresentada a área descoberta da cooperativa, onde se
observa os amontoados de resíduos sólidos descartados após a triagem a serem
retirados pela COMLURB. Percebe-se, ainda, os caminhões do projeto “Cata Rio
Solidário” e um caminhão carregado com materiais recicláveis para negociação.
Nessa área, a quantidade de rejeitos é grande e, não raro, constata-se a presença
de animais e insetos, como ratos, baratas, moscas e mosquitos que são vetores
para a transmissão de doenças.
68
Figura 7 – Cooperativa nº 1. Área externa da Cooperativa e Caminhões do
projeto “Cata Rio Solidário”.
Fonte: Autora
4.2 – Cooperativa nº 02 - Cooperativa de Materiais Recicláveis.
A Cooperativa nº 02 foi criada em 2002, com o apoio da Igreja Católica
situada próxima à Cooperativa, mas só em 2006 foi formalizada. O galpão da
Cooperativa está situado em Brás de Pina, Rio de janeiro, e conta, atualmente, com
três cooperados do gênero masculino e sete cooperados do gênero feminino.
A demanda da formação da cooperativa surgiu da necessidade de se
buscarem alternativas de fonte de renda para as pessoas cadastradas nos projetos
sociais da Igreja, principalmente, às mulheres que não tinham estudos e que
estavam desempregadas, necessitando desenvolver alguma atividade remunerada.
A Cooperativa nº 02 recebe materiais de diversas instituições públicas, de
acordo com a assinatura do termo de compromisso estabelecido no Decreto
5.940/2006, como Hospital Central do Exército (HCE), Arsenal da Marinha, Empresa
de Correios e Telégrafos (ECT), Centro de Instrução Almirante Wandenkolk (CIAW),
Ministério Público, da Igreja da comunidade e de vários condomínios residenciais.
Os próprios membros dessa Cooperativa realizam palestras de conscientização e
ministram cursos relativos à coleta seletiva no intuito de incentivarem os condôminos
69
a separarem os materiais passíveis de reciclagem para sua destinação à
cooperativa. No processo inicial de estabelecimento da separação dos resíduos, um
grupo de cooperados vai para dentro do condomínio a fim de conferir o suporte
logístico e esclarecer dúvidas quanto à nova ação.
Essa Cooperativa manipula diversos tipos de materiais. Os de maior
freqüência são: papel branco; papelão; embalagens de cápsula de míssil (oriundos
do arsenal da marinha); plásticos transparentes de Acetato de Etilvinila (EVA);
bombonas que armazenam cloreto de sódio e outros produtos químicos; latas de
tintas; embalagens de produtos de limpeza; revistas; jornais; vários produtos de
revelação (chapa de revelação, cartuchos grandes e pequenos de impressoras,
copiadoras e reveladoras); e óleo vegetal usado.
A quantidade de materiais
trabalhados, por mês, na Coopquitungo, gira em torno de 20 toneladas.
As atividades laborais dos cooperativados são desenvolvidas em recintos
abertos e fechados, tanto no galpão da cooperativa quanto nos condomínios e nas
empresas ou instituições que mantêm termo de compromisso para a coleta de
materiais. Todos atuam de acordo com a demanda de trabalho, da sua capacidade
física e de conhecimento/capacitação. A jornada de trabalho é de 8 horas diárias,
exercida em pé na maior parte do tempo, com bastante movimento e raramente os
trabalhadores fazem horas extras.
Os gestores da cooperativa informaram que são distribuídos equipamentos de
proteção individual e que é de responsabilidade do cooperado a utilização, a guarda
e a conservação dos EPIs. As luvas são adquiridas pelos próprios cooperados,
decisão tomada pelo grupo como uma forma de assumir a responsabilidade pela
utilização e cuidados com esse equipamento. Apesar da informação, verificou-se a
utilização de luvas apenas pelo trabalhador da prensa.
Todos os membros da cooperativa passaram a contribuir para o INSS a partir
de outubro de 2009. Para a presidente da Cooperativa nº 2, as doenças por
contaminação, dermatológicas, do trato respiratório e alergias são os riscos a que
estão expostos diariamente pelo manuseio de material contaminado e periculoso,
como é o caso das embalagens de míssil e dos produtos químicos dos materiais de
revelação. Com a finalidade de minimizar os riscos, os cooperados optaram por
fazer um revezamento freqüente das atividades, exceto o prensador, que tem uma
capacitação específica para essa tarefa. Outra decisão tomada pelo grupo é a de
70
que as cargas pesadas devem ser manuseadas pelos homens devido à maior
resistência física.
Quando indagados sobre os riscos decorrentes do manuseio dos produtos
que circulam na cooperativa, surgiram as seguintes respostas:
“É só essa coisa mesmo de pegar algum tipo de material que a gente não
conhece e vir com algum tipo de resíduos que venha de repente trazer risco
à saúde da gente... que a gente não conhece, não sabe o que tá dentro de
alguma embalagem, né? Quando a gente tava na Marinha, na Ilha das
Cobras, às vezes vinha óleo, vinha uns galões grandes com coisas que a
gente nem sabia o que era, um líquido.” (G2.1)
“Como nosso material vem limpo, a gente não tem essa grande
preocupação... mas quando vem de outro setor, tipo Marinha, HCE, a gente
tem o maior cuidado. Recebemos uma grande quantidade de chapas que a
gente sabe que tem problema, ai eles falaram assim que a gente tinha que
ter LO aí nós fomos, buscamos a empresa que é interessada no produto,
trouxemos a documentação dela, a LO, para ela ficar responsável pelo
descarte desse material, pois dizem que é radioativo. Essa empresa pega
as chapas e os recipientes com restos de revelador, são bombonas de
plásticos que contem restos de reveladores. A gente manuseia para
separar e ai a empresa pega e leva.” (G2.1)
“Vários riscos à saúde, porque a gente trabalha com muitas coisas que a
gente não sabe, desconhece a composição... a gente desconhece o que é
químico e o que não é.” (C2.5)
Todos os cooperativados têm café da manhã e almoço na própria
cooperativa. Esse benefício é fruto de uma parceria com uma instituição filantrópica
que doa mensalmente 30 cestas básicas que são distribuídas entre os cooperados e
as que sobram são utilizadas para o consumo na cooperativa ou doadas a pessoas
carentes da comunidade.
Na Cooperativa nº 02, não se observou quantidade significativa de lixo.
Entretanto, o que chamou à atenção foi a grande quantidade de cartuchos de
impressoras espalhando toner por um raio considerável. Devido à chuva ocorrida no
período em que visitei a cooperativa, o toner percolava no solo e os cartuchos que
não estavam molhados, ao serem remexidos, levantavam uma poeira densa de
partículas escuras. Foram presenciadas quantidades significativas de seringas
jogadas ao chão, o que deve ter sido resultante do material recebido do HCE,
podendo causar riscos de perfuração nos trabalhadores que transitam no recinto,
principalmente pelo fato de os mesmos não usarem botas adequadas para o tipo de
trabalho.
71
As figuras de números 8, 9 e 10 apresentam a grande quantidade de diversos
tipos de cartuchos que já foram manuseados (classificados, separados e ensacados)
pelos trabalhadores. Na ocasião da venda, esses sacos são transportados, pelos
cooperados, para o carregamento do caminhão, momento em que todos reclamam
da poeira de toner que é levantada.
Figura 8 – Cooperativa nº 02. Cartuchos de impressoras e copiadoras
Fonte: Autora
Os trabalhadores questionam quais os riscos a que estão expostos pela
inalação e pelo contato dérmico com as partículas de toner. Todos desconhecem a
sua composição química e são unânimes na desconfiança das conseqüências
futuras e se pudessem optar, não receberiam esse tipo de material. Só o fazem
porque se veem obrigados devido à assinatura do termo de compromisso junto à
instituição doadora, conforme previsto no Decreto 5.940/2006. As falas abaixo
exemplificam as dificuldades enfrentadas pelas cooperativas.
72
Figura 9 – Cooperativa nº 2. Cartuchos de impressoras e
copiadoras
Fonte: Autora
“Tem empresa que depois do decreto, sabe que tem que doar o material
pra gente, mas não cooperou assim nem um pouquinho pra seguir o que ta
na lei, né? Tanto a lei municipal, estadual e Federal pede que a instituição
entregue o material separado na fonte e isso não tá acontecendo em
algumas empresas até mesmo porque elas usavam esse material em
beneficio próprio, vendiam... depois que veio a lei 5.940 que eles tem que
doar esse material para as cooperativas isso tem dado muita dor de cabeça
pra gente, é... vem só material que não presta que não tem valor
comercial.” (G2.1)
“Um formato de cartucho que eu acho que era algum, não é capa, é
embalagem, de míssil, de montagem de míssil, que vinha com aquele
residuozinho de pólvora.” (G2.1)
“Essas embalagens foram manuseadas de diversas formas para se tentar
abrir, para retirar o plástico e a latinha que estavam na embalagem.
