casa das histórias e desenhos paula rego

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casa das histórias e desenhos paula rego
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Por: Paulo Queirós de Faria – Engenheiros Consultores, Lda
CASA DAS HISTÓRIAS E DESENHOS PAULA REGO
1. INTRODUÇÃO
O Projecto que se designou por “Casa das histórias e desenhos Paula Rego” foi uma
forma digna que o País encontrou para, através da construção de um Museu em Cascais,
homenagear e perpetuar o nome de um seu cidadão que através da arte da pintura se
tornou mundialmente reconhecido e com todos os seus trabalhos cobiçados.
Para complementar esta iniciativa, e por expresso desejo da Pintora, a idealização do
edifício foi entregue a outro português também reconhecido lá por fora – o Arquitecto
Eduardo Souto de Moura e a sua equipe, Arqto. Sérgio Koch e Arqto. Ricardo Prata.
O projecto apresentado assenta numa área global de construção de cerca de 2.500 m2,
dividido em dois pisos, incluindo as seguintes funcionalidades:
• Piso 0 – (Nível de rés-do-chão)
-
6 espaços dedicados a exposições permanentes;
1 espaço dedicado a exposições temporárias;
Átrio de entrada;
Área para Bar;
Livraria e sala de leitura;
Áreas de circulação;
Área Administrativa dividida em 4 gabinetes.
• Piso -1 – (Nível Cave)
-
Áreas Técnicas;
Central de Segurança;
Áreas para depósito de obras de arte e documentos;
Oficina de restauro;
Átrio, circulações e instalações sanitárias/balneários.
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Figura 1 – Maqueta do Edifício vista do lado dos Gabinetes Administrativos
2. DESAFIOS
Na elaboração de um projecto de climatização para um Museu, apresentam-se à equipe
projectista dois enormes desafios; Um, de ordem técnica e de trabalho multidisciplinar
coordenado, e outro, tão mais importante, de equilíbrio nas soluções a adoptar.
• 1º Desafio:
Basicamente, qualquer ideal de conservação do património histórico e artístico, consiste
num compromisso entre:
-
Armazenamento pura e simples das peças sem qualquer intuito divulgativo, mas nas
melhores condições ambientais para a sua conservação;
-
Conservação das peças e a sua divulgação pública, contribuindo de uma forma
decisiva para que toda a sociedade possa apreender e contemplar a história científica
e artística do Homem - engrandecimento cultural.
2º Desafio:
Se pretendemos conservar divulgando, teremos que pensar nos custos que essa opção
implica, sendo importante que todas as concepções adoptadas, quando tecnicamente
aceites pelos especialistas em conservação, tornem a solução final economicamente
viável para que o local possa conservar a sua filosofia primária – funcionar e estar aberto
aos cidadãos conservando o seu espólio.
3. FACTORES QUE INFLUENCIAM A DETERIORAÇÃO
Na concepção de um sistema de climatização para um Museu, deverá existir um trabalho
interdisciplinar entre o engenheiro mecânico, arquitecto, engenheiro electrotécnico,
técnicos de conservação, e museólogo responsável.
Esta colaboração será responsável pela definição dos critérios e soluções a adoptar para
que o Projecto seja bem sucedido.
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Os principais factores, por ordem decrescente de importância, que influenciam a
deterioração da generalidade das peças museológicas são:
-
Iluminação natural ou artificial das peças, tendo o cuidado de controlar a exposição
aos ultravioletas, limitar a intensidade de iluminação e restringir a duração da mesma;
-
Humidade relativa ambiente, a qual, deve ser controlada em função do tipo e
natureza de peça exposta;
-
Temperatura que também deve ser controlada e que tem influência directa na
humidade relativa;
-
Qualidade do ar interior, no que respeita a componentes gasosos e sólidos que
podem ter origem em eventuais infiltrações de ar pela envolvente do edifício ou na
admissão de ar exterior do sistema de climatização;
-
Fungos, bactérias ou insectos, cujo aparecimento pode ser evitado por eficientes
controlos da temperatura/humidade e da qualidade do ar interior;
-
Vibrações transmitidas do ambiente exterior ou pelos equipamentos mecânicos;
-
Sinistros tais como incêndio, inundações por ruptura de tubagens de água, etc.;
-
Actos de vandalismo, de onde será importante um bom sistema de anti-intrusão e
vídeo vigilância.
