a crise da tradição: sobre a importância de - monodireitounime

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a crise da tradição: sobre a importância de - monodireitounime
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A CRISE DA TRADIÇÃO: SOBRE A IMPORTÂNCIA DE MAIOR
SOLENIDADE NA TRANSFERÊNCIA DO PATRIMÔNIO MOBILIÁRIO.
Iana Crusoé Rocha Rebello1
RESUMO
Este ensaio tem por objetivo uma sucinta análise da questão envolvente do título de
transmissão de propriedade no direito moderno, indagando sobre a necessidade de
determinação de um certo valor ao qual se impusesse certa solenidade à transmissão dos
valores mobiliários. Isso, tendo em vista a grande quantidade de valores que se
movimentam nestes mercados, sendo transmitidos meramente pela tradição, o que dificulta
em muito a fiscalização por parte de terceiros interessados nestas transações ou mesmo
nos próprios valores, como no caso dos cônjuges e herdeiros.
PALAVRAS-CHAVE: BENS MÓVEIS. TÍTULO DE TRANSMISSÃO. PROPRIEDADE.
CASAMENTO. SUCESSÕES. HERANÇA. NEGÓCIO JURÍDICO.
RESUMEN: Este ensayo tiene por objeto una analisis sucinta de la cuestión de la
transferencia del título de propiedad en el derecho moderno. Investigado la necesidad de
determinar un valor a lo que para imponer una cierta solemnidad a la transferencia de
valores. Que, en vista de la multitud de valores que mueven a estos mercados, se transmite
sólo por la tradición, lo que hace más difícil el control por parte de terceros de interesados
en estas transacciones, o incluso los propios valores, como el cónyuge y los herederos.
PALABRAS-CLAVE: BIENES MUEBLES. TRANSFERENCIA DE TITULARIDAD.
PROPIEDAD. MATRIMONIO. HERENCIA. SUCESSIONES. NEGOCIOS LEGALES.
EXÓRDIO
A questão da divisão clássica dentre as categorias de bens sempre ocupou
o bojo da tradição jurídica ao longo da história. Isso porque a determinação de estar
circunscrito um bem da vida a uma dada classe, originava não apenas o termo do
debate sobre o título que seria capaz de transferir sua posse, mas espraiava-se a
longas distâncias, sendo mesmo determinante de ações em cujo elemento subjetivo
figuravam terceiros estranhos à relação entre bem e possuidor.
1
Discente do curso de direito da União Metropolitana de Educação e Cultura - UNIME.
Faculdades UNIME – União Metropolitana de Educação e Cultura S/C Ltda.
Av. Luis Tarquínio Pontes, nº 600, Lauro de Freitas – Bahia / Tel.: 288-8202 / e-mail: [email protected]
2
Na atualidade a questão não se afasta deste âmbito, sendo imprescindível
uma releitura das defesas colocadas a cada uma das categorias.
Não se pode mais admitir que uma massa tão grande como a de capitais
mobiliários circule na atualidade sem nenhum tipo de controle ou formalidade.
Assim, este artigo visou demonstrar esta necessidade.
Inicialmente, o debate foi colocado levando em conta as raízes da questão
da divisão dos bens, atentando sobre as peculiaridades que envolveram a evolução
da proteção dispensada à alienação de bens na summa rerum divisio.
A segunda parte do trabalho foi dedicada à exposição da questão dos bens
móveis, sua transferência de titularidade e sua relação com o patrimônio mínimo, a
fim de atingir as desejadas conclusões.
Assim, as linhas têm seguimento.
DAS RAÍZES
Dizer que a divisão de bens em móveis e imóveis é a summa rerum divisio
do direito, significa reportar às origens históricas do pensamento jurídico, cujo
alicerce maior pode-se encontrar na tradição romana, no culto aos antepassados
que se engendrava seja por meio dos pacta (pacto – ajustes de vontade nos quais
havia a produção de uma obrigação sem exigibilidade jurídica, de grande valia para
os escravos e incapazes), seja por meio do contractus (contrato – gerava a
capacidade genérica de obrigações civis). Isto, porque nessas categorias, qual fosse
a natureza dos bens que se visava transmitir, era a solenidade da stipulatio que
dava a plausibilidade dos efeitos2.
