Relatório Nike - Ministério do Esporte

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Relatório Nike - Ministério do Esporte
COMISSÃO PARLAMENTAR DE
INQUÉRITO DESTINADA A APURAR A
REGULARIDADE DO CONTRATO
CELEBRADO ENTRE A CBF E A NIKE
Relator: SÍLVIO TORRES
Presidente:
ALDO REBELO
1º Vice-Presidente: NELO RODOLFO
2º Vice-Presidente: PEDRO CELSO
3º Vice-Presidente: EURICO MIRANDA
SUB-RELATORES
Eduardo Campos
Jurandil Juarez
José Rocha
Dr. Rosinha
Léo Alcântara
Olímpio Pires
Tráfico de Menores
Passaportes Falsos
Legislação
Federações Sul e Nordeste
Federações Sudeste
Federações Norte Centro Oeste
JUNHO/2001
ÍNDICE
COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO DESTINADA A APURAR A
REGULARIDADE DO CONTRATO CELEBRADO ENTRE A CBF E A NIKE (CPI
CBF/NIKE).
Composição............................................................................................................................1
DEMONSTRATIVO ESTATÍSTICO DAS REUNIÕES REALIZADAS...................... 2
AGRADECIMENTOS ......................................................................................................... 4
Introdução ............................................................................................................................. 8
Capítulo I – O futebol brasileiro: diagnóstico de suas dimensões; sugestões ............13
Capítulo II - Legislação Desportiva: Evolução Histórica................................................ 24
Capítulo III – A CBF é uma associação civil sem fins lucrativos ................................... 34
Capítulo IV – O Contrato entre a CBF, a Nike e a Traffic............................................. 56
Capítulo V -- Outros Contratos da CBF. A Parceria com a Traffic............................... 78
Capítulo VI – Administração da CBF acumula prejuízos.................................................91
Capítulo VII – Empréstimos no Exterior a juros extorsivos...........................................130
Capítulo VIII – Doações políticas. Criação de uma rede de influência política no
Congresso. ..........................................................................................................................156
Capítulo IX – Declarações de Renda de Ricardo Teixeira.............................................175
Capítulo X - Federações: desagregação da organização conferativa ............................. 191
ACRE .............................................................................................................................. 194
ALAGOAS....................................................................................................................... 197
AMAPÁ ........................................................................................................................... 201
amazonas .......................................................................................................................... 209
BAHIA ............................................................................................................................. 227
BRASÍLIA ....................................................................................................................... 234
CEARÁ ............................................................................................................................ 249
ESPÍRITO SANTO .......................................................................................................... 253
GOIÁS............................................................................................................................. 259
MARANHÃO .................................................................................................................. 266
MATO GROSSO ............................................................................................................. 276
MATO GROSSO DO SUL ............................................................................................... 287
MINAS GERAIS.............................................................................................................. 292
PARÁ............................................................................................................................... 304
paraíba ............................................................................................................................. 309
PARANÁ ......................................................................................................................... 319
PERNAMBUCO .............................................................................................................. 331
piauí ................................................................................................................................. 338
rio de janeiro.................................................................................................................... 348
RIO GRANDE DO NORTE............................................................................................. 352
RIO GRANDE DO SUL................................................................................................... 358
rondônia........................................................................................................................... 372
RORAIMA....................................................................................................................... 380
santa catarina................................................................................................................... 388
SÃO PAULO.................................................................................................................... 392
sergipe .............................................................................................................................. 398
Tocantins ......................................................................................................................... 403
Capítulo XI – Passaportes falsos de jogadores ............................................................... 406
Capítulo XII - Fábrica de “gatos”. Falsificação de identidades e tráfico de menores
para o Exterior................................................................................................................... 440
Capítulo XIII - Negócios de Juan Figer...........................................................................461
Capítulo XIV - Hélio Viana e Pelé Sports ....................................................................... 478
CAPÍTULO XV - OUTROS DEPOIMENTOS............................................................. 489
1. Depoimento do Deputado Federal Eurico Miranda ...................................................... 489
2. Depoimento de Kleber – Presidente da Kleffer........................................................... 501
3. Depoimento de Wanderley Luxemburgo ...................................................................... 506
Capítulo XVI -- Segurança nos Estádios........................................................................ 523
Capítulo XVII -- A Questão das Arbitragens.................................................................. 530
CAPÍTULO XVIII - PAINÉIS SOBRE A LEGISLAÇÃO DESPORTIVA ................ 533
XIX – CONCLUSÕES...................................................................................................... 540
ANEXOS ............................................................................................................................619
COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO DESTINADA A APURAR A
REGULARIDADE DO CONTRATO CELEBRADO ENTRE A CBF E A
NIKE (CPI CBF/NIKE).
Criada pelo RCP nº 0003/99 Constituída em: 16/10/2000 Instalada em: 17/10/2000
COMPOSIÇÃO
PRESIDENTE:
1º VICE-PRESIDENTE:
2º VICE-PRESIDENTE:
3º VICE-PRESIDENTE:
RELATOR:
TITULARES
DEPUTADO ALDO REBELO (PCdoB-SP)
DEPUTADO NELO RODOLFO (PMDB-SP)
DEPUTADO PEDRO CELSO (PT-DF)
DEPUTADO EURICO MIRANDA (PPB-RJ)
DEPUTADO SILVIO TORRES (PSDB-SP)
SUPLENTES
Bloco PSDB, PTB
ALEX CANZIANI (PSDB/PR) - 5842
ALEXANDRE SANTOS (PSDB/RJ) - 5302
IRIS SIMÕES (PTB/PR) - 5948
LÉO ALCÂNTARA (PSDB/CE) - 5726
(PSDB/CE) - 5725
MAX ROSENMANN (PSDB/PR) - 5758
SILVIO TORRES (PSDB/SP) - 5624
BASÍLIO VILLANI (PSDB/PR) - 5634
FERNANDO GONÇALVES (PTB/RJ) - 5256
JUQUINHA (PSDB/GO) - 5335
RAIMUNDO GOMES DE MATOS
DARCÍSIO PERONDI (PMDB/RS) - 5518
GEOVAN FREITAS (PMDB/GO) - 5580
JOSÉ LOURENÇO (PMDB/BA) - 5313
JURANDIL JUAREZ (PMDB/AP) - 5383
NELO RODOLFO (PMDB/SP) - 5660
ANTÔNIO DO VALLE (PMDB/MG) - 5503
JOÃO MAGALHÃES (PMDB/MG) - 5211
JORGE PINHEIRO (PMDB/DF) - 5837
JOSÉ BORBA (PMDB/PR) - 5616
PEDRO CHAVES (PMDB/GO) - 5406
SÉRGIO REIS (PSDB/SE) - 5958
YEDA CRUSIUS (PSDB/RS) - 5956
Bloco PMDB, PST, PTN
CHICO SARDELLI (PFL/SP) - 5706
CORAUCI SOBRINHO (PFL/SP) - 5460
JAIME MARTINS (PFL/MG) - 5333
JOSÉ MENDONÇA BEZERRA (PFL/PE) - 5314
JOSÉ ROCHA (PFL/BA) - 5908
DR. ROSINHA (PT/PR) - 5474
EDUARDO CAMPOS (PSB/PE) - 5846
PEDRO CELSO (PT/DF) - 5572
EURICO MIRANDA (PPB/RJ) - 5420
JOSÉ JANENE (PPB/PR) - 5608
OLIMPIO PIRES (PDT/MG) - 5384
ALDO REBELO (PCdoB/SP) - 5924
LUCIANO BIVAR (PSL/PE) - 5717
RUBENS FURLAN (PPS/SP) - 5836
PFL
PT
PPB
EXPEDITO JÚNIOR (PFL/RO) - 5240
ILDEFONÇO CORDEIRO (PFL/AC) - 5231
JOSÉ MÚCIO MONTEIRO (PFL/PE) - 5458
LUIS BARBOSA (PFL/RR) - 5340
ROBERTO PESSOA (PFL/CE) - 5607
GERALDO MAGELA (PT/DF) - 5479
JOSÉ GENOÍNO (PT/SP) - 5270
TÂNIA SOARES (PCdoB/SE) - 5625
HERCULANO ANGHINETTI (PPB/MG)-5241
PDT
TELMO KIRST (PPB/RS) - 5424
JOÃO SAMPAIO (PDT/RJ) - 5944
Bloco PSB, PCdoB
1 vaga
Bloco PL, PSL
PPS
VALDECI PAIVA (PSL/RJ) - 5508
REGIS CAVALCANTE (PPS/AL) - 5724
COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO DESTINADA A APURAR A
REGULARIDADE DO CONTRATO CELEBRADO ENTRE A CBF E A
NIKE.
DEMONSTRATIVO ESTATÍSTICO DAS REUNIÕES
REALIZADAS
1 - AUDIÊNCIAS PÚBLICAS :
- nº de reuniões realizadas: 35
- nº de horas: 188 h 26 min. – média aproximada de 5 h37 min., por
reunião
- nº de depoentes: 100 – média aproximada de 3 por reunião
reunião
reunião
- nº de Parlamentares participantes: 380 – média aproximada de 11 por
- nº de indagações formuladas: 1.900 – média aproximada de 55 por
2 - ORDINÁRIAS:
-
nº de reuniões realizadas: 17
-
nº de horas: 23 h 39 min. – média aproximada de 1 h 37 min. por reunião
-
nº de Parlamentares participantes: 222 – média aproximada de 13 por reunião
3 - REUNIÕES DA SUB-RELATORIA DE LEGISLAÇÃO :
-
nº de reuniões realizadas: 7
-
nº de horas: 25 h 11 min. – média aproximada de 3 h 58 min. por reunião
-
nº de depoentes: 25 – média aproximada de 4 por reunião
-
nº de Parlamentares participantes: 52 – média aproximada de 8 por reunião
-
nº de indagações formuladas: 260 – média aproximada de 37 por reunião
4 - TOTAL DE REUNIÕES (CPI + SUB-RELATORIA)
-
nº de reuniões realizadas: 59
-
nº de horas: 237 h 16 min. – média aproximada de 4 h por reunião
-
nº de depoentes: 125 – média aproximada de 2 por reunião
-
nº de Parlamentares participantes: 654 – média aproximada de 11 por reunião
-
nº de indagações formuladas: 2.160 – média aproximada de 37 por reunião
AGRADECIMENTOS
Cresci no interior de São Paulo praticando futebol nas calçadas, nas ruas
de terra, nos campinhos improvisados no meio de pastos e em espaços de recreio nas
escolas. Privilegiado dentre tantos da minha idade, cheguei aos clubes que dispunham
de campos de verdade para categorias menores. Não fui longe, mas me tornei um
torcedor apaixonado e praticante bissexto mantendo com o futebol uma relação
constante em toda a minha vida.
Minha cidade, São José do Rio Pardo, diferentemente do que aconteceu
comigo, revelou craques que se destacaram, forjados em condições semelhantes que
tive na infância e juventude.
Richard, que jogou pelo Palmeiras no início da década de 50, abriu
caminho para uma fila de ídolos da terra que revelou e projetou Modesto, pelo Santos;
Aloísio, pela Portuguesa; Zanata, pelo Vasco; Rondinelli, pelo Flamengo; Edson e Luiz
Fernando, pelo Corinthians; Márcio Araújo, pelo São Paulo, e outros jogadores de bom
nível técnico. Tive o prazer de conviver e até mesmo de jogar com eles nas 'peladas' e
em torneios municipais.
Minhas ligações com o futebol começaram bem antes e estão
relacionadas à própria história da minha família: meu pai, Lupércio Torres, foi jogador e
presidente do Rio Pardo F. C. que, a exemplo de outro time da cidade – a Associação
Atlética Rio Pardense - disputou campeonatos amadores do Estado na década de 40.
Meus irmãos seguiram destinos parecidos: Lupércio e Elizabeth ocuparam cargos de
direção do mesmo clube e, um outro irmão já falecido, Marcus, foi diretor do
Corinthians nos anos 80, atuando no futebol amador e no basquete.
Permito-me registrar essas reminiscências pessoais para afirmar que elas
foram um importante estímulo para a minha tarefa de levar à frente esta CPI, tarefa que
julgo ter cumprido sem abdicar do enorme prazer que o tempo da minha vida ligado ao
futebol me proporcionou.
Creio eu, lembranças parecidas que a maioria dos brasileiros ainda
preserva na memória e no coração.
No entanto, as profundas crises moral e técnica que vêm destruindo o
futebol brasileiro nos últimos anos acabaram afetando até mesmo os sentimentos e o
interesse de milhões de simpatizantes e torcedores pelo futebol, que fugiram dos
estádios, mudaram de canal de televisão e desligaram o rádio, indignados com
denúncias de escândalos e irregularidades que estão presentes nos mais diferentes
setores do nosso futebol.
A isso se deve a criação desta CPI. Ela nos levou a dedicar oito meses de
trabalho, na busca da identificação das causas e dos agentes que permitiram tamanho
descalabro.
O relatório que apresentamos é o resultado da investigação que a
Comissão realizou por todo o País e, em alguns casos, até no exterior, para esclarecer a
opinião pública sobre a realidade do futebol brasileiro, que se expressa não apenas nos
oscilantes índices técnicos e no ufanismo de conveniência que tentam esconder a sujeira
debaixo do tapete.
Por isso, como se verá, além de analisar o contrato CBF/NIKE,
procuramos trazer à luz todos os fatos que envolvem setores do futebol brasileiro
relacionados com a entidade-mãe, a CBF, e, em especial, os contratos com
patrocinadores, a administração da entidade e sua relação com as federações, além da
ação dos empresários e agentes que representam interesses comerciais, econômicos e
políticos.
A CPI ouviu 125 pessoas; recebeu e analisou milhares de documentos e,
além de repassar com transparência à opinião pública tudo o que encontrou, utilizou-se
dessas informações para elaborar, na forma de projeto de lei, uma proposta para
modernização e moralização do futebol brasileiro.
Essa é a colaboração maior que acreditamos ter dado para ver resgatada a
credibilidade desse esporte, que hoje se constitui em uma importante alavanca para a
economia do País e, mais do que isso, queremos também preservá-lo como patrimônio
cultural inalienável que o transforma em um bem público - o único que consegue unir
todo o território nacional em torno de uma só paixão, democraticamente dividida por
classes e segmentos sociais.
Ao encerrar essa tarefa, que não contém a pretensão de preencher todas
as expectativas da sociedade, estou convicto de que a CPI CBF/NIKE vai dar uma
importante contribuição para que a ética, a transparência e o interesse público sejam
valores essenciais para habilitar as pessoas e entidades que pretendam comandar o
futebol brasileiro e levá-lo à condição de líder inquestionável do futebol mundial.
O presidente da CPI, deputado Aldo Rebelo, foi o criador desta
Comissão, pela qual lutou e à qual deu um brilho especial pela sua dedicação e
liderança. Agradeço o privilégio de tê-lo tido como parceiro, assim como aos subrelatores, Dr. Rosinha, Eduardo Campos, José Rocha, Léo Alcântara e Olímpio Pires.
Aos demais membros da Comissão, que se revezaram no trabalho de
acompanhar audiências e sessões de votação, registro também meus agradecimentos,
extensivos aos funcionários incansáveis da Secretaria da CPI, aos consultores e
assessores da Câmara e aos colaboradores cedidos por outros órgãos, cujos nomes são
listados em outro espaço do relatório.
À imprensa, em especial à imprensa esportiva, agradeço o estímulo pelo
acompanhamento constante e das informações relevantes que nos trouxeram, como
também o fizeram inúmeros amigos e torcedores que se manifestaram pessoalmente e
por correspondências enviadas à Comissão.
Agradeço, ainda, ao líder e hoje presidente Aécio Neves que me escolheu,
em meio a tantos companheiros competentes, para representar o partido nessa
Comissão, sem interferir na minha liberdade de ação.
Um especial agradecimento faço à minha mulher, Vera Lúcia, e aos meus
filhos, Fábio, Henrique e Marina, apoio de todos os momentos, especialmente daqueles
nos quais tive que me ausentar para realizar este trabalho.
SILVIO TORRES
Relator
AGRADECIMENTOS:
SECRETARIA DA CPI
•
•
•
•
•
ANTONIO CARLOS BARBOSA
DEISE SIQUEIRA DEL NEGRO
ESTEVAM DOS SANTOS SILVA
MARCOS FIGUEIRA DE ALMEIDA
MARIA TEREZINHA DONATI
ASSESSORIA DA CPI
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•
CARLOS ALBERTO DE AZEVEDO
CARLOS ANTÔNIO MENDES RIBEIRO LESSA
EMILE PAULUS BOUDENS
KÁTIA DE CARVALHO JACOPPETTI
LUIZ HENRIQUE CASCELLI DE AZEVEDO
PAULO DE SENA MARTINS
REQUISITADOS DE OUTROS ÓRGÃOS
•
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•
•
•
AGNALDO ANTONIO GISLENI – BACEN
ANDRÉ LUIZ DE CARVALHO - TCU
EDUARDO PINGARILHO MENDIZABAL – BANCO DO BRASIL
FLÁVIO BRITO MAGNO – BACEN
JOAQUIM PINHEIRO BEZERRA DE MENEZES – BACEN
MIGUEL DE SIQUEIRA VERAS – BACEN
NORBERTO DE SOUZA MEDEIROS - TCU
• PEDRO ARRAES DE ALENCAR – BACEN
INTRODUÇÃO
A CPI para apurar a regularidade do contrato CBF-Nike foi requerida em
11 de março de 1999. E foi instalada em 17 de outubro de 2000, dezenove meses
depois. Esse intervalo de quase dois anos é revelador das imensas resistências que se
antepuseram à sua criação. Também durante sua vigência esta CPI encontrou
dificuldades e obstáculos de variados tipos às suas investigações. E atuou ameaçada de
ter seus trabalhos encerrados a qualquer momento. Seu fim prematuro foi anunciado
inúmeras vezes pela imprensa. Trabalhou, pois, sob uma condição sui generis, porque as
outras CPIs da Casa não costumam sofrer essa pressão, e há até uma delas que está em
funcionamento já pelo segundo ano (sobre mortalidade materna). Encerra-se após oito
meses. Cabe à sociedade avaliar contribuição que deu para o aperfeiçoamento do
esporte nacional.
POR QUE UMA CPI PARA INVESTIGAR O FUTEBOL?
Por volta de 1993 a Confederação Brasileira de Futebol, a CBF,
começou a chamar mais a atenção da opinião pública pelas suspeitas de irregularidades
na sua administração do que pelas façanhas da Seleção canarinho. O empresário Edson
Arantes do Nascimento, o Pelé, veio a público para denunciar que sua empresa de
intermediação de patrocínios e de negócios de direitos de imagem televisivos na área
esportiva, a Pelé Sports, havia sido vítima de uma tentativa de chantagem. A Pelé
Sports tentava comprar junto à CBF os direitos de transmissão de imagem do
Campeonato Brasileiro de 1994. Ofereceu 5 milhões de dólares por esses direitos. Pelé
acusou o então diretor financeiro da CBF, José Carlos Salim, de exigir uma propina de
um milhão de dólares, depositados num Banco da Suíça, para fechar o contrato. Pelé
recusou-se a pagar e denunciou o fato à imprensa. Ricardo Teixeira, presidente da CBF,
processou Pelé. Denúncias mútuas, agressões verbais, represálias, iriam se suceder
durante os últimos sete anos.
Essa polêmica revelou que nos bastidores do futebol nacional se
desenrolava uma concorrência feroz entre empresas de intermediação de negócios
publicitários na área esportiva, envolvendo também emissoras de TV e grandes clubes
de futebol agrupados no “Clube dos Treze”. A empresa Traffic Assessoria e
Comunicação, do ex-jornalista esportivo José Hawilla, saíra na frente e levava
vantagem. Conseguira firmar contratos de exclusividade para intermediação de certos
direitos da CBF. Vantagem que havia de se tornar virtual monopólio a partir das
denúncias de Pelé, já que, desde então a Pelé Sports seria praticamente banida de
negócios no Brasil durante a década dos 90. A luta comercial estendeu-se até à
retaliação pessoal contra Pelé. Como no episódio em que João Havelange, então
presidente da FIFA, solidário com seu então genro e sócio, Ricardo Teixeira, alijou
Pelé, a maior celebridade do universo do futebol, das cerimônias oficiais de abertura da
Copa do Mundo de 1994.
A conquista do tetra-campeonato pelo Brasil na Copa de 94 foi o
momento de maior prestígio da CBF sob direção de Ricardo Teixeira. Poderia ter
significado o alívio das críticas que a direção da entidade vinha recebendo. Mas a
repercussão da gloriosa conquista acabou parcialmente comprometida dois dias depois,
pelo “Vôo da Muamba”. De volta ao Brasil, a delegação tetracampeã provocou
escândalo ao tentar trazer 17 toneladas de bagagem, sem passar pela Alfândega. Por um
instante a Nação suspendeu os aplausos e assistiu perplexa a um espetáculo de
arrogância e truculência, encenado pelo presidente da CBF, que tentava colocar-se
acima da lei.
Em 1997, estourou o Escândalo da Arbitragem, que envolveu Ivens
Mendes, até então responsável pela Comissão Nacional de Arbitragem da CBF,
CONAF. Acusado de graves irregularidades, Ivens Mendes foi afastado da função,
decisão tomada em Assembléia Geral da CBF. Intensificou-se o debate sobre os
chamados “instrumentos de poder da cartolagem”, ou seja, a justiça desportiva, a
arbitragem e o passe.
O futebol profissional havia se convertido plenamente num produto
comercial, movimentava vultosos capitais. Essa tendência encontrava respaldo na
mudança de legislação -- “Lei Zico” em 1993; “Lei Pelé” em 1998, -- que abriam
espaço para a intervenção empresarial em seu gerenciamento. Generalizava-se o debate
sobre questões como patrocínio desportivo, comercialização de marcas, exploração
do desporto por empresas públicas e privadas para fins de publicidade e parcerias entre
clubes e bancos de investimento. Repercutia intensamente o sucesso de algumas
parcerias como, por exemplo, Coca-Cola e Comitê Olímpico Internacional, Energil e
Cruzeiro, Parmalat e Palmeiras. Alastrava-se a idéia de que é possível transformar o
futebol num grande negócio, desde que os clubes sejam administrados como empresas,
supostamente sem concessões às disputas internas pelo poder político, substituindo os
“cartolas” por executivos de fundos de investimentos, “sintonizados” com o mercado.
A Confederação Brasileira de Futebol também se contaminou desse viés empresarial.
A CBF anunciava com desenvoltura seu sucesso em negócios que
envolviam grandes números, milhões de dólares. Dessa dança dos milhões o que a
torcida mais percebia eram: 1) a partida em massa dos nossos melhores jogadores para
irem jogar no Exterior; 2) os grandes lucros das empresas de marketing esportivo, os
sinais de rápido enriquecimento de empresários, agentes de jogadores, de dirigentes.
Paralelamente, as finanças de clubes e federações iam de mal a pior, em
estado de crise econômica e financeira cada vez mais grave. A grande massa de atletas
ficou ainda mais abandonada, com salários mais baixos, sem acesso a assistência médica
nem a um plano de previdência social. Quanto aos poucos craques afortunados por
contratos milionários, espalharam-se pelo planeta, deixando atrás de si um futebol
menos vistoso e estádios crescentemente vazios.
Quanto ao essencial, quanto à arte do jogo, aos resultados, à qualidade do
futebol praticado pela seleção brasileira, e pelos clubes, o futebol milionário e
marqueteiro amargava frustrações crescentes, como se viu da atuação fracassada na
Olimpíada de 1996 e a sucessão de maus resultados desde então.
O episódio mais significativo dessa euforia empresarial deu-se em
meados de 1996 com a assinatura de um contrato entre a CBF e a multinacional Nike
de material esportivo. Trata-se de um contrato de patrocínio e apoio, entre a empresa
Nike Europe B.V., e a Confederação Brasileira de Futebol, intermediado pela Traffic
Assessoria e Comunicações. Por este contrato, a Nike tornou-se co-patrocinadora da
CBF, junto com a Coca-Cola, para o uso da imagem da seleção brasileira de futebol,
além de patrocinadora e fornecedora exclusiva de material esportivo da CBF.
A outra face da moeda: o episódio mais frustrante deu-se em 1998, com
a derrota da seleção brasileira na final da Copa do Mundo, para a França. A maneira
como nossa seleção se comportou na maioria dos jogos, e como foi derrotada,
levantou a indignação contra os métodos usados na seleção e sobre os critérios de
administração da CBF. A Nação torcedora teve o vislumbre de que os dirigentes da
CBF estavam por demais ocupados com grandes negócios. Para eles, o futebol era o
que menos importava.
O Deputado Aldo Rebelo relembra:
“Das cenas de tristeza e revolta pela derrota do Brasil na Copa
da França, uma me impressionou em particular. Era a foto de um
estudante com um cartaz onde desenhara a Bandeira do Brasil. No lugar
da frase “Ordem e Progresso” ele escreveu: “Nike”. Abaixo, o grito de
repulsa: “Nossa bandeira agora é esta”. O estudante levou seu protesto
para o aeroporto do Rio, na hora em que o presidente da CBF
desembarcava com a taça de vice-campeão. Um segurança do sr. Ricardo
Teixeira destruiu o cartaz”.
O jornalista Juca Kfouri, então na Folha de S. Paulo, ousou fazer as
perguntas cabíveis. A onipresença da NIKE em todos os momentos da vida da
seleção tornou-se o alvo principal das críticas. Que significava essa interferência que ia
desde a convocação, escalação, programação de eventos que obrigava a suspensão de
treinamentos, que escolhia de adversários, inclusive data e local? Em que medida a
interferência da Nike na seleção brasileira influenciara no insucesso do time brasileiro?
A suspeita de que a CBF havia cedido o controle sobre a seleção brasileira à Nike não
parava de crescer, embora ainda não fossem conhecidas as cláusulas do contrato.
A LUTA PELA CONVOCAÇÃO DA CPI
Só em janeiro de 1999 a imprensa teve acesso ao contrato entre a CBF e
a Nike. Sua divulgação levantou vozes indignadas. O jornalista Armando Nogueira viu
o contrato como “uma rendição melancólica ao poder do dinheiro”. E foi adiante:
“posso, agora, entender a onda de maledicência popular que atribuiu a derrota brasileira
no final da Copa a um conchavo comercial”.
Em 11 de março de 99, o Deputado Aldo Rebelo enviou requerimento
ao Deputado Michel Temer, então presidente da Câmara dos Deputados, em favor da
criação desta Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a investigar a regularidade
do contrato CBF-Nike. Alegava como motivos suficientes a existência de “cláusulas
contratuais que asseguram à Nike a organização dos jogos e a escolha dos times que
competirão com a seleção brasileira e limitam o poder de decisão da CBF sobre os
jogos amistosos destinados à preparação técnica e tática do time”. Argumentava que
tais cláusulas podiam significar o desrespeito aos princípios fundamentais inscritos no
artigo 2º da Lei Geral do Desporto, entre os quais os da soberania, da autonomia e da
identidade nacional; e ao art. 4º, § 2º da mesma Lei, que dispõe que “a organização desportiva
do País, fundada na liberdade de associação, integra o patrimônio cultural é considerada de elevado
interesse social”.
A CBF opôs-se à convocação da CPI. Ricardo Teixeira, argumentava
que, por tratar-se de uma entidade civil de direito privado, a CBF não poderia ser
investigada pelo Congresso Nacional. De início, a CBF arregimentou deputados,
dirigentes de futebol, artistas, treinadores, para esvaziar a proposta. Ricardo Teixeira
convenceu o ex-treinador da seleção, Mario Zagallo e aquele que na época era o
treinador, Wanderley Luxemburgo, a enviarem cartas à Câmara de Deputados negando
qualquer interferência da Nike na seleção. Luxemburgo chegou a ser mandado a
Brasília para reafirmar pessoalmente sua posição. Vários Deputados que haviam
subscrito o requerimento foram pressionados e retiraram suas assinaturas. Apesar disso,
restaram 206 assinaturas (são necessárias 171) e a CPI pôde ser criada.
Mas ainda não foi dessa vez que se implantou. Desencadeou-se uma
operação-abafa: imediatamente foram desarquivadas CPIs remanescentes, criadas na
legislatura anterior, e que haviam sido encerradas em 31 de dezembro de 1998. CPIs
aprovadas, mas que não haviam sido instaladas, foram abertas às pressas. Como o
regimento limita a cinco o número de CPIs simultâneas, a da CBF, que era a segunda,
passou a ser a oitava. Iria amargar na fila por 19 meses.
Sua criação se efetivou em 16 de outubro de 2000. Só depois que novos
incidentes escandalizaram ainda mais a opinião pública. Indicações adicionais da
interferência da Nike na seleção se evidenciaram no episódio dos dois jogos na
Austrália em que Wanderley Luxemburgo recusou-se a escalar Ronaldo (ele só podia
jogar um, devido as obrigações de contrato com o Inter de Milão). O treinador alegou
que isso prejudicaria a preparação da seleção para a Olimpíada. A Nike queria que
Ronaldo jogasse pelo menos um jogo porque assumira no contrato com a Federação
Australiana a escalação obrigatória de Ronaldo. Como isso não ocorreu, os jogos foram
realizados com portões abertos. A Nike perdeu a arrecadação. E depois descontou do
que tinha de pagar à CBF.
Outros fatos negativos foram o fracasso da seleção brasileira na
Olimpíada de Sidney, e a medíocre participação nos jogos eliminatórios para a Copa de
2002. E, como se tudo aquilo não bastasse, caíram como uma bomba as denúncias que
envolveram Wanderley Luxemburgo. O técnico da seleção foi acusado de intermediar
vendas de jogadores brasileiros para o Exterior, de sonegar seus ganhos ao Imposto de
Renda. E, mais grave ainda, convocar jogadores para a seleção apenas para provocar
sua valorização e poder vendê-los para o Exterior. Luxemburgo foi demitido do cargo
de treinador, agravando-se ainda mais a crise da seleção.
Ricardo Teixeira e a administração da CBF eram alvos de críticas cada
vez mais pesadas. A imprensa repercutia denúncias de má administração, de corrupção,
que ganhavam mais eco por se juntarem ao descontentamento de milhões de
torcedores com o desempenho da seleção.
Não bastasse o clima de caos que se instalara, o Senado Federal também
resolveu abrir uma CPI para investigar o futebol. Era demais! Pouco depois, a CPI
CBF-Nike foi instalada pela Câmara dos Deputados. Agora a sociedade ia poder afinal
conhecer os subterrâneos do futebol. E saber os motivos por que interesses poderosos
haviam resistido tão tenazmente à sua instalação.
CAPÍTULO I – O FUTEBOL BRASILEIRO: DIAGNÓSTICO DE SUAS
DIMENSÕES; SUGESTÕES
O futebol é um dos aspectos de maior vitalidade do patrimônio cultural
do povo brasileiro. Embora seja um jogo importado -- sua forma regulamentar chegou
ao país no final do século dezenove -- rapidamente integrou-se à paisagem. O futebol
como é hoje, seus milhões de jogadores, seus clubes, torcidas, é uma criação da
sociedade, sua existência não depende do Estado, e é sustentada unicamente pela
vontade da cidadania, enraizada na tradição, e sempre renovada pela paixão popular e a
magia do esporte. Tal é sua importância que a lei Pelé, que rege o futebol, no artigo 4º,
afirma que “a organização desportiva do país integra o patrimônio cultural e é
considerada de elevado interesse social”. Um patrimônio que deve ser preservado,
conforme prevê a Constituição.
A matriz do futebol se alimenta em três fontes: os praticantes, os
torcedores, e sua expressão viva, que é a associação voluntária dos aficcionados em
seus clubes. Sua presença no imaginário popular é intensa, a seleção de futebol usa as
cores da bandeira e chega a se confundir com a Nação, suas vitórias e derrotas são
vitórias ou derrotas do país; os grandes atletas são heróis que povoam o universo
mítico, os sonhos de glória e de riqueza dos jovens.
Ao longo do século vinte o futebol veio crescendo de importância como
elemento de identidade nacional. Como atividade de massa que envolve milhões de
praticantes e torcedores, sua influência é crucial para o aprimoramento esportivo, físico
e técnico, formação moral de crianças, jovens e adultos.
Motivo de alegria e forma de participação, o futebol também é a maior
fonte de lazer para a população de todas as idades em todos os cantos do país. Daí
decorre seu dinamismo econômico -- atividade geradora de empregos, criadora de
riquezas em volume considerável para o PIB nacional.
A mercantilização do esporte, e em particular, do futebol criou, nos
últimos anos, uma situação nova em que grande fluxo de capitais passou a envolver as
atividades esportivas. A venda de direitos de uso de imagem de seleções, clubes e
jogadores a empresas de produtos esportivos e outros, a venda dos direitos de
transmissão de jogos por TV, rádio, Internet etc.; as transferências de jogadores entre
clubes e de um país a outro, tudo isso, somado, superou em muito a antiga fonte de
recursos que era a renda resultante da venda de ingressos para torcedores assistirem aos
jogos em estádios. Numa fase mais recente, grandes grupos de investidores, fundos de
investimentos multinacionais inclusive, atraídos pelo potencial econômico do futebol,
vêm entrando no setor, patrocinando e tornando-se co-administradores de clubes e
jogadores.
Esse tipo de interferência, endereçado à busca de lucros e de resultados
que valorizem a imagem da marca patrocinadora, tem exercido uma influência que está
submetendo o futebol a rápidas mudanças e a distorções. No Brasil, como a atividade
ainda é administrada de forma amadorística e os negócios feitos em grande parte na
informalidade, o resultado tem sido uma elevação do grau de corrupção. E se cria um
quadro de contrastes. Por um lado, emissoras de TV, empresas de investimentos e de
marketing, empresários e agentes de jogadores, obtêm lucros elevados; boa parte dos
dirigentes se enriquecem pessoalmente; uma minoria de jogadores recebem altos
salários. Por outro lado, as entidades e clubes mergulham em crise profunda,
chegando em muitos casos à insolvência. A maior parte dos atletas recebe baixos
salários e não tem qualquer sistema de aposentadoria. A qualidade do futebol decai, os
estádios vão ficando vazios. E também abandonados, sem reformas e manutenção,
oferecendo pouco conforto e até mesmo tornando-se ameaça à segurança dos
torcedores.
Como ilustração veemente desses fatos cabe anexar reportagem do
jornal “Folha de S. Paulo” de 29 de fevereiro de 2000:
Título da matéria:
“Dados da CBF revelam empobrecimento jogador nacional”
da Sucursal do Rio
“Ao mesmo tempo em que o futebol brasileiro recebe
investimentos nunca antes vistos, com os principais clubes firmando
parcerias com multinacionais milionárias, os jogadores do país estão cada
vez mais pobres.
Segundo documentos oficiais do Departamento de Registro e
Transferência da CBF (Confederação Brasileira de Futebol) obtidos pela
Folha, os ''boleiros ricos'' integram uma parcela cada vez menor no
futebol brasileiro.
De acordo com o levantamento, apenas 3,7% dos jogadores profissionais
relacionados na entidade receberam mais de 20 salários mínimos no ano
passado. Ou seja, 765 dos 20.496 jogadores registrados na CBF
ganharam mais de R$ 2.720 mensais em 1999.
Em 1998, a porcentagem de jogadores que integravam a elite do futebol
nacional era de 4,3 %.
Analisando as estatísticas dos últimos quatro anos, descobre-se
que, enquanto o grupo que ganha até dois salários mínimos mostra uma
tendência de crescimento, a parcela daqueles que recebem de duas a mais
de 20 vezes esse valor apresenta inclinação contrária (veja quadro
abaixo).
Em 1996, 81% dos profissionais do país recebiam até dois salários
mínimos, número que pulou para 84,8% no ano passado (crescimento de
4,7%).
Ocorre que a categoria dos miseráveis do futebol nacional foi engordada
em 20% por atletas que, em 1996, estavam no grupo dos que ganhavam
mais de dois salários mínimos (naquele ano, eles eram 19%, ao passo
que hoje representam 14,7%).
O fenômeno contrasta com a injeção de dinheiro observada recentemente
no futebol do país, especialmente no ano passado.
Em 1999, o Flamengo firmou contrato com a ISL pelo qual receberá
cerca de R$ 145 milhões em 15 anos (a maior parte para o futebol),
enquanto o Corinthians fechou acordo com o HMTF recebendo
aproximadamente R$ 55 milhões por dez anos.
Cruzeiro, Grêmio, Santos e Atlético-MG também acertaram
recentemente parcerias milionárias com multinacionais.
A CBF fechou, em 1996, contrato com a Nike para receber US$ 160
milhões (cerca de R$ 285 milhões) em dez anos.
O levantamento da pirâmide salarial do futebol brasileiro é feito
anualmente pela CBF, com base na
palavra dos clubes. Todos os
contratos são registrados, obrigatoriamente, na entidade.
Mas a estatística tem distorções provocadas por clubes que não declaram o
valor verdadeiro dos vencimentos. Muitos dirigentes obrigam os jogadores
a assinar contratos no valor de um salário mínimo, mas pagam por fora
até R$ 1.000 _o conhecido "caixa dois" (contabilidade paralela para
recolher menos imposto).
Mas como isso também ocorria em anos anteriores, os dados da CBF
evidenciam o empobrecimento dos jogadores e voltam a exibir o enorme
fosso que separa a minoria rica da maioria pobre.
Enquanto no Everest, do Rio, todos os atletas recebem um salário
mínimo, craques como o meia Rincón, contratado recentemente pelo
Santos, ganham R$ 250 mil todo mês. Em dois, anos, período do
contrato, o colombiano _que teve o salário indexado ao dólar, pela
cotação fixa de R$ 1,80_ receberá R$ 6 milhões, entre salários e aluguel
do passe.
No Santos, Rincón ganhará US$ 20 mil (ou R$ 35,6 mil) a mais do
que recebia no Corinthians.
O vascaíno Edmundo é outro exemplo dessa casta.
O atacante está recebendo, atualmente, cerca de US$ 8 mil (R$ 14,2
mil) por dia. No total, Edmundo recebe cerca de US$ 240 mil (R$ 427
mil) mensais.
Criado em um subúrbio da periferia do Rio, Edmundo mora hoje em
uma luxuosa casa na Barra da Tijuca (zona sul da cidade), com campo
de futebol e uma grande piscina.”
A ECONOMIA DO FUTEBOL
Apesar de sua importância na formação da identidade do país, o futebol
ainda não atingiu seu pleno potencial no aspecto econômico. Diversas razões
contribuem para isso, notadamente a desorganização da atividade no país, administrada
de forma precária e pouco profissional.
A importância do esporte no Brasil em termos econômicos ainda está
muito abaixo do que ocorre na Europa e nos Estados Unidos, onde este setor responde
por 3,5% a 4% do PIB, enquanto que no Brasil sua participação não atinge 1% do PIB.
O futebol foi adquirindo nas últimas décadas grande relevância
econômica no mundo inteiro, e hoje movimenta em torno de US$ 250 bilhões ao ano.
Desse total o Brasil participa com R$ 16 bilhões, de acordo com o estudo da Fundação
Getúlio Vargas.
Os clubes, que são a unidade fundamental do futebol, geram uma receita
anual de aproximadamente US$ 182 milhões no Brasil, muito abaixo do que ocorre nos
principais centros europeus. Os clubes ingleses obtêm uma receita anual de US$ 1
bilhão, na Itália este número é de US$ 700 milhões e na Espanha US$ 580 milhões.
Esta disparidade não se deve apenas a diferenças econômicas entre esses países, mas
também a diferentes estágios de organização do futebol entre o Brasil e os centros
europeus.
Quando se observa a estrutura de receita dos clubes, verifica-se que os
clubes brasileiros dependem excessivamente dos direitos de televisão que chegam a
57% do total, de acordo com dados da Pelé Sport e Marketing. E que podem ser de até
70%, conforme estimativa da Globo Esporte. Em alguns casos, chegam a 90%. A
transferência de jogadores equivale a 20% da receita gerada pelos clubes, provocando
distorções em alguns deles, onde observa-se um excesso de compra e venda de
jogadores, funcionando como um balcão de negócios. Na Inglaterra e na Itália, por
exemplo, esta receita apresenta-se bem mais equilibrada, como se verifica nos quadros
abaixo:
Inglaterra
Itália
Brasil
Atividades
Comerciais
29%
15%
15%
Fonte: Pelé Sport e Marketing
Direitos de
Televisão
25%
39%
57%
Bilheteria
33%
31%
8%
Transferência de
jogadores
13%
15%
20%
País
Inglaterra
Brasil
Patrocínio
Direitos de
Televisão
Bilheteria
11%
20%
28%
60%
39%
17%
Licenciamentos
(parceria com empresas
de investimento)
12%
3%
Fonte: Panamerican Sports Teams
Essa dependência leva a um poder de ingerência exagerado da televisão,
muitas vezes com prejuízo para os atletas e o público que devem adaptar-se aos
horários televisivos.
O Brasil, apesar de contar com estádios de grande capacidade, possui
uma média de público relativamente baixa, em torno de 12 mil pessoas/jogo e a taxa de
ocupação dos estádios é de cerca de 20%. Na Itália e Inglaterra o público médio é de 30
mil espectadores por jogo e na Espanha este número é de 27 mil. Na Inglaterra a taxa
de ocupação dos estádios está em torno de 90%, levando os principais clubes a fazerem
planos para aumentar a capacidade de seus estádios.
Está claro que essa diferença de público é decorrente de diversos fatores
entre os quais estão a disponibilidade e comodidade dos transportes até o estádio,
segurança, credibilidade dos torneios, renda per capita e preço dos ingressos (ver
Tabela).
País
Inglaterra
Itália
Espanha
Brasil
Preço Médio dos Ingressos (em US$)
30,00
30,00
20,00
5,00
Fonte: Pelé Sport e Marketing
Porém, o Brasil conta com um grande número de praticantes, estimado
em 30 milhões. Existe registro de 13 mil times amadores e 800 clubes de futebol. Há
igualmente 11 mil jogadores federados no Brasil além de 2 mil atuando no exterior. A
estrutura física compreende 308 estádios com capacidade total de 5 milhões de lugares.
Os dados acima mostram que o país já possui uma grande base a partir
da qual surgem os atletas profissionais. Não é por acaso que o Brasil está sempre
revelando jogadores de qualidade. No entanto, grande parte destes atletas termina
encaminhando-se para o exterior visto que não encontram no país condições
semelhantes às existentes na Europa.
O atual quadro de dificuldades por que passa o futebol brasileiro tem por
origem uma multiplicidade de fatores.
Em primeiro lugar a organização deficiente dos campeonatos, com
calendário confuso e sem critérios perenes, colabora para a baixa credibilidade dos
torneios, onde se assiste a diversas “viradas de mesas”, atendendo a critérios políticos.
O segundo ponto, de acordo com estudo realizado pela Fundação
Getúlio Vargas, é a inadequação da infra-estrutura para atender às necessidades do
espetáculo, sobretudo no que diz respeito aos estádios que precisam ser modernizados
e dotados de serviços que possam atender adequadamente ao público.
Outro aspecto levantado pelo estudo trata da necessidade de fontes de
financiamento e de apoio à formação das categorias de base. Com o fim da chamada lei
do passe, este aspecto passa a adquirir maior importância, visto que, para os clubes,
houve uma relativa diminuição ao incentivo para formação de jogadores.
A estrutura administrativa do futebol brasileiro é precária e carece de
credibilidade em todos os níveis (clubes, federações e CBF). A Confederação Brasileira
de Futebol não possui a necessária liderança nem para a organização dos campeonatos,
ficando a mercê dos caprichos das emissoras de TV e dos grandes times.
Por fim, os sistemas de informação relativos ao registro dos atletas,
estatísticas, legislação entre outros, ainda são precários e não trazem subsídios
confiáveis para tomada de decisões bem fundamentadas.
Apesar dos problemas acima citados, uma série de fatores positivos
permitem vislumbrar a possibilidade de alteração da atual conjuntura.
O futebol é o esporte nacional por excelência. Em todo o país existe um
alto grau de envolvimento dos torcedores com seus times e uma grande fidelidade aos
mesmos. Não há dúvida, portanto, de que há uma grande possibilidade de aumento da
freqüência aos estádios, uma vez sanados os problemas apontados acima.
Apesar do mau momento por que passa, a seleção brasileira sempre foi
motivo de orgulho para os brasileiros porque construiu ao longo do tempo uma
história vitoriosa e de destaque em nível mundial.
O Brasil sempre foi um celeiro de grandes jogadores e possui um grande
número de boas equipes, o que possibilita uma grande visibilidade do nosso futebol no
exterior, podendo-se imaginar que exista potencial de venda dos torneios brasileiros no
exterior.
Do ponto de vista social, o futebol possui capacidade de geração de
empregos e é uma das poucas formas de ascensão social no país.
Existe, atualmente, consenso entre os analistas de que sem uma
modificação profunda em sua estrutura o futebol brasileiro estará fadado a conhecer
crescentes dificuldades e descrédito. Alguns sinais de modificação estão sendo
esboçados. A própria direção da CBF anunciou, em fins de maio de 2001, intenção de
mudança no seu Estatuto e de medidas visando maior transparência na administração.
Propostas positivas, mas por enquanto insuficientes para convencer de que não se trata
de mero exercício de marketing de parte dos dirigentes.
É preciso portanto romper as estruturas viciadas existentes hoje no
futebol, de forma que se possa adotar as ações necessárias para as transformações
desejadas. A própria CBF encomendou um estudo para a Fundação Getúlio Vargas
onde fica traçado um plano estratégico de desenvolvimento do setor. Resta a dúvida de
se os diversos atores e participantes do futebol brasileiro estariam dispostos a pensar
além dos seus interesses individuais e concentrar esforços para benefício do setor
como um todo.
ESTUDO DA FGV - RECOMENDAÇÕES
O conjunto de recomendações resultantes do Estudo supracitado estão
agrupadas em três pilares fundamentais, quais sejam: o aprimoramento da gestão do
futebol, a modernização do sistema CBF e intensificação da atratividade do futebol
brasileiro.
1 - APRIMORAMENTO DA GESTÃO ESTRATÉGICA
Quanto ao aprimoramento da gestão do futebol o estudo propõe a
reformulação da legislação esportiva brasileira com vistas a dotar o setor de modernos
instrumentos de regulação, com reflexos diretos no futebol profissional. A relação entre
os clubes “formadores” e seus atletas adquire singular importância para a formatação
do contexto em que os clubes evoluirão. A Medida Provisória 2141, de 23/03/2001,
que alterou a Lei Pelé, aumentou o valor das multas rescisórias, beneficiando os clubes
formadores, dando-lhes garantia de retorno do investimento. A prática desse novo
dispositivo legal irá mostrar se tal medida não se tornará um fator de prejuízo para os
jovens atletas.
É imperativo o aprimoramento da Justiça Desportiva, conferindo-lhe
autonomia financeira e adotando um plano de carreira, com exigência de prova de
conhecimento e títulos para o ingresso na instituição. Essas providências irão aumentar
sua transparência e credibilidade, uma vez que o diagnóstico da FGV aponta para fortes
indícios de parcialidade nesse setor. (Ver Capítulo XIX – Projeto de legislação para
renovar o futebol).
Outro aspecto do aprimoramento da gestão do futebol toca no melhoria
do sistema de arbitragem, através da definição de um quadro de árbitros com direito a
um plano de carreira e de cargos e salários. Aponta também a necessidade de criação de
um conselho nacional de árbitros de futebol e dos conselhos estaduais de árbitros,
como órgãos executivos, autônomos e independentes. Propõe também a manutenção
da comissão de arbitragem da CBF. (Ver Capítulo ...)
A carreira de jogador é de curta duração. Para poder proporcionar ao
atleta um mínimo de amparo quando do término de sua carreira, sugere-se a criação de
um plano de previdência privada complementar, com um modelo atuarial próprio e capaz de
fornecer os recursos necessários para o período de readaptação às novas atividades dos ex-profissionais
do futebol.
O estudo discute também a necessidade de linhas de crédito para
aumentar a competitividade dos clubes e do futebol brasileiro em geral de forma a
garantir uma capacidade de alavancagem de recursos a curto, médio e longo prazo.
Atualmente, as possibilidades para este tipo de crédito no Brasil são limitadas. Na esfera
internacional, vêm surgindo diversas formas de apoio ou proteção financeira que aumentam a
capacidade de gestão dos clubes e reduzem os riscos inerentes ao negócio. O setor deveria portanto
mobilizar-se no sentido de articular soluções e produtos financeiros junto a instituições
de fomento (como o BNDES), instituições bancárias e financeiras e grandes
seguradoras.
A sistematização das informações através da criação de um anuário
estatístico pela CBF viria suprir a atual deficiência de informações e permitiria a
realização de estudos e pesquisa para o desenvolvimento de novos produtos, para a reivindicação de
auxílios governamentais, bem como para a tomada de decisão.
2 – MODERNIZAÇÃO DO SISTEMA CBF
Como ficou demonstrado ao longo das investigações desta CPI, a CBF e
as federações estaduais precisam atuar dentro de um modelo organizacional diverso do
hoje existente. Entre os principais pontos a ser considerados está o aumento da
transparência destas organizações através de comunicação financeira e institucional
compreendendo, entre outros, relatórios anuais, materiais institucionais e balanços
sociais.
É preciso igualmente dar transparência às transações com jogadores
através da introdução de instrumentos de comprovação de compra e venda de
jogadores por ambas as partes – comprador e vendedor.
Como parte deste processo a CBF, sendo o órgão central do futebol
brasileiro, deveria liderar o esforço de modernização da gestão dos clubes e das
federações que em muitos casos possuem estruturas arcaicas e práticas administrativas
condenáveis. A FGV sugere a elaboração de um conjunto de instrumento de gestão
contemplando os seguintes pontos:
- Modelo organizacional para os pequenos, médios e grandes clubes;
- “kits de modernização” (sistemas: contábil e financeiro, folha de
pagamento, orçamentário etc..);
- Cartilha de orientação para as questões estratégicas de obtenção de
patrocínios, parcerias, vendas otimizadas de ingresso etc.;
- Estudo de linha de financiamento para modernização dos clubes (a ser
desenvolvida junto ao BNDES)
Está claro que a própria CBF necessita de mudanças para poder fazer
face às necessidades de seu setor e crie condições de planejamento adequadas ao
desempenho de suas funções na gestão de uma estrutura complexa como a do futebol
brasileiro. Para tal é preciso que a entidade elabore seu plano estratégico, contemplando
uma série de objetivos a serem perseguidos ao longo do tempo. A CBF deverá contar
com um corpo funcional capacitado para o enfrentamento dos desafios de um setor em
processo de modernização. Assim sendo recomenda-se a implementação de um
programa de capacitação interna, coerente com os objetivos estratégicos da CBF e com
sua nova estrutura organizacional.
A FGV sugere também o desenvolvimento de um projeto de memória
do futebol brasileiro, contemplando ações de preservação, recuperação e manutenção
desta história, por meio de criação de um banco de dados de:
- Fotos, Filmes e outras formas de memória visual;
- Livros, jornais, revistas e outras publicações; e
- Depoimentos e entrevistas com personalidades, estudiosos,
atletas, dirigentes e demais profissionais.
Este material poderá ser disponibilizado ao público de diversas formas
como livro, CDs, DVDs, vídeos, sites oficiais etc.
3 – INTENSIFICAÇÃO DA ATRATIVIDADE DO FUTEBOL BRASILEIRO
O primeiro aspecto relacionado com a atratividade do futebol brasileiro
abordado no estudo da FGV trata da manutenção do craque no Brasil. A situação atual
revela a incapacidade do país em reter seus craques devido ao descompasso existente
entre os salários pagos internamente e aqueles pagos no exterior, sobretudo nos
principais centros europeus. O êxodo excessivo de jogadores contribui para a redução
na atratividade do futebol brasileiro como espetáculo, uma vez que as maiores estrelas
estão no exterior. Além da fuga de talentos já consagrados há casos de “exportação”
sem controle de crianças e jovens talentosos.
Para fazer face a este estado de coisas é preciso que a FIFA, como
entidade máxima do futebol, crie uma norma para que os jogadores sejam obrigados a
fazerem o primeiro registro profissional em seu país de origem. Isto evitaria a ida
precoce de atletas jovens, que muitas vezes não conseguem sucesso no exterior, ficando
em situação precária nos países para os quais são transferidos. (Ver Capítulo XII –
Fábricas de “gatos” e tráfico de menores para o Exterior).
Ademais, além do aspecto normativo, é preciso incentivar a formação
dos jovens talentos. De acordo com a FGV : Estes incentivos poderão ser de caráter
fiscal (plano de avaliação das necessidades e dos benefícios a serem gerados), de caráter
esportivo (campeonato Brasileiro de Estudantes) ou de caráter social (parceria com o
terceiro setor, ONG´s)
A necessária profissionalização na gestão dos clubes contribuiria para a
manutenção dos atletas no país, através do aumento da rentabilidade das agremiações,
permitindo uma maior competitividade com relação aos clubes europeus.
Por fim, como citado anteriormente, a criação de mecanismos de
proteção ao jogador como previdência privada complementar e apólices de seguros
especializadas constituiria uma melhoria da situação dos jogadores no país.
Além da manutenção dos jogadores em território nacional, é necessário
restaurar a credibilidade dos diversos campeonatos realizados no Brasil. Atualmente os
critérios adotados são controversos e pouco transparentes.
A FGV sugere a criação de um Ranking Nacional do Futebol Brasileiro
como mecanismo de seleção de equipes para participação de equipes nos campeonatos
do sistema CBF que facilite a aceitação da escolha, o planejamento das equipes e a
rentabilidade das competições. Este Ranking deverá ter critérios e ponderações de
classificação que sejam claros e não passíveis de questionamento para viabilizar sua
manutenção ao longo do tempo.
Uma vez definidos os critérios de escolha das equipes é necessário tratar
da racionalização do calendário nacional. Atualmente existe um número excessivo de
competições, trazendo prejuízos para todos os envolvidos. Os atletas desgastam-se, o
público fica saturado com a quantidade de jogos, os clubes não podem realizar um
planejamento adequado visto que em alguns casos as datas dos jogos não são
fornecidas com a antecedência necessária.
A Fundação Getúlio Vargas traçou alguns critérios sobre os quais poderá
ser fundamentada a elaboração do novo calendário do futebol brasileiro:
Necessidade de integração do calendário nacional com o
calendário FIFA;
Subordinação ao Ranking Nacional do Futebol Brasileiro, como
instrumento preponderante de acesso e descenso dos participantes nas
diversas competições;
Interdependência entre as competições estaduais, regionais e
internacionais;
Fortalecimento dos Campeonatos
Estaduais, ampliando o
número de datas para os pequenos e médios e racionalizando o número de
jogos para os grandes;
-
Ausência de equipes disputando competições simultaneamente;
Valorização da participação dos grandes clubes nas competições,
tornando-os mais atrativos;
Utilização de apenas duas datas por semana para as disputas,
respeitando a saúde do atleta;
-
Obrigatoriedade de férias remuneradas de 4 semanas; e,
Atendimento das necessidades física, técnica e psicológica da prétemporada.
Por fim, é feita uma sugestão de tabela, que seria ocioso reproduzir aqui,
com os seguintes campeonatos: Campeonatos Estaduais, Copa dos Campeões,
Campeonato da Integração Nacional (novo), Copa do Brasil, Campeonato Brasileiro da
Primeira e da Segunda Divisão, Copa Libertadores de América e Copa Mercosul.
O estudo pode estar, sem dúvida, sujeito a discussão. No entanto poderá
servir de base para as mudanças necessárias no futebol brasileiro, de forma a superar o
momento crítico e apontar caminhos para o desenvolvimento do esporte.
É oportuno trazer a sugestão do Sr. Jonh Richard Law, Presidente da
Panamerican Sports Teams - PST e representante da Hicks Muse Tate and Furst,
apresentada a esta Comissão, durante painel sobre Patrocínio, Contratos de Marketing e
Direitos de Transmissão. Segundo ele, os clubes de futebol poderiam ser parceiros das
empresas de investimentos, tal qual a PST, com o objetivo de alavancar a marca do
clube e desenvolver o seu potencial econômico. Hoje, o Corinthians paulista e o
Cruzeiro possuem esse tipo de contrato – chamado genericamente de licenciamento,
que busca atender às necessidades do clube e do seu torcedor.
CAPÍTULO II - LEGISLAÇÃO DESPORTIVA : E VOLUÇÃO HISTÓRICA
LEGISLAÇÃO DESPORTIVA ANTERIOR À CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
Historicamente, há dois tipos de legislação desportiva brasileira: uma
marcada pela presença do Estado nos negócios desportivos, mas que no decorrer de
sua prática deu espaço para uma relativamente livre organização dos esportes; a outra,
liberal, concebida a partir do princípio da autonomia das entidades desportivas e
associações quanto à organização e ao funcionamento, com base na Constituição
Federal de 1988.
O período mais intervencionista do Estado no esporte ocorreu no
Estado Novo, com o Decreto-lei nº 3.199, de 1941, e, de certa forma, coincidiu com o
reconhecimento da legitimidade do desporto profissional, praticado com fins
econômicos, ao lado do desporto amador, praticado gratuitamente, sem fins utilitários.
Esse decreto-lei colocou a organização e a prática do desporto sob a tutela do
Conselho Nacional de Desportos, CND -- órgão disciplinador e normativo, além de
última instância da Justiça Desportiva.
Trinta e quatro anos mais tarde, veio a Lei nº 6.251, de 1975, sancionada
pelo Presidente Geisel e adjetivada pelo Decreto nº 80.288, de 1977. Na visão sintética
de Eduardo Dias Manhaes, “nada, absolutamente, foi mudada no ordem desportiva,
quase nada e formalmente nas estruturas, nada no conceito, quase nada nas
prioridades”. Foi mantido o Conselho Nacional de Desportos, que, no seu meio século
de existência, encerrada com a entrada em vigor da Lei Zico, expediu aproximadamente
400 atos normativos, regulamentando uma enorme diversidade de assuntos, tais como,
publicidade em camisas, composição dos conselhos deliberativos nas sociedades
desportivas, critérios e condições do passe, organização de calendários.
Os clubes conseguiram introduzir no Decreto nº 80.288 um dispositivo
pelo qual, nas associações desportivas com mais de duzentos sócios maiores de dezoito
anos, os sócios pudessem manifestar-se coletivamente por meio de conselhos
deliberativos, constituídos de membros eleitos (1/3, pelo menos) e membros vitalícios
(2/3, no máximo, indicados de acordo com o que estatuía a esse respeito o estatuto).
Para a assembléia geral sobrou o poder de “eleger” os membros do Conselho
Deliberativo e de decidir quanto à extinção ou fusão da entidade. Está aí a razão
principal por que, em muitos clubes, o mesmo grupo, não raro uma família, consegue
perpetuar-se no poder.
A Constituição de 1988 delegou às sociedades desportivas a capacidade
de decidir e legislar em matéria de organização interna, ordem desportiva (organização
de competições, regras de jogo) e disciplina desportiva. Determinou a nova
Constituição Federal, também, que a Justiça comum só admitisse ações relativas à
disciplina e às competições depois que se esgotassem as instâncias da justiça desportiva,
que tem que proferir decisão final no prazo de sessenta dias, contados da instauração
do processo.
A Constituição de 1988 significou o afastamento do Estado e do mundo
do desporto. A mudança foi tão radical que não havia como considerar recepcionada a
Lei nº 6.251/75, que passou a configurar autêntico entulho autoritário. Mesmo assim,
levou quase cinco anos até que o País tivesse uma nova lei do desporto, que traduzisse
em ordenamento jurídico-desportivo os princípios estabelecidos no art. 217 da
Constituição 1.
A LEI DO PASSE
Até 26 de março de 2001, quando entrou em vigor o art. 28,
§ 2º da Lei Pelé, a legislação desportiva então em vigor constava,
basicamente, da Lei n.º 6.345, de 1976, mais conhecida como Lei do
Passe; da Lei n.º 9.615, de 25 de março de 1998, mais conhecida como
Lei Pelé; e da Lei n.º 9.981, que altera substancialmente a redação da
Lei Pelé.
A Lei do Passe – na verdade, uma lei que dispunha sobre as relações de
trabalho do atleta profissional do futebol - definia o passe como “a importância devida
por um clube a outro clube, pela cessão do atleta durante a vigência do contrato ou
depois de seu término, “observadas as normas desportivas pertinentes”. Importante
destacar “ou depois de seu término”, pois, significava que, acabado o vínculo empregatício,
permanecia o chamado vínculo desportivo, que mantinha o atleta preso ao clube. O
vínculo desportivo costumava ser justificado como justa recompensa do investimento
que o clube faz na formação profissional e pessoal do atleta.
Além de dispositivos de menor importância, a Lei do Passe ainda
estabelecia que a) o valor do passe seria estabelecido de acordo com as normas
desportivas, “segundo os limites e as condições estabelecidas pelo Conselho Nacional
de Desportos”; b) teria passe livre, ao fim do contrato, o atleta que, ao atingir 32 anos
de idade, tivesse prestado 10 anos de serviço ao seu último empregador.
O dono do passe não era necessariamente um clube. Qualquer pessoa
jurídica ou pessoa física (inclusive o próprio atleta) podia tornar-se o dono de um ou
mais passes, desde que se dispusesse a: a) investir dinheiro na educação e formação
profissional de um possível talento desportivo, via de regra pobre; b) comprar o passe
a outra pessoa (investidor, clube, empresário, o próprio atleta). Investir em passes podia
render bons lucros (da mesma forma que investir na engorda de um boi magro), muito
1
Interessante lembrar que nossas entidades desportivas proclamam alto e bom som sua autonomia com relação
ao poder público (a não ser que se trate de pedir facilidades tributárias ou o perdão dos débitos fiscais e
parafiscais), mas não se importam de ficar submetidas a entidades burocráticas como federações e confederações,
aí incluída a FIFA, que não toleram o pensamento divergente, sob pena de exclusão de campeonato, desfiliação,
etc. “Burocráticas”, no caso, quer dizer: não praticam o desporto, não formam atletas e não participam
diretamente do espetáculo desportivo; apenas registram contratos, recolhem taxas, arrecadam contribuições,
fornecem infra-estrutura física e administrativa aos órgãos da Justiça Desportiva.
embora, obviamente, seja um negócio de risco. Daí a importância do profissional
chamado olheiro, que, graças a seu “olho clínico”, desempenha papel de consultor na
compra e venda de passes.
LEI ZICO, LEI PELÉ E LEI N .º 9.981, DE 14.6.2000
A Lei Pelé (Lei n.º 9.615, de 25.3.1998) substituiu a Lei
Zico (Lei n.º 8.672, de 6.7.1993), mas, na verdade, desconsiderados os
artigos dedicados ao bingo (na Lei Zico, era um só), quase a metade de
seus dispositivos são simples transcrições.
As principais diferenças entre a Lei Zico e a Lei Pelé referem-se ao passe
e ao que se convencionou chamar clube-empresa.
Quanto ao passe, a Lei Pelé preceitua que,
a) “o vínculo desportivo do atleta com as entidades contratantes tem
natureza acessória ao respectivo vínculo empregatício, dissolvendo-se, para todos os
efeitos legais, com o término da vigência do contrato de trabalho” (art. 28, § 2º);
b) mesmo assim, a entidade formadora de atleta tem o direito de assinar
com o mesmo o primeiro contrato de profissional, cujo prazo não poderá ser superior a
dois anos (art. 29, caput), ficando com a preferência para a primeira renovação deste
contrato (cuja duração, não está claro, será também de dois anos, ou, aplicando-se o
disposto no art. 30, caput, de até cinco anos );
b) o disposto no § 2º do art. 28 passou a produzir efeitos jurídicos a
partir de 26 de março de 2001 (art. 93), quando foram revogados os dispositivos
básicos da Lei do Passe.
Importante destacar a complementação do art. 93, na redação dada pela
Lei n.º 9.981/2000: “... respeitados os direitos adquiridos decorrentes dos contratos de
trabalho e vínculos desportivos de atletas pactuados com base na legislação anterior”. A
dúvida é se anterior a 26 de março de 2001 ou anterior à data de sanção da própria Lei
n.º 9.981/2000. Daí a paradeira atual nos negócios de compra e venda de passes.
Quanto ao clube-empresa, cumpre lembrar que a simples possibilidade de
sua constituição, prevista na Lei Zico, foi uma novidade, para muitos um avanço, na
medida em que, pela legislação desportiva anterior à Constituição de 1988, era proibido
organizar e praticar o desporto profissional em sociedades de fins econômicos e que os
clubes profissionais desse lucro a quem neles aplicasse capital. Já Pelé queria que as
entidades que fossem participar de competições oficiais ou quisessem fazer jus a
incentivos fiscais fossem obrigatoriamente organizadas como sociedades de fins
econômicos, vedada sua constituição como associações.
A mudança mais profunda introduzida na Lei Pelé pela Lei n.º 9.981, de
14.7.2000, consiste, precisamente, no retorno à situação anterior, a da Lei Zico, ou seja,
à facultatividade da transformação dos clubes em empresas (ver a nova redação do art.
27). De quebra, além de declarar revogado, a partir de 31 de dezembro de 2000, todo o
capítulo dedicado ao bingo (art. 2º), a Lei 9.981 disciplinou restritivamente a celebração
de acordos de parceria entre clubes e patrocinadores, investidores, etc. (ver o art. 27A). Finalmente, por força do disposto no art. 94 da Lei n.º 9.981, a Lei Pelé virou uma
lei do futebol.
A MEDIDA PROVISÓRIA N .º 2.141, DE 23 DE MARÇO DE 2001
Esta Medida Provisória foi editada quase às vésperas da data de extinção
do passe, ou seja, 26 de março. Teve por objetivo amenizar os efeitos negativos da
extinção do passe. Contudo não criou, como os clubes queriam e até mesmo
esperavam, um mecanismo legal que substituísse o passe, protegendo-os de uma
eventual (anunciada como apocalíptica) debandada dos talentos desportivos. Criou, em
substituição, algumas salvaguardas para os clubes que investem na formação de atletas.
De fato, como se pode verificar na leitura da nova redação que foi dada
pela MP ao § 2º do art. 28 da Lei n.º 9.615/98, o clube formador de atleta poderá exigir
do novo empregador, conforme o caso, uma “indenização de formação” ou uma
“indenização de promoção”: a primeira, no caso de cessão de atleta na vigência do
primeiro contrato de trabalho (valor: duzentas vezes o montante da remuneração
anual); a segunda, quando de nova contratação do atleta após o término do primeiro
contrato (valor: cento e cinqüenta vezes o montante da remuneração atual). Neste caso,
o clube dispõe de seis meses para negociar a transferência do atleta, desde que continue
pagando normalmente o salário.
As demais alterações da Medida Provisória n.º 2.141/2001 se referem à
criação e à composição do Conselho Nacional de Esportes (do qual a CBF passa a fazer
parte), à publicação obrigatória dos balanços anuais pelas entidades desportivas e às
responsabilidades dos dirigentes de entidade desportiva.
AS QUESTÕES BÁSICAS TRATADAS NA LEGISLAÇÃO ESPORTIVA
A QUESTÃO DA ORGANIZAÇÃO
O modelo de organização do desporto moderno, tal como o conhecemos
hoje, foi idealizado na Inglaterra, em razão da sistematização de certos jogos populares
e sua introdução nas escolas públicas, numa época em que fair-play e cavalheirismo
eram fatores determinantes da educação total do homem. É, assim, que o desporto
foi institucionalizado, com regras bem definidas, sendo talvez a matriz moderna do que
poderíamos chamar de Direito Desportivo (Vargas, 1995). Com a progressiva
unificação, codificação e universalização das regras de jogo, tornou-se possível a
realização de competições nacionais e internacionais nas diversas modalidades
desportivas, como, por exemplo, futebol, esgrima, ciclismo, tênis e luta-livre.
A institucionalização do desporto e a universalização das regras de jogo e
dos regulamentos não aconteceram em decorrência de alguma iniciativa ou intervenção
do poder público. Pessoas e grupos de pessoas é que se organizaram em estruturas que
assegurassem a observância das regras de jogo e a disciplina desportiva, sob a égide do
fair-play, do cavalheirismo, da valorização do convívio social. Tratava-se - como ainda
se trata - de estruturas hierárquicas, verticalizadas, em cujo topo figura a entidade
internacionalmente reconhecida em cada modalidade desportiva (FIFA, FIA, FIVB,
etc.), que é uma associação de confederações continentais e nacionais (Conmebol, CBF,
por exemplo). Estas, por sua vez, são associações de federações estaduais (ou
regionais), às quais estão associados os clubes onde a respectiva modalidade desportiva
é praticada.
Na verdade, a interferência do Estado na prática e na administração do
desporto organizado e institucionalizado nunca foi motivada por razões éticodesportivas ou humanitárias, mas, sim, porque, por exemplo, as autoridades achavam
que essa interferência era necessária para assegurar a prática disciplinada do desporto,
a qual, por sua vez, interessava à formação espiritual e física da juventude; ou, então,
intentavam tornar os desportos uma alta expressão da cultura e da energia nacionais,
privilegiando, conseqüentemente a prática do desporto de alto rendimento, a
preparação de equipes olímpicas, etc.; ou, ainda, como na época dos governos militares,
tentando tapar o sol com a peneira, usavam o incentivo oficial à prática do desporto
como solução para problemas sociais causados por má distribuição de renda, má
qualidade de vida nas cidades, etc.
A organização do desporto de competição em pessoas jurídicas de
direito privado chamadas sociedades civis, ou associações, é tradição tão antiga quanto
a sua sistematização, internacionalização e popularização, que se tornaram possíveis
graças à unificação das regras de jogo, a partir de meados do século passado. Uma das
características das sociedades civis (associações) é que os associados, tomados
individualmente, não têm qualquer participação no patrimônio, por maior que possa
ser. Quer dizer que se, por qualquer razão a sociedade for dissolvida ou extinta, o
patrimônio não pode ser distribuído entre os associados; terá de ser destinado a outra
entidade, de fins idênticos ou semelhantes.
Outra característica é que, a existência da pessoa jurídica é tão distinta da
dos seus membros que a admissão ou o desligamento de associados não acarreta
qualquer mudança nos atos constitutivos, diferentemente do que ocorre com a
sociedades comerciais, onde a saída (ou admissão) de qualquer um dos sócios implica
alteração do contrato existente ou a elaboração de um novo contrato social.
Foi em 1941, que União estabeleceu as bases de organização do
desporto em todo o país. No que se refere ao tema objeto deste estudo, cumpre
lembrar que o capítulo inicial do Decreto-lei n.º 3.119, de 14 de abril de 1941 é todo
dedicado ao Conselho Nacional de Desportos, incumbido, entre outras, de “estudar e
promover medidas que tivessem por objetivo assegurar uma conveniente e constante disciplina à
organização e à administração das associações e demais entidades desportivas do país (...)”.
Desde então e até a Constituição de 1988, o desporto de competição era
obrigatoriamente organizado em associações. Ficou proibido a organização e o
funcionamento de entidade desportiva de que resultasse lucro para os que nela
empregassem capital de qualquer forma, a remuneração
intermediação, mediante pagamento, de mão-de-obra desportiva.
dos diretores e a
Inicialmente, as sociedades desportivas só podiam funcionar depois de
obter licença por meio de alvará expedido pelo Conselho Nacional de Desportos. .A
estrutura associativa, regulada nos mínimos detalhes pelo poder público, foi mantida
pela Lei n.º 6.251, de 1976, que confirmou as associações como entidades básicas da
organização desportiva nacional, sempre "sob a alta supervisão normativa e disciplinar"
do Conselho Nacional de Desportos.
