Escola e produção cultural - Base Integradora da TV Escola

Transcrição

Escola e produção cultural - Base Integradora da TV Escola
ESCOLA E PRODUÇÃO
CULTURAL
Apresentação
A série “Escola e produção cultural”, que será apresentada de 16 a 20 de
abril no programa Salto para o Futuro, da TV Escola, é composta por cinco programas dedicados a refletir sobre as diferentes produções culturais e as formas como a
escola se relaciona com elas. O que é produção cultural? Como podemos compreender as produções culturais nas mais diversas áreas? Como se dá a relação entre arte
e cultura, entre ética e estética? É possível buscar uma postura criativa num contexto
aparentemente tão massificado?
Esta série tem por objetivo enfocar alguns temas e questões muito presentes no cotidiano da escola, entre eles a busca compartilhada de um olhar crítico acerca de nossa realidade atual e dos tipos de produção cultural a que temos acesso. O
que produzimos no interior da escola? Como a escola pode criar intercâmbio com
outras instituições culturais? Será que sabemos o que a comunidade escolar produz?
Como criar critérios para selecionar e indicar livros, filmes, peças de teatro, sites na
Internet, shows, mostras populares?
FUNDAMENTAÇÃO
A CASA
DOS
TEÓRICA
E SPELHOS
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“O senhor, por exemplo, que sabe e estuda, suponho nem tenha idéia do que seja na
verdade – um espelho? (...)
O espelho, são muitos, captando-lhe as feições; todos refletem-lhe o rosto, e o senhor crê-se com aspecto próprio e praticamente imudado, do qual lhe dão imagem
fiel.
Mas, que espelho?
Há-os “bons” e “maus”, os que favorecem e os que detraem; e os que são apenas
honestos, pois não.
E onde situar o nível e ponto dessa honestidade e fidedignidade? Como é que o senhor, eu, os restantes próximos, somos, no visível?” 1
(Guimarães Rosa: O espelho)
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ROSA, João Guimarães. Primeiras histórias. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1988.
PROPOSTA PEDAGÓGICA
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ESCOLA E PRODUÇÃO
CULTURAL
Há algo de intrigante nos espelhos: não podemos olhá-los sem sermos por
eles olhados também. E como é firme o olhar de um espelho! Ninguém passa indiferente à sua frente. Como entender essa paixão entre o espelho e o olhar humano?
Quem sabe, aceitando que o espelho nasce de uma vontade humana de se ver... Mas
há também que se desconfiar dos espelhos: alguns oferecem-nos imagens que garantem ser “exatamente” aquilo que somos; outros mostram-nos tão distorcidos que
custamos a aceitar o seu reflexo; e há ainda aqueles que apresentam uma única e
mesma imagem a todos os que se colocam à sua frente.
Engana-se quem pensa que desconfiar dos espelhos seja coisa ruim. É vendo o
que não somos, é mostrando o que o espelho não reflete que revigoramos nossa vontade de nos ver e nos transformar. Quanto mais diferenciados espelhos pudermos encarar, mais possibilidades teremos de construir uma imagem singular. Em contrapartida,
certamente, um espelho muito procurado cria maneiras diferenciadas de mostrar. Por
isso, há que se prestar atenção a quem se olha sempre num mesmo espelho... Às vezes,
é o único espelho que temos – o que nos leva a crer que também só temos uma imagem,
um único modo de ser e de pensar. Outras vezes, temos tanto medo do que podemos
ver, que até esquecemos que o olhar pode ser uma atitude solidária.
Talvez seja esse o segredo dos espelhos: a consciência da sua (e da nossa)
incompletude. Por isso mesmo, vivem a capturar nosso olhar, a duplicar os espaços por
onde passamos. Um espelho nunca reflete apenas a nossa suposta imagem, mas traz
junto dela todo um contexto que com nossos próprios olhos nem sempre conseguimos
ver. Num espelho nos vemos como se nós mesmos fôssemos outra pessoa e, nesse
jogo de reflexos, vamos, de fato, nos repensando, nos refazendo, nos transformando.
Se esta reflexão contribuiu para entender melhor o que é um espelho – fértil
indagação trazida aqui por Guimarães Rosa – não nos garante, pelo menos ainda, que
reconheceremos um espelho quando estivermos à frente de um deles. Isso porque
alguns espelhos se recusam a pendurar-se nas paredes aprisionados em molduras;
aprenderam a arte de se metamorfosear, embora essa liberdade nem sempre lhes
permita que sejam reconhecidos por quem os olha. Quando um espelho desse tipo é
reconhecido pelo sujeito que o olha, nasce desse encontro a mais rica das imagens.
Experimentando linguagens, lapidando formas, construindo sentidos, criamos e recriamos quotidianamente a cultura. Buscamos dar visibilidade aos nossos
modos de pensar e de sentir, bem como nos lançamos à aprendizagem de outros
pensamentos e percepções. Nesse sentido, cabe ressaltar, as produções culturais
não esgotam em si a cultura como um todo, mas são fragmentos, maneiras de apresentar as muitas faces da cultura. Cinema. Literatura. Video game. Escultura. Internet.
Televisão. Música. Desenho infantil. Fotografia. Ciência. Teatro. As produções culturais – nascidas do desejo humano de se comunicar – são grandes espelhos por onde
as sociedades se olham, se repensam, se recriam.
Criando produções como essas, criamos também a nós mesmos. Através
delas compartilhamos nossas indagações, nossas descobertas, nossas lutas, nossas
relações de poder. Do mesmo modo que nos espelhos comuns, nos quais simultaneamente criamos e assimilamos uma imagem, também vivemos a experiência de sermos
PROPOSTA PEDAGÓGICA
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ESCOLA E PRODUÇÃO
CULTURAL
criadores e consumidores no que se refere às produções culturais. Mas há que indagar: Como nos relacionamos com as produções culturais? Em que medida somos ou
nos reconhecemos como sujeitos criadores? De que maneiras temos percebido e expressado nossa singularidade?
Permeando essas questões, revela-se uma espantosa armadilha oculta em
alguns espelhos: a de oferecer imagens prontas, feito produto, sem deixar que quem
as olhe faça parte efetiva dessa construção. Pouco a pouco, acabamos nos esquecendo da nossa capacidade criativa e passamos a apenas assimilar aquilo que nos é dado
externamente. É dessa maneira que a cultura, nas sociedades capitalistas, muitas vezes se transforma num produto no qual as pessoas não se reconhecem como criadoras. Ela passa a ser algo externo, fetichizado, alienada das relações humanas de que
provém, um produto que, como tantos outros, nos resta unicamente consumir. Transformada em mercadoria, a cultura – e as produções culturais – estabelece (m) com as
pessoas uma relação de posse e, conseqüentemente, de poder. Dizemos que alguns
“têm” cultura, outros não, que uns têm mais cultura do que outros, que uma produção
cultural é melhor do que outra.
Em conseqüência disso, passamos a nos olhar a partir daquilo que consumimos e passamos a consumir aquilo que o mercado nos apresenta como correto: a
música que ouvimos, a roupa que vestimos, os filmes que assistimos, o livro que lemos, as palavras que pronunciamos, o modo como devemos ser. Por vezes, ficamos
prostrados em frente àquele espelho que apresenta sempre, sempre a mesma imagem. Eles são tão insistentes que acabamos por aceitar que aquele reflexo é mesmo o
nosso. É também o caso das produções massificadas, oriundas da chamada indústria
cultural.
Esse termo – indústria cultural – foi criado pelos filósofos Adorno e Horkheimer para designar o surgimento de um novo tipo de produção e recepção da cultura
no contexto capitalista, orientado pelas mesmas características dos parques industriais: produção em série, recepção em massa, reprodução, supervalorização do produto em detrimento do trabalho dos sujeitos que o produzem ou consomem – transformados numa anônima e padronizada multidão. Que músicas ouvimos? Como nos
vestimos? O que nos leva a cantar e a dançar de um mesmo jeito? Como elaboramos
nossa linguagem? Que papel a mídia assume nesse contexto? E nós, como nos colocamos frente a tudo isso?
Pois existe nisso tudo um paradoxo: para que esse tipo de imagem sobreviva, para que a cultura se apresente apenas sob a forma de produto, é imprescindível
que permaneçamos de olhos fechados. Por que até mesmo os espelhos sabem que o
olhar é também uma forma de criação. Por superstição ou não, não se trata de quebrar esses espelhos. Até mesmo porque, do ponto de vista dos espelhos, pior do que
ser quebrado é não ser olhado. Um espelho que não quer ser olhado condena-se à
opacidade. Deixa de ser espelho. Do mesmo modo que as produções culturais: se
reduzidas unicamente a produto, se arrancadas do movimento processual que caracteriza a história humana, acabam por se apagar, perder seu vigor, transformarem-se
em caricatura do sistema que as produz.
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ESCOLA E PRODUÇÃO
CULTURAL
Mas, se olharmos com cuidado, podemos perceber qualidades que nem mesmo os espelhos sabiam possuir. Cuidado semelhante deve ser tomado quando pensamos a respeito das produções culturais. Filmes “cult” e “enlatados”, música erudita,
samba, bossa nova, funk, HipHop, a música dos DJs, histórias em quadrinhos, RPG,
novelas, pop art, arte sacra, literatura, a ciência, o saber popular. Mais do que ter a
pretensão de classificá-las como produções boas ou más, criativas ou massificadas,
ricas ou empobrecidas, precisamos reconhecê-las como produções que falam da vida,
das relações humanas e dos elementos e linguagens que cada grupo dispõe e inventa.
Mesmo porque a qualidade dessas produções não se esgota nelas mesmas, mas é
construída pelos sentidos que conferimos a elas, pelo lugar que elas ocupam nas nossas experiências quotidianas – em casa, no trabalho, na relação com os amigos, na
escola.
A escola é um espaço de produção cultural, embora venha sendo tratada
como lugar de “aquisição” de cultura, num contexto em que a educação é vista como
produto. Também na escola podemos viver a experiência paradoxal de sermos criativos produtores de bens culturais e/ou apenas consumidores apassivados de modelos já existentes. É nesse sentido que a escola precisa se repensar, se recriar, reafirmar-se parte integrante da vida cultural e política da sociedade, para que ela própria
não se transforme num espaço isolado de outros campos da cultura, lidando com ela
na condição de produto, reforçando as relações de poder aqui já descritas.
