Pdf - AAPJ - Associação Amizade Portugal Japão

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DEPARTAMENTO DE HISTORIA DA FACULDADE DE LETRAS DA
UNIVERSIDADE DE LISBOA
O Comércio entre Macau e o Japão
1555 - 1639
SAMUEL VEIGA SILVA
LICENCIATURA EM ESTUDOS ASIÁTICOS
História dos Descobrimentos e da Expansão Portuguesa
TP1
41289
PROFESSOR ORIENTADOR: Maria Leonor García Cruz
NOVEMBRO 2011
Índice
Introdução. ............................................................................................. 2
Estabelecimento de Macau e Nagasáqui.................................................. 2
A Nau do Trato e mercadorias ................................................................. 3
Conclusão ................................................................................................ 6
Bibliografia .............................................................................................. 7
Introdução
Neste trabalho vou abordar o estudo da ligação maritima entre Macau e Nagasáqui,
especialmente na sua faceta comercial. Escolhi este tema, pois, o comercio entre estas
duas cidades foi dos mais prósperos durante a presença portuguesa no Japão e além
disso, era através dos mercadores portugueses que se fazia grande parte do comercio
entre o Japão e a China. Irei analisar algumas obras especificas sobre o assunto e
recorrer a outras obras gerais para que seja possível um melhor enquadramento no
aspecto mais geral da presença dos portugueses no Oriente. Devo também explicar a
escolha do período a analisar. Em 1555 os portugueses conseguem, por fim, uma base
na costa China, Macau. Isso acontece após várias tentativas de se estabelecerem em
portos mais a norte, mas sem sucesso. O ano de 1639 é muito importante porque
marca a saída do édito do shogunato que expulsava todos os portugueses, mercadores
e missionários, do Japão, bem como o impedimento do seu regresso. Apesar do
comercio entre Macau e Nagasáqui não ter terminado exacatamente nesta data, ela
marca e ínicio do fim desta próspera rota comercial.
O comércio entre Macau e o Japão está bem documentado e bem estudado. Para isso
são essenciais os relatos da época, feitos na sua maioria por missionários e padres
jesuítas, sobre os quais os estudos recaíem. Neste campo, recorro ao estudo sobre o
comércio entre Macau e Nagasáqui feito por Charles R. Boxer na sua obra O Grande
Navio de Amacau e a obra de João Paulo Oliveira e Costa Portugal e o Japão – O Século
Namban, entre outras obras de cômputo geral.
Estabelicimento de Nagasáqui e de Macau
Como é sabido a presença portuguesa na Ásia é marcada pelo controlo de rotas
maritímas, muito rentáveis, mas que já eram conhecidas pela população local. Assim
quando chegaram ao Mar da China, os navegadores portugueses aperceberam-se do
grande comércio que existia ali, entre a China e os seus estados vizinhos. O caso do
comércio com o Japão tornou-se especialmente interessante para os portugueses, pois
a dinastia Ming havia cortado todo o comércio (legal) com os japoneses devido ao
constante ataque dos piratas japoneses, chamados de wako. Então como se tinha
tornado hábito, começou a procura por uma base fixa quer no Japão quer na China.
Nesta sua busca os portugueses vão tentar, primeiro fixar-se em Liampó, no Fuquiem,
na costa chinesa. É pouco tempo depois disto, um ano depois, 1 os primeiros
portugueses desembarcam na ilha de Tanegashima. Quem foram os primeiros a chegar
1
OLIVEIRA E COSTA, J.P. Portugal e o Japão – O Século Namban, Lisboa, Imprensa Nacional Casa da Moeda, 1993,
pág. 18
2
não há certeza2, mas o certo é que este acontecimento iria afectar tanto os japoneses
como os portugueses no extremo oriente.