Em síntese, entre 1941 (Decreto-lei n.º 3119) e 1993 (Lei n.º 8.672),
foram princípios básicos da organização do desporto (profissional e não-profissional):
associacionismo, responsabilidade colegiada, finalidade não lucrativa, não-remuneração
dos dirigentes,
tutela governamental, controle interno e externo dos atos
administrativos nas entidades desportivas, transparência contábil.
A Constituição Federal de 1988, ao mesmo tempo que reconheceu a
competência legislativa concorrente em matéria de desporto (art. 24), proclamou a
autonomia das entidades desportivas quanto a sua organização e funcionamento (art.
217, I,). Daí que a necessidade de uma legislação desportiva atualizada não se fez
esperar. A nova lei, de n.º 8.672, ficou pronta em 6 de julho de 1993 e, no art. 18,
confirmou o princípio da libertação do desporto da tutela do Estado, em artigo que foi
reaproveitado na Lei Pelé (art. 26): “Atletas, entidades de prática desportiva e entidades de
administração do desporto são livres para organizar a atividade profissional de sua modalidade,
respeitados os termos desta Lei".
Ao permitir que as entidades desportivas se constituíssem como
sociedades de fins econômicos ou assumissem a estrutura de sociedades comerciais (art.
11), a Lei n.º 8.672, de 1993, também conhecida como Lei Zico, rompeu com a tradição
do associativismo como filosofia e modelo de organização do desporto, consagrada na
legislação.
De fato, hoje o desporto de competição vale como espetáculo
(sobretudo televisivo), onde o resultado desportivo interessa na medida em que seja
fator de reprodução e multiplicação do capital nele investido. É o desporto-negócio,
subordinado às leis do mercado, onde os aspectos pragmáticos da renda e do lucro
prevalecem sobre os valores desportivos (integração social, de desenvolvimento
psicomotor, de exercícios físicos educativos, de fortalecimento da cidadania, etc.) e
onde as decisões importantes são tomadas pelo departamento de marketing.
Foi presumivelmente nessa linha de raciocínio a Lei n.º 9.532, de 10 de
dezembro de 1997 excluiu do rol de entidades beneficiadas com a imunidade fiscal
prevista no art. 150, inciso VI, alínea c), as sociedades desportivas dedicadas ao
desporto profissional. De fato, em razão dos interesses financeiros (emissoras de TV,
patrocinadores e outros parceiros), já não era possível sustentar a caracterização como
entidades que colocam seus serviços “à disposição da população em geral, em caráter
complementar às atividades do Estado, sem fins lucrativos” (art. 12).
Ao mesmo tempo, ao revogar o art.. 30 da Lei n.º 4.506, de 30 de
novembro de 1964, a Lei n.º 9.532/97 revogou a isenção concedida às entidades
dedicadas à prática desportiva de caráter profissional (clubes) e às de administração do
desporto (federações e confederações).
Em 10 de dezembro de 1997, foi sancionada a Lei n.º 9.528. No que
interessa ao presente estudo, essa lei alterou o art. 22 da Lei n.º 8.212, de 24 de julho
de 1991 (a Lei de Custeio da Seguridade Social), reconhecendo como fato gerador da
contribuição previdenciária não só a renda de bilheteria, mas também a receita obtida
com outras atividades relacionadas a competições de atletas profissionais, consoante se
vê no parágrafo a seguir citado:
“A contribuição empresarial da associação desportiva que mantém equipe
de futebol profissional destinada à Seguridade Social, em substituição à
prevista nos incisos I e II deste artigo, corresponde a cinco por cento da
receita bruta, decorrente dos espetáculos desportivos de que participem em
todo território nacional em qualquer modalidade desportiva, inclusive
jogos internacionais, e de qualquer forma de patrocínio, licenciamento de
uso de marcas e símbolos, publicidade, propaganda e de transmissão de
espetáculos desportivos”.
A QUESTÃO DA AUTONOMIA DAS ENTIDADES DESPORTIVAS
Nossa primeira “lei orgânica” do desporto data de 1941, ou seja, do
regime conhecido como Estado Novo, que se notabilizou pelo paternalismo nas
relações entre o Estado e a sociedade e, conseqüentemente, pelo emprego alternado da
força e da cooptação, como instrumentos de manutenção da harmonia social e da
ordem pública. O Decreto-lei n.º 3.199, já referido, prescrevia que toda matéria
relativa à organização desportiva do país fosse regulada por lei federal (art. 46) e que
cada confederação não só adotasse o código de regras desportivas da entidade
internacional a que estivesse filiada, mas também o fizesse respeitar pelas entidades
nacionais que lhe estivessem direta ou indiretamente vinculadas (art. 43).
O Decreto-lei n.º 3.199, de 1941, inaugurou também a presença do
Estado nos esportes através da legislação desportiva, determinando que as entidades
desportivas se organizassem em confederações, federações, ligas e associações, sob a
superintendência do Conselho Nacional dos Desportos e instituindo “medidas de
proteção dos desportos” (subvenções e isenções de tributos e taxas). Pouco mais de
trinta anos depois, em pleno regime militar, foi substituído pela Lei n.º 6.251, de 8 de
outubro de 1975.
Pela Lei n.º 6.251/75, a organização do desporto (“atividade
predominantemente física, com finalidade competitiva, exercitada segundo regras
preestabelecidas”) no País passou a obedecer ao disposto na lei e sua regulamentação,
bem como, ainda, nas resoluções do Conselho Nacional de Desportos. É por isso que
Vargas (1995) pôde escrever que “podemos definir que a história do Direito
Desportivo no Brasil é a história da intervenção do Estado, visando transformar o
desporto num instrumento de pressão e manipulação ideológica”. Não é por acaso que
o primeiro (e único) Plano Nacional de Educação Física e Desportos veio a lume em
1976.
Com a Constituição Federal de 1988, passaram a ser reconhecidas as
práticas desportivas formais e não formais (art. 217, caput) o desporto educacional (art.
217, II), o desporto de alto rendimento (idem) e o lazer, este “como forma de
promoção social” (art. 217, § 3º). Proclamou-se, também, que as entidades desportivas
dirigentes e associações eram competentes para definir sua estrutura interna, sua
organização e seu funcionamento. Na prática, a Constituição Federal de 1988 tornou
obsoleta toda a legislação desportiva então em vigor, ou seja, a Lei n.º 6.251, de
08.10.75, o Decreto n.º 80.228, de 25.08.77, que a regulamenta, a Lei n.º 6.354 (Lei do
Passe), de 2.09.76, e grande parte das resoluções do Conselho Nacional de Desportos.
Álvaro Mello Filho chama a autonomia das entidades desportivas de
pedra de toque, chave de abóbada e espinha dorsal do atual ordenamento jurídicoconstitucional-desportivo brasileiro. Não há dúvida de que sua proclamação rompeu
com uma relativamente longa tradição de institucionalização do desporto sob tutela
estatal.
O exercício da autonomia quanto à organização e ao funcionamento do
Comitê Olímpico Brasileiro, do Comitê Paraolímpico Brasileiro e das entidades de
administração do desporto é que confere a essas entidades a competência para manter
a ordem desportiva, ou seja, para impor o respeito às normas desportivas (estatuto,
regulamento de campeonato, dispositivos legais, etc.). Com esse objetivo, são
colocadas à disposição das entidades algumas apenações de caráter administrativo:
advertência, censura escrita, multa, suspensão, desfiliação.
Observe-se, finalmente, que nossos clubes (a não ser que se trate de pedir
facilidades tributárias ou o perdão dos débitos fiscais e parafiscais!), proclamam alto e
bom som sua autonomia com relação ao poder público; contudo nunca reclamam da
mão-de-ferro com que são governados por entidades burocráticas 2 como federações e
confederações, aí incluída a FIFA, que têm horror do pensamento divergente os
mantém subordinados graças ao poder que têm de excluí-los de campeonatos, puni-los
com desfiliação, etc. Aliás, não é muito diferente a maneira de agir dos clubes com
relação a seus atletas.
RELAÇÕES DE TRABALHO NO FUTEBOL
Dispunha o § 2º o art. 28 da Lei n.º 9.615, de 24.3.1998, Lei Pelé:
“Burocráticas”, no caso, quer dizer: não praticam o desporto, não formam atletas e não
participam diretamente do espetáculo desportivo; apenas registram contratos, recolhem taxas,
arrecadam contribuições e oferecem infra-estrutura física e administrativa aos órgãos da Justiça
Desportiva.
2
“O vínculo desportivo do atleta com a entidade contratante tem natureza
acessória ao respectivo vínculo empregatício, dissolvendo-se, para todos os efeitos
legais, com o término da vigência do contrato de trabalho”.
Pelo art. 93 da mesma lei, com a redação que lhe foi dada pela Lei n.º
9.981, de 14.7.2000, o disposto no § 2º do art. 28, acima citado,
“... somente produzirá efeitos jurídicos a partir de 26 de março de 2001,
respeitados os direitos adquiridos, decorrentes dos contratos de trabalho e
vínculos desportivos de atletas profissionais pactuados na legislação anterior”.
A expressão “legislação anterior” tem dado origem a uma querela jurídica,
que deverá ser decidida na Justiça: anterior à própria Lei Pelé (que é de 24 de março de
1998), ou seja, a Lei do Passe, ou anterior à data de extinção do passe, ou seja, 26 de
março de 2001?
É conhecida como Lei do Passe a Lei n.º 6.354, de 2.9.1976, que dispõe
sobre as relações de trabalho do atleta profissional. Consoante o disposto no art. 96 da
Lei Pelé,
“São revogados, a partir da vigência do disposto no § 2º do art. 28
desta Lei, os incisos II e V e os §§ 1º e 3º do art. 3, os arts. 4º, 6º, 11 e
13, o § 2º do art. 15, o parágrafo único do art. 16 e os arts. 23 e 26 da
Lei n.º 6.354, de 2.9.1976”.
A partir de 26 de março de 2001, está extinto o passe e, por conseguinte,
parcialmente revogada a chamada Lei do Passe (Lei n.º 6.354, de 1976). Extinção e
revogação, pois, não causaram maior surpresa.
Para bem entender em que consiste a “extinção do passe”, é preciso
comparar o texto do art. 11 da Lei do Passe com o texto do § 2º do art. 28 da Lei Pelé.
No primeiro, está muito claro que, uma vez contratado como profissional, o atleta se
torna propriedade (patrimônio) do clube, pois a ele continua vinculado mesmo depois
do término do contrato de trabalho. Isto é, se por qualquer motivo, não houver acordo
sobre um novo contrato com o mesmo clube, este só libera o atleta se quiser.
Conseqüentemente, o atleta pode ficar impedido de trabalhar, o que, como é óbvio,
configura um abuso, para não dizer uma lesão de direito líquido e certo, que é o direito
ao trabalho (Constituição Federal, art. 5º, XIII).
Portanto, na vigência da Lei do Passe, o contrato de trabalho do atleta
criava dois vínculos com o clube: o vínculo empregatício e o vínculo desportivo. O
término do primeiro não significava o término do segundo. O atleta só ficava livre do
vínculo desportivo aos trinta e dois anos de idade e, ainda assim, se tivesse jogado por
pelo menos dez anos em seu clube atual.
Na época, a principal reclamação contra o passe era que, vencido o
contrato de trabalho (vínculo empregatício), o clube podia não recontratar o atleta,
nem permitir que fosse jogar em outro clube. E, assim, como dono do passe (vínculo
desportivo), o clube podia manter o atleta num banho-maria, até que concordasse com
as condições do novo contrato, do jeito que o clube queria.
Enfim, o que diz o § 2º do art. 28 da Lei Pelé é que não mais existe o
chamado “vínculo desportivo”, ou seja, aquele que prendia o atleta ao clube mesmo
que tivesse terminado o contrato de trabalho. Assim, de 26 de março de 2001 em
diante, o vínculo do atleta profissional com o clube se dissolve com o término do
contrato de trabalho, não precisando o atleta esperar sua “liberação” por parte do
clube.
Obviamente, isso não quer dizer que, na vigência do contrato de
trabalho, o atleta possa, sem mais nem menos, pedir a conta e ir embora, seja para
exercer uma outra profissão, seja para jogar em outro clube. Este caso configura
abandono de emprego, sujeito à aplicação da cláusula penal prevista no final do caput
do art. 28 da Lei n.º 9.615/98 e ao pagamento de indenização nos termos dos
parágrafos 3º, 4º, 5º e 6º do mesmo artigo (Ver o quadro abaixo).
A propósito, importa notar (para, depois, comparar com o valor de um
outro tipo de indenização, criada pela Medida Provisória n.º 2141, de 23 de março de
2001), que, consoante o disposto no § 3º do art. 28 da Lei Pelé (redação dada pela Lei
n.º 9.981, de 14 de julho de 2000), o valor da cláusula penal imposta em razão de
abandono de emprego sem justa causa é livremente estabelecido pelos contratantes, até
o limite de cem vezes o montante da remuneração anual pactuada.
De qualquer forma, retomando o raciocínio, a extinção do passe não
invalida o pagamento de indenização, pelo atleta ao clube, em virtude de rescisão
unilateral de contrato de trabalho. Extinção do passe significa apenas que, terminado o
contrato com um clube, o jogador está livre, inclusive para vincular-se a outro clube,
sem que o clube empregador anterior possa cobrar qualquer coisa do clube empregador
que o sucede.
CAPÍTULO III – A CBF É UMA ASSOCIAÇÃO CIVIL SEM FINS
LUCRATIVOS
Uma questão crucial para esta CPI é a definição da natureza jurídica da
CBF como entidade. Comprovadamente, a CBF é uma associação civil, sem fins
lucrativos. É o que consta do Estatuto, que não foi mudado. No entanto, em seu
depoimento, por diversas vezes Ricardo Teixeira se referiu à CBF como a uma
empresa. Disse ele:
“Achava eu, naquela ocasião, na base da jurisprudência do Supremo
Tribunal Federal, que um contrato privado entre duas empresas
privadas, como é o caso da NIKE e da CBF, não deveria ser objeto de
uma investigação num foro político. Achava eu que duas empresas que
não recebem recursos públicos de nenhuma forma e que já são alvos de
investigação permanente por parte da Receita Federal, do Ministério
Pùblico, do Banco Central, entre outros, estavam sob o necessário
controle das instituições nacionais, sem prejuízo, portanto, para o
interesse público”.
(...)
“A visibilidade da CBF é muito maior do que a dimensão
financeira dela como empresa. Como empresa, ela é uma empresa
de médio porte, mas caminha para o para o equilíbrio do ponto de vista
financeiro”.(...)
(...)
“E tem um detalhe muito importante que é preciso que se
ressalve com relação à contabilidade da CBF – e aqueles aqui da
Comissão que têm alguma vinculação com clubes e confederações sabem
disso. Até 98 e no início de 98 foi que, por uma medida provisórian, nós
tivemos que transformar as entidades em empresas de fins
lucrativos”. (...) A partir de 1998, ela (CBF) começou a ter que
fazer toda a contabilidade normal de uma entidade, como se fosse uma
empresa comercial”.
O presidente da CBF foi contestado pelo Deputado Aldo Rebelo:
“V.Excia., no pronunciamento de abertura de seu depoimento e
recorrentemente insistiu na tese e na formulação de que a CBF é uma
empresa privada com fins lucrativos. No estatuto, o que vejo é uma
associação civil de direito privado. Empresas privadas têm regra de
mercado. Eu sei que uma empresa que fabrica paletó concorre com outras
que fabricam paletó; uma empresa de televisão concorre com outra de
televisão; de rádio, com outras de rádio. Eu gostaria de saber qual é a
empresa no ramo de futebol que concorre com a CBF para organizar
Seleção Brasileira, campeonato de futebol, qual é a natureza mesmo, o
caráter privado de uma empresa, se na verdade ela recebe e tem, quase em
caráter de monopólio, a atribuição de organizar uma atividade
esportiva?”
Ricardo Teixeira:
“ Dentro desse critério, nós teríamos alguns segmentos, por exemplo, as
escolas de samba...”
Aldo Rebelo:
“ Não, mas escola de samba o senhor tem pelo menos uma dúzia no Rio
de Janeiro, outra dúzia, em São Paulo; CBF só há uma no Brasil,
Presidente. É isso que eu quero lhe dizer. Eu não posso organizar uma
Seleção Brasileira no lugar da CBF...”
O deputado Jurandil Juarez também questionou o argumento de Ricardo
Teixeira:
“(...) eu fui à CBF e procurei mudanças, estou convicto de que não
houve mudanças. Por isso, eu vou ler o que diz o Estatuto, que foi o que
essa Comissão recebeu, lá na CBF: esta entidade continua sendo uma
associação civil de direito privado sem fins lucrativos. Agora, deixar bem
claro que existe uma diferença entre ser sem fins lucrativos e isenta do
pagamento de impostos. A entidade, portanto, continuou, por sua própria
deliberação, dado que não existe, na Junta Comercial do Rio de Janeiro,
registro de mudança de característica de pessoa jurídica da CBF...”
Ricardo Teixeira respondeu:
“O que eu disse não foi que houve modificação estatutária. O que eu
disse é que, com a alteração da lei em que a CBF deixou de ser entidade
isenta de impostos, automaticamente caiu a proibição que existia de ter
salário diretor de empresa de fins lucrativos”. (g.n.)
Deputado Jurandil Juarez:
“A que título o senhor recebe esses proventos? O senhor é funcionário?
Isso é pro labore? São os honorários? São rendimentos da atividade?
Qual é o título do seu rendimento?”
Ricardo Teixeira:
“Vou consultar minha auditoria para lhe mandar...” (...) “Nós estamos
tentando entrar em contato com o Departamento Jurídico, não
conseguimos contatar, para responder à sua primeira pergunta...”
Deputado Jurandil Juarez:
“Eu vou ler o artigo 13 do estatuto que rege a entidade: ‘Os membros
dos poderes e órgãos não serão de qualquer forma remunerados pelas
funções que exercerem na CBF. Esse artigo já foi revogado do
Estatuto?”
(...) “Se não foi o artigo 13 revogado, o senhor recebeu 405 mil, 962
reais no ano de 99. Se não foi revogado especificamente esse artigo, o
senhor tem consciência de que está recebendo irregularmente da CBF?”
O presidente da CBF referia-se às mudanças produzidas pela lei 9.532 de
10 de dezembro de 1997, que revogou a isenção de imposto de renda e outros impostos
que até então beneficiava a CBF. Cobrado pela CPI , Teixeira enviou afinal, em 24 de
abril último uma cópia da ata da Assembléia geral da CBF que tratou desse tema e que
se realizou-se em 5 de janeiro de 1998.
A ata da assembléia estabeleceu no item “e” da ordem do dia “examinar
e deliberar sobre concessão de poderes especiais à Diretoria, para adoção de medidas
necessárias visando à adaptação da CBF ao novo regime tributário a que ficará sujeita a
partir de 1º de janeiro de 1998, em razão da Lei no. 9532, de 10 dezembro de 1997, que
revoga a isenção de imposto de renda que beneficiava as entidades de administração do
desporto...”.
Assembléia:
Ricardo Teixeira apresentou a seguinte proposta da Diretoria à
“Como conseqüência do término do regime isencional, entende a Diretoria
que diversas providências deverão ser tomadas pela CBF, a fim de
compatibilizar sua administração, notadamene nas áreas financeira e
contábil, com os requisitos inerentes a essa nova realidade que a equipara,
sob aspecto tributário, às empresas mercantis. Isto não significa que a
Diretoria entenda conveniente ou necessário modificar o caráter das
finalidades societárias da CBF, a qual continuará a ter fins não
lucrativos...”
Sua proposta foi aceita: “A Assembléia Geral decidiu por unanimidade de
votos, conceder à Diretoria os mais amplos poderes para adoção de medidas visando a
adaptação da CBF ao novo regime tributário...”
“Ficou, portanto, autorizada a Diretoria a praticar todos os atos
necessários e recomendáveis para atender aos reclamos da recente
legislação, podendo, para tanto, também, promover alterações nos
Estatutos Sociais...”
“(...) A Assembléia Geral, por unanimidade de votos, decidiu que
doravante os membros da Diretoria poderão, ou não, receber remuneração
pelas funções que exercem na CBF, sendo conferido ao sr. Presidente da
Entidade poderes para fixar o valor dessa remuneração”.
DECISÕES ILEGAIS
Esta CPI não tem dúvida alguma de que as decisões adotadas por aquela
Assembléia Geral foram ilegais. Pelos seguintes motivos:
1. O artigo 13 do Estatuto da CBF dispõe que: “ Os membros dos poderes e
órgãos não serão de qualquer forma remunerados”. Portanto, os diretores
da entidade não poderiam ser remunerados. A não ser que o artigo 13 do
Estatuto fosse modificado ou revogado.
2. A Assembléia Geral deu poderes à Diretoria para remunerar seus diretores,
mas nada decidiu sobre a mudança do artigo 13 do Estatuto. O Estatuto não
foi mudado, caracterizando-se assim como uma ilegalidade a remuneração
dos diretores, que passou a ser efetivada a partir de setembro de 1998.
3. E tem mais. Na verdade, essa Assembléia Geral, que foi convocada com
base no artigo 17 do Estatuto, que é, portanto, uma Assembléia Geral de
natureza administrativa, que se reúne apenas com as federações filiadas, não
tem poderes para mudar o Estatuto. Isto é, mesmo que aquela Assembléia
Geral houvesse decidido mudar o Estatuto, ela não poderia tomar essa
decisão.
4. Somente a Assembléia Geral de natureza eleitoral pode mudar o Estatuto da
CBF. Diz o Artigo 19 do Estatuto da CBF que Assembléia Geral de natureza
eleitoral é aquela que reúne-se não só com a participação das federações, mas
também com as “filiadas especiais, que serão as 24 entidades de prática de futebol
(clubes) que, na época da reunião estejam integrando a divisão principal do Campeonato
Brasileiro de Futebol...” Pois bem: O artigo 19, em seu parágrafo 3º reza:
“Compete, também, especificadamente à Assembléia Geral, de natureza
eleitoral, reformar os Estatutos da CBF, no todo ou em parte, por
iniciativa própria ou proposta do Presidente, mediante voto de, pelo
menos ¾ (três quartos) dos filiados diretos e especiais, permanecendo o
texto vigente caso não se obtenha na Assembléia Geral o número de votos
necessários para proceder a alteração”.
5. No Cartório Civil do Rio de Janeiro não consta nenhuma alteração do
Estatuto da CBF, como notou o deputado Jurandil Juarez durante o
depoimento de Ricardo Teixeira em 10 de abril último:
“A exigência estatutária é de que seja convocada uma assembléia geral
específica para fazer isso. E certamente, para cumprir as determinações
também do estatuto, ele precisa ser registado no Cartório de Registro
Civil das Pessoas Jurídicas do Rio de Janeiro. Não há (...) não há esse
registro no Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas. Isso quer
dizer o seguinte, Sr. Presidente, vale o que está escrito aqui.”
Fica, assim, evidenciada a ilegalidade da decisão da Assembléia Geral de 5
de janeiro de 1998, que aprovou a proposta de remunerar os diretores da CBF.
Portanto, vê-se que a Assembléia Geral da CBF, levada pelo
desconhecimento que é próprio dos dirigentes de suas filiadas, aprovou medidas que
ultrapassaram a sua competência. Desse modo, abre-se a possibilidade de que a
remuneração à diretoria possa vir a ser revista. Pela Assembléia Geral, ou por
intermédio de alguma ação judicial que pretenda fazer com que a CBF destine seus
recursos para os fins estatutários, e não outros que o próprio Estatuto proíbe e que
fogem às suas finalidades. Como conseqüência, que os diretores da CBF podem ser
levados a devolver à entidade os valores que receberam indevidamente. (Anexo
Estatuto da CBF, de 1994, em vigor, sem alterações até esta data).
CONSELHO FEDERAL DE CONTABILIDADE CONFIRMA
O Relatório de Análise do Conselho Federal de Contabilidade, que fez
uma diligência à sede da CBF para examinar seus livros e contas, vem em reforço de
nosso entendimento:
“Houve alterações significativas na Legislação Fiscal pertinente, que
afeta diretamente a CBF, não incorporadas a seu Estatuto, passando a
recolher os tributos federais e remunerar a diretoria em decorrência disso.
A CBF continua sendo uma Entidade ‘sem fins lucrativos’, conforme
decisão unânime da diretoria em Assembléia Geral ‘...apesar do novo
regime tributário... continuará a ter fins não lucrativos...’ (Ata da
Assembléia Geral de 05.01.98 pg. 184). Tal fato necessita ser definido,
uma vez que coloca na ilegalidade alguns atos que vêm sendo
administrativamente praticados”.
CONTROLE EXTERNO E INTERNO
Apesar de utilizar um modelo de contabilidade que traduz um aparente
controle, não existem pessoas ou órgãos dentro ou fora da CBF que podem exercer
algum tipo de controle ou pressão. Nisso a CBF se afasta mesmo das empresas privadas
das quais Ricardo Teixeira tanto se esforça para aproximá-la, sem ter tido sucesso.
Quais os instrumentos de controle a que a CBF está estatutariamente
submetida? Teoricamente, à Assembléia Geral, ao Conselho Fiscal e a uma auditoria
contratada.
O CFC E O CONTROLE INTERNO DA CBF
A CPI solicitou o apoio do Conselho Federal de Contabilidade (CFC)
para auxiliá-la no exame do sistema contábil e de controle da CBF. O Conselho
participou com membros e assessores desta Comissão de diligência nas instalações da
Confederação.
Após a diligência, o CFC, produziu um trabalho, o Relatório de Análise
01/2001, elaborado pelos auditores Daniel Salgueiro da Silva e Alberto Jones Silva.
Esse trabalho, muito importante para esta Comissão, foi fundamental
para que se chegasse ao juízo real do controle, da contabilidade e das finanças da CBF.
Quanto ao controle interno da entidade, a seguir são transcritos alguns
trechos do Relatório do CFC, que demonstram a fragilidade contábil, financeira e
operacional da CBF (Anexo Relatório de Análise CFC):
“2.2.1
Quanto aos aspectos de “Controle Interno” a proteção dos
ativos da entidade deixa muito a desejar. Reiteradamente processa-se a
transferência de numerários a diversas organizações, sem uma definição de
critérios, dentre os quais destacamos:
a) Ajudas de custos às Federações Estaduais, Clubes esportivos e
Entidades outras, sem critérios definidos. Ora registradas em “Outras
Contribuições e Doações”, ora na atividade fim.
b) Ajuda de custo a título de contribuição para candidatos nas
eleições/98, sem o recebimento do correspondente “bônus eleitoral”, fato
que caracteriza irregularidade de procedimento e infração à “Lei
Eleitoral”.
c) Distribuição de recursos financeiros em valores bastantes elevados a
diversos funcionários, dirigentes, em cheques nominais à própria entidade,
para posterior prestação de contas, sem a centralização necessária ao
funcionamento de um bom “Controle Interno”.
(...)
2.2.5
Consta depósito do valor de R$ 458.896,89, baixado em
contrapartida na conta “Caixa” em 30/12/99, documento no
002/043. Confirmamos tratar-se de 36 (trinta e seis) comprovantes de
depósitos bancários. Entretanto, tais depósitos foram efetuados entre os
dias 12/11/99 a 23/12/99. Tal procedimento fere, no mínimo, o
mais frágil “Controle Interno” existente, desnudando a fragilidade na
administração dos “ativos financeiros” da Entidade.
(...)
3.2.4
Testamos um repasse feito a SBTR (Stella Barros Turismo),
no valor de R$ 716.469,23 – despesas com eliminatórias da copa de
2002 – feito em 18/12/98 doc.005/0049 Fatura 041/98 de
09/12/98, que menciona “... conforme carta em anexo”. A justificativa
é que refere-se a apropriação de despesas de “acerto Copa do Mundo de
98”. Não localizamos a tal “carta em anexo”, nem tampouco a fatura
encerra maiores explicações além do lançamento do valor: FF
3.097.181,14 : 5,49 = U$ 564.149,00 x 1,27 = R$ 716.469,23.
Tal procedimento fere o bom “controle interno”.
(...)
Conclusões:
(...)
b) O Fluxo contábil utilizado pode ser otimizado, em uma estruturação
mais moderna, de formar a permitir a direta contabilização dos atos e
fatos administrativos da Entidade, eliminando assim lançamentos
supérfluos.
c) O entendimento acima não exclui a necessidade de se proceder
alterações profundas no “Controle Interno” da Entidade, este sim, maior
responsável pela má impressão que se obtêm em uma análise da estrutura
administrativo-operacional.” (g.n.)
ASSEMBLÉIA GERAL
A Assembléia Geral reúne-se, ordinariamente, todos os anos, em janeiro,
para aprovar as contas do ano anterior. Os representantes são os presidentes da
Federações e clubes da primeira divisão. Não é raro, entretanto, que sejam enviados
procuradores para responder pela entidade filiada.
Esta CPI apurou que essas reuniões anuais não examinam as contas
devidamente. Há, na realidade, uma grande reunião de confraternização, na qual alguns
representantes são escolhidos para examinar a documentação contábil. O restante do
grupo estará de acordo com que os examinadores disserem. E, pelo que se sabe, nunca
se levantou algum tipo de irregularidade nas contas da CBF.
Os presidentes de federações, em geral, não têm formação apropriada
para examinar as contas da CBF. A grande maioria das entidades estaduais de futebol
não tem um sistema de contabilidade mínimo, não sendo raro os casos em que elas
nada têm. Entre diversos exemplos, o presidente da Federação do Espírito Santo
declarou ter preparado todos os livros contábeis após receber a requisição desta CPI.
Até fins de 2000 essa entidade não tinha contabilidade.
Pelos depoimentos tomados de todos os presidentes de federações, esta
CPI pôde averiguar que reina o descontrole em quase todas essas entidades. Quando
há um programa de computador adequado, as despesas é que não são controladas. Ou
os dois problemas em conjunto.
O que se pode esperar desse tipo de administrador, que, em seu Estado
conduz a sua federação nos moldes da CBF, tratando-a como coisa particular, sem
qualquer comprometimento ou responsabilidade? Esse mesmo presidente terá
condições de julgar as contas da entidade mãe, cujos números são muito superiores?
Em janeiro de 1999, foram aprovadas as contas da CBF relativas ao
exercício de 1998. Esta CPI questionou alguns presidentes se eles estiveram presentes
àquela reunião e se souberam da assinatura dos empréstimos da Confederação junto ao
Delta Bank. Os que estiveram presentes declararam desconhecer completamente os
empréstimos firmados com as taxas mais elevadas do mercado financeiro na época.
Um exemplo, quando perguntado sobre esse tema pelo Deputado Dr.
Rosinha, o sr. Nilson Gomes da Costa, presidente da Federação Norte-rio-grandense
de Futebol afirmou:
“O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Eu vou começar por onde
terminou o Deputado Pedro Celso. O senhor já esteve em alguma
assembléia da CBF, que aprovava contas da CBF?
O SR. NILSON GOMES DA COSTA – Várias.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – O senhor esteve nessa
especificamente de 1998, que...
O SR. NILSON GOMES DA COSTA – De 99, que aprovava as
contas de 98.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – ... que se deu em janeiro
de 1999?
O SR. NILSON GOMES DA COSTA – Acredito que sim. Eu
não tenho certeza, porque algumas delas eu mandava representante, mas
acredito que em 99 eu deva ter participado.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Foi exposto, nessa
aprovação de contas, foi feita a exposição de que havia um empréstimo do
Banco Delta National Bank(?).
O SR. NILSON GOMES DA COSTA – Bom, já foi mais ou
menos explicado, mas a prestação de contas da CBF é examinada pelo
Conselho Fiscal e emitido um parecer. E esse parecer, com toda a
documentação, é colocado à disposição dos membros da Assembléia. Na
verdade, não é dito, não é lido naquela hora, porque foi aprovado pelo
Conselho, para aprovação dos Clubes. Não me recordo de que ele tenha
falado quanto pagou ou de quanto foi o empréstimo. Salvo engano, acho
que não houve esse assunto.” (g.n.)
Pode-se observar com clareza que as filiadas nem tiveram as informações
sobre os primeiros dois empréstimos da CBF com o Delta e que os dirigentes supõem
que o Conselho Fiscal faça a sua parte.
Por sua vez, o sr. Fares Cândido Lopes, presidente da Federação
Cearense de Futebol afirmou que manda, às vezes, o diretor de futebol para reuniões
que aprovam contas da CBF. Será que o diretor de futebol reúne conhecimento
específico para analisar essas contas?
“O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – (...) Houve essa
reunião, deve ter sido no Rio de Janeiro, (...) que aprovou as contas do
Sr. Ricardo Teixeira de 1998. O senhor estava nessa reunião?
O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – Não.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Quem é que estava
representando o senhor nessa reunião?
O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – (...) O Raimundo Chaves.
Era...
(...)
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO- Ele era o que da
Federação?
O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – Ele era diretor de futebol, e
eu não... Em 99... A assembléia de 99, que aprovou as contas de 98, e
a de 2000, que aprovou a conta de 99, eu não fui à CBF.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Quer dizer, porque aí, eu
acredito que todos os presidentes aqui presentes e os presidentes de
federações pelo Brasil afora vão ter que responder pela aprovação das
contas do Sr. Ricardo Teixeira de 1998. Porque tem ali um escândalo.
O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – Possível que ele tenha
aprovado essa conta sozinho, sem nenhuma federação presente. Só faltava
essa.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Como é?
O SR. FARES CÂNDIDO LOPES- Que o Teixeira tenha
convocado uma assembléia, não tenha comparecido nenhuma federação, e
ele tenha aprovado a conta sozinho. Não é possível que isso tenha
acontecido.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO- Porque o Estatuto da
CBF manda reunir a assembléia geral, que é composta pelos senhores,
para aprovar as contas. E aí, Sr. Fares, vamos aqui. O senhor tem
conhecimento do negócio feito entre a CBF e o Delta
National Bank?
O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – Tenho o que, rapaz?
(Risos.)
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - O senhor sabe que só de
juros, em um período de três anos,...
O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – Eu tenho assistido às
sessões da Câmara.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - ... ele pagou 10 milhões
de dólares, só de juros desse negócio com o Delta National Bank?
Mentiu na CPI quando disse que os juros eram juros de mercado. E a
nossa assessoria, muito competentemente, diga-se, ressalte-se aqui, foi
atrás de verificar os juros pagos por outras empresas, companhias
similares até, e os juros foram pagos, é... os juros pagos por outras
companhias ou similares muitas vezes menor do que o pago pela CBF. E
neste mesmo ano que a CBF disse que estava numa situação de
insolvência, que estava numa situação de quebradeira completa, por isso
precisava fazer o empréstimo, ela doou pra políticos e até pra criadores de
cavalo mais de 5 milhões de reais? É só o Ricardo Teixeira que é o
responsável por essas contas? Não tem uma assembléia? Então, eu
gostaria aqui...
O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – Tem uma assembléia e tem
o Conselho Fiscal, que...
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Quem aprova as contas é
a assembléia...
O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – É, mas... Não, é o
Conselho. Sabe por que Deputado. Vou lhe dizer o porquê. Eu, no meu
primeiro ano, eu não fui...
(...)
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Quem aprova as contas é
a Assembléia.
O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – É, mas o ... É o Conselho.
Sabe por quê, Deputado? Vou até dizer por quê. Eu, no meu primeiro
ano, eu não fui.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Essa questão, vamos ter
que analisar juridicamente, não é isso, Presidente?
O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Vamos ter que
analisar juridicamente e analisar politicamente — entendeu? —, porque
22 milhões, porque dez milhões de dólares são 22 milhões de reais, pagos
de juros em três anos, quantidade que não precisa, porque recebia e podia
receber em adiantamento da própria Nike esse dinheiro, empréstimo de
três meses, de seis meses, que no fim resulta em dez milhões de dólares de
juros, de 40 milhões que pediu emprestado. Isso é um escândalo!
Sinceramente.
O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – Mas, Deputado, eu não
tenho nenhum conhecimento, nem desse contrato com a Nike, não fomos
consultados, não participamos.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Mas isso é feito
em nome dos senhores, porque a CBF é uma Confederação. Uma
Confederação significa que ela é formada por federações. Quando ele chega
em Nova York, ou na sede da Nike, ou na sede da AMBEV, para
vender os direitos da CBF, está vendendo em nome dos senhores.” (g.n.)
Verifica-se, por esse depoimento, que os presidentes de entidades filiadas
desconhecem os negócios da CBF. Ao que parece, os empréstimos com o Delta Bank
nem foram trazidos à discussão na reunião da Assembléia, de janeiro de 1999.
Prova cabal é que Fares, voluntariamente, afirmou que os presidentes de
federações não foram consultados sobre o contrato com a Nike. O presidente desta
CPI, Deputado Aldo Rebelo, lembrou aos dirigentes que a CBF não é nada em si: ela é
nada mais nada menos do que uma associação de federações, e que tudo que a CBF faz
é em nome desses mesmos dirigentes.
Sintomaticamente, o presidente da Federação Pernambucana de Futebol,
Carlos Alberto de Oliveira, foi aplaudido por todos os presidentes das federações do
Nordeste presente à audiência de João Pessoa, em 12/05/2001, quando fez
contundentes críticas à administração de Ricardo Teixeira. Ele declarou que, após
assistir ao depoimento do presidente da CBF à CPI, pela TV, pediu a renúncia de
Ricardo Teixeira..
Há uma crescente insatisfação dos dirigentes estaduais com a atual
administração da CBF, até porque eles estão descobrindo que desconheciam os
descaminhos seguidos pela Confederação. Agora percebem que foram abandonados à
margem de todo o processo. Um processo que tem envolvido centenas de milhões de
dólares, enquanto que as federações só participam quando se trata da distribuição das
doações de mesadas, que comparadas aos negócios dos diretores da CBF nada
significam.
No mesmo depoimento, em João Pessoa, o presidente da Federação
Pernambucana de Futebol, reconheceu que não há controle sobre as atividades da CBF.
Acrescentou que se alguma filiada tentar fiscalizar, sofrerá retaliações:
“O SR. CARLOS ALBERTO GOMES DE OLIVEIRA -Por
que a CBF não negocia os contratos? Eu tenho uma mercadoria boa, o
filé, que é a primeira divisão, mas tenho o contrafilé que é a segunda. (...)
E por que nós somos tão espoliados? Um time da grandeza do Náutico
que tá fazendo cem anos, que tem uma torcida imensa, ir pra terceira
divisão, sem dinheiro. E agora chega um Ministro bota o América, o
outro bota outro, e o Náutico não entra no campeonato. (...) A coisa pior
do mundo é você ser injustiçado. CBF, meu caro Relator, é mais fechada
que uma maçonaria, ninguém fala com ninguém ali. Eu tô sabendo do
contrato da Nike quando os senhores interrogaram o Ricardo Teixeira
porque eu não sabia e perguntei ao Presidente: Me diga quanto a CBF
ganha da Nike porque nunca me disseram. Me diga quanto a CBF
ganha de cota de televisão porque nunca me disseram. O senhor diz: “O
senhor é membro da Assembléia Geral?” Sou. “O senhor é irresponsável
porque devia cobrar isso.“ Talvez, mas eu já disse porque eu não fiz,
porque o problema não era meu, o problema era dos meus clubes que
podiam ser retaliados. Mas agora não tem mais clube pra ser retaliado
não, porque têm os Deputados que defendem os clubes deles. Agora eu
tenho condições de tomar as posições na CBF.” (g.n.)
CONSELHO FISCAL
O Conselho Fiscal da CBF não é eleito independentemente da diretoria.
O Deputado Jurandil Juarez questionou o presidente da CBF:
“O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - (...) Bom, o
senhor já me disse que tem um instrumento de controle que é a auditoria
externa, não é? Uma empresa de auditores independentes. Internamente,
o senhor tem algum controle? Quem exerce o controle das contas? Quem
fiscaliza as contas da CBF?
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Nós temos o Diretor
Financeiro e nós temos uma estrutura da CBF, do Departamento
Financeiro.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Quem fiscaliza
isso? O senhor tem um conselho fiscal?
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Nós temos um conselho
fiscal e a auditoria manda para o Conselho Fiscal o seu parecer.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - O Conselho Fiscal
pode ser eleito autonomamente?
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Quem elege o Conselho
Fiscal é a assembléia da CBF e o representante de cada região.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Eu estou lendo
aqui o art. 23 do Regimento Interno da Confederação. No seu § 8º, ele
diz o seguinte, Sr. Presidente: “Não haverá registro de chapa para o
Conselho Fiscal”. O senhor acha que uma disposição como essa não
estabelece desde logo uma relação subalterna, uma relação subordinada do
Conselho Fiscal, que vai fiscalizar os atos da diretoria, que apenas pode
se eleger de forma subsidiária? O Regimento Interno — quero repetir,
talvez o senhor não tenha entendido, porque não estava prestando atenção
—: “Não haverá registro de chapa para o Conselho Fiscal”. É proibido
pelo Regimento Interno da Confederação.
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Excelência, quem
indica os membros do Conselho Fiscal, normalmente, na CBF, pelo
menos na minha gestão, tem sido a assembléia, que me entrega os nomes.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Mas eles são
eleitos, não é isso?
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - São eleitos.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - São eleitos. Como
é que faz o registro da chapa? Veja, me chama atenção de que “não
haverá registro de chapa para o Conselho Fiscal”. E no estatuto diz que
ele é eleito, inclusive em sessão secreta, tudo. Como é que faz o registro da
chapa? Como é que alguém pode se candidatar? Suponha que eu queira
ser Conselheiro do Conselho Fiscal. Como é que eu posso me candidatar
lá na CBF?
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Excelência, até agora
tem sido candidato único, de forma que não houve nenhum registro de
chapa até hoje, como na minha candidatura à Presidência da CBF.”
(g.n.)
Ricardo Teixeira não soube responder ao Deputado Jurandil Juarez como
o Conselho Fiscal é eleito, se o próprio estatuto da CBF não admite o registro de
chapa. Ficou provado que a CBF não tem, e não teve na administração de Teixeira, um
Conselho Fiscal independente.
O Deputado Jurandil mostrou ao presidente da CBF e aos presentes ao
depoimento de 10/4/2001, que o Conselho Fiscal aprovou as contas da entidade, nos
últimos cinco anos, com o mesmo parecer, sem que uma vírgula fosse alterada, sem que
fosse feito qualquer tipo de reparo ou sugestão, concluindo seu questionamento:
“O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – O senhor fez
um empréstimo que pode ser considerado, em qualquer operação,
altamente temerário, porque o senhor estava em vias de receber recursos.
O senhor fez empréstimo no momento em que você tinha juros crescentes.
O senhor, conhecendo o mercado, sabia disso. Daí, Sr. Presidente, eu
chegar à conclusão, pela inquirição feita, porque tenho aqui cinco
pareceres do Conselho Fiscal absolutamente idênticos, até nos erros de
português, de colocação de vírgula, assinado pelas mesmas pessoas, nos
anos de 96... de 94 a 99, iguaizinhos. Tenha a certeza do seguinte: a
CBF está atravessando, atravessou — e o Presidente disse que recebeu a
CBF com 1 milhão de dólares de déficit —, atravessa dificuldades com
as mesmas características do futebol brasileiro. A entidade que gere o
futebol brasileiro tem as mesmas características do futebol, os mesmos
defeitos, também as mesmas virtudes. Nós temos um terrível problema de
má administração. O dinheiro da CBF, ele entra aos borbulhões e sai
aos borbulhões. Não há nenhum controle. O conselho fiscal assina
igualzinho. É o mesmo conselho fiscal. A empresa de auditoria é
contratada para consubstanciar o que está colocado lá
contabilmente. É por isso que a gente tem casos também como dos
recursos que estão destinados para as federações, como esse para a
Federação Amazonense de Futebol, que recebeu 40 mil reais da CBF e
ele foi simplesmente destinado à Braga Distribuidora de Veículos, em
Manaus, Amazonas. Foi por isso que um pagamento feito à Federação
Amazonense, sobre um compromisso internacional da Seleção Brasileira
lá, tem como comprovante de despesas, Sr. Presidente, um papel timbrado
de um representante comercial de medicamentos que diz lá simplesmente
quanto é que deve ser pago. Esses documentos são comprobatórios de
despesa da Confederação Brasileira de Futebol, que administra o futebol
brasileiro” (g.n.)
É importante ressaltar a composição atual do Conselho Fiscal da CBF.
Um dos três membros titulares, é José Guilherme, ex-presidente da Federação Mineira
de Futebol e pai de Elmer Guilherme, atual presidente desta entidade, que está
envolvida em muitos escândalos de diversas naturezas, de acordo com informações
obtidas e já comprovadas por esta CPI (Ver capítulo relativo às federações).
José Guilherme Ferreira é funcionário da Federação que seu filho dirige.
É um dos muitos parentes contratado por Elmer Guilherme, autor do caso mais
escandaloso de prática de nepotismo, dentre todas as federações. Sendo pai de Elmer, e
seu funcionário, é conivente com o quadro em que se encontra a Federação mineira.
Qual o grau de independência de José Guilherme, se a CBF acaba de
assumir uma dívida de R$ 1,5 milhão não paga pela Federação Mineira para a Federação
Paulista? Como ele resolve esse conflito de ser ao mesmo tempo membro do Conselho
Fiscal e pai do presidente da entidade mineira?
Outro membro do Conselho é o presidente do Jornal do Brasil, o senhor
José Antônio Nascimento Brito. Isso cria uma ligação entre a CBF e o jornal, devido às
relações normais que tem a entidade com os meios de comunicação. A imparcialidade
do jornal, ao noticiar fator relativos à CBF fica prejudicada, principalmente quando se
tratar de problemas financeiros ou a falta de controle da entidade.
O terceiro membro efetivo do Conselho Fiscal é o senhor Antônio
Carlos de Oliveira Coelho, executivo do grupo Vega. A CBF manteve aplicações no
Banco Vega, chegando a ter R$ 3.616.845,76 aplicados, em 31/12/97, de acordo com
dados da contabilidade da CBF (Ver Anexo Contabilidade da CBF). Também no ano
de 1997, a CBF pagou à Vega Administradora e Corretora de Seguros Ltda. pelo menos
R$ 232.121,18 (Anexo 3 pasta 18).
Além disso, em 1995, Ricardo Teixeira possuía aplicações, no Banco
Vega, no valor de R$ 16.003,98 no fundo de investimento financeiro do Vega e no
fundo de commodities no mesmo banco, no valor de R$ 187.466,24 (Anexo 4 Pasta
Fiscal). Teixeira manteve, no final de 1996, R$ 425.574,47 em certificados de depósito
bancário (CDBs), no mesmo Banco Vega, na mesma época em que a CBF trabalhava
com esse Banco.
É digno de nota o fato de Ricardo Teixeira realizar movimentações
bancárias particulares, inclusive de suas empresas, nos mesmos bancos, e até agências,
da CBF: Real, Vega, Rural, Delta Bank, etc.
EMPRESA DE AUDITORIA
A CBF contratou a empresa PS Contax Auditoria para realizar serviços
de auditoria na entidade. Essa empresa recebe da CBF mensalmente cerca de R$ 11 mil,
tendo faturado mais de R$ 314 mil, entre 1998 e 2000.
O Deputado Jurandil Juarez, como visto acima, afirmou, no depoimento
de Teixeira, que a empresa de auditoria seria contratada apenas para “consubstanciar o
que está colocado lá contabilmente”. É o que se conclui pelo exame das contas da CBF
e dos documentos que comprovam as despesas realizadas. São tantos as falhas
cometidas, conforme atesta o Conselho Federal de Contabilidade, que não se pode
conceber que uma empresa de auditoria esteja prestando, de fato, serviços efetivos à
Confederação.
A CBF C OMO PESSOA JURÍDICA
A Confederação Brasileira de Futebol – CBF é uma associação civil de
direito privado, sem fins lucrativos, constituída com a finalidade de dirigir
nacionalmente o futebol. Tem, como filiadas diretas, 27 federações e, como filiadas
indiretas, aproximadamente 13 mil clubes, dos quais cerca 800 dedicados ao futebol
profissional. Por meio desses clubes, a CBF, que é uma espécie de entidade de cúpula
ou entidade guarda-chuva, controla mais de meio milhão de jogadores inscritos e
acima de 5 mil árbitros.
O controle da CBF sobre entidades filiadas, jogadores, árbitros, etc.
decorre da obrigatoriedade de seu registro na entidade: quem não está registrado na
CBF não participa, sob qualquer título, de campeonato oficial, ou seja, não existe para
o futebol de competição. A CBF detém, ainda, a exclusividade da representação do
futebol brasileiro junto à Fifa, decide sobre a promoção de competições interestaduais e
nacionais por federações e clubes, fiscaliza a rigorosa execução das determinações da
Fifa, e, ressalvada a competência do COB, representa o futebol brasileiro em qualquer
atividade internacional.
A FIFA – Fédération Internationale de Foot-ball Association – é a entidade que
rege os destinos do futebol em todo o mundo. Cabe-lhe, entre outras tarefas, zelar pela
correta observância da “lei do jogo” estabelecida pelo órgão legislador do futebol, a
International Board. A FIFA é muito poderosa: ela só aceita a filiação de entidade
desportiva que renunciar ao direito de submeter ao Poder Judiciário quaisquer litígios
de natureza desportiva ou que envolvam entidades desportivas.
O poder máximo da CBF é a Assembléia Geral 3, constituída pelas
federações filiadas. É ela que julga a prestação de contas anual das atividades
administrativas e financeiras da diretoria da entidade. Além disso, entre outras
competências, é a Assembléia Geral elege a diretoria e reforma e interpreta o Estatuto,
decide sobre a desfiliação da CBF da FIFA e resolve sobre a extinção da entidade. Pelo
art. 82 da Lei n.º 9.615/98, os dirigentes, unidades ou órgãos de entidade de
administração do desporto não exercem função delegada do poder público, nem são
consideradas autoridades públicas, “para os efeitos desta lei”.
Como associação civil, a CBF é autônoma quanto à organização e ao
funcionamento. Suas competências estão definidas no Estatuto. Apesar de reconhecer a
autonomia das entidades desportivas, a Lei n.º 9.615/98 estabelece algumas regras a
serem observadas nos processos eleitorais (art. 22) e determina que os estatutos devem
prever a instituição de Tribunal de Justiça Desportiva, a adoção de Códigos de Justiça
Desportiva e a inelegibilidade ou nomeação para cargo de direção de quem cumpre
pena ou já deu mostras de improbidade administrativa (art. 25).
3
Trata-se, bem entendido, da Assembléia Geral de natureza eleitoral, da qual participam, além das 27 federações, os 24 clubes da divisão
principal do Campeonato Brasileiro. A Assembléia Geral de natureza administrativa reúne-se exclusivamente com as 27 federações
diretamente filiadas e tem poderes mais limitados. Não pode, por exemplo, mudar o Estatuto.
Entidades nacionais de administração do desporto, como a CBF, têm
competência para decidir as questões relativas ao cumprimento das normas e regras de
prática desportiva (art. 47), podendo aplicar sanções com o objetivo de manter a ordem
desportiva e o respeito aos atos emanados de seus poderes internos. Daí o estatuto da
CBF estabelecer, em seu art. 8º, que a entidade não intervém em suas filiadas, exceto
para por termo a grave comprometimento do futebol brasileiro. Os Tribunais de Justiça
Desportiva são tecnicamente autônomos e independentes das confederações e
federações. Contudo, delas dependam financeira e administrativamente. (art. 52).
O art. 50 da Lei n.º 9.615/98, define que a organização, o funcionamento
e as atribuições da Justiça Desportiva, limitadas ao processo e julgamento das infrações
disciplinares e às competições desportivas, serão definidas em Códigos Desportivos.
No regime da lei anterior, cabia às entidades federais de administração do desporto
propô-los; a Lei Pelé é omissa quanto ao este ponto: apenas diz que cabe ao Conselho
de Desenvolvimento do Desporto Brasileiro aprová-los4.
No que interessa ao objetivo desta CPI, a Constituição Federal, em seu
art. 217, além de proclamar a autonomia das entidades desportivas quanto a sua
organização e funcionamento, restringe a destinação de recursos públicos à promoção
do desporto educacional e, somente em casos específicos, à do desporto de alto
rendimento; estabelece que o Poder Judiciário só admitirá ações relativas à disciplina e
às competições desportivas após esgotarem-se as instâncias da justiça desportiva,
regulada em lei.
O art. 24 da Carta Magna estabelece que cabe à União legislar sobre
desporto concorrentemente aos Estados e ao Distrito Federal. Assim, nesta matéria, a
competência da União é limitada ao estabelecimento de normas gerais (CF, art. 24, IX e
§ 1º). Atualmente, as normas gerais sobre desporto estão instituídas na Lei n.º 9.615, de
24 de março de 1998, cognominada Lei Pelé, que foi recentemente alterada pela Lei n.º
9.981, de 14 de julho de 2000, e pela Medida Provisória no. .... de 23 de março de
2001.
É óbvio que a autonomia das entidades desportivas não é absoluta. Ela
deve ser entendida à luz do princípio da plena liberdade de associação para fins
lícitos, assegurada no art. 5º, XVII, da Constituição Federal: o Estado não pode impedir
a criação de associações, não pode ditar regras para seu funcionamento e só pode
ordenar que encerrem suas atividades por decisão judicial. Contudo, por força do
princípio da isonomia, não estão as entidades desportivas dispensadas de observar a lei
quando se trata de relações de trabalho, obrigações para com terceiros, pagamento de
impostos, contribuições à previdência social, direito de arena, proteção à infância e à
adolescência, direito do consumidor, respeito à autoridade constituída, etc.
4
A Lei n.º 9.981/00 acrescentou que cabe ao CDDB aprovar os código e suas alterações. Supõe-se que é para impedir que os códigos
(assim como o estatuto!) sejam alterados pela própria Diretoria da CBF, mediante RDI’s (Resoluções da Diretoria), que favorecem a
legislação em causa própria.
Quanto à destinação de recursos públicos para a promoção do desporto
de rendimento, em casos específicos, o art. 7º, II, permite concluir tratar-se dos casos
de participação de entidades nacionais de administração do desporto (o Comitê
Olímpico Brasileiro, por exemplo) em competições internacionais. Portanto, a receita
da CBF compreende as taxas de filiação, registro e transferências; as rendas das partidas
que realizar; as rendas provenientes de patrocínios, de venda de direitos de transmissão
de imagem e de aplicação de multas; da participação na arrecadação das competições
internacionais e interestaduais.
A Lei n.º 9.615/98, mais conhecida como Lei Pelé, tem por objetivo
disciplinar a prática e a administração do desporto formal, que é regulado por
normas nacionais e internacionais e pelas regras de prática de cada modalidade. Trata-se
do desporto de resultados ou de rendimento, referido no art. 3º (II) da Lei, que pode
ser organizado e praticado de modo profissional e de modo não-profissional (art. 3º
parágrafo único). No caso da CBF, ou seja, do futebol, as normas e regras são
estabelecidas pela FIFA, que é a associação internacional de confederações de futebol.
A lei distingue entidades de administração do desporto (confederações e
federações) e entidades de prática do desporto (clubes). Essas entidades compõem o
Sistema Nacional do Desporto, juntamente com o Comitê Olímpico Brasileiro e o
Comitê Paraolímpico Brasileiro, que, na verdade, assim como eventuais ligas, também
são entidades de administração do desporto. Sistema Nacional do Desporto é o
conjunto das pessoas jurídicas de direito privado, com ou sem fins lucrativos,
encarregados da coordenação, administração, normalização, apoio e prática do
desporto, bem como as incumbidas da Justiça Desportiva (art. 13, parágrafo único).
Confederações são associações de federações. Federações são associações
de clubes. Clubes são associações de pessoas físicas. A organização do desporto
competitivo em sociedades civis, ou associações, sem fins lucrativos, é tradição tão
antiga quanto a sua sistematização, internacionalização e popularização, que se
tornaram possíveis graças à unificação das regras de jogo, a partir de meados do século
passado.
Pelo art. 16 da lei do desporto em vigor 5, confederações, oficialmente
chamadas “entidades nacionais de administração do desporto”, são pessoas jurídicas de direito
privado, que têm as competências definidas em seus estatutos. Entre essas
competências constam, invariavelmente, a direção nacional da respectiva modalidade
desportiva, sua representação no exterior, e o intercâmbio com as entidades
internacionais, cujas determinações são obrigadas a cumprir e fazer cumprir.
A lei brasileira, pois, reconhece que a Confederação Brasileira de Futebol
tem, entre outros fins, o de “representar o futebol em qualquer atividade de cunho
internacional, com poderes para celebrar convênios e acordos, assim como orientar,
coordenar e fiscalizar as atividades das federações e dos clubes filiados no âmbito
nacional”.
5
Lei n.º 9.625, de 25 de março de 1998 (Lei Pelé), alterada pela Lei n.º 9.981, de 14 de julho de 2000.
Representar é ser procurador de, substituir, ou, mais pomposamente,
simbolizar (o País, o povo brasileiro, o Estado, o governo, a cultura pátria, o que for).
Qualquer que seja o significado, não existe representante sem representado. Ao
representado cabe definir os poderes do representante, traçar os objetivos, os limites e
a área de atuação, cobrar periódicas prestações de conta.
Desta forma, sob certo aspecto, por se tratar de uma espécie de delegação
de poder, pode-se dizer que, muito embora não seja uma entidade estatal, a CBF, a
exemplo das demais confederações desportivas, do Comitê Olímpico e de entidades
como a OAB e SBPC, presta um serviço de natureza pública. A Medida Provisória que
alterou a Lei Pelé, em 23 de março de 2001, colocou a CBF como membro do CND,
Conselho Nacional de Desportos, mais uma demonstração de que se caracteriza como
serviço de natureza pública. Ou, pelo menos, no País onde futebol e vida se misturam,
um serviço de evidente interesse geral da sociedade.
A Confederação Brasileira de Futebol – CBF, é a entidade nacional de
administração do futebol. Como tal, existe desde 1979, quando foi desmembrada da
Confederação Brasileira de Desportos, fundada em 1904. De acordo com o seu
estatuto, a CBF é uma associação civil de direito privado, sem fins lucrativos, de caráter
desportivo, com personalidade jurídica e patrimônio próprios, com sede no Rio de
Janeiro. Trata-se, pois, de pessoa jurídica regida pelo Código Civil.
ORGANIZAÇÃO E FUNCIONAMENTO DAS ENTIDADES DESPORTIVAS
A Constituição Federal assegura, portanto, às entidades desportivas
dirigentes (confederações e federações) e associações desportivas (clubes) autonomia
quanto à sua organização e seu ao funcionamento. Na prática, isso significa 1º) que a
criação de entidades como a CBF independe de autorização do poder público e 2º) que
o Estado não pode interferir nas matérias chamadas “interna corporis”, tanto as de
natureza técnica e desportiva, quanto as de natureza organizacional e administrativa.
Em oposição a esta “liberalidade”, a legislação desportiva anterior à Constituição
Federal de 1988 foi marcada pelo autoritarismo, pelo paternalismo e pela tutela estatal.
Ocorre que a transição do regime de subordinação das entidades
desportivas ao Estado para o regime de autoregulação e independência deixou muito a
desejar, no sentido de que não contribuiu significativamente para o aperfeiçoamento da
organização do desporto no País. Esta constatação é confirmada por diversos autores,
conforme se vê nos parágrafos a seguir.
“Com a revogação de fato da legislação desportiva, através da
promulgação da Constituição de 1988, ficou um vazio 6 na ordem
jurídica esportiva nacional, o que, de certa forma, favoreceu o
fortalecimento das estruturas arcaicas e os interesses dos senhores feudais
do esporte brasileiro”. Estes pseudo-esportistas teriam passado a
6
O art. 217 foi de tal forma inovador que a Constituição Federal de 1988 revogou de fato a Lei n.º 6.251, de 1975, que era a lei do desporto
então em vigor. A lei do desporto, Lei Zico, só foi sancionada em julho de 1993, ou seja, quase cinco anos depois da promulgação da CF/88.
É a esse período de vacatio legis que se refere o autor.
referenciar-se unicamente na estrutura vertical das entidades
internacionais. “Desse modo, com o CND7 completamente desaquecido e
em fase terminal, estes verdadeiros ‘coronéis’ do esporte nacional, na
maioria investidos como dirigentes de federações e confederações,
principalmente no futebol, passaram a fazer regras próprias, deixando
reduzidas oportunidades de contestação, justamente pelo aval que
recebiam das entidades internacionais” (Manoel Gomes Tubino).
“Constituindo-se numa autêntica medula espinhal do esporte,
a autonomia desportiva, desde o advento da Carta Federal de 1988, tem
gerado muitas contendas judiciais e controvérsias extrajudiciais, além de
enfoques emocionais e distorcidos, conquanto inúmeras mutações
estatutárias e procedimentos eleitorais foram concretizados com amparo
nesta concepção constitucional (art. 217, I), deixando ‘a latere’ os arts.
17, 19 e 20 da então vigente Lei n.º 6.251/75, exatamente quando
faltava um quadro legal-normativo adequado e ajustado aos princípios
desportivos do Texto Maior, pois a nova lei de normas gerais ainda
estava em projeto” (Álvaro Mello Filho).
Na Exposição de Motivos que acompanhou o Projeto de Lei n.º 3.633,
de 1977, o então Ministro Pelé, seu autor, assim ponderava:
“Essa situação (de desorganização, de amadorismo, de falta de
transparência e de desprezo pela condição do atleta) foi produzida,
principalmente, pela má interpretação do art. 217 da Constituição
Federal, que garantiu autonomia às entidades de prática e de
administração do desporto. O referido dispositivo constitucional tem sido
interpretado de forma equivocada por essas entidades, gerando a idéia de
uma liberdade irrestrita e causando danos irreparáveis ao prestígio e à
credibilidade do esporte brasileiro”.
Apesar do reconhecimento oficial do princípio da autonomia e,
conseqüentemente, a revogação automática de uma legislação do desporto impositiva,
contraditoriamente, até hoje são mantidas as tradicionais estruturas desportivas, tão
autoritárias e paternalistas quanto aquelas. Em outras palavras, as confederações se
libertaram da tutela do Estado, mas não se tornaram independentes de entidades como
FIFA e COI, nem conseguiram ajustar aos novos tempos estruturas administrativas e
métodos de gestão herdados do passado.
Ao mesmo tempo, o legislador não teve a preocupação de explicitar
claramente qual o papel do Estado em matéria de desporto, mesmo observando que,
com a interveniência da televisão, o espetáculo desportivo vinha se transformado
rapidamente numa atividade econômica e numa indústria de entretenimento, onde não
só a prática do desporto de competição é um meio de vida para o atleta e uma fonte
de renda para os clubes, mas também há evidente risco de as “normas gerais sobre
7
Conselho Nacional de Desportos.
desportos” serem ditadas pelo mercado e terem muito pouco ou nenhum compromisso
com os valores desportivos propriamente ditos.
A QUESTÃO DA AUTONOMIA
É público e notório que, a despeito de sua autonomia e de sua ojeriza a
qualquer tipo de controle por parte do poder público, as entidades desportivas têm
buscado a proteção do Estado. Procuram por subsídios, isenções, anistias fiscais,
parcelamentos de débitos acumulados junto ao INSS. Defenderam
uma legislação
desportiva que os livrasse de correr os riscos próprios da iniciativa privada e da
atividade econômica. Foi o que se viu, por exemplo, na Lei Zico, onde empresários da
jogatina e dirigentes de entidade desportiva conseguiram introduzir a permissão para o
jogo de azar em pretenso benefício do esporte (o bingo); na Lei Pelé, os clubes
conseguiram inserir dispositivo que adiou por dois anos a extinção do passe. Como a
Lei Pelé deixou sem proteção os interesses dos clubes, ameaçados de perderem seus
jogadores sem qualquer remuneração, procuraram influir na recente medida provisória,
de 23/03/2001 para que os protejesse da evasão em massa de atletas para o exterior. O
que efetivamente acabou acontecendo.
Na verdade, sequer a própria legislação desportiva distingue claramente
o público e o privado. Ao que parece, no mundo do esporte, é proibido o público
invadir o espaço reservado ao privado, mas o privado pode perfeitamente invadir o
terreno do público.
Na legislação desportiva, o caso mais flagrante é que, no art. 82, é
estabelecido que “os dirigentes, unidades ou órgãos de administração do desporto não
exercem função delegada pelo poder público, nem são consideradas autoridades
públicas, para os efeitos da lei do desporto”, mas, logo a seguir, no art. 84, caput e § 2º,
se preceitua que será considerado como de exercício efetivo, para todos os efeitos
legais, o período em que o servidor público que for convocado, a qualquer título, para
integrar representação nacional em treinamento ou competição desportiva. À parte a
questão da isonomia, como deixar de concluir que a participação em seleção ou
delegação desportiva é considerado um serviço público?
Para reverter esta situação, impõe-se, antes de mais nada, uma leitura
lógica do art. 217, caput e incisos, da Constituição Federal. Pela própria ordenação física
desses dispositivos, não há dúvida de que a autonomia das entidades desportivas está,
no mínimo, literalmente subordinada ao dever do Estado de promover as práticas
desportivas de qualquer natureza.
Em outras palavras, o inciso da autonomia, assim como os demais (o da
destinação de recursos públicos para a promoção prioritária do desporto educacional, o
do tratamento diferenciado para o desporto profissional e o desporto não profissional,
e o da proteção e do incentivo às manifestações desportivas de criação nacional) não
têm uma valor absoluto: o universo em que se move a autonomia das entidades
desportivas é o do dever do Estado de fomentar o desporto.
A interpretação correta do art. 217 é que a autonomia não é um fim em si
mesmo, nem é ilimitada: não exime o Estado do dever de traçar e implementar políticas
de desenvolvimento do desporto, não o desobriga de suas responsabilidades relativas
ao fomento das práticas desportivas formais e não formais, como direito de cada um,
nem inibe, de qualquer forma, a ação do poder público em matéria de desporto. Ao
assegurar autonomia às entidades desportivas, os constituintes apenas reconheceram
que existe uma realidade do desporto, que cumpre respeitar.
A ESTRUTURA DO FUTEBOL
A CBF surgiu em 1979, via Portaria n.º 615 do MEC para, em
substituição à CBD, então desmembrada em diversas confederações desportivas, cuidar
do nosso futebol internamente e de representá-lo externamente. Se cuidou mal,
representou pior. CBF se tornou sinônimo de modo errado de fazer as coisas. Por
exemplo, o futebol profissional é praticado em pouco mais de oitocentos clubes,
endividados (ou com os jogadores, ou com o INSS, ou com os fornecedores, ou com a
federação). De vez que, freqüentemente, sequer têm com que pagar a arbitragem,
comprar bolas ou custear o transporte dos jogadores, os clubes recorrem às federações,
a maioria das quais também quebradas.
Sabidamente, confederações e federações não geram empregos, como
fazem os clubes. Ressalvadas algumas exceções, confederações e federações são,
sobretudo, organizações burocráticas, freqüentemente cabides de emprego e
distribuidoras de mordomias, redutos do nepotismo, pois existem principalmente para
servir de suporte a projetos pessoais e políticos de dirigentes que se elegem
indefinidamente. Já que, via de regra, cada clube é um voto, raramente as federações se
recusam a prestar-lhes socorro. Note-se que não ajudam os clubes a sair da crise com
medidas saneadoras, com uma administração esclarecida, com bons contratos de
publicidade e transmissão de imagem e com campeonatos rentáveis. Não. Para o
custeio das operações tapa-buracos, as federações recorrem à CBF.
A CBF, também quase falida, porém interessada em assegurar preciosos
votos para eventuais candidatos a reeleição, tem pavor de dizer um não. Em vez de
sanear o sistema que preside, que é sua obrigação de acordo com o estatuto, a CBF
toma dinheiro emprestado ao sistema financeiro, vende jogos da seleção e outros
“direitos”8. É desta forma que consegue manter o esquema de mesadas, que beneficia
mais da metade das federações de futebol. Já que todos têm culpa em cartório, ninguém
reclama de ninguém, e o círculo vicioso se fecha.
Esses problemas só se resolvem mediante uma lei que acabe de vez e de
forma radical com a idéia de que o desporto profissional é uma área reservada à
competência exclusiva de confederações, federações e clubes e de que cabe ao Estado
cuidar apenas das sobras, da periferia. O peso econômico e o impacto social do
8
Para comprovar esta assertiva, basta ter a paciência de ler atentamente o Contrato Nike/Traffic/CBF, especialmente a Introdução, os itens
2.2, 2.3, 2.4 e 2.5, os subitens 8.4 a e 8.4 f (I, II, III, IV, V)
desporto profissional são grandes demais para ficarem a cargo apenas das próprias
entidades desportivas.
O RESGATE DO PAPEL DO ESTADO
A conclusão é que o País realmente precisa de uma nova lei do desporto,
uma lei que, para começar, além de tratar diferentemente o desporto profissional e o
desporto não profissional, conforme manda o art. 217, II, da Constituição Federal,
defina claramente o papel do Estado enquanto responsável maior pela promoção do
desporto, mediante a implementação de políticas públicas específicas e a elaboração de
um Plano Nacional do Desporto, a par do incentivo à valorização do espetáculo
desportivo, à modernização dos estádios, ao investimento no esporte de base e à
profissionalização de todos os agentes, sem esquecer-se de proteger o trabalhadoratleta.
Somente um Estado consciente do papel que lhe cabe na
compatibilização do direito ao desporto com os objetivos fundamentais da República
terá a autoridade (muito diferente de o autoritarismo) necessária para, em nome da
nação politicamente organizada, obrigar a CBF a cumprir o disposto no estatuto, a dar
satisfação à sociedade civil e a exigir campeonatos bem organizados, calendários
racionais, clubes economicamente viáveis, justiça desportiva tecnicamente independente
das federações, processos eleitorais democráticas, respeito ao torcedor, gestão
participativa e transparente. Sem explicitar as responsabilidades do Estado, não há
como cobrar moralidade às entidades desportivas.
CAPÍTULO IV – O CONTRATO ENTRE A CBF, A NIKE E A
TRAFFIC
O contrato da CBF com a Nike só ficou conhecido depois da Copa do
Mundo de 1998. Foi firmado em 1996, com prazo de dez anos. Valor de 160 milhões
de dólares em dinheiro, mais 150 milhões de dólares em “marketing esportivo” a ser
realizado pela NIKE, mais 10 milhões para pagamento à UMBRO, de multa pela
rescisão de contrato, mais 5 milhões em material esportivo a ser fornecido à CBF, e
mais 1 milhão de dólares para fornecer veículos de transporte às delegações da CBF em
qualquer parte do mundo durante a vigência do contrato. Total: 326 milhões de dólares.
E tem mais: uma previsão de pagar 43 milhões de dólares por uma prorrogação do
contrato por mais quatro anos, chegando a um total de 369 milhões de dólares por 14
anos de contrato. Pelos primeiros dez anos, efetivamente, entrarão nos cofres da
entidade, em dinheiro, somente os 160 milhões de dólares.
O contrato coloca à disposição da NIKE não só a seleção de futebol
principal, mas também as seleções sub-17 e sub-20 e a seleção feminina de futebol.