A escola tem também os seus espelhos. Espelhos “honestos” que supomos
nos mostram apenas aquilo que somos; espelhos côncavos, convexos, ondulados,
quadrados, redondos, caleidoscópicos, que nos aumentam, nos diminuem, nos desafiam, nos enfeitam, nos inibem, nos espantam, nos aniquilam; espelhos de uma imagem só; espelhos à espera do nosso olhar. O que diz um mural de escola repleto de
desenhos todos iguais? O que reflete uma festa da escola onde todos cantam e dançam do mesmo jeito? O que nos contam as redações lidas como labirintos ortográficos? E a organização de projetos literários? Os concursos de poesias? Os grupos de
teatro? Os clubes de ciência? As oficinas de vídeo? Como, no cotidiano escolar, lidamos com as diversificadas produções culturais? Que alternativas pode-se buscar a
fim de conciliar uma efetiva relação da escola com outras instituições culturais – cinemas, bibliotecas, teatros, etc. – e a produção que é feita no seu interior?
Dessa maneira, a escola pode ser vista também como um grande espelho à
espera do olhar de seus alunos, seus professores, seus funcionários, das famílias, da
comunidade. E, se é verdade que os espelhos nascem do desejo humano de poder se
ver, há que lembrar que somos nós que inventamos os espelhos – e as escolas, os
teatros, a mídia, todas as produções culturais – movidos que somos pelo desejo de
buscar sentidos para nós mesmos e para o mundo que quotidianamente teimamos
em “re”-inventar.
PROPOSTA PEDAGÓGICA
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ESCOLA E PRODUÇÃO
CULTURAL
PROGRAMAS
PGM 1 – O
QUE SE CRIA/COPIA
A cultura como elemento constituinte do ser humano. Os limites de perceber a cultura
apenas como produto. A criança, o adolescente e o educador vistos como sujeitos
produtores de cultura. A arte e a cultura de massas. Criação e repetição, massificação
e construção da singularidade. A importância da história na criação do novo. A escola
como espaço de produção cultural.
PGM 2 – LER, ESCREVER E TECL
AR (LITERATURA
TECLAR
INFANTIL, JUVENIL E INTERNET)
Diferentes maneiras de lidar com a leitura e a escrita. A leitura e a escrita como aventura e criação. Inovações tecnológicas e as transformações das narrativas. O que
lêem e escrevem alunos e professores, na escola e fora dela? Como se expressam?
PGM 3 – O
OLHO E A CÂMERA
(CINEMA,
FOTOGRAFIA E TELEVISÃO)
O mundo contemporâneo e a proliferação de imagens. Imagem e palavra como linguagens complementares. As novas formas de olhar possibilitadas pelo cinema e
pela televisão. O espectador e o produtor. Olhar, interagir e criar: as experiências de
alunos e educadores.
PGM 4 – AO
PÉ DO OUVIDO
(A
LINGUAGEM MUSICAL)
As narrativas orais e a linguagem musical. O que se assimila e o que se produz musicalmente na escola e fora dela. As produções eruditas, populares e massificadas. Os elementos fornecidos pelo cotidiano. O que ouvem crianças, adolescentes e educadores?
PGM 5 – ENTR
ANDO
NTRANDO
NO JOGO
(BRINCADEIRAS
INFANTIS, VIDEO GAME E
RPG)
O brincar como expressão cultural. As cidades e os espaços destinados às crianças.
As brincadeiras tradicionais e os jogos eletrônicos. Como brincam e jogam, atualmente, crianças e adolescentes? A escola como espaço de interação.
Bibliografia
BENJAMIN, Walter. Reflexões: a criança, o brinquedo, a educação. São Paulo, Summus, 1984.
Coletânea de artigos na qual o autor reflete acerca do lugar social da criança na cultura. Aborda temas como
a história cultural do brinquedo, a produção literária e traz ainda histórias contadas a partir da própria
experiência da infância.
BROUGÈRE, Gilles. Brinquedo e Cultura. São Paulo, Cortez, 1995.
Apresenta o brincar não como uma característica natural da criança, mas como um processo cultural. Tece
uma crítica sobre o significado da produção de brinquedos nas sociedades industrializadas e analisa as
brincadeiras como um diálogo da criança com o contexto social.
CASTRO, Lúcia Rabello de (org.). Infância e adolescência na sociedade de consumo. Rio de Janeiro, Editora UFRJ, 1998.
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ESCOLA E PRODUÇÃO
CULTURAL
Aborda as transformações nos modos de ser e compreender a infância e a adolescência na cultura do consumo. Levanta questões acerca do papel da psicologia do desenvolvimento em formular questões que ajudem a
melhor entender essas transformações na virada do século.
CITELLI, Adilson (coord.) Outras linguagens na escola - publicidade, cinema e TV, rádio, jogos e informática. São
Paulo, Cortez, 2000.
O livro faz parte de uma coleção dedicada a pensar alternativas práticas para a construção de linguagens
diversificadas no contexto escolar, fazendo uso de produções culturais do cotidiano dos alunos e educadores.
COELHO, Teixeira. O que é indústria cultural. São Paulo, Brasiliense. 1985.
O livro faz parte da Coleção Primeiros Passos e apresenta com clareza o conceito de indústria cultural,
conceito construído pelos filósofos frankfurtianos para nomear as produções da esfera cultural que seguiram
um processo de massificação.
GARCIA, Claudia A. et alii. Infância, cinema e sociedade. Rio de Janeiro, 1997.
O livro traz textos que serviram de base para um evento de mesmo nome. Teve como ponto de partida três
filmes (O jardim secreto, O balão branco e O Menino Maluquinho), a partir dos quais debateram-se os
temas: a criança e o consumo, a criança e a cidade e a criança e o adulto.
KRAMER, Sonia & LEITE, M. Isabel (orgs.) Infância e produção cultural. Campinas, Papirus, 1998.
Coletânea constituída por textos originados em grupos de pesquisa e em dissertações de mestrado. Entre os
temas tratados: teatro, literatura, o brincar, a fotografia, o desenho.
ZILBERMAN, Regina (org.) A produção cultural para a infância. Porto Alegre, Mercado Aberto, 1990.
Coletânea de textos de autores diversos, que abordam as produções culturais dirigidas à infância: teatro,
cinema, TV, desenhos animados.
Home-pages
www.cce.ufsc.br/ñupill/literatura/literati/html – Site com vasta produção literária digitalizada, organizado
por obras e por autores, abrangendo o período que se estende do século XVI ao XX. Várias obras disponíveis
para download.
www.mood.com.br/e-contos/e-contos – contos produzidos especificamente para a Internet.
www.gips.psc.br – Site de grupo de pesquisa interdisciplinar – psicologia, educação, comunicação, artes –
com enfoque na relação com as imagens no mundo contemporâneo.
www.secrel.com.br/jpoesia – Jornal da poesia, com banco de dados de cordel, poesia, cantadores, etc.
www.autoriaecia.com.br – Revista de ficção, dicas sobre diferentes tipos de produções literárias, entrevistas com autores.
www.mundodeaventuras.cjb.net – Este site explica o que é e conta a história do RPG (RolePlaying Game).
Fala da possibilidade de uso como uma ferramenta educacional.
http://culturahh.cjb.net – Site que apresenta a cultura HipHop.
www.djsound.com.br – revista com sons e canções para download.
www.prossiga.br/artecultura/pacc – Site do CNPq, traz rica biblioteca virtual com textos bastante variados.
www.casacinepoa.com.br – Site da Casa de Cinema de Porto Alegre, iniciativa dos cineastas Jorge Furtado, Carlos Guerbase, Giba Assis Brasil. Traz textos e sinopses de filmes.
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ESCOLA E PRODUÇÃO
CULTURAL
O que se cria / copia
“Nada se cria. Tudo se copia.” Quantas
vezes já nos deparamos com essa sentença?
Mas o que, exatamente, queremos expressar
com ela? Uma insatisfação frente às novidades que já parecem conhecidas? Um desprezo pelo potencial inovador da cópia? Uma
descrença no surgimento do novo? A espera
de algo excepcionalmente original? No entanto, ao mesmo tempo em que olhamos desconfiados aquilo que se apresenta como cópia,
nos deixamos seduzir pelo desejo de copiar –
a moda da vitrine, a música de que gostamos,
um texto que queremos distribuir para muitas
pessoas, ou mesmo um modo de ser. Essa
relação paradoxal de apego e desprezo ao que
é copiado, de busca e descrédito a uma produção que seja, de fato, original, oferece questões bastante ricas para se pensar a respeito
dos processos de criação nas mais diversas
áreas da realidade humana. O que é, enfim, o
novo? Como surge? Como nos relacionamos
com ele? Quais os limites entre a criação e a
cópia? O que é criar? Pode a cópia ser uma
forma de criação? De onde vem essa relação
ambivalente com o ato de copiar?
Um primeiro ponto que aqui convém destacar é que, uma vez que o ser humano é um
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Rita Marisa Ribes Pereira1
ser eminentemente social e histórico, os modos de produção por ele criados também são,
por natureza, históricos e sociais. Isso implica, por um lado, compreender que nem sempre produzimos do mesmo modo e que nem
sempre nos relacionamos do mesmo modo
com as obras que produzimos e, por outro
lado, que nenhuma produção humana acontece de maneira isolada, mas deriva de uma base
comum a todos os homens, que é a realidade
social em que vivemos. Desse modo, ainda que
cada esfera da atividade humana – a arte, a
ciência, a política, a economia etc. – desenvolvam metodologias próprias e bem definidas em seu universo, todas elas se relacionam entre si, compartilhando elementos trazidos de um cotidiano vivo em permanente
transformação. Por isso mesmo, o que lhes
confere identidade é o modo singular com que
cada área aborda essas questões que são comuns.