2
Para mais sobre a questão dos pacta e do contractus vide “A função social do contrato de trabalho”,
SOLLA, Paulo Ramon.. Nele encontra-se: “Na verdade, de ser ver que as origens destas noções se
prendem as práticas quiritárias, ao mores maiorum, à solenidade litúrgica do direito romano, que se
baseava na fé da palavra, na promessa, nos respeito aos costumes ancestrais.
Decerto, a falta do conteúdo para a causa civilis imputava ao contrato a ausência de uma noção
conceitual. Por isso, não se pode afirmar que existiu entre os povos romanos uma compreensão
conceitual, isto é, genérica e abstrata do contrato capaz de açambarcar todas as suas variedades.
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A divisão clássica dos bens em móveis e imóveis já fazia Jorge Llambias
dispensar tintas fortes ao criticar este posicionamento, porque não se pode, numa
sociedade moderna, admitir que apenas os bens imóveis tenham o privilégio de
certas solenidades, porque também não se pode admitir que se dispense o
assentimento do cônjuge na transmissão de valores mobiliários.
Este, contudo, não é o ponto sobre o qual nos debruçaremos agora. Ao
contrário, pende de análise a questão da utilidade histórica que deteve a
classificação dos bens em móveis e imóveis.
Zanonni3, lecionando sobre a história do direito de famílias, mas intricado na
questão das raízes do protecionismo civilista, noticia que a proteção exacerbada
dispensada aos bens imóveis provinha da cultura eminentemente medieval,
porquanto neste período histórico era a propriedade produtiva, ou seja, a terra, os
bens imóveis que possuíam maior valor agregado. Tal observação parece
pertinente. Isso, porque numa sociedade estratificada a necessidade de segurança e
solenidade no tráfico social, além de dar maior certeza aos atos celebrados,
contribuía para limitar o acesso à propriedade.
Observemos com mais cautela. Ora, se tratando de uma sociedade
medieval, marcada pela doutrina romano-germânica imbricada com o direito
canônico, há de se ver que suas instituições jurídicas refletiriam o conservadorismo
proveniente não apenas de uma sociedade de classes, mas de uma estrutura
cognoscitiva que privilegiava a tradição em detrimento à comprovação.
Havia algumas figuras contratuais bem definidas, embora bem escassas. E é a isso que se deve a
predominância das pacta, que possibilitavam aos pupilos e escravos, cuja capacidade impedia a
celebração de contratos, a participação na vida econômica, porque embora não comportasse a ação,
com base na exceptio pacti conventi, o pacto tinha a possibilidade de contar com a exceptio,
passando a produzir certos efeitos, como obrigações civis imperfeitas.
Já na fase justianéia, era nítido o impulso no sentido de extinguir a antiga distinção entre o pacto e
o contrato. Nesta senda, acentua-se a contraposição verbal entra contratar e distratar, bem como a
antinomia entre contrato e distrato, com o escopo de relatar que o contrato seria sempre fonte de uma
obrigação.
Essa, provavelmente, foi a inspiração de Domat e Pothier, cujos ensinamentos se consagraram no
Código de Napoleão de 1804, o que teve como conseqüência o vasto prestígio alcançado por esta
tese.”
3
ZANNONI, Eduardo. BOSSERT, Gustavo. Manual de derecho de família. 6 ed.. Buenos Aires:
Ástrea, 2004.
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Eis que ainda vigente o valor da palavra, não o valor dos fatos. E o que isso
tinha a ver com o direito de propriedade e a divisão dos bens em móveis e imóveis?