Usamos martelo e maquita para rasgar, mas não conseguimos. Um ferro
velho que comprou, colocou as embalagens ao relento para molhar com a
chuva para amolecer o papelão, para se conseguir retirar a lata e o
plástico.” (G2.1)
“E as empresas hoje depois do decreto tão fazendo isso, o que não presta
pra eles, eles jogam pras cooperativas independente de ser ou não ser, e o
que presta eles seguram.” (G2.1)
73
Figura 10 – Cooperativa nº 02. Cartuchos de impressoras e copiadoras
Fonte: Autora
4.3 – Cooperativa nº 03 - Cooperativa de Materiais Recicláveis.
A Cooperativa nº 03 foi criada em 04 de maio de 2002, a partir da demanda
de alguns trabalhadores que, de forma isolada, faziam catação diária de materiais
recicláveis tais como, latas, papelão, garrafas pet e demais resíduos sólidos
comercializáveis no próprio bairro de Bonsucesso e no entorno do Complexo da
Maré.
Em 2004, essa Cooperativa foi incubada pela Incubadora Tecnológica de
Cooperativas Populares – ITCP/COPPE/UFRJ e, em seguida, estabeleceu uma
parceria com a Linha Amarela SA (LAMSA), com o objetivo de desenvolver trabalhos
de educação ambiental na área da Maré, Cidade Universitária e comunidades
circunvizinhas. Além disso, essa Cooperativa desenvolve trabalhos comunitários em
parceria com a Associação dos Moradores do Conjunto Bento Ribeiro Dantas e a
Associação de Moradores da comunidade da Vila dos Pinheiros, no Complexo da
Maré.
74
O galpão da Cooperativa está situado no Complexo da Maré – Bonsucesso.
Todavia, seus cooperados prestam serviços em vários postos de trabalho de acordo
com a demanda, necessidade de trabalho da Cooperativa, capacitação e
conhecimento e habilidade física do cooperado. As atividades realizadas pelos
cooperados se desenvolvem no próprio galpão, no Canal do Cunha, nos trabalhos
de artesanatos e nas instituições com as quais mantêm termo de compromisso para
o recebimento de materiais recicláveis, conforme determina o Decreto 5.940/2006.
Atualmente, a Cooperativa mantém convênio com várias instituições públicas
como Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (CREA),
Nuclebrás Equipamentos Pesados S.A (NUCLEP), Banco do Brasil S/A, Marinha,
Ministério da Fazenda, BNDES, Agência Nacional do Cinema (ANCINE) e SERLA,
de onde recebe os materiais a serem triados para a reciclagem. O contrato mantido
com a SERLA (Superintendência de Rios e Lagoas do Rio de Janeiro) regula o
trabalho prestado pelos cooperados no Canal do Cunha, que inclui a retirada de
resíduos acumulados na barreira de contenção. Após a separação desse material,
os resíduos recicláveis são armazenados e o restante é descartado em contêineres
para a COMLURB proceder à destinação final.
Figura 11 – Cooperativa nº 03. Quantidade de lixo a ser triada.
Fonte: Autora
75
O volume de resíduos manuseados mensalmente pela Cooperativa nº 03 se
dá em torno de 14 toneladas no galpão da cooperativa e em torno de 10 toneladas
no Canal do Cunha. Os materiais de maior prevalência são: papéis brancos,
garrafas tipo PET, papelões, sucatas de ferro, vidros e plásticos em geral e pilhas e
baterias. O galpão da cooperativa é bem organizado, havendo, porém, grandes
amontoados de resíduos a serem separados e classificados, conforme demonstrado
nas figuras 11 e 12.
A cooperativa, atualmente, possui quatorze cooperados do gênero feminino e
dezesseis do gênero masculino e conta, ainda, com o trabalho de catadores avulsos
que trabalham por conta própria recolhendo materiais nos diversos locais de
despejos existentes no Complexo da Maré (figuras 13 e 14). Esses catadores
vendem à Cootrabom, de forma isolada, os resíduos coletados. Constatou-se grande
quantidade de lixo disposta a céu aberto em diversas áreas do complexo da Maré e
vários catadores atuando nesses locais.
Figura 12 – Cooperativa nº 03. Quantidade de lixo a ser triada.
Fonte: Autora
76
Figura 13 – Cooperativa nº 03. Catadora de Rua – Complexo da Maré.
Fonte: Autora
Figura 14 – Cooperativa nº 03. Catadora de Rua – Complexo da Maré.
Fonte: Autora
77
Figura 15 – Cooperativa nº 03. Barreira de Contenção - Canal do Cunha
Fonte: Autora
Figura 16 – Cooperativa nº 03. Barreira de Contenção - Canal do Cunha
Fonte: Autora
78
Os trabalhadores que exercem atividades no galpão trabalham em recinto
fechado. Os que são destinados a atividades nas instituições conveniadas, no
entanto, trabalham em recintos fechados e abertos. Todavia, os cooperados que
trabalham no Canal do Cunha – Projeto Ecobarreira, exercem suas atividades
somente em ambiente externo, estando expostos a todas as intempéries, sol, chuva,
calor e frio (figuras 15 e 16).
4.4 – Cooperativa nº 04 - Cooperativa de Materiais Recicláveis.
A Cooperativa nº 04 surgiu em 2000, sendo legalizada apenas em 2007. A
cooperativa está localizada, no Complexo do Alemão, Rio de Janeiro, e ocupa um
galpão antigo que, segundo a presidente da cooperativa, era de propriedade da
Cerveja Brahma. Esse imóvel foi abandonado há 30 anos e em 2000 foi ocupado
pela cooperativa. A demanda para a formação dessa cooperativa surgiu da
inquietação da atual presidente que viu no trabalho de reciclagem a possibilidade de
restabelecer a dignidade, inclusive a sua, e de uma parte da população do complexo
do alemão, que vivia em situação precária e sem perspectivas de emprego.
No período de 2004 a 2008, a cooperativa esteve no seu auge, contando
naquele momento, com cerca de cinquenta cooperados. Além de agregar os
catadores que faziam catação e trabalhavam de forma isolada, a cooperativa
desenvolveu, ao longo de cinco anos, projetos sociais junto à comunidade como
creche, alfabetização de adultos, planejamento familiar e mutirão de limpeza dos rios
da região. Naquele período, os cooperados tinham café da manhã e almoço no
próprio local de trabalho.
A creche foi um projeto social reconhecido pela comunidade e era mantida
com os próprios recursos da cooperativa. Um grupo de cooperados, especialmente
as mulheres, se revezava entre o trabalho na cooperativa e a divisão de tarefas na
creche que chegou a abrigar, aproximadamente, cinquenta crianças filhos dos
próprios cooperados e de alguns moradores que não tinham onde deixar os seus
filhos.
Devido à baixa de preço dos materiais recicláveis e à falta de incentivos
financeiros para dar continuidade aos projetos sociais incorporados pela Cooperativa
nº 04, os programas foram abandonados e a creche fechada. Atualmente, a
79
cooperativa conta com vinte e cinco cooperados, sendo nove do gênero masculino e
dezesseis do gênero feminino.
Assim como as demais cooperativas, a Cooperativa nº 04 recebe materiais de
diversas origens, dentre elas de instituições públicas conforme a assinatura do termo
de compromisso estabelecido no Decreto 5.940/2006, incluindo o Ministério da
Fazenda, a Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM) e o Instituto
Nacional de Seguridade Social (INSS). Essa última instituição foi abandonada
devido ao alto preço do aluguel do caminhão para a retirada do material, ficando o
custo-benefício prejudicado. Nessa Cooperativa, alguns cooperados fazem a
catação nas ruas circunvizinhas ao Complexo do Alemão. Ela recebe, ainda, óleo
vegetal usado e materiais não-separados de residências, o que contribui para o
acúmulo de lixo no galpão da cooperativa, como pode ser visto nas figuras 17 e 18.
Figura 17 – Cooperativa nº 04. Resíduos a serem triados
Fonte: Autora
O volume de material negociado pela cooperativa, mensalmente, é de
aproximadamente 30 a 36 toneladas. Todo o resíduo é transacionado com
atravessadores, pois segundo informações da gestora, essa negociação tem sido
mais vantajosa do que o envio para a Central Cata Rio, uma vez que o recebimento
pela venda do material é imediato e, consequentemente, o rateio entre os
80
cooperativados. A Cooperativa nº 04 dispõe de poucos equipamentos para a
condução de suas atividades, dentre estes, uma balança de 200 quilos que
atualmente está com defeito, uma prensa e um computador.
Figura 18 – Cooperativa nº 04. Bombona com óleo usado
Fonte: Autora
A cooperativa, no momento, não fornece equipamento de proteção individual
por não ter condições financeiras para a sua aquisição. Portanto, os cooperados não
os utilizam. Segundo informação da presidente, quando sobra algum dinheiro são
adquiridas apenas luvas de látex. Atualmente, nenhum cooperado contribui para a
Previdência Social. Os cooperativados executam suas tarefas no decorrer de oito
horas diárias, em ambientes abertos e fechados e, na maior parte desse período,
trabalham sentados.
81
4.5 – Caracterização dos resíduos manuseados nas Cooperativas
Essa investigação não teria parte dos seus objetivos atendidos sem a devida
caracterização dos resíduos manuseados diariamente nas cooperativas analisadas
neste estudo.
