Revisão das Práticas Internacionais em Cuidados de Saúde Primários
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Revisão das Práticas Internacionais em Cuidados de Saúde Primários
CONTRATUALIZAÇÃO EM CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOS Horizonte 2015/20 FASE 3: REVISÃO DAS PRÁTICAS INTERNACIONAIS Versão Preliminar Equipa de Projecto: Ana Escoval (Coordenação) Tânia Matos Rute Ribeiro Escola Nacional de Saúde Pública 31/07/2009 FINLÂNDIA......................................................... 37 ÍNDICE 10. Caracterização do sistema de saúde .................. 37 11. Organização da prestação de cuidados de saúde primários ............................................................... 38 12. O processo de contratualização......................... 38 LISTA DE ACRÓNIMOS ............................................. IV LISTA DE QUADROS ................................................ VI LISTA DE FIGURAS ................................................. VI SUMÁRIO EXECUTIVO ............................................ VII QUADRO-SÍNTESE.............................................. XVIII INTRODUÇÃO ......................................................... 1 METODOLOGIA ADOPTADA ........................................ 3 I. SELECÇÃO DO OBJECTO DE ESTUDO .......................3 II. RECOLHA DA BASE DOCUMENTAL ...........................3 III. LEITURA ......................................................4 REINO UNIDO..................................................... 40 13. Caracterização do sistema de saúde .................. 40 14. Organização da prestação de cuidados de saúde primários ............................................................... 40 15. O processo de contratualização......................... 41 15.1. Antecedentes ................................................ 41 15.1.1. General Practitioner Fundholding (1990-1997) ... 41 15.1.2. Total Purchasing Pilots (1994-1998) .................. 42 15.1.3. Locality/GP Commissioning Pilots (1998-2000) ... 43 15.1.4. Primary Care Groups (1999-2002) ..................... 44 15.1.5. Primary Care Trusts (2002) .............................. 44 15.1.6. A abordagem Primary Care-led Commissioning ... 45 15.1.6.1. Modelo Individual Patient Purchasing – “Patient Choice” ........................................................... 46 15.1.6.2. Modelo Single Practice-Based Commissioning ...................................................................... 47 15.1.6.3. Modelo Multi-Practice or Locality Commissioning ...................................................................... 47 15.1.6.4. Modelo Joint or Integrated Commissioning ...................................................................... 48 15.1.6.5. Modelo Primary Care Organisation/PCT Commissioning ................................................ 48 15.1.6.6. Modelo „Lead‟ PCT/LHB/HB Commissioning ...................................................................... 49 15.1.6.7. Modelo National Commissioning ........... 49 IV. REDACÇÃO.....................................................5 ANÁLISE DO PROCESSO DE CONTRATUALIZAÇÃO EM CONTEXTO DE CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOS POR TIPO DE SISTEMA DE SAÚDE I. ............................................. 6 SISTEMAS DE SAÚDE TIPO BEVERIDGIANO ................2 AUSTRÁLIA ........................................................ 2 1. Caracterização do Sistema de Saúde ...................... 2 2. Organização da prestação de cuidados de saúde primários ................................................................. 3 3. O processo de contratualização ............................. 5 3.1. Os mecanismos de contratualização ................. 5 3.1.1. Incentivos ........................................................ 5 3.2.1. 3.2.2. 3.2.3. Australian Primary Care Collaboratives Program ... 6 Quality Improvement Skills Program ................... 6 Rebirth of a clinic .............................................. 7 3.2. Formação e apoio ........................................... 6 15.2. Contexto actual ............................................ 50 15.2.1. A abordagem Practice-based Commissioning ...... 50 15.2.2. A qualidade no centro de todas as acções .......... 53 15.2.3. A liberdade como condição para a qualidade ...... 54 3.3. Desenvolvimentos futuros ............................... 7 15.3. Os mecanismos de contratualização ............... 55 CANADÁ ............................................................ 8 15.3.1. O processo decisório........................................ 55 15.3.2. A definição de planos estratégicos e operacionais56 15.3.3. As diferentes vias de contratualização de cuidados de saúde primários ....................................................... 57 15.3.4. Clausulado contratual ...................................... 57 15.3.5. Indicadores .................................................... 59 15.3.6. Incentivos ...................................................... 60 4. Caracterização do sistema de saúde....................... 8 5. Organização da prestação de cuidados de saúde primários ................................................................. 8 6. O processo de contratualização ........................... 10 6.1. As experiências de contratualização ............... 10 6.1.1. Health Transition Fund (1997-2001) .................. 10 6.1.1.1. Avaliação dos projectos desenvolvidos .... 10 6.1.2. Primary Health Care Transition Fund (2000-2006) 11 6.1.2.1. Avaliação dos projectos desenvolvidos .... 11 6.1.3. Primary Health Care Transfer (2003) ................. 12 15.4. Formação e apoio ......................................... 62 15.4.1. Business Cases ............................................... 64 15.4.2. Practice-based Commissioning Development Framework .................................................................. 65 15.4.3. World Class Commissioning .............................. 65 15.4.4. Knowledge Based Commissioning Programme .... 66 15.4.5. Primary Care Management Development Programme .................................................................. 66 15.4.6. Leadership for clinical service improvement ....... 66 15.4.7. Framework for Procuring External Support for Commissioners e PCT BOard Development Framework ..... 67 6.2. Indicadores .................................................. 13 6.3. Formação e apoio ......................................... 13 ESPANHA ........................................................... 15 7. Caracterização do sistema de saúde..................... 15 8. Organização da prestação de cuidados de saúde primários ............................................................... 16 9. O processo de contratualização ........................... 19 9.1. Antecedentes ............................................... 19 9.2. Contexto actual ............................................ 20 9.3. Os mecanismos de contratualização ............... 21 15.5. Avaliação das metas contratualizadas ............. 67 15.6. Acreditação .................................................. 69 15.7. Desenvolvimentos futuros ............................. 69 15.8. Literatura crítica............................................ 72 II. 9.3.1. As diferentes vias de contratualização de cuidados de saúde primários ....................................................... 21 9.3.1.1. Andaluzia ............................................. 22 9.3.1.2. Castilla-La Mancha ................................ 22 9.3.1.3. Castela e Leão ..................................... 23 9.1.3.4. Catalunha ............................................ 24 9.3.1.5. Madrid................................................. 25 9.3.1.6. Valença ............................................... 26 9.3.1.7. Principado das Astúrias ......................... 26 9.3.2. Clausulado contratual ....................................... 27 9.3.2.1. Andaluzia ............................................. 27 9.3.2.2. Catalunha ............................................ 29 9.3.2.3. Madrid................................................. 29 9.3.2.4. País Basco ........................................... 31 9.3.2.5. Principado das Astúrias ......................... 32 9.3.3. Incentivos ....................................................... 33 9.3.3.1. País Basco ........................................... 34 SISTEMAS DE SAÚDE TIPO BISMARCKIANO .............. 75 ALEMANHA......................................................... 75 16. Caracterização do sistema de Saúde ................. 75 17. Organização da prestação de cuidados de saúde primários ............................................................... 76 18. O processo de contratualização......................... 76 FRANÇA ............................................................ 80 19. Caracterização do sistema de Saúde ................. 80 20. Organização da prestação de cuidados de saúde primários ............................................................... 82 21. O processo de contratualização......................... 83 HOLANDA .......................................................... 85 22. Caracterização do sistema de Saúde ................. 85 23. Organização da prestação de cuidados de saúde primários ............................................................... 87 9.4. Literatura crítica ........................................... 35 ii 24. O processo de contratualização ........................ 88 III. SISTEMAS DE SAÚDE DE LIVRE ESCOLHA E COMPETIÇÃO 89 O CASO DOS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA ................ 89 25. Caracterização do sistema de saúde.................. 89 26. Reforma do sistema de saúde........................... 90 26.1. Os novos modelos de organização dos cuidados 91 27. O exemplo da Kaiser Permanente e da Geisinger 93 27.1. O sistema de saúde da Kaiser Permanente ..... 93 27.2. O sistema de saúde da Geisinger ................... 95 IV. SISTEMAS DE SAÚDE FINANCIADOS POR ONGS ........ 99 O CASO DO RUANDA ............................................. 99 28. Caracterização do sistema de saúde.................. 99 29. O exemplo do Butare e de Cyangugu ................ 99 29.1. A experiência do Butare: The Performance Initiative ............................................................... 99 29.1.1. 29.1.2. 29.1.3. 29.1.4. Antecedentes .................................................. 99 Os mecanismos de contratualização ................ 100 Resultados .................................................... 102 Desenvolvimentos futuros .............................. 102 29.2. A experiência de Cyangugu ......................... 103 29.2.1. Antecedentes ................................................ 103 29.2.2. Os mecanismos de contratualização ................ 103 29.2.3. Resultados .................................................... 104 29.2.4. Desenvolvimentos futuros .............................. 104 CONCLUSÕES ..................................................... 106 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................. 108 iii GHS – Geisinger Health System LISTA DE ACRÓNIMOS AAFP – American Academy of Family Physicians GKV-WSG – Gesetz zur Stärkung des Wettbewerbs in der gesetzlichen Krankenversicherung AAP – American Academy of Pediatrics GMC – Geisinger Medical Center ABS – Áreas Básicas de Salud GPFG – General Practice Financing Group ACOs – accountable care organizations GPII – General Practice Immunisation Incentives ACP – American College of Physicians GQI – Geisinger Quality Institute AIIM – Association Management for Information and Imaging GSG – Gesundheitsstrukturgesetz GSWB – Geisinger South Wilkes-Barre AME – L‟Aide Médicale d‟Etat GWV – Geisinger Wyoming Valley Medical Center ANU – Australian National University HCAIs – Healthcare Associated Infections AOA – American Osteopathic Association HIC – Health Insurance Commission APCC – Australian Primary Care Collaboratives APCCP – Australian Primary Care Collaboratives Program VIH/SIDA – Vírus da Imunodeficiência Humana/Síndrome de Imunodeficiência Adquirida API – allocation de parent isolé HMO – Health Maintenance Organization AWBZ – Algemene Wet Bijzondere Ziektekosten HOED – Huisartsen Onder Een Dak BOCYL – Boletín Oficial de Castilla y León HP – Kaiser Health Plan CABG – coronary artery bypass graft HRGs – healthcare resource groupings CAP – Centros de Atención Primaria ICS – Institut Català de la Salut CatSalut – Servei Català de la Salut IFA – Improvement Foundation Australia CC.AA – Comunidade Autónoma IM/IT – Technology CG – Geisinger Clinic Information Management/Information CHIPP – Canada Health Infostructure Partnerships Program IMSALUD – Instituto Madrileño de la Salud CIHI – Canadian Institute for Health Information INP – Instituto Nacional de Previsión CLSCs – Local Community Service Centres INSALUD – Instituto Nacional de la Salud CMI – Care Management Institute ISSA – International Social Security Association CMU – Couverture Maladie Universelle KP – Kaiser Permanente CMU-C – Couverture Maladie Universelle – Protection Complémentaire LOSC – Ley de Ordenación Sanitaria de Cataluña INGESA – Instituto Nacional de Gestion Sanitaria LOSCAM – Ordenación Sanitaria de la Comunidad de Madrid CSE-PHC – Canadian Survey of Experiences with Primary Health Care MBS – Medicare Benefits Schedule CSMF – Confédération des Syndicats Médicaux Français MedPAC – Medicare Payment Advisory Commission CSP – cuidados de saúde primários MeSH – Medical Subject Headings CVZ – College voor zorgverzekeringen MfDR – managing for development results DGAS – Dirección General de Asistencia Sanitaria MSA – Medical Services Agreements DH – Department of Health MSA – Medicare Medical Savings Account Plans DNB – Nederlandsche Bank MSA – Mutualité Sociale Agricole DPO – direcção participativa por objectivos MVZ – Medizinische Versorgungszentren EAP – Equipo de Atención Primaria NCQA – National Committee for Quality Assurance EBA – Entidades de Base Associativa NHI – National Health Insurance EBAP – Equipos Básicos de Atención Primaria NRG – National Reference Group ECM – Enterprise Content Management NSW – New South Wales EFQM – European Foundation for Quality Management ODSF – Ottawa Decision Support Framework EUA – Estados Unidos da América GAP – Gerencias de Atención Primaria OEPSS – Observatório Europeu de Sistemas e Políticas de Saúde GHP – Geisinger Health Plan ONG – Organização Não Governamental iv P4P – Payment for Performance U.N.C.A.M. – Union Nationale des Caisses d‟Assurance Maladie PAPPS – Programa de actividades de promoción y prevención de la salud UBAP – Unidad Básica de Atención Primaria PBC – practice-based commissioning UGC – Unidades de Gestión Clínica PBCs – practice-based commissioners UTE – Unión Temporal de Empresas PBF – performance-based financing WCC– world class commissioning PCG – Primary Care Group WHO – World Health Organization PCMDP – Primary Care Management Development Programme WiC – Walk-in Centre PCMH – Patient-Centered Medical Home ZvW – Zorgverzekeringsswet ZBS – Zonas Básicas de Salud PCPCC – Patient-Centered Primary Care Collaborative PCT – Primary Care Trust PEC – Professional Executive Committee PFFS – Private Fee-for-Service Plans PGP – Programas de Gestión Propia PHCTF – Primary Health Care Transition Fund PHP – Preventive Health Prompt PIB – Produto Interno Bruto PIPs – Practice Incentive Payments PLC – practice-led commissioning PMG – Permanente Medical Group PNI – Practice Nurse Incentive PPO P– referred Provider Organization QPA – Quality Practice Award QPI – Quality Prescribing Incentive QuISP – Quality Improvement Skills Program RACGP – Royal Practitioners Australian College of General RBM – results-based management RMI – revenu minimum d'insertion RSA – revenu de solidarité active RSI – Régime Social des Indépendants SAS – Servicio Andaluz de Salud semFYC – Sociedad Española de Medicina de Familia y Comunitaria SEMG – Sociedad Española de Médicos Generales y de Familia SESPA – Servicio de Salud del Principado de Asturias SIPs – Service Incentive Payments SNPs – Medicare Special Needs Plans SNS – Sistema Nacional de Salud SOPs – Service Outcome Payments SSCC – Unidades de los Servicios Centrales TFF – Territorial Formula Financing TPP – Total Purchasing Pilot TSJCYL – Tribunal Superior de Justicia de Castilla y León v LISTA DE QUADROS LISTA DE FIGURAS Quadro 1: Quadro-síntese dos países em estudo ............ xviii Figura 1: Fases do projecto de investigação – fase 3 .......... 2 Quadro 2: Organização dos países objecto de estudo por sistema de saúde ...................................................... 3 Figura 2: Mapa-mundo ilustrado com os países objecto de estudo ...................................................................... 6 Quadro 3: Percurso de pesquisa ........................................ 3 Figura 3: Organização dos cuidados primários e secundários no Reino Unido ....................................................... 41 Quadro 4: Palavras-chave utilizadas .................................. 3 Figura 4: O continuum dos níveis de contratualização no Reino Unido ............................................................ 45 Quadro 5: Pesquisas realizadas numa primeira fase ............ 4 Quadro 6: Percurso de leitura ........................................... 5 Figura 5: Processo de Practice-based Commissioning ........ 51 Quadro 7: Quadro-síntese Austrália ................................... 2 Figura 6: Dimensões do Practice-led Commissioning ......... 53 Quadro 8: Quadro-síntese Canadá ..................................... 8 Figura 7: Fluxos financeiros no sistema de saúde holandês 86 Quadro 9: Indicadores do Canadian Institute for Health Information ............................................................ 13 Figura 8: Benefícios da Medicare e benefícios do novo plano de saúde ................................................................ 90 Quadro 10: Quadro-síntese Espanha................................ 15 Figura 9: Modelo integrado de financiamento e prestação de cuidados de saúde da Kaiser Permanente ................. 94 Quadro 11: Indicadores e fontes de informação para a avaliação das Gerencias de Atención Primaria (GAP) . 23 Figura 10: Actores do processo de contratualização da Performance Initiative ........................................... 102 Quadro 12: Percentagem de Equipos de Atención Primaria cumpridores do contrato ......................................... 34 Figura 11: Configuração institucional do financiamento com base no desempenho em Cyangugu ....................... 104 Quadro 13: Percentagens de incentivos atribuídos à Unidade de Atención Primaria ............................................... 35 Quadro 14: Quadro-síntese Finlândia ............................... 37 Quadro 15: Quadro-síntese Reino Unido .......................... 40 Quadro 16: Quadro-síntese Alemanha ............................. 75 Quadro 17: Quadro-síntese França .................................. 80 Quadro 18: Quadro-síntese Holanda ................................ 85 Quadro 19: Quadro-síntese Estados Unidos da América .... 89 Quadro 20: Quadro-síntese Ruanda ................................. 99 vi Verifica-se que, por exemplo, no Reino Unido, tem sido destacada a importância das unidades de saúde de proximidade, dado que assim se poderão desenvolver abordagens mais adequadas às necessidades das populações e melhor concretizar os objectivos definidos pelas políticas de saúde. SUMÁRIO EXECUTIVO Muito embora se registem diferenças significativas nos sistemas de saúde do mundo inteiro, os Cuidados de Saúde Primários (CSP) são unanimemente reconhecidos pela comunidade internacional como um pilar fundamental dos sistemas de saúde, que condiciona de forma determinante e incontornável o seu desempenho global. Com efeito, o Department of Health, na continuidade da linha de actuação que tem vindo a adoptar, ao permitir, promover, reconhecer e, finalmente, formalizar experiências inovadoras (veja-se o caso dos Total A evidência internacional demonstra também que os Purchasing Pilots, de 1994 a 1998, e dos GP modelos de organização e gestão dos CSP, bem como as Commissioning Pilots, de 1998 a 2000), tem incentivado, estratégias de financiamento adoptadas e a forma de desde 2004, a abordagem practice-based commissioning, articulação com os restantes níveis de cuidados podem em que se pretende motivar os profissionais para a potenciar, ou ao contrário, comprometer o cumprimento inovação clínica e para a inovação dos serviços. Procurados princípios basilares dos sistemas de saúde, bem se aqui que as equipas encontrem o caminho mais como das metas definidas pela política de saude ao nível adequado, esperando colher daí ensinamentos para o da equidade, acesso, eficiência e qualidade dos cuidados. futuro das políticas de saúde. Nesta perspectiva, é abandonado o primado das autoridades de saúde e Assumindo uma importância crucial para a melhoria do reconhecido formalmente o valor dos nível de saúde das populações e modelos organizativos locais, simultaneamente para a concedendo-lhes liberdade (e sustentabilidade dos sistemas de «As the providers of care in responsabilidade) para o saúde, parece não haver dúvidas de experimentalismo e desenvolvimento que os CSP devem ser objecto de the future (…) become ever de novas abordagens, por meio de uma atenção particular no âmbito das more independent, a processos de contratualização reformas dos sistemas de saúde. facilitadores. powerful commissioning Neste contexto e porque a contratualização, enquanto Também o sistema de saúde norteforce on behalf of patients instrumento que dá suporte à americano Geisinger valoriza a aquisição estratégica de cuidados, se necessidade que os cidadãos têm nos and the wider community tem constituído como denominador dias de hoje, impostas pela dinâmica comum das reformas encetadas em must surely be welcomed» da sociedade, de aceder mais facil e vários países, considerou-se prontamente a serviços de saúde. Por (Lewis, 2004) fundamental, no âmbito da fase 3 do esse motivo, foram criadas as projecto de investigação inovadoras CareWorks – Convenient “Contratualização em Cuidados de Healthcare Clinics, centros de saúde Saúde Primários – Horizonte 2015/2020”, proceder à estabelecidos dentro de supermercados, onde os análise das práticas internacionais no que concerne ao cidadãos podem dirigir-se para muitos dos tratamentos, processo de contratualização de CSP. exames e actividades de prevenção mais comuns. O principal objectivo consistiu, assim, na caracterização das experiências desenvolvidas e/ou em curso, tendo em vista, em última análise, contribuir para uma reflexão sobre os modelos implementados ou sustentar a adopção de novas abordagens para este nível de cuidados em Portugal, tendo por base a evidência internacional. Os EUA são, aliás, um país para onde actualmente estão voltadas todas as atenções. Sendo um sistema que não garante a cobertura e o acesso a uma parte significativa da população, atravessa este ano a oportunidade de alterar de forma histórica os valores que o sustentam. O programa eleitoral de Barack Obama prometia um sistema nacional de saúde, que finalmente reconhecesse o papel fundamental dos cuidados de saúde primários, no âmbito de uma cobertura universal. Também num país com um sistema tão historicamente distante de um serviço nacional de saúde se vive agora um debate aceso sobre a importância dos cuidados primários, restando atentar nas próximas mudanças neste vizinho transatlântico. Da análise desenvolvida, realçam-se alguns elementos comuns ao sucesso dos vários processos de contratualização desenvolvidos nos CSP, tais como a criação de equipas multidisciplinares, o envolvimento e a motivação dos profissionais e a delegação dos processos decisórios e da gestão dos recursos nos profissionais da “linha da frente”, que se encontram mais próximos dos doentes e conhecem melhor as suas necessidades e expectativas. vii Ao longo do processo de investigação, verificou-se ainda uma interacção cada vez maior entre as diferentes áreas profissionais, como na Austrália, onde um grupo de arquitectos da RMIT School of Architecture and Design em parceria com o Royal Australian College of General Practitioners concebeu um modelo para os centros de cuidados de saúde primários, tendo em conta as várias características que se consideram determinantes no contexto actual deste nível de cuidados. Foi, para o efeito, criada a mnemónica D.E.S.I.G.N. (diversity, efficiency, safety, innovation, green, neighbourhood). de prestar cuidados de saúde preventivos adequados para limitar o desenvolvimento e a progressão destas doenças 3. Problemas resultantes de iniquidades no acesso aos cuidados primários, em virtude de uma inadequada distribuição geográfica dos serviços e de constrangimentos financeiros 4. Duplicação de serviços e má coordenação da prestação resultantes da falta de integração dos serviços de cuidados primários a outros níveis de cuidados A diversidade das experiências de contratualização, adequada aos diferentes tipos de sistema de saúde, conferiu, com efeito, a oportunidade de rever com detalhe os moldes em que foram desenvolvidas, as suas características particulares e os ganhos que daí resultaram, em termos de equidade, eficiência, acesso, qualidade dos cuidados de saúde primários prestados às populações e satisfação dos utilizadores e dos profissionais. Diversos países têm respondido a estes desafios, encetando uma reforma generalizada no âmbito dos cuidados de saúde primários, com destaque para a promoção da saúde, a gestão de doenças crónicas, uma melhor integração dos cuidados primários e especializados e um foco crescente no envolvimento e motivação dos cidadãos. Neste contexto, têm igualmente emergido novas formas de organização dos cuidados, que procuram concretizar a descentralização dos processos decisórios e da gestão dos recursos. Deste modo, os serviços são ajustados às necessidades das populações locais por quem delas está mais próximo e os recursos disponíveis são adaptados às exigências desses serviços, alcançando-se deste modo maior eficiência e efectividade na prestação de cuidados. Das diferentes experiências, considera-se fundamental retirar os devidos ensinamentos, com base nos pontos fortes e fracos identificados, alcançando-se assim um nível de conhecimentos mais alargado sobre o processo de contratualização, enquanto abordagem amplamente internacionalizada e adoptada por diferentes sistemas de saúde. Fundamentalmente, importa colher lições de um processo que é já aplicado em múltiplos contextos, ainda que configurado de formas diversas, mas que é considerado por numerosos países como uma ferramenta essencial e imprescindível para alcançar e sustentar as metas e políticas de saúde. Estes novos modelos de organização têm exigido a necessária correspondência a diferentes modelos de financiamento e é também nesta perspectiva que há necessidade de recolher evidência sobre as experiências desenvolvidas em diferentes países, com sistemas de saúde semelhantes ou distintos do nosso. Internacionalmente, o panorama dos cuidados de saúde primários tem vindo a alterar-se rapidamente. Muitos países têm colocado prioritariamente nas suas agendas a reforma dos cuidados de saúde primários, conferindo particular atenção ao estabelecimento de estruturas regionais e locais, novas formas de financiamento e alterações nos modelos de organização das equipas de profissionais de saúde, atribuindo-lhes novos papéis e capacitando-os para melhor responder às necessidades das populações. O trabalho de pesquisa documental desenvolvido seguiu uma estrutura em torno dos diferentes tipos de sistemas de saúde: beveridgiano, bismarckiano, de livre escolha e competição e financiados por organizações não governamentais (ONGs). Contudo, um projecto de investigação é balizado pelas matérias-objecto do estudo, dependendo da qualidade da documentação encontrada, mas não podendo dar à questão de investigação de que se partiu respostas para além daquelas que o próprio processo de investigação encontrou. Nesta medida, para garantir a qualidade e a relevância dos conteúdos e em função da informação disponível, foram revistos com maior profundidade dez países de quatro continentes, cujos sistemas de saúde se distribuem pelos quatro tipos referidos. No entanto, os conteúdos com maior desenvolvimento dizem respeito aos sistemas de saúde que mais se aproximam ao nosso. Uma recente revisão sistemática de literatura (ANU, 2006) identificou quatro desafios globais que têm actualmente guiado o processo de reforma dos cuidados primários: 1. A maior percentagem do produto interno bruto (PIB) que é despendida em cuidados de saúde especializados, associada a uma inadequada utilização dos serviços hospitalares 2. O envelhecimento da população e o aumento do peso das doenças crónicas evidenciam a necessidade viii Com um sistema de saúde de tipo beveridgiano, foram estudados a Austrália, o Canadá, a Espanha, a Finlândia e o Reino Unido. Com um sistema de saúde de tipo bismarckiano, foram objecto de estudo a Alemanha, a França e a Holanda. Foi ainda atendido o caso particular dos Estados Unidos da América, com um sistema de saúde de livre escolha e de competição e uma cobertura limitada a um determinado tipo de população, e, finalmente, o caso do Ruanda, financiado por ONGs, onde pudemos observar duas experiências particularmente interessantes. Citando Collins e Green (2000), é importante colher ensinamentos dos países em desenvolvimento e não apenas daqueles que mais se aproximam do nosso país, não se devendo, por isso, persistir num processo unilateral de aprendizagem. O sistema de saúde australiano caracteriza-se, assim, pela existência de diferentes actores e pela partilha de responsabilidades na gestão dos cuidados, também entre o sector público e o sector privado. A Commonwealth tem a maior responsabilidade pela medicina familiar, enquanto os estados e os territórios australianos, financiados pelo estado, são responsáveis pela gestão dos hospitais e da rede dos serviços de saúde na comunidade. Na sequência da reforma de 1992, com a General Practice Strategy, que tinha como finalidade aumentar e integrar o papel dos médicos de família, e do General Practice Strategy Review Group de 1997, que reconheceu o lugar destes profissionais no centro do sistema, os serviços de saúde atravessam presentemente uma nova fase de mudança, uma vez que o Governo australiano prevê a criação de uma plataforma de cuidados de saúde primários acessíveis, compreensivos, contínuos, centrados nas famílias e publicamente financiados. Os sistemas de saúde da Austrália, Canadá, Espanha, Finlândia e Reino Unido assentam em serviços nacionais de saúde, ainda que haja diferenças significativas entre todos, com base, principalmente, na divisão do território. O Reino Unido e a Espanha são os países que apresentam os modelos de contratualização mais desenvolvidos, em concordância aliás com os inovadores modelos organizativos que têm vindo a implementar e que têm servido de exemplo a muitos outros países, como a Austrália, o Canadá ou mesmo a Costa Rica, o Perú e o Ruanda. Os mecanismos de contratualização têm sido igualmente adaptados aos novos modelos de organização e de prestação dos cuidados. Com as Divisions of General Practice foram celebrados contratos com base no desempenho, no âmbito do National Quality & Performance System, estabelecido em 2005. Com as GP Super Clinics são estabelecidos acordos de financiamento, com descrição detalhada dos serviços a prestar. Estas últimas organizações actuam no âmbito de uma particular governância organizacional, uma vez que a Commonwealth não é sua proprietária nem responsável pela gestão dos seus serviços. Cada clínica deve, por isso, apresentar uma robusta estrutura directiva, concretizando os objectivos do programa acordado e prestando contas pelo seu cumprimento ou incumprimento. Apresenta-se, de seguida, a síntese da caracterização do sistema de saúde e do processo de contratualização desenvolvido em cada um dos vários países estudados, predizendo os conhecimentos colhidos ao longo do projecto de investigação. Sistemas de saúde tipo beveridgiano AUSTRÁLIA São conferidos diversos apoios às organizações de cuidados de saúde primários, destacando-se um projecto particularmente interessante e inovador. Um grupo de arquitectos desenvolveu, em parceria com o Royal Australian College of general Practitioners , um design especialmente concebido para os serviços de cuidados primários, considerando as necessidades e as particularidades destas organizações. O projecto serve a mnemónica D.E.S.I.G.N. (diversity, efficiency, safety, innovation, green, neighbourhood). A Austrália, ainda que caracterizada por um serviço nacional de saúde (Medicare) com base num seguro de saúde universal e compulsório, apresenta uma diversidade de modelos de gestão dos cuidados e uma elevada privatização das clínicas de medicina geral. Estas últimas são chamadas Divisions of General Practice e constituem organizações voluntárias de médicos de família que têm apresentado resultados significativamente positivos na prestação de cuidados primários. Na sequência do novo Governo eleito em 2007, foram também criadas as GP Super Clinics, um modelo de prestação inovador no país, que tem como objectivo prestar aos australianos acesso a cuidados primários multidisciplinares de qualidade e custoefectivos, adaptado às necessidades e às prioridades das populações abrangidas. CANADÁ O sistema de saúde do Canadá sustenta-se na existência de um seguro de saúde nacional (Medicare) que não é, porém, único, mas composto por tantos seguros quantas as províncias (10) e territórios (3) do país, que deverão reunir cinco princípios fundamentais, nomeadamente a ix administração pública, a compreensividade, a universalidade, a transferabilidade e a acessibilidade, reforçados pela redacção de 2009 do Canada Health Act, diploma que legitima o sistema de saúde canadiano. relatório de Romanow, que veio contornar a fragmentação e a lentidão dos avanços alcançados até ao momento, tentando impulsionar uma reforma sustentada e duradoura. No âmbito deste projecto, pretende-se o desenvolvimento de diversas abordagens, ainda que orientadas por determinados princípios considerados fundamentais, aos processos de contratualização, entendendo-se que a implementação de um único modelo de prestação geral não se coaduna com as diferentes necessidades da população canadiana. Os cuidados de saúde primários são a porta de entrada para o sistema de saúde canadiano, muitas vezes associados à função de referenciação e coordenação de outros serviços de saúde especializados. Considera-se, efectivamente, essencial no sistema de saúde canadiano a melhoria dos cuidados primários para a modernização do sistema de saúde. Actualmente, tem sido dado também maior enfoque às equipas multidisciplinares, com um efeito comprovadamente positivo nas percepções dos cidadãos sobre a qualidade global do sistema de saúde. ESPANHA O sistema de saúde espanhol tem por base o Sistema Nacional de Salud (SNS), criado em 1986, altura também de uma reforma no financiamento que passou de um sistema de seguro social para um sistema de impostos, de cobertura praticamente universal. O sistema de saúde espanhol sofreu também um processo de descentralização, tendo as matérias da saúde passado da gestão do Instituto Nacional de la Salud (INSALUD) para as 17 Comunidades Autónomas, que exercem actualmente competências na planificação da saúde, saúde pública e assistência à saúde. Houve três fases principais do processo de contratualização. A primeira teve lugar com o Health Transition Fund (de 1997 a 2001), que acompanhou o entendimento na altura de que o sistema de saúde canadiano deveria promover o custo-efectividade e a qualidade dos cuidados de saúde. O projecto tinha, assim, como finalidade a promoção e a sustentação com base na evidência dos processos decisórios no âmbito da reforma dos cuidados primários. Os serviços de saúde de nível primário encontram-se organizados com base num critério territorial, estando definidas diversas Áreas Básicas de Salud (ABS) ou Zonas Básicas de Salud (ZBS), que compreendem actividades de promoção da saúde e prevenção da doença e se caracterizam pela grande acessibilidade e pela suficiente capacidade de resolução técnica dos problemas de saúde mais frequentes. Nas ABS ou ZBS os serviços de saúde são desenvolvidos pelos Equipos de Atención Primaria (EAPs) que prestam cuidados de saúde nos Centros de Atención Primaria (CAP). De 2000 a 2006, concretizou-se o projecto com o nome Primary Health Care Transition Fund, destinado ao financiamento e à avaliação da efectividade de diversos projectos de cuidados primários ao longo do país. A iniciativa resultou principalmente do reconhecimento da necessidade de flexibilização, tendo em conta as diferentes necessidades e circunstâncias das populações, pretendendo implementar equipas multidisciplinares de cuidados de saúde primários que prestassem aos cidadãos o primeiro contacto com o sistema de saúde. O programa estabeleceu um modelo para os cuidados primários que incluía diversas condições, entre as quais, a criação de mais equipas interdisciplinares, com maior participação dos enfermeiros, farmacêuticos e outros profissionais de saúde, reflectindo o consenso generalizado sobre como deveriam ser os serviços de saúde a este nível de cuidados. Porém, o referido programa deixou espaço considerável para que as províncias e os territórios canadianos concebessem e implementassem diversas e consistentes abordagens no âmbito do modelo global preconizado. Os EAPs constituem uma das grandes alterações no decurso das reformas ocorridas no país, sendo o trabalho em equipa uma característica essencial do modelo de cuidados de saúde primários no sistema de saúde espanhol, entendendo-se este modelo organizativo determinante para a melhoria da qualidade dos serviços e para a oferta aos cidadãos de cuidados personalizados e próximos das suas residências. Porém, se o novo modelo organizativo deu impulso a cuidados assistenciais integrados, contínuos e de qualidade, também apresentou algumas fragilidades, como a rigidez normativa laboral e das estruturas de gestão, as deficiências estruturais e ao nível de recursos humanos, o sistema retributivo uniforme ou a escassa implementação de incentivos. Por essa razão, foram surgindo, desde a década de 90, principalmente após o chamado Informe Abril de 1991, modelos alternativos de gestão, como é o caso da “direcção participativa por Têm sido explorados e implementados novos modelos de prestação de cuidados primários no sistema de saúde canadiano, acompanhando o crescente enfoque neste nível de cuidados e a necessidade de uma maior participação e responsabilização por parte dos médicos, inseridos em equipas com outros e diferentes profissionais de saúde. Nesta medida, surgiu o Primary Health Care Transfer, estabelecido em 2003, após o x objectivos” (DPO), da introdução de Contratos-Programa com estabelecimento de objectivos e incentivos associados aos resultados e da diversificação de prestadores de cuidados, por meio da compra de serviços através da celebração de contratos de gestão. saúde prestados pelo sector público ou pelo sector privado, independentemente do local de residência ou do nível de rendimentos. O Contrato-Programa, estabelecido em 1993, é o instrumento que permite relacionar e vincular a utilização e o consumo de recursos aos resultados obtidos, por meio da negociação e fixação de objectivos, do estabelecimento de metodologias de monitorização, da valoração e da compensação do cumprimento dos serviços. A prestação de serviços no sistema de saúde finlandês funciona através de cuidados de saúde municipalizados. São os 348 municípios que estão legalmente constrangidos a organizar serviços de saúde adequados aos seus residentes. A responsabilidade pela prestação de cuidados de saúde primários cabe também aos municípios. Os serviços são prestados em centros de saúde, sob a alçada do município ou de um conjunto de municípios que tenham constituído uma federação. Actualmente, convivem diversas formas jurídicas de organização dos cuidados nas diferentes Comunidades Autónomas, com delegação na responsabilidade da gestão dos serviços, como, por exemplo, nas “unidades de gestão clínica” da Andaluzia e das Astúrias, nas “unidades de contrato” de Castilha-La Mancha, nas “uniones temporales de empresas” de Valença, ou nos novos modelos de autonomia de gestão da Catalunha, com maior autonomia e flexibilidade. Neste último caso, são estabelecidos contratos-programa com os EAPs que configuram verdadeiros contratos de gestão, com pactuação de objectivos e metas e uma maior descentralização dos processos decisórios e da gestão do risco. Uma das principais preocupações actuais consiste em assegurar o financiamento e a disponibilidade de cuidados de saúde primários, situação particularmente relevante nos pequenos municípios, com recursos limitados para a obtenção de serviços adequados. Uma das alternativas apontadas por alguns autores é a criação de um modelo em que os cuidados primários são financiados através de um novo programa nacional de seguro de saúde, libertando os municípios de prestar os serviços de saúde, tendo estes somente que adquirir a cobertura do seguro de saúde para os seus residentes a partir de um prestador do novo sistema que, por sua vez, adquiriria os serviços a partir de prestadores do sector público e privado. No fundo, trata-se de um modelo com base na separação entre as funções de financiamento e prestação de cuidados de saúde, que partiria de um processo de negociação e contratualização e que, de acordo com os autores que o defendem, eliminaria disparidades na responsabilidade do financiamento entre grandes e pequenos municípios, garantindo a todos os cidadãos a igualdade no acesso a cuidados de saúde. Até ao momento, porém, não se conhecem desenvolvimentos deste modelo. FINLÂNDIA Os serviços de saúde finlandeses têm por base um sistema de seguro nacional (National Health Insurance – NHI), que constitui um programa de cobertura universal compulsória introduzido em 1964, com base na residência, operacionalizado pela Social Insurance Institution of Finland, também conhecido por Kela. A missão da Kela, que sofreu uma reforma administrativa em 1 de Janeiro de 2009, é acompanhar o cidadão ao longo de toda a sua vida, assegurando os seus rendimentos, promovendo a saúde e apoiando a capacidade de auto-cuidados, tendo por base os valores do respeito pelo indivíduo, da especialização, da cooperação e da renovação. Os serviços de saúde finlandeses são cada vez mais desenvolvidos e avaliados em torno do ponto de vista do utente, através dos chamados customer panels. REINO UNIDO O National Health Service (NHS), base do sistema de saúde britânico, foi criado em 1948 e é considerado a maior organização de prestação de cuidados de saúde da Europa. Os cuidados primários, assegurados em Inglaterra pelos Primary Care Trusts (PCTs), são considerados um serviço frontline e abrangem uma rede de médicos de clínica geral, médicos dentistas, médicos oftalmologistas, optometristas, farmacêuticos, NHS Walk-in Centres (WiCs) e o serviço telefónico NHS Direct. Os cuidados de saúde são prestados essencialmente pelo sector público, que oferece um conjunto variável de serviços aos cidadãos, complementado pelos serviços do sector privado, de carácter essencialmente ambulatório e disponíveis principalmente nas grandes cidades. O sistema de financiamento do NHI sofreu uma reforma em 2006, tendo como finalidade conferir aos cidadãos segurados a possibilidade de escolha por serviços de É nos finais da década de 90 que surge o conceito de commissioning, referindo-se, fundamentalmente, à xi Os Primary Care Groups exerceram a sua actividade de 1999 a 2002, tendo adquirido o estatuto de Primary Care Trusts com o documento do Department of Health de 2001, “Shifting the Balance of Power”. Os Primary Care Trusts são entidades estatutárias que, actualmente, combinam a gestão dos serviços locais e comunitários com um muito mais alargado papel na contratualização (commissioning) de serviços de saúde para a população local. identificação de respostas em serviços de saúde apropriadas e efectivas perante a avaliação das necessidades dos doentes, ao cumprimento das prioridades em cuidados de saúde ao nível local e nacional, ao planeamento de uma prestação coerente de cuidados, à obtenção desses cuidados através da celebração de contratos com os prestadores de serviços e à afectação dos recursos disponíveis. A expressão primary care-led commissioning surgiu pouco depois, reflectindo o aparecimento de diferentes abordagens para o purchasing e commissioning de serviços de saúde que envolviam os médicos de família na liderança e nos processos decisórios. Este modelo teve origem no General Practitioner Fundholding, tendo sido identificadas sete diferentes variantes nas várias regiões do Reino Unido no período 1990-2004. O conceito pretendia traduzir uma contratualização conduzida por médicos de cuidados primários, em particular por médicos de clínica geral, que, recorrendo aos seus conhecimentos acumulados quanto às necessidades dos seus doentes e quanto ao desempenho dos serviços, aliados à sua experiência como agentes dos seus pacientes e no controlo de recursos, avaliam as necessidades em saúde, a especificação de serviços e o estabelecimento de standards de qualidade como etapas do processo de contratualização. O objectivo principal consistia na melhoria da qualidade e da eficiência dos serviços de saúde utilizados pelos seus doentes. Perante algumas alegadas fragilidades dos Primary Care Trusts, como o insucesso na concretização das mudanças desejadas na organização e na prestação de cuidados secundários, o insuficiente envolvimento dos profissionais de saúde nos cuidados primários ou a pouca influência sobre as decisões em contratualização de serviços, o Governo de Blair lançou em 2004 uma proposta para incentivar uma nova abordagem para a contratualização com base na prática, o practice-based commissioning. Este conceito é também referido por alguns autores como practice-led commissioning, na medida em que implica a delegação dos Primary Care Trusts nas unidades prestadoras de cuidados primários de todas ou de algumas das vertentes do commissioning. O conceito incorpora elementos dos extintos General Practitioner Fundholding, Total Purchasing Pilots e Locality/GP Commissioning Pilots que, essencialmente, constituíram três variantes do conceito. Actualmente, o practice-led commissioning existe num contexto em que os Primary Care Trusts fazem mediação entre a burocracia do NHS e a visão e as necessidades da “linha da frente” e pugnam pelo direito de todos os doentes à escolha pelo prestador, contrariamente ao que acontecia nos projectos anteriores. Principalmente em Inglaterra, o processo de contratualização encontra-se muito desenvolvido, registando-se as primeiras experiências no início da década de 90, com o referido projecto General Practitioner Fundholding que, partindo da cisão entre as funções de financiamento e prestação de cuidados, atribuía aos médicos de família, que participavam voluntariamente, um orçamento anual para a compra de um conjunto de serviços de saúde para os seus doentes. Este projecto teve a duração de sete anos (1990-1997), ao qual se seguiram as experiências dos Total Purchasing Pilots, entre 1994 e 1998, que consistia na compra de todo o leque de cuidados hospitalares e comunitários para os doentes. A abordagem practice-based commissioning, impulsionada pelo Department of Health, diz respeito ao empowerment dos médicos de família e de outros profissionais de saúde para a configuração dos serviços e cuidados de saúde prestados às populações locais. Assim, desde 2005, os médicos de família em Inglaterra têm o direito a assumir um orçamento para a contratualização, de carácter indicativo e com vista à gestão da prestação de serviços de saúde aos seus doentes. Este novo processo de contratualização veio permitir ao NHS a prestação de cuidados de saúde mais próximos das necessidades da população e a melhoria da qualidade dos cuidados prestados. Com a eleição do Governo de Blair em 1997, deu-se o fim do General Practitioner Fundholding, ainda que tenha permanecido a ideia de um NHS orientado para os cuidados de saúde primários. Foi também, na altura, formalizada a abordagem dos Locality/GP Commissioning Pilots, que tinham como finalidade reduzir as iniquidades associadas ao projecto fundholding original, revogado, aliás, com base nesse motivo e nos custos operacionais excessivos. Este modelo teve, porém, uma curta duração (1998-2000), tendo os commissioning pilots sido convertidos em 481 Primary Care Groups, responsáveis pela aquisição de serviços de saúde na comunidade. As quatro vias de contratualização de cuidados de saúde primários são os General Medical Services, os Personal Medical Services, os Alternative Provider Medical Services e os Primary Care Trust Medical Services. Os contratos celebrados entre os Primary Care Trusts e os General Medical Services (GMSs), processo inovador com início xii em Abril de 2004, foram desenvolvidos pela NHS Confederation em parceria com o General Practitioners Committee da British Medical Association e constituem uma maior flexibilidade para os médicos de família, representando um nível sem precedentes de investimento nos cuidados primários. O sistema de saúde alemão encontra a raiz da história da contratualização nos finais do século XIX, com a introdução do sistema estatutário de seguros de saúde. Os contratos eram estabelecidos com cada prestador individualmente, tendo os “fundos de doença” um papel dominante nas negociações. O “acordo de Berlim” de 1914 veio centralizar o processo de negociação, através da formação de comissões que preparavam as negociações contratuais e fixavam a regulamentação respeitante à admissão de médicos ao grupo de prestadores de cuidados “estatutários”. Após o termo do acordo, em 1923, os conflitos entre os “fundos de doença” e os prestadores reacenderam-se, tendo sido introduzida, para os dissipar, a opção pela negociação de contratos colectivos que, até 1932, coexistiram com os contratos individuais, altura em que estes últimos foram extintos, perdendo as seguradoras o papel predominante de antigamente. No contexto actual da contratualização no NHS, considera-se fundamental o enfoque na qualidade dos cuidados, perspectivada do ponto de vista e das necessidades dos doentes e entendida em três dimensões: segurança, experiência do doente e efectividade. Por outro lado, para alcançar cuidados de elevada qualidade, entende-se essencial conceder liberdade e oportunidade aos profissionais da “linha da frente” para darem uso às suas capacidades, enquanto portadores de um papel tridimensional, como médicos, parceiros do NHS e líderes, e enquanto elementos de uma equipa direccionada para a concretização dos mesmos objectivos. A introdução em 1993 da base legal do seguro de saúde estatutário (GSG) marcou um esforço maior no sentido da reforma do sistema de saúde alemão, com o objectivo de abolir a ineficiência, através de incentivos e da competição. Foi igualmente atribuída importância à qualidade dos cuidados, tão preponderante agora como a eficiência. Sistemas de saúde tipo bismarckiano ALEMANHA O sistema de saúde alemão assenta, desde 1883, no modelo bismarckiano, ainda que tenha sofrido, ao longo do tempo, algumas modificações. Em 1 de Abril de 2007, deu-se início a uma reforma significativa, com a introdução da “Lei para o Fortalecimento da Competição no Sistema de Seguro de Saúde Estatutário” (GKV-WSG). Esta reforma incluiu alterações em quatro áreas principais, nomeamente, a introdução da cobertura universal, a reforma das estruturas de saúde e a reorganização do fundo de seguro de saúde, a reforma das estruturas financeiras e a reforma dos seguros de saúde privados. Em 1996, foi concedida alguma liberdade de escolha aos “fundos de doença” que, no entanto, continuavam a não poder escolher ou compensar os prestadores mais eficientes ou estabelecer colaborações preferenciais. No final da década de 90, imperava o princípio da igualdade e a validade generalizante dos termos contratuais negociados colectivamente. Porém, na senda da reforma da década de 90, o sistema de contratos veio responder à necessidade de impulsionar a inovação e a criatividade dos compradores de cuidados de saúde, no sentido de se procurarem novas formas de prestação e de remuneração, tendo surgido com a introdução da segunda legislação reformadora, em 1997, duas formas distintas de contratos, alternativas ao formato generalizante, os contratos experimentais (Modellversuche) e os contratos estruturais (Strukturverträge). Estas duas modalidades alternativas aos contratos universais constituíam duas formas possíveis de conceder maior flexibilidade às negociações contratuais, ambas introduzidas com o objectivo de melhorar a qualidade e a eficiência dos serviços prestados em ambulatório. Os cuidados de saúde são prestados tanto por entidades públicas como privadas, controlando, porém, o Governo alemão as políticas de saúde e a própria prestação dos cuidados de saúde. Actualmente, encontra-se em execução uma política de solidariedade, em que se pretende que todos tenham igual acesso a cuidados de saúde com qualidade, independentemente da capacidade para pagar. Os cuidados primários são prestados por médicos de clínica geral que não têm, porém, historicamente uma função de gatekeepers. Tem sido, no entanto, notada uma tendência para a prestação de cuidados de nível primário por meio de grupos de médicos de família, que coordenam as referenciações dos doentes para especialistas, tendo em 2000 sido finalmente introduzido o gatekeeping. Outra inovação foi a introdução em 2004 dos centros médicos (MVZ), instituições multidisciplinares, presididas por médicos que contratam outros médicos. A principal diferença entre estes dois tipos de contratos e os contratos universais standards consistia no facto de se poder optar, através dos primeiros, por diferentes regras de pagamento aos prestadores assim como por criar redes com os prestadores de cuidados de saúde primários, com o propósito de gatekeeping. xiii A prestação de cuidados de saúde na Alemanha encontra-se nos dias de hoje, segundo alguns autores, altamente fragmentada, resultando numa integração vertical e horizontal empobrecida e num sistema principalmente focalizado no tratamento individualizado de doenças e não na gestão de populações de doentes. O sistema de saúde francês caracteriza-se também pela liberdade de escolha e pelo fácil e livre acesso dos doentes, incluindo o acesso directo a especialistas, e pela liberdade de prática e de prescrição pelos profissionais de saúde. Os cuidados de ambulatório encontram-se, por isso, largamente desenvolvidos em França, oferecendo um leque variado de serviços, por meio de uma organização não hierárquica, ainda que de certo modo iniquitativamente distribuída ao longo do território francês. De forma a facilitar novas formas de prestação de cuidados, o Governo Federal alemão alterou, no ano 2000, as regras para a contratualização entre os fundos de seguros de saúde e os prestadores. Pela primeira vez, as seguradoras não estavam limitadas aos contratos negociados colectivamente e a orçamentos, sendo possível agora os médicos contratualizarem de forma selectiva com as primeiras, em esquemas de cuidados integrados, modelos de gatekeeping e programas de gestão de doença. Actualmente, e desde 2004, existe um sistema voluntário de gatekeeping, através da figura do médecin traitant, um médico generalista ou especialista escolhido pelo doente que coordenará todo o ciclo de cuidados, assumindo o papel central na orientação do paciente ao longo de toda a prestação de cuidados, incluindo referenciações para outros níveis de cuidados. Estas inovações têm, assim, promovido formas de prestação de cuidados integrados através de centros clínicos, o gatekeeping, incentivos financeiros para médicos, seguradoras e doentes e a competição através da contratualização selectiva entre prestadores e financiadores, ainda que tenha sido dado muito lentamente início a contratos com esta nova tramitação. O processo de contratualização é constituído essencialmente pela negociação entre os profissionais de saúde e as seguradoras de disposições referentes aos serviços prestados, enquadradas nos acordos de boas práticas estabelecidos ao nível nacional e regional, para a respectiva área profissional. Estes acordos, com a duração de cerca de cinco anos, têm fundamentalmente por objectivo obter o compromisso individual dos profissionais na melhoria e na eficiência das suas práticas, em troca de incentivos financeiros. Os médicos podem, no entanto, aceitá-los ou rejeitá-los. A competição introduzida com a reforma de 2007 veio, por outro lado, permitir às seguradoras novas possibilidades na configuração dos contratos, podendo, por exemplo, contratualizar directamente com os médicos que prestam cuidados de saúde em consultórios privados. Muitas das reformas encontram-se, porém, ainda em fase de implementação, dada a sua introdução ainda tão recente, não sendo possível por enquanto uma avaliação sistemática. O processo de contratualização em França sofreu a influência dos grandes conflitos existentes entre médicos e seguradoras, tendo em 1971 sido implementado o conventionnement, em que os contratos de serviços de saúde com os médicos eram estabelecidos numa base uniforme nacional. Em troca, os médicos beneficiavam de vantagens sociais e fiscais e tinham garantidos os princípios da prática médica independente: livre escolha do médico, liberdade de prescrição, sigilo profissional e pagamentos directos pelos doentes. Estas convenções nacionais foram subscritas subsequentemente em 1976, 1980, 1985, 1990, 1993 e para o período 1997-1998 FRANÇA Inspirado inicialmente no sistema bismarckiano, o sistema de saúde francês (l‟Assurance Maladie, criada em 1945) combina, nos dias de hoje, elementos decorrentes dos modelos de Bismarck e de Beveridge, tendo por base seguros de saúde enquadrados num sistema de segurança social, sob uma forte intervenção estatal. A reforma de Juppé de 1996 veio dar abertura à celebração de acordos autónomos com os médicos de família e outros especialistas. Muitos acordos estabelecidos entre os sindicatos e as seguradoras foram, porém, anulados, por não se encontrarem em conformidade com a lei, o que foi deteriorando as relações entre os médicos e as relações entre o Governo e as seguradoras. Em 2001, o Governo promoveu um processo de consulta, para dar reinício ao diálogo com os profissionais do sector privado. Na sequência deste processo, foi reformado em 2002 o sistema dos acordos entre os profissionais e as seguradoras. O novo sistema compreende actualmente três níveis: i) a fixação de Com a reforma da Couverture Maladie Universelle (CMU) em 2000, o seguro de saúde obrigatório, base do actual sistema de saúde francês, passou a cobrir toda a população. Actualmente, estão presentes três regimes principais no sistema de l‟Assurance Maladie: o regime geral (Assurance Maladie - Régime Général), o regime agrícola, garantido pela Mutualité Sociale Agricole (MSA), e o regime social dos independentes (Régime Social des Indépendants - RSI). Existe em França uma grande preocupação pela cobertura de todos os cidadãos, independentemente do seu estatuto sócio-económico. xiv regras comuns para todos os profissionais a nível regional e nacional, ii) a especificação de cláusulas de boas práticas a nível regional e nacional para cada área profissional iii) e, no caso de falta de aceitação por uma categoria profissional, a celebração de contratos (public health contracts) entre as seguradoras e os profissionais individualmente para o desenvolvimento de cuidados preventivos ou a integração em redes, em troca de pagamentos adicionais. No anterior processo de contratualização, as organizações representantes das seguradoras e dos prestadores de cuidados de saúde reuniam-se anualmente para conceberem o enquadramento geral dos contratos a firmar, que serviria de ponto de partida para as negociações a encetar entre ambos. Actualmente, admite-se a contratualização selectiva, sendo esta uma característica predominante do sistema de saúde holandês e das relações entre as seguradoras e os prestadores de cuidados de saúde. Enquanto entidades independentes, as seguradoras recebem orçamentos da Comissão para os Seguros de Saúde (College voor Zorgverzekeringen – CVZ), para a contratualização de serviços de saúde com vista a assegurar o acesso dos seus membros a cuidados de saúde, podendo seleccionar livremente os prestadores de serviços de saúde. O processo legislativo de 2002 permitiu, assim, que os profissionais de saúde e as seguradoras celebrassem, entre si, diferentes tipos de acordos que, essencialmente, representam um compromisso individual e têm por objectivo obter o compromisso dos profissionais na melhoria e na eficiência das suas práticas, em troca de incentivos financeiros. As seguradoras têm, ainda, no enquadramento legal permitido, promovido outras iniciativas, como a contratualização selectiva, principalmente nos sectores onde há espaço para negociação. Um dos objectivos principais da reforma foi permitir, com efeito, um sistema que conduzisse a uma prestação mais eficiente dos serviços de saúde. Por essa razão, as seguradoras podem contratualizar selectivamente de forma a negociar uma relação favorável entre qualidade e preço para os seus subscritores. O sistema de saúde francês iniciou em 2004 o desenvolvimento de uma forma de contratualização com base na cooperação. Este movimento resultou da necessidade de sedimentar políticas de contratualização, na medida em que acordos específicos poderiam contribuir para a melhoria da eficiência do sistema de saúde, assim como para a flexibilização das relações entre os diferentes actores. O processo de contratualização em desenvolvimento em França tem em vista a formalização dos papéis de cada actor num sistema global e coerente nos cuidados prestados aos doentes. No âmbito de um enquadramento definido através de uma política de contratualização, cada médico poderá, porém, manter um elevado grau de autonomia na prestação de serviços de saúde. Sistemas de saúde de livre escolha e competição ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA O sistema de saúde americano presta cobertura de cuidados de saúde aos cidadãos através da Medicare e da Medicaid, estando excluídos todos aqueles que não reunirem os requisitos necessários. A Medicare, dirigida essencialmente aos idosos, abrange 14% da população americana, enquanto a Medicaid, dirigida à população empobrecida, abrange 13% dos cidadãos. HOLANDA A maioria dos planos de saúde nos Estados Unidos é prestada por seguradoras privadas por meio de acordos com entidades patronais, não existindo, até ao momento, um sistema nacional de saúde que proteja todos os cidadãos americanos, estimando-se que 45 milhões não estejam cobertos por qualquer plano de saúde. O sistema de saúde holandês apresenta uma mistura de elementos dos modelos bismarckianos e beveridgnianos, com uma longa tradição na prestação privada de cuidados de saúde e no financiamento e regulação públicos, caracterizando-se ainda por um sistema de cuidados primários robusto. Actualmente, e fazendo parte essencial da agenda política de Barack Obama, a reforma compreensiva do sistema de saúde americano encontra-se em discussão, consistindo essencialmente em cinco estratégias fundamentais, nomeadamente, i) a cobertura universal financeiramente comportável, ii) o alinhamento dos incentivos com valor em saúde e um efectivo controlo de custos, iii) cuidados coordenados, acessíveis e centrados no doente, com prestação de contas, iv) fixação elevada Em 2006, o Governo holandês introduziu uma reforma significativa, tendo por objectivo a melhoria da qualidade e da eficiência por meio da introdução de um sistema uniforme de seguros de saúde e da intensificação da competição entre as seguradoras. Tendo desaparecido a distinção entre seguros de saúde públicos e seguros de saúde privados, os cidadãos têm agora liberdade de escolha entre todas as seguradoras disponíveis no mercado. xv de objectivos no sentido da melhoria da qualidade, resultados em saúde e eficiência e v) liderança com prestação de contas e colaboração para estabelecer e alcançar metas nacionais. do estado de Pennsylvania, abrangendo uma população de cerca de 2,6 milhões de pessoas. O GHS apresenta como missão a melhoria da qualidade de vida por meio de uma organização de serviços de saúde integrados e com base num programa de cuidados aos doentes, educação, investigação e serviços na comunidade. Neste trabalho, foram estudadas duas organizações, a Kaiser Permanente e a Geisinger, por constituírem sistemas de prestação integrada de cuidados de saúde que funcionam quase ao nível de um sistema nacional de saúde, abrangendo populações de grandes dimensões. A liderança dos médicos é uma dimensão marcante na Geisinger, dado que a organização se assume como um sistema de saúde orientado para o prestador de cuidados médicos, o que contribuiu para a completa integração dos serviços. Por essa razão, foi criado o Geisinger Quality Institute (GQI), que tem como finalidade a formação de equipas clínicas multidisciplinares para a prestação de cuidados integrados e seguros. A Kaiser Permanente (KP) é o maior sistema sem fins lucrativos de prestação integrada de cuidados de saúde dos Estados Unidos, foi constituída em 1945 e abrange uma população de 8,6 milhões de cidadãos. A KP abrange ainda 14.000 médicos e 35 centros médicos, dotados de instalações hospitalares. Apresenta-se com um propósito social, tendo como missão a prestação de cuidados de saúde de elevada qualidade e financeiramente comportáveis e a melhoria da saúde das comunidades que serve. O sistema de saúde da Geisinger é formado por diferentes dimensões complementares entre si, designadamente, a Geisinger Clinic e o Plano de Saúde Geisinger. A Geisinger Clinic abrange aproximadamente 200 médicos de clínica geral e 450 médicos de outras especialidades, incluindo cirurgiões e pediatras e é um dos programas de cuidados ambulatórios de maior dimensão do estado da Pennsylvania, prestando serviços de elevada qualidade em locais mais próximos dos doentes. Uma dimensão inovadora do GHS e da Geisinger Clinic é a rede das chamadas CareWorks® – Convenient Healthcare Clinics, centros clínicos em supermercados criados com vista a prestar cuidados de saúde financeiramente comportáveis e de modo mais conveniente aos doentes. A KP destaca-se dos restantes planos de saúde americanos na medida em que constitui um modelo integrado de financiamento e prestação, actuando como um “serviço nacional de saúde”, com uma única linha de financiamento, um orçamento global e a responsabilização por toda a linha de cuidados de uma população. A estrutura organizacional da KP apresenta como um elemento importante a delegação da gestão clínica, sendo os Permanente Medical Groups responsáveis pela supervisão das compensações aos médicos e da gestão do desempenho. A prestação de cuidados é liderada igualmente pelos médicos. O Plano de Saúde Geisinger foi, por seu lado, instituído em 1985 e é parte