Destacam-se no contrato cláusulas que têm sido consideradas excessivas
em termos de predominância dos interesses da Nike sobre os da CBF, resultando
prejudiciais ao futebol brasileiro, como se pode ver detalhamento a seguir. Duas
cláusulas surpreenderam a opinião pública por influenciarem diretamente a vida da
Seleção Brasileira de Futebol:
1. aquela em que a CBF se obriga a escalar os oito principais jogadores
sob um critério não definido, mas que pode ser o da Nike;
2. e a cláusula em que a CBF cede à Nike a primazia de definir os
adversários e os locais de 50 jogos amistosos durante dez anos. Além disso, a CBF não
pode marcar jogos nos Estados Unidos, Japão, Coréia e em qualquer país da Europa se
a Nike já houver marcado jogos nesses locais nesse mesmo ano.
Pressionado pelas críticas, o presidente da CBF, Ricardo Teixeira,
recuou. Nike e CBF repactuaram alguns pontos do contrato, o número de “ jogos
NIKE” foi reduzido. E também reduzido o valor do contrato em 14 milhões de
dólares.
COPA DO MUNDO DE 1998
Os sinais de interferência da Nike na seleção brasileira tornaram-se mais
evidentes durante a Copa do Mundo de 1998. A doença de Ronaldo e sua polêmica
escalação para o jogo da final da Copa, converteram-se no ponto crucial da questão:
teria a Nike exigido a escalação de Ronaldo sem condições físicas, após uma convulsão
horas antes da partida, para atender a seus interesses de propaganda? Essa polêmica
ocupou a atenção da CPI. Vários personagens do episódio foram convidados a depor.
Zagallo veio depor de espírito armado. Seu depoimento está eivado de
negativas, de não-respostas, evitando todo tempo abrir qualquer flanco para que a CPI
pudesse aprofundar sua investigação. Deliberadamente desconhecia perguntas, dava
respostas evasivas, procurava evitar que a linha de investigação voltada para o contrato
NIKE-CBF se desenvolvesse.
INCONSISTÊNCIAS DO DEPOIMENTO DE ZAGALLO
No seu depoimento, Zagallo utilizou uma “retranca” eficiente. Mas
algumas inconsistências se evidenciaram.
Contrato CBF-NIKE:
Negou terminantemente ter qualquer
conhecimento sobre o contrato CBF-Nike durante seu tempo como treinador. O que é
duvidoso, já que era o chefe da Comissão Técnica e efetivamente o contrato existia
desde 1996, e implicava em uma série de posturas da seleção que contratualmente
exigiam o conhecimento e entendimentos com o treinador. É o caso, por exemplo, dos
chamados “Jogos NIKE”, aqueles que são decididos pela multinacional.
No capítulo 8 do contrato, parágrafo 8.4, letra “a”, está escrito: “Durante
o Período do Contrato a CBF colocará à disposição da NIKE o time de futebol
masculino de primeira linha (...) para um mínimo de 50 jogos (...) A NIKE compreende
que a CBF precisará consultar o Treinador-Chefe/Diretor Técnico do Time AMasculino com relação à programação desses jogos.”
Depois de muita insistência dos Deputados, Zagallo recuou parcialmente
e admitiu que havia jogos definidos por outra instância que não a Comissão Técnica, e
que ele atribuiu vagamente ao “oitavo andar” (andar do prédio da CBF onde fica a
diretoria). De qualquer modo, fica difícil aceitar as palavras de Zagallo de que ele
desconhecia o contrato e ao mesmo tempo participava e coonestava atividades como o
evento comercial da Nike ao qual os jogadores tiveram de comparecer durante a Copa98, para isso tendo que interromper os treinamentos.
Também é irrecusável a evidência da interferência da NIKE na
convocação dos jogadores. Basta ler o parágrafo 8.4 letra “c” do contrato: “Pelo
menos 8 (oito) dos então principais jogadores do Time-A Masculino serão requisitados
a participar de cada um desses jogos”. Refere-se aos “ Jogos NIKE”. Quer dizer, a
Comissão Técnica estava impedida de promover uma renovação da equipe, caso
considerasse necessário. Diante disso, cabe perguntar: antes da existência da CPI
CBF/NIKE, que pôs o contrato em questão, o técnico da seleção brasileira poderia ter
feito uma mudança radical da escalação no time como a que o atual treinador
Emerson Leão fez ao deixar de convocar Rivaldo, Cafu, Roberto Carlos e outras
estrelas?
O CASO RONALDO : INCONGRUÊNCIAS E CONTRADIÇÕES
A CPI também conseguiu descortinar novos cenários para o nebuloso
episódio da escalação de Ronaldo na final da Copa 98. A crise "convulsiva" de
Ronaldo, o principal jogador do time, maior ídolo mundial do futebol, sete horas antes
da final da Copa, certamente foi um acontecimento estarrecedor, uma bomba. Milhões
de dólares estavam envolvidos no acontecimento supremo do futebol. Boa parte deles
investidos no prestígio e na imagem de Ronaldo, um espetáculo da mídia e, em
particular, da Nike. O incidente certamente colocou em grande confusão a
concentração do Brasil. Por que motivo esse acontecimento é retratado por Zagallo e
pelos membros da Comissão Médica com tanta imprecisão e até com aparente
indiferença, tentando minimizá-lo?
O MEDO CONFESSADO
Foi um problema grave de saúde? César Sampaio teve de destravar a
língua do colega (como se faz em casos de epilepsia e outras convulsões), isso não é
fábula, vários jogadores foram testemunhas. Do ponto de vista médico, foi um
acontecimento de gravidade.
As estranhezas começam aqui: o melhor jogador do mundo sofre de um
mal súbito, e o treinador, o líder da Comissão Técnica, o centralizador, o mesmo que
afirma categoricamente que é ele quem decide tudo na seleção, Zagallo, não é avisado?
Ronaldo passou mal entre 14 e 15 horas. Zagallo disse que ouviu uma
algazarra, mas supôs que fosse a torcida francesa do lado de fora da concentração.
Estava vendo vídeo de um jogo, e depois dormiu até 17 horas, e só foi avisado três
horas depois do fato. É o que ele afirma em seu depoimento:
“O SR. MÁRIO JORGE LOBO ZAGALLO - Bem, na véspera
do jogo, a torcida francesa, ela se localizou na porta da concentração e fez
uma... uma algazarra, e foi comunicado, a Polícia veio e retirou a
torcida, que estava perturbando. Isso na véspera, à noite. No dia que
aconteceu o problema do Ronaldo, nós tínhamos almoçado, cada um foi
para os seus quartos, e eu fui para o meu justamente ver um tape de
França e Croácia, que foi o jogo que a França jogou, para analisar
sozinho, sossegado, tranqüilo, pra ver o plano tático, o que ia ser feito
diante do jogo da França.
E, de fato, quando eu estava vendo a televisão, eu escutei uma gritaria,
sim, mas pensei que fosse perturbação dos próprios franceses, dia do jogo,
tiveram na véspera, e eu pensei que fosse também. Não dei bola. Acabei
de ver o meu, o tape, dormi. E, cinco horas da tarde, eu saí tranqüilo,
foi quando eu soube do fato que ocorreu, que o Ronaldo tinha tido um
estresse, um estresse emocional, uma convulsão. Somente às cinco horas da
tarde, foi que eu, de fato, fui comunicado”.
Primeiro questionamento: nos outros depoimentos ninguém confirmou
que tivesse havido algazarra da torcida francesa. E mais: da rua ao interior da
concentração há uma distância grande, os ruídos externos não chegam lá.
Segundo questionamento: Dr. Lídio Toledo tem versão diferente. Sua
versão: Ronaldo passa mal após as 14 horas, depois do almoço. A concentração entra
em alvoroço. Os colegas assustados temem pela sua saúde. Os médicos acorrem. A
crise já passou. Estranhamente, não fazem nenhum exame, não dão nenhum remédio
(Por que? Por que, desde o início, pensavam na possibilidade de Ronaldo jogar, apesar
da "convulsão?) Limitam-se a vigiar seu " sono". Dr. Lídio diz que limpou a saliva que
escorrera da boca do atleta e ficou apenas dois minutos a seu lado, chamou seu auxiliar
Wilson da Mata e saiu, porque tinha de cuidar do lanche dos outros atletas (isso era
mais importante que cuidar de Ronaldo?) E foi avisar o Supervisor Américo de Faria.
Em seguida, (20 a 30 minutos depois?), avisa Zagallo.
Zagallo foi avisado três horas depois, ou 20 a 30 minutos depois? Por que
Zagallo insiste nessa linha de "distanciamento" do problema? Ele, o centralizador, quer
dizer que aquele não era um problema dele, mas um problema do Departamento
Médico? É a postura que manterá até o final do episódio.
Ronaldo, três horas depois de passar mal, depois de tomar lanche, é afinal
levado a uma clínica neurológica francesa (essa demora não se caracterizaria como
omissão dos médicos e da própria Comissão Técnica?)
Zagallo decide escalar Ronaldo com base nos resultados dos exames da
clínica, e diante do fato de não haver veto dos médicos à sua escalação. E também
porque Ronaldo chegou dizendo que estava bem, insistindo para jogar, segundo ele.
Em seu depoimento Ronaldo não foi tão enfático. Afirmou que colocou-se à
disposição do técnico.
Depois de buscar se distanciar das responsabilidades, no final Zagallo
afirma que a escalação de Ronaldo foi decisão solitária dele, embora toda Comissão
Técnica estivesse reunida, e Ricardo Teixeira presente.
Toda essa argumentação parece de encomenda para negar que a
escalação de Ronaldo tenha se dado por interferência da Nike, para atender às
conveniências dos grandes negócios envolvidos. E também para tentar negar que tenha
sido uma temeridade, para não dizer irresponsabilidade, já que a Comissão Técnica pôs
a saúde do atleta em risco. E finalmente, para encobrir o pânico de que a Comissão
Técnica foi tomada quando se viu diante da decisão de tirar Ronaldo do time no jogo
do final da Copa. A CBF e a Comissão Técnica se beneficiaram da sorte, porque
felizmente a saúde do atleta não foi prejudicada. O Brasil perdeu, mas ele foi escalado.
Então, a irresponsabilidade terá sido premiada. Ronaldo foi escalado por medo, não
por coragem, como quer fazer parecer Zagallo. Lídio Toledo resumiu tudo nesta frase
do seu depoimento à CPI: "se não escalamos Ronaldo e o Brasil perde, hoje eu estaria
morando no Polo Norte".
EDMUNDO CONTRADIZ ZAGALLO
Em 23 de novembro, dois dias depois de Zagallo, o jogador Edmundo
depôs na CPI. Foi o depoimento que mais lançou luz sobre o espisódio. Por isso,
trecho dele merece ser transcrito:
“O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA - Poderia nos relatar esse
ocorrido?
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO - Posso, sim. Eu
estava na concentração, depois do almoço. É normal todos os jogadores
irem pro quarto e descansarem, dormir, quem gosta de dormir, outros
gostam de ler, outros gostam de ouvir música. Enfim, eu estava no
quarto, e eram aqueles quartos interligados. E era eu e o Doriva, e o
Ronaldo e o Roberto Carlos. E por volta de 3h da tarde, não sei bem o
horário, eu estava vendo televisão, e o Roberto entrou no quarto:
“Edmundo, Edmundo, Doriva, o Ronaldo está passando mal”. E, ao
ver a cena, eu me desesperei, porque era uma cena muito forte e muito
chocante. E saí correndo por dentro do hotel inteiro, batendo em todas as
portas e gritando pra todo mundo, pra que os médicos viessem o mais
rápido possível pra atender o Ronaldo. Como o quarto dos médicos e da
comissão técnica era uma pouco mais distante, os jogadores chegaram
primeiro. E, nisso, eu gritei pra todo mundo e voltei até o quarto do
Ronaldo. E quando eu cheguei lá, o César Sampaio já estava prestando,
digamos assim, os primeiros socorros: era desenrolar língua, aquelas
coisas. E fui eu e o César Sampaio que tivemos a iniciativa, porque
ninguém nunca sabe o que pode fazer, se mexe ou se não mexe, o que
fazer até a chegada dos médicos. E... enfim, conseguimos fazer com que a
língua desenrolasse, ele adormeceu, e os médicos reuniram todos os
jogadores e falaram: “Olha, a gente tem um jogo superimportante, uma
final de Copa do Mundo, e o Ronaldo vai acordar e não vai saber o que
aconteceu com ele. Então, a gente não vai falar nada até a hora do jogo.
Volte todo mundo pros seus quartos, e vamos descansar”. O lanche seria
às 6h, 5h30, 6h da tarde. Voltamos pros quartos, deitamos, mas, quer
dizer, todo mundo preocupado. Meu quarto era interligado ali, eu via
toda hora; de cinco em cinco minutos, vinha um, olhava, e o Ronaldo
estava ali, dormindo, estava tranqüilo. Quando chegou as 6h, na hora do
lanche, estávamos todos assim, como estamos aqui, lanchando, Ronaldo
foi o último a chegar. Sentou, não falou com ninguém, o que não era uma
coisa normal, ele sempre brincava, não falou com ninguém. Sentou, com a
cabeça baixa, não comeu nada. Levantou e foi em direção ao campo que
tinha ao lado do restaurante. E o Leonardo se levantou desesperado e
falou: “Doutor, tem que levar esse garoto pra fazer exame, não sei o quê,
pra ele tomar alguma atitude, que ele não está bem”. Foi quando os
médicos se aproximaram do Ronaldo e falaram, contaram tudo que tinha
acontecido, até pra levá-lo a fazer os exames. Ele disse: “Não, eu tenho
que jogar, é final de Copa do Mundo, eu quero jogar, eu quero jogar”. E
foi aí que os médicos disseram... eu não ouvi, mas foi o que os médicos
disseram pra nós depois: “Você vai fazer todos os exames; se você estiver
bem, você volta e joga” (..)
(...)
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO (..) E nós fomos
para o estádio; quando chegamos lá, quando ia começar o aquecimento,
chegou o Ronaldo. E aí ele já chegou completamente diferente de quando
ele saiu. Ele já chegou mais alegre, mais sorridente e foi direto trocar de
roupa. Foi quando aí se reuniram os membros da comissão técnica e o
departamento médico e chamaram o Ronaldo lá pra dentro de uma sala,
que nenhum dos jogadores participaram. E o Zagallo saiu, foi o primeiro
a sair dessa sala e falou: “Edmundo, você vai se segurar um pouco”.
Foram essas as palavras. Eu falei: “Tudo bem”. E só.
O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA - Quando V.Sa. chegou no
quarto do Ronaldo, o quadro horrível que V.S.a. falou, como é que ele se
encontrava? Estava batendo, tremendo?
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO - É, ele estava se
batendo muito. Eu não... eu não...
O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA - Deitado?
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO - Deitado e se
batendo com as mãos assim, com os dentes...
O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA - Cerrados.
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO - Trancados e com
a boca espumante.
O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA - Espumando.
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO E era... Pra mim
era muito chocante porque ele é muito forte. Ele é muito grande. E
fazendo aquela força toda...
O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA - O corpo todo se batia?
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO - O corpo todo se
batia.
O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA - E alguns colegas seus
tiveram que contê-lo com os braços ou...
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO - É...
O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA - ...ou apenas ficaram
“espectando”?
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO - Não, como eu
contei. Eu, quando eu vi a cena, eu saí correndo do quarto, tá? Fui eu
que acordei todo mundo, dentro da concentração. E quando eu voltei, já
estavam ali dez jogadores, quinze jogadores, e ninguém, assim, tinha
iniciativa. O César Sampaio é que enrolou um lençol na mão.
O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA - Ele chegou a cair da cama?
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO - Não, que eu
tenha visto, não.
O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA - Durante o tempo todo, só
viu ele na cama.
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO - Durante o tempo
todo na cama.
O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA - O Zagallo chegou quanto
tempo após o ocorrido?
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO - Olha, eu não
posso precisar o período, porque um prédio era dos jogadores, e o prédio
da frente é que era da comissão técnica; mas, dez minutos, quinze
minutos...
O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA - Dez minutos, quinze
minutos.
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO - Mais do que isso
impossível.”
CONTRADIÇÕES ENTRE ZAGALLO E LUXEMBURGO
O depoimento de Zagallo também foi diferente do depoimento de outro
ex-técnico da seleção brasileira, Wanderley Luxemburgo. Zagallo admitiu que tinha
contrato com a Nike pela época da Copa, depois mandou carta à CPI negando. O
representante da NIKE, Ingo Ostrovsky confirmou que Zagallo não tinha contrato
com a NIKE à época da Copa de 98, mas apenas um “acerto” para Zagallo receber
materiais esportivos.
Luxemburgo confirmou que tinha contrato. O primeiro negou qualquer
influência da Nike na escalação dos jogadores, Luxemburgo admitiu haver
entendimentos, conversas, influência enfim. Zagallo alegou ignorar tudo, até a clausula
do contrato que dá à Nike direito de escolher os adversários e o local de cinco jogos da
seleção por ano, como vimos. Mas Luxemburgo admitiu saber do contrato e da
cláusula.
SOBRE A INTERFERÊNCIA DA NIKE NA CONCENTRAÇÃO DA SELEÇÃO
Edmundo trouxe à CPI novos elementos que fortaleceram os indícios de
interferência da NIKE sobre os assuntos da seleção brasileira de futebol, conforme
pode-se ver abaixo:
“O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA – Os jogadores... a
informação que tenho aqui é que os senhores jogadores ficaram irritados
de cumprir um compromisso com a Nike na inauguração do Nike
Center de Paris. V.S.a. confirma isso? Houve suspensão do treino para
esse
compromisso? Ou o treino transcorreu durante todo o tempo
devido?
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – Olha, eu... eu
não posso afirmar se... se houve. Mas, treinamentos, eles são cancelados e
colocados de acordo com a... com a... com a necessidade. Nós ficamos um
mês lá treinando, de manhã e à tarde, e, às vezes, um jogador ou outro
estava com dor ou uma coisa dessa e, às vezes, os treinamentos eram
cancelados. Eu não posso afirmar se nesse dia, propriamente, o treino foi
cancelado em função...
O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA – Mas foi cancelado?
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – Não. Eu não
posso afirmar se foi em função disso. Mas que foi cancelado, sim.
O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA – Foi. É isso que eu queria...
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – Olha, eu não
sei se foi suspenso. Eu sei que nós treinamos e fomos pra lá à tarde.
O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA – E o treinamento
transcorreu todo o tempo devido ou não?
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – Não. A gente
treinava, como eu disse, período da manhã e período da tarde.
O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA – Nesse dia, nesse dia.
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – Nesse dia,
treinamos só durante um período.
O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA – Só durante um período?
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – É.
O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA – O outro período não foi...
não houve treinamento?
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – Não.
O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA – Em função desse evento?
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – Em função
desse evento.
O SR. DEPUTADO RONALDO VASCONCELLOS (...) Os jogadores da Seleção Brasileira sabiam do contrato da Nike, ele,
que ele foi assinado em 1996 e nós estávamos em 1998? Os jogadores
da Seleção Brasileira sabiam que a CBF tinham um contrato com a
Nike?
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – Sabia. É
normal que a empresa que patrocine tenha um contrato. Eu acho que
sim. Todos os jogadores sabiam.
O SR. DEPUTADO RONALDO VASCONCELLOS Existia na comitiva — não digo na concentração —, na comitiva, em
algumas reuniões, e na própria viagem, um representante da Nike junto
à comitiva da Seleção Brasileira nos jogos da França?
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – Sim.
O SR. DEPUTADO RONALDO VASCONCELLOS Tempo integral?
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – Tempo integral.
O SR. DEPUTADO RONALDO VASCONCELLOS - O
senhor lembra do nome dele?
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO - Todo não, mas
era Luís alguma coisa.
O SR. DEPUTADO RONALDO VASCONCELLOS Nacionalidade dele.
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO - Brasileira. É
mineiro.
(...)
O SR. DEPUTADO ALEX CANZIANI – Esse Sr. Luís, que o
senhor cita que é o representante da Nike, ele freqüentava a
concentração? Ele ficava no local onde vocês estavam concentrados?
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – Isso, ele ficava
na concentração, ia no ônibus, enfim...
O SR. DEPUTADO ALEX CANZIANI – Acompanhava
toda...
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – É,
acompanhava toda a delegação.
O SR. DEPUTADO ALEX CANZIANI – A concentração na
França, eu estou dizendo, lá, na França.
O SR. EDMUNDO ALVES SOUZA NETO – Na França.”
DEPOIMENTO DOS REPRESENTANTES DA NIKE
Embora em nota divulgada à imprensa, de autoria do gerente de
comunicação da NIKE, Ingo Ostrovsky, se afirme que o contrato com a CBF é de
quatrocentos milhões de dólares, “dos quais U$ 160 milhões em dinheiro e o restante
em outros benefícios”, nunca se esclarece a aplicação efetiva, em prol da seleção, da
importância de duzentos e quarenta milhões de dólares, seja em propaganda, divulgação
de qualquer ordem ou fornecimento de materiais.
Em depoimento à CPI Ostrovsky afirmou que o contrato envolve
trezentos e sessenta e nove milhões de dólares (e não 400 milhões como havia afirmado
na nota): são cento e sessenta milhões por dez anos de contrato, divididos de acordo
com um cronograma estipulado, mais dez milhões de dólares para pagar a empresa
Umbro pela rescisão do seu contrato com a CBF, mais cerca de cinco milhões em
materiais esportivos, além de cento e cinqüenta milhões de investimentos em marketing
e, por fim, um milhão de dólares para custear equipamentos de transporte para a
Seleção Brasileira.
O contrato prevê ainda uma possibilidade de renovação por um mínimo
de quatro anos, prevendo, para isso, quarenta e três milhões de dólares. Conforme a
mesma testemunha, não se poderia comparar o contrato com a Seleção e com o
Manchester, pois este joga muito mais vezes num ano com transmissão pela TV para
todo mundo, com grande exposição.
Como a CBF pode controlar essas despesas, particularmente aqueles US$
150 milhões de investimento em marketing? E esse investimento favorece efetivamente
a quem? Ao futebol brasileiro ou à multinacional NIKE? Os depoimentos dos
representantes da NIKE ajudaram a lançar luz sobre esses fatos.
“O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - Muito bem. Esse
dinheiro previsto em contrato, que é previsto para investimentos em
marketing, qual é o tipo de investimento, que o contrato não diz, deixa
em aberto, mas nós queremos saber qual o tipo de investimento que esses
recursos cobrem e quanto desses recursos já foram investidos. E em que já
foram investidos até agora? E quem decide pelos investimentos de 150
milhões de dólares, é a Nike com a CBF ou os dois em conjunto? Ou a
Traffic também participa?
O SR. REYNALDO OSTROVSKY (Ingo Ostrovsky) - Sr.
Relator, esses 150 milhões de dólares são gastos ou serão gastos ao longo
de dez anos em atividades de marketing, de publicidade, de divulgação, de
promoção, de exposição da Seleção Brasileira em todo o mundo. São
atividades que incluem filmes, publicidade, materiais de publicidade,
pôsteres, campanhas publicitárias, campanhas de rua em várias partes do
mundo, enfim, campanhas de marketing — acho que o nome geral é esse.
Nós estamos atualmente quase no meio do contrato, já passamos quatro
anos do contrato e, até o momento, nós investimos cerca de 50 milhões de
dólares. Eu gostaria aqui de fazer uma pequena observação: quando se
olha o tamanho do contrato da Nike com a CBF, esse contrato ele inclui,
excelência, três Copas do Mundo — a Copa de 98, a Copa de 2002 e
a Copa de 2006. Durante... no ano de realização da Copa do Mundo é
que são feitos os maiores investimentos em marketing em torno da
Seleção, uma vez que, evidentemente, a Copa do Mundo dá uma
exposição global à seleção e a nossa marca. Portanto, nós passamos
apenas uma dessas três copas, até agora, e já gastamos 50 milhões, por
volta de 50 milhões. Respondendo também a sua última questão,
excelência, esses gastos são decididos pela Nike e em consulta com a
CBF.
O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - Não há uma prestação
de contas? É um contrato bilateral. Nesse contrato consta um
investimento de 150 milhões de dólares, que é um investimento, apesar de
abranger três Copas do Mundo, é um investimento razoável. E imaginase que ao constar uma cláusula contratual de investimento dessa
natureza, imagina-se que seria em benefício de ambas as partes. Então,
eu queria saber, primeiro, se isso... se quem decide é a Nike,
efetivamente, se ela consulta a CBF, como o senhor disse, mas quem
presta... a Nike decide, paga e presta contas, tem uma prestação de
contas desses valores?
O SR. REYNALDO OSTROVSKY (Ingo Ostrovsky) Excelência, a Nike decide fazer o investimento de marketing, ela faz o
investimento de marketing, evidentemente que é a companhia que arca
com todas as despesas desse investimento, e ela comunica à CBF aonde
foi gasto o dinheiro, aonde foi investido, aonde foi feito esse investimento
de marketing.
O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - De que forma é feita
essa comunicação? É o senhor quem faz a comunicação, como o
representante do contrato no Brasil?
O SR. REYNALDO OSTROVSKY (Ingo Ostrovsky) - Não,
excelência.
O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - Como é feito?
O SR. REYNALDO OSTROVSKY (Ingo Ostrovsky) - Não
passa, não sou eu a pessoa que faz essa prestação de contas. Eu não
tenho informações sobre como exatamente ela é feita, mas ela é feita.
O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - Mas se o senhor que é o
representante da empresa no Brasil, responsável pelo desempenho de um
contrato de um valor de 150 milhões de dólares, o senhor disse que não
sabe como é feito? O senhor não acha que isso é uma informação
truncada?
O SR. REYNALDO OSTROVSKY (Ingo Ostrovsky) Excelência, o que eu ...
O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - O que o senhor
administra, então, além disso?
O SR. REYNALDO OSTROVSKY (Ingo Ostrovsky) Excelência, o que eu estou dizendo é que eu não tenho informações se essa
é uma prestação de contas anual, se essa é uma prestação de contas que é
feita na medida em que os eventos de marketing são criados e realizados,
eu não tenho essa informação no momento não.
O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - Gostaria que o senhor
perguntasse ao seu assistente pra saber se ele tem condições de dar essa
informação que o senhor não tem condições.
O SR. AMADEU AGUIAR JÚNIOR - Muito obrigado pela
palavra. A Nike, como falado pelo Ingo, ela executa campanhas de
marketing periódicas, concentradas ao redor das Copas do Mundo, que
são os três eventos mais importantes cobertos por esse contrato. A maioria
desses investimentos, como o contrato é feito também pela empresa Nike
Europa, são coordenados por essa entidade. Essa entidade decide a forma
da campanha, o tema da campanha, comunica isso à CBF, através do
seu escritório no Brasil, representado pela Nike do Brasil, que discute
com a CBF a forma que essa campanha vai ser executada. A prestação
de conta é feita diretamente pela Nike Europe à CBF. Eu tenho comigo
um resumo que demonstra as campanhas principais que foram feitas até
agora. Possa mencionar, com relação à Copa de 1998, o investimento
total de aproximadamente 41 milhões e 600 mil dólares num filme de
publicidade veiculado no mundo todo chamado Aeroporto, inclusive foi
mostrado em TV aberta no Brasil. E diversos outros eventos. E essas
informações estão disponíveis a esta Comissão, caso vocês, V.S.as.
queiram consultar maiores detalhes, nós podemos consultar a empresa que
fez os investimentos diretos para satisfazê-los.
O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – Nós temos,
requerimento aprovado aqui nesta Comissão que solicita à CBF o envio
de toda a relação das despesas realizadas em termos de marketing,
investimentos em marketing. E como, segundo a sua afirmação, quem
decide é a Nike Europe, e depois remete, presta as contas à CBF, nós
gostaríamos de obter uma cópia, então, dessas informações que o senhor
coloca à disposição.
O SR. AMADEU AGUIAR JÚNIOR – Perfeitamente.”
Em 17 de maio de 2001 a CPI recebeu a documentação prometida pela
Nike. Refere-se a campanhas publicitárias realizadas entre junho de 1997 e julho de
1998. Anúncios em TV e jornais, voltados para a Copa do Mundo de 98. Um único
anúncio de TV intitulado “Aeroporto”, divulgado mundialmente pela TV, custou US$
41,624 milhões. Mais US$ 5 milhões foram gastos em outros anúncios em TV,
outdoors, revistas e jornais, tendo quase sempre o jogador Ronaldo, contratado da
multinacional, como protagonista, e a Copa de 98 como tema. A marca Nike e Ronaldo
rodaram o mundo nas asas dos comerciais de TV por conta do contrato com a CBF.
Resta saber em que essa publicidade beneficiou a seleção brasileira de futebol e a
própria CBF.
Resumindo: essas informações e o depoimento de um dos representantes
da NIKE, reforçaram o ponto de vista desta CPI de que os cento e cinqüenta milhões
de dólares destinados a atividades de marketing (publicidade, divulgação, promoção e
exposição da seleção em todo o mundo), são aplicados única e exclusivamente à
vontade desta, que apenas “comunica”, segundo se expressou, à CBF “aonde foi gasto
o dinheiro, aonde foi investido, aonde foi feito esse investimento de marketing.”
Entretanto, Ostrovski não sabia informar como esta comunicação se dava, isto é,
“...não sou eu a pessoa que faz essa prestação de contas. Eu não tenho informações
sobre como exatamente ela é feita, mas ela é feita.”
CONTRATO CBF-NIKE, ANÁLISE DETALHADA
O Contrato CBF/NiKe, cuja investigação é um dos objetivos mais
importantes desta Comissão Parlamentar de Inquérito, é um contrato de patrocínio e
apoio, firmado em meados de 1996, entre a empresa Nike Europe B.V., a
Confederação Brasileira de Futebol e a Traffic Assessoria e Comunicações. Por este
contrato, a NIKE tornou-se co-patrocinadora da CBF, junto com a Coca-Cola, além de
patrocinadora e fornecedora exclusiva da CBF de bolas, caneleiras, calçados e outros
produtos fabricados e comercializados pela Nike.
O contrato regula detalhadamente o uso do chamado Kit da Nike pela
CBF, ou seja, seu pelos jogadores, pelos gandulas, pelos integrantes da equipe técnica,
pelos mascotes e por toda a periferia da Seleção. O Contrato simplesmente assegura a
onipresença da marca. Todos são obrigados a facilitar e até mesmo priorizar de todas as
maneiras a exposição da marca Nike. Além disso, o logotipo e a marca devem estar
nos pôsteres, publicações e papel timbrado da CBF, nas placas de campo, nos
escritórios da entidade desportiva, nos veículos usados para transporte da Seleção –
tudo de forma muito visível, muito clara, muito promocional.
O contrato ainda prevê que, no período do contrato, a seleção masculina
ficará à disposição da Nike para um mínimo de 50 jogos ou exibições internacionais, a
serem organizadas sob a responsabilidade da empresa, com direitos exclusivos de
comercialização, patrocínio e licenciamento, inclusive no que se refere à transmissão de
imagens. A Nike tornou-se também co-patrocinadora de escolas, clínicas e quaisquer
programas juvenis de futebol diretamente operados pela CBF.
A Nike é uma empresa transnacional de material esportivo. Consta que a
produção desse material esportivo é toda terceirizada. A Nike do Brasil disputa o
mercado esportivo com concorrentes de peso, dentre os quais se destacam a gigante
nacional Olympikus, a vice-líder Rainha, as multinacionais Reebok, Adidas e New
Balance e a japonesa Mizuno.
No momento, os objetivos de marketing, no Brasil, são, até 2003, dobrar
sua participação no mercado nacional de calçados esportivos e atingir a liderança;
triplicar o volume de vendas atual, no mesmo período. São objetivos de comunicação:
transmitir aos consumidores os valores da Nike, aproximando-os da empresa; valorizar
o esporte, a determinação e o esforço; transmitir a performance da tecnologia Nike.
O CONTRATO COLIDE COM OS INTERESSES DO FUTEBOL BRASILEIRO
À luz da legislação desportiva, porém, o contrato colide, com os
princípios da qualidade, que se refere à valorização dos resultados desportivos
educativos e dos relacionados à cidadania e ao desenvolvimento físico e moral, e da
eficiência, obtido por meio da competência desportiva e administrativa, conforme
consta do art. 2º, IX e XII, da Lei Pelé. Em outras palavras, cabe questionar se e de
que forma o contrato CBF/Nike subordina o resultado desportivo (em seu sentido
mais amplo) aos interesses do capital e aos princípios do marketing.
É verdade que, de acordo com o § 2º do art. 4º da Lei Pelé, a organização
desportiva do País e fundada na liberdade de associação. Contudo, ela também integra
o patrimônio cultural brasileiro e é considerada de elevado interesse nacional. Quanto
ao patrimônio cultural brasileiro, pelo art. 216, § 1º, da Constituição Federal, cabe ao
poder público, com a colaboração de todos, promovê-lo e protegê-lo por meio de
formas variadas de acautelamento e preservação, em nenhuma hipótese deixá-lo
entregue à própria sorte. “Elevado interesse nacional” remete a organização
desportiva aos cuidados do Ministério Público, que, aliás tem responsabilidade
específica no que se refere à proteção do patrimônio público e social.
Além disso, hoje a competição desportiva é principalmente um
espetáculo público, de cujos protagonistas, os atletas, os promotores esperam que a
conduta pessoal, o desempenho profissional e o modo de relacionar-se com a
imprensa e o público antes de mais nada promovam a marca do patrocinador. Nesse
espetáculo, (sobretudo televisivo), o resultado desportivo interessa na exata medida em
que seja fator de reprodução e multiplicação do capital nele investido.
O desporto-negócio é subordinado às leis do mercado, onde os aspectos
pragmáticos da renda e do lucro prevalecem sobre os valores desportivos (integração
social, de desenvolvimento psicomotor, de exercícios físicos educativos, de
fortalecimento da cidadania, etc.) e onde as decisões importantes são tomadas por
algum departamento de marketing ou órgão similar. Neste contexto, justifica-se que o
contrato CBF/Nike seja analisado à luz da legislação de defesa do consumidor, da
regulamentação de diversões e espetáculos públicos, da legislação trabalhista.
A TRAFFIC É PARTE NO CONTRATO
O contrato entre a CBF, a Traffic e a NiKe, firmado entre entidades de
natureza privada em um país estrangeiro, em local não declarado pela partes, traz
profundas conseqüências para o nosso país, a começar pelo fato de envolver a nossa
seleção, detentora de tantos títulos, capaz de unificar o sentimento de todos os
brasileiros, seja pelo orgulho, pela expectativa, seja, enfim, pela esperança. Quando a
seleção vence, temos a certeza de que todo o país, isto é, dos mais velhos aos mais
jovens e mesmo aqueles que não costumam acompanhar o futebol no dia-a-dia dos
campeonatos regionais e nacional, se sentem unidos pelo sentimento de que temos
valor, que os nossos atletas – representantes da nossa diversificada população – têm
qualidades inerentes a todo o povo brasileiro e de que, enfim, nosso país pode ser
vitorioso e feliz aos olhos do mundo.
Daí a percepção de que a associação da seleção a uma empresa privada de
material esportivo certamente implica na exploração comercial do sentimento de uma
população. Em outras palavras, a utilização da imagem da nossa Seleção traz, e não
temos a menor dúvida em afirmá-lo, grandes vantagens comerciais para a empresa, no
caso específico a NIKE. Mais ainda pelo fato de que a imagem da Seleção ultrapassa
em muito as fronteiras do nosso país. Até países longínquos com os quais o Brasil não
mantém relações comerciais mais estreitas nem tampouco políticas conhecem o futebol
brasileiro e o admiram.
Portanto, a entidade que administra o futebol brasileiro, a CBF, deveria
ter um cuidado extremo na participação de contratos comerciais para a exploração da
imagem da nossa Seleção. Assim, em termos nominais, o valor do contrato pode
impressionar a alguns, mas a destinação dos recursos advindos da sua execução não são
claros ou privilegiam interesses que não os propriamente ligados à Seleção e ao futebol
brasileiro.
Tem-se noticiado na imprensa e também no depoimento a esta CPI do
jornalista Flávio Prado, a partir de informações divulgadas em diversos sites – Telenet,
Zipnet e UOL -, que a mesma NIKE firmou contrato com o clube Manchester no
valor de quatrocentos e trinta e nove milhões de dólares. Mais ainda, de acordo com
matéria do Correio Braziliense do dia 1o de dezembro do ano passado, a TV Globo
estabeleceu contrato com o Clube dos 13 que chega ao montante de quinhentos e
sessenta milhões de dólares, incluindo os direitos de transmissão pela TV. Somente isto
justificaria a revisão ou mesmo a extinção do pacto com a CBF.
Sob o ponto de vista jurídico formal, chama a atenção que não haja a
indicação do local onde o contrato foi celebrado, crítica que se mantém mesmo tendo
Ricardo Teixeira, em depoimento do dia 10 de abril a esta CPI, afirmado que o pacto
foi estabelecido em Nova York e que lá, nos Estado Unidos, é irrelevante a indicação,
no instrumento formal, do local em que foi assinado. Assim também não há assinaturas
de testemunhas, as firmas não estão reconhecidas, não foi submetido a registro nos
órgãos competentes, os anexos não acompanham a cópia da tradução juramentada.
Neste ponto vale ressaltar que a tradutora pública fez constar que a tradução se deu a
partir de uma cópia reprográfica do original em inglês.
O contrato envolve, em verdade, três partes, quais sejam a CBF, a Traffic
e a NIKE EUROPE. O contrato foi chancelado pela NIKE, Inc – matriz norteamericana. A NIKE EUROPE, por sua vez, é uma empresa sediada na Holanda,
podendo configurar-se como empresa não-residente para fins fiscais (“offshore”), já
que a legislação daquele país oferece a possibilidade de isenção tributária.
No contrato, a Traffic é mais do que simples intermediária, constituindose em verdadeira parte, o que pode ser depreendido a partir do fato de que, como
inscrito, “...é titular de certas marcas registradas e outros Direitos de Propriedade
pertencentes à CBF, cujo direito a NIKE deseja obter”. O próprio representante da
NIKE, confirmou, instado pelo Deputado Aldo Rebelo, que “...a Traffic é detentora
de direitos legais da CBF. Então...(...)...nós não podemos assinar um contrato com a
CBF, uma vez que nós estamos interessados em adquirir direitos que são da Traffic.
Então, ela tem que fazer parte do contrato.”
A NIKE É A PARTE PRIVILEGIADA
Em seu depoimento à CPI Ricardo Teixeira foi contestado por três
aspectos da formalização do contrato:
1) por não haver no contrato indicação do local onde foi firmado. Ele
disse que foi em Nova Iorque, mas que nos Estados Unidos isso é comum, não tem
importância. No que foi contestado pelo deputado Sílvio Torres, dizendo que esse é
um contrato de interesse do Brasil;
2) Enquanto do lado da NIKE assinaram quatro diretores, do lado da
CBF o presidente da CBF assinou sozinho, refletindo a falta de democracia e de
transparência nas decisões da entidade;
3) Na elaboração do contrato havia três advogados representando a
NIKE. E não havia nenhum advogado representando a CBF, o que, evidentemente,
pode ter favorecido os interesses da multinacional. É o que se verá em seguida:
Quanto às cláusulas operacionais do contrato, devemos registrar que as
de nºs 2.1, 2.2, 2.3 e 4.5 traduzem uma exclusividade desmedida do uso dos direitos
adquiridos em razão do contrato, aliás, exclusividade oponível em qualquer parte do
mundo, sendo que a 2.2, “a”, V, traduz um objeto contratual de certo modo ilimitado.
A expressão “em todas as atividades da CBF” na cláusula 5, “i”, demonstra novamente
a larga extensão do objeto do contrato concedido em favor da NIKE.
A cláusula 2.7 estabelece que “CBF e a Traffic concordam que os
direitos e benefícios concedidos à NIKE, por meio deste Contrato, serão também
estendidos a cada e a todos os membros do Grupo NIKE, e que cada uma das
obrigações da NIKE, assumidas de acordo com este Contrato, pode, a critério
exclusivo da NIKE, ser cumprida por quaisquer dos membro do Grupo NIKE, desde
que esse cumprimento não iniba ou restrinja a responsabilidade da NIKE por suas
obrigações...” [Grifo nosso.]
Por esta cláusula contratual a CBF possibilita que qualquer participante
do “grupo NIKE”, seja lá onde for e seja lá com que função, tome a frente de sabe-se
lá que sorte de providências e usufrua da imagem da Seleção para fins não
determináveis (confecção de fotos, vídeos, filmes, camisetas, material esportivo, álbuns,
objetos de toda natureza com a imagem da Seleção), mesmo em padrões não
espeficificados no contrato, porquanto a CBF não teria e não tem condições de
fiscalizar todo o “grupo NIKE” mundo afora.
A CBF se compromete, nesta cláusula, a aceitar a atuação de entidades do
grupo NIKE, sem saber exatamente qual e em que parte do mundo, sujeitando-se ao
alvitre exclusivo da empresa.
Sobre a cláusula 4.1 devemos observar que os preços por atacado da
NIKE para o Brasil, ali insertos, e que servem de referência para a aferição dos valores
negociais, ficam, exclusivamente, ao alvitre da NIKE, sem qualquer garantia de controle
e aferição pela CBF.
A CBF também estaria prejudicada pela cláusula 4.6, à medida que a
NIKE não poderia ser responsabilizada nem pelo atraso e tampouco pela não entrega
dos produtos. Em complemento, a cláusula 4.7 inibe os direitos da CBF ao não
estabelecer um prazo certo para uma obrigação da NIKE.
Da cláusula 4.9 depreendemos que nem a própria NIKE confia tanto
assim na qualidade dos seus produtos, porquanto se escusa em ter responsabilidade em
acidentes ou danos sofridos pelos atletas da Seleção pelo uso de tais produtos, de forma
a afrontar o nosso ordenamento jurídico, já que clausula contratual não pode excluir a
responsabilidade legal a ser aferida caso a caso (art. 12, 18, 23, 24 e principalmente o
art. 25 do Código de Defesa do Consumidor – Lei n.º 8.078, de 11.9.90). A este
propósito, a simples assinatura de um termo de responsabilidade pelo atleta não elide a
responsabilidade da empresa frente ao mesmo estatuto legal.
interesses.
A cláusula 6.2
suprime a liberdade de a CBF administrar os seus
A alínea “a” da clausula 8.2, por sua vez, procura, de maneira inadequada
e indevida, superar os limites que envolvem as partes pactuantes (CBF-Traffic-NIKE)
para estabelecer obrigações aos jogadores:
“cada Membro do Time cooperará com a NIKE e dará a
NIKE todas as facilidades, dentro do razoável (inclusive o uso da marca
e do logotipo da NIKE nos itens do Kit da NIKE e de outros Produtos
NIKE), conforme a NIKE exigir, de tempos em tempos, para a
obtenção e publicação de fotografias, vídeos e outros materiais de
marketing ou promocionais e para outras atividades patrocinadas pela
NIKE e relacionadas com a CBF;”
Da mesma forma, tal raciocínio volta a aparecer na cláusula 8.14, pela
qual a CBF assume o compromisso de envidar todos os seus esforços
“para fazer com que os Membros do Time-A Masculino
estejam disponíveis, assim como os outros Membros do Time para
aparecerem nos eventos promocionais conduzidos pela NIKE e facilitará
esse comparecimento. A NIKE pagará todas as despesas incorridas por
esses Membros do Time, dentro do razoável, relacionadas com esses
comparecimentos.”
Assim, em função destas cláusulas a CBF, de acordo com o art. 929 do
Código Civil Brasileiro9, poderia ser chamada a indenizar a NIKE ao prometer algo em
nome de outrem que pode se recusar a cumprir o acordo de que não fez parte. O
constrangimento indevido provocado por esta cláusula pode ser verificado por ocasião
dos preparativos para a Copa de 1998, quando foi noticiado que o jogador Dunga, de
maneira bastante justa, havia apontado o inconveniente em interromper-se o treino dos
jogadores para a realização de uma festa promocional para a NIKE.
Isso demonstra como a CBF poderia ter exigido uma redação mais
favorável do contrato e não sujeitar-se, inclusive em nome alheio, às condições
estabelecidas pela sua patrocinadora. Em conseqüência, mesmo quando os atletas são
chamados a assinar documento assumindo o compromisso de não oposição às
exigências comerciais assumidas pela CBF, há a possibilidade de controle judicial pela
evidente desvinculação com a prática esportiva.
INGERÊNCIA DA NIKE
E a ingerência inaceitável da NIKE na administração da CBF continua
quando, nesta mesma cláusula 8.4 as alíneas “b” e “c” estabelecem, a primeira, que a
NIKE é a responsável pela organização dos jogos e “pelo fornecimento de outros times
que irão competir nesses jogos” e, a segunda que estabelece a obrigatória presença de
pelo menos oito dos principais jogadores do Time-A para atuarem em cada um desses
jogos.
Mais ainda, adiante, na alínea “d”, a CBF fica impedida de participar,
durante o contrato, de “quaisquer jogos amistosos ou de exibição, que não sejam os 50
(cinqüenta) jogos a serem organizados pela NIKE e mencionados acima.” Sobre este
ponto, devemos lembrar que Ricardo Teixeira no depoimento prestado a esta CPI
reconheceu que cometeu um erro ao assumir a possibilidade de realizar tantos
amistosos, o que levou, inclusive, a uma revisão contratual que, ao diminuir o número
dos amistosos, também reduziu em cerca de catorze milhões de dólares o valor do
contrato em detrimento da CBF.
“Art. 929. Aquele que tiver prometido fato de terceiro responderá por perdas e danos, quando este o não
executar.”
9
Pela cláusula 8.16, a CBF se compromete a ceder áreas, dentro das suas
dependências administrativas, para que a NIKE possa comercializar seus produtos,
através de uma “Loja com Conceito NIKE”. E, mais, a NIKE exige que tal loja seja
localizada próxima ao Museu, de forma que “todos os visitantes do museu passem
através da Loja com conceito NIKE quando saírem do museu.”
E a CBF, como se não fosse suficiente, dá ainda mais demonstrações de
má gestão negocial ao assumir, na cláusula 8.18, de maneira abusiva, o compromisso de
disponibilizar para uso da NIKE, livre de quaisquer despesas, todas as filmagens que
tenha em seu poder dos jogos da seleção, até mesmo daqueles jogos realizados antes da
assinatura do contrato.
A propósito da remuneração da CBF (cento e sessenta milhões de dólares
americanos, na versão original do contrato), devemos ressaltar que ela ainda é menor
do que a declarada, uma vez que, na alínea “b”, da cláusula 11.1, é estabelecido que o
valor deverá ser partilhado com a Traffic (5 por cento).
DESREIPEITO À JUSTIÇA BRASILEIRA
Outra cláusula que chama a atenção é 18.2, mais especificamente a alínea
“g”, pela qual fica evidente que a NIKE, com anuência da CBF, coloca o contrato
acima até mesmo das disposições legais, mesmo de ordem pública, a demonstrar que a
regra número um do contrato, ou melhor ainda, a essência do contrato é basicamente
voltada para o lucro que a empresa vislumbra ao aproveitar-se da imagem da Seleção.
Assim a empresa se julga no direito de “cancelar” unilateralmente o contrato, se por
exemplo: “g) qualquer lei, regra, regulamento ou decisão judicial resultar em uma
redução material do valor dos direitos e benefícios concedidos à NIKE, de acordo com
este Contrato.”
O desrespeito ao nosso ordenamento – e assim cremos que constituiria
desrespeito a qualquer ordenamento jurídico contemporâneo -, se torna ainda mais
evidentemente expresso na alínea “m”, que se põe acima das decisões judiciais de
qualquer natureza que “proíbam quaisquer das partes contratantes deste Contrato, de
cumprir, totalmente, as suas obrigações...”.
A alínea “n”, por seu turno, pretende tornar a NIKE livre de qualquer
responsabilidade tributária contrariando a nossa Constituição e a nossa legislação
infraconstitucional, podendo haver a configuração, até mesmo do crime previsto no art.
2º, II, da Lei n.º 8.137, de 27 de dezembro de 1990. Assim a NIKE poderia cancelar o
contrato caso viesse a “receber uma notificação de qualquer autoridade fiscal, em
qualquer parte do mundo, avisando que a NIKE precisa reter ou que deveria ter retido
impostos sobre quaisquer dos pagamentos exigidos de acordo com este contrato.”
Sobre o teor destas cláusulas e os perigos que elas embutem, o
representante da empresa, em depoimento à esta CPI, Ingo Ostrovsky, considerou que
se tratava tão-somente de proteger os interesses da empresa, isto é, “...essa é uma
cláusula de proteção. É...nós não estamos nessa cláusula dizendo que qualquer decisão
judicial ou fiscal deixará de ser cumprida. O que nós estamos dizendo é que, se houver
uma decisão judicial que implique em diminuição dos direitos que nós adquirimos da
CBF, nós temos o direito de rescindir o contrato.”
Nesta mesma toada se pronunciou o senhor Amadeu Aguiar Júnior,
quando lhe oferecemos um fato concreto: há uma autuação fiscal da Receita Federal
para que a CBF recolha os impostos devidos não só sobre os cento e sessenta milhões
de dólares mas também sobre os dez milhões pagos a Umbro. Confrontado sobre a
eventual determinação da autoridade administrativa no sentido do obrigatório
recolhimento do imposto devido, houve o reconhecimento de que uma decisão desta
natureza poderia configurar uma daquelas hipóteses contratuais de rescisão do contrato
por deliberação da NIKE.
Por fim, a supremacia indubitável da NIKE sobre a CBF se faz também
clara na cláusula 22, pela qual a primeira pode escolher o foro ao seu bel-prazer
inclusive onde houver “propriedades intangíveis” da CBF ou da Traffic. Mas, para ser
demandada, exige como foro a cidade de Zurique, na Suíça. Posteriormente, não se
sabe a razão, foi realizado um aditamento, firmado em 28 de março de 2000, pela qual o
foro para o deslinde de questões referentes ao contrato passou a ser o do Rio de
Janeiro.
Entretanto, a alteração contratual firmada no dia 3 de abril de 2000
modificou a cláusula 2.4 da versão original, tornando exclusivo o direito da NIKE de
“utilizar e sublicenciar o uso dos Direitos de Propriedade e Imagens dos Atletas”. E
acrescentou que depois de deduzidas as despesas administrativas da NIKE (vinte por
cento da receita bruta) e comissões, haveria o compartilhamento, em cinqüenta por
cento, do que fosse auferido com a utilização dos direitos outorgados.
Na alínea “b” da cláusula terceira deste adendo, acrescenta-se um novo
item - 2.8 -, na cláusula dois do contrato original, definindo o termo “prêmios” a serem
distribuídos pela NIKE que deterá o direito exclusivo de estabelecer os termos e
condições. Mais uma vez, a CBF e a Traffic anuem, cedem expressamente a
exclusividade de determinação em favor da NIKE.
Outro adendo, datado de 6 de abril de 2000, define, através de fórmulas
matemáticas, uma nova reformulação financeira no contrato, a partir de metas que
foram redefinidas, observando, é claro, como é freqüente neste contrato, uma redução
de remuneração em desfavor da CBF.
AÇÃO CIVIL EM DEFESA DO PATRIMÔNIO CULTURAL BRASILEIRO
Enfim, a NIKE ditou o contrato e a CBF, muito mal representando os
interesses da nossa Seleção e assim do povo brasileiro, aceitou de olhos fechados os
seus termos, condições, imposições e, principalmente, sua remuneração.
Isto posto, temos como certa a utilização da ação civil pública por dois
fundamentos legais: o primeiro por ser o esporte patrimônio cultural em relação ao qual
há interesses difusos manifestos e protegíveis pelo Estado (art. 1º, IV, da Lei 7.347, de
24.07.85). O segundo fundamento está justamente na aplicação do Código de Defesa
do Consumidor, à medida que o contrato CBF (TRAFFIC) – NIKE excede os
interesses das partes contratantes para atingir os torcedores-consumidores dos produtos
esportivos desta última empresa, levados pela associação da marca com a Seleção
Brasileira.
Principalmente em consideração ao segundo fundamento, podemos
indicar, em conformidade com Cláudia Lima Marques, as três “bases instrumentais para
combater as cláusulas abusivas, previstas no Código Brasileiro de Defesa do
Consumidor: 1) prioridade ao controle judicial do conteúdo do contrato, sem excluir
um controle administrativo; 2) opção pela nulidade absoluta como sanção da
abusividade da cláusula; 3) elaboração de uma lista exemplificativa de cláusulas
consideradas nulas, permitindo sua regulamentação.”
O controle judicial, hoje, se faz possível pela evolução da teoria
contratual pela qual a intervenção do Estado no conteúdo dos contratos se efetiva, em
última análise, pelo Poder Judiciário. Segundo a mesma autora (Contratos no Código...,
op. cit., p. 395), pode se dar um controle formal e do conteúdo dos contratos a partir
basicamente do art. 51 do Código, constituindo-se num verdadeiro “novo controle
incidente do conteúdo e da eqüidade de todos os contratos de consumo submetidos à
apreciação do Judiciário brasileiro. Um controle direto também é possível, segundo os
arts. 80 e 83, através de uma ação de nulidade de cláusula.” [Grifos da autora.] De
modo que há um controle formal (arts. 46, 47 e 49), por um lado, e a possibilidade de
um controle do conteúdo do contrato (arts. 51 a 53).
Antes que o litígio seja formalizado diante do Juiz, o Ministério Público,
como adverte a autora citada, tem realizado um notável trabalho, sendo responsável
pelos mais significativos êxitos dos consumidores, principalmente em sede de controle
abstrato.
CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
O § 4o do art. 51 do Código de Defesa do Consumidor preceitua que o
Ministério Público pode ser chamado a ajuizar a competente ação para que cláusula
contratual, que contrarie os preceitos do Código ou não assegure o justo equilíbrio
entre os direitos e obrigações das partes, seja declarada nula. O Ministério Público,
então, atua não só como órgão legitimado para a propositura da ação de controle
abstrato das cláusulas abusivas, mas também na conciliação e no possível ajuizamento
da ação civil pública.
O Código de Defesa do Consumidor, atribui, como conseqüência, a
nulidade absoluta, seja na lista exemplificativa das cláusulas abusivas inseridas no seu
art. 51, seja no que se refere ao art. 53. A propósito, o inciso XV do art. 51 prevê, que
todas as demais cláusulas, mesmo que não previstas na numeração legal, serão
consideradas nulas quando se caracterizar a sua desconformidade com o sistema de
proteção do consumidor, expresso no conteúdo do próprio Código.
Cláudia Lima Marques adverte que o inciso IV do art. 51, completado
com o § , traduz “verdadeira norma geral proibitória de todos os tipos de abusos
contratuais, mesmo aqueles já previstos exemplificativamente nos outros incisos do art.
51. A boa técnica legislativa ordenaria que norma tão importante e ampla estivesse
contida em artigo próprio e não escondida, talvez por medo do veto, em uma lista de
quinze incisos. Mas, seja como for, a cláusula geral da boa-fé, da eqüidade e do
equilíbrio nas relações contratuais está presente no sistema do Código de Defesa do
Consumidor, representando uma das mais importantes inovações introduzidas por esta
lei no direito contratual brasileiro.” [Grifos da autora.] De acordo com o referido
inciso, são nulas as cláusulas que estabeleçam obrigações iníquas, de forma a deixar o
consumidor em desvantagem exagerada, incompatível com a boa-fé ou a eqüidade.
1o
Em conseqüência, várias cláusulas do contrato CBF (TRAFFIC) –
NIKE, ofendem o art. 51, bem como o inciso V do art. 6o do Código de Defesa do
Consumidor, entre outras.
Ainda merece consideração a falta de informação que envolve toda a
negociação, fato que, por si, seria o bastante para gerar o controle já com base no art.
46 do Código de Defesa do Consumidor.
CAPÍTULO V -- O UTROS C ONTRATOS DA CBF. A PARCERIA COM
A TRAFFIC.
No momento em que entra em declínio o domínio de Ricardo Teixeira
sobre o futebol brasileiro, a FIFA, a entidade máxima do futebol mundial, também é
abalada por denúncias. O presidente José Blatter está sendo acusado de corrupção em
cumplicidade com a parceira ISL. Os fatos indicam que um modelo de administrar o
futebol está em crise. Um modelo que combinou poder com marketing esportivo e
grandes negócios menos transparentes. O que está falindo é o modelo João Havelange
de administrar o futebol.
A CBF inspirou-se no método inaugurado por João Havelange. Durante
anos Havelange cedeu os direitos da FIFA para a Adidas e depois para uma sociedade
da Adidas com uma agência de publicidade japonesa, que formou a ISL. A FIFA vendia
para essa agência os direitos de publicidade para as Copas do Mundo, por um certo
valor. E a agência os revendia a inúmeros patrocinadores por valores muito superiores.
A ISL enriquecia rapidamente, transformava-se em uma potência do marketing
esportivo. Foi exatamente o que a CBF passou a fazer com sua parceira Traffic, a partir
da posse de Ricardo Teixeira na entidade, em 1989. O modelo-Havelange de gerir o
futebol foi seguido à risca no Brasil por seu então genro, Ricardo Teixeira.
Embora em seu depoimento a esta CPI o ex-presidente da FIFA, tenha
afirmado que nessa entidade se fazia licitação para escolha da agência intermediadora,
na prática isso não acontecia, ficando a ISL como parceira exclusiva durante anos,
mesmo quando empresas concorrentes ofereciam contratos melhores.(Ver o livro
“Como eles roubaram o jogo”, do jornalista David Yallop, pág.
186/187/222/248/249/250). Na CBF aconteceu algo semelhante, como mostraram
tanto a exclusividade da Traffic nos contratos com a CBF como as fracassadas
tentativas de participação nesse mercado por parte da principal concorrente da Traffic,
a Pelé Sports.
Ultimamente, com a falência espetacular da ISL, esse sistema, herança
dos 24 anos de poder de João Havelange na FIFA, sofreu um abalo, lançando
estilhaços até sobre a preparação da Copa do Mundo de 2002 na Coréia e Japão. A
associação FIFA-ISL veio abaixo acompanhada de denúncias e acusações. Por trás dos
negócios privilegiados haveria corrupção. A ISL é acusada de manter um fundo
secreto no paraíso fiscal de Liechtenstein destinado a subornar dirigentes de
confederações. Eis o que relatou o “Jornal do Brasil” de 23/05/2001:
“FIFA NEGA SUBORNO
esportivos
Fundação da empresa suíça seria usada para comprar dirigentes
ZURIQUE - Um minúsculo país que tem apenas 25
quilômetros separando o norte do sul pode ser a sede de um escândalo sem
precedentes no esporte. Liechtenstein - um paraíso fiscal de 30 mil
habitantes na Europa - abrigaria uma fundação mantida pela empresa
de marketing esportivo ISMM, controladora da ISL, para subornar
dirigentes esportivos. A denúncia poderia atingir o presidente da FIFA,
o suíço Joseph Blatter.
A ISL, ex-parceira do Flamengo e do Grêmio, era responsável
pela comercialização dos direitos de transmissão da Copa do Mundo até
2006. Dirigentes da empresa - que teve a falência decretada esta semana
- teriam chantageado Blatter, ameaçando contar ''detalhes escusos'' do
presidente da FIFA se ele rompesse o contrato da entidade com a ISL.
Blatter negou as acusações dizendo que a Fifa é apenas uma cliente da
ISL. Por causa da insolvência da empresa, o Campeonato Mundial de
Clubes, em julho, na Espanha, foi adiado para 2003.
A fundação da ISL em Liechtenstein, que se chamaria
Nunca, teria US$ 40 milhões para usar no suborno a dirigentes. Além
da Fifa, a empresa cuidava do marketing das federações internacionais de
natação, basquete e atletismo, além da Associação dos Tenistas
Profissionais (ATP
(...)
...a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento da
Europa (OCDE), pôs Liechtenstein numa lista negra de países onde há
lavagem de dinheiro. O pequeno principado já tinha aparecido no Brasil,
durante a CPI da CBF-Nike, na Câmara dos Deputados. O presidente
da CBF, Ricardo Teixeira, disse, em depoimento, que a RLJ, sua
empresa, tem sociedade com a Sanud, sediada em Liechtenstein”.
A FIFA começou negando tudo. Mas, diante de evidências apresentadas
pela imprensa européia, recuou. Em 26/05/2001 a “Folha de S. Paulo” acrescentou
novos detalhes às denúncias de corrupção no futebol globalizado, negócios que
envolvem a TV Globo e a empresa Traffic, do Brasil:
“Acuada, Fifa admite pela 1ª vez corrupção
“A Fifa reconheceu que um esquema de corrupção fraudou os
cofres do futebol mundial. No centro da grave crise financeira, está sua
ex-parceira, a ISL
A agência de marketing, que já teve sua falência decretada na
Suíça, desviou cerca de US$ 45 milhões em direitos de TV pagos pela
Globo. A existência dessa "conta secreta", revelada pela imprensa
européia no último fim-de-semana, foi confirmada ontem pelo presidente
da Fifa, Joseph Blatter.
""A única coisa que eu sei é que é provável que os US$ 45
milhões ingressaram em uma conta que não corresponde à dos direitos de
TV da Copa do Mundo de 2002. Se essa for mesmo uma conta secreta,
nós vamos ter um processo jurídico", disse Blatter.
A Globo foi a primeira emissora no mundo a adquirir os
direitos de transmissão das Copas de 2002 e 2006. Em 1998, a
emissora acertou a compra dos direitos por US$ 383 milhões, valor
apurado pela Folha. Os US$ 45 milhões a que Joseph Blatter se refere
seriam uma parcela do desembolso.
""Infelizmente, nós apuramos que parte desse dinheiro foi
usado pela ISL para pagar alguma outra coisa. Isso não é totalmente
honesto", disse o presidente da Fifa.
(...)
O contrato entre a Globo e a ISL feito em 98 seguiu modelo de
negociação definido pela Fifa em 96, quando João Havelange presidia a
entidade - o brasileiro era amigo do alemão Horst Dassler, ex-dono da
Adidas que fundou a ISL.
Ontem, Blatter, sucessor e ex-secretário-geral de Havelange,
convocou coletiva de imprensa às pressas para explicar denúncias sobre a
"conta secreta" da ISL - o dinheiro, segundo a imprensa européia, seria
destinado para subornar dirigentes esportivos. Lennart Johansson,
presidente da Uefa que concorreu com Blatter à presidência da Fifa,
exigiu explicações sobre a crise.
"Eu não tenho nada a esconder. Nós não estamos em
crise. Nós vivemos uma situação diferente. Uma crise é quando você não
sabe o que fazer", disse Blatter.
A PARCERIA ENTRE A CBF E A TRAFFIC
A análise dos contratos de patrocínio e de cessão de direitos pela CBF
feitos com a intermediação da Traffic revelam a semelhança com o sistema FIFA-ISL.
O primeiro contrato mais amplo entre CBF e Traffic data de 1987, de exploração de
vendas para o Exterior de direitos dos jogos da seleção brasileira nas eliminatórias da
Copa do Mundo de 1990. E o contrato básico cujas cláusulas se mantêm até hoje,
apenas com mudanças, foi pactuado em 1990.
Após onze anos dessa íntima parceria a Traffic, que era uma empresa
modesta em 1989 saltou para o lugar de quinta maior empresa de marketing esportivo
no mundo, com um faturamento de 262 milhões dólares em 2000. Só com a CBF o
faturamento foi de 96 milhões de reais. O crescimento do ativo da Traffic assumiu
proporções gigantescas: de R$5.678 milhões em 1995, saltou para R$57.649 milhões
em 1999. Enquanto isso, a CBF teve prejuízos, espelhados por um passivo, que vai
sendo rolado há três anos, de R$25 milhões de reais, de acordo com o balanço de 2000.
O patrimônio pessoal de José Hawilla, oficialmente declarado à Receita
Federal, que era de 3,7 milhões de reais em 1995, passou a ser de 76 milhões de reais
em 1999. Esses números causaram espanto aos deputados da CPI:
“O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - É realmente assustador.
Porque, veja bem, senhor... É a pergunta que eu quero fazer: o senhor
enriqueceu muito em poucos anos. A que o senhor atribui isso?
O SR. JOSÉ HAWILLA - Ao trabalho. Eu posso garantir ao
senhor...
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – ... Porque, veja bem,
trabalhando com o futebol brasileiro, a Traffic e o senhor tiveram grande
sucesso financeiro na última década. A Traffic, por exemplo, acaba de
inaugurar uma sede muito boa, em local nobre de São Paulo. Enquanto
isso, o futebol brasileiro foi levado a uma crise financeira profunda. A
CBF tem elevado as dívidas, as federações regionais não têm nada, os
clubes, e principalmente os grandes clubes, estão falidos. Como podem os
empresários e intermediários como a Traffic terem tanto sucesso financeiro
ao mesmo tempo em que o futebol se encontra, o futebol brasileiro, se
encontra em crise tão profunda? Então, há uma contradição aí, há
alguma coisa que nós precisamos descobrir — Deputado Benito Gama, e
outros Deputados aqui também, Darcísio Perondi, José Lourenço. O Zé
Lourenço se assustou, por exemplo, não sei por quê, Zé Lourenço, nobre
Deputado José Lourenço, com os 262 milhões. Ele achou um número
assim espantoso. A pergunta é esta: nosso futebol numa crise sem fim,
federações quebradas, clubes quebrados e empresários e empresas como a
Traffic, multimilionárias. Quer dizer, há um enriquecimento de alguns,
né, alguns poucos, certo? Inclusive, tem a situação da Hicks Muse,
também, com a ISL — a informação que nós temos é que a ISL está
quebrada. Mas não quero entrar nisso agora, não quero entrar nisso
agora. Eu gostaria que V.S.a. me respondesse a respeito disto: uma crise
tão profunda no nosso futebol, quebradeira, e a Traffic tão bem. Gostaria
que tecesse comentário.
Em resposta, José Hawilla argumentou que seus negócios são no
Exterior, que apenas 1,3 por cento deles acontecem no Brasil.
O SR. JOSÉ HAWILLA - O único equívoco que V.Ex.a. fez é
quando o senhor se refere ao futebol brasileiro. Quando disse aqui no
início, Deputado, a Traffic tem muito pouco trabalho no futebol
brasileiro. Nós fomos inquiridos nesta CPI por causa do contrato que
nós temos com a CBF. O Deputado Enrico Miranda, que é Presidente
de clube, sabe muito bem disso. O trabalho da Traffic é internacional.
Nós temos empresas que trabalham no futebol fora do Brasil. No Brasil
nós não temos nenhum direito em nenhum campeonato de nenhum clube,
de nenhuma seleção estadual. O único contrato que nós temos, Deputado,
é com a CBF. O contrato da CBF com a Nike, para nós, no nosso
faturamento, representa 1,37% do nosso faturamento — 1,37% do
faturamento. Este, este é o dinheiro que nós ganhamos com os negócios
com a CBF e com a Nike. Noventa e oito por cento e meio, um pouco
mais, vem de faturamento de fora do Brasil, de campeonatos, de torneios,
de eventos, de ações, de merchandising e de marketing.”
José Hawilla foi contestado pelo Deputado Eurico Miranda:
“O SR. DEPUTADO EURICO MIRANDA - Eu só quero
colocar, sem entrar, sem entrar no mérito, porque eu vou deixar pra
minha oportunidade, dizer o seguinte: o contrato com a CBF sem dúvida
nenhuma permitiu que a Traffic fizesse todos esses contratos
internacionais.
O SR. JOSÉ HAWILLA - É verdade.
O SR. DEPUTADO EURICO MIRANDA - Isso eu vou chegar.
Então, há uma coisa, hoje corresponde a pouco, pode ser pouco o
faturamento, mas foi o que alavancou.
O SR. JOSÉ HAWILLA - Exato, eu falei isso no começo, eu falei
isso, que institucionalmente...
O SR. DEPUTADO EURICO MIRANDA - Sim, mas eu só
queria colocar que, em termos de valores, quando o Deputado estava
perguntando, há uma conexão com a CBF, porque a CBF é que
permitiu, o contrato com a CBF é que permitiu esse, essa alavancagem.
O SR. JOSÉ HAWILLA - Me permite, Deputado. O Deputado
Pedro Celso está dizendo, a pergunta dele se refere que os clubes estão
pobres, que a CBF está pobre, que a federação está pobre, que o futebol
brasileiro está pobre e nós ficamos ricos. Então, eu estou respondendo
diretamente à pergunta formulada por ele nesta direção. Nós não ficamos,
não ficamos, não somos ricos, nem nossa empresa é rica. Nossa empresa
trabalha como outra qualquer, só que nós tivemos — é desagradável
falar —, mas, um relativo sucesso fora do Brasil. Não é no Brasil. No
Brasil nós geramos recursos pra CBF.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Eu não contesto isso.
V.S.a. teve uma atitude correta, acertou quando fez o contrato com a
CBF. E nós é que imaginamos, acho que foi o que o Deputado Enrico
Miranda colocou aí, e que eu também imagino, que a partir do contrato
da CBF é que as portas de outras confederações pelo mundo afora se
abriram.”
E acabou confessando que o sucesso da Traffic foi feito em cima do
prestígio da seleção brasileira, portanto, enriquecendo, sim, enquanto o nosso futebol
mergulhava em crise.
“O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – Naquele período, a
sua empresa já era uma empresa já com alguma tradição no mercado? O
senhor já tinha alguma...?
O SR. JOSÉ HAWILLA – Não. Eu confesso que o contrato com a
CBF, depois mais amplo, ele foi muito importante pra nossa empresa
internacionalmente. Embora financeiramente não tenha sido um bom
contrato, um ótimo contrato pra nós, ele institucionalmente foi muito
importante, porque a Seleção Brasileira, todos nós sabemos, é famosa no
mundo inteiro. É o melhor futebol do mundo, é a que tem mais tradição
no mundo inteiro. Então, pra nós, institucionalmente, era muito
importante ser a empresa de marketing da CBF. Pra fora do Brasil,
isso, pra nós, tinha um valor muito grande e representou muita coisa,
embora, repito, não seja... não tenha sido significativa a parte econômica e
financeira.”
OS PRIMEIROS CONTRATOS CBF-TRAFFIC
O contrato-base entre a CBF e a Traffic se deu em 1990, pouco depois
de Ricardo Teixeira assumir a presidência da entidade. Depois, foram sendo feitos
outros contratos, como de publicidade estática, com a Pepsi. E o contrato com a
Topper.
A parceria inicial foi sendo ampliada. Em 21/10/1994, a CBF vendeu à
Traffic “em caráter de exclusividade”, os seguintes direitos: utilização para fins
publicitários e promocionais da marca CBF e da imagem da seleção brasileira de
futebol, como um todo, resguardando os direitos individuais de seus integrantes e
restrições constantes do contratos firmados entre CBF/UMBRO e CBF-Coca-Cola, os
quais declaram conhecer e se obrigam a respeitar.
1. Painéis publicitários, em sua totalidade, nos campos dos jogos, em
todas as partidas da Seleção Brasileira, amistosos ou oficiais, realizados no Brasil,
obrigando-se a CBF a entregar os estádios inteiramente livres de publicidade...
2. Direitos mundiais de transmissão por televisão, à exceção do Brasil e
do país a que pertencer o adversário da Seleção Brasileira, em todos os jogos e treinos,
realizados em território brasileiro.