Foi constatado que existe uma similaridade na maior parte dos resíduos
sólidos manejados nas quatro cooperativas, conforme demonstrado no quadro 2. Em
todas elas são manipulados papéis brancos, papelões, jornais, sucatas de ferro,
plásticos e vidros em geral, garrafas de água e garrafas PET e sucatas de material
eletroeletrônico (High tech). Cerca de 80% desse material é oriundo de órgãos e
entidades da administração pública federal direta e indireta, de acordo com o
estabelecido no Decreto nº 5.940/2006, sendo o restante proveniente de
condomínios residenciais. As cooperativas nº 03 e nº 04 recebem, ainda, materiais
resultantes da catação na rua.
Cabe aqui, então, enfatizar alguns resíduos que, devido às suas
peculiaridades e periculosidade, carecem de destaque especial e de atenção quanto
à classificação e cuidados que devem lhes ser dispensados, como pilhas, baterias,
bombonas usadas com restos de resíduos químicos, embalagens usadas de
cápsulas de míssil contendo resíduos de pólvora, recipientes de óleo diesel e de
graxa, cartuchos de impressoras e copiadoras, recipientes de materiais de limpeza e
latas de tintas e de solventes.
Esses resíduos contêm componentes potencialmente perigosos que oferecem
riscos à saúde humana e ao meio ambiente, pois trazem em suas composições
elementos com propriedades corrosivas, inflamáveis, tóxicas, patogênica ou reativa.
Na Cooperativa nº 01, cabe enfatizar o manuseio de grande quantidade de
embalagens de óleo diesel e graxa que são doados pelos postos da BR Distribuidora
e pela Prosint Química – Petróleo e derivados.
Necessário se faz salientar o nível de contaminação dos resíduos sólidos
retirados do Canal do Cunha e que são manipulados pelos trabalhadores. O estudo
realizado por Amaral (2006, p. 156) concluiu que
“Os parâmetros de qualidade da água que mostraram maior relevância
para a proposição de um índice de degradação ambiental foram: o oxigênio
dissolvido, com maior peso; a demanda bioquímica de oxigênio; a
demanda química de oxigênio; o nitrogênio amoniacal e a relação
nitrogênio amoniacal + nitrito + nitrato, que indica quanta amônia o rio
82
recebeu e o quanto conseguiu oxidar – quanto a região foi impactada por
processos de degradação e o potencial de depuração do rio -, incluindo
condicionantes físicos-geográficos (velocidade, temperatura, volume
d´agua e matéria orgânica presente...). O conjunto destes parâmetros
revela a degradação ambiental, e logo, os riscos à saúde associados ao
meio ambiente”.
Nesse mesmo estudo, por meio da relação Demanda Bioquímica de Oxigênio
(DBO) x Coliformes e Demanda Química de Oxigênio (DQO) x Coliformes, foram
medidos os níveis de coliformes termotolerantes, que oferecem riscos potenciais de
contaminação aos seres humanos, numa relação ecossistêmica entre o homem e o
meio ambiente. Essa pesquisa identificou ainda, a Refinaria Manguinhos como a
possível responsável pelo lançamento de dejetos resultantes de processos
industriais contendo Fenol, o que pode contribuir para uma grande eliminação de
coliformes fecais e termotolerantes. No entanto, quais os riscos que o fenol pode
causar à saúde humana? Os resíduos retirados do canal podem estar impregnados
de fenol em níveis de contaminação aos trabalhadores?
De acordo com Peixe et al (2006, p. 280), o fenol é absorvido rapidamente
após exposição por via oral, inalatória e dérmica, sendo distribuído imediatamente
para todos os tecidos e, em exposições agudas, apresenta toxicidade de moderada
à alta e a dose letal em humanos é estimada em 70 ml/kg. Em exposições
ocupacionais, o fenol pode provocar rach cutâneo, lesões eritematosas e necrose
tecidual.
Na Cooperativa nº 02, existe um armazenamento considerável de cartuchos
usados de impressoras e copiadoras (figuras 8, 9 e 10). Esses cartuchos, ao serem
manejados, liberam uma poeira densa de partículas escuras espalhando-se pelo
chão e atingindo todos os que estão no ambiente pelas vias respiratórias e
dérmicas, necessitando de estudos no campo da saúde para investigar possíveis
agravos à saúde dos trabalhadores expostos.
As cooperativas estudadas alegam que as instituições públicas têm se valido
do Decreto 5.940/2006 para obrigá-las a recolher todos os tipos de materiais de que
não necessitam mais e veem na cooperativa uma forma de se livrar dos entulhos
que lhes causam problemas. Segundo as cooperativas, as instituições chegam a
ameaçá-las caso não retirem o material, mesmo que aquele tipo de resíduo não
sirva para a cooperativa ou que esta não tenha condições de absorvê-lo, como se
constata na fala abaixo:
83
“Nós não reciclamos madeira, no entanto, recebemos uma pirâmide e tanto
de madeira que não sabíamos pra onde descartar aquilo que nem dado
ninguém quis. Aí o que fizemos, essa semana que passou liguei pra
algumas lojas de construção e através destas lojas eu consegui o endereço
de uma cerâmica que é quem tá tirando esses pedaços de palete de dentro
do Correios pra mim. Porque eles disseram ou eu tirava aquela madeira ou
então dava espaço pra outra cooperativa trabalhar que vai entrar no
mesmo problema que eu, porque ninguém tem espaço pra armazenar
madeira.” (G2.1)
O Decreto 5.940/2006 determina que os resíduos sejam separados na fonte e
entregues às cooperativas. Segundo as informações obtidas nas entrevistas, vem
ocorrendo o contrário, pois as cooperativas têm alocado seus cooperativados dentro
das instituições para realizar a separação e classificações dos materiais, ficando até
mesmo responsáveis pela limpeza do ambiente onde estão armazenados os
resíduos.
4.6 – Catador e triador de material reciclável: Profissão ou Exclusão?
A exacerbação da pobreza e os desequilíbrios sociais são resultados da
deterioração ambiental e dos moldes insubsistentes de produção e de consumo
exacerbado, ambos, nutridos, principalmente, pelos países desenvolvidos. Essa
afirmação está contida no capítulo 4, da Agenda Global 21, documento elaborado na
Rio Eco 92, quando da realização, no Rio de Janeiro, da Conferência das Nações
Unidas sobre as questões do meio ambiente e desenvolvimento.
O modelo de consumo da sociedade contemporânea que privilegia o uso
desordenado de materiais descartáveis corrobora para os problemas ambientais e
para o esgotamento dos recursos naturais. A utilização de embalagens descartáveis
aumentou sobremaneira, a quantidade e a qualidade dos resíduos sólidos, (Siqueira
e Moraes, 2009, p. 2116). Consequentemente, o agravamento da disposição final
desses resíduos.
Frente às questões das desigualdades sociais provocada pela concentração
de riqueza e pelos aspectos da produção e do consumo ditados na nossa
sociedade, surge a categoria de Catadores de lixo, processo decorrente da exclusão
social. Esses trabalhadores passam a vislumbrar um modo de vida, de subsistência
e de inserção na cadeia produtiva e no mercado de trabalho. Trata-se de uma forma
de obtenção de renda alinhada na busca de uma dignidade. De acordo com
84
Gonçalves (2003, p. 91), “... Ele trabalha na sombra das idiossincrasias de consumo
da sociedade”.
Em 1947, Manuel Bandeira, em seu poema “O Bicho”, já relatava a existência
de pessoas que viviam do lixo, catando comida entre os detritos, em busca da
sobrevivência, mas ainda não atentavam para a cata de materiais passíveis de
reciclagem (Bosi, 2008, p. 67). No Brasil, o trabalho informal do catador existe há
algumas décadas tendo recebido várias denominações, dentre elas, papeleiro,
garrafeiro, sucateiro, e até mesmo “burro sem rabo”. Esse trabalhador sempre
esteve presente no processo de gerenciamento de resíduos (Gonçalves, 2003, p.
91).
De acordo com a descrição feita por Siqueira (2009, p. 2120), os catadores
estão assim classificados: a) Catadores de lixão: representam a relação direta de
exclusão, fazem a catação diretamente nos lixões e estão excluídos de qualquer
assistência ou organização. Representam as mazelas sociais; b) Catadores de Rua:
fazem a coleta nos sacos de lixo colocados na rua pela população em geral, pelo
comércio ou pela indústria. Têm o seu transporte próprio, carroça ou outro tipo
adaptado para carga; c) Catadores Cooperativados e autogestionários: prestam
serviços de coleta seletiva de qualidade, de forma articulada e organizada, gerando
trabalho e renda. Estão articulados em movimentos nacionais e fóruns e recebem
apoio de entidades não governamentais. Estes últimos são o foco do nosso trabalho.
