Sem título-4 - Busca rápida - Conselho Regional de Contabilidade

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Sem título-4 - Busca rápida - Conselho Regional de Contabilidade
ISSN 1519-0412
Ano V I • Nº 20 • Mai/Jul - 2003
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Pensar Contábil
Mai/Jul - 2003
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
Editorial
PRÊMIO GERALDO DE LA ROCQUE
A edição especial da revista “Pensar Contábil” justifica-se por demonstrar o crescimento quantitativo e qualitativo da produção literária
contábil nos últimos anos e consagra a existência de um prêmio, o
GERALDO DE LA ROCQUE, que vem se consolidando junto aos pesquisadores da Contabilidade, desde a sua criação.
Antes de tecermos comentários sobre a matéria que integra esta
edição, temos o dever de fazer breves comentários sobre o titular do
prêmio: o contador e professor GERALDO DE LA ROCQUE.
O professor GERALDO DE LA ROCQUE é um nome de referência para a escola brasileira de contabilidade, pela sua produção
literária e pelo exercício do magistério em instituições de ensino
importantes no cenário brasileiro, como o DASP – Departamento
de Aperfeiçoamento do Serviço Público e a EBAP – Escola Brasileira de Administração Pública da Fundação Getúlio Vargas, onde
lecionou cursos de Contabilidade Pública, Contabilidade Geral, Técnicas de Tributação, Didática e Conteúdo de Contabilidade, Auditoria e Contabilidade Industrial.
Produziu mais de 30 obras contábeis, obras essas que apresentam
temas variados e aprofundados (Contabilidade Pública, Auditoria e Análise de Balanço, Dicionário Fisco-Contábil do Imposto de Renda, etc).
Trabalhou 34 anos no serviço público federal, como Auditor Fiscal do
Tesouro Nacional, mediante ingresso por aprovação em concurso público, em 1940.
Foi vitorioso na carreira pública, pois exerceu posições de destaque
como: Contador Geral da República (último profissional a ocupar tal
Índice
4
José Paulo Cosenza
A Qualidade das Demonstrações Contábeis
Convertidas em Ambiente Econômico
Estável e Desvalorização Cambial ..........................................
15
Áurea de Carvalho Martins
Fraudes com Derivativos: O Caso Barings ...........................
19
Fluxos de Caixa e Capital de Giro
27
Andréa Alves Silveira Monteiro
Desperdício: Miopia Informativa da D.R.E, ...........................
Pensar
Contábil
ISSN 1519-0412
CONSELHO DIRETOR
Sebastião Bergamini Júnior
– Uma adaptação do Modelo de Fleuriet ..............................
Antonio Miguel Fernandes
Vice-presidente de Desenvolvimento Profissional
Expediente
Contabilidade criativa:
as duas faces de uma mesma moeda ...................................
cargo no país), Delegado Regional do Imposto de Renda, Secretário de
Assuntos Legislativos, Assessor do Ministro da Fazenda e Contador do
Ministério do Planejamento.
Ao se aposentar em 1974, deu continuidade às suas atividades profissionais, como empresário contábil, professor, autor e articulistas dos
principais jornais em circulação no país (O GLOBO, JORNAL DO COMMERCIO, GAZETA MERCANTIL, JORNAL DO BRASIL, ESTADO DE
SÃO PAULO, FOLHA DE SÃO PAULO e ÙLTIMA HORA).
Foi por mais de 20 anos conselheiro do CRC-RJ, tendo inclusive
ocupada a vice-presidência da entidade.
Partiu para outra etapa da vida em 1982, aos 63 anos, tendo nos
deixado além da sua obra e carreira profissional brilhantes, dois filhos,
entre eles o nosso ex-presidente e atual conselheiro o contador CARLOS DE LA ROCQUE.
Considerando o caráter especial da edição, estamos publicando os
cinco primeiros premiados no último evento, trabalhos que muito contribuirão para auxiliar aos alunos dos cursos de graduação e pós-graduação (lato e strictu senso) na absorção dos conhecimentos tratados em
cada um dos artigos selecionados.
Esperamos que os leitores aproveitem bem esta edição e que possam contribuir com artigos para o próximo prêmio GERALDO DE LA
ROCQUE, e para a própria PENSAR CONTÁBIL.
35
Presidente: Nelson Monteiro da Rocha
Vice-Presidente de Desenvolvimento
Profissional: Antonio Miguel Fernandes
Vice-Presidente de Administração
e Finanças: Diva Maria de Oliveira Gesualdi
Vice-Presidente de Fiscalização do Exercício
Profissional: Vitória Maria da Silva
Vice-Presidente de Registro:
Carlos de La Rocque
Vice-Presidente de Controle
Interno: Paulo Cesar de Castro
Vice-Presidente de Interior: Cezar Stagi
Pensar
Contábil
Fabiano Simões Coelho
CONSELHO EDITORIAL
José Carlos Sardinha
Gestão dos Custos da Qualidade Ambiental .......................
Maria Elisabeth Kraemer
Uma publicação do
43
Coordenador: Antonio Miguel Fernandes
Conselheiro Jorge Ribeiro dos Passos Rosa
Conselheiro Josir Simeone
Conselheiro Walter Conceição
Conselheiro Waldir Ladeira
Editora: Rosa Helena Martire (MT 21405)
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Diagramação: Adriano Antunes dos Santos
Revisão: Claudia Stivelman
Estagiário: Marcelo Bernardo Pereira
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3
Pensar Contábil
Mai/Jul - 2003
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
1º colocado no Prêmio Geraldo de La Rocque
Contabilidade criativa:
as duas faces de uma
mesma moeda
José Paulo Cosenza
Bacharel em CC, doutorando na Universidade de Zaragoza,
mestre em Contabilidade, professor na UERJ, contador no BNDES
1 – INTRODUÇÃO
Com a internacionalização econômica dos mercados, as
empresas se viram forçadas a desenvolver suas atividades em
um ambiente mais competitivo e complexo. Neste contexto, a
contabilidade assume um papel preponderante, já que permite
o efetivo conhecimento da situação real do patrimônio das entidades.
Assim, a informação de caráter econômico-financeiro que as
companhias elaboram e divulgam anualmente constitui uma
variável chave para a tomada de decisão por parte dos usuários, pois é o principal meio de comunicação dessas empresas
com os distintos agentes, interessados em suas situações econômicas e na evolução de seus patrimônios.
Como, a princípio, somente os proprietários, visando o processo de gestão, e o governo, a fim de conhecer os resultados
obtidos pelas empresas e fiscalizá-las com base nos registros
de suas atividades, teriam interesse em tais informações, não
havia muita preocupação com esse aspecto. No entanto, o surgimento de novos interessados na informação contábil-financeira, na literatura denominados stakeholders (credores, dirigentes não proprietários, acionistas, sindicatos, fundos de previdência, etc.), acabou por elucidar a magnitude da ineficácia
dos sistemas de informação contábil1 .
Na literatura acadêmica, já há algum tempo se vem debatendo sobre quais seriam os usuários interessados no conhecimento da informação contábil e se desenvolvendo pesquisas sobre a utilidade da contabilidade, dirigida a diferentes
objetivos dentro do processo de análise da gestão. Contudo,
o grande problema é que cada um desses usuários possui
objetivos distintos a respeito da informação econômico-financeira, acarretando, assim, um conflito de interesses, já que
cada um deseja que os dados contábeis sejam gerados segundo suas conveniências particulares; fato que tem levado
o debate sobre a legalidade, a legitimidade, a conveniência e
o sigilo da informação contábil a estar sempre presente em
Pensar
Contábil
congressos, conferências, seminários e publicações especializadas.
Todavia, o principal problema neste momento está relacionado à forma como se elabora essa informação, pois, dependendo
do modo como os valores são calculados e da maneira como
podem ser publicados em cada país, é possível a obtenção de
resultados mais ou menos favoráveis, levando os usuários a
fundamentarem suas decisões em resultados talvez enganosos
em essência.
São as ambigüidades dos critérios contábeis que dão margem a contabilizações distintas de um mesmo fato e, portanto, a
grandes diferenças na representação de uma mesma realidade
patrimonial2 . E neste contexto são canalizadas as práticas ditas
de contabilidade criativa, cujos fundamentos estão embasados
no aproveitamento das subjetividades, flexibilidades e omissões
das normas contábeis para que se consiga apresentar as contas de forma a melhor demonstrar a imagem desejada por quem
a elabora.
Partindo dessas considerações iniciais, iremos analisar e
explorar os aspectos relevantes associados ao fenômeno conhecido na literatura como contabilidade criativa ou earnings
management, como lhe denominam os autores internacionais,
e demonstraremos, também, que a norma contábil mundial oferece possíveis campos para práticas neste sentido. Nosso objetivo é abordar e explicar os aspectos indutores da contabilidade
criativa, discutindo seu significado, sua natureza e os fatores
que mais a motivam.
2 – O ALCANCE E O SIGNIFICADO DO
TERMO CONTABILIDADE CRIATIVA
O termo contabilidade criativa é de origem anglo-saxônica —
tanto em sua forma prática, quanto em sua estratégia — e já foi
objeto de grandes debates e pesquisas no meio acadêmico,
principalmente no Reino Unido3 , porém esse fenômeno ainda
se apresenta como um tema atual na prática contábil internacio-
1 Em geral, os sistemas contábeis são estruturados para atender as demandas de informação direcionadas aos proprietários e administradores. Isto pode gerar, em certas ocasiões,
conflitos de interesses, já que a contabilidade nem sempre consegue atender aos interesses dos demais usuários que necessitam de dados que ponham em evidência outros
tipos de informes diferentes daqueles contidos nas demonstrações contábeis tradicionais.
2 Giner, 1992.
3 Em função da flexibilidade presente nas normas contábeis daquela sociedade (ver Naser, 1993).
4
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nal, uma vez que tem ganhado importância na informação contábil-financeira que se divulga para os usuários e comunidade
empresariais4 .
O tema contabilidade criativa pode ser analisado sob varia-
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das perspectivas e sua conceituação depende da extensão que
se lhe queira outorgar5 . Por conseqüência, distintos autores têm
identificado esse mesmo fenômeno sob os mais diferentes enfoques:
AUTOR
ANO
ABORDAGEM
CONCEITUAÇÃO
Ian Griffiths
1988 e 1995
Jornalística
A contabilidade criativa seria uma prática negativa de manipulação da realidade empresarial para distorcer os resultados e a
posição financeira de maneira que reflitam a situação
desejada por quem a moldou.
Michael Jameson
1988
Contábil
Entende ser uma prática inadequada, mesmo operando dentro da
legislação e das normas contábeis, porque distorce os resultados
e a posição financeira da empresa, induzindo os usuários a
decisões econômicas ineficientes.
Terry Smith
1992
Analista de
Mercado
Vê a contabilidade criativa como um problema muito grave, já que
serve como instrumento de manipulação contábil para se apresentar indicadores de crescimento econômico e financeiros não reais,
que, em um segundo momento, podem se tornar verdadeiros
colapsos empresariais.
Kamal H.M. Naser
1993
Acadêmica
A contabilidade criativa é o resultado da intenção de se transformar
os fatos contábeis de aquilo que verdadeiramente são, para
aquilo que se deseja que eles sejam, aproveitando-se as
lacunas das normas existentes, ou mesmo ignorando-as.
Jose María
Gay Saludas
1997 e 1999
Jurídica
Identifica a contabilidade criativa sob uma perspectiva de engenhosidade, como uma arte, onde os grandes artistas da contabilidade – os contadores e os auditores – se aproveitam das brechas
oferecidas pelas rigorosas normas para imaginar uma engenharia
fiscal-financeira que lhes permita espelhar a imagem fiscal ou
societária desejada para a companhia. A contabilidade criativa pode
ser catalogada como uma magnífica falsidade de obras de arte
contábil, demandadas de estruturas de verdadeira
engenharia contábil.
Pensar
Contábil
Fonte: Elaboração própria do autor.
Além dos autores citados, outros, ainda, têm dado suas próprias interpretações para definir este fenômeno, conceituando a
contabilidade criativa sob os mais variados enfoques de abordagem, seja no âmbito legal, ético, contábil, ou financeiro6 . Todavia, na leitura de tais referenciações se observa que todos
são unânimes em associá-la a dois fatores: 1o) a manipulação
contábil; e 2o) a intenção de enganar.
Podemos deduzir, então, que a contabilidade criativa, na verdade, se trata de uma maquiagem da realidade patrimonial de
uma entidade, decorrente da manipulação dos dados contábeis, para se apresentar a imagem desejada pelos gestores da
informação contábil. Portanto, identificar quais seriam os incen-
tivos que as companhias teriam para praticá-la seria o ponto
central para a explicação dessa problemática.
Por isso formular uma definição exata deste fenômeno pode
ser muito difícil, dada a complexidade do tema e seu caráter
nebuloso. Entretanto, o termo contabilidade criativa pode ser
entendido como a seleção de alternativas possíveis, segundo
os princípios e as normas de contabilidade vigentes, utilizadas
para se conseguir a apresentação mais favorável da informação
contábil-financeira da empresa em um momento determinado.
De qualquer modo, para praticar a contabilidade criativa, o
profissional da área contábil se vale, principalmente, da flexibilidade presente nos princípios contábeis e na norma contábil-
4 A manipulação na contabilidade não é uma coisa recente, apenas se torna mais conhecida agora devido aos freqüentes escândalos que ocorrem mundialmente (Bauch & Lomb,
em 1995, Long Term Capital Portfolio, em 1998, Rite Aid e Cendant, em 1999, Sunbeam, Waste Management, Enron e Superior Bank, em 2001, Dollar General, em 2002, todos
nos Estados Unidos; Banesto, em 2000, Gescartera, em 2001, e BBVA, em 2002, na Espanha; Comroad, em 2000, na Alemanha; e no caso do Brasil, os bancos Nacional,
Econômico, Boavista e Noroeste; para não citar diversos outros exemplos mundo afora).
5 Rodríguez, 1996.
6 Ver Giner, 1992; Monterrey, 1997; Blasco, 1998; Laínez e Callao, 1999; Amat e Blake,2000; Cordobes e Sanchez,2000.
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societária, aos quais está subordinado. Assim, apesar de certas
restrições quanto à elaboração, contabilização e evidenciação
da informação econômico-financeira, em muitos casos é possível contemplar certo grau de arbitrariedade na escolha de procedimentos que melhor se adaptem aos requerimentos estratégicos da entidade, muitas vezes em detrimento da apresentação
da imagem fiel da companhia, prejudicando, até mesmo, os interesses de alguns dos usuários da informação divulgada.
3 – A NATUREZA E OS OBJETIVOS
DA CONTABILIDADE CRIATIVA
A literatura contábil-financeira está repleta de estudos empíricos sobre a manipulação da informação contábil, cada qual dirigido a diferentes objetivos dentro do processo de análise da
gestão, principalmente à hipótese de eficiência do mercado7 .
Embora o primeiro trabalho que analisou seriamente as motivações econômicas que os administradores teriam para manipular
a informação contábil tenha sido produzido nos anos 60,8 as
principais evidências empíricas, neste campo, foram obtidas na
década seguinte com um trabalho de caráter autenticamente
inovador em que seus autores estabeleceram o paradigma da
utilidade, baseando-se na hipótese da eficiência9 .
Os autores desse trabalho, particularmente, analisaram o aspecto da evidenciação contábil, se centrando na realidade econômica e nas motivações determinantes da regulamentação
contábil; para isso, enfocaram a conduta dos usuários e suas
reações diante da informação do sistema contábil10 . Suas hipóteses foram baseadas, fundamentalmente, nas teorias da rede
contratual11 , da regulamentação econômica12 e da agência13 .
Em uma pesquisa posterior, esses mesmos autores sustentaram, também, a hipótese de que a divulgação de benefícios extraordinários, mais especificamente de lucros, põe a empresa
em evidência ante os usuários externos, exibindo uma imagem
positiva da companhia14 . Assim, segundo eles, tais empresas
estariam mais suscetíveis a manipulações contábeis visando a
redução dos benefícios divulgados, para não prejudicar politicamente sua imagem externa, principalmente em situações de elevações de preços de seus produtos.
Em etapas subsequentes, outros estudos foram realizados,
seguindo esse mesmo raciocínio, sobre a arbitrariedade de que
dispõem as empresas para manipular os ajustes em suas con-
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Contábil
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tas de giro, sobre as restrições às importações15 e sobre as
práticas antitruste16 .
Todavia, nenhuma pesquisa havia estudado, até então, os
efeitos do earnings management relacionado à ótica de crescimento dos preços dos produtos consumidos, o que foi realizado
em um estudo para identificar até que ponto as empresas petrolíferas estariam vulneráveis às manipulações contábeis, devido
aos lucros extraordinários que obtiveram durante a crise do Golfo Pérsico, em 199017 .
Essa pesquisa buscava testar a hipótese exposta no estudo
de Watts e Zimmerman18 e para isso estabeleciam que as companhias petrolíferas de refinamento, ao contrário daquelas de
extração, estariam mais suscetíveis a realizar ajustes em sua
contabilidade, na determinação dos seus resultados. Tal manipulação ocorreria em função do maior grau de exposição política e social que teriam estas últimas empresas, por gerarem
riqueza diretamente de sua relação com o consumidor final de
sua cadeia produtiva.
Uma segunda hipótese formulada, ainda, por esses autores
foi de que estas mesmas empresas também pesavam os benefícios para liberar ou não oportunamente ao público a informação dos lucros obtidos com o aumento dos preços de seus
produtos19 . Para contrastar suas hipóteses utilizaram dois estudos, os quais estabeleciam que as empresas com grandes
crescimentos de lucro, em períodos politicamente sensíveis,
teriam como incentivo antecipar a divulgação de seus informes financeiros positivos, pois assim atrairiam a atenção pública adicionalmente, ou vice-versa, quando fossem resultados negativos20 .
A constatação de que a informação contábil divulgada pode
debilitar ou fortalecer o valor da empresa tem sido objeto de
muitos estudos empíricos nos últimos anos21 , sendo unanimidade o fato de que as entidades medem os custos políticos na
escolha de estratégias contábeis que reflitam suas cifras de negócio22 .
Em geral, a contabilidade criativa está associada à estratégia
para transmitir a visão mais otimista possível da companhia para
os distintos agentes econômicos. Contudo, pode, também, favorecer outros tipos de práticas, como melhorar ou piorar os resultados econômicos por diversas razões, além da adequação da
estratégia empresarial23 , divulgação de performance da com-
7 Ver Copeland, 1968; Cushing, 1969; White, 1970; Ball, 1972; Ball e Watts, 1972; Barefield e Comiskey, 1972; Sunders, 1975; Smith, 1976, dentre outros.
8 Gordon, 1964.
9 Watts e Zimmerman, 1978 (desde então, diversas pesquisas foram realizadas tomando tal estudo como base, abordando principalmente a temática do disclosure relativo às
companhias que negociam ações no mercado de capitais).
10 Watts e Zimmerman, 1978.
11 A teoria da rede contratual pode ser definida como um conjunto de interrelações (contratos) entre grupos, com finalidades discordantes, o que origina conflitos de interesses.
12 A teoria da regulamentação econômica entende que os organismos governamentais, mediante a adoção de medidas que regulam a atividade econômica (estabelecimento de
tarifas de serviços públicos, impostos e subvenções), tem o poder de levar a cabo as redistribuições da riqueza entre os agentes econômicos, o que supõe para as empresas
uns custos de regulação, também denominados custos políticos (surgidos para evitar ou conseguir transferência de riqueza da empresa para o exterior), gerando-se outra série
de conflitos entre a entidade e o ambiente onde desenvolve suas atividades.
13 A teoria de agência enfoca sua atenção nas relações e conflitos havidos pelas disparidades de interesses entre a propriedade da empresa e a gerência, decorrentes da delegação
que o principal (acionista ou proprietário) faz para o agente (gerente) para realizar algo em seu interesse, mediante uma contraprestação que pode ser financeira ou não.
14 Watts e Zimmerman, 1986.
15 Jones, 1991.
16 Cahan, 1992.
17 Han e Wang, 1998.
18 Watts e Zimmerman, 1986.
19 Han e Wang, 1998.
20 Chambers e Denman, 1984; Kross e Schroeder, 1994.
21 Ver Hagerman e Zmgewski, 1979; Dhaliwal, 1980; Ronen e Sadan, 1980 e 1981; Suarez, 1989.
22 Skinner, 1994.
23 Zmijewski e Hagerman, 1981.
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panhia24 , avaliação de desempenho dos administradores25 , obtenção de benefícios26 , subsídios ou isenções governamentais27 ,
conduta para comunicar boas e más notícias28 ou melhorias
sociais e medidas medio-ambientais29 .
Por este motivo, é muito difícil analisar e explicar os mecanismos de escolha contábil, dada a forma sutil como são realizados
e a heterogeneidade que existe de um segmento econômico
para o outro. Entretanto, a razão fundamental para a sustenção
da contabilidade criativa é a forte assimetria de informação que
existe entre os ambientes interno e externo da organização,
portanto, os gerenciadores da informação contábil dispõem de
um certo grau de arbitrariedade que lhes permite condutas que
podem chegar a não ser conhecidas pelos usuários externos,
se esses mesmos gerentes assim o quiserem, e cuja percepção
é muito difícil desde fora da organização. O caso Enron Corporate é um exemplo recente desse tipo de problema30 , que, por
sinal, tem posto, também, em xeque-mate a própria credibilidade da profissão contábil31 .
4 – A CONTABILIDADE CRIATIVA FRENTE
AO CONCEITO DE IMAGEM FIEL
A finalidade principal da contabilidade, como ciência, consiste na análise, descrição e explicação dos fenômenos patrimoniais que afetam a riqueza de uma entidade e gerar, dessa maneira, uma informação que permita a formação de opinião exata e
fidedigna sobre determinada realidade empresarial.
Todavia, plasmar de uma maneira simples, em um documento contábil, todos os fatores e variáveis que influem em uma
atividade econômica, é algo quase impossível de captar de uma
forma unívoca e definitiva, dadas as incertezas que circundam
toda atividade econômica e financeira desenvolvida pelas empresas32 . No sentido de limitar o campo de arbitrariedade na
eleição e representação dos fatores econômicos, se recorre ao
estabelecimento de normas e procedimentos contábeis, homogeneizando e facilitando, assim, o processo de entendimento e
comparação para que cada agente econômico possa tomar suas
decisões de forma racional e equilibrada.
Ocorre, entretanto, que a teoria contábil tem se mostrado limitada e ineficaz para se defrontar com os problemas econômico e
financeiros derivados do crescimento da complexidade empresarial nas últimas décadas, como por exemplo, a preponderância dos mercados de capitais, a desvalorização da moeda, a
rápida obsolescência dos bens e produtos, a primazia dos ativos intangíveis sobre os tangíveis, etc. Dessa incapacidade,
deriva a contabilidade criativa, que encontra terreno fértil nessa
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falta de clareza e de consenso em torno dos aspectos mais conflitantes e nebulosos do campo contábil.
Não obstante, é errado considerar que a contabilidade criativa é um modismo recente, ela existe na atividade econômica
organizada, desde as mais remotas épocas33 . Fato é que, atualmente, essas práticas adquiriram maior importância, pois seu
fenômeno se vincula à transcendência que há na informação
contábil para a empresa e seu ambiente, já que cresce a preocupação com a entidade e a imagem que dela se tem na sociedade.
O mundo contemporâneo caracteriza-se por iniciativas voltadas a um conjunto de fatores que coloque em prática a cidadania responsável. As empresas, por importantes que são para o
desenvolvimento da comunidade, estão tendo que assumir um
posicionamento mais crítico na busca de princípios de gestão
fundamentados em iniciativas sustentáveis, onde estejam refletidas suas relações com o meio ambiente e a comunidade.
O conceito de imagem fiel é derivado da literatura contábil
anglo-saxônica, quando foi aplicado na norma para as sociedades comanditas britânicas, em 184434 . Ainda que este conceito,
desde 1947, venha representando um papel central na legislação mercantil inglesa, no que se refere à contabilidade, não
existe nenhuma definição sobre seu significado nas leis do Reino Unido.
Além disso, não existe uma doutrina internacional que defina
precisamente a interpretação da imagem fiel - true and fair view
-, que no seu sentido literal poderia ser traduzida como verdadeira e real, ou clara, correta e leal, ou verdadeira e apropriada,
ou também, sinteticamente, visão real e correta. Para alguns
autores, é impossível definir a expressão imagem fiel, por ser
um fato de caráter conceitual muito filosófico o qual não é suscetível de uma definição mediante um conjunto de regras detalhadas35 .
A característica fundamental e essencial desse conceito, entretanto, está centrada na discussão “conteúdo/forma”, ou seja:
o texto da lei (true), que representa a forma, deverá ter primazia
sobre o espírito econômico (fair), que representa o conteúdo, ou
vice-versa? Há duas correntes na investigação dessa temática:
uma legalista e, outra, econômica; a primeira entende que a
imagem fiel é um objetivo derivado, em definitivo, da conformidade com as disposições legais, de forma que seja um sistema
informativo legal36 ; para a segunda, a imagem fiel seria algo
equivalente à realidade econômica, onde o fundo tem predominância sobre a forma e a informação útil para os usuários deve
ser priorizada37 .
Pensar
Contábil
24 DeAngelo, 1988; DeAngelo, DeAngelo e Skinner, 1994.
25 Strong e Meyer, 1987; Elliot e Shaw, 1988; Pourciau, 1993; Francis, Hanna e Vincent, 1996.
26 Choi, Gramlich e Thomas, 2001.
27 Healy e Palepu, 1993.
28 Skinner, 1994; Han e Wang, 1998; Giner e Rees, 2001; Basu, 2001.
29 García e Monterrey, 1993.
30 BusinessWeek, 2001.
31 BusinessWeek, 2002.
32 Giner, 1992.
33 Por exemplo, acredita-se que a terminologia contábil “inventário” deriva do verbo inventar, pois os contadores, ao realizarem os levantamentos da situação física dos estoques,
criavam números fictícios para poder conciliar com os saldos dos livros contábeis.
