2010-05-24 Amazonia Fundo Quintal – Praca Central
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2010-05-24 Amazonia Fundo Quintal – Praca Central
Pan-Amazônia: de “fundo de quintal” a “praça central do planeta”. Qual é nossa missão profética? Fernando López SJ ([email protected]) Laura Valtorta MdI ([email protected]) Arizete Miranda Dinelly CSA ([email protected]) Membros da Equipe Itinerante da Amazônia1 Introdução Na atual conjuntura histórica que vivemos, a Pan-Amazônia abre uma nova e crucial discussão geopolítica sobre o futuro da humanidade e do planeta, sobre os modelos de articulação regional da América Latina e do mundo todo. Uma articulação que se apóia em novos paradigmas de relacionalidade sistêmica e reciprocidade, de justiça sócioambiental e cultural numa perspectiva sustentável. O ser humano não pode viver mais sem o sentido profundo de reciprocidade e corresponsabilidade sócioambiental e cósmica em que foi criado. Há que superar as visões economicistas de integração, centradas unicamente no modelo de mercado único, capitalista e neoliberal, que explora e depreda tudo e a todos; que fragmenta e divide a realidade; que beneficia alguns e exclui a maioria; que só busca lucrar hoje sem pensar nas gerações futuras; que substitui o Deus da Vida pelo ídolo do dinheiro. Como religiosos-as, leigos-as e comunidades cristãs missionárias na Pan-Amazônia, temos uma palavra e um testemunho de vida profético e político (como a busca do bem comum) a oferecer. Ser sementes e fermento, signos e sinais do projeto de Vida Abundante que Deus quer para toda a criação, para todos e para amanhã; não só para uns poucos e para hoje! I. A PAN- AMAZÔNIA, SEUS POVOS E OS PROCESSOS ATUAIS QUE VIVEM 1.1. Pan-Amazônia A Pan-Amazônia abrange uma superfície de 7,5 milhões de Km2. Espalha-se por oito países da América do Sul mais Guiana Francesa2. Ela representa 43% da superfície do continente SulAmericano. O rio Amazonas tem mais de 1.100 afluentes importantes e uma infinidade de igarapés que tecem a rede fluvial mais extensa do mundo com mais de 25 mil Km navegáveis. A região amazônica concentra 20% da água doce não congelada do planeta que é vertida no Atlântico regulando o equilíbrio sistêmico do oceano. O bioma amazônico não é “uniforme”. É um gigantesco arquipélago de ecossistemas riquíssimo em biodiversidade. Nela concentram-se 34% das matas primárias do planeta que abrigam entre 30% e 50% da fauna e flora do mundo. Estima-se que a Amazônia captura entre 80 e 120 mil milhões de toneladas de carbono ao ano. Este imenso jardim amazônico é cuidado por uma enorme diversidade de “jardineiros” (os povos tradicionais). A Amazônia é fundamental para o equilíbrio climático e sistêmico do planeta e, consequentemente, para o presente e futuro da humanidade. 1 A Equipe Itinerante nasce em Manaus, Amazônia brasileira, em 1998, com a intuição e apoio do Pe. Cláudio Perani SJ. É um espaço interinstitucional de serviço itinerante aos povos, organizações, igrejas, comunidades e grupos da Pan-Amazônia. Atualmente está formado por 18 pessoas (leigos-as, religiosos-as) de 11 instituições/grupos diferentes: Jesuitas; Congregação de Nossa Senhora – CSA; Conselho Indigenista Missionário – CIMI; Comissão Pastoral da Terra – CPT; Comunidade BIDARI; Providência de Gap; Catequistas Franciscanas; Mínimas da Paixão; Serviço de Ação, Reflexão e Educação Social – SARES; Missionárias da Imaculada – PIME; Cordimarianas. A intuição fundamental é que juntos podemos responder aos grandes desafios que sozinhos, cada um por seu lado, não poderíamos chegar. Blog da Equipe Itinerante: www.amazoniaitinerante.blogspot.com 2 1. Brasil (67%), 2. Bolivia (11%), 3. Peru (13%), 4. Equador (2%), 5. Colômbia (6%), 6. Venezuela (1%), 7. Guiana, 8. Suriname e 9. Guiana Francesa (todas as Guianas 0,1%). 1 1.2. Povos tradicionais da Pan-Amazônia A população atual da Pan-Amazônia é estimada em 40 milhões. Deste, três milhões são indígenas distribuídos em aproximadamente 400 povos que falam 250 línguas diferentes organizadas em 49 famílias linguísticas (as mais numerosas são: Aruak, Karib e Tupi-Guarani). Além disso, são milhares as comunidades de afro-descendentes (só na Amazônia brasileira mais de mil) e uma infinidade de comunidades ribeirinhas, mestiças e “caboclas”, migrantes, colonos, agricultores e moradores das cidades amazônicas. Esta enorme diversidade sociocultural e linguística é consequência da capacidade de adaptação humana ao riquíssimo e diverso bioma amazônico. A diversidade sócioambiental da Amazônia é uma enorme riqueza para a humanidade e a vida do planeta, é expressão do rosto diverso (trinitário) de Deus, sua unidade só pode ser pensada e articulada na diversidade. As investigações arqueológicas apontam que a presença humana na região amazônica é de 11 mil anos; muito mais antiga que a recém chegada dos europeus há apenas 500 anos. Ao longo de todo o tempo anterior à colonização, os povos indígenas utilizavam os recursos naturais de forma sábia e equilibrada, em íntima reciprocidade com o meio-ambiente em que viviam. Não depredavam; muito pelo contrário, contribuíam com o enriquecimento da biodiversidade levando espécies, de um lugar para outro, em seus contínuos deslocamentos dentro da região. O “descobrimento” europeu do século XV (“encobrimento”, em palavras de Dom Pedro Casaldáliga), iniciou um dramático processo de depredação dos recursos naturais, escravidão e extermínio dos povos indígenas da região. Para alguns historiadores, se trata de uma das maiores catástrofes demográficas da história recente. De cinco milhões de indígenas que pertenciam a 900 etnias no ano 1.500, ficaram apenas alguns milhares cinco séculos depois.3 O extermínio continuou nos séc. XIX (final) e XX (primeira metade) com a exploração da borracha: “Ao longo dos cursos de água navegáveis, onde quer que pudesse chegar uma canoa a remo, as aldeias eram assaltadas, incendiadas e sua população liquidada. Grupos de índios expulsos de seus territórios perambulavam pela floresta sem paradeiro. Para qualquer lado que se dirigissem encontravam grupos de coletores de seringa e outras resinas, dispostos a exterminá-los”.4 1.3. Grandes projetos na Pan-Amazônia e impactos sócioambientais Hoje, a depredação amazônica e a violência contra os povos indígenas e tradicionais da região continuam com os novos ciclos extrativistas e, sobretudo, com os grandes projetos de “desenvolvimento” que se estão impondo na região (IIRSA e PAC)5. A IIRSA nasceu numa reunião dos Presidentes da América Latina realizada em Brasília no ano 2000. Propuseram gerar um processo de integração política, social e econômica desenvolvendo a infraestrutura de transporte, energia e comunicação em todo o continente; criar novos corredores de exportação para reduzir os custos de transporte e assim alcançar uma maior competitividade nos mercados mundiais. O compromisso entre os governos prevê um conjunto de 510 projetos, organizados em 47 planos para articular 10 eixos modais de integração latinoamericana. O custo estimado em 2009 foi de US$ 74.500 milhões, financiados pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Corporação Andina de Fomento (CAF), Fundo Financeiro de Desenvolvimento da Bacia do Rio da Prata (FONPLATA), Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Banco Europeu de Inversões (BEI) e Banco Mundial. A região mais afetada pela IIRSA é a Pan-Amazônia: dos dez eixos IIRSA, cinco a afetam diretamente. Na região amazônica os interesses econômicos internacionais são maiores pelas riquezas do solo e subsolo, da biodiversidade, da água doce, dos minérios estratégicos, etc. Para tirar as riquezas da região e transportar mercadorias a baixo custo, de um oceano ao outro Benedito Prezia e Eduardo Hoornaert, “Esta terra tinha dono”. CEHILA POPULAR – CIMI, FTD, 1992. Darcy Ribeiro, “Os índios e a civilização”, 1978. 