Os agentes que exercem a atividade de catação e triagem de materiais
recicláveis vêm, ao longo do tempo, buscando o reconhecimento da profissão e a
otimização da atividade por meio da organização de movimentos iniciados nos anos
80. Com o apoio de instituições não-governamentais na década de 90, esses
movimentos se fortaleceram, culminando em vários encontros e reuniões em
diversos locais do país. Em 2001, aconteceu o 1º Congresso Nacional de Catadores
de Materiais Recicláveis e a 1ª Marcha de População de Rua. Nesse mesmo ano, foi
criado o Movimento Nacional de Catadores, (Medeiros e Macedo, 2006, p. 65).
Como resultado desse processo, houve o reconhecimento da categoria de catadores
com a oficialização na Classificação Brasileira de Ocupação (CBO).
Na CBO, essa categoria profissional é descrita como catador de material
reciclável, podendo exercer as atividades de catação, seleção e venda de materiais
recicláveis, tais como, papel, papelão, vidro e todos os tipos de materiais
reaproveitáveis. O reconhecimento da profissão passa a ser um passo importante na
85
busca de condições dignas de vida e de trabalho, pois o que se constata é que
esses trabalhadores são excluídos socialmente, sofrem preconceito e não são
reconhecidos pelo papel que desempenham na economia e no meio ambiente. Uma
exclusão perversa, por sobreviverem do lixo, “estes seres humanos são
desconhecidos e identificados como `descartáveis´”, (Velloso, 2008, p. 1958).
No processo de catação e separação de materiais passíveis de reciclagem,
segundo o Relatório do Encontro dos 700 do Movimento Nacional dos Catadores de
Materiais recicláveis, ocorrido em Brasília em 2006, estima-se que existam, no
Brasil, 500 mil catadores de rua. No Estado do Rio de Janeiro, segundo dados
obtidos
na
Secretaria
Estadual
de
Meio
Ambiente,
http://www.ambiente.rj.gov.br/pages/outros_projetos/coletaseletiva_cooperativas, por
meio do cadastramento das cooperativas, atualizado em fevereiro de 2009,
constata-se que 914 trabalhadores estejam vinculados às Cooperativas de
Catadores. Segundo dados da Rede Nacional do PROVE, esse número é de
aproximadamente 740 trabalhadores.
De acordo com o Coordenador do Comitê Interministerial da Inclusão Social
de Catadores de Lixo (CIISC)g, em palestra proferida no II Fórum dos Órgãos
Federais do Rio de Janeiro para Coleta Seletiva Solidária, o Brasil se tornou pioneiro
e protagonista, no cenário internacional, na problemática que envolve a inclusão dos
catadores, ao reconhecer, na Classificação Brasileira de Ocupação – CBO, a
categoria de Catador de Material Reciclável. Tal pioneirismo deve-se à instituição do
CIISC, do Decreto Presidencial nº 5.940/2006 e da Lei nº 11.445/2007, que
estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento e para a política federal de
saneamento básico. Todavia, ainda existe um longo caminho a ser percorrido, pois
falta um olhar mais comprometido sobre o catador quando se consideram as
condições em que estes estão inseridos no processo de organização, de trabalho e
no ambiente. Devem também ser tomadas como relevantes a escolaridade, as
condições sócio-econômicas e outras variáveis que interferem na vida e no processo
saúde-doença.
Os trabalhadores que executam as atividades de triagem de material
descartável as exercem sob as mais diversas situações, estando expostos ao frio,
ao calor, à chuva, às variações bruscas de temperatura, além do contato físico com
g
Comitê criado pelo Decreto Federal de 11 de setembro de 2003.
86
diversos tipos de materiais e produtos. No momento em que lidam com o lixo e
manuseiam os resíduos descartados à procura de objetos passíveis de
comercialização, esses indivíduos ficam expostos e vulneráveis a diversos perigos
de contaminação presentes nos resíduos vazados, (Ferreira e Anjos, 2001, p. 691).
A contaminação a que esses trabalhadores estão suscetíveis pode ocorrer por meio
da inalação, do contato dérmico, por via oral, pela ingestão de alimentos e pelos
incontáveis riscos de acidentes, (Juncá, 2004, p. 41).
Diversos autores (Ferreira, 1997; Velloso 2005; Cussiol 2006 e Pinto Júnior e
Braga 2009) são unânimes ao concordar que os resíduos sólidos causam efeitos
adversos à saúde dos trabalhadores e ao meio ambiente. Ferreira (2001, p. 691),
afirma ainda que poucos são os estudos epidemiológicos acerca da saúde dos
trabalhadores vinculados ao sistema de gerenciamento dos resíduos sólidos. Devido
à vulnerabilidade a que estão expostos pelo tipo de trabalho desenvolvido, essa
população fica suscetível e com alta probabilidade de restrições na qualidade e vida
e, conseqüente, de complicações à saúde.
O
caminho
percorrido
por
estes
trabalhadores
apresenta
inúmeras
contradições e conflitos que permeiam os seus terrenos. Necessário se faz um olhar
mais aguçado com políticas públicas que dêem conta, senão de todas, pelo menos
da problemática que envolve a saúde destes sujeitos que lidam com os resíduos
sólidos.
No campo de pesquisa sobre a saúde dos trabalhadores que lidam com a
triagem de materiais recicláveis, ainda há muito a se percorrer, considerando-se os
ambientes vulneráveis onde esses sujeitos exercem suas atividades, os agravos à
saúde resultante das exposições diárias, as precárias relações e condições de
trabalho a que estão submetidos e a injustiça social a que estão relegados. Nessa
direção, cabe observar as palavras de Foucault (1984, p. 13), “existem momentos na
vida onde a questão de saber se se pode pensar diferentemente do que se pensa, e
perceber diferentemente do que se vê, é indispensável para continuar a olhar ou a
refletir.” O discurso abaixo demonstra o anseio pelo reconhecimento da atividade
desses trabalhadores e a relação do significado do trabalho na vida desses
profissionais.
“Daqui desse trabalho, através da cooperativa tiramos o rendimento e a
dignidade, o alimento da família. A importância do trabalho... acho que é
bacana focar a importância da coleta seletiva... O que é lixo pra mim, pode
87
gerar renda pro outro, né? Alimento pro outro, dignidade pro outro. A
importância que tem não só para os cooperados que trabalham aqui, mas
para toda a sociedade, pois a gente tá retirando lixo do meio ambiente.”
(G1.3)
Para Porto (2004, p. 1511), os catadores veem o manejo do lixo como fonte
de renda e de sobrevivência; a saúde, como capacidade primordial para a realização
desse trabalho, existindo uma tendência à negação da relação direta entre trabalho
com o lixo e problemas relacionados à saúde. Nesse contexto, faz-se necessária a
percepção do trabalhador como sujeito ativo no seu processo de trabalho, para
identificar os danos à saúde e outros obstáculos que podem causar sofrimento e
mal-estar. Com este saber, poderão buscar melhores condições de trabalho em
defesa da saúde e integridade física. É de fundamental importância que o
trabalhador vulnerável tenha o conhecimento do seu processo de trabalho para
avaliar e discutir soluções alternativas, (Dall´agnol et al, 2007, p. 731; Lacaz, 2007,
p. 761).
4.7 – Perfil
Os atores desta pesquisa são vinculados às cooperativas de materiais
recicláveis e desenvolvem diversas tarefas de acordo com a demanda de serviço,
capacidade física e nível de conhecimento. O trabalho envolve os processos de
classificação, separação, prensagem, enfardamento e armazenamento, além da
manutenção, da organização e da limpeza do ambiente laboral. Essas tarefas são
executadas nas dependências das cooperativas ou nas instituições que mantêm
acordos decorrentes do Decreto nº 5940/2006.
Em duas dessas cooperativas, foram encontrados trabalhadores que exercem
a atividade de catação na rua utilizando os chamados carrinhos-de-burro. No grupo
definido nesta pesquisa, havia jovens e pessoas idosas, de 20 a 68 anos. A média
de idade é de 44 anos, predominando trabalhadores do gênero feminino. Cinqüenta
e oito por cento do total observado são casados e 9% são solteiros e residem com
seus familiares. Ainda que haja pouco analfabetismo, a maioria possui baixa
escolaridade, fato que, associado à insuficiência de postos de trabalho, contribuiu
para adentrarem na catação. Identificou-se, porém, um trabalhador com nível
superior completo em Gestão Ambiental e nove com ensino médio completo.
88
Por exigirem pouca educação formal, as tarefas exercidas pelos catadores
são facilmente aprendidas, o que facilita a sua inserção rápida no trabalho sem a
necessidade de uma instrução mais aprimorada. A iniciação no trabalho de catação,
classificação e separação é imediata, não carecendo de experiências anteriores,
segundo afirmam os catadores. No grupo estudado, a maioria ingressou nesse ramo
por estar desempregada, vendo no trabalho com materiais recicláveis uma
alternativa frente à falta de um trabalho formal. Apurou-se que a média de tempo
nessa atividade é de quatro anos, mas encontramos cinco trabalhadores com menos
de seis meses e três com mais de dez anos nessa atividade.
Quase todos os profissionais residem em comunidades carentes e próximas
ao local de trabalho, o que facilita o deslocamento residência-trabalho-residência.