3. Prazo de validade do contrato, quatro anos – 1/1/95 a 31/12/98 -Valor: a Traffic comprometeu-se a pagar à CBF R$1 milhão de reais em oito parcelas
de R$125 mil reais, em fevereiro e agosto de cada ano.
Portanto, um milhão de reais em quatro anos. Por quais valores a Traffic
terá negociado esses direitos? Somente o item 1.3 – direitos mundiais de transmissão
de TV dos jogos da seleção brasileira por quatro anos – deverá ter rendido à Traffic
muitos milhões. Esse é mais um exemplo da administração ruinosa da CBF. E tem
mais:
PRORROGAÇÃO DO CONTRATO ATÉ ELIMINATÓRIAS DE 2002.
O contrato acima referido foi prorrogado em 1/12/98 para valer até
2002, ampliado e modificado:
A Traffic passou a ter os seguintes direitos:
Direitos mundiais à exceção do território brasileiro, de transmissão por
televisão aberta ou fechada, em quaisquer sistemas existentes, ou que venham a existir
no futuro, dos nove jogos da Seleção Brasileira de Futebol a serem realizados no Brasil,
válidas pelas eliminatórias sul-americanas à Copa do Mundo de 2002, a ser realizada na
Coréia e Japão.
Direitos exclusivos de publicidade estáticas nos estádios.
Direitos exclusivos de comercialização das transmissões por Pay per view
para as cidades onde se realizem os jogos referidos...
Por esses direitos a Traffic está pagando à CBF, em reais, a importância
de US$ 4,5 milhões, sendo US$ 1 milhão na data da assinatura e o restante em parcelas
semestrais até 20/07/2001 (1 milhão em 1999; 1 milhão em 2000 e 1 milhão e 500 mil
em 2001.)
CONTRATO DE INTERMEDIAÇÃO, AGENCIAMENTO E OUTRAS
AVENÇAS
Em 09/03/1995 a CBF e a Traffic firmaram mais um contrato, de
intermediação, dando à empresa amplos direitos para negociação. Foi esse pacto que
abriu caminho para o rompimento do contrato com a UMBRO e para fazer o negócio
com a NIKE. Seus termos:
“ A CBF...
(...) considerando que para viabilizar e otimizar negócios
referentes a patrocínio e licenciamento o melhor caminho é se valer de
serviços de empresas especializadas na área de marketing, com amplo
conhecimento e experiência no segmento esportivo, afeto à CBF.
Considerando que a Traffic, empresa responsável pela criação
de patrocínio da Seleção Brasileira de Futebol, é uma das mais atuantes
do mercado, tanto no Brasil como em nível mundial.
5. Considerando que os excelentes serviços prestados pela
Traffic à CBF a recomendam para promoção, agenciamento e
intermediação de eventos esportivos e novos negócios, têm as partes justo e
contratado o presente ajuste (...) seguintes cláusulas e condições:
1ª. A CBF contrata a Traffic para atuar na intermediação ,
agenciamento e operação de novo negócio de patrocínio e fornecimento de
material esportivo, objetivando maximizar a receita da contratante neste
segmento.
2ª A Traffic está autorizada a iniciar gestões junto a empresas
do setor, inclusive a atual contratante da CBF, que deverá
prioritariamente consultar a respeito.
5ª Pela efetiva concretização do negócio (...) a CBF lhe pagará
a remuneração de 5% sobre o montante ...”
Conforme depoimento de José Hawilla a esta CPI, após a vitória do
Brasil na Copa de 1994, a imagem da seleção brasileira ficou mais valorizada, criando
possibilidades de novos negócios. Farejando melhores negócios a Traffic fechou esse
novo contrato com a CBF, que lhe deu poderes para negociar e intermediar o contrato
com a Nike.
Concretizado o negócio com a NIKE, a Traffic passou a receber 5% dos
US$ 16 milhões de dólares anuais recebidos pela CBF = US$ 800 mil dólares por ano
durante dez anos, total: US$ 8 milhões de dólares.
Um aspecto do negócio ficou obscuro porque envolveu prejuízos para a
CBF. Para aceitar o rompimento do contrato, a UMBRO, que era a anterior detentora
do direito de uso da imagem da seleção brasileira, e que até então havia pago US$ 3
milhões de dólares à CBF, exigiu uma multa de nada menos que US$ 10 milhões de
dólares. Pôde fazer essa exigência porque – pasmem! – no contrato CBF-UMBRO,
intermediado pela Traffic, não havia cláusula de previsão de rompimento do contrato,
nem fixação de multa. Foi uma imprevidência da CBF e da Traffic, a empresa que
intermediou os contratos. Resultado: os primeiros US$ 10 milhões do contrato foram
destinados a pagar a multa cobrada pela UMBRO, repassados diretamente pela NIKE.
Grande negócio para a UMBRO, que investiu US$3 milhões, usou por vários anos a
imagem da seleção brasileira, e ainda recebeu US$10 milhões de indenização.
E, pior ainda: a Receita identificou que os US$ 10 milhões pagos pela
Nike diretamente à UMBRO fariam parte, também, da receita da CBF, além de
diversos outros valores. Com isso, a Receita Federal autuou a CBF por sonegação fiscal,
devido à omissão de faturamento.
O Termo de Verificação e Constatação Fiscal da Receita FM 199901.756-4 (Anexos 3 pastas fiscal 1 e 2, bancárias 1 a 40) estabeleceu que:
“Portanto, o valor total da Remuneração prevista na Cláusula
11 do Contrato entre a CBF e a NIKE foi de US$ 170.000.000,00
(e não apenas os US$ 160.000.000,00 previstos na cláusula 11.1), o
que significa que os US$ 10.000.000,00 deveriam ter sido
contabilizados com Receita Operacional nas datas acima previstas.”
Diante disso, mais um prejuízo deverá ser atribuído às costas largas da
CBF, com relação aos contratos UMBRO e Nike: o valor referente à autuação pela
Receita Federal..
CONTRATOS CBF/TRAFFIC-COCA COLA
Em 21/10/1994, Traffic intermediou o contrato CBF-Coca Cola, com
prazo de quatro anos, valor de US$8 milhões de dólares, sendo US$2 milhões por ano,
de 95 a 98. Mais um prêmio para a Copa de 98 (1 milhão se o Brasil fosse campeão,
US$800 mil, se fosse vice, o que acabou acontecendo).
Entre as cláusulas, a 4ª , a CBF se obriga a realizar dez jogos da Seleção
Brasileira por ano, abertos ao público, amistosos ou oficiais.
A remuneração: a Traffic emite as faturas contra a Coca Cola. Dos
valores recebidos repassa 80 por cento para a CBF e retém 20% como remuneração
por seu trabalho. Por sua vez, a Klefer Produções, de Kleber Leite, que participou das
negociações, recebe 20% da parte da Traffic.
RENOVAÇÃO DO CONTRATO COM A COCA COLA
Em 08/01/1997,
o contrato foi prorrogado de 01/01/1997 a
31/12/2002, substituindo o contrato de 1994. Por um novo valor: R$30 milhões de
reais. Pagos em parcelas anuais:
1997 – 4.0 milhões de reais
1998 – 5.5 milhões
1999 – 5.5 milhões
2000 – 5.0 milhões
2001 – 5.0 milhões
2002 –5.0 milhões
A Traffic continuou recebendo sua comissão de 20%.
CONTRATO PARA AS ELIMINATÓRIAS DE 2006 E 2010
Mais um contrato foi firmado entre a CBF e a Traffic em 02/03/2000.,
pelo qual a CBF concede os direitos mundiais de transmissão por TV direta ou fechada
e Internet, dos jogos da Seleção Brasileira de Futebol, na condição de mandante nas
eliminatórias de 2006 e de 2010.
A vigência do contrato é até 2010. Preço e condições de pagamento:
Pelos direitos cedidos, a Traffic paga à CBF US$900 mil dólares na
assinatura do contrato.
Se o Brasil for mantido nas eliminatórias, a Traffic pagará à CBF o valor
total de US$16 milhões e 200 dólares.
02/03/2000 – 1.0 milhão de dólares
30/12/2000 – 1.1
30/07/2001 –1.2
30/07/2002 –1.2
30/07/2003 –1.2
30/07/2004 --1.2
30/07/2005 --3.3
30/07/2006—1.2
30/07/2007—1.2
30/07/2008—1.2
30/07/2009—1.2
30/07/2010—1.2
A INTERMEDIAÇÃO DA TRAFFIC
Para justificar a necessidade de sua empresa como intermediária nos
negócios da CBF, em seu depoimento à CPI, J. Hawilla alegou que a Traffic “batalha
os clientes” para trazê-los para a CBF.
Mas uma marca com o renome da CBF, da seleção brasileira de futebol,
não precisa de intermediação. O que aconteceria se a CBF anunciasse no mercado que
está vendendo os direitos de imagem da seleção e abrisse uma concorrência para quem
desse o melhor preço? Será que não apareciam propostas? Isso já foi feito com sucesso
por Giulite Coutinho quando foi presidente da CBF (ele antecedeu Ricardo Teixeira).
No contrato com a Coca Cola a Traffic ficava com 20% do total a título
de comissão. Nos contratos de cessão de direitos exclusivos para a CBF comercializar
as imagens dos jogos da seleção brasileira (eliminatórias da Copa de 2002, 2006, 2010)
em todo o mundo, exceto no Brasil (aqui os direitos são negociados com a TV Globo),
a CBF recebe importâncias muito inferiores àquelas recebidas pela Traffic ao
comercializar essas imagens com o Exterior. Prejuízo para a CBF. Grandes lucros para
a Traffic. E também para a TV Globo, que faz a mesma coisa, compra os direitos da
CBF e os revende para anunciantes em território nacional por valores muito superiores
aos que paga à CBF.
A Traffic é parceira no contrato da CBF-Nike e recebe uma comissão de
5% sobre o valor de 160 milhões de dólares em dez anos. Na época, sua intermediação
foi considerada imprescindível, como afirmou Ricardo Teixeira em seu depoimento à
CPI. Mas era mesmo necessária?
Em 2001 a CBF decidiu romper o contrato com a Coca Cola. A partir de
maio firmou um contrato com a AMBEV, no valor de 170 milhões de dólares. Antes, a
CBF havia tentado negociar com a Coca-Cola um reajuste de 100 por cento no
contrato. A multinacional não aceitou fazer o reajuste. Então, a CBF rompeu e fez o
contrato com a AMBEV.
De acordo com o jornal O Estado de S. Paulo de 29 de maio de 2001, “a
CBF ainda negocia com a Coca-Cola o pagamento dos R$30 milhões da multa
rescisória”. Se pagar multa nesse valor, mais uma vez a CBF estará sofendo prejuízos.
O contrato com a Coca-Cola tinha o valor de R$30 milhões por cinco anos, e o prazo
era 2002. Até o ano passado a CBF havia recebido R$20 milhões, menos R$4 milhões
correspondentes aos 20% da comissão da Traffic, portanto, R$16 milhões. Se a CocaCola receber agora R$30 milhões de indenização, além de haver usado por três anos a
marca da CBF em sua propaganda, terá feito um grande negócio. Nesse caso, a CBF irá
devolver em dobro o que recebeu. Fazer contratos com a CBF é um negócio muito
bom, mas para os outros. Veja-se o exemplo da UMBRO, e agora, da Coca-Cola. E a
Traffic, receberá seus 20% sobre o valor da multa?
Em seu depoimento à CPI José Hawilla falou sobre a rescisão com a
Coca-Cola, assegurou que não haveria multa e que também não iria cobrar sua
comissão na multa. Deu também opinião sobre o fato de a Traffic ter ficado de fora:
“SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – E a Coca-Cola, apesar
de ter sido solicitada essa revisão, ela não aceitou fazer a revisão do
contrato?
SR. JOSÉ HAWILLA – Ela negociou, negociou com a gente e até
um determinado limite, mas o Presidente da CBF preferiu atender a
outra empresa, que o procurou diretamente.
SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – E o senhor não participou
dessa negociação com a AMBEV?
SR. JOSÉ HAWILLA – Não, não participamos.
SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – A Coca-Cola está
disposta a rescindir esse contrato?
SR. JOSÉ HAWILLA – Em princípio, a informação que temos é de
que ela aceitou a rescisão.
SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – E o senhor vai participar
dos valores dessa rescisão?
SR. JOSÉ HAWILLA – Em que sentido?
SR. EPUTADO SILVIO TORRES – O senhor, como tem uma
percentagem do contrato, o senhor vai ter também uma percentagem do
valor da rescisão.
SR. JOSÉ HAWILLA – Não, não. Não acredito que tenha
penalidade, que tenha multa pra pagar. Não acredito.
O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – Mas o contrato, ele
segue o mesmo padrão do contrato da Umbro, que foi rescindida por
acordo, porque foi rescindido antes do término do contrato. Da mesma
forma, a Coca-Cola. O contrato da Coca-Cola vai vencer em dezembro
de 2002.
R. JOSÉ HAWILLA – Eu não acredito que tenha alguma
penalidade pra pagar. Não acredito. Não acredito que a Coca-Cola vai
exigir isso da CBF. Penso que não vai exigir.
SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – O senhor acha que ela vai
abrir mão do direito dela de exigir? O senhor vai abrir mão do seu
direito?
SR. JOSÉ HAWILLA – Devo abrir mão.
SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – Mesmo não participando
do próximo contrato?
SR. JOSÉ HAWILLA – Mesmo não participando(...)
SR. JOSÉ HAWILLA – ... eu queria dar uma explicação. Nem a
Coca-Cola, nem a CBF, nem a AMBEV vão conseguir fazer este
trabalho de entrega sem uma empresa que possa operacionalizar esse
contrato. A CBF não tem a menor condição de fazer isso. E a
AMBEV, ou ela vai contratar uma empresa, que pode ser a Traffic, ou
ela vai contratar uma outra empresa, ou ela vai montar, dentro, um
departamento seu pra atender esse contrato, porque isso não é uma
intermediação comum de venda de um terreno ou de venda de um
apartamento, de uma casa, onde você recebe a comissão e terminou a sua
participação. Nós não recebemos a comissão só pela venda ou só pela
intermediação. Nós temos que operacionalizar esse contrato. Isto é
complicado. Exige especialização, exige conhecimento. Então, eu acredito,
eu acredito que a AMBEV terá que contratar uma empresa pra fazer a
operação desse contrato.
(...)
DEPUTADO SILVIO TORRES – O senhor acha que,
diferentemente do que ocorreu em todo o tempo anterior, agora seria
estabelecido uma concorrência pra... A CBF estabeleceria uma
concorrência pra esse tipo de contrato, de operacionalização dos seus
contratos?
SR. JOSÉ HAWILLA – Veja, eu não posso responder pela CBF,
mas eu acho injusto isso com a nossa empresa, porque a nossa empresa é
que foi a geradora de todos os recursos que a CBF recebeu até hoje. De
todo esse montante de dinheiro que a CBF recebe, fomos nós que criamos,
nós que inventamos, nós que saímos no mercado pra buscar, nós que
corremos riscos, nós que trabalhamos. Esse contrato da Coca-Cola, esse
contrato da Nike, sempre tem uma equipe nossa trabalhando nisso.
Todos os dias do ano. Todos os jogos do ano. Em todas as partes do
mundo, nós temos cinco, seis pessoas trabalhando pra entregar esse
contrato. Isso não é uma coisa absolutamente simples de compra e venda,
como eu disse pro senhor agora. Entende? Eu não acho... Eu não sei o
que é que está na cabeça da CBF e qual é o procedimento que ela vai
fazer, mas eu não acho justo isso, neste momento. Todas as empresas que
atendem às seleções do mundo inteiro têm uma reciprocidade de fidelidade
no atendimento. Não é pra todo o ano se fazer uma licitação, porque vem
uma empresa que não conhece o mercado, vem uma empresa que não
conhece a estrutura da CBF, a estrutura...
SR. JOSÉ HAWILLA – Só que isto depende de um acordo. Então,
a AMBEV pode chegar pra CBF agora e dizer o seguinte: “Tá bom ,
eu te pago 170 milhões de dólares, mas você me entrega o produto
pronto”. A CBF vai ter que contratar uma empresa pra fazer esse
serviço. Ela não tem competência pra fazer isso. Não é do objetivo dela
fazer isso. (...) Depois, eu entendo, depois do acordo feito com a CBF, se
ela, AMBEV, disser “eu assumo a responsabilidade da
operacionalização do contrato”, ela só tem duas alternativas: ou
contrata uma empresa especializada ou monta uma empresa, dentro do
departamento dela, da AMBEV.
O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – Sr. J. Hawilla, o
senhor foi contatado, ou foi sondado pela CBF pra esse fim?
O SR. JOSÉ HAWILLA – Não, porque eu imagino — repito pra
V.Ex.a. —, eu acredito que a AMBEV é que vai ficar com essa
responsabilidade. Eu acredito e espero que nós venhamos a ser procurados
pela AMBEV.”
Afinal, a intermediação é mesmo necessária? Em 1995, a CBF
considerava a intermediação fundamental, como consta da introdução do seu contrato
de agenciamento e intermediação com a Traffic:
(...) considerando que para viabilizar e otimizar negócios
referentes a patrocínio e licenciamento o melhor caminho é se valer de
serviços de empresas especializadas na área de marketing, com amplo
conhecimento e experiência no segmento esportivo, afeto à CBF...
A novidade é que no contrato com a AMBEV, realizado em 2001, as
CPIs em plena atividade, e a opinião pública atenta, a CBF não utilizou a
intermediação da Traffic. A intermediação deixou de ser necessária. José Hawilla
mostra seu ressentimento. Qual é a explicação da CBF?
CAPÍTULO VI – ADMINISTRAÇÃO DA CBF ACUMULA PREJUÍZOS
Como resultado da quebra de sigilo bancário e fiscal da CBF, a CPI pôde
fazer uma análise de suas contas de 1995 a 2000. Dessa investigação resultou a
conclusão de que a CBF vem sendo administrada de forma errada. Em que pese a
arrecadação anual da entidade ter quadruplicado no período devido ao patrocínio
empresarial, suas despesas mais que quadruplicaram e a CBF chegou ao final de 2000
com um passivo circulante de R$ 55 milhões de reais. E um passivo a descoberto, quer
dizer, prejuízo acumulado, de quase R$25 milhões. Técnicos de contabilidade avaliam
que, se fosse uma empresa, a CBF estaria insolvente no final do exercício de 2000.
(Documentação de referência: CBF -- Anexo 03 – Sigilo Fiscal – pastas 1F e 2F; Sigilo
Bancário, pastas 1B a 42B)
Além disso, a CBF tem sobrevivido, durante os últimos três anos,
usando o subterfúgio de buscar
adiantamentos de patrocínios. Assim, está
comprometendo seriamente sua estrutura operacional para os anos seguintes. A CBF
chegou ao ponto de recorrer a empréstimos tomados junto a instituições financeiras
externas, como o Delta National Bank, agravando ainda mais seus problemas estruturais.
Esses empréstimos, que serão tratados em capítulo à parte devido ao
prejuízo que vêm trazendo à CBF, representam a mais significativa parcela do
endividamento da entidade. Foram pagos, entre juros, multas e desvalorização cambial,
cerca de US$ 11 milhões de dólares (atenção: dólares!), em menos de dois anos e meio.
Os juros desses empréstimos extrapolaram, e muito, as taxas de mercado.
Enquanto o mercado praticava taxas de juros em torno de 10% ao ano, em dólares, a
CBF contratou empréstimos a 52% ao ano, também em dólares.
Esses endividamentos colocaram a CBF em uma posição delicada.
Apesar de receber volumosos recursos, principalmente externos, a CBF se encontra
bastante deficitária. Por que um empréstimo comprometedor uma semana antes de
receber US$ 15 milhões da Nike? E pagá-lo, já após a aguardada liberação do dólar, em
vez de usar o dinheiro recebido da Nike?
O presidente da CBF, questionado pelo Deputado Jurandil Juarez sobre
seus negócios pessoais relativos ao mercado de capitais, em seu depoimento à CPI,
afirmou que durante todo o ano de 1998 já se aguardava a desvalorização do Real:
“O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Eu volto a
dizer que não necessariamente alguém ganha e outro perde. Eu vou dar
um exemplo de uma operação que o senhor considerou uma operação de
um grande número. Desde o ano de 98, Excelência, que se falava no
Brasil que iria haver uma desvalorização cambial. Se o senhor
acompanhasse, se o senhor acompanhou o mercado de 98 do dólar, desde
98, final do ano, que começou a haver uma mutação do dólar. Qualquer
pessoa que estivesse no mercado e acreditasse nas informações da queda
do, na época, Presidente do Banco Central Gustavo Franco, tinha certeza
absoluta que no momento que o Presidente do Banco Central, Gustavo
Franco, saísse do Banco Central, imediatamente haveria um
descolamento do dólar de valores bastante depreciados. Essa operação eu
fiz exatamente porque eu tinha certeza absoluta que com os boatos que já
se faziam da queda do Gustavo Franco, eu posso lhe enviar depois essa
documentação de jornais da época, e exatamente essa grande operação foi
em dólar. Essa operação foi compra de dólar futuro.” (g.n.)
Infelizmente, os interesses da CBF não foram beneficiados pelos
conhecimentos de Ricardo Teixeira sobre o mercado financeiro. Vê-se, sem dúvida
alguma, que houve desídia na contratação dos US$ 4,5 milhões junto ao Delta Bank, a
juros de 32% ao ano, alguns dias antes da desvalorização do real. Esse dinheiro entrou
no caixa da CBF no dia 30 de dezembro de 1998, já reduzido em quase US$ 1 milhão,
devido ao pagamento dos juros adiantados! Em 5 de janeiro de 1999, a CBF viria a
receber US$ 15 milhões da Nike.
RECEITAS AUMENTARAM , DESPESAS MUITO M AIS AINDA
As principais receitas da CBF quadruplicaram em quatro anos. Saltaram
de R$18 milhões 286 mil reais em 1997 para R$79 milhões 352 mil reais em 2000.
Fruto principalmente dos contratos de patrocínio e dos direitos de transmissão.
TABELA 1
Exercício
Receitas
Taxas Diver
Fut.Profis.
1997
1.982.968,00
3.599.898,00
1998
2.010.118,00
1999
2000
Dir. Trans.
3.358.962,00
Patrocínios
Total
9.344.615,00
18.286.443,00
7.306.264,00 2.301.218,00
15.659.845,00
27.277.445,00
2.661.726,00
7.233.958,00
26.306.307,00
32.228.734,00
68.430.725,00
2.594.099,00
4.504.303,00
15.699.950,00
56.553.660,00
79.352.012,00
Fonte: Relatório de Análise 01/2001, do Conselho Federal de Contabilidade
Comparativo das Principais Receitas
80.000.000,00
70.000.000,00
60.000.000,00
50.000.000,00
40.000.000,00
30.000.000,00
20.000.000,00
10.000.000,00
Total
Taxas Diver
Fut.Profis.
Dir. Trans.
Patrocínios
Total
No mesmo período, as principais despesas da CBF também
quadruplicaram. Passaram de 26 milhões 924 mil reais em 1997 para 86 milhões 700 mil
reais em 2000. Nos quatros anos os prejuízos acumulados superaram 55 milhões de
reais.
TABELA 2
Exercício
Despesas
Pessoal
Enc. Serviços
Fut. Amador
Fut. Profission
Outras/Totais
1997
4.846.690,00
6.166.886,00
2.410.008,00
11.010.427,00
26.924.219,00
1998
5.883.079,00
14.337.097,00
1.881.648,00
17.711.958,00
43.383.327,00
1999
14.784.219,00
34.029.886,00
4.316.601,00
12.394.165,00
69.552.183,00
36.197.848,00
9.518.038,00
20.410.305,00
86.700.009,00
2000
17.883.987,00
Comparativo dos Principais Grupos de Despesa e Total
90.000.000,00
80.000.000,00
70.000.000,00
60.000.000,00
50.000.000,00
40.000.000,00
30.000.000,00
20.000.000,00
10.000.000,00
-
Pessoal
1997
1998
Enc. Serviços
Fut. Amador
1999
Fut. Profission
2000
Outras/Totais
DESPESAS COM PESSOAL AUMENTARAM 400 POR CENTO
Chama a atenção que as despesas que mais aumentaram foram as com
Pessoal, que cresceram 400 por cento em quatro anos, e as despesas com Encargos e
Serviços, que aumentaram seiscentos por cento. Ao mesmo tempo, as despesas com
futebol profissional aumentaram cerca de 90 por cento, no mesmo período.
Comentário do Relatório do Conselho Federal de Contabilidade: “É
como se a CBF tivesse perdido o rumo”. Enquanto se instalava uma farta distribuição
de dinheiro em gratificações, doações, salários, juros e encargos de dívidas, e “outras”
despesas, a atividade-fim, -- o futebol profissional e o amador – teve sua participação
diminuída no conjunto das despesas.
A Tabela 3 mostra que o item Despesa com Pessoal/Encargos ampliou
sua participação de 45% em 1997 para 64% em 2000, tendo chegado a 74,5% em
1999. A atividade-fim, o futebol, teve sua participação reduzida de 54,9% em 1997 Para
35,6% em 2000.
TABELA 3
ANO
1997
1998
1999
2000
TOTAL
EVOLUÇÃO DESP. PES. + ENCAR. X FUT.AMAD. PROFIS. EM R$ 1,00
PESSOAL + ENCARGOS
FUTEBOL AMAD/PROFIS
TOTAL DESPESAS
VALOR
%
VALOR
%
VALOR
%
11.013.576
45,07
13.420.435
54,93
24.434.011
100,00
20.220.176
50,79
19.593.606
49,21
39.813.782
100,00
48.814.105
74,50
16.710.766
25,50
65.524.871
100,00
54.081.835
64,38
29.928.343
35,62
84.010.178
100,00
134.129.692
63,04
78.653.150
36,96
212.782.842 100,00
Fonte: Relatório de Análise 01/2001, do Conselho Federal de Contabilidade
REMUNERAÇÃO DA DIRETORIA
A remuneração da diretoria, que passou a ser paga a partir de 1998, deu
saltos espetaculares. A Tabela 4 mostra a evolução dessas despesas. Os onze diretores
receberam 1 milhão de reais em 98 e 3 milhões e cem mil em 2000, mais de 300 por
cento de aumento, rendimentos de dar inveja aos mais bem pagos executivos de
multinacional. Ricardo Teixeira recebeu 126 mil reais em 98 e 418 mil reais em 2000.
Atualmente, sua remuneração mensal é de 35 mil reais. Mais notável é a situação de
seu tio, Marco Antônio Teixeira, secretário geral da entidade, que recebeu 387 mil reais
em 98 e 507 mil reais em 2000. Com vínculo empregatício estabelecido a partir de
julho de 99, o salário mensal de Marco Antônio é de 37 mil reais.
E todos ainda recebem 13º e 14º salários. Com que justificativa? Afora
Marco Antônio Teixeira, que tem vínculo empregatício, os outros diretores não são
assalariados da CBF. Acrescente-se a esse capítulo alguns “enganos” indesculpáveis,
como o do adiantamento do 13º e 14º salários de José Carlos Salim em 1999, que não
foi descontado de sua remuneração no final daquele ano. Quem se preocupa com tais
detalhes, se o dinheiro jorra por todos os lados?
TABELA 4
REMUNERAÇÃO DE DIRETORIA EM R$ 1.000,00
DIRETOR
Ricardo Terra Teixeira/Presidente
Alfredo Alberto L. Nunes/Vice
Carlos Eugênio Lopes/Jurídico
José Carlos Salim/Marketing
Luiz Gustavo V. Castro /Registro
Melchiades Mariano/Patrimônio
Gilberto M. Coelho/Finanças
Antônio O. R.L. Costa/Financeiro
Vandenbergue Santos/Institucion.
Luiz M. E.Oliveira/Cat. Especial
Marco Antônio Teixeira/Secretár.
TOTAIS
RETIR
1998
126,9
1
96,6
122,6
122,6
122,6
102,4
3
57,6
00,0
00,0
00,0
5
387,6
1.046,5
RETIR
1999
405,7
1
349,1
310,5
2
317,5
300,5
269,2
00,0
00,0
4
91,4
00,0
5
431,9
2.475,8
RETIR
2000
418,3
308,8
311,1
328,7
308,4
299,8
00,0
283,8
279,1
62,8
5
507,4
3.108,2
RETIRADA
ATUAL
35,1
23,1
23,2
23,2
23,2
23,2
00,0
23,2
23,2
6,7
37,3
241,5
(*) Remuneração da diretoria iniciou a partir de set/98, inclusive.
1 – incluso valor recebido em dez/98 e jan/99 por exercício da Presidência.
2 – Concedido em jul/99 adiant. 13 e 14o sem o respectivo desconto em dez/99
3 – Permanência de set a out/99 apenas.
4 – Início em set/99
5 – Remuneração desde jan/98. Após jul/99 estabeleceu-se vínculo empregatício.
Fonte: Relatório de Análise 01/2001, do Conselho Federal de Contabilidade
Quanto aos salários dos funcionários destaca-se a falta de critérios e a
disparidade. Enquanto um auxiliar de escritório recebe entre R$ 800 e R$ 1.200 por
mês, um assistente administrativo recebe entre R$ 2.400 e R$ 5.800. Enquanto o
Supervisor Geral, José Antônio de Almeida, recebe R$ 2.444 por mês, o Assessor de
Comunicação, o jornalista Carlos Leite Lemos da Cruz, recebe R$ 19 mil.
REMUNERAÇÃO DA DIRETORIA É ILEGAL
Conforme demonstramos cabalmente em outra parte deste relatório
(Capítulo V – A CBF é uma associação civil sem fins lucrativos), a adoção pela
CBF de remuneração de seus diretores é flagrantemente ilegal. Isto porque o artigo 13
do Estatuto da CBF estabelece que:
Art. 13 - Os membros dos poderes e órgãos não serão, de qualquer
forma, remunerados pelas funções que exercerem na CBF.
E o Estatuto não foi mudado pela a Assembléia Geral da CBF realizada
em 5 de janeiro de 1998. A ata registra que não houve mudança no Estatuto. E nem
poderia haver, já que aquela era uma Assembléia Geral de natureza administrativa, de
quorum limitado. E pelo artigo 19, parágrafo 3º. , somente a Assembléia Geral de
natureza eleitoral, de quorum mais amplo, tem poderes para alterar o Estatuto.
Como conseqüência, esta CPI recomenda medidas, inclusive judiciais
que promovam a devolução aos cofres da entidade da remuneração recebida
indevidamente pelos diretores e presidente.
DESPESAS COM JUROS E ENCARGOS EXPLODIRAM
Na Tabela 5 acompanha-se a evolução incontrolável dos juros e
encargos financeiros. De R$ 51 mil, em 1996, para R$ 11 milhões, em 2000. Saltou de
0,001% no primeiro ano para 12,48% no último, tendo chegado a 16% da receita total
em 1999. Nesse ano, a CBF pagou R$ 11,348 milhões de juros enquanto sua receita
total foi de R$ 70,62 milhões. Isso significa que as despesas com encargos financeiros
evoluíram assustadoramente em 3.078% no período em comparação com o incremento
de 209% nas Receitas, em termos reais.
Essa conta coincide com o período em que a CBF mais arrecadou
dinheiro, fruto do contrato CBF/NIKE, e também é o período em que a entidade mais
se endividou, apelando à série de seis empréstimos junto ao Delta Bank, tomados a
juros altíssimos e em condições duramente adversas aos interesses da CBF. (Ver
Capítulo VIII – Empréstimos no Exterior a juros extorsivos).
TABELA 5
EXERCÍCI0
ANÁLISE DOS VALORES
ENCARGOS
FINANCEIROS EM
R$ 1,00
RECEITA TOTAL
EM R$ 1,00
% S/RECEITA DO
EXERÇÍCIO
1996
51.473
27.112.312
0,001
1997
346.790
28.552.761
1,21
1998
2.841.877
28.245.589
10,06
1999
11.348.171
70.620.345
16,07%
2000
11.021.495
88.315.644
12,48%
Fonte: Relatório de Análise 01/2001, do Conselho Federal de Contabilidade
AUXÍLIOS A FEDERAÇÕES FILIADAS E A POLÍTICOS
Uma das maiores rubricas de despesas da CBF é a de “auxílios eventuais”.
Em 97 foi de R$ 1,637 milhão; em 98, registrou um salto de quase 400 por cento, para
R$ 5,138 milhões. Em 99, sob a rubrica de “auxílio a federações filiadas”, foram
registrados R$ 4,15 milhões. E, em 2000, sob o mesmo nome, R$ 7,199 milhões. Mas
em 2000 também reaparece a rubrica “auxílios eventuais”, com um valor de R$ 596,6
mil.
Segundo o depoimento de Ricardo Teixeira a esta CPI, além das doações
às federações, a CBF renunciou voluntariamente a várias taxas e contribuições devidas
pelas federações. Umas e outras, apresentadas como uma generosidade da CBF, têm
um significado real muito diverso. Criaram laços de dependência, subordinação e
cumplicidade das federações frente à entidade nacional. O que lhes tirou poder de
contestação nas votações na Assembléia Geral da CBF, de cujas decisões passaram a ser
meras subscritoras passivas. Em troca, a CBF não pede prestação de contas das
federações pelo uso que fazem das doações, generalizando-se os desvios das finalidades
e o uso dessas verbas em benefício pessoal dos dirigentes (Ver Capítulo X -Federações: Desagregação da Organização Confederativa).
Entre os beneficiários de vultosas doações aparecem também, em
período eleitoral, inúmeros candidatos a eleições parlamentares e majoritárias. O que
evidencia o plano dos dirigentes da CBF de estabelecer pontos de apoio no Parlamento
e em governos para fazer lobby das posições da CBF. (Ver Capítulo VIII – Doações
políticas. Criação de uma rede de influência política no Congresso).
A CBF COMPRA OURO NO EXTERIOR. POR QUÊ ?
A CBF efetuou transferências para o exterior no mercado flutuante, tipo
04, no período de novembro de 1995 a março de 2001, no valor de US$ 9.738.423,02 ,
sendo US$ 2.123.850,55 a título de Capital Brasileiro de Curto Prazo – Operações com
ouro, representando 21,81% das transferências no mercado flutuante – tipo 04.
Essas operações trazem informações incompletas, pois não indicam qual
o país de destino nem o nome do recebedor no exterior. Chama a atenção também o
fato de serem os únicos contratos da CBF, ao longo do período jan/1995 a mar/2001,
a serem realizados na moeda dólar-ouro.
Cabe portanto solicitar ao Banco que efetuou a operação (HSBC Bank
Brasil S.A, na época Banco Bamerindus) e a própria CBF, através de seus
representantes, informar qual o país de destino desses recursos, assim como o
recebedor no exterior.
Em seu depoimento à CPI, Ricardo Teixeira não soube explicar o
motivo dessas transferências em dólar-ouro. Posteriormente, em correspondência de 19
de abril último, informou apenas que “os saldos de conta corrente da CBF no Bamerindus eram
automaticamente aplicados sem risco, já que extratos anexos demonstram que as taxas anexas eram
prefixadas”. Continuou sem explicar os motivos de a CBF ter feito essas transferências
para o Exterior e para quem.
CBF FAZ TRANSFERÊNCIAS DE DINHEIRO EM FAVOR DA FIFA
No mesmo período, a CBF transferiu US$ 3.314.778,64, para a FIFA,
sendo que US$ 325.000,00 correspondem ao código natureza Serviços diversos - Passes
de Atletas Profissionais e US$ 2.989.778,64 a título de Serviços diversos - Remuneração
de participação em competições esportivas. As transferências para FIFA representam
34,04 % do total de transferências no período considerado.
Os valores envolvidos nestas transferências não condizem com o
próprio conteúdo do sítio da FIFA, na internet:
“De acordo com o seu estatuto a FIFA é uma organização sem
fins lucrativos, e assim as federações associadas devem pagar apenas uma
modesta anuidade, uma taxa de entrada para participar da copa do
mundo e um percentual mínimo das receitas com as seleções nacionais”.
O relatório financeiro da FIFA prossegue ainda:
“A Copa do Mundo é a vitrine da FIFA e atinge milhões –
até bilhões de fãs, gerando uma receita substancial para a entidade e para
a federação do país organizador através da venda de ingressos, direitos de
retransmissão, patrocínio, merchandising e outros. A maior parte dos
lucros é destinada aos países finalistas. Enquanto cada federação
associada tem assegurada uma doação de US$1 milhão de dólares para o
período de quatro anos, a FIFA retém apenas os fundos necessários à
manutenção de seus custos administrativos e de suas principais
atividades.”
Com relação ao período de envio dos recursos destinados à FIFA,
observa-se uma forte concentração no ano de 1999 quando foram realizadas 90,19%
das remessas, conforme tabela as seguir:
Ano
1996
1997
1999
2000
Total
US$
125.000,00
200.000,00
2.989.593,64
185,00
3.314.778,64
%
3,77
6,03
90,19
0,01
100,0
Fonte: Sisbacen – PCAM 130
A resposta de Ricardo Teixeira a esse questionamento foi dizer que se
tratava de “um encontro de contas” para compensar créditos e débitos entre as duas
entidades.
CBF AUTUADA PELA RECEITA FEDERAL: R$ 14,4 MILHÕES
O fato de a CBF não acompanhar, de modo adequado, a legislação
tributária brasileira, tem feito com que a entidade deixe de recolher tributos de acordo
com a lei. A isso adiciona-se o fato de que irregularidades nas áreas contábil e financeira
contribuíram para que a Receita Federal autuasse a CBF em mais de R$ 14 milhões.
A CBF foi autuada pela Receita Federal, em 2000, por irregularidades
diversas, dentre elas sonegação de imposto de renda, de COFINS, de CSLL, além de
omissão de receita e de fraude fiscal, com a criação de receitas, indevidamente (ver
Anexo 03/01, CBF - Sigilo Fiscal)
Pelo processo 15374.000839/00-03, encerrado em 30/3/2000, a CBF
está obrigada a pagar R$ 8.378.778,62 por omissão de receitas, glosa de custos de bens
e serviços. Pelo processo 15374.000840/00-84, a Confederação necessita recolher ao
caixa da Receita R$ 6.029.882,18, devido a falta de recolhimento da COFINS. A soma
total da autuação é, assim, de R$ 14.408.660,80.
Um caso claro de omissão de receitas envolve o recebimento de R$ 10
milhões referentes ao pagamento feito pela Nike à Umbro, em nome da CBF para
pagar a multa rescisória do contrato CBF/Umbro. Essa importância passou a fazer
parte do contrato CBF-Nike., como receita da CBF. Mas não foi declarada à Receita
Federal. E o Imposto de Renda relativo àquela importância também não foi pago.
Chama a atenção o fato de que o contrato CBF/Umbro não incluía
cláusula penal alguma, que é uma falha do trabalho de intermediação da Traffic, a qual
deveria ter sido responsabilizada pelo prejuízo causado à sua cliente. Essa cláusula foi
acordada depois, em conjunto com a Nike, e tudo se resolveu com a Nike adiantando o
dinheiro e a CBF arcando com o prejuízo.
Outra irregularidade verificada pela CPI, tanto quanto pela Receita, foi a
inclusão na contabilidade da CBF de uma despesa que não existiu. Trata-se de uma
pretensa despesa de cerca de R$ 629 mil que relativa a um adiantamento obtido junto à
Nike. A multinacional remeteu à CBF, em abril de 1997, US$ 5 milhões adiantando o
pagamento de janeiro de 1998. Como é de praxe, os dólares foram convertidos em reais
pela cotação do dia em que foram enviados à CBF. Em janeiro da 1998, o dólar valia
mais. A entidade contabilizou a diferença da cotação do dólar entre abril de 1997 e
janeiro de 1998, um valor de 629 mil reais, como despesa. A CBF alegou que havia
deixado de receber R$ 629 mil em função de ter recebido os US$ 5 milhões em abril de
1997 com a cotação de abril de 1997 e não com a cotação de janeiro de 1998!
É claro que o valor a receber pela CBF era de US$ 5 milhões, em
qualquer momento, e esse valor deveria ser contabilizado pela moeda nacional no
momento do recebimento. Grande equívoco ou esperteza para encobrir prejuízos?
Naturalmente, a Receita não vacilou em glosar essa falsa despesa.
A administração da CBF não tem tido o cuidado em garantir que a
entidade se mantenha a par de toda a legislação, atualizada e de acordo com a lei, em
todos os aspectos. O exemplo das doações a campanhas eleitorais é um outro exemplo,
a ser analisado, com detalhes, em capítulo a parte (Capítulo VIII, novamente).
CASO VEÍCULO VOLVO
A CBF adquiriu, em 10/5/1995, um veículo marca Volvo, importado,
completo com todos os acessórios disponíveis, teto solar, 2.300 CC, no valor de R$
68.199,00, eqüivalente, na época, a US$ 76.542,08, pela cotação do dólar flutuante do
dia (US$ 1 = R$ 0,891) comprado da Vocal Comércio de Veículos Ltda., nota fiscal
171.413 (Anexo Contrato CBF/Nike 37, segunda parte).
Pouco mais de um ano depois, em 10/7/1996, o próprio Ricardo
Teixeira adquiriu esse automóvel da CBF, pagando apenas R$ 49.000,00, ou melhor,
US$ 45.526,52 pela cotação do dia 10/7/1996 (US$ 1 = R$ 1,0104). O veículo foi
comprado por Teixeira com um desconto de cerca de 40% sobre o valor pago pela
CBF, pois a diferença entre o valor pago pela CBF e o pago pelo presidente da entidade
foi de US$ 31.015,56.
Na CBF, não há licitação, nem para compra, nem para a venda. Uma
parte do ativo permanente é vendido sem que qualquer providência administrativa
prévia seja tomada. O veículo foi vendido para o presidente da entidade, sem que
ninguém tivesse a oportunidade de oferecer mais, nem mesmo alguém externo à CBF.
O carro poderia ter sido oferecido no mercado e, nesse caso, a Confederação poderia
ter arrecadado bem mais do que obteve de Ricardo Teixeira. Tem sido, sempre,
evidenciado que a CBF não mantém em sua contabilidade os recibos adequados, fato
constatado pelos auditores do Conselho Federal de Contabilidade.
A COMPRA DE PRODUTOS DAS FAZENDAS
TEIXEIRA
DE PROPRIEDADE DE
RICARDO
A CBF adquire, sem licitação, leite e derivados das fazendas de Ricardo
Teixeira, em Piraí, RJ. Esse procedimento foi denunciado durante os trabalhos desta
Comissão, e foi noticiado pela imprensa.
Diante da repercussão negativa das denúncias feitas pela CPI, Ricardo
Teixeira devolveu cerca de R$ 28.200,00 ao caixa da CBF. Esse valor foi contabilizado
como sendo relativo ao fornecimento de leite e derivados durante o período 1995-2000.
PAGAMENTOS DA CBF A RESTAURANTES DE RICARDO TEIXEIRA
A CBF vem realizando festas, almoços e jantares, eventos, em
restaurantes de propriedade de Ricardo Teixeira, dentre eles, o El Turf Bar e
Restaurante e o City Port. Normalmente, os eventos patrocinados pela CBF sempre
vêm ocorrendo nesses locais. É verdade que os gastos com o El Turf, por exemplo,
caíram de cerca de R$ 50.000,00, em 1998, para zero, em 2000. Isso se deve, aos que
parece, à má repercussão que vinha tendo esse costume da CBF de realizar os eventos
nos restaurantes do presidente da entidade.
Num evento, em 7 de fevereiro de 1996, durante o lançamento do
Instituto de Assistência ao Futebol Brasileiro - IAFB, no restaurante El Turf, a CBF
gastou R$ 32.480 (trinta e dois mil, quatrocentos e oitenta reais). Para se ter uma breve
idéia, foram cobrados 1.300 litros de chope, 1.750 porções diversas (frango champanhe,
filé ao champinhon, dentre outras), além de 360 refrigerantes, 80 doses de Whisky 8
anos e 3 champanhas Dom Perignon (que custaram R$ 300,00 cada uma).
Ao que parece, foi uma festa para um público muito exigente.
Durante o seu depoimento na Câmara, em 10/4/2001, Ricardo Teixeira
procurou explicar como são esses negócios da CBF com o Restaurante El Turf:
“O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – O senhor
disse... . O senhor disse que o El Turf tem um movimento bastante
grande. No dia 5/5/98 o El Turf emitiu duas notas fiscais para a
CBF, as de nºs 768 e 769. Ótimo, pode ter tido dois eventos. Mas no
dia 4/9/98 a nota fiscal é a 770. Nesse período, não foi emitida nota
fiscal nenhuma?
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA – Excelência,
podem ser... Essa nota fiscal é de eventos. As outras notas fiscais... Hoje
em dia, no Rio de Janeiro, a maioria das empresas tem um caixa, por
exigência do ICM, eu não sei, em que você recebe... Eu não sei explicar.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Então, tá.
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA – O Deputado
sabe como é...
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Então, é a nota
fiscal de eventos. Então, eu acho que o El Turf está tendo poucos eventos,
só está tendo a CBF. A nota fiscal 768, 769, 770, 772, 780, 789,
quer dizer, o El Turf tem como única fonte de renda, pelo jeito, nos
eventos, a CBF.
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA – Excelência,
esse dado não é verdade. Quer dizer, não é...
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – É a Receita que
está nos fornecendo esse dado.
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA – A Receita...
Eu vou lhe enviar o faturamento do El Turf, que ele é bem superior a
isso. É mais de 200 mil reais por mês. Eu faço questão absoluta de lhe
enviar, porque eu não tenho esses dados, até porque não faziam parte da
documentação que eu trouxe, mas eu vou lhe enviar o faturamento anual
do El Turf a partir da sua criação até a data de hoje.” (g.n.)
Outro elemento de comparação é o City Port Restaurante Ltda., também
de propriedade de Ricardo Teixeira. Apenas como amostra, verificou-se que a CBF
pagou faturas desse restaurante em vinte e seis (26) vezes, apenas no ano de 1999. Já
em 2000, aconteceu o mesmo que com o El Turf: não houve eventos naquele
estabelecimento.
ADVOGADOS DE RICARDO TEIXEIRA PAGOS PELA CBF
Ricardo Teixeira, a pessoa física do presidente da CBF, pode estar
utilizando escritórios de advocacia remunerados pela Confederação para solucionar
suas pendências judiciais, conforme apurou esta CPI.
1. LEONARDO ORSINI DE CASTRO AMARANTE
Um dos exemplos é o do processo de Ricardo Teixeira contra Juca
Kfouri. Tanto para o agravo AG-131466 (Agravo de Instrumento) quanto para o
recurso especial RESP-138420, ajuizados no Superior Tribunal de Justiça (STJ), consta
o nome do mesmo advogado de Teixeira. Esses processos aconteceram durante o ano
de 1997.
O advogado de Teixeira era o dr. Leonardo Orsini de Castro Amarante,
conforme observado nas consultas realizadas no processo. Ocorre que o dr. Amarante
recebeu três pagamentos da CBF, e não de Ricardo Teixeira. Não constam cheques, ou
qualquer tipo de pagamento dele, pessoa física, para o advogado. Já a CBF, por meio de
três cheques no valor de R$ 16.315,00, datados de 27/8/97, 15/9/97 e 4/12/97,
realizou pagamento de cerca de R$ 50.000,00 ao dr. Amarante.
Além desse caso, o dr. Amarante foi advogado no processo 9500220261,
ajuizado na 6ª Vara da Justiça Federal do Rio de Janeiro, que tratou do problema de
Teixeira com o contrabando de equipamentos para uma choperia. Esse processo,
somente em 8/5/98 subiu para o Tribunal Regional Federal, da 2ª Região.
De 1998 a 2000 a CBF não pagou mais nada ao advogado Leonardo
Amarante. O que reforça a tese de uso da estrutura da CBF, por Ricardo Teixeira, para
solução de seus litígios perante a Justiça.
2. MÁRCIA PARENTE
Outro exemplo é o da advogada Márcia Parente, que defende Ricardo
Teixeira nos processos 95/00298821 (RESP-189066), no STJ, e no Habeas Corpus HC
001497, do Tribunal Regional Federal da 2a Região, processo esse ligado à ação por
sonegação de imposto de renda, pessoa física.
Ela não recebeu valores diretamente do senhor Ricardo Teixeira, fato
comprovado com base nos documentos enviados pelos bancos, após a quebra do seu
sigilo bancário. Já a CBF pagou a essa advogada a quantia de R$ 20.000,00, em
23/10/97, por meio do cheque 36.590, do Banco Real (Anexo 3/18).
Esse é mais um indício de que a CBF tenha arcado com os honorários
advocatícios em mais um processo envolvendo a pessoa física do senhor Ricardo
Teixeira. O argumento de que Teixeira representa a CBF não pode prosperar devido ao
fato de que ele, enquanto cidadão, pessoa física, é responsável por seus atos. Não pode
haver confusão entre a pessoa do presidente e a entidade.
3. JOSÉ MAURO COUTO DE ASSIS
O dr. Mauro Couto de Assis vem representando Teixeira em muitos
processos (RESP-189571, HC-11514, RESP-297898 e AG-385279, do STJ). E fica
clara a confusão entre a pessoa do presidente e a da entidade, a CBF. A CBF vem
fazendo pagamentos a Couto de Assis, já há tempos. De acordo com dados em poder
desta Comissão, a CBF pagou, em 8/5/97, R$ 20.000,00 a José Mauro Couto de Assis,
cheque número 34.702, do Banco Real, agência 003, da Av. Rio Branco (Anexo 3/11).
Já em 5/3/98, o escritório Couto de Assis Associados recebeu da CBF a
quantia de R$ 59.100,00 (cheque 37.960, do mesmo banco, Anexo 3/16).
E de Ricardo Teixeira ele, ou o escritório, nada receberam.
Mais grave é o fato de Teixeira estar respondendo a processo por
sonegação fiscal, tendo sido condenado a seis anos de reclusão em primeira instância, e
estar sendo atendido por Couto de Assis. Esse processo teve grande movimentação
durante o ano de 2000. Coincidentemente a CBF vem realizando pagamentos mensais a
Couto de Assis, no valor de R$ 9.850,00 (Anexo Contabilidade da CBF, ano 2000, em
meio magnético, CD). Apenas em 2000, foram nove pagamentos.
4. JANETE LACERDA
A advogada Janete Lacerda também defendeu Teixeira (AG/RE 10691,
STJ). Dra. Janete também trabalha ou trabalhava para o mesmo escritório Couto de
Assis.
5. BARBOSA, MÜNNICH E ARAGÃO
Esse escritório esteve defendendo Ricardo Teixeira em seu processo
junto à Receita Federal (Processo 13706.000045/95-13). Em 25/5/2000, a CBF pagou
a esse escritório R$ 50.000,00 (Anexo “Contabilidade da CBF - CD”). Ricardo Teixeira
já havia pago a esses advogados uma única vez, em 13/5/96, apenas R$ 3.371,20,
cheque de número 10.805, do Banco Real, Agência Avenida Rio Branco, no Rio de
Janeiro.
Todos esses registros são indicações de que a CBF esteja pagando por
honorários advocatícios para a defesa de processos contra a pessoa física de Ricardo
Teixeira.
6. ESKENAZY PERNIDJI ADVOGADOS
Esses advogados receberam, da CBF, um total de R$ 23.874,99, no ano
de 1998, de acordo com a movimentação bancária recebida por esta CPI. O senhor
Sérgio Isidoro Eskenazy foi procurador da empresa AMERITECH HOLDING INC.,
sediada nas Ilhas Virgens Britânicas, para a compra da casa de Búzios que foi vendida
para a empresa MINAS INVESTIMENTOS S/A, de propriedade de Ricardo Teixeira
(Ver Capítulo IX -- Declarações de Renda de Ricardo Teixeira).
7. CARLOS ROBERTO SIQUEIRA CASTRO
Em seu depoimento à CPI do Futebol, no Senado, em 22-5-2001, o
funcionário da CBF Ariberto Pereira dos Santos Filho admitiu que a entidade estava
pagando o seu advogado. O seu defensor não é ninguém menos que o advogado Carlos
Roberto Siqueira de Castro, do Rio de Janeiro, sub-procurador da República
aposentado, jurista renomado, de biografia brilhante. E certamente um dos advogado
mais caros do país. O funcionário Ariberto deve ter muito do que ser defendido para
que a CBF tenha indicado um defensor desse calibre. Entretanto, essa contratação
revela outra vez a promiscuidade entre pessoa física e pessoa jurídica no trato com as
finanças da entidade. E caracteriza mais uma irregularidade, outro desvio das finalidades
no uso dos recursos da CBF.
8. CARLOS EUGÊNIO LOPES
Esse advogado, que também é diretor jurídico da CBF, trabalhou para
Ricardo Teixeira, no caso da liberação do restaurante El Turf, de propriedade de
Teixeira, em 1999. Há, como nos outros casos, uma confusão entre as pessoas (1) física
de Ricardo Teixeira, (2) jurídicas das empresas de Teixeira e (3) jurídica da CBF.
Esse fato foi noticiado pelo Estado de São Paulo, de 16/9/1999:
“O desembargador Paulo Espírito Santo, do Tribunal
Regional Federal (TRF), acatou mandado de segurança impetrado pelos
advogados da Boate El Turf, da qual o presidente da Confederação
Brasileira de Futebol (CBF), Ricardo Teixeira, é um dos proprietários, e
determinou que as 22 chopeiras da casa, localizada na Gávea, zona sul
do Rio, fossem deslacradas.
Na sexta-feira, o juiz da 6ª Vara Federal do Rio, Guilherme
da Gama, cassou liminar que impedia a Receita Federal de apreender o
equipamento instalado na boate. A Receita alega que o material das
chopeiras chegou ao País de forma ilegal, no vôo que trouxe a seleção
brasileira logo após a Copa do Mundo de 1994, nos Estados Unidos.
Anteontem, as torneiras foram lacradas por um inspetor da Receita.
O advogado Carlos Eugênio Lopes, vice-presidente jurídico da
CBF e encarregado por Teixeira de defender a El Turf, disse que o juiz
errou ao determinar a execução da sentença antes de sua publicação no
Diário Oficial. "Ele também se equivocou, ao não esperar o prazo legal
de apelação", afirmou. De acordo com Lopes, o processo estava
"concluso" para sentença desde dezembro de 1997. "Me causou espanto
que o juiz tenha demorado tanto para se manifestar."
A PARCERIA ENTRE
PASSAGENS LTDA
A
CBF
E
SBTR - STELLA BARROS TURISMO
E
A empresa SBTR PASSAGENS E TURISMO LTDA vem recebendo
valores muito elevados da CBF, há anos. Grande parte das despesas da CBF se referem
a gastos com passagens e hospedagem. Esses valores não são devidamente
contabilizados pela CBF, que faz com que as faturas da SBTR fiquem diluídas em todas
as contas da entidade. Ou melhor, não há uma conta específica para a SBTR; as
despesas com a empresa ficam espalhadas por muitas contas diferentes, o que dificulta
a contabilização dos valores pagos a essa empresa.
O presidente Ricardo Teixeira, em seu depoimento à CPI, em
10/4/2001, não soube explicar os motivos que levam a CBF a manter por anos a fio a
exclusividade desse serviço nas mãos da SBTR, como segue:
“O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Nós temos uma
incidência muito grande de pagamentos feito à Stella Barros Transportes
e Turismo Ltda., que é uma empresa de turismo do Rio de Janeiro.
Chama a atenção pelo seguinte: em cinco anos, esta empresa recebeu
aproximadamente 20 milhões de reais da CBF, o que dá o cálculo —
que eu fiz aqui rapidamente — de 75 mil por semana. O que existe
assim de negócio que levaria a ter uma transação de 75 mil reais. O
senhor conhece alguém da Stella Barros?
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Claro que eu conheço.
Conheço o dono da SBTR, da Stella Barros, e essas... provavelmente
todas essas despesas estão incluídas algumas que são competições
nacionais, outras que são competições dos campeonatos da CBF e outras
da Seleção Brasileira.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Eu cogitei de ver
como é que era feita a venda lá e verifiquei que ela tem preços de tabela
cheia, e são os preços que a CBF pratica junto com ela. Qual seria a
razão da CBF ter essa exclusividade com essa empresa. Quero dizer que,
pelos preços, eu verifiquei que não. Não há vantagem.
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Desde que eu assumi a
CBF, ela é uma empresa que prestava serviço não só à CBF, como
também nos campeonatos mundiais, e ela permaneceu.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Foi uma decisão
administrativa unilateral, portanto.
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Foi uma decisão da
Diretoria da CBF, assim como cada uma das... cada um dos... Por
exemplo, o campeonato nacional, quando realizado pelo Clube dos 13,
utiliza outras companhias. Enfim, eu acho que é uma decisão
efetivamente da empresa, quer dizer, da entidade”. (g.n.)
A SBTR, como apurou o Deputado Jurandil Juarez, somente pratica a
tabela cheia, referindo-se aos preços nominais de tabela das passagens aéreas, sem
desconto algum. E o senhor Ricardo Teixeira afirmou, no depoimento de 10/4/2001,
conhecer os proprietários da SBTR. Todo o volume de vendas de serviços à CBF e o
conhecimento pessoal fruto de mais de doze anos de relacionamento não fizeram com
que a CBF obtivesse condições especiais de negociação.
Fora isso, levantamento feito com dados obtidos durante a diligência na
demonstram que a CBF repassou à SBTR
valores bastante
significativos, como se pode observar na tabela abaixo:
Confederação10
Ano
1998
1999
2000
Total
Valor (R$)
6.624.771,30
8.174.522,59
16.305.000,00
31.104.293,89
Fonte: Contabilidade CBF/Movimentação financeira da CBF
O valor referente a 2000 foi obtido por meio da movimentação financeira
da CBF, e não via contabilidade. Muitas despesas da entidade, em 2000, não foram
identificadas devidamente. Alguns cheques para a SBTR estão contabilizados apenas
como adiantamentos, sem que sejam nominados os favorecidos. Nesse ano, há dois
cheques de valores redondos, para essa empresa, de R$ 500 mil, datados, ambos, de
29/2/2000.
Comparando-se os valores diretamente repassados às Federações a título
de auxílio, verifica-se que a CBF vem tendo despesas muito maiores com a SBTR do
que com todas as Federações em conjunto. Apenas em 2000, a SBTR recebeu quatro
vezes mais do que todas as federações reunidas! Ver tabela a seguir:
Ano
27 Federações (R$)
SBTR (R$)
% Feder./SBTR
1998
3.225.215,00
6.624.771,30
48,68
1999
4.292.772,00
8.174.522,59
52,51
2000
4.181.218,00
16.305.000,00
25,64
Total
11.699.205,00
31.104.293,89
37,61
Fonte: Contabilidade CBF 1998-2000/CPI CBF Nike
Entre os dias 5 e 6 de abril de 2001, esta Comissão realizou diligência na CBF, durante a qual foram obtidos
dados complementares necessários ao exame contábil e operacional da entidade.
10
O USO DAS PASSAGENS E HOSPEDAGENS DA SBTR
A CBF pagou cerca de R$ 400.000,00 em hospedagem para jornalistas
durante a Copa de 1998, indicação de que o uso do dinheiro da CBF, despendido com a
SBTR, está tendo destinação diversa à que se propõem os Estatutos da Confederação.
Outro exemplo: a CBF pagou passagens aéreas, entre Tóquio e Campo
Grande, ida e volta, para o sobrinho do senhor Francisco Cezário, presidente da
Federação de Futebol do Mato Grosso do Sul, senhor Umberto Pereira, e mais três
familiares deste, em dezembro de 1998 (Anexo: SBTR).
O Deputado Dr. Rosinha também criticou os gastos excessivos da CBF
com a SBTR, quando apresentou requerimento que buscava quebrar os sigilos fiscal e
bancário dessa empresa :
“O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – (...) Eu entendia que
esses requerimentos estariam pautados hoje. Como um que eu fiz ontem,
que diz em relação aos gastos que teve a CBF com a SBTR, que é a
empresa conhecida como Stella Barros. Se nós estamos investigando a
CBF, a Stella Barros tem sido e tem servido, de acordo com a minha
compreensão, como um dos mecanismos de dinheiro. da CBF. No ano de
2000, só para ter um exemplo, a CBF gastou com a Stella Barros mais
de 9 milhões em reais em passagens. Se nós compararmos com esta
Câmara dos Deputados, que tem 513 Deputados, a Câmara gastou 22
milhões de reais em passagens.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Pode repetir, Dr.
Rosinha?
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – A Câmara gastou o ano
passado, com 513 Deputados, 22 milhões de reais. E nós viajamos todas
as semanas mais do que uma vez, todos nós. Enquanto a CBF gastou
com a Stella Barros 9 milhões de reais. E a Seleção Brasileira, quando
viaja, não é tudo pago pela CBF, como nós sabemos. Porque, às vezes,
ao assinar um contrato, a outra seleção ou o outro país é que paga as
despesas. Então, o que acontece? Há uma suspeita minha, pelo menos,
que a Stella Barros está servindo como um dos caminhos de desvio de
dinheiro da CBF. Se nós não quebrarmos o sigilo da Stella Barros, pra
saber o trajeto desse dinheiro... Ele sai da CBF, entra na Stella Barros e
vai pra onde? Eu quero crer que ele volta a algumas pessoas da CBF.
Há esses indícios, há essa suspeita. Sem a quebra do sigilo da Stella
Barros... Eu não vou investigar a Stella Barros, não vou pedir
contabilidade dela. Mas eu vou pedir o que está acontecendo com isso. A
CBF gasta cerca de 50% do que gasta esta Câmara Federal — é um
absurdo — em passagens. Inclusive há passagens compradas na Stella
Barros pra quatro pessoas da família Teixeira, em nome da família
Teixeira, em viagens que não são a serviço da CBF. Inclusive naquele
fato que eu não quis falar, não quis citar, porque envolve uma questão
familiar, daquele acidente com o BMW, nos Estados Unidos, um
representante da Stella Barros, a informação que eu tenho, estava junto.
Então, há essa questão que tem que ser esclarecida. Serve ou não serve a
Stella Barros como um dos caminhos de desvio de dinheiro da CBF? É
só quebrando esse sigilo, porque eu achei que ele estaria na pauta hoje.
Por isso que eu não fiz questão nem de apresentar requerimento
extrapauta. Porque, quando eu retirei, retirei da pauta de ontem,
sabendo que tinha reunião hoje. Era essa a minha questão de ordem, Sr.
Presidente.” (g.n.)
CBF LEVA DESEMBARGADORES ÀS COPAS DO MUNDO
A CBF tem convidado diversos magistrados para irem às Copas, com
todas as despesas pagas, incluindo acompanhante. Pelo menos em 1994 e em 1998 isso
ocorreu. O jornal O Estado de São Paulo, de 20/6/98, tomou o depoimento de diversas
autoridades, em reportagem intitulada “ Juristas apontam atitude antiética”:
“Os desembargadores do Tribunal de Justiça do Rio que aceitaram
convite da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) para ir a Paris tiveram um
comportamento antiético que compromete a imagem do Poder Judiciário. Essa é a
opinião unânime de juristas consultados pelo Estado. Eles acham que o fato pode
configurar crime de corrupção passiva - os desembargadores não deveriam fazer uma
viagem a passeio paga por terceiros.
"Esse comportamento de receber cortesias não pode ser justificado do
ponto de vista ético", acentua Dalmo de Abreu Dallari. "É uma atitude claramente
antiética", prossegue o professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo
(USP). Dallari defende a apuração dos fatos pelo Ministério Público. "Há, em tese, a
possibilidade de configurar corrupção passiva."
A atitude dos desembargadores Marlan de Moraes Marinho, Sylvio
Capanema de Souza, Manoel Carpena Amorim, Paulo César Salomão e Luís Zveiter é
passível de averiguação do Conselho de Magistratura do próprio Tribunal de Justiça do
Rio.
"A população espera de um juiz um comportamento ético", lembra Luiz
Flávio Borges D'Urso, presidente da Associação Brasileira dos Advogados
Criminalistas. "Juiz não pode aceitar esse tipo de convite e ainda mais de uma entidade
tão polêmica como é a CBF", concorda Dyrceu Aguiar Dias Cintra Jr., presidente da
Associação Juízes para a Democracia. "Esses desembargadores estão impedidos de
cuidar de processos em que a CBF seja parte interessada."
Carlos Miguel Aidar, relator da Lei Pelé e presidente em exercício da
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) foi incisivo. "É uma vergonha, uma atitude
antiética", assinala. "Espero que o presidente do Tribunal de Justiça do Rio os declare
impedidos para julgamento de processos em que a CBF tenha interesse." Aidar acha
que o Tribunal de Justiça do Rio deveria investigar o assunto. "Pode ficar comprovada
a corrupção passiva."
"Fiquei chocado", ressalta José Carlos Dias, advogado criminal. "Eles não
foram felizes em aceitar esse convite, caíram em tentação."
Quanto aos acontecimentos da Copa de 1994, verificou-se que um dos
passageiros contemplados foi o desembargador Antônio Carlos Amorim, presidente
do Tribunal de Justiça do Rio.
Em seu depoimento à CPI, Ricardo Teixeira negou conhecer o
desembargador Amorim, como também o fato de a CBF ter doado a ele os R$ 50 mil
para a campanha de 1998. Não se recordou que Amorim foi o relator de uma queixa
crime que Teixeira moveu contra Márcio Braga, ex-presidente do Flamengo, em 1991,
processo número 1991.067.00003, que resultou num pedido de licenciamento feito à
Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro, para que fosse instaurado o processo contra
Braga. O Desembargador Amorim também desarquivou outro processo de Teixeira
contra Braga, o de número 1991.067.00001, outra queixa crime.
Perguntado sobre a viagem à Copa, Amorim disse à Folha de São Paulo
de 27/7/1994, que viajou pois queria estar próximo às manifestações populares:
“Aceitei o convite porque acho que o Judiciário deve se fazer representar
nas manifestações populares", afirmou Amorim.
Acompanhados das esposas, eles embarcaram na véspera do jogo de
abertura (dia 17/06) e voltaram dia 19 de julho. Amorim e Sartori voltaram num vôo
normal.
"A CBF é ligada aos órgãos oficiais e convidou autoridades. Até o
presidente Itamar foi convidado", disse. A CBF é uma entidade de direito privado, não
sendo subordinada a órgãos oficiais.
Amorim declarou ainda que não acredita que os dirigentes da CBF
utilizem o convite "para obter facilidades junto à Justiça".
O presidente da CBF tem processos na Justiça. Ele entrou com um
processo de difamação contra Pelé, que o acusou de estelionato.
Os advogados que defendem os jogadores do time que ganhou o
tricampeonato no México, e que movem ação contra a CBF, Sales Nobre e Franco
Oliveira, afirmaram à Folha, em 4/8/1994, que a Procuradoria da República deveria
investigar a viagem dos membros do Judiciário do Rio, paga pela CBF. Além do
presidente do TJRJ, a CBF pagou as despesas de viagem do corregedor de Justiça José
Moledo Sartori e do desembargador Paulo Roberto de Azevedo Freitas, que passaram
20 dias assistindo aos jogos do Brasil, acompanhados pelas esposas.
De acordo com a Folha, “os advogados enviaram uma petição ao subprocurador-geral da República, Paulo Sollberger, solicitando que fossem tomadas
medidas referentes ao caso”. Eles afirmaram, então:
“Membros da Justiça não podem viajar com despesas custeadas
por uma ré num processo, como é a CBF. Esperamos que a Procuradoria
da República tome as medidas cabíveis no caso”.
Na época, o procurador da República Paulo Solleberger enviou a
Amorim, segundo a Folha de 9/11/94, “ofício pedindo explicação sobre o que
considera ‘operação pouco recomendada’ ”.
Em 1998, a CBF também levou magistrados à Copa, na França.
Participaram os desembargadores Marlan de Moraes Marinho, Sylvio Capanema de
Souza, Manoel Carpena Amorim, Paulo César Salomão (ex-corregedor do TRE-RJ,
professor de Direito Eleitoral na Faculdade Cândido Mendes) e Luís Zveiter (também
presidente do STJD).
O Desembargador Salomão ajuizou uma ação contra o jornal Tribuna de
Imprensa, por danos morais, que provocou a decretação de falência do jornal (g.n.)
Há um processo, de número 95.001.024141-7, por meio do qual Ricardo
Teixeira ajuizou ação de indenização por danos morais contra Juca Kfouri. A juíza que
relatou esse processo foi Márcia Santos Capanema de Souza, que é filha do
Desembargador Sylvio Capanema de Souza. Nesse processo, a juíza condenou Kfouri
ao pagamento de 150 salários mínimos. Quinze dias depois, sua sentença foi anulada
pelo Tribunal de Justiça, por erro insanável, entre outros motivos porque a juíza não
deu ao réu o direito de defesa.
A Agência Folha publicou, em 18/7/1998:
“No início do mês, a atitude dos desembargadores já foi
condenada, por 95% dos votantes, na consulta popular organizada pelo
Sindicato dos Advogados do Estado do Rio. Na ocasião, o sindicato
espalhou urnas de votação nos prédios do Tribunal de Justiça e no
Tribunal Regional do Trabalho do Rio.”
De acordo com a Folha, de 18/7/1998, Ricardo Teixeira foi intimado
pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro a prestar esclarecimentos sobre o
“vôo da muamba”. A procuradora Inês da Matta exigiu que Teixeira divulgasse o nome
dos convidados, o critério da CBF para fazer os convites e o valor gasto no vôo.
Entrevistados em Paris, o Desembargador Marlan Marinho e o diretor
jurídico da CBF, Carlos Eugênio Lopes, defenderam a ida dos magistrados com tudo
pago pela CBF, pelo que publicou a Folha de 20/6/1998:
“Entre os que aceitaram o convite este ano está Marinho, 60, que foi
relator do processo da CBF contra a cervejaria Brahma no Tribunal fluminense. Ele
está hospedado com a mulher no hotel Westminster, um quatro estrelas localizado
próximo à Ópera de Paris, local nobre da capital francesa.
A CBF pagou as passagens aéreas (classe executiva) e a hospedagem do
grupo na França, além de fornecer os ingressos para as partidas da seleção brasileira. A
diária básica para um casal no Westminster custa US$ 450, sem o café da manhã.
Marinho não vê relação entre o convite e o processo que relatou no
Tribunal de Justiça do Rio. "É verdade que julguei um processo da CBF contra a
Brahma, mas julguei contra. Minha câmara reduziu pela metade a indenização prevista
em primeira instância."
Ele disse que recebeu o convite por meio de um diretor da CBF e não crê
em conflito de interesses. "Antes de vir para cá, estive em dois congressos patrocinados
por empresas e não me senti comprado por isso."
Segundo Carlos Eugênio Lopes, diretor jurídico da CBF, também
hospedado no Westminster, "cabe à CBF a responsabilidade de colaborar para que
personalidades de destaque na vida nacional e representantes dos poderes constituídos
estejam presentes nos locais de disputa". Ele reafirmou que a prática de convidar
personalidades é comum em Copas do Mundo.
Por ser uma entidade de direito privado, a "CBF convida quem quiser.
Não precisa prestar contas a ninguém, só ao seu conselho fiscal", disse Lopes.
Marinho e Lopes lembraram que outras empresas e entidades trouxeram
convidados brasileiros à França. O desembargador fez uma comparação com o
Carnaval: "Ninguém se importa com quem está no camarote da Brahma, por exemplo".