Pensemos um pouco sobre isso. Como se
produz o conhecimento científico? Como nasce uma obra de arte, um filme, uma música,
um desenho, uma caricatura? Como são
construídas as leis? O que são as teorias científicas, as artes ou as leis se não respostas
1 Professora da Faculdade de Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e do Curso de Especialização em Educação da PUC-Rio
BOLETIM – PGM 1
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ESCOLA E PRODUÇÃO
provisórias a questões que cada sociedade,
formula, reformula, reinventa, em diferentes
épocas, desencadeando inúmeros processos
de criação? Desse modo, as transformações
acontecidas na esfera cultural relacionam-se
também com as modificações acontecidas no
âmbito da base econômica, dito de outro
modo, com as transformações e consolidação
dos modos de produção capitalista.
É nesse contexto que buscaremos situar
nossa reflexão sobre criação e reprodução,
tomando como ponto de partida a contribuição do filósofo alemão Walter Benjamin
(1987), que analisou as transformações dos
modos de produção no contexto da arte, buscando não perder de vista a relação com as
transformações na esfera econômica e social. Para o autor, o capitalismo representa não
somente o surgimento de um novo modo de
produção econômica, mas também o
surgimento de uma nova ordem cultural. Pensemos um pouco sobre que transformações
são essas: a substituição do trabalho manufaturado e artesanal pela produção seriada da
linha de montagem, a presença da máquina no
processo de produção, a fragmentação do trabalho e o envolvimento de um maior número
de pessoas na produção, a redução do tempo
de trabalho empreendido em cada peça produzida, a produção e reprodução em série de
peças iguais, a relativização do tempo de durabilidade das peças produzidas que podiam,
então, ser mais facilmente substituídas. Em
contrapartida, transformaram-se também os
modos de recepção dessas peças produzidas:
diminuiu o tempo de espera para que elas ficassem prontas, tornou-se possível um barateamento do seu preço, podiam ser adquiridas por muito mais pessoas e em quantidades maiores, criou-se uma padronização e
massificação do consumo.
Walter Benjamin observa essas transformações no campo da produção artística.
Antes das modificações surgidas com o capiBOLETIM – PGM 1
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CULTURAL
talismo, principalmente pelo desenvolvimento das técnicas de reprodução, as obras de
arte se caracterizavam pela sua exclusividade
e existência única. Só existe, no mundo todo,
uma única Monalisa, uma única Vitória de
Samotracia, um único Sarcófago de Tutankâmon ou as pirâmides únicas de Queópes,
Quéfren e Miquerinos. Essa existência única
fazia com que as obras de arte só pudessem
ser vistas por um número muito restrito de
pessoas, por isso mesmo, precisavam ser
muito duráveis, para que ao longo dos anos
pudessem ser contempladas. Sua unicidade,
aliada à dificuldade de acesso a essas obras,
acabou por gerar um tipo de relação com a
arte que era sagrada, que seguia os rituais de
um culto. Algumas obras inclusive só podiam
ser vistas por pessoas iniciadas. Em função
disso, o que caracterizava todas as obras de
arte até então era a sua existência única e a
sua durabilidade. Mas como compreender
essa “existência única” se a Monalisa, por
exemplo, pode ser vista em tantos livros, em
capas de cadernos, camisetas, até mesmo em
copos de requeijão? É no interior dessa questão que encontraremos o nascedouro de nossas desconfianças com a prática de “copiar”
e a fidelidade à originalidade.
A cópia sempre esteve presente nos processos de criação artística, pondera Walter
Benjamin. A imitação era uma prática comum
utilizada como metodologia de ensino entre
os artistas e seus discípulos, como forma de
difusão da arte ou mesmo modos de obtenção de lucro. Nesse contexto, no entanto, toda
cópia é uma imperfeição, o que coloca uma
profunda distância entre a obra original e as
reproduções que dela são feitas, pois mesmo
a mais perfeita cópia não apreende algo que
só se apresenta no original: a sua autenticidade – o aqui e agora da obra – elemento
guardador da história e das transformações
sofridas pela obra, seja ao longo do tempo,
seja em suas relações de propriedade. É o que
a obra tem de irrepetível que a torna única;
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ESCOLA E PRODUÇÃO
apreendê-la significa também conhecer sua
história.
É certo que ainda hoje obras desse tipo
– únicas e irrepetíveis – continuam sendo produzidas, ou seja, esse modo de produção artística continua vivo e cumprindo um papel
importantíssimo na história cultural da humanidade. Entretanto, Benjamin considera
que as transformações engendradas pelo capitalismo operaram na esfera artística mudanças tão profundas que mudaram inclusive os modos de relação com a arte no seu
todo. Que transformações foram essas? Assim como nos demais campos da produção,
também a arte inaugurou sua produção em
série, com o surgimento da fotografia, do cinema – e hoje acrescentaríamos muitos outros campos. A fotografia e o cinema já nasceram sob a condição de serem cópias. Não
existe um “original” das fotografias – o que
existe é o negativo, que é uma outra coisa
(ele não é a fotografia). O filme que assistimos no cinema também não é a sua fita original, mas uma montagem de cenas selecionadas, cortadas, editadas.
O que muda com isso? Se a produção
nasce de maneira seriada, isto é, em grande
quantidade, a exigência de que a obra de arte
tivesse uma existência única é posta em questão e, com isso, seu critério de valoração deixa
de ser a sua originalidade e passa a ser quantidade de cópias produzidas. A relação de culto que caracterizava a contemplação da arte
foi substituída pela exposição ou mesmo
super-exposição. Quanto maior o número de
salas que exibirem um determinado filme, mais
valorizado este será; mais bem sucedido será
o músico que vender a maior quantidade de
discos ou que mais fizer tocar a sua música
em rádios ou TVs. Também essas produções
vão deixando de ser feitas por um único artista e passam a ser produzidas de maneira mais
coletiva. Basta lermos todos os créditos que
aparecem ao final de um filme para termos uma
BOLETIM – PGM 1
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CULTURAL
idéia da quantidade de pessoas envolvidas
nessa construção.
Há que prestar atenção às conseqüências
éticas trazidas por essas transformações.
Walter Benjamin pondera que, ao seu ver, essas transformações tem seu lado positivo e
negativo: o lado positivo está na democratização da arte, uma vez que o acesso a ela se
ampliou – atualmente um filme pode ser visto
num único dia no mundo inteiro, por um número de pessoas infinitamente maior do que
as que tiveram acesso à Monalisa ou às pirâmides egípcias ao longo da história dessas
obras. Para além do dado quantitativo, está
em jogo também a construção de uma outra
relação com a arte, na medida em que ela se
torna mais próxima e mais compartilhada. O
lado negativo, na visão do autor, está ligado à
massificação que passa a se fazer presente
nesse contexto de produção. O que significa
um número infinito de pessoas verem um mesmo filme, ouvirem uma mesma música, lerem
um mesmo livro, falarem de um mesmo assunto? Estaremos, nós mesmos, fadados a
sermos cópias também?
Nesse sentido, cabe o questionamento
sobre os modos como nos relacionamos não
somente com a arte, mas com as diversas produções culturais que também assimilaram as
transformações dos modos de produção capitalista. Em que medida essas transformações ajudam-nos a nos apropriarmos dessas
linguagens como sujeitos criadores, produtores de cultura? Em que medida elas nos cerceiam, limitam nossas possibilidades criadoras? Quais os limites entre o criar e o copiar?
Como buscar uma reflexão que permita um
olhar dialético para essas questões? Em que
ponto buscar um diálogo entre a originalidade e a repetição, entre o igual e o singular?
Mikhail Baktin e Lev Vigotsky são dois
autores que nos ajudam a qualificar nossa reflexão, recuperando nossas indagações iniciais acerca dos significados da criação.
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ESCOLA E PRODUÇÃO
Bakhtin afirma que toda produção científica e
estética é, sobretudo, uma produção social,
nascida da necessidade humana de se comunicar. Cada uma, ao seu modo, expressa de
maneira singular provisórias respostas a indagações nascidas do movimento vivo da realidade social. A preocupação de Bakhtin em
afirmar o caráter social de toda produção cultural está ligada ao fato de recuperar a dimensão humana presente nessas produções, isto
é, de entender cada obra como um diálogo
permanente entre quem a faz e quem a contempla. A criação, segundo o autor, não pode
ser isolada somente na obra ou somente no
seu autor. A criação é também completada por
aquele que se relaciona com a obra, que não é
e nem pode ser visto como um ser passivo,
que apenas assimila uma realidade pronta.
Toda obra é uma obra aberta, a ser completada por todos aqueles que se relacionam com
ela, que lhe atribuem novos sentidos, ao longo da história.
Com isso, Bakhtin também adverte que
nenhuma obra é de todo original, pura, feita
exclusivamente por um único sujeito, livre das
interferências de outras produções. Na medida em que o ser humano é por natureza um
ser social, nossos discursos e criações são
todos mesclados pelas palavras que já ouvimos, pelos livros que já lemos, pelos filmes
que assistimos, as músicas que ouvimos, enfim, todos os elementos constituidores da
cultura humana. Exemplo disto, este texto que
o leitor agora tem nas mãos: as idéias aqui
presentes tomam forma também pelos sentidos que você está dando a ele. Assim, não
caberia a reivindicação por uma originalidade
suprema nem o desprezo àquilo que se oferece inicialmente como cópia. A busca de algo
exclusivamente novo precisaria abdicar da
própria história da humanidade, pois mesmo
a história se renova fazendo uso daquilo que
já tem.
Um diálogo que se estabelece entre BakhBOLETIM – PGM 1
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CULTURAL
tin e Vigotsky diz respeito à necessidade de
recuperar a dimensão política que envolve o
processo de criação. Os autores afirmam que
a criação é uma capacidade humana – por isso
mesmo, comum a todos os seres humanos –
e não apenas uma característica restrita a alguns sujeitos considerados geniais. Vigotsky
associa a capacidade criadora à experiência
de vida, afirmando que o processo criativo
está ligado às possibilidade de combinar de
maneira original as experiências vividas, podendo trazer à tona algo novo, inovador. Nesse processo, Vigotsky atribui papel fundamental à atitude de copiar, entendendo que ela representa uma primeira maneira de apreensão
da realidade que nos cerca. Copiando formas
já existentes aprendemos a falar, a andar, a
desenhar, a escrever... Posteriormente fomos
buscando novas formas, criando nossa singularidade. Vigotsky pondera, porém, que a atividade criadora necessita de uma diversidade de elementos para que ela possa se desenvolver, entre os quais salienta a importância
da relação entre imaginação e realidade, entendendo que estas não são opostas, mas
complementares – é a realidade que fornece
os ingredientes para a imaginação, assim
como é a imaginação que aponta os ingredientes de que a realidade carece. A cópia, cabe
frisar, é uma parte do processo de criação, não
o seu fim e representa a apreensão daquilo que
já existe, do que já foi criado; não deve – jamais – ser encarada como uma expressão finalizada.