Cabe observar que todas as cooperativas citadas neste estudo também estão
localizadas em comunidades, como o Complexo da Maré e o Complexo do Alemão,
e em Brás de Pina. A carga horária desses trabalhadores é de oito horas diárias e
40 horas semanais. A maioria dos homens exerce outras atividades extras fora da
jornada na cooperativa, como a de pedreiro, de vendedor ambulante, de armador de
redes de jogos em praias, etc., a fim de aumentar a renda familiar. Já as mulheres
exercem outra jornada de trabalho em casa, nas atividades domésticas.
A média de renda individual é de R$ 520,00 (Quinhentos e vinte reais) e a
familiar, de aproximadamente R$ 1.100,00 (Hum mil e cem reais). Todavia, existem
famílias que sobrevivem apenas da renda de um membro e, como, em média, cada
família é composta por 04 membros (adultos e crianças), pode-se concluir facilmente
que essas famílias vivem com rendimentos pífios e insuficientes para uma vida
digna.
Quando indagados se consideram essa atividade um trabalho ou apenas uma
alternativa pela falta de outra função laborativa, a maioria (85%) respondeu que
considera um trabalho, mas, quando se insistiu na pergunta, quase se obteve uma
unanimidade, pois afirmam que almejam outro trabalho em que possam ser
reconhecidos como cidadãos, com vínculo formal e respectivos direitos patronais,
salários fixos e dignos e em que possam exercer suas funções em um ambiente
menos sombrio, como se observa nos relatos abaixo.
“Alternativa enquanto arrumo outro trabalho, não gosto de mexer com o lixo
o dia todo.” (C1.1)
89
“Considero um trabalho, mas alternativo, pois não há reconhecimento pela
sociedade, mas é melhor do que roubar, traficar.” (C1.2)
“Ganha-pão...” (C1.4)
“Um trabalho, mas se aparecer outro vou analisar.” (C1.5)
“É um trabalho mesmo... mas não é carteira assinada... nosso trabalho aqui
é muito perigoso, é muito lixo, muita lama, muitos gases.” (C3.7)
4.8 – Trajetórias vulneráveis
Os atores que exercem as atividades de classificar, separar, compactar,
enfardar e acumular os produtos passíveis de reciclagem, ligados às cooperativas
de materiais recicláveis, executam suas funções nas mais adversas situações, o que
propicia um sentimento de instabilidade, insegurança, insatisfação e exclusão na
sociedade, considerando-se invisíveis dentro do sistema.
“Há 1 ano e 3 meses estou afastado, por ácido úrico que peguei aqui...
parece agora que me mandaram embora... Eu tive alta do INSS, mas eu
acho que fui mandado embora.” (C3.6)
A vinculação a uma cooperativa não só proporciona melhor poder de
barganha para a venda do material e organização da classe – elo para as
reivindicações –, mas também um sentimento de pertencimento e de filiação.
Consiste, portanto, em uma forma de tornar os catadores visíveis na sociedade,
fazendo-os participarem de um processo produtivo que, de certa forma e nível,
movimenta a economia, gerando renda e, principalmente, conferindo ao lixo um
valor social e econômico (Carmo, 2009, p. 599). Fica constatado que o elo a uma
instituição e classe desperta um sentimento positivo de rupturas de costumes e
valores adquiridos quando estavam desempregados ou trabalhando em lixões ou,
ainda, quando exerciam a atividade de catação na rua. A obrigação do cumprimento
de uma carga horária, da assiduidade, do lidar com atividades rotineiras, passou a
ser um fator de valorização. O compromisso, para muitos, significou o abandono de
práticas consideradas ruins, como o deixar de se embriagar na noite anterior.
Em quase todas as cooperativas analisadas, as atividades são exercidas por
todos os trabalhadores, de acordo com a demanda de trabalho e capacidade física.
O peso por fardo levantado por trabalhador se dá em torno de 80 quilos, quantidade
90
considerada alta por todos, apesar de haver ajuda dos companheiros e utilização,
em algumas cooperativas, de carrinhos para a condução dos fardos. Ao final da
jornada diária de trabalho, por o esforço físico despendido ser excessivo, esses
profissionais estão exaustos. Geralmente, os homens ficam com as tarefas mais
pesadas e as mulheres com as atividades que exigem maior concentração.
Ao serem indagados se já sofreram algum tipo de acidente no horário de
trabalho, como lesões por objetos perfuro-cortantes, queimaduras por produtos
químicos ou quedas com fardos, a maioria nega, mas, na observação de suas
rotinas, a realidade é diferente, fato que pode ser atribuído à necessidade dos
cooperados de enfatizar que o trabalho com o lixo oferece riscos como qualquer
outro. Verificou-se, ainda, que são grandes os riscos de saúde a que estão
submetidos, pois a maioria dos catadores não utiliza equipamentos de proteção
individual. Por outro lado, segundo os cooperados, é muito comum a presença de
objetos cortantes e perfurantes misturados com os materiais recebidos, como
seringas, agulhas, vidros quebrados e até mesmo bisturis.
Figura 19 – Cooperativa nº 02. Cooperada com braços queimados/Cicatrizes
Fonte: Autora
91
Na cooperativa nº 02, encontrou-se uma cooperada que sofreu queimaduras
de primeiro grau nos braços (figuras 19 e 20) que, segundo ela, deveu-se ao
manuseio de vários cartuchos de impressoras e copiadoras, atribuindo ao evento a
grande quantidade de toner que é liberada dos cartuchos quando manejados ou
mesmo pela manipulação de uns papelões à mesma época da dos cartuchos de
toner, conforme relatado abaixo.
“Meus braços foram queimados com alguma coisa, ou pelo toner ou por
alguma coisa que tava envolvido no papelão ou no saco Eva, que entrou
dentro da luva e misturou suor dentro da luva, num dia de calor e sol
quente, começou uma coceira, das coceiras criou umas bolhas, porque eu
já uso essas luvas a tempo, e até pensei será que foi a luva? A gente
sempre comprou essas luvas... não era alergia as luvas, ela tava nova
até... foi no material do Correio, plástico Eva e papelão. Ficou essa dúvida
no ar... levou mais de um mês para sarar... coçava muito... me tirava o
sono, até para dormir era ruim.” (G2.1)
Figura 20 – Cooperativa nº 02. Cooperada com braços queimados/Cicatrizes
Fonte: Autora
Obteve-se a informação de que outros cooperados já tiveram o mesmo tipo
de queimadura. Outro fator que pode ter contribuído para as queimaduras no braço
da cooperativada foi o manuseio de embalagens de míssil, recebidas da marinha,
que vinham com muitos resíduos de pólvora. O manejo desses materiais ocorreu no
mesmo período, tendo sido difícil a identificação do nexo causal.
92
Quando inquiridos sobre os tipos de riscos a que estão expostos no exercício
de suas tarefas, inúmeras afirmações foram prestadas. Como exemplo, pode-se citar
os gases e odores fortes exalados dos amontoados de lixo e de restos de produtos
químicos, presença de agulhas e seringas no material a ser separado, cheiro do
material armazenado e exposição a muitos resíduos que desconhecem o tipo, a
origem e a sua composição. Relataram também sobre o contato físico com o lixo, a
surdez por conta do uso da prensa, a contaminação em geral, os cortes com
infecção, o contato com materiais pontiagudos, o trabalho repetitivo e as diversas
implicações dermatológicas. As falas abaixo expressam as preocupações desses
trabalhadores no exercício de suas tarefas:
“Acho o lixo tóxico.” (C1.2)
“Ambiente contaminado por vetores. Resíduos Sólidos Urbanos é uma
bomba.” (C1.5)
“Vários, trabalho com muitos materiais que desconheço o tipo. Não sei a
origem e a composição.” (C2.5)
“Qualquer trabalho tem risco, mas tem que ter cuidado senão tem
contaminação.” (C1.7)
“Só o tempo para dizer.” (C1.4)
“Veja, os que trabalham no escritório, sentado, dói as costas, tem tendinite,
dor na coluna, (...) o que trabalha no hospital diz que corre o risco de ser
contaminado por limpar aquele chão sujo... então, se a gente for olhar por
esse caminho... o meio ambiente vai ficar por aí cada vez mais complicado,
as enchentes, inundações vão piorar, vão triplicar mais ainda, porque isso
é conseqüência da omissão, da falta de consciência da população, é
omissão da população que tem o seu consumo e deixa por ai, joga de
qualquer jeito. Então eu vejo para mim, que é trabalho como qualquer um
outro. Toda profissão tem os seus riscos.” (C4.2)
“É só essa coisa mesmo de pegar algum tipo de material que a gente não
conhece e vir com algum tipo de resíduos que venha de repente trazer
risco à saúde da gente... que a gente não conhece, não sabe o que tá
dentro de alguma embalagem, né? Quando a gente tava na Marinha, na
Ilha das Cobras, às vezes vinha óleo, vinha uns galões grandes com coisas
que a gente nem sabia o que era, um líquido.” (G2.1)
“Nosso trabalho aqui é muito perigoso, é muito lixo, muita lama, muitos
gases, muito bicho morto, a gente não se prejudica mais porque tem a
mascara, mas mesmo assim é a nossa saúde.” (C3.7)
93
Os cooperados que trabalham no Canal do Cunha citam que os riscos a que
estão expostos no exercício das tarefas são decorrentes de gases e cheiros fortes
exalados da baía de Guanabara, devido ao elevado nível de poluição da água e ao
contado com o óleo que, segundo eles, é derramado na baía pela Refinaria
Manguinhos. Alegam que, ao final do dia, estão impregnados com o cheiro forte de
esgoto e gases da baía e, mesmo após um banho realizado com capricho, o cheiro
persiste em seus corpos e no olfato. Outro fator de risco é a grande carga de
material que retiram do canal e que carregam subindo uma escada de
aproximadamente 15 degraus, no decorrer de toda a jornada de trabalho.