5 Iniciativa de “Integração da Infraestrutura Regional Sul Americana” (IIRSA), www.iirsa.org; a versão brasileira deste projeto é o “Programa de Aceleração do Crescimento” (PAC), www.brasil.gov.br/pac/. 3 4 2 (Atlântico-Pacífico-Caribe), são construídas estradas transoceânicas e hidrovias associadas a hidroelétricas que cortam a Pan-Amazônia tanto no sentido leste-oeste como norte-sul. Os impactos sócioambientais na região serão (já são) gravíssimos, assim como a pressão sobre os marcos legais da regulamentação ambiental e, sobretudo, a pressão sobre os direitos territoriais dos povos tradicionais (indígenas, ribeirinhos, afro-descendentes, etc.) conquistados com muita luta e sofrimento nas últimas décadas. Os grandes projetos na Pan-Amazônia provocam fortes impactos de “mobilidade humana”. Por um lado, as grandes obras requerem e atraem rapidamente um enorme número de migrantes trabalhadores que chegam, na sua maioria, de outras regiões não-amazônicas, e que trazem consigo outra cosmovisão de mundo e de relação com a mãe-terra. Muitas vezes, esta população choca com os povos tradicionais da região, com suas diferentes cosmovisões e modos de relação com a terra e o meio-ambiente. Por outro lado, os grandes projetos também geram enormes impactos sócioambientais que pressionam e expulsam os povos tradicionais, fazendo deles “refugiados ambientais”. Todos estes processos colocam em risco o equilíbrio sistêmico sócioambiental do bioma amazônico com suas implicações e consequências para toda a humanidade e o planeta. Em 2007, o Brasil lançou o Programa de Aceleração do Crescimento - PAC (versão brasileira da IIRSA). E neste ano, 2010, tem iniciado o PAC II, que está sendo chamado o Plano de Aceleração para a Copa do Mundo e que prevê melhorar as obras de infraestrutura, transporte público e turismo nas cidades que serão sedes do mundial. O que não se diz são as consequências desta “Aceleração da Copa”. Por exemplo, na cidade de Manaus-AM (coração da amazônia brasileira), já começou “a limpeza de pobres” dos igarapés do centro da cidade que são expulsos para as periferias distantes. A isto se chama "maquiagem social". Com a IIRSA e o PAC, a história se repete: A Amazônia continua sendo pensada a partir dos interesses “de fora” e não a partir dos interesses “de dentro”, dos povos amazônicos. Os que têm o poder econômico e político (nacional e internacional) são os que decidem, buscando só seu próprio benefício. O resultado desta visão externa e de todo este “desenvolvimento de fora”: a PanAmazônia é devorada por empresas madeireiras e fábricas de papel, por companhias de petróleo e empresas de mineração, pelas indústrias farmacêuticas e do agronegócio, por hidroelétricas, hidrovias e grandes estradas que cortam sem piedade os rios, florestas e territórios dos povos tradicionais que nelas habitam. A tudo isto há que somar as máfias do narcotráfico, donas da região, que controlam um exército de pistoleiros e mercenários dispostos a qualquer coisa. Lamentavelmente, frente a tudo isto, a resposta imediata dos estados é a militarização da Amazônia. É importante destacar que esta lógica desenvolvimentista sobre a região tem como imaginário social considerar a Pan-Amazônia como uma “terra vazia” ou “terra de ninguém”. Os problemas e conflitos sociais de outras regiões do continente são solucionados empurrando os mais pobres para a Amazônia. Esta lógica é perversa. Confrontar “pobres contra pobres”: pobres migrantes, colonos e assentados (de fora) contra indígenas, ribeirinhos e povos tradicionais da região. Fazer que uns pobres lutem contra outros pobres, para que se eliminem completamente entre eles mesmos... É terrível esta sutil politicagem de extermínio! Em todo esse processo os mais afetados e frágeis são os “povos indígenas em isolamento” 6. São “restos de povos” que decidiram isolar-se do ocidente pela terrível e violenta relação que sofreram. Dos 100 grupos humanos que existem ainda no mundo “sem contacto” com o ocidente, estima-se que 85 estão na Pan-Amazônia; deles, mais de 70 estão na amazônia brasileira. Muitos destes grupos estão a ponto de ser exterminados pelos grandes projetos de “desenvolvimento” que avançam implacavelmente sobre seus territórios e habitat. Resumindo: a Amazônia deixou de ser “fundo de quintal”. Converteu-se em “praça central do planeta”, cobiçada e disputada pelas grandes potências econômicas e políticas. Ela é hoje uma Indígenas em “isolamento”, “povos isolados”: CIMI, www.cimi.org.br; CTI, www.trabalhoindigenista.org.br; FUNAI, www.funai.gov.br; SURVIVAL, www.survivalinternational.org 6 3 importante carta política e econômica de negociação entre os grandes países. É uma das regiões de maior interesse estratégico do mundo. A biodiversidade, as novas fontes energéticas, a água doce, os princípios ativos, a engenharia genética, os minérios estratégicos, etc. são objeto de disputa pelas grandes potências do mundo. Não contam para nada os impactos sócioambientais que provocam sobre a vida dos povos indígenas e comunidades tradicionais da região, nem a depredação de seus recursos naturais. O único que interessa para as grandes e poderosas empresas e países é o dinheiro. II. “NÃO SE PODE SERVIR A DOIS SENHORES, A DEUS E AO DINHEIRO” (Mt 6,24) Em recente visita a Alemanha (maio/2010), o líder e pajé Davi Kopenawa, do povo indígena Yanomami7, afirmou aos meios de comunicação: “A terra está brava com o homem branco. Porque o homem da cidade não quer deixar em paz nem viver como ele viveu. O homem da cidade gosta pegar aquilo que vale para ele. É muito grande a ganância dele. O jogo dos políticos é muito antigo. Nós, indígenas, falamos com o governo federal e também com o governo da Europa. Falamos da invasão de nossa terra. Porém eles não escutam porque eles precisam tirar mais e mais mercadorias para negociar com outros países. Vocês, das cidades de Alemanha, moram do jeito que vocês escolheram. É bom para vocês. Porém, para mim, como líder