Por fim, compartilhemos novamente a
preocupação central dos três autores que –
entre tantos outros – ajudaram-nos a construir esta reflexão: a de recuperar a dimensão
política de toda produção humana. Os autores apontam a necessidade de construir uma
reflexão consistente sobre essas questões
para que possamos nos sentir, de fato, sujeitos criadores. Para isso, precisamos construir
uma postura crítica frente ao que assimilamos
e também àquilo que criamos. Bakhtin pon11
ESCOLA E PRODUÇÃO
dera que um poeta deve recordar-se que sua
poesia é culpada pela trivialidade da vida, e o
homem na vida há de saber que sua falta de
exigência e seriedade em seus problemas
existenciais são culpados pela esterilidade da
arte (Bakhtin, 1985).2 O que Bakhtin está chamando de culpa pode ser tratado como responsabilidade e pode estender-se também ao
nosso cotidiano na escola e fora dela, orquestrando o desafio de inovar sem esquecer a história do que se produz.
Sugestões de atividades
– Organizar um evento específico ou reservar
um espaço no planejamento cotidiano para
2
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CULTURAL
que a comunidade escolar possa apresentar/mostrar o que produz;
– Organizar mostra de filmes, poesias etc. envolvendo a comunidade.
Bibliografia
BAKHTIN, Mikhail. Arte y responsabilidad. In: Estética
de la criacion verbal. México, Siglo XX, 1985.
BENJAMIN, Walter. A obra de arte na era de sua
reprodutibilidade técnica. São Paulo, Brasiliense, 1987.
Vigotsky, Lev. Imaginacion y el arte en la infancia.
México, Ediciones Hispanicas, 1987.
Na tradução mexicana: “Un poeta debe recordar que su poesía es culpable de la trivialidad de la vida, y el hombre
en la vida ha de saber que su falta de exigencia y seriedad en sus problemas existenciales son culpables de la
esterilidad del arte.
BOLETIM – PGM 1
12
ESCOLA E PRODUÇÃO
CULTURAL
Ler, escrever e teclar
Vocês se lembram de como aprenderam
a ler e a escrever? Na mesa da sala? No chão
da cozinha? No quintal, como Paulo Freire? Na
rua, vendo placas de ruas e letreiros de ônibus? Ou fingindo ler os papéis que lhes apareciam na frente, em qualquer lugar? Quem
sabe acompanhando os estudos do irmão ou
da irmã mais velha? Ou foi mesmo na escola
que começou essa aventura? São muitas as
histórias e muitas as possibilidades...
O fato é que a linguagem escrita nos circunda de modos diversos e muitas vezes insuspeitos: a conta de luz, o tíquete do metrô,
o santinho preferido, os objetos que portamos, usamos e vestimos, a lista de compras,
os livros que vemos e/ou manuseamos, a propaganda entregue na rua, o jornal e a revista,
a sacola do supermercado, o papel da bala...
Até o mundo de imagens e sons da televisão
é impregnado de língua escrita! E quem duvida de que há um leitor por trás de grande parte dos textos falados na TV e no rádio? No
computador, os ícones de comando são acompanhados de legendas por escrito. Nas máquinas, de um modo geral, a compreensão de
suas ações é também formulada por escrito.
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Cecília Maria Goulart*
A dimensão que a escrita tem em nossas vidas é enorme, desde que nascemos,
quando precisamos ser registrados para termos existência civil reconhecida. Assim, essa
linguagem atravessa a vida de todos, em vários níveis – analfabetos ou letrados, urbanos
ou rurais, crianças, jovens ou adultos – todos
a usam, por curiosidade, por necessidade ou
por prazer.
E na escola, será que as muitas faces da
leitura e da escrita são trabalhadas? Que textos utilizamos com nossos alunos para que se
transformem em leitores de verdade? Que textos produzem os nossos alunos para que cada
vez mais escrevam sobre esse mundo e sobre
outros mundos possíveis e sonhados?
Quais são as práticas sociais que exigirão da criança, hoje, o domínio da escrita? Em
que medida, enquanto alfabetizamos,
estamos preparando-a para tais práticas? O
que lemos e o que escrevemos nós, professores no século XXI? Realizamos as mesmas
leituras e escritas de nossos avós ou mesmo
de nossos pais? Lemos e escrevemos daquela mesma forma? Ou mudaram os tempos, os
* Universidade Federal Fluminense
BOLETIM – PGM 2
13
ESCOLA E PRODUÇÃO
espaços, as pessoas e com isso mudaram
também os objetos dados a ler e a escrever e
as práticas de leitura e escrita? Será que lemos hoje um romance, como Dom Casmurro, de Machado de Assis, da mesma forma
como era lido há algumas décadas?
Sabemos que o que traz sentido para um
ou outro modo de ler e de escrever são os
conhecimentos e os valores de que somos
constituídos. Portanto, lemos e escrevemos
“de dentro” de uma rede de significados culturais que construímos historicamente. Essas
redes significativas que formamos, e de que
somos formados, variam de grupo social para
grupo social, de pessoa para pessoa e também de período histórico para período histórico.
Os homens, criadores da escrita, vêm
permanentemente constituindo novos usos e
funções para esse saber, de acordo com novas necessidades que vão se instaurando no
processo cultural. Nesse sentido, ser letrado
envolve estar continuamente vivendo experiências novas, tanto do ponto de vista da criação de novos textos e de novas formas de
dizer, quanto da própria aventura de conhecer, lendo novos mundos e novas possibilidades de viver/transformar esse mundo.
A leitura de textos literários, por exemplo, muitas vezes nos leva a “viajar”, conhecer novos horizontes, refletir sobre outras possibilidades de ação, explorar caminhos desconhecidos; remete-nos para outros textos
lidos, para os nossos próprios textos, pelo que
contêm de semelhanças e diferenças em relação a idéias, relações diversas, problemas,
soluções e também sonhos. A escrita, por sua
vez, nos obriga a refletir sobre o que somos,
o quê e como pensamos, acarretando dificuldades que, em geral, são atribuídas a questões lingüísticas relacionadas, por exemplo, à
falta de vocabulário, mas que estão mais ligadas aos nossos próprios modos de concatenar
as idéias, conceituar, inter-relacionar quesBOLETIM – PGM 2
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CULTURAL
tões. Viagem também para dentro de nós
mesmos, buscando explicitar de forma organizada maneiras de ler as facetas do mundo.
Viajar lendo, viajar escrevendo...
Inovações tecnológicas, como a Internet,
nos trouxeram a possibilidade de “navegar”,
muitas vezes, por “mares nunca dantes navegados”! Navegar lendo, navegar escrevendo...
Que desafios a superfície da tela de um computador traz para a leitura e a escrita? O conhecimento da linguagem escrita em si é o
mesmo, entretanto novas condições de produção determinam novos modos de ler e de
escrever, diferentes daqueles implicados nos
tradicionais – vamos dizer assim – objetos
portadores de textos.
A leitura e a escrita na tela do computador
requerem um sistema de convenções diferente
daquele que regula aquelas atividades em folhas de papel. O modo como o texto se estrutura no computador (incluindo a apresentação
e a formatação do texto) dimensiona a
materialidade do texto de um modo diferente
daquele lido ou escrito em papel. A própria
maneira como o “manuseamos”, indo e voltando, fazendo destaques, inserções, entre outras
ações, nos obriga a novos conhecimentos, novas estratégias de leitura e de escrita, bem
como a novos modos de ler e de escrever.
Navegar na Internet nos possibilita acessar muitos textos ao mesmo tempo, por meio
de “links” (isto é, ligações, possibilidades de
caminhos para outros textos que se abrem)
que vamos acessando: um texto se abre, então, em muitos textos, operacionalmente, e
não mais em nível metafórico, como falamos
acima, em relação à leitura de textos escritos
em livros. Essa possibilidade nos faz experimentar o conhecimento de um modo novo,
diferente das fontes tradicionais de referência. Um texto pode nos levar a outros textos,
subjugando a linearidade espacial do texto no
papel a uma verdadeira rede de textos que nos
permite criar trajetórias de leitura diferencia14
ESCOLA E PRODUÇÃO
das, pelas opções que fazemos. A interação
com o texto se dá, assim, com uma dinâmica
diferente daquela que acontece com o texto
em papel.
Ler, escrever e teclar se constituem hoje,
mais do que nunca, em atividades altamente
desafiadoras e necessárias, pelo que representam de possibilidade de inserção maior do homem na sociedade, não como forma de submissão aos textos existentes e às tecnologias
disponíveis, mas como forma de, conhecendoas, poder criticá-las, criar novas formas de ação
com elas e para elas, novos modos de ler e de
escrever caminhos sociais mais justos.
A tradicional ênfase dada na escola às associações sonoro-visuais e gráfico-auditivas
é apenas um dos aspectos da aprendizagem
da linguagem escrita, e não é o mais relevante, embora necessário. O contato com textos
de vários padrões, simulações de leituras pelos alunos e de leituras realizadas pelos professores, além de espaços em que as crianças possam discutir os textos lidos e escrever do modo como puderem, a partir de propostas da turma, tornam-se cada vez mais fundamentais. As experiências das crianças ao lerem, escreverem e ouvirem leituras são valiosas quando há um professor que os inquieta
com perguntas, lança pontes entre os temas
discutidos, coteja textos de diversas origens,
trabalhando para expandir os seus universos
de referências, estimulando a curiosidade natural e abrindo um mundo de exploração e descobertas.