Tudo, haja vista que tais categorias visavam excluir o acesso do camponês, da
massa trabalhadora, à propriedade, colocando apenas no título escrito a capacidade
de transmissão do título de propriedade.
Nesta seara, cumpre observar que determinava o Código Civil francês que a
transferência dos bens, seja de qual categoria fossem, dispensava a tradição,
necessitando apenas da celebração do negócio jurídico por parte dos sujeitos para a
transmissão do título de propriedade. Tal ocorrência tinha apenas um sentido: o de
afastar ao mesmo tempo a atuação dos juízes4, agentes do antigo regime, e de
exorcizar a apropriação por parte da massa urbana e rural de trabalhadores dos
bens, em razão de muitos deles possuírem a tradição, a proximidade com a coisa
em si, restando, contudo, a léguas do título de proprietário, que nunca lhes fora
ofertado ou possível.
Assim doutrina o eminente Jorge Llambias, in verbis:
“La situación ya había comenzado a variar a fines del siglo XVIII y continuó
cambiando sustancialmente durante los siglos XIX y en lo que va del XX. El
desarrollo de las grandes industrias, el auge del comercio impulsado por el
liberalismo económico, y en general las nuevas condiciones de la economía
crearon fortunas mobiliarias fabulosas que el propio dinamismo del sistema
capitalista no cesó de incrementar. La riqueza mobiliaria computada por
millones de millones ha pasado con creces el valor de la propiedad raíz. Sin
4
Neste sentido: “Todo este cenário deveu-se à desconfiança perante o estado e em relação à
atuação dos juízes, que eram considerados agentes do antigo regime, cujas atividades deveriam
estar controladas pela interpretação aos moldes da L'École de L'Exégèse, que depositava toda a
atividade interpretativa na extração do sentido literal da lei por meio dos métodos gramaticais, lógico
e sistemáticos.
Com os contratos aconteceu de mesma forma. Enquanto nas leis o receio com os magistrados
fazia com que o sistema lhes imputasse a busca pela mens leges, nos contratos buscava-se entender
apenas aquilo que estava clausulado, ou seja, apenas aquilo que estava pelas partes disposto, sem a
preocupação com a vontade das partes. Eis que se entendia o contrato como um ente autônomo
após sua passagem para o plano da existência.
Assim, seguia-se em direção oposta à da racionalidade estético-expressivo e da racionalidade
moral prática para uma hipertrofia do pensamento científico, perquirindo os moldes de uma razão
4
cognitivo instrumental. Ou seja, em lugar da complexidade de um sistema jurídico aberto, optou-se
por uma sistemática simples e fechada, na qual o método, a racionalidade orientada para fins
depositavam todas as fichas do sistema jurídico na neutralidade, na imparcialidade, enfim, na busca
da mens leges.” SOLLA, Paulo. A função social do contrato de trabalho. Monografia apresentada ao
Prêmio Luiz Tarquínio, 2009.