tradicional que nunca sonhei com a cidade cheia de luz, cheia de pedra, cheia de carros, tudo isto é muito triste. Porque vocês não têm nada que nasce da terra: pássaros, animais, papagaios, árvores tradicionais. Não têm nada, tudo está desmatado. Rio de Janeiro e São Paulo, no Brasil, é a mesma coisa. Essa é a mesma doença que foi daqui para invadir o nosso Brasil, a mesma destruição”8. Por que Kopenawa denuncia tão forte o homem branco? Ele tem a dolorosa experiência vivida por seu povo na década dos anos 80. A região Yanomami foi invadida por mais de 20 mil garimpeiros, buscadores de ouro, que depredaram seu território, trouxeram doenças e violência. Quase foi o extermínio do povo Yanomami. Comunidades inteiras morreram afetadas com malárias e doenças deixadas pelos garimpeiros. Ficaram tão fracos que tinham roças, mas não tinham forças nem para dar uma banana uns aos outros. Só lhes restava ver, escutar e sentir a morte avançando entre eles. O mais triste e indignante de tudo isto é que hoje, três décadas depois, a história de abuso e exploração dos povos da Amazônia e da mãe-terra continua de um modo ainda mais sofisticado, técnico e voraz, ainda mais desumano! A Campanha da Fraternidade Ecumênica deste ano 2010 9, do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (CONIC) de quem forma parte a Conferência dos Bispos do Brasil (CNBB), trabalha o tema “Economia e Vida” com o lema “Não se pode servir a dois senhores, a Deus e ao dinheiro” (Mt 6,24). As igrejas do Brasil convidam a refletir e se posicionar sobre o atual sistema econômico depredador que subordina as pessoas, os povos e a natureza ao lucro econômico. O dinheiro se converteu no deus a quem temos que imolar toda a criação. Por que as igrejas nos convidam a refletir e tomar postura frente a esta crucial encruzilhada? Os indígenas Yagua, por exemplo, foram trasladados no final do s. XIX da Amazônia colombiana para a peruana. Foram levados como escravos para trabalhar primeiro na seringa, depois no ouro, nas peles, etc. Hoje continuam sendo explorados pelas empresas madeireiras: “A historia se repete, as grandes empresas e alguns se enriquecem e nós cada dia mais pobres e doentes… Acaso se pode comprar ou vender a terra, a água, o ar, o sol que Deus deu para todos nós?”. Assim comentava um velho líder Yagua que sobreviveu a todos esses ciclos de exploração. 7 Os Yanomami habitam um grande território continuo que se estende entre Brasil e Venezuela, ao longo da serra do Parima, divisor de águas entre o rio Amazonas e o rio Orinoco. 8 Deutsche Well: www.dw-world.de/dw/0,,607,00.html (17/05/2010) 9 Conselho Nacional de Igrejas Cristãs e Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, Campanha da Fraternidade 2010: www.conic.org; www.cnbb.org.br (17/05/2010) 4 Por tudo isso os bispos latinoamericanos denunciam em Aparecida: “Hoje, os povos indígenas e afros estão ameaçados na sua existência física, cultural e espiritual; nos seus modos de vida; nas suas identidades; na sua diversidade; nos seus territórios e projetos” (DA 90). Por toda esta violência histórica que têm sofrido, e sofrem até nossos dias, os próprios indígenas questionam “o Deus do homem branco”. Tajy Poty, velho pajé Kokama10, questionou durante um encontro de sábios anciãos: “Será que Tupana (Deus em Tupi) se equivocou ao criar nós, povos indígenas da Amazônia? Será que o Deus dos brancos é o Deus forte, e o nosso Tupana um Deus débil?” Um forte silêncio tomou conta do espaço... Depois, Tajy Poty continuou fazendo uma interpretação crítica e irônica do mito cristão da criação, questionando a todos os presentes: “Deus pegou barro branco e fez com muito carinho e cuidado duas figuras humanas. Soprou sobre elas e deu vida. Criou a mulher e o homem branco, bonitos e poderosos. Depois, Deus ficou com as mãos meladas de barro, as sacudiu para limpá-las e as bolinhas de barro que saíram somos nós, os povos indígenas”. E concluiu: “Será verdade que Deus nos fez assim?” Qual é a imagem de Deus que nós, ocidentais, temos transmitido aos povos da Pan-Amazônia? Muitas vezes já presenciamos esta forte contradição: o empresário agroindustrial, o madeireiro ou o fazendeiro que depredam uma determinada região e exploram os povos tradicionais amazônicos que moram nela, são os “patrões bonzinhos” que constroem a capela, compram o santo e são os primeiros em acender as velas e ficam de joelhos rezando... E, além disso, como anfitriões da festa do padroeiro, doam uma vaca (magra) e umas caixas de cerveja para que todos possam comer e beber, rezar ao santo e louvar ao patrão… E, algumas vezes, o padre abençoa tudo isto… Maika, mulher guerreira Ticuna11, num encontro comentou: “Vocês dizem que nós não somos nem civilizados nem cristãos, porém se isso é ser civilizado e cristão, nós não queremos ser”. A pergunta se repete: Qual é a imagem de Deus que transmitimos aos povos da Amazônia com nosso estilo de vida e missão, com nosso compromisso? Em Aparecida nossos pastores questionam e denunciam profeticamente toda esta situação: “Com muita frequência, se subordina a preservação da natureza ao desenvolvimento econômico, com danos à biodiversidade, com o esgotamento das reservas de água e de outros recursos naturais, com a contaminação do ar e a mudança climática” (DA 66). “Nas decisões sobre as riquezas da biodiversidade e da natureza as populações tradicionais têm sido praticamente excluídas. A natureza foi e continua sendo agredida. A terra foi depredada. As águas estão sendo tratadas como se fossem uma mercadoria negociável pelas empresas, além de terem sido transformadas num bem disputado pelas grandes potências” (DA 84). O próprio Papa Bento XVI, no seu discurso aos jovens no Estádio de Pacaembu (São Paulo, 2007), denuncia fortemente a “devastação ambiental da Amazônia e as ameaças à dignidade humana de seus povos” (DA 85). Os bispos do Brasil (CNBB), em sua recente visita “ad limina” (abril/2010), apresentaram ao Papa a grave situação da Amazônia. Dom Erwin Kräutler, bispo do Xingu (Amazônia brasileira) e Presidente do CIMI12, comenta sobre este importante encontro com o Papa: “Eu mesmo fui recebido pelo Papa no dia 16 de abril, dia de seu aniversário de nascimento e, pegando a carona deixada por Dom Esmeraldo, expliquei ao Papa toda a problemática que a hidroelétrica de Belo Monte traz para os povos do Xingu se o projeto realmente fosse executado. Aproveitei para entregar em mão ao Papa o texto que eu tinha preparado para a Coletiva de Imprensa. Posso revelar que nossa angústia sobre o futuro da Amazônia e, de modo especial, de nossos rios Tapajós e Xingu, tocaram ao Papa profundamente” 13. Nosso modelo ocidental de desenvolvimento tem subordinado o político ao econômico. A busca do bem comum à ambição de ganância e lucro de uns poucos. É mentira afirmar que os países do sul 10 O povo indígena Kokama habita ao longo do rio Amazonas, tanto no lado peruano como colombiano e brasileiro (o rio é denominado Solimões). O povo Ticuna estende seu território também ao longo do rio Amazonas (Solimões em Brasil), suas comunidades estão no Peru, Colômbia e Brasil. 