34 Amat, Blake e Oliveras, 1997.
35 Túa, 1985; Niño, 1992.
36 Gondra, 1991.
37 Gonzalo, Castro e Gabás, 1985.
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Parece, então, que em relação ao que se entende por imagem fiel, tanto acadêmico, empresarial, profissional quanto juridicamente, há o consenso de que ela é resultante da aplicação
sistemática e regular dos princípios e normas contábeis, os quais
expressam a realidade econômica das transações realizadas.
Logo, os conceitos de imagem fiel e contabilidade criativa estão
fortemente vinculados e interdependentes, como as duas faces
de uma mesma moeda. Perfilar seus limites, alcances e conteúdo, aproximando-os da realidade empresarial, seria a forma de
se evitar suas manipulações conceituais38 .
5 – A CONTABILIDADE CRIATIVA FRENTE
AO POSICIONAMENTO ÉTICO
A aplicação de práticas de contabilidade criativa nem sempre
está evidentemente clara na informação financeira que as empresas oferecem aos seus usuários, uma vez que a maioria das
companhias domina tão bem esse tema, que consegue embutir
tais práticas no complexo conjunto de informações que compõe
os relatórios anuais divulgados.
Na prática, as demonstrações contábeis publicadas são ou
de reduzido conteúdo, quando não se quer informar um aspecto
determinado, ou de excessiva informação, quando se divulga o
fato por obrigatoriedade. No primeiro caso, a quase omissão
informativa, torna até mesmo impossível a análise e a identificação da utilização ou não de práticas de contabilidade criativa. Já
no segundo caso, busca-se confundir os usuários, com demasiada informação, de conteúdo sem relevância e desassociada
do tema que se teria que divulgar39 .
Contudo, o aspecto ético relativo ao profissional que elabora
as demonstrações contábeis deveria prevalecer, pois ele tem a
missão de administrar a evidenciação do patrimônio da entidade, de forma que essa represente a imagem fiel da organização.
A postura ética profissional está fundamentada na adoção da
norma técnica necessária, que permita oferecer informação útil,
oportuna e exata a todos os usuários da informação contábil e
no acatamento de parâmetros gerais de comportamento de independência, apesar da relação capital-trabalho existente.
Está óbvio, então, que o tema contabilidade criativa introduz
simultaneamente, outra importante discussão, que está relacionada com o aspecto da ética profissional. Com isso queremos
dizer que a contabilidade criativa serpenteia por um caminho de
meias verdades que moralmente pode ser discutível, levando
ao questionamento sobre se os fins justificariam os meios, já
que ela se move numa linha bem próxima do permissível e do
ilegal, ficando muito difícil delimitar onde começa uma e termina
a outra, ou vice-versa.
Se entendermos por ética profissional o conjunto de normas e parâmetros gerais que regulamentam o comportamento moral e profissional do contador ante seus companheiros
de trabalho e de profissão, os usuários da informação que ele
elabora, o seu empregador, e os seus órgãos de classe, podemos inferir que estas regras de comportamento outorgam
certo tipo de independência profissional caracterizada pela
Pensar
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necessária submissão a tais regras gerais de conduta. O conflito se apresenta quando, nesse contexto, o profissional de
contabilidade tem que executar e operacionalizar uma atividade caracterizada ou tipificada como contabilidade criativa,
previamente concebida e desenhada como uma estratégia
organizacional pela alta administração da entidade; já que
ao funcionário compete somente sua realização, sem a devida consideração de seus efeitos adversos para os demais
usuários, sob pena de pôr em risco seu posto de trabalho,
caso não concorde em realizar tal prática. Por isso, não é tão
simples, assim, dirimir esta questão.
Neste estudo, não entraremos no mérito da discussão dessa
problemática porque, assim, estaríamos caminhando para a
análise de outro tema igualmente importante e complexo. Cabe,
apenas, ressaltar que ao efetuar práticas ditas criativas é possível amodificação da imagem fiel da companhia, com reflexos
em suas informações publicadas, que, como pode ser visto, possui um aspecto de difícil interpretação, a intencionalidade, a qual
pode apresentar problemas relativos ao campo da ética profissional e da moral.
A normatização no campo contábil e a harmonização das
normas internacionais podem vir a reduzir as alternativas de
eleição entre princípios contábeis ou regras específicas de valoração, como os critérios de amortização, depreciação, provisão,
etc., os quais podem ser determinantes para induzir às práticas
de contabilidade criativa. A partir da ambiguidade das normas e
princípios contábeis, gera-se um campo fértil para estimativas
subjetivas, calculadas e aplicadas sob as mais variadas diversidades de critérios alternativos, o que pode gerar comportamentos discordantes dos valores éticos e morais40 .
6 – O ÂMBITO DE APLICAÇÃO DA
CONTABILIDADE CRIATIVA
A contabilidade criativa tem sua aplicação nas subjetividades
das normas e princípios de contabilidade que proporcionam uma
ampla margem de escolha dos critérios e métodos contábeis a
empregar, assim como da forma de informá-los a terceiros. Isso
permite uma imensa gama de formatações e procedimentos que,
geralmente, são muito difíceis de se detectar, sem uma análise
mais criteriosa e profunda, a nível de auditoria.
Todas estas práticas podem ter mais ou menos importância
ou estar estendidas em um grau maior ou menor de complexidade, dependendo, antes de tudo, das probabilidades que têm os
auditores de detectá-las e das necessidades de cada companhia em realizá-la. Por isso que os auditores independentes
desempenham um papel fundamental no levantamento e divulgação destas práticas em seus pareceres de auditoria41 .
Embora a contabilidade criativa, normalmente, seja motivada
por objetivos de cunho especulativo de curto prazo, ela pode,
também, estar associada a efeitos de longo42 . No entanto, em
sentido geral, os gerentes se deixam conduzir por medidas de
curto prazo, já que lhes preocupam mais suas necessidades
momentâneas que suas rentabilidades futuras: estão obrigados
38 Rodríguez-Vilariño, 1998.
39 Algumas empresas oferecem pistas, divulgando tais fatos nas suas notas explicativas ou no relatório da administração, mas o fazem de maneira tão engenhosa, que a maioria
dos usuários não presta atenção a esses trechos escritos em um impecável, impenetrável e enfadonho jargão contábil-jurídico.
40 Para um estudo visando aprofundar esse tema, ver Leung e Cooper, 1995; Fischer e Rosenzweig, 1995; Amat, Blake e Dowds, 1999.
41 Monterrey, 1997.
42 Rojo, 1993.
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a buscar, no curto prazo, soluções contábeis que possam dar
respostas à necessidade de informações direcionadas para a
manutenção da atividade da empresa no futuro. Este conflito
leva ao confronto da contabilidade como um sistema de informação, com as necessidades dos gerentes em viver o hoje,
aproveitando-se das vantagens que se apresentam no momento, para poder passar ao amanhã43 .
O pensamento de curto prazo é o causador, em grande parte,
do surgimento da contabilidade criativa44 ; contudo há um limite
pois, apesar de sua característica de manipular as cifras contábeis45 , ela não pode fazer parecer boa eternamente, a situação
econômico-financeira de uma empresa que atravesse autênticas e continuadas dificuldades: apenas serve para atrasar e
suavizar as más notícias46 ; uma vez que seria impossível convertê-las em boas permanentemente, sem recorrer à verdadeira
fraude47 .
As práticas de contabilidade criativa podem ocorrer nos seguintes âmbitos48 :
i) Práticas baseadas no incumprimento dos princípios contábeis;
ii) Práticas estruturadas em contabilizações incorretas das operações contábeis;
iii) Práticas alicerçadas em classificações erradas das partidas
contábeis;
iv) Práticas fundamentadas em operações vinculadas49 .
A verdade é que todas essas práticas podem ter os mais diversos efeitos na situação patrimonial da entidade — aumento,
redução ou mesmo simples permuta50 . Todas elas podem acarretar implicações negativas na tomada de decisão dos usuários
da informação contábil. Um paliativo para minimizar esta problemática seria a conscientização dos usuários de que, nas informações que as empresas publicam anualmente, há a possibilidade de manipulações a fim de apresentar determinada imagem econômico-financeira da companhia que, não necessariamente, é a verdadeira51 .
7 – AS MEDIDAS CONTRA A
CONTABILIDADE CRIATIVA
Na leitura de distintos autores, se nota que há o consenso
quanto ao fato de a impossibilidade de se extinguir as práticas
de contabilidade criativa52 , entretanto, todos sugerem a criação
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de medidas com a finalidade de limitar seu campo de ação e
restringir sua proliferação, e apontam algumas alternativas possíveis como soluções:
a)
Maior envolvimento dos auditores independentes nesta
questão;
b)
Implantação efetiva de comitês de auditoria;
c)
Incorporação de conselheiros externos nos conselhos
de administração;
d)
Melhoria do nível de revelação da informação contábil;
e)
Estabelecimento de uma norma contábil mais precisa e
concreta;
f)
Limitação da liberdade dos gerentes na escolha das alternativas contábeis;
g)
Eliminação do resultado das transações que envolvam
estimativas subjetivas.
Outro ponto seria estabelecer mecanismos legais para controle da existência da contabilidade criativa, que permitiria haver uma penalidade jurídica por praticá-la, criando, assim, um
obstáculo importante para a manipulação da informação contábil.
8 – ALGUNS CASOS DE
CONTABILIDADE CRIATIVA53
Não há dúvida de que os gerentes seriam os principais beneficiados com manipulação contábil, pois, além de possuírem
motivos para tal, controlam os mecanismos que possibilitam
executá-la54 . Os instrumentos para a manipulação contábil são
as variáveis nas quais o gerente ou o contador podem influir
para lograr os efeitos desejados55 .
Considerando que a maioria desses efeitos econômicos tem
reflexo imediato ou futuro no resultado contábil, o principal relatório manipulado é a demonstração do resultado, através de
técnicas de manipulação dos ingressos ou dos gastos.
Tal conflito associado ao reconhecimento das receitas e despesas está formado por uma tríplice vertente: 1) as condições
que se devem cumprir para registrá-las contabilmente e os critérios para decidir quando incorporá-las (temporalidade); 2) o importe monetário pelo qual deverão ser registradas (valoração);
e 3) a forma de conceituação a qual correspondem em função
da atividade da empresa (classificação)56 .
Como exemplo concreto de uma técnica contábil com fim de
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Contábil
41 Monterrey, 1997.
42 Rojo, 1993.
43 Rojo, 1993.
44 Rojo, 1993.
45 Griffiths, 1995.
46 Griffiths, 1988.
47 Laínez e Callao, 1999.
48 Monterrey, 1997.
49 Esta prática tem sido o principal foco de problemas identificados nos casos recentes de contabilidade criativa, uma vez que boa parte das companhias norte-americanas vêm se
utilizando da criação de estrutura jurídicas enigmáticas, freqüentemente denominadas entidades para propósito específico (SPEs – Special Purposes Entitities), que nada mais
são que sociedades extra-oficiais que servem para ocultar ativos e passivos que representem risco para a empresa controladora, uma vez que essa não está obrigada
legalmente a consolidar o patrimônios destas sociedades quando investe mais de 3% do capital dessas sociedades para fins especiais.
50 Para mais detalhes, ver trabalho de Monterrey, 1997.
51 Amat, Moya e Blake, 1997.
52 Amat, Moya e Blake, 1997; Laínez e Callao, 1999; Monterrey, 1997; Naser, 1993; Blasco, 1998.
53 Como a linha de interesse deste trabalho é também pesquisar possíveis casos de práticas de contabilidade criativa, foi realizada uma consulta na imprensa internacional no sentido
de encontrar possíveis manipulações contábeis, de onde destacamos alguns exemplos que poderiam ser classificados nesta situação específica.
54 É praxe no mercado que a remuneração paga aos executivos contratados tenha sua maior parcela calculada de forma variável, associada ao desempenho econômico-financeiro
da empresa e alguns critérios e indicadores de performance previamente acordado entre as partes. Assim, quanto melhor os resultados da companhia, maior serão os benefícios
usufruídos por tais elementos em suas contas bancárias.
55 Apellándiz, 1991.
56 Cano, 2001.
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influir no resultado através das receitas, aumentando-as quando para inflar o resultado do exercício, ou, diminuindo-as quando se deseja reduzi-lo, citamos o caso da Coca-Cola57 que regula convenientemente a quantidade de produto concentrado
(xarope) que vende para as companhias associadas que produzem e engarrafam esse refrigerante. Esta empresa quando necessita incrementar seus resultados contábeis, envia maior quantidade desse produto, obrigando as fábricas a manterem essa
sobre compra em seus estoques até que se possa utilizá-la na
fabricação do refrigerante; e, de maneira inversa, reduz a venda
do concentrado, quando suas perspectivas de lucro já são boas
e, evitando, assim, incrementar mais seus resultados contábeis.
Um outro exemplo claro de manipulação dos resultados, desenhando o nível de ingresso desejado, é realizado pela Microsoft58 , a qual não contabiliza suas vendas no ato em que são
realizadas, tendo como justificativa o fato de que ainda restam
serviços por prestar — as atualizações dos produtos e a assistência técnica. Desde que desenvolveu o sistema Windows 95,
essa companhia tem utilizado uma metodologia contábil conservadora diante das licenças vendidas para a utilização do
software. Portanto, tendo o cliente direito às atualizações do
software, assim como ao apoio técnico durante dois anos, a
Microsoft atrasa o reconhecimento contábil das vendas de um
produto, até bastante tempo após a venda e entrega do produto.
Com isso, essa empresa consegue retardar o reconhecimento
dos seus resultados contábeis, podendo mostrar um gráfico de
crescimento de suas vendas mais ameno ao longo do tempo, já
que se assim não o fizesse, apresentaria grandes picos de ingressos nos anos em que aparecessem novos programas59 .
A problemática da contabilidade criativa também tem aparecido no caso das empresas ditas da nova economia, ou “empresas pontocom”. O valor de mercado destas companhias é estabelecido com base na expectativa de seus resultados futuros, já
que não se pode ponderar seus resultados passados e presentes por estarem associados a perdas bastante elevadas, já que
estão iniciando seus negócios. Como as expectativas de vendas futuras servem como base de medição para o cálculo de tal
valor, essas empresas procuram inflar seus ingressos, mesmo
sem apresentar efeito sobre seu resultado final.
Uma dessas companhias, a PriceLine.com60 , que se dedica
à venda de passagens aéreas e reservas de hotéis por Internet, costuma contabilizar suas vendas pelo valor total pago
pelo cliente - o valor da comissão cobrada por sua intermediação na transação, mais o importe relativo à compra da passagem aérea e da reserva do hotel — só posteriormente, essa
empresa registra os gastos relativos à passagem e à reserva.
Contabilmente, o correto seria efetuar apenas o registro do
valor da comissão recebida e utilizar contas de compensação
para refletir os outros dois fatos contábeis, tal como o fazem as
agências de viagem. Todavia, a PriceLine argumenta que, di-
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Contábil
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ferentemente das agências de viagem, ela assume o risco no
caso do não pagamento pelo cliente. Então, o mais adequado
seria efetuar uma provisão para perdas futuras ou algo de
mesma natureza contábil.
Os casos típicos de alteração temporal dos gastos estão
associados à decisão de a ativar ou não determinado desembolso em um exercício concreto, principalmente aqueles correspondentes a pesquisas e desenvolvimento (P&D). A American On Line (AOL) é exemplo real de capitalização das despesas com marketing e pesquisa e desenvolvimento61 . A partir de
1995, a AOL decidiu amortizar tais gastos ativados durante um
período de 41 meses, ao invés de 25 meses como costumava
praticar, justificando que havia ocorrido um incremento na vida
média das contas de Internet para 3 anos e 5 meses, segundo
projeções realizadas internamente. Com isso, a AOL conseguia manter ativado no diferido os gastos que deveriam ser
considerados como despesas do exercício. Entretanto, sabese que esta companhia não possuia clientes com aquele perfil
na data em que tomara tal decisão, pois a grande maioria dos
seus clientes havia sido conquistada nos últimos 36 meses,
não mais.
Outro truque empregado pelas empresas para evitar que uma
despesa seja considerada permanente é utilizar a técnica de
classificá-la em um grupo considerado extraordinário, para assim, poder apresentar um desempenho operacional mais estável no tempo, além de argumentar que o mal resultado final
apresentado foi causado por atividades extraordinárias, conjunturais, que provavelmete não se repetirão62 .
Neste caso específico, estão determinadas empresas que
realizam vendas por Internet (por exemplo, Amazon.com, eToys,
1800 Flowers), as quais classificam seus custos relativos ao
cumprimento dos pedidos (armazenamento, embalagem e distribuição) como despesas comerciais, ao invés de incluí-los no
custo dos produtos vendidos63 . Apesar de parecer um prática
inofensiva, tal reclassificação tem um efeito considerável no resultado contábil, pois apresenta indicadores de rentabilidade,
no caso a margem bruta, superiores ao que efetivamente são;
ocultando, com isso, uma possível ineficiência operacional dessas empresas ao aliviar suas margens de contribuição, que, por
si só, já são bastantes estreitas por motivos de uma forte competitividade no setor. Também permite misturar esses custos com
as efetivas despesas de marketing, que, sabidamente, são o
grande desembolso dessas companhias na conquista de clientes, como tais despesas tendem a ser mais elevadas durante os
primeiros anos, nos quais essas companhias buscam consolidar seu market share, reduzindo-se a partir de então, essa prática é importante na manutenção do valor de mercado dessas
empresas, uma vez que permite iludir a atenção dos investidores, ocultando uma série de custos permanentes e notadamente
importantes.
57 Fox, 1997.
58 Fox, 1997.
59 Por exemplo, em 1995, 1998 e 2000, quando lançou os Windows 95 e 98 e o Millenium, seguidos de notáveis decréscimos nos anos seguintes.
60 Kahn, 2000.
61 NewsWeek, 1995.
62 Cano, 2001.
63 Kahn, 2000.
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9 – CONCLUSÃO
A contabilidade é considerada uma fonte de informação para
os interessados na marcha da empresa. No entanto, face a suas
limitações para harmonizar os fatores internos e externos ante
os princípios e normas contábeis, podem induzir a informações
imprecisas ou manipuladas, o que na literatura se denomina
como contabilidade criativa.
Assim, tomando como base a literatura existente sobre o earnings management, este trabalho objetivou analisar e explorar
os aspectos relevantes relacionados à problemática da aplicação da contabilidade criativa, detectando tais práticas em empresas, a partir de exemplos documentados na imprensa internacional.
O estudo permitiu observar que, não obstante as normas,
os princípios e os procedimentos contábeis regulamentem,
nacional e internacionalmente, o registro, a elaboração e a
apresentação da informação econômico-financeira gerada,
as empresas sempre encontram argumentos para justificar
aqueles procedimentos contábeis que, segundo seus interesses, melhor reflitam suas circunstâncias econômicas e financeiras.
Muito embora não explicitado, é possível admitir que as prá-
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ticas ou estratégias de contabilidade criativa obedecem não a
uma casualidade, mas sim, a uma política empresarial bem pensada e desenhada para inferir ou modificar a visão que terão os
usuários da informação contábil e financeira64 . Tudo indica que
essas políticas não só são aprovadas pelas altas esferas hierárquicas da organização, como também são muito inteligentemente
desenhadas por elas, fazendo com que os profissionais da área
de contabilidade apareçam apenas como simples responsáveis
pela operacionalização de tais práticas.
Embora seja possível identificar um amplo campo para discussão acadêmica sobre as práticas de manipulação contábil,
formar conclusões sobre o assunto é complexo e demasiado
leviano, tanto pela subjetividade do tema, quanto pelos aspectos que a ele estão associados — ética profissional, conceito de
imagem fiel, paradigma da utilidade da informação contábil-financeira para os usuários, fraude etc. Os esforços no sentido de
se buscar um referencial conceitual que harmonize todas as
práticas e uniformize a justificativa racional da norma contábil
são quem irão permitir, por um lado, respaldar as decisões de
separação da norma concreta, quando não ofereça a imagem
fiel e, por outro lado, reduzir o número de opções contábeis
sobre um mesmo fato patrimonial.
64 Verrecchia, 1983.
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Prêmio
FREITAS BASTOS
Pensar
Contábil
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Pensar Contábil
Mai/Jul - 2003
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
2º colocado no Prêmio Geraldo de La Rocque
A Qualidade das Demonstrações
Contábeis Convertidas em
Ambiente Econômico Estável
e Desvalorização Cambial
1- INTRODUÇÃO.
Cada vez mais, as empresas brasileiras se relacionam com
entidades estrangeiras, seja através da compra e venda de mercadorias, captação de recursos, emissão de ações em bolsas
de valores de outros países, ou outras transações de interesse
dos sócios e acionistas.
Quando a empresa almeja captar recursos no mercado norte-americano, as exigências sobre as informações a serem divulgadas variam conforme o título a ser emitido. Segundo Martins (1995 pág. 216)
“Se uma empresa vai lançar títulos no mercado norte-americano, por exemplo, há situações em que, por se tratar de colocações fechadas, não públicas, não são pedidas demonstrações
convertidas, nem demonstrações elaboradas à base dos procedimentos daquele país; mas, no caso de lançamento primário
ou público normalmente se exige a re-elaboração das demonstrações conforme a contabilidade de lá”.
Muitas empresas brasileiras convertem suas demonstrações
contábeis para outras moedas não só com a finalidade de captar recursos no exterior, mas também de consolidar as informações contábeis de um grupo empresarial, comparar-se com concorrentes do mesmo ramo, entre outras.
Em se tratando do mercado norte-americano, a padronização do processo de conversão das demonstrações iniciou-se
em outubro de 1975, quando o Financial Accounting Standards
Board - FASB normatizou o processo através do FAS 8 (Financial Accounting Standards Borad Statement n.º 8). Este pronunciamento determinava que fosse usada uma única metodologia
para a conversão em países de economia estáveis ou não, e em
dezembro de 1981 foi substituído pelo pronunciamento n.º 52,
que contém duas metodologias para o processo de conversão.
Este pronunciamento encontra-se em vigor atualmente.
2- MÉTODOS ATUAIS DE CONVERSÃO.
O processo de conversão das demonstrações contábeis para
moeda estrangeira varia conforme a estabilidade econômica do
país em que a empresa está localizada e a moeda funcional
utilizada.
O parágrafo 39 do FAS 52 define moeda funcional como “a
moeda do principal sistema econômico em que a entidade opera; dependendo das circunstâncias, é a moeda do sistema em
que a entidade gera e despende fundos”.
Empresas localizadas em países de economia considerada
estáveis, ou seja, cujo somatório da inflação dos três últimos
anos for inferior a 100%, e que tenham a moeda local como
Áurea de Carvalho Martins
Contadora, mestranda em Ciências Contábeis pela UFRJ
moeda funcional, devem utilizar a metodologia de conversão
denominada “Translation”.
Mas, se o somatório dos índices de inflação for próximo ou
superior a 100% nesse mesmo período, a economia é considerada hiperinflacionária, a empresa não pode, para fins de conversão, basear-se em seus registos feitos em moeda local, devendo usar a metodologia do “Remeasurement”.
Sobre a utilização das metodologias, Gomes Neto (1999,
pág.77) esclarece ainda que o Remeasurement.
“...não se aplica apenas a economias altamente inflacionárias, como correntemente se descreve, mas também a entidades,
que apesar de localizadas em países de economias estáveis,
tem suas operações preponderantemente dependentes da matriz norte-americana”.
Pensar
Contábil
Os dois métodos de conversão estão resumidos abaixo:
TRANSLATION
a) Todas as contas patrimoniais, tanto os monetários quanto os
não monetários, são convertidos pela taxa de venda do dólar
em 31 de dezembro.
b) As contas de resultado são convertidas pela taxa de câmbio
do dia da operação, entretanto, existe a possibilidade da
empresa utilizar a taxa média mensal do período se for impraticável a utilização da taxa do dia da operação.
c) A conta Capital Social é convertida pela taxa de câmbio do dia
da integralização.
d) O ajuste da oscilação cambial é registrado no Patrimônio
Líquido, em uma conta separada, denominada Cumulative
Translation Adjustment – CTA.
REMEASUREMENT
a) Itens monetários são convertidos pela taxa de venda do dólar
em 31 de dezembro.
b) Itens não monetários, são convertidos pela taxa de do dia da
operação, ou seja, a taxa histórica.
c) As contas de resultado são convertidas pela taxa de câmbio
do dia da operação, entretanto, existe a possibilidade da
empresa utilizar a taxa média mensal do período, se for im-
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Pensar Contábil
Mai/Jul - 2003
praticável a utilização da taxa do dia da operação.
d) A conta Capital Social é convertida pela taxa de câmbio do dia
da integralização.
e) O ajuste da oscilação cambial é registrado no resultado do
exercício, na conta denominada Translation Gain or Loss –
TGL.
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
Nessa conjuntura econômica, o Brasil é um país de baixa
inflação desde primeiro de julho de 1997, e o real é considerado
moeda forte. Desde 1998, as empresas brasileiras que possuem o real como moeda funcional, estão fazendo a conversão
das demonstrações contábeis pelo método de economia estável, o “Translation”.
Independente do método utilizado, antes de iniciar a conversão, é necessário adequar os Princípios da contabilidade local
aos princípios contábeis geralmente aceitos nos Estados Unidos – US GAAP.
3- CONJUNTURA
ECONÔMICA BRASILEIRA.
Seguindo as orientações de conversão das demonstrações
contábeis para moeda estrangeira impostas pelo FAS 52, Bufoni, Gonçalves e Marques elucidam que na metodologia que está
sendo usada no Brasil,
“... todos os eventos econômicos sujeitos ao
reconhecimento contábil são quantificados em
Há pouco mais de cinco anos, o Brasil está conseguindo
conter a inflação em níveis bastante baixos, se comparados
com os anteriores que superavam os 40% ao mês. O Gráfico
abaixo mostra que, segundo o medidor de inflação oficial do
governo – IPCA, nos últimos cinco anos a inflação mantevese abaixo de 2%, exceto no último trimestre de 2002 quando
chegou a 3,02 %
GRÁFICO 1 - INFLAÇÃO BRASILEIRA MEDIDA PELO IPCA
Reais, não sendo reconhecido nenhum efeito da
oscilação do poder aquisitivo médio da moeda
funcional no Resultado da empresa.”