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duda aquélla requiere una facilidad de circulación que no se concilia con las
formas severas que rigen la transmisión de las cosas inmuebles, ni con las
garantías a veces harto pesadas que aseguran la protección de la riqueza
inmobiliaria, especialmente tratándose de bienes de incapaces. Pero en la
medida que sea conciliable con la conveniencia de mantener dentro del giro
comercial los valores mobiliarios, procede extender a éstos la protección
5
que la ley dispensa para los inmuebles. “
É dizer, a insólita tentativa de reverter aos bens móveis a livre circulação
proveniente das doutrinas liberalistas absolutas de Adam Smith ou do liberalismo
mitigado dos agenda e non agenda de Jeremy Bentham, não se associa às
necessidades de proteção que se conformam à conjuntura de um estado
democrático de direito, que não pode ser o baluarte da injustiça.6
A TRANSFERÊNCIA DOS BENS MÓVEIS
“No obstante lo expuesto, no ha de pensarse que las cosas inmuebles han
perdido en el orden civil su situación de primacía. Si en lugar de poner
nuestros ojos en la alta burguesía, que en las sociedades modernas de
Occidente detenta la posesión de los bienes de producción, miramos al
hombre común que es el verdadero protagonista del derecho civil, y a las
familias de clases media y obrera, comprobaremos que para ellos siguen
siendo de la mayor importancia las cosas inmuebles, que a veces
constituyen el único elemento del acervo patrimonial: es la casa donde la
familia vive, el lote o la chacra en que se han invertido los ahorros de tal vez
toda una vida. De ahí que el régimen diferencial de las cosas muebles e
inmuebles, en cuanto rodea a éstas de mayores recaudos, aunque no ha
7
perdido justificación”
Se é verdade, como leciona Llambias, que os bens imóveis não perderam,
na sociedade em geral, sua primazia frente aos móveis, é também verdadeiro que
quando se fala em circulação de valores e riquezas no tráfico social é incomparável
o quinhão representado pelas coisas mobiliárias.
5
LLAMBIAS, Jorge. Tratado de Derecho Civil, parte general, tomo II. 17ª Ed. Buenos Ayres: Editorial
Perrot: 1997, p. 194.
6
ROSANVALLON, Pierre. A crise do Estado-providência. Goiania: UFG; Brasília: UNB, 1997.
7
LLAMBIAS, Jorge. Tratado de Derecho Civil, parte general, tomo II. 17ª Ed. Buenos Ayres: Editorial
Perrot: 1997, p. 194 - 195.
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O comércio certamente os têm como o mais expressivo gênero de bens. Na
indústria, no operariado, enfim, nos mais diversos ramos da vida humana em
sociedade os bens móveis representam a parcela majoritária da produção.
Questiona-se, contudo, se tendo tamanha representatividade, esta enorme
gama de capitais não deve se submeter a um regime de transferência mais
controlado, visando proteger a terceiros interessados, proporcionando maior
segurança no tráfico jurídico.
Assim, mister que o Estado, mediante controle da forma na alienação dos
bens móveis, cuide de manter de forma mais efetiva a monitoração da circulação de
riquezas na sociedade, evitando que a facilidade de transferência da titularidade
mobiliária seja utilizada como expediente ardiloso para prevaricação de direitos
alheios.
Exemplo disso é o conhecido investimento em valores móveis, como jóias e
pedras preciosas das quais, ao término do casamento, se desfazem com certa
facilidade os cônjuges, buscando elidir os direitos do consorte durante a partilha.
Desta forma, impende, para a garantia de um patrimônio mínimo, uma maior
solenidade na transferência de bens móveis a partir de determinado valor, como
ocorre com os bens imóveis8.
O patrimônio mínimo, nas palavras do eminente civilista Luiz Edson Fachin,
compreende:
“(...) uma quantidade suscetível de várias grandezas ou de uma grandeza
suscetível de vários estados, em que o mínimo não seja o valor menor, ou
o menor possível, e o máximo não seja necessariamente o valor maior, ou
8
Assim dipõe o Novo Código Civil em seu art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura
pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência,
modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior
salário mínimo vigente no País.
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o maior possível. Próximos ou distintos, os conceitos jurídicos e as
categorias não jurídicas podem dialogar.”.
9
Assegurar este “mínimo acervo patrimonial” que “jamais significa o menor
patrimônio possível”, mas sim um “patrimônio essencial” que “corresponde àquela
parcela de bens, que não necessariamente devem ser imóveis, imprescindíveis ao
sustento do indivíduo, dos sujeitos sobre sua guarda, vale dizer, sua família”
consubstancia, numa ordem capitalística, imperativo insofismável à garantia da
dignidade humana.10
Esta forma de enxergar o direito, principalmente na seara dos direitos reais,
revela uma nova perspectiva jusfilosófica, relacionada a
“La revelación de la dimensión coexistencial de la persona, a la par que
permite reconocer la importância del valor solidaridad dentro del derecho,
otorga sustento a la posición doctrinaria que postula que el derecho es
intersubjetividad
(...) gracia a la filosofia de la existência, permite
comprender al derecho como intersubjetividad, como relación entre sujetos.
(...) Esta visión coexistencial del hombre y, por onde, del derecho, nos
proprociona el fundamento necesario para um serio replanteo de los
conceptos tradicionales de la dogmática jurídica, elaborados em base a
uma concepción individualista del derecho”
11
Desta forma, redescobrindo o direito em formas privilegiadoras da pessoa,
insta reconhecer que carece de maior proteção, de maior segurança a transferência
de bens móveis de elevado valor no tráfico social. Resguardando a dignidade da
pessoa humana, valor fundamental do Estado Democrático de Direito Brasileiro.
Nesta ânfora, assim como é anulável a doação que reduz o doador ao
estado de miserabilidade, também deveria ser anulável a venda de bens móveis
9
FACHIN, Luiz Edson. Estatuto jurídico do patrimônio mínimo. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar,
2006, p. 273.
10
SOLLA, Paulo Ramon da Silva. Mínimo existencial e patrimônio mínimo: a ambigüidade préconstitucional. Ainda não publicado.
11
SESSAREGO, Carlos Fernández. Derecho y persona. 2ª Ed. Truhullo-Peru: Normas Legales,
1995, p. 86-87.
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componentes da meação que reduza o quinhão a ser percebido pelo outro cônjuge
no término da partilha, negando, inclusive, um patrimônio mínimo.
“Aqui o mínimo transcende essa percepção quantitativa e não coloca no
ponto central a noção de extremo. Ao falar de mínimo ou de máximo não
se cogita de extremos abaixo ou acima dos quais o objetivo em questão
12
perde todas as suas características, suas propriedades.”.
Assim, como já foi dito, a garantia deste patrimônio mínimo, da qual uma
maior solenidade na transferência de bens móveis é instrumento, é essencial à
dignidade da pessoa humana. No escarmento do insigne Pietro Barcelona, in verbis:
“(...) como dice Vattimo, el nihilismo es La consumación del valor de uso
em el valor de cambio. La reificación general, La reducción de todo a valor
de cambio, es precisamente ‘el mundo que se convierte em fábula’; es um
debilitamiento de la fuerza apremiante de la realidade. En el mondo del
valor de cambio generalizado todo viene dado como relato. Ya no hay
necesidad de um centro de referencia. Lãs imágenes se suceden y los
mensajes de los médios de comunicación de masas se congvierten em
uma declinación vertiginosa de lãs relaciones entre el presente y la misma
tradición.”
13
Vê-se, então, que a hipertrofia valorativa dos bens imóveis, dotando de
maior solenidade sua transferência em detrimento aos bens móveis, não tem fonte
outra senão a tradição feudal de vinculação dos homens à terra, que, por isso,
constituía a classe de bens de maior valor.14
Neste sentido, o magistério do inigualável Jorge Llambias, in verbis:
“La riqueza mobiliaria computada por millones de millones ha pasado con
creces el valor de la propiedad raíz. Sin duda aquélla requiere una facilidad
de circulación que no se concilia con las formas severas que rigen la
transmisión de las cosas inmuebles, ni con las garantías a veces harto
pesadas que aseguran la protección de la riqueza inmobiliaria,
especialmente tratándose de bienes de incapaces. Pero en la medida que
12
Idem, p. 277.
BARCELONA, Pietro. El individualismo proprietário, Collección Estructuras y Procesos –
Série Derecho. Madrid: Trotta, 1996, p. 37
14
ARIES, Philippe; DUBY, George. Da Europa feudal à Renascença. São Paulo: Companhia das
Letras, 1990.
13
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sea conciliable con la conveniencia de mantener dentro del giro comercial
los valores mobiliarios, procede extender a éstos la protección que la ley
15
dispensa para los inmuebles.”
Insta, então, que se estenda aos bens móveis a proteção dispensada aos
bens imóveis, posto que representam a grande massa de capitais que circulam na
sociedade moderna.
CONCLUSÃO
Colocada a questão, esboçados os debates preliminares acerca do tema,
adentrada a questão principal sobre a classificação e o trânsito dos bens em
sociedade, cumpre expor o rol das conclusões.
Primeiro, se analisou a questão da summa rerum divisio sob o ponto de vista
histórico-analítico, definindo os motivos que enlevaram a superposição do patrimônio
imobiliário e sua garantia em detrimento aos bens móveis.
Em segundo aspecto e, principalmente sobre este ponto, as elucubrações
gravitaram em torno da necessidade de colocar sob um regime mais formal a
transferência de bens móveis de elevado valor, visando garantir a segurança de
terceiros porventura interessados nestes, como cônjuges e herdeiros.
Mais ainda: a questão foi pareada com o patrimônio mínimo, elucidando a
pertinência, o liame entre as duas, posto que a garantia de um patrimônio mínimo
perpassa, necessariamente a garantias de segurança nos negócios jurídicos.
Assim, pôde-se concluir sobre a insofismável necessidade de uma maior
formalidade na transferência de bens moveis de valor mais elevado, porque a mera
tradição não confere, ao contrário, elide, a necessária publicidade que a formalidade
confere ao tráfico social.
15
LLAMBIAS, Jorge. Tratado de Derecho Civil, parte general, tomo II. 17ª Ed.
Editorial Perrot: 1997, p. 195.
Buenos Ayres:
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10
Enfim, como disse José Saramago, exige-se “um direito que se respeite,
uma justiça que se cumpra” e, neste sentido, é preciso que se adote uma postura
capaz de promover o apaziguamento das desigualdades sociais, da torpeza
capitalística, tarefa da qual não se pode furtar o direito moderno.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARIES, Philippe; DUBY, George. Da Europa feudal à Renascença. São Paulo:
Companhia das Letras, 1990.
BARCELONA, Pietro. El individualismo proprietário, Collección Estructuras y
Procesos – Série Derecho. Madrid: Trotta, 1996.
BESSONE, Darcy. Direitos reais. Sao Paulo: Saraiva, 1988.FACHIN, Luiz Edson.
Estatuto jurídico do patrimônio mínimo. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 273.
GOMES, Orlando. Direitos reais. 19. ed. Rio de Janeiro: Revista Forense, 2004.
LLAMBIAS, Jorge. Tratado de Derecho Civil, parte general, tomo II. 17ª Ed. Buenos
Ayres: Editorial Perrot: 1997, p. 194.
PEREIRA, Caio Mario da Silva. . Instituições de direito civil. 12. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2005.
ROSANVALLON, Pierre. A crise do Estado-providência. Goiania: UFG; Brasília:
UNB, 1997.
SESSAREGO, Carlos Fernández. Derecho y persona. 2ª Ed. Truhullo-Peru: Normas
Legales, 1995, p. 86-87.
SOLLA, Paulo Ramon da Silva. Mínimo existencial e patrimônio mínimo: a
ambigüidade pré-constitucional. Ainda não publicado.
SOLLA, Paulo Ramon da Silva. A função social do contrato de trabalho. [Não
publicado].
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Av. Luis Tarquínio Pontes, nº 600, Lauro de Freitas – Bahia / Tel.: 288-8202 / e-mail: [email protected]
11
SOLLA, Paulo Ramon da Silva. Para além do arco-íris: a família constitucional e a
união homossexual . Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 2269, 17 set. 2009.
Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=13519>. Acesso em: 15
set. 2009.
ZANNONI, Eduardo. BOSSERT, Gustavo. Manual de derecho de família. 6 ed..
Buenos Aires: Ástrea, 2004.
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