12 Conselho Indigenista Missionário (CIMI), www.cimi.org.br 13 Entrevista de Nattêma Simões do Periódico “Voz de Nazaré” de Belém, Pará, Brasil a Dom Erwin Kräutler, 03-05-2010. 11 5 chegarão um dia aos mesmos níveis de vida e consumo dos países do norte. O nível de bem-estar econômico dos países do norte não é universalizável para toda a humanidade e, muito menos, sustentável para as futuras gerações de amanhã. O planeta não suporta tanta exploração-depredação. Em lugar de propor um consumismo universalizável (falso e impossível), temos que propor uma “austeridade universalizável”, como projeto de vida para todos e para que amanhã, as gerações futuras, também possam desfrutar desta terra. Essa é a proposta do “Bem Viver”14, dos projetos políticos de vida milenários dos povos indígenas do continente. Há doze anos que a Equipe Itinerante15 está tentando partilhar e aprender junto aos povos amazônicos: indígenas, ribeirinhos, camponeses, moradores das periferias urbanas, etc. Muitas vezes, em nossas itinerâncias, escutamos nossos irmãos indígenas nos dizendo: “Queremos lhes oferecer nossa sabedoria, nossa palavra antiga… Porém, parece que vocês os brancos não escutam ou não entendem nossa palavra…”. A partir de nossa lógica ocidental, linear e fragmentária, nos é muito difícil entender sua palavra. É importante saber “atravessar a fronteira” e mudar de “espaçotemporalidade”, para poder nos encontrar, face a face, com nossos irmãos indígenas e entender sua palavra. É muito importante escutá-los atentamente para reaprender a “pensar com o coração”, que tem razões que a razão desconhece (Pascal). Muitas vezes encontramos, em distintas aldeias, mulheres indígenas que, além de amamentar sua criança, davam de mamar também a um filhotinho de macaco ou de veado, ou mesmo de porco do mato. Uma mulher Kokama, que amamentava um filhote de veado, com paciência e carinho nos ofereceu sua palavra sábia para que pudéssemos entender: “Meu marido saiu cedo a caçar com outros homens da aldeia. O único que encontraram foi uma mamãe veado com seu filhote. Tiveram que sacrificá-la porque era tarde e tinham que trazer algo para comer. Se tivessem encontrado algum outro animal, não teriam sacrificado a mamãe veado. Porém, também trouxeram seu filhote. Não o abandonaram, porque assim como a mamãe veado foi sacrificada para alimentar meus filhinhos, eu tenho que sacrificar-me também e alimentar a seu filhinho para que amanhã, meus filhinhos e seus filhinhos continuem se ajudando”. Totorixiu, yanomami, chegou na cidade de Manaus para um encontro. Ficou impressionado pela magnitude daquela aldeia dos napë (brancos), Manaus (dois milhões de habitantes), onde tinham derrubado e arrasado toda a vegetação... Mais perplexo ficou ainda quando escutava os brancos queixarem-se do calor que sentiam na grande cidade. Brevemente comentou: “Napë não entende. Para construir sua aldeia derruba todas as árvores... e logo fica se queixando de calor… Nós yanomami construímos nossa Xapona (aldeia) no meio das árvores . Tiramos somente as árvores necessárias… Nós cuidamos das árvores e elas nos cuidam do calor.” Não é por acaso que em Aparecida os bispos latino-americanos reconhecem especialmente aos povos indígenas por sua sabedoria e pelo muito que nos ensinam: “A Igreja valoriza especialmente os indígenas por seu respeito à natureza e pelo amor a Mãe-Terra como fonte de alimento, casa comum e altar da partilha humana” (DA 472). III. QUAL É NOSSA MISSÃO PROFÉTICA NA PAN-AMAZÔNIA? O documento de Aparecida dá uma linha de ação geral muito importante: “Criar consciência nas Américas sobre a importância da Amazônia para toda a humanidade”. E não só nas Américas, mas também em todo o mundo temos que criar consciência da importância da Amazônia para o equilíbrio sistêmico do planeta. Por outro lado, consequentemente e corresponsavelmente com esta visão, nossos pastores nos convidam a “apoiar, com os recursos humanos e financeiros necessários, a Igreja que vive na Amazônia, para que siga proclamando o evangelho da vida...” (DA 475). “Sumak Kawsay”, palavra quéchua que expressa a cosmovisão do “Bem Viver” que têm os povos indígenas de Sul-América. O conceito do “bem viver” está em oposição ao conceito do “viver melhor”. O “bem viver” propõe um modelo de vida e de desenvolvimento mais justo, mais sustentável, mais sócioambiental e ecológico. Esta visão só se realiza coletivamente. 15 Cf. Nota 1. 14 6 A Amazônia é importante para toda a humanidade e o planeta, por isso, todos temos que unir esforços nesta causa comum. Necessitamos assumir uma perspectiva mais sistêmica na nossa vida e missão: uma visão mais global que oriente nossa ação mais local; uma ação local que ajude a enfrentar os grandes desafios globais. Numa palavra, uma missão mais “glo-cal” (articulação global-local). Isto exige que aprendamos e desenvolvamos um pensamento mais simbólico e holístico, uma lógica mais circular e conectada, menos linear, mais feminina e integral, como a que têm os povos tradicionais da Amazônia. Como vida religiosa, como missionários-as leigos-as e como comunidades cristãs inseridas na PanAmazônia somos chamados a sermos testemunhas e sinais do Reino, luz e fermento (cf. Mt 5,14; 13,33), grão de mostarda (cf. Mc 4,31), sementes do Deus da Vida Abundante (cf. Jo 10,10). Não nos corresponde substituir aos Estados (na educação, na saúde, etc.), ainda que, muitas vezes, prestemos essa função subsidiária. Somos chamados a sermos profetas e profetizas que testemunham e anunciam ao Deus da Vida e denunciam aos ídolos de morte, ainda que custe a própria vida. Frente aos grandes e cruciais desafios que vivem hoje a Pan-Amazônia, a humanidade e o planeta, assinalamos alguns elementos que possam ajudar a questionar, despertar, inspirar, iluminar e discernir nossa vida e missão, nosso compromisso profético nesta estratégica região do planeta. Três perguntas fundamentais: 3.1. Com quem Deus nos convida a gastar nossa vida e missão na Pan-Amazônia? Discernir e responder a esta pergunta exige muita atenção, escuta interior e escuta ao clamor dos povos Pan-amazônicos. É fundamental “descer” e ir ao encontro para ver, escutar e sentir profundamente a Amazônia e seus povos. Escutar o grito da mãe-terra e o grito de seus filhos e filhas. Há que buscar e aprender com eles, caminhos novos de solução aos grandes desafios que temos, a partir de suas experiências milenárias e projetos políticos sustentáveis de vida. É fundamental abandonar-nos com decisão e confiança no Espírito, adentrar-nos no caminho da encarnação e inculturação, do diálogo intercultural e interreligioso. Aparecida nos convida a contemplar os rostos dos pobres e a fixar nosso olhar sobre os novos rostos de excluídos (DA: 