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HardKey um teclado físico para smartphones e tablets
para pessoas cegas e com baixa visão
Jaime Cazuhiro Ossada1, Luiz Teruo Kawamoto Junior², Waltraudi Orchulhak
Kawamoto2, Annie France Frère Slaets2
1
Faculdade de Tecnologia de Indaiatuba (FATEC-ID)
Rua Dom Pedro I, 65 Cidade Nova – 13334-100 – Indaiatuba – São Paulo – Brazil
2
Universidade de Mogi da Cruzes (UMC) – Mogi da Cruzes – São Paulo - Brasil
¹[email protected], ²[email protected],
³[email protected], [email protected]
Abstract. This article describes the process of developing a hardware-based keyboard that
provides enhanced usability and interaction with smartphones by the public of blind or low
vision. The keyboard uses reliefs shaped Braille and results indicate that it is a viable and
economical way to commercial production. Initial tests indicate that the product has a great
potential.
Resumo. Este artigo descreve o processo de desenvolvimento de um teclado baseado em
hardware que proporciona uma melhor usabilidade e interação com os smartphones pelo
público de pessoas cegas ou com baixa visão. O teclado utiliza relevos em forma de Braile e
os resultados obtidos indicam que é uma forma viável e econômica para produção comercial.
Testes iniciais indicam que o produto tem um grande potencial.
1. Introdução
Nos dias atuais, a forma de inserção de textos em dispositivos móveis, como tablets e
em grande parte dos smartphones se modificaram. Inicialmente a digitação de textos era
feita por minúsculos teclados, constituídas de micro chaves mecânicas que ao serem
pressionadas pelos usuários, enviavam o conjunto de caracteres ao processador e o
exibia no display.
A companhia Apple aboliu completamente os teclados físicos em seus
dispositivos móveis e esta parece ser um modelo a ser seguido nos dispositivos móveis
fabricados pelas companhias Samsung, L&G, Motorolla e demais concorrentes.
Percebe-se uma tendência em apresentar produtos que utilizam o teclado de forma
virtual, beneficiada pela tecnologia de touch screen.
A interface touch screen, é uma tecnologia que existe há muito tempo.
Inicialmente utilizado em controle de automação industrial, aeronaves e uso militar.
Com o avanço dessa tecnologia, despertou o interesse na indústria de aparelhos
celulares para utilizar essa interface em seus novos dispositivos, substituindo dessa
forma os tradicionais teclados baseados botões físicos (hardware).
Com esta nova forma de digitar textos, percebe-se que um público especial de
usuários está sendo ignorada, são as pessoas cegas ou com baixa visão (Blind and
Visual Impaired People - BVI).
A Organização Mundial da Saúde (HEALTH, 2013) estima que existam 285
milhões de pessoas no mundo que convivem com problemas de visão e destes 39
milhões são totalmente cegas. Pesquisadores ao redor do mundo desenvolvem métodos
e processos para a criação de produtos eletrônicos e softwares com o objetivo de prover
autonomia para os BVI’s realizarem tarefas nesses produtos.
A cegueira total é caracterizada pela ausência total da percepção visual ou com
alguma percepção luminosa e prejudica a visão dos portadores desta anomalia genética.
A doença pode ser adquirida ao longo da vida por anormalidades, lesões, ações
intencionais ou doenças ou ainda nascer com essa anomalia. Em ambos os casos
interfere para o exercício de muitas tarefas comuns do cotidiano.
A motivação para o desenvolvimento do projeto considerou o fato do aumento
significativo da presença de smartphones na população BVI, tornando necessário o
desenvolvimento de soluções que possam contribuir para minimizar os problemas de
acessibilidade.
Em algumas situações cotidianas, não é possível que o usuário utilize o speech
to text para escrever textos em tablets e smartphones. Em salas de cinema, bibliotecas
ou em outros espaços públicos em que o silencio seja fundamental, por exemplo, é
impossível enviar um comando de voz ao dispositivo, pois uma ação desse tipo
despertaria atenção e incomodaria as pessoas ao redor, além de não permitir a
privacidade. Um outro exemplo, em ambientes com muito ruído pode ocorrer do
sistema de reconhecimento de voz ser incapaz de reconhecer o comando.