A padronização do FAS 52, foi formulada com o conceito de
oscilação da moeda reproduzido na dissertação de Gomes Neto
(1999, pág. 20), distinguindo-a de três maneiras :
“a) Flutuação – caracterizada quando as alterações da taxa cambial entre dois períodos contábeis, delimitados por demonstrações financeiras, se situam numa faixa muito estreita, consoante os parâmetros recomendados pelo Fundo Monetário
Internacional – FMI (variação de, no máximo 2,25% para mais
ou para menos, entre as taxas de câmbio oficial do país praticadas no período).
b) Desvalorização ou Depreciação – quando a taxa cambial do
país sofrer modificações radicais entre duas datas distintas,
Pensar
Contábil
expressando substancial perda de consistência em relação
às moedas estrangeiras, em razão de expressivo processo
inflacionário.
c) Valorização ou Apreciação – quando a taxa cambial expresFonte: o autor
Já, segundo um indicador muito utilizado pelo mercado, o
IGP-M, a inflação também se manteve relativamente baixa, superando três pontos percentuais apenas em quatro meses, nos
últimos cinco anos.
GRÁFICO 2 - INFLAÇÃO BRASILEIRA MEDIDA PELO IPCA
Fonte: o autor
16
sar elevação do valor da moeda local em relação à moeda
estrangeira.”
A premissa do pronunciamento é que, empresas situadas em
países com economias estáveis e moeda forte, possuem variações de câmbio pequenas e transitórias, logo, essas variações
não são reconhecidas como despesas ou receitas do exercício.
O valor referente a essa variação, encontra-se no Patrimônio
Líquido em uma conta denominada CTA (Cumulative Translation Adjustment). O CTA é compensado com a variação dos exercícios posteriores, pois acredita-se que essa variação é transitória.
A observação das taxas de câmbio brasileiras mostram que o
real vem se desvalorizando frente ao dólar. As perdas são efetivas, e a pequena recuperação do poder aquisitivo do real perante ao dólar, só pode ser observada após períodos de forte
especulação que desencadearam em uma maxidesvalorização
em nossa moeda - bem exemplificado no período pré-eleitoral
de 2002.
Pensar Contábil
Mai/Jul - 2003
Desde a estabilidade da economia brasileira, as variações
nas taxas médias mensais de câmbio foram:
GRÁFICO 3 - TAXAS MÉDIAS MENSAIS
DA VARIAÇÃO DO DÓLAR
Comparando a variação anual da inflação, a taxa final do
dólar nos últimos cinco anos e a variação acumulada do mesmo
período temos:
COMPARAÇÃO ENTRE A VARIAÇÃO
DA INFLAÇÃO E DO DÓLAR
1998
1999
2000
2001
2002
1998-2002
1,66%
8,94%
5,97%
7,67%
12,53%
42,20%
VARIAÇÃO ANUAL
DO DÓLAR
1998
1999
2000
2001
2002
1998-2002
5 – ANÁLISE DA INFORMAÇÃO
CONTÁBIL CONVERTIDA
NAS EMPRESAS BRASILEIRAS.
A qualidade da informação contábil será analisada considerando os registros de uma empresa hipotética brasileira que
possui o real como moeda funcional, no período de 1º de janeiro
de 1998 a 31 de dezembro de 2002.
Em 1º de janeiro de 1998 a empresa foi constituída com o
Capital Social de R$ 500.000,00 integralizado em dinheiro. Em
1º de março de cada ano, a empresa adquire mercadorias por
R$ 100.000,00 e as vende em 1º de outubro de cada ano por R$
200.000,00 - as operações são efetuadas a vista. Nenhum lucro
foi distribuído. Para fins didáticos serão desconsiderados os
impostos, despesas e centavos.
Fonte: o autor
VARIAÇÃO DA
INFLAÇÃO IPCA
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
8%
48%
9%
19%
52%
217%
Fonte: o autor
BALANÇO PATRIMONIAL EM REAIS
Ativo
Caixa
Total
Passivo
Capital
Social
Lucros
Acumulados
Total
1998
600.000
600.000
1999
700.000
700.000
2000
800.000
800.000
2001
900.000
900.000
2002
1.000.000
1.000.000
1998
1999
2000
2001
2002
500.000
500.000
500.000
500.000
500.000
100.000
600.000
200.000
700.000
300.000
800.000
400.000
900.000
500.000
1.000.000
DEMONSTRAÇÃO DO RESULTADO
DO EXERCÍCIO EM REAIS
DRE
Receita
CMV
Lucro Bruto
1998
1999
2000
2001
2002
200.000
200.000
200.000
200.000
200.000
(100.000) (100.000) (100.000) (100.000) (100.000)
100.000
100.000
100.000
100.000
100.000
Pensar
Contábil
No Brasil, taxas de câmbio e inflação não registram variações
proporcionais. Nos cinco últimos anos, a economia foi considerada estável e, a variação cambial só foi “pequena” no ano de
2000.
Analisando a Demonstração do Resultado do Exercício em
Reais, observa-se um aumento substancial no fluxo de caixa da
Companhia oriundo do resultado operacional, ou seja, todo o
lucro que a empresa gera transforma-se em caixa.
4 – O PAPEL DA CONTABILIDADE.
A conversão das demonstrações contábeis para moeda estrangeira conforme o FAS 52 será efetuada seguindo a metodologia Translation, onde o caixa será convertido pela taxa corrente (31 de dezembro de cada ano), o Capital Social pela taxa
histórica (em 01/01/98, US$ 1,00 = R$ 1,1164), as receitas e
despesas pela taxa do dia em que a operação foi realizada. Não
é feita a conversão da conta Lucros Acumulados por nenhuma
taxa específica, o valor a ela referente é obtido através do cálculo da DRE em dólares.
A ciência contábil é responsável por fornecer informações
fidedignas sobre o patrimônio das entidades sob os aspectos
econômicos e financeiro, aos seus usuários. Entende-se por
informações fidedignas, relatórios que possuam credibilidade,
respeitem os princípios contábeis e expressem a realidade da
Companhia.
Hendriksen e Van Breda (1999 pág. 105) esclarecem que,
segundo o Fundamento da Incerteza e Conservadorismo, instituído pelos órgãos normatizadores norte-americanos,
“... os contadores devem divulgar o menor dos
vários valores possíveis para ativos e receitas e o
maior dos vários valores possíveis de passivos e
despesas. Também significa que as despesas
devem ser reconhecidas mais cedo e não mais
tarde, e que as receitas devem ser reconhecidas
mais tarde, e não mais cedo”. (grifo nosso)
As taxas de câmbio de venda no período segundo o Banco
Central do Brasil foram:
1998
1999
2000
2001
2002
01 de março
01 de outubro
31 de dezembro
1,1304
2,0284
1,7678
2,0428
2,3596
1,1807
1,9565
1,8437
2,6866
3,7467
1,2087
1,7890
1,9554
2,3204
3,5333
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Pensar Contábil
Mai/Jul - 2003
Logo, temos os seguintes demonstrativos em US$. (Desprezando os centavos).
BALANÇO PATRIMONIAL EM DÓLAR
Ativo
Caixa
Total
Passivo
Capital
Social
CTA
Lucros
Acumulados
Total
1998
496.401
496.401
1999
391.280
391.280
2000
409.123
409.123
2001
387.864
387.864
2002
283.021
283.021
1998
1999
2000
2001
2002
447.868
447.868
447.868
447.868
447.868
(74.567) (368.148) (542.265) (896.564) (1.514.787)
123.100
496.401
311.560
391.280
503.520
409.123
836.560 1.349.940
387.864
283.021
DEMONSTRAÇÃO DO RESULTADO
DO EXERCÍCIO EM DÓLAR
DRE
Receita
CMV
Lucro Bruto
1998
1999
2000
2001
2002
236.140
391.300
368.740
537.320
749.340
(113.040) (202.840) (176.780) (204.280) (235.960)
123.100
188.460
191.960
333.040
513.380
Analisando a Demonstração do Resultado do Exercício em
Dólares, observa-se o lucro crescente, e o Balanço Patrimonial
no ano de 2002 informa que a empresa espera um aumento em
seu caixa de US$ 1.514.787 oriundo exclusivamente da valorização do real.
6 - CONCLUSÃO.
As demonstrações contábeis convertidas, não expressam
corretamente o resultado das atividades da empresa quando
são elaboradas em ambientes de baixa inflação e grande variação no poder aquisitivo da moeda.
Pensar
Contábil
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
No nosso exemplo, embora a empresa consiga, através da
atividade, gerar reais, em dólares, a liquidez está diminuindo,
pois o lucro em reais é menor que a desvalorização cambial do
período.
A demonstração contábil convertida, informa que no
futuro, somente com a variação positiva do dólar a empresa irá “ganhar” dólares, sem que realize nenhuma atividade. Essa informação não é verdadeira. Na conjuntura econômica do Brasil não há expectativa de valorização do real para se equiparar às perdas registradas desde 1998, ano que o Brasil, pela estabilidade econômica,
alterou a metodologia de conversão das demonstrações
contábeis em moeda estrangeira.
A metodologia atualmente utilizada no Brasil, não reconhece
uma variação da perda do poder aquisitivo da moeda em 217%,
e desrespeita um Fundamento contábil norte-americano, o da
Incerteza e do Conservadorismo.
A fidedignidade da informação contábil é relevante, pois, baseada nessas informações, entidades estrangeiras concedem
ou negam empréstimos para empresas brasileiras, logo a qualidade da informação está diretamente relacionada ao ingresso
de recursos financeiros no Brasil.
Gomes (2000 pág. 57) esclarece que no mercado norte americano “... todas as informações disponíveis ao público influenciam os preços dos títulos negociáveis de forma integral, instantânea e sem tendenciosidade”, é possível que os valores dos títulos das empresas brasileiras estejam distorcidos.
A comunidade científica contábil brasileira precisa promover
discussões sobre o assunto de modo a garantir a qualidade da
informação dos demonstrativos das empresas brasileiras tanto
em reais, reconhecendo a inflação, como em dólares, reconhecendo a perda do poder aquisitivo de nossa moeda perante a
outras moedas.
7 – BIBLIOGRAFIA.
BUFONI, André; GONÇALVES, Paulo e MARQUES, José Augusto. O Impacto da Inflação nas Demonstrações Financeiras
das Empresas Brasileiras. BALAS Annual Conference,
EUA. Financial Accounting Standards Board – FASB. Translation of foreing currency. FASB Statement n.º 52, 1982.
HENDRIKSEN, Eldon S. e VAN BREDA, Michael F. Teoria da Contabilidade. 5ed. São Paulo: Atlas, 1999.
GOMES, Amaro Luiz de Oliveira. As Informações Contábeis e o Ambiente Econômico. Brasília: UnB Contábil. n.º 1, vol.3, p.
51-77, 2000.
GOMES NETO, Francisco de Paula. Conversão das Demonstrações Financeiras Real X Dólar. Dissertação de Mestrado Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 1999.
MARTINS, Eliseu. Conversão das Demonstrações Contábeis em Moeda Estrangeira - Introdução e “FAS 8” , Boletins 24 a
27, Temática Contábil, IOB, 1995
. Conversão das Demonstrações Contábeis em Moeda Estrangeira - O FAS 52, Boletins 30 a 32, Temática
Contábil, IOB, 1995
. Análise Comparativa dos Métodos FAS 8 e FAS 52 de Conversão das Demonstrações Contábeis em Moeda
Estrangeira, Boletins 35 a 37, Temática Contábil, IOB, 1995
. O “Método Brasileiro” de Conversão das Demonstrações Contábeis em Moeda Estrangeira, Boletins 42 a
44, Temática Contábil, IOB, 1995.
SZUSTER, Natan, e GONÇALVES, Paulo. Conversão das Demonstrações Contábeis em Moeda Estrangeira - Considerações sobre o Tratamento Monetário em Decorrência do Real ser Considerado como Moeda Forte a Partir de 1998. Semana de
Contabilidade do Banco Central do Brasil, Rio de Janeiro, 1998.
Banco Central do Brasil <www.bcb.gov.br> acesso em 20 de fevereiro de 2003.
O Estadão <www.estadao.com.br/ext/economia/financas/historico> acesso em 20 de fevereiro de 2003.
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Pensar Contábil
Mai/Jul - 2003
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
3º colocado no Prêmio Geraldo de La Rocque
Fraudes com Derivativos:
O Caso Barings
Sebastião Bergamini Júnior
Bacharel em Ciências Contábeis pela
Faculdade Moraes Júnior (1975); pós -graduado em Finanças Corporativas pela Fundação Getúlio Vargas (1994); técnico do
BNDES, desde 1977; atualmente exercendo o cargo de Gerente de Crédito na Área
de Crédito.
INTRODUÇÃO
Os instrumentos financeiros derivativos,
como os contratos de futuros e de opções,
não são produtos novos, mas seu uso
cresceu enormemente nos últimos anos
como reflexo da crescente globalização e
da redução nos controles da movimentação das moedas estrangeiras. A maior
parte dos bancos dos grandes centros financeiros obteve êxito em utilizá-los para
administrar seus negócios e em oferecer
serviços de administração de risco aos
seus clientes.
No entanto, a história registra episódios de grandes perdas decorrentes do uso
desses instrumentos, salientando que esses prejuízos têm sido acarretados por
diversos fatores, como administração pouco previdente, risco de modelo, técnicas
de hedge inadequadas, movimentação
inesperada do mercado, risco excessivo
com relação ao capital e fraudes. Esse
artigo descreve um caso notório de perdas decorrentes de fraudes com derivativos, que eclodiu no início de 1995, acarretando a quebra do Banco Barings.
O trabalho aborda o assunto em duas
etapas: na primeira são relatadas as circunstâncias da falência do Barings e, na
segunda, são comentadas as influências
da cultura organizacional sobre o processo de gestão do risco operacional; as falhas dos controles internos no Barings, que
estão no cerne de sua quebra; e, finalizando, a constatação da existência de um
campo de atuação pouco explorado pelos contabilistas, representado pelo apoio
ao desenvolvimento e implantação de
controles internos nas empresas. No
Apêndice são apresentados os conceitos
essenciais sobre os mercados e as operações com derivativos, necessários ao
pleno entendimento do artigo.
1. FRAUDES NO BARINGS
O ambiente de operações com derivativos do Barings, em meados da década
de 90, era diferente do atual. O volume
global de negócios multiplicou por dezesseis entre 1986 e 1995. As perdas com o
uso de instrumentos derivativos foram de
US$ 16,4 bilhões em 1995, dos quais cerca de pouco menos de US$ 1 bilhão decorreram da quebra do Barings. Os valores envolvidos nessa falência não constituíram parcela tão relevante das perdas
totais do mercado, se considerada a ampla divulgação que o fato recebeu na época.
A falência do Barings decorreu de fraudes cometidas pelo seu principal operador local, Nicholas William Leeson, em
operações com derivativos transacionados na bolsa de Cingapura, a Singapore
International Monetary Exchange- SIMEX.
Era um pequeno e tradicional banco inglês, fundado em 1763 por Sir Francis
Baring. Seu capital acionário, na época
da falência, era de 470 milhões de libras,
o que permitia um nível de operações de
pouco mais de 5 bilhões de libras. A família Barings ainda participava do controle
do banco, sendo representada por Peter
Barings, presidente do Conselho de Administração.
As perdas em libras - não registradas
até a sua descoberta - foram ascendentes: no final de 1992 eram de cerca de
150 mil libras; em 1993 de 23 milhões; em
1994 de 170 milhões, culminando com
uma perda acumulada, em 23 de fevereiro de 1995, de cerca de 600 milhões de
libras - equivalentes a cerca de 960 milhões de dólares. Em contraste, os ganhos de Leeson sob a forma de bonificações passaram de 100 mil libras sobre os
resultados de 1993, e para 400 mil libras
sobre os de 1994, ressaltando que esse
último valor representava oito vezes os
seus salários fixos anuais, da ordem de
50 mil libras.
Pensar
Contábil
1.1. Cronologia dos fatos
Leeson deu a sua versão dos fatos, a
qual constitui a matéria-prima básica desse relato (Leeson, 1997): em 10 de julho
de 1989, com vinte e dois anos, começou
a trabalhar no Barings, de Londres, inicialmente no back office, unidade responsável pela liquidação, documentação-suporte e registro contábil de operações com
derivativos. Em fevereiro de 1992 foi designado para o cargo de gerente-geral da
Barings Future Singapore-BFS, subsidiária criada em Cingapura para atuar no
mercado local de derivativos, tendo então
a incumbência de contratar os operadores e o pessoal do back office. Foi nesse
curto espaço temporal de três anos - entre
fevereiro de 1992 e fevereiro de 1995 que ocorreram os fatos que levaram o
Barings à bancarrota.
As fraudes começaram em 17 de julho
de 1992, com a utilização de “conta erro”
em duplicata para, alegadamente, enco-
19
Pensar Contábil
brir uma falha de funcionária do back office, envolvendo a compra de 20 contratos
de futuros de títulos de emissão do Tesouro japonês - os Japan Governmental Bond
(JGB’s) - com perdas estimadas em 20 mil
libras. Leeson utilizou essa conta logo
após para encobrir falha de um operador
e, em seguida, para realizar transações
não autorizadas. Entre setembro e dezembro daquele ano foram realizadas trinta
transações não autorizadas. Em janeiro
de 1993 a conta erro continha 420 contratos de futuros, com valor de mercado de
cerca de 150 mil libras, envolvendo transações de cerca de oito milhões de libras,
todas originadas por transações não autorizadas.
Para encobri-las, Leeson passou a operar com opções, o que era uma necessidade, não uma alternativa. Além de manter suas operações não-autorizadas em
sigilo para a Divisão de Contabilidade Interna, Leeson precisava providenciar, também, a cobertura de margem diária. A
margem inicial para futuros e opções no
SIMEX podia ser feita em dólares ou ienes, porem as margens diárias eram liquidadas em ienes, e para obtê-los era
necessário lançar opções. A SIMEX operava com ienes, dólares e libras, numa
salada de moedas que trazia dificuldades
adicionais para as atividades de controle.
As cotações no período foram, em média,
de uma libra por 1,60 dólares e de 100
ienes por dólar.
Em março de 1993 a fraude se sofistica: Leeson passa a operar com opções
straddle. No mês de julho, ou seja, quatro
meses depois, em uma operação arriscada, Leeson estabelece uma posição comprada em futuros e uma posição vendida
a descoberto em opções de compra, revertendo sua posição de perda de seis
milhões de libras para uma de “lucro glorioso”. Porém, em pouco tempo voltou a
realizar transações não autorizadas e, em
setembro, detinha uma perda acumulada
de pouco mais de um milhão de libras.
No início de 1994 o Barings divulgou
lucros de 200 milhões de libras, relativas
ao ano anterior, pagando metade desse
valor em bonificações à Diretoria e funcionários, conforme era usual no banco.
Escondida nas demonstrações contábeis
havia perdas não registradas de 23 milhões de libras. Leeson recebeu uma bonificação de 100 mil libras, equivalente ao
dobro dos salários recebidos durante o
ano.
Mai/Jul - 2003
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
Em julho de 1994 uma auditoria interna que durou três semanas nada apurou,
embora o relatório final apontasse para o
fato de que as chefias no pregão e no back
office eram exercidas pela mesma pessoa, o que lhe permitia “efetuar transações
por conta do Grupo e depois garantir que
fossem ajustadas e registradas de acordo
com as suas próprias instruções”. Dos 50
milhões de libras em lucros auferidos oficialmente pelo Barings no primeiro semestre de 1994, cerca de 50% provinham
das atividades do BFS. Curiosamente, as
perdas cristalizadas no final de julho eram
de 50 milhões de libras, o equivalente à
totalidade dos lucros oficiais do Barings
naquele período.
Em dezembro de 1994 as perdas não
registradas de Leeson eram de 170 milhões de libras, dos quais 50 milhões repousavam na conta erro, sendo a diferença representada por margens em poder
do SIMEX. Oficialmente as atividades do
BFS naquele ano tinham gerado lucros
de 28 milhões de libras. Na distribuição
de bonificações estava sendo discutida a
participação de Leeson, em torno de 400
mil libras.
Em 02 de fevereiro de 1995, Leeson
falsificou duas cartas simulando uma operação de balcão financiada pelo Barings,
realizada em 02.12.94 e com vencimento
em 30.12.94, envolvendo uma transação
de opções entre a Spear, Leeds & Kellogg
(SLK) - uma corretora de Cingapura especializada em futuros e opções - e o Banque Nationale de Paris, no valor de 7,78
bilhões de ienes (equivalentes a 50 milhões de libras). Em seguida, manipulou
extratos bancários do Citibank para simular o pagamento pela SLK em 02.02.95.
Esses documentos forjados induziram a
empresa de auditoria independente Coopers & Lybrand (C&L) a isentá-lo, em 3 de
fevereiro, através do relatório preliminar
de auditoria sobre a consolidação das
operações do BFS.
Em 10 de fevereiro de 1995 as perdas
ascendiam a 200 milhões de libras, porém a falência do Barings ainda seria evitável. Nas duas semanas seguintes as
perdas triplicaram, chegando a mais de
600 milhões de libras, engolindo o capital
acionário do banco, de pouco menos de
500 milhões de libras. Em 24 de fevereiro
de 1995, dia do pagamento das bonificações relativas ao ano de 1994, Leeson
fugiu de Cingapura, sendo preso no dia 2
de março de 1995, em Frankfurt. Depois
de uma demora de oito meses por alegados problemas de jurisdição, foi recambiado para Cingapura. Em 1º de dezembro
daquele ano se declarou culpado de dois
crimes para enganar os auditores externos do Barings e um para fraudar a SIMEX, sendo condenado a seis anos e meio
de prisão. Na época tinha vinte e oito anos.
Pensar
Contábil
20
1.2. Análise das fraudes
Leeson executou suas fraudes na seguinte seqüência: aproveitou sua expertise para operar uma “conta erro”, a partir
de julho de 1992, na qual descarregava
provisoriamente os resultados de suas
operações não autorizadas; “criou” ativos
inexistentes nas datas dos fechamentos
mensais ou anuais, pois a conta erro –
que era uma conta transitória de resultados - deveria estar zerada ao encerrar o
período de apuração dos resultados; registrou um recebível, no final de 1994, para
poder fechar o balanço daquele ano, com
base em uma suposta operação de balcão; produziu documentação-suporte, no
início de fevereiro de 1995, falsificando
assinaturas de terceiros para simular a
referida operação de balcão, visando
manter o sigilo das fraudes cometidas.
A ocorrência de falhas humanas na realização de operações financeiras é relativamente comum, sendo a inversão de
ordem (de compra para venda, e vice-versa) a mais comum. A sua reversão exigia
a realização de duas transações no mercado, gerando dois lançamentos na “conta erro”. O resultado da reversão - representado por lucro ou prejuízo - era apropriado, posteriormente, aos resultados
correntes. No início das atividades do BFS,
Leeson operava com uma conta erro, de
número 99905, na qual eram descarregados os erros, antes que fossem transferidos para Londres. Porem, dado o número
elevado de erros diários - cerca de cinqüenta, o que acarretava o dobro de registro para cancelá-los - o pessoal da
matriz em Londres permitiu a criação de
uma conta erro local, de número 88888.
Algumas semanas depois, Londres determinou a desativação da conta 88888, passando a registrar todos os erros de forma
centralizada. Em julho de 1993, Leeson
passou a utilizar fraudulentamente a conta 88888 – que deveria permanecer inativa - com o duplo objetivo de executar transações sem autorização de Londres e de
manter suas perdas provisoriamente em
sigilo, pois nos fechamentos mensais e
Pensar Contábil
anuais essa conta deveria estar zerada.
As perdas eram mascaradas por Leeson, no fechamento dos balancetes e do
balanço anual, sob a forma de saldo de
recebíveis inexistentes, na figura contábil
de uma insubsistência ativa. Note-se que
essas perdas também podiam estar transitória e parcialmente ocultas na forma de
margens depositadas na SIMEX, porém
se cristalizavam nas datas dos vencimentos dos contratos de futuros ou de opções.
Por exemplo, o déficit em torno de 50 milhões existentes em julho de 1994 foi encoberto pelo expediente de registrar um
depósito no Citibank de 50 milhões de libras. Era uma maneira absurda de esconder o dinheiro desaparecido, pois se cruzassem os dados contábeis com os do
extrato do Citibank confirmariam a inexistência dos 50 milhões de libras.
Leeson não tinha autorização para
operar no mercado de balcão, mas simulou a execução de uma operação de financiamento entre a SLK e o Banque
Nationale de Paris, o que envolveria, se
tivesse sido realizada, a avaliação de risco de crédito do financiado SLK. O Comitê de Administração do Barings em Londres tomou conhecimento de que cerca
de 80 milhões de dólares de dinheiro do
banco teriam passado dois meses longe
do banco sem que ninguém tivesse percebido. Seus superiores não somente
aceitaram sem protestos a pretensa realização, por Leeson, de uma operação não
autorizada em uma modalidade não autorizada, como também não investigaram
o fato de uma transação concluída em
30.12.1994 não tivesse sido tempestivamente liquidada. Essa situação demonstra o reduzidíssimo nível de controle.
As atividades ilícitas de Leeson começaram com a realização operações não
autorizadas, ou seja, com fraudes de natureza operacional que, para serem encobertas, acarretaram a execução de fraudes contábeis. Essas consistiam na omissão ou falsificação dos registros dessas
transações e de seus resultados. Manter
suas atividades em sigilo por dois anos e
meio revela muito do caráter calculista de
Leeson e denota a existência de circunstâncias facilitadoras. Leeson conseguiu
esse feito por conhecer as operações com
derivativos e seu registro contábil; por atuar sem supervisão efetiva; por ter conseguido enganar as auditorias interna e externa; por iludir a SIMEX e , finalmente,
pelo Barings ter obtido a complacência do
Mai/Jul - 2003
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
Banco da Inglaterra com relação ao seu
desenquadramento às regras bancárias
vigentes.