64, 393, 402, 407-430). Adverte-nos que alguns rostos estão ameaçados de extinção: indígenas e afro-americanos (DA 90). E temos que acrescentar os “povos indígenas em isolamento” que hoje estão gravemente ameaçados de extinção pelo avanço implacável do atual modelo econômico de desenvolvimento. Além dos rostos humanos, é fundamental olhar o rosto da mãe-terra. Ela está sendo gravemente violentada ao ponto de depredá-la e matar toda possibilidade de vida (DA: 83-87, 125-126, 472, 474, 491). Da mãe-terra dependem todos os outros rostos. Muitas vezes, estes rostos de empobrecidos e excluídos, na sua luta pela sobrevivência, acabam sendo sutilmente manipulados pelo sistema e enfrentados entre eles. É a diabólica lógica de enfrentar pobres contra pobres para ver se eles se exterminam: povos tradicionais da Amazônia versus migrantes, assentados e colonos (de fora). Como ajudar nos processos de reconciliação e resolução não violenta de conflitos entre estes sujeitos históricos empobrecidos e excluídos? Como construir uma grande aliança entre eles para enfrentar este perverso sistema? Como articular nossa missão para ajudar a tecer este grande “Povo de Deus? Aparecida nos interpela: “A criação também é manifestação do amor providente de Deus; foi-nos entregue para que cuidemos dela e a transformemos em fonte de vida digna para todos. Nossa irmã a mãe-terra é nossa casa comum e o lugar da aliança de Deus com os seres humanos e com toda a criação” (DA 125). E insiste sobre a urgente necessidade do cuidado do meio-ambiente16: “Como discípulos de Jesus, nos sentimos convidados a dar graças pelo dom da criação, reflexo da sabedoria e beleza do Logos criador. no desígnio maravilhoso de Deus, o homem e a mulher são convocados a viver em comunhão com Ele, em comunhão entre eles e com toda a criação. O Deus 16 Documento de Aparecida. Cuidado do Meio-ambiente (9.8), n. 470-475. 7 da vida encomendou ao ser humano sua obra criadora para que a cultivasse e guardasse.” (Gn 2, 15)” (DA 470). Insistimos. Todos estes rostos estão estreitamente interrelacionados, entre si e com a mãe-terra (princípio de reciprocidade), ainda que muitas vezes esta interrelação seja muito conflitava. 3.2. Onde estão os mais excluídos, empobrecidos e diferentes desta Amazônia? Onde estão as feridas mais abertas? Nas fronteiras geográficas e/ou simbólicas. As fronteiras, geográficas e/ou simbólicas desta imensa região pan-amazônica, são lugares privilegiados da revelação do Deus desconcertante e surpreendente, encarnado em múltiplos rostos, diverso e plural, uno e trino, profundamente presente nas distintas realidades amazônicas. No nível geográfico as fronteiras pan-amazônicas são regiões estratégicas que dividem-conectam oito países (mais Guiana Francesa) do bioma amazônico. Nas fronteiras se manifestam com maior clareza as “feridas”, os limites e as contradições do sistema. Nelas os Estados não chegam e as máfias são as que mandam. Porém, a “fronteira” também significa “estar na frente” (“frontis”) do outro. As fronteiras são possibilidade de encontro com o outro diferente. Por isso, nelas se abrem novas e criativas possibilidades. As fronteiras permitem confrontar-nos com outras perspectivas: identificar, aprender e comparar os processos que acontecem a um e outro lado delas. Elas nos permitem estabelecer e construir novos caminhos que dão uma maior unidade a nossa missão na região Pan-amazônica. Na atual configuração dos Estados nacionais da Pan-Amazônia, identificamos sete tríplices fronteiras17, além de 20 duplas fronteiras. Todas essas regiões são altamente estratégicas para tecer nossa missão comum, com projetos evangélicos conjuntos que sejam sementes do Reino de Justiça e Vida Abundante para os povos amazônicos, para a humanidade e o planeta. No nível simbólico compreendemos as fronteiras como aquelas realidades diferentes que nos convidam a sair de nós mesmos e ir além dos espaços e realidades conhecidas. Assim são fronteiras simbólicas: os povos tradicionais da Amazônia, com suas culturas diferentes; os excluídos e empobrecidos; as situações de violência e violação de direitos; todas aquelas realidades onde as feridas estão mais abertas, a vida mais ameaçada, os direitos sócioambientais mais desrespeitados, a humanidade e a mãe-terra mais agredida e desflorestada. Uma das fronteiras mais alarmante é a urbanização (ou “des-humanização”?) acelerada da Amazônia, com o consequente esvaziamento demográfico do interior. Atualmente, 70% da população da Pan-Amazônia mora nas cidades. A falta de políticas públicas para o interior (educação, saúde, trabalho, infraestrutura, etc.), tem empurrado a população para a miséria das periferias das cidades amazônicas. Muitos analistas sustentam que esta política e modelo de desenvolvimento (esvaziar o interior e encher as cidades amazônicas) é imposta sutilmente pelo grande capital das empresas (nacionais e transnacionais). Elas querem esvaziar todo o interior amazônico para poder explorar os recursos naturais do riquíssimo bioma, sem ter que sujar suas mãos de sangue, nem desgastar sua imagem nos conflitos sociais com os povos amazônicos. Contra esta política e modelo de desenvolvimento temos que nos opor energicamente. É fundamental fomentar que as comunidades se fixem no interior. Temos que colocar nosso pequeno e profético grão de areia, buscando e propondo alternativas junto aos povos tradicionais da região, para que possam viver com dignidade no interior. As fronteiras amazônicas são lugares privilegiados para ensaiar as importantes orientações pastorais que os bispos dão em Aparecida: “Estabelecer entre as Igrejas locais de diversos países sulamericanos que estão na bacia amazônica uma pastoral de conjunto, com prioridades diferenciadas, para criar um modelo de desenvolvimento que privilegie os pobres e sirva ao bem comum” (DA 475). E insistem: “Convidamos aos Episcopados de países envolvidos nos diferentes 17 As 7 tríplices fronteiras amazônicas são: 1) Bolivia-Peru-Brasil, 2) Peru-Colômbia-Brasil, 3) Peru-Equador-Colômbia, 4) Brasil-ColômbiaVenezuela, 5) Brasil-Venezuela-Guiana, 6) Brasil-Guiana-Suriname, 7) Brasil-Surinam-Guiana Francesa. 