Marinho não se dirá impedido de julgar outras possíveis ações contra a
CBF no Tribunal do Rio. "Em 26 anos nunca me declarei impedido. O juiz tem que
saber separar as coisas, senão não pode ser juiz.” (g.n.)
O desembargador Marlan Marinho, a menos de dois meses da Copa de
1998, decidiu a favor da CBF, no processo desta contra a Brahma.
O Jornal da Tarde, de 20/6/1998, publicou entrevista com o presidente
do TJRJ, desembargador Thiago Ribas Filho:
“No caso do desembargador Thiago Ribas Filho, o convite foi feito no
ano passado, por ocasião de sua posse na presidência do Tribunal, mas ele recusou a
oferta. O presidente evitou reprovar a atitude dos colegas. “Não tenho o que reprovar
sem estudo prévio da matéria ou sem ouvir os desembargadores”, esquivou-se. Mas ao
ser perguntado se a presença de algum dos integrantes da lista de mordomias da CBF o
surpreendeu, ele deixou transparecer a decepção com o desembargador Marinho. “Ele
é um dos antigos, como eu, membro do conselho da magistratura”, lembrou, para em
seguida fazer um pedido: “Não me constranja.” (g.n.)
Calcula-se que a CBF gastou, na Copa de 1998, pelo menos US$ 75 mil
com os cinco desembargadores e acompanhantes, entre passagens em classe executiva,
hospedagens e bilhetes para os jogos. E isso ocorreu em um ano em que a CBF iria
apresentar déficit de mais de R$ 15 milhões.
“NEGÓCIOS DAS ARÁBIAS ”
Não é de espantar que o Conselho Federal de Contabilidade tenha
criticado a desídia no trato dos recursos da CBF, que definiu como “negócio das
arábias”:
“A participação na estrutura em análise, com a remuneração
percebida, com gratificação de 13º e 14º salários, participação em
gratificações diversas (eventos), a título de exemplo: documento
020/0013 de 30/10/98, gratificação paga a Sérgio Pinto da Silva
(campeonato mundial de clubes) de R$ 67.258,25 , nos parece
absolutamente fora do contexto empresarial do País, resultando no
chamado “negócio das arábias”, ou ortodoxamente, uma forma de
locupletar-se dos recursos financeiros da entidade”. (g.n.)
EMPRÉSTIMOS JUNTO A EMPRESAS DE FACTORING
Conselho Federal de Contabilidade -- CFC observou que a CBF
realizou empréstimos junto a empresas não pertencentes ao mercado financeiro,
conforme afirma no item 3.7 do seu Relatório de Análise 01/2001, sobre a
contabilidade da Confederação:
“A Entidade, vem recorrendo reiteradamente a empresas
privadas, não integrantes do mercado financeiro, para suprir suas
necessidades de “Caixa”. Levantamos, a título de exemplo, alguns
empréstimos de financiamentos, captados a custos bastante elevados:
CREDOR
INFORMAÇÕES SOBRE O EMPRÉSTIMO
DOC. No
DATA
VALOR R$
TAXA %
M. P. G. Ass. Empr. Part. Ltda 004/0038
M. P. G. Ass. Empr. Part. Ltda 004/0035
CIAR Part. Admin. Ltda
004/0040
04.12.98
04.12.98
11.12.98
600.000,00
1.400.000,00
2.000.000,00
5,00% a.m.
3,93% a.m.
4,5% a.m.
Ressalte-se que há inúmeros outros empréstimos contratados
com as empresas acima. Pelo que apuramos as empresas credoras não são
instituições financeiras autorizadas a funcionar normalmente no mercado
financeiro. São empresas trasvestidas de “Empresas de Factoring”, tendo
inclusive motivado autuação por parte da Receita Federal.
Outro aspecto interessante nas contratações de empréstimos
junto a tais empresas é que os encargos são descontados antecipadamente
com entrega de cheque pelo valor bruto do empréstimo, fato que eleva
ainda mais os encargos financeiros. As taxas médias anuais saltariam de
algo em torno de 69,5% a.a., para em torno de 100,00% a.a.,
tornando-se um excelente negócio para o credor. Tal situação abre
inclusive a possibilidade de estar havendo desvio de recursos, solapando o
“Caixa” da entidade.” (g.n.)
De fato, a Receita Federal identificou que CBF havia criado pagamentos
sem causa no valor de R$ 175 mil, em 1998, relativos aos empréstimos firmados com a
MPG e com a CIAR. A Receita Federal assim afirmou:
“(...) constatei irregularidade com relação ao valor total de R$
175.000,00 indevidamente deduzido em dezembro de 1998 e
representado pela soma dos valores pagos a títulos de despesas financeiras
sobre empréstimos efetuados junto às empresas CIAR
PARTICIPAÇÕES E EMPREENDIMENTOS LTDA E
M.P.G. ASSESSORIA EMPREENDIMENTOS LTDA.
Constatei que o principal e mais os valores das supostas
despesas foram pagos no mesmo dia ou até antes do ingresso dos recursos
na conta bancária da fiscalizada, de acordo com o Anexo (...); portanto,
houve retorno dos valores dos citados empréstimos com pagamento sem
causa dos valores de R$ 90.000,00, R$ 30.000,00 e R$ 55.000,00
em dezembro de 1998”. (g.n.)
INSTITUTO DE ASSISTÊNCIA AO FUTEBOL BRASILEIRO -- IAFB
O IAFB – Instituo de Assistência ao Futebol Brasileiro -- vem
consumindo muitos recursos da CBF, como se pode verificar pela tabela abaixo:
IAFB - REPASSES DA CBF - 1998 A 2000
FEV
MAR
ABR
72.002,56
JAN
42.762,17
59.397,47
91.771,46
122.019,71
39.199,30
1999
81.023,40
100.798,35
101.267,16
100.416,25
174.792,38
148.563,87
2000
152.664,34
97.477,83
175.492,34
105.215,80
143.707,12
1998
JUL
AGO
SET
OUT
1998
87.596,98
107.175,30
122.646,40
115.774,86
1999
103.539,35
114.772,53
141.467,79
100.036,39
2000
299.464,48
218.652,04
365.970,48
149.538,69
MAI
NOV
102.194,89
151.825,29
JUN
DEZ
TOTAL
82.912,36
1.045.453,46
252.603,01
1.419.280,48
142.967,77
2.002.976,18
TOTAL 98-2000...............
4.467.710,12
FONTE: CONTABILIDADE CBF
A CBF criou o IAFB em 1996, em evento realizado no restaurante El
Turf, de Ricardo Teixeira. Para o presidente da CBF, o instituto tinha como objetivo
“melhorar a vida do jogador e criar opções de emprego aos atletas”, como ele afirmou
ao Estado de São Paulo, de 6/2/1996. Teixeira disse, na época, que o órgão pretendia
atender 60 mil atletas profissionais do futebol, no Brasil e que teria a função de
“associá-los nas áreas social, cultural e jurídica”. Teixeira afirmou que:
"Vamos implantar um sonho antigo e tirar a maioria dos
jogadores brasileiros do abandono"
Pelo que se pode perceber, o projeto do Instituto era bastante ambicioso.
Pretendia tirar a maioria dos jogadores brasileiros do abandono. No entanto, o que se
vê hoje é que a própria CBF não dá a relevância devida ao projeto, pois nos relatórios
recentes da Confederação não se faz menção alguma às realizações do Instituto, e , por
certo, muitas medidas projetadas, então, não devam ter sido cumpridas.
É o que se vê pelo que o Estado publicou naquela data:
“No próximo ano, o IAFB pretende construir cinco hospitais
exclusivos para os jogadores e seus dependentes (RJ, SP, PE, GO, PR).
O Instituto vai dar a todos os jogadores profissionais um seguro de vida,
além de assistência jurídica aos atletas e seus dependentes, gratuitamente.
O órgão pretende criar uma série de cursos profissionalizantes. A
intenção é desenvolver paralelamente a carreira do jogador a outras
atividades. Para isso, os diretores pretendem promover parcerias com o
SENAC, SENAI, SEBRAE e SESI.”
Não se tem notícia alguma de que esses hospitais tenham sido
construídos. Afinal, nem os relatórios anuais da CBF informam a sua construção ou
manutenção. Além disso, nunca se ouviu dizer que algum jogador se utilizasse do IAFB
para solucionar algum problema judicial, nem tenha participado de algum curso
profissionalizante.
Em depoimento à CPI do Futebol, do Senado Federal, em 13/11/2000,
o ex-jogador Wilson Piazza , comentando as condições do jogador profissional
brasileiro, disse que:
“A CBF às vezes não dispõe de nenhuma informação. Ou se
dispõe, é daqueles clubes que estão disputando campeonato. Detém
qualquer meia dúzia de jogadores registrados. E na federação local,
desses clubes que estão disputando, uma grande parte dos atletas não tem
sequer seus contratos registrados. Já aconteceu de muitos atletas, em vários
Estados do Brasil, irem buscar a comprovação do tempo de serviço porque às vezes não ficam nem com a cópia do contrato, que é levado e
nem é registrado – e não terem nada. Mas o clube com jogador irregular
não pode disputar a competição. Basta a outra equipe denunciar. Mas
isso tem se tornado uma coisa comum. Seria bom verificar essa situação,
porque isso traz um prejuízo enorme para muitos atletas que às vezes
jogam e não podem contar aquele tempo de serviço. Quando, na verdade,
vão verificar, os contratos não foram registrados nem na CBF nem
tampouco na própria federação local.”
Piazza foi um dos dirigentes do IAFB e critica, com veemência, o descaso
da entidade com o atleta brasileiro. A CBF criou o Instituto, que não mostrou resultado
prático para a classe de jogadores profissionais de futebol, e nem mesmo protege o
jogador para que, no futuro, ele possa estar garantido pela Previdência Social.
Já os recursos despendidos pelo IAFB vêm aumentando muito. E um
dos motivos disso são, sem dúvida, os altos salários pagos pela CBF, direta ou
indiretamente, aos funcionários que ficam à disposição do Instituto.
Nos relatórios anuais da CBF, nos últimos três anos, não se encontra
prestação de contas do Instituto. Nem dos recursos repassados pela CBF ao IAFB. É
de se crer que o controle dos gastos do Instituto fique a cargo do Conselho Fiscal da
CBF. Os últimos pareceres do Conselho, no entanto, nada comentam a respeito.
Quanto aos cursos oferecidos pelo IAFB, em convênio com as
prefeituras, verifica-se que o apoio do Instituto se refere à parte organizacional, e não
material. Em documento entregue a esta CPI, quanto ao procedimentos das prefeituras,
há a informação de que :
“Quanto aos cursos de inglês e espanhol, caso a Secretaria de
Educação não tenha professores com disponibilidade de horário para
aplicá-los, deverá solicitar a colaboração, através de rádio, TV ou jornal,
de estudantes universitários, ou de cursos particulares de línguas, que
tenham boa noção do idioma a ser ensinado, a fim de que possam dar
aulas voluntariamente.” (g.n.)
Apesar dos benefícios que o Instituto possa estar trazendo a
comunidades carentes, há necessidade de que os recursos da CBF, ou mesmo da FIFA,
de quem Ricardo Teixeira afirmou receber repasses exclusivos, sejam auditados por
órgãos de controle independentes e imparciais.
O IAFB, por outro lado, por meio desses convênios, pode ser visto
também como um meio de aumento da base de influência política da CBF. Pelos
documentos referentes ao IAFB, entregues pelo senhor João Havelange, quando de seu
depoimento, verifica-se que dezenas de parlamentares vêm (ou vinham) se dirigindo ao
IAFB ou à CBF com o desejo de ter determinados municípios contemplados com
convênios.
Em geral, observa-se que o apoio do IAFB restringe-se mais à
organização de eventos, notadamente na cidade do Rio de Janeiro, e no fornecimento
de materiais esportivos. Esse aspecto fortalece a força política do instituto.
Na sítio do instituto na internet (www.iafb.com.br), não se percebe como, de
fato, o IAFB auxilia as prefeituras. Na lista de municípios relacionados no sítio,
constam os “municípios que recebem atendimento esportivo e cultural e os nomes dos
que, por enquanto, só fazem parte do segmento cultural. A porção esportiva vai sendo
implantada, de acordo com a disponibilidade do IAFB” (g.n.).
Durante o depoimento de Ricardo Teixeira à CPI, em 10/4/2001, o
Deputado Jurandil Juarez questionou-o sobre o IAFB e como são feitos os
ressarcimentos mensais ao instituto:
“O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Sr. Presidente,
tenho aqui um recibo de pagamento feito a esse Instituto. E ele trabalha
com ressarcimentos. Ele teve uma despesa com pessoal no valor de 45 mil,
908 reais. Cobrou de ressarcimento 21 mil, 694 reais de INSS.
Significa 46% do valor da folha de pagamento. Pediu ressarcimento do
Imposto de Renda retido da fonte sobre salários, no valor de 11 mil, 048
reais. Isso feito com recibos. São recibos que estão nas minhas mãos aqui,
por isso que eu estou lendo os números. Não existe, Sr. Presidente,
alíquota de 46% de INSS em nenhum lugar do Brasil. Aqui se cobra
demais INSS. É um absurdo o que se cobra. Mas 46% eu lhe asseguro
que não existe. Mas, o mais interessante é que não há como se chegar a
uma conta de 11 mil reais para Imposto de Renda retido na fonte. Não
existe alíquota no Código Tributário Brasileiro que chegue a esses 11 mil
reais. E o que é mais interessante é que o Imposto de Renda retido na
fonte é pago por quem recebe. Eu, como Deputado, recebo os meus
proventos, e a Câmara retém os meus custos referentes a Imposto de
Renda. Portanto, não há ressarcimento de Imposto de Renda retido na
fonte. Estranhamente, a CBF, que tem dificuldades financeiras, ressarce
Imposto de Renda retido na fonte a esse Instituto de Assistência ao
Futebol Brasileiro. Eu queria saber se esses procedimentos... eu queria
lhe perguntar se o senhor tem conhecimento desses procedimentos e se as
coisas funcionam assim: alguém manda um recibo, discrimina contas, e a
CBF paga.” (g.n. )
O Deputado Jurandil Juarez reforçou a questão importante da
necessidade de controle do IAFB e da CBF.
Levando-se em conta o recibo do IAFB, relativo a dezembro de 1998, no
valor de R$ 82.912,36 (ver tabela acima), ao qual se refere o Deputado Jurandil,
verificam-se os seguintes gastos (Anexo Recibo IAFB dez/98, pasta Contrato
CBF/Nike 116)):
Item
Folha de pagamento
Folha pagamento 13.° salário
Férias
SETEC
OPENLINK
TELERJ
VIDEO CLIPPING
PIS
IRF-SALÁRIOS
INSS
CONTRIB. SINDICAL
TOTAL
Valor (R$)
30.981,02
11.612,21
3.315,57
2.400,00
50,00
1.279,79
200,00
309,81
11.048,00
21.694,30
21,66
82.912,36
% do Total
37,37
14,01
4,00
2,89
0,06
1,54
0,24
0,37
13,32
26,17
0,03
100,00
As despesas com a natureza pessoal chegam a 95,3% do total do mês.
Com isso, comprova-se que naquele mês os gastos da CBF com o instituto foram para
a folha de pagamentos e encargos. Infere-se, daí, que os gastos com pessoal
preponderem sobre os restantes, o que deixa transparecer que o IAFB esteja destinando
seus recursos quase totalmente para o pagamento de pessoal, em prejuízo dos fins para
os quais foi criado, o que confirma denúncias feitas a esta CPI de que o IAFB é um
“cabide de empregos”. Aliás, esta CPI não teve notícia de que o IAFB tenha algum
estatuto, se foi registrado em cartório e qual seria a sua natureza jurídica.
Além disso, surgem outros problemas relativos à administração do IAFB,
cujo presidente também é Ricardo Teixeira: os altos salários pagos a alguns
funcionários, a possibilidade de existência de nepotismo e a remuneração de alguns
funcionários em duplicidade.
Há funcionários, como a gerente Denise Paiva da Cunha, que recebia
salários da ordem de R$ 8.850,00, ainda em dezembro de 1998. É provável que o
salário da senhora Denise já tenha quase que duplicado, com vem ocorrendo com as
pessoas que assumem cargos de topo na administração da CBF ou do IAFB. Há
indicação nesse sentido na folha de pagamento de 2000, de posse desta CPI, que indica
pagamento líqüido de R$ 15.064,36 para a gerente Denise Cunha.
Assim como na CBF, os cargos no IAFB não são ocupados via concurso
ou por outro critério de competência. Há parentes de Denise de Paiva Cunha, que lá
trabalham, sem que haja empecilho algum. É o caso de Oraide Paiva da Cunha, cargo
de professora orientadora, salário base de R$ 2.550,00 em 12/98, recebendo R$
3.141,09 liqüido em 2000; e de Fátima Paiva da Cunha, assistente administrativa, salário
de R$ 1.913,17, também em 12/98, que, por sua vez, recebeu R$ 2.482,87 líqüidos na
folha de pagamento de 2000.
Dos 17 funcionários do IAFB, três são irmãs, incluindo a gerente geral,
Denise. Ainda há denúncias que o IAFB seja usado como cabide de emprego, onde
pessoas são empregadas, apenas, por indicação pessoal de Ricardo Teixeira ou por
membros da diretoria.
Há um funcionário de nome Ricardo Sarney Fernandes Costa, que
guarda parentesco com um dos diretores da CBF, o senhor Fernando José Macieira
Sarney, diretor de relações governamentais. E isso reforça a hipótese de nepotismo.
Dois funcionários, pelo menos, são remunerados pela CBF e pelo IAFB,
simultaneamente. Um deles é o tesoureiro da CBF, Ariberto Pereira dos S. Filho, que
no instituto assume o cargo de coordenador financeiro, salário de R$ 4.462,97, em
dezembro de 1998, e na CBF é tesoureiro com salário base de R$ 3.950,00, em
dezembro de 2000.
Ressalte-se que o tesoureiro trabalha as 240 horas mensais na CBF e
ainda encontra tempo para se dedicar ao IAFB. Somados os dois salários, a sua
remuneração mensal, já em 1998, encontrava-se próxima de R$ 10.000,00. Como o
cargo de tesoureiro na CBF adquire uma importância maior em função do descontrole
administrativo que se observa naquela entidade, torna-se necessário que os órgãos
competentes, em especial a Receita Federal, fiscalizem os recursos geridos pelo
tesoureiro Ariberto, assim como em relação a toda a diretoria da CBF e a gerência do
IAFB.
Outro funcionário que trabalha para a CBF e para o IAFB é Nélson
Sampaio de A. Júnior. No IAFB, ele é assistente de informática, e ganhava R$ 1.765,50
mensais, em dezembro de 1998; na CBF, ele trabalha como auxiliar de escritório, e
recebe R$ 1.177,05, base dezembro de 2000.
Outro indício de irregularidade é o fato de a gerente Denise Paiva da
Cunha receber cheques diretamente da CBF. Pelo documentos de posse desta
Comissão, Denise teria recebido pelo menos R$ 29.024,24, em 1998, e R$ 48.160,86,
em 1999. Levando-se em conta que os controles de gastos da CBF ( e por extensão os
do IAFB) são muito precários, os depósitos diretos em conta corrente pessoal da
gerente são suspeitos de conterem desvios de recursos. A boa conduta contábil não
permite esse procedimento.
PUBLICIDADE PAGA EM BRASÍLIA
A CBF comprou uma página do Jornal de Brasília, para publicar material
de publicidade. Realizou pagamento de R$ 300 mil em seis parcelas de R$ 50 mil, a
partir de 30/11/2000.
A fatura do jornal de número 5384, contrato 65021, com data de
captação de 22/11/2000, define as condições do negócio. Foi paga uma página de
757,26 cm, tipo de contrato “compra de página”, valor bruto R$ 300 mil, em seis
parcelas.
Em 13/12/2000, foi publicada um entrevista exclusiva com Ricardo
Teixeira, exatamente no dia em que ele depôs na CPI do Futebol, no Senado Federal. A
reportagem daquele dia exibia uma entrevista exclusiva do presidente da CBF.
Ao ser questionada sobre essa entrevista, a direção do jornal apresentou a
membros da CPI cópia de contrato pelo qual a CBF se encarregava de pagar,
adiantadamente, os serviços a serem executados pelo jornal. Afirmou, também, que
nenhuma publicidade havia ainda sido feita. Por sinal, o contrato apresentado não
trazia assinatura da CBF, apenas dos representantes do jornal, apesar de o primeiro
pagamento ter ocorrido em 30/11/2000.
Convém destacar que a CBF não realiza pagamentos a jornais ou outros
meios de comunicação. Pelos documentos de posse desta CPI, a CBF nunca teria
emitido cheques para, por exemplo, O Globo, Jornal do Brasil, Folha de São Paulo,
Estado de Minas, Estado de São Paulo, Zero Hora, etc. No período de cinco anos
analisados por esta Comissão não houve, portanto, pagamentos a órgãos de imprensa.
É provável que a CBF já tenha contratado agências de publicidade, o que é diferente.
A CBF faz o primeiro pagamento a um jornal, em 30/11/2000, e menos
de quinze dias depois é publicada uma entrevista com Ricardo Teixeira, no dia em que
ele iria depor no Senado. Há indícios de que recursos da CBF, mais uma vez, estejam
sendo utilizados para outras finalidades que não as estabelecidas em seu estatuto, em
vigor desde 1994. Cabe, nesse caso, aprofundar esse exame, como meio de se apurar a
regularidade desses pagamentos e do contrato mencionado.
CBF PAGA ICMS DO VÔO DA MUAMBA
A CBF pagou, por meio do cheque número 32.540, de 21/10/96, a
quantia de R$ 46.209,60 pelo ICMS devido pelas pessoas que viajaram por conta da
Confederação e desembarcaram no Rio de Janeiro, em julho de 1994, vindas dos
Estados Unidos.
Foram muitos os autos de infração, da Secretaria de Estado da Fazenda
do Rio de Janeiro, incluindo o de número 01.029128-4. A CBF arcou, assim, com o
ICMS devido pelos passageiros que estiveram naquele vôo famoso, que ficou
conhecido como o vôo da muamba.
A CBF arcou com o ICMS de todos os passageiros do vôo. Seguem
alguns exemplos, obtidos dos autos de infração da Secretaria da Fazenda do governo do
Rio de Janeiro.
O jogador Branco, nome real Cláudio Ibraim Vaz Leal, trouxe uma
cozinha completa, avaliada segundo os jornais da época em US$ 18 mil, enquanto o
limite legal era de US$ 500. Como o avião que trazia a cozinha do Branco veio depois
do primeiro vôo, a bagagem dele foi revistada. Dentre outras coisas, Branco trouxe:
1 geladeira GE profile dupla CFX 24W
1 Esteira motorized tread mil, mod DP life strider
1 Televisão cinema wide system marca Pioneer mod SD-P507
1 Aparelho de ginástica Megaflex Home Gym mod IDNOS 157600
1 Forno de parede duplo digital GE
1 Máquina de lavar roupa Maytag
2 Máquinas de lavar pratos GE
Apenas o custo desta infração custou à CBF 11.500 UFIRs.
Quanto ao funcionário da CBF, Alexandre Silva da Silveira:
2 video cassetes
1 CD player
2 papagaios de brinquedo
2 aparelhos telefônicos
E a secretária particular de Teixeira, Gláucia Feijó Fernandes:
2 CDs para carro
1 som portátil
1 máquina fotográfica
1 bateria celular
1 Stik
O motorista de Ricardo Teixeira, Odair Araújo Silva:
1 Filmadora Panasonic
1 Walkman
1 Bicicleta Mountain
1 Agenda Casio mod 9600
1 Video Game
1 Game Boy
Já Américo Faria teria trazido o seguinte:
1 CD Portable System JVC
1 Som port. AIWA
1 Impressora Canon
1 Notebook Toshiba (Só o notebook custou US$ 3.569)
Apesar das despesas arcadas pela CBF, Ricardo Teixeira disse à CPI que
os passageiros recolheram seus impostos:
“O SR. DEPUTADO SILAS CÂMARA – Nós estamos fazendo
essa CPI para esclarecer várias situações, e entre elas uma situação que
chama muita a atenção: é sobre o caso de 1994 chamado caso Alfândega,
quando foi divulgado em toda a mídia nacional sobre aquela questão da
Receita Federal ter levantado questionamento sobre o excesso de compras
que os jogadores e a Seleção Brasileira havia feito no exterior. O senhor
tem alguma... algum esclarecimento em especial (...)?
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA – Que alguns jogadores
trouxeram acima da cota de 500 dólares é verdade, tanto que todos eles
recolheram depois os seus impostos, fizeram declaração, recolheram seus
impostos. Esse assunto foi exaustivamente analisado pela Receita
Federal e já está arquivado, tanto na Receita Federal como numa ação
ordinária que ocorria no Rio de Janeiro.” (g.n.)
Percebe-se, com isso, que a CBF realiza gastos em desacordo com sua
finalidade e que ficam a critério do interesse do presidente ou de algum diretor. Não há
controle do que deve ou pode ser despendido. Na comitiva que foi à Copa do Mundo
foram motorista e secretária do presidente, desembargadores, empresários amigos de
Teixeira, vai quem a diretoria da CBF quer. Quanto custou? Não se sabe. Só se sabe
que a CBF pagou a conta.
O VÔO DA MUAMBA
Ao retornar ao Brasil, após a vitória do tetracampeonato nos Estados
Unidos, a comitiva da seleção teve a sua bagagem barrada na alfândega, no aeroporto
do Galeão. A fiscalização pretendia revistar todas as malas e caixas regularmente, como
se faz com todo cidadão que ingressa no País. O presidente Ricardo Teixeira comandou
um esquema de pressão para que a bagagem fosse liberada sem ser vistoriada,
argumentando que os jogadores deveriam desfilar, e que poderia até haver risco de vida
para todos eles, caso o desfile não ocorresse logo.
Depois de muitas ameaças, inclusive dos jogadores, que, orientados por
Teixeira, ameaçaram jogar fora as medalhas conseguidas e não desfilar em carro aberto
no Rio de Janeiro, chegou uma ordem de Brasília, diretamente do governo federal,
permitindo que a bagagem passasse sem ser revistada. Sindicância da Receita Federal
confirmou que os jogadores foram incitados por Teixeira para fazer ameaças, fato que
teria sido comprovado por mais de dez depoimentos feitos à comissão de sindicância
(Jornal do Brasil, 25/8/94 e Folha de São Paulo, 9/8/94). No mesmo dia, o JB publicou
que a Procuradoria da República, no Rio de Janeiro, informava que o a bagagem da
comitiva saiu do Brasil com 3,4 toneladas e voltou com 14,4.
Esses fatos geraram uma série de conseqüências que até hoje são
sentidas, por meio de ações judiciais. Para Ricardo Teixeira, principalmente, que foi
acusado de contrabandear equipamentos que seriam utilizados em sua choperia, no
Jóquei Clube, no Rio de Janeiro. Ainda hoje os processos tramitam na Justiça carioca.
O Jornal do Brasil, de 23/7/94, publicou afirmação do ex-Secretário da
Receita Federal, Osíris Lopes Filho, considerado por muitos, na época, autor de um ato
de decência no episódio:
“Os cartolas da CBF usaram os jogadores da Seleção com fins escusos”.
Enquanto isso, o mesmo jornal afirma que Ricardo Teixeira estava
felicíssimo com a queda do secretário. Osíris se demitiu após saber da decisão superior
de que a bagagem poderia ser liberada sem revista. Em seguida, irritado pela cobrança
da imprensa em relação à bagagem da seleção, Teixeira disse:
“É irrelevante o que os jornais escrevem. O que vale é o povo,
que nos recebe com muito carinho” (Folha de São Paulo, 5/8/94)
O fato é que algumas informações terminam por ser relevantes.
Em editorial de 29/7/94, intitulado de “Investigue-se a CBF”, o Estado de
São Paulo repudiou a atitude de Teixeira e da comitiva presente no vôo:
“Parece que se supôs que os jogadores seriam mesmo
dispensados do pagamento à aduana. É aí que entra o fator CBF. O
que não se poderia supor é que o avião viria cheio, carregado da seleção
(...). E passou tudo, num festival de liberações que ninguém de bom
senso poderia prever, porque o fato é inusitado, mas se enquadra na
mentalidade dominante na Confederação Brasileira de Futebol.
Cresce o interesse da sociedade no esclarecimento do que ocorreu,
sobretudo porque esse bizarro vôo do tetra é uma espécie de
coroamento do que vinha acontecendo na notória entidade da Rua da
Alfândega (quanta ironia do destino!) e agora há esperança de que os
bastidores da Confederação Brasileira de Futebol venham a ser
conhecidos, para que, se for o caso, se ponha ordem na casa.
O erro de origem de tudo o que está acontecendo vem da
circunstância do que foi montado para produzir efeito em 17 de julho
de 1991. Naquele dia o sr. Ricardo Teixeira, para driblar o Projeto
Zico, pelo qual 110 presidentes de clubes elegeriam no tempo devido o
presidente da Confederação (...), reuniu 27 representantes das 27
Federações, o colégio eleitoral que o remeteria a um segundo mandato, e
aclamou-se supremo mandatário do futebol brasileiro. O mandato dele
terminaria a 16 de janeiro de 1992. O escrutínio foi antecipado e ele
ganhou de mão beijada novo mandato.
(...) É preciso não esquecer que a CBF está subordinada ao
Conselho Nacional de Desportos, órgão do Ministério da Educação e do
Desporto. Não é propriamente uma entidade privada, como quis fazer
crer o sr. Teixeira, recusando ingenuamente dar a público a lista dos
passageiros do vôo do tetra. (...)
A conclusão a extrair de tudo é que se as ocorrências da
Alfândega não ficarem esclarecidas, promovendo-se a observância da lei, é
que esta é a hora de esclarecer a CBF - e bem.” (grifos no original)
Já a Folha do dia 5/8/94 informou que Ricardo Teixeira pagou R$
1.040,00 à Receita Federal, pelo que trouxe dos EUA. O motorista dele, Odair Araújo
Silva, pagou mais, R$ 1.633,00. A CBF, na época, encaminhou uma lista à Receita
contendo a relação dos bens trazidos pela delegação e seu valor. Pela lista da CBF, os
bens pesariam cerca de 1.100 kg. Só que o vôo trouxe quase 15 toneladas.
Além disso, a lista incluía 42 dos 95 nomes das pessoas que teriam
viajado naquele vôo. Uma das falhas da lista foi a indicação de que Marco Antônio
Teixeira, secretário geral da CBF, teria trazido um computador avaliado em US$ 129.
“É impossível comprar qualquer computador por esse preço”, finaliza a Folha de São Paulo, de
30/7/94.
O jornalista Marcelo Pontes, no Jornal do Brasil de 10/8/97, criticou com
veemência as ações de Teixeira no desembarque:
“Veja que história exemplar. (...) A Fifa é uma ONU, para
Havelange. Tem suas leis próprias, seus estatutos, suas condições. Quem
concordar está dentro, quem discordar que se mande (...) Então, se é
assim, se a Fifa e por tabela e obrigação a CBF rejeitam ruidosamente a
interferência oficial, por que diabos os cartolas correram para os braços do
governo quando os tetracampeões mundiais de futebol retornaram dos
Estados Unidos em 20 de julho de 1994 com um Jumbo entupido de
contrabando? (...)
Foi um vexame. Diante da decisão dos fiscais da Receita
Federal de conferir a bagagem, os jogadores, Romário à frente,
ameaçaram devolver a medalha recebida horas antes do presidente da
República, em Brasília. Entre a comenda oficial, a homenagem cívica e a
quinquilharia eletrônica ou doméstica, não tinham dúvidas. Eram
simplesmente consumidores.
O que fez, então, no aeroporto, o presidente da CBF, Ricardo
Teixeira, agora um obediente seguidor da doutrina Havelange de não
admitir em hipótese alguma interferência do governo no futebol?
Incomodou Brasília inteira. Indignado, ligou direto para o Palácio do
Planalto. (...)
Esta é a historinha: o cartola que hoje, pela obrigação da
religiosa fidelidade à ONU do futebol, não admite interferência do
governo no seu mundo, arrancou do mesmo governo, na pressão, na
ameaça, na chantagem e na marra, uma isenção fiscal para todo o Jumbo
dos tetracampeões. Isso que é coerência.”
A revista VEJA, de 27/7/1994, publicou um reportagem extensa, capa
daquela edição, cujo título era “Muamba Tétrica”. Em editorial, VEJA atacou também a
atitude da comitiva:
“ (...) O governo federal, traduzindo acertadamente o
entusiasmo dos brasileiros, concedeu a medalha do mérito desportivo aos
jogadores. O orgulho de ser brasileiro imperava. A festa era uma
maravilha até que o avião com os craques aterrissou no Rio. A partir
daí, jogadores, cartolas e autoridades protagonizaram um espetáculo
lamentável, que maculou a comemoração. (...) Ameaçar devolver as
medalhas, ameaçar não desfilar caso a lei fosse cumprida é falta de
compostura. É dar um péssimo exemplo. Autoridades e jogadores
perderam uma excelente oportunidade de mostrar aos brasileiros que
todos são iguais diante da lei, que as regras têm de ser respeitadas”
A reportagem destacou a ação dos cartolas da CBF:
“Mas houve uma conspiração maluca contra o bom senso. Os
cartolas da CBF esbravejaram e os jogadores engrossaram, ameaçando
devolver medalhas e não desfilar. A República de Juiz de Fora, atônita,
vacilou, submeteu-se à chantagem orquestrada por Ricardo Teixeira. A
muamba foi liberada, mas ao custo do desagrado geral (...) Pesquisa de
opinião mostra que 70% da população acha que os jogadores devem
pagar o que devem à Receita.”
Ao longo desse debate, outras discussões e polêmicas foram levantadas.
A Receita Federal, que iria vistoriar os equipamentos importados nas residências das
pessoas que vieram no vôo, não obteve a lista completa dos passageiros. Apesar disso,
iniciou-se a fiscalização nos domicílios dos passageiros que já haviam sido identificados.
Segundo informações, um dos mais conhecidos passageiros, o Desembargador Antônio
Carlos Amorim11, não apareceu na lista oficial. Até que, por motivos ainda ignorados,
essa fiscalização foi interrompida pela Justiça.
JUSTIÇA FEDERAL CONFIRMA CONTRABANDO
Alguns processos na Justiça Federal revelam uma série de informações
importantes. Teixeira teria trazido os tais equipamentos para sua choperia, e que as
caixas desse material teriam sido filmadas no aeroporto, pela Infraero, e a fita teria sido,
depois, cortada, desaparecendo uma das principais provas do crime.
A Receita Federal passou, então, a acompanhar a montagem da choperia
de Teixeira e confirmou que uma segunda importação do mesmo tipo de equipamento
teria sido feita para tentar justificar a primeira, e, assim, regularizá-la. É que agindo
dessa maneira, Teixeira, segundo a versão da Receita Federal, poderia utilizar a mesma
guia de importação para o equipamento novo, importado corretamente, e para o que
veio ilegalmente na bagagem da seleção, meses antes da segunda remessa, em julho de
1994.
A Receita Federal acompanhou, filmou e confirmou que os
equipamentos vistos no aeroporto, durante o desembarque, levados para o Jóquei
Clube, onde foi instalado o bar El Turf, eram os mesmos utilizados por Teixeira em seu
restaurante. Esses equipamentos, mesmo antes da chegada da segunda remessa de
equipamentos, já começaram a ser montados, como consta nos processos.
O segundo grupo de equipamentos foi importado por uma empresa de
nome Uno Industrial Exportadora Ltda., empresa que também já recebeu dinheiro da
CBF (R$ 15.000,00 em 14/10/96 e R$ 15.631,74, em 3/12/96).
No processo movido pela União contra o El Turf, de Ricardo Teixeira e
seu irmão Guilherme, a União venceu em primeira instância na Justiça Federal,
sentença proferida pelo juiz Dr. Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Juiz Federal da
6ª Vara. Esse juiz determinou a aplicação da pena de perdimento do equipamento
importado ilegalmente, além de seu lacre. Com isso, o El Turf perdeu o equipamento
trazido no vôo da muamba.
O Estado de São Paulo publicou a seguinte notícia, em 16/9/99:
“Na sexta-feira, o juiz da 6ª Vara Federal do Rio,
Guilherme da Gama, cassou liminar que impedia a Receita Federal de
O Desembargador aposentado Antônio Carlos Amorim recebeu, inclusive, ajuda para a sua campanha eleitoral para
Deputado Federal, em 1998, no valor de R$ 50 mil.
11
apreender o equipamento instalado na boate. A Receita alega que o
material das chopeiras chegou ao País de forma ilegal, no vôo que trouxe
a seleção brasileira logo após a Copa do Mundo de 1994, nos Estados
Unidos. Anteontem, as torneiras foram lacradas por um inspetor da
Receita.”
Advogados do El Turf ajuizaram mandado de segurança (Processo
1999.02.01.036599-3) contra a decisão de lacrar os equipamentos do estabelecimento. A
mesma reportagem do Estado, acima, informou que o Desembargador Paulo Espírito
Santo mandou que o equipamento fosse liberado:
“O desembargador Paulo Espírito Santo, do Tribunal
Regional Federal (TRF), acatou mandado de segurança impetrado pelos
advogados da Boate El Turf, da qual o presidente da Confederação
Brasileira de Futebol (CBF), Ricardo Teixeira, é um dos proprietários, e
determinou que as 22 chopeiras da casa, localizada na Gávea, zona sul
do Rio, fossem deslacradas.”
O advogado do El Turf na ocasião foi o também vice-presidente da CBF,
como informou o Estado:
“O advogado Carlos Eugênio Lopes, vice-presidente jurídico da
CBF e encarregado por Teixeira de defender a El Turf, disse que o juiz
errou ao determinar a execução da sentença antes de sua publicação no
Diário Oficial.” (g.n.)
O El Turf apelou contra a decisão do juízo de primeira instância.
Segundo informações, o mesmo desembargador Paulo Espírito Santo avocou a
apelação ajuizada pelos advogados dos irmãos Teixeira, e que isso poderia não ser
regular.
O fato é que os dois recursos do El Turf foram autuados pelo Tribunal
Regional Federal da 2ª Região em 9/2/2000, e têm os números 2000.02.01.012314-0 e
2000.02.01.012315-1. Os dois processos têm como relator o Desembargador Paulo
Espírito Santo, que, até a data de hoje, não se pronunciou sobre a questão.
Ricardo Teixeira, ao depor perante a esta CPI, não disse a verdade, por
duas vezes, sobre o processo que o envolve e a seu restaurante El Turf. O Deputado
Dr. Rosinha interrogou Teixeira sobre o assunto:
“O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - (...) Foi feita uma
pergunta pelo Deputado Silas Câmara sobre as importações de
equipamentos. E o senhor não teve nenhum problema? O senhor falou
dos jogadores, o senhor não teve nenhum problema com a importação
daqueles equipamentos na época do vôo, daquele vôo dos atletas?
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA – Excelência, tive. Eu
tive, inclusive, uma ação fiscal sobre isso, foi noticiado na época, inclusive
lacraram o equipamento. Mas logo em seguida, o mesmo juiz que
determinou o lacre daquele equipamento reconheceu a legalidade da
importação e imediatamente autorizou que se acabasse o lacre. De forma
que essa ação já terminou não só na parte criminal, como na parte
também de Receita Federal. (g.n.)
Teixeira afirmou que a ação “terminou”, o que não é verdade. Ao
contrário, o juiz federal Dr. Guilherme da Gama decidiu pelo perdimento do material,
em desfavor de Teixeira e do El Turf. E o El Turf recorreu, estando o processo nas
mãos do desembargador Dr. Paulo Espírito Santo. Este sim, e não o juiz federal como
disse Teixeira, é que liberou o equipamento para uso temporário, até que a decisão final
seja proferida.
Mesmo que o desembargador Espírito Santo venha a decidir a favor do
El Turf, a União pode, ainda, recorrer. Com isso, não poderia Teixeira ter afirmado que
a ação terminou, mesmo que ele conheça, previamente, a decisão do desembargador.
“O SR. DEPUTADO SILAS CÂMARA – Então, não existe um
processo que corre até hoje, nem contra o senhor nem contra nenhum
membro da Seleção, na Receita Federal, sobre o assunto do excesso de
compras feitas no exterior?
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA – Não, isso foi tudo
liquidado.”
SUSPEITAS DE
SONEGAÇÃO DE IMPOSTOS NA SEGUNDA IMPORTAÇÃO
De acordo com os autos dos processos que tramitam na Justiça Federal,
os sócios do El Turf teriam apoiado a sonegação de impostos que seria feita na segunda
importação de equipamentos para a choperia. Isso ficou claro diante de carta inserta
nos autos, por meio da qual a importadora Uno questiona a Guilherme Teixeira se os
equipamentos deveriam ser importados ou não com características falsas para fugir do
pagamento de impostos, o II (imposto de importação) e o IPI (imposto sobre produtos
industrializados).
A carta diz o seguinte:
“Para Guilherme Teixeira
Data: 14/10/94
Ref.: Sistema para Chopp
Conforme combinado, encaminhamos, em anexo, Planilhas Estimativas
para a importação do “Sistema para servir chopp”. Favor notar que consideramos dois
preços distintos com referência a Guia de Importação.
Para que possamos ficar isentos de II e IPI, precisaríamos classificar o
sistema como segue:
‘Filtro prensa automático para mosto de cerveja, com sistema de
pré-compressão e compressão para retirada do mosto sem absorção de
oxigênio, com controlador programável’
Gostaria de ouvir sua opinião técnica a respeito dessa classificação.
Um abraço,
Oscar Cruz
Uno Importação e Importação Ltda.
Av. Ataulfo de Paiva, 135/1212, Rio de Janeiro” (g.n.)
Anexadas à carta seguiram duas planilhas, cada uma com valores
específicos para as duas situações (Ver Anexo Carta da Uno e seus anexos).
Os equipamentos foram, de fato, importados com a denominação que
permitia a sonegação de impostos federais, ou seja, em vez de equipamentos para servir
chopp, foram importados como sendo filtro prensa automático para mosto de cerveja ... etc.
Essa falsificação, entre outras, fez com que a Receita e a Justiça Federal
considerassem irregular toda a transação envolvendo a importação ou descaminho dos
equipamentos do El Turf. Para conferir, basta consultar o processo, que é público,
tramitando no TRF da 2ª Região.
TEIXEIRA RECLAMA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS
Ricardo Teixeira ajuizou, à época, uma ação visando obter indenização de
alegados danos morais sofridos, em decorrência da autuação de agentes públicos que
reputava desmotivada e abusiva.
Em contestação à ação de Teixeira, processo número 95.0022026-1 da 6ª
Vara da Justiça Federal do Rio de Janeiro, o Procurador da Fazenda Nacional,
representante judicial da União, Dr. Manoel Rolim Campbell Penna, afirmou que o
pedido de Ricardo Teixeira continha “incorreções, inverdades e dolosas omissões”
(grifos do original) (Ver Anexo Processo El Turf/Muamba).
O Dr. Manoel Penna chegou, dentre outras, às seguintes conclusões:
“ - o maquinário apreendido não é oriundo, exclusivamente, da
Nova Zelândia, tendo sido encontrados e apreendidos materiais
produzidos nos Estados Unidos da América, procedentes de Los
Angeles, e na Inglaterra;
- o que o autor denomina de intransigência dos fiscais por
ocasião do desembarque da comitiva da seleção brasileira representou, na
verdade, uma tentativa das referidas autoridades em dar o cumprimento
fiel à legislação aduaneira, no que foram obstadas pela atitude do autor,
que exaltava os ânimos dos presentes, como ele próprio confessa, visando
a liberação da bagagem da comitiva ‘sem a cansativa revista’; afirmação
esta que a par de salientar a prepotência que norteia as atitudes do autor,
serve ainda como confissão dos crimes de resistência e desobediência à
ordem legal emanada de funcionários públicos no legítimo exercício de
suas funções (Código Penal, arts. 329 e 330);
- o Inspetor da Receita Federal e o Procurador da República
acoimados de perseguidores do autor atuaram nos estritos limites de suas
obrigações funcionais, promovendo a apuração de denúncias de fraude ao
Erário de que tiveram conhecimento;
- existiam e persistem severos indícios de intrusão ilegal de
maquinário estrangeiro em território pátrio por atos do autor e seus
sócios, justificadores das atitudes adotadas pelo Sr. Inspetor da
Alfândega e Dr. Procurador da República no exercício de suas
atribuições funcionais...”
O Dr. Manoel Penna terminou sua contestação com as seguintes
palavras:
“Em qualquer hipótese, ressalta-se a ostensiva má-fé do autor,
que altera a verdade dos fatos e falseia documentos com o intuito de
induzir a erro esse MM. Juízo e, com isso, obter ilegal locupletamento
sobre a própria torpeza, lide temerária esta que reclama a devida
repreensão de V. Exa., para que não se desmoralize a Justiça (CPC
art. 17)” (g.n.)
Esse processo se encontra no Tribunal Regional Federal da 2ª Região, do
Rio de Janeiro, com o número 98.02.28351-7.
Já nessa instância, o Procurador Regional da República, Dr. Luiz Mendes
Simões, membro do MP junto ao TRF da 2ª Região, condenou Ricardo Teixeira, em
seu parecer, julgando improcedente o pedido de indenização do presidente da CBF:
“De início, cumpre lembrar que até hoje [4/2/1999]
permanecem obscuros diversos fatos que envolveram o desembarque da
seleção brasileira de futebol em julho de 1994. Se os jogadores e os
integrantes da comissão técnica da seleção nada tinham a esconder, por
que então não permitiram a conferência da bagagem que traziam? Se
nada tinham a ocultar, por que os auto-proclamados “ídolos” nacionais
criaram toda aquela celeuma que envolveu o desembarque da seleção?”
(g.n.)
E concluiu:
“Na verdade, e ao contrário do que se postula na inicial, a
inação dos servidores, ao tomarem conhecimento dos fatos que envolvem a
demanda, é que poderia configurar, em tese, crime de prevaricação. O
comportamento desses servidores merece, muito ao contrário do que afirma
o Autor, todos os elogios e aplausos da sociedade.” (g.n.)
Esse processo tem como relator o Desembargador Federal Poul Erik
Dyrlund, da 6ª Turma do TRF da 2ª Região, de quem se aguarda a decisão.
INCÊNDIO NA GRANJA COMARY
Em 1999, houve um incêndio nas instalações da Granja Comary, local
utilizado para os treinos da seleção, que fica em Teresópolis, RJ. Pela ocorrência
registrada pelo 16° Grupamento de Bombeiro Militar, naquela localidade, no dia 27 de
junho de 1999, por volta das 6 h 50 min teria ocorrido um princípio de incêndio na rua
Hercílio Ferreira dos Santos, sem número, bairro Granja Comary. A ocorrência foi
registrada apenas no dia 7 de julho do 1999 (Anexo Certidão Incêndio Granja Comary).
Foram perdidos documentos importantíssimos referentes à contabilidade
da CBF, de 1985 até 1994. Nessa documentação, incluía-se todo material referente aos
problemas ocorridos com a seleção na volta da Copa de 94. Essa questão, o retorno da
comitiva em julho de 1994, ainda não está completamente resolvida, com várias ações
na Justiça.
O incêndio não mereceu investigação alguma da CBF. Afinal, quem
examina os atos da entidade?
O que conteria aquele conjunto de documentos? Recibos, espelhos de
cheques, informações úteis, não só para outras investigações, até para a história da CBF
e do futebol brasileiro. Não se sabe, também, se alguém teria algum interesse em
destruir aqueles documentos.
Há necessidade, portanto, do Ministério Público promover investigações
que poderão revelar se o incêndio foi, ou não, proposital.
CAPÍTULO VII – EMPRÉSTIMOS NO EXTERIOR A JUROS
EXTORSIVOS
Entre 1998 e 2000, a CBF tomou seis empréstimos junto ao Delta
National Bank and Trust Co. of N.Y. (650 Fifth Avenue, Nova.Yorque). Trata-se de
uma série de seis empréstimos feitos pela CBF junto ao Delta Bank, entre outubro de
1998 e setembro de 2000, com juros muito acima dos juros correntes no mercado
internacional, na época. Foram empréstimos que somaram de 39 milhões de dólares,
sendo que a entidade pagou mais de 6 milhões de dólares só de juros.
A seguir, tabela com os seis empréstimos:
EMPRÉSTIMOS TOMADOS PELA CBF JUNTO AO DELTA NATIONAL BANK
Emprés
timo
1
Valor (US$)
7.000.000,00
2
4.500.000,00
3
10.000.000,00
4
3.708.281,83
5
10.000.000,00
6
4.500.000,00
TOTAL 39.708.281,83
Juros
nominai
s aa
Valor dos
Juros
Início
Juros
Venciment
Liquidação Reais ao
o
ano
43,576% 652.429,56
27/10/98
12/01/99
06/01/99
52,12%
25,0% 843.750,00
29/12/98
14/09/99
02/09/99
34,30%
25,0% 2.326.388,89
05/02/99
05/01/00
07/01/00
32,48%
21,0%
748.454,88
21/09/99
14/09/00
06/09/00
20,70%
16,0% 1.435.555,56
24/02/00
12/01/01
12/01/01
18,68%
14,5%
07/09/00
10/01/01
04/01/01
15,23%
---
215.702,48
6.222.281,37
---
---
---
---
Fonte: Delta Bank, CBF e CPI CBF/Nike
Examinando o primeiro desses empréstimos, um analista do Banco
Central, do escritório de Belo Horizonte, comentou, nos autos de um processo, ainda
em andamento no BC (Ver Anexo Processos dos Empréstimos - Banco Central,
documentos de referência: Sigilo Bancário CBF Anexo 03 Pasta 05, página 41 a 59 e
124 a 194) que:
“ fato que merece ser destacado é que enquanto as taxas de
juros praticadas no mercado internacional encontravam-se no patamar de
5,22% ªª (LIBOR trimestral) e 8% ªª (PRIME trimestral), a taxa
pactuada para o mútuo sob comento foi de 43,576 ªª; (...) assim sendo,
podemos afirmar que, caso a captação realizada pela CBF tivesse curso
no mercado de câmibo de taxas livres (foi no flutuante), a contratação do
mútuo ora sob análise, muito provavelmente não seria autorizada por este
Banco Central” . E conclui: (...) “ são fortes os os indícios de evasão de
divisas, uma vez que os juros pagos exorbitam daqueles cobrados no
mercado internacional (...) o que poderá ser conclusivamente apurado pelo
Ministério Público”. (g.n.)
O Departamento Jurídico do BC de Belo Horizonte, entretanto, não
encontrou indicações de evasão de divisas, mas “tão-somente indícios de um mau negócio, que
só poderá ser fiscalizado pelos membros da CBF, associação civil de direito privado”. E opinou pela
não comunicação ao Ministério Público. Mas o caso não se encerrou aí. Requisitado
pela superintendência do Banco Central, esse processo está sendo reexaminado em
Brasília, conforme nos informou, oralmente, a sua Diretora de Fiscalização, dra.
Theresa Grossi.
Em todos os seis empréstimos o presidente da CBF, Ricardo Teixeira,
assina como avalista da entidade. Causa estranheza que o Banco tenho aceitado esse
aval, dada a enorme discrepância entre os valores negociados e a renda declarada de
Ricardo Teixeira.
Entre os documentos sobre o primeiro empréstimo há cópia de uma
carta do Delta Bank endereçada à CBF, datada de 18/9/98, na qual o banco relaciona
as condições do empréstimo de US$ 7.000,000.00, descrevendo que a garantia seria o
“aval pessoal do Sr. Ricardo Teixeira (pede para fornecer a relação de bens do Sr.
Teixeira) e alienação de recebíveis do contrato da Nike”.
É inusitado que um banco dos EUA, cuja política de concessão de
crédito é conhecida como muito rigorosa pelo mercado, tenha concedido um
empréstimo num montante vultoso de sete milhões de dólares apenas tendo como
garantia o aval do Sr. Ricardo Teixeira, cujos bens estão avaliados em cerca de R$4.8
milhões de reais. A garantia que os bancos exigem costuma estar por volta de 130 por
cento do valor tomado. Além disso, sabe-se que a NIKE recusou dar a garantia para o
empréstimo, conforme depoimento dos representantes da NIKE a esta CPI:
“O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – Saber o seguinte...
Há possibilidade de a empresa entrar como garantidora de algum
contrato de empréstimo feito pela CBF ou pela Traffic, qualquer uma
que conste do contrato, mediante os pagamentos que tem a fazer?
O SR. AMADEU AGUIAR JÚNIOR - Não. Isso não é uma
previsão do contrato. Nossa única obrigatoriedade é fazer os pagamentos
conforme a programação definida.”
A estranheza se transforma em espanto quando o aval de Ricardo
Teixeira continua a ser suficiente para garantir os cinco empréstimos seguintes, que
elevaram os compromissos da CBF a 39 milhões de dólares.
Esses empréstimos foram objeto de exame da própria mídia, conforme
publicou a Folha de São Paulo, do dia 20/4/2001. Nessa reortagem, consta que
analistas especializados foram unânimes em afirmar que os empréstimos foram feitos
de maneira irregular (Ver Anexo Folha de São Paulo, dia 20/4/2001):
“Juros da CBF foram recorde
Documentos em poder da CPI da CBF/Nike mostram que,
dos 50 empréstimos feitos pelo Delta Bank no período, seis maiores
taxas foram tomadas por Ricardo Teixeira
A CBF foi a instituição brasileira que pagou os maiores juros
entre todos os empréstimos realizados pelo Delta Bank (EUA) de 1997
a 2000, segundo documentos que estão em poder da CPI da CBF/
Nike, na Câmara dos Deputados.
De acordo com a lista, que contém o nome das 50 empresas do
Brasil que realizaram operação de empréstimo com o banco nos últimos
quatro anos, a entidade foi responsável pelo pagamento dos seis maiores
juros ao Delta.
O que chama a atenção e reforça as dúvidas de parte da
comissão sobre a legalidade das operações da CBF é que muitos dos
negócios das outras empresas foram feitos no mesmo período que os da
entidade. A CPI quer usar a lista para derrubar o principal argumento
de Ricardo Teixeira, presidente da CBF, para justificar as operações.
Ele alega que as taxas de juros se elevaram por conta da crise financeira
da Rússia, em 1998.
A maior taxa anual entre os negócios _avalizados por
Teixeira_ feitos pela entidade foi fixada em 43%, para um empréstimo
de US$ 7 milhões tomado em outubro de 1998. O prazo do negócio era
de 77 dias. Segundo a CPI, como a CBF pagou os juros adiantados e
liquidou o empréstimo alguns dias antes da data final, os juros chegaram
a 52,1% ao ano.
À época, com o auge da crise na Rússia, o Fed Funds _taxa
de juros básica determinada pelo Federal Reserve, o Banco Central dos
EUA_ era de 5% ao ano.
A título de comparação, com base na lista em poder da CPI,
uma determinada empresa realizou empréstimo no mesmo banco seis dias
antes (20 de outubro), com juros de 10% ao ano. Outras três instituições
realizaram a mesma operação no dia 26 com juros que variaram de 8%
a 10%. Da lista, a taxa mais alta paga por uma empresa após as da
CBF é de 12%.
Mesmo se não conseguirem comprovar irregularidades (evasão
de divisas), deputados da CPI já estão convencidos de que os empréstimos
revelam má administração de Teixeira na entidade.
(...)
Especialistas em mercado consultados pela Folha afirmaram
que os juros são altos demais até para o período de crise.” (g.n.)
As taxas praticadas pelo Delta Bank com a CBF foram as únicas que
excederam as taxas normais de mercado. Até mesmo o Restaurante El Turf, de
propriedade de Ricardo Teixeira, obteve, em abril de 1999, um empréstimo de R$
843.262,00 junto ao mesmo Delta Bank, a taxas de 12,0% ao ano (Ver Anexo Banco
Rural International Conta CC5 - Anexo 33, pastas 1 a 37).
A seguir, será realizada análise dos empréstimos, individualmente.
1. PRIMEIRO EMPRÉSTIMO :
ANTECIPADAMENTE
US$
7
MILHÕES ,
JUROS
PAGOS
a) Juros extorsivos
Em 20 de outubro de 1998, a CBF contratou um empréstimo de 7
milhões de dólares com o DELTA NATIONAL BANK, de Nova Iorque, com juros
de 43,57% ao ano, sendo esses juros em dólares! Nada explica esses juros tão elevados.
A CPI tem em mãos dezenas de empréstimos feitos por empresas e mesmo pessoas
físicas brasileiras junto ao Delta Bank, no mesmo período. Todos foram tomados com
juros de, apenas, 9% a 10% ao ano.
b) Juros pagos antecipadamente
Como qualquer tomador, a CBF tinha o prazo de 77 dias para pagar os
juros do empréstimo. Mas os juros, – os 652.339,72 dólares – foram pagos
adiantadamente. Foram pagos no mesmo dia 29/10/98. Quer dizer, o dinheiro dos
juros veio para a conta da CBF e voltou no mesmo dia para o Delta Bank. Na prática,
isso significa que a CBF não pagou juros de apenas 43.57%, mas juros reais de 52%
ao ano!
c) O pagamento do principal foi feito antes do prazo.
Parece que a CBF não se importa em desperdiçar dinheiro. A data do
vencimento do empréstimo de US$7 milhões era 12/01/99. No entanto, a CBF pagou
no dia 06/01/99. Por que pagou seis dias antes do prazo? Considerando que a CBF
estava pagando US$8.471,00 por dia de juros, deu de graça cerca de US$50 mil ao
Banco credor.
No mesmo dia 6 a CBF havia recebido o pagamento de US$15 milhões
da Nike. Se ficasse com os US$7 milhões a juros por esses seis dias, como faria
qualquer pessoa ou empresa, a CBF teria ganho uma importância considerável. Por que
não o fez? Ou, então, porque a CBF não solicitou ao Delta Bank um desconto pelo
apagamento adiantado?
d) Caminho tortuoso com passagem nas Bahamas.
Neste gráfico anexo temos o rastreamento do caminho seguido pelos
US$7 milhões desde o Delta Bank, em Nova Iorque, até a conta corrente da CBF na
agência do Banco Rural, em Belo Horizonte. Por que um caminho tão complicado? O
dinheiro sai do Delta, vai para o BANESTADO, agência de Nova Iorque. Daí, vai para
a agência do RURAL INTERNATIONAL BANK, em Nassau, Bahamas, paraíso
fiscal. De lá, vai para a conta corrente da CBF no Banco Rural, em Belo Horizonte.
(gráfico a seguir)
DELTA INTER.
BANK
1
6B
4B
BANESTADO
RURAL INTERN.
BANK
CC: 1.111-3
NASSAU - BAHAMAS
AMERICAN
EXPR. BANK
1A
CC: 124 081
4A
6A
NOVA YORK
5
3
2
CC: 133107
BCO RURAL
NIKE
6
BCO RURAL
CC: 4344-2
HOLANDA
BELO HORIZONTE
4
CBF
RIO DE JANEIRO
INFORMAÇÕES
1. Transferência de US$ 7.000.000 do Delta para CC do Rural
International, no Banestado
1A. Transferência de US$ 6.836.000 do Rural Int. para o Banco Rural,
BH, menos US$ 163.000 do previsto (28.10.98)
CONTA CORRENTE
2. Depósito dos US$ 6.836.000, deduzido dos tributos pagos pelo banco
(líqüido: R$ 7.846.000,00), na CC da CBF (29.10.98).
CHEGADA DE VALORES
SAÍDA
DE
VALORES
EMPRÉSTIMO DA CBF JUNTO
AO DELTA NATIONAL BANK,
DE US$ 7.000.000.
(em 29.10.98, taxa: 43,6% a.a.)
3. Depósito do equivalente aos juros (R$ 779.000,88) na CC geral do
Banco Rural, Rio, pelo Rural International. Não se sabe o motivo.
(29.10.98)
4. Pagamento dos juros pela CBF, R$ 779.000,88, na CC do Rural
International (29.10.98).
4A. Transferência interna (Rural International) dos juros pagos pela CBF
para o Banestado (suposição).
4B.Transferência do Rural International para o Delta dos juros enviados
pela CBF, via Banestado (não se sabe se ocorreu).
5. Depósito de US$ 15.000.000 da NIKE na conta do Banco Rural,
dentro do American Express Bank, NY (6.1.99).
6. Pagamento do empréstimo (R$ 8.623.713,00) pela CBF, ao Rural
International. Valor eqüivale a US$ 7.123.000, maior em cerca de US$
123.000 do contratado (6.1.99).
6A. Transferência interna do Rural International (suposição)
6B. Transferência de US$ 7.000.000 da CC do Rural International de
sua CC no Banestado, NY, para o Delta (6.1.99).
Perguntado pelo Deputado Sílvio Torres a respeito do trajeto da remessa
do dinheiro desse empréstimo e do seu pagamento, Ricardo Teixeira não soube
responder:
“O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - Queria também
agregar mais uma informação sobre os empréstimos, mais especialmente
sobre o primeiro empréstimo, de valor maior, para dizer que o empréstimo
de 7 milhões do Delta Bank, que foi o primeiro, ele percorreu três bancos
diferentes antes de chegar ao Banco Rural, que era o banco que queria
fazer o depósito. Ele passou pelo Delta, pelo BANESTADO e pelo
Rural International Bank. O Dr. Ricardo Teixeira tem alguma
informação sobre esse caminho, para nos esclarecer por que esse caminho
tão tortuoso?
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Eu tenho que verificar
por quê, mas isso daí não é uma decisão que a CBF toma. Quer dizer,
quem toma é o próprio banco, a forma de o dinheiro sair daqui.
O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - O senhor conhecia esse
percurso?
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Com toda a
honestidade, eu estou tomando conhecimento, mas deve... Se aconteceu
isso, deve estar na contabilidade.” (g.n.)
Por que, afinal, esse dinheiro teria passado por três Bancos diferentes
antes de chegar ao Banco Rural? Delta, Banestado e Rural International Bank?
e) Recebeu a menos e pagou a mais
Na transferência dos US$ 7 milhões do Rural International Bank, de
Nassau, para a agência do Banco Rural de Belo Horizonte há uma diferença de valores
Saíram, da agência de Nassau, US$ 7 milhões, e deram entrada na agência de Belo
Horizonte apenas US$ 6.836.000,00. Tudo com a mesma taxa de câmbio e já
descontados IR, IOF e CPMF... Há uma diferença para menos de US$ 163 mil.
Já no pagamento do empréstimo, em 06/01/99, deu-se um movimento
contrário, mais uma vez em prejuízo da CBF. Nessa data, a CBF creditou ao Rural
International Bank, Nassau, R$ 8.606,500,00 (atenção! reais). Convertidos pela taxa
cambial do dia, que foi R$ 1,2082 por dólar, no flutuante, equivaleram a US$
7.123.064,00 (dólares). Mas a dívida da CBF era de US$ 7.000.000,00 apenas! Por que a
CBF pagou US$ 123.000,00 a mais?
O Banco Rural alega que essas diferenças, na entrada e na saída dos
valores se deve à sua comissão, que é obtida em cima da oscilação do câmbio, no dia.
Na entrada foi uma comissão de 2,33%. Uma comissão considerada alta no mercado,
ainda mais sendo aplicada a uma importância grande.
Se somarmos tudo o que a CBF perdeu em razão de uma taxa de juros
escandalosa, o pagamento antecipado de juros e do principal, a desvalorização cambial,
as elevadas comissões ao Banco intermediário (Banco Rural), chegamos a um número
de cerca de US$ 1.080.000.
2. SEGUNDO EMPRÉSTIMO : US$ 4,5 MILHÕES ,
ARAUCÁRIA, JUROS PAGOS ANTECIPADAMENTE
POR MEIO DO
BANCO
Em 14 de dezembro de 1998, 22 dias antes de receber os US$15 milhões
da Nike, a CBF fechou o segundo empréstimo com o Delta Bank, de Nova Iorque. A
transferência, no valor de US$ 4,5 milhões, foi efetivada em 30/12/98. Os juros foram
de 25% ao ano, duas vezes e meia a mais do que os juros praticados no período pelo
mercado. (Boletim do Banco Central do Brasil indicou taxas entre 8% a 13% a.a. na
época. O Banco Central do Uruguai admitiu, para a mesma data, taxas médias de 10,4%
a.a.)
Nesse empréstimo, o valor dos juros pagos ficou em Vencimento em
14/09/99, prazo de 9 meses. 4.500.000,0 X 25% em 9 meses = US$ 843.750,00 (valor
dos juros).
JUROS PAGOS ANTECIPADAMENTE
Os juros foram pagos antecipadamente, como no empréstimo anterior, o
que os torna, em juros reais de mais de 30% ao ano, pagos pela CBF. Com um
agravante: o valor referente aos juros nem chegou a ser internado no Brasil,
caracterizando sonegação de impostos sobre esse valor (US$ 843.750,00).
Rastreando os movimentos dessa transferência através das telas do Banco
Central, observamos que:
a) O DELTA BANK de Nova Iorque transferiu US$ 4.500.000,00 para a
agência do TRADE AND COMMERCE BANK nas Ilhas Cayman (paraíso fiscal);
b) Em 30/12/98 O TRADE AND COMMERCE BANK transferiu US$
3.614.442,00 para sua conta corrente no Banco Araucária, em Curitiba, retirando US$
885.000,00, relativos aos juros. Como os juros eram de US$ 843.750,00, estamos
supondo que a direrença a mais – US$ 41.500,00 refiram-se à comissão do Banco.
Quanto ao Banco Araucária, ao aceitar esse procedimento, isto é, receber menos do que
havia sido emprestado, omitiu-se perante a lei brasileira, tornando-se cúmplice do ilícito
de sonegação do Imposto de Renda relativo aos juros e que deveriam ser pagos no
Brasil.
c) O Banco Araucária converteu US$ 3.614.442,00 em reais que, depois
de descontados os outros impostos e taxas -- IOF R$ 87.216,49 e CPMF R$ 8.704,21 - resultaram em R$ 4.264,904,00, que foram depositados na conta corrente da CBF no
Banco Real, agência do Rio de Janeiro (taxa cambial do dia: R$ 1,206500).
a) Em 2 de setembro de 1999 a CBF depositou R$8.969,850,00 na conta
corrente do DELTA BANK no Banco Sudameris, agência de Araraquara. De onde esse
dinheiro, convertido em dólares, foi enviado para o DELTA BANK em Nova Iorque,
em pagamento do empréstimo, doze dias antes do prazo estipulado, em prejuízo da
CBF e em inexplicável vantagem para o DELTA BANK.
b) Aspecto ainda mais relevante: naquela data, o valor de R$ 8.969,805,00
era equivalente a US$ 4.660.000,00, valor superior em US$ 160.000,00 (dólares) ao do
empréstimo feito pelo DELTA BANK, que era de US$ 4.500.000,00. Para onde foram
esses US$ 160 mil dólares?
c) O Imposto de Renda sobre os juros foi pago com multa. Pressionada
pela Receita Federal, a CBF pagou o imposto de renda sobre os juros 5 de novembro
de 1999, quase um ano depois. Valor do IR pago: R$ 168.768,97. Valor da multa: R$
33.753,79. Valor de encargos: R$ 35.677,76. Total: R$ 238.200,52. Mais um prejuízo
de R$71 mil para a CBF.
Nota: nesse caso, a CBF pagou o IR sobre os juros, após a desvalorização
cambial, sem fazer a atualização dos juros, em reais, pela variação cambial. Esse
pagamento deve ser examinado pela Receita Federal, para se aferir a sua regularidade.
a) A imprevidência resultou em mais prejuízos. Esse empréstimo foi feito
quinze dias antes da desvalorização do Real. Essa falha administrativa é indesculpável.
O próprio presidente da CBF, Ricardo Teixeira, estava atento, sabia que
a desvalorização ia acontecer. Tanto que, quando perguntado, nesta CPI, sobre os seus
elevados ganhos no mercado de capitais, como pessoa física, em 1998, ele respondeu
que todo mundo sabia que na hora em que Gustavo Franco caísse do Banco Central, o
real iria se desvalorizar. E que ele fez como qualquer investidor , comprou dólar, e teve
grandes lucros.
Só que a CBF não se beneficiou dos refinados conhecimentos que
Ricardo Teixeira tem do mercado financeiro. Mesmo todo mundo prevendo que o real
ia desvalorizar-se, em 30/12/98, a CBF tomou empréstimo de US$ 4.500.000,00
pagando 25% de juros ao ano (taxa real de 34,3% ao ano, devido aos juros pagos
adiantadamente), em dólares. Nessa ocasião, recebeu o valor líquido em reais de R$
4.264.904,00. Doze dias antes do vencimento do empréstimo, em 2 de setembro de
1999, pagou R$ 8.969,850,00. Isto é, pagou mais que o dobro em reais.
3. TERCEIRO EMPRÉSTIMO : US$ 10
ANTECIPADAMENTE
MILHÕES ,
JUROS
DE
25%, PAGOS
Há o mesmo procedimento dos outros empréstimos, com pequena
diferenças.
Em 5 de fevereiro de 1999, 35 dias após o último empréstimo (o 2.°), a
CBF recebeu outro empréstimo do Delta Bank, no valor de US$ 10 milhões de dólares.
Com juros de 25% ao ano, e vencimento em onze meses, em 5 de janeiro de 2000
(data de receber o dinheiro da Nike).
Enquanto a CBF firmou esse empréstimo com as taxas mencionadas, de
25% ao ano. No entanto, o restaurante de propriedade de Ricardo Teixeira, o El Turf,
fechou empréstimo junto ao Delta, dias depois, no valor de R$ 843 mil, a uma taxa bem
menor, de 12% ao ano, já dentro da faixa de mercado.
Por onze meses, pagou US$ 2.326.388,89 dólares de juros. Os juros
foram pagos antecipadamente. Pagou o IOF à vista, mas o Imposto de Renda não
pagou logo. Pressionada pela Receita Federal, a CBF só veio a pagar nove meses
depois. A seguir, os valores pagos:
Valor do principal do pagamento do IR
Valor da multa
Valor dos juros e encargos
Total
R$
R$
R$
R$
722.549,02
144.509,80
119.003,82
986.062,64
Além dos gastos com os juros e do imposto sobre esses juros, mais um
outro prejuízo contabilizado para a CBF, representado pela soma da multa com os
juros e encargos: R$ 263,5 mil!
4. QUARTO EMPRÉSTIMO : US$ 3,7 MILHÕES, JUROS DE 21%ªª
Em 21 de setembro de 1999 a CBF tomou junto ao Delta Bank um
empréstimo de US$ 3.708.281,83. Pagou juros de 21% aa., o dobro do que o mercado
estava praticando no período. Prazo do vencimento: 14/09/2000. Valor dos juros
pagos: US$ 748.454,88. Esse juros não foram pagos antecipadamente.
O agravante aqui é que esse foi um empréstimo pelo prazo de um ano. E
nem assim a CBF “conseguiu” taxas de juros na média dos 10% como as outras
empresas (menores que a CBF) conseguem. Destaque-se que esse empréstimo foi
tomado 19 dias depois da data de pagamento do segundo empréstimo, indicação de que
estava em curso um processo de rolagem de dívida.