Ainda que as crianças não tenham disponíveis computadores para aprender a manejar,
estarão sendo criadas condições para o desenvolvimento de ações interativas, de estabelecimento de relações e associações
intertextuais e de convite a proposições. Um
trabalho que faz circular textos escritos e textos orais, criando espaços de leitura e de escrita pelas crianças, gera também o desejo de
aprender a língua escrita. O destaque e a imBOLETIM – PGM 2
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CULTURAL
portância desta linguagem vão tornando-a necessária à vida das crianças. No movimento em
sua direção, vão realizando, com a intervenção
e incentivo dos professores, a análise de seus
segmentos e de suas relações, desbravando
aos poucos suas normas e seus segredos, assim como a diferenciando da língua oral.
Na direção acima trilhada, é interessante
gerar condições e ambiente para que os alunos trabalhem favorecendo novos tipos de
interação. Se considerarmos hoje que atividades envolvendo a interação entre grupos de
alunos e entre professores e alunos têm-se
mostrado como altamente férteis para a construção e troca de conhecimentos, devemos
promover do mesmo modo condições para
que haja interação entre textos, bem como
entre diversos portadores de texto. Como um
texto “conversa”, discute com outro(s) texto(s)? Em que se aproximam, se cruzam e de
que modo se afastam? – são questões que
devem estar presentes nas salas de aula.
Trabalhar para a alfabetização de todos
não como uma forma de alienação, de ensinar
sentidos dados, escritas congeladas, mas
como uma forma de ler “mais longe”, de criar
condições de escrita de outras histórias:
aprender a ler e a escrever para entrar no jogo
e jogar, e até mesmo para descobrir que não
somos tão livres quanto pensamos. O espaço
coletivo e a vida coletiva nos levam a restrições, a convenções – as que devemos aprender para ler, escrever e teclar socialmente são
apenas algumas delas e, contraditoriamente,
podem nos libertar.
Sugestão de atividade prática
Criação de um horário diário para a rodinha de conversa. As atividades realizadas nesta rodinha podem variar: desde conversas espontâneas sobre experiências vividas por uma
criança ou vividas por grupos em um determinado local da comunidade, do bairro, da cidade, do estado ou do país, até atividades
15
ESCOLA E PRODUÇÃO
programadas de apresentação de livros por
algumas crianças, de apresentação da(s)
notícia(s) mais importante(s) (ou mais triste
etc.) do jornal da TV do dia anterior, cotejando com a mesma notícia no jornal impresso
levado pelos alunos e/ou pela professora.
O fundamental nessas rodinhas é que as
crianças tenham espaço para falar, para apresentar suas idéias, seus pontos de vista sobre o tema em discussão, e também para ouvir opiniões diferentes das suas. A professora, além de mediar a conversa, apresenta seu
ponto de vista, procura organizar sínteses de
como o assunto está sendo tratado. A professora deve também ir solicitando às crianças que, aos poucos, assumam esse papel
mediador, garantindo espaço para todos que
queiram falar, bem como levar as crianças a
realizarem pequenos resumos dos temas e do
modo como foram discutidos. Podem ser elaborados registros escritos datados dessas
atividades diárias em um blocão, ou num caderno de desenho grande, que fique disponível para quando as crianças quiserem revêlos. Dependendo do período em que as crianças estiverem, a professora pode escrever
primeiro no quadro de giz com a ajuda das
crianças e, em seguida, uma criança a cada dia
BOLETIM – PGM 2
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CULTURAL
fica responsável pela transcrição e ilustração
no caderno da turma. Ao final de cada mês, ou
de cada dois meses, podem ser realizados levantamentos pelas crianças e professora, em
forma de gráficos ou tabelas, das atividades
ou temas que mais se destacaram.
Desses encontros também podem surgir
temas para projetos de estudos que envolvam
toda a turma. Caso a escola possua computadores, pode ser estudado um modo de ter
essas informações digitadas, inclusive os gráficos ou tabelas.
Indicações Bibliográficas
BATISTA, A. A. & GALVÃO, A. M. de O. (orgs.). Leitura, Práticas, Impressos e Letramentos. Belo Horizonte. Autêntica, 1999.
MASSINI-CAGLIARI, G. & CAGLIARI, L. C. Diante das
Letras – A escrita na alfabetização. Campinas,
Mercado das Letras/ Associação de Leitura do
Brasil/ALB; São Paulo, FAPESP, 1999. (Coleção Leituras no Brasil)
CHARTIER, R. e outros. Práticas de Leitura. São Paulo, Estação Liberdade, 1996.
PÉREZ, F. C. e GARCIA, J. R. (orgs.). Ensinar ou
Aprender a Ler e a Escrever? Porto Alegre,
Artmed, 2001.
16
ESCOLA E PRODUÇÃO
CULTURAL
O olho e a câmera
Este tema provoca mais perguntas do
que respostas conclusivas e é por este motivo que reunimos algumas indagações iniciais
que irão orientar nossas reflexões, apontando um caminho para discutirmos as transformações do olhar, da subjetividade e do conhecimento engendradas pela tecnologia.
O que é olhar o mundo através das lentes? Que mudanças são desencadeadas no
olhar através da mediação proporcionada pelos instrumentos técnicos? O que somos capazes de ver e o que nos escapa ao olhar? A
imagem técnica é uma representação fiel e
objetiva do real ou uma nova forma simbólica
de captar o mundo mediado pela técnica? Os
objetos, captados pelas lentes, são signos que
definem a realidade através de conceitos?
Conhecer o mundo através das lentes é criar
um outro mundo possível? Quais as conse-
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Solange Jobim e Souza1
qüências deste acontecimento contemporâneo
nos modos de ser, agir e conhecer? De que
modo podemos tirar partido do uso da tecnologia para construirmos relações interpessoais solidárias e humanitárias? Quais são as
possibilidades de criação e de liberdade em
uma sociedade cada vez mais programada pela
tecnologia?
Estas questões hoje se colocam por que
a cada dia sentimos com maior evidência o
modo como a tecnologia da imagem se transformou numa prótese do olhar, sendo praticamente impossível falar da nossa existência
no mundo atual sem os aparatos técnicos que
acabaram por modificar a própria natureza
humana. A distinção entre natureza e cultura
é cada vez mais tênue e os limites de uma ou
outra não podem ser mais facilmente definidos2 . Os produtos culturais de nossa época
1
Professora do programa de pós-graduação do Departamento de Psicologia da PUC-Rio. Professora Adjunta da
Faculdade de Educação da UERJ. Coordenadora do Grupo Interdisciplinar de Pesquisa da Subjetividade (GIPS)
2
No campo das ciências humanas, especialmente nos estudos da Psicologia, vimos durante as últimas décadas o
desenvolvimento de pesquisas que buscavam definir uma espécie de matriz da natureza humana, através da elaboração de conceitos universais que distinguiriam com objetividade a base biológica das influências culturais na constituição do sujeito. Entretanto, o vertiginoso desenvolvimento da técnica, interferindo na vida cotidiana, e a ênfase dos
estudos da linguagem sobre os efeitos do discurso na constituição subjetiva dos indivíduos tornaram frágeis os argumentos científicos que pretendiam traçar fronteiras rígidas para se compreender o indivíduo separado da cultura. Este
fato exige a construção de novos paradigmas para se discutir as relações entre natureza e cultura na constituição do
sujeito. A década de 90 aprofundou ainda mais este debate a partir do desenvolvimento das pesquisas e das práticas
médicas de intervenção na reprodução humana e na manipulação genética. Este é um vasto campo de debate,
implicando questões éticas e políticas no campo dos estudos e pesquisas nas ciências humanas neste novo milênio.
Sobre este tema ver “Futurenatural”, George Robertson et al. 1996, New York, Routledge.
BOLETIM – PGM 3
17
ESCOLA E PRODUÇÃO
estão entranhados em nossa experiência, forjando uma nova subjetividade que só é possível de ser compreendida quando levamos em
conta o modo como assimilamos o tato e o
contato com os diferentes aparatos que estão mediando nossas relações com o mundo
físico e social.
Como fazer deste novo acontecimento
cultural algo que seja vinculado essencialmente ao homem, melhor dizendo, como garantir
que cada um de nós saiba se reconhecer como
produto e como autor das criações culturais
de uma dada época? Como vincular a experiência passada da humanidade à história dos
modos atuais de criar o mundo através da
tecnologia? Digo isto porque quando há uma
ruptura no processo de compreensão dos
modos de criação, o homem acaba por não se
reconhecer como parte ativa das transformações mais amplas de nossa época, depositando sempre no outro o controle sobre suas
ações. Este outro se configura hoje para nós
como um ser maquínico. Isto porque as
interações que estabelecemos com as máquinas coloca o objeto-máquina em destaque,
criando modos de diálogo inteiramente novos,
muitas vezes suplantando as relações entre
as pessoas.
Estranha condição esta que a cultura nos
impõe, posto que aquilo que foi criado pelo
homem pode, por um erro de percurso, se tornar um instrumento de dominação de nossas
ações e do nosso desejo, deixando o que denominamos vontade abandonar a nossa morada. Enfrentar o desafio do uso da tecnologia
sem perder nossa capacidade de criar, com
ela e através dela, novas estratégias de mediação crítica com o mundo, depende, num certo sentido, do acesso das crianças, dos jovens e dos adultos a uma formação educacional que contemple as diferentes linguagens
presentes no cotidiano de uma dada época.
Mesmo que sejamos receptivos às mudanças desencadeadas pelas imagens técniBOLETIM – PGM 3
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CULTURAL
cas, devemos destacar alguns pontos críticos
nesta relação. Arlindo Machado (1998), comentando a obra de Vilém Flusser, diz que a
proliferação imensa de imagens técnicas acarreta uma predisposição da sociedade para um
comportamento mágico programado.