8 sistemas de integração sub-regionais, incluídos os da bacia amazônica, a estreitar vínculos de reflexão e de cooperação” (DA 544). Algumas igrejas amazônicas começaram a ensaiar esta importante orientação pastoral alguns anos antes da Conferência de Aparecida (2007). Por exemplo: em 2005 iniciaram seus encontros interfronteiriços os missionários-as e pastores do Vicariato San Jose do Amazonas (Peru), Vicariato de Leticia (Colômbia) e Diocese de Alto Solimões (Brasil); a partir de 2006 encontram-se os agentes pastorais e bispos da Diocese de Roraima (Brasil), Vicariato de Santa Elena de Uairén (Venezuela) e a Diocese de Guiana; também em 2006, iniciaram seus encontros fronteiriços as igrejas do Vicariato de Puerto Maldonado (Peru), Vicariato de Pando (Bolivia) e a Diocese de Rio Branco (Brasil). Graças a Deus, já são três tríplices fronteiras amazônicas onde as igrejas estão aprendendo a tecer suas fronteiras para servir melhor ao Povo de Deus que transita nelas. Todos buscam unir esforços nas regiões fronteiriças para responder melhor aos gigantescos desafios da missão. Nos Evangelhos encontramos, em várias oportunidades, a Jesus animando seus discípulos a embarcar e atravessar para a outra margem do lago. Em alguns textos a expressão é muito forte: “Jesus obrigou seus discípulos a entrar na barca e ir para a outra margem do mar” (Mt 14,22). Em Aparecida nossos pastores também são profeticamente exigentes neste ponto: “Devemos formar-nos como discípulos missionários sem fronteiras, dispostos a ir à outra margem” (DA 376). 3.3. Como chegar nas fronteiras (geográficas e/ou simbólicas), onde as feridas estão mais abertas? Itinerância e interinstitucionalidade na missão. A itinerância e a interinstitucionalidade na missão são dois componentes importantes que nos facilitam chegar nas “fronteiras”. a) “Itinerância geográfica” e “itinerância interior” na missão Em seu evangelho, Lucas (8,1) nos disse que “Jesus andava por cidades e povoados anunciando a boa noticia do reino de Deus. Os discípulos e algumas mulheres iam com ele”. Ser “discìpulo missionário sem fronteiras” (DA 376), significa que estamos dispostos a movimentar-nos, a carregar a mochila e caminhar para ir ao encontro do outro. Dispostos a sair de nossos espaços para chegar e atravessar as fronteiras, geográficas ou simbólicas, onde as feridas da humanidade, da mãe-terra e de toda a criação estão mais abertas. A “itinerância” tem duas dimensões importantes e complementárias. Por um lado está a itinerância geográfica, que é exigente e nos convida a viver, muitas vezes, “sem ter onde repousar a cabeça” (Lc 9,58). Por outro lado está a dinâmica de “itinerância interior”. Esta é, ainda, muito mais exigente! É preciso estar disposto a sair de nós mesmos, de nossos esquemas e seguranças, para colocar-nos na perspectiva do outro diferente. Isto exige estar dispostos a entregar todas as nossas seguranças e colocar-nos por inteiro nas mãos providentes de Deus. Isto requer muita fé e uma confiança absoluta no Deus Itinerante que nos acompanha no meio de todas as realidades desconhecidas, que não controlamos. Confiança total no Deus que nos cuida com as mãos (Suas Mãos) simples e acolhedoras do povo, dos outros “diferentes” que nos acolhem com carinho nesta Amazônia. Uma itinerância não acontece sem a outra. As duas itinerâncias (geográfica e interior) são as faces de um mesmo processo espiritual que nos convida a despojar-nos radicalmente e colocar toda a nossa confiança no Deus Pai Providente: “Não se angustiem por sua vida, pensando que vão comer, nem pelo corpo, que vão vestir” (Lc 12,22-31). E nos anima também a escutar a Nossa Mãe Morena que, serena e atenta às necessidades dos pobres, nos disse: “Façam tudo o que Ele mandar!” (Jo 2,5). A itinerância é um chamado a atravessar as fronteiras nos dois sentidos, nas duas direções. Atravessar as fronteiras provoca medo e risco, exige “desvestir-nos” de nossas velhas roupas, esquemas e lógicas. Esse é um forte desafio que vivemos na Amazônia, onde continuamente somos convidados a atravessar fronteiras, a passar de nossa “monocultura” de visão e lógica a uma “ecologia de culturas”, com uma diversidade enorme de lógicas e espaço-temporalidades. Só assim, é possível captar e compreender a novidade que se encontra no outro lado da fronteira, que o outro 9 diferente nos revela. Porém, não basta atravessar as fronteiras num único sentido. Isso seria mais fácil: atravessar a fronteira e ficar no outro lado (porque muitas vezes neste lado não nos entendem!). O exigente e fecundo é atravessar as fronteiras nos dois sentidos, nas duas direções. É necessário “sair” ao outro lado, porém, não é suficiente. É necessário voltar a “entrar” e traduzir, em categorias compreensíveis, a novidade encontrada no outro lado da fronteira. Somente assim, poderemos avançar e ir desconstruindo os velhos modelos, que não respondem mais, para juntos construir processos e caminhos mais adequados – segundo tempos, lugares e pessoas – aos novos e grandes desafios da Pan-Amazônia e do mundo. A itinerância compreende-se como um serviço complementar (não em oposição) aos serviços missionários “mais fixos”. É o serviço que Paulo prestou à nascente Igreja, complementando a missão de Pedro. Esta dinâmica itinerante faz parte, desde seu início, da tradição missionária mais genuína da Igreja. Parece que hoje, mais que nunca, é importante equilibrar o corpo apostólico da Igreja (talvez um pouco estática pelo peso das instituições) com esta dimensão missionária itinerante. Assim, com esta dinâmica mais paulina, itinerante, poderemos chegar com mais agilidade e vigor profético nos novos cenários, nas fronteiras, onde as feridas estão mais abertas. b) Interinstitucionalidade e intercongregacionalidade na missão18: Nossa missão comum tão importante como a minha! Além da itinerância, necessitamos também aprender a somar com outros na missão. Porque sozinho não dá! Nem individualmente, nem institucionalmente uma única instituição pode enfrentar estes enormes desafios pan-amazônicos. Graças a Deus, atualmente, muitas de nossas instituições reconhecem humildemente sua incapacidade para responder a estes enormes desafios. Muitas vezes se argumenta que não podemos responder por falta de recursos humanos e/ou materiais. Porém, pode ser que a questão seja mais profunda. Talvez seja um oportuno convite histórico do Espírito a ampliar nossa visão (muitas vezes míope) e a mudar nossos paradigmas de missão. Se frente às “feridas mais abertas” reconhecemos que sozinhos não podemos, a questão forte que se levanta é: será que Deus se esqueceu de seus prediletos, dos pobres e excluídos que têm suas vidas mais ameaçadas nesta Amazônia? Evidentemente o problema não é de Deus. Deus continua nos interpelando desde os crucificados e as “feridas mais abertas”. Se “sozinhos” e a partir de nossas instituições, reconhecemos que não podemos, talvez seja porque Deus nos está convidando a dar mais um passo nesta conjuntura histórica. Talvez Ele nos está convidando a assumir Sua Missão de outro modo: interinstitucionalmente, somando com outros, para chegar onde as feridas estão mais abertas e onde sozinhos não podemos chegar. Atualmente vivemos num mundo onde o individualismo e a fragmentação social são parte das estratégias do sistema para continuar impondo-se, dominando as maiorias empobrecidas e explorando predatoriamente a mãe-terra. Por isso, talvez o Espírito nos convida profeticamente a retomar nosso sentido profundo de comunidade e catolicidade. É o tempo para somar, juntar e unir esforços num grande projeto que busca o bem comum (político), que articula a unidade na diversidade (trinitário). Isso é profecia, revolução divina, Reinado do Deus Pai de Jesus. Ficar cada um por seu lado, fragmentados e individualistas, é ser míopes, ingênuos ou muito soberbos. É continuar sendo funcionais ao sistema vigente, ainda que cada um por seu lado esteja fazendo muitas coisas boas e maravilhosas. É urgente voltar a tecer os sujeitos sociais da Amazônia e do mundo numa grande aliança comum. Cremos que nessa grande aliança em favor da Vida podemos contribuir muito com a perspectiva de interinstitucionalidade na missão. Hoje, assumir a missão interinstitucionalmente é um sinal profético dos tempos que denuncia o individualismo e a fragmentação social e institucional que o sistema nos impõe. 