Os portugueses aperceberam-se que se queriam tirar muito proveito do comércio
China-Japão tinham de ter bases fixas. Na China isso seria um problema, devido
especialmente ao sentimento xenófobo dos nativos. Assim os portugueses tiveram de
sair de Liampó, em direcção ao Sul, e após várias tentativas de se fixarem noutros
portos, os portugueses invernaram numa ilha perto da foz do Rio das Pérolas. Nessa
ilha com a permissão das autoridades cantonesas, os portugueses poderam,
finalmente, estabelecer-se fundando a cidade porto de Macau3.
No Japão as relações entre portugueses e japoneses eram mais afáveis, chegando os
Daimyo4 a disputarem entre si onde os nanbanjin, os “bárbaros do sul ” como eram
chamados os portugueses, deviam ter o seu porto. Os portugueses nos primeiros anos,
andaram de porto em porto, como o de Hirado, Satsuma e Bungo. O porto de Hirado
era de especial interesse para os portugueses pois ficava na costa ocidental de Kyushu,
diminuindo o tempo da viagem. Mas antes de se fixarem em Nagasáqui, os
portugueses tiveram a sua base em Bungo, isto porque o seu Daimyo, Otomo, foi um
dos primeiros Daimyo cristãos. Essa situação foi importante porque nesta altura já se
fazia sentir a importância dos jesuítas e a sua missionização no Japão5. Por fim, em
1571, após o fundear de embarcações portuguesas em Kuchinotsu6, foi fundada
Nagasáqui e entregue o seu controlo aos jesuítas7.
Assim os comerciantes portugueses passaram a ter duas bases fixas para o comércio
entre o Japão e a China. Comércio esse que foi consedido pelas autoridades
exclusivamente aos portugueses, devido à situação mencionada acima.
A Nau do Trato e mercadorias
Neste tópico vou abordar como e que tipo de comércio era feito entre Macau e
Nagasáqui. Primeiro como ele era feito.
A chegada dos portugueses ao Japão ficou marcada pelo tipo de embarcação utilizada
por eles ao desembarcarem as suas mercadorias nos portos. Esse tipo de nau ficou
marcada na história e língua japonesa como Kurofune, isto é, o Barco Negro, devido,
possivelmente ao tom escuro da madeira da nau. Esta Kurofune, muitas vezes
representado em biombos japoneses (imagem 1) era o que os portugueses
2
Idem, ibidem págs. 18-19
Idem, ibidem pág. 20
4
Podemos entender um Daimyo, como um senhor feudal japonês, embora o termo seja deficiente.
5
Idem, ibidem pág. 23
6
Idem, ibidem pág. 23
7
BOXER, Charles, O Grande Navio de Amacau, Lisboa, Fundação do Oriente e Museu e centro de Estudos Maritimos
de Macau, 1989, 4ªedição pág. 2
3
3
designavam como A Nau do Trato 8 . Era através da Nau do Trato que a coroa
portuguesa fazia a maioria do comercio entre a China e Japão e retirava o seu maior
proveito. Embora a Nau do Trato tivesse grande importância no comércio China-Japão,
esse também era feito por privados em barcos menores, na maioria das vezes chineses,
chamados pelos portugueses de somas9. Esse comércio era muitas vezes efectuado a
revelia das autoridades, prática remanescente dos piratas wako. A Nau do Trato fazia a
sua rota anualmente, esperando pelas monções para sair de Goa em direcção a Malaca,
subindo de pois até Macau e finalmente indo até Nagasáqui. Algumas vezes a Nau teve
de invernar em Nagasáqui, não cumprindo o desejo da Coroa de não o fazer. Na
imagem 2 podemos ver a rota da Nau do Trato desde Goa até Nagasáqui.