integrante do sistema de saúde com o mesmo nome, com cerca de 220.000 membros e uma rede de 25.000 entidades prestadoras de cuidados, entre as quais 3.288 são médicos de família e 1.393 são centros de cuidados primários. O processo de contratualização utilizado pelo sistema de saúde da KP funciona através da mútua exclusividade, isto é, o Plano de Saúde Kaiser contratualiza cuidados de saúde apenas com os chamados Permanente Medical Groups (PMGs), grupos clínicos multidisciplinares que, por sua vez, contratualizam exclusivamente com o Plano de Saúde Kaiser para a prestação de praticamente todos os serviços de saúde para os membros da KP. As duas entidades chegam a acordo, estabelecendo os chamados Medical Services Agreements (MAS), em que se incluem os objectivos de desempenho de qualidade e de serviço a atingir e em que o pagamento do Plano de Saúde aos PMGs é determinado ao nível populacional. É nestes acordos que também se define a responsabilização partilhada sobre a qualidade e o desempenho. No que se refere a modalidades de pagamento, o Plano de Saúde Geisinger e a Clínica Geisinger encontram-se a desenvolver iniciativas inovadoras de pagamento pelo desempenho (P4P), com vista à motivação e reconhecimento das melhores práticas, dos melhores resultados clínicos e da satisfação dos doentes. Neste âmbito, foi estabelecido em 2006 um programa para a revascularização do miocárdio (coronary artery bypass graft – CABG), denominado CABG ProvenCareSM, assente num único pacote de serviços com preço fixo para todos os cuidados referentes àquela patologia e com resultados muito positivos. O sistema de saúde Geisinger (Geisinger Health Plan – GHS) foi, por sua vez, fundado em 1915 e é uma rede de cuidados de saúde compreensivos integrados sem fins lucrativos que presta serviços em cerca de 40 municípios O sistema de saúde Geisinger tem sido alvo de numerosos reconhecimentos ao nível nacional pelos sucessos alcançados no acesso a cuidados de elevada xvi O sistema performance-based financing tem revelado no país uma positiva sustentantibilidade, enquadrando-se nas actuais políticas de saúde nacionais e recebendo um forte apoio político. O Governo tem contratualizado carteiras básicas de indicadores de saúde, a nível nacional, e, por outro lado, outras entidades encontramse a contratualizar indicadores de desempenho específicos (VIH/SIDA, malária, tuberculose) através do mesmo modelo administrativo. O Governo de Ruanda, em manifestação de compromisso, consignou inclusivamente, em 2005, fundos públicos para a continuação das experiências no Butare e em Cyangugu, no sentido de se alcançarem os Millennium Development Goals da OMS. qualidade e constitui um dos mais proeminentes sistemas de saúde americanos, prevendo-se a sua expansão a outros estados. Sistemas de saúde financiados por ONGs RUANDA O Ruanda é um dos países mais pobres do mundo, configurando a ajuda internacional 17,3% do Produto Interno Bruto, enquanto apenas uma pequena parte do PIB (cerca de 4,3%) é aplicada na saúde. O Ruanda tem apresentado progressos substanciais na estabilização e na reabilitação económica, após os conhecidos confrontos de 1994, manifestando, igualmente, um grande esforço na melhoria das condições de vida da população, apesar dos elevados níveis de pobreza. No pós-guerra, foram seguidas as orientações de 1987 do Regional Commitee of Africa of the World Health Organization quanto ao modelo de política de saúde, tendo sido delegadas nas sub-regiões de saúde o planeamento, o financiamento e a regulação. Subsistia, no entanto, a ausência de planos de saúde e da formalização de procedimentos. Para uma melhor comprensão do modelo de organização dos cuidados de saúde em cada um destes países e do seu eventual impacto na saúde das populações, procurámos sintetizar num quadro único, os países estudados em tipo de sistema de saúde e organização da prestação, alinhando ainda alguns indicadores, nomeadamente, % PIB afecto à saúde, esperança de vida ao nascer e taxa de mortalidade neonatal (vd. Quadro 1). Pretende-se, essencialmente, disponibilizar uma abordagem tão breve quanto possível das diversas componentes de análise do estudo realizado para posteriores reflexões e comparações. Em 2000, o Governo permitiu a descentralização dos serviços de saúde, deixando o sistema vulnerável às leis de mercado. Quando a procura de cuidados de saúde, livre de encargos para o utente, ultrapassou a capacidade de resposta dos prestadores, o Governo do Ruanda permitiu a estes a fixação livre do custo imputável ao doente e a arbitrária aplicação dos recursos obtidos. Na sequência das iniquidades que se verificavam, foram desenvolvidas duas experiências de contratualização, a chamada Performance Initiative e o projecto de Cyangugu. A Performance Initiative foi aplicada em 2002 em meios essencialmente rurais da Província do Butare, com a participação de 19 centros de saúde de Gakoma e de Kabutare. O processo de contratualização tinha em vista uma maior responsabilização mútua dos contraentes tendo, em prol da simplicidade, sido delineado um único contrato multilateral para cada centro de saúde. O contrato especificava a tabela de pagamentos, as obrigações de informação e transparência e as penalizações e os motivos para a quebra do contrato. Os resultados favoráveis da Performance Initiative impulsionaram o nascimento de novas experiências no Ruanda, como o projecto de financiamento com base no desempenho de Cyangugu, em que participaram 24 centros de saúde da região, e que também obteve resultados muito positivos. xvii QUADRO-SÍNTESE Quadro 1: Quadro-síntese dos países em estudo País Sistema de saúde Austrália Seguro de saúde universal compulsório financiado com base em impostos – Medicare (1984) Canadá Seguro de saúde universal compulsório financiado com base em impostos – Medicare (1961), composto pelos 13 planos das diferentes províncias e territórios % PIB para a saúde1 8,7% 10,0% Esperança de vida ao nascer (anos)2 82 81 Esperança de vida saudável (HALE) ao nascer (anos) 74 73 Taxa de mortalidade neonatal (por 1.000 nados vivos) Organização da prestação de CSP Unidades de CSP 3 Cuidados de saúde primários prestados maioritariamente pelo sector privado Divisions of General Practice / Primary Care Partnerships (Victoria) / 8 Projectos-piloto Primary Health Care Networks 2002-2005 (New South Wales) 3 Responsabilidade na prestação e gestão dos cuidados partilhada pelo Governo federal e pelos Governos das províncias e territórios Espanha SNS (1986) 8,1% 81 74 2 Comunidades Autónomas, através dos Distritos de Atención Primaria ou Áreas de Salud Finlândia Sistema de segurança social - National Health Insurance (NHI), operacionalizado pela Kela. Sistema de seguro nacional compulsório, financiado com base em impostos (1964) 7,6% 79 72 2 Municípios 1 2 Primary health care organizations (equipas multi e interdisciplinares) Projectos com delegação de responsabilidades na gestão da prestação e dos recursos em CSP Mecanismos de contratualização de CSP Incentivos e apoios ao processo de contratualização de CSP GP Super Clinics Contratos de financiamento com base nos resultados 1998 (extintos) / National Quality & Performance System 2005 / Contratos com base no desempenho com as Divisions of General Practice / Acordos de financiamento com as GP Super Clinics Practice Incentives Program / Australian Primary Care Collaboratives Program / Quality Improvement Skills Program / Rebirth of a clinic (D.E.S.I.G.N.) Health Transition Fund (1997-2001) / Primary Health Care Transition Fund (20002006) / Primary Health Care Transfer (2003) Educação interprofissional do College of Health Disciplines da University of British Columbia, entre outras instituições / 2008 Canadian Survey of Experiences with Primary Health Care / Canada Health Infostructure Partnerships Program / Knowledge Development and Exchange Applied Research Initiative / Ottawa Decision Support Framework Equipos de Atención Primaria Unidades de Gestión Clinica (Andaluzia e Astúrias) / Unidades de Contrato (Castilha-La Mancha) / Uniones Temporales de Empresas (Modelos Alzira - Valença) / modelos de autonomia de gestão (Catalunha) Contratos de Gestión no âmbito dos Contratos-Programa - Centros de cuidados primários (desde a década de 70) - - - WHOSIS, 2008 (dados referentes ao ano de 2006, para todos os países indicados, com excepção do Ruanda). Os dados referentes aos três indicadores de saúde têm como fonte a World Health Organization, 2009c. xviii País Reino Unido Sistema de saúde SNS (1948) % PIB para a saúde1 8,4% Esperança de vida ao nascer (anos)2 80 72 Taxa de mortalidade neonatal (por 1.000 nados vivos) 3 Organização da prestação de CSP Primary Care Trusts Unidades de CSP Projectos com delegação de responsabilidades na gestão da prestação e dos recursos em CSP General Medical Services Mecanismos de contratualização de CSP Incentivos e apoios ao processo de contratualização de CSP Primary Care-led Commissioning (1990-2004): General Practice Fundholding (1990-1997) / Total Purchasing Pilots (1994-1998) / Locality/GP Commissioning Pilots (1998-2000) / Primary Care Groups (1999-2002); Abordagem Practicebased Commissioning (2004) General Medical Services Contract Business Cases / Practice-based Commissioning Development Framework / World Class Commissioning / Knowledge Based Commissioning Programme / Primary Care Management Development Programme / Leadership for Clinical Service Improvement / Framework for Procuring External Support for Commissioners / PCT Board Development Framework - Contratos individuais entre prestadores e os “fundos de doença” (1883-1914) / Acordo de Berlim (1914-1923) / Contratos colectivos e contratos individuais (1923-1931) / Contratos colectivos em exclusivo (1931-1993) / Introdução da competição entre os “fundos de doença” (1993) / Contratos universais, experimentais e estruturais (1997) / Contratualização directa entre “fundos de doença” e prestadores privados (2007) - - 3 Associação de Médicos do Seguro de Saúde Estatutário 73 2 Prestação de forma independente pelos médicos de família / Centros de saúde geridos pelas autoridades locais ou pelas associações mutualistas Médicos de família em consultório privado / Centros Médicos - Negociação de acordos colectivos por área profissional, num formato estandardizado (1960) / Conventionement (1970) / Acordos autónomos com os médicos (Reforma de Juppé de 1996) / Acordos de boas práticas de âmbito regional e nacional; Acordos para a área profissional; Contratos autónomos + Contratualização selectiva (2002) 80 73 3 Médicos de família - - Contratualização selectiva (Relatório de Dekker 1987) - 15,3% 78 70 4 Não existem, até ao momento, CSP prestados pelo Estado - Accountable Care Organizations / Patient-Centered Medical Home / CareWorks (Geisinger) / Permanente Medical Groups (Kaiser Permanente) - - 9,8%3 50 43 48 Não existem CSP - Performance Initiative / Experiência de Cyangugu Contratualização dos objectivos, preços e serviços a prestar - Alemanha Seguros compulsórios (1883) França L‟Assurance Maladie (1945) - Seguros compulsórios em 3 regimes principais (geral, agrícola, independentes) 11,1% 81 Holanda Sistema de seguro social universal de saúde (compulsório), oferecido pelo sector privado (2006) 9,3% EUA Seguros privados de livre escolha e competição / Cobertura pelo sector público dos idosos (Medicare) e da população empobrecida Medicaid) Ruanda Pagamentos directos / Financiamento ONGs 3 Esperança de vida saudável (HALE) ao nascer (anos) 10,4% 80 73 Centros médicos WHO, 2009a (dados referentes ao ano de 2008). Refira-se que, de acordo com a mesma fonte, o Ruanda apresentou uma percentagem do PIB gasta em saúde de apenas 4,3% no ano de 2002. xix de um processo contínuo de cuidados de saúde» (Alma- INTRODUÇÃO Ata, 1978). A Organização Mundial de Saúde (OMS) define um sistema de saúde como o conjunto de todas as organizações, instituições e recursos que têm como objectivo primordial a promoção da saúde (WHO, 2005). É, porém, também verdadeiro que existem diversas formas de organizar um sistema de saúde, sem que algum país tenha descoberto o sistema de saúde ideal, em termos de financiamento, organização e prestação de cuidados de saúde (World Bank, 2000). Os CSP desempenham diferentes funções, como a responsabilidade clínica do primeiro contacto do doente com o sistema de saúde, gatekeeping e, mais recentemente, uma cada vez maior responsabilidade financeira, na medida em que retêm, em geral, grande parte dos recursos disponíveis (Saltman, 2003). A forma como se perspectivam os CSP tem sido alvo de grandes alterações. Hoje, consideram-se como um conjunto, a vários níveis, de respostas compreensivas às necessidades de saúde das populações, que exigem um investimento significativo, mas que, em retorno, prestam um valor superior às alternativas (WHO, 2008). Uma reforma dos cuidados de saúde significa uma mudança no sentido de uma melhor organização, financiamento, prestação e regulação, que conduza a cuidados e serviços de saúde mais acessíveis, eficientes, custo-efectivos, justos e de qualidade (FuenzalidaPuelma, 2002). A cada organização de CSP deve, por essa razão, poder ser confiada a responsabilidade por uma comunidade ou população claramente definida. Desse modo, poderá exigir-se-lhe accountability pela prestação de cuidados compreensivos, contínuos e centrados na pessoa, através – sugere a OMS (2008) – de ferramentas de medição ou de cláusulas contratuais. O desafio consiste em analisar os resultados finais das estratégias alternativas, reconhecendo se são compatíveis com os valores fundamentais da equidade, solidariedade, justiça e sustentabilidade de um sistema de saúde (WHO, 1996). É neste contexto que surge a pertinência de pensar em novas alternativas que contribuam para o cumprimento dos objectivos confiados aos CSP, para o que servirá a recolha de evidência sobre as experiências existentes e os modelos adoptados noutros países, com sistemas de saúde semelhantes ou distintos do nosso. No contexto da actual reforma das organizações de saúde (Fuenzalida-Puelma, 2002; Saltman, 2002; OPSS, 2008) e de contenção de despesas ao nível global, os decisores políticos dos diferentes países têm vindo a introduzir mecanismos, ao nível institucional e local, para uma gestão mais eficiente da prestação de cuidados, (Saltman, 2002). O presente relatório enquadra-se na fase 3 do projecto de investigação “Contratualização em Cuidados de Saúde Primários – Horizonte 2015/2020”, que se ocupou da revisão das práticas internacionais no contexto das matérias em estudo (vd. Figura 1). É neste momento de mudança que os cuidados de saúde primários (CSP) assumem um papel de liderança (Saltman, 2003). E, numa altura de crise financeira mundial, os valores da equidade, solidariedade e universalidade, que sustentam os CSP, tomam uma particular relevância (WHO, 2009b). Neste âmbito, apresentamos os resultados obtidos ao longo do processo de investigação, conduzido no sentido de dar resposta à questão de investigação que serviu de ponto de partida, designadamente, a caracterização e a contextualização da temática da contratualização em saúde, especificamente nos cuidados de saúde primários, por meio da observação das diferentes práticas no espaço internacional. Os cuidados de saúde primários são «cuidados essenciais de saúde baseados em métodos e tecnologias práticas, cientificamente bem fundamentadas e socialmente aceitáveis, colocados ao alcance universal de indivíduos e famílias na comunidade, mediante a sua plena participação e a um custo que a comunidade e o país possam suportar em cada fase de seu desenvolvimento, no espírito de autoconfiança e autodeterminação. Fazem parte integrante tanto do sistema de saúde do país, do qual constituem a função central e o foco principal, como do desenvolvimento social e económico global da comunidade. Representam o primeiro nível de contacto dos indivíduos, da família e da comunidade com o sistema nacional de saúde, possibilitando cuidados de saúde o mais próximo possível do local de residência e trabalho das pessoas, e constituem o primeiro elemento A revisão das práticas no panorama internacional, apresentada no presente relatório, contribuirá, a par do estudo sobre as experiências desenvolvidas no contexto nacional (fase 4), para a prossecução do objectivo final, que consiste na identificação e sustentação de diferentes cenários para o desenvolvimento e aplicação do processo de contratualização no âmbito da rede dos cuidados de saúde primários. 1 Em última instância, o projecto de investigação desenvolvido ao longo das diferentes etapas pretende contribuir para a concretização de um modelo que, dotando o sistema de melhores estruturas de gestão, possibilite o acesso dos cidadãos à prestação de cuidados de nível primário de qualidade e potencie melhores resultados em saúde. Para garantir a actualidade e veracidade da informação vertida neste relatório de revisão de práticas internacionais, a equipa de investigação submeteu parte do seu conteúdo a uma leitura crítica, junto de especialistas que conhecem em profundidade ou trabalham em alguns dos países estudados e que detêm experiência profissional e de investigação no âmbito das reformas de cuidados de saúde primários, nesses países. Esta fase de validação levantou algumas dificuldades na obtenção, em tempo útil, de alguns dos contributos e eventuais correcções decorrentes da leitura crítica realizada, pelo que se entendeu considerar o presente documento como uma versão preliminar, cujo conteúdo definitivo será disponibilizado aquando da apresentação do relatório final do projecto de investigação em curso, onde se recolherá e integrará, não só a totalidade desses contributos, como ainda a actualização da temática em análise, resultante da investigação e da evidência que entretanto for sendo publicada. Figura 1: Fases do projecto de investigação – fase 3 2 investigação. A pesquisa documental foi conduzida por meio do cumprimento de regras e procedimentos metodológicos, devidamente explicitados, de forma a garantir a qualidade, integridade e validade da investigação (vd. Quadro 3). METODOLOGIA ADOPTADA I. S ELECÇÃ O DO OBJECTO D E ESTUDO Em primeiro lugar, e uma vez definida a pergunta de investigação, o trabalho de pesquisa documental desenvolvido seguiu uma estrutura em torno dos diferentes sistemas de saúde: tipo beveridgiano, tipo bismarckiano, de livre escolha e competição e financiados por organizações não governamentais (ONGs). Quadro 3: Percurso de pesquisa Registo de cada artigo/obra em ficheiro bibliográfico Pesquisa por tema/assunto/palavras-chave Pesquisa por palavras-chave encontradas com referência ao mesmo tema Pesquisa por autores Pesquisa nos sítios institucionais Referências bibliográficas dos artigos/livros sobre o tema, com atenção nas referências citadas por vários autores Artigos relacionados Eliminação de referências repetidas Contudo, um qualquer projecto de investigação é também conduzido pelas matérias estudadas, dependendo da qualidade da documentação encontrada e não podendo retribuir mais do que recebeu, nem entregar à questão de investigação de que partiu respostas para além das que o próprio processo de investigação encontrou. Nesta medida, para garantir a qualidade e a relevância dos conteúdos, e em função da informação disponível, foi decidido rever com maior profundidade dez países de quatro continentes, distribuídos por quatro tipos de sistemas de saúde. A maior amostra corresponde aos sistemas de saúde que mais se aproximam do nosso (vd. Quadro 2). De forma a não serem excluídas referências bibliográficas importantes, atentou-se igualmente nas palavras-chave que conduzissem aos estudos relevantes na matéria (vd. Quadro 4). Quadro 4: Palavras-chave utilizadas Objecto de pesquisa Recursos em saúde Cuidados Primários de Saúde Quadro 2: Organização dos países objecto de estudo por sistema de saúde Tipo beveridgiano Tipo bismarckiano Austrália Alemanha Canadá Espanha Finlândia Reino Unido França Holanda De livre escolha e competição Estados Unidos da América Cuidados compreensivos Financiados por ONGs Ruanda Modelos de pagamento com base no desempenho Persistiu, ainda assim, um relativo desequilíbrio entre a informação obtida com referência a cada um dos sistemas de saúde objecto de investigação, que teve como causa inevitável as diferenças na produção de documentação de cada país. Para o que contribuiu também o facto de a matéria em estudo ter uma vertente particularmente instrumental, não tendo sido, muitas vezes, possível encontrar disponibilizados os materiais necessários e desejados para dar resposta a todas as questões de que nos ocupámos. II. Contratualização Palavras-chave Health resources (MeSH), health care economics and organizations, (…) Primary care, primary health care, primary medical care, (…) Comprehensive care, comprehensive primary care, comprehensive medical care, (…) P4P, payment for performance, care-based payment, performancebased payment, outcomes-based payment, comprehensive payment, quality, quality of care, budgeting for results, results-based management (RBM), managing for development results (MfDR), money for results, (…) Contratualização, contracting, commissioning, public health commissioning, primary care-led commissioning, contractual approach, performance contract, self-management, health service contract, performance-based contracting, incentive contract, contrato de gestión, contract theory, incentive theory, valuebased delivery, practice-based commissioning, funding agreement, (…) Na prossecução dos objectivos supra definidos, a pesquisa bibliográfica centrou-se num período temporal que abrangesse o histórico das experiências de contratualização dos diferentes países, com particular atenção e análise naquelas que ocorreram no período compreendido entre 2004 e 2009. R ECOLHA DA BASE DOC UMENTAL Construir uma bibliografia compreende um processo de procura de algo que, por enquanto, nos é desconhecido (Eco, 2009). Nesta medida, foi observado o percurso de pesquisa enunciado infra, para que dele resultasse o conhecimento da base bibliográfica do trabalho de 3 Na primeira fase de recolha de evidência, foram realizadas 8 pesquisas, com 333 resultados (vd. Quadro 5). Documentação da Escola Nacional de Saúde Pública, Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge, Direcção Geral de Saúde, Alto Comissariado da Saúde, Unidade de Missão dos Cuidados de Saúde Primários, Conselho Consultivo para a Reforma dos CSP, entre outros, e, ainda, as referências bibliográficas indicadas nos estudos mais relevantes na matéria em estudo. (primary care [Title/Abstract] OR primary health [Title/Abstract]) AND commissioning [Title] AND health [Title/Abstract] contracting AND health / Abstract RESULTADOS Data 03-03-2009 03-03-2009 03-03-2009 05-03-2009 05-03-2009 05-03-2009 (primary care [Title/Abstract] OR primary health [Title/Abstract]) AND commission [Title] AND health [Title/Abstract] 05-03-2009 (primary care [Title/Abstract] OR primary health [Title/Abstract]) AND contract [Title] AND health [Title/Abstract] 05-03-2009 PESQUISA Pubmed 1 Pubmed 3 (primary care [Title/Abstract] OR primary health [Title/Abstract]) AND contracting [Title] AND health [Title/Abstract] Emerald 1 Pubmed 4 health resources AND (primary care OR primary health care OR primary medical care OR community care) AND (payment for performance OR comprehensive payment OR performancebased OR outcomes-based OR needs-adjusted OR contract) Pubmed 5 health resources AND (primary care OR primary health care OR primary medical care) AND (payment for performance OR comprehensive payment OR contracting OR commissioning) Pubmed 6 health resources AND (primary care OR primary health care OR primary medical care) AND (payment for performance OR comprehensive payment) Pubmed 7 Palavras-chave Pubmed 2 Quadro 5: Pesquisas realizadas numa primeira fase 8 59 162 17 24 11 24 Na sequência do processo de investigação conduzido pela documentação encontrada, foram ainda obtidos diversos artigos, entre outras publicações e fontes de informação. Da totalidade de documentos encontrados, foram seleccionados 384, de acordo com a relevância dos conteúdos e da sua adequação ao objecto do projecto de investigação. Com efeito, os textos devem ser escolhidos, por terem uma ligação com a pergunta de partida, que servirá de fio condutor, para além de elementos de análise e de interpretação e de abordagens diversificadas. Deve ainda ter-se em conta a dimensão do programa de leitura (Quivy e Campenhoudt, 2008). A documentação daí resultante foi reunida num ficheiro bibliográfico, devidamente identificada por meio dos elementos impostos pela Norma Portuguesa 405-1 e 405-4 e catalogada através de siglas, no final de cada referência, em função do tema, sub-tema e país ou países a que dizia respeito. Foi também registada a informação de se encontrarem ou não digitalizadas e/ou em suporte papel e disponibilizada a localização na internet ou, sendo o caso, noutros locais. Posteriormente, a lista de referências foi reorganizada, por temas e sub-temas, de maneira a ser mais fácil e simples a percepção do seu conteúdo. Este procedimento permite a verificação das referências bibliográficas que serviram de ponto de partida ao projecto de investigação, devidamente identificadas, organizadas e perfeitamente localizáveis. III. L EITURA Ao processo de recolha da base documental seguiu-se o processo de leitura. Os documentos considerados mais importantes e mais directamente relacionados com a contratualização em cuidados de saúde primários obedeceram à técnica do registo em grelha de leitura, para uma leitura ordenada e em profundidade (Quivy e Campenhoudt, 2008) (vd. Quadro 6). 28 Para a revisão das publicações internacionais, foram utilizados, principalmente, os canais de pesquisa Pubmed, Emerald, Google Scholar, os sítios da Organização Mundial da Saúde e do Observatório Europeu de Políticas e Sistemas de Saúde, os sítios institucionais dos diferentes países observados, os recursos bibliográficos disponíveis no Centro de 4 Quadro 6: Percurso de leitura Discussão da lista de títulos com a equipa de investigação Impressão de todas as obras e artigos considerados pertinentes Redacção de fichas de trabalho (fichas de ligação entre ideias e partes do plano, de problemas, de sugestões) Nova recolha de bibliografia Redacção de fichas de leitura: Registo de cada obra lida em grelha de leitura, com identificações bibliográficas precisas, informações sobre o autor, resumo, citações ou paráfrases com indicação da página, comentários e apreciações pessoais não confundíveis com as citações, siglas ao alto com identificação do tema ou assunto geral Utilização de siglas com graus de importância e registo de trechos importantes em fichas temáticas/por autores/de citações (conforme mais adequado) Registo da localização das referências no respectivo capítulo (a redigir posteriormente) As grelhas de leitura foram acompanhadas de um resumo, para destacar as ideias principais e reconstituir a unidade do pensamento do autor e a coerência do seu raciocínio (Quivy e Campenhoudt, 2008). As fichas de leitura foram reunidas num ficheiro de leitura temático. Os textos foram ainda comparados, com base nos pontos de vista, para detectar convergências, divergências ou complementaridades, e também com base nos conteúdos, para verificar complementaridades e, caso existissem, concordâncias ou desacordos manifestos. Ao longo do processo de leitura, foram sendo recolhidas pistas para o prosseguimento da investigação, seguindo os ensinamentos de Quivy e Campenhoudt, 2008. IV. R EDACÇÃ O Finalmente, a fase da redacção reuniu toda a informação constante do ficheiro de leitura temático e elaborou o produto que constitui a presente versão preliminar. 5 ANÁLISE EM e o Reino Unido. Com um sistema de saúde de tipo bismarckiano, foram objecto de estudo a Alemanha, a França e a Holanda. Foi ainda estudado o caso dos Estados Unidos da América, com um sistema de saúde com base em seguros não compulsórios e uma cobertura limitada a um determinado tipo de população, e, finalmente, o caso do Ruanda, financiado por ONGs. DO PROCESSO DE CONTRATUALIZAÇÃO CONTEXTO DE CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOS POR TIPO DE SISTEMA DE SAÚDE O projecto de investigação incidiu, como referido, sobre dez países (vd. Figura 2) de quatro tipos de sistemas de saúde distintos, nomeadamente, de tipo beveridgiano, de tipo bismarckiano, de livre escolha e competição e financiados por ONGs. Com um sistema de saúde de tipo beveridgiano, foram estudados a Austrália, o Canadá, a Espanha, a Finlândia Figura 2: Mapa-mundo ilustrado com os países objecto de estudo Legenda: Amarelo – Sistemas de saúde de tipo beveridgiano (Austrália, Canadá, Espanha, Finlândia e Reino Unido) Azul – Sistemas de saúde de tipo bismarckiano (Alemanha, França e Holanda) Verde – Sistemas de saúde de livre escolha e competição (Estados Unidos da América) Vermelho – Sistemas de saúde financiados por ONGs (Ruanda) 6 I. custos em saúde, de acordo com a sua capacidade para pagar, sendo financiada através de uma taxa e de impostos progressivos, calculados sobre os rendimentos (Australia, 2009c). S ISTEMAS DE SAÚ DE TIP O BEVERIDGIANO A U ST RÁLIA Os serviços de saúde são prestados por uma complexa rede de prestadores públicos autónomos e de prestadores privados. Existem mais de 1.000 hospitais do sector público e privado (Australia, 2008d) e o número de médicos (de clínica geral e de outras especialidades) ascende aos 26.0005 (Australia, 2009f). Quadro 7: Quadro-síntese Austrália Sistema de saúde % PIB gasta em saúde Esperança de vida ao nascimento (anos) Esperança de vida saudável (HALE) ao nascimento (anos) Taxa de mortalidade neonatal (por 1.000 nados vivos) Organização da prestação de CSP Unidades de CSP Projectos com delegação de responsabilidades na gestão da prestação e dos recursos em CSP Mecanismos de contratualização de CSP Incentivos e apoios ao processo de contratualização de CSP 1. C ARACTERIZAÇÃO Seguro de saúde universal compulsório financiado com base em impostos – Medicare (1984) 8,7% 82 As práticas de medicina familiar são maioritariamente privadas, da propriedade de médicos de clínica geral ou de entidades empresariais, constituindo uma parte importante da prestação de cuidados de saúde primários (Australia, 2009f). 74 3 Cuidados de saúde primários prestados maioritariamente pelo sector privado Divisions of General Practice / Primary Care Partnerships (Victoria) / 8 Projectos-piloto Primary Health Care Networks 2002-2005 (New South Wales) O sistema de saúde australiano é, por isso, caracterizado por diferentes responsabilidades de gestão e por uma prestação de cuidados tanto pública como privada. A Commonwealth tem a maior responsabilidade pela medicina geral e os estados/territórios são responsáveis pelos hospitais e pela rede dos serviços de saúde na comunidade financiados pelo estado. O sistema de pagamentos aos médicos de clínica geral é, predominantemente, feefor-service (ANU, 2006). GP Super Clinics Contratos de financiamento com base nos resultados 1998 (extintos) / National Quality & Performance System 2005 / Contratos com base no desempenho com as Divisions of General Practice / Acordos de financiamento com as GP Super Clinics Practice Incentives Program / Australian Primary Care Collaboratives Program / Quality Improvement Skills Program / Rebirth of a clinic (D.E.S.I.G.N.) DO S ISTEMA DE A Medicare faz parte dos programas desenvolvidos pela Medicare Australia, a par do Sistema de Benefícios Farmacêuticos, Imunização Infantil, entre outros (Australia, 2009b). A Medicare Australia surgiu na sequência do Financial Management and Accountability Act 1997 , constituindo-se como entidade oficial, no âmbito do Department of Human Services, a partir do Public Service Act 1999. Trabalha em parceria com o Department of Health and Ageing, com vista a alcançar os objectivos da política de saúde do Governo australiano (Australia, 2009b). S AÚDE O sistema de saúde da Austrália caracteriza-se por ser um serviço nacional de saúde desde 1984 (Australia, 2009c), tendo por base um seguro de saúde universal e compulsório (WHO, 2004). Quase todos os residentes australianos, médicos, farmacêuticos e outros profissionais de saúde estão associados à Medicare (Australia, 2009ª). Em 2005, havia 20,5 milhões de pessoas registadas na Medicare australiana (Australia, 2009c). O SNS australiano denomina-se Medicare e serve o objectivo de prestar aos residentes australianos elegíveis cuidados de saúde financeiramente comportáveis, acessíveis e de elevada qualidade 4. A Medicare foi estabelecida com base na convicção de que todos os australianos devem contribuir para os Este sistema presta tratamento gratuito em hospitais públicos e tratamento gratuito ou subsidiado prestado por outros médicos, incluindo médicos de família, 4 A Medicare é administrada pela Health Insurance Commission (HIC), a entidade responsável pelas políticas de saúde, planeamento e supervisão do seguro de saúde universal compulsório na Austrália (WHO, 2004). 5 Dados referentes a 2007/2008. 2 As Divisions of General Practice constituem o terceiro elemento do sistema de saúde australiano, sendo os restantes dois o sector da saúde pública e dos hospitais públicos e o sector dos seguros privados (Sprogis, 2007). outros especialistas e, para serviços específicos, optometristas e dentistas (Australia, 2009c). As despesas cobertas pela Medicare dependem do serviço de saúde e do prestador e são estabelecidas pelo Governo no chamado Medicare Benefits Schedule (MBS), actualizado anualmente (Justlanded, s.d.). Scott e Coote (2007) examinaram o efeito no desempenho dos cuidados primários da actividade das Divisions of General Practice, que, segundo Sprogis (2007), constituem uma abordagem única na estrutura do sistema de saúde nacional, na medida em que constituem propriedade privada de médicos de clínica geral. O Governo australiano espera que a Medicare assuma uma nova geração, na medida em que se pretende criar uma plataforma de cuidados de saúde primários compreensivos, publicamente financiados, considerar o novo leque de serviços abrangidos pela cobertura universal, adoptar uma abordagem centrada nas famílias que melhore a comportabilidade financeira dos cuidados e, finalmente, rever a Medicare Benefits Schedule, com base na evidência (Australia, 2009c). 2. O RGANIZAÇÃO O estudo incidiu sobre os anos entre 2002 e 2004 e abrangeu todo o país. Foram utilizados 14 indicadores de desempenho dos cuidados primários nas áreas de infraestururas, acesso, trabalho multidisciplinar, doença crónica e outros aspectos mensuráveis referentes à qualidade dos cuidados. DA PRESTAÇÃO DE CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOS Os autores verificaram em todos os modelos de regressão aplicados efeitos estatisticamente significativos das actividades das Division of General Practice sobre o desempenho, concluindo terem estas entidades um efeito positivo no desempenho na prestação de cuidados primários num difícil contexto de sistema de saúde. O Governo australiano apresenta como objectivo dos cuidados de saúde primários e na comunidade a promoção da saúde dos cidadãos, constituindo o primeiro ponto de entrada no sistema de saúde, a prestação de cuidados de saúde que promova alterações nos estilos de vida e previna a doença, a coordenação e a integração dos serviços de saúde, com enfoque no doente, e a prestação de cuidados contínuos (Australia, 2009f). No estado australiano de Victoria, existem ainda os chamados Primary Care Partnerships, estabelecidos em 2000 como parcerias entre agências para os cuidados de saúde primários financiados predominantemente pelo estado. Têm como objectivo contornar a fragmentação no sistema de saúde a este nível de cuidados e reduzir a hospitalização por meio de um melhor planeamento e coordenação dos serviços. Em 2006, existiam 31 no estado de Victoria (ANU, 2006). O sistema de cuidados primários encontra-se organizado em Divisions of General Practice, organizações voluntárias de médicos de família (ANU, 2006), financiadas com base na capitação (Richardson et al., 2006, cit. por ANU, 2006)6 e constituídas para integrar a medicina geral no sistema de saúde (Coote, 2009). No estado de New South Wales (NSW), foram implementados também oito projectos-piloto, denominados Primary Health Care Networks, para o período 2002-2005, um deles liderado pela Division of General Practice. Consistiam em parcerias voluntárias entre prestadores de serviços de saúde ao nível primário e da comunidade, com o objectivo de melhorar a coordenação destes serviços numa população definida com especiais necessidades em saúde. Em 2006, existiam 120 em todo o país, tendo como finalidade apoiar o desenvolvimento da medicina geral nas áreas da melhoria da qualidade e dos cuidados com base na evidência, da melhoria do acesso, da integração e dos cuidados multidisciplinares, da prevenção e da intervenção precoce, da gestão da doença crónica e do enfoque no doente (Commonwealth of Australia, 2004, cit. por ANU, 2006). A reforma dos cuidados primários na Austrália teve início em 1992, com a General Practice Strategy, que tinha por objectivo aumentar o papel dos médicos de família para além dos cuidados individuais aos doentes e promover a sua integração no sistema (General 6 A Australian General Practice Network congratula-se pelo facto de o Orgamento Federal 2009 incluir algumas das suas propostas, como é exemplo, o novo sistema de classificação a aplicar desde 1 de Janeiro de 2010 para o financiamento do Divisions of General Practice Program, estabelecido numa base de “nenhum perdedor”, tendo em conta as alterações demográficas (AGPN, 2009). 3 Practice Consultative Committee 1992, cit. por ANU, 2006). Desde 2. Enfoque no doente, apoio à literacia em saúde, auto-gestão e preferências individuais 3. Maior enfoque nos cuidados preventivos 4. Prestação de cuidados integrada, coordenada e contínua 5. Cuidados seguros e de elevada qualidade 6. Melhor gestão da informação em saúde 7. Flexibilidade para melhor responder às necessidades das comunidades locais, através de modelos operacionais eficientes e sustentáveis 8. Melhores condições de trabalho para os profissionais de saúde 9. Educação e formação de elevada qualidade 10. Sistemas custo-efectivos, eficientes e financeiramente sustentáveis este documento que as reformas da vão no sentido de melhorar a capacidade da medicina geral e fortalecer a sua colaboração com outros prestadores de cuidados. Muitas iniciativas têm, por essa razão, sido concebidas para melhorar o acesso aos médicos de família e a outros prestadores de cuidados de saúde primários, fomentando a capacidade e qualidade da prática clínica, prestando apoio e formação, introduzindo standards, mecanismos de acreditação e reforço das bases de evidência, entre outros programas de melhoria da qualidade (ANU, 2006). Commonwealth Em 1997, foi constituído o General Practice Strategy Review Group com o objectivo de rever a estratégia de 1992. Os autores reconheceram o papel dos médicos de família como o centro do sistema de saúde e a existência de questões a resolver para melhorar os cuidados de saúde primários, incluindo a falta de um caminho a seguir, baixos vencimentos, relacionamentos fragmentados e perda de controlo. No entanto, as recomendações emitidas, como a fixação de serviços mínimos a prestar pela medicina familiar e o desenvolvimento de programas para a melhoria das práticas e das ineficiências e de modelos de trabalho em equipa, não chegaram a ser implementadas (Coote, 2009). O documento ressalta ainda a importância da equidade no acesso, assim como uma maior responsabilização e prestação de contas pelo desempenho e pelos resultados (Australia, 2008b). Um dos indicadores avaliados pelo Relatório Anual 2007-2008 do Department of Health and Ageing é o apoio ou a implementação de novos modelos de prestação de cuidados primários, como as chamadas GP Super Clinics (Australia, 2008d). O objectivo da Commonwealth é prestar aos australianos acesso a cuidados primários multidisciplinares de qualidade e custo-efectivos, em locais de acesso dificultado. A Commonwealth conta (Australia, 2008d) com a inauguração, em breve, de 31 GP Super Clinics. O novo Governo eleito em 2007 implementou a National Primary Health Care Strategy que, entre outras prioridades, estabelece a necessidade de apoiar os médicos de família a sustentar o seu papel no sistema de saúde (Coote, 2009). Esta estratégia teve como intuito recepcionar propostas dos profissionais de saúde e consumidores dos serviços de saúde sobre as questões em debate, através de um comunicado datado de 30 de Outubro de 2008 (Australia, 2008a). As GP Super Clinics constituem um investimento de 223.2 milhões de dólares do Governo da Commonwealth, com vista ao impulso da capacidade dos serviços a este nível de cuidados, considerando-as um elemento chave para um fortalecido sistema nacional de cuidados de saúde primários (Australia, 2008c). «We seek input from all sectors of the community – our hardworking doctors, nurses and allied health professionals, as well as working families and individuals who are consumers of health services» (Australia, 2008a) É consensual a necessidade de inexistência de um modelo universal de prestação pelas GP Super Clinics, uma vez que o leque de serviços a prestar e a população-alvo de cada clínica serão determinados antes pelas necessidades e prioridades das comunidades locais (Australia, 2008c). No documento para discussão, são apresentados como proposta pela Minister for Health and Ageing dez elementos para um melhor sistema de cuidados primários, designadamente (Australia, 2008b): 1. O Governo da Commonwealth estabeleceu, porém, dez características centrais que as GP Super Clinics deverão sempre apresentar, designadamente (Australia, 2008c): Cuidados acessíveis, clínica e culturalmente apropriados, em tempo útil e financeiramente comportáveis 1. 4 Prestação de cuidados integrados multidisciplinares centrados no doente 2. Capacidade de resposta cabal às necessidades e prioridades da população local 3. Prestação de cuidados acessíveis, culturalmente apropriados e financeiramente comportáveis 4. Prestação de cuidados preventivos 5. Utilização eficiente e efectiva das tecnologias de informação 6. Condições e ambientes de trabalho que atraiam e retenham os profissionais 7. Boas práticas com elevada qualidade 8. Business models viáveis, sustentáveis e eficientes 9. Apoio aos futuros profissionais de cuidados primários 10. Integração com programas e iniciativas locais estrutura directiva capaz de cumprir os objectivos do programa, ao mesmo tempo que prestará contas pela utilização do financiamento recebido (Australia, 2008c). Neste contexto, torna-se fundamental a verificação de uma governância clínica, relacionada com a gestão da responsabilização e da prestação de contas pelo desempenho clínico e com mecanismos de avaliação do trabalho da equipa. É também imprescindível a actuação de acordo com uma governância organizacional, gerindo os aspectos operacionais e financeiros da clínica. Os dois tipos de governância deverão, ainda, reflectir a visão de todos os prestadores de cuidados de saúde que trabalham na respectiva GP Super Clinic (Australia, 2008c). No GP Super Clinics National Program Guide, emitido em Abril de 2008, são apresentados formulários de proposta a constituição destas clínicas, entre outras informações relevantes destinadas aos candidatos, que poderão ser médicos de família, profissionais de saúde aliados, Divisions of General Practice, organizações não governamentais, organizações sem fins lucrativos, grupos comunitários, entre outros (Australia, 2008c). 3. O 3.1. 3.1.1. I NCENTIVOS Os incentivos dirigidos aos médicos de família durante o período 1998-2003 tiveram como objectivo promover a extensão do leque e da qualidade dos serviços prestados, particularmente, no que respeitava à prevenção e gestão da doença crónica e à melhoria do acesso a cuidados multidisciplinares (ANU, 2006). PROCESSO DE CONTRATUALIZAÇÃO Nessa medida, distinguiam-se quatro tipos de esquemas de financiamento de médicos de família, práticas clínicas e Divisions of General Practice, nomeadamente (ANU, 2006): O S MECANISMOS DE CONTRATUALIZAÇÃO Em 2005, foi estabelecido o National Quality & Performance System e foram introduzidos contratos com base no desempenho, a celebrar com as Divisions of General Practice (Australian Government Department of Health and Ageing, 2005, cit. por ANU, 2006). Estes novos contratos vieram substituir os anteriores contratos de financiamento com base nos resultados, introduzidos em 1998/1999. 1. 2. 3. As Divisions of General Practice são financiadas de acordo com uma fórmula calculada sobre a população ajustada. Estas organizadas são ainda responsáveis por orçamentos destinados à aplicação em iniciativas nacionais, para, por exemplo, melhorar o acesso dos médicos de família a outros prestadores de cuidados primários (ANU, 2006). 4. Enhanced Primary Care – introduzido em 1999/2000, renovado ao longo do tempo para, por exemplo, cuidados multidisciplinares Practice Incentive Payments (PIPs) – introduzidos em 1998 e renovados em 2003 Service Incentive Payments (SIPs) – introduzidos em 1999/2000 para financiar as infraestruturas das práticas, extintos em 2008 (Australia, 2009e) Service Outcome Payments (SOPs) – introduzidos em 2001 para financiar cuidados com base na evidência Existe (Australia, 2009d), actualmente, o Practice Incentives Program (PIP), que distribui incentivos financeiros com o objectivo de reconhecer as práticas de clínica geral que prestam cuidados compreensivos e de qualidade, que se encontram acreditados ou em processo de acreditação no âmbito dos Royal Australian College of General Practitioners‟ (RACGP) Standards for General Practices. Por outro lado, as recentes GP Super Clinics receberão os seus orçamentos com base em especiais acordos de financiamento, que explicitarão em detalhe todos os termos e condições (Australia, 2008c). Estas organizações actuarão durante o período de 20 anos e no âmbito de uma particular governância organizacional. Com efeito, a Commonwealth não será sua proprietária nem será responsável pela sua gestão. Espera-se que cada clínica apresente uma robusta Este programa faz parte de um conjunto de outros pagamentos efectuados para a medicina familiar, como os pagamentos directos ou os abatimentos da Medicare. O PIP pretende, fundamentalmente, compensar as limitações dos sistemas fee-for-service, 5 que podem ser perversos no sentido de premiarem médicos que levam menos tempo por consulta e não aqueles que passam mais tempo com os doentes, atendendo às suas necessidades em saúde (Australia, 2009d). Com o objectivo de prestar apoio às práticas de medicina familiar na melhoria sistemática e sustentável da qualidade dos seus serviços, foi implementado pelo Governo australiano o chamado Australian Primary Care Collaboratives Program (APCCP) que, entre outras áreas, focaliza-se na reconfiguração do acesso e dos cuidados prestados (APCC, 2009). Este programa pretende, fundamentalmente, contribuir para que se melhor a operacionalização da prática e a eficiência e para que se alcancem melhores resultados em saúde, ajudando a construir equipas clínicas mais fortes (IFA, 2009). A base da fórmula de pagamento do PIP foi desenvolvida (Australia, 2009d) com a cooperação do General Practice Financing Group (GPFG), um corpo negocial que representa diferentes entidades, incluindo a Australian Medical Association, o Royal Australian College of General Practitioners e o Governo australiano. O programa inclui a definição de áreas de actuação, como a diabetes ou o acesso aos serviços de saúde, sessões de trabalho em que se partilham conhecimentos e experiências, períodos de actividade com acompanhamento no local, fornecimento e retorno de informação e disseminação de conhecimentos (Australia, 2008e). Essencialmente, a abordagem do programa resume-se a modificar princípios e ideias, a partilhar aprendizagens, a testar ideias na prática clínica e a monitorizar o impacto das mudanças (IFA, 2009). O pagamento, no âmbito deste programa, focaliza-se nos aspectos da prática de medicina geral que contribuem para cuidados de qualidade, como, por exemplo (Australia, 2009d): 1. A utilização da gestão de informação ou das tecnologias de informação (Information Management/Information Technology – IM/IT) – até Agosto de 2009, altura em que entrará em vigor o eHealth Incentive, que pretende impulsionar a utilização de sistemas electrónicos nas práticas no âmbito do programa PIP 2. Prestação de cuidados fora de horas 3. Recrutamento de enfermeiros (Practice Nurse Incentive – PNI) 4. Formação 5. Boas práticas de prescrição (Quality Prescribing Incentive – QPI) 6. Exames citopatológicos 7. Tratamento da asma 8. Tratamento da diabetes 9. Apoio à violência doméstica 10. Cuidados a idosos prestados nas próprias casas de repouso (desde 2008) A primeira fase do Collaboratives Program foi implementada de Julho de 2004 a Dezembro de 2007, gerido pela Flinders University e teve como participantes cerca de 500 práticas de 42 Divisions of General Practice. A segunda fase teve início em Janeiro de 2008, foi gerido pelo Improvement Foundation (Australia) e esperavam-se cerca de 500 práticas participantes novamente (Australia, 2008e). No final da primeira fase de implementação do programa, registaram-se os resultados obtidos pelas práticas participantes, tendo-se verificado notáveis melhorias, como o aumento de doentes diabéticos com níveis de colesterol controlados ou o aumento de doentes com aceitáveis níveis de pressão arterial (Australia, 2008e; IFA, 2009). ainda, o sistema de General Practice Immunisation Incentives (GPII), que entrega incentivos Existe, financeiros aos médicos de clínica geral que monitorizem, promovam e prestem serviços de vacinação a crianças com menos de sete anos de idade (Australia, 2009e). 3.2.2. Existe também o Quality Improvement Skills Program (QuISP), concebido para ajudar especificamente pequenas equipas multidisciplinares a melhorar o que já fazem (IFA, s.d.). O objectivo fundamental deste sistema é impulsionar pelo menos 90% das práticas a alcançarem 90% de vacinação total (Australia, 2009e). 3.2. F ORMAÇÃO E APOIO 3.2.1. A USTRALIAN P RIMARY C ARE C OLLABORAT IVES P ROGRAM Q UALITY I MPR OVEMENT S KILLS P R OGRAM O programa concede (IFA, s.d.) às práticas aptidões para promoverem melhorias nos serviços prestados nas suas organizações e contribui para o desenvolvimento de uma cultura de melhoria contínua da qualidade, investindo nas áreas que as equipas apontam como mais relevantes. 6 3.2.3. pagamentos 2009c). R EBIRTH OF A CLINIC “Rebirth of a clinic – an architectural workbook for general practice and primary care” é um projecto muito particular, desenvolvido pelo Royal Australian College of General Practitioners, em parceria com a RMIT School of Architecture and Design, para a configuração As duas entidades apresentaram como motivação a necessidade de conceber algo que reflectisse os desafios actuais para a medicina geral, como a sua dimensão crescente e as equipas multidisciplinares, o enfoque na excelência na educação, a importância da segurança dos doentes e dos profissionais e a pressão crescente de gestão dos custos (RACGP/RMIT, 2008). ou globais (Australia, A coordenação dos serviços e o planeamento da saúde das populações, como prioridades da política de saúde, também deveriam (Australia, 2009c) ser fortalecidos ao nível local através do estabelecimento de Primary Health Care Organizations, resultado do desenvolvimento ou da substituição das Divisions of General Practice. Estas organizações precisarão de uma governância apropriada que reflicta a diversidade dos profissionais e serviços que constituem os cuidados de saúde primários compreensivos. Para além disso, deverão assumir uma dimensão adequada que preste uma coordenação eficiente e efectiva dos cuidados e, ainda, ir de encontro aos critérios e metas estabelecidas para se habilitarem a receber apoio financeiro da Commonwealth. Nessa medida, considerou-se (RACGP/RMIT, 2008) que o design poderia certamente produzir eficiências e melhorar a segurança, para além de poder melhorar a experiência do doente. Se esta experiência é uma questão central no contexto dos cuidados primários, então, defendem os autores, valerá a pena debruçarem-se sobre ela. A mnemónica D.E.S.I.G.N. foi criada (RACGP/RMIT, 2008) para captar as características que muitos médicos de família pretendem ver reflectidas na concepção ou na renovação do local da prática: 3.3. episódio7 O Governo australiano recomenda (Australia, 2009c) que, no futuro, a Commonwealth encoraje e activamente promova o estabelecimento ao nível global dos Comprehensive Primary Health Care Centres and Services, por meio de mecanismos como subsídios fixos iniciais numa base competitiva e de metas determinadas. de clínicas seguras e efectivas (RACGP, 2008). 1. 2. 3. 4. 5. 6. por Fundamentalmente, o Governo australiano pretende estabelecer os cuidados primários como a pedra angular do futuro sistema de saúde, para o que contribuirá a constituição de equipas multidisciplinares, com vista, em última instância, a promover o acesso aos serviços de saúde. O financiamento, da responsabilidade do Governo da Commonwealth, deverá ser, no futuro, constituído por subsídios fixos e por subsídios calculados com base na capitação (Australia, 2009c). Diversidade Eficiência Segurança Inovação Ambiente (“Green”) Envolvência na comunidade (“Neighbourhood”) D ESENVOLVIMENTOS FUTUROS O próximo passo da reforma segue (Australia, 2009c) no sentido da concepção de modelos de financiamento e de aquisição estratégica de serviços de saúde, para melhor responderem às crescentes necessidades em saúde da população. Para que se encoraje a formação de equipas multidisciplinares e cooperantes, será necessário utilizar modelos de financiamento englobado, que compreenda pagamentos fee-for-service, pagamentos fixos para apoio aos serviços clínicos multidisciplinares e à coordenação dos cuidados, pagamentos em função dos resultados para recompensar o bom desempenho e 7 Os pagamentos por episódio enquadram-se numa abordagem que considera as necessidades do doente na sua globalidade (Australia, 2009c). 7 O sistema de saúde canadiano é também denominado Medicare e foi concebido para assegurar que todos os residentes têm acesso aos serviços básicos de saúde, numa base de pré-pagamento (Canada, 2008). C AN ADÁ Quadro 8: Quadro-síntese Canadá Sistema de saúde % PIB gasta em saúde Esperança de vida ao nascimento (anos) Esperança de vida saudável (HALE) ao nascimento (anos) Taxa de mortalidade neonatal (por 1.000 nados vivos) Organização da prestação de CSP Unidades de CSP Projectos com delegação de responsabilidades na gestão da prestação e dos recursos em CSP Mecanismos de contratualização de CSP Incentivos e apoios ao processo de contratualização de CSP 4. C ARACTERIZAÇÃO Seguro de saúde universal compulsório financiado com base em impostos – Medicare (1961), composto pelos 13 planos das diferentes províncias e territórios Os princípios nacionais que sustentam o sistema de saúde do Canadá encontram-se legislados no Canada Health Act de 1984, que surgiu na sequência de uma avaliação do estado dos serviços de saúde do país desenvolvida em 1979, por Justice Emmett Hall, a pedido do Governo federal. Anualmente, o Ministro da Saúde do Governo federal emite anualmente um relatório sobre a administração e as actividades desenvolvidas no âmbito do Canada Health Act, resultando no Canada Health Act Annual Report (Canada, 2008). 10,0% 81 73 3 Responsabilidade na prestação e gestão dos cuidados partilhada pelo Governo federal e pelos Governos das províncias e territórios Primary health care organizations (equipas multi e interdisciplinares) O Canada Health Act estabelece que «o objectivo primordial das políticas de saúde canadianas é proteger, promover e reabilitar o bem-estar físico e mental dos residentes no Canadá e facilitar acesso razoável aos serviços de saúde sem barreiras financeiras ou de outro tipo» (tradução nossa) Health Transition Fund (1997-2001) / Primary Health Care Transition Fund (2000-2006) / Primary Health Care Transfer (2003) (Canada, 2009). Educação interprofissional do College of Health Disciplines da University of British Columbia, entre outras instituições / 2008 Canadian Survey of Experiences with Primary Health Care / Canada Health Infostructure Partnerships Program / Knowledge Development and Exchange Applied Research Initiative / Ottawa Decision Support Framework O Canada Health Act tem muito recentemente uma nova redacção, datada de 17 de Junho de 2009, tendo sido mantidos, porém, os cinco princípios basilares e representativos dos valores da equidade e da solidariedade, subjacentes ao sistema de saúde canadiano. Estes princípios são a administração pública, a compreensividade, a universalidade, a transferabilidade e a acessibilidade, que deverão ser reunidos pelo plano de saúde de cada província, para um total financiamento do Governo federal (Canada, 2009). DO SISTEMA DE SAÚDE O Canadá apresenta um sistema de saúde financiado e administrado predominantemente pelo estado, sustentado num esquema de seguro de saúde nacional (“nacional health insurance system ”). Não existe, porém, um único plano, sendo este sistema nacional composto, desde 19618, por 13 planos de saúde das diferentes províncias (10) e territórios9 (3) do Canadá (Canada, 2008). As responsabilidades e as funções dos diferentes actores do sistema de saúde canadiano são partilhadas, assim, pelo Governo federal e pelos Governos das províncias e territórios. Com efeito, o Canada Health Act estabelece os princípios que deverão sustentar todos os planos de saúde, enquanto as províncias gozam de liberdade de jurisdição na administração e prestação dos cuidados de saúde, o que inclui a determinação das suas prioridades próprias, a administração dos orçamentos para a saúde e a gestão dos seus próprios recursos (Canada, 2008). 8 O primeiro seguro nacional foi estabelecido na província de Saskatchewan em 1947. Em 1961, o acesso universal foi estabelecido unicamente para os serviços prestados em contexto hospitalar. A cobertura dos serviços prestados por médicos fora do âmbito dos hospitais só foi alcançada em 1972, com o Medical Care Act 1966. 9 Os territórios, que dependem do governo federal, são financiados através da aplicação anual do Territorial Formula Financing (TFF), que permite àqueles a prestação de um leque de serviços comparáveis aos prestados pelos governos das províncias (Canada, 2004). 5. O RGANIZAÇÃO DA PRESTAÇÃO DE CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOS Os cuidados de saúde primários são a porta de entrada para o sistema de saúde canadiano, muitas vezes associados à função de referenciação e coordenação de outros serviços de saúde especializados (Canada, 8 2002). O Canadian Community Health Survey revelou com base em dados de 2007 que 85% da população com mais de 12 anos consultavam um mesmo médico (CIHI, 2009). A reforma dos cuidados de saúde primários, no Canadá, tem tido o reforço do Governo federal, considerando-se essencial a melhoria destes cuidados para a modernização do sistema de saúde. O compromisso público do Primeiro-Ministro neste empreendimento teve início em 2000 e foi renovado com o 2003 First Ministers‟ Accord on Health Care Renewal e com o 2004 First Ministers‟ Health Accord. No âmbito destes documentos, foi estabelecido o trabalho em conjunto e com os profissionais de saúde no sentido de melhorar a qualidade dos cuidados primários, assim como a sua integração no sistema de saúde, tendo em vista alcançar o acesso dos cidadãos a estes cuidados de saúde. O sistema canadiano de cuidados de saúde primários abrange um diverso leque de actividades em saúde, designadamente (CIHI, 2009): 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. Cuidados de rotina Cuidados menores em situação de emergência Saúde mental Maternidade Pediatria Serviços psicosociais Parcerias para cuidados ao domicílio Promoção da saúde e prevenção da doença Nutrição Cuidados em fim de vida Os Primeiros-Ministros acordaram na prossecução do objectivo de assegurar que pelo menos 50% dos residentes têm acesso a um prestador apropriado de cuidados de saúde, 24 horas por dia, sete dias por semana, o mais rapidamente possível (Canada, 2003). Pretende-se alcançar esta meta até ao ano de 2011 (Canada, 2003b), estabelecida no 10-Year Plan to Strengthen Health Care. O sistema de cuidados primários incentiva a melhor utilização por todos os prestadores de cuidados para que se maximize o potencial de todos os recursos em saúde, no âmbito da reforma do sistema de saúde. Às organizações que prosseguem uma abordagem com estas características, o sistema de saúde canadiano denomina primary health care organizations (Canada, 2002). Um dos maiores enfoques, no contexto da reforma dos cuidados primários no Canadá, é dado às equipas multidisciplinares. Khan et al. (2008) puderam observar, com base no Canadian Survey of Experiences with Primary Health Care (CSE-PHC) e na aplicação de modelos de regressão múltipla e análises univariadas, que o acesso a equipas de cuidados de saúde primários tem uma positiva influência nas percepções dos canadianos sobre a qualidade global do sistema de saúde e na confiança no sistema. «Timely access to family and community care through primary health care reform is a high priority for all jurisdictions» (Canada, 2004) Os principais elementos destas organizações incluem (Canada, 2002): 1. 2. 3. 4. Os resultados indicaram que quase 40% dos canadianos têm acesso a equipas de cuidados primários, definidas como a existência de um enfermeiro ou outro profissional de saúde no consultório do seu médico ou no local habitual de prestação de cuidados. Participação e escolha dos cidadãos Gatekeeping Médicos que trabalham em grupo Equipas multidisciplinares e interdisciplinares de prestadores 5. Planeamento e distribuição de tarefas («rostering») 6. Financiamento com base na capitação 7. Serviços centrais compreensivos – incluindo: a. Promoção da saúde b. Prevenção da doença c. Diagnóstico e tratamento d. Cuidados urgentes e. Cobertura 24 horas por dia, sete dias por semana f. Gestão da doença crónica 8. Sistemas de informação – incluindo registo electrónico de dados 9. Enfoque na qualidade 10. Potencialidades para a integração vertical Segundo o mesmo estudo, os doentes que têm acesso a estas equipas recebem mais provavelmente serviços de promoção da saúde e de prevenção da doença, particularmente os doentes crónicos. Os doentes crónicos têm também uma maior probabilidade de receberem cuidados de elevada qualidade, quando atendidos por equipas clínicas multidisciplinares. Os autores puderam verificar ainda que o acesso às equipas reduz a utilização das urgências, assim como a redução de cuidados não coordenados. No entanto, pode ter também um efeito directo negativo sobre a confiança dos doentes nas equipas quando a 9 experiência não resulta num melhor processo de cuidados. 6. O A avaliação conduzida sobre os projectos desenvolvidos observou a verificação de seis elementos fundamentais, designadamente (Canada, 2002): PROCESSO DE CONTRATUALIZAÇÃO 6.1. A S EXPERIÊNCIAS DE CONTRATUALIZAÇÃO 6.1.1. H EALTH T RANSITION F UND (1997-2001) 1. 2. 3. 4. 5. 6. O estabelecimento do Health Transition Fund acompanhou o entendimento de que o sistema de saúde canadiano deve promover o custo-efectividade a qualidade dos cuidados de saúde. As pressões ao nível económico e as alterações demográficas têm vindo a resultar no aparecimento de iniciativas tendentes a explorar o aumento da eficiência ao mesmo tempo que se garante serviços de elevada qualidade, acessíveis e financeiramente comportáveis (Canadá, 2002). Acesso Qualidade Integração Resultados em saúde Custo-efectividade Transferabilidade Era exigido (Canada, 2002) a cada projecto a apresentação de um plano de avaliação que contemplasse os elementos referidos e de um plano de disseminação de resultados, a par da estratégia de difusão ao nível nacional promovido pelo Health Transition Fund. Dos 141 projectos, 65 enquadraram-se (Canada, 2002) no âmbito dos cuidados de saúde primários, sete dos quais apresentaram novos modelos deste nível de cuidados, incluindo todas ou quase todas as vertentes elencadas supra. Nesta medida, tornou-se essencial encontrar evidência sobre que abordagens são bem sucedidas e, por outro lado, sobre que abordagens apresentam resultados negativos. Em resposta a esta necessidade, e seguindo a recomendação do National Forum on Health, foi criado o Health Transition Fund com o orçamento federal de 1997. O projecto tinha como finalidade promover e sustentar com base na evidência os processos decisórios no âmbito da reforma dos cuidados primários (Canadá, 2002). Alguns dos projectos incorporaram (Canada, 2002) elementos dos cuidados primários de uma forma que uma estrutura tradicional não permitiria e várias províncias obtiveram sucesso na conjugação e maximização da interacção entre os elementos essenciais referidos. O projecto conduzido em Eskasoni, na província de Nova Escócia, que recebeu o código NA305, concebeu implementou e avaliou um modelo holístico de prestação de cuidados de saúde, com base nas seguintes características (Canada, 2002): Num trabalho conjunto do Governo federal e dos Governos das províncias e territórios, o projecto financiou 141 projectos e/ou estudos de avaliação ao longo do país, entre 1997 e 2001, com o custo de 150 milhões de dólares. Os cuidados de saúde primários eram uma das áreas prioritárias, a par dos cuidados ao domicílio, farmácia e cuidados integrados. 1. O projecto tinha uma característica particular, dado que tinha um financiamento limitado no tempo, o que significava que um projecto tinha de ser concebido, financiado, implementado e avaliado em quatro anos, um curto espaço de tempo no contexto da reforma do sistema de saúde. Por outro lado, era conduzido pelas próprias políticas de saúde, estando os decisores políticos envolvidos no processo de selecção de projectos e interessados em obter informação que sustentasse futuras decisões. 3. 4. 5. 2. 6. 7. Transferência da administração dos cuidados de saúde do Governo federal para a equipa local Alteração de um modelo de serviços isolado e fee-for-service para um modelo multidisciplinar Construção de novas instalações Cuidados ao domicílio Melhor utilização de medicamentos e dos serviços médicos e hospitalares Integração dos serviços médicos nos programas de saúde na comunidade Estabelecimento de redes com o centro de saúde regional O modelo apresentou melhorias na eficiência e na efectividade dos programas. De acordo com a informação disponível até ao momento da avaliação, registou-se (Canada, 2002), durante o primeiro ano, a redução das visitas aos serviços de emergência em 40% e aos médicos de família de 11 por ano para 4 6.1.1.1. A VALIAÇÃO DOS PROJECT OS DESENVOLVIDOS 10 por ano. Por outro lado, o custo de tratamentos prescritos diminuiu 7%, apesar do crescimento demográfico em 10%. enquadrados em cinco domínios principais: domínio das províncias e territórios; domínio multi-jurisdicional; domínio nacional; domínio aborígene; domínio das línguas oficiais das comunidades minoritárias (PHCTF, 2007). Muitos projectos demonstraram, com efeito, as possibilidades que as novas abordagens de prestação de cuidados de saúde primários proporcionam (Canada, 2002). 