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Anais do
XIII Seminário Nacional de Formação de
Professores para o Ensino Religioso
___________________________________
13ª Edição
FONAPER
Florianópolis/SC
2015
XIII Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino
Religioso,realizado entre os dias 06 a 08 de novembro de 2014,
no CENTUR, em Belém/PA.
© 2015 FONAPER – Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso
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Copyright dos textos: dos autores
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(FONAPER); Maria José da Silva Lopes (FONAPER); Maria José Torres Holmes (FONAPER);
Josiane Cruzaro (FONAPER); Simone Riske-Koch (FONAPER); Rosilene Pacheco Quaresma
(UEPA); Iolanda Rodrigues da Costa (UEPA); Edina Fialho Machado (UEPA); Rodrigo Oliveira
dos Santos (ACREPA); Alex Coimbra Sales (SEDUC); Maria Cristina (CACIR/UEPA); Juscelio
Pantoja (CACIR/UEPA); Debora Samara Dias (UEPA); Debora Corrêa (UEPA); Marllon Ramos
(CACIR/UEPA); Thiago Borges (CACIR/UEPA); Manoel Vitor Neto (CACIR/UEPA);Rafael
Monteiro (CACIR/UEPA); Tony Vilhena (Comitê Interreligioso do Estado do Pará).
Comissão Científica
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Douglas Rodrigues da Conceição (UEPA); Dr. Christian Muleka (UFMS); Dr. Edivaldo José
Bortoleto (Unochapecó); Dr. Eduardo Gusmão de Quadros (PUC-GO); Dr. Fabrício Possebon
(UFPB); Dr. Frederico Pieper Pires (UFJF); Dra. Glória Escarião (UFPB); Dra. Irene de Araújo
Van Den Berg (UERN); Dr. João Bosco Filho (UERN); Dr. José Carlos da Silva (USJ); Dr. José
Mário Méndez Méndez (UNA – Costa Rica); Dr. Luiz José Dietrich (PUC-PR); Dr. José
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(FURB); Dr. Lourival José Martins Filho (UDESC); Dr. Lusival Antônio Barcelos (UFPB); Dr.
Manoel Ribeiro de Moraes Junior (UEPA); Dr. Marcos Rodrigues da Silva (FURB); Dra. Marga
Janete Ströher (SDH/PR); Dr. Remí Klein (Faculdades EST); Dra. Rosa Gitana Krob
Meneghetti (UNIMEP); Dr. Tarcísio Alfonso Wickert (FURB); Me. Admilson Eustáquio Prates
(Unimontes); Me. Antônio Paraense da Paixão (UEPA); Me. Elcio Cecchetti (UFSC); Me.
Gilberto Oliari (Unochapecó); Me. José Antonio Mangoni (UEPA).
Organização dos Anais: Simone Riske-Koch; Josiane Crusaro; Ediana M. Finatto
Produção dos Anais do XIII Seminário Nacional de Formação de Professores para o
Ensino Religioso
Dados Técnicos:
Título: Anais do XIII Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Organização: Simone Riske-Koch; Josiane Crusaro; Ediana M. Finatto
Editora/Autor corporativo: FONAPER Cidade: Florianópolis Ano: 2015 Volume: 13
Páginas: 938
ISSN: 2447-7850
Editoração Eletrônica: Simone Riske-Koch
Revisão Final: Simone Riske-Koch; Adecir Pozzer
Como citar um texto nos Anais do XIIISEFOPER:
SOBRENOME, Nome. Título da Comunicação. In: XIII Seminário Nacional de Formação de
Professores para o Ensino Religioso, 12., 2014, Belém/ PA. Anais do XIII Seminário Nacional
de Formação de Professores para o Ensino Religioso. Organizado por Simone Riske-Koch;
Josiane Crusaro e Ediana M. Finatto. Florianópolis: FONAPER, v. 13, 2015. página inicial página final.
(Online) ISSN: 2447-7850
____________________________________________________________________________
A correta menção às fontes, em termos de honestidade intelectual, a coerência às normas da
ABNTe revisão textual são de responsabilidade dos autores e das autoras dos textos.
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO .......................................................................................................................... 14
PROGRAMAÇÃO ......................................................................................................................... 19
COMUNICAÇÕES ......................................................................................................................... 20
GT1: INTERFACE ENTRE CIÊNCIAS DA(S) RELIGIÃO(ÕES) E O ENSINO
RELIGIOSO ................................................................................................................ 21
O ENSINO RELIGIOSO E SEU OBJETO: O FENÔMENO RELIGIOSO ............................................... 22
Elisa Rodrigues
RACIONAL E IRRACIONAL E SUAS RELAÇÕES EM O SAGRADO DE RUDOLF OTTO ...................... 30
Frederico Pieper
PROJETO RECICLART UEPA: PROMOVENDO PRÁTICAS SUSTENTÁVEIS ATRAVÉS DA
ESPIRITUALIDADE DESENVOLVIDA NA FORMAÇÃO DO PROFESSOR DO ENSINO RELIGIOSO .... 41
Ariane Caldas
O PROFESSOR DE ENSINO RELIGIOSO ......................................................................................... 54
Jéssica Kerolaine dos Santos Sousa; Stepheny Jennf Araújo Rahan
LUSOFONIA AMAZÔNICA: O CIENTISTA DA RELIGIÃO COMO PESQUISADOR-LICENCIADO ....... 65
Kellen Irene Rabelo Borges; Rafaela Da Silva Figueiredo
O ENSINO RELIGIOSO NA ESCOLA: PROPOSTAS FRENTE AO ESTADO LAICO .............................. 79
Thalisson Pinto Trindade de Lacerda; Camilo de Lélis Diniz de Farias
A RELIGIÃO NO BRASIL E SUAS INFERÊNCIAS NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA ..................... 90
Wellington Oliveira dos Reis
GT2: INTERCULTURALIDADE, CIÊNCIAS DA(S) RELIGIÃO(ÕES) E ENSINO
RELIGIOSO .............................................................................................................. 108
DEBATES SOBRE CIÊNCIAS DA RELIGIÃO, ENSINO RELIGIOSO, DIVERSIDADE E PLURALISMO
RELIGIOSO NA ESCOLA DE APLICAÇÃO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ (EA-UFPA) ...... 109
Devison Amorim do Nascimento; Silvia Danielle da Cunha Smith; Maria Divanete Sousa da Silva
Vera Lúcia da Rocha Pereira
ÁFRICA, BERÇO DA CIVILIZAÇÃO: O DESAFIO DA NOVA PROPOSTA EPISTEMOLÓGICA,
ANTROPOLÓGICA E SÓCIO-HISTÓRICA PARA EDUCAÇÃO ........................................................ 127
George Alexandre Barbosa de Vasconcelos; José Augusto Oliveira Dias
O ENSINO RELIGIOSO E RELIGIÕES AFRO-BRASILEIRAS ............................................................ 140
José Carlos do N. Santos
UNIVERSIDADE E POVOS INDÍGENAS: A EXPERIÊNCIA DA LICENCIATURAS INTERCULTURAL
PARA A FORMAÇÃO DE PROFISSIONAIS PARA A EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA .................. 155
Leonel Piovezana; Teresa Machado da Silva Dill; Henrique Kujawa
ANTÔNIO CONSELHEIRO D’OS SERTÕES: UM DIÁLOGO ENTRE A LITERATURA E O ELEMENTO
RELIGIOSO ................................................................................................................................. 167
Lucinéia Maria Confalonieri Bertoldi
COMO É O PAPAI DO CÉU?: O SAGRADO SOB A ÓTICA DE CRIANÇAS NA PRÉ-ESCOLA ........... 179
Antonio Jorge Paraense da Paixão; Luiza Romeu da Silva Veloso da Costa; Maria de Lourdes
Santos Melo
A CONTRIBUIÇÃO DA EDUCAÇÃO POPULAR NA ABORDAGEM INTERCULTURAL DAS CIÊNCIAS
DAS RELIGIÕES NO ENSINO RELIGIOSO..................................................................................... 196
Mirinalda Alves Rodrigues dos Santos; Marinilson Barbosa da Silva
O ENSINO RELIGIOSO NA ESCOLA PÚBLICA: ALIENAÇÃO OU LIBERTAÇÃO? ............................ 207
Ocivaldo Lima Souza; Denise Simões Rodrigues
DIVERSIDADE CULTURAL E RELIGIOSA NA EDUCAÇÃO: SUAS FACES E SEUS SIGNIFICADOS NA
FORMAÇÃO DO EDUCANDO ..................................................................................................... 222
Rosângela da Silva Gomes
MANIFESTAÇÃO DO FENÔMENO RELIGIOSO PRESENTE EM FILMES INFANTIS........................ 233
Elizabeth de Fátima Oliveira Matos; Maria de Lourdes Silva Santos
O ENSINO RELIGIOSO NA ESCOLA PÚBLICA NA PERSPECTIVA DOS PROFESSORES .................. 250
Maria Lúcia Gomes Figueira de Melo; Rosália Leite de Medeiros
O USO DAS REPRESENTAÇÕES SIMBÓLICAS NA DIVERSIDADE RELIGIOSA ............................... 267
Tânia Mª da S. Rodrigues
GT3: FORMAÇÃO INICIAL E CONTINUADA PARA O ENSINO RELIGIOSO ........ 278
A FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE ENSINO RELIGIOSO NO PARFOR DA UNOCHAPECÓ ........ 279
Ediana M. M. Finatto; Gilberto Oliari
EXPERIÊNCIA INÉDITA NO ESTADO DO ACRE DE MODELO DE FORMAÇÃO CONTINUADA PARA
O ENSINO RELIGIOSO ................................................................................................................ 289
Cid Mauro Araujo de Oliveira; Elaine Costa Honorato
FORMAÇÃOCONTINUADA: O ENSINO RELIGIOSO E AS INTERFACES COM A EDUCAÇÃO
AMBIENTAL, AS RELAÇÕES ÉTNICO RACIAIS E A DIVERSIDADE SEXUAL ................................... 304
Eliane Maura Littig Milhomem de Freitas
ENSINO RELIGIOSO E FORMAÇÃO DOCENTE: RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA NA PERSPECTIVA
DE UMA FORMAÇÃO CONTINUADA NA REGIONAL DE SLO - PARFOR ..................................... 318
Eliane Ludwig; Josiane Crusaro Simoni; Rosinei Pedrotti Ferrari
O ENSINO RELIGIOSO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: UMA PERSPECTIVA ECUMÊNICA.................. 329
Glauciene Dias de Araújo
AS TRAJETÓRIAS E EXPERIÊNCIAS DE PROFESSORES DE ENSINO RELIGIOSO EM NATAL AO
LONGO DAS ÚLTIMAS DÉCADAS – NOVAS MEMÓRIAS ............................................................ 341
Jamillis Keila; Araceli Sobreira Benevides; Joelita Farias Silva Lodi
A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE ENSINO RELIGIOSO: CONSIDERAÇÕES SOBRE A
INTERPRETAÇÃO DAS VIVÊNCIAS RELIGIOSAS NO PROCESSO EDUCATIVO.............................. 359
Marcos Porto Freitas da Rocha; José Geraldo da Rocha; Jacqueline de Cássia Pinheiro Lima;
Cleonice Puggian;
O PERFIL DO PROFESSOR DE ENSINO RELIGIOSO DO ESTADO DO PARÁ .................................. 369
Maria de Lourdes Silva Santos; Iolanda Rodrigues da Costa; Rosilene Pacheco Quaresma; Iris
Larisse de Aguiar
CICLO DE VIDA DA CARREIRA PROFISSIONAL DE PROFESSORES (AS) DO ENSINO RELIGIOSO DA
CIDADE DE JOÃO PESSOA-PB .................................................................................................... 377
Narjara Lins de Araújo; Marinilson Barbosa Silva
ENSINO RELIGIOSO CONFESSIONAL: NARRATIVAS DISCENTES E PRÁTICAS DOCENTES ........... 392
Raimundo Márcio Mota de Castro
ENSINO RELIGIOSO EM PERNAMBUCO: ABORDAGEM E POSSIBILIDADES PARA OS DOCENTES
DA REDE ESTADUAL NAS CIÊNCIAS DA RELIGIÃO ..................................................................... 405
Rosalia Soares de Sousa; Wellcherline Miranda Lima
O ENSINO DE FUNÇÃO E VALORES DA TRADIÇÃO RELIGIOSA NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES
DE ER: SEIS CONSTITUINTES DA RELIGIÃO EM UMA SENTENÇA............................................... 418
Sidney Allessandro da Cunha Damasceno; Eunice Simões Lins Gomes
GT4: CURRÍCULO DO ENSINO RELIGIOSO .......................................................... 430
UMA REFLEXÃO SOBRE O ENSINO RELIGIOSO COMO COMPONENTE CURRICULAR NO ESTADO
DO ACRE .................................................................................................................................... 431
Elaine Costa Honorato; Luciete Basto de Andrade Albuquerque; Cid Mauro Araújo de Oliveira
REFLEXÕES SOBRE OS CONTEÚDOS DO ENSINO RELIGIOSO .................................................... 442
Maria José T. Holmes; Ieda de O. Caminha; Jailson da Silva
CIÊNCIAS DA RELIGIÃO E ENSINO RELIGIOSO NA REGIÃO NORTE: O QUE E COMO ENSINAR? 460
Rodrigo Oliveira dos Santos
UM ESTUDO DE CASO SOBRE O TRABALHO REALIZADO NA DISCIPLINA TEOLOGIA E CULTURA
NA UNIMEP: O TRATAMENTO PEDAGÓGICO DO CONCEITO DE CIÊNCIA DA RELIGIÃO........... 467
Rosa Gitana Krob Meneghetti
INTOLERÂNCIA RELIGIOSA REPÕE PRÁTICAS OBSCURANTISTAS NA ESCOLA E INTERFERE NO
PROCESSO DE ENSINO APRENDIZAGEM ................................................................................... 477
Tania Alice de Oliveira
CURRÍCULO E ENSINO RELIGIOSO: NO INTRAMUROS DA ESCOLA ........................................... 487
Gleyds Silva Domingues
SÍMBOLOS RELIGIOSOS
Ibrahim Cardoso ; Nadir de Jesus
GT5: FUNDAMENTOS EPISTEMOLÓGICOS DO ENSINO RELIGIOSO ................ 510
A IMPORTÂNCIA DOS MEDIEVAIS E DA SEMIÓTICA NO PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DOS
CAMINHOS CONCEITUAIS DA CIÊNCIA DA RELIGIÃO E DO ENSINO RELIGIOSO ....................... 511
Edivaldo José Bortoleto; Rosa Gitana Krob Meneghetti
TEOLOGIA E MITOLOGIA GREGA E CRISTÃ NA CULTURA JAPONESA ........................................ 528
Elton Nascimento Moreira da Silva; Carlos Henrique Corrêa Assunção
DA RELAÇÃO COM O FUNDAMENTO E O SABER: ELEMENTOS PARA A EPISTEMOLOGIA DO
ENSINO RELIGIOSO .................................................................................................................... 538
Wellcherline Miranda Lima
GT6: METODOLOGIAS DO ENSINO RELIGIOSO .................................................. 551
RELIGIOSIDADE AFRO-BRASILEIRA E ENCAMINHAMENTOS METODOLÓGICOS NO ENSINO
RELIGIOSO ................................................................................................................................. 552
Alysson Brabo Antero; Maria de Nazaré Fonseca de Senna Pereira
PROJETO CATADOR DE PAPEL: “SUSTENTÁVEL SEJA A MINHA FÉ E O CUIDADO COM O MUNDO
EM QUE VIVO”........................................................................................................................... 564
Patrícia Maria de Sena Soares
ENSINO RELIGIOSO E OS DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS: NECESSIDADE DE NOVOS OLHARES
................................................................................................................................................... 572
Elisângela Madeira Coelho
O ENSINO RELIGIOSO E OS JOGOS DE INTERPRETAR: RELATO DE UMA EXPERIENCIA DE JOGO
................................................................................................................................................... 582
Edilson Borges Vulcao
LETRAMENTO LITERÁRIO A PARTIR DE RICARDO AZEVEDO: OS CONTOS DE ENGANAR A MORTE EM
AULAS DE ENSINO RELIGIOSO DO ENSINO FUNDAMENTAL I....................................................... 591
Francisco Melquíades Falcão Leal; Ana Carla Oliveira Nascimento; Carlos Alberto Peixoto de
Paula; Priscila Fernandes da Costa; Rozélia Maria do Nascimento; Layane Karla da Silva Santos
AFROQUIZ: PERGUNTAS OU RESPOSTAS? ................................................................................ 603
Gézika dos Anjos Ferreira; Elisa Sofia Angelim da Silva dos Santos
RELIGIOSIDADE AFRO-BRASILEIRA: DESAFIOS DO ENSINO RELIGIOSO EM UMA ESCOLA
CATÓLICA................................................................................................................................... 609
Alex Coimbra Sales; Orivaldo José Soeiro Silva
UMA CONSTRUÇÃO METODOLÓGICA PARA O ENSINO RELIGIOSO: O MITO DO ROUBO DO
MJIÖLLNIR DE THOR .................................................................................................................. 620
Ana Paula de Lima Soares Barros; Dione Maria; Flávia Gomes da Silva; Hugo Nascimento;
Rosiane Paulo;Themis Mello
LETRAMENTO LITERÁRIO NA FORMAÇÃO DISCENTE DE ENSINO RELIGIOSO: O FILME A MÚMIA
................................................................................................................................................... 632
André Lima Souza; Francinete Alves de Medeiros; Francisca Luciene da Silva;Jamiry Rosiely de
Mesquita; João Barbosa Neto; Maria de Fátima Araújo
ENSINO RELIGIOSO: O QUE ENSINAR? COMO ENSINAR? ......................................................... 642
CINEMA E ESPIRITUALIDADE, O ASPECTO MÁGICO-REALISTA NO FILME UM HOMEM SÉRIO 652
Andreza Silva Santos; Eliane da Conceição; José Marcos Araújo Lima
O NOÉ DILUVIANO EM CONTOS DE MACHADO DE ASSIS E MIGUEL TORGA – PERSPECTIVAS
PARA O LETRAMENTO LITERÁRIO EM AULAS DE ENSINO RELIGIOSO ...................................... 664
Araceli Sobreira Benevides
A POESIA DE PATATIVA DO ASSARÉ: AS CONTRIBUIÇÕES PARA O LETRAMENTO LITERÁRIO NO
ENSINO RELIGIOSO .................................................................................................................... 675
Cintia Eliziário de Barros; Cícero Alves; Paulo Henrique Bezerra; Lívia Cristiana Costa Martins;
Wesley Henrique Soares Silva; Francisco de Assis Lopes
ABORDAGEM DOS CONCEITOS DE TOLERÂNCIA E DIÁLOGO INTER-RELIGIOSO UTILIZANDO A
METODOLOGIA DE EXIBIÇÃO DE FILMES: UMA ANÁLISE DE AS AVENTURAS DE PI. ................ 687
Giovana dos Anjos Ferreira; Tony Welliton da Silva Vilhena
IMAGENS MÍTICAS NAS AULAS DE ENSINO RELIGIOSO ............................................................ 697
Gizêlda da S. Rodrigues; Ilza Felix Pereira; Tânia Mª da S. Rodrigues
JOGAR, BRINCAR E APRENDER: JOGOS E BRINCADEIRAS COMO INSTRUMENTOS
METODOLÓGICOS PARA O ENSINO RELIGIOSO ........................................................................ 708
Juscelio Mauro Pantoja; Iris Larisse Aguiar; Larissa Souza Nascimento; Paulo Henrique Gomes
Nunes
O USO DO DOCUMENTÁRIO E DA FICÇÃO NAS AULAS DE ENSINO RELIGIOSO ........................ 719
Lilian Bento de Souza Silva;Andrea Cardoso Sobreira
ANIMES COMO FERRAMENTA DO PROFESSOR DE ENSINO RELIGIOSO ................................... 733
Manoel Vitor Barbosa Neto; Daniel Wirland Ferreira dos Santos; Keven Silva Magalhães
RESSIGNIFICAÇÃO DO MITO INDÍGENA “CUMADRE FULORZINHA”: UMA PROPOSTA AUDIOVISUAL PARA AS AULAS DO ENSINO RELIGIOSO ....................................................................... 743
Narjara Lins de Araújo
A RELAÇÃO ENTRE A EDUCAÇÃO BIOCÊNTRICA E O ENSINO RELIGIOSO NO CAMPO DA
INCLUSÃO .................................................................................................................................. 753
Simone Simões da Cruz
DO CONCÍLIO VATICANO II AO ESTUDO EPISTEMOLÓGICO DAS CIÊNCIAS DAS RELIGIÕES: OS
DISCURSOS DOCENTES SOBRE OS MÉTODOS UTILIZADOS NO ENSINO RELIGIOSO NO RIO
GRANDE DO NORTE................................................................................................................... 765
Valdicley Euflausino da Silva; Araceli Sobreira Benevides
OLIMPÍADAS DE ENSINO RELIGIOSO ......................................................................................... 776
Marcus Vinicius Leão Azevedo de Sena
GT7: DIREITOS HUMANOS E DIVERSIDADE CULTURAL RELIGIOSA ............... 780
ENTRE O LEGAL E O REAL: CAMINHOS NORMATIVOS E EPISTEMOLÓGICOS PARA O ENSINO DAS
RELIGIÕES AFRO-BRASILEIRAS NA ESCOLA NUMA PERSPECTIVA INCLUSIVA DE EDUCAÇÃO
PARA TODOS ............................................................................................................................. 781
Ana Cristina de Almeida Cavalcante Bastos; Glória das Neves Dutra Escarião
IGREJA CATÓLICA NO PROCESSO DE LUTA SOCIAL DAS MULHERES DO BAIRRO DJARD VIEIRA
NA CIDADE DE PARINTINS (1980-1990) .................................................................................... 796
Dayanna Batista Apolônio; Arcângelo da Silva Ferreira
A RELIGIOSIDADE DOS INDÍGENAS TABAJARA DA PARAÍBA ..................................................... 812
Eliane Farias; Lusival Barcellos
A VIOLAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS CONSTITUINDO A VIOLÊNCIA DE GÊNERO A PARTIR DA
RELIGIÃO ................................................................................................................................... 827
Jamile Santos da Silva; Marily Martins de Lima
A INTERSECÇÃO DO PODER RELIGIOSO E POLÍTICO: UMA LEITURA A PARTIR DE UM
MOVIMENTO PENTECOSTAL NO ESTADO DE SANTA CATARINA/BRASIL – IEAD ...................... 837
Josué de Souza
ENSINO RELIGIOSO: SABERES DOCENTES E RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS .................................. 852
Luis Augusto Barbosa Teixeira; Júlia Gabriela Leão Monteiro
ENSINO RELIGIOSO: POSSIBILIDADE DE DIÁLOGO INTER-RELIGIOSO ....................................... 863
Walber Rodrigues da Silva
O LUGAR DA RELIGIÃO NA(S) ADOLESCÊNCIA(S) ...................................................................... 878
Rodrigo Bruno de Sousa
DIREITOS HUMANOS, DIVERSIDADE CULTURAL RELIGIOSA E BEM VIVER: PRESENÇAS E
AUSÊNCIAS NA CONSTRUÇÃO DE UMA OUTRA CONCEPÇÃO DE DESENVOLVIMENTO ........... 893
Raquel Riffel,Lilian Blanck de Oliveira
DIVERSIDADE RELIGIOSA: (In)Visibilidade na sala de aula ....................................................... 909
Fernanda Santos do Nascimento; Amurabi Pereira de Oliveira
PÔSTERES .................................................................................................................................. 924
O SIGNIFICADO RELIGIOSO DA CAPELA DE NOSSA SENHORA DAS GRAÇAS NA IGREJA DA SÉ, EM
BELÉM DO PARÁ ....................................................................................................................... 925
“POR NÓS TU SERÁS INESQUECIDO”: IDENTIDADE CATÓLICA E PRODUÇÃO DA MEMÓRIA NO
COLÉGIO NOSSA SENHORA DO CARMO, EM PARINTINS .......................................................... 925
PROJETO A DIVERSIDADE DO SABER: SÍMBOLOS RELIGIOSOS ................................................. 926
IMPLANTAÇÃO DA DISCIPLINA DE ENSINO RELIGIOSO NA ESCOLA MUNICIPAL JOANA
FORTUNATO: UMA PERCEPÇÃO DA REALIDADE DO 5º ANO .................................................... 926
“BRINCAR, JOGAR E APRENDER: PROPOSTA DE INSTRUMENTOS METODOLÓGICOS PARA O
ENSINO RELIGIOSO” .................................................................................................................. 927
TRABALHANDO AS RELIGIÕES DE MATRIZ AFRICANA EM SALA DE AULA ................................ 927
A COMUNIDADE ISKCON (HARE KRISHNA): A ALIMENTAÇÃO LACTO-VEGETARIANA E A
TRANSCEDÊNCIA DA ALMA ....................................................................................................... 928
OS SEGREDOS SAGRADOS PRESENTES NAS ERVAS E PLANTAS DA AMAZÔNIA ....................... 928
RITOS RELIGIOSOS AFRICANOS – ENSINO FUNDAMENTAL ...................................................... 929
ENSINO RELIGIOSO E ENTRETENIMENTO: ANIMES E MANGÁS COMO FERRAMENTA DE ENSINO
................................................................................................................................................... 930
A LUDICIDADE DOS SÍMBOLOS RELIGIOSOS NO RELINCE ......................................................... 930
AFROQUIZ: PERGUNTAS OU RESPOSTAS? ................................................................................ 931
GRUPO JOVEM RELIGIOSO ........................................................................................................ 931
CULTURA INDÍGENA E IDENTIDADE RELIGIOSA EM SALA DE AULA .......................................... 931
O ENSINO RELIGIOSO EM PARINTINS (AM): REFLEXÕES SOBRE A FORMAÇÃO E A PRÁTICA
DOCENTE EM DUAS ESCOLAS DE EDUCAÇÃO BÁSICA .............................................................. 932
FÉ: FORÇA MOTIVADORA DE CANUDOS ................................................................................... 933
RESSIGNIFICAÇÃO DO MITO INDÍGENA “CUMADRE FULORZINHA”: UMA PROPOSTA AUDIOVISUAL PARA AS AULAS DO ENSINO RELIGIOSO ....................................................................... 933
EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS: UMA ALTERNATIVA PARA O RESPEITO À DIVERSIDADE
RELIGIOSA.................................................................................................................................. 933
ENSINO
RELIGIOSO,
DIREITOS
HUMANOS
E
IMAGINÁRIO:
UMA
PERSPECTIVA
TRANSFORMADORA DIANTE DA REALIDADE SOCIAL................................................................ 934
A FORMAÇÃO DO DOCENTE E O ENSINO RELIGIOSO ............................................................... 934
ENSINO RELIGIOSO E CULTURA DIGITAL: EXPERIÊNCIAS NA ESCOLA ROMILDO CZEPANHIK... 935
A CONSTRUÇÃO DO PLURALISMO NO CAMPO RELIGIOSO DO MUNICÍPIO DE PARINTINS, NO
AMAZONAS ............................................................................................................................... 935
OFICINAS PEDAGÓGICAS UTILIZANDO AS INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS PEDAGÓGICAS............ 936
A IGREJA MESSIÂNICA NO ESTADO DO PARÁ: INSTALAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO DAS
ATIVIDADES ATRAVÉS DE UMA FILOSOFIA PRAGMÁTICA ........................................................ 936
A LEGISLAÇÃO EDUCACIONAL E A IMPLANTAÇÃO DO ENSINO RELIGIOSO NO MUNICÍPIO DE
BAYEUX-PB ................................................................................................................................ 937
O ENSINO RELIGIOSO NA ESCOLA DE TEMPO INTEGRAL ENEIDA DE MORAES: UMA VIVÊNCIA
DA INTERDISCIPLINARIDADE COMO MODELO PEDAGÓGICO DAS CIÊNCIAS DA RELIGIÃO ..... 938
NA BARCA QUE NOS ANIMA ONDE EMBARCA A NOSSA FÉ: ARRASTÃO DO CÍRIO, FESTA, RITUAL
DE SIMBOLISMO ........................................................................................................................ 938
APRESENTAÇÃO
Desde a sua instalação, o FONAPER vem atuando enquanto espaço de
debates, reflexões e proposição de um Ensino Religioso que contemple a
complexidade do mundo contemporâneo em seus paradigmas emergentes. É
reconhecido nacional e internacionalmente por defender o direito do educando
de ter acesso ao conjunto de saberes e conhecimentos historicamente
construídos pelas culturas e tradições religiosas, sem proselitismos. Estes
saberes e conhecimentos, por sua vez, estão presentes nos processos de
construção e desenvolvimento das identidades pessoais e coletivas, sofrendo
ressignificações e ampliações por influência de pesquisas, experiências
pedagógicas e outras vivências no decurso da vida.
Por tratar da formação docente para o Ensino Religioso, está implícito a este
Seminário
a
preocupação
acerca
das
questões
epistemológicas
e
metodológicas que inevitavelmente envolvem a pesquisa e a prática
pedagógica do Ensino Religioso, elementos indissociáveis e em constante
comunicação quando pensados e articulados a partir de e para os sujeitos da
educação básica, os educandos.
Decorrem dessa indissociabilidade tensões e dúvidas que geram interfaces
entre os saberes populares e os conhecimentos científicos, os quais são
constituintes das
relações humanas e
dos processos de
ensino e
aprendizagem no cotidiano escolar, o qual é entendido como espaço em que
devem conviver dialogicamente diversos tipos de conhecimentos, dentre eles o
religioso.
A pesquisa é uma prática indispensável tanto para a academia quanto para a
escola, pois, para além das suas peculiaridades, visa investigar e
concomitantemente construir conhecimentos específicos e estruturados sobre
determinado objeto. A capacidade de perguntar e problematizar questões
referentes às dúvidas, anseios e necessidades constituem-se como elementos
fundamentais a mobilizar pesquisas tanto na academia quanto na educação
escolar, salvo as suas especificidades.
Em um sentido amplo, a pesquisa é concebida como uma ação investigativa
relacionada a objetos de conhecimento que retratam as dúvidas, as
inquietações e as potencialidades humanas. A prática da pesquisa não pode
ser tratada apenas como ação estritamente acadêmica, mas também escolar,
pois ela é fundante para a construção e revisão de saberes a serem
mobilizados nas diferentes áreas de conhecimento, nas experiências
curriculares da Educação Básica. Como método de ensino ela aproxima os
estudantes da atitude investigativa diante da realidade e permite o domínio
cognitivo e reflexivo dos saberes sobre os quais se organiza a vida em
sociedade, envolvendo aspectos relativos a economia, política, ecologia,
religião e outros mais. Tem de possibilitar ao educando/pesquisador a
apropriação prática dos conceitos que, em seus aspectos interpretativos e
normativos, revelam a complexidade e diversidade dos elementos simbólicos
com os quais a sociedade é representada e significada pelos diversos agentes.
Verifica-se assim, que o Ensino Religioso está em fase de construção enquanto
concepção e fundamentação, requerendo mais estudos no tocante à sua
epistemologia e metodologia que contemple os saberes e conhecimentos da
diversidade cultural e religiosa. Esta instabilidade tem gerado implicações
relacionadas às iniciativas de formação inicial e continuada, à oferta do
componente curricular por parte dos sistemas de ensino, à elaboração de
propostas curriculares, e à produção científica e de subsídios pedagógicos.
Este contexto possibilita o surgimento de perspectivas que procuram contribuir
com o desenvolvimento ou apontamento de epistemologias que provocam
debates e encaminhamento de produções acadêmicas e práticas curriculares.
Esta compreensão possibilita problematizar e refletir o que se espera das
pesquisas relativas a esta área, de modo a ampliar as interfaces com as
Ciências da(s) Religião(ões) e demais áreas afins, evitando que o Ensino
Religioso se torne o que Gruen (2013) denomina de minicurso de Ciências da
Religião ou de Teologia na escola. Para ele, "o Ensino Religioso distingue-se
do saber cultivado no ensino superior e na comunidade acadêmica. Tem
discurso e linguagem próprios" (GRUEN, 2013, p. 132).
Neste sentido, os diretos à aprendizagem e ao (des)envolvimento na educação
são compreendidos como a apropriação de atitudes e instrumentos para
continuar aprendendo, quer pela compreensão dos fundamentos científicotecnológicos dos processos produtivos, quer pelo aprimoramento da condição
humana por meio da construção e formação de referências éticas, de
sensibilidade estética e do desenvolvimento da autonomia intelectual e moral.
A noção de (des)envolvimento na perspectiva dos direitos retrata o
compromisso do Ensino Religioso e das Ciências da(s) Religião(ões) com a
formação para a cidadania numa perspectiva de direitos humanos no Brasil
que, inevitavelmente, abarca questões como economia, ecologia, trabalho,
globalização e diálogo intercultural.
Os inúmeros movimentos contestatórios emergentes no país têm indicado as
demandas sociais prioritárias, sem a preocupação de encaminhá-las. No
entanto, tais movimentos tem indicado o desejo da população em (re)descobrir
seu papel em um país democrático, como uma forma de se envolver nas
mudanças necessárias.
No bojo da educação, o Ensino Religioso tem a oferecer uma significativa
contribuição para assegurar o direito à aprendizagem e ao (des)envolvimento
dos educandos brasileiros, possibilitando uma sólida formação filosófica,
sociológica e plurirreligiosa, articulando saberes e conhecimentos necessários
à consciência ética e crítica frente aos problemas e necessidades que afrontam
a alteridade e a dignidade das pessoas.
Além do mais, as contribuições do Ensino Religioso para assegurar os direitos
à aprendizagem e ao (des)envolvimento na educação perpassam pela
formação inicial e continuada de docentes. Por isso, os Cursos de Ciências
da(s) Religião(ões) - Licenciatura em Ensino Religioso no Brasil são uma
novidade presente nos campus universitários por estarem se configurando
como uma das mais recentes abordagens a cerca dos conhecimentos
religiosos numa perspectiva científica, possibilitando um processo de
reconhecimento acadêmico do conjunto de saberes que constituem as
diferentes identidades culturais, de modo a contribuir com os processos de
ensino e aprendizagem no contexto escolar.
O estudo dos conhecimentos religiosos na diversidade cultural se apresenta
como um dos direitos à aprendizagem e ao desenvolvimento para a formação
integral dos educandos, juntamente com os demais componentes curriculares
da educação básica. Compreende-se que os conhecimentos sobre o fenômeno
religioso fazem parte da construção da identidade cultural, perpassando todo o
percurso formativo, da educação básica à superior.
O conhecimento possibilita a superação de preconceitos e estigmatizações que
por vezes geram violências e subalternidades. Evidencia-se a relevância da
pesquisa investigativa como um meio que aproxima respeitosamente as
pessoas de diferentes crenças religiosas e não religiosas. A experiência do
encontro leva à abertura, ao acolhimento e ao diálogo respeitoso.
Simplesmente negar esta possibilidade de conhecimento e diálogo na escola é
ignorar os inúmeros casos de discriminação resultantes dos preconceitos
reproduzidos no seio da escola e da sociedade.
No Brasil identifica-se um paradoxo: convivem paralelamente intolerâncias e
violências praticadas por motivações religiosas e tentativas de excluir
discussões relativas ao religioso do espaço público e democrático. Ao mesmo
tempo,
verificam-se
lideranças
religiosas,
pesquisadores,
instituições
educacionais, fóruns e membros da sociedade civil organizada promovendo
estudos e debates, produzindo materiais e criando comitês para fomentar o
respeito à diversidade religiosa em nível nacional, estadual e municipal. Nesta
direção, inúmeros sistemas educacionais vêm cumprindo a legislação vigente
(Art. 33 LDB/1996) quanto a oferta do Ensino Religioso nas escolas,
assegurando o direito dos estudantes ter acesso aos conhecimentos religiosos,
contribuindo com a construção de uma cultura de respeito e valorização das
diferentes crenças religiosas, bem como das não-religiosas.
Sente-se a necessidade de marcar posição num esforço conjunto em vista da
promoção da liberdade religiosa em um estado laico, concebendo o diálogo
como a metodologia adequada para o desenvolvimento de um Ensino Religioso
de perspectiva científica e respeitosa, onde a pesquisa tem o papel de
aprofundar e gerar novos conhecimentos e experiências significativas, os quais
podem/devem provocar e encaminhar transformações sociais, não ficando
restrito a benefícios academicistas.
Nesta perspectiva, o objetivo do XIII SEFOPER foi refletir e socializar estudos e
experiências pedagógicas relacionadas aos Direitos à Aprendizagem e ao
(Des)envolvimento no Ensino Religioso, no contexto da diversidade cultural
religiosa, articuladas às Ciências da(s) Religião(ões) e demais áreas, numa
perspectiva interdisciplinar.
Ao
todo,
71artigose
28
pôsteres
foram
aprovados
pela
Comissão
Científicapara a publicação, os quais integram o presente volume dos Anais
do XIII SEFOPER.
O FONAPER agradece as instituições copromotoras e apoiadoras do evento,
os membros
da
Comissão
Organizadora
e
da
Comissão
Científica,
acadêmicos, pesquisadores e docentes de Educação Básica que gentilmente
submeteram seus trabalhos, bem como a todos os participantes do XIII
SEFOPER, os quais, em conjunto, contribuíram para a realização de mais um
evento científico em prol da consolidação do Ensino Religioso como área de
conhecimento na Educação Básica.
Coordenação FONAPER
(Gestão2012-2014)
PROGRAMAÇÃO
DATA
HORA
06/11
5ª feira
08h30
Reunião da RELER
16h00
Credenciamento
18h30
Solenidade de Abertura
06/11
5ª feira
07/11
6ª feira
08/11
sábado
ATIVIDADE
19h00 às
21h30
Mesa I: Direitos à aprendizagem e ao desenvolvimento na
Educação Básica e no Ensino Religioso: Diálogos entre
saberes populares e científicos na pesquisa investigativa.
Dra. Lana Cláudia de Souza Fonseca (UFRRJ)
Me. Adecir Pozzer (FONAPER/SED-SC)
Dra. Maria de Lourdes Santos Melo (UEPA)
Coordenação da mesa: Dr. Manoel Ribeiro de Morais
Junior (UEPA)
08h00 às
12h00
Comunicações de trabalhos – GTs
Coordenação: Dra. Maria de Lourdes Santos Melo (UEPA)
e Me. Adecir Pozzer (FONAPER)
14h00 às
16h30
Espaços Pedagógicos
Me. Francisco Salles Palheta (FONAPER) e
Ma. Eliane Ludwig (UNOCHAPECÓ)
17h00 às
18h00
Socialização das discussões/produções
18h00
Assembleia Ordinária do FONAPER
20h00
Noite Cultural
08h30
Mesa II: Pesquisa e a formação de professores para o
Ensino Religioso no Brasil: contribuições e interfaces com
as Ciências da(s) Religião(ões) e a Educação.
Dr. Paulo Agostinho Nogueira (PUC Minas)
Dr. Gilbraz de Souza Aragão (UNICAP)
Dra. Clarice Traversini (SEB/MEC)
Coordenação da mesa: Ma. Simone Riske Koch
(FURB/FONAPER)
Plenária
12h00
Solenidade Encerramento
CH
COMUNICAÇÕES
GT1: INTERFACE ENTRE CIÊNCIAS DA(S) RELIGIÃO(ÕES) E O ENSINO
RELIGIOSO
Coordenação:
Dr. Paulo Agostinho Nogueira (PUC-Minas)
Dr. João Bosco Filho (UERN)
Dr. Frederico Pieper Pires (UFJF)
Dr. Douglas Rodrigues da Conceição (UEPA)
Dr. Raimundo Márcio Mota de Castro (UEG)
Ementa: Este GT é um espaço de socialização de estudos que apresentem
interfaces entre Pesquisa, Ciências da(s) Religião(ões) e Ensino Religioso
tematizando discussões relacionadas à investigação acadêmica e a educação
básica de modo a problematizar lógicas que reproduzem imposições,
discriminações e até negações relacionadas ao religioso ou correlato a ele, em
espaços acadêmicos e escolares.
Palavras-Chave: Pesquisa. Ciências da(s) Religião(ões). Ensino Religioso.
O ENSINO RELIGIOSO E SEU OBJETO: O FENÔMENO RELIGIOSO
Elisa Rodrigues- UFMG
Resumo
O artigo que segue tem por finalidade refletir a respeito do uso do termo fenômeno religioso, no
âmbito do componente curricular Ensino Religioso. Trata-se de problematizar a passagem da
discussão teórica, empreendida pela Ciência da Religião quanto à definição desse conceito,
para a prática docente. Isso porque supomos que a vocação ou potencial peculiar ao
entendimento de fenômeno religioso é o de permitir que tanto a dimensão social da religião,
quanto a sua dimensão ontológica sejam abordadas sem prejuízo de nenhuma tradição
religiosa ou não-religiosa, mas tendo em vista a contribuição que essa área de conhecimento
tem a conceder para a formação cidadã e plena dos alunos e alunas das escolas públicas.
Palavras-chaves: Ciência da Religião. Ensino Religioso. Fenômeno Religioso. Prática
docente.
“[...] para mim, é impossível existir sem sonho.
A questão que se coloca é, em primeiro lugar,
saber se o sonho é historicamente viável.
Segundo, se a viabilidade do sonho demanda
um pedaço de tempo e de espaço a caminhar.
Terceiro, se demanda um espaço ainda longo
para caminhar e viabilizar, é o caso de se
aprender como caminhar e, em caminhando,
reaprender inclusive a realizar o sonho, quer
dizer, buscar os caminhos do sonho. Fora do
sonho possível, da viabilidade do sonho, é que
não é possível, para mim, pensar, nem atuar
em termos de mudança e transformação.”
Paulo Freire
Introdução
O que estamos dizendo quando afirmamos que o Ensino Religioso (ER)
tematiza o fenômeno religioso? O que significa pensar a prática docente do ER com
base na noção de fenômeno, com a qual trabalha a Ciência da Religião?
A educação pensada no nível da prática de ensino é responsável por grande
parte da formação do ser humano. Capaz de transformá-lo e abrir-lhe horizontes de
compreensão sobre ser, existir e co-existir com outros humanos. Se vista apenas
como prática social restringiria-se a mero processo de transmissão de conhecimentos,
o que a tornaria fria, desprovida de sentido e tecnicista. Consideramos mais profícuo
pensar a educação como processo que contribui para a formação de indivíduos
reflexivos que estão no-mundo e nele agem. Dentro dessa perspectiva, o ER constitui
componente curricular, cujo conjunto dos conteúdos tem a peculiaridade de refletir
sobre: o que é ser humano, qual o seu lugar no mundo, quem é o outro, como se
relacionar com ele e o que pode-se fazer para co-existir com dignidade, justiça e
respeito?
O diferencial desse componente curricular em relação a outras que
eventualmente refletem sobre questões como essas é que se trata de um meio de
tematizá-las com base nas experiências religiosas dos alunos e dos professores,
contribuindo para refletir o quanto são frutíferas em termos de horizonte de
significância, quanto podem não o ser. Nesse caso, mesmo quando não se vive a
religião, na condição de um não-crente, ela está presente sob alguma forma de
negação. Mas ambos os casos pedem a reflexão sobre o seu lugar no mundo
contemporâneo.
Nosso problema consiste em pensar como o ensino religioso pode ser
abordado no ambiente de sala de aula, considerando uma abordagem que tenha como
suposto a experiência mesma dos alunos e o que se observa na realidade social.
Religião, portanto, entendida como fenômeno que é social, político, cultural e que tem
implicações simbólicas para quem crê. Com essa discussão, pretende-se 1) refletir
sobre uma proposta de ensino religioso como ocasião de estímulo à liberdade, de
opinião, de decisão, de informação, por meio de um ensino que visa não a
passividade, mas a consciência de ser-sujeito na história.
Educação e religião
No âmbito da escola, as disciplinas oferecidas formalmente seguem propostas
organizadas e previstas no currículo programático. Esse currículo corresponde a um
programa educacional em que o ensino das disciplinas é planejado de forma a
estabelecer o tema de estudo, propósitos, alvos objetivos gerais e específicos,
também chamados competências e habilidades, estratégias, recursos, procedimentos
ou técnicas de ensino e processos de avaliação. Todas as etapas desse planejamento
programático são previamente elaboradas e afirmam um projeto político-pegagógico
geral formulado pelo estabelecimento de ensino.
Na sala de aula, ao ensinar em conformidade com esse currículo, o educador
coloca em prática um planejamento realizado em conformidade com essa proposta
visando à formação dos alunos, do ponto de vista do conhecimento, mas também da
pessoa. Por isso, além de matemática, português, história, geografia, ciências e outras
disciplinas, o educador deve tematizar a relevância prática desses conteúdos, a fim de
que não se tornem meros dados informativos. A maneira como o ensino será
ministrado é responsável pela formação ética, política, social, cultural e acadêmica do
educando e terá implicações para a vida profissional, mas, também, para o seu
comportamento
social.
Portanto,
esse
conjunto
de
saberes
sistematizados
formalmente tem uma relevância prática, que se desdobra em outras finalidades.
A construção de um currículo é uma prática intencionada. Sob a perspectiva
de um educador ou equipe de educadores, a seleção dos conteúdos, bem como
definição
de
abordagens
teórico-pedagógicas
e
procedimentos
estratégicos,
corresponde a supostos socialmente convencionados como necessários à formação
dos educandos. Vale ressaltar que se trata, então, de um tipo de instrumento de poder
que incide na relação entre professor-aluno para reificar hierarquias ou flexibilizá-las
em nome da formação de um cidadão capaz de se posicionar no debate público,
característico das sociedades democráticas e plurais. Sendo assim, os programas de
ensino
elaborados
a
partir
dos
conteúdos
estabelecidos
pelas
instituições
educacionais, podem ter caráter político, filosófico, religioso e outros, contudo, sempre
indicam o que deve ser ensinado em sala de aula, de acordo com o que se considera
“a necessidade dos alunos”.
Paradoxalmente, a prática desse ensino essencialmente técnico e pragmático
prestigia a transmissão de informações em grande parte prescritivas. Freire (1998, p.
34) salienta que a “prescrição é a imposição da opção de uma consciência a outra”,
por isso, a educação prescritiva tem caráter alienador que produz consciências
passivas por meio de pautas estranhas aos educandos, fundadas em relações
“dissertadoras”, isto é, constituídas de sujeitos narradores de um lado e, do outro,
“objetos pacientes, ouvintes – os educandos” (FREIRE, 1998, p.57).
A distância entre escola/educador e educandos obstaculiza a prática de ensino
centrada na realidade do aluno e na riqueza de sua cultura. Ela reifica um viés
paternalista na concepção da ideia de sociedade brasileira que sugere a necessidade
de que seja protegida pelo Estado, ao invés de ressaltar sua incumbência de zelar
pela garantia dos direitos e deveres dos cidadãos, concedendo-lhes dispositivos para
o uso-fruto das liberdades individuais com responsabilidade. A prática de ensino que
zela pelas liberdades individuais é possível por meio de uma educação para
autonomia, que busque a transformação da realidade objetiva.
A autonomia, enquanto amadurecimento do ser para si, é processo, é vir a ser.
É neste sentido que uma pedagogia da autonomia tem de estar centrada em
experiências estimuladoras da decisão e da responsabilidade, vale dizer, em
experiências respeitosas da liberdade (FREIRE, 1996, p.118-119).
Nesta perspectiva, quando o processo de ensino-aprendizagem conduz à
transformação da realidade, contribui para a interação dos educandos-cidadãos em
seu meio social por meio de três níveis: a compreensão do ambiente social, a
capacidade de conceituá-lo e a habilidade de desenvolver práticas de intervenção.
Quando a educação faz sentido para os alunos, aí se pode inferir alguma praticidade,
não apenas porque a informação foi “útil”, mas porque conduziu o educando à crítica e
à consciência de sua historicidade para a eficaz inserção no espaço público. Portanto,
a educação deixa de ser “bancária” para se transformar em libertadora1.
Em oposição a uma prática de ensino evasiva e distante do educando que o
forma para reproduzir e não desenvolver habilidades criativas e críticas, a educação
reflexiva que pretende-se para o ensino religioso, como para as outras áreas do
conhecimento que compõem a base nacional, pressupõe o diálogo como metodologia
e a experiência do aluno como matéria-prima a partir de onde o conteúdo pode ser
desenvolvido. Uma tal relação tem por finalidade desarticular o imperativo da
autoridade inquestionável do professor e humanizá-la:
Desta maneira, o educando já não é o que apenas educa, mas o que, enquanto
educa, é educado, em diálogo com o educando que, ao ser educado, também educa.
Ambos, assim, se tornam sujeitos do processo [...] para ser-se, funcionalmente,
autoridade, se necessita de estar sendo com as liberdades e não contra elas (FREIRE,
1998, p.68).
A prática de ensino reflexiva, problematizadora e dialógica que faz dos
conteúdos da experiência a pauta da educação, faz do objeto cognoscível, a religião,
matéria de investigação e não simples descrição. Ao apresentar a religião como objeto
de ad-miração, re-ad-mirá-lo permite tanto aos educandos quanto ao educador, a
superação do conhecimento no nível da doxa, pelo conhecimento no nível do logos.
Estamos falando, pois, no ensino religioso não-doutrinário, confessional ou proselitista.
Trata-se do contrário disso: o ensino do fenômeno religioso em sua pluralidade,
contingência histórica, contribuição sócio-cultural, dimensão simbólica e política, bem
como na sua instituição de sentido. Trata-se de restituir ao fenômeno religioso o seu
caráter de humano e social, portanto, cognoscível e passível de abordagem científica,
investigativa, criativa, problematizadora: isto é, reflexiva.
Religião, fenômeno religioso e experiência religiosa
Durante grande parte da história do Brasil, o ensino religioso concebeu como
seu objeto e objetivo valores éticos morais, tendo por finalidade a formação ética da
pessoa. Isso pode-se perceber no período colonial através do intuito de moralização
dos costumes dos nativos, implementado pelos jesuítas. Mas também em outros
períodos fecundos em debates sobre a legitimidade do ensino religioso na escola
pública, como o período dos anos 1930, marcado pelo eco das esfervecências sociais
das décadas iniciais do século XX. Não foi diferente nas décadas de 1960-1970,
1
A concepção e prática “bancária” de educação reforça “uma ação social de caráter
paternalista, em que os oprimidos recebem o nome simpático de assistidos [...] meros
marginalizados, que discrepam da fisionomia geral da sociedade” (FREIRE, 1998, p.60).
quando o objeto do ensino religioso eram valores pacifistas e éticos, atinentes ao
regime em vigor no período. A força desses objetivos ainda é presente em várias
propostas curriculares e práticas pedagógicas. Os anos 1990, entretanto, por ocasião
da reforma educacional empreendida pelo governo do presidente FHC, foram anos
centrais para a emergência de novos paradigmas que ficaram conhecidos sob o título
de Parâmetros Curriculares Nacionais, os PCNs. A proposta elaborada e apresentada
pelo FONAPER, na ocasião, a despeito de não ter sido aprovada pelo Ministério de
Educação, tornou-se amplamente conhecida no território nacional e norteadora tanto
para estabelecimentos de ensino público, quanto para educadores. Segundo essa
proposta, o ensino religioso deve “proporcionar o conhecimento dos elementos
básicos que compõem o fenômeno religioso, a partir das experiências religiosas
percebidas no contexto do educando”.
Pretende-se,
com
isso, “possibilitar
esclarecimentos sobre o direito à diferença na construção de estruturas religiosas que
têm na liberdade o seu valor inalienável” (FONAPER, 2010, p. 47). Nesse sentido,
ainda, na apresentação à 9ª edição, os coordenadores do FONAPER assinalam a
importância de se valorizar “a diversidade cultural religiosa presente na sociedade, no
constante propósito de promoção dos direitos humanos” (Idem, p.8).
Podemos depreender dos parâmetros acima que: 1) o ensino religioso deve ser
desenvolvido com base nas experiências religiosas disponíveis no meio social com o
qual o educando tem contato; 2) a observação desse contexto deve conduzir à analise
comparativa e à compreensão do fenômeno religioso no Brasil, entendido como
diverso e plural; 3) a constatação dessa pluralidade bem como a compreensão de seu
processo histórico e social de formação podem contribuir para a construção de uma
realidade social de respeito pelas diferenças. Tais propósitos, assegurados pela LDB
(Lei no 9.475, de 22 de julho de 1997, nova redação do art. 33 da lei no 9.394, de 20 de
dezembro de 1996) atendem positivamente aos princípios de separação, igualdade e
liberdade de consciência2. Especialmente, no que tange à liberdade de consciência,
de culto e de credo, bem como à liberdade de não professar crença alguma, deve-se
dizer que talliberdadeé afirmada pela laicidade, conquanto, impondo-lhe como
limitação as regras estabelecidas pela ordem pública. Assim, simultaneamente, esse
princípio garante a participação e a expressão religiosa nos debates e espaços
públicos como a escola e lhe impõe limites a fim de proteger o indivíduo de imposições
religiosas3.
2
3
Para uma discussão sobre tais princípios, ver GIUMBELLI, 2004, p. 50.
Os princípios de separação, igualdade e liberdade estão assegurados no CAPÍTULO I - Dos
Direitos e Deveres Individuais e Coletivos - Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem
distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
É preciso ressaltar que neste documento, com sua forte inspiração no método
da correlação do filósofo da religião e teólogo Paul Tillich, há uma tensão. No início do
texto, afirma-se que o objeto do ensino religioso é o “transcendente” (Idem, p.31 e 32).
No entanto, na sequência afirma-se que o objeto é o fenômeno religioso. Por estas e
outras razões, o FONAPER está empreendendo a revisão dos PCNs.
Cabe, então, retomar um suposto anteriormente anunciado e esmiuçá-lo, qual
seja: o de que o ensino religioso nas escolas públicas tem por objeto a religião,
entendida como fenômeno, isto é, a religião (ou experiência religiosa) como evidência
de fé e de crença. Portanto, a religião expressa por meio de uma tradição, uma lógica
doutrinária, um sistema de praticas e prescrições de acento espiritual e ético. Ao
abordar a religião nesses termos não se pretende o ensino doutrinário, de caráter
catequético, nem moralizaente, mas uma disciplina que define-se por tematizar a
religião nos marcos de um fenômeno ambíguo que tem dimensão social e simbólica.
Sendo assim, é parte de um patrimônio cultural e histórico coletivo, é constitutivo do
ser-humano porque projeta-se no nível de sua identidade e etnicidade e é político
porque define disposições por meio das quais os cidadãos interpretam o mundo e
orientam suas ações. E é segundo essa concepção que a disciplina ensino religioso
orienta-se pela fenomenologia: na tentativa de fazer da experiência uma chave
metodológica para guiar educador e educandos pelo caminho efetivo das religiões
contemporâneas “mais feita de redes que de instituições, de “bricolagens” individuais
que de sínteses globalizantes, mas que sabe também organizar trajetórias individuais
e referências fluidas aos grandes filões tradicionais da história religiosa” (SANCHIS,
1998, p.50). Assim, privilegiando simultaneamente o aspecto da função social da
religião, tanto quanto a religião como arcabouço de sentidos.
Esclarecemos que a noção de fenômeno aqui se torna importante para
delimitar um campo possível de tematização. Fenômeno indica que não se trata dos
objetos religiosos enquanto tais (o transcendente), mas como o ser humano tematiza e
constitui sentidos a partir da experiência religiosa. Em outros termos, é a religião
enquanto experiência de sentido dos seres humanos. Por este motivo, o ensino
religioso não tem por objeto o Transcendente (com maiúsculo) enquanto tal, mas
propriedade, nos termos seguintes: [...]VI. é inviolável a liberdade de consciência e de crença,
sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a
proteção aos locais de culto e a suas liturgias;
VII. é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis
e militares de internação coletiva;
VIII. ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção
filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e
recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei;
IX. é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação,
independentemente de censura ou licença.
como os seres humanos tematizam isso. Isso implica abordar o fenômeno religioso
pelas várias formas pelas quais adquire expressão: símbolos, mitos, ritos e doutrinas.
Um professor de artes, por exemplo, analisa uma catedral gótica destacando
os elementos estéticos ali presentes. Para o professor de história, esta mesma
catedral interessa enquanto esclarece aspectos do final da Idade Média européia.
Para o ensino religioso, no entanto, a catedral é analisada levando-se em
consideração a experiência religiosa, isto é, o que esta catedral revela de religioso,
importante dimensão de tematização do ser humano.
Concluindo
Considerar a religião enquanto fenômeno não significa emitir juízos sobre a
existência ou não dos entes transcendentes afirmados pelas diversas tradições
religiosas. Antes, interessa a ela exercer a tarefa compreensiva de como a experiência
religiosa se constitui como referência para constituição de sentido e interpretação do
mundo. Em suma, não se trata de verificar a verdade do conhecimento religioso, mas
perceber como o ser humano tematiza estes conteúdos. A verdade do fenômeno
religioso, enquanto objetivo de conhecimento, não passa pelo realismo objetivo (se os
objetos existem ou não), mas sua verdade reside na análise pelo modo segundo o
qual os indivíduos e grupos interpretam o mundo a partir de suas experiências
religiosas. Por esse motivo, o ensino religioso é parte das ciências humanas. Enfim,
falar em Fenômeno religioso pode evitar dois extremos: concepções reducionistas da
religião, que empregam a religião tendo em vista a compreensão de outros aspectos
da realidade humana (a sociedade, a história, a psicologia, etc), mas sem cair numa
elaboração teológica confessional. Além disso, preserva-se o caráter peculiar do
objeto do Ensino religioso, sem necessariamente perder a interdisciplinariedade, tão
necessária para a compreensão de um fenômeno tão complexo como este que ocupa
o ER. Como se pode notar, defender a peculiaridade do fenômeno religioso não
necessariamente implica em encontrar uma essência, mas em direcionar o olhar para
aquilo que faz de um determinado objeto, fato, lugar, tempo etc., religioso.
A experiência se torna objetiva e atravessa todas as outras vivências do
indivíduo, atribuindo-lhe significado e ordenando-as, torna-se religião. Cada sujeito,
segundo as imagens, os conhecimentos e os símbolos que tem à disposição formula
certo repertório de noções elementares que o conduzirão numa síntese individual que
comporá a sua experiência religiosa ou, no caso de um não-crente, sua percepção do
que seja a religião.
Nesse sentido, o ensino religioso requer encantamento pelo seu objeto.
Admirá-lo, na perspectiva que mencionamos anteriormente. E isso não significa adotar
uma religião, aceitar uma crença ou converter-se a determinado credo. O
encantamento de que falamos é o interesse genuíno pelo saber a respeito de algo, no
caso, o fenômeno religioso. Encantar-se pela religião não quer dizer deixar-se levar
por ela, mas ao conhecê-la, construir bases reflexivas que permitam ao aluno-cidadão,
a formulação de uma opinião informada. Assim, a função do professor é dupla. De um
lado, mostrar o encanto que há em se compreender o fenômeno religioso e como ele
abre pontos de compreensão sobre a realidade inacessíveis a outras abordagens.
Mas, por outro lado, a religião é objeto. Assim, é preciso também certo distanciamento,
certa “objetividade”, para que o educando possa tematizar sua própria experiência
religiosa (ou a não presença dela) em relação a outras tradições. Assim, é preciso
manter a tensão entre encanto e distanciamento. Paixão e objetividade. Há muitos
relatos de como a abordagem da religião como fenômeno (não somente como moral
ou catequese) é extremamente atraente, especialmente para educandos entre o 6º e
9º Anos. Devido ao limite de tempo e espaço disponíveis, tais exemplos não poderiam
ser aqui tratados com o cuidado que merecem.
Referências
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. Saberes necessários à prática educativa.
Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996.
______. Pedagogia do oprimido. 17ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1998.
GIUMBELLI, Emerson. Religião, Estado, modernidade: notas a propósito de fatos
provisórios. In: Estudos Avançados 18, 52 (2004): 47-59.
OLENIKI, Marilac R.; DALDEGAN, Viviane Mayer. Encantar. Uma prática pedagógica
no ensino religioso. Petrópolis, RJ: Vozes, 2003.
SANCHIS, Pierrre. Estudos de religião: academia e instituições religiosas, um diálogo
em construção. In SOUZA, Beatriza Muniz de; GOUVEIA, Eliane Hejaij; JARDILINO,
José Rubens Lima (Orgs.). Sociologia da religião no Brasil. São Paulo:
PUC/UMESP, 1998. p.50.
SILVA, Rute Patrícia da. Escola: um dos lugares/espaços para a construção da
alteridade – relato de uma experiência. In Terra e alteridade. Pesquisas e práticas
pedagógicas em ensino religioso. São Leopoldo: Nova Harmonia, 2007. Pp.249-257.
RACIONAL E IRRACIONAL E SUAS RELAÇÕES EM O SAGRADO DE
RUDOLF OTTO
Frederico Pieper - UFJF4
Resumo
O problema do racional e do irracional em Otto se mostra fundamental. Aliás, o subtítulo de seu
texto mais reconhecido, O sagrado, é: os aspectos irracionais na noção de divino e sua relação
com o racional. Assim, para Otto, o sagrado é composto de elementos racionais (conceituais) e
elementos não-racionais (intuídos) em todas as suas manifestações. O objetivo dessa
comunicação é comentar alguns aspectos dessa relação, tomando como referência os
capítulos 1 e 10 de O sagrado. A importância dessa abordagem, tendo em vista o Ensino
Religioso, está em se tratar de um clássico da Ciência da Religião que fornece subsídios de
fundo para uma compreensão de religião que pode ser pressuposta em muitas abordagens do
fenômeno em sala de aula.
Palavras-chave: Religião. Sagrado. Ciência da religião.
“Quando eu terei explorado toda a história
santa,
Que ainda me restará?
Ó dogmas, porque sois tão claros”
(Murilo Mendes. O novo céu e a nova terra)
O problema do racional e do irracional em Otto se mostra fundamental tanto
para compreensão de sua obra como para a abordagem da religião. Aliás, o subtítulo
de seu texto mais reconhecido, O sagrado, é: os aspectos irracionais na noção de
divino e sua relação com o racional. Assim, para Otto, o sagrado é composto de
elementos racionais e não-racionais em todas as suas manifestações. O objetivo
dessa comunicação é comentar alguns aspectos dessa relação, tomando como
referência os capítulos 1 e 10 de O sagrado e dialogando com suas obras anteriores.
A importância dessa abordagem, tendo em vista o Ensino Religioso, está em se tratar
de um clássico da Ciência da Religião que fornece subsídios de fundo para uma
compreensão de religião que pode ser pressuposta em muitas abordagens do
fenômeno em sala de aula.
Para iniciar, observemos o termo irracional, sujeito a muitas interpretações.
Otto emprega Das Irrationale, que pode ser compreendido de forma errônea, uma vez
que não pretende constituir um pensamento que seja anti-racional. Ele objetiva apenas
reservar certa região inacessível ao pensamento lógico, ao conceito, no qual palavra e
coisa se articulam de modo íntimo, sendo que o referente é plenamente apreendido
pela linguagem, através do conceito. É interessante observar o termo alemão para
4
Graduado em Teologia (EST-ICSP), História (USP) e Filosofia (USP). Mestre e doutor em
Ciências da Religião (UMESP). Doutor em Filosofia (USP). Professor no Departamento de
Ciência da Religião (UFJF). Contato: [email protected]
conceito: Begriff tem origem em no verbo greifen, que tem o significado de agarrar,
apreender ou incluir. Assim, conceito captura, inclui, apreende seu objeto. Se o
sagrado apenas se restringisse a este modelo, que não reconhece nenhum âmbito
para além do conceitual, apenas nos forneceria o Deus dos filósofos. Mas, para Otto, o
sagrado não se reduz a isso. O conceitual é parte integrante, mas não compreende a
totalidade do sagrado. Como forma de evitar compreensão errônea do termo
Irrationale, como se fosse afirmação de uma anti-razão, algumas traduções para
nosso idioma optaram por não-racional (OTTO, 1985). No entanto, se o próprio autor
optou por esta palavra, equívoca também no original, é de se perguntar se a opção por
manter irracional não seria mais adequada (como optou a tradução que aqui
utilizamos), cabendo esclarecer o termo de seu possível equívoco.
I.
Otto inicia sua obra, logo no primeiro capítulo, destacando a necessidade de
clareza e distinção que marca a concepção teísta de Deus. Esta ênfase no elemento
teísta evidencia o cristianismo como importante referência para o autor. Mas quais as
consequências dessa concepção teísta para a religião? Para Otto, o teísmo possui
clareza sobre seu objeto e esta clareza se manifesta na formulação conceitual que
fornece à divindade. Assim, concebe-se este Deus como uma substância a partir da
qual se pode derivar ou conferir atributos.
Mas de onde se originam estes atributos? De onde o ser humano retira as
qualidades que são conferidas à divindade? Segundo Otto, este aspecto racional se
liga com o modo como “o ser humano o percebe em si próprio de forma limitada e
inibida. No divino, todos esses atributos são pensados como sendo ‘absolutos’, ou
seja, como ‘perfeitos’” (OTTO, 2007, p.33). Deste modo, em relação ao aspecto
racional da divindade, Otto não estaria muito distante de certas compreensões da
religião como projeção. Melhor dizendo, ele não deixa de reconhecer o mérito dessas
abordagens, muitas vezes tida com reservas tanto por religiosos como por
determinados estudiosos da religião.
Talvez, o pensador mais expressivo dessa tendência seja Ludwig Feuerbach.
Em Das Wesen des Christentums (1841), entende que Deus é o interior do homem
projetado para seu exterior. Ao falar de Deus, o ser humano estaria, na verdade
falando de si próprio ou atribuindo à divindade aquilo que nega em si. Na relação com
Deus, o ser humano acaba se anulando para tornar a divindade maior. Se Deus é a
essência do ser humano projetada, a teologia deve ser transformada em antropologia,
para que este ser humano tome consciência de si e supere a alienação. É importante
notar que Feuerbach não emprega o termo “projeção”, ainda que essa palavra pareça
identificar com relativa precisão sua concepção. Antes, ele fala em reducionismo
antropológico, indicando que é preciso conduzir os discursos teológicos e religiosos
para sua verdadeira raiz, isto é, na direção do ser humano. Nas Preleções sobre a
essência da religião, Feuerbach resume sua doutrina da seguinte maneira:
teologia é antropologia, ou seja, no objeto da religião a que
chamamos theós em grego, Gott em alemão, expressa-se nada mais
do que a essência do homem, ou: o deus do homem não é nada mais
que a essência divinizada do homem, portanto a história da religião
ou, o que dá na mesma, de Deus (porque quão diversas as religiões
tão diversos os deuses, e as religiões tão diversas quão diversos são
os homens) nada mais é do que a história do homem”(FEUERBACH,
1989, p.23).
Para Feuerbach, a religião não é, em seu conteúdo, falsa. Ela é apenas uma
ilusão, pois não tem clareza com relação ao seu objeto. Fala do ser humano achando
que está dizendo algo sobre Deus. Assim, os atributos divinos se relacionam com a
natureza humana e não com Deus. Como se pode notar, Feuerbach acaba instituindo
certa cisão: natureza humana e o indivíduo. Enquanto aquela é ilimitada, este sofre
com as limitações próprias de sua condição. É claro que Otto não assume este
elemento mais crítico de Feuerbach. Ele apenas admite o princípio de que os atributos
divinos comportam certa dimensão antropomórfica, reconhecendo que há religiões nas
quais esta característica é mais marcante do que em outras.
Enfim, para Otto o que significa racional? Ele não define racional como um
modo de ser ou mesmo como prioritariamente um atributo do intelecto humano, no
sentido do ser humano como ser racional. Ele liga o racional a um objeto: “Se
chamarmos de racional um objeto que pode ser pensado com clareza conceitual,
deve-se caracterizar como racional a essência da divindade descrita nesses atributos.
E a religião que os reconheça e afirme é, nesse sentido, uma religião racional” (OTTO,
2007, p.33). Mas o aspecto racional propriamente dito não se restringe somente ao
objeto. Interessa este objeto enquanto alvo do pensamento, de modo que a clareza
constitui seu atributo fundamental para ser denominado de racional. Nesta citação, há
também movimento importante. Otto, de certo modo, inverte o caminho da reflexão.
Ele diz que o racional é um objeto que se dá a pensar com clareza e, portanto, podese conceber a divindade entendida nestes termos como racional, concluindo que,
assim, a o sagrado tem uma dimensão racional. Note-se que é o objeto, no que
permite ser expresso conceitualmente, que determina a racionalidade. É sua clareza e
distinção que faz da religião racional. O caminho “natural” seria dizer que a religião é
racional e, portanto, concebe a divindade com clareza conceitual. Mas aqui não é o
sujeito que se torna determinante; mas a relação sujeito-objeto. Uma vez que este se
dá claramente, contamina a religião para que ela seja concebida também como
racional.
De todo modo, apesar dos âmbitos de compreensão que abrem, é preciso
cuidado com os conceitos. Há certa tendência em se pensar que eles poderiam
esgotar completamente seu objeto. Muitas vezes, parte-se do pressuposto de que a
essência divina se reduz ao que a linguagem conceitual é capaz de expressar sobre
ele. Ou, dito de outro modo, é como se o sagrado pudesse ser reduzido ao seu
constituinte racional. Para Otto, essa concepção sobre o sagrado se reflete no
discurso religioso que assume a possibilidade de se falar sobre Deus como um ente
acessível à razão, que pudesse ser apreendido por assertivas racionais sobre ele. De
todo modo, é importante que fique claro um ponto: a crítica de Otto ao aspecto
racional do sagrado não significa que ele o conceba em menor conta. Antes, como se
pretende argumentar a seguir, o racional tem seu lugar na constituição do sagrado e,
consequentemente, do sagrado.
Mas por que a tendência é pensar desse modo? Está na base dessa
interpretação uma concepção bem tradicional de linguagem: linguagem é expressão
de conteúdos e, quanto mais exata essa linguagem for, mais eficiente será. Em suas
palavras: “Mas não causa surpresa que o racional necessariamente ocupe o primeiro
plano, uma vez que toda linguagem, enquanto constituída de palavras, pretende
transmitir principalmente conceitos. E quanto mais claros e unívocos os conceitos,
melhor a linguagem” (OTTO, 2007, p.34). Em resumo, uma explicação para a
importância que o racional assume reside no fato de que seria função da linguagem
comunicar conteúdos. Uma vez que os conceitos o fazem com mais exatidão, o
aspecto racional tem sua importância assegurada.
A importância que Otto confere ao racional também aparece em outra
consideração. Como filho de sua época, ele confere superioridade ao cristianismo.
Esse tema é bastante complexo nos autores da fenomenologia. De um lado, eles se
mostram como críticos das teorias evolucionistas, bastante comuns na antropologia.
Assim, para Otto, se o temor aparece, em primeiro lugar, em relação a forças
demoníacas (medo de fantasmas, antepassados etc), não decorre daqui que ele
evolua até chegar à noção de Deus. No entanto, o cristianismo se mostra como
normativo para se compreender as demais manifestações religiosas. Assim, afirmar a
superioridade do cristianismo não significa encampanar teorias evolucionistas. Antes,
busca-se uma norma capaz de permitir aproximação do sagrado e da religião. Em
suas palavras: “O cristianismo possui esses conceitos e os possui com maior clareza,
nitidez e completude, o que constitui um sinal fundamental de sua superioridade sobre
outros níveis e formas de religião, embora não seja a única característica a conferir-lhe
essa posição” (OTTO, 2007, p.33). Para nossa temática, é importante notar como ele
considera o racional em alta conta. São justamente os conceitos, ainda que não
somente eles, que o levam a afirmar a superioridade do cristianismo, fornecendo-lhe
uma noção normativa para entender a religião. Desse modo, não se pode ler Otto
apenas como se afirmasse o caráter inefável do sagrado em detrimento dos elementos
racionais. Pelo contrário. O racional é admitido em sua importância na constituição do
sagrado. Isso se torna ainda mais claro quando voltamos a análise para obras
anteriores a essa que vimos analisando.
O reconhecimento do aspecto racional aparece também em outros escritos do
autor, inclusive anteriores a O sagrado. Otto concebe a religião não somente como
sistema fechado. Antes, toda a forma de religião está preocupada com a realidade.
Inclusive, toda religião acaba emitindo proposições sobre a realidade. Segundo ele,
numa obra de 1904, “Nenhuma forma de religião existente é inteiramente feita de
‘sentimento’, ‘subjetividade’ ou ‘comportamento’, que pode renunciar a quaisquer
suposições e convicções em relação à natureza. De fato, toda forma, num exame mais
próximo, revela um conjunto mais ou menos fixo de convicções, suposições teóricas e
suposições sobre o homem, o mundo e a existência: isto é, uma teoria, ainda que
simples, do universo” (OTTO, 1907, p.5). Qual a importância de uma afirmação como
essa? No início do século XX, com o avanço da ciência (especialmente das ciências
biológicas), acreditava-se que a religião era mera fase superada no desenvolvimento
do ser humano. Era algo primitivo, já deixado para trás. Uma vez que não era
utilizável, estava relegada ao nível privado, subjetivo, como tipo de ilusão ou mesmo
sonho. A religião, por isso mesmo, não teria significado social, visto não ter uso
prático. Mas, não é possível reduzir a noção de verdade a este pragmatismo,
relegando lugar tão tímido para a religião. “Nenhuma forma de religião existente é
inteiramente feita de ‘sentimento’, ‘subjetividade’ ou ‘comportamento’, que pode
renunciar a quaisquer suposições e convicções em relação à natureza. De fato, toda
forma, num exame mais próximo, revela um conjunto mais ou menos fixo de
convicções, suposições teóricas e suposições sobre o homem, o mundo e a
existência: isto é, uma teoria, ainda que simples, do universo” (idem).
Enfim, o aspecto conceitual da religião tem importância para Otto. Isso se
manifesta em textos anteriores a O sagrado e são mais bem trabalhados nestes
textos. É importante que se ressalte isso para que não se leia Otto como alguém que
simplesmente descarta o aspecto racional da religião. Ele é constituinte fundamental,
inclusive servindo como crítica a teorias correntes na época.
II.
Desse modo, não é intenção do autor destituir a religião do seu aspecto
racional, mas apenas indicar seus limites. Se é certo que o racional constitui o
sagrado, daí não se pode concluir que ele possa ser tomado como o todo do sagrado.
Por mais clara que soe essa assertiva, tanto no âmbito da vivência da religião como na
reflexão sobre ela, essa não tem sido a perspectiva predominante.
A ortodoxia protestante do século XVI, por exemplo, tem sua dose de
responsabilidade no surgimento do racionalismo. O problema da ortodoxia não estava
na elaboração conceitual das doutrinas. A constituição de doutrinas é parte do
processo de institucionalização de qualquer movimento religioso e expressão da
dimensão racional do sagrado. Antes, o problema está em que o elemento racional se
impôs de tal maneira a ponto de excluir e anular o irracional. “Ao formular doutrina a
ortodoxia não soube fazer justiça ao elemento irracional do eu objeto e mantê-lo vivo
na experiência religiosa, racionalizando unilateralmente a idéia de Deus, numa
evidente apercepção errônea dessa experiência” (OTTO, 2007, p.35). Nessa mesma
perspectiva, nota-se como a linguagem herdada da tradição aristotélica é também
censurada. Aliás, em O sagrado, retomando esta crítica já presente no trabalho sobre
Lutero, argumenta Otto: “Aristóteles é mais teológico que Platão. Mas de espírito bem
menos religioso e essencialmente racionalista em sua teologia” (OTTO, 2007, p.133).
O modelo medieval é avaliado de maneira similar, especialmente pela imposição do
elemento racional, abafando complemente o irracional. Assim também não se aceita a
noção de que Deus é causa prima e a fé é causa segunda. Segundo Otto, em sua
perspectiva, atividade de Deus é empírica.
Em segundo lugar, há de se reconhecer que esse pressuposto também se
mostra como paradigma para a interpretação da religião. Otto lembra que nas
pesquisas em relação ao ser humano nos seus inícios, a ênfase no racional é
evidente: “não se parte daqueles elevados conceitos racionais que foram nosso ponto
de partida, e sim se enxerga neles e em sua gradual ‘evolução’ o problema principal,
para então supor que seus precursores seriam noções e conceitos inferiores; mas o
que se busca sempre são conceitos e noções, e ainda por cima conceitos ‘naturais’,
isto é, do tipo que também aparece no imaginário humano comum” (OTTO, 2007,
p.35). Neste caso, sempre se aborda o aspecto racional da religião, mostrando como
há desenvolvimento e complexificação dos conceitos. O ponto de Otto é indicar que
são sempre os conceitos e ideias religiosas que são tomadas como paradigmas para
se analisar determinada religião. No entanto, aquilo que extrapola esse âmbito do
racional, devido à dificuldade de se abordá-lo, acaba sendo relegado a um segundo
plano. Essa abordagem não percebe aquilo que está claro para os adversários dos
míticos: o sagrado possui também um elemento irracional. Aliás, isto é considerado o
que há de mais próprio e específico na religião, que acaba escapando à abordagem
que parte da preponderância do aspecto racional.
Nesse sentido, vale citar a um trecho do prefácio à edição inglesa,onde Otto
afirma:
Este livro, reconhecendo a importância do não-racional para a
metafísica, faz uma séria tentativa de analisar mais exatamente o
sentimento que permanece onde o conceito falha, e introduzir uma
terminologia que não é mais solta ou indeterminada por ter de
necessariamente fazer uso de símbolos. Antes de me aventurar neste
campo de investigação eu gastei muitos anos de estudo sobre o
aspecto racional da realidade suprema que denominamos de ‘Deus’,
e os resultados de meu trabalho estão contidos em meus livros [...] E
eu senti que ninguém se preocuparia com o Numen ineffabile se não
tivesse já devotado estudos sérios e assíduos à Ratio aeterna”
(OTTO, 1936, p. VIII).
Essa passagem é interessante por indicar como o caminho intelectual de Otto,
é justamente o reconhecimento dos limites do racional que conduzem sua atenção ao
irracional.
Enfim, o que concluir do dito até aqui? “Isso não deixa de ser um incentivo
salutar para que se perceba que a religião não se esgota em seus enunciados
racionais, e para que se passe a limpo a relação entre seus diferentes aspectos, para
que ela própria se enxergue com clareza” (OTTO, 2007, p.36). Assim, no primeiro
capítulo de O sagrado, Otto mostra como ele é composto de elementos racionais e
irracionais. Seu objetivo é abrir o horizonte para que se traga ao olhar algo que a
religião e a interpretação deixam escapar por se focar demais nos conceitos.
III.
Mas, o que se entende, afinal, por irracional? Em O sagrado, busca-se pelo
irracional na ideia de divino. Nesse sentido, faz-se necessária certa leitura da época
em que Otto escreve, mostrando como há esta febre pela busca do irracional, sem o
devido cuidado em precisar o sentido deste termo, jogando-a numa série de
oposições: diante do transcendental, o psicológico; face ao determinável a priori,
aquilo que é reconhecido a posteriori, etc. De certo modo, esta busca pelo irracional
nos mostra importante face da época em que Otto escreve. As promessas da razão
iluminista, que se tornam moeda corrente e se intensificam no século XIX, não foram
cumpridas. No ano em que Otto lança sua obra, o mundo já sentia o lado “irracional”
desse projeto através da Primeira Guerra Mundial. É como se a intensificação da
razão tivesse revelado o irracional que escondia. No entanto, para além deste
elemento histórico, no pensamento é possível já identificar esta busca pelo
sentimento, pelos impulsos, pelo irracional, pelos instintos já no romantismo. Mas, esta
não foi a tendência predominante no século XIX, como se pode notar pela leitura
desenvolvida por Otto.
Para não incorrer nos erros de seus contemporâneos, Otto busca definir bem
os termos. Ele não entende o irracional como pulsões individuais contra a razão, numa
espécie
de
anti-racionalismo.
Aliás,
retoma
uma
definição já
desenvolvida
anteriormente: “Por ‘racional’ na idéia do divino entendemos aquilo que nela pode ser
formulado com clareza, compreendido com conceitos familiares e definíveis.
Afirmamos então que ao redor desse âmbito de clareza conceitual existe uma esfera
misteriosa e obscura que foge não ao nosso sentir, mas ao nosso pensar conceitual, e
que por isso chamamos de ‘o irracional’” (OTTO, 2007, p.97-98). Com isso, ele quer
dizer que o irracional escapa ao conceito, mas se mostra acessível ao sentimento. A
noção de sentimento, que também remete a Schleiermacher, pode ser compreendida
pelo duplo emprego feito por Kant.
Para compreender o emprego do termo, é importante retomar a recepção de
Kant no século XIX, especialmente a de Jakob Fries. Na sua leitura de Fries, Otto
destaca que três tipos de cognição. O conhecimento (em sentido estrito) é produzido a
partir da combinação entre categorias e intuição. Este tipo de cognição é desenvolvido
por Kant na sua primeira crítica, Crítica da Razão Pura, mostrando-se útil ao
conhecimento científico. A fé, como segundo tipo de cognição, constitui-se a partir de
ideias produzidas às quais não correspondem nenhuma intuição sensível (fé como
convicção de coisas que não se vê). A terceira forma de cognição é denominada de
Ahnung (intuição), entendia como tipo de sentimento aos quais não corresponde
nenhum conceito sendo, portanto, imediato. É este último tipo de cognição que permite
a apreensão do eterno no temporal. Textualmente, afirma Otto sobre a Ahnung em
Fries: “[...] e então nós entendemos sem nenhum meio o Eterno no temporal, e o
temporal como aparição do Eterno. Inteligível o suficiente, positivamente, ainda que
além de nossos poderes de expressão, o mundo da fé se manifesta no mundo do
conhecimento por meio da Ahnung” (OTTO, 1931, p.141). Com isso, não se defende
espécie de “intuição intelectual”. Todo o conhecimento (em sentido estrito) deve ter a
experiência como pedra de toque, de modo que não se pode compreender o infinito
em conceitos positivos. Por essa razão, Otto é incisivo em demonstrar a distância
existente entre Fries e tendências do idealismo alemão, especialmente Hegel. É por
meio do sentimento que se tem conhecimento do eterno. Enfim, como se pode notar,
sentimento não pode ser confundido como mera emoção. Antes, é uma forma
específica de cognição pré-reflexiva.
A noção de irracional aparece desde muito cedo no pensamento de Otto. Ela é
possível de ser identificada no seu primeiro livro publicado, que trata da noção de
Espírito Santo em Lutero. Aliás, o próprio Otto nos dá elementos para pensar a
importância de Lutero, ao afirmar: “Inclusive foi ‘O servo-arbítrio’ de Lutero que formou
em mim a compreensão do numinoso e da sua diferença para com o racional, muito
antes de eu reencontrá-lo no qadosch do Antigo Testamento e nos elementos do
‘receio religioso’ na história da religião em si” (OTTO, 2007, p.138). Nesta mesma
página, Otto cita na nota de rodapé seu trabalho sobre Lutero: Die Anschauung vom
Heiligen Geiste bei Luther. Göttingen, 1898 (Cf. MINNEY, 1990).
Em O sagrado, lembra constantemente que o contato entre o numinoso e a
alma humana é sem mediação. Em outros termos, o fato de não ser acessível
intelectualmente, não significa que se deva calar sobre o irracional. Caso esse racional
não fosse passível de assumir certa expressão (ainda que parcial), o próprio livro de
Otto seria um empreendimento irrealizável. A saída encontrada é voltar o olhar para os
ideogramas e símbolos, pois eles podem
descrever seus aspectos da forma mais aproximada possível para
assim firmar com “sinais” duradouros aquilo que flutuava em oscilante
aparição do mero sentimento, e chegar a uma discussão unívoca e
de validade geral, formando “doutrina sadia”, que apresente estrutura
firme e busque validade objetiva, ainda que opere apenas com
símbolos conceituais em vez de conceitos exatamente
correspondentes. Trata-se não de racionalizar o irracional, o que é
impossível, mas de captá-lo e fixá-lo em seus aspectos, assim
fazendo frente ao ‘irracionalismo’ do entusiástico discurso arbitrário
(OTTO, 2007, p.99).
Para Otto, o ideograma ou símbolo não é arbitrário (como em W. James), mas
deve ser de algum modo apropriado. A questão é saber como e quando estes
símbolos/ideogramas são adequados. Aliás, como se pode julgá-los como adequados
ou não? O símbolo funciona como certo estímulo para rememorar o ouvinte de algo
que ele está consciente. Com isso, Otto não está querendo dizer que o símbolo
racionaliza o irracional. Caso admitisse esta hipótese, entraria em contradição com o
aspecto irredutível do irracional afirmado anteriormente. Entre o racional e o irracional
há certo abismo, impossível de ser totalmente transposto. Há um hiato. Isso, no
entanto, não significa afirmar o irracionalismo, uma vez que os ideogramas podem ser
úteis. Há ideogramas mais adequados, que correspondem melhor. Isso confere
determinada objetividade a este sentimento. Aliás, ele é tornado público (retirando-se
desta esfera subjetiva) por meio desta operação.
Conclusão
Como se pode observar, em diálogo com correntes de sua época, reconhece a
importância do racional na constituição do sagrado que anima as diversas
manifestações religiosas bem como as tentativas teóricas de compreendê-las. No
entanto, Otto busca restringir esse racional, apontando para uma dimensão que não
pode ser contida por esse âmbito e que se mostra mais fundamental: o irracional. As
exterioridades das manifestações religiosas, desse modo, pressupõem e são
animadas por esse elemento vivo e dinâmico, acessível apenas indiretamente pelo
símbolo.
Saltando para nosso contexto, em termos de abordagem do fenômeno religioso
em sala de aula, é de se fazer duas questões. A primeira, tomando como referência a
discussão anterior, diz respeito ao modo como o fenômeno religioso é interpelado. De
certa maneira, a crítica que Otto faz aos seus contemporâneos não poderia ser dirigida
a muitas formas de se tratar da religião nas salas de aula? Muitas vezes, ela é tomada
apena como conjunto de ideias e exterioridades, mas que se esquece dessa dimensão
mais viva da religião. É certo que o sagrado se exterioriza por símbolos, mitos, ritos,
doutrinas, relações sociais, ideias religiosas etc. Mas, como fica aquilo que dá fôlego a
essas aparições do sagrado?
Do mesmo modo, coloca-se a questão de como tratar dessa dimensão?
Novamente, muitas vezes se trata os símbolos no nível meramente de significação,
como se determinado objeto ou ideograma fosse uma referência a uma ideia clara e
distinta. No entanto, o símbolo é muito mais do que isso. Ele pode ser o meio que as
religiões encontraram para expressar essa dimensão irracional do sagrado que, de
outro modo, poderia ficar inacessível.
Referências
GOOCH, Todd. The Numinous and Modernity. An Intepretation of R. Otto’s
Philosophy of Religion. Berlin: Walter de Gruyter, 2000.
MINNEY, Robin Minney. “The development of Otto's thought 1898–1917: From
Luther's View of the Holy Spirit to the Holy”. In: Religious Studies, 26, 1990. Pp. 505524.
OTTO, R. O sagrado. Trad. Walter O. Schlupp. Petrópolis/São Leopoldo,
Vozes/Sinodal, 2007.
______. O sagrado. Um estudo do elemento não-racional na idéia de divino e sua
relação com o racional. Trad. Prócoro Velasques Filho. SBC: Ciências da Religião,
1985.
______. The Idea of Holy.Trad. John Harvey. Oxford University Press, 1936.
______. Naturalism and Religion. Trad. J. Arthur Thomson. Londres, 1907.
(Disponível em http://www.gutenberg.org/files/31794/31794-pdf.pdf).
______ The Philosophy of Religion based on Kant and Fries. Trad. E.B. Dicker.
New York: Richard R. Smith, 1931.
_______. West-Östlich Mystik. Gotha: Klotz, 1926.
SCHLAM, Leon. Numinous Experience and Religious Language. In: Religious
Studies, 28, 1992. Pp.533-551.
PROJETO RECICLART UEPA: PROMOVENDO PRÁTICAS SUSTENTÁVEIS
ATRAVÉS
DA
ESPIRITUALIDADE
DESENVOLVIDA
NA
FORMAÇÃO
DO
PROFESSOR DO ENSINO RELIGIOSO
Ariane Caldas - UEPA5
Resumo
Este artigo pretende expor as práticas sociais exercidas dentro da instituição de ensino
superior Universidade do Estado do Pará (UEPA), onde buscamos no seio da formação de
professores do ensino religioso uma possível captura dessa consciência ambiental. Usamos
como suporte teórico um dos eixos temáticos localizados nos Parâmetros Curriculares
Nacionais do Ensino Religioso (PCNER): o Ethos e sua temática de valores e respeito com o
ser humano e o espaço que o envolve, além do uso de uma hermenêutica ecológica localizada
no livro de Gêneses que foi utilizado como referencial teórico para definir a relação homemnatureza. Nas práticas sociais desenvolvidas pelo projeto, relataremos a realização de uma
oficina realizada entre os alunos do curso de Ciências da Religião, cujo principal objetivo foi
despertar no futuro professor essa consciência ambiental e ressaltar valores éticos já
existentes dentro de cada discente.
Palavras-chave: Educação ambiental. Ethos. Práticas sociais.
Introdução
O projeto RECICLART UEPA baseia-se nos princípios de uma hermenêutica
ecológica (REIMER, 2003) e nos eixos organizadores dos conteúdos dos Parâmetros
Curriculares Nacionais do Ensino Religioso (FONAPER, 2009) para compor um
diálogo entre o Ensino Religioso e as práticas da Educação Ambiental no contexto
escolar.
Para alguns autores a questão da sensibilização é o primeiro passo quando se
pretende realizar ações de educação ambiental (TRISTÃO, 2004; VIEGAS E
GUIMARÃES, 2004), mas sabemos que apenas essa identidade afetiva e de
comportamento não é o suficiente para dar um enfoque maior nas práticas efetivas de
educação ambiental. É necessário partirmos para o campo das práticas sociais.
As dificuldades são enormes quando se propõe a trabalhar verdadeiramente a
Educação Ambiental, mas precisam ser enfrentadas, pois, segundo Dias (1992,
p.137), “Sabemos que a maioria dos nossos problemas ambientais tem suas raízes
em fatores, políticos, sócio-econômicos e culturais, e que não podem ser previstos ou
resolvidos por meios puramente tecnológicos”. Daí a grande importância da inserção
da Educação Ambiental e das realizações dessas práticas nas escolas, a fim de
conscientizar nossos professores e alunos ajudando-os a se tornarem cidadãos
5
Graduanda do curso de Licenciatura Plena em Ciências da Religião pela UEPA - Universidade
do
Estado
do
Pará.
Técnica
Florestal
pela
instituição
Escola Técnica
Agroindustrial Juscelino Kubitschek de Oliveira. E-mail: [email protected].
ecologicamente corretos. A teoria em relação à educação ambiental e sustentabilidade
é muito extensa, porém pouco tem-se feito em relação a prática de tal ensino,
principalmente na sala de aula.Tristão (2004) sinaliza que uma sensibilização dos
professores para o tema pode ocorrer durante sua formação universitária, em
conversas informais com colegas de trabalho, na participação em eventos, cursos e na
militância em partidos políticos, entre outros.
O projeto RECICLART UEPA surgiu dessa necessidade de trabalhar de forma
prática a Educação Ambiental dentro do âmbito da formação do profissional do Ensino
Religioso, estimulando a reflexão crítica da importância da prática sustentável no
ambiente escolar.
O projeto possui vários módulos: Módulo I: realização de oficinas didáticas;
Módulo II: Debates e Mesas redondas; Módulo III: Seminários. Estes módulos serão
realizados dentro da instituição e fazem parte de uma programação extensa que
engloba todo o projeto.
Neste estudo descreveremos o Módulo I do projeto em que foi realizada uma
oficina didática com os seguintes objetivos: (1) avaliar os oficineiros de maneira tal a
construção de técnicas; (2) despertar em cada participante a necessidade das práticas
sustentáveis; (3) promover interfaces entre o ensino religioso e a educação ambiental;
(4) produzir aulas práticas para ensino religioso. Para a formação do professor de
ensino religioso foi aplicada para os discentes do curso de licenciatura plena em
ciências da religião. Os resultados serão discutidos ao longo desse artigo.
Este artigo tem como objetivo expor a real necessidade do despertar da prática
da sustentabilidade na formação docente do professor do ensino religioso. Está
dividido como segue: Na seção 1 será descrito a fundamentação teórica que envolve a
formação do professor e as práticas pedagógicas na Educação Ambiental, o ensino
religioso, o despertar do Ethos e a interdisciplinaridade ou a transversalidade da
educação ambiental; Na seção 3 têm-se as práticas sociais abordadas para o projeto
RECICLART UEPA com a execução de uma oficina e por fim, na seção 4 as
considerações finais e trabalhos futuros.
A Hermenêutica Ecológica no Livro de Gênesis
Crescei e multiplicai-vos, DOMINAI E
SUBMETEI a terra, os animais, as aves e os
peixes…. (Gênesis 1: 28 – Antigo Testamento
– Bíblia Sagrada)
A preocupação com a destruição ambiental e a consequente ameaça às
diversas formas de vida no planeta Terra, principalmente do ser humano.
Uma das conclusões que podemos chegar por meio do mútuo diálogo/influência entre
teologia da criação e hermenêutica bíblica é que se tende a relativizar a ideia de poder
e dominação nas narrativas de criação bíblicas.
Deve-se também relativizar as atribuições de domínio dos humanos e
ações na criação (Gn 1,28), vendo suas possibilidades e seus limites
e fortalecer uma leitura que destaca a tarefa de trabalho e cuidado na
criação (Gn 2,15). (REIMER, 2005).
A perspectiva decocriador e cuidador da natureza como criação é pressuposto
básico de uma leitura ecológica da Bíblia para o papel do ser humano.
O mandato de domínio, em Gn 1.26-28trata de uma “interpolação secundária”
(REIMER, 2003). Ou seja, a noção original de um paraíso que abrigava
harmoniosamente todos os seres no relato de Gênesis 1 foi perturbado com a
introdução, por parte de copistas, de referências à subjugação da criação por parte do
ser humano no texto de Salmos 8.6-9. No entanto, esta interpretação por mais
plausível que seja, não explica suficientemente a complexidade de sentido expresso
no texto lido atualmente. Em função da percepção do acúmulo de apropriações de
sentido dadas ao texto na tradição judaica e cristã, e levando-se em conta os relatos
da criação no conjunto do Antigo Testamento, logra-se êxito em afirmar que a idéia de
poder-dominação provém da apropriação de sentido posterior à origem do texto,
proveniente de várias influências ideológicas.
É importante ressaltar que justamente por causa desta interpretação se
entende que em ambos os relatos de Gênesis fica evidente que os humanos não
podem fugir de sua situação como criatura e seu destino, portanto, está ligado ao
destino da criação. Esta tese converge diretamente com a noção de ecologia social: as
complexas relações ecológicas dos seres humanos ao longo da história contêm
mecanismos de aprendizagem, que continuam a operar ainda hoje.
Para uma compreensão do termo Hermenêutica Ecológica foi necessário
buscar uma profunda reflexão entre os textos bíblicos e um pensar ecológico,
buscando uma releitura “ecológica” dos textos do livro mítico de Gênesis, onde se
revela o papel do ser humano dentro de toda a complexidade que foi a formação do
universo, buscou-se relativizar essa teologia da criação e compreender as atribuições
desenvolvidas do domínio humano na criação e sua tarefa de trabalho e cuidado com
esse mundo como uma criação divina.
O Projeto Reciclart Uepa nos Eixos norteadores dos Parâmetros Curriculares
Nacionais do Ensino Religioso
Ao buscarmos uma compreensão ao definir o papel do educador e
consequentemente da escola em relação a vivência dos educando no que diz respeito
a princípios de conduta religiosa e confessional ficando por tanto esse papel específico
para determinada religião; a escola tem que integrar o educando em uma visão de
totalidade em vários níveis de conhecimento inclusive o religioso e baseado nessa
vertente o projeto RECICLART UEPA se apropia de dois dos eixos organizadores para
os blocos de conteúdo que são: ritos e ethos e iremos descrever a seguir.
Ritos
É a série de práticas celebrativas das tradições
religiosas que formam um conjunto de: Rituais,
Símbolos e Espiritualidades.
(FONAPER, 2009).
Através dos ritos o professor explica aos alunos sobre a busca do
entendimento das práticas celebrativas elaboradas por diferentes grupos religiosos e
identifica os símbolos mais importantes de cada tradição religiosa comparando os seu
significados, nesse sentido o referido projeto proporciona de forma prática o aluno a
não só identificar os símbolos, mas a produzir esses objetos e orienta aos educando
sobre um pensamento reflexivo sobre a relação desses símbolos e compara os
significados a exemplo da oficina “Como o Ensino Religioso me Faz Pensar em
Reciclar” - módulo II, que produziu oratórios referentes a igreja católica e os gonhozon
que são oratórios usados pelos budistas.
O Que Entendemos Por Espiritualidade
... A espiritualidade não é um estado, mas uma
forma de viver a fé cristã a partir de um impulso
da graça para participar da vida divina na
peregrinação terrestre.
(ZILLES, 2004 ).
Nesse momento usamos como exemplo os sujeitos praticantes das religiões
cristãs para definirmos tal conceito. A palavra espírito, da qual deriva espiritualidade,
não designa espírito do homem, mas o Espírito de Deus, o Espírito Santo. Quando a
Bíblia fala do espírito do homem refere-se não a uma parte do homem, mas ao todo
em sua relação com Deus. Desta maneira, a Espiritualidade não é a exclusão da
materialidade, mas a relação ou união do homem todo – corpo e alma – com o Espírito
de Deus. A espiritualidade é compreendida então como uma opção na mudança do
modo de vida. Perez (2000) faz uma análise histórica da religiosidade brasileira,
explicando sua diversidade étnica que influencia no modo de ser religioso. As
diferentes religiões se constituem pelo produto da diversidade de modos de
organização da sociedade, marcada pelas diferentes civilizações que a compõem,
diferentes economias, personagens, religiões, paisagens, etc. Para esta autora, a
origem do Brasil tem fundo religioso que se confunde com a própria formação histórica
do país.
O Ensino Religioso e o Despertar do Ethos
O Ensino Religioso surge como área do conhecimento que propõe um caráter
reflexivo sobre as questões fundamentais da existência humana. Para tanto, uma
grande perspectiva que temos para a disciplina de Ensino Religioso é a questão do
Ethos, que, segundo Longhi (2004 p.14) é uma questão altamente relevante e se
justifica pela relação do comportamento do ser humano com a transcendência. Já Boff
(2009, p.10) denomina como “cuidado, cooperação, corresponsabilidade, compaixão e
reverência”, responsável por salvar a humanidade, a vida e a própria Terra.
Assim o professor de ensino religioso tem responsabilidade de explorar a
questão da cidadania e espiritualidade exercida pelo seu aluno.No contexto do ensino
religioso ethos designa “caráter pessoal; padrão relativamente constante de
disposições morais, afetivas, comportamentais e intelectivas de um indivíduo”, Longhi
(2004, p.17), ou seja, ethos se traduz na maneira de ser habitualmente, no caráter
pessoal.
A presença e a ênfase ao ethos no Programa de Ensino Religioso se justifica
pela estreita relação existente entre moral e tradição religiosa, querendo entender que
é no interior de cada indivíduo que nasce a experiência religiosa. É no ethos que
encontramos sua expressão mais autêntica, assim como sua vinculação mais antiga.
Encontrada pela primeira vez em Homero, a palavra ethos significava
“morada”. Não sendo arquitetura ou técnica de construção, tampouco
o local em que se habita, ethos é habitat, “toca”, mas também o fato e
a maneira de habitá-la. A modesta tenda do caçador nômade ou a
casa do agricultor sedentário é localização em um espaço sagrado de
onde se faz possível a comunicação com os deuses. Habitar um
espaço é decisão religiosa que, “cosmizando” o caos, santifica um
pequeno cosmos, tornando-o semelhante ao divino. O desejo de ter
uma “morada semelhante à casa dos deuses” foi representado mais
tarde em santuários e templos (MATOS, 2001, p. 59).
Portanto, educar para o transcendente requer educar para dar sentido à vida.
Assim, a educação religiosa deve ser construída não a partir da religião, mas do ser
humano, segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Religioso
(FONAPER, 1998). Buscar a partir da vivência e das ações cognitivas dos alunos o
despertar para essa consciência, de um desejo de respeito e dignidade com o
ambiente em que vivemos e que onde realizamos nossas práticas religiosas.
A Formação do Professor do Ensino Religioso
A formação de professores de Ensino Religioso ampara-se no artigo
62 da Lei nº 9.394/96 – LDB(Lei de Diretrizes e Bases) da Educação
Nacional, na Lei nº 9.475/97, nas Diretrizes Curriculares Nacionais
Para Formação de Professores de Ensino Religioso e na Resolução
Nº 02/98- Da CEB/CNE (Câmara de Educação Básica e do Conselho
Nacional de Educação) que cita o Ensino Religioso entre as dez
áreas curriculares do Ensino Fundamental(HOLANDA, 2004).
O Ensino Religioso baseia-se nos princípios educacionais e não sobre
argumentações religiosas. O Ensino Religioso utiliza-se de aspectos da Ciências da
Religião para compreender o fenômeno religioso em todas as instâncias da existência
humana,vivemos num período de muitas modificações e momentos incontestáveis de
extensas incertezas. Assistimos uma grande exaltação da produtividade e
competitividade nos diversos segmentos da vida humana, inclusive na educação.
Neste contexto está incluída a figura do educador do Ensino Religioso e os saberes
que servem de base para a sua prática educativa. Saber este que não pode ser
desvinculado das outras dimensões do ensino, de sua profissionalidade, de sua
formação e de sua epistemologia da prática.
Relacionar Ensino Religioso e Educação Ambiental pressupõe pensar a
formação docente e a prática pedagógica com qualidade, por isso se faz necessário
entender a formação do professor para o desenvolvimento dos saberes docentes,
como a prática sustentável, que exige conscientização, capacitação e valorização
profissional, como também políticas adequadas, considerando o local de trabalho do
professor.
O educador Freire (1996) já se referiu à formação como um fazer permanente
que se refaz constantemente na ação. Sabe-se que a formação não se dá por mera
acumulação de conhecimentos, mas através de múltiplas trocas de experiências e
outros.
A Interdisciplinaridade ou a Transversalidade da Educação Ambiental
Ao analisarmos uma das questões que tem levantado inúmeros e
aparentemente intermináveis debates no meio acadêmico sobre formação docente é
em qual disciplina podemos inserir a Educação Ambiental no Ensino Fundamental.
Essa questão de “encaixe” tem gerado diversos assuntos divergentes, e essa é
uma das polêmicas que mais tem sido discutida pelos educadores ambientais nos
mais diversos espaços como eventos e seminários que envolvem tanto uma
abordagem disciplinar (como uma disciplina escolar isolada ou no interior de
disciplinas escolares já existentes) quanto interdisciplinar e/ou transversal. Podemos
entender que as políticas públicas,e as legislações específicas que abordam o tema
da educação ambiental ainda são muito recentes no país. Portanto, nessa seção não
poderíamos deixar de mencionar também, a elaboração, em 1998, dos Parâmetros
Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental (PCN), documento que institui
formalmente o ‘meio ambiente’ como um tema transversal dos currículos escolares.
Entendemos que esse aspecto que contribuiu para propagar, disseminar e aprofundar
o debate acerca das questões ambientais no universo escolar como um conjunto de
conhecimentos essencialmente válidos e necessários para o pleno exercício da
cidadania. É a partir dessa visão que inserimos este tema na disciplina de ensino
religioso, voltando e envolvendo questões do ethos já relacionado neste artigo. Bovo
(2004) aponta que os equívocos advindos da base conceitual e das interpretações de
terminologias como interdisciplinaridade e transversalidade constituem, quase sempre,
fatores para a não efetivação de certas práticas docentes. Ainda relacionado a essa
questão Sato & Passos (2003, p. 2-3) destacam:
A produção dos conhecimentos advoga um tratamento interdisciplinar
– sintetiza a vasta literatura. Mas qual é a definição para ela?
Diversas nomenclaturas vêm sendo utilizadas paulatinamente,
deferindo nas definições, nas práticas e nos campos ontológicos. Não
bastasse essa indagação, assistimos, de um tempo para cá,
propostas do Ministério da Educação (MEC, 1996) sobre uma
proposta “transversal”, pondo a dimensão do “meio ambiente” (entre
outros) como tema transversal no currículo. Mas qual é o de
transversalidade, neste contexto? É diferente de interdisciplinaridade?
Essa forma de organização só ocorre em espaços formais da
educação? Como colocar em prática? Diversas outras perguntas
bombardeiam-nos cotidianamente, deixando-nos imobilizadas frente
às propostas que nos chegam(grifo dos autores).
Por fim, ao tratarmos do referido tema não podemos deixar de refletirmos sobre
uma questão levantada por Guerra & Guimarães (2007, p. 162)16 – “Como fazer a
Educação Ambiental acontecer em todos os níveis de ensino, como recomenda a Lei
nº 9.795, de 27 de abril de 1999” – ansiamos por disseminar essas reflexões e
identificar outras possibilidades de como e onde a Educação Ambiental na escola.
O Projeto Reciclart Uepa: Interfaces entre Ensino Religioso e Educação
Ambiental
O projeto RECICLART UEPA busca valorizar as experiências religiosas
relacionando diferentes culturas envolvidas no âmbito escolar, articula conhecimentos
e debates sempre respeitando as diferenças e proporciona ao educando a
possibilidade de superar preconceitos sobre qualquer experiência religiosa, através de
oficinas pedagógicas realizadas nas escolas da rede pública de ensino selecionada
pelo projeto.
Compondo a programação do projeto que acontece no período de fevereiro a
dezembro do ano de 2014, uma extensa programação que envolve seminários, ciclo
de palestra, mostra culturais, debates reflexivos e as práticas docentes através das
oficinas do projeto que serão descritas a seguir.
As Oficinas do Projeto Reciclart Uepa: Um espaço de aprendizagem
O projeto propõe práticas em sala de aula que torne o ato de ensinoaprendizagem interessante envolvendo o professor e o aluno num trabalho motivante
e participativo. Destaca-se como relevante o preparo do futuro professor para a
adequação educativa às características dos alunos.
Em sua etimologia a palavra oficina se origina no latim “officina” e significa
lugar de trabalho, é nesse sentido que infere uma situação pedagógica denominada
oficina pedagógica,referindo-se a oficina pedagógica Martin afirma: “Procuramos
através desse espaço,criar uma atmosfera facilitadora, para que a elaboração, o
discernimento e a construção pudessem ser uma constante no fazer coletivo”.
Durante o processo construtivo das oficinas buscou-se produzir conhecimentos
a partir de situações vivenciadas por cada um dos participantes, o processo criativo
baseia-se em momentos marcados pelo exercício constante do pensar e do criar pelo
incentivo à descoberta de novas facetas do conhecido e a ousadia da reelaboração da
construção do novo e para isso “costuramos” técnicas de artes plásticas, o pensar da
sustentabilidade através da reciclagem e o fazer coletivo para um bem comum.
A cada oficina executada pelo projeto destacamos a reflexão e a troca de
experiências dos envolvidos,confrontando a prática com a teoria para um avanço na
construção coletiva do saber, identificamos uma atuação efetiva dos participantes com
responsabilidade e compromisso e o empenho na execução das tarefas, otimizando a
prática do ensino-aprendizagem.
A oficina “Como o Ensino Religioso me Faz Pensar em Reciclar” – módulo I,fez
parte da programação “Semana do Calouro UEPA”, possuiu carga horária de 4 horas
e teve 25 inscritos, com o objetivo de despertar a consciência da coleta e da produção
de produtos úteis feitos a partir de lixos domésticos, além de proporcionar a prática da
docência no oficineiro, que é aluno da referida instituição regularmente matriculado no
curso de Licenciatura Plena em Ciências da Religião, sobre educação ambiental e
suas possibilidades de aplicar tarefas simples porém eficazes para uma possível
consciência ecológica que deverá ser desenvolvida em seus alunos na prática da sala
de aula.
Foram necessários embalagem de sucos industrializados coletadas na escola
pública de ensino fundamental “Santo Afonso”, resultados de um trabalho de
consciência ambiental com as servidoras da cantina, através de palestras realizadas
na escola estadual a qual foi proposta.
O material recolhido serviu de matéria-prima pra a construção dos artefatos
produzidos ao final da oficina como: carteiras porta-cédulas, vasos decorativos e
fechadores práticos para embalagens de cereais.
Durante a oficina, pôde-se perceber que os alunos ou agentes multiplicadores
desenvolveram a questão do sensibilizar para a consciência sustentável através da
reciclagem. Por outro lado, os oficineiros, que chamamos de facilitadores, promoveram
princípios éticos de sustentabilidade e cidadania.
Por fim, facilitadores e multiplicadores puderam perceber que através de
materiais considerados inutilizáveis, foram reaproveitados para transformação deste
material em algo utilizável.
A oficina “Como o Ensino Religioso me Faz Pensar em Reciclar” – módulo II
Símbolos Sagrados produziu oratório feitos com embalagens de leite longa, símbolos
sagrados para algumas religiões a exemplo dos oratórios católicos que serve como um
nicho para as imagens desantos, destinado à devoção particular de um devoto.Os
oratórios originaram-se naIdade Médiae até os dias de hoje ainda é utilizado nas
casas como local de oração, foram inicialmente destinados à moradia do rei. As
famílias mais ricas também passaram a ter seusaltaresparticulares e à medida que o
culto aos santos se propagava, estes altares ou capelas passaram a ser frequentados
pelas associações leigas, confrarias, uma das mais conhecidas foram os oratorianos.
Este hábito se popularizou e chegou às colônias portuguesas através dos
colonizadores. O costume disseminou no Brasil, onde os oratórios se espalharam nas
fazendas, senzalas e residências no processo de colonização e catequização.
Relacionamos os oratórios católicos aos Gonhonzon que é um objeto de adoração na
prática do budismo de Nitiren Daishonin (Soka Gakkay) difundido através da lei
místicaNam-myoho-rengue-kyo, alguns dos caracteres contidos no gonhonzon
representa personagens míticos,como deuses e heróis budistas,força da natureza e
funções do universo.” Ogonhonzon é a personificação da vida de Buda dentro de
nós.”(SILVA, 2014]. Entrevistador: Ariane Caldas. Belém, 2014)6
De tal maneira o projeto RECICLART UEPA buscou de forma prática
acompanhar os alunos a um pensamento reflexivo que relaciona símbolos sagrados
de determinadas religiões,na ocasião também produzimos oratórios com a imagem de
Iemanjá ,deusa da umbanda, e a Krishina um dos deuses que configuram o panteão
do hinduísmos,
objetos esses produzidos a partir de caixas de fósforos
reutilizadas.Desta forma o projeto buscou relacionar os símbolos sagrados de
determinadas religiões comparando seus significados,e acreditamos ser relevante não
o que se ensina,mas quais os efeitos desta aprendizagem para os alunos participantes
das oficinas do projeto
A escola onde foi aplicada a oficina foi a Escola Estadual Vera
Simplício,localizada no bairro do Telégrafo,iniciamos o projeto aplicando uma palestra
sobre a temática “Como o ensino religioso me faz pensar em reciclar?” tendo como
público o corpo docente da instituição selecionada pelo projeto,como resultado dessa
palestra pretendemos despertar uma consciência ambiental na comunidade escolar
(professores,serventes,direção,etc...) e uma sensibilização para a arrecadação dos
produtos recicláveis para o próximo momento do projeto que será a aplicação da
oficina alteridade dos alunos, o gosto pelas artes manuais, pretendemos analisar a
religiosidade
existente
nos
alunos
ao
confeccionar
a
partir
de
produtos
recicláveis.Todos os produtos confeccionados pelas crianças participantes da oficina
serão expostos em forma de instalação na Universidade do Estado do Pará, campus
CCSE, compondo assim mais uma etapa do projeto que é a Mostra Cultural.
Estão programadas as oficinas “Como o Ensino Religioso me Faz Pensar em
Reciclar” –módulo III E IV, e iremos produzir brinquedos pedagógicos e instrumentos
musicais, respectivamente,como parte das programações educativas da “E.E Vera
Simplício".Por ora, as oficinas do PROJETO RECICLART UEPA mantêm-se
financeiramente através de recursos capturados pela autora do mesmo.
6
(informação verbal) fragmentos da entrevista concedida por Antônio Silva,em uma visita
realizada no centro de reunião Sokka Gakai,Belém-PA,out,2014.
Quadro 1- Cronograma para aplicação do projeto RECICLART UEPA.
ATIVIDADES
Escolha do tema
Pesquisa
bibliográfica
preliminar
Elaboração
do
projeto
Oficina
RECICLART
UEPA, SEMANA
DO
CALOURO
UEPA-CCSEBELÉM-PARÁ
Comunicação Oral:
Semana do Meio
Ambiente
NECAPS- CCSEUEPA-BELÉMPARÁ
Exposição
de
Banner - 27 º
Congresso
Internacional
de
Teologia
e
Ciências
da
Religião – SOTERPUC–BELO
HORIZONTE
MINAS GERAIS
Seminário
apresentação
do
projeto
aos
discentes do curso
Elaboração
e
Execução Oficina
Pedagógicaoficineiros
Palestra sobre a
temática “como o
ensino religioso me
faz pensar em
reciclar ? ”
Oficina“
símbolo
sagrados”
Estadual “ Vera
Simplício”
Exposição Cultural
UEPA-CCSEBELÉM-PARÁ
Comunicação
oral:VIII
SEFOPERBELÉM-PA
FEV
MAR
ABR
JUL
SET
OUT
NOV
DEZ
Oficina brinquedos
pedagógicos:
Semana da Árvore
E.E.E.F“Vera
Simplício”
Comunicação oral:
saber –fazer da
pesquisa
UEPACCSE-BELÉMPARÁ(proposta
enviada,
aguardando
confirmação)
Oficina
Instrumentos
musicais reciclados
Oficina
reciclar
para o natal
Considerações
Ao longo do texto as experiências pedagógicas que foram obtidas a partir da
realização das atividades executadas dentro do ambiente acadêmico como a oficina
que faz parte do projeto RECICLART UEPA, sobre as práticas pedagógicas adquiridas
inerentes a formação de docentes do ensino religioso, a ética religiosa encontrada em
um dos eixos temáticos do ensino religioso, o ethos, que está inserida dentro dos
parâmetros curriculares nacionais do ensino religioso e a partir dessa ética iremos
abordar temas como sustentabilidade buscando a interdisciplinaridade que envolve a
educação ambiental como um todo.A pesquisa sobre uma hermenêutica ecológica
localizada no livro de Gênesis foi de fundamental importância, pois trouxe-nos a uma
reflexão de um pensar ecológico e de uma releitura nos textos bíblicos visando
identificar o papel do ser humano mediante como papel de “cuidador” desse universo
sob uma perspectiva de uma ecologia social, em que o ser humano possui deveres
sob a boa manutenção desse universo.
Este trabalho teve como objetivo conscientizar a comunidade acadêmica sobre
a sustentabilidade e o bom aproveitamento dos materiais recicláveis de uso doméstico
despertando o desejo do futuro professor a trabalhar com alunos do Ensino
Fundamental, e construir os mesmos da importância da reciclagem dos resíduos
sólidos domésticos, e da necessidade da mudança de hábitos visando à conservação
do Meio Ambiente, através de alternativas dinâmicas e interativas a partir de
atividades práticas. Buscamos com essa prática valorizar as experiências religiosas e
sensibilizar os educandos a envolver-se com diferentes culturas e proporcionar a esse
educando condições para um despertar de uma construção de uma identidade
religiosa, além de promover debates e trocas de conhecimentos no que diz respeito a
nações básicas de cidadania e do respeito às diferenças.
Referências
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SATO, Michèle; PASSOS, Luiz A. Notas desafinadas do poder e do saber — quala
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TEIXEIRA, Evilázio Francisco Borges, / Organizadores: Marisa Campio Müller, Juliana
Dors Tigre da Silva.Espiritualidade e qualidade de vida. Porto Alegre: EDIPUCRS,
2004. 224 p.
O PROFESSOR DE ENSINO RELIGIOSO7
Jéssica Kerolaine dos Santos Sousa - UEPA8
Stepheny Jennf Araújo Rahan - UEPA9
Resumo:
A LDB mostra a importância da disciplina de Ensino Religioso, além de interferir em como a
mesma deve ser considerada. A educação é um processo singular e ao mesmo tempo
complexo. Contudo, de alguma maneira, reflete sempre o pensar de uma comunidade, de uma
sociedade. Exige, necessariamente, um profundo diálogo com outras áreas do conhecimento e
com outras experiências; pois, este movimento promovido pela educação é na realidade algo
efetivado com intensidade e intencionalidade. O professor deve entender no exercício de sua
função, o aluno como sujeito de múltiplas relações, pois este está em processo de formação e
deve ser considerado em sua totalidade, deve ser assegurado ao educando uma formação
crítica, capaz de levá-lo a refletir sobre o cotidiano e interferir positivamente em seu meio e,
sobretudo, em sua vida para transformá-la. O educando de Ensino Religioso deve ser um
mediador da própria questão religiosa e de todo movimento que esta última acarreta. Daí, a
importância do professor de ensino religioso, sua formação, entre outros, onde este funciona
como mediador entre o elemento religioso presente na realidade social e a realidade
pedagógica da escola. O conteúdo abordado pelo Ensino Religioso terá, também, a
preocupação com os processos históricos de constituição do sagrado, com os quais se
fundamenta e se consolida, neste ponto, o Fonaper é de relevante importância.
Palavras-chave: Formação. Ensino Religioso. Plano de Ensino.
Introdução
O ensino religioso está relacionado com a chegada dos portugueses ao Brasil
em 1500, os mesmos trouxeram consigo os seus costumes, cultura, religião e com
eles os escravos africanos (que também incorporaram a sua própria cultura e religião)
neste país, que passou a ser “confessionalmente” católico por imposição dos
portugueses. Somente tempos depois, após a Proclamação da República que teve-se
a liberdade de cultos e etc.
Após isso, o estudo de Ensino Religioso também passa a ser considerado
importante para a formação básica do cidadão, e com isso tem-se a constituição de
1934 que declara que o ensino religioso é facultativo nas escolas, a escola começa a
se tornar num espaço de reflexão e de construção de conhecimentos relacionados à
diversidade cultural. A LDBEN (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional)
trouxe consigo o reconhecimento para o ensino religioso e avanço na educação.
7
O artigo apresenta pesquisa iniciada no ano de 2012, com o intuito de verificação das aulas de
Ensino Religioso por professores sem formação na disciplina, em instituições públicas.
8 Jéssica Kerolaine dos Santos Sousa, acadêmica do terceiro ano do curso de Licenciatura
Plena em Ciências da Religião, da Universidade do Estado do Pará (UEPA),
[email protected].
9 Stepheny Jennf Araújo Rahan, acadêmica do terceiro ano do curso de Licenciatura Plena em
Ciências da Religião, da Universidade do Estado do Pará (UEPA).
Ainda assim, muitos têm dúvidas sobre a permanência do Ensino Religioso,
esse tipo de pensamento é devido a falta de qualificação de muitos professores que
acabam ministrando aulas de forma catequética e confessional; ou as desenvolvem
numa perspectiva moralista e doutrinária, o que é totalmente contrário ao que afirma o
Fonaper (Fórum Permanente do Ensino Religioso).
`
Segundo a concepção de educação proposta na LDBEN 9.394/96, o Ensino
Religioso constitui um dos elementos para a formação integral do ser humano no
espaço da escola, juntamente com os demais componentes curriculares. Assume o
compromisso de pensar, discutir, analisar e organizar critérios encaminhadores de
vivências fundamentadas numa ética planetária que se percebe e se julga na
alteridade e tem na liberdade, na justiça, no direito à diferença, na solidariedade e na
defesa da dignidade do ser humano os referenciais para uma educação diferenciada
(JUNQUEIRA, 2002).
O presente artigo teve início de pesquisa no ano de 2012, no qual o objetivo foi
o de verificar, relatar e o de observar como estão sendo ministradas as aulas de
Ensino Religioso nas escolas de ensino fundamental, tanto sobre os conteúdos como
o profissional. Com a justificativa de conhecer em geral a atuação do profissional na
área, abrangendo desde o uso do proselitismo até o interesse nas aulas de Ensino
Religioso, tanto do profissional quanto dos alunos.
Diante desse fato é que surgem as questões que serão relatadas no decorrer
do artigo, como: formação acadêmica da professora; conteúdo e metodologia usados
pela mesma; proposta curricular do Ensino Religioso recomendada pelo Fonaper;
também os resultados que obtivemos na pesquisa.
Percurso Metodológico
A pesquisa foi realizada na E.E.E.F.M. Dr. Freitas, localizada na Avenida
Generalíssimo Deodoro, 220 – Umarizal, nos dias (01/06/2012; 15/06/2012;
19/06/2012).
Essa pesquisa foi realizada nas salas de ensino fundamental do sexto e o nono
ano (respectivamente: quinta e oitava séries), com especificamente trinta alunos em
cada turma, as aulas são ministradas por uma professora relativamente nova nessa
instituição, cujo nome omitiremos para preservar sua identidade.
Começamos com a estrutura do prédio, que segundo alunos e professora “não
ajuda na ministração das aulas”, a quadra de esportes se localiza no centro da escola,
que é relativamente pequena para uma instituição que abriga alunos de ensino
fundamental e médio e em dois turnos, e por não possuir um local de lazer para os
alunos que estão em horário recreativo ou em horário vago, o resultado é a
aglomeração dos mesmos nos espaços da quadra esportiva e transição dos
estudantes nos corredores da instituição, atrapalhando assim as aulas dos professores
resultando na desconcentração dos alunos, pois o barulho ecoa por toda a instituição.
Essa reclamação não foi feita apenas pela professora que acompanhamos, mas por
vários professores que encontramos ao longo da instituição ao perguntarmos sobre a
estrutura do colégio.
Em se tratando no método utilizado nessa pesquisa, foi entrevistas com a
professora e com os alunos separadamente e também com alguns professores que
tivemos contato ao longo da pesquisa; além da observação antes, durante e depois
das aulas de Ensino Religioso-antes e depois para sabermos como os alunos se
comportavam frente à espera da entrada e da saída da professora na sala de aula, já
que, queríamos obter o máximo de informações sobre a professora e saber se os
alunos a aguardavam com saudade antes da aula ou se desejavam com fervura que a
aula acabasse ajudaria em muito a perceber como é a relação da professora com os
alunos.
O sujeito de pesquisa foi à professora “W”, - preferimos não citar seu nome no
artigo, ainda que ela tenha permitido nomeá-la aqui - católica, a qual possui vinte anos
de graduação em Pedagogia, três anos de Gestão Escolar, e que, há dois anos
trabalha no Ensino Religioso, antes ministrava aulas de Filosofia no ensino médio em
outro colégio, e já foi docente na UVA (em pedagogia) em todos os níveis escolares.
Dificuldades Encontradas na Realização da Metodologia
Ao chegarmos à instituição a ser pesquisada, enfrentamos o desafio de
encontrar a professora, pois a mesma não cumpria com a carga horária do currículo
institucional. Foram cinco visitas atrás da professora, que - apesar dos pesares - não
foram em vão10. Segundo os próprios alunos, era comum a falta da professora e de
suas justificativas. Em um dos encontros marcados pela própria professora, chegamos
à escola e nos deparamos com a instituição em caracterização de festa junina,
perguntamos ao porteiro desde quando a festa estava marcada e se todos da
instituição estavam a par da mesma e ele prontamente respondeu que a festa se
realiza todos os anos na mesma data, pois também é o aniversário da escola e que
todos os discentes e docentes sabiam da confraternização, ou seja, além de irmos
para o possível encontro com a professora em uma manhã em que teríamos aula logo
10Por
que devido a falta da professora, foi possível entrevistar os alunos de modo que ficassem
mais à vontade para falar da mesma.
em seguida, e de não a encontrarmos, descobrimos assim que ela aparentemente era
desinteressada nas festividades da instituição.
Outra dificuldade encontrada por nós foi a indisposição dos alunos para as
entrevistas, no inicio alguns alunos se sentiram pressionados e incomodados com a
ideia de falar sobre a professora - no fim da pesquisa obtivemos a conclusão que essa
indisposição para falar da professora era devido não conhecerem ela, já que, ela
faltava muitas aulas - mas cederam e descobrimos, enfim, que uma das dificuldades
em falar era por não ter o que comentar sobre a disciplina pois não tiveram
professores de Ensino Religioso à altura.
Um ponto que merece ser citado: como parte da pesquisa, precisaríamos
dispor do plano de ensino da professora, já que, uma de nossas prerrogativas da
pesquisa era relacionada há que modo este ensino está sendo praticado. Mas
professora somente iria dispor seu plano de ensino se a ajudássemos na execução de
algumas tarefas com as demais turmas.
O Professor de Ensino Religioso e sua Formação - Segundo o Texto “O Ensino
Religioso no Ensino Fundamental”
Percebemos facilmente que, a formação da professora “W” foi algo de suma
importância, o que interferiu diretamente nas suas aulas. A docente não é formada em
“Licenciatura Plena em Ciências da Religião”, o que a impossibilitou de ter
conhecimentos sobre outras religiões, crenças, culturas, a sua visão de religião era
apenas a Cristã: Católica ou Protestante.
De acordo com Oliveira et al. (2007),o professor de Ensino Religioso deve
trabalhar nos alunos: as diferenças entre cada um. Sobre ensinar os alunos a se
tornarem seres pensantes, críticos e não apenas decoradores de textos. Comenta
sobre a influência exercida pelos professores, ainda que indiretamente, em seus
alunos, mostra como o professor deve agir diante de um tema que abrange não
apenas a sua matéria (Ensino Religioso) e talvez o que seja um dos principais temas:
auxilia o educador à avaliar os seus alunos e a si mesmo.
Um dos tópicos apontados sobre como deve ser o professor do Ensino
Religioso, demonstra a autoavaliação do professor, indicados pelos autores do livro,
onde ele deve verificar:
 Clareza e qualidade de seus trabalhos;
 Desempenho de seus alunos em realizar tarefas;
 Aumento do conhecimento de seus alunos;
 Ampliação da capacidade de lidar com o diferente;
 Qualidade dos materiais construídos pelos alunos.
Ficou claro que a professora não se autoavaliava, pois ela nem mesmo se
interessava nas aulas. Sobre o desempenho de seus alunos em realizar tarefas,
podemos afirmar que a professora não se esforça a fazer isso pois, quando tivemos
que recolher os trabalhos, podemos perceber que as respostas dos alunos eram todas
iguais, e segundo os alunos, não é a primeira vez que isso acontece e a professora
não reclamava sobre isso. Dito isso, o aumento do conhecimento de seus alunos e a
ampliação da capacidade de lidar com o diferente dos mesmos está fora de cogitação,
tendo em vista as aulas da professora, o que inclui o material feito pelos alunos.
Percebemos que a professora utilizou de apenas um assunto para ministrar as
suas aulas, esse tema era o “amor”. Ao utilizar somente a temática “Amor” a
professora apenas influenciou seus alunos a se dar o trabalho de “xerocar” as
respostas dos colegas de sala de aula, onde as respostas para as indagações feitas
por ela, através dos textos eram as mesmas. Podemos perceber inclusive que os
alunos ao serem questionados sobre como era a professora diziam sempre o mesmo:
Ela é calma, tranquila. O que foi quebrado ao frequentarmos as suas aulas, pois
percebemos que a professora rapidamente se estressava com a bagunça dos alunos.
Percebemos assim que nem alunos e nem a professora tentava quebras a barreira
que se intensificava entre ambos. Muitos alunos nem sequer sabiam o nome dela.
Outro ponto vital alinhavado pelo livro é o que o professor irá trabalhar em sala
de aula. O educador deve ter muito cuidado nesse ponto, já que, ainda que não
queira, ou não perceba, ele exerce influência em seus alunos. Sendo professor de
uma disciplina tão plural que é a de Ensino Religioso. A início de conversa, ele deve
ter consciência que os alunos não são livros em branco, cada um trás em si
conhecimentos empíricos que aprenderam em casa, nas comunidades que
frequentam, etc. E isso deve ser respeitado, inclusive valorizado. Um aluno que é de
uma religião não Cristã pode até se interessar em estudá-la, mas se essa religião for
imposta a ele, ele terá intolerância, repudio a ela. Segundo a autora, o professor deve
trabalhar isso em seus alunos. Por isso é tão necessária a formação adequada do
professor. Infelizmente não comprovamos isso na didática da professora entrevistada
e acompanhada por nós.
A autora do texto demonstra que o foco atual diferentemente do antigo, não é
mais fazer o aluno decorar textos, perguntas e repostas como se fossem fórmulas, a
intenção, já mencionada acima, é tornar o discente um ser pensante, crítico, que
possa realizar tarefas com excelência e desempenho. O professor deve ser o
mediador entre o aluno e o mundo e o aluno deve encontrar-se nesse mundo, onde
para isso o educador deve valorizar as diferenças de cada aluno, de instigá-lo,
desafiá-lo e assim fazê-lo integra-se a sociedade. Também não vimos esses aspectos
na professora “W”.
O que queremos mostrar nesse tópico é a dificuldade dos professores de
Ensino Religioso não formados adequadamente. O fato da professora não ser formada
em Ciências da Religião a incapacitou de ter certos conhecimentos sobre a disciplina e
ao tentar trabalhar com a disciplina ela deixou “buracos” em seu trabalho. Não
estamos generalizando ao falar que professores ministrantes da disciplina, não
formados na mesma são inadequados, estamos mostrando como é difícil e impróprio a
contratação dos mesmos para fazer esse trabalho.
Formação da Professora
A docente pesquisada possui vinte anos de graduação em Pedagogia, e três
anos em Gestão Escolar, já atuou em todos os níveis da educação, deste o infantil ao
superior. Lecionou inclusive em Filosofia, atua há dois anos com a disciplina de Ensino
Religioso.
Conteúdo e Metodologia
A metodologia que a professora usa nas suas aulas são textos didáticos
que falam sobre solidariedade, o respeito, o amor,...; pois ela acredita que
trabalhando com esses textos ajudará na formação do aluno como pessoas de
bem para a família e a sociedade.
Alguns exemplos podem ser vistos no plano de aula da educadora:
TURMAS
CONTEÚDO PROGRAMÁTICO
Celebração da Páscoa.
Campanha da Fraternidade.
501 E 502 (SEXTO ANO)
Celebração do Dia Nacional de Denúncia
Contra o Racismo.
Projeto Bíblia: “Alice no Mundo da Bíblia”
(O Filho Pródigo; O Bom Samaritano).
Campanha da Fraternidade.
Celebração da Páscoa.
Projeto Bíblia: “Alice no Mundo da Bíblia”
(O Abraço do Pai – Filme).
801 E 802 (NONO ANO)
Celebração do Dia Nacional de Denúncia
Contra o Racismo.
Oração: Conversa com o Pai (Para que
Rezar?; A Boa Oração; Oração e
Compromisso ).
Nota-se que o método de ensino da docente é enfatizar só no
cristianismo (catolicismo), fazendo assim uma catequese aos alunos com
assuntos que devem ser abordados em uma determinada comunidade
religiosa.
Contudo não é função da escola ou do professor propor aos alunos a
adesão e vivência de princípios de conduta religiosa e confessional, visto que
não é lugar de uma determinada religião.
Segundo o Fonaper“o ensino religioso, como elemento normal do
sistema escolar brasileiro, não deve ser entendido como o ensino de uma
religião ou como o ensino das religiões nas escolas, mas, sim, como um
componente curricular centrado na antropologia religiosa”; então o professor de
ensino religioso sendo ou não graduado na área precisa trabalhar com os
conhecimentos
humanos
sistematizados,
historicamente
produzidos
e
acumulados, ou seja, ter conhecimento de que se trata de ensino religioso e
não de uma catequização.
A estrutura para a disciplina que o próprio Fonaper fornece aos
professores para orientá-los, se dá a seguinte maneira:
EIXOS ORGANIZADORES DO CONTEÚDO
CONTEÚDOS
Filosofia da Tradição Religiosa
História e Tradição Religiosa
CULTURAS E TRADIÇÕES RELIGIOSAS
Sociologia e Tradição Religiosa
Psicologia e Tradição Religiosa
Revelação
ESCRITURAS SAGRADAS ( ORAIS E
História das Narrativas Sagradas
ESCRITOS )
Contexto Cultural
Exegese
Divindades
TEOLOGIAS
Verdades de Fé
Vida Além da Morte
Rituais
RITOS
Símbolos
Espiritualidades
Alteridade
ETHOS
Valores
Limites
Através dos conteúdos da professora e pela observação que foi feita nas
salas de aula percebemos que ela pratica o proselitismo 11 , cujo ato não é
permitido, segundo o artigo 33 da LDB.
Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante
da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários
normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o
respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer
formas de proselitismo (BRASIL, 1997).
O modo avaliativo da professora é dado através da participação dos alunos em
atividades, frequência e trabalhos escritos, onde percebemos que alguns desses
trabalhos escritos consistiam em questões e eram utilizados tanto para o sexto ano
quanto para o nono ano, sem nenhuma diferenciação. Segundo o FONAPER, a
avaliação deve passar por três etapas: Inicial, Formativa e Final. A avaliação inicial
consiste no reconhecimento de grupos culturais/religiosos diferentes, identificados nas
crenças dos alunos. Seguido vem a avaliação formativa, que deve ser formal e
sistemática e ser organizada de acordo com os conteúdos significativos levando ao
conhecimento. A avaliação final verifica a aprendizagem dos conteúdos essenciais e
determinar os conteúdos futuros, se os alunos estão aprendendo os conteúdos e se é
possível levar adiante.
Com tudo isso, percebemos que a professora não avaliava de forma qualitativa
os seus alunos, pois quando os trabalhos pedidos se relacionavam com perguntas
feitas sobre os textos que ela utilizava em sala de aula, os alunos copiavam uns dos
outros as respostas e ao utilizar a questão da frequência como pontuação avaliativa
ela forçava a presença dos alunos em sala de aula.
11É
a tentativa de converter uma ou várias pessoas a uma determinada causa, ideia ou religião.
As Aulas de Ensino Religioso – Conforme o Currículo Fonaper e o Artigo 33 da
Lei de Diretrizes e Bases de Ensino Nacional
Conforme a lei acima, as aulas de Ensino Religioso, apesar de serem
facultativas (escolha), são importantes para a formação do indivíduo. Mas o que
queremos frisar aqui é a escolha do que será ministrado pelos professores. Isso traz
responsabilidade tanto para a instituição de ensino, quanto para os docentes da
disciplina. Será relato logo mais abaixo a metodologia da professora e o que ela
trabalha em sala de aula, mas, iremos comentar um pouco o assunto.
O segundo parágrafo da lei, implica na instituição do ensino ouvir entidade civil,
formadas por diversas religiões, culturas e assim estabelecer a temática e o conteúdo
da disciplina. Na instituição visitada pela equipe, a escolha sobre o planejamento de
ensino é de total escolha dos professores. Ao procurarmos a direção da escola e
perguntarmos sobre a professora e seus métodos de ensino, a escola se mostrou
totalmente indiferente ao assunto, não podemos confirmar se o motivo é a pouca
estadia da professora na instituição ou se é por indiferença mesmo.
Neste mesmoparágrafo da lei citada acima, é de obrigação das instituições de
ensino ouvir entidades religiosas, e somente assim, após serem apontados todos os
possíveis temas a serem abordados pela escola, escolher o que realmente trabalhar
em sala de aula. Lembrando que acima de tudo deve estar o respeito à escolha de
cada aluno, seja qual for sua religião, ou a escolha de não seguir uma. Mas como
podemos comprovar a instituição “Dr. Freitas” não procura seguir este parágrafo da lei.
A escola somente procura preencher a vaga de professor de Ensino Religioso, sem ao
mesmo se preocupar com a formação do mesmo.
De acordo com o Fonaper “A escola é o espaço de construção de
conhecimentos e principalmente de socialização dos conhecimentos historicamente
produzidos e acumulados”. E a disciplina de Ensino Religioso consiste em valorizar o
pluralismo e a diversidade cultural presente no país e é direito do aluno aprender isso,
onde o próprio Fonaper oferece como organizar conteúdos e como avaliar as
atividades.
Os principais temas, segundo o Fonaper, para serem os norteadores da
disciplina são: a morte, a ressurreição, a reencarnação, o ancestral, o nada. A partir
desses temas, é que se podem organizar os eixos que organizarão o conteúdo. Sobre
o conteúdo programático da professora relacionado ao Fonaper, algumas aulas do
plano de aula são relacionados à eles, mas somente na plano de aula.
Como o Docente de Ensino Religioso é Visto e Sua Opinião Sobre a Disciplina

Aos Olhos dos Dissentes:
Segundo alguns alunos, a professora é calma, tranquila, mas deveria mudar
sua metodologia. Alguns alunos reclamaram que as aulas sempre são as mesmas,
com os mesmos assuntos, um aluno disse: “a professora deveria passar filmes, pra
aula não ser sempre a mesma coisa”.
A maioria dos alunos disse gostar da disciplina Ensino Religioso, afirmando não
se interessar muito pela aula por causa da professora. Mas algo que nos intrigou foi a
reclamação de alguns alunos pelo fato da professora faltar aulas e não informar nada.
Perguntamos se certo aluno gostava das aulas da professora “W” ele
respondeu: “Acho as aulas um pouco chatas, porque ela fala muito e ela é muito
fechada com a gente.”.Outra aluna disse: “As aulas dela são muito importantes,
porque ela ajuda a refletir sobre a vida.”.
Foi possível perceber que as opiniões dos alunos em relação à professora se
contradiziam bastante, uns gostavam de suas aulas e outros prefeririam outra
professora, mas a unanimidade foi em relação as faltas dela.