4. OUTROS ASPECTOS A TER EM CONTA
Os diversos espaços de um Museu requerem distintos cuidados no sistema de tratamento
do ar ambiente de acordo com o fim a que se destinam.
Assim poderemos ter:
-
Espaços de depósitos, sem acesso público, nos quais se podem manter condições
ideais para a conservação das peças – maior rigor no controlo termo-higrométrico, ar
exterior mínimo, iluminação controlada e ausência de luz natural. Estes espaços
situam-se normalmente em caves.
-
Oficinas de restauro, onde se podem libertar com facilidade substâncias químicas e
físicas prejudiciais à conservação, tendo que haver o cuidado de prever a instalação
de sistemas localizados e individuais de exaustão com filtragens próprias de modo a
evitar-se a sua propagação para outros espaços e para o exterior.
-
Salas para exposições permanentes, onde as condições termo-higrométricas interiores
podem ser bem definidas de acordo com o tipo de objectos expostos;
-
Salas de exposições temporárias, onde os sistemas de climatização terão que possuir
a maior flexibilidade possível, pois o tipo de peças expostas pode ser extremamente
variável. Normalmente, a entidade que cede as peças para exposição e até os próprios
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seguros das mesmas exigem, antes de cada cedência, uma demonstração clara que
as condições ambientais estão de acordo com os parâmetros exigidos;
-
Áreas de lazer, tais como bares, salas de leitura, auditórios, etc., onde o tratamento do
ar ambiente se destina principalmente ao conforto dos ocupantes.
-
Áreas Administrativas, com exigências idênticas às anteriores.
5. TIPOS DE SISTEMAS DE CLIMATIZAÇÂO
O tipo de sistema de climatização a implementar deve, para cada local específico e de
acordo com o tipo de peças expostas, contribuir para:
-
Aumentar as potencialidades de conservação das peças;
-
Proporcionar o conforto dos visitantes sem contudo colidir com o aspecto anterior;
-
Possibilitar os trabalhos de restauro e armazenamento de peças momentaneamente
não expostas;
-
Possibilitar o trabalho de estudo e investigação das equipes de museólogos
responsáveis pelo edifício;
-
Proporcionar custos de exploração controlados de forma a viabilizar a continuidade do
edifício na sua função de divulgação cultural.
6. NO CASO PRESENTE
Durante o trabalho de concepção e projecto deste Museu, a partir dos conceitos base
referidos anteriormente, chegamos a soluções e compromissos técnicos que nos
pareceram os mais adequados para que o produto final possa vir a ter o sucesso que o
mesmo merece.
Assim:
a)
Solução arquitectónica, iluminação e segurança
-
Encontrou-se uma solução arquitectónica que proporcionou um edifício compacto,
quase sem aberturas para o exterior nas salas de exposição, uma excelente
iluminação natural nas zonas de lazer e administrativas, espaços técnicos de fácil
acesso, espaços para depósitos em cave.
-
Todas as soluções de iluminação das salas de exposições foram estudadas de forma
a possibilitarem a mais correcta e atractiva observação das obras de arte sem contudo
serem fontes de deterioração das mesmas, contribuindo também para a redução dos
custos energéticos associados.
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-
Foram implementados sistemas eficientes de detecção e combate a incêndios e
sistemas anti-intrusão e vigilância permanentes.
b)
Condições termo-higrométricas interiores
Tratando-se de um museu para exposição de pintura de arte, foi estabelecido que nas
áreas de exposição e armazenamento, os valores termo-higrométricos interiores se
situassem dentro da área tracejada apresentada no psicrométrico seguinte.