6.1.2. P RIMARY H EALTH (2000-2006) C ARE T RANSITION No âmbito do domínio das províncias e territórios do Canadá, pretendia-se apoiar os seus Governos nos esforços empreendidos para alargar e acelerar actividades transitórias que conduzissem a cuidados de saúde primários permanentes e sustentados. O financiamento foi calculado primordialmente numa base capitacional. F UND Em Setembro de 2000, o Primeiro-Ministro emitiu um comunicado nas matérias da saúde, de acordo com a visão de que os canadianos deverão receber cuidados de saúde de qualidade e custo-efectivos. No mesmo documento, refere-se que os inovadores modelos de cuidados primários de saúde têm sido bem sucedidos, com melhores resultados em saúde, acesso melhorado, prestadores mais satisfeitos e a redução da procura nos serviços de urgência, pelo que se determina o compromisso na aceleração do processo de reforma (Canada, 2000). 6.1.2.1. A VALIAÇÃO DOS PROJECT OS DESENVOLVIDOS Apesar da positiva expansão dos projectos-piloto, foram identificados alguns focos de preocupação, como o facto de algumas vertentes das abordagens desenvolvidas não terem suporte na investigação e na evidência, mas apenas em boas ideias ou preferências (CFHCC, 2002). Por outro lado, o mero crescimento de organizações de cuidados de saúde primários fora do âmbito de um plano aglutinador poderia não resultar nas mudanças “compreensivas” (aspas nossas) que se pretendia desenvolver (CFHCC, 2002). Assim, o Primeiro-Ministro, no mesmo comunicado, declarou que, reconhecendo a necessidade de flexibilização e tendo em conta as particulares necessidades e circunstâncias das populações abrangidas pelas diferentes jurisdições no território canadiano, se promoveria o estabelecimento de equipas multidisciplinares de cuidados primários que prestassem aos cidadãos o primeiro contacto com o sistema de saúde (Canada, 2000). Aponta-se, a título de exemplo, a província do Quebec, onde a rede compreensiva de clínicas denominadas Local Community Service Centres (CLSCs) foi estabelecida sem nunca ter conseguido alterar a estrutura do sistema de saúde ou afectar as prioridades dos decisores e utilizadores do sistema (CFHCC, 2002). Para este efeito, foi estabelecido o chamado Primary Health Care Transition Fund, no âmbito de um investimento de 800 milhões de dólares, para o financiamento e avaliação da efectividade de diversos projectos de cuidados primários ao longo do país (CFHCC, 2002). Ainda que estas experiências tenham constituído, no entanto, um bom princípio, a dispersão e o financiamento a curto prazo das experiências promoveram a fragmentação das diferentes abordagens e não permitiram aproveitar a oportunidade para transformar o sistema de saúde (CFHCC, 2002). O programa estabeleceu um modelo para os cuidados primários que incluía diversas condições, entre as quais, a criação de mais equipas interdisciplinares, com maior participação dos enfermeiros, farmacêuticos e outros profissionais, reflectindo o consenso generalizado sobre como deverão ser os serviços de saúde a este nível de cuidados. Porém, o referido programa deixou espaço considerável para que as províncias e os territórios canadianos concebessem e implementassem diversas e consistentes abordagens no âmbito do modelo global preconizado (CFHCC, 2002). Deter-nos-emos com algum detalhe na província de Colômbia Britânica, dado que adoptou um modelo multidisciplinar e foi também uma das províncias que se destacou com melhores resultados no âmbito do projecto anterior, o Health Transition Fund (Canada, 2002). Esta província teve como parceiros o College of Family Physicians, a British Colombia Medical Association, a University of British Colombia, o Centre for Health Services, as comunidades, entre outros (PHCTF, 2007). Esta estratégia resultou no aparecimento de diferentes projectos-piloto ao longo do Canadá (CFHCC, 2002), 11 A iniciativa focalizou-se (PHCTF, 2007) principalmente no apoio aos médicos de clínica geral na melhoria dos cuidados a populações prioritárias em áreas carenciadas, determinadas com base na evidência. As áreas intervencionadas foram a melhoria dos resultados em saúde, o suporte de um leque de modelos de prática clínica e o desenvolvimento, recolha de evidência e avaliação das características profissionais e organizacionais. lógico para os cuidados de saúde primários e um website. O processo conduzido ao longo do projecto foi aparentemente bem sucedido (PHCTF, 2007), na medida em que se alcançou um trabalho em equipa multidisciplinar e a adesão a guidelines. Por outro lado, registou-se um aumento na qualidade dos cuidados dirigidos a doentes com diabetes e insuficência cardíaca e a redução da mortalidade e das hospitalizações. No âmbito do apoio à criação de novos modelos de prestação de cuidados, distinguiam-se (PHCTF, 2007) ainda quatro categorias, nomeadamente, modelos e redes de práticas clínicas, prestação partilhada de cuidados, envolvimento dos médicos e tecnologia. As metas estabelecidas foram a promoção de uma abordagem interdisciplinar, a melhoria do acesso a dados clínicos dos doentes integrados, o estabelecimento de mecanismos que assegurem a qualidade, o acesso 24 horas dias e sete dias por semana, a educação e o desenvolvimento profissional e a integração dos cuidados de saúde com os serviços comunitários. Durante o período de aplicação do projecto, foram (PHCTF, 2007) desenvolvidos ou melhorados 92 modelos de prática clínica, enquanto 26 práticas melhoraram a estrutura ou a prestação dos cuidados. Predomina, actualmente, um movimento que vai de encontro à prestação de cuidados em equipa e à utilização das tecnologias de registo electrónico de dados, já introduzido em 85% das práticas. A maioria encontra-se também a desenvolver actividades de promoção da saúde e prevenção da doença, ainda que poucas participem no programa de apoio da província. O projecto decorreu (PHCTF, 2007) entre Abril de 2002 e Março de 2006 e, no âmbito da área referente ao desenvolvimento de modelos de prática clínica, foram realizadas, em 2004 e em 2005, nove sessões para estimular o envolvimento dos profissionais, e que tiveram o nome de Professional Quality Improvement Days. Estes dias constituíram uma oportunidade para os médicos, as autoridades de saúde e o Ministro da Saúde discutirem os desafios da prestação da totalidade dos cuidados à comunidade (denominado Full Service Family Practice), as oportunidades de construção de um sistema de saúde capaz e as questões da remuneração justa. Os prestadores têm revelado igualmente, de uma forma geral, uma grande satisfação (PHCTF, 2007). 6.1.3. P RIMARY H EALT H C ARE T R ANSFER (2003) Têm sido, com efeito, explorados e implementados novos modelos de prestação de cuidados primários, acompanhando o crescente enfoque neste nível de cuidados. Neste contexto, espera-se que os médicos sejam mais participativos e partilhem responsabilidades no âmbito de uma equipa que reúne diferentes profissionais de saúde (CFHCC, 2002). Verifica-se que a reforma dos cuidados primários conduzida desde a década de 90 no Canadá coloca um claro ênfase na flexibilização de responsabilidades e na importância das equipas multidisciplinares e das redes de prestadores que trabalham em parceria para dar resposta às necessidades dos seus doentes. Para além de que constitui uma oportunidade para a mudança a descentralização dos processos decisórios, atribuídos actualmente às organizações de saúde locais para uma adaptação dos serviços e dos objectivos estabelecidos às necessidades e características da população abrangida (CFHCC, 2002). As autoridades de saúde e os prestadores de cuidados colaboraram (PHCTF, 2007) na determinação dos modelos apropriados em função das necessidades da população. Ao longo da implementação do projecto, revelou-se essencial o desenvolvimento das tecnologias de informação, o que conduziu a quatro iniciativas paralelas, como a informatização dos registos clínicos ou um sistema para a gestão da doença. No âmbito da iniciativa, foram desenvolvidos (PHCTF, 2007) vários recursos, como um programa de prevenção da doença em dez áreas (tabagismo, alcoolismo, colonoscopias, gripe, exames citopatológicos, cancro da mama, hipertensão, obesidade, alimentação saudável e exercício físico), um manual de auto-gestão da doença dirigido aos doentes crónicos, formação sobre auto-cuidados, protocolos para a prestação partilhada de cuidados, um modelo Nesta medida, e considerando que este nível de cuidados é essencial para a transformação do sistema de saúde canadiano, o intitulado relatório de Romanow de 2002 propõs o Primary Health Care Transfer (Recomendação 19), entre outras recomendações, para que se dissemine a mudança e a expansão das 12 abordagens aos cuidados de saúde primários ao longo do Canadá, com vista a uma verdadeira renovação na prestação destes cuidados (CFHCC, 2002). existentes, assim como as iniciativas nacionais em decurso. Quadro 9: Indicadores do Canadian Institute for Health Information Por outro lado, o Primary Health Care Transfer pretende contornar a fragmentação e a lentidão dos avanços alcançados até ao momento, instigando e acelerando um processo que se afasta das diversas, isoladas e breves experiências nos cuidados primários. O projecto ambiciona promover uma reforma sustentada e duradoura, pelo que o financiamento entregue, numa base capitacional, às províncias e territórios canadianos deva obedecer à condição de que as mudanças se farão com base em quatro pilares fundamentais, designadamente (CFHCC, 2002): 1. 2. 3. 4. Prevenção primária e secundária Avaliação do risco de saúde Prevenção do cancro cervical Vacinação contra a gripe para maiores de 65 anos Vacinação pneumocócica para maiores de 65 anos Avaliação de factores de risco alteráveis em adultos com doença arterial coronária Avaliação de factores de risco alteráveis em adultos com hipertensão Avaliação de factores de risco alteráveis em adultos com diabetes Segurança do doente Monitorização antidepressiva Resultados Controlo glicémico na diabetes Controlo da pressão arterial na hipertensão Tratamento da dislipidemia Tratamento da depressão Prestação contínua de cuidados Detecção e acção precoces Melhor informação sobre as necessidades e os resultados Novos e mais fortes incentivos Adaptado de CIHI, 2009b. A comissão autora do relatório Romanow considera não dever existir um único modelo para os cuidados primários. Porém, o financiamento provindo do programa deverá sustentar-se na verificação dos quatro aspectos referidos nas abordagens desenvolvidas e implementadas (CFHCC, 2002). A aplicação dos indicadores tem (CIHI, 2009b), como finalidade, entre outras, a monitorização do desempenho nas áreas da prevenção, segurança do doente, qualidade e resultados e a promoção de um entendimento das variações sócio-demográficas e das particulares necessidades da população, o que sustentará o planeamento dos serviços. Pretendia-se que, posteriormente, estas experiências fosse alvo de avaliação e que um National Primary Health Care Summit concertasse esforços no sentido de identificar e remover obstáculos à implementação dos cuidados de saúde primários nos novos moldes (CFHCC, 2002). 6.2. 6.3. F ORMAÇÃO E APOIO Existem diversas ferramentas e instrumentos de apoio aos prestadores de cuidados de saúde primários, desenvolvidos com base na necessidade de recolher ensinamentos, experiências e evidência que sustentem os processos decisórios. I NDICADORES Apesar da importância dada aos cuidados de saúde primários no sistema de saúde canadiano, desde há pelo menos uma década, é uma área onde faltam dados comparáveis e estandardizados para servirem de apoio a uma análise sistemática que, por sua vez, permita compreender melhor e sustentar a prestação dos serviços de saúde (CIHI, 2009b). É o caso do College of Health Disciplines da University of British Columbia, que desenvolve acções de formação onde participam diferentes profissionais de saúde, acreditando que a troca de conhecimentos e experiências suportará melhores decisões no âmbito da prestação de cuidados de saúde primários e desenvolverá uma prática em que todos colaboram (CFHCC, 2002). O Canadian Institute for Health Information construiu (CIHI, 2009b), por isso, muito recentemente, uma base de 12 indicadores de qualidade clínica no contexto dos cuidados de saúde primários (vd. Quadro 9), com a colaboração de peritos de todo o país, incluindo profissionais clínicos, representantes do Governo federal, das províncias e dos territórios, investigadores desta área de cuidados e peritos habituais. A construção dos indicadores esteve alinhada com os standards nacionais e internacionais Existem ainda outras instituições que promovem igualmente actividades na área da educação interprofissional, como (CFHCC, 2002) a colaboração existente entre a Canadian Nurses Association, a Association of Canadian Medical Colleges e a Canadian Association of University Schools of Nursing em parceria com o Health Canada. 13 O Canadian Institute for Health Information (CIHI) fundou, com outros parceiros, o 2008 Canadian Survey of Experiences With Primary Health Care (CSE-PHC), que tem como objectivo prestar aos processos decisórios, no âmbito dos sistemas e das políticas de saúde, uma nova fonte de informação sobre os cuidados de saúde primários de elevada qualidade (CIHI, 2009). expectativas quanto aos resultados dos profissionais de saúde, compatibilidade com a abordagem centrada no doente ou com base na evidência foram elementos considerados apenas como facilitadores (Légaré et al., 2006). Também no âmbito das tecnologias da informação, de 2000 a 2002, foi desenvolvido o chamado Canada Health Infostructure Partnerships Program (CHIPP), um programa de financiamento com a finalidade de apoiar a implementação de aplicações informáticas e sistemas de informação inovadores na prestação de cuidados de saúde (Canada, 2004b). O Knowledge Development and Exchange Applied Research Initiative consistiu num projecto semelhante ao anterior, e vigorou até Março de 2001. Envolvia a partilha das melhores práticas, como os registos de saúde electrónicos ou a protecção da informação de saúde pessoal (Canada, 2004c). Uma técnica que se reveste de alguma particularidade é o Ottawa Decision Support Framework (ODSF), dirigido aos actores dos processos decisórios, incluindo os médicos e os doentes, que tem como finalidade auxiliar a tomada de decisão. A técnica tem em conta as necessidades ao nível do processo decisório (incerteza, conhecimentos, expectativas, valores, apoio e recursos, tipo, tempo, estádio e tendência da decisão, e características pessoais e clínicas) que afectarão a qualidade da decisão (informada, com base em valores) que, por sua vez, afectará acções e comportamentos (atraso), os resultados em saúde, as emoções (arrependimento, culpa) e a utilização apropriada de recursos. Nesta medida, o apoio à decisão na forma de aconselhamento clínico, ferramentas de auxílio e coaching podem melhorar a qualidade da decisão, dando resposta às necessidades decisionais por resolver (OHRI, 2006). Quanto a esta técnica, Légaré et al. (2006) conduziram um estudo junto dos profissionais de cuidados de saúde primários, com o intuito de perceber as barreiras e os factores facilitadores para a implementação do ODSF. Os autores verificaram que muitos dos elementos da técnica, como modificabilidade da técnica, o tempo, familiaridade ou praticabilidade eram identificados tanto como um obstáculo como um favorecimento. Já o esquecimento da aplicação da técnica, a interpretação da evidência, o desafio da autonomia e a falta de concordância quanto à utilização da técnica foram identificados somente como barreiras. Por outro lado, inquéritos sobre valores, 14 origem nos impostos indirectos (que representam 94,07% dos recursos), sendo que algumas prestações (como, por exemplo, os medicamentos) são estabelecidas em função do perfil dos cidadãos (activos, com doenças crónicas, aposentados). O financiamento com origem noutras fontes é residual. O SNS encontra-se organizado em função dos princípios que o sustentam, pelo que, assumindo um carácter universal e solidário, deve assegurar a equidade no acesso e, sendo financiado com recursos públicos, os gastos em saúde deverão ser orientados por critérios de eficiência (Espanha, 2008). E SPAN HA Quadro 10: Quadro-síntese Espanha Sistema de saúde % PIB gasta em saúde Esperança de vida ao nascimento (anos) Esperança de vida saudável (HALE) ao nascimento (anos) Taxa de mortalidade neonatal (por 1.000 nados vivos) Organização da prestação de CSP Unidades de CSP Projectos com delegação de responsabilidades na gestão da prestação e dos recursos em CSP Mecanismos de contratualização de CSP Incentivos e apoios ao processo de contratualização de CSP 7. C ARACTERIZAÇÃO SNS (1986) 8,1% 81 74 2 Comunidades Autónomas, através dos Distritos de Atención Primaria ou Áreas de Salud Equipos de Atención Primaria Unidades de Gestión Clinica (Andaluzia e Astúrias) / Unidades de Contrato (Castilha-La Mancha) / Uniones Temporales de Empresas (Modelos Alzira Valença) / modelos de autonomia de gestão (Catalunha) Contratos de Gestión no âmbito dos Contratos-Programa Existe uma oferta de seguros de saúde voluntários, subscritos, principalmente, pela população urbana, direccionados para a complementação dos serviços oferecidos pelo SNS, como, por exemplo, a saúde oral ou modalidades alternativas de cuidados (Durán et al., 2006). Os mesmos autores registam 15% da população coberta por seguros de saúde privados. O SNS espanhol pretende oferecer aos cidadãos actividades de prevenção, diagnóstico, terapêutica, reabilitação, promoção e manutenção da saúde, encontrando-se os serviços básicos definidos na Ley de cohesión y calidad do SNS (Lei 16/2003, de 28 de Maio12). - DO SISTEMA DE SAÚDE Espanha é uma monarquia parlamentar e desde a Ley General de Sanidad de 1986 que se caracteriza por um sistema de saúde que tem por base o Sistema Nacional de Salud (SNS) (SEMG, 2009), criado no contexto de uma reforma no financiamento, que passou de um sistema de seguro social para um sistema de impostos, de cobertura universal. O SNS é sustentado actualmente nos valores fundamentais da universalidade, da equidade e da garantia e financiamento públicos10 (España, 2007). A Ley 14/1986, General de Sanidad13, estabeleceu, por sua vez, os princípios orientadores do direito à protecção da saúde e aos cuidados primários de todos os cidadãos, designadamente: 1. 2. Durán et al. (2006) referem uma cobertura, em 2005, de 99,5% da população, incluindo imigrantes e habitantes com baixos rendimentos11. A assistência à saúde consiste numa prestação não contributiva, financiada através dos orçamentos públicos com 3. O financiamento público, a universalidade e a gratuitidade dos serviços de saúde, no momento da sua utilização A definição dos direitos e deveres dos cidadãos e das entidades públicas A descentralização política da saúde nas comunidades autónomas 4. 5. A prestação de cuidados integrados de saúde, procurando elevados níveis de qualidade devidamente avaliados e controlados A integração das diferentes estruturas e serviços públicos ao serviço da saúde no SNS Desde a década de 80 que se assiste em Espanha a reformas significativas no sistema de saúde, verificando-se níveis elevados de satisfação e uma melhoria constante dos indicadores de saúde. 10 Os principais problemas no sistema de saúde espanhol, no momento da transição para um regime democrático, eram, segundo Durán et al. (2006), uma variedade de redes de cuidados de saúde e de departamentos superiormente hierárquicos, que conduziram a uma pobre e inadequada organização, cuidados de saúde primários e cuidados preventivos pouco desenvolvidos e a ausência de equidade e de universalidade no acesso. 11 A primeira tentativa para implementar um seguro social para os trabalhadores com baixos vencimentos teve lugar durante a Segunda República (1931-1936), com o Instituto Nacional de Previsión (INP), até ao início da Guerra Civil de 1936-1939. O Governo Franco aproveitou, no pós-guerra, muitas das anteriores propostas de novas políticas de saúde, tendo o INP sustentado, até 1977, um sistema de saúde com base na segurança social (Durán et al., 2006). Na sequência destas reformas, foi consolidada (Durán et al., 2006) a cobertura universal, criada uma rede 12 13 15 España, 2003. España, 1986. 28 de Maio, de cohesión y calidad del Sistema Nacional de Salud. extensiva de cuidados de saúde primários e de serviços hospitalares e alteradas as estruturas de gestão e financiamento. Em 2006, O Ministerio de Sanidad y Consumo emitiu o Plan de Calidad para el Sistema Nacional de Salud, apresentando seis grandes áreas de actuação que pretendem dar resposta às questões que afectam os princípios do sistema de saúde espanhol, designadamente: O sistema de saúde espanhol sofreu também um processo de descentralização, que teve início em 1981 e só foi concluído em 2002. As matérias da saúde passaram da gestão do Instituto Nacional de la Salud (INSALUD) para as 17 Comunidades Autónomas (CC.AA), que exercem competências na planificação da saúde, saúde pública e assistência à saúde. Cada Comunidad Autónoma conta com um Servicio de Salud, uma estrutura administrativa e de gestão que integra todos os centros, serviços e estabelecimentos da Comunidad. 1. 2. 3. 4. 5. «La asunción de competencias por las comunidades autónomas constituye un medio para aproximar la gestión de la asistencia sanitaria al ciudadano y facilitarle, así, garantías en cuanto a la equidad, la calidad y la participación» (España, 2003) 6. Protecção, promoção da saúde e prevenção Fomento da equidade Apoio à planificação dos recursos humanos em saúde Fomento da excelencia clínica Utilização das tecnologias da informação para melhorar os cuidados aos cidadãos Aumento da transparência Estas grandes áreas concretizam-se no plano de qualidade em 12 estratégias, 41 objectivos e 189 projectos de acção. É igualmente estabelecida a atribuição de prémios pela inovação, melhores práticas clínicas, qualidade, igualdade e transparência (España, 2006). Na sequência destas alterações, o Real Decreto 840/2002, de 2 de Agosto, modificou e desenvolveu a estrutura básica do Ministerio de Sanidad y Consumo, considerando-se imprescindível a adaptação do INSALUD a uma entidade de menor dimensão, que conservasse, no entanto, a mesma personalidade jurídica, económica, financeira e patrimonial, assim como a natureza de entidade gestora da segurança social e as funções de gestão dos direitos e obrigações. O INSALUD passou assim a denominar-se Instituto Nacional de Gestion Sanitaria (INGESA) (España, s.d.). 8. O RGANIZAÇÃO DA PRESTAÇÃO DE CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOS A especialidade de Medicina Familiar e Comunitária foi criada em 1978, com o que se pretendia converter o médico de cuidados primários na figura fundamental do sistema de saúde, devendo as suas actividades ser integrantes (preventivas, curativas e reabilitadoras) e integradas (segundo os princípios reconhecidos em Alma-Ata) (España, 2007). Culminando o processo de transferências para as Comunidades Autónomas, a este novo instituto corresponde actualmente a gestão dos direitos e obrigações do extinto INSALUD, assim como a prestação dos serviços de saúde de âmbito territorial nas Cidades de Ceuta e Melila (España, s.d.). O Real Decreto 137/1984, de 11 de Janeiro, das Estruturas Básicas de Saúde, definiu as bases da actual rede de cuidados primários em Espanha, inspirado na Declaração de Alma-Ata de 1978. Este diploma estabeleceu a delimitação territorial das “zonas de saúde”, o trabalho em equipa multidisciplinar, a integração das actividades curativas nas de promoção e prevenção, entre outras matérias (España, 2007). O SNS espanhol é, assim, constituído pelo conjunto dos serviços de saúde da Administração Central e dos serviços de saúde das Comunidades Autónomas, que são dotadas de autonomia para a sua organização e gestão dos recursos, desde que mantenham o seu carácter público (SEMG, 2009), e de um leque de competências em saúde muito amplo (España, 2007). A Lei 14/1986, General de Sanidad, ressaltou, por seu lado, a relevância dos cuidados de saúde primários, reforçou o papel dos médicos de família como gatekeepers dos serviços de saúde (Espanha, 2008), a importância do trabalho em equipa e o papel fundamental do pessoal de enfermagem (Puig-Junoy e Ortún, 2004; Goñi, 1999). Desde esse momento, o sector dos cuidados de nível primário sofreu um extenso processo de reforma institucional e de criação de competências (Espanha, 2008) e uma grande O Consejo Interterritorial del Sistema Nacional de Salud, presidido pelo Ministro de Sanidad y Consumo, é, por sua vez, o órgão permanente de coordenação, cooperação, comunicação e informação dos serviços regionais de saúde das diferentes CC.AA, garantindo a coesão do SNS, também por força da Lei 16/2003, de 16 mudança nas organizações, na acessibilidade e na qualidade dos cuidados (España, 2001B). Este programa, em 2007, estava já implementado em 700 centros de saúde (España, 2007). Desde meados da década de oitenta que se observam, por isso, profundos processos de reforma dos cuidados primários nas CC.AA que já haviam recebido “transferências” do estado, como a Catalunha, o País Basco ou a Andaluzia. No entanto, o primeiro diploma normativo estatal que expressamente reconheceu os serviços do sistema de saúde e, em concreto, os cuidados de saúde primários, foi o Real Decreto 63/1995, de 20 de Janeiro (España, 2007). O SNS espanhol encontra-se, assim, organizado em dois níveis assistenciais, a atención primaria e a atención especializada14, estabelecidos pela Ley General de Sanidad de 1986. A atención primaria consiste na porta de acesso ao sistema. A atención especializada funciona como apoio e complemento à atención primaria, compreendendo os procedimentos cuja complexidade excedem a capacidade da última. Estes dois níveis de assistência foram reformulados e colocados no mesmo plano assistencial, ainda que sendo facilitada a permeabilidade e complementaridade entre ambos desde a Ley de cohesión y calidad del Sistema Nacional de Salud de 2003 . A atención primaria continuou, porém, a assumir a função de gestão e coordenação de casos (España, 2007). Posteriormente, a Lei 16/2003, del 28 de Maio, de cohesión y calidad del Sistema Nacional de Salud, estabeleceu o catálogo de serviços a prestar pelo sistema de saúde, entre elas as da “Atención Primaria”, tendo em conta a sua eficácia, eficiência, efectividade, segurança e utilidade terapêuticas, assim como as vantagens e alternativas assistenciais, os cuidados para grupos menos protegidos ou em risco e as necessidades sociais e o seu impacto económico e administrativo. Neste enquadramento geral, e dada a autonomia na organização das diferentes CC.AA, algumas delas foram desenvolvendo também redes de cuidados complementares que oferecem diferentes tipos de respostas adequados aos diferentes tipos de cuidados e necessidades que apresentam os doentes. Assim, por exemplo, encontram-se desenvolvidas redes de saúde mental, tanto na Catalunha como no País Basco, para doentes com problemas agudos ou crónicos de saúde mental, e uma rede de cuidados socio-sanitários, na Catalunha, dirigida a doentes com problemas crónicos de saúde e de dependência. Nos termos deste diploma, os cuidados de saúde primários compreendem a assistência em saúde em função da procura, programada ou urgente, tanto em consulta como ao domicílio, a indicação ou prescrição e a realização de meios complementares de diagnóstico e terapêutica, as actividades de prevenção da doença e promoção da saúde, as actividades de informação e vigilância na protecção da saúde, a reabilitação básica, os serviços específicos da mulher, da infância, da adolescência, dos adultos, da terceira idade, dos grupos de risco e dos doentes crónicos, os cuidados paliativos e os cuidados de saúde mental, em coordenação com os cuidados especializados e os cuidados de saúde oral (España, 2007). Cada comunidade autónoma divide-se em grandes regiões de saúde, denominadas de uma forma geral de Áreas de Salud (Instituto de Información Sanitaria, 2008), também por vezes chamadas Distritos de Atención Primaria, concebidas como unidades fundamentais para a direcção e gestão do sistema de saúde e responsáveis pelo planeamento das necessidades de saúde e pela gestão conjunta dos diferentes centros, estabelecimentos, programas e prestação de cuidados de saúde (Instituto de Información Sanitaria, 2008). Cabe destacar a importância e o impulso que tem sido dado à planificação em saúde nas últimas decádas. Por essa razão, cada Serviço Regional de Saúde define e estabelece as suas prioridades através da elaboração de planos de saúde, os quais orientam as prioridades e os objectivos a desenvolver pelo conjunto do sistema de saúde regional. Posteriomente, foi publicado o Real Decreto 1030/2006, de 15 de Setembro, onde se estabelece a carteira de serviços comuns ao Sistema Nacional de Saúde, assim como o conteúdo da prestação de cuidados de saúde primários, que todas as Comunidades Autónomas deverão disponibilizar (España, 2007). Por outro lado, desde o início da década de 90 que a Sociedad Española de Medicina de Familia y Comunitaria (semFYC) promove o chamado PAPPS, acrónimo para “Programa de actividades de promoción y prevención de la salud”, que emite recomendações periódicas sobre as prioridades e os métodos preventivos com base na evidência, sobre os recursos disponíveis e sobre, ainda, resultados de avaliações. 14 Existem, ainda, os Centros, Servicios y Unidades de Referencia do SNS, que têm por objectivo garantir a equidade no acesso e cuidados de qualidade, seguros e eficientes a pessoas que necessitam de cuidados de elevado nível de especialização. 17 As Áreas Básicas de Salud (ABS) ou Zonas Básicas de Salud (ZBS) resultam, por sua vez, da organização dos serviços de saúde de nível primário com base num critério territorial e populacional, compreendendo cuidados assistenciais directos e actividades para a promoção da saúde e prevenção da doença. Estes serviços caracterizam-se pela grande acessibilidade e pela suficiente capacidade de resolução técnica dos problemas de saúde mais frequentes (España, 2008). Constituem um marco territorial, dentro do qual se desenvolve a actividade do Equipo de Atención Primaria (EAP). Para efeitos de tratamento da informação, a unidade básica utilizada é a Unidad Básica de Atención Primaria15 (UBAP) (Instituto de Información Sanitaria, 2008). Os EAPs constituíram uma das grandes alterações no decurso das reformas em Espanha (España, 2001B), sendo actualmente o trabalho em equipa uma característica fundamental do modelo de cuidados primários do sistema de saúde (España, 2007), dado que se considera fundamental para a qualidade deste nível de cuidados a existência de equipas bem organizadas e coesas, prosseguindo o objectivo comum de querer oferecer aos cidadãos os melhores cuidados possíveis em termos de proximidade17 e personalização. Em 2001, os EAPs já se encontravam presentes em 99,8% de zonas básicas de saúde, abrangendo 92% da população (España, 2001B). O modelo organizativo dos EAPs permitiu (España, 2007) impulsionar a actual oferta assistencial, preservando os valores fundamentais dos cuidados primários, como devendo ser uma prestação integral, integrada, contínua, entre outras características. Entre os seus aspectos positivos, o Ministerio de Sanidad y Consumo (España, 2007) destaca o trabalho em equipa multidisciplinar, a continuidade e a longitudinalidade da assistência, os registos clínicos compartilhados, o aumento do tempo assistencial e da acessibilidade e a informatização. Os Centros de Atención Primaria (CAP), estabelecimentos assistenciais principais (España, 2008), são os centros onde são prestados os cuidados primários por parte dos Equipos de Atención Primaria (EAPs), podendo corresponder aos centros de salud, como sendo a estrutura física e funcional de referência para as actividades deste nível de cuidados na zona de saúde (Instituto de Información Sanitaria, 2008). Na Andaluzia e Catalunha, por exemplo, compreende também, para além dos centros de saúde, os consultórios locais e os consultórios auxiliares, oferecendo uma maior acessibilidade para as populações das localidades mais distantes ou pequenas (Instituto de Información Sanitaria, 2008). Como principais fragilidades do mesmo modelo, o Ministerio de la Sanidad y Consumo apresenta a rigidez normativa laboral e das estruturas de gestão, que não facilita a inovação e dificulta a exploração das potencialidades dos cuidados de saúde primários; a burocracia nos modelos de prescrição de medicamentos; as deficiências estruturais e ao nível de recursos humanos; a insuficiente dotação de meios de diagnóstico; o sistema retributivo uniforme e com escassa implementação de incentivos associados aos objectivos que reconheçam os profissionais com maiores responsabilidades e melhores resultados; a dificuldade na contratação de pessoal; o aumento da procura; a falta de satisfação dos profissionais; e a insuficiente definição do conteúdo funcional destes18 (España, 2007). O SNS conta actualmente com 2.913 Centros de Salud e, ainda, com 10.178 consultórios locais, que prestam serviços básicos à população, maioritariamente envelhecida, que reside em zonas dispersas do meio rural (España, 2008). Os Equipos de Atención Primaria (EAPs) são equipas multidisciplinares de profissionais de saúde (médicos de família, pediatras, enfermeiros, administrativos, assistentes sociais, parteiras e fisioterapeutas) (España, 2008) que trabalham nos Centros de Salud/Centros de Atención Primaria/Unidades Básicas de Atención Primaria, denominando-se, neste último caso, Equipos Básicos de Atención Primaria (EBAP) Neste sentido, desde os anos noventa que os diferentes Serviços Regionais de Saúde das diferentes CC.AA apresentam diversas intervenções para o desenvolvimento de alternativas de gestão para sanar algumas destas fragilidades. É o caso da (Instituto de Información Sanitaria, 2008)16. 15 As UBAP são na realidade as zonas básicas de saúde no meio rural e os centros de saúde no meio urbano (MSPS, 2008). 16 A título de exemplo, na Andaluzia, existem (MSPS, 2008) 7 Áreas Gestión Sanitaria, 33 Distritos de Atención Primaria/Áreas de Salud, 216 Zonas Básicas de Salud (ZBS) (388 Unidades Básicas de Atención Primaria) e 1431 Centros de Atención Primaria (CAP) (334 centros de saúde, 623 consultórios locais, 474 consultórios auxiliares). 17 A rede de cuidados primários coloca à disposição diversos serviços básicos de saúde, incluindo apoio domiciliário, a uma distância de 15 minutos desde qualquer local de residência (España, 2008). 18 Este último aspecto tem propiciado um desenvolvimento heterogéneo das equipas, gerando tensões entre os diferentes profissionais (España, 2007). 18 implementação do trabalho por objectivos (nomeadamente, a chamada “direcção participativa por objectivos” – DPO), da introdução de ContratosPrograma com estabelecimento de objectivos e metas e de incentivos associados aos resultados e da diversificação de prestadores, para além dos próprios do sistema público, através da introdução da compra de serviços por meio do contrato de gestão, por exemplo. eficiência, separando-se as funções de financiamento das funções de prestação de cuidados (SEMG, 2009). Os novos EAPs, criados na sequência do diploma de 1986, caracterizam-se, como já referido, pelo trabalho em equipa, por uma maior dedicação horária, pelo uso sistemático do historial clínico, pela renovação das infra-estruturas, por um aumento significativo de recursos humanos e por um processo interno de gestão participativa por objectivos (Andrés, 1995). Em 2007, o Ministerio de Sanidad y Consumo estabeleceu o projecto “Marco Estratégico para la mejora de la Atención Primaria en España: 2007-2012”, também chamado “Proyecto AP-21”, onde se encontram definidas 44 estratégias de melhoria, assim como as linhas de actuação para a sua prossecução. As estratégias centram-se em três objectivos chave, nomeadamente, a qualidade, a capacidade de resolução e a continuidade assistencial, que deverão ser alcançados por meio de profissionais motivados e competentes e de uma organização descentralizada, participativa, eficiente e eficaz. O horizonte estratégico é de seis anos para que, durante este período, as Comunidades Autónomas desenvolvam as medidas que, no seu âmbito de competências e com a adaptação necessária à realidade territorial, tornem possível a concretização dos desafios propostos (España, 2007). É considerado como ponto de partida com apoio claramente político das reformas na gestão das unidades de saúde em Espanha, já iniciadas anteriormente em algumas CC.AA, o chamado Informe Abril de 1991 (SEMG, 2009). A partir deste documento, operacionalizam-se em maior número e em mais Serviços Regionais diversas formas jurídicas organizativas diferentes das tradicionais, que permitem a introdução de diferentes elementos dos modelos de gestão empresarial, a incorporação de novas tipologias de prestadores (empresas públicas, consórcios, entidades sem fins lucrativos, entidades privadas, entre outras entidades) e, assim, a configuração de novos cenários com a presença de uma diversificação de entidades prestadoras de serviços tendentes a estabelecer modelos de “mercado”. Estes modelos, também denominados quasi-market, são modelos regulados e planificados (pela autoridade de saúde), numa dinâmica de competitividade, centrados fundamentalmente nos resultados de qualidade. Outro importante bloco de estratégias, divulgado no mesmo documento, respeita à melhoria da organização dos cuidados primários, objectivo transversal e instrumental que procura optimizar os recursos disponíveis e melhorar as ferramentas de gestão para facilitar a prossecução dos seus fins e tornar este nível de cuidados mais eficiente. 9. O 9.1. Acompanhando a introdução do conceito de “direcção participativa por objectivos”, a melhoria contínua dos sistemas de informação e o desenvolvimento de uma contabilidade de custos, surge o Contrato-Programa, como instrumento que permite relacionar e vincular a utilização e o consumo de recursos aos resultados obtidos, procedimento que implicava a negociação da fixação de objectivos, o estabelecimento de metodologias de monitorização, a valoração do grau de cumprimento dos objectivos e a compensação pelo cumprimento dos mesmos (Aguirre, 2002). PROCESSO DE CONTRATUALIZAÇÃO A NTECEDENTES Ao longo de vários anos, foram conduzidas diversas experiências quanto a diferentes formas de gestão, tendentes à flexibilização e utilização do direito privado. Nas diferentes Comunidades Autónomas, foram surgindo novas formas e iniciativas de gestão que são a base do que existe actualmente em Espanha (SEMG, 2009). No território INSALUD, ainda não dependente dos serviços regionais de saúde, o primeiro ContratoPrograma, estabelecido em 1993, entre a Dirección General de Insalud e as Gerencias de Atención Primaria, tinha carácter voluntário e contemplava, apenas, quatro cláusulas: prestação de serviços de saúde, gestão de urgências, melhoria da qualidade e financiamento (Aguirre, 2002). Nos finais do século XX, acompanhando as reformas europeias, também em Espanha a gestão pública foi sofrendo alterações, procurando-se transferir os processos decisórios para os vértices do sistema com maior capacidade para alcançar o máximo de O Contrato-Programa de 1994 era mais robusto e articulado, notando-se com maior clareza os objectivos institucionais em todos os âmbitos assistenciais 19 (Aguirre, 2002). Este Contrato-Programa e os seguintes, até 1996, previam os objectivos e os critérios de qualidade a alcançar, especificando cinco grupos de cláusulas referentes a financiamento, prestação de serviços, organização dos serviços, qualidade e descentralização da gestão (Andrés, 1995; Aguirre, 2002). gestão da prestação farmacêutica. Em 2001, é excluída a cláusula de incentivos, por estar a ser objecto de um pacto sindical. Quanto ao cumprimento dos Contratos, a sua monitorização era inicialmente, até 1997, de carácter trimestral, posteriormente, semestral e, em 2001, passou a ser anual (Aguirre, 2002). 9.2. O Contrato-Programa seguinte foi redigido no seguimento da reestruturação do Ministerio de Sanidad y Consumo e do INSALUD, por via dos Reais Decretos 1140/1996 e 1893/1996. A nova organização e gestão dos serviços veio, por isso, alterar o processo de elaboração dos Contratos-Programa a partir de 1997, passando a ser necessária a fixação de uma proposta prévia de objectivos da Subdirección General de Atención Primaria, as chamadas Linhas Prioritárias de Actuação, para serem aprovadas pelo Consejo de Dirección del INSALUD. É a partir das linhas de actuação definidas que se determina o clausulado dos Contratos-Programa (Aguirre, 2002). C ONTEXTO ACTUAL Em 2001, a Subdirección General de Atención Primaria sentiu a necessidade de emitir um documento de consenso, com a participação dos profissionais dos EAPs (médicos, enfermeiros e administrativos), com o objectivo de alcançar qualidade e aceitabilidade social ao menor custo possível na prestação de cuidados de saúde, numa altura em que se esgotavam os ideais que tinham impulsionado a reforma, em que se verificava uma gestão tecnicista e em que cresciam as expectativas dos cidadãos. O grupo de trabalho pretendia, ainda, procurar estudar as alternativas normativas e organizacionais, de modo a conferir uma maior autonomia aos EAPs (España, 2001B). Em 1997, o Contrato-Programa do INSALUD passou, assim, a incluir cláusulas referentes a princípios institucionais, objectivos e programas assistenciais, organização assistencial, financiamento, formação contínua, participação e incentivos (Aguirre, 2002). Do processo de discussão, resultaram (España, 2001B) diversas recomendações para os EAPs, como uma maior informatização e utilização dos sistemas de informação, o ajuste dos protocolos e guidelines à evidência científica, a coordenação efectiva com os cuidados especializados, o fomento da educação para a saúde e da formação contínua para os profissionais, entre outras. Para o Contrato-Programa de 1998, foram novamente elaboradas as Linhas Prioritárias de Actuação em Cuidados Primários, apresentadas a todas as Direcciones Generales e ao Consejo General del INSALUD. As cláusulas constantes do Contrato passaram a ser população, estrutura assistencial, financiamento, objectivos e actividade assistencial, qualidade, coordenação entre cuidados primários e cuidados especializados, participação dos profissionais, incentivos, formação contínua, incapacidade temporal e os contratos de gestão assistencial (Aguirre, 2002). No mesmo ano, foram formalizados Contratos de Gestión com as 57 Gerencias de Atención Primaria (Aguirre, 2002). Após as reformas no modelo organizativo do sistema de saúde espanhol, registaram-se (España, 2005) duas tendências diferenciadas. A primeira apoiava-se na gestão pública directa de natureza administrativa que, sem beneficiar de uma das novas formas jurídicas de gestão, descentraliza e transfere a responsabilidade da gestão nos Equipos e/ou caminha para um maior grau de coordenação com os cuidados especializados, incluindo experiências de gestão única. Dado que uma das linhas prioritárias era o maior envolvimento dos profissionais, esta última cláusula era dedicada à definição de como e quando se estabeleceriam os chamados Contratos de Gestión entre os Equipos Directivos de Atención Primaria e as Unidades de Provisión de Servicios. Desta tendência o Ministerio de la Sanidad y Consumo destaca (España, 2005) a Comunidade de Navarra que, desde 1998, aplica o Plan de Gestión Clínica de Atención Primaria del Servicio Navarro de Salud , apoiado na descentralização da gestão dos Equipos de Atención Primaria, a fixação de incentivos associados aos resultados obtidos e a avaliação anual, conduzida pela direcção das Zonas Básicas de Salud. Da avaliação do período 1998-2000, depreende-se a garantia e a melhoria da oferta dos serviços e a afectação de A partir de 1999, os Contratos-Programa passaram a designar-se Contratos de Gestión, ainda que sem alterações muito significativas nas cláusulas que lhes davam corpo (Aguirre, 2002). O Contrato de Gestão de 2000 mantém as onze cláusulas estabelecidas em 1998, desaparecendo, porém, a cláusula dedicada aos Contratos de Gestão Clínico-Assistencial e surgindo uma cláusula referente à 20 recursos entre as Zonas Básicas de Salud de modo mais equitativo, na medida em que se têm introduzido critérios que não os custos históricos (Carnicero et al., cit. por España, 2005). Com a excepção da Catalunha e da Andaluzia, não tinham sido, porém, criadas, até 2003, diferentes formas jurídicas e organizativas de gestão, ainda que tenham sido registados esforços no sentido da autogestão no âmbito da administração pública, destacando-se os contratos-programa ou de gestão (Minué et al., 2002, cit. por España, 2005). Segundo o Ministerio de la Sanidad y Consumo , este facto deviase a dois obstáculos que a descentralização da gestão: nem as direcções mostravam interesse em assumir novas responsabilidades nem houve suficiente desenvolvimento legislativo que o permitisse (España, 2005). Também na linha desta tendência, o Ministerio de la Sanidad y Consumo destacou na Andaluzia, em 2003, as Unidades Clínicas de Gestión, um caso de estratégia de gestão por processos orientada para a continuidade dos cuidados, enformada pelo Plan de Calidad. Neste contexto, a gestão dos recursos materiais corresponde aos distritos de cuidados primários, de maneira que, a partir de uma dotação orçamental com base numa capitação ponderada em função da idade dos doentes, os profissionais podem orientar-se no sentido de prosseguirem o objectivo de prestarem um melhor serviço aos cidadãos (Gálvez, 2002, cit. por España, 2005). Destaca-se (España, 2005) também a experiência piloto da Área de Saúde de Puertollano, na Comunidad de Castilha-La Mancha, como um exemplo de gestão única. Em 2007, no Informe anual del Sistema Nacional de Salud 2007, reflectiu-se sobre os quatro anos volvidos desde as últimas avaliações em 2003, concluindo-se que os esforços em matéria de qualidade assistencial têm sido, no entanto, incorporados na gestão dos serviços de saúde das comunidades autónomas, a maioria delas declarando que dispõe de documentação em que se explicita um plano de qualidade com objectivos estratégicos e com definição de tarefas para períodos de dois ou três anos (España, 2009). Estes planos contêm frequentemente elementos comuns às restantes comunidades autónomas e às estratégias em desenvolvimento na União Europeia (España, 2009). A segunda linha de tendência já beneficia das novas fomas jurídicas de gestão, sendo a Catalunha a CC.AA pioneira, com, em 2003, 22% dos Equipos já geridos por 37 entidades prestadoras de diferentes tipos, destacando-se as chamadas Entidades de Base Associativa (EBAs), associações de médicos de família que se responsabilizam também pela aquisição de serviços especializados, e os consórcios, que disponibilizam uma oferta integrada de serviços de cuidados primários e especializados (España, 2005). Em 2008, 23% dos Equipos eram geridos já por 49 entidades. Muitas das comunidades autónomas dizem também utilizar como âmbito de referência para as actividades de gestão da qualidade o modelo EFQM (European Foundation for Quality Management), ainda que, exceptuando o caso do País Basco, onde já se recorre a este modelo há bastante tempo, a sua utilização se encontre ainda numa fase inicial (España, 2009). No que respeita a estes novos modelos na Catalunha, foi realizado um estudo pioneiro pela Fundação Avedis Donabedian, referente ao ano 2001 (España, 2005). O estudo incluíu oito indicadores, através dos quais foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre os grupos de prestação incluídos na amostra, designadamente 34 EAPs geridos pelo Instituto Catalán de la Salud, 5 por EBAs e 11 por outras entidades. Foram encontradas diferenças significativas na acessibilidade horária dos profissionais e na dotação de alguns equipamentos, com melhores resultados nas EBAs e nos EAPs geridos por outras entidades. Trata-se de aspectos relacionados com a existência de uma verdadeira relação contratual e com a disponibilidade de margem de manobra na gestão dos recursos económicos em geral e dos recursos humanos em particular (Ponsà, 2003, cit. por España, 2005). Foi, aliás, este estudo que inspirou o plano de melhora dos cuidados primários na Catalunha (España, 2005). A maioria das comunidades autónomas incorporam já objectivos de qualidade no contrato de gestão com os centros de saúde, tendo em alguns casos sido adaptada a estrutura e o conteúdo do contrato de gestão ao modelo EFQM (é o caso de Cantabria e de Castilla-La Mancha). Na comunidade autónoma de Valença, por exemplo, o nível de cumprimento dos contratos de gestão, onde se incluem os objectivos de qualidade, tem repercussão tanto sobre a instituição como nas retribuições dos profissionais, que são, por essa razão, variáveis (España, 2009). 9.3. O S MECANISMOS DE CONTRATUALIZAÇÃO 9.3.1. A S DIFERENTES VIAS DE CONTRAT UALIZAÇÃO DE CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOS A Lei 15/1997, de 25 de Abril, de Habilitación de Nuevas Formas de Gestión en el Sistema Nacional de Salud, estabelece, no seu artigo único, que os serviços 21 de saúde podem ser prestados e geridos mediante acordos, convénios ou contratos com pessoas ou entidades públicas ou privadas, nos termos previstos na Ley General de Sanidad (España, 1997). Na sequência deste diploma, registou-se novamente a introdução de mais experiências de autogestão em diferentes comunidades autónomas, com recurso aos processos de contratualização que, de seguida, se descrevem. Têm como finalidade (SEMG, 2009) o desenvolvimento da actividade assistencial, preventiva e promotora da saúde, actuando com autonomia organizativa e com co-responsabilidade na gestão dos recursos e nas boas práticas. As unidades clínicas são, porém, de índole funcional, não orgânica, e não têm personalidade jurídica própria. Não têm igualmente independência económica, nem podem contratar pessoal. Por outro lado, oito dos dezasseis objectivos prioritários da unidade são impostos pelo Servicio Andaluz de Salud (SAS), enquanto os restantes oito são propostos por cada uma das unidades (SEMG, 2009). 9.3.1.1. A NDALUZIA No serviço andaluz de saúde, vinha sendo notada (SEMG, 2009) a aplicação de modelos organizativos inovadores nos cuidados de saúde primários, impulsionando a formação de equipas de trabalho e a integração das suas actividades. Também quanto a incentivos, havia já sido concebido e implementado, para o período de 2003 a 2005, um modelo retributivo que incluía um complemento no vencimento para compensar o rendimento, a qualidade e o cumprimento dos objectivos acordados, assim como um modelo de desenvolvimento profissional para recompensar o desempenho individual e as competências profissionais acreditadas (España, 2005). A Dirección Gerencia do distrito dos cuidados primários estabelece (SEMG, 2009) acordos de gestão com a direcção de cada uma das unidades de gestão clínica, sob proposta da Dirección de Salud do mesmo distrito. O acordo vigora durante quatro anos, renovável sucessivamente por iguais períodos. Através deste acordo, é fixado (SEMG, 2009) o âmbito da gestão da unidade, assim como os métodos e os recursos para alcançarem os objectivos definidos no mesmo documento. Também são determinados os recursos humanos, materiais, tecnológicos e financeiros atribuídos ao período de vigência do acordo, para além dos incentivos a atribuir à unidade e aos profissionais, em função do grau de cumprimento dos objectivos. Na sequência destes novos modelos, revelou-se necessária a introdução de alterações ao nível das organizações que possibilitassem a participação dos profissionais nas decisões da unidade de saúde, compartilhando responsabilidades que permitissem a definição de objectivos comuns, alinhados com as metas do sistema de saúde (SEMG, 2009). 9.3.1.2. C ASTILLA -L A M ANCHA A Gerencia de Atención Primaria de Toledo, província e capital da Comunidade Autónoma de Castilla-La Mancha, emitiu em Julho de 2007 o Proyecto de descentralización de la Atención Primaria, com o que se pretendeu alcançar (SEMG, 2009) uma gestão participativa, mediante um modelo que optimize a utilização dos recursos, melhore a qualidade da prestação de cuidados, motive os profissionais e satisfaça a população. Este projecto pretende conferir maior autonomia aos profissionais, definindo novos papéis e criando as condições necessárias para a descentralização da gestão, co-responsabilizando os profissionais pelos resultados. Para assegurar a sua viabilidade, é necessário (SEMG, 2009), porém, alterar os modelos organizativos, consolidar os sistemas de informação e conduzir processos de auto-regulação interna e externa, como a acreditação de serviços. Na sequência destas convicções, foi emitido o Decreto 197/2007, que estabeleceu que todos os centros de saúde se organizariam em “unidades de gestão clínica”, dotando os profissionais de saúde de maior autonomia e capacidade de gestão. Deste modo, ficou regulada a estrutura, a organização e o funcionamento dos cuidados de saúde primários. A Andaluzia foi, assim, a primeira Comunidade Autónoma a desenvolver esta estratégica, sustentada juridicamente (SEMG, 2009). O objectivo deste novo modelo organizativo visa (SEMG, 2009) conferir maior autonomia aos profissionais para que concebam as suas estratégias de trabalho, fundamentalmente situando o doente no centro do sistema. As unidades andaluzas de gestão clínica dos cuidados de saúde primários são formadas por profissionais, adstritos funcionalmente às zonas básicas de saúde. Nas unidades, são organizadas as actividades, é proposta e planificada a forma de concretização dos objectivos assistenciais e são avaliados os resultados. Para seguir esta finalidade, os Equipos de Atención Primaria desta Comunidade Autónoma constituíram-se (SEMG, 2009) em unidades de contrato que estabelecem um “compromisso de gestão”, mediante 22 uma relação contratual entre a Gerencia e cada unidade prestadora de serviços, onde são fixados os compromissos da actividade, qualidade, custos e objectivos da prestação de serviços. Este novo modelo implica que os profissionais assumam uma liderança compartilhada na gestão dos serviços de saúde na sua zona. determinam os requisitos necessários para a qualificação e os procedimentos para a sua aprovação. Esta resolução não foi publicada no Boletim Oficial da Comunidade Autónoma (BOCYL), tendo sido anulada (SEMG, 2009) por sentença do Tribunal Superior de Justiça de Castela e Leão (TSJCYL) nº 1378, de 13 de Junho de 2008. No contrato prevê-se a transferência do risco, introduzem-se elementos de qualidade e é identificado o sistema de incentivos. É ainda quantificada a capacidade de resolução, a satisfação dos utentes e a eficiência a alcançar. Os programas, previamente supervisionados por um grupo de trabalho multidisciplinar das diferentes gerências de salud, tinham como objectivos incrementar a capacidade decisória dos profissionais sobre a organização da sua própria actividade e sobre a gestão dos recursos necessários para a sua concretização, envolver os profissionais na melhoria da eficiência dos recursos, partilhando o risco, e melhorar a qualidade dos serviços de saúde e a capacidade de resposta às expectativas e necessidades dos cidadãos. As equipas constituem-se como unidades contratuais que se responsabilizam pelo cumprimento dos objectivos em saúde, distribuindo-se os papéis a desempenhar pelos seus elementos, que têm flexibilidade para determinar o tempo dedicado à equipa. A participação era voluntária, exigindo-se que pelo menos 70% dos profissionais estivessem de acordo e que destes fossem, no mínimo, 80% dos médicos de família e pediatras da equipa. Os programas tinham uma vigência de três anos. Este modelo centra-se, essencialmente, na gestão de cuidados, sendo os resultados em saúde fortemente valorados. Foi dado início a uma experiência de um ano num dos centros de saúde da província, que terminou em 31 de Dezembro de 2008, não havendo ainda retorno dos resultados da aplicação do modelo. Era, ainda, necessária a apresentação pela equipa de determinados requisitos, designadamente, de gestão, como factores de qualidade reflectidos na carteira de serviços e uma gestão económica com especial enfoque no consumo de recursos, e de organização, como a estrutura organizativa, os planos de melhoria, a estrutura docente ou a distribuição de tarefas. 9.3.1.3. C ASTELA E L EÃO A Lei 1/1993 de Ordenación del Sistema Sanitario determinou a descentralização, autonomia e responsabilidade na gestão dos serviços de saúde, seguindo-se-lhe a Lei 44/2003 de Ordenación de Profesiones Sanitarias, que determinou o uso racional dos recursos, evitando a sua sobre-utilização, subutilização e inadequada utilização. Finalmente, no mesmo ano, a Lei 55/2003 do Estatuto Marco definiu a participação e colaboração dos profissionais na fixação e prossecução dos objectivos em saúde com base em critérios de eficiência. Para a avaliação, conduzida pelas Gerencias de Atención Primaria e pela Gerencia regional, foram utilizados os indicadores constantes do Quadro 11. Quadro 11: Indicadores e fontes de informação para a avaliação das Gerencias de Atención Primaria (GAP) Indicadores Gestão económica e financeira Na sequência destes marcos legislativos (SEMG, 2009), foi assumido o compromisso na construção de um sistema de saúde próprio e participativo, impulsionando a descentralização dos processos decisórios, tendo este movimento normativo servido de base à constituição em 2004 de um grupo de trabalho para o desenvolvimento dos chamados Programas de Gestión Propia (PGP). Fonte de informação Sistema de informação orçamental da Gerencia de Atención Primaria Carteira de serviços e normas técnicas Objectivos de melhoria da qualidade: 1. Tempos de cuidados e de espera 2. Satisfação dos utentes 3. Utilização dos recursos 4. Indicadores de TI Gestão da prescrição de medicamentos e de produtos de saúde Objectivos estratégicos específicos fixados em cada Equipo de Atención O suporte legal destes projectos resultou (SEMG, 2009) da resolução do Director Gerente Regional de Salud de 5 de Abril de 2005, onde se estabelece a possibilidade de ser solicitado um programa de gestão própria e se (GAP) Historial clínico informatizado Medição externa Inquéritos de satisfação Sistema de informação da GAP Inspecção Sistema de informação Objectivos Avaliação da GAP Primaria Adaptado de SEMG, 2009. 23 Aderiram inicialmente, em 2005, a este projecto sete centros de saúde, permanecendo em 2007 seis deles. A avaliação após o período de três anos revelou (SEMG, 2009) bons resultados no que respeitava aos indicadores de gestão económica, organizativos, assistenciais e de qualidade. De uma maneira geral, houve uma eficiente gestão de recursos e em todos os casos houve um cumprimento em 65%, tal como estabelecido. A autora destaca especialmente a qualidade da prescrição e do uso racional dos medicamentos. incorporação de objectivos e metas relacionados com os objectivos estabelecidos pelo Plano de Saúde da Catalunha e pelos correspondentes Planos de Saúde subregionais. 9.1.3.4. C ATALUNHA Nas EBAs, uma equipa de médicos e enfermeiros recebe um orçamento para uma determinada população, destinado a salários, instalações, meios complementares de diagnóstico, referenciações e prescrição de medicamentos (McCallum et al., 2006). A partir de 1995, começa a existir abertura para a autogestão, que permitiu que se estabelecessem contratos para a gestão privada dos centros de saúde mediante as Entidades de Base Associativa (EBA), através das quais os profissionais se constituem como sociedade empresarial (SEMG, 2009). A Catalunha é a primeira CC.AA a receber em 1981 competências em matéria de saúde, caracterizando-se o período 1981-1990 por um modelo de gestão única (McCallum et al., 2006), onde a única entidade prestadora de cuidados primários era o Institut Català de la Salut (ICS)19. Em 2008, existiam 14 Equipos de Atención Primaria oficial e juridicamente definidos como EBAs, para além de outros 357, dos quais 274 eram geridos pelo ICS e 83 pelas restantes entidades prestadoras existentes (CatSalut, 2009a). A este modelo seguiu-se o de gestão diversificada, que decorreu desde 1990 a 1995 e que resultou da Ley de Ordenación Sanitaria de Cataluña (LOSC)20, que separou as funções do financiamento, que passou a depender do serviço de saúde catalão (Servei Català de la Salut – CatSalut), das funções de prestação de serviços, que deixou de ser única para o Instituto Català de la Salut21 (ICS) (McCallum et al., 2006). Surgiram, assim, nesta altura, várias formas de contratualizar cuidados de saúde primários a prestadores que não o ICS (Puig-Junoy e Ortún, 2004). A primeira experiência de autogestão na Catalunha teve início em 1993, oficializada em 1996, no município de Vic, por meio da constituição de uma sociedade de responsabilidade limitada e um acordo contratual com o Servei Català de la Salut (CatSalut). O financiamento tinha por base a capitação (SEMG, 2009). O serviço de saúde catalão utiliza, por isso, actualmente dois tipos de contratos, sendo um deles p Contrato/Convénio de Gestão com as entidades não ICS, com base num sistema de pagamento retrospectivo, com uma parte variável. Neste contrato, as equipas de cuidados primários assumem accountability por 5% do orçamento global, desde que cumpram determinados objectivos relacionados com metas especificadas no plano de saúde e com resultados qualitativos e quantitativos quanto à prescrição de medicamentos (Puig-Junoy e Ortún, 2004). O modelo de gestão dos serviços e das respostas das diferentes redes (cuidados primários, cuidados especializados hospitalares, saúde mental e sociosanitária) passa, assim, a ser sustentado num modelo de gestão baseado na separação das funções de financiamento, planificação e direcção das redes das funções de prestação directa dos serviços assistenciais, estes realizados através do conjunto de diferentes entidades (públicas ou privadas) previamente acreditadas. A autoridade em saúde (através do Serviço Catalão da Saúde – CatSalut) procede neste contexto à compra de serviços de saúde com cada uma das diferentes entidades. A compra de serviços inclui a Na sequência do desenvolvimento desta tipologia de contratos, surgiram na Catalunha novos prestadores de cuidados, subsumíveis, segundo Puig-Junoy e Ortún (2004), a três categorias, nomeadamente, prestadores horizontalmente integrados, associações mutualistas (semelhantes às americanas Health Maintenance Organizations – HMOs) e organizações constituídas por médicos de família. 19 O Servei Català de la Salut (SCS) é uma autoridade pública, que se assume como compradora, celebrando contratos com prestadores de cuidados de saúde, públicos e privados (Puig-Junoy e Ortún, 2004). 20 Este diploma teve, por sua vez, como base o Real Decreto 858/1992 (Morell, 2001). 21 O Instituto Catalão da Saúde (ICS) é uma entidade de carácter público dependente directamente da autoridade regional de saúde, responsável por um conjunto de serviços de titularidade pública, anteriormente atribuídos ao INSALUD. O segundo tipo de contratos é o chamado ContratoPrograma, em que o pagamento se baseia num orçamento financiado pelo CatSalut, em parte, com 24 base nos custos históricos22 (Puig-Junoy e Ortún, 2004). A Catalunha distancia-se das outras CC.AA, no que diz respeito aos modelos organizativos, dado que (SEMG, 2009) apresenta um modelo de provisão múltipla e diversificada, onde coexistem diversas fórmulas de gestão através de diversas figuras jurídicas, como fundações, consórcios, sociedades anónimas, empresas públicas e as já referidas Entidades de Base Associativa (EBAs). última reforma iniciou-se de forma experimental em dez Equipos de Atención Primaria. Barrera (2008) diferencia, porém, este modelo de autonomia de gestão do modelo de autogestão, defendendo não se tratar da mesma coisa. As equipas têm, assim, um projecto assistencial próprio e a capacidade para decidir o seu planeamento organizativo, assim como a gestão dos recursos humanos e financeiros. Trata-se de conceder aos profissionais ferramentas que lhes permitam ser responsáveis directos pela gestão da sua actividade, sem terem que constituir uma EBA. Em 2000, decorreu (SEMG, 2009) uma avaliação sobre estes novos modelos de gestão, promovido por Antón Cañellas, um “defensor do povo” da Catalunha. Em 2002, a segunda avaliação foi conduzida pela Fundação Avedis Donabedian. Actualmente, no ano 2009, encontra-se em desenvolvimento, uma terceira avaliação. Com efeito, continua a autora, estes projectos não se confundem com as EBAs, ainda que prossigam a mesma finalidade, isto é, mais flexibilidade, maior envolvimento e maior participação dos profissionais, para que se incrementem os seus níveis de satisfação. Trata-se de um projecto reconhecedor das diferenças e baseado muito mais na liderança, delegando capacidade decisória, uma certa gestão do risco e a avaliação dos resultados que se obtenham. Com esta inovação, uma parte da eficiência económica alcançada reverterá também para as equipas (Barrera, 2008). Das avaliações já realizadas, resultou (SEMG, 2009) que a diversificação da gestão nos cuidados primários não tem provocado diferenças significativas entre os diferentes prestadores. De uma forma geral, os indicadores de qualidade eram semelhantes nos diferentes modelos, ainda que as EBAs empregassem menos enfermeiros, prescrevessem menos medicamentos, requisitassem menos exames laboratoriais e referenciassem menos doentes para outras especialidades (Fundación Avedis Donabedian, 2003, cit. por McCallum et al., 2006). 9.3.1.5. M ADRID Na sequência da Lei 15/97, já citada anteriormente, a Lei 12/2001, de 21 de Dezembro, de Ordenación Sanitaria de la Comunidad de Madrid (LOSCAM) criou o Sistema Sanitario de la Comunidad de Madrid, organizado funcional e territorialmente em Áreas Sanitarias, com o objectivo de consolidar a universalidade, a equidade e igualdade efectiva de acesso aos cuidados de saúde23 (España, 2001a). Para este efeito, introduziu um mercado público regulado (SEMG, 2009), permitindo a prestação dos cuidados de saúde por organizações de saúde privadas 24 (España, 2001a), e criou o Instituto Madrileño de la Salud (IMSALUD), que exerce as competências antes atribuídas ao extinto INSALUD25, separando assim as funções de financiamento e prestação26. Na perspectiva de Gená-Badia (2003, cit. por McCallum et al., 2006), a ausência de diferenças nos indicadores de qualidade sugere que a política de diversificação na gestão das organizações prestadoras de serviços de cuidados primários tem promovido a competição e beneficiado toda a comunidade catalã e não apenas os cidadãos abrangidos pelos projectos-piloto. Com a Lei 8/2007, de 30 de Julho, do Institut Català de la Salut, o ICS converteu-se (España, 2007) em empresa pública, aspecto que permite iniciar o processo de modernização da gestão das diferentes respostas que abrange e de desenvolvimento dos contratos-programas estabelecidos (com pactuação de objectivos e metas, com base num fluxo mais económico e administrativo-orçamental) no sentido de se configurarem como verdadeiros contratos de gestão com cada um dos EAPs. Foi também emitido, no mesmo contexto de mudança, um documento (SEMG, 2009) que fomentava a descentralização e a autonomia de gestão dos próprios centros de saúde. O novo modelo de autogestão que aparece na sequência desta Uma das funções atribuídas ao novo IMSALUD é, precisamente, a potenciação do trabalho em equipa no contexto da prestação de cuidados de saúde27. É também ao IMSALUD que compete a gestão dos 23 24 25 26 27 22 Os medicamentos são pagos pelo seu custo (Puig-Junoy e Ortún, 2004). 