Aos Olhos da Equipe:
Diferentemente dos alunos, a equipe pôde perceber as aulas da professora de
um ângulo diferente. Notamos que existe a falta de interesse da mesma em relação as
aulas, ela faltou a várias dessas aulas e inclusive fez a equipe recolher trabalhos em
cada uma de suas classes. Um fato interessante é que ao pedirmos seu planejamento
escolar, a professora ofereceu uma moeda de troca: teríamos que recolher trabalhos
do sexto ao nono ano e somente no fim teríamos o planejamento em mãos.
A professora se mostrou indiferente ao perguntarmos sobre sua própria visão
em relação ao que ensinava. Percebemos também que apesar de em seu plano conter
a intenção de formar alunos éticos, o que ela fazia era totalmente o contrário.
Podemos dizer que as palavras escritas em seu plano de aula era bem promissor, mas
totalmente diferente ao que ela ensinava. Constatamos enfim que a educadora não
está preparada para ser professora de Ensino Religioso.
O que nos intrigou foi o fato de a professora trocar as disciplinas de sua real
formação por Ensino Religioso, não ficou claro o motivo dessa sua escolha, mas ela
tentou deixar exposto que gostava e muito de dar aulas de Ensino Religioso. Outro
ponto que ela se fez indiferente foi em relação a ministrar aulas dessa disciplina em
outras escolas. Ela não quis falar sobre isso.
Considerações Finais
A pesquisa mostra que o Ensino Religioso ainda tem poucos profissionais
qualificados atuando nos centros de ensino. Quanto ao termo “qualificados”, não
estamos falando que existem poucos profissionais formados em Ensino Religioso pelo
curso de licenciatura plena e sim que muitos dos professores encontrados nas
instituições que têm o Ensino Religioso em seu currículo, são profissionais de outras
áreas, como filosofia e principalmente pedagogia, como é o caso da professora que
está presente em nosso artigo.
Falando sobre a professora, além de ser proselitista, não demonstrava nenhum
interesse ao ministrar as aulas, não dialogava com os educandos- o que é a principal
função do professor de Ensino Religioso, além de ser uma das reclamações dos seus
próprios alunos-e há apenas um conteúdo para todas as turmas de todas as séries,
mesmo que em seu plano de ensino o caso seja diferente.
Pode-se perceber que seu perfil é como os de muitos educadores que não tem
formação na área da disciplina em que atuam, onde falta a real experiência nos
assuntos abordados, até o fim da produção do nosso artigo, descobrimos que a
professora estava para se aposentar e que ela decidiu fazer isso atuando no Ensino
Religioso, além disso, muitos professores de várias áreas escolhem atuar nessa
disciplina porque precisam concluir sua carga horária em aulas. Enfim, fechamos esse
artigo afirmando que o Ensino Religioso precisa ser levado mais à sério pelos seus
profissionais.
Referências
OLIVEIRA, Lilian Blanck de. et al. Ensino Religioso no ensino Fundamental. 1ª
Edição. São Paulo: Cortez, 2007.
OLIVEIRA, Manuel Delmo Silva de. Estrutura e Funcionamento da Educação
Básica.
SCUSSEL, Marcos André. O Ser e o Fazer no Ensino Religioso.Disponível em
http://www.dhi.uem.br/gtreligiao/pdf/st6/Scussel,%20Marcos%20Andre.pdf.
LUSOFONIA AMAZÔNICA: O CIENTISTA DA RELIGIÃO COMO PESQUISADORLICENCIADO
Kellen Irene Rabelo Borges - UEPA12
Rafaela Da Silva Figueiredo - UEPA13
Resumo
O Ensino Religioso e a Ciências da Religião no Brasil estão sempre em condição de estudo,
questões e discussões. A motivação para a elaboração desse presente artigo transcorre pela
importância de expor a Lusofonia Amazônica, região marcada pelo pluralismo que caracteriza o
local em um emaranhado de ethos compondo uma cultura complexa. Nessa perspectiva a
estrutura do tema proposto evoca sobre professores precursores que reformularam a matriz
curricular da disciplina Ensino Religioso na escola pública. Eles contribuíram para o
crescimento e dinamismo na formação de licenciados e a nova metodologia empregada
baseada na interdisciplinaridade e transversalidade que o Ensino Religioso possibilita
atualmente. Assim como também a implantação do curso de Licenciatura Plena em Ciências
da Religião pela Universidade do Estado do Pará, pelos mesmos pioneiros. Para que tudo isso
fosse exposto em uma ordem lógica, foi necessário fazer alguns recortes no que diz respeito à
história do Brasil da época do colonialismo e do período republicano para verificar as práticas
de ensino com o propósito de se perceber gradualmente a reformulação da Constituição
Federal e Leis de Diretrizes e Bases. Após essa retrospectiva sobre antiga concepção do
ensino religioso até a reformulação do mesmo por volta de 1891, voltamos nosso olhar para o
contexto Amazônico do século XIX, mas especificamente em Belém, a capital do estado do
Pará dentro da perspectiva do pesquisador-licenciado. O fenômeno religioso nesse contexto
ainda foi pouco explorado pelo pesquisador tanto dentro da academia como pelo professor em
sala de aula. Talvez isso ocorra pelo fato do curso ainda ser novo nessa região tão vasta de
expressões religiosas.
Palavras-chaves: Ensino Religioso. Ciências da Religião. Pará.
Introdução
O presente artigo tem como objetivo traçar uma relação entre o Ensino
Religioso e o professor-pesquisador do Curso de Ciências da Religião14 no estado do
Pará. Para isso foi preciso abordar a historicidade da disciplina escolar, o curso
profissionalizante e a diversidade cultural e religiosa dessa região. A estrutura
proposta segue os tópicos: “Retrospectiva do Ensino Religioso”, “O Ensino Religioso e
seu processo de reformulação” e a “Lusofonia Amazônica: o cientista da religião
pesquisador-licenciado”.
A concepção mais remota do ensino religioso tanto no Brasil, como no estado
do Pará, estava associada à catequização promovida pela Igreja Católica. Com o
passar dos anos o avanço da reflexão sobre o conteúdo de moralidade cristã dentro
das escolas foi criticado ferrenhamente, pois aos poucos se reconhecia a pluralidade
12
Graduanda em Ciências da Religião (licenciatura plena) pela Universidade do Estado do
Pará. E-mail: [email protected]
13 Graduanda em Ciências da Religião (licenciatura plena) pela Universidade do Estado do
Pará. E-mail: [email protected]
14 Nomenclatura utilizada na Universidade do Estado do Pará – UEPA.
religiosa do povo brasileiro. O novo paradigma que surgia em meados do século XX
refletia o Ensino Religioso como um diferente perfil e a necessidade de habilitar um
profissional.
A pesquisa bibliográfica e a coleta de dados por meio do “V Painel: Relato de
Experiência do Ensino Religioso Escolar”, promovido pelo Curso de Licenciatura Plena
em Ciências da Religião através da Universidade do Estado do Pará – UEPA – no dia
24/ 04/ 2013, foi de extrema importância para a desenvoltura do tema proposto,
especialmente em se tratando da história do Ensino Religioso em Belém, capital do
estado do Pará.
Esse painel possibilitava que os graduandos, graduados e os leigos
interessados no tema conhecessem professores que estiveram à frente da
reformulação do Ensino Religioso, antes e durante a formação do Projeto Político
Pedagógico do Curso de Licenciatura Plena em Ciências da Religião no estado do
Pará. Foi um evento que tanto a retrospectiva do Ensino Religioso foi abordado, como
grande curricular, entre outros assuntos que esclareciam essas questões para o
público envolvido.
Ainda há poucas pesquisas acadêmicas sobre a história do Ensino Religioso
em se tratando do estado do Pará, especialmente em sua região metropolitana,
Belém. De fato, apesar do vasto campo que se tem para coletar informações sobre
esse assunto, apenas alguns trabalhos de conclusão de curso de Ciências da Religião
por meio da Universidade do Estado do Pará contemplam essa área de pesquisa.
Mas, é de se considerar que o material produzido não é suficiente para aludir por
completo a retrospectiva históricado e sua desenvoltura do Ensino Religioso, assim
como também, o papel dosprofessores envolvidos.
Em se tratando da região Amazônia, especialmente no estado do Pará e sua
capital Belém,a investigação sobre a históriado Ensino Religioso e as pesquisas do
curso de Ciências da Religião promovem um vasto campo a ser observado. As
tradições, as lendas, a alimentação, as expressões religiosas entre outros, solidificam
um contexto rico de objetos que não se pode passar despercebido das indagações e
de produções acadêmica.
Assim como as Ciências da Religião são importantes para promover uma
discussão acadêmica da necessidade de se pesquisar o fenômeno religioso, o Ensino
Religioso não fica atrás, pois ele possibilita a conscientização e uma discussão entre
os alunos sobre a diversidade religiosa, o conhecimento e o respeito dessa pluralidade
cultural.
Retrospectiva do Ensino Religioso no Brasil
Antiga concepção do Ensino Religioso
Para compreender um pouco da história do Ensino Religioso no Brasil, é
preciso antes de tudo buscar seus primeiros vestígios e desenvolturas, assim como
também entender seus primeiros objetivos. Por volta do século XVI, época das
grandes navegações que procuravam caminhos que possibilitassem um intercâmbio
maior para trocas e vendas de mercadorias, ocorreu o descobrimento de terras
desconhecidas por parte desses navegantes. O comércio marítimo e suas descobertas
possibilitaram ainda mais uma prática já realizada há muito tempo, o chamado
colonialismo.
Ainda no século XVI, apesar da reforma protestante em 1517, a Igreja Católica
permanecia vinculada com império de Portugal mantendo relações que por um lado
discutia empreendimento econômico e, pelo outro, a salvação dos fiéis. No processo
de colonização do Brasil, a extração de suas matérias primas e o proselitismo religioso
que se instaurou gradativamente.A imposição do catolicismo, considerado religião
oficial, tinha a justificativa de que nativos que já residiam, precisavam da moral cristã
para alcançar a salvação.
Quando finalmente a então chamada “Terra de Santa Cruz” tornou-se colônia
da metrópole portuguesa, foi preciso reforçar a segurança contra a cobiça comercial
de outros países europeus, muitos portugueses mantiveram residência fixa com
famílias transformando-se em colonos. Além dos povosantigos residentes intitulados
de “índios”, agoraportugueses, eum pouco mais tarde, negros que foram escravizados,
habitavam juntos em meio a conflitos sociais.
O poderio da Igreja Católica Apostólica Romana e seus interesses de restituir
novos cristãosna colônia investiram ainda mais na catequização por meio da
Companhia de Jesus, uma ordem religiosa composta por jesuítas que eram
missionários e educadores.Segundo Oliveira (2005) “a intenção de catequizar e instruir
os indígenas, incluindo os filhos de colonos, assim como mamelucos e os órfãos”,
estava na proposta de ensinar questões morais. Ensino esse especialmente para os
indígenas que eram acusados de possuírem “maus costumes” 15.
O primeiro Ensino Religiosonão se distinguia da catequizaçãocristã. Esse
ensino tinha dois objetivos.Um visava à salvação do povo pagão;o outro estava
relacionado com a ideia de se ter novos adeptos para o catolicismo. Boa parte do
Estão
associados
à
nudez,
magia
antropofagia
–
artigo
do
site
http://www.ppe.uem.br/publicacoes/seminario_ppe_2009_2010/pdf/2009/15.pdf – Acessado
no dia 12/07/2014 às 22h.
15
processo de educação da moral cristã com os colonos foi relatada em documentos por
jesuítas. Acerca da catequização dos indígenas é dito:
Para pregar o Evangelho aos índios, os jesuítas procuraram aprender
o tupi-guarani. [...]. O trabalho de conversão dos nativos era
completo. Os mais velhos se recusavam a aceitar a fé cristã; por isso,
como relata o historiador Rafael Chambouleyron, os jesuítas
concentraram seus esforços na catequização das crianças, vista
como um “papel em branco” no qual poderia ser impressa a palavra
divina. (AZEVEDO; SERIACOPI, 2008, p.195).
Quando a metrópole começou a fazer o tráfico humano por meio dos
navios,forçou que residentes de colônias africanas fossemretirados de seus clãs,
distribuídos como mercadorias e inseridos em terras brasileiras no sistema
escravocrata. Havia uma distribuição de diversos clãs, e por consequência, várias
formas de se cultuar o sagrado. Assim como os indígenas, os negros foram também
alvo de um ensino cristão no cotidiano da colônia.
Laura de Melo e Souza em seu livro “O Diabo e a terra de Santa Cruz” traz um
esboço acerca da colônia-purgatório. Sua análise através de fontes documentais
propõe um recorte do universo colonial e práticas mágicas realizadas e procuradas
como “formas de ajuste do colono ao meio que o circundava: por vezes, protegeu-o
dos conflitos e, por outras, refletiu as tensões insuportáveis que desabavam sobre seu
cotidiano.” (SOUZA, 2007, p. 208). Adivinhações, Curas, Benzeduras são algumas das
práticas que o poder ortodoxo eclesiástico da época tentou combater com um ensino
religioso rígidopara quem as praticassem.
[...] levar as massas as bases teológicas da religião, derivando-se
idealmente daí uma nova moral em termos religiosos. Respirava-se,
então, uma atmosfera de maior rigidez doutrinal dirigida às práticas
populares do catolicismo, enxergadas pelos reformadores católicos
como formas de culto de devoção distantes dos dogmas religiosos
que se desejava impor naquele contexto (VIANA, 2007, p. 97).
Segundo Viana (2007), “o Brasil não foi contemplado com um número
expressivo de dioceses ao logo do período colonial”, issoera então um problema para
que fosse efetivadoo ensino religioso à população, até porque no século XVI existiu
apenas a diocese da Bahia fundada em 1575. A autora faz ainda referência à frágil
presença
do
clero
no
período
colonial,como
conseqüência
a
Igreja
não
conseguiaimpor em parâmetros rígidos a religião oficial para todos os colonos.O
surgimento do padroado e das irmandades nesse contexto terá extrema importância
para a religiosidade leiga que estava se desenvolvendo.
Durante o período Colonial, a Igreja do Brasil teve um caráter
predominantemente leigo, por força da instituição do padroado. As
confrarias, irmandades e ordens terceiras tinham por finalidade
específica a promoção da devoção a um santo. Os leigos reunidos
entorno dessa devoção tinham o compromisso de angariar fundos
para a construção da ermida ou capela, manter seus culto e promover
sua festa(VALENTE, 2011, p.206).
Além desse papel de organizar fundos para uma ermida, as irmandades
religiosas eram também, de acordo com Viana (2007), “associações eminentemente
leigas e dedicadas à caridade e à proteção social de seus próprios membros”.Os
leigos ficavam responsáveis por promover o festejo do santo padroeiro, com a frágil
presença
do
clero,o gerenciamento feito
pelas
irmandades seguia
moldes
populares.Esse sistema que instituiu a devoção ao padroado era estimulado por
ordens religiosas que acreditavam que assim era possível um ensino religioso
edoutrinação dos escravos.
[...] poder-se-ia dizer, em linhas gerais, que o Ensino Religioso
(reconhecido pelo Estado) se apresentou em duas modalidades ao
longo dessa trajetória histórica. Inicialmente, sob o regime do
padroado e regalismo numa perspectiva colonial-regalista, com um
ensino religioso humanista-católico. Num segundo momento, durante
o período republicano, sob a égide do pensamento liberal, o ensino
religioso é mantido na escola pública, mas sua frequência passa a ser
opcional para o educando (OLIVEIRA, 2005, p. 8).
As irmandades religiosas e o padroado proporcionam uma discussão ampla
que merece ainda mais ser pesquisado. Sua presença no cotidiano do colonialismo
abre espaço para discussões de como se organizavam e qual o papel mais
característico do ensino religioso nessa época. Compreender esses sistemas é
perceber o desenvolvimento do complexo fenômeno religioso dentro dahistória do
Brasil, no que diz respeito à construção do povo brasileiro.Assim como também os
primeiros vestígios do chamado catolicismo popular nesse país.
Ensino religioso: processo de reformulação
Com a Proclamação da República do Brasil, no século XIX, houve a separação
entre Igreja e Estado. O Estado buscou constituir através de princípios filosóficos e
políticos um perfil laico. Rui Barbosacom convicções positivistas propõeainda nessa
época que as instituições religiosas deveriam possuir liberdade de culto em seus
locais de liturgia. As aulas de religião deveriam ser realizadas dentro do espaço
sagrado e de responsabilidade de cada confissão religiosa.
art. 72 § 3º Todos os indivíduos e confissões religiosas podem
exercer pública e livremente o seu culto, associando-se para esse fim
e adquirindo bens, observadas as disposições do direito comum [...] §
6º Será leigo o ensino ministrado nos estabelecimentos públicos. § 7º
Nenhum culto ou igreja gozará de subvenção oficial, nem terá
relações de dependência ou aliança com o Governo da União, ou o
dos Estados. (RÉPÚBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO
BRASIL.Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil [24
fevereiro 1891]. In: BONAVIDES, P.: AMARAL, R. Textos Políticos da
história do Brasil: Senado Federal, 1996. P. 193. v.8)(OLIVEIRA et al,
2007, p. 5).
Segundo Oliveira (2005), “no artigo 72, parágrafo 6, que ‘será leigo o ensino
ministrado nos estabelecimentos públicos’”, fica clara uma concepção diferente para
educação dos cidadãos. Anos mais tarde, na década de 90, um novo repensar propôs
mudanças progressivas na compreensão do Ensino Religioso no Brasil, especialmente
nas escolas públicas.Através das Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(doravante LDB). Em 1997, é sancionada uma reformulação da nova LDB sob nº.
9.475/97. No artigo 33 sobre do Ensino Religioso é proposto:
O Ensino Religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da
formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários
normais das escolas públicas de Educação Básica, assegurado o
respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer
formas de proselitismo § 1º - Os sistemas de ensino regulamentarão
os procedimentos para a definição dos conteúdos do Ensino
Religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão
dos professores. § 2º - Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil,
constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição
dos conteúdos do ensino religioso (BRASIL, 1997 apudOLIVEIRAet
al,2007, p. 55).
Dentro dessa perspectiva,o Ensino Religioso antes de tudo deveria respeitar a
opção religiosa dos indivíduos em sala de aula. Permanecendo como disciplina a ser
ministrada nas escolas garantidapor lei.Outra questão começa a entrar em cena: a
formação superior do educador.
A preocupação com uma formação superior pedagógica dos
professores era especifica de cada região, detendo-se muitas vezes,
apenas no acompanhamento dos conteúdos de ordem teológica [...]
Na década de 80 [...] os professores desencadearam importante
movimentos de discussão para repensar a concepção do Ensino
Religiosoe uma perspectiva pedagógica e com princípios que lhe
dessem identidade própria (OLIVEIRAet al, 2007, p. 54).
Na década de 90,com finalidade de discutir o componente curricular junto com
professores e interessados pelo tema surge o Fórum Nacional Permanente do Ensino
Religioso (FONAPER)16. O Fonaper é um espaço onde se discuti ideias e propostas
que na visibilidade e efetivação de um Ensino Religiosono Brasil como componente
curricular.Vale ressaltar que já foram publicados dozes cadernos em parceira com
educadores, pesquisadores e interessados pelo tema, com o propósito de promover a
formação do professor capacidade na área.17
Por fim, sancionado a ideia de “habilitação e admissão dos professores”, a
formação acadêmica do profissional para trabalhar pedagogicamente em sala de
16Desde
de novembro de 1995, o Fonaper tem investido na garantia do Ensino Religioso como
disciplina para a formação básica do cidadão.
17Mais informações no endereço eletrônico:
http://www.fonaper.com.br/documentos_capacitacao.php
aula,diante da exigência de um novocurrículo da disciplina era uma realidade que
precisava serposta em questão.Logo,essa discussão seguia para outros estados
brasileiros que começavam a encarar o novo Ensino Religioso que estava sendo
organizado e proposto.
Ensino Religioso no Pará e o curso de Ciências da Religião18
Assim como em outros estados brasileiros, o Ensino Religioso no Pará também
teve como berço inicial a Igreja Católica.A Arquidiocese de Belém, capital do estado,
ainda era responsável em proporcionar o conteúdo aos alunos.Mas,emnossa ótica tais
conhecimentostraduziam os preceitos cristãose negligenciavam de certa forma
perspectivas de outras expressões religiosas.Além de não ter a finalidade de
possibilitar o conhecimento do fenômeno religioso em suas dimensões sociais,
culturais e etc. Com o reconhecimento de uma educação laica ficava mais distante a
ideia de uma catequização.Os professores que estavam atentos às novas discussões
sobre
o
Ensino
Religioso
no
Brasil
assegurado
pela
LBD
e
promovido
peloFonaper,contrariavam os pressupostos da antiga estrutura do Ensino Religioso.
Voltando à história do Ensino Religioso no Pará por volta da década de 70, a
Arquidiocese de Belém possibilitou um curso profissionalizante para professores em
conjunto com a Universidade Federal do Pará visando um ensino com características
interconfessional.
A formação de recursos humanos para o fim aludido dava-se,
inicialmente, no âmbito da Arquidiocese de Belém e possuía a
chancela da Universidade Federal do Pará, desde a década de 70 do
século passado [...] Durante as décadas de 70, 80 e 90 do século
passado, a formação de licenciados para o exercício do ensino
religioso no estado do Pará, pelo menos até o ano de 1999, teve,
portanto, duas protagonistas: a Arquidiocese de Belém e a
Universidade Federal do Pará. Os cursos de Licenciatura em
Educação Religiosa, até então oferecidos pela própria Arquidiocese
de Belém, eram sucessivamente reconhecidos por resoluções do
Conselho Superior de Ensino e Pesquisa da Universidade Federal do
Pará(CONCEIÇÃO, 2012, p. 306).
Em meados da década de 70, um frei que havia conhecido a ASSINTEC
(Associação Interconfessional da Educação de Curitiba), chega a Belém e articula uma
nova estruturação para o Ensino Religioso tendo em vista a LBD da época, e insere o
Sistema Radiofônico para escolas estaduais e municipais. É importante ressaltar que a
18Ainda
há uma leve escassez relacionada à pesquisa do Ensino Religioso no Pará, boa parte
do tema tratado nesse tópico foi coletado por meio do “V Painel Relato de Experiência do
Ensino Religioso Escolar”, realizado no dia 24/ 04/ 2013 promovido pelo Curso de
Licenciatura Plena em Ciências da Religião por meio da Universidade do Estado do Pará –
UEPA.
ASSINTEC foi também à primeira associação de professores com caráter
interconfessional, e que Belém foi a segunda capital a receber esse sistema.
O sistema Radiofônicofez parte de umperíodo da história do ensino religioso
que as aulas eram ministradas através do rádio, por meio da emissora conveniada
com a Arquidiocese, Secretaria Municipal de Educação e Cultura (Semec)eSecretaria
de Educação e Cultura(Seduc), para as séries de 1ª a 4ª, uma vez por semana com
duração de uma hora. No entanto, não foi possível dar continuidade a essa ideia
devidoalgumas dificuldades tais como a pouca audiência e especialmente, rádios
defeituosos, fitas de rádios que se corrompiam, e os professores que não conseguiam
sintonizar para ouvir as aulas.
Com sistema de radiofônico interrompido uma equipe que era responsável pelo
Ensino Religioso, começou a pensar novos métodos para lecionar a matéria. Nasce a
ideia de imprimir textos e distribuir pelas escolas para que ajudassem os professores a
trabalhar o conteúdo com seus alunos.Vale ressaltar que ainda não existia um
professor específico para a área. Quem ministrava os conteúdos eram docentes de
outroscursos e com formação em teologia, assim como leigos de comunidades
religiosas.
O curso que a Arquidiocese possibilitava validado pela Universidade Federal do
Pará tinha um problema.A licenciatura possuíauma carga horária curta e comparada a
outros cursos da universidade e isso prejudicava professores que desejavam alcançar
uma especialização, seguir um mestrado e doutorar-se. Já era uma realidade a
discussão do Ensino Religioso, pois fazia parte do currículo escolar.Então era preciso
uma formação profissional na área como também estava previsto na lei.
Muitos professores tais como,Antônio Jorge Paraense da Paixão, Maria de
Lurdes Santo Melo e Socorro Cardoso estiveram à frente da discussão de um Projeto
Pedagógico do Curso de Licenciatura Plena em Ciências da Religião junto osecretário
de estado de educação, na época, José Souza. A implantação do Curso de
Licenciatura Plena em Ciências da Religião aconteceu através do departamento de
Língua e Literatura da Universidade do Estado do Pará (UEPA), discussão promovida
pelos professores José Cardoso e Socorro Cardoso que gerou um processo noano de
1999 para inserção do Curso. Muitos dos educadores que já lecionavam o Ensino
Religioso tiveram que prestar vestibular e graduar-se em licenciatura.
Mais tarde, em 2009um grupo de professores da Universidade do Estado do
Pará deu outro passo promissor, pois estabeleceram discussões para a criação do
Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião. No ano de 2010 foi enviada à
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) o projeto
para implantação do curso de mestrado.19Os quesitos que caracterizam o curso de
mestrado estavamrelacionados “a) A vasta e consolidada tradição investigativa acerca
do fenômeno religião no contexto amazônico e b) o pavimento lançado pela criação do
curso de Licenciatura” (CONCEIÇÃO, 2012, p. 307).
Lusofonia amazônica: cientista da religião o pesquisador-licenciado
A Amazônia sempre foi cobiçada e alvo de intensos conflitos sociais. Oabuso
da extração dos recursos naturais em busca de lucros abriu discussão a respeito de
desmatamentos, poluição, extinção de algumas espécies de fauna e flora, entre outros
problemas. Essas questões evocavam a irresponsabilidade e negligência para com a
biodiversidade da região, e além do mais prejudicava os povos indígenas que ainda
residem nessa área.
Quando surgiu o reavivamento de cultos antigos com práticas vinculadas à
natureza e a introdução de filosofias asiáticas mais voltadas a uma conscientização do
“eu com o todo”, a Amazônia também abrigou essas formas de acessar o sagrado. As
expressões religiosas dessa região coexistem em meio a tradições indígenas,
africanas, européias e asiáticas, de modo que é possível perceber um novo paradigma
não só na Amazônia, mas no Brasil inteiro do século XXI, a liberdade de procurar e
conhecer outras religiões.
A vida religiosa na Amazônia vem se metamorfoseando
ininterruptamente numa vívida e genuína expressividade, o que
inclusive me permite dizer que em relação a outros aspectos da
cultura amazônica, a religião ocupa o lugar de esfera central. Aqui o
sagrado nunca se ausentou e a religião está em toda parte.
(CONCEIÇÃO, 2012, p. 297).
A Amazônia agrega uma inigualável biodiversidade. O próprio ecossistema se
compõe adjunto da cultura cabocla é expresso em narrativas míticas que espelham o
cotidiano do misterioso cosmo com o caçador, a dona de casa, a moça, rapazes e
crianças. A narrativa do Boto-cor-de-Rosa 20 ainda hoje é contada como forma de
precaver as mulheres do galanteador homem que saia da água nos dias de festas
juninas. A encantaria perto dos rios e igarapés após as dozes horas da manhã ou no
De acordo com Conceição (2012) a “elaboração da proposta de constituição do programa e
de sua implantação os seguintes docentes: Antonio Carlos de Melo Magalhães, Agenor Sarraf
Pacheco, Daniela Cordovil Corrêa Santos, Douglas Rodrigues da Conceição, Eliete de Jesus
Bararuá Solano, Ipojucan Campos Dias, Manoel Ribeiro de Moraes Júnior, Maria Betânia
Barbosa Albuquerque, Maria Marize Duarte, Raymundo Heraldo Maués, Saulo de Tarso
Cerqueira Baptista e TaissaTavernard de Luca”.
20 Lenda Amazônica que conta que o Boto-cor-de-Rosa transforma-se em um homem vestido
de branco, com um chapéu de palha típico dos caboclos e sai em dia de festas para seduzir
as mulheres e manter relações sexuais com as mesma.
19
entardecer é outro tema típico das narrativas que visa proteger as pessoas dos entes
de outras dimensões.Acerca deencantados eencantaria é dito que:
[...] no Pará, os espíritos cultuados são personagens lendários que
um dia teriam vivido na terra, mas que por alguma razão, não
conheceram a morte, tendo passado da vida terrena ao plano
espiritual por meio de algum encantamento são os encantados
(FERRETI, 1993 e 2001) [...] Os encantados são de muitas origens:
indígena, africana, mestiça, portuguesa, turca, cigana etc [...]
Elementos da encantaria amazônica, como as histórias de botos que
viram gente e vice-versa; lendas de pássaros fantásticos e peixes
miraculosos, tudo isso foi compondo ao longo do tempo, a religião
que se convencionou chamar encantaria [...] (PRANDI, 2008, p. 3738).
Há um vasto terreno de lendas amazônicas presente no cotidiano paraense, no
qual a coexistência de diversas expressões religiosas possibilita um rico objeto para
ser estudado com atenção. Compreender as diferentes concepções de acessoao
sagrado é uma tarefa audaciosa em se tratando do universo amazônico. Por exemplo,
um indivíduo que se reconhece como católico,é devoto de um padroeiro, adepto
dobanho de cheiro21,tem umTajá22; podendo associar uma coruja a um pressagio de
Rasga-Mortalha 23 , ou um assobio qualquer se lembrar daMatinta-Perera 24 . Tudo
issocaracteriza um sujeito tão envolto do seu cotidiano com lendas e expressões
religiosas diferentes. Pajés que promovem curas, rezadeiras para tirarem o mal
olhado, preceitos alimentícios, feituras de ervas para trazer o amor de volta, entre
outras, sãoexemplos quefazem parte da cultura paraense, são iguarias que merecem
ser estudas a partir do viés do fenômeno religioso.
[...] é preciso olhar para o lugar onde a religião floresceu e floresce
sob pena de perdemos grande parte do seu desenvolvimento, sua
mutação e sua força significativa, acima de tudo. É por isso que o
ambiente amazônico poder ser reconhecido como lugar de tantas
confluências culturais. Daqui não só temos notícias de genuínas
expressões religiosas amazônicas, mas também de um rico processo
de encontro e profusão com expressões de outros contextos
geográficos e culturais. O Brasil, de um modo geral, também
apresenta esta característica (CONCEIÇÃO, 2012, p. 299).
Grandes pesquisas foram realizadas como as de Eduardo Galvão, autor de
“Santos e Visagens” (GALVÃO, 1976), livro onde aborda sobre o cotidiano, diferenças
sociais, crenças e lendas coabitando adjuntas. Sua pesquisa é um acervo de
21
É tradicional no mercado do Ver-o-Peso, em Belém. A mistura feita com folhas, paus e essências,
as pessoas procuram o banho para que de um modo geral, a vida melhore, na sorte no amor,
nas finanças e até cura para doenças.
22 Planta nativa rodeada de lendas onde pode ganhar características humanas ou animal para
proteger a casa. Normalmente é colocado na frente das residências.
23 Termo associado a uma coruja branca. O som emitido por esse animal é associado a mau
presságio.
24 Lenda Amazônica que conta sobre uma mulher idosa que se veste de preto e passeia nas
noites de lua cheia. Seu assobio é associado à ideia que ela pede fumo pelas redondezas.
elementos que abordam o fenômeno religiosocoexistindo de uma maneira peculiar
com caboclo amazônico. Heraldo Maués é outro que se debruçou sobre a pesquisar
intitula “Padre, Pajés, Santos e Festas” (MAUÉS, 1995) entre outros. A respeito das
religiões Indígenas vemos o trabalho da professora Maria Betânia Albuquerque acerca
das práticas xamânicas e de beberagens indígenas.Isodoro Alves, Aldrin Figueiredo,
AnaízaVirgolino
entre
outros
compuseram
um
acervo
de
uma
vasta
produçãoacadêmica do contexto religioso amazônico.
[...] religiões e mitologias indígenas e africanas amazônicas, pelas
pajelanças rurais ou caboclas, pelos cultos xamânicos de curas, pelos
pajés, pelos “santos e visagens”, pelos Encantados e pelos Círios das
cidades amazônicas, pelas religiões de beberagem, pelas expressões
religiosas das populações autóctones da Amazônia [até hoje, em
muitos casos, desconhecidas completamente] e pelos cultos afroamazônicos (CONCEIÇÃO, 2012, p. 298).
Todas essas produções acadêmicas possibilitam um caminho de pesquisa
importante no que diz a respeito ao fenômeno religioso no Pará. Essas pesquisas
analisaramo cotidiano dos indivíduos e suas crenças que coexistem diacronicamente
entre pajelança, cristianismo e suas variantes, religiões de matriz africana e etc.
Atualmente, é possível também observar presença doneopaganismo, neoseoterismo
entre outras expressões religiosas nesse contexto, dando cada vez mais destaque a
fala de Geertz (2001) “a religião nunca desapareceu, foi a atenção das ciências sociais
que se desviou a outros campos”.
Pela ótica do cientista da religião, não há como deixar de vislumbrar a
diversidade e o emaranhado de culturas.Como licenciado é impossível não deixar de
notar que a realidade regional é possível de trabalhar no Ensino Religioso por meio da
discussão do ethos desse povo.
Considerações Finais
Muito se tem discutido sobre o Ensino Religioso no Brasil, mas pouco é a
pesquisa da história do mesmo quando se tratado do estado do Pará. Talvez isso seja
decorrência do curso ainda ser muito novo, e mais recente ainda éo Programa de PósGraduação em Ciências da Religião no Norte do Brasil, desenvolvido em 2009.
Somente em Outubro de 2010 a CAPES validou o curso de mestrado, em atividade de
produção acadêmica até hoje.
A discussão sobre o Ensino Religioso ganhou espaço no Brasil e
consecutivamente por suas capitais. O primeiro passo propulsor das mudanças no
perfil da disciplina foi o reconhecimento da diversidade religiosa brasileira. Mais tarde,
entre idas e vindas, questionamentos e críticas lançadas sobre a real necessidade
daárea de formação para o aluno é revogado a nova Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional sob nº. 9.475/97. No artigo 33, apesar de continua o quesito de
matrícula facultativa, via-se agora que era parte integrante da formação básica do
cidadão e:
constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de
EducaçãoBásica, assegurado o respeito à diversidade cultural
religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo
(BRASIL, 1997 apudOLIVEIRA et al, 2007, p. 55).
Desde a reformulação que sancionava o Ensino Religioso como parte da
formação dos alunos, ficava evidente a necessidade de se ter um docente
devidamente habilitado para lecionar. A habilitação do licenciado estava garantido
naLDBe cada vez mais sendo discutido pelo FONAPER. É de se ressaltar ao
considerar as assertivas a cima, que a construção do Projeto Político Pedagógico para
o curso de Licenciatura em Ciências da Religião em 1999 possibilitava habitação para
o professorno estado do Pará.
Apesar de muitos avanços na habilitação do profissional docente no Brasil,
deve-se reconhecer que as velhas concepções metodológicas do Ensino Religioso em
escolas públicas ainda estão presentes.O proselitismo é só um dos exemplos que
ainda vem sendo trabalhadoe combatido gradualmente. Assim como também, a
dificuldade que muitas escolas e pais de alunos colocam para os educadores
lecionarem
conteúdos referente
às religiões
de matriz africana
do
Brasil,
gradativamente estão vencendo barreiras. Esses são alguns dos temas trabalhados na
graduação de Ciências da Religião na Universidade do Estado do Pará.
É possível que o próprio nome da disciplina proponha uma confusão entre os
desconhecedores do assunto. É uma nomenclatura que carrega uma história com o
qual revoga um ensino catequético que há muito tempo vem sendo discutido e
combatido por professores, pesquisadores e interessados no tema. Atualmente
percebe os movimentos para a mudança para um título que se despida da arcaica
concepção e mostre o novo perfil do Ensino Religioso.
Muitas discussões referentesàs mudanças ainda mais progressivas, como por
exemplo, as escolas públicas portarem um tempo aula para lecionar o conteúdo ser
demasiadamente curto, são realizadas. Assim como também é trabalhado a ideia que
o Ensino Religioso é obrigatório à escola, massendo facultativo ao aluno, torna-se
desafiador para o professor lecionar o conteúdo de uma matéria que pode ser
facultada. A observação, a reflexão e a informação são uma das partes integrante da
metodologia da disciplina do Ensino Religioso atual, que não infligi liberdade de
crença, desenvolvendo-se então como parte integrante da formação do cidadão.
As problemáticas que o Ensino Religioso propõem, sejam elas de caráter
educacional, metodológica entre outras; assim como também as discussões sobre a
própria nomenclatura do curso (ciência(s) da(s) religião(ões),a metodologia
científica e etc, fazem parte do universo do pesquisador-licenciado.
As pesquisas acadêmicas e os textos literários 25 já produzidos expõem o
cotidiano dos indivíduos com suas crendices, lendas e expressões religiosas do povo
paraenses. Toda essa bagagem propõe uma multidisciplinaridade para Ensino
Religioso e como também para as Ciências da Religião que investigam igualmente o
fenômeno religioso, a educação e o profissional docente, objeto que vai depender da
escolha do pesquisador.
De tal modo como em outros estados, a Amazônia comporta um vasto campo
de pesquisa sobre o fenômeno religioso, onde é preciso compreender sua
historicidade, contexto e analisar suas expressões religiosas das mais diferentes
formas possíveis.
Ser um pesquisador-licenciado na Amazônia é uma tarefa importante e
audaciosa para quem faz o curso de Licenciatura Plena em Ciências da Religião. Em
se tratando da complexa Amazônia, mais especificamente estado do Pará, percebe-se
a tarefa desse pesquisador-licenciado em não só compreender o fenômeno religioso,
como também discuti-lo didaticamente com os alunos como forma de sensibilizá-los
para religião do outro.
Referências
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Paulo: Ática, 2005.
CONCEIÇÃO, Douglas da.Perspectivas investigativas da religião na Amazônia:
reflexões sobre a emergência do Programa de Pós-Graduação em Ciências da
Religião da Universidade do Estado do Pará.Numen: revista de estudos e pesquisa da
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GALVÃO, Eduardo. Santos e Viagens: um estudo da vida religiosa de Itá. Baixo
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GEERTZ, Clifford.O futuro das religiões. Disponível em:
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs1405200614.htm>. Acesso em: 29 setembro 2014.
MAUÉS, Raymundo Heraldo. Padres, Pajés, Santos e Festas: Catolicismo Popular e
Controle Eclesiástico. Um estudo antropológico numa área do interior da Amazônia.
Belém: Cejup, 1995.
25
Inglês de Souza, Dalcídio de Jurandir e Walcyr Monteiro são apenas alguns dos escritos de
literatura paraense.
PRANDI, Reginaldo. A dança dos caboclos: uma síntese do Brasil segundo os
terreiros afro-brasileiros. In: MAUÉS, Raymundo Heraldo; VILLACORTA, Gisela
Macambira. Pajelanças e religiões africanas na Amazônia. Belém: EDUFPA, 2008.
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SCUSSEL, Marcos André. O Ser e o Fazer no Ensino Religioso. REVISTA
LUSÓFONA DE CIÊNCIA DAS RELIGIÕES – Ano VI, 2007 / n.º 12 – 251-262.
SOUZA, Laura de Mello. O diabo e a terra de Santa Cruz: feitiçaria e religiosidade
popular no Brasil colonial. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.
VALENTE, Ana Lúcia Eduardo Farah. As irmandades de negros: resistência e
repressão. Horizonte, Belo Horizonte, v. 9, n. 21, p. 202-219, ab./jun. 2011.
VIANA, Laura. O idioma da mestiçagem: as irmandades de pardos na América
Portuguesa. Campinas, SP: UNICAMP, 2007.
O ENSINO RELIGIOSO NA ESCOLA: PROPOSTAS FRENTE AO ESTADO LAICO 26
Thalisson Pinto Trindade de Lacerda - UFPB27
Camilo de Lélis Diniz de Farias- UFPB28
Resumo:
O Brasil define-se como Estado laico desde 1891. Até então, o catolicismo era a religião oficial,
e a única a ter permissão para manifestações públicas, uma vez que às demais crenças só
eram permitidos os cultos domésticos. Desde então, o tratamento dado ao ensino religioso
variou historicamente. O presente estudo é uma alternativa ao ensino religioso, que não
assuma cultos em particular, mas que se paute no respeito à alteridade, constituindo-se como
instrumento hábil para a promoção da cidadania e reconhecimento da diversidade religiosa.
Este trabalho insere-se no contexto dos estudos acerca da viabilidade de um novo ensino
religioso, nos moldes acima relatados, em contraposição ao recorrente modelo confessional e
tem como objetivos demonstrar a importância do ensino religioso na formação cidadã dos
indivíduos, Analisar a atual situação do ensino religioso no contexto da rede pública de ensino
brasileira e propor ferramentas de efetivação dos parâmetros constitucionais e legais para o
ensino religioso brasileiro. O trabalho consistirá em pesquisa bibliográfica, assentada na
literatura específica e jurídica. Destarte, inaugura-se uma nova perspectiva para o ensino
religioso, cuja finalidade passa a compreensão do fenômeno religioso, e não mais de angariar
seguidores para cultos em particular. Tal visão encontra-se em consonância com a nova ordem
constitucional, na qual o pluralismo é elemento essencial da construção do Estado,
compreendendo que, a partir do reconhecimento das particularidades – dentre as quais a
religião – dos indivíduos e grupos sociais é que se constroem os direitos e a cidadania, que
deve ter caráter universal. Assim, o ensino religioso poderá superar o paradigma doutrinário e
se tornar mecanismo essencial na efetivação do respeito às diferenças, necessário no contexto
de uma sociedade multicultural como a brasileira.
Palavras-Chave: Constituição. Estado Laico. Ensino Religioso. Diversidade religiosa.
Introdução
O Ensino Religioso na escola é sem dúvidas um componente em debate na
modernidade. Há décadas, que esse debate, implicou frente à Constituição Federal e
Educacional, sobretudo, contrapontos acerca de conteúdos e professores habilitados
para essa disciplina. No entanto, o modelo catequético implantado pelos jesuítas deixa
invisível o ensino que paute à diversidade nos dias atuais. Para entendermos melhor,
conforme Junqueira (2011, p. 179) “descartando qualquer possibilidade de uma
26
No verbete laicidade, contido nesse dicionário, Buisson nos informa que: A Revolução
Francesa fez aparecer pela primeira vez com clareza a ideia de Estado laico, de Estado
neutro entre todos os cultos, cultos, independente de todos os clérigos, liberado de toda
concepção teológica. [...] Apesar das reações, apesar de tantos retornos diretos ao antigo
regime, apesar de quase um século de oscilações e de hesitações políticas, o princípio
sobreviveu: a grande ideia, a noção fundamental do Estado Laico, quer dizer, a delimitação
profunda entre o temporal e o espiritual entrou nos costumes de maneira a não mais sair.
(BUISSON, 1911, apud, DOMINGOS, 2009, p. 48).
27 Mestrando em Ciência das Religiões pela Universidade Federal da Paraíba. Membro do
Grupo de Estudos FIDELID: Formação, Identidade, Desenvolvimento e Liderança de
Professores de Ensino Religioso. Atua na linha de pesquisa: Educação e Religião. Email:
[email protected].
28 Mestrando em Direitos Humanos pela Universidade Federal da Paraíba e Membro fundador
da Revista Jurídica e Cultural, A Barriguda. Email: [email protected].
compreensão pedagógica, ainda explicitando uma postura de catequização e não uma
disciplina escolar”.
Neste contexto, pautamos a nossa discussão diante desse trabalho,
problematizando o tratamento dado ao Ensino Religioso no contexto educacional
brasileiro, fazendo um resgate histórico e jurídico da constituição e legislação
educacional que asseguram essa disciplina na escola, e identificando por meio dessas
constituições, a relevância legal que este ensino religioso tem na formação de uma
sociedade.
Começamos o nosso trabalho, apresentando a formação do Estado Laico
brasileiro; primeiro, a formação do império e a constituição que assegurou o Ensino
Religioso como paradigma da Religião do império, ou seja, a Igreja Católica Apostólica
Romana como, religião oficial nesse período. Relevamos a importância de outros
contextos que pautaram o ensino religioso, entre esses, os conflitos ideológicos que
impactaram a sociedade; Proclamação da República, positivismo, Revolução Francesa
e o decreto de 1891 ao efetivar a laicidade do Estado brasileiro na carta Magna
Republicana.
No segundo momento, apresentamos as novas dimensões constitucionais e
educacionais, que inseriram o Ensino Religioso como caráter laico e, cidadão.
Estamos falando da constituição de 1988 e da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional de 1996, que inseriu no Art: 33, alterado em 1997, o Ensino Religioso na
escola sem quaisquer formas de proselitismo, e, a importância do Ensino Religioso
nos direitos humanos e na formação de uma política democrática que isente a
confessionalidade no espaço escolar e insira uma discussão mais coerente com a
realidade atual, sobretudo, as indagações feitas por propostas de formação docência
do ensino religioso, implantado em Cursos de Graduação em Ciência(s) da(s)
Religião(ões) no Brasil.
A Formação do Estado Laico Brasileiro
Um dos temas mais sensíveis no que se refere à educação pública brasileira é,
sem dúvidas, a oferta do ensino religioso num Estado Laico. Embora a previsão
Constitucional vede a adoção de uma crença oficial por parte do Estado,
frequentemente este ensino encontra-se vinculado a uma doutrina religiosa específica,
apresentando cunho catequético, em detrimento da enorme diversidade cultural
presente em nosso território, contribuindo para o desconhecimento acerca da mesma
e para a perpetuação das opressões religiosas.
Enquanto um país de formação cultural profundamente ligada à religião,
especialmente o cristianismo católico, foi automática a associação do ensino religioso
com a propagação da doutrina da Igreja Católica, inclusive considerando que, até o
ano de 1890, não havia por aqui a noção de Estado Laico, conforme se notabiliza
neste trecho da Constituição imperial de 1824:
Art. 5. A Religião Católica Apostólica Romana continuará a ser a
Religião do Império. Todas as outras Religiões serão permitidas com
seu culto domestico, ou particular em casas para isso destinadas,
sem forma alguma exterior do Templo (BRASIL, 1824).
Tal previsão representava, portanto, a ausência de liberdade religiosa e o dever
estatal de, enquanto porta voz da Igreja de Roma, de veicular a sua doutrina nos
estabelecimentos de ensino que, frequentemente, confundiam-se com a própria
catequese ofertada pelas paróquias em sede de preparação para recebimento dos
sacramentos29. Sobre o tema, pronuncia-se Severino:
o processo ideológico da política educacional desenvolvida pelo
Estado brasileiro, é característica a utilização do ideário católico como
concepção de mundo, exercendo a função ideológica para a
sustentação e a reprodução desse modelo de sociedade. A
cosmovisão católica serviu de ideologia adequada para a promoção e
a defesa dos interesses da classe dominante ao mesmo tempo que
fundamentava a legitimação, junto às classes dominadas, dessa
situação econômico-social, objetivamente marcada pela exploração e
dominação da maioria por uma minoria (SEVERINO, 1986, p. 70).
Com a proclamação da República em 1899, sob a notória influência do
positivismo de August Comte e, principalmente, dos ideais das revoluções liberais,
com destaque para as revoluções francesas de 1789, 1830 e 1849, além da
independência dos Estados Unidos da América (1776), e dos próprios movimentos
revolucionários que sacudiram o império durante o período colonial e imperial, foi
decretada a laicidade do Estado (1890), como uma espécie de ruptura com a antiga
estrutura de vinculação entre a Igreja e o poder público.
Assim rezava a Carta Magna republicana:
Art. 11 - É vedado aos Estados, como à União:
2º) estabelecer, subvencionar ou embaraçar o exercício de cultos
religiosos;
Art 72 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros
residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à
liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos
seguintes:
§ 3º - Todos os indivíduos e confissões religiosas podem exercer
pública e livremente o seu culto, associando-se para esse fim e
adquirindo bens, observadas as disposições do direito comum.
§ 4º - A República só reconhece o casamento civil, cuja celebração
será gratuita.
29
Ainda, por exemplo, eram inelegíveis aqueles que não professassem a fé católica.
§ 5º - Os cemitérios terão caráter secular e serão administrados pela
autoridade municipal, ficando livre a todos os cultos religiosos a
prática dos respectivos ritos em relação aos seus crentes, desde que
não ofendam a moral pública e as leis.
§ 6º - Será leigo o ensino ministrado nos estabelecimentos públicos.
§ 7º - Nenhum culto ou igreja gozará de subvenção oficial, nem terá
relações de dependência ou aliança com o Governo da União ou dos
Estados.
§ 28 - Por motivo de crença ou de função religiosa, nenhum cidadão
brasileiro poderá ser privado de seus direitos civis e políticos nem
eximir-se do cumprimento de qualquer dever cívico (BRASIL, 1891).
As previsões constantes na Constituição de 1891 representaram, até o atual
momento, a maior ruptura entre Estado e religião no que se refere à inserção de um
ensino religioso no currículo escolar. Destaque-se que tal distanciamento é, em parte,
fruto do ranço existente entre a Igreja Católica e os republicanos, dado o apoio dado
pela mesma ao Império, bem como à sua vinculação já demonstrada com a causa
monárquica, havendo a necessidade de romper com a normalidade do antigo regime,
de modo a consagrar o novo modelo perante a sociedade e os meios judiciais.
Com a ascensão de Vargas ao poder, em 1930, inaugura-se o parâmetro do
ensino religioso facultativo, como uma forma de estabelecer relações mais cordiais
com as igrejas. Em tese, ele deveria ser voltado à formação religiosa particular do
aluno, o que criou diversos inconvenientes de ordem prática, considerando a grande
diversidade religiosa do Brasil, bem como o déficit de formação acadêmica daqueles
responsáveis por ministrá-lo.
Nas próximas Constituições, a tendência se manteve, consagrando-se a
especificidade do ensino religioso, e o seu caráter multiconfessional - ao menos em
teoria. Anote-se, porém que, no período da ditadura militar, a inclusão da disciplina de
educação moral e cívica eclipsou o ensino religioso, dando-lhe um tom de coadjuvante
dentro das grades curriculares das escolas públicas (CAETANO; OLIVEIRA, 2006).
A Constituição de 1988 e as novas dimensões do Ensino Religioso
Após duas décadas de regime de exceção, notabilizou-se a superação do
então paradigma constitucional, sendo gritante a necessidade de elaboração de uma
nova Carta Magna que suprisse as demandas sociais e fizesse jus ao momento de
efervescência política pelo qual passava a República Federativa do Brasil. Assim, em
1988, depois de um processo marcado pela participação popular e pela pluralidade de
ideias, foi promulgada a nova Constituição, alcunhada de cidadã.
Ainda, sob a égide do chamado neoconstitucionalismo, a nova norma
fundamental consagra os direitos fundamentais como epicentro do ordenamento
jurídico, numa perspectiva essencialmente humanista, fortemente pautada no respeito
à diversidade e no reconhecimento das diferenças enquanto meio eficaz de tutelar os
direitos humanos.
Neste contexto, é essencial que o Estado esteja livre de ingerências religiosas
(e que as religiões estejam livres da ingerência do poder público), devendo afirmar a
sua laicidade. A Constituição ora em vigor o consagra em seu artigo 19, o qual reza
que:
É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los,
embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus
representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na
forma da lei, a colaboração de interesse público; (BRASIL, 1988).
De tal modo, depreende-se que o ensino religioso porventura ofertado nos
estabelecimentos públicos de ensino não deve ser confessional, como forma de
instrumentalização da laicidade do Estado. A Carta Magna disciplina de modo esparso
o ensino religioso, reafirmando o seu caráter facultativo, deixando para a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional a tarefa de regulamentá-lo.
Neste sentido, a LDB Art. 33 da Lei n° 9.394, de 20 de dezembro de 1996,
dispõe:
Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante
da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários
normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o
respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer
formas de proselitismo.
§ 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a
definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as
normas para a habilitação e admissão dos professores.
§ 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas
diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos
do ensino religioso." Redação dada pela lei nº 9.475, de 22. 7. de
1997 (BRASIL, 1997).
O excerto legal traz em seu conteúdo duas preocupações principais: em
primeiro lugar, a definição dos conteúdos, os quais devem ser baseados em uma
perspectiva pluralista e alteritária, diante da vedação do proselitismo e do ensino
catequético e, em segundo lugar, o estabelecimento de parâmetros para a seleção dos
docentes.
Ainda, há a previsão da necessidade de participação pluralista das diversas
denominações religiosas na elaboração destes conteúdos, o que dificilmente ocorre,
na prática. Por fim, ressaltamos o desafio de se elaborar um material didático que
possa cumprir as exigências legais.
Destarte, a grande preocupação é a da efetivação das previsões legais e
constitucionais, tendo em vista o baixo contingente de profissionais capacitados para
exercer a licenciatura em Ensino Religioso e, especialmente, a dificuldade para
estabelecimento de fato plural dos conteúdos a serem ministrados. Tal situação,
portanto, requer trabalho diante esse cenário que está em constante construção,
segundo os autores:
É importante destacar, que além das mudanças pretendidas na
concepção de ER é imprescindível ampliar o papel desse profissional
que deve integrar o sistema escolar, devidamente habilitado, com
incentivo e direito a uma formação continuada nos termos da atual
reforma de Ensino Superior no Brasil. É nesse sentido que se busca
definir as bases sobre as quais se devem construir as Diretrizes
Nacionais para a Formação desse professor em nível Superior, Curso
de Licenciatura de Graduação Plena, Cursos de Pós-Graduação e
outras modalidades de formação continuada constituídas por
princípios e critérios, entre os quais: Assim, a disciplina do Ensino
Religioso ampliada pela Educação Religiosa como área de
conhecimento, aos poucos vai tomando o seu espaço no currículo
como tal, para desempenhar a sua função no ambiente escolar de
forma pedagogicamente adequada às urgências e necessidades dos
novos tempos (JUNQUEIRA et al., 2006, p. 445).
Esta afirmativa refere-se ao Ensino Religioso com caráter de identidade das
Ciências das Religiões, sobretudo, afirmando o papel da formação docente vinculada
as graduações que focam a licenciatura no ensino religioso. Mas, é inexistente o papel
de graduação em Ciências das Religiões em todas as Universidades ou faculdades
privadas que contenham essa formação, ainda, a ausências de cursos de formação,
mas, não adentraremos em apresentar as Universidades públicas e privadas que
contemplam esse trabalho, mas, os desafios que representam essa realidade, diante
dos envolvidos no processo de formação docente do ensino religioso em nível de
graduação. Para um entendimento melhor, segundo Domingues (2011,p.180):
A ação do professor reflexivo no Ensino Religioso, ainda, requer
desse profissional a atitude de abrir-se a discussão e a crítica frente
ao objeto de estudo em questão, o qual deve ser reposicionado nos
discursos, nas representações e nos fazeres dos diferentes grupos
sociais presentes em seu fazer educativo.
Nesse contexto, há décadas na história da educação brasileira que essa
reflexão foi posta como obstáculo para ser refletiva como disciplina escolar, com
mudanças que ocorreram durante o processo educacional, o Ensino Religioso foi alvo
de críticas em diferentes contextos sociais. Como já foi citado nesse trabalho, em 1891
com a formação do Estado Laico, à escola publica tornou-se leiga e o ensino ainda
permaneceu confessional, mas com as novas reformulações em 1988, o Ensino
Religioso conquistou seu espaço na Constituição Federal no Art: 210. Expressando-se
da seguinte maneira, §1, “O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá
disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental”.
Conforme esse contexto, e apesar dos resultados já alcançados em prol do
Ensino Religioso, ainda há muitas problemáticas com relação à matriz curricular da
disciplina, ou seja, nesse trabalho, já falamos que há uma ausência de conteúdos e
professores habilitados para ministrarem esta disciplina por um caráter científico,
sobretudo, uma identidade pedagógica que, até então, ainda encontra-se em
construção epistêmica.
Ensino Religioso e Cidadania
Conforme foi ressaltado, a Constituição de 1988 é fortemente construída sobre
a noção do respeito aos direitos humanos e da universalidade da cidadania. Sob a
influência da terceira geração dos direitos fundamentais, a diversidade se apresenta
como elemento chave no processo de sedimentação e consolidação da dignidade da
pessoa humana, valor central da nova ordem constitucional.
De modo que, conforme explicita Bobbio (1992, p. 68), a proliferação dos
direitos humanos se dá, também, “porque o próprio homem não é mais considerado
como ente genérico, ou homem em abstrato, mas é visto na especificidade ou na
concreticidade de suas diversas maneiras de ser em sociedade”.
Portanto, diante de uma Constituição que elenca o pluralismo político como um
de seus fundamentos, todo o aparato estatal deve estar orientado para a reflexão
deste princípio, de modo que o ensino religioso, neste contexto, deve ser utilizado
enquanto instrumento que reafirme e promova o respeito à diversidade, e como
mecanismo eficaz para a consolidação da noção universal de cidadania, Uma vez que,
A cidadania expressa um conjunto de direitos que dá à pessoa a
possibilidade de participar ativamente da vida e do governo de seu
povo. Quem não tem cidadania está marginalizado ou excluído da
vida social e da tomada de decisões, ficando numa posição de
inferioridade dentro do grupo social (DALLARI, 1998, p. 14).
O ensino religioso plural e sem proselitismos apresenta, neste contexto, um
caráter dúplice: em primeiro lugar reafirma a laicidade 30 do Estado e, em segundo
lugar, promove, por meio de seus conteúdos, o conhecimento da diversidade e da
necessidade do reconhecimento do outro, especificamente da multiplicidade de credos
e do dever de convivência harmônica entre eles numa sociedade democrática. É a
chamada educação em direitos humanos, sobre a qual se pronuncia Marconi
Pequeno:
O homem é um ser em construção que pode ser melhorado. Sua
existência é resultado dessa busca de aperfeiçoamento e da sua
30
A laicidade é baseada no respeito ao princípio da separação do poder público e administrativo
do Estado e do poder religioso. (DOMINGOS, 2009, p.49).
capacidade de superar os instintos egoístas e nocivos à vida em
sociedade. Por isso, é possível defender e promover a dignidade do
indivíduo mediante meios educativos apropriados, como é o caso de
uma educação voltada para os direitos humanos. Esta deve, pois,
preparar o sujeito para o exercício da cidadania e, sobretudo, para o
reconhecimento da dignidade que define sua natureza e condição. O
processo educacional pode fornecer ao homem os instrumentos
necessários para que ele possa constituir as bases de um viver
compartilhado e baseado nos valores de solidariedade, justiça,
respeito mútuo, liberdade e responsabilidade. A realização desses
valores o torna mais apto a viver com dignidade. Porém, sem eles o
homem se revela destituído de sua essência fundamental, ou seja,
ele perde aquilo que define o seu ser: a sua humanidade. A educação
em direitos humanos é, pois, uma forma de o sujeito reconhecer a
importância da dignidade e, sobretudo, agir visando à conquista, a
preservação e a promoção de uma vida digna (PEQUENO, 2008, p.
27).
Diante da interpretação desse autor, com relação aos direitos humanos. É
grande a responsabilidade do professor de ensino religioso pautar esse direito em sala
de aula, sobretudo, num espaço de sociabilidade humana, conforme assevera Silva
(2010, p. 13) “numa sala de aula há uma grande diversidade, não só religiosa, mas
também étnica cultural social e de gênero. Essa diversidade se estende ao campo das
opiniões e formas de pensamento”. Que implicam, na formação de uma sociedade
mais igualitária, vetando, todas, e, quaisquer formas de discriminação contra a
integridade humana.
Com essa ótica, a formação da cidadania e da diversidade cultural dentro dos
direitos humanos mostra-nos a importante relação que deve ser realizada com o
Ensino Religioso na escola, para então, fortalecer um diálogo na prática escolar e
proporcionar as escolas e consequentemente aos alunos, o respeito da diversidade.
Vejamos a seguir, que a reflexão de Marconi Pequeno, faz jus quando Diniz, Lionço e
Carrião (2010) apresentam a relevante contribuição à educação democrática, e a
proliferação dos direitos humanos na cidadania.
A educação é um bem público no Brasil. Por meio da educação se
promovem princípios e valores centrais à democracia, tais como a
liberdade de pensamento e crença, a cidadania e a igualdade. A
escola pública é um dos espaços privilegiados para a plena vigência
da Laicidade do Estado, dada a centralidade da educação para a
cidadania. (DINIZ; LIONÇO; CARRIÃO, 2010, p 11).
Nesse contexto, só entenderemos o papel do ensino religioso na escola,
quando houver o respeito da laicidade na escola, sobretudo de um diálogo interreligioso nas práticas pedagógicas, que buscam por uma educação mais dialógica
diante de um contexto plural. Por isso, é necessário que o Ensino Religioso tenha um
caráter pedagógico, ou seja, desenvolva um papel crítico e social dos conteúdos na
ótica da pluralidade religiosa, e também, com seus conteúdos direcionados à realidade
do educando e do contexto em que vive.
Considerações Finais
A despeito da importância da concepção de um ensino religioso plural e
alteritário, percebe-se que, na prática, o proselitismo ainda vigora em grande parte dos
estabelecimentos educacionais brasileiros. Consequência disso é a incompreensão da
diversidade e a crescente intolerância religiosa em nosso território, o que enfraquece a
ideia da cidadania universal. Torna-se necessária, portanto, a concretização real dos
parâmetros legalmente exigidos para o ensino religioso, embora reconheçamos a
dificuldade de tal intento.
Mas, com o advento da Laicidade do Estado, o ensino religioso deverá inserese no contexto com, uma identidade mais coerente com a realidade. Conforme a
leitura abaixo, verificamos que o Estado Laico assegura o Ensino Religioso na escola,
mas, com um tratamento didático-pedagógico, sem congruências com o modelo
catequético.
Sendo assim, fica bastante evidente que a laicidade permite a prática
da tolerância dentro do ensino religioso contribuindo para uma melhor
educação. E como educação e religião estão intrinsecamente ligadas
à vida das pessoas, então, estudá-las tem a ver com seres humanos,
e com o progresso da humanidade (OLIVEIRA; LACERDA; SILVA,
2011, p. 181).
Vejamos que, conforme essa reflexão, a Laicidade permite que o ensino
religioso seja estudado na escola pública brasileira, mas com o planejamento
adequado
ao
sistema
educacional,
com
parâmetros
curriculares
Nacionais
reconhecidos pelo Ministério da Educação, e um projeto que assegure o livro didático
para essa disciplina. Para tanto, o caminho à frente dessa proposta na escola, precisa
ter uma formação docente que componha de conteúdos e metodologias pedagógicas,
além de trabalhos já realizados no campo da (s) Ciência (s) da (s) Religião (ões), e de
contribuições bem-sucedidas do Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso, FONAPER, que desde 1995, propõe um diálogo entre essa relação de Educação e
Religião na escola.
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A
RELIGIÃO
NO
BRASIL
E
SUAS
INFERÊNCIAS
NA
SOCIEDADE
CONTEMPORÂNEA
Wellington Oliveira dos Reis - UEPA31
Resumo
A religião no Brasil vem se tornando um campo bastante polêmico e ao mesmo tempo
interessante de ser pesquisado, pelo fato da diversidade de etnias e miscigenações. Para isso,
esse trabalho pretende apresentara religião no Brasil e suas inferências na sociedade
contemporânea. Adotou o método bibliográfico para faze a comparação entre as religiões.
Apresenta as formas de atuação das religiões no país. Conclui que a aproximação entre as
religiões e fomentar debates que colaborem para o entendimento dessas mudanças e ajudem
na implementação de uma teologia hermenêutica inter-religiosa.
Palavras-chave: Religião. Diferenças. Pluralismo.
Introdução
A religião no Brasiltornou-se um campo polêmico e ao mesmo tempo instigante
de ser estudado e pesquisado, devido a diversidadede etnias e miscigenações que
vieram, através das imigrações, das diferentes partes do mundo, após a expansão da
globalização, e espalharam-se pelo país. Essas imigrações colaboram para que os
diversos atores envolvidos nesse processo, ao aqui chegar, trazendo consigo suas
culturas e tradições, desenvolvessem suas práticas religiosas, sem discriminações,
privações ou medo. Esse fato transformou-se num fenômeno religioso pelo fato de que
no Brasil, por ser um país laico, as pessoas podem praticar suas crenças religiosas
sem impedimentos, contanto que, para isso, mantenham o respeito a diversidadee não
provoquem um distúrbio social. Nesse sentido, este artigo pretende apresentar a
religião no Brasil e suas inferências nas sociedades contemporânea. Para isso, dividiuse este estudo na seguinte forma: 2- O fenômeno religioso, 3 - A religião na América
Latina contemporânea, 4–A religião e o fundamentalismo, 5 - A Religião no Brasil e
suas inferências,5 – O diálogo inter-religioso, 6 – a teologia hermenêutica interreligiosa. Utilizou-se a pesquisa bibliográfica, a partir do confronto das ideias de
autores que falam sobre a temática. Neste víeis, este trabalho justifica-se através
desse entendimento, visando colaborar com as academias, os alunos, e a sociedade
na construção e produção do conhecimento cientifico a partir dos fatos observados e
pesquisados.
O fenômeno religioso
31
Graduado em Administração de Empresas pela Faculdade de Estudos Avançados do Pará,
Graduando em Ciências da Religião pela Universidade do Estado do Pará. Grupo de
Pesquisa: Religião e Democracia
O processo de abertura dos mercados mundiais, o avanço das novas
tecnologia, e a facilidade do acesso as informações, colaborarampara que a
diversidade dos povos e suas culturas se expandissem rompendo os limites
fronteiriços, criando laços de relacionamentos interculturais e inter-religiosos e
ajudando, com as diversas formas de conhecimento oriundos dessa teia de relações
que surgem, na criação de novas raças e povos miscigenados frutos desses do
contatos exercidos entre as pessoas nos mais diferentes lugares, garantindo a
sobrevivência da sociedade e de tudo mais que a compõem. Segundo Sanches (2005,
p. 16),“para sobreviver no mundo realizamos um processo de apropriação deste, por
meio das diversas formas de conhecimento: O mito, a religião, a arte, a filosofia, a
ciência e a teologia”. Nesse processo de apropriação, o fenômeno religioso traça um
caminho ainda em construção, de acordo com o que se apresenta, uma vez que, na
atualidade nada é perene, as verdades construídas há décadas, são substituídas por
outras, o homem moderno apresenta-se religioso, mas sem muito comprometimento
com a religião, isso resulta em nichos de estudos que precisam ser investigados com
desvelo, cientificamente pelas universidades, pesquisadores, e estudiosos na área.
Esta realidade, nem sempre foi percebida dessa forma, como destacam
Manoel e Freitas (2012, p. 07), “Tempos houve em que a história das religiões não
gozava de muito prestigio, particularmente nos meios acadêmicos: ela não fazia parte
dos “grandes temas” propostos para a discussão”. Ou seja, não havia a percepção da
necessidade do desenvolvimento de estudos sobre a religião, uma vez que os
estudiosos preocupavam–se com outras áreas do saber cientifico. Esses mesmos
autores apontam que “a proposta de investigação da história das religiões, atribuindolhes uma tarefa de conscientização e libertação, exigia uma redefinição metodológica
para estabelecer o lugar dessa mesma investigação no conjunto da história”
(MANOEL; FREITAS, 2012, p. 11). Ou seja, tornar-se-ia necessário, atribuir às
pesquisas de investigação, os métodos científicos acadêmicos para dar sustentação à
esta. Assim, aacademia admitira, “que o estudo da história de nossas religiões era
imprescindível para o entendimento da multifacetada tessitura de nossa história, em
que as tolerâncias e intolerâncias entrecruzaram-se e amalgamaram-se no sincretismo
cultural, político e religioso que tanto nos caracteriza” (MANOEL; FREITAS, 2012, p.
11). Dessa forma, surgiram estudiosos com pensamentos variados, que se
interessaram pelo tema, surgindo assim a diversidade metodológica e de
interpretações, que colaborou para o enriquecimento e avanço dos estudos sobre a
religião.
As diferenças e identidades das pessoas e culturas dependem desses
contextose processos, transformações e entendimentos que passam, bem como, de
que forma asreligiões são praticadas. Diz Silas (2006, p. 13) que, “alguma coisa está
acontecendo no campo religioso”, porque, “estamos acostumados a pensar em religião
como algo perene, ligado às tradições mais antigas e portador de uma verdade
ancestral que não pode ser mudada ou colocada sob suspeita”. Ou seja, essas
mudanças desmitificam as verdades construídas pelas religiões mais antigas e
objetivam uma nova forma depercepção sobre essa realidade, num socialismode
novas formulações teóricas, desprendido de proselitismos, mas como intuito de
compreender o que desponta nesse novo horizonte anuviado da religião. A religião
não fica mais somente na Igreja e na comunidade original, mas se desloca para outros
lugares, assume novas feições e formas de vivência (SILAS, 2006, p. 13), conforme
Olga de Sá (apud GUERRIERO, 2003, p. 103)“num momento que estimula a
emergência das mais diferentes abordagens para dar conta do universo, das
sociedade e da história”.
A religião na América Latina contemporânea
A diferença de etnias, culturais e sociais são percebíveis no Brasil, as mídias
sociais apresentam conflitos e tensões que surgem a cada dia, isso porque o processo
de sociabilização, não ocorre sem haver uma certa resistência entre os
desconhecidos, diz Sanches (2005, p. 20) “Na história da sociedade Ocidental
encontramos diversos, exemplos de rejeição das diferenças e da identidade do outro”.
Isso mostra que muitas vezes, os problemas que surgem desse encontro entre os
diferentes, causa certo um desconforto que prejudica, no primeiro contato, o
relacionamento de convivência frutuoso que possa surgir.
De acordo com Murray (1956, apud GUERRIERO, 2003, p.103) “nós nos
confrontamos hoje, na vida americana, com dois fenômenos cuja combinação parece
paradoxal. Primeiro, existe hoje um notável ressurgimento da religião. Segundo, o
fenômeno é complexo; ele é também ambíguo, seja quanto ao seu conteúdo, seja
quanto a sua origem”.Essa abordagem de Murray, feita há 67 anos, demonstra que a
sociedade foi moldando as transformações que foram ocorrendo, tendo a religião uma
nova retomada e seguindo por caminhos de interpretações diferentes das aprendidas
pelas gerações anteriores, uma vez que, “muito do que acontece de novo no campo
das crenças e das práticas religiosas foge da nossa concepção usual da religião
(SILAS, 2006, p. 14).Nessa compreensão,Andrade (2011,p. 2), comenta que Murray
“parece referir-se a América de hoje, onde a religião se faz fortemente presente na
vida pública e pauta os diversos discursos de muitas lideranças políticas”. Ou seja, a
religião parece ter servido de base para que muitos lideres religiosos,que envolveram-
se na política, fossem vistos como bons ou melhores que outros, fazendo, de certo
modo, a sua autopromoção diante dos fiéis, numa verdadeira busca por interesses
pessoais de bem estar social.
Aponta Silas (2006, p. 15) que, o que acontece no campo religioso hoje, longe
de ser um movimento único, organizado, com filosofia e propósito definidos, tem mais
a ver com a ideia de mudança, algo em constante movimento. Ou seja, são
transformações, marcadas por mudanças nos comportamentos das pessoas, nos
valores humanos, na educação, na política e nas instituições religiosa. Para ele,
cresce o número de religiões agora ao alcance de escolha e livre opção do individuo e
não mais como uma herança recebida dos pais ou impostas pela sociedade (SILAS,
2006, p. 14).Isso desvela o apanágio religioso que se prefigura na sociedade, a
ruptura com as formas tradicionais depráticas religiosas que outrora foram ensinadas e
seguidas, em alguns momentos, sem questionamentos.
Norris, P. Inglehart R.(apud OLIVEIRA; MORI, 2012, p. 57) dizem que,
“vivemos na contemporaneidade em uma cultura secular, mas não numa cultura
ateia”. Ou seja, a secularidade existente na sociedade não representa que o homem
deixou ou não pratica religião alguma, e nem tão pouco, que não crê em nada, mas
que esse, “processo de secularização tem sido interpretado de diferentes modos. Isso
para C. Taylor(apud OLIVEIRA; MORI, 2012, p. 57),“nos levou a uma mudança
cultural profunda, de tal modo que vivemos hoje em uma Era secular, o que não
implica o fim da religião e suas instituições, mas sim sua reconfiguração e
ressignificação. Dessa forma, o sincretismo religioso que se apresenta, reforça a
liberdade de expressão proporcionado pelo entendimento do estado laico de direito,
isso propicia uma nova visão e interpretação do que seja religião e do contato com o
sagrado, de modo a não provocar disparidade especulativas e errôneas das
interpretações criadas para explicar o fenômeno religioso. Segundo Santos (2012,
p.102),“Isso demonstra que, nessa nova sociedade em constante mudança o que não
se adapta aos novos moldes está fadado, inelutavelmente, ao fracasso”. Esse
processo de mudanças aponta parauma nova forma de interpretação e reconversão
da tradição religiosa na sociedade, de maneira que seja capaz de responder aos
anseios de seus fieis, e estes percebam se há importância, ou não, dessa prática para
suas vidas. Isso implica em reconversão da tradição cultural e religiosa que;
significa aprender a ler a mesma, mantendo-se livre das formas em
que ela se concretizou. Significa aprender a viver a tradição sem
estar subordinado em nada às formas em que essa tradição viveu no
passado. Reconverter uma tradição a nova situação significa estar
disposto a adotar modos de existência, de expressão e de
concretização que jamais existiram; estar disposto a adotar formas,
de todo tipo e em todos os âmbitos, que comportem uma novidade
radical. Esta atitude inovadora deverá viver em paz, sem sentimento
de infidelidade ao passado, pelo contrário, como a única maneira real
e viva de ser fiel ao passado, como a única maneira possível de não
deixá-lo morrer, de resgatar e transmitir sua realidade, sua
mensagem, sua sabedoria (CORBÍ apud SANTOS, 2012, p. 102).
Diz Silas (2006, p. 15) “a religião não fica mais somente na igreja e na
comunidade original, mas se desloca para outros lugares, assume novas feições e
formas de vivência.Nesse sentido, existem religiões que desenvolvem sua práticas
religiosas em lugares fora dos espaços físicos, onde tenham contato com a natureza e
se preencham de energias positivas. O mesmo autor diz que, nossa visão está muito
ligada à ideia de igreja principalmente a cristã, haja vista a influência que o
cristianismo exerceu, e ainda exerce na sociedade (SILAS, 2006, p. 15).
Nesse sentido Bauman (apud SILAS, 2006, p. 15), ressalta que, “os
movimentos religiosos de hoje têm uma capacidadesingular de revelaros males da
sociedade, sobre os quais eles têm seu próprio diagnóstico”.Uma vez que colaboram
para que oindivíduo desenvolva o sentimento de pertença a uma determinada religião,
tornando-o capaz de colaborare adquirir a experiência, na construção de uma nova
sociedade, enxergar os outros na sua totalidade e amenizar seus sofrimentos mais
urgentes. Pode-se dizer então que ela encontra-se em tudo que compõe a existência
humana,logo a vivência do ser humano se transforma em experiências de
relacionamento com os outros na sociedade. Como diz Sanches (2005, p. 16), “a
experiência é o lugar fundante desse processo de apropriação do mundo [...] é um
processo dialético, em que cada um de nós influência a cultura e, ao mesmo tempo é
influenciado por ela”. Esse processo desenvolve a alteridade nas pessoas, que
mediante isso, conseguem perceber que precisam criar relacionamentos baseados em
valores morais para produzir na sociedade, o que ela mesma perde através dos
isolamentos egoísticos causados através da globalização. Sendo assim, a vida social
enraíza-se na experiência da alteridade e, ao mesmo tempo, leva-nos a descoberta,
fato que pode ser constatado por todas as pessoas e por todas as culturas
(SANCHES, 2005, p.17).
A religião e o fundamentalismo
Atualmente as interpretações dos livros sagrados feitas pelas diferentes
religiões provocam entendimentos errôneosde suas mensagens, haja vista, que esses
livros visam a pratica do bem comum, as hermenêuticas criadas tornam-se então,
determinantes para alguns praticantes de uma determinada religião,tentarem se
sobrepor aos de outras religiões de forma fundamentalista. Danasiewicz (2007, p.51)
diz que, “o termo fundamentalismo tem sido vastamente utilizado nos últimos anos e
muitas vezes de maneira imprecisa, pois tem servido para justificar atitudes religiosas
fanáticas, um retornar a sociedade pré-moderna ou mesmo práticas violentas”. Nesse
sentido, percebe-se a existência de uma compreensão inadequada para o termo
fundamentalismo, isso requer outras formas de interpretação. O mesmo autor aponta
que “o fundamentalismo na sua origem histórica se encontra na religião, mas, na
sociedade atual ocupa espaço na política e na economia, com traço ideológico
(DANASIEWICZ, 2007, p. 51).
Segundo Andrade (2011) As formas contemporâneas do fundamentalismo de
certo modo apresentam certezas [...] mas adesão incondicional a um a conteúdo, a
uma narrativa que se apresenta como uma verdade que se impõe ao individuo como
evidente, do mesmo modo que a verdade científica. AssimDanasiewicz (2007, p.52)
aponta queo fundamentalismo existe, entre outras coisas, serve para que seus líderes
e membros possam tomar distância e fazer oposição às afirmações de outras crenças
religiosas.
A presença pública da religião na forma dos fundamentalistas acaba
por atrair o sujeito neurótico a alienar-se a esse saber que se permite
evitar o mal-estar próprio de sua condição, torna-o instrumento,
reduzido ou anula sua autonomia, em ultima instância fazendo-o
abdicar de seu desejo, rebaixando a uma incessante demanda
(ANDRADE, 2011 apud OLIVEIRA, MORI, 2012,p.63).
Nesse sentido, um indivíduo que se fecha, na sua prática religiosa, em
doutrinas que lhes foram ensinadas não percebe e não aceita a existência de outras
manifestações religiosas com suas doutrinas, e a todo custo,tenta fazer que as outras
pessoas convertam-se à sua religião, vista como verdade absoluta, de forma cínica,
tenta se aproximar dos não convertidos para convertê-los, e quando contrariados, ou
não conseguindo o que pretendem, partem para o uso da violência. Conforme Zizek
(2011, p. 50) “tanto o cinismo cético liberal quanto o fundamentalismo têm em comum
uma característica subjacente básica: a perda da capacidade de acreditar”.Esse fato
pode ser observado na constatação das pessoas que se dizem ateias.
Sobre a interpretação literária dos textos sagrados. Danasiewicz (2007, p. 52),
ressalta que “o fundamentalismo é um anti-hermenêutico. Ele não aceita que o texto
possa ter mais de um sentido, mesmo que seu entendimento não seja claro ou que
contenha aparente contradição”. Ou seja, não se aceita qualquer modificações nos
textos, considerados sagrados, ainda que se encontre erros de interpretações dos
seus autores.
A Religião no Brasil e suas inferências
A religião e os índios
O Brasil e conhecido por sua diversidade cultural, racial e religiosa apresentada
nas variadas manifestações de práticas devocionais e tradicionais que vêm se
realizando há muito tempo de norte a sul no país. Essas manifestações evidenciam a
pluralidade e a diversidade do povo, bem como suas características religiosas, se
formou a partir da miscigenação dos povos desde a sua colonização. Segundo Santa
Ana (1997, p. 257), “a formação do quadro religioso [...]. Origina-se com os povos
indígenas, com eles iniciou também o pluralismo religioso destas terras, na variedade
sociocultural das diferentes nações cada uma com um modo próprio de expressar o
sentimento religioso.Para Wolff (2007, p. 13-14) “essa diversidade constitui a
identidade dos aimaras, tupis, guaranis, astecas, toltecas, zapotecas, maias, quéchuas
e tantos outros”. Esse autor diz:
os índios tem um sentimento religioso que os leva a crer numa vida
pós-terrena, com duas dimensões: a idéia da existência de um
paraíso terrestre, uma “terra sem males”, reservadas as pessoas que
neste mundo praticavam coisas boas; e a idéia de existência de um
deserto, como um lugar de castigo, reservado como morada para os
maus (WOLFF, 2007, p. 14).
Wolff (2007),destaca Tupã, como princípio do bem em oposição a Anhangá o
principio do mal. Vale aqui ressaltar que a organização estrutural dessa religião
indígena, o sacerdote acumula três funções: 1) sacerdotal agindo como mediador
entre a tribo e as divindades; 2) medicinal como curandeiro; 3) juiz responsável pelas
decisões sobre questões de convivência da tribo (WOLFF, 2007, p.14).
A Religião na Era colonial no Brasil
A religião no Brasil remonta ainda operíodo da Monarquia Constitucional (18231889) onde o texto da Carta Magna de 1824, mantinha a Religião Católica como a
Religião oficial do império, em concordância com os acordos estabelecidos entre o
Sumo Pontífice e o Monarca de Portugal (FONAPER, 2006, apud CASSEB, 2009).
Assim sendo, não levava em conta as tradições, crenças e costumes que advinham do
povo, como uma forma de manipulação das massas, na busca de um monopólio
religioso edos interesses dos conquistadores que, aproveitavam-se para explorar mãode-obra dos nativos, além dos escravos. Uma vez que esses colonizadores trouxeram
os escravos africanos que pertenciam a diversas etnias e grupos culturais.Dessa
forma suas tradições e crenças eram desprezadas e desrespeitadas, sendo eles
submetidos a seguirem os ensinamentos que melhor se adequavam as exigências do
império.
Exemplo disso foi o processo de colonização desencadeado a partir
do século XV na América por países europeus. [...] podemos pensar
nos diversos grupos indígenas presentes em países latinoamericanos que buscam resgatar a sua tradição e reivindicam direitos
seculares negados (SANCHES, 2005, p. 17).
Nesse período aconteceu o encontro do catolicismo português com as culturas
indígenas e africanas. Aponta Wolff (2007, p.19) que, “daí nasceu o catolicismo
popular que era, para ele, centrado no culto aos santos sem a participação do clero,
onde a família servia de oratórios domésticos, as irmandades e a capela rural, com
sua festas e santuários de peregrinação. Esse autor enfatiza que, o catolicismo
português que foi trazido valorizava a externalização da fé, sobretudo pelos
sacramentos, procissões e romarias, uniformizando índios, negros e protestantes,
sendo expressos nas confrarias, nas irmandades, nas ordens terceiras e nos eremitas
(WOLFF, 2007,p.19).
A chegada dos africanos com suas crenças no Brasil
O processo de conquista e expansão territorial no período colonial no Brasil,
necessitou de mão-de-obra que pudesse realizar os trabalhos pesados nos quais os
portugueses colonizadores não conseguiam realizar. Eles trouxeram escravos
oriundos de diversos lugares da África eram“os bantos da Angola, Congo e
Moçambique que foram mandados para o Rio de Janeiro, Bahia, Pernambuco e São
Luiz do Maranhão. Os sudaneses, da região entre o Saara e o Atlântico, onde está a
Nigéria, o Daomé ou Benin, e a Costa do ouro. Estes subdivididos em iorubas ou
nagôs, jejes e minas, sendo que estes foram mandados para a Bahia, o Rio de
Janeiro, Pernambuco, e Maranhão (MELO, 1996, p.261).
Entre estas religiões afrodescendentes, possuíam segundo Melo (apud
WOLFF, 1999, p.16) traços comuns: ideias reencarnacionistas – após a morte da alma
voltava ao país de seus ancestrais. Ou seja, a ideia de que o sofrimento que eles
passavam no Brasil, eram passageiros, que um dia, sua vidas voltariam a ser como
antes nas suas terras de origem, livres e ao lado de seus familiares.
A chegada do protestantismo no Brasil
A partir do Século XIX houve mudanças significativas que reforçaram a
pluralidade religiosa no Brasil, a partir do rompimento da Igreja Católica com o Estado,
a proclamação da República, as mudanças ocorridas no governo, na sociedade as
reformas constitucionais, oingresso das igrejas pentecostais, no século XX, leva o
catolicismo a conviver com outros sujeitos, com tradições e práticas, diversas o que
causou o fim do monopólio do catolicismo no Brasil.
De acordo com Sanches (2005, p.120), “o ano de 1824 marca o início da
implantação do protestantismo no Brasil com a fundação da primeira comunidade
evangélica em Nova Friburgo, Rio de Janeiro, por imigrantes alemães”. Essa chegada
do protestantismo veio de certa forma, empurrar a Igreja Católica contra a parede pelo
fato das crises diversas que atravessava, tendo que ceder o domínio dos seus
praticantes à esses protestante que chegaram e depois aos missionários protestantes
americanos que, viam o catolicismo deformado, diz o mesmo autor que, vinham com a
finalidade de fazer o proselitismo e converter a população católica para o
protestantismo (SANCHES 2005, p. 121). Para Wolff (1999, p. 20) o protestantismo
missionário se vinculam, [...] com a “Era Metodista”. Daí um certo desinteresse
doutrinal
dando
ênfase
ao
avivamento”.
Esse
autor,
aponta
as
principais
características do protestantismo:
O pietismo, que favorece a liberdade individual da prática da fé; o
denominacinismo, que pode favorecer a coesão interna dos grupos
na medida em que pode favorecer a eles uma identidade comum,
mas ao mesmo tempo os separa da sociedade; o puritanismo, que
exige o cumprimento de uma disciplina moral rígida; eo
fundamentalismo manifesto sobretudo na interpretação da Escritura
Sagrada (WOLFF, 1999, p. 20).
De acordo com Hortal (apud WOLFF, 1999 p. 21), os pentecostais distinguemse em três categorias: 1) O pentecostalismo clássico com chegada no inicio do século,
representado sobretudo pela Assembleia de Deus e pela Congregação Cristã no
Brasil; 2) movimentos de cura divina, com chegaram ao Brasil na década de 50,
representado pela Igreja do Evangelho Quadrangular e o Brasil para Cristo; 3) o
neopentecostalismo [...] com clientes flutuantes; 4) grupo de pentecostais que seguem
uma linha de cura divina com insistência no exorcismo, representado sobretudo pela
Igreja Deus é amor, a Igreja internacional da Graça de Deus, a Igreja da Nova Vida e a
Universal do Reino de Deus.
Daí em diante, diz Sanches (2005, p. 122) o pentecostalismo desenvolveu-se
com
muita
rapidez
sendo,
mesmo,
um
dos
seus
desdobramentos
o
neopentecostalismo. Este por vez surge após o rompimento, provocado por brigas
internas, de um pastor com outro, que resolve criar a sua “própria igreja”, dando-lhe
um nome de acordo com o achar mais indicado, passando a desenvolver sua missão
particular e paralela aquelana qual pertencia. Demonstra-se assim, as diversas faces
que surgem, dessasvariadas denominações protestantes que se desenvolvem de
acordo com estes rompimentos após brigas internas. Destaca-se aqui a diferença
entre esse protestantismo que se ramifica de acordo com essas pretensões e o
catolicismo da igreja católica que prega unicidade de suas igrejas.
Os desafios do campo religioso no Brasil
A diversidade religiosa no Brasil tornou-se um grande desafio para as religiões
que, para superá-lo, é imprescindível o fomento do diálogo e o respeitointer-religioso,
porém, não obstante, existem barreiras à serem superadas, uma vez que,nas três ou
quatro primeiras décadas do século XX, proliferaram associações que se
autodenominavam “Livres Pensadores”, baseados nos princípios dos iluministas, com
o seguinte propósito:
acelerar o processo de aniquilação de qualquer manifestação
religiosa – ser moderno, se acreditava na época, era ser ateu e
inimigo das religiões. As religiões não desapareceram, a fé não
morreu. Ao contrário, sobreviveram, fortaleceram-se, e multiplicaramse (MANOEL, 2012, p. 08).
Para superação dessa dificuldade e perseguição, o passo mais importantes
dado, foi a garantia da liberdade de culto, uma vez que, o contrário, “impõem limites
aos grupos religiosos [...] e tira do horizonte das religiões a possibilidade de imporem
ao conjunto da sociedade os seus quadros de referenciais” (SANCHES, 2003, p.7). De
acordo com Guerriero (2003, p.7), experimentou-se um processo de sedimentação,
superposição, acumulação e reelaboração de tradições religiosas mais diversas, como
de origem portuguesa, indígena, africana e, mais tarde, europeia e asiática.Isso
demonstra que o país permite a liberdade religiosa e dos cultos, onde as pessoas
podem expressar suas crenças sem a preocupação com censuras de outras
referênciasreligiosas.
Essa abordagem demonstra o que Monterro (1998, p. 231-234) escreveu sobre
o campo religioso brasileiroque “aparece, cada vez mais, recortado por uma enorme
variedade de pertencimentos religiosos oriundos de tradições e culturas mais
diversas”. É marcado ainda por estranhamentos e disputas de interesses mais
diversos, sejam eles por parte do Estado ou da Igreja, onde ambos pretendem
transformar o ambiente um do outro nos lugares onde possam se favorecer. Mas,
apesar dessa aparente disputa de interesses e tentativa de monopolização advindas
de ambas as partes, houve uma aproximação entre os dois durante o período
varguista, onde a Igreja católica inicia um trabalho de estudos históricos das religiões a
partir da teoria da Teologia da Libertação.
Um desdobramento importante da consolidação das teses e das
práticas da Teologia da Libertação para os estudos da história das
religiões e da igreja foi a criação da CEHILA (Comissão para os
Estudos da História da Igreja Latino-Americana), [...] constitui um
centro privilegiado de pesquisa histórica, não sôo da Igreja Católica,
mas também de outras Igrejas cristãs e mesmo de religiões nãocristãs (MANOEL,2012, p. 11).
Conforme Sanches (2005) a igreja católica repensou suas estratégias para
manter seus fiéis. Entre estas estratégias destacam-se:
a adoção de instrumentos eficientes de planejamento da ação
evangelizadora para atingir, [...] os católicos [...] como também a
sociedade. Os esforços da CNBB, desde sua origem, em 1952, [...]
atendem a essa estratégia.
segunda estratégia [...] será a afirmação da identidade do católica
com perfil conservador a partir da década de 1980 (SANCHES, 2005,
p. 126).
Outras religiões como, as de origem africana, as de origem oriental, foram
perdendo a condição que se lhes imputaram de “fora da lei”, foram surgindo outras
crenças que se transformaram rapidamente, sem para isso haver uma explicação
plausível e definitiva. Para Passos (2006, p. 101-102) “as religiões guardam idéias
valores e práticas de milhares de anos atrás [...] o modo de organizar das religiões tem
função de conservar suas tradições, adaptando, porém, suas ofertas para os dias de
hoje”. Nesse sentido, as religiões foram se adaptando para não perderem seus fiéis e
conquistarem outros, mesmo que para isso, tivessem que se dividir e criarem outras,
não certamente ocorrendo isso com todas, na mesma linha de devoção.
Ecumenismo no Brasil
Há alguns anos surgiu no cenário global a intenção de reaproximação das
religiões cristãs, bem como das demais religiões, através do tema do ecumenismo,
numa tentativa de estreitar os laços de amizade e alteridade entre todas, uma vez que
todos os grupos religiosos se organizam, construindo discursos legitimadores. Todos
afirmam uma origem divina direta ou indiretamente para si mesmos (PASSOS, 2006,
p. 111). Ou seja, procuram legitimar a validade de sua praticas religiosas como sendo
de inspiração divina. Assim, diante de tantas afirmações. O ecumenismo segundo
Wolff (1999, p. 7), trata-se de buscar a unidade dospovosde Deus não através da
hegemonia de uma denominação que consiga absorver as demais comunidades
cristãs. Ou seja, tornando-se necessário para isso que todas as religiões busquem,
através do diálogo, a mútua compreensão. Esse autor afirma que, o movimento
ecumênico empenhou-se em promover duas ações: despertar a consciência dos
cristãos sobre a urgência de recompor a unidade do povo cristão e buscar caminhos
novos que levem as comunidades divididas à reconciliação (WOLFF, 1999, p. 7).
Conforme Danasiewich (2007, p. 100) “o ecumenismo é entendido como a busca do
diálogo entre as tradições religiosas cristãs” Ou seja, nesta proposta ecumênica a preocupação
com a unidade era apenas com os cristãos, sem a percepção e a tentativa de aproximação
com as demais religiões. Num mundo tão diferenciado e pluriforme esse impulso ecumênico é
visto como testemunho da unidade (CNBB, 1999, p. 26). Para isso, “o comportamento mais
eficaz diante do pluralismo religioso e eclesial é aquele que leva em frente o projeto de unidade
[...] Dessa forma, há que se partir do reconhecimento do fato de que [...] as diferenças de toda
natureza, existem elementos de convergência”(WOLFF, 1999, p. 122). Nesse sentido, Wolff
(1999) diz que, é necessário uma conversãoda mente e do coração.
Pluralismo Religioso no Brasilcontemporâneo
Conforme Sanches (2005, p. 13), “o mundo é um verdadeiro mosaico esse é o
primeiro passo para termos pluralismo religioso. O segundo passo é reconhecer que
todas as religiões têm legitimidade, porque expressam as diferentes formas humanas
de aproximação do mistério fundante da vida”. Nesse sentido, o pluralismo religioso
está associado ao fenômeno da intensa mobilidade religiosa dos brasileiros, que
frequentam, não raro, mais de uma religião, ou trocam de igreja com relativa
facilidade, ou misturam elementos e práticas de religiões diferentes (WOLFF, 1999, p.
143). Nesse entendimentoSanches (2005, p. 126), demonstra que “o pluralismo
instaura no campo religioso a multiplicação do sujeito religioso, de interesses
religiosos diferentes e de alternativas religiosas”. A diversidade cultural e religiosa no
Brasil transformaram-se, então, em referência nacional e internacional, impulsionado
pela globalização, pelo avanço da tecnologia, o Mercosul e pelo fato do pais ser laico.
Essa diversidade é percebida, inclusive, no tocante a educação:
A importância de uma reflexão sobre as manifestações religiosas,
sobretudo no campo educacional, se deve a uma preocupação em
relação aos desafios, conflitos e tensões gerados no âmbito da
cultura da escola pública brasileira provocados pelo ensino religioso e
pela presença do pentecostalismo. No processo de construção do
objeto, a temática da manifestação religiosa foi sendo identificada
com o crescente número de profissionais evangélicos, no espaço
escolar, que provocam interrogações e objeções a uma
práticapedagógica que sempre incorporou determinadas expressões
da cultura popular (festa junina, carnaval, etc.) (OLIVEIRA, 2007,
p.01).
Há uma diversidade de sujeitos que compõem as religiões e de modo particular
as cristãs.Essas religiões penetram as várias fases da vida do ser humano e que cria
laços sociais que refletem sua maneira de crer. “Uma vez que se essa religião praticar
rituais exóticos e converter a nossa juventude. Rapidamente será acusada de enganar
as pessoas e fazer lavagem cerebral” (SANCHES, 2005, p. 13). Três momentos
importantes nesse processo de mudanças são necessários:
Primeiro: Houve um embate com muitos setores da Igreja católica
Romana no Brasil e as religiões de origem afro, sobretudo candomblé
e umbanda;Segundo: Igreja católica Romana no Brasil vai enfrentar
um dilema [...] de um lado procura dialogar com as igrejas
protestantes históricas e, de outro, tem dificuldade de dialogar com as
igrejas pentecostais e neopentecostais [...] que representa uma
ameaça para atuação de Igreja católica Romana no Brasil [...]
ganham adeptos [...] e negam-se a participar do movimento
ecumênico justamente por não aceitarem dialogar com ela;Terceiro:
dois
embates
simultâneos
desencadeados
por
setores
neopentecostais contra as religiões de origem afro e contra a Igreja
Católica Romana [...] notadamente a Igreja Universal do Reino de
Deus [...] no primeiro caso, [...] essas religiões são expressões
demoníacas; no segundo, [...] sob a acusação de que a Igreja
Católica Romana pratica a idolatria (SANCHES, 2005, p. 120).
Sanches (2005, p. 120),aponta elementos que colocam obstáculos a
consolidação do pluralismo religioso:
a) a dificuldade de muitos sujeitos religiosos reconhecerem a legitimidade dos
demais;
b) O proselitismo religioso;
c) a incapacidade para o diálogo.
Segundo Bartz (2012, p. 03), Os últimos recenseamentos demográficos
realizados no Brasil têm mostrado mudanças significativas na composição religiosa do
país. Recentemente divulgado, o Censo de 2010 trouxe dados que reiteram as
mudanças já constatadas nos recenseamentos realizados em 1991 e 2000.
Gráfico 1: Percentual da população residente, segundo os grupos de religião Brasil –
2000/2010
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2000/2010.
Conforme Camurça (apud TEIXEIRA; MENEZES,2011, p. 37) uma primeira
constatação é a tendência para uma crescente situação de pluralismo e diversidade
religiosa no país. [...] classificações de diferentes religiões no Brasil, incluindo os “sem
religião e os de “religião não determinada”.
Os dados quantitativos e demográficos sobre a religião no Brasil
evidenciam dinâmicas de deslocamento de pessoas pelos diversos
grupos religiosos. A intensa circulação de pessoas, ao redor de
alternativas religiosas variadas, proporciona uma situação de
desestabilização e de fragmentação das organizações religiosas
tradicionais, já que a mobilidade traz consequências nos planos das
crenças e das práticas religiosas (BARTZ, 2012, p. 3).
Diante disso Danasiewich (2007, p. 100) demonstra que “o pluralismo religioso,
por si mesmo, desinstala a Igreja Católica se sua posição tradicional e de sua certeza
absoluta ante a concepção de revelação e de salvação advindos, sobretudo da
teologia dogmática”. Nesse aspecto há uma mudança na forma com que se pratica
determinada religião, pois, muitos que eram de uma religião passam para outra sem
comprometimento algum com esta, ou simplesmente, pratica-se várias religiões. Esse
fenômeno reflete o descomprometimento dessas pessoas em relação ao que praticam,
ou a busca por algo que ainda não encontraram nos lugares onde procuram vivenciar
sua fé.
A vivência de crenças e práticas de duas ou mais tradições religiosas
ou de religiosidades pessoais, compostas de fragmentos de tradições
diversas, tornou-se generalizada num campo religioso pluralista,
construído desde as primeiras décadas do século anterior e
consolidado nos seguintes, até o seu ápice atual. Os
migrantesreligiosos geralmente recusam laços de pertença definida, e
apegam-se a crenças e práticas que lhes parecem melhor adequar-se
a si e ao estilo de vida que escolheram (OLIVEIRA, 2007, p.259).
Nesse aspecto diz Sanches (2005), o pluralismo é um desafio para a teologia
que deve rever seus métodos e adaptar-se para uma dimensão hermenêutica interreligiosa que vise responder a realidade plural circundante. Este pluralismo representa
um desafio para os teólogos repensarem seus métodos de pesquisa e estudos, no
intuito de oferecer à sociedade, o entendimento dessa interreligiosidade que se
apresenta, sendo motivo de quebra de certos paradigmas religiosos que dificultam o
diálogo.
Legitimação das religiões no Brasil
Para Passos (2006) as religiões legitimam suas estruturas através de
fundamentos transcendente original, através de argumentos racionais e de autoridade
religiosa. O autor aponta para:
O poder religioso tem de estar vinculado aos primórdios fundacionais
de sua tradição, seja por linha ascendente, que regressa ao momento
original -Como no caso da sucessão apostólica no catolicismo - , seja
pela reencarnação do líder fundador – no caso do budismo tibetano –
, ou por ligação direta pela reedição , mediante a experiência via
religiosa – caso da experiência pentecostal – ou, ainda, pela via ritual
– quando um determinado roteiro litúrgico tem força de refundação do
carisma original, caso típico das consagrações e ordenações
sacerdotais (PASSOS, 2006, p. 104).
Passos (2006) diz que as religiões esforçam-se para manter seus fiéis sobre
diversas formas iludindo-os com mecanismos de salvação numa visão sobrenatural
dos fatos, com ofertas de cura religiosa, de exorcismo e de prosperidade, operam com
estas estratégias de deslocamento que escondem as verdadeiras causas dos
problemas vivenciados sobre tudo pelas populações de baixa renda. Assim, a
legitimação é mais radical nas seitas e mais eficientes e elaboradas nas igrejas.
(PASSOS, 2006, p.106)
O diálogo inter-religioso
Conforme Teixeira (1995, p. 210) o diálogo inter-religioso ocupa um lugar de
grande importância [...] exige antes de qualquer coisa, uma disponibilidade interior de
abertura e acolhimento, que requer uma atitude equilibrada. Nesse sentido, não
bastam apenas discursos que enfatizem essa necessidade do diálogo, tornasse
necessária a prática do exercício da alteridade, da empatia e do altruísmo. De acordo
com Sanches (2005, p. 132) o grande desafio do diálogo inter-religioso está em
reconhecer sem restrição alguma o caráter irredutível e irrevogável do outro
interlocutor com o qual se instaura a busca de um conhecimento mútuo e de recíproco
enriquecimento.
Teixeira (1995, p. 210) diz que o diálogo é antes de um estilo de ação, uma
atitude e um espírito que guia a conduta. Conforme Wolff (1999) um grande desafio
para a ciência teológica, se trata [...] de trabalhar a possibilidade do diálogo religioso.
Diz Pereira (1999, p. 165) que, o diálogo é uma exigência do pluralismo cultural
religioso.Nesse sentido, então percebesse a importância de uma mudança de
comportamentos que superem os paradigmas instaurados nas diversas religiões, para
que estas possam aproximar-se, umas das outras. Como aponta Danasiewich (2007),
o diálogo inter-religioso se dá mediante quebra do absolutismo e a reflexão teológica.
A teologia hermenêutica inter-religiosa
Diante do desafio desse fenômeno religioso, está a necessidade de uma
reflexão teológica que colabore para o avanço da compreensão das diferenças
religiosas e ajude para que haja o estabelecimento de um diálogo mais eficaz entre
elas. Uma vez que, sobre a diversidade religiosa, aponta Danasiewich (2007, p.
100),“como sendo esta, uma nova questão que a teologia hermenêutica terá de
enfrentar, incentivando uma teologia das religiões aberta ao encontro das religiões”.
Aqui parece ser o um grande desafio nesse cenário pluralista religioso no Brasil, por ir
ao cerne da formação dos líderes religiosos.
Para Sanches (2005, p.132) o exercício de uma teologia cristã do pluralismo
religioso exige uma dinâmica de acolhida da vulnerabilidade. Ou seja, que não crie
obstáculos para o entendimento e aceitamento dos diferentes. Diz Danasiewich (2007,
p. 100), somente uma teologia hermenêutica, que valorize a história e a liberdade
humana, conseguirá captar o sentido da divindade religiosa sem colocar em risco o
específico da identidade e da verdade das tradições religiosas.
Considerações finais
As transformações que ocorreram no Brasil marcaram a sociedadecom
mudanças nos seus diferentes setores, essas, foram percebidas nos comportamentos
das pessoas, nos valores humanos, na educação, na política e nas instituições
religiosa, entre outras... Fazendocrescer o número de religiões agora de acordo com
as escolhadas pessoas, e não mais como uma herança recebida dos pais ou impostas
pela sociedade. Percebe-se a intensa mobilidade das pessoas através das religiões,
fenômeno esse, que causa certa confusão nelas próprias, mediante a diversidade de
doutrinas ensinadas e praticadas conforme o lugar em que são praticadas.
Sendo assim as inferências religiosas ocorrem nesse campo da diversidade
social e cultural, na qual esta se encere, num processo revestido de disparidade de
elementos, de indivíduos comprometidos e descomprometidos com uma prática
religiosa apenas, mas partícipes desse emaranhado apresentado, que permeia a
sociedade brasileira, caracterizada como pluralista e diversificada.
Nesse sentido o diálogo inter-religioso tornasse importante pelo fato de
possibilitar a aproximação entre as religiões e fomentar debates que colaborem para o
entendimento dessas mudanças e fenômenos,
ajudando na implementação
dessateologia hermenêutica inter-religiosa, que se conforme e adéque-se a este
processo de mudanças continuas em que está inserido. Porém, há de se observar
que, para tal, o importante é iniciar-se, com a quebra dos paradigmas engendrados
nos berços de formação (faculdades, universidade e institutos) de líderes religiosos,
(padres, pastores, rabinos...) onde se pode encontrar ainda, muitas visões retrogradas
e isoladas, de alguns formadores, em relação ao diálogo inter-religioso e o debate
sobre a tolerância religiosa, talvez longe ainda, da criação de comportamentos e
pensamentos que visem o reconhecimento religioso dos diferentes. Por fim, sugere-se
a busca pela aproximação das religiões através de diálogos, debates, seminário,
fóruns e congressos que colaborem para o entendimento dessas mudanças e ajudem
na implementação de soluções plausíveis para a questão.
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GT2: INTERCULTURALIDADE, CIÊNCIAS DA(S) RELIGIÃO(ÕES) E
ENSINO RELIGIOSO
Coordenação:
Dr. José Mário Mendez Mendez (UNA-Costa Rica)
Dr. Christina Muleka (UFMS)
Dra. Lílian Blanck de Olivieira (FURB)
Dr. Leonel Piovesana (Unochapecó)
Ementa: Este GT objetiva oportunizar espaços para discussões e reflexões
relativas às interfaces entre Interculturalidade, Ensino Religioso e Ciências
da(s) Religião(ões). A diversidade cultural e religiosa presente na sociedade
brasileira, na sua relação com a educação e demais áreas, requer
aprofundamentos epistemológicos e pedagógicos capazes de educar para o
respeito, dignidade e o reconhecimento de todas as formas humanas de ser e
estar. Para isso, este GT oferecerá possibilidades para apresentar pesquisas e
experiências pedagógicas e metodológicas em Ensino Religioso e nas Ciências
da(s) Religião(ões) numa perspectiva intercultural.
Palavras chave: Diversidade Cultural Religiosa. Interculturalidade. Saberes e
conhecimentos religiosos. Ensino Religioso. Ciências da(s) Religião(ões).
DEBATES SOBRE CIÊNCIAS DA RELIGIÃO, ENSINO RELIGIOSO, DIVERSIDADE
E PLURALISMO RELIGIOSO NA ESCOLA DE APLICAÇÃO DA UNIVERSIDADE
FEDERAL DO PARÁ (EA-UFPA)
Devison Amorim do Nascimento32
Silvia Danielle da Cunha Smith33
Maria Divanete Sousa da Silva34
Vera Lúcia da Rocha Pereira35
Resumo
O propósito deste artigo é de fazer um breve histórico da disciplina Ensino Religioso,
destacando seus aspectos legais. Apresentamos o histórico do Ensino Religioso, desde sua
implantação no período Colonial até a República; permeando-o de seus aspectos legais nas
esferas Federal, Estadual e Municipal, com o objetivo de entender a fragilidade com a qual a
disciplina se apresenta no Currículo Escolar e a forma excludente com a qual tende a tratar do
pluralismo e da diversidade religiosa, em especial às religiões afro-brasileiras e indígenas. O
artigo visa ainda relatar o processo de desenvolvimento do Projeto “Ensino Religioso na
Educação de Jovens e Adultos (EJA) da Escola de Aplicação da Universidade Federal do Pará
(EA-UFPA)”, que amplia os debates sobre Ciências da Religião, Ensino Religioso, Diversidade
e Pluralismo Religioso aos alunos da EJA.
Palavras-chave: Ensino Religioso. Ciências da Religião. Diversidade e Pluralismo Religioso.
Educação de Jovens e Adultos.
Breve Histórico e Aspectos Legais do Ensino Religioso no Brasil
32
Licenciado Pleno em Ciências da Religião e Especialista em Docência da Educação Superior
pela Universidade do Estado do Pará (UEPA). Especialista em Educação para Relações
Étnico-Raciais pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará (IFPA).
Técnico em Assuntos Educacionais da Universidade Federal do Pará (UFPA). Professor de
Ensino Religioso da Secretaria Executiva de Educação do Pará (SEDUC/PA). Membro do
Grupo de Estudo, Pesquisa, Ensino e Extensão em Educação Inclusiva (GEPEEI).
Coordenador do Projeto de Intervenção Metodológica “Ensino Religioso na Educação de
Jovens
e
Adultos
da
Escola
de
Aplicação
da
UFPA”
(EA-UFPA).
[email protected]
33 Licenciada Plena em Matemática pela Universidade do Estado do Pará (UEPA). Mestre em
Educação Matemática pelo Instituto de Educação Matemática e Cientifica da Universidade
Federal do Pará (IEMCI/UFPA). Professora da Escola de Aplicação da UFPA (EA-UFPA).
Membro do Grupo de Estudo, Pesquisa, Ensino e Extensão em Educação Inclusiva
(GEPEEI). Coordenadora do Projeto de Intervenção Metodológica “Ensino Religioso na
Educação de Jovens e Adultos da Escola de Aplicação da UFPA”. [email protected]
34 Formada em Pedagogia, Especialista em Docência da Educação Superior e Mestre em
Serviço Social pela Universidade Federal do Pará (UFPA). Pedagoga da Escola de Aplicação
da UFPA (EA-UFPA). Membro do Grupo de Estudo, Pesquisa, Ensino e Extensão em
Educação Inclusiva (GEPEEI). Pedagoga do Projeto de Intervenção Metodológica “Ensino
Religioso na Educação de Jovens e Adultos da Escola de Aplicação da UFPA”.
[email protected]
35 Licenciada Plena em Geografia pela Universidade Federal do Pará (UFPA). Mestre em
Ciências Florestais e Meio Ambiente pela Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA).
Doutora em Geociências pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Professora da
Escola de Aplicação da UFPA (EA-UFPA). Professora do Instituto de Filosofia e Ciências
Humanas (IFCH/UFPA) na Faculdade de Geografia e Cartografia (FGC/UFPA). Assessora do
Projeto de Intervenção Metodológica “Ensino Religioso na Educação de Jovens e Adultos da
Escola de Aplicação da UFPA” (EA-UFPA)[email protected]
Ao iniciar este artigo acreditamos ser necessário fazer uma síntese da história
do Ensino Religioso no Brasil, bem como apresentar o respaldo legal da disciplina no
que tange a sua participação no Currículo do Ensino Fundamental. No decorrer dessa
discussão veremos como a história e a legislação do Ensino Religioso no Brasil ajudou
na configuração de um Ensino Religioso confessional, negligente à diversidade
religiosa e excludente às religiões afro-brasileiras e indígenas.
De acordo com Figueiredo (1995), o Ensino Religioso no Brasil começou no
período colonial, com a instituição das escolas jesuítas. Durante esse período tratouse, na verdade, de um ensino catequético da religião católica.
A Igreja, no cumprimento de sua missão de evangelizar, através dos
missionários jesuítas, estava comprometida com os acordos estabelecidos com o
Monarca de Portugal e o Sumo Pontífice, para a conquista dos gentios. Por meio do
regime de padroado - outorgado desde meados do século XV, trazido para o Brasil
durante a colonização e extinto oficialmente pelo Decreto nº 119 “A” de 1890 - em que
o Sumo Pontífice concedia poderes sobre a Igreja e sua administração eclesiástica, o
Estado mantinha uma política que subjugava a religião ao poder da metrópole e dessa
se serviu para a expansão de seu domínio.
Assim, o Ensino Religioso desenvolvido no Brasil Colônia privilegiou o
conteúdo doutrinário, pois a religião era um dos meios necessários para legitimar a
dominação europeia sobre os indígenas. Dessa maneira, o regime de padroado
conduziu o processo de formação religiosa do povo brasileiro, tendo o Ensino
Religioso como um dos elementos de sua sustentação ideológica.
Durante o regime imperial o Ensino Religioso passou a ser lecionado nas
escolas religiosas, quando o catolicismo havia sido declarado por Dom Pedro I como a
religião oficial do País. A Constituição Imperial de 1824 decretou, em seu Artigo 5º,
que a Religião Católica Apostólica Romana, continuava a ser a religião do Império e
que todas as outras religiões seriam permitidas com seu culto doméstico, ou particular,
em casas para isso destinadas, sem forma alguma exterior de templo.
Tal fato fortaleceu ainda mais a ligação do Ensino Religioso com a Igreja
Católica, uma vez que a própria liberdade de expressão religiosa no Brasil, antes
precária, agora se tornava restrita aos ambientes particulares. Portanto, o Ensino
Religioso continuou tendo no clero o seu grande propagador (FIGUEIREDO, 1995).
Após a Proclamação da República, o já mencionado Decreto 119 “A” acaba
com o regime de padroado, até então principal sustentáculo do Ensino Religioso.
Começaram inúmeros questionamentos acerca da razão de ser e da inclusão ou não
do Ensino Religioso nas escolas de um país que passava a ser leigo, em que deveria
ser leigo o ensino ministrado nos estabelecimentos públicos. O que culminou com a
sua desconsideração na primeira Constituição Republicana de 1891.
A laicidade do Estado e do ensino recebeu diversas interpretações e, por isso,
também aplicação diferenciada. Rui Barbosa, redator principal da Carta Magna
republicana, inspirando-se na legislação dos Estados Unidos da América do Norte,
admitia o Ensino Religioso confessional na escola pública: a escola não fornece o
Ensino Religioso, mas abre as portas de sua casa, sem detrimento do horário escolar,
ao Ensino Religioso, ministrado pelos representantes de cada confissão.
Outros líderes republicanos, achegados à prática laicista francesa, baniam o
Ensino Religioso da legislação e vedavam sua prática na escola oficial: a neutralidade
é a exclusão do Ensino Religioso na escola. Esta última interpretação prevaleceu
largamente, além de algumas pessoas terem feito dela um cavalo de batalha
anticlerical. Também aqui se nota, mais uma vez, a conceituação de Ensino Religioso
como uma iniciação e um cultivo religioso em determinada igreja ou confissão
religiosa, tornando-se, por isto, incompatível com a laicidade do Estado, segundo a
interpretação mais difundida (RUEDELL, 2007).
Todavia, essa exclusão não foi aceita de maneira pacífica pelas autoridades
católicas. O Ensino Religioso, ainda de caracterização confessional, motivou a Igreja
Católica a travar uma batalha pela sua reintrodução na legislação, especificamente na
década de 20 e mais ainda na década de 30. Essa luta teve resultados e então o
Ensino Religioso foi admitido pela primeira vez nas escolas da rede oficial de ensino
no regime republicano pelo Decreto nº 19.941 de 30 de abril de 1931. A partir daí o
Ensino Religioso é contemplado em todas as demais Cartas Magnas (JUNQUEIRA et
al., 2007).
Wolfgang Gruen (1994) destaca três problemas do Ensino Religioso: O
problema do sentido, em que alguns educadores não entendem o Ensino Religioso
como conhecimento de valor educativo e cultural a ser inserido na rede oficial de um
país leigo como é o nosso, por Constituição. Para esses educadores as questões
religiosas devem ser tratadas no âmbito da família e das próprias religiões. Defendem
que o Ensino Religioso na escola assume um caráter alienante junto aos educandos.
O outro problema se refere à linguagem usada no Ensino Religioso, pois pode
ser trabalhado de duas diferentes formas: a do ensino catequético e a do ensino das
Ciências da Religião; um com objetivo de evangelizar e o outro de tratar o fenômeno
religioso de uma maneira científica.
Há ainda o problema dos interesses, em que autoridades civis interessadas em
não ir de encontro com instituições religiosas influentes e autoridades católicas, com
vista a não perder os direitos sobre o Ensino Religioso, fazem uma união para
defender uma proposta que agrade a ambos, estreitando e mantendo sua relação de
amizade mútua.
Para Gruen (1994), os educadores contrários ao Ensino Religioso têm o mérito
de nos reconduzir ao cerne do problema: ou o Ensino Religioso é importante, valioso
para todo aluno – um conteúdo tipicamente escolar; ou então, não se justifica sua
presença na rede oficial de ensino de um estado leigo; quando muito, poderá ser um
espaço que se concede às religiões, em horário extraescolar. Se estivermos
convencidos da primeira alternativa, cabe a nós o encargo de apresentar as provas e
razões.
Aceitando o desafio proposto, fazemos algumas considerações acerca das
problemáticas em questão.
Sobre o problema do sentido, acreditamos que aqueles que não entendem o
Ensino Religioso na escola estão equivocados em suas afirmações, por dois motivos.
Primeiro, porque se não compreendem o Ensino Religioso é porque ainda não se
deram conta da real importância do fenômeno religioso como fenômeno global que
existe em todas as épocas e em todas as culturas e que influencia, de maneira
imensurável, a vida social e individual das pessoas. Depois, quando esses educadores
dizem que o Ensino Religioso deve ser feito pela família e pelas religiões não estão
considerando que um Ensino Religioso desenvolvido nessas instituições não passaria
de uma catequese, pois há de se convir que uma igreja ou uma família cristã
dificilmente abordariam as religiões afro-brasileiras; ou então as famílias ou igrejas
evangélicas dificilmente optariam por tratar do hinduísmo ou do budismo, em
detrimento de sua própria religião. Pensamos que as pessoas que questionam o
Ensino Religioso o fazem por desconhecimento de qual a proposta genuína de Ensino
Religioso nas escolas.
Para entender porque o Ensino Religioso ainda é ministrado de diferentes
formas e não com apenas no enfoque das Ciências da Religião, embora a discussão
de sua mudança por autores diversos seja relativamente intensa, citamos artigos de
várias constituições brasileiras que tratam do Ensino Religioso:
A Constituição de 1934, no seu Art. 153, prescreve: “O Ensino
Religioso será de freqüência facultativa e ministrada de acordo com
os princípios da confissão religiosa do aluno, manifestada pelos pais
ou responsáveis e constituirá matéria dos horários nas escolas
públicas, secundárias, profissionais e normais”. A de 1937, no Art.
133, permite o Ensino Religioso: “O Ensino Religioso poderá ser
contemplado como matéria do curso ordinário das escolas primárias,
normais e secundárias. Não poderá, porém, constituir objeto de
obrigação dos mestres ou professores nem de freqüência
compulsória por parte dos alunos”. Em 1946, voltamos à linha de
1934. Cf. Art. 168 V. Na Constituição de 1969, Art. 176 §3º item IV,
lemos: “O Ensino Religioso, de matrícula facultativa, constituirá
disciplina dos horários normais das escolas oficiais de grau primário e
médio” (GRUEN, 1994, p. 56-57).
Como vemos, além da longa trajetória histórica a qual o Ensino Religioso
esteve ligado à Igreja Católica, sua situação nas Constituições Republicanas sempre
foram muito oscilatórias, mostrando que os debates sobre a disciplina eram intensos e
contínuos. O Ensino Religioso em caráter confessional foi explicitado nas
Constituições de 1934 e de 1946, mas não nas de 1937, 1967 e 1969.
Para completar o conflito, a omissão da atual Carta Magna em relação ao
caráter do Ensino Religioso abre precedentes para o confessionalismo, uma vez que a
expressão “matrícula facultativa” só tem sentido enquanto o Ensino Religioso for
confessional. E acrescenta-se na polêmica mais o agravante de que a primeira
redação da LDB nº 9394/96, colaborando com as ideias implícitas da Constituição
Federal, novamente dava ao Ensino Religioso um caráter confessional e inseria um
caráter interconfessional, pois assim decretava:
Art. 33. O Ensino Religioso, de matrícula facultativa, constitui
disciplina dos horários normais das escolas públicas de Ensino
Fundamental, sendo oferecido, sem ônus para os cofres públicos, de
acordo com as preferências manifestadas pelos alunos ou por seus
responsáveis, em caráter: I – Confessional, de acordo com a opção
religiosa do aluno ou do seu responsável ministrada por professores
ou orientadores religiosos preparados e credenciados pelas igrejas ou
entidades religiosas; ou II – interconfessional, resultante de acordo
entre as diversas entidades religiosas, que se responsabilizarão pela
elaboração do respectivo programa (BRASIL, 1996).
Se o retrocesso que a LDB nº 9394/96 apresentava fosse aceito, problemas
colossais seriam instituídos legalmente, haja vista que:
Levando-se em conta o Art. 210 da Constituição Federal, O ER foi
aprovado na LDBEN 9.394/96, com a seguinte estrutura: a) de
matrícula facultativa, uma disciplina apenas para os alunos
interessados; b) ministrada nos horários normais das escolas
públicas do ensino fundamental; mas para a escola da rede privada
não há nenhuma determinação; c) não acarretando nenhum ônus
para os cofres públicos; d) oferecida conforme as preferências
manifestadas pelos alunos ou por seus responsáveis; e) podendo ter
caráter confessional e interconfessional (JUNQUEIRA et al., 2007, p.
37-38).
Considerando a citação acima, não é difícil entender quais seriam esses
problemas.
Se o Ensino Religioso é de matrícula facultativa, isto é, apenas para os alunos
com interesse em cursá-lo o que fazer com os alunos que optarem não cursá-lo.
Ficariam ociosos? Já que a Lei não esclarece o que fazer com tais alunos.
Se o ensino público e o particular devem ser regimentados pelos mesmos
princípios, a fim de se garantir a qualidade do processo de ensino-aprendizagem
porque então o Ensino Religioso estaria vinculado apenas à escola pública?
Ao ser pensado um Ensino Religioso confessional e interconfessional,
desconsiderou-se completamente o caráter científico que as aulas de Ensino Religioso
devem empreender. Da mesma forma que se desconsiderou os debates sobre a
formação de professores e a autonomia de seu fazer docente. Como ressalta
Popkewitz (1997), as sociedades modernas exigem práticas de ensino que valorizem o
pensamento crítico, a flexibilidade e a capacidade de questionar padrões sociais, isto
é, requisitos culturais. Tarefa difícil para um professor subsidiar num Ensino Religioso
nesses moldes.
Além do mais, o fato de ser delegado às pessoas “preparadas” pelas igrejas
estaria empurrando o dever do estado de oferecer a disciplina e qualificar professores
para o Ensino Religioso.
Questões inquietantes, capazes de desencadear um movimento Pró-Ensino
Religioso de norte a sul do país, mobilizando a sociedade e os professores para que o
Ensino Religioso tivesse um tratamento como disciplina do currículo escolar. O próprio
Presidente da República reconheceu a necessidade de rediscutir e reelaborar a
proposição sobre o Ensino Religioso na legislação de Educação, e para tal solicitou ao
Ministro da Educação que assumisse essa revisão (Idem, 2007).
O resultado desse movimento foi a sanção da Lei n° 9.475, de 22 de julho de
1997 que deu a atual redação da referida LDB:
O Ensino Religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da
formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários
normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurando o
respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer
formas de proselitismo. §1° Os sistemas de ensino regulamentarão os
procedimentos para a definição dos conteúdos do Ensino Religioso e
estabelecerão as normas para habilitação e admissão de professores.
§2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas
diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos
do Ensino Religioso (BRASIL, 1997).
Mas ainda assim a nova redação da LDB continua trazendo problemas ao
Ensino Religioso, uma vez que se manteve a expressão “facultativa”, que menospreza
a importância da disciplina no currículo escolar e o faz recair no ensino confessional. O
parágrafo segundo estabelece uma orientação que na ordem dos fatos, mantém o
vínculo com as confissões religiosas no que concerne aos conteúdos a serem
definidos.
Nesse parágrafo está localizada a grande fragilidade do Ensino Religioso,
tendo em vista que se abre uma brecha para a manutenção de seu caráter
confessional e do interesse das igrejas em assumir sua condução no interior das
escolas. Ele expressa o tratamento diferenciado dado a essa disciplina, já que o
estabelecimento dos conteúdos das demais disciplinas do ensino fundamental não
está delegado a nenhuma entidade civil, mas tão somente embasado na tradição
científica, reproduzida e transmitida legitima e legalmente pelas escolas de ensino
superior. Além disso, parece ser verdade que o fato de a lei remeter a
responsabilidade pela habilitação do professor aos sistemas de ensino deixou em
aberto inúmeras possibilidades de cursos, sem garantir uma base mínima para essa
formação, de modo a responder, coerentemente, a sua natureza de disciplina regular
dos currículos como área de conhecimento. Também nesse aspecto o Ensino
Religioso ficou na condição de exceção, pois as exigências legais para o exercício do
magistério, em qualquer disciplina, estabelecem a necessidade de formação em curso
superior de licenciatura.
Diante disso, a formação docente do Ensino Religioso acabou ficando numa
espécie de campo aberto, composto de diferentes forças: as igrejas, as
intencionalidades missionárias, as entidades civis, com seus esforços titânicos de
oferecer uma tese consistente de formação docente; e o próprio Ministério da
Educação e que se tem negado a legislar e a gestar a questão (PASSOS, 2007).
Também as legislações do Pará e do Município de Belém constituem
problemas ao Ensino Religioso.
Embora a Constituição do Estado do Pará, de 05 de outubro de 1989, ao
destacar que “O Ensino Religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos
horários normais das escolas públicas, podendo versar sobre quaisquer religiões,
inclusive afro-brasileiras, estrangeiras ou indígenas” (PARÁ, 1989, Art. 277 § 1º), seja
referência no Ensino Religioso, ao tratar das religiões afro-brasileiras e indígenas, em
um país tão preconceituoso contra religiosidade de matriz africana; retrocede ao
confessionalismo e a formação deficitária do profissional de Ensino Religioso na
medida em que estabelece, no artigo 314 (das disposições constitucionais gerais),
que:
Para o desempenho da atividade docente no Ensino Religioso, o
profissional deverá ter habilitação por curso específico, ministrado em
instituições de ensino superior ou entidade religiosa competente, de
acordo com a legislação da Educação nacional. §1º Além de
preencher os requisitos legais, o candidato a professor de religião
deverá ser apresentado pela autoridade religiosa de seu credo e, nos
atos de admissão, será respeitado o princípio da proporcionalidade
entre o número de alunos que declarem professá-lo, sendo a opção
religiosa dos menores de dezesseis anos firmada pelos respectivos
responsáveis. §2º O concurso público para professor de religião será
específico para cada credo que tenha alcançado o quociente
religioso, o qual é obtido dividindo-se o efetivo geral da instituição
pelo número de cargos fixados em lei. §3º Se uma determinada
denominação religiosa contar, no mínimo, um décimo
alunado da escola, isolada ou cumulativamente com
afins na sua doutrina, terá direito a um professor
religião, observadas as demais disposições deste
1989).
de adeptos do
denominações
da respectiva
artigo (PARÁ,
A Lei Orgânica do Município de Belém, no Artigo 217, Parágrafo Único, diz que
“O Ensino Religioso, de frequência facultativa ao aluno, constituir-se-á em disciplina
dos horários normais das escolas da rede municipal”.
E no Artigo 218 conclui:
Para o desempenho de atividade docente no Ensino Religioso, o
professor deverá estar habilitado por curso específico ministrado em
instituição de ensino superior ou entidade religiosa competente, de
acordo com a legislação da Educação nacional. § 1º Além de
preencher os requisitos legais, o candidato a professor de religião
deverá ter consentimento expresso, por escrito, da autoridade
religiosa de seu credo e nos atos de admissão será respeitado o
princípio da proporcionalidade entre o número de alunos que
declararem professá-lo, sendo a opção religiosa dos menores de
dezesseis anos firmada pelos respectivos responsáveis. § 2º O
concurso público para professor de religião será específico para cada
credo que tenha alcançado o quociente religioso, o qual é obtido
dividindo-se o efetivo geral de instituição pelo número de cargos
fixados em lei. § 3º Para complementação de carga horária, o
professor de religião poderá ser lotado em mais de uma escola
(BELÉM, 1990).
Portanto, além de não trazer inovação alguma, como no caso da Constituição
do Pará, apenas compactua com os problemas supracitados.
Até a segunda metade da década de 1990os professores de Ensino Religioso
eram formados em cursos teológicos ligados às diversas opções religiosas cristãs.
Cursos que preparavam profissionais para trabalharem o Ensino Religioso de forma a
promover a religião a que estavam ligados. Colocava-se no mercado de trabalho
professores despreparados para promover um Ensino Religioso não atrelado ao
proselitismo.
Como se percebe um problema leva ao outro. A frágil legislação sobre o Ensino
Religioso institui a formação deficitária do docente que, por sua vez, acentua a
problemática da linguagem do Ensino Religioso, também impulsionada pela legislação.
Os professores se sentem despreparados para a tarefa de promover um Ensino
Religioso tipicamente escolar e, na maioria das vezes, não veem como superar tal
despreparo. E a situação é mais grave ainda quando os professores nem sequer são
formados em cursos de Teologia. É espantoso, mas, é fato, que as Secretarias de
Educação Municipais e Estaduais lotam professores das mais diversificadas áreas
(Geografia, Matemática, Química e outras) para a disciplina de Ensino Religioso.
De um lado, professores formados para lecionar em direção de uma única
religião e, de outro, professores com nenhuma formação. Nos dois casos, o Ensino
Religioso se torna exclusivamente cristão em vez de considerar o pluralismo da
religião e religiosidade brasileira.
Uma prática errada, haja vista que em uma sala de aula pode haver praticantes
de muitas outras religiões. Não que o cristianismo não deva ser estudado em sala de
aula, mas como bem diz Gruen (1994), anunciar Cristo num clima de experiência,
reflexão e fé cristã é uma coisa – é catequese de explicitação cristã. Apresentar a
extraordinária figura de Jesus de Nazaré numa linha mais afirmativo-formativa e como
de fora da experiência cristã é perfeitamente válido em determinadas situações; mas é
algo bem distinto da catequese de explicitação – tanto no método quanto nas
consequências. Pertence ao Ensino Religioso. Evidentemente, trata-se de aspectos
diversos de um único processo educativo.
Fica claro, portanto, que a falta da clareza dos professores sobre a disciplina
gera frequentes falhas pedagógicas no nível da sala de aula; bem como a
desorientação e as práticas equivocadas do próprio sistema de ensino contribuem
indisfarçavelmente para as problemáticas do Ensino Religioso.
No que tange ao problema dos interesses para Ruedell (2007), o Ensino
Religioso foi utilizado também como argumento político-ideológico, com destaque em
plataformas e programas ou como objeto de debates e de contestação.
Com este enfoque fez parte de acertos e articulações político-partidárias,
transformou-se em material de manipulação nos jogos de poder entre governantes e
próceres de diferentes tendências ideológicas e políticas, envolvendo também
lideranças de denominações religiosas, especialmente a Igreja Católica.
Ficou notório tal uso político da religião, ressaltando o Ensino Religioso em
momentos de mudanças de governos ou de golpes institucionais, como o foram a
instauração da República e a 'Revolução de 1930' e anos subsequentes. Na década
de 1930, o Ensino Religioso foi reintroduzido na legislação, durante o governo
provisório de Getúlio Vargas, que buscava o apoio da Igreja.
Alguns anos depois, no Rio Grande do Sul, houve entendimento semelhante
entre lideranças de várias igrejas e o governo estadual, presidido por Flores da Cunha,
sendo publicado nesta circunstância o Decreto nº 6.024, de 22/07/1935, referente ao
Ensino Religioso nas escolas públicas. Depois do Estado Novo, a utilização da política
do Ensino Religioso passou a ser mais de índole ideológica, enfocando a questão da
laicidade.
Em nossa compreensão Ruedell (2007) deixa bem claro o quanto o Ensino
Religioso esteve à mercê de interesses políticos; servindo como trunfo, ora de um ora
de outro partido. O que fragilizou a disciplina já que é uma ação muito oportuna tirar
determinado conteúdo programático intencionalmente da grade curricular da escola
para oferecê-lo novamente em troca de apoio político; ou então reimplantar uma
disciplina abolida por um Governo anterior também em troca de apoio político.
Para Passos (2007), o saldo comum dessa experiência é que o Estado
concede às igrejas o direito de educar seus fiéis dentro das escolas, oferecendo
diferentes formas de suporte, conforme as conjunturas e os acordos. Em suma, a
Educação significa Educação da religiosidade dos educandos.
A questão dos interesses perpassa ainda pelo motivo que faz as instituições
religiosas cristãs – em especial a Igreja Católica - desejarem conservar o Ensino
Religioso sob sua tutela.
É fato que tais instituições ainda veem no Ensino Religioso uma maneira de
direcionar a religiosidade dos jovens e fazer seguidores; mas não somente isso veem,
também, uma forma de tratar de valores e princípios, tão comprometidos em uma
sociedade secularizada em que a violência e o desrespeito (à família, ao meio
ambiente, à vida) cresce de modo progressivo e alarmante.
Ora, é claro que o Ensino Religioso - e não só essa disciplina mais também
todas as outras - deve zelar pelos valores e princípios humanos, afinal de contas a
Educação não está voltada somente para o ensino de conhecimentos técnicos, mas
está norteada, principalmente, para a formação do cidadão, do ser humano em sua
vivência individual e coletiva. É por isso que reconhecemos que as instituições
religiosas estão corretas nesse ponto.
A questão a ser refutada é a catequese e o proselitismo, pois acaba
determinando ao Ensino Religioso a desconsideração de toda uma outra religiosidade
existente nesse país. É preciso que se entenda que o Ensino Religioso não pode ser
catequético porque é ilegítimo negar as demais religiosidades existentes. É necessário
considerar que o Ensino Religioso confessional nas escolas não faz outra coisa senão
criar problemas à disciplina; os alunos acabam tomando uma atitude hostil por
entenderem como a disciplina “chata”, que não acrescenta nada de novo e apenas
reproduz o que já é dito na igreja. Como afirma Gruen (1994), quanto maiores os
alunos, tanto menos acolhedores se mostram para um ensino oficializado da fé, que
lhes parece uma imposição; uma formação mais lenta, que respeita o pluralismo e a
liberdade, é bem mais aceita pelos jovens: consideram-na mais honesta e
desinteressada.
Assim, é melhor que as instituições religiosas deixem o Ensino Religioso por
conta dos professores devidamente preparados para lecionar a disciplina, já que
sabem que devem trabalhar tanto o fenômeno religioso quanto contribuir com a
formação de valores e princípios por meio dos temas transversais. Insistimos em
destacar que ao Ensino Religioso cabe também essa dimensão formativa integral do
educando, o problema é quando há uma distorção disso. Como no caso do Rio de
Janeiro em que o Ensino Religioso é mantido afim de “atuar como força integradora de
uma geração quase perdida” (CAVALIERE, 2007, p. 313), pois então se recai na
questão do ensino confessional e proselitista, se esquecendo do estudo do fenômeno
religioso como área de conhecimento científico.
Com toda sua trajetória de ligação com Igreja Católica e levando consideração
o problema da legislação e da formação específica, que já referimos, se torna claro
porque as religiões afro-brasileiras e indígenas, na maioria esmagadora dos casos,
estão fora dos conteúdos da disciplina de Ensino Religioso. Em um ensino que desde
em toda sua história no decorrer do tempo tende a desconsiderar qualquer religião que
não esteja visivelmente de acordo com os preceitos do cristianismo, evidentemente,
terá veementes ressalvas com religiões que costumam ligar a seres inexistentes e/ou
malignos; ainda que disso não tenham prova alguma.
Com os constantes debates que atualmente vem acontecendo, no sentido de
valorização das religiões afro-brasileiras e indígenas; com os cursos de Ciências da
Religião, voltados para a formação específica para a docência do Ensino Religioso
que estão sendo implantados em diversas universidades do Brasil e; com a
implantação da Lei nº 10.639/2003 e da Lei nº 11.645/2008 espera-se que essas
posturas preconceituosas contra as religiões afro-brasileiras e indígenas no Ensino
Religioso sejam superadas.
Ensino Religioso na Educação de Jovens e Adultos na Escola de Aplicação da
Universidade Federal do Pará (EA-UFPA)
A Escola de Aplicação é uma subunidade acadêmica da Universidade Federal
do Pará que tem como objetivo subsidiar a Educação Básica e a Educação de Jovens
e Adultos para a comunidade; ao mesmo tempo em que é campo de estágio para
discentes dos cursos de graduação da referida Instituição de Ensino Superior (IES).
Ao longo de 51 anos vem desenvolvendo trabalhos diversos de Ensino, Pesquisa e
Extensão com vista a possibilitar a formação de cidadão críticos e reflexivos; capazes
de contribuir com a transformação da sociedade em que vivem.
Na EA-UFPA o Ensino Religioso é ofertado tal como estabelece as leis, isto é,
aos alunos do Ensino Fundamental. Por isso, neste ano letivo de 2014, ampliamos a
oferta da disciplina via os editais lançados pela UFPA. O projeto “Ensino Religioso
naEducação de Jovens e Adultos na Escola de Aplicação da Universidade Federal do
Pará (EA-UFPA)”, vinculado ao Programa de Apoio a Projetos e Intervenções
Metodológicas
da
Pró-Reitoria
de
Ensino
de
Graduação
da
UFPA
(PROEG/PAPIM/UFPA), é direcionado aos discentes da Educação de Jovens e
Adultos (EJA) da EA-UFPA. O mesmo visa favorecer os educandos com outros
processos de Ensino e de Aprendizagem, agregando novas discussões às já
promovidas pelas disciplinas que fazem parte do desenho curricular da Escola.
O projeto vem trabalhando com a execução de palestras sobre Ciências da
Religião e Ensino Religioso, onde se mostra o panorama diversificado das
manifestações religiosas na Amazônia e suas implicações nos acontecimentos sociais
de ontem e de hoje. Espera-se contribuir com reflexão sobre o diálogo e o respeito à
diversidade e o pluralismo religioso da Amazônia e do Brasil.
A metodologia do projeto pauta-se na execução de palestras, promovidas por
professores de diversas IES, sobre temas diversificados a respeito das Ciências da
Religião e do Ensino Religioso.
Quadro 1: Palestras desenvolvidas no primeiro semestre de 2014.
Temáticas abordadas
O Curso de Ciências da Religião da Universidade do Estado do
Para (UEPA).
Breve Histórico sobre o Ensino Religioso no Brasil.
Religião, Religiosidade e Pluralismo Religioso.
As Diferentes Linguagens da Experiência Religiosa.
Religião, Poder e Ideologia.
Fonte: Devison Amorim do Nascimento/Silvia Danielle da Cunha Smith
Quadro 2: Palestras em desenvolvimento no segundo semestre de 2014
Temáticas a serem abordadas
Diálogo Inter-Religioso e Cultura de Paz.
Igreja Católica no Contexto de Ontem e de Hoje.
Protestantismos.
A Doutrina Espírita.
Tradições Orientais: A Doutrina de Buda Nitiren Daishonin.
Tradições Religiosas Indígenas.
Religiões de Matriz Africana: O Tambor de Mina em Belém/PA.
Religião e Arte.
Religiosidade Popular na Amazônia: Festas de Santo.
Encerramento do Projeto/Lançamento do Livro de Artigos.
Fonte: Devison Amorim do Nascimento/Silvia Danielle da Cunha Smith
A cada palestra atinge-se cerca de 150 discentes da Educação de Jovens e
Adultos da Escola de Aplicação da UFPA; os quais interagem de maneira intensa nas
discussões subsidiadas. As palestras contam ainda com a participação de docentes e
técnicos da Escola e ocorrem no período noturno.
Foto 1: Lançamento do Projeto, pela equipe de trabalho, na Escola de Aplicação da UFPA. –
Foto: Devison Amorim do Nascimento.
Foto 2: Docente, discentes e técnicos da Escola de Aplicação da UFPA, partícipes das
palestras. - Foto: Devison Amorim do Nascimento.
Foto 3: Profª Drª Lourdes Melo, proferindo a palestra “O Curso de Ciências da Religião da
UEPA”. - Foto: Devison Amorim do Nascimento.
Considerações Finais
Em virtude das fragilidades com é desenvolvido nas escolas o Ensino Religioso
necessita de uma (re) significação. Que pode ser realizada por meio da ampliação dos
debates a cerca das problemáticas que envolvem a disciplina e o desenvolvimento de
projetos (de Ensino, Pesquisa e Extensão) voltados para a área.
Nessa perspectiva iniciamos no ano letivo de 2014, como já dito, um projeto de
intervenção metodológica voltado para os estudantes da Educação de Jovens e
Adultos da EA-UFPA, matriculados no período noturno. O objetivo geral do mesmo é o
de promover debates significativos sobre a diversidade e o pluralismo religioso nas
sociedades, estimulando o respeito às várias manifestações do sagrado no Brasil e na
Amazônia.
As temáticas desenvolvidas nas palestras estão sendo bem aceitas pelos
estudantes que, até então, relatam não ter outras oportunidades de participar de
momentos de reflexão a respeito dos temas propostos nas palestras.
Em suas manifestações os partícipes das palestras questionam, de forma
reflexiva, o que está sendo analisado e buscam perceber a sua importância. Quando o
problema está relacionado a questões ligadas às suas próprias experiências religiosas
e tem relevância subjetiva para eles mesmos, os estudantes reconhecem os
problemas como “seus problemas”, algo que não pertence a realidades distantes, sem
nenhuma significação. De certo que os alunos da EJA, na medida em que fazem
relações com suas práticas diárias através de situações que provoquem o interesse do
grupo em geral, poderão perceber qual é a função da temática abordada e como ela
está imbricada no contexto extraescolar.
Na prática com os alunos da EJA, o professor precisa conhecer diversas
possibilidades de trabalho em sala de aula, na expectativa dos educandos
estabelecerem conexões entre os diversos conteúdos. E alguns conteúdos
desenvolvidos nas palestras do projeto, contemplam assuntos do próprio Currículo
Escolar (de algumas disciplinas), ou seja, fazem parte do conteúdo programático,
servindo de auxilio para o professor promover discussões em classe e outros
esclarecimentos para os alunos.
Acreditamos que a realização das atividades do projeto, motivam conversas
interativasquesão
estabelecidas
entre
palestrantes/estudantes/docentes/técnicos.
Espaço em que podem estabelecer discussões e reflexões, que possibilitam a análise
crítica de questões relevantes no contexto religião, religiosidade, diversidade e
pluralismo religioso. Percebemos que os alunos da EJA mostram iniciativas mais
autônomas quando lhes são oferecidos a oportunidade de exporem seus
questionamentos, ideias e opiniões.
Esperamos que, ao término do projeto, possamos levar todos àqueles que
participaram do mesmo à consciência de que intervenções como essa podem
fomentar novas discussões que favoreçam o respeito entre as diferenças; contribuindo
com uma cultura de paz e de reconhecimento da religião e da religiosidade do outro
dentro e fora da Escola.
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EPISTEMOLÓGICA, ANTROPOLÓGICA E SÓCIO-HISTÓRICA PARA EDUCAÇÃO
George Alexandre Barbosa de Vasconcelos- UEPA36
José Augusto Oliveira Dias - UEPA37
Resumo
O presente artigo traz uma abordagem sobre a temática: História da África e Afro-brasileira no
espaço educacional brasileiro e sua implantação como obrigatória no currículo escolar.
Trabalhando a importância da temática nas escolas como meio para se trabalhar a diversidade
racial, cultural, assim como racismo e injustiça social e exclusão. Mencionando as dificuldades
que profissionais da educação e instituições de ensino apresentam no trabalhar ou no tentar
inserir o tema no currículo escolar. Dificuldades que têm como um de seus fatores o
despreparo dos professores. Embora o campo educacional brasileiro tenha avançado, é notório
que as instituições estão longe de cumprirem suas atribuições no que diz respeito à temática. A
proposta esta lançada cabendo assim o empenho não só na construção ou reconstrução da
História da África e Afro-brasileira, como também na desconstrução dos estereótipos herdados
(pelos negros) da construção histórica Eurocêntrica.
Palavras-chave: África. Afro-brasileira.Educação.Negro. história.
Introdução
Este trabalho pretende abordar a necessidade do comprimento daLei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996)
como também a lei que inclui no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade
da temática "História e Cultura Afro-Brasileira" (lei 10.639, de 09 de janeiro de 2003), a
qual já tratava da inclusão de temas pouco discutidos no ambiente escolar,como
diversidade cultural, desigualdades raciais e de gêneronas escolas. Tal temática tornase uma ferramenta valiosa para trabalhar dentro das escolas para se garantir o direito
a diversidade cultural e igualdade legal entre os povos rumo à conquista da justiça
social e da verdadeira democracia.
Por esse prisma entendemos que deve ser fazer justiça historicamente, a
história de um povo de grande importância na construção da sociedade em geral- a
partir da qual se inclui sociedade brasileira, que muito deve a eles –Vemos assim que
nossa sociedade tem ampla responsabilidade em empenhar-se na desconstrução de
estereótipos criados por uma história da humanidade totalmente embasada em ideias
Eurocêntricas. Diante dessa proposta o negro não pode mais ser visto como panes,
36
Mestrando do Programa de Pós-graduação em Ciências da Religião- Universidade do Estado
do Pará (UEPA). E-mail: [email protected].
37
Mestrando do Programa de Pós-graduação em Ciências da Religião- Universidade do Estado
do Pará (UEPA). E-mail: [email protected].
uma ferramenta de trabalho, um objeto qualquer, usado historicamente por diversas
civilizações para trabalho forçado e escravo.
Este povo tem e deve terdireito sua históriaprópria, que não seja mais forjada e
difundida sob a ótica das civilizações dominantes, mas que seja uma história
reconstruída e formada antes e para além da ótica ocidental.Nesta perspectiva
tentamos neste breve texto trazer a necessidade de regatar a historia e cultura do
povo negro, para acompreendermos melhor, e a partir dela também podermos
conhecer nossahistoria e cultura,a qual se encontra entrelaça a esta cultura viva e rica
entre muitos povos.
Nesta esteira em vista de se trabalharsua inserção no meio social. Observamos
que esta cultura não tem sido incluída de maneira isonômica na sociedade, ao ponto
de receber o reconhecimento e dignidade que merece. Por isso vemos que se faz
urgente reconhecer a importância da cultura e historia desse povo na construção
cultura e identidades da sociedade brasileira, e da comunidade mundial. Nesta direção
mencionamos o papel importante das escolas e universidades, como campos de
produção e reprodução de conhecimento, os quais podem nos ajudar nesta tarefa
árdua, no sentido de contribuir significativamente para mudança da mentalidade
vigente, em vista dese construir uma sociedade democrática, justa e solidaria, para
que assim possamos combater ao racismo e exclusão e qualquer tipo de preconceito.
Neste itinerário utilizando-nos de alguns autores que trabalham a temática em
questão com muita precisão, e por meio das observações no meio educacional básico
e acadêmico, tentaremos trabalhar o tema voltado para a importância da construção
de uma história própria no que se refere a historia da África e Afro-brasileira. Por
julgamos aqui ser a escola o principal campo para manifestação de novos paradigmas,
que ajudaram na construção de uma nova realidade, no que diz respeito à História
Afro-brasileira e África.
Ahistória da África: ótica ocidental e a luta do movimento negro atual
Conforme vem se refletindo em âmbito acadêmico a partir de meados do
Século XX, observa-se que no inicio do processo de independência das antigas
colônias europeias na África, este fenômeno passou a se constituir e impulsionaro
movimento de reescrita da história africana, o qual não deixou de ser beneficiado
pelas novas perspectivas de análise da historiografia (isto, de certa forma, atinge a
história brasileira e a Cultura Afro presente de forma hibrida e, sua raiz).
Tal processo caracterizou-se pelo propósito de romper com uma história da
África restrita à história de dominação epistemológica eurocêntrica no continente –
pois na atualidade esse movimento tem buscado como referênciaa tentativa de
reescrever a própria história do próprio continente – sem desconhecer, obviamente,
suas relações com outros povos. Esse novo contexto político passa assim a favorecer
a desmontagem da concepção hegeliana, que postulara, no Século XIX: “A África não
é uma parte histórica do mundo. Não têm movimentos, progressos a mostrar,
movimentos históricos próprios” (HEGEL, apud ARNAUT; LOPES, 2005).
A negação de uma história própria ao continente africano, ou a descrença na
possibilidade de escrevê-la, ainda encontrava eco e resquícios enraizados nos meios
acadêmicos mundiais. Assim em meados do Século XX, como se percebe pelo
exemplo do professor de Oxford, “Sir Hugh Trevor-Hoper, que afirmou em 1963, não
haver uma história da África subsaariana, mas tão somente a história dos europeus no
continente, porque o resto era escuridão, e a escuridão não é matéria da história.”
(SILVA, 2003, p. 229).
Porém diante desse e de outros fatores não citados nesta pesquisa, observa-se
também que apesar de a humanidade ter alcançado avanços no estudo da historia
mundial do povo africano, no que se refere aos direitos humanos38 e raciais.Percebese que naatualidade temos vivido um momento único e históricoem quea UNESCO e
parte da comunidade científica mundial e dealguns países,começam a reconhecer que
é a partirdo povo negroque se encontra o berço da civilização e a historia de outros
povos.Com esta afirmação passa-se também areconhecerque o povo negro foi e ainda
é vítima histórica e secular de massacres39, preconceitos ediscriminação. Devido à
38
No cenário do Direito Internacional dos Direitos Humanos, o princípio de não discriminação
tem aplicação destacada, e baliza toda a temática dos direitos econômicos, sociais e
culturais. Esse princípio é caracterizado como sendo uma garantia fundamental, porque se
salienta nele o caráter instrumental, garantidor do direito de igualdade. O referido princípio
básico de não discriminação se encontra presente em quase os todos os instrumentos
internacionais de proteção dos direitos humanos fundamentais produzidos no século XX,
dentre os quais destacamos: Declaração Universal dos Direitos Humanos (artigo 2º). Políticas
de ação afirmativas para negros no Brasil: Considerações sobre a compatibilidade com o
ordenamento jurídico nacional e internacional. *Luiz Fernando Martins da Silva Advogado,
Professor de Direito (licenciado) e doutorando em Ciências Políticas no IUPERJ (RJ).
Atualmente chefia a Ouvidoria da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade
Racial - SEPPIR - da Presidência da República. E-mail: [email protected] e
[email protected].
39
Observa-se aqui singularidade da África decorre, precisamente, do fato desse continente ter
sido o precursor mundial das sociedades agro-sedentárias e dos primeiros estados
burocráticos, particularmente ao longo do rio Nilo (Egito, Kerma, Napata e Kush-Meroé). Ao
longo dos séculos, as riquezas destes estados, assim como as riquezas do império de Axum,
na parte oriental do continente, e do império de Cartago, situado na porção setentrional,
aguçaram a cobiça de inúmeros povos vizinhos, desde o mediterrâneo europeu (gregos e
romanos) e o Oriente Médio semita (hicsos, assírios, persas, turcos, árabes), até o sudeste
asiático (indonésios). Com efeito, desde os meados do primeiro milênio a.C. até o período
recente de dominação colonial pela Europa Ocidental, a África tem sido o lugar do mundo que
sofreu as mais prolongadas e devastadoras invasões de diferentes povos e civilizações.
influência eurocêntrica que difundiu mundo a fora sua maneira própria de ver e contar
a história da África e do mundo.
Brasil e o contexto afro-brasileiro
Em países como o Brasilalguns grupos tembuscado reivindicar eassegurar
alguns direitos conquistadose assegurados pela Constituição40 de 1998.Nessa linha de
pensamento um dos direitos alcançados no Brasil e que não podemos deixar de citar
como exemploé o sistema de cotas41para negros e índios nas Universidades de nosso
país.Tais direitos foram alcançados com muita dificuldade e, nesta direção pequenos
passos são dados para que tais direitos não fiquem somente no papel.
Nesta perspectiva, valorizando a esteira de pensamento dessa pesquisa, que
busca valorizar o movimentoda reescrita e da nova abordagem epistemológica da
história africana – cabe aqui ressaltar, que tal movimento tem sido marcado pela
heterogeneidade, tanto em seus fundamentos epistemológicos quanto em suas
concepções e propósitos políticos. Nesta direção é validoobservar- conforme a ótica
do historiador guineense Carlos Lopes (1995) a partir de seus estudos sobre o
movimento da reescrita da historia africana – Carlos identifica para nósa existência de
três momentos de interpretação histórica da África: a) a corrente da Inferioridade
Africana; b) a corrente da Superioridade Africana; c) e os novos estudos africanos.
Para Lopes (1995, p. 23)a corrente da Inferioridade Africana, é fruto de séculos
de dominação e exploração do continente. Pois esta corrente de pensamento teria
como marco teórico o paradigma hegeliano eurocêntrico, o qual é responsável por
uma visãomarginal,fragmentada, reducionista, preconceituosasobre a contribuição
MOKHTAR, G. História Geral da África – vol. 2: A África antiga. São Paulo: Ática; [Paris]:
UNESCO, 1983.
40
O artigo 2015 da Constituição Federal de 1998 assegura que o “Estado garantirá a todos o
pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e
incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais populares, indígenas e afrobrasileiras, e de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional”. Nota extraída
do
site
acessado
em
21/05/2013
às
16h30min.
http://www.crmariocovas.sp.gov.br/grp_l.php?t=007.
41
STF decide, por unanimidade, pela constitucionalidade das cotas raciais. Por unanimidade,
o Supremo Tribunal Federal (STF) validou nesta quinta-feira (26) de abril de 2013 a adoção
de políticas de reserva de vagas para garantir o acesso de negros e índios a instituições de
ensino superior em todo o país. O tribunal decidiu que as políticas de cotas raciais nas
universidades estão de acordo com a Constituição e são necessárias para corrigir o histórico
de discriminação racial no Brasil. Supremo julgou ação do DEM que questionou sistema de
cotas da UnB.Ministros entenderam que cotas são necessárias para reduzir desigualdade.
26/04/2012
20h11 –
http://g1.globo.com/educacao/noticia/2012/04/stf-decide-porunanimidade-pela-constitucionalidade-das-cotas-raciais.html.
Atualizado
em 26/04/2012
21h23.
africana,“[...] de que a África não pode produzir conhecimento ou História por si só.”.
Embora esta visão já tenha sido superada do ponto de vista acadêmico, ela ainda
prevalece no imaginário coletivo ocidental e mundial. Outra questão levantada pelo
autor seria sobre a existência de uma visão crítica da corrente da “Superioridade
Africana”, por Lopes chamada de “pirâmide invertida”, que teria partido do equivocado
argumento de que “a África também temuma História [...] em vez de apenas temos
História”.
Tal perspectiva teria a intenção de se contrapor ao paradigma da
“inferioridade”, essa corrente de certa forma busca promover uma supervalorização do
continente, pois ela tem alcançado bastante expressão no mundo acadêmico, mas que
precisa se libertar de categorias eurocêntricas, ao comparar, por exemplo, feitos
históricos africanos ao que se considerava “grandioso” em outras culturas e regiões do
mundo. Nesta linha podemos citar o historiador Ki-Zerbcomo um dos pioneiros dessa
corrente. Diante do expostopara enriquecimento de nossa pesquisa cabe aqui
evidenciar o que pensa Lopes42.
Assim a partir deste posicionamento há de considerarmos que o texto de
Lopes, escrito em 1995, apontava para a potencialidade desta nova corrente, a qual
ainda se encontrava em estado embrionário de fortalecimento, frente ao desafio de
buscar ferramentas para se enfrentar a complexidade das historicidades africanas.
Porém há de se admitir, que nas últimas décadas, muito se avançou na produção
historiográfica sobre o continente africano. Poisinúmeras obras sugiram e estão
surgindo no cenário internacional e nacional. Outro importante fator a se destacar e
que caminha nesta direção é que já encontramos uma quantidade significativa de
publicações acessíveis ao público brasileiro – além do surgimento de diversas
revistas43 especializadas em história da África, o que acaba favorecendo uma maior
divulgação das pesquisas e a consolidação da história da África como disciplina
acadêmica.
O contexto do movimento nos meios educacionais no Brasil
42
Para Lopes, os historiadores da pirâmide invertida seriam responsáveis pela conquista de um
importante projeto, patrocinado pela UNESCO, a partir dos anos 1960: o projeto “História
Geral da África”. Com objetivo de desenvolver uma ampla pesquisa sobre o continente, na
perspectiva dos próprios africanos, abrangendo desde o surgimento dos primeiros seres
humanos até os dias atuais, tal empreendimento resultou na publicação de oito volumes, fruto
do trabalho de diversos especialistas, em grande parte africanos. Este projeto, ao mesmo
tempo em que simbolizou a afirmação da pirâmide invertida, também possibilitou o
surgimento do que Lopes chama de “novos Historiadores Africanos, libertos da necessidade
de impor uma superioridade Africana” (LOPES, 1995, p. 27).
43
Afro-Ásia; África e Estudos Afro-Asiático.
Seguindo este pensamento, Silva (2003, p. 236) observa que “A história da
África alcançara a maioridade nos meios intelectuais e universitários africanos,
europeus e norte-americanos.” Porém na concepção de Silva o movimento deveria ter
mais expressão no Brasil, pois a compreensão de nossa história passa, pelo
conhecimento da história africana. Mas, sem dúvida, já presenciamos que o interesse
pela história da África já atinge um considerável grupo de pesquisadores brasileiros,
responsáveis pela realização de congressos e eventos diversos, pela publicação de
obras e pela organização decentros de pesquisas44(OLIVA, 2008). Contudo, não só
nas universidades, mas na educação brasileira de modo geral, faltam materiais
didáticos que trabalhem o tema com mais precisão.
Os livros didáticos ainda pecam por apresentar a África como um
continente miserável, pobre e selvagem. O continente sempre foi
visto a partir de um olhar de fora, do colonizador, baseada em visões
estabelecidas pelo olhar eurocêntrico. Além disso, a diversidade sócio
espacial sempre foi pouco explicitada, em predomina a noção de um
continente selvagem, não considerando a existência de uma África
urbanizada e desenvolvida. Nos livros didáticos, por exemplo, o
continente africano está colocado sistematicamente nas partes finais
da publicação e geralmente com um espaço bem menor que os
outros blocos continentais. Sendo o último a ser estudado, devido ao
tempo escolar exíguo para o cumprimento do programa, verifica-se
que, muitas vezes, a África não é estudada. “Aí esta, mais uma das
questões estruturais que envolvem a desinformação da população
brasileira sobre o continente africano” (MALCHER, 2013, p 239).
De acordo com Silva (2003), é difícil, em nosso país, delimitar rigidamente as
fronteiras que separam uma história da África de uma parte importante da história do
Brasil, sendo muitas vezes impertinente pensar uma história da África que não inclua
suas relações com o Brasil e uma história da presença africana no Brasil que não
remeta a aspectos diversos da história do continente africano. Como comenta Malcher
a respeito da história dos negros no Brasil:
Neste sentido, a população negraescravizada não deve ser vista
comopeça de trabalho, mas sim mostradacomo uma população que
tem umacultura, uma História a ser estudada,e foram também
construtores doterritório brasileiro (MALCHER, 2013, p.233).
Não se pode negar que tem crescido em nosso país, nos últimos anos, o
interesse pelos estudos sobre África, para além daqueles que, durante muito tempo,
se restringiram ao interesse quase exclusivo pelo tráfico negreiro. Além da ampliação
44
Destaca-se aqui o Centro de Estudos Afro-Orientais (CEAO), criado em 1959, na
Universidade Federal da Bahia, http://www.ceao.ufba.br/2007/, site acessado dia 23/05/2013
às 9h50min; o Centro de Estudos Africanos (CEA), da Universidade de São Paulo, criado em
1965, sob denominação de Centro de Estudos e cultura africana, http://www.fflch.usp.br/cea/,
site acessado dia 23/05/2013 às 9h53min; e o Centro de Estudos Afro-Asiático (CEAA),
criado em 1973, na Universidade Cândido Mendes, http://www.ucam.edu.br/index.php/centrode-estudos-afro-asiaticos, site acessado dia 23/05/2013 às 9h56min.
de pesquisas, a história da África vem adquirindo status de disciplina da educação
básica e acadêmica, começando a ser introduzida nos currículos de diversos cursos
de graduação e pós-graduação em História por parte de algumas faculdades como
próprio exemplo da UEPA [...] esse fenômeno embora se trate de um processo ainda
lento e recente em grande parta das escolas e universidades particulares e até
federais do país e mundo a fora.
Mesmo presenciandoa ampliação da produção historiográfica sobre a África e
sua crescente introdução nos currículos das escolas da educação básica e
graduações, em nosso país,a grande maioria dos professores que lecionam essa
disciplina nas escolas de Educação Básica brasileiras não tem, ou, tiverampouco
acessoaos conhecimentos específicos sobre a história do continente africano, em sua
formação inicial. E acabam por (muitas vezes) reproduzindo o racismo no âmbito
escolar.
Segundo Sousa, alguns estudos realizados apontam o professor
como um relevanteelemento influenciador do desenvolvimento e
desempenho escolar. Estestambém mostram que o ambiente escolar
está impregnado de um preconceitosocial, mas, sobretudo de uma
espécie de racismo difuso, dissimulado, silencioso,fundamentado na
cristalização de imagens negativas presentes no imaginário
social,afetando especialmente o desempenho escolar dos estudantes
negros e consequentemente eu progresso no sistema de ensino, que
terminam tendo uma trajetóriaescolar mais acidentada, quando não
excluídas desde cedo da escola (MALCHER, 2013, p.236).
Mesmo que tais conteúdos venham comparecendo de forma mais sistemática
em cursos de formação continuada, prevalece, entre os professores, o pouco acesso a
tais conhecimentos, dificultando assim, sua introdução ao conteúdo curricular
obrigatório. Por esses e outros fatores, muitos professores também não seguiram ou
não
conseguem
em
suas
aulas,
ir
além
das
imagens
estereotipadas
e
homogeneizadoras do continente africano, reproduzindo um senso comum que
restringe a África às imagens de guerras, pobreza, fome e doenças (MALCHER,
2013).
Por outro lado, a necessidade de romper com tais representações também têm
levado muitos professores a buscarem somente imagens positivas e valorizadoras da
história e culturas africanas. Este movimento parece reproduzir no contexto escolar
algo que o historiador Carlos Lopes acima identificou em relação às correntes
historiográficas que de certa maneira tendem a inferiorizar, ou,afirmar a superioridade
africana. De toda forma, apesar de apresentar certa complexidadeàs abordagens
sobre o continente africano.
O que têm prevalecido em inúmeras escolas de educação básica -é a
dificuldade de acesso a elementos e dados históricos capazes de fazer emergir a
complexidade e a diversidade de situações sócias e históricas presentes no continente
africano, como também no território brasileiro, em diferentes épocas. Pois como
comenta Malcher (2013, p.241), em se tratando da educação no Estado do Pará:
Segundo pesquisa divulgada no ano de 2010 15 sobre as ações das
instituições deensino superior presentes do Estado do Pará para a
implementação da Lei 10.639/03,há críticas pelos mais diversos
setores, em especial dos integrantes do movimentonegro, por
entenderem que essas instituições, a exemplo do ocorre nas
esferasestadual e municipal, encontram-se muito distante de
cumprirem as suas atribuições,em vista de desenvolverem ainda
ações isoladas que não são suficientes paragarantir o cumprimento
de algo é obrigatório, como está definido na legislação.
E no que diz respeito à educação na região Norte, Pantoja e Cardoso (2013,
p.249) comentam:
A região Norte e a educação quando contextualizadas, chamam
atenção para os currículos escolares que não levam em consideração
especificidades desta região que poderiam ser trabalhadas de forma
mais intensa, por ser parte de uma multiplicidade cultural própria
dessa região. Torna-se necessário neste momento em que se
percebe um esforço para unificação dos conteúdos curriculares
questiona como resguardar as diferenças diversidades culturais tão
enriquecedoras a cultura deste país.
Porém outro fator importante ligado a essa temática é que nos últimos anos,
temos assistido a emergência de se difundir e instalar uma legislação educacional no
Brasil cuja ênfase tem recaído sobre o trato da diversidade sociocultural nos currículos
escolares. A Lei 10.639/03 aborda e torna essa necessidade como obrigatóriano
ensino de história e cultura africana e afro-brasileira na educação básica. Assim como
a Lei nº 11.645/08, que ao lado desta temática inclui também a questão indígena como
componente curricular obrigatório, que se inserem nesse processo.
Assim a importante temática africana e afro-brasileira apresenta-se como um
conteúdo de fortes significações políticas e sociais, no âmbito da sociedade brasileira,
onde sua abordagem nos currículos escolares adquire certa ênfase para a perspectiva
da reeducação das relações étnico-raciais, aos quais passa a apresentar dilemas e
desafios de ordem política, pedagógica, ética e epistemológica, entre outras
dimensões.
A necessidade da elaboração do novo paradigma
Prosseguindo nesse pensamentoa temática africana passa também a englobar
aobrigatoriedade45do ensino de história da África nas redes do Ensino Brasileiro. Tal
proposta de mudança no paradigmado ensino de História e Cultura Afro-Brasileira –
tem de certa maneira,confrontado o universo dos docentes brasileiros, seja em âmbito
(do ensino fundamental, médio, público, particular e até universitário).Umavez que a
nova mentalidade apresenta-se a classe docente como a proposta, que visa àruptura
com a epistemologia-metodológica-didática-eurocêntrica e, especificamente sobre o
modo de conceber a historia do povo africano.
Pois essa concepção não só propõe um novo olhar sobre a história da
humanidade 46 ,como também se apresenta como um novo “paradigma”, uma nova
epistemologia-metodológica-didática de abordagem a ser usadano que se refere à
história da África e do Brasil. Tal perspectivade abordagem sugerida tem
exigidobastante esforço dos novos docentes, pois estes devem reconfigurar e
aprofunda-se emseus conhecimentos sobre os povos, culturas e civilizações do
continente africano, para que assim e de imediato possampropagarnacomunidade
discente, uma gama de conhecimentos multidisciplinares sobre o mundo africano.
Agora descoberto como berço da civilização.
Outro dado que se relaciona com a temática em questão são as disputasse
embates ideológicos pela perpetuação e/ou instituição de memórias - pois o ensino de
história tem sido historicamente, palco de uma verdadeira “guerra de narrativas”
45
A lei nº 10639, de 09 de janeiro de 2003, altera a lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e
passa a vigorar acrescida dos seguintes arts. 26-A, 79-A e 79-B: "Art. 26-A . Nos
estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e particulares, torna-se obrigatório
o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira. § 1º O conteúdo programático a que se
refere o caput deste artigo incluirá o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos
negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional,
resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à
História do Brasil. § 2º Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão
ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação
Artística e de Literatura e História Brasileiras". .Art. 79-B . O calendário escolar incluirá o dia
20 de novembro como 'Dia Nacional da Consciência Negra.
46
Grupos de humanos anatomicamente modernos deixaram o continente africano pela primeira
vez há aproximadamente 100.000 anos. Essa população humana ancestral, que tinha apenas
dois mil indivíduos migrou progressivamente para os outros continentes, atingindo a Ásia e a
Austrália há 40 mil anos, a Europa há 30-35 mil anos, e, finalmente chegando ao continente
Americano há pelo menos 18 mil anos. Com as recentes descobertas sobre as singularidades
africanas, ou melhor, com o fato de seus povos autóctones terem sido os progenitores e
protótipos de todas as populações humanas do planeta, faz do continente africano o berço
único da espécie humana. Os dados científicos atuais corroboram com esse resultado tanto
as análises do DNA mitocondrial quanto os achados paleontropológicos. Nesse sentido o
continente africano, não deixa de o palco exclusivo dos processos interligados de
hominização e de sapienização, ele é o único lugar do mundo onde se encontram, em perfeita
sequência geológica, e acompanhados pelas indústrias líticas ou metalúrgicas
correspondentes, todos os indícios da evolução da nossa espécie a partir dos primeiros
ancestrais hominídeos. A humanidade, antiga e moderna, desenvolveu-se primeiro na África
e logo, progressivamente e por levas sucessivas, foi povoando o planeta inteiro.
(LAVILLE, 1999), podendo-se identificar diferentes vozes realizando distintas
apropriações de discursos e narrativas históricas, em função de seus projetos
políticos47 e concepções de mundo.
Nesta perspectiva as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das
Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e
Africana, ao serem instituídas tentam alcançar o objetivo de resgatar “historicamente a
contribuição dos negros na formação da sociedade brasileira” e da própria
humanidade, poisa temática é de importante relevância quandose busca promover
“alteração positiva na realidade vivenciada pela população negra.” (BRASIL, 2004: 08).
Dessa forma, seja por, meio de formulações de novas epistemologias,
didáticas, fóruns, simpósios, discussões, da formulação de leis e propostas oficiais de
ensino ou das pesquisas acadêmicas, as questões da valorização da pluralidade
cultural e da denúncia e combate às desigualdades e injustiças sociais tem se tornado
tema e problema para o ensino de história, podendo-se identificar um crescente e
sistemático diálogo com alguns conceitos e categorias analíticas, tais como os
conceitos de identidade, alteridade, memória e cultura.
Essa incorporação evidencia uma aproximação cada vez maior da história, da
sociologia e com outros campos de saber, especialmente a antropologia e os
chamados “estudos culturais”, que englobam múltiplas abordagens e articulações
disciplinares.
Embora a legislação em si seja digna de nossa apreciação como educadores,
isso não significa que determinados aspectos não devam ser refletidos e mais
aprofundados para seu fortalecimento, como proposta a ser abraçada pelo corpo
docente de nosso País, ou,de outros Países. Nesta intenção para que os objetivos
sejam alcançados observa-seque lei estabelece os aspectos que devem ser
destacados dentro do currículo do ensino de História africana.Nesse ponto chama-se a
atenção para a “articulação entre passado, presente e futuro [...] experiências,
construções e pensamentos produzidos em diferentes circunstâncias e realidades do
povo negro.” (IDEM, IBIDEM).
Porém, se forem seguidas à risca as “determinações” enumeradas logo depois
pela mesma legislação, esta “articulação” simplesmente desaparece48 do quadro no
47
A Conferência de Berlim (1884-1885) fixou e disciplinou as regras do jogo de ocupação do
continente africano. Em 1880, apenas uma décima parte da África estava vagamente
ocupada pelos Europeus, lembra o historiador Joseph Ki-Zerbo, mas essa situação mudaria
bruscamente nos vinte anos seguintes, quando o Ocidente se apoderou de todo o resto do
continente. (KI-ZERBO, 2002, p.76-77).
48
Ancestralidade e religiosidade africana; aos núbios e aos egípcios, como civilizações que
contribuíram decisivamente para o desenvolvimento da humanidade; às civilizações e
organizações pré-coloniais, como os reinos do Mali, do Congo e do Zimbabwe; ao tráfico e à
item sétimo das determinaçõesque se referem à ancestralidade e religiosidade
africana.
Esse formato precisa ser discutido, se levarmos em conta a diversidade de
povos e impérios apresentados em sala de aula.Pois se for seguido à risca, exclui
importantes civilizações africanas, sem critério algum para tal seleção. Isso émais
grave quando se passa a enumerar algumas civilizações que devem obrigatoriamente
ser estudadas, estando estas enormemente distantes umas das outras no tempo e no
espaço, como a Núbia (século IV a.C) e o Mali (século XIV da nossa era).
Ou seja, tal método de abordagem recai na falha da mera enumeração de
civilizações, algo como os “grandes momentos” da História africana. Caso o docente
ministre dessa maneira, o ensino de História da África não se aprofundará sobre
qualquer de seus aspectos, se torna uma simples lista de nomes e datas em
sequência. Não torna possível a compreensão da História africana como um processo,
mais faz com que a abordagem permaneça na esfera da superficialidade e
privilegiando o estudo das opressões infligidas ao africano pelo estrangeiro. Por tanto,
se não atentarmos para esse fator,todos os esforços conquistados até o presente
momento ainda contemplará resquício da visão eurocêntrica.
Considerações finais
Temos visto o quanto é dificultoso colocar em prática leis que tratam de temas
ligados a inclusão, racismo, igualdade e justiça social. Pois é justamente o que tem
acontecido com a História da África e o povo negro no Brasil. Mesmo sendo
obrigatoriedade o ensino destes nas escolas (de todos os níveis) no Brasil, ainda não
há na prática, o exercício pleno da disciplina no trabalhar da cultura afro-brasileira e
africana.
Embora o amparo legal, tal exercício exigi empenho comunitário, social,
escolar, cultural, que envolva a presença de grupos culturais e étnicos, no trabalhar da
diversidade brasileira, o que inclui o movimento negro e sua cultura. Trabalhar no
âmbito escolar a coletividade dos grupos variados no combate a desigualdade, ao
racismo e todo tipo de obstáculos que possam gerar o pensamento e prática de
exclusão, é de extrema importância para uma sociedade mais justa e a escola deve se
empenhar nisto.
escravidão do ponto de vista dos escravizados; [...] à ocupação colonial na perspectiva dos
africanos; às lutas pela 50 independência política dos países africanos; às ações em prol da
unidade africana em nossos dias. (IDEM, p.22).
Trazer para o campo da escola ou da academia a História da Cultura afrobrasileira eÁfrica é remeter a sociedade a trajetória do povo negro e suas
contribuições na sociedade que eles ajudaram a construir, a sociedade brasileira.
Além de contribuir para o reconhecimento e inclusão social do negro. A disciplina
História da Cultura Afro-brasileira e África, constituí-se como uma forte ferramenta
para agir na desconstrução dos estereótipos criados a respeito do povo negro.
Cabe a cada instituição educacional buscar ferramentas e investir recursos,
sejam eles pessoas, didáticos e outros, para o comprimento da Lei e fazer valer o
reconhecimento do povo negro. Introduzindo na História da Humanidade, como
também na do Brasil, as contribuições deste povo para as mesmas. E, além disso,
expor a real história de um povo que nem sempre esteve na “periferia” do mundo,
como a História Eurocêntrica fez acreditar por todo esse tempo.
Referências
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Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura
Afro-Brasileira e Africana.BRASÍLIA: Ministério da Educação, 2004.
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sexual na escola e o combate à homofobia. In: Flávia L. G. Marçal Pantoja de Araújo
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Actas do Colóquio “Construção e Ensino da História da África”. Lisboa, Portugal:
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Pantoja de Araújo (org.). Direito humano a educação na Amazônia:uma questão de
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MOKHTAR, G. História Geral da África. In: A África antiga. São Paulo: Ática; [Paris]:
UNESCO, 1983.Rev. Jur., Brasília, v. 8, n. 82, p.64-83, dez./jan., 2007
SILVA, Alberto da Costa e. Um Rio Chamado Atlântico: a África no Brasil e o Brasil
na África. Rio de Janeiro: Nova Fronteira: Ed. UFRJ, 2003.
Sites
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sob denominação de Centro de Estudos e cultura africana. http://www.fflch.usp.br/cea/.
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Site
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Centro de Estudos Afro-Orientais (CEAO), criado em 1959, na Universidade Federal
da Bahia. http://www.ceao.ufba.br/2007/. Site acessado dia 23/05/2013 às 9h50min.
OLIVA, Anderson Ribeiro. A História da África nos bancos escolares: representações e
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Disponível
em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sciarttext&pid=S0101- 546X200300030000 3
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http://www.crmariocovas.sp.gov.br/grp_l.php?t=007. Em 21/05/2013.
http://g1.globo.com/educacao/noticia/2012/04/stf-decide-por-unanimidade-pelaconstitucionalidade-das-cotas-raciais.html. Em 26/04/2012 20h11 – Atualizado em
26/04/2012 21h23.
O ENSINO RELIGIOSO E RELIGIÕES AFRO-BRASILEIRAS
José Carlos do N. Santos49
Resumo:
Este artigo objetiva dar ênfase à prática do ensino religioso nas escolas públicas como também
a importância das religiões afro-brasileiras na formação cultural do povo brasileiro, objetivando
sensibilizar a comunidade escolar acerca das questões étnico-raciais. Destaca o perfil do
professor para o ER voltado para a diversidade cultural sem proselitismo como diz o artigo 33
da LDB. O estímulo e o diálogo entre as diversas religiosidades na tentativa de superar o
egocentrismo que colocou o negro e sua cultura como inferiores no processo histórico
educacional brasileiro.
Palavra-chaves:Ensino Religioso. Prática Pedagógica. Religiões Afro-Brasileiras.
Introdução
O Brasil convive com religiões afro-brasileiras desde o século XVI, mas ainda
são relacionadas ao profano se considerarmos uma análise à luz da doutrina cristã. O
interesse em redigir algo sobre o ensino religioso e religiões afro-brasileiras
religiosidade afro-brasileira veio à tona diante da preocupação acadêmica, nos últimos
tempos, em olhar a religião não apenas de forma racional, mas, principalmente,
científica; além da necessidade de evidenciar a pluralidade religiosa.
Entender as religiões de matrizes africanas, a discriminação histórica às quais
estiveram e continuam submetidas, a fusão ou adaptação às características da religião
católica, o sentido de sagrado entre os seus adeptos tornam-se pontos pertinentes
para uma reflexão com a sociedade. Esta discriminação tem um aporte histórico que,
no caso do Brasil, justificou-se pela necessidade do capitalismo mercantilista, desde a
Idade Moderna, de utilizar o trabalho escravo do negro.
O intuito vem em consonância com implementação da Lei 10639/03, a qual
institui a obrigatoriedade do ensino de História da África e da Cultura Afro-brasileira.
Iremos nos nortearmos por alguns questionamentos: por que as religiões afrobrasileiras têm ainda uma conotação profana numa sociedade carregada de traços
culturais de três grupos raciais (branco, negro e índio)? Qual (ais) a(s) dificuldades de
se implantar o Ensino Religioso voltado para as diversas perspectivas do sagrado de
acordo com as várias influências histórico-culturais? Qual o perfil do professor de
Ensino Religioso atual? Iremos refletir no decorrer do artigo a cerca do ensino religioso
e as religiões que ao longo do tempo foram e são discriminadas.
49Graduado
em Letras/UEPB. Pós-graduado-Língua, Linguagem e Ensino/CINTEP. Bacharel
em Teologia –Faculdade João Calvino. Aluno especial do Mestrado em Ciências das
Religiões/UFPB. Prof.-Rede M.dos Municípios-Cuitegi/PB e Pilões/PB.
Trajetória do ensino religioso no Brasil
Com relação à história do Ensino religioso no Brasil, não devemos abrir mão de
entender o sagrado nas principais perspectivas que forjaram o povo brasileiro: a
europeia, a indígena e a africana. O Ensino Religioso no Brasil deve atender a esta
expectativa para, dentro do princípio de liberdade, valorizar a espiritualidade humana.
Os diversos contextos históricos produziram e produzem formas diferentes de
enxergar o mundo e o divino. Nas escolas brasileiras, há uma diversidade de
dimensões da fé, as quais têm que ser abordadas. A tarefa não é fácil diante de uma
trajetória de ideias eurocêntricas que permearam o cotidiano e a vida escolar,
principalmente nos livros didáticos de História, nas aulas de religião que seguiam a
postura de catequese cristã.
Uma emenda foi acrescida à LDB, abrindo espaço para que o professor de
Ensino Religioso, assim como os demais, seja remunerado ao retirar do texto a
determinação de "sem ônus" para o Estado. Para tanto, o correspondente deve existir:
a sua preparação na forma como administrar os conteúdos em sala de aula para que a
influência cristã, como é de costume, não prevaleça ou não seja a única opção
ensinada. Esta emenda é a Lei 9.475/97, de 25 de julho de 1997, a qual estabelece:
Art. 1.º O art. 33 da Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a
vigorar com a seguinte redação: A revisão do artigo 33 da LDB,
conforme Oliveira et. al. (2007, p. 58), evidenciou que o foco do Ensino
Religioso "...deixou de ser teológico para assumir um perfil pedagógico
de re-leitura das questões religiosas da sociedade, baseado na
compreensão de 'área do conhecimento' e orientado pelos Parâmetros
Curriculares Nacionais". Pelo menos é o que se estabelece no texto,
mas será que a lei está sendo colocada em prática de forma
condizente com o contexto de respeito à heterogeneidade racial e
cultural?
Como o professor e o aluno fazem parte de um contexto e, na realidade
educacional brasileira, as suas vivências devem ser consideradas, não de forma
proselitista, ou seja, professar a sua fé em sala de aula. A sua postura deve ser de um
verdadeiro formador e não transmissor de uma fé formada.
O que vem acontecendo, em geral, é que o profissional adota a proposta
interconfessional cristã, inserindo, de maneira an passant, informações sobre outras
religiões, não havendo o diálogo entre os credos diversos, e o entendimento do
homem, do sagrado e da relação entre si. Nas explicações para esta postura,
certamente está à influência dogmática das religiões cristãs e a modalidade
confessional usada por elas na preparação daquele que se tornou professor. Além
disto, são necessários um maior comprometimento e uma preparação, a nível
acadêmico, deste profissional. Segundo Oliveira et. al. (2007, p. 58-9), contribuem
para este quadro,
[...] a demora e as dificuldades de ordem política, epistemológica e
pedagógica em instituir e/ou implementar cursos de atualização e/ou
habilitação para os professores na perspectiva de um ensino que tem
como objeto de estudo a re-leitura do fenômeno religioso presente no
cotidiano escolar e social e as diferentes tessituras e inferências do
sagrado nas histórias dos humanos.
Visando ao melhor esclarecimento acerca da presença doutrinária da Igreja
católica na educação, acreditamos por bem fazer um breve histórico do Ensino
Religioso no Brasil. A presença da Igreja Católica foi tão forte na educação, tendo sido
os professores vindos de Portugal, na sua maioria, padres que, quando se
estabeleceram as aulas de religião de acordo com a confissão dos estudantes ou
interesses dos familiares, a sociedade já tinha em sua mente que o correto, o nãopecador era seguir os princípios católicos.
Ao longo do tempo o ER tinha o caráter de catequisar aos alunos. O ER era
conhecido como “aula de religião” cuja finalidade era fazer seguidores segundo a lei
4024/61. A primeira concepção era de REELIGERE que quer dizer Re-escolher, onde
o enfoque era centrado em “uma verdade”. A principal característica desta concepção
era de “evangelizar” usando uma metodologia com textos sagrados e memorização. A
estratégia usada era de trabalhos bíblicos (teatro, gincanas etc.) O conhecimento
veiculado era do saber de si, ou seja, adquirir informação sobre religião. O tratamento
didático era transmitido através de conteúdos e recursos. Nesta época o professor
desempenhava o papel de catequista e não de professor.
Já na Lei 5692/71 era “resgate de valores aula de ética tendo o propósito”
tornar as pessoas mais Religiosas. A concepção era de RELIGARE, ou seja, religar. O
enfoque central era de religiosidade, tendo como caracterização a pastoral. O
pensamento inicial era de desempenhar o papel de pastor, de pastorear. O tratamento
didático era de não só de transmissão de conteúdos e sim de dinâmicas e
celebrações. A metodologia usada era de: VER JULGAR, AGIR e CELEBRAR.
O ER desta época segundo a Lei em vigor era de desenvolver uma estratégia
de gestos concretos, de vivência de valores e atitudes de vida. O conhecimento
veiculado era de saber em relação, seria uma visão antropológica da religiosidade.
O ER por sua vez estava voltado ao ser religioso. Com o surgimento da Lei
9394/96 o ER passou a fazer parte da grade curricular “sem ônus” para os cofres
públicos. A concepção, no entanto, era de RELIGERE, ou seja, reler o fenômeno
religioso. O entendimento era de uma área do conhecimento. O enfoque central era de
uma disciplina que caracterizava - se em conhecimento. A metodologia tinha o
desempenho de observação, reflexão e informação.
A estratégia usada era de convivo social, relação entre culturas e tradições
religiosas. O conhecimento veiculado era de saber de si (entendimento de fenômeno
religioso que vive e/ou percebe em seu convivo social).
Com a aprovação da Lei nº 9475/97 é modificado o ART. 33 da LDB e passa
ser expressa: ... O Ensino Religioso de matrícula facultativa é parte integrante de
formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas
públicas do ensino fundamental assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa
do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo.
No caso das religiões afro-brasileiras, acreditamos que as festividades cristãs
nas escolas procuram não tolerá-las, o que é contraditório se o sentido da religião é
estimular comportamentos pacíficos e de respeitabilidade. A formação adequada do
professor pode favorecer o diálogo entre as várias culturas que compõem a sociedade
brasileira.
Temos vivenciado uma educação mais justa, democrática, que prime pela
igualdade e liberdade. Para isto, precisamos reconhecer a necessidade de uma
preparação dos professores, obtendo uma licenciatura, bem como a presença da
formação continuada, cujo objetivo é privilegiar a diversidade cultural e religiosa do
estudante brasileiro.E ressaltamos que uma forma importante de cumprir este papel é
também buscar uma relação com outras disciplinas, mas não de forma como fizeram
os governantes militares, mas que habilitem os alunos para o entendimento crítico da
realidade.
A prática pedagógica na escola pública
Didaticamente o ER tem um tratamento de acordo com os Parâmetros
Curriculares Nacionais baseados em três (3) eixos temáticos: Observação, reflexão e
informação.
A observação não é apenas uma experiência visual, mas diz respeito às
condições externas e internas do observador, tais como idade, formação, história de
vida, conhecimentos prévios etc. no caso do ER as observações feitas, por exemplo, a
propósito de um determinado símbolo será tão variadas quanto forem os educando
observadores e sua matrizes religiosas. O mesmo fenômeno, tomado como objeto de
estudo, será observado diferentemente por professores e alunos. Isso não significa
que a observação feita pelo professor deva se sobrepor a do(s) aluno(s), mas que elas
podem se completar e se enriquecer. O professor age como orientador dessa
observação seletiva para trabalhar os conceitos básicos do ER.
A observação feita de ambas as partes deve acontecer de forma interativa. Diznos Freire (1996, p. 86):
O fundamental é que o professor e alunos saibam que a postura
deles, do professor e dos alunos, é dialógica, aberta, curiosa,
indagadora e não apassivadora, enquanto fala ou enquanto ouve. O
que importa é que professor e alunos se assumam
epistemologicamente curiosos.
A reflexão é um procedimento que acompanha todo o processo, desde a
observação até a informação. Na realidade não se trata de momentos isolados e
estanques, mas de passos que se entrelaçam, se interligam numa dinâmica, num
movimento constante. O professor pode encaminhar a reflexão com questionamentos,
diálogos, problematizações que promovam a conscientização, o entendimento e a
decodificação do objeto de estudo, no caso o fenômeno religioso. Essa decodificação
progressiva permitirá ao aluno abrir sua visão, desarmar – se de preconceitos,
discernir, perceber a unidade na diversidade das tradições religiosas, como por
exemplo, a defesa da vida, a busca do sentido, a necessidade da transcendência.
Estes reflexos devem estar sempre aguçando o educando a ser um ser pensante
como diz Freire (1996) “Satisfeito uma curiosidade a capacidade de inquietar-se e
buscar continua em pé. Não haveria existência humana sem a abertura de nosso ser
ao mundo, sem a transitividade de nossa consciência”.
Pela informação, o professor ajuda o aluno a se apropriar do conhecimento
sistematizado, organizado, elaborado, para que possam passar de uma visão ingênua,
empírica, fechada, dogmática, desarticulada e muitas vezes incoerente para uma nova
visão decodificadora e explicitadora da realidade. Todos esses procedimentos devem
necessariamente possibilitar que alcance dos objetivos propostos pela disciplina
Ensino Religioso sejam atingidos. A intencionalidade e a direção do processo
ensino/aprendizagem no ER devem conduzir para a realização de dois aspectos: o
primeiro, de ordem interna, refere-se à junto com os educandos parâmetros na
construção de subjetividade de cada um. O nosso relacionamento com as outras nos
impõe um aprofundamento de nossa consciência e responsabilidade diante das
contingências do mundo em que vivemos e os desafios com os quais nos defrontamos
no dia a dia. Abrir espaços de diálogo para o jovem permiti que ele exista de fato, é
dar - lhe oportunidade de colocar-se como sujeito e artífice da sua própria formação,
na liberdade e responsabilidade.
Antes de tudo é preciso ouvir o que o educando tem a dizer, discutir com ele
expectativas de direitos e deveres implícitos em sua fala, destacando ponto - chaves
para a elaboração de juízos norteadores do comportamento humano
OBJETIVOS DO ER
Os objetivos do ER, em nível nacional, estão definidos nos Parâmetros
Curriculares Nacionais, fruto de discussão e reflexão do Fórum Nacional Permanente
do Ensino Religioso. Constituem – se referencial para que se preserve uma “espinha
Dorsal” e se evite o proselitismo, conforme prevê a Lei.
Dessa maneira, o ER é o instrumento que auxilia na superação das
contradições de repostas isoladas (proselitismo) e na construção da cidadania. “O
Ensino Religioso, valorizando o pluralismo e a diversidade cultural presente na
sociedade brasileira, facilita a compreensão das formas que exprimam o processo
histórico da humanidade. Por isso necessita”:

Proporcionar o conhecimento dos elementos básicos que compõem o
fenômeno religioso, a partir das experiências religiosas percebidas no
contexto do educando.

Subsidiar o educando na formação do questionário existencial, em
profundidade, para que ele possa dar sua resposta devidamente
informada.

Analisar o papel das tradições religiosas na estruturação e manuseio das
diferentes culturas e manifestações socioculturais.

Facilitar a compreensão do significado das afirmações e verdades de fé
das traduções religiosas.

Refletir o sentido de atitude moral como conseqüência do fenômeno
religioso e expressão da consciência pessoal e comunidade do ser
humano.

Possibilitar esclarecimento sobre o direito à diferença na construção de
estruturas religiosas que têm na liberdade o seu valor inalienável.
 CONTEÚDOS PROGRAMÁTICOS DO ER
Da mesma forma que nas outras disciplinas os conteúdos no ER assumem o
enfoque dado pelos Parâmetros Curriculares Nacionais. Constituem – se em meio ao
invés de um fim em si mesmos. Esses conteúdos recebem um tratamento especial,
pois através deles é que são operacionalizados os objetivos de disciplina.
Os conteúdos se enquadram em grandes categorias:
a. CONTEÚDOS CONCEITUAIS, que envolvem fatos, conceitos, princípios e a
capacidade para operar com símbolos, imagens e representações.
b. CONTEÚDOS PROCEDIMENTAIS, que expressam um saber de modo a
permitir que os alunos construam instrumentos de análise, que em última
instância, serão um modo de pensar e produzir conhecimento.
c. CONTEÚDOS ATITUDINAIS, que permeiam todo o conhecimento escolar;
considerados positivamente, contrariam a pretensa neutralidade da
apresentação do saber cientifico.
Perfil do educador de ensino religioso
O Ensino Religioso no Brasil, por lei (art.33 da Lei 9.394/06 e Resolução 02/98
do CNE Conselho Nacional de Educação, de 7 de abril de 1998), deve constar no rol
das disciplinas escolares. Os profissionais devem ser preparados, não somente para
respeitar a diversidade religiosa, bem como para estimular uma consciência
antirracista. A religião não pode continuar se apresentando no ambiente escolar de
forma
inibidora
de
diversas
experiências
culturais.
É
comum
assistirmos
comemorações de festas juninas nas escolas que, por possuírem um conteúdo
doutrinário de homenagem a santos católicos, terminam inibindo a participação de
estudantes de outras matrizes religiosas.
O profissional de ER deve estar capacitado para lecionar esta disciplina, uma
vez trata – se de estar abordando a religiosidade num sentido amplo e global.
O perfil do educador deve conter os seguintes requisitos:
1. Ter o espírito de pesquisa;
2. Respeitar as demais tradições e manifestações religiosas;
3. Ter clareza quanto à sua própria convicção de fé;
4. Ter consciência;
5. Sensibilidade à pluralidade
6. Ser livre de todo e qualquer preconceito,
7. Amar incondicionalmente o ser humano.
Vivemos
numa
realidade
onde
todas
as
áreas
profissionais
estão
constantemente se reciclando da melhor forma possível, a fim de estar apto a exercer
a função da qual optou para desempenhar na sua trajetória como profissional.Com
relação ao ER não é diferente, pois o professor é chamado a participar de congressos,
simpósios e conferências para assim atualizarem sobre as inovações e evoluções do
ER na história educacional
Diante da trajetória do ER podemos perceber de que é importante ser
desenvolvido e até criar o espírito de tolerância na sala. Primeiro porque trata – se de
conhecimento do fenômeno religioso, como diz o PROGRAMA NACIONAL DOS
DIREITOS HUMANOS, na PROPOSTA 110: “Prevenir e combater a intolerância
religiosa, inclusive no que diz respeito a religiões minoritárias e a cultos afrobrasileiros”.
É bom salientar de que temos raízes diversificadas com descendência afro. O
educador deve ter consciência de que a questão afro-brasileira é obrigatória nas
escolas.
Reflexões sobre religiões afro-brasileiras
Para pensar sobre religião no Brasil temos que levar em conta os traços
culturais que formaram o povo brasileiro e, no que se refere a nossa temática,
considerar a imensidão de caracteres do branco e do negro. Já é sabido que a
contribuição cultural do africano sempre foi posta sob um olhar etnocêntrico do
europeu, mas temos que aprender a reconhecer a criatividade e perseverança dos
seus descendentes em tentar reavivar seus costumes, suas crenças. E o sincretismo
com o catolicismo foi uma das formas de não deixar se apagar o seu imaginário
religioso africano. Outra forma é reiterar as crenças africanas o mais próximo de suas
origens, tentando, hoje em dia, evitar mesclar ritos não africanos.
Arthur Ramos destaca a importância de Nina Rodrigues e de seu método aos
estudos sobre a cultura negra no Brasil:
Destaco alguns destas apreciações no estrangeiro, precisamente
para mostrar a importância do método do exame das culturas negras
no Novo Mundo para o conhecimento recíproco da influência negra
nos vários países deste hemisfério. Na realidade, como já destaquei
no prefácio da primeira edição, não se trata mais do que uma
ampliação do método da escola de Nina Rodrigues – considerando o
termo escola no sentido de grupo de trabalho ou de pesquisas, não é
demais repetir – o da necessidade de se estudarem as culturas
africanas para se melhor compreender o negro no Novo Mundo,
método hoje triunfante, e adotado e alargado por notáveis
especialistas nacionais e estrangeiros (RAMOS, 1979, p.18).
Ao descrever a presença do “fetichismo” dos negros da Bahia e seus mestiços,
Nina Rodrigues explica que sua persistência como expressão do sentimento religioso
se dá de forma exterior ao culto católico aparentemente adotado por eles. Nesse
momento, a percepção do fetichismo surge ligada à identificação entre santos e orixás
e a prática de feitiços:
A persistência do fetichismo africano como expressão do sentimento
religioso dos negros bahianos e seus mestiços, é facto que as
exterioridades do culto apparentemente adoptados por elles, não
conseguiram disfarçar nem as associações hybridas que com esse
culto largamente estabeleceu o fetichismo, nem ainda as praticas
genuínas da feitiçaria africana, que ao lado do culto christão por ai
vegeta exuberante e válida (RODRIGUES, 1935, p.15).
No Brasil colonial, o catolicismo popular, apesar da objeção dos doutores da
Igreja Católica, "deu uma brecha" às manifestações africanas, ainda que comedidas.
Lembremos também que os negros não tiveram uma efetiva catequização nos moldes
dos índios nas missões jesuíticas, contribuindo para que elementos africanos
continuassem presentes, embora camuflados. Havia membros de tribos que vieram
para a colônia e aqui procuravam, sutilmente, por em prática seus saberes sagrados
como líderes (umbandas). Batuques eram permitidos para proporcionar o encontro de
nações africanas diferentes, cujo objetivo era estimular as rivalidades (AUGRAS,
1983), mas que puderam, contraditoriamente, ter contribuído para deixar viva muita
crença africana.
Além disso, a Igreja Católica permitia a presença das irmandades e confrarias
de pretos como forma de controle social, mas que para os negros contribuíram na
compra de algumas alforrias e numa forma de não destruir, por completo, a
solidariedade
étnica
(SOARES,
2002; WEHLING; WEHLING,
2005).
Muitas
irmandades estiveram, inclusive, na origem do candomblé [2].
Soares (2002) acredita que este conjunto de fatores propiciou não "tãosomente uma aproximação entre orixás e santos, mas antes a participação dos
membros do candomblé na vida da igreja católica" (p. 50). De forma criativa se fazia
uma analogia entre as suas crenças africanas e as dos europeus; o africano integrou
nas suas tradições as características católicas. A devoção católica aos santos ajustouse aos panteões africanos.
As religiões afro-brasileiras foram vivenciando a descriminalização, obtendo a
liberdade de culto com a Constituição Brasileira de 1946 (SOARES, 2002). Porém, o
senso comum já tinha incorporado aideia de cultura branca como superior em
detrimento das demais, não reconhecendo a presença de elementos físicos e culturais
africanos. O que se precisa, e um dos mais importantes caminhos são através da
educação, é redescobrir aspectos positivos dos descendentes de africanos na
constituição da cultura brasileira.
Para os adeptos do candomblé - culto africano que se tornou afro-brasileiro -, o
sentimento de liberdade é presente no que se refere a pertencer a uma comunidade.
Os seus membros, assim como muitos dentro da Igreja Católica, não veem com bons
olhos o sincretismo da religião no Brasil. O candomblé procura resgatar, mesmo que
seja uma tarefa difícil, suas raízes africanas, enquanto cabe à umbanda o status de
religião efetivamente brasileira por não se preocupar em preservar as marcas
africanas originais.
O candomblé foi trazido da África pelos grupos étnico ioruba ou nagô, mas foi
também cultuado pelo povo banto, que fez algumas adaptações às suas crenças.
Segundo Augras (1983), a palavra candomblé pode significar "lugar de dança" e
esteve presente nos quilombos como forma de resistência não somente cultural, mas
também de estímulo às insurreições negras.
Em A Cidade das Mulheres Landes descreveu a opinião de Carneiro sobre a
tradição das pesquisas em candomblés:
Os aristocratas sempre condescendem – resmungou, em voz calma,
carregada de intensidade, tirando baforadas do seu cigarro – e
quando alguns deles resolvem estudar candomblé, colhe material
chamando os negros aos seus escritórios para entrevistas, porque
são muito orgulhosos ou muito preguiçosos para visitar os templos
nos arrabaldes. Mas você tem de ir a eles. Você não pode esperar
que se portem com naturalidade num escritório ou num hotel. E eles
saberão que você os respeita, se for a eles. Eu a apresentarei
(LANDES, 1967, p. 56).
A partir do século XIX as casas de santo ou templos foram surgindo no
contexto histórico de abolição da escravatura, sendo fundadas na zona urbana, onde
as novas levas de escravos obtinham maior interação. Apesar da permissão destas
casas, o respeito como religião estava longe de ser alcançado, como até hoje parece
acontecer. Para a sociedade da época, o candomblé não passava de um conjunto de
superstições, de orgias e de cerimônias profanas que maculavam a honra das
famílias.
O candomblé queto é o mais comum e exerce influência sobre outras "nações",
justiçando a nossa escolha para o entendimento da relevância das religiões afrobrasileiras. Gantois e Axé Opô Afonjá são nomenclaturas mais veiculadas e se
referem a antigos terreiros na Bahia, com destaque para as suas mães-desantoMenininha e Senhora, respectivamente.
Todo iniciado pertence a um orixá que controla sua cabeça, o qual é
descoberto pela mãe ou pai-de-santo, através dos búzios. De acordo com Prandi
(1997), no imaginário dos seguidores, é comum usar traços da personalidade do orixá
dono de sua cabeça, e até mesmo de outro orixá associado (juntó), geralmente do
sexo oposto ao da principal divindade para ratificar seus comportamentos perante a
sociedade. Pode acontecer também do seguidor passar a adotar as características do
seu orixá, tentando se aproximar dele o máximo possível.
O importante para o seguidor do candomblé é, além de conhecer o seu orixá, o
rito, marcado tanto por sacrifícios de animais nos quartos-de-santo, de cunho privativo,
o que gera mistério para a sociedade; quanto por danças nos barracões sob o olhar do
público. A ocasião pede comidas, toques diversos, roupas com cores específicas,
ferramentas; enfim, um arsenal simbólico para honrar todos os orixás, manifestados
nos corpos dos seus filhos. A autoestima é trabalhada pela religião porque se aprende
a ficar bem consigo mesmo para poder ter um orixá forte e esta característica tem
atraído mais adeptos (PRANDI, 1997).
Além dos seguidores, existem os clientes que buscam respostas mágicas para
seus problemas, mas que não necessariamente participam de todos os aspectos
ritualísticos. Este tipo de participante representa uma importante fonte de recursos
para o sustento do terreiro.
O maniqueísmo da religião católica não está presente no orixá no Brasil. Não
há a visão do pecado da tradição judaico-católica, não existe uma preocupação moral
com o coletivo. O bem e o mal dependem da relação estabelecida entre o deus
pessoal (orixá) e o seguidor.O papel do pai ou mãe-de-santo é muito importante na
orientação de como se portar frente ao orixá, buscando a força sagrada, vital da
natureza, ou seja, o axé, e evitar os desequilíbrios causadores dos males do corpo e
d'alma.
Este personagem detém a autoridade por saber interpretar os símbolos,
conhecer as estruturas ritualísticas e suas funções, exercendo poder no âmbito do
sagrado. O caráter aético é que marca as religiões mágicas, pois os pais e mães-desanto podem jogar uma divindade contra a outra e contra os homens para beneficiar
seu adepto, numa relação que se faz individualmente entre o pai ou mãe-de-santo e o
seguidor.
Não há uma teodiceia capaz de nuclear a religião e nem desenvolver
especulações éticas sobre a ordem cósmica, mesmo porque a religião no caso do
candomblé já se desenvolveu como uma colcha de retalhos, fragmentos cuja unidade
vem sendo ainda buscada por alguns de seus adeptos que se põem esta questão da
explicação da ordem cósmica, ainda que num plano que precede o encontro de um fim
transcendente, e que se ampara numa etnografia que relativiza as culturas e legítima
como igualmente uniorganizadoras do cosmo as diferentes formas de religião
(PRANDI, 1997, p. 17).
O que acontece é uma transgressão ao rito, é uma quebra na relação de
fidelidade e obediência entre o seguidor e seu pai ou mãe-de-santo e, não, um
rompimento das regras morais como há no catolicismo e em outras religiões, porque
não existe uma preocupação com tais normas; bem como não há um interesse pela
ideia de salvação. Os problemas terrenos são resolvidos pela intermediação do orixá,
e a sobrevivência dos deuses é garantida pela forma como os seus seguidores são
tratados.
No caso da umbanda, a influência kardecista e católica lhe imputa um certo
caráter moral, ou seja, seu caráter aético é atenuado pela presença de caracteres
ocidentais. Existe a crença na comunicação com os espíritos dos mortos na cerimônia
do transe, cujo objetivo é a caridade entre os dois mundos.Esta religião afro-brasileira
surgiu nos anos de 1920 e se originou do encontro de tradições africanas (com matriz
no candomblé), do espiritismo e do catolicismo popular. Esta bricolagem de tradições
a tornou mais facilmente uma religião aberta a várias pessoas. Seu panteão integra
divindades do candomblé, destacando seu correspondente católico e também espíritos
de índios (BRUMANA; MARTÍNEZ, 1991).
Os seus seguidores tendem ao afastamento da sua matriz no que tange à
mentalidade e ao comportamento de origem tribal e escrava; porém não conseguem,
por completo, ocidentalizar-se, "[...] ficando a meio caminho entre ser religião ética,
preocupada com a orientação moral da conduta, e religião mágica, voltada para a
estrita manipulação do mundo” (PRANDI, 1997, p. 3-4). Provavelmente esta influência
ocidental pode ter contribuído para que seu rito de iniciação fosse mais simples do que
o do candomblé, inclusive, sem o uso do sangue.
Sua presença na terra (entidades que baixam em cerimônias) não
tem por finalidade, como no Candomblé, oferecer-se aos homens
como objeto de culto, mas "trabalhar" a seu serviço, ajudar a resolver
seus males e, cumprindo esta missão, elevar-se espiritualmente até
chegar a um grau em que já não precisem mais incorporar
(BRUMANA; MARTÍNEZ, 1991, p.63).
A questão ética é que vem contribuindo para que as religiões afro-brasileiras
estejam abertas para várias pessoas, numa relação, inclusive, mercadológica e nãoduradoura. Negro, branco, pardo, bissexual, homossexual, rico, pobre estão em busca
de favores das entidades sagradas ou até de aceitação dentro de um grupo por parte
daqueles que a sociedade "exclui". Hoje o pai ou mãe-de-santo não é mais
perseguido, podendo ostentar seu poder pelas ruas, através de sua indumentária e de
suas medalhas, seja integrante do candomblé ou da umbanda, que equivalem a
diplomas universitários dentro do seu universo (PRANDI, 1997).
Para Roger Bastide (1975),
o negro teve a criatividade, a habilidade de viver em dois mundos
distintos: o dos orixás e do catolicismo.Isto porque precisava
sobreviver, criando uma identidade brasileira no período da
escravidão colonial.De toda forma, no passado a religião afrobrasileira teve um caráter de resistência, não somente camuflada ao
buscar simbolicamente uma aproximação com a África, como
explícita dando apoio às rebeliões de negros no século XIX e,
inclusive, mantendo-se posteriormente como forma de resistência
cultural, uma resposta à segregação racial.E neste último aspecto, as
religiões afro-brasileiras carregam um conjunto material e imaterial
grandioso.
Estamos ouvindo muito falar em respeito à alteridade, aos valores culturais e
raciais diversos, principalmente àqueles que compõem o ser brasileiro. Talvez seja
uma influência, mas o que se sabe é que tais religiões estão sendo bastante
procuradas por pessoas, independentes da raça e da condição social, que querem
encontrar na religião uma forma de felicidade.Vamos aproveitar o contexto para
quebrar as barreiras, que ainda são muitas, em direção à sensibilização para as
questões étnicas e raciais no meio educacional, especificamente ao que se refere à
religiosidade.
Há muitas pessoas que olham para as religiões afro-brasileiras sob o prisma do
não sagrado.Devemos levar em consideração que a relação entre o ser humano e o
sagrado é determinada por cada cultura, numa maneira de organizar o seu mundo
(AUGRAS, 1983).
É a cultura que estabelece o que tem significado de força sagrada,
por isso não podemos permitir que uma visão etnocêntrica do
passado colonial ainda se manifeste na sociedade de hoje,
interferindo no que se deve ou não ser ensinado.
Considerações
Percebeu-se no decorrer do artigo que as religiões afro-brasileiras fazem parte
do grupo de religiões minoritárias, mas não quer dizer que seja menos importante do
que o catolicismo, religião historicamente majoritária no Brasil. O que precisamos fazer
é reconhecer a relevância cultural da religiosidade afro-brasileira, mas não da maneira
como se tem feito, isto é, focalizando o ponto de vista de investigação de curiosidade.
Temos de fato que socializarmos as mesmas a todas as outras religiões.
As comunidades religiosas vêm buscando valorizar suas raízes africanas para
redimensionar seu papel na sociedade brasileira. Porém, uma vez aqui inseridas,
estas comunidades passam a fazer parte da realidade brasileira e, portanto, a nos
interessar. Lembremos que são grupos sociais presentes no nosso dia a dia, que
partilham hábitos de comportamento, seguem crenças, como a maioria de nós, e que
veem nelas a presença do sagrado mesmo que para o senso comum se apresentem
como profanas.
Vimos que uma das formas de sensibilização mais eficaz pode encontrar no
espaço da escola, desde que haja profissionais preparados para o ensino da
pluralidade cultural e dispostos a manterem contato entre si sem quaisquer tipos de
proselitismo. Neste contexto, cabem também políticas públicas voltadas para a
formação de professores do Ensino Religioso dentro do perfil de seguidor das
propostas pedagógicas e do reconhecimento da cultura de matriz africana, com suas
manifestações religiosas, como também componente fundamental da sociedade
brasileira.
No caso das religiões afro-brasileiras, acreditamos que as festividades cristãs
nas escolas procuram não tolerá-las, o que é contraditório se o sentido da religião é
estimular comportamentos pacíficos e de respeitabilidade. A formação adequada do
professor pode favorecer o diálogo entre as várias culturas que compõem a sociedade
brasileira.
Temos vivenciado uma educação mais justa, democrática, que prime pela
igualdade e liberdade. Para isto, precisamos reconhecer a necessidade de uma
preparação dos professores, obtendo uma licenciatura, bem como a presença da
formação continuada, cujo objetivo é privilegiar a diversidade cultural e religiosa do
estudante brasileiro.
Referências
AUGRAS, M.O duplo e a metamorfose: a identidade mítica em comunidades
nagô.Petrópolis, RJ: Vozes, 1983.
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BRUMANA, F. G. e MARTÍNEZ, E. G. Marginália sagrada. Trad.: Rúbia P. Goldoni e
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UNIVERSIDADE E POVOS INDÍGENAS: A EXPERIÊNCIA DA LICENCIATURAS
INTERCULTURAL
PARA
A
FORMAÇÃO
DE
PROFISSIONAIS
PARA
A
EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA
Leonel Piovezana50
Teresa Machado da Silva Dill51
Henrique Kujawa52
Resumo:
Este texto reflete sobre o contexto da educação na política de inclusão educativa em culturas
indígenas tendo como referência a experiência do curso de licenciatura intercultural superior
em andamento, iniciado em 2009 no interior da Terra Indígena Xapecó, com concluído agosto
de 2014. Uma das características da experiência e de acontecer na aldeia indígena,
possibilitando a participação efetiva de estudantes e comunidade, tendo em seu projeto político
pedagógico, como um dos objetivos revitalizar a cultura, religiosidade e a língua materna,
propósito importante e que assegura territorialidade, bem como a permanência dos jovens na
comunidade rural, com trabalho e educação juntos a seus familiares. A língua, a religiosidade,
o poder, a verdade e o pertencimento inferem diretamente aquilo que marca a cultura indígena.
Assim, promover educação qualitativa e inclusiva em culturas diversificadas implica, sobretudo,
em rever e (re)significar não tão somente os métodos e práticas pedagógicas, mas, sobretudo,
implicar-se com as novas propostas educativas, inovadoras que dialoguem com a diversidade
cultural. Esse processo de mudança objetiva instaurar a escola de qualidade social centrada no
estudante e na aprendizagem, pois numa época onde diversas ciências apresentaram seus
objetos de estudo é de suma importância dizer que necessitamos reavaliar os nossos métodos
e teorias quando nos ocupamos com os conceitos de inclusão no âmbito específico da
educação. A religião de outras matizes étnicas desestabiliza e desorganiza os processos de
educação integral autóctone, no caso Kaingang, o ritual do Kiki. Apresentamos como conclusão
que a metodologia da oferta do ensino superior no interior de uma terra indígena em
alternância com a Universidade garantiu a formação de 90% dos estudantes matriculados em
regime presencial, num período de cinco anos e consequentemente posições acerca do saber,
cultura e religiosidade e bem viver.
Palavras-chave: Educar. Empoderamento. Língua. Diversidade. Cultural.
Introdução
Os processos educativos no Brasil caracterizaram-se historicamente como
elitistas e colonialistas, ou seja, o seu acesso vinculava-se com o poder econômico e
político das famílias e os programas são vinculados a conteúdos de caráter
eurocêntrico. Estas mesmas características valem para o tardio desenvolvimento do
ensino superior, refletindo uma sociedade que propagou-se como miscigenada e
50
Professor da Unochapecó. Coordenador Geral dos cursos de Licenciatura Intercultural
Indígena. Doutor em Desenvolvimento Regional e Professor dos Programas de Mestrado em
Educação e Políticas Sociais e Dinâmicas Regionais. [email protected].
51 Professora da Unochapecó.Coordenadora dos cursos de Licenciatura Intercultural Indígena,
e coordenadora institucional do Plano Nacional de Formação de Professores da Educação
Básica – PARFOR. Mestre em História. [email protected]
52 Professor da Unochapecó e da IMED. Professor do curso de Licenciatura Intercultural
Indígena, Mestre em História e Doutorando em Ciências Sociais/UNISINOS.
[email protected]
adepta a democracia racial, mas na prática permanece como uma das mais desiguais,
que possui um dos maiores índices de concentração de renda. Essa desigualdade
social e econômica também reflete uma desigualdade étnico cultural e de
oportunidade de acesso ao ensino superior.
Apenas no final do século XX, após a constituição de 1988 é que inicia-se um
debate mais efetivo sobre políticas afirmativas e, especificamente, sobre o acesso a
educação em todos os níveis, inclusive universitária, por pessoas de baixa renda,
negros e índios. Estas políticas, embora recente e enfrentando enormes e complexos
desafios, já demonstram resultados e, simultaneamente, são objetos de reflexão
acadêmica que poderão contribuir para o seu aperfeiçoamento.
Em relação a inserção indígena vemos que ações mais específicas datam do
início do século XXI e desde então se ampliam os debates sobre as estratégias e
condições de acesso, permanência e conclusão dos cursos superiores por indígenas.
Neste texto objetivamos refletir sobre a experiência do Curso de Licenciatura
Intercultural Indígena desenvolvido pela UNOCHAPECÓ, em parceira com a
Secretaria estadual de Educação de Santa Catarina - Brasil, conjuntamente com as
comunidades indígenas e suas lideranças, demonstrando que esta experiência pode
contribuir para a construção de uma Universidade socialmente responsável.
O presente texto foi construído metodologicamente a partir de revisão
bibliográficas e, principalmente, observações e reflexões desenvolvidos pelo corpo
docente e discente envolvidos no curso. Num esforço didático dividimos o texto em
três partes para além da introdução e conclusão. No primeiro item faremos um
cotejamento da trajetória das políticas que objetivam a inserção indígena na
universidade. Num segundo momento, faremos a descrição da experiência do Cursos
de Licenciaturas Intercultural Indígena desenvolvido pela UNOCHAPECÓ no interior
da Terra Indígenae Xapecó, município de Ipuaçu, Santa Catarina, Brasil. Por fim,
levantaremos alguns pontos de reflexão sobre os elementos de aprendizagem e
desafios vivenciados no processo.
Um cotejamento da Política Educacional Indigenista
"Contraditória, oscilante, hipócrita: são esses os adjetivos empregados, de
forma unânime, para qualificar a legislação e a política da Coroa Portuguesa em
relação aos povos indígenas [...]" (MOISES, 2009, p.115). Esta frase serve de retrato
não só do período colonial, mas da trajetória das políticas desenvolvidas no decorrer
dos cinco séculos de contatos entre indígenas e europeus. O mesmo é válido para a
política educacional relacionada a estes povos. Piovezana (2007) destaca que
analisando a trajetória da educação escolar indígena no Brasil são consideradas cinco
fases distintas.
A primeira fase, que se estende do início do processo de colonização até final
do século XIX, em que o grande objetivo era integrar o indígena a lógica mercantilista
servindo de mão de obra e de aliado ao domínio territorial e, inclusive, para controle
dos grupos indígenas que não se dispunham a se aldear53. Neste a educação indígena
estava ligada à Igreja Católica visando à conversão religiosa e a adoção do padrões
socioculturais e econômicos europeu, o que significava, na prática o aniquilamento da
cultura indígena.
Na segunda fase tem-se a criação do Serviço de Proteção ao Índio - SPI54
(1910-1967) cuja política de ensino, revelou uma preocupação com a necessidade de
adequação da escola indígena às particularidades de cada um dos grupos. O
funcionamento destas escolas era até então, idêntico ao das escolas rurais e diante de
insucessos passou-se a refletir sobre a questão da adequação do ensino indígena
adaptado ao grau de “aculturamento”, mesmo não considerando viável a adoção do
ensino bilíngue.
Na terceira fase, ocorreu a substituição do SPI pela FUNAI (Fundação Nacional
Indígena) e tem início a atuação do Summer Institute of Linguistc (SIL) que visava a
conversão dos indígenas ao protestantismo, tendo inclusive, transcrito para diferentes
línguas indígenas textos religiosos extraídos da bíblia. A atuação destes diferentes
órgãos se pautava no princípio integracionista do Estado brasileiro para com essas
populações, unificando assim os diferentes grupos e instituições. A Funai por sua vez,
tornou o ensino bilíngue obrigatório através do Estatuto do Índio, em 1973. Tratava-se,
teoricamente, de respeitar os valores tribais.
O objetivo do SIL de conversão dos indígenas à religião protestante, foi objeto
de polêmica junto à Funai, o que resultou no rompimento do convênio entre a FUNAI e
o SIL, em 1977. Apesar das discussões, o SIL continuou atuando, embora com
alterações. Propunha então, um caráter mais científico e menos religioso
53MOISES(2009)
retrata muito bem que a política indigenista no período colonial diferenciava
com clareza o índio aldeado, sob a catequização religiosa como amigos da Coroa
Portuguesa, útil para a concretização dos seus objetivos como mão de obra, como força
militar e como agente de domínio de territórios e conquista de regiões controladas por índios
"rebeldes" a quem era destinada a "guerra justa" ou seja o emprego da força e a eliminação
quando necessário.
54 A criação do SPI foi justamente após a proclamação da República em que ocorreu
oficialmente a separação entre Estado e Igreja e foi marcado por um intenso debates no
contexto internacional e nacional sobre o destino dos índios. A tese vitoriosa defendida
veemente pelos positivista, dentre eles o Marechal Rondon pregava a criação, por parte do
Estado de uma entidade laica que pudesse proteger os indígenas e garantir que de forma
pacífica eles, gradativamente optassem pela integração. Ver GAGLIARDI (1989); PESAT
(1997); KUJAWA (2013).
transformando-se em “Sociedade Internacional de Linguística”, a que possibilitou a
reativação do convênio em 1983. Mesmo fundamentando-se em programas
respaldados pela ONU, não só sua ideologia continuou embutida nos textos, como
também a FUNAI continuou apoiando esta entidade – republicando seus textos ainda
em 1990. Mais de cinquenta missões religiosas entre protestantes e católicas atuavam
nesse período, acelerando convênios com o governo brasileiro, caracterizando assim
a famosa “educação missionária”, que não teve êxito, pois marcava uma ruptura com a
tradição indígena.
Na quarta fase essa educação escolar contou com a participação de
Organizações não-governamentais: Comissão Pró-Índio (CPI/SP – 1977), o Centro
Ecumênico de Documentação e Informação (CEDI – 1980), Operação Anchieta
(OPAN – 1969) e o Conselho Indígena Missionário (CIMI – 1972), que atuavam
paralelamente à política indigenista oficial. Acrescidas a essas, os indígenas criaram
suas próprias organizações, ocorrendo o I Encontro de Educação Indígena Escolar,
em 1979, do qual resultaram documentos e propostas 55 . É nesse contexto que
ocorreram muitas discussões que foram geradoras de novas reflexões que acabaram
por culminar nas inovações da Constituição de 1988.
A quinta fase, iniciada na década de 80, corresponde ao momento atual, e
neste se destaca o fortalecimento do movimento indígena, que possibilitou a
articulação dos professores indígenas em torno da elaboração de filosofias e diretrizes
básicas. Esse processo tem mostrado o quanto os índios podem articular-se na
construção de uma escola diferenciada.
A Constituição Federal reconhece às populações indígenas, sua organização
social, costumes, línguas, crenças e tradições (art. 231). Além disso, assegura a estas
comunidades o uso de suas línguas maternas e os processos próprios de
aprendizagem (art. 210), o que é reforçado pelo artigo 164, § 2º da Constituição do
Estado de Santa Catarina. “O ensino fundamental regular será ministrado em Língua
Portuguesa, assegurada às comunidades indígenas também a utilização de suas
línguas maternas e processos próprios de aprendizagem”.
A partir de 1991, no Decreto Presidencial nº 26, é atribuída ao Ministério da
Educação a função de “coordenar as ações referentes à educação indígena” e este,
por sua vez, atribui o desenvolvimento destas ações às Secretarias Estaduais e
55
BITTENCOURT(2007) demonstra que nesta fase(f décadas ds 1970 - 1980) ocorre um
processo de politização do movimento indígena, com apoio de ONG,s, do Conselho
Missionário Indigenista e organizações internacionais há um processo de articulação das
diferentes lideranças indígenas que, em que pese a diversidade entre elas, constroem pautas
unificadas e passam a desenvolver ações conjuntas de interlocução com a sociedade e com
o Estado.
Municipais. A partir da Portaria Interministerial 559 é regulamentada a competência do
MEC e instituído o Comitê de Educação Escolar Indígena (Portaria nº 60/92 e nº
490/93), levando em consideração grande parte das reivindicações dos povos
indígenas com respeito à educação escolar.
Deste modo, estamos afirmando que é viável e possível utilizar os recursos da
linguagem tradicional como a lógica, mas, sobretudo, é necessário valorar aquilo que
pertence à condição específica cultural no processo de aprendizagem para que a
qualidade do ensino seja alcançada através de uma linguagem que se traduza em
sentidos. Isso favorece a percepção do mundo num processo de tornar o
conhecimento e a aprendizagem compreensíveis no âmbito universal. Diz Herman
(2002, p. 24), “ao inserir-se no mundo da linguagem, a hermenêutica renuncia a
pretensão de verdade absoluta e reconhece que pertencemos às coisas ditas, aos
discursos, abrindo uma infinidade de interpretações possíveis”.
Assim, a universidade é um local onde se pode promover a aprendizagem da
cultura indígena desde que os alunos sejam reconhecidos enquanto transformadores e
detentores de poderes. E para alcançar resultados seguros acerca de algo deve
prevalecer tanto o âmbito lógico de ensino, como se deve ceder espaço à
contingência,
à
subjetividade
efêmera
e
ao
erro,
bem
como mencionado
anteriormente, as concepções teóricas e metodológicas devem valorizar o estudante.
Assim, possivelmente alcançaríamos o êxito, almejado por todos aqueles que se
propõe elevar a condição de sabedoria em espaços e tempos distintos com
observações do Plano Nacional de Educação Lei n. 10.172/2001.
É neste contexto que se amplia o debate na sociedade brasileira e dentro das
universidades objetivando oportunizar aos indígenas o ensino superior. Pode se
identificar, em linhas gerais, duas macros estratégias para isso, uma delas através de
destinação de cotas, reserva ou criação de vagas específicas para indígenas nos
cursos tradicionalmente ofertados pelas instituições56 e a outra a criação de cursos de
Licenciaturas Intercultural57 que objetivam formar professores indígenas para trabalhar
nas escolas de educação infantil e básicas das redes de ensino do país.
56Estas
vagas foram sendo viabilizadas através de bolsas estabelecidas pela FUNAI(Fundação
Nacional do Índio), cotas estabelecidas pelo POUNI - Programa Universidade para Todos,
desenvolvido pelo governo Federal e pelo estabelecimento de vagas para indígenas em
instituições públicas que foi iniciado no Paraná, viabilizada pela Lei Estadual n.º 13.134/2001
e foi seguido por diversas instituições Brasileiras.ver FAUSTINO, et al., (2013), SILVA et,
al.(2012) e LIMA; BARROSO ( 2013).
57O
primeiro curso foi criado pela UNIMAT em 2001, hoje são vinte seis cursos com três mil
indígenas matriculados. Pelos dados do Censo de 2010, o Brasil conta com 2.836 escolas e
200 mil indígenas matriculados na Educação Básica. Quanto à formação universitária, o
mesmo Censo aponta que, dos doze mil professores indígenas, cinco mil têm curso superior
As sociedades indígenas, e particularmente, no Estado de Santa Catarina, as
culturas Kaingang, Xokleng e Guarani, traduzem de forma singular a vivência de
processos históricos diferenciados, sendo portadoras de tradições culturais específicas
que veem sendo revitalizadas e encontram ressonância e poder nos processos de
educação que vem acontecendo no interior de seus territórios.
Assim vamos entendendo que não tem sentido, portanto, representar as
culturas indígenas e a própria figura do “índio” de forma homogênea, folclorizada, ahistórica e preconceituosa. É preciso superar a forma padronizada e estereotipada de
um “índio” com cocar, vivendo em oca, andando nu, sem formação superior, comendo
raízes, vivendo da caça e da pesca... os índios são diversos de nós, mas também
diversos entre si (GRUPIONI, 1994, p.14).
Nesta perspectiva, a escola indígena específica e diferenciada é construída a
partir do diálogo, do envolvimento e do compromisso dos grupos indígenas como
sujeitos do processo e promove o resgate de elementos fundamentais no processo de
definição da identidade, como os ritos, danças, festas tradicionais [...] (Documento dos
professores das áreas indígenas de Xapecó e Toldo Chimbangue).Destaca-se,
também, a força da tradição oral para a manutenção da memória e a importância do
saber dos mais velhos, que detêm grande parte da história e dos valores do grupo.
Deste modo, elementos pedagógicos como conhecimentos, planejamento,
avaliação, calendários, distribuição espaço temporal, regimentos e outros deverão
respeitar o processo educacional próprio de cada etnia. Já o processo de
definição/encaminhamentos destas diferenciações ocorre através de reuniões
pedagógicas nas regiões, contato direto com as escolas, capacitação de professores,
reuniões do NEI (Núcleo de Educação Indígena) e discussões com a própria
comunidade.
Um curso superior em andamento no interior da Terra Indígena de Xapecó
Verificamos que no sul do Brasil a maioria dos povos indígenas compõem a
porção social, econômica e culturalmente marginalizada da população. Neste cenário
de diversas dificuldades, a educação indígena constitui-se em grande desafio, pois
enseja a inserção qualificada dos indígenas nos processos de desenvolvimento
regional. Vejamos a condição do curso de Licenciaturas Intercultural Indígena do
programa de desenvolvimento do ensino superior para a formação de professores.
ou estão na graduação, o que demonstra o grande desafio pois menos de 50% dos
professores são formados ou estão em processo de formação. (FAUSTINO et. al. 2013)
O curso está em andamento desde 1999 e possui como uma de suas
características, que o torna uma experiência pioneira no Brasil, ser desenvolvido no
interior da Terra Indígena Xapecó, uma das beneficiadas pelo projeto. O curso
concluiu com a formação dessa turma em agosto de 2014, completando cinco anos,
ou seja, dez semestres. Todos os processos pedagógicos, propostos no PPC –
Projeto Político do curso foram construídos com professores universitários, lideranças
indígenas, comunidades e representantes de entidades regionais como Secretarias
Municipais e Estaduais de Educação e áreas acadêmicas.
Sabe-se que os desafios para a inserção dos povos indígenas no ensino
superior são inúmeros e complexos e se relacionam ao acesso deles nas
universidades, na permanência e na conclusão do curso (FAUSTINO, et al.,2013;
SILVA et, al.,2012). No projeto em tela a preocupação com a evasão esteve presente
desde os primeiros debates, com o grupo de professores bem como com as lideranças
indígenas, que gestaram a proposta do curso. Um dos temas levantados,
principalmente pelas lideranças indígenas era de que a evasão poderia estar
associada a dificuldade de locomoção das aldeias até a universidade, o que geraria
reprovações por faltas e desistências. Associa-se a isto a clareza de que espaço e o
ambiente da universidade é estranho a cultura indígena fator que provocaria um
choque e uma necessidade de adaptação muito rápida para não resultar em abandono
do curso. Fruto destas reflexões o curso foi pensado para ocorrer numa das aldeias
(Terra Indígena Xapecó) beneficiada pelo projeto, sendo que os estudantes indígenas
das demais aldeias, bem como os professores da Universidade se deslocam até ela.
Esta estratégia tem se mostrado eficaz pois concluíram o curso 56 estudantes, dos 60
que iniciaram, uma realidade diversa dasexperiências expressas em relatórios dos
cursos
superiores
da região que tiveram alunos indígenas ingressos nas
Universidades, nas quais apenas 8% conseguiram ou conseguem terminar e realizar a
formatura.
A Licenciatura tem por objetivo geral a formação e a habilitação de professores
indígenas para o exercício docente na educação infantil, ensino fundamental e em
disciplinas específicas do ensino médio, conforme a área de terminalidade em que
fizer opção. O Curso de Licenciatura Intercultural Indígena conferirá aos concluintes o
título de Licenciado numa das quatro áreas do conhecimento, a saber: Línguas, Artes
e Literaturas; Pedagogia; Ciências Humanas e Sociais; Matemática e Ciências da
Natureza. A estrutura curricular é composta de um núcleo comum com componentes
curriculares de formação básica durante dois anos e, posteriormente o estudante fez
opção por uma das áreas para habilitação e conclusão em componentes específicos.
Durante todo o processo formativo, geral e específico, os componentes
curriculares asseguram vínculo estreito com a missão do curso que é formar
professores para atuarem na educação escolar, produzindo e garantindo a
apropriação do conhecimento universal e específico da etnia, contribuindo para o
desenvolvimento cidadão.
No entendimento da Universidade, este Cursode Licenciatura Intercultural para
a formação de professores é de extrema relevância, dado que interage de modo
propositivo e participativo na formação desses novos agentes de produção e
reprodução cultural denominado professor indígena. Se é na universidade que se
constitui um espaço privilegiado de interlocução com a diversidade cultural, então,
naturalmente, este curso se justifica, pois as comunidades indígenas identificam-se
enquanto protagonistas da diversidade cultural da civilização contemporânea.
Por fim, este Curso de Graduação atende a demanda existente das
comunidades, das Terras Indígenas Xapecó, Chimbangue, Pinhal, Imbu, Palmas e
Condá, localizadas nos municípios de Ipuaçu e Entre Rios, Chapecó, Seara e
Abelardo Luz do Estado de Santa Catarina, com uma população de aproximadamente
12.000 pessoas e das quais 2.400 são estudantes do Ensino Básico. Nessa região
existe a Escola de Formação Específica de Ensino Médio: Escola Indígena Estadual
Cacique Vãinkrê, localizada no município de Ipuaçu, sede da T.I. Xapecó, com uma
média de 25 estudantes egressos/ano, desde 1990.
Aprendizagem e desafios
As instituições e as pessoas nelas envolvidas desenvolvem aprendizagem,
reflexão e conhecimento acumulado a partir das experiências vivenciadas. Neste
sentido o referido curso está sendo um rico espaço de discussões, reflexões e
proposições. É inegável que as instituições de ensino superior no Brasil se
constituíram a partir de racionalidade e de uma centralidade do conhecimento
ocidental e, a partir disso é que se constituíram as estruturas curriculares, projetos
pedagógicos e estratégias didáticas. A existência de um curso de Licenciatura
Multicultural Indígena, com uma turma composta exclusivamente por discentes
indígenas, ocorrendo numa aldeia indígena provoca um estranhamento, provocando a
necessidade de repensar estruturas institucionais, projetos pedagógicos e práticas
educacionais.
Selecionamos
e
sistematizamos
dois
grandes
elementos
de
aprendizagem e desafios que passamos a relatar.
A primeira questão é a relação dos discentes com a Universidade e sua
permanência no Curso. É consenso entre os autores que discorrem sobre a relação
dos indígenas com as universidades, que um dos grandes desafios é a permanência e
a formação destes alunos. Cabem salientar que esta dificuldade não está associada a
uma inferioridade ou a uma dificuldade de conhecimento dos alunos indígenas, o que
ocorre é que o ambiente da universidade é completamente estranho para eles, a
necessidade de afastamento de suas aldeias e famílias provoca um ritmo e dinâmica
cotidiana diferente gerando uma grande dificuldade de adaptação. Por isso, a opção
por desenvolver o curso na Terra Indígena de Xapecó 58demonstrou-se uma estratégia
eficaz, na medida em que após 9 nove semestres dos 60 alunos iniciantes 56
continuam frequentando o curso. O significado do local de realização do curso vai bem
além da questão espacial e de deslocamento adentrando muito para o campo
simbólico e pedagógico. O fato de os professores se deslocarem até a comunidade
dos indígenas permitiu a quebra de uma relação hierárquica, uma aproximação dos
"dois mundos" o início de uma horizontalização das relações. Soma-se a isso o fato
dos professores fazerem as refeições junto com os alunos 59 , convivendo com as
lideranças, crianças e demais professores indígenas possibilitando-os efetivamente
uma aproximação vivencial dos professores com a realidade indígena.
Uma segunda questão fundamental é de ordem espistemológica a universidade
e seu corpo docente deparou-se com uma diferente perspectiva de saber que teve que
reconhecer, conhecer e buscar atuar a partir dele. Este continua sendo um processo
bastante complexo, pois a formação dos professores, caracterizada por algumas
políticas pedagógicas cartesiana, vem como pela permanência de convicções
pessoais, precisaram ser discutidas e relativizadas.este desafio, continua em processo
de constante dialogo e reflexão do corpo docente e coordenação do projeto, o que te
permitido repensar as estratégias no decorrer do curso, como forma de garantir a
promoção do reconhecimento e respeito à diversidade, principalmente, em relação aos
ritmos de aprendizagem.
Nesta perspectiva, o conjunto de coordenadores perceberam a necessidade de
desenvolver estratégias de avaliação para os alunos que, por diversas razões não
conseguiam concluir alguma disciplinas. alguns por problema de frequência e outros,
por "dificuldade de aprendizagem". A estratégia foi oferecer novamente essas
disciplina em horários alternativos, para que estes alunos conseguissem permanecer
58
É importante ressaltar que mesmo o curso ocorrendo majoritariamente na TI de Xapecó, em
diversos momento os alunos foram transportados para terem aula no ambiente da
universidade. Isso ocorre quando um componente curricular necessita da utilização de um
laboratório específico e em momentos de eventos acadêmicos. Isso permitiu também que os
discentes frequentassem o ambiente físico e se sentissem parte da universidade.
59A aulas acontecem de forma concentrada, nas sextas-feiras nos turnos da tarde e noite e nos
sábados manhã e tarde. Devido a distância os horários são organizados para que o professor
que trabalhe na sexta a tarde, jante e trabalhe também no turno da noite e o mesmo ocorre
com o sábado.
integrados na turma. De acordo com a avaliação dos alunos e dos professores que
acompanharam esse processo, o resultado está sendo enaltecedor. Talvez possa ser
considerado e tomado como experiência inovadora na tão problemática cultura de
avaliação do processo de aprendizagem na educação escolar como um todo. Pois, foi
possível constatar nessa experiência, que a reprovação pode ser considerada uma
forma de exclusão extremamente agressiva, por não levar em consideração que as
pessoas possuem formas e ritmos diferentes de aprender. A interação entre
professores e alunos, no processo de recuperação, mostrou que nem sempre se pode
atribuir como dificuldade de aprendizagem a não compreensão de um determinado
conhecimento; mas, na maioria dos casos, constitui-se como dificuldade de
"ensinagem". Por isso cabe ao professor, rever frequentemente sua cultura
pedagógica, ter lucidez e humildade pedagógica para reconhecer suas fragilidades,
para assim descobrir novos procedimentos passíveis de contribuir com a cultura
educativa que permite um processo emancipatório.
Considerações finais
A partir do que foi apresentado inferimos: pode universidade ser um local onde
se estabelece uma nova concepção de apreensão do conhecimento e do mundo? A
resposta é afirmativa deste que ela não esteja adequada apenas à tradição clássica,
por exemplo, que postulava um uso de racionalidade capaz de tornar o conhecimento
sistematizado, apenas lógico formal. Embora existam regras formais e tradicionais de
ensino, ele de fato será relevante quando também adotar outras formas e expressões
da linguagem presentes em culturas distintas como a dos indígenas. Todos estes
ideais mantidos arduamente no âmbito escolar têm por remetimento a formação de um
homem educado, religioso, político, racional e, sobretudo, reflexivo.
Deste modo, o que circunscreve o diálogo sobre a qualidade em Educação é
algo aparentemente simples: sabemos o que estamos propondo enquanto
conhecimento e aprendizagem? Ao que parece o termo qualidade por si só não nos
esclarece muito, pois além de ter muitos significados conflituosos é conveniente
salientar que
[...] em Educação, não podemos esquecer que existem interesses
(frequentemente) conflituais e que ambos os lados podem desfraldar
a bandeira da qualidade para se auto justificarem. Por exemplo, o que
é qualidade para um professor pode não o ser para os pais dos
alunos ou ainda para a gestão da escola. Falar em qualidade não
resolve o problema(RODRIGUES, 2006, p. 12).
Assim, o desafio é imenso pois numa formação indígena, foram estabelecidas
diversas relações conformes vimos com professores universitários, lideranças
indígenas, comunidades indígenas e representantes de entidades regionais e áreas
acadêmicas da Universidade.
Numa época onde diversas ciências apresentaram seus objetos de estudo é de
suma importância dizer que necessitamos reavaliar os nossos métodos e teorias
quando nos ocupamos com os conceitos de inclusão no âmbito específico da
educação. É notório que estamos numa época de inovações, de transformações
temporais e existenciais que afetam diretamente o campo do raciocínio humano e por
isso é urgente que tenhamos cautela, na aprendizagem.
Nessa época de carecimento de sentidos e de distanciamento ao que se
apresenta enquanto lógico, é indispensável que se reconheça o novo tempo e espaço
o qual estamos inseridos para que o conhecimento nas escolas ultrapasse o tempo de
duração de consumo ou o de queixa, a saber, de um lugar que não lhe concedeu o
bastante. Caso contrário, daremos razão ao chefe indígena Tuiavii de Tiavea, das
ilhas Samoa, que comentava: O Papalagi 60 não tem tempo [...] correm como
desesperados como se estivessem possuídos por demônios, e por onde quer que
passem causam danos, provocam desastres e grande alarde porque perderam o
tempo deles (DE MASI, 2001, p.19).
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FONAPER
ANTÔNIO CONSELHEIRO D’OS SERTÕES: UM DIÁLOGO ENTRE A LITERATURA
E O ELEMENTO RELIGIOSO
Lucinéia Maria Confalonieri Bertoldi - FUV – ES1
Resumo:
O presente estudo traz uma discussão acerca da religiosidade popular presente na obra Os
Sertões, de Euclides da Cunha. Ler a obra euclidiana é adentrar numa história de múltiplos
enfoques. A obra fornece aos estudiosos um amplo leque de reflexão sobre as reais intenções
republicanas, econômicas e religiosas por detrás da máscara de fanatismo religioso. Ademais,
é uma das obras mais discutidas no campo literário, científico e político, contudo no campo
religioso somente recentemente começou a ser investigada. Por isso, este estudo tem como
foco analisar o aspecto religioso e sua contribuição para a formação do séquito de Antônio
Conselheiro. Certamente revisitar Os Sertões é uma oportunidade ímpar para perceber a força
do elemento religioso no destino da humanidade.
Palavras-chave: Canudos. Antônio Conselheiro.religiosidade popular.Catolicismo. povo
nordestino.
Introdução
Eu sou o Alfa e o Ômega, o princípio e o fim.
A quem quer que tiver sede, de graça
lhe darei da fonte da água da vida.
(Apocalipse 21:6)
Meu interesse por Canudos surgiu assim que iniciei minha primeira
leitura da obra Os Sertões, de Euclides da Cunha. Fascinada, decidi conhecer
a história do homem que conseguiu seduzir tanta gente a ponto de fazê-los
abandonar sua terra, seus parentes e segui-lo em suas andanças pelo sertão
afora. Por isso, este estudo trata-se de uma investigação do elemento religioso
na formação do séquito de Antônio Conselheiro e na luta dos ideais mantidos
mesmo diante da morte. Ciente de que o caminho aqui traçado é apenas o
início de uma longa caminhada.
Infelizmente, passados mais de um século da famosa frase dita por
Euclides da Cunha (2000, p.112-113), “o sertanejo é, antes de tudo, um forte”,
ainda vivenciamos o mesmo cenário caótico da vida sofrida do povo do sertão
1
Mestranda em Ciências das Religiões - Faculdade Unida de Vitória/ES -Prof. Orientador: José
Adriano Filho. Graduada em Letras com Habilitação em Língua Portuguesa (UNEB/BA).
Especialista em Docência Superior (PATOS/PB). Especialista em Educação a Distância
(SENAC/BA). Docente da rede estadual pública da Bahia – Colégio Estadual Antônio Carlos
Magalhães – Itabela/BA. E-mail: [email protected]
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
nordestino. A seca continua presente naquele solo esturricado e cheio de
pedregulhos. Não é difícil imaginar como Antônio Conselheiro conseguiu tantos
seguidores esperançosos de uma vida melhor se, ainda hoje, vemos terras
abandonadas e esqueletos de animais mortos.
Mas, que tipo de ligação havia entre Antônio Conselheiro e as pessoas
que resolviam largar tudo (mesmo que na maioria das vezes este tudo era
nada) para peregrinar ao seu lado? Antônio Conselheiro seria um exemplo
típico de fanatismo antirrepublicano e/ou líder religioso? Quais aspectos –
sociais, políticos, econômicos e/ou religiosos contribuíram para a formação do
Arraial de Canudos? Qual seria a força motivadora responsável pelo
desencadeamento da resistência dos moradores de Canudos contra a força
militar?
Frente a essas inquietações, este artigo busca investigar a formação do
enorme séquito em torno de Antônio Conselheiro. Trabalhamos com as
seguintes hipóteses: 1) o aspecto religioso pode ter sido fator relevante para o
surgimento da comunidade de Canudos, visto o desejo de salvação e
libertação do povo, sofrido e escravizado; 2) a formação de Belo Monte
demonstrou ao regime republicano que o povo nordestino sertanejo poderia
sobreviver frente às agruras da seca; 3) o movimento não passou de uma
comuna mística liderada por um fanático religioso e sua visão apocalíptica do
mundo. Para compreendermos o acontecimento, consideramos necessário
iniciar por uma leitura histórico-religiosa acerca do objeto do fenômeno religioso
no intuito de entender o universo simbólico construído em torno do movimento
de Canudos. Acreditamos que um olhar mais atento para os fatos ocorridos
poderá nos levar às mensagens de teor teológico presentes na obra Os
Sertões, de Euclides da Cunha.
A religiosidade popular no nordeste brasileiro no final do século XIX
Discorrer acerca da religiosidade popular requer antes de tudo refletir
sobre o que vem a ser o fenômeno religioso.
Etimologicamente o termo religião advém do latim religare. Conceituá-lo
não é uma tarefa simples, visto seu caráter polissêmico. Para uns, o termo
FONAPER
religião refere-se a culto a uma divindade e, para vivenciá-la é preciso ter fé e
acreditar que há um poder supremo, sobrenatural. Para outros, é uma aliança
com o Pai Celestial para usufruir de uma vida transcendental sendo, portanto,
uma busca pela salvação da alma. Para muitos, cada indivíduo define o termo
de acordo com os valores espirituais em que foi criado.
O teólogo e filósofo Tomás de Aquino declara na Suma Teológica que
“religião implica propriamente uma relação com Deus” e sua tarefa é “mostrar
reverência a Deus segundo um único aspecto: justamente enquanto Ele é o
primeiro princípio da criação e do governo das coisas” (AQUINO apud
SOARES, 2010, p. 29)
Historicamente o vocábulo “religião” é produto de nossa cultura ocidental
e passou por várias alterações ao longo do tempo. Para os sociólogos ela
representa um objeto a ser pesquisado para compreender a sociedade. Para
Marx, a “religião é uma realidade histórica dependente do desenvolvimento das
condições materiais de vida e da consciência dos indivíduos”. Nessa
perspectiva a sociedade à medida que adquire uma economia autossustentável
supera o processo instaurado de “desalienação” provocado pelo capitalismo e,
consequentemente, não necessita mais da existência da religião. No
entendimento de Durkeim, a religião é “uma possibilidade de organizar-se
coletivamente” e, por isso, “terá sempre uma função social a cumprir”. Já
Weber diz que a religião “é uma espécie particular do agir coletivo devendo ser
examinada em sua especificidade histórica, social e cultural”(NUNES, apud
USARSKI, 2007, p. 105-107 passim).
Na verdade, de modo geral, historiadores, filósofos, sociólogos,
antropólogos, geógrafos e demais cientistas que analisam o fenômeno religioso
reconhecem sua importância na vida dos grupos humanos e o consideram
como um sistema comum de crenças e práticas voltadas a entes superiores,
sobre-humanos, e que devem ser interpretados a partir da vivência de cada
povo. Além do que, acreditam que os fatos envolvendo o aspecto religioso
devem ser discutidos a partir dos usos e conceitos dos termos, ou seja, não
somente em um determinado contexto histórico, geográfico, econômico,
cultural, mas, também, segundo suas crenças, mitos, ritos, atitudes teológicas
etc.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Nesse sentido, cada sociedade interage com o fenômeno religioso de
uma forma específica. O mistério, o transcendental, a simbologia, os rituais, as
crenças e dogmas são originários na cultura humana. Interpretá-los não é uma
tarefa apenas para uma única ciência. A religião está presente na vida do
homem desde seus primórdios, por isso analisar toda a complexidade que
envolve o aspecto religioso é uma tarefa multidisciplinar.
É válido dizer que a religiosidade popular pode ser entendida tomando
como ponto de partida o desenvolvimento de formas distintas da expressão do
fenômeno religioso nas diferentes regiões do país. São manifestações
expressas através de inúmeras formas de perceber o elemento sagrado, tais
como as peregrinações, as festas patronais, as novenas, os rosários e via
sacras, as procissões e romarias, as danças e os cânticos do folclore religioso,
a devoção ao espírito santo, aos santos e santas, em especial a Nossa
Senhora, as promessas, as ofertas, as orações e celebrações. É a crença de
que há um poder divino, criador de todos os seres e que ele é a luz, o caminho
e a resposta a todas as incertezas da humanidade sobre os problemas
existenciais.
Quanto ao surgimento da religiosidade popular no Brasil, sabe-se que
sua existência é marcada desde a época do descobrimento do nosso país. De
acordo com a história dos primeiros conquistadores, o choque cultural entre os
portugueses e os indígenas foi imediato. Os índios não conheciam os objetos
usados pelos recém-chegados, como por exemplo, “as contas do rosário”.
Estranharam também a cruz e o altar improvisados pelos europeus para a
realização da Primeira Missa no Brasil. Os rituais espirituais eram totalmente
desconhecidos pelos nativos. Tal fato fez com que os portugueses
acreditassem que era preciso “salvá-los”, tirá-los da vida “selvagem” através da
evangelização na fé católica. Assim, desde o descobrimento houve de certo
modo a imposição dos rituais impostos pela Igreja Católica Apostólica Romana.
Consequentemente, a realização do ritual religioso da missa tornou o local
recém-descoberto sagrado nomeando-o de “Terra de Santa Cruz”.
Nesse contexto, em linhas gerais pode-se dizer que a religiosidade
popular no Brasil tem origem no entrelaçamento das manifestações do sagrado
dos portugueses e dos indígenas. Apesar de a priori os colonizadores
FONAPER
acreditarem que os gentios não tinham religião, tal fato não se comprovou. Na
verdade os nativos expressavam o sagrado de maneira bem diferente dos
colonizadores. Mas, compreender a religiosidade popular é uma tarefa plural,
complexa, visto sua diversidade e amplitude de manifestações: rituais, gestos,
milagres, novenas, romarias, penitências, objetos e locais sagrados, jejuns etc.
Além do que, vivemos num país multicultural. A fusão de culturas indígenas,
africanas, portuguesas, italianas, alemãs, japonesas e outras contribuíram para
as múltiplas religiões existentes: católica, espírita, protestante, islamita,
judaicas e outras. É, justamente, esse entrelaçamento de etnias que favoreceu
o crescimento do cristianismo.
Assim, reconhecer a religiosidade de um povo, de uma cultura, é uma
oportunidade de aproximação do outro, o que José Carlos Calasans pontua
como um contributo da Ciência das Religiões para a interpretação do fenômeno
religioso, e que “é tão importante como a paz social. Promovê-lo é, ao mesmo
tempo, ajudar a construir uma diplomacia de paz entre os povos” (CALASANS,
2008, p. 18).
Catolicismo popular
O surgimento do Catolicismo Popular (CP) no Brasil é marcado com a
chegada dos portugueses. Sociologicamente, o CP pode ser definido como um
conjunto de práticas religiosas nascidas da interação com o Catolicismo Oficial
(CO), Romanizado, e as crenças populares acerca do sagrado. Nas palavras
de Eduardo Hoornaert, o catolicismo do povo brasileiro, desde sua origem,
funcionou “fora do figurino”. É um catolicismo totalmente diferente do
propagado no Vaticano. Contudo, o catolicismo popular deve ser visto “como a
expressão mais valiosa do evangelho na realidade brasileira” (HOORNAERT,
1974, p. 05).
Historicamente, até fins do século XIX, as práticas religiosas aconteciam
no seio familiar ou pessoal. Cada família designava um canto de sua casa para
servir de oratório. Foram os portugueses que trouxeram para o Brasil o
costume de realizar celebrações, confissões, sacramentos, novenas, romarias,
festa do padroeiro. A partir daí deu início a uma nova forma de expressar a fé.
Em boa parte do país as festas de Coração de Nossa Senhora, festas e
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
procissões do padroeiro foram aos poucos substituindo as Folias de Reis e do
Divino, Procissão das Almas e as Festas de São João. Vale lembrar que ainda
há lugares em que as festas não foram extintas. Toda essa situação revela-nos
a origem do sincretismo que permeia o catolicismo popular. Os indígenas
presentes através de seus animismos e superstições, os portugueses com o
culto aos santos e às almas, os africanos com o candomblé – divindades,
ancestrais e orixás, todas as manifestações estão interligadas de forma
singular pela força salvífica da religião.
Nesse sentido, o CP pode ser percebido como uma combinação de
religiosidades, etnias, crenças, nas diversas esferas: cultural, histórica, social e
geográfica. Muitos teólogos definem o CP como fruto do processo histórico
onde se proliferam práticas de fé agregadas às práticas universais do
catolicismo. Outros acreditam que o CP nada mais é do que um desvio da
forma legítima de cristianismo.
Para Oliveira há entre ambos uma relação dialética, uma vez que as
representações e práticas religiosas do CP são autoproduzidas pelas classes
subalternas a partir dos elementos significantes do CO (OLIVEIRA, 1985, p.
135).
O CP está também relacionado às figuras de conselheiros, beatos e
beatas, rezadores e benzedores, aos puxadores de rezas e procissões, aos
missionários, monges e capelães dentre outros.
Para Hoornaert, o povo do sertão brasileiro sente a necessidade de um
guia espiritual. Daí a escolha de Antônio Conselheiro para liderá-los,
protegendo-os das atrocidades da vida nordestina com todo o seu aspecto
representativo de fome, miséria, morte e ignorância.
Como afirmam Macedo e Maestri,
A religião cabocla, resultante de um profundo sincretismo,
congregava em si elementos do catolicismo popular português,
com crenças e rituais nativos e de origem africana. A
exteriorização da crença mesclava aspectos do culto católico –
preces, romarias e penitências – com ritos, cerimônias,
talismãs e amuletos pertencentes ao universo mágico-religioso
das tradições indígenas e africanas (MACEDO; MAESTRI,
2011, p. 80 grifo nosso).
Restava então aos sertanejos clamar ao divino para enviar
[...] alguém capaz de representá-los, defendê-los, orientá-los e
negociar com eles o trânsito de valores. Só dentro do mundo
FONAPER
referencial camponês sertanejo entende-se a história do
Conselheiro, uma história feita de negociação e astúcia,
inteligência e tática (HOORNAERT, 1997, p. 111).
A figura do conselheiro no CP sertanejo é uma tradição cultural que se
perpetuou por um longo tempo. Ele tornou-se a peça fundamental para manter
viva a fé católica em terras longínquas.
Catolicismo oficial
O Catolicismo Popular a partir do Concílio Vaticano I acaba sofrendo
uma repressão ao Catolicismo Oficial, isso porque passou a ser visto como
uma negação aos preceitos do Catolicismo Romanizado. Seu surgimento é
marcado a partir da segunda metade do século XIX, aproximadamente do ano
de 1858, tendo como objetivo principal a reafirmação dos cânones da Igreja
Católica, numa tentativa de igualar toda a doutrina com o esquema romano –
hierárquico eclesiástico. Esse interesse em controlar todo tipo de expressão do
fenômeno religioso do povo não surtiu o efeito desejado, pelo contrário, o CP
sobreviveu numa clara demonstração da força da religiosidade popular.
Outro ponto relevante envolvendo o Catolicismo Oficial Romanizado diz
respeito à ênfase dada aos sacramentos. Como em boa parte deste imenso
Brasil não podia contar com o luxo de ter um sacerdote para a realização da
prática sacramental, o povo mantinha viva sua religiosidade com o apoio
espiritual dado pelos leigos - beatos e beatas, rezadores e rezadoras. Eram
eles os responsáveis pelo repasse do saber doutrinário apreendidos com os
padres e missionários.
Para Comblin “o povo não conhece o catolicismo oficial da Igreja
Católica, nem se preocupa em conhecê-lo” (COMBLIN, 1967, p.848), isso
porque não sentem a necessidade de aprofundar os conhecimentos religiosos
visto que consideram como essencial a vivência espiritual, ou seja, a prática.
Já para os fiéis seguidores do Catolicismo Oficial o Catolicismo Popular
não passa de uma forma ilegítima de cristianismo e, por isso, deve ser
combatido para erradicá-lo.
O aparecimento de Antônio Conselheiro
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Na segunda parte de Os Sertões - Euclides da Cunha apresenta Antônio
Conselheiro como documento vivo de atavismo, diátese e síntese, produto do
meio, elemento representativo de mal social gravíssimo, portador de psicose
progressiva e consciência delirante, “indo para a história como poderia ter ido
para o hospício”. Em torno dele reúne “todas as crenças... misticismo feroz e
extravagante”. A vida dele pode ser analisada sob o prisma de “um capítulo
instantâneo da vida de sua sociedade” (CUNHA, 2000, p. 142-143).
Antônio Vicente Mendes Maciel nasceu em 13 de março de 1830, na
cidade de Quixeramobim, interior do Ceará. Sua infância foi marcada pelos
maus-tratos da madrasta, pelas bebedeiras do pai alcoólatra e luta entre
famílias – os Macieis e os Araújos (os primeiros sendo acusados de roubos,
porém sem provas).
Por incentivo do pai, Vicente Mendes Maciel, Antônio iniciou sua carreira
na vida sacerdotal. Ao completar 25 anos, os estudos foram interrompidos pela
morte de seu pai e sua admissão nos negócios da família, um comércio que já
encaminhava para a falência.
Em 1857, Antônio Conselheiro casou com sua prima Brasilina Laurentina
de Lima. No entanto, a instabilidade financeira de Antônio forçou-o a mudar-se
constantemente de moradia, exercendo distintos ofícios: caixeiro, escrivão,
professor e pedreiro. Talvez, a ausência de segurança no emprego tenha
prejudicado sua vida conjugal. O certo é que em 1861 como diz Cunha “surgelhe um revés violento” ao tornar-se vítima da traição de sua mulher com um
sargento de polícia. A vergonha assomada à infelicidade o faz abandonar sua
vida estável e assumir uma vida de andarilho. Vai para o sul do Ceará. Na
passagem em Paus Brancos fere num ímpeto de loucura um parente que o
hospedou, mas logo é inocentado pela própria vítima. Depois disso, ficou um
longo período desaparecido.
Dez anos depois surge na Bahia: “anacoreta sombrio, cabelos crescidos
até aos ombros, barba inculta e longa; face escaveirada; olhar fulgurante;
monstruoso, dentro de um hábito azul de brim americano; abordoado ao
clássico bastão em que se apoia o passo tardo dos peregrinos” (CUNHA, 2000,
p. 153).
FONAPER
Inicia aí sua vida peregrina. Homem de poucas palavras, rude, humilde,
simples vivendo sem nenhuma preocupação com o lado material, andava pelo
sertão reformando ou construindo capelas, igrejas, cemitérios e cacimbas. Mas,
sem deixar de rezar terços, entoar cânticos, ladainhas e procissões. Ele e seu
séquito saíam pelas ruas “alevantando imagens, cruzes e bandeiras do Divino”
(CUNHA, 2000, p. 158).
Em 1893 Conselheiro e seus seguidores resolvem assentar-se em
Canudos, um lugar paupérrimo, às margens do rio Vaza-Barris, no sertão da
Bahia. Mas, que significava para o povo “a Nova Canaã”, o “cosmo”, “a imunda
ante-sala (sic) do Paraíso” (CUNHA, 2000, p. 184).
Logo o líder dos conselheiristas rebatizou o lugar de Monte Santo e, em
pouco tempo, foram construídos milhares de casebres. O rápido crescimento
do local começou a causar preocupações às autoridades políticas e aos
fazendeiros locais que ficaram sem mão de obra. Assomado a isso, a Igreja
também se mostrou insatisfeita por perder fieis para um líder leigo. Assim,
Antônio Conselheiro passou a incomodar muita gente e a ser chamando de
monarquista e inimigo da República.
A força do discurso de Antônio Conselheiro
Compreender o carisma de Antônio Conselheiro requer antes de tudo
perceber o seu poder de abdicação às coisas mundanas. Sua vida era um
purgatório duro, oportunidade única que deveria ser aproveitada para
purificação da alma. Portanto, cabia ao homem dedicação plena às coisas
espirituais, divinas. Proclamava a todos que “bem-aventurados eram os que
sofrem... a extrema dor era a extrema unção” (CUNHA, 2000, p. 178).
A figura do padre era para aquela gente simples do sertão uma pessoa
distante e até mesmo sem credibilidade, pois muitas vezes era ignorante ou
envolvia-se com coisas erradas. Desse modo, o beato ou o conselheiro
tornava-se uma pessoa com muito mais crédito para o povo carente de alguém
que estivesse mais próximo à realidade deles. Antônio Conselheiro tornou-se
então uma pessoa querida para eles. Isso porque ele falava de coisas simples,
mas importantes para o povo humilde. Dava conselhos das coisas celestiais,
do fim do mundo, da lei do Cão (a República), rezava o Credo, o Padre Nosso,
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
a Ave Maria e outras rezas. Com isso ele ia encantando a todos por onde
passava e aumentando cada vez mais seu séquito.
Desse modo, o povo ia seguindo-o. Conselheiro representava para
aquela gente um líder espiritual em quem podia confiar e contar, em quaisquer
situação. Nas palavras de Cunha, Conselheiro era um “santo exilado na terra,
de fetiche de carne e osso” pronto para “reviver os estigmas degenerativos de
três raças” (CUNHA, 2000, p. 177).
Para Facó, Antônio Conselheiro simbolizava para seus seguidores “a
voz da esperança, acenando na sua linguagem mística, inspirada nos
evangelhos, um igualamento em que haveria um só pastor e um só rebanho”
(FACÓ, 1965, p. 93).
Na voz euclidiana, a prédica de Antônio Conselheiro nada mais era do
que “uma oratória bárbara e arrepiadora, feita de excertos truncados das Horas
Marianas” (CUNHA, 2000, p. 184).
Um momento de extrema importância para todos os canudenses era o
anoitecer.
Ao cair da tarde, a voz do sino apelidava os fiéis para a oração.
Cessavam os trabalhos. O povo adensava sob a latada coberta de
folhagens. Derramava-se pela praça. Ajoelhava. Difundia-se nos ares
o coro da primeira reza.
[...] As rezas eram longas, demoradas. Os fieis não tinham pressa,
oravam todas as escalas das ladainhas [...] O ritual do ‘beija’ das
imagens era impressionante. Iniciado com o crucifixo no qual cada fiel
saudava todos os santos com ósculo santo, conforme a prática cristã
(CUNHA, 2000, p.186).
Na verdade, a fé e a esperança em uma vida melhor serviam para o
povo de Belo Monte como um refrigério para suas dores, seus sofrimentos
diários. O consolo que lhes restavam era a religião. Ou melhor, a salvação de
seus pecados para que pudessem gozar de uma vida eterna sem agonias, sem
lamúrias. Esse era o verdadeiro bálsamo de suas almas. A fé era o
sustentáculo de um povo que lutou até suas últimas forças por um ideal
coletivo de fraternidade e partilha.
Considerações finais
Os Sertões sem dúvida é múltiplo e único. A maestria de Cunha é, sem
dúvida, fascinante. Sua narrativa nos encanta e nos comove. Assim como um
FONAPER
pintor fascina e provoca deleite ao apreciador. Canudos transforma-se. Como
declara o prefaciador Bernucci In: Os Sertões: Campanha de Canudos é “um
lugar inexaurível de infinitas possibilidades interpretativas (dilúvio, Canaã
Sagrada, arca de aliança, Anticristo, Babilônia)”. E conclui: “A Terra, se
antecipa ao paraíso terrestre, recarregado de sentido religioso para os
conselheiristas” (CUNHA, 2009, p.20).
Mas, ao analisarmos a prédica de Antônio Conselheiro citada por
Cunha, percebe-se que está muito além do fanatismo religioso ou político.
Penso que o séquito de Conselheiro era guiado pela força motivadora, fruto do
desejo, de uma vida mais digna, mais justa e fraterna. A ética do Conselheiro é
passiva. A busca que ele propõe aos seus seguidores é espiritual.
A resistência dos combatentes frente às forças militares durante a
campanha demonstrou todo o poder que o fenômeno religioso representava
para os habitantes de Canudos.
A República significava a lei do Cão porque propunha uma separação
entre Igreja e Estado, o casamento civil e a cobrança de impostos. Para
Conselheiro a monarquia era um direito hereditário divino.
Analisar a formação do séquito de Antônio Conselheiro, talvez, sirva-nos
como lição para reconhecer que é possível a harmonia entre individuo e
comunidade, sem preocupação com o capitalismo e a ambição de sempre
querer mais que o outro.
Para os conselheiristas o sagrado, o elemento religioso, era a base, o
sustentáculo, o bálsamo que os alimentava diariamente frente às adversidades
da vida sofrida sertaneja. Daí vinha toda a garra daquele povo que foi
covardemente massacrado pelas forças militares.
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Antonio Jorge Paraense da Paixão– IFPA2
Luiza Romeu da Silva Veloso da Costa - UEPA3
Maria de Lourdes Santos Melo - UEPA4
Resumo
A partir da questão: que visão do Sagrado/Deus está presentes no imaginário de crianças que
frequentam o ambiente de pré-escolas em instituições públicas de ensino, estabeleceu-se
como objetivo analisar diferentes percepções do Sagrado/Deus presente no imaginário de
crianças. Optou-se por realizar um estudo qualitativo tendo como cenário uma escola de
educação infantil. A produção de informações envolveu dez crianças de 4 a 6 anos. O
processo metodológico incluiu: aplicação de formulário junto as crianças e produção livre de
um desenho. Conclui-se que as crianças possuem visão do Sagrado/Deus em seu imaginário,
formada a partir de seu meio social. Conclui-se que família, escola e igreja são espaços
privilegiados para a formação do imaginário infantil , influenciando, sobretudo, em seus
conhecimentos e experiência com o Sagrado/Deus.
Palavras-chave: Crianças. Sagrado. Deus.Imaginário.
Introdução
Para a maioria das crianças a infância deveria ser um período de grande
aprendizagem, conhecimento e liberação de muita fantasia, onde o imaginário é
ilimitado. Nessa fase da vida, fadas, duendes, monstros, santos, demônios, anjos e
deuses podem tomar proporção imensa na vida de uma criança, colaborando em
muitos momentos para sensação de medos e pânicos, em outros, dando à criança a
sensação de sentir-se amada, protegida e cuidada por entes sagrados ou
sobrenaturais.
Esse maravilhoso e ao mesmo tempo complexo universo do imaginário infantil
nos motivou a buscar evidencias empíricas para tentar sobre percepções de crianças
da pré-escola têm sobre Sagrado/Deus Essas visões de Sagrado/Deus são adquiridas
por elas no âmbito familiar ou são adquiridas na escola a partir das aulas ministradas
pela professora da pré- escola? Qual a percepção da professora sobre essa questão?
Como a professora da pré-escola trabalha noções de Ensino Religioso escolar em
salas de aula de pré- escola?
Autores como Áries (1981), Oliveira (2002), Cruz (2008), Neiss (2010), Ribeiro
2
Doutor em Educação (UFRJ/RJ), Filósofo, docente da Universidade do Estado do Pará-UEPA
e do Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Pará – IFPA – Campus
Castanhal [email protected].
3 Licenciada em Ciências da Religião pela Universidade do Estado do
Pará[email protected].
4 Doutora em Educação (UFRJ/RJ), Pedagoga, coordenadora do Curso de Licenciatura em
Ciências da Religião e docente da Universidade do Estado do Pará-UEPA,
[email protected].
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
(2003), Pires (2010) e outros que pesquisam por diferentes caminhos questões
relacionadas à infância contribuíram para ampliar nossos conhecimentos e ao mesmo
tempo fundamentar este trabalho. Para realizá-lo, nos propusemos a pesquisar
questões do sagrado pela ótica infantil ousando fazer um caminho investigativo pouco
usual, na medida em que, os principais respondentes do estudo foram crianças de 4 a
6 anos.
Assim elegemos como objetivo curso analisar diferentes percepções do
Sagrado/Deus presente no imaginário de crianças da pré-escola. Para atingir tal
objetivo estabelecemos alguns objetivos específicos como: identificar elementos do
Sagrado presentes no imaginário de 10 crianças com idades em torno de 4 a 6 anos
que já estudam em turmas de pré-escola; apontar como a amostra de crianças
investigadas representa questões do sagrado em suas falas e desenhos;
A pesquisa de campo foi realizada no mês de junho de 2011, em uma escola
pública conveniada com a secretaria de educação do município de Ananindeua, do
bairro do Coqueiro estado do Pará envolvendo dez crianças e uma professora que
foram ouvidos por meio de formulários e questionário.
A produção das informações junto às crianças foi feita através de formulários
preenchidos com a ajuda da pesquisadora e a produção de desenhos objetivando a
livre expressão da imagem que elas tinham de Deus, Papai do Céu ou Sagrado.
Os resultados geraram esse artigo que no primeiro momento faz um breve
histórico da infância, da educação infantil no Brasil e do Ensino Religioso. No segundo
momento trata questões relacionada a religiosidade no imaginário infantil, passando
por alguns autores, A segunda seção discorre sobre o percurso metodológico
indicando como ocorreu o processo da produção das informações, tais como: tipos de
pesquisa, informante do estudo, aplicação dos instrumentos e organização dos dados.
Na quarta e última seção serão analisadas as informações colhidas junto as crianças
da pré-escola e junto a professora além da conclusão do estudo em questão
Educação Infantil e Ensino Religioso
Infância
Alguns séculos atrás, na Idade Média ainda não se tinha uma concepção do
que era "infância.” Desconhecia-se esse termo como sendo uma fase da vida do ser
humano no qual deveria haver um tratamento e educação especifica da idade.
Oliveira (2002, p.44) ao analisar o termo "infância” mostra que (in-fans) tem o
sentido de "não-fala”, ou seja, sem voz. A autora pergunta que período da vida
FONAPER
humana se referia esse significado? E explica que desde o nascimento começa a ser
construídos os sistemas de comunicação entre o bebe e seu entorno social por meio
de choros, sorrisos e gestos o que significa que existe uma tentativa de se comunicar,
de falar muito precocemente. Diante disso questiona: "Infância”, refere- se, então, aos
primeiros anos de vida, em que mesmo quando a criança fala sua fala "não conta”? É
sem voz e também sem vez?
Nos estudos de Áries (1981) pode-se entender que o conceito de infância
sofreu modificações no decorrer da historia, e estes estão ligadas às transformações
econômicas, políticas e sociais que a humanidade passou.
Na educação grega, período clássico, a criança era vista como ser selvagem
que tinham que ser dominado pela razão e bem ético e político. Durante a Idade Media
a criança não tinha nenhum tipo de tratamento especial adequado a sua idade, fato
que tornava sua vida difícil. O pensamento medieval compreendia a infância como
evidencia da natureza pecadora do homem, pois nela a razão, reflexo da luz divina,
não se manifestaria. Até os filósofos do Renascimento e da Idade Moderna não
percebiam a infância como um período de racionalidade, mesmo a criança sabendo
lidar com as informações que recebe de seu meio, mas para eles, a razão não existia
(OLIVEIRA, 2002, p.44).
O que importava para a sociedade medieval era as crianças crescerem o mais
rápido para participar do trabalho e atividades dos adultos e com isso ia aprendendo e
se desenvolvendo.
A criança era preparada para ser adulto e exerce atividades de gente grande.
Não se pensava que a criança tinha suas necessidades físicas, psíquicas e cognitivas
própria de sua idade e que por isto deveria ser tratada diferentemente de um adulto
(MUIKHIMA, 1995)
No século XVI, início dos tempos modernos, a infância ainda era tratada como
preparação para fase adulta, os infantes tratados como "miniatura” de adultos. As
crianças participavam das festas, brincadeiras, jogos, danças e outras manifestações
sociais juntamente com os adultos (ÁRIES, 1981).
Por volta do século XVII em função das transformações econômicas e sociais,
decorrentes da Revolução Industrial e o aparecimento da burguesia, houve uma
transformação na sociedade e com ela o surgimento de um maior sentimento pela
criança (ÁRIES, 1981). A criança passa a ser o centro das atenções da família que
passa a se preocupar com a educação de seus filhos.
Mas esse sentimento de maior preocupação com o futuro educacional da
criança passou a ser fortalecido nas famílias modernas, englobando somente uma
parte da sociedade, ou seja, nobres e burgueses. A outra parte, os pobres,
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
permaneceu por um longo tempo educando seus filhos no modelo arcaico da família
medieval.
Como consequência das várias transformações socioeconômicas e de muitas
pesquisas realizadas sobre infância, no século XX, a criança começa a aparecer com
uma nova identidade. Segundo Einaudi (apud NEISS, 2010, p.39) “[...] vimos a criança
sair do anonimato e da indiferença das idades remotas e torna-se mais preciosa, mais
rica de promessas e de futuro.” Surge à concepção de criança como um ser humano
completo sujeito social, histórico e em desenvolvimento - como pessoa com
especificidades decorrentes de sua fase inicial de desenvolvimento.
Criam-se leis que vão amparar a criança, entre elas podemos citar o Estatuto
da Criança e do Adolescente (ECA), criado em 1990. Apesar de ter significado um
grande avanço, a realidade tem apontado que esse instrumento legal ainda precisa
passar por algumas mudanças. Ainda em Neiss (2010, p.38) “na visão de muitos
autores, a criação do ECA é um marco no que diz respeito ao reconhecimento e
valorização da infância por parte das política publicas.”
A Constituição de 1988 juntamente com o ECA corroboraram para
implementação de políticas públicas voltadas para a infância de modo que
gradativamente o governo cede as pressões sócias e assume seu papel de protetor e
educador da criança juntamente com a família como aponta Passetti (apud NEISS,
2010, p.38) quando diz:
a criança e o jovem se transformam em propriedades de Estado. A
legislação pretende protegê-los da família desestruturada e dos
maus-tratos que venham sofrer; quer garantir educação, políticas
sociais, alimentação e bases para o exercício da cidadania.
Em suma a criança tem suas especificidades advindas de seu lugar social e,
como tal, interage com outras pessoas, tanto crianças quanto adultos e nessa relação
educam e são educadas pelo contexto circundante, extraindo e produzindo cultura,
resignificando, introjetando e reproduzindo hábitos que para ela vai se tornado
expressões de verdade.
Imaginário Infantil
O imaginário faz parte do campo das representações, ocupando um lugar que
ultrapassa a representação intelectual. Ele pode ser edificado e manifestado através
de símbolos e imagem, à medida que estes fazem parte do imaginário dos seres
humanos.
Em se tratando de criança, falar de símbolos e imagens presentes em seu
FONAPER
imaginário, é tentar captar as diversas formas como elas vêem, ouvem e falam a
respeito do mundo que a cerca. Para Sarmento (2002, p.03), "o imaginário infantil é
inerente ao processo de formação e desenvolvimento da personalidade e
racionalidade de cada criança concreta”. Ele acontece a partir de contextos sociais e
culturais que fornecem condições e possibilidades para o desenvolvimento individual
ou coletivo do imaginário de cada criança.
O simbólico esta presente em toda vida social do ser humano situado: na
família, na economia, na religião etc. Apesar das experiências sociais não terem fim,
pois em alguns casos elas são dirigidas por signos, os símbolos movem de forma
afetiva as manifestações humanas e legitimam essas manifestações. Para Leplantine
e Trindade (1996, p.06), “a vida social é impossível, portanto, fora de uma rede
simbólica.”
Durand (1996) acredita que para se ter um conhecimento maior do ser humano
e seu universo é preciso entender que o homem estabelece uma relação direta não
com o mundo e sim com o significado das coisas através dos símbolos imbuídos na
sua cultura.
O homem cria símbolos como melhor forma de entender a si e o mundo que o
envolve e estes símbolos agregam-se a história humana como elementos vitais de sua
cultura. Uma vez inserida neste meio, a criança começa a desenvolver sua imaginação
baseada nos símbolos próprios que lhe são apresentados, passando a representá-los
posteriormente como explica Sarmento (2002, p.14) quando afirma que as crianças:
[...] desenvolvem sua imaginação sistemática a partir do que
observam, experimentam, ouvem e interpretam na sua experiência de
vida, ao mesmo instante que as situações que imaginam lhes permite
compreender o que observam, interpretando novas situações e
experiências de modo fantasista, até incorporarem como experiência
vivida e interpretada.
Estas ideias somam-se as descobertas de Valle, Gavillán e Marques (2003,
p.50), quando inferem que “a infância é um período da vida do ser humano onde ela
cria ou lida com fantasia e personagens imaginários”. Como vemos o processo
imaginativo depende das experiências e do ambiente criador, pois quanto mais a
criança aumentar suas relações sociais e culturais maior será a diversidade de
imagens mentais. As crianças estruturam seu mundo interior a parti das impressões
advindas do ambiente externo onde os pais e responsáveis serão os tradutores dessa
realidade. Para os autores acima citados a criança por meio da imaginação pratica o
que socialmente lhe é transmitida, cabendo ao adulto mostrar para ela até onde é real
e até onde é fantasia. Contudo essas interferências devem ocorrer de modo cauteloso
para que não frustre ou traumatiza a criança.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Segundo Mukhina (1995) a criança devida sua pouca experiência de vida não
tem uma fantasia mais rica do que a do adulto como comumente se ouve falar. O que
acontece é que a criança dá livre vazão a sua imaginação sem que a razão lhe
imponha limites como o adulto.
A criança na sua imaginação pratica o que socialmente lhe é transmitida. Assim
ao dar asas a sua imaginação ela pode evocar seres onde não existe, dá vida ao que
esta morto e atribui sentimentos a coisas, em resumo, a criança é capaz de criar um
mundo próprio, a sua maneira. Diferente do adulto ela é livre para dar evasão a sua
imaginação, sem que a razão, como indica Mukhina (1995), lhe imponha limites.
Malrieu
(apud
NEISS,
2010)
entende
que
imaginação
e
razão
se
complementam, apesar de oposto, transportando a realidade para a imaginação e a
imaginação para a realidade.
Postic (apud RIBEIRO, 2003, p.34) afirma que "a imaginação é um processo
instaurador, da capacidade de imaginar: evocar seres colocá-los em determinada
situação, fazê-lo viver como se quer, criar um mundo a seu bel-prazer, libertando-se.
Tudo é possível. Tudo acontece.” Para o autor na vida cotidiana, imaginar é:
uma atividade paralela à que exercemos, ligada à realidade. Imaginar
é uma atividade de reconstrução, até de transformação do real, em
função dos significados que damos aos acontecimentos ou das
repercussões interiores que eles têm em nós. Não é afastar-se em
relação ao mundo real; é seguir ao mesmo tempo por uma via
paralela.
Held (apud RIBEIRO, 2003, p.35 ) reafirma as idéias de Postic quando infere
que:
O imaginário pode ser definido como a mistura mínima da vida real,
vida cotidiana com seus problemas, sua comicidade, seus ridículos,
sua mistura íntima de cuidados, de angustia, de pitoresco, de ternura;
tudo aquilo que é tangível com sonho. Nele o sonho e realidade se
interpenetram a tal ponto que qualquer linha de demarcação
desaparece, e o sonho chega a parecer realidade e a realidade chega
a parecer sonho.
Para o autor o imaginário é definido como uma mistura de sonho e realidade
onde ambos andam junto, um penetra no outro na vida cotidiana.
Desta forma fundamentando-se mais ainda em Ribeiro, conclui-se que a
criança assim como o adulto não inventa nada do nada, é necessário modelos, para
construção de realidades. Assim a criança lança mão, do que o meio lhe oferece para
a construção do seu imaginário. Devemos entender que em vez de cópia o imaginário
pode ser entendido como invenção favorecido pela realidade uma vez que resulta nas
mais variadas possibilidades.
Assim, entendemos que desenhos, de um modo geral, podem ser utilizados
FONAPER
como representação de parte do imaginário infantil. Daí nossa intenção em tentar
captar a partir do imaginário de crianças de 4 a 6 anos como elas pensam ou
imaginam o Sagrado/Deus. Para isso nos utilizaremos de conversas, informações
registradas em formulários e desenhos realizados por crianças da pré-escola. Essas
representações do sagrado a partir do imaginário infantil serão apresentadas a seguir.
Como é o papai do Céu? A diversidade sacra ou a sacra diversidade
Um dos pressupostos do presente trabalho é de que o imaginário é fomentado
pelas circunstancias envolventes, portanto se as circunstancias são diversas
pressupõe-se que esse imaginário também será diverso.
Quando iniciamos o trabalho junto às crianças elas ficaram curiosas para
saberem o que iriam fazer. Separamos uma mesa onde foram agrupadas e ficaram
esperando serem chamadas. A aplicação do formulário foi tranqüila e as respostas
foram rápidas. Nós perguntávamos, elas iam respondendo e nós marcávamos a
indicação dada.
A segunda fase foi dedicada aos desenhos. Ao saírem da etapa do formulário
as crianças dirigiam-se a outra mesa para realização dos desenhos. Além de
disponibilizar folha de papel em branco e lápis para colorir orientamos que
individualmente, deveriam desenhar como eles imaginavam a figura de Deus ou do
Papai do Céu. Nossa intenção era verificar a representação do Sagrado no desenho
dos alunos.
Nesse momento a criança ficava sozinha e concentrada em sua tarefa. Em
média cada aluno/a levava de cinco a oito minutos para finalizar o trabalho.
Observamos que no momento destinado as respostas das questões subjetivas
onde elas tinham que falar como imaginavam Deus ou Papai do céu e depois
desenhá-lo o resultado foi surpreendente. Nós imaginavam que eles iriam ter alguma
dificuldade nesse momento devido a pouco idade de algumas crianças mas,
surpreendentemente, todas responderam coerentemente as perguntas e seus
desenhos foram reveladores ao demonstrarem à maneira que elas vêem Deus ou
Papai do céu e como ele está presente em suas vidas.
Observamos que ao responder as perguntas "como você imagina/pensa que é
Deus? e a solicitação do desenho de Deus / Papai do Céu”, não foi preciso explicar
isso as crianças. Elas simplesmente pegavam o papel e representavam suas visões
do Sagrado/Deus.
Quando foi perguntado à criança "Como você imagina/pensa que é Deus?
Tivemos respostas variadas como "É grande, forte, com poderes para destruir pessoas
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
más”, "Ele é amor, bonito e sempre esta em sua casa, fazendo coisas boas”, "Bom,
traz alegria e paz para sua família.” Essas falas captadas durante as entrevistadas
indicam noções do Sagrado na vida das crianças, seja no âmbito familiar ou escolar
A maioria das crianças frequenta uma instituição religiosa, juntamente com sua
família. Isso denota que para a maioria das famílias da amostra estudada a vivencia
religiosa ainda é um fator importante para suas vidas e que nos entrevistado e seus
desenhos são confirmações dessas percepções.
A totalidade as crianças gostam de Deus ou papai do Céu. Isso mostra que
essas crianças nutrem um sentimento pelo ser divino denotando o tipo de educação
religiosa que os envolve, que não apresenta o temor como necessário, e que esse
temor pode ser trabalhado em momentos posteriores quando a sociedade (família,
escola, igreja, estado) tenta inibir determinadas atitudes consideradas negativas.
Após a aplicação do questionário solicitamos "Faça um desenho de Deus /
Papai do Céu.” O resultado demonstrou seus imaginários e a diversidade do mesmo
pois em alguns desenhos estão representados casa, flores, coração e as imagens são
bem diferentes entre sí.
Sabemos que o desenho, de um modo geral, ao longo da história da
humanidade tem servido como importante fonte de registro iconográfico, capaz de
indicar fases de evolução da humanidade, estágio de civilização, emoções,
sentimentos etc. Assim para melhor captarmos como as crianças de nossa pesquisa
imaginavam o Sagrado/Deus, solicitamos que fizessem um desenho bem bonito de
Deus / Papai do Céu. O resultado desse processo foi, para nos como pesquisadora,
surpreendente,
revelador
e
emocionante,
se
consideramos
a
beleza
dos
trabalhos/desenhos e a riqueza dos detalhes que povoavam o imaginário das crianças,
e que elas em suas singelezas e inocências expressaram e partilharam conosco suas
visões do numinoso.
O processo ocorreu de modo que primeiro deixávamos a criança livre para
desenhar e depois de concluído o trabalho perguntávamos a ela o significado de
alguns detalhes presentes no desenho.
No desenho que catalogamos como Criança n° 1 de cinco anos do gênero
masculino, o aluno disse que pensa o Sagrado/Deus "Grande e forte como um super
homem, cheio de poderes para destruir as pessoas más.
FONAPER
Pesquisa de campo 2011 - Desenho 1 / Criança 1 / Gênero Masculino/5anos
No desenho apresentado acima podemos observar que a criança dá
características sobrenaturais a Deus quando fala e mostra que ele tem poderes. No
desenho a criança ainda não o vê como um ser humano, imaginando-o e comparandoo a um super-herói ou personagem de filme, como pode ser constatado quando ela diz
que Deus é um super homem. Também vemos que a força, pode estar relacionada a
compleição física avantajada e estatura alta (músculos, tamanho). Outro ponto que
podemos observar é que apesar de comparar Deus com um super herói de revistas
em quadrinho ou da televisão dotado de super poderes (forte e musculoso) o desenho
traz no peito uma cruz, indicando por parte da criança conhecimento da existência
deste símbolo religioso de reconhecida importância para boa parte dos cristãos.
Como sabemos a cruz é um símbolo Sagrado presente em boa parte das
igrejas e ao desenhá-la nos mostra que em algum lugar viu ou ouviu falar nela, ainda
que não tenha consciência de que para os cristãos ela representa sofrimento de Cristo
durante o momento da crucificação.
Como essa criança durante a pesquisa nos respondeu que tem costume ir para
a igreja com os pais, e que sua família é católica, concordamos com Sarmento (2002)
quando afirma que a imaginação das crianças é desenvolvida a partir do que
observam, experimentam, ouvem e interpretam situações novas de forma fantasiosa,
mas que para ela, criança, se torna realidade.
As constatações junto a esta criança nos remetem as ideias de Postic (apud
RIBEIRO, 2003) quando infere que a imaginação é uma atividade paralela a vida real,
é uma reconstrução do real. Held reafirma as ideias de Postic nos dizendo que o
sonho e a realidade se misturam e que o sonho parece realidade e a realidade parece
sonho, um penetra no outro na vida cotidiana. A criança trouxe para "realidade de seu
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
desenho” aquilo que sua imaginação capta de sua vida diária, de suas relações sociais
e de suas pequenas experiências com o Sagrado.
A criança n° 2, de cinco anos do gênero Feminino disse que: "Ele é amor,
bonito e sempre esta na sua casa, fazendo coisas boas.”
Pesquisa de campo 2011 - Desenho 2/ Criança 2/ Gênero Feminino / 5 anos
A criança 2 apesar ter desenhado figuras avulso como : casa, flor e coração,
deixou fluir seu imaginário sobre Deus com representações muito próprias do
imaginário representativos da alma feminina. Deus para ela simboliza "proteção,
beleza e amor” e é dessa forma que ela o percebe em sua vida, ou seja, como um
Deus protetor de sua casa e de sua família.
O desenho nos lembra Pires (2010) quando afirma que uma experiência
religiosa de uma criança não é fantasia e sim uma forma de conhecimento que ela tem
do transcendente. A representação icnográfica da criança 2 indica que ela atribui a
Deus sentimentos como proteção e amor que são representados pelas figuras casa e
coração.
A criança n° 3, de cinco anos do gênero masculino desenhou Deus como
"Lindo, de olhos azuis, barba grande e branca.”
FONAPER
Pesquisa de campo 2011 - Desenho 3/ Criança 3/ / Gênero Masculino 5 anos
No desenho 3, da criança 3, Deus é lindo , de olhos azuis, tem barba, é grande
e tem pele clara. Podemos observar nessa figura acima um Deus cristianizado, com
características humanas ocidentais.
Essa imagem de Deus de olhos azuis e cabelos compridos surgiram na idade
média na Europa. Ela era utilizada para pregar a fé cristã para os povos do norte da
Europa, assim a força o eurocentrismo cunhou Jesus com essa característica, quando
na verdade não se tem notícias de uma imagem de Jesus feita por seus
contemporâneos. Como expansão do cristianismo inicialmente por Roma, ficou
prevalecendo essa imagem ocidentalizada de Jesus que teve grande influencia no
meio cristão católico brasileiro.
Para Ribeiro (2003, p.121), "A criança constrói aos poucos a imagem de Deus
a partir das experiências vivenciadas na família, com seus pais, observando gestos,
ações, decisões e reações das pessoas a sua volta”. Certamente quando a criança se
refere essa imagem de Deus europeu, ela colocou aquilo que observou, experimentou
e ouviu do seu meio de convívio e depois interpretou sua experiência vivida.
A criança n° 4, de cinco anos considera Deus como "O protetor de todos e que
está no centro do mundo ajudando a todos, ele é bondoso”
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Pesquisa de campo 2011 - Desenho 4/ Criança 4/ Gênero Masculino / 5 anos
Ele desenhou um círculo grande e colocou uma pessoa no centro que para ele
representa Deus. Este círculo é o mundo e Deus está no centro do mundo. Em sua
interpretação o Sagrado está no controle de tudo, vendo e ajudando a todos. Nesse
desenho Deus também possui formas humanas como olhos, boca, nariz e cabelo. Ela
desenha-o com sorriso e de braços abertos como se quisesse simbolizar através
desses traços acolhimento e proteção. Em sua fala ela diz que ele é bondoso,
caridoso, protetor.
A forma que esta criança utilizou para representar Deus nos fez recordar os
estudos de Malrieu (apud NEISS, 2010) quando nos mostra que imaginação e razão
se complementam, apesar de opostos, transportando a realidade para a imaginação e
a imaginação para a realidade.
Apesar de opostas imaginação e razão, se interligam, pois o ato de imaginar
depende da realidade cotidiana que cerca a criança. Quando o pequeno informante
imagina um Deus no controle de tudo e protegendo a todos, ela usou seu lado
racional, de sua realidade transportou para a sua imaginação e depois expressou
através do desenho.
A criança n° 5 do gênero masculino de cinco anos diz também gostar de Deus
e na sua imaginação ele é baixo, bonito, com asas e está sempre presente em sua
casa.
A criança desenhou uma casa e uma pessoa que para ela é Deus. Atribui-lhe
algumas características "é baixo”, "bonito” e "tem asas”, como se fosse um ser que
pudesse voar e estar sempre em sua casa. Essa criança também caracteriza Deus
como onipresente e guardião de sua morada. O desenho nos alude as idéias de Valle,
Gavillán e Marques (2003) quando falam que a infância é o período da vida em que a
criança lida com fantasia e personagens imaginários. Em seu imaginário Deus é um
personagem bom que pode voar e proteger sua casa, dando-lhe a sensação de
FONAPER
segurança a proteção, motivos pelos quais muitos de nós, mesmos adultos, também
recorremos ao Sagrado/Deus.
A criança n° 6, de cinco anos do gênero masculino disse "gostar de Deus e
imaginá-lo bom, que traz alegria e paz para sua família”.
Pesquisa de campo 2011 - Desenho 5/ Criança 5/ Gênero Masculino / 5 anos
A criança de n°10, de seis anos do gênero feminino disse que gosta de Deus
por que "ele fez os animais, as pessoas e criou todos nós e imagina-o grande, negro e
com poderes.”
Pesquisa de campo 2011 - Desenho 10/ Criança 10/ Gênero feminino / 5anos
Essa criança desenhou uma pessoa grande, alta, cabelos compridos, negro, de
olhos claro meio verde mesclado com azul, com poderes e que carrega outras
pessoas em sua perna (detalhe no desenho de suas calças).
Inferimos que para esta criança Deus é criador de tudo, dos animais, pessoas e
em seu imaginário, ele é negro, grande e de cabelos compridos. Quando perguntamos
o que era isso nas pernas do desenho, ela respondeu que são as pessoas que Deus
protege.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Durante a pesquisa o estudo sobre o imaginário infantil nos mostrou que
processo imaginativo depende das experiências e do ambiente que ela vive, pois
quanto mais a criança aumentar suas relações sociais e culturais maior será a
diversidade de imagens mentais.
Os estudos de Durand (1996) nos mostram que o homem estabelece uma
relação direta não com o mundo e com o significado das coisas através dos símbolos
imbuídos na sua cultura. Ele cria símbolos como melhor forma de entender a si e o
mundo que o envolve e estes símbolos agregam-se a história humana como
elementos vitais de sua cultura.
A criança uma vez inserida neste meio começa a desenvolver sua imaginação
baseada nos símbolos próprios que lhe são apresentados, passando a representá- los
à sua maneira aquilo que seu entorno social lhe apresenta.
Assim, concluímos que Deus representado nos desenhos infantis das crianças
estudadas nesta amostra, tomou formas variadas como: "grande, forte, baixo, negro,
poderoso, bonito, etc.”
Os desenhos nos permitem inferir que estas percepções sobre Deus provém
de conhecimentos aprendidos e vivenciados nos contextos socais em que as crianças
transitam, iniciando, na maioria das vezes, no meio familiar e à medida que elas se
envolvem com outros grupos socais como escola, igreja e até a mídia, vão somando e
fortalecendo sua percepção sobre Deus. Com o tempo essa visão infantil vai
amadurecendo e se unindo as formam do imaginário individual construído sobre o
Sagrado/Transcendente/Deus.
Isso confirma o pensamento de Ribeiro (2003, p.118) quando diz que "O
imaginário de Deus, portanto inclui influências vindas de pessoas importantes para as
crianças como pais, vizinhos, amigos ou do ensino formal da televisão, do rádio, e até
da música.
Considerações Finais
A intrínseca relação entre formação espiritual e meio familiar e escolar
estimulou a realização deste estudo que se propôs a investigar qual visão que as
crianças da pré-escola têm do Sagrado/Deus, analisando diferentes percepções do
Sagrado/Deus presente em seus imaginários.
A busca em identificar elementos do Sagrado/Deus presentes no imaginário de
crianças que já estudavam em turmas de pré-escola e conclusão do trabalho nos
permitiu a confirmação de que realmente as crianças são seres sociais e agentes
FONAPER
históricos e, como tal, o meio que os cercam influencia na construção de seu
imaginário.
O contato com os pequeninos no período da produção das informações nos
permitiu perceber que elas recebem do meio familiar uma grande quantidade de
informações e aquilo que consideram relevantes é processado e recriado à sua
maneira, como pode ser visto nos desenhos das dez crianças que fizeram parte deste
estudo. As representações do Sagrado/Deus foram criativa, surpreendente e única.
Quanto a questão da representação do Sagrado/Deus presente nas falas dos
alunos investigados foi possível perceber que elas, influenciadas pela família devem
ter uma prática religiosa e por meio desta, ouvem falar do Sagrado/Deus, assim
também a escola e a igreja são locais frequentes onde a criança também/aprende
sobre o transcendente.
Constatamos também que elas gostam de ouvir e falar sobre Deus,
demonstrando alegria e emitindo opinião no momento de realização de suas
atividades quando o assunto é Deus.
Mesmo com pouca idade as crianças de nosso estudo demonstraram suas
visões indicando que o Sagrado/Deus em seus imaginários aparece como: forte,
poderoso, protetor, bondoso, traz paz e alegria. Assim elas representam o
transcendente que para ela tem distinção de cor, estatura e força, Deus pode ser,
segundo elas, representado em todos os tipos físicos sem carga de preconceito. Ele é
tudo para todos. As crianças sabem que Deus ou Papai do Céu ou o Sagrado não é
palpável, concretamente não está presente, mas, de forma abstrata e em seus
imaginários Ele existe e é amado.
Consideramos que para as crianças o Sagrado/Deus faz parte de suas
experiências individuais e coletivas. A observação das crianças falando ou
desenhando sobre Deus nos permitiu concluir também que suas relações com o
numinoso é mais intensa, e a nosso ver verdadeira, que a do adulto, pois os infantes
não têm uma consciência religiosa formada, pelo contrário essa consciência ainda
está em formação, de modo que tudo que sentem e vivenciam no decorrer de seu
crescimento mostrou de forma verdadeira, completa e pura, sem controle racional do
adulto.
De acordo com o que foi possível verificar, para algumas crianças a forma
como imaginam ou pensam o Sagrado/Deus é digna de um pensamento quase que já
amadurecido, de uma formação quase que completa religiosamente.
Sobre a influência do trabalho da professora da pré-escola na visão que as
crianças têm sobre o Sagrado/Deus é possível concluir que a professora não tinha
uma percepção clara a respeito do conhecimento acerca do Sagrado/Deus por parte
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
de seus alunos. Também consideramos que a docente em questão não demonstrava
maior compromisso com uma prática voltada para a formação religiosa regular da
turma, já que ministra aulas de religião somente uma vez por mês e não com
regularidade. Apesar da disciplina ensino religioso não constar no desenho curricular
da pré-escola, isto não a impediria de adotar uma prática pedagógica onde questões
da religiosidade se fizessem presente, até porque muitas crianças demonstravam já
possuir certa vivência com familiares sobre o assunto.
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Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
A
CONTRIBUIÇÃO
DA
EDUCAÇÃO
POPULAR
NA
ABORDAGEM
INTERCULTURAL DAS CIÊNCIAS DAS RELIGIÕES NO ENSINO RELIGIOSO
Mirinalda Alves Rodrigues dos Santos - UFPB5
Marinilson Barbosa da Silva- UFPB6
Resumo
Este trabalho é fruto do processo de escrita da dissertação de mestrado em andamento. Com o
objetivo de apresentar a necessidade de uma abordagem metodológica e pedagógica em
busca do diálogo intercultural proposta nas Ciências das Religiões no Ensino Religioso em uma
perspectiva de Educação popular. Uma vez que, essas modalidades de ensino buscam
contemplar e promover o diálogo intercultural religioso em suas práticas educativas, tornando
assim um grande desafio para os profissionais de Ensino Religioso, pois o mesmo deve
promover esse dialogo de forma não proselitista. Esse trabalho é de caráter bibliográfico com
delineamento explicativo. Faremos interlocuções com os teóricos Hock (2010) Teixeira (2001),
Passos (2007), Freire (2004), Candau (2008), entre outros autores que fazem a reflexão da
promoção do diálogo e o respeito e interação à diversidade cultural.
Palavras-chave: Ensino Religioso. Dialogo intercultural. Diversidade religiosa.
Introdução
A problemática apresentada nesse estudo é resultado parcial do processo
escrito dos autores da dissertação de mestrado em Ciências das Religiões, na linha de
pesquisa Educação e Religião o Programa de Pós-graduação em Ciências das
religiões (PPGCR/UFPB), com o objetivo de apresentar a necessidade de uma
abordagem do diálogo intercultural proposta nas Ciências das Religiões nas
metodologias pedagógicas aplicadas no Ensino Religioso em uma perspectiva de
Educação popular.
Pedagoga e mestranda em ciências das religiões na linha de pesquisa: Educação e Religião –
UFPB. Integrante do grupo de pesquisa Formação, Identidade, Desenvolvimento e Liderança
de Professores de Ensino Religioso - FIDELID. Tutora do curso de especialização em Gênero
e Diversidade na Escola (GDE) pelo Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e Ação sobre Mulher
e Relações de Sexo e Gênero (NIPAM). ([email protected]).
6 Graduado em Psicologia pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), Bacharel em
Teologia pela Escola Superior em Teologia no Rio Grande do Sul (EST-RS). É mestre em
Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e doutor em
Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Atualmente, é
professor Adjunto do Departamento de Habilitações Pedagógicas (DHP) - Centro de
Educação (CE) - da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). É também professor, membro
do Colegiado Deliberativo, vice-coordenador e pesquisador do quadro permanente do
Programa de Pós-Graduação em Ciências das Religiões (PPGCR). Na pesquisa, dedica-se
ao estudo sobre Formação de Professores, Ensino Religioso, Cultura de Paz, Liderança e
Práxis Pedagógica com foco na Fenomenologia. É líder do Grupo de Estudo e Pesquisa
FIDELID (Formação, Identidade, Desenvolvimento de Líderes) na área do ensino religioso.
([email protected]). Orientador da autora.
5
FONAPER
Uma vez que essa educação substituir o discurso e práticas autoritárias por um
ensino que proporcione uma construção de saberes significativos que deem voz ativa
para o educando, inclusive aos que ficam a margem de uma sociedade excludente,
isso permeia em diversos seguimentos entre eles está as religiões menos
consideradas em um contexto social cristão.
Nessa perspectiva entendemos que a educação popular é um grande
contribuidor no Ensino Religioso no sentido da formação plena do/a educando/a, que
visa a sua forma de observar e compreender o mundo que o/a cerca, essa é uma
característica importante do Ensino Religioso que é o de valorizar experiências e
saberes dos/as educandos/as potencializando a formação integral do ser, para isso
requer práticas pedagógicas e postura ética de profissionais que direcionem suas
metodologias voltadas para a inclusão de componentes curriculares que contemple as
diversidades religiosas sem proselitismo.
É nesse sentido que esse estudo se fortalece, pois apresenta alternativas
teórico-metodológicas para formação docente de profissionais do Ensino Religioso,
construindo uma perspectiva de consciência crítico-reflexivo, e rompendo assim com
certos preconceitos. Uma vez que o respeito a diversidade é um do ponto central
desse ensino, tendo em vista que a Educação Popular valoriza a multiculturalidade e a
interção e interligação desse multiculturalismo, no caso, a interculturalidade que esse
estudo busca contribuir no processo de ensino e aprendizagem do Ensino Religioso.
Primeiramente
esse
estudo
abordará
a
Educação
Popular
como
potencializador da construção de saberes da pessoa plena, em seguida faremos uma
discussão entre o Ensino Religioso na perspectiva da Educação Popular e por fim será
feita uma relação entre essas modalidades de ensino direcionadas nas concepções
das Ciências das Religiões que tem como proposta educativa a interação da
diversidade cultural, ou seja, a promoção da interculturalidade, essa proposta que
poderemos verifica na abordagem pedagógica e metodológica apresentada nesse
estudo.
Educação Popular: formação e construção de saberes do cidadão
Quando pensamos em Educação Popular remetemos que ela parte do princípio
de que, a mesma trata do que acontece na organização no meio popular e é
autodeterminada pelo sujeito dentro de um processo participativo. A base dessa
educação é a percepção da realidade voltada para toda forma de organização e
participação comunitária.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Para compreender a Educação Popular é preciso refletir primeiramente sobre:
o que é educação? E o que é popular? Conforme Brandão (1985) a educação é um
conhecimento que adquirimos ao longo do nosso cotidiano e no contato com a
sociedade. Ela pode se estabelece em qualquer espaço seja formal ou não formal de
maneira dinâmica e flexível em uma relação de troca de conhecimentos, podemos
observar em seus escritos:
Ninguém escapa da educação. Em casa, na rua, na igreja ou na
escola, de um modo ou de muitos, todos nós envolvemos pedaços da
vida com ela: para aprender, para ensinar, para aprender-e-ensinar.
Para saber,para fazer, para ser ou para conviver, todos os dias
misturamos a vida com a educação. Com uma ou com várias:
educação? Educações (BRANDÃO, 1985, p.7).
Em se tratando do questionamento do que é popular? Recorremos ao autor
Souza (1999), que ao se referir em popular relaciona aos movimentos sociais que são
oposições a qualquer relação em que nos coloquem em uma situação de dominação,
ou seja, é um campo de ação política e educativa que busca igualdade, justiça,
cidadania, democracia. De acordo com o autor, as áreas que dizem respeito à
Educação Popular e os seus sujeitos são:
Segmentos sociais explorados, oprimidos e subordinados, cujos
temas, quase sempre de maior incidência em suas vidas, em seu
cotidiano são: trabalho, habitação, alimentação, participação,
dignidade, paz, direitos humanos, meio ambiente, gênero, gerações,
etc. (p.38).
Nesse caso, quando pensamos em popular associamos a povo, identidade,
cultura, diversidade, comunidade entre outros, nesse entendimento, a visão em
relação à popular expressa significado específico no mundo em que é produzido. Uma
questão de utopia libertária, na tentativa de superação de exploração com participação
ativa voltada para os interesses de classes majoritárias. Conforme Neto (2012, p. 7677):
Educação popular expressa por um sistema aberto de ensino e
aprendizagem, constituído de uma teoria de conhecimento
referenciada
na realidade, com
metodologia
(pedagogia)
incentivadoras à participação e ao empoderamento das pessoas e
dos grupos, com conteúdos e técnicas de avaliação processual,
permeada de uma política estimuladora de transformações sociais e
orientada para à liberdade, á justiça, à igualdade e para a felicidade.
Objetivando levar os protagonistas constituintes desse meio a construção de
conhecimento, em que o respeito a si mesmo, a sua diversidade cultural, seus
saberes, dando-lhes voz ativa no processo de ensino-aprendizagem, de forma que
FONAPER
esse processo aconteça contextualizado, os respeitado enquanto tributários sociais
críticos-transformadores.
A Educação Popular, sendo uma teoria de conhecimento, sua metodologia
pedagógica “pode ter diferentes significados na medida em que as atividades a ela
atribuídas se orientam para os segmentos “populares” da coletividade, e sua condição
de classes, sendo as potencialidades transformadoras inerentes a essa condição”.
(BEISIEGEL, 1992, p.50).
Paulo Freire na década de 60 traz uma vertente de educação de extrema
importância para a camada menos favorecida, considerando que Paulo Freire não é
método, mas um sistema filosófico que pensa na valorização do outro. Para termos
uma visão ampla do que seja a sistematização do projeto de Freire podemos observar
no quadro7 abaixo:
QUADRO 1
PROJETO DE PAULO FREIRE
Área de interesse
A pessoa e o mundo
Objetivo geral
Transformar a pessoa e o mundo
- fazer ler e escrever;
Objetivos específicos
- conscientizar;
-dialogar (trocar com o outro)
Sujeitos
Todo mundo nessa abordagem é agente,
ou seja, sujeito que age e transforma.
Fonte: organizado pela a autora.
Como podemos observar no quadro elencado, todos os sujeitos para Freire são
agentes a partir da tomada de consciência da ampliação da visão de mundo préestabelecida os mesmos se tornam autores e transformadores da sua própria história.
O que é uma característica fundamental nessa educação é o fato de que Freire trouxe
a cultura para dentro da alfabetização. Assim podemos verificar na fala de Peroza
(2012):
A questão da cultura é um dos temas centrais contidos entre os
princípios da proposta político-pedagógica de Paulo Freire. Este
reconhece a cultura do seu povo como porta de entrada para iniciar
um diálogo significativo com a sua realidade, pois esta lhe permite
7
Quadro feito pela autora para sistematizar a concepção de educação do teórico Paulo Freire
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
captar a riqueza dos conhecimentos presentes do imaginário criativo
expressos na sua linguagem, muitas vezes sinônimos de
resistência2, bem como de subserviência, também culturalmente
elaborados como forma de resignação histórica para assegurar sua
sobrevivência diante da dominação cultural. A dialeticidade que deve
haver entre educação e cultura é a condição de possibilidade para
que o conhecimento, resultado da investigação que brota desta
relação, seja realmente significativo entre educandos e educadores.
Uma prática educativa que se queira democrática não pode ser
invasiva, sobrepor-se à realidade cultural em que está se dando. (P.
4).
A escola (formal e não formal), a qual o teórico aborda é uma escola que
proporcione o diálogo em que a pergunta e a escuta do outro é um fator principal da
sua abordagem, nessa escola é preciso que se faça o exercício da leitura e escrita,
reflexão e dialogo todos os dias na perspectiva da Educação Popular, uma vez que o
educador desse ensino deve ter características tais como: a mente clara e aberta;
olhos críticos; escutar depois ouvir; serem preocupados com a política, respeitar a
diversidades (religiosa, sexual, cultural, entre outros).
Educação Popular e Ensino Religioso: reflexões e implicações na construção de
conhecimentos de sujeitos reflexivos e participativos
A Educação Popular é tudo que acontece na organização no meio popular, é
autodeterminada pelos sujeitos dentro de um processo participativo objetivando levar
os protagonistas constituintes desse meio a construção de conhecimento, em que o
respeito a si mesmo, a sua diversidade cultural, seus saberes, dando-lhes voz ativa no
processo de ensino-aprendizagem,
de forma que esse processo aconteça
contextualizado, os respeitado enquanto tributários sociais críticos-transformadores.
A educação popular, ao longo da História do Brasil buscou e, ainda busca
substituir o discurso e práticas autoritárias por um ensino que proporcione uma
construção de saberes significativos que deem voz ativa para o educando. A partir da
década de 1960 a classe oprimida começou a tomar voz em clamor à mudança na
linguagem freiriana, construindo uma tomada de consciência política, teórica e
filosófica nesses indivíduos.
A Educação Popular trabalha com o “nós” e não com o “eu”, tendo como ponto
de partida a realidade desses sujeitos, que é de suma importância nos processos de
libertação dos mesmos e da sociedade. Para Vasconcelos (2004, p. 72):
Educação Popular é o saber que orienta nos difíceis caminhos,
cheios de armadilhas, da ação pedagógica voltada para a apuração
do sentir/pensar/agir dos setores subalternos para a construção de
uma sociedade fundada na solidariedade, justiça e participação de
todos.
FONAPER
De acordo com o autor, essa educação busca uma construção de saberes
cotidianos e científicos, uma aprendizagem que contribua no desenvolvimento
participativo, ativo, transformador do sujeito, uma educação que, respeita e valoriza o
“outro” como parte integrante de um contexto de práticas sociais. Essa educação visa
conquistar a cidadania plena em que a camada popular seja ouvida e considerada, de
forma que construa sua própria cultura, através de práticas emancipatórias dentro de
um movimento, é, portanto, uma luta coletiva de transformação social. Sendo assim,
segundo Guiso (1991, p.32) a Educação Popular:
[...] tem a responsabilidade de construir um processo pedagógico que
recupere o saber popular, contribuindo para a construção,
apropriação e aplicação de conhecimentos que respondam, com
pertinência e eficácia, às necessidades de vida rumo à participação
sociocultural e política dos sujeitos envolvidos.
A Educação Popular busca uma formação cidadã, ela é comportamental e luta
pelo respeito e igualdade de todos em diversos seguimentos, convergindo com o
Estado e sociedade, uma vez que, ela tem bases políticas e libertadoras. A Educação
Popular, sendo uma teoria de conhecimento sua metodologia pedagógica. É nesse
sentido que o Ensino Religioso insere-se na Educação Popular em uma perspectiva de
formação do/a educando/a proposto por essa educação.
Levando em consideração que o Ensino Religioso é parte integrante da
educação popular, que busca a formação de educandos autônomos, com
valores perdidos ao longo do processo de construção social, “O Ensino
Religioso escolar é uma questão de educação para a cidadania plena;
sustenta-se sobre pressupostos educacionais e não sobre argumentações
religiosas [...]” (PASSOS, 2007 p. 70). Assim, a religião é uma questão que
precisa ser contemplada nas escolas formais ou informais de forma que
valorize todas as religiões dentro de um contexto que leve em consideração a
cultura, história e sociedade. Nesse sentido podemos observar que:
A educação assenta-se sobre pressupostos e valores que incluem a
dimensão religiosa do ser humano, enquanto o Ensino Religioso fica
posto como um meio de educação da religiosidade em si mesma,
finalidade que permite chegar a uma visão integral do ser humano e a
fundamentar sua atuação ética na história. Em suma, o sujeito ético
pressupõe o sujeito religioso. Esse modelo parece concretizar
perfeitamente a ideia de educação religiosa ou da religiosidade dos
sujeitos como uma necessidade para a formação geral escolar.
(PASSOS, 2007, p. 63).
Nessa perspectiva entendemos que o Ensino Religioso é um grande
contribuidor para a formação plena do/a educando/a, que visa a sua forma de observar
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
e compreender o mundo que o/a cerca, essa é uma característica importante do
Ensino Religioso que é o de valorizar experiências e saberes dos/as educandos/as
potencializando a formação integral do ser, para isso requer práticas pedagógicas e
postura ética de profissionais que direcionem suas metodologias voltadas para a
inclusão de componentes curriculares que contemple as diversidades religiosas sem
proselitismo.
Abordagem Metodológica e Pedagógica das Ciências das Religiões no Ensino
Religioso em uma perspectiva de Educação Popular
A ciência da Religião como é uma área complexa, atual e que vem sendo
bastante debatida, devido a sua nomenclatura e por ela ser extraída da Teologia a
torna muito polêmica, há discursos que apontam essa separação como algo sem
pertinência, pois ambas se relacionam. Conforme Hock (2010, p. 10) em relação à
Teologia e a Ciência da Religião e que:
A primeira ciência te seu ponto de partida na fé e dirige sua atenção à
palavra de Deus, a segunda trabalha com todas as outras ciências
humanas. De acordo com o interesse ou com uma questão de
pesquisa específica pode haver uma cooperação pontual, ou que,
porém, não muda nada de fato de que a Teologia e a Ciência da
religião têm uma orientação fundamentalmente distintas. Adeptos
desse modelo encontram-se principalmente entre os adeptos da
Teologia Dialética e das vertentes teológicas por eles influenciadas.
O que podemos perceber é que tanto a teologia como a ciência da religião são
áreas que podem ser trabalhadas juntas e auxiliar a pesquisa com um olhar crítico e
reflexivo assim podemos dizer segundo Teixeira (2001, p. 279) é “o que define a
pertinência de uma disciplina é o seu objeto de estudo”. Neste caso, o dialogo entre
ambas é de suma importância que conciliem visões e que tenha o entendimento que a
religião é um fenômeno multifacetado.
Diante disso o Ensino Religioso torna um desafio para quem não tem a
compreensão de relacionar a Teologia com a Ciência da Religião, assim muitos
professores dessa área acaba cometendo o proselitismo, indo contra o verdadeiro
sentido do que é Ensino Religioso, essa disciplina requer uma formação sólida e
contínua, que haja reflexões constantes sobre a prática cotidiana, buscando assim,
sempre driblar as implicações e os desafios encontrados acerca dessa modalidade.
Com essa proposta de formação de profissionais do Ensino Religioso nessa
perspectiva de Educação Popular, uma vez que o mesmo consideramos como parte
integrante e especificidade dessa educação, podemos nos remeter nesse estudo
abordagem pedagógica, trazendo a reflexão de uma educação voltada para a o
FONAPER
multiculturalismo e a promoção da interculturalidade, uma vez que a sociedade que
vivemos exclui o que é diferente da grande maioria, gerando o preconceito dos que
são considerados inferiores, no caso, os negros fazem parte desse cenário de
exclusão social como já vimos ao longo desse trabalho, essa educação
multiculturalismo tem o intuito de mostrar a diversidade cultural existentes no nosso
contexto. Entendendo por multiculturalismo, conforme Gonçalves & Silva (2003, p.
111):
O multiculturalismo é o jogo das diferen-ças, cujas regras são
definidas nas lutas sociais por atores que, por uma razão ou outra,
experimentam o gosto amargo da discriminação e do preconceito no
interior das sociedades em que vivem [...]. Isto significa dizer que é
muito difícil, se não impossível, compreender as regras desse jogo,
se explicar os contextos sócio-históricos nos quais os sujeitos agem,
o sentido de interferir na política de significados em torno da qual dão
inteligibilidade as suas próprias experiências, construindo-se
enquanto atores.
Nesse sentido, o multiculturalismo no âmbito educacional é um importante para
compreendermos o onde estamos inseridos e direcionar um olhar voltado para o
contexto das relações sociais de poder que regem a nossa sociedade. Mas o
educando ao perceber essas questões se tornam capazes de atuarem e agirem nessa
realidade. Essa pequena introdução a respeito do multiculturalismo foi apenas para
fortalecer o debate metodológico como estratégia promotora da interculturalidade,
conforme Candau (2008, p. 52):
A perspectiva intercultural que defendo quer promover uma educação
para o reconhecimento do “outro”, para o diálogo entre os diferentes
grupos sociais e culturais. Uma educação para a negociação cultural,
que enfrenta os conflitos provocados entre assimetria de poder entre
os diferentes grupos socioculturais nas nossas sociedades e é capaz
de favorecer a construção de um projeto em comum, pelo qual as
diferenças sejam dialeticamente integradas. A perspectiva
intercultural esta orientada à construção de uma sociedade
democrática, plural, humana, que articule políticas de igualdade com
políticas de identidade.
É nessa perspectiva de uma educação que promova o reconhecimento, o
respeito e a interação da diversidade cultural existente em nossa sociedade é que
iremos apresentar, uma proposta educativa que visa a importância da abordagem
multicultural e a interação da mesma para compreendermos, reconhecer e respeitar as
representações culturais do nosso contexto educacional, e o/a educando/a enquanto
pessoa pensante e atuante a partir de um meio não reconhece o diverso, possa
transformar
criticamente
essa
realidade
vivenciada,
que
é
excludente
e
discriminatórias as diversidades culturais religiosas consideradas minoritárias .
Em uma perspectiva freiriana podemos começar a falar sobre as religiões a
partir do tema gerador. E em uma relação dialógica propondo expor o entendimento de
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
cada um a respeito das religiões existentes em nosso contexto social. Conforme Freire
(2004, p. 122), a respeito do tema gerador diz que:
Em verdade, o conceito de “tema gerador” não é uma criação
arbitrária, ou uma hipótese de trabalho que deva ser comprovada. Se
o “tema gerador” fosse uma hipótese que devesse ser comprovada, a
investigação, primeiramente, não seria em torno dele, mas de sua
existência ou não.
A abordagem dialógica é fundamental para essa perspectiva, ou seja, o
educador de Ensino Religioso deve proporcionar uma relação de diálogo com os
educandos, para que o mesmo possa perceber a visão de mundo que eles trazem
consigo. Em roda de conversas o educador passa a perceber a concepção de cada
um a respeito das religiões afro-brasileiras, podendo assim, refletir e planejar de forma
que supra as necessidades apontadas nesse diálogo no sentido de humanização.
E que é o diálogo? É uma relação horizontal de A com B. Nasce de
uma matriz crítica e gera criticidade (Jaspers). Nutre-se do amor, da
humildade, da esperança, da fé, da confiança. Por isso, só o diálogo
comunica. E quando os dois pólos do diálogo se ligam assim, com
amor, com esperança, com fé um no outro, se fazem críticos na
busca de algo. Instala-se então, uma relação de simpatia entre
ambos. Só aí há comunicação (FREIRE, 1994, p.115).
É nessa perspectiva que o diálogo s fortalece no tema abordado, como uma
troca de conhecimento ele permite gerar novos conhecimentos e/ou rever os
conhecimentos (pré) estabelecidos. Assim esse diálogo permite aos educandos agir e
transformar o mundo, nesse sentido através do diálogo perceber que a imagem que é
imposta pela sociedade a respeito das diversas religiões existentes.
É de suma importância a promoção de um diálogo inter-religioso com os
demais membros da escola e com a comunidade, poderia ser pensada em construir
um evento semanal que pudesse levar diversos representantes de várias religiões
para que cada um possa expor sobre sua religião, mostrando que cada uma tem suas
doutrinas, crenças e que merece o respeito de todos.
Outra abordagem importante para facilitar o trabalho acerca dessa questão são
as atividades lúdicas, tendo em vista que esse recurso metodológico é importante
facilitador na construção do conhecimento, e constrição da percepção do mundo que o
cerca, como também contribui para a construção da identidade dos educandos, no
sentido de contribuir para e aceitação de si mesmo e do outro, percebendo o diverso,
facilita o entendimento que o outro é parte integrante e importante para a construção
de sociedade que estamos inseridos, onde o respeito é necessário para a interação, a
convivência e a aceitação com os demais. Para Almeida (1998, p. 31-32).
A educação lúdica integra uma teoria profunda e uma prática atuante
[...] seus objetivos enfatizam a libertação das relações pessoais
passivas, técnicas para relações reflexivas, criadoras, inteligentes,
FONAPER
socializadoras [...] sem perder o caráter de prazer, de satisfação
individual e modificador da sociedade.
As atividades lúdicas podem fortalece o autoconhecimento e a percepção do
outro como diferente do mesmo. Contudo promove a reflexão e o respeito das
particularidades de cada um, nesse caso desperta nos educandos a curiosidade em
conhecer o outro em seus diversos aspectos, inclusive religioso.
Em um contexto plural o diálogo é fundamental nessa perspectiva de interreligiosidade. É nessa perspectiva que esses levantamentos servem para nortear a
proposta pedagógica dos educadores dessa área, no sentido de abordar temas
emergentes no Ensino Religioso que precisa ser trabalhados nas escolas, de forma
contextualizada acerca das diversidades religiosas.
Considerações
O Ensino Religioso como área de conhecimento que parte do principio do
respeito à diversidade religiosa, que possa contemplar as necessidades específicas de
cada realidade, formando educandos reflexivos e críticos que reconheça o outro e
estimula a construção do pensamento humano o respeito a multiculturalidade em
busca da promoção da interculturalidade.
Em um contexto plural o diálogo é fundamental nessa perspectiva de interreligiosidade. É nessa perspectiva que esses levantamentos servem para nortear a
proposta pedagógica dos educadores dessa área. Esse diálogo vem para fortalecer o
respeito às diversidades religiosas no contexto das relações sociais no âmbito
educacional. Fazendo com que possamos refletir da importância que o Ensino
Religioso tem para a interligação das diversas culturas existentes no contexto das
relações sociais em que vivemos.
Diante do exposto podemos perceber, portanto, que há uma necessidade de
inclusão de uma proposta metodológica e pedagógica no Ensino Religioso que
contemplem e promovam o dialogo inter - religioso e intercultural proposta pelas
ciências das religiões em uma perspectiva de educação popular, pois essa educação
visa a formação de pessoas tolerantes que respeita e valoriza o/a outro/a como
diferente em sua plenitude e inclusive nas questões religiosas.
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2012.
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em:
http://www.ucs.br/etc/conferencias/index.php/anpedsul/9anpedsul/paper/viewFile/3183/
420%20. Acesso dia 30. Mar. 2014.
FONAPER
O ENSINO RELIGIOSO NA ESCOLA PÚBLICA: ALIENAÇÃO OU LIBERTAÇÃO?
Ocivaldo Lima Souza8
Denise Simões Rodrigues9
Resumo:
O artigo versa sobre o ensino religioso na escola pública com ênfase na ótica dos docentes e
alunos do ensino Fundamental. O objetivo deste estudo é analisar a forma sociopedagógica
deste tipo de ensino em uma instituição de ensino fundamental e médio, Laura Freire Falcão,
situada na cidade de Marituba/PA. Como referencial teórico para fundamentar o processo de
análise dos dados pesquisados empregou-se a abordagem do Holismo para se interpretar as
concepções e práticas dos sujeitos do processo educativo mencionados. Os resultados
alcançados evidenciam que, o ensino religioso, é ainda ministrado de uma forma catequética e
disciplinar, embora haja evidências de um pensamento crítico em busca de um ensino religioso
Holístico, intercultural e ecumênico, visando construir uma cultura de Paz Mundial.
Palavras-chave: Ensino Religioso. Escola Pública. Alienação. Libertação.
Introdução
Este artigo constitui um fragmento de uma pesquisa mais ampla que foi
realizada na Escola Pública Laura Freire Falcão, em Marituba/PA. Ela se teve entre
seus objetivos identificar, nos conteúdos e metodologia, mapear indícios de que o
Ensino Religioso se propunha à alienação ou libertação, dos destinatários diretamente
envolvidos, os alunos do Ensino Fundamental de 5ª a 8ª série ou 6º ao 9º ano. Afinal
oEnsino Religioso na escola pública é alienante ou libertador das consciências dos
sujeitos Sociais? Para isso buscou analisar os princípios básicos que fundamentam o
fundamentam e identificar as condições materiais de existência dos alunos elaborando
seu perfil identitário assim como dos docentesque atuam na escola mencionada. Entre
os elementos que compuseram o levantamento de dados destacamos itens sobre a
concepção de religiosidade dos sujeitos pesquisados, as práticas pedagógicas dos
docentes e procuramos desvelar se o Ensino Religioso ministrado é confessional,
catequético ou ecumênico, intercultural, transdisciplinar e libertador ou ao contrário
constitui um instrumento a serviço da alienação social.10
Fundamentação Teórica: o ensino religioso no discurso científico
8
Graduado em Ciências da Religião. Professor da Secretaria de Educação do Estado do Pará
(SEDUC). E-mail: [email protected]
9 Doutora em Sociologia. Docente do Programa de Pós-graduação em EducaçãoPPGED/UEPA. Líder do Grupo de Pesquisa Sociedade, Ciência e Ideologia (SOCID). E-mail:
[email protected]
10 A pesquisa integral subsidiou o Trabalho de Conclusão de Curso, sob o mesmo título,
apresentado por Ocivaldo Lima Sousa, em 2014, como requisito à obtenção do grau de
Licenciado Pleno em Ciências da Religião.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
A perspectiva teórica que oferece suporte deste estudo científico, é a
abordagem do Materialismo Histórico, linha de orientação que em relação aos demais
paradigmas,
acreditamos
ser
aquela
que
apresenta
maiores
possibilidades
epistemológica para se analisar criticamente a temática, na medida em que optamos
por esta temática de estudo, por uma análise qualitativa que se preocupasse
fundamentalmente com as raízes sócio- históricas do ensino religioso no Brasil.
Para facilitar o diálogo critico procurou-se estabelecer entre religião, Ensino
Religioso e educação tornou-se metodologicamente mais recomendável realizarmos
uma analise desta relação, e dos principais paradigmas clássicos e contemporâneos
e, durante esta analise, remetendo os prováveis leitores deste trabalho de conclusão
de curso, as fragilidades e contribuições de cada abordagem de modo a cientificá-los
das razões pelas quais preferimos optar pelo referencial do Materialismo
Históricoquenos orientou teoricamente neste estudo.
Os estudos marxistas sobre “religião” são historicamente datados e, ao mesmo
tempo, socialmente contextualizados. Não há entre os fundadores do Materialismo
histórico (MARX; ENGELS) a formulação de uma teoria da religião em geral.
As obras marxianas que mais discutem a problemática da religião são
fundamentalmente três, sou seja, “A Questão Judaica” (1843); “A introdução àCrítica
da Filosofia do Direito de Hegel” (1844) e “O Cristianismo Primitivo” (1894/95).
A análise marxiana nos revela que a religião transmitida pelo ensino religioso
na sociedade atual, não é neutra, ou seja, não corresponde a um valor em si mesmo,
mas atende a interesses da sociedade capitalista da qual faz parte. Assim, quando
Marx(1969), expressou a célebre frase de “a religião é ópio do povo”, estava se
referindo criticamente às teologias Católicas e Protestantes no contexto social e
histórico da Prússia de 1844, que na época, utilizavam seus dogmas e preceitos
religiosos para alienar as massas exploradas da sociedade prussiana. Enganam-se,
pois, aqueles que pensam de formas equivocada, que o marxismo é incompatível com
a religião. Na verdade, o diagnóstico marxiano sobre religião na antiga Prússia,
evidencia a dimensão alienante da religião na Alemanha da época e, portanto não
poderia melhor expressar essa alienação religiosa como na comparação que
estabeleceu com o principio ativo extraído da “papoula” (ópio), cujos efeitos
alucinógenos
agem
no
organismo humano através
de uma sintomatologia
entorpecente e de dependência “química”. Pois bem, era o que realmente acontecia
na relação da Sociedade prussiana com a religião naquele momento histórico.
FONAPER
Isto não significa dizer que existia uma negação absoluta entre o marxismo e a
religião. Marx analisou criticamente a relação espúria, porém real entre a religião e o
capitalismo germânico, ainda incipiente naquele momento histórico da Alemanha.
Assim, para Marx (1986), “a religião é o suspiro da criatura oprimida, o coração
de um mundo sem coração”. É a expressão da miséria real do mundo e o próprio
protesto do homem contra a sua situação histórica, num mundo totalmente
mergulhado no processo de acumulação ampliada do grande capital.
Analisando a religião em seu duplo caráter, o fundador do Materialismo
Histórico enfatizou que:
A angústia religiosa é, ao mesmo tempo e expressão da angústia real
é o protesto contra essa angústia real. A religião é o suspiro da
criatura oprimida; o coração de um mundo sem coração; assim como
é o espírito de uma situação sem espiritualidade. Ela é o ópio do povo
(MARX, 1969, p. 106).
Os motivos sociais das crenças e práticas religiosas, o modo real como essas
crenças e práticas se organizam e se desenvolvem; assim como os efeitos concretos
que tais crenças e prática têm, sobre a sociedade, tudo isso, permanece geralmente
oculto para a maioria dos crentes alienados pelo superpoder de um “ente” abstrato que
criaram sem perceber, abdicando de seu poder coletivo real a um “Deus” todopoderoso que insistem em acreditar. Em seu lugar, o crente e sua instituição religiosa
tendem dialeticamente a produzir explicações que reforçam essa oclusão da dimensão
histórico-social de suas próprias crenças e práticas religiosas.
Como um fato social, afirma Marx (Op. Cit.), “a religião não faz o homem, mas
ao contrário, o homem é que faz a religião”. Diante desta constatação, este autor em
sua célebre obra “Introdução a crítica da Filosofiado Direito de Hegel” (1844), afirmou
a necessidade de uma análise das condições e das relações sociais que tornavam as
religiões como indispensáveis à humanidade. Todavia, este autor também afirmou que
a religião em todas as sociedades Capitalistas apareça como um instrumento
opressor, isto é alienador e ideologizador a serviço da ordem social dominante;
constitui também uma ação de libertação dos oprimidos, como no caso da América
Latina, que através de uma religião nova baseada da Teologia da Libertação, luta em
favor das classes pobres e socialmente desfavorecidas.
Como se pode concluir pelos escritos de Marx(1982) não se trata de ser contra
ou favor do ensino religioso nas Escolas Públicas, pois esta é uma falsa questão e
profundamente simplificadora do real, pois segundo o fundador do Marxismo, o Estado
pode se propõe como separado da religião e, até mesmo se autodesignar-se como um
Estado Ateu e, ainda assim, sua sociedade, ou seja, o seu povo ser “visceralmente”
religioso.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Desse modo, enfatiza Marxse a religião é uma linguagem que tem o poder de
penetrar mais facilmente na estrutura ideológica de uma determinada sociedade,
historicamente contextualizada, como no caso da América Latina, especialmente no
Brasil, que foi colonizado por povos católicos, cabe aos nossos intelectuais e, em
especial aos professores questionarem a ideologia castradora das religiões
conservadoras, e através de um contra-discurso, ou seja, da ação de uma nova
religião, de uma religião libertadora lutar junto com as classes subalternas para a
emancipação do povo brasileiro e, de toda a humanidade, mediada agora, por um
“Deus” coletivo libertador.
Nesse sentido, invertendo-se o discurso e a ação da religião alienante, o
ensinoreligioso poderá sim, de forma afirmativa servir de tese antitética para que,
coletivamente, passamos superar todas as formas sociais de alienação humana, e
juntos construirmos a síntese de uma utopia social do possível, ou seja, uma
sociedade nova, utilizando a nova religião como um processo transformador de uma
sociedade politicamente mais justa, mais solidária e, mais humanizada.
Como se pode concluir, no que concerne a Educação, nem Marx e nem Engels
aludiram o término do Ensino Religioso na escola pública, mas de se superar a forma
alienante como é ministrado e, essa superação só pode ser realizada pelos sujeitos do
próprio ensino religioso, desmistificando suas contradições e desenvolvendo suas
novas possibilidades libertadoras.
No interior da concepção materialista histórica da religião em sua relação com
a sociedade se sobressaem as análises de Gramsci (1991), constantes de seus
“Cadernos do Cárcere”, que procurou compreender o papel da Igreja Católica durante
a sua trajetória histórica, a partir do surgimento do Cristianismo primitivo, ressaltando o
seu apogeu como Cristianismo Católico durante a idade média até a sua fase de
decadência na sociedade contemporânea, assim como a sua penetração na ideologia
das massas populares.
Segundo Gramsci o peso da religião é significativo em momentos históricos
determinados. Ela pode se apresentar como força aglutinadora das massas oprimidas
enquanto força criadora de uma “vontade coletiva”, ou seja, enquanto uma concepção
ativa do mundo, ou como uma força alienadora das massas populares, por isso,
especialmente sob esta segunda perspectiva, deve-se lutar pela superação, em prol
da filosofia da práxis. Todavia, enfatiza Gramsci (1991), muito embora a religião seja
uma forma de ideologia, onde muitos de seus componentes já sedimentados estão
introjetados no senso-comum, sobretudo em sua dimensão tradicional, procedente de
uma ordem social pretérita, não é possível se decretar a sua extinção, em virtude de
FONAPER
corresponder uma simples expressão do fatalismo e alienação das massas oprimidas.
Tal pretensão é impossível, pois, o fenômeno religioso é permanente e, como tal,
possui um caráter politicamente contraditório e ambíguo comportando um conjunto de