“O cheiro é muito forte do gás que vem da maré... quando junta muito lixo...
mesmo com a mascara a gente sente um cheiro muito forte.” (C3.7)
“Tem muito risco pra pessoa... eu digo para essa garotada nova aí procurar
outro trabalho... não sei que doença pode arrumar eu acho que pode ser
doença grave... è muito cheiro forte... pode causar coisa pior.“ (C3.6)
“Um gás danado daquele lixo que fica ali (na barreira de contenção) e
fedendo... a gente tem muito sono, cansaço, dor de cabeça e é por causa
do gás... sufoca a gente.“ (C3.5)
“Por enquanto nada... só quando chego em casa sinto muito dor na
coluna...agora a gente não sente muita coisa não, mas mais tarde pode ter
muito problema.” (C3.4)
“A gente sabe que nessa água tem metais pesado... a gente queria que
tivesse uma acompanhamento.” (G3.1)
Na cooperativa nº 01, os riscos mais citados foram a presença de vetores,
principalmente de roedores, e o contato com os óleos lubrificantes e graxas
restantes dos recipientes recebidos dos postos pela cooperativa. Um dos
cooperados relatou que o maior risco a que está exposto é o contato direto com o
óleo e com a graxa. Esse trabalhador estava com a roupa totalmente encharcada de
óleo combustível, sendo o produto visível na sua cabeça, pescoço e braços.
Segundo ele, para a retirada do óleo do corpo, utiliza, nessa ordem, sabão de coco
líquido, sabão em pó e, por último, o sabonete. Gasta todos os dias 1 hora no banho
e, mesmo após esse processo, ainda continua com a sensação de oleosidade na
pele. A utilização desses produtos lhe causa prurido e irritações. Outro problema que
pode causar risco é o cheiro do óleo e o abafamento no local por conta do calor, o
que torna o ambiente sufocante.
94
Quanto às doenças que podem ser contraídas em decorrência do exercício da
profissão, as mais citadas pelos trabalhadores que desenvolvem atividades nos
galpões das cooperativas ou junto às instituições parceiras foram câncer de pele e
de pulmão; problemas de coluna devido ao excesso de peso que carregam;
problemas do trato respiratório como infecções pulmonares (pneumonia, bronquite),
tosses, espirros, pigarros decorrentes de mofo e de particulados e fuligem;
problemas dermatológicos (coceiras e irritações); leptospirose; surdez; dores
musculares na região lombar e nos membros; alergias diversas; tendinite devido ao
movimento repetitivo; e cefaléias. Cabe destacar as falas de alguns cooperativados
que procuram justificar ou minimizar o sofrimento do pensar em adoecer.
“Nenhuma doença, tomo sempre muito cuidado.” (C1.1)
“Muitos problemas sérios que só com o tempo para identificar.” (C2.13)
“Pode ter todo tipo de doença que virá mais tarde devido a sujeira.” (C3.19)
“Nenhum serviço deixa de causar problema ao trabalhador. O trabalho
desenvolvido na cooperativa pode causar várias doenças, dependendo do
material e do cuidado se não for tomado.” (C4.1)
Para os trabalhadores que atuam no Canal do Cunha, a visão com relação ao
adoecer é mais clara, porém não encontram outra alternativa a não ser enfrentar a
realidade que lhes é apresentada. Todos reclamaram de dor de cabeça no decorrer
e após a jornada de trabalho.
“Era bom fazer um check up, eu já perdi o baço e não sei como tá a
saúde... eu agora não sinto nada, mas mais tarde eu não sei... ou até a
gente pode ter alguma coisa e não sabe porque a gente não vai
constantemente ao médico só vai quando vai tomar a vacina.” (C3.7)
“Uma dor de cabeça, que eu não sei como arrumei ela. Demorou a sair.”
(C3.6)
“Não tive doença não... mas uma dor de cabeça daquelas chatinhas...
direto.” (C3.2)
“Fui expulso do INSS e agora eu quero saber como vai ficar... acho que
eles vão me mandar embora porque passei esse tempo fora e não consigo
mais fazer o que eu fazia.” (C3.6)
Ao se perguntar aos trabalhadores se contraíram doenças nos últimos 15
dias, 62% dos entrevistados afirmaram que não, mas a maioria relatou a presença
constante de cefaléias no percurso da jornada. Os 38% que afirmaram ter adoecido
95
nesse período, apontaram gripes e resfriados como o problema de saúde mais
constante decorrente das atividades de manuseio dos resíduos. Neste último grupo,
averiguaram-se três trabalhadores com problemas dermatológicos, inclusive em
tratamento, mas atuando nas suas atividades. Problemas estomacais também foram
relatados neste grupo, como enjôos e náuseas provocadas pelos odores dos
materiais.
“Nos últimos 15 dias tive micose no braço e tá até agora... começou com
umas bolinhas e foi se espalhando... fui ao médico e ele me passou uma
pomada, to tomando remédio até agora.” (C3.4)
“Sinto muita tonteira e uma agoniação no estômago de vez em quando, dor
nas costa de tanto baixar e levantar e subir a rampa que eles fizeram ali...
Pode causar muitas doenças que a gente não vai sentir agora... quando a
gente tiver 50 anos.” (C3.5)
Apesar de relatarem que facilmente encontram objetos cortantes nos
materiais, apenas 46% do grupo entrevistado informaram que foram vacinados nos
últimos 2 anos contra tétano. Vinte e cinco por cento tomaram a vacina contra
Influenza e 16%, contra hepatite. A argumentação dos trabalhadores pela não
imunização é a de que não têm tempo para se deslocarem aos postos de saúde e
ressaltam que, caso tivessem condições de receber as doses de vacinas nos locais
de trabalho, estariam dispostos a serem vacinados.
Constatou-se, então, que esses trabalhadores estão vulneráveis aos diversos
riscos oferecidos pelo manuseio dos resíduos frente às condições insalubres,
periculosas e precárias em que realizam suas atividades. Outro fator preponderante
que evidencia os riscos aos quais estão expostos é a grande falta do uso de
equipamentos de proteção individual, tanto pela indisponibilidade de tais
equipamentos quanto pela falta de conscientização do próprio trabalhador dos
malefícios que poderão ser evitados ao utilizá-los. O elo entre o trabalho e doença
tende a ser negado na tentativa de afirmar que suas atividades oferecem os riscos
como qualquer outra. Constatações idênticas já foram relatadas em outros trabalhos,
com o de Porto et al (2004, p.1511) e de Gonçalves (2004, p.89).
5. Conclusões e recomendações
97
5. Conclusões e recomendações
Esta pesquisa procurou direcionar, em todos os momentos, os caminhos
relacionados às questões da saúde dos trabalhadores que exercem atividades em
cooperativas de materiais recicláveis e que manuseiam resíduos de origem química,
tendo como foco os paradigmas da saúde coletiva.
Essa categoria de trabalhadores agrega um amplo leque multiprofissional
como ex-pedreiros, ex-domésticas, ex-vendedores ambulantes e ex-operários que,
hoje, compõem uma nova classe profissional, a do catador/triador. Muitos se sentem
honrados por terem conquistado a satisfação, dignidade e valor por não serem mais
enquadrados como desocupados. Para eles, a ocupação e o vínculo profissional os
colocam
numa
posição
da
estrutura
social,
permeada
de
hierarquias
e
complexidades, que os fazem ascender alguns e poucos degraus na sociedade.
Apesar da satisfação com o novo vínculo que consideram como trabalho,
esses sujeitos não escondem a esperança de encontrar uma ocupação diferente da
atual, longe da manipulação do lixo. Vislumbram uma atividade em que possam ter
direitos sociais, abandonando as condições precárias onde trabalham. A maioria
considera o trabalho cooperado como uma alternativa frente à falta de emprego
formal.
Um longo caminho ainda deverá ser percorrido para que esses trabalhadores
tenham visibilidade na sociedade; para que os resultados das suas atividades
possam ser percebidos como um dos fatores de minimização dos problemas
ambientais; para que a sociedade seja conscientizada sobre os benefícios advindos
do processo da reciclagem ao meio ambiente, que minimizam os impactos e a
utilização de novas matérias primas; para que haja a constatação de que essa
atividade tem um potencial econômico e que movimenta a economia, gerando renda
e buscando uma valorização social do lixo por meio da reciclagem.