25 Artigo Artigo Artigo Artigo Artigo 2º, nº 1, da Lei 12/2001, de 21 de Dezembro. 23º, nº 1, da Lei 12/2001, de 21 de Dezembro. 78º da Lei 12/2001, de 21 de Dezembro. 71º da Lei 12/2001, de 21 de Dezembro. 80º, al. b), da Lei 12/2001, de 21 de Dezembro. acordos firmados para a prestação de serviços28 (España, 2001a). fundamental, integrando-se numa organização onde se fundem todos os níveis assistenciais (SEMG, 2009). A Lei 12/2001 estabelece, ainda, que os centros e estabelecimentos do IMSALUD deverão contar com um sistema integral de gestão que, de acordo com a sua planificação estratégica, permita implementar técnicas de gestão participativa por objectivos, sistemas de controlo de gestão orientados pelos resultados e sistemas de padrões mínimos de serviços, dê lugar à delimitação clara das responsabilidades de direcção e gestão e possibilite estabelecer parâmetros quanto a custos e à qualidade dos cuidados a prestar29 (España, 2001a). Algumas vantagens associadas a este modelo são o desaparecimento da competição entre níveis assistenciais, da duplicidade de consultas e exames e do uso inadequado das tecnologias. Por outro lado, melhora a continuidade dos cuidados, potencia a promoção da saúde e facilita uma maior eficiência na gestão. Para que tal aconteça, é promovida a motivação económica dos profissionais e fomentado o compromisso de cooperação com os colegas, o que beneficiará, em último caso, os cidadãos (SEMG, 2009). Foi, ainda, delineado um Plan de Mejora de la Atención Primaria, pioneiro em Espanha e em vigor até ao ano 2009. Este plano antecedeu o Projecto AP21, para aplicação no período 2007/2012. Entretanto, as restrições orçamentais têm lançado o debate sobre o início de um outro modelo de gestão, com aprofundamento da autogestão, abrindo a possibilidade a outras modalidades como as EBA e a Gerencia Única (SEMG, 2009). 9.3.1.7. P RINCIPADO DAS A STÚR IAS Encontram-se actualmente em preparação as chamadas Unidades de Gestión Clínica. Nesta primeira fase, estudam-se outras experiências e promove-se o debate entre os profissionais, para uma reflexão colectiva sobre o futuro, tendo em conta os eixos do sistema de saúde, nomeadamente, a participação de todos os profissionais e a melhoria contínua da qualidade assistencial e organizativa em torno do cidadão (SEMG, 2009). 9.3.1.6. V ALENÇA Em 1 de Janeiro de 1999, foi implementado o primeiro modelo de concessão administrativa num serviço de saúde público, na área sanitaria 10, a que se deu o nome de “Modelo Alzira”, consolidado em Abril de 2003 com a integração dos cuidados primários. Nesta altura, a empresa concessionária geria todos os cuidados de saúde prestados aos 235.000 habitantes dos 29 municípios abrangidos por aquela área de saúde de Valença (SEMG, 2009). Existe algum cepticismo por parte de todos os sectores profissionais quanto à adequação do momento para a implementação deste modelo (SEMG, 2009), dadas as restrições orçamentais actuais e o ambiente de conflitualidade que as primeiras ideias fizeram surgir. O enquadramento legal encontra-se igualmente em estudo, apontando-se já, porém, para a aplicação de uma fórmula de capitação, uma vez que, até ao momento, os centros de saúde recebem um orçamento calculado com base nos custos históricos (SEMG, 2009). A concessão administrativa parte (SEMG, 2009) da separação entre as funções de financiamento e de prestação dos serviços de saúde. A propriedade, o financiamento e o controlo são públicos, enquanto a prestação é privada. Outra das linhas do projecto já conhecidas é o facto de os centros de saúde que manifestem interesse em constituir-se em unidades de gestão clínica terem que o assumir durante o período de quatro anos, com a obrigação da celebração anual de um contrato de gestão (SEMG, 2009). Este modelo consiste, fundamentalmente, na transferência para uma determinada organização empresarial, denominada Unión Temporal de Empresas (UTE), de um orçamento calculado com base na capitação. Em troca, a UTE constrói um centro hospitalar que gere, a par dos outros centros de saúde, durante um largo período de tempo prorrogável (cerca de 25 anos). O hospital deixa de ser o eixo O Servicio de Salud del Principado de Asturias (SESPA) estabeleceu já que as unidades de gestão terão diferentes categorias, em função de critérios de autonomia de gestão, que poderá ser básica, intermédia ou avançada, e em função de critérios de nível de qualidade, que poderá ser inicial, avançado ou de excelência (SEMG, 2009). 28 Artigo 81º, al. f), da Lei 12/2001, de 21 de Dezembro. 29 Artigo 88º, nº 3, da Lei 12/2001, de 21 de Dezembro. 26 Segundo os resultados de qualidade e eficiência, as unidades de gestão clínica poderão adquirir ou perder essa qualificação. A sua avaliação consistirá numa monitorização periódica conduzida pela SESPA, em que serão analisados o desenvolvimento dos processos clínicos e não clínicos, com observação dos standards de qualidade, os resultados da carteira de serviços e os resultados quanto à autonomia da gestão, aos resultados em saúde e à satisfação dos cidadãos (SEMG, 2009). 9.3.2. seus centros de saúde, os recursos de que estes disporão e o enquadramento e a dinâmica das relações intra-institucionais para o ano a que se refira (Servicio Andaluz de Salud, 2008). Para o acompanhamento do cumprimento dos objectivos contidos no Contrato-Programa, o Distrito implementará um conjunto de directivas. Todas as informações e relatórios solicitados no ContratoPrograma deverão ser enviados para as correspondentes Unidades de los Servicios Centrales (SSCC), às quais serão fornecidas todos os elementos referentes à actividade de auditoria, avaliação e acompanhamento. O Distrito submeterá então ao Servicio Andaluz de Salud todos os dados e indicadores necessários para tornar possível a avaliação de todas as dimensões previstas no Contrato-Programa (Servicio Andaluz de Salud, 2008). C LAUSULADO CONTRATUAL 9.3.2.1. A NDALUZIA A Adenda 2008 ao Contrato Programa dos Distritos de Cuidados Primários do Serviço Andaluz de Saúde 20052008, datado de 1 de Janeiro de 2008, partiu da Lei 2/1998, de 15 de Junho, referente à Saúde da Andaluzia, onde se reconhecem os princípios da universalidade, equidade e igualdade efectiva no acesso aos cuidados de saúde como os valores que inspiram o modelo de cuidados primários desta comunidade autónoma. Também constituem princípios básicos deste modelo a concepção integral da saúde, a descentralização, a autonomia e a responsabilidade na gestão dos serviços, a melhoria contínua da qualidade e a utilização eficaz e eficiente dos recusos em saúde (Servicio Andaluz de Salud, 2008). O Contrato-Programa para o ano 2008 sustentou-se nas seguintes linhas de actuação: 1. 2. As principais linhas de actuação estabelecidas, através dos Contratos-Programa, pela Consejeria de Salud para o período 2005-2008 foram (Servicio Andaluz de Salud, 2008): 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. O compromisso com as necessidades e expectativas dos cidadãos A extensão da gestão por processos e a extensão da gestão clínica A integração dos diferentes níveis assistenciais A orientação para os resultados A garantia da qualidade da prestação de cuidados A promoção da inovação e da gestão do conhecimento O desenvolvimento de um modelo integral de gestão por competências A gestão da qualidade nas políticas de saúde pública, com especial atenção na implementação de políticas transversais de inovação tecnológica 3. O Contrato-Programa constitui o instrumento a que recorre a Dirección Gerencia del Servicio Andaluz de Salud para estabelecer as actividades a realizar pelos 27 Área 1.1. 1.2. 1.3. de atenção ao cidadão: Personalização da atenção Valorização da opinião do cidadão Informação, acessibilidade, conforto e confidencialidade 1.4. Planos específicos para a participação do cidadão 1.5. Direitos em saúde Área de gestão da prevenção da doença, promoção e protecção da saúde: 2.1. Desenvolvimento de estratégias em saúde para a redução das desigualdades 2.2. Melhoria dos serviços de dispensa de metadona nos centros de saúde e dos cuidados a pessoas que sofrem de adições 2.3. Segurança alimentar e saúde ambiental 2.4. Saúde sexual e reprodutiva 2.5. Plano de vacinação 2.6. Cuidados a polimedicados 2.7. Doenças transmissíveis 2.8. Rede de alertas de saúde pública 2.9. Cuidados de saúde em casos de violência de género 2.10. Cuidados de saúde em casos de maus tratos a menores 2.11. Cuidados de saúde a pessoas imigrantes 2.12. Saúde dos jovens Área de organização da assistência em saúde: 3.1. Acessibilidade 3.2. Gestão clínica 3.3. Gestão por processo assistencial integrado 3.4. Personalização e continuidade assistencial 3.5. Actividade assistencial 3.6. Área de segurança do doente 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. Área 4.1. 4.2. 4.3. 4.4. 4.5. de planos horizontais de gestão: Plano Andaluz de Urgências e Emergências Plano de Apoio às Famílias Andaluzas Plano de Saúde Oral Laboratórios clínicos e bancos biológicos Cuidados a doentes em tratamento anticoagulante oral Área de planos integrados de saúde: 5.1. Plano Integrado de Cardiopatias 5.2. Plano Integrado de Saúde Mental da Andaluzia 5.3. Plano Integrado de Oncologia 5.4. Plano Integrado de Diabetes 5.5. Plano Integrado de Tabagismo 5.6. Plano Integrado de Acidentabilidade 5.7. Plano Integrado de Obesidade Infantil 5.8. Plano Integrado de Cuidados Paliativos Área de promoção do uso racional do medicamento Área de apoio à investigação Área de docência e formação Gestão ambiental Área de gestão de recursos humanos Área de gestão financeira Área de investimentos Área de financiamento (com base na capitação) Área de tecnologias da informação Área de sistemas de informação e avaliação estratégicas da organização, permitindo às diferentes unidades de gestão clínicas ver reflectidos os seus elementos comuns e os seus elementos distintivos. O acordo compreende designadamente: 1. 2. Na área de gestão clínica, prevê-se no ContratoPrograma impulsionar o desenvolvimento das chamadas Unidades de Gestión Clínica (UGC) já existentes e a criação de novas. A gestão clínica tem (Servicio Andaluz de Salud, 2008) como principal característica poder dotar os profissionais de maior autonomia organizativa e paralelamente de uma maior responsabilidade na gestão dos recursos, sendo em simultâneo uma ferramenta para promover a melhoria da qualidade nos cuidados primários e o enquadramento ideal para implementar as políticas e os objectivos estratégicos da organização. 3. três domínios distintos, Descrição da UGC – cada unidade deve definir “o que é” e “o que faz”, explanando os principais problemas de saúde que atende, o tipo de doentes e famílias, outros profissionais com quem há-de estabelecer parcerias para desempenhar devidamente o seu trabalho e os recursos disponíveis Objectivos – devem ser ambiciosos, mas alcançáveis, mensuráveis e reflectir fielmente a prática assistencial da unidade. As unidades devem estabelecer objectivos de melhoria, que serão agrupados nas seguintes dimensões: 2.1. Actividade, oferta de serviços e acessibilidade 2.2. Segurança do doente 2.3. Indicadores clínicos 2.4. Redução da diversidade na prática clínica e normas de qualidade dos Processos Assistenciais Integrados 2.5. Orientação para os cidadãos e inquéritos de satisfação 2.6. Adequação da prescrição e consumo de fármacos 2.7. Continuidade assistencial 2.8. Gestão financeira 2.9. Prevenção da doença, promoção e protecção da saúde 2.10. Gestão do conhecimento Avaliação – o acordo deve conter as fontes de informação e o tipo de metodologia que se implementará para medir, anualmente, os resultados obtidos em cada uma das vertentes em que foram fixados objectivos Os acordos de gestão das novas UCGs, após ratificação pelo seu titular, devem ser remetidos pela Direcção de Distrito à Dirección General de Asistencia Sanitaria (DGAS). Para a implementação das UGCs é necessário ainda (Servicio Andaluz de Salud, 2008) disponibilizar os mecanismos que possibilitem a transferência de níveis de decisão e de co-responsabilidade às unidades. Para tal, o Contrato-Programa estabelece que a direcção do Distrito deve: Neste contexto, acredita-se (Servicio Andaluz de Salud, 2008) que o modelo de gestão clínica implementado por meio da criação de Unidades de Gestión Clínica nos diferentes centros do Serviço Andaluz de Saúde coloca o enfoque na efectividade da prática clínica, com base na liderança que incorpore a opinião do cidadão, a transparência e o impulso da investigação e do desenvolvimento. No anexo VIII do Contrato-Programa é incluído o Acuerdo de Unidades de Gestión Clínica, o documento com vigência de quatro anos, que formaliza o compromisso dos profissionais junto da Direcção do seu Distrito. Neste acordo, são definidas as linhas 1. 2. 28 Valorar e decidir que UGCs devem ser constituídas Transmitir a promoção da cultura da gestão clínica 3. 4. 5. 6. Colaborar na preparação e desenvolvimento das actividades de formação que a DGAS promova na área de gestão clínica Participar activamente nas reuniões de consenso e identificação de áreas de melhoria Participar e coordenar o processo de avaliação anual das UCGs do distrito, assim como remeter os resultados do mesmo no prazo fixado Sugerir melhorias em termos de fiabilidade, equidade e homologação nos sistemas de registo, recolha de dados ou informação locais, que se considerem necessários para avaliar os indicadores das suas UCGs 1. 9.3.2.2. C ATALUNHA 2. Para o ano 2009, o contrato de compra de serviços de cuidados primários da Catalunha especifica os objectivos comuns e específicos. É do cumprimento destes dois tipos de objectivos que depende o pagamento na parte variável (CatSalut, 2009b). Os objectivos comuns a todas as unidades prestadoras são (CatSalut, 2009b) definidos por linhas contratuais e de acordo com critérios de homogeneidade para o conjunto do território. O cumprimento destes objectivos corresponderá ao pagamento de 60% da parte variável (no ano 2008, havia sido de 70%, e no período 2005-2007, de 80%). Os objectivos específicos das regiões de saúde são (CatSalut, 2009b) determinados em função das particularidades e necessidades de prioritização de cada território ou unidade prestadora, correspondendo, em caso de cumprimento, ao pagamento de 40% da parte variável (no ano 2008, havia sido de 30%, e no período 2005-2007, de 20%). 3. Estas alterações ao contrato para a compra de serviços em cuidados de saúde primários resultam da vontade de aumentar a margem de gestão da parte variável por parte das regiões de saúde, atenta a necessidade que existe de especificar ao nível territorial e ao nível das unidades prestadores os objectivos prioritários (CatSalut, 2009b). Os critérios de ponderação para cada objectivo são fixados pelas regiões de saúde, para que melhor se ajustem às necessidades de prioritização de cada uma. Porém, o peso de cada objectivo não pode ser inferior a 4% nem a 20% do conjunto da parte variável (CatSalut, 2009b). Objectivos comuns dos contratos: 1.1. Objectivos comuns da parte variável30 1.1.1. Resolução/Qualidade assistencial (8 indicadores) 1.1.2. Coordenação (1 indicador) 1.1.3. Eficiência (3 indicadores) 1.1.4. Qualidade percepcionada (2 indicadores) 1.1.5. Informação (1 indicador) 1.2. Outros objectivos comuns prioritizados 1.2.1. Resolução/Qualidade assistencial (5 indicadores) 1.2.2. Eficiência (1 indicador) 1.3. Objectivos específicos da parte variável da região de saúde (Barcelona) (6 indicadores) Indicadores de avaliação dos objectivos comuns dos contratos com os EAPs: 2.1. Indicadores de avaliação dos objectivos comuns da parte variável: 2.1.1. Resolução (8 indicadores) 2.1.2. Coordenação (1 indicador) 2.1.3. Eficiência (7 indicadores) 2.1.4. Qualidade percepcionada (2 indicadores) 2.1.5. Informação (2 indicadores) 2.2. Indicadores de avaliação dos outros objectivos comuns prioritizados: 2.2.1. Resolução (6 indicadores) 2.3. Indicadores de avaliação dos objectivos específicos da parte variável da região de saúde (Barcelona): 2.3.1. Resolução (2 indicadores) 2.3.2. Coordenação (1 indicador) 2.3.3. Eficiência (2 indicadores) 2.3.4. Informação (1 indicador) Pedido de dados à entidade prestadora: 3.1. Dados para avaliação dos objectivos comuns da parte variável (34 elementos) 3.2. Dados para avaliação dos objectivos comuns da parte variável específicos da região de saúde (Barcelona) (19 elementos) 3.3. Outros dados provenientes da entidade prestadora (121 elementos) 3.4. Outros dados provenientes da entidade prestadora específicos da região de saúde (Barcelona) (41 elementos) 9.3.2.3. M ADRID O Contrato-Programa da comunidade de Madrid, datado de 29 de Janeiro de 2009, resulta do Plan de O contrato para a compra de serviços em cuidados de saúde primária, para o ano 2009, apresenta os seguintes conteúdos (CatSalut, 2009b): 30 Para cada indicador de avaliação dos objectivos comuns da parte variável, são apresentadas as definições, descrição, fonte, fórmula, referência, entre outras observações (CatSalut, 2009b). 29 Mejora de la Atención Primaria 2006-2009 e da O Contrato-Programa definido para a comunidade de Madrid contempla (Servicio Madrileño de Salud, 2009), ainda, os objectivos estratégicos, resultantes do Plan de Mejora de la Atención Primaria 2006-2009 e da aplicação de um esquema baseado no Modelo EFQM de Excelência, enumerados de seguida: necessidade de impulsionar uma maior autonomia de gestão dos centros de saúde. Para tal, entende-se necessário conceber instrumentos que favoreçam uma maior assunção de responsabilidades pelas equipas clínicas (Servicio Madrileño de Salud, 2009). Com o chamado Contrato Programa de Centro, respeitante a esta comunidade autónoma de Espanha, pretende-se (Servicio Madrileño de Salud, 2009) contribuir para a descentralização da estratégia de melhoria dos cuidados primários através da fixação homogénea de objectivos. 1. Este contrato é único, conferindo-lhe um carácter inovador (Servicio Madrileño de Salud, 2009), dado que estabelece os mesmos objectivos e os mesmos critérios para a definição de metas para todos os centros de saúde da comunidade de Madrid. Os objectivos deverão ser alcançáveis e contemplar de forma global e sistemática todos os aspectos da organização. Os indicadores deverão também ser avaliados de forma individualizada relativamente a cada profissional. 2. 3. De modo a facilitar a fixação global de objectivos, elegeu-se (Servicio Madrileño de Salud, 2009) o já referido modelo EFQM de Excelência (European Foundation for Quality Management), como referência para o delineamento do Contrato-Programa. O recurso ao modelo EFQM tem como intuito fomentar o enfoque na gestão com base nos conceitos fundamentais da “excelência” (aspas nossas), como são a orientação para o doente, a orientação para os resultados, a liderança e a constância dos objectivos estabelecidos, a gestão por processos e resultados alcançados, o desenvolvimento e o envolvimento das pessoas, a aprendizagem, a inovação e a melhoria contínua, o desenvolvimento de parcerias e a responsabilidade social (Servicio Madrileño de Salud, 2009). Orientados para os cidadãos: a. Actualizar a oferta assistencial às expectativas e necessidades da população b. Melhorar a satisfação do cidadão que recorre aos centros de saúde c. Melhorar a acessibilidade aos centros de saúde d. Melhorar os resultados em saúde Orientados para os profissionais: a. Adequar a dotação de recursos humanos às necessidades da população b. Melhorar o desenvolvimento profissional em cuidados primários c. Melhorar a satisfação dos profissionais dos centros de saúde Orientados para a organização e gestão dos serviços: a. Aumentar a capacidade de resposta ao primeiro nível assistencial b. Melhorar a organização interna entre os diferentes profissionais dos Equipos de Atención Primaria que permita uma prestação de cuidados rápida e eficaz c. Potenciar a continuidade assistencial com os cuidados especializados, facilitando uma boa comunicação entre os diferentes níveis assistenciais d. Impulsionar a continuidade assistencial junto dos Serviços Sociais e. Melhorar os sistemas de informação f. Contribuir para a sustentatibilidade do meio ambiente g. Contribuir para a sustentabilidade do sistema de saúde Para que a organização alcance os resultados pretendidos, cada objectivo estratégico é traduzido em objectivos operativos previstos no Contrato-Programa, que se enquadram nos seguintes domínios ou critérios (Servicio Madrileño de Salud, 2009): O enfoque nas metas referidas permitirá obter resultados tangíveis e medir parâmetros, que constituirão um passo num processo contínuo de desenvolvimento progressivo no sentido da gestão da qualidade. Por ser um processo de continuidade, assume especial relevância o desenvolvimento em simultâneo de um “painel de controlo integrado de cuidados primários” (aspas nossas) (Cuadro de Mandos Integral de Atención Primaria) como ferramenta para a monitorização dos indicadores do Contrato-Programa. Com a mesma finalidade, importará conceber um sistema de incentivos associado ao cumprimento de objectivos (Servicio Madrileño de Salud, 2009). 1. 2. 3. 4. 5. 30 Orientados para a liderança Orientados para facilitar a implementação das políticas e estratégias de saúde Dirigidos aos profissionais Orientados para as parcerias e para os recursos Que garantam a gestão dos processos 6. 7. 8. 9. Relacionados com a percepção da população sobre os cuidados prestados nos centros de saúde Relacionados com a percepção dos profissionais dos centros de saúde Relacionados com a percepção da sociedade sobre a actividade realizada junto dela a partir dos centros de saúde Resultados chave – onde se incluem objectivos de efectividade e de eficiência 4. O Contrato-Programa estipula o objecto, o âmbito de actuação, os direitos do utente, financiamento e facturação, entre outras questões. Estabelece ainda (Pais Vasco, 2002) a igualdade dos utentes no acesso aos serviços de saúde e o compromisso do centro de saúde na prestação dos serviços com a máxima qualidade que os seus recursos disponíveis permitam. 9.3.2.4. P AÍS B ASCO Os Contratos-Programa nesta comunidade autónoma resultam (Pais Vasco, 2002) da Lei 8/1997, de 26 de Junho, de Ordenación Sanitária de Euskadi, do Decreto 255/1997, de 11 de Novembro, e do Decreto 254/1997, de 11 de Novembro. No anexo I, é definido o modelo para a fixação da cobertura e da oferta de serviços e, no anexo II, o modelo para o estabelecimento dos programas de qualidade e acreditação e dos compromissos básicos e complementares de qualidade. O anexo III constitui o modelo para a definição das questões referentes ao financiamento. Em virtude da Ley de Ordenación Sanitária de Euskadi, o Contrato-Programa deve contemplar os aspectos seguintes: 2. 3. 4. 5. A estimativa do volume global de actividade e previsão das contingências de saúde cobertas A determinação quantificável e periódica dos requisitos de qualidade que os serviços de saúde deverão cumprir Estimativa sobre a cobertura económica da actividade com dotação orçamental, periodicidade e documentação justificativa dos pagamentos Os níveis de responsabilidade assumidos pelas partes Os requisitos, procedimentos de controlo e auditoria estabelecidos pelo Departamento de Saúde Complementares ao Contrato-Programa, são os contratos de gestão clínica, a estabelecer entre a Unidade de Atención Primaria e a Gerencia da comarca respectiva (Servicio Vasco de Salud, 2007). O modelo de gestão clínica, previsto para 2007, definia (Servicio Vasco de Salud, 2007) como objectivo geral a melhoria da efectividade e da eficiência dos processos assistenciais clínicos e dos processos que lhes servem de suporte e, mais concretamente, a melhoria da qualidade dos serviços, a eficiência na utilização dos recursos, uma maior participação dos profissionais, o uso racional do medicamento e a melhoria dos sistemas de informação dos processos assistenciais. Os objectivos e as linhas estratégicas básicas do Plano de Saúde constituem (Pais Vasco, 2002), por sua vez, um guia dinâmico para que os serviços se adequem progressivamente às necessidades, orientando a contratação em função dos critérios seguintes: 1. 2. 3. mais O Contrato-Programa pretende contemplar as novas regras de organização e funcionamento descentralizado dos serviços de saúde, pelo que adquirem (Pais Vasco, 2002) especial relevância os critérios de flexibilidade, autonomia e responsabilidade exigidos pelos profissionais de saúde e pelas unidades organizativas, para o desenvolvimento de uma convergência efectiva entre a cultura clínica e a cultura de gestão. Em última instância, pretende-se (Pais Vasco, 2002) alcançar uma gestão mais eficiente dos recursos e uma resposta assistencial de qualidade aos cidadãos. São previstos igualmente os critérios de afectação orçamental, referentes aos gastos com pessoal, com bens correntes e serviços, farmácia e facturação de serviços a terceiros. 1. serviços, sobre todos os segmentos desfavorecidos da população Eficiência na utilização dos recursos No contrato de gestão clínica (Servicio Vasco de Salud, 2007), é fixado o âmbito de actuação, mais concretamente, os centros de saúde que integram a Unidade, os profissionais que compõem a unidade, a população abrangida e a extensão do contrato. No que respeita à cobertura e oferta de serviços, prescreve-se que a Unidade deverá oferecer serviços enquadrados nas seguintes vertentes: Prioritizar as intervenções que possam contribuir em maior medida para a melhoria do estado de saúde Personalizar os serviços, melhorando os níveis de informação ao utente Promoção de políticas de qualidade total e, especialmente, de melhoria de acesso aos 31 1. 2. 3. 4. Serviços de cuidados primários no centro de saúde e ao domicílio Programas de educação para a saúde, promoção da saúde e cuidados comunitários acordados com a Comarca Outros programas assistenciais diferenciados Actividade docente e investigação O legislador entende a gestão clínica como um instrumento que permite descentralizar progressivamente as decisões sobre a gestão dos recursos utilizados na prática clínica e dotar as unidades assistenciais da capacidade e dos instrumentos para a planificação e gestão das suas actividades em benefício do doente, dentro de um quadro limitado de recursos. Pretende-se, em última análise, promover a sua autonomia e responsabilidade. Deverá (Servicio Vasco de Salud, 2007) também ser explicitará a oferta dos serviços básicos, dos serviços “seleccionados” (aspas nossas) e dos serviços complementares. A criação das unidades de gestão clínica realizar-se-á de forma progressiva, favorecendo os projectos-piloto que permitam gerar conhecimento local e facilitem a transição de uma organização fortemente hierarquizada como a actual para uma outra que conceda maior protagonismo aos profissionais e esteja mais centrada nas necessidades dos doentes, potenciando a prática assistencial, com base na melhor evidência científica, e a gestão, em que o custo das intervenções constitui um outro elemento na decisão clínica. Constituem ainda objecto do contrato de gestão clínica quatro dimensões adicionais, respeitantes à melhoria contínua da qualidade, designadamente (Servicio Vasco de Salud, 2007): 1. 2. 3. 4. Documentação clínica da qualidade – fundamental para a atribuição de incentivos. Estabelece-se que 80% das consultas deverão ser registadas na História Clínica Electrónica, devendo a Unidade comprometer-se ainda com o registo de todos os diagnósticos que motivaram as consultas ao longo de um ano, para possibilitar o cálculo no âmbito do sistema de classificação de doentes utilizado (ACGs) Sistema de gestão da qualidade Prescrição de qualidade – o índice de qualidade será composto pelo resultado obtido a partir dos 14 indicadores previstos Gestão eficaz da incapacidade temporal As unidades de gestão clínica serão as unidades orgânicas de um serviço hospitalar, de uma zona básica de saúde ou de qualquer outra instituição de saúde que, sem personalidade jurídica própria, reúnam um conjunto de recursos humanos e materiais determinados, se organizam com critérios de qualidade, autonomia, eficácia e eficiência, segundo um modelo de prática clínica integrado, com o objectivo de prestar cuidados de saúde, actividades de prevenção da doença e promoção da saúde, contribuindo para a necessária coordenação e continuidade assistencial em benefício do doente31 (Principado de Asturias, 2009). O modelo de gestão clínica inclui também (Servicio Vasco de Salud, 2007) os critérios e os indicadores respectivos para o reconhecimento da gestão da qualidade na ausência de certificação comum externa (Anexo 3) e também o sistema de incentivos, explicitado supra. As áreas de gestão clínica serão o conjunto de unidades orgânicas de carácter multidisciplinar que pratiquem a actividade nos mesmos moldes previstos para as unidades de gestão clínica. 9.3.2.5. P RINCIPADO DAS A STÚRIAS Entre as gerencias e a direcção de cada uma das áreas ou unidades de gestão clínica serão estabelecidos acordos de gestão clínica para que se assegure à população abrangida cuidados de saúde eficazes, efectivos e dirigidos às suas necessidades específicas, garantindo uma adequada acessibilidade aos serviços prestados, num quadro de gestão eficiente dos recursos públicos32 (Principado de Asturias, 2009). O Decreto 66/2009, de 14 de Julho, publicado em 23 de Julho de 2009, regula a estrutura e o funcionamento das áreas e unidades de gestão clínica do serviço de saúde do Principado das Astúrias. Este marco legislativo dá-se em resposta às propostas estratégicas emitidas pela Consegería de Salud y Servicios Sanitarios (Principado de Asturias, 2009), entre as quais se destaca a vontade de fomentar uma organização integrada entre os diferentes níveis assistenciais, promovendo um maior envolvimento dos profissionais na organização e gestão dos serviços de saúde e orientando a actividade para o processo assistencial, em benefício dos cidadãos. 31 Artigo 1º, nº 1, alínea a), do Decreto 66/2009, de 14 de Julho. 32 Artigo 5º, nº 1, do Decreto 66/2009, de 14 de Julho. 32 O mesmo diploma estabelece (Principado de Asturias, 2009) que o acordo de gestão clínica deverá contemplar33: 1. 2. 3. 4. 5. 6. Programa. Com efeito, houve necessidade (Aguirre, 2002) de discriminar positivamente as Gerencias que alcançavam um maior grau de cumprimento dos objectivos plasmados nos Contratos-Programa, reconhecendo esse maior esforço e traduzindo-o na entrega de recursos adicionais. Os objectivos assistenciais, de docência e investigação, assim como os referentes à promoção da saúde, prevenção da doença e protecção e educação para a saúde. Estes objectivos deverão estar enquadrados nas metas estabelecidas no correspondente ContratoPrograma estabelecido entre a Administração de Saúde e o Serviço de Saúde do Principado das Astúrias Os recursos humanos, materiais e tecnológicos afectos para o período de vigência do acordo O orçamento da unidade Os indicadores, recursos, critérios e metodologia de avaliação do acordo Os mecanismos de distribuição de incentivos As causas de resolução Segundo Aguirre (2002), na história dos cuidados primários, há sempre uma associação entre um Contrato-Programa e um sistema de incentivos, não havendo um sem o outro, para o que contribuíram em grande medida os sistemas de informação. Outro elemento básico na concepção dos sistemas de incentivos foi, de acordo com o mesmo autor, a comparabilidade entre Gerencias, conhecido como Sistemas de Torneo, em que são utilizadas ferramentas de ajustamento demográficas e de dispersão, com a correspondente tradução orçamental (Aguirre, 2002). Surgiu, assim, o conceito de “subfinanciamento/subvenção” (aspas nossas), classificação que resultava da aplicação homogénea dos critérios de afectação dos recursos a cada uma das Gerencias, com base na sua estrutura populacional e comparados com os padrões estabelecidos para o conjunto do INSALUD. Se o orçamento anual, considerado como despesa por habitante ajustado, era superior ao valor standard, essa quantia era tida como “subvenção” e, em caso contrário, “sub-financiamento” (Aguirre, 2002). É ainda determinado (Principado de Asturias, 2009) que, em função do nível de desenvolvimento da área ou da unidade de gestão clínica, se poderão estabelecer no acordo diferentes graus de autonomia34. A avaliação do cumprimento do acordo de gestão clínica será (Principado de Asturias, 2009) avaliada anualmente, sem prejuízo de prestação de informação sempre que solicitado pela autoridade de saúde35. 9.3.3. Em primeiro lugar, era comparada a cobertura alcançada com referência aos diferentes serviços, assim como o cumprimento da afectação orçamental. Mais tarde, em 1995, introduziu-se a satisfação dos utentes como outro elemento de competitividade entre Gerencias (Aguirre, 2002). I NCENTIVOS Os pagamentos aos funcionários de cuidados primários têm como base o Real Decreto-Lei 3/87, que configurou um sistema salarial baseado em retribuições básicas e complementares. Os créditos adicionais obtidos pela Gerencia eram aplicados no orçamento do ano seguinte (Aguirre, 2002). Mais tarde, os acordos sindicais de 1992 vieram introduzir um sistema de avaliação da gestão dos recursos e dos serviços de cada Equipo de Atención Primaria (EAP), ponderando-se de forma primordial os que estivessem relacionados com a prevenção da doença e a promoção da saúde, incluídos na carteira de serviços dos centros de saúde. Neste contexto, os profissionais deveriam estar envolvidos na organização e na gestão dos recursos dos EAPs (Aguirre, 2002). Por outro lado, nos primeiros anos de aplicação do sistema de incentivos, a Gerencia era (Aguirre, 2002) a unidade de avaliação, isto é, os profissionais e o EAP não recebiam quaisquer incentivos se não estivessem abrangidos por uma Gerencia cumpridora do ContratoPrograma, por melhores resultados que tivessem obtido no seu EAP. O denominado Sistema de Incentivación en Atención Primaria, ainda do extinto INSALUD, tem, assim, início com os referidos acordos sindicais e com os Contratos- Nos anos seguintes, foram sendo introduzidos (Aguirre, 2002) elementos de flexibilidade e, em 1997, deu-se uma alteração significativa, passando a unidade de avaliação a ser o EAP, de forma que, para receberem incentivos, os profissionais já não precisavam estar abrangidos por uma Gerencia cumpridora. Além de que 33 Artigo 5º, nº 2, do Decreto 66/2009, de 14 de Julho. 34 Artigo 5º, nº 3, do Decreto 66/2009, de 14 de Julho. 35 Artigo 5º, nº 4, do Decreto 66/2009, de 14 de Julho. 33 passa a existir uma taxa de penalização se o EAP pertence a uma Gerencia não cumpridora. Nos anos seguintes ocorreram novas alterações, estando o sistema de incentivos previsto em alguns Contratos de Gestão Clínica (Pais Vasco, 2007). Passaram, então, a existir dois níveis de incentivos, um reservado aos EAPs e Unidades de Apoio, outro para as Gerencias. Os primeiros eram contemplados nos contratos de gestão (Aguirre, 2002). 9.3.3.1. P AÍS B ASCO No contrato de gestão clínica para o ano 2007, do País Basco, está previsto o sistema de incentivos a estabelecer junto das Unidades de Atención Primaria. Passaram também a existir penalizações por incumprimento dos pactos financeiros. Mas, para receberem incentivos, bastava (Aguirre, 2002) que os EAPs alcançassem pelo menos os chamados “pactos de actividade específicos” (aspas do autor), ainda que inferiores aos recebidos por aqueles que cumpriam os restantes objectivos e pertenciam a Gerencias que participavam no Torneo. Estabelecem-se no capítulo 6 do referido contrato os requisitos para a participação num sistema de incentivos, nomeadamente, o cumprimento dos objectivos de pontuação global na oferta de serviços “seleccionados” (aspas nossas) plasmados no contrato de gestão clínica; um consumo não superior aos recursos afectos; uma documentação clínica que cumpra os requisitos de qualidade; e a existência de critérios consensuais na Unidade para a utilização e distribuição dos incentivos, explicitados no contrato de gestão clínica (Servicio Vasco de Salud, 2007). Em 1998, surgiu (Aguirre, 2002) o Sistema de Torneo Intergerencias, que fez desaparecer o conceito de “sub-financiamento/subvenção”, que comparava os resultados obtidos pelas Gerencias em cinco parâmetros: cumprimento de normas técnicas, satisfação, cobertura, gasto por habitante ajustado e taxa populacional de utilização de medicamento. Os incentivos podem ser de cinco tipos (Servicio Vasco de Salud, 2007): A monitorização do cumprimento do Contrato de Gestão estabelecido com cada EAP também se encontra prevista (Aguirre, 2002), sendo interessante conhecer a percentagem de EAPs que cumpriam o seu contrato (vd. Quadro 12). 1. 2. 3. Quadro 12: Percentagem de Equipos de Atención Primaria cumpridores do contrato Ano 1998 1999 2000 % EAP cumpridoras do pacto orçamental % EAP cumpridoras do pacto de cobertura de serviços % EAP cumpridoras das duas condições % EAP não cumpridoras de qualquer das duas condições 48 47 43 63 80 79 40 42 33 29 15 18 4. 5. Formação contínua Desenvolvimento de projectos de investigação Dotação de recursos: 3.1. Organizativos 3.2. Informáticos 3.3. Mobiliário 3.4. Equipas técnicas Organização flexível do trabalho – sempre que a jornada de trabalho anual complete as horas estabelecidas no acordo das condições de trabalho Reconhecimento público da boa gestão do centro de saúde e dos seus profissionais Os incentivos serão atribuídos à Unidade de Atención Primaria que cumpra os requisitos mencionados infra e em função dos seus resultados nos diferentes domínios vertidos no contrato de gestão clínica, a que são atribuídas determinadas percentagens (vd. Quadro 13). Adaptado de Aguirre, 2002. No ano 2000, são flexibilizados ainda mais os “requisitos imprescindíveis” (aspas do autor) e, como medida de promoção da qualidade da prescrição de medicamentos, é introduzido pelo extinto INSALUD um sistema de incentivos individualizado, dirigido aos médicos prescritores dos centros de saúde, para que se fomentasse a prescrição de medicamentos genéricos, o que constituiu alvo de controvérsia (Aguirre, 2002). No ano 2001, o sistema de incentivos deixou de estar previsto no Contrato de Gestão (Aguirre, 2002), estabelecendo-se um procedimento de incentivos nos cuidados primários, aprovado, pela primeira vez, por Organizações Sindicais. 34 Quadro 13: Percentagens de incentivos atribuídos à do risco, em ordem a aumentar o custo-eficiência dos contratos. Caso contrário, alertam os autores, o desempenho, no âmbito dos contratos, ficará comprometido e os custos operacionais sofrerão um aumento. Unidade de Atención Primaria 35% Oferta de serviços 65% Melhoria contínua da qualidade 20% Oferta “seleccionada” 10% Oferta de serviços complementares: 6% Serviços estratégicos 4% Acções de melhoria contínua 5% Compromissos associados 25% Sistema de gestão da qualidade (acreditação externa comum): 10% Limitado às áreas de atenção ao cliente 15% Nos serviços assistenciais 40% Farmácia – prescrição de qualidade Num estudo sobre os EAPs de Navarra, Goñi (1999), por outro lado, concluiu que as equipas eram uma forma organizacional muito útil na melhoria do desempenho dos cuidados de saúde primários, tendo por causas a elevada satisfação dos profissionais, a elevada qualidade dos cuidados recebidos pelos cidadãos e a, igualmente, elevada eficiência prosseguida pelo Governo. Adaptado de Servicio Vasco de Salud, 2007. Também no País Basco, foi conduzido um estudo de avaliação dos resultados clínicos e económicos de um modelo que conjugou os objectivos do plano de saúde com as condições contratuais plasmadas no ContratoPrograma e nos Contratos de Gestão Clínica (de actividade, qualidade, resultados e preços), aplicado aos centros de cuidados primários da Comarca Sanitaria Araba (Álava), nos anos 2000 e 2001. A principal conclusão foi a de que o fomento da cultura de gestão clínica permite alcançar melhores resultados clínicos e económicos (Elexpuru et al., 2002, cit. por España, 2005). Para a prescrição de qualidade, são ainda indicados 14 indicadores, com pesos relativos distintos, reunindo na sua globalidade os já referidos 40% do índice de prescrição (Servicio Vasco de Salud, 2007). 9.4. L ITERATURA CRÍTICA Um estudo (Andrés, 1995) realizado no início da implementação do novo modelo avaliou a aceitabilidade do Contrato-Programa entre os EAPs e o INSALUD, em Madrid. A investigação revelou que, de uma forma geral, o contrato era aceite pelos médicos, exceptuando os pediatras, sendo, no entanto, rejeitado pelos profissionais de enfermagem. Por outro lado, a Sociedad Española de Medicina General realizou, em Fevereiro de 2008, um estudo mediante a compilação dos dados das comunidades autónomas a partir de 33 indicadores agrupados em sete itens gerais, com o intuito de avaliar e encontrar um perfil da situação actual dos cuidados primários, concluindo pela possibilidade de existência de iniquidades no conjunto do serviço nacional de saúde (SEMG, 2008). Aguirre (2002) aponta, no entanto, que os ContratosPrograma trouxeram a transparência das obrigações e dos objectivos, incrementaram a autonomia dos profisisonais, facilitaram a descentralização da gestão e revelaram-se uma estratégia, pacificamente aceite, de participação e veículo relacional entre as actividades e os objectivos a alcançar. No início de 2009, também a Sociedad Española de Medicina General redigiu uma análise aos processos de auto-gestão nos cuidados primários em Espanha. Neste documento encontram-se identificadas determinadas componentes básicas comuns a todos os projectos de descentralização da gestão nos cuidados primários no país, designadamente (SEMG, 2009): Villegas (2001) refere, por outro lado, a importância dos incentivos, como recompensa do esforço individual sem prejuízo do resultado global do EAP, ainda que as condições para o seu acesso devam estar bem definidas. No fundo, o que se pretende alcançar é um grupo de profissionais satisfeitos pelo trabalho que desempenham. 1. Puig-Junoy e Ortún (2004) alegam, por sua vez, não ter encontrado, no sistema de saúde catalão, evidência de que os novos contratos firmados com os prestadores de cuidados contribuíram para melhorar a relação custo-eficiência. 2. A separação entre os financiadores e os prestadores deverá, segundo os autores, ser acompanhada de uma definição clara dos objectivos, objecto de negociação, e de níveis adequados de incentivos e de transferência 35 O enquadramento legal e normativo – que tem sido insuficiente e inadequado, deixando matérias em aberto, o que condiciou o êxito ou o fracasso dos projectos-piloto. Registaram-se, porém, esforços autónomos para a sua adequação aos objectivos fixados, sobre os quais não existe ainda informação conclusiva A gestão e a estrutura – definindo os actores, os seus papéis e as suas inter-relações, é uma componente fundamental 3. 4. 5. 6. 7. O financiamento – também determinante no fracasso ou no sucesso dos projectos, permanece da mesma forma, não havendo nem fórmulas adequadas à nova situação nem liberdade de decisão quanto a esta matéria Os recursos humanos – são o factor humano de todo o projecto, constituído em equipa. A autogestão leva estes profissionais a assumirem uma liderança partilhada na gestão dos serviços de saúde. Cada um dos membros da equipa constitui-se gestor das suas actividades e funções no sentido da prossecução dos objectivos da organização, contribuindo para aumentar o nível de saúde Um modelo de gestão clínica – um conceito que ainda não se encontra devidamente definido e dentro do qual cabem vários conceitos, que resultam numa nova forma de conceber os serviços de saúde, destacando-se a governância clínica, recebida com entusiasmo pelos profissionais de saúde para alcançar uma maior eficiência e eficácia na saúde pública. Dentro deste conceito, as três componentes principais são a qualidade, a melhoria contínua da qualidade e a utilização de standards para seguir uma política de saúde pré-estabelecida, submetida a uma avaliação. Destas, deve prioritizar-se a qualidade. O objectivo da gestão clínica é, assim, a prossecução de um maior compromisso profissional no processo decisório, não apenas clínico, mas também quanto à distribuição de recursos, ou seja, o médico assume, de forma partilhada, os riscos População – é sempre o objectivo de todas as actividades, segundo os pilares fundamentais da integridade, assistência contínua e qualidade máxima sustentável pelo sistema Vertente política – é necessário ajustar o nível de eficiência e, assim, as necessidades de financiamento. O médico não será apenas responsável pelos cuidados ao doente, mas também pela eficiência na utilização dos recursos limitados, precisando encontrar o equilíbrio entre, por um lado, o custo (os recursos disponíveis) e, por outro lado, a qualidade do serviço de saúde 36 prestador de uma segurança social claramente definida, de elevada qualidade e seguidora de padrões de razoabilidade. As suas políticas estratégicas e os princípios operacionais têm por base as expectativas e as necessidades dos cidadãos. Os serviços prestados são por isso cada vez mais desenvolvidos e avaliados em torno do ponto de vista do utente, através dos chamados customer panels (Kela, 2008). F IN LÂN DIA Quadro 14: Quadro-síntese Finlândia Sistema de saúde % PIB gasta em saúde Esperança de vida ao nascimento (anos) Esperança de vida saudável (HALE) ao nascimento (anos) Taxa de mortalidade neonatal (por 1.000 nados vivos) Organização da prestação de CSP Unidades de CSP Projectos com delegação de responsabilidades na gestão da prestação e dos recursos em CSP Mecanismos de contratualização de CSP Incentivos e apoios ao processo de contratualização de CSP 10. C ARACTERIZAÇÃO Sistema de segurança social National Health Insurance (NHI), operacionalizado pela Kela. Sistema de seguro nacional compulsório, financiado com base em impostos (1964) 7,6% Os cuidados de saúde são prestados essencialmente pelo sector público, tal como nos restantes países nórdicos, sendo oferecido um leque variável de serviços aos cidadãos, complementados pelos serviços do sector privado, de carácter essencialmente ambulatório e disponíveis principalmente nas grandes cidades. Os prestadores privados caracterizam-se tipicamente por se estabelecerem em centros de saúde, unidades de saúde ocupacional ou serviços de fisioterapia, empregando geralmente poucos profissionais (ISSA, 2007). 79 72 2 Municípios Centros de cuidados primários (desde a década de 70) - A prestação de serviços no sistema de saúde finlandês funciona através de cuidados de saúde municipalizados. Os municípios, que são actualmente 348, encontram-se legalmente constrangidos a organizar serviços de saúde adequados para os seus residentes36 (Valkonen, 2009). - DO SISTEMA DE SAÚDE Para a prestação de cuidados especializados, a Finlândia encontra-se dividida em 21 distritos hospitalares, operacionalizados por federações de municípios, sendo a participação numa federação compulsória para todos os municípios (ISSA, 2007). Os serviços de saúde finlandeses têm por base um sistema de seguro nacional (National Health Insurance – NHI), um programa de cobertura universal compulsória introduzido em 1964, operacionalizado pela Social Insurance Institution of Finland, que, por sua vez, é supervisionada pelo Parlamento Finlandês. Este sistema presta reembolsos pelas despesas dos serviços de saúde, paralelamente a outros “fundos de doença” ou planos de seguros privados voluntários, ainda que estes funcionem em menor escala (ISSA, 2007). A eligibilidade para os benefícios concedidos pela segurança social tem por base a residência na Finlândia (Kela, 2009). Existem ainda outros sistemas paralelos, como a saúde ocupacional, que existe na sequência do Occupational Health Care Act 1979. Este sistema é de subscrição obrigatória pelas entidades patronais e abrange 84% de todos os empregados (mas não as suas famílias) (Valkonen, 2009). Outro sistema paralelo é o do município que pode determinar o seu próprio âmbito de serviços quando exceda o limiar de cobertura mínima nacional. Abrange os cuidados preventivos, a saúde escolar, o planeamento familiar, a saúde oral, a reabilitação ou os cuidados de curta e longa duração em regime de internamento (Valkonen, 2009). Os benefícios em saúde concedidos aos cidadãos finlandeses encontram-se, assim, organizados através de um sistema de segurança social, o já referido Social Insurance Institution of Finland, também conhecido por Kela. A missão da Kela, que sofreu uma reforma administrativa em 1 de Janeiro de 2009, é acompanhar o cidadão ao longo de toda a sua vida, assegurando os seus rendimentos, promovendo a saúde e apoiando a capacidade de auto-cuidados, tendo por base os valores do respeito pelo indivíduo, da especialização, da cooperação e da renovação. A Kela pretende ser uma activa promotora do desenvolvimento e da implementação da segurança social, um actor de confiança, eficiente e socialmente responsável e O sistema de saúde é financiado com base em taxas de 16% a 24% sobre os rendimentos, cobradas pelos municípios. O orçamento da saúde é fixado pelo 36 A população de um município é inferior a 6.000 habitantes (Valkonen, 2009). 37 município, que também fixa anualmente as taxas de imposto. Os subsídios concedidos pelo estado aos municípios são determinados de acordo com critérios de riqueza (Valkonen, 2009). 11. O RGANIZAÇÃO DA PRESTAÇÃO DE CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOS A responsabilidade pela prestação de cuidados de saúde primários cabe aos municípios (ISSA, 2007). Os serviços são prestados em centros de saúde, sob a alçada do município ou de um conjunto de municípios que tenham constituído uma federação (Valkonen, 2009). Existem dois sistemas para a prestação de cuidados de saúde que são financiados publicamente: os centros de saúde e os hospitais públicos, que se encontram sob gestão pública e são financiados com base em impostos; e os cuidados de saúde do sector privado, reembolsados e financiados publicamente a partir do NHI (ISSA, 2007). Os municípios têm autoridade para a cobrança de impostos para o financiamento dos serviços de saúde, recebendo ainda subsídios estatais que permitam a prestação de cuidados a que estão obrigados. Os processos decisórios cabem ao concelho municipal, eleito pela população local (ISSA, 2007). A finalidade do NHI é conferir aos cidadãos segurados a possibilidade de escolha por serviços de saúde prestados pelo sector público ou pelo sector privado, independentemente do local de residência ou nível de rendimentos. O NHI reembolsa despesas com medicamentos, custos com médicos e dentistas, exames e tratamentos e despesas de viagens (ISSA, 2007). As taxas de reembolso são de 42%, 72% ou 100% (contra o pagamento de uma taxa de €3) do preço dos serviços de saúde, consoante os casos (Kela, 2009). Actualmente, existem cerca de 16.000 médicos que exercem activamente a profissão no sistema de saúde finlandês, estando 21,8% nos centros de saúde e 11,1% em consultórios privados (Valkonen, 2009). Os centros de cuidados primários, construídos na década de 70, são geridos localmente pelos 470 municípios e apresentam um leque alargado de serviços, como medicina geral, maternidade e pediatria, saúde oral, saúde escolar e cuidados de longo termo em regime de internamento (Valkonen, 2009). O sistema de financiamento do NHI sofreu uma reforma a partir de 1 de Janeiro de 2006, que teve como objectivos principais a criação de uma base sólida para o financiamento do NHI, alcançar um equilíbrio entre as receitas e as despesas, reforçar os princípios do financiamento do sistema finlandês e refrear o crescimento das despesas. Pretendia-se também corrigir as fragilidades que se foram detectando e aumentar a transparência e a predictabilidade do sistema. Foi também dada atenção à importância do compromisso dos contribuintes na contenção de custos, com vista a alcançar o equilíbrio do sistema de financiamento (ISSA, 2007). De uma forma geral, a satisfação actual com os cuidados primários é de cerca de 44% nas grandes cidades e até 85% nas áreas mais pobres (Espoo Survey, 2008, cit. por Valkonen, 2009). A insatisfação prende-se, principalmente, de acordo com o mesmo autor, com as vias de comunicação e com os tempos de espera. 12. O A reforma dividiu o financiamento do sistema de saúde em duas partes: um seguro com base nos rendimentos, financiado pelas entidades patronais, trabalhadores por conta de outrem e por conta própria e o estado, e um seguro de saúde, pago pelos trabalhadores por conta de outrem, por conta própria, pensionistas37 e pelo estado. Os segurados e as entidades patronais financiam cerca de 70% do total das despesas, enquanto o estado cobre a parte restante (ISSA, 2007). PROCESSO DE CONTRATUALIZAÇÃO O pagamento dos médicos nos centros de saúde municipais varia significativamente, uma vez que resulta da combinação de um salário base, um pagamento por capitação, um pagamento fee-forservice e subsídios locais. Este sistema de pagamento tem como finalidade prestar aos médicos incentivos para que desenvolvam um serviço custo-eficiente. No sector privado, os médicos são pagos no âmbito do sistema fee-for-service, sendo os doentes parcialmente reembolsados pelo NHI (Järvelin, 2002). Uma das principais preocupações actuais consiste em assegurar o financiamento e a disponibilidade de cuidados de saúde primários, situação particularmente relevante nos pequenos municípios, com recursos 37 Os pensionistas encontram-se dispensados de contribuir para o regime do seguro com base nos rendimentos (ISSA, 2007). 38 limitados para a obtenção de serviços adequados (ISSA, 2007). Por outro lado, o compromisso em reduzir os tempos de espera estabelecido em 2005 depende da obtenção por parte dos municípios de serviços do sector privado de nível primário e especializado, o que implica despesas que os municípios poderão não conseguir comportar. Uma das medidas a tomar poderá ser a fusão de pequenos municípios de forma a tornarem-se economicamente mais fortes. Outra das soluções preconizadas (ISSA, 2007) é a criação de um modelo em que os cuidados primários são financiados através de um novo programa nacional de seguro de saúde, libertando os municípios de prestar os serviços de saúde, tendo estes somente que adquirir a cobertura do seguro de saúde para os seus residentes a partir de um prestador do novo sistema que, por sua vez, adquiriria os serviços a partir de prestadores do sector público e privado. No fundo, trata-se de um modelo com base na separação entre o financiamento e a prestação de cuidados de saúde, que partiria de um processo de negociação e contratualização e que, segundo o mesmo autor, eliminaria disparidades na responsabilidade do financiamento entre grandes e pequenos municípios, garantindo a todos os cidadãos a igualdade no acesso a cuidados de saúde. Até ao momento, porém, não se conhecem desenvolvimentos deste modelo (ISSA, 2007). 39 2. R EIN O U N IDO 3. Quadro 15: Quadro-síntese Reino Unido Sistema de saúde % PIB gasta em saúde Esperança de vida ao nascimento (anos) Esperança de vida saudável (HALE) ao nascimento (anos) Taxa de mortalidade neonatal (por 1.000 nados vivos) Organização da prestação de CSP Unidades de CSP Projectos com delegação de responsabilidades na gestão da prestação e dos recursos em CSP Mecanismos de contratualização de CSP Incentivos e apoios ao processo de contratualização de CSP 4. SNS (1948) 8,4% 5. 6. 80 72 7. 3 8. Primary Care Trusts 9. General Medical Services Primary Care-led Commissioning (1990-2004): General Practice Fundholding (1990-1997) / Total Purchasing Pilots (1994-1998) / Locality/GP Commissioning Pilots (1998-2000) / Primary Care Groups (1999-2002); Abordagem Practicebased Commissioning (2004) Adequação dos serviços às necessidades e preferências dos doentes e suas famílias Resposta às diferentes necessidades de diferentes populações Melhoria contínua da qualidade dos serviços e minimização dos erros Valorização dos recursos humanos Utilização dos fundos públicos para os cuidados de saúde unicamente em doentes do nhs Criação de parcerias de forma a assegurar um serviço indiscriminado a todos os doentes Promoção da saúde e redução das iniquidades em saúde, Confidencialidade dos doentes e acesso livre a informação sobre os serviços, tratamento e desempenho das organizações de saúde O NHS é principal objectivo primários momento General Medical Services Contract Business Cases / Practice-based Commissioning Development Framework / World Class Commissioning / Knowledge Based Commissioning Programme / Primary Care Management Development Programme / Leadership for Clinical Service Improvement / Framework for Procuring External Support for Commissioners / PCT Board Development Framework financiado por fundos públicos, com origem nos impostos (NHS, 2009), tendo por prestar a maioria dos cuidados de saúde, e secundários, de forma gratuita, no da utilização (EOHSP, 1999). Criadas em 2002 e reformuladas em 2006, existem 10 Strategic Health Authorities (SHAs), que, em nome do Governo, gerem o NHS a nível local, incluindo funções de monitorização (NHS, 2009). Na Escócia, Gales e Irlanda do Norte, os serviços locais do NHS são geridos separadamente. 14. O RGANIZAÇÃO DA PRESTAÇÃO DE CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOS 13. C ARACTERIZAÇÃO DO SISTEMA DE SAÚDE Os cuidados primários, considerados um serviço frontline, abrangem uma rede de médicos de clínica geral (General Practitioners), médicos dentistas, O Reino Unido apresenta um sistema de saúde que assenta no National Health Service (NHS), considerado a maior organização de prestação de cuidados de saúde da Europa. Muito recentemente, em 21 de Janeiro de 2009, foi publicada a Constituição do NHS, onde se encontram estabelecidos os princípios e valores que o sustentam (UK, 2009d). médicos oftalmologistas, optometristas, farmacêuticos, NHS Walk-in Centres (WiCs)38 e o serviço telefónico NHS Direct (vd. Figura 3). O NHS, implementado em 5 de Julho de 1948, com o, então, Ministro da Saúde Aneurin Bevan, partiu de três princípios fundamentais: a satisfação das necessidades da população em geral, a prestação livre de cuidados de saúde e a relevância da necessidade de cuidados clínicos e não da capacidade para pagar (NHS, 2009). Em 2000, foram introduzidos novos princípios orientadores do NHS, designadamente, o compromisso na: 1. Prestação de diversificados cuidados compreensivos 38 Os WiCs existem desde 2000 e destinam-se ao tratamento imediato de lesões e doenças menos graves. Existem, actualmente, cerca de 90 WiCs em Inglaterra. 40 Figura 3: Organização dos secundários no Reino Unido cuidados primários e competição entre os fortes monopólios de prestadores de cuidados de saúde existentes (Smith et al., 2004). Os termos purchasing, commissioning e contracting surgem nesta época de mudança. O purchaser era aquele que actuava no lugar do doente menos informado, competindo-lhe ainda assegurar que as metas nacionais de saúde definidas eram alcançadas. O purchasing era, porém, reconhecido em oposição ao tradicional acto de pagar indiscriminadamente serviços oferecidos pelos prestadores, que passaram a ter de os especificar previamente, tendo por base critérios de qualidade e value-for-money, sendo apenas solicitados a prestar cuidados de saúde aqueles que cumprissem os requisitos exigidos (Smith et al., 2004). Na década de 90, surge o termo commissioning que correspondia a uma actividade alegadamente mais sofisticada e estratégica do que o purchasing, por incluir a avaliação das necessidades em saúde da população, a compra de serviços que vão de encontro a essas necessidades e um leque de esforços estratégicos para a promoção da saúde (Ovretveit, 1995, cit. por Smith et al., 2004). Fonte: NHS, 2009. Os cuidados primários são assegurados, em Inglaterra, pelos cerca de 150 Primary Care Trusts (PCTs), que controlam cerca de 80% do orçamento do NHS (NHS, 2009), correspondendo a um investimento de cerca de 8 milhares de milhões de libras nos serviços de medicina familiar todos os anos, 9% do orçamento do NHS (UK, 2009f). Tratando-se de organizações a nível local, encontram-se melhor posicionadas para entender as diferentes necessidades da população. Os PCTs abrangem cerca de 29 000 GPs e 18 000 médicos dentistas do NHS (NHS, 2009). Da separação das funções de financiamento e prestação resultaram dois modelos para a aquisição (purchasing) dos serviços de saúde. Um destinado aos cuidados hospitalares e outro desenvolvido para os cuidados na comunidade. O segundo modelo tinha por base a medicina familiar, sendo orientado para os doentes, e visava encontrar uma forma de melhorar os serviços através da atribuição de um orçamento a General Practitioners (GPs), que actuavam em práticas individuais. Surgia, então, o General Practitioner Fundholding (GPFH) (Smith et al., 2004). No NHS, todos os doentes devem estar registados num GP e, exceptuando as situações de emergência, nenhum paciente tem acesso a especialistas de cuidados secundários sem uma referenciação do seu GP (Mannion, 2008). Os médicos de clínica geral assumem a função de gatekeepers do sistema de saúde, estando 99% da população registada junto de um médico de família (UK, 2009f). 15.1.1. G ENERAL P RACTITIONER F UNDHOLDING (19901997) O General Practitioner Fundholding (GPFH) permitia que os GPs se voluntariassem39 à atribuição pela respectiva Health Authority de um orçamento anual para a compra (purchase) de um pacote de serviços para os seus doentes40 (Mannion, 2008). Estes orçamentos eram limitados e davam cobertura a algumas cirurgias, exames de diagnóstico e investigação, referenciação de doentes em ambulatório, cuidados de saúde à comunidade e No início da década de 90, o Governo Conservador britânico introduziu, através do NHS and Community Care Act 1990, algumas mudanças consideradas como parte de grandes reformas estruturais, tendo em vista a criação de um quasi-market em torno da separação universal e compulsória entre as funções de financiador (purchaser) e prestador (Mannion, 2008). Esta cisão tinha como objectivo nuclear a introdução de 39 Para as práticas que se mantiveram fora do esquema do General Practitioner Fundholding, as despesas com os seus doentes continuaram a ser cobertas pela sua Health Authority (Mannion, 2008). 40 No início, limitava-se a practices com uma população superior a 11.000, mas reduziu-se para 5.000 (Mays, 1999, cit. por Lewis, 2004). 15. O 15.1. PROCESSO DE CONTRATUALIZAÇÃO A NTECEDENTES 41 prescrição de medicamentos (Mays, 1999, cit. por Lewis, 2004). Os GPs eram, assim, responsáveis pela compra directa de serviços aos prestadores (Mays, 1999, cit. por Lewis, 2004). ainda que tenham surgido diversos estudos sobre o seu impacto. Só as avaliações mais tardias conferiram, no entanto, alguma confiança no sistema, sendo certo que algumas foram apenas publicadas depois de ter sido finalizado (Lewis, 2004). O programa registou, até ao ano de 1997/1998 e ao longo de sete fases, a participação voluntária como fundholder de cerca de metade das práticas (Mannion, 2008). No que respeita a este período de contratualização, Mackintosh (1993) apontou algumas críticas, entre as quais o facto de as linhas de orientação do UK Department of Health serem lacónicas e contraditórias quanto ao papel das partes no processo de contratualização, dando lugar à experimentação e à iniciativa local. O autor refere, também, a existência de um conflito de objectivos entre a necessidade de um maior controlo central de custos e a melhoria dos cuidados de saúde prestados e entre estes e a lógica da contratualização, tendo a “linguagem” deste modelo, com os seus diversos níveis de significado, servido, de certa forma, para ocultar estes conflitos. Ao longo da década de 90, alguns GP fundholders uniram-se, ainda, em redes conhecidas como multifunds ou fundholding consortia, enquanto alguns GPs que não aderiram ao novo esquema começaram, porém, a trabalhar em conjunto em GP commissioning groups (Smith, 2004). Os serviços de cuidados de saúde mantinham, neste sistema, a característica de gratuitidade no momento da sua utilização e as decisões sobre a afectação de recursos continuavam a ter por base fórmulas de capitação de forma a promover a equidade geográfica. O financiamento tinha por base um orçamento fixo determinado com base numa fórmula de capitação ajustada pelas necessidades (Mannion, 2008). Não obstante a falta de consistência da evidência existente sobre o assunto, Lewis (2004) conclui que os fundholders conseguiram prestar tratamentos mais rápidos aos seus doentes, procuraram reduzir o nível de referenciações e prescreveram medicamentos mais baratos. Este sistema era, no entanto, aparentemente dispendioso e não equitativo. No período compreendido entre 1990-1997, as relações entre financiadores e prestadores de cuidados eram definidas mediante a celebração de contratos. No entanto, ainda que de forma limitada, as partes eram livres de determinar a forma precisa desses contratos, podendo observar-se as escolhas que se faziam no estudo bibliográfico de Chalkley e McVicar (2008). 