18 Distinguimos intercongregacionalidade de interinstitucionalidade na missão. Entendemos a intercongregacionalidade quando somente somam congregações religiosas num mesmo projeto missionário. Quando falamos de interinstitucionalidade queremos expressar que além das congregações religiosas somam-se na missão distintas instituições leigas, grupos, etc. Neste sentido a interinstitucionalidade integra e amplia a intercongregacionalidade na missão. 10 Porém, temos que reconhecer que o caminho da interinstitucionalidade na missão é uma experiência nova que está em fase de construção. E o novo assusta, gera medo e insegurança, nos desinstala de nossas seguranças. Por isso, a interinstitucionalidade na missão exige uma atitude humilde e profunda de discernimento, de escuta e aprendizagem, de coragem no Espírito para estar dispostos a trilhar e navegar estes “caminhos e rios” novos, com todos os seus riscos. Ainda não há uma “cultura interinstitucional” na prática missionária das congregações, organizações e igrejas. Estamos aprendendo. A interinstitucionalidade na missão só é possível se cada pessoa, grupo, organização, congregação ou instituição que participa do projeto o assume com o mesmo carinho, cuidado, coragem e dedicação que assume seus próprios projetos missionários. Isso significa que o “nosso” projeto missionário interinstitucional é tão importante como “meu” próprio projeto missionário. Afinal, a missão não é nem “minha”, nem “tua”, nem sequer “nossa”. A missão é do Senhor. Ele é quem com carinho nos chamou para o serviço na Sua Missão. Esta perspectiva pastoral “inter”, que soma na missão, é proposta pelos próprios bispos em Aparecida quando convidam as igrejas da bacia amazônica a estabelecer “uma pastoral de conjunto, com prioridades diferenciadas, para criar um modelo de desenvolvimento que privilegie aos pobres e sirva ao bem comum” (DA 475, 544). A partir da itinerância e da interinstitucionalidade na missão, como comunidades missionárias na Pan-Amazônia chamadas pelo Espírito a atravessar as “fronteiras”, podemos propor projetos e comunidades interfronteriças. Propor comunidades e projetos intercongregacionais (com pessoas de varias congregações) e interinstitucionais (também com leigos-as), dos distintos países amazônicos nas regiões de fronteira. Podemos somar nas fronteiras amazônicas recursos humanos e materiais para organizar projetos e comunidades missionárias que possam contribuir com seu grão de areia aos enormes desafios presentes nestas regiões (e que sozinhos reconhecemos que não podemos enfrentar). Esse seria hoje um profundo sinal profético missionário para a Pan-Amazônia e para o mundo. 3.4. Qual é a mística para estar nas fronteiras? Espiritualidade profética de fronteira. Dom Helder Câmara19 inspirou desde o início a mística de nossa missão interinstitucional e itinerante pelas fronteiras da Pan-Amazônia: “Aceita as surpresas que transtornam teus planos, derrubam teus sonhos, dão rumo totalmente diverso ao teu dia e, quem sabe, à tu vida. Não há casualidades. Dá liberdade ao Pai, para que Ele mesmo conduza a trama de teus dias." Itinerar pelas fronteiras, pessoais e interpessoais, das distintas realidades onde as feridas estão mais abertas, exige uma espiritualidade encarnada, disposta a “estar com quem ninguém quer estar, onde ninguém quer estar e como ninguém quer estar”20. Esta espiritualidade e mística é dom e tarefa. É preciso pedi-la incessante e humildemente ao Espírito. Porém, é necessário também cultivá-la no cotidiano da vida e missão, no caminhar com os outros pelas fronteiras da Amazônia. Em Aparecida nossos pastores nos animam nesta espiritualidade profética que anuncia e denuncia: “Como profetas da vida, queremos insistir que, nas intervenções sobre os recursos naturais, não predominem os interesses de grupos econômicos que arrasam irracionalmente as fontes de vida, em detrimento de nações inteiras e da própria humanidade.” (DA 471). Este desafio apresentado por nossos pastores retoma o tema central do compromisso cristão com a política, entendida como busca do bem comum. Vivemos num sistema que tem invertido a ordem das coisas: o econômico se impôs e têm subordinado o político. O interesse econômico de uns quantos se tem imposto à busca do bem comum (política) das maiorias. Nesta conjuntura, nosso compromisso profético carrega novamente de espiritualidade e mística a política, para que volte a retomar seu lugar primordial no exercício da gestão do poder na busca do bem comum, ao qual a economia deve servir. 19 20 Profeta, bispo de Olinda (Recife, Brasil), falecido em 1999. Projeto da Equipe Itinerante (Versão 2007). Traços da espiritualidade itinerante. Expressão de Pepe H sj. 11 A Conferência de Religiosos-as do Brasil (CRB) nos anima a: “Cultivar uma espiritualidade encarnada e profética, centrada na Palavra de Deus e na mística do discipulado, aberta à diversidade cultural, religiosa e de gênero”.21 Isso exige um altíssimo compromisso político (bem comum) impregnado de espiritualidade e mística. Na atual mudança de época e paradigma que nos toca viver na Amazônia e no mundo, é fundamental cultivar uma espiritualidade radical e profética, de fronteira, como a de nossos mártires. Não serve ser tíbios: “Porque eres tíbio, e não eres nem frio nem quente, te vou a vomitar de minha boca” (Ap 3,16). Afirmava a Ir. Dorothy Stang, pouco antes de ser assassinada em 2005: “Não vou fugir nem abandonar a luta desses agricultores que estão desprotegidos no meio da selva. Eles têm o sagrado direito a uma vida melhor numa terra onde possam viver e produzir com dignidade, sem desmatar”.22 Dom Erwin Kräutler (68), bispo do Xingu (Amazônia brasileira) e Presidente do CIMI, está há mais de quatro anos “marcado para morrer” por denunciar a depredação da mãe-terra e violência contra seus povos tradicionais. Por isso, está com custódia policial permanente. Seu testemunho também nos anima a não sermos tíbios em nossa missão profética: “Amazônia, um filho teu não foge da luta”. Esses irmãos “maiores” na fé e no compromisso místico-político, nos convidam a não deixar que matem nossa utopia, a Utopia do Reino. Animam-nos a apostar nossas vidas por aquilo que estamos convencidos que é o “nosso