Apesar de alguns avanços nas políticas públicas adotadas em nível federal e
em alguns estados, faz-se necessária a adoção de medidas que envolvam as
esferas governamentais, privadas e a sociedade civil a fim de se criarem bases que
possibilitem a formulação e implementação de políticas públicas eficientes e eficazes
para a gestão dos resíduos sólidos e, principalmente, para o que tange a saúde
ambiental e à saúde do trabalhador envolvido no processo de reciclagem.
98
A situação de vida e de trabalho desses cooperados é crítica, com salários
pífios e moradias inadequadas, colocando-os à margem da sociedade. O contexto
em que ocorre o processo de trabalho, em condições insalubres e periculosas,
requer ações que visem a melhoria do ambiente e que resultem em qualidade e
melhoria de vida, ensejando ampliação dos direitos de cidadania a esses
trabalhadores.
Foi constatada que a negação quanto aos riscos advindos da relação
trabalho/saúde/doença é uma forma menos dolorida de aceitar as condições que
lhes são impostas frente à realidade em que se dá o processo de trabalho,
manuseando todos os tipos de resíduos de várias origens e composições químicas.
Percebeu-se, segundo relato dos cooperativados, que o manuseio dos
materiais nas cooperativas estudadas provoca vários problemas de saúde, como
doenças de pele (dermatoses), queimaduras, dores de cabeça, resfriados e
problemas respiratórios, decorrentes do contato com os resíduos e dos odores
exalados. O esforço físico causado pelo carregamento dos pesados fardos provoca
exaustão e fadiga no final da jornada de trabalho.
Averiguou-se que as instituições que assinam o termo de compromisso com
as cooperativas, como determinado no Decreto 5.940/2006, têm obrigado as
cooperativas a retirarem de suas dependências todos os tipos de materiais
inservíveis, independentemente do seu valor reciclável, da composição química do
produto e das condições de espaço e logística da cooperativa. Há, inclusive,
ameaças de suspensão da doação como forma de pressionar a cooperativa a retirar
materiais que possam lhes causar diversos perigos.
Ressalta-se que se faz necessária uma avaliação seguida de ações de
adequação do Decreto 5.940/2006 objetivando a sua correta aplicação, para que as
cooperativas não sejam obrigadas a retirar das dependências das instituições
materiais que possam lhe causar problemas, principalmente os relacionados à
saúde.
Observou-se a carência de políticas públicas efetivas e eficazes com ações
nos mais variados segmentos que envolvem a gestão dos resíduos sólidos. Medidas
de fiscalização e de controle devem assegurar a preservação do meio ambiente,
mas, sobretudo, assegurar saúde à sociedade, principalmente, àqueles que estão
envolvidos no processo de reciclagem. Ações mescladas com programas
multidisciplinares objetivando práticas saudáveis que promovam a saúde individual e
99
coletiva dessa classe de trabalhadores devem ter lugar prioritário na agenda
governamental.
Destacam-se algumas práticas que devem ser adotadas por parte do Poder
Público a fim de minimizar os problemas enfrentados pelos trabalhadores inseridos
no processo de reciclagem, como:
1)
Parcerias entre governo e iniciativa privada, na definição de metas e
estratégias que alterem os padrões de produção/consumo de materiais
que causam mais impacto ao meio ambiente;
2)
Adoção de Eco-taxas, a exemplos das adotadas nos países da
Comunidade Européia, quando da produção de produtos que
desestabilizam o ecossistema;
3)
Monitoramento dos ambientes das cooperativas e, principalmente,
daqueles visivelmente insalubres, a exemplo das águas do Canal do
Cunha;
4)
Adoção de políticas que protejam a saúde desse coletivo de
trabalhadores, incluindo monitoramento por meio de exames periódicos
e campanhas específicas de imunização. Atenção diferenciada deve
ser dada aos catadores/triadores por meio dos Centros de Referência
em Saúde do Trabalhador, objetivando a melhoria das condições de
trabalho e de vida desses sujeitos;
5)
Acompanhamentos devem ser realizados por meio do Programa de
Saúde da Família, considerando que esse programa traz em seu bojo
a capacidade de intervir sobre os fatores de risco aos quais a
comunidade possa estar exposta, além de interferir nas causas
determinantes das condições de vida e saúde das comunidades;
6)
Concessão de aposentadoria especial para os profissionais que lidam
com a triagem/classificação de resíduos sólidos.
100
Pode-se concluir, portanto, que a problemática envolvendo a gestão dos
resíduos sólidos, desde a sua geração até o descarte final, é um problema de saúde
pública, uma vez que afeta o meio ambiente, a saúde do trabalhador envolvido no
processo de reciclagem e a sociedade quando não descartados e tratados
adequadamente.
Por fim, deseja-se que este trabalho desperte, nos diversos segmentos da
nossa sociedade – político, social e econômico -, um olhar mais aguçado para as
dificuldades enfrentadas por essa classe de trabalhadores. Almeja-se que ações
públicas e privadas venham transpor as barreiras que mobilizam a nossa sociedade
frente à contribuição que esses profissionais prestam ao meio ambiente. Espera-se
que os silêncios não permitam a continuação ou o aumento das injustiças sociais no
nosso país.
6. Referências
102
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2009.
7. Apêndice
111
7. Apêndice
7.1 – Apêndice A – Roteiro de Entrevista – Gestores/Cooperativa
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO - UFRJ
INSTITUTO DE ESTUDOS DE SAÚDE COLETIVA - IESC
CURSO DE MESTRADO EM SAÚDE COLETIVA
ROTEIRO DE ENTREVISTA – GESTORES DA COOPERATIVA
I - IDENTIFICAÇÃO
1: Cooperativa: ______________________________________________N º ____________
2: Localização/Endereço: _____________________________________________________
___________________________________________________________________________
3: Data da Formação da Cooperativa: ______________________
4: Quantidade de Cooperados: Masculino: _____________ Feminino.:_______________
II – CARACTERÍSTICAS
1: Estrutura física da Cooperativa:
( ) Galpão coberto
Outros: 1. _____________________________________
( ) banheiros
2. _____________________________________
( ) refeitório
3. _____________________________________
( ) escritório
2: Recinto de trabalho: (
) aberto
(
) fechado
3: A Cooperativa possui os seguintes equipamentos: (caminhão, prensa, balança, etc)
3.1: _____________________________________ 3.2: ______________________________
3.3: _____________________________________ 3.4: ______________________________
3.5: _____________________________________ 3.6: ______________________________
3.7: _____________________________________ 3.8: ______________________________
4: Tipos de materiais recebidos: (listar todos ou os de maior quantidade ou freqüência)
Material
Fonte
Quantidade/mês
112
6: Clientela de destinação dos resíduos:
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
7: Estrutura Organizacional: (Gerente, Financeiro, Conselho, etc)
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
III – RELAÇÕES DE TRABALHO
1. Qual o horário de trabalho da Cooperativa:
___________________________________________________________________________
2: Os Cooperados têm Férias? Sim ( ) Não ( )
Obs.:_______________________________________________________________________
3: Recolhem INSS? Sim ( ) Não ( )
Obs.: ______________________________________________________________________
4: Como se dá a forma de rateio?_______________________________________________
___________________________________________________________________________
5: Quando em licença médica o Cooperado participa do rateio? Sim ( ) Não ( )
6: Descrição do processo de trabalho:
6.1: ___________________________________ 6.2: ________________________________
6.3: ___________________________________ 6.4: ________________________________
6.5: ___________________________________ 6.6: ________________________________
6.7: ___________________________________ 6.8: ________________________________
6.9: ___________________________________ 6.10: _______________________________
6.11: __________________________________ 6.12: _______________________________
6.13: __________________________________ 6.14: _______________________________
6.15: __________________________________ 6.16: _______________________________
7: A Cooperativa fornece Equipamentos de Proteção Individual?(luvas, mascaras, etc)
Sim ( )
Quais? ___________________________________________________
Não ( )
_________________________________________________________
8: Existe algum programa de prevenção de acidentes? Sim ( ) Não ( )
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
9: Quais os riscos decorrentes do trabalho?
9.1: ___________________________________ 9.2: ________________________________
9.3: ___________________________________ 9.4: ________________________________
9.5: ___________________________________ 9.6: ________________________________
9.7: ___________________________________ 9.8: ________________________________
10: Como se dá a divisão de tarefas?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
11: Você gostaria de fazer algum comentário? ___________________________________
___________________________________________________________________________
113
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
12:Observação do entrevistador:
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
Muito Obrigada pela sua colaboração!