Os homens já não decifram as imagens
como significados do mundo, mas o próprio
mundo vai sendo vivenciado como um conjunto
de imagens. Não sabendo mais servir-se das
imagens em função do mundo, eles passam a
viver em função de imagens, de modo que estas
últimas, tradicionalmente encaradas como mapas, se transformam gradativamente aos seus
olhos em biombos, cuja função já não é mais
representar, mas mascarar o mundo. (p. 16)
Levando em consideração esta crítica,
nossa proposta é intervir para que o olhar não
seja empobrecido e aprenda a usar a tecnologia para construir estratégias de interação
com o mundo físico e social, que sejam promotoras de um certo modo de ver as coisas,
interpretando e recriando o mundo de muitas
e diferentes maneiras. Isto significa assumir
o compromisso de desencadear um conhecimento que desmascare a superficialidade e a
padronização do olhar, permitindo um mais
profundo contato com a leitura e a interpretação das imagens que circulam velozmente entre nós.
A produção do conhecimento hoje não
dispensa a nossa capacidade de dialogar com
os aparatos tecnológicos, incentivando as
pessoas a construírem, com eles, novas possibilidades de usos, submetendo as máquinas
ao nosso poder e desejo de inventar outros
jogos ainda não revelados na prática. Tratase, portanto, de criarmos, através da educação, modos de confronto com a experiência
tecnológica, colocando tanto educadores
como educandos na posição de se sentirem
responsáveis por inventar outras estratégias
de interação na produção de conhecimento.
Isto significa dizer que a educação mediada
18
ESCOLA E PRODUÇÃO
pela tecnologia é um jogo, pois cada vez mais
as máquinas se transformam em aparatos para
recuperarmos a dimensão lúdica na produção
do conhecimento, que é de fato também trabalho. A relação jogo e trabalho no contexto
da tecnologia se transforma de modo radical.
Como diz Flusser (1998), os instrumentos
técnicos emancipam o homem do trabalho,
libertando-o para o jogo. E para reforçar nosso argumento nesta direção é interessante
observarmos como as crianças lidam com os
aparelhos. Se comparamos os adultos e as
crianças nestas atividades, constatamos, com
freqüência, um modo muito mais descontraído
e familiar das crianças com as máquinas do
que muitos adultos alcançam em situações
similares. A criança não teme a tecnologia
porque para ela, desde o princípio, os aparelhos são máquinas de jogar, são brinquedos.
No brincar a criança inventa o jogo, cria sempre novos lances e desafia a máquina, experimentando com ousadia e curiosidade os resultados que desencadeia. Já o adulto não
consegue a mesma descontração porque a
máquina, tomada como mediadora do trabalho sério, perde todo o encantamento e a magia que a criança é capaz de alcançar. A criança está livre do sentido sério e sisudo que as
coisas posteriormente adquirem no curso da
vida e, por isto, pode nos mostrar novas alternativas de convívio com as máquinas. Cabe
ao educador aprender esta postura com a criança e construir junto com ela, sem deixar de
lado a sua experiência como adulto que vê o
mundo de uma determinada maneira, modos
mais criativos para enfrentarmos os desafios
que a tecnologia nos impõe. O confronto entre gerações amplia o campo das experiências criadoras e a dimensão alteritária do saber
da criança, em contato com o conhecimento
do adulto, é extremamente positiva para a produção do conhecimento e da subjetividade,
configurando um clima de autêntica liberdade
nos modos de ser, agir e conhecer.
Voltemos agora nossa reflexão para enfoBOLETIM – PGM 3
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CULTURAL
car especialmente as máquinas de visão.
Como se dá nossa relação com os aparelhos
que produzem imagens, como, por exemplo, a
máquina fotográfica, o cinema e a televisão?
Como consumimos e / ou produzimos imagens?
Com a fotografia iniciamos um longo caminho na construção de novos modos de escrita do mundo. Pasolini (1983) vaticinou: “...
O cinema trará as mesmas mudanças revolucionárias em relação à realidade que a língua
escrita em relação à língua falada”(p.145). Do
mesmo modo que a escrita ortográfica nos
revelou uma maneira mais sistemática e
conceitual de tomarmos consciência da nossa cultura, a “foto-grafia” se constitui como
uma escrita atual do homem, mediada por uma
tecnologia criadora de uma narrativa figurada. Podemos considerar que, depois da invenção do ato de fotografar, a experiência humana nunca mais foi a mesma, pois conquistamos, a partir desta prótese da visão, um olhar
sobre a materialidade do mundo físico e social que antes não era possível, criando em nós
uma nova consciência cultural e subjetiva do
mundo. Além disto, podemos afirmar que as
imagens constituem hoje as narrativas do
mundo contemporâneo, trazendo novos elementos para buscarmos uma compreensão
mais abrangente do próprio conceito de narrativa. Com isto a compreensão do que constitui hoje o domínio da leitura e da escrita
mudou radicalmente, desafiando a escola a
penetrar no universo dos signos que permeiam
a experiência do homem atual, a partir da criação de novos códigos de interpretação e
construção de sentidos.
A experiência atual com as imagens, quer
sejam fotográficas, cinematográficas ou televisivas, acontece na maioria das vezes de forma espontânea, intermitente, fragmentada,
enfim, de modo superficial. Com a proliferação das imagens, a cada dia elas perdem mais
a sua capacidade de dizer algo a alguém, pois
19
ESCOLA E PRODUÇÃO
também as pessoas que vivem esta dispersão perceptiva de modo permanente acabam
por perder a sensibilidade para ver as coisas,
enxergando-as como signos, extraindo sentidos diferenciados da materialidade do mundo e dos significados incorporados às imagens que nos rodeiam. A leitura de imagens
como uma atividade subjetiva compromissada
com a experiência racional e sensível de tomada de consciência do mundo deve ser uma
conquista e, portanto, exige uma educação estética do olhar.
A educação estética do olhar é aquela que
incentiva o educando a intervir no ritmo dispersivo e intermitente que, em geral, estamos
acostumados a exercitar quando interagimos
com as imagens no cotidiano (TV, vídeo, cinema, fotografia, outdoors, computador etc.). É
preciso aprender a olhar o mundo indo aos
detalhes, melhor dizendo, é preciso decompor o mosaico para melhor enxergar a figura
que reina majestosa no todo de uma revelação figurativa. Neste exercício que propomos
com as imagens, a palavra é companheira,
posto que com ela a imagem se enriquece,
ganha contornos, torna-se icástica. Por mais
que o mundo esteja se revelando aos nossos
olhos através de narrativas figuradas, há que
se decompor estas imagem em palavras e
devolver ao outro as possíveis interpretações
daquilo que é visto, tornando as imagens técnicas mediadoras de um diálogo entre pessoas que buscam novos modos de narrar sua
experiência, recriando o mundo na imagem e
BOLETIM – PGM 3
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CULTURAL
no discurso. Deixar de ser dominado pela imagem é saber criar sentidos novos, composições que alteram e libertam nossa percepção
do mundo em variadas direções. Aprender a
ver o mundo com outros olhares, resgatando
sua condição de diversidade, é formar leitores de imagens que sabem dar um sentido
estético e ético ao modo como produzimos
conhecimento na contemporaneidade. Este é
um dos maiores desafios para a educação nos
dias atuais.
Bibliografia:
FLUSSER, V. Ensaio sobre a fotografia. Para uma filosofia da técnica. Lisboa, Relógio D’água, 1998.
JOBIM E SOUZA, S. (ORG.). Mosaico: Imagens do Conhecimento. Rio de Janeiro, Rios Ambiciosos,
2000.
__________ & FARAH NETO, M. A tirania da imagem na
educação. Presença Pedagógica, v. 4, n.22, jul./
ago., 1998.
LOPES, A. E.; SANDER, L.; JOBIM E SOUZA, S. A criação
de narrativas na escola: uma abordagem através da fotografia. In: Paiva A. et alli. No fim do
século: a diversidade. Belo Horizonte, Autêntica, 2000.
MACHADO, A. Apresentação. In: Flusser, V. Ensaio
sobre a fotografia. Para uma filosofia da técnica.
Lisboa, Relógio D’água, 1998.
PASOLINI, P. P. As últimas palavras do herege. Entrevistas com Jean Duflot. São Paulo, Brasiliense,1983.
20
ESCOLA E PRODUÇÃO
CULTURAL
Ao pé do ouvido
Criação e Cultura de Massa: uma
relação possível?
A experiência humana é hoje caracterizada por uma diversidade de relações. As crianças e os adolescentes que povoam as salas
de aula têm seu processo de construção subjetiva marcado não somente pela relação com
a família e a escola, como nos acostumamos
a pensar, mas também com máquinas que, há
bem pouco tempo, só habitavam a imaginação de escritores de ficção científica. A bem
dizer, sua formação não se distingue apenas
pelo convívio com a tecnologia, que pode se
dar em intensidades variadas, mas, acima de
tudo, pelo modo como os avanços tecnológicos e a utilização de cada um desses novos
objetos interfere em nossa forma de percepção, interação e intervenção no mundo.
Os instrumentos técnicos que nos são
apresentados a todo o momento atingem, com
sua presença, aspectos de nossa subjetividade. O advento do computador pessoal, por
exemplo, não propicia unicamente uma mudança objetiva, uma nova maneira de realizar
tarefas, mas, ultrapassando a dimensão de
utilidade, terminou por gerar uma nova forma
de comunicação, de relação com a escrita, de
organização do pensamento e, mais ampla-
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Maria Cecília Morais*
mente, uma nova percepção do tempo e do
espaço. Tais transformações afetam tanto as
crianças que têm um computador em seu quarto, quanto aquelas que nunca chegaram a
utilizá-lo. Trata-se de experiências diferenciadas que, no entanto, inscrevem-se num contexto compartilhado, na medida em que a existência do computador se impõe e marca a realidade de ambos.
Destes inventos, muita coisa se originou.
As artes, de um modo geral, sofreram grandes
transformações. A criação artística é hoje radicalmente atravessada pelo desenvolvimento
tecnológico e, também, pela forma massificada
e agressiva que o ato de consumir assumiu nos
últimos tempos. Na música, campo em que
concentraremos nossas atenções no presente
texto, este atravessamento é determinante e
se manifesta de muitas formas.
Ao lado do cinema e da televisão, a música talvez seja uma das formas de expressão
com maior poder de disseminação e penetração entre os jovens. Tal fato nos leva a supor
que, através das manifestações musicais, seja
possível aproximarmo-nos um pouco mais da
* Psicóloga Clínica, mestre em Psicologia.