Por ser capaz de atuar nos dois lados
do balancete, Leeson reincidia na execução de transações não autorizadas. Seu
conhecimento sobre a contabilização das
operações com derivativos, o desconhecimento ou desinteresse de seus supervisores sobre o registro dessas transações,
sua condição de operador de pregão, o
fato de ter clientes com transações volumosas, sua contribuição aparentemente
positiva para os resultados do Barings em
períodos anteriores formavam um conjunto de motivos que faziam com que seus
pedidos de transferência de recursos de
Londres para Cingapura – destinados em
grande parte para margear suas transações não autorizadas - fossem atendidos
sem questionamento sobre as suas destinações específicas.
Leeson se reportava diretamente a
quatro pessoas: seu supervisor direto, lotado em Cingapura, era o gerente regional de operações do Barings no sul da
Ásia, que não se interessava pela parte
de futuros e opções, não exercendo nenhuma supervisão sobre suas atividades;
outro chefe nominal era o gerente global
de futuros e opções baseado em Tóquio;
e, por último, Leeson estava subordinado
a dois executivos do Grupo de Produtos
Financeiros do Barings, lotados em Londres. O fato de ser reconhecido como um
operador competente e de suas linhas de
comando serem cruzadas e nebulosas
contribuíam para que a falta de supervisão mínima e para que seus pedidos de
transferência de recursos fossem feitos
sem perguntas.
A auditoria interna estava mais preocupada em quanto tempo o BFS poderia produzir lucros tão espetaculares, em vez de
se interessar pela natureza dos lucros. Os
auditores internos pareciam entender a
mecânica das transações, mas não as especificidades de seu registro contábil. A
manipulação das demonstrações contábeis por Leeson e seu conhecimento dos
procedimentos de registro permitiam despachá-los com respostas vagas e sem
sentido. O relatório de auditoria interna
continha uma relação dos limites fixados
pelo Comitê de Riscos do Barings sobre
as posições máximas que o BFS podia
assumir cada dia, não sendo autorizada
nenhuma posição de um dia para o outro.
No começo de setembro de 1994 Leeson
tinha 5.000 futuros de Nikkey 225 (contratos autorizados: 200); 2.000 futuros de
JGB’s (autorizados: 10); 1.000 futuros de
Euroyen (autorizados: 500); e 20.000 opções (não autorizados). Era evidente que
Leeson atuava sem qualquer supervisão,
pois os limites operacionais não eram efetivamente acompanhados pela sua chefia imediata, pelos seus superiores hierárquicos, pelos membros do Comitê de
Riscos ou pelos auditores.
A C&L, auditores externos do Barings,
foram iludidos por documentos forjados e
a quebra do Barings respingou em sua
reputação de forma indevida, pois a documentação-suporte relativa à operação
de balcão estava em ordem. A C&L teve
sua desforra no julgamento, no qual Leeson se declarou culpado de dois crimes
para enganá-los, de forma passível a causar danos à sua reputação.
A SIMEX remeteu um memo, datado de
11.01.95, pedindo justificativa para o fato
do Barings ter violado a norma que proíbe
os membros de financiarem as margens
operacionais de seus clientes, pois até
então os registros da SIMEX computavam
parte das posições relativas às transações
não autorizadas como se fossem transações de clientes. Antes de ser respondido
pelo Barings, a SIMEX mandou outro
memo, datado de 16.01.95, questionando a separação inadequada de recursos
dos clientes e a computação imprópria de
recursos dos clientes para atender as exigências financeiras de margens. A SIMEX
estava tomando ciência das irregularidades praticadas por Leeson, mas provavelmente ignorava a sua extensão. O fato de
Leeson ser responsável, na época, por
cerca de 40% do movimento do mercado
de Cingapura, recomendava um tratamento cauteloso da SIMEX.
O Barings comunicou ao Banco da Inglaterra, no mês de setembro de 1994, que
tinha remetido, em descumprimento da
legislação bancária britânica então vigente, mais de 25% de seu capital acionário
para Cingapura, destinados à cobertura
de margens. Essa carta ficou na “bandeja
de entrada” de Christopher Thompson,
executivo do Banco da Inglaterra encarregado da supervisão dos bancos de investimentos. O Barings tinha auferido resultados medíocres e preocupantes alguns anos antes e se, para melhorar seu
desempenho tivesse que operar em outros mercados, as autoridades reguladoras da Inglaterra teriam complacência,
Pensar
Contábil
21
Pensar Contábil
portanto deram a sua autorização tácita.
Mais tarde, Thompson foi demitido em razão de sua leniência com o Barings. Esse
fato deve ter contribuído para a posterior
oposição das autoridades britânicas em
recambiar Leeson da Alemanha para a
Inglaterra em 1995, para responder por
crimes financeiros contra o Barings, pois
seu depoimento iria, provavelmente, comprometer a imagem do Banco da Inglaterra.
2. CONTROLES INTERNOS
NA GESTÃO DAS EMPRESAS
O caso Barings tornou-se um divisor de
águas: antes se buscava estimar quanto
deveria ser aplicado em derivativos para
garantir flexibilidade a uma carteira de investimentos e reduzir o risco dos bancos
e de seus clientes; posteriormente, o centro das preocupações dos investidores
deslocou-se para o risco operacional inerente à cultura de risco das organizações,
levando os investidores a refletir sobre a
estrutura e a forma de operação dos mercados nos quais esses produtos financeiros são negociados e sobre os controles
internos necessários para bem geri-los.
As causas da quebra do Barings residiram, segundo Altman (2000), na sua
cultura de gestão de risco, ficando evidente
que o banco não tinha técnicas adequadas de monitoramento, administração e
controle de risco para a importância e
magnitude dos riscos envolvidos nas operações com derivativos, portanto, a sua
cultura de gestão de risco não se adequava às atividades nas quais o Barings estava envolvido.
Mai/Jul - 2003
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
relacional; enquanto que a valorização do
trabalho, o reconhecimento e o estímulo
das diferenças individuais, predominantes na sociedade americana, geraram
uma cultura mais influenciada pelos conceitos da meritocracia.
Essa diferença remonta à evolução das
empresas no contexto da formação social
dos países. A empresa privada teve um
papel decisivo no processo da formação
da sociedade americana, portanto ambas
cresceram juntas, sendo a primeira uma
expressão concreta de noções como livre
iniciativa, liberdade econômica e direito
individual. No Brasil esse processo ocorreu de forma diferente, muito provavelmente devido ao desenvolvimento tardio
do capitalismo. A empresa privada nacional passou a influenciar o processo de
formação histórica e econômica do país
apenas em meados do século XX, e mesmo assim, com vínculos de forte dependência do Estado.
Os diferentes tipos de cultura das organizações irão acarretar tratamentos diversos com relação aos métodos de gestão
das operações: uma cultura relacional,
como a brasileira, irá se basear nas pessoas, tendo grande dependência de prepostos de confiança da família proprietária da empresa para ocupar as funções
de controle, valorizando os sistema de
controles poucos rigorosos e formais; ao
passo que uma cultura meritocrata dará
preferência a sistemas estruturados, privilegiando o uso de controles formais detalhados e a sua aplicação de forma impessoal.
Um tipo de cultura não parece ser intrinsecamente melhor do que outra, com
as inferências apontando para a existência de culturas com variados graus de
adequação com relação às atividades
desenvolvidas pela empresa, o que fortalece a crença de que uma cultura organizacional do tipo relacional estará pouco
instrumentalizada para gerir atividades de
risco operacional elevado.
vante para os diferentes mercados de derivativos, devido às características comuns
desses mercados: operam com informações atualizadas; dependem dos recursos da telemática; embutem um alto nível
de risco; possibilitam um elevado nível de
alavancagem de resultados; exigem uma
grande agilidade no processo negocial; e
requerem a disponibilidade de pessoal
altamente especializado.
A decisão de utilizar instrumentos derivativos representa, para as instituições financeiras, assumir riscos - principalmente os de crédito, os operacionais e os de
mercado. O uso do hedge estrutural transformou o risco do overnight no único risco
de crédito relevante nos mercados de transações com derivativos padronizados,
contudo o risco de crédito ainda constitui
o principal vetor de risco para o conjunto
de atividades desenvolvidas pelas instituições financeiras.
Estudo elaborado no final da década
de 90 pela Oliver, Wyman & Co., consultora especializada em análise de risco de
instituições financeiras, revelou a importância relativa de cada tipo de risco para a
formação de resultados dos bancos - 65%
para o risco de crédito, 25% para o operacional e 10% para o de mercado – confirmando a pouca divulgada relevância do
risco operacional.
A falência do Barings demonstrou como
é essencial o desenvolvimento de uma
cultura organizacional adequada para
gerir os riscos envolvidos na utilização dos
instrumentos financeiros derivativos, principalmente o risco operacional. Essa cultura está consubstanciada, em parte, pelos seus controles internos. Para avaliar
os pontos fracos desses controles e sua
influência na quebra do Barings, é necessário relembrar alguns conceitos (baseados em Atie, 1995).
Pensar
Contábil
2.1. Cultura organizacional
A descrição de Leeson revela que a
cultura organizacional do Barings privilegiava as relações interpessoais, com controles exercidos num clima de alta informalidade e de excessiva confiança. Essa
particularidade guarda grande similaridade com a cultura organizacional da maioria expressiva das empresas brasileiras,
que é de propriedade familiar.
As culturas das organizações refletem,
segundo Barbosa (1999), os valores de
uma sociedade: a baixa valorização do
trabalho no Brasil fez com que tempo de
casa e relações pessoais e políticas contassem mais do que o bom desempenho
medido de forma fria e objetiva, resultando numa cultura organizacional fortemente
22
2.2. Risco operacional
O risco operacional surge da probabilidade de ocorrerem perdas acarretadas por
erros, fraudes e falhas em equipamentos,
portanto se referem à organização, qualificação e treinamento dos funcionários,
bem como aos recursos materiais utilizados pela empresa, principalmente, os relacionados à informática.
Esse tipo de risco torna-se muito rele-
2.3. Barings e os controles internos
A definição do Comitê de Procedimentos de Auditoria do Instituto Americano de
Contadores Públicos Certificados é que
“o controle interno compreende o plano
de organização e todos os métodos e
medidas adotadas na empresa para salvaguardar seus ativos, verificar a exatidão
e fidelidade dos dados contábeis, desenvolver a eficiência nas operações e estimular o seguimento das políticas administrativas prescritas”.
Seus objetivos são os de obter um controle eficiente sobre todos os aspectos vi-
Pensar Contábil
tais do negócio, e consistem em (a) estimular a eficiência dos funcionários, mediante o acompanhamento através dos relatórios; (b) identificar erros e desperdícios, promovendo ao mesmo tempo a uniformidade e correção ao registrarem-se
as operações; (c) salvaguardar os ativos;
(d) prevenir fraudes e, em caso de sua
ocorrência, ter meios de descobri-las rapidamente e determinar a sua extensão;
e (e) comprovar a veracidade dos informes e relatórios contábeis, financeiros e
operacionais;
Os princípios de controle interno correspondem ao conjunto harmônico de regras detalhadas que devem ser formalizadas nas políticas, sistemas e organização. São representados pelas seguintes
medidas: clara atribuição de responsabilidades, formalização dos procedimentos,
efetiva capacitação dos funcionários, divisão de tarefas com a segregação de funções, periódica rotação de funções, exigência de garantias formais para a ocupação de cargos sensíveis (tesoureiro, por
exemplo), preferência pelos controles mecanizados, e realização de revisão independente por pessoal capacitado.
O caso Barings mostra que a maioria
dos princípios de controles internos foi violada:
- as linhas de comando eram nebulosas e Leeson atuava sem supervisão (clara atribuição de responsabilidades);
- os limites operacionais diários para
as transações proprietárias eram diariamente desrespeitados (formalização dos
procedimentos);
- a modalidade de transação no mercado de balcão não estava autorizada à
Leeson, que apesar disso simulou operar
nesse mercado (formalização dos procedimentos);
- o chefe do back office, responsável
pelos registros das operações e pelo margeamento das operações, acumulava a
função de operador de pregão, responsável por realizá-las (divisão de tarefas com
segregação de funções); e
- a auditoria interna era realizada por
funcionários sem o adequado conhecimento para comprovar a aderência das
transações às exigências das normas internas (realização de revisão independente por pessoal capacitado).
Os controles internos se desdobram em
dois tipos: os administrativos e os contábeis. Os primeiros são mais abrangentes
e compreendem o plano de organização,
Mai/Jul - 2003
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
os métodos e procedimentos relacionados com a eficiência das operações, voltadas diretamente para a implementação
da política de negócios da empresa e, indiretamente, com os seus registros financeiros. Os controles contábeis – que constituem parte dos controles administrativos,
complementando-os - abrangem o plano
de organização e todos os métodos e procedimentos relacionados com a salvaguarda do patrimônio e a adequação dos
registros contábeis, sendo compostos por
três sistemas: de segregação de funções,
de autorizações e de registros.
O caso Barings revela que os sistemas
de controles contábeis também estavam
claramente comprometidos:
- sistema de segregação de funções:
não havia independência no exercício
das diversas funções. A execução operacional (operação no pregão), a custódia
de bens patrimoniais (manutenção das
margens das operações), e a contabilização das operações (registros feitos pelo
back office) eram realizados e controlados pela mesma pessoa;
- sistema de autorização: o controle das
operações através de métodos de aprovações, de acordo com as responsabilidades e os riscos envolvidos, não era realizado. No Barings, esse sistema era
constituído pelos limites diários para a
execução de operações com derivativos
que, embora existisse formalmente, não
era acompanhado de forma efetiva;
- sistema de registros: as normas que
regiam a utilização de uma estrutura formal de contas, a preparação das demonstrações contábeis e o uso correto das disposições constantes de um manual descritivo do uso das contas, não eram seguidas. Esse fato é corroborado pelo uso não
autorizado de uma conta erro em duplicata.
A comprovação de que, no Barings, os
princípios de controles internos não eram
respeitados e que os sistemas de controles contábeis estavam comprometidos
contribuiu para evidenciar uma falha comum encontrada, de forma recorrente, na
administração de empresas brasileiras de
propriedade familiar: a existência de controles internos que não são efetivamente
utilizados nas atividades rotineiras das
empresas, o que pode ser diagnosticada
na fase de verificação da aderência das
práticas organizacionais com relação às
previstas (compliance).
Esse tipo de falha decorre, geralmen-
te, da falta de assertividade da alta administração - responsável pela implementação dos padrões da cultura organizacional - em exigir o efetivo cumprimento das
normas. Altman (2000) compartilha dessa idéia, quando afirma que “uma organização pode estabelecer políticas e procedimentos complexos como freios e contrapesos para controlar os seus riscos,
mas se faltar um núcleo cultural forte, esses serão de pouca utilidade”.
2.4. Um campo de atuação pouco explorado
O caso Barings indicou a relevância que
o risco operacional tem para as empresas
que atuam em qualquer ramo de atividade, porem assume especial importância
para as instituições financeiras, pelo fato
de sua mercadoria – o dinheiro - ter liquidez imediata, exigindo controles mais restritivos. No entanto, os conceitos de controles internos voltados para a administração do risco operacional podem e devem ser aplicados às pequenas e médias
empresas (PME’s), cujo processo de sobrevivência e crescimento dependem, em
grande parte, de um nível mínimo de formalização e do desenvolvimento integrado desses controles.
As PME’s apresentam um histórico de
reduzida utilização de controles internos
formais e/ou de desenvolvimento desses
controles embasado na implementação
de sistemas naturais. Esses decorrem da
adoção de procedimentos isolados - e
muitas vezes, inconsistentes ou conflitantes com os demais controles internos –
visando à resolução de problemas específicos. Esse tipo de sistema se contrapõe
ao sistema planejado de controles internos, elaborados a partir de uma visão conjunta e estruturada dos controles internos
necessários ao bom desenvolvimento das
atividades da empresa (adaptado de Peleias, 2002).
A elevada taxa de mortalidade nos novos negócios abertos pelas PME’s no Brasil decorre, em parte, da ausência de uma
cultura adequada ao exercício de suas
atividades, acarretando o aumento do seu
risco operacional. Esse agravamento de
risco parece decorrer, em grande parte,
da cultura relacional predominante no
país, fundada em relações pessoais, implicando tanto na ausência ou baixa utilização de controles formais quanto na prevalência do uso de sistemas naturais de
controles internos.
Pensar
Contábil
23
Pensar Contábil
Os contabilistas vinham há muito, de
forma não sistemática, difundindo as técnicas de gestão empresarial entre as
PME’s, colaborando para a diminuição do
seu risco operacional. Essa contribuição
pode aumentar de forma significativa,
como permitem inferir os seguintes dados:
apenas 5% das redes brasileiras de franquias têm sistemas profissionais de administração e cerca de 60% das PME’s do
Brasil tem no contador sua principal fonte
de consulta; dados que sinalizam tanto a
existência de demanda reprimida para
esse tipo de consultoria, quanto a oportunidade dos contabilistas virem a ter uma
participação expressiva no desenvolvimento dessas atividades.
Os organismos de apoio às atividades
das PME’s também chegaram à conclusão semelhante, confirmando a importância dos controles internos na redução do
risco dos novos empreendimentos. Com
base nesse diagnóstico, passaram a ofertar treinamento para contabilistas que trabalham com micros e pequenas empresas nas áreas de planejamento e controle, inclusive em controles internos. Esse é
um campo de atuação pouco explorado
pelos contabilistas que se afigura com
grande potencial de desenvolvimento:
apoiar as PME’s brasileiras, dotando-as
de controles internos indispensáveis a um
crescimento sustentado.
Mai/Jul - 2003
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
pação nos lucros, assumiu um valor reconhecidamente elevado, mesmo para os
padrões do mercado financeiro.
Leeson teve seu perfil traçado por Altman (2000), segundo o qual ele seria um
traders option: “como estou jogando com
as suas fichas, se eu ganhar, nós ganhamos; mas se eu perder, só você perde.”
Leeson participava dos lucros do banco,
mas não precisava pagar pelas perdas. O
Barings falhou ao deixar de implantar
meios de controle adequados, porém o
fato é que, quando os negócios foram lucrativos, a direção em Londres ficou satisfeita em receber os lucros sem fazer perguntas.
Na época, esse episódio deslocou o
foco dos investidores dos possíveis benefícios trazidos pela flexibilidade de uma
carteira de ativos para o risco operacional
envolvido nas transações com derivativos.
Outra conseqüência foi que os contratos
de derivativos mais complexos perderam
popularidade em benefício dos produtos
padronizados mais simples ofertados pelos mercados futuro e de opções. No final
do ano de 1995, os mercados se acalmaram, depois de vários meses de pânico e
de redução no volume de negócios com
derivativos.
deriva do preço do mesmo ativo negociado no mercado à vista, podendo ser identificados os mercados de futuros, os mercados de opções, os mercados a termo e
os mercados de swaps.
Esses mercados negociam dois tipos
de contratos: o padrão, no qual o vencimento, o prazo e as condições de entrega
e liquidação são padronizados e, uma vez
efetuada a transação, a relação contratual passa a ser entre cada parte e a bolsa
ou câmara de compensação, o que é possibilitado pelo hedge estrutural; e o individual, feito para atender as necessidades
específicas de um cliente e que não segue as regras padronizadas dos mercados de bolsas, sendo transacionado diretamente entre as partes no sistema de
balcão.
O artigo está focado nos contratos padronizados de futuros e de opções, cujo
conhecimento básico é necessário para o
entendimento das circunstâncias que envolveram a quebra do Barings. As operações com derivativos padronizados são
realizadas através das bolsas, que estabelecem as regras de transação, definindo o objeto, a forma e a unidade de negociação; os meses de vencimento, a data
de vencimento e último dia de negociação; o preço de exercício, a oscilação
máxima diária, a margem de garantia; etc..
O objetivo básico dos mercados de futuros é a proteção dos agentes econômicos contra as oscilações de preços de seus
produtos e de seus investimentos em ativos financeiros constituindo um instrumento efetivo para eliminar o risco de um
investidor que detenha uma determinada
posição de mercadorias ou ativos financeiros.
Ao transacionar com contratos de futuros, o investidor está capacitado a fixar
um valor futuro, ficando protegido das conseqüências de um cenário desfavorável;
no entanto, caso ocorra o cenário favorável, esse investidor fica impossibilitado de
tirar proveito da situação porque tem a
obrigação de liquidar a operação aos preços previamente definidos.
No mercado de derivativos existe um
instrumento que possibilita o uso do hedge apenas no cenário desfavorável, não
constituindo obrigação caso esse cenário
se revele favorável: as opções de compra
e venda, que são contratos que têm uma
característica especial com relação aos
demais instrumentos: a assimetria de obrigações.
BIBLIOGRAFIA
1. Altman, Edward; Caouette, John;
Narayanan, Paul. Gestão do risco de crédito: o próximo grande desafio financeiro.
Rio de Janeiro: Qualitymark Editora, 2000.
2. Attie, William. Auditoria: conceitos e
aplicações. São Paulo: Ed.Atlas, 1995.
3. Barbosa, Lívia. Igualdade e meritocracia: a ética do desempenho nas sociedades modernas. Rio de Janeiro: FGV
Editora; 1999.
4. Fortuna, Eduardo. Mercado financeiro: produtos e serviços. Rio de Janeiro:
Qualitymark Editora, 1997.
5. Leeson, Nicholas W. A história do
homem que levou o Banco Barings à falência. Rio de Janeiro: Ed.Record, 1997.
6. Peleias, Ivam R. Falando sobre controle interno. IOB, Temática Contábil e
Balanços; Ano XXXVI, nº 50, dez.2002.
Pensar
Contábil
CONCLUSÕES
O caso Barings demonstrou que todas
as empresas, independente da natureza
dos seus negócios, precisam administrar
seu risco operacional, através da utilização de um sistema de relatórios compreensível para a maioria das pessoas envolvidas em funções de supervisão, de um
adequado sistema de verificações independentes e de demonstrações contábeis
transparentes.
O seu colapso foi conseqüência direta
das perdas causadas pela falta de controles adequados sobre as ações de seu jovem operador em Cingapura, que acumulava funções incompatíveis e não tinha
supervisão adequada. No entanto, as causas mais profundas devem ser buscadas
no sentimento de ganância generalizada
que sempre existiu nos mercados financeiros, aliado ao conflito de interesses.
Esse se materializou quando a parcela
variável da remuneração do funcionário,
paga como bonificação à título de partici-
24
Apêndice:
MERCADO DE INSTRUMENTOS FINANCEIROS DERIVATIVOS
A. Instrumentos financeiros derivativos
Os derivativos são instrumentos financeiros cuja formação de preço decorre ou
Pensar Contábil
Os pontos essenciais para se entender
o funcionamento desses dois mercados
se referem a três características básicas:
precificação; estratégias dos participantes
e esquema de garantias (baseado em
Fortuna, 1997). Esses pontos permitem
entender os fatores representativos do risco operacional envolvidos nas operações
com derivativos padronizados.
B. Mercado de futuros
A formação de preços nos mercados
de futuros depende da base, que correspondente, em valor, aos custos de manter
a posse da mercadoria física ou do ativo
financeiro até a data de vencimento do
contrato futuro, em situação normal de
mercado. Esses custos se referem à armazenagem, seguros, custos financeiros,
transporte, impostos e lucro. Essa base
evolui porque existem diferentes expectativas que podem afetar cada um dos
seus componentes de custo.
Ao transacionarem nos mercados de
futuros, os agentes econômicos envolvidos podem assumir a posição de hedger
ou de especulador. O hedger assume uma
posição no mercado de futuros contrária
à posição assumida no mercado à vista,
por ter o objetivo de buscar proteção (hedge) contra oscilações no preço de mercadorias ou ativos financeiros objeto de suas
atividades. Essa proteção equivale a um
seguro para limitar eventuais perdas. O
especulador assume a posição contrária
ao hedger procurando obter ganhos em
função de suas expectativas com relação
à evolução futura do mercado, assumindo riscos e dando liquidez a esse mercado.
O preço futuro e o preço à vista tendem
a mover-se de forma convergente - embora não necessariamente ao mesmo tempo e na mesma ordem de grandeza – geralmente com o preço futuro declinando e
o preço à vista aumentando com relação
à data do vencimento do contrato, refletindo as influências da volatilidade do ativo
e do principal componente da base: o custo do dinheiro. Essa base tende a zero na
data do vencimento do contrato futuro, com
o preço de vencimento futuro e o preço à
vista afetando-se mutuamente, pois na
data do vencimento o contrato futuro deve
ser liquidado pelo preço à vista vigente
no mercado.
As transações de futuros podem ser de
operações de financiamento ou arbitragem e operações de caixa. As primeiras
Mai/Jul - 2003
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
ocorrem quando o preço futuro do ativo
supera o seu preço à vista acrescidos os
custos de transação, enquanto que as
segundas ocorrem numa situação inversa, no qual o preço futuro do ativo é inferior ao seu preço à vista acrescidos os custos de transação.
A discrepância entre os preços futuro e
à vista, em ambas as transações, é que
acarreta a possibilidade de concretizá-las
com resultados positivos. As oscilações
definem os ganhadores e perdedores:
quem está comprado ganha se o preço
no mercado à vista sobe e perde se esse
preço cai; enquanto que o vendido está
na situação inversa.
As operações de futuros são, em sua
grande maioria, liquidadas financeiramente, ou seja, apenas um percentual residual das operações é liquidado pela tradição efetiva do bem negociado. A compra
e venda de mercadorias e ativos financeiros nos mercados de futuros se dão apenas no papel, o que torna crucial o controle do risco operacional das entidades envolvidas nesse tipo de operação. Para
cobrir esse tipo de risco, as bolsas de futuros operam com um esquema de garantias sucessivas, chamado hedge estrutural, constituído conjunto de margens e de
garantias, que visam assegurar a liquidação de todas as operações.