Rio de Janeiro, ______/________/_________
__________________________________
Entrevistado
__________________________________
Aplicador
114
7.2 – Apêndice B – Roteiro de Entrevista Cooperado
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO - UFRJ
INSTITUTO DE ESTUDOS DE SAÚDE COLETIVA - IESC
CURSO DE MESTRADO EM SAÚDE COLETIVA
ROTEIRO DE ENTREVISTA – COOPERADO
I - IDENTIFICAÇÃO:
1. Cooperado n° ________
2: Cooperativa: ________________________________
3. Sexo: ( ) Feminino ( ) Masculino 4. Idade: ______ 5. Naturalidade: _______________
6. Estado Civil: ( ) Solteiro(a)
( ) Casado(a)
( ) Viúvo(a) ( ) Separado(a)
7. Escolaridade: ( ) Ensino Fundamental incompleto
( ) Ensino Fundamental completo
( ) Ensino Médio incompleto
( ) Ensino Médio completo ( ) Ensino Superior
II – CONDIÇÕES SÓCIO ECONÔMICAS:
1: Bairro de Moradia/Domicílio:
__________________________________________________________
2: N° de pessoas que moram no Domicílio: Adultos: _________ Crianças: ______________
3: Renda Mensal individual:______________ 4: Renda Familiar/mensal: ______________
III – SITUAÇÃO DE TRABALHO:
1: Você é Cooperado nesta Cooperativa?
( ) Sim. Há quanto tempo? _________
( ) Não
2: O que levou você a participar de um Grupo/Cooperativa de Catadores? _____________
_____________________________________________________________________________
3 – O que você acha da organização dos catadores em Cooperativa? __________________
_____________________________________________________________________________
4: Você contribui para o INSS? ( ) Sim. Há quanto tempo? _________
( ) Não
5: Há quanto tempo você trabalha na catação/reciclagem? __________________________
6. Você tira férias todos os anos?
( ) Sim
( ) Não
7: Quantos dias/horas você trabalha na catação/reciclagem?_____dias/semana _____hs/dia
8. Quantas horas você trabalha em pé por dia?________________________________
9: Você faz horas extras freqüentemente? ( ) Sim. Quantas horas/semana? _____
( ) Não
115
10: Tem outra atividade após o horário na Cooperativa? ( ) Sim ( ) Não
Que tipo?_______________________ _____________________________________________
11: Após o trabalho você volta todos os dias para casa? ( ) Sim () Não_________________
_____________________________________________________________________________
12: Quanto tempo você gasta:
12.1: de casa para o Trabalho? __________ 12.2: do trabalho para casa? ______________
13: Descrição das atividades de trabalho: _________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
14: Você considera esta atividade como um trabalho ou apenas uma alternativa enquanto
encontra um trabalho? ________________________________________________________
____________________________________________________________________________
15: Você recebeu treinamento para o trabalho atual?
( ) Sim
( ) Não
16: Já sofreu algum tipo de acidente no horário de trabalho?
Acidente
SIM
NÃO
Quantas
vezes
Corte com vidro ou gilete
Corte, arranhão, perfuração com objetos
pontiagudos
Queimaduras com produtos químicos
Queda com recipiente, fardos ou sacos de lixo
Prensagem no equipamento de compactação
17: Após o acidente você recebeu atendimento médico?
( ) Sim ( ) Não
18: Por causa do acidente você se ausentou do trabalho?
( )Sim. Quanto tempo? ________ ( ) Não
19: Você ficou hospitalizado por causa do acidente?
( ) Sim. Quanto tempo? ________ ( ) Não
20: Se você se ausentou, você recebeu o benefício do INSS?
( ) Sim ( ) Não
21: Você levanta muito peso por dia: ( ) Sim, Quantos quilos? ________ ( ) Não
22: O barulho no seu local de trabalho lhe incomoda?
( ) Sim ( ) Não
23: Que tipo de incômodo o barulho do seu trabalho provoca em você?
23.l ________________________________ 23.2________________________________
23.3 ________________________________ 23.4________________________________
24: O cheiro do lixo incomoda você?
( ) Sim
( ) Não
25: Você encontra objetos perfurantes e cortantes no lixo?
( ) Sim
( ) Não
116
26: Você já encontrou no lixo materiais estranhos (incomuns, chocantes)?
26.1: ( ) Sim
1. ____________________________________________________________
26.2: ( ) Não 2. ____________________________________________________________
3. ____________________________________________________________
27: Que outro tipo de risco para a saúde existe em seu trabalho? _____________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
IV – ESTADO DE SAÚDE:
1: O seu trabalho pode lhe causar algum tipo de doença?
1.1: ( ) Sim
1.3: Quais?1. ______________________________________________
1.2: ( ) Não
2. ______________________________________________
3. ______________________________________________
2: O trabalho de triagem provoca em você esforço físico:
( ) Pequeno
( ) Normal
( ) excessivo
3: A poeira no seu ambiente de trabalho provoca algum incômodo em você?
3.1: ( ) Sim
3.3: Quais? 1. ___________________________________________
3.2: ( ) Não
2. ___________________________________________
3. ___________________________________________
4: Você teve alguma doença nos últimos 15 dias? ( ) Sim
( ) Não
4.1: Se a resposta foi sim, informe quais foram as doenças.
1. ______________________________ 2. __________________________________________
3. ______________________________ 4. __________________________________________
5. ______________________________ 6. __________________________________________
7. ______________________________ 8. __________________________________________
9. _____________________________ 10. __________________________________________
5: Algum membro da sua família já teve hepatite?
6: Você recebeu alguma das vacinas abaixo?
Vacina
SIM
Gripe (Influenza)
Hepatite
Febre Amarela
Antitetânica
Outra:
( ) Sim
NÃO
( ) Não
Quanto Tempo
7: Você gosta do seu trabalho? ( ) Sim
( ) Não
7.1: Por Que?1. _______________________________________________________________
2. _______________________________________________________________
3. _______________________________________________________________
117
8: Você gostaria de fazer algum comentário? ______________________________________
____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
9: Observação do entrevistador: _________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
Muito Obrigada pela sua colaboração!
Rio de Janeiro, ______/________/_________
__________________________________
Entrevistado
__________________________________
Aplicador
118
7.3 – Apêndice C – Termo de Participação e Consentimento
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO - UFRJ
INSTITUTO DE ESTUDOS DE SAÚDE COLETIVA - IESC
CURSO DE MESTRADO EM SAÚDE COLETIVA
TERMO DE PARTICIPAÇÃO E CONSENTIMENTO
O Instituto de Estudos em Saúde Coletiva/IESC da Universidade Federal do Rio de
Janeiro/UFRJ
convida
você,
trabalhador
cooperado
da
___________________________________________________________________
(nome da Cooperativa)
a participar do projeto “Estudo do Processo de Trabalho nas Cooperativas de
Material Reciclável e Efeitos à Saúde em decorrência do manuseio de produtos
químicos”, que será realizado pela pesquisadora Vinólia Barbalho do
Nascimento, sob a orientação da Doutora Heloisa Pacheco-Ferreira, tendo como
objetivo analisar os processos de trabalho dos agentes que lidam com materiais
recicláveis de origem química, em sua relação com a saúde.
Sua participação neste projeto é de extrema importância e voluntária. Não haverá
qualquer tipo de sanção ou punição caso você não queira participar deste projeto.
Os trabalhadores que participarem desta pesquisa não serão identificados em
nenhum momento da realização da pesquisa e nem na divulgação dos resultados.
As informações fornecidas serão sigilosas.
Os resultados do estudo serão apresentados a todos os trabalhadores participantes
da pesquisa e aos órgãos/instituições responsáveis pelos cuidados com a saúde dos
trabalhadores e pelas condições de trabalho.
Ao participar da pesquisa autorizo a pesquisadora a usar integralmente ou em partes
as minhas informações sem restrições de prazos e citações, abrindo mão de
quaisquer direitos.
Declaro estar de acordo em participar da Pesquisa.
Nome:
___________________________________________________________________
RG nº __________________________________
Local e data: Rio de Janeiro, _____de _________________________ de 2010.
_________________________________________________________
Assinatura
119
7.4 – Apêndice D – Carta de Apresentação
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO - UFRJ
INSTITUTO DE ESTUDOS DE SAÚDE COLETIVA - IESC
CURSO DE MESTRADO EM SAÚDE COLETIVA
CARTA DE APRESENTAÇAO
Rio de Janeiro,
de
Fevereiro de 2010.
À Cooperativa
__________________________________________
Rio de Janeiro/RJ.
Prezados Senhores,
Apresentamos a Srª VINÓLIA BARBALHO DO NASCIMENTO, aluna do Curso de
Mestrado do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva – IESC/UFRJ, que fará
pesquisa de campo junto a essa Cooperativa, sob a orientação da Drª Heloisa
Ferreira-Pacheco.
O projeto a ser desenvolvido focará os aspectos relacionados aos Processos de
Trabalho nas Cooperativas de Material Reciclável e os efeitos à Saúde em
decorrência do manuseio de produtos químicos, tendo como objetivo geral analisar
os processos de trabalho dos agentes que lidam com materiais recicláveis de origem
química, em sua relação com a saúde.
Assim, solicitamos permitir o livre acesso da pesquisadora nas dependências dessa
Cooperativa, conforme previsto do termo de cooperação celebrado entre este
IESC/UFRJ e a Rede Nacional do PROVE, afim de que a pesquisadora possa
desenvolver o seu trabalho.
Atenciosamente,
Drª Heloisa Ferreira-Pacheco
Diretora
Instituto de Estudos em Saúde Coletiva – IESC/UFRJ