15.1.2. T OTAL P URCHASING P ILOTS (1994-1998) Alguns grupos de fundholders obtiveram sucesso na tentativa pioneira de assumirem a responsabilidade por um orçamento destinado à compra de um conjunto de serviços hospitalares e de serviços na comunidade (Mays et al., 1997). Os GPs comprometiam-se, entre outras obrigações, a produzir relatórios anuais, respeitar orçamentos indicativos na prescrição de medicamentos e cumprir objectivos respeitantes a diversos serviços de prevenção da doença e de promoção da saúde (Chalkley e McVicar, 2008). Na procura de potenciar o sucesso alcançado por estas iniciativas locais de pequena escala e dada a percepção crescente das limitações do modelo General Practitioner Fundholding, o Governo lançou um apelo nacional aos fundholders para se voluntariarem à compra (purchase) do completo leque de serviços de saúde hospitalares e na comunidade para os seus doentes (Mannion, 2008). Também os modelos de pagamento se alteraram no sentido de contemplarem incentivos para a melhoria do desempenho e para permitirem uma resposta mais próxima das necessidades dos doentes. Com efeito, as práticas no âmbito do esquema do General Practitioner Fundholding foram incentivadas à eficiência, uma vez que os recursos “poupados” do seu orçamento poderiam ser retidos para aplicação em serviços adicionais destinados aos doentes ou em acções de melhoria das instalações (Mannion, 2008). No Outono de 1994, o Department of Health (DH) determinou um NHS orientado para os cuidados de saúde primários (practice-led NHS), tendo alargado o modelo do General Practitioner Fundholding para o sistema de experiências piloto que adquiriam a totalidade da linha de cuidados (Smith et al., 2004), estabelecendo formalmente os chamados Total Purchasing Pilots (TPPs) (Mannion, 2008). A opinião pública divergiu muito quanto ao efeito do General Practitioner Fundholding sobre o NHS. A implementação deste sistema não foi, porém, acompanhada por uma avaliação nacional sistemática, O TPP foi desenvolvido de acordo com o princípio de que os GPs poderiam continuar a ser inovadores, no 42 da linha do General Practitioner Fundholding no seu formato original, mas teriam que seguimento cobertura a populações maiores, tendo as primeiras em ambos os casos obtido melhores resultados no primeiro ano de actividade no âmbito deste sistema (Lewis, 2004). apresentar uma maior capacidade de resposta às necessidades dos doentes, face à da sua respectiva Health Authority (Mannion, 2008).41 Baxter et al. (2000), cit. por Lewis (2004), evidenciam ainda diferenças de desempenho entre as unidades de menor e maior dimensão, atribuindo-as fundamentalmente às diferentes dinâmicas relacionais entre os GPs, dado que, nas últimas, ao conferenciarem menos com os colegas ou com as autoridades de saúde, tendem a referenciar mais para cuidados raros e dispendiosos. Nas práticas individuais, acrescentam os autores, existia também uma maior probabilidade de integração dos papéis clínicos e financeiros. Este sistema contemplou duas fases. Num primeiro momento, incluía 53 pilotos, 64% deles envolvendo grupos de práticas que trabalhavam em colaboração (Lewis, 2004). A população dos TPPs podia abranger entre 8.100 a 84.700 habitantes (Wyke et al., 2003, cit. por Lewis, 2004). Ao contrário do General Practitioner Fundholding, a experiência TP foi sujeita a uma avaliação nacional extensiva (Lewis, 2004), tendo tido um «impacto modestamente relativo», segundo Wyke et al. (2003), cit. por Lewis, 2004. 15.1.3. L OCALITY /GP C OMMISSIONING P ILOTS (19982000) Os TPPs foram definidos como contratualizadores compreensivos de serviços e, assim, actuavam como compradores selectivos que focalizavam a sua actuação em áreas específicas dos cuidados de saúde. A responsabilização (accountability) não era atribuída às autoridades de saúde nem aos doentes (porque os GPs assumiam já a sua função de agência) (Lewis, 2004). A eleição para o Governo do Partido Trabalhista de Tony Blair, em 1997, conduziu ao fim do modelo General Practitioner Fundholding (Mannion, 2008), tendo permanecido, porém, a ideia de um NHS orientado para os cuidados primários (EOHSP, 1999). O novo Governo eleito emitiu o documento White Paper: The New NHS – Modern, Dependable, que veio definir a substituição de um mercado interno por um sistema designado por “cuidados integrados”, baseado em acordos e parcerias e conduzido pelo desempenho. Por seu turno, serve de base a um programa de dez anos destinado a renovar e melhorar o NHS, assente numa mudança evolutiva orientada pelos ensinamentos do passado, a qual adopta aquilo que resultou e declina o que não promoveu melhorias. As necessidades dos pacientes será determinante para o novo sistema, assim como a manutenção da separação entre financiador e prestador e, de uma forma geral, a responsabilidade das autoridades de saúde para a contratualização de serviços de saúde (UK, 1997). Havia, porém, dificuldades e atrasos na fixação de orçamentos, o que prejudicou a capacidade das total purchasing practices na negociação de mudanças. A falta de orçamentos reais também impossibilitou a atribuição de incentivos pessoais directos aos GPs para a gestão efectiva de recursos (Lewis, 2004). Esta experiência revelou, não obstante, um notável trabalho em equipa dos GPs das total purchasing practices, no sentido do exercício de um maior controlo da procura, através da discussão de casos individuais e, ainda, pela consensualização de protocolos de práticas clínicas (Lewis, 2004). Baxter et al. (2000), cit. por Lewis, 2004, destacaram ainda algumas inovações dos TPPs, como a monitorização da actividade dos especialistas e a aplicação de penalizações para um desempenho diferente do acordado. Ao mesmo tempo que foram criados os TPPs no início da década de 90, vários grupos de práticas começaram a colaborar com o objectivo de exercer uma influência colectiva sobre a contratualização de cuidados no âmbito de áreas populacionais definidas (NHS Executive, 1997, cit. por Lewis, 2004; Mannion, 2008). Tinham como objectivo tornar as Health Authorities mais sensíveis às necessidades locais e à visão do doente através da mediação dos GPs locais actuando em grupo (Regen, Smith e Shapiro, 1999, cit. por Mannion, 2008). De acordo com avaliações levadas a efeito pelas próprias unidades de saúde, foram assinaladas diferenças entre, por um lado, práticas individuais e práticas colectivas e, por outro lado, entre aquelas que abrangiam populações menores e aquelas que davam 41 Ainda que oficialmente rotulados como Total Purchasers pelo governo, na prática não houve nenhum documento ou orientação central oficiais sobre a forma como deveriam operar. O valor e âmbito da responsabilidade orçamental foi negociada localmente entre cada piloto e a respectiva Health Authority (Mannion, 2008). O novo Governo eleito formalizou esta abordagem em Abril de 1998, através do estabelecimento de 40 GP commissioning pilots (Lewis, 2004; Mannion, 2008), 43 que tinham como intenção reduzir as iniquidades associadas ao fundholding original (Mannion, 2008), revogado com base nesse motivo e nos custos operacionais excessivos (EOHSP, 1999). Estes novos grupos pretendiam fundar-se nas melhores práticas e alcançar uma maior justeza (fairness), o objectivo central da política de então (Lewis, 2004). Refira-se que os PCGs foram, desde o início, intencionalmente, entidades transitórias até à formação dos PCTs, entidades estatutárias que combinariam a gestão dos serviços locais e comunitários com um muito mais alargado papel em commissioning de serviços de saúde para a população local. (Smith, 2004). Os 40 pilotos incorporavam tanto fundholders como não fundholders, variando muito de dimensão (desde 38.000 a 564.000 habitantes) e de responsabilidades na contratualização. Alguns contratualizavam todos os cuidados com responsabilidades orçamentais, outros tinham orçamentos indicativos ou apenas assumiam um papel de aconselhamento perante os commissioners das autoridades de saúde (Regen et al., 1999, cit. por Lewis, 2004). 15.1.5. P RIMARY C ARE T R USTS (2002) Em 2001, o Department of Health anuncia através da publicação do documento Shifting the Balance of Power a abolição de todas as 100 Health Auhtorities em Inglaterra, a criação de 28 novas Strategic Health Authorities (SHAs) e a mudança de todos os PCGs para o estatuto de Primary Care Trust (PCT) até Abril de 2002 (Smith et al., 2004), o que veio a ocorrer na data prevista (Mannion, 2008). Estes pilotos deveriam ter a duração de dois anos, mas decorrido um ano percebeu-se que o NHS iniciava um processo de mudança e que os commissioning pilots se converteriam em Primary Care Groups (Lewis, 2004). A curta duração dos pilotos não permitiu, segundo Lewis (2004), uma avaliação clara do seu impacto, mas as estruturas e as abordagens colectivas (como a revisão dos pares) pareciam começar a mostrar desenvolvimentos, o que poderá ter contribuído para os benefícios que as experiências apresentaram. Quando as Health Auhtorities foram abolidas em 2003, os PCTs tornaram-se a principal organização promotora da saúde pública, da contratualização (commissioning) e do desenvolvimento dos cuidados primários no NHS de Inglaterra (Smith et al., 2004; Mannion, 2008). Os PCTs têm a responsabilidade pelos cuidados de saúde numa área geográfica definida, com populações de cerca de 150.000 habitantes, coincidentes com a base populacional das práticas de GP que os compõem (tipicamente, de cerca de 20 a 25 práticas) (Mannion, 2008). 15.1.4. P RIMARY C ARE G ROUPS (1999-2002) A partir de Abril de 1998, não foram permitidos novos fundholders, tendo o General Practitioner Fundholding sido abolido em 1 de Abril de 1999 e substituído por organizações chamadas Primary Care Groups (PCGs)42, inicialmente introduzidos como sub-comités da respectiva Health Authority local (Mannion, 2008). Têm sido, no entanto, alegados insucessos em 3 áreas, designadamente, i) na consecução das mudanças desejadas na organização e prestação de cuidados secundários; ii) no insuficiente envolvimento dos clínicos de cuidados primários no trabalho do respectivo PCT e na pouca influência sobre decisões de contratualização (commissioning); iii) e na indução inapropriada de procura “induzida pelo fornecedor” de cuidados secundários, através do desenvolvimento de melhores níveis de gestão da procura e da garantia de alternativas aos cuidados hospitalares dentro do NHS por meio de financiamento adicional e de novos incentivos financeiros (Mannion, 2008). A aquisição (purchasing) de serviços de saúde na comunidade foi entregue aos 481 novos primary care groups (PCGs), que substituíram todos os anteriores esquemas de fundholding e practice-led commissioning (PLC)43 (Smith et al., 2004). Em 2000, o Department of Health determinou no documento The NHS plan que todos os PCGs deveriam passar a Primary Care Trusts (PCTs) até Abril de 2004 (Smith et al., 2004). Para responder a estas preocupações, o Governo de Blair lançou em 2004 algumas propostas para incentivar uma abordagem para a contratualização (commissioning) que tivesse por base a prática (Practice-based Commissioning - PBC) e, desde Abril de 2005, os GPs em Inglaterra passaram a dispor de um orçamento para a contratualização (commissioning), de carácter indicativo e destinado à gestão da prestação de serviços aos doentes (Mannion, 2008). 42 Inicialmente, os PCGs foram introduzidos como sub-comités da respectiva Health Authority local (Mannion, 2008). 43 Todos os GPs e profissionais dos cuidados primários são membros, de modo compulsório, de um PCG. As 3 funções centrais dos PCGs encontram-se definidas num documento do NHS Executive, de 1998. (Smith, 2004). 44 15.1.6. A ABORDAGEM C OMMISSIONING P RIMARY C ARE - LED seleccionados e utilizados pelas entidades contratualizadoras, tendo sido identificadas nas várias regiões do Reino Unido no período 1990-2004 sete diferentes variantes. O termo commissioning correspondia, nos finais da década de 90, como já foi referido, à avaliação das necessidades em saúde da população, à compra de serviços correspondentes a essas necessidades e a um conjunto de estratégias para a promoção da saúde (Ovretveit, 1995, cit. por Smith et al., 2004). O modelo primary care-led commissioning deve ser visto, por isso, não isoladamente mas como podendo fazer parte de um continuum de modelos a seleccionar em função da sua adequação às necessidades locais de saúde e à configuração dos serviços Smith (2004) (vd. Figura 4). A expressão primary care-led commissioning apareceu pouco depois e pode definir-se, segundo Smith (2004), como «contratualização conduzida por médicos de «As each health system contemplates its next stage of approaches is made in a robust and critical manner, and how that choice is then assessed using core indicators of performance that enable careful monitoring of health outcomes and user satisfaction» (Smith et al., 2004) cuidados primários, em particular por médicos de clínica geral, que usam os seus conhecimentos acumulados quanto às necessidades dos seus doentes e quanto ao desempenho dos serviços, aliados à sua experiência como agentes dos seus pacientes e no controlo de recursos, para ir ao encontro da avaliação das necessidades em saúde, da especificação de serviços e do estabelecimento de standards de qualidade como etapas do processo de contratualização, com vista à melhoria da qualidade e eficiência dos serviços de saúde utilizados pelos seus doentes»44. Figura 4: O continuum dos níveis de contratualização no Reino Unido Nesta definição, o primary careled commissioning envolve necessariamente a capacitação para o processo decisório quanto à utilização de recursos, atribuído a práticas individuais ou colectivas, assim como a correspondente prestação de contas (accountability) pelo uso desses recursos45 (Smith et al., 2004). Fonte: Smith et al., 2004. O conceito reflecte, segundo Smith (2004), o aparecimento de diferentes abordagens para o purchasing e commissioning de serviços de saúde que envolviam os médicos de família na liderança e nos processos decisórios. Este modelo teve, no fundo, origem no General Practitioner Fundholding e, não sendo uma abordagem isolada, corresponde, segundo o autor, a um continuum de modelos a serem Smith (2004) descreveu e avaliou os diferentes modelos de commissioning identificados no NHS, com base na sua capacidade para: 1. 2. 3. 4. 44 Tradução nossa. 45 O primary care-led commissioning distingue-se, por isso, de esquemas de incentivos na forma de orçamentos e/ou de metas e pagamentos pelo desempenho para encorajar a prestação de determinados serviços nos cuidados primários e em ambulatório. Ainda que frequentemente referidos como PLC (como em Bradford North), estas modalidades de incentivos constituem na realidade esquemas de gestão orçamental ou de reembolso com base no desempenho. Para além disso, a aplicação dos recursos determinada por uma outra entidade não configura uma forma de PLC (Smith et al., 2004). 5. 6. 7. 45 Enquadrar diferentes tipos de serviços, cada um apresentando níveis diferentes de complexidade e de espaço para contestabilidade Oferecer um grau de escolha de prestadores, contestabilidade e capacidade de resposta Gerir orçamentos e riscos financeiros, incluindo a elaboração de planos financeiros Minimizar custos administrativos e operacionais (transaction costs) Desenvolver e sustentar o envolvimento clínico Responder às necessidades em saúde e resolver iniquidades Melhorar e gerir a qualidade clínica Segundo o autor, as sete diferentes abordagens de primary care-led commissioning identificadas no espaço britânico foram as seguintes: 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. prestados a doentes crónicos e a pessoas mais desfavorecidas ou com deficiências. Exemplos deste modelo incluem as iniciativas piloto denominadas Patient Choice, em curso em Inglaterra, onde aos doentes referenciados para cirurgia é garantida a escolha dos prestadores, com informação determinada sobre os tempos de espera. Individual patient purchasing – “Patient Choice” Modelo 2: Single practice-based commissioning Modelo 3: Multi-practice or locality commissioning Modelo 4: Joint or integrated commissioning Modelo 5: Primary care organisation/PCT commissioning Modelo 6: „Lead‟ PCT/LHB/HB commissioning Modelo 7: National commissioning Modelo 1: De acordo com o autor do estudo, neste modelo é maximizado o poder de escolha dos doentes e a capacidade de resposta (“responsiveness”). Os cuidados serão também prestados mais rapidamente, uma vez que os doentes estão mais motivados para isso. Muitas das opções apresentadas são complementares entre si, dado que nenhuma delas compreende por si só todos os atributos desejáveis numa abordagem para a contratualização. Para além disso, estão também condicionadas pela existência de uma entidade como o Primary Care Trust (em Inglaterra), o Local Health Board (em Gales e na Escócia) ou o Health Board (na Irlanda do Norte) com autoridade para gerir um orçamento para a saúde, atribuído pelo NHS. No entanto, existem factores que podem colocar em causa este dinamismo e eficiência, como: 1. Smith (2004) aponta três decisões estratégicas que estas entidades terão que tomar: 1. 2. 3. 2. De que forma escolher uma das abordagens e com que base? Até que nível deverá ser desenvolvida uma forma organizacional que integre contratualização e prestação como parte do processo geral de contratualização e planeamento? Qual é a mistura apropriada das abordagens de contratualização para a economia de saúde local? 3. A falta de capacidade ou de conhecimentos dos doentes idosos para fazerem uma escolha informada (assimetria de informação e/ou inexistência de agente como representante dos seus interesses) A confiança dos doentes depositada no seu GP para a organização da prestação de cuidados, podendo perder-se o carácter distintivo desta abordagem A indisponibilidade por vezes (principalmente, nas zonas rurais) de uma oferta efectiva de prestadores alternativos Este modelo terá mais sucesso em sectores de cuidados onde possa existir um planeamento prévio, como acontece na cirurgia e nos cuidados de longa duração. A escolha do doente por cuidados altamente especializados ou de emergência estará, contudo, muito limitada por falta de prestadores alternativos ou de tempo suficiente para um efectivo planeamento de cuidados. A abordagem primary care-led commissioning é, no momento, essencialmente aplicada em Inglaterra, tendo sido abolida na Escócia e sub-aplicada em Gales e na Irlanda do Norte (Smith et al., 2004). Quanto aos custos que este sistema poderá implicar, o investimento substancial em tecnologias de informação que permita a marcação directa dos serviços hospitalares a partir das unidades de cuidados primários poderá elevar os custos operacionais. Também a prestação de informação suficiente para uma escolha devidamente fundada implicará, de acordo com o autor, a um peso financeiro significativo. 15.1.6.1. M ODELO I NDIVIDUAL P ATIENT P URCHASING – “P ATIENT C HOICE ” No modelo Individual patient purchasing – “Patient Choice”, os doentes, com ou sem a ajuda dos seus GPs, escolhem o prestador de serviços, entre os disponíveis, pagando directamente através de um voucher ou mesmo de quantias disponibilizadas pelo NHS. É a forma de commissioning mais centrada no consumidor. Foi concebido para encorajar um sistema de cuidados de saúde responsável e orientado para o consumidor, estendendo-se para além do conceito do GP ou gestor do NHS como agente do paciente, característico do sistema de purchasing ou commissioning do NHS tradicional. Este modelo já é aplicado, de forma limitada, no âmbito de cuidados O grau de risco financeiro dependerá ainda, de acordo com Smith (2004), das estruturas de gestão da procura desenvolvidas a par deste modelo. No caso de se adoptar o sistema de pagamentos directos, existe, com efeito, o risco dos doentes não gerirem com cuidado o seu “orçamento” para, por exemplo, um ano de cuidados referentes a uma doença crónica, uma vez 46 que, de qualquer modo, será, segundo o autor, pouco provável a não prestação de cuidados a estes doentes mesmo em casos de overspend. preferências sobre que cuidados receber e sobre que prestadores. 15.1.6.3. M ODELO C OMMISSIONING Por outro lado, o impacto deste modelo em termos de equidade e ao nível das necessidades em saúde poderá ser paradoxal. Se a equidade poderá ser melhorada uma vez que a todos os doentes serão assegurados os seus direitos, também é possível que certas iniquidades sejam fortalecidas na medida em que grupos considerados em vantagem façam melhor uso das novas prerrogativas do que grupos desfavorecidos. 15.1.6.2. M ODELO C OMMISSIONING S INGLE M ULTI -P R ACT ICE OR L OCALITY No modelo Multi-practice or locality commissioning, um grupo de prestadores de um PCT assume a responsabilidade por um orçamento partilhado para a contratualização de serviços, com algumas semelhanças com os antigos fundholder multi-funds, GP commissioning groups e total purchasing pilots. Esta abordagem tende a ser desenvolvida de modo a reduzir o número e a frequência do internamento hospitalar de pacientes com doenças crónicas, de forma a melhorar a qualidade dos cuidados e a eficiência dos recursos. P RACTICE -B ASED No modelo Single practice-based commissioning, é atribuído um orçamento a uma prática individual que decide os cuidados de saúde que deverão ser comprados, enquanto o PCT trata do processo formal de contratualização (“contracting”), pretendendo-se trazer de volta os GPs ao processo de commissioning. Por essa razão, as iniciativas no âmbito deste modelo investem normalmente num conjunto mais alargado de cuidados primários e intermédios, podendo inclusivamente incluir alguns serviços especializados prestados normalmente em contexto hospitalar (como, por exemplo, o caso da diabetes). É o que acontece com um grupo de prestadores em Smethwick and Oldbury PCT que contratualizaram serviços especializados na diabetes para a comunidade, através de um PMS contract, que reúne a equipa dos cuidados primários, os cuidados intermédios e serviços hospitalares no âmbito de um único acordo com o PCT. Também Bradford North PCT explora actualmente um acordo semelhante para a saúde mental. O modelo pode ter por base orçamentos reais, valores indicativos ou incorporar os dois e, habitualmente, é permitido aos prestadores a utilização do montante do orçamento remanescente, como forma de incentivo. Tem-se verificado um aumento gradual no número de prestadores em Inglaterra que recebem uma qualquer forma de orçamento do seu PCT, como, por exemplo, Waltham Forest PCT, East Devon PCT, South Hams e West Devon PCT. Outros exemplos da aplicação deste modelo são os de Mid-Devon PCT, North East Lincolnshire PCT e Dartford e Gravesham PCT, todos antigos GP commissioning pilots no período de 1997-1999, demonstrando a persistência do interesse nestas abordagens. O autor entende que esta abordagem implica um elevado grau de envolvimento no processo de commissioning e adequa-se mais a determinados serviços de saúde do que a outros, como por exemplo, o primeiro contacto com o sistema de saúde. No entanto, neste caso, podem ocorrer, ainda segundo Smith (2004), conflitos de interesse. Esta abordagem colectiva apresenta, no entendimento do autor do estudo, algumas semelhanças com o modelo 2, ao nível da estratégia de contratualização, mas também algumas diferenças significativas, como o trade-off que existe entre a capacidade de resposta e a contestabilidade quanto à equidade e ao risco. Estes modelos permitem o estabelecimento de alianças entre as práticas e prestadores seleccionados, delineadas de maneira a prestar resultados pré-acordados e aplicáveis a todos os doentes de uma determinada área, o que consubstancia a robustez destas iniciativas, ainda que uma das consequências possa ser a possibilidade reduzida de oportunidade de escolha dos doentes. Atenta a dificuldade em conseguir que os prestadores assumam orçamentos para os primeiros contactos dos utentes com o sistema de saúde, alguns PCTs delinearam esquemas de incentivos, visando igualmente a melhoria da qualidade e da eficiência e à semelhança dos existentes no contrato nacional para os GPs, esperando encorajar a assunção de responsabilidade pela utilização de recursos. É exemplo o Bradford North PCT. Neste modelo, os commissioners podem desenvolver pacotes de cuidados personalizados, tendo os doentes oportunidades significativas para a expressão das suas 47 representada no Reino Unido pela Primary Care Trust commissioning, em Inglaterra, e pela Local Health Board commissioning em Gales. Refira-se que este modelo funcionará bem, segundo o autor, quando os serviços são complexos ou requeiram uma reconfiguração substancial, sem no entanto desestabilizar a economia de saúde local. 15.1.6.4. M ODELO C OMMISSIONING J OINT OR Dada a dimensão das populações abrangidas (desde 55.000 a 330.000, tendo a maioria mais de 100.000 doentes), os PCTs podem, no entendimento de Smith (2004), contratualizar todos os serviços exceptuando aqueles altamente especializados, se o principal critério for simplesmente a sua capacidade para gerir o risco financeiro respectivo. As PCTs encontram-se igualmente melhor posicionadas para desenvolver actividades integradas de contratualização com as suas autoridades locais. I NTEGR ATED O modelo Joint or Integrated Commissioning foi, por sua vez, construído para garantir que os serviços dirigidos aos doentes cujas necessidades se enquadrem nas responsabilidades dos serviços sociais sejam prestados de um modo coordenado sem que haja alterações ao nível dos custos. Tem normalmente por base a definição de um orçamento partilhado e gerido conjuntamente, para a compra de, por exemplo, todo o leque de cuidados para a população idosa. As iniciativas existentes no âmbito deste modelo são as de Northumberland e de Witham, Braintree and Halstead. Existe, por outro lado, a convicção generalizada de que os PCTs, como os seus predecessores PCGs, pugnam por exercer influência sobre os seus prestadores de cuidados agudos hospitalares, em parte porque o risco de desestabilização do padrão deste tipo de cuidados é maior ao nível de um PCT do que ao nível de pequenos commissioners, sendo as restrições por isso muito mais elevadas. Segundo o autor, tende a beneficiar a população com necessidades complexas de serviços sociais e de saúde e oferece a oportunidade de manter cuidados continuados no domicílio ou em instalações sociais na comunidade. Existem diferentes pontos de vista quanto à adequação do PCT em contratualizar cuidados de saúde primários, nomeadamente entre aqueles que entendem que se trata de uma organização fundamentalmente orientada para este nível de cuidados e aqueles que consideram que os PCTs são influenciados pelos profissionais de saúde, caso em que não será adequada a contratualização por essas entidades devido a conflitos de interesse. Por outro lado, apresenta a possibilidade de constituir uma gestão efectiva de orçamentos e dos riscos financeiros, ainda que alguma evidência aponte para a existência de uma certa relutância por parte das autoridades locais quanto à partilha de risco com os prestadores do NHS que, desta forma, enfrentam menos sanções no caso de gastos excessivos. Apresenta ainda a potencialidade de poder melhorar a qualidade dos cuidados através de um conjunto de medidas ao nível do desempenho. Quanto mais envolvidos na governação, estratégia e commissioning dos PCTs estiverem os profissionais de cuidados primários, mais dificilmente se poderá sustentar, num sistema baseado na separação entre o commissioner e o prestador, de acordo com o autor, que os PCTs devem contratualizar este nível de serviços. Por outro lado, alguma entidade deve determinar pelo menos que práticas locais de medicina geral devem prestar cuidados, ajudando-as a desenvolver a qualidade dos seus serviços e a assumir accountability pelo seu desempenho, papel que é actualmente desempenhado pelos ingleses PCTs e pelos galeses LHBs. As fragilidades apontadas prendem-se com os diferentes objectivos, fontes de financiamento e ciclos de planeamento entre o NHS ao nível local e os serviços das autoridades locais sociais. Nalguns casos, o relacionamento poderá ser dificultado pela falta de partilha de fronteiras (“coterminosity”), em muitos pontos, entre os serviços de saúde e os serviços sociais. 15.1.6.5. M ODELO P RIMARY C ARE O RGANISATION /PCT C OMMISSIONING No modelo Primary care Não existe em princípio nenhuma razão para que os PCTs e organizações similares como commissioners não possam oferecer uma escolha de prestadores para aqueles serviços onde essa possibilidade é desejada e possível. Ao nível macro, os PCTs não podem, segundo o mesmo autor citado, responder directamente às necessidades individuais dos doentes, mas devem ter a capacidade para promover a avaliação dessas organisation/PCT commissioning, a organização responsável pela prestação de cuidados de saúde primários e de serviços de saúde na comunidade tem também a responsabilidade de contratualizar todos ou a maioria dos outros serviços de saúde utilizados pela população pela qual responde. Actualmente, esta abordagem é 48 necessidades e da experiência dos doentes, com vista a um processo futuro de contratualização com informação que o sustente, podendo assim estabelecer mecanismos de contratualização de serviços que sirvam, de modo abrangente, as preferências e necessidades da população. serviços e quando a eficiência técnica é conseguida através de uma acção em parceria. O impacto ao nível da equidade é, porém, segundo Smith (2004), ambíguo. Se os polling budgets podem aumentar a equidade no acesso, o commissioning em larga escala pode servir para ocultar o acesso iniquitativo a serviços escassos. Esta questão pode, no entanto, ser mitigada se existir informação suficiente sobre quem usa que serviços, por pequenas áreas. Os PCTs têm maior dificuldade em manter o nível de envolvimento e entusiasmo do que as organizações de menor escala, o que constitui em parte uma função de dimensão e de forma mais significativa uma função de governação e de estratégias de gestão. Por outro lado, existe um trade-off entre o potencial para reduzir custos e alargar a perícia na contratualização, próprio de uma grande organização, e a identificação mais próxima dos GPs perante uma organização mais pequena. Em resposta, os PCTs podem delegar para níveis inferiores parte das suas responsabilidades na contratualização e dos seus recursos. O envolvimento clínico, por outro lado, deverá ser fraco, dada a distância entre os serviços de saúde primários e o processo de commissioning. Mas poderá, adianta o mesmo autor, recorrer-se à formação de um pequeno grupo de clínicos que actuem directamente como consultores e ainda à criação de mecanismos de consulta com mais participantes, uma vez que a compliance dos GPs se tornará uma questão determinante assim que forem tomadas decisões ao nível macro. A par do desafio em manter o envolvimento clínico, Smith (2004) aponta outra das principais limitações na contratualização ao nível do PCT relaciona-se com o desenvolvimento suficiente de perícia neste processo ao longo de um alargado leque de serviços, pelo que é provável que o PCT desempenhe apenas uma parte dessa função. O papel do PCT será provavelmente, como defende o mesmo autor, o da liderança na identificação da mais apropriada combinação de modelos na sua área e para a sua população, coordenando as actividades das diferentes organizações e grupos envolvidos na contratualização em seu nome, apoiando as suas actividades com informação relevante e sabedoria e garantindo que respondem pelo uso racional e eficiente dos seus recursos. 15.1.6.7. M ODELO N ATIONAL C OMMISSIONING O modelo National Commissioning é utilizado em Gales e na Escócia e existe, ao nível nacional, para alguns processos de contratualização de serviços altamente especializados. É o caso das doenças cardíacas, neoplasias específicas e serviços de sangue e de ambulatório, para todo o país de Gales (papel desempenhado pela Health Commission Wales - HCW). É, portanto, um modelo apropriado quando os conhecimentos técnicos são escassos e seja necessário alcançar uma situação de monopsónio. Este modelo tende a aplicar-se, na visão do autor, a serviços de custos elevados e de baixo volume. Como tal, constituirá apenas um complemento de outras formas de commissioning. No entanto, também poderá ser usado para a reconfiguração de serviços complexos ao nível nacional ou regional, ainda que num contexto e num tempo específicos. 15.1.6.6. M ODELO „L EAD ‟ PCT/LHB/HB C OMMISSIONING No modelo „Lead‟ PCT/LHB/HB Commissioning, os PCTs em Inglaterra, os Local Health Boards na Escócia e os Health Boards na Irlanda do Norte reúnem-se para a contratualização de serviços, com vista a contornar a falta de expertise ao nível do Primary Care Trust ou o facto de existir um único prestador de serviços. É um modelo adequado a serviços altamente especializados (de custos elevados e baixo volume) e de promoção da saúde pública. Em Inglaterra, a maioria dos PCTs encontra-se envolvida nalguma espécie de colaboração para a contratualização de serviços especializados. É um modelo efectivo na redução dos custos operacionais e na gestão de orçamentos, assim como na minimização dos riscos financeiros que penderiam sobre organizações menores. No entanto, o doente não tem tanta possibilidade de escolha nem existe contestabilidade (não significativo fora de Inglaterra). A capacidade de resposta às necessidades da população também será diminuída. O envolvimento clínico dos GPs será fraco, ainda que outros clínicos prestadores de serviços especializados possam envolver-se mais, o que dependerá dos mecanismos adoptados pelo commissioner. É um modelo provavelmente utilizado, de acordo com o autor, como complemento a outros, como os já enunciados anteriormente, sendo adequado a cuidados altamente especializados, assim como a mudanças estratégicas complexas como reconfiguração de 49 O impacto na melhoria e na garantia da qualidade clínica é ambíguo. Pode ser efectivo através do estabelecimento de standards de cuidados, ao nível nacional, ainda que o elevado alcance possa diluir eventuais problemas e asfixiar a inovação na prestação dos serviços. Recentemente, o NHS PCC abandonou inclusivamente a designação NHS Primary Care Contracting para NHS Primary Care Commissioning, mudança que pretende reflectir a natureza mutativa do contexto dos cuidados primários e o papel determinante do commissioning na política de saúde dos Primary Care Trusts. Também subsistem dúvidas quanto ao impacto na equidade e na igualdade, uma vez que se este modelo, por um lado, apresenta vantagens em termos financeiros, de fixação de standards e de acesso para as promover, perde, simultaneamente, o enfoque no doente e na realidade local. O Department of Health utiliza o conceito de commissioning para descrever o processo de avaliação das necessidades em saúde locais, de identificação dos serviços necessários para ir de encontro a essas necessidades e, finalmente, de aquisição de serviços a partir de um leque de prestadores de cuidados de saúde46 (UK, 2009i). Este conceito refere-se, fundamentalmente, segundo Lewis (2004). à identificação de respostas em serviços de saúde apropriadas e efectivas perante a avaliação das necessidades dos doentes, ao cumprimento das prioridades em cuidados de saúde ao nível local e nacional, ao planeamento de uma prestação coerente de cuidados, à obtenção desses cuidados através da celebração de contratos com os prestadores de serviços e à afectação dos recursos disponíveis. Após a incursão por cada um destes modelos, o autor conclui que todos têm forças e fraquezas e não são mutuamente exclusivos. A questão central será então saber que atributos são em particular desejáveis para as diferentes combinações de serviços, em diferentes circunstâncias e em diferentes contextos, uma vez que a força de um modelo não pode resultar da soma das suas vantagens, devendo ser sempre avaliada casuisticamente, com base em considerações técnicas e valores políticos. O practice-based commissioning diz já respeito ao empowerment dos GPs e de outros clínicos, como enfermeiros, farmacêuticos e outros profissionais de saúde, para a configuração dos serviços e cuidados de saúde prestados às populações locais (UK, 2009i). Cada sistema de saúde deverá considerar algumas questões em ordem a determinar a mais efectiva combinação de abordagens para a contratualização na sua área local. Os autores sugerem que se considere a análise do serviço a contratualizar (complexidade, informação, contestabilidade), do contexto e circunstâncias (existência de possibilidade de escolha de prestadores, disponibilidade dos doentes para se deslocarem em caso de inadequação dos prestadores locais) e do modelo de contratualização proposto em relação aos critérios de avaliação. 15.2. Esta abordagem apresenta-se, segundo Smith (2005), como uma resposta às limitações de duas alternativas fundamentalmente distintas para determinar a afectação de recursos, quais os cuidados a prestar e a quem. Uma mais orientada pelos interesses dos consumidores e pela competição entre organizações de saúde, e outra determinada pelo planeamento burocrático centralizado governamental. O PBC é, de acordo com o autor, um caminho intermédio que procura ajudar médicos generalistas informados a melhorar os cuidados de saúde através da intervenção directa sobre o conteúdo e localização dos cuidados que prestam. C ONTEXTO ACTUAL 15.2.1. A ABORDAGEM P RACTICE - BASED C OMMISSIONING Em Dezembro de 2004, com a publicação do documento intitulado Practice Based Commissioning: Promoting Clinical Engagement, o Department of Health manifestou interesse na exploração pelas práticas médicas, incentivadas pelos PCTs, de formas de envolver os doentes e as comunidades locais no processo de contratualização. Na perspectiva do Governo britânico, uma das forças do chamado Practice-based Commissioning (PBC) é precisamente a aproximação dos processos decisórios à comunidade, permitindo o desenvolvimento de modelos informais dos quais o NHS pretende recolher ensinamentos para acções futuras (UK, 2004). O conceito de practice-based commissioning não é, porém, inovador e já se previa em 1998. Com efeito, o direito a gerir um orçamento e a vontade do Governo em reconhecê-lo como um primeiro passo no sentido do desenvolvimento de um conjunto sofisticado de meios para envolver os clínicos na contratualização é 46 Que podem incluir, no sistema de saúde britânico, hospitais, optometristas, farmácias e organizações de voluntariado (UK, 2009i). 50 consistente com o princípio de uma grande delegação de poderes. A figura 5 ilustra como funciona o processo de contratualização de serviços através do trabalho do practice-based commissioning, as diferentes etapas e as parcerias existentes para a identificação e contratualização de serviços bem sucedidas. Com a promoção do practice-based commissioning, o Department of Health pretende que se inovem meios através dos quais os doentes beneficiarão de uma grande variedade de serviços, prestados por um grande número de profissionais e em práticas mais convenientes e mais próximas das suas casas. Em simultâneo, o NHS e o público beneficiarão de um uso mais eficiente de serviços e um maior envolvimento na “linha da frente” de médicos e enfermeiros nas decisões sobre contratualização (UK, 2004). Figura 5: Processo de Practice-based Commissioning O practice-based commissioning constitui, assim, o caminho pelo qual os clínicos influenciam a forma como os serviços existentes são prestados, por meio da avaliação das necessidades em saúde das populações locais e através da proposta de novos serviços ou de reconfiguração dos serviços existentes que melhor vão de encontro às necessidades dos seus doentes (UK, 2009i). Fonte: UK, 2009i. O médico generalista que contratualiza tem, porém, que gerir o equilíbrio entre o papel de agente de um doente e o papel de “guardião” de recursos para uma população mais abrangente de doentes (Smith, 2005). Neste contexto, os PCTs deverão disponibilizar aos clínicos informações-chave e apoio para a identificação das oportunidades e para a concepção das propostas. Trabalhando em parceria com os seus PCTs, os GPs podem desenvolver um entendimento mais aprofundado das necessidades em saúde de longo termo da comunidade local e planear e prestar os serviços que melhor respondam a essas necessidades específicas (UK, 2009i). O relatório High Quality Care For All: Nhs Next Stage Review Final Report, datado de 2008, da autoria de Lord Darzi, teve como objectivo ajudar os doentes, profissionais de saúde e público em geral a concretizar as mudanças de que necessitam e desejam no seu NHS local e dirigir recomendações ao Primeiro Ministro relativamente à forma como o NHS pode responder aos novos desafios enquanto prestador de serviços compreensivos e publicamente financiados (NHS, 2007c). O practice-based commissioning reconhece, com efeito, o papel central dos profissionais de cuidados primários na utilização dos recursos do NHS para a prestação de cuidados (UK, 2009i) e coloca-os no centro do processo de contratualização, para que tenham uma participação activa e responsabilidade na configuração dos serviços que melhor se traduzam em ganhos em saúde nas suas comunidades locais (UK, 2009f). «High Quality Care for All set out our ambition for a system-wide focus on quality, by setting out a definition of quality covering three specific domains: Safety (…) Effectiveness (…) Patient experience» (Darzi, 2008) Esta abordagem funciona, por isso, como uma força motora para a inovação clínica e para a inovação dos serviços, na medida em que permite a identificação e disseminação de novas ideias que podem melhorar a qualidade dos cuidados, confere aos clínicos locais maior poder e influência e possibilita o trabalho em parceria com os PCTs, nomeadamente na configuração da forma como os recursos são afectados, oferecendolhes ainda um papel directo na configuração e na compra dos serviços que prestem melhor saúde, melhores cuidados e maior valor para a população local (UK, 2009i). Este documento partiu da convicção de que a melhor mudança é a que é determinada localmente, pelo que é importante que as organizações do NHS enfrentem um processo de avaliação adequado para a determinação do que funcionará melhor, envolvendo todos os interessados através de uma clara comunicação, reconhecendo-se, porém, que as populações e as comunidades de Inglaterra têm diferentes características e diferentes necessidades. Os serviços que actualmente são prestados não estão suficientemente adaptados a essas diferenças, 51 fundholding, dos total purchasing pilots e dos locality/GP commissioning pilots. Porém, num contexto acreditando-se (NHS, 2007c), no entanto, que, se o NHS deve ser universal, não significa que deva ser uniforme. actual muito diferente daquele que ocorreu no período compreendido entre 1991-1997. Com efeito, presentemente, a mediação dos Primary Care Trusts entre a burocracia do NHS e a visão e as necessidades da “linha da frente” pugna pelo direito de todos os doentes à escolha pelo prestador e não apenas daqueles inscritos em fundholding practices (Lewis, 2004). Na sequência do estudo desenvolvido no âmbito do relatório referido, foram identificados os desafios comuns às diferentes regiões no país, do que resultou uma perspectiva nacional do que o NHS do século XXI defronta, como expectativas mais elevadas 47, a procura conduzida por questões demográficas (aumento da esperança média de vida), a saúde numa era de informação e conectividade, a natureza mutativa da doença, os avanços nos tratamentos e o próprio contexto actual do trabalho desenvolvido pelos profissionais de saúde. A expressão practice-led commissioning implica (Lewis, 2004) a delegação de todas ou de algumas das vertentes do commissioning dos Primary Care Trusts nas unidades prestadoras de cuidados primários, dependendo da reunião de três condições: a identificação inicial pelos PCTs da actividade ao nível das unidades de saúde, o envolvimento das unidades na configuração dos serviços utilizados pelos seus doentes e a existência de um esquema de incentivos associados ao desempenho perante objectivos ao nível das práticas clínicas acordados previamente. As visões contidas neste documento representam o início da tentativa de dar resposta às necessidades locais, configurando um NHS que pretende interagir com organizações parceiras ao nível local de forma a chegar às populações, ajudando-as a manterem-se saudáveis e, quando necessário, a receberem cuidados adequados de grande qualidade. Reconhece-se, por isso, o papel de liderança que os serviços locais assumirão no futuro na promoção da saúde junto das populações. Essencialmente, o practice-led commissioning é concebido para empoderar as equipas de cuidados primários para a construção de pacotes de cuidados que reflictam as necessidades dos doentes de uma forma responsável e precisa, para oferecer uma oportunidade para a consideração das preferências individuais dos doentes no processo de contratualização e para prestar incentivos que possam colocar a ênfase na prevenção da doença e na promoção da saúde ao invés e não no tratamento (Lewis, 2004). Os quatro princípios que sustentam a abordagem do practice-based commissioning como via de implementação do citado Next Stage Review (UK, 2009a) são os seguintes: 1. 2. 3. 4. Co-produção da visão, construída com base no envolvimento dos stakeholders Delegação (subsidiarity), na medida em que um propósito central do PBC é a possibilidade e encorajamento da tomada de decisões pelos clínicos locais, assegurando que estas são assumidas ao nível adequado do sistema e o mais próximo possível dos doentes Sentido de serviço e liderança dos clínicos, encorajados pelo PBC a assumirem um papel mais activo na contratualização de serviços Alinhamento apropriado do sistema para o apoio ao PBC, assegurando clareza sobre o papel dos practice-based commissioners e o papel facilitador dos PCTs e SHAs «Practice-led commissioning is designed to: empower primary care teams to construct care packages that reflect the needs of individual patients in a precise and highly responsive way» (Lewis, 2004) Uma unidade de saúde pode adoptar (Lewis, 2004) o modelo practice-led commissioning em diferentes níveis no âmbito de cada uma das seguintes três dimensões (vd. Figura 6): 1. Há autores (Lewis, 2004) que se referem a este conceito como practice-led commissioning, que na sua visão incorpora elementos do general practitioner 2. 47 Darzi (2008) cita o Relatório de Beveridge de 1942, em que são identificados os “Cinco Gigantes” – desejo, doença, ignorância, miséria e ociosidade – a que uma sociedade precisa responder de forma global. 52 Delegação de responsabilidade na contratualização – muito variável: num extremo, as práticas aconselham apenas os PCTs; noutro extremo, têm completa autonomia; num ponto intermédio, têm autonomia para contratualizar no quadro da estratégia definida pelo PCT Âmbito – também muito flexível: apenas determinados cuidados de saúde, doenças ou grupos de população (a população idosa, por exemplo) ou todos os cuidados 3. Incentivos – mais complexo: satisfação pessoal, pagamentos perante o cumprimento de indicadores de qualidade ou com base no desempenho financeiro, dado que há uma transferência do risco do PCT para a prática. Figura 6: Dimensões do Practice-led Commissioning Fonte: Lewis, 2004. qualidade deve estar no centro de todas as acções, é fundamental perspectivá-la do ponto de vista dos doentes. Assim, para o NHS, de acordo com Darzi (2008), a qualidade deverá incluir as dimensões seguintes: Os diferentes prestadores e os próprios PCTs têm potencialmente um leque alargado de escolhas, uma vez que a falta de directrizes detalhadas e impositivas do Department of Health significa que diversas variações do PLC poderão emergir. Esta diversidade poderá revelar-se benéfica. No entanto, implicará a necessidade de negociar localmente enquadramentos claros em termos de processos decisórios (Lewis, 2004). 1. 2. 15.2.2. A QUALIDADE NO CENTRO DE TODAS AS ACÇÕES Na prestação de cuidados de elevada qualidade, os doentes assumem uma posição de controlo, têm um efectivo acesso às terapêuticas, são tratados num ambiente seguro e as doenças não são apenas curadas mas prevenidas. Estas são manifestações de cuidados de elevada qualidade, havendo por isso um longo caminho a percorrer no sentido de colocar a questão da qualidade no centro do NHS (Darzi, 2008). 3. Segurança para o doente – ambientes seguros, higienizados, redução de danos evitáveis como erros na medicação ou infecções nosocomiais Experiência do doente – a qualidade dos cuidados inclui a qualidade do “cuidar” (“caring”). Os cuidados personalizados implicam compaixão, dignidade e respeito no tratamento dos doentes Efectividade dos cuidados – análise das taxas de sucesso de diferentes tratamentos para diferentes condições Por outro lado, refere o autor, para conseguir o empenho do NHS na melhoria dos cuidados serão precisas seis etapas colocadas em torno de uma governância clínica local: Após a consideração de como a qualidade é percepcionada pelos doentes e pelo público em geral, é necessário, segundo o autor do relatório High Quality 1. 2. 3. Care For All: Nhs Next Stage Review Final Report (Darzi, 2008), dar-lhe o devido enquadramento e, se a 4. 53 Conferir clareza à qualidade Medir a qualidade Divulgar o desempenho (“performance”) qualidade Reconhecer e recompensar a qualidade da 5. 6. 7. Elevar os padrões mínimos Assegurar a qualidade (regulação) Inovar (“stay ahead”) – um NHS pioneiro recursos) e líder. O exacto equilíbrio das funções dependerá da posição institucional assumida. Este novo papel tridimensional concede aos profissionais a oportunidade de se focalizarem não apenas na melhoria da qualidade dos cuidados que prestam individualmente, mas numa perspectiva mais ampla, enquanto enquadrada na sua organização e no NHS de uma forma grobal (Darzi, 2008). Conclui Darzi (2008) que se ultimamente os cuidados de alta qualidade estão a tornar-se mais do que um ideal, é necessário libertar o NHS local para que se concentre nessa questão. No sentido de dar resposta às necessidades da população britânica, é dado enfoque à melhoria da qualidade dos cuidados, para o que se reconhece ser necessário (Darzi, 2008): 1. 2. 3. 4. Para que os médicos possam ser parceiros e líderes, a par dos seus colegas, torna-se fundamental, segundo o autor, a aplicação dos seguintes princípios: Ajudar as pessoas a manterem-se saudáveis – colocando o enfoque no apoio à prevenção da doença e assegurando o acesso conveniente a serviços preventivos, para o que, segundo o autor referido, o NHS precisa trabalhar com os seus parceiros locais de forma mais efectiva Empoderar os doentes – conferindo maior poder de escolha, prestando melhor informação, atribuindo controlo acrescido e maior influência sobre a utilização de recursos e criando parcerias com enfoque nas populações. Darzi (2008) determina que o NHS precisa conceder aos doentes mais direitos e maior controlo sobre a sua própria saúde, para uma prestação de cuidados mais personalizados Prestar os tratamentos mais efectivos – os doentes precisam de um acesso melhorado aos tratamentos de que necessitam, apoiados por processos melhorados de diagnóstico para uma detecção precoce da doença Manter os doentes o mais seguros possível – o NHS deve pugnar para ser o sistema de saúde mais seguro, mantendo os doentes em ambientes higienizados e reduzindo danos evitáveis 15.2.3. A LIBERDADE COMO CONDI ÇÃO PARA 1. 2. 3. 4. A QUALIDADE O objectivo de alcançar elevada qualidade dos cuidados só terá, porém, sucesso se aos profissionais da linha da frente do NHS for concedida liberdade para dar uso aos seus talentos. Os profissionais tentam melhorar as práticas, mas precisam de liberdade e oportunidade para o alcançar (Darzi, 2008). É, por isso, fundamental “desbloquear talentos” (Darzi, 2008). Os cuidados de saúde deverão ser prestados por uma equipa, em que todos os seus elementos têm valor e prosseguem os mesmos objectivos. No futuro, cada profissional de saúde terá a oportunidade de ser médico (primeiro dever), parceiro (sujeito a prestar contas sobre o seu desempenho e sobre a utilização de Conceder maior liberdade à linha da frente – continuar-se-á a investir em conceder liberdade aos profissionais para darem uso à sua perícia, criatividade e competência para encontrarem formas inovadoras de melhorar a qualidade dos cuidados prestados aos doentes Criar uma nova responsabilização (“accountability”) – para libertar os profissionais do NHS de um controlo centralizado é necessária uma nova e mais forte responsabilização, enraizada na população como o dever de serviço imputado ao NHS Empoderar os profissionais – os profissionais precisam deste atributo de forma a poderem tomar decisões no dia-a-dia que melhorem a qualidade dos cuidados. Se os clínicos prestam contas sobre a qualidade dos resultados em saúde que entregam, devem razoavelmente esperar que lhes sejam concedidos poderes para interferir nesses resultados Fomentar a liderança para a qualidade (clínica e gestionária) – o autor identifica os elementos centrais de qualquer abordagem à liderança, designadamente: a. Visão – que melhorias na qualidade tentam alcançar e como beneficiarão os doentes e as comunidades locais b. Método – como conseguirão que haja mudança, que técnicas de gestão aplicarão para a implementação, melhoria contínua e medição do sucesso c. Expectativas – o que as diferenças representarão para as pessoas, que mudanças comportamentais serão necessárias e que valores as deverão sustentar Do exposto, e com vista a alcançar cuidados de saúde de elevada qualidade, é necessário, segundo o documento de Darzi (2008), permitir, como já foi referido, que a mudança se faça localmente, acompanhada de uma liderança ao mesmo nível. 54 recorrendo à Public Health Development Team, que emite uma recomendação sobre a contratualização de um tratamento particular ou serviço com o apoio profissional da Effectiveness Facilitation Unit, através de uma análise local da questão com base em critérios de custo-efectividade e nas necessidades locais. Sendo fundamental a formação e o desenvolvimento das capacidades de liderança, o NHS prevê (Darzi, 2008) a exploração de formas de a incluir nos programas curriculares dos estudantes de medicina e enfermagem. Está igualmente prevista a introdução de um novo standard na liderança dos cuidados de saúde, contornando a variabilidade dos objectivos e padrões mínimos dos diferentes programas de desenvolvimento de competências de liderança, em que o NHS local tem investido. Trata-se do Leadership for Quality Certificate. Ainda que com menos recursos, uma posição semelhante foi adoptada (Vergel e Ferguson, 2006) no North Yorkshire, uma outra SHA, com a criação do posto de Clinical Advisor que apoia decisões de contratualização difíceis ao longo dos quatro PCTs, mais uma vez através de uma perspectiva com base na evidência. Este sistema tem pendido para uma abordagem prática e mais informal do que no East Yorkshire. Constituir-se-á (Darzi, 2008) ainda o NHS Leadership Council, uma entidade presidida pelo NHS Chief Executive, responsável pela supervisão das questões de liderança nos cuidados de saúde, com particular enfoque no estabelecimento de padrões mínimos e com um orçamento destinado à contratualização de programas de desenvolvimento. 15.3. Já quanto à participação pública na produção de políticas, parece ser, segundo os mesmos autores, relativamente limitada, ainda que com algumas excepções (existência de um Patients‟ Forum num caso, envolvimento do Community Health Council em 4 casos). O S MECANISMOS DE CONTRATUALIZAÇÃO 15.3.1. O PROCESSO DECISÓRIO Quanto aos recursos, é frequente verificarem-se dois tipos de formação, em sequência: um Exceptional Cases Commitee, que se reúne mensalmente para considerar pedidos de financiamento; e, no caso de serem rejeitados, um Appeals Panel. Vergel e Ferguson (2006) descreveram o recente desenvolvimento local da prioritização do processo decisório. A lógica (“rationing”) da exclusão é a abordagem mais comum para a fixação de prioridades nos cuidados de saúde nas duas SHAs estudadas, o que envolve a identificação dos serviços que podem ser considerados de “baixa prioridade”. Quanto à publicitação das decisões sobre cobertura e a sua motivação, a maioria dos PCTs participantes no estudo não preencheram esta condição. O nível de disseminação tanto das motivações das políticas como dos direitos dos doentes para recorrerem foi relativamente modesta, ainda que com algumas excepções. De uma forma geral, os PCTs confiam, segundo os autores, aos GPs a prestação de informação sobre as escolhas dos doentes e direitos quanto às políticas implementadas pelos PCTs. Todos os PCTs encontram-se aparentemente em diferentes estádios de desenvolvimento de políticas. De uma forma geral, as organizações dotadas de maior autonomia e experiência já tinham desenvolvido as suas próprias políticas (“rationing policies”), por vezes como parte de um exercício coordenado com outros PCTs locais, acontecendo frequentemente adoptarem, no âmbito do PBC, uma posição semelhante ou produzirem políticas comuns às que já tinham emitido ao nível interno, através de um simples trabalho de revisão (Vergel e Ferguson, 2006). De uma maneira geral, a atenção é dada à listagem dos tratamentos excluídos e aos critérios de eligibilidade, sem que se declare de forma clara a evidência científica quanto à efectividade, segurança e custo-efectividade e quanto à equidade e considerações éticas tidas em conta na decisão (Vergel e Ferguson, 2006). Foram estabelecidos, de acordo com os autores referidos, dois processos formais para o suporte do processo decisório quanto a escolhas de contratualização difíceis, ambos operacionalizados actualmente numa SHA britânica (North & East Yorkshire and Northern Lincolnshire). Alguns PCTs envolveram-se num processo formal para apoiar uma contratualização com base na evidência e a integração das orientações do National Institute for Clinical Excellence (NICE) no processo decisório local, A execução já aparenta ser uma questão difícil para os PCTs, uma vez que dificilmente se alcança sem a colaboração dos GPs e consultores. Uma grande parte da disseminação e compreensão dessas políticas é atribuída aos GPs e consultores no seu papel de educadores. Neste contexto, é crucial a prestação de argumentos razoáveis e de acesso público. De outra 55 forma, os actores chave na implementação dessas políticas não serão envolvidos, referem Vergel e Ferguson (2006). serão prestados, onde estarão disponíveis e quem os prestará (UK, 2009f). A visão revelada pelo plano estratégico deverá (UK, 2009f) ser constituída por duas partes, a oferta ao doente e o modelo de serviço estratégico. Segundo os mesmos autores, na ausência de orientações locais claras em relação às decisões difíceis de contratualização, existe um risco de confusão, inconsistência da prática, iniquidade do tratamento e vulnerabilidade organizacional ao desafio legal. A oferta ao doente poderá incluir os serviços adicionais ou melhorados que a população pode esperar dos cuidados primários, como: A adopção do processo denominado accountability for reasonableness (AFR) pode contribuir, segundo os autores, para assegurar que o processo decisório se torne mais transparente, justo e menos vulnerável aos desafios legais. Ainda que não elimine toda a controvérsia sobre a aplicação dos critérios lógicos, tem, no entanto, o potencial para restringir o espaço para a discussão e tornar-se um processo de educação interactiva entre todas as partes, incluindo os doentes. Com o tempo, poderá até permitir, alegam Vergel e Ferguson (2006), uma mudança cultural que facilite a implementação de decisões motivadas no seio do NHS. 1. 2. 3. 4. 5. 6. Sem uma clara lógica que se apoie em evidência e em princípios que os gestores, clínicos e cidadãos possam concordar serem relevantes, será muito difícil para os PCTs legitimarem as suas decisões. Sem este tipo de legitimidade, a credibilidade e implementação das políticas mostrar-se-á dificilmente alcançável (Vergel e Ferguson, 2006). 15.3.2. A DEFINIÇÃO DE PLANOS ESTRATÉGICOS 7. Planeamento familiar e outros serviços de saúde sexual Cirurgias menores Serviços de diagnóstico Serviços de saúde emental Cuidados melhorados em condições de longo termo A oferta incluirá os standards mínimos esperados no que respeita a: a. Acesso (horário de abertura, acesso em 48h, pré-marcação) b. Qualidade clínica (e.g. indicadores de qualidade e resultados) c. Experiência do doente Instalações O modelo de serviço estratégico descreverá como será concretizada a oferta ao doente. Deverá ser mapeada a prestação de serviços existente em relação às necessidades, tendo em conta a qualidade, a viabilidade económica e a sustentabilidade a longo prazo de cada practice. E OPERACIONAIS Cada modelo será diferente para cada PCT, mas deverão todos incluir a abordagem adoptada relativamente a (UK, 2009f): O Department of Health determinou que cada Primary Care Trust deveria divulgar, até à primavera de 2009, o seu plano estratégico, estabelecendo um plano de cinco anos para a melhoria ao nível local da saúde da população que abrange (Darzi, 2008). Neste plano, deveria ainda ser explanada a visão de como serão os serviços dos médicos de clínica geral no futuro, enquadrada pelas prioridades nacionais, através do exercício de mapeamento do ponto de partida e pelo contínuo envolvimento dos doentes, clínicos e outros parceiros locais (UK, 2009f). 1. 2. 3. Estes planos colocarão em prática os caminhos de cuidados no âmbito dessa visão de cada região, com enfoque nas parcerias a estabelecer entre os PCTs, as autoridades locais e outras entidades (públicas e privadas), de forma a assegurar que as necessidades em saúde e bem-estar locais estão a ser devidamente percepcionadas e atendidas (Darzi, 2008). Contém ainda a definição das prioridades do PCT e a forma como serão concretizadas, explicitando os serviços que 4. 5. 6. 56 Definição de regras de acesso geográfico, como a distância máxima que é esperado que os doentes percorram até à prática em que estão inscritos, ou o número de práticas entre as quais podem escolher registar-se Prestação de serviços em redes comunitárias Contratualização de prestação de serviços mais integrada, maior coordenação com os serviços de saúde na comunidade com os serviços de clínica geral e uma mais integrada prestação de cuidados primários, cuidados sociais e serviços locais governamentais mais alargados Contratualização de serviços de acesso aberto tanto para os cuidados urgentes como rotineiros Contratualização de prestadores de cuidados primários especializados (e.g. para condições de longo termo) Promoção de uma maior integração entre os médicos de clínica geral para aumentar a massa 7. 8. crítica e reduzir o isolamento de práticas mais pequenas Promoção de uma prestação mais integrada de outros serviços de cuidados primários, como farmácia, estomatologia e oftalmologia Promoção dos auto-cuidados e da autoreferenciação para certas condições ou grupos de doentes, incluindo o uso de orçamentos pessoais 2. Deverá, ainda, ser elaborado por cada PCT um plano operacional anual, com a explicitação de como será implementada a sua estratégica no ano seguinte (UK, 2009f). Tanto o plano estratégico como operacional deverão explanar a forma como o PCT pretende melhorar os serviços de cuidados primários. No entanto, antes de promover essas melhorias, o Department of Health aconselha o estabelecimento, em primeiro lugar, do mapeamento das circunstâncias actuais (“mapping the baseline”), que deverá ultrapassar três etapas fundamentais para o concretizar (UK, 2009f): 1. Avaliar necessidades – usualmente através da Joint Strategic Needs Assessment (JSNA) com a autoridade local Localizar os serviços existentes – será necessário traçar diferentes tipos de dados: a. Capacidade b. Qualidade – que inclui qualidade organizacional, efectividade e experiência do doente c. Acesso d. Capacidade de resposta e. Escolha do doente f. Value for money g. Instalações h. Procura i. Serviços melhorados Identificar que é preciso mudar 3. 15.3.3. A S DIFERENTES VIAS DE CONTRATUALIZAÇÃO DE 4. 2. 3. CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOS O novo processo de contratualização, introduzido em Abril de 2004, veio, efectivamente, permitir ao NHS prestar cuidados de saúde mais próximos das necessidades da população e melhorar a qualidade dos cuidados prestados. 15.3.4. C LAUSULADO CONTR ATUAL As quatro vias de contratualização de cuidados de saúde primários presentes actualmente no sistema nacional de saúde britânico são as seguintes (UK, s.d.): 1. clínica geral, introduzida de forma inovadora, ao nível nacional, em Abril de 2004 Personal Medical Services (PMS) – os contratos com PMS constituem uma alternativa aos GMS e distinguem-se destes pelo seu carácter localista e por serem estabelecidos entre a prática clínica e a respectiva Primary Care Organization48, não estando sujeitos às negociações do Department of Health com a General Practitioners Committee da British Medical Association, contrariamente ao que acontece com os GMS. Sofreu, no entanto, algumas influências do novo contrato com os GMS (BMA, 2004) a. Specialist Provider Medical Services (SPMS) – são acordos PMS, com a diferença de não ser necessário que os doentes, para receberem os cuidados, se encontrem inscritos junto do prestador. As orientações para os SPMS encontram-se no documento denominado “Sustaining Innovation through new PMS arrangements”, emitido pelo Department of Health em Dezembro de 2003 (UK, s.d.) Alternative Provider Medical Services (APMS) – trata-se de uma via de contratualização em que os PCTs podem contratualizar com um leque alargado de prestadores para a entrega de serviços adaptados às necessidades locais. Oferece oportunidades significativas para a reestruturação de serviços de forma a oferecer maior poder de escolha aos doentes, maior acesso e maior capacidade de resposta às necessidades específicas da população. Por outro lado, constitui uma ferramenta importante para responder às necessidades em saúde em áreas de sub-prestação histórica, para permitir a nova prestação de serviços onde outras práticas exerceram o direito a excluírem-nos da sua acção (“opt outs”) e para a melhoria do acesso em áreas com problemas ao nível do recrutamento e da retenção de GPs (UK, s.d.) Primary Care Trust Medical Services (PCTMS) – os PCTs podem também prestar serviços, empregando directamente funcionários a tempo inteiro para a prestação de um conjunto completo de serviços, a tempo parcial ou apenas pontualmente (UK, s.d.) Os contratos celebrados entre os Primary Care Trusts e os General Medical Services (GMSs) foram General Medical Services (GMS) – via de contratualização estabelecida com os médicos de 48 Denominação geral que corresponde à estrutura responsável pela organização e gestão dos cuidados primários na nação. 57 desenvolvidos pela NHS Confederation em parceria com o General Practitioners Committee (GPC) da British Medical Association (BMA) e vem dar lugar a uma maior flexibilidade para os GPs, representando um nível sem precedentes de investimento nos cuidados primários (UK, s.d.). Parte Parte Parte Parte Parte Parte Parte Porém, ao contrário do que acontecia com o General Practitioner Fundholding, as práticas que reúnam condições para contratualizarem não o poderão fazer de forma automática e por força da lei. É necessário que os PCTs assim o autorizem (Lewis, 2004). 20 21 22 23 24 25 26 – – – – – – – Seguros Doações Cumprimento da legislação e orientações Reclamações Resolução de conflitos Modificações e termo do contrato Não sobrevivência das cláusulas ao termo do contrato Integridade do contrato Legislação aplicável e jurisdição Renúncia, atraso ou falta no exercício de direitos Força maior Eliminação de cláusulas do contrato sem prejuízo da validade das restantes (“severance”) Serviços de notificação O contrato contém todas as disposições de índole obrigatória resultantes do Health and Social Care (Community Health and Standards) Act 2003 e do National Health Service (General Medical Services Contracts) Regulations 2004 (SI 2004/291). Contém ainda outras cláusulas, não exigidas pelos documentos referidos, mas que são altamente recomendadas para todos os Primary Care Trusts (UK, s.d.). Inclui ainda os seguintes anexos: 1. Actualmente, encontra-se em vigor um novo contrato, com efeitos a partir de 28 de Janeiro de 2008, com base nas National Health Service (Primary Medical Services) (Miscellaneous Amendments) Regulations 2007 (SI 2007/3491), disponíveis no website do Department of Health49 (UK, s.d.). 2. 3. Este contrato standard é composto por 26 partes (UK, 2008c), nomeadamente: 4. Parte 1 – Definições e interpretação Parte 2 – Relação entre as partes Parte 3 – Contrato com o NHS Parte 4 – Início do contrato/Duração do contrato Parte 5 – Garantias Parte 6 – Nível de competências/Prestação de serviços Parte 7 – Serviços básicos Parte 8 – Serviços adicionais Parte 9 – Serviços fora de horas (Out of hours services) Parte 10 – Não prestação opcional (opt outs) dos serviços adicionais e fora de horas Parte 11 – Serviços melhorados (Enhanced services) Parte 12 – Pacientes Parte 13 – Prescrição e dispensa de medicamentos Parte 14 – Pessoas que realizam serviços Parte 15 – Registos, informação, notificação e direitos de acesso Parte 16 – Certificados Parte 17 – Pagamento no âmbito do contrato Parte 18 – Taxas e encargos Parte 19 – Governação clínica 5. 6. 7. Elementos do prestador de serviços (“contractor”), quando individual Elementos do prestador de serviços (“contractor”), quando parceria Elementos do prestador de serviços (“contractor”), quando empresa Assinaturas das partes Informação que deverá constar da publicidade à prática clínica Formulários de dispensa (“repeat dispensing forms”) (em branco) Notificação de encerramento (“closure notice”) Plano para a melhoria das premissas (em branco) Calendarização do pagamento (em branco) Na Parte 1 (“Definições e interpretação”), descrevemse os termos e expressões utilizados no contrato, dos quais destacamos o conteúdo de serviços adicionais, designadamente: 1. Exames citopatológicos (“cervical screening services”); 2. 3. 4. 5. 6. 7. Planeamento familiar (“contraceptive services”); Vacinação e imunização (“vaccinations and immunisations”); Vacinação e imunização infantil (“childhood vaccinations and immunisations”); Vigilância da saúde infantil (“child health surveillance services”); Obstetrícia (“maternity medical services”); Pequenas cirurgias (“minor surgery”). O contrato determina ainda, na parte 7 (“Serviços básicos”), que o segundo contraente (“contractor”) deverá prestar os chamados serviços básicos e de emergência, em horário normal (“core hours”), de 49 Existe, ainda, um documento standard para variações, de forma a não ser necessária, nesses casos, consulta ao GPC (UK, s.d.). 58 forma apropriada a responder às razoáveis dos doentes (cláusula 46). O documento Quality and Outcomes Framework necessidades Guidance50 for GMS Contract 2009/10: Delivering Investment in General Practice, datado de Março de O Contractor deve prestar a todos os doentes registados e a todos os temporariamente residentes que estejam ou acreditem estar doentes em condições terminais, crónicas ou em que a recuperação é expectável. Os serviços deverão ser prestados de acordo com as práticas médicas e em resultado de discussão com o doente (cláusula 47.1). Deve também prestar tratamentos e cuidados contínuos, tendo em conta necessidades específicas, incluindo actividades de promoção da saúde e referenciações para outros serviços (cláusula 47.2). 2009, integra as alterações ao contrato com os GMS para 2009/10, identificando os 127 indicadores a contratualizar. São aí também fixados os princípios orientadores dos indicadores, nomeadamente (UK, 2009g): 1. 2. Quanto aos chamados serviços melhorados (“enhanced services”), encontram-se identificados em três tipos, referidos na parte 11 do contrato standard (UK, s.d.): 1. 2. 3. 3. Directed Enhanced Services (DES) – serviços que devem ser prestados pelos PCTs à sua população, como é o caso do programa de imunização infantil Local Enhanced Services (LES) – serviços desenvolvidos localmente e concebidos para ir de encontro às necessidades locais de saúde National Enhanced Services (NES) – serviços para responder às necessidades locais de saúde, contratualizados de acordo com as especificações nacionais e aos quais se aplica benchmarking. É o caso dos cuidados melhorados para os semabrigo, serviços mais especializados para a esclerose múltipla e cuidados especializados a pacientes depressivos 4. Os indicadores deverão, tanto quanto possível ter como base a melhor evidência disponível O número de indicadores para cada condição clínica deverá manter-se no mínimo compatível com uma precisa avaliação dos cuidados ao doente Apenas a informação que seja útil para os cuidados ao doente deverá ser coligida, devendo existir um equilíbrio entre o excesso de dados recolhidos e, por outro lado, uma amostragem inadequada Os dados nunca deverão ser coligidos duas vezes, ou seja, a informação recolhida para efeitos de auditoria (audit) deve ser recolhida de forma rotineira no âmbito dos cuidados ao doente e obtida a partir dos sistemas para a prática clínica existentes Os indicadores são numerados e, no caso de serem excluídos, essa numeração nunca será atribuída a outro, para que não haja comparações incorrectas ao longo dos anos. Os indicadores clínicos encontram-se organizados por categorias de doença, seleccionadas pelas razões seguintes: Estes serviços melhorados vieram ultrapassar uma lacuna que existia quanto aos serviços básicos e permitem a prestação de cuidados para além dos especificados de forma standard, com vista a apoiar os PCTs na redução da procura de cuidados secundários (UK, s.d.). 1. 2. O prestador de serviços (“contractor”) assegura ainda, no âmbito do mesmo contrato, que as instalações utilizadas para prestar os serviços contratados são adequadas à prestação desses mesmos serviços e suficientes para responder às necessidades dos doentes do contractor. 3. Quando a responsabilidade pela gestão contínua da doença reside principalmente no médico de clínica geral e na equipa dos cuidados primários Quando a evidência revela que os benefícios em saúde, no contexto da doença, resultam provavelmente da prestação de melhores cuidados primários, em particular se houver uma reconhecida orientação clínica nacional Quando a área da doença é uma prioridade na maioria das quatro regiões do Reino Unido No documento referido, salvaguarda-se que não se pretende que os indicadores cubram todo o processo e resultados de cada categoria de doença. 15.3.5. I NDICADORES 50 O Quality and Outcomes Framework (QOF) distingue-se dos Indicators for Quality Improvement (IQI), porquanto o primeiro diz respeito aos cuidados de saúde primários, enquanto os segundos respeitam aos cuidados de saúde secundários. 59 Os indicadores clínicos são 86 e encontram-se organizados em 20 domínios, designadamente: 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. 18. 19. 20. São também explicitados os pontos e etapas de pagamento em percentagem no domínio da experiência do doente, para qual foram estabelecidos 3 indicadores. Prevenção secundária de doença cardíaca coronária (10 indicadores) Doença cardiovascular – prevenção primária (2 indicadores) Falha cardíaca (4 indicadores) Acidente vascular cerebral e acidente isquémico transitório (8 indicadores) Hipertensão (3 indicadores) Diabete mellitus (17 indicadores) Doença pulmonar obstrutiva crónica (5 indicadores) Epilepsia (4 indicadores) Hipotiróidismo (2 indicadores) Cancro (2 indicadores) Cuidados paliativos (2 indicadores) Saúde mental (6 indicadores) Asma (4 indicadores) Demência (2 indicadores) Depressão (3 indicadores) Doença renal crónica (5 indicadores) Fibrilhação auricular (3 indicadores) Obesidade (1 indicador) Deficiências na aprendizagem (1 indicador) Consumo de tabaco (2 indicadores) Dirigidos às práticas que prestem serviços adicionais, são enunciados 9 indicadores distribuídos pelos domínios seguintes: 1. 2. 3. 4. O documento prevê, ainda, o conceito de “relatório de excepção” (“exception reporting”) para que as práticas possam cumprir os seus objectivos de melhoria da qualidade sem serem penalizados quando, por exemplo, os doentes não apareçam para as revisões ou a medicação não pode ser prescrita devido a contraindicação ou efeitos secundários, sendo também estabelecidos os nove critérios para estas exclusões. 15.3.6. I NCENTIVOS Os recursos resultantes de ganhos em eficiência apenas podem ser utilizados em serviços para os doentes, nomeadamente no desenvolvimento de prestação de cuidados mais alargados e no aumento da população a abranger (UK, 2005). No mesmo documento, são também indicadas as tabelas por domínio clínico, com explicitação dos pontos e das etapas de pagamento em percentagem. No início de cada período financeiro, as práticas deverão apresentar a forma como pretendem utilizar estes recursos. Sobre esta proposta, o PEC fará uma recomendação ao PCT. Em caso de conflito, recorrerse-á à arbitragem (UK, 2005). Relativamente a cada indicador clínico, é apresentado o rationale, ou seja, é explicada a razão pela qual o indicador foi seleccionado, indicando-se, quando possível, a fonte de evidência, orientações nacionais e artigos científicos. Em alguns indicadores é incorporado um factor tempo adicional, reconhecendo que na prática haja dificuldade em fazer com que os doentes cumpram o tempo de revisão previsto (por exemplo, se é necessário aos doentes com hipertensão rever a pressão arterial todos os 6 meses, o indicador prevê o espaço temporal de 9 meses). As propostas ao PCT deverão respeitar os aspectos seguintes (UK, 2005): 1. É também definida a informação para efeitos de auditoria que as práticas clínicas deverão submeter anualmente. 2. 3. 4. 5. 6. Os indicadores organizacionais são, por sua vez, 36 e encontram-se divididos em 5 domínios: 1. 2. 3. 4. 5. Registos e informação (12 indicadores) Informação aos doentes (2 indicadores) Educação e formação (7 indicadores) Gestão da practice (7 indicadores) Gestão clínica (medicines management) indicadores) Exames citopatológicos (4 indicadores) Vigilância da saúde infantil (1 indicador) Obstetrícia (1 indicador) Planeamento familiar (3 indicadores) 7. 8. (8 60 O contributo para a gestão da procura e para as metas do NHS, a forma de implementação das recomendações e posição financeira global do PCT Os benefícios para os doentes O enquadramento numa estratégica global A gestão do risco sem reprimir inovação Ganhos antecipados em saúde Prestação de adequados e efectivos cuidados de saúde Valor do dinheiro Acordo de outros profissionais de saúde, que também têm a responsabilidade de prestar cuidados aos mesmos doentes 9. Envolvimento do pessoal da “linha da frente” no processo decisório da contratualização e no uso de recursos “freed up” ganhos em saúde, tanto através de uma observação directa como de testes estatísticos formais. Neste caso, a provável carga de trabalho não parece estar correlacionada com os prováveis ganhos em saúde. Historicamente, o Department of Health tem procurado manter a separação entre os processos de decisão clínica e as compensações pessoais aos clínicos. No entanto, segundo Lewis (2004), esta política poderá reduzir a concretização dos benefícios desejados, dado que se os incentivos financeiros não são uma força motivacional por si só, serão, pelo menos, uma parte importante. Este resultado alerta para o perigo de os pagamentos a título de incentivos poderem enviesar a actividade, no sentido de se recompensar mais actividades de trabalho intensivo com benefícios para a saúde da população relativamente baixos. Actividades que conduzem a elevados ganhos em saúde mas que recebem menos incentivos podem estar, por outro lado, a ser mal pagos. Nesta linha de raciocínio não é suficiente demonstrar que uma actividade tem algum efeito sobre a saúde da população (pequeno) e então gastar dinheiro (muito) para incentivar a actividade. De acordo com Smith (2005), serão necessários incentivos mais incisivos para levar todos os GPs a assumirem orçamentos com o propósito de melhorarem os serviços. O mesmo autor sugere que parte da sua remuneração esteja, por isso, associada à responsabilidade de gerir um orçamento. Os autores propõem que os esquemas de pagamento de incentivos, como os do novo contrato com os GMS, tenha em vista a associação das recompensações aos benefícios para os doentes alcançados. Chalkley e McVicar (2008) registam também que, tanto no NHS inglês como noutros sistemas de saúde, tem sido notado um movimento que se distancia dos sistemas de pagamento que reembolsam os prestadores de cuidados de saúde, apenas atendendo ao critério do custo dos serviços que prestaram. Isto porque os pagamentos de incentivos têm custos de oportunidade para a saúde da população de dois tipos: 1. A motivação para este movimento resulta dos desejados benefícios sob a forma de incentivos dos sistemas de pagamento, argumentando que os prestadores são os “reclamantes” residuais de quaisquer poupanças que alcancem. 2. O actual NHS, onde existe o sistema de Pagamento por Resultados, estabelece contratos que especificam um preço fixo por tratamento. Chalkley e McVicar (2008) alertam para o facto de a teoria dos contratos sustentar, porém, a incorporação de um elemento de reembolso do custo num sistema ideal de pagamento. Os mesmos autores alegam, aliás, que os próprios financiadores do NHS, se tivessem essa escolha, estariam dispostos a permitir um ajustamento ex post do pagamento em determinadas circunstâncias. O dinheiro gasto em pagamentos de incentivos poderia ser aplicado noutras actividades que promovem a saúde O tempo do pessoal, já insuficiente, orientado para as actividades do QOF pelos incentivos de FFS será desviado de outras actividades em cuidados primários que promovem a saúde Se o pagamento falha no objectivo de reflectir ganhos em saúde, então existe o perigo da actividade clínica ser desviada para actividades dispendiosas, mas apenas marginalmente efectivas, em detrimento das actividades de baixo custo e altamente benéficas. O novo contrato conduzirá a um aumento das actividades do QOF cobertas pelo esquema do pagamento de FFS. Os autores questionam-se, no entanto, se melhorará a saúde da população. O novo contrato para os cuidados primários, no Reino Unido, oferece um pagamento fee-for-service (FFS) por um variado leque de actividades previstas no Quality Outcomes Framework, já descrito supra. Os pagamentos são concebidos de maneira a reflectirem a carga de trabalho correspondente. Porém, no estudo de Fleetcroft e Cookson (2006), que pretendeu explorar a associação entre estes incentivos financeiros e os prováveis benefícios para a saúde da população, foi observado que não existe aparentemente nenhuma relação entre o pagamento a título de incentivos (com base na provável carga de trabalho) e os prováveis Para dar resposta a esta questão central, é necessária, segundo os mesmos autores, uma análise aos resultados em saúde por via da introdução do novo contrato, em vez de uma estimativa (como no presente estudo) dos resultados prováveis. Será necessária evidência não apenas sobre os benefícios do contrato, mas também sobre os custos de oportunidade em termos de recursos e tempo do pessoal investido nas actividades do QOF e não noutras actividades que poderiam beneficiar a saúde da população. 61 15.4. O Department of Health alerta também (UK, 2009i) para o facto de ser necessário ainda avaliar a prestação actual de serviços, para identificar oportunidades para o desenvolvimento ou reconfiguração de serviços, determinando as forças e fraquezas da prestação dos principais serviços no momento. F ORMAÇÃO E APOIO O Department of Health identifica (UK, 2009i) as áreaschave nas quais o PCT deverá prestar suporte aos GPs e practice-based commissioners: 1. 2. 3. 4. 5. Dados necessários para a gestão e informação financeira Apoio gestionário e financeiro Celeridade na fixação do orçamento e no processo decisório Esquemas locais de incentivos Flexibilidade para explorar o PBC da forma que melhor se adeque aos GPs e practice-based Neste caso, o Department of Health aponta (UK, 2009i) determinadas áreas a considerar: 1. 2. 3. commissioners 6. Linhas de orientação para o estabelecimento de uma equipa de PBC 4. 5. 6. Nas linhas de orientação dirigidas às equipas de PBC, incluem-se as seguintes: 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. O desempenho actual dos serviços perante indicadores de qualidade Acesso actual para a população local Localização da prestação ou disponibilização dos serviços na localidade Experiência do doente quanto ao serviço Visão e experiência do serviço do pessoal Custos, incluindo benchmarking O Department of Health divulga ainda (UK, 2006) algumas técnicas para ajudar a identificar as áreas onde os serviços podem ser reconfigurados e, assim, libertar recursos para aplicação em doentes com necessidades clínicas específicas. A orientação dada neste documento dissemina as melhores práticas do NHS em diversas técnicas chave que os commissioners podem usar, com vista a assegurar que os serviços são utilizados apropriadamente, em particular a utilisation management (UM) e o prior approval (PA). Alcançar a um consenso com os colegas GPs, enfermeiros e outros profissionais de saúde sobre o caminho a seguir Estabelecimento de um grupo de trabalho para a implementação da actividade Assegurar uma estratégica clara e focalizada, através da criação da visão do que se quer alcançar por meio do PBC Envolver todos os elementos da equipa dos cuidados primários, incluindo gestores e enfermeiros, para que haja uma responsabilização colectiva Assegurar que as visões dos doentes estão representadas Estabelecimento de bons canais de comunicação; Documentação da visão e dos acordos alcançados Oferece também alguns indicadores aos commissioners no auxílio da determinação dos modelos mais apropriados para serviços de avaliação clínica (clinical assessment services – CASs) e para centros de gestão da referenciação (referral management centres – RCMs). Dado que existe muita informação disponível, é apresentada pela mesma entidade britânica (UK, 2009i) uma checklist das áreas sobre as quais os GPs e practice-based commissioners podem identificar as questões prioritárias na identificação e percepção das necessidades em saúde locais. Destacam-se a análise do plano estratégico de cinco anos da PCT respectiva, para confirmar as prioridades e melhorias desejadas para a melhoria da sáude e do bem estar da área local e contextualizar as propostas para o desenvolvimento ou reconfiguração dos serviços, a observação no contexto alargado de outras fontes de informação relacionadas também com a população local ou a comparação das estatísticas locais com outras áreas da região, usando os NHS Comparators, uma ferramenta desenvolvida pelo Information Centre em parceria com Connecting for Health. Não se trata, porém, como explicitado, de um guia definitivo. Ao longo do desenvolvimento da base de evidência e das boas práticas, outras informações, ferramentas úteis e apoio aos commissioners serão publicados pelo Department of Health. Os Primary Care Trusts recebem, ainda, em troca de uma subscrição anual51, o apoio da National Health Service Primary Care Contracting (NHS PCC), uma organização sem fins lucrativos que opera no âmbito do NHS e que colabora com as organizações de saúde no processo de contratualização e na sua implementação. 51 Para o biénio 2009/2010, a subscrição isolada de uma PCT tem o valor de £20,750. Se todas as PCT de uma Strategic Health Authority (SHA) subscreverem os serviços, o valor passa a ser de £15,500 (NHS PCC, s.d.). 62 O Department of Health aponta ainda a existência de um leque de poderosas ferramentas à disposição dos PCTs, para um processo de contratualização conducente às mudanças desejadas (UK, 2009f). Sabendo como cada uma funciona, a sua combinação será mais efectiva no sentido da concretização das mudanças desejadas. língua utilizada, instalações para crianças, descrição detalhada dos serviços oferecidos, incluindo áreas especializadas, scores de satisfação do doente, taxas da qualidade clínica, avaliação do desempenho. Deve garantir-se ainda que esta informação se encontra disponível através de links na internet, da distribuição em entidades públicas, como bibliotecas, e do desenvolvimento pró-activo de outros canais de divulgação da informação 5. Assegurar padrões mínimos – necessidade de registo junto da Care Quality Commission (previsto para 2011) 6. Promover a escolha do doente – sobre o médico de clínica geral junto do qual se podem registar, as formas adicionais de acesso aos serviços, os ciclos de cuidados disponíveis, o tipo de cuidados e apoio que receberão, a forma de acesso à prática clínica em que se encontram registados 7. Desenvolver o mercado – será necessário desenvolver uma estratégia para assegurar que o mercado dos prestadores pode dar resposta às necessidades identificadas, agora e no futuro, estratégia que não deverá estar limitada aos actuais modelos de prestação de serviços ou níveis de integração. Consiste na consideração da dimensão de potenciais doentes, suficiência dos actuais e futuros recursos humanos, viabilidade das instalações e infra-estruturas, sustentabilidade dos serviços requeridos, viabilidade do prestador para a duração do contrato 8. Contratualizar capacidade adicional – quando a avaliação das necessidades e o mapeamento dos serviços revelem que é preciso aumentar a capacidade dos principais serviços de cuidados primários, quando o ciclo de gestão contratual (“contract management cycle”) revele que é necessária capacidade adicional, seja na forma de um novo prestador para maior escolha e competição, seja incentivando um ou mais prestadores a expandirem-se, ou quando haja substituições periódicas (dissolução de parcerias, reforma de um médico de clínica geral, termo de um contrato). A capacidade adicional poderá ser contratualizada de três formas: contratualização dos serviços de uma prática totalmente nova (o que é uma oportunidade para especificar exactamente o que se pretende, estimular ideias, procurar propostas inovadoras), incentivando uma prática já existente a expandir, ou contratualizando um serviço alternativo 9. Melhorar instalações 10. Practice based commissioning (supra descrito) Estas ferramentas foram agrupadas sob dez temas gerais (UK, 2009f): 1. 2. 3. 4. Uso transparente da informação sobre a qualidade e o desempenho – os PCTs precisam assegurar que detêm um robusto e equilibrado conjunto de instrumentos de medição de qualidade para os cuidados primários, o que deverá ser desenvolvido em conjunto com os clínicos locais Uma abordagem compreensiva à gestão do desempenho – para o que é preciso capacidade e aptidão. Abrange quatro componentes essenciais: a. abordagem transparente e documentada à gestão contratual – que standards esperamos alcançar, quando e como será o nosso desempenho revisto, o que acontecerá se o nosso desempenho for inferior aos standards acordados, que apoio obteremos para melhorar, o que farão se falharmos b. desenvolvimento de um ciclo de desempenho c. medição do desempenho d. faseamento (escalation) – fixará o que será feito no caso de o desempenho ficar aquém dos standards acordados, clarificando como o PCT responderá a diferentes tipos de desafios (questões clínicas, problemas organizacionais, quebra dos standards mínimos, falha no cumprimento de standards de desenvolvimento), como e quando o desempenho contínuo será monitorizado mais intensivamente antes de outra intervenção, como será prestado apoio Apoio às melhorias na qualidade e no desempenho – por exemplo, colocando pessoas do PCT com especiais habilitações a trabalhar directamente com as unidades de saúde, partilhando as melhores práticas de outros prestadores, estabelecendo redes locais de aprendizagem entre os prestadores, mediar o apoio das agências, contratualizar consultadoria externa Prestar informação aos doentes e ao público em geral – localização, horário de abertura, estacionamento, meios de transporte, dimensão da prática clínica, qualidade das instalações, 63 serviços, os GPs e os practice-based commissioners deverão estar actualmente em posição de desenvolver um business case para a mudança (UK, 2009a). A precisa combinação das ferramentas a utilizar variará de acordo com as circunstâncias, prioridades e mudanças que se querem ver realizadas por cada PCT. O Department of Health espera, no entanto, que sejam usadas as duas primeiras (uso transparente da informação sobre a qualidade e o desempenho e uma abordagem compreensiva à gestão do desempenho), dado que são os processos básicos que permitirão a todos os PCTs obterem a percepção do desempenho de cada prática clínica e determinarão o que é necessário que aconteça para apoiar as melhorias a desenvolver. Os business cases são concebidos tanto para construir a conjectura de mudança como para demonstrar que os GPs e os practice-based commissioners têm um plano claro e robusto para a concretização da mudança na prática, a partir da utilização dos recursos. É fornecida alguma orientação para a construção bem sucedida de um PBC business plan, como: 1. Sumário claro, conciso e compulsório das necessidades a que se tenta responder 2. Explanação da forma como tal é consistente com o plano estratégico do PCT 3. Explanação clara, concisa e compulsória do que se está a tentar fazer e como isso irá beneficiar os doentes 4. Melhorias esperadas em eficiência e efectividade; 5. Exploração de abordagens alternativas para alcançar o mesmo objectivo 6. Os riscos do projecto e como serão mitigados 7. De que forma serão contactados os serviços associados como serviços sociais 8. Os recursos para a gestão e as habilitações necessárias 9. Os custos envolvidos na prestação do serviço; 10. Que critérios serão usados na medição da efectividade do serviço Todos estes processos e ferramentas precisam (UK, 2009f), no entanto, ser sustentados por: 1. 2. 3. 4. 5. Supervisão e liderança ao nível hierárquico superior Prestação de contas Aconselhamento clínico junto de peritos e liderança clínica Envolvimento regular das práticas de clínica geral e um envolvimento clínico mais profundo Envolvimento regular do público e representantes dos pacientes e “cuidadores” (“carers”) Para uma contratualização dos serviços de clínica geral de alto nível, nos termos expostos, o Department of Health entende, ainda, que devem ser reunidas onze competências, nomeadamente (UK, 2009f): 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. Liderança local Trabalho em colaboração com os parceiros na comunidade – criação do Local Area Agreement (LAA) Envolvimento contínuo e significativo com o público e doentes Liderar o envolvimento contínuo e significativo de todos os clínicos Gerir conhecimentos e promover a avaliação robusta e regular das necessidades Prioritizar o investimento de acordo com as necessidades locais Estimular de forma efectiva o mercado para responder à procura e assegurar os resultados exigidos Assegurar a aquisição de competências que garantam contratos robustos e viáveis Sistemas de gestão efectivos e trabalho em parceria com os prestadores para garantir o cumprimento do contrato Uma vez submetidos, os business cases têm que ser aprovados pelo respectivo PCT, no prazo de 8 semanas, procedimentos que poderão, no entanto, variar. Os commissioners clínicos podem esperar os seguintes apoios e prerrogativas (UK, 2009a): 1. 2. 3. 4. 5. 15.4.1. B USINESS C ASES Com a compreensão firme da oportunidade, com base na análise dos dados e na avaliação da prestação dos 64 Quadro para o desenvolvimento do PBC (PBC Development Framework) Equipa para o desenvolvimento do PBC e inquérito do PBC Rede de melhores práticas Desenvolvimento da liderança clínica Prerrogativas: a. Informação gestionária e financeira b. Apoio gestionário e financeiro c. Celeridade na fixação de orçamentos e na tomada de decisões d. Esquemas locais de incentivos e. Responsabilização do PCT f. Responsabilização do SHA referência aos cenários, indicando que podem oferecer soluções diferentes de forma a irem de encontro às diferentes necessidades e restrições financeiras. 15.4.2. P RACTICE - BASED C OMMISSIONING D EVELOPMENT F RAMEWORK O Practice-based Commissioning (PBC) Development Framework, referido no ponto 1 da lista referida supra, foi estabelecido pelo Department of Health e pode ser utilizado pelas SHAs, pelos PCTs e pelos practice-based commissioners (PBCs) para indicarem organizações apropriadamente capazes da prestação de um determinado âmbito de apoio ao desenvolvimento das competências para o PBC. Este conceito parte da ideia de que a contratualização é mais forte e mais efectiva quando resulta de uma parceria entre clínicos locais e gestores de serviços de saúde que trabalham lado a lado (UK, 2009h). Reconhece-se que nem todos os clínicos querem assumir o papel de commissioning, mas pretende-se que todos aqueles que o queiram tenham o apoio e as oportunidades para o seu desenvolvimento como líderes clínicos e para conduzirem o PBC. Pela mesma razão, prevê-se ainda a construção de parcerias producentes entre PCTs e commissioners clínicos e a disponibilização de exemplos de boas práticas no website do Department of Health. Se os profissionais da linha da frente vão centrar-se na melhoria dos cuidados prestados pelo NHS precisam de adequadas condições de trabalho e da educação e formação apropriadas, compreendendo esta última vertente uma abordagem orientada localmente, papéis claros e apoio aos gestores (Darzi, 2008). O PBC Development Framework encontra-se em vigor desde 2008 até, pelo menos, Novembro de 2012 e proporciona um método estruturado e eficiente no tempo para que as entidades do NHS adquiram apoio de elevada qualidade para dar impulso à sua capacidade e aptidões para o PBC. 15.4.3. W ORLD C LASS C OMMISSIONING Na sequência de um rigoroso processo para a identificação de um número de prestadores para prestar apoio ao desenvolvimento das capacidades dos PCTs and practice-based commissioners, foram indicadas 5 organizações, assim como as organizações suas parceiras, para o PBC Development Framework (Aetna Health Services (UK), Catch on Group, Centre for Innovation in Health Management , Humana Europe e Tribal Group). Existe, ainda, uma nova abordagem para a realização do commissioning, que aproveita as melhores práticas do país e dos sistemas de saúde do resto do mundo para melhorar a forma como os PCTs contratualizam serviços. Denomina-se world class commissioning (WCC), em virtude do qual os PCTs estão a prestar melhores serviços, mais próximos das necessidades locais, resultando em cuidados de maior qualidade, em melhor saúde e bem-estar e na redução das iniquidades em saúde na comunidade (UK, 2009i). De forma a garantir que o processo de avaliação fosse o mais robusto possível, o NHS foi envolvido ao longo do processo de selecção. «World class commissioning (WCC) is a new, ground-breaking approach (…). It is an ambitious programme, which takes best practice from this country, and from health systems around the world, to improve the way in which Primary Care Trusts (PCTs) commission services» (UK, 2009i) O Framework concede aos PCTs e practice-based commissioners acesso a um leque de prestadores rigorosamente avaliados, a convidar para uma minicompetição, onde a qualidade garantida corresponderá às necessidades individuais dos PCTs e practice-based commissioners. O Department of Health entende que um WCC efectivo e um forte PBC aumentam de modo infinito o potencial para a excelência da saúde da população, dos cuidados de saúde e do valor. O Department of Health suporta os custos da implementação do PBC Development Framework, enquanto os PCTs e os practice-based commissioners serão os responsáveis pelos custos de suporte dele resultantes com vista ao desenvolvimento local do PBC. Estes custos de suporte variarão em função da extensão e complexidade do apoio necessário. Como parte do processo de avaliação, foi solicitado aos concorrentes que delineassem a sua abordagem e preço para a prestação de suporte ao desenvolvimento do PBC num cenário fictício. Os concorrentes responderam com várias abordagens e custos com Sob a alçada deste programa, todos os PCTs desenvolveram planos estratégicos para a sua área, já descritos supra, mapeando as prioridades para a melhoria da saúde e do bem-estar local. Compete aos PCTs prestar uma liderança estratégica para a contratualização dos serviços adequados à prestação destas melhorias na saúde. A sua aptidão para trabalhar em parceria com os clínicos, com vista a 65 adquirir um entendimento empírico das necessidades dos doentes, é a chave para ser world class (UK, 2009i). É, ainda, disponibilizada na página referente a esta matéria do Department of Health diversa documentação, incluindo informação sobre cada candidato para que cada organização escolha aquele que apresente a melhor abordagem em relação às suas necessidades. 15.4.4. K NOWLEDGE P ROGRAMME B ASED 4. 15.4.5. P RIMARY C AR E P ROGRAMME C OMMISSIONING 2. 3. Conhecimento oriundo da investigação, por vezes chamada evidência Conhecimento oriundo da análise de dados, por vezes chamada estatística Conhecimento oriundo da experiência dos clínicos e doentes O formato é muito prático, com a inclusão de actividades a experimentar no local de trabalho, associado a exercícios de reflexão. O documento contém o desenvolvimento dos seguintes módulos: 1. 1. 2. 3. quatro D EVELOPMENT Os módulos têm também como objectivo ajudar à verificação dos padrões incluídos nos Standards for Better Health Framework. Gray (2006) especifica, no mesmo artigo, o Knowledge Based Commissioning Programme, cujo objectivo é contribuir para a prática com o melhor conhecimento actual procedente da investigação, experiência e análise de dados, com vista a assegurar que a afectação de recursos reflecte as necessidades, assim como a utilização de recursos maximiza os benefícios enquanto minimiza prejuízos e custos. O programa compreende designadamente: M ANAGEMENT O Programa para o Desenvolvimento da Gestão dos Cuidados Primários (Primary Care Management Development Programme – PCMDP) foi desenvolvido (NHS, 2007b) como um piloto para apoiar os gestores na construção das suas competências e capacidades individuais, em resposta a um documento de 2004 da mesma entidade. Os responsáveis pela contratualização precisam, segundo Gray (2007), deter conhecimentos de 3 tipos: 1. Mensalmente far-se-ão briefings de conhecimento dirigidos ao NHS sobre as inovações de elevado valor a implementar ou sobre novos conhecimentos sobre intervenções de menor valor que poderiam ser interrompidas. The National Service Network Programme – criação de redes clínicas sustentáveis. 50 redes de serviço nacional serão criadas, envolvendo o NHS e prestadores do sector independente. dimensões, 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. The Annual Population Value Review – reflexão sobre a variação da despesa. Tem como objectivo produzir em cada ano uma análise da despesa em programas de cuidados de saúde e a sua relação com as necessidades e valores das populações. Annual Patient-Focused Value Reviews – reflexão sobre a variação da prática e dos resultados. Em cada ano, cada contratualizado produzirá um relatório sobre a sua despesa e a actividade adquirida para servir a população, comparadas com as mesmas variáveis em outras populações, tendo em conta a incidência e prevalência da condição nessa população. O relatório incluirá também um plano para o ano seguinte descrevendo as intervenções que deverão ser iniciadas, interrompidas, aumentadas, diminuídas ou usadas apenas em investigação. Módulo prática Módulo Módulo Módulo Módulo Módulo Módulo Módulo Módulo 1: Condução e desenvolvimento da 2: 3: 4: 5: 6: 7: 8: 9: Gestão do risco Questões de parceria Serviços do doente e comunidade Finanças Recursos humanos Instalações e equipamentos Gestão e tecnologias de informação Cuidados à população Encontram-se, ao longo do documento, evidenciados os pontos do Quality and Outcomes Framework (QOF), que podem ser alcançados por meio da resposta a determinadas questões. 15.4.6. L EADERSHIP FOR CLINICAL SERVICE IMPROVEMENT A Improvement Foundation, que trabalha conjuntamente com o Department of Health, apresenta também programas dirigidos aos profissionais de saúde da “linha da frente”, de forma a alcançar ganhos e melhores resultados em saúde e a disponibilizar The National Innovation Management Programme – promoção da inovação de elevado valor. 66 ferramentas de desenvolvimento de competências na área da liderança e da melhoria da qualidade dos serviços prestados (IF, 2009). Quanto à utilização de recursos, também no ano 2007/2008, 46% (n:70) dos 153 PCTs apresentaram um desempenho “Bom” (good), 45% (n:69) um desempenho “Razoável” (fair), 5% (n:8) um desempenho “Excelente” (excellent) e os restantes 4% (n:6) um desempenho “Fraco” (week). O programa desenvolvido para o ano 2009/2010 tem o nome de Leadership for Clinical Service Improvement e destina-se aos gestores de cuidados de saúde para que adquiram competências para liderar as mudanças desejadas no sistema de saúde, através de um efectivo processo de contratualização (IF, 2009). 15.4.7. F RAMEWORK FOR P ROCURING E XTERNAL S UPPORT FOR C OMMISSIONERS E PCT BO ARD D EVELOPMENT F RAMEWORK Quanto ao cumprimento dos standards principais (core standards), mais especificamente, quanto à “equidade, escolha”, verificámos, no mesmo ano de 2007/2008, que 89% (n:136) dos 153 PCTs apresentaram o resultado “Cumprido” (compliant), 6% (n:9) “De garantia insuficiente” (insufficient assurance) e 5% (n:8) “Não alcançado” (not met). Estes programas foram lançados ao nível nacional e dirige-se aos Primary Care Trusts para colmatarem as suas deficiências no que respeita a capacidades e competências para o processo de contratualização (UK, 2009e). Ainda quanto ao cumprimento dos standards principais (core standards), mas agora, mais especificamente, em relação às necessidades em saúde locais, 99% (n:152) dos 153 PCTs apresentaram o resultado “Cumprido” (compliant) e 1% (n:1) “Não alcançado” (not met). 15.5. Já em relação às metas nacionais existentes, mais especificamente, quanto ao acesso a um GP, dos 152 PCTs (o South Downs Health NHS Trust não aparece listado, por razões desconhecidas), 47,4% (n:72) apresentaram o resultado “Abaixo do limiar de alcançado” (under achieved), 30,3% (n:46) o resultado “Alcançado” (achieved), 19% (n:29) o resultado “Não atingido” (failed) e os restantes 3,3% (n:5) o resultado “Informação não devolvida” (data not returned). A VALIAÇÃO DAS METAS CONTRATUALIZADAS A Care Quality Commission52 disponibiliza, num website do Department of Health (UK, 2008a), a verificação e comparação do desempenho entre as diferentes organizações do NHS, entre elas os Primary Care Trusts, que abarcam os serviços dos GPs, nos períodos de 2007/2008, 2006/2007 e 2005/2006. É possível verificar o desempenho numa determinada Strategic Health Authority ou em todos os 153 PCTs. O Department of Health identificou (UK, 2009a), por sua vez, as razões por detrás da falta de progresso do PBC nalgumas práticas: Podem ser analisadas as seguintes dimensões: 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. Qualidade dos serviços Utilização de recursos Standards principais (core standards) Metas nacionais existentes Novas metas nacionais Controlo do consumo de tabaco Diabetes Maternidade Outros 1. Falta de uma suficientemente forte e partilhada visão entre os PCTs e practice-based commissioners 2. 3. 4. 5. Podemos verificar que, no que respeita à qualidade dos serviços, no ano 2007/2008, 61% (n:94) dos 153 PCTs apresentaram um desempenho “Razoável” (fair), 27% (n:41) um desempenho “Bom” (good), 6% (n:9) um desempenho “Fraco” (week) e outros 6% (n:9) um desempenho “Excelente” (excellent). 6. Apoio insuficiente para o desenvolvimento da capacidade e aptidão (“capacity and capability”) para o PBC Deficiência na qualidade, desactualização da informação no apoio ao PBC e lenta resposta sobre os planos de PBC e business cases Confusão de papéis, responsabilidades e relações Preocupações sobre a governância e percepção de conflitos de interesse Falta de consenso sobre o correcto equilíbrio de incentivos Num exercício para encontrar os atributos de um PCT bem sucedido na concretização do PBC, o Department of Health solicitou a cada SHA (UK, 2008b) para indicarem o PCT com melhor desempenho em relação ao PBC (practice-based commissioning). 52 A Care Quality Commission substituiu a Healthcare Commission, a Commission for Social Care Inspection e a Mental Health Act Commission em Abril de 2009. 67 Foram observadas oito características comuns aos PCTs com melhor desempenho. Verificou-se também que os PCTs com pior desempenho apresentavam a ausência de pelo menos duas dessas oito características. consecução da mudança estratégica na prestação dos serviços e permitir a partilha de responsabilidade pela actividade. Este envolvimento com o “lado da procura” é um elemento necessário ao NHS e, em última análise, aos doentes que serve. O PCT considerado como o que apresentava o melhor desempenho apresentava ainda uma nona característica, a delegação orçamental formal nos consórcios com prestação de contas e acordo de prestação com o PCT. Os autores reconhecem que o PBC não perdeu apoio como conceito, mas é preciso, no entanto, aprender as lições sobre qual será a melhor forma de o implementar. O estudo de Sutton e McLean (2006) teve, por outro lado, como objectivo identificar os factores associados à qualidade dos cuidados primários de saúde incentivados por via do novo contrato com os General Medical Services (GMS). As oito características encontradas foram: 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. Liderança do PCT, visivelmente apoiante e empenhado no PBC, tanto nas acções como no discurso Clareza e boa definição reduzida a escrito dos papéis e responsabilidades do PCT e consórcios, e entre as práticas no âmbito de um consórcio Dados mensais, precisos, oportunos e comparativos ao nível da prática Estrutura local Apoio à gestão pelo PCT em dias de pessoal empenhado nos consórcios Subsídio para a gestão Esquemas de incentivos para promover a actividade numa área de importância estratégica Envolvimento relevante nas decisões de contratualização do PCT – chefia dos consórcios clínicos no Professional Executive Committee (PEC), ou uma poderosa comissão para a contratualização do PCT (não PEC) Um modelo multivariado, que incluía as variáveis de privação, dimensão e composição da equipa clínica e incentivos financeiros, explica 53% da variação nos resultados de qualidade. Segundo o estudo, os resultados de qualidade para os 10 domínios clínicos e cuidados holísticos do contrato com os GMS foram mais elevados para áreas de população empobrecida, equipas clínicas de maior dimensão e práticas com maior probabilidade de resposta a incentivos financeiros. A dimensão e composição da equipa clínica foi o elemento mais importante. Factores associados com a qualidade mas que, uma vez controladas outras variáveis, se revelaram sem significância foram a acreditação, o estatuto académico e a idade média dos GPs. Na segunda fase do estudo, uma vez conhecidas as práticas com melhor desempenho, verificou-se uma perda generalizada de entusiasmo pelo PBC, maioritariamente devido ao bloqueio de comportamentos pelos PCTs ou à falta de apoio. Os autores concluem que, se se generalizarem os resultados do presente estudo, ainda que sobre uma pequena amostra de uma área em particular, a estrutura e os recursos dos prestadores de cuidados primários parecem dever ser o foco dos decisores políticos na procura de melhorarem a qualidade. Muitos reportaram também uma maior dificuldade no envolvimento dos colegas devido a uma mais generalizada percepção de falta de apreço pelos GPs. Já o inquérito de Julho de 2009, conduzido pelo Department of Health e dirigido aos médicos de clínica geral que se encontram a desenvolver o processo do Practice-Based Commissioning, revelou que se tem verificado um aumento de novos serviços contratualizados como resultado directo do PBC (UK, 2009c). Os entrevistados manifestaram que a introdução rigorosa das oito características nas suas áreas seria de grande utilidade, mas que dependeriam de forma crucial da vontade da liderança do PCT. Os autores concluem que um melhor desempenho pode ser alcançado permitindo-se a verificação das oito características comuns às melhores práticas e através de exemplos por meio de sessões de trabalho em convenções, na web ou em ambos. Segundo o mesmo inquérito, quanto à implementação do PBC, 75% das práticas dizem ter recebido um sistema de incentivos e 61% apresentaram business cases. Quanto à percepção do PBC, 29% das práticas O PBC é a única via, segundo os autores do estudo, através da qual o NHS conseguirá envolver os GPs na 68 concordam que o processo tem melhorado os cuidados prestados (UK, 2009c). 15.6. A CREDITAÇÃO O Royal College of General Practitioners (RCGP) apresenta um sistema de acreditação, o Quality Practice Award (QPA), que tem como objectivo promover a melhoria da qualidade, o trabalho em equipa, a aprendizagem, a prática reflectida e com base na evidência. No âmbito do processo de acreditação, são considerados os indicadores organizacionais, os indicadores referentes aos exames citopatológicos e os indicadores relativos à experiência do doente (RCGP, 2009)53. 2. 3. No final de 2008, tinham sido acreditadas 206 práticas clínicas, enquanto outras 32 foram acreditadas pela segunda vez e 61 encontravam-se em processo de acreditação (RCGP, 2009). 4. As práticas podem ainda apresentar outros indicadores para se habilitarem a serem recomendados pelo National Reference Group (NRG) como equivalentes aos indicadores organizacionais do QOF (UK, 2009g). 15.7. 5. D ESENVOLVIMENTOS FUTUROS Como refere Smith (2004), infelizmente, cada região do Reino Unido tem prosseguido as suas políticas próprias e objectivos de gestão, com pouca referência aos seus “vizinhos”. O maior desafio dos sistemas de saúde, com vista ao passo seguinte do seu desenvolvimento, é escolher uma abordagem de forma robusta e crítica, recolhendo todos os ensinamentos. Escolha que deve ser, segundo o autor, avaliada com recurso a indicadores fundamentais de desempenho que permitam uma cuidadosa monitorização dos resultados em saúde e satisfação do utilizador. 6. 7. 8. O Department of Health enuncia, por seu lado, as características de uma contratualização clínica bem sucedida (UK, 2009a): 1. Um PBC bem sucedido caracteriza-se, centralmente, pelo envolvimento dos clínicos no ciclo contínuo da avaliação das necessidades da prática para as populações, analisando a forma como os recursos são utilizados e os serviços 9. 53 Os critérios da versão 12, aplicável ao período de 1 de Abril de 2009 a 31 de Março de 2010, encontram-se disponíveis na página web do Royal College of General Practitioners: http://www.rcgp.org.uk/practising_as_a_gp/team_quality/qpa/qpa _essential_guidance.aspx#PracticeProfile. prestados aos doentes ao longo do sistema, identificando o que é preciso mudar e trabalhando para a prestação da melhoria contínua da qualidade – assegurando que os doentes têm um conveniente acesso aos serviços certos, no local certo e no tempo certo UM PBC bem sucedido combinará o conhecimento local e a perícia profissional dos GPs e outros clínicos com crescentemente poderosas ferramentas e bases de dados que fornecem visões mais profundas sobre o impacto nos doentes individuais de mudanças mais alargadas nos serviços ou ciclos de cuidados Commissioners clínicos activos libertarão e reinvestirão recursos usando as suas aptidões e conhecimento para desafiar intervenções clínicas e prática clínica inefectivas e inapropriadas Os commissioners clínicos também utilizarão o seu conhecimento local e aptidões para desenvolverem propostas e business cases para novos serviços, trabalhando com os PCTs para dar forma às suas decisões de investimento estratégico para a comunidade local Através da análise dos ciclos de cuidados, da libertação de recursos para reinvestimento e da ajuda na tomada de decisões de commissioning mais alargadas, os practice-based commissioners serão capazes de mudar os cuidados para estruturas que prestam mais convenientes e integrados cuidados aos doentes Um PBC bem sucedido estará enraizado em sistemas fortes e culturas de envolvimento dos doentes e do público, assegurando que as decisões reflectem as necessidades diversas dos pacientes locais, incluindo aqueles cujas vozes são menos ouvidas O PBC também proporciona oportunidades para uma maior colaboração dos clínicos e profissionais e para um trabalho mais integrado ao longo das fronteiras tradicionais Um PBC de grande qualidade precisa assentar nos cuidados de saúde primários de elevada qualidade. Os PCTs devem poder esperar ver evidência de boa qualidade nos serviços dos GPs como um pré-requisito para a tomada de decisões no âmbito do PBC A prosperidade dos practice-based commissioners pode servir como uma força motora para a inovação clínica e dos serviços, identificando e disseminando novas ideias que melhoram a qualidade da saúde (desde Abril de 2009, os practice-based commissioners têm acesso aos novos regionais Innovation Funds) Por outro lado, o conceito de “commissioning a patientled NHS”, constante de um documento com o mesmo 69 nome de 2005, é definido de modo geral como uma mudança para o foco na contratualização (commissioning) através da estrutura e do processo, alterando a ênfase nos gastos em saúde para o investimento nos resultados em saúde e bem-estar (NHS, 2007A). autonomia ao nível local, com respeito compromissos e prioridades nacionais. As cinco prioridades nacionais para 2009/2010, já estabelecidas anteriormente no último Operating Framework, mantêm-se (NHS 60, 2008): 1. Na sequência desta concepção, surgiu o programa world class commissioning (WCC), já descrito supra, uma declaração de intenção, concebida para elevar as ambições para uma nova forma de contratualização. 2. WCC não é um fim em si mesmo, por isso, os commissioners são incentivados a demonstrar melhores resultados, «adicionando vida aos anos e anos à vida» (NHS, 2007A), designadamente, através de: 1. 2. 3. pelos 3. 4. Melhor saúde e bem-estar para todos – vivência mais saudável e longa; redução dramática das iniquidades em saúde Melhores cuidados para todos – serviços com base na evidência e da maior qualidade; escolha e controlo das pessoas sobre os serviços que utilizam, de forma a serem mais personalizados Maior valor para todos – as decisões de investimento são feitas de uma forma informada e reflectida, assegurando que as melhorias são concretizadas por meio de recursos disponíveis; os PCTs trabalham em conjunto para optimizar os cuidados efectivos 5. Melhorar a higienização e reduzir as infecções nosocomiais (Healthcare Associated Infections – HCAIs) Melhorar o acesso cumprindo o compromisso da referenciação para tratamento em 18 semanas e melhorar o acesso aos serviços de medicina geral Manter os adultos e as crianças com saúde, melhorando a sua saúde e reduzindo iniquidade em saúde (as áreas consideradas chave em 2008/2009 foram cancro, trombose, maternidade e infância) Melhorar a experiência do doente, a satisfação e envolvimento dos profissionais Preparar a resposta em caso de emergência, como no caso do surgimento de uma pandemia de influenza Adicionalmente às prioridades nacionais, há prioridades a determinar localmente, pelos PCTs em colaboração com os seus parceiros, baseadas no que as comunidades locais dizem ser importantes e reflectidas nos Local Area Agreements (LAAs). A discussão destas prioridades resulta da evidência sobre dados recolhidos, avaliação estratégica de necessidades e melhores práticas (NHS 60, 2008). Na concretização de um WCC, os PCTs deverão (NHS, 2007A) desenvolver os conhecimentos, aptidões, comportamentos e características que sustentem uma contratualização efectiva. Estas competências organizacionais encontram-se descritas em 11 pontos: Enquanto o NHS é um sistema nacional, os seus serviços são, com efeito, prestados localmente. Foram, por isso, estabelecidos os Vital Signs (NHS 60, 2008), fixados pela primeira vez como uma abordagem diferencial à gestão do desempenho, permitindo aos serviços locais a prestação de modo a ir de encontro às circunstâncias locais. Os indicadores encontram-se divididos em três dimensões: 1. 2. 3. 4. 5. Condução local do NHS Trabalho com os parceiros comunitários Envolvimento com o público e doentes Colaboração com os clínicos Gestão do conhecimento e avaliação das necessidades 6. Prioritização do investimento 7. Estimulação o mercado 8. Promoção da melhoria e da inovação 9. Aquisição de competências 10. Gestão do sistema de saúde local 11. Realização de investimentos financeiros sustentáveis 1. 2. 3. Em 2008, o Department of Health emitiu um documento (NHS 60, 2008), o segundo no âmbito de um planeamento de três anos estabelecido em 2007, onde declara que se mantém o compromisso dos últimos dois anos na delegação de maior poder e Must dos – exigências nacionais sobre o que precisa ser alcançado e até quando Prioridades nacionais para a prestação local Conjunto de indicadores – disponibilizados aos PCTs que, após consulta das suas comunidades locais e organizações parceiras, podem escolher as áreas onde pretendem focalizar a sua acção local e esforços para a melhoria. O Department of Health não pretende envolver-se na gestão do desempenho nesta vertente No documento já citado (NHS 60, 2008), é traçada uma nova abordagem à mudança, em que todos os envolvidos deverão desempenhar um papel. 70 Reconhece-se, por outro lado, ser necessário progredir ainda nas seguintes áreas: 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 4. 5. Conferir clareza à qualidade Medir a qualidade Publicar o desempenho em qualidade Reconhecer e recompensar a qualidade Elevar os padrões mínimos e máximos Assegurar a qualidade Inovar 6. 7. Para a concretização de um pagamento pelos resultados, foi, por outro lado, desenvolvida (NHS 60, 2008) uma nova versão dos healthcare resource groupings (HRGs) com envolvimento clínico significativo, com efeitos previstos desde Abril de 2009 – os HRG4. 8. practice based commissioners 9. Quanto a um desenvolvimento coerente dos serviços, os policy-makers defrontam-se, no entanto, segundo Lewis (2004), com uma questão de resposta complexa: como dar liberdade às pessoas que se encontram na linha da frente para inovarem e tomarem iniciativas, assegurando em simultâneo a coerência no desenvolvimento dos serviços de saúde em geral. Existe um cepticismo compreensível (Lewis, 2004) quanto à possível influência das decisões ao nível micro sobre os resultados ao nível macro. O Department of Health (UK, 2005) conclui que o PLC deve ser “bem-vindo” e não encarado com suspeita, dado que a delegação da commissioning e da configuração dos serviços poderá contribuir para: 1. 2. 3. Alcançar “localismo”, alocando poder o mais possível e o mais perto possível dos doentes O envolvimento das equipas de cuidados primários na configuração activa e na gestão de circuitos de cuidados A quebra da fronteira entre os cuidados primários e os cuidados secundários Também existem novas estruturas que permitem aos profissionais de cuidados de saúde primários o consenso na determinação de estratégias para a prestação de serviços no âmbito das quais as decisões de commissioning terão que ser tomadas, assim como novos mecanismos para uma regulação nacional do âmbito e princípios dos cuidados do NHS. Este novo contexto poderá diluir as preocupações quanto a potenciais iniquidades e custos operacionais, já verificados no passado, no caso de ser dada grande liberdade para contratualizar. Segundo o autor, os PCTs deverão “experimentar” um nível “ligeiro” de controlo sobre a commissioning delegada, pelo menos, quando não haja riscos estratégicos elevados, sob pena de os practice-led commissioners questionarem o sentido da experiência do PLC. Já segundo Smith (2005), os factores facilitadores de uma efectiva contratualização pelos cuidados de saúde primários são: 3. Regulamentação apropriada para a minimização de conflitos de interesse resultantes de serem os médicos de família tanto commissioners como prestadores Por outro lado, defende o Department of Health, as unidades de saúde deverão receber retorno sobre a utilização dos seus serviços de saúde (que a experiência de algumas PCTs tem revelado ser útil), dado que a partilha da informação, em tempo útil, é determinante para uma efectiva commissioning e gestão da procura (UK, 2004). Os PCTs podem garantir que os planos estratégicos não são postos em causa e que as decisões em nome da colectividade encontram suporte se tiverem a última palavra sobre as acções dos practice-led commissioners ou, pelo menos, se estabelecerem as fronteiras dos seus actos. Assim, assegurar-se-ão que estes demonstram consistência, ao nível da comunidade, com os protocolos estratégicos de âmbito geral (Lewis, 2004). 1. 2. Políticas que permitam a realocação de recursos entre prestadores e serviços Uma configuração local de serviços que permita aos commissioners a escolha entre prestadores Um sistema local de cuidados de saúde primários suficientemente desenvolvido para que se prestem serviços adicionais Incentivos que envolvam os médicos de família e as práticas na procura do desenvolvimento de novas formas de cuidados entre o circuito de cuidados primários e secundários Gestão efectiva e suportes de informação para os Estabilidade na organização de saúde Tempo suficiente para envolver os clínicos e estratégias para a contratualização a desenvolver e implementar Políticas que permitam aos doentes e commissioners um processo de escolha dos prestadores Por outro lado, se as funções de commissioning são delegadas também deverá ser a accountability. Deste modo, no âmbito do processo de delegação, o Department of Health britânico considera que as metas em saúde pública devem ser formalmente acordadas com os practice-led commissioners. 71 No Department of Health Anual Report, publicado em Junho de 2009, foi reforçada a importância do PracticeBased Commissioning e reconhecido que, em muitos casos, não foram ainda aproveitadas todas as suas potencialidades (UK, 2009b). 4. 5. Wanless (2002) refere no documento independente solicitado pelo Chancellor of the Exchequer, “Securing Our Future Health: Taking A Long-Term View”, a primeira avaliação com base na evidência dos recursos a longo prazo necessários para que o NHS atinja serviços de elevada qualidade, que estes dependerão da procura e das necessidades da população, do desenvolvimento da tecnologia, de questões com pessoal e produtividade. Neste relatório, Wanless constrói três possíveis para o serviço de saúde em 2020: 1. 2. 3. 6. cenários «Success or failure will ultimately depend on how effectively the health service uses its resources.» (Wanless, 2002) Um sólido progresso, em que as pessoas se encontram envolvidas no seu estado de saúde e têm confiança no sistema de cuidados de saúde primários e usam-no de modo apropriado e em que o serviço de saúde tem capacidade de resposta, dá uso às novas tecnologias e utiliza de modo eficiente os recursos Um desenvolvimento lento, em que não há alterações no envolvimento público, o estado de saúde é constante ou decrescente, o sistema de saúde não tem capacidade de resposta, não dá muito uso às novas tecnologias e apresenta baixa produtividade Um completo envolvimento em que os níveis de envolvimento público em relação à sua saúde são elevados, o estado de saúde melhora significativamente, as pessoas estão confiantes no sistema de saúde e procuram cuidados de elevada qualidade e em que o serviço de saúde tem capacidade de resposta, em particular na prevenção da doença, dá um grande uso à novas tecnologias e utiliza os recursos de modo mais eficiente Em 2003, foi solicitado pelo Primeiro-Ministro, o Chancellor e o Secretário de Estado para a Saúde que Wanless fizesse uma actualização dos desafios na implementação de um cenário de completo envolvimento, o que resultou no documento “Securing Good Health for the Whole Population: Population Health Trends”. Focalizado principalmente na prevenção e nos determinantes da saúde em Inglaterra, o documento mostra que tem havido, ao longo do século passado, uma grande alteração no peso da doença, designadamente das doenças infecciosas do século XIX e do início do século XX para as doenças crónicas do século XX e dos dias de hoje, a par de outros determinantes da saúde que desempenham um papel significativo na condução da saúde da população, como factores sócio-económicos e ambientais. Wanless (2003) adianta, por isso, que deve haver uma preocupação fundamental na melhoria da saúde da população e não apenas no tratamento individual das doenças. Wanless (2002) adverte que o sucesso da prestação de serviços de elevada qualidade não depende apenas na afectação dos recursos adequados, mas desses recursos serem usados até ao máximo possível. Para um uso efectivo de recursos, o mesmo autor sugere: 1. 2. 3. assegurar a prestação adequada de um serviço de elevada qualidade O equilíbrio certo entre os cuidados de saúde e os cuidados sociais, os cuidados primários e os cuidados secundários, o tratamento e a prevenção Assegurar que o uso do dinheiro dos contribuintes é utilizado de modo eficiente e efectivo através da realização de auditorias independentes Promover um maior envolvimento público de forma a aumentar a consciência dos cidadãos sobre o estado da saúde e a estabelecer parcerias mais efectivas entre as pessoas e o sistema de saúde 15.8. L ITERATURA CRÍTICA Vários estudos têm sido realizados com vista à avaliação do processo de contratualização com os GPs. Standards nacionais para os cuidados clínicos e Twomey e Pledger (2008) alertam para o facto de os objectivos estipulados no contrato com os GPs deverem atender aos diferentes métodos de classificação, que poderão apresentar resultados distintos, como no caso do controlo glicémico, influenciando o pagamento dos médicos. É importante verificar as diferenças entres os métodos quando são um sistema integrado de tecnologias de informação Incentivos e metas adequados O equilíbrio certo entre os standards nacionais e a sensibilidade às circunstâncias locais de modo a 72 alteradas as plataformas analíticas ou quando dois analysers diferentes estão localmente disponíveis. poderá fortalecer a capacidade do sistema de saúde em reorganizar a prestação de cuidados de saúde em torno dos cuidados primários, encorajando estes serviços a reter ou atrair doentes para o seio da comunidade. Há, no entanto, alguns focos de tensão, que deverão ser geridos com cautela, assim como deverá ser alcançado o equilíbrio certo entre as diferentes metas da política de saúde: Checkland et al. (2008) notam, por seu lado, que os objectivos clínicos contratualizados representam uma mudança para um modelo biomédico da saúde e da doença, contrário aos cuidados holísticos, biopsicosociais ou centrados no doente, prestados tradicionalmente pelos GPs. 1. Foram objecto de estudo quatro unidades com diferentes características organizacionais, que alteraram por completo a estrutura das práticas, as consultas e os cuidados clínicos, em resposta à QOF. No entanto, os prestadores de cuidados continuam a alegar que os resultados são fruto de uma prática holística, contrariando a realidade. 2. 3. Os autores declaram ter observado uma verdadeira mudança para um tipo de cuidados “mais” biomédico, orientado para a doença, em resposta aos imperativos do novo contrato, apesar de os médicos entrevistados não terem essa consciência, negando qualquer mudança significativa e argumentando em como continuam a prestar cuidados à pessoa em si, ainda que tenham mais atenção nas consultas para registar os elementos referidos na QOF. Os médicos, segundo os autores, entendem que o QOF está relacionado com uma melhor organização e registo das práticas médicas. Os incentivos para os médicos de cuidados de saúde primários gerirem a procura e os riscos financeiros podem conflituar com o seu papel como agentes dos doentes; A liberdade para as equipas de cuidados de saúde primários estabelecerem os seus objectivos encontra-se num ponto de tensão com o papel dos PCTs para assegurarem um coerente planeamento e prestação de serviços; A maior influência das equipas de cuidados de saúde primários na utilização dos recursos do NHS para a commissioning reduz o grau de prestação de contas pública formal exercida através dos PCTs. O mesmo autor refere que o PLC traz efectivamente benefícios para os doentes, na medida em foi concebido para: 1. No entanto, no âmbito deste estudo, os médicos apresentaram, de uma forma geral, satisfação com a implementação do contrato. E, se se argumentar que este contentamento poderá ter sido influenciado pela existência de incentivos, os autores referem que grande parte das verbas adicionais foi aplicada em novas contratações e em tecnologias de informação. 2. 3. Velasco-Garrido (2005) refere-se, por sua vez, ao novo contrato como uma ferramenta para a promoção de melhorias na qualidade dos cuidados primários, associando aspectos contratuais essenciais ao pagamento em função do alcance de metas clínicas e organizacionais e da implementação de garantias de qualidade. O mesmo autor ressalta, também, o facto de os médicos poderem determinar que metas e que áreas se propõem trabalhar e de existir um mecanismo que recompensa os profissionais por terem alcançado mais do que contratualizaram. Atribuir às equipas de cuidados de saúde primários autoridade para conceber pacotes de cuidados que reflictam as necessidades dos doentes (ao nível individual) de forma precisa e altamente responsável; Dar espaço à definição de preferências individuais em parceria com os doentes, expressas ao longo do processo de commissioning; Atribuir incentivos que possam deslocar o enfoque no tratamento para o enfoque na prevenção da doença e na promoção da saúde. Em eficiência, o PLC constitui também, segundo o autor referido, uma nova estrutura em que os cuidados podem ser geridos de forma pró-activa ao nível em que os doentes têm o primeiro contacto com o sistema de saúde. Os clínicos assumem, neste contexto, responsabilidade na gestão dos cuidados, na gestão do risco financeiro e na redução da procura ao NHS de cuidados dispensáveis, evitando o recurso a mecanismos de controlo menos sensíveis, como as listas de espera. Também o esbatimento progressivo da fronteira entre os cuidados primários e secundários, através da contratualização ou da prestação directa destes serviços pelas equipas de cuidados de saúde primários, por meio da aquisição de outras competências pela equipa, é um sinal positivo. Lewis (2004) nota igualmente que o PLC, diferindo da PCT-led commissioning, onde as decisões sobre a compra de cuidados reflectem, na melhor das hipóteses, as necessidades da generalidade dos doentes em vez das suas necessidades individuais, 73 Também acarreta benefícios políticos, na medida em que o PLC poderá constituir-se como uma estratégia para aumentar a consciência dos profissionais de cuidados primários sobre o seu envolvimento no trabalho dos PCTs e também o seu nível de influência sobre estes. Este envolvimento servirá igualmente para incrementar a accountability dos profissionais dos cuidados de saúde primários como gatekeepers dos cuidados prestados pelo NHS (Lewis, 2004). estabilidade organizacional e uma oportunidade para se testarem. Por outro lado, o envolvimento clínico e o uso apropriado de incentivos são fundamentais a um efectivo PBC e ao desenvolvimento dos serviços em todos os estadios do continuum da contratualização, em particular nas abordagens mais próximas do doente, devendo ser clarificada a legimitidade e a prestação de contas das organizações contratualizadoras, independentemente da aplicação de uma ou de outra mistura dos modelos. Deve ser ainda equilibrada, alerta o mesmo autor, com o necessário envolvimento dos clínicos. O PLC não representa, segundo este último autor, uma cisão entre as organizações ao nível local e os PCTs, mas uma parceria. O PLC poderá ser uma nova e dinâmica “arma” dos PCTs que, em vez de provocar a dissipação da sua influência, aumentá-la-á. Encorajando as práticas a contratualizarem cuidados no seu todo, novas alianças entre os cuidados primários e secundários poderão ser criadas, oferecendo pacotes sofisticados de cuidados, exigidos pelo crescente número de doentes com complexas e múltiplas doenças crónicas. O PLC poderá, com efeito, gerar a configuração de novos tipos de organização integrada de cuidados, com base na comunidade. Alguns dilemas surgirão, no entanto, como a necessidade dos profissionais se sentirem livres para inovarem e serem empreendedores e a necessidade dos PCTs planearem os cuidados de forma sistemática e de modo a melhorarem a equidade e o acesso aos serviços dos seus doentes. Estes trade-offs não se resolvem com facilidade e poderão ter soluções diferentes ao longo do país (Lewis, 2004). Segundo Smith (2004), este sistema pode, apesar de tudo, melhorar a utilização de recursos e o desenvolvimento dos serviços de forma positiva nos cuidados primários e intermédios. Existe um potencial significativo a retirar desta experiência de desenvolvimento de serviços e de inovação, agora no quadro robusto de responsabilidade (“accountability”) pública e das prioridades nacionais de saúde. O PBC pode ser efectivo como parte de um continuum de modelos de contratualização e particularmente apropriado para a gestão da doença crónica na comunidade e dos serviços de nível primário. O desafio será seleccionar uma mistura apropriada de abordagens e a clareza da escolha. Há a necessidade, porém, de desenvolver uma avaliação mais sistemática do impacto dos modelos de contratualização em saúde, incluindo a fixação de objectivos específicos de qualidade dos serviços, que poderão ser monitorizados de modo rigoroso. Para tal, é necessário, alega Smith (2004), que às organizações contratualizadoras seja atribuída 74 a reforma das estruturas financeiras e a reforma dos seguros de saúde privados (Germany, 2009). II. S ISTEMAS DE SAÚ DE TIP O BISMARCKIANO A modernização dos “fundos de doença” e a reforma do “fundo de saúde” são as pedras basilares do novo financiamento do sistema de saúde alemão (Schabloski, 2008). A LEMAN HA Quadro 16: Quadro-síntese Alemanha Sistema de saúde % PIB gasta em saúde Esperança de vida ao nascimento (anos) Esperança de vida saudável (HALE) ao nascimento (anos) Taxa de mortalidade neonatal (por 1.000 nados vivos) Organização da prestação de CSP Unidades de CSP Projectos com delegação de responsabilidades na gestão da prestação e dos recursos em CSP Mecanismos de contratualização de CSP Incentivos e apoios ao processo de contratualização de CSP Seguros compulsórios (1883) O Ministério Federal da Saúde alemão arroga apresentar actualmente um sistema de saúde moderno, eficiente e de alta qualidade, com cerca de 2.200 hospitais e mais de 300.000 médicos que prestam cuidados de saúde a mais de 72 milhões de membros do seguro de saúde estatutário e a 8,5 milhões de membros dos seguros de saúde privados. A despesa em saúde é de aproximadamente 245 milhares de milhões de euros, cerca de 11% do produto interno bruto (Germany, 2009). 10,4% 80 73 3 Associação de Médicos do Seguro de Saúde Estatutário Centros médicos - Os cuidados de saúde são prestados tanto por entidades públicas como privadas, controlando, porém, o Governo alemão as políticas de saúde e a prestação dos cuidados de saúde. Actualmente, encontra-se em execução uma política de solidariedade, em que todos deverão ter igual acesso a cuidados de saúde com qualidade, independentemente da capacidade para pagar (Schabloski, 2008). Contratos individuais entre prestadores e os “fundos de doença” (1883-1914) / Acordo de Berlim (1914-1923) / Contratos colectivos e contratos individuais (1923-1931) / Contratos colectivos em exclusivo (1931-1993) / Introdução da competição entre os “fundos de doença” (1993) / Contratos universais, experimentais e estruturais (1997) / Contratualização directa entre “fundos de doença” e prestadores privados (2007) Na sequência da reforma de 2007 e da consequente reorganização do fundo de solidariedade, com início em 1 de Janeiro de 2009 (Schabloski, 2008), os cidadãos alemães subscrevem actualmente um seguro de saúde compulsório, beneficiando da cobertura das despesas com serviços preventivos, cuidados hospitalares em regime de internamento ou em ambulatório, consultas, cuidados de saúde mental, saúde oral, prescrição de medicamentos, reabilitação e subsídio de doença. Os cuidados continuados estão, por sua vez, desde 1995, cobertos por um regime autónomo, imperativo também para toda a população (Busse, 2008). - 16. C ARACTERIZAÇÃO DO SISTEMA DE S AÚDE O sistema de saúde alemão assenta, desde 1883, no modelo bismarckiano (Sakellarides, 2006), ainda que tenha sofrido, ao longo do tempo, algumas modificações. Em 1 de Abril de 2007, deu-se início a uma reforma significativa, com a introdução da “Lei para o Fortalecimento da Competição no Sistema de Seguro de Saúde Estatutário”54 (Gesetz zur Stärkung des Pela primeira vez na história do sistema de saúde alemão, todos os residentes alemães são obrigados a subscrever um seguro de saúde, excepto se estiverem cobertos por outra via (Germany, 2009). Wettbewerbs in der gesetzlichen Krankenversicherung – nome reduzido: GKV-Wettbewerbsstärkungsgesetz Desde o início de 2009, os cidadãos alemães também já não têm que entregar aos “fundos de doença” uma contribuição, calculada com base numa percentagem progressiva sobre os rendimentos. De acordo com a nova reforma (Schabloski, 2008), os indivíduos e as suas entidades patronais contribuem com uma percentagem universal para os “fundos de saúde” (Gesundsheitfonds). ou sigla: GKV-WSG). Esta reforma incluiu alterações em quatro áreas principais, nomeamente, a introdução da cobertura universal, a reforma das estruturas de saúde e a reorganização do fundo de seguro de saúde, 54 Tradução nossa. 75 Com a introdução deste “fundo de saúde”, todos os contribuintes pagam pela mesma taxa de contribuição, em determinação do Governo Federal alemão (Germany, 2009). O valor de contribuição standard pretende enquadrar-se na nova política de cobertura universal compulsória (Schabloski, 2008). papel de gatekeeper, conduzindo o doente ao longo do percurso do ciclo de cuidados. A consulta de especialistas só pode ser feita por referenciação do médico de família respectivo, ainda que haja excepções, designadamente, para ginecologia, pediatria e oftalmologia (Schlette, Lisac e Blum, 2009). A partir das contribuições, o chamado “fundo de saúde” procede ao pagamento dos planos de seguros, com base na capitação. Estes pagamentos são ajustados pelo risco, com base na idade, sexo e estado de saúde (Schabloski, 2008). É desta forma que as seguradoras recebem os recursos de que necessitam para assegurar a prestação de cuidados aos seus membros, sendo pagos de forma justa e transparente (Germany, 2009). Os contratos de gatekeeping têm como objectivo melhorar a qualidade dos cuidados e a redução dos custos evitando consultas desnecessárias (Schlette, Lisac e Blum, 2009). No entanto, não parece serem por enquanto esses os resultados, dado que um inquérito realizado entre 2004 e 2007 revelou que os doentes inscritos em sistemas de gatekeeping não reportam um melhor estado de saúde relativamente aos não inscritos. Também as consultas a especialistas não parecem ter decrescido (Böcken, 2008, cit. por Schlette, Lisac e Blum, 2009). A competição introduzida no sistema de saúde alemão confere aos cidadãos uma maior liberdade de escolha entre as diversas formas e os diferentes preços de prestação de cuidados. Cada pessoa tem a liberdade de subscrever o seguro de saúde que melhor corresponda ao seu perfil, estatutários ou privados. O novo sistema de seguros de saúde está, assim, focalizado nas expectativas e necessidades dos seus membros, fomentando a competição entre as diferentes seguradoras, motor da reforma de 2007 (Germany, 2009). 17. O RGANIZAÇÃO Outra inovação foi a introdução em 2004 dos centros médicos (Medizinische Versorgungszentren – MVZ), também chamados policlínicas, que apenas podem prestar cuidados em ambulatório. São definidas pelo legislador como instituições multidisciplinares, presididas por médicos que contratam outros médicos (Germany, 2003). Estes centros de saúde, cujo número na Alemanha tem vindo a aumentar progressivamente, têm como finalidade melhorar a qualidade dos cuidados, mas não tem havido uma avaliação sistemática que permita concluir se têm alcançado os seus objectivos (Schlette, Lisac e Blum, 2009). DA PRESTAÇÃO DE CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOS A organização dos cuidados primários encontra-se regulada pela Associação de Médicos do Seguro de Saúde Estatutário55 (Quellmann, 2009), sendo esta linha de cuidados prestada por médicos de clínica geral que não têm, porém, historicamente uma função de gatekeepers (Busse, 2008). Desde 2007, a legislação impõe também aos fundos de seguros de saúde a oferta de contratos de gatekeeping. Para os doentes, a subscrição destes sistemas de gatekeeping é voluntária e pode ser recompensada por meio da atribuição de incentivos financeiros pelo seu fundo de seguro de saúde (Schlette, Lisac e Blum, 2009). Até ao final de 2007, cerca de 6 milhões de doentes tinham subscrito este sistema (Germany, 2007, cit. por Schlette, Lisac e Blum, 2009). Tem sido, no entanto, notada uma tendência para a prestação de cuidados de nível primário por meio de grupos de médicos de família (Saltman e Dubois, 2004), que coordenam as referenciações dos doentes para especialistas (Kamke, 1998). Estas experiências tinham anteriormente um cariz voluntário, registandose as do estado federal de Praxisnetz Berlin, de 1996 a 2002, e de Nordrhein-Westfalen, em 2004 (Saltman e Dubois, 2004). Os médicos de família que queiram fazer parte destes esquemas de gatekeeping devem preencher alguns requisitos, como a participação em grupos de qualidade, o acompanhamento de guidelines com base na evidência e a participação em acções de formação (KBV, s.d., cit. por Schlette, Lisac e Blum, 2009). Deverão, ainda, utilizar um sistema de gestão da qualidade (Busse, 2008). Em 2000, foi, porém, introduzido o gatekeeping. Os doentes têm agora liberdade de escolha pelo médico de família que, a partir desse momento, assume o 18. O 55 www.kvb.de 76 PROCESSO DE CONTRATUALIZAÇÃO O sistema de saúde alemão encontra a raiz da história da contratualização de cuidados de saúde ainda no século XIX, com legislação datada de 15 de Junho de 1883, altura em que foi introduzido o sistema estatutário de seguros de saúde (Germany, 2009). No início, os contratos eram estabelecidos um a um com cada prestador, tendo os “fundos de doença” um papel dominante nas negociações (Riemer-Hommel, 2002). Contrastando com a propugnação dos acordos colectivos pelas associações de prestadores, os “fundos de doença” reclamavam, por isso, maior liberdade para poderem activamente configurar a sua relação com os primeiros (Riemer-Hommel, 2002). A introdução, em 1 de Janeiro de 1993, da Gesundheitsstrukturgesetz (GSG), base legal do seguro de saúde estatutário na Alemanha (Sauerland, 2001), marcou um esforço maior no sentido da reforma do sistema de saúde alemão, com o objectivo de abolir a ineficiência, através de incentivos e da competição, ainda que os “fundos de doença” pudessem apenas competir por mais membros inscritos (Riemer-Hommel, 2002). Nos 30 anos que se seguiram, os prestadores de cuidados procuraram (Riemer-Hommel, 2002) centralizar o processo de negociação, tendo em 1914 sido aprovado o chamado “acordo de Berlim” ( Berliner Abkommen), que determinou a formação de comissões que, acima de tudo, preparavam as negociações contratuais e fixavam a regulamentação respeitante à admissão de médicos ao grupo de prestadores de cuidados “estatutários”. Com as alterações legislativas de 1993, foi igualmente atribuída importância à qualidade dos cuidados, tão preponderante agora como a eficiência. No entanto, se a eficiência (antes, talvez, contenção de custos) se tentava alcançar com fortes constrangimentos orçamentais, os instrumentos aplicados na promoção da qualidade não eram tão fortes (Sauerland, 2001). Quando, em 1923, o acordo cessou, reacenderam-se (Riemer-Hommel, 2002) os conflitos entre os fundos de doença e os prestadores, tendo sido introduzida, para os dissipar, a opção pela negociação de contratos colectivos, tendo, nos 10 anos seguintes, coexistido contratos individuais e acordos colectivos. Entre 1931 e 1932, passaram a existir apenas acordos colectivos, o que implicou a passagem da responsabilidade pela garantia da prestação de cuidados dos fundos de doença para a “associação dos prestadores de cuidados regulamentados” (Kassenärztliche Vereinigung). No relacionamento entre os decisores políticos e os “fundos de doença”, passou a existir, porém, espaço para alguma liberdade de escolha, possível desde 1 de Janeiro de 1996. No entanto, os “fundos de doença” não poderiam escolher ou compensar os prestadores mais eficientes ou estabelecer colaborações preferenciais (Riemer-Hommel, 2002). Os fundos de doença deixaram, nesta altura, de desempenhar um papel predominante, passando de actor principal na negociação de contratos individuais a um “pagador” de serviços sujeito a acordos colectivos (Riemer-Hommel, 2002). No final da década de 90, imperava (Riemer-Hommel, 2002) o princípio da igualdade e a validade generalizante dos termos contratuais negociados colectivamente. Porém, na senda da reforma da década de 90, o sistema de contratos veio responder à necessidade de impulsionar a inovação e a criatividade dos compradores de cuidados de saúde, no sentido de se procurarem novas formas de prestação e de remuneração (Kamke, 1998). De uma forma geral, os “fundos de doença” eram obrigados a negociar contratos numa base colectiva, condicionados pela regulamentação pública e por diversas exigências, como a eficiência económica (Riemer-Hommel, 2002). Neste contexto, surgiram, com a introdução da segunda legislação reformadora, datada de 23 de Junho de 1997, duas formas distintas de contratos, alternativas ao formato generalizante, os contratos experimentais (Modellversuche) e os contratos estruturais (Strukturverträge), as duas formas possíveis de conceder maior flexibilidade às negociações contratuais (Riemer-Hommel, 2002), ambos introduzidos com o objectivo, no fundo, de melhorar a qualidade e a eficiência dos serviços prestados em ambulatório (Kamke, 1998). No entanto, o enquadramento legal dos acordos colectivos não facilitava ou prestava apoio, segundo Riemer-Hommel (2002), à tentativa de alcançar a eficiência pelos “fundos de doença”. Estes nem sequer tinham competência para sancionar prestadores ineficientes. Este autor aponta que o facto de não poderem emitir recomendações ou penalizar os prestadores bloqueou a tentativa dos “fundos de doença” de alcançarem a almejada eficiência económica. A principal diferença entre estes dois tipos de contratos e os contratos universais standards consistia no facto 77 de se poder optar, através dos primeiros, por diferentes regras de pagamento aos prestadores assim como por criar redes com os prestadores de cuidados de saúde primários, com o propósito de gatekeeping (Riemer-Hommel, 2002). falhou a oportunidade de implementar mecanismos de competição para a promoção da qualidade dos cuidados. A prestação de cuidados de saúde na Alemanha encontra-se no momento altamente fragmentada, resultando numa integração vertical e horizontal empobrecida e num sistema principalmente focalizado no tratamento individualizado de doenças e não na gestão de populações de doentes (Schlette, Lisac e Blum, 2009), pelo que, segundo as autoras, só agora o sistema de saúde alemão começa a fortalecer os cuidados primários, reconhecendo que só assim poderá promover a coordenação e a capacidade de resposta dos cuidados de saúde. Os contratos experimentais permitiam, ainda, pagamentos na forma de bónus aos contraentes, não previsto nos contratos universais, nota Riemer-Hommel (2002). Estes contratos tiveram como objectivo, de acordo com os mesmos autores, a melhoria tanto da qualidade como da eficiência da prestação de cuidados de saúde. Cobriam áreas como, por exemplo, a prevenção, a detecção precoce ou o tratamento de doenças não cobertas pelos contratos regulares. A participação dos doentes e dos prestadores era voluntária e os termos do contrato podiam ter a duração até oito anos, podendo ser negociados desvios ao contrato universal. Tradicionalmente, a medicina familiar não tem desempenhado uma função de gatekeeping, podendo os doentes livremente escolher e aceder tanto a prestadores de cuidados primários como secundários, tornando difícil a coordenação e a cooperação ao longo dos sectores (Schlette, Lisac e Blum, 2009). Os contratos estruturais tinham, por seu lado, como objectivo o estabelecimento de redes de prestadores como uma forma organizacional alternativa, prestando cuidados de saúde de acordo com o princípio da economia (Riemer-Hommel, 2002), e a responsabilização da rede de médicos pelos “seus” doentes (Kamke, 1998). De acordo com RiemerHommel (2002), estes contratos abrangiam prestadores de cuidados primários e redes de prestadores de cuidados primários e especializados, sendo a participação dos doentes e dos prestadores também voluntária. Não havia limitações para a sua duração e podiam igualmente ser negociados desvios ao contrato universal. Muitos destes contratos estruturais experimentaram uma curta duração, por falta principalmente de experiência na gestão, alega este último autor. Desde o ano 2000 que têm sido preparados diversos movimentos legislativos no sentido da promoção da continuidade dos cuidados, servindo os cuidados primários de eixo, permitidos por uma invulgar continuidade programática nas políticas de saúde alemã. Os cuidados primários têm estado no centro de todas as reformas, sendo fortalecido o seu papel como comandante do caminho percorrido pelo doente no sistema de saúde (Schlette, Lisac e Blum, 2009). De forma a facilitar novas formas de prestação de cuidados, o Governo Federal alemão alterou, em 2000, as regras para a contratualização entre os fundos de seguros de saúde e os prestadores. Pela primeira vez, as seguradoras não estavam limitadas aos contratos negociados colectivamente e a orçamentos, sendo possível agora os médicos contratualizarem de forma selectiva com as primeiras, em esquemas de cuidados integrados, modelos de gatekeeping e programas de gestão de doença (Schlette, Lisac e Blum, 2009). Por outro lado, existia um número de restrições e limitações a estes dois tipos de contratos. Por exemplo, se os prestadores decidiam participar, já não poderiam ser excluídos (Riemer-Hommel, 2002). Kamke (1998) previu que se viesse a verificar uma mistura entre os elementos que caracterizavam os contratos experimentais, que admitiam a atribuição de incentivos aos membros inscritos, e as características próprias dos contratos estruturais, que concediam orçamentos aos médicos. Riemer-Hommel (2002) já defendia que, enquanto os “fundos de doença” não pudessem estabelecer uma contratualização selectiva, não conseguiriam influenciar a prestação de cuidados e a estrutura dos serviços de saúde, ainda que este mecanismo não fosse por si só suficiente para o ambicionado controlo de custos. A reforma dos cuidados de saúde iniciada em 2000 (Gesundheitsstrukturreform) atentava na qualidade e, especialmente, no fortalecimento dos prestadores de cuidados de saúde primários. Esta tentativa reformadora não obteve (Riemer-Hommel, 2002), porém, o apoio desejado e, segundo Sauerland (2001), Estas inovações têm, assim, promovido formas de prestação de cuidados integrados através de centros clínicos, o gatekeeping, incentivos financeiros para médicos, seguradoras e doentes e a competição através da contratualização selectiva entre prestadores 78 e financiadores, ainda que tenha sido dado muito lentamente início a contratos com esta nova tramitação (Schlette, Lisac e Blum, 2009). Foram desenvolvidas algumas experiências, já referidas anteriormente, nomeadamente por equipas voluntárias de médicos de família nos estados federais de Praxisnetz Berlin, de 1996 a 2002, no âmbito do enquadramento legal anterior, e de NordrheinWestfalen, desde 2004, que pretendiam actuar como gatekeepers do sistema de saúde, utilizando o regime de contratos como modelo de pagamento dos prestadores de cuidados de saúde (Saltman e Dubois, 2004), acompanhando uma cada vez maior preocupação com a qualidade dos cuidados, a eficiência e o controlo de custos (Busse, 2008). De forma a impulsionar a coordenação dos cuidados permitida pela nova legislação, foram oferecidos incentivos aos prestadores, mas apenas entre 2004 e 2008, em que 1% do orçamento do Seguro de Saúde Estatutário disponível para os cuidados hospitalares e de ambulatório foi destinado ao financiamento da contratualização de cuidados integrados. Em 2005, foram firmados 600 contratos de cuidados integrados e, em Dezembro de 2008, eram mais de 6.000, abrangendo esta forma de contratualização cerca de 4 milhões de doentes (Schlette, Lisac e Blum, 2009). Actualmente, e desde a reforma de 2000, a prestação integrada de cuidados na Alemanha é (Schlette, Lisac e Blum, 2009) orientada para a população, reforçando o papel dos cuidados primários como coordenadores do ciclo de cuidados do doente e implicando cuidados mais compreensivos, prestados por uma equipa multidisciplinar não apenas responsável pelo tratamento da doença mas também pela manutenção e promoção da saúde da população abrangida. A competição introduzida com a reforma de 2007 veio permitir às seguradoras, por outro lado, novas possibilidades na configuração dos contratos, podendo, por exemplo, contratualizar directamente com os médicos que prestam cuidados de saúde em consultórios privados (Germany, 2009). Muitas das reformas encontram-se, porém, ainda em fase de implementação (Schlette, Lisac e Blum, 2009), dada a sua introdução ainda tão recente, não sendo possível por enquanto uma avaliação sistemática. 79 O financiamento público do sistema de saúde tem (Durand-Zaleski, 2008), essencialmente, origem em impostos sobre os vencimentos entregues pelos trabalhadores e pelas entidades patronais56 (43%), sobre os rendimentos – “contribution sociale generalisée” – (33%), criada em 1990, e sobre a venda de tabaco e álcool (8%), e ainda em subsídios estatais (2%) e em transferências de outros ramos da segurança social (8%). F RAN ÇA Quadro 17: Quadro-síntese França Sistema de saúde % PIB gasta em saúde Esperança de vida ao nascimento (anos) Esperança de vida saudável (HALE) ao nascimento (anos) Taxa de mortalidade neonatal (por 1.000 nados vivos) Organização da prestação de CSP Unidades de CSP Projectos com delegação de responsabilidades na gestão da prestação e dos recursos em CSP Mecanismos de contratualização de CSP Incentivos e apoios ao processo de contratualização de CSP 19. C ARACTERIZAÇÃO L‟Assurance Maladie (1945) - Seguros compulsórios em 3 regimes principais (geral, agrícola, independentes) 11,1% 81 73 A Assurance Maladie foi criada em 1945, sob três princípios fundamentais: a igualdade no acesso à prestação de cuidados, a qualidade dos cuidados de saúde e a solidariedade (L‟Assurance Maladie, 2008ª). Este novo sistema de segurança social surgiu na sequência do Act on Social Insurance de 1930, que sinalizava a emergência de um sistema de seguro público. Foi, então, criada uma protecção compulsória para os trabalhadores industriais e comerciantes, com rendimentos abaixo de determinado nível. As áreas protegidas eram a doença, maternidade, incapacidade, velhice e morte. O sistema passou a abranger também os agricultores, em 1961, e outros trabalhadores por conta própria, em 1966, num processo faseado de alargamento da cobertura do seguro público (Sandier et al., 2004). Em 1974, e após a autonomização em 1967 dos ramos da doença, velhice e família (L‟Assurance Maladie, 2008ª), deu-se início a um processo de globalização da cobertura, tendo sido criado um sistema de seguro pessoal para aqueles que não se enquadrassem naquelas categorias. Nestes casos, os cidadãos pagavam uma contribuição ou requeriam, no caso de não terem meios suficientes, que o sistema pagasse por eles (Sandier et al., 2004). 2 Prestação de forma independente pelos médicos de família / Centros de saúde geridos pelas autoridades locais ou pelas associações mutualistas Médicos de família em consultório privado / Centros Médicos Negociação de acordos colectivos por área profissional, num formato estandardizado (1960) / Conventionement (1970) / Acordos autónomos com os médicos (Reforma de Juppé de 1996) / Acordos de boas práticas de âmbito regional e nacional; Acordos para a área profissional; Contratos autónomos + Contratualização selectiva (2002) - DO SISTEMA DE S AÚDE Inspirado inicialmente no sistema bismarckiano, o sistema de saúde francês (l‟Assurance Maladie) combina, nos dias de hoje, elementos decorrentes dos modelos de Bismarck e de Beveridge, tendo por base seguros de saúde, enquadrados num sistema de segurança social, sob uma forte intervenção estatal. O seguro de saúde em França é, por isso, actualmente mais centralizado e uniforme do que em outros sistemas de tipo bismarckiano (Sandier et al., 2004). Reformas recentes alteraram as características originais do sistema de saúde francês, como a “reforma de Juppé” de 1996, que aumentou o poder do Parlamento, responsável agora pela definição de metas em saúde e de objectivos financeiros. Por outro lado, as contribuições dos trabalhadores deixaram de se basear nos salários, sendo actualmente calculadas a partir da totalidade dos rendimentos, assumindo o carácter de um imposto. Este novo elemento aproximou o sistema de saúde francês do modelo de Beveridge (Sandier et al., 2004). A Assurance Maladie funciona através de cerca de 250 organismos orientados por uma lógica de desempenho colectivo, com vista a alcançar ganhos em eficiência, a fortalecer as competências existentes e a optimizar os recursos disponíveis por meio da partilha de serviços entre organismos (como um departamento jurídico, por exemplo). É incentivado o rigor na gestão dos diferentes organismos, sob a vigilância da Assurance Maladie, através da observação de indicadores de resultados (de serviços e da gestão do risco) (L‟Assurance Maladie, 2005). Com a reforma da Couverture Maladie Universelle (CMU), em vigor a partir de 1 de Janeiro de 2000, o seguro de saúde obrigatório, base do actual sistema de 56 Não existe um limite máximo para as contribuições dos trabalhadores e das entidades patronais, traduzindo-se o imposto em 0,75% e 12,8% sobre o vencimento, respectivamente (DurandZaleski, 2008). 80 direitos para todos (Sandier et al., 2004), o que serviu de base ao aparecimento de diferentes regimes visando proteger em matéria de saúde todos os residentes em França. saúde francês, passou a cobrir toda a população (Sandier et al., 2004). Este diploma estabeleceu (Durand-Zaleski, 2008) uma cobertura universal do sistema de saúde, atribuindo o direito ao seguro de saúde público a qualquer residente em França. Actualmente, estão presentes três regimes principais no sistema de l‟Assurance Maladie (L‟Assurance Maladie, 2008b)58: A CMU contribuiu (Sandier et al., 2004) para a redefinição, nos dias de hoje, do sistema de saúde francês, que passou de um sistema de seguros de saúde, com base no emprego, para um sistema de cobertura universal. i. Em 2004, deu-se uma reforma estrutural da Assurance Maladie, impulsionada pela situação financeira particularmente preocupante, tendo sido redefinida a organização da oferta de cuidados de saúde (L‟Assurance Maladie, 2008ª). Actualmente, os seguros de saúde existentes são públicos ou privados e financiam os mesmos serviços prestados pelas mesmas entidades e para as mesmas populações. Existe, ainda, uma grande oferta de seguros de saúde voluntários complementares, que têm por objectivo cobrir os co-pagamentos tabelados (Sandier et al., 2004). ii. Os seguros de saúde privados são financiados fundamentalmente pelas associações de trabalhadores mutualistas (mutuelles) sem fins lucrativos, que cobrem entre 87% a 90% da população. Estas associações apenas cobrem serviços de saúde já garantidos pelo sistema de seguro de saúde público. Mais recentemente, seguradoras com fins lucrativos têm vindo a oferecer cobertura de serviços não incluídos no pacote público de benefícios de saúde (Durand-Zaleski, 2008). iii. A cobertura de um ou outro seguro público de saúde depende da ocupação profissional, pelo que não existe competitividade entre os fundos. As associações mutualistas também têm como base de selecção o ramo profissional, havendo geralmente apenas uma ou duas escolhas em alternativa. Por isso, a competição entre as mutuelles é também praticamente inexistente57 (Durand-Zaleski, 2008). Regime Geral – Assurance Maladie (Régime général). É o regime de seguros solidário de quatro em cinco pessoas em França, financiando 75% das despesas em saúde (L‟Assurance Maladie, 2008b). O regime geral é centralizado pelo Estado, abrangendo trabalhadores por conta de outrem do comércio e da indústria e as suas famílias (cerca de 87% da população) e beneficiários da Couverture Maladie Universelle59, os não elegíveis para a cobertura do regime nos termos gerais (cerca de 0,4% da população), e da Couverture Maladie Universelle – Protection Complémentaire (CMU-C), que garante a cobertura a cidadãos de baixos rendimentos60 (Durand-Zaleski, 2008) Regime agrícola, garantido pela Mutualité Sociale Agricole (MSA). É o regime que protege agricultores por conta própria e por conta de outrem e suas famílias (cerca de 10% da população em 200961) (MSA, 2009) Regime social dos independentes – Régime Social des Indépendants (RSI). Constitui uma reforma de modernização e simplificação do serviço público da segurança social (RSI, 2007) para os trabalhadores por conta própria não agricultores, tendo, por isso, surgido na forma de único interlocutor para toda a protecção social obrigatória desde 2008. O RSI delega nos organismos convencionados (mutuelles e 58 Estes três regimes encontram-se agrupados na chamada Union Nationale des Caisses d‟Assurance Maladie (U.N.C.A.M.), criada com vista à condução da política convencional, à definição dos cuidados reembolsáveis e à fixação das coberturas (L‟Assurance Maladie, 2009). 59 A CMU de base permite a todos os residentes em França beneficiarem da prestação de cuidados de saúde quando não estiverem cobertos a outro título, designadamente, pelos regimes de seguro de saúde obrigatórios (Artigo L380-1 da Lei nº 99-641 de 27 Julho de 1999, publicado no art. 3 do Journal Officiel de 28 Julho de 1999, com entrada em vigor a 1 de Janeiro de 2000 (Fonds CMU, 2007). 60 Em 1 de Junho de 2009, entrou em vigor o revenu de solidarité active (RSA) que substituiu o allocation de parent isolé (API) e o revenu minimum d'insertion (RMI). Os beneficiários do RSA podem afiliar-se à CMU de base se não estiverem protegidos a outro título. A afiliação é gratuita reunidas determinadas condições. Estes cidadãos também poderão subscrever a CMU-C em certas situações (Fonds CMU, 2009). 61 Os beneficiários da MSA são, em 2009, cerca de 6,5 milhões (MSA, 2009), enquanto a população em França era, em 2006, de cerca de 61,3 milhões (WHOSIS, 2008). O objectivo do sistema de segurança social francês, inspirado em Beveridge, tem consistido na criação de um único sistema que garanta a uniformidade de 57 Não existe um sistema de ajustamento pelo risco entre as mutuelles, ainda que haja uma certa selecção inadvertida, também com base no risco, uma vez que é determinada pela ocupação profissional (Durand-Zaleski, 2008). 81 seguradoras) a gestão da prestação de cuidados (RSI, 2008) um lado, hospitais privados com fins lucrativos e, por outro, muitos médicos independentes (Sandier et al., 2004). Existem ainda outros regimes, chamados “especiais” (L‟Assurance Maladie, 2008b), que cobrem outras categorias profissionais, funcionando conjuntamente com o regime geral (estudantes, militares, entre outros) ou autonomamente (Sandier et al., 2004), como os regimes da marinha, Banque de France, Assembleia Nacional, Senado, clero ou dos mineiros e dos notários (L‟Assurance Maladie, 2008b). Os cuidados de saúde de nível primário são prestados por médicos que exercem a profissão de forma independente, dentistas e auxiliares médicos nas suas áreas profissionais e, ainda, por pessoal assalariado dos hospitais e dos centros de saúde (Sandier et al., 2004). Existem, ainda, cerca de 1.000 centros de saúde, geralmente geridos pelas autoridades locais ou por associações mutualistas, que também actuam na prestação de cuidados de ambulatório (Sandier et al., 2004). Existe, também, um regime para os residentes ilegais, L‟Aide Médicale d‟Etat (AME) (CMU, s.d.; DurandZaleski, 2008) e, ainda, a Aide Complémentaire Santé, atribuída em condições semelhantes às do CMU-C e que consiste na aquisição de uma cobertura complementar prestada por um organismo complementar à escolha (CMU, s.d.)62. 20. O RGANIZAÇÃO A organização dos cuidados ambulatórios em França encontra-se largamente determinada pelos princípios do sistema de médicos independentes de 1927, designadamente, a livre escolha do médico de família pelo doente, o absoluto respeito pelo sigilo profissional, o direito a cobrar taxas por cada doente tratado, os pagamentos directos pela pessoa segurada, liberdade de terapêutica e de prescrição de medicamentos e livre escolha pela área clínica (Bourgueil, Marek, Mousquès, 2009). DA PRESTAÇÃO DE CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOS O sistema de saúde francês é caracterizado (Sandier et al., 2004) pela liberdade de escolha e pelo fácil e livre acesso dos doentes, incluindo o acesso directo a especialistas, e pela liberdade de prática e de prescrição pelos profissionais de saúde (os médicos deverão, apenas, respeitar guidelines). Os profissionais liberais, médicos de família e outros especialistas, representam a maioria dos profissionais de saúde. Não obstante, existem outros tipos de serviços e estruturas de saúde, alguns com vários anos, organizados com base em critérios territoriais (serviços de cuidados ao domiciílio, Protecção à Maternidade e Infância, serviços de emergência), dependentes de uma unidade hospitalar ou de instituições específicas (Bourgueil, Marek, Mousquès, 2009). Trata-se de um sistema de gestão complexa e pluralística, reflectindo a tentativa de equilíbro entre diferentes valores, como a equidade, liberdade e eficiência. Enfrenta, também, por essa razão, dificuldades estruturais, catapultoras de reformas de saúde (Sandier et al., 2004). Os seguros de saúde garantem o acesso dos cidadãos a profissionais de saúde da sua escolha, não havendo, por regra, limites para os serviços a reembolsar. Excepto nos casos de hospitalização, em que o hospital é pago directamente pelo seguro de saúde, e dos beneficiários da Couverture Maladie Universelle (CMU), a regra geral é a de que os doentes pagam directamente aos prestadores e são posteriormente reembolsados pelo seguro de que beneficiam. Os pagamentos directos são cada vez mais comuns no ambulatório (Sandier et al., 2004). Os cuidados de ambulatório encontram-se, por isso, largamente desenvolvidos em França, oferecendo um leque variado de serviços, por meio de uma organização não hierárquica e, por vezes, iniquitativamente distribuída ao longo do território francês. Por essa razão, a coordenação dos cuidados depende do próprio doente e da sua família, por um lado, e do entendimento entre os profissionais de saúde (baseado na confiança, na formação em comum e em protocolos mais ou menos explícitos), por outro (Bourgueil, Marek, Mousquès, 2009). A oferta de cuidados é abundante, sendo a prestação de cuidados tanto pública como privada. Existem, por O sistema de saúde francês ao nível dos cuidados primários pode caracterizar-se (Bourgueil, Marek, Mousquès, 2009), assim, por um modelo profissional não hierárquico. 62 A Coverture Maladie Universelle apresenta, assim, quatro modalidades: a CMU de base, a CMU compleméntaire, a Aide compleméntaire santé e a Aide Médicale de l‟État (CMU, s.d.). 82 A reforma do financiamento do sistema de saúde de 2004 introduziu um sistema voluntário, ainda que com fortes incentivos financeiros, de gatekeeping para maiores de 16 anos63 (Durand-Zaleski, 2008). Ao médico escolhido dá-se o nome médecin traitant, figura criada pela Lei nº 2004-810, de 13 de Agosto, alterada em 23 de Julho de 2009 (Legifrance, 2004; Legifrance, 2009). aos valores cobrados pelos médicos e a condicionar as situações em que poderiam ser excedidos. Nessa altura, subsistia a possibilidade de negociação de acordos colectivos por área profissional. Era necessário, porém, que passassem a respeitar um formato estandardizado definido ao nível nacional. Aos médicos era, aliás, conferida a possibilidade de aderirem individualmente ao acordo nacional, reduzindo a possibilidade de veto pelas organizações de profissionais (Sandier et al., 2004). O médecin traitant é um médico generalista ou especialista, sediado num consultório ou num hospital, que coordena todo o ciclo de cuidados de um doente, assumindo o papel central na orientação do paciente ao longo de toda a prestação de cuidados. Este médico assegurará de forma personalizada os cuidados preventivos e de tratamento habituais, reencaminhando o doente sempre que necessário para outras especialidades, acompanhado de uma carta redigida pelo seu médico descrevendo o seu estado de saúde. A prestação de cuidados é assim coordenada e centralizada por um só médico, da escolha do doente (L‟Assurance Maladie, 2006). Em 1971, foi implementado (Sandier et al., 2004) o conventionnement, em que os contratos de serviços de saúde com os médicos eram estabelecidos numa base uniforme nacional. Estes contratos aplicavam-se aos médicos, excepto em caso de recusa. Em troca, os médicos beneficiavam de vantagens sociais e fiscais e tinham garantidos os princípios da prática médica independente: livre escolha do médico, liberdade de prescrição, sigilo profissional e pagamentos directos pelos doentes. Estas convenções nacionais foram subscritas subsequentemente em 1976, 1980, 1985, 1990, 1993 e para o período 1997-1998. Este novo sistema formal de gatekeeping não veio atribuir mais obrigações aos médicos, sendo formalizada, no fundo, a prática já corrente do acompanhamento do doente ao longo do ciclo de cuidados (L‟Assurance Maladie, 2006). Subjacente às negociações destes acordos, estava (Sandier et al., 2004) a preocupação no controlo da despesa em saúde, pelo que se estabeleciam sucessivamente medidas com o objectivo de reduzir os custos juntamente com os preços dos tratamentos. Estas medidas incluíam monitorização individual do trabalho dos médicos (em 1971), o estabelecimento de um “segundo sector” (aspas do autor) em que os médicos eram autorizados a exceder os preços acordados, ainda que perdessem os benefícios sociais e fiscais e não fossem reembolsados pelos seguros de saúde (1980), e a limitação na prescrição através da introdução de guidelines que deveriam ser respeitadas sob pena de sanções (1993-1999). O médico tem, inclusivamente, o direito a recusar-se à constituição como médecin traitant de determinado doente, assim como o paciente tem a liberdade de escolher o médico da sua preferência. Um paciente pode igualmente não querer continuar a ser acompanhado pelo seu médecin traitant, precisando, nesse caso, de preencher uma nova Déclaration de Choix du Médecin Traitant (Cerfa, s.d.). Da mesma forma, o médico pode não querer continuar a ser o médecin traitant de determinada pessoa, caso em que o doente deverá também escolher novo médico, através da mesma Declaração (L‟Assurance Maladie, 2006). 21. O A reforma de Juppé de 1996 introduziu (Sandier et al., 2004) grandes alterações nas relações contratuais entre os médicos e as seguradoras, com o objectivo, por um lado, de limitar a actividade dos médicos em termos de preços e prescrição de medicamentos através da fixação de um limite máximo anual, sob pena de sanções financeiras (chamado pela Confédération des Syndicats Médicaux Français (CSMF) “book-keeping control”). Foi com base nesta medida que a CSMF formou a sua estratégia de oposição e, desde 1996 a 2002, a Confederação não subscreveu qualquer acordo. PROCESSO DE CONTRATUALIZAÇÃO O processo de contratualização em França sofreu a influência dos grandes conflitos existentes entre médicos e seguradoras, na sequência dos quais o Governo começou a impôr em 1960 limites máximos No entanto, a reforma deu abertura (Sandier et al., 2004), por outro lado, à celebração de acordos autónomos com os médicos de família e outros especialistas, tendo em 1997 as seguradoras assinado 63 Os adolescentes menores de 16 anos precisam do consentimento ou da autorização dos pais para a escolha do médecin traitant. Quanto às crianças, os pais não têm de emitir a declaração de escolha do médecin traitant (L‟Assurance Maladie, 2006). 83 um acordo com a MG-France, um sindicato de médicos de família. Foram também determinadas as regulações mínimas contratuais para outros especialistas, em resultado de não ter sido alcançado um acordo no âmbito das negociações com os seus representantes. França é um dos países que tem optado por definir uma política contratual antes de iniciar processos de experimentação em larga-escala, o que, tendo vantagens e desvantagens, evita porém segundo Perrot (2004), a desorganização dos serviços de saúde. Muitos acordos estabelecidos entre os sindicatos e as seguradoras foram, porém, anulados, por não estarem em conformidade com a lei, o que foi deteriorando as relações entre os médicos e as relações entre o Governo e as seguradoras (Sandier et al., 2004). O sistema de saúde francês iniciou, por isso, em 2004 o desenvolvimento de uma forma de contratualização com base na cooperação. Este movimento resultou da necessidade de sedimentar políticas de contratualização, na medida em que acordos específicos poderiam contribuir para a melhoria da eficiência do sistema de saúde, assim como para a flexibilização das relações entre os diferentes actores (Perrot, 2004). Em 2001, o Governo promoveu (Sandier et al., 2004) um processo de consulta, para dar reinício ao diálogo com os profissionais do sector privado. Uma das propostas da comissão formada para o efeito foi a reforma do sistema de celebração de acordos entre as seguradoras e as profissões médicas. As conversações só tiveram fim com a aceitação do Governo eleito em 2002, que veio facilitar o diálogo, em conceder um significativo aumento nas tarifas (20% relativamente ao ano de 2001) em troca do compromisso nas boas práticas. O processo de contratualização em desenvolvimento em França tem em vista a formalização dos papéis de cada actor num sistema global e coerente nos cuidados prestados aos doentes, reconhecendo a multiplicidade de factores determinantes da saúde e, assim, a necessidade da coordenação do ciclo de cuidados e de uma gestão compreensiva dos doentes. No âmbito de um enquadramento definido através de um política de contratualização, cada médico poderá manter um elevado grau de autonomia na prestação de serviços de saúde (Perrot, 2004). Na sequência deste processo, foi reformado em 2002 o sistema dos acordos entre os profissionais e as seguradoras. O novo sistema compreende três níveis (Sandier et al., 2004): i) a fixação de regras comuns para todos os profissionais a nível regional e nacional, ii) a especificação de cláusulas de boas práticas a nível regional e nacional para cada área profissional iii) e, no caso de falta de aceitação por uma categoria profissional, é permitida a celebração de contratos (public health contracts) entre as seguradoras e os profissionais individualmente para o desenvolvimento de cuidados preventivos ou a integração em redes, em troca de pagamentos adicionais. O processo legislativo de 2002 permitiu, assim, que os profissionais de saúde e as seguradoras celebrassem, entre si, diferentes tipos de acordos que, essencialmente, representam um compromisso individual e têm por objectivo obter o compromisso dos profissionais na melhoria e na eficiência das suas práticas, em troca de incentivos financeiros (Sandier et al., 2004). As seguradoras têm, ainda, no enquadramento legal permitido, promovido outras iniciativas (Sandier et al., 2004), como a contratualização selectiva, principalmente nos sectores onde há espaço para negociação, como na optometria, ou a cobertura de novos serviços que não fazem parte do pacote básico de cuidados abrangidos pelo regime estatutário de seguros de saúde. 84 sistema de saúde por meio da introdução de um sistema uniforme de seguros de saúde e da intensificação da competição entre as seguradoras (Greβ, Manouguian e Wasem, 2007). H O LAN DA Quadro 18: Quadro-síntese Holanda Sistema de saúde % PIB gasta em saúde Esperança de vida ao nascimento (anos) Esperança de vida saudável (HALE) ao nascimento (anos) Taxa de mortalidade neonatal (por 1.000 nados vivos) Organização da prestação de CSP Unidades de CSP Projectos com delegação de responsabilidades na gestão da prestação e dos recursos em CSP Mecanismos de contratualização de CSP Incentivos e apoios ao processo de contratualização de CSP 22. C ARACTERIZAÇÃO Sistema de seguro social universal de saúde (compulsório), oferecido pelo sector privado (2006) 9,3% O antigo esquema de seguro social de saúde (ZFW) e o esquema alternativo de seguro de saúde privado (PHI) que existia foram extintos e substituídos por um novo e universal seguro social de saúde “privado” (aspas dos autores) (ZVW), executado por entidades privadas, mas de regulação social (Greβ, Manouguian e Wasem, 2007). 80 73 3 A reforma introduzida na Holanda, com o novo diploma referente aos seguros de saúde, o Zorgverzekeringsswet (ZvW), uniformizou, assim, a protecção dos cidadãos holandeses. A partir de 1 de Janeiro de 2006, o sistema de saúde holandês prevê uma cobertura universal, por meio de um mercado regulado e competitivo de seguros privados64, com ou sem fins lucrativos (Leu et al., 2009). Sector privado Contratualização selectiva (Relatório de Dekker 1987) - DO SISTEMA DE O Governo holandês não participa, com efeito, directamente na prestação de cuidados, cabendo esta tarefa a entidades privadas, sejam médicos independentes ou organizações, sendo o novo sistema considerado um equilíbrio saudável entre uma base social sólida e a dinâmica de um mercado, no qual o doente, enquanto parte segurada, ocupa o lugar central (The Netherlands, 2006). S AÚDE A Holanda tem uma longa tradição na prestação privada de cuidados de saúde. Porém, o financiamento sempre foi visto pelo Ministry of Health, Welfare and Sport como uma tarefa pública, assim como a sua regulação. O sistema de saúde holandês é visto, por isso, como uma mistura de elementos dos modelos bismarckianos e beveridgnianos (The Netherlands, 2001). Actualmente, existe um seguro básico compulsório65, que assegura cuidados de saúde para toda a população, oferecido por seguradoras (as chamadas zorgverzekeraar). O chamado manifesto governamental de 1998 (Regeerakkoord 1998) distinguiu três segmentos de financiamento dos cuidados de saúde. O primeiro para os cuidados de doenças crónicas, financiados principalmente a partir do seguro para cuidados de longo termo (o AWBZ), o segundo para os cuidados agudos, suportados por sistemas de seguros privados de saúde, e o terceiro respeitante às linhas de cuidados remanescentes, para as quais os cidadãos poderiam optar por subscrever seguros privados (The Netherlands, 2001). Todos os residentes encontram-se, por isso, obrigados, sob pena de multa (The Netherlands, 2006)66, a subscrever uma apólice de seguro, para a cobertura dos serviços básicos de saúde, como consultas, hospitalização, prescrição de medicamentos e exames laboratoriais e de diagnóstico (Leu et al., 2009)67. A Holanda apresentava, assim, até 2006, um sistema de saúde com base essencialmente em seguros de dois tipos, designadamente, os “fundos de doença”, sem fins lucrativos, financiados a partir de contribuições com base nos rendimentos, e os seguros privados, subscritos, maioritariamente, pela população com rendimentos mais elevados (Leu et al., 2009). 64 O mercado encontra-se muito concentrado, sendo que cinco planos de seguro estão associados a 82% dos subscritores (Leu et al., 2009). 65 A taxa de pessoas que não subscrevem um seguro de saúde e de pessoas que se encontram em situação de incumprimento é, nos dois casos, de 1,5% (Leu et al., 2009). 66 Não existe, no entanto, nenhum mecanismo de controlo dos cidadãos que não se inscrevem (Greβ, Manouguian e Wasem, 2007). 67 Os beneficiados podem optar por um seguro de saúde que opera numa rede de prestadores determinados, ou por um outro, em que podem utilizar os serviços de qualquer prestador qualificado, sendo reembolsados no final (Leu et al., 2009). Em 2006, o Governo holandês introduziu uma reforma significativa no sistema de seguros de saúde, tendo por objectivo a melhoria da qualidade e da eficiência no 85 A maioria da população subscreve, ainda, apólices complementares, que incluem serviços não cobertos pelo seguro básico, como os cuidados de saúde oral, sendo frequente a subscrição de pacotes combinados, oferecidos pela mesma seguradora do seguro básico (Leu et al., 2009). abrangidas sem nenhum custo acrescido para os seus familiares, sendo as suas despesas de saúde financiadas por fundos públicos (Leu et al., 2009). As seguradoras devem aceitar todos os cidadãos que pretenderem subscrever o seguro standard (The Netherlands, 2006) e que se apresentem num determinado período, que tem lugar anualmente, encontrando-se proibidas de modificar os prémios de seguro em função da idade, sexo ou do estado de saúde que apresentam. É também neste momento que os subscritores podem mudar de seguradora (Leu et al., 2009). O sistema holandês disponibiliza, ainda, separadamente, o Algemene Wet Bijzondere Ziektekosten (AWBZ), um seguro público, de cobertura também universal, destinado a cobrir despesas médicas excepcionais e de custo elevado, como cuidados continuados e ao domicílio, a que os cidadãos holandeses estão também obrigados (DNB, 2007). As seguradoras são pagas a partir de um fundo de equalização do risco, financiado com base em contribuições com base no rendimento. O ajustamento pelo risco é complexo e é considerado por alguns autores (Leu et al., 2009) como um bom preditor de utilização. Este mecanismo tem em conta diversas características, como a fonte de rendimentos, a idade, o sexo, a região, os pharmacy cost groups, os diagnostic cost groups (The Netherlands, 2008) e, desde 2008, o estatuto sócio-económico (Leu et al., 2009). O financiamento do sistema de saúde holandês tem duas componentes. A primeira tem por base o pagamento, devido por todos os residentes, de uma contribuição68 para o “bolo” nacional, de 6,5%, calculada a partir dos rendimentos, de onde serão pagas as seguradoras (Leu et al., 2009). Os trabalhadores por conta própria e os desempregados têm este custo a seu cargo, que é de 4,4% (Leu et al., 2009) (vd. Figura 7). Figura 7: Fluxos financeiros no sistema de saúde holandês Fonte: The Netherlands, 2006. O ajustamento pelo risco é utilizado pelo Governo holandês para prevenir uma selecção dos segurados com base no risco, permitindo o pagamento do mesmo valor por todos (The Netherlands, 2008). Nesta medida, as seguradoras poderão focalizar a sua actuação na qualidade e no controlo de custos (Leu et al., 2009). A segunda componente consiste no pagamento de um prémio fixo nominal, por cada adulto abrangido pela apólice69. As crianças até aos 18 anos encontram-se 68 Este valor é, em parte, reembolsado, no caso de não serem usados cuidados de saúde, até um montante determinado (Leu et al., 2009). 69 Em 2006, era de cerca de € 1.050 (Leu et al., 2009). O escopo do novo sistema de saúde traduz-se no controlo de custos e na eficiência, através das leis de 86 mercado e da competição, aplicadas aos seguros de saúde e à prestação de cuidados de saúde. Pretendese que o sistema seja orientado pela procura e que as seguradoras compitam entre si, negociando com os prestadores o preço e a qualidade dos cuidados e que, estes, por sua vez, compitam também entre si, de modo a conseguirem contratos com as seguradoras. O cidadão escolherá, agora, a seguradora, com base no preço, na qualidade e nos serviços de saúde prestados (DNB, 2007). cirurgia cosmética, os cidadãos podem optar por subscrever uma apólice suplementar, existindo, inclusivamente, como já foi referido, pacotes combinados de seguros básicos e de seguros complementares (Schabloski, 2008). Tendo desaparecido a distinção entre seguros de saúde públicos e seguros de saúde privados, os cidadãos têm liberdade de escolha entre todas as seguradoras disponíveis no mercado (Greβ, Manouguian e Wasem, 2007), o que já se previa como uma importante característica do modelo recentemente implementado, onde o mercado de saúde é orientado pela procura e pela satisfação das necessidades e expectativas dos cidadãos (The Netherlands, 2004). O Nederlandsche Bank é responsável pela monitorização do comportamento das seguradoras (DNB, 2007), enquanto que o College voor Zorgverzekeringen (CVZ), uma comissão para os seguros de saúde, assegura que cada um dos seguros existentes oferece um pacote básico de cuidados de saúde e que estes serviços são acessíveis e financeiramente comportáveis. Esta comissão tem, ainda, a seu cargo o cálculo e a distribuição dos pagamentos às seguradoras, a partir do fundo de equalização do risco (Schabloski, 2008). Deste modo, ainda que as seguradoras assumam, actualmente, uma maior responsabilidade, o Governo holandês continua responsável pela acessibilidade, comportabilidade e qualidade dos cuidados de saúde (The Netherlands, 2006). 23. O RGANIZAÇÃO Tem-se verificado, porém, que até ao momento são os contractos colectivos entre seguradoras e entidades patronais que têm exercido uma forte influência na competição pelo preço e na mobilidade dos subscritores (Greβ, Manouguian e Wasem, 2007). Os cuidados de saúde primários encontram-se, não obstante, bem desenvolvidos (Exter et al., 2004; Leu et al., 2009) e são prestados, fundamentalmente, por médicos de clínica geral, figura dominante no sistema de saúde ao nível primário (Exter et al., 2004). Cada cidadão, tendo subscrito o seguro de saúde obrigatório, deve consultar um só médico de clínica geral, que autoriza o acesso e coordena os cuidados prestados por todos os médicos especialistas. DA PRESTAÇÃO DE CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOS A Holanda tem, historicamente, um sistema de cuidados primários robusto, que a reforma não veio alterar (Leu et al., 2009). Os médicos de clínica geral actuam como gatekeepers, na referenciação para outras especialidades e cuidados hospitalares (Schabloski, 2008), não existindo um acesso directo a cuidados especializados, pelo que é sempre necessária a referenciação, característica do sistema de saúde holandês, que a reforma não modificou (Leu et al., 2009)71. O médico de família assume, por isso, um papel central, conduzindo o doente ao longo da linha de cuidados (The Netherlands, 2005). A legislação holandesa assegura, desde 2006, que a todos os cidadãos seja oferecida uma carteira básica de benefícios e que ninguém poderá ver negada a cobertura das suas despesas de saúde (Schabloski, 2008). Aqueles que não puderem suportar financeiramente o prémio de seguro poderão requerer um subsídio de saúde, a cargo do Estado70 (Schabloski, 2008). Todos pagam de acordo com a sua capacidade para pagar, estando presente uma política de solidariedade entre os grupos financiadores, pedra basilar do novo sistema (The Netherlands, 2006). Alguns médicos de família trabalham em parceria com colegas, as chamadas práticas Huisartsen Onder Een Dak (HOED), ou num centro de saúde, conjuntamente com outros profissionais de saúde, como dentistas, fisiatras, enfermeiros e assistentes sociais (The Netherlands, 2005). Para cobrir despesas não incluídas no seguro básico, referentes a saúde oral, óculos, medicina alternativa ou 71 Existe uma taxa reduzida de referenciações e de prescrição de medicamentos, atribuída às capacidades de comunicação e aconselhamento, desenvolvidas, pelos médicos de clínica geral, ao longo da sua formação (Exter et al., 2004). 70 O subsídio para pagamento dos prémios de seguro, nos casos de baixos rendimentos, é entregue a 40% da população (Leu et al., 2009). 87 24. O Por outro lado, os prestadores de cuidados detinham, anteriormente, uma posição dominante no sistema de saúde, determinando o nível e a qualidade de cuidados a prestar. Este sistema não consubstanciava qualquer incentivo à melhoria e à medição do desempenho (The Netherlands, 2006). PROCESSO DE CONTRATUALIZAÇÃO Durante muitas décadas, a contratualização de cuidados de saúde na Holanda teve como base a divisão entre financiador e prestador. Seguradoras sociais e privadas independentes actuavam como um terceiro pagador, contratualizando mais de 80% de todos os cuidados de saúde (The Netherlands, 2001). A legislação de 2006 veio permitir às seguradoras assumir agora uma posição de força perante os prestadores de cuidados. Na verdade, uma vez que não são obrigados a contratualizar com qualquer um, podem escolher os melhores prestadores e determinar condições para a prestação de cuidados, com vista à oferta de planos de saúde competitivos (The Netherlands, 2006). A contratualização não era selectiva e as organizações representantes das seguradoras e dos prestadores de cuidados de saúde reuniam-se anualmente para conceberem o enquadramento geral dos contratos a firmar, que serviria de ponto de partida para as negociações a encetar entre ambos (The Netherlands, 2001). O sistema robusto de cuidados primários que caracteriza o sistema de saúde holandês tem, com efeito, permitido a contratualização selectiva e variações no pagamento em função da melhoria do desempenho nos resultados e nos custos (Leu et al., 2009), com introdução inclusivamente de benchmarking (The Netherlands, 2006). O conceito da contratualização selectiva foi introduzido ainda na década de 80, com o chamado “Relatório de Dekker”, que, já nessa altura, indicada este mecanismo como ideal para a criação de um mercado do lado da oferta, que incrementaria a eficiência e aumentaria os padrões de qualidade (Ham e Brommels, 1994). No entanto, a implementação da contratualização selectiva não foi nessa altura concretizada por razões políticas (The Netherlands, 2002). Modelos que promovem a prestação de cuidados eficientes e de elevada qualidade começam, por isso, a ter lugar no mercado de seguros holandês (The Netherlands, 2006; Leu et al., 2009). Actualmente, esta é uma característica predominante do sistema de saúde holandês e das relações entre as seguradoras e os prestadores de cuidados de saúde (Greβ, Manouguian e Wasem, 2007). Os contratos são estabelecidos de forma a que os doentes não tenham que pagar directamente ao prestador de cuidados e incluem acordos quanto ao acesso, qualidade e efectividade dos cuidados prestados (The Netherlands, 2005). Enquanto entidades independentes, as seguradoras recebem orçamentos da Comissão para os Seguros de Saúde (tradução nossa), o College voor Zorgverzekeringen (CVZ), para a contratualização de serviços de saúde com vista a assegurar o acesso dos seus membros a cuidados de saúde (The Netherlands, 2001). O pagamento dos médicos de clínica geral é constituído por um valor por cada doente inscrito e por um valor por consulta, sendo os incentivos oferecidos aos médicos de família limitados à remuneração por consulta (Ginneken, 2005). Os médicos de família recebem ainda pagamentos adicionais por certos tipos de serviços, como a vacinação contra a gripe da população idosa (The Netherlands, 2001). Um dos objectivos principais da reforma foi permitir, com efeito, um sistema que conduzisse a uma prestação mais eficiente dos serviços de saúde. Por essa razão, as seguradoras podem contratualizar selectivamente de forma a negociar uma relação favorável entre qualidade e preço para os seus subscritores (Greβ, Manouguian e Wasem, 2007). Espera-se (Thewissen, 2008), no futuro, que os contratos colectivos sejam cada vez em maior número, que a competição sirva de motor nas negociações com os prestadores e que a contratualização selectiva se faça com base tanto no preço como na qualidade, na sequência do que já se vem verificando desde 2006. O Governo holandês previa que o actual modelo de mercado de saúde regulado fosse orientado pela procura e pelas expectativas e necessidades da população (The Netherlands, 2005). Porém, segundo Greβ, Manouguian e Wasem (2007), por enquanto, a competição tem sido estabelecida unicamente com base no preço. A qualidade ainda não é uma arma determinante na atracção de subscritores. 88 III. 2. S ISTEMAS DE SAÚDE DE LI VRE ESCOLHA E COMPETIÇÃO O CASO DO S E ST ADO S U N IDO S DA A MÉRICA Quadro 19: Quadro-síntese Estados Unidos da América Sistema de saúde % PIB gasta em saúde Esperança de vida ao nascimento (anos) Esperança de vida saudável (HALE) ao nascimento (anos) Taxa de mortalidade neonatal (por 1.000 nados vivos) Organização da prestação de CSP Unidades de CSP Projectos com delegação de responsabilidades na gestão da prestação e dos recursos em CSP Mecanismos de contratualização de CSP Incentivos e apoios ao processo de contratualização de CSP 25. C ARACTERIZAÇÃO Seguros privados de livre escolha e competição / Cobertura pelo sector público dos idosos (Medicare) e da população empobrecida Medicaid) 15,3% 3. 78 70 As Health Maintenance Organizations, em particular, consistem em organizações que estariam no ponto oposto ao dos planos de seguros convencionais num continuum de diferentes abordagens de gestão da doença. As HMOs prestam cuidados compreensivos, pelo que um novo membro tem a oportunidade de escolher o seu médico de cuidados primários a partir de uma lista disponibilizada pela organização. Esse médico coordenará todos os cuidados prestados ao doente a partir desse momento, incluindo referenciações para outros médicos especialistas (Carlson, 2009). 4 Não existem, até ao momento, CSP prestados pelo Estado Accountable Care Organizations / PatientCentered Medical Home / CareWorks (Geisinger) / Permanente Medical Groups (Kaiser Permanente) - Estas organizações são financiadas com base na capitação e oferecem cuidados com base num preço fixo. São mais complexas e, por isso, suportam custos operacionais mais elevados. O enfoque encontra-se na prevenção e na qualidade dos cuidados, de modo a evitar que muitos dos seus membros precisem de cuidados especializados dispendiosos (Carlson, 2009). DO SISTEMA DE SAÚDE O sistema de saúde americano presta cobertura de cuidados de saúde aos cidadãos através da Medicare e da Medicaid, estando excluídos todos aqueles que não reunirem os requisitos necessários para a inscrição nestas duas modalidades. A Medicare, dirigida essencialmente aos idosos, abrange 14% da população americana, enquanto a Medicaid, dirigida à população empobrecida, abrange 13% dos cidadãos (Wallace, 2009c). A Medicaid, por sua vez, consiste num programa conjunto do Governo Federal e de cada estado, que presta ajuda no pagamento das despesas médicas de algumas pessoas de rendimentos e recursos limitados. Os programas Medicaid variam entre estados e podem ser cumulativos com os programas Medicare (USA, 2008). A Medicare é um seguro de saúde dirigido a pessoas com mais de 65 anos, de idade inferior com determinadas deficiências ou de qualquer idade com insuficiência renal permanente (USA, 2009). Este sistema apresenta três planos essenciais72 (Medicare, 2008): 1. Os Planos de Saúde Medicare (Medicare Health Plans), também chamados Medicare Advantage Plans, planos de saúde geridos por companhias privadas, com aprovação da Medicare. Existem actualmente os seguintes planos de saúde: a. Health Maintenance Organization (HMO) b. Preferred Provider Organization (PPO) c. Private Fee-for-Service Plans (PFFS) d. Medicare Medical Savings Account Plans (MSA) e. Medicare Special Needs Plans (SNPs) Os Planos Medicare para a Prescrição de Medicamentos (Medicare Prescription Drug Plans), oferecidos por companhias de seguros e outras companhias privadas aprovadas pela Medicare A maioria dos planos de saúde nos Estados Unidos é, porém, prestada por seguradoras privadas, por meio de acordos com entidades patronais. Destes planos, seis controlam 43% do mercado de cuidados de saúde no país: a WellPoint (13%), a UnitedHealth (11%), a Aetna (7%), a Kaiser Permanente (4%), a Humana (4%) e a Cigna (4%). De todos eles, apenas a Kaiser Permanente opera sem fins lucrativos (Wallace, 2009c). A chamada Medicare “original”, um plano de saúde fee-for-service gerido pelo Governo 72 A expansão do programa da Medicare, que cobre agora as três áreas referidas, foi considerada um dos legados positivos da administração Bush (The Economist, 2009). 89 26. R EFORMA oferecida pelas grandes entidades patronais ou, ao invés, a opção estandardizada oferecida aos funcionários do Governo Federal e aos membros do Congresso, que incluem actividades de prevenção e cuidados de saúde essenciais. DO SISTEMA DE SAÚDE Actualmente, e fazendo parte essencial da agenda política de Barack Obama (Davis, 2009), a reforma compreensiva do sistema de saúde americano encontra-se em discussão, consistindo essencialmente em cinco estratégias fundamentais: i) a cobertura universal financeiramente comportável, ii) o alinhamento dos incentivos com valor em saúde e um efectivo controlo de custos, iii) cuidados coordenados, acessíveis e centrados no doente, com prestação de contas, iv) fixação elevada de objectivos no sentido da melhoria da qualidade, resultados em saúde e eficiência e v) liderança com prestação de contas e colaboração para estabelecer e alcançar metas nacionais (The Commonwealth Fund, 2009). Figura 8: Benefícios da Medicare e benefícios do novo plano de saúde «A high performance health system would provide everyone with timely access, emphasize prevention and chronic care management, organize care around the patient, and coordinate care across settings» (The Commonwealth Fund, 2009) Fonte: The Commonwealth Fund, 2009. O sistema de cuidados de saúde nos EUA tem sido objecto de um intenso debate. Por um lado, os seus defensores argumentam que os americanos têm “o melhor sistema de saúde no mundo”, apontando como mais-valias a disponibilidade da tecnologia médica e o estado da arte das instalações verdadeiramente simbólicas do sistema. No outro extremo, encontramse aqueles que o qualificam como um sistema de saúde fragmentado e ineficiente, com destaque para o facto de ser o país que mais gasta em cuidados de saúde do que qualquer outro no mundo, a par de um elevado número de pessoas não seguradas, deficiente qualidade e desperdícios em termos administrativos (Chua, 2006). No sentido da concretização da cobertura universal, a Commonwealth Fund Commission tem procurado conceber um quadro conceptual que i) expanda a cobertura de cuidados de saúde e assegure o acesso com continuidade, ii) que estimule uma nova dinâmica competitiva entre seguradoras e prestadores, focalizados em melhores resultados e num melhor desempenho nos custos, iii) que tenha como base seguros públicos e privados já existentes, iv) que assegure cobertura independentemente do estatuto social e que, finalmente, v) permita o financiamento equitativo com responsabilidades partilhadas (The Commonwealth Fund, 2009). Fundamentalmente, espera-se (The Commonwealth Fund, 2009) que ocorra uma mudança no sistema de seguros e que este passe a oferecer um leque de escolhas alargado de planos privados e, simultaneamente, a opção por um novo plano de seguro público. «At its root, the lack of health care for all in America is fundamentally a moral issue. The United States is the only industrialized nation that does not have some form of universal health care (defined as a basic guarantee of health care to all of its citizens). While other countries have declared health care to be a basic right, the United States treats health care as a privilege, only available to those who can afford it» (Chua, 2006) «Mr Obama is also seeking a healthcare legacy, only his goal is even more ambitious» (The Economist, 2009) A opção por este novo ambicionado plano de seguro público (vd. Figura 8) usará as redes de prestadores da Medicare e, para evitar a necessidade de cobertura suplementar, os benefícios incluirão um pacote de serviços compreensivos semelhante à cobertura Na verdade, não existe, até ao momento, um sistema nacional de saúde que proteja todos os cidadãos americanos, nem mesmo ao nível dos cuidados de saúde primários, estimando-se que 45 milhões (16% 90 da população) não estejam cobertos por qualquer plano de saúde (Wallace, 2009c). debate sobre a cobertura universal e a necessidade de criação de um sistema de cuidados de saúde primários, são actualmente postos em causa os valores históricos a que o país habituou o mundo. É constatável o esforço que Barack Obama empreende na implementação de uma reforma no sistema de saúde americano, podendo observar-se as particularidades das alterações entre o que foi um programa de campanha e o que poderá traduzir-se numa proposta dirigida ao Parlamento. No fundo, observamos as fortes convicções do novo Presidente reflectidas nas estratégias empreendidas para a concretização do que considera ser a mais importante e mais drástica reforma do sistema de saúde americano. Em 16 de Agosto deste ano, Obama declarou, através de um artigo de opinião publicado no New York Times, numa altura em que o Parlamento se prepara para aprovar (ou não) as suas propostas, por que pensa ser essencial esta reforma. Por outro lado, um estudo divulgado em Maio de 2007 pelo Commonwealth Fund aponta que o sistema de saúde norte-americano é o mais caro e o menos eficaz entre os seis grandes países industrializados (Alemanha, Austrália, Canadá, EUA, Nova Zelândia e Reino Unido) (Davis et al., 2007). Intitulado "Mirror, mirror on the wall", com alusão à estória infantil da Branca de Neve, um estudo revelou que os profissionais de saúde dos EUA defendem que têm o melhor sistema do mundo, sem, no entanto, apresentarem evidência científica que comprove essa afirmação e sem admitirem qualquer comparação internacional73. Do mesmo estudo resultou, contudo, que os EUA perdem no que respeita à qualidade dos cuidados para a Alemanha e na equidade no acesso e na eficácia para o Reino Unido (Davis et al., 2007). «It makes sense, it saves lives and it can also save money. This is what reform is about» (Obama, 2009) As principais conclusões dos mesmos autores apontam no sentido de existir espaço de manobra suficiente para a introdução de melhorias em todos os países considerados, especialmente nos EUA. Com efeito, se o sistema de saúde deve actuar de acordo com as expectativas dos pacientes, torna-se necessário eliminar as barreiras financeiras para melhorar a prestação de cuidados. Para além disso, as disparidades verificadas em termos de acesso assinalam a necessidade de expandir seguros para cobrir os uninsured e para assegurar que todos os americanos têm acesso a cuidados. Mais referem que os Estados Unidos devem igualmente encetar esforços no sentido de adoptar tecnologias de informação em saúde, por exemplo, um registo electrónico integrado e um sistema de informação acessível aos prestadores e pacientes. Tendo por base os relatórios de pacientes e médicos, Davis et al. (2007) defendem ainda que os Estados Unidos poderão melhorar a prestação, a coordenação e a equidade do sistema de saúde por meio da adopção de melhores práticas. «In the end, this isn‟t about policies. This is about people‟s lives and livelihoods. This is about people‟s businesses. This is about America‟s future, and whether we will be able to look back years from now and say that this was the moment when we made the changes we needed, and gave our children a better life. I believe we can, and I believe we will» (Obama, 2009) 26.1. O S NOVOS MODELOS DE ORGANIZAÇÃO DOS CUIDADOS Aguarda-se, actualmente, a aprovação da reforma do sistema de saúde americano, em torno da criação de uma rede de cuidados primários, enquanto, simultaneamente, se levanta algum cepticismo, nomeadamente, na vertente dos custos determinados pela reforma (Fisher, Bynum e Skinner, 2009). A título exemplificativo, saliente-se que os médicos são pagos por episódio, não existindo um plano de incentivos com vista à prestação de cuidados mais custo-efectivos (The Economist, 2009). «The simultaneous achievement of universal coverage, better health outcomes, and slowed spending growth requires changing the way public policy is shaped, as well as rapid experimentation and learning» (Davis, 2009) Esta é, inexoravelmente, uma altura de viragem na política de saúde dos Estados Unidos. Instalado o Por outro lado, acredita-se também que uma reforma que simultaneamente promova a cobertura, a qualidade e a eficiência pode determinar melhorias 73 Como, aliás, a Rainha Má da mesma estória infantil (Davis et al., 2007). 91 para a saúde das famílias americanas, num quadro de sustentabilidade económico-financeira (Davis, 2009). A mesma autora74 nota, porém, que esta reforma requererá uma mudança profunda nas políticas públicas, devendo o responsável da Saúde ter capacidade para intervir com mais autoridade, actuar como um comprador prudente, testando novas modalidades de pagamento, e disseminar e implementar prontamente as mudanças preconizadas. diversas recomendações para o aumento da eficiência na utilização dos recursos e da qualidade na prestação de cuidados, entre elas, a reforma das modalidades de pagamento. A MedPAC acredita fundamentalmente que a sustentabilidade financeira do sistema de saúde americano se encontra em risco, pelo que as reformas dos sistemas de pagamento são determinantes para a construção de um novo paradigma. A comissão considera inclusivamente novas abordagens como as chamadas accountable care organizations (ACOs). Fisher, Bynum e Skinner (2009) consideram também que a implementação de uma reforma profunda ao nível das modalidades de pagamento representa uma importante estratégia para o controlo da despesa em saúde, a par da promoção de novos e melhores modelos organizativos. Quanto a este último aspecto, os autores revelam existir um consenso quanto à ideia de que sistemas de prestação integrada de cuidados, que apoiem os profissionais de saúde e tenham como base o trabalho em equipa, permitirão alcançar esses objectivos. Acompanhando, aliás, o facto de a maioria dos profissionais de saúde utilizar já redes locais de referenciação. Uma accountable care organization, cujo conceito começa a suscitar interesse no Congresso americano, define-se (Glass e Stensland, 2009) como um conjunto de médicos de cuidados primários, um hospital e eventualmente outros especialistas, responsáveis voluntaria e solidariamente pela qualidade e pelo custo dos cuidados prestados a uma população determinada. O conceito admite bónus por cuidados de elevada qualidade e pela contenção de custos e possíveis penalidades no caso de se verificar o contrário. Também Fisher et al. (2009) suportam a validade deste conceito, propondo esta nova abordagem para alcançar cuidados integrados e eficientes. Os autores apoiam igualmente a responsabilização voluntária das organizações locais pela qualidade e pelo custo dos cuidados prestados às populações que abrangem, ultrapassando a perversidade dos incentivos e da fragmentação do sistema potenciada pelas actuais modalides de pagamento fee-for-service. Mais referem que os decisores políticos precisam remover os entraves à colaboração e oferecer, inclusivamente, um plano de incentivos, como actualizações de vencimento mais significativas ou subsídios para a implementação do registo clínico electrónico, destinado a prestadores que pretendam estabelecer uma prática clínica com prestação de contas. Também nesse caso as modalidades de pagamento deverão ser alteradas para passarem a incorporar capitação parcial, pagamentos mistos ou poupanças partilhadas, fomentando deste modo a responsabilização pelos custos totais e pela qualidade dos cuidados (Fisher, Bynum e Skinner, 2009). Fisher et al. (2009) tentam, aliás, demonstrar, ao longo do citado estudo, a aplicabilidade deste modelo e adiantam que é uma abordagem concretizável, uma vez que se baseia nas actuais práticas de referenciação, não necessita de alterações aos benefícios nem à forma actual de inscrição dos beneficiários e permite, ainda, que os prestadores recebam vencimentos significativos, mesmo numa lógica de contenção de despesas. Também a Medicare Payment Advisory Commission (MedPAC) declarou muito recentemente a necessidade de uma reforma profunda no sistema de saúde americano, principalmente ao nível dos cuidados de saúde primários, entendendo que o acesso dos doentes a estes cuidados é essencial para um sistema devidamente funcional. Outro modelo que apresenta uma abordagem de prestação de cuidados compreensivos centrados no doente é o chamado Patient-Centered Medical Home (PCMH), focalizado especialmente nos cuidados de saúde primários. O PCHM é um modelo de cuidados de saúde que integra o conceito “medical home”, correspondendo a uma forma de prestar cuidados primários acessíveis, centrados nas famílias, coordenados, compreensivos, contínuos, humanizados e efectivos. O conceito resultou das considerações sobre cuidados de saúde primários constantes da Declaração de Alma-Ata de 1978 e foi adoptado pelo A mesma comissão entende não existir nos EUA um verdadeiro sistema de prestação de cuidados, na medida em que a coordenação é rara, os cuidados especializados são favorecidos em relação aos cuidados primários, a qualidade é geralmente fraca e os custos são elevados e crescem de uma forma insustentável. Com base nestas convicções, a MedPAC (2009) emitiu 74 A autora, Karen Davis, é a Presidente do Commonwealth Fund. 92 Institut of Medicine na década de 90. Mais tarde, 27. O EXEMPLO G EISINGER passou a fazer parte do próprio conceito de medicina familiar (Robert Graham Center, 2007). 27.1. Em 2004, a American Academy of Family Physicians (AAFP), a American Academy of Pediatrics (AAP), o American College of Physicians (ACP) e a American Osteopathic Association (AOA) estabeleceram os sete princípios fundamentais, complementares entre si, caracterizadores do modelo PCMH, designadamente: 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. DA O SISTEMA P ERMANENTE K AISER P ERMANENTE DE SAÚDE DA E DA K AISER Considerámos pertinente o estudo da Kaiser Permanente (KP), não apenas porque actualmente abrange uma população de cerca de 8,6 milhões de cidadãos, mas por representar o maior sistema sem fins lucrativos de prestação integrada de cuidados de saúde dos Estados Unidos (Wallace, 2009b). Constituída em 1945, a KP tem uma rede de 14.000 médicos e 35 centros médicos, dotados de instalações hospitalares próprias. A existência de um médico de família, preparado para receber o doente no seu primeiro contacto com o sistema de saúde e para lhe prestar cuidados contínuos e compreensivos; Prática clínica conduzida pelo médico, que lidera uma equipa responsável pela linha de cuidados percorrida pelo doente; Orientação para a pessoa no seu todo, incluindo cuidados agudos e crónicos, actividades preventivas e cuidados em fim de vida; Os cuidados são coordenados ou integrados ao longo de todo a complexidade do sistema de saúde; Qualidade e segurança; Acesso melhorado; Reforma das modalidades de pagamento. Os membros da KP são (Wallace, 2009b) cidadãos individuais (7%), pessoas inscritas nos programas da Medicare e Medicaid (15%) e funcionários de grupos de empresas (78%). A KP nasceu do desafio de prestar cuidados de saúde aos trabalhadores industriais durante a Grande Depressão e a Segunda Grande Guerra, numa altura em que poucos podiam sustentar uma consulta médica. Apresenta-se, por isso, com um propósito social, tendo como missão a prestação de cuidados de saúde de elevada qualidade e financeiramente comportáveis e a melhoria da saúde das comunidades que serve. Tem como foco a prevenção e a gestão dos cuidados, por meio da prestação de contas e da integração dos cuidados nas suas diferentes dimensões (Wallace, 2009b). A Future of Family Medicine Project Leadership Committee (2004) determinou igualmente que todos os americanos devem ter um Personal Medical Home que sirva de ponto nuclear de todos os cuidados que recebe. Em 21 de Julho de 2009, o grupo Patient-Centered Primary Care Collaborative endereçou uma carta ao A empresa destina ainda (Wallace, 2009b) cerca de 3% das suas receitas, que em 2007 representaram cerca de um milhar de milhões de dólares, em actividades de prevenção da doença e promoção da saúde na comunidade, no âmbito de um programa de beneficência que sustenta. Chairmen of the House Ways & Means, Education & Labor and Energy & Commerce Committees, declarando que os cuidados de saúde primários e o modelo Patient-Centered Medical Home são a chave para o desenvolvimento de um sistema de cuidados de saúde de elevada qualidade e financeiramente comportáveis. No documento são ainda emitidas recomendações a considerar pela House of Representatives no trabalho legislativo no âmbito da reforma da saúde, como o aumento dos pagamentos aos médicos de cuidados primários, o financiamento para a extensão dos programas e dos recursos das práticas de medicina geral e o financimento para os pilotos de PCHMs da Medicare ao nível nacional e para a iniciação de outros projectos do mesmo modelo (PCPCC, 2009). O modelo integrado de financiamento e prestação de cuidados de saúde da KP tem como base (Wallace, 2009b) a parceria entre três entidades, o Permanente Medical Group, os membros do Plano de Saúde e os Hospitais e, finalmente, o Plano de Saúde da Fundação Kaiser (vd. Figura 9). 93 Figura 9: Modelo integrado de financiamento e prestação de cuidados de saúde da Kaiser Permanente os sintomas, exercícios físicos, nutrição, resolução de problemas e comunicação (Wallace, 2009b). Os cuidados preventivos são outra das preocupações do Sistema KP (Wallace, 2009b), pelo que em cada visita a qualquer serviço de saúde é impresso e entregue ao doente um formulário, chamado Preventive Health Prompt (PHP), uma ferramenta partilhada por doentes e clínicos, contendo as datas para a realização de mamografias, vacinação, controlo do colesterol, consultas de rotina, entre outras responsabilidades dos doentes no âmbito da prevenção da doença. As tecnologias de informação são determinantes no sistema de saúde da KP (Wallace, 2009b) e incluem apoio à decisão, como alertas para as boas práticas, para medicamentos recomendados ou interacções medicamentosas, registos clínicos electrónicos ou ferramentas de comunicação entre a equipa médica. Fonte: Wallace, 2009a. Num dos estados abrangidos, a Califórnia, onde residem 75% dos membros da KP, a maioria dos serviços de saúde encontra-se disponível num único local (Wallace, 2009b), incluindo o hospital, consultas externas, farmácia, imagiologia e laboratórios. Estes centros médicos caracterizam-se por médicos de clínica geral que trabalham perto de outros médicos especialistas e dos serviços hospitalares, pela promoção de actividades de educação para a saúde e de cuidados preventivos e também por uma rede de cuidados ao domicílio. Saliente-se que a KP se destaca (Wallace, 2009b) dos restantes planos de saúde americanos na medida em que constitui um modelo integrado de financiamento e prestação, actuando como um “serviço nacional de saúde” (aspas do autor) com uma única linha de financiamento, um orçamento global e a responsabilização por toda a linha de cuidados de uma população. Compete também no mercado por “patrocinadores” (aspas do autor) – as entidades patronais –, por membros, médicos e trabalhadores, competição que é conduzida com base no desempenho em qualidade, eficiência e valor, satisfação dos membros e doentes e qualidade no ambiente de trabalho (Wallace, 2009a). A gestão da doença é também uma das actividades importantes da KP, uma vez que 27% dos seus membros sofrem de doenças crónicas, correspondendo a 64% dos custos da empresa (Wallace, 2009b). Através do chamado Care Management Institute (CMI), criado em 1997, a KP focaliza a sua acção em nove áreas clínicas prioritárias, por meio de guidelines com base na evidência e programas de gestão da doença na população. As áreas de acção prioritária são (Wallace, 2009b) a asma, a dor crónica, a doença arterial coronária, a depressão, a diabetes, os cuidados na terceira idade, a insuficiência cardíaca, a obesidade e os auto-cuidados. A KP apresenta os quatro pilares inovadores fundamentais que sustentam o seu modelo de prestação de cuidados (Wallace, 2009b): 1. Este último domínio dos auto-cuidados é visto como uma meta importante, dado que a KP acredita serem os cidadãos os verdadeiros prestadores de cuidados primários. Com efeito, a empresa declara que cerca de 80% dos problemas de saúde apresentados pelos seus membros são auto-diagnosticados e tratados em casa sem a intervenção de profissionais de saúde (Wallace, 2009b). Para que possam fazê-lo, a empresa entrega documentação adequada, nomeadamente, o chamado Healthwise Handbook. 2. 3. 4. A KP promove ainda sessões de trabalho para doentes crónicos, contendo informação sobre como reconhecer 94 O pré-pagamento do plano de saúde – os médicos são pagos com base na capitação, auferindo um salário que não é calculado por episódio “Economia revertida” (aspas do autor) – é dada prioridade à prevenção da doença e à promoção da saúde, assim como se procura investir numa nova cultura de saúde Prática clínica multidisciplinar – é dada importância à colaboração, a uma eficiente e efectiva gestão da doença crónica e das patologias complexas e à revisão dos pares, com supervisão da qualidade e avaliação da prática clínica Parceria entre iguais com mútua exclusividade – relacionada com aptidões, competências e conhecimentos para liderar e co-gerir, é considerada essencial para a competição entre médicos, existindo, por isso, o Plano de Saúde da Fundação Kaiser (Kaiser Foundation Health Plan) e também o Permanente Medical Group, governado e gerido de forma autónoma só não é suficiente para alterar os comportamentos dos médicos e dos doentes. Finalmente, é importante, segundo Wallace (2009), considerar a promoção da aprendizagem como uma responsabilidade partilhada, entre, por exemplo, pagador e prestador e clínico e doente. A mútua exclusividade significa que o Plano de Saúde Kaiser (Kaiser Health Plan – HP) contratualiza cuidados de saúde apenas com os chamados Permanente Medical Groups (PMGs), grupos clínicos multidisciplinares que, por sua vez, contratualizam exclusivamente com o Plano de Saúde Kaiser para a prestação de praticamente todos os serviços de saúde dirigidos aos membros da KP. 27.2. O SISTEMA DE SAÚDE DA G EISINGER O sistema de saúde Geisinger (Geisinger Health Plan – GHS), fundado em 1915 por Abigail Geisinger (Geisinger, 2006), é uma rede de cuidados de saúde compreensivos integrados sem fins lucrativos que presta serviços em cerca de 40 municípios do estado de Pennsylvania (GHP, 2009) e que abrange uma população de cerca de 2,6 milhões de pessoas (Geisinger, s.d.e). As duas entidades chegam a acordo, estabelecendo os chamados Medical Services Agreements (MSA), em que se incluem os objectivos de desempenho de qualidade e de serviço a atingir e em que o pagamento do HP aos PMGs é determinado ao nível populacional. Também é nestes acordos que se define a responsabilização partilhada sobre a qualidade e o desempenho. O GHS apresenta como missão (Geisinger, s.d.c) a melhoria da qualidade de vida por meio de uma organização de serviços de saúde integrados e com base num programa de cuidados aos doentes, educação, investigação e serviços na comunidade. A constituição de um sistema de saúde de primeira escolha e de cuidados avançados constitui a visão do GHS, sustentada nos valores de excelência, sentido de serviço, dignidade individual, trabalho em equipa, liderança dos médicos, diversidade, educação, investigação, eficiência e na tradição da organização. A estrutura organizacional da KP apresenta, assim, como um elemento importante a delegação da gestão clínica, sendo os PMGs responsáveis pela supervisão das compensações aos médicos e da gestão do desempenho. A prestação de cuidados é liderada igualmente pelos médicos. Os incentivos aos médicos têm três componentes com um peso relativo semelhante, nomeadamente a qualidade clínica (como, por exemplo, na gestão da diabetes e no controlo do carcinoma mamário), a satisfação do doente (com as vertentes de satisfação geral como membro e de satisfação na relação médicodoente) e o desempenho financeiro organizacional. De qualquer modo, estes incentivos constituem, na opinião de Wallace (2009), uma parte modesta do salário (cerca de 5-10%). A liderança dos médicos é, com efeito, uma dimensão marcante na Geisinger, dado que a organização se assume como um sistema de saúde orientado para o prestador de cuidados médicos, o que contribuiu para a completa integração dos serviços (Geisinger, 2006). Aliás, o médico escolhido pela fundadora da Geisinger para a organização dos serviços, Harold L. Foss, fomentou o conceito de equipa, acreditando na ideia de que os médicos especialistas deveriam trabalhar conjuntamente em benefício dos seus doentes. Foss era igualmente um gestor clínico, assumindo diversos papéis no âmbito da organização consoante as necessidades (Geisinger, s.d.b). Da componente relativa ao exercício da prática clínica da KP, o autor referido retira algumas lições, como a importância da transparência, do comprometimento dos clínicos na prática, alcançado através da confiança depositada pela empresa, e da atribuição de ferramentas e de responsabilidades na gestão das áreas cinzentas da gestão clínica. É também dada relevância às técnicas activas e agressivas com vista ao comprometimento dos doentes. A organização congratula-se (Geisinger, s.d.b) por prestar actualmente serviços de elevada qualidade às populações de Pennsylvania, não sendo necessário aos doentes a deslocação para os grandes centros urbanos para terem acesso a esse nível de cuidados (Geisinger, s.d.a). Por outro lado, o mesmo autor refere que se o plano de incentivos não se encontrar devidamente alinhado com os objectivos definidos, a melhor evidência por si O sistema de saúde da Geisinger é formado por diferentes dimensões complementares entre si, designadamente (Geisinger, 2006): 95 1. Geisinger Medical Center (GMC) – hospital Estas clínicas estão ligadas à rede do sistema de saúde Geisinger através de sistemas de informação que garantem a segurança, a precisão, o controlo de qualidade e a continuidade dos cuidados (Geisinger, 2006). universitário 2. Geisinger Wyoming Valley Medical Center (GWV) – hospital de agudos 3. Geisinger South Wilkes-Barre (GSWB) – hospital de agudos 4. 5. 6. Marworth Alcohol & Chemical Dependency Treatment Center – centro de tratamento em O Plano de Saúde Geisinger (Geisinger Health Plan – GHP) foi, por seu lado, instituído em 1985 e é parte integrante do sistema de saúde com o mesmo nome, com cerca de 220.000 membros e uma rede de 25.000 entidades prestadoras de cuidados, entre as quais 3.288 são médicos de família e 1.393 são centros de cuidados primários76 (GHP, 2009). Inicialmente, o GHP era constituído simplesmente por uma Health Maintenance Organization (HMO) da Medicare, pelo que os cuidados eram apenas prestados pelas entidades da própria Geisinger. Entretanto, o GHP evoluiu para uma mais abrangente rede organizativa de cuidados, tendo em conta as necessidades dos doentes, pelo que actualmente 60% dos seus membros recebem cuidados de saúde de prestadores fora da rede (Geisinger, 2006). regime de ambulatório e em regime de internamento Geisinger Clinic (CG) – um grupo multidisciplinar de práticas clínicas com aproximadamente 650 médicos e cerca de 55 centros de cuidados primários e especializados Geisinger Health Plan (GHP) – uma das maiores organizações rurais com gestão integrada da doença sem fins lucrativos do país. A Geisinger Clinic abrange (Geisinger, 2006) aproximadamente 200 médicos de clínica geral e 450 médicos de outras especialidades, incluindo cirurgiões e pediatras. É um dos programas de cuidados ambulatórios de maior dimensão do estado da Pennsylvania, prestando serviços de elevada qualidade em locais mais próximos dos doentes. O GHP é hoje um dos maiores prestadores de cuidados em locais rurais do país. A cobertura do plano de saúde abrange empresas, indivíduos, famílias e beneficiários da Medicare e pretende disponibilizar cuidados de elevada qualidade e financeiramente comportáveis próximos das populações (Geisinger, 2006). São disponibilizados, por isso, diversos programas, na área da promoção da saúde e nas áreas de tratamento de diversas patologias, como (Geisinger, 2006): Uma dimensão inovadora do GHS e da Geisinger Clinic é a rede das chamadas CareWorks® – Convenient Healthcare Clinics, centros clínicos em supermercados, estabelecidos em parceria com a Weis Markets, com vista a prestar cuidados de saúde financeiramente comportáveis e de modo mais conveniente aos doentes. Trata-se de “in-store clinics” (Geisinger, 2006), constituídas por enfermeiros e médicos assistentes, onde se podem realizar testes de rotina (por exemplo, aos níveis de colesterol), testes laboratoriais, vacinação e tratamentos rápidos de doenças menos graves (garganta inflamada, bronquite, infecções do ouvido, entorses e distensões musculares, gripe, conjuntivite). 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. As clínicas CareWorks dispõem ao público as tabelas de preços e funcionam em horários mais alargados, adaptando-se às necessidades e às contingências profissionais das pessoas, não sendo necessária marcação. O tempo de espera é muito reduzido, mas existem pagers para que os doentes possam inclusivamente fazer as suas compras enquanto não são chamados75 (Geisinger, 2006). Asma em crianças e adultos Doença renal crónica Doença pulmonar obstrutiva crónica Insuficiência cardíaca congestiva Diabéticos Doença das artérias coronárias Hipertensão Osteoporose Cessação tabágica O Plano de Saúde Geisinger pretende levar mais além o carácter de solidariedade da organização, acrescentando valor e melhorando a qualidade dos cuidados na comunidade através de produtos e programas de saúde que coordenem a prestação e o financiamento dos serviços. Nesta medida, o GHP procura cumprir ou exceder os standards estabelecidos pelo mercado e melhorar os scores de benchmarking. O GHP foi, aliás, o primeiro plano da Medicare a 75 A clínica disponibiliza, ainda, um espaço próprio e seguro para os carrinhos de supermercado, enquanto as pessoas são atendidas (Geisinger, 2006). 76 Incorpora ainda 21.782 médicos de outras especialidades e 90 hospitais participantes do plano de saúde (GHP, 2009). 96 oferecer cobertura para a prescrição de medicamentos (em 2006) (Geisinger, 2006). O GHS não reconhece, com efeito, a validade dos pagamentos fee-for-service, na medida em que recompensam geralmente cuidados com pouca qualidade. Os programas P4P colocam, por sua vez, o enfoque na qualidade, no serviço e no custo, visando prevenir complicações clínicas desnecessárias, a redução das despesas e o aumento da produtividade. A Geisinger pretende, por isso, ser pioneira na colocação no mercado de um programa de P4P bem sucedido e nacionalmente reconhecido, por meio da garantia de um nível de desempenho clínico notável (Geisinger, 2006). Recompensada pelos esforços desenvolvidos na área clínica, o GHP foi a primeira HMO na costa este e a quarta HMO no país a receber acreditação da National Committee for Quality Assurance (NCQA) para os programas de gestão da doença. O GHP já recebeu também acreditação para os programas da doença pulmonar obstrutiva crónica, osteoporose, doença das artérias coronárias (em 2005) e para os programas da insuficiência cardíaca congestiva, hipertensão e diabetes (em 2003). O estatuto do GHP na acreditação da NCQA foi “excelente”. O sistema de saúde Geisinger tem sido alvo de numerosos reconhecimentos ao nível nacional pelo trabalho desenvolvido. Em 2008, o Plano de Saúde Geisinger foi nomeado “Outstanding Health Plan” pela Care Continuum Alliance, uma organização para a gestão da doença, tendo ainda sido classificado em terceiro lugar no ranking dos melhores planos de saúde da Medicare e em quinto lugar no ranking dos melhores planos de saúde dos EUA77. No que se refere a modalidades de pagamento, o Plano de Saúde Geisinger e a Clínica Geisinger encontram-se a desenvolver iniciativas inovadoras de pagamento pelo desempenho (P4P), com vista à motivação e reconhecimento das melhores práticas, dos melhores resultados clínicos e da satisfação dos doentes. Neste âmbito, foi estabelecido em 2006 um programa para a revascularização do miocárdio (coronary artery bypass graft – CABG), denominado CABG ProvenCareSM, assente num único pacote de serviços com preço fixo para todos os cuidados referentes àquela patologia. Esta doença foi escolhida por existir um volume significativo e suficiente de casos, guidelines emitidas pelas autoridades de saúde, modelos de ajustamento pelo risco estandardizados para a predição de resultados e benchmarks compreensivos (Geisinger, 2006). O GHS recebeu, por sua vez, o American Medical Group Association‟s prestigious Preeminence Award , em reconhecimento da excepcional liderança, inovação e visão, pelos avanços na qualidade dos cuidados, por uma estrutura de prestação efectiva de cuidados de saúde e pelos significativos contributos para a comunidade local onde se insere. O GHS foi ainda referido, pela quinta vez, em 2007, na Verispan Integrated Health Networks Top 100 list , por ser uma das mais destacadas redes de serviços de saúde integrados, com base na integração das operações, na qualidade clínica, no desempenho financeiro, na eficiência e no leque de serviços (Geisinger, s.d.d). Em 2007, Casale et al. desenvolveram um estudo para testarem se um sistema de prestação integrada, como o do GHP, conseguiria implementar com sucesso um programa de pagamento pelo desempenho para a CABG. Os doentes tratados sob o novo programa do GHP foram, assim, comparados com os 137 doentes que haviam sido tratados de modo tradicional em 2005 (o Conventional Care Group). Também a Association for Information and Imaging Management (AIIM) premiou o GHS com o 2006 Best Practices Award, pela utilização das tecnologias de Enterprise Content Management (ECM) no âmbito dos cuidados de saúde. O estudo revelou que, ao fim de três meses, o cumprimento do programa foi de 100% (avaliado por meio de várias dimensões caracterizadoras de boas práticas, que eram ou não aplicadas aos doentes), ainda que tenha sofrido um decréscimo até 86% nos três meses seguintes. O cumprimento total (estatisticamente significativo) foi novamente alcançado e assim se manteve até ao fim do período estudado. A probabilidade de alta nos doentes tratados no âmbito do programa CABG ProvenCareSM era maior do que nos doentes tratados de modo tradicional, tendo a demora média decrescido em 16%, assim como a média das despesas hospitalares que desceu 5,5% (Casale et al., 2007). Quanto aos profissionais de saúde que fazem parte da rede, também o seu desempenho tem sido reconhecido. Em 2005-2006, 36 médicos da Geisinger estavam presentes nas listas do Best Doctors in America. Também na área da gestão da doença e da cirurgia, muitos têm sido os destaques e os prémios para a Geisinger (Geisinger, s.d.d). 77 America's Best Health Plans 2008-09 (GHP, 2009). 97 Para o período 2007-2012, a Geisinger estabeleceu quatro prioridades estratégicas, designadamente (Geisinger, 2006): 1. 2. 3. 4. Qualidade – “Striving for Perfection”; Expansão do mercado dos cuidados de saúde – prestar cuidados próximos das residências e dos locais de trabalho dos doentes; Inovação – desenvolvimento de métodos de liderança inovadores nos cuidados aos doentes, investigação, educação e tecnologias; Assegurar o legado – considera-se que recrutar, ensinar e formar os trabalhadores é a chave do futuro da organização. No mesmo sentido, foi criado o Geisinger Quality Institute (GQI), que tem como finalidade a formação de equipas clínicas multidisciplinares para a prestação de cuidados integrados e seguros. O Instituto encontra-se a trabalhar em parceria com diversas organizações, como o Institute of Medicine, o Institute for Healthcare Improvement e os Centers for Medicare and Medicaid Services para o desenvolvimento de estratégias que assegurem cuidados seguros e efectivos. A organização tem, aliás, a pretensão de servir como um modelo de cuidados de saúde de qualidade ao nível nacional (Geisinger, 2006). 98 imputável ao doente e a arbitrária aplicação dos recursos obtidos (Soeters, Habineza e Peerenboom, 2006). IV. S ISTEMAS DE SAÚ DE FIN ANCIADOS POR ONG S O CASO DO R U AN DA Em consequência do novo sistema de saúde, a qualidade dos serviços de saúde aumentou, mas o peso da comparticipação nos seus custos sobre uma população predominantemente pobre revelou-se insustentável, observando-se a descida da procura de cuidados de saúde (Soeters, Habineza e Peerenboom, 2006). Quadro 20: Quadro-síntese Ruanda Sistema de saúde % PIB gasta em saúde Esperança de vida ao nascimento (anos) Esperança de vida saudável (HALE) ao nascimento (anos) Taxa de mortalidade neonatal (por 1.000 nados vivos) Organização da prestação de CSP Unidades de CSP Projectos com delegação de responsabilidades na gestão da prestação e dos recursos em CSP Mecanismos de contratualização de CSP Incentivos e apoios ao processo de contratualização de CSP Pagamentos directos Financiamento ONGs 9,8% / 50 43 Distinguiram-se, porém, alguns factores favoráveis à mudança, como (Soeters, Habineza e Peerenboom, 2006): 48 Não existem CSP Performance Initiative / Experiência de Cyangugu 1. Contratualização dos objectivos, preços e serviços a prestar 2. - 3. 4. 28. C ARACTERIZAÇÃO DO SISTEMA DE SAÚDE 5. 6. Com uma população de cerca de 9,7 milhões de habitantes (The World Bank, 2008) e uma economia assente, primordialmente, na produção de chá, café e bananas, o Ruanda é um dos países mais pobres do mundo. A ajuda internacional configura 17,3% do Produto Nacional Bruto (Meessen et al., 2006). As comunidades com elevadas taxas de utilização estão dispostas a aceitar novas abordagens As reduzidas restrições consusbtanciam uma excelente oportunidade para testar novas ideias Existência de um sistema de informação para a gestão da saúde Existência de uma rede não monopolizada de distribuição de medicamentos essenciais Criação de redes de telecomunicações móveis Melhoria do acesso rodoviário 29. O 29.1. O Ruanda tem, porém, apresentado substanciais progressos na estabilização e na reabilitação económica, após os confrontos de 1994, manifestando, igualmente, um grande esforço na melhoria das condições de vida da população, apesar dos elevados níveis de pobreza (Soeters, Habineza e Peerenboom, 2006). A percentagem do PIB gasta em saúde aumentou, inclusivamente, de 4,3% em 2002 para 9,8% em 2008 (WHO, 2009a). EXEMPLO DO B UTARE E DE A EXPERIÊNCIA DO P ERFORMANCE I NITIATIVE C YANGUGU B UTARE : T HE 29.1.1. A NTECEDENTES A chamada Performance Initiative foi aplicada em dois Health Districts da Província do Butare, Kabutare e Gakoma, meios, essencialmente, rurais. O Health District de Kabutare, com 302 750 habitantes, compreendia um hospital de referência e 19 centros de saúde, 15 dos quais abrangendo a população do meio rural. O Health District de Gakoma, com 85 090 habitantes, compreendia, igualmente, um hospital de referência e 4 centros de saúde. No pós-guerra, foram seguidas as orientações de 1987, do Regional Commitee of Africa of the World Health Organization, quanto ao modelo de política de saúde, sendo delegadas nas sub-regiões de saúde o planeamento, o financiamento e a regulação. Subsistia, no entanto, a ausência de planos de saúde e da formalização de procedimentos (Soeters, Habineza e Peerenboom, 2006). Desde o final da guerra até 1999, o distrito de Kabutare recebeu apoio dos Médicos sem Fronteiras, Bélgica, a que se seguiu a HealthNet International, uma organização não governamental (projecto Santé d‟Abord I e Santé d‟Abord II, que também se estendeu ao distrito de Gakoma). Tratava-se, em larga medida, de um projecto de apoio a um sistema de saúde descentralizado, incluindo construção de competências e apoio financeiro. Até ao início do processo de contratualização, os dois distritos apresentavam uma evolução promissora. Em 2000, o Governo permitiu a descentralização, deixando os serviços de saúde vulneráveis às leis de mercado. Quando a procura de cuidados de saúde, livre de encargos para o utente, ultrapassou a capacidade de resposta dos prestadores, o Governo do Ruanda permitiu a estes a fixação livre do custo 99 Foram apontados aos distritos de Kabutare e Gakoma pontos fortes determinantes (Meessen et al., 2006): 1. 2. 3. desempenho das unidades públicas poderá dever-se, ainda, a mecanismos de accountability menos eficazes (Meessen et al., 2006). Exceptuando os serviços de planeamento familiar, os centros de saúde eram, efectivamente, usados pela população Infra-estruturas novas, com qualidade e equipadas para os serviços mínimos Recursos humanos qualificados em número suficiente no distrito de Kabutare, para o que contribuíam os subsídios fixos pagos pelos Médicos Sem Fronteiras e, depois, pela HealthNet International; o distrito de Gakoma, mais afastado da rede rodoviária principal, mais dificilmente atraía pessoal qualificado, para além de ainda não beneficiarem, em 2001, do esquema de subsídios do projecto Santé d‟Abord Foram observados níveis diferentes de desempenho, mesmo entre unidades de missão, no que respeitava, designadamente, a cuidados preventivos, o que poderia dever-se ao facto de estes cuidados não serem pagos, representando um encargo adicional, e também ao facto de a resposta às necessidades de cuidados de saúde estar sujeita a uma maior pressão por parte da população, presentemente, doente do que pela população, anónima, que ainda não o está (Meessen et al., 2006). Vários factores apontavam (Meessen et al., 2006) para a necessidade de mudança para um sistema remuneratório: II 4. Os sistemas de gestão encontravam-se operacionais; as falhas de stock de medicamentos e vacinas eram pouco recorrentes; existência de um robusto sistema de informação de saúde computorizada (GESIS); as falhas no transporte e os custos operacionais eram suportados pela ONG 1. 2. 3. Algumas tendências, porém, começavam a notar-se, gerando alguma preocupação, como a redução da utilização dos centros de saúde. Em Kabutare, verificou-se uma redução em 20% do número de consultas, de 1998 para 2001, ainda que não fosse o distrito com mais baixas taxas de utilização (Meessen et al., 2006). Um subsídio fixo era já tomado como garantido O desempenho dos profissionais não era levado em consideração na atribuição do suplemento salarial O montante investido numa unidade de saúde não era calculado com base nos seus outputs, mas no número de trabalhadores, o que beneficiava unidades com mais pessoal, ainda que menos producentes do que outras com um número mais reduzido de profissionais Outros factores, ainda, conduziam (Meessen et al., 2006) para um sistema de remuneração com base no desempenho: 1. Por um lado, as cada vez mais reduzidas taxas de utilização comprometiam a sustentação da prestação de cuidados de saúde (desde 1999, os pagamentos directos dos utentes eram a única fonte de recursos financeiros (Foulon et al., 2004, cit. por Meessen et al., 2006) e, por outro lado, deixava a população doente sem a atenção devida, mesmo no que respeitava a cuidados de saúde básicos e de baixo custo (Meessen et al., 2006). 2. 3. 4. A vontade manifestada pelo Ministério da Saúde em obter melhores resultados das unidades de saúde beneficiárias de ajuda externa A experiência similar no Cambodja A existência de um sistema de informação de saúde computorizada O apoio dos profissionais de saúde As unidades de saúde estavam já devidamente operacionais e equipadas, pelo que, exceptuando os recursos financeiros, que, apenas, se poderiam limitar aos centros de saúde de Kabutare e Gakoma, era o momento favorável para a mudança (Meessen et al., 2006). Para além de se querer melhorar os cuidados já existentes, surgia a necessidade de dar atenção à saúde materna e ao planeamento familiar, com baixas taxas de utilização, e aos cuidados relativos ao VIH/SIDA, cada vez mais emergentes. Por esta razão, a eficiência dos recursos disponíveis tornava-se a melhor ferramenta (Meessen et al., 2006). 29.1.2. O S MECANISMOS DE CONTRATUALIZAÇÃO Quatro centros de saúde de Gakoma (anteriormente, sujeito a um sistema sem incentivos) participaram no projecto, que teve início em Março de 2002, assim como 15 dos 19 centros de saúde de Kabutare (anteriormente, sujeito a incentivos individuais fixos), desde Junho de 2002 (Meessen et al., 2006). No distrito de Kabutare, o desempenho entre as diferentes unidades de saúde era muito variável, dependendo, em parte, de pertencerem ou não a missões. Sendo certo que as comunidades religiosas contribuem para as suas unidades de saúde, o pior 100 A ONG HealthNet International prestou o apoio financeiro e a avaliação teve lugar após três anos de implementação. O projecto teve também (Meessen et al., 2006) o apoio do Ministério da Saúde, no que respeitava à necessidade de tomada atempada de decisões, designadamente, quanto à colocação e transferência dos trabalhadores. por cada nova mulher que se inscrevesse na unidade, de maneira a fomentar as consultas de planeamento familiar (Meessen et al., 2006). Foi, ainda, propositadamente ignorado o comportamento decrescente da linha do custo marginal de produção, dado que o objectivo era garantir a simplicidade da experiência (Meessen et al., 2006). Foram definidas cinco áreas básicas de serviços (Meessen et al., 2006): 1. 2. 3. 4. 5. Houve uma grande preocupação pela definição de indicadores claros, ainda que se revelasse necessária a sua adaptação ou alteração ao longo da experiência, de forma a prosseguir os objectivos traçados (Meessen et al., 2006). Cuidados curativos Partos assistidos na unidade de saúde Consulta pré-natal Planeamento familiar Vacinação infantil Foram, intencionalmente, excluídos indicadores de qualidade, pelas suas difíceis mensurabilidade e gestão administrativa, não suportáveis pelo projecto, e, ainda, pela convicção de que o pagamento com base nos resultados impulsionaria um aumento da qualidade dos serviços prestados e a atracção de pessoal qualificado. Por outro lado, a motivação dos profissionais permitiria, posteriormente, outras intervenções, como formação e introdução de novos protocolos (Meessen et al., 2006). Foi intencional a delimitação simples dos serviços a contratualizar, de forma a permitir uma maior facilidade na prestação, por um lado, e na sua monitorização, por outro. Era desejável uma forma pragmática de explorar as potencialidades e os riscos da experiência (Meessen et al., 2006). Por cada um dos cinco serviços enumerados, foi definida (Meessen et al., 2006) uma taxa suportada por um comprador, que não o utente. O pagamento por cada unidade de produção configurava um factor de motivação para os profissionais, representava um retorno e benefício financeiro por cada serviço prestado pela unidade e permitia o planeamento da aplicação de recursos. Foi, igualmente, definido o pagamento por cada novo episódio de cuidados curativos, ainda que de baixo valor, representando o poder de atracção da unidade de saúde. Foi criada uma Steering Commitee, encarregada de, trimestralmente, avaliar os serviços prestados pelas unidades de saúde, identificar e contornar constrangimentos na implementação da experiência, tomar decisões sobre a necessidade de ajustes e aplicar sanções em caso de fraude. Para promover a transparência e a responsabilização, as reuniões da Steering Commitee eram abertas ao público, estando, também, presentes representantes dos centros de saúde (Meessen et al., 2006). O pagamento pela produção total da unidade de saúde, e não pelo incremento após a mudança, configurava (Meessen et al., 2006) uma manifestação de boa-vontade e reconhecimento pelo trabalho prestado pelas unidades que já apresentavam um bom desempenho, ao mesmo tempo que representava uma oportunidade para outras unidades de saúde, cujo desempenho era anteriormente prejudicado por factores que lhes eram inimputáveis. O contrato tinha em vista (Meessen et al., 2006) uma maior responsabilização mútua dos contraentes e, em prol da simplicidade, foi delineado um único contrato multilateral para cada centro de saúde. O contrato especifica a tabela de pagamentos, as obrigações de informação e transparência, penalizações e motivos para a quebra do contrato (designadamente, violação do código de conduta e fraude). O contrato permitia ainda (Meessen et al., 2006) a tomada livre de decisões da Steering Commitee para a resolução de problemas que possam eventualmente surgir, nomeadamente, quanto a uma prestação pobre de cuidados de saúde. Foi atribuído um custo elevado por parto assistido na unidade, ainda que se revelasse necessário transferir a gestante e/ou o recém-nascido para uma unidade de saúde mais adequada, em caso de complicações (de forma a evitar a retenção na unidade da mulher e da criança, apenas para não se perder o pagamento), e 101 Figura 10: Actores do processo de contratualização da Os profissionais eram remunerados mensalmente e de modo significativo, como factor de motivação e a traduzir-se igualmente em mais horas de trabalho. Os pagamentos estavam a cargo da ONG. Estabeleceram-se também incentivos para a criatividade e iniciativa (Meessen et al., 2006). Performance Initiative Foi criada (Meessen et al., 2006), também, uma comissão para a gestão em cada centro de saúde, que consistia numa plataforma de discussão e de implementação de estratégias para a melhoria do desempenho, composta por representantes dos profissionais, com poderes decisórios e responsabilidade na viabilidade económica do centro de saúde. Fonte: Meessen et al., 2006. 29.1.3. R ESULT ADOS Para a avaliação do impacto da Performance Initiative, foi utilizando o GESIS, um sistema de informação de saúde, com reconhecida fidelidade. Foram comparados os 19 centros de saúde participantes antes e depois da Performance Initiative e, ainda, com o resto do país (Meessen et al., 2006). A Steering Commitee exigiu a cada comissão para a gestão que fosse redigido um regulamento interno e definido o conteúdo funcional de cada posto de trabalho, articulados num motivation contract que obrigaria cada profissional perante a comissão, onde se encontra, no fundo, reflectido o que se espera de cada trabalhador (Meessen et al., 2006). Segundo os autores citados, a Steering Commitee demonstrou a capacidade para conduzir a experiência, fazer cumprir os contratos e dirimir conflitos. Estabeleceram-se, ainda, incentivos para o registo devido e verdadeiro da informação, através de relatórios mensais, e, ainda, monitorização complementar independente, para dissuadir falsos registos, como cruzamento de informação, incluindo visitas a utentes aleatoriamente seleccionados dos registos diários, e a ameaça de sanções severas (Meessen et al., 2006). Todos os serviços contratualizados apresentaram um aumento (Meessen et al., 2006), de forma mais notória nos referentes à saúde materna. A taxa de cobertura da população também se tornou mais elevada nos dois distritos intervencionados, destacando-se de outros distritos rurais da África Sub-Saariana. A taxa de cobertura da população, relativamente ao planeamento familiar, não foi, porém, tão satisfatória como esperado. A monitorização e verificação dos outputs declarados pelas unidades de saúde foram realizadas pela School of Public Health of Butare, uma instituição independente e experiente, o que constituiu, também, uma forma de envolver investigadores locais, que contribuíram para o desenvolvimento de sistemas de controlo dos centros de saúde (Meessen et al., 2006). Kabutare e Gakoma destacaram-se do resto do país, no que se refere à vacinação, consultas externas e partos assistidos (Meessen et al., 2006). 29.1.4. D ESENVOLVIMENTOS FUTUR OS Meessen et al., 2006 apontam as seguintes fraquezas da Performance Initiative: A Performance Initiative assumiu-se como uma experiência, não pretendendo, de todo, representar um modelo ideal e definitivo (Meessen et al., 2006) (vd. Figura 10). 1. A Performance Initiative não foi submetida a um randomized control trial 2. 102 O impacto da iniciativa em termos de qualidade técnica e de ética profissional encontra-se, ainda, por documentar 3. Não devem substimar-se as especiais circunstâncias do país que poderão ter influenciado os resultados 6. A experiência em Kabutare e Gakoma constituiu uma grande mudança no sistema de incentivos, que, aliado a novos aspectos organizacionais e ao investimento de recursos limitados, resultou na melhoria do desempenho de 19 unidades de saúde. 7. A intervenção mostrou que a forma de pagamento influencia, definitivamente, o desempenho das unidades, o que se revelou, particularmente, notório no distrito de Kabutare, onde de um sistema de bónus individuais fixos se passou para um sistema de incentivos com base nos resultados da unidade (Meessen et al., 2006). 8. 9. Segundo Meessen et al. (2006), a descentralização da gestão de recursos parece ser, assim, uma forma de evitar a multiplicação de entidades prosseguindo os seus próprios interesses e regras. 29.2. Os autores referidos deixam alguns conselhos: 1. 2. 3. 4. 5. definição simples de prémios ou salários, mas a discussão das várias relações contratuais, direitos, riscos e compensações Se estiverem presentes os valores e normas sociais, como o “profissionalismo”, a honestidade e a ética, menos mecanismos de controlo serão necessários (e, em consequência, menores custos operacionais) – situação que se esperava do Ruanda A maior aprendizagem a retirar da Performance Initiative é a importância do pagamento com base nos resultados, mesmo em países com baixos recursos. É um contrato “completo”, deixando pouco por interpretar ou negociar no final (Salanié, 1999, cit. por Meessen et al., 2006) A possibilidade das unidades de saúde de reterem as taxas de utilização dos seus utentes representa um grande inventivo Não negligenciar o entusiasmo dos profissionais de saúde e sua a capacidade para desenvolver esforços e inciativas A EXPERIÊNCIA DE C YANGUGU 29.2.1. A NTECEDENTES A fundamental definição clara do papel de cada actor no futuro quadro institucional, sendo necessário que uma entidade autónoma assuma as funções desempenhadas, na experiência do Butare, pela Steering Commitee (contratação de serviços), pela ONG (gestão diária e monitorização) e pela School of Public Health (verificação dos resultados), o que exigirá recursos consideráveis e uma verdadeira capacidade operativa. Por outro lado, é necessário admitir um eventual desajuste do papel que cada entidade tem vindo a desempenhar A verificação da exigível capacidade técnica das unidades, admitindo a frequência de acções de formação para colmatar lacunas que se verifiquem A atenção no provável aumento de referenciação para os hospitais A importância da monitorização do processo e do seu impacto (incluindo a qualidade dos cuidados), sendo essencial um bom sistema de informação de saúde e uma verdadeira capacidade operacional. A monitorização futura do impacto em dimensões intangíveis, como valores individuais e ética profissional constituirão um desafio Os incentivos constituem uma verdadeira influência, mas não se resumem a pagamentos individuais, sendo, igualmente, todos os benefícios intrínsecos e extrínsecos resultantes do quadro institucional, pelo que não bastará a Os resultados favoráveis da Performance Initiative impulsionaram o nascimento de novas experiências no Ruanda, como a de Cyangugu. 29.2.2. O S MECANISMOS DE CONTRATUALIZAÇÃO Participaram no projecto de financiamento com base no desempenho na região de Cyangugu 24 centros de saúde da região de Cyangugu. A contratualização teve início em 2002 e a conclusão da redacção a escrito de todos os contratos terminou em Janeiro de 2003 (Soeters, Habineza e Peerenboom, 2006). A ONG Cordaid prestou o apoio financeiro, que já operava em Cyangugu desde 1998. As autoridades prestaram igualmente um apoio fundamental (Soeters, Habineza e Peerenboom, 2006). Verificou-se a existência de quatro vertentes fundamentais no desenho do enquadramento institucional (Soeters, Habineza e Peerenboom, 2006): 1. 103 Prestação de cuidados de saúde – Após a assinatura dos contratos, os centros de saúde e hospitais eram prestadores autónomos de cuidados de saúde e funcionavam como uma organização. As health commitees com representação da comunidade funcionavam como elo de ligação com a população, enquanto as management teams coordenavam o planeamento 2. 3. 4. 3. interno e a sua implementação Reforço da voz do utente – Os utentes influenciavam, directamente, os prestadores de cuidados, através do pagamento de taxas de utilização e, indirectamente, através de sistemas de pré-pagamento e de respostas a questionários de satisfação Financiamento – Um financiador robusto e independente negociava os contratos com os prestadores de cuidados, monitorizava resultados e distribuía os prémios pelo desempenho Regulação, planeamento e controlo de qualidade – A nível nacional, foram definidas prioridades, em função do equilíbrio entre decisões políticas e técnicas, como estudos de custo-efectividade ou os Monitorização e controlo – Monitorização dos resultados em termos de produção e qualidade Renovação do contrato – Revisão trimestral com base nos resultados, qualidade e satisfação dos utentes O projecto teve a configuração institucional explicitada na Figura 11. Figura 11: Configuração institucional do financiamento com base no desempenho em Cyangugu Millennium Development Goals. As equipas das sub-regiões de saúde asseguraram a implementação das políticas de saúde e conduzem o controlo de qualidade Foi criada uma coordination commitee, composta pelas autoridades locais e administrativas, prestadores de cuidados de saúde e financiadores (Soeters, Habineza e Peerenboom, 2006). Fonte: Soeters, Habineza e Peerenboom, 2006. O processo de contratualização foi submetido a quatro fases (Soeters, Habineza e Peerenboom, 2006): 1. 2. 29.2.3. R ESULT ADOS Da avaliação realizada ao projecto de Cyangugu, verificou-se uma maior satisfação dos utentes e uma maior motivação dos profissionais (Soeters, Habineza e Peerenboom, 2006). Planeamento – Por convite, os administradores das unidades de saúde apresentarão business plans (para o que terão, igualmente, contribuído a população e outros prestadores privados de cuidados), demonstrando como prestariam à população abrangida cuidados de saúde com qualidade (curativos, de prevenção da doença e promoção da saúde), a um custo razoável, e que deverão encontrar-se em consonância com as linhas de orientação locais e nacionais. Esta fase terminará com a aprovação do business plan Prestação de cuidados – Implementação do business plan aprovado, pelas unidades de saúde, através de uma política de hands-off ou black box, relativamente às taxas de utilização, fornecedores e gestão de recursos humanos Registou-se, ainda, um aumento de 25% para 60% da proporção de partos assistidos na unidade de saúde, assim como um aumento na cobertura do planeamento familiar (Soeters, Habineza e Peerenboom, 2006). Foram também criados 120 novos postos de trabalho para trabalhadores qualificados e, anteriormente, desempregadores, resultado positivo que não havia sido previsto (Soeters, Habineza e Peerenboom, 2006). 29.2.4. D ESENVOLVIMENTOS FUTUR OS 104 Desde 2004, foram introduzidos no Ruanda novos sistemas de pré-pagamento ou seguros (conhecidos por mutuelles) (Soeters, Habineza e Peerenboom, 2006), o que tem aumentado o acesso a cuidados de saúde. Em 2006, 51% da população encontrava-se já abrangida (Rusa e Fritsche, 2007), contrastando com os 7% cobertos em 2003. No entanto, o chamado sistema performance-based financing (PBF) tem revelado sustentantibilidade, enquadrando-se nas actuais políticas de saúde nacionais e recebendo um forte apoio político. O Governo tem contratualizado carteiras básicas de indicadores de saúde, a nível nacional, e, por outro lado, outras entidades encontram-se a contratualizar indicadores de desempenho específicos (VIH/SIDA, malária, tuberculose), através do mesmo modelo administrativo (Rusa e Fritsche, 2007). O Governo de Ruanda, em manifestação de compromisso, consignou, em 2005, fundos públicos para a continuação das experiências no Butare e em Cyangugu, no sentido de se alcançarem os Millennium Development Goals da OMS (Meessen et al., 2006). 105 significava que um projecto tinha de ser concebido, financiado, implementado e avaliado em quatro anos. Também o estabelecimento do Primary Health Care Transition Fund promoveu o aparecimento de diversas abordagens, financiando e avaliando a efectividade de diversos projectos de cuidados primários ao longo do país. Mais tarde, o Primary Health Care Transfer veio contornar a fragmentação e a lentidão dos avanços alcançados até à altura, instigando e acelerando um processo que se afastava das diversas, isoladas e breves experiências nos cuidados primários. O projecto ambiciona, assim, promover uma reforma sustentada e duradoura. CONCLUSÕES A revisão de práticas internacionais realizada no âmbito do projecto de investigação, em curso, permitiu evidenciar a existência de numerosos exemplos de processos de contratualização, tendentes à melhoria da efectividade dos cuidados de saúde e a uma maior eficência na utilização dos recursos. Foram observados com maior atenção os países que mais se assemelham ao nosso sistema de saúde, como é o caso dos países com um modelo de sistema nacional de saúde, nomeadamente, a Austrália, o Canadá, a Espanha, a Finlândia e o Reino Unido, ainda que os dois primeiros apresentem algumas diferenças que, de certo modo, os distinguem particularmente, dada a especial organização do território. Em Espanha, e coincidindo com a introdução do conceito de gestão participativa por objectivos, surge o Contrato-Programa, como a necessidade de relacionar e vincular a utilização e o consumo de recursos aos resultados obtidos, procedimento que implicava a negociação da fixação de objectivos, o estabelecimento de metodologias de monitorização, a valoração do grau de cumprimento dos objectivos e a compensação pela prossecução dos mesmos. Por outro lado, a Lei 15/1997, de 25 de Abril, de Habilitación de Nuevas Formas de Gestión en el Sistema Nacional de Salud , estabeleceu que os serviços de saúde podiam ser prestados e geridos mediante acordos, convénios ou contratos com pessoas ou entidades públicas ou privadas, nos termos previstos na Ley General de Sanidad. Na sequência deste diploma, registaram-se diversas experiências de autogestão em diferentes comunidades autónomas, com recurso aos processos de contratualização. Também se verificou a existência de diversas experiências de descentralização e contratualização em países em desenvolvimento, onde têm sido observados resultados muito positivos, como no Cambodja (Soeters e Griffiths, 2003), no Paquistão (Loevinsohn et al., 2008), em Madagáscar e Senegal (Marek et al., 1999) e no Ruanda (Meessen et al., 2006; Meessen, Kashala e Musango, 2007; Soeters, Habineza e Peerenboom, 2006), país a que dedicámos particular atenção. Como referem Collins e Green (2000) é importante aprender com os países em desenvolvimento e não apenas com aqueles que mais se aproximam do país em causa, concluindo que não deve existir um processo unilateral de aprendizagem. Também é possível obter conhecimentos com aqueles a quem habitualmente se ensina e, por essa razão, apresentamos o caso do Ruanda, onde é possível retirar algumas experiências, como, por exemplo, os universais factores motivacionais da gestão clínica. No Reino Unido, assume particular importância o conceito de practice-based commissioning, que diz respeito ao empowerment dos médicos de clínica geral, assim como de outros profissionais de saúde, para a configuração dos serviços e cuidados de saúde prestados às populações locais, no contexto dos contratos estabelecidos com os General Medical Services. O processo de contratualização neste país, principalmente, em Inglaterra, encontra-se claramente instalado, tendo tido importantes e profundos desenvolvimentos, nas mais diversas áreas. Os diferentes países estudados revelaram diferenças significativas nos processos de contratualização desenvolvidos, também em função do sistema de saúde que os caracteriza. Na Austrália, foi estabelecido em 2005 o National Quality & Performance System e introduzidos contratos com base no desempenho, a celebrar com as Divisions of General Practice. Por outro lado, as recentes GP Super Clinics recebem os seus orçamentos com base em especiais acordos de financiamento, que explicitarão em detalhe todos os termos e condições. A Alemanha e a Holanda caracterizam-se por terem presentes no sistema de saúde um quase-mercado de seguros de saúde e destacam-se também pelos diferentes processos de contratualização, estabelecidos entre as seguradoras e os prestadores de cuidados médicos. O sistema canadiano mostra igualmente projectos interessantes, destacando-se o Health Transition Fund, que tinha um financiamento limitado no tempo, o que Na Alemanha, a competição introduzida com a reforma de 2007 veio, com efeito, permitir às seguradoras, novas possibilidades na configuração dos contratos, 106 das chamadas CareWorks® – Convenient Healthcare Clinics, centros clínicos em supermercados, permitindo, por exemplo, contratualizar directamente com os médicos que prestam cuidados de saúde em consultórios privados. rede Na Holanda, predomina a contratualização selectiva que, já na década de 80, era defendida no “Relatório de Dekker”, como um mecanismo ideal para a criação de um mercado do lado da oferta, o qual incrementaria a eficiência e aumentaria os padrões de qualidade. A implementação da contratualização selectiva não foi nessa altura concretizada, mas, actualmente, encontrase presente no sistema de saúde holandês e nas relações entre as seguradoras e os prestadores de cuidados de saúde. Todos os sistemas de saúde apontam os processos de contratualização no sentido de alcançarem uma maior eficiência dos recursos utilizados, um acesso mais alargado e facilitado aos serviços de saúde, a prestação de cuidados de elevada qualidade e o enfoque na promoção da saúde e na prevenção da doença. mais próximos das pessoas. São também notórios alguns elementos comuns ao sucesso dos vários processos de contratualização desenvolvidos, como a criação de equipas multidisciplinares, o envolvimento e a motivação dos profissionais e a delegação dos processos decisórios e da gestão dos recursos nos profissionais da “linha da frente”, por se encontrarem mais próximos dos doentes e conhecerem melhor as suas necessidades e expectativas. Quanto à França e Finlândia não foram dados a conhecer os processos de contratualização que eventualmente tenham decorrido ou se encontrem em desenvolvimento, fragilidade que, no decorrer do projecto de investigação, se tentará suprir, procurando-se dedicar-lhes especial atenção. No caso particular dos Estados Unidos da América, caracterizado pela inexistência de uma protecção universal na saúde, espera-se actualmente uma mudança no sistema de seguros que passe a oferecer um conjunto de escolhas alargado de planos de seguros privados e simultaneamente a opção por um novo plano de seguro público. Em suma, ainda que ressaltem diferenças significativas em termos de modelos de planeamento, contratualização e financiamento de serviços de saúde entre os diversos países em análise, parece indiscutivel o papel fundamental que os cuidados de saúde primários representam nos sistemas de saúde, contituindo a peça fundamental e o elemento chave das reformas tendentes à obtenção dos desejáveis níveis de equidade, acesso, eficiência e qualidade dos cuidados. Relativamente a este país, por se considerar pertinente para a investigação, atenta a reforma generalizada e profunda em curso, destacámos o caso singular da Kaiser Permanente que, para além de abranger uma população de mais de 8 milhões de pessoas, se destaca dos restantes planos de saúde americanos na medida em que constitui um modelo integrado de financiamento e prestação, actuando como um serviço nacional de saúde, com uma única linha de financiamento, um orçamento global e a responsabilização por toda a linha de cuidados de uma população. «Care delivered with an orientation toward primary care has been found to be associated with more effective, equitable, and efficient health services; residents of countries more oriented to primary care report better health at lower costs» (Starfield, Shi, Macinko, 2005) Também foi dada particular atenção ao sistema de saúde da Geisinger, alvo de numerosos reconhecimentos ao nível nacional pelos sucessos alcançados no acesso a cuidados de elevada qualidade, constituindo um dos mais proeminentes sistemas de saúde americanos, abrangendo uma população de cerca de 2,6 milhões de pessoas. Aposta essencialmente na liderança dos médicos, uma dimensão marcante na Geisinger, assumindo-se a organização como um sistema de saúde orientado para o prestador de cuidados médicos, o que contribuiu para a completa integração dos serviços. Uma dimensão inovadora do GHS e da Geisinger Clinic é a 107 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 466272A7DCF04FCA25743D001739E0/$File/GPSC%20National%20 Program%20Guide.pdf AGPN. AUSTRALIAN GENERAL PRACTICE NETWORK - Federal budget 2009: brief overview and analysis of measures of interest to the network. 2009. [Em linha] [Consult. em 31 Jul. 2009]. Disponível em http://www.agpn.com.au/__data/assets/pdf_file/0015/12561/budg et-analysis-2009.pdf AUSTRALIA. AUSTRALIA GOVERNMENT. DEPARTMENT OF HEALTH AND AGEING - Australian primary care collaboratives program (APCCP). 15 Outubro de 2008b. [Em linha] [Consult. em 31 Jul. 2009]. Disponível em http://www.health.gov.au/internet/main/publishing.nsf/Content/he alth-pcd-programs-apccp-index.htm AGUIRRE, J. 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