Figura 2 – Condições termo-higrométricas interiores
c)
Soluções para climatização
As soluções para a climatização dos vários espaços do edifício tiveram naturalmente em
linha de conta todos os aspectos já referidos de forma genérica.
Basicamente, teremos então:
• Produção de energia térmica
-
Produção centralizada de energia térmica (arrefecimento e aquecimento) através de
um conjunto de duas unidades; Uma para produção de água refrigerada e outra para
produção simultânea de água refrigerada e água quente com recuperação total. Para a
água refrigerada as duas unidades serão montadas em paralelo, sendo a temperatura
da água fornecida a 5ºC (com 5% de etilenoglycol) de forma a proporcionar um grau
de desumidificação adequado nas unidades terminais de tratamento de ar.
-
Com a utilização do grupo a 4 tubos com recuperação total, conseguimos que a
produção de água quente seja sempre gratuita, pois verificou-se pela simulação
energética realizada que existe sempre necessidade de arrefecimento para controlo da
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humidade, tendo assim, o sistema de GTC sido concebido para dar sempre prioridade
de funcionamento a esta unidade.
Com esta opção conseguiu-se não ultrapassar o valor do Índice de Eficiência
Energética (IEE) imposto regulamentarmente – 15 Kgep/m2.ano pois a parcela IEEi
possuiu um valor muito pequeno – o que contribui para uma redução dos custos de
exploração do edifício.
Também, e por razões de redução de espaços técnicos, facilidade de manutenção,
compacticidade do equipamento e suavidade de funcionamento, os grupos foram
previstos incluindo no seu interior bombas circuladoras e tanques de inércia.
As potências térmicas totais instaladas serão:
ARREFECIMENTO
…………………………………. 260 kW
AQUECIMENTO
recuperação total)
…………………………………. 166 kW (Valor da potência em
• Sistemas terminais de climatização – conversores de energia térmica
Os sistemas de climatização interiores foram pensados de forma a puderem cumprir com
os seguintes requisitos:
o SALAS DE EXPOSIÇÃO
-
Para as salas de exposição e depósitos, a quantidade de ar exterior considerada foi a
estritamente necessária para satisfazer os índices de ocupação previstos e
regulamentares. Não foram utilizados sistemas de “free-cooling” pois, quaisquer
excessos de ar exterior constituem motivos de flutuações na humidade relativa e
entrada de poluentes, implicando sobrecustos desnecessários nos sistemas de
humidificação e filtragem.
-
Por outro lado foram utilizados nestes locais, sistemas de arrefecimento híbridos –
radiantes e de convecção forçada – de forma que parte das cargas sensíveis sejam
absorvidas pelo sistema estático e a carga latente e a restante sensível pelos sistemas
convectivos. Os sistemas passivos serão responsáveis pelo conforto dos ocupantes o
que se traduz numa diminuição dos custos de exploração.
-
Estes sistemas convectivos (tectos arrefecidos) foram projectados utilizando malhas
de tubos capilares em polipropileno embebidos num pladur acústico. Foi possível
atingir uma potência térmica específica de 45 W/m2.
-
Os sistemas convectivos foram concebidos utilizando máquinas de “close control”,
uma para cada área de exposição. Estes sistemas poderão controlar a temperatura e a
humidade relativa e cada unidade de climatização possuirá duas serpentinas (uma
para arrefecimento e outra para aquecimento alimentadas a partir das redes gerais do
edifício), um humidificador a vapor e um sistema de filtragem da classe EU 5. A
distribuição do ar foi feita através de linhas de difusores lineares em todo o perímetro,
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com afastamentos de 1,5 m às paredes; As calhas para iluminação foram instaladas
ao longo do bordo exterior dos difusores. O retorno do ar foi idealizado a nível inferior
através de fendas nas paredes de pladur.
o ÁREAS DE DEPOSITO (CAVE)
Nestas áreas foi prevista a instalação de unidades de climatização “close control” também
alimentadas hidraulicamente através do sistema centralizado de produção térmica. A
renovação do ar foi efectuada recorrendo ao sistema central de insuflação de ar exterior e
exaustão do ar viciado existente.
o ÁREAS DE LAZER (BAR, LIVRARIA E AUDITÓRIO)
Para estes espaços foram naturalmente considerados os parâmetros de conforto
considerados “standard” – 20ºC a 24ºC / 50% a 55% HR.
O tratamento do ar ambiente foi projectado recorrendo a unidades modulares a 4 tubos de
montagem exterior incluído, cada uma delas as respectivas secções de insuflação,
exaustão de ar, módulo de mistura de 3 vias para doseamento automático das taxas de
ventilação em função da ocupação de cada espaço e o recuperador de calor entre os dois
fluxos de ar.
o ÁREAS ADMINISTRATIVAS
Para as áreas administrativas foram consideradas as tradicionais unidades ventiloconvector a 4 tubos – uma para cada espaço autónomo.
A renovação do ar interior ficou a cargo da unidade central UTAN 1.
o SISTEMA PARA RENOVAÇÃO DO AR INTERIOR
Este sistema foi concebido de forma centralizada e destina-se a:
-
Áreas de exposição;
Áreas de depósitos;
Circulações;
Áreas administrativas.
A unidade terminal responsável designou-se por UTAN 1 e ficou instalada na área técnica
da Cave.
Trata-se de uma unidade de construção modular, a 4 tubos, de montagem sobreposta.
Inclui um sistema de filtragem composto por um pré-filtro EU4, um filtro EU8 e um terminal
EU10, um sistema de recuperação de calor ar/ar do tipo roda entálpica.
O controlo térmico foi feito sobre a temperatura de insuflação e fixado um valor constante
de 20ºC.
Os valores finais dos caudais de ar foram:
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-
Ar exterior = 7.650 m3/h
Exaustão = 5.740 m3/h
• Sistemas de distribuição hidráulica
A distribuição hidráulica foi projectada com tubagem em cobre. Esta opção, ao seu tempo,
deveu-se ao facto da sua maior longevidade, permissão de sistemas de tratamento de
água mais simples e redução do valor dos consumos de bombagem dado a menor perda
de carga associada.
Utilizamos o sistema de garrafa hidráulica entre o colector primário (fontes térmicas) e o
secundário (distribuição).
Para os circuitos de alimentação de UTA´s, ventilo-convectores e unidades “cose control”,
usamos a solução caudal constante; Para os tectos arrefecidos caudal variável.
A regulação do caudal foi projectada recorrendo a válvulas de regulação de caudal do tipo
estático e válvulas do tipo dinâmico nos conversores de energia.
• Sistemas atenuação acústica
Em todas unidades terminais de tratamento de ar foram previstos sistemas de atenuação
acústica dimensionados para que os níveis finais não ultrapassem os 35 dB(A) em todos
os espaços com a excepção do Auditório em que o valor máximo será de 25 dB(A).
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Figura 3– Esquema de princípio da instalação projectada
d)
Solução para desenfumagem
O sistema de desenfumagem dedicado exclusivamente à Cave onde se encontram os
Depósitos foi concebido com o cuidado, para controlo de custos, de utilização das
mesmas redes aerólicas da climatização.
Através da abertura e fecho de registos corta-fogo de comando eléctrico e com a
introdução de um ventilador resistente ao fogo (400ºC / 2H), em caso de incêndio em
qualquer um dos espaços o sistema realiza a função de extracção dos fumos.
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7. CONCLUSÕES
Após a realização deste projecto ficou claro que um edifício como este, sendo complexo
vivo e “altruísta” deve ser concebido com soluções técnicas que, preservando o seu
espólio conduzam a custos de manutenção que lhe permita sobreviver.

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