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ESCOLA E PRODUÇÃO
experiência contemporânea das crianças e
adolescentes de nosso tempo.
Não há dificuldade em observar o interesse dos jovens pela música. Eles estão sempre
escutando a rádio ou o CD preferidos, insistindo para ir a este ou aquele show, colando os
pôsteres e as fotos de seus cantores e cantoras prediletos nas paredes do quarto, querendo montar sua própria banda para apresentarse na escola, enfim, demonstrando de todas as
formas o espaço que a música ocupa em seu
dia-a-dia. Mas, qual é a música que essas crianças e adolescentes reverenciam? Apesar de
haver variações significativas que, em nosso
olhar distanciado, acabamos não percebendo,
podemos certamente afirmar que, em sua grande maioria, eles se voltam para chamada música pop. Artistas como Madonna, Michael
Jackson e, mais recentemente, Britney Spears
e Sandy fazem a alegria de meninos e meninas.
Há poucos meses, o funk carioca entrou para a
lista, ultrapassou as fronteiras sociais e geográficas e passou a se repetir exaustivamente
por todo o país, para revolta de muitos pais e
educadores, devido à temática explicitamente
sexual expressa tanto nas letras como nas danças que as acompanham.
Esse gosto pelo que consideramos vulgar e pouco instrutivo nos assusta. É comum
que se façam previsões sinistras quanto ao
futuro de uma geração exposta a esse tipo de
produção cultural. Entretanto, se questionamos o interesse das crianças por esse tipo de
música, é preciso que nos perguntemos também sobre o medo que acomete os adultos.
É importante indagar, para início de conversa, que conseqüências tem este sentimento
no trato diário com as crianças.
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CULTURAL
Para além da preocupação legítima e necessária com a formação de seus filhos e alunos, o medo de pais e educadores reafirma,
intencionalmente ou não, uma opinião largamente disseminada no senso comum e corroborada pela academia: aquilo que se produz
na cultura de massa é de valor artístico e cultural discutível e, acima de tudo, sempre inferior à cultura erudita ou clássica. Assim, um
filme como “Guerra nas Estrelas” será sempre considerado inferior a um livro de Alexandre Dumas, a música que se repete nas rádios
nunca terá tanto valor quanto a audição de um
clássico da música erudita ou da MPB**. Por
analogia, acabamos por julgar que brincar de
bola ou peão é também mais saudável do que
jogar video game ou “cuidar” de um tamagoschi. A pobreza cultural derivada de nossa
organização social centrada no capital é um
fantasma que nos assombra e a que atribuímos muitos males presentes e futuros.
Não nos interessa aqui determinar a superioridade de uma obra ou estilo em relação
a outros, isto é, discutir, por exemplo, a importância da obra de Machado de Assis em
comparação à de George Lucas*** ou Steven
Spielberg. Mais importante que isso talvez
seja atentar para as diferenças que existem
entre a cultura de massa e a chamada “cultura
elevada” para, assim, nos aproximarmos um
pouco mais daquilo que povoa o imaginário
de nossas crianças e adolescentes.
De fato, como bem observa Edgar Morin,
“tudo parece opor a cultura dos cultos à cultura de massa: qualidade à quantidade, criação à produção, espiritualidade ao materialismo, estética à mercadoria, elegância à grosseria, saber à ignorância” (Morin, 1967). Mas
**A MPB é aqui incluída como estilo musical relacionado à cultura clássica, apesar de seu cunho popular, porque
sua valorização no contexto cultural brasileiro, e mesmo mundial, deve-se em muito à sua enorme riqueza melódica, harmônica e poética, ou seja, à sua adequação a critérios advindos da cultura clássica.
*** Produtor da série cinematográfica “Guerra nas Estrelas”.
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ESCOLA E PRODUÇÃO
será que esta oposição, que coloca as duas
formas de criação cultural como dois extremos, não esconde as nuances e a diversidade
que compõem cada uma delas? Será que tudo
o que se produz de acordo com os parâmetros
da cultura clássica é necessariamente mais
interessante que qualquer coisa que se origine no ambiente da cultura de massa?
Ao nos indagarmos sobre a possibilidade de encontrar vida inteligente nessa forma
de cultura, tão conhecida por seus efeitos
padronizadores e homogeneizantes, o tipo de
criação musical que os DJs realizam pode
nos ser de grande interesse. Por DJ designa-se um tipo de “músico”**** que trabalha
com a montagem de sons reproduzidos, em
geral de autoria de outros músicos, utilizando predominantemente discos de vinil (os
antigos LPs) que manipula em seus toca-discos. Como características fundamentais da
profissão de DJ estão a extrema proximidade com a tecnologia – que eles utilizam em
todas as etapas de sua produção, aprendendo a mexer com os equipamentos pelo próprio uso – e uma formação musical basicamente popular. Os DJs são, em sua esmagadora maioria, ouvintes daquilo que
Theodor Adorno chama de música “ligeira”,
isto é, música feita nos moldes da cultura de
massa e não da cultura erudita. Podemos dizer que a tecnologia e a música popular são
sua matéria-prima. Seu som provém da manipulação direta daquilo que ouvem. Além
disso, o DJ tem como função primeira o entretenimento. Sua mais importante tarefa é
a de fazer as pessoas dançarem sob seu comando. Assim, sua música destina-se, prioritariamente, à fruição momentânea e desconcentrada que se dá na pista de dança.
Os DJs reúnem, portanto, uma série de
elementos extremamente criticados quando se
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CULTURAL
trata de preservar uma certa qualidade na produção cultural. A efemeridade de suas “composições” – quase sempre improvisos que
serão utilizados em algumas festas e depois
esquecidos – não permite uma apreciação
mais concentrada, que se detenha neste ou
naquele detalhe. No caso dos DJs, o que conta é a reação imediata, e não a assimilação
reflexiva que caracteriza a postura diante das
obras provenientes da cultura clássica. Além
disso, os DJs, para criarem suas montagens,
se utilizam de composições, arranjos e gravações feitos por terceiros. Isto os coloca no
centro de uma polêmica sobre os direitos autorais e em confronto com a distinção clássica entre cópia e original.
Ao lado de tudo isso, o que os DJs nos
apresentam é uma forma particular de confecção da música que advém de um modo de utilização de aparatos técnicos criados por eles.
Subvertendo o uso comum dos toca-discos,
os DJs deram a este aparelho uma nova dimensão. Ao invés de somente reproduzir músicas já finalizadas, o toca-discos, em suas
mãos, passa a ser tratado como um instrumento para a produção de efeitos sonoros
totalmente novos. Através da prática de
discotecagem, também os discos deixam de
ser apenas ouvidos para serem, literalmente,
tocados. Opera-se uma espécie de desconstrução da música gravada, que, a partir de sua
reutilização, é transformada e recriada.
Assim, por trás da aparente superficialidade da prática de colocar discos para fazer
as pessoas dançarem, está um processo criativo que expressa uma singular relação com
a música e com a tecnologia. Para percebêla, entretanto, é imprescindível um olhar, ou
uma escuta, interessados. O repúdio e o medo
não nos permitem tal aproximação e, portanto, não auxiliam no estabelecimento de um diá-
**** Não é unânime a opinião de que os DJs possam ser considerados de fato músicos. Daí a utilização das aspas.
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ESCOLA E PRODUÇÃO
logo com esta ou qualquer outra forma de produção cultural desconhecida ou distante de
nosso mundo. Antes de exaltar ou combater,
consideramos importante que estas produções – por sua relação com o consumo e pelo
aspecto homogeneizante da cultura de massa
– não sejam, de saída, tratadas como ilegítimas, isto é, esvaziadas de significado. Esta
desqualificação tem como conseqüência um
impedimento na interlocução não somente
com tais formas de expressão, mas também
com os sujeitos que delas participam.
Com um olhar alheio e generalizante, torna-se impossível estabelecer qualquer intervenção, crítica legítima, ou qualquer tipo de
interlocução. Este desafio se impõe e precisa
ser enfrentado, sobretudo, por aqueles que atuam junto a crianças e adolescentes. A todo o
momento, os mais jovens podem nos surpreender com formas inéditas de interação e percepção de seu cotidiano, do qual fazem parte
objetos e práticas tão novos para nós quanto
familiares para eles. Ignorar o que eles tenham
a dizer só pode resultar no aumento da distância que nos separa, e, portanto, no empobrecimento da experiência de ambos os lados.
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24
ESCOLA E PRODUÇÃO
CULTURAL
Entrando no jogo
O ato de brincar, tão necessário à formação da criança, tem se alterado nas últimas décadas. O avanço tecnológico provocou modificações nos hábitos da sociedade, incluindo as
formas de lazer; as crianças deixaram as brincadeiras de rua, passando a viver em espaços
confinados, quer seja em apartamentos, quer seja
em shopping centers. Elza Dias Pacheco, professora doutora da Escola de Comunicação e
Artes da Universidade de São Paulo (1985,
p.24), destaca muito bem o impacto causado
pela televisão no mundo infantil:
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Apesar de ser ela (a televisão) um dos mais
recentes meios de comunicação, através de
seu fascínio magnético, invadiu, indiscriminadamente, todos os lares, transformando-se
num elemento que, pela onipresença, ocupa as horas livres das crianças, impedindoas de se dedicarem a atividades participativas tais como os folguedos de outrora, onde
a criança exercitava naturalmente todo o seu
corpo e a sua imaginação.
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Kazuko Kojima Higuchi 1
As brincadeiras desenvolvidas em espaços públicos: calçadas, ruas, praças e jardins
proporcionavam às crianças viverem, segundo Edmir Perrotti (1991), “experiências de
autonomia indispensáveis à realização de suas
potencialidades criativas” e “abertura para as
diferenças de todo tipo que estão na base de
nossa constituição enquanto sociedade”. Com
o desaparecimento desse espaço, “há um estímulo de fantasias consumistas compensatórias para consolar nossas crianças do vazio
de relações socioculturais plenas. (...) A ilusão, porém, de que qualquer gadget2, qualquer
objetozinho encantador, qualquer estrelinha de
TV é capaz de distrair a atenção da infância,
desviando-a de seu desejo maior – brincar,
inventar livremente, participar da vida e dos
riscos do mundo, compartilhar jogos e brincadeiras – poderá levar-nos num curto espaço de tempo aos impasses que o logro sempre impõe. Oferecer o consumo como prêmio
de consolação à falta de participação ativa e
criadora na vida cotidiana é com certeza tiro
pela culatra, já que seu destino não é outro
senão o do vácuo significativo, do não-senti-
1
Mestre em Teoria Literária e Literatura Comparada – USP. Professora da Rede Pública de Ensino do Estado de
São Paulo.
2
Termo em inglês que significa aparelho, invenção e, no sentido figurado, insignificância. Jean Baudrillard utiliza
esse termo para designar objetos cujo valor simbólico está expresso em pessoas ou produtos que ganham status
especial, ou seja, podem ser vendidos ou consumidos em larga escala, representando objeto de desejo dos
consumidores.
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ESCOLA E PRODUÇÃO
do, do vazio de referências, da negação da
cultura” (Perrotti, 1991, pp. 23-28).
Com o desaparecimento do espaço público de lazer, as brincadeiras infantis tradicionais também foram desaparecendo. Parece
que não sentimos muita falta delas; até esquecemos a riqueza de uma atividade em grupo,
a importância da brincadeira pela brincadeira, não visando a nada imediato além do prazer compartilhado. Alguns pais colocam os
filhos em escolinhas de futebol ou estimulam,
precocemente, o lado fashion da filha visando
à futura profissionalização, todavia não é bem
este o caso, pois traz uma carga de obrigatoriedade: de acertos e de sucesso.
As brincadeiras foram, paulatinamente,
sendo substituídas por outras como os jogos
eletrônicos, cards (cartões como os da Liga
Pokémon) e os RPGs (Roleplaying Games),
gerando mais críticas negativas do que aprovação por parte dos adultos. Será que essas
atividades só apresentam aspectos negativos?
Não seria o caso de nós, educadores, conhecermos um pouco mais o que está em jogo?
Esses produtos culturais, embora apresentem características inovadoras, trazem
estreita relação com a tradição oral, aproximando-se dos contos maravilhosos. Tanto no
videogame como no RPG há uma aventura
para ser vivida, motivada por uma busca (salvar uma princesa, matar um monstro, conquistar tesouros, enfim, vencer um desafio), tendo, como recurso, poderes extras (várias vidas, força descomunal) ou objetos mágicos,
elementos da fantasia, extrapolando a vida
real e limitada (e por isso tão interessante?).
Elza Dias Pacheco (1998,pp.33-34) ressalta os jogos simbólicos como “fases transitórias de pensamento mágico e onipotente
que levam a criança, por meio de repetições
dos próprios atos ou jogos, a um pleno domínio de situações de medo, vivendo e convivendo simultaneamente com o real e o fantástico, ajudando a elaborar conflitos e angústiBOLETIM – PGM 5
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as pelo uso dialético de perda e reparação.
(...)É por meio dessa magia, desse fantástico, que a criança elabora suas perdas, materializa seus desejos, compartilha da vida animal, muda de tamanho, liberta-se da gravidade, fica invisível e, assim, comanda o universo
por meio de sua onipotência. Dessa forma, ela
realiza todos os seus desejos e as suas necessidades.” Essas considerações valem também para o adolescente e o adulto. A necessidade de ficção para alimentar o imaginário,
aliviar tensões, encontrar respostas às dúvidas, viver experiências impossíveis de serem
vividas no mundo real, rompendo com os limites do tempo e do espaço, são aspectos
relevantes nas atividades lúdicas.
Nos jogos citados, o participante interage
intensamente com o mundo imaginário e virtual. E vai além, sua vivência não se esgota no
indivíduo, há uma rede de troca de experiências que realimenta o prazer de jogar. Criase, assim, um círculo de iniciados que comentam os lances, trocam “dicas”, lêem revistas
especializadas para se atualizarem e melhorarem seu desempenho. Os adolescentes passam, então, a fazer parte de “uma tribo” (conforme expressão utilizada por eles), afastando-se do isolamento e do individualismo tão
comum na sociedade moderna.
O que mais está em jogo?
Além desse aspecto social, os novos produtos culturais favorecem o contato com novas tecnologias, o desenvolvimento da observação, a rapidez de raciocínio, a tomada de
decisões, o conhecimento de outras realidades, referenciais ou virtuais. Nestes, como no
caso dos jogos tradicionais, a questão do erro é vista sem a carga negativa; pode-se errar
muitas e muitas vezes, mas não tem importância, porque o jogador dispõe de muitas vidas e sempre é possível reiniciar o jogo. Os
insucessos são estímulos para continuar jogando, até ultrapassar as marcas alcançadas
por ele ou por outro jogador.
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ESCOLA E PRODUÇÃO
No caso do RPG, como em todo jogo simbólico, a linguagem tem papel fundamental.
Como bem destaca Edda Bomtempo (1999,
p.64), baseada em Vygotsky, a linguagem e
jogo simbólico “são expressões de um sistema mediado, no qual eventos internos, imagens ou palavras, servem para orientar e dirigir o comportamento” e, continua ela, “o jogo
simbólico é um mecanismo comportamental
que possibilita a transição de coisas como
objetos de ação para coisas como objetos do
pensamento”. À medida que o mestre vai narrando a história, os jogadores vão tomando
decisões dando um encaminhamento ímpar,
embora haja um esquema básico a ser seguido. Outros fatores como entonação de voz,
expressão facial e corporal, adaptação de vestuário, canto, música, enriquecem o jogo de
encenação. Muitas vezes, a sorte é decidida
nos dados; são feitos cálculos de probabilidade, lançando dados de 4, 6, 8, 10 ou 12 lados. Em outros momentos, faz-se necessário
utilizar o senso de direção e escolher o caminho certo, para o Norte ou para Leste; sendo
fundamental a iniciação na leitura de mapas.
Os jogos e brincadeiras, em geral, fazem
visbumbrar uma rica gama de atividades envolvendo os diferentes códigos e linguagens:
a expressão corporal (brincando de estátua),
a linguagem verbal e musical (cantigas de
roda), a instrucional (obediência a regras),
vídeo, áudio ou multimídia (tecnologias da informação), para citar algumas.
Há um consenso de que novos desafios
se apresentam à escola tradicional, uma vez
que a sociedade alterou-se: globalização e
tecnologia são termos presentes. Os Parâmetros Curriculares Nacionais propõem o rompimento dos limites estanques das disciplinas, porque o conhecimento não é passível
desse enquadramento, como deixava supor em
outros momentos. Temas transversais, pluralidade cultural, interdisplinaridade, diferentes
códigos e linguagens são aspectos que vêm
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CULTURAL
atualizar uma prática já em transformação,
apontando para um ensino mais global. E nesse sentido, os jogos poderiam ser uma fonte
a ser apropriada pela escola.
Para sair do individualismo, tão comum
nos dias atuais, precisamos conviver com outras pessoas, compartilhar experiências. É no
contato com outras pessoas que as personalidades se desenvolvem, na ação e na reação
que provocam. As brincadeiras tradicionais
poderiam ser resgatadas e os novos jogos
incorporados, constituindo-se a escola num
espaço de interação cultural, onde o moderno
e o velho integrassem um novo diálogo.
Sugestão de atividades
Fazer um levantamento com os alunos sobre as brincadeiras que conhecem. Posteriormente, intercambiar essa pesquisa pela
Internet.
Selecionar algumas para serem brincadas.
Em grupo, escrever as regras de um jogo,
apresentando-o à classe. Pode-se solicitar
que um grupo descubra o jogo, através da
leitura de algumas regras básicas.
Criar novas regras aos jogos já existentes.
Promover um campeonato. Por exemplo:
Concurso de pipas. Muitas são as atividades possíveis: elaboração da ficha de inscrição, regulamento (quem se inscreve,
quais são as modalidades: a maior, a menor, a que voa mais alto, a mais criativa),
execução da pipa, dia do evento, premiação,
relatório posterior, desenhos, pesquisa, elaboração de um jornal mural etc.
Jogos de “faz-de-conta” e RPG: criação de
personagens (nome, idade, atributos físicos
e mentais, caracterização da família, da moradia, do bairro), representação plástica
(desenho ou boneco), invenção da aventura, desafios a serem vencidos, criação de
um espaço (mapa ou maquete).
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ESCOLA E PRODUÇÃO
Jogos eletrônicos: os objetivos do jogo,
quais são os obstáculos a serem vencidos,
como vencer. No caso do Mário Bros, por
exemplo, elencar suas ações, relatar uma
passagem, pedir para alguém imitá-lo,
desenhá-lo, criar uma aventura envolvendo
a personagem, criar uma história em quadrinhos.
Questão a ser discutida: É possível desenvolver um projeto multidisciplinar a partir
desses jogos? De que forma? Quais áreas/
disciplinas estariam envolvidas?
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USP. Professora da Rede Pública de Ensino do
Estado de São Paulo.
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Presidente da República
Fernando Henrique Cardoso
Ministro da Educação
Paulo Renato Souza
Secretário de Educação a Distância
Pedro Paulo Poppovic
MEC
Secretaria de Educação a Distância
Programa TV Escola – Salto para o Futuro
Diretora de Planejamento e
Desenvolvimento de Projetos
Carmen Moreira de Castro Neves
Coordenadora-Geral de
Planejamento e Desenvolvimento de
Educação a Distância
Tânia Maria Magalhães Castro
Diretor de Produção e Divulgação
de Programas Educativos
Antonio Augusto Silva
Coordenadora-Geral de Material
Didático-Pedagógico
Vera Maria Arantes
Associação de Comunicação Educativa Roquette-Pinto - ACERP
Supervisora Pedagógica
Rosa Helena Mendonça
Consultoria Pedagógica
Rita Marisa Ribes Pereira
Coordenadoras de Utilização
e Avaliação
Mônica Mufarrej e
Leila Atta Abrahão
Copidesque e Revisão
Magda Frediani Martins
Programadora Visual
Norma Massa
e.mail: [email protected]
Abril de 2001
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