A Nau do Trato desempenhava um papel de muita importância para Macau e
Nagasáqui. Não só por causa do comércio e dos materiais que comerciava, que iremos
ver de seguida, mas porque o Capitão-Mor da Nau do Trato foi durante muitos anos o
representante máximo da Coroa em Macau e Nagasáqui, exercendo poderes de
Governador Interino de Macau, o que causou muitos atritos com o Senado da Câmara
de Macau10. Em Nagasáqui, apesar de esta cidade estar sob o controlo dos jesuítas,
quando a Nau do Trato chegava e o Capitão-Mor era chamado à corte do Shogun, este
era recebido como se fosse um Daimyo11. Além da grande reverência que o cargo
possuía, ele também proporcionava muitos ganhos monetários. Por isso não é de
admirar que, embora de ínicio fosse um gargo concedido devido a méritos, ele tenh
passado a ser um cargo comprado pelo licitação maior12.
Os grandes ganhos do comércio Macau-Nagasáqui deviam-se principalmente a dois
productos, a prata japonesa e a seda chinesa13. Em relação à prata japonesa, ela era
muito apreciada pelos chineses, não que fosse de uma qualidade superiror, mas
porque a certa altura os chineses apenas aceitavam pagamentos em prata e esta
tornara-se pouco para a demanda que tinha. Já a seda chinesa era também muito
apreciada pelos japoneses. Estes eram produtores de seda, mas preferiam a vinda da
china, quer crua, quer tecida, pois era de maior qualidade. Embora não tivessem o
grande impacto destes dois produtos, havia mais produtos em circulação, como o
bronze, espadas, lanças e outros. De salientar são os produtos de madre-pérola
produzidos no Japão, conhecidos como produtos Nanban (imagem 3).
Este comercio manteria-se estável, até cerca de 1639. É neste ano, como já referido,
que o Shogun lança o édito de expulsão de todos os portugueses. Anteriormente já
havia lançado um edito de expulsão dos missionários, mas como os mercadores
portugueses continuavam a trazê-los infiltratos, o Shogun com medo de que o
8
O Grande Navio de Amacau segundo lhe chama Boxer
Idem, ibidem pág. 12
10 Idem, ibidem pág. 8
11 Idem, ibidem pág. 9
12 Idem, ibidem pág. 7
13
Idem, ibidem pág. 6-7
9
4
catolicismo se tornasse numa causa de desordem e desunião decidiu elimanar por
completo a ameaça. Tentativas futuras de reabrir o comercio, efectuadas pela Coroa,
não foram sucedidas, ficando apenas os holandeses como intermidiários estrangeiros
no Japão, mas com fortes restrições. Mesmo assim o comércio entre Macau e o Japão
continuou, apenas não em grande escala e por “portas travessas”.
Imagem 1 - Biombo Nanban mostrando a chegada da Kurofune (MNAA)
Imagem 2 – Rota da Nau do Trato de Goa a Nagasáqui (O Grande Navio de Amacau)
5
Imagem 3 – Contador Nanban (MNAA)
Conclusão
O objecto de estudo escolhido, o comércio entre Macau e o Japão, Japão
nomeadamente Nagasáqui, durante a presença portuguesa em terras japonesas está
bem documentado e muito estudado. É interessante notar, que mesmo em obras mais
gerais como a enciclopédia de Bethencourt e Chaudhuri, História da Expansão
Portuguesa, este assunto está muito bem abordado. Também outros estudos mais
especificos, como a obra mencionada de João Paulo Oliveira e Costa portugal e o Japão
– O Século Nanban, apresentam de maneira interessante a importancia deste
comercio para a presença portuguesa no Japão. Outra obra utilizada e de grande
importancia para o estudo deste assunto é O Grande Navio de Amacau por Charles R.
Boxer, na qual ele apresenta não só uma disertação sobre o problema, como também
vários documentos, na lingua original, sobre quem ia nesta rota, as mercadorias
comerciadas, entre outros. Para um estudo mais compreensivo deste assunto, penso
que esta é uma obra essencial, bem como a consulta de documentos da época.
Em suma, como já referi, este é um assunto bem estudado, que, provavelmente, não
carece de estudo, mas muito interessante e essencial para a compreensão da prsença
portuguesa no extremo oriente.
6
Bibliografia
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