Pensando nos cenários apresentados, o objetivo desta pesquisa é o
desenvolvimento de uma solução econômica que proporcionasse ao BVI interagir com
dispositivos móveis de forma autônoma e privada.
O foco deste trabalho é apresentar uma solução alternativa que permita aos
BVI’s, utilizarem e interagirem com tablets e smartphones que possuem somente telas
touch screen e teclado virtual em ambientes na qual o reconhecimento de fala não pode
ser utilizado, proporcionando privacidade para o usuário.
2. Os telefones celulares inteligentes
Os telefones celulares inteligentes (smartphone) são a evolução dos antigos
aparelhos de telefones celulares, que com a evolução, além de realizar as funções
tradicionais de telefonia, como efetuar ligações, armazenar dados de agenda e receber
mensagens curtas (SMS), passaram então a integrar funções antes disponíveis apenas
em computadores pessoais e notebooks.
Atualmente podem ser utilizados para navegar na internet, jogar, ouvir música,
assistir vídeos, tirar fotos, filmar, armazenar dados, entre tantas outras opções de
utilização.
No momento ainda não podem substituir totalmente computadores pessoais,
devido ao seu processamento ser inferior, entretanto houve uma evolução considerável
em seu hardware, e isso possibilitou que inúmeras funções pudessem ser incorporadas e
dentre elas se destacam, o processamento de imagens, cálculos numéricos e sintetização
de voz.
Para realizar qualquer função, todo smartphone é controlado por um sistema
operacional (SO), no momento, é liderado pelo SO Android desenvolvido pela Open
Handset Alliance, baseado no Kernel do SO Linux.
Segundo a pesquisa do IDC (MEULEN e RIVERA, 2013), indica que as vendas
de smartphone em 2013 cresceram 45,8% comparado ao 3º quartil de 2013, chegando
ao total de vendas de 250 milhões de aparelhos e com a continuidade na liderança do
SO Android com mais de 81% de market share, seguido pelo iOs da companhia Apple
com 12,1%.
Dos fabricantes de telefones celulares, a companhia Coreana Samsung lidera as
vendas com 117 milhões de aparelhos vendidos, de um mercado com mais 455 milhões
de celulares.
O SO Android se popularizou por ser uma plataforma open source, com código
aberto e rapidamente começou a se tornar nativo além dos smartphones, em tablets e
outros tipos de dispositivos, como o Google TV e Android mini PC, Google Eyes.
Os smartphones tornaram-se também sistemas ubíquos, sendo fabricados com
sensores e que quando programados isoladamente ou em conjunto podem realizar
muitas funções de acordo com a criatividade do desenvolvedor.
2. Trabalhos correlatos
A interação com dispositivos touch screen apresenta vários desafios, aliado aos
fatores limitantes desse grupo de usuário. Alguns comandos são extremamente
complexos de serem realizados. A interface carece da falta de padronização por parte
dos desenvolvedores de hardware ou de software e o tamanho da tela de touch screen
varia conforme a resolução desejada pelo fabricante.
O tema de usabilidade para dispositivos de touch screen não é recente e há muito
tempo é discutido na área de interação homem-computador.
Já a usabilidade de um smartphone com telas touch screen para o uso da
comunidade BVI tem sido discutida na comunidade acadêmica e pode-se observar que:
Em pesquisa sobre as preferencias da comunidade BVI no uso de interface touch
screen (KANE, WOBBROCK e LADNER, 2011) as conclusões são que esse público
prefere criar seus próprios gestos na tela, memorizar o movimento para identificar
funções do dispositivo.
Pesquisas anteriores (SOUTHERN, CLAWSON e FREY, 2012) e (MASCETTI,
BERNAREGGI e BELOTTI, [S.d.]) propuseram transformar a tela touch screen de um
dipositivo Android em um teclado Braile. A ideia foi utilizar tela touch screen e um
software que realiza a contagem dos dedos que pressionam a tela e enviar o comando
desejado ao dispositivo. No entanto essa configuração não permitiu que o usuário
soubesse a orientação da tela ou posicionasse com precisão os dedos sobre a tela.