5. QUINTO EMPRÉSTIMO : US$ 10
ADIANTADAMENTE
MILHÕES,
JUROS
DE
16%AA., PAGOS
Em 24 de fevereiro de 2000 a CBF tomou um empréstimo de US$ 10
milhões de dólares, com juros de 16% ao ano, para pagamento em 12 de janeiro de
2001. (antecipando em quase um ano o recebimento da Nike, mas á custa de juros
ruinosos.
A CBF pagou US$ 1,436 milhão de dólares de juros! E, além do valor
elevado, os juros foram pagos antecipamente. E o imposto de renda sobre a remessa
dos juros foi pago em 25/02/2000. Valor do principal: R$ 378.448,34. Valor da multa:
R$ 23.728,71. Total pago à Receita: R$ 402.177,05.
6. SEXTO EMPRÉSTIMO : US$ 4,5
ADIANTADAMENTE
MILHÕES,
JUROS
DE
14,5%ªª, PAGOS
Em 7 de setembro de 2000, a CBF contratou um sexto empréstimo com
o Delta Bank, no valor de US$ 4.500.000,00, com vencimento em 10/01/2001, à taxa
de juros de 14,5% aa., pagos antecipadamente. Mesmo essa taxa de juros, mais baixa
que as anteriores, ainda é mais elevada que a de quaisquer outros empréstimos junto ao
Delta Bank feitos por outras empresas e até por pessoas físicas. E uma vez mais a
inexplicável generosidade com o Banco credor, com o pagamento antecipado dos juros,
que foram de US$ 290 mil por quatro meses de empréstimo.
SOMA DOS CUSTOS GERADOS PELOS SEIS EMPRÉSTIMOS
Conforme mostra o quadro anexo, a CBF fez empréstimos junto ao
Delta Bank num total de US$ 39,7 milhões. E pagou de juros nada menos que US$ 6,22
milhões. Além dos juros, a CBF pagou impostos e multas por atraso de pagamento,
perdeu muito com a desvalorização cambial, dentre outros encargos financeiros.
Esses dados, mostrados na tabela abaixo, ajudam a a entender os motivos
do crescente endividamento da CBF:
Juros
EMPR
Nomin
NÚM.
ao ano
Juros
Reais JUROS (US$)
ao ano
IR S/ JUROS COMISSÕES,
MAIS
ETC
MULTAS
(US$)
(US$)
115.134,57
159.486,69
1.857.552,63
125.368,69
49.266,96
DESVALORIZ
IOF (US$) CPMF (US$) . CAMBIAL
(US$)
TOT. DESP
(US$)
1.081.050,82
2.955.291,58
1
2
43,58% 52,12%
25,00% 34,30%
652.429,56
843.750,00
140.000,00
72.139,36
14.000,00
7.213,94
3
25,00% 32,48%
2.326.388,89
147.496,92
14.749,69
538.449,54
298.765,07
3.325.850,11
4
5
21,00% 20,70%
16,00% 18,68%
748.454,88
1.435.555,56
72.182,60
256.423,43
14.732,29
32.044,26
131.875,37
??
158.643,08
285.716,42
1.125.888,23
2.009.739,67
6
14,50% 15,23%
215.702,48
??
807,23
41.132,79
266.441,63
524.084,13
Total
6.222.281,37
Fonte: Delta Bank, CBF, CPI CBF Nike
688.242,31
83.547,42
1.857.552,63
951.960,97
1.218.319,84 11.021.904,55
Verifica-se que as despesas com os seis empréstimos ultrapassaram US$
11 milhões. E esse gasto foi realizado em menos de dois anos e meio, no período que
vai de outubro de 1998 a janeiro de 2001.
Importante ressaltar que não se localizou, em todos os empréstimos, os
recibos com os valores pagos a título de imposto de renda ou de IOF. Cabe aos órgãos
competentes verificarem o recolhimento desses tributos, tanto pela CBF como por
parte dos bancos envolvidos nas transações.
COMPARAÇÃO
COM EMPRÉSTIMOS TOMADOS POR OUTRAS EMPRESAS
BRASILEIRAS JUNTO AO DELTA NO MESMO PERÍODO . COMPARAÇÃO
MOSTRADA EM GRÁFICO .
SÓ A CBF PAGOU JUROS TÃO ELEVADOS
Para justificar os juros elevados, em seu depoimento nesta CPI Ricardo
Teixeira disse que o primeiro empréstimo (19/10/98) foi tomado num momento
conturbado (crise da Rússia), e que havia falta de capitais para empréstimo no mercado
financeiro, tanto no Brasil como no Exterior. O exame dos jornais da época mostra um
clima tenso no mercado financeiro, mas os juros praticados em dólar eram bem mais
modestos, o que contesta a afirmação de Teixeira. Pela tabela divulgada pelo Banco
Central, naquele momento praticavam-se juros de 8 a 13 por cento no mercado
internacional.
Esta Comissão examinou dezenas de empréstimos feitos pelo Banco
Delta a empresas e mesmo pessoas físicas brasileiras naquele período e todos foram
contratados com taxas em torno de 10% ao ano. (Ver Documentos Sigilosos/Sigilo
Bancário Delta Bank – Anexo 34 – Pastas 1b a 116b, destacadamente pastas
084/085/086/087/088/089/90/91/92/93/102/104/111/115/116).
No quadro e no gráfico anexos esses empréstimos estão relacionados.
Veja-se a enorme defasagem entre os juros dos empréstimos tomados pela CBF e os
dos outros, inclusive o do El Turf.
EMPRÉSTIMOS DE BRASILEIROS JUNTO AO DELTA BANK
NOME
ASSIN.
VALOR (US$)
1
2
EMPRESA 1
EMPRESA 2
20-jul-97
12-set-97
200.000
1.500.000
3
EMPRESA 3
18-set-97
4
5
PESSOA FÍSICA 1
EMPRESA 4
28-jan-98
31-jan-98
6
7
EMPRESA 5
EMPRESA 6
8
EMPRESA 7
9
10
JUROS AO ANOJUROS PRÉ%
PAGOS?
PRAZO
6,0
1,5
NÃO
NÃO
360 DIAS
360 DIAS
400.000
10,0
NÃO
3 ANOS
150.000
800.000
5,5
8,5
NÃO
NÃO
360 DIAS
360 DIAS
17-fev-98
17-fev-98
300.000
360.000
9,0
10,0
NÃO
NÃO
2 ANOS
3 ANOS
25-fev-98
2.000.000
11,0
NÃO
8 ANOS
PESSOA FÍSICA 2
PESSOA FÍSICA 3
04-mar-98
04-mar-98
1.200.000
1.085.000
9,0
9,0
NÃO
NÃO
360 DIAS
360 DIAS
11
12
EMPRESA 8
EMPRESA 9
10-mar-98
26-mar-98
1.000.000
120.000
5,5
8,0
NÃO
NÃO
3 ANOS
2 ANOS
13
14
EMPRESA 10
EMPRESA 11
11-mai-98
10-jun-98
100.000
850.000
10,0
10,0
NÃO
NÃO
360 DIAS
5 ANOS
15
PESSOA FÍSICA 4
06-jul-98
127.000
9,0
NÃO
360 DIAS
16
17
EMPRESA 12
EMPRESA 13
10-jul-98
17-jul-98
220.000
1.000.000
8,0
10,0
NÃO
NÃO
3 ANOS
360 DIAS
18
19
EMPRESA 14
EMPRESA 15
23-jul-98
04-ago-98
500.000
300.000
11,0
10,0
NÃO
NÃO
8 ANOS
360 DIAS
20
EMPRESA 16
06-ago-98
1.300.000
10,0
NÃO
3 ANOS
21
22
EMPRESA 17
EMPRESA 18
06-ago-98
07-ago-98
400.000
220.000
8,0
10,0
NÃO
NÃO
5 ANOS
180 DIAS
23
24
EMPRESA 19
EMPRESA 20
09-ago-98
12-ago-98
200.000
88.000
6,0
10,0
NÃO
NÃO
360 DIAS
2 ANOS
25
26
EMPRESA 21
EMPRESA 22
12-ago-98
23-set-98
500.000
200.000
10,0
10,0
NÃO
NÃO
3 ANOS
5 ANOS
27
EMPRESA 23
23-set-98
100.000
10,0
NÃO
5 ANOS
28
29
EMPRESA 24
EMPRESA 25
25-set-98
08-out-98
100.000
70.000
9,0
1,5
NÃO
NÃO
180 DIAS
360 DIAS
30
EMPRESA 36
14-out-98
1.000.000
10,0
NÃO
360 DIAS
31
32
CBF
EMPRESA 27
20-out-98
26-out-98
7.000.000
100.000
52,1
8,0
SIM
NÃO
77 DIAS
360 DIAS
33
34
EMPRESA 28
EMPRESA 29
26-out-98
26-out-98
100.000
3.000.000
10,0
10,0
NÃO
NÃO
360 DIAS
5 ANOS
35
36
EMPRESA 30
EMPRESA 36 (SEGUNDO)
13-nov-98
13-nov-98
400.000
1.000.000
?
10,0
NÃO
NÃO
2 ANOS
360 DIAS
37
EMPRESA 37
23-nov-98
300.000
10,0
NÃO
360 DIAS
38
39
PESSOA FÍSICA 5
PESSOA FÍSICA 5 (SEGUNDO)
25-nov-98
03-dez-98
432.000
256.500
12,0
12,0
NÃO
NÃO
360 DIAS
360 DIAS
40
41
EMPRESA 38
CBF
07-dez-98
14-dez-98
330.000
4.500.000
10,0
32,0
NÃO
SIM
360 DIAS
270 DIAS
42
EMPRESA 39
18-dez-98
237.780
10,0
NÃO
?
43
44
PESSOA FÍSICA 5 (TERCEIRO)
PESSOA FÍSICA 6
22-dez-98
30-dez-98
350.000
417.000
12,0
10,0
NÃO
NÃO
360 DIAS
360 DIAS
45
46
EMPRESA 40
CBF
11-jan-99
05-fev-99
500.000
10.000.000
8,5
32,5
NÃO
SIM
2 ANOS
330 DIAS
47
EMPRESA 41
04-mar-99
1.000.000
12,0
NÃO
360 DIAS
48
49
PESSOA FÍSICA 7
EL TURF
06-abr-99
20-abr-99
60.000
R$843.262
10,0
12,0
NÃO
NÃO
360 DIAS
5 ANOS
50
51
CBF
CBF
21-set-99
24-fev-00
3.708.281
10.000.000
21,0
18,7
NÃO
SIM
360 DIAS
320 DIAS
52
CBF
07-set-00
4.500.000
15,2
SIM
125 DIAS
60,0
50,0
40,0
30,0
20,0
10,0
0,0
EMPRÉSTIMOS DO DELTA
A BRASILEIROS
(juros ao ano %)
CBF X EL TURF
Cabe ressaltar, novamente, que a CBF utilizou essas taxas elevadas,
enquanto que o restaurante El Turf, de Teixeira, fechou também um empréstimo com
o Delta a 12% a.a., em abril de 1999. Ou seja, nos mesmos dias em que tomava
recursos para a CBF junto ao Delta Bank a 32,5%, como no 3.° empréstimo, com juros
pagos adiantadamente, Ricardo Teixeira obtinha, da mesma agência e igual banco,
empréstimo a apenas 12% a.a., com juros pagos posteriormente, junto com o principal.
O empréstimo do El Turf foi, então, realizado dentro dos padrões do mercado. (Sigilo
bancário – Rural International Bank – Anexo 33 -- Pastas 1-B a 37-B).
Não se pode crer que o El Turf pudesse dar ao Delta Bank maiores
garantias do que a CBF, que justificassem a diferença de juros. E, em qualquer dos
casos, Ricardo Teixeira foi o avalista dos empréstimos. Sendo assim, percebe-se que a
condução dos negócios da CBF é feita de modo completamente diferente dos negócios
particulares de Teixeira. Não é à-tôa que enquanto a CBF se vê diante de um grande
rombo, de pelo menos R$ 25 milhões, os negócios pessoais do presidente da entidade
estejam prosperando, a todo vapor.
Outro ponto a destacar é que a CBF nunca reclamou, publicamente, com
o Delta Bank, o fato de a Confederação Brasileira de Futebol ter sido a única instituição
a ter tomado dinheiro emprestado a juros tão elevados. Nem quando tomou
conhecimento por intermédio da imprensa. Ricardo Teixeira procurou, ao contrário,
manter argumentos que justificassem aquelas taxas contratadas. Afinal, ele,
particularmente, conhece as taxas reais de mercado. O empréstimo para o El Turf
confirma isso.
EXPLICAÇÃO DA CBF NÃO CONVENCEU. DADOS APRESENTADOS POR
RICARDO TEIXEIRA EM SEU DEPOIMENTO À CPI FORAM DESMENTIDOS. AS
EMPRESAS APONTADAS POR ELE ENVIARAM OFÍCIOS À CPI AFIRMANDO QUE
JAMAIS TOMARAM EMPRÉSTIMOS NAQUELAS CONDIÇÕES.
DIVULGAÇÃO DE INFORMAÇÕES FALSAS
Em seu depoimento nesta CPI em 10 de abril último, Ricardo Teixeira
tentou justificar os altos juros apresentando uma placa com uma lista de empresas que
supostamente haviam tomado empréstimos com taxas semelhantes às da CBF no
mesmo período. A placa tinha as informações abaixo:
´
Empresa
NET
Klabin
Governo de M. Gerais
Singer
Ed. Abril
RBS
NetSat
TV Filme
Juros
36,00 %
50,56%
47,57%
56,22%
51,46%
45,62%
42,30%
50,36%
Fonte: Ricardo Teixeira, depoimento 10/4/2001
A placa, como todos presentes à sessão viram, tinha apenas esses dados,
sem quaisquer outras informações, sem data da tomada do empréstimo, sem
esclarecerer se eram empréstimos em reais ou em dólar.
Aparentemente, o argumento, logo assumido como verdadede por parte
da imprensa, derrubava os questionamentos da CPI. Para conferir, algumas das
empresas citadas e o governo de Minas Gerais foram consultados pela CPI nos dias
subseqüentes. Eis suas respostas:
No entanto, ao tomar conhecimento de que Teixeira havia citado o
Governo de Minas Gerais como tendo firmado contratos de empréstimos com taxas de
juros próximas ou superiores às da CBF, e em torno de 47% ao ano, o Secretário da
Fazenda de Minas Gerais, José Augusto Trópia Reis,enviou ofício datado de 18/04/01,
no qual afirma:
“informamos que o Governo de Minas Gerais não contratou
nenhum empréstimo externo nos últimos três anos (...) a última operação
de financiamento externa contratada pelo Governo de Minas Gerais foi
realizada em março de 1995 (...) à média anual de 5,78%”.
Na mesma data, a empresa Indústrias Klabin oficiava:
“De 1998 a 2000 a Klabin contratou financiamentos no
montante de US$637 milhões, com custo médio de 9,53% ªª. Deste
modo, não procede a afirmação de que a Klabin tenha contratado
financiamentos em moeda estrangeira pagando taxas de juros superiores a
50%ªª”.
Em 19 de abril a empresa Itsa Telecomunicações/TV Filme respondia
que havia contrado um empréstimo externo apenas em dezembro de 1996, com a taxa
de juros de 12,8%ªª.
A Empresa Singer também respondeu afirmando que nunca tomara
empréstimo externo com os juros anunciados por Teixeira.
O presidente da CBF apresentara informações falsas à CPI. É o que
demonstra a tabela retificadora, preenchida com os dados das empresas e do Governo
de Minas Gerais, que foram encaminhados oficialmente a esta CPI:
Empresa ou Órgão
Klabin
Governo de M. Gerais
Singer
ITSA/TV Filme
Juros informados por
Ricardo Teixeira
50,56%
47,57%
56,22%
50,36%
Juros reais informados
1
pelas empresas
9,53%
5,78%
10,0%
12,87%
Fonte: CPI CBF/Nike, Klabin, Singer, TV Filme e Gov. de M. Gerais.
Anexo 4: Ofícios das empresas Klabin, Singer e TV Filme e do Governo
de Minas Gerais.
Teixeira prometeu encaminhar a esta CPI documentos esclarecendo os
fatos que levaram a CBF a fazer tais empréstimos. Os documentos enviados trazem
como fundamentação básica dois pontos: (1) a necessidade de caixa da entidade, em
outubro de 1998, e (2) que as taxas de mercado estavam elevadas, devido à chamada,
por ele, de crise da Rússia. Insiste, pois, num argumento já comprovadamente sem
fundamento.
O PARECER DE MAÍLSON DA NÓBREGA
Quanto às taxas de mercado, a CBF encaminhou a esta Comissão parecer
de economista Maílson da Nóbrega que tenta estabelecer um entendimento de que as
condições durante a crise da Rússia obrigavam contratações de empréstimos de curto
prazo para problemas de falta de caixa. Entretanto, o parecer não abrangeu os casos
concretos em exame. Por manter-se em hipóteses acaba por confundir a questão
central. E qual é a questão?
Ela se resume-se a: por que o Delta Bank teria emprestado apenas à CBF
àquelas taxas tão elevadas? E mais: por que, além do Delta, instituições como o Trade
and Commerce Bank teriam firmado empréstimos, no mesmo período, e a brasileiros
também, a taxas de apenas 6%? (Ver Trade and Commerce Bank, Anexo 35, pastas 1B
a 8B).
O documento de Maílson da Nóbrega tergiversa sobre o tema. Faz
referência a títulos privados emitidos no exterior por empresas brasileiras e não a
empréstimos tomados por empresas brasileira no Exterior, em dólar, pela Instrução 63
e pela então chamada conta CC5, que é o caso em pauta. Compara também com
títulos da dívida pública brasileira, dando como exemplo o título Interest Due and
Unpaid,IDU, emitido para pagar juros da dívida externa do nosso governo. Compara ,
portanto, coisas diferentes. Mesmo assim, os dados que apresenta indicam que os juros
elevaram-se até 30% ao ano em setembro e cairam para menos de 20% ao ano, em
outubro. O gráfico que acompanha a explanação indica precisamente que em 25 de
outubro de 1998 a taxa de juros dos IDUs estava por volta de 17%. Bem diferente,
portanto, da taxa de 52% que a CBF assumiu no empréstimo feito três dias depois, em
28 de outubro de 1998.
A seguir, Maílson da Nóbrega afirma:
“ Apesar das dificuldades conhecidas e esperadas, esse impactos
foram passageiros. O quadro de instabilidade foi considerado como um
problema de curto prazo, que se estenderia até o primeiro trimestre de
1999, dada a concedntração de vencimentos referentes às captações do
primeiro trimestre de 1998. Para 1999, as perspedtivas da economia
brasileira, com o desaquecimento da atividade e melhoria dos preços dos
produtos primários no mercado externo, eram de recuperação”. (g.n.)
Quer dizer, os maus tempos na economia continuaram apenas para a
CBF, que em 1999 continuou a tomar empréstimos a juros extorsivos, de mais de 30%
ao ano, como vimos acima. Com suas palavras o eminente economista evidencia a
excepcionalidade do caso da CBF e vem em reforço às denúncias desta CPI.
Na suas conclusões o ex-ministro da Fazenda tenta dar um alento aos
surrados argumentos de Ricardo Teixeira:
“ Em situações de crise como a do México em 1995, da Ásia
em 1997, da Rússia em 1998, ou na desvalorização de 1999, a
disponibilidade de recursos externos para países como o Brasil diminui
súbita e drásticamente. Torna-se muito difícil obter ou renovar
empréstimos externos. E quando se consegue, o custo é extremamente
elevado quando comparado com taxas vigentes antes ou depois da crise.
Taxa da ordem 20%, 30% ou mesmo 40% passam a ser praticadas...”
(g.n.)
Como se vê, o dr. Maílson está preocupado em justificar aquele primeiro
empréstimo feito pela CBF em 29 de outubro de 1998, com juros antecipados de 52%
ao ano. O máximo que consegue é fazer afirmações genéricas, externando uma lógica
acaciana, sem jamais apresentar um fato concreto. O que ele não consegue explicar são
as dezenas de empréstimos cedidos pelo Delta Bank a empresas e mesmo a pessoas
jurídicas brasileiras, naquele mesmo período, nos dias próximos e no mesmo dia
29/10/98, conforme mostram a tabela e o gráfico apresentado em outra parte deste
capítulo. Os comprovantes, relativos à quebra de sigilo do movimento do Delta Bank,
estão de posse desta CPI, como já referimos (Anexo 34 -- Pastas 1b a 116b).
Desse episódio resta um último questionamento. De acordo com a
imprensa a CBF pagou R$ 30 mil reais a Maílson da Nóbrega pelo seu parecer. A que
título? Em que medida essa despesa se justifica em relação à atividade-fim da
Confederação, que é o desenvolvimento do futebol? Trata-se de mais um exemplo de
malversação de recursos da administração temerária da CBF.
TEIXEIRA APARENTA DESPREPARO
Questionado sobre os empréstimos com o Delta, em especial sobre o
segundo empréstimo, firmado nos últimos dias de 1998, ocorreu o seguinte diálogo
durante o depoimento de Ricardo Teixeira, em 10/4/2001:
“O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - No dia 14 de
dezembro de 1998, praticamente dois meses depois, menos de dois meses
depois que o empréstimo de 7 milhões, a CBF fez um outro empréstimo
com o Delta Bank, no valor de 4,5 milhões de dólares. Dessa vez os
juros foram de 25% ao ano, segundo informações do Banco Central —
duas vezes e meia os juros praticados no período no mercado —, e esse
empréstimo era com vencimento com prazo de 9 meses, e novamente os
juros foram pagos antecipadamente, o que eleva essa taxa para 30% ao
ano. Eu queria saber do senhor por que esse novo empréstimo, a CBF
teve que recorrer a um novo empréstimo, e por que essas taxas.
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Excelência, o
empréstimo foi feito por necessidade de caixa da CBF; agora, a taxa foi
dentro do mercado. Eu só não estou localizando aqui os documentos que
comprovam isso. (Pausa.)
O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - Quer dizer, a CBF
tinha...
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Excelência, eu tenho
certeza de que eu tenho esses documentos, mas eu não estou localizando
eles aqui. Especificamente desse, de dezembro. Mas eu tenho convicção
absoluta que eu fiz a tomada das taxas nessa época, e elas eram... e eu
sempre faço através do banco, e as taxas, elas eram compatíveis.” (g.n.)
Percebe-se que o próprio presidente da CBF admite que o primeiro
empréstimo foi fechado numa taxa exorbitante. Apesar de que, para isso, considerou a
taxa de 25% (de fato, 34,3%) dentro do mercado, enquanto ela é quase o triplo do
mercado.
Em geral, Teixeira tentou aparentar não estar preparado para responder
as questões relativas aos empréstimos:
“ Excelência, de cabeça eu não posso... não tenho informações
para lhe dar, mas eu lhe prometo que envio isso para o senhor tão logo eu
chegue no Rio de Janeiro...”;
ou:
“Excelência, eu vou mandar verificar através da Auditoria
da CBF e lhe responderei em 48 horas esse assunto”...
A resposta que mais vezes se ouviu durante o depoimento do presidente
da CBF foi essa. Freqüentemente não tinha informações para responder aos deputados.
Em trinta e uma ocasiões, tratando-se de 31 temas diferentes Ricardo Teixeira
prometeu enviar documentos que esclareceriam os fatos. Sobre os empréstimos da
CBF com o Delta Bank mandou um resumo das operações bancárias, com os mesmos
dados apresentados anteriormente, mas sem esclarecimento adicional.
A RESPONSABILIDADE DO DELTA BANK
A polêmica envolveu o Delta Bank. Em contato pessoal com o relator
Sílvio Torres, dirigente do Banco disse que o dinheiro dos empréstimos não era do
Delta. Posteriormente, em carta à CPI, o advogado do Banco, Roberto Rosas, fez a
mesma afirmação:
“Quanto `a alusão sobre ‘empréstimos a juros extorsivos’, é
preciso que se diga que não faz parte dos serviços do Delta Bank a
concessão de empréstimos diretos. O Delta realiza intermediações entre o
tomador e instituições e/ou investidores do mercado financeiro. A fixação
de juros é negociada com as partes, cabendo ao Delta não a receitas dos
juros mas somente um spread pela operação.” (g.n.)
Se o dinheiro dos empréstimos não era do banco, se o Delta não faz
empréstimos, se só intermedia, de quem era o dinheiro? No seu depoimento à CPI,
inquirido pelos deputados, Ricardo Teixeira afirmou que o dinheiro era do Delta Bank.
Em 16 de abril, o Delta Bank enviou ofício à CBF, que o repassou à
CPI. Nessa correspondência, o vice-presidente executivo do Delta, Newton Bleffe, diz:
“ gostaria de confirmar que o Delta National Bank and Trust Co., concedeu
empréstimos diretos à CBF em condições de prazos e de juros compatíveis tanto
com o risco comercial do tomador bem como às condições prevalecentes no
momento de cada operação para captação de recursos no mercado internacional
com risco brasileiro”.
E relacionava uma lista incompleta dos empréstimos e dos juros.
Portanto, o Delta voltava atrás.
Permanecia a indefinição. A CPI convocou o representante do Delta
Bank no Brasil, George Philip de Brito, para depor. Mas este não compareceu. Dois
dias antes do seu depoimento, a CPI recebeu carta do presidente do Delta Bank, John
D. Landers, informando que Brito não poderia comparecer ao depoimento por “
encontrar-se em Portugal a caminho dos Estados Unidos” em cumprimento de férias e
tratamento de saúde. Brito é cidadão estadunidense. Por haver se omitido de
comparecer à CPI deve prestar contas à Justiça brasileira, se pretender voltar ao Brasil.
A evasão de Brito, recusando-se a prestar declarações à CPI, referendada
oficialmente pelo presidente do Delta Bank, o cidadão estadunidense John Landers,
reforçou as dúvidas sobre esses empréstimos e a suspeita de que estejam envolvidos em
irregularidades. A confirmar-se que o emprestador não foi o Delta Bank seria de alto
interesse público saber quem se privilegiou das taxas de juros extorsivas. Mas essas
informação nem o Banco Central do Brasil detém. Seria necessário invocar auxílio de
autoridades financeiras dos Estados Unidos para se obter tal informação, providência
que esta CPI já adotou.
Porém, se o dinheiro usados nos empréstimos pertencia ao Delta Bank,
essa instituição pode ter infrigido a legislação bancária dos Estados Unidos. Pela
legislação financeira dos EUA um Banco só pode emprestar até o limite de 25 por
cento de seu patrimônio líquido a um mesmo segmento da economia, quanto mais a
um mesmo cliente.
A Section 2050.1 do Commercial Bank Examination Manual, do Federal
Reserve Board – FED, determina que o limite máximo permitido para concentração de
crédito nas mãos de um único credor ou de grupos de credores do mesmo segmento
econômico, não ultrapasse 25% do patriomônio líquido do Banco - nível 1, ou seja,
excluídas as provisões para créditos duvidosos.
No caso do Banco Delta envolvendo a CBF, em 31/12/1998, os créditos
somavam US$ 11,5 milhões! (FLI-40853 e FLI-40962). Naquela data, o patrimônio
líquido do referido Banco era de apenas US$ 21,896 milhões. As duas operações de
crédito representavam 53% do patrimônio da instituição.
Considerando a posição em 31/12/2000, os saldos dos empréstimos
somavam US$ 14,5 milhões, enquanto o patrimônio líquido do Delta era de US$ 41,414
milhões. Os empréstimos correspondiam a 35% desse patrimônio. Em ambos os casos
o limite aceitável pela legislação americana (25%) foi desobedecido, o que é
considerado como administração temerária, e sujeita a instituição a receber tratamento
específico bastante severo por parte do FDIC, o Federal Deposit Insurance
Corporation.
Não se pode esquecer também o risco sem precedentes a que o Delta
Bank se expôs ao aceitar, como vimos atrás, Ricardo Teixeira como avalista dos seis
empréstimos tendo um patrimônio declarado muito inferior aos valores emprestados.
O Banco Central dos EUA precisa ser informado disso.
COMPETÊNCIA SELETIVA
Após todos esses meses de investigação, a conclusão a que esta CPI
chega é de que permanecem e até se fortaleceram os indícios de evasão de divisas nas
operações desses empréstimos. O tema merece atenção do Banco Central e do
Ministério Público.
Além disso, a confusão interna que o próprio Delta Bank causou com
respeito a de quem é o dinheiro emprestado à CBF dificulta as conclusões da CPI sobre
essa questão fundamental.
Desse espisódio fica a evidência de que quando se trata de seus negócios
particulares Ricardo Teixeira é uma administrador muito mais competente. É o que
demonstram os contratos de empréstimo do restaurante El Turf, de Teixeira, junto ao
Delta Bank, de abril de 1999, que está dentro da faixa de mercado (12% a.a.), e outro
empréstimo do mesmo El Turf, obtido utilizando-se da Resolução 63, do Banco
Central. Neste empréstimo, fechado com o Banco Real, em 1996, as taxas foram muito
baixas, 1,25% acima da Libor. Isso remete ao depoimento de Teixeira a esta CPI,
quando questionado sobre os seus ganhos na Bolsa de Mercadoria e de Futuro
(BM&F):
“O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Eu volto a dizer que não
necessariamente alguém ganha e outro perde. Eu vou dar um exemplo de uma
operação que o senhor considerou uma operação de um grande número. Desde o
ano de 98, Excelência, que se falava no Brasil que iria haver uma
desvalorização cambial. Se o senhor acompanhasse, se o senhor acompanhou o
mercado de 98 do dólar, desde 98, final do ano, que começou a haver uma
mutação do dólar. Qualquer pessoa que estivesse no mercado e acreditasse nas
informações da queda do, na época, Presidente do Banco Central Gustavo
Franco tinha certeza absoluta que no momento que o Presidente do Banco
Central, Gustavo Franco, saísse do Banco Central, imediatamente haveria um
descolamento do dólar de valores bastante depreciados. Essa operação eu fiz
exatamente porque eu tinha certeza absoluta que com os boatos que já se
faziam da queda do Gustavo Franco, eu posso lhe enviar depois essa
documentação de jornais da época, e exatamente essa grande operação foi em
dólar. Essa operação foi compra de dólar futuro.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Eu acho perfeito isso.
Eu só não consigo entender por que o senhor, sendo Presidente da CBF, não
fez o mesmo também com os recursos da CBF. O senhor fez um empréstimo
que pode ser considerado, em qualquer operação, altamente temerário, porque o
senhor estava em vias de receber recursos. O senhor fez empréstimo no momento
em que você tinha juros crescentes. O senhor, conhecendo o mercado, sabia
disso.” (g.n.)
O Deputado Jurandil Juarez questionou o fato de Ricardo Teixeira, sendo
especialista e experiente na área de mercado de capitais, que é uma área que exige
conhecimento muito específico e é complexa, não gerir as contas da CBF como vem
fazendo com as suas empresas particulares.
Uma segunda conclusão é que as condições em que esses empréstimos
foram negociados evidenciam, sem sombra de qualquer dúvida, a administração ruinosa
da CBF. O pagamento de juros extorsivos – em benefício de quem? – causou grandes
prejuízos à CBF. Para esse aspecto também chamamos a atenção do Ministério Público.
A diretoria da entidade deve ser responsabilizada.
AINDA O SEGUNDO EMPRÉSTIMO
A PARTICIPAÇÃO
BANK
DO
BANCO ARAUCÁRIA
E
DO TRADE
AND
COMMERCE
O Trade and Commerce Bank realizou a intermediação do segundo
empréstimo da CBF. E isso a pedido da própria entidade. O dinheiro, US$ 4,5 milhões,
saiu do Delta Bank e foi enviado para o Trade Bank, nas Ilhas Cayman. De lá, passou
pelo Banco Araucária, onde foi transformado em reais e veio para a conta corrente da
CBF.
A CBF é que, inclusive, solicitou que a transação fosse feita via o Trade
Bank. A Confederação enviou correspondência em 3/12/1998 para o Delta Bank.
Nela, a CBF deu as instruções para que o dinheiro fosse enviado, passando pelas Ilhas
Cayman (Ver Anexo Pastas Contratos CBF Delta Bank):
“Instruções para crédito de dólares:
Creditar
CITYBANK - NEW YORK / USA
ABA: 021000089
CONTA: 36016231
Para crédito do:
TRADE & COMMERCE BANK
Por ordem de:
Delta Bank
Em favor de:
Confederação Brasileira de Futebol - CBF
Referência:
Empréstimo”
A CBF, desse modo, ordenou ao Delta Bank que remetesse o dinheiro
para a conta do Trade, no Citybank, em Nova York. das Ilhas Cayman, o dinheiro, já
deduzido dos juros, foi para a CBF, como já mencionado.
Não se pode compreender o porquê dessa providência, e nem mesmo a
carta da CBF para o Delta esclarece isso. O Delta Bank tinha todas as condições
possíveis para enviar o dinheiro diretamente para o Brasil, como esta CPI pôde
comprovar por intermédio de centenas de remessas realizadas pelo Delta para o Banco
Real, ambos bancos então pertencentesao mesmo grupo.
Essa transação mereceu a atenção da Polícia Federal (PF) e do Ministério
Público Federal (MPF), em Foz do Iguaçu, Paraná, pelas suas peculiaridades. Primeiro,
porque os dólares, que deveriam vir diretamente do Delta Bank, em Nova York, para o
Brasil, passaram pelas Ilhas Cayman. Segundo, porque não constava pagamento de
imposto de renda sobre os juros do empréstimo. Terceiro, devido ao fato de os juros
terem sido pagos antecipadamente, o que é extremamente raro nesse tipo de negócio.
O inquérito na PF de Foz do Iguaçu já está em andamento e cabe a esta
Casa e à sociedade exigir resultados dessa investigação, bem como das centenas de
processos envolvendo crimes relativos à lavagem de dinheiro, à evasão de divisas e à
sonegação fiscal sob a responsabilidade daquele órgão. Afinal, o trabalho dedicado de
pessoas da PF e do Ministério Público, que incansavelmente se dedicam a essa batalha,
não pode ser esquecido ou engavetado. 12
Esta CPI quebrou o sigilo bancário das contas “CC-5” do Trade no
Brasil. Inicialmente, o Banco Araucária, no qual o Trade mantém conta CC-5, demorou
para enviar os documentos exigidos. Quando os documentos chegaram, verificou-se
que não tinham utilidade alguma, pois o banco havia remetido algumas cópias de
depósitos na conta do Trade Bank, sem que se pudesse identificar quem eram os
Sugere-se, portanto, ao Ministério da Justiça promover ações no sentido de agilizar os trabalhos da PF de Foz,
bem como equipá-la mais dignamente, sob os aspectos pessoal e material. Desse trabalho harmonioso feito em
conjunto com a Receita Federal, que tem trabalhado, também, com afinco, sairão, por certo, resultados muito
positivos para este País, como os já obtidos, até o ano de 2000.
12
depositantes. E isso trouxe uma série de dificuldades para esta CPI, além de atrasos nas
investigações (Ver Anexo 35, Pastas 1 a 8, do Trade and Commerce Bank).
OS EMPRÉSTIMOS DO TRADE
O Trade emprestava dinheiro a brasileiros, por intermédio do Banco
Araucária. Esta CPI obteve as informações fundamentais sobre os empréstimos
realizados diretamente pelo Trade. Os contratos de empréstimos mencionam
literalmente o Trade como uma das partes envolvidas.
Desses contratos, pôde-se obter informações importantes que vêm se
somar a muitos outros dados que esta CPI já possui a respeito de empréstimos tomados
no exterior, nos últimos anos. Isso auxilia esta Comissão no sentido de estabelecer um
juízo cada vez mais definido sobre os empréstimos tomados pela CBF, nos últimos dois
anos e meio.
Para demonstrar esse fato, basta que sejam relacionados alguns
empréstimos e suas condições. As empresas ou pessoas não serão citadas
expressamente, devendo caber ao MP averiguar a regularidade dessas transações. A
tabela a seguir indica essas condições:
JUROS
JUROS
ADIANTADOS?
VALOR (US$)
DATA
ASSINAT.
A. C. S/A
LIBOR+1%
NÃO
1.500.000
28/10/95
P. A. S/A
6%
NÃO
1.500.000
10/12/98
P. A. S/A
6%
NÃO
2.020.000
01/03/99
P. A. S/A
6%
NÃO
1.000.000
21/05/99
P. A. S/A
6%
NÃO
5.000.000
28/10/99
P. A. S/A
6%
NÃO
1.500.000
10/12/99
M. C. S.
6%
NÃO
5.000.000
24/07/00
P. A. S/A
6%
NÃO
755.000
27/07/00
NOME
Fonte: Banco Araucária - CPI CBF Nike
O que importa a esta CPI é comprovar que todos os empréstimos foram
tomados a, no máximo, 6% ao ano.
Um dos empréstimos chamou mais a atenção desta Comissão: é o
empréstimo que está destacado em negrito, acima. Ele foi assinado a apenas quatro dias
do segundo empréstimo da CBF, negócio esse que também teve a participação do
Trade Bank. No empréstimo em destaque, o Trade ofereceu dinheiro à P. A. S/A a 6%
ao ano e juros pagos depois, junto com o principal, como é de praxe.
Para a CBF, o tratamento foi bem diferente. O Trade participou de um
negócio entre o Delta Bank e a CBF no qual, em vez de 6% ao ano, se cobrou 32,5%
ao ano. Os juros, foram pagos antecipadamente, e ficaram com o Trade na agência das
Ilhas Cayman, paraíso fiscal, local onde não se consegue identificar os beneficiados por
transações nebulosas ou mesmo ilegais. E cobrou taxa de administrtação – o spread –
sobre essa importância.
Comparando-se os empréstimos da CBF com os outros realizados pelo
Trade Bank, tem-se a tabela e o gráfico, a seguir:
TOMADOR
JUROS
ADIANTADOS?
NÃO
SIM
NÃO
SIM
SIM
NÃO
NÃO
NÃO
NÃO
NÃO
SIM
NÃO
NÃO
SIM
JUROS AA
A. C. S/A
CBF 1
P. A. S/A
CBF 2
CBF 3
P. A. S/A
P. A. S/A
CBF 4
P. A. S/A
P. A. S/A
CBF 5
M. C. S.
P. A. S/A
CBF 6
6,00%
52,12%
6,00%
34,30%
32,48%
6,00%
6,00%
20,70%
6,00%
6,00%
18,68%
6,00%
6,00%
15,23%
VALOR (US$)
DATA
1.500.000
7.000.000
1.500.000
4.500.000
10.000.000
2.020.000
1.000.000
3.708.282
5.000.000
1.500.000
10.000.000
5.000.000
755.000
4.500.000
28/10/95
29/10/98
10/12/98
14/12/98
05/02/99
01/03/99
21/05/99
21/09/99
28/10/99
10/12/99
24/02/00
24/07/00
27/07/00
07/09/00
Fonte: Trade and Commerce Bank/Banco Araucária/CPI CBF Nike
JUROS
AO ANO
EMPRÉSTIMOS EM DÓLARES
60,00%
50,00%
40,00%
30,00%
20,00%
CBF 6
P. A. S/A
M. C. S.
CBF 5
P. A. S/A
P. A. S/A
CBF 4
P. A. S/A
P. A. S/A
CBF 3
CBF 2
P. A. S/A
CBF 1
0,00%
A. C. S/A
10,00%
Fonte: Trade and Commerce Bank/Banco Araucária/CPI CBF Nike
Os dados são claros e demonstram que a CBF poderia ter captado
recursos a taxas de juros muitas vezes menor do que as obtidas junto ao Delta Bank
(por intermédio ou não do Trade Bank). Fica, mais uma vez, provado que os juros altos
contratados pela CBF soam como algo inexplicável diante das provas que esta CPI tem
em mãos.
Diante de fatos concretos como esses, torna-se impossível estabelecer
modelos econômicos teóricos, ou se utilizar de outros elementos hipotéticos,
provenientes de exames em abstrato e de análises acadêmicas, para justificar as taxas
elevadíssimas praticadas pela CBF. A única verdade concreta é que tanto o Delta Bank
como o Trade Bank emprestaram dólares a brasileiros, a taxas de mercado, desde antes,
durante e depois da crise da Rússia. Parece que a crise só foi sentida pela CBF. Por que
não pelos centenas de outros tomadores de empréstimos?
Mesmo porque a crise da Rússia, argumento repetido por Ricardo Teixeira
para convencer da necessidade de se pegar dinheiro a 52,12% ao ano de juros e em
dólares, somente afetou o Brasil durante parte do segundo semestre de 1998. Em 1999,
com os efeitos da crise já não mais sentidos por aqui, a CBF continuou tomando
dinheiro no exterior, a taxas de juros três vezes maior do que o mercado.
Por que? Por que continuar insistindo em argumentos vazios de realidade
sob o disfarce de tendências teóricas da conjuntura econômica?
CAPÍTULO VIII – DOAÇÕES POLÍTICAS. CRIAÇÃO DE UMA REDE
DE INFLUÊNCIA POLÍTICA NO C ONGRESSO.
O estudo dos documentos da CBF revela um esforço continuado de
apoio financeiro a candidatos ao Parlamento (e também a Prefeituras de algumas
cidades), visando a eleição de candidatos de suas relações. Ao mesmo tempo, a CBF
investiu na montagem de uma casa em Brasília, um verdadeiro escritório de
representação, para dar atendimento a parlamentares. São indicações de que a CBF
planejava ampliar sua influência política além do mundo do futebol, criando no
Congresso uma “Bancada da CBF”.
Além de eticamente discutível, essa prática de fazer doações a políticos
configura uma ilegalidade, já que a CBF é uma entidade sem fins lucrativos e recebe
recursos do Exterior. Essa condição preenche uma das vedações estabelecidas pela
legislação eleitoral de 1997 (Lei 9.504, art. 24, VII).
Relação das doações contabilizadas da CBF a candidatos nas campanhas
eleitorais de 1998:
NOME
ANTÔNIO CARLOS AMORIM JR
ANTÔNIO DELFIM NETTO
PAULO CARDOSO DE ALMEIDA
ANTÔNIO AQUINO LOPES
ANTÔNIO AQUINO LOPES
MAURÍCIO MAGALHÃES
MAURÍCIO MAGALHÃES
CARLOS AUGUSTO A.SANTANA
DARCÍSIO PAULO PERONDI
DARCÍSIO PAULO PERONDI
JOSÉ AGRIPINO MAIA
HUGO NAPOLEÃO DO REGO NETO
ARTHUR HENRIQUE G. FERREIRA
EURICO ÂNGELO DE O. MIRANDA
RAVENA NAPOLEÃO DO REGO
TOTAL
* Doações fora do prazo legal.
(R$)
50.000
5.000
50.000
25.000
32.500
25.000
25.000
50.000
50.000
50.000
50.000
50.000
50.000
50.000
50.000
612.500
DATA DOS CHEQUES
18/9/98
21/8/98
30/9/98
25/9/98
30/10/98 *
11/9/98
30/9/98
09/10/98 *
11/9/98
30/9/98
11/9/98
11/9/98
11/9/98
11/9/98
30/11/98 *
---
Os deputados contestaram as justificativas de Ricardo Teixeira para fazer
essas doações. Veja trechos das notas taquigráficas do depoimento do presidente da
CBF a esta CPI:
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – O senhor tem
conhecimento, então, dos cheques que saem, dos valores que são colocados,
das doações que são feitas, dos empréstimos que são feitos, dos
pagamentos de juros, de toda a administração da CBF, ou empresa, como
o senhor está dizendo, que essa CBF é uma empresa hoje?
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA – Especificamente, no
caso das doações, eu tenho.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – O senhor tem?
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA –Tenho.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – O senhor não conhece
Antonio Carlos Amorim Júnior?
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA – Por nome...
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Ele é o pai... Ou melhor,
Sr. Ricardo Teixeira, ele é filho do Sr. Antonio Carlos Amorim, o
desembargador ex-Presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro,
ex-Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro, que
V.Sa. levou para a Copa do Mundo com todas as despesas pagas. Esse
Antonio Carlos Amorim Júnior é filho desse desembargador(...)
Antonio Carlos Amorim Júnior, então candidato a Deputado, recebeu
uma doação da CBF de 50 mil reais. E o Presidente não conhece o Sr.
Antonio Carlos Amorim 13
Talvez conheça, Sr. Presidente, o Sr. Antônio Delfim Netto, exMinistro, Deputado, que recebeu também da CBF 5 mil reais num
jantar de adesão. (...)
Ou ainda o Sr. Paulo Cardoso de Almeida, que também, no dia
30/9/98, recebeu 50 mil reais;
ou ainda Antônio Aquino Lopes, que, no dia 25/9, também recebeu 25
mil reais para a sua campanha eleitoral;
ou ainda Antônio Aquino Lopes, que, no dia 30/10/98, recebeu 32
mil e 500 reais da CBF para a sua campanha eleitoral;
ou ainda o Sr. Maurício Magalhães, que, no dia 30/9/98 — sempre
às véspera da eleição ou um pouco depois, Sr. Presidente —, Maurício
Magalhães recebeu 25 mil reais também da CBF;
ou ainda Carlos Augusto Santana, Deputado Federal do PT do Rio de
Janeiro, que recebeu, no dia 9/10/98, 50 mil reais;
Na verdade, verificou-se tratar do próprio desembargador, e não do filho dele. O desembargador se
aposentou e se candidatou a uma vaga de Deputado Federal.
13
membro dessa CPI, o Deputado Darcísio Paulo Perondi, que recebeu
100 mil reais, em duas parcelas de 50 mil reais, uma datada — de 50
mil — de 11/9/98, outra de 30/9/98;
ou ainda o Senador José Agripino Maia, que, no dia 11/9/98, recebeu
50 mil reais;
ou ainda o Presidente do PFL, o Senador Hugo Napoleão do Rego
Neto, que recebeu também, no dia 11/9, 50 mil reais;
ou ainda, na mesma data, o Sr. Artur Henrique G. Ferreira, 50 mil
reais também;
e aqui outro Deputado dessa CPI, Deputado Eurico Miranda, que, na
mesma data, recebeu 11 mil reais.14
Então, Sr. Presidente, como pode a CBF (...) Primeiro é saber qual o
critério da escolha: porque é filho do desembargador, porque é próximo,
enfim, quais os critérios que a CBF utiliza para sortear ou beneficiar ou
premiar candidaturas com valores razoáveis para as campanhas. Porque
isso, na própria disputa eleitoral, causa já uma desigualdade, causa já
dificuldades para outras candidaturas. Queria saber, Sr. Presidente, os
critérios que V.Sa., o Sr. Salim e outros mais da CBF utilizam-se
para...
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Porque também, Sr.
Presidente, a legislação que eu tenho em minhas mãos aqui proíbe que
uma entidade como a CBF, proíbe que Deputados recebam, que
candidatos recebam doações de instituições como a CBF, certo? E
gostaria de saber também de V.Sa. se é comum V.Sa. levar
desembargadores graciosamente nas disputas da Copa do Mundo
.O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA – Sr. Presidente, eu
gostaria de pedir a S.Exa., o Deputado, que me informasse qual é a
legislação que diz que a CBF não pode e por que razão ela não pode
fazer doações políticas?
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Um minutinho que eu já
vou localizar. Olha, eu não tenho, Deputado Jurandil... Está aqui. É
exatamente o art. 24 da Lei 9.504, de 30/7/97, publicada no Diário
Oficial de 1/10/97. Art. 24: “É vedado partido e candidato receber
direta ou indiretamente doação em dinheiro ou estimável em dinheiro,
inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie procedente de...”. Aí
vem inciso I, II, III, certo? Vou ler somente o IV, que diz que, ou aliás,
o inciso VII, que diz: “Pessoas jurídicas sem fins lucrativos que recebam
recursos do exterior”. É vedado que candidatos recebam de pessoas
jurídicas sem fins lucrativos que recebam recursos do exterior. Isso é
ilegal. Mas, além da questão legal... a questão pode não ser legal, para
14
O deputado Eurico Miranda recebeu R$50 mil reais em doação da CBF à sua campanha eleitoral.
mim é muito mais moral e ética. O que a CBF exatamente ganha ao
financiar determinados candidatos e não financiar os outros?
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA – Excelência, eu gostaria
de esclarecer que, desde 98, a CBF é entidade de fins lucrativos, porque
houve uma medida provisória do Governo que acabou com a isenção
tributária que a CBF tinha. Segundo, é perfeitamente legal e dentro da
lei que saiu, que emanou do Congresso Nacional e da Câmara dos
Deputados a lei que faculta o auxílio oficial, como a CBF dá, com
cheques nominativos, que estão na sua contabilidade, razão por que essa
CPI conseguiu obter a documentação. Todos os cheques de auxílio que
nós fornecemos foram nominativos e totalmente declarados dentro da
entidade, entidade essa, que eu voltou a dizer, em janeiro de 98, perdeu o
direito de ser uma entidade de fins não lucrativos.
Mas o deputado Jurandil Juarez havia analisado a legislação e o estatuto
da CBF e concluiu que o argumento usado pelo depoente não tinha fundamento:
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – (...) Sr.
Presidente, eu fui à CBF e procurei mudanças, eu estou convicto de que
não houve mudanças. Por isso, eu vou ler o que diz o estatuto, que foi o
que esta Comissão recebeu, foi o que este Deputado, em nome da
Comissão, recebeu a informação, lá na CBF: esta entidade continua
sendo uma associação civil de direito privado sem fins lucrativos. Agora,
deixar bem claro que existe uma diferença entre ser sem fins lucrativos e
isenta do pagamento de impostos. A entidade, portanto, continuou por
sua própria deliberação, dado que não existe, na Junta Comercial do Rio
de Janeiro, registro de mudança de característica de pessoa jurídica da
CBF. Continua valendo este estatuto, e este estatuto é a lei da CBF.
Considerado que isso é verdadeiro, eu começaria por algumas questões que
foram ficando pendentes e que vão orientar o meu raciocínio. Com
referência às doações feitas às pessoas que disputaram a eleição de 1998,
não é fato que elas sejam legais, não. Consultei também a CBF sobre
isso, de lá obtive a resposta que seriam legais. Mas quero lhe dizer que
essas doações ferem, em primeiro lugar, o estatuto. Os arts. 7º e 57
proíbem que sejam feitas essas doações, porque o art. 7º determina que:
todos os recursos da CBF — estou lendo — serão empregados na
realização de suas finalidades. Leio as suas finalidades, e nenhuma tem
aqui apoiamento de candidatos para cargos eletivos.
Ainda que fossem legais, essas contribuições se tornariam ilegais porque
excederam o limite previsto pela lei eleitoral, segundo o deputado Jurandil Juarez:
“Ferem, Sr. Presidente, a lei, porque a lei que rege essa matéria estabelece
que as doações poderão atingir o máximo teto de 2% do faturamento das
empresas. A lei estabelece que as doações têm que ser feitas no período
eleitoral. A CBF fez doações pelo menos a dois candidatos — acho que
se torna ocioso aqui citar os seus nomes — fora de prazo, depois de
realizadas as eleições, portanto, depois que os comitês financeiros estavam
fechados; e eles não concorreram a cargos majoritários, portanto não tinha
o segundo turno. Por todas essas razões, Sr. Presidente, eu posso lhe
assegurar que essas doações são ilegais. Claro que isso não atingirá os que
receberam, não só porque receberam de boa-fé, mas porque os prazos para
contestação, para que a própria Justiça Eleitoral fosse acionada, já se
exauriram. Mas eu lhe pergunto: o que o senhor acha de uma situação
dessas, em que em pelo menos quatro situações uma entidade tão bem
dirigida por V.Sa. comete esse tipo de deslize?
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Excelência, o senhor
tem os dados nas suas mãos, eu não os tenho. Chegando à CBF, vou
verificar os dados, primeiro, e, segundo, pode haver, o senhor conhece isso
melhor do que ninguém, opiniões diferenciadas sobre o mesmo assunto,
juridicamente falando. Eu tenho que fazer uma análise e pedir um
parecer a uma grande empresa de advogados para que configure realmente
que isso tenha existido dessa forma, porque na realidade, em janeiro de
98, existe uma medida provisória em que todas as entidades que eram de
fins não lucrativos deixaram de sê-lo, por uma medida provisória
aprovada no Congresso Nacional.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Sr. Presidente, me
desculpe, eu não estou fazendo julgamento de valor, não estou dando
opinião. É possível, e por isso que disse que estou lendo no seu estatuto
que o senhor continua sendo... a entidade continua sendo sem fins
lucrativos, regida pelo seu estatuto. E no seu estatuto não há abertura
para haver esse tipo de doações, o estatuto da entidade, que o senhor pode
reformar, dar-lhe outra personalidade jurídica, permitir que isso aconteça.
Bom, mas isso poderia configurar eventualmente o julgamento de valor,
mas eu estou falando de fato. As doações ultrapassaram o teto
estabelecido na lei e duas delas foram feitas. Uma, no dia 30 de outubro
de 98. Ora, as eleições foram no dia 3 ou no dia 4, se não me falha a
memória. Outra, no dia 9 de outubro de 98. Isso não é objeto de
especulação, eu posso lhe dar o nome do cheque, a data estou lhe dando
aqui, posso lhe dizer o banco e, como já foram até citadas algumas
pessoas, não é do meu interesse citar quais foram as pessoas que
receberam fora do período determinado pela lei. Por isso, quero lhe dizer
que não se trata de um julgamento de valor, é o julgamento de fato; isto
não é estatuto, não é receita federal, essa é a lei que orienta e que baliza
esse tipo de procedimento.”
O valor total doado - e declarado na contabilidade - pela CBF, em 1998, é
de R$ 612.500,00. A Lei 9.504/97 estatui o limite de 2% do faturamento bruto da
empresa doadora, no ano anterior ao das eleições. O faturamento bruto da CBF, em
1997, foi de R$ 28.097.358,00, já descontados os R$ 455.402,00 relativos a doações e
subvenções que foram destinadas à CBF.
Assim, mesmo na hipótese de que a CBF pudesse realizar doações, tese
essa que é falsa, o valor doado representa 2,18% do faturamento da Confederação em
1997. Com isso, a CBF pode vir a ser apenada conforme estabelecem os parágrafos 2. e
3. do art. 81 da Lei, o que vale dizer que a CBF poderá pagar multas pelo excesso
doado e poderá ficar proibida de firmar qualquer tipo de contrato com o Poder
Público, durante cinco anos.
A Lei 9.504/97, a Lei Eleitoral, estabelece em seu art. 81 o seguinte:
Art. 81. As doações e contribuições de pessoas jurídicas para
campanhas eleitorais poderão ser feitas a partir do registro dos comitês
financeiros dos partidos ou coligações.
§ 1º As doações e contribuições de que trata este artigo ficam
limitadas a dois por cento do faturamento bruto do ano anterior à eleição.
§ 2º A doação de quantia acima do limite fixado neste artigo
sujeita a pessoa jurídica ao pagamento de multa no valor de cinco a dez
vezes a quantia em excesso.
§ 3º Sem prejuízo do disposto no parágrafo anterior, a pessoa
jurídica que ultrapassar o limite fixado no § 1º estará sujeita à proibição
de participar de licitações públicas e de celebrar contratos com o Poder
Público pelo período de cinco anos, por determinação da Justiça Eleitoral,
em processo no qual seja assegurada ampla defesa. (g.n.)
Além das doações declaradas a candidatos apoiados pela CBF, também
se observa, através do fluxo das doações feitas às federações, que elas tendem a ser
maiores nos períodos eleitorais. O que indica também aí o favorecimento de
candidatos ligados à CBF.
Por meio das tabelas e do gráfico tem-se uma idéia dos valores
despendidos pela CBF em doações. Observa-se na tendência das doações, o objetivo de
influenciar as eleições, de ampliar sua influência política elegendo sua “ bancada”
federal, e mesmo prefeitos e vereadores. O gráfico evidencia que o fluxo de doações a
federações estaduais se intensifica nos anos e meses em que há eleição. Veja-se o
gráfico mostrando as doações da CBF às federações em 1998, 1999 e 2000. Após,
tabelas com essas doações, por ano (1998 a 2000), obtidas da contabilidade da
CBF.
0
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/2000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/99
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/98
R$
CBF: DOAÇÕES PARA AS FEDERAÇÕES
1998 - 2000
1.000.000
800.000
600.000
400.000
200.000
MESES
Em 1998 as doações intensificaram-se no período eleitoral, a partir de em
setembro, chegaram ao máximo em dezembro desse ano, estendendo-se até janeiro de
1999, num valor total de R$ 1.885.768,00. Em 1999 as doações se mantiveram iguais
durante o restante do ano, na faixa de R$300 mil por mês Em 2000, ano das eleições
municipais, novamente as doações intensificaram-se depois de agosto, alcançaram o
máximo em setembro – R$ 687.839,00 -- e a um total de R$ 2.178.093,00 até
dezembro.
DOAÇÕES PARA O DIRETÓRIO DO PFL MUNICIPAL DE NATAL, RN
A CBF fez uma doação para o Diretório Municipal do PFL de Natal, RN,
no valor de R$ 100 mil, em 19/9/2000, por meio do cheque do Banco Real, agência
003, número 53.446.
Trata-se de mais um auxílio eleitoral ao Estado do Rio Grande do Norte,
que reforça a hipótese de que a CBF esteja realizando doações para campanhas políticas
por meio de repasse de recursos para a Federação de Futebol daquele Estado. O gráfico
abaixo é claro:
DOAÇÕES DA CBF PARA A FEDERAÇÃO DE FUTEBOL
DO RIO GRANDE DO NORTE, NO ANO DE 2000
R$
DEZEMB
NOVEMB
OUTUBR
SETEMB
AGOSTO
JULHO
JUNHO
MAIO
ABRIL
MARÇO
FEVEREI
JAN/2000
120.000
100.000
80.000
60.000
40.000
20.000
0
MESES
Pode-se verificar que durante os meses mais próximos à data das eleições
municipais de 2000 houve envio de mais recursos pela CBF. Em julho, o patamar é o
de R$ 12 mil; em setembro, a Federação recebeu mais R$ 40 mil, em outubro mais R$
100 mil e, em outubro, mais R$ 20 mil, além da mesada habitual.
Outra característica dos repasses da CBF para as Federações é que,
enquanto as Federações do Nordeste recebem a mesada de R$ 12 mil, a do Rio Grande
do Norte, apenas, aufere R$ 12.780,00.
Quanto ao cheque para o Diretório Municipal do PFL, ele não se
encontra incluído nos repasses para a Federação.
Caberá aos órgãos competentes examinar o uso desse dinheiro enviado
pela CBF ao Diretório, bem como todos os repasses da CBF para Federações e clubes
de futebol, em períodos eleitorais.
DOAÇÕES PARA FEDERAÇÕES OU PARA CAMPANHAS ?
Em depoimento feito a esta Comissão, em 9/5/2001, o presidente da
Federação de Futebol do Mato Grosso, senhor Carlos Orione, confirmou que é
costumeiro a CBF enviar às Federações dinheiro para campanhas eleitorais. O trecho
em que Orione confirma isso está a seguir:
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – A Federação recebeu
diversas doações em 98. Como foi um ano eleitoral dentro da... Foi um
ano eleitoral dos dois lados, com eleição pra Presidente, Governador,
Senadores, Deputados e também do Presidente da Federação... Presidente
da CBF. O senhor acha que esse dinheiro foi com o intuito eleitoral?
O SR. CARLOS ORIONE – Excelência, eu recebo isso acho que
como uma ofensa, porque jamais eu iria vender o meu voto. Pela minha
posição (ininteligível) no Estado do Mato Grosso.
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – Todas as federações
receberam mais.
O SR. CARLOS ORIONE – Eu sei, mas não em compra, em troca
de voto, absolutamente.
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – Eu não estou dizendo
que é compra de voto.
O SR. CARLOS ORIONE – Eu tô entendendo V.Exa. como isso,
como fins eleitorais. Para quê fins eleitorais? Eu recebi, eu recebi da
CBF, do Dr. Ricardo Teixeira, uma importância de 50 mil reais que eu
pedi que era pra mim ajudar alguns candidatos a Deputado estadual,
federal, a Governador do Estado.
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Eu ia chegar nessa
pergunta.
O SR. CARLOS ORIONE - Então, logicamente, esse...
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Então, foi pra fim
eleitorais?
O SR. CARLOS ORIONE - Esses 50 mil foi pra eleitorais, não
meu nem dele, foi pra fins eleitorais de candidatos ligados ao futebol de
Mato Grosso, que me pediu esse...
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Eu não perguntei, eu
não perguntei se era pro senhor ou não. Eu te disse, ainda... Eu ainda
disse que era uma eleição pra Deputados, Governador, Governadores...
O SR. CARLOS ORIONE - Senadores.
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - ...Senadores e também
do Presidente da CBF.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - Aparte?
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Perfeitamente.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - É o seguinte, Sr.
Carlos, não é a sua Federação, todas as Federações, na análise que nós
fazemos, no ano de 98, aumentaram a contribuição da CBF para essas
Federações. No depoimento do Deputado, do Sr. Ricardo Teixeira nós
constatamos inclusive o registro da colaboração da CBF com campanhas
eleitorais.
O SR. CARLOS ORIONE - Certo.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - Pelo estatuto há
duas interpretações e que nós vamos discutir no nosso relatório. Há uma
interpretação, de alguns, que a CBF pode fazer isso. E há de outros,
advogados e Parlamentares, que não pode. Nós estamos nessa discussão.
Ao fazer...
O SR. CARLOS ORIONE - Eu só fiz a solicitação porque eu
fiquei sabendo realmente que lá na CBF estaria, o Presidente estaria
colaborando com algumas candidaturas.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - Pois é.
O SR. CARLOS ORIONE - Então, como esse pessoal é ligado ao
esporte, muitos foram Presidente de clubes, alguns até já participaram da
nossa administração, e eles... Só não vou declinar o nome, porque o
senhor tá vendo, eu não vou declinar o nome das pessoas pra quem eu
repassei, porque não foi em dinheiro, eu repassei em material esportivo. O
material esportivo era recolhido pelos coordenadores das campanhas, mas
eles tinham ciência do que estava fazendo.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - Então, como
Presidente do órgão, quero dizer pro senhor que, como o senhor foi
convidado, o senhor pode deixar de declinar o nome. Se o senhor tivesse
sido convocado, que foi até uma discussão que nós tivemos na Comissão
de não fazer as convocações dos Srs. Presidentes porque a gente entendia
que a colaboração pode vir sem tá convocado. Então, o senhor diz que
não gostaria de declinar...
O SR. CARLOS ORIONE – Não vou declinar.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - ...e nós da
Comissão gostaríamos muito que fosse declinado que houve colaboração
da Federação Mato-Grossense de futebol em material para alguns
candidatos no ano de 98.
O SR. CARLOS ORIONE - Com recursos oriundos que vieram da
CBF.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - Com recursos
oriundos da CBF.
O SR. CARLOS ORIONE - A meu pedido.
Com isso, pode-se concluir que a CBF doou muito mais dinheiro às
campanhas de 1998 e de 2000, do que realmente consta em sua contabilidade. Para se
ter uma idéia, basta apenas calcular o valor líqüido recebido pelas federações,
debitando-se a mesada habitual, nos meses próximos às eleições.
Tendo-se como base o ano de 1998, e considerando-se os meses de
agosto de 1998 a janeiro de 1999, chega-se ao valor de R$ 1.885.768,00. Isso tudo, é
claro, sem se contabilizar as doações oficiais. Somente em setembro de 1998, mês mais
crítico em termos das eleições daquele ano, o excesso de doações foi de R$ 293.280,00.
Há indícios de que grande parte do valor em excesso doado tenha sido
dirigido para campanhas eleitorais nos Estados. Tanto em 1998, como em 2000, para
campanhas dos próprios presidentes de Federações, como no caso de Sergipe, onde o
presidente é prefeito de Macambira; Mato Grosso do Sul, onde o presidente é prefeito
de Rio Negro; da Paraíba, onde o marido da presidente (e ex-presidente da Federação
paraibana) é prefeito da cidade de Sossego; ou para Regeneração, no Piauí, onde o vicepresidente da CBF, Alfredo Nunes, se elegeu prefeito; ou em muitos casos, nos quais o
presidente deva apoiar políticos locais.
Há, inclusive, no caso de Alfredo Nunes, uma denúncia ainda não
completamente apurada por esta CPI, de que ele teria sido eleito com recursos e
materiais esportivos fornecidos pela CBF.
Esse excesso, calculado apenas como hipótese, em quase R$ 2 milhões,
demonstra que a CBF, além de não poder fazer doações para campanhas, vem doando
muito acima do que a Lei permite para quem está habilitado a realizar doações.
Sabe-se que a CBF é uma entidade sem fins lucrativos. É o que rege seu
Estatuto e o que confirma a sua Assembléia Geral em reunião no dia 5/1/1998,
quando estabeleceu que :
“a Assembléia Geral decidiu, unanimemente, que, apesar do
novo regime tributário, não deverá haver modificação no caráter das
finalidades societárias da CBF, a qual continuará a ter fins não
lucrativos, o que vale dizer, não distribuirá lucros. De acordo com tal
critério aprovado pela Assembléia Geral, eventual resultado financeiro
positivo, apurado entre a receita e despesa de um exercício, continuará
sendo aplicado, como até agora, na manutenção e desenvolvimento da
CBF e na consecução de seus objetivos estatutários”. (g.n.)
Ver Anexo “Ata da Assembléia Geral da CBF, de 5/1/1998”.
Todo dinheiro arrecadado pela CBF deve ser usado na consecução de
seus objetivos estatutários. Além disso, a CBF é uma entidade que recebe recursos do
exterior. Um dos exemplos são os recursos que recebe da multinacional Nike, e
também da FIFA, que é uma entidade nos moldes da CBF, ou seja, a FIFA não é uma
empresa comercial com fins lucrativos.
Sabe-se que os valores recebidos do exterior são bastante expressivos.
Apenas da Nike, a CBF recebeu nos últimos anos cerca de US$ 60 milhões. Com isso, a
CBF, de fato, recebe recursos do exterior, que têm participação efetiva no conjunto de
receitas da entidade.
Mesmo que a CBF queira afirmar que não procurou montar uma
“bancada da bola” na Câmara dos Deputados ou no Senado, as provas disso são
irrefutáveis. Uma delas é o esquema montada em Brasília, com se verá neste Capítulo.
FAVORECIMENTOS ESPECIAIS AO MUNICÍPIO DE PIRAÍ, RJ
A CBF vem realizando doações, conforme tem-se verificado e já se
tornou notório. Há casos, no entanto, que extrapolam a doação pura e simples,
destinada a manter e promover uma bancada em Brasília. Há momentos em que a CBF
realiza destinações de recursos atendendo a critérios pessoais de Ricardo Teixeira.
Um desses casos é o da cidade fluminense de Piraí. Nesse município,
Teixeira possui três fazendas: Santo Antônio, com 115,6 hectares, Santa Rosa, de 155,6
hectares e Fazenda Linda Linda, de 960,0 hectares.
Um dos privilegiados, em 1998, foi o Deputado Estadual Arthur
Henrique G. Ferreira. Esse parlamentar auxiliado pela CBF (leia-se Teixeira) foi eleito
Deputado Estadual. Ele é de Piraí, cidade que indicou ao TRE/RJ como sendo a de sua
residência. Qual seria a ligação entre a CBF e esse Deputado? Qual seria a ligação entre
a CBF e o município de Piraí?
O que vem, de imediato à mente, é o fato de a ajuda ter sido feita devido
ao fato de Ricardo Teixeira ter suas fazendas naquele município.
Outra doação para Piraí chamou mais a atenção desta Comissão. Foi uma
doação feita pela CBF no dia 18/9/2000, às vésperas das eleições municipais do ano
passado, para a Prefeitura de Piraí. Foram dois cheques: o de número 53.386, do Banco
Real, agência 003, no valor de R$ 36.000,00 e o de número 53.388, no valor de R$
14.110,00. O total foi de R$ 50.110,00. Chama a atenção o fato de que as doações da
CBF têm um valor padrão de R$ 50.000,00. Essa doação foi repartida pelo motivo que
será tratado a seguir.
Um dos cheques, o de R$ 14.110,00, foi endossado por alguém
supostamente com competência para fazê-lo, da Prefeitura de Piraí, e foi depositado na
conta corrente do então vereador (e candidato a reeleição) de Piraí, Nilton Teixeira
Crosgnac, do PFL, conta no Banco Itaú, agência 0688, número 09500-9. Essa agência
do Banco Itaú, 0688, fica na cidade vizinha de Barra do Piraí, na Av. Gov. Portela, 158,
centro.
Há uma ligação entre Ricardo Teixeira e Nilton Crosgnac: há indícios
fortes de que Teixeira seja sócio ou tenha sido sócio de Edelweis José Crosgnac na
empresa Linda Linda Com. Ind. Ltda. Teixeira vendeu para Edelweis a parte que lhe
cabia na empresa em 1997, por R$ 319,68, valor declarado à Receita Federal. Edelweis
Crosgnac é, possivelmente, parente próximo do vereador Nilton Crosgnac. Ess ligação
pode ser um dos motivos da doação para esse vereador de Piraí, RJ.
O outro cheque no valor de R$ 36.000,00 foi depositado numa conta da
Caixa Econômica Federal de Piraí. Não se sabe o destino desse dinheiro. Caberá ao
órgão competente verificar para onde foi o valor que deveria ser destinado à Prefeitura
de Piraí. Tudo indica que tenha sido para a campanha de reeleição do prefeito ou viceprefeito de Piraí.
A CBF contabilizou essas despesas como sendo “Ajuda concedida à
Prefeitura Municipal de Piraí”. Primeiro, o que a CBF tem a ver com a Prefeitura de Piraí?
Somente Ricardo Teixeira tem. Que ajuda é essa feita às vésperas das eleições
municipais, sendo que uma parte delas foi, escancaradamente, para a conta de um
vereador, o senhor Nilton Crosgnac?
Sem a menor dúvida, fica claro que essas “ajudas” tiveram como fim o
auxílio oculto a campanhas eleitorais municipais de Piraí. Sem se considerar o fato de
que a CBF não pode fazer doações, a entidade o fez de maneira indireta, fugindo
completamente dos seus objetivos estatutários. Cabe refletir se o presidente atual da
CBF pode continuar agindo como se a entidade fosse mais uma de suas muitas
empresas.
Ficam os órgão competentes de natureza eleitoral, o Ministério Público,
compelidos a investigar essas doações até o fim, para que se possa apurar as
responsabilidades das pessoas que foram indevidamente favorecidas e quem burlou a
lei. E mais uma vez, cabe à sociedade reivindicar seus direitos, por meio de ação
judicial pertinente tendo em vista o desvio de finalidades ocorrido, como meio de
promover a devolução dos recursos desviados novamente para a CBF.
A CASA DE BRASÍLIA E O LOBBY DA CBF
A CBF mantém alugada uma casa em Brasília, numa das regiões mais
valorizadas da cidade. A casa fica numa chácara no Lago Sul, SHIS, QI-15, chácara 2,
lote 15. O aluguel é, atualmente, de R$ 15.747,00.
É alugada de uma empresa, que se diz proprietária do imóvel, que se
chama CCL Comércio e Serviços Ltda., CGC 00.737.486/0001-45 (ver Anexo “Contrato
CBF CCL Aluguel”). Essa empresa tem como sócios Dannyel Carvalho Coelho e Dannyela
Carvalho Coelho. O procurador da empresa é o senhor José Maria Gonçalves Coelho.