C. Mercado de opções
No mercado de opções o vendedor ou
lançador tem apenas obrigações, enquanto que o comprador ou titular da opção de
um ativo tem um direito, que poderá ser
exercido ou não: se a opção for de compra (call), o titular tem o direito de comprar, e se for de venda (put), o direito de
vender. Os direitos são negociados pelo
valor do prêmio, recebido pelo lançador e
pago pelo investidor. A oscilação do valor
da opção é derivada da variação do preço do ativo no mercado à vista.
O titular de uma opção de compra acredita que o preço do ativo irá subir alem do
preço de exercício pré-fixado, enquanto
que o lançador acha que vai cair; o titular
de uma opção de venda acredita que o
preço do ativo irá cair aquém do preço de
exercício, enquanto o lançador espera que
suas cotações subam, de forma a não ser
exercido. Nos casos em que o lançador
espera uma baixa volatilidade, pode realizar operações de straddle, que consiste
na venda simultânea de uma opção de
compra (call) e de uma opção de venda
(put) pelos mesmos preços de exercício e
com as mesmas datas de vencimento.
Os contratos de futuros têm uma volatilidade menor quando comparados com os
de opções e as operações de straddles
(estando essas últimas em um patamar
mais elevado de risco), indicando que a
concretização de operações a descoberto - ou seja, realizadas sem o lastro do
ativo-objeto - podem resultar em perdas
elevadas, dependendo da volatilidade do
derivativo e da quantidade de contratos
envolvidos. Essa situação pode ser consideravelmente agravada quando os
agentes econômicos que atuam na ponta
contrária têm ciência do fato.
No mercado de opções são negociados apenas os direitos de compra e venda dos ativos, mas não os ativos. A opção
americana pode ser negociada a partir do
dia seguinte ao seu lançamento, podendo ser exercida a qualquer tempo até o
dia do vencimento. Uma opção não exercida implica na perda integral do valor
aplicado pelo investidor (diz-se que “virou pó”). A reversão de posição ocorre
quando o lançador faz uma operação inversa à anteriormente realizada envolvendo o mesmo volume de ativos da mesma
série, acarretando o encerramento da posição é encerrada. Portanto, as obrigações
assumidas pelo lançador podem ser extintas pelo exercício da opção pelo titular,
pelo seu vencimento sem que tenha havido o exercício e pelo encerramento da
posição através da reversão de posição.
O lançador é obrigado, nesse mercado, a depositar garantias de forma a poder cumprir os compromissos assumidos.
O valor da garantia corresponde, em geral, ao dobro do prêmio médio do mercado ou se seu valor arbitrado pela bolsa.
As posições margeadas terão que manter
o nível até o vencimento, com ajustes sendo calculados diariamente. O lançador
coberto – ou seja, aquele que detém a
posse do ativo-objeto - poderá depositálo como garantia.
D. Hedge estrutural e risco operacional
A atuação das câmaras de compensação e das bolsas de derivativos é direcionada para obter o hedge estrutural, ou
seja, o conjunto de instrumentos para a
redução dos riscos, representado pelo
posicionamento líquido, exigência de
margens, prestação de garantias, referência ao mercado e gatilhos de rebaixamento. Essa combinação provou ser altamen-
Pensar
Contábil
25
Pensar Contábil
te eficaz, funcionando melhor com produtos padronizados negociados em grandes
volumes.
O posicionamento líquido – a prática
de compensar pagamentos em um sentido com pagamentos no sentido oposto –
é a principal ferramenta de gestão de risco das câmaras de compensação e das
bolsas. Permite que os agentes de mercado tenham uma visão precisa de sua
exposição com relação aos demais agentes. Os fluxos entre as instituições não são
iguais, portanto os agentes aceitam, até
certo ponto, o crédito de outros, a partir do
qual exigem alguma forma de garantia
para realizar mais negócios; e essa garantia vem sob a forma de garantias reais.
O tempo constitui um aspecto crítico do
risco da contraparte devido ao valor dos
derivativos ser altamente volátil, fazendo
com que as bolsas e as câmaras de compensação passem a exigir que os participantes do mercado referenciem suas carteiras ao mercado (mark to market), usando esse valor no fechamento do pregão
para determinar o valor de cada instrumento que detêm. Com isso margens e
garantias podem ser ajustadas diariamente. O hedge estrutural é complementado
Mai/Jul - 2003
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
pela utilização de gatilhos de rebaixamento, portanto, se uma das partes for rebaixada alem de um determinado limite, deverá apresentar garantias reais para continuar a negociar.
As operações com derivativos têm que
estar claramente segregadas entre as
que compõem a carteira própria - denominadas de transações proprietárias - e
as realizadas por conta de clientes, o que
é crucial para o adequado cumprimento
das exigências de margeamento diário
previstos em seus esquemas de garantias.
Adicionalmente, as bolsas têm exigências que incluem depósitos de garantia,
vigilância de crédito e monitoramento de
seus membros. As câmaras de compensação também investem em sistemas de
processamento para garantir alta confiabilidade, desenvolvem procedimentos
para lidar com a inadimplência de seus
membros, estabelecem reservas financeiras para suportar eventos causadores de
desequilíbrio, mantêm relacionamento
com órgãos regulamentadores e podem
obter apoio governamental em tempos de
crise. Algumas câmaras têm poderes para,
esgotados os seus recursos em decorrên-
cia das perdas sofridas, impor um confisco de bens de seus membros.
Com o esquema de exigência de margens, as bolsas facilitam a negociação de
derivativos e praticamente eliminaram o
risco da contraparte entre comprador e
vendedor, fazendo com que o risco de crédito que remanesça seja o do overnight –
a possibilidade de que a contraparte não
proporcione a margem do dia seguinte.
Esse esquema é complementado pela atuação das câmaras de compensação, que
foram desenvolvidas para permitir que as
instituições que fazem muitos negócios
umas com as outras compensem suas transações. Ao final do dia, a câmara de compensação tem um livro perfeitamente equilibrado de contratos e, assim, não incorre
em risco de mercado. A câmara de compensação fica exposta ao risco – em grande parte, controlado - de seus membros.
Com a participação das câmaras de
compensação, o risco de crédito entre os
participantes do mercado é diluído entre
o baixo risco operacional inerente ao funcionamento dessas câmaras, e o risco de
crédito da contraparte, de natureza residual, ao qual as câmaras estão expostas,
representado por seus clientes.
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Mai/Jul - 2003
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
4º colocado no Prêmio Geraldo de La Rocque
Fluxos de Caixa
e Capital de Giro –
Uma adaptação
do Modelo de Fleuriet
1 – INTRODUÇÃO
O objetivo principal de qualquer administrador de empresa
deve ser o de maximizar a riqueza dos proprietários, que é
medida pelo preço da ação. Este, por sua vez, baseia-se na
ocorrência dos fluxos de caixa (retorno), em sua magnitude e
seu risco. Esta consideração, permite-nos afirmar que as informações mais relevantes que uma empresa pode gerar são
aquelas relacionadas ao seu caixa. Para qualquer natureza
de decisão, seja operacional, de investimento ou de financiamento, conhecer os reflexos de curto e de longo prazo no
caixa para cada atitude tomada é o que realmente importa.
Stancil (1987, p.38) considera a capacidade de geração
de caixa uma informação essencial. Afinal, em sua opinião,
uma empresa não pode pagar contas com lucros, apenas com
o caixa. O próprio pagamento dos lucros é diretamente dependente dos saldos de caixa da empresa. Para Stancil, por
trás do interesse sobre a potencialidade de lucros de uma
organização, está o desejo de saber quanto em caixa ela está
gerando.
Contudo, casos recentes de fracasso empresarial têm fortalecido a convicção de que os enfoques previsivo e preventivo da análise dos fluxos de caixa não são explorados em
toda sua potencialidade. A Demonstração dos Fluxos de Caixa (DFC) resguarda, na sua simplicidade, capacidades essenciais para o sucesso na condução de qualquer porte ou
atividade empresarial, que permite, como por exemplo: (a)
apoiar o estudo para a previsão de falência; (b) analisar a
relação lucro versus caixa; (c) avaliar os efeitos no caixa das
transações de investimentos e financiamentos e (d) indicar as
possibilidades futuras de liquidação de obrigações. Estas,
entre outras, corroboram com a idéia de que, quando a questão é o estudo da liquidez, a DFC é o relatório mais eficaz na
gestão empresarial.
Além disso, “dez entre dez analistas utilizam o Fluxo de
Caixa para saber o verdadeiro valor de uma empresa” (Alperowitch, 1999, p.24). O Modelo do Fluxo de Caixa Descontado foi considerado por Miller e Modigliani como a metodologia mais abrangente para avaliação de ativos e de empresas.
Eles afirmaram que a abordagem do fluxo de caixa desconta-
Andréa Alves Silveira Monteiro
Bacharel em C.C. pela Moraes Júnior, graduada em Matemática
pela FEFACEL, mestre em C.C. pela UERJ.
do pode “ser aplicada a toda empresa, a qual pode ser vista
como um grande e complexo equipamento”. ( in Paxson &
Wood, 2001, p.181).
Desde 1988 os Estados Unidos reconhece a relevância da
DFC e formalizou esta posição ao substituir, naquele ano, a
Demonstração das Origens e Aplicações de Recursos (DOAR)
pela DFC. Os critérios de elaboração e divulgação foram normatizados pelo Financial Accounting Statement Board (FASB),
através do Statement Financial Accounting Standard (SFAS) 95.
No Brasil, estamos na eminência de passarmos pela mesma
substituição, conforme proposta de modificações para a Nova
Lei das S/A. Se aprovada, a Demonstração dos Fluxos de Caixa
passará ser relatório obrigatório para as Sociedades Anônimas,
sendo acatado o modelo americano, como sucintamente determinou a Normas e Pronunciamento de Contabilidade (NPC)20,
do IBRACON.
À luz do que pesquisamos, o Brasil tende a seguir o êxodo
americano em direção ao uso da DFC como fonte de informações. No entanto, importantes questionamentos ainda aguardam o posicionamento da comunidade contábil. Parte relevante das indagações está relacionada a taxonomia, ao método de elaboração do Fluxo de Caixa Operacional e a qualidade das informações sobre o caixa gerado ou consumido pelos
três fluxos. A comparabilidade, como uma característica informacional essencial, pode ficar comprometida por incongruências que se acentuam de acordo com as peculiaridades empresariais.
A DFC adotada como peça importante do conjunto das
Demonstrações Financeiras, será exaustivamente dissecada por usuários interessados por respostas para as variações de performance apresentada pelas organizações. A sua
natureza dinâmica, demanda critérios próprios para sua análise, distintos dos utilizados para o Balanço Patrimonial.
Os parâmetros de análise de Balanço foram criticados, pelo
Pensar
Contábil
27
Pensar Contábil
Mai/Jul - 2003
professor francês Michel Fleuriet, principalmente quanto as limitações dos índices de liquidez. Na sua opinião, a interpretação
da situação financeira de uma empresa, quando baseada no
balanço, tende a ser uma visão estática incompatível com o dinamismo do cotidiano empresarial.
Seu interesse por este assunto veio atender as dificuldades
existentes no Brasil, já existentes na década de 70. Junto com a
Fundação Dom Cabral, Fleuriet desenvolveu pesquisas no sentido de identificar um modelo de análise para as estruturas financeiras brasileiras. Seu principal norteador foi a construção
de um método que se adaptasse a um cenário sob constante
mutação e imprevisibilidade, e não uma simples importação de
modelos exógenos à nossa realidade.
O enfoque estático do Balanço foi revisto a partir da reclassificação dos elementos patrimoniais em três naturezas: (a) operacionais, (b) financeiros e (c) não circulantes. Desta segregação, foram extraídas três variáveis interdependentes, as quais
representam o fio condutor das pesquisas de Fleuriet: (a) Necessidade de Capital de Giro (NCG), (b) Saldo de Tesouraria
(ST) e (c) Capital de Giro (CDG). Estas, a partir de um modelo de
combinação, resultaram em seis tipos de estruturas financeiras,
servindo como diagnóstico e parâmetro para decisões operacionais, táticas e estratégicas.
Nosso trabalho teve como objetivo principal verificar a
possibilidade de aplicação dos diagnósticos do Fleuriet sobre a DFC, mantido o formato estabelecido pelo SFAS 95.
Para tanto, estudamos e organizamos as combinações das
variáveis, propondo uma tabela-resumo dos 6 tipos de estruturas financeiras. A seguir, desenvolvendo uma demonstração lógica da compatibilidade entre o Balanço Patrimonial e a DFC, provamos que é possível isolar, a partir dos Fluxos de Caixa, as mesmas variáveis do Modelo Dinâmico de
Capital de Giro.
Com base nos dados publicados por empresas selecionadas
do setor de comércio varejista, aplicamos o modelo proposto
sobre as Demonstrações Financeiras da controladora para o
período de 01 de janeiro de 1997 a 31 de dezembro de 2000.
Foram escolhidas para base de teste quatro organizações importantes deste setor, que para efeito desta publicação, chamaremos de empresas A, B, C e D.
Pensar
Contábil
2 – A DEMONSTRAÇÃO DOS
FLUXOS DE CAIXA, SEGUNDO O FASB
A DFC é um relatório que evidencia, historicamente, as entradas e saídas caixa de uma entidade, em um determinado período. O termo caixa, deve ser tratado no seu sentido amplo, como
o somatório de Caixa, Bancos e Aplicações Financeiras. Para
este último caso, o SFAS 95 orienta sobre o que considerar como
equivalente de caixa. Entre as considerações mais relevantes,
28
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
está o prazo de resgate em até 90 dias. O FASB determina que a
DFC seja segregada em três atividades: operacional, investimento e financiamento.
As atividades operacionais referem-se as entradas e saídas
de caixa necessárias à manutenção dos negócios da entidade.
O parágrafo 21 do SFAS 95 determina que neste fluxo estejam
representadas todas as transações que envolvam a produção e
entrega de bens, mercadorias e serviços, e que não estejam
enquadradas em nenhuma das características de operações de
investimentos ou financiamentos preconizadas pelos parágrafos 15 ao 20. O FASB não faz menção a respeito da segregação
entre curto e longo prazo. O Fluxo Operacional pode ser evidenciado por dois métodos: direto ou indireto. O Método Direto consiste na composição dos valores de entradas e saídas que efetivamente geraram ou consumiram caixa das operações. O Método Indireto, consiste na conciliação do Resultado Líquido do
exercício com a efetiva variação do caixa. Para compor esta
relação, são aplicados os seguintes ajustes: (a) expurgo dos
efeitos das transações incluídas na Demonstração do Resultado do Exercício (DRE) que não afetaram o Capital Circulante
Líquido, como por exemplo: Depreciação, Resultados de Equivalência Patrimonial e Imposto de Renda Diferido, e (b) expurgo
das variações dos ativos e passivos por representarem valores
relativos às transações de caixa decorridas antes ou após o
período de apuração do resultado.
As atividades de financiamento são tratadas no parágrafo 18
do pronunciamento e incluem: (a) a obtenção de recursos de
acionistas e o pagamento de um retorno (dividendos) sobre seus
investimentos e (b) a obtenção de empréstimos e financiamentos de curto e longo prazo, incluindo os seus respectivos pagamentos. Estas atividades estão diretamente relacionadas com a
estrutura de capital da empresa e envolvem as modificações
que afetaram o caixa nos exigíveis onerosos de curto e longo
prazo e no Patrimônio Líquido.
As atividades de investimentos são vinculadas às mudanças
da estrutura de investimento de curto ou longo prazo que afetaram o caixa, porém não de natureza operacional. O parágrafo
15 inclui as operações de execução e arrecadação de empréstimos, aquisição e disposição de aplicações financeiras e compra e venda de ativos permanentes.
A seguir, apresentamos um exemplo hipotético de movimentação de caixa de uma entidade e como deveriam ser evidenciados, segundo a estrutura determinada pelo FASB. Consideremos os seguintes dados para X1: (a) saldo inicial em 1o de janeiro de X1: $10.000,00; (b) Fluxo Líquido das Atividades Operacionais: $80.000,00; (c) Fluxo Líquido das Atividades de Investimento: ($100.000,00) e (d) Fluxo Líquido das Atividades de Financiamento: $60.000,00. Neste caso, a Demonstração dos Fluxos de Caixa fica assim representada:
Fluxo de Caixa Líquido das Atividades Operacionais ----------------------------------------------------------------
$ 80.000
(+/-) Fluxo de Caixa Líquido das Atividades de Investimento ------------------------------------------------------
($ 100.000)
(+/-) Fluxo de Caixa Líquido das Atividades de Financiamento ---------------------------------------------------
$ 60.000
(=) Acréscimo /Decréscimo de caixa no período -----------------------------------------------------------------------
$ 40.000
(+) Saldo inicial de caixa em 1º de janeiro -------------------------------------------------------------------------------
$ 10.000
(=) Saldo final de caixa em 31 de dezembro ----------------------------------------------------------------------------
$ 50.000
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Mai/Jul - 2003
O acréscimo ou decréscimo de caixa no período é determinado pelo somatório dos três fluxos líquidos. Chamamos esta variação de caixa gerado, se positiva, ou consumido, se negativa. O
saldo final é determinado, acrescentando o saldo inicial àquela
variação.
Este formato permite uma visualização da movimentação dos
recursos existentes entre os três fluxos. No exemplo dado, as
atividades operacionais e as atividades de financiamento produziram em caixa, respectivamente, $80.000 e $60.000. Desse
total de $140.000, foram utilizados $100.000 nas atividades de
investimentos da empresa, restando $40.000 os quais foram
adicionados ao caixa inicial de $10.000, o que derivou seu montante final para $50.000. Apesar da simplicidade, o critério de
classificação quanto às suas atividades é o ponto de maior discussão e questionamento sobre o modelo norte americano. Problemas de taxonomia podem resultar em distorções nos valores
demonstrados por cada fluxo de caixa.
3 – O MODELO DINÂMICO
DE CAPITAL DE GIRO
A partir da reclassificação do Balanço Patrimonial em operacional, financeiro e não circulante, Fleuriet isolou e combinou
três variáveis, permitindo interpretar as decisões dos gestores,
identificar suas conseqüências e nortear os rumos para o futuro.
São estas:
1. O Capital de Giro (CDG) é a diferença entre os Passivos
Não Circulantes (PNC) e os Ativos Não Circulantes (ANC). Como
PNC, estão inclusos os Passivos Exigíveis a Longo Prazo e o
Patrimônio Líquido, já o ANC, considera os Ativos Realizáveis a
Longo Prazo e o Ativo Permanente. O CDG possui o mesmo
valor absoluto que o Capital Circulante Líquido (CCL), apenas
seu cálculo é realizado de maneira diferente (Fleuriet,1978,p.20).
Metaforicamente, o CCL é o reflexo no espelho do CPL: imagens iguais para composições diferentes. Este termo é entendido por alguns autores como sinônimo de Capital de Giro Líquido
e de Capital Circulante Líquido, o que é ratificado por Stickney e
Weil (2001, p.806), que consideram uma redundância a terminologia “líquido”. Neste trabalho, adotaremos a definição Capi-
Tipo
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
tal Permanente Líquido (CPL), aceita por alguns autores, como
Silva (2001, p.371), para melhor diferenciar do termo Capital
Circulante Líquido utilizado em explanações que seguem. Quando o CPL é positivo, significa que as origens de recursos de
longo prazo e o capital próprio superam o valor investido em
longo prazo, destinando esta sobra para o CCL. Se o CPL é
negativo, as aplicações de longo prazo utilizam recursos de curto prazo.
2. A Necessidade de Capital de Giro (NCG) é a diferença
entre Ativos e Passivos Operacionais. É positiva quando o ciclo
operacional for maior que o prazo médio de pagamento e negativa quando o contrário ocorrer. A NCG tende a ser positiva e
diretamente crescente em relação a evolução das vendas, se o
volume de negócios cresce a demanda de investimento em giro
também aumenta. Neste sentido, o CPL precisa acompanhar
esta evolução, fazendo face ao lastro necessário para o crescimento das operações. Quando isto não ocorre, a empresa tende a utilizar capital financeiro de curto prazo e a apresentar
Saldo de Tesouraria negativo, apesar do crescimento das vendas. Este fenômeno, conhecido como “Efeito Tesoura”, foi tratado por Fleuriet como evidencia da interdependência das variáveis por ele isoladas.
3. O Saldo de Tesouraria (T) é a diferença entre os Ativos
Financeiros (AF) e Passivos Financeiros (PF) de Curto Prazo, e
será positiva quando os AF forem superiores aos PF e negativa
quando o contrário ocorrer. As decisões operacionais e as políticas de autofinanciamento são determinantes de T.
4 – MODELO PROPOSTO:
INTEGRAÇÃO FLUXOS DE
CAIXA VERSUS CAPITAL DE GIRO
A partir da combinação das variáveis CPL, NCG e T, Fleuriet
diagnosticou 6 tipos de situações financeiras. Originalmente,
sua obra demonstrou 4 tipos, fazendo apenas menção a mais
dois que posteriormente, foram estudados por Braga (1999, p.17).
Nossas pesquisas permitiram construir a tabela abaixo, facilitando visualizar os diagnósticos:
Pensar
Contábil
CPL
=
T
+
NCG
Interpretação
1
+
=
+
+
-
Situação de Excelente Liquidez
2
+
=
+
+
+
Situação Financeira Sólida
3
+
=
-
+
+
Situação Financeira Insatisfatória
4
-
=
+
+
-
Alto Risco de Insolvência
5
-
=
-
+
-
Situação Financeira Muito Ruim
6
-
=
-
+
+
Péssimo
29
Pensar Contábil
Mai/Jul - 2003
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
Estes são os fatores que contribuem para a modificação das variáveis:
CPL = Passivos Não Circulantes –
Ativos Não Circulantes = CCL = NCG + T
NCG = Ativos Cíclicos – Passivos Cíclicos
Variável
Característica
De natureza operacional
Quando positiva: o ciclo operacional é mais longo que o prazo médio
de pagamento, necessitando de investimento em giro operacional. Neste caso, uma situação desfavorável
Quando negativa: o ciclo operacional é menor que o prazo médio de
pagamento, representando recursos
financiados por terceiros (não onerosos). Neste caso uma situação favorável.
De natureza estratégica
e operacional
Função espelho com o CCL. Se aumenta o CPL, aumenta o CCL. Se diminui o CPL, diminui o CCL
Quando Positivo: fonte líquida de recursos de permanentes, dando fôlego ao CCL. Neste caso, situação favorável
Quando Negativo: aplicação em itens
permanentes. Incapacidade da empresa de ter giro com capital próprio
ou de longo prazo. Neste caso, situação desfavorável
T = Ativos Financeiros – Passivos
Financeiros = CPL - NCG
Pensar
Contábil
De Natureza errática
Dependente do NCG e do CPL
Quando positiva: empresa com sobra de recursos financeiros de curto
prazo. Neste caso, situação favorável
Quando negativa: empresa dependente de recursos financeiros de curto prazo. Neste caso, situação desfavorável
Aumenta com
Crescimento no volume de vendas
Esticamento da estocagem
Esticamento do processo de produção
Políticas de crédito agressivas,
com aumento do prazo de recebimento
Redução do prazo de pagamento
Geração de Lucros
Aporte de Capital
Captação de recursos onerosos
de longo prazo
Diminuição de investimentos em
Ativos Não Circulantes
Diminui com
Redução das Vendas
Velocidade no giro dos estoques
Velocidade no processo produtivo
Políticas de crédito mais conservadora
Esticamento do prazo com fornecedores
Geração de Prejuízo
Retirada de Capital
Distribuição de Lucros
Amortização de financiamentos
Aumento de Investimentos em
Ativos Não Circulantes
Aumento do CCL
Redução do NCG
Redução do CCL
Aumento da NCG
Fonte: adaptado de Joanília Cia (1988, p.62)
O acompanhamento do comportamento destas variáveis e a
relação entre elas pode representar a diferença entre o fracasso
e o sucesso da gestão financeira de uma empresa. Para tanto,
há necessidade que de esta ação seja preventiva e dinâmica
como o próprio modelo propõem. A tempestividade da DFC,
utilizada por muitas empresas até diariamente na condução de
seus negócios, veio ao encontro desta necessidade, superando a estaticidade peculiar do Balanço Patrimonial. Este fato foi
o principal norte para a proposta de verificarmos a adaptabilida-
30
de do Modelo Dinâmico de Capital de Giro para a DFC.
Contudo, o modelo adotado para evidenciação dos Fluxos
de Caixa tem critérios de evidenciação que dificultam a extração
das variáveis para análise dinâmica do Capital de Giro. O principal obstáculo é a junção de operações de curto com longo prazo
em um mesmo fluxo de caixa, o que impede a segregação das
operações para composição de CPL, NCG e T. Em decorrência,
propomos a reclassificação das transações que compõem os
fluxos em curto e longo prazo, da seguinte forma:
Pensar Contábil
Mai/Jul - 2003
Operação
Eventos
(=)
Resultado Líquido
(+)
Ajustes
(=)
Resultado Líquido Ajustado = (1)
(-)
Variações de Ativos Circulantes Operacionais = (2)
(+)
Variações de Passivos Circulantes Operacionais = (3)
(=)
Variação da Necessidade de Capital de Giro = (2) – (3) = (4)
(-)
Variações de Ativos Não Circulantes Operacionais = (5)
(+)
Variações de Passivos Não Circulantes Operacionais = (6)
(=)
Geração de Caixa Operacional = (1) - (4) – (5) + (6) = (7)
(=)
Investimentos Estratégicos = (8) – (9) = (10)
(+)
Entradas de Investimento de Longo Prazo = (8)
Fluxo de Caixa das Atividades Operacionais
Fluxo de Caixa das Atividades de Investimento
(-)
(=)
(+)
Saídas de Investimento de Longo Prazo = (9)
Investimentos Táticos = (11) – (12) = (13)
Entradas de Investimento de Curto Prazo = (11)
(-)
Saídas de Investimento de Curto Prazo = (12)
(=)
Geração de Caixa de Investimento = (10) + (13) = (14)
(=)
Financiamentos Estratégicos = (15) - (16) = (17)
Fluxo de Caixa das Atividades de Financiamento
(+)
Entradas de Financiamento de Longo Prazo (15)
(-)
Saídas de Financiamento de Longo Prazo (16)
(=)
Financiamentos Táticos = (18) - (19) = (20)
(+)
Entradas de Financiamento de Curto Prazo (18)
(-)
Saídas de Financiamento de Curto Prazo (19)
(=)
Geração de Caixa de Financiamento = (17) + (20) = (21)
(=)
Total do Caixa Gerado = (7) + (14) + (21)
(+)
Saldo inicial de caixa = (23)
(=)
Saldo final de caixa = (21) + (23) = (24)
(=)
Variação do Saldo de Tesouraria = (21) + (13) – (20) = (25)
(=)
Variação do Capital Permanente Líquido = (4) + (25) = (26)
Este modelo não contraria as exigências da NPC 20 que
segue as orientações do FASB. Mas, tão somente, consiste em
segmentar os fluxos de atividades em curto e longo prazo, viabilizando a extração da variáveis: (a) a NCG, como a diferença
entre a variação dos Ativos Circulantes e Passivos Circulantes
Operacionais (item 4); (b) o ST, como somatório do Total do
Caixa Gerado acrescido dos Investimentos Táticos e subtraído
os Financiamentos Táticos (item 25) e (c) o CPL, como o somatório das variações da NCG e ST (item 26).