Em projeto de pesquisa liderada pela Google e desenvolvedores Android, cujo
tema de pesquisa é a usabilidade e interação de dispositivos móveis, alguns sistemas já
foram lançados e podem ser acessados pelo portal Google Play gratuitamente
(GOOGLE, 2014). No entanto, métodos de substituição do teclado baseado em software
ainda não foram desenvolvidos.
Projeto desenvolvido na França propõe o uso de uma capa de silicone com furos
sobre o teclado baseado em software para ser utilizado como referência para a inserção
de textos (TELORION, 2014). No entanto, ao observar o produto, percebe-se que por
utilizar o teclado virtual com 12 teclas, existe a necessidade da troca de tela para utilizar
letras e símbolos, o que pode ser um pouco dificultoso ao usuário BVI. O valor do
software é anunciado no site do desenvolvedor por 260 libras. O valor da capa não é
anunciado, somente o conjunto compostos por capa, smartphone e software é vendido
por 500 libras.
Existe um smartphone mundial desenvolvido para o público BVI (RAY, 2014).
O valor de comercialização para o modelo Ray G510 é de U$ 650,00. Este dispositivo,
no entanto não possui teclado físico. Funciona somente com a tecnologia de
reconhecimento de voz.
3. Processo de desenvolvimento
Para o desenvolvimento da solução, criou-se um grupo formativo voluntário
com 30 BVI’s usuários de smartphones na Região Metropolitana de Campinas, no
Estado de São Paulo. O nosso principal foco foi identificar quais são os principais
aplicativos que utilizam no dia a dia em seus smartphones.
Afirmaram que utilizam com frequência para a função de telefonia (100%),
verificar o histórico de ligações efetuadas e recebidas (80%), audição audiobooks e
música (80%), envio de mensagens (60%), data e hora atual (60%), calendário (50%),
alarme (50%) e internet (30%).
Os usuários interagem com o aparelho com os métodos de acessibilidade
disponibilizados pelo desenvolvedor do sistema operacional, geralmente por comando
de voz. Relataram que a maior dificuldade é introduzir textos, devido ao fato de
comandos e reconhecimento de voz requerer a conexão com a Internet e
consequentemente a durabilidade da carga da bateria diminuir rapidamente, exigindo
recarga diária.
Outro problema relatado é que em certas situações, quando o reconhecimento de
voz falha, não sabem se o comando foi executado com sucesso e ainda que o
reconhecimento de voz reduz a privacidade uma vez que em ambientes públicos,
precisam falar em voz alta os comandos desejados.
Perguntados sob a não utilização de outras funções disponíveis nesses
dispositivos, estes informaram que devido a dificuldade de identificar os ícones
correspondentes as funções desejadas é um grande empecilho.
A proposta dessa pesquisa consiste de um dispositivo de fácil implementação e
que permita que o BVI possa operar um dispositivo móvel sem a presença de teclado
baseado em hardware e que possa ser produzida de modo fácil devido a grande
variedade de modelos disponíveis atualmente.
O principal problema para o desenvolvimento do produto HardKey, foi
inicialmente encontrar uma solução econômica que proporcionasse aos dispositivos que
não possuem teclados baseados em hardware pudessem ser utilizados pelo público BVI,
facilitando a acessibilidade desses usuários.
Desta forma, a solução encontrada foi utilizar uma película feita com material
com boa aderência eletrostática, que além de proteger o smartphone contra impactos
proporciona a interação com dispositivos táteis.
A solução com o uso de uma película permite que se desenvolva de forma
econômica para os mais variados tamanhos de telas disponíveis nos smartphones atuais.
A película conta com o alfabeto Braile em relevo. O relevo é transferido à
película por uma matriz e prensada a vácuo.
O relevo por sua vez permite que o usuário localize na tela a letra
correspondente no alfabeto Braile e então interaja com o dispositivo através de um
software especialmente desenvolvido para essa finalidade e que será distribuído no
portal Google Play de forma gratuita e o seu código fonte distribuído sob a licença GPL,
permitindo que a comunidade de desenvolvedores ao redor do mundo possam contribuir
para a melhoria do sistema..
4. Funcionamento da película
A seguir é apresentado o funcionamento da película e do sistema desenvolvido e
a forma de interação com o sistema.