amor primeiro”. Seduzem-nos e empurram-nos a gastá-la com aqueles com quem Nosso Senhor a gastou primeiro. Não tenhamos medo; ou ainda com medo, não “joguemos a toalha”. Gastemos nossa vida naquilo que nos dá Vida Abundante e Verdadeira Paz. Devemos pedir e alimentar uma espiritualidade profética que nos ajude a manter com firmeza duas decisões importantes no seguimento do Senhor pelas fronteiras da vida: 1. Discernir e decidir com quem Deus nos convida a gastar (“complicar”) nossa vida e missão na Pan-Amazônia, onde as feridas estão mais abertas; 2. Manter a primeira decisão quando as coisas se complicam e ficam difíceis, ainda que nos custe a vida como a tantos mártires... Rezemos uns pelos outros para que o sangue de nossos mártires não nos deixe em “paz” e sim nos fortaleça no compromisso. Alguns traços dessa espiritualidade de fronteira23: a) Espiritualidade itinerante. A expressão “espiritualidade itinerante” evoca leveza e movimento em novas direções, interna e geograficamente, deixando-nos conduzir pela brisa do Espírito de Deus, discernindo sua vontade, no cotidiano da vida dos pobres, diferentes e excluídos: sair da própria terra (Gn 12,1); Êxodo: aprender a ser livres (Ex 13,18.20-22); acolher ao migrante (Lv 19,33-34); caminhar humildemente (Miq 6, 8); atravessar para o Egito: novo êxodo (Mt 2,13-14); acolhida incondicional (Mt 25,31-46); caminhar com Jesus a Emaús (Lc 24,13-35); caminhar rumo aos excluídos (Is 61,1-2); somar forças com pessoas e entidades que se identificam com a causa da justiça sócioambiental e da liberdade (Lc 9,49-50). b) Mais além da itinerância geográfica. Estar disponível para ir a qualquer lugar onde seja mais necessário. Significa uma atitude de itinerância interior muito mais exigente que a própria mobilidade externa. Trata-se de sair dos próprios esquemas mentais, das obras, estruturas ou organizações pastorais e se abrir em atitude de acolhida e escuta, diálogo aberto ao novo e ao diferente, a exemplo de Jesus (Jo 4,1-15). A itinerância geográfica cria um estado de insegurança e falta de certeza no itinerário. É nesse ponto onde se dinamiza a intinerância interior e a espiritualidade de fronteira: livre para, como disse um trovador destas terras: “Viver e não ter a 21 CRB, 2ª Prioridade para o período 2007-2010. A Ir. Dorothy Stang (73) foi assassinada por defender os direitos dos povos da Amazônia. Deram seis tiros nela, um na cabeça e cinco ao redor do corpo, no dia 12/02/2005, em Anapu, Pará, Brasil. 23 Projeto da Equipe Itinerante, traços da espiritualidade. 22 12 vergonha de ser feliz. Cantar e cantar e cantar, a beleza de ser um eterno aprendiz…”24. Ainda que tenhamos que dar a vida! c) Ir ao encontro do outro: inculturação e diálogo. Uma espiritualidade que implica descer ao encontro do pobre e diferente; diminuir para que ele cresça e assim tecer com ele relações de igualdade e fraternidade. Isso exige humildade e simplicidade. É uma espiritualidade encarnada em contínua gestação e diálogo que exige criatividade, abertura, dinamismo, desprendimento do poder e sensibilidade humana. d) Discernimento e decisão. Frente à diversidade constante de situações internas e externas que as fronteiras apresentam, é necessária uma atitude permanente de discernimento pessoal, comunitário, institucional e de equipe, na urgência de perceber por onde aponta hoje o Espírito na missão. Feito o discernimento é preciso decidir e manter com firmeza essa decisão no meio das dificuldades, obscuridades, medos, incompreensões, incertezas, ameaças… Depositando toda nossa confiança no amor compassivo e fiel da Trindade que nos ilumina, conduz e acompanha na itinerância da vida e da missão. e) Os excluídos como sujeitos, filhos da mãe-terra. Uma espiritualidade que exige uma opção pelos mais excluídos, seguindo os passos do Mestre amigo das crianças, mulheres e pecadores, porque eles são os prediletos do Pai. Isto exige um compromisso contínuo com os sujeitos da missão: os indígenas, os ribeirinhos e os marginados urbanos, os povos tradicionais, etc. Eles são marginalizados (ou manipulados) pelas instâncias de poder das elites que não reconhecem seus valores, suas culturas, sua dignidade. É preciso crer que estas pessoas são sujeitos de seu próprio caminho, de sua historia e de sua libertação dentro de suas próprias culturas e realidades. Porém, é também uma espiritualidade sócioambiental, cuidadosa das pessoas e cuidadosa da mãe-terra que a todos nos cuida e sustenta como filhos-as seus que somos. f) Agradecer e celebrar nossos mártires. A espiritualidade de “fronteira” se alimenta no Mistério Pascal de Cristo, no mistério Pascal de nossos Mártires. Como nos lembram nossos pastores, devemos “bendizer ao Senhor pelo testemunho de tantos leigos e leigas, religiosos e religiosas, sacerdotes e bispos que têm entregado sua vida até o martírio, para dar vida aos povos amazônicos”.25 g) Origem, centro e finalidade. A espiritualidade de fronteira tem como origem o Deus da Vida e da história, o Deus de diferentes nomes que está presente na diversidade sócioambiental amazônica, antes que nós chegássemos. Tem como centro os excluídos e a mãe-terra. Sua finalidade é o amor e a justiça sócioambiental do Reino, a Vida Abundante, vida integral de toda a criação. Para que nossos filhos-as continuem a dança da vida... Os bispos amazônicos insistem: “A Amazônia é parte da criação e temos responsabilidade para respeitar a biodiversidade e a sóciobiodiversidade. Esta responsabilidade nos impele a reconhecer a sabedoria milenar e a espiritualidade dos povos tradicionais que habitam nela, a reconhecer neles os rostos do Cristo sofredor.”26 Como nos dizia o velho líder Yagua (rio Oroza, na Amazônia peruana) numa oficina sócioambiental: “Só assim, unidos todos e tomando consciência de que todos somos filhos e filhas da mãe-terra, cuidando dela responsavelmente e deixando ela nos cuidar, nossos filhos e os filhos de nossos filhos poderão continuar a dança da vida sobre a mãe-terra”. “Avancemos para águas mais profundas!” (Lc 5,1). 24 25 26 Gonzaguinha. CELAM, III Encontro dos Bispos Amazônicos, Manaus, 1-4/10/2009. Idem. 13 Perguntas para a oração/reflexão pessoal e/ou grupal: 1. Com que rostos nos convida Deus a gastar (“complicar”) e comprometer nossa vida e missão aqui na Pan-Amazônia? 2. Quais são as fronteiras (geográficas e/ou simbólicas) que descubro na minha realidade, onde as feridas estão mais abertas? Sinto o chamado de Deus a partir das fronteiras? Sinto o convite a arriscar com quem está nessas fronteiras? 3. Estamos abertos às perspectivas de itinerância e interinstitucionalidade (ou intercongregacionalidade) na missão? E minha congregação ou instituição está aberta a estas novas perspectivas missionárias? 4. Como está a mística e a “saúde espiritual”, pessoal e institucional? É uma espiritualidade ou mística de fronteira, profética? Como a estamos cultivando e alimentando? 14