A restrição deste modelo é a falta dos saldos iniciais de
NCG e ST, já que a DFC permite apenas isolar as variações
das mesmas. No entanto, este fato pode ser contornado a
partir do conhecimento dos saldos iniciais destas variáveis, os
quais são obtidos do Balanço Patrimonial imediatamente anterior ao período da DFC. Estas informações podem ser inseridas em notas de rodapé dos Fluxos de Caixa, quando apresentados isolados do Balanço Patrimonial. Estas providências tornariam viável a aplicação dos diagnósticos de Fleuriet
sobre a DFC, conferindo a este relatório a transparência e a
consistência informacional suficientes para sustentar a inter-
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pretação por parte dos usuários sejam eles internos ou externos.
Considerando que para o isolamento das variáveis é necessário acrescentar à variação os saldos iniciais de Balanço, é
possível aplicarmos as seguintes fórmulas na determinação das
variáveis, onde:
NCG = NCGi + DAocp - DPocp
T = Ti + TCG - EIt + SIt - EFt + SFt
CCL = NCG + T
CPL = CCL
A aplicação do modelo, baseou-se nos seguintes procedimentos: (a) seleção das Demonstrações Financeiras e transcrição das mesmas para uma planilha eletrônica (Excel); (b) reorganização do Balanço Patrimonial em: cíclico, financeiro e não
circulante; (c) isolamento das variáveis: NCG, ST e CPL; (d)
aplicação da tabela resumo dos diagnósticos sobre o Balanço
Patrimonial; (e) elaboração da DFC conforme o modelo adaptado; (f) isolamento das variáveis: NCG, ST e CCL, a partir dos
Fluxos de Caixa; (g) aplicação da tabela resumo dos diagnósticos sobre a DFC; (h) comparação entre os resultados (d) e (g); (i)
verificação da consistência do diagnóstico obtido pelo confronto
com as informações divulgações sobre a situação da empresa; e
(j) conclusões sobre os testes.
O teste possibilitou o isolamento das variáveis NCG, ST e
CCL, assim como revelou seus valores iguais aos existentes no
Balanço Patrimonial. Em decorrência, verificamos que os diagnósticos de Fleuriet podem ser aplicáveis para análise da DFC.
Para tanto, o analista deve conhecer apenas os saldos iniciais
de NCG e T. O modelo também permitiu ratificarmos a situação
divulgada pelas empresas e ainda conhecermos mais detidamente o comportamento de suas políticas estratégica, operacional e financeira. Como segue:
Pensar
Contábil
1. Desempenho Geral: visualizamos o bom desempenho
das empresas A, B e D, esta última já apresentando um Efeito
Tesoura em 2000. A situação da empresa C também transpareceu ratificando uma estrutura financeira que inspira muitos
cuidados e revisão das estratégias atuais. O gráfico demonstra a performance geral, através da aplicação do Diagnóstico,
combinando as decisões estratégicas (CPL), operacionais
(NCG) e financeiras (ST). Neste caso a empresa D foi a mais
eficiente, apesar do ano de 2000 ter sido desfavorável. O
desempenho veio seguido das empresas A, B e C, nesta ordem.
31
Pensar Contábil
Mai/Jul - 2003
2. Decisões Estratégicas: a empresa B foi a mais conservadora, seguida de D e A . Estas mantiveram seu CPL
positivo durante todo o período, no entanto diminuíram seu
CCL a medida que realizaram investimentos não circulantes. O gráfico abaixo mostra o resumo destas decisões
através da medida ANC/PNC (índice de Imobilização do
PNC):
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é demonstrado graficamente:
5 – CONCLUSÃO
3. Decisões Operacionais: podem ser sintetizadas pelo índice Pop/Aop (financiamento dos Ativos Operacionais por Passivos Operacionais). O índice indicou que a empresa A foi a mais
eficiente. No entanto, a empresa D também teve um ótimo comportamento em 1998 com 1,18 de financiamento de seus Ativos
Operacionais por Passivos Operacionais, o que não conseguiu
manter nos anos seguintes. Em terceiro ficou B, seguida de C. O
comportamento destas decisões foi assim demonstrado pelo
gráfico:
Pensar
Contábil
4. Decisões Financeiras: foram medidas pela capacidade de liquidação de Passivos Erráticos com Ativos Erráticos e foi definido pelo índice Ae/Pe. Cabe ressaltar, que o
termo errático é equivalente ao termo financeiro utilizado
por Fleuriet. A empresa B apresentou a melhor gestão de
Tesouraria no período. Esta medida deve ficar perto de 1.
Valores expressivamente acima disto, indica excesso de
dinheiro em tesouraria e abaixo, sinaliza insuficiência para
pagamentos financeiros de curto prazo. O índice médio da
empresa B no período foi de 1,73, seguido de 3,88 da empresa D e 7,97 de A . A empresa C apresentou Saldo de
Tesouraria negativo no período e sua média de cobertura
de passivos erráticos foi de 0,26. O desempenho neste item,
32
A Demonstração dos Fluxos de Caixa (DFC) tem como finalidade evidenciar a geração ou consumo do caixa relativo a três
atividades: (a) operação, (b) financiamento e (c)investimento. É
considerada essencial no estudo da liquidez e da capacidade
de continuidade organizacional. Em decorrência de sua riqueza informacional a DFC faz parte do elenco de mudanças propostas para a Nova Lei das S.A., onde está sendo cogitada a
inclusão deste relatório em substituição a Demonstração das
Origens e Aplicações de Recursos. À luz do que pesquisamos,
o Brasil tende a seguir o êxodo americano em direção ao uso da
DFC, adotando os critérios preconizados pelo FASB através do
SFAS 95.
Devido a sua natureza dinâmica, a análise da DFC demandará critérios próprios, distintos dos tradicionalmente adotados para o Balanço Patrimonial. O enfoque dinâmico da empresa foi estudado por Michel Fleuriet que criticou a estaticidade dos modelos tradicionais de análise. Sua pesquisa foi norteada pela reclassificação dos elementos patrimoniais, de onde
foram extraídas três variáveis interdependentes: (a) Necessidade de Capital de Giro(NCG); (b) Saldo de Tesouraria(T) e (c)
Capital Permanente Líquido(CPL). A combinação destas resultaram no Modelo Dinâmico de Capital Giro, compondo 6
tipos de diagnósticos sobre a situação financeira de uma empresa.
Nossa pesquisa teve como objetivo verificar a possibilidade de aplicação dos diagnósticos do Fleuriet sobre a DFC.
Para tanto, foi apresentada uma revisão teórica sobre a DFC
e o Capital de Giro, seguido de uma demonstração lógica da
compatibilidade entre os dois temas. Conseguimos desenvolver um modelo adaptado que permitiu isolar, a partir dos
Fluxos de Caixa, as mesmas variáveis utilizadas por Fleuriet.
O modelo foi testado sobre as Demonstrações Financeiras
de quatro empresas importantes no setor de varejo, o que permitiu concluir que é possível aplicar os diagnósticos do Modelo
Dinâmico de Capital de Giro também sobre o modelo norte americano de Demonstração dos Fluxos de Caixa. Para tanto, é
necessário conhecer os saldos iniciais de Balanço da NCG e ST
e segregar nos Fluxos de Caixa as transações de curto prazo
das de longo prazo. Também podemos concluir que os diagnósticos sobre a situação financeira das empresas concebidos,
a partir da aplicação do modelo adaptado, sinalizaram informações equivalentes àquelas divulgadas pelas empresas ao mercado.
Pensar Contábil
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6 – BIBLIOGRAFIA
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BAHSON, P. R., MILLER, P. B., BUDGE, B. P. Nonarticulation in Cash Statements and Implications for Education, Research and
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Significado, Vantagens e Limitações, Algumas Evidências. Universidade de São Paulo (USP), Departamento de Contabilidade e Atuária.
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24 KELLY, Gary. Rate of Return Statistics Theory and Observation. Journal of Accounting Literature, vol. 15, 1996.
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28 MARQUES, José Augusto Veiga da Costa. Estudo como pré-requisito de pós-doutoramento em Contabilidade e Controladoria:
Medidas e Modelos Integrados do Desempenho Empresarial: Uma investigação de fundamentos e critérios de classificação operacional.
Universidade de São Paulo – USP, Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade Departamento de Contabilidade e Atuária, São
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29 MARTINS, Eliseu. Contabilidade Versus Fluxo de Caixa. Universidade de São Paulo (USP), Departamento de Contabilidade e Atuária,
Caderno de Estudos Fipecafi, São Paulo, jan./abr., 1999.
30 OHLSON, James A., ZHANG, Xiao-Jun. On the Theory of Forecast Horizon in Equity Valuation. Journal of Accounting Research, vol.
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31 PADOVEZE, Clovis Luis. Análise do Índice de Liquidez sob o conceito de avaliação econômica da empresa. Revista Brasileira de
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34 REICHELSTEIN, Stefan. Providing Managerial Incentives: Cash Flows versus Accrual Accounting. Journal of Accounting Research,
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37 ROSS, Stephen A, WESTERFIELD, Randolph W., JORDAN, Bradford D. Princípios de Administração Financeira. São Paulo: Atlas,
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39 SALES CIA, Jonília Neide de. Sistema de Gerenciamento de Liquidez sob a ótica da teoria das restrições: uma adaptação da
Metodologia de Fleuriet. Tese de Doutoramento. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1998.
40 SANTOS, Ariovaldo, LUSTOSA, Paulo Roberto. Demonstração de Fluxo de Caixa: uma reflexão sobre a objetividade (ou falta de) do
Fluxo de Caixa. Boletim IOB, Temática Contábil de Balanços, São Paulo, n.14, 1999.
41 _______. Demonstração dos Fluxos de Caixa: Alternativas para Tratamento dos Estoques: Atividades Operacionais ou de Investimentos. Boletim IOB, Temática Contábil de Balanços, São Paulo, n. 21, 1999.
42 _______. Juros e Dividendos Pagos: Onde Classificá-los na Demonstração do Fluxo de Caixa. Boletim IOB, Temática Contábil de
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44 SILVA, José Pereira. Análise Financeira das Empresas. 5.ed. São Paulo: Altas, 2001.
45 SOFFER, Leornard C. SFAS n. 123 Disclosures and Discounted Cash Flow Valuation. Accounting Horizons, vol.14, no. 2, June 2000.
46 SOUZA, Milanez Silva, FAMÁ, Rubens. Gestão do Capital de Giro na Corporação Virtual. Revista Contabilidade Vista & Revista, Belo
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47 STANCILL, James McNeil. “When is there Cash in Cash Flow?” In Harvard Business Review, Boston, vol. 65, n. 3/4, mar./abr., 1987.
48 STICKNEY, Clyde P., WEIL, Roman L. Contabilidade Financeira: uma introdução aos conceitos, métodos e usos. São Paulo: Atlas,
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49 SZUSTER, Natan. Cálculo e Análise Contábil do Lucro Passível de Distribuição. Revista Brasileira de Contabilidade, Brasília, n. 58, 1986.
55 WAHLEN, James M., BOASTMAN, Jams R., HERZ, Robert H. American Accounting Association’s Financial Accounting Standards
Commitee. Accounting Horizons, vol. 14, no. 4, december 2000.
56 WILLIANS, Jan R. GAAP GUIDE – Generally Accepted Acconunting Principles – Ed. Harcourt Brace & Company, 1996, pág. xvi, xvii,
xviii, xix, xx, xxi, xxii, xxiii, xxiv e xxi;
Pensar
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33
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5º colocado no Prêmio Geraldo de La Rocque
DESPERDÍCIO
MIOPIA INFORMATIVA DA D.R.E,
Fabiano Simões Coelho
José Carlos Sardinha
1 - INTRODUÇÃO
Ultimamente, estamos sendo abarrotados de novas expressões que almejam direcionar a modernização da gerência empresarial. Cada vez mais estamos conhecendo “uma série de
recursos (que) pode ser utilizada para a condução e o desenvolvimento de um processo da análise e mudanças do ambiente
interno. Corresponde, em sua maioria, a novos termos que têm
aflorado na administração para caracterizar processos e práticas nem sempre novos”1 . Termos estes como, entre vários, benchmarking, downsizing e Theory of Constrains.
Entretanto, um erro comum é a utilização de conceitos e mudanças estruturais, que, em sua aplicabilidade, se perdem por
simples miopia estratégica. Decisões de investimentos, cortes
de custos, novos investimentos ou reduções dos mesmos e expressões como “cortar a gordura da organização” são realizadas sem a devida visão sistêmica da contabilidade e, de forma
mais pragmática, da contabilidade de custos.
Sua importância dentro da organização é imprescindível ao
sucesso organizacional, afinal “o sistema contábil é o principal
– e o mais confiável – sistema de informação quantitativo em (...)
todas as organizações”2 , pois é, basicamente, o único “meio de
coletar, resumir, analisar e relatar informação acerca dos negócios”3 de uma empresa, onde a contabilidade de custos agrega
um valor inestimável à empresa, pois estas necessitam cada
vez mais de “informações precisas sobre custos em todos os
aspectos de sua empresa, do projeto e desenvolvimento à produção, marketing e entrega de serviços ao cliente pós compra”4 .
Ou seja, as empresas estão vivenciando um cenário de grande concorrência e necessitam tornarem-se cada vez mais eficientes e enxutas. Ao mesmo tempo esquecem a contabilidade
como principal fonte de informação.
O objetivo deste trabalho é mostrar como um relatório contábil, a Demonstração de Resultado de Exercício, pode ser um
Bacharel em C.C. pela UERJ, pós-graduado em C.C. pela FGV,
mestre em C.C. pela UERJ.
Coordenador de Área da FGV Manegement. Doutor e Mestre
em Ciência em Administração de Empresas pela University of Southern
Califórnia.
importante instrumento de tomada de decisão gerencial ao ser
utilizado de forma a gerar informações dependendo do grau de
evidenciação disposta na mesma.
Não é propósito deste trabalho questionar todo o referencial
teórico quanto ao pensamento e aplicação de nova cultura organizacional. O que iremos discutir é como utilizar todo este
conhecimento que aflora a cada dia no mundo em consonância
com a realidade empresarial. O enfoque deste trabalho, de forma mais objetiva, ao entendimento de um poderoso instrumento, a Demonstração de Resultado de Exercício, para agregar
valor a tomada de decisão.
Pensar
Contábil
2 - A IMPORTÂNCIA DO SISTEMA CONTÁBIL
A Contabilidade é, objetivamente, um sistema de informação
e avaliação destinado a prover seus usuários com demonstrações e análises de natureza econômica, financeira e de produtividade, com relação à entidade, objeto de contabilização.
Essas informações são fornecidas a diversos tipos de usuários, que subsidiem a tomada de decisão: para o cliente interno
as informações o auxiliam no planejamento e controle; para o
cliente externo informa a situação econômica e financeira da
empresa, que o permite tomar decisões de investimento. Assim
sendo, a contabilidade é a ciência que tem por função registrar,
controlar e analisar os atos e fatos administrativos de uma atividade econômica:
a) Registro - Ato de acumular dados de efeitos econômicos
permitindo a transcrição dos mesmos em contas a serem agrupadas nos demonstrativos econômico-financeiros (Balanço,
DEREX, DOAR, etc) como caixa, estoque, etc.
1 TAVARES, Mauro Calixta. Gestão estratégica. São Paulo: Atlas, 2000. p. 284
2 HORNGREN, Charles T., et al. Contabilidade de custos. Tradução de “Cost accounting” 9 ed., por José Luiz Paravato. 9 ed. Rio de Janeiro: LTC, 2000. p.2
3 ANTHONY, Robert N. Contabilidade gerencial. Tradução de Management accounting principles, por Luiz Aparecido Caruso. São Paulo: Atlas, 1975. p.17
4 HANSEN, Don R. e MOWEN, Maryanne M. Gestão de custos. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2001. p. 54
35
Pensar Contábil
Mai/Jul - 2003
b) Controle - Processo pelo qual a alta administração se certifica, na medida do possível, de que a organização está atingindo em conformidade com os planos e políticas traçados pelos
donos do capital. Como a mensuração é periódica e sistemática, os dados contidos nos demonstrativos econômicos e financeiros permitem avaliar os resultados vis-à-vis aos planejados.
c) Análise - Técnica utilizada para saber o que está errado, o
que pode ser corrigido, o que está funcionando e o que pode
funcionar melhor.
Integrado neste sistema, há a Contabilidade de Custos, que,
em um sentido amplo, tem como principal objetivo registrar informações suficientes para abastecer a Contabilidade Financeira e a Contabilidade Gerencial.
A Contabilidade, bem como a Contabilidade de Custos, sempre existiram, mas seu progresso e desenvolvimento cresceram
em velocidade progressiva nos últimos 40 anos frente as novas
necessidades informativas de seus usuários. Hansem5 define
de maneira precisa este novo cenário:
“O ambiente econômico atual criou a necessidade de
uma reestruturação da gestão de custos. Pressões competitivas mundiais, o crescimento do setor de serviços e
os avanços nas tecnologias de informação e de manufatura mudaram a natureza de nossa economia e fizeram
com que muitos fabricantes dos EUA mudassem drasticamente sua maneira de operar seus negócios.”
Essas alterações dramáticas tornam a contabilidade de custos uma necessidade em toda a organização. Entretanto, expressões, modelos e técnicas como o Just in time6 , Administração total da qualidade7 , Benchmarking8 , Reengenharia9 , Theory of Constrains10 , Downsizing11 , entre outros, estão sendo
constantemente aplicados na entidade sem as devidas noções
inerentes a seus efeitos colaterais.
Além disso, a empresa e seus gestores esquecem que há um
impacto comportamental das informações de custos, além da
simples necessidade informacional. Um pensamento equivocado é que a contabilidade de custos, bem como o sistema contábil, é um mero instrumento que reflete o que está acontecendo
de forma imparcial. “Ao invés disso, um sistema de informações
de contabilidade de custos também molda a empresa”12 .
A idéia básica de custos, atualmente, é de que eles devem
ser determinados, tendo em vista o uso a que se destinam. A
diversidade de objetivos da Contabilidade de Custos torna difícil estabelecer um só tipo de custo da produção, que se adapte
a todas as necessidades. Cada utilização de custo requer, de
fato, diferentes tipos de custos. Por isso, a Contabilidade de
Custos, quando acumula os custos e os organiza em informações relevantes, pretende atingir três objetivos principais: a de-
Pensar
Contábil
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terminação do lucro, o controle das operações e a tomada de
decisões.
Os dados de custos necessários para a determinação do lucro podem ser extraídos diretamente dos registros convencionais da Contabilidade. Uma ou outra compilação deverá ser
feita para transformá-los em informações úteis. Por exemplo, a
separação dos custos em aplicados e periódicos já vai fornecer
resultados mais realísticos à Administração. A acumulação dos
custos por fases de fabricação, por departamentos e por produtos resultará em apropriações mais racionais. O atendimento do
princípio contábil da competência, na qual para toda renda devem ser computados os custos necessários para realizá-la, é a
maneira mais usada e correta para o levantamento do lucro do
período.
Considerando os mesmos dados básicos, pode a Contabilidade, por meio de classificações especiais, atender ao controle.
Quando o contador acumula os custos por centros de responsabilidade e dentro de cada centro classifica os custos por função,
por natureza e por possibilidade de controle, dota a Administração de meio eficaz para a determinação dos custos por componente da organização e, conseqüentemente, para o exercício
de controle mais efetivo sobre o desempenho de cada um dos
responsáveis por esses mesmos componentes.
O sistema de custos-padrão, adotado pelas empresas industriais e que também pode ser empregado para o controle de
outras atividades, é instrumento valioso à disposição do administrador o qual permite a criação de metas, bem como medir os
resultados. A separação dos custos em relação ao volume, isto
é, custos fixos e custos variáveis, fornecerá ao contador meios
para dar melhores informações à administração em termos de
controle (por exemplo, os orçamentos flexíveis) e de auxílio ao
processo decisório (por exemplo, a análise do ponto de equilíbrio).
Tratando-se das relações entre a Contabilidade de Custos e
o processo de decisão, vale lembrar a existência de diversos
tipos de custos que devem atender a várias finalidades. Neste
ponto é que reside a maior utilidade das técnicas de Custos. Os
dados de custos são manipulados de formas diferentes, objetivando emprestar-lhes a significação exigida para a solução dos
mais complexos problemas que enfrenta o administrador.
O custeamento dos planos e das alternativas, das atividades
de distribuição e dos inventários por meio de tipos diferentes de
custos, permitirá ao administrador tomar decisões mais científicas. É sabido que existem fatores qualitativos de extrema importância que devem ser levados em conta ao se tomar uma decisão.
Todavia, mesmo reconhecendo que existem elementos imponderáveis na escolha de uma alternativa, este processo será mais
válido se auxiliado por fatores de natureza quantitativa. Em resumo, a Contabilidade de Custos fornece informações para:
5 HANSEN, Don R. e MOWEN, Maryanne M. Op cit. p. 30
6 Em produção ou compras, cada unidade é adquirida ou fabricada exatamente antes de ser utilizada.
7 Métodos gerenciais de acordo com o qual a organização procura apresentar desempenho excelente em todas as dimensões; o cliente é quem define qualidade.
8 O processo contínuo de acordo com o qual uma organização avalia seus produtos, serviços e atividades contra os melhores níveis de desempenho.
9 Redesenho radical dos processos organizacionais, de maneira a promover melhoria no desempenho.
10 Teoria das Restrições - Método gerencial que focaliza a maximização de lucros mediante a identificação de restrições de capacidade e aumento da capacidade.
11 Redução do tamanho da organização, representada pela diminuição dos níveis hierárquicos e, às vezes, de pessoas.
12 HANSEN, Don R. e MOWEN, Maryanne M. Op cit. p. 37
36
Pensar Contábil
Mai/Jul - 2003
a) A determinação dos custos dos fatores de produção;
b) A determinação dos custos de qualquer natureza;
c) A determinação dos custos dos setores de uma organização;
d) A redução dos custos dos fatores de produção, de qualquer
atividade ou de setores da organização e controle das operações e das atividades de qualquer organização;
e) A administração, quando esta deseja tomar uma decisão,
estabelecer planos ou solucionar problemas especiais;
f) O levantamento dos custos dos desperdícios, do tempo ocioso dos operários, da capacidade ociosa do equipamento, dos
produtos danificados, do trabalho necessário para conserto, dos
serviços de garantia de produtos;
g) A determinação da época em que se deve desfazer de um equipamento, isto é, quando as despesas de manutenção e reparos
ultrapassam os benefícios advindos da utilização do equipamento;
h) A determinação dos custos dos pedidos não satisfeitos;
i) A determinação dos custos dos inventários com a finalidade
de ajudar o cálculo do estoque mínimo, do lote mais econômico
de compra, da época de compra;
j) O estabelecimento dos orçamentos.
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3 - COMO CORTAR CUSTOS
SEM DERRAMAR SANGUE?13
A contabilidade em geral e todos os seus ramos, como a auditoria, contabilidade de custos, perícia contábil, análise econômica e financeira, entre outros importantes e geradores de informações para a empresa, são instrumentos poderosos para o gestor
e a própria continuidade empresarial.
Entretanto, como qualquer mecanismo, pode ser utilizado corretamente ou não e saber manipulá-lo vai decidir sobre
a possibilidade de sucesso ou fracasso na assertividade
informacional. Sua utilidade será questionada quando for
utilizada da maneira incorreta. O problema, portanto, consiste que tais decisões, visando alcançar objetivos determinados, são feitas sem conhecimento suficiente de todo ferramental contábil podendo, assim, causar alguns efeitos
negativos. A seguir serão dispostos algumas decisões encontradas no dia-a-dia da empresa e seus possíveis efeitos
negativos:
OBJETIVO
DECISÕES
FATORES NEGATIVOS SE UTILIZADOS DE MANEIRA ERRADA14
Calcular o
resultado de
cada departamento
Divisão da empresa em unidades de
negócios e cálculo do lucro que cada
unidade gera
Ao transformar unidades de centro de custos ou receita em centros
de lucro ou investimento, cada unidade pode se preocupar em
buscar apenas seus resultados, não se preocupando com a empresa
como um todo, afinal o somatório do melhor de cada não será o
melhor para a empresa.
Atingir metas
a qualquer
custo
Remuneração de executivos e
gerentes atrelados a metas orçamentárias
“Se o gerente apresenta um número que é aprovado e, depois,
ultrapassa esse número, ele fica tentado a esconder o fato, transferindo os custos para outro período”15
Aumentar
resultados e
melhorar
desempenho
Redução de Custos - Parte 01 Visão genérica
“Há muitas companhias em que o crescimento do lucro é muito maior
que o crescimento das receitas, porque eles cortam custos, mas não
geram novas receitas. Sabemos que isso é um jogo que acaba
abruptamente. A empresa chega num ponto que simplesmente não
consegue cortar mais nada. Você não consegue criar mais lucro sem
criar novas receitas”16 .