traços conflituosos “cheios” de contradições.
Para o filósofo italiano, a religião se caracteriza por sua heterogeneidade
ideológica e social, portanto não é um conjunto ideológico homogêneo, mas
subdividido internamente em várias sub-religiões, por isso enfatiza que:
Toda religião, inclusive a Católica na realidade uma multidão de
religiões distintas e frequentemente contraditórias. Assim, há um
catolicismo dos camponeses, um catolicismo dos pequenosburgueses, um catolicismo das mulheres e um catolicismo dos
intelectuais, também este variado e desconexo (GRAMSCI, 1991, p.
12).
Dessa forma, esta heterogeneidade, segundo Gramsci (Op. Cit.), explica o
porque no interior de uma religião se pode distinguir uma “filosofia” (a filosofia Cristã),
um folclore (os movimentos messiânicos) e um “senso-comum” (uma religião do povo).
Conforme enfatiza o filósofo: “obre o senso- comum, influem não só as formas mais
toscas e menos elaboradas dos vários catolicismos, como influíram também as
religiões precedentes e as formas do atual Catolicismo; os movimentos heréticos
populares e as superstições ligadas as religiões passadas” (GRAMSCI, 1991, p.14).
Gramsci se interessa, sobretudo pela norma de conduta que corresponde a
cada religião. Deste ponto de vista, como a religião é produto e processo histórico das
contradições do mundo social pode conduzir atitudes totalmente opostas, podendo
comportar tanto uma atitude ativa e progressista como a do Cristianismo Primitivo ou
do Protestantismo da Reforma, como uma atitude passiva e conservadora,
exemplificado pelo Cristianismo jesuitizado durante a Idade média.
Em Gramsci, a religião é uma forma especificamente histórica de “ideologia”,
que tanto pode desempenhar, como nos primórdios do Cristianismo, um papel
revolucionário, fornecendo às classes populares uma base ideológica para uma ação
prática transformadora, como também um papel conservador, tradicional, a exemplo
do Catolicismo dogmático, transformado em simples opiáceo oferecido às massas.
Assim, neste estudo o referencial teórico do Materialismo histórico,
especialmente na tendência gramsciana servirá como fio condutor do processo de
análise desta pesquisa, particularmente no que concerne a sua questão central e
objetivos
específicos,
cuja
análise
e
interpretação
dos
resultados
objetiva
fundamentalmente elucidar do ponto de vista materialista histórico, se o ensino
religioso, tal como é atualmente é ministrado é alienador ou libertador das
consciências dos sujeitos sociais envolvidas no processo educativo.
Definição dos Conceitos Básicos:
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
a)
O Ensino Religioso Escolar: corresponde a parte diversificada do
currículo do Ensino Fundamental, onde estão inseridos em seus conteúdos,
eixos que fazem parte do conhecimento humano, como por exemplo: cultura
religiosa, tradições religiosas, escrituras sagradas, ethos, ritos e teologias. O
Brasil pela sua própria formação cultural possui uma diversidade ambiental e
cultural, especialmente na sua religiosidade. Assim, é um país plural e como
tal, seus educadores devem ministrar no seu conteúdo um ensino religioso que
atenda ao pluralismo de tal sociedade. Uma vez que, não cabe à escola educar
para dogmas ou para doutrinas religiosas e sim formar cidadãos para uma
atitude de solidariedade e respeito à alteridade, aceitando a sua religião.
b)
Escola Pública: corresponde a instituição de ensino implantada pelas
políticas públicas governamentais. Do ponto de vista constitucional essas
instituições educacionais devem prover um ensino básico gratuito às crianças e
jovens que não possuem possibilidades de se escolarizar na rede de ensino
privada;
c)
Aluno: o aluno do Ensino Religioso na Escola analisada. Na
perspectiva holística, da tendência Eco-Socialista Marxista, se exige a análise
dos oprimidos e explorados de uma determinada sociedade, despertando nos
alunos uma atitude prática de luta em favor de seus direitos e contra um
sistema de exclusão e opressão em sua atual conjuntura;
d)
Professores: docentes do Ensino Fundamental que lecionam as
disciplinas do referido currículo. Em geral trata-se de Licenciado Pleno na área
de conhecimento, da qual faz parte a disciplina que lecionam, sobretudo nas
últimas séries do Ensino Fundamental e Médio das Escolas da rede de ensino
público.
e)
Alienação: corresponde a um processo ideologizador, ou seja, se o
ensino religioso na Escola pesquisada ministra um ensino alienador, ou seja,
catequético e não ecumênico, cujo objetivo é formatar “rebanho” e não
pastores-transformadores da sociedade;
f)
Libertação: ato ou efeito de libertar as consciências para transformar
no nosso estudo objetivamos investigar se o ensino religioso está efetivamente
servindo de ação cultural pedagógico para conscientizar professores e alunos
enquanto Sujeitos transformadores das estruturas dominantes da Sociedade
Capitalista.
O Ensino Religioso na Escola Pública: opiniões de alunos e professores
FONAPER
Caracterização Identitária dos Alunos enquanto sujeitos da informação:
Conforme o gráfico n°01 abaixo, se verificou que do total da amostra dos
alunos pesquisados (106), 41/% são da 6ª série do Ensino Fundamental, contra 11%
que são da 7ª série desde nível de ensino.
Analisando-se mais detalhadamente dos dados do gráfico mencionado se
constata que 35% estão matriculados na 5ª série e 13% na oitava série do Ensino
Fundamental.
Os dados revelam uma ampla evasão escolar, mas a situação já é considerada
um pequeno avanço em relação ao passado, posto que segundo dados do IBGE/1970
o índice das perdas era de quase 80%, ou seja, do total de alunos que ingressavam no
Ensino Fundamental na Escola Pública apenas 20% concluíram esta nível de Ensino.
Com relação a variável da amostra pesquisada se verifica pelo mesmo gráfico
em análise que 67% são do sexo feminino contra 33% que são do seco masculino.
Este dado nos revela que existe uma maioria de mulheres matriculadas na Escola
Pública em virtude do índice de repetência e evasão escolar se apresentam maior
entre os alunos do sexo masculino. Este dado parece denotar que o crescimento das
mulheres matriculados na Escola Pública, além de sua maior aplicação nos estudos
explica em parte a sua permanência maior na Escola, fato que também revela ser este
grupo aquele que representa maior incidência dos alunos matriculados no ensino
religioso.
No que diz respeito a faixa etária dos alunos, se observa ainda pelo mesmo
gráfico que, 23% da amostra dos alunos pesquisados, tem a idade de 12 anos de
idade.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Procedendo-se a análise desagregada dos dados desse gráfico, observa-se
que 18% da amostra pesquisada têm entre 10 a 11 anos de idade enquanto 21%
estão da idade limite de termino do Ensino Fundamental que é de 14 anos de idade.
Por outro lado, um percentual bastante significativo, ou seja, 22% já atingiram a idade
de 15 anos e mais, o que revela uma distorção idade/série de certa forma, bastante
elevada, somente explicável pelo tardio ingresso dos alunos na Escola, bem como o
elevado índice de evasão e repetência escolar registrados na escola pública com
relação a variável origem dos alunos matriculados no ensino Fundamental na escola
pública, se constata pelo gráfico em analise que 79% dos alunos são oriundos da
Capital contra apenas o grupo que é procedente da zona rural.
Conforme Marx (1977) enfatizou, este dado nos revela que na sociedade
capitalista há uma dominação da cidade, considerada sede administrativa e política
das relações sociais em detrimento das áreas interioranas e rurais, que, portanto uma
adequação curricular para atender as necessidades dos muito embora sejam núcleos
de abastecimento dos grandes centros urbanos, são nas formações sociais
capitalistas, como no caso da sociedade brasileira, áreas consideradas como
inferiores e subdesenvolvidas, razão pela qual, mesmo no campo educacional as
escolas públicas que são em número muito maior que as existentes nas áreas rurais e
interioranas, atendem em maior número as pessoas da cidade, até porque na
Amazônia as populações interioranas e rurais são pobres e vivem em condições
precárias de vida, o que dificulta a sua vinda para as grandes cidades em busca dos
serviços públicos na área da educação.
Existe uma grande diferenciação interna no interior das crenças, por isso se
pode observar que o curriculum Escolar do Ensino Fundamental em suas diversas
áreas de conhecimento não atende a realidade social das áreas interioranas e rurais
da Amazônia e, de um modo geral do Brasil. Seria correto aceitar as palavras de
Gramsci, quando afirma que há vários catolicismos e não apenas um. Há catolicismo
das classes superiores, o catolicismo dos pobres: o catolicismo dos intelectuais; o
catolicismo das mulheres: o catolicismo das cidades e; o catolicismo das áreas rurais
(GRAMSCI, 1992, p.23).
De acordo com o gráfico N°02, sobre as condições sociais dos alunos
enquanto sujeitos da informação desta pesquisa, constatamos que 49% da amostra
possuem uma estrutura familiar, cujos Paes possuem uma união estável contra
apenas 20% onde os pais são casados legalmente. Por outro lado, 31% das famílias
desses alunos são compostas de Paes separados.
FONAPER
Estes dados nos demonstram que 80% das famílias dos alunos pesquisados
não possuem uma estrutura familiar legalmente constituída, fato que reflete
profundamente na concepção dessas famílias, uma vez que a maioria das religiões
professadas por estes alunos se fundamentam no Cristianismo, como nos casos das
religiões Católica e Evangélicas, cujos os preceitos pregam o matrimônio legalmente
constituído e consideram os não-casados
em pecado, na medida em que esses
grupos domésticos não estão se espelhando na estrutura da “Sagrada Família”. Como
se observa há já aqui uma contradição que é bastante refletido no ensino religioso
ministrado pela escola pública, onde há uma prevalência de um ensino fundamentado
no Cristianismo, especialmente nos estudos do Catolicismo e nos ensinamentos da
Bíblia.
Com relação a composição familiar dos alunos pesquisados se constata pelo
gráfico em analise que 42% da amostra pesquisada moram só com a mãe contra 9%
que moram apenas com o pai. Na medida em que os dados analisados nos revelam
que 62% da amostra pesquisada são representadas por outro tipo de família ou seja,
aquelas chefiadas por mulheres 38%; aquelas chefiadas só pelo pai (9%), e aquelas
chefiadas por outros parentes dos alunos, principalmente pelos avós e tias. Nesse
caso consideramos que o ensino religioso ministrado pela escola ao enfatizar a
necessidade de uma família completa fundamentada no modelo previsto pela religião,
deixa de fora a diversidade familiar existente na contemporaneidade.
No que diz respeito a renda familiar dos alunos pesquisados se verifica no
gráfico mencionado que 67% da amostra pesquisada possuem uma renda familiar
entre 01 a 03 salários mínimos contra apenas 2% que possuem de 11 a mais salários
mínimos, como renda familiar mensal. Esses dados sobre renda familiar revelam
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
também que 16% das famílias desses alunos sobrevivem com uma renda mensal de
apenas zero a R$ 70,00 por mês; 8% possuem uma renda familiar de 4 a 7 salários
mínimos; finalmente 7% possuem uma renda mensal de 08 a 10 salários mínimos.
Uma reflexão crítica mais profunda sobre estes dados nos mostra que cerca de
80% dessas famílias são pobres e sobrevivem em precárias condições de vida. Além
disso, desse percentual uma parcela bastante representativa (16%) estão sob uma
situação de miserabilidade extrema, sobrevivendo abaixo da linha de pobreza.
Com base nos dados analisados no gráfico mencionado, concluímos este
tópico, considerando a situação de pobreza material de existência dos alunos
pesquisados, diversos fenômenos sociais, na medida em que a sua luta diária para
suprir suas necessidades de subsistência os induzem a um processo de alienação
social,
razão pela qual o nível de sua consciência ingênua limitada politicamente
apresenta-se com grandes dificuldades de enxergar, (razão pela qual já se imagina,
suas parcas condições sociais de vida), e alcançar uma consciência amplamente
politizada e crítica sobre o ensino religioso ofertado pela sua escola.
Concepções de Ensino Religioso dos Alunos Pesquisados
Analisando-se mais detalhadamente o referido gráfico se verifica que para 5%
dos alunos pesquisados o Ensino Religioso contribui para que as pessoas esqueçam
os problemas sociais e passem a dar, mas atenção a si própria em sua relação com
Deus. Por outro lado, 16% dos alunos pesquisados consideram que o Ensino
Religioso ministra aulas sobre as várias culturas religiosas. Convém ressaltar que,
uma análise mais aprofundada do gráfico mencionado observa ainda que para alguns
alunos pesquisados (5%), o ensino religioso nos aliena dos problemas sociais, muito
FONAPER
embora felizmente para outros (16%) este tipo de ensino ministra aulas se
preocupando com a diversidade religiosa.
Como se pode concluir neste tópico não existe uma única concepção de
Ensino Religioso na perspectiva dos alunos pesquisados, mais várias, entretanto a
que mais se sobressai é aquela que considera que o ensino religioso ministra aulas
sobre religião. Nenhuma, entretanto, das concepções apresentadas se reportou sobre
que é o ensino religioso, segundo o FONAPER, deve enfatizar o estudo científico do
fenômeno religioso, sem proselitismos, mas enfatizando um ensino que deve contribuir
no processo de conscientização crítica e formação do cidadão enquanto sujeitos
politizados, sujeitos de suas destinações históricas, conforme a perspectiva
gramsciana e o próprio educador brasileiro Paulo Freire(1970), ratificou em sua
concepção de educação enquanto uma prática de liberdade.
Práticas Pedagógicas de Ensino Religioso na Escola Pública
Analisando-se o gráfico acima sobre as práticas pedagógicas, constata-se que 22%
dos alunos disseram que as práticas pedagógicas aplicadas no ensino religioso dão
ênfase aos filmes sobre a cultura religiosa; outros alunos representando 20% dos
pesquisados, disseram que estas práticas são as sínteses sobre os temas religiosos
no quadro magnético com o apoio de textos teóricos sobre o assunto. Por outro lado,
14% dos alunos pesquisados mencionaram que essas práticas pedagógicas se
resumem as aulas teorias e expositivas; enquanto 10% dos alunos disseram que os
professores em suas práticas pedagógicas solicitam os trabalhos em grupo sobre
tópicos religiosos pesquisados via internet.
De todo modo, ainda que se observe a manutenção de algumas práticas pedagógicas
tradicionais, as práticas em atividades de pesquisas demonstra que o ensino religioso
na escola pública, pelo menos segundo os alunos pesquisados, está se renovando,
ainda que estas atividades ainda se concentrem sobre o estudo das religiões dos
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
povos, quando deveria focar no estudo do fenômeno religioso, visando fornecer
fundamentos teóricos e práticos para contribuir no processo de formação de cidadãos
críticos e atuantes.
Considerações Finais e Proposições Gerais
Com base nos argumentos acima se pode concluir que as várias concepções
de ensino religioso apresentadas pelos alunos pesquisados indicam que este tipo de
ensino ainda fornece elementos que contribuem muito mais com o processo de
alienação social do que propriamente com a conscientização crítica e política da
formação dos sujeitos-cidadãos, favorecendo mais a formação de rebanhos do que de
pastores, que poderiam através da ação cultural religiosa, lutar pelos seus direitos
sociais e pela construção de uma sociedade mais justa, fraterna e solidária.
O ensino religioso na escola pública, tomando-se por base os dados e as
informações analisadas na Escola Municipal de Ensino Fundamental “Laura Freire
Falcão”, se caracteriza por ser mais alienante do que libertador das consciências dos
sujeitos envolvidos no processo educativo. Embora tenhamos também encontrado
sinais visíveis de que este tipo de ensino esta passando atualmente por uma fase de
transição, na medida em que alguns sujeitos pesquisados já possuem alguma ideia
crítica do que este ensino deva ser socialmente e pedagogicamente transformador, em
direção de um ensino que, no futuro se comprometa com a luta dos oprimidos. Por
outro lado, esses sujeitos da pesquisa percebem que o ensino religioso enquanto um
estudo do fenômeno religioso em suas várias manifestações, pode servir enquanto
uma ação educativa politizadora para libertar e nunca para alienar sou seja,
contribuindo na formação de cidadãos politicamente emancipados e, ao mesmo
tampo, sujeitos de suas destinações históricas.
Assim, detectamos em nossos resultados que o Ensino Religioso tal como esta
sendo ministrado atualmente na escola pública, reflete as contradições sociais de uma
sociedade de classes, como a brasileira, ou seja, quer avançar para além do capital
como enfatizou Mezáros (2002), mas se rende às novas formas de transmutação do
capital e, acaba por aprisionar-se nas malhas de um capitalismo neoliberal.
Quanto aos princípios básicos que fundamentam o Ensino Religioso na escola pública
atual, constatamos que ainda que os Parâmetros Curriculares de acordo com a
proposta do FONAPER estipula que este tipo de ensino deve ser um ensinamento
sem proselitismo, inter-religioso, ecumênico e intercultural, na prática tais princípios
ainda não se efetivam em nível do real, por isso o ensino religioso é ainda
FONAPER
preconceituoso, discriminador, alienador, disciplinar no qual ainda há uma prevalência
de um estudo sobre as religiões, com a predominância da religião Católica, sobre tudo
da vertente mais conservadora, pois que no caso deste estudo, verificou-se que as
religiões de matrizes africanas e indígenas são ainda bastante desprezadas nas
atividades didáticas. Foi também observado que os professores do ensino religioso da
escola pesquisada, grande parte estão em processo de aposentadoria, a maioria
professa o catolicismo e, estão situados predominantemente na classe média média e
muitos deles ainda não possuem a Licenciatura Plena em Ciências da Religião.
Com relação as concepções de ensino religioso, os resultados nos apontaram
que não existe uma única visão sobre o ensino religioso entre os professores e alunos
pesquisados, mas várias, que de certa forma se relacionam entre si, na medida em
que afirmam em uma concepção disciplinar, restrita e alienadora, favorecendo um
estudo sobre religião com a prevalência do catolicismo.
Quanto às práticas didáticas há uma prevalência das aulas expositivas com
sínteses no quadro magnético, embora sejam também realizadas atividades de
pesquisa, vídeos-documentários, leitura de textos, desenhos sobre os assuntos
ligados as religiões do mundo, com prevalência das religiões cristãs.
De todo modo, tanto os alunos como os professores enquanto os sujeitos da
pesquisa deste estudo listaram sugestões para que se comtemple um ensino religioso
de qualidade, mas consentâneo com uma ação educativa libertadora.
Assim, as sugestões recomendadas pelos alunos foram:
1°- Aulas através de mostras de filmes sobre a diversidade cultural religiosa;
2°-Aulas-visitas monitoradas em espaços religiosos, tais como: Santuários,
Sinagogas e Terreiros;
3°- Ampliação de unidade programática relacionada a cultura religiosa de
matrizes africana e indígena;
4°- Palestras ecumênicas e interculturais;
5°- Atividades de pesquisa de campo em espaços religiosos reais;
6°- Aulas mais participativas e motivadoras, através de técnicas de dinâmicas
de grupo;
7°- Ampliação da carga horária do ensino religioso.
No que concerne às sugestões dos professores, as mais recomendadas foram:
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
1°- Aulas mais participativas com a presença das famílias, abordando os
valores universais da vida, tais como: a não violência, o respeito as diferenças,
a ética e o amor;
2°- Um ensino religioso sem proselitismo e não catequético e que valorize a
diversidade religiosa;
3º- Um Ensino ministrado de forma transparente com a liberdade de
questionamentos opiniões e escolhas;
4º- Um Ensino que não se transforme em um instrumento a serviço dos
interesses do capitalismo dominante, mas, uma ação educativa para libertar.
Nossas considerações finais estão abertas a reformulações e as críticas que se
fizeram necessárias para revitalizar e aprofundar o debate científico sobre o objeto
estudado. Esperamos que este trabalho possa contribuir na reflexão crítica dos
interessados em formular uma proposta de ação pedagógica que possa revolucionar
as bases tradicionais do ensino religioso alienador em prol de um ensino
transdisciplinar, que leve em consideração as condições materiais de existência dos
sujeitos sociais, com a finalidade de ousar um ensino novo, preocupado com a
libertação e a emancipação dos indivíduos.
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Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
DIVERSIDADE CULTURAL E RELIGIOSA NA EDUCAÇÃO: SUAS FACES E SEUS
SIGNIFICADOS NA FORMAÇÃO DO EDUCANDO
Rosângela da Silva Gomes - PUC-GOIÁS/FAPEAM11
Resumo
O presente texto procura situar os conteúdos do Ensino Religioso numa perspectiva
sócioantropológica,onde sua abordagem oportuniza aos estudantes da Educação
Básicaadquirem conhecimentossobre os aspectos do pluralismo cultural e religioso do
povobrasileiro. Isso porque, nas últimas décadas vem ocorrendo umaampla ressignificação dos
temas abordados por essa área de conhecimento direcionado a formação básica do cidadão.
Neste sentido, algumas questões-chave adquire configuração específica na Base Nacional
Comum que todos devem ter acesso, independentemente de sua opção religiosa, porém, em
sintonia com oprocessode ensino aprendizagem. Já que, os temas centrais do Ensino
Religioso remetem ao estudo do fenômeno religioso na história cultural da sociedade brasileira.
Palavras-chave: Ensino Religioso. Diversidade Religiosa. Educação Pública.
Introdução
Os esquemas que organizam o pensamento de
uma época somente se tornam inteiramente
compreensíveis se forem referidos ao sistema
escolar, o único capaz de consagrá-los e
constitui-los, pelo exercício, como hábitos de
pensamentos
comuns
a
toda
uma
geração(BOURDIEU, 2002, p.208).
Nos últimos anos o Sistema de Educação Nacional vem buscando aproximar
temas que abordam os aspectos sócio-histórico-cultuaisda formaçãodo povo
brasileiro.Essa realidade nos permite refletir sobre os conteúdos que fazem parte do
Ensino Religioso nas escolas públicas, significando dizer que esse ensino como
qualquer outro componente do currículo da Educação Básica tem a peculiaridade de
acompanhar as temáticas que buscam refletir sobre o conhecimento do campo
religioso, a promoção ao respeito à pluralidade culturalreligiosa que fazem parte do
contexto sócio histórico brasileiro.
A questão incide num ensino que deve comprometer-se com uma educação de
qualidade social e formação cidadã, igualmente, subtendido como um direito ao
conhecimento sobre as singularidades das tradições religiosas e asignificação que
cadareligião oferece como resposta ao sentido da vida na relação com o
Transcendente/imanente.
11
Doutoranda em Ciências da Religião - Pontifícia Universidade Católica de Goiás;
Pesquisadora da Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado do Amazonas - FAPEAM;
Grupo de Pesquisa: Religião Cultura e Sociedade. [email protected].
FONAPER
Denotando com isso, que o Ensino Religioso nas escolas públicas se
empenhano estudo e reflexões a partir da compreensão sobre a finitude humana, os
sofrimentos, a relação do bem e do mal como um fenômeno humano que acompanha
a história das tradições religiosas e culturais de toda humanidade.
Deste modo, o Ensino Religioso tem um aspecto formal que possibilita trazer
um referencial capaz de fundamentar ao aluno, para o enfrentamento nas questões
existenciais. Com prevenção e combate a eliminação de quaisquer manifestações de
intolerância e preconceito de origem religiosa, ououtras formas de discriminaçãoentre
as diferenças de crenças. Uma vez que, nas suas temáticas abre espaço para refletir
coletivamente sobre a questão do fenômeno religioso que faz parte da pluralidade
cultural da sociedade e, certamente se faz presente também na sala de aula.
Nesse sentido, as aulas devem contemplar o diálogo e a pesquisa de temas
como: sistemas simbólicos não coincidentes, ética, valores morais, sexualidade, o
sentido da vida e sua finitude, a relação dos indivíduos e grupos sociais com o
Transcendente ou Sagrado. Essas questões fazem parte das experiências
religiosasnas diversas tradições, as quais precisam ser apresentadas aos alunos de
forma adequada, sobretudo, no que se refere às formulações e concepções religiosas
sobre esses assuntos.
Portanto, em consonância com a legislação educacional nos estabelecimentos
de ensino público esse tema deve ser tratado como área de conhecimento que não
objetiva conduzir os alunos à adesão de uma determinada religião, todavia, procura
explicitar os modos de crenças e práticas que fazem parte das ideologias religiosas
com seu entorno (natureza, transcendências, alteridade), nasrelações que constituem
pontos centrais dos marcos histórico-sociais entre diferentes povos e civilizações.
O estudo da diversidade religiosa sinaliza esforços para além do domínio
confessional, como é previsto nas Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação
Básica (DCNs) n.04/201012; Resolução da Câmara de Educação Básica do Conselho
12
Parecer DCNs e Resolução CNE/CEB nº 4/2010. Reúnem princípios, fundamentos e
procedimentos definidos pelo Conselho Nacional de Educação, para orientar as políticas
públicas educacionais e a elaboração, implementação e avaliação das orientações
curriculares nacionais, das propostas curriculares dos Estados, do Distrito Federal, dos
Municípios e dos projetos político-pedagógicos das escolas. Art. 3º As Diretrizes Curriculares
Nacionais específicas para as etapas e modalidades da Educação Básica devem evidenciar o
seu papel de indicador de opções políticas, sociais, culturais, educacionais, e a função da
educação, na sua relação com um projeto de Nação, tendo como referência os objetivos
constitucionais, fundamentando-se na cidadania e na dignidade da pessoa, o que pressupõe
igualdade, liberdade, pluralidade, diversidade, respeito, justiça social, solidariedade e
sustentabilidade.Publicado no Diário Oficial da União, Brasília, 14 de julho de 2010, Seção 1,
p. 824.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Nacional de Educação (CEB/CNE) n.07/201013, assevera o texto que: “Serão fixados
conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar formação
básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais”.
Essas orientações normativas permitem perceber que a legislação educacional
brasileira ao logo do tempo vem se posicionando, de modo geral, a ampliar o
conhecimento e o respeito à diversidade cultural presente no Brasil.Logo essa
diversidade está acompanhada pela pluralidade das tradições religiosas da cultura
brasileira.
Deste modo, o conhecimento sobre o fenômeno religioso passa a ser objeto
central da ação educativa a partir de suas raízes antropológicas, suas modalidades
contextualizadas nas diferentes tradições religiosas, seus sistemas simbólicos
construídos coletivamente e historicamente.
Implica analisar a influência do sentimento religioso de cada grupo social que
se materializa nas ações humanas por meio de diversas orientações como:
devocionismos, misticismo, moralismo, entre outros aspectos que organizam a vida
social (individuo/sociedade).
Nessa abordagem os elementos culturais das várias tradições religiosas,
favorecem caminhos para refletir as concepções existenciais a respeito das práticas
sociais. Tais como: a religião como recurso político, experiência pessoal mística,
estudos dos grupos marginais, etc. Sistematicamente, é a dimensão do fenômeno
religioso que se expressa nas singularidades das culturas religiosas que se insere
como questão-chave para mediar às aulas e o conhecimento desse contexto.
Num primeiro momento, cabe ressaltar, que a proposta no título deste trabalho
parte do princípio de queas articulações e os desafios de uma práxis pedagógica
ancorada na promoção e compreensão da diversidade religiosa brasileira devem ser
temas urgentesnas escolas, principalmente, no aprofundamento conceitual que
demanda não só no olhar crítico sobre a realidade, mas também, numa ação
educativo-criativa e transformadora que buscapromover o desenvolvimento humano.
Partindo, sobretudo, de temasantes invisibilizados, excluídos e desprestigiados como
é o caso das tradições religiosas de matrizes africanas e indígenas.
CNE/CEB 07/2010 – Reporta-se à promoção de aprendizagens significativas do
ponto de vista das exigências sociais e do direito à diferença, sendo ela mesma também um
direito social, e possibilita a formação cidadã e o usufruto dos bens sociais e culturais.
Parágrafo único. As escolas que ministram esse ensino deverão trabalhar considerando essa
etapa da educação como aquela capaz de assegurar a cada um e a todos o acesso ao
conhecimento e aos elementos da cultura imprescindíveis para o seu desenvolvimento
pessoal e para a vida em sociedade, assim como os benefícios de uma formação comum,
independentemente da grande diversidade da população escolar e das demandas sociais.
Publicado no Diário Oficial da União, Brasília, 15 de dezembro de 2010, Seção 1, p. 34.
13Resolução
FONAPER
O reconhecimento dos aspectos processuais e dinâmicos contidos nas
concepções
e
práticas
dessas
tradições
religiosas
é
complexo,
se
trata
decontextoshistóricos de diferentes grupos sociais e suas cosmovisão. Inclui a tarefa
de refletir coletivamente com os alunos às diferentes formas de crença e de culto das
matrizes africana e ameríndias que historicamente são mistificadas, demonizadas ou
satanizadas pela sociedade.
Vale lembrar, que no processo de colonização do Brasil diferentes grupos
sociais que aqui chegaram: portugueses, espanhóis, holandeses e africanos
trouxeram suas ideologias fundamentadas em suas culturas e religião. De tal modo,
não se pode esquecer que a convivência cultural aqui se deu de forma forçada, com a
imposição de uma cultura europeia sobre outras formas culturais indígenas e
africanas.
Deste modo, duas questões se colocam como desafios que devem ser evitado
nas aulas de Ensino Religiosoo primeiro diz respeito ao alerta feito pelo sociólogo
Emile Durkheim (1996, p.19) que não existem religiões que sejam falsas “todas elas
respondem
de
formas
diferentes,
a
condições
dadas
da
existência
humana”.Sugerindo, com isso, numa abordagem respeitosa a todas as formas de
manifestações religiosas, uma vez que sua importância e características variam de
cultura para cultura; todas elas têm uma dinâmica interna de organização que zelam
pela sua continuidade, oficiam seus rituais e fazem a ligação dos indivíduos e grupos
com o Transcendente.
A segunda questão é evitar um olhar etnocêntrico sobre as definições do
fenômeno religioso nas distintas culturas. Como bem lembra Oro (2013, p.19),
[...] a visão etnocêntrica, é a visão de mundo onde o nosso próprio
grupo – o modo da gente – é tomado como centro do mundo e todos
os outros grupos sociais, etnias, movimentos, partidos e religiões são
pensados e sentidos a partir dos nossos valores, definições e sentido
da existência humana.
Portanto, não é uma visão reducionista dos elementos que compõem o
fenômeno religioso dentro das diferentes culturas religiosas, especialmente, em seus
aspectos simbólicos. Por outro lado, deve ser uma abordagem sensível e flexível por
parte do professor de Ensino Religioso o qual deve refletir juntamente com os alunos a
respeito da religiosidadecomo um dos sentimentos que acompanha a história de todas
as culturas, em todos os tempos. Ou seja, é falar em uma das forças mais profunda e
intensa de movimentação e sentido para os seres humanos.
Deste modo, refletir sobre o substrato do fenômeno religioso em contextos
socioculturais diferenciados, exige se abrir para outras formas de ser e perceber o
mundo. Consideramos, que se o professor possuir um conhecimento bem definido da
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
área, ele se sentirá seguro e motivado no exercício de seu papel para com a
comunidade estudantil.
Segundo Morin (2000) o desafio que não pode ser ignorado na área
educacional em pleno século XXI, está relacionado com as concepções espiritualistas
que excluem ou não permitem mudanças de paradigmas, ou seja:
[...] Ao determinismo de paradigmas e modelos explicativos associase convicções e crenças que, quando reinam em uma sociedade,
impõem a todos e a cada um a força imperativa do sagrado, a força
normatizadora do dogma, a força proibitiva do tabu. As doutrinas e
ideologias dominantes dispõem igualmente, de força imperativa que
traz a evidência aos convencidos e dá força coercitiva que suscita o
medo inibidor nos outros. [...] Daí, decorre a necessidade de
destacar, em qualquer educação, as grandes interrogações sobre
nossas possibilidades de conhecer (para mudar nossas ações). Por
em prática essas interrogações constitui o oxigênio de qualquer
proposta de conhecimento. De qualquer forma, o conhecimento
permanece como uma aventura para a qual a educação deve
fornecer o apoio indispensável (MORIN, 2000, p.27-31).
Com base em Durkheimconsideramos aqui, a definição de sagrado como uma
categoria que inclui todas as dimensões do fenômeno religioso, variando de religião
parareligião. Assim, o sagrado é uma realidade absoluta em todas as tradições
religiosas, ou seja,
O aspecto característico do fenômeno religioso é que ele supõe
sempre uma divisão bipartida do universo conhecido e conhecível em
dois gêneros que compreendem tudo o que existe, mas que se
excluem radicalmente. As coisas sagradas são aquelas que se as
proibições protegem e isolam; as coisas profanas, aquelas a que se
aplicam essas proibições e que devem permanecer à distância das
primeiras. As crenças religiosas são representações que exprimem a
natureza das coisas sagradas (DURKHEIM 1996, p.24).
Para Bowker (1997, p.10) todas as religiões mudaram com o tempo, algumas
mais relutantemente do que outras, porém, é importante notar que ao longo da história
das civilizações o ser humano se apresenta como um ser religioso. Decorrente desse
fato, o autor ressalta que,
A religião não vai desaparecer. Somos basicamente religiosos; somos
preparados para a religião desde o berço, como somos preparados
para inúmeros outros comportamentos básicos (BOWKER. 1997,
p.10).
Por essa razão, acredita-se que o estudo sobre o fenômeno religioso é
pertinente, precisando ser abordado nos espaços pedagógicos, ou seja, é necessário
haver ensino aprendizagem para as novas e futuras gerações.
Cortella (2007) afirma que a religião ou o fenômeno religioso é uma percepção e
conexão com a vida que procura captar significados de existência, devendo ser
encarada como uma questão linear e natural no processo deensino aprendizagem. O
FONAPER
autor afirma que esses conteúdos são importantes para a reflexão e desenvolvimento
educacional.
Se, como dissemos, a religião (fenômeno religioso) está presente em
todas as sociedades e momentos da história, fica evidente que ela não
pode ausentar-se da vida de uma criança. [...] Na rede pública de
ensino, sabemos como é. Já algumas escolas privadas não
confessionais podem não ter o componente Ensino Religioso (não
aparece como nome de matéria), mas possui o conteúdo, que é tratado
em Literatura, História, Língua Portuguesa. Ora, como falar do mundo
antigo e do atual sem tocar na religião? Discussões sobre o
fundamentalismo, eleições, confrontos seculares, ética e a frase
clássica de Dostoievski “se Deus não existe, tudo é permitido” estão
profundamente ligados ao tema. Uma escola inteligente não pode
deixar de fora o conteúdo religioso. Pôr para escanteio essa noção é
esquisito, pois, se ela não é estranha à vida, como pode ser estranha à
escola? Se a Religião é presença constitutiva das existências
humanas, e, desse modo, a educação é imprescindível, vê-se que o
Ensino Religioso, como a ordenação intencional desse conteúdo no
espaço escolar, torna-se tão sério quanto qualquer outro componente
pedagógico obrigando-nos a desenvolver a nossa competência para tal
empreita (SENA apud CORTELLA, 2007 p. 17-19).
O autor chama atenção para alguns pontos importante sobre o Ensino Religioso,
como condição indispensável ao aprendizado e formação dos estudantes, isto é, de um
ensino responsável, especialmente, por se tratar de uma área profundamente delicada e
usualmente polêmica nas escolas públicas.
Nas palavras deCortella(2007, p.20).oEnsino Religioso é parte fundamental da
tarefa educativa e, como tal, “precisa de robusta base científica, religiosidade
consciente, solidez pedagógica e compromisso cidadão”.
Considerando esses aspectos,percebe-se que a temática sobre a diversidade
cultural religiosa na Educação. São temas que, como já apontamos, exigem de modo
geral uma ampla abordagem a respeito das matrizes religiosas da cultura brasileira. Já
que, indiscutivelmente, essas formas culturais de expressões e manifestações de
religiosidade tiveram e tem papel importantíssimo na construção das origens identitária
do Brasil.
De acordo com o antropólogo Darcy Ribeiro,
O povo Nação não surge no Brasil da evolução de formas anteriores
de sociabilidade, em que grupos humanos se estruturam em classes
opostas, mas se conjugam para atender às suas necessidades de
sobrevivência e progresso. Surge, isto sim, daconcentração de uma
força de trabalho escrava, recrutada para servir a propósitos
mercantis alheios a ela, através de processos violentos de ordenação
e repressão que constituíram, de fato, um continuado genocídio e um
etnocídio
implacável.
Nessas
condições,
exacerba-se
o
distanciamento social entre as classes dominantes e as
subordinadas, e entre estas as oprimidas, agravando as oposições
para acumular, debaixo da uniformidade étnico-cultural e da unidade
nacional, tensões dissociativas de caráter traumático. [...] Nesse
plano, as relações de classes chegam a ser tão infranqueáveis que
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
obliteram toda comunicação propriamente humana entre a massa do
povo e a minoria privilegiada, que a vê e a ignora, a trata e a maltrata,
a explora e a deplora, como se esta fosse uma conduta natural
(RIBEIRO, 1995.p.23).
.
Embora, a história registre que a sociedade brasileira tenha se constituído em
um contexto pluriétnico, a partir da união dos brancos europeus, dos indígenas nativos
e dos negros africanos, contudo, o que valia naquele período de expansão territorial
era o fator financeiro, consequentemente, toda a produção de bens culturais era
dominada pela cultura dos colonizadores.
Convém lembrar que, antes de qualquer coisa, que os registros históricos do
período colonial revelam os interesses econômicos e concepções religiosas trazidas
pelos colonizadores europeus, sendo impossível negar que esses interesses tende a
discriminar, a reprimir e até a suprimir as outras formas de concepções religiosas,
atacando e restringindo a diversidade das culturas. Apesar disso, o encontro com os
estudos voltados para o reconhecimento e para a valorização da diversidade cultural
brasileira é parte abrangente de uma educação para cidadania.
No contexto da formação cultural do Brasil a questão ganha contornos bastante
específicos, não se pode esquece as relações desiguais e de imposição ideológicas
das culturas, especialmente, no que diz respeito à ameaça de anulação de suas
próprias identidades, todavia, precisamos reconhecer que temos uma formação
histórica marcada, desde a colonização, pela dominação e exterminação de todas as
formas de manifestações religiosas de origem não europeia.
Historicamente esses acontecimentos envolvem a relação de resistência
cultural entre os distintos grupos étnicos; é claro que as práticas religiosas dos povos
nativos indígenas, dos negros africanos e dos brancos europeus disseminaram
profundas raízes nas tradições culturais de nossa atual sociedade.
Consideramos que muitos dos aspectos sócios, políticos, econômicos e
culturais assumidos pelo Brasil na atualidade, são frutos desse período histórico de
negação, estratégia de controle das variáveis tradições religiosas, principalmente, das
populações negra e indígenas. Porém, em tempos atuais à situação começou a mudar
e, atualmente podemos perceber iniciativas que buscam a promoção e valorização da
diversidade cultural do povo brasileiro.
Além disso, esses fatores chamam atenção para um compromisso social da
tarefa educativa, requer possibilitar aos estudantes uma visão mais ampla sobre a
pluralidade cultural e seus desdobramentos no contexto histórico e social da formação
do povo brasileiro; das concepções de mundo, das tradições e percepções do campo
FONAPER
religioso. Por outro lado, não visa tão-somente produzir um conhecimento do passado,
mas, sobretudo, para uma visão crítica e postura conscientes no presente.
Para isso, estamos considerando aqui, elementos de várias culturas presente
na composição da sociedade brasileira, como é sugerido nos Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCNs) elaborados pelo Ministério da Educação, o documento destaca que
a pluralidade cultural diz respeito:
[...] Ao conhecimento e à valorização das características étnicas e
culturais dos diferentes grupos sociais que convivem no território
nacional, às desigualdades socioeconômicas e à crítica às relações
sociais discriminatórias e excludentes que permeiam a sociedade
brasileira, oferecendo ao aluno a possibilidade de conhecer o Brasil
como um país complexo, multifacetado e algumas vezes paradoxal
(BRASIL, 1997, p.19).
Cabe lembrar que, efetivamente, de acordo como marconormativo da
legislação em vigorfaz parte da tarefa do Ensino Religioso levar as novas gerações o
conhecimento da dimensão religiosa com dados antropológicos e socioculturais, ao
mesmo tempo, assumindo o estudo do fenômeno religioso como um dado históricocultural, como manifestações da dimensão humana, que envolvem os indivíduos e a
sociedade. Por isso, o estudo das diferentes tradições religiosas são pautas
indispensáveis da ação educativa para a plena cidadania, onde sua função e
significado na vida individuale coletiva da sociedade sejam percebidos de forma
respeitosa e reverencial frente ao diverso de si.
Discernir o dado religioso e assumir posturas cidadãs perante suas
manifestações e relações com as diversas dimensões da vida
humana é uma habilidade indispensável para a educação dos
cidadãos oriundos de qualquer credo, ou mesmo de nenhum credo.
[...] A busca de uma ética civil com base nas religiões constitui,
segundo Hans Kung, um caminho necessário para a civilização atual.
Não se trata de reeditar para o conjunto da sociedade as éticas
religiosas, como na fase pré-moderna da história ocidental, mas de
haurir delas seu potencial valorativo e estabelecer consensos básicos
para a sobrevivência da humanidade (SENA apud PASSO, 2007,
p.36-37).
Do ponto de vista pedagógico, nota-se que as aulas de Ensino Religioso
direcionam seus conteúdos para um quebra-cabeça das complexidades humanas,
ligado ao pluralismo religioso marcado por tantos conflitos socioculturais. Daí, se tem
um desafio educacional, para a sua abordagem equilibrada, pois, existem
inadequações graves, por exemplo, de um lado, os saberes compartimentados e
fragmentados, de outro, as realidades ou carências do campo educacional. Tais como:
professores lecionando sem formação específica para essa área de conhecimento,
faltam
materiais
didático
adequado
para
serem
(principalmente em regiões mais carentes do Brasil).
trabalhados
nessa
área
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Há, portanto, uma complexidade que precisam ser trazida para o centro dos
debates das escolas públicas brasileiras, sobretudo, no que se refere aos seus
projetos políticos pedagógicos, pois essa abordagem não deveria ser negligenciada
como conteúdos do Ensino Religioso. Aliás, essa condução, diga-se de passagem, é
uma atribuição importante a essa área de ensino. Nas palavras de Freire (2000, p.110)
enfatizar que toda área de ensino deve ser "fundada na ética, no respeito à dignidade
e à própria autonomia do educando".
Na visão de Junqueira (2013) o Ensino Religioso passou a ser visto como uma
disciplina escolar oportuna ao desenvolvimento do educando. Para o autor é possível
trabalhar temas no Ensino Religioso como “os espaços do sagrado”, numa abordagem
significativa ao ensino aprendizagem, uma vez que essa reflexão envolvem elementos
presente no contexto sociocultural dos alunos. Contudo, há e haverá sempre uma
relação complexa, pois os elementos que compõem o sagradoretratam sempre uma
dimensão de ligação e religação entre as diversidades. É interessante observar como
o autor argumenta essa questão:
Julga-se oportuna a apreciação preliminar de três questões
relacionadas ao Ensino Religioso, que se estabelecem como
pressuposto científico para se viabilizar a presente proposta de forma
consistente, educativa e pertinente: Da superação do ensino prosélito
à relação com o Espaço Sagrado; O espaço sagrado e sua
importância pedagógica para o Ensino Religioso; Oturismo
pedagógico como possibilidade para a Educação (KRONBAUER
apud JUNQUEIRA. 2013, p. 36-37).
Em suas considerações, o autor chama atenção para que esse ensino
enquanto processo educativo possibilite a leitura da interferência do fenômeno
religioso na sociedade. Para isso, é necessário o conhecimento do universo simbólico,
dos ritos, das festas, dos tempos e dos templos dedicados às perspectivas religiosas.
Observa-se, contudo, que através do processo de socialização desses conhecimentos
os estudantes não só aprendem, como também, se identificam tornando-se não só
ouvintes que se apropriaram desses sentidos, mas como indivíduos atuantes que
também o exprime.
A partir desse entendimento, a compreensão dos espaços sagrados que
recebem influência constante da sociedade e, ao mesmo tempo, esses elementos
interfere na vida das pessoas, na cultura, nas decisões éticas e nos comportamentos
morais que constitui oethosbrasileiro. Portanto, entender a dinâmica da cultura
brasileira por meio das tradições religiosas e seus fenômenos, certamente, essa
abordagem é parte inseparável do papel do Ensino Religioso numa perspectiva
educacional que visa à construção da cidadania, bem como, colaborar na qualidade
das relações de convívio entre pessoas de diferentes crenças que são presentes no
FONAPER
âmbito local (sala de aula) e, na sociedade de modo geral. Logo, conhecer para
entender, sem dúvida, é uma forma viável na superação de preconceito e
discriminação por motivos religiosos.
Isso também representa estabelecer diálogos, demonstrando que ao longo da
história das civilizações motivos de intolerância, preconceito e fundamentalismo
religioso produzem guerras e matanças, porém, esses acontecimentos podem ser
entendidos como a experiência humana que sente as dores de uma história
socialmente construída pela ausência de conhecimento por parte do próprio homem.
Para concluir, um dos últimos pontos a ser considerado é que o dever principal
da educação diante a diversidade religiosa, é antes de tudo, conscientizar as novas
gerações, principalmente, aquelas que estão em fase de formação à competência da
definição de sua própria cultura. Isso significa, igualmente, assegurar a compreensão
de sua própria existência, ou mesmos, que se percebam como sujeitos críticos e
participativos. Para isso, o conhecimento produzido pelas diferentes tradições
religiosas que muitas vezes é tratada como um tabu, porém, corresponde aos
conteúdos do Ensino Religioso para uma educação que promova a compreensão e
maior percepção de que, mesmo com tanta pluralidade religiosa é possível uma
convivência pacífica, sem o intento de homogeneizar as culturas, mas sim de celebrar
a diversidade cultural. Além disso, é fundamental que a organização dessa área de
conhecimentos, seja desenvolvida, sobretudo, de forma integrada com as demais
disciplinas do currículo e, especificamente com a realidade plural da cultura brasileira,
dessa forma, possibilitará ao educandos a compreensão do mundo em que vive.
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SENA, L. Ensino Religioso e formação docente: ciências da religião e ensino
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RIBEIRO, Darcy. O povo do Brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. 2ª ed.São
Paulo: Companhia das Letras, 1995.
ROCHA, Ruth. Minidicionário Ruth Rocha. São Paulo: Scipioni, 2000.
SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do trabalho científico. 23ª ed. São Paulo:
Cortez, 2007.
FONAPER
MANIFESTAÇÃO DO FENÔMENO RELIGIOSO PRESENTE EM FILMES INFANTIS
Elizabeth de Fátima Oliveira Matos - UEPA14
Maria de Lourdes Silva Santos - UEPA15
Resumo
Este trabalho apresenta os resultados de uma pesquisa que teve como objetivo analisar
manifestações do fenômeno religioso presentes em filmes infantis.O percurso metodológico
perpassou por uma revisão da literatura sobre o tema fenômeno religioso e análise de 05
filmes, sendo eles: Branca de Neve e os sete anões, A pequena sereia, O rei leão, O corcunda
de Notre Dame e o Irmão Urso. Os filmes foram analisados com base nas seguintes categorias:
religião, manifestação religiosa e experiência religiosa. Os resultados da análise nos permitiram
concluir quenos diferentes enredos dos filmes estão registradas manifestações do fenômeno
religioso, traduzidas nas formas como alguns personagens expressavam e operavam com suas
crenças e fé. Nos enredos fílmicos a questão religiosa aparece demarcada por imagens, ritos,
símbolos, representações e falas. As experiências religiosas também foram
traduzidas/representadas nos diferentes encontros dos personagens centrais com o
Transcendente/Sagrado.
Palavras-chave: Manifestação do fenômeno religioso. Desenho animado.Religião. Experiência
religiosa.
Introdução
A mídia, em suas várias apresentações, cada vez mais tem lugar especial na
vida das pessoas, influenciando comportamentos, atitudes e valores. São muitas as
formas e linguagens midiáticas, contudo, nos chamou mais a atenção a produção
cinematográfica direcionada ao público infantil. Ao assistir alguns filmes infantis e
perceber a quantidade de mensagens oriundas destas produções, surgiu a intenção
de realizar um estudo analítico de algumas obras cinematográficas de modo a localizar
nas imagens e textos articulações com outros campos de formação da cultura, como
por exemplo, o instigante campo do universo religioso.
Segundo BattistoneFilho (1993) as primeiras manifestações artísticas do
homem foram encontradas no período Aurinaciano, sendo este o período que inaugura
o Paleolítico Superior. É nesse decurso temporal que surgem estatuetas feitas de
marfim e ossos, baixos-relevos em pedras, etc. Em razão desta afirmação, o autor nos
diz que as primeiras manifestações artísticas do homem se deram em forma de
escultura e posteriormente a pintura. A Arte pode ser vista como forma de expressar o
sagrado desde o período Paleolítico e Neolítico. Atualmente, o sagrado é expresso em
todas as formas de Arte como na música, na escultura, na dança, entre outras. A
14
Pedagoga, Doutora em Educação (UFRJ/RJ), coordenadora do Curso de Licenciatura em
Ciências da Religião da Universidade do Estado do Pará-UEPA, [email protected]
15
Licenciada Plena em Ciências da Religião pela Universidade do Estado do Pará (UEPA),
[email protected]
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
dança e a música podem servir de mediação entre o homem e o sagrado nas religiões.
Nas missas e em cultos (cerimônias religiosas) estes dois elementos artísticos
aparecem como adoração, louvores e agradecimentos à divindade.
A atração que os filmes infantis exercem sobre o público em geral, e em
especial, nas crianças, nos motivou a realizar a seguinte busca: como filmes infantis
da Walt Disney expressam questões do sagrado em seus roteiros? A Partir do
questionamento estabelecemos como objetivo geral para este artigo, analisar
expressões do sagrado presentes em filmes infantis da Disney.
Metodologia
A pesquisa foi realizada por meio das seguintes etapas: revisão da literatura,
seleção de filmes, elaboração de instrumento de analise, sistematização das
informações e análise dos resultados.
A revisão da literatura recaiu sobre obras dos seguintes autores: Durkheim
(2008), Mircea Eliade (2010), Battistone Filho (1993), Otto (2007), Piazza (2005),
Santos (2004), dentre outros. A revisão permitiu concluir queareligião, da forma como
a entendemos, ou seja, um sistema formado por crença que abarca ritos, dogmas, é
caracterizada por uma divisão dualista, isto é, pelas coisas sagradas que são dotadas
de forças sobrenaturais e pelo profano que precisa do sagrado para guiá-lo, orientá-lo
nas situações da vida. Uma religião existe enquanto religião porque existe o religioso,
e este necessita do sagrado. É desse contexto emergem as manifestações do
fenômeno religioso.
Para realização deste estudo selecionamos 05 filmes da mesma produtora,
lançados em períodos diferentes. A escolha recaiu: “O Corcunda de Notre Dame”, “O
Rei Leão”, “Irmão Urso”, “Branca de Neve e os Sete Anões” e “A Pequena Sereia”.
Vale destacar que não houve intenção deliberada de nossa parte em escolher filmes
vinculados a uma determinada religião, pelo contrário, achamos adequado eleger
filmes com abordagens religiosas diversificadas como: religiosidade popular,
cristianismo/catolicismo, totemismo e xamanismo. Para facilitar a compreensão do
texto apresentaremos a seguir as sinopses dos filmes.
Branca de Neve e os sete anões
O filme é uma produção baseada nos contos dos Irmãos Grimm foi o primeiro
longa-metragem da Disney, produzido e lançado em 1937, chegou ao Brasil em 1938.
FONAPER
Tem como personagens principais Branca de Neve e a Madrasta e como secundários,
os Anões e os animais do bosque. A princesa è a personagem central da trama. Antes
da tragédia que desestabilizou sua vida, morava em um reino e vivia feliz com seus
pais. O rei fica viúvo e procura uma nova esposa. Surgirá na vida de Branca uma
mulher muito bela e vaidosa, que seduz o rei e casa-se com ele. Decorrido certo
tempo, o rei morre, sua esposa assume o reino e sua verdadeira identidade, uma
bruxa perversa e preocupada em ser a mulher mais bela do reino. Para isso tentará
matar Branca de Neve que escapa do caçador e se abriga na casa dos anões da
Floresta.
Os Sete Anões trabalhavam nas minas e moravam em uma pequena casa no
meio da floresta. Típico do comportamento masculino da época, eles são machistas e
desorganizados. Eles acolhem Branca de Neve em sua casa, inicialmente
contrariados, posteriormente aprendem a amá-la e tornam-se dependentes de seus
afetos e cuidados domésticos. No final da trama, são eles que irão enfrentar a Bruxa e
velar (guardar) o corpo de Branca de Neve.
A pequena sereia
O filme é uma adaptação do conto de Hans Christian Andersen e lançado em
1989. Tem cinco personagens principais: Ariel personagem central da trama, Tritão,
Úrsula e Eric, três personagens secundários, grande importância no enredo:
Sebastião, Linguado e Sabidão, animais que acompanham Ariel em suas aventuras.
Ariel é uma jovem sereia de 16 anos é a sétima filha de Tritão, o rei dos mares. Ela
deseja novas aventuras e sonha conhecer o mundo dos humanos. Linguado é seu
amigo e parceiro de aventuras. Em uma de suas idas à superfície, Ariel avista o jovem
Príncipe Eric e se apaixona.
Em uma região mais tenebrosa das profundezas do mar, mora Úrsula. Ela tem
a forma “metade humana e metade polvo”, tem inveja do Rei Tritão e desejo de tomar
seu lugar. A bruxa tem porções capazes de realizar os desejos dos seres marinhos
que a procuram.
Apaixonada por Eric, percebendo a incompatibilidade entre eles Ariel procura a
ajuda de Úrsula para a solução de seus problemas. Ela pede ajuda a bruxa e esta diz
que a solução para o seu problema seria ela se tornar humana. Ariel pergunta se ela
pode ajudar. Úrsula diz: “_ Minha querida e Bela menina, é isso que faço, é para isso
que vivo para ajudar os infelizes seres do mar como você. Pobres almas que não tem
a quem recorrer”.
A bruxa faz uma porção mágica que transforma Ariel em humana por apenas
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
três dias. Nesse período, a sereia deve fazer o príncipe se apaixonar por ela e beijá-la
até o pôr do sol do terceiro dia, assim ela ficará humana para sempre, caso ele não a
beije, ela voltará a ser sereia e será mais um bichinho da bruxa. Como pagamento
pelo serviço, Ariel dá sua voz à bruxa.
Ariel é transformada em mulher e levada imediatamente à superfície do mar
por Sebastião e Linguado. Ao encontrar Ariel na praia, Éric acredita que ela é a moça
que o salvou do naufrágio, no entanto, ele fica desiludido pelo fato de Ariel não poder
falar, pois, ele se apaixonou por pelo canto da sereia. Achando que Ariel está perdida,
ele a leva para o castelo e com o passar do segundo dia, Eric vai se apaixonando pela
moça. Percebendo que seu plano está falhando a bruxa se transforma também em
humana (Vanessa), para impedir que o príncipe se apaixone por Ariel. Ela enfeitiça
Eric. Este sob o efeito do encanto se apaixona por Vanessa/Úrsula marca o
casamento deixando Ariel arrasada.
No restante da trama, os amigos de Ariel irão se unir para tentar derrubar os
planos e magias da bruxa, de modo que a “voz roubada de Ariel seja devolvida” e que
Vanessa/Úrsula seja desmascarada. No final da trama, Úrsula se transforma num
monstruoso polvo e tenta matar Eric e Ariel, no entanto, ela é atingida pelo mastro de
um navio e morre. Com sua morte, todos os seres que a Bruxa prendia “tiveram suas
vidas de volta, inclusive o rei dos mares”. Tomando consciência de sua atitude com
Ariel, Tritão a transforma em humana para que ela se case com o príncipe.
O rei leão
O filme retrata uma fábula, foi lançado em 1994, nos Estados Unidos, tornadose um sucesso e mais um clássico da Disney A história tem 4 personagens principais:
Mufasa, Scar, Simba e Rafiki, e 4 secundários: Zazu, Timão, Pumba e Nala. .
A película mostra a cerimônia de apresentação de Simba. Na “Pedra do rei”
estão Mufasa (o pai), Sarabi (mãe), Simba (filhote) e Rafiki (babuíno), que presidia a
cerimônia. Rafiki sacoleja seu cajado sobre Simba, parte uma fruta e passa o líquido
desta na fronte do leãozinho, pega uma porção de areia e joga sobre a face de Simba.
O sábio o carrega e o apresenta a todos os animais do reino, que o reverenciam.
Nesse momento abrem-se as nuvens e raios de luzes refletem em Simba.
Mufasa é um personagem virtuoso. Como um bom pai e rei, mostra seu reino
para o filho e lhe ensina que o “tempo de um reinado se levanta e se põe como o sol”
e assim acontecerá com o tempo dele, imprimindo ao pequenino Simba noções
temporalidade.
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Simba, como bom representante felino, é um personagem brincalhão, curioso e
esperto. Tem um bom relacionamento com Scar e em sua inocência não percebe que
as atitudes de seu tio são más. Scar é irmão de Mufasa. Ele tem inveja do rei e
pretensões de tomar seu lugar, por isso fica furioso pelo nascimento de Simba, já que
perde seu lugar na sucessão.
Simba é o personagem central. Ao nascer tornar-se sucessor de Mufasa. É
esperto, curioso espera pelo dia quem será rei. No entanto, após a morte de seu pai, é
manipulado por Scar, que o acusa de ter matado Mufasa, e o manda fugir para que as
hienas o matem. Simba consegue se livrar da morte e foge para um lugar bem
distante.
Passado algum tempo Nala, amiguinha de infância de Simba, que está à
procura de ajuda, ataca Pumba, no entanto, Simba o salva. Na luta entre dois, Simba
é derrubado por Nala tal qual acontece quando eles eram crianças. Ela pede que
Simba retorne à Pedra do Rei e tomar seu lugar, ele recusa. Simba nunca esqueceu
seu pai e, a culpa que sente pela morte do rei o acompanhou durante todo esse tempo
em que ele se exilou da família.
Rafiki, mediado pelos espíritos, descobre que Simba não morreu e vai atrás do
leão, pois está no tempo dele assumir o reino. Após dizer a Simba que Mufasa está
vivo, Rafiki leva o leão até um riacho e mostra Mufasa na água. Olhando para água
Simba vê apenas seu reflexo, no entanto, o babuíno diz que Simba deve olhar com
atenção e aponta novamente para as águas quando Simba olha com atenção vê seu
pai refletindo sobre a água. A reflexão de Mufasa acontece porque Simba apenas
superou a morte do pai, mas nunca o esqueceu.
Através da mediação feita por Rafiki, Simba consegue se comunicar com seu
pai. Mufasa aparece ao filho em espírito e o convence a voltar e tomar conta de seu
reino. Simba chega às terras de seu pai e vê o lugar destruído, sem vida, parecido
com o cemitério dos elefantes. Quando ele chega à Pedra do Rei vê Scar
esbofeteando sua mãe. A partir daí Simba irá lutar e conquistar seu reino. Simba
aprendeu com seu pai a respeitar a todos, e que todas as coisas têm sua importância
no ciclo da vida e então torna-se um rei igual a seu pai.
O corcunda de Notre Dame
O filme “O Corcunda de Notre Dame” (“The Hunchback of Notre Dame”) é 34º
desenho animado em longa-metragem Disney e conta uma história emocionante e
comovente, repleta de ação, humor e músicas encantadoras. Inspirado no romance
clássico de Victor Hugo, a Disney traz as heroicas aventuras de Quasídomo, o amável
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
e solitário tocador de sinos da Catedral de Notre Dame, numa obra-prima espetacular.
Dirigido por Gary Trousdale e Kirk Wise e foi lançado em 1996.
O filme tem 3 personagens centrais envolvidos na trama: Quasímodo, um dos
heróis da obra, conhecido como o “Corcunda de Notre Dame”, pelo fato dele ser o
sineiro e viver na torre da catedral de Notre Dame, Esmeralda, uma cigana que luta
pelo direito de igualdade entre todos e o Juiz Claude Frollo, o vilão da trama.
A obra começa com uma perseguição étnica pelo Juiz Claude Frollo, o vilão da
trama. Ele é um personagem cruel e egoísta. Persegue Esmeralda, uma jovem cigana
destemida, que luta por justiça e pelo direito de igualdade entre todos. Frollo tenta
combater Esmeralda por três razões: pelo fato dela tê-lo enfrentado, por ela ser cigana
e por ele amá-la e não ser correspondido. Para ter argumento persuasivo e assim
poder condenar a moça, Claude Frollo a acusa de fazer bruxaria, razão pela qual ela
recebe como sentença a morte na fogueira.
Como Frollo não gosta dos povos ciganos os persegue há mais de vinte anos
e, numa de suas perseguições contra esse povo, matou a mãe de Quasímodo e se viu
obrigado a cuidar do pequeno órfão por medo de ser castigado pelos Santos da Igreja
católica, que são temidos pelos fiéis, principalmente, Nossa Senhora (Notre Dame).
Mesmo assim, o juiz cuida da criança com má intenção, pois acredita que ela possa
lhe servir no futuro.
A morte da mãe de Quasímodo ocorre quando Frollo prende um grupo de
ciganos, mas uma cigana que está no grupo foge para proteger seu bebê. Pensando
que a cigana tinha em suas mãos coisas roubadas, o Juiz a persegue. Ela então tenta
se refugiar na Catedral, mas ninguém aparece para ajudá-la. Então a cigana clama
santuário, no entanto, Frollo toma o embrulho de seus braços com tanta força que a
cigana cai e morre. Ao abrir o embrulho percebe que tratava de uma criança, ao notar
que o bebê é deficiente, o Frollo chama-o de monstro e tenta jogá-lo dentro de um
poço para matá-lo, no entanto, é impedido por um sacerdote da catedral. Frollo se
justifica dizendo que a criança é uma alma profana e vai mandá-la para o inferno, que
é o lugar dela. No entanto, o sacerdote diz que ele derramou sangue inocente nos
degraus de Notre Dame; ainda assim, o juiz tenta demonstrar inocência, mas, o
sacerdote diz-lhe que ele “pode até se iludir, não ter remorso por seu ato cruel, porém,
ele não vai conseguir desviar e nem fugir do olhar de Notre Dame”. Nesse momento,
Claude sente temor por suas ações.
Irmão urso
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O filme foi lançado em 2003. É uma narrativa é inspirada na tradição dos mitos
de transformação encontrados em diversas culturas do mundo.
Tanana é a xamã e líder da aldeia indígena é a ela que os espíritos revelam o
totem que guiará cada aldeão no tempo certo. Tanana é uma pessoa boa, divertida e
respeitada por todos.
Sitka é o mais velho dos três irmãos. É um homem bom e é responsável por
cuidar de seus dois irmãos mais novos Denahi e Kenai. Suas ações são guiadas pela
Águia da orientação. O amor que sente pelos irmãos o leva a morte. Vendo que
Denahi e Kenai estão em perigo e com muita dor, Sitka comete o suicídio para
proteger seus irmãos do ataque da ursa. Após a morte, seu espírito fica guiando os
irmãos. Sitka foi o responsável pela transformação de Kenai em um urso.
Danahi é segundo dos três irmãos. É uma pessoa boa, mas vive provocando
Kenai, o irmão caçula: zomba do irmão por este ter recebido o totem do amor,
esquecendo o verdadeiro sentido dos totens para cada um deles. Denahi é guiado
pelo totem da sabedoria. Após a transformação de Kenai em urso, ele o persegue,
pensando que seu irmão está morto.
Kenai é o personagem central da trama, é um rapaz impulsivo, extrovertido,
brincalhão e um pouco egocêntrico, está prestes a se submeter ao rito de passagem.
Neste ritual, o jovem recebe um totem que guiará suas ações durante a vida. Ele fica
chateado pelo totem que recebe: o totem do amor, representado pelo Urso pardo, pois
esperava um totem que ele acredita ser superior como coragem, força e destreza,
características representadas pelo tigre dente de sabre.
Aborrecido pelo totem que recebeu e com implicância de Denahí, pelo fato do
urso ter comido os peixes que fariam parte dos preparativos para a cerimônia de
iniciação, o jovem resolve perseguir o urso, e em sua caçada seus irmãos os veem em
perigos e correm para ajudá-lo. Na luta pela sobrevivência, Sitka morre para salvar os
irmãos. Revoltado, Kenai decide se vingar do urso, acreditando que ele foi o culpado
pela morte de Sitka. Porém, Denahi lhe diz que a culpa não é do urso e diz que eles
devem seguir seu totem e que matar o urso não fará dele um homem. Kenai segue
firme em sua vingança e mata o urso, o que deixa os espíritos aborrecidos,
transformando o rapaz em um urso. A partir dessa metamorfose, ele aprenderá a
respeitar o comportamento dos demais (pessoas e animais) pelos desafios que
enfrentará como urso até se tornar humano novamente.
Elaboração do instrumento de análise
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Foi necessária a criação de um instrumento para facilitar a organização dos
dados observados. Ele foi elaborado com base nas categorias: religião, manifestação
religiosa e experiência religiosa, vividas ou manifestadas pelos personagens e que
emergiram nas observações fílmicas. O processo culminou com a produção do quadro
abaixo.
Manifestação do fenômeno Religioso
Religião
Manifestação religiosa
Experiência religiosa
Quadro 1: Composição das categorias
Manifestação do fenômeno religioso nos filmes
No filme A Branca de Neve e os sete anões a manifestação do fenômeno
religioso se reporta para um tipo de religiosidade popular, que acredita nos poderes
mágicos das bruxas. No imaginário popular, as bruxas são caricaturadas como
mulheres feias que possuem conhecimentos de magia negra. No filme em questão, a
Madrasta possui objetos como espelho mágico, um livro de magia negra e porções
mágicas, que podem ser considerados elementos sagrados, que resolvi classificar
como Sagrado Negativo16, por entender que são forças sagradas canalizadas para
prejudicar as pessoas. A manifestação religiosa ocorre quando a Madrastainvoca o
espelho mágico, conforme o trecho do filme“_ Escravo do espelho mágico deixa o
infinito espaço e vem pelas trevas! Eu te convoco! Deixa-me ver tua face [...]!”.
A crença na existência de bruxas ou da bruxa, no caso do filme, é expressa
pelos anões. Eles acreditam que a rainha além de má, seja bruxa,
Expressões do sagrado negativo podem ser percebidas na invocação do
espelho mágico e na utilização de porção mágica para envenenar/encantar a maçã.
No filme é possível visualizar em destaque uma das muitas formas de expressão do
16
Considerando que o sagrado é aquilo que está separado do mundo profano e, portanto essa
qualidade de sacralidade e dada pelo homem aos fenômenos e forças que ele desconhece e
entende como superiores em sí (GALIMBERTI, 2003). Nesse caso, utilizamos o termo
“Sagrado Negativo” para nos referirmos as formas ou representações do sagrado que
aparecem nas obras fílmicas e são canalizados para fazer o mal, ponderando a subjetividade
humana.
FONAPER
sagrado, no momento em que a bela rainha se transforma na terrível bruxa, com seus
estereótipos bem demarcados.
No filme Pequena Sereiaa manifestação do fenômeno religioso é expressa na
religiosidade popular, neste caso, a crenças nas sereias e nas bruxas. No imaginário
popular, as sereias encantam os homens com o seu canto. No imaginário popular
amazônico, as sereias são conhecidas como Mãe d’Água e moram no fundo de rios e
igarapés. Em nosso contexto, muitos ribeirinhos ainda acreditam que elas vivem no
“mundo encantado”. Nas lendas, sereias e mães d’água aparecem como entes
capazes de atrair muito mais os homens, mas as crianças também podem ser levadas
por elas por seu canto, como fazia a bruxa do mar.
No filme, podem ser observados vários momentos ligados ao fenômeno
religioso como as transformações de Ariel e Úrsula em mulheres, a fusão dos olhos de
Pedro e Juca (bola de cristal) através do qual Úrsula pode ver tudo o deseja, o modo
como a bruxa toma para si a voz de Ariel, o tridente do rei dotado de poderes mágico.
No filme O Rei Leãoa Manifestação do fenômeno religiosoincide sobre o
Xamanismo. No contexto acredita-se nos espíritos dos ancestrais representados pelas
estrelas; há a presença do líder religioso (xamã), representado pelo personagem
Rafiki; o sagrado é expresso nos elementos usados na cerimônia de apresentação de
Simba: o cajado, o pó e o liquido.
A experiência religiosa é representada nas cenas em que as folhas são levadas
pelos espíritos até Rafiki e na aparição/materialização de Mufasa a Simba, emergindo
das águas. Também há indícios de questões ligadas ao Espiritismo, quando o pai se
Simba retorna para se comunicar com seu filho. -Já na chuva há um elemento
ritualístico que lava as impurezas do reino.
A crença nos ancestrais é expressa por Simba, que diz aos amigos que as
estrelas representam os grandes reis do passado. Chateado pela falta de importância
dos amigos em crença, ele fica triste se joga no chão. Com esse ato, as folhas voam e
são levadas pelos espíritos dos ancestrais até Rafiki e, através desse fenômeno, ele
vê que Simba ainda está vivo e que é chegada a hora dele voltar e tomar seu lugar na
pedra do rei.
No filme O corcunda de Notre Damea manifestação do fenômeno religiosoé
retradada primeiramente no personagem da mãe de Quasímodo ao clamar
“SANTUÁRIO”, em frente a Catedral Notre Dame. Logo em seguida, no personagem
Juiz Frollo, que teme diante das imagens dos Santos (que fazem parte da arquitetura
da catedral); no personagem de Capitão Febo, quando diz não prender Esmeralda,
devido esta ter clamado Santuário; por fim, o Corcunda, que também clama a palavra
santuário. A religião que aparece no filme é o catolicismo, que ainda predominava no
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
ocidente, além de elementos como o sacerdote, a presença de fiéis na igreja e
Esmeralda que está no espaço sagrado (catedral), onde ela expressa sua
religiosidade (pede proteção a Nossa Senhora para ela e seu povo).
No filme Irmão Ursoa manifestação do fenômeno religioso é tão presente na
trama de modo que fica impossível caracterizar que fenômeno religioso é mais
importante. A religiosidade é expressa na narrativa feita por Denahi no início do filme,
onde ele conta a um grupo de pessoas como acontecem as mudanças do mundo e
quem são os responsáveis pelas transformações sobrenaturais.
O totemismo é a religião retratada. Como sabemos, esta é uma crença cujos
seguidores acreditam nos Espíritos dos Ancestrais (o grande espírito) como os
responsáveis por todas as mudanças que ocorrem no mundo, tais como as mudanças
das estações do ano, por exemplo. A trama apresenta uma líder religiosa, que é a
xamã da aldeia, e como líder ela é a intermediária entre os Espíritos e os aldeões.
A manifestação do sagrado é expressa diversas vezes como: nas mudanças
das estações do ano (inverno em primavera), na transformação (revelação) da pedra
em totem e na transformação de Kenai em urso. O filme propaga o Mito da Criação na
concepção religiosas dos aldeões no trecho da canção Espíritos dos Ancestrais:
“Quando a terra e o ar/ Sem nenhum pudor/ Se deitavam sob o sol/Semeavam luz/Na
imensidão/Com o brilho de um farol [...]”. A religiosidade também é expressa em uma
cerimônia de iniciação, que acontece em dois momentos: a primeira etapa do rito
destina-se a entrega do totem a Kenai, e é a partir desse momento o Grande Espírito
guia suas ações. A segunda etapa acontece depois das experiências vivida pelo jovem
após sua transformação.
Religião
De acordo com Durkheim (2008) a religião é um sistema formado por crenças
que abarcam símbolos, mitos e ritos que se caracteriza pela divisão entre o profano e
o sagrado. Para este autor, a religião surge pela necessidade que o ser humano tem
em responder a acontecimentos que estavam ou estão fora do seu conhecimento, ou
seja, tudo aquilo que o homem desconhece e não pode explicar são postos numa
ordem sobrenatural.
Fenômenos como os eclipses solar e lunar e as fases da lua foram
considerados sobrenaturais, embora tenham sido explicados posteriormente pela
ciência. Entretanto, fenômeno como a morte, a criação do universo e o que ocorre
pós-morte, são acontecimentos que a ciência ainda não conseguiu responder de forma
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consensual, assim estes fenômenos se encontram numa esfera sobrenatural e são
explicados a partir das diversas concepções religiosas. Interessante foi perceber que
em todos os filmes analisados, a questão religiosa se faz presente, como pode ser
percebido no quadro a seguir:
Filmes
Religião
1. Branca de Neve e os sete anões
Crenças nas bruxas
2. A pequena seria
Crenças nas bruxas
3. O rei leão
Xamanismo
4. O corcunda de Notre Dame
Cristianismo católico
5. O irmão Urso
Xamanismo totêmico
Quadro 2: religiões presentes nas temáticas dos cinco filmes.
Os filmes Branca de Neve e os sete anões e a Pequena Sereia não expressa
um tipo de religião sistematizada, entretanto, apresenta uma das crenças presente no
imaginário popular: crença na existência de bruxas.
Segundo Duarte (2003), no século XV, o cristianismo perseguia mulheres que
detinham certos conhecimentos, dentre eles os saberes medicinais (ervas) e que, de
certa forma, iam de encontro com os valores morais cristãos da época. Essas
mulheres foram consideradas bruxas e caçadas pelos conhecimentos que tinham.
Como forma de condenar ou acabar com esse tipo de “mal” elas eram queimadas
vivas, pois assim teriam suas almas purificadas.
De acordo com Sant’Anna (2005), as fadas e as bruxas são seres
sobrenaturais que em geral estão contidas nas histórias infantis. Elas incorporam a
noção de bem e mal. Neste caso, as bruxas são representadas, principalmente no
imaginário popular, como velhas narigudas, de risada estrondosa e possuem uma
vassoura com a qual se locomovem. Elas possuem poderes mágicos com os quais
elas fazem seus encantos ou feitiços.
Embora a bruxa do filme em questão use seu poder para fazer o mal, podemos
comparar sua prática com as de curandeiros, benzedores e vendedores de ervas de
várias partes do mundo. Em nossa região é muito comum pessoas trabalharem na
manipulação de ervas ou objetos que posteriormente farão parte de ritos ou que serão
sacralizados e ofertados para divindades. Nesse contexto, temos pessoas que
compram os produtos para serem utilizados em trabalhos ou seções de cura, mas
também encontramos pessoas que “encomendam trabalhos ou despachos” com a
finalidade de causar o mal. As porções manipuladas em nome das divindades podem
trazem benefícios, como sorte no amor, riqueza, felicidade ou até mesmo malefícios
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
quando, usado para causar o mal a um inimigo ou rival. No filme “A pequena Sereia”,
onde detectamos a religiosidade popular, Ariel não exista em encomendar um feitiço
para a bruxa do mar em troca da realização de seu desejo, que é ter pernas em lugar
da cauda de peixe. Assim, os filmes infantis alimentam o imaginário popular e por
vezes trazem a tona a figura das bruxas que continuam presente e se renovam no
contexto infantil.
O Rei leão apresenta como religião o Xamanismo. Esse sistemas de crenças
acredita nos Espíritos dos Ancestrais como seres divinos. Eles têm como função guiar
e orientar as ações de seus descendentes.
Segundo Montal (1986 p.13), a palavra xamã deriva do tungue saman, é
semelhante ao termo em sânscrito sramana e ao termo em pâli samana que significa
“homem inspirado pelos espíritos”.
O xamanismo é uma religião que tem como fenômeno religioso a “técnica do
êxtase 17”. É característico da “Ásia Central e Setentrional (povos altaicos, buriatas,
samoiedos, iacutes, tungues, voguls etc) e das regiões árticas norte-européias
(lapões)”. Os primeiros registros que temos dessa religião são do século XIII e foram
feitas por caçadores noruegueses. No século XVII, o arcipreste ortodoxo Avvakum foi
o primeiro a testemunhar as práticas xamânicas dos povos norte siberianos.
Fenômenos da mesma natureza são encontrados entre os esquimós, os índios
da América do Norte, da América Central e América do Sul, na Oceania, na Austrália
etc. O xamanismo constitui um conjunto de práticas que adaptam e mesclam de
acordo com a cultura, no entanto, apresentam as mesmas características religiosas,
dentre as religiões que se assemelham com o xamanismo, destacamos o Totemismo.
O xamanismo, segundo Piazza (2005), é uma crença que provavelmente tenha
surgido no continente asiático e o totemismo no continente australiano. “O xamanismo
é próprio dos nômades” Piazza (2005, p. 55). O modo de vida desses povos os leva a
realizar “grandes experiências míticas” nas quais os xamãs realizam viagens
espirituais em busca de curas e de outros benefícios para os membros da aldeia e/ou
de malefícios para os inimigos.
Manifestação religiosa
Conforme Assis, Pereira (2010) através da religiosidade, aquele que crê
17
A técnica do êxtase segundo Eliade (1998 apud FERREIRA, 2003, p. 6) consiste no
despedaçamento do corpo seguido pela renovação dos órgãos internos e das vísceras,
ascensão ao Céu e diálogo com os deuses ou os espíritos; descida aos Infernos e contato
com os espíritos e as almas dos xamãs mortos; revelações diversas de ordem religiosa e
xamânica (segredos do ofício).
FONAPER
manifesta sua fé. Ela se expressa na prática do homem religioso dentro e fora dos
sistemas religiosos ou dos lugares sagrados.
As festas religiosas, os ritos, a missa ou o culto são momentos em que o
religioso/crente se liga com a divindade e, portanto, são formas de manifestações
religiosas. Por suposto, aspectos ligados a religiosidade podem ser encontrados em
diferentes campos da produção cultural, já que a religiosidade também se faz fora dos
sistemas religiosos.
Nas festas religiosas, alguns ritos têm como função, segundo Eliade (2010),
atualizar acontecimentos que fundamentam, de alguma forma, as religiões. Por
exemplo, no cristianismo a Semana Santa atualiza a paixão, morte e ressurreição de
Cristo. Nos filmes analisados são muitas as passagens onde manifestações religiosas
podem ser claramente identificadas, como veremos no quadro abaixo:
Filmes
Manifestação religiosa
1. O rei leão
Cerimônia de apresentação de Simba
Simba manifesta sua crença
2. O corcunda de Notre Dame
Temor de Frollo diante das imagens dos
Santos
Pedido de Esmeralda
3. O irmão urso
Cerimônia de Iniciação de Kenai
4. Branca de Neve
---------------------------------------
5. A pequena Sereia
--------------------------------------Quadro 3: manifestações religiosas
A cerimônia de apresentação de Simba nos remete ao ritual do batismo,
principalmente o batismo dos cristãos católicos.
No filme O rei leão a manifestação religiosas em destaque é o rito de
passagem. “A iniciação é uma longa série de cerimônias que têm por objetivo
introduzir o jovem na vida religiosa: ele sai, pela primeira vez, do mundo profano onde
passou sua primeira infância, para entrar no âmbito das coisas sagradas”
(DURKHEIM, 2008, p. 71). O autor em questão deixa evidente que o jovem sai do
mundo profano e entra no sagrado, ou seja, o jovem não deixa de ser profano. Com a
concretização do rito o jovem, ou qualquer outro que esteja sendo iniciado, morre e
renasce para uma nova forma de viver o mundo.
No filme O corcunda de Notre Dame o modo como os personagens fílmicos se
portam diante do sagrado nos remete a Otto (2007), que diz que essa relação do
homem com a sua divindade é de dependência, no entanto, essa dependência
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
acontece numa esfera sobrenatural.
Ainda segundo este autor, como o crente tem consciência de seus pecados, ao
mesmo tempo em que ele tem fascínio por seu criador, ele o teme. Quando o religioso
faz seus pedidos e agradece, se sente pequeno diante da divindade. Observamos tais
características nos personagens Frollo e Esmeralda.
As festas religiosas, os ritos religiosos praticados e vividos pelos homens
religiosos e o uso de amuletos, são entendidos como manifestação do fenômeno
religioso e formas de expressão de fé de todo crente. Sendo assim, consideramos que
o fenômeno religioso é observado na devoção do homem religioso dentro ou fora dos
sistemas religiosos.
Experiência religiosa
A experiência religiosa se difere de manifestação religiosa. A primeira trata da
experiência religiosa onde só quem vive o momento pode compreender o fenômeno, já
a segunda trata da expressão de fé do homem religioso.
Eliade (2010) chama de hierofania as manifestações do sagrado (Deus) diante
do profano (homem). Segundo o autor, quando Moisés ouve do Senhor: “não te
aproximes daqui, [...] tira as sandálias de teus pés, porque o lugar onde te encontras é
uma terra Santa” (ELIADE, 2010, p. 25) acontece uma hierofania, ou seja, de algum
modo o sagrado se manifesta ao profano e no caso de Moisés, o sagrado se manifesta
a ele sob a forma de fogo. No filme de número 3, a aparição de Mufasa a Simba
retrata bem a situação de hierofania.
Em geral, a hierofania é a manifestação do sagrado a uma pessoa com o
intuito de revelar um lugar sagrado ou acontecimentos futuros. Para Otto (2007), é na
experiência religiosa que o homem vive o sagrado. Nos filmes, percebe-se essa
questão na transformação de Ariel e Úrsula em humanas.
Filmes
Experiência religiosa
1. Branca de Neve e os sete anões
Transformação da madrasta em bruxa
2. A pequena sereia
Transformação de Ariel e Úrsula em
humanas
3. O rei leão
Aparição de Mufasa a Simba
4. O irmão Urso
Transformação de Kenai em urso
5. O corcunda de Notre Dame
-------------------------------------------
Quadro 4: experiência religiosa
FONAPER
Como vimos, os filmes retratam bem a questão. São situações que também
podem ser comparadas com as experiências religiosas que conhecemos, como por
exemplo, no cristianismo católico, a Anunciação, a visão do apóstolo Paulo e o achado
da imagem de Nossa Senhora de Nazaré pelo caboclo Plácido em Belém do Pará.
Experiências religiosas também estão registradas em livros sagrados, pois, elas fazem
parte do mito da criação o nascimento dos deuses. A experiência com o sagrado é
manifestada principalmente nas religiões afro e pajelança, pois, as divindades nessas
religiões encarnam o corpo dos praticantes da religião, nesse caso, acontece uma
experiência com o sagrado.
Considerações finais
Este trabalho traduz nosso esforço em analisar manifestações do fenômeno
religioso presentes em filmes infantis, verificando como aparecem nos enredos das
películas questões relacionadas a: religião, manifestação religiosa e experiência
religiosa.
A religiosidade foi constatada nos filmes, através da manifestação do
fenômeno religioso e as religiões detectadas nos enredos foram: o xamanismo, o
cristianismo católico, o imaginário religioso popular e o xamanismo totêmico. A
manifestação religiosa se expressa nas representações religiosas dos diferentes
protagonistas dos filmes e a experiência religiosa é manifestada nas experiências
sobrenaturais que acontecem na vida de alguns personagens.
Concluímos que, de um modo ou de outro, nos diferentes enredos dos filmes,
houve manifestação do fenômeno religioso traduzido no modo como alguns
personagens expressavam e operavam com suas crenças e fé. E isso ficou
evidenciado nas festas religiosas e ritos praticados e vividos pelos personagens,
traduzindo assim manifestações do fenômeno religioso e formas de expressão de fé
naqueles cenários.
Nos filmes a questão religiosa esteve bem demarcada por imagens, símbolos,
representações e falas, e as experiências religiosas foram traduzidas/representadas
nos diferentes encontros dos personagens centrais com o Transcendente/Sagrado. E
como afirma Otto (2007), é por intermédio dessa experiência religiosa que o homem
vive e vivifica o Sagrado.
Concluímos ainda que pesquisas realizadas com os filmes e desenhos
infantis podem se constituir em uma rica fonte de investigação para a produção de
novos conhecimentos na área de ciências da religião, e em especial, para o ensino
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
religioso escolar, sobretudo se filmes como os analisados neste trabalho forem
utilizados como recurso didáticos.
Referências
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ASSIS, Angelo Adriano Farias de; PEREIRA, Mabel Salgado. Religiões e
religiosidades: entre a tradição e a modernidade. São Paulo: Paulinas, 2010.
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FONAPER
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WILGES, Irineu. Cultura religiosa: as religiões do mundo. 6 ed. Petrópolis, RJ:
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Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
O ENSINO RELIGIOSO NA ESCOLA PÚBLICA NA PERSPECTIVA DOS
PROFESSORES
Maria Lúcia Gomes Figueira de Melo - UEPA18
Rosália Leite de Medeiros - SEDUC/PA19
Resumo
Este artigo se propõe a analisar o ensino religioso com ênfase em uma cultura de paz. O
“lócus” observacional deste estudo foi a Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio “Luiz
Nunes Direito”, considerando que no seu Projeto Político-Pedagógico se propõe a
operacionalizar um ensino intercultural baseado na paz em todas as dimensões sociais da vida,
a fim de alcançar uma relação de solidariedade humana entre as pessoas envolvidas no
processo educativo pela escola. O paradigma teórico que serviu de referencial neste estudo foi
o do Holismo. Resultados obtidos neste trabalho contribuem para o aprofundamento do debate
sobre o ensino religioso centrado em uma Cultura de Paz.
Palavras-chave: Ensino Religioso. Cultura da Paz. Escola Pública.
Introdução
Este artigo constitui um fragmento de uma pesquisa mais ampla que
problematizou como objeto de estudo a Religiosidade e a Cultura de Paz, tendo
como objetivo analisar o Projeto Político Pedagógico da Escola de Ensino
Fundamental e Médio Luiz Nunes de Direito, localizada na Cidade Nova IV, WE-36,
S/N, Bairro do Coqueiro, Ananindeua/PA.
A pesquisa teve entre seus objetivos identificar, nos conteúdos e metodologia
desenvolvidos pelos professores, como eram repassados os conteúdos programáticos
do ensino religioso para os alunos do Ensino Fundamental de 5ª a 8ª série ou 6º ao 9º
ano. Para isso buscou analisar os princípios básicos que fundamentam o Ensino
Religioso e identificar as condições materiais de existência dos professores
elaborando seu perfil e atuação na escola mencionada. Entre os elementos que
compuseram o levantamento de dados destacamos itens sobre a concepção de
religiosidade dos sujeitos pesquisados, as práticas pedagógicas dos docentes e
procuramos desvelar se o Ensino Religioso ministrado é confessional, catequético ou
ecumênico, intercultural, transdisciplinar. Nossa abordagem privilegiou o enfoque
holista na análise e interpretação dos dados coletados em nossas observações
sistematizadoras e nas entrevistas realizadas com os docentes no decorrer da
pesquisa.
18
Doutora em Gestão Educacional. Vice-Líder do Grupo de Pesquisa Sociedade, Ciência e
Ideologia. Professora de Prática Pedagógica do Ensino Religioso, Sociologia e Orientação de
TCC do Curso de Ciências da Religião /UEPA. E-mail: [email protected].
19Graduada em Ciências da Religião/UEPA.
FONAPER
Fundamentação Teórica: o Ensino Religioso baseado na Cultura de Paz no
discurso científico
A pesquisa se respaldou como fio condutor de análise pela abordagem
Teórico-Metodológica do Holismo, e mais especificamente pela vertente teórica do
Holismo Eco(Teo)logia da Libertação, por considerarmos que esta tendência constitui
o paradigma teórico que dava mais conta de captar as múltiplas dimensões de uma
realidade complexa e multifacetada, sobretudo quando o laboratório de pesquisa
incide em uma Escola Pública de Ensino Fundamental e Médio, localizada no
município de Ananindeua que, vem passando por um desordenado processo de
urbanização. Em razão disso o Ensino Religioso pode estar voltado a contribuir para
reduzir a intolerância religiosa através de uma cultura de paz.
O termo Holismo advém etimologicamente do vocábulo “HOLO”, que significa
“todo”, razão pela qual a concepção Holística concebe o “ser” como uma totalidade
indivisa em constante transformação, onde cada parte está no todo e, o todo está em
cada parte. Assim, para a concepção Holística, as partes de um determinado “ser”,
tomado como objeto de estudo, constitui uma unidade viva, onde suas partes são
eventos em movimento interconectados, que só podem ser explicados quando se leva
em consideração o movimento cósmico universal do planeta Terra em conexão com
os demais corpos estelares.
Assim, sob essa perspectiva teórica, tomou-se o objeto investigado, que no
nosso estudo foi o Ensino Religioso baseado em uma Cultura de Paz no Ensino
Fundamental da Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio “Luiz Nunes
Direito”, enquanto uma totalidade sócio-histórica interconectada estruturalmente com a
comunidade escolar da qual faz parte, com a realidade brasileira e com o mundo
contemporâneo.
O Holismoenquanto abordagem teórica paradigmática do conhecimentobaseiase em um conjunto de princípios básicos, entre os quais destacamos:
1. Princípio da Universalidade Cósmica:
O objeto do ponto de vista do Holismo deve ser sempre considerado em sua
totalidade, ou seja, em sua estrutura global e nunca como parte fragmentada e
setorizada, por isso em nosso estudo consideramos o Ensino Religioso e a cultura de
paz como duas dimensões sociais que fazem parte da estrutura cósmica do planeta;
2. Princípio da Bioenergeticidade:
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Para o Holismo todo objeto que possui energia constitui uma estrutura viva.
Apoiados na teoria da relatividade de Einstein, toda energia é capaz de se transformar
em matéria, ou seja, se materializar; da mesma forma que toda matéria possui um
campo energético, sendo, portanto capaz de transformar-se em energia. Portanto
neste estudo consideramos a religiosidade um campo de forças energéticas, capaz de
liberar energias poderosas sob uma perspectiva de guerra ou de paz, embora
consideremos que nossa proposta se centraliza em um Ensino Religioso baseado em
uma cultura de paz;
3. Princípio da Inteligibilidade Holística:
Para o Holismo toda e qualquer estrutura viva possui um código de inteligência
do sistema planetário global. Da mesma forma, que o código de inteligência do
sistema global se reproduz internamente através das várias subestruturas que lhe
fazem parte. Assim, caso cultivemos um Ensino Religioso baseado em uma Cultura de
Paz, construiremos uma religiosidade coletiva e cósmica em sintonia com a paz
universal;
4. Princípio da Transcendentalidade:
As explicações holísticas não tomam como referência o sujeito individual
isolado da humanidade, mas o sujeito coletivo, ou seja, a humanidade cósmica, que
significa a humanidade em conexão com a natureza, cultura, religiosidade, paz,
sociedade e com o universo planetário total. Como somos seres de transcendência,
segundo Boff (2000), somos, portanto capazes de romper com uma cultura de
violência para instaurar uma sociedade nova baseada em uma cultura de paz;
5. Princípio do Ecocentrismo:
Para o Holismo, segundo Capra (1993), o núcleo unificador da consciência
cósmica é a consciência ecológica, razão pela qual os holistas consideram a Ecologia
como centro da consciência plena, objetivando a construção de uma cultura de paz
universal;
6. Princípio da Transdisciplinaridade:
Para o Holismo as explicações científicas devem ser transdisciplinares, ou seja,
transcender as diversas disciplinas tomadas isoladamente, para corresponder a uma
unidade transdisciplinar. Neste sentido, a religiosidade do ser humano não deve se
basear em uma única disciplina (ensino religioso), mas deve ser cultivada
transversalmente em todas as dimensões da vida;
7. Princípio da Dialeticidade do Sujeito/Objeto:
Para o Holismo, segundo Boff (2000), durante o processo de conhecimento,
sujeito e objeto não são duas entidades separadas, mas se relacionam,
FONAPER
interpenetrando-se dialeticamente para formar uma unidade estrutural, ou seja, uma
unidade de consciência cósmica em sintonia com uma cultura de paz em todas as
dimensões sociais da vida, por isso são ambos “sujeitos-conhecedores” do processo
de conhecimento global;
8. Princípio do Autoconhecimento:
Para o Holismo, segundo Weil (1987), o conhecimento científico deverá iniciarse pelo conhecimento do próprio homem, ou seja, iniciar-se por um autoconhecimento
de acordo com o pensamento socrático de que “conhece-te a ti mesmo”, o que
certamente motivará para o próprio conhecimento do homem em todas as dimensões
sociais da vida, como no caso da religiosidade, baseado em uma cultura de paz. Além
disso o conhecimento do movimento cósmico constitui o auto conhecimento,
considerando que o homem é também parte integrante do planeta nas diversas
dimensões físicas e transcendentais do mundo;
9. Princípio da Unidade da Diversidade:
De acordo com Miller (1991), os seres humanos embora distintos, formam uma
unidade do diverso, ou seja, a humanidade, por isso é formada por uma sóciobiodiversidade, cujas diferenças devem ser respeitadas em sua unidade estrutural.
Neste sentido entendemos que um Ensino religioso Baseado em uma Cultura de Paz
deve priorizar os princípios do ecumenismo, o não proselitismo confessional e um
ensino intercultural;
10. Princípio do Holomovimento:
ParaPribam (1991), o universo ou consciência cósmica constitui uma estrutura
global em constante transformação, nunca, pois permanecendo paralisada, a vida é
um constante fluir em holomovimento de contínua mudança conjuntural e estrutural.
Neste sentido, se torna compreensível as possibilidades sócio-históricas que visam a
transformação de um ensino religioso jesuitizado e dogmático em um novo ensino
religioso libertador.
As principais vertentes do Holismo são 5 (cinco) e utilizaremos algumas em
nossa análise como se segue.
1 HolismoAntroposófico ou Espiritualista:
Fundador: Rudolf STEINER
Esta vertente teórica da abordagem holística foi fundada pelo filósofo alemão
Rudolf Steiner (1919), que buscou em seus estudos sobre a Antroposofia uma ciência
Filosófica e Antropológica que enfatiza que o homem, ou seja, o “ser” humano não é
composto apenas de matéria, mas um conjunto sensível de sentimentos, desejos,
preferências, emoções e paixão, instâncias diretamente relacionadas à estrutura
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
espiritual, ou seja, a “alma humana”. Neste sentido, o fundador da Antroposofia, insiste
que a alma humana deve ser antes de tudo, entendida e não simplesmente explicada,
como se fosse um simples número, uma expressão matemática, ou ainda, apenas
uma substância corpórea material, mas principalmente como um “ser” humano em sua
dimensão integral, especialmente afetiva e espiritual capaz de formar um campo de
forças energético, especialmente quando considerado coletivamente em sua conexão
com a esfera do “sagrado”, em cuja relação amplia a sua consciência espiritual com a
energia suprema e universal do divino.
Rudolf Steiner aplicou os seus fundamentos antroposóficos em uma Escola
que fundou para os filhos dos operários de uma empresa de cigarros na Alemanha,
cuja marca era “Waldorf-Astoria”. A partir daí, os seus ensinamentos e a sua
experiência educacional ficaram conhecidas em todo o mundo como Pedagogia de
Waldorf, que se implantou em vários países, inclusive no Brasil, segundo a qual o “ser
humano” é matéria e energia ao mesmo tempo, ou seja, corpo e espírito
simultaneamente.
2 Holismo da Ecologia Profunda ou Transpessoal:
Fundadores: Arne NAESS e Warwick FOX
Continuadores: Frijof CAPRA, MILLER e Pierre WEIL
A segunda vertente do Holismo é a tendência teórica do Holismo da Ecologia
Profunda também denominada de HolismoTranspessoal. Segundo esta vertente, o
indivíduo não vive sozinho no mundo isolado de seus semelhantes, mas interage
constantemente com outros indivíduos dando origem a sociedade, ou seja, uma
consciência cósmica; convém ressaltar que, para a vertente do HolismoTranspessoal
não existem apenas terráqueos como indivíduos inteligentes, mas outros mundos, ou
seja, outras galáxias, além do sistema solar cientificamente conhecido por nós.
Para os teóricos desta vertente, a consciência humana coletivamente
constituída transcende à consciência meramente individual, para construir-se como
uma consciência universal, ou seja, transpessoal, transcendente, transdisciplinar,
mundial e planetária.
3 Holismo Ecológico Social:
Fundador: Murray BOOKCHIN
Continuadores: Roberto CREMA, Moacir GADOTTI e outros.
Para os Holistas Ecológicos Sociais, o homem é apenas um dos elos da cadeia
do ecossistema natural e sócio-cultural da vida, portanto o fundamental é que a
FONAPER
educação se baseia em uma perspectiva da Ecopedagogia, com a finalidade de
construir uma educação de base ecológica, através da qual o indivíduo, cultura e
natureza se interpenetrem estruturalmente, dando origem a uma consciência ecológica
global, que objetive superar as relações alienadas de estranhamento entre essas três
instâncias, tendo em vista resgatar o equilíbrio do ecossistema global.
4 HolismoEco-Socialista Marxista ou Eco-Sustentável:
Fundadores: Serge MOSCOVICI e Ignacy SACHS
Continuadores: Edgar MORIN, Gustavo CHERUBINE, Natália BERNOL, John
FOSTER, Ludolf BAHRO, Fring FETSCHA, Willian LEISS e outros.
Esta vertente do Holismo se baseia no pensamento marxista, particularmente
nas obras de juventude de Marx e Engels para fundamentar a relação homemnatureza.
Segundo esta perspectiva, tanto as correntes no Naturalismo que dá
prevalência à natureza; como o Culturalismo que defende a primazia do homem, estão
superados porque falam linguagens diferentes. Para os Eco-Marxistas, a tendência é
dialogar criativamente trilhando o caminho de um “neo-naturalismo” que defende as
necessidades da bio-sociodiversidade do meio ambiente planetário. Esse “Novo
Naturalismo” se baseia em três pressupostos básicos:
a)
O homem produz o meio que o cerca e, é ao mesmo tempo seu produto;
b)
A natureza faz parte da história humana, portanto, ela é, ao mesmo tempo,
natural e social;
c)
A coletividade e não o indivíduo isolado, se relaciona com a natureza, pois
a sociedade pertence à natureza, constituindo-se num produto do mundo
natural através do trabalho, ou seja, um mundo social.
A vertente do HolismoEco-Socialista Marxista considera que o importante é a
possibilidade histórica do homem estabelecer uma relação não-alienada e antidestruidora com a natureza e com a sociedade global, tentando construir uma nova
aliança, ou seja, uma unidade sócio-ambiental superior de abertura com o mundo
sócio-cultural e com o universo cósmico.
No entendimento desta vertente, Marx nos “Manuscritos Econômicos e
Filosóficos” (1844) e em “O Capital” (1867), assim, como Engels em sua “Dialética da
Natureza” (1882), criticaram a relação alienada do homem com a natureza, onde o
primeiro se utiliza da segunda como instrumento de exploração para a acumulação da
mais valia, visando a reprodução ampliada do capital. Neste sentido, essa nova
“utopia” de que fala Moscovici e Sachs está em Marx, que propunha não um retorno
ao modo comunal primitivo, para se tomar como modelo o mito do “ideal selvagem”
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
como os ecologistas sociais utópicos, mas a construção de um modo comunista
moderno de produção, no qual a natureza e o homem ainda que distintos, possam
encontrar a sua unidade na diversidade, ou seja, a sua síntese qualitativamente
superior, como superação de suas relações antitéticas.
Nesta Nova Síntese, como uma unidade da sociobiodiversidade, as partes
formariam uma totalidade organicamente dialética que, a conduzirá a negação da
negação, ou seja, à uma síntese nova baseada em um novo padrão de
relacionamento sustentável com o planeta.
5 Holismo Eco(Teo)logia da Libertação:
Fundador: Leonardo BOFF.
Continuadores: Frei BETTO, Gustavo GUTIERREZ, Rubem ALVES, B. SWIMME, T.
BERRY eoutros.
Esta vertente do Holismo embora também se baseie no pensamento marxista,
preferentemente nas obras de maturidade de Marx e Engels, especialmente em “O
Capital”, livros I, II e III e, sobretudo nas teorias da mais-valia de Marx, faz uma severa
crítica à “Teoria da Alienação” constante de suas obras de juventude, nas quais
apresenta uma concepção negativa da religião enquanto “ópio do povo” e, que a
mesma enquanto pertencente à uma ordem social pretérita, seria automaticamente
extinta, quando as classes proletárias se apoderassem da filosofia da práxis e, a
transformassem em forças materiais revolucionárias.
Segundo Boff (2004), esta concepção restrita de religião enquanto ideologia
alienadora foi predominantemente vulgarizada pelo Marxismo Stalinizado enquanto
patrulhamento ideológico oficial durante a época de Joseph Stalin (1879-1953) no
poder da URSS após a morte de Lênin (1924), mas que no interior do pensamento
marxista, quem mais se aproximou de uma concepção ampliada de religião, foi o
filósofo italiano AntonioGramsci (1891-1937), segundo o qual, a religião é uma forma
especificamente histórica de ideologia, que tanto pode desempenhar como nos
primórdios do Cristianismo, um papel revolucionário, fornecendo às classes populares
uma base ideológica para uma ação transformadora, como também um papel
conservador e tradicional, a exemplo do catolicismo jesuitizado e dogmático,
transformado em simples opiáceo às massas populares. A religião enquanto uma
forma particular de ideologia pode tornar-se de acordo com as condições sóciohistóricas de cada contexto social, uma força revolucionária, orgânica, tradicional, ou
até mesmo entrar em crise, adaptar-se e transformar-se, mas sempre tenderá a
permanecer enquanto uma dimensão da cultura como uma força social dominante,
FONAPER
secundária, progressista ou conservadora e, por isso varia nas diversas sociedades
historicamente contextualizadas.
Entendendo que os novos sujeitos do futuro de que falara Gramsci seriam
potencialmente os oprimidos quando tomasse consciência política de seu verdadeiro
papel na história, um grupo de teólogos da América Latina, críticos do capitalismo
construíram a Teologia da Libertação enquanto um grito dos socialmente excluídos.
Mais tarde, de acordo com Boff (2004), quando consideraram que esta poderia ao
invés de confrontar-se, complementar o novo paradigma emergente, ou seja, se aliar
ao “grito da Terra”, conseguiram fundar a vertente holística da Eco(Teo)logia da
Libertação, segundo a qual toma por base os seguintes princípios:
1. Totalidade/diversidade: O universo e o fenômeno humano do planeta Terra
são totalidades dinâmicas organicamente relacionadas. Ainda que as
totalidades sejam feitas de diversidades, os filhos e as filhas da Terra são
membros da natureza, portanto a situação degradante de vida dos pobres e
dos oprimidos em geral representa uma agressão ecológica, o que evidencia
que as diversidades se interligam organicamente formando uma totalidade
cósmica;
2. Re-ligação/autonomia Relativa: Todos os seres estão interligados e, por
isso, sempre re-ligados entre si, um precisa do outro para existir. Em razão
deste fato, há uma solidariedade cósmica de base, embora cada um goze
de autonomia relativa e possua sentido e valor próprios.
3. Relação/Campos de força: Todos os seres vivem numa teia de relações,
por isso fora da relação nada existe, pois tudo está dentro de campos
energéticos e morfogênicos, razão pela qual tudo tem a ver com tudo em
todas as dimensões da vida, física, transcendental e universal.
4. Complexidade/Interioridade: Tudo vem carregado de energias em diversos
graus, mas quando condensadas se apresenta como matéria e, ao se
desmaterializar-se se transforma em campo energético. Essa dialética entre
energia-matéria e vice-versa, gera uma complexidade, especialmente nos
seres vivos superiores que evidencia a intencionalidade do universo
apontando para uma interioridade, ou seja, uma consciência de elevada
complexidade. Esta compreensão abre espaço para a necessidade de um
denominador comum que tudo unifica e, “Deus” interpretado a partir da
consciência cristã que lê no rosto dos oprimidos a atualização de Cristo
crucificado, poderia preencher este significado, ressuscitando-nos para a
vida e para liberdade eternas.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
5. Complementaridade/Reciprocidade/Caos: Toda realidade se dá sob a
forma de ordem e desordem, caos e cosmo, e, no nível humano, da forma
“sapiens” (inteligente) e “demens” (demente). São dimensões da mesma
realidade, por isso são complementares e recíprocas.
6. Seta do Tempo/Entropia: Tudo o que existe, preexiste e coexiste, portanto
a seta do tempo marca todas as relações e sistemas, dando-lhes o caráter
da irreversibilidade. A história universal cai sob a seta termodinâmica do
tempo, quer dizer deve-se levar em conta a entropia ao lado da evolução
temporal nos sistemas tomados em si mesmos. Mas o ser humano pode
retardar seus efeitos nocivos prolongando as condições de vida abrindo-se
ao mistério para além da morte térmica do sistema, ou seja, para a sintropia,
para a sinergia e para a dimensão de uma vida de “neguentropia” e
absolutamente dinâmica.
7. Destino Comum/Pessoal: Como temos uma origem comum que nos
interliga universalmente, temos um destino comum, pois embora sejamos
sujeitos singulares e únicos, estamos todos no ecossistema planetário em
interação com os demais seres da mesma e diferentes espécies.
8. Bem Comum Cósmico/Bem Comum Particular: O bem comum não é
apenas humano, mas de toda comunidade cósmica. Tudo o que existe e
vive, merece existir, viver e conviver. O bem comum particular emerge a
partir da sintonia e sinergia com a dinâmica do bem comum planetário e
universal.
9. Criatividade/Destrutividade: Os seres humanos no conjunto das interações
com outros seres são extremamente criativos e co-criativos porque podem
interferir no ritmo da criação, tanto para evoluir, preservando e expandindo o
Sistema-Terra, como também para agredir o planeta como sinônimo de
“Terra arrasada”, eis sua destrutividade. Todavia, sob a perspectiva do
paradigma emergente (Holismo) aliado a Teologia da Libertação, devemos
reforçar nossas potencialidades latentes voltadas para reacriatividade
construtiva de preservação e conservação de nossa mãe-gaia, co-evoluindo
conscientemente junto com ela.
10.
Atitude
Holístico-Ecológica/Negação
do
Antropocentrismo:
A
atitude de abertura e de inclusão plena propicia uma cosmo-visão
holisticamente ecológica que contribui para superação do histórico
antropocentrismo,
nos
propiciando
enquanto
“seres”
solidários
e
FONAPER
complementares, à construção de uma nova aliança com a vida de todos e
com a própria vida do planeta.
Assim, como a Teologia da Libertação reconheceu o mérito do marxismo por
ter mostrado que o pobre é um oprimido, alguém que foi desumanizado por um
processo de superexploração econômica, política e social, pressupôs para a
construção desta vertente teórica, a necessidade de uma nova aliança dos humanos
com os demais seres, ou seja, uma nova convivência para com o criado e a gestação
de uma ética e mística de fraternidade para com a inteira comunidade cósmica. Neste
sentido, segundo Boff (2004, p.157), o significado da libertação foi ampliado, “porque
todos são oprimidos por um paradigma que a todos escraviza, de maus-tratos da
Terra, do consumismo; de negação da alteridade e do valor intrínseco de cada ser”.
Portanto, o novo paradigma da Eco(Teo)logia da Libertação propõe are-ligação de
tudo com o “todo”, permitindo a emergência de uma nova religião, que na
convergência com a diversidade, objetiva construir a paz entre os humanos com os
demais seres na Terra.
Considerando pois, que as categorias de análise de nosso estudo, são mais
profundamente trabalhadas pelo Holismo da Eco(Teo)logia da Libertação, optamos por
esta abordagem como paradigma central para servir como referencial teórico desta
pesquisa científica.
Conceitos básicos utilizados na pesquisa
Com a finalidade de uniformizar a linguagem científica utilizado neste trabalho
procedeu-se na acepção teórica do paradigma que serviu de referência neste estudo,
a definição científica dos seguintes conceitos básicos:
a)
ENSINO RELIGIOSO: Corresponde à uma matéria que integra a parte
diversificada do currículo da Educação Básica. De acordo com a emenda do
art. 33 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional Brasileira – Lei nº
9394/96, o Ensino Religioso deverá ser ministrado de forma transdisciplinar,
facultativa e em horário normal, sem proselitismo e de forma científica.
Do ponto de vista do Holismo Eco(Teo)logia da Libertação, o Ensino Religioso
não é apenas para ser ensinado cientificamente, mas para ser vivido em toda
sua inteireza, ou seja, enquanto uma ação/reflexão/transformação educativa
para libertar os sujeitos envolvidos no processo educacional em função do
bem-estar comum do planeta Terra, dos humanos e de todos os seres, no
exercício da convivência em todas as dimensões da vida através de uma
cultura de paz universal;
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
b)
CULTURA DE PAZ: Corresponde ao exercício da liberdade, da
convivência universal e da celebração da vida entre todas as religiões e todos
os povos do planeta Terra.
Do ponto de vista do Holismo da Eco(Teo)logia da Libertação, a cultura de paz
inaugura um novo desafio verdadeiramente ecumênico: uma nova aliança com
a Terra e com os filhos e filhas da Terra, de tal forma que signifique aquela
aliança que Deus estabeleceu com Noé após a devastação do dilúvio,
mediante relações novas de benevolência, compaixão, solidariedade humana e
profunda veneração pelo mistério que cada religião é portadora e revela. Só
então, haverá uma cultura de paz integral entre os seres no planeta;
c)
ESCOLA PÚBLICA: Corresponde a instituição de ensino implantada
pelas políticas públicas governamentais que devem prover um ensino básico,
obrigatório e gratuito às crianças e jovens que não possuem possibilidades
sócio-econômicas de se escolarizar na rede privada de ensino.
Segundo a perspectiva do Holismo da Eco(Teo)logia da Libertação, a Escola
Pública constitui uma necessidade social educativa da sociedade escolarizadas
que deve propiciar uma educação intercultural, transdisciplinar, ecológica e
politicamente crítica, tendo em vista formar cidadãos conscientes e plenamente
desenvolvidos para exercer a sua cidadania real e, não apenas juridicamente
formal;
O ensino religioso na escola pública na perspectiva dos professores
Neste trabalho se constata que os professores entrevistados da Escola Luiz
Nunes Direito, que a maioria dos docentes que compõem a amostra pesquisada
compreende o Ensino Religioso como uma disciplina que faz parte da estrutura
curricular das últimas séries do Ensino Fundamental e Médio, conforme especifica a
Lei nº 9.394/96 que regulamenta as Diretrizes da Educação Nacional Brasileira e
confirmada pelo FONAPER. Tais informações nos demonstram que o Ensino Religioso
na Escola Pública, encontra-se ainda centrado em uma concepção de disciplina
curricular, quando deveria ser tratado enquanto um tema transdisciplinar que deveria
atravessar as várias áreas de conhecimento, tanto científica, como política, social e
cultural, na medida em que Gramsci (1982), o Ensino Religioso assim como a própria
religião constituem duas dimensões da cultura que perpassa pela sociedade inteira.
Ainda a luz da matriz analítica citada se observa uma concepção de Ensino
Religioso enquanto um estudo sobre religiões, quando segundo a própria proposta do
FONAPER
FONAPER, deveria tratar-se de um estudo Holístico e científico sobre p fenômeno
religioso.
Com a finalidade de confirmar o processo de análise acima basta se conferir
“algumas” falas dos docentes entrevistados quando dizem que:
O Ensino Religioso é uma disciplina que oferece aos alunos uma
visão de fé. É uma disciplina muito importante porque deve
desenvolver uma noção de tolerância. É um ensino que está centrado
no Cristianismo e deve contemplar as diferentes religiões. Penso que
fale na religião em geral. (PROFESSORES Nºs. 1, 2, 3,6, 8 e 9
ENTREVISTADOS, 1º Sem./2013).
Convém ressaltar que além da concepção disciplinar do Ensino Religioso, se
verifica ainda que este tipo de ensinamento é ainda confundido com o estudo das
religiões que deve dar prevalência a religião do Cristianismo. Se observa portanto que
ainda há entre os professores entrevistados um ranço de um Ensino Religioso
catequético, muito embora já haja menção que este Ensino Religioso deve cultuar uma
cultura de paz.
Assim, com base nas considerações analíticas acima podemos concluir que o
Ensino Religioso na Escola Pública passa por uma fase de transição em que a
diversidade, o respeito, a comunhão e a cultura religiosa são também dimensões que
foram reafirmadas pelos professores pesquisados.
Dessa forma, embora não possamos ainda confirmar conclusivamente que já
temos na atualidade um Ensino Religioso baseado em uma cultura de paz, entretanto,
a referida concepção está em vias de construção social entre os professores
entrevistados que em conjunto com os seus alunos fazem parte da comunidade
escolar da unidade de ensino que serviu como laboratório de pesquisa neste estudo.
Práticas Pedagógicas Aplicadas no Ensino Religioso na Escola Pesquisada:
A pesquisa constata que a maioria dos professores entrevistados afirmou que
as práticas pedagógicas aplicadas no Ensino Religioso são motivadas através de
técnicas de dinâmica de grupo, outros colocaram também que recomendam as
atividades de pesquisa, tanto as de campo como as pesquisas documentais através
da Internet.
Com a finalidade de reforçar a análise acima, basta verificar pelas próprias
falas dos docentes entrevistados quando dizem que:
Eu aplico seminários, exposições de trabalhos, dinâmicas de grupo e
atividades de pesquisa sobre as religiões dos povos ... Utilizo
dinâmicas de grupo, seminários temáticos e trabalhos em grupo ...
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Aplico técnica de dinâmica de grupo. (PROFESSORES Nºs. 4, 6, 7 e
8 ENTREVISTADOS, 1º Sem./2013).
Como se pode verificar quase todos os professores pesquisados aplicam
práticas pedagógicas de dinâmica de grupo, além de atividades de pesquisa,
enfatizando que não direcionam a fé de ninguém, mas que todos devem aceitar a fé
do outro para que se cultive uma cultura de paz.
Como se pode concluir através deste tópico, pelo menos com relação às
práticas pedagógicas aplicadas no Ensino Religioso, os professores entrevistados
dessa escola, estão de acordo com os novos paradigmas da educação holística, na
medida em que dão ênfase às técnicas de dinâmica de grupo como forme de motivar a
sensibilidade, a afetividade e a subjetividade dos alunos. Tais práticas pedagógicas de
acordo com a proposta holística de educação, demonstram que o Ensino Religioso
não deve trabalhar pedagogicamente apenas a esfera do cognitivo, mas também as
demais dimensões do saber humano, uma vez que o processo de aprendizagem se
realiza através do corpo inteiro.
A Oferta do Ensino Religioso na Escola Pública na Perspectiva dos Professores:
A quase unanimidade dos professores respondeu que este tipo de ensino deve
sim ser ofertado na Escola Pública, porque visa ampliar a visão de mundo dos sujeitos
da educação, pois além do intelecto os alunos precisam evoluir espiritualmente,
tornando-se seres humanizados de um mundo que deve basear-se em uma cultura de
paz.
Os Professores entrevistados, com a exceção de um que não respondeu,
disseram que o Ensino Religioso é importante porque dá ênfase aos valores humanos
e a uma manutenção da vida humana, por isso consideram que o Ensino Religioso faz
parte da formação do ser humano enquanto cidadão.
Tendo em vista fornecer consistência interna aos nossos argumentos
analíticos, basta verificar alguns trechos dos depoimentos dos docentes entrevistados,
quando afirmam que:
Sim, o Ensino Religioso deve ser ofertado na escola porque objetiva
ampliar a visão de mundo dos alunos e deve ser ministrado para
mostrar a necessidade de que temos de realizar o bem ao próximo,
independente de sua crença... Sim, o Ensino Religioso é importante
para o desenvolvimento espiritual dos alunos, além de favorecer a
formação de um intelecto mais humanizado e a construção de uma
cultura de paz... Sim, porque o Ensino Religioso traz um
conhecimento global para todos e a ajuda na construção de uma
FONAPER
cultura de paz à humanidade inteira. (PROFESSORES Nºs. 1, 2, 4, 7
e 10 ENTREVISTADOS, 1º Sem./2013).
De acordo com as considerações analíticas acima, se conclui que o Ensino
Religioso não deve ser abolido da escola pública porque é um conhecimento
fundamental para o desenvolvimento humano, além de se reafirmar que existe um ser
superior, ou seja, um Deus criador que dá um foco de fé, amor à humanidade e
esperança no futuro.
Como se pode verificar pelas informações dos professores entrevistados, há
aqui neste tópico uma concepção de Ensino Religioso mais em consonância com uma
concepção holística de educação e menos socialmente alienada, na medida em que
quase todos os docentes da Escola pesquisada enfatizaram o não direcionamento
deste ensino para uma religião específica, mas que se deve dar prevalência a
diversidade da cultura religiosa do fenômeno entre os povos da Terra. Merece
destaque também a ênfase que os professores entrevistados deram a importância do
Ensino Religioso no processo de humanização dos seres humanos, bem como à
construção de uma cultura de paz no mundo.
A Religião dos Professores Entrevistados:
Existe uma ligeira prevalência de professores que professam a religião
Evangélica, posto que a metade dos professores se manifestaram como Cristãos
Evangélicos enquanto que 40% disseram que são Católicos, e somente 10%
afirmaram professar uma diversidade religiosa com ênfase na religião Católica,
Evangélica e Espírita.
Um dado digno de registro foi o fato de que enquanto alguns professores
disseram que como a maioria dos brasileiros professa o Catolicismo, então o ensino
ministrado na Escola Pública deve se basear nesta religião, enquanto que outros
disseram que, ainda que a maioria seja Católica, este fato não deve interferir no
Ensino Religioso ministrado.
Com a finalidade de demonstrar os argumentos de nossa análise, vale “a pena”
conferir os discursos dos docentes pesquisados quando dizem que:
Somos em grande maioria Católica, seguindo as tradições que a
religião ensina, por isso o nosso ensino deve se basear nesta religião.
Somos Católicos embora isso não deva influenciar no Ensino
Religioso ministrado. (PROFESSORES Nºs. 1, 6 e 9
ENTREVISTADOS, 1º Sem./2013).
Convém ressaltar que os professores que afirmaram que há uma maioria
Católica na sociedade brasileira, parecem desconhecer o grande crescimento que as
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
religiões Evangélicas tem apresentado nos últimos anos no Brasil. A própria pesquisa
feita entre os professores dessa escola localizada no município de Ananindeua,
demonstra também que a perda de fiéis católicos na contemporaneidade para as
Igrejas Evangélica é um ponto de grande preocupação para a Igreja Católica, Em
nossa opinião apoiamos a posição de Boff (Op.Cit...), a religião de cada um não deve
servir para se cultivar a superioridade religiosa de uma religião sobre a outra, posto
que o Ensino Religioso na Escola Pública não deve cultivar o preconceito religioso,
mas um ensino científico do fenômeno religioso, dando-se prevalência a diversidade
cultural dos povos, tendo em vista a construção de uma cultura de paz mundial.
Formas do Ensino Religioso que deve ser Ministrado na Escola Pública:
Cerca de 80% dos docentes entrevistados disseram que o Ensino Religioso
deve ser ministrado na Escola Pública de forma intercultural, ecumênica e
intereligiosa, de modo a se respeitar a diversidade cultural dos povos, apenas 20%
disseram que a forma correta de se ministrar esse ensino é baseando-se na religião
Católica, posto que as aulas devem ensinar o aluno a orar, principalmente o “Pai
Nosso”.
Como se pode observar entre os professores entrevistados já há um avanço no
processo de conscientização política dos professores da Escola Pública, pois ao se
tornar por base os depoimentos dos docentes da Escola em análise, uma parcela
representativa da amostra pesquisada reafirmou a necessidade de um ensino interreligioso e científico.
Assim, tendo em vista aprofundar e justificar nossos argumentos analíticos
acima, torna-se de fundamental importância transcrever na íntegra algumas “falas” dos
entrevistados quando dizer que:
O Ensino Religioso deve ser ministrado respeitando-se todo tipo de
fé, seja o Candomblé, Espírita, o Evangélico, o Budista e o próprio
Ateu, sem nenhuma discriminação religiosa... Este ensino deve
promover a prática dos valores universais, provocando nos alunos um
interesse pelas questões fundamentais da vida, tais como a ética, a
justiça e o amor... Este ensino deve respeitar todas as religiões e
todos os credos, tendo em vista construir uma cultura de paz no
mundo. (PROFESSORES Nºs. 1, 2, 8 e 10 ENTREVISTADOS, 1º
Sem./2013).
Como se pode concluir neste tópico, apenas 20% dos docentes entrevistados
disseram que o Ensino Religioso deve ser ministrado unicamente tomando-se por
base a religião Católica, enquanto a grande maioria ratifica que este ensino deve ser
FONAPER
ministrado de forma científica, ecumênica, intercultural e interdisciplinar, de modo a se
construir uma cultura de paz mundial.
Considerações Finais
Tomando-se por base os questionamentos principais relacionados às
interrogantes de pesquisa deste estudo, ainda que nossos resultados sejam
diretamente ligados a região de pesquisa, ou seja, a Escola Luiz Nunes Direito,
podemos concluir que as concepções de Ensino Religioso na perspectiva dos
professores entrevistados são várias, não havendo portanto uma única concepção de
ensino religioso na escola pública.
De todo modo, as diversas concepções apresentadas ainda se centram em
uma visão restrita de currículo, na medida em que dão ênfase a um Ensino Religioso
enquanto uma disciplina específica, desconhecendo a sua dimensão transdisciplinar e
transversal que deve “atravessar” toda a estrutura curricular do ensino, tendo em vista
a uma concepção ampla e holística de Ensino Religioso na Escola Pública, baseada
em uma cultura de paz mundial.
Com relação às práticas pedagógicas aplicadas no Ensino Religioso na Escola
Pública, a grande maioria dos professores entrevistados ministram esse ensino
através das técnicas de grupo, bem como através de atividades de pesquisa de campo
e documental pela Internet, além de visitas monitoradas em templos religiosos, de
modo a alcançar não apenas o cognitivo mas também a sensibilidade, a afetividade e
a subjetividade dos alunos, com a finalidade de possibilitar uma aprendizagem
holística, ou seja, pelo corpo inteiro. No que diz respeito se o Ensino Religioso deve ou
não ser ofertado na Escola Pública, a quase unanimidade dos professores respondeu
de modo afirmativo, justificando que este ensino faz parte da formação do ser humano
enquanto cidadão, além de contribuir para o desenvolvimento cognitivo contribuindo
no processo de humanização dos sujeitos sociais e da construção de uma cultura de
paz mundial.
Quanto a forma que o Ensino Religioso deva ser ministrado na Escola Pública,
os professores entrevistados disseram que a melhor maneira de se desenvolvê-lo é
estudando-se o fenômeno religioso de forma científica, ecumênica e interdisciplinar. E
que este ensino deve respeitar todas as religiões, desenvolvendo os valores
fundamentais da vida, tais como a Ética, a Justiça e o amor, ressaltando ainda que
este ensino deve ser não preconceituoso e intercultural tendo em vista a construção
de uma cultura de paz no mundo.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Ao finalizar de forma provisória este estudo, esperamos que os resultados
alcançados nesta pesquisa possam servir para o aprofundamento do debate sobre o
Ensino Religioso na Escola Pública e, ao mesmo tempo possa contribuir para
subsidiar uma proposta de ação pedagógica que priorize um Ensino Religioso de
qualidade social e pedagógica elevada, baseado em uma concepção holística e em
uma cultura de paz mundial.
Referências
BOFF, Leonardo.Ecologia: Grito da Terra, Grito dos Pobres. Rio de Janeiro(RJ):
SEXTANTE, 2004.
EINSTEIN, Albert.Como Vejo o Mundo. Rio de Janeiro (RJ): NOVA FRONTEIRA,
1981.
FOSTER, John. A Ecologia de Marx: Materialismo e Natureza. Rio de Janeiro (RJ):
CIVILIZAÇÃO BRASILEIRA, 2005.
FOX, Warwick.Aproximando a Ecologia Profunda: Uma Resposta à Crítica da
Ecologia Profunda de Richard Sylvan. Tasmânia (AUS): CEA, 1986.
MORIN, Edgar.Ciência Com Consciência. Rio de Janeiro(RJ): FA, 1995.
NAESS, Arne.A Ecologia Profunda. São Paulo(SP): CORTEZ, 2001.
PRIBAM, Karl.Ciência e Consciência, as Duas Leituras do Universo. Paris(FR):
STOCK, 1980.
SACKS, Ignacy.Desenvolvimento Includente, Sustentável Sustentado. Rio de
Janeiro (RJ): GRAMON, 2008.
STEINER, Rudolph.O Futuro Social. São Paulo (SP): ANTROPOSÓFICA, 1990.
FONAPER
O USO DAS REPRESENTAÇÕES SIMBÓLICAS NA DIVERSIDADE RELIGIOSA
Tânia Mª da S. Rodrigues20 - SEDEC
Resumo:
As Representações Simbólicas contribuem para o desenvolvimento do educando, favorecendo
o conhecimento intelectual religioso, levando-o a um entendimento facilitador e real no seu dia
a dia, tanto na área acadêmica, como também nas inúmeras dimensões da vida e,
principalmente na área religiosa, conduzindo o aluno à outra realidade de campo, que é a
comunicação. Para o professor de Ensino Religioso, se faz necessário alargar os
conhecimentos, com o propósito de interagir com os estudantes, obtendo resultados positivos.
Palavra Chaves: Ensino Religioso. Representações Simbólicas. Diversidade Religiosa.
Introdução
Ao longo da história da vida percebe-se que o indivíduo possui desde muito
pequeno, ainda criança, um vazio enorme, e que só é preenchido através da sua
intimidade com o Sagrado. Esta aproximação conduz o ser humano a uma posição de
leitor e pesquisador assíduo dos meios de canais de conhecimentos religiosos
presentes sua realidade pelo qual está envolvido culturalmente.
De acordo com os (BRASIL, 2009, p.36), a incessante busca de conhecimentos
religiosos que o indivíduo deseja abraçar lhe oferece o caminho para o crescimento no
campo religioso, sempre fazendo perguntas e buscando respostas. Sendo assim:
“Todo ser humano faz perguntas. Ele interroga a si mesmo e ao mundo. Ao interrogarse, procura saber quem ele é, para onde vai e de onde veio”.
Tais conhecimentos antropológicos abrem novos horizontes de necessidade
espiritual que é a confiança inabalável no sobrenatural. Pode-se afirmar que esse ser
humano ao deparar-se no ambiente escolar, mostra-se aberto para um novo saber e
entre os demais destacamos um, que é “o religioso” envolvido numa aprendizagem
firmada e fortalecida através da construção do conhecimento não só dos componentes
curriculares, entre os quais se encontra presente o Ensino Religioso, oferecendo-lhe
uma vasta infinidade de conhecimentos religiosos, presentes nas várias culturas e
tradições religiosas. Por isso, se faz necessário um mergulhar nos inúmeros meios de
estudo, com o propósito de levantar informações cabíveis e verdadeiras a respeito do
uso
das representações
simbólicas
na
diversidade
religiosa.
Diante
dessa
complexidade, como o docente poderá trabalhar esses conteúdos? E como os
discentes assimilarão tais conhecimentos?
Psicopedagogia/L. Portuguesa - IESP/ PB. Prof.ª ER – Sec. De Educação
João Pessoa. GP–GEPAI / UFPB. E-mail: [email protected]
20Pós-Graduação.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Podemos afirmar que o objetivo geral desta pesquisa é analisar com os
educandos e ao mesmo tempo, fazerem-se conhecedores das representações
simbólicas na diversidade religiosa existentes no campo do conhecimento científico.
Tendo como objetivos específicos, promover o aprofundamento intelectual no que diz
respeito esse conhecimento religioso; verificar através das aulas se aconteceu um
entendimento satisfatório por parte do alunado a respeito das representações
simbólicas. A metodologia utilizada é apresentar as representações simbólicas na
diversidade religiosa com vídeos, pesquisas, diálogos, confecções de trabalhos em
cartazes, produções textuais, etc., avaliando através da observação e reflexão se
houve uma compreensão das representações simbólicas na diversidade religiosa. Os
PCNER asseguram que:
Se é na escola que a consciência humana das limitações se
aprofunda, também é nela que a humanidade poderá aprender as
razões de superação de seus limites. É na dinâmica da educação que
o anseio de aprender a totalidade da vida e do mundo é explicitado
em formas de conhecimentos culturais (FONAPER, 2009, p. 45).
Linguagem simbólica em sala de aula
O estudo sobre as Representações Simbólicas na diversidade religiosa nas
aulas de ensino religioso exige do educador abertura de compreensão para com a
escolha religiosa do outro. Mediante esta verdade, alguns autores orientam uma
posição de investimento no mundo da pesquisa científica como um meio de garantir ao
mesmo uma segurança real aos seus conhecimentos para que haja um
enriquecimento no aprendizado, pois é na diversidade religiosa que haverá de
envolver o educando a observar que nas inúmeras religiões há uma infinidade de
representações simbólicas como um recurso enriquecedor e fortalecedor do
aprendizado. Levando em conta que tais ensinamentos partem do meio familiar e
contagia o universo escolar trazendo resultados que contribuem para que o aluno
obtenha a oportunidade de garantir sua liberdade de escolha religiosa.
Vejamos o que nos diz as autoras (OLENIKI; DALDEGAN, 2004, p.. 57).
É no espaço familiar que o educar em especial está voltado
para a necessidade do indivíduo desde a higiene até as normas
de conduta, ética e as expressões religiosas. Lembrando que
para satisfazer essas urgências do ser humano, tais
necessidades não se pode separar, elas se articulam
oferecendo atenção e promovendo meios que venham
enriquecer o desenvolvimento do aluno, e dando condições de
ajuda na construção de suas inúmeras escolhas.
Para que isto aconteça, se faz cabível que o aluno entre num processo
contínuo de ensinamentos que venham levá-lo a fazer sua própria escolha, sem
FONAPER
esquecer que os outros também têm o mesmo direito de serem respeitados de acordo
com o que se relaciona ao direito de ir e vir. Vale salientar que a educação é acima de
qualquer coisa, um meio pelo qual a sociedade está atrelada numa busca constante
de ser e conhecer ir e vir e que conduz o ser humano em todos os seus aspectos:
físicos psíquicos, espiritual, social, intelectual e moral e principalmente no que diz
respeito às condições de vida da pessoa em geral. É firmada nesta realidade que se
percebe, uma ação educativa que começa mesmo
dentro de uma pequena
sociedade, que é o espaço família e se estendendo até o espaço escola como uma
forma de promover mudanças, e isto acontece de geração a geração, envolvendo todo
tipo de aprendizagem nas várias dimensões da vida.
De acordo com (DURKHEIM, 1967 p. 85):
A educação satisfaz, antes de tudo, as necessidades sociais, e isto
quando se investe cautelosamente e de maneira cuidadosa nos
primeiros anos de vida dos filhos, a fim de que no futuro haja uma
aceitação e compreensão para com o outro.
São nas aulas de Ensino Religioso que o educador tem que ter uma atenção
dobrada, procurando envolver o aluno e oferecer ao mesmo o conhecimento religioso,
que para este é algo novo. Vale salientar que devagar vai acontecendo esse
entendimento, levando-o a ver que esse conhecimento religioso é patrimônio da
humanidade e que está à sua disposição no espaço escolar, favorecendo ao alunado
uma formação cidadã.
De acordo com os PCNER “A escola, por sua natureza histórica, tem uma
dupla
função:
trabalhar
com
os
conhecimentos
humanos
sistematizados,
historicamente produzidos e acumulados, e criar novos conhecimentos” (FONAPER,
2009, p.35).
As representações simbólicas tendem a enriquecer a construção de infinidades
desse conhecimento, levando a favorecer a capacidade de sentido que acontece
através da vida dos símbolos nas diversas religiões presentes em todo universo que
cerca o homem religioso. A elaboração de uma linguagem simbólica contribui para o
favorecimento de descobertas e experiências de uma realidade de vida. É nos
aspectos da ação pedagógica do Ensino Religioso que a pedagogia da educação e a
linguagem simbólica, e os livros considerados sagrados são de grande valor para a
vida do educando, por apresentar eles ao longo da história, não apenas vida, mas, por
algo que fala, emociona e diz.
Podemos ratificar que a escola tem a função e o dever de ajudar investindo
intelectualmente o educando a se libertar de estruturas opressoras que o impedem de
progredir e avançar por meio da reflexão, quebrando prisões do preconceito.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
“A constante busca do conhecimento das manifestações religiosas, a clareza
quanto à sua própria convicção de fé, a consciência da complexidade da questão
religiosa e a sensibilidade à pluralidade, são requisitos essenciais no profissional do
ensino religioso”. (FONAPER, 2009 p. 43). De acordo com essa afirmação, deduz-se
então, que este profissional está aberto para manter o diálogo inter-religioso, bem
como provocar o equilíbrio entre o falar e o escutar, fato este tão importante na sala de
aula. Ainda na visão dos PCNER, destacamos:
Desse profissional espera-se que esteja disponível para o diálogo e
seja capaz de articulá-lo a partir de questões suscitadas no processo
de aprendizagem do educando. E cabe a esse educador escutar,
facilitar o diálogo, ser interlocutor entre a Escola e a Comunidade e
mediar os conflitos (FONAPER, 2009, p. 43).
O Ensino religioso é firmado no respeito à diversidade cultural do cidadão. A
diversidade cultural religiosa do Brasil tem abertura para a presença de todas as
variantes no sistema escolar. Portanto pode-se afirmar que a escola por ser um bem
público está, portanto aberta à diversidade cultural religiosa.
Desse modo, afirma-se que no Ensino Religioso não se permite a possibilidade
de se agir com proselitismo, e sim, dar-se abertura para o diálogo inter-religioso,
essencial para que se assegure o respeito à diversidade cultural e religiosa.
Holmes (2010, p. 48), afirma que:
Atualmente, o respeito à diversidade constitui-se como um fator de
desenvolvimento pessoal e social, bem como um caminho para a
sustentabilidade ambiental do Planeta. Nessa diversidade inclui-se o
ser humano como um ser que precisa ser respeitado pelas suas
diferenças, tais como racial, social, cultural e religiosa.
Deduz-se então, que atualmente este é um tema muito discutido pela
sociedade no que tange ao respeito pelas diferenças, o que nos leva a refletir no bem
estar do nosso Planeta Terra, como um símbolo de cultura de paz.
O símbolo como linguagem
Mediante as diversas religiões existentes, pode-se perceber o quanto os
símbolos enriquecem a vasta construção desse conhecimento, contribuindo para a
ampliação de mundo que acontece por meio da interação entre as pessoas, dando
sentido à vida, através da linguagem, histórias, lendas, provérbios e metáforas.
De acordo com o autor (MARDONES, 2006, p 103) nos afirma que:
O símbolo é a linguagem expressiva da experiência religiosa. Sem o
símbolo não saímos da clausura no mundo da eminência nem nos
abrimos à alteridade ao outro. Há uma fragilidade inata ao caráter do
símbolo que faz com a racionalidade simbólica, seja propensa à
manipulação e aos excessos: do objetivismo e do subjetivismo já
FONAPER
mostrados. Pois, o pensamento simbólico sem pensamento crítico é
muito fraco.
Isto significa que, o pensamento simbólico e o pensamento crítico se
completam. Os dois juntos garantem mais força e enriquecimento contínuo na
experiência religiosa, no crescimento que acontece por meio da relação que oferecem
entre ambos estarem em comum acordo.
Todo ritual é acompanhado de símbolos. Dessa forma os PCNER asseguram
que: “os símbolos são sinais indicativos que atingem a fantasia do ser levando-o à
compreensão de alguma coisa.” (FONAPER, 2009, p. 54). Como por exemplos: No
casamento, se apresentam as alianças. Na diversidade cultural religiosa se apresenta
a simbologia da água e do fogo, nas mais diversas formas de entendimento. Como é o
caso da cultura afro, que se apresenta a Iemanjá como a Mãe das Águas. No
Hinduísmo esse símbolo se dá através do Rio Ganges21, considerado sagrado, assim
como toda a natureza, entre outros.
Assim sendo, toda essa simbologia se confirma nos conteúdos do Ensino
Religioso, que tem como objeto de estudo o fenômeno religioso na grande diversidade
religiosa da humanidade. Portanto em cada uma das culturas estudadas, observa-se a
riqueza dos símbolos, bem como a sua representação nessa diversidade. Isto para os
educandos é algo novo que gera um saber que antes para eles era indiferente e talvez
até mesmo fosse ignorado ou esquecido.
Diferenças entre o signo e o símbolo
Para o autor (SCOUARNEC, 2001, p. 13), o signo e o símbolo são
inseparáveis, o signo se trata de uma palavra, de uma imagem, de um gesto, de um
objeto, de uma pessoa, de uma informação, que leva a compreensão e tem a função
de designar. O símbolo estabelece uma relação entre pessoas que se comunicam,
interage e afeta a pessoa em sua vinculação com aqueles com quem ela se comunica.
Este texto quer dizer que mesmo o signo e o símbolo apresentando funções
diferentes não há como haver uma separação entre ambos, essa união inseparável
que existe entre os dois, faz com que um dependa do outro, enquanto o signo procura
21O
Rio Ganges tem uma ligação muito forte com a cultura e a religião indiana, eles acreditam
que suas águas têm a origem dos céus, por vontade do deus Brahma, que para sua religião é o
responsável pela criação do universo. Esse rio tem um valor espiritual para as pessoas que
seguem o hinduísmo, vários desses seguidores tomam banho nas águas do rio, acreditando
que ele tem a capacidade de purificar todos os pecados. www.infoescola.com/Geografia.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
explicar algo, o símbolo abre meios de relação entre as pessoas que se comunicam
promovendo uma interação e estendendo para novos horizontes.
Segundo o autor (SCOUARNEC, 2001, p. 14):
O signo fecha e delimita, enquanto o símbolo abre horizontes quase
inexauríveis, pois condensa múltiplos sentidos: ele é polissêmico, age
como parábola nos evangelhos: compreenda quem puder. Ou ainda
como o Espírito em Pentecostes: Cada um entende a mensagem
singular em sua língua materna.
O autor explica que o signo tem a capacidade apenas de estabelecer regras,
enquanto o símbolo desenvolve essas regras dando vários sentidos, agindo como
parábola, e cada leitor interpreta de acordo como for compreendido, de conformidade
com a sua linguagem de origem.
Quando se trata de signo e símbolo. Essa discussão levada para o espaço
escolar faz-se necessário que o docente tenha o cuidado de observar o seu
vocabulário quanto ao entendimento dos educandos, em relação a essa temática.
Embora estes precisem saber seus significados, porém serão preciso muitas
reflexões. Conforme afirma a autora Figueiredo (1995, p.30):
A escola, como instituição de cultura, é articuladora de todo e
qualquer processo de educação que promova o reencontro da razão
com a vida; com as aspirações do ser criativo, em contínuo
desenvolvimento, a adquirir e a produzir cultura, segundo as suas
necessidades vitais, as suas aspirações e conhecimentos baseados
nos princípios que o ajudam à estabelecer confrontos entre o que
promove a vida e o que a depreda [...].
Esses conhecimentos bem elaborados e planejados enriquecem a produção do
saber, pois tudo que se refere ao ato de ensinar e aprender, não se pode esquecer
que a escola é este espaço precioso, onde se está a promoção da construção e
reconstrução do conhecimento nas mais diversas ciências.
As representações simbólicas na diversidade religiosa
Por ser o ambiente escolar o espaço adequado para se promover o
reconhecimento da trajetória dos diversos grupos sociais, faz-se necessário que os
saberes abordados sejam pesquisados, contextualizados historicamente e socialmente
de maneira interdisciplinar, procurando promover o respeito pelo outro, tendo o
cuidado de não só tratar sobre as culturas, mas sim de relatar uma abordagem sobre a
diversidade cultural. Os saberes lecionados pela disciplina do Ensino Religioso devem
ser discutidos e pesquisados dentro do espaço escolar, pois esses tipos de
ensinamentos se tornam grandes desafios tanto na atualidade como na educação.
Considerando a sua complexidade, vale destacar que de acordo com os Parâmetros
FONAPER
Curriculares Nacionais do Ensino Religioso, (FONAPER, 2009, p.5-6), que nos
assegura ser:
O Ensino Religioso de matrícula facultativa é parte integrante da
formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários
normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurando o
respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer
formas de proselitismo (BRASIL, 1996).
Mediante essa afirmativa, vale salientar que para se compreender com mais
clareza a questão da diversidade religiosa no espaço escolar, se faz importante
elaborar discussões que venham contextualizar o exercício de cidadania. Este tema
merece mais atenção e cuidado nas escolas por parte dos educadores e de todos os
que estão encaixados no processo educativo e em especial pelo educador do Ensino
Religioso que poderá facilitar promovendo reflexões e ações que gerem mudanças na
área de intolerância religiosa. De acordo com Silva; Ribeiro(2007, p. 13) nos faz a
seguinte afirmação: “Um dos grandes desafios para a convivência social é encontrar
maneiras de diálogo com o diferente. E por muito tempo se procurou encontrar o que
os grupos têm em comum. Descobriu-se que além de ter algo em comum, se faz
importante que a convivência se dê pela diferença”.
Nesse caso, é de suma importância que haja aceitação naturalmente do outro,
independente do meio em que está inserido o aluno, seja no convívio social, ou no
religioso no qual o educando pertence, se faz necessário o respeito por aquilo que
encontramos de comum nas diferentes religiões. Pois o estudo das diferentes religiões
tem a forma de nos apresentar suas narrativas de origens. E é neste aspecto que a
Chauí, 2000, p. 298) nos chama a atenção para nos afirmar que: “A religião não passa
apenas o espaço, mas também o tempo, oferecendo-lhe o conhecimento e o sinal do
Sagrado”.
Na verdade, é que a religião está ligada a um conjunto de crenças e práticas
relacionadas a seres, dentro do universo histórico e cultural. Faz-se necessário
considerar que religiões, religiosidade se expressam em linguagens e formas
simbólicas.
Segundo Geertz(1989, p. 67), diz que a religião está relacionada a um sistema
de:
Símbolos que atuam para estabelecer disposições e motivações do
alunado através da elaboração de conceitos de uma ordem de
existência geral e procurar de forma inteligente fazer uso dessas
concepções ao ponto de tais disposições e motivações venham
parecer realmente reais.
Olhando para o ângulo antropológico a religiosidade oferece como fonte de
concepções de mundo, funções culturais e de caráter sociais e psicológicos.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Vale destacar que o Ensino Religioso historicamente tinha um caráter
confessional, isto é, estava ligado a uma religião específica, como o catolicismo ou as
religiões evangélicas. Hoje, essa área de atuação docente tem como companhia a
pluralidade religiosa que existe na sociedade em geral. Consciente dessa realidade é
bom repensar na condição de estruturar essa disciplina, seus fundamentos, didáticos,
metodologias e conteúdos, de maneira que aconteça para fortalecer mais ainda esse
componente curricular nas escolas públicas e privadas. Para que isso aconteça é
importante se observar o perfil dos professores como afirma Silva (2010, p. 21):
Um bom número de professores de ensino religioso, acredita ainda
hoje, que ensinar é transmitir conhecimentos relevantes de sua
doutrina e educação religiosa, sendo assim, a principal
responsabilidade destes professores, de acordo com essa
concepção, é a de serem grandes conhecedores dos assuntos
relativos aos conteúdos doutrinários e confessionais [...].
Diante desta abordagem, percebemos que este profissional ainda não acordou
para a atualidade, pois como afirma o autor, essa é uma prova de que isso vai de
encontro a um conceito errado sobre o que este professor deve ensinar e discutir ou
não em sala de aula.
Experiências simbólicas
O ser humano, por ser considerado um ser único, livre para fazer escolhas,
principalmente na área religiosa vai aos poucos percebendo que pela sua contínua
busca pelo sagrado, encontra algo que
venha lhe completar, e por isso, torná-lo
inteiro, devido ter em sua origem sexuada, considerando-se uma metade de um
símbolo e que almeja encontrar sua outra parte.
De acordo com o autor (SCOUARNEC, 2001, p.109) nos confirma a respeito:
O ser humano é sexuado. É um dado da natureza, de sua natureza.
Todavia, sua sexualidade não se reduz à genitalidade nem aos
mecanismos de reprodução em vista da sobrevivência da espécie, ela
se reveste de uma dimensão simbólica e cultural, estruturando-o
como ser de troca e de relação. Um traço que nutre uma necessidade
fisiológica, mas também um desejo espiritual de procurar sua outra
“cara-metade”.
Neste texto acima, o autor aborda a respeito da simbólica nupcial, mostrando o
valor simbólico do matrimônio através do casamento, seguido de todos os rituais
específicos, levando em consideração a tradição religiosa do casal de noivos. Pois
cada tradição zela e quer aprimorar a liturgia da cerimônia aplicando o ritual oficial
adotado pela sua comunidade, igreja.
FONAPER
Outra experiência simbólica é a morte humana, que é a última etapa da
passagem terrena, pois cada ser humano vê a morte de um determinado jeito, ou de
compreensão ou de frustração pela perda insubstituível do ser perdido, experiência
dolorosa e que não há como se explicar. Na língua portuguesa não há palavras
adequadas para se descrever o tamanho de tal dor.
Vejamos através do autor (SCOUARNEC, 2001, p. 123) como tudo começou:
Por meio dos ancestrais, quando tomaram consciência da finitude e
se pusera, a sepultar seus mortos. Através de ritos e mitos, fizeram
da morte biológica uma morte simbólica, uma morte representada.
Para colocar em ordem o que estava em desordem provocado pelo
desaparecimento de membros de seu grupo familiar ou social. Como
propósito que sua morte adquirisse sentido e não interrompesse a
continuidade da vida.
De acordo com o texto citado, podemos perceber que as representações
simbólicas estão presentes nas várias tradições religiosas e nas diversas dimensões
da vida cotidiana do ser humano em geral. Como afirma o autor, é difícil e muito
doloroso saber lidar com a morte de alguém muito querido, ou de alguém que faz parte
da comunidade família. E é em meio à morte simbólica que nos acontece a
consciência de que a pessoa amada desapareceu do seu contexto social e familiar,
tudo se desmoronou em seu mundo, e que não se deve continuar assim, é preciso que
haja a morte representada através dos ritos e mitos, para que tudo venha a se
organizar novamente, por meio da indispensável superação da perda.
Esse tipo de experiência simbólica não está fora do contexto escolar, pelo
contrário, o alunado deve ter o entendimento desse conhecimento, mesmo porque
esse é um tema estudado pelos educandos do 8º e 9º anos, a começar pelas
perguntas existenciais: De onde vim? Para onde vou? Por que vivo? Que sentido tem
a vida? Estes são questionamentos que transporta o ser humano para muitas
reflexões. Ao se deparar com tal situação, possa saber como enfrentá-la, procurando
um meio para solucionar suas revoltas e frustrações, pois o aluno com dor e
frustrações é impossível de obter um aprendizado com sucesso.
Considerações
A busca do homem pelo sentido da vida tem crescido de forma assustadora, e
nos últimos tempos em especial, e essa busca, muitas vezes, para alguns não tem
havido um resultado positivo de imediato, contribuindo para que o tal indivíduo se
ponha numa posição de descrença ao sobrenatural, consequência da falta de
paciência que o indivíduo abraça. Pois é esse tipo de gente que a população está
repleta: “Do aqui e agora”. Pois se não for como eu quero e na hora que eu desejo,
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
esse algo não dá para mim! Jamais me servirá! Como o educando reflete o meio em
que vive, pode-se afirmar que é esse tipo de alunado que recebemos no público
escolar.
Alunos
impacientes,
sem
limites
e
cheios
de
vontades
próprias,
consequências de pais descontrolados, descrentes, e sem perspectiva de aproximarse do sobrenatural.
Diante de tais situações que enfrentamos vale salientar que de início tudo
parece desmoronar em nossos braços, ou melhor, em nossa responsabilidade como
professor (a) de Ensino Religioso, pois tanto a gestão da escola como toda
comunidade escolar, principalmente nossos colegas docentes, esperam de nós,
professores enquanto responsáveis por esse componente curricular dê uma solução
imediata para resolver questões relacionadas à mudança de comportamento dos
discentes. Quando na verdade, tudo requer um trabalhar coletivo, contínuo e
perseverante nos valores ethos, para contribuir com essa diversidade cultural e
religiosa que nos cerca. Para Freire(2003 p. 26-27): “Percebe-se, assim, a importância
do papel do educador, o mérito da paz com que viva a certeza de que faz parte de sua
tarefa docente não apenas ensinar os conteúdos, mas também ensinar a pensar
certo”.. Portanto, esse universo estudantil precisa de professores determinados que
estejam dispostos a abraçar a causa, sem nenhum preconceito, passando para a
demanda o conhecimento religioso e as ações presentes no seu cotidiano social
familiar, levando os mesmos a respeitarem às diferenças presentes no contexto
escolar. Quero afirmar que esta pesquisa contribuirá para reforçar e fortalecer o
Ensino Religioso, não apenas nas escolas públicas de ensino, mas nas escolas de
ensino privado, levando em consideração as necessidades dos educandos. E como
professores do Ensino Religioso, devemos procurar repensar em nosso ensino, uma
metodologia utilizada nos assuntos de modo geral, a fim de que possamos atrair o
público estudantil de maneira criativa e afetiva. Portanto significativa no processo de
ensino e aprendizagem.
Referências
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DURKHEIM, Émile. Educação e sociologia. 7 ed. São Paulo: 1967.
GEERTZ, Clifford. A Interpretação das Culturas. Rio de Janeiro: Vozes, 1983.
MARDONES, José M. A Vida dos Símbolos. São Paulo: Paulinas, 2006.
FIGUEREDO, Anísia de Paulo.Ensino
Petrópolis- RJ: Vozes, 1994. 2. Ed. 1995
Religioso: perspectivas pedagógicas.
FONAPER
FONAPER. Parâmetros curriculares nacionais do ensino religioso.São Paulo-SP:
9. Ed. Mundo Mirim, 2009. Conforme novo acordo ortográfico.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa.
- São Paulo: 27. Ed. Paz e Terra, 1996. (Coleção Leitura).
HOLMES, Maria José Torres. Ensino Religioso: problemas e desafios. Dissertação
(Mestrado em Ciências das Religiões), 186 f. – Universidade Federal da Paraíba,
UFPB. João Pessoa, 2010.
OLENIK, Marilac Loraine R., DALDEGAN, Viviane Mayer. Encantar: Uma prática
pedagógica no ensino religioso. 2 ed. Petrópolis: Vozes 2004.
SCOUARNEC, Michel. Símbolos Cristãos: os
humanosSão Paulo: Editora Paulinas – Brasil, 2001.
sacramentos
como
gestos
SILVA, Clemildo A., RIBEIRO, Mário B. Intolerância religiosa e direitos humanos.
Porto Alegre, Ed. Sulina e Universitária Modista, 2007.
SILVA, Marinilson Barbosa. Em busca do significado do ser professor de ensino
religioso. João Pessoa: Ed. Universitária UFPB-2010.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
GT3: FORMAÇÃO INICIAL E CONTINUADA PARA O ENSINO RELIGIOSO
Coordenação:
Dra. Irene Araújo Van Den Berg (UERN)
Ma. Simone Riske Koch (FURB)
Ma. Teresa Machado da Silva Dill (Unochapecó)
Ma. Iolanda Rodrigues da Costa (UEPA)
Dr. Fabrício Possebon (UFPB)
Ementa: A partir da promulgação da Lei n. 9.475/97, a formação de docentes
para a área do conhecimento Ensino Religioso tem sido alvo de crescente
interesse, discussão e pesquisa em âmbito nacional, visando assegurar aos
educandos os direitos à aprendizagem na educação básica na diversidade
cultural-religiosa do Brasil, sendo vedadas quaisquer formas de proselitismo.
Neste sentido, este GT busca problematizar, discutir e socializar referenciais,
políticas e práticas referentes à formação inicial e continuada na área de
conhecimento Ensino Religioso.
Palavras-Chave: Formação Docente. Ensino Religioso. Diversidade Cultural
Religiosa. Direitos à Aprendizagem e ao Desenvolvimento.
FONAPER
A FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE ENSINO RELIGIOSO NO PARFOR DA
UNOCHAPECÓ
Ediana M. M. Finatto- Unochapecó22
Gilberto Oliari- Unochapecó23
Resumo
Este ensaio debruça-se sobre a problemática da formação de professores para o Ensino
Religioso, tendo como objetivo refletir sobre a formação desenvolvida na Universidade
Comunitária Da Região de Chapecó – UNOCHAPECÓ, através do curso de Ciências da
religião: licenciatura em Ensino Religioso, ofertado através do Plano Nacional de Formação de
Professores da Educação Básica – PARFOR. O intuito é buscar elementos que descrevam
como se abordam as diferentes conceituações que compõe o fenômeno religioso, quais
práticas significativas tem se desenvolvido e como o curso tem se espraiado para fora do
campo acadêmico. Realizou-se uma abordagem reflexiva sobre o currículo proposto e
executado na universidade a fim de entender como constrói-se a identidade profissional do
egresso. Concluiu-se que o curso proporciona uma formação que valoriza a diversidade
religiosa existente na construção do conhecimento e possibilita aos egressos muitas
alternativas de permanecer em movimento.
Palavras-chave: Formação de professores. Ensino Religioso. Unochapecó. PARFOR.
Considerações iniciais
Desde a efetivação da LDB em 1996 o Ensino Religioso, como componente da
educação básica, tem se mostrado desafiador quanto a sua consolidação. Que não é
mais permitido se fazer proselitismo ou “converter os alunos” muitos profissionais já
sabem. Aliás como professores de Ensino Religioso na educação básica podemos
afirmar que nem é mais possível de fazê-lo. A diversidade grita por reconhecimento e
espaço no espaço escolar, e é necessário que o conhecimento seja construído em
bases interculturais.
Em nosso ponto de vista existe a grande necessidade de se ampliar cada vez
mais a formação de professores. Duas situações são inaceitáveis: que professores
sem habilitação desenvolvam esse componente curricular; que professores de outras
áreas do conhecimento “complementem carga horária” com Ensino Religioso.
Inegavelmente muitas pessoas são conhecedoras de procedimentos didáticos, e
mesmo de conhecimentos interculturais mas, o específico de dialogar e construir
Mestre em Educação pela Universidade Comunitária da Região de Chapecó – Unochapecó
(SC), Graduada em História e Ciências da Religião pela Universidade Comunitária da Região
de Chapecó – Unochapecó (SC) e professora efetiva da rede estadual de Santa Catarina.
[email protected].
23
Mestre em Educação pela Universidade Comunitária da Região de Chapecó – Unochapecó
(SC), Graduado em Filosofia e Ciências da Religião pela pela Universidade Comunitária da
Região de Chapecó – Unochapecó (SC) e professor efetivo da rede estadual de Santa
Catarina. [email protected].
22
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
conhecimentos com a amplitude das religiões se dá através do processo formativo
especifico.
Esta pesquisa tem como objetivo refletir sobre a formação de professores de
Ensino Religioso desenvolvida na UNOCHAPECÓ com vistas a buscar elementos que
identifiquem práticas significativas na turma egressa e na turma presente do curso
ofertado através do PARFOR. Encontra-se divido em duas partes: na primeira
abordamos o Ensino Religioso e a formação de professores através do Plano Nacional
para a Formação de Professores da Educação Básica – PARFOR e no segundo
momento abordamos o currículo da formação de professores de Ensino Religioso na
Universidade Comunitária da Região de Chapecó.
Ensino Religioso e formação de professores/ PARFOR
Logo de início nessa reflexão é importante tomar um posicionamento sobre
qual Ensino Religioso estamos tratando. Lilian de Oliveira et. al. (2006, p. 91) nos
apresenta de forma muito simples o princípio nodal desta área do saber, que instiga as
práticas pedagógicas do componente: “o ER articula-se a partir da leitura e
decodificação do fenômeno religioso considerando a pluralidade cultural da sociedade,
assim como o desenvolvimento de ensino-aprendizagem pertinente a todo e qualquer
componente curricular”. Dessa forma afirmamos que o Ensino Religioso não toma
posição de uma única religião para discutir e construir conhecimentos. Para justificar o
pensamento anterior lembramos que no artigo 33 da Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional – LDB de 1996, o componente curricular Ensino Religiosos será
desenvolvido sem qualquer forma de proselitismo. Portanto, a pluralidade cultural e
religiosa será tomada sempre como ponto de partida para desenvolver diferentes
práticas educativas.
O ER como componente curricular da educação básica, assim como tantos
outros não escapa à necessidade de formação de professores. Por isso a
Universidade Comunitária da Região de Chapecó – UNOCHAPECÓ, através de
convênio firmado com a CAPES/PARFOR ofertou em 2009 o curso de Ciências da
Religião: Licenciatura em Ensino Religioso. Naquele momento aproximadamente 70
pessoas pré inscreveram-se na Plataforma Freire, 40 se matricularam (número
máximo permitido pela instituição) e apenas 10 vieram a concluir o curso no segundo
semestre de 2013. Por iniciativa da mesma instituição, novamente em 2014 ofertou-se
pelo PARFOR o curso, desta vez ocorreram 40 pré-inscrições e destas apenas 26
efetivaram realmente a matrícula no referido curso. Percebe-se diante disso que a
FONAPER
busca pela formação tem sido encarada por profissionais que sentem-se provocados
pelas transformações sociais que vem ocorrendo. Assim, buscar aprimorar seus
conhecimentos para poder discutir novas possibilidades de ensino e obter novos
olhares em relação ao outro também vem sendo o objetivo dos que buscam a
formação continuada.
O Plano Nacional de Formação dos Professores da Educação Básica –
PARFOR, visa fomentar a oferta de cursos superiores gratuitos para professores em
exercício nas redes públicas de ensino. O programa se consolida na Universidade
Comunitária da Região de Chapecó – UNOCHAPECÓ no segundo semestre do ano
de 2009. Entre os cursos ofertados (Licenciatura em Sociologia, Educação Especial)
encontra-se o curso de Ciências da Religião – Licenciatura em Ensino Religioso (curso
este que já era ofertado pela instituição).
O PARFOR surge para atender o Decreto Presidencial nº6.755/2009, que
instituí a política nacional de formação de profissionais do magistério da educação
básica e tem como princípios básicos: a formação de professores com compromisso
de um projeto social, político e ético, que contribua para a consolidação de uma nação
soberana, democrática, justa e inclusiva; articulação entre teoria e prática no processo
de formação docente; reconhecimento da escola e demais instituições como espaços
de formação de professores. Percebe-se que o PARFOR surge como possibilidade
deinstituir uma nova roupagem na formação de professores, uma formação que seja
diferenciada daquela já praticada pelas instituições formadoras, que dê ênfase no
processo de aprendizagem integral tanto dos futuros professores quanto dos alunos
da educação básica.
O Art. 3º do decreto (6.755/09) apresenta os objetivos do plano, dentre os
quais destacamos:
I – promover a melhoria da qualidade da educação básica; [...]
VIII – promover a formação de professores na perspectiva da
educação integral, dos direitos humanos, da sustentabilidade
ambiental e das relações étnico-raciais, com vistas à construção de
ambiente escolar inclusivo e cooperativo;
IX – promover a atualização teórico metodológica nos processos de
formação dos profissionais do magistério, inclusive no que se refere
ao uso das tecnologias de comunicação e informação nos processos
educativos (Art. 3º)
Todo o decreto de criação revela o desejo de se executar um programa que
produza novos frutos na formação de professores. Que capacite profissionais
comprometidos com um projeto de sociedade, onde os estudantes sejam autônomos
na construção do conhecimento e que os professores possam atualizarem-se
constantemente com as ferramentas tecnológicas de comunicação e informação
existentes na sociedade.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Os cursos apoiados pelo PARFOR são todos aqueles relativos às disciplinas
aplicadas no currículo da educação infantil, do ensino fundamental, do ensino médio e
da educação profissional e técnica de nível médio, tanto das redes municipais quanto
das redes estaduais. O programa se desenvolve em regime de colaboração entre a
União, por meio da Capes, dos Estados, Distrito Federal e os municípios (através das
secretarias de educação), utilizando-se da cooperação técnica entre a Capes e os
Estados; da criação de fóruns estaduais permanentes de apoio à formação docente;
da participação dos municípios.
O programa, conforme o Manual Operativo (2013), oferta cursos de:
Licenciatura – para docentes ou tradutores intérpretes de Libras em exercício na rede
pública da educação básica que não tenham formação superior ou que mesmo tendo
essa formação se disponham a realizar curso de licenciatura na etapa/disciplina em
que atua em sala de aula; Segunda licenciatura – para professores licenciados que
estejam em exercício há pelo menos três anos na rede pública de educação básica e
que atuem em área distinta da sua formação inicial, ou para profissionais licenciados
que atuam como tradutor intérprete de Libras na rede pública de Educação Básica;
Formação pedagógica – para docentes ou tradutores intérpretes de Libras, com nível
superior em curso que não seja de Licenciatura, que se encontram no exercício da
docência na rede pública da educação básica. Dessa forma justifica-se a oferta do
curso de Ciências da Religião pelo programa.
Após a conclusão do curso Ciências da Religião (da turma que ingressou em
2009) quatro egressos tornaram-se professores efetivos de Ensino Religioso na rede
estadual de ensino de Santa Catarina, tendo assumido as vagas por terem sido
aprovados no concurso do ano de 2012. Dois concluintes da turma ao longo da
graduação já estavam cursando mestrado em educação na UNOCHAPECÓ,
buscando adquirir mais conhecimentos e excelência nas práticas pedagógicas
desenvolvidas. Ao longo do tempo muitas pesquisas e atividades pedagógicas foram
apresentadas e publicadas, por alunos e professores, em eventos da área organizados
pelo Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso – FONAPER, pela Associação
de Professores de Ensino Religioso de Santa Catarina – ASPERSC e por
universidades que promoveram espaços de discussão sobre a temática.
Dois egressos assumiram um papel importante frente às discussões e
construções do Ensino Religioso no Estado vindo a assumir cargos na diretoria da
ASPERSC, como presidente e segunda tesoureira (gestão 2013-2015). A associação
tem como objetivos, conforme seu estatuto, garantir espaços autônomos de encontro
para reflexão e aprimoramento do Ensino Religioso; promover seminários, colóquios e
FONAPER
contribuir com ações sistemáticas que promovam e evidenciem o ER nas escolas,
mediante representação junto aos órgãos oficiais e articulação com instituições civis e
religiosas. Isso demonstra o quanto o curso tem provocado transformações didáticas e
promovido
envolvimento
referente
ao
comprometimento
com
ações
de
desenvolvimento na educação.
O curso tem desenvolvido também a extensão, envolvendo os acadêmicos e
egressos na organização de colóquios regionais de Ensino Religioso, cursos de
formação continuada à professores de ensino religioso de outros municípios. Além
disso, os egressos recentemente se envolveram na organização do II Seminário
Internacional Culturas e Desenvolvimento, II Congresso Sul-brasileiro de Promoção
dos Direitos Indígenas e V Colóquio Catarinense de Ensino Religioso, que ocorreram
concomitantes na instituição (UNOCHAPECÓ) no mês de maio de 2014.
Orientados pelo princípio de desenvolver o diálogo interreligioso desenvolvemse muitas viagens de estudos, com vistas a observar e compreender a presença de
distintas tradições religiosas que não se instalaram na região de Chapecó (cidade
sede do curso). As visitas são sempre organizadas com a presença de algum seguidor
da religião, contribuindo para o esclarecimento de dúvidas que possam surgir ao longo
do percurso. Os acadêmicos sempre se comportam de forma respeitosa provando que
àquilo que aprenderam na teoria desenvolvem também na prática.
Nas palavras de uma pessoa que trabalha na gestão da 4ª Gerência Regional
de Educação de Chapecó e Região – 4ª GERED (órgão de administração
descentralizada da Secretaria Estadual de Educação de Santa Catarina – SEDSC) “o
curso de Ciências da Religião da UNOCHAPECÓ, é o curso que tem formado
professores com grande diferencial e que estão fazendo a diferença nas escolas por
onde passam”. Em sua percepção os egressos desse curso tem grande receptividade
à interdisciplinaridade, ao trabalho em grupo e em desenvolver sua docência pautado
por sentimentos de receptividade e humanidade frente a diversidade presente na
escola.
Para Cortella (2006, p. 20), “ensino religioso é parte fundamental da tarefa
educativa e, como tal, precisa de robusta base científica, religiosidade consciente,
solidez pedagógica e compromisso cidadão”. Essa compreensão pode ser
pormenorizada em algumas reflexões que tratam diretamente da ação pedagógica
desenvolvida. Robusta base científica se desenvolve apropriando os acadêmicos com
teorias que possibilitem interpretar a vida, a escola e as relações que se estabelecem,
além de proporcionar conhecimentos específicos da área de aprendizagem.
Quanto a religiosidade consciente o professor, como ser humano, tem a
possibilidade de escolher alguma tradição religiosa para seguir, bem como não seguir
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
nenhuma. Mas esse seguimento deve ser consciente, ou seja, não pode ter a
pretensão de converter os alunos para que o sigam. Não estamos falando de
neutralidade, mas que o docente seja capaz de distinguir entre o que é a sua crença e
o que é o conhecimento que precisa ser desenvolvido na escola. Solidez pedagógica e
compromisso cidadão referem-se a construção e assunção de metodologias que
possibilitem tornar o aluno sujeito construtor de sentido e significado para o que
acontece ao seu redor.
Reflexões sobre o currículo de formação de professores de Ensino Religioso na
UNOCHAPECÓ
Tendo presente toda a complexidade a ser desenvolvida pelo Ensino Religioso
na escola, vale sempre refletir sobre os campos teóricos nos quais os graduandos tem
contato durante o curso. Oliveira et. al. (2006, p. 92) afirma que “os cursos de
licenciatura em ER tem uma grande contribuição a dar [...] uma vez que analisam e
pesquisam o campo religioso dentro de sua complexidade a partir de um olhar e
abordagens de cunho inter e transdisciplinar”. Por isso defende-se que os professores
de Ensino Religioso sejam habilitados em Ciências da Religião - Licenciatura e não em
Teologia, possibilitando construir saberes sólidos de cidadania e de humanização.
Segundo o Projeto Pedagógico do Curso – PPC, da UNOCHAPECÓ, tem-se
como missão “produzir e difundir conhecimentos, contribuindo com o desenvolvimento
regional e a formação profissional cidadã”. Dessa forma há uma interação, que é
imprescindível com as comunidades locais, com seu processo histórico e social, a fim
de gestar profissionais envolvidos, comprometidos com o desenvolvimento da região e
do próprio curso. Por isso o objetivo geral do curso visa habilitar um profissional com
conhecimentos teóricos/metodológicos contextualizados para o exercício da docência
em ER
Frank Usarski (2006), em um estudo realizado nos cursos de Ciências da
Relegião da Alemanha aponta três categorias de componentes presentes no curso,
que se tornam elementos chave na constituição dessa área do conhecimento.
Trata-se primeiro de unidade com a intenção de fornecer aos alunos
um conhecimento pelo menos sobre as principais religiões do mundo
e fenômenos tipicamente associados a ela. O segundo elementochave faz parte do objetivo de gerar e aprofundar no aluno a atitude
da tolerância enquanto integrante de uma sociedade multirreligiosa e
pluricultural. O terceiro aspecto tem a ver com o propósito de
capacitar os participantes do curso a associar suas próprias
preferências ideológicas a quadros filosóficos cujo caráter sistemático
questiona ecletismos subjetivos ingênuos e a combinação ingênua de
FONAPER
elementos de origem variáveis muitas
incompatíveis (USARSKI, 2006, p. 51-52).
vezes
logicamente
Munidos dessas características passa-se a fazer uma reflexão sobre a matriz
curricular do curso de Ciências da Religião da UNOCHAPECÓ. Vale destacar que nas
categorias de análise acrescenta-se a categoria pedagógica, justamente pelo curso
visar à preparação de professores dinâmicos e de fácil envolvimento interdisciplinar.
Além disso, busca-se compreender como o desenvolvimento do curso lida com
complexidade do fenômeno religioso em consonância com a sala de aula.
Abordando e refletindo a partir desses elementos apontados por Usarski (2006),
podemos encontrar na matriz curricular do curso o componente: Introdução aos textos
e narrativas sagradas indígenas, africanas, orientais, semitas (quatro componentes,
onde cada um aborda uma matriz específica); histórias religiosas da América Latina;
as religiões no oeste de Santa Catarina e mais algumas que tem como objetivo
fornecer conhecimentos sobre as diferentes religiões aos estudantes. Podemos
perceber com isso que o curso não faz opção de privilégio de nenhuma tradição
religiosa em especifica, pelo contrário aborda a multiplicidade existente no mundo.
Além disso, de acordo com a matriz procura-se abordar também o contexto regional
ao estudar a América Latina e o oeste catarinense, inserindo assim o educando em
sua realidade.
Alguns componentes têm por objetivo despertar justamente para a necessidade
de tolerância e de diálogo inter-religioso e intercultural, podemos identificar os
seguintes: sociedade e desenvolvimento; diálogos interculturais e diversidade religiosa;
ensino religioso e direitos humanos; éticas e ensino religioso; artes culturas e religiões.
Existe uma preocupação grande em construir conjuntamente com os acadêmicos,
sentimentos que possibilitem amenizar muitos conflitos existentes e que tem raízes
nas atitudes de intolerância e desrespeito à religiosidade. Destaca-se aqui a presença
de um componente que aborda discussões sobre Direitos Humanos, no entanto na
abordagem da grande maioria dos componentes curriculares os professores abarcam
conceituações acerca da Declaração Universal dos Direitos Humanos, tão necessária
de ser conhecida e aplicada nos dias de hoje.
Obviamente que no percurso da graduação, existe uma preocupação em
construir conhecimentos com cuidados de não cair em ecletismos e subjetivismos
muitas vezes incompatíveis com o processo de construção do curso. Nesse sentido,
percebemos a presença de componentes curriculares que tem como predisposição
abordar quadros conceituais/filosóficos que permitam ao acadêmico aprofundar suas
reflexões ancorados em filósofos/teóricos que permitam relacionar o mundo da vida
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
com o conhecimento. Esses componentes são: psicologia e religiosidade; antropologia
da religião; epistemologias e fenômenos religiosos; filosofia da religião; sociologia da
religião. Estes permitem uma compreensão ampla do fenômeno religioso e
possibilitam abordagens diferenciadas a partir do mesmo.
Esses componentes descritos até aqui não podem ser tidos apenas como
abordagens de conhecimentos teóricos, ou como parte teórica do curso. Pelo contrário,
eles possibilitam que o acadêmico a todo o momento reflita a luz de suas vivências
cotidianas em sala de aula e com isso reveja suas atitudes e posicionamentos
tomados diante de seus grupos de alunos. Existe também a presença muito
contundente da pesquisa que se revela frutífera no planejamento de aulas e na
divulgação e apresentação desses resultados em eventos e publicação em anais.
Voltando-se para os aspectos pedagógicos, propriamente voltados a responder
as obrigações legais dispostas na formação de professores no Brasil e a ampliar as
discussões no campo escolar e no ensino desse pensamento e conhecimento
desenvolvido no curso, podemos encontrar componentes como: metodologia do
ensino religioso I e II; estágios supervisionados; didática; política e gestão da
educação básica; educação especial e inclusão e outros. Nesses componentes
discutem-se formas de mobilizar o estudante da Educação Básica ao conhecimento,
portanto discutem-se os planos de aprendizagem, planejamento de aulas, avaliação e
os aspectos necessários à aulas mais práticas e envolventes.
Nesta breve abordagem feita sobre a matriz curricular e sua organização é
pertinente refletir que o curso está voltado a pensar e recriar o ofício de professor,
conforme Canário (2007) nos instiga a pensar. Segundo o autor é necessário superar
a situação do exercício docente que acontece de forma “tutelada” aos interesses do
sistema, gerando uma autonomia profissional. Canário (2007) aborda quatro
dimensões essenciais a serem refletidas e construídas na identidade profissional
docente.
Segundo ele, o professor precisa ser entendido como um analista simbólico
sendo “alguém que equaciona e resolve problemas, em contextos marcados pela
incerteza e pela complexidade” (CANARIO, 2007, p. 22), ou seja, não àquele professor
treinado para dar respostas prontas independente do contexto no qual está inserido,
mas aquele que provoca para a elaboração de belas perguntas. Isso pode ser
apontado no curso quando se discutem os referencias teóricos de relação com a
antropologia, a filosofia e mesmo com a psicologia que permitem ao licenciando
compreender a complexidade que se estabelece em seu contexto de trabalho e
solucionar situações problemáticas que se apresentam a ele.
FONAPER
Outra categoria apontada é a de entender o professor como um profissional de
relação o qual “ensina não aquilo que sabe, mas sim, aquilo que é” (CANARIO, 2007,
p. 22). Nesse sentido o professor investe toda a sua potencialidade e suas habilidades
para desenvolver com o aluno suas atividades. É o professor que sensibiliza-se com
as dúvidas e questionamentos de seus estudantes e aventura-se a viajar na busca
pelo conhecimento junto com os alunos. Ambos descobrem e solucionam dúvidas,
construindo novo saberes. Essa habilidade pode ser aprendida no curso, justamente
nos componentes que abordam a tolerância e o diálogo inter-religioso, que podem ser
interpretados em atitudes como essas que foram citadas.
“Mais do que um reprodutor de práticas, o professor é um reinventor de
práticas, reconfigurando-as de acordo com as especificidades dos contextos e dos
públicos” (CANARIO, 2007, p. 22). Essa conceituação apresenta a dimensão de um
professor que se constrói como um artesão, aquele que é capaz de abstrair todas as
situações do contexto e partir deste desenvolver suas aulas. Essa ideia supera muitas
antigas concepções das quais se preocupavam em municiar o professor com técnicas
e transcende para o princípio de desenvolver no docente, habilidades para construir
seus próprios métodos e formas de trabalho.
Junto a essa noção podemos avançar e entender o professor como um
construtor de sentidos.
O professor tem de funcionar cada vez mais como um construtor de
sentido para as situações educativas, contrariando, assim, o divorcio
crescente entre a instituição escolar e a diversidade de expectativas e
de lógicas de ação presentes em alunos cada vez mais diferenciados
(CANÁRIO, 2007, p. 22).
Para tal a formação de professores não pode furtar-se a discutir questões
contextuais/locais e atribuir sentido e significado a elas. O professor ao desenvolver
essa habilidade sem dúvida nenhuma proporcionará ao aluno momentos de
aprofundar reflexões sobre a sua vida e a significar de forma mais consciente e cidadã
o que acontece ao seu redor.
O curso de Ciências da Religião tem mostrado na região de Chapecó e
arredores que é possível desenvolvermos aulas práticas de forma interdisciplinar.
Considerações finais
Diante de tamanha necessidade de formação de professores de Ensino
Religioso a UNOCHAPECÓ tem demonstrado-se preocupada e capaz de oferecer um
curso que contribui com a formação de profissionais comprometidos com as
demandas de diálogo inter-religioso e intercultural. Através das inúmeras atividades
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
realizadas extra sala de aula, mostra-se que existe a preocupação com o
desenvolvimento local, mas também o desejo de que seus acadêmicos desenvolvam
autonomia frente os inúmeros desafios que se colocam em sua caminhada.
Através do relato sobre seus componentes curriculares revela-se que a
preocupação é desenvolver profissionais, não apenas habilitados para o ensino mas,
para construir espaços de discussão que envolvam a sociedade de forma ampla a fim
de desenvolver uma sociedade mais tolerante e que saiba dialogar. Além disso buscase construir um professor capaz de resolver os conflitos que se apresentam em sala
de aula, mas também um professor que saiba mediar o conhecimento com o aluno e
não apenas impor um saber.
Referências
CANÁRIO, Rui. A escola tem futuro? Das promessas às incertezas. Porto Alegre:
Artmed, 2007.
CORTELLA, Mario Sergio. Educação, Ensino Religioso e Formação Docente. IN:
SENA, Luzia. Ensino Religioso e formação docente: Ciências da Religião e Ensino
Religioso em diálogo. São Paulo: Paulinas, 2006.
JAEGER, Werner Wilhelm. Paidéia: a formação do homem grego. 5ª. ed. São
Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2010.
NÓVOA, A. Formação de professores e profissão docente. In: A. Nóvoa (org.). Os
professores
e
sua
formação.
Lisboa:
Nova
Enciclopédia,
1992.
file:///C:/Users/User/Downloads/12424596.pdf. Acessado em 06/09/2014.
OLIVEIRA, Lilian Blanck de (et. Al). Curso de Formação de professores. IN: SENA,
Luzia. Ensino Religioso e formação docente: Ciências da Religião e Ensino
Religioso em diálogo. São Paulo: Paulinas, 2006.
USARSKI, Frank. Ciências da Religião: uma disciplina referencial. IN: SENA, Luzia.
Ensino Religioso e formação docente: Ciências da Religião e Ensino Religioso em
diálogo. São Paulo: Paulinas, 2006.
FONAPER
EXPERIÊNCIA INÉDITA NO ESTADO DO ACRE DE MODELO DE FORMAÇÃO
CONTINUADA PARA O ENSINO RELIGIOSO
Cid Mauro Araujo de Oliveira (IEFP)24
Elaine Costa Honorato (Ufac)25
Resumo
Este trabalho indica o modo como oficinas de Formação Continuada de Professores de Ensino
Religioso vêm sendo realizadas no Estado do Acre, como experiência inédita, por meio de um
convênio entre a Secretaria de Estado de Educação e o Instituto Ecumênico Fé e Política,
detalhando o conteúdo e sequência do material apresentado aos profissionais de educação
participantes, bem como analisando os resultados obtidos.
Palavras-chave: Formação Continuada. Proposta Curricular. Tolerância religiosa .
Introdução
O Estado do Acre, a partir de 14 de abril de 2014, vem realizando um programa
de oficinas de Formação Continuada de professores de Ensino Religioso patrocinado
pela Secretaria de Estado de Educação e Esporte  SEE. Dois técnicos, Ivanilde
Lopes da Silva, Pedagoga, especialista em Educação, e Cid Mauro Araujo de Oliveira,
especialista em Língua Portuguesa e mestre em Teologia, foram indicados para a
mediação dessas oficinas, tendo já percorrido 12 de um total de 22 municípios,
contatado cerca de 400 profissionais da educação e coberto mais de 4000 km.
Havia muito tempo, de um modo geral, os professores sentiam a carência de
material e orientações básicas para dar cumprimento à tarefa do Ensino Religioso. Até
mesmo a Proposta Curricular de Ensino Religioso, pronta desde 2003, já estava
praticamente esquecida ou poucas escolas tinham conhecimento de sua preparação.
Outra peculiaridade era o fato de que, para aulas de Ensino Religioso, são recrutados
professores de História, Filosofia, Sociologia, Geografia, Artes e Língua Portuguesa, e
até mesmo, pelo menos um, de Educação Física, participou das oficinas. Daí a
urgência em contemplá-los com uma detalhada orientação.
O modelo de Formação Continuada
As reuniões de planejamento das oficinas de Formação Continuada ocorreram
na sede da SEE, com a participação do Diretor de Ensino Josenir Calixto e Lídia Maria
Mestre em Teologia – Membro do Instituto Ecumênico Fé e Política – [email protected]
Especialista em Gestão Escolar – Professora Substituta do Colégio de Aplicação –
Universidade Federal do Acre – [email protected]
24
25
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Pereira de Souza, Rubia de Abreu Cavalcante, Cleide Helena Prudêncio e Izis Melo da
Silva, respectivamente Coordenadoras do Ensino Médio e do Ensino Fundamental,
Diretora de Inovação em Educação e Coordenadora de Educação para os Direitos
Humanos, Cidadania e Diversidade, quando foram definidos forma e conteúdo das
oficinas, assim como a agenda de datas. A partir desse encontro, foram destacadas as
Técnicas em Educação Lucia Torres de Oliveira e Maria de Lourdes Nascimento
Pereira para que, juntamente com o professor Cid Mauro Araujo de Oliveira,
pudessem dar forma à sequência de atividades, propriamente ditas, da oficina de
Formação Continuada.
A partir da década de 1990, surgiu a necessidade de se investir mais na
formação continuada de professores, tendo em vista as novas demandas decorrentes
das transformações sociais que se refletiam na escola, exigindo um profissional mais
capacitado para lidar com os desafios apresentados pela sociedade globalizada.
Desde 1999, a SEE definiu como uma das ações estratégicas a Formação Continuada
de professores, tendo como documento base “Os Referencias Para Formação de
Professores”, do Ministério da Educação e Cultura - MEC, que partem do princípio de
que a formação continuada deve responder tanto às demandas do sistema de ensino
quanto às demandas dos professores em exercício.
De acordo com esses mesmos referenciais, um programa de formação
continuada deve ser definido considerando os seguintes pontos: análise da realidade
na qual pretende incidir, uma avaliação de ações de formação anteriores e novas
demandas colocadas, levando-se em conta as orientações do MEC. A formação
continuada é imprescindível para a melhoria do processo de ensino e aprendizagem e
se faz necessária em razão da formação inicial não suprir os conhecimentos gerais,
pedagógicos e habilidades didáticas que atendam às necessidades de aprendizagem
dos alunos.
A formação teórica é importante, mas não é suficiente para garantir o direito de
que o aluno aprenda. Esses conhecimentos teóricos precisam ser mobilizados,
transpostos didaticamente para sala de aula. Os professores precisam construir
competências que promovam as mudanças esperadas na qualidade do ensino.
Perrenoud define competência como sendo a “capacidade de agir eficazmente em um
determinado tipo de situação, apoiando-se em conhecimentos, mas sem se limitar a
eles” (PERRENOUD, 1999,p.7).
Nesse sentido, a política de formação continuada da SEE, vem se respaldando
nas orientações do MEC e têm como ponto de partida a necessidade de melhorar a
formação dos professores, gestores, coordenadores pedagógicos e dos formadores de
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professores, os quais são considerados sujeitos fundamentais no processo
educacional e, portanto, na construção da sociedade do conhecimento. As formações
priorizam a metodologia em que o professor é considerado como mediador da
construção do conhecimento do aluno, pautada no aprofundamento didático das
temáticas educacionais e curriculares, na reflexão e atualização da prática docente
bem como na necessidade pedagógica do professor para atuar eficazmente na sala de
aula, ou seja, na construção de práticas pedagógicas que permitam a ampliação do
universo profissional e cultural, rompendo assim com um modelo tradicional focado na
figura do professor, do livro didático e quadro de giz.
Outros componentes da Formação Continuada
Para a tarefa específica da Formação Continuada de Professores de Ensino
Religioso, a SEE decidiu manter um convênio com o Instituto Ecumênico Fé e Política
 IEFP, organizado em dezembro de 2007, entidade que reúne representantes das
principais confissões religiosas presentes no Acre, possuindo uma amadurecida
experiência de promoção do diálogo inter-religioso, resultante de encontros mensais,
intercâmbios entre seus membros, por meio de visitas a cada lugar de culto das
diferentes religiões e conferências em que cada grupo tem a oportunidade de falar
sobre as particularidades de sua própria religião, respondendo questões propostas
pelo auditório presente nesses encontros.
Através do folheto “Instituto Ecumênico Fé e Política  compromisso com a
justiça social e o respeito à diversidade religiosa”, o IEFP divulga os pontos principais
de seu modo de encarar a diversidade religiosa e os problemas de preconceito
religioso presentes no contexto social do Estado do Acre:
O Instituto Ecumênico é uma entidade civil, democrática e pluralista,
que reúne pessoas dos mais diversos credos religiosos: católicos,
protestantes, espíritas, adeptos do candomblé, da umbanda, das
comunidades tradicionais da ayahuasca, e de outras expressões de
fé, que tem como objetivo principal estimular e promover atividades
educativas de caráter ecumênico, a partir da cooperação entre igrejas
e instituições religiosas afins, orientadas para a paz, a cidadania, a
promoção dos direitos humanos, da democracia e de outros valores
universais. (IEFP – Instituto Ecumênico Fé e Política ACRE/BRASIL –
COMPROMISSO COM A JUSTIÇA E O RESPEITO À DIVERSIDADE
RELIGIOSA – Folder distribuído nas reuniões do Instituto).
Resultado prático desses encontros mensais foi a ideia de publicar uma
Cartilha da Diversidade Religiosa. Para tanto, chegou-se à conclusão que a melhor
escolha seria convocar um representante de cada confissão religiosa, Católicos,
Daimistas, Espíritas, Religiões de Matrizes Africanas e Protestantes, desde 17 de
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
dezembro de 2005 membros fundadores do IEFP, quando, informalmente, reuniões
periódicas eram convocadas por seu atual Secretário Geral, Prof. Manoel Pacífico da
Costa e pelo, na época, deputado estadual Nilson Mourão, sempre realizadas num
salão anexo à Catedral de Nossa Senhora de Nazaré, em Rio Branco, AC.
A ideia de organizar a Cartilha nasceu agregada a outra, que foi fazê-la chegar
aos professores de Ensino Religioso da rede estadual para que, em sala de aula, o
aluno do ensino fundamental, desde cedo, pudesse reconhecer, por meio dos
professores dessa disciplina, a importância do respeito à religião do outro e como
evitar o preconceito religioso de qualquer tipo. Esperava-se compartilhar a experiência
dos membros do IEFP, como parcela legítima da sociedade, com a parcela dessa
mesma sociedade representada pelos professores, pais e alunos, levada em conta
sua diversidade religiosa.
O IEFP, por meio da articulação de seus membros e sua inserção na
sociedade, informava-se de problemas ocorridos no entorno da cidade de Rio Branco
relacionados a casos de intolerância religiosa, fossem, exemplo mais comum, entre
protestantes e adeptos das religiões de matriz africana, assim como outros ocorridos
no contexto de escolas da rede pública e privada. Exemplo notável é o caso da Escola
Estadual São Francisco de Assis, construída no terreno do Centro Espírita e Culto de
Oração “Casa de Jesus  Fonte de Luz”, especificamente para acolher crianças, filhos
de adeptos do Daime, discriminados por colegas e pais nas demais escolas de Rede
Estadual.
Diante desses e outros casos, em várias ocasiões, os membros do IEFP
deslocavam-se para municípios vizinhos, onde convocavam representantes das
diversas religiões locais, promovendo encontros nos quais essa experiência de
tolerância religiosa era compartilhada. A produção da cartilha e a estratégia de fazê-la
chegar às mãos dos professores de ensino religioso tornou-se prioridade para o IEFP.
Vários encontros foram realizados com representantes da SEE, sempre indicando a
experiência vivida no contexto das reuniões mensais do IEFP, assim como aquela
experimentada nos contatos realizados no entorno da capital do Estado.
Uma vez encampada a ideia, pela SEE, foi marcada a I Conferência Estadual
de Diversidade Religiosa, realizada em 21, 22 e 23 de novembro de 2011 quando,
efetivamente, foi apresentada ao público presente a “Primeira Cartilha da Diversidade
Religiosa Muitos são os caminhos de Deus  um pouco de nossa história e de nossas
crenças”. Em sua Apresentação, escrita pelo Secretário Geral do IEFP Manoel
Pacífico da Costa, destaca-se sua importância como contribuição ao diálogo interreligioso, assim como a expectativa positiva que cerca seu uso e divulgação:
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O Instituto Ecumênico oferece sua contribuição a professores e
lideranças religiosas, no sentido de capacitá-los para o diálogo interreligioso, na sociedade pluralista em que vivemos, além de estimular
a cooperação entre as diversas denominações e expressões de fé,
com o objetivo da construção da paz, da cidadania, da democracia e
do respeito aos direitos humanos. A presente Cartilha da Diversidade
Religiosa é resultado de quase seis anos de encontros inicialmente
de representantes católicos e evangélicos, ampliados há mais de
quatro anos com representantes espíritas, daimistas e de religiões de
matriz africana, que integram a direção do Instituto Ecumênico Fé e
Política – ACRE. (Primeira Cartilha da Diversidade Religiosa – Muitos
são os caminhos de Deus – Um pouco de nossas histórias e de
nossas crenças, p. 7).
A partir do contexto da I Conferência Estadual e do lançamento da Cartilha, o
desafio passou a ser o modo como fazê-la chegar às mãos dos professores, não
apenas enviando-a por mala postal ou como arquivo pela internet. Foi então que se
planejou ter disponíveis representantes do IEFP que pudessem, junto à SEE, planejar
e levar a efeito Oficinas de Formação Continuada por meio das quais o modo como
estava sendo planejado e executado o Ensino Religioso fosse colocado em questão e
que as Cartilhas chegassem, então, às mãos dos professores, como recurso útil tanto
no seu planejamento quanto, e principalmente, com relação à prática de uma filosofia
de diálogo e tolerância religiosa.
Juntamente com a Cartilha da Diversidade Religiosa, também ficou decidido
fazer chegar às mãos dos professores de Ensino Religioso a “Proposta Curricular do
Ensino Fundamental – Implementação do Ensino Religioso no estado do Acre”,
resultadode um criterioso processo no qual participaram o Conselho Estadual de
Educação – CEE e o Fórum do Ensino Religioso, convocado e composto por
representantes da Secretaria Municipal de Educação, Associação de Ministros
Evangélicos do Acre, Igrejas Evangélicas, Associação das Escolas Católicas,
Departamento de Professores do SINTEAC – Sindicato dos Professores do Acre,
Sociedade Bíblica do Brasil, Federação Espírita do Acre, Corpo Docente do Ensino
Religioso, Igreja Católica, Secretaria Estadual de Educação e Fé Bahá’í. Foram
também nomeadas uma Equipe da Coordenação de Ensino Religioso e uma Equipe
de Relatoras, ambas compostas por três membros.
As reuniões do Fórum foram presididas pela presidente do CEE, Profa. Iris
Célia Cabanellas Zannini e, ao final da agenda de um período de 4 anos de reuniões,
1999-2002, foram convocadas e visitadas as escolas estaduais de ensino
fundamental, numa agenda de reuniões periódicas, quando professores, alunos e pais,
puderam conhecer a proposta, opinar a seu respeito e propor possíveis intervenções
em seu modelo. A aprovação deu-se por meio do Parecer CEE/AC/63/2002 e foi
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
publicada em 2003, com Ficha Catalográfica elaborada pela biblioteca da
Universidade Federal do Acre - UFAC.
A forma da Proposta Curricular, em seu Sumário, apresenta “Justificativa” e
“Fundamentação do Ensino Religioso”, em seus “Aspectos Legais”, sua “Concepção
Político-Pedagógica” e seus “Princípios Norteadores”. A seguir é apresentada,
propriamente dita, “Uma Proposta Curricular para o Ensino Religioso”, em seus
“Aspectos Gerais”, “Caracterização da Clientela” e “Aspectos do Currículo”. Estes
últimos, subdivididos em “Princípios Norteadores”, “Objetivos”, “Organização dos
Conteúdos” e “Organização dos Componentes Curriculares”. No texto em si, o
currículo subdivide-se em quatro colunas: “Séries” (antigas 1ª à 8ª), “Unidade
Temática”, “Tópicos Curriculares” e “Objetivos”. No final são apresentadas “Ações
Compartilhadas da Prática Educativa”, “Avaliação” e “Bibliografia”.
Vale destacar, na seção “Princípios Norteadores”, a colocação do aluno como
pólo principal de interesse, a partir do qual e no contexto de vida em que o fenômeno
religioso terá uma abordagem bem fundamentada. A partir dessa ideia-mestra, as
subdivisões dessa seção enfocam: “Visão orgânica do conhecimento escolar”;
“Interdisciplinaridade, contextualização e transversalidade (conceitos epistemológicos
básicos na organização e desenvolvimento do currículo)”; “O conhecimento como
processo de construção coletiva, que mobiliza afetos, emoções, relações com seus
pares, além de cognição e habilidades”; “A realidade religiosa do aluno como ponto de
partida e chegada na construção do conhecimento”; “A realidade do aluno quanto às
necessidades, interesse e possibilidade de aprendizagem deve ser considerada”.
No item “Aspectos Gerais da Proposta” um pequeno histórico da consolidação
do Fórum e dos procedimentos para a consecução da Proposta Curricular foram
indicados no texto:
A proposta ora apresentada, como indicativo de colaboração à
escola, na construção de seu currículo pleno, constituiu-se a partir
das sugestões dos professores e alunos de 5ª a 8ª séries, expressas
nos instrumentais específicos aplicados em 80% das escolas de Rio
Branco, em 1999, das indicações feitas pelos professores por ocasião
da discussão das Diretrizes Curriculares Nacionais, realizada em
todos os municípios, em agosto de 2002, em questionários
respondidos pelos professores de 1ª a 4ª séries do ensino
fundamental, em outubro do corrente ano (ACRE, 2002, p. 15).
A partir da coleta desses dados, verificou-se um perfil geral de matriz cristã
para a clientela de alunos, assim como contribuições significativas cristalizaram-se
para a fundamentação dos dois eixos norteadores do currículo, que foram adotados
como “Transcendentalidade” e “Alteridade”, a partir dos quais “fluíram as temáticas
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que motivarão os conteúdos e objetivos a serem ampliados no currículo pleno” (ACRE,
2002, p. 16). A seguir, vão expostas as unidades temáticas, deste modo definidas:
Espiritualidade: o divino e o humano nos textos sagrados para
elucidar os tópicos ‘Deus’ e ‘Jesus Cristo’ revelados na pesquisa;
Tradição: História das narrativas, atendendo à pesquisa que revelou o
tema ‘Bíblia’ reconhecendo haver outros textos relativos a outros
credos e religiões; História das principais religiões, atendendo à
constatação da pesquisa quanto ao desejo de serem conhecidas as
diversas religiões; Ética e Ser Humano, valores extraídos dos textos
religiosos para atender necessidades éticas na construção da
identidade e da cidadania, sobrelevando-se a aceitação do próximo
independentemente do credo de cada um, magnanimidade no
julgamento das pessoas, caridade no seu sentido etimológico
(carinho) e solidariedade fraterna (ACRE, 2002, p. 16).
Ao Fórum coube ainda a elucidação dessas temáticas, ou seja, sua discussão
de modo detalhado por ocasião dos encontros e, para tanto, pesquisou a proposta
elaborada pelo Fórum Nacional de Educação Religiosa, além das normas dos
Conselhos Nacional e Estadual de Educação.
Atendendo, de acordo com a Proposta Curricular, ao Eixo Norteador
“Alteridade”, é apresentada aos participantes da oficina a Coleção Cidadania e
Liberdade de Escolha, de Gabriel Chalita, Editora FTD, como fonte de referência de
material para os professores. Os volumes dessa coleção apresentam subdivisões
muito precisas, em consonância com as Unidades Temáticas, Tópicos Curriculares e
Objetivos da Proposta Curricular, como indicado a seguir, assim como com relação
aos subtópicos do eixo Cultura de Paz do Projeto Vida: “Respeito e Convivência”,
cujas unidades são Respeitar e ser respeitado, Nossos Direitos, Proteção e amor,
Regras de convivência; “Solidariedade e Gratidão”, cujas unidades são Cuidando uns
dos outros, Amizade e gratidão, Proteger e ser protegido, Crescer em solidariedade,
Cooperação e Igualdade; “Justiça e Paz”, cujas unidades são Justiça e Direitos
Humanos, Fraternidade, Bullying, Paz; e “Ética e Poder”, cujas unidades são
Cidadania na Política, Política e Eleições, Participação e Ética na Política, Projeto de
Vida.
Além desses dois elementos, Cartilha e Proposta Curricular, outra iniciativa da
SEE foi a promoção de ações que, segundo sua avaliação, relacionam-se à
constatação de necessidades urgentes no contexto das escolas. Daí a proposta de
elaborar um projeto abrangente, que atendesse a todas essas demandas:
Com participação de gestores, professores e alunos dos ensinos
Fundamental e Médio, além de representantes da Universidade
Federal do Acre, da Secretaria de Estado de Saúde (Sesacre) e
outros parceiros, a Secretaria de Estado de Educação e Esporte
(SEE) lançou, na manhã desta terça-feira, o Projeto Vida, que
promove a participação da comunidade escolar na prática de hábitos
saudáveis. O principal objetivo do projeto, voltado para educadores
das áreas de Biologia, Ciências e Educação Física, é chamar a
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
atenção para os fatores que, de acordo com a Organização Mundial
de Saúde (OMS), representam riscos para a saúde e para a
qualidade de vida, independentemente da idade ou condição
social.(SEE, 2014, p. 20).
Por essa razão, a SEE decidiu incluir o Projeto Vida como conteúdo das
oficinas de Formação Continuada, o qual define cinco eixos prioritários de ações nas
escolas: Nutrição, Atividade Física, Sexualidade, Drogas e Violência e Cultura de Paz.
Este último eixo tem como subtópicos: compreensão/tolerância/solidariedade; ética e
participação democrática; compromisso com os direitos humanos; equidade entre
gêneros; relação professor/aluno. A orientação da SEE é propor que seja este o eixo
priorizado pelos professores de Ensino Religioso para que, juntamente com o estudo
em si das religiões, sejam contemplados os aspectos práticos e os desafios propostos
por esse eixo do Projeto Vida.
Conteúdo e sequência das Formações Continuadas
A forma final constitui-se, no início, de uma Apresentação, na qual os
participantes,
tendo
confeccionado
seus
crachás,
falam
seus
nomes,
sua
especialização, local de trabalho e são solicitados a, numa só palavra, escrever a
expectativa que nutrem com relação à oficina. Essa dinâmica inicial, através da qual
os professores e coordenadores se tornam conhecidos uns dos outros, indicando
colégio e área em que lecionam, procura criar um ambiente de descontração para os
próprios participantes, eliminando reações de resistência que são comuns na rotina de
Formações Continuadas.
Logo depois, a eles é apresentado o IEFP, por meio de um vídeo que mostra
atividades do Instituto, em suas reuniões mensais. É relevante conhecer a natureza de
missão do IEFP, visto que, no estado do Acre, a SEE entendeu que valia a pena
utilizar essa experiência de diálogo inter-religioso como laboratório para as escolas,
representado na convocação de dois dos membros do IEFP formados como
educadores e profissionais pertencentes ao quadro de funcionários da própria SEE.
Também ficam conhecendo imagens da I Conferência Estadual de Diversidade
Religiosa, para que conheçam o contexto de lançamento da Cartilha que irão receber.
A seguir entra-se, especificamente, no assunto do Ensino Religioso, por meio
do segundo vídeo que é “Como lidar com a religiosidade dos alunos e professores nas
escolas brasileiras”, produzido pelo Globo Educação. Trata-se de uma sequência de
três curtos vídeos, que completam cerca de 20 min, ao final dos quais é dada aos
participantes a oportunidade de discutir a temática ali abordada.
FONAPER
Alguns exemplos de depoimentos, no vídeo, de alunos e representantes das
religiões convidadas, Candomblecistas, Católicos, Espíritas e Protestantes, são
utilizados como pontos de retomada do assunto no debate efetuado logo após a
apresentação. Destaque é a fala do candomblecista Pai Marcio de Jagum, com
relação a sua intervenção quando entrevistado, destacando sua posição com relação
à importância da escola como veículo que possibilita educar o aluno contra o
preconceito religioso, tornando-o instrumento de promoção da aceitação e tolerância
religiosa:
Eu acho que a escola deve se preocupar, nesse momento,
principalmente nesse momento crítico da nossa sociedade, em abrir
espaços didáticos para que as pessoas possam se respeitar, espaços
de cidadania e solidariedade. Quando a gente consegue
compreender, na idade deles, o que é solidariedade, a gente aprende
a se respeitar, automaticamente. A gente aprende, automaticamente,
a ter valores, limites que façam com que a sociedade progrida de
forma natural e saudável. Eu acho que a religião, o ensino
confessional, como se fala, ele é subjetivo, ele é pessoal. E o Brasil é,
constitucionalmente, um estado laico, ele não tem religião, nós é que
temos (JAGUM).
Tal destaque coloca em questão a relevância da abordagem e do tratamento
consciencioso que a escola deve dar ao Ensino Religioso, não para que doutrine ou
ensine, especificamente, uma religião, mas para que seja a principal mediadora na
solução de conflitos religiosos, situando o aluno no contexto do fenômeno religioso e
da tolerância religiosa. Este é o argumento usado para ressaltar a importância do
Ensino Religioso quando, logo no início do vídeo, os professores são colocados, pela
fala introdutória de Sandra Anennberg, diante da não obrigatoriedade do aluno
matricular-se em suas aulas: “A lei diz que o ensino religioso deve, sim, fazer parte do
currículo das escolas públicas, mas a participação do aluno é opcional, ou seja,
ninguém pode ser obrigado a frequentar uma aula de religião.”
Essa questão da não obrigatoriedade é novamente destacada em outra parte
do vídeo, desta vez pela repórter Helena Lara Resende, quando menciona que “a lei
que orienta a educação no Brasil diz que o ensino religioso deve fazer parte do
currículo das escolas públicas, embora não seja obrigatório: cada Estado deve definir
a melhor forma de fazer isso.” Torna-se, então, relevante frisar, para os participantes
da oficina, a entrevista com Ana Paula Miranda, professora da UFF, que destaca
pesquisas nas cidades vizinhas de Niterói e Rio de Janeiro, RJ, com relação a escolas
onde alunos se recusavam a participar das aulas de ensino religioso:
Nós fizemos uma análise de conflitos religiosos no estado do Rio de
Janeiro e identificamos, na cidade de Niterói e na cidade do Rio de
Janeiro, que foram escolas onde nós selecionamos para fazer a
pesquisa, casos que evidenciavam relação onde alunos e professores
enfrentavam problemas. Numa escola onde o ensino religioso era
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
ministrado, uma escola estadual aqui em Niterói, os conflitos
apareciam na aula de ensino religioso, mas não eram conflitos de
desafiar o professor, mas conflitos onde os alunos, eles se
recusavam a participar das aulas. Numa outra escola onde não havia
o ensino da disciplina de ensino religioso, os conflitos passavam por
conflitos cotidianos, onde a identidade religiosa dos estudantes ou
dos professores era colocada em xeque, geralmente como uma
categoria de acusação: os alunos, muitas vezes, ou se agrediam ou
agrediam os professores, chamando de macumbeiro ou debochando,
porque era evangélico, ou seja, esses conflitos têm características
distintas, mas a identidade religiosa acaba funcionando com um
elemento que vai provocar uma série de discriminações e, o que é o
mais grave, a escola não lida bem com isso, quer dizer, ela não
intervém de uma maneira a tentar administrar esses conflitos. Na
verdade, ela faz de conta que ele não existe, o que significa que os
conflitos tendem a crescer (MIRANDA).
Torna-se claro, na apreciação feita pela professora, que os conflitos religiosos
subjazem aos relacionamentos cotidianos, na escola e até mesmo fora dela. Portanto,
o lugar precípuo onde abordá-los, educando para resolvê-los, é a sala de aula, mais
exatamente na aula de Ensino Religioso. Não será propriamente uma aula de religião,
mas de compreensão do fenômeno religioso e do modo como o ser humano tem
lidado com ele. Na discussão da não obrigatoriedade e do caráter opcional por parte
do aluno, é relevante indicar essa pesquisa, que se constitui numa amostragem de
como tais conflitos se configuram e de como soluções positivas podem ser mediadas
pela escola.
Outra questão relevante abordada, indicada no depoimento da aluna Beatriz
Lima, do 3º ano do Ensino Médio, foi a prevalência, no Ensino Religioso, de um vício
resultante do mau preparo do professor, que é a possibilidade de catequese
enfatizada pela predominância de uma das religiões majoritárias, ou seja, o
despreparo do professor pode carrear para a sala a de aula traços de sua religiosidade
pessoal:
Eu acho muito importante conhecer sobre as religiões, mas não acho
que deva ter uma disciplina, até porque o que eu tenho notado nos
colégios que têm a religião como uma disciplina mesmo, obrigatória,
é que acaba tendo uma predominância do catolicismo ou de outras
religiões cristãs. Mas há outras religiões, e até outra que a gente
conhece muito pouco (LIMA)
A Proposta do Currículo de Ensino Religioso organizada pelo CEE/AC e
apresentada nas oficinas mantém rigoroso cuidado em não indicar Tópicos
Curriculares que contenham aspectos doutrinários, por demais particularizados ou
tendenciosos com relação ao ponto de vista de qualquer confissão religiosa. O bom
preparo do professor, da mesma forma, torna possível que saiba encarar o fenômeno
religioso como inerente ao ser humano, independentemente da religião específica de
FONAPER
cada um. Assim poderá abordá-lo, sem que transpareçam elementos de sua própria
religião.
Outro fator frequentemente mencionado por professores nas Formações
Continuadas relaciona-se ao depoimento da aluna Irene Cavet, 3º ano do Ensino
Médio, diante da pergunta da repórter Helena Lara Resende sobre o tema
“Expectativas e desafios do Ensino Religioso nas escolas brasileiras”, feita a cada um
representante das religiões Católica, Espírita, Protestante e Candomblé: “O que vocês
acham mais importante ser valorizado na aula de ensino religioso, a formação moral
ou a tradição e a história de cada crença?”. Com relação à associação moral e
religião, ela respondeu:
Eu, particularmente, acho que ̶ acho que eu sou uma só aqui ̶ mas
eu sou absolutamente contra o ensino religioso. Eu acho que a
escola, em sua natureza, é um ambiente republicano, em sua origem,
e democrático. Por exemplo, eu, que não tenho uma crença religiosa
me sentiria excluída num lugar onde tem um professor dizendo que a
religião é portadora da moral. E as pessoas que não possuem
religião? Elas são menores, por causa disso? (CAVET)
Questões sobre alunos que não professam religião, embora acreditem em
Deus, ou que afirmam ser categoricamente ateus, são mencionadas pelos
participantes das oficinas. A intervenção dessa aluna, no vídeo, abre chance para
comentar que nas aulas de Ensino Religioso, quando se leva em conta a religião como
fenômeno social e cultural e não se pratica o proselitismo religioso, estes fatores
aliados a um preparo aprimorado do professor, torna possível situar a abordagem num
contexto de estudo e discussão que não deixará deslocado o aluno ateu ou que não
possui uma religião especificada.
Após esse debate, é apresentado mais um vídeo, agora introduzindo a
discussão das diferenças religiosas e o modo de encarar questões conflitantes, como
diferentes concepções de Deus e a noção de pecado, denominado “Carnaval dos
deuses”, de Tata Amaral. 26 Trata-se de uma sala de ensino infantil, na qual a
professora deu como tarefa aos alunos preparar suas próprias fantasias para um baile
de Carnaval. Em meio a essa tarefa, as crianças, de modo informal e descontraído,
começam a discutir religião, refletindo as concepções de Deus a que estão
acostumadas, resultantes, principalmente, de sua vivência familiar.
Mais uma vez é dada oportunidade para debate sobre as questões abordadas
no vídeo. Então é distribuído o kit de materiais que contém, entre eles, a Cartilha da
Diversidade Religiosa, a Cartilha – Promovendo e Defendendo Direitos Humanos, da
Secretaria de Justiça e Direitos Humanos – SEJUDH, uma cópia da Proposta
26
Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=KtOV6W7B_wA>. Acesso em: 03 set.
2014.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Curricular de Ensino Religioso, o folder do IEFP e uma apostila de resumo da Cartilha
da Diversidade Religiosa, cujo objetivo é orientar os participantes na pesquisa da
mesma.
A seguir, os participantes são subdivididos em cinco Grupos de Trabalho, para
a realização de uma pesquisa sobre os cinco tipos de confissões religiosas presentes
na Cartilha, lançando mão do material gráfico distribuído para que, no retorno na parte
da tarde, possam apresentar o resultado de seu trabalho para, em seguida, ser
apreciada a Proposta de Currículo de Ensino Religioso e o modo como se adapta às
necessidades do Projeto Vida, especificamente em seu eixo Cultura de Paz, com
relação à tarefa da mediação de conflitos nas escolas.
O último vídeo, “Mediação resolve conflitos em escola”27, é apresentado aos
participantes, atendendo ao eixo Cultura da Paz, do Projeto Vida, com o objetivo de
demonstrar uma experiência positiva de mediação de conflitos, projeto esse efetuado
por uma escola da cidade satélite de São Sebastião, no Distrito Federal. Trata-se da
escolha de alunos-problema, anteriormente liderança negativa que, após trabalho de
conscientização, são escolhidos e treinados como mediadores de conflitos.
Ocorre na escola um dia de Formatura de Mediadores, como programação
especial, reunindo toda a comunidade escolar, quando camisas personalizadas são
distribuídas, shows são realizados, sendo que, entre esses mediadores se encontram
também professores e alunos mediadores, os quais tratam dos conflitos que ocorrem
entre professor e aluno, segundo é mostrado no próprio vídeo, além de um aluno e
uma aluna que, escolhidos como mediadores, são entrevistados e parentes e demais
colegas confirmam a influência positiva que passaram a exercer.
A essa altura, já no final da jornada, os participantes são convidados a anotar
uma avaliação da oficina da qual participaram, assim como comentar se a palavra
escolhida como perspectiva de síntese para as atividades do dia correspondeu às
expectativas. Têm sido unânimes as avaliações positivas, sendo que o ponto negativo
geralmente mencionado pelos professores é que o tempo de atividades foi muito curto
para o volume de informações de todo o material disponibilizado. Este é um exemplo
típico do tipo geral de avaliação feita pelos participantes na avaliação da oficina de
Formação Continuada: Sena Madureira. Escola Estadual Instituto Santa Juliana, 30 abr. 2014:
A oficina de educação religiosa considero que foi muito importante
para, a partir desse momento, compreender e saber entender melhor,
a respeitar as diferenças e opções religiosas que cada indivíduo
escolhe. Além de vir contribuir para os professores poderem ter um
norte a ser seguido, melhorando o comportamento, a disciplina e,
acima de tudo, o aprendizado dos alunos. Essa formação foi
27
Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=G5Jt_vVeo38>. Acesso em: 03 set. 2014.
FONAPER
inovadora, dinâmica e enriquecedora. Parabéns! O encontro foi
bastante proveitoso para nós educadores, pois há uma certa carência
quanto a material para trabalhar o Ensino Religioso nas escolas. Um
outro ponto é a questão dos professores que não têm formação na
área e, na maioria das vezes, levam para a sala de aula a própria
doutrina. Acredito que, a partir dessa formação, as aulas vão começar
a mudar. A ‘sementinha’ foi plantada, por isso temos como avançar
no Ensino Religioso, trabalhando projetos com foco na ética, na
cidadania e na dignidade humana.
Conclusões
Procurou-se organizar as oficinas de modo a não afastar de sala de aula os
professores por um período muito longo. Daí estreitar-se para um período considerado
de 8h/aula, em duas etapas, manhã, das 8 às 12h, e tarde, das 14 às 17h, uma oficina
que, diante das opções de material disponível e das reconhecidas necessidades do
Ensino Religioso, tornou-se de pouco tempo, porém de um tamanho produtivo, dentro
dessas exigências e expectativas.
Finalmente, uma problemática compartilhada com os participantes da oficina é
a urgente necessidade de, no Estado do Acre, ser oferecido um curso específico para
a formação de professores do Ensino Religioso, no nível de especialização. No início
de 2014, ocorreram reuniões entre representantes do IEFP, da SEE, da FADISI –
Faculdade Diocesana São José e professores da UFAC – Universidade Federal do
Acre, numa primeira tentativa de estabelecer o ponto de partida de um curso de
Ciência das Religiões.
O fato da diversidade de áreas entre as quais são convocados os professores
de Ensino Religioso, mesmo diante do esforço das Formações Continuadas, enseja
que os problemas mais rotineiros continuem a ocorrer, que são a predominância de
uma religião majoritária no contexto do ensino em sala de aula como, por exemplo,
catolicismo ou protestantismo, assim como desvios de uma temática melhor definida e
mais condizente com a Proposta Curricular com relação ao conteúdo das aulas
ministradas. Certamente um curso específico tornará possível a esses profissionais o
acesso a disciplinas formadoras nessa área. Desse modo, estarão melhores treinados
e capacitados para as abordagens teóricas e práticas que deverão empreender em
sala de aula.
Do mesmo modo, em jornadas futuras de Formações Continuadas, será
necessário abordar, de modo mais detalhado, a Proposta Curricular, que precisa ser
atualizada, incluídas agora as séries de 1º a 9º ano, assim como devem ser abordadas
orientações para os Planos de Curso e o preparo específico de Sequências Didáticas
voltadas para um aprimoramento ainda maior em sala de aula, além de adaptá-la no
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
contexto mais específico de habilidades e competências. A próxima edição da Cartilha
da Diversidade Religiosa, além da inclusão de outros grupos religiosos, trará em
anexo a Proposta Curricular do Ensino Religioso, facilitando aos professores a
consulta.
Outro aspecto característico desses encontros realizados foi o tempo utilizado
pelos professores conhecendo o conteúdo da Cartilha da Diversidade Religiosa.
Embora fosse planejada para um tempo menor, tanto à pesquisa nos Grupos de
Trabalho, quanto à própria apresentação feita posteriormente aos colegas,
propositadamente deu-se um tempo maior, mesmo porque muitas questões surgiam
quando professores de credos variados reconheciam conteúdos de religiões, até o
momento, desconhecidas para eles, ou mesmo detalhes que não conheciam das
religiões mais conhecidas.
Foi assim com as tradições do Daime, assim conhecido, que são originárias
especificamente do Acre e aparecem registradas de um modo muito cuidadoso na
Cartilha da Diversidade Religiosa, refletindo o contexto de uma organização muito
criteriosa dos três maiores grupos, Centro de Iluminação Cristã Luz Universal, Centro
Espírita e Culto de Oração “Casa de Jesus Fonte de Luz” e Centro Espírita
Beneficente União do Vegetal, os quais possuem um blog que reúne informações
sobre as três correntes, a Culturas Ayahuasqueiras – Câmara Temática.28 Também
com relação às tradições escritas e a história das religiões de Matriz Africana no
Brasil, Umbanda e Candomblé, mal compreendidas e com história tão cruel de
rejeição por parte de católicos e protestantes. Fica patente que ler sobre essas
tradições, textos escritos por representantes particularmente escolhidos por elas, torna
mais claras e melhor compreensíveis suas maneiras de exercer seu modelo de fé.
Evidentemente, todos os problemas e estranhezas com as quais os
professores se deparam ou trazem de sua vivência não se resolvem automaticamente,
no contexto e contato das oficinas. Mas a leitura das avaliações escritas por eles
permite constatar que colocá-los frente a frente com essas questões, mediados por
uma pedagoga católica e um professor pastor evangélico, que compartilharam com
eles não somente os conteúdos da Cartilha da Diversidade Religiosa, mas a
experiência do IEFP, confrontando-os com os dilemas da aceitação das diferenças
religiosas, contribuiu como despertamento para a realidade, possibilidade e
necessidade do diálogo inter-religioso e a postura ecumênica. E reconhecemos que,
uma vez conscientizados, ficará mais fácil para o professor transmitir aos alunos essa
28
Disponível em: <http://camaratematicaayahuasca.blogspot.com.br/2014/06/camara-tematicapresta-homenagem-irma.html>. Acesso em: 03 set. 2014.
FONAPER
mesma postura, de modo a prepará-los para uma convivência mais harmônica, seja no
contexto escolar, seja na vida em sociedade, de um modo geral.
Referências
CAVET, Irene. In: COMO LIDAR com a religiosidade dos alunos e professores nas escolas
brasileiras.
Direção:
Globo
Educação.
Vídeo,
19’25”.
Disponível
em:
http://redeglobo.globo.com/globoeducacao/videos/t/edicoes/v/como-lidar-com-a-religiosidadedos-alunos-e-professores-nas-escolas-brasileiras-integra/2417556/>. Acesso em: 02 set. 2014.
COSTA, Manoel Pacífico da et al. Cartilha da Diversidade Religiosa - Muitos são os
caminhos de Deus:um pouco de nossa história e de nossas crenças. Rio Branco, Acre:
Instituto Ecumênico Fé e Política – Acre, Secretaria de Estado de Educação e Esporte,
2011.
JAGUM, Marcio de. In: COMO LIDAR com a religiosidade dos alunos e professores nas
escolas brasileiras. Direção: Globo Educação. Vídeo, 19’25”. Disponível em:
http://redeglobo.globo.com/globoeducacao/videos/t/edicoes/v/como-lidar-com-a-religiosidadedos-alunos-e-professores-nas-escolas-brasileiras-integra/2417556/>. Acesso em: 02 set. 2014.
LIMA, Beatriz. In: COMO LIDAR com a religiosidade dos alunos e professores nas escolas
brasileiras.
Direção:
Globo
Educação.
Vídeo,
19’25”.
Disponível
em:
http://redeglobo.globo.com/globoeducacao/videos/t/edicoes/v/como-lidar-com-a-religiosidadedos-alunos-e-professores-nas-escolas-brasileiras-integra/2417556/>. Acesso em: 02 set. 2014.
MIRANDA, Ana Paula. In: COMO LIDAR com a religiosidade dos alunos e professores nas
escolas brasileiras. Direção: Globo Educação. Vídeo, 19’25”. Disponível em:
http://redeglobo.globo.com/globoeducacao/videos/t/edicoes/v/como-lidar-com-a-religiosidadedos-alunos-e-professores-nas-escolas-brasileiras-integra/2417556/>. Acesso em: 02 set. 2014.
PERRENOUD, Philippe. Construir as competências desde a escola. Porto Alegre:
Artmed, 1999.
ZANNINI, Iris Célia Cabanellas et. al. Proposta Curricular do Ensino Fundamental Implementação do Ensino Religioso. Rio Branco, Acre: Gráfica e Editora Floresta,
2002.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
FORMAÇÃOCONTINUADA: O ENSINO RELIGIOSO E AS INTERFACES COM A
EDUCAÇÃO AMBIENTAL, AS RELAÇÕES ÉTNICO RACIAIS E A DIVERSIDADE
SEXUAL
Eliane Maura LittigMilhomem de Freitas – PMC/FSG29
Resumo
No ano de 2014, a Secretaria Municipal de Educação de Cariacica/ES trouxe como proposta
para as formações de áreas do conhecimento os temas Educação Ambiental, Relações Étnico
Raciais e Diversidade Sexual. A disciplina do Ensino Religioso buscou também desenvolver um
diálogo com as temáticas, pois sendo a escola um todo complexo, os professores de todas as
disciplinas devem lançar seus olhares para a formação integral do educando numa perspectiva
de valorização do ser humano com vistas à cidadania e desta forma melhor conduzir o projeto
político pedagógico escolar.
Palavras-chaves: Educação Ambiental. Relações Étnico Raciais. Diversidade Sexual.
Formação Continuada
Introdução
O currículo escolar compreende muitos conhecimentos que não estão
prescritos diretamente nos documentos oficiais da escola;tais conteúdos são
reconhecidos como currículo oculto e, por isso, devem buscar espaços em todas as
disciplinas. Desta feita, o Ensino Religioso também deve proporcionar momentos de
discussão sobre as questões mais diversas do cotidiano escolar. Mas, porque
trabalhar com os eixosEducaçãoAmbiental, Relações Étnicos Raciais e Diversidade
Sexual?
Iniciando com o tema Meio ambiente, observa-se uma preocupação cada vez
maior das autoridades e organizações não governamentais sobre o cuidado e o zelo
para com a natureza. É urgente a tomada de consciência para que possamos buscar
alternativas e mudanças de atitudes, garantindo assim um ambiente mais saudável
para as próximas gerações.
Embora muito se tenha estudado e discutido sobre As Relações Étnico Raciais,
o tema é muito pertinente uma vez que o racismo se apresenta de variadas formas,
trazendo constrangimentos, preconceitos ediscriminações quea escola precisa
eliminar.
29
Mestre em Educação. Universidade São Marcos/SP. Coordenadora da formação de
professores do Ensino Religioso no município de Cariacica – ES. Professora do curso de
Pedagogia da FSG. [email protected]
FONAPER
No que diz respeito à Diversidade Sexual, há muito para se discutir, pois o
diálogo iniciou há pouco tempo e a escola deve contribuir para a erradicação de todo
tipo e forma de preconceito e discriminação.
Considera-se como de primordial importância que a escola, em sua função
pedagógica, busque visibilizar os alunos que carregam consigo as marcas de um
estereótipo excludente da sociedade, que os torna, também por isso, invisíveis no
meio educativo.
O Ensino Religioso, assim como outras disciplinas, precisa buscar espaços
para tais alunos, pois de acordo com a LDB 9.394/96 devem ser garantidas as
condições para acesso e permanência na escola.
O Ensino Religioso e as interfaces com o Meio Ambiente
De conformidade com Amâncio (2005), a conservação da qualidade do meio
ambiente e da vida está na pauta das preocupações da sociedade. Para a autora isto
pressupõe não somente uma consciência ambiental, mas também as questões social,
cultural e econômica relacionada à existência do homem. Para tanto se faz necessário
uma crítica consciente das relações sociais e de produção, tanto ao tipo de valor,
como ao uso dos recursos e produtos da natureza. O modelo de educação ambiental
deve alterar o modelo tradicional de educação, isto é, não deve somente estar voltado
para a transmissão de conhecimento sobre ecologia, no sentido reduzido da palavra.
Amâncio (2005, p. 1), diz que:
Seu propósito fundamental é mostrar as correlações
econômicas, políticas, sociais, culturais e ecológicas do mundo
contribuindo, portanto, para o desenvolvimento de um espírito
de responsabilidade e solidariedade entre os indivíduos e as
sociedades.
A autora citada adverte que o uso indiscriminado de agrotóxicos, fertilizantes
químicos dentre outros colaboraram para a degradação ambiental causando danos
aos animais, plantas, águas e ao ser humano. Amâncio destaca que há duas formas
de combater esse mal; por um lado, se apoia na busca de tecnologias alternativas
visando superar ou restringir os constrangimentos que o padrão tecnológico coloca no
meio cotidiano e, por outro, pelo movimento social em luta. Para se alcançar
resultados satisfatórios, torna-se essencial a participação cidadã.
Para Amâncio (2005), a educação ambiental pode ser subdividida em três
grandes espaços: A Educação Ambiental Formal, exercida como atividade escolar dos
sistemas de ensino, com conteúdos, metodologias e meios de avaliação claramente
definidos; Educação Ambiental não-Formalque ocorre em variados espaços da vida
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
social, com diferentes componentes, metodologias e formas de ação daquela formal,
exercida normalmente por Organizações Não-Governamentais (ONGs), empresas,
secretaria de governo, e etc. e Educação Ambiental Informal que é aquela exercida em
outros espaços sociais, sem compromisso com a continuidade. “A Educação
Ambiental surge com a finalidade de reintegrar o ser humano no complexo
ecossistema a que está inserido” (AMÂNCIO, 2005, p.03).
A partir desse entendimento sobre a Educação Ambiental buscamos fazer o
link entre as religiosidades e a Educação Ambiental, isto é como cada religião trata da
natureza e quais os seus ensinamentos sobre a mesma. Tal atividade se tornou muito
prazerosa uma vez que em nossas discussões e pesquisas encontramos muitos
pontos de contato.
Segundo Becker(2008) as teologias do cuidado são representações básicas
nas tradições religiosas. Para o autor a relação do ser humano com o seu meio
ambiente é objeto de reflexão em praticamente todas as tradições religiosas.
O autor revela que para o Budismo é fundamental o entendimento do ciclo do
sofrimento e, consequentemente, a busca pela libertação desse sofrimento. O
Budismo compreende que todos estão interligados. Conforme Becker (2008, p.319):
[...] Daí a importância dos termosKaruna – ajuda os outros
seres a se libertaremdo sofrimento, na medida em que o
sofrimento de um ser é compartilhado pelos outros seres, pois
na cosmovisão budista, todos os seres estão interligados, como
também interdependentes pela lei do Karma que tudo envolve.
NoJainismo, os princípios éticos fundamentais são ahimsa–que consiste na
não violência para com todos os seres vivos;aparigraha – independência de todas as
posses supérfluas esatya – amor à sinceridade/veracidade. No Jainismo não há
nenhum tipo de sacrifício de animal, nem caça ou alimentação baseada na morte de
um ser vivo. “Neste tipo de teologia do cuidado, podemos ver a preocupação de evitar
efetivamente qualquer sofrimento desnecessário para superar assim o samsara, o
ciclo das reencarnações” (BECKER, 2008, p.320).
Segundo Becker (2008) as religiões indígenas encontram na terra suas raízes
humanas, religiosas e sociais. Destaca que a terra é o alicerce do indígena. É ela que
sustenta toda a cosmovisão dos povos indígenas, é fonte de vida biológica e cultural,
base fundamental da vida espiritual e integridade enquanto sobrevivência econômica.
O indígena tem uma forte ligação com a terra, por isso também a respeita e a tem
como sagrada. Conforme Becker (2008, p.320):
A terra não é algo profano, pelo contrário, ela representa a
essência de seu sistema religioso. A terra é o conceito chave
para a compreensão dos povos indígenas das Américas em
todos os seus aspectos de vida. Por isso, qualquer ataque à
FONAPER
sua terra é um ataque à sua vida e à sua religião e identidade
cultural e vida comunitária. O sentido religioso e comunitário
que é dado a terra leva os índios a respeitarem seu ritmo
natural de produção. Adaptam-se ao meio ambiente e
procuram manter o equilíbrio ecológico, que lhes assegura sua
continuidade biológica, econômica, cultural e social.
As religiões africanas e afro-brasileiras possuem forte conotação no contexto
da natureza. As trocas são baseadas no dom e contra dom e não no lucro. O bemestar material é visto como consequência da observância religiosa e não do esforço de
trabalho profissional e da ambição de vencer.
Os Orixás são orixás da terra em dois sentidos. O primeiro é
que eles vêm de uma situação rural e são divindades de uma
religião predominantemente agrária. A terra é o grande
sacramento da relação religiosa do homem com a divindade.
Também através de imagens, símbolos e ritos, o homem sente
a sua vinculação com o mundo ao seu redor, sua inserção na
natureza e sua dependência às forças da natureza. (BECKER,
2008, p. 322).
No Cristianismo, Becker (2008) nos revela que “A Teologia do Cuidado”,
durante
muito
tempo
contribuiu
e
continua
contribuindo
para
uma
visão
antropocêntrica da relação entre pessoa e criação, mas pelo conceito de creatio
continua, a tradição da Igreja destaca que Deus está continuamente em atividade
criativa ao manter toda a criação na existência. Em relação ao conceito de imanência,
Becker (2008, p. 322) assim se expressa:
[...]Deus habita em tudo que existe, revelando como um Deus
da providência divina, preocupado e cuidadoso com sua própria
obra criada. Na medida em que a pessoa humana, criada
segundo a imagem e semelhança de Deus, participa como
criatura criativa dessa obra criativa, a pessoa tem
possibilidades de se conscientizar sobre o seu papel de
colaborar na subsistência da criação.
No Islamismo, segundo Souza (2012), a vida religiosa é uma vida
experienciada também na ecologia e por isso também deve ser reverenciada e
expressar espiritualidade. “Ao crente, é outorgada a obrigação de preservar o meioambiente, por todas as frentes de ações da crença e da normatividade social”(SOUZA,
2012, p. 102).
A autora destaca que na concepção mulçumana tudo foi criado por Deus com
propósito. Os seres humanos para servi-lo e o restante para louvar a Deus e servir aos
seres humanos. Ao ser humano foidada uma característica peculiar que é o arbítrio
moral, afim de que realize boas obras, dentre elas o cuidado com a natureza para as
gerações futuras.
Na ecologia islâmica, o homem é o gerente da criação,
responsável por cuidar e preservar todo o meio-ambiente
(fauna e flora). Ele é autorizado pelo sagrado para utilizar os
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
recursos naturais com responsabilidade e de modo sustentável,
porquanto é administrador e não proprietário desses
recursos(SOUZA, 2012, p. 111).
No Judaísmo faz parte integral da religiosidade o ato de evitar o sofrimento,
bem como o respeito ao meio ambiente. O ser humano é parte integral da “Teia da
vida”, mas não superior.
Segundo Bar (2013), somos totalmente dependentes da “Teia da Vida”, pois da
mesma depende a sobrevivência do ser humano e a ele cabe a responsabilidade da
liberdade de cuidar, educar, conservar a natureza e assim por em prática o amor ao
próximo.
Segundo Marçaneiro (2013) o Hinduísmo ensina que a realidade subsiste
graças a Brahman, que é potência cósmica e que sustenta todas as manifestações
animadas e inanimadas. É a inteligência ordenadora do mundo, impessoal e
onipresente. Para o hinduísmo todas as criaturas recebem essa porção de Brahman
que é o atman (sopro ou energia vital).
Embora as religiões de uma maneira geral apresentem muitas aproximações
com a Educação Ambiental, o inverso também ocorre conforme discutido por Castro,
Cassani,Giachetta, Dória e Mauad (2012) no texto “As principais Religiões do Mundo e
suas influências sobre o Meio Ambiente numa perspectiva global”.
Embasados em Bernard Nebel e Richard Wright, biólogos especializados em
Botânica, os autores citados apresentam quatro princípios para um funcionamento de
ecossistema sustentável: reciclagem dos elementos com intento de dispor de forma
inteligente do lixo e promover a reposição dos nutrientes; uso de energia solar;
limitação
da
expansão
das
populações
consumidoras;
e
manutenção
da
biodiversidade. Segundo os autores toda essa base não se mantém com o avanço da
tecnologia.
As principaisreligiões presentes no mundo atual, de certa
forma, vêm tanto para contribuir para a preservação ambiental,
quanto para a sua destruição. E percebe-se que não cabe
única exclusivamente ao que a religião prega, mas pelos
interesses econômicos e sociais, e de como todos esses
ensinamentos são moldados aos interesses. Portanto, mesmo
vendo a população mundial dividida em religiões,
aparentemente os interesses acabam por sobrepujar quaisquer
doutrinas(Castro, et al.2012, p. 81).
Para Souza (2010, p.110) “A crise ecológica é atribuída, portanto, ao consumo
irrefletido, a exploração predatória, a ganância humana. O ambiente sofre vítima da
corrupção humana“.
FONAPER
Dessa feita, a escola deve possibilitar reflexões sobre toda a problemática através de
projetos e outros com a finalidade de melhor preparar seus educandos para a vida em
sociedade.
O Ensino Religioso e as interfaces com as Relações Étnico Raciais
O Brasil, conhecido como o país que convive bem com todas as raças, teve tal
entendimento desvelado a partir de uma pesquisa encomendada pela UNESCO. A
investigação foi realizada em regiões economicamente tradicionais como o Nordeste e
em áreas modernas como o Sudeste.
De conformidade com Maio (1999), o projeto tinha como propósito apresentar
ao mundo os detalhes de uma experiência no campo das interações raciais,
consideradas bem-sucedida, isto é, brancos, negros e indígenas conviviam muito bem.
No entender do historiador americano RudigerBilden, o Brasil era um “Laboratório de
Civilização” (RudizerBilden apud Maio, 1999, p. 142).No entanto, o estudo revelou um
racismo velado que aliado a ele em muitas demandas políticas deixaram de incluir os
negros.
A lei 10.639/2003 trouxe ganhos em várias frentes; dentre elas destacamos a
visibilidade da “História e Cultura Afro-brasileira” que no seu bojo inclui uma gama de
conhecimentos ainda desconhecidos da cultura escolar.Daí a necessidade de um
projeto
para
as
relações
étnicos
raciais
cuja
base
se
encontra
nos
documentos:Constituição Federal, Plano Nacional em Direitos Humanos e, por
conseguinte LDBEN, dentre outros.
A escola precisa cada vez mais promoverà articulação da igualdade e da
diferença;
formar
sujeitos
de
direitos;
descontruir
preconceitos
e
discriminações,desenvolver a educação para o diálogo entre diferentes grupos
culturais.
Siss (2013) p. 10, assim se expressa:
O sistema educacional no Brasil reproduz, com frequência, práticas
discriminatóriasracializadas e racistas. Existe um círculo vicioso que
combina racismo, pobreza, fracasso escolar e marginalização social.
A soma destas práticas impede o desenvolvimento dos direitos
humanos, o exercício pleno da cidadania e a possibilidade de
participação social, econômica, cultural e política do segmento
populacional negro majoritariamente aí inserindo de forma
subalternizada o que torna urgente e inadiável construção de uma
política de formação de professores em seus aspectos inicial e
continuado, baseada em princípios antirracistas, que valorizem a
diversidade, a equidade e a justiça social.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
A fala do autor nos desafia a pensar ações para a desconstrução do que está
posto; pois é notório a dificuldade ou desafio de como formar professores para ensinar
na escola plural, “para atuarem em uma a sociedade diversificada por gênero, classe
social, cultura, raça ou etnia, respeitando as diferenças e atuando na perspectiva da
educação das relações Étnico-Raciais” (SISS, 2013, p. 10).Para tal mudança é preciso
uma transformação social para que a sociedade se veja plural, vivencie de fato a
democracia e busque a equidade, pois só poderemos construir um mundo melhor
quando todos forem incluídos igualmente nas pautas sociais.No que diz respeito ao
currículo escolar compreende-se que a ideologia contida no livro didático se
encarregou de invisibilizar os sujeitos das classes menos favorecida.
Por outro lado Barreto, Rodrigues e Siss (2013)nos convidam a refletir sobre a
consciência do poder do currículo sobre as nossas vidas e sobre o que trazem no seu
contexto, como também a compreensão de que no currículo podem estar presentes
outras narrativas, e outras representações a partir de outra versão. Assim, o currículo
poderá sofrer as transformações necessárias imbuindo-se como instrumento de luta
política.
Para corroborar com os autores citados anteriormente, nos baseamos nas
palavras de Paulo Freire(2002), p.110:
Minha presença de professor, que não pode passar despercebida dos
alunos da classe e na escola, é uma presença em si política.
Enquanto presença não posso ser uma omissão, mas um sujeito de
opções.Devo revelar aos alunos a minha capacidade de analisar, de
comparar, de avaliar, de decidir, de optar, de romper. Minha
capacidade de fazer justiça, de não falhar à verdade. Ético, por isso
mesmo, tem que ser o meu testemunho.
A escola tem papel fundamental no combate ao racismo, como também de
pensar medidas que atenuem as diferenças, promovendo atividades de fortalecimento
da cultura afro-brasileira.Uma boa parte da população está nas escolas, e é lá que se
inicia a educação transformadora.
De acordo com Pereira (2013) àmedida que os estudantes começarem a
compreender e valorizar as raízes culturais do negro, a sociedade começará a se
sensibilizar com questões que promovam o progresso intelectual e a qualificação do
negro.
No entanto, segundo Katsan (2005) para se aproximar da África e estudá-la na
sua complexidade, é preciso vencer alguns preconceitos. Dentre eles a autora
elencou: África, um continente sem história e sem cultura, no qual discute que a
tradição oral deve ser entendida também como fonte de história. De conformidade com
a autora os estudos de um antropólogo alemão Leo Frobenius (1873-1936) levaram o
pesquisador ao entendimento de que “A África, não somente tem história, mas há
FONAPER
indícios de que a África é o berço da humanidade”. Outro indício do preconceito diz
respeito à Passividade congênita dos povos africanos:parte do entendimento de que
os povos da África nunca ofereceram nada à humanidade, o que também é
desmistificado pela autora. Outro preconceito citado é quanto ao Afro-pessimismo, no
qual se identifica a África com coisas ruins, dentre as quais: fome, guerras, doenças,
tragédias e etc.
Desfazendo desse entendimento a autora aborda a cultura da África e destaca:
a valorização da vida como um dom de Deus que deve ser preservada, pois é
sagrada; seu sentido comunitário – tendo a mesma como força vital de comunhão e
coletividade; forte sentido da transcendência – tudo é envolto pela transcendência; as
sociedades africanas são integradas e complexas. Para a mesma nada está fora do
lugar: a religião tem ligação com a política, a economia, a justiça e assim por diante; a
valorização do ancião que é depositário das tradições da comunidade; concepção do
tempo que valoriza tudo ao redor principalmente o ser humano.
Diante de tantas informações que perpassam os currículos escolares, nos
perguntamos: De que forma a disciplina do Ensino Religioso poderá colaborar na
desconstrução de preconceitos e na interlocução com a Lei 10.639?
Primeiramente é preciso dizer que tudo o que foi colocado anteriormente se
constitui em conteúdo escolar também para o Ensino Religioso. Assim é preciso lançar
a semente, discutir os pontos de contato e diversidade cultural de povos africanos; seu
jeito de ser; vivência da cultura e religiosidade são pontos muitos fortes e devem ser
problematizados em âmbito escolar.
Destaca-se como ponto de reflexão, de acordo com Moura(2005), que tipo de
abolição querem os negros e queremos todos nós? A esse questionamento a palavra
base sem dúvida é o respeito que abarca a todas as demais; condições de cidadania,
valorização da sua cultura e identidade, justiça social, equidade social e adoção de
políticas afirmativas a fim de superar as desigualdades entre brancos e negros.
A escola tem a função de aprofundar todos esses conceitos, discutindo suas
necessidades contribuindo para que a cultura negra se mostre no interior da escola.
Em relação aos sabores e saberes, Pereira (2005) nos lembra do quanto
aprendemos e nos deliciamos com o acarajé, vatapá, abará, munguzá, cuscuz e etc.
Para o autor, o modo de preparar os alimentos, demonstra como os antepassados
africanos investiram na inserção de seus hábitos em nossa vida diária. Para ele, a
troca de sabores representava também uma troca de saberes entre os diferentes
grupos de nossa sociedade.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
O mesmo autor destaca também os ritmos musicais como o batuque e o
samba que forneceu elementos para a configuração do carnaval das grandes escolas
e dos desfiles em nosso país.
Na herança religiosa, Pereira (2005) nos fala que na vivência religiosa dos
brasileiros a presença africana é marcante. Tal como o Candomblé, também chamada
à religião dos orixás que segundo os preceitos sagrados cuidam de partes específicas
do mundo e da natureza; colheita, chuva, afetividade e etc. Dentre os quais se
apresentam vários orixás: Exu, Ogum, Xangô, Iemanjá, Oxum dentre outros que se
manifestam através do transe e atuam como intermediários entre os seres humanos e
a natureza.
Oliveira (2007) nos informa que refugiados nos valores religiosos vindos da
África e aqui reelaborados a partir de elementos católicos, foram essenciais no sentido
de alimentar e constituir força para resistir a dura realidade do cativeiro, a luta pela
inclusão e ainda construir uma história a partir das lembranças e da fé.
O autor citado nos esclarece que um dos pontos altos da religiosidade africana
é o segredo.Com uma hierarquia, os terreiros de Candomblé são marcados por regras
rígidas de convivência, a partir de valores bem definidos. “Cabe aos iniciados ir, aos
poucos, tomando contato com o patrimônio sagrado da religião, conforme compete à
graduação pessoal e ao laço de sangue como dono da casa, o centro da religião
afrodescendente” (OLIVEIRA, 2007, p.29).
Pereira (2008), nos alerta de que, no que diz respeito às culturas afrobrasileiras, é importante apreendê-las dentro do princípio da diversidade, uma vez que
os
vários
grupos
culturais
apresentam
modelos
diferenciados
de
culturas
afrodescendentes.
Sob a perspectiva da diversidade, a inserção de conteúdos
relativos à história da África e às culturas afro-brasileiras nos
currículos escolares representa um considerável aporte de
informações, em termos qualitativos e quantitativos, às práticas
educacionais direcionadas para o desenvolvimento da
democracia. Nesse cenário, a educação tem um relevante
papel a desempenhar, na medida em que contribui para a
formação de cidadãos cientes de suas responsabilidades
sociais e os transforma em atores da história de seu grupo
(PEREIRA, 2007, p.11)
E ainda Oliveira (2007, p 29):
Os escravos africanos encontraram na religião os valores para
o resgate de sua identidade. Nela, também, construíram
estratégias de diálogo com a sociedade e suas normas.
Estudar a contribuição das religiões africanas constitui um
indispensável passo para o reconhecimento das contribuições
dos negros na formação da cultura brasileira. Reconhecer
esses valores é um desafio à nossa consciência e, ao mesmo
FONAPER
tempo, um exercício de respeito à diferença e á diversidade
como elementos e matizes da nação brasileira.
O Ensino Religioso e as interfaces com a Diversidade Sexual
No âmbito dos temas relacionados aos Direitos Humanos encontra-se a
orientação sexual e a identidade de gênero. Cada vez mais se observa a presença do
tema nas pautas escolares; porém nem sempre com a seriedade que o tema requer.
Dois
pontos
de
extrema
discussão
constituem-se
no
preconceito
e
discriminação que muitas vezes partem justamente daqueles que deveriam resguardar
os direitos humanos em âmbito escolar, ou seja, os profissionais da educação.
A violência mesmo que simbólica é tanto quanto ou mais destruidora que a
violência física e por isso não deve ter assento nas escolas. Para tanto,se faz
necessário atentar para os direitos humanos tendo em vista a perspectiva de
valorização da igualdade de gênero, como também da promoção de uma cultura de
respeito e reconhecimento da diversidade sexual (BRASIL, 2007).
Ao reconhecer os aspectos que perpassam a identidade de gênero, a escola e
seus agentes educativos estará também preservando seus alunos de comentários
maldosos e mesmo inserindo-os na escola como sujeitos históricos de direitos.
Nesse sentido compreende-se homossexualidade e não homossexualismo,
pois de acordo com os cadernos da Secad (BRASIL,2007) a desinência ismo o torna
inadequado uma vez que configura doença, aberração. Do mesmo modo que não se
diz opção sexual, mas orientação sexual.O texto também nos adverte quanto ao
sentido de que os rapazes mais femininos seriam homossexuais (ou com forte
tendência a sê-lo) e que as mulheres mais masculinizadas seriam lésbicas.
Segundo o texto citado anteriormente na área da educação para análise,
discussão e embasamento da equidade de gênero, identidade de gênero e orientação
sexual e ao enfrentamento ao sexismo e a homofobia, o respaldo encontra-se nos
seguintes documentos: Programa Nacional de Direitos Humanos II (2002);no Plano
Nacional de Políticas para as Mulheres (2004);no Programa Brasil sem Homofobia
(2004) e no Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos (2006),gestados a
partir de lutas e transformações que receberam maior impulso desde a promulgação
da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2007).
A escola tem papel fundamental da reformulação de conceitos e na construção
de valores democráticos. É preciso que, baseados nos documentos oficiais, como os
citados anteriormente, o/a professor/a se aproprie do seu papel de mediador/a e traga
para o contexto da sala de aula discussões sobre esse tema tão complexo, porémtão
presente no cotidiano da escola.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
A partir da conscientização e da regra de ouro “Não faça ao outro o que você
não gostaria que fizesse com você”, o professor de Ensino Religioso terá uma
infinidade de possibilidades para conduzir debates, projetos e outros que darão o
subsídio necessário para a efetivação do respeito e consideração ao outro. Assim,
destacamos as piadinhas, os estereótipos, atitudes que desqualificam e ridicularizam
os/as alunos/as homossexuais, a pesquisa sobre as consequências da homofobia e
lesbofobia, a adoção de crianças por casais homossexuais e o que isto representa
num sentido largo da questão afetiva, social, econômica e de inserção social e de
direitos humanos, a religiosidade e a homossexualidade; os princípios de cada religião
e tantos outros que puderem ser levantados para crescimento dos indivíduos e
erradicação do preconceito e discriminação.
A Formação Docente do professor de Ensino Religioso
No Estado do Espírito Santo a Formação inicial é bastante precária, cabendo
ao(a) professor(a) buscar alternativas de formação continuada por seu próprio
interesse ou através dos sistemas de ensino.
Cabe aqui ressaltar que a formação para lecionar a disciplina do Ensino
Religioso vai muito além da transmissão de conteúdos.
De acordo com Cortella (2007), a construção da competência do docente do
Ensino Religioso, por ser área complexa e polêmica carece de maior capacitação, pois
deve estar embasada com recursos e reflexões didáticas e pedagógicas, além dos
conhecimentos advindos da graduação em Ciências da Religião.
Nesse exercício é preciso compreender como adverte o autor citado “O ensino
é um dos caminhos da educação, nem sempre o mais perene e emancipador, porém
um dos mais eficazes” (CORTELLA, 2007, p. 22).
É importante ressaltar o que o autor apresenta sobre o currículo:
[...] a escola, um local também de educação, é entendida como
instituição de ensino e se estrutura de forma a selecionar e
ordenar seus conteúdos e componentes em uma organização
curricular. Grosso modo, os conteúdos curriculares são todos e
quaisquer assuntos que sejam objeto da ação educativa
escolar, enquanto os componentes curriculares são as
disciplinas que compartimentam a presença desses assuntos
para a ordenação da grade curricular (CORTELLA, 2007, p. 22)
Diante da fala do autor citado compreendemos como é necessário buscar os
temas que envolvem o alunado seja por interesse pessoal ou por demanda social
como os temas trabalhados com os/as professores/as de Ensino Religioso do
município de Cariacica/ES no ano de 2014.
FONAPER
Por outro lado, vivemos momentos de grande ansiedade, pois a Universidade
Federal do Espírito Santo UFES, acatou uma solicitação do CONERES no sentido de
pensar na criação de um curso de Licenciatura em Ciências da Religião, que em
nosso entender trabalha na égide da construção do conhecimento a partir da
experiência do Sagrado, como elemento norteador para o entendimento da vivência
humana, sem fazer apologias a determinadas religiões ou instituições religiosas, pois o
Ensino Religioso é responsável para assegurar o respeito à diversidade cultural e
religiosa na escola.
No entanto a formação em Ciências da Religião por si só não basta, é preciso
buscar a licenciatura, isto é, formar o/a professor/a de Ensino Religioso, no sentido de
formar o/a professor/a com as especificidades docentes que dizem respeito tanto ao
conhecimento científico como ao conhecimento pedagógico que engloba a didática e
as metodologias que melhor subsidiarão o fazer pedagógico do/a professor/a.
Conclusão
O percurso da formação nos tem ensinado sobre as aprendizagens
necessárias ao cotidiano escolar. Ao pensar a escola como celeiro de possibilidades,
nos deparamos também com a diversidade presente no contexto escolar e é por isso
que a escola deve possibilitar ao(a) aluno(a) que se veja na sua complexidade e
diversidade e, principalmente, que se veja pertencente como sujeito de direitos.
Em relação ao meio ambiente observamos que os/as professores/as trazem
suas experiências e demonstram notório conhecimento quando se trata de buscar as
interfaces com o Ensino Religioso.Do mesmo modo em relação às Relações Étnico
Raciais e Diversidade Sexual observamos o zelo e o cuidado para tratar de um tema
complexo, porém muito presente no meio escolar.
Desse modo a escola precisa se mostrar ativa e atuante em relação as
questões mais latentes, isto é, que envolvem os alunos na sua subjetividade e
problematização de toda essa complexidade.
Assim, é válido destacar que em toda a formação continuada de
professores/as, o/a aluno/a é o alvo principal e, por isso, nossos interesses e
preocupações devem estar voltadas a realidade do educando buscando cada vez mais
aproximar a vida real do cotidiano escolar.
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Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
ENSINO RELIGIOSO E FORMAÇÃO DOCENTE: RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA
NA PERSPECTIVA DE UMA FORMAÇÃO CONTINUADA NA REGIONAL DE SLO PARFOR
Eliane Ludwig - UNOCHAPECÓ/PARFOR30
Josiane Crusaro Simoni - UFSC/ASPERSC31
Rosinei Pedrotti Ferrari - UNOCHAPECÓ32
Resumo
Este trabalho relata uma experiência de formação continuada para educadores que atuam com
o componente Ensino Religioso nos Anos Finais do Ensino Fundamental da Rede Pública
Estadual e Municipal de São Lourenço do Oeste e Região, ocorrida na Secretaria de
Desenvolvimento Regional de São Lourenço do Oeste/Santa Catarina. A temática da formação
esta relacionada aos fundamentos e metodologias do Ensino Religioso previsto nos
Parâmetros Curriculares Nacionais de Ensino Religioso onde, metodologicamente, trata-se de
oferecer uma breve introdução teórica sobre os conteúdos do componente curricular,
apresentando possíveis caminhos de como desenvolvê-lo em sala de aula, tendo em vista a
diversidade cultural religiosa e não religiosa presente nos diferentes lócus, em especial, nos
ambientes escolares que agregam todas as variedades possíveis.
Palavras-Chave: Ensino Religioso. Formação Docente. Educadores.
Ambientes escolares: espaços de aprendizagem e convivência!
A Escola enquanto instituição social é local/espaço de saberes que deve
promover o acesso e permanência dos estudantes, além de propiciar conhecimentos
voltados à prática e formação humana e cidadã. Caracteriza-se por agregar uma vasta
30
Mestranda do Curso Stricto Sensu em Educação na Universidade Comunitária da Região de
Chapecó (UNOCHAPECÓ). Especialista em Gestão Educacional: Administração, Orientação
e Supervisão Escolar pela Faculdade de Itapiranga (FAI). Acadêmica do Curso de Pós
Graduação Lato Sensu em Educação em Direitos Humanos (EDH) e Diversidades: Uma
Abordagem Interdisciplinar pela Universidade Comunitária de Chapecó (UNOCHAPECÓ).
Graduada em Pedagogia pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE) e em
Ciências da Religião - Licenciatura em Ensino Religioso pela Universidade Comunitária da
Região de Chapecó (UNOCHAPECÓ).Professora efetiva da Rede Estadual e municipal de
Ensino de Santa Catarina/SC e professora do Curso de Ciências da religião – Parfor na
UNOCHAPECÓ. E-mail: [email protected].
31 Acadêmica do Curso de Pós Graduação Lato Sensu em Educação na Cultura Digital
(UFSC). Especialista em Psicopedagogia pela UNIGRAN. Graduada em História - UNOESC e
Ciências da Religião - Licenciatura em Ensino Religioso pela UNOCHAPECÓ. Professora
efetiva na Rede Estadual de Ensino de Santa Catarina com os componentes Ensino Religioso
e História. Secretária da Associação dos Professores de Ensino Religioso do Estado de Santa
Catarina – ASPERSC, Gestão 2013-2015. Contato: [email protected].
32 Graduada em Ciências da Religião - Licenciatura em Ensino Religioso pela Universidade
Comunitária da Região de Chapecó (UNOCHAPECÓ - 2012). Acadêmica do Curso de Pós
Graduação Lato Sensu em Educação em Direitos Humanos (EDH) e Diversidades: Uma
abordagem Interdisciplinar pela UNOCHAPECÓ. Professora de 1 ao 9 ano de Ensino
Religioso na Rede Municipal de Novo Horizonte/SC e Secretaria de Educação do Estado de
Santa Catarina do 6º ao 9º ano. Contato: [email protected].
FONAPER
diversidade cultural representando um lindo mosaico de cores, ideias, etnias,
linguagens, culturas, religiosidade, formas de pensar, analisar e olhar o mundo.
Diante de tantas diferenças culturais, Silva destaca que “um dos grandes
desafios da escola hoje é de contribuir para a construção da alteridade e do
conhecimento de eu e o outro, oportunizando espaços de diálogo para o pleno
desenvolvimento dos educandos [...]”, visto que, não raras às vezes, as diferenças de
cunho étnico, político, religioso ou social são motivo de brigas, guerras e intolerância
entre os humanos (2007, p. 250).
Caminhar em direção a uma educação intercultural onde todas e quaisquer
diferenças sejam valorizadas e, acima de tudo, respeitadas denota mudanças no
próprio eu e na forma de olhar/entender as pessoas que convivem conosco; é pensar,
refletir e (re)ver que o “eu” não existe sem o “outro”. Por isso, os ambientes escolares
precisam ensinar a ver a partir de novos olhares/direcionamentos e lentes os quais
possibilitem compreender que cada um(a) é diferente, mas igual em direitos e
dignidade.
Despertar para a consciência do bem viver entre as diferenças requer que os
ambientes escolares estejam atentos para suas funções que vão muito além de
transmitir conhecimentos. É preciso refletir nas inter-relações grupais e conciliar
convivência e aprendizagem, num processo em que o conhecimento seja elaborado
coletivamente e possa formar cidadãos melhores em respeito, dignidade e
coexistência.
Assim, Rocha e Trindade (2006, p. 55) enfatizam que territórios escolares
precisam tecer caminhos
[...] de felicidade, de satisfação, de diálogo, onde possamos de
fato desejar estar. Um lugar de conflitos, sim, mas tratados
como contradições, fluxos e refluxos. Lugar de movimento,
aprendizagem, trocas, de vida, de axé (energia vital).
E, o educador enquanto agente transformador assume tarefa relevante, pois
utilizando da mediação - onde o ser mais experiente auxilia o menos experiente -, bem
como de práticas inovadoras e atrativas, contribui de maneira decisiva neste processo.
Destacamos que é vital respeitar os diferentes níveis de aprendizagem e
conhecimento dos estudantes, entendendo que na escola, cada estudante trará
consigo saberes comuns da sua existência que precisarão ser valorizados.
Nessa perspectiva, onde o professor assume tarefa relevante, Delors (2001, p.
150) traz um excelente respaldo ao afirmar que,
o trabalho do professor não consiste simplesmente em transmitir
informações ou conhecimentos, mas em apresentá-los sob a forma
de problemas a resolver, situando-os num contexto e colocando-os
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
em perspectiva de modo que o aluno possa estabelecer a ligação
entre a sua solução e outras interrogações mais abrangentes.
Para o autor Rubem Alves (1999, p. 125) “o prazer é uma experiência
qualitativa. Não pode ser medido. Não há receitas para suas repetições. Cada vez é
única, irrepetível” e o professor educador precisa sentir e possibilitar aos estudantes
os diferentes sabores do aprendizado, do conhecimento e da alegria, do saber e do
encantamento, da escuta e do diálogo.
Souza e Cardoso (2008, p. 95) destacam que “mais do que aprender uma
qualificação acadêmica ou profissional, na escola o estudante aprende a viver numa
organização social” e,nesse caminhar cada um(a) tende a contribuir na garantia da
aprendizagem; assim, a escola enquanto organização, só se concretiza de fato com o
conjunto educador e estudante, sendo que um não se justifica sem o outro em que são
faces da mesma unidade.
Ensino Religioso: possibilidades para uma Educação Diferencial
Formação é um lugar de construção de sentido,
no qual a identidade, ou a questão identitária,
assume lugar de proa, pois é uma tomada de
consciência
de
nossas
heranças,
continuidades,
rupturas,
preocupações,
inquietudes [...]. (SOUZA: 2000, p. 110).
O Ensino Religioso é um dos componentes curriculares das escolas públicas
brasileiras, garantido pela Constituição Federal de 1988, em seu artigo 21033. Com
base nos Parâmetros Curriculares Nacionais de Ensino Religioso (PCNER) é
considerado parte integrante da formação básica do cidadão e veiculado a um
conjunto de conhecimentos que buscam o entendimento do fenômeno religioso e a
compreensão das diferentes formas de exprimir o transcendente.
O Ensino Religioso, de matrícula facultativa aos estudantes e obrigatório para
os Sistemas de Ensino, deve ser ministrado nos horários normais de aula e enquanto
componente tem a “função de garantir que todos os estudantes tenham a possibilidade
de estabelecer diálogo” disponibilizando o acesso ao conhecimento, bem como a
produção/construção de saberes através de pesquisas, projetos, interações, relatos e
comparação, e de percepções (FONAPER, 2009, p.45).
Destacamos que com a lei número 9475/97 que estabelece nova redação ao
33O
Ensino Religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das
escolas públicas de ensino fundamental (§ 1º, art. 210, Seção I, capítulo III).
FONAPER
artigo 33 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), é assegurado
aos estudantes “[...] o respeito à diversidade cultural religiosa no Brasil, vedadas
quaisquer formas de proselitismo” onde o espaço escolar deve ser caracterizado como
laico havendo livre liberdade dos estudantes manifestarem ou não sua religião
(BRASIL: 1997).
O conhecimento religioso, resultado da produção cultural de inúmeros grupos
humanos necessita estar disponível a comunidade escolar, a fim de proporcionar o
entendimento do contexto religioso que eles vivenciam e observam no cotidiano,
produzindo um “saber de si” que lhes permita estabelecer relações alteritárias consigo
mesmo, com o Outro, com os demais seres vivos e com a natureza.
Pensar o Ensino Religioso enquanto área do conhecimento da educação
básica (Cf. Resolução 04/2010, CNE/CEB) reflete em compreender a sua importância
e finalidade nos ambientes escolares, bem como desenvolver
[...]práticas inovadoras e atraentes, [...] que ofereça e provoque no
aluno o desejo de adquirir e construir o conhecimento para responder
aos desafios da sociedade (VEIGA; VIANA, 2010, p.32).
Para tanto, é necessário, antes de tudo, desenvolver nos ambientes escolares
a capacidade de acolhimento à diversidade religiosa e não religiosa, para que as
múltiplas culturas sejam (re)conhecidas em mesmo grau e valor, o que é possível
através do diálogo, da socialização, da aprendizagem e reconhecimento das
diferenças culturais enquanto bens humanitários.
Salientamos que a diversidade cultural, presente nos inúmeros espaços do
planeta, enquanto patrimônio da humanidade,
[...] constitui-se em um dos mais valiosos bens da humanidade. É
expressão da riqueza de cada comunidade, portadora de conjunto de
símbolos e significados que servem de referência para a constituição
das identidades pessoais e grupais (CECCHETTI et al: 2013, p. 21).
Por isso, refletir e buscar entender/compreender como trabalhar atividades
educativas relacionadas à área de conhecimento do Ensino Religioso nos Anos Finais
do Ensino Fundamental é importante e, ao mesmo tempo, um desafio constante, pois
requer que o educador desenvolva em “[...] suas aulas o encantamento, a ética nas
relações de ensino aprendizagem, a escuta, o respeito ao educando e a construção de
sua autonomia na elaboração do saber religioso” (OLENIKI; DALDEGAN, 2003, p. 36).
Podemos dizer que as escolas - enquanto instituições sociais - não possuem
apenas a incumbência de socializar e mediar conhecimentos, mas também devem ser
ambientes/lugares de construções coletivas do saber organizado, onde educadores e
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
educandos, e demais envolvidos nesse processo, possam criar, ousar, refletir e buscar
alternativas para constantemente inovar a partir de suas experiências.
Por isso, é necessário compreendermos o complexo sistema de comunicação
que se estabelece na sala de aula, responsável imediato dos significados que se
criam, se transmitem e transformam nas trocas educativas, pois o saber é um dos
instrumentos capazes de possibilitar mudanças significativas nos sujeitos e cada qual
quando adentra nos ambientes escolares já possui consigo inúmeros conhecimentos
oriundos da sua vivência em família e comunidade.
Assim, existe uma preocupação constante quanto à formação de educadores
para o Ensino Religioso visto que a mesma
[deve] contribuir na constituição de profissionais com sensibilidade,
discernimento e equilíbrio na mediação das relações com o fato
religioso em suas diversas manifestações no cotidiano educativo:
numa visão de totalidade, por meio de reflexões e ações
contextualizadas,
dialógicas,
críticas,
criativas,
prazerosas,
investigativas e comprometidadas com a defesa da vida em suas
múltiplas manifestações, próprias a uma dimensão de esperança, luta
e conquista (OLIVEIRA et al, 2007).
O
desafio
didático
supõe
que,
os
conteúdos
do
currículo
e
as
experiências/bagagens culturais de cada estudante devam ser interligados no
desenvolver de uma determinada atividade, ou seja, a construção de aprendizagens
relevantes que induzam à transformação do pensamento comum e cotidiano dos
estudantes deve ocorrer a partir de escutas, diálogos e socializações para que ambos
se tornam agentes construtores do saber.
Para tanto, acreditamos que a formação continuada do educador é recurso
favorável e indispensável para essa nova perspectiva, pois não podemos reproduzir e
repassar apenas conhecimentos quando nossa missão consiste em possibilitar novos
olhares, análises e compreensões para o mundo em que vivemos a partir de uma
educação diferencial que favoreça a autonomia, reflexão e criticidade nos sujeitos.
Corroborando a concepção de Delors (2001, p. 51) destacamos que “a
educação pode ser um fator de coesão, se procurar ter em conta a diversidade dos
indivíduos e dos grupos humanos [...]” vislumbrando que cada cidadão(ã) carrega
consigo múltiplos saberes que socializados e partilhados contribuem para a
elaboração/produção de novos conhecimentos.
Relato de uma experiência
Existem coisas que não sabemos dizer –
embora as experimentamos profundamente –
ou que somos incapazes de compreender
FONAPER
porque nossa linguagem não é ainda capaz de
formulá-las
claramente.
[...].
E
há
conhecimentos que só são possíveis porque
dispomos das palavras para dizer aquilo que
nossa experiência nos indica (Otto Maduro).
Em Novembro de 2013, fomos convidadas pela Secretaria de Desenvolvimento
Regional (SDR) de São Lourenço do Oeste/Santa Catariana para coordenarmos e
ministrarmos o curso de Ensino Religioso, aos docentes atuantes com o componente
curricular desta disciplina da Rede Municipal e Estadual que abrange os municípios de
São Lourenço do Oeste.
Essa experiência iniciou - e perdura - neste ano letivo de 2014, nas
dependências da SDR de São Lourenço do Oeste/SC, envolvendo 15 profissionais
que atuam com a disciplina onde os encontros ocorrem por bimestres. Destacamos
que um dos principais objetivos consiste no aprofundamento dos fundamentos e
metodologias do Ensino Religioso em articulação com os Parâmetros Curriculares
Nacionais desta disciplina.
Nesse sentido, busca-se compreender os seguintes itens: O Ensino Religioso é
parte integrante da formação básica do cidadão e área de conhecimento da educação
básica; Deve proporcionar espaços de diálogo na construção coletiva dos
fundamentos e metodologias do Ensino Religioso; Necessita discutir as concepções
de currículo, aprendizagem, metodologia e avaliação do/no Ensino Religioso; Propõe
pensar e socializar experiências pedagógicas relacionadas aos conteúdos propostos
nos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso.
Destacamos que cada encontro inicia-se e encerra-se com uma dinâmica de
integração e aprendizagem entre os participantes, onde buscamos promover o
contato, as interações e partilhas, visto que se faz necessário “[...] construir uma
sociedade com ações humanitárias e solidárias” que devem e precisam iniciar-se nos
ambientes escolares, espaços esses que agregam todas as diversidades (KRIECK;
PACHECO, 2007, p. 295).
Frisamos também que nossa preocupação está voltada a produção/construção
de atividades de aprendizagem significativas, visto que uma aula semanal com
duração de quarenta e cinco minutos deve favorecer a análise, reflexão, conhecimento
e respeito às diferenças culturais, um dos princípios deste componente que visa
garantir práticas de coexistência entre a humanidade.
Por isso, em cada encontro propomos conjuntamente socializar atividades e,
ao mesmo tempo, pensarmos novas estratégias para as aulas vindouras de Ensino
Religioso, tendo em vista que “a busca de alternativas e propostas devem ser uma
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
constante em nosso dia-a-dia, no sentido de possibilitar ao educando o exercício da
cidadania”, o que é possível e vital na formação continuada de educadores (SILVA,
2007, p. 250).
Propomos ainda, durante a formação continuada, momentos que permitam aos
educadores a reflexão das suas próprias práticas pedagógicas em Ensino Religioso,
pautados na práxis (ação-reflexão-ação) visto que, repensar e refletir sobre as próprias
ações propõe novos olhares para o desenvolver dos demais encontros (MARTINS
FILHO, 2011).
Afirmamos que em cada encontro sentimentos de alegria, realização, felicidade
e amor tomam conta de nós; emerge uma grande expectativa de que cada educador
ali presente faz a diferença. Lembramos que, antes mesmo de iniciarmos a formação
continuada, apostamos todas as possibilidades de concretização dos encontros e
quando nos confrontamos com nossas limitações e desafios cotidianos, o sentimento
da necessidade da formação continuada foi maior e possibilitou que o “sonho” se
tornasse real.
Em cada encontro está visível para nós que este não se limita à prática e que
toda ação pressupõe uma relação dialética, ou seja, a experiência em sala de aula,
bem como as leituras, estudos e pesquisas científicas nos possibilitam novos
conhecimentos e uma reflexão sobre nossa atuação enquanto educadoras, que vem
contribuir na formação continuada de outros profissionais que também atuam nesta
área.
Dúvidas surgiram e surgirão constantemente... Contudo, elas também fazem
parte de nosso aprendizado. Cada encontro, cada socialização de práticas vivenciadas
pelos participantes nos proporcionam crescimentos e aprendizados; já somos capazes
de refletir e (re)pensar quanto à responsabilidade e atuação do educador da disciplina
de Ensino Religioso buscando corroborar que a prática pedagógica é uma construção
diária, cotidiana, e um processo que como a vida se refaz.
Observamos que a grande maioria dos profissionais que atuam com a
disciplina de Ensino Religioso não possui habilitação na área para ministrar as aulas.
No iniciar da formação continuada alguns educadores não tinham noção de conteúdos
a serem trabalhados com este componente curricular, dando ênfase a algo que no
momento seria importante.
Contudo, presenciamos que a formação está proporcionando momentos
riquíssimos, pois se identifica a empolgação do grupo e reflete-se em seus rostos que
mesmo com tantos afazeres,
tais momentos estão oportunizando grandes
FONAPER
conhecimentos e cada descoberta/aprendizado está sendo de suma importância, tanto
para a formação humana quanto profissional.
Salientamos que é através do encantamento das novas descobertas que os
estudantes desenvolvem a sua curiosidade por determinados conteúdos do Ensino
Religioso; e, é através deste processo que o educador deve favorecer e dar
possibilidades estabelecendo “novos jeitos de ver e conhecer outras realidades,
apresentando-lhes caminhos para que se possa desenvolver em sua convivência o
entendimento do outro, revelando-se e deixando o outro revelar - se.” (OLENIKI;
DALDEGAN, 2003, p.13).
Nesse sentido, a proposta da formação continuada, constitui-se como espaço
de estudos e reflexões, visando contribuir na formação destes profissionais que atuam
diretamente em sala de aula, e trazem consigo seus anseios e expectativas de uma
educação inovadora e diferencial.
Os autores Pimenta e Libâneo (2002, p. 43-44)apontam que:
dada à natureza do trabalho docente, que é ensinar como processo de
humanização dos alunos historicamente situados, espera-se dos
processos de formação que desenvolvam os conhecimentos e as
habilidades, as competências, atitudes e valores que possibilitam aos
professores irem construindo seus saberes, fazeres docentes a partir
das necessidades e desafios como a prática social lhes coloca no
cotidiano. Espera-se, pois, que mobilizem os conhecimentos da teoria
da educação e do ensino, das áreas do conhecimento necessários a
compreensão do ensino como realidade social, e que desenvolvam
neles a capacidade de investigar a própria atividade (a experiência)
para a partir dela, constituírem e formarem os seus saberes – fazeres
docentes, num processo continuo de construção de suas identidades
como professores.
Assim, o educador enquanto mediador do acesso ao conhecimento para o
estudante necessita dominar sua área, ao mesmo tempo científica e pedagógica, ter
olhar de análise crítica da sociedade, além de, por meio de suas experiências auxiliar
na elaboração de conhecimentos que contribuam na reflexão de seu próprio trabalho
docente. Indiferente da área em que o educador atua é preciso que mantenha “viva a
curiosidade dos educandos para que, por meio dela, sintam-se desafiados a buscar o
novo saber, a tecer comparações, investigar, a pesquisar, a redescobrir.” (OLENIKI;
DALDEGAN, 2003, p.35).
O educador necessita, não apenas de organização de conteúdos, mas deve
oferecer espaços para relações de abertura proporcionando encantamento em suas
aulas a partir das interações, da escuta, do questionamento, da partilha de saberes e
do respeito, promovendo autonomia na construção do saber e realizando-se com o
seu fazer pedagógico no ambiente escolar.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Portanto, pensar e socializar experiências pedagógicas durante a formação
continuada também é um dos objetivos propostos no curso que está se efetivando.
Nas palavras de Libâneo (2004) podemos dizer que os encontros consistem numa
atividade permanentemente de reflexão e ação; um processo contínuo de
conhecimento e análise da realidade escolar em suas condições concretas, de busca
de alternativas para a solução de problemas e de tomada de decisões, possibilitando a
revisão e reflexão da própria prática pedagógica e a correção no rumo das ações.
Palavras Finais
O Ensino Religioso, enquanto área do conhecimento, integrante da Educação
Básica propõe contribuir na formação humana e cidadã dos sujeitos. Na sua nova
concepção (Lei nº 9475 que altera o artigo 33) presenciamos a superação dos
modelos doutrinário e ecumênico, dando-se ênfase ao conhecimento do fenômeno
religioso, entendido como aquilo que se mostra/revela/manifesta na busca pelo
sentido e significado da existência humana (BRASIL, 1997, grifo das autoras).
Assim, a compreensão sobre este componente, bem como a formação
continuada são extremamente importantes aos educadores - que são mediadores do
processo ensino e aprendizagem - tendo em vista que se deve garantir o respeito às
diversidades culturais religiosas e não religiosas e primar pela efetivação dos direitos
de cada cidadão, em especial a liberdade religiosa.
Presenciamos que a formação continuada tem despertado o interesse dos
profissionais que atuam na disciplina de Ensino Religioso, que estão na busca de uma
compreensão mais ampla e profunda das concepções e práticas deste componente.
Neste sentido, os encontros estão proporcionando conhecimentos teóricos e
metodológicos, enriquecendo o bojo de ferramentas para o trabalho em sala de aula,
oportunizando múltiplos conhecimentos e compreensões da disciplina enquanto
componente curricular.
Perante tais perspectivas, frisamos que a formação continuada é espaço para
discussão e construção de propostas pedagógicas autônomas para trabalhar o Ensino
Religioso em sala de aula. Assim, para nós docentes do curso, uma das únicas
certezas é que a formação contínua a ser percurso indispensável para os futuros
educadores, pois não se pode pensar em práticas isoladas e repetitivas, mas sim em
mediação, coletividade, criatividade e aprendizagem conjunta.
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FONAPER
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FONAPER
O
ENSINO
RELIGIOSO
NA EDUCAÇÃO
INFANTIL:
UMA PERSPECTIVA
ECUMÊNICA
Glauciene Dias de Araújo34*
Resumo:
O presente artigo tem como objetivo quebrar paradigmas a respeito do estudo do ensino
religioso. Esse campo de conhecimento favorece ao ser humano, sobretudo a criança, nosso
foco de estudo, uma abordagem da vida, do outro e do mundo. Essa visão ampla em buscar
respostas ainda não encontradas, levam-nos as mais diversas manifestações de fé. A
manifestação que cada um deve ser aprendida a ser respeitada desde a mais tenra idade,
nesse sentido a educação infantil é o solo para aprender, para compreender, para viver o
ecumenismo de forma humana, amorosa e natural.
Palavras-Chaves:Ensino Religioso. Ecumenismo. Criança.
“Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, pela sua origem,
ou ainda pela sua religião. Para odiar as pessoas precisam aprender, e se podem
aprender a odiar porque não podem aprender a amar. “ (Nelson Mandela)
INTRODUÇÃO
Esse artigo tem com propósito central o estudo do ensino religioso na
educação infantil, bem como sua importância como campo de conhecimento,
valorizando seus estudos, estreitando a relação do humano com o Divino. Analisando
a experiência religiosa como favorecimento da união das pessoas, em nome de uma
mesma fé e nas mais diversas existentes. Pesquisar o funcionamento do Ensino
Religioso na Educação Infantil, em diferentes realidades.
Refletir a importância do Ensino Religioso na primeira infância, partindo do
pressuposto que a Educação Infantil é base de toda a formação, onde se sabe que a
criança necessita ser estimulada de forma integral.
Desenvolver ações que ampliam o estudo do Ensino Religioso como
fenômeno religioso, que estuda as religiões e não a fé, esta deve ser respeitada e
manifestada de forma que não se torne invasivo, principalmente para um Estado laico,
com o Brasil.
Por fim, refletir e estudar as religiões no mundo atual, requer de todos um
comprometimento ao direito de expressar, e aceitar que todas as religiões tem
legitimidade, porque exprimem as diferenças formas humanas de aproximação do
mistério fundante da vida.
A RELIGIÃO NO UNIVERSO INFANTIL
34
Graduada em Pedagoga pelo Centro Universitário Instituto de Educação Superior de Brasília.
Professora de Ensino Religioso no Centro Marista Circuito da Criança e Agente de Pastoral na
mesma Instituição.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
O ensino religioso, não é obrigatoriedade para educação infantil, nessa fase a
visão de educação interdisciplinar é bem aceita e praticada nas escolas. O que
podemos ver é que as escolas confessionais têm uma tendência voltada para a
educação religiosa, pautados pela LDB e nos Referencias Curriculares que relacionam
o ensino religioso ao carisma de cada Instituição de ensino.
Com a Proclamação da República o Brasil tornou-se um país laico,
consequentemente, garantiu a liberdade de crença. A Constituição de 1988 prescreve
essa liberdade, enaltecendo também a liberdade de culto religioso, e proteção as
organizações religiosas. A imunidade tributária é um dos mecanismos escolhidos pela
Carta de 1988 para assegurar o direito à liberdade de crença, como prescrevem o
artigo 19, inciso I, e o artigo 150, inciso VI. Diante disso, a educação escolar é laica,
sendo de responsabilidade da família a formação religiosa da criança. A Declaração
Universal dos Direitos Humanos, artigo 18, afirma que toda pessoa tem direito à
liberdade de pensamento, de consciência e de religião, este direito implica a liberdade
de mudar a religião, assim como a liberdade de manifestar a religião ou convicção,
sozinho ou em comum, tanto em público como em privado, pelo ensino, pela prática,
pelo culto e pelos ritos. No entanto, existe hoje uma necessidade de preparar a criança
para a religiosidade, de maneira que não seja proselitista, catequética e doutrinária,
tendo em vista que o Ensino Religioso como disciplina curricular, deve formar a
criança na sua totalidade. Para isso é preciso compreender o universo da criança, o
que esta entende por religião. Religião para criança está relacionada à igreja (prédio).
Aos poucos essa visão vai ganhando novos elementos, característicos da religião
compreendida dos familiares.
O ser humano, em geral, tem uma necessidade de encontrar respostas para
as mais diversas perguntas a respeito da vida, na tentativa de explicar o que a ciência
não deu conta, busca na religião compreender os mistérios que envolvem a vida e a
morte. As primeiras tentativas de estudo sistemático sobre o humano e Deus, o
sobrenatural, o transcendente, começam com os filósofos gregos Platão (437-347
a.C.) e Aristóteles (384-322 a. C.), propunham normas para a sociedade, procurando
melhorá-la de acordo com seus princípios. Nesse sentido, religião é compreendida
como uma forma de conhecer e compreender o mundo, seguindo essa lógica pode-se
afirmar que religião passa a ser um tipo de conhecimento. E nessa perspectiva
acredita-se que seja o ponto primordial para desenvolver atividades na Educação
Infantil. Mesmo que seja para nós adultos um fator importante, o estudo de conceitos
mais amplos e complexos de religião, a criança não terá necessidade de abranger tais
conceitos, para ela a sua identidade religiosa se construirá pelos gestos, palavras e
FONAPER
olhares, atribuindo significados a tudo que a cerca. Seus conceitos e valores sobre a
vida, o belo, o bom, o mal, o feio, entre outras coisas, começam a constituir nesse
período.
Considerando os estágios de desenvolvimento segundo Piaget a criança da
Educação Infantil, encontra-se nos dois primeiros estágios de desenvolvimento: O
sensório Motor e o Pré Operatório;nessa fase, o campo da inteligência da criança
aplica-se a situações e ações concretas. Trata-se do período em que há o
desenvolvimento inicial das coordenações e relações de ordem entre ações. É
também o período da diferenciação entre os objetos e o próprio corpo. É a fase em
que as crianças reproduzem imagens mentais. Elas usam um pensamento intuitivo
que se expressa numa linguagem comunicativa.
Com isso o Referencial Curricular para Educação Infantil considera que
educar é:
[...] propiciar situações de cuidados, brincadeiras e aprendizagens
orientadas de forma integrada e que possam contribuir para o
desenvolvimento das capacidades infantis de relação interpessoal, de
ser e estar com os outros em uma atitude básica de aceitação,
respeito e confiança, e acesso, pelas crianças, aos conhecimentos
mais amplos da realidade social e cultural (BRASIL, 1998,p23).
Diante dessa afirmação, podemos concluir que a escola como lugar plural, em
que pessoas diversas, dividem o mesmo espaço, deve conviver tendo uma
convivência pacífica, com conhecimento, dialogo e compreensão, valores básicos para
uma socialização que deve ser aprendido desde a tenra idade, portanto na educação
infantil. Essa pratica é assumir a religião como contribuição de visão de um mundo
mais justo, fraterno e solidário. Desenvolver a sensibilidade religiosa é ajudar as
pessoas a serem melhores, cultivarem valores que lhes dão sentido para vier e
conviver (PROVÍNCIA MARISTA BRASIL, p.133).
ASSOCIANDO TEORIA E PRÁTICA
Para associar os termos teoria e prática e compreender o universo infantil,
uma das atividades desenvolvidas em sala de aula utilizada para enriquecimento do
artigo, foi justamente o entendimento e a compreensão da criança a respeito de
religião.
No quadro abaixo veremos que a visão da criança está no processo de
compreensão e crescimento. A avaliação utilizada para construção desse quadro foi
observação da oralidade e dos desenhos produzidos livremente pelas crianças.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Resultado de uma atividade realizada em sala de aula com crianças do
Centro Marista Circuito da Criança, pela Professora Glauciene Dias do Campo de
Conhecimento: Sentido Religioso.
Atividade: “Minha religião é assim”
 Desenharam o céu;
Estudantes do Maternal III –
Idade 03 anos
 Expressaram com as mãos como
se
comportam
ao
falar
de
religião,
prédios
com
associou religião à oração;
 Desenharam
cruzeiros;
Estudantes do Primeiro Ano –
Idade 04 anos
 Partilharam com a turma algumas
músicas e gestos que utilizam em suas
igrejas;
 Desenharam prédios, com portas
abertas, dando a visão do que há dentro:
Cruz, mesa, pastor, padre, família;
 Contaram
histórias
da
bíblia,
histórias da família, a ida aos locais que
Estudantes do Segundo Ano –
Idade 05 anos
para eles é religião;
 Trouxeram de casa objetos que
simbolizam
a
religião
desenhos,
bíblias,
da
terço,
família:
imagem,
camiseta, revistas, folhetos da igreja
frequentada.
Vigotsky concede um papel de enorme importância para a interação social no
desenvolvimento humano. Para o autor, é na relação que os indivíduos estabelecem
com os diversos grupos e ambientes, que se realizam as aprendizagens. Diante disso,
é importante que as crianças sejam protagonistas das ações construtivas na escola,
envolvendo-se em soluções de problemas reais, atuando como fonte de iniciativa,
liberdade e compromisso no contexto escolar.
CONCEITOS EPISTEMOLOGICOS BÁSICO PARA COMPREENDER RELIGIÃO
FONAPER
Na relação estudante objeto de estudo e mediação do professor, é importante
alinharmos o que concebemos por cada um dos componentes desta relação e como
eles se constituem na mesma. Para tanto o mediador, professor é peça fundamental
para compreender a capacidade de construir e mobilizar diversos recursos para
interagir e intervir em situações complexas de modo a resolver problemas e alcançar
objetivos derivados de projetos pessoais e coletivos. Competência é um conceito
integrador, que mobiliza em múltiplas realidades e contextos estruturas cognitivas,
conhecimentos, conteúdos, saberes, experiências, valores, linguagens, habilidades,
entre outros(PROVÍNCIA MARISTA BRASIL, p.23).
O professor é convocado a ser reflexivo e um eterno aprendiz. Destaca Paulo
Freire: “Eu agora diria a nós, como educadores e educadoras: ai daqueles e daquelas,
entre nós, que pararem com a sua capacidade de sonhar, de investigar a sua coragem
de denunciar e anunciar. Ai daqueles e daquelas que, em lugar de visitar de vez em
quando o amanhar, o futuro, pelo profundo engajamento com o hoje, com o aqui e
com o agora, ai daqueles e daquelas que em lugar desta viagem constante ao
amanhã, se atrelem a um passado de exploração e de rotina.”
Fazer uma analise da religião hoje, pressupõem a necessidade de explicitar
alguns termos significativos para compreensão da religião:
RELIGIÃO
Pode-se entender a religião como ma linguagem. É uma comunicação. Um
modo pelo qual homens e mulheres se comunicam entre si e com entidades
(invisíveis) que fazem parte de seu mundo. Está no campo da expressão, da
comunicação, portanto da cultura. Religião é um conhecimento. É uma forma de
conhecer o mundo. É uma determinada visão de mundo, socializada dentro de
determinado grupo social(ORO, p.23).
O termo RELIGIÃO: Ligação baseada na submissão e no amor entre o
homem e Deus.
Na atualidade significa religação com a existência, Cosmos, divino.
Weber definiu a religião como um sistema estruturado de símbolos pelos
quais grupos humanos formulam a última razão de ser da vida e do mundo em que
vivem e em redor de que se organizam certa unidade com progressiva especialização
de papéis.
RELIGIOSIDADE
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
A religiosidade pode ser exteriorizada em sistemas formais, tais como ritos,
mitos, doutrinas, tradições, mistérios, modelos de organização comunitária etc. Esses
sistemas se inserem em um espaço cultural próprio, que define as maneiras de se
viver a religiosidade no grupo ou na sociedade.
O fenômeno religioso constitui-se no complexo de manifestações culturais
que derivam das experiências religiosas individuais e coletivas, por isso, é antes de
tudo um fenômeno humano. Considerado em sua totalidade ou tomado em cada uma
de suas dimensões, o ser humano se desenvolve à medida que se expressa e se
relaciona. Da mesma forma, a religiosidade torna-se efetiva e se desenvolve pela
expressividade, comunicabilidade e linguagem. O dinamismo da religiosidade ganha
forma, ritmo e intensidade no fenômeno religioso.
SAGRADO
A palavra Sagrado, derivada do latim "sacer" (sagrado), constitui uma das
dimensões fundamentais da vida religiosa e designa uma área ou conjunto de
realidades (seres, lugares, coisas ou momentos) que de certa forma estão separados
do mundo profano comum, manifestando um poder superior e podendo ser abordados
apenas ritualmente. No contacto com o sagrado, o homem experimenta algo que o
ultrapassa, que o transcende. Assim sendo, as realidades sagradas não existem em
função das suas próprias características, mas sim devido à transcendência nelas
manifestada.
Além do seu sentido religioso, o termo sagrado tem também um sentido moral
que constitui uma atenuação do sentido religioso: na moral, o sagrado qualifica valores
primordiais como, por exemplo, a liberdade ou a justiça. (Enciclopédia Temática,
2009).
ECUMENISMO
A palavra ecumenismo tem origem na palavra grega oikoumene, que está
relacionada com moradia, habitação. Referenciam-se ao mundo habitado onde
conviviam diferentes povos e culturas.
No século XIX, a palavra ecumenismo é utilizada pela primeira vez de forma
mais ampla. Em 1846, membros de diversas denominações evangélicas fundaram, em
Londres, a Aliança Evangélica, com a finalidade de organizar um “concilio ecumênico
evangélico”. Em 1948, com a fundação do Conselho Mundial de Igrejas, em Amsterdã,
FONAPER
temos a consolidação da palavra ecumenismo. “Já podemos aceitar as divisões da
Igreja como se fosse um fato normal” (WAGNER, 2010).
DIÁLOGO INTER-RELIGIOSO
Associado a dois outros conceitos:

Flexibilidade: Capacidade que uma religião tem de movimentar-se no
campo religioso, atendendo às diversas expectativas daqueles e daquelas que
buscam responder às suas inquietações de ordem religiosa.

Dialogicidade: é definida como sendo o potencial de uma religião em
dialogar com as mudanças mais gerias em curso na sociedade, sobretudo aquelas
que afetam o campo religioso, e em incorporar elementos de outras expressões
religiosas num processo de mixagem religiosa.
Pluralismo religioso e, portanto, do dialogo entre os diversos sujeitos, numa
determinada sociedade, vai depender da flexibilidade e da dialogicidade existente no
interior do campo religioso(SANCHEZ, p.55).
FÉ
A relação entre fé e religião pode ser fecundada. O conjunto de expressões
de uma religião pode contribuir na compreensão, expressão e vivência da fé. Quando
se identifica a fé com o arcabouço histórico da religião, corre-se alguns perigos: pode
reduzir a fé a um verniz cultural religioso, identificando-a com algumas práticas e
expressões; pode igualar e ligar a prática da fé, de agora, as formas arcaicas de
compreensão e de expressão de sarado e de religião, limitando seu sentido e objetivo.
Durkheim, no final do século XIX, reconhecia que a fé é uma força importante para os
fiéis. Os que crêem os que vivem a vida religiosa,
[...] sentem, com efeito, que a verdadeira função da religião não é nos
fazer pensar, enriquecer nosso conhecimento, acrescentar às
representações que devemos à ciência representações de outra
origem e de outro caráter, mas nos faz agir, nos ajuda a viver. O fiem
que comungou como seu deus não é apenas homem que vê
verdades novas que o incrédulo ignora:é homem que pode mais. Ele
sente em si força maior para suportar as dificuldades da existência e
para vencê-las. Está como que elevado acima das misérias humanas,
[...] acredita-se salvo do mal [...] (DURKHEIM, 1989.p.493).
IGREJA
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
O termo ecclesia, cuja origem deriva de um vocábulo grego que significa
“assembleia”, permite fazer referência ao templo cristão. Trata-se da edificação onde
têm lugar serviços religiosos públicos e são apresentadas imagens ou relíquias
adoradas (ou veneradas) pelos fiéis. Por exemplo: “Todos os domingos de manhã, vou
à igreja pedir pela saúde da minha mãe”, “Vemo-nos esta tarde à porta da igreja”.
Uma igreja de modo geral, a participação de fato se baseia no nascimento (a
família faz parte dessa Igreja). Tem a amplitude de estrutura social, que
frequentemente coincide com as fronteiras geográficas e étnicas. Entende-se como
uma instituição que realiza a administração dos meios formalizados de graça e suas
consequências sociológicas e teológicas- hierarquia e dogma. Fornece uma orientação
para a conversão de todos. Tem uma tendência a ajudar-se com a sociedade
existente, aos seus valores e instituições, acomodando-se a eles. (ORO, p.26).
SEITA
Uma análise que se pretende cientifica não pode estar carregada de juízos de
valor nem acompanhada de atitudes de desprezo em relação ao diferente. Ocorre, que
na linguagem usual do dia a dia, bem como no senso comum, o termo seita vem
carregado de conotação negativa. Comumente, as pessoas ao falar de seita, referemse a um grupo religioso fechado.
O conceito de seita, expressa uma adesão voluntária, uma escolha feita em
um determinado momento da vida. Seus membros normalmente têm atitude de
austeridade ética. Doutrina ou sistema que se afasta da opinião geral; conjunto dos
indivíduos que a seguem; comunidade fechada; de cunho (caráter) radical; facção;
partido.
Os sociólogos Max Weber e Ernest Troeltsch definem a seita como uma
sociedade contratual para distingui-la de uma organização eclesiástica institucional.
A seita é um grupo de pessoas que separado da Igreja por meio de um líder ou
líderes. Dentro desse contexto dois fatores aparecem: o poder econômico e político
(HUBERT,1991, p. 12).
APLICAÇÃO METODOLÓGICA DOS FATORES:A RELIGIÃO NO UNIVERSO
INFANTIL E CONCEITOS EPISTEMOLOGICOS BÁSICO PARA COMPREENDER
RELIGIÃO
FONAPER
A prática pedagógica a ser desenvolvida no Ensino Religioso na educação
infantil tem como urgência a ser praticada, a postura ecumênica e de diálogo interreligioso, por parte dos professores e de toda comunidade escolar, essas práticas
devem levar a criança a compreender o mundo ao seu redor. A criança não um ser do
futuro de um País, mais um ser do agora, sujeito ativo que tem por direito uma
educação que desenvolva conhecimento. Para isso o Ensino Religioso terá que ter
bem claro aonde se quer chegar, quais as habilidades e competências surgirão a partir
do estudo abordado. O objetivo do estudo deve levar conhecimento à compreensão do
seu papel social. Oportunizar o primeiro contato com o universo religioso, tendo como
base o saber de si, para que a criança consiga reconhecer as diferenças do contexto
social que a cerca, pois através deste processo é que ela conseguirá crescer em seu
aspecto social e cognitivo, sem carga de preconceito.
Ajudar a criança a estabelecer relação consigo, com os outros e com o
Transcendente.
RELAÇÃO CONSIGO
O estudo cientifico para a compreensão da valorização a vida, ao ser que
mesmo criança é dotado de sentimentos, com isso a disciplina de Ensino Religioso,
deve buscar ações que tornem significativas para criança para que ela possa
desenvolver sua auto estima, amor a ela mesmo e o conhecimento do seu corpo e
seus costumes.
As atividades terão como objetivos:

Ajudar a criança a descobrir que ela não é só um corpo exterior, há algo
que existe nela e que ela não vê – ajudar o nascimento do mistério pessoal.

Fazer descobrir o para além da matéria. Ajudá-la a dar atenção aos
seus pensamentos.

Ajudá-la a mandar, a ter domínio no seu corpo para que um dia seja um
adulto com capacidade de domínio dos seus próprios instintos. Ajudá-la a ter
cuidados com o seu corpo.

Ajudá-la a fazer a descoberta dos seus próprios limites, para que se dê
conta de que precisamos uns dos outros.

Levá-la a refletir antes de agir, porque só assim procedendo, damos
densidade à nossa vida de seres humanos.

Comunicar seus sentimentos, pensamentos e escolhas através da fala e
linguagem corporal.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
RELAÇÃO COM O OUTRO
Vivemos num país com índices altíssimos de preconceitos, como vivenciar
esses momentos de alteridade? A criança não é um ser preconceituoso, porém assim
como ela aprende com facilidade coisas boas, infelizmente ela aprende coisas ruins
com os adultos, e o preconceito é uma delas. O que é alteridade? Para Frei Betto o
significado parte de uma visão de um ser capaz de apreender o outro na plenitude da
sua dignidade, dos seus direitos e, sobretudo, da sua diferença. Quanto menos
alteridade existe nas relações pessoais e sociais, mais conflitos ocorrem. A nossa
tendência é colonizar o outro, ou partir do princípio de que eu sei e ensino para ele.
Ele não sabe. Eu sei melhor e sei mais do que ele. Toda a estrutura do ensino no
Brasil, criticada pelo professor Paulo Freire, é fundada nessa concepção. O professor
ensina e o aluno aprende. É evidente que nós sabemos algumas coisas e, aqueles
que não foram à escola, sabem outras tantas, e graças a essa complementação
vivemos em sociedade. Como disse um operário num curso de educação popular: "Sei
que, como todo mundo, não sei muitas coisas" (Frei Betto).
As crianças devem compreender as necessidades humanas, os direitos de
cada um e cada uma a partir da experiência com ela mesma e com o outro. Direitos
básicos são o jeito de respeitas as pessoas e criar uma sociedade humana digna para
todos. Qualquer direito humano que não é respeitado se torna uma ameaça para
dignidade de todos.
Quanto à forma de se expressar o que pensa, deseja, a forma de comunicar
cresce em sofisticação, em diversidade. Uma destas formas de expressão é o
desenho, por meio do qual a criança apresentar nossas emoções, nossa visão de
mundo e sua relação com o outro.
Os objetivos dessas práticas levarão a criança a:
 Fazer a educação da proximidade.
 Fazer a educação da generosidade, do amor que sabe partilhar
e que sabe acima de tudo perdoar.
 Fazer a educação da gratuidade é levar a criança a saborear o
dar-se.
 Fazer a educação da solidariedade. Levá-la a fazer experiências
de se sentir responsável pelos outros.
RELAÇÃO COM O TRANSCENDENTE
A definição de transcendente na visão da criança é aquele que tudo fez e cria,
uma visão que vem da família, uma cultura do respeito ao ser que não é visto, mas
que é soberano e supremo.
FONAPER
Para Leonardo Boff, a definição e ilustração de transcendência parte do
principio de romper barreiras e ultrapassar limites, impulsionando a busca permanente
para novos mundos. Descreve ainda os lugares privilegiados onde ela se dá,
desvendando-a nos grandes e pequenos acontecimentos, dando-nos olhos para
enriquecer gestos e momentos cotidianos.
O convívio respeitoso entre as diferenças tradições religiosa é fundamental
para a paz e as construção do bem maior na sociedade, nessa perspectiva o
transcendente, se torna estudo com crianças, a partir do momento que ela passa a
contemplar o planeta, valorizar a riqueza das diferentes formas de vida que ele abriga
e reflexões com quais os cuidados que devemos ter com essa obra tão maravilhosa
que é nossa grande casa. O objetivo é apresentar a criança o interessante do mistério
da vida que cresce, transforma e espalha por todo planeta. Esse encantamento pela
natureza prepara o coração para o compromisso de preservação e cuidado com o
planeta, desenvolvendo um espírito de justiça e solidariedade em relação ao mundo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Ensino Religioso trata do fenômeno religioso e da busca pelo além para
encontrarmos a nós mesmos. Desenvolver esse conhecimento na educação infantil é
um grande desafio, no entanto podemos afirmar que muito necessário. O estudo do
Ensino Religioso é uma contribuição fundamental no processo de desenvolvimento
integral da criança, uma vez que proporciona para a mesma ver o mundo de diferentes
formas e ao mesmo tempo desperta para a convivência com as diferenças,
respeitando-as e valorizando-as, o que facilita a compreender o seu relacionamento
com a sua dimensão religiosa, nessa perspectiva ecumênica a participação da criança
nas atividades desenvolvidas, mostra ricas partilhas e a necessidade que a criança,
como um ser do hoje, tem de ter respostas as pequenas questões sobre o surgimento
da vida e do mundo. Ensinar à criança que o mundo ao seu redor pode ser mais
harmonioso e fraterno e depende das ações que praticamos diariamente é o resultado
esperado para chegarmos ao conhecimento do fenômeno religioso. Desde a infância o
ser humano é convidado a abrir os horizontes para uma sociedade sem preconceito.
Portanto o educador tem uma grande tarefa, e não poderia deixar de incluir com as
outras disciplinas o Ensino Religioso de grande importância para a urgente formação
de um novo ser humano, de sujeito da história que não concordem inocentemente aos
diferentes sistemas dominantes, mas que, pela própria prática e reflexão, sejam
capazes de construir sua própria história. E a Escola pode ser este espaço onde o
aluno fará suas perguntas e terá suas respostas. Podemos assim atribuir a religião à
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
função de educar o aluno para a vida, dando a ele a capacidade de vivê-la em
plenitude a partir do encontro consigo mesmo, com o seu próximo, com transcendente
e com o mundo.
REFERÊNCIAS
ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social. Tradução de Lourdes Santos
Machado. In: Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1973.
WEBER, Max. Sociologia. 2 ed. São Paulo , Ática, 1982
DURKHEIM, Émile. As formas elementares da vida religiosa. São Paulo: Paulus,
1989.p.493.
SOARES, Afonso Maria Ligorio: Religião & Educação: da ciência da religião ao
ensino religioso. São Paulo: Paulinas, 2010.
SANCHES, Wagner Lopes. Pluralismo religioso no mundo atual. 2ª Ed. São
Paulo:Paulinas, 2010
ORO, Ivo Pedro. O Fenômeno Religioso: Como entender. São Paulo: Paulinas, 2013.
(Coleção temas de religião).
BOFF, Leonardo. Tempo de Transcendência.
http://www.freibetto.org/index.php/artigos/45-alteridade
Editora
Sextante,
2000.
O transcendente: Jornal pedagógico para o Ensino Religioso. Editora Mundo e Missão,
São Paulo, v.VIII, n. 30, p.02,07,09, ago./set.2014
O transcendente: Jornal pedagógico para o Ensino Religioso. Editora Mundo e Missão,
São Paulo, v.VIII, n. 30, p.09,10,11, mar./abr.2014
FONAPER
AS TRAJETÓRIAS E EXPERIÊNCIAS DE PROFESSORES DE ENSINO RELIGIOSO
EM NATAL AO LONGO DAS ÚLTIMAS DÉCADAS – NOVAS MEMÓRIAS
Jamillis Keila /PIBIC/CNPq/UERN35
Araceli Sobreira Benevides /UERN36
Resumo
Este artigo analisa as trajetórias pessoais pelo ponto de vista de professores do Ensino
Religioso da Grande Natal/RN. Temos por objetivo investigar como esses professores
ingressaram nessa área de ensino e quais saberes utilizam em sala de aula. O estudo
caracteriza-se como uma pesquisa qualitativa, sendo utilizadas informações fornecidas através
de um questionário estruturado, preenchido pelos participantes. Dessa forma, tomamos por
base autores que discutem a formação de professores (BENEVIDES, 2011; BARRETO, 2011)
e a necessidade dessa formação (MEDEIROS, 2011). Discutimos os desafios e os avanços
ocorridos com as práticas pedagógicas do ER nas últimas décadas, pelas lentes de docentes
que iniciaram suas trajetórias na fase da passagem para o modelo mais atual desse
componente curricular do Ensino Fundamental: o Modelo Pluralista.
Palavras-chave: Saberes da docência do Ensino Religioso. Formação de Docentes do Ensino
Religioso. Memórias de docentes do Ensino Religioso.
Introdução
Este trabalho é fruto de uma pesquisa de iniciação científica 37 realizada no
curso de Ciências da Religião da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, na
linha de pesquisa Formação e Atuação do Docente da Educação e das Ciências da
Religião.
O Ensino Religioso, ao contrário do que se pode imaginar, é uma disciplina
bastante antiga que, desde o período da colônia, já ocupava um lugar nos currículos
escolares dos alunos das escolas brasileiras. Contudo, a metodologia e os eixos
norteadores da disciplina eram outros, e a formação necessária para lecionar o ER
também era outra. No início da história do Ensino Religioso, é possível observar a
catequese como pano de fundo da disciplina, professores precisavam apenas ter o
conhecimento sobre a Bíblia para estar aptos a desempenhar o papel de professor.
Com o passar dos anos, essa disciplina entrou para a área de conhecimento
disciplinar e, com orientações contidas na Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional – LDBEN, em seu artigo 33 (BRASIL, 1996), pretende-se que a postura
35
Discente do Curso de Ciências da Religião, Campus de Natal, UERN. E-mail:
[email protected].
36Docente do Departamento de Ciências da Religião, Campus de Natal, UERN. E-mail:
[email protected]
37 Agradecemos ao CNPq pelo suporte financeiro à bolsista e pelo apoio e parceria na
realização do projeto. Agradecemos imensamente aos sujeitos colaboradores desta pesquisa,
pelo modo gentil como atenderam nosso pedido em participar como informantes deste
estudo.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
docente deixe de ser prosélita, a qual passa, agora, a desempenhar a condição de
uma prática baseada no Ensino Pluralista do fenômeno religioso.
Apesar desses avanços e, após a instauração da lei, o ER atravessa ainda
certas dificuldades, a principal delas é a não legitimação dessa área de ensino por
parte dos próprios educadores e das equipes de gestores e coordenadores de ensino,
os quais tendem a ver o ER de maneira como se essa disciplina fosse catequética e
dogmática. Disso, decore a prática muito comum, nas escolas públicas do RN, de se
colocar professores não formados para preencher sua carga horária com a disciplina
ER, como se para esse exercício não houvesse necessidade de formação específica.
Diante do quadro descrito acima, fomos conhecer, por meio de um questionário
investigativo, os discursos de professores/as de ER da Grande Natal/RN sobre suas
trajetórias e experiências com a docência. Optamos por investigar professores/as
formados na área para compreender como ingressaram na docência e quais os
saberes utilizados por eles em sala de aula. Essa investigação amplia a pesquisa
desenvolvida por Benevides (2014), sobre as identidades e saberes de professores de
Ensino Religioso no RN. Sua importância decorre da contribuição para o avanço e o
reconhecimento do ER área das Ciências Humanas e Sociais, servindo como base
ainda para outras pesquisas sobre formação docente.
A metodologia
Empregamos a metodologia de enfoque qualitativo, com base na abordagem
Interpretativista (MOITA LOPES, 1994), à qual confere ao contexto sócio-histórico um
papel significativo para a compreensão dos dados subjetivos desse tipo de enfoque.
(FREITAS, 2002). Dentre os autores selecionados, elegemos Moita Lopes, para quem,
na pesquisa interpretativista, “[...] o acesso ao fato deve ser feito de forma indireta
através da interpretação dos vários significados que o constitui”. (MOITA LOPES,
1994). Sendo assim, essa abordagem possibilita a interpretação do mundo social
através da linguagem, dando suporte no tocante às perspectivas sociais e históricas
que formam a sociedade, onde o sujeito está inserido. Assim, na compreensão de
Freitas (2002, p.24- 25),
Diante dele, o pesquisador não pode se limitar ao ato contemplativo, pois
encontra-se perante um sujeito que tem voz, e não pode contemplá-lo,
mas tem de falar com ele, estabelecer um dialogo com ele.[..] O homem
não pode ser apenas ser um objeto de explicação, produto de uma
consciência, de um sujeito, mas deve ser também compreendido,
processo esse que supõe duas consciências dos sujeitos, portanto,
dialógica.
FONAPER
Trabalhamos com o questionário como instrumento de pesquisa, para compor
os dados das análises, com três professoras de ER que atuam em Natal/RN. Para
guardarmos as identidades dos/as participantes utilizaremos P1 (professora 1), P2
(professora 2). P3 (professora 3), para remetermos aos sujeitos que colaboram nesta
pesquisa. Cada professor teve acesso ao questionário através de um formulário
enviado por e-mail e como documento do Google Drive. Os participantes responderam
a 07 questões abertas que versavam sobre o tempo de serviço, os motivos para
lecionar Ensino Religioso, as práticas existentes nas escolas no momento em que os
professores iniciaram a carreira docente, além de um breve relato pessoal com
informações sobre quando, onde e como o participante começou a carreira como
docente do Ensino Religioso. Também foi solicitado que se registrassem as principais
atividades realizadas nesse período e a importância dessa carreira na vida
profissional. Foram pedidas informações ainda sobre as dificuldades e as vantagens
de ser professor de Ensino Religioso, além de lembranças sobre aquilo que
consideravam importante para as futuras gerações conhecerem sobre as práticas que
envolveram sua trajetória como professor/a.
Os participantes foram orientandos a enviar o formulário respondido para um
link acessado pela pesquisadora e pela bolsista Pibic/CNPq. Foi mantido sigilo em
respeito à identificação dos sujeitos participantes, sendo que todos foram informados
sobre a importância da pesquisa e dos objetivos deste estudo. Também foram
informados sobre os procedimentos éticos, estabelecidos conforme Comitê de Ética da
UERN e existentes no Projeto maior a que esta pesquisa se insere (BENEVIDES,
2010).
Informamos ainda que os trechos selecionados dos questionários foram
compilados tais quais foram produzidos pelos três participantes.
Perspectiva Teórica
Ao debater o lugar do conhecimento no curso de Ciências da Religião,
deparamo-nos com o papel fundamental das mudanças ocorridas na última década
em relação a esse curso. Essas mudanças foram construídas lentamente, porém,
introduziram uma nova percepção tanto para a prática docente quanto para a
construção teórica dessa área. Destacamos como principal mudança a ruptura com o
ensino confessional – tipicamente orientado pela Igreja Católica – para um ensino
pluralista que marcou as duas últimas décadas da educação brasileira. Muito embora
que, na prática, ainda se percebam práticas completamente pluralistas, conforme
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
alguns participantes desta pesquisa enunciam, essa mudança de prática corrobora
para um enfoque pedagógico não catequizante, como era antes realizado.
A criação de cursos de Licenciaturas implementa um caráter científico
responsável pelo suporte teórico (CORTELLA, 2006) necessário à preparação de
futuros professores. Cortella (2007) é um dos principais teóricos que defendem a
formação específica na área, trazemos o que ele diz sobre a necessidade de saberes
específicos para docência nessa área de conhecimento:
É nessa condição de formadora especifica que entra a urgente
consolidação da graduação em Ciências da Religião, com uma
licenciatura dentro dela que dê conta da responsabilidade que tal
ensino demanda, evitando o proselitismo e a doutrinação, garantindose a democracia e o multiculturalismo (CORTELLA, 2007, p. 20).
´
Além disso, tanto o ensino quanto as pesquisas que começaram a ser
desenvolvidas, nessa área, pertencente às Ciências Humanas, valorizam o aspecto
investigativo que demanda as questões culturais do fenômeno religioso, analisado por
vários ângulos: antropológicos, psicológicos, sociais, entre outros.
Nessa perspectiva, destacamos o que diz Junqueira (2002, p. 28) sobre os
conteúdos da área da Licenciatura em Ciências da Religião, que, segundo o autor,
devem privilegiar “[...] informações no campo sociológico-fenomenológico, tradições e
cultura, teologias, textos sagrados orais e escritos, ethos, ritos, onde o professor seja
um educador e não um agente religioso”.
Ainda, de acordo com Passos (2006, p.39), “[...] as Ciências da Religião podem
oferecer a base teológica para o Ensino Religioso, posicionando-se como mediação
epistemológica para as suas finalidades educacionais em cursos de licenciaturas”.
Isso provoca a vinculação a conhecimentos específicos os quais somente a presença
efetiva em um curso de Licenciatura pode dar conta. Sendo assim, a posição que
adotamos, nesta pesquisa, indica a necessidade de formação inicial para os docentes
desse componente curricular do Ensino Fundamental.
Nesse sentido, Medeiros (2011, p.263) defende que “[...] a formação inicial
superior [...] como ponto de partida para a conquista da profissionalização docente”.
Desse modo, identificamos a importância da formação em um curso de licenciatura
em Ciências da Religião para a prática profissional, principalmente para assegurar “[...]
a interação com conhecimentos didáticos-metodológicos que organizam/sistematizam
procedimentos que não estão presentes em práticas baseadas apenas no estudo da
Bíblia”, como também destaca Benevides (2011, p.37).
Klein (2010) é outro autor também propõe a formação, para atuação nessa
área de conhecimento e concebe que é fundamental e imprescindível para o ER se
concretizar conforme a LDB.
FONAPER
Nessa perspectiva, indicamos ainda o pensamento de Tardif (2006) que, ao
pesquisar a importância dos saberes na atividade profissional do professor, trabalha
com o conceito de saberes da docência, entendido como “[...] como um saber plural,
formado pelo amálgama, mais ou menos coerente, de saberes oriundos da formação
profissional e de saberes das disciplinas, dos currículos e da experiência” (TARDIF,
2006, p. 218).
Ainda segundo esse autor, os saberes da docência são divididos em quatro
categorias: a) saberes disciplinares, referentes aos diversos conhecimentos que a
sociedade dispõe através de diferentes disciplinas oferecidas pelas universidades; b)
saberes curriculares que são os métodos e objetivos que a escola impõe como modelo
de cultura erudita através dos programas escolares; c) saberes profissionais, que
abrange um conjunto de saberes que são construídos pelas instituições de formação
de professores através de faculdades e escolas. d) saberes da experiência, aqueles
que incorporamos à experiência individual ou coletiva que se transforma no nosso
modo de saber-fazer.
A diversidade desses conhecimentos, construídos na formação, como dito
acima, ressalta firmemente que existe uma relação inseparável entre o que se sabe, a
busca pelo saber, e o que é ensinado através de experiências diversas voltadas para
as práticas pedagógicas. Então, para que o modelo atual de professor e de Ensino
Religioso seja compreendido, precisamos trabalhar com a percepção de que esses
são sociais, plurais, heterogêneas e temporais, desenvolvidos em sua prática de
acordo com as ideologias, a história de vida, as crenças, as concepções de ensino e
aprendizagem e da interação quem este mantém com os alunos, outros profissionais
no espaço escolar, e dos conhecimentos cuja base apoia e orienta a prática educativa.
Para isso, portanto, faz-se necessária a formação específica em um curso de
Licenciatura.
Sujeitos e seus discursos sobre o Ensino Religioso atual
Os sujeitos, cujos enunciados foram selecionados para a discussão,
contribuíram com respostas discursivas, construídas em 1ª pessoa, as quais revelam
um engajamento dos participantes e uma multiplicidade de visões, de conceitos e de
práticas relacionadas às vivências atuais dessa disciplina. Ressaltamos nosso
entendimento em relação às respostas construídas que está baseado na compreensão
de que “[...] a produção de conhecimentos e o texto em que se dá esse conhecimento
são uma arena onde se confrontam múltiplos discursos” (AMORIM, 2007, p. 12). Em
outras palavras, queremos dizer que assumimos um olhar sobre os discursos
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
produzidos no contexto da pesquisa, esse olhar reflete alguns valores que estão
orientando nossa voz de pesquisadora. Estamos em lugares diferentes e em posições
diferentes dos participantes. São professores de ER na Grande Natal/RN e possuem
entre 1,5 e 8 anos de tempo de serviço em sala de aula, todos atuam na rede pública
do município de Natal/RN, sendo concursados. Foram selecionados trechos das
respostas enviadas e informamos que os nomes citados pelos participantes foram
substituídos pelas letras X, Y e Z, para também manter anonimato.
Tivemos a oportunidade de perceber, na prática, a importância do saber
específico para os professores que atuam na disciplina de ER, suas trajetórias e seus
discursos.
Descrevemos, a seguir, cada participante:
P1 – Iniciou sua carreira em 2009 pelo desejo de trabalhar na sua área de
formação. Esta há 5 anos lecionando na rede municipal de Natal na disciplina de ER.
P1: Eu já cheguei na escola com a nova proposta do ensino religioso,
embora na escola a qual trabalho, nunca houve um professor do
ensino religioso. Eu fui a primeira professora de ensino religioso em
40 anos de existência da escola. Embora não houvesse um
profissional da área, a concepção que existia anteriormente no
ambiente escolar sobre o ensino religioso, era de catequese e com o
objetivo de disciplinar, de acalmar os alunos. Até hoje continuo
lutando pelo reconhecimento da disciplina na escola, pois ainda
existe o estigma sobre o profissional de ensino religioso, por parte
dos professores de outras disciplinas, familiares e alunos.
Procuramos trabalhar para que essa estigmatização acabe e
trabalhamos para implementar o ensino religioso dentro da proposta
atual e mostrar que é uma área de conhecimento legítima.
P2 – Licenciada pela UERN em Ciências da Religião desde 2010. Participou de
uma seleção da prefeitura de Natal para professor de ER. Há 1 ano e 5 meses atua
como professora no município de Natal.
P2: Como fui formada pela UERN especificamente em Ciências da
Religião, o que tenho sobre como eram ministradas as aulas são as
experiências coletadas durante o curso por bolsistas colegas de
turma como, por exemplo, X e também pela proximidade com
professora Y e sua pesquisa sobre formação de professores de
Ensino Religioso. Então, durante a graduação aprendemos muito
bem o que não fazer dentro de sala de aula.
P3 – No início (nas salas polivalentes), foi convidada a fazer parte da Equipe
de Professores de Ensino Religioso (Rede Estadual), por pertencer a grupo de jovens
na Arquidiocese de Natal. Tem 25 anos como professora polivalente e 8 anos como
professora específica da disciplina na rede municipal de Natal, com formação na área.
Assim, começaremos a análise dos dados coletados para investigarmos as mudanças
nas aulas de ER.
FONAPER
P3: As aulas eram voltadas para Catequese dos Alunos. Dando
enfoque ao Cristianismo Católico, onde os alunos eram preparados
para receberem Sacramentos como: Primeira Eucaristia e Crisma.
Também existia a leitura de alguns textos onde eram trabalhados o
amor, a caridade, a amizade, etc. De acordo com o Cristianismo
Católico Romano.
Nesse primeiro momento, compreendemos os discursos dos professores em
relação à formação em Ciências da Religião e suas posições sobre o modo da
ministrar as aulas. P1 revela-nos uma irregularidade por parte desta escola, a qual
nega ao aluno o direito de cursar essa disciplina, descumprindo a redação da Lei
9.475/1997(BRASIL, 1997), a qual prevê.
[...] o ensino religioso, de matricula facultativa, é parte integrante da
formação básica do cidadão e constitui disciplinas dos horários
normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o
respeito a diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer
formas de proselitismo (WONDRACEK, 2010, p. 222).
Outro aspecto que chama atenção, no discurso de P1, é o fato da escola nunca
ter tido um professor de ER em 40 anos de existência. Do mesmo modo, P2 faz-nos
refletir sobre a importância das pesquisas feitas pelos alunos bolsistas no curso de
Ciências da Religião da UERN campus de Natal, pois foi o meio pelo qual, P2 se
inteirou a respeito das práticas anteriores ao modelo antigo de Ensino Religioso.
P3 aponta o modelo catequético vigente anterior a sua entrada na escola e
destaca o enfoque ao Cristianismo católico e as pregações dos seus preceitos na
escola.
Os enunciados acima nos mostram a diferença das falas de professores que
lecionam o Ensino Religioso com formação para os que não têm formação em
Ciências da Religião.
Então, quando encontramos professores de áreas de formação que
não sejam a licenciatura em Ciências da Religião, damos conta de que
a compreensão por parte de quem distribui essa disciplina repete o
gesto de quem interage com o Ensino Religioso conforme as condições
sócio-históricas do passado [...] (BENEVIDES, 2011, p,36).
Em outras palavras, há a necessidade de reconhecimento, por parte de quem
distribui essa disciplina, da legitimidade desse saber cientifico, como também o
conhecimento das diretrizes que regem este saber.
Identidades e trajetórias de professores do Ensino Religioso
O ER passou por diversas mudanças no decorrer de sua trajetória, do
proselitismo ao pluralismo, e nesta perspectiva também houve mudanças nas
identidades e trajetórias dos professores que atuam na disciplina. Os enunciados a
seguir apontaram o caminho o qual estes profissionais percorreram e as identidades
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
do novo professor do ER que para atuarem necessitam de formação. Identidades de
profissionais qualificados e preparados para o novo modelo de ensinar com base na
compreensão do fenômeno religioso nas escolas, tendo como base as diretrizes
básicas do ensino e o Pluralismo Religioso como novo modelo do ER. Parafraseando
Benevides (2011), o aprendizado se dá no campo das experiências e práticas,
vivenciadas ao lado da teoria, só assim esses profissionais estão aptos a atuarem
como professores dessa disciplina.
P1- Eu comecei a ensinar em 2009, depois que me formei em
Ciências da Religião pela Universidade do Estado do Rio Grande do
Norte. Prestei concurso para o Município de Natal, sendo aprovada e
convocada. Trabalho na Escola Municipal Professora Ivonete Maciel,
no bairro da Cidade da Esperança. Ensino nas turmas de ensino
fundamental I. As principais dificuldades considero o tempo de aula,
que é apenas de 45 a 50 minutos semanais, sendo empecilho para o
desenvolvimento de uma aula que atinja o objetivo desejado. E ainda
o não reconhecimento do ensino religioso como saber científico. Essa
é uma consequência da falta de conhecimento sobre as Ciências da
Religião
como
área
legítima
da
ciência.
A vantagem em ensinar essa disciplina é poder contribuir para que o
Ensino Religioso cresça, quebrando o preconceito pré-existente sobre
a disciplina, apesar do salário que não é nada atraente.
As atividades realizadas geralmente são parte de projetos temáticos
que desenvolvo, estabelecidos pelas áreas das ciências da religião.
São aulas, apresentações, exposições, entre outros. Considero
importante que conheçam modos de religiosidade diferentes do
ambiente o qual estão inseridos, e também temas como a tolerância
religiosa que podem colaborar para um bom convívio social e
religioso.
P2- Comecei como professora de Ensino Religioso em março de
2013 em escolas da rede municipal de Natal, o que mais me
incomodou foi o déficit que crianças de terceiro a quinto ano
enfrentam algumas até analfabetas, o que dificulta bastante o
planejamento fazendo com que tenhamos que criar atividades em
que todos possam participar, lembrando que temos apenas uma aula
em cada turma por semana, outro complicador a meu ver.
P3- Como Professora foi a profissão escolhida por opção de trabalho,
onde me realizo tanto profissional como pessoal. Fiz a opção em ser
professor na Área de Ensino Religioso por gostar de desafios e uma
constante busca pelo conhecimento.
Para ser professor de Ensino Religioso, o profissional tem que estar
em constantes pesquisas para acompanhar a evolução humana em
relação as suas dúvidas e angústias buscando saber qual sua origem
e sua importância na construção do planeta.
Possuindo como dificuldades acervos específicos para essa nova
metodologia onde o proselitismo não deve existir. Deve-se mostrar
aos docentes a beleza encontrada em cada prática religiosa,
possuindo o ser humano como ponto central de transformação.
Os discursos, acima, apontam um novo olhar para o ER, olhar voltado para o
saber plural, o qual se propõe a ensinar a docente que, em seu discurso, traz a marca
de uma formação acadêmica. Percebemos que ela respeita os valores das
FONAPER
comunidades religiosas, entende o papel do educador do ER, percebe e contribui para
a quebra do preconceito, como diz P1, ao mostrar sua importância no reconhecimento
da área. Enfatiza ainda que o profissional precisa estar em constante pesquisa e isso
deixa evidente que a formação não faz o professor o dono do conhecimento, mas que
este precisa estar em constante formação, renovando-se em saberes a cada dia mais.
Esses relatos faz-nos observar as transformações que, apesar de tardias, as
Ciências da Religião estão trilhando, mesmo faltando reconhecimento e espaços no
contexto escolar. Outro enfoque de suma importância é o posicionamento de P1,
quando registra o tempo de aula da disciplina Ensino Religioso – 45 a 50 minutos, por
semana, em cada turma. Esse tempo muitas das vezes se reduz a 30 ou 25 minutos
de aula, o que torna a aula improdutiva.
No depoimento de P3, encontramos outra dificuldade que interfere diretamente
nas práticas cotidianas: a questão do acervo, ou da falta dele, no ambiente escolar.
Para ela, além do pouco tempo para dar a aula, o professor conta também com a
necessidade de materiais para a produção de suas aulas, fato que inexiste na escola
pública, segundo os colaboradores deste estudo.
Considerações finais
Nos relatos deste artigo, percebemos que os caminhos percorridos pelo Ensino
Religioso desde sua formação prosélita até o novo paradigma que se compõe de
práticas pluralistas, apesar das dificuldades observadas no cotidiano da prática
docente. Notamos, nas investigações feitas, que há professores com formação
acadêmica atuando na área, contribuindo para a construção do novo caminho,
caminho este que está sendo percorrido por profissionais qualificados, conscientes de
seu papel como profissional das Ciências Humanas, embora ainda se encontrem
muitos profissionais de outras áreas atuando no Ensino Religioso.
Ao analisar o que é dito sobre as práticas desse componente curricular,
defendemos a necessidade de uma formação específica para o docente da área, por
entender sua importância para a sociedade atual. Do mesmo modo, a transposição
didática das Ciências da Religião para a disciplina de ER, como também orienta
Passos (2007), constitui um desafio primordial das Licenciaturas. De fato, essa
situação é uma problemática que necessita ser discutida entre as várias licenciaturas
de modo a se levar em consideração as questões epistemológicas quanto
metodológicas, com intuito de superar as indefinições de conteúdos curriculares e dos
modelos de práticas adotados em sala de aula.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Referências
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e epistemológica. In: FREITAS, Maria Tereza; JOBIM e SOUZA, Solange; KRAMER,
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BENEVIDES, Araceli Sobreira. Formação de professores e pesquisas em educação.
Fortaleza: Edições UFC, 2011. In:. SANTOS, Jean Mac Cole Tavares; ANDRADE,
Francisco Ari. Formação de Professores e Pesquisas em Educação. Fortaleza:
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Sérgio R. A.; MENEGHETTI, Rosa G. K.; WASCHOWICZ, Lílian A. Ensino Religioso
e sua relação pedagógica. Petrópolis, RJ: Editora Vozes, 2002.
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MOITA LOPES. Luiz Paulo da. Pesquisa interpretativista em Linguística Aplicada: a
linguagem como indicação e solução. D.E.L.T.A, 10(2): 1994, p. 329-338.
PASSOS, João Décio. Ensino Religioso: mediações epistemológicas e finalidades
pedagógicas. In: SENA, Luzia (org.) Ensino religioso e formação docente: ciências
da religião e ensino religioso em diálogo. 2. ed. São Paulo: Paulinas, 2006, p. 21-45.
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João Décio (org). Ensino Religioso: Construção de uma Proposta. São Paulo,
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TARDIF, Maurice. Saberes Docentes e Formação Profissional. 12º Ed. Petrópolis,
RJ: Vozes, 2011.
FONAPER
A FORMAÇÃO DO DOCENTE E O ENSINO RELIGIOSO
Joelita Farias Silva Lodi
Resumo:
O presente artigo está pautado na formação docente para a prática profissional da disciplina
Ensino Religioso do Ensino Fundamental das Escolas da rede pública. Conquanto, apresentase a trajetória do ensino religioso no Brasil desde o período colonial aos dias atuais, que teve
sua abordagem enraizada em um caráter doutrinário e catequético. Ao longo do tempo perdeu
sua identidade e seu papel no ambiente escolar. Ocorre que atualmente a LDB 9394/1996 põe
a disciplina como parte do núcleo comum da estrutura curricular das escolas públicas
brasileira, proibindo qualquer tipo de proselitismo. Outro ponto refere-se à ausência de
docentes qualificados para lecionarem o Ensino Religioso, prejudicando desse modo o estudo
do fenômeno religioso na sala de aula.
Palavras-chave: Aspectos Históricos. Ensino Religioso. Formação Docente.
INTRODUÇÃO
Sabe-se que estamos vivenciando novos tempos, novas expectativas e novos
valores. Porém, há por um lado uma sociedade extremamente consumista e
preocupada com os bens materiais. Por outro lado, há também uma busca pelo
entendimento da existência humana. Talvez seja essa a grande incógnita do homem
desde os seus primórdios. Daí sua aliança com o poder divino como forma de superar
obstáculos do dia a dia.
A partir desse pressuposto que o presente artigo vem trazer a discussão em
torno do Ensino Religioso nas escolas públicas brasileira, o qual objetiva o seguinte:
demonstrar a importância da formação do docente para a prática do Ensino Religioso
do Ensino Fundamental das escolas da rede pública brasileira; conhecer a trajetória do
Ensino Religioso no Brasil: do período colonial à atualidade; analisar a abordagem do
Ensino Religioso na Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional 9394/96 e nos
Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso; e compreender o Ensino
Religioso no espaço escolar brasileiro.
Primeiramente abordaremos sobre a trajetória histórica do ensino religioso no
Brasil, passando do período colonial até os dias atuais. Em seguida discorre-se sobre
a abordagem do Ensino Religioso na Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional
9394/96 e nos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso, bem como o
ensino religioso no ambiente escolar.

Graduação em Pedagogia. Especialização em Psicopedagogia. Especialização em Gestão
Educacional. Mestranda do Curso de Ciências das Religiões pela Faculdade Unida de
Vitória/ES. Docente da rede pública municipal e estadual de ensino Itabela/BA.
[email protected]
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
O ENSINO RELIGIOSO NO BRASIL
A Trajetória do Ensino Religioso no Brasil: do período colonial à atualidade
O Ensino Religioso começa sua trajetória da educação nacional, por meio das
relações estabelecidas entre o Estado Brasileiro e a Igreja Católica. Assim, nos
primeiros séculos da história do Brasil, período em que o Império e a Igreja se unem
na pretensão de desenvolver a ação colonizadora, deixou de levar em conta as
culturas dos africanos e indígenas, objetivando além da exploração de riquezas a
propagação do Evangelho.
Destarte, a obra de evangelização e educacional no Brasil começou com a
vinda dos jesuítas em meados do século XVI. No ano de 1550, com a criação das
primeiras escolas jesuítas, o Ensino Religioso passa a fazer parte da educação
brasileira, que tinha como premissa básica a adesão à cultura portuguesa e aos
princípios do catolicismo.
Segundo o PCNER (FONAPER, 2009, p. 22), de 1500 -1800 “a ênfase é a
integração entre Escola, Igreja, Sociedade política e econômica”. Neste período é
desenvolvido a evangelização dentro dos costumes da época, ou seja, a cristianização
por delegação pontifícia, autoridade de Roma, como justificativa do poder
estabelecido.
O que se desenvolve nesse período como Ensino Religioso é o Ensino da
Religião oficial, como evangelização dos gentios e catequese aos negros e combate à
Reforma Protestante através do movimento da Contrarreforma.
Ainda conforme os PCNER (FONAPER, 2009, p. 24) - de 1823 a 1889 - o
Ensino Religioso é dominado ao esquema de protecionismo da Metrópole. E para
confirmar a Constituição de 1824, mantém a “Religião Católica Apostólica Romana, a
religião oficial do Império em seu artigo 5º”. Assim, a religião passa a ser um dos
principais aparelhos ideológicos do Estado. O que se faz na Escola é o Ensino da
Religião Católica.
Segundo Souza (2006):
As intervenções e articulações da Igreja Católica passaram a ter
domínio na educação religiosa. O caminho passa ser exigente e
desafiador, a história indica experiências já executadas ou em
andamento, e, ao mesmo tempo, um olhar atento às artimanhas
políticas articuladas por instituições, lideranças que nada mais
buscam do que a coerência com seus próprios referenciais.
FONAPER
Como se vê a Igreja tinha total domínio sobre o processo educacional no Brasil,
e usou a educação como meio de proselitismo e para servir aos interesses da Coroa
Portuguesa.
No período da implantação da República (1890 -1930) Souza (2006) afirma
que:
O Ensino da Religião passa por questionamentos, uma vez tomado
como principal empecilho para a implantação do novo regime, em que
separação entre Estado e Igreja se dá pelo viés dos ideais
positivistas. E assim mesmo, perante a proclamada laicidade do
ensino nos estabelecimentos oficiais, o Ensino de Religião esteve
presente, pelo zelo de fidelidade dos princípios estabelecidos sob a
orientação da Igreja Católica.
Os primeiros passos do rompimento da educação religiosa dar-se em razão da
vontade da nova conjuntura política brasileira separar o Estado e a Igreja, uma vez
que o Estado Brasileiro se declarou laico e o ensino público deveria estar desraigado
de qualquer ideia de conversão religiosa.
Nesse período o Ensino da Religião Católica Romana passa por uma crise,
uma vez que o novo regime que surgiu, em 1891, pede a separação do Estado e da
Igreja. Em razão disto, passa a vigorar a seguinte expressão: “Será leigo o Ensino
ministrado nos estabelecimentos oficiais de ensino” (FONAPER, 2009, p. 15).
De 1930 a 1937 o Ensino Religioso é inicialmente admitido em caráter
facultativo, através do Decreto de 30 de Abril de 1931, por conta da Reforma de
Francisco Campos. Na Constituição de 1934 é assegurado nos termos do artigo 153: o
ensino religioso será de matrícula facultativa e ministrada de acordo com os princípios
da confissão religiosa do aluno, manifestada pelos pais e responsáveis e constituirá a
matéria dos horários nas escolas públicas primárias, secundárias, profissionais e
normais.
Com o Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova o Ensino Religioso passa a
ficar inexpressivo e perde autoridade no quadro das disciplinas. Subestima-se sua
falta em múltiplos sentidos, de forma paradigmática na organização do trabalho
escolar nos diversos níveis de ensino de modo independente, já que poderia constituir
verdadeiros canais para a comunicação entre a escola e a realidade. Isso leva a
reformulações
ou
atualizações
curriculares,
a
ausência
desta
disciplina
é
frequentemente interpretada como falta eminente da espiritualidade tanto por parte
dos educadores como educandos.
Com a Constituição de 1937, se perde a obrigatoriedade do ensino religioso
como elenca o artigo 133; “não poderá, porém constituir objeto de obrigação dos
mestres e professores, nem frequência compulsória por parte dos alunos”.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
No período do Estado Novo, os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino
Religioso, “fala que é efetivada a Reforma “Francisco Campos”. O Ensino Religioso
perde o seu caráter de obrigatoriedade, uma vez que não implica em obrigação para
professores e alunos” (FONAPER, 2009, p. 15), nos termos do artigo 133 da
Constituição de 1937.
Para Figueiredo (1995), o Ensino Religioso é admitido em caráter facultativo,
após amplas discussões a favor e contra sua inclusão na Carta Magna de 1934, o
artigo 153 da Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil pretendia
proteger:

O princípio da liberdade religiosa com a expressão “será de frequência
facultativa”;

A confessionalidade, com determinação da prática pedagógica - “ministrado de
acordo com os princípios da confissão religiosa do aluno”;

O direito de participação da família, com a expressão: “manifestada pelos pais
e responsáveis”;