Ao inicializar o sistema HardKey, que se dará por comando de voz, o usuário
passa a ter a tela conforme a figura 1. A película deverá estar sobreposta a tela touch
screen.
O insert button enquanto pressionado desabilita todas as funções de touch
screen, e justificamos a inserção deste botão aliado ao fato que as telas são sensíveis ao
toque e enquanto o usuário localiza o botão correspondente, acidentalmente pode tocar
em botões que não deseja devido a sensibilidade da tela. A tecla só poderá ser habilitada
quando for pressionado o INSERT BUTTON.
Ao pressionar a tecla o sistema emitirá um aviso sonoro ou vibração, para que o
usuário possa identificar a tecla pressionada. Por exemplo, se a tecla correspondente a
letra “a” for pressionada, será emitido um áudio que falará o nome da tecla. Para isso
será utilizado o método Text to Speech, que sintetiza a fala e é nativo nos dispositivos
Android. O modo de síntese de voz ou vibração será escolhido pelo usuário na
configuração do aplicativo.
Um segundo grupo de teclas corresponde às letras e números do alfabeto Braile
e foram posicionadas em grupos verticais e horizontais, totalizando uma matriz de 35
teclas.
No terceiro grupo estão as teclas correspondentes ao espaço, backspace e enter,
permitindo a edição de textos.
No quarto grupo foram inseridas 4 teclas de atalho rápido, correspondente as
funções mais utilizadas pelos BVI’s, a saber: realizar ligação telefônica, acessar a
agenda telefônica, verificar a hora atual e acesso as mensagens SMS.
O desenvolvimento do aplicativo será em forma de gadget e será inicializado
simultaneamente com o sistema operacional Android.
Figure 1. Design conceitual do Hard Key. Fonte: autores.
5. Testes e resultados
Os testes iniciais foram realizados em 3 smartphones, sendo os modelos
Samsung Glaxy Duos, L&G Nexus IV e Samsung S-IV.
Foram realizados testes mecânicos na película para verificar o funcionamento, a
sensibilidade e o ajuste da sobreposição sobre a tela touch screen.
Testou se ainda o funcionamento de acionamento das respectivas teclas e a
interação com o Text to Speech. Houve um acerto de 100% das teclas pressionadas.
Percebe-se que dependendo do tamanho da tela do dispositivo as teclas se
tornam minúsculas e que as telas com dimensões superiores a 5 polegadas apresentam
maior precisão para o acionamento das teclas.
Os resultados apresentados motivam para a continuidade do projeto.
6. Conclusão
Neste trabalho, apresentou-se pesquisas relacionadas para um modelo de teclado
físico de baixo custo para utilização em dispositivos com sistema Android com o
objetivo de proporcionar a comunidade BVI uma maior interação na utilização de um
smartphone com autonomia.
Foram apresentados os métodos e materiais utilizados para o desenvolvimento
do protótipo e os resultados obtidos e concluem que o objetivo apresentado foi
alcançado com sucesso.
Os autores enfatizam que este processo de desenvolvimento será distribuído sob
a licença GPL.
Para a continuidade do projeto, será realizada uma pesquisa aplicada, com a
participação do público BVI e serão observadas as dificuldades e facilidades de
operação do sistema e na sequência a realização de ajustes para o lançamento do
aplicativo.
References
GOOGLE. Eyes-Free.
HEALTH, W. O. Visual impairment and blindness. Disponível em:
<http://www.who.int/mediacentre/factsheets/fs282/en/>. Acesso em: 20 jan. 2014.
KANE, S. K.;; WOBBROCK, J. O. e LADNER, R. E. Usable Gestures for Blind
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MASCETTI, S.;; BERNAREGGI, C. e BELOTTI, M. TypeInBraille : Quick Eyes-Free
Typing on Smartphones . n. c, [S.d.].
MEULEN, R. Van der e RIVERA, J. Gartner Says Smartphone Sales Accounted for 55
Percent of Overall Mobile Phone Sales in Third Quarter of 2013. Disponível em:
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Disponível em: <http://www.project-ray.com>. Acesso em: 30 maio. 2014.
SOUTHERN, C.;; CLAWSON, J. e FREY, B. An Evaluation of BrailleTouch : Mobile
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2014.