Aumentar
resultados e
melhorar
desempenho
Redução de Custos - Parte 02 Corte de pessoal
A demissão de pessoas é a mais rápida e mais fácil forma de cortar
custos, entretanto ela pode causar a médio e longo prazo uma
deficiência operacional sentida pelos clientes.
Calcular
custos
unitários
Utilizado para valorar o estoque e
resultado
A visão estrita do custo unitário pode levar a empresa a esquecer do
comportamento de custos, tomando, assim, decisões erradas inerentes a curto prazo, como decisões de aceitar ou rejeitar uma proposta,
concorrência, entre outros.
Pensar
Contábil
A falta de conhecimento quanto aos mecanismos contábeis fazem com que os dados produzidos dentro da empresa sejam meras peças soltas. Então, como cortar custos sem derramar sangue? A resposta bem simplificada desta questão é: conhecendo a
empresa e todos os processos inerentes a evolução patrimonial.
Deve-se esclarecer que o ambiente competitivo da atualidade exige uma estrutura mais enxuta e, por isso, o corte de custos
muitas vezes é necessário, mas o mesmo não deve ser feito,
necessariamente, através de processos “sangrentos”, nem através de fatos ilícitos como está acontecendo com algumas em-
13 COPELAND, Tom. Cutting costs without drawing blood.Harvard Business Review. Set-Oct / 2000. p. 155.
14 Não é propósito comentar que todos os cenários causam problemas para a empresa, mas que os mesmos, se utilizados de maneira inadequada, poderão distorcer a informação a ser gerada.
15 LEVI, William. in SANVICENTE, Antonio Zoratto. As 10 maiores armadilhas do orçamento. HSM Management. N 32, ano 6, maio-junho 2002. p. 140.
16 HAMEL, Gary. O pior inimigo é a tradição. Exame n 737, ano 35 abril/2001. p. 98.
37
Pensar Contábil
Mai/Jul - 2003
presas nos E.U.A. e que provavelmente acontece com várias
outras no mundo inteiro17 .
Entretanto, deve-se saber que o objetivo das empresas não é
cortar custos. Ao se voltar estritamente para a política de redução de custos e tentativa de alavancar lucros sem devido conhecimento do processo como um todo, muitas vezes, o foco empresarial se perde. A forma mais sensata de cortar custos é se tornando mais eficiente. Evita-se, assim, o desperdício dentro do
processo operacional, como será abordado a seguir.
3.1 - Eficiência Empresarial
Todo entendimento é bastante nebuloso dentro do arcabouço, pois há uma imensa confusão entre a diferença de eficiência
e eficácia. Segundo Anthony18 :
“In summary, (...) is efficient if it does things right, and it is
effective if it does the right things”.
Ou seja, eficácia é a relação entre as saídas e seus objetivos,
portanto, se a empresa alcançar seus objetivos da maneira correta, então será eficaz.
Eficiência é a relação existente entre entradas e saídas. Sardinha complementa afirmando que “o retorno sobre o ativo é o
retorno sobre o investimento: sendo, uma medida de performance gerencial. Esta informação permite o investidor conhecer se
a empresa A teve performance superior a B, porque: (1) apesar
de ambas apresentarem o mesmo resultado operacional, os ativos da empresa A são inferiores aos da empresa B; ou, (2) ambas possuem o mesmo investimento, mas a empresa A apresenta um lucro superior ao da empresa B. Este conceito expressa: a
empresa A é mais eficiente, pois exige menos recursos para
obter os mesmos resultados ou com os mesmos recursos obtém
resultados superiores.”19
Conforme pode ser inferido, a eficiência está associada com
o fazer tarefas, processos, ou similares, de forma correta; ou
seja, está próxima ao nível tático ou operacional. Já a eficácia
está associada ao alcance/obtenção de resultados (nível estratégico).
À medida que o administrador se preocupa em fazer corretamente as coisas, ele está se voltando para a eficiência (melhor
utilização dos recursos disponíveis). Porém, quando ele utiliza
os instrumentos e resultados fornecidos por aqueles que executam para avaliar o alcance dos resultados, isto é, se as coisas
bem feitas são as que realmente importam para o alcance dos
objetivos e metas organizacionais, então ele está se voltando
para a eficácia (alcance dos objetivos através dos recursos disponíveis).
Portanto, uma empresa eficaz é aquela capaz de produzir um
resultado desejado afim de alcançar algum objetivo; mas a mesma só será eficiente se, no alcance de tais objetivos, sua produção for feita com o mínimo de perdas, gastos e esforços.
Pensar
Contábil
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4 - CORTAR DESPERDÍCIOS E CAUTERIZAR
UM DOS LADRÕES DE LUCROS
Sendo assim, quando uma empresa não é eficiente, ela passa a ser geradora de desperdícios. Para promover uma melhoria organizacional e tornar-se mais eficiente a empresa deve
promover a redução dos desperdícios dentro da entidade. Para
isso, antes de mais nada, todo o processo dentro da organização deve estar claro, bem definido e estipulado.
Desde a seleção de uma estratégia bem definida, passando
por um plano de contas bem estruturado e a utilização dos mecanismos contábeis são processos essenciais para tornar um
desperdício em condições de ser percebido.
A chave para o crescimento sustentável, neste caso, é focar
em encontrar e eliminar desperdícios valorando cada fato nos
devidos lugares. Sua importância existe porque, segundo McNair20 , “o desperdício expulsa os lucros da firma. Apenas tornando o desperdício visível e trabalhando ativamente no sentido de eliminá-lo, a companhia poderá obter um controle de longa duração sobre seus lucros”.
O problema é que o desperdício está oculto dentro de todo o
processo operacional da empresa. A mensuração do que fizemos de errado (desperdício) é raro, pois o registro atual e a
forma de utilização dos relatórios contábeis acabam, muitas vezes, mesclando o que é bom (trabalho eficiente) com o ruim
(trabalho ineficiente).
A Demonstração de Resultado de Exercício poderia se encaixar neste contexto, pois o uso do D.R.E. muitas vezes mistura
variáveis que poderão confundir o gestor no momento da tomada de decisão, distorcendo, assim, a geração de informação.
Para isso é necessário entender os elementos inerentes ao
D.R.E., o desperdício e sua classificação.
4.1 - Elementos Básicos
Para que o desperdício possa ser localizado e evidenciado,
deve-se definir de maneira precisa os termos e elementos básicos a serem abordados, como será visto a seguir:
a) Custo das Mercadorias Vendidas e Despesas Operacionais - Gastos relativos a bens ou serviços consumidos direta ou
indiretamente para a obtenção de receita. São os gastos que
agregam valor ao produto ou que não agregam valor, mas são
necessários. Ou seja, são os valores econômicos de recursos
necessários para se fabricar produtos, fornecer serviços ao cliente ou para sustentar a organização;
b) Despesa Não Operacional - Eventos e transações de caráter significativamente diferente das atividades típicas ou usuais
da entidade. São decréscimos pela participação de transações
periféricas ou incidentais de uma entidade, e em outras transações ou outros eventos e circunstâncias, afetando a entidade
durante um período;
c) Desperdício - Valor de todas as atividades utilizadas de
17 Os casos mencionados são da WorldCom, Xerox, Enron entre outras que inflacionaram e fraudaram resultados e balanços.
18 ANTHONY, Robert N. e GOVINDARAJAN, Vijay. Management control system. 8a ed. Irwin, 1995, p. 111
19 SARDINHA, Carlos José. Apostila de formação de preços. FGV/RJ, 2002. p.120.
20 MCNAIR, Carol J. Maximizando o lucro final - alto desempenho em todas as linhas do “lucro e perdas”. São Paulo: Makron Books, 2000. p. XVI
38
Pensar Contábil
Mai/Jul - 2003
forma ineficiente ou pelas quais os clientes não estão dispostos
a pagar. Torna-se, portanto, o ladrão de lucro da empresa. São:
Máquinas ociosas, pessoal subutilizado, material desnecessário, filas, retrabalhos, redundâncias operacionais, variações excessivas, ajustes, superprodução, etc.
Ou seja, dentro da estrutura empresarial, há dois tipos de
esforços: aqueles que agregam valor ao bem, que compreende
as atividades que realmente aumentam o valor do produto (normalmente condicionadas às atividades de transformação) e
aqueles que não agregam valor ao bem, mas proporcionam
suporte para o trabalho efetivo.
Os desperdícios não adicionam valor aos produtos e também
não são necessários ao trabalho efetivo. Algumas empresas,
inclusive, estão utilizando tal para mensurar itens que não adicionam valor ao produto no enfoque do consumidor. Dependendo
da percepção que o cliente tenha dos bens ou serviços, algumas características dos mesmos podem estar, inclusive, diminuindo o valor dos produtos.
Portanto, ao se estruturar e manipular os demonstrativos contábeis de forma a fazer submergir os desperdícios, focando, assim, em sua eliminação ou redução, a empresa se tornará mais
eficiente. Enquanto não fizer isso, sua miopia contábil poderá
levá-la a descontinuidade.
Percebe-se que um desperdício poderia ser classificado como
Despesa não Operacional, entretanto, como não há a devida
noção da importância informativa da localização e devida separabilidade dos desperdícios, os mesmos acabam configurando
os custos e despesas.
4.1.1 - Tipos de Desperdícios
A partir dos conhecimentos de Shingo21 e McNair22 pode-se
classificar:
a) Desperdícios de superprodução - Refere-se à produção
de itens acima do necessário ou antecipadamente. Com isso,
há um aumento dos estoques, podendo mascarar imperfeições
do processo. Para ser completamente eliminado, a empresa deve
produzir uma quantidade próxima ao necessário;
b) Desperdícios por transporte - Refere-se às atividades de
movimentação de materiais. Sua eliminação ou redução está
atrelada a reorganização física da fábrica;
c) Desperdícios no processamento - Correlacionados às atividades de transformações desnecessárias para que o produto
adquira suas características básicas de qualidade, ou seja, consistem em se trabalhar fazendo peças, detalhes ou complexidades produtivas excessivas. Além disso, define-se que parte deste desperdício está intimamente relacionada com a percepção
que o cliente tem do produto. Se o bem ou serviço possuem
peças e partes que são dispensáveis do ponto de vista do consumidor, então os custos dos mesmos não agregam valor para o
produto final e, portanto, são gastos que não visam a geração de
receita. Sua eliminação depende de técnicas de análise do valor de produto e de processo, bem como um pós venda bem
estruturado;
d) Desperdícios por fabricação de produtos defeituosos Relacionado à produção de itens fora das especificações de
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
qualidade. Este talvez seja o mais comum e o mais fácil de
ser identificado. Sua eliminação depende de uma confiabilidade no processo e na rápida identificação e solução de problemas;
e) Desperdícios no movimento - Relaciona-se à movimentação inútil na consecução das atividades. Sua eliminação está
no esforço de estabelecer padrões de desempenho, bem como
o de atingir tais metas;
f) Desperdícios por espera - Formados pela capacidade ociosa, ou seja, trabalhadores e máquinas paradas. Seus principais
geradores são: elevado tempo de preparação, ajustes necessários, mudanças de layout da linha de produção, falta de sincronização da produção e falhas não previstas no sistema produtivo.
Devem ser através da redução o tempo de processamento, tempo de ajustes, filas, balanceamento da produção e aumento da
confiabilidade do sistema;
g) Desperdícios de estoques - Gerado basicamente pela superprodução ou falhas no processo que podem resultar em gargalos e, consequentemente, em excesso de estoques em processo. Para sua eliminação deve ser localizado tais gargalos,
bem como adequação da produção à necessidade do mercado;
h) Desperdícios de matéria-prima - Relacionados ao desperdício de matérias-primas despendidas de maneira anormal ou
acima do estritamente necessário à confecção do produto. Confunde-se com desperdício de processamento, entretanto este é
mais fácil de ser localizado. Para isso localiza-se variação excessiva do padrão estabelecido;
i) Desperdícios de capacidade humana - São aqueles muitas
vezes associadas em outros processos, mas que estão relacionados ao conhecimento dos funcionários. Existem a partir de
treinamentos inadequados, funcionários sem poder de decisão
ou de flexibilidade, imperícia e erros no processo, ou até comunicações ineficientes transmitidas de cima para baixo ou vice
versa. Sua eliminação deve estar condicionada a uma gerência
de RH bem estruturada;
j) Outros desperdícios - Há ainda uma gama de desperdícios
não alocados em nenhum anterior, por ser inclusive possível
alocá-los em todos. São aqueles como redundância operacional, burocratização, erros de remessa, promessas descumpridas, insatisfação de clientes, entregas atrasadas, retrabalhos,
inspeções para tentar apurar falhas não encontradas, paralisações não esperadas, e qualquer outro gasto que não visa receita e reduz o lucro da organização.
Muito em voga a tentativa da empresa em minimizar ou
eliminar por completo os desperdícios na busca pela eficiência empresarial. Entretanto, percebe-se que, muitas vezes, a
eliminação de um desperdício causa a maximização de outro. Assim como acontece no estudo do LEC (Lote Econômico
de Compra), que, por exemplo, a escolha do mínimo custo de
estocagem causa a maximização do custo de pedido, então a
empresa irá calcular um ponto onde o custo será mínimo. O
mesmo ocorre com desperdícios, como é o caso de superprodução e por espera. Caso a empresa elimine por completo a
ociosidade, pode acarretar maximização de produção e de
custo de estoques, causados por esta superprodução.
Pensar
Contábil
21 SHINGO, Shigeo. Study of Toyota production system from industrial engineering viewpoint. Tokyo, Japan: Japan Manegement Association, 1981 in BORNIA, Antonio Cezar. Análise gerencial de custos: aplicação
eme empresas modernas. São Paulo: Bookman, 2002. p. 31.
22 MCNAIR, Carol J. Op cit. p. 07
39
Pensar Contábil
Mai/Jul - 2003
4.2 - Otimizar a utilização do D.R.E.
A partir destas definições podermos reformular o D.R.E. de
acordo com nossas expectativas, com intuito de valorar a demonstração e evidenciação. Lembre-se que podem existir várias “versões” do mesmo relatório para usuários diferentes, ou
seja, esta reformulação pode ser naturalmente feita, desde que
seja gerencial.
Os valores apresentados no relatório do Demonstrativo de
Resultados, de acordo com a Contabilidade Financeira, utilizam
o método da competência. Esse método tem por objetivo apropriar os gastos que foram necessários à organização para obter
a receita que está sendo apresentada. De uma forma geral, o
Demonstrativo de Resultado empregado na Contabilidade Financeira tem a seguinte estrutura de informação:
DEMONSTRAÇÃO DO RESULTADO DO EXERCÍCIO
Receita Operacional Bruta (de vendas ou serviços)
$
(-) Deduções
$
(=) Receita Operacional Líquida
$
(-) Custo das Mercadorias /
Produtos Vendidos (CMV / CPV )
$
(=) Lucro Operacional Bruto
$
(-) Despesas Operacionais
(comerciais, administrativas, gerais)
$
(=) Lucro Operacional Líquido
$
(+ / -) Resultados Não Operacionais
$
(=) Lucro Antes do Imposto de Renda
$
$
(=) LUCRO ou PREJUÍZO
Pensar
Contábil
LÍQUIDO DO EXERCÍCIO
Custo Variável
Por unidade
MAD
MOD
Outros
Nunca é demais recordar que a Demonstração do Resultado
do Exercício possui, como objetivo, informar aos usuários das
demonstrações contábeis uma série de informações acerca de
seus objetivos. Algumas delas: a rentabilidade da empresa no
decorrer do tempo, a margem que cada processo etapa do processo gera, o resultado do período como medida de desempenho das atividades da empresa, o peso de cada rubrica frente à
receita, o comportamento de cada linha ao longo do tempo, entre outras.
Nesse sentido, o contador deve evitar processos sofisticados
que interfiram no entendimento da informação contábil. As Demonstrações de Resultado dos Exercícios deverão informar a
tendência do empreendimento. Por exemplo, saber uma possível correlação existente entre Receita e Custo dos Produtos
Vendidos, evidenciando ou não uma eficiência; o peso das despesas financeiras que impactam o resultado e o risco inerente à
empresa; uma possível relação entre o preço cobrado e o lucro
atingido, de forma a entender o comportamento do mercado e
aproveitar uma maior sinergia deste conhecimento.
Dentro deste relatório, pode-se visualizar melhor os desperdícios ocorridos ao expurgá-los das classificações, onde normalmente são inseridas (Custo das Mercadorias / Despesas
Operacionais), lançando-os em despesas não operacionais. Isso
agregaria mais informação ao gestor, indicando com maior precisão e assertividade, onde a empresa poderá se esforçar para
melhorar resultados, inclusive em índices e análises. Com o
exemplo a seguir, será exposta a melhoria informacional.
4.3 - Exemplo
Uma empresa chamada Lost’n’notfound tentava se encontrar
dentro do próprio processo de geração de valor. Seu único produto, o energetion, tem um preço de $ 250,00 por unidade. Apesar do mercado absorver 1.000 unidades por mês, sua capacidade é de 2.000 unidade / mês. Seu contador informou, ainda,
os seguintes dados:
(-) Contribuição Social / Provisão
para Imposto de Renda
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$
$ 110,00
$ 80,00
$ 20,00
$ 10,00
Custo Fixo
Despesa Variável
Despesa Fixa
Custo de Estocagem
$ 80.000,00
$ 30,00 / unid
$ 25.000,00
$ 45,00 / unid
Em uma melhor apuração, estipulou-se e apurou-se ainda:
Eficiência
5,0 Kg / unid
$ 16,00 / Kg
MAD
10,0 h / unid
$ 2,00 / hora
MOD
$ 80,00 / unid
$ 20,00 / unid
Dados dos fatos ocorridos
5,1 Kg / unid
$ 16,30 / Kg
MAD
40
$ 2,15 / hora
MOD
$ 83,13 / unid
Produção
10,3 h / unid
1.200 unidades
$ 22,04 / unid
Pensar Contábil
Mai/Jul - 2003
O seguinte D.R.E. poderia ser montado a partir das informações acima:
Receita
$
250.000,00
(-) C.M.V.
$
181.834,17
= Lucro Bruto
$
68.165,83
(-) Despesas
$
64.000,00
= Lucro Operacional
$
4.165,83
(-) Result Não Oper
$
= LAIR
$
0,00
4.165,83
A fim de tornar este relatório mais condizente com a funcionalidade contábil bem como gerador de informação, remodela-se
o D.R.E. estruturando-o da seguinte maneira:
Receita
$
250.000,00
Custos Variáveis
$
110.000,00
Despesas Variáveis
$
30.000,00
Margem de Contribuição
$
110.000,00
Custos Fixos
$
40.000,00
Despesas Fixas
$
25.000,00
Lucro Operacional
$
45.000,00
Ociosidade
$
26.666,67
Estocagem
$
9.000,00
Variação MOD
$
2.037,50
Variação MAD
$
3.130,00
$
4.165,83
Result Não Oper
LAIR
Percebe-se que o LAIR dos dois relatórios não possui diferença, entretanto a análise a ser formulada é mais detalhada. A
relevância da informação gerencial amplia-se, visto que cada
desperdício necessita uma ação específica e “a quantificação
dos mesmos permite a formação de prioridades para a atuação
gerencial no combate aos desperdícios”23 .
Isso agregaria ao gestor mais valor à importância do sistema
contábil como fonte de informação, pois garantiria à sua tomada
de decisão uma maior assertividade e certeza.
5 - CONCLUSÃO
O controle organizacional é imprescindível ao sucesso do
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empreendimento. Seu principal mecanismo, a Contabilidade,
bem como todas suas engrenagens, fazem com que haja uma
maior precisão na identificação dos problemas internos de uma
organização.
Como exemplo, cita-se a Tigre que “sabe exatamente quanto
custa cada novo microcomputador, cada funcionário da assistência técnica, cada máquina que processa as informações corporativas. Com essas informações ele conseguiu um ganho de
eficiência notável”24 . Outro exemplo é a Basf que “implementou
seu sistema integrado de gestão, ou ERP, dentro do prazo e a
um custo 30 % inferior”25 resultado de cobranças e cumprimento
de custos e prazos.
“A era da informação criou mercados hipercompetitivos. Os
compradores estão mais informados a respeito das ofertas dos
concorrentes, mais conscientes em relação ao preço e mais exigentes quanto às características dos produtos e serviços, do
que em qualquer outra época e em qualquer outro mercado.”26
Por isso, no mundo turbulento dos negócios, há exigências das
empresas tornarem-se enxutas. A partir disso, o corte de custos
muitas vezes é implementado, em que a demissão de pessoas
passa a ser um mecanismo atraente por proporcionar resultados a curto prazo.
Todavia, a redução de custos deve ser realizada de maneira coerente e inteligente atrelado ao enfoque estratégico, bem como ao controle proporcionado pela Contabilidade Gerencial, evitando, portanto, que um possível corte de
custos possa ser feito sem que ocorra algum revés inesperado ou afete negativamente o cenário de médio e longo
prazos. Ou seja, muitas vezes o corte de custos pode e
deve ser realizado, mas decisões ineficazes podem resultar em processos operacionais ineficientes, chocando-se
diretamente com a performance estrutural e econômica das
empresas.
Com a Contabilidade gerencial, através de mecanismos
eficientes da gestão orçamentária, o processo de redução de
custos torna-se mais preciso, proporcionando, assim, otimização dos gastos empresariais, efetivando-se numa profícua
ferramenta para avaliação de desempenho e maximização
de resultado.
Só que para sua melhor utilização o gestor pode melhor
utilizar os relatórios existentes, como a D.R.E., a fim de
saber localizar e evidenciar os problemas, como no caso
exemplificado, os desperdícios. O objetivo deste trabalho
foi mostrar que os relatórios contábeis são de imensa importância para os gestores que buscam mensurar as variáveis que podem levar a empresa a descontinuidade, afinal
tudo aquilo que não é medido, controlado ou evidenciado,
não é gerenciado.
Pensar
Contábil
23 BORNIA, Antonio Cezar. Op cit. p. 65.
24 TEIXEIRA JUNIOR, Sérgio. Chega de desperdício. Revista Exame. Ed 760, ano 36, n 4, fev/2002. p. 34
25 TEIXEIRA JUNIOR, Sérgio. Op cit. p. 35
26 KOTLER, Philip, JAIN, Dipak e MAESINCEE, Suvit. Marketing em ação. Rio de Janeiro: Campus, 2002. p.06
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Pensar Contábil
Mai/Jul - 2003
Conselho Regional de Contabilidade do RJ
5 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANTHONY, Robert N. Contabilidade gerencial. Tradução de Management accounting principles, por Luiz Aparecido Caruso. São Paulo: Atlas, 1975.
BORNIA, Antonio Cezar. Análise gerencial de custos: aplicação eme empresas modernas. São Paulo: Bookman, 2002.
COPELAND, Tom. Cutting costs without drawing blood.Harvard Business Review. Set-Oct / 2000.
DIEGUEZ, Consuelo. O futuro está em jogo. Revista Exame. Ed 760, ano 36, n 4, fev/2002.
HAMEL, Gary. O pior inimigo é a tradição. Exame n 737, ano 35, abril/2001.
HANSEN, Don R. e MOWEN, Maryanne M. Gestão de custos. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2001.
HORNGREN, Charles T., et al. Contabilidade de custos. Tradução de “Cost accounting” 9 ed., por José Luiz Paravato. 9 ed.
Rio de Janeiro: LTC, 2000.
KOTLER, Philip, JAIN, Dipak e MAESINCEE, Suvit. Marketing em ação. Rio de Janeiro: Campus, 2002.
MCNAIR, Carol J. Maximizando o lucro final - alto desempenho em todas as linhas do “lucro e perdas”. São Paulo: Makron
Books, 2000.
NAGLE, Thomas. Cuidado com o preço. HSM Management, n 21. Julho-Agosto 2000.
SANVICENTE, Antonio Zoratto. As 10 maiores armadilhas do orçamento. HSM Management. N 32, ano 6, maio-junho 2002
TAVARES, Mauro Calixta. Gestão estratégica. São Paulo: Atlas, 2000.
TEIXEIRA JUNIOR, Sérgio. Chega de desperdício. Revista Exame. Ed 760, ano 36, n 4, fev/2002.
EDUCAÇÃO
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CONTINUADA
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Pensar
Contábil
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5º colocado no Prêmio Geraldo de La Rocque
GESTÃO DOS
CUSTOS DA
QUALIDADE
AMBIENTAL
1 – INTRODUÇÃO
O novo contexto econômico caracteriza-se por uma rígida
postura dos clientes, voltada à expectativa de interagir com organizações que sejam éticas, com boa imagem institucional no
mercado, e que atuem de forma ecologicamente responsável.
Diante deste novo cenário, as organizações necessitam direcionar suas estratégias para a variável ambiental, a fim de
obter vantagem competitiva. As estratégias da empresa devem
levar em conta, a preocupação com gastos relevantes por natureza e volume, principalmente em função da relação custo/benefício. Estes gastos tornam-se relevantes para a organização,
bem como para a qualidade de vida da população atual e das
gerações futuras.
Nestas condições, um gerenciamento dessa variável exige
ferramentas gerenciais para o controle dos custos e despesas.
Isto exposto, se faz necessário que os gastos de natureza ambiental devam ser controlados e gerenciados continuamente. Para
isso, as empresas podem adotar sistemas de custos da qualidade ambiental, a fim de apurar os seus números que, na maioria
das vezes, estão distorcidos por outros custos da empresa.
2 – MEIO AMBIENTE E CUSTOS
DA QUALIDADE AMBIENTAL
A busca pela preservação do meio ambiente tomou forma e
começou sensibilizar a sociedade e as autoridades.
Hoje, após anos de intensas discussões, conclui-se que a
ausência de crescimento ou desenvolvimento é nociva ao meio
ambiente e que a grande questão atual é torná-lo sustentável.
De acordo com Alves (2001), a variável ambiental é um aspecto significativo a ser considerado e tratado na estratégia das
organizações. A gestão ambiental, por sua vez, deve ser gerida
eficientemente, monitorando-se os custos de controle, a poluição e os custos das falhas da falta de controle de gestão.
Moura (2000) diz que os custos da qualidade ambiental devem ser utilizados na avaliação e melhoria da posição de competitividade das companhias, com relação aos seus concorrentes.
Daí a sua importância. Enfatiza também que a gestão de custos
da qualidade ambiental é uma ferramenta fundamental para o
gerenciamento do sistema de gestão ambiental, pois fornece ele-
Maria Elisabeth Pereira Kraemer
Contadora, CRC/SC nº 11.170, Professora e Membro da equipe de Ensino e Avaliação na Pró-Reitoria de Ensino da UNIVALI –
Universidade do Vale do Itajaí. Mestre em Relações Econômicas
Sociais e Internacionais pela Universidade do Minho-Portugal. Doutoranda em Ciências Empresariais pela Universidade do Museu
Social da Argentina. Membro da Corrente Científica Brasileira do
Neopatrimonialismo e da ACIN – Associação Científica Internacional Neopatrimonialista.
mentos para a alta administração das empresas à tomada de
decisões, direcionando a melhoria do desempenho ambiental.
Desse modo, o gerenciamento ambiental passa a ser um fator estratégico que a alta administração das organizações deve
analisar.
A Gestão Ambiental inclui uma série de atividades que devem
ser administradas, tais como: formular estratégias de administração do meio ambiente, assegurar que a empresa esteja em conformidade com as leis ambientais, implementar programa de prevenção à poluição, gerir instrumentos de correção de danos ao
meio ambiente, adequar os produtos às especificações ecológicas, além de monitorar o programa ambiental da empresa.
Além dessa ferramenta, a problemática ambiental envolve
também o gerenciamento dos assuntos pertinentes ao meio
ambiente, por meio de sistemas de gestão ambiental, da busca
pelo desenvolvimento sustentável, da análise do ciclo de vida
dos produtos e da questão dos passivos ambientais.
Pensar
Contábil
3 – GESTÃO AMBIENTAL
A nova consciência ambiental, surgida no bojo das transformações culturais que ocorreram nas décadas de 60 e 70, ganhou
dimensão e situou o meio ambiente como um dos princípios fundamentais do homem moderno. Nos anos 80, os gastos com proteção ambiental começaram a ser vistos pelas empresas líderes
não primordialmente como custos, mas como investimentos no
futuro e, paradoxalmente, como vantagem competitiva.
A inclusão da proteção do ambiente entre os objetivos da
organização moderna amplia substancialmente todo o conceito
de administração. Administradores, executivos e empresários
43
Pensar Contábil
Mai/Jul - 2003
introduziram em suas empresas programas de reciclagem, medidas para poupar energia e outras inovações ecológicas. Essas práticas difundiram-se rapidamente, e em breve vários pioneiros dos negócios desenvolveram sistemas abrangentes de
administração de cunho ecológico.
Esse novo paradigma precisa ser acompanhado por uma
mudança de valores, passando da expansão para a conservação, da quantidade para a qualidade, da denominação para a
parceria.
A gestão ambiental demanda uma dimensão ética, cujas principais motivações são a observância das leis e a melhoria da
imagem da organização. É motivada por uma ética ecológica e
por uma preocupação com o bem-estar das futuras gerações.
Não questiona a ideologia do crescimento econômico, que é a
principal força motriz das atuais políticas econômicas e, tragicamente, da destruição do ambiente global.
Assim, para que uma empresa passe a realmente trabalhar
com gestão ambiental deve, inevitavelmente, passar por uma
mudança em sua cultura empresarial; por uma revisão de seus
paradigmas.
4 - DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
O desenvolvimento sustentável é aquele que atende às
necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem a suas próprias necessidades. Ele contém dois conceitos-chave: 1) o conceito de “necessidades”, sobretudo as necessidades essenciais dos pobres no mundo, que devem receber a máxima
prioridade; 2) a noção das limitações que o estágio da tecnologia e da organização social impõe ao meio ambiente,
impedindo-o de atender às necessidades presentes e futuras.
Além disso, desenvolvimento sustentável introduz uma dimensão ética e política que considere o desenvolvimento como
um processo de mudança social, com conseqüente democratização do acesso aos recursos naturais e distribuição eqüitativa
dos custos e benefícios do desenvolvimento.
Para a existência de uma sociedade sustentável, Meyer (2000)
diz que é necessária a sustentabilidade ambiental, social e política, constituindo-se em alinhamentos e ajustes ao longo do
processo, a fim de se buscar um estágio final equilibrado.
O desenvolvimento sustentável, além de equidade social e equilíbrio ecológico, segundo Donaire (1999), apresenta, como terceira vertente principal, a questão do desenvolvimento econômico. Induz um espírito de responsabilidade comum como processo de mudança no qual a exploração de recursos materiais, os investimentos financeiros e as rotas do desenvolvimento tecnológico deverão
adquirir sentidos harmoniosos. Neste sentido, o desenvolvimento da tecnologia deverá ser orientado para metas de
equilíbrio com a natureza e de incremento da capacidade
de inovação dos países em desenvolvimento, e o progresso será entendido como fruto de maior riqueza, maior benefício social eqüitativo e equilíbrio ecológico.
Então para solucionarmos este conflito, temos que passar
por uma mudança de valores e de orientação nos sistemas produtivos das organizações e da sociedade, com a produção e o
consumo, visando à minimização de danos e impactos ambientais negativos normalmente causados
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5 - CICLO DE VIDA DOS PRODUTOS
O ciclo de vida do produto tem sido estudado em ampla gama
de contextos organizacionais, influenciando as relações comerciais entre países exportadores e importadores, tendo como preocupações de caráter ambiental aspectos que compreendem
desde o processo produtivo e seus produtos, o uso, até o posterior descarte.
A série ISO 14000, na organização do seu comitê técnico TC207 – Gestão Ambiental, encarregado da elaboração das normas e guias internacionais para o SGA – Sistema de Gerenciamento Ambiental, Nahuz (1995), criou o subcomitê SC-5 para
Avaliação do Ciclo de Vida, considerando os impactos causados ao meio ambiente desde a extração da matéria-prima usada na geração do produto, e por todo processo produtivo, levando em conta as emissões de efluentes, até o descarte do produto com sua reintegração ao meio ambiente.
A avaliação do ciclo de vida do produto é definida por Chehebe (1998) como uma técnica para avaliação dos aspectos ambientais e dos impactos potenciais, associados a um produto, compreendendo etapas que vão desde a retida da natureza das
matérias-primas elementares que entram no sistema produtivo
(berço) à disposição final (túmulo).
O referido autor diz que a análise do ciclo de vida pode ser
utilizada com um enfoque gerencial para vários propósitos, pois
ajuda no seguinte:
- a identificar oportunidades de melhoramentos dos aspectos
ambientais, considerando as várias fases de um sistema
de produção.
- na tomada de decisão, por exemplo, no estabelecimento de
prioridades ou durante o projeto de produtos e processos,
podendo levar à conclusão de que a questão ambiental
mais importante para uma determinada empresa pode estar
relacionada ao uso de seu produto, e não as suas matérias-primas ou ao processo produtivo.
- como parte do processo para avaliar a seleção de componentes feitos de diferentes materiais.
- Na avaliação da performance ambiental.
Na realidade, a análise do ciclo de vida propõe-se a responder às questões e às dúvidas mais comuns quando da concepção de um produto. De acordo com Alves (2001): que embalagens causam menos danos ao meio ambiente: retornáveis ou
recicláveis? Quais dessas alternativas são mais viáveis economicamente? Essas e outras questões são importantes, pois as
empresas são responsáveis pelo produto até a disposição final,
conforme a legislação brasileira atual.
6 – PASSIVO AMBIENTAL
O passivo ambiental são as obrigações contraídas pela empresa perante terceiros, que têm como origem um gasto ambiental (ativos, custos, despesas etc). Assim, segundo Ribeiro &
Gonçalves (2002), constituem-se obrigações ambientais aquelas decorrentes de compras de ativos ambientais, de elementos
consumidos durante o processo de produção e aqueles provenientes de penalidades impostas às organizações por infração
à legislação ambiental, por danos ao meio ambiente e à propriedade de terceiros.
Com a dinâmica dos negócios, os passivos ambientais devem ser tratados com muita atenção e devem fazer parte da
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tomada de decisões das organizações na aquisição de outras
empresas, na formação de cluster, nas fusões, nas análises de
riscos do negócio, na venda da empresa e na concepção de
novos produtos, dentre outras transações pertinentes ao assunto.
Para a ONU apud Ribeiro (1998), existem três tipos de obrigações decorrentes do passivo ambiental:
1) - Legais – são as provenientes de instrumentos legais.
2) Construtivas – são aquelas que a empresa propõe-se a
cumprir espontaneamente, excedendo as exigências legais.
3) Justas (equitable) – refletem a consciência de responsabilidade social; ou seja, a empresa cumpre em razão de fatores
éticos e morais.
Alves (2001) ressalta que a variável custos da qualidade
ambiental decorrente de gastos para manter o padrão de emissão dos resíduos, em conformidade com as leis que regulamentam a questão ambiental no Brasil, bem como as despesas originadas pela falta de controle, como os passivos ambientais e os
demais custos envolvidos (dentre eles: ciclo de vida de produtos, manutenção dos sistemas de gestão e custos dos estudos
de novas tecnologias menos impactantes ao meio ambiente),
deverão fazer parte do controle de custos gerenciais das organizações.
7 - CUSTOS DA QUALIDADE
Com o propósito de participar de forma efetiva neste mercado
com tendências à globalização, os fatores de produção sempre
estiveram constituindo o núcleo de preocupações dos gestores
empresarias, tanto no contexto de ambiente produtivo em si,
como também no que diz respeito à dinamicidade de fatores
externos de qualquer forma, associados aos núcleos de transformação das empresas.
Os conceitos de custos da qualidade passaram a ser disseminados com a bibliografia que tratava do controle da qualidade
e buscava oferecer suporte às ações de melhorias, além de
tentar medir a qualidade das empresas. A partir daí, surgem
conceitos iniciais de custos da qualidade, buscando oferecer
suporte às ações de melhoria e como forma de medir a qualidade das empresas.
Para SÁ (1995), custo da qualidade é a aplicação de capital
no sentido de oferecer o produto que se elabora um caráter
distintivo, que lhe atribui condições para a plena satisfação do
cliente, quer quanto à utilização, quer quanto ao preço.
Os custos da qualidade são um importante indicativo para
avaliar quanto às empresas estão perdendo ou deixando de
ganhar por não estarem produzindo com qualidade. Então custos da qualidade buscam identificar e apontar as falhas existentes, assim como os custos para se prevenir problemas decorrentes dessas falhas.
Esses custos são classificados em dois grandes grupos: os
Custos do Controle e os Custos de Falhas no Controle. Os Custos do Controle se subdividem em Prevenção e Avaliação e no
caso dos Custos de Falhas no Controle em Custos de Falhas
Internas e Custos de Falhas Externas. Abaixo, será detalhado
cada custo de acordo Shank & Govindarajan (1995).
Custos de Prevenção – A soma de todos os custos associados a medidas tomadas para planejar o processo de modo a
garantir que não ocorrerão defeitos. Por exemplo, projetar um
processo de fabricação sem defeitos, um projeto de produto es-
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tável, treinamento e desenvolvimento de empregado, etc.
Custos de Avaliação – Aqueles custos associados à medição do nível de qualidade obtido pelo sistema ou, em outras
palavras, custos associados à inspeção para garantir que as
exigências do cliente sejam atendidas. Por exemplo, inspeção e
teste de protótipo, inspeção e teste de recebimento, inspeção
durante o processo, e auditoria de qualidade em produtos acabados.
Custos de Falha Interna – Aqueles custos incorridos para
corrigir a produção defeituosa antes que ela chegue ao cliente.
Por exemplo, refugo, retrabalho, reparo, reprojeto, reinspeção
de retrabalho, paralisação devido a defeitos e custo de oportunidade de vendas perdidas causadas por ter produção insuficiente para vender.
Custos de Falha Externa – Aqueles custos associados à
entrega de produtos com defeito ao cliente. Por exemplo, ajustes de garantia, investigação de defeitos, devoluções, cancelamentos, processos judiciais e perda da boa vontade do cliente.
8 - COMO MEDIR OS CUSTOS DA QUALIDADE
Segundo Coral (1996), existem dois enfoques para se medir
os custos da qualidade: o enfoque tradicional e uma nova tendência que se baseia na utilização de valor agregado.
No enfoque tradicional, os custos da qualidade são obtidos
através da identificação de itens de prevenção, avaliação, falha
interna e falhas externos em uma organização. Os cálculos dos
custos são retirados de relatórios contábeis e através de ajustes
em sistemas de custos tradicionais, levando aos mesmos problemas dos sistemas tradicionais de custos, uma vez que os
itens dos custos da qualidade são separados em grandes blocos de custos e não relacionam tais itens as suas causas.
Neste enfoque, adiciona-se um relatório financeiro de falhas,
que serve para medir a qualidade em uma empresa, porém não
aponta as causas de falhas, não possuindo efeito significativo
no gerenciamento da qualidade.
Já no enfoque da utilização do valor agregado aos custos da
qualidade, relaciona os itens de prevenção e falhas com as atividades que agregam valor para o consumidor. Portanto o gerenciamento da qualidade baseia-se na eliminação de atividades que não agregam valor e que resultam em custos desnecessários para a organização. Nesta metodologia, os custos da
qualidade são obtidos através de sistemas de custeio baseados
em atividades.
Para Juran & Gryna, apud Alves (2001), a mensuração dos
custos da qualidade é vista pelos administradores como a forma
de se atender a vários objetivos ou questões, dentre os quais se
destacam:
-aumentar a produtividade através da qualidade;
-avaliar os programas de qualidade por intermédio de quantificações físicas e monetárias;
-conhecer na realidade o quanto à empresa está perdendo pela
falta de qualidade;
-revelar o impacto financeiro das decisões de melhoria;
-tornar a qualidade um dos objetivos estratégicos da organização;
-identificar as oportunidades para diminuir a insatisfação dos
clientes;
-identificar as principais oportunidades para a redução dos custos;
-expandir os controles orçamentários e de custos da qualidade; e
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-estimular o aperfeiçoamento da qualidade por meio de divulgação.
Verifica-se, portanto, diante do exposto que os conceitos de
custos da qualidade são aplicáveis também aos custos da qualidade ambiental.
9 – CUSTOS DA QUALIDADE AMBIENTAL
Os custos de qualidade, na realidade, buscam identificar e
apontar as falhas existentes, bem como os custos para se prevenir problemas decorrentes destas falhas.
Para Bovenberg & Goulder, apud Alves (2001) a interface
entre a competitividade e a preservação do meio ambiente dáse por meio da gestão dos custos da qualidade ambiental.
As empresas, para se adequarem à nova postura de preservação ambiental e buscarem uma política de qualidade ambiental na gestão da sua organização, devem se preocupar também
com os custos da relação meio ambiente e meio empresarial,
destacando estes custos dos demais.
Neste sentido, Campos (1996) diz, que o meio empresarial
deverá se preocupar com dois aspectos relacionados aos seus
custos da qualidade ambiental: o primeiro, e mais complexo,
buscar formas de considerar os custos tratados, até então, como
“externalidades”, ou seja, internalizá-los; o segundo, identificar
e obter, para em seguida avaliar, os custos ambientais, sejam
tanto os relacionados aos processos empresariais, quanto os
relacionados aos processos produtivos e a apuração destes
custos tornar-se uma ferramenta imprescindível ao direcionamento das tomadas de decisões.
Para melhor entendimento dos conceitos dos custos da qualidade ambiental e da sua padronização, a GEMI, Global Environmental Management Initiative, e a USEPA, U.S. Environmental Protection Agency apud Alves (2001), atribuíram quatro categorias de custos da qualidade ambiental e sugerem a seguinte
classificação:
- Custos Convencionais: incluem os custos que, na maior
parte das vezes, recebem atenção especial na contabilidade
gerencial, tais como: investimentos em equipamentos, matériaprima, mão-de-obra e materiais indiretos. Incluem todos custos
associados aos aspectos ambientais tangíveis de tais processos e atividades. Seu controle conduz ao aumento da eficiência
produtiva, por eliminar o desperdício.
- Custos Potencialmente Ocultos: são aqueles ligados a
todas as atividades necessárias para que a empresa se mantenha em conformidade com as leis e outras políticas ambientais
inerentes à própria organização. Alves (2001) dá como exemplo
os custos com o monitoramento ambiental, treinamento e relatório ambiental.
- Custos com Contingências: são os gastos que podem ou
não ocorrer devido a futuros custos de regulamentações, multas
e penalidades, gastos com recuperação de recursos naturais
danificados, etc. Se o fato gerador de tais custos é conhecido
antecipadamente, possibilita à empresa definir ações a fim de
evitá-los.
- Custos de Imagem e Relacionamento: envolvem a percepção e o relacionamento que os acionistas, comunidade e
governo desenvolvem com a companhia. Para Alves (2001),
apesar de difícil quantificação, o desempenho ambiental pode
melhorar ou prejudicar o relacionamento da empresa com terceiros, e os impactos gerados podem ter custos e/ou implicações financeiras.
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Os custos da qualidade ambiental para Moura (2000), referem-se à definição, criação e montagem de um sistema de controle da qualidade ambiental, bem como da avaliação, de conformidade com os objetivos e metas derivados da política ambiental, de normas legais e outros compromissos assumidos pela
empresa, além de outros custos associados com as conseqüências de falhas ambientais, acidentes e incidentes.
Para se ter um efetivo controle dos investimentos e gastos na
área ambiental, Alves (2001) diz que o sistema de custos da
qualidade ambiental pode auxiliar, sobremaneira, a competitividade e sobrevivência das organizações, principalmente por
apontar deficiências na gestão da qualidade ambiental, podendo construir para as ações de melhoria contínua no desempenho ambiental da empresa.
Para implantação de um sistema de custos da qualidade
ambiental Moura (2000) segue os mesmos procedimentos empresariais tradicionais que consistem em:
- preparação do gerenciamento geral do programa de custos
da qualidade ambiental;
- identificação dos itens de custos da qualidade ambiental;
- identificação dos centros de responsabilidade (centros de custos);
-preparação dos formulários de coleta de dados dos custos da
qualidade;
- treinamento das pessoas responsáveis pela obtenção dos
dados e do pessoal da contabilidade;
- levantamento dos custos pelas pessoas responsáveis (coleta
de dados); e
- preparação dos relatórios de análise.
10 – GESTÃO DE CUSTOS AMBIENTAIS
A gestão dos custos ambientais é um instrumento estratégico
para aumentar e reduzir os custos, conduzindo a um processo
de mudanças em desenvolvimento contínuo. É por intermédio
da gestão dos custos ambientais que se fortalece os sistemas
de gestão ambiental existentes ou facilita o estabelecimento de
sistemas padronizados. Ela gera informações básicas, ajuda a
formar consciência e a criar estrutura que podem ser utilizadas
como primeiros passos para o processo ISO 14001.
Ela enfoca o fluxo de material, energia e água, não a racionalização. Ao contrário da maioria das outras ferramentas da gestão dos custos, ela não objetiva primordialmente a redução de
(custos do) trabalho evitando, portanto, dois tipos de conflitos
sociais: com os empregados (emprego) e com a opinião pública
(impacto ambiental).
Com o aumento da competitividade mundial, segundo Campos (1996), as empresas começaram a se preocupar mais em
controlar e gerenciar seus custos, juntamente com seus programas de qualidade. Neste contexto, trabalhar com custos da qualidade passa a ser fundamental para medir e guiar a qualidade,
as estratégias de custos e a diferenciação das empresas modernas.
Com isso, surgem novos sistemas de custos para substituir a
obsolescência e imprecisão dos sistemas de custos tradicionais, já que, por sua vez, por sua natureza, a maioria destes
custos se enquadra na classificação de Custos Indiretos de Fabricação, dificultando, com isso, sua identificação e alocação.
De acordo com estudos realizados e constatações práticas,
os atuais sistemas de custos repassam muitas vezes custo ao
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produto final que não lhe pertencem. Portanto, necessita-se de
ferramentas gerenciais que condiz com a realidade.
Neste cenário, o Custeio Baseado em Atividades (ABC) temse mostrado como o mais apropriado, para auxiliar a gestão dos
custos ambientais, inclusive para contribuir no gerenciamento
do controle dos impactos ambientais.
O ABC preocupa-se em melhorar a apropriação dos custos
aos produtos, sendo um sistema de custeio que se destaca por
detalhar, principalmente, os custos indiretos. Vêm tentando minimizar os impactos de alocações inadequadas, através do custeamento das atividades exigidas pelos produtos ou demais atividades operacionais. Ele constitui o ponto culminante da análise estratégica dos custos e, em conseqüência, contribui significativamente para o processo de planejamento estratégico da
empresa.
Este sistema não é centrado apenas em números. Isto é, ele
não se preocupa exclusivamente com os aspectos monetários,
mas procura contemplar aspectos físicos das atividades, analisando fatos, atividades e processos. Assim, são definidos como
elementos importantes desta abordagem de custeio, conforme
Zardo & Schlosser (2002):
- Função: grupo de processos desempenhados com uma
finalidade específica, como a função de marketing e vendas e,
por exemplo, a de controle ambiental.
- Processo: conjunto de atividades encadeadas com um fim
específico, como por exemplo, uma linha de montagem de um
produto ou o conjunto de procedimentos necessários para o
tratamento de uma determinada quantidade de resíduos poluentes, em um período em particular.
- Atividades: ação empreendida a recursos consumidos para
se chegar a um dado objetivo, como estudar o processo de produção para verificar, por exemplo, o que causa a poluição.
- Tarefa: trabalho desenvolvido para a execução das atividades, como, por exemplo, selecionar os pontos passíveis de produção de resíduos poluentes.
- Operações: operacionalização das tarefas, ou seja, a menor fração de trabalho, como visitar pontos passíveis de produção de resíduos poluentes.
O fato do método em questão dividir a empresa em atividades, sua implantação resulta numa base de apoio adequada
para a definição de metas de resultados e para a obtenção de
excelência empresarial, a qual, segundo Brimson (1996), é a
integração eficaz do custo das atividades de todas as unidades
de uma empresa para melhorar, continuamente, a prestação
dos serviços que satisfaçam ao cliente.
De acordo com Brimson (1996), a capacidade de alcançar e
manter a excelência empresarial requer a melhoria contínua e
deliberada de todas as atividades dentro de uma empresa. Nesse sentido, o autor aponta, como elementos-chave, a eficácia
em custos, a integração de atividades, a coerência interna em
todas as unidades da empresa, a satisfação do cliente e a alocação correta de custos.
Quanto à eficácia em custos, as atividades devem ser realizadas com tanta eficácia quanto possível. Isso significa que a empresa produz a custo baixo, mas não necessariamente ao menor custo. Ter custos baixos significa que os custos totais estão
abaixo da média de todos os concorrentes que oferecem produ-
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tos ou serviços equivalentes ao mesmo segmento de cliente
Quanto à integração de atividades, as empresas são organizadas com rígidas especializações por assunto, de maneira que
os relatórios gerenciais enfatizam as unidades organizacionais
individuais, quase como se fossem independentes e auto-suficientes.
Portanto, estas e outras questões afins poderão ser facilmente respondidas, quando os gerentes dispõem de um sistema de
gestão e de apuração dos custos fundamentado no método de
custeio ABC. Segundo Martins (1996), nada melhor do que conhecer os custos de todas as atividades para daí se ter condições de verificar quais as atividades que não adicionam valor e
que precisam ter seus gastos reduzidos ou anulados, e quais as
atividades que podem sofrer processo de racionalização (às
vezes de reengenharia) para se chegar a esta adaptação ao
mundo real.
Enfim, o ABC é uma ferramenta de gestão que dá às organizações uma visão mais clara de sua economia interna e externa, através do qual os custos passam a ser visíveis, e dessa
forma, podem ser alvo de programas que objetivem melhores
resultados para a empresa. Além disso, proporciona o cálculo
mais acurado do custo dos produtos, o qual suporta diversos
tipos de decisões.
Portanto, os recursos da área de gestão ambiental, conforme
Zardo & Schlosser (2002) devem ser rigorosamente mensurados e avaliados econômico, financeira e fisicamente de forma a
garantir um adequado balanceamento de recursos possuídos
pela empresa, para assegurar a eficácia da aplicação destes
recursos e para satisfazer as exigências do público externo, ou
mais precisamente, para o cumprimento da responsabilidade
social da empresa.
A análise dos custos da qualidade ambiental mostra-se uma
ferramenta gerencial importantíssima não somente à tomada de
decisão, mas também à gestão ambiental de forma equilibrada
e concisa.
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11 – CONCLUSÃO
As despesas e os investimentos na área ambiental constituem itens que não podem faltar no rol da gestão econômica das
organizações, bem como os custos da qualidade ambiental, ferramenta pela qual as mesmas estão usufruindo para atingir as
metas do desafio do crescimento econômico, da administração
dos passivos ambientais, da análise do ciclo de vida e da contribuição para o desenvolvimento sustentável.
Para se ter um efetivo controle dos investimentos e gastos na
área do meio ambiente, o sistema de custos da qualidade ambiental pode auxiliar a competitividade e sobrevivência das organizações, porque aponta deficiências na gestão da qualidade,
contribuindo para a melhoria contínua no desempenho ambiental da organização.
Os custos da qualidade ambiental, na sua maioria são compostos por atividade indireta, e para apuração ser mais eficiente o Custeio por Atividade retrata a realidade, uma vez que
o foco está na atividade, podendo com isto proporcionar eliminação de custos de falhas e desperdícios, melhorias no
processo produtivo e conseqüente aumento da competitividade.
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12 – REFERENCIAIS
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