A obrigatoriedade, na grade curricular, com o enunciado: “e constituirá matéria
dos horários nas escolas primárias, secundárias, profissionais e normais”
(FIGUEIREDO, 1995, p. 10-11).
Durante a Ditadura Militar na visão de Figueiredo (1995, p. 12), “por ser fruto de
uma outorga, o dispositivo constitucional garante o Ensino Religioso no sistema
escolar”.
No entanto, a prática, dá origem a muitos desafios de natureza pedagógica e
administrativa. Uma vez que, por mais que naquele período tenha sido iniciada a
busca de sua identidade, não há clareza em relação ao seu papel específico no
ambiente escolar. Há, contudo, um grande esforço de renovação da prática
pedagógica em relação a esse conteúdo na escola.
O Ensino Religioso procura restabelecer a dignidade, a harmonia e o valor do
Homem que cujo alvo é o apelo da própria vida, que busca desenvolver o
relacionamento espontâneo do ser humano com seus semelhantes e a natureza, sem
eliminar jamais, a sua individualidade.
A Constituição de 1967 e a de 1969 sob a Emenda Constitucional de 1969
apresenta o seguinte texto: “O ER de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos
horários normais das escolas oficiais de grau primário e médio...”.
Com a promulgação da Constituição de 1988, passou a ter a seguinte redação:
FONAPER
Art. 210 § 1º - “O Ensino Religioso, de matrícula facultativa, constituirá
disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental.”
(BRASIL, 1988). E a LDB Nacional 9394/96, modificada pela Lei 9475/97, segue o
mesmo texto, trazendo a compreensão do fenômeno religioso a partir do convívio
social do educando.
A Abordagem do Ensino Religioso na Lei de Diretrizes e Base da Educação
Nacional 9394/96 e os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso
Com a promulgação da Constituição Federal em 1988, através do artigo 210, §
1º, o Ensino Religioso passa a ser visto pelos seguintes termos: “O Ensino Religioso
de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas
públicas de ensino fundamental” (BRASIL, 1988).
Em seguida, começou a tramitar no Congresso, o Projeto de Elaboração da
nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação, que resultou na Lei 9394/96. Tratando o
Ensino Religioso, da mesma forma apresentado pela Constituição acrescido da
expressão “sem ônus para os cofres públicos” (artigo 33), que criou muita polêmica. A
versão final do artigo 33 ficou da seguinte forma: O ensino religioso, de matrícula
facultativa, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino
fundamental, sendo oferecido, sem ônus para os cofres públicos, de acordo com as
preferências manifestadas pelos alunos ou por seus responsáveis, em caráter,
confessional e interconfessional, resultante de acordo entre as diversas entidades
religiosas, que se responsabilizarão pela elaboração do respectivo programa.
Mas deve-se observar que a redação do artigo da LDB acima descrito,
apresenta o Ensino Religioso em duas formas: confessional e interconfessional, e, isso
poderia causar um tratamento desigual do Estado em relação às diversas igrejas,
sendo que a subvenção seria desproporcional à demanda. Outra coisa seria a inclusão
da expressão “sem ônus para os cofres públicos”, que poderia causar dificuldades
para a organização e sistematização da prática pedagógica deste ensino na escola.
Diante das discussões suscitadas, o artigo 33 da LDB foi modificado por meio
da Lei nº. 9475/97 alterando a LDB n. 9394/96. Concebendo o Ensino Religioso como
disciplina escolar, passando a ser vista como uma área de conhecimento e como parte
integrante da formação básica do cidadão.
1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a
definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as
normas para a habilitação e admissão dos professores.
§ 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas
diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos
do ensino religioso.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
O mencionado substitutivo de certa forma aparece de forma mais avançada,
em
que
respeita
a
diversidade
cultural
religiosa;
se
responsabiliza
pela
regulamentação dos procedimentos para a definição dos conteúdos do Ensino
Religioso; assume a elaboração de normas para a habilitação e admissão dos
professores e determina o ônus para o cofre público.
O Ensino Religioso no Espaço Escolar
“A escola é um espaço de construção de conhecimento e partindo do
pressuposto que todo conhecimento humano é patrimônio da humanidade, o
conhecimento deve ser ensinado na escola” (FONAPER, 2009, p. 34-45).
Nesse sentido, o conhecimento religioso enquanto patrimônio da humanidade
necessita estar disponível ao aluno. O ensino religioso tem como característica a
busca de compreensão do homem, explorando temas de seu interesse, de forma
interdisciplinar, com estratégias que considerem este novo perfil de indivíduos,
estimulando, sobretudo, o diálogo.
Assim, o ensino religioso a ser praticado em um Estado laico é o não
confessional, em que os professores ingressam através de concursos públicos, sem
que esteja arraigado suas próprias religiões. Se a Constituição veda expressamente
em seu artigo 19, inciso I, “que o Estado mantenha qualquer tipo de aliança com
igrejas e cultos religiosos, é inadmissível que o professor de uma escola pública possa
ser indicado por qualquer confissão religiosa”. 38
Portanto, o currículo da disciplina de ensino religioso deve abordar não só as
religiões majoritárias como o catolicismo e o protestantismo, mas também o
espiritismo, a umbanda, o candomblé e todas as outras religiões praticadas no Brasil,
bem como o ateísmo e o agnosticismo. Aos docentes não cabe praticar o proselitismo,
a estes cabem tão somente expor a história e os dogmas dessas religiões sem
qualquer juízo de valor de qual seria a melhor ou a pior.
O ensino religioso nas escolas públicas não deve se converter em um
instrumento de proselitismo do cristianismo. As instituições de ensino não poderão
utilizar a sala de aula como local para orações nem para catecismos. A razão disso é
que a Constituição criou um Estado laico, porém paralelamente estabeleceu o ensino
religioso nas escolas públicas, com intuito de “permitir às crianças tomar conhecimento
38VIANA,
Túlio. O ensino religioso nas escolas públicas. Disponível em
<http://www.revistaforum.com.br/blog/2013/01/o-ensino-religioso-nas-escolaspublicas/>. Acesso em 15 de maio de 2014.
FONAPER
de que existem religiões e crenças distintas daquelas praticadas por seus familiares e
aprender a respeitá-las” (VIANNA).
Como diz o parecer CP/CNE nº 05/97:
A Constituição apenas reconhece a importância do ensino religioso
para a formação básica comum do período de maturação da criança
e do adolescente que coincide com o ensino fundamental e permite
uma colaboração entre as partes, desde que estabelecida em vista do
interesse público e respeitando – pela matrícula facultativa – opções
religiosas diferenciadas ou mesmo a dispensa de frequência de tal
ensino na escola (BRASIL,1997).
É na proposta pedagógica que os estabelecimentos de ensino deverão dispor o
seu currículo, a seleção e organização dos conteúdos. Há um discurso de que a
prática pedagógica do ER é neutra. Contudo, sabemos que a atuação dos professores
é moldada de acordo com o modelo de concepção religiosa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Entende-se por fim que o Ensino Religioso no âmbito escolar deve ser na
verdade uma proposta plural e dialética que poderá contribuir de forma afirmativa para
a formação do indivíduo. No mais, procurou-se conhecer o desenvolvimento histórico
do Ensino Religioso, sempre fazendo a relação presente / passado e sua importância
na vida do ser humano. Recomenda-se que seja feito este tipo de estudo na formação
docente, uma vez que poderá ser útil a todos àqueles que estão inseridos no cotidiano
da escola e, também, àqueles que estão abertos à pluralidade cultural e religiosa.
REFERÊNCIA
BRASIL.Constituição
Senado, 1998.
da
República
Federativa
do
Brasil.
Brasília,
DF,
________. Ministério da Educação, Conselho Nacional de Educação, Parecer CP/CNE
05/97, sobre formação de professores para o ensino religioso na escola pública
do ensino fundamental.
_________. Câmara de Educação Básica, Parecer 012/97, esclarecendo dúvidas
sobre a Lei nº 9.394/96, em complemento ao parecerCEB/05/97.
_________. Parecer 016/98, sobre carga horária do ensino religioso no ensino
fundamental.
_________. Conselho Pleno, Parecer 097/97, sobre a formação de professores
para o ensino religioso na escola pública do ensino fundamental.
FIGUEIREDO, Anísia de Paulo. Ensino Religioso: perspectivas pedagógicas.
Petrópolis: Vozes, 1994.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
FONAPER, Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso.Parâmetros
Curriculares Nacionais: Ensino Religioso.. 9.ed. São Paulo: Mundo Mirim, 2009.
SOUZA, Rodrigo Augusto de Souza. O Ensino Religioso no Brasil: Uma
Abordagem Histórica a partir dos Parâmetro Curriculares Nacionais. Disponível
em
<http://www.pucpr.br/eventos/educere/educere2006/anaisEvento/docs/CI-115TC.pdf>. Acesso em: 11 de maio de 2014.
VIANA, Túlio. O ensino religioso nas escolas públicas. Disponível em:
<http://www.revistaforum.com.br/blog/2013/01/o-ensino-religioso-nas-escolaspublicas/>. Acesso em 15 de maio de 2014.
FONAPER
A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE ENSINO RELIGIOSO: CONSIDERAÇÕES
SOBRE A INTERPRETAÇÃO DAS VIVÊNCIAS RELIGIOSAS NO PROCESSO
EDUCATIVO
Marcos Porto Freitas da Rocha - UFRJ / UNIGRANRIO39
José Geraldo da Rocha- UNIGANRIO40
Jacqueline de Cássia Pinheiro Lima - UNIGRANRIO41
Cleonice Puggian - UERJ / UNIGRANRIO42
Resumo
O artigo discute aspectos da formação do professor de ensino religioso (ER) pelo pressuposto
de que seu objeto compreende o estudo das diferentes manifestações do transcendente.
Descreve resultados de um levantamento bibliográfico de artigos científicos e livros, bem como
dos Parâmetros Curriculares Nacionais e Lei 9394/96. Nele destacam-se as proposições de
Wachs sobre a identidade destes docentes e as características de sua prática, considerando a
interpretação das vivências religiosas no processo formativo. Esta pesquisa possibilita
argumentar que o atual processo de formação deve contribuir para constituição de docentes
sensíveis e equilibrados na mediação das relações com o fato religioso na pluralidade do
cotidiano educacional, incentivar ações e reflexões contextualizadas, críticas, dialógicas,
prazerosas, criativas e comprometidas com defesa da vida, inerentes a uma dimensão de
esperança.
Palavras chave: Formação. Identidade docente. Ensino Religioso. Prática docente.
Introdução
Neste artigo, abordamos a formação e identidade do professor do Ensino
Religioso (ER) partindo do pressuposto de que lidamos com o fenômeno religioso
observável na cultura, história, vida social e educacional, entendendo também que
39
Marcos Porto Freitas da Rocha. Mestrando pelo Programa de Pós Graduação Interdisciplinar
em Letras e Ciências Humanas – PPGLCH. Universidade do Grande Rio – UNIGRANRIO.
Especialista em Ciências da Religião pela Faculdade São Bento do Rio de Janeiro – FSBRJ.
Especialista em Gestão da Universidade Pública Federal pela Universidade Federal do Rio de
Janeiro – UFRJ. Bacharel em Teologia pelo Instituto Metodista Bennett do Rio de Janeiro –
BENNETT. Chefe de Atividades Gerenciais do Campus UFRJ – Xerém da Universidade
Federal do Rio de Janeiro – UFRJ. E-mail: [email protected].
40 José Geraldo da Rocha. Doutor em Teologia pela PUC do Rio de Janeiro e Professor
Adjunto Dr. do Programa de Pós Graduação Interdisciplinar em Letras e Ciências Humanas
da Universidade do Grande Rio - UNIGRANRIO. Líder do Grupo de Pesquisa Relações
Raciais, Desigualdades Sociais e Educação no CNPq. Bolsista de Produtividade em Pesquisa
-(FUNADESP/UNIGRANRIO). E-mail: [email protected].
41 Jacqueline de Cássia Pinheiro Lima. Doutora em Sociologia pelo Instituto Universitário de
Pesquisas do Rio de Janeiro (2006). Bolsista de Produtividade em Pesquisa 1A UNIGRANRIO/FUNADESP. Membro da Diretoria da ANINTER-SH. Coordenadora do
Programa de Pós Graduação em Letras e Ciências Humanas, UNIGRANRIO. E-mail:
[email protected].
42 Cleonice Puggian. Jovem Cientista do Nosso Estado (FAPERJ 2013-2016) e Bolsista de
Produtividade em Pesquisa 1B - UNIGRANRIO/FUNADESP. Doutora em Educação
(Universidade de Cambridge, Inglaterra, 2009). Lidera o grupo de pesquisa Relações Raciais,
Desigualdades Sociais e Educação (CNPq). É docente da Faculdade de Formação de
Professores da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ-FFP) e do Mestrado
Interdisciplinar em Letras e Ciências Humanas, da Universidade do Grande Rio
(UNIGRANRIO). E-mail: [email protected].
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
este ultrapassa a organização e a institucionalização das religiões. Logo, o
componente curricular do Ensino Religioso não deve se restringir à introdução às
Ciências das Religiões e nem à confessionalidade religiosa. Consideramos que o
objeto do Ensino Religioso é mais amplo do que propriamente as religiões: ele
compreende o estudo sobre as diferentes formas e manifestações do religioso e do
transcendente que devem estar presentes no processo da formação dos professores
de Ensino Religioso, como veremos a seguir.
O espaço escolar é constituído de diferentes formas de manifestações da
religiosidade popular e do fenômeno religioso presentes na vida dos indivíduos. Logo,
não é possível desconsiderar a experiência religiosa do estudante de um curso de
magistério e de licenciatura que poderá tornar-se um professor de ensino religioso.
Ensino Religioso na formação docente
Educadores e pesquisadores como Paulo Freire (1996) afirmavam que a
educação não é neutra, sendo necessário considerar o que está por trás das
manifestações das pessoas, mesmo que estas não possuam plena consciência do
sentido de seu discurso e das influências por elas provocadas.
Isto também acontece quando se trata do Ensino Religioso. Uma pessoa, seja
docente ou discente, ao ingressar em sala de aula transporta consigo as experiências
religiosas, as percepções sobre as manifestações do fenômeno religioso, as crenças
advindas da religiosidade popular assim como as crenças de caráter psicológico e
antropológico, a ainda suas convicções existenciais.
É comum ouvir pessoas que afirmam ser contra a igreja, mas que creem em
Deus. Ou outros que se declaram ateus por afirmarem ser ultrapassado o ensino das
igrejas; contudo, fazem preces diárias a Deus. Ou ainda que não acreditam na
existência de um Deus, por não conseguir prová-la, mas acreditam em uma energia
cósmica, mesmo afirmando também não poder provar a existência desta energia.
Segundo Wachs (2010), é preciso ajudar as pessoas do meio educacional a
perceber que o elemento religioso pode ser encontrado em diversos segmentos da
vida humana, tais como na história, cultura, vida social e na organização temporal e
espacial da humanidade. O objeto do ensino religioso é o fenômeno religioso e não se
restringe ou reduz à manifestação da religião por meio de uma instituição organizada,
um pensamento ou doutrina de um grupo religioso específico ou ainda por meio da
história das religiões.
FONAPER
É plenamente possível constatar que grande parte do material didático de
Ensino Religioso enfoca a temática como uma introdução à Ciência das Religiões e,
consequentemente, aborda o fenômeno religioso como um elemento meramente
antropológico, cultural e social. Sua abordagem do fenômeno religioso acaba por ser
superficial no que se refere à presença deste nas crenças populares e nas
manifestações culturais. Essas, algumas vezes, são compreendidas como algo
exótico, da marginalidade, folclórico ou que situam-se na periferia do conhecimento.
Segundo Wachs (2010, p. 63), a prática docente em ensino religioso na
perspectiva da legislação vigente em conjunto com a diversidade religiosa no Brasil
será possível apenas quando o professor de ensino religioso considerar seu
imaginário religioso, conceito, concepções e pré-conceitos, uma vez que, no dia a dia,
este experimentará a possibilidade de ressignificação, diálogo e confronto com a
diversidade religiosa presente em sala de aula.
O fenômeno religioso também precisa ser abordado na dimensão da revelação,
pois nas diferentes matrizes religiosas presentes no Brasil o fenômeno religioso lida
com a revelação do transcendente, mesmo que compreendido de diversas formas
como o Transcendente, ou como transcendentes, ou ainda como a manifestação
antropológica do transcendente do próprio indivíduo. Este fenômeno integra as
diferentes dimensões como fato social, cultural, histórico e até antropológico, mas não
se restringe a elas.
Não se confunda a observação da revelação do transcendente com a
promoção desta em sala de aula, nem o proporcionar da uma experiência mística ou
não com o(s) T(t)ranscendente(s). Trata-se do exercício de romper com uma visão
cientificista da religião e do fenômeno religioso. É um foco de pesquisa que considera
e integra a dimensão da pessoalidade, da subjetividade e que ainda se preocupa em
assegurar o rigor metodológico de investigação.
O objeto de trabalho nas aulas de ensino religioso são pessoas que se
envolvem de forma subjetiva e pessoal com fatos concretos e objetivos. Nenhuma
delas é neutra, nem na escolha da temática, nem na definição da metodologia da aula,
nem na abordagem pessoal em sala de aula e nem na atitude diante da diversidade
religiosa (WACHS, 2010, p. 64). É preciso trabalhar o professor no intuito de ajudá-lo a
ter clareza e consciência das suas opções e abordagens.
É necessário conscientizar o docente de que a ação educativa no Ensino
Religioso, independentemente de credo, é uma ação de amar o outro, de escolher
respeitar a diferença como identificação de proximidade, algo que nos permita nos
enxergar em cada próximo. Bauman (2004, p. 46) afirma em relação ao ato de amar
ao próximo que:
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Eles o merecem se são tão parecidos comigo de tantas maneiras
importantes que neles posso amar a mim mesmo; e se são tão mais
perfeitos do que eu que posso amar neles o ideal de mim mesmo...
Mas, se ele é um estranho para mim e se não pode me atrair por
qualquer valor próprio ou significação que possa ter adquirido para a
minha vida emocional, será difícil amá-lo (BAUMAN, 2004, p. 46).
Da mesma forma, é preciso considerar o diálogo sobre a expressão de fé dos
alunos, nunca considerando-os como meros baús contendo um conhecimento que não
interfere em sua vida pessoal. É preciso lidar com sabedoria no que diz respeito à
manifestação da busca e da revelação, em especial quanto ao respeito à diversidade
religiosa e ao espaço público e à inclusão das diferentes matrizes religiosas.
Prática, Formação e Identidade
A prática docente advém da concepção educacional que determina a
compreensão dos papéis sociais que diferenciam docentes e discentes, da
metodologia, função social da escola e dos conteúdos a serem abordados. Discutir tais
questões nos possibilita explicitar pressupostos pedagógicos inerentes à atividade de
ensino que persigam a coerência entre o que se pretende fazer e o que realmente se
faz.
Esta prática é constituída a partir das concepções educativas e das
metodologias de ensino que perpassam a formação educacional e o histórico
profissional do professor, nela incluem-se suas experiências escolares e de vida, a
ideologia que compartilha com seu grupo social e ainda as tendências pedagógicas
que são contemporâneas a este (PIMENTA; LIMA, 2004).
Tanto nas escolas privadas como nas públicas, as tendências pedagógicas, na
maioria dos casos, não se apresentam em sua forma pura, mas com características
singulares que, muitas das vezes, mesclam aspectos de mais de uma linha
pedagógica.
O docente é visto, desta forma, como mediador no processo de busca do
conhecimento que se deve iniciar no discente. Ao primeiro cabe organizar, coordenar
e mediar a situações de aprendizagem, promovendo adaptações em suas práticas
conforme as características individuais dos discentes, visando o desenvolvimento de
suas capacidades e habilidades humanas e intelectuais (OLIVEIRA et al., 2007, p.
120). Os professores de ensino religioso precisam estar plenamente inseridos no
contexto das escolas para que isto ocorra, preferencialmente sem privilégios ou
discriminações de qualquer natureza.
FONAPER
Deve ser observado o princípio metodológico da dialogicidade freireana na
ação docente (FREIRE; SHOR, 1996). A experiência proporcionada por este princípio
cria um ambiente educativo próprio que permite às pessoas expressarem o seu
sentimento e revelarem o que os move intimamente.
Além disto, deve-se acrescentar a hermenêutica de Paul Ricoeur, para nos
fundamentarmos na importância da interpretação da fala das pessoas. No livro Da
Interpretação, ele afirma que a “reflexão é a apropriação de nosso esforço para existir
e de nosso desejo de ser, através das obras que dão testemunho desse esforço e
desse desejo” (RICOEUR, 1977, p. 48). E ainda, que a reflexão “possibilita-nos
entrever o lugar da interpretação do conhecimento de si mesmo” (RICOEUR, 1997, p.
46).
Ricoeur (1997) propõe uma hermenêutica restauradora do sentido, de índole
transcendental, em que as categorias de apropriação de sentido, da autonomia do
texto e da auto compreensão perante o texto são essenciais. Para ele, a interpretação
de um texto não se finda na interpretação e na compreensão do texto em si, mas deve
ser considerada como uma ação significativa que culmina numa melhor interpretação
de si mesmo (RICOEUR, 1997, p. 50).
Neste sentido, então, a aula de Ensino Religioso como espaço da manifestação
da experiência religiosa pessoal torna-se fundamental para que docentes e discentes
promovam a ressignificação de sua trajetória pessoal. Para tanto, o respeito e o
diálogo são basilares para a construção de um ambiente de acolhimento e abertura
para a diversidade.
Se faz mister reconhecer que, ao longo da história deste componente
curricular, a formação docente específica sempre foi uma das maiores preocupações,
embora esta tenha sido marcada por conflitos ideológicos e políticos devido à
dificuldade da definição clara da identidade pedagógica da disciplina.
Uma das temáticas mais fortes que permeou a reforma educativa brasileira
iniciada na década de 80 abordava a pluralidade cultural-religiosa presente nas
escolas brasileiras – logo, uma proposta de Ensino Religioso que integrasse este
referencial se fez necessária. A reflexão sobre o ensino religioso que considerava esse
contexto propiciava uma abordagem da disciplina em que o acesso ao conhecimento
religioso sistematizado historicamente pela humanidade fosse assegurado a todo
cidadão (OLIVEIRA et al., 2007, p. 120).
Esta discussão influenciou a alteração do art. 33 da LDBEN 9394/96 e a
elaboração dos PCNER, além da instituição das Diretrizes Curriculares Nacionais
(Resolução CEB 02/98) que contemplaram as aspirações da sociedade brasileira
quanto à pluralidade no Ensino Religioso (CARON, 1997).
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Ainda conforme Caron (1997), até a década de 90, a formação de docentes de
ensino religioso era orientada, em sua maioria, pelas denominações religiosas em
parceira com os sistemas de ensino. Independentemente de optar pelo padrão
confessional ou interconfessional adotado pelos sistemas em consonância com a
legislação em vigor, é necessário destacar o interesse e participação maciça das
denominações cristãs na formação destes professores, em especial da Igreja Católica
Apostólica Romana, e das igrejas de confissão cristã protestante.
Foram desenvolvidos cursos de Teologia, Ciências Religiosas, Catequese,
Educação Cristã e outros semelhantes no intuito de oferecer formação contínua a
estes profissionais. Porém, ao inverso do que ocorria com os profissionais da
educação de outras disciplinas, estes não graduavam os professores, acarretando
impasses e dificuldades em sua vida funcional (JUNQUEIRA; OLIVEIRA; RISKEKOCH, 2006).
Os professores com graduação reconhecida pelo Ministério de Educação e
Cultura (MEC) possuíam o direito de concorrerem a cargos públicos e à progressão
funcional, o que não ocorria com os de ensino religioso, pois seus cursos teológicos
não possuíam este reconhecimento (OLIVEIRA, 2003). Contudo, hoje já vigora o
reconhecimento de curso de Teologia pelo referido ministério, o que vem promovendo
mudanças nesta situação.
Em 1996, a Universidade Regional de Blumenau (FURB), a Universidade da
Região de Joinville (UNIVILLE) e a Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL)
elaboraram e aprovaram projetos de criação de curso superior para a área de
Educação Religiosa. Isto assegurou, pela primeira vez na história brasileira, os direitos
concernentes aos profissionais de educação que neles se graduassem e garantiu à
sociedade brasileira uma formação para a cidadania que integrasse o estudo do
fenômeno religioso em sua pluralidade cultural.
Outros estados da federação e instituições seguiram o pioneirismo de Santa
Catarina e elaboraram cursos de licenciatura em Ensino Religioso ou adequaram
cursos existentes à legislação em vigor. O envolvimento de universidades, secretaria
de educação, do Fórum Nacional de Pesquisa do Ensino Religioso (FONAPER) e de
grupos educacionais e religiosos não se limitou à formação inicial de docentes de
Ensino Religioso, mas ampliou-se através de propostas e ações de formação
continuada e pesquisa nesta área do conhecimento.
Segundo o FONAPER, a atual proposta de ensino religioso prevê um
profissional de educação com:
[...] formação adequada ao desempenho de sua ação educativa;
abertura ao conhecimento e aprofundamento permanente de outras
FONAPER
experiências religiosas além da sua; consciência e espírito sensível
voltados à complexidade e pluralidade da questão religiosa;
disposição para o diálogo, com capacidade de articulá-lo à luz das
questões suscitadas no processo de aprendizagem dos estudantes;
uma vivência de reverência à alteridade; capacidade de ser o
interlocutor entre escola e comunidade, reconhecendo que a escola
propicia a sociabilização do conhecimento religioso sistematizado, ao
passo que a família e a comunidade religiosa são espaços
privilegiados para a vivência religiosa e para a opção de fé.
(FONAPER, 1997).
A concepção de licenciatura em ensino religioso constrói-se numa relação
íntima e profunda com os conhecimentos e saberes inerentes à área, em harmonia
com debates e a legislação para formação dos profissionais da educação brasileira,
com a produção e pesquisa científica e também no entendimento de que uma
formação continuada é imprescindível.
O professor de ensino religioso é um indivíduo que, em relação com os
conhecimentos próprios da área e com os discentes, desempenha importante
contribuição nos diversos processos de aprendizagem realizados da mesma forma
que os demais profissionais na unidade escolar o fazem em suas áreas. É necessário
que consiga desencadear e ativar processos dialógicos em que confrontos abertos e
construtivos entre discentes, conhecimentos e docentes resultem em rigoroso respeito
à liberdade e à consciência de cada um.
A pesquisa e a abertura à contemplação e ao religioso precisam promover e
sustentar uma compreensão do desenvolvimento da religiosidade sob a perspectiva da
construção da autonomia e liberdade dos sujeitos comprometidos com a vida
planetária (OLIVEIRA et al., 2007, p. 125).
O atual processo de formação docente para o ensino religioso deve contribuir
para a constituição de profissionais com discernimento, sensibilidade e equilíbrio na
mediação das relações com o fato religioso em suas diferentes manifestações no
cotidiano educacional. Deve ainda incentivar uma visão de totalidade, através de
ações e reflexões contextualizadas, críticas, dialógicas, prazerosas, investigativas,
criativas e comprometidas com defesa da vida nas suas múltiplas manifestações,
inerentes a uma dimensão de esperança.
Entretanto, diversas linhas ainda estimulam uma ação nesta disciplina baseada
na visão de ela proporcionaria um espaço legítimo de doutrinamento. É possível,
inclusive, identificar com facilidade professores que aderem a tais linhas em
contrariedade à legislação vigente, muitos destes por desconhecerem o fazer docente
diferenciado que se expressa na legislação, mas outros ainda por não crerem na
escolarização do Ensino Religioso.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
O FONAPER propôs dois critérios para avaliação da formação docente de
Ensino Religioso que se somam aos esforços empreendidos para evidenciar o perfil
deste profissional segundo a interpretação da legislação em vigor. São eles:
a) ahonestidade científica do profissional, que exige: a constante
busca do conhecimento religioso; o entendimento da complexidade
do conhecimento do fenômeno religioso; a capacidade de viver a
reverência à alteridade; o reconhecimento da família e da
comunidade religiosa como espaços privilegiados para a vivência
religiosa e para a opção de fé; o propósito de estar a serviço da
liberdade do estudante; o aperfeiçoamento nas cinco áreas temáticas
do estudo do fenômeno religioso (Fundamentos Epistemológicos do
Ensino Religioso, Culturas e Tradições Religiosas, Textos Sagrados,
Teologias e Ethos);
b) a competência profissional, que exige do professor: a
compreensão do fenômeno religioso, contextualizando-o espacial e
temporalmente; a configuração do fenômeno religioso por meio das
ciências da tradição religiosa (religião); o conhecimento da
sistematização do fenômeno religioso pelas tradições religiosas e
suas teologias; a análise do papel das tradições religiosas na
estruturação e manutenção das diferentes culturas e manifestações
socioculturais; a exegese dos textos sagrados orais e escritos das
diferentes matrizes religiosas (africana, indígena, ocidental e oriental);
a compreensão do sentido da atitude moral como consequência do
fenômeno religioso sistematizado pelas tradições religiosas e como
expressão da consciência e da resposta pessoal e comunitária das
pessoas (FONAPER, 2000).
O resultado destas iniciativas é evidenciado em pesquisas, organizações de
publicações, cursos e eventos que têm como objetivo favorecer o surgimento de um
profissional do ensino religioso diferenciado.
Na década de 90, várias editoras abriram espaços para a discussão sobre
questões pertinentes ao Ensino Religioso e formação de docentes da área. Dentre os
objetivos destas experiências evidenciamos a formação pessoal de profissionais, a
discussão sobre a identidade deste componente curricular, suas metodologia,
conteúdo e linguagem, e ainda a articulação deste componente com os demais
(OLIVEIRA et al., 2007, p. 127).
Assim, autores e professores como Oliveira, Batista, Blanck, Boff, Cruz, Cunha,
Figueiredo, Junqueira, Silva, Wachs, Fuchs, Keim, Klein, Reblin e outros teceram e
registraram a história do Ensino Religioso no Brasil.
Contudo, ainda que tenham sido muitos os esforços para estruturar uma
identidade para o ensino religioso e para a formação docente para esse componente
curricular, deve-se reconhecer que, desde seu início, estas iniciativas se revestem de
um caráter eminentemente político em detrimento de pedagógico, o que favorece um
embate que perdura e que tardará em ser resolvido.
FONAPER
Considerações finais
Atualmente, professores e disciplina de Ensino Religioso encontram-se em
uma constante encruzilhada entre o novo e o velho, o estabelecido e o desafiador, o
solidificado e o fluído. É provável que a sabedoria se sustente em aproveitar de
ambos, aquilo que permanece válido, ou seja, princípios que, na ebulição do tempo,
despidos de vestes históricas e contextuais, possuam o poder de enunciar, desafiar e
denunciar outras perspectivas, que vão ao encontro e promovam vivências
pedagógicas e didáticas inovadoras e ainda que valorizem e respeitem as
diversidades e o diferente.
A formação da identidade docente encontra-se em constante transformação,
num processo contínuo de permanente inconclusão. Ela se constitui por intermédio
das significações sociais, revisão das tradições e reafirmação de práticas, e ainda
pelas vivências do professor enquanto estudante que permitem a este posicionar-se
em relação ao meio onde atua.
Do mesmo modo que um adolescente é influenciado pelas referências
pessoais únicas que vivencia em sua formação rumo ao amadurecimento para a idade
adulta, e que em comparação com as dos outros, o auxiliam num processo de
autoconhecimento, o mesmo ocorre ao docente, que realiza semelhante dinâmica
interna. A partir de sua autoimagem, este posiciona-se no contexto escolar e
ressignifica experiências e lembranças, remodelando sua identidade num processo
ininterrupto e legitimado pelo contexto em que vive.
Referências
BAUMAN, Zygmunt. Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2004.
_______, Zigmunt. Identidade. Tradução de Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar Editor, 2005.
BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Diretrizes e bases da educação
nacional.
(LDB/96
–
LDBEN/96)
Disponível
em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm> Acessado em 30 de maio de
2014.
CARON, L. (Org.) O Ensino Religioso na nova LDB: histórico, exigência,
documentário. Vozes, Petrópolis, 1997.
FONAPER (Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso)
Curriculares Nacionais do Ensino Religioso. São Paulo, Ave Maria, 1997.
Parâmetros
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
_______. Ensino Religioso: referencial curricular para a proposta pedagógica da
escola. São Paulo, 2000.
FREIRE, Paulo; SHOR, Ira. Medo e ousadia: Cotidiano do professor. 4. ed. Paz e
Terra, Rio de Janeiro, 1996. (Coleção Educação e Comunicação, v. 18).
JUNQUEIRA, S. R. A. OLIVEIRA, Lilian, RISKE-KOCH, Simone. A. A formação do
professor de Ensino Religioso em Santa Catarina: uma leitura histórica. In:
CONGRESSO LATINO-AMERICANO SOBRE RELIGIÃO E ETNICIDADE, 11., 2006,
São Bernardo. Mundo Religiosos: identidade e convergências. ALER, São Bernardo,
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OLIVEIRA, Lilian Blanck de. Formação de docentes para o Ensino Religioso:
perspectivas e impulsos a partir da ética social de Martinho Lutero. 2003. Tese de
doutorado – EST: IEPG, São Leopoldo.
_______, Lilian Blanck de. JUNQUEIRA, Sérgio Rogério Azevedo. ALVES, Luiz
Alberto Sousa. KEIM, Ernesto Jacob. Ensino Religioso no Ensino Fundamental.
Coleção Docência em formação: Série ensino fundamental. São Paulo, Cortez, 2007.
PIMENTA, Selma G. LIMA, Maria S. L. Estágio e docência. Cortez, São Paulo, 2004.
(Docência em Formação).
RICOEUR, Paul. Da Interpretação: ensaio sobre Freud. Imago, Rio de Janeiro, 1977.
WACHS, Manfredo Carlos. A pessoa do professor e a religiosidade: conflitos e práticas
em sala de aula. In: Ensino Religioso: Religiosidade e práticas educativas. WACHS
(Org.) Sinodal, São Leopoldo, 2010.
FONAPER
O PERFIL DO PROFESSOR DE ENSINO RELIGIOSO DO ESTADO DO PARÁ
Maria de Lourdes Silva Santos (UEPA) 43
Iolanda Rodrigues da Costa (UEPA) 44
Rosilene Pacheco Quaresma (UEPA) 45
Iris Larisse de Aguiar (UEPA) 46
Resumo:
O projeto de pesquisa intitulado “Perfil do Professor de Ensino Religioso do Estado do Pará”
objetiva Identificar o perfil dos professores de Ensino Religioso que atuam nas escolas de
educação básica no Estado, bem como, oferecer alguns indicativos para as políticas públicas
voltadas para a formação dos educadores que atuam nessa área de conhecimentos. O estudo
foi realizado por meio de uma pesquisa de campo, dentro de uma abordagem quantiqualitativa. A coleta de dados foi realizada por meio da técnica de aplicação de formulário,
contendo questões fechadas, bem como, pelo levantamento de dados junto ao setor de lotação
das Secretarias de Educação. Os dados estão sendo sistematizados em gráficos estatísticos. A
amostra envolveu no mínimo 50% dos professores de ensino religioso, tanto da rede pública
como da rede particular de ensino. A coleta de dados foi feita pelos acadêmicos do curso de
Licenciatura em Ciências da Religião da UEPA (PARFOR e Regular), e bolsista do PIBIC. Os
resultados da pesquisa encontram-se em fase de sistematização e análise e serão divulgados
e discutidos por meio de palestras junto às Secretarias de Educação (Estadual e municipais), e
Conselhos Municipais de Educação, além de outros eventos educacionais dentro e fora do
Estado.
Palavras-chave: Formação de Professores. Ensino Religioso. Perfil Docente
INTRODUÇÃO
São inúmeras as competências que se exige atualmente para a atuação do
professor no sentido de responder aos desafios da sociedade atual, exigências estas
que têm provocado certa “crise de identidade do magistério” (CANDAU, 1977), uma
vez que demandam a necessidade de estabelecer rupturas com concepções e
práticas historicamente arraigadas, impregnadas de um modelo positivista de pensar e
agir no e sobre o mundo.
Esse “dever ser” do novo perfil do professor aponta para uma postura mais
aberta, crítica, participativa e propositiva no contexto escolar, ampliando suas
43
Doutora em Educação (PUC/RJ), Mestra em Educação (UNIMEP/Piracicaba), Licenciada em Pedagogia
(UFPA), professora do Curso de Licenciatura Plena em Ciências da Religião (UEPA).
[email protected]
44
Mestra em Educação (UNIMEP/Piracicaba), Especialista em Ensino Fundamental (UNAMA/PA),
Licenciada em Pedagogia (UFPA), professora do Curso de Licenciatura Plena em Ciências da Religião
(UEPA) [email protected]
45
Especialista em Educação e Problemas Regionais (UFPA), Licenciada em Pedagogia (FICOM/PA),
professora do Curso de Licenciatura Plena em Ciências da Religião (UEPA) [email protected]
46
Graduanda do Curso de Licenciatura Plena em Ciências da Religião (UEPA),bolsista do
[email protected],.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
atribuições e competências para além dos limites da sala de aula, envolvendo ações
tanto no âmbito da organização do trabalho pedagógico como da gestão escolar, além
da produção de saberes docentes advindos da reflexão sobre as experiências
vivenciadas ao longo da prática docente, bem como de estudos e trocas de
experiência com outros educadores. O perfil profissional dos professores é também
marcado pelo seu contexto de vida pessoal, cuja realidade exerce influência sobre o
seu desempenho.
Ferreira (2003) aponta que até o final dos anos 60, a escassez de estudos
sobre a temática formação de professores e, sobretudo, a ênfase dada a essa
formação, era sentida em vários países. Durante décadas, a falta de interesse e de
financiamento para pesquisar questões relacionadas com a educação de um modo
geral, e como a formação de professores particularmente, tornaram-se fatores que
contribuíram largamente para a ausência de investigações nessa área.
De certo modo, os câmbios sociais, as inovações tecnológicas e principalmente
as reformas educacionais, que, por sua vez, exigem novas práticas pedagógicas como
a dos professores de ensino religioso, são fatores que se impões novos paradigmas
de formação, exigindo das políticas públicas um cuidado especial como essa
formação, bem como apontam para a necessidade de investigações educacionais que
possam nos permitir conhecer melhor esse campo, para nele intervir. Atualmente, a
formação do professores é temática atual, de relevância social e cientifica, tanto
internacional como nacionalmente, no que concerne a como formar professores na
contemporaneidade de modo, a saber, lidar com os desafios que são impostos à
docência e que essa formação os prepare, mesmo que inicialmente, para lidar os
desafios, inovações e alterações presentes nas necessidades formativas que são
exigidas para as novas gerações.
No Brasil, a formação de professores, apesar dos avanços nessa área ainda
carece de múltiplos olhares e interesse em encontrar respostas para questões que
permeassem em aberto ou que vão emergindo imbricadas com as mudanças
contextuais impostas às escolas e professores, ligadas as novas atribuições e
responsabilidades que recaem sobre os dois grupos.
Delors (1999) defende uma educação baseada em quatro pilares do
conhecimento: aprender a conhecer; aprender a fazer; aprender a viver com os outros
e aprender a ser, respectivamente são: estimula o prazer de compreender, de
conhecer, descobrir e construir o conhecimento; relaciona-se ao investimento nas
competências pessoais, para que as pessoas tenham as habilidades necessárias para
acompanhar a evolução de sociedades marcadas pelo avanço do conhecimento; é um
FONAPER
dos maiores desafios da educação, já que a maior parte da história da humanidade é
marcada por guerras e conflitos decorrentes da tradição de se administrar conflitos por
meio da violência e refere-se ao conceito de educação ao longo da vida em seu
sentido mais amplo, visando ao desenvolvimento humano tanto no aspecto pessoal
quanto no profissional.
Morais (1997), por sua vez, trata a sala de aula não somente como espaço
físico, mas como um espaço onde de interação entre professor e aluno, assim
propiciando a troca de experiência entre ambos.
Nóvoa (1997)diz que a formação do professor vai além da metodologia e
construção de conhecimento. Ele precisa assumir uma postura dinâmica e reflexiva,
para responder às novas exigências de mudanças de caráter subjetivo e objetivo na
ressignificação da sua identidade profissional.
Dentre os inúmeros desafios apontados para a escola e para a formação de
professores, destaca-se a educação multicultural, uma vez que esta é a marca
fundamental das sociedades contemporâneas, cujas diferenças se expressam em
várias dimensões da vida social: gênero, etnia, orientação sexual, cultura e religião.
Nesse sentido, o multiculturalismo representa uma condição inescapável do mundo
ocidental, à qual se pode responder de diferentes formas, mas não se pode ignorar
(MOREIRA, 2011, p. 66).
A educação multicultural representa uma resposta dada pela escola às
diferenças existentes na sociedade, enquanto um desafio que envolve a garantia dos
direitos humanos, uma vez que as pessoas têm direito a ser iguais sempre que a
diferença as tornar inferiores; contudo, têm também direito a ser diferentes sempre
que a igualdade colocar em risco suas identidades (SANTOS,1997, apud MOREIRA,
2001, p. 67).
Ao abordar sobre a formação do educador no atual contexto da sociedade,
Canen (2000, p. 136) destaca a questão da diversidade cultural e propõe que:
A formação do profissional estará, pois fundamentada em valores de
tolerância, respeito e apreciação da diversidade cultural. Nossa
concepção curricular parte da perspectiva intercultural crítica que
busca a valorização da pluralidade cultural e a superação de
estereótipos, preconceitos e hierarquização cultural nas práticas
pedagógicas do profissional em formação.
Dentre as diferenças a serem trabalhadas pela educação multicultural,
situamos a diversidade religiosa. Sendo o ser humano possuidor de uma religiosidade
intrínseca, este sente necessidade de transcender à realidade imanente, em direção
ao transcendente, em busca de respostas para o sentido da vida. A religiosidade se
expressa de diversas formas em diferentes culturas humanas, por meio de símbolos,
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
gestos, ritos, mitos, festividades, teologias, textos sagrados, monumentos, edificações,
ethos e outras formas de expressão.
Por se constituírem em saberes e práticas sociais, as expressões religiosas
fazem parte da cultura humana em sua diversidade, sendo, portanto conhecimentos a
serem incorporados pelo currículo escolar, no contexto de uma educação multicultural.
Nessa perspectiva, mais do que nunca ampliam-se os horizontes da Educação
Básica, no sentido de promover uma ampla revisão tanto no currículo quanto nas
práticas pedagógicas dos professores, de forma a incorporar a diversidade religiosa
como área de conhecimentos, como forma de desenvolver uma formação cidadã,
onde os alunos possam aprender a conviver com as diferenças de credo de forma
respeitosa e dialógica.
Nesse sentido, os novos paradigmas da disciplina Ensino Religioso Escolar,
apontam para o respeito à diversidade cultural religiosa, quando a lei nº 9.475/97 (que
altera o Art. 33 da LDB 9394/96) estabelece:
O Ensino Religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da
formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários
normais das escolas públicas de Educação Básica assegurada o
respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer
formas de proselitismo.
Como pode-se observar, a referida lei integra essa disciplina no conjunto da
formação básica do cidadão e garante o tratamento igualitário de sua oferta no horário
escolar, bem como, a liberta das amarras do proselitismo, afirmando a sua identidade
como área de conhecimentos, tal como as demais disciplinas que compõem o
currículo da educação básica. Nesta nova abordagem, o Ensino religioso assume
como objeto de estudos o fenômeno religioso em suas diversas formas de expressão
entre os diferentes povos do planeta, de acordo com a sua história e cultura.
Junqueira (2010, p. 71) considera que
É o pressuposto pedagógico que sustenta a proposta do Ensino
Religioso na escola, com as diferentes crenças, grupos e tradições
religiosas e/ou na ausência deles. Esses são aspectos da realidade
que não devem ser meramente classificados como negativos ou
positivos, mas sim como dados antropológicos e socioculturais
capazes de fundamentar e interpretar as ações humanas.
Esta abordagem representa um avanço significativo em relação ao caráter e à
abordagem dessa disciplina no currículo escolar, uma vez que rompe com o modelo
tradicional que historicamente têm marcado a identidade dessa disciplina na escola,
norteada por uma abordagem catequética, que se confunde com o papel da igreja.
FONAPER
É nessa perspectiva que a formação de professores para o Ensino Religioso
Escolar se coloca enquanto um importante desafio para a Licenciatura, uma vez que
exige o estabelecimento de um referencial teórico-metodológico fundamentado nas
Ciências da Religião, norteada por uma práxis inovadora, aberta à pluralidade de
concepções de mundo e de crenças, apoiada no espírito critico e investigativo, bem
como no senso de alteridade e respeito às diferenças.
Em geral, o que se observa na realidade são professores oriundos de outras
áreas da licenciatura, principalmente da pedagogia, além de outros que sequer são
licenciados, ou mesmo professores leigos indicados pelas igrejas para ministrarem
aulas de ensino religioso. Tal situação é alimentada por várias situações, que vão
desde a falta de profissionais devidamente habilitados nessa área de conhecimentos,
à ausência de investimentos em cursos de licenciatura na área, como a própria
ausência de políticas públicas que qualifiquem o currículo na área de ensino religioso
escolar.
Ao contextualizar a questão da formação de professores de Ensino Religioso
no Brasil Junqueira (2010, p. 63) destaca que:
Antes da década de 1990, a formação dos professores era
organizada em sua quase totalidade pelas instituições religiosas
cristãs. Algumas experiências realizadas em parceria com os
sistemas de ensino, em decorrência da proposta confessional ou
interconfessional, foram adotadas pela disciplina. Eram cursos
denominados de Teologia, Ciências Religiosas, Catequese,
Educação Cristã e similares. Essas propostas não graduavam os
professores em conformidade com os profissionais da educação de
outras disciplinas, gerando impasses e dificuldades na vida funcional
dos mesmos. Os professores das outras disciplinas tinham suas
graduações reconhecidas pelo MEC, o que lhes dava direito ao
ingresso por concurso público e, consequentemente, de adesão a um
plano de carreira funcional. Os professores de Ensino Religioso,
embora muitas vezes formados por cursos de caráter teológico, não
tinham reconhecimento por parte do MEC.
O cenário apresentado exige o desenvolvimento de iniciativas no sentido de
atender às demandas para a formação inicial de professores nessa área de
conhecimentos, garantindo a esses professores uma identidade profissional
devidamente reconhecida, que oportunize o seu acesso às políticas públicas de
valorização e profissionalização do magistério.
A Lei 9.475/97, determina que os sistemas de ensino devem regulamentar os
procedimentos para a definição dos conteúdos do Ensino religioso e as normas para a
habilitação e admissão de professores, atendendo à prerrogativa da LDB (lei nº
9.394/96), que exige habilitação específica do professor em nível de Licenciatura na
área que leciona.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Neste contexto, o Ensino Religioso necessita de profissionais de formação
adequada ao desempenho de sua ação educativa, considerando que o conhecimento
religioso para estudo do fenômeno religioso na escola, situa-se na complexidade da
questão religiosa e na pluralidade brasileira.
O Fórum Nacional Permanente dos Professores do Ensino Religioso FONAPER (2000) definiu critérios interessantes para a para a avaliação da formação
do professor de Ensino religioso, quais sejam:
a) Honestidade científica do profissional, que exige a constante busca
do conhecimento religioso, o entendimento da complexidade do
conhecimento do fenômeno religioso, a capacidade de viver a
reverência à alteridade; o reconhecimento da família e da comunidade
religiosa como espaços privilegiados para a vivência religiosa e para a
opção de fé; o propósito de estar a serviço da liberdade do estudante;
o aperfeiçoamento nas cinco áreas temáticas do estudo do fenômeno
religioso (fundamentos epistemológicos do Ensino Religioso, Culturas
e Tradições Religiosas, Textos Sagrados, Teologias e Ethos).
b) Competência profissional, que exige do professor: a compreensão
do fenômeno Religioso, contextualizando- espacial e temporalmente;
a configuração do fenômeno religioso por meio das ciências da
tradição religiosa (religião); o conhecimento da sistematização do
fenômeno religioso pelas tradições religiosas e suas teologias; a
análise do papel das tradições religiosas na estruturação e
manutenção das diferentes culturas e manifestações socioculturais; a
exegese dos textos sagrados orais e escritos das diferentes matrizes
religiosas (africanas, indígenas, ocidental e oriental); a compreensão
do sentido da atitude moral como consequência do fenômeno
religioso sistematizado pelas tradições religiosas e como expressão
da consciência e da resposta pessoal e comunitária das pessoas .
Com isso, percebe-se uma preocupação do movimento dos educadores com a
formação adequada dos profissionais que atuam nessa área de conhecimentos,
enfatizando dimensões fundamentais que devem compor essa formação, permeada
por competências pessoais e profissionais que apontam para um professor dotado de
curiosidade epistemológica, reflexivo, aberto à diversidade cultural e religiosa da
sociedade, além de ser sensível, capaz de conviver com as diferenças e de interpretar
o fenômeno religioso à luz das ciências da religião e da experiência pessoal das
pessoas que vivenciam uma relação com o sagrado.
Nessa perspectiva, faz-se de fundamental importância a realização da
pesquisa sobre o perfil dos professores de Ensino Religioso do Estado do Pará,
dentro de uma abordagem quanti-qualitativa, tendo como questões norteadoras
as seguintes perguntas: Qual o perfil dos professores de Ensino Religioso
Escolar que atuam no Ensino Fundamental no Estado do Pará? Quais as
demandas para as políticas públicas na área de ensino religioso escolar no
Estado do Pará?
FONAPER
O estudo encontra-se em fase de levantamento da coleta de dados junto às
Secretarias de Educação, bem como, aplicação de formulário aos professores de
Ensino Religioso que atuam nas escolas públicas e particulares. A amostra envolve no
mínimo 60% dos professores, abrangendo, no mínimo, 10 municípios do Estado.
O formulário contém questões fechadas envolvendo aspectos de sua formação
acadêmica, experiência no magistério, forma de ingresso como professor da disciplina,
conhecimento da legislação sobre o ensino religioso, forma de seleção dos conteúdos
da disciplina e percepção acerca da importância do Ensino Religioso no currículo
escolar. Os dados serão sistematizados em gráficos estatísticos.
Feita a análise dos dados, estes serão divulgados e discutidos por meio de
palestras junto às Secretarias de Educação e Conselhos Municipais de Educação,
realizadas durante o estágio supervisionado do Curso, além de outros eventos
educacionais.
CONSIDERAÇÔES FINAIS
O novo perfil do professor de ensino religioso preconizado representa um
avanço significativo na história dessa disciplina no currículo escolar, uma vez que
nunca houve qualquer preocupação com o tipo de profissional responsável pela
formação dos alunos nessa área.
Os desafios postos para a educação no século XXI apontam para a
necessidade de se repensar não apenas o trabalho desenvolvido pela escola, a
formação e a prática docente, as políticas públicas educacionais, bem como a gestão
dos sistemas de ensino e da própria escola pública. Isso significa dizer que o bom
desempenho do aluno não depende unicamente do professor, mas de um conjunto de
fatores econômicos, políticos e sociais que envolvem a atividade docente.
Acredita-se que os novos paradigmas do professor de ensino religioso, aliada
às novas oportunidades de formação inicial nessa área estejam provocando uma nova
reconfiguração do perfil dos professores que atuam nessa disciplina no âmbito da
educação básica.
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Acesso em: 20/06/2014
FONAPER
CICLO DE VIDA DA CARREIRA PROFISSIONAL DE PROFESSORES (AS) DO
ENSINO RELIGIOSO DA CIDADE DE JOÃO PESSOA-PB
Narjara Lins de Araújo- PPGCR/UFPB (autora)47
Marinilson Barbosa Silva- PPGCR/UFPB (coautor)48
Resumo:
O objetivo geral desse estudo consiste em compreender o Ciclo de Vida da Carreira
Profissional de Professores do Ensino Religioso de acordo com Huberman (1992). E como
objetivo específico, verificar entre os professores de ensino religioso os conflitos e dilemas
presentes no seu processo de construção de identidade pessoal e profissional a partir da
dinâmica da pluralidade de crenças e valores religiosos. Esta é uma pesquisa de campo,
qualitativa, exploratória e descritiva. O instrumento usado para coletar os dados da pesquisa foi
uma entrevista semiestruturada e a análise foi por meio da TAC de Bardin (1997). De acordo
com os resultados os sujeitos desta pesquisa se dividem nas três primeiras fases das cinco
existentes do ciclo de Huberman (1992) de acordo com o tempo na carreira e apesar dos
dilemas e dificuldades de cada fase, vivenciam os seus aspectos positivos.
Palavras-chave: O ciclo de
Religioso.Dilemas.Dificuldades.
vida
da
carreira
profissional
docente.
Ensino
Introdução
Este artigo foi criado a partir do meu trabalho de dissertação resultado do
mestrado em Ciências das Religiões/PPGCR/UFPB. Destaca a Teoria do Ciclo de
Vida da Carreira Profissional Docente de acordo com Huberman (1992). Mostrado
uma visão deste ciclo voltada para a carreira do professor de Ensino Religioso da rede
pública da cidade de João Pessoa-PB. As problemáticas envolvem a formação
docente para o Ensino Religioso na atualidade, marcada pelaindefinição de uma
identidade pedagógica e profissional para este componente curricular.
Este trabalho espera contribuir para um melhor qualidade dos cursos de
formação inicial e continuada específicos para os professores de Ensino Religioso
através dos levantamentos de dificuldades e dilemas tanto relacionados ao contexto
da profissão quanto a dilemas psicológicos que podem variar de acordo com cada fase
do ciclo; visa contribuir ainda para o autoconhecimento dos professores de Ensino
Religioso quanto a sua identidade profissional; ajudar a traçar um perfil pedagógico
para este componente curricular e contribuir com a resolução 026\12 instituída pelo
Conselho Municipal de Educação.
Com isso, visando estudar mais detalhadamente estes aspectos tomei como
base a teoria do Ciclo de Vida da Carreira Profissional Docente de Huberman (1992).
47
Pedagoga e mestre em Ciências das Religiões. Vinculada ao grupo de pesquisa
FIDELID/PPGCR/UFPB. E-mail: [email protected].
48 Professor Doutor do PPGCR/UFPB. Coordenador do grupo de pesquisa FIDELID. E-mail:
[email protected].
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
De acordo com essa teoria todo docente passa por fases dentro de sua profissão que
são constituídas por perspectivas e dificuldades específicas, tanto práticas como
psicológicas, e que interferem diretamente na forma de lidar com as necessidades
presentes no contexto de sala de aula.
Isto posto, tenho como objetivo geral deste trabalho compreender o Ciclo de
Vida da Carreira Profissional de Professores do Ensino Religioso de acordo com
Huberman (1992). E como objetivo específico, verificar entre os professores de Ensino
Religioso os conflitos e dilemas presentes no seu processo de construção de
identidade pessoal e profissional a partir da dinâmica da pluralidade de crenças e
valores religiosos.
Por tanto, o corpus teórico deste trabalho aborda teóricos como Melucci (2004);
Silva (2011); Huberman (1992) entre outros. Os procedimentos teórico e metodológico
da pesquisa, tem como base a Técnica de Análise de Conteúdo de Bardin (1997).
Nesse caso, o universo da pesquisa é composto por professores de Ensino Religioso
da rede estadual e municipal de ensino da cidade de João Pessoa-PB que estão em
fases distintas dentro do Ciclo de vida da Carreira Profissional Docente (HUBERMAN,
1992). Os dados foram coletados durante um curso de extensão oferecido pelo
município, aberto a professores do Estado.
No que se refere ao instrumento para a coleta dos dados, foi usado um
questionário semiestruturado envolvendo perguntas direcionadas para as questões
que envolvem o Ciclo de Vida da Carreira Profissional Docente e questões
relacionadas aos dados de identificação dos sujeitos, que abordam aspectos mais
pessoais.
É importante ainda frisar, que está é uma pesquisa de campo e descritiva,
quantitativa e qualitativa. Com relação a análise dos dados foi usado a técnica
conhecida como Análise de Conteúdo (BARDIN, 1979).
A construção da Identidade docente atrelada ao ciclo de vida da carreira
profissional
Fundamentando o conceito de identidade
De acordo com Melucci (2004. p.44) falar da identidade tanto no que se refere
a um indivíduo, como também da identidade de um grupo específico, é se referir a três
características: [...] continuidade do sujeito, independentemente das variações no
tempo e das adaptações ao ambiente; delimitação desse sujeito em relação aos
FONAPER
outros; e capacidade de reconhecer-se e ser reconhecido. Nesse sentido, é difícil falar
em identidade sem fazer referência as suas raízes sociais e relacionais.
Desse modo é impossível separar rigidamente os aspectos individuais e os
aspectos relacionais e sociais (coletivos) da identidade. Pois, na “história individual, a
identidade apresenta-se como um processo de aprendizagem que leva a autonomia
do sujeito” (MELUCCI, 2004, p.45-46). Na verdade, as muitas experiências
possibilitam o desenvolvimento da capacidade para resolver os problemas advindos
do ambiente e uma independência nas relações.
Neste mesmo sentido Dubar (2005, p.136) afirma que a identidade é “resultado
a um só tempo estável e provisório, individual e coletivo e objetivo, que,
conjuntamente, constroem os indivíduos e definem instituições”. Ele nos ajuda nessa
discussão sobre identidade, explicando que ela se apresenta como resultado e como
extremos, uma vez que é um jogo entre o estável e o provisório, o individual e o
coletivo, o subjetivo e o objetivo, constituído a partir dos papéis sociais que se
assumem por meio dos processos de socialização.
Nessa direção, Silva (2010, p.45) acrescenta que a identidade, além de ser
simultaneamente estável e provisório, individual, e coletivo, subjetivo e objetivo é
também “biográfico e estrutural” dos diversos processos de socialização.
Uma vez que, é no processo da ação do indivíduo que a identidade coletiva se
estrutura. Para tanto, os indivíduos interagem, influenciam- se negociam no interior
desses sistemas e produzem quadros cognitivos e motivacionais necessários para a
ação. (MELUCCI, 2001, p.67).
Na verdade, conflitos decorrentes de novas situações e do ingresso a um novo
sistema de normas, podem comprometer a identidade. A solução segundo Melucci
(2007, p.51) é:
[...] reestruturar a ação, com o apoio de novas orientações, ou
segmentando as esferas de vida para cultivar certa consistência, ao
menos no interior de cada segmento; pois, a identidade é composta
por processos sociais e, uma vez cristalizada, é nutrida, modificada
ou mesmo remodelada na formação e conservação da identidade são
determinados pelas relações sociais.
A partir disso, torna- se claro a importante função da formação inicial e
continuada na constituição da identidade docente. Como também da qualidade destes
cursos, e a coerência com as necessidades de aprendizagem da realidade social na
qual o professor está inserido.
As propostas de Ensino Religioso: condutoras da prática em sala de aula
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
De acordo com as três principais propostas de ensino religioso conhecidas, isto
é a Catequética, a Teológica e a das Ciências das Religiões é possível perceber a
complexidade de conceituações de formas e implicações epistemológicas e
pedagógicas sobre o ser professor de Ensino Religioso.
Isto posto existem, alguns aspectos que caracterizam o ser professor do
Ensino Religioso, de acordo com as propostas destacadas. Segundo Silva (2010,
p.21) “por trás de toda e qualquer prática de ser professor de Ensino Religioso,
encontram-se subjacentes a essas práticas, visões e modelos pedagógicos e
epistemológicos”.
Em suma, existem propostas mais tradicionais, como a Catequética e a
Confessional e outras mais atuais, como a Interconfessional e a das Ciências das
Religiões. Porém, independente da proposta adotada o professor deste componente
curricular deve ter consciência que a sua principal função consiste em “conhecer os
assuntos relativos aos conteúdos doutrinários e confessionais de que vão tratar, com
entendimento, possibilitando a transferência destes conhecimentos para os alunos da
forma mais objetiva e clara possível” (SILVA, 2010, p.21).
O perfil do professor de Ensino Religioso
Em linhas gerais pensar atualmente na identidade pedagógica que dá forma ao
Ser Professor de Ensino Religioso se resume segundo Silva (2010, p.21) em:
[...] refletir sobre a dimensão humana do ponto de vista existencial,
fenomenológico, idiossincrático, contextual, reflexivo e crítico
resgatando a pessoa do ‘ser- professor’ e, consequentemente, suas
relações com uma perspectiva de construção identitária
pedagógicaintimamente interligada com a educação.
Com efeito, a proposta que abrange essa dimensão e seus pontos de vista,
está vinculada a proposta mais recente, a das Ciências das Religiões. Visto que, está
proposta vai “além de uma perspectiva reducionista e linear” (SILVA, 2010, p.22). Uma
vez que esta coerente com a proposta curricular construída sobe a base da teoria póscrítica de currículo.
É preciso ressaltar que tanto o processo de construção de identidades
individuais e coletivas dos professores de Ensino Religioso “é em última instância, a
relação processual e dialética entre o processo de continuidades versus
descontinuidades, de conservação e de mudanças que ocorrem ao longo da trajetória
de vida de professores”. Presume-se que seja necessário que o professor “tenha plena
consciência de sua individualização é um encontrar- se consigo mesmo na direção da
FONAPER
alteridade”. Com efeito é uma forma de dar um novo significado a sua própria práxis
em relação ao Ensino Religioso (SILVA, 2010, p.65).
Nesse caso, não há lugar melhor do que a sala- de- aula para aprender a ser
professor, porém de forma intuitiva, por meio de erros e acertos, o que torna possível a
reflexão. Neste espaço, tudo acontece “as alegrias, as angústias, os medos, os
acertos e os desacertos” (LIMA, 2008, p.139).
Desafios na constituição do ser professor de Ensino Religioso
Cabe frisar que apesar da grande gama de trabalhos e pesquisas acadêmicas
a respeito da construção de identidades, sente-se por parte de pesquisadores e de
educadores,
uma
necessidade
e
carência
de
maiores
aprofundamentos
e
especificações desses referidos temas interligados as dinâmicas sobre formação de
professores e, em especial, afirma Silva (2010, p.19) “sobre o significado do ser
professor da área do Ensino Religioso, hoje”.
É preciso ressaltar que, o significado do Ser professor de Ensino Religioso na
sociedade atual é ainda bastante inexplorado. E as dificuldades encontradas para o
desenvolvimento desse conceito são ainda “amplas e desafiadoras, pois envolvem em
grande parte aspectos e discussões de natureza política, cultural, eclesial e teórica”
(SILVA, 2010, p.17)
Conceituando o Ciclos de Vida da Carreira Profissional Docente
Os estudos acerca do ciclo de vida da carreira profissional docente
foraminiciados a partir de Huberman (1992). O autor preocupou-se em estudar a
carreira de professores e classificar os ciclos de vida profissional de docentes,
denominando- as como fases, onde cada fase apresenta características próprias e
procura enquadrar o professor durante o seu percurso profissional.Apesar de que está
“não seja a mais difundida nos últimos anos” como afirma García (1999), foi com
certeza “uma das que trouxeram contribuições significativas para o estudo da
formação de professores” (CANDAU, 1997, p. 58)
Nesse sentido, de acordo com essa teoria do Ciclo da Carreira Profissional
Docente, é possível encontrar segundo Huberman (1992):
[...] uma série de ‘seqüências’ ou de ‘maxiciclos’ que atravessam não
só as carreiras de indivíduos diferentes, dentro de uma mesma
profissão, como também as carreiras de pessoas no exercício de
profissões diferentes isto não quer dizer que tais seqüências sejam
vividas sempre pela mesma ordem, nem que todos os elementos de
uma dada profissão as viviam todas. (HUBERMAN, 1992, p.37).
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Uma vez que, “estudar o conceito de ‘carreira’ possibilita focar mais
especificamente nos tempos psicológicos e sociológicos” (HUBERMAN, 1992, p.38).
E apesar de já existirem vários estudos e investigações sobre o ciclo de vida, a que
esta relacionada à docência é recente.
Com isso, peguemos como exemplo, as seqüências conhecidas como “de
exploração” e de “estabilização”, que freqüentemente ocorrem no início de uma
carreira. Em relação a essas seqüênciasHuberman (1992) afirma:
A exploração consiste em fazer uma opção provisória, em
proceder a uma investigação dos contornos da profissão,
experimentando um ou mais papéis. Se esta fase for globalmente
positiva, passa- se a uma fase de “estabilização”, ou de
compromisso, na qual as pessoas centram a sua atenção no
domínio das diversas características do trabalho, na procura de
um sector de focalização ou de especialização, na aquisição de
um caderno de encargos e de condições de trabalho satisfatórias
e, em vários casos, na tentativa de desempenhar papéis e
responsabilidades de maior importância ou prestígio, ou lucrativas.
(HUBERMAN, 1992. p.37)
Conforme essa seqüência há pessoas que “estabilizam” mais cedo do que
outras, existem outras que não o fazem nunca e outras ainda que estabilizem, para
depois desestabilizar logo em seguida que o desenvolvimento de uma carreira é,
assim, um processo e não uma série de acontecimentos. Para alguns, este processo
pode ser linear, mas para outros, há patamares, becos sem saída (HUBERMAN, 1992,
p.38).
A partir disso, é importante perceber que a relação entre “idade cronológica” e
“fase inicial da carreira” é clara, porém não é nem completa e nem homogênea. Até
por que, o termo “exploração” tem vários tipos, vários momentos e saídas para a
exploração, ou seja, a “estabilização” é a penas uma das saídas (HUBERMAN, 1992,
p.38).
As fases iniciais da carreira docente: primeira fase ‘Sobrevivência e Descoberta’
O início da carreira docente é conhecido como ‘Sobrevivência’ e ‘Descoberta’.
E vai da introdução na carreira até os 03 anos de docência. Sabe-se que não é nada
simples, “como pode parecer aos não- iniciados”. Pois antes de nos tornarmos
professores, fomos estudantes, por isso imaginamos que sabemos, muito, da
profissão que acabamos de ingressar. O que acontece é que estamos em outra
posição que nos “impõe situações, responsabilidades e experiências novas”
(MARIANO, 2006, p. 17).
Por isso, a passagem do estado de estudante para o estado de professor nos
permite segundo Mariano (2006):
FONAPER
Estabelecer algumas comparações com o teatro. É como se
saíssemos da platéia e subíssemos ao palco. Mesmo que
tenhamos assistido a aquela peça milhares de vezes, nunca
conseguiremos saber de toda a preparação que os atores e a
equipe de direção têm de ter para que o espetáculo aconteça.
(MARIANO, 2006, p.17)
Portanto, este autor compara em certa medida, a profissão de professor com a
de artista, por imaginarmos o que esperamos encontrar, apesar de que na maioria das
vezes usamos improvisos. Segundo ele existe uma diferença no planejamento da
seqüência de cenas que compõem a docência do que constrói uma peça teatral:
[...] no primeiro caso, a seqüência de cenas podem não obedecer à
seqüência na qual foram pensados. É muito comum que todos – ou
alguns deles- sejam vivenciados ao mesmo tempo, pois o espetáculo
da docência não pode ser reduzido a uma série de seqüências
cronológicas. (MARIANO, 2006, p.18)
Ou melhor, no aspecto da “sobrevivência” se caracteriza como o “choque do
real”, isto é:
[...] a confrontação inicial com a complexidade da situação
profissional: o tactear constante, a preocupação consigo próprio
(“Estou- me a agüentar?”), a distância entre os ideais e as realidades
quotidianas da sala de aula, a fragmentação do trabalho, a dificuldade
em fazer face, simultaneamente, a relação pedagógica e a
transmissão de conhecimentos, a oscilação entre relações demasiado
íntimas e demasiado distantes, dificuldades com os alunos que criam
problemas, com material didático inadequado, etc. (HUBERMAN,
1992, p.39)
Desta forma, o que balanceia este aspecto da “sobrevivência” é outro aspecto
que surge em paralelo e que permite vivenciar o primeiro, é a “descoberta”, este traduz
o encanto inicial, a experimentação, a exaltação por estar, finalmente, em situação de
responsabilidade (ter a sua sala de aula, seus alunos, o seu programa), por se sentir
colega num determinado corpo profissional (HUBERMAN, 1992, p.39)
Em razão disso, Huberman (1992, p. 36) afirma que podem existir professores
iniciantes, em que predomine apenas um destes aspectos (a sobrevivência ou a
descoberta), ou com perfis que tenham outras características, como: a indiferença ou
o quanto- pior- melhor (aqueles que escolhem a profissão a contragosto ou
provisoriamente), a serenidade (aqueles que têm já muita experiência), a frustração
(aqueles que se apresentam com um caderno de encargos ingrato ou inadequado,
tendo em atenção à formação ou as motivações iniciais).
Em certa medida, todos estes perfis “vivenciam o tema ‘exploração’, ou seja,
pode ser sistemática ou aleatória, concludente ou enganadora” (HUBERMAN, 1992,
p.39). No entanto muitas vezes a ação em sala de aula, a exploração é definida pelo
sistema escolar. Esta fase pode ser mais longa, ou mais curta, vai depender de um
futuro compromisso definitivo.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
A segunda fase: Estabilização
Já a segunda fase desta sequência geral é conhecida como a “fase de
estabilização”. É o ciclo da carreira profissional entre os 4 e 6 anos de experiência
docente. É caracterizada pela necessidade da afirmação do eu, do fortalecimento da
identidade profissional. E quanto mais tarde for estabelecida esta identidade, mais
chances estes sujeitos terão de ter uma “dispersão de papeis” e assim uma dispersão
do sentimento de identidade pessoal (HUBERMAN, 1992, p.40).
Com isso, sabe- se que por mais que seja uma escolha temporária, elas
estarão se responsabilizando pela aquela função no mínimo por um período de 8 a 10
anos. Desta forma a estabilização no ensino trata-se de:
[...] um tempo, de uma escolha subjetiva (comprometer-se
definitivamente) e de um acto administrativo (a nomeação oficial).
Num dado momento, as pessoas “passam a ser” professores, quer
aos seus olhos, quer aos olhos dos outros, sem necessariamente
ter de ser por toda a vida, mas ainda assim, por um período de 8 a
10 anos, no mínimo. Como se vê pelos registros, nem sempre é
uma escolha fácil. Com efeito “escolher” significa “eliminar outras
possibilidades” (HUBERMAN, 1992, p.40).
Nesse processo, também é normal ter um sentimento de pertença a um grupo
profissional e de independência. Assumindo a sua identidade profissional para os
colegas com mais tempo de experiência, para autoridades e até para si mesmo.
Visto que, nessa fase um sentimento de “competência” pedagógica que é
paralelo a um sentimento de confiança, o professor passa a ter um estilo próprio de
ensino. Gerando uma preocupação menor consigo mesmas e uma maior preocupação
com os objetivos didáticos. “O professor se sente com mais liberdade para situações
novas e mais complexas, com mais habilidades para fazer uso de recursos técnicos”.
(HUBERMAN, 1992, p.41)
A partir disso, Huberman (1992, p. 41) afirma que no caso de professores que
não tiveram uma boa preparação pedagógica, o aspecto de “libertação” e da
“afirmação” é ainda mais complexo, chegando mesmo a ser violento. Daí, a
importância de participar de formações continuadas, além de uma boa formação
inicial.
Por um lado, surge durante essa fase, temas colaterais como os termos
“flexibilidade”, “prazer”, “humor” em conseqüência do domínio da situação pedagógica
gerando uma sensação de liberdade. A autoridade fica algo mais “natural”. Os limites
são colocados de uma forma tão espontânea e seguros, que os alunos passam a
respeitá-los sem grandes excitações (HUBERMAN, 1992, p.41).
FONAPER
A entrada no ‘meio- da- carreira’ docente: terceira fase ‘Diversificação/ Pôr-se
em Questão’
A terceira é a Fase de Diversificação, esta é caracterizada pelo percurso mais
individual. É o ciclo da carreira profissional entre os 7 e os 25 anos de experiência.
“São inseridas as respostas e observações elaboradas ao longo das experiências
profissionais do próprio professor” (HUBERMAN, 1992, p.41). Nesta fase há mais
ousadia, experimentações e diversificações de suas práticas pedagógicas.
De acordo com Huberman (1992, p.42) “não há confirmações empíricas que a
grande maioria dos professores passe por esta fase, mas os que passam estão em
busca de novos desafios para não emergir na rotina”. Geralmente ficam mais
motivados, ambiciosos a trabalhos administrativos e criativos no desenvolvimento de
trabalhos pedagógicos em equipes.
Desse modo, o Pôr-se em questão, que é vista por alguns estudiosos como
uma fase especifica dentro desse ciclo, seguida dessa fase de Diversificação, tem
suasorigens e características difíceis de perceber. Visto que, geralmente esta fase
surge em virtude dos muitos casos que foram surgindo durante a fase anterior, de
diversificação, como por exemplo, os que estão relacionados “ao monotonismo de sala
de aula; o desencanto diante os fracassos das experiências de luta. Como os
professores não tinham respostas claras ficavam a se por em questão” (HUBERMAN,
1992, p.43).
Não obstante, esta atitude gera o desenvolvimento de vários sintomas, que
podem ir desde “uma ligeira sensação de rotina até uma ‘crise’ existencial efectiva
face à prossecução da carreira”. Já para outros nota- se o desenvolvimento de forma
mais progressiva de uma “sensação de rotina a partir da fase de estabilização, sem
que as pessoas passem por uma actividade inovadora significativa”. (HUBERMAN,
1992, p.43)
Assim sendo, pôr-se em questão, afirma Hubermam (1992, p):
Corresponderia a uma fase – ou várias fases – “arquetípica (s)” da
vida, durante a (s) qual (s) as pessoas examinam o que terão feito da
sua vida, face aos objectivos e ideais dos primeiros tempos, e em que
embrenharem na incerteza e, sobretudo, na insegurança de outro
percurso. (HUBERMAN, 1992, p.43)
Por fim, Huberman (1992) conclui seu pensamento a cerca desta fase
afirmando que estes questionamentos são vivenciados de forma diferentes por
homens e mulheres. Sendo mais elevado nos homens quando são mais jovens; nas
mulheres aparecem mais tarde.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
A quarta fase: Serenidade e Distanciamento afetivo e/ou Conservadorismo e
Lamentações
Após passar pela quarta fase, a dos questionamentos, vem à fase da
Serenidade e Distanciamento afectivo. É o quarto ciclo entre os 25 e 35 anos de
experiência. É interessante notar que a grande maioria dos professores não chega lá,
mas os que chegam podem ser por diversos caminhos (HUBERMAN, 1992, p.44).
Presume-se que estes professores apresentam muita serenidade, pois,
prevêem o que vai acontecer em situação de sala de aula e já têm as respostas
prontas. Tão menos importância a avaliação dos alunos, e dos colegas de profissão. É
preciso ressaltar que os professores dessa fase falam explicitamente de “serenidade”,
de ter, enfim, chegado à situação de me aceitar tal como sou e não como os outros me
querem (HUBERMAN, 1992, p.44).
Enquanto isso, “o nível de ambição diminui e consequentemente o nível de
investimento, pois não precisam ficar provando nada a ninguém, nem a si mesma”
(HUBERMAN, 1992, p.44). Este fato faz com que a sensação de confiança e de
serenidade se eleve, e voltem seu tempo para investimento em projetos futuros.
Cabe frisar que nessa fase do Conservadorismo e das Lamentações, alguns
estudiosos também a vêem como uma fase específica dentro desse ciclo de vida
profissional docente. Nessaos professores ficam mais resmungões e se queixam
constantemente da bagunça e desmotivação dos alunos. Huberman (1992, p; 45)
afirma que nessa fase há uma maior:
[...] descredibilidade da política educacional; da incompetência dos
profissionais recém chegados. As mulheres deploram, em particular,
a evolução dos alunos, e os homens têm tendência para aceitar a
idéia de que as modificações raramente conduzem a melhorias no
sistema.
É preciso ressaltar que uma das coisas que levam os professores a não
passarem por esta fase é decorrente da “evolução da escola secundária. Porém, os
mais conservadores são os mais jovens, estes podem chegar a esta fase por vários
caminhos, por estarem mais freqüentemente influenciados pelos meios sociais e
políticos” (HUBERMAN, 1992, p.45).
Tem- se que os que são mais velhos na idade e que se encontram nesta fase
têm a maior tendência “a uma maior rigidez e dogmatismo, para uma prudência
acentuada, para uma resistência mais firme as inovações, para uma nostalgia do
passado, para uma mudança de óptica geral face ao futuro, etc.” (HUBERMAN, 1992,
p.46).
FONAPER
O final da carreira: quinta fase ‘Desinvestimento/ Recuo e Interiorização’
Chega-se finalmente a última fase do ciclo de vida da carreira profissional
docente, sendo descrita por vários autores como “o desinvestimento”. Este ciclo se
desenvolve entre os 35 e 40 anos de experiência. Nesta fase acontece
constantemente do “professor ser mais introspectivo recuar para o seu interior, de
forma positiva, sem lamentações. Voltam-se mais para assuntos externos a escola
como uma vida social repleta de muita reflexão filosófica” (HUBERMAN, 1992, p.46).
Existe a possibilidade de muitos docentes que não chegaram a esta fase é
porque desistiram no meio da carreira, devido às dificuldades encontradas. Em relação
a este fato, afirma Huberman (1992, p.46):
[...] são docentes que, não tendo podido chegar tão longe quanto as
suas ambições os teriam conduzido, desinvestem já a meio da
carreira, ou que, desiludidos com os resultados do seu trabalho, ou
das reformas empreendidas, canalizam para outros lados as suas
energias.
Supõe- se que os professores nesta fase, assim como qualquer profissional no
final de sua carreira, “estão sujeitos a mesma evolução fisiológica e as mesmas
pressões sociais, como por exemplo, acreditam que não dão mais conta do trabalho e
que este deve ser passado para um profissional mais jovem” (HUBERMAN, 1992,
p.46).
Desta forma, Huberman (1992) faz uma reflexão em relação ao ciclo de vida
profissional docente:
[...] ocorre uma evolução progressiva que vai acelerando com a
idade, o que torna possível perceber o paralelismo entre os estudos
gerais do ciclo de vida e os que se referem de forma especifica aos
professores por meio de uma característica comum, isto é, reportamse a tendências centrais de um perfil que engloba um grande número
de pessoas, por vezes mesmo a maior parte dessas pessoas, mas
nunca a totalidade de um conjunto (HUBERMAN, 1992, p.47).
Porém, é importante ressaltar mais uma vez que esse processo não é linear.
Vai depender das experiências vividas no meio pessoal e das qualificações no meio
profissional. Podendo ainda ter influência da idade cronológica e das suas
perspectivas em relação à profissão.
Resultados e Considerações Finais
De acordo com os resultados obtidos foi possível perceber algo que Silva
(2010) afirma queapesar dos avanços, ainda são muitos os desafios enfrentados pelos
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
professores de Ensino Religioso. E que ainda existem poucas pesquisas envolvendo o
Ensino Religioso como componente curricular e do perfil de seu profissional. Em
contrapartida, como foi confirmar com a pesquisa deste trabalho, que ainda prevalece
muito preconceito, desvalorização e desinteresse em relação ao Ensino Religioso,
tanto por parte dos próprios professores, quanto da equipe escolar e dos alunos.
Em compensação, esses sujeitos principalmente os que tem mais tempo na
carreira demonstram que já aconteceram mudanças positivas e que existem muitos
estímulos para que essas mudanças continuem acontecendo, só depende do esforço
dos professores em se qualificarem, como também que o Ensino Religioso se torne
um componente curricular obrigatório para os alunos.
Voltando agora mais especificamente para os objetivos desse trabalho, pude
constatar algo novo no contexto do Ensino Religioso, ou seja, uma ideia do Ciclo de
Vida da Carreira Profissional Docente do professor desse componente curricular.
Apesar de ser um estudo em minha opinião ainda superficial é possível se ter uma
ideia das fases que o caracterizam, dos desafios pedagógicos e dos conflitos
psicológicos existentes durante esse ciclo.
Desta forma, os aspectos, desafios e dilemas existentes nas fases encontradas
especificamente neste trabalho, são bastantes semelhantes, o que varia é o nível de
otimismo e pessimismo frente aos problemas existentes no contexto de sala- de- aula.
Partindo desse ponto presumir-se que os professores pertencentes a terceira fase,
possuem mais serenidade e otimismo comparada as duas outras fases. Supõe- se que
seja em virtude da maior experiência na prática de sala de aula. Visto que esses
sujeitos sofreram maior impacto ocasionados pela transição do Ensino Religioso
catequético para o Ensino Religioso como componente curricular e que a oferta de
formações continuadas tem trazido esperança e boas perspectivas, principalmente
para esse grupo.
Mediante aos resultados obtidos na pesquisa, pode-se supor a partir do tempo
na carreira que o Ciclo de Vida da Carreira Profissional do Professor de Ensino
Religioso, no que concerne ao grupo de professores desta pesquisa é formado por
três fases das cinco existentes dentro da teoria de Huberman (1992).
A primeira é chamada de Sobrevivência e/ou Descoberta e vai de 0 a 3 anos
de carreira na profissão; a segunda é a fase de Estabilização que vai 4 aos 6 anos na
carreira. Estas duas fazem parte das fases que compõem o início da carreira. Já a
terceira fase encontrada faz parte da primeira fase que compõe o meio da carreira,
conhecida como Diversificação e/ou pôr-se- em- questão que vai dos 7 aos 25 anos na
FONAPER
profissão. O sujeito desta pesquisa com mais tempo de carreira no Ensino Religioso,
se encontra com 16 anos de carreira nessa profissão.
Este ciclo é caracterizado por uma relação com os alunos baseados no diálogo,
na troca de aprendizagens, principalmente no que se refere ao sistema de crenças
religiosas. Por sua vez nessa relação ainda existem muitos desafios como a busca por
recursos didáticos e pedagógicos voltados para os eixos temáticos elaborados pelo
PCNER, capazes de transformarem a “curiosidade ingênua” dos alunos em
“curiosidadeepistemológica” (FREIRE, 2011).
Nota- se que os professores das três fases encontradas apresentam bastante
motivação em inovar e se qualificar, o que dar a entender que os aspectos positivos de
cada fase predominam sobre os aspectos negativos. Apesar, do apoio das formações
continuadas, o que impede uma melhor exploração destes aspectos, principalmente
no de diversificação presente na terceira fase é a escassez de recursos didáticos e
pedagógicos variados, voltados para o Ensino Religioso.
Sem embargo, ainda na relação professor e aluno compreende- se que é
preciso o professor assumir uma postura ética, criando assim um ambiente baseado
na confiança e na alteridade, capaz de estimular o respeito a pluralidade de ideias
religiosas que venham a surgir no dia- a- dia da sala de aula.
Fica claro que, ao longo deste ciclo os professores sentem a necessidade do
apoio e valorização em relação ao Ensino Religioso como componente curricular,
principalmente por parte da equipe escolar de onde surge bastante preconceitos.
Está demonstrado que os professores que pertencem a este ciclo sentem a
necessidade de participarem de formações continuadas como forma de adquirir
conhecimentos que lhes deem suporte para questões que vão desde a indisciplina dos
alunos até a aquisição de recursos didáticos e pedagógicos nos moldes dos PCNER.
Diante disso, muitos almejam os cursos de graduação e pós- graduação em Ciências
das Religiões oferecidos pela UFPB.
É preciso acentuar que muitos dos professores deste ciclo desejam melhores
condições de trabalho e mais valorização do Ensino Religioso. Para tanto, desejam
que este componente curricular seja obrigatório para os alunos e tenha uma carga
horária ampliada.
Objetivam ainda alcançar uma das metas para o Ensino Religioso que é se
aprofundar no Fenômeno Religioso, desenvolver o humanismo e a cidadania por meio
do pensamento crítico e reflexivo, capazes de estimular nos alunos para a autonomia
na escolha das suas opções religiosas e ao respeito as opções de seus colegas.
Parece claro afirmar, que uma característica bastante específica entre os
sujeitos pertencentes as três fases deste ciclo, foi a ocorrência de mudanças na
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
própria religiosidade dos professores ao lecionarem o Ensino Religioso, alguns alegam
ter adquirido um maior autoconhecimento religioso, seja se aprofundando na sua
própria religião, seja se permitindo frequentar outros credos religiosos.
A partir deste fato surge- me as seguintes indagações: existe uma fase
específica dentro desse ciclo onde aconteça essa mudança? Quais os conflitos
psicológicos estão relacionados a essas mudanças? A que ponto esses conflitos e
dilemas podem prejudicar a evolução da prática pedagógica no Ensino Religioso?
Será que os professores que se aprofundaram no conhecimento da sua própria
religião estariam mais propensos a fazer proselitismo em sala de aula? E o contrário,
aconteceria com os que se permitiram explorar outros credos religiosos.
Suponho que os conflitos relacionados a essa questão possam surgir já
durante a formação inicial, no caso da proposta das Ciências das Religiões, que está
voltada para a pluralidade de crenças religiosas. Por isso, acredito que se não forem
bem resolvidos durante esse processo, poderão prejudicar o processo de “exploração”
e de “estabilização” na profissão e se estender para a primeira fase desse ciclo;
intensificando o aspecto da “sobrevivência” em contrapartida as “descobertas”. E desta
forma, prejudicar a atuação desse profissional na prática de sua profissão. O que
poderá influenciar no domínio do espaço pedagógico e no alcance dos objetivos
propostos pelo Ensino Religioso (HUBERMAN, 1992).
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Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
ENSINO RELIGIOSO CONFESSIONAL: NARRATIVAS DISCENTES E PRÁTICAS
DOCENTES
Raimundo Márcio Mota de Castro - UEG49
Resumo:
O ensino religioso está presente na escola pública brasileira desde a década de 1930. Sendo
entendido inicialmente como espaço que garantia a presença da confissão religiosa dentro da
escola, majoritariamente católica e de outros credos cristãos. O modelo deste ensino residia na
confesionalidade e, quando muito, na interconfessionalidade. Após a promulgação da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n. 9.394/96), que entendia que por ser publica o
modelo desse ensino deveria ser pluralista, percebe-se que o modelo presente na escola
pública não corresponde ao previsto na lei. Diante desta perspectiva pergunta-se como o
modelo confessional perdura na escola? A resposta aparece relacionada a reprodução do
modelo que os professores receberam como herança de sua formação na escola pública,
resposta obida por meio da pesquisa qualitativa, utilizando-se de narrativas, da qual
participaram de 11 (onze) professores/as de escola pública da região noroeste do Estado de
Goiás.
Palavras-chave: Ensino religioso confessional. Práticas docentes. Narrativas.
Introdução
Apesar de aparecer na legislação brasileira desde a década de 1930, como
disciplina obrigatória na escola pública, em que pese o fato de ser facultativo ao aluno,
o ensino religioso, foi entendido como ensino de doutrina e catequese até quando a
Lei nº 9.475, de 22 de julho de 1997 deu nova redação dada ao Art. 33 da LDB de
1996 e possibilitou o entendimento de que esse componente curricular faz parte da
matriz escolar, logo coisa da escola e não da Igreja.
Marcado pelo estigma das aulas de catequese o ensino religioso arrasta-se
apresentando diversas problemáticas, primeira que se trata uma prerrogativa lega que
não é cumprida, depois que não houve nenhuma política pública de estado
preocupada em fomentar a formação de professores bem como um dialogo com a
sociedade civil no que diz respeito a admissão de professor específico para a área.
Geralmente, a disciplina tem sido ministrada por professores de diversas áreas, com
nenhuma formação específica, sendo critério apenas a complementação da carga
horária na escola.
Diante desse cenário temos realizado algumas pesquisas tentando perceber
como os professores se preparam para efetivamente trabalharem a pluralidade
religiosa na sala de aula, que conteúdos ministram, que formação possuem. As
49
Doutor em Educação – Professor efetivo da Universidade Estadual de Goiás – Colaborador do GPER.
[email protected]
FONAPER
respostas são inúmeras e surpreendentes. No entanto, percebe-se que se trata de
uma reprodução do modelo confessional, posto que esses professores reproduzem
suas práticas a partir de suas realidades vividas como alunos de escolas públicas.
Assim, por meio da pesquisa qualitativa, exploratória e utilizando-se de narrativas,
ouvimos professoras de escolas públicas na região oeste do Estado de Goiás, que
atuam na disciplina de ensino religioso há pelo menos dois anos. Este trabalho tenta
apresentar parcialmente o que encontramos.
O percurso da pesquisa
A pesquisa nasce da necessidade de se buscar uma resposta a uma
indagação, mas a forma de atingir tal resposta, longe de possuir um padrão único, está
de certa forma condicionada a “crença” do pesquisador, ou melhor, ao entendimento
teórico e metodológico apreendido no percurso da pesquisa.
Pesquisar tem muito de desafio e aventura. É uma luta por saber e
para demonstrar o que se sabe. É sempre uma decisão árdua
desentranhar o conhecimento para, com a discrição e o equilíbrio
devidos, pô-lo em circulação e torná-lo acessível aos demais. São
esses, pelo menos esses, que devem ser, de um ponto de vista
deontológico, a meta, o destino e a finalidade: contribuir com nosso
esforço e nossa vontade perscrutadora par ampliar os limites do
conhecimento racionalizado (PERUJO SERRANO, 2011, p. 13).
Se durante muitos anos a pesquisa debruçou-se apenas sobre o modelo
positivista, que primava pela exatidão e em muitos casos a dogmatização dos
resultados contempla-se nas últimas décadas inúmeros debates sobre a permanência
de outros modelos como o método histórico dialético e o método fenomenológico. A
utilização desses métodos produziu alterações substanciais, na forma de se pensar
pesquisa em Ciências Sociais, haja vista a complexidade do homem enquanto Ser
produtor de si e de história.
Enquanto Ser, o homem busca estabelecer-se no mundo mediante a
apreensão do mesmo. Essa apreensão vai acontecendo por meio das indagações que
o ser humano faz de si e do mundo que o cerca. Nem sempre as indagações são
respondidas no todo ou no tempo em que se destinou a buscar soluções para tal
problemática. Assim também ocorre com a pesquisa. Inicialmente pensava-se que no
prazo de um ano daríamos conta de responder a questão norteadora dessa pesquisa,
mas logo percebemos que o primeiro ano seria apenas para efetuarmos o
levantamento bibliográfico sobre a temática, assim a pesquisa prolongou-se por três
anos (2011-2013).
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Dada a complexidade de nosso objeto, optamos por realizar uma pesquisa de
natureza qualitativa. De acordo com Lüdke; André (1986, p. 11-13), as características
básicas de uma pesquisa qualitativa são:
1. A pesquisa qualitativa tem o ambiente natural com sua fonte direta
de dados e o pesquisador com seu principal instrumento. [...]
2. Os dados coletados são descritivos [...].
3. A preocupação com o processo é muito maior do que com o
produto [...].
4. O significado que as pessoas dão as coisas e à sua vida são focos
de atenção especial pelo pesquisador [...]
5. A análise dos dados tende a seguir um processo indutivo. Os
pesquisadores não se preocupam em buscar evidências que
comprovem hipóteses definidas antes do início dos estudos. As
abstrações se formam ou se consolidam basicamente a partir da
inspeção dos dados num processo de baixo para cima.
Bicudo (2011, p. 17) amplia essa caracterização afirmando que a pesquisa
qualitativa, como o nome já indica, trabalha com a qualidade.
Tendo presente a necessidade de ouvir os relatos e deste modo dar voz aos
professores/as, optou-se pela pesquisa narrativa, por entender que se trata de uma
perspectiva que permite não somente a investigação, mas também a formação. Para
esclarecer a dupla dimensão da pesquisa narrativa, Souza (2006, p. 26) infere que
essa perspectiva de trabalho,
[...] configura-se como investigação porque se vincula à produção de
conhecimentos experienciais dos sujeitos adultos em formação. Por
outro lado, é formação porque parte do princípio de que o sujeito
toma consciência de si e de suas aprendizagens experienciais
quando vive, simultaneamente, os papéis de ator e investigador da
sua própria história.
Para Catani et al (1997, p. 20)
[...] o que se convencionou chamar de pesquisa narrativa, no campo
educacional, enfatiza a variedade de práticas de investigação e
formação assim agrupadas, como iniciativas que vêm se firmando no
campo desde a década de 80, principalmente na Europa, e que deve
muito às tentativas de recolocação do sujeito no centro das
interpretações das ciências humanas.
Pela pesquisa narrativa é possível compreender as experiências vividas,
lembradas pelos/as narradores/as, tornado-se forma de comunicação e troca de
experiências, haja vista que não se tem apenas uma informação repassada do
narrador ao ouvinte, mas principalmente uma troca, onde narrador e ouvinte unem-se
em uma simbiose de trocas mutuas.
A escolha de narrativas como instrumento de coleta de dados deu-se ao fato
de que entender que as mesmas constituem-se de acordo com Chizzotti (2003, p.17).
“testemunho oral das pessoas presentes em eventos, suas percepções e análises” e
isso pode “esclarecer muitos aspectos ignorados e indicar fatos inexplorados do
FONAPER
problema”. Ainda sobre as narrativas, Bosi (1994, p. 88) afirma que “a narração é uma
forma artesanal de comunicação. Ela não visa a transmitir o ‘em si’ do acontecido, ela
o tece até atingir uma forma boa. Investe sobre o objeto e o transforma”.
As narrativas foram produzidas de próprio punho por 11 (onze) professores/as
da rede municipal e estadual de ensino que ministram aulas de Ensino Religioso,
depois as mesmas foram digitalizadas e arquivadas em mídia eletrônica. Para a
produção dos mesmas, os/as sujeitos receberam um roteiro no qual se solicitava que
os/as mesmos/as mencionassem em seus relatos suas histórias de vida considerando
as aulas e professores de ensino religioso. A participação dos sujeitos foi voluntária, e
a utilização de suas falas foi possível graças à autorização das mesmas que por meio
de termo de consentimento livre e esclarecido tomaram conhecimento dos objetivos da
pesquisa e decidiram contribuir.
O corpus teórico: a narrativa, a lembrança e a memória
Para Benjamin (1987a, p. 201), o narrador ao contar suas histórias, recorre ao
acervo, tanto de suas experiências vividas, quanto das experiências relatadas por
outros, uma vez que, “[...] uma vida não inclui apenas a própria experiência, mas em
grande parte a experiência alheia” (BENJAMIN, 1987a, p. 221). Deste modo, ao
narrar, tais experiências são transformadas em produto sólido, único e útil servindo e
se transformado em experiências daqueles que ouvem a narrativa. Essas narrativas
são evocadas pela lembrança e trazidas à tona pela memória.
É graças às lembranças armazenadas na memória, que o indivíduo imagina,
sonha, lembra o vivido e o interpreta sendo estimulado por fatores externos a si. O
passado atualiza-se por meio de um cheiro, de um gesto, de um som, de uma cor, de
uma imagem enquanto vestígio da lembrança que ativa as recordações e evoca um
tempo que já não nos pertence.
Bosi (1994, p. 46-47), afirma:
[...] A memória permite a relação do corpo presente com o passado e,
interfere no processo atual das representações. Pela memória, o
passado não só vem a tona das águas presentes, misturando-se com
as percepções imediatas, como também empurra, “desloca” estas
últimas, ocupando o espaço todo da consciência. A memória aparece
como força subjetiva ao mesmo tempo profunda e ativa, latente e
penetrante, oculta e invasora.
De acordo com a autora, cada memória individual é uma compreensão, um
ponto de vista sobre a memória coletiva, que se modifica de acordo com o lugar que
algo ocupa sendo que este lugar varia segundo as relações que se mantém com
outros meios. Deste modo, Bosi (1994, p. 81) entende a lembrança como:
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
[...] um diamante bruto que precisa ser lapidado pelo espírito. Sem o
trabalho da reflexão e da localização, seria uma imagem fugidia. O
sentimento também precisa acompanha-la para que ela não seja uma
repetição do estado antigo, mais uma reaparição.
Na narrativa da professora A percebe-se a dimensão do que Bosi (1994) infere.
Ao falar em memórias de escola me vem logo à boca um gosto
enorme de saudade, pois apesar da pouca idade lembro-me com
clareza de muitos momentos. Dos meus erros e acertos, da minha
turma, das (os) minhas (os) professoras (os) e, principalmente, da
cobrança incansável de minha mãe. [...] Refletindo, reportei à infância
que vivi dos momentos em que, no espaço escolar, recebi as
primeiras instruções, pois as primeiras letras e palavras aprendi com
minha mãe.
A mesma perspectiva teórica de Bosi (1994) é encontrada em Maurice
Halbwachs (1990), na obra Memória Coletiva. Para esse autor a lembrança pode ser
reconstruída ou reelaborada a partir do presente, constituindo-se por um emaranhado
de lembranças advindas de tempos anteriores.
[...] a lembrança é em larga medida uma reconstrução do passado
com a ajuda de dados emprestados do presente, e além disso,
preparada por outras reconstruções feitas em épocas anteriores e de
onde a imagem de outrora manifesta-se já bem alterada
(HALBWACHS, 1990, p. 71).
Ainda segundo Halbwachs (1990), pela memória, o passado emerge,
misturando-se com as percepções presentes, arrastando-as para o tempo presente,
deste modo, a natureza da lembrança torna-se memória social.
Deste modo:
Nossas lembranças permanecem coletivas, e elas nos são lembradas
pelos outros, mesmo que se trate de acontecimentos nos quais só
nós estivemos envolvidos, e como objetos que só nós vimos. É
porque, em realidade, nunca estamos sós. Não é necessário que
outros homens estejam lá, que se distingam materialmente de nós:
porque temos sempre conosco e em nós uma quantidade de pessoas
que não se confundem (HALBWACHS, 1990, p. 26).
Nesta perspectiva, Halbwachs (1990), integra a memória do indivíduo à
memória coletiva, assim, a memória que é propriedade de um sujeito, integra a
memória de um povo, internalizando e integrando, suas regras, seus costumes, sua
cultura, e tudo o que foi imposto socialmente. É possível compreender assim que,
mesmo solitário, o ser humano nunca está sozinho e suas lembranças que se gravam
na memória são o resultado de suas relações coletivas vividas socialmente. Portanto,
ainda que não haja essa presença física do outro, tem-se uma presença subjetiva.
Ao resgatar o passado, enquanto memória social caberia perguntar como o
indivíduo apoia-se no presente para recuperar o caminho condutor do passado?
Mesmo entendendo tal dificuldade, Bosi (1994, p. 81) infere que a “[...] faculdade de
FONAPER
relembrar exige um espírito desperto, a capacidade de não confundir a vida atual com
a que passou, de reconhecer as lembranças e opô-las às imagens de agora”. Por
conseguinte: “a lembrança é a sobrevivência do passado” (BOSI, 1994, p. 53).
Tanto para Halbwachs (1990), quanto para Bosi (1994) a lembrança consiste
em uma atividade da memória que permite emergir as vivências individuais
impregnadas de influências da coletividade, isto porque, segundo Halbwachs (1990), a
lembrança é uma atividade da memória que envolve profunda relação entre repetição
e rememoração, ou seja, a cada momento, ao mesmo tempo em que as memórias são
repetidas, elas são sempre revisadas. A memória apoia-se sobre o “passado vivido”,
permitindo a constituição de uma narrativa sobre o passado do indivíduo de forma viva
e natural.
Neste sentido, ao interpretar as narrativas dos sujeitos desta pesquisa
(professorres/as-narradores/as) entendemos que, cada um, ao elaborar, por escrito, a
narrativa de sua trajetória escolar na escola pública tendo por base referencial a
presença do Ensino Religioso, apresenta informações que possivelmente não se teria,
inclusive sobre o Ensino Religioso, se a temática, fosse, por exemplo, a educação
física escolar. Com isso, reforçamos a ideia de que a memória emerge, a partir da
significação e resignificação da lembrança, ou seja, a partir do ponto referencial a que
se pretende lembrar. Neste sentido, nem tudo é relembrado. Quem lembra, seleciona
e resignifica o que lembra. “[...] Que memória escolhemos para recordar e relatar (e,
portanto, relembrar), e como damos sentido a elas são coisas que mudam com o
passar do tempo” (THOMSON, 1997, p. 57).
Apesar desse caráter paradoxal da memória (esquecer, lembrar, não lembrar,
não esquecer), Bosi (1994, p. 90) a caracteriza como “[...] a faculdade épica por
excelência. Não se pode perder, no deserto dos tempos, uma só gota da água irisada
que, nômades, passamos do côncavo de uma para outra mão”. Por meio da memória
a história pode ser repassada de geração a geração e nisto reside a função social da
memória: lembrar o passado.
Um mundo social que possui uma riqueza e uma diversidade que não
conhecemos pode chegar-nos pela memória dos velhos. Momentos
desse mundo perdido podem ser compreendidos por quem não os
viveu e até humanizar o presente. A conversa evocativa de um velho
é sempre uma experiência profunda: repassada de nostalgia, revolta,
resignação pelo desfiguramento das paisagens caras, pela
desaparição de entes amados, é semelhante a uma obra de arte
(BOSI, 1994, pp. 82-83).
Se a memória ocupa função social, perder a memória implica na perda não
somente do passado, mas principalmente na perda do presente, uma vez que este se
constrói e reconstrói-se resignificando aquele, mesmo que de forma inconsciente.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Aperda da memória implica um estado de suspensão do próprio entendimento de ser
humano, posto que seja pela memória que o homem se humaniza, como ressalta Bosi
(1994).
Tanto para Bosi (1994) como para diversos teóricos que se ocupam da
investigação referente à memória, esta é entendida como o resultado do
entrelaçamento das experiências de um tempo vivido, tornando-se uma espécie de
“guardiã” da integridade de cada pessoa, que assegura a sobrevivência de
acontecimentos que marcaram uma época e garante a partilha desses acontecimentos
entre indivíduos de um grupo afim. Deste modo, o ato de lembrar torna-se então uma
emergência dos registros da memória, uma vez que,
[...] a memória não é um instrumento para a exploração do passado;
e, antes, meio. É o meio onde se deu a vivência, assim como o solo é
o meio no qual as antigas cidades estão soterradas. Quem pretende
se aproximar do próprio passado soterrado deve agir como um
homem que escava (BENJAMIN, 1987b, p. 239).
Benjamin entende que a atitude de aproximação do passado é um trabalho
como do arqueólogo que escava em busca de resquícios do passado, uma vez que a
memória é o meio para resgatá-lo, deste modo a memória é a recuperação de
fragmentos revisitados e que emergem quando escavados. Percorrido esse percurso
que entrecruza narrativa, lembrança e memória, afirmamos que se a lembrança é o
exercício da memória, a narrativa é sua forma privilegiada de transmissão, posto que
pela narrativa se expressa, tanto as experiências pessoais quanto aquelas
aquinhoadas pela experiência relacional e comunitária, ou melhor, social. E esta
compreensão tornou-se crucial na opção de escolha da narrativa como caminho
investigativo e ponto basilar desta pesquisa.
O modelo confessional a parir da interpretação das lembranças discentes
Bosi (1994, p. 68) pontua que “a lembrança é a história da pessoa e seu
mundo, enquanto vivenciada”. Não se trata de um recuso de simples rememorização,
mas um resgate da vivência deixada em um canto da memória a qual o ser humano
recorre a fim de compor momentos significativos de sua história. Neste sentido, a
lembrança é um retrato que o ser humano constrói utilizando materiais disponíveis do
seu hoje, a partir do conjunto de representações que povoa sua consciência atual.
Assim, por mais nítida que a imagem de um acontecimento do passado possa parecer
ela não é a mesma imagem vivenciada no momento vivido. Ao relatar suas
lembranças escolares enquanto alunos sujeitos/objetos do Ensino Religioso na escola
pública, os/as narradores/se, ainda que esforcem apresentam suas lembranças
FONAPER
significadas do que viveram, posto que suas percepções, ideias, juízos de realidade e
de valor que hoje possuem são diferentes daqueles vividos no momento em eram
alunos.
Disto inferimos que a percepção que da professora B tem de sua primeira
escola ao narrar sua vida escolar não tenha sido exatamente aquela que possuía a
época em que era aluna.
Apesar de não ser uma escola repleta de recursos, materiais
pedagógicos diversificados, era um ambiente agradável, com valores
e respeito ao próximo. A comunidade local ajudava com o que era
possível e os alunos eram comprometidos, não me lembro de ter
havido desacato de educando com professor, tenho boas lembranças
daquele período.
O professor não possuía uma formação pedagógica, um curso
superior, nem mesmo magistério, ele só possuía a 8ª série e o curso
técnico em Contabilidade, mas eu sempre o via preparando as aulas,
estudando, planejando, sua letra era muito bonita, ele falava bem,
tinha domínio de sala e conseguia realizar bem sua função apesar do
pouco estudo que possuía.
Na narrativa aparecem categorias significadas a partir se sua vivência atual,
posto que entendê-las hoje, faz parte de seu próprio amadurecimento que advém de
sua formação enquanto pedagoga (ausência de recursos pedagógicos, compromisso
dos alunos, desacato ao professor, formação de seu professor). Interpretamos tal
narrativa como resignificação de sua própria experiência como pedagoga. É a partir
desse referencial que ela deixa emergir suas lembranças escolares.
Ao elaborar sua tese Sobre o conceito de história, Benjamim (1987a, p. 224)
afirma:
A verdadeira imagem do passado perpassa veloz. O passado só
existe se deixa fixar, como uma imagem que relampeja
irreversivelmente, no momento em que é reconhecido [...] Articular
historicamente o passado não significa conhecê-lo “como ele de fato
o foi”. Significa apropriar-se de uma reminiscência, tal como ela
relampeja [...]
Como se pode notar, para o filosofo, o passado não é concreto em si posto que
ao narrá-lo não se pode conhecê-lo “como ele de fato o foi”. Deste modo, uma
lembrança revivida, contada, narrada, sempre se dá como nova experiência, uma vez
que se é possível ampliar sintetizar, ampliar ou até extinguir as sensações que
emergem, posto que em cada momento de uma recordação, um acontecimento ganha
ou perde significado. Neste sentido, as pesquisas narrativas (na qual se enquadra as
autobiográficas) religam o sujeito a suas lembranças, deste modo, revisitar as
experiências vividas (suas histórias) a partir de uma temática (as aulas de Ensino
Religioso) guiam e orientam uma retrospectiva, para extrair daí os significados
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
atribuídos a essas vivências. Portanto, o tema gerador “lembranças discentes”
apresenta-se distribuído em 6 (seis) unidades de sentido, a saber: Impressões sobre a
vida escolar; como eram as aulas de Ensino Religioso; quem as ministrava; que
interesse os alunos demonstravam; o que se ensinava e que relação constituíam com
os outros conteúdos escolares.
Impressões sobre a vida escolar:
Nas lembranças discentes, para a maioria dos/as narradores/as, aparecem
impressões positivas da vida escolar haja vista aparecer em suas histórias adjetivos
como “muito boa, “muito tranquila”. Professor C conta que a professora era exigente e
ao fazê-lo ler os textos da bíblia, entende que tais leituras Essas leituras serviam para
transformar [seu] dia-a-dia por meio da educação religiosa. Também para o professor
D os exemplos que os professores davam conseguia influenciar o comportamento dos
alunos. Na narrativa da professora E se destaca a postura de obediência e
subserviência dos alunos em relação aos professores: “O que o professora falava a
gente seguia”. Importante perceber que na narrativa da professora A, há um dado
relevante, pois mesmo considerando a vida escola “boa” a narradora faz conexão com
as aulas de Ensino Religioso e diz que tais aulas não eram boas “pois havia muita
discriminação religiosa”.
Como eram as aulas de Ensino Religioso
As lembranças que demarcam as aulas de Ensino Religioso residem na esfera
de um catolicismo tradicional posto que haja sempre a recitação de orações, e até
mesmo das lições do catecismo. De acordo com as lembranças do professor D “As
aulas eram sempre expositivas”. Quando muito, percebe-se que as aulas ganham uma
dimensão cívica com a introdução de cantos como o Hino Nacional (professora F).
Para a professora G, eram aulas em que não havia participação A aula sempre
passava rápido e não tínhamos espaços para discussões. As aulas eram meio chatas,
porque a gente recebia o conteúdo sem o direito ao questionamento. Essa história
opõe-se a da professora H que conta que sua professora lia um texto bíblico e
expunha suas ideias e por fim, permitia a participação dos alunos.
Destaco que
professora E percebe tais aulas como momento de relaxamento entre o que ela chama
de disciplinas “muito puxadas”. Também vem da professora E a informação de que se
tratava de uma “matéria extremamente importante”. Ao apresentarem suas histórias
os/as narradores/as demarcam o horário escolar em que a disciplina era ministrada. E
esta variava de acordo com cada escola, ora sendo realizada no início da manhã, ora
FONAPER
entre disciplinas, ora após o recreio, ora ao final das atividades escolares, o que neste
caso, promovia certa evasão (professora G).
Penso ser necessário evidenciar ainda um fato de grande relevância que se
percebe na narrativa de professor C:
Algumas aulas eram realizadas na escola, outras na Igreja Congregação Cristã, igreja do véu – com isso nós tínhamos duas
aulas por semana. [...]. As aulas não tinha horário definido, mas era
sempre um dia na Igreja e outro na escola. Para quem frequentava a
Igreja tinha aulas também aos domingos.
Esse fato promove a percepção da relação estabelecida entre o público e o
privado, entre igreja e estado (escola), mesmo em se tratando de um país republicano
e laico e de uma escola pública.
Quem as ministrava:
Quanto à regência da disciplina os narradores permitem encontrar dois grupos
docentes: os professores que ministravam outras disciplinas, e que as vezes,
precisavam complementar suas cargas horárias ou por pessoas ligadas a igreja
catequista, cooperador, freira. Somente a professora A menciona que em certo
momento teve professor especifico de Ensino Religioso.
Que interesse os alunos demonstravam:
As lembranças permitem inferir que os alunos não se mostravam interessados
na disciplina. Professora A arisca uma hipótese “talvez pela maneira que era
trabalhada a disciplina”. Penso ser interessante destacar a percepção de professora
G: “Os alunos de outras religiões ficavam constrangidos quando a professora
trabalhava com textos de conteúdo católico”, talvez esse constrangimento causasse
desinteresse por parte dos alunos. Professora H associa o desinteresse dos alunos a
questões de avaliação: “Nós alunos não tínhamos interesse em desenvolver os
trabalhos dessa disciplina, porque não valia nota”. Uma única narrativa que destoa das
demais é a de Professor D:
gostávamos mais das aulas de Ensino Religioso que das aulas de
matemática, pois tínhamos mais atenção e concentrávamos mais.
Suas aulas eram interessantes, pois aguçava cada vez mais nossa
curiosidade em saber as diferenças entre o que era certo e o que era
errado. Isso sabia na ponta da língua.
Para professor C, dado o desinteresse e a desvalorização da disciplina,
somente a minoria aprendia o conteúdo ministrado, isto porque “o conteúdo passado
era fraco, então as aulas não rendiam muito”.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
O que se ensinava:
Com exceção da narrativa de Professor J, todos/as os/as demais narradores
referem-se a conteúdos de base bíblica. Deste modo, percebemos a força dos valores
cristãos, presentes em todo o percurso da história e da constituição do povo brasileiro.
E a partir da bíblia que os conteúdos são construídos na escola, o que demonstra
haver um entendimento unilateral da religião: a cristã, seja evangélica, protestante ou
católica.
Que relações constituíam com os outros conteúdos escolares.
Nas narrativas de sete, dos onze, narradores emergi a questão da relação que
os conteúdos das aulas de Ensino Religioso estabeleciam com os demais conteúdos
ministrados na escola. Nas lembranças dos professores A, C, D, J os conteúdos não
se relacionavam com outras áreas do conhecimento. É somente na narrativa de
professor H que se encontra a afirmativa que havia certo relacionamento entre Ensino
Religioso e outras disciplinas escolares:
Quanto aos conteúdos das aulas de Ensino Religioso, as vezes se
relacionavam com a disciplina de língua portuguesa, pois alguns
textos eram interpretativos, mas não tinha muito aproveito por que
eram atividades que não chegavam ao nível da turma, assim se fosse
para colocar na balança, eram atividades bem simples mesmo, bem
fáceis.
O professor D em sua narrativa aponta para o fato de que mesmo esses
conteúdos não se relacionando com os demais saberes escolar, os ensinamentos que
ele recebeu, serviram para sua vida. A professora A e o professor C entendem que a
ausência do relacionamento entre os conteúdos reside no fato de que em seus tempos
escolares não se tinha presente os debates em torno da interdisciplinaridade.
Considerações Finais
Ao cruzar os relatos das memórias discentes dos professores, com o relato de
suas práticas, percebe-se que a construção do modelo de ensino confessional emerge
de suas vivencias. No que diz respeito ao proselitismo religioso, todos os participantes
declaram-se cristãos católicos e evangélicos e na unidade de significado referente ao
como trabalha a disciplina em sala temos:
Professora B: [...] às vezes os alunos não tem conhecimento do pai-nosso,
que tem família [...] tem família que não senta, não abre a bíblia, não discute uma
palavra de Deus [...] o primeiro texto que trabalhei com eles esse ano foi “a família,
presente de Deus”.
FONAPER
Professora E: Mas eu gosto muito aprofundar dentro da palavra de Deus que
é muito importante.
Professor J: Eu sou pastor [...] trabalhar o ensino religioso é aproximar as
crianças de Deus.
Como se pode observar nas narrativas o ensino é proselitista uma vez que o
conteúdo volta-se à uma única possibilidade de entendimento do sagrado (perspectiva
cristã). Há, como se pode notar, a tomada do espaço público como prolongamento do
espaço privado, e podemos atribuir tal situação a dois motivos que se desvelam no
decorrer da pesquisa: o primeiro refere-se a ausência de formação para ministrar tal
disciplina, o segundo diz respeito ao entendimento reinante que ensino religioso é
espaço de ensino de catequese doutrinal e das verdades relativas a fé e não espaço
de construção de conhecimento sobre as religiões. Não havendo uma formação que
possibilite entender o ensino religioso como parte do currículo escolar, os professores
replicam suas experiências e reatualizam o modelo confessional.
Referências
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história da cultura. Obras Escolhidas 1. Trad. Sérgio Paulo Rouanet. 3. ed.. São Paulo:
Ed. Brasiliense, 1987a.
_____. Rua de mão única. Obras Escolhidas 2. Trad. Rubens Rodrigues Torres Filho
e José Carlos Martins Barbosa. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1987b.
BICUDO, Maria Aparecida Viggiani. A pesquisa qualitativa olhada para além dos seus
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BOSI, Ecléa. Memória e sociedade: lembranças de velhos. São Paulo: Companhia
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Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9475.htm> Acesso em: 10
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CATANI, D. B. et al. Docência, memória e gênero. São Paulo: Escrituras, 1997.
CHIZOTTI, Antônio. Pesquisa em ciências humanas e sociais. São Paulo: Cortez,
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HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. Tradução Laurent Léon Schaffter. São
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OLIVEIRA, Lilian Blank. A formação de docentes para o ensino religioso no Brasil:
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PERUJO SERRANO, Francisco. Pesquisar no labirinto: a tese, um desafio possível.
São Paulo: Parábola Editorial, 2011.
SOUZA, Elizeu Clementino de (Org.). Autobiografias, História de Vida e Formação:
pesquisa e ensino. Salvador/Bahia: EDUNEB - EDIPUCRS, 2006.
HOMSON, Alistair. Recompondo a memória: Questões sobre a relação entre a História
Oral e as memórias. In: Projeto História: revista do Programa de Estudos PósGraduação em História do Departamento de História da PUC-SP: Ética. História Oral.
número 17: São Paulo: EDUC, 1998. p. 51-84.
FONAPER
ENSINO RELIGIOSO EM PERNAMBUCO: ABORDAGEM E POSSIBILIDADES
PARA OS DOCENTES DA REDE ESTADUAL NAS CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
Rosalia Soares de Sousa - SEE/PE50
Wellcherline Miranda Lima - SEE/PE51
Resumo:
Este artigo traz uma reflexão sobre do Ensino Religioso (ER) para a sociedade através dos
questionários aplicados nas Formações realizadas pela Secretaria de Educação e Esportes de
Pernambuco. O objetivo é abordar e refletir nas possibilidades de contribuição desse
componente curricular na formação básica do cidadão que se encontra em processo de
formação considerando os direitos fundamentais da criança e do adolescente. A metodologia
dessa pesquisa foi revisão bibliográfica e através de aplicação de questionários.O resultado
apontou para a confirmação da contribuição desse componente curricular no Estado de
Pernambuco e da necessidade de continuar no caminho do Ensino Religioso com promoção a
Educação em Direitos Humanos com a inserção da valorização da diversidade religiosa e
cultural brasileira através das Ciências da Religião.
Palavras-chave: Ensino Religioso. Docentes. Escola Pública.
O Ensino Fundamental na formação básica do cidadão
O Ensino Religioso é uma área de conhecimento de oferta obrigatória para o
Ensino Infantil e Fundamental como os demais componentes. Segundo a LDBEN, a
matrícula só é efetivada se o responsável legal do estudante fizer a opção. Essa
condição é determinada também pela Constituição da República Federativa do Brasil
em seu artigo 210. Entretanto, apesar de não ser obrigatório, esse componente
procura atender à função social da escola de conformidade com a legislação vigente.
No entanto, o Ensino remete à instrução enquanto o religioso deve ser
entendido como a dimensão humana de abertura ao transcendente que se almeja
educar no ambiente escolar com base no respeito à diversidade dos sujeitos
existentes nesse espaço educacional. O fenômeno religioso é o seu objeto de estudo
sendo expresso nas manifestações religiosas.
O ordenamento jurídico do Brasil está baseado em princípios que expressam a
conduta e os valores do povo brasileiro. De acordo com Sundfeld (1995, p. 18) os
50 Autoria:
Licenciada em Geografia e Mestra em Ciências da Religião (UNICAP) e docente
efetiva da Secretaria de Educação e Esportes de Pernambuco onde trabalha com o
componente curricular Ensino Religioso no Ensino Fundamental - Anos Finais, da Gerência
de Políticas Educacionais de Educação Infantil e Ensino Fundamental – GEIF.
Email:[email protected].
51 Co-autoria: Licenciada em História (UNICAP) e Ciências Biológicas (UFPE), Mestra em
Ciências da Religião (UNICAP), docente efetiva da Secretaria de Educação e Esportes de
Pernambuco. Email: [email protected].
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
princípios devem ser entendidos como as "ideias centrais de um sistema, ao qual dão
sentido lógico, harmonioso, racional, permitindo a compreensão de seu modo de se
organizar". Assim, os princípios do Ensino Religioso (e demais componentes
curriculares) deverão estar fundamentados nos princípios constitucionais e a partir
dele na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9394/96, incluindo a
Lei 9475/97 que dá nova redação ao art. 33.
São considerados princípios do Ensino Religioso: A igualdade de condições
para o acesso ao conhecimento das tradições culturais religiosas em todas as escolas
da rede pública do ensino fundamental. Esse princípio não pode ser efetivado para
todos os estudantes pelo fato óbvio de a matrícula para esse componente curricular
ser opcional.
Outro princípio constitucional é o pluralismo religioso. Reconhecer a
diversidade religiosa dos sujeitos que fazem parte do universo escolar é dever de
todos. Esse princípio faz jus à condição de país de riquíssima diversidade cultural
como o Brasil, notável em vários povos que deram sua contribuição no processo de
formação desse espaço geográfico.
Os povos indígenas, já ocupavam esse território quando da chegada dos
portugueses. A migração forçada dos negros africanos, além de outros povos
europeus e asiáticos que vieram para cá contribuindo com o processo de
miscigenação fez surgir essa diversidade cultural que precisa ser considerada na
escola, valorizando a experiência que os estudantes trazem sobre sua religiosidade,
mas abordar também a religiosidade regional e brasileira.
As Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de 09 (nove)
anos apresentam em seus fundamentos que as escolas devem:
Assegurar a cada um e a todos o acesso ao conhecimento e aos
elementos da cultura é um direito humano e imprescindíveis para o
seu desenvolvimento pessoal e para a vida em sociedade, assim
como os benefícios de uma formação comum, independentemente da
grande diversidade da população escolar e das demandas sociais
(BRASIL, 2010, p.01).
Para que o Ensino Religioso Escolar cumpra sua função social é importante
considerar os princípios éticos, políticos e estéticos determinados pelas Diretrizes
Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de 09 (nove) anos.
No primeiro, espera-se que esse componente possa contribuir para a
eliminação dos preconceitos religiosos combatendo a discriminação expressas nas
abordagens orientadas pelo professor, pelas opções dos estudantes em professar
religiões consideradas minorias em relação àquelas predominantes. Liberdade,
autonomia, justiça e solidariedade, portanto, são expressas nesse princípio ético.
FONAPER
Considerando o segundo princípio (políticos), espera-se que o Ensino Religioso
possa contribuir para o reconhecimento dos direitos dos estudantes em expressar sua
religiosidade e deveres quanto ao respeito do outro também poder expressar-se
livremente a sua opção religiosa, à preservação dos templos religiosos evitando
depredações nos símbolos de outras religiões. O reconhecimento da igualdade de
direitos entre os sujeitos escolares que apresentam diferentes necessidades também
fazem parte desse segundo princípio.
Quanto ao terceiro princípio (Estéticos), faz-se necessário o estímulo e
desenvolvimento da sensibilidade, da racionalidade, da criatividade e valorização das
diferentes expressões da cultura (local, regional e nacional) do reconhecimento do
pluralismo religioso, característico da sociedade brasileira.
Os pressupostos referem-se à interdisciplinaridade e contextualização como
estruturadores da organização do currículo; o reconhecimento “do transcendente e do
sagrado através de fontes escritas e orais, ritos, símbolos e outras formas de
expressão, identificadas e organizadas pelas tradições religiosas”. Reconhece também
os valores (éticos/morais) que cada tradição religiosa traz e a garantia da dignidade do
ser humano; a cultura de paz; justiça e solidariedade entre os diversos povos; o
reconhecimento do pluralismo religioso presente na escolas que deverá ser respeitado
como direito inerente a cada indivíduo; a busca pelo diálogo entre as diversas
religiões.
De acordo Orientações Curriculares de Educação em Direitos Humanos:
O objetivo deste documento é contribuir para a qualidade da
educação de Pernambuco, proporcionando a todos os
pernambucanos uma formação de qualidade, pautada na Educação
em Direitos Humanos em prol da valorização da diversidade e do
respeito pelo diferente, que garanta a sistematização dos
conhecimentos desenvolvidos na sociedade e o desenvolvimento
integral do ser humano (PERNAMBUCO, 2012, p.16).
A dignidade existe mesmo quando não é reconhecida pelo Direito.
Ela
compreende qualidade inerente a todo e qualquer ser humano, portanto é
irrenunciável e inalienável no qual Sarlet diz que "Assim sendo, temos por dignidade
da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser
humano que o faz merecedor de respeito e consideração por parte do Estado e da
comunidade [...]” (2006, p. 60).
Conclui que os direitos humanos se fundamentam na dignidade e na razão
humana, que são naturais, iguais e universais, contudo, só ganham significado político
quando adentram na Declaração da Independência Americana de 1776 e na
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão em 1789. Segundo Benevides
(2000, p.337)
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Direitos Humanos são aqueles comuns a todos, a partir da matriz do
direito à vida, sem distinção alguma decorrente de origem geográfica,
caracteres de fenótipo, [...] de etnia, nacionalidade, sexo, faixa etária,
presença de incapacidade física ou mental, nível socioeconômico ou
classe social, nível de instrução, religião, opinião política, orientação
sexual ou qualquer tipo de julgamento moral [...] decorrem do
reconhecimento da dignidade intrínseca de todo ser humano .
A Educação em Diretos Humanos, compreendida como processo permanente
e multidimensional, tem por objetivo formar o sujeito de direitos, dando-lhe ciência
disso e dos mecanismos destinados a sua proteção e promoção.
Segundo Candau e Sacavino defendem que formar sujeitos de direitos
pressupõe "[...] reforçar no cotidiano [...] a lógica expansiva da democracia, afirmar o
princípio e o direito da igualdade estabelecidos na esfera jurídica e política e
transportar essa dimensão igualitária para as diversas esferas da sociedade” (2010,
p.56).
Contudo, educar em direitos humanos não implica na mera socialização de
conhecimentos historicamente construídos no campo dos direitos humanos de forma
atualizada e demanda ainda por uma teoria de educação e processos metodológicos
coerentes com os direitos humanos.
Assim sendo, defendemos a inserção da mesma no contexto das pedagogias
críticas com forte influência da educação popular compreendida como "[...] prática
educativa engajada politicamente, comprometida com os grupos sociais que sofrem
diferentes processos de marginalização e diferentes formas de inclusão social e
cultural perversa." (SOUZA, 2007, p. 374).
Portanto, o Ensino Religioso é direito humano de todos os estudantes, sem
exceções, pois desenvolverá o potencial da transcendência humana, além de
oportunizar o pleno exercício dos mais variados direitos cumprindo, assim, a função
social da escola.
Fundamentação legal para o Ensino Religioso e o seu cenário em Pernambuco
Considerando a ausência de Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino
Religioso e de Parâmetros Curriculares para a Educação Básica de Pernambuco
destinado ao componente curricular Ensino Religioso.
A fundamentação legal para esse componente curricular deve ser feita através
dos documentos oficiais existentes, a saber:
 Organização das Nações Unidas (ONU), através da Declaração Universal
dos Direitos do Homem;
FONAPER
 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988; Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional, nº 9394/96; Lei nº 9475/97 que dá nova
versão ao art. 33 da LDB;
 Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica; Diretrizes
Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de 09 (nove) anos.
Outros fundamentos legais que oficializa e especifica, conforme a instituição
local, o Ensino Religioso, a saber:

Constituição Estadual de Pernambuco;

Resolução nº 5 de 09 de maio de 2006 CEE/PE52;

Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA);

e da Instrução Normativa nº 01 de 2012 da Secretaria de Educação e
Esportes do Estado de Pernambuco. (SOUSA, 2014, p. 22-23)
O Estado de Pernambuco através do Conselho Estadual de Educação publicou
no ano de 2006 a Resolução nº 05 cujo dispõe sobre o Ensino Religioso (ER) nas
escolas da rede pública de ensino constando na formação básica dos estudantes do
ensino fundamental.
O proselitismo também está presente nessa resolução e assim como na Lei nº
9.394/1997 fica expressamente proibido, bem como os conteúdos direcionados para
esse ou aquele credo religioso. Os mesmos deverão constar no projeto-políticopedagógico de cada unidade de ensino desde que estejam em consonância com os
pressupostos das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental.
A trajetória do Ensino Religioso em Pernambuco apresenta os passos da
estruturação dessa área de conhecimento inserido no âmbito da sociedade, desde o
período da colonização nos espaços da educação informal (lares domésticos) e da
educação jesuítica; assim como no espaço escolar, em especial na rede estadual de
ensino vista até início dos anos de 1990.
No início dos anos 1990 a Secretaria de Educação deu inicio a implementação
de um novo projeto pedagógico, conhecido pelos docentes da rede estadual de
“Coleção Carlos Maciel” 53 essa ação decorrente no ER houve um processo de
participação do segmento católico interessados na sua organização e efetivação como
elemento normal do sistema.
Entre os conteúdos que respaldam essa Proposta, são apresentadas as
dimensões do ER, o documento importa sob a titulação de “os mundos” e mais adiante
52
Conselho Estadual da Educação de Pernambuco.
Houve a revisão e atualização dos currículos das disciplinas, e estabeleceu diretrizes
próprias, visto também para o Ensino Religioso. A proposta curricular elaborada, em 1990,
incluiu os conteúdos básicos cristão para Ensino Religioso, na perspectiva de sua integração
com os conteúdos: a natureza, o trabalho, a sociedade.
53
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
explica que “essa dinâmica atinge a pessoa em todas as dimensões de sua vida, daí
os “mundos” ou áreas onde o indivíduo efetiva a sua práxis” (PERNAMBUCO, 1993,
p.14). Os mundos considerados situações chaves que permitiam a reflexão sobre os
temas que o sujeito esteja inserido, focalizando sob diversos ângulos de visão:
econômico, social, cultural, político, religioso, família, escola e sociedade.
Entre os temas chamados de mundos que respaldam essa Proposta,
apresentado na segunda parte do documento que importa sobre a Fundamentação do
Ensino Religioso que é na reflexão sobre o ser humano como ser “situado histórico” e
mais “[...] deve levar ao conhecimento dos núcleos estruturais causadores dos
problemas. O desconhecimento destes núcleos nos levaria a soluções funcionalistas”
(PERNAMBUCO, 1993, p.17). Entende-se que a Proposta mescla com referência ao
contexto político da redemocratização que o país estava vivendo. No entanto, ao
utilizar as categorias de transcendência e alteridade, não consegue sair do enfoque
teológico e, consequentemente, não resolve o problema epistemológico da disciplina.
Com a implementação da última versão da LDBEN nº 9.394/1996 o Ensino
Religioso na rede pública estadual pernambucana notam-se a existência de propostas
diferenciadas que estão divididas em duas, de ordem cronológica conforme a nova
redação do artigo 33, dada pela Lei nº 9475/1997, e em três períodos mediante aos
anos de 1997 a 2006, de 2007 a 2010 e posteriormente 2011.
No primeiro momento originou uma nova orientação pedagógica proposta pela
Coordenação do Ensino Religioso da Secretaria de Educação de Pernambuco com
reuniões bimestrais com os técnico-pedagógicos para a revisão e atualização dos
currículos das disciplinas, assim como as formações inicial e continuada; nesse
sentido, estabeleceu proposta de diretrizes curriculares para o Ensino Religioso e a
disciplina inserida no horário escolar.
A proposta chamada de Referencial Curriculares da Disciplina do Ensino
Religioso do ano 2006 apresenta a produção com base na fundamentação teóricometodológica foi contemplado o amadurecimento do projeto de vida pessoal do
discente; o desenvolvimento da sua religiosidade; o reconhecimento e valorização do
pluralismo religioso; e o incentivo à participação efetiva na construção da sociedade,
através da reflexão ética e prática cidadã, conforme o documento abaixo:
No processo de formação, o conhecimento religioso, somando aos
demais setores do conhecimento, vem responder à busca inata do
Transcendente, da compreensão profunda do valor e dignidade da
pessoa humana e do sentido da vida. A apreensão do fenômeno
religioso, tanto através do estudo dos elementos que compõem os
mitos, ritos e instituições, quanto das teologias, ideologias e visões de
mundo elaborado por cada tradição[...] (PERNAMBUCO, 2006, p.08)
FONAPER
Na compreensão de Passos, as características tanto proposto pelo Referencial
Curricular assim como as formações destinadas aos docentes trata-se do Modelo das
Ciências da Religião que abrange as mais variadas modalidades de religiosidade,
filosofias de vida, incluindo o ateísmo. Nesse sentido, “este modelo tem o mérito de
superar uma visão unirreligiosa e pautarem-se pelo diálogo entre as confissões
religiosas presentes nas escolas” (PASSOS, 2007b, p.64).
Na segunda fase de 2007 a 2010 ocorreram mudanças significativas em
termos de normatização e métodos pedagógicos no que se refere especificamente ao
ER a Instrução Normativa nº 03/2008 o Ensino Religioso nos estabelecimentos de
ensino da Rede Estadual. Segundo a Instrução Normativa nº 03/2008, o Ensino
Religioso no Ensino Fundamental deve ser:
Parágrafo 1 º. O Ensino Religioso ofertado obrigatoriamente pela
Escola é de frequência facultativa para os estudantes e será
ministrado no horário normal da aula e em turno diferente no qual o
estudante está matriculado.
Parágrafo 2º. A oferta do Ensino Religioso deverá expressar a
diversidade cultura-religiosa da sociedade onde a escola está
inserida, devendo ser desenvolvida sob a forma de seminários
quinzenais, de 04h/a, por turno, contemplando todas as opções
religiosas. (PERNAMBUCO, 2008, p.15).
O instrumento normativo em destaque que regulava a rede estadual de ensino
naquele período não atendia (e ainda nos dias atuais continua sem entrar em
consonância com a legislação federal) a LDBEN Lei Federal nº 9.394/96 com a sua
nova redação Lei nº 9.475/97, verificando por etapa, segue a análise do parágrafo 1º
que contradiz a legislação federal na qual essa se refere aos horários sendo “normais
das escolas públicas de ensino”, ou seja, a disciplina do Ensino Religioso deve ser
inserida dentro do horário em que o discente está matriculado garantindo a
frenquência e permanência do mesmo.
No parágrafo 2º transforma o ER em seminários, entretanto o ER passa a sua
compreensão como disciplina e ampliação como área de conhecimento, segundo nos
termos da Resolução CNE/CEB nº 02/1998:
b) as áreas de conhecimento:
1. Língua Portuguesa
2. Língua Materna, para populações indígenas e migrantes
3. Matemática
4. Ciências
5. Geografia
6. História
7. Língua Estrangeira
8. Educação Artística
9. Educação Física
10. Educação Religiosa (CNE, 1998, grifo nosso)
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Segundo Cesar Coll esclarece sobre a dimensão do termo disciplina sendo “um
campo especializado de conhecimento é um domínio, um território [...] com fronteiras
permeáveis, com uma certa visão especializada [...]” (COLL, 1998 apud JUNQUEIRA,
2002, p.26). Nos PCN do Ensino Fundamental -3º e 4º ciclos informam sobre a
dimensão de área de conhecimento:
As áreas de conhecimento constituem importante marcos estruturados de
interpretação de leitura e interpretação da realidade, essencialmente para garantir a
possibilidade de participação do cidadão na sociedade de uma forma autônoma.
Através das diferentes áreas, os conteúdos selecionados em cada uma delas e
o tratamento transversal de questões sociais constituem uma representação ampla e
plural dos campos de conhecimento e da cultura do nosso tempo, favorecendo a
integração do estudante na comunidade na qual participa.
No Ensino Médio é opcional para a escola e facultativa para o estudante e
quando ofertado deve ser ministrado em horário normal da escola e em turno diferente
daquele no qual o estudante está matriculado.
As opções religiosas devem ser respeitadas ao serem manifestadas pelos
estudantes ou por seus responsáveis sendo vetadas quaisquer formas de proselitismo
mantendo respeito à diversidade cultural e religiosa dos alunos.
E por último, foi mudança significativa da existência do Ensino Religioso nas
escolas públicas estaduais vem da publicação em 29 de janeiro de 2011 a Instrução
Normativa nº 02 das Matrizes Curriculares do Ensino Fundamental e da EJA nas fases
I e II com a fim de regulamentar a distribuição de carga horária no horário escolar.
A instrução normativa faz referência no artigo 12 o reconhecimento do Ensino
Religioso como área de conhecimento, entretanto tendo em vista que no artigo 13 e 14
(especificamente o parágrafo 8º estão destinados aos anos finais e fases III e IV) sob
a orientação operacional na modalidade do Ensino Fundamental nos anos iniciais
deverão ser considerados (as):
I - nos anos iniciais:
e) as temáticas, Saúde, Orientação Sexual, Educação Ambiental,
Direitos Humanos e Cidadania, História da Cultura Indígena e AfroBrasileira, Música e Ensino Religioso, as quais deverão ser
desenvolvidas de forma interdisciplinar.
II – nos anos finais:
c) o Ensino Religioso deverá ser ofertado em forma de seminário,
com carga horária de 2 horas-aula quinzenais sendo oferecido no
contra turno em que o estudante está regularmente matriculado
(PERNAMBUCO, 2011, p.24).
Na alínea e supra acima faz da disciplina Ensino Religioso como temática que
na visão dos especialistas de Ensino Religioso como Junqueira se torna invalidada,
FONAPER
pois “a hipótese não se sustenta nem pelas razões legais e muito menos epistêmicas”
(JUNQUEIRA, 2002, p.51).
No entanto, sob o aspecto da interdisciplinaridade do Ensino Religioso deve
existir e persistir como modo de pesquisar a realidade e “as suas relações e
interconexões, através de um método integral de investigações conjuntas” (Idem,
p.104).
A carga horária, na alínea c do inciso II apresenta outro momento de atenção
pela razão da sua aplicabilidade, que os aspectos caracterizados pela rede estadual
de ensino apresentam “o desencontro com o espírito do artigo 33 na qual a disciplina
Ensino Religioso tem identidade e meios operacionais próprios” (LIMA, 2013, p.83).
A instrução legal da orientação e a operacionalidade postas pela legislação
educacional do Estado de Pernambuco minimizam a relevância do Ensino Religioso
para também os municípios uma vez que muitos desses seguem o regimento
estadual. Esse posicionamento dos legisladores caracteriza uma visão sobre o Ensino
Religioso de cunho catequético confessional, que dificulta a integração da disciplina ao
âmbito escolar. (C.f. Idem)
Atualmente a Secretaria de Educação e Esportes de Pernambuco, desde 2013,
está promovendo a elaboração da proposta curricular na perspectiva das Ciências da
Religião, bem como as formações com os docentes e técnicos-pedagógicos da Rede
Estadual concedendo a abordagem e possibilidades na diversidade religiosa e cultural
para educação brasileira.
Abordagem e possibilidades para os docentes no Ensino Religioso em
Pernambuco
Ao considerar a formação básica do cidadão, bem como um direito humano, e
a legislação educacional vigente abordado nos dois primeiros tópicos, a Secretaria de
Educação Esportes de Pernambuco vem através da Gerência de Políticas
Educacionais da Educação Infantil e Ensino Fundamental realizando formações para
docentes e técnicos do componente curricular de Ensino Religioso.
Esta Secretaria tem sob sua jurisdição 17 Gerências Regionais de Educação
(GRE)54 No decorrer do ano de 2014, nos meses de março a agosto do corrente ano,
54
Recife Norte, Recife Sul, Metropolitana Norte, Metropolitana Sul, Mata Norte (Nazaré), Mata
Cento (vitória de Santo Antão), Mata Sul (Palmares), Litoral Sul (Barreiros), Vale do
Capibaribe (Limoeiro), Agreste Cento Norte (Caruaru), Agreste Meridional (Garanhuns),
Sertão do Moxotó-Ipanema (Arcoverde), Sertão do Médio São Francisco (Petrolina), Sertão
Central (Salgueiro) e Sertão do Araripe (Araripina).
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
estão acontecendo formações continuadas para os professores de Ensino Religioso
em regência de classe.
No primeiro semestre foram quatro formações em parceria com o Fórum
Diálogos55 – Fórum da Diversidade Religiosa em Pernambuco, e Instituto Humanitas56.
Nesses encontros foram abordadas as seguintes temáticas: Ensino Religioso em
Pernambuco: Desafios e Perspectivas; Eixos Temáticos; Experiências Exitosas e
Fundamentação Legal do Ensino Religioso.
No segundo semestre do ano em curso e até o presente momento da
construção desse artigo, foram realizadas três formações. A primeira destinava-se
atender aos docentes e técnicos57 das 17 GREs e os docentes em regência das GREs
Salgueiro, Metropolitana Sul e Recife Norte. A segunda visou atender aos professores
da GRE do Sertão do Araripe e a terceira formação atendeu aos professores da GRE
do Sertão do Médio São Francisco, no município de Petrolina.
Ao final das formações, os docentes são convidados a fazerem uma avaliação
do encontro cuja finalidade é a melhoria no atendimento para as próximas formações.
Para efeito desse artigo será analisada a formação para docentes-técnicos, ou seja,
aqueles que estão trabalhando na gerência regional de educação exercendo a função
técnico-pedagógica. Também foram convidados alguns docentes em regência de
classe.
A avaliação do encontro tem perguntas objetivas e subjetivas. Compareceram
14 participantes. No entanto, as perguntas subjetivas apresentaram a dimensão que o
docente faz sobre o evento o qual participou e a articulação do saber na área de
conhecimento do Ensino Religioso.
Na primeira questão subjetiva aplicada no evento, indagou: o encontro, como
política de formação continuada, atendeu as suas expectativas? Dê sugestões
relacionadas aos aspectos pedagógicos, físicos e humanos que podem melhorar o
funcionamento desse encontro nas próximas formações.
Para a primeira pergunta: O encontro, como política de formação continuada,
atendeu as suas expectativas?
Participante 03: As reflexões e encaminhamentos foram pertinentes
as questões da disciplina que precisa de definições e posições da SE
em relação aos gestores das GREs.
Fórum Diálogos – Fórum da Diversidade Religiosa em Pernambuco. Criado no ano de 2012
por iniciativa do Ministério Público de Pernambuco.
56 Instituto Humanitas.
57 Professores que trabalha na função técnica na atuam na Gerência Regional de Educação
(GRE)
55
FONAPER
Participante 11: Em parte – já tinha noção que o Ensino Religioso
tem de ser seguindo o ecumenismo, ou seja, orientação abrangendo
todas as religiões. Tenho desejo de me aprofundar no assunto.
Participante 12: Sim. Apesar de não ter a formação acadêmica no
Ensino Religioso a formação foi interessante e os palestrantes
souberam conduzir o tema com clareza, conhecimento e curiosidade
de forma democrática e construtiva.
Participante 13: Em termo de conteúdo não, preciso saber
claramente que conteúdo deve ser trabalhado em série/ano X, talvez
o técnico mais adiante passe esse conteúdo e finalize essa angústia.
Nas respostas dos participantes apresentaram com satisfação diante da
realização desta formação do ER no âmbito de conhecer as competências e
finalidades do ER com bem expressa a Participante 06: “Sim. Principalmente nos
esclarecimentos, uma vez que somos principiantes nas ações do Ensino Religioso. A
equipe bem compreensiva, disponível aos nossos anseios e bem preparada no
assunto”.
Nota-se que há muita rotatividade dos docentes ER na regência e que se
reflete nas formações.58
Quanto à segunda pergunta, apresenta o “despertar” das Ciências da Religião,
vejamos: Dê sugestões relacionadas aos aspectos pedagógicos, físicos e humanos
que podem melhorar o funcionamento desse encontro nas próximas formações, essas
foram às respostas:
Participante 01: Visita a espaços religioso diferenciados para uma
apropriação maior da religião, adquirindo conhecimentos sobre as
diferentes religiões e suas práticas.
Participante 14: Encontros com formação em locus (as religiões).
Convidar os gerentes municipais de ensino. Criar comitês regionais e
a partir deles produzir fóruns, seminários e palestras.
Considerações Finais
As reflexões realizadas sobre respectivas propostas pedagógicas na área do
Ensino Religioso mostraram o tratamento diferenciado que lhe é dado por legislações
e o Sistema de Ensino do Estado até 2011; sendo em 2013 a inserções da proposta
curricular
ser
nas Ciências
da Religião conforme as formações docentes
apresentadas. Sobre a identidade do Ensino Religioso, a LDBEN é clara quando
afirma ser ela parte integrante do sistema e elemento essencial para a formação
integral do cidadão.
Essa ampliação e aprofundando destas considerações, o Conselho Nacional
de Educação deu o seu parecer a respeito dos objetivos e conteúdos da disciplina.
Sobre este mesmo “lugar” do Ensino Religioso como formação cidadã previsto nos
58
Confirma a análise do ER em Pernambuco realizada o subtítulo anterior.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso (PCNER), propostos pelo
Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso (FONAPER); em Pernambuco no
Conselho Estadual da Educação e ainda identificado no primeiro período de 1997 a
2006 na Referencial Curricular da Secretaria de Educação e Esportes de Pernambuco.
Torna-se bastante notável os questionamentos de docentes e até mesmo as
instituições sobre o termo “Ensino” “Religioso”, identificado por Wolfgang Gruen
(GRUEN, 1995, p.18) “problema do sentido” sendo a palavra “religioso é o monopólio
das religiões” e ensino como alienar ou domesticar.
Acredita-se que esse problema continua devido à própria legislação federal
deixar elementos ambíguos como “a matrícula facultativa do aluno, justificada por
respeitar a diversidade cultural e religiosa do povo brasileiro”.
Referências
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fundamentais na Constituição Federal de 1988. Porta Alegre: Livraria do Advogado,
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FONAPER
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panorâmica na legislação e no projeto político-pedagógico das escolas da rede
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SOUZA, João Francisco de. E a educação popular: que? Uma pedagogia para
fundamentar a educação, inclusive escolar, necessária ao povo brasileiro. Recife:
Bagaço, 2007.
SUNDFELD, Carlos Ari. Licitação e Contrato Administrativo. 2. ed. São Paulo:
Malheiros, 1995.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
O ENSINO DE FUNÇÃO E VALORES DA TRADIÇÃO RELIGIOSA NA FORMAÇÃO
DE PROFESSORES DE ER: SEIS CONSTITUINTES DA RELIGIÃO EM UMA
SENTENÇA
Sidney Allessandro da Cunha Damasceno - UFPB59
Eunice Simões Lins Gomes - UFPB60
Resumo:
O presente estudo é uma pesquisa-ação, bibliográfica, descritiva com abordagem qualitativa
que faz parte da proposição da dissertação de mestrado no PPGCR/UFPB. Após a realização
do primeiro levantamento da fundamentação teórica, foi possível verificar o impasseda
complexidade do tema e do nível da linguagem acadêmica referente a questão: “como a
Formação Continuada de Professores de Ensino Religioso (ER) pode dar a conhecer aos
professores de ER à percepção de uma tradição religiosa englobando vários componentes de
uma religião de maneira associada?” Como primeiro resultado, apresentamos uma forma de
tradução pedagógica desses saberes de modo contextualizado à educação básica,por meio
dos denominados constituintes primordiais de uma tradição religiosa(CPTR), para respaldar
uma sentença designada sentença representativa de uma tradição religiosa (SRTR).
Palavras-chave: Formação Continuada. Ensino Religioso. Tradição Religiosa.Tradução
Pedagógica.
Introdução
O presente estudo resulta das observações iniciadas a partir do ano de 2011,
ao ingressar no Sistema de Ensino da Rede Municipal da Cidade de João Pessoa,
para compor o quadro dos professores de Ensino Religioso (ER). Onde teve início o
registro das observações e reflexões a respeito do ER na Paraíba. Por outro lado,
surgiu o interesse de desenvolver como pesquisa no Programa de Pós Graduação de
Ciências das Religiões da Universidade Federal da Paraíba (PPGCR/UFPB) sobre:
“Formação continuada de professores de ensino religioso: teoria e prática na sala de
aula”. Com o objetivo de identificar se a Formação Continuada de Professores de
Ensino Religioso – FCPER – (conforme o modelo desenvolvido na Rede Municipal de
Ensino de João Pessoa desde o ano de 2006) contribui com os professores de ER no
ensino do tema “função e valores da Tradição Religiosa”. O recorte do estudo foi
delimitado do eixo organizador para o conteúdo do componente curricular de ER,
59
Mestrando em Ciências das Religiões no Programa de Pós-graduação em Ciências das
Religiões –PPGCR-UFPB, especialista em Ciências da Religião – FATIN – PE, Bacharel em
teologia – FATIN -PE, Professor de ER da rede pública municipal de João Pessoa, membro
do grupo de estudo e pesquisa em antropologia do imaginário – GEPAI, e-mail
[email protected].
60 Orientadora da Pesquisa do Mestrado Prof.ª Pós Dr.ª docente na graduação e pósgraduação em
Ciências das Religiões PPGCR-DCR-CE-UFPB, e-mail [email protected] Líder do
grupo GEPAI. www.gepai.com.br/
FONAPER
Culturas e Tradições Religiosas, segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais de
Ensino Religioso – PCNER (FONAPER, 2009, p. 50) considerando às necessidades
de desenvolver a construção do Ensino Religioso estabelecido como inter-religioso.
Assim, nosso estudo encontra-se organizado como uma pesquisa-ação,
bibliográfica, descritiva com abordagem qualitativa. Sendo o mesmo resultado da
realização do primeiro levantamento da fundamentação teórica, através da leitura,
fichamento e análise. O qual, aponta a priori uma problemática frente a própria
complexidade que envolve o tema e o impasse do nível da linguagem acadêmica
referente
ao
assunto
específico
da
Tradição
Religiosa(TR)encontrar-se
contextualizado para o nível da educação superior.
Desse modo, a partir da questão: “como a Formação Continuada de
Professores de Ensino Religioso pode dar a conhecer aos professores de ER à
percepção de uma Tradição Religiosa englobando vários componentes de uma
religião de maneira associada?” O estudo tece como uma alternativa de resposta
viável e sustentável (não como sendo a única e/ou a melhor possível) a associação de
alguns componentes característicos da religião – e por sua vez componentes
presentes também em várias tradições religiosas – através de uma sentença.
Associação essa pensada como “princípios organizadores que permitam ligar
os saberes e lhes dar sentido” (MORIN, 2006, p. 21), o que é feito por meio de uma
perspectiva de tradução pedagógica de conteúdos e saberes relativos ao tema, de
modo a contextualizar o assunto à educação básica. O que resulta nos referidos
constituintes primordiais de uma tradição religiosa(CPTR), os quais, nessa perspectiva
respaldam a sentença designada, sentença representativa de uma tradição religiosa
(SRTR).
Portanto, a estrutura do trabalho está organizada emseis momentos distintos.
O primeiro momento, esse da introdução que discorre sobre a estrutura do texto; O
segundo ponto faz uma breve referência a alguns pressupostos teóricos à formação
continuada,conforme o viés da Associação Nacional pela Formação dos Profissionais
da Educação – ANFOPE e outros autores; O terceiro instantedescrevealgumas
informações referentes ao modelo de Formação Continuada de Professores de Ensino
Religioso na rede municipal de ensino da cidade de João Pessoa devido ser o campo
de pesquisa no qual tem sido desenvolvida as observações relativas ao estudo.
Na sequência, o quartomomento ressaltasobre a Tradição Religiosa, função e
valores como associado no recorte da nossa pesquisa; Oquinto instante aborda
aspectos pertinentes a perspectiva da tradução pedagógica do conteúdo como opção
frente ao desembaraço para a compreensão do assunto e o sexto momento,discorre
sobre a viabilidade do ensino de uma TR em função de uma sentença observando a
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
possibilidadepelo qual o modo proposto em forma de uma SRTR venha a favorecer e
suportar na FCPER a consolidação e o mais apropriado desenvolvimento doestudo do
tema função e valores da tradição religiosa através da consideração de seis CPTR.
Indicando ainda, quatro exemplos de associações de CPTR e a formação de
respectivas quatro SRTR, demonstrando assim, a conveniência e o favorecimento por
meio da sistematização da compreensão do tema através de uma SRTR.
Os Pressupostos Teóricos à Formação Continuada
A formação continuada de professores – também conhecida como formação
permanente de professores, formação docente, formação em serviço – encontra-se
relacionada diretamente com o processo de práticas didático-pedagógicas, de
ensino/aprendizagem. Freire (1996) ressalta que ensinar exige diálogo, pesquisa,
criticidade e quando aponta a relação do ensino com a formação continuada de
professores o autor frisa que “na formação permanente dos professores, o momento
fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática” (Id., p. 39).
Autores como Libâneo (1999), Nóvoa (1995), Porto (2000) e Tardif (2003),
concordam que o conceito de formação continuada de professores está centrado nas
diversas atividades desenvolvidas pelos professores com o objetivo de melhorar a
qualidade de ensino caracterizada pelas práticas pedagógicas e didáticas na docência.
Conforme a Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação –
ANFOPE, “Considera-se a formação continuada como um processo de construção
permanente do conhecimento e desenvolvimento profissional” (ANFOPE, 1994, p.34).
De acordo com Pimenta (1999), o professor é um intelectual em processo
contínuo de formação. Vera Candau (1998) discorre sobre a noção do conhecimento
docente atestando que tal noção é sistematicamente um processo constante de
construção, desconstrução e reconstrução. Nóvoa (1997) acrescenta que a formação
de professores necessita promover a autonomia de pensamento do docente, no
aspecto crítico-reflexivo.
Seguindo o mesmo pensamento Finkel (1992) considera a complexidade da
formação continuada quando afirma, com relação aos professores, que “Não é fácil
determinar qual o conhecimento científico relevante que devem possuir [...] quais as
melhores iniciativas institucionais para ligar com coerência teoria e prática” (1992, p.
87, grifos nosso).
Verifica-se que essas observações de Finkel aparentam uma maximização do
grau de complexidade quando o tipo de formação diz respeito a FCPER. Visto quena
FONAPER
práxis, o professor que atua no ER, reconhece de fato o tão alto grau de complexidade
que o componente curricular exigi de si. Para que ele como educador, desenvolva e
consolide uma mais adequada sensibilidade para os aspectos que compreendem a
religião, a religiosidade e a espiritualidade, mediante a diversidade cultural presente na
conjuntura de cada comunidade que compõe uma unidade escolar.
Bem como, seu compromisso de “ligar com coerência teoria e prática”
(FINKEL,1992, p. 87) e sua responsabilidade ética, quando encontra diante de si cada
educando, quando interagi com o fenômeno religioso segundo a percepção de uma
criança, expresso através de sua religiosidade e suas questões mais legítimas,
principalmente quando o educando, desde criança, depara-se com os saberes de
outras tradições religiosas.
O
que
vem
permitindo-nos
suspeitar
que
resida
nessa
relação
–
compromisso/responsabilidade – a existência de uma necessidade do professor de ER
constitui-se como um “generalista” 61 (não necessariamente como um professor
esponja, como um pretenso sabe tudo), mas, no sentido de não se restringir a ser um
especialista em uma única religião e/ou ao conhecimento de algumas tradições
religiosas específicas. E dessa maneira, permitir a si como professor, a não
abordagem do ensino de algumas religiões e tradições religiosas, ou seja, ensinar uma
tradição religiosa em detrimento de outras. Ressaltando que tal relação é sobre tudo
conforme o entendimento de ser pois na “perspectiva da formação plena do cidadão,
no contexto de uma sociedade cultural e religiosamente diversa, na qual todas as
crenças e expressões religiosas devem ser respeitadas, que se insere o Ensino
Religioso como disciplina, conforme a atual legislação.” (FONAPER, 2009, p. 6).
A Formação Continuada na Rede de Ensino Municipal de João Pessoa
No contexto da capital da Paraíba, na cidade de João Pessoa foi no mês de
fevereiro do ano de 2006, que o Componente Curricular de Ensino Religioso foi
implantado no Sistema de Ensino da Rede Municipal da cidade e iniciou-se a
consolidação de sua estrutura por via imediata da FCPER. Vale destacar que esta
formação adquiriu um caráter de mantenedora para a consolidação do sucesso desse
61
Cabe destacar que essas reflexões surgem a partir das leituras de Philippe Perrenoud (2000)
quando o autor demonstra que quanto aos conhecimentos teóricos e metodológicos no
ensino as divergências não se restringem apenas ao conteúdo, “mas à própria oportunidade
de descrever as competências profissionais de maneira metódica”. O autor pondera que “O
ofício não é imutável. Suas transformações passam principalmente pela emergência de novas
competências (ligadas, por exemplo, ao trabalho com outros profissionais ou a evolução das
didáticas) ou pela acentuação de competências reconhecidas, por exemplo, para enfrentar a
crescente heterogeneidade dos efetivos escolares e a evolução dos programas.”
(PERRENOUD, 2000, p. 11-12).
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
componente curricular – ao longo de quase duas décadas de sua existência – e para
os educadores de ER terem um suporte no desenvolvimento do seu trabalho na sala
de aula, proporcionando as devidas noções dos princípios elementares do ER62.
Portanto, desde o ano de 2006 em João Pessoa, o ER é organizado e
acompanhado pedagógica e administrativamente pela Secretaria de Educação e
Cultura do Município (SEDEC), sob a orientação da Diretoria de Gestão Curricular –
DGC – e regulamentado através da Resolução nº 026/201263. Daí confirmarmos que a
relevância dessa temática e sua importância é referente às contribuições do modelo
de FCPER 64 que tem sido desenvolvido pela Rede Municipal de Ensino de João
Pessoa para fundamentar a dimensão dos conteúdos do Ensino Religioso junto ao seu
corpo docente.
Considerações a Respeito da Tradição Religiosa
A tradição religiosa é considerada como parte que integra o universo cultural de
inúmeros grupos sociais, como expressão da consciência e da resposta pessoal e
comunitária das pessoas as suas crenças relativas ao Transcendente. A TR engloba
vários aspectos da religião como costumes, crenças, símbolos, ritos, mitos, doutrinas,
práticas, entre outros.
A tradição religiosa como afirma Longhi (2004) está manifesta no modelo
organizacional que cada pessoa – ou grupo de pessoas, a partir das concepções
religiosas – define como determinantes para sua vida. Daí, considerar o autor a
importância que há no fato do educador de ER entender o que acontece a partir do
conhecimento dos aspectos que englobam a Tradição Religiosa.
Posto que cada Tradição Religiosa configura-se como um modelo de
organização da vida e do mundo a partir da ótica religiosa, em um
sistema de conhecimentos prático-performativos traduzidos em ritos,
fatos e valores, o professor de Ensino Religioso precisa entender que
62
Uma vez que de acordo com o FONAPER o ER deve proporcionar o conhecimento dos
elementos básicos que compõem o fenômeno religioso; questionar a dimensão existencial;
analisar a função das tradições religiosas e das culturas a partir das experiências religiosas
percebidas no contexto do educando (FONAPER, 2009, p. 47).
63 Disposição sobre a oferta do Componente Curricular do Ensino Religioso no Ensino
Fundamental da
Rede Municipal de Educação do Município de João Pessoa-PB. Semanário Oficial da
Prefeitura.
(Número
1.355,
p.
009/15.
Resolução
026/2012).
Disponível
em:
<http://www.joaopessoa.pb.gov.br/portal/wpcontent/uploads/2013/01/2013_13551.pdf>.
Acessado em: 05/07/2014.
64
Essa Formação Continuada desde o início foi desenvolvida pela coordenação da assessora
pedagógica e orientadora do Ensino Religioso/SEDEC/PMJP, a professora Maria José
Holmes (mestraem Ciências das Religiões/UFPB), todos os anos, com encontros quinzenais,
no período do mês de março a dezembro.
FONAPER
a elaboração deste saber por parte do educando acontece por
associação, em que atos, intenções e significados descritos e
comparados situam o universo religioso de cada cultura e justificam
os símbolos de cada crença. Dito de outro modo, a compreensão, o
respeito e a tolerância para com as diferentes expressões religiosas
acontecem a partir do conhecimento da própria Tradição Religiosa
na qual germina e desabrocha a humanidade de cada um (LONGHI,
2004, p. 50-51, grifo nosso).
Do mesmo modo como contribui significativamente para o educando, quanto
mais cedo possível, a compreensão da organização da religião como “seu aspecto
mais visível e imediato aos observadores externos das religiões [...] Ela tem a função
paradoxal de ocultar e revelar os mistérios da tradição religiosa” (PASSOS, 2006,
p.14-15). Além de que, conforme Cândido (2002, p. 40, grifo nosso) “O
reconhecimento das diferentes tradições religiosas, bem como o estudo das
diferentes tradições, precisa acontecer já nas séries iniciais.”
Até porque a função da TR expõe a atividade própria, os deveres impostos por
um princípio, às atribuições que distingue cada tradição religiosa. Enquanto, os valores
da TR caracterizam o conjunto de princípios, concepções e preceitos morais que
fundamentam os significados e a significâncias dentro de uma tradição religiosa.
Então, a FCPER pode ser desenvolvida de forma mais propícia de acordo com
as perspectivas dos fundamentos examinados por esses respectivos teóricos,
considerando sempre o viés apontado por Soares (2010, p. 118) de que “Na realidade,
o Ensino Religioso é o resultado prático da transposição didática do conhecimento
produzido pela Ciência da Religião para as aulas do ensino público fundamental e
médio”.
Perspectivas da Tradução Pedagógica
As reflexões propostas pelo ER no período da passagem da heteronomia para
a autonomia – no segundo ciclo – indicam em sua caracterização “ações concretas”
para se construir as noções elementares que estruturem o seu eu, ou seja, a pessoa
do educando. Objetivando a compreensão da história “da origem e formação dos
textos sagrados” a partir de relações com diferentes grupos religiosos e suas práticas
e a percepção de como o significado e a significância das “representações do
Transcendente de cada tradição religiosa se constituem no valor supremo de uma
cultura.” (FONAPER, 2009, p. 69, grifo nosso).
A partir desse referencial, surgem questões a exemplo de: como viabilizar por
meio das práticas didáticas/pedagógicas essas “ações concretas no tempo e no
espaço”, uma vez que elas de acordo com o tratamento didático devem ser
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
enfatizadas para “O conhecimento dos elementos básicos que compõem o fenômeno
religioso? (Idem, p.72) Como relacionar o “nível natural de fatos” com o “sobrenatural
no plano das crenças, na relação com o Transcendente” e o desenvolvimento da
“sensibilidade no trato cotidiano em relação a pessoas ou grupos, evitando juízos,
atitudes e preconceitos pelo diálogo”? (Id. p. 73, grifo nosso).
Devido esperar-se o entendimento do educando, bem como “à valorização do
direito de expressão religiosa na sala de aula e na sociedade”, através da
compreensão das “práticas religiosas, significantes para os diferentes grupos” (Id., p.
70, grifo nosso) é crível que pensar alternativas a essas indagações – e outras que
sejam – por meio da TR,permite ao educador estabelecer de modo mais propício o
desenvolvimento das percepções que perpassam o fenômeno religioso.
Consequentemente, devido a associação ser uma das formas de proposição do
desenvolvimento das percepções, a tradução pedagógica vai ao encontro de
corroborar com o educador no processo de ensino/aprendizagem no sentido
apresentado por Myriam Krasilchick (1998, p. 26) quando esclarece que
A tradução pedagógica de um conteúdo implica no conhecimento de
um conjunto de alternativas, de modalidades didáticas e recursos
para poder atender a alunos e diferentes conhecimentos, faixas
etárias e níveis de desenvolvimento. A escolha do melhor exemplo,
da melhor analogia, da linguagem mais adequada são competências
das quais depende o sucesso ou o insucesso da aprendizagem.
Conforme o ponto de vista da autora a tradução pedagógica é uma área
extremamente carente para todas as disciplinas, pois
Da estreita relação entre o conhecimento e a forma como deve ser
apresentado a determinados grupos de alunos deve derivar um
processo empírico de busca de regularidades para compor um
campo de conhecimento próprio dos professores de cada
disciplina, ou seja, ensino de [...] (KRASILCHICK, 1998, p. 26, grifo
nosso).
Nesse sentido, dograu de complexidade envolvido, verifica-se que ao
examinarmos o acesso aos conteúdos que abrangem o eixo temático do ER,Culturas
e Tradições Religiosas, é possível detectar que eles encontram-se nas áreas da
História, Antropologia, Sociologia da religião, entre outras disciplinas, bem como, nos
relatos das práticas religiosas através das transmissões dos textos sagrados ou da
tradição oral.
Assim, verifica-se que se torna mais propícioa tradução pedagógica desses
conteúdos, ao verificar-se que reside na raiz do problema,tanto o fato da linguagem
para a temática encontrar-se propriamente contextualizada para o nível superior de
FONAPER
ensino/aprendizagem, como o fato da complexidadepresente na variedade de
tradições religiosas entre as religiões e também dentro de uma mesma religião.
O Ensino de uma tradição religiosa em função de uma sentença
Portanto, devido esse contexto favorecer um certo embaraço para a
compreensão do assunto, tal dificuldade levou-nos a princípio, a promover uma mais
favorável sistematização da compreensão de uma Tradição Religiosa,mediante a
questão que tem sido analisada: “como a Formação Continuada de Professores de
Ensino Religioso pode dar a conhecer aos professores de ER à percepção de uma
Tradição Religiosa englobando vários componentes de uma religião de maneira
associada?”
Por isso que, através da viabilidade da tradução pedagógica, propomos em
resposta a essa questão – de forma mais ajustada ao tema função e valores da
Tradição Religiosa – dada uma mais oportuna atenção e ênfase ao assunto na
FCPER, a consideração de alguns componentes da Tradição Religiosa. Os quais na
nossa pesquisa temos denominadocomo constituintes primordiais de uma tradição
religiosa(CPTR) – ou seja, particularidades comuns a uma Tradição Religiosa –para
respaldar uma sentença a qual designamos como sentença representativa de uma
tradição religiosa(SRTR). Vejamos então, como essa proposta discorre na integração
de seis CPTR na formação de uma SRTR.
Admitimos o primeiro dos CPTR como sendo os costumes mais vivenciados
pelos seguidores de uma Tradição Religiosa. O que se demonstra através dos hábitos
que na prática, geram as crenças as quais orientam as vidas dos fieis de uma TR.O
segundo CPTR é referente ao lugar de reunião, o qual pode ser ou não
necessariamente um templo, ainda mais nas conjunturas de reorganização de
tradições religiosas que tem se reunido em ambientes de trabalhos, escolas, casas65,
vagões de trem66, etc.
O terceiro é relativo a pessoa do sacerdote ou sacerdotisa, que pode ser
simplesmente um(a) líder espiritual, a mulher ou o homem dito Santo, Mestre, Xamã,
65Na
Internet há vários sites que apontam para esse fenômeno de reuniões religiosas fora de
templos
religiosos.
Disponíveis
em:
<igrejanoslares.com.br/>
e<igrejasemcasas.blogspot.com/> e <www.heavensfamily.org/ss/portuguesetdmm/04> e
<www.pequenosgrupos.org.br/seminarios_pastores.../02.htm>e<www.gruponews.com.br/que
m-somos>. Acessados em: 21ago2014.
66 “TREM DAS BOAS NOVAS”, UMA ANÁLISE SOCIOANTROPOLÓGICA DO PROCESSO
DE
INSTITUCIONALIZAÇÃO DO CULTO NOS TRENS DE SÃO PAULO. Disponível
em:<http://ibict.metodista.br/tedeSimplificado/tde_arquivos/6/TDE-2010-10-08T182453Z877/Publico/PAGINAS%201-30.pdf>. Acessado em: 21ago2014.
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
Pajé, Pai,Guru ou simplesmente o responsável por cuidar de um grupo de pessoas
que seguem uma particular TR.Sendo o quarto CPTR o transmissor da Tradição
Religiosa, que pode ser através da forma oral ou textual.
O quintoa religião, a qual a Tradição Religiosa está ligada. Destacando
conforme Soares (2010, p. 36) que “é preciso ter muito cuidado com a ambiguidade
que cerca o próprio conceito de ‘religião’”, até porque essa importância dar-se devido
uma mesma religião poder apresentar várias tradições religiosas diferentes e osexto
CPTR a divindade67.
Assim, quando reunimos esses seis CPTRformamos a SRTR que vem a ser: “A
tradição religiosa é caracterizada pelos costumes de um povo que se reuni com um
sacerdote para transmitir a sua religião e a crença (ou não) no seu deus ou seus
deuses”.
Onde o chamativo “ou não” que surge entre parênteses na SRTR reflete as
magníficas implicâncias de tradições religiosas – e viabiliza a continuidade dos
estudos do educador ao adquirir o conhecimento dos saberes das demais tradições
religiosas na continuidade de seus estudos ligados a religiões como o budismo (“onde
ocorre o silêncio sobre Deus”)68, o Jainismo69, o Confucionismo70 e/ou outras filosofias
religiosas.
Portanto, a seguir, apontamos quatro exemplos de associações de CPTR de
modo à, no exercício prático, demonstrar formas (as quais são favoráveis à variação
do exemplo de CPTR – mas não a substituição ou acréscimo de CPTR – de acordo
com o objetivo do plano de aula) de compor uma SRTR.
67 Tal
afirmação dar-se no nível da sistematização idealizada aqui para a meta de formar a
SRTR.Ressaltamos que existem exceções de tradições religiosas concernentes a algumas
particularidades, porém, como parte dos esclarecimentos que cabem ao professor destacar,
essas características precisam ser devidamente apontadas durante as indagações mais
pertinentes na FCPER.
68 O budismo e o silêncio sobre Deus? Monja CoenSensei entrevista o Profº. Pós Dr. Faustino
Teixeira no tema da entrevista e na resposta à pergunta: A recusa de uma “palavra supérflua
sobre Deus”, que explica o fato de se calar sobre Ele, aproxima o budismo da filosofia de
Wittgenstein, com as categorias do silêncio e do inefável? Disponível em:
http://www.monjacoen.com.br/textos-budistas/textos-diversos/198-o-budismo-eo Acessado em:
13ago2014.
69O Jainismo é uma tradição religiosa cujo centro são os seres humanos e suas preocupações.
Ensina que o universo é eterno e não possui um criador. Embora existam deuses, num sistema
de céus acima do mundo humano, esses deuses não têm influência sobre os assuntos dos
mortais, e eles próprios podem deixar de ser deuses e assim renascer. (BOWKER, 2004, p. 76)
70 “Confúcio, transliteração latina para Kong Fuzi, ou Mestre Kong, nasceu em 551AEC”
(BOWKER, 2004, p. 157). “O confucionismo como se chamou no ocidente” é a apresentação
das interpretações da visão de mundo de Confúcio (Id. p. 162 -163). “Interessado pelos
problemas humanos e desejando encontrar soluções, Confúcio desviou a atenção do culto às
divindades e voltou-a para a exploração de um Caminho Universal que pudesse guiar e
aconselhar as atividades humanas”. (Id. p. 159)
FONAPER
Na Religião do Islamismo
“A tradição religiosa (mulçumanos) é caracterizada pelos costumes (festas
sagradas do desjejum – Eid al Fitr – e o encerramento da peregrinação à cidade de
Meca – Hajj) de um povo que se reuni (em mesquitas) com um sacerdote (Sheik) para
transmitir (o alcorão) a sua religião (o islamismo) e a crença no seu deus (Alah)”.
Na Religião do Cristianismo
“A tradição religiosa (católica romana) é caracterizada pelos costumes (de
festas como a da padroeira do Brasil, o natal, o Círio de Nazaré) do povo que se reuni
(em igrejas) com um sacerdote (o padre) para transmitir (a Bíblia) a sua religião
(cristianismo) e a crença no seu deus (o Pai nosso do céu, Jesus e o Espírito Santo)”.
Na Religião Afro-descendente
“A tradição religiosa (Candomblé Ketu) é caracterizada pelos costumes (festas
de xangô, oxalá, iemanjá) de um povo que se reuni (nas chamadas casas, roças ou
terreiros) com um sacerdote (babalorixá) para transmitir (as histórias dos orixás) da
sua religião (afro-brasileira) e a crença no seu deus (Olorum chamado também de
Olodumaré).”
Considerações Finais
Os resultados que têm sido comunicados através do desenvolvimento dessa
proposição, como condizentes com a problemática referente ao assunto em estudo,
frente a realização dos primeiros levantamentos da fundamentação teórica de nossa
pesquisa, apontam para o estabelecimento de tais noções a partir datradução
pedagógica. Bem no viés da busca dos conhecimentos relevantesque há no tema e
pode ser trabalhado abundantemente na FCPER, gerandodesse modo uma melhor
interação do professor de ER com a inter e a multidisciplinaridade que perpassa o
componente curricular de ER.
Por isso, devido à dimensão ocupada pela Tradição Religiosa, considera-se
que a mais propícia compreensão por parte do educador, da determinação que o
assunto função e valores da Tradição Religiosa exercem sobre o ER vem propiciar
uma melhor compreensão e ensino dos aspectos que abrangem o fenômeno religioso.
Como também, que a FCPER pode dar a conhecer ao educador de modo associado
através dessa SRTR à percepção de uma Tradição Religiosa englobando vários
aspectos por meio de CPTR. Conhecimentos quesinalizam uma possibilidade real de
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
favorecimento da compreensão inicial/elementar da Tradição Religiosa de modo
compacto, concomitante e inteiro no sentido da interdependência dos CPTR
entrelaçados como na SRTR.
Referências
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ensino religioso. São Paulo: Paulinas, 2010. (Coleção temas do ensino religioso).
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
GT4: CURRÍCULO DO ENSINO RELIGIOSO
Coordenação:
Dra. Glória Escarião (UFPB)
Drando. Elcio Cecchetti (UFSC/SED-SC)
Ma. Maria José Torres Holmes (SEMED-João Pessoa)
Me. Francisco Salles Palheta (SEDUC/AM)
Ementa: Concebendo o Ensino Religioso como área do conhecimento da
educação básica, este GT objetiva aprofundar as discussões relacionadas às
concepções, objetivos, conteúdos, metodologias e procedimentos avaliativos
concernentes aos processos de ensino-aprendizagem em Ensino Religioso na
perspectiva dos direitos à aprendizagem e ao desenvolvimento; socializar
atividades de aprendizagem e práticas pedagógicas em Ensino Religioso e;
estabelecer relações entre currículo, saberes e conhecimentos religiosos na
diversidade cultural religiosa brasileira.
Palavras-chave: Currículo. Ensino Religioso. Direitos à Aprendizagem e ao
Desenvolvimento. Conhecimentos Religiosos. Diversidade Cultural Religiosa.
FONAPER
UMA REFLEXÃO SOBRE O ENSINO RELIGIOSO COMO COMPONENTE
CURRICULAR NO ESTADO DO ACRE
Elaine Costa Honorato- Ufac71
Luciete Basto de Andrade Albuquerque - Ufac72
Cid Mauro Araújo de Oliveira - IEFP73
Resumo:
Um dos componentes curriculares que gera polêmica nas discussões educacionais é a
disciplina denominada Ensino Religioso. Os debates acerca desta disciplina perpassamdesdea
ausência de profissionais preparadosparalecionara disciplina Ensino Religioso, assim como
também na preocupação relacionada a prática docente que, pela falta de preparo,podeinduzir o
educando a uma determinada crença, gerando conflitos na sala de aula e na escolha religiosa
dos educandos. Dessa forma, esta pesquisa apresentará a organização curricular do Ensino
Religiosono Estado do Acre trazendo reflexões sobreeste ensino na escola.
Palavras-chave: Currículo. Ensino Religioso. Organização Curricular.
Introdução
Toma-se religião, aqui, como conjunto de crenças próprias de um grupo de
indivíduos – ou, em casos específicos, de um único indivíduo – em elementos, seres
ou representações de ordem sobrenatural, divina ou sagrada. Rituais e códigos morais
são componentes derivados de uma crença e não podem, sob qualquer hipótese,
serem tomados como a religião propriamente dita.
Para muitos homens, contudo, a religião é vista também como fonte
fundamental da existência humana e, em casos extremos, como fator único e
determinante de importância em suas vidas.
A palavra religião é derivada do verbo latino religiare que significa união, no
caso, com o divino, definição que se estende a qualquer forma de aspecto místico e
religioso, abrangendo seitas, mitologias e quaisquer outras doutrinas.
Segundo John Bowker (1997, p. 6), ser religioso:
Significa quase tudo, porque as religiões dizem respeito à totalidade
da vida – e a morte do ser humano. Por milhares de anos a pessoa
tem buscado o sentido e a verdade de sua própria natureza e do
universo; as religiões, que lidam com a totalidade da vida e morte
humanas, resultam dessa busca. Mesmo as ciências naturais eram
originalmente religiosas; somente nos últimos trezentos anos religião
e ciência se separam como caminhos de conhecimento. Vemos
religião hoje como comunidade de pessoas que compartilham
Especialista em Gestão Escolar – Professora Substituta do Colégio de Aplicação –
Universidade Federal do Acre – [email protected]
72 Doutora em Educação – Professora Adjunta da Universidade Federal do Acre –
[email protected]
73 Mestre em Teologia – Membro do Instituto Ecumênico Fé e Política – [email protected]
71
Anais do Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso
práticas e crenças (geralmente em um Deus ou deuses), que se
reúnem em construções especiais para o culto ou mediação e que
vivenciam o mundo de maneira especial. Sabe-se que a mais de três
quartos da população mundial considera-se pertencente a uma
religião, independente do pouco ou muito que a pratiquem.
Partindo desse pressuposto, toma-se conhecimento de que hoje em dia,
mesmo com todo o avanço cientifico, o fenômeno religioso sobrevive e cresce fazendo
com que a grande maioria da humanidade manifeste alguma crença religiosa, direta
ou indiretamente.
Assim, a religião continua a promover diversos movimentos humanos,
imbricando-se neles, mantendo estatutos políticos e sociais, estendendo-se até
mesmo, e, em alguns casos, sobretudo, nas escolas.
Por essa e outras razões, algumas escolas têm como plano curricular o
objetivo de oferecer subsídios sobre religião, suas formações, suas doutrinas, seus
valores e sua repercussão social. Esse Ensino Religioso tem como intuito contribuir
aos projetos pedagógicos, e integrar-se como disciplina na grade curricular.
Segundo Paulo Freire (1996, p. 29-30):
A importância do papel do educador, o mérito da paz com que viva a
certeza de que faz parte de sua tarefa docente não apenas ensinar os
conteúdos, mas também ensinar a pensar certo. Daí a
impossibilidade de vir a tornar-se um professor crítico se,
mecanicamente memorizado, é muito mais um repetidor cadenciado
de frases e de ideias inertes do que um desafiador.