O contrato de locação contém uma série de irregularidades. Verificou-se
que o imóvel pertence, na verdade, a José Maria Gonçalves Coelho, ao que tudo indica, pai
de Dannyel Coelho. A CCL tem capital social de apenas R$ 10.000,00, enquanto o
imóvel deve valer mais de R$ 1 milhão de reais. Daí se infere que possa estar
ocorrendo, no mínimo, sonegação fiscal por parte da empresa CCL ou do senhor José
Maria Gonçalves Coelho.
A casa foi alugada pela CBF, por intermédio do presidente da Federação
Metropolitana de Futebol, Weber Magalhães. E é administrada pelo irmão de Weber,
Wagner de Azevedo Magalhães. O contato, pelo que consta, foi feito com Dannyel
Coelho, que é presidente da Federação Brasiliense de Boliche.
Um outro problema é o endereço da empresa. No contrato, consta “QI
13, Bloco H, sala 203, SHIS, Brasília, DF”. Nesse endereço não existe a empresa. No
registro na Junta Comercial do Distrito Federal, consta sala 103. Além disso, os cheques
da CBF sempre tiveram como destinatários uma empresa de nome diverso: CCL
Comércio e Construção Ltda.
Essa empresa, a CCL, segundo dados do seu registro junto à Junta
Comercial, tem como atividades econômicas: comércio varejista de material de construção, e
higiene, limpeza e outros serviços. .
Além disso, o contrato de aluguel não tem firmas reconhecidas e não há
avalistas. Consta na Cláusula 6a do contrato que:
A) O imóvel destina-se exclusivamente ao uso da Confederação
Brasileira de Desportos (sic) que fará dele o uso relacionado a suas
finalidades estatutárias, sendo proibido ao Locatário sublocá-lo, cedê-lo
ou emprestá-lo no todo ou em parte, seja a que título for”.
As finalidades estatutárias da CBF estão listadas nos nas letras “a” a “o”
do art. 2. do Estatuto da CBF. Não se encontra, dentre elas, alguma que se ajuste à
necessidade de a CBF ter uma casa em Brasília. Talvez, merecesse exame mais
profundo a necessidade de se transferir a sede da CBF para Brasília, e não manter uma
unidade lobista tão cara.
Para se ter uma idéia do custo Brasília para a CBF, tem-se os seguintes
números:
Item
Aluguel
IPTU
Administração
Diretor Brasília
TOTAL
1998
145.551
7.722
99.747
253.020
1999
155.636
7.746
205.939
116.492
485.813
2000
175.860
9.996
196.430
278.433
660.719
TOTAL
477.047
25.464
502.116
394.925
1.399.552
Pode-se verificar que o custo Brasília vem crescendo muito nos últimos
três anos, quase 50% a cada ano.
DOAÇÕES : “ARRANJE UM RECIBO ”
Entre muitos exemplos de doações feitas, um é peculiar. A CBF fez uma
doação para um clube catarinense, o Joinville, no valor de R$ 60 mil, no final de 1998.
Esse fato foi denunciado por esta Comissão, durante o depoimento de Teixeira, em
10/4/2001.
No dia seguinte, o clube foi aos jornais avisar que nunca havia recebido
esse dinheiro. E que ele teria ficado com um vice-presidente da CBF, José Jorge Pio.
Em audiência pública realizada em Florianópolis, dia 7/5/2001, o senhor Pio
confirmou isso:
“O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - (...) Como que o Joinville
solta nota na imprensa que não recebeu o dinheiro e o senhor diz que
recebeu? E esse recibo em nome do Joinville, como foi feito?
O SR. JOÃO JORGE PIO - Foi... Desde a primeira notícia eu
declarei à imprensa e vou declarar hoje de novo: em 8 de outubro, eu tava
a serviço da CBF, caí no aeroporto em Cumbica e fraturei o braço. Aí
vim pra Joinville, o Joinville me colocou dois dias no Hospital Dona
Helena, em Joinville, e me pagou a despesa. (...) O único que é
remunerado é o Presidente. Aí eu pedi uma ajuda pra ele, porque ia ficar
muito tempo parado, e ele me disse: “Não, se tu me conseguir um recibo,
um recibo, eu te dou uma ajuda de 60 mil reais.” Aí, solicitei o
Presidente do Joinville na época esse recibo”. (...) Tanto é que quando eu
pedi pra CBF pra me dar um documento eles me mandaram os dois
recibos e disseram: “Oh, aqui, do Joinville não consta nenhum pedido de
verba pro Joinville.” E, de fato, lá na CBF, o Dr. Salim, que era o
Departamento Financeiro, e o Dr. Marco Antônio, os dois que
assinavam os cheques da CBF: “Se tu me arrumares um recibo, eu te
arrumo essa quantia.” E arrumei o recibo, e eles me deram em 3 ou 4
pagamentos. Agora, quero deixar bem claro pra esta Comissão: cheque
de 50 mil reais eu não recebi. Nu... E não... E esses 60 mil reais eu
acho que foi um ou dois cheques, e o resto eles me deram em dinheiro.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - E o dinheiro o senhor
pegou na CBF ou pegou no Joinville?
O SR. JOÃO JORGE PIO - Não, não. Na CBF. Eu podia chegar e
dizer, na hora que a imprensa me procurou: “Peguei o dinheiro e dei pro
Presidente do Joinville.” Não. Não aconteceu isso. Ele apenas me deu o
recibo pra mim prestar contas na CBF. Eu ainda perguntei: “Mas não
pode ser um recibo meu?” “Não, não pode. Tem que ser um recibo de
uma firma ou de um clube, de uma doação.” “Tudo bem.” Aí eu
consegui.” (g.n.)
Pio obteve com o Joinville dois recibos, um de R$ 10 mil e outro de R$
50 mil, com promessa de que a CBF iria auxiliar na reforma do estádio local. O clube
forneceu, antecipadamente, os recibos para Pio, não tendo, depois, recebido valor
algum. Pio, sozinho, embolsou os R$ 60 mil.
Em resumo, Pio recebeu R$ 60 mil, em dinheiro na CBF, sem que esse
valor tivesse sido contabilizado pela entidade. Ricardo Teixeira, Marco Antônio
Teixeira e José Carlos Salim recomendaram a Pio que providenciasse um recibo para
que eles pudessem dar a ele uma ajuda daquele valor. Tinha de ser um recibo de firma, de
clube, de uma doação. (Cheques em referência estão no Anexo 03 – Pasta Sigilo Bancário
17).
CAPÍTULO IX – DECLARAÇÕES DE RENDA DE RICARDO TEIXEIRA
O valor real do patrimônio pessoal de Ricardo Teixeira é insondável, mas
com certeza é superior àquele que aparece nas suas Declarações de Renda. Para
comprovar essa afirmação, basta fazer referência a algumas propriedades não
declaradas, como a mansão que possui no balneário de Búzios (RJ) e à mansão,
igualmente não declarada até 2000, em Miami, Florida, USA.
Esse costume de sonegar informações à Receita Federal não vem de
agora. Por isso, Ricardo Teixeira foi condenado a seis anos de prisão por sonegação
fiscal pela Justiça Federal do Rio de Janeiro, em novembro de 2000. O juiz Flávio
Oliveira Lucas sentenciou:
“Julgo procedente a pretensão punitiva deduzida na denúncia
para condenar o acusado RICARDO TERRA TEIXEIRA,
qualificado nos autos, como incurso nas penas do artigo 1, inciso I da Lei
8.137/90, por três vezes, na forma do artigo 69 do Código Penal (...)
Destarte, chega-se à pena definitiva de seis anos de reclusão e 300 diasmulta , cada um deles no valor acima declarado (200 UFIR) (...) A
pena privativa de liberdade será cumprida em regime semi-aberto (...)
Concedo ao sentenciado o direito de recorrer em liberdade, considerando
sua primariedade e bons antecedentes (...) Transitada em julgado esta
sentença, expeça-se mandado de prisão...”
Assim, por ser primário, o condenado Ricardo Teixeira pôde recorrer da
sentença em liberdade.
O escritório Couto de Assis Advogados, que recebe R$9.850,00 reais por
mês da CBF, para defender Teixeira (o que já configura uma irregularidade, e caberia às
federações cobrar do presidente da CBF), propôs o encerramento do processo
argüindo sua prescrição. O processo continua em curso na Justiça.
A análise feita por esta CPI das declarações de renda de 1997 a 2000
do presidente da CBF encontrou falhas e inconsistências que certamente ainda serão
questionadas pela Receita Federal.
Algumas delas:
a) Desde 1997 Ricardo Teixeira declara a propriedade de cinco
apartamentos. Mas não declarou a renda desses imóveis em nenhum desses anos. Não
estão alugados? Estão fechados? Estão emprestados? Em seu depoimento à CPI em
10/4/01, Ricardo Teixeira disse apenas que esses apartamentos não estão gerando
renda.
b) Na sua declaração de renda de 97 (ano base 96) consta um pagamento
de R$140 mil reais à empresa MB DTVM. Uma empresa que, segundo os registros,
está encerrada desde 1991.
c) Na Declaração de 98 (ano base 97) declara envio de 200 mil reais para
sua empresa Rio Port, mas na sua movimentação bancária do ano há cheques no valor
de 500 mil reais para essa empresa. Qual o motivo para essa diferença?
d) Na declaração do mesmo ano, declara empréstimo de 299 mil reais à
empresa City Port Bar e Restaurante. Mas na sua movimentação bancária não há
nenhum lançamento para essa empresa. Qual o motivo dessa ausência?
e) Em 1999, apesar de transferir 924 mil reais em bens para sua exesposa Lúcia Havelange, seu patrimônio não diminuiu. Seus rendimentos declarados
aumentaram em 251,53% em comparação com 98. Declarou 329 mil reais recebidos
da CBF e 974 mil de ganhos no mercado financeiro.
INCONSISTÊNCIAS NAS DECLARAÇÕES DE RENDA
1. Declaração do IR 1997 – Calendário 1996
Observação
5 apartamentos declarados
Título de sócio do Iate Clube do RJ, adquirido
de Alex Silva da Rocha.
Cheques nominais ao El Turf
Pagamentos à MB DTVM
Valor
Carnet Leão ?
R$ 12.000
Rendimentos do rest. El Turf
R$ 8.800
Veículo marca espero, D10, Daewoo, não
consta na declaração de 96. Na de 97 aparece
nas 2 colunas
R$ 19.398
R$ 60.000
R$ 140 mil
Comentário
Não há renda de aluguel
Movimento bancário de
R$ 4.000,00
no IRPF nada consta
Inst. Cancelada em
1991
emitiu cheques R$
280000
Não tem registro no
Renavam.
2. Declaração de 1998 – Calendário 1997
Observação
5 apartamentos declarados
Aquisição de carro usado (volvo 850) à CBF
Cheques p\ Rio Port
Cheques p\City Port Bar e Rest.
Valor
Sem carnet
leão
R$ 46 mil
R$ 500 mil
Nihil
Comentário
Não há renda de
aluguel
Ano seguinte, perda
total
no IRPF = R$ 200 mil
Na IRPF = R$ 299
3. Declaração 1999 – Calendário 1998
Observação
5 apartamentos declarados
El Turf
Cheques p\ Rio Port
Cheques p\ City Port Bar e Rest,
Valor
Sem carnet leão
R$ 13 mil
IRPF 200 mil
IRPF 349634
Comentário
Não há renda de aluguel
Chq. R$ 513 mil
Chq. 200 Rend. 00
Cheques=00 Rend.R$0
4. Declaração do IR 2000 – Calendário 1999:
Observação
5 apartamentos declarados
Valor
Carnet leão
Aquisição imóvel lote 05, quadra 10,rua
vereador Crispin da Fonseca, adquirido de
Edivaldo Gerônimo da Silva
Transferiu bens p\ Lúcia Havelange
R$ 190.000
Em relação ano anterior, rendimentos
cresceram 251,53 %
R$ 329 mil
R$ 974 mil
Elevada soma em cc e no “cofre” particular
R$ 360 mil + R$
712 mil
R$ 924 mil
City Port bar
Comentário
Não há renda de
aluguel
Não há movim.
bancária
correspondente
Patrimônio não
diminuiu
CBF pagou a mais.
Ganhou no merc. fut.
a+
Chq. R$ 88,1
APLICAÇÕES NA BM&F
Ricardo Teixeira vem realizando muitas aplicações financeiras nos
últimos cinco anos. Em geral, referem-se a apostas em dólar futuro, na Bolsa de
Mercadorias e Futuros. Para se ter uma idéia da sua competência nesse ramo, basta
examinar alguns de seus ganhos recentes. Apenas em janeiro de 1999, ganhou cerca de
R$ 877 mil.
Esse ganho é resultado da aposta na desvalorização do real ocorrida em
janeiro de 1999. Ganhou exatamente nos dias seguintes àquele fato, como demonstram
os relatórios da BM&F recebidos por esta CPI. Ricardo Teixeira confirmou que
acreditava na desvalorização do real, durante seu depoimento de 10/4/2001. Ele
afirmou que qualquer pessoa que tivesse informações sobre a queda do presidente do
Banco Central saberia que o dólar iria descolar.
Essa afirmação sugere que Teixeira pode ter tido informações
privilegiadas, devendo aquela operação ser examinada devidamente. Foram
encontradas, também, inconsistências entre as informações relativas às aplicações no
mercado futuro, constantes nas declarações de renda, e os relatórios encaminhados pela
BM&F e pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
Caberá à Receita Federal, à CVM e ao Ministério Público Federal
examinar essas operações e apurar sua regularidade. A CVM, especialmente, deverá
verificar o cumprimento das normas contidas na Instrução CVM n° 301, de
16/4/1999. (Documentos de referência: Ricardo Teixeira Anexo 04 – Sigilo Bancário
Pasta 08).
AS EMPRESAS DE RICARDO TEIXEIRA NO BRASIL
Na Declaração de Renda de 2000 (Ano Calendário/99), Ricardo Teixeira
declarou ser sócio ou proprietário das seguintes empresas, todas em território nacional.
Não declarou nenhuma empresa fora do Brasil:
- Fazenda Linda Linda, em Barra do Piraí;
- Fazenda Santo Antônio, Barra do Piraí;
- Cotas de capital da empresa RLJ Participações (R$ 152.77,29);
- Cotas de capital da empresa LR da Barra Veículos, que declara ter
vendido em 1999;
- 50 mil cotas de capital da empresa Casa do Chopp 2001 Bar e
Restaurante (R$ 48.500,00);
- Cotas de capital da empresa El Turf Bar e Restaurante (R$
12.572.00);
- 1.600 cotas de capital da empresa El Turf Bar e Restaurante
adquiridas de Guilherme Teixeira (R$ 100.000,00);
- Ações de Minas Investimentos S/A (R$ 5.060,00);
90.000,00);
valores).
- Cotas de capital da empresa City Port Bar e Restaurante (R$
- Subscrição de cotas da empresa Rio Port View (sem referência a
O Banco Central identificou mais essas outras empresas de Ricardo
Teixeira, que não foram declaradas:
- UNEMIL União Nacional de Empreendimentos e Participações;
(não foi declarada)
(Obs. No depoimento à CPI (10/04/01), indagado sobre a UNEMIL, Ricardo
Teixeira respondeu apenas que essa empresa estava cancelada. Mas só foi cancelada
em abril de 2000. Portanto, deveria ter sido declarada à Receita nos anos anteriores.)
- Minas Investimentos Empreendimentos e Administração Ltda;
(não foi declarada)
- Joio Empreendimentos e Participações Ltda; (não foi declarada)
- Minas Investimentos Condomínio de Seguros Sociedade Civil
Ltda.; (não foi declarada)
declarada)
- Minas Investimentos Corretora de Seguros Ltda.; (não foi
- Agropecuária Santa Rosa Ind. E Comércio Ltda; (declarada, mas
como Fazenda Santa Rosa).
Em investigações paralelas identificamos com mais detalhes algumas
dessas empresas:
EMPRESAS EM QUE RICARDO TEIXEIRA E JOÃO HAVELANGE SÃO SÓCIOS
“O SR. JOÃO HAVELANGE - Eu lhe digo: eu fico tão triste de
ouvir isso! Eu quando fiz o meu primeiro Imposto de Renda foi em
1940, quando eu vim trabalhar em São Paulo, e eu faço até hoje. O
pouco ou tudo que tenho está estipulado no meu Imposto de Renda, e,
dentro desse Imposto de Renda, como eu consegui comprar um
apartamento ou isso ou aquilo. E posso lhe dizer o que possivelmente vai
estarrecer quem está aqui: eu nunca comprei uma coisa para mim; o
pouco que tenho está tudo no nome de minha mulher. Se eu me separar,
eu tenho que começar do zero, pelo respeito que eu tenho à minha família.
Este é um ponto.”
Quando de seu depoimento como convidado a esta CPI, João Havelange
declarou-se pobre e enfatizou que o pouco que tem está em nome de sua mulher.
Talvez não tenha se lembrado. Mas alguma coisa ele tem em seu nome, pois é sócio de
seu ex-genro Ricardo Teixeira em algumas empresas do grupo MINAS
INVESTIMENTOS.
Consultado, o Cartório de Registros de Minas Gerais informa que existe
uma empresa chamada Minas Investimentos Empreendimentos e Administração Ltda.,
com o mesmo CNPJ de uma antiga empresa de Ricardo Teixeira -- a Minas
Investimentos S/A, Empreendimentos e Administração – ADMINAS -- na qual ele é
sócio de João Havelange e outros.
De acordo com os registros da Junta Comercial de Minas Gerais,
localizamos três empresas cujos sócios são os mesmos, ainda que em funções diferentes
em cada uma delas. São:
MINAS INVESTIMENTOS EMPREENDIMENTOS E ADMINISTRAÇÃO
LTDA.
MINAS INVESTIMENTOS CONDOMÍNIOS DE SEGUROS SOCIEDADE
CIVIL LTDA.
UNEMIL UNIÃO NACIONAL DE EMPREENDIMENTOS E
PARTICIPAÇÕES.
Os sócios dessas três empresas são:
RICARDO TERRA TEIXEIRA
MARCO AURÉLIO TEIXEIRA
GUILHERME TERRA TEIXEIRA
JEAN MARIE FAUSTIN GODEFROID HAVELANGE
A seguir, histórico de algumas dessas empresas:
1. MINAS INVESTIMENTOS S/A EMPRENDIMENTOS
ADMINISTRAÇÃO LTDA - ADMINAS - CNPJ 17.496.431/0001-93
E
Foi aberta em 31/03/1971, em Belo Horizonte, rua do Catete, 272 bairro de Barroca.
2. MINAS INVESTIMENTOS CONDOMÍNIO
LTDA.
DE
SEGUROS SOCIEDADE CIVIL
Alteração de contrato social da empresa em 12/01/1989. Transferência
de sede para Travessa do Ouvidor, 38 - 3º andar - Rio de Janeiro. (Belo Horizonte,
26/04/1989).
3. UNEMIL UNIÃO NACIONAL DE EMPREENDIMENTOS E
PARTICIPAÇÕES S/A - CNPJ 17.362.237/0001-15
Aberta em 22/09/1981. End. Rua Pedra Bonita, 1114 - Barroca - Belo
Horizonte (mesmo bairro da Minas Investimentos).
Sócios:
Responsável e Diretor -- RICARDO TERRA TEIXEIRA
QSA incluído em 18/09/1990.
Diretor -- GUILHERME TERRA TEIXEIRA
QSA incluído em 18/09/1990.
Diretor -- JEAN MARIE FAUSTIN GODEFROID HAVELANGE
QSA incluído em 18/09/1990.
Diretor --MARCO AURÉLIO TEIXEIRA
QSA incluído em 18/090/1990.
Essa empresa foi cancelada em 07/04/2000.
4. MINAS INVESTIMENTOS S/A CRÉDITO E FINANCIAMENTO, que era
a empresa mais ativa do grupo de Ricardo Teixeira, foi vendida por ele. As empresas
restantes do grupo ficaram a partir daí praticamente inativas, sem pagar impostos.
Entretanto, uma delas, a ADMINAS, aparece em 1996 como proprietária da casa de
Búzios.
5. ALTERAÇÃO DE CONTRATO SOCIAL: Em 12/01/2000.
Minas Investimentos S/A Empreendimentos e Administração ADMINAS teve seu nome alterado para MINAS INVESTIMENTOS
EMPREENDIMENTOS E ADMINISTRAÇÃO LTDA.
CNPJ é o mesmo: 17.496.431/0001-93
Sócios-gerentes:
RICARDO TERRA TEIXEIRA - 5.060 cotas;
UNEMIL União Nacional de Empreendimentos e Participações S/ª -17.940.000 cotas. De Serviços gerais financeiros, e da qual João Havelange é sócio.
A composição societária da empresa MINAS INVESTIMENTOS
EMPREENDIMENTOS E ADMINISTRAÇÃO LTDA.:
Responsável e sócio-gerente: RICARDO TERRA TEIXEIRA
QSA alterado em 12/01/2000
Diretor: GUILHERME TERRA TEIXEIRA
QSA alterado em 28/08/1990.
Sócio; UNEMIL : União Nacional de Empreendimentos e Participações
S/A
QSA incluído em 12/01/2000. (da qual João Havelange é sócio).
Alguns meses depois -- 07/04/2000 -- a UNEMIL e suas duas filiais
tiveram seu registro cancelado.
6. A empresa MINAS INVESTIMENTOS CONDOMÍNIOS DE SEGUROS
também continua existindo.
Esses registros contradizem declarações de Ricardo Teixeira, feitas em
sucessivas entrevistas à imprensa, na qual afirmava que havia vendido a empresa Minas
Investimentos. Vendeu apenas a financeira do grupo, que continuou sendo de sua
propriedade.
Ele também se equivocou em seu depoimento à CPI quando disse que a
empresa remanescente é a MINAS INVESTIMENTOS – ADMINAS. Segundo o
registro do Cartório, essa empresa foi substituída pela MINAS INVESTIMENTOS
EMPREENDIMENTOS E ADMINISTRAÇÃO LTDA., em 12 de janeiro de 2000.
NEGÓCIOS DA EMPRESA MINAS INVESTIMENTOS
A MANSÃO EM BÚZIOS
O Imóvel de Ricardo Teixeira em Búzios é uma mansão composta por
três prédios, localizados sobre um terreno de 1.460 m2, na Praia do Canto, uma das
mais valorizadas do balneário mais caro do Brasil. Foi avaliada recentemente por
agente imobiliário local em pelo menos 1 milhão de reais. Não está em seu nome, mas
no da empresa Minas Investimentos, de sua propriedade.
A história do terreno e da mansão: em 1984 Renato Mendonça Pacote
obteve aforamento de terreno da Marinha, pertencente à União, para domínio útil do
imóvel contra pagamento de foro anual. Ali construiu três casas de boa qualidade, uma
com quatro suítes, as outras duas com três quartos cada uma. Na verdade, é uma
mansão, com várias dependências autônomas. Em 1994, dez anos depois, Renato
Pacote assinou contrato de promessa de venda a Octávio Koeler Plácido Teixeira
Júnior dos imóveis por 39.9 milhões de cruzeiros, equivalente em reais a 14.509,09
(cerca de 16 mil dólares, pois na ocasião o real valia mais que o dólar). Chama atenção o
preço pelo qual o imóvel foi vendido, aparentemente muito abaixo do preço de
mercado. O registro da venda em escritura deu-se em 9 de setembro de 1996.
Nota:
Octávio Koeler Plácido Teixeira mora no Rio de Janeiro,
empresário, é proprietário da SWAP Sociedade Corretora de Câmbio Ltda. Ele tem um
sócio na SWAP, Renato Tiraboschi, que também é sócio de Ricardo Teixeira no
Restaurante El Turf. Na declaração de renda de 1999 de Ricardo Teixeira Tiraboschi
aparece como credor de um empréstimo de R$ 97.313,00. A SWAP SOCIEDADE
CORRETORA DE CÂMBIO LTDA. presta serviços de corretagem – empréstimos no
Exterior, compra e venda de moeda estrangeira - à CBF. Durante os anos de
1997/98/99 recebeu vinte cheques da CBF no valor aproximado de R$ 1,1 milhão,
conforme comprovantes em mãos desta CPI.
Em 18 de outubro de 1996, o mesmo Octávio Koeler Plácido Teixeira
vendeu o imóvel para a empresa Ameritech Holding Ltd. , pessoa jurídica estrangeira,
existente e organizada segundo as leis das Ilhas Virgens Britânicas. O preço ajustado foi
o mesmo pelo qual Octávio havia comprado o imóvel, de Renato Pacote, 39.9 milhões
de cruzeiros, equivalentes a R$ 14.509,09. O imóvel continuava, portanto, sendo
negociado por preço muito abaixo do mercado.
A Ameritech Holding foi representada no negócio por um procurador,
Sérgio Isidoro Eskenazi Pernidji, advogado do Rio de Janeiro., A procuração havia sido
passada em 14 de novembro de 1993, na Cidade do Panamá.
Nota: À época Sérgio Eskenazi era advogado da CBF – Confederação
Brasileira de Futebol (temos cheques da CBF para ele) e também do sr. Ricardo
Teixeira. Apesar dessa aparente familiaridade, em seu depoimento à CPI Ricardo
Teixeira negou ter qualquer relação com a empresa Ameritech Holding
Em 06 de outubro de 1997 registrou-se promessa de venda do terreno,
da Ameritech Holding Ltd. para Minas Investimentos S.A. Empreendimentos e
Administração, que, como vimos, é de propriedade de Ricardo Teixeira. O preço foi de
R$500.000,00 – quinhentos mil reais – algo como 500 mil dólares à época,
integralmente recebidos (pagos à vista). Na venda, a Ameritech foi representada por
outro procurador, Luiz Eduardo Landim Balthazar, engenheiro, procuração passada
em 17 de junho de 1997, na Cidade do Panamá.
Nota: à época, Luiz Eduardo Landim Balthazar era gerente do
restaurante Chopp 2001, de propriedade de Ricardo Teixeira, e sócio do presidente da
CBF.
Pela Minas Investimentos assinou o sr. Marco Aurélio Teixeira, irmão de
Ricardo Teixeira, diretor da empresa Minas Investimentos, da qual Ricardo também é
sócio.
No registro de imóveis de Búzios o número do CNPJ da empresa Minas
Investimentos S/A é 17.966.431/0001-93, o que confere com seu registro de CNPJ
no Cartório de Registro de Imóveis de Minas Gerais. O endereço apresentado – Rua
Pedra Bonita, 1114, em Belo Horizonte –MG, não é o que consta no Registro de
Imóveis (Rua do Catete, 272 – BH). Aquele é o endereço de outra empresa de Ricardo
Teixeira, João Havelange, Marco Aurélio Teixeira e Guilherme Teixeira, a UNEMIL
União Nacional de Empreendimentos e Participações S/A .
INDÍCIOS DE ILICITUDE
É notável a valorização do imóvel em 33 vezes no período de um ano,
enquanto havia se mantido sem valorização durante os anos anteriores, sendo inclusive
vendido por Octavio Koeler Plácido Teixeira pelo mesmo preço que havia comprado, o
que não parece razoável, ainda mais num local tão valorizado. Esses fatos são indícios
que essa tenha sido uma negociação forjada entre parceiros de negócios.
Seja a Ameritech Holding ou não de propriedade de Ricardo Teixeira,
(na compra,o procurador da Ameritech foi Sergio Eskenazi, seu advogado; na venda
Balthazar Landim, seu sócio), o negócio dessa empresa com a Minas Investimentos é
suspeito.
Aqui há duas hipóteses:
a) A Minas Investimentos nada pagou à Ameritech, forjou-se o negócio
apenas para transferir a propriedade da mansão à empresa de Ricardo Teixeira, o que
caracteriza falsificação de documentos;
b) Ou os US$500mil dólares foram pagos à Ameritech,
importância foi enviada para as Ilhas Virgens Britânicas, o que caracteriza
operação de evasão de divisas.
essa
uma
SONEGAÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA
Em suas declarações de renda de pessoa física de 1997 a 2000 Ricardo
Teixeira nunca declarou ser proprietário da mansão de Búzios.. Ele declarou apenas
deter cotas de pequeno valor da Minas Investimentos, R$5.060,00. Não tivemos acesso
à declaração de renda da Minas Investimentos. Se não declarou a comprou da mansão,
a Minas Investimentos cometeu crime de sonegação fiscal. Como Ricardo Teixeira é
sócio gerente dessa empresa ele é o principal responsável.
Outros indícios, ver item que trata, a seguir, da lavagem de dinheiro.
INDÍCIOS DE ENTRADA IRREGULAR DE DINHEIRO NO PAÍS
Em 26/09/1996 El Turf Bar e Restaurante tomou um empréstimo no
Banco Real de Nova York a Valor US$ 2.500.000,00, com juros de 1.25% ao ano acima
da Libor . O negócio foi feito na agência do Banco Real em São Paulo, para ser pago
em largo prazo, em 16 prestações semestrais até 26/09/2004. O Intermediário foi o
Banco Real de Investimento S/A. (Atual Banco Alfa de Investimentos S/ª).
Ricardo Terra Teixeira assinou como Creditado. E também como
Avalista.
Atenção para o texto, em inglês, do ofício do Banco Real S/A New York
ao Banco Real de Investimento, São Paulo, Brasil: no parágrafo central o texto diz algo
assim:
“ ...se o devedor não puder honrar o pagamento do empréstimo
para você em Reais na data da liquidação, você (Banco Real de
Investimentos/ S. Paulo) não será obrigado a depositar o equivalente em
reais no Banco Central do Brasil, o qual, por sua vez, não será obrigado
a remeter o equivalente em dólar para nós (Banco Real Nova York).
QUER DIZER, O DEVEDOR NÃO PRECISA PAGAR.
Não foram encontrados na documentação do Banco Central registros
dos pagamentos das parcelas do empréstimo. Até 26/03/01 deveriam ter sido pagas
nove dessas parcelas. Por sinal, o Banco Central está examinando esse empréstimo não
usual desde 1998. Mas tem havido um retardo inexplicável no desenvolvimento do
processo, o que pode levar em algum tempo à prescrição do provável ilícito. Pelo atraso
imotivado, recomenda-se medida judicial contra o Banco Central.
Outros negócios feitos pelo Restaurante El Turf no mercado financeiro
internacional :
a) empréstimo do Delta Bank para El Turf – de R$ 843.262,50 - Em
20/04/1999, o El Turf Bar e Restaurante fez um empréstimo deste valor junto ao
DELTA BANK.
b) pagamento de juros ao RURAL INTERNATIONAL BANK LTD. –
Em 07/07/2000 o El Turf Bar e Restaurante enviou para o Exterior US$112.270,50
sob a rubrica de juros. Provavelmente para pagamento de juros do empréstimo acima.
Em suma, fica caracterizada a intensa movimentação de capitais feitas
pelo El Turf no mercado financeiro, importâncias que excedem em muito as
necessidades de investimento de uma empresa desse tipo. Tais fatos merecem a atenção
do Banco Central, pois podem estar ligados a transferências ilegais de capitais,
caracterizando evasão de divisas ou outro crime.
Quanto ao El Turf, há ainda algo importante a ser examinado. Ricardo
Teixeira afirmou, em seu depoimento a esta CPI, que o El Turf tem um faturamento
grande, pelo que se pode observar, via as notas taquigráficas daquele depoimento:
“O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – (...) Porque eu
estava analisando aqui e observando um certo relacionamento entre o El
Turf Bar e Restaurante e a CBF. O El Turf Bar e Restaurante é de
V.Sa. Eu nunca estive lá, não conheço, deve ser um bar e restaurante
muito grande, não deve ser um espaço pequeno, até porque, pelos valores
que pega emprestado, como pegou do Banco Real de Nova Iorque, 2
milhões e meio de dólares, eu imagino que seja um bar e restaurante com
uma área bastante grande. E, em 98, o El Turf emitiu notas fiscais
para a CBF em diversas ocasiões. E o que chama a atenção é que, pelo
tamanho do bar e pelo tamanho que deve ter sido investido lá, deve ter
um movimento muito grande. Qual é o movimento do bar e restaurante?
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA – Só para
responder parcialmente, é realmente grande. Seguramente, é o maior do
Rio de Janeiro. Eu só queria fazer uma correção. Ele não tem
empréstimos do Banco Real de Nova Iorque, até porque não existe Banco
Real de Nova Iorque. Ele tem empréstimos do Banco Real do Brasil.”
(g.n.)
Ou seja, o El Turf tem um faturamento invejável. Um restaurante como
esse, que toma empréstimos de US$ 2.500.000 deve ser realmente de porte. O próprio
Teixeira afirma ser o El Turf o maior do Rio de Janeiro.
O que é estranho nesse caso é fato de Ricardo Teixeira não ganhar nada,
nos últimos anos, com o maior restaurante carioca. Abaixo, estão relacionados os
ganhos obtidos por Teixeira, retirados do El Turf:
Ano Calendário
1995
1996
1997
1998
1999
Rendimentos (R$)
9.450,00
8.800,00
0,00
0,00
0,00
I. Renda na Fonte (R$)
2.450,00
0,00
0,00
0,00
0,00
Observa-se que Teixeira não declara retiradas do El Turf desde 1997. No
entanto, de acordo com documentos de posse desta Comissão, ele emitiu cheques ou
DOCs para o El Turf nos valores abaixo:
Ano Calendário
1995
1996
1997
1998
1999
Valor enviado (R$)
60.000,00
280.000,00
100.000,00
13.000,00
500.000,00
Os valores de 2000 não são conhecidos ainda porque o Banco Real
(ABN AMRO Real) não entregou a esta Comissão os documentos exigidos, mesmo
tendo sido cobrado. Os dados acima podem ser verificados em todos os Anexos 4, que
deverão fazer parte deste Relatório.
São completamente incoerentes os valores pagos por Teixeira com os que
ele declara à Receita Federal. A movimentação financeira entre Teixeira e o El Turf
demonstra indícios de sonegação fiscal.
O quadro abaixo sintetiza essas divergências, incluindo-se os
empréstimos feitos por Teixeira para o El Turf:
Ano Calendário
Rendimentos de RT
no El Turf
Valor enviado por RT
para El Turf (R$)
1995
9.450,00
1996
8.800,00
1997
0,00
1998
0,00
1999
0,00
Soma
17.450,00
1 Informado por Ricardo Teixeira à Comissão em maio de 2001
60.000,00
280.000,00
100.000,00
13.000,00
500.000,00
953.000,00
Empréstimo de RT
para El Turf
declarados à SRF
0,00
0,00
40.000,00
13.000,00
0,00
53.000,00
Faturamento do El
Turf (R$)1
1.724.762,60
2.558.976,80
2.673.691,85
3.060.322,12
?
10.017.753,37
Verifica-se que:
a) há valores repassados por Teixeira ao El Turf que não foram
declarados à Receita, como (a1) os R$ 500.000,00 enviados por Teixeira em 1999, (a2)
os R$ 280.000,00 de 1996, (a3) os R$ 60.000,00 de 1995 e (a4) a diferença de R$
60.000,00, de 1997;
b) enquanto Teixeira recebeu R$ 9.450,00 do restaurante em 1995, com
um faturamento de R$ 1,7 milhão, ele não retirou da empresa quando o faturamento
dela chegou a R$ 2,5 milhões, em 1997, ou a R$ 3 milhões, em 1998, o que sugere estar
ocorrendo sonegação fiscal tanto da pessoa física dele quanto da empresa;
c) em 1999, Teixeira afirma não ter recebido nada do El Turf. No
entanto, prevê-se que a empresa tenha tido faturamento maior do que o de 1998 (pelo
crescimento que vinha apresentando) e ele repassou ao restaurante, pelo menos, R$
500.000,00. Isso também reforça a tese de que o El Turf seja um repositório de indícios
fortes de ilicitudes fiscais, tanto na esfera federal, quanto aos tributos estaduais ou
municipais que, porventura, devessem ser arrecadados.
Somente do empréstimo de US$ 2,5 milhões, o El Turf teria de pagar
cerca de US$ 400.000 por ano ao banco. Isso eqüivale, hoje, a R$ 880.000,00 ou em
torno de 25 a 30% do faturamento bruto do restaurante.
Ou seja, se se considerar um lucro líquido mais realista, em torno de
15%, cerca de R$ 450.000,00, na melhor das hipóteses, o El Turf poderia pagar o
empréstimo com esse lucro em mais de quinze anos. Isso sem se considerar o segundo
empréstimo, tomado junto ao Delta Bank, o mesmo com que a CBF firmou os seis
empréstimos sob investigação por esta CPI.
Deve ser ressaltado que Ricardo Teixeira declarou não ter feito retiradas
do El Turf, o que levanta dúvidas quanto ao que tem sido declarado à Receita Federal
(por ele e pelo restaurante), como também quanto aos empréstimos feitos pelo El Turf,
como descrito acima. São fortes os indícios, portanto, de lavagem de dinheiro e de
sonegação generalizada de impostos e contribuições.
EMPRESAS DE RICARDO TEIXEIRA NO EXTERIOR
AMERITECH HOLDING LTD.
Em seu depoimento a esta CPI em 10 de abril último, o presidente da
CBF, Ricardo Teixeira, negou que fosse proprietário da empresa AMERITECH
HOLDING LTD., que tem sede nas Ilhas Virgens Britânicas. Entretanto, recomendase investigação sobre ela porque tal empresa vendeu à empresa Minas Investimentos
(empresa de Ricardo Teixeira) uma mansão em Búzios, no que parece um negócio no
mínimo suspeito e que envolve sócios e empregados de Teixeira como procuradores. A
saber:
1) A mansão de Búzios foi vendida por Octávio Koeler Plácido Teixeira
Jr., à Ameritech Holding. Ele é proprietário da empresa SWAP Corretora de Câmbio
Ltda., que opera largamente para a CBF em negócios com o Exterior;
2) Nesse negócio a Ameritech foi representada pelo advogado Sérgio
Isidoro Eskenazi Pernidji, como procurador. Este foi advogado da CBF e do próprio
Ricardo Teixeira naquela época (1996);
3) A Ameritech vendeu a mansão de Búzios para Minas Investimentos
S/A, empresa de Ricardo Teixeira, por um preço 33 vezes maior, imediatamente
depois. O procurador da Ameritech na venda foi o engenheiro Landim Balthazar, na
época sócio e empregado de Ricardo Teixeira no Restaurante Chopp 2001. A
procuração dada a ele pela Ameritech foi assinada por Armando Aparício, cidadão sem
registro de CPF no Brasil.
4) Em 31 de janeiro de 2000, Ricardo Teixeira pagou de seu bolso, em
nome da Ameritech Holding Ltd., uma diferença de laudêmio relativo à mansão da
Praia do Canto em Búzios. São dois DARFs , recibos da Receita Federal, nos quais
constam o nome da Ameritech Holding como pagadora: o primeiro, de R$16.431,22,
refere-se à diferença de laudêmio. O segundo, de R$1.446,21, à multa de transferência.
O pagamento foi feito por meio de autorização de débito na conta corrente de Teixeira
no Banco Real.
Portanto, há fortes indícios de que a AMERITECH seja de Ricardo
Teixeira. E há evidências de que envolveu-se em negócio nebuloso com outra empresa
do presidente da CBF, a Minas Investimentos.
GLOBUL ANSTALT
CORPORATION
GLOBUL
ETABLISSEMENT
A
LIECHTENSTEIN
O nome da empresa GLOBUL aparece na Declaração de Renda de 1997
de Ricardo Teixeira. Refere-se a um pagamento feito a ela, no valor de 12.185,55 reais.
É uma empresa localizada no Liechtenstein, o paraíso fiscal mais fechado do mundo.
No seu depoimento, o presidente da CBF afirmou que esse valor se referia a
pagamento de aluguel de uma casa em Miami. Valor evidentemente baixo para fazer
frente ao aluguel de uma mansão daquele porte e naquele balneário estadunidense,
conforme observou o deputado Dr. Rosinha na ocasião, não sendo contestado pelo
depoente.
SANUD
Embora insistindo que não é dono de empresa alguma no Exterior, o
presidente da CBF admitiu em seu depoimento que a empresa SANUD tem sociedade
com uma empresa de sua propriedade, a LRJ PARTICIPAÇÕES. A SANUD, como a
GLOBUL, também tem sede no principado de Liechtenstein15, na Europa. A SANUD
aparece como proprietária de 40% do capital da empresa LRJ PARTICIPAÇÕES.
Informações mais recentes dão conta de que a SANUD já detém 92% do capital da
LRJ PARTICIPAÇÕES.
A PRIMEIRA CASA DE RICARDO TEIXEIRA EM MIAMI
Na declaração de renda de 1997, referente ao ano de 1996, Ricardo
Teixeira informa que fez um pagamento de R$12.185,55 reais a uma empresa chamada
GLOBUL, sediada no Principado de Liechtenstein.
Em depoimento à CPI o presidente da CBF negou ser proprietário da
GLOBUL. Afirmou que essa empresa era a proprietária da casa em que ele morava em
Miami e que o valor acima se referia ao aluguel pago no ano de 1996. Endereço da casa:
16879 Knigtsbridge Lane, Delray Beach, CEP Florida 33484-6949.
Observação: foi contactada a corretora de imóveis Desirée, em Miami,
(telefone 561-998-5243 ou 998-5220), que trabalha com imóveis na região de Delray
Beach e ela informou que o aluguel de uma casa naquela área não sai por menos de US$
5 mil por mês, isto é, US$ 60 mil dólares por ano. Em correspondência de 02/05/01,
Ricardo Teixeira enviou a esta CPI cópia do contrato de aluguel da casa de Miami,
firmado em 15/03/1995, com aluguel fixado em US$ 1.500,00 mensais. Ainda assim, o
15
NOTA: PRINCIPADO DE LIECHTENSTEIN É UM PARAÍSO FISCAL. Fica entre a Suíça e a Áustria. Pequenino, ali vivem apenas 30
mil habitantes,. Fica a 110 km -- a uma hora de carro – distante de Zurique, sede da FIFA. Aliás, o aeroporto internacional que serve
Liechtenstein é o de Zurique. Muito conveniente para quem tem negócios na Suíça. Ainda mais porque dos cinco bancos desse principado, os
três maiores pertencem à Associação Suíça de Bancos “e são obrigados a reconhecer muitas das convenções desta associação, da
mesma maneira que os bancos suíços” (propaganda dos Bancos de Liechtenstein na Internet). Além disso, diz a propaganda, “o
principado tem estabilidade política e impostos e leis liberais para pessoas físicas e pessoas jurídicas” investirem ali. Na verdade,
Liechtenstein é o paraíso fiscal mais fechado do mundo. Segue as leis suíças, isto é, não dá informação alguma sobre as contas bancárias de
pessoas ou empresas que invistam ali.
valor é superior àquele declarado à Receita. Detalhe: só declarou em 1997 sobre o anocalendário de 1996.
.Ricardo Teixeira afirmou que a casa era alugada. Entretanto, em 1996 a
empresa SOLIMARE INTERNATIONAL INC., com sede em Miami, e de
propriedade de Waldemar Verdi Jr., (brasileiro, sócio do Banco DIBENS e proprietário
de um dos 50 maiores grupos empresariais do Brasil, entre os quais o Consórcio
Rodobens), intermediou a venda dessa mesma casa situada no mesmo endereço: 16879
Knigtsbridge Lane, Delray Beach, CEP Florida 33484-6949. A casa foi vendida a um
casal de estadunidenses (o comprador é um médico, cujo nome não será citado).
A SEGUNDA CASA
Em seguida, em
abril de 1997, a empresa SOLIMARE
INTERNATIONAL INC. (de Waldemar Verdi Jr., amigo de Ricardo Teixeira e de
José Háwilla) intermediou a compra de uma outra casa, em favor da empresa
GLOBUL, sediada no Principado de Liechtenstein, vizinho da Suíça. Essa casa, que
tem cerca de 600 metros quadrados de área construída, fica no mesmo condomínio
fechado da casa anterior. Endereço: Delray Beach, Florida; Vintage Oaks, 5896 , CEP
33484 6424. É um dos lugares mais valorizados do balneário. Segundo o registro de
imóveis da Flórida foi comprada por US$924.400,00 dólares.
Esta é a casa em que Ricardo Teixeira reside desde 1997. Ele nega que
seja dono da GLOBUL, e diz que pagava aluguel da casa a essa empresa. Aliás, no
depoimento à CPI tentou fazer confusão dizendo que o valor enviado à GLOBUL em
1996 se referia a esta segunda casa. Mas essa casa só foi comprada pela GLOBUL em
1997. E nas suas Declarações de Renda de 1998/1999/2000 não consta pagamento à
GLOBUL. No seu depoimento à CPI, disse que, por ser um imóvel alugado a pessoas
jurídica sediada no Exterior, considerava desnecessário declarar o aluguel à Receita
Federal do Brasil.
“EFEITO CPI”
Ainda de acordo com o cartório de registro de imóveis de Miami, em
março de 2001 Ricardo Teixeira, pessoa física, comprou a casa por US$800 mil dólares
junto à GLOBUL.
Generosa, a GLOBUL concordou em vender a casa por preço inferior
ao que havia comprado (US$ 924 mil), em 1997.
Dez meses depois, em 26 de dezembro de 2000 (A CPI CBF/NIKE
acabava de ser instalada), no penúltimo dia útil do ano, numa mesma data, Ricardo
Teixeira fez duas remessas de dinheiro para o Exterior, transferência internacionais de
reais, em seu próprio nome: uma de US$ 602.160,00 e outra de US$ 246.628,44. As
duas remessas foram através do RURAL INTERNATIONAL BANK, de Nova
Iorque. São desconhecidos os objetivos dessas remessas. Mas se ele quisesse
regularizar a “compra” da casa, para poder declará-la na Declaração de Renda de 2001,
esse seria o caminho. Aliás, no seu depoimento Teixeira manifestou intenção de
declarar a casa na próxima Declaração de Renda.
Em conclusão, embora Ricardo Teixeira negue, há indícios fortes de que
é proprietário de várias empresas no Exterior. São nebulosas as condições em que o
presidente da CBF adquiriu as duas casas em Miami, Florida através de da empresa
Solimare International de seu amigo Valdemar Verdi Jr., dono do Banco DIBENS.
Esta CPI, que promove investigações a esse respeito nos Estados Unidos, espera ainda
poder esclarecer melhor tais assuntos.
CAPÍTULO X - FEDERAÇÕES : DESAGREGAÇÃO DA ORGANIZAÇÃO
CONFERATIVA
A situação encontrada pela CPI nas federações não poderia ser pior.
Revela um processo avançado de desagregação da organização confederativa. Entidades
dominadas há muitos anos por grupos familiares e de compadrio político, misturando
as relações esportivas com relações políticas. Não raro, o dirigente da federação ou de
clube é também parlamentar, havendo casos como o do Maranhão, onde o presidente
de um clube, o Sampaio Correia, é também o presidente da Assembléia Legislativa.
Desse panorama pode-se deduzir como estão essas entidades distanciadas da
participação da comunidade desportiva na definição de seus destinos, como não há
nelas vestígios de vida democrática.
Associado ao continuísmo, viceja o nepotismo, a contratação de parentes
e de amigos, chegando-se ao cúmulo de o presidente da Federação Mineira ter pelo
menos 27 parentes empregados na entidade. É como se a federação fosse uma empresa,
uma fazenda do dirigente, que nela reina e se impõe como senhor feudal, como dono
absoluto, sem ter que prestar contas a ninguém.
A manipulação dos recursos arrecadados pela federação tem como regra
geral o completo descontrole. Não há orçamento, não há prestação de contas, nem
balanços, nem registros contábeis. Não se declara ao Imposto de Renda. Os recursos
transitam livre e impunemente da conta da entidade para as contas pessoais de
dirigentes e amigos. Nem mesmo sobre os recursos enviados pela CBF há qualquer
prestação de contas ou indicação do destino dos gastos
Em muitos casos, são situações que vêm de longe, herdadas do
“coronelismo” que se implantou nos clubes, mesclado com um mecenato de interesses
eleitorais e que criou a figura do “cartola”, esse misto de dirigente, torcedor e político,
assemelhado, no caráter e nas fidelidades, a um pelego sindical.
O agravante é que, após a Constituição de 1988, que delegou amplamente
à sociedade a organização dos esportes, esses grupos de interesses particularistas
sentiram-se à vontade para ampliar sua atuação, abandonando qualquer atividade de
organização e apoio efetivo à atividade-fim, o esporte, o futebol.
Desgraçadamente, a nova administração da CBF, que instalou-se em
1989, não só omitiu-se completamente quanto à delegação que o Estado lhe deu, e à
sua função estatutária de organizadora do futebol, como foi muito além. Aproveitou
aquela estrutura carcomida e, ainda mais, incentivou-a, colocando-a a serviço dos
interesses privados do grupo que assumiu a entidade nacional. Ricardo Teixeira e seu
grupo, ao deixarem de corrigir as irregularidades que proliferam na base confederativa,
e ao oferecerem ajuda paternalística a federações falidas, estabeleceram laços de
dominação que lhes permitiram, em troca, contar com os votos cativos das federações
nas decisões da CBF. Contando assim com folgada maioria na Assembléia Geral, obtida
à base da cooptação dos dirigentes de federação, o grupo de Ricardo Teixeira pôde, por
sua vez, exercer um poder sem contestações no futebol brasileiro, durante os últimos
doze anos. O resultado todos estão a ver: o colapso do futebol nacional.
A REORGANIZAÇÃO NECESSÁRIA
A reforma do sistema confederativo se impõe com urgência a partir da
sua cabeça, a CBF. Uma nova legislação se impõe, que fortaleça e amplie a democracia
nas relações internas da CBF e nas suas relações com as federações e clubes. Todas as
entidades terão de abrir espaço para a participação da comunidade no processo eleitoral
e nas decisões federativas. A CBF e as federações não são, definitivamente, empresas
privadas, que só devem prestar contas a seus sócios. São delegadas da Nação para a
organização do esporte. A sociedade tem direito de fazer cobranças e de receber a
prestação de contas.
À CBF cabe extrema responsabilidade. Após a reorganização dos
estatutos, estabelecendo rigorosamente direitos e deveres de todos os membros da
confederação, fortalecendo a democracia no sistema confederativo e na vida interna das
entidades, eliminando o continuísmo e o nepotismo, a CBF terá de apresentar um
planejamento geral a ser cumprido por todas as entidades.
O futebol brasileiro é rico, gera muitos recursos. A CBF tem uma
arrecadação vultosa. Nos próximos anos poderá contar com a arrecadação garantida de
25 milhões de dólares por ano, devidos aos contratos de patrocínio da NIKE e da
AMBEV; e mais outros milhões resultantes da venda de direitos dos jogos da seleção às
emissoras de TV, dos contratos com a Traffic etc. A CBF não recebe esses recursos por
si mesma. Eles se originam da força do futebol brasileiro, do seu prestígio. Esse
dinheiro é tanto da CBF quanto das federações, até que porque a CBF não é nada
senão a representação nacional das federações. Esses recursos devem retornar ao
futebol como estímulo ao seu desenvolvimento e aprimoramento, beneficiando atletas,
clubes e a comunidade, na medida em que incentiva o esporte e o lazer.
A obrigação estatutária da CBF é gastar os recursos arrecadados pela
confederação unicamente com a promoção do futebol, a atividade-fim a que o sistema
confederativo se destina. O planejamento plurianual deve incluir atividades da própria
CBF, mas, mais que tudo, deve nortear as atividades das federações e clubes. O
primeiro passo é organizar a federação de forma a que passe a ter atividades ordenadas,
sistema de orçamentos, balanços, prestação de contas, através de um sistema-padrão
informatizado, desenvolvido pela CBF. Moralizadas, reorganizadas e postas a serviço
da comunidade, as federações contarão com os recursos repassados pela CBF, não
como “generosidade” paternalista e eleitoreira, mas como recursos a que têm direito,
instrumentos de incentivo à prática do futebol. Por exemplo:
1. Medidas de apoio à formação de atletas desde a infância até a
adolescência, orientação técnica, de saúde, educacional. Apoio material,
como fornecimento de material esportivo;
2. Programação de campeonatos em estreita colaboração com as entidades
da comunidade, como escolas, empresas, sindicatos, associações e clubes
comunitários;
3. Obras físicas, como construção e reformas de praças de esporte e
providências simples, como iluminar e cercar quadras de esportes no bairros
podem servir de grande estímulo ao esporte e às praticas de sociabilidade da
juventude na comunidade;
4. Estímulo à formação de clubes comunitários, de bairros, de associações,
de empresas;
5. Apoio aos clubes profissionais nas suas atividades de formação de base,
na modernização de suas instalações, no fortalecimento da participação dos
sócios na vida do clube.
Em resumo, apesar do estado lamentável em que esta CPI encontrou o
sistema confederativo de futebol, ele se mantém como uma estrutura viva e,
reorganizado, poderá transformar-se em fator de desenvolvimento do nosso futebol
em todo o território nacional.
Nas próximas páginas, seguem os relatos sobre cada uma das federações
estaduais, pautados nos trabalhos dos sub-relatores Deputados Dr. Rosinha, Olímpio
Pires e Léo Alcântara. A título de auxílio ao leitor, relacionamos no quadro abaixo a
localização dos documentos utilizados pela CPI, integrantes como anexos a este
Relatório.
DOCUMENTOS ANEXOS E SUAS LOCALIZAÇÕES (*)
ANEXO
05
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31
Observações:
FEDERAÇÕES (por Estados)
ACRE
ALAGOAS
AMAZONAS
AMAPÁ
GOIÁS
MARANHÃO
MINAS GERAIS
MATO GROSSO DO SUL
BAHIA
CEARÁ
DISTRITO FEDERAL
ESPÍRITO SANTO
MATO GROSSO
PARÁ
PARAÍBA
PERNAMBUCO
PIAUÍ
PARANÁ
RIO DE JANEIRO
RIO GRANDE DO NORTE
RONDÔNIA
RORAIMA
RIO GRANDE DO SUL
SANTA CATARINA
SERGIPE
SÃO PAULO
TOCANTINS
PASTAS (**)
1F; 1B
1F; 1B
1F; 1B
1F; 1B
1F; 1B
1F; 1B
1F; 1B a 5B
1F; 1B
1F; 1B a 10B
1F; 1B e 2B
1F; 1B
1F; 1B a 4B
1F; 1B
1F; 1B a 3B
1F; 1B a 3B
1F; 1B a 4B
1F; 1B a 5B
1F; 1B a 3B
1F; 1B a 9B
1F; 1B
1F; 1B
1F; 1B
1F; 1B a 7B
1F; 1B e 2B
1F; 1B
1F; 1B a 12B
1F; 1B e 2B
(*) Acrescenta-se a esta relação e aos anexos da CPI os documentos de cada Federação específica, constantes das pastas
nominadas por regiões, sob o domínio da CPI: Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul.
(**) As letras “F” e “B” referem-se, respectivamente, aos sigilos fiscal e bancário. Ao se colocar, por exemplo, “1F; 1B a 3B”,
significa que foram utilizadas, naquela Federação, uma pasta de sigilo fiscal (1B) e três de sigilo bancário (1B a 3B).
ACRE
1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DA FEDERAÇÃO
A Federação acreana possui personalidade jurídica de sociedade civil de
direito privado, regida pelos artigos 20 e 23 do Código Civil Brasileiro.
2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA :
Segundo depoimento de Antônio Aquino Lopes, presidente da Federação
Acreana de Futebol, a situação administrativa é bastante tranqüila, sem dívidas, com
todas as suas obrigações sendo cumpridas a contento. Ainda, conforme depoimento,
possui seis funcionários, com salário médio de R$ 300,00.
À frente da Federação há dezessete anos, Antônio Aquino frisou que,
nem ele, nem os outros diretores, recebem remuneração. Informou que está no cargo
desde abril de 1984, portanto há mais de dezessete anos. Questionado sobre a extensão
do período em que comanda a Federação, disse que não vê problema algum, e que todo
esse tempo indicaria que esteja realizando um bom trabalho.
3. S ITUAÇÃO FISCAL /F INANCEIRA
Inicialmente, foi observado que a Federação não entregou as Declarações
de Imposto de Renda de Pessoa Jurídicas referentes aos exercícios de 1996 e 1997.
Como se não bastasse, as declarações referentes aos três anos seguintes contém em
todas as suas contas de todas as demonstrações o valor 0,00, como podemos perceber a
seguir, por meio de um extrato resumido de duas demonstrações contábeis constantes
das declarações:
Com relação a situação fiscal descrita acima, Antônio Aquino Lopes,
quando inquirido sobre o assunto depoimento, não teve explicações para a omissão nos
anos calendários de 95 e 96, nem para a forma como foi feita a declaração referente aos
anos de 97, 98 e 99 ; culpou seu contador pela falha. De todo modo, ficaram sem
respostas os porquês relacionados às suas declarações de Imposto de Renda, talvez por
que não as tenha, sendo, de pronto, passível de ser indiciado por sonegação fiscal.
4. RELAÇÃO COM A CBF
4.1 ELEIÇÕES NA CBF
Em depoimento à CPI da Bola, da Assembléia Legislativa do Maranhão,
que realizou audiências públicas entre abril e maio de 1994, o jornalista Herbert
Fontenele afirmou o seguinte:
“O SENHOR BENEDITO COROBA: Fontenele, também fala-se
o seguinte. Que o cargo de presidente de Federação, não obstante todas
essas dificuldades materiais, é um cargo assim, muito cobiçado e
principalmente em época de eleição de dirigentes da Confederação
Brasileira de Futebol. Tens notícias de que no período da eleição, um voto
custa assim muito caro, por exemplo, na disputa pela CBF? Há notícias
de que na época da escolha dos dirigentes da Confederação realmente corre
muito dinheiro e, por isso, determinadas pessoas cobiçam esse cargo?
O SENHOR FONETENELE: É muito comentado que o voto na
Assembléia Geral da CBF vale muito, dependendo, é claro, de como a
campanha vai se desenvolver. E só o apoio ao presidente da CBF,
durante o mandato de quatro anos, aquilo pelo que se sabe, já rende
alguma coisa, não só na época da eleição, mas durante a administração
toda, há casos comprovados de um Presidente da Federação do Acre,
nessa eleição do Ricardo Teixeira, que foi muito divulgado na imprensa.
O SENHOR BENEDITO COROBA: Tu tens mais ou menos a
idéia de quanto realmente vale, em dólares, por exemplo?
O SENHOR FONETENELE: Não. Eu até agora não consegui
entender por que eles se apegam a esse cargo, já que só recebem críticas, é
difícil administrar, não tem recursos, são criticados sempre. Mas todos
eles querem se perpetuar. O presidente da Federação Carioca vai fazer
agora 24 anos, teve um de Pernambuco que passou trinta, João
Havelange vai para 24 anos na FIFA. O vôlei do Brasil deu uma
guinada quando houve uma mudança.” (g.n.)
Durante o depoimento das Federações do nordeste, em João Pessoa, dia
12/5/2001, o Deputado Pedro Celso recordou esse depoimento:
“O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Esta CPI tem
verificado que a CBF vem fazendo doações para as federações sem
controle algum e já tem formado juízo sobre esse assunto. O Jornalista
Herbert Fontenele(?) disse à CPI da Bola, do Maranhão, de 1994, que
Ricardo Teixeira paga caro pelo voto na Confederação e que o cargo na
Federação rende também, apesar de que não tanto quanto durante as
eleições...não tanto quanto durante as eleições. Fontenele disse, há sete
anos, que o Presidente da Federação Acreana teria vendido o seu voto
caro pra eleição de Ricardo Teixeira. Esse caso ficou famoso na época.
Disseram que o voto da Federação Acreana custou mais caro do que o
próprio Acre, esse importante Estado brasileiro, que foi adquirido junto
a Bolívia. (...)”
(g.n.)
O presidente da Federação acreana sempre foi o Antônio Aquino,
durante todo os diversos mandatos sucessivos de Ricardo Teixeira. Pelo que se pôde
apurar, há denúncias e indícios fortes de que tenha ocorrido algum tipo de compra de
voto da Federação, por parte do atual presidente da CBF.
4.2 DOAÇÕES DA CBF
Por meio da análise da Contabilidade da CBF, constatou-se um fato, no
mínimo paradoxal: em 1999 a Federação Acreana, a despeito do futebol no Estado não
ter nenhuma expressão no cenário nacional, foi a que recebeu o maior montante da
CBF, a título de auxílio financeiro: R$ 418.000,00. Questionado sobre o fato, Antônio
Aquino Lopes, achou natural e afirmou que gastou todo o dinheiro na Federação, e que
estaria tudo contabilizado. Prometeu que remeteria toda a documentação à CPI,
comprovando os gastos, o mais breve possível. Porém, nada remeteu, depois, a esta
CPI.
Segue gráfico com as doações da CBF para a Federação, sem se
considerar as doações recebidas por Aquino Lopes para a campanha política de 1998,
registradas pela contabilidade da CBF:
DOAÇÕES DA CBF PARA A FEDERAÇÃO ACREANA DE FUTEBOL
1998 - 2000
R$
100.000
80.000
60.000
40.000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/2000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/99
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
0
JAN/98
20.000
MESES
4.3 DOAÇÕES DA CBF PARA ANTÔNIO AQUINO LOPES
O presidente recebeu duas doações da CBF, em 1998, para sua campanha
eleitoral.
Para melhor avaliação desse item, é importante esclarecer como se deu
essas doações. Em setembro de 1998, a CBF emitiu um cheque nominal à Federação
Acreana, no valor de R$ 25 mil; sete dias após, a Federação Acreana emitiu um cheque,
no mesmo valor para a CBF; no mesmo dia, a CBF emitiu um cheque nominal a
Antônio Aquino Lopes, com o mesmo valor, 25.000 reais; um mês após, Antônio
Aquino Lopes recebeu mais um cheque nominal a si, da CBF, no valor de 32.500 reais.
Esta Comissão, durante as investigações, ficou com a impressão de que o primeiro
cheque no valor de 25.000,00 foi emitido, num primeiro momento, erroneamente à
Federação, corrigido o erro sete dias depois. Um mês após, houve o reforço 32.500
reais. Quando questionado sobre essa movimentação, Antônio Aquino Lopes, afirmou
não lembrar, apresentou algumas desculpas. Após insistentes questionamentos dos
deputados, Antônio Aquino Lopes revelou ter acontecido exatamente o que esta CPI
havia imaginado. Completou, dizendo que foi candidato e que teria usado o dinheiro na
campanha. É importante observar que o último cheque, o de 32.500,00 reais, foi
emitido após a data das eleições, o que estaria em desacordo com a legislação eleitoral.
Antônio Aquino Lopes ainda afirmou em seu depoimento que acha
perfeitamente legal que a CBF auxilie a políticos em suas campanhas. Essa afirmação,
juntamente com o fato de a Federação Acreana ter recebido da CBF o maior montante
em 1999, mais o auxílio recebido por Antônio Aquino Lopes, em sua campanha
política, faz essa CPI concluir que, no mínimo, o presidente da Federação Acreana está
em perfeita sintonia com o pensamento do Ricardo Teixeira, à frente da CBF.
5. CONTRATOS COM TV
de TV.
A Federação acreana informou que não firmou contratos com emissoras
6. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL
7. RELAÇÃO COM CLUBES
8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DE FUTEBOL
9. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES
A Federação acreana tem uma relação muito próxima com a CBF.
Percebe-se que as doações recebidas são fruto desse convívio de mais de doze anos,
sendo que Antônio Lopes é tido, na opinião de jornalistas especializados, como uma
pessoa que tenha negociado seu voto durante as eleições de Ricardo Teixeira.
Sugere-se que seja encaminhado ao Ministério Público denúncia de
compra de voto durante as últimas eleições de Ricardo Teixeira;
ALAGOAS
1. N ATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DAS FEDERAÇÕES:
Conforme estatuto da entidade, aprovado por assembléia geral
extraordinária reunidas em 14/02/1991 e em 15/10/1991 (art. 97 do estatuto), a
Federação Alagoana de Futebol é uma “sociedade civil de caráter desportivo, com
personalidade jurídica distinta das suas filiadas” (art. 1º), tendo como finalidades:
“dirigir, difundir e incentivar (...) a prática do futebol amador e profissional (...)”;
“promover a realização de campeonatos, torneios e competições de futebol”; “cumprir
e expedir as filiadas, com caráter de adoção obrigatória, os atos originários” da CBF
(...); e penalizar os responsáveis por desrespeitos ao estatuto (art. 2º).
Trata-se de típica entidade de direito privado sem fins lucrativos.
O estatuto define como “poderes” da entidade as seguintes instâncias:
assembléia geral, Tribunal de Justiça Desportiva, Conselho Fiscal e, Presidência e
Diretoria (art. 11). Não há previsão expressa, na Seção estatutária dedicada às
“Despesas”, de gastos com pagamento de remunerações aos membros dos poderes
acima mencionados (art. 82). Em depoimento a esta CPI, o vice-presidente da
Federação afirmou que a entidade não remunera seus dirigentes.
2. S ITUAÇÃO ADMINISTRATIVA :
A Federação Alagoana de Futebol é presidida por José Raimundo de
Albuquerque Tavares, sendo que na Sessão da CPI em João Pessoa foi ouvido o José
Raimundo Soares Alexandre, vice-presidente administrativo da entidade.
3. S ITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA
3.1. AS F INANÇAS DA FEDERAÇÃO
A Federação Alagoana encontra-se em difícil situação financeira. Esta é a
opinião do vice-presidente da entidade, conforme seu depoimento a esta CPI:
“As finanças da Federação da mesma maneira em que estão as finanças
das Federações mais deficitárias do futebol nordestino, difíceis.”
3.2. I MPOSTO DE RENDA E PROPRIEDADES
A Federação, no período entre 1995 e 2000, apenas declarou Imposto de
Renda relativo aos exercícios de 1998 e 1999. Nestes dois anos base foram declarados
bens, nos itens “edifícios e construções”, “equipamentos, máquinas e instalações
industriais”, “veículos” e “móveis, utensílios e instalações comerciais”. Em seu
depoimento à CPI sobre as propriedades da Federação, o José Raimundo Soares
Alexandre afirmou que:
“ (...) Nós temos o prédio da Federação Alagoana de Futebol, um
estádio, um pequeno estádio e uma concentração.”
Ao compararmos os números contábeis da CBF em relação à Federação
Alagoana com a contabilidade da própria FAF, constatamos suspeitas de irregularidade
no Imposto de Renda no ano base de 1999: a Federação, conforme o livro razão da
CBF, recebeu auxílio no valor de R$ 289.744,00, e as receitas diretas com futebol
totalizam R$ 118.818,32. Ocorre que em seu Imposto de Renda, a entidade alagoana
declara apenas R$ 291.200,32. Considerando que receitas diretas com futebol não
poderiam ser confundidas com auxílios da CBF, conclui-se que a receita mínima a ser
declarada seria de R$ 408.562,32, que é a soma dos dois primeiros valores acima
mencionados.
Também há diferenças entre o contido no livro razão da CBF e o
movimento de caixa contabilizado pela Federação Alagoana, nos seguintes valores: R$
44.103,50 em 1998; R$ 136.946,50 em 1999; e R$ 31.365,00 em 2000.
As questões acima levantam suspeitas graves de sonegação nas
declarações de Imposto de Renda da Federação Alagoana de Futebol.
3.3. INSS
Junto à previdência social, a Federação tem dívida de R$ 7.660,50.
4. RELAÇÃO COM A CBF
A Federação Alagoana recebeu da CBF, entre 1998 a 2000, os seguintes
valores: em 1998, R$ 6.000,00 mensais, com exceção dos meses de novembro e
dezembro, quando a Federação recebeu R$ 36.000,00 em cada mês. Em 1999, o repasse
mensal foi de R$ 6.000,00 em janeiro, R$ 12.000,00 em fevereiro, junho, julho, agosto,
outubro e novembro, R$ 72.000,00 em março, R$ 23.372,00 em abril e maio, R$
48.000,00 em setembro e R$ 45.000,00 em dezembro. Em 2000, de janeiro a fevereiro,
abril, maio, julho e dezembro, o valor foi de R$ 12.000,00, em março, junho, setembro
e outubro foi R$ 62.000,00 e R$ 40.365,00 em novembro. Curiosamente, os finais dos
anos 1998 e 2000, períodos eleitorais, aumentam os repasses da CBF à Federação
Alagoana, sugerindo interesses explicitamente eleitorais.
A seguir, gráfico com as doações da CBF para a Federação:
DOAÇÕES DA CBF PARA A
FEDERAÇÃO ALAGOANA DE FUTEBOL
1998 - 2000
R$
80.000
70.000
60.000
50.000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/2000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/99
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
JAN/98
10.000
0
MARÇO
40.000
30.000
20.000
MESES
Fonte: Contabilidade da CBF/ CPI CBF Nike
Em seu depoimento à CPI, o vice-presidente da Federação negou que a
entidade financia campanhas políticas. Acerca de verba enviada em março de 2000,
José Raimundo Soares Alexandre alegou tratar-se de auxílio financeiro da CBF para a
reforma em estádio de futebol na cidade de Arapiraca, interior do estado. Outra parcela,
porém, de igual valor, não foi contabilizada pela FAF.
5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL
Da análise dos documentos e do depoimento do vice-presidente da
Federação, não foi observada qualquer informação ou denúncia relevante que
relacionam a Federação com a política local, em que pese a constatação acima
registrada, que levanta suspeitas sobre o financiamento eleitoral.
6. C ONTRATOS COM A TV
A Federação Alagoana de Futebol não possui contratos de transmissão
de jogos com emissoras de televisão.
7. RELAÇÃO COM OS CLUBES
Não foram encontradas informações ou denúncias relevantes sobre a
relação entre clubes e Federação.
8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DO FUTEBOL
Também não foram encontradas informações ou denúncias relevantes
sobre a relação entre Federação e empresários.
9. C ONCLUSÕES, ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES
Da análise de todos os documentos e do depoimento do José Raimundo
Soares Alexandre, vice-presidente administrativo da Federação Alagoana de Futebol,
concluímos que a entidade é gerida de forma temerária, notadamente nos aspectos
financeiro e fiscal.
Constatou-se sonegação fiscal.
Há suspeitas de financiamento eleitoral a candidatos, seja em 1999 ou em
2000.
Recomenda-se reforma estatutária para permitir maior autonomia do
conselho fiscal.
Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao
Ministério Público Federal, ao Ministério Público do Estado de Alagoas e ao Ministério
Público Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral de Alagoas, com base na Lei nº
9.504/97.
AMAPÁ
1. N ATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DA FEDERAÇÃO :
Conforme preceitua o estatuto, a Federação Amapaense de Futebol é
uma sociedade civil de direito privado, regida pelo direito comum, leis desportivas em
vigor e pelo estatuto social. Esse estatuto não permite que os dirigentes recebam
remuneração.
2. S ITUAÇÃO ADMINISTRATIVA:
Iniciando por uma análise na direção da entidade, pode-se verificar uma
razoável rotatividade dos Presidentes da Federação do Amapá, em contraposição ao
que acontece com a maioria das Federações. O atual Presidente, José Orlando Pereira
Santana, era vice do anterior, e assumiu o cargo em abril do ano passado, depois do
afastamento do então Presidente, Silvio Barbosa de Assis. É interessante mencionar o
motivo do afastamento de Silvio Barbosa, até para que se tenha idéia sobre quem estava
à frente do futebol do Amapá: Este cidadão foi acusado, por várias vezes, na CPI do
Narcotráfico, ficando um tempo foragido, depois preso por 30 dias.
O atual presidente havia ocupado a presidência, pela primeira vez, de 95 a
97 e iria tentar a reeleição, quando foi apresentado a Silvio Barbosa, com quem se aliou
para compor uma chapa, recusando a presidência. Assim o fez, porque acreditou nas
propostas apresentadas por Silvio Brabosa, já que este tinha amizades em Brasília e
melhores condições financeiras.
Ainda com relação ao processo eleitoral da Federação, é permitido o voto
por procuração, desde que protocoladas com até 24 horas antes da instalação da sessão.
José Orlando afirmou que não recebe qualquer remuneração, nem os
demais dirigentes, devido à proibição estatutária. Também frisou que não pretende mais
se candidatar à Presidência.
Com relação ao patrimônio da Federação do Amapá, seu Presidente deu
uma resposta que retrata as dificuldades na administração do Futebol no Amapá:
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - (...) a Federação
tem uma sede. E ela tendo uma sede ela tem que fechar até
por que dispondo de bens ela tem que fazer o balanço e
demonstrar no seu ativo imobilizado os imóveis que ela tem.
Eu pergunto: a sede da Federação está no nome da
Federação? Aquele prédio?
O SR. JOSÉ ORLANDO PEREIRA SANTANA Excelência, aquele prédio da Federação foi comprado pelo
então Presidente Bernardino Sena Ferreira Filho, e até hoje
disse que o prédio é da Federação. Mas até hoje não se tem
um documento, nem o próprio Bernardino que comprou sabe
onde estão os documentos que comprovam que aquele prédio
é da Federação.
3. SITUAÇÃO FISCAL/FINANCEIRA
A Federação nunca declarou Imposto de Renda de Pessoa Jurídica. Ao
ser questionado quanto à omissão, o presidente informou que não tinha conhecimento
da obrigatoriedade de, mesmo isenta, apresentar a declaração. Ainda expressou outros
argumentos que mais uma vez demonstram o descontrole administrativo a que está
entregue o futebol profissional do Estado do Amapá:
“Excelência, não. A Federação de Futebol, durante o período
em que eu passei na Presidência, eu confesso que não declarei Imposto de
Renda. Não declarei, primeiro, porque não tinha contador, eu não
contratei contador para isso, até porque a informação que eu tinha era
que as Federações não... não... não poderiam... estavam dispensadas,
melhor dizendo, de fazer as declarações de Imposto de Renda, e, quando,
na verdade, elas não estavam, vim saber agora, que não estão dispensadas
de declarar, elas têm que apresentar declaração mesmo que seja sem
movimento, e quando tiver movimento, logicamente, quando recebe
recursos, tem que ser declarado. E a Federação de Futebol não declarou.
E eu tenho uma intimação da Receita Federal que eu recebi há uns 15
dias atrás me dando o prazo de 60 dias para que eu possa regularizar a
situação sob perda da extinção do CNPJ da Federação.”
Com relação à sua contabilidade, a Federação do Amapá também
elaborou documentos contábeis a serem enviados a esta CPI (vide fala acima do José
Orlando), com a observação de que seu Presidente não assinou nenhum deles. O
contador que elaborou os documentos, Paulo Marques de Araújo, CRC-AP, nº
001259/O-0, apesar de ter confeccionado os documentos este ano, colocou a data do
ano a que se referia o demonstrativo contábil, ou seja, assinou tudo com data retroativa.
Paulo Marques é também presidente do Santos Futebol Clube, do Estado
do Amapá. Seguem importantes trechos dos questionamentos sobre a situação contábil
da entidade, que dão uma visão panorâmica da fragilidade do controle contábil.
“O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – A contabilidade da
Federação estava em dia ou como estava essa contabilidade?
O SR. JOSÉ ORLANDO PEREIRA SANTANA – Não
estava em dia, até porque eu deixei de mandar para a CPI, inclusive,
prestação de contas de 98 e 99, porque não tinha nenhum documento que
comprovasse despesa ou receita.
(...)
O SR. JOSÉ ORLANDO PEREIRA SANTANA – Paulo
Marques de Araújo é o Presidente do Santos Futebol Clube.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Ele presta algum
serviço à Federação?
O SR. JOSÉ ORLANDO PEREIRA SANTANA –
Excelência, foi ele que fez, ele é contador, foi ele que fez esse balanço que
a CPI pediu e que teria que ser assinado por uma pessoa que tivesse
CRC. Eu passei os documentos a ele, e ele fez e assinou. Mas garanto a
V.Exa. que eu não pedi para ele que fizesse nada além dos documentos
que foram apresentados a ele, até porque ele é de maior e tem que zelar
pelo seu registro de CRC, ele vive disso.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Foi bom o senhor
ter lembrado isso, porque talvez ele vá ter complicações com o seu
Conselho Regional de Contabilidade lá. Estou satisfeito, Sr. Presidente.”
(g.n.)
Ao se examinar as finanças da Federação do Amapá, também pôde-se
perceber um quadro complexo, com uma série de dívidas aliadas à falta de recursos.
Dívidas atrasadas, funcionários sem receber seus salários, pedidos de material
desportivos à própria CBF, e até o interrompimento de um jogo por falta de
pagamento ao árbitro e auxiliares, são relatos do presidente da Federação a esta CPI,
que demonstram as condições financeiras em que se desenvolve o futebol amapaense:
“O SR. JOSÉ ORLANDO PEREIRA SANTANA –
Excelência, quando eu assumi a Federação, a sede da Federação estava
penhorada e ia para leilão por débitos junto ao INSS. E eu estive na
CBF e consegui recursos para pagar inclusive oito meses de salários de
funcionários atrasados. E hoje já estão atrasados novamente por falta
exatamente do repasse desses recursos, que são os únicos que a Federação
tem. E negociei esses débitos junto ao INSS.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Negociou através do
REFIS?
O SR. JOSÉ ORLANDO PEREIRA SANTANA – Eu
negociei diretamente com a Procuradoria. Isso já estava a nível de Justiça
Federal. Eu acredito que não seja REFIS. Eu não entendo. Sei que veio
parcelamento. Estou pagando 214 reais por mês. E também está há dois
meses atrasado.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Qual o montante da
dívida?
O SR. JOSÉ ORLANDO PEREIRA SANTANA – De INSS,
na época, eram de dez mil reais. Eu dei dois mil reais adiantados para o
INSS. Fiquei pagando. Hoje, esse débito deve estar em cerca de sete mil
reais, seis, sete mil reais.”
3.1 RETENÇÃO DE VALORES PAGOS POR CLUBES
O presidente Orlando Santana confirmou ao Deputado Jurandil Juarez
que não havia repassado, para a CBF, valores pagos pelo Ypiranga:
“O SR. JOSÉ ORLANDO PEREIRA SANTANA - O
Ipiranga pagou 700 reais. Eu, talvez tenha errado, porque não tenha
feito por escrito, mas comuniquei à Tesouraria da CBF de que havia
recebido 700 reais. E como a CBF não estava repassando recurso para a
Federação, eu utilizei o dinheiro dando vale para o meu pessoal na
Federal para que eles não ficassem passando fome, Excelência; para que
eles não ficassem passando necessidade, e os recibos eu posso enviar a
V.Exa. assim que eu chegar em Macapá, provando o que eu estou
dizendo.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Eu posso aceitar
como uma explicação, mas esse não é um procedimento regular. A
Confederação atestou não ter recebido os recursos.
O SR. JOSÉ ORLANDO PEREIRA SANTANA - Mas eu
comuniquei, Excelência. Eu estou dizendo que eu usei e
comuniquei para eles. O meu erro talvez foi não ter feito por
escrito, mas comuniquei por telefone. Assim como V.Exa.
telefonou para eles perguntando e eles lhe passaram por
escrito, a mesma coisa eu fiz, comunicando para eles. Mas vou
passar por escrito e passar inclusive a cópia do ofício. E o
procedimento da CBF quando se faz isso, eles escrituram
dizendo... quando o clube não paga, eles escrituram na conta
da Federação e depois descontado da quota da Federação.
Está aqui uma quota que o Ipiranga não pagou de
transferência de jogador, que eu trouxe para mostrar a V.Exa.,
que é escriturado quando o clube não paga, na conta da
Federação.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Bom, mas,
então, a informação de que o dinheiro foi recebido e não
repassado à CBF, esse confere...
O SR. JOSÉ ORLANDO PEREIRA SANTANA - Confere.”
(g.n.)
4. RELAÇÃO COM A CBF:
A Federação do Amapá recebe mensalmente a “mesada” da CBF.
Segundo seu presidente, é de fundamental importância para o desenvolvimento das
atividades da Federação, dada a escassez de recursos no desporto do Estado.
A seguir, gráfico com doações da CBF para a Federação:
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/2000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/99
NOVEMB
SETEMB
MAIO
MARÇO
80.000
70.000
60.000
50.000
40.000
30.000
20.000
10.000
0
JAN/98
R$
JULHO
DOAÇÕES DA CBF PARA A
FEDERAÇÃO AMAPAENSE DE FUTEBOL
1998 - 2000
MESES
Fonte: Contabilidade CBF/CPI CBF Nike
O Deputado Jurandil Juarez criticou a Federação Amapaense e a CBF:
“O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Bom, Sr. Presidente, ficou
claro que com a contestação de ter sido feito a coleta entre os torcedores, ficou claro
que a partida ficou interrompida, porque não houve pagamento dos árbitros.
O SR. JOSÉ ORLANDO PEREIRA SANTANA Exatamente.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Isso aconteceu?
O SR. JOSÉ ORLANDO PEREIRA SANTANA - Ficou por
20 minutos, ficou o intervalo do primeiro para o segundo tempo.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - O que me leva a
raciocinar que nós podemos ter tudo lá, menos o futebol profissional. E
uma da propostas, ao final da CPI, será nós apresentarmos idéias que
poderão.. idéias transformadas em alguns casos até em leis, para
transformar a estrutura do futebol brasileiro em algo mais compatível com
aquilo que é o futebol. Tanto lá o Amapá quanto no Rio Grande do
Sul, no Acre ou na Paraíba e, no meio disso, o restante dos Estados,
como talvez a única unanimidade que exista no País. Porque todo
mundo é torcedor de futebol de alguma forma ou de outra, mas o é. O que
é injustificável é que essa expressão da cultura nacional seja tão
maltratada, tão mal dirigida, tão mal concebida. E nós entendemos, e
pessoalmente eu entendo como Deputado, que essa estrutura não pode
permanecer desse jeito. Explico: não adianta tentar mexer politicamente
no sentido de, usando a própria estrutura, inclusive a estrutura mental
existente, alterar o que faz a CBF. Porque o Presidente nos disse que ele
dá mesada — ele usou esse termo — ele dá mesada para dezessete
Federações. Ora, votam 27 Federações. Então, ele já tem no bolso
dezessete votos. Os clubes vivem em situação senão pior, mas semelhante a
das Federações. Então, essa estrutura que está desde de 89 no comando
da Federação se perpetuará dando bola para disputar o campeonato lá no
Amapá, porque certamente a situação média daqui das outras
Federações. E isso não vai nos levar a lugar nenhum. Isso me leva a
fazer a última pergunta: a Federação Amapaense tem sido uma eleitora
incondicional — vi pelas eleições —, incondicional do Sr. Ricardo
Teixeira. O senhor pessoalmente, mesmo com a disposição de deixar a
Federação, o senhor acha que é possível uma estrutura como essa, tendo a
Confederação Brasileira de Futebol, que paga ao seu Presidente
aproximadamente 500 mil reais por mês, sem poder, porque isso é
proibido, que doa ao Presidente da Federação do Acre 57 mil reais para
disputar uma eleição para Deputado Federal, se não me falha a
memória; que faz, que paga, remunera seus dirigentes em quantias
extraordinárias e que tem uma filiada chamada Federação Amapaense
de Futebol, que tem que interromper um jogo do seu campeonato no
intervalo do primeiro para o segundo tempo, porque não tem dinheiro
para pagar árbitro. O senhor acha que uma estrutura dessa pode
continuar funcionando assim? Se o senhor continuasse na Federação, o
senhor votaria, por exemplo, na manutenção desse status quo?
O SR. JOSÉ ORLANDO PEREIRA SANTANA - Excelência,
eu acho que a estrutura tem que mudar. Tem que mudar. E se tem que
mudar, tem que mudar para melhor. Não pode ficar do jeito que está.
Na reunião de assembléia geral passada na Confederação, nós
conversávamos com vários Presidente de Federações, dos quais três estão
aqui presente, e nós conversávamos exatamente a respeito disso, dizendo
que enquanto um diretor na CBF está ganhando cerca de 19 mil reais,
as Federações recebem 12 mil por mês. E que no mínimo, no mínimo, no
mínimo a CBF deveria ajudar as Federações, auxiliar as Federações
mais pobres de outra forma. Ou repassando esse recurso para que ela se
mantivesse, mantivesse o seu pessoal, mantivesse despesa de manutenção
de prédio, pagamento de pessoal, encargos, e até mandando material para
os clubes, clube profissional, para as ligas, e também facilitando quando
confeccionasse as suas tabelas de competições nacionais.
facilitando quando confeccionasse as suas tabelas de competições
nacionais. Inclusive isso. Eu poderia até votar. Não digo que não
votaria, não. Poderia até votar no Presidente Ricardo Teixeira. Agora,
ele teria que apresentar uma proposta que fosse melhor que essa que está
sendo, que está havendo agora, dessa que está acontecendo agora no
futebol brasileiro. Se continuasse, sinceramente, se eu fosse candidato, não
votaria.
5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL :
Não foi identificada, explicitamente, nenhuma doação da CBF ou da
própria Federação a políticos do Estado, tendo inclusive a negativa do José Orlando,
durante seu depoimento a esta Comissão.
6. RELAÇÃO COM CLUBES
A futebol do Amapá é composto, basicamente, de doze clubes amadores,
doze clubes profissionais, dos quais, dez estão disputando o campeonato, e quinze ligas,
um total de 39 entidades, desde que estejam regularizadas.
O relacionamento da Federação do Amapá com os clubes é marcado pela
suspeita de evasão de rendas em jogos mais importantes; como exemplo, temos os
jogos contra São Paulo, Flamengo e Cruzeiro no Estádio local, oportunidades em que,
seguramente, a renda seria de mais de cem mil reais, porém, não passou de trinta mil.
Tal suspeita fez com que o Presidente do Flamengo entrasse com um ação na justiça,
na tentativa de reaver a diferença.
Houve, ainda, uma consulta do clube Ypiranga ao deputado Jurandil
Juarez, sobre parcelas, no valor de R$ 700,00, de uma multa, aplicada ao clube pelo
Superior Tribunal de Justiça Desportiva. Para se informar, o Deputado entrou em
contato com Ricardo Teixeira que negou a existência de tal multa, e fez chegar às mãos
do Deputado o prontuário do Clube na Justiça Desportiva. Questionado, José Orlando
respondeu:
“Excelência, eu vou começar mostrando ao senhor, passando às suas
mãos cópia de telefax enviado pela Comissão Disciplinar da
Confederação Brasileira de Futebol, primeira e segunda Comissão
Disciplinar, o que mostra que o Ypiranga foi multado e que deve à
Confederação. Eu fiz uma consulta ao saber que o Ypiranga passou
um...tinha um documento dizendo que não viu o documento mas dizendo
que havia sido anistiado ou não devia nada. Eu fiz uma consulta
perguntando à CBF. Tá aqui a cópia do meu ofício também que eu vou
passar às suas mãos, perguntando se havia alguma anistia, se tinha
acontecido alguma anistia pro Ypiranga. Cópia de todos os ofícios
enviados pelo tesoureiro da CBF e pelo Sr. Herma Seixas, Procurador
do Tribunal de Justiça da CBF, que diz que o Ypiranga deve não os 2
mil e 800, mas sim 4 mil 110 reais. Eles fizeram as conversões desde o
tempo de cruzado ainda, o débito do Ypiranga. Isso aqui está datado do
dia 8 de maio. Eu passo às suas mãos, para que o senhor tome
conhecimento. Quanto à parcela que o Ipiranga pagou na Federação, o
Presidente em exercício do Ipiranga, Sr. Paulo Rodrigues, foi na
Federação, apresentou o documento e disse: “Olha, eu não posso pagar o
débito”. Porque, conforme o art. 200, do CBDF, depois da multa ele
tem o prazo de cinco dias para pagar, sob pena de suspensão dos seus
direitos. Então, eu encaminhei todos...Todos esses ofícios aí foram
encaminhados para o Ipiranga, exceto esses últimos com a data do dia 8,
que vieram da CBF. O Ipiranga deu entrada num documento, num
ofício, pedindo para pagar de três vezes. Três vezes de 800 reais. O
Ipiranga pagou 700 reais. Eu, talvez tenha errado, porque não tenha
feito por escrito, mas comuniquei à Tesouraria da CBF de que havia
recebido 700 reais. E como a CBF não estava repassando recurso para a
Federação, eu utilizei o dinheiro dando vale para o meu pessoal na
Federal para que eles não ficassem passando fome, Excelência; para que
eles não ficassem passando necessidade, e os recibos eu posso enviar a
V.Exa. assim que eu chegar em Macapá, provando o que eu estou
dizendo.”
7. CONCLUSÃO
De tudo quanto foi exposto, pode-se enunciar a inequívoca e simplista,
porém, escorreita, afirmação de que a administração do futebol no Amapá precisa ser
recriada. Seguem, neste sentido, as palavras do deputado Jurandil Juarez, que defende a
obrigatoriedade da ajuda da CBF:
“O que me leva a raciocinar que nós podemos ter tudo lá, menos o futebol
profissional. E uma da propostas, ao final da CPI, será nós
apresentarmos idéias que poderão.. idéias transformadas em alguns casos
até em leis, para transformar a estrutura do futebol brasileiro em algo
mais compatível com aquilo que é o futebol. Tanto lá o Amapá quanto
no Rio Grande do Sul, no Acre ou na Paraíba e, no meio disso, o
restante dos Estados, como talvez a única unanimidade que exista no
País. Porque todo mundo é torcedor de futebol de alguma forma ou de
outra, mas o é. O que é injustificável é que essa expressão da cultura
nacional seja tão maltratada, tão mal dirigida, tão mal concebida. (...)
Confederação Brasileira de Futebol, que paga ao seu Presidente
aproximadamente 500 mil reais por mês, sem poder, porque isso é
proibido, que doa ao Presidente da Federação do Acre 57 mil reais para
disputar uma eleição para Deputado Federal, se não me falha a
memória; que faz, que paga, remunera seus dirigentes em quantias
extraordinárias e que tem uma filiada chamada Federação Amapaense
de Futebol, que tem que interromper um jogo do seu campeonato no
intervalo do primeiro para o segundo tempo, porque não tem dinheiro
para pagar árbitro.”
No tocante à responsabilização, não se deve esquecer que atos praticados
em 1998 e 1999, são de responsabilidade do já citado Silvio Barbosa de Assis, indiciado
na CPI do Narcotráfico. Porém, a juízo desta CPI, José Orlando é co-responsável,
guardadas as devidas vênias jurídicas, pela administração do ex-presidente, uma vez que
estava na vice-presidência, durante o período mencionado.
AMAZONAS
1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DAS FEDERAÇÕES :
Conforme seu estatuto, a Federação Amazonense de Futebol é uma
“sociedade civil de caráter desportivo” (art. 1º do estatuto de 1983). Não consta, entre
as despesas da entidade, o pagamento de remuneração a seus dirigentes (art. 65, idem).
Trata-se de típica entidade de direito privado sem fins lucrativos.
As informações sobre os estatutos estão parcialmente prejudicadas, tendo
em vista que a Federação não enviou à CPI seus estatutos. Esta CPI teve à sua
disposição uma versão ultrapassada que, por outros meios, chegou até ela. Ao que
parece, os estatutos passaram por alterações, em 1993. Em seu depoimento, o
presidente da entidade, Francisco Dissica, comprometeu-se a enviar a última e atual
versão, o que não fez. Constata-se, assim, um primeiro desrespeito à ordem da CPI, no
tocante ao envio da documentação pleiteada e fruto de requerimento aprovado por esta
Comissão Parlamentar de Inquérito.
2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA:
Francisco da Chagas Dissica Valério Tomaz ocupa o cargo de presidente
da Federação desde 1992. Francisco da Chagas Dissica, enquanto presidia a Federação,
ocupou cargo de Prefeito em sua cidade natal, Eruneté, de 1997 a 2000, além de ter
exercido a atividade empresarial, seja no setor de comércio importador (atividade que
durou 26 anos e que deixou em finais de abril de 2001), seja como proprietário de uma
editora, de uma emissora de TV (UHF, há dois anos, que retransmite o sinal da CNT) e
outra de rádio (“FM de Povo”).
Em que pese afirmar que não recebia qualquer remuneração da
Federação, Francisco da Chagas Dissica percebeu repasses diretos da Federação, como
é o caso dos R$ 10.000,00, em 21/6/95 (doc. 632.226, Banco 034, Agência 1, Conta
107.712).
3. SITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA
A Federação Amazonense de Futebol não enviou à CPI a sua
documentação contábil, nem os estatutos, conforme requerimentos aprovados, em
plenário, nesse sentido.
3.1 MOVIMENTAÇÃO BANCÁRIA DA FEDERAÇÃO
Segundo alega o presidente da Federação, a entidade não tinha cheques,
apesar de ter conta bancária. Declara Francisco da Chagas Dissica:
“É... Vamos... Vamos pela ordem, aqui. O problema é o seguinte. A
Federação não tem..., cheque. A Federação não pode pegar cheque. Ponto
um. Esses valores que estão sendo colocados..., esses valores altíssimos...,
não é da Federação. A Federação simplesmente..., simplesmente pegava
esse dinheiro e repassa, de imediato, para os clubes que jogaram o
campeonato. Isso aí realmente... Em 99, se o senhor verificar, tem o
valor..., deve ter um valor bastante..., bastante significativo.”
Todos os saques em conta durante os anos 1999/2000 foram efetuados
através de cheques avulsos, sem qualquer identificação do objeto do pagamento. Tratase de movimentação que envolvia valores altos (entre R$ 20.000,00 a R$ 200.000,00).
A movimentação bancária, a partir de cheques avulsos, tornaria possível o
desvio de verbas paga pela CBF à Federação. Segundo o Deputado Jurandil Juarez,
poderia estar havendo um mecanismo ilícito, assim sintetizado: “a CBF simula um
pagamento e envio de recursos a uma afiliada e alguém se apropria desse dinheiro”.
Das muitas dúvidas geradas por esse procedimento, há um fato que
chama especial atenção: o saque, pelo presidente da Federação, de cheque emitido pela
CBF, no valor de R$ 150.000,00, em 10/12/1999. Francisco da Chagas Dissica nega,
embora haja documento probatório do saque, na boca do caixa, junto ao Banco Real
(agência 3, Av. Rio Branco, prédio da CBF, Rio de Janeiro).
Seguem, abaixo, trechos do depoimento do Francisco da Chagas Dissica:
“O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Sr. Dissica, eu tenho
preocupado em repetir essa questão da pergunta porque num período curto
de três anos foi retirado, sacado na boca do caixa, 1 milhão 667 mil 301
reais e 94 centavos. O que leva a preocupar ainda mais é que há uma
procuração, uma assinatura só no cheque.
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ - Qual o período , Deputado? Qual o período?
(...)
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – De 11/6/93 a
22/6/99. É muito dinheiro sacado na boca do caixa. Alguns desses
cheques que já foram levantados pelo nosso Relator, por exemplo, cem mil
em 7/2/96. Cento e cinqüenta mil em 10/2/99 e 25 mil também em
11/09/96 foram descontados na boca do caixa, na agência do Banco
Real do Rio de Janeiro, onde a conta é da CBF, não é nem aqui em
Manaus.
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ - Não, não, vou fazer uma declaração aqui agora que eu não
sei o que vai dar, pode ter certeza de que a Federação Amazonense de
Futebol nunca recebeu, reafirmo, em 99, nós recebemos da Confederação
Brasileira, entre repasse e ajuda 187 mil reais. Eu nunca saquei um
centavo no Rio de Janeiro.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - É um dado importante
que o senhor está colocando.
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ - Reafirmo que nunca recebi, Deputado.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Nosso Presidente está
chamando a atenção que os 150 mil foi no ano de 96.
(...)
Junto com o cheque de 100 mil.
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ - Repudio veementemente esses valores, eu tenho aqui.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Aí é que a gente levanta
umas questões. Eu ia até perguntar se foi o senhor ou foi o tesoureiro que
sacou na boca do caixa, porque com uma procuração, com uma
assinatura única não há o controle entre as partes, quando a
responsabilidade é dos dois do procurador de quem deu a procuração e de
quem tem a autorização para fazer isso. Então, leva-se a esses
questionamentos que estou fazendo em função disso.
(Não identificado) - Em 96 com esses cem mil reais deu 248.923 reais.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Outro fato que chama a
atenção é que nós quebramos o sigilo da CBF e constatamos o dinheiro
saído da CBF. No caso desses cheques é que sai de lá em nome da
Federação, por isso que foi sacado no caixa. Ele não chegou a entrar na
conta da Federação, por isso que nós identificamos. A CBF também fez
repasse...
O SR. PRESIDENTE (Deputado Jurandil Juarez) - Me conceda um
aparte? Porque veja: a pergunta foi feita com base nos documentos da
CBF, uma vez que a Federação não encaminhou, toda a documentação
não foi encaminhada, a própria Receita Federal nos envia a informação
que o senhor jamais declarou imposto de renda.
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ - Da Federação, é verdade.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Da Federação, do senhor,
inclusive, da Federação
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ - É verdade, que era inclusive ignorância minha.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Essa já é uma situação
bastante grave, porque nunca foi declarada, não é uma federação que
mexe com pouco dinheiro. Acabei de citar uma cifra que não é uma cifra
baixa.
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ - Mas nesta época, Deputado, não era... não se pagava nada.
Só a partir de 98.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Mas assim mesmo não foi
declarado.
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ - Não foi declarado.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Mesmo que isso fosse
considerado legal, como o senhor está dizendo que nós temos compreensão
diferente disso.
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ - Perfeito. Eu entendo e realmente eu aceito essa crítica, como
disse, mas não ... Esse dinheiro é para mim uma coisa absurda, não
aconteceu mesmo.”
Francisco da Chagas Dissica admite ter recebido R$ 100.000,00, mas
contesta o pagamento de R$ 150.000,00:
“Não, Sr. Presidente. O 100 mil aconteceu, retirado aqui, que veio,
inclusive, antes do segundo jogo da seleção brasileira, pra gente fazer
alguns pagamentos, pra depois serem ressarcidos, mas 150 nunca recebi
não. Tá aqui, eu tenho aqui a relação dos depósitos, confere o de 100
mil, mas 150, esse eu nunca vi. Confesso, esse aqui pra mim é novidade.
(...)
Bom, existe alguns pagamentos daqui pra lá que foi quando nós fomos
pagar o terceiro jogo da seleção brasileira. Não tenho de 150 mil.
Confesso isso aqui pra mim é novidade. Não tenho, tá aqui, tenho todas
os, as entradas aqui. Não tenho, sinceramente, não tenho. Esse pra
mim... Nunca recebi 150 mil da CBF.”
3.2 DECLARAÇÕES DO IMPOSTO DE RENDA
A Federação, no período entre 1995 e 2000, não declarou Imposto de
Renda. O presidente da Federação, em seu depoimento, afirma que a entidade possui
bens registrados em cartórios, como é o caso da sua sede, adiante mencionada:
“E nós temos... Nós recebemos a Federação, para o senhor ter uma idéia,
eu recebi a Federação numa sacola das lojas Belmiro, os documentos
numa sacola. Só tinha uma sala. Ela tem 2 andares, tem auditório, tem
tudo. Inclusive, só funcionava uma salinha pequenininha. E nós, hoje,
temos uma Federação.”
Federação.
Igualmente não foram declarados os rendimentos bancários da
3.3 INSS
A Federação tem dívida junto à previdência social.
3.4 O
VEÍCULO ADQUIRIDO PELO
CHEQUE DA CBF
FRANCISCO
DA
CHAGAS DISSICA
COM
Francisco da Chagas Dissica, presidente da Federação, adquiriu um
veículo Blazer, junto à concessionária de propriedade de João dos Santos Braga Neto,
oferecendo um cheque da CBF para a Federação Amazonense de Futebol. O cheque da
CBF foi recebido por João Braga com o endosso do Francisco da Chagas Dissica, e ao
encaminhar ao banco para ter acesso ao dinheiro, João Braga endossou o documento
pela segunda vez. O fato ocorreu em dezembro de 1998. O banco efetuou a operação,
mesmo contrariando o dispositivo previsto na Lei nº 9.311/96, que veda o segundo
endosso. Já aí identifica-se uma irregularidade na movimentação bancária. Segundo o
Deputado Jurandil Juarez, presente à Sessão da CPI em Manaus, a operação
configuraria uma “venda simulada”, envolvendo “um cheque de uma pessoa jurídica”,
“duas pessoas jurídicas que são de notoriedade nacional, que ainda têm (...) o rótulo de
sociedades civis de Direito Privado”. A operação sugere que Francisco da Chagas
Dissica se apossou de verba que a CBF enviou para a Federação para a compra do
veículo. Esse fato é confirmado pela absoluta ausência de documentação que nos leve a
outra conclusão.
Braga Neto:
Seguem, abaixo, trechos do depoimento do empresário João dos Santos
O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO – “ (...) O Sr.
Francisco esteve conosco, o Sr. Dissica, no caso até comigo, na época, e
propôs a compra de um carro, no final de 98 – eu não me lembro
propriamente a data. Esse carro, na época, já era final do ano, e nós
fizemos o negócio. E naquela época era permitido ainda por lei fazer o
segundo endosso em cheques de terceiros. O cheque era nominal à
Federação Amazonense de Futebol e ele, como era o Presidente, ele
endossou e nós recebemos aquele cheque, sim. Porém, há uma
complementação que, com certeza, acho que o senhor vai me perguntar, eu
deixaria pra sua pergunta.”
(...)
“É uma Blazer..., executivo.”
(...)
“Saiu em nome dele, porém vale ressaltar o seguinte. Na realidade, o que
foi colocado... Porque, pra mim, como empresário, eu queria vender o
carro. Eu queria receber o dinheiro. Foi explicado, no momento, que
aquele dinheiro era um dinheiro da Federação, que seria um modo de eu
ajudar..., a empresa ajudar ele receber aquele dinheiro, porque a
Federação estava com problema de não poder depositar o cheque. Ele deu
o cheque pra nossa empresa, nós devolvemos em dinheiro, pra ele – isso
está contabilizado – e ele pagou com cheque dele próprio, em 6 vezes.”
(...)
“A nota fiscal foi emitida em nome do Sr. Dissica. Nós recebemos o
cheque de terceiros, no caso, da CBF; depositamos o cheque, devolvemos
em dinheiro para o Sr. Dissica e ele pagou o carro com cheques dele
próprio, que nós inclusive temos depósito desses cheques na nossa conta,
do próprio Banco Safra, que foi aonde nós depositamos o cheque também
da CBF.”
(...)
“Ele deu um cheque de 40 mil reais, nós devolvemos pra ele 32 mil e
uma fração; ficou 6 mil e pouco como entrada e ele deu 6 cheques dele pra
complementar os 40 mil reais.”
(...)
“Uma transação, porém, legal, contábil.”
(...)
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – O cheque entrou na
conta da Braga Veículos?
O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO – Da Braga
Veículos, positivo.
(...)
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Qual é a quantidade de
cheques que daí a Braga Veículos recebe?
O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO – Seis cheques.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – No valor de quanto cada
um?
O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO – Cinco mil 300
e uma fração que, somados aos 6 mil, dá exatamente os 40 mil reais.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Quer dizer que 6 mil,
nessa história, ficou por conta do cheque da Federação? Aquele da
entrada não foi feito outro?
O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO – Veja bem, eu
respondo como empresário. Eu recebi 40 mil reais referente a um carro
que eu vendi, no valor de 40 mil reais, e devolvi pro senhor Francisco
Tomaz Dissica 32 mil e poucos reais, dos quais ele me deu 6 cheques
dele, que foram devidamente pagos.
(...)
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Então significa que o
restante, pra completar os 40 mil, não foi cheque do Sr. Francisco?
O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO – Não.
(...)
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – ... da CBF...
O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO – Correto.
(...)
O SR. DEPUTADO LÉO ALCÂNTARA – Sr. João Braga,
V.Sa. disse que recebeu 6 mil e poucos reais de entrada, foi isso?
O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO – Não. Eu
recebi... A operação foi o seguinte. Foi dado um dado um cheque de 40
mil, certo, no qual foi devolvido 32..., 33 mil e uma fração...
O SR. DEPUTADO LÉO ALCÂNTARA – Ah, 33 mil?
O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO – É. Ficou um
saldo de 6 mil e poucos reais como entrada e eu recebi, a empresa recebeu
6 cheques de R$ 5.337,00 que, somados a essa entrada, deu os 40 mil.
(...)
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Sr. Presidente,
Srs. Deputados, Sr. Diretor da Braga... Braga Veículos, não é? O
senhor disse, com clareza — e tive o cuidado de anotar —, que o senhor,
como empresário, queria vender e receber o dinheiro.
O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO - Correto.”
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Eu acho que,
empresarialmente, talvez, em tese, isso seja irrefutável. No entanto, nessa
transação houve um cheque de uma pessoa jurídica, uma pessoa jurídica
que trabalha um bem que é de toda a sociedade amazonense, a sociedade
brasileira, que é o futebol. Então, mesmo o senhor sendo empresário, e eu
queria lhe dizer que não vejo em mim nenhum preconceito, um
preconceituoso contra a atividade empresarial. É minha origem, eu sou
filho e neto de pequenos empresários. E exerço a atividade nessa área.
Fui, durante sete anos, Presidente da Federação do Comércio da minha
terra. Mas eu não posso concordar com o senhor. Eu acho que, até
individualmente, isso possa ser justificável, mas, na verdade, a sua
empresa participou da simulação de uma venda, o que não é correto, do
ponto de vista empresarial. Eu posso aceitar, pela sua ótica, que foi
simples: eu recebi um cheque de 40 mil reais, devolvi 33 e poucos, fiquei
com 6 mil e recebi cheques, seis cheques, no valor de 5 mil, 337. Mas eu
posso lhe dizer, em contrapartida, como Deputado, que o senhor pode ter
feito isso, e, na verdade, ter trocado seis cheques de 5 mil para a pessoa
que lhe fez a compra do veículo.
O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO - Ter trocado
como?
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Os seis cheques de
5 mil, 337. Porque, na verdade, foi esse o dinheiro da transação.
O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO - Correto.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Seis mil e
seiscentos reais não compunha o patrimônio da pessoa física que foi fazer
a troca. Seis mil e seiscentos reais era um recurso da federação. O senhor
poderia ter devolvido os 40 mil e, aí, não haveria questionamento, a não
ser o Presidente, isso deverá acontecer, e qualquer uma outra forma de
pagamento, até recebendo sete cheques — isso eu não entro no mérito —.
Mas, na verdade, o que aconteceu foi uma operação simulada, em que o
senhor trocou um cheque e vendeu um veículo, recebendo como entrada,
como parte do pagamento — estou chamando de entrada aqui, por
entender assim — , o recurso da federação amazonense de futebol, que o
senhor sabia que era da federação, porque o cheque era da federação. Eu
queria lhe perguntar sobre o endosso desse cheque. O cheque foi... o
cheque era da federação, foi endossado pela federação, recebeu endosso.
Quando passou pra Braga Veículos recebeu outro endosso?
O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO - Para... na época,
o senhor deve saber bem, como Deputado... primeiro, eu quero deixar
claro pro senhor que isso é no seu entendimento, porque, no meu
entendimento, como empresário, eu gostaria, também, com respeito a
V.Exa., que eu discordo do seu posicionamento. E no meu fórum eu,
nós, diretores de Braga Veículos, aqui representando a empresa, tenho
certeza que eu não fiz nada de errado. Então, eu quero dizer o seguinte:
que, naquele momento, todos os bancos aceitavam cheque de terceiros. E o
que foi feito foi feito legalmente, depositado na conta um cheque de terceiro
endossado. Eu queria lhe perguntar, lhe devolver até uma pergunta: se
isso tem alguma ilegalidade.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – O senhor fez um
segundo endosso no cheque, pra poder depositá-lo?
O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO - Sim. Para
depositar, naquela época, não era, não era... hoje, não é permitido ter o
segundo endosso, mas na época, sim.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Qual foi a época?
O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO - Noventa e oito,
dezembro de 98.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Deixa eu só...
O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO - Tanto é que o
próprio Banco Safra recebeu o cheque. Se, por acaso, não fosse permitido,
fatalmente o próprio Banco Safra não o receberia. Como não recebe hoje.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Então, eu vou ler
para o senhor o que diz a Lei 9.311, de 1996. A operação foi em 98.
Portanto, esta lei estava em vigor: O art. 17 da Lei diz o seguinte:
“...que não pode haver um segundo endosso durante o período de tempo
previsto no art. 20, inciso I. Somente é permitido um único endosso nos
cheques pagáveis no País.”
O SR. JOÃO DOS SANTOS BRAGA NETO - Só que eu acho
que essa pergunta o senhor deveria fazer para o banco, porque o banco
aceitou. Tanto é que nós temos o comprovante do depósito bancário na
conta da empresa Braga Veículos.” (g.n.)
A compra do veículo Blazer pelo presidente da Federação com o
dinheiro da entidade foi assim comentada por Francisco da Chagas Dissica:
“O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Mas o Sr. Braga diz
que esse recibo aí foi do cheque da CBF...
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ – Sim.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – ... na qual era a
Federação, o senhor endossou, e ele lhe devolveu 40 mil, ele devolveu
segurando esses 6 mil, que ele segurou 6.778 lá, ele devolveu pro senhor
a diferença.
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ – Perfeito. E é verdade isso, não é mentira. Agora, isso aí foi
um artifício usado...
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Agora, quando é que foi
paga essa diferença de 6.788?
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ – A ele?
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – A ele.
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ – Não, ele já ficou com o dinheiro. Quando ele descontou ...
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Mas o dinheiro não era do
senhor era da Federação.
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ – Sim, mas, perfeito, e na Federação entrou os 40 mil,
porque tinha 10 mil mandado pra fazer essa compra. E foi um artifício
usado pra que exatamente se trocasse o cheque, tá certo? O cheque pra
depositar aqui demoraria oito dias pra ficar disponível, tá, então, nós
teríamos que sacar esse cheque também da mesma maneira que recebemos
o dinheiro, com cheque avulso. Então, esse foi o artifício. Podem até
pensar, mas o senhor usou 6 mil reais então do dinheiro da Federação ...
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA –
pensando.
É o que eu estou
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ – ...é, mas eu poderia dizer, é, é, que tinha recebido 40, eu
podia ter combinado com ele, né, que é meu amigo, combinado com ele e
dizer: “Não, é, eu entreguei os 40 e depois ele me pagou a entrada em 6
mil reais”. Então foi isso que aconteceu.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – E o senhor tem o
comprovante que fez esse depósito na conta da Federação?
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ – Tenho, tenho na prestação de contas, tenho.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Então é necessário nos
entregar...
O comprovante a que se refere Francisco da Chagas Dissica não foi
encaminhado a esta CPI.
3.5 A F EDERAÇÃO E A EXPLORAÇÃO DE BINGOS
De acordo com Francisco da Chagas Dissica, a Federação participou da
exploração de bingos. Essa informação foi dada pelo presidente da Federação quando
questionado acerca de pagamento de R$ 14.000,00 (em 16/06/1995), da Federação a
José Edson Bezerra. Ao tentar explicar essa movimentação, Francisco da Chagas
Dissica noticia à CPI duas ocorrências que valem registro: a primeira, de que teria
acontecido sonegação de pagamento devido ao INSS; e a segunda diz respeito à forma
como o presidente da Federação gere a entidade, colocando-a muito próxima de uma
empresa de prestação de serviços. Segue o depoimento:
“(...) Deixa eu pegar, que se for a pessoa que eu tô imaginando foi um
representante do bingo, que nós iniciamos aqui, que era o Bingo do
Palmeiras. Deixa eu só confirmar aqui o nome dele. (Pausa.) Edson,
Edson Bezerra, o.k. Edson Bezerra foi um representante do, daquele
bingo que era feito pelo Palmeiras. Era feito pelo Palmeiras, por um
grupo de empresários de São Paulo, que nos procuraram e nós vimos
naquele momento, 93, 94, por aí, mais ou menos, esses anos não me vem
à memória o ano exato, para fazer uma parceria, a exemplo do que
faziam com alguns clubes, em São Paulo, e nós logicamente, né,
acordamos, e iniciamos esse, essa experiência nefasta, que realmente foi
nefasta. (...) E aí, é que vem mais uma vez também certa solidariedade
por parte, né, do Dr. Ricardo Teixeira. E eu levei a ele o problema,
simplesmente nós realizamos quatro bingos, dois diretamente eles
assumiram responsabilidade, e os dois últimos já veio, como deu certo, a
Federação àquela época ganhou, salvo engano, treze, doze mil reais, oito
mil uma, doze a outra, treze, não sei o número exato, passou a ser da
Federação. Aí, eu envolvi dois dos companheiros que estão aqui, fui às
suas cidades para a gente fazer junto e tal, era o Bingão da Amazônia.
Nas duas primeiras vezes, aliás, na primeira vez, eu fui ao Diretor da
Rede Amazônica, fui ao jornal A Crítica, fui a diversos empresários,
porque graças a Deus, nós sempre tivemos um bom relacionamento com
toda essa gente, e assinei os pedidos de própria publicidade e tal, e tal e a
empresa exigiu, porque ela também manipularia dinheiro, que eu
nomeasse então essa pessoa pra assinar conosco, né, os pagamentos, os
compromissos. Primeiro, eu assinei; no segundo, veio, eu não assinei mais,
eu não assinei. Eles assinaram, pagaram. Terceiro, eles assinaram; e
quarto, assinaram, solicitações, inclusive, de uma empresa de São Paulo e
tal. E não pagaram nenhuma delas. E foi minha sorte não ter assinado.
Aqui, aquelas empresas onde eu fui, onde eu estive presente pedindo
apoio, pedindo desconto para as propagandas, impressões em editores e
tal, eu tive que honrar com esses compromisso. Eu tenho, tive, como disse.
Aqui mesmo tem um aqui, olha: execução. Aqui tá: Justiça Federal.
Essa aqui é do INSS, de um clube que o Promotor fugiu com o dinheiro.
Nós távamos no estádio, não recolheu o 5%, e veio a confusão, que nós
vamos chegar lá depois. Então, nós tivemos que honrar esses
compromissos. Com o de São Paulo e alguns de fora, nós denunciamos o
fato à Polícia, que tinha sido utilizado. E esse cidadão deixou uma carta
pra mim, quando ele fugiu daqui, ele fugiu, inclusive, levou até o televisor
da televisão, onde ele diz que tinha comprado com o dinheiro dele e tal.
Mas nos deixou esse tremendo problema. Foi aí que nós procuramos a
Confederação Brasileira, pedimos ajuda, pedi o jogo pra cá, do Brasil.
Naquele ano estavam iniciando aqui a, a reconstrução do Estádio
Vivaldo Lima não é nem reforma, era uma reconstrução. E nós então
vimos naquilo ali a possibilidade de nós começarmos a sanar esses
problemas. E foi o que aconteceu. Com um primeiro jogo, citado pelo
Dr. René (...). Eu, naquele momento, eu podia ter cobrado até 20%,
porque 10% é normal. Agenciamento de qualquer evento, agência de
publicidade tudo ganha 20%. Com aquele 20% talvez tivesse sanado
todos os problemas de imediato da Federação. Porque eu tive que
continuar recorrendo pra fazer um outro jogo, um segundo jogo. E aí nós
conseguimos equilibrar as coisas. Aí fizemos um terceiro jogo um ano
depois. E ele não citou nada, sabe por quê? Porque deu prejuízo de 56
mil reais. E quem arcou com esse ônus fomos, fomos nós.” (g.n.)
3.6 CONSELHO FISCAL
A contabilidade da Federação não tem qualquer controle.
Os cheques avulsos mencionados anteriormente foram todos assinados
duas vezes pelo diretor financeiro da entidade, José Castro de Lima, portador de
procuração do presidente (mesmo após a vigência do instrumento procuratório). O
órgão que estatutariamente, competeria fiscalizar e aprovar as contas da entidade, não
possui autonomia para levantar questionamentos à movimentação da Federação,
centralizada pelo seu presidente. Em seu depoimento, Francisco da Chagas Dissica
confirma que o conselho fiscal não fiscaliza e assume que a gestão da entidade é
baseada na “informalidade” e na afinidade entre a pessoa do presidente e seus membros:
“O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Quem são os membros
do Conselho Fiscal hoje nominalmente?
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ - É Vandico Pereira Cardoso, comerciante, meu ex-sócio. É
Roberto de Lima Caminha, João Paulo Pereira, é... Tamer Freire de
Versoza, cidadão que é... foi presidente também de entidades esportivas,
CBDU, e até hoje pertence ainda à CBDU e mais outros dois membros
que não me vêm o nome. Três titulares e três suplentes.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - O Sr. Vandico Pereira
Cardoso era sócio do senhor?
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ - Era.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - O Sr. João Paulo Ferreira
de Oliveira é sobrinho do senhor?
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ - Não. Não. Cunhado.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Cunhado do senhor?
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ - Cunhado.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - O senhor acha que há
isenção num conselho fiscal com graus de parentescos e de sociedade?
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ - Dr. Rosinha, vamos abrir o coração e falar a verdade. Essa
informalidade no futebol, se os senhores verdadeiramente e a CPI viesse
pra dar uma punição generalizada por esses problemas, né, que
aconteceram... Porque o futebol sempre funcionou nessa informalidade.”
(g.n.)
4. RELAÇÃO COM A CBF
A Federação Amazonense recebeu da CBF, nos anos de 1998 a 2000, os
seguintes valores: em 1998, R$ 6.000,00 por mês, com exceção do mês de dezembro,
quando a Federação recebeu R$ 46.000,00; em 1999, o repasse mensal foi de R$
12.000,00, com as exceções de janeiro (R$ 6.000,00), fevereiro (R$ 31.000,00) e julho
(R$ 42.000,00); em 2000, a Federação recebeu R$ 37.000,00 em janeiro, e nos outros
meses, o repasse foi de R$ 12.000,00. Além desses valores, registre-se o acima
mencionado, no valor de R$ 150.000,00. Verificar gráfico a seguir:
DOAÇÕES DA CBF À FEDERAÇÃO
AMAZONENSE DE FUTEBOL
1998 - 2000
R$
50.000
40.000
30.000
20.000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/2000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/99
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
0
JAN/98
10.000
MESES
Francisco da Chagas Dissica afirma, sobre a relação entre Federação e
CBF, que se negou a seguir a sugestão de advogado supostamente vinculado à CBF, e
ajuizar ação contra a CPI:
“Em absoluto. Aqui tão, (...) tão quatro presidentes. Todos nós fomos
contrários a isso, porque nós entendemos que não cometemos deslize
nenhum que pudesse vir a nos causar problema. E nós fomos contrários a
isso. Só um minutinho Deputado. Veio pra cá advogado do Rio de
Janeiro, constitucionalistas, vieram pessoas importantes do futebol
brasileiro, pa exatamente talvez tentar conseguir o apoio de mais
federações para consubstanciar essa, essa, essa solicitação, né, de não, de
não fazê-lo. Nós nunca entramos em nenhum momento, nem pensamos
em entrar, contra qualquer tipo de ação pa impedir que verificasse
qualquer coisa. Tanto é que não entramos, não tem nada disso.”
5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL
O presidente da Federação Amazonense foi Prefeito em uma cidade do
interior do estado. Enquanto candidato, reconhece que há ajuda, mesmo que indireta,
da CBF, em termos de material esportivo. A utilização desse material e sua distribuição,
auxiliariam em uma campanha. Como dirigente da Federação e tendo em vista que sua
gestão foi marcada por uma forte centralização na pessoa do presidente, é plausível
considerar a hipótese de que Francisco da Chagas Dissica tenha instrumentalizado o
material esportivo da entidade em sua campanha eleitoral. Além disso, dado o
descontrole das contas da Federação, é impossível afirmar que não houve utilização das
suas verbas em financiamento de campanhas políticas. Segue trecho do depoimento do
Francisco da Chagas Dissica:
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – Recebeu, já que o senhor disse que foi
candidato a Prefeito, recebeu ajuda da CBF, do Ricardo Teixeira, na sua campanha?
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ - Não recebi ajuda. Isso aí seria um engodo, quem não
recebeu o dinheiro assim declarado, explicitamente pra política. Eu não
recebi esse dinheiro explicitamente pra política. Mas lógico, nós não somos
nenhuma, nenhuma criança. Todos sabem, o material esportivo, não é,
que você dá prum clube duma comunidade, o material esportivo
logicamente você compra com esse dinheiro que vem, né, de alguns repasses
da CBF, logicamente que isso ajuda, ajudam na política, não resta a
menor dúvida.
6. CONTRATOS COM A TV
A Federação Amazonense de Futebol não possui contratos de
transmissão de jogos com emissoras de televisão de canal aberto, sendo que a
Federação, com a concordância dos clubes, acerou com a Sky para que esta emissora de
canal fechado transmita jogos da primeira divisão do campeonato estadual. Francisco
da Chagas Dissica não informou se a empresa remunerará a Federação ou os clubes.
Houve um fato que foi objeto de denúncia contra a Federação. Trata-se
de jogo envolvendo o clube Sul América, que foi transmitido pela emissora do canal 13,
sem autorização ou acerto com os clubes e sem o pagamento referente ao direito de
imagem. Conforme estatuto da CBF, a Federação não poderia permitir a transmissão
nestes termos. A Federação se omitiu. O fato foi exposto da seguinte maneira no
depoimento do Francisco da Chagas Dissica:
“Bom, veja bem, o Presidente do Sul América queria que a Federação
tomasse uma ação, formalizasse uma ação jurídica contra a televisão,
quando nós — nós e todos os outros clubes —, e ficou claro aqui que só
o Sul América foi contrário, todos os outros queriam e querem ter os seus
jogos transmitidos, porque eram categorias básicas, não era nem
profissional, ter transmitido os jogos. Isso, aí, se for possível até se pagar
pra fazer isso com a televisão... quer dizer, é importante pra essa
criançada, pra essa molecada poder se sentir prestigiada e ser vista, tá
certo? Então, nós entramos em contato com a televisão, exatamente
dizendo que o clube tal não havia protestado contra isso. E mais,
conforme confirmado aqui, nem um jogo mais foi transmitido. Agora...
(...)
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Mas esse direito de imagem
anterior não foi pago.
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ - Não. Veja bem, mas não houve cobrança, porque também o
Sul América não exigiu cobrança, ele não permitiu mais, também, que
fosse feito. E agora, por exemplo, estamos com a Sky transmitindo...
iniciamos esse... essa parceria dia 6, agora, depois de negociação e tal.
Nós estivemos tentando, durante algumas semanas, puxar o que fosse
possível da Sky para ver se... ver se conseguíamos pagar pelo menos a
arbitragem, quadro móvel e alguns clubes, devido às vendas serem
mínimas, estarem passando dificuldades e até atrasando pagamentos de
quadro móveis. Como a exemplo de Estádio Vivaldo Lima, existem
alguns atrasos. Eu tô esperando chegar esse valor, depois de negociações, a
primeira parcela, para mim, exatamente, pagar àqueles clubes esses
valores. E, graças a Deus, todos os clubes, os nove clubes que estão
disputando campeonato profissional, aquiesceram e assinaram. E até
mesmo sem valor nenhum, seria de interesse pra nós que a Sky mostrasse
pra seiscentos e poucos mil assinantes o futebol do Amazonas, nesse
primeiro momento.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – É, eu sei que todo garoto
gosta de se ver, ou na televisão, ou gosta de ser assistido pela televisão,
porém, há um dispositivo legal... se ver no sentido de vídeo, a posteriori...
Porém, há um dispositivo legal que não foi cumprido. E eu quero, talvez
aqui pode até entender como censura, mas entender que qualquer
protocolo tem que ser dado resposta. E parece que o senhor é bastante
omisso, não responde absolutamente nada, pelo menos, esses documentos
que eu fui citando aqui... o caso do Júnior, do São Raimundo, não houve
a resposta por escrito; o caso do campeonato encerrado, não houve resposta
por escrito; pelo menos, não está anexado; o chamado golpe no peladão; e
outras questões mais, como esse do Canal 13. Realmente há dois pedidos
aqui: “Assim sendo, para o cumprimento das normas legais já citadas,
que... se possível, uma demanda judicial, a requerente solicita dessa
federação, como litisconsorte, nas seguintes medidas administrativas: que
a Rádio e Televisão Rio Negro, Canal 13, seja notificada a pagar os
direitos de transmissão ao vivo da partida realizada no último sábado,
dia 16/02/97; e que a emissora de televisão seja notificada para o
cumprimento das normas sobre o assunto, caso seja seu interesse
continuar”. Pelo menos, a resposta, dizendo que não aceita ser
litisconsorte deveria ser dada. No mínimo, isso.
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ – Perfeito, Deputado...
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Mas aqui não tá que foi
feito essa resposta...
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ – Perfeito, mas foi feito isso verbalmente em reunião com os
clubes. Foi feito isso, e nós tomaríamos as providências, foi cobrado isso
por eles, algumas vezes, e foi...
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Isso consta em ata?
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ – Hã?
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Isso consta em ata, que foi
feito oralmente?
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ – Não, mas foi feito, tanto é que ele mesmo disse que não foi
mais transmitidos os jogos dele. Não foi mais, acabou, não foi mais. E
não foi por discriminação, não, foi simplesmente porque não foi mais
permitido. E a televisão até parou de transmitir exatamente por causa
desse impasse.”
7. RELAÇÃO COM OS CLUBES
Conforme denúncias apresentadas à CPI por Renê Gomes da Silva,
dirigente do clube Sul América, a relação entre a Federação e os clubes e ligas do estado
é de desconfiança, que se estende até mesmo ao Tribunal de Justiça Desportiva.
Francisco da Chagas Renê informou que vários desportistas locais encaminharam ao
Conselho Estadual de Esporte, com um rol de queixas sobre a Federação e seu
presidente. Desde beneficiamento a determinados clubes e boicotes a outros, a desvio
de verbas e extinção do futebol feminino, a direção da Federação se caracterizaria,
segundo Renê Gomes, pela constante prática de irregularidades e pelo controle político
sobre os clubes.
Outrossim, o campeonato amazonense da juniores de 1999, de acordo
com denúncias, não chegou a termo, demonstrando falta de capacidade da Federação
em administrar as competições que envolvem os clubes.
8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DO FUTEBOL
Francisco da Chagas Dissica trabalha como empresário no setor das
comunicações, tendo experiência em comércio de importados. Do seu histórico na
Federação, conforme apurado pelos documentos e depoimentos, constata-se que sua
atitude sempre foi a de gerir a Federação como uma empresa de sua propriedade,
associando-a a empreendimentos econômicos. Assim foi o caso do vínculo com o
bingo.
Especificamente quanto à relação entre Federação e empresários do
futebol, pode-se supor uma ligação na exploração de atletas que são utilizados por
clubes com idades alteradas.
A denúncia do Renê Gomes, dirigente do clube Sul América, sobre a
utilização pelo clube São Raimundo (do qual Francisco da Chagas Dissica teria
vínculos) de um “gato” em partida de futebol, é admitida pelo próprio Francisco da
Chagas Dissica, que assume a omissão da Federação, comportamento também
verificado pelo Tribunal de Justiça Desportiva local:
“O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - O Sr. René trouxe uma
denúncia do caso do júnior do São Raimundo. Eu fiquei aqui analisando
o documento e, considerando que esses documentos são verdadeiros, houve
o protocolo desse documento na federação... a data tá um pouco apagada,
e o carimbo, mas acho que é 7/10/99. E a denúncia é grave,
demonstrando que é mais um gato do futebol brasileiro.
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ - Mais um gato?
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Mais um gato. Não tô
dizendo o senhor, mais um gato no futebol brasileiro.
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ - Perfeito, não, eu entendo.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - É... qual foi a ... a ação
que tomou a Federação Amazonense a respeito disso?
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ - Olha, salvo engano, nós encaminhamos isso, Deputado,
para registro policial. Salvo engano, porque
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Salvo engano?
O SR. FRANCISCO DAS CHAGAS DISSICA VALÉRIO
TOMAZ - É eu não posso afirmar, não vou afirmar, mas, vejam bem,
aconteceram aqui alguns casos que nós mandamos inclusive pra polícia
pra instalar inquérito. Agora, infelizmente, numa cidade, hoje já não tão
pequena, existe sempre aquele... aquela coisa, né, de amizade. Aí um diz
pro outro: “Deixa pra lá, vai prejudicar o rapaz”. Aí começa essas
coisas. Mas, na verdade, a responsabilidade disso, e precisa ser tomada
alguma providência mesmo, é contra quem faz essa... essas falsificações e
levam pra federação essas coisas. E depois a responsabilidade sempre cai
na costa da federação, sempre.”
9. CONCLUSÕES , ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES
Da análise de todos os documentos e do depoimento do Francisco da
Chagas Dissica, concluímos que a Federação Amazonensede Futebol tem uma
administração absolutamente temerária, além de total descontrole contábil e fiscal.
Constatou-se sonegação fiscal, admitida pela presidente.
Foi comprovada a falta de fiscalização e controle das contas, além de
irregularidades estatutárias e diversas ilegalidades. Desde nepotismo a ofensas básicas
aos estatutos da Federação, até o descumprimento de ordem da CPI.
Há necessidade de que a Receita Federal promova (1) fiscalização na
entidade no sentido de apurar o recebimento por parte da Federação dos valores
enviados pela CBF, bem como (2) investigar, na CBF, se houve desvio de recursos da
Confederação, de acordo com as informações desta CPI divergentes das prestadas pelo
presidente da Federação amazonense.
No aspecto administrativo, recomenda-se uma imediata reforma
estatutária para limitar o mandato da diretoria da entidade em no máximo quatro anos,
impedindo a recondução aos cargos; para permitir uma maior autonomia do conselho
fiscal; para obrigar a realização de licitação para a aquisição de bens e de material
esportivo; e para estabelecer maior transparência nas contas da Federação e nos
repasses de verbas que envolvam a entidade e os clubes.
Diante do descalabro administrativo em que se encontra a Federação,
sugere-se a intervenção naquela filiada, de acordo com o art. 8., do Estatuto da CBF.
Quanto à empresa Braga Distribuidora de Veículos Ltda., que a Receita
Federal apure a negociação feita com o presidente da Federação do Amazonas, com a
contabilização do cheque da CBF que tinha como favorecido a Federação, e que
contém mais de um endosso, bem como a existência de outras transações que,
porventura, existam entre as duas entidades.
Sugere-se, ainda, encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao
Ministério Público Federal, ao Ministério Público do Estado da Amazonas – no tocante
aos casos de “gatos” e aos atos que ofendem o direito do consumidor, assegurados na
Lei nº 8.078/90 e na Lei nº 9.615/98 (art. 42, § 3º) –, e ao Ministério Público Eleitoral
do Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba, com base na Lei nº 9.504/97.
BAHIA
1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DAS FEDERAÇÕES :
O estatuto da entidade, alterado por assembléia geral extraordinária
realizada em 22/07/1997, dispõe que a Federação Paraibana de Futebol é uma
“associação civil de direito privado, sem fins lucrativos, de finalidades desportivas, com
personalidade jurídica e patrimônio próprios” (art. 1º), tendo como objetivos: “dirigir o
futebol (...) incentivando a sua difusão e aperfeiçoamento”; “promover (...)
campeonatos, torneios e outros eventos de futebol”; “incrementar a cultura física,
intelectual, moral e cívica dos desportistas (...)”; e “colaborar para o progresso material
e técnico das associações filiadas (...)” (art. 2º).
O estatuto define como “poderes” da entidade: a assembléia geral
(composta das associações filiadas e ligas amadoras), o Tribunal de Justiça Desportiva,
o Conselho Fiscal e a Diretoria (art. 3º). Os diretores da entidade devem ter dedicação
“prioritária” à Federação (art. 20, § 1º), e poderão ser remunerados por suas atividades
em valores aprovados pelo Conselho Fiscal, a partir de proposta da Presidência (art. 20,
§ 2º), sendo esses valores limitados em até 120 salários mínimos (omite-se a
periodiciodade desse limite: não se sabe se se trata de remuneração mensal ou anual).
2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA:
A Federação é presidida, desde janeiro de 2001, por Ednaldo Rodrigues
Gomes. Antes dele, presidiu a entidade por oito anos o Virgílio Elísio da Costa Neto.
Ednaldo Rodrigues fazia parte das gestões anteriores, como diretor.
2.1. “PROFISSIONALIZAÇÃO ” DA FEDERAÇÃO E REMUNERAÇÃO AOS SEUS
DIRIGENTES
A Federação Bahiana de Futebol, a partir da alteração estatutária de 1997
acima indicada, passou a remunerar seus dirigentes. A nova redação dada ao estatuto,
ao permitir a remuneração, contém uma grave injuridicidade: enquanto seu art. 20, § 2º
prevê que o Conselho Fiscal aprovará a remuneração, o dispositivo que dispõe sobre as
competências do Conselho Fiscal não dispõe sobre aprovação, conforme se verifica da
seguinte redação: “oferecer parecer sobre os valores de remuneração da Diretoria, após
análise da proposta encaminhada pela Presidência da FBF” (art. 24, § 3º). Oferecer
parecer não significa aprovar. A Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, que “dispõe
sobre as Sociedades por Ações”, que ora tomamos como legislação análoga, estabelece
competências apenas consultivas para o Conselho Fiscal, e não executivas, como seria o
caso de aprovar valores para remuneração.
Conforme depoimento do Ednaldo Rodrigues, a Federação remunera seu
presidente e alguns dos seus diretores a título de “pró-labore”. O presidente recebe,
atualmente, R$ 8.000,00 mensais.
Questionado a esse respeito, considerando que o estatuto da CBF não
prevê remuneração de dirigentes e que os estatutos das Federações não podem ser
conflitantes com o da CBF (arts. 52, I, e 53 dos estatutos da CBF), assim respondeu
Ednaldo Rodrigues:
“O curioso é que o Estatuto de qualquer entidade, de qualquer
Federação quando existe uma reforma até ele está totalmente validado
passa para a diretoria jurídica da CBF, o qual aprecia. E o Estatuto da
Federação, em 22 de julho de 1997, quando teve as suas reformas
aprovadas pela Assembléia Geral, foi submetido á CBF. Se a CBF não
colocou nenhum impedimento e também através da Constituição Federal
no seu 217, que dá autonomia administrativa às entidades, a Federação
entendeu que estava fazendo correto.”
A Federação remunera seus dirigentes desde 1997, após reforma dos
estatutos, quando a entidade foi, nas palavras do seu presidente, “profissionalizada”.
Seguem, abaixo, trechos do depoimento do Ednaldo Rodrigues:
“O SR. EDNALDO RODRIGUES GOMES - A Federação tem
três diretores.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Três diretores.
Remunerados?
(...)
O SR. EDNALDO RODRIGUES GOMES - São 4.500 reais ao
diretor administrativo financeiro, 4.500 reais ao diretor técnico, e 2.000
reais ao diretor departamento do interior.”
(...)
“O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – (...) O senhor é dirigente
há quantos anos da Federação?
O SR. EDNALDO RODRIGUES GOMES – A partir de
janeiro de 98.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Janeiro de... já era
remunerado anteriormente.
O SR. EDNALDO RODRIGUES GOMES – Já, no cargo de
Diretor do Interior.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – E o Sr. Virgílio Elísio é
o ex-presidente?
O SR. EDNALDO RODRIGUES GOMES – É o ex-presidente.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Também era remunerado.
O SR. EDNALDO RODRIGUES GOMES – Exatamente.”
A remuneração paga aos dirigentes da Federação se dá a título de prólabore, conforme documentação analisada pela CPI e confirmada pelo depoimento do
Ednaldo Rodrigues. Pró-labore é a retirada que os sócios de uma empresa privada se
permitem fazer, na repartição de seus lucros. Por essa conclusão, o pagamento aos
dirigentes da Federação Bahiana não se dá como remuneração pelas atividades
prestadas, mas como divisão de lucros. Ocorre que a entidade não tem fins lucrativos, o
que aproxima o ato dos dirigentes a uma grave irregularidade administrativa,
envolvendo a verba, o patrimônio da Federação.
Segue, abaixo, trecho do depoimento em que Ednaldo Rodrigues admite
receber pró-labore:
“O SR. EDNALDO RODRIGUES GOMES - A Federação, em
22 de julho de 1997, quando fez a reforma estatutária, ela se tornou
profissional, sendo que seus diretores dando exclusividade de trabalho à
federação e em conseqüência também em remuneração.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - O senhor recebe a que
título?
O SR. EDNALDO RODRIGUES GOMES - A título de prólabore.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Deixa só eu terminar a
pergunta, Dr. Ednaldo, por favor. O senhor pode me informar o valor, é
a título de pró-labore?
O SR. EDNALDO RODRIGUES GOMES – Pró-labore. 8 mil
reais.”
3. SITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA
3.1. IMPOSTO DE RENDA
A Federação Bahiana de Futebol não encaminhou à Receita Federal as
declarações de Imposto de Renda nos exercícios de 1996 e 1997.
A Federação declarou à Receita Federal em 1999, ano calendário 1998, e
em 2000, ano calendário 1999, que sua forma de tributação teria como base àquela de
quem recebe lucro real. Seu estatuto, ao contrário, dispõe que a entidade não tem fins
lucrativos. Trata-se de questão não esclarecida por Ednaldo Rodrigues, conforme se vê
abaixo:
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – (...) A declaração do
Imposto de Renda: vem a definição, forma de tributação do lucro, definese como lucro real. A Federação é uma entidade sem fins lucrativos?
O SR. EDNALDO RODRIGUES GOMES – Olha, pelo
estatuto, é uma entidade sem fins lucrativos.
Curiosamente, ao declarar-se, em 1999 e em 2000, com lucro real, ao
mesmo tempo a Federação encaminhou à Receita Federal, no item natureza jurídica,
como sendo “outras formas de organização sem fins lucrativos”. A Federação utilizou
de ardil para manter-se em uma confusa e impossível situação híbrida: entre lucrativo e
sem fins lucrativos.
3.2. P ATRIMÔNIO E REMUNERAÇÃO DE DIRIGENTES
O valor da remuneração do presidente da Federação Bahiana (R$
8.000,00 por mês) é desproporcional à realidade do futebol bahiano. São poucas as
equipes que disputam a primeira divisão do campeonato, e apenas dois clubes têm
projeção nacional: o Bahia e o Vitória. Ambas as entidades de prática desportiva
transformaram-se em empresas, sob o modelo de sociedade anônima. O atual
presidente ocupa o cargo desde janeiro de 2001, tendo sido diretor (do interior) na
gestão anterior.
Trata-se de questão comentada no item 2.1., acima.
3.3. I NSS
Junto à previdência social, a Federação tem uma dívida de R$ 796.328,33,
sendo mais de 20% referente a contribuições recolhidas e não encaminhadas ao INSS.
A Federação comprometeu-se a pagar sua dívida por meio do programa REFIS.
3.4. SONEGAÇÃO NO PROGRAMA “SUA NOTA É UM SHOW”
A Federação Bahiana contratou com a Secretaria da Fazenda do Governo
do Estado da Bahia, para os campeonatos estaduais de 1999 e de 2000, em suas
principais divisões de profissionais, a permuta de ingressos por notas fiscais. Trata-se
do programa “sua nota é um show”. Ocorre que a própria Secretaria da Fazenda alegou
que a Federação não estaria cumprindo suas obrigações públicas, a saber, recolhendo
tributos à menor. O mecanismo da Federação era divulgar, no borderô, uma receita
irreal, onde o ingresso era comercializado por R$ 0,88, quando 80% da carga do estádio
já havia sido vendida pelo programa “sua nota é um show”, de forma prévia, por R$
2,34. Assim, quanto menos público, maior a diferença que era deixada de recolher pela
Federação. Caso concreto foi relatado pela imprensa, conforme transcrição abaixo:
“No jogo Galícia x Camaçari, no dia 18 de abril do ano passado,
também na Fonte Nova, o governo do estado pagou o equivalente a
67.980 mil ingressos, enquanto o borderô anunciava a renda de apenas
R$ 15 mil, correspondente a 6.410 ingressos, menos de 10% do que foi
pago, antecipadamente, pelo próprio governo. Ainda nesse documento, a
entidade declara o recolhimento de apenas R$ 750,00, de Iapas,
correspondente a renda bruta de R$ 15 mil, quando, na realidade,
deveriam ser recolhidos R$ 7.956,00 (INSS), R$ 3.978,00 (ISS) e R$
2.386,80 (IR).” (“A Tarde”, edição de 11/03/2000)
3.5. MOVIMENTAÇÃO ENTRE AS CONTAS BANCÁRIAS DA
FEDERAÇÃO E DO SENHOR VIRGÍLIO ELÍSIO DA COSTA NETO
O ex-presidente da Federação Bahiana de Futebol, Virgílio Elísio da
Costa Neto, tinha uma movimentação bancária intensa com a Federação. O dinheiro
saia da Federação para a conta do Virgílio Elísio, e da conta deste para a Federação com
grande regularidade. Tal movimentação, observada nos anos de 1996 e 1997, ocorreu
até dois meses após a última reforma estatutária.
O quadro é de uma tal promiscuidade, que não restou esclarecida a que
título, baseando-se nos estatutos da entidade, foram feitos os pagamentos de um para o
outro. Aparentemente, o Conselho Fiscal silenciou sobre essa circulação entre contas.
Trata-se de um fato que não encontra respaldo legal nem estatutário, e sugere
procedimentos contábeis irregulares.
4. RELAÇÃO COM A CBF
A Federação Bahiana de Futebol não recebeu, entre os anos de 1998 e
2000, qualquer auxílio financeiro da CBF. Conforme o critério adotado e publicamente
assumido por Ricardo Teixeira, apenas as entidades com dificuldades financeiras seriam
beneficiadas por repasses da CBF. Por esse critério, a Federação Bahiana estaria, aos
olhos da CBF, em uma relação estável.
Ao contrário do que foi observado em outras Federações, a entidade
bahiana pagou à CBF um valor significativo, fato não esclarecido por Ednaldo
Rodrigues, em seu depoimento em João Pessoa, conforme o quadro abaixo.
Movimentações financeiras entre Federação e CBF (1998/2000).
Ano
Pagamento da CBF para a FBF (R$)
Pagamento da FBF para a CBF (R$)
1998
0,00
0,00
1999
0,00
246.377,97*
2000
0,00
0,00
*consta aqui o valor de R$ 130 mil, referente a pagamento em espécie à CBF, como cota do jogo entre as seleções brasileira e
holandesa, em 03/06/99.
5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL
Não foram levantadas informações e denúncias relevantes no tocante à
relação entre a Federação Bahiana de Futebol e a política local.
6. CONTRATOS COM A TV
Conforme documentação encaminhada à CPI, os contratos entre as
empresas de captação e transmissão de imagens e a Federação se dão anualmente.
A análise do contrato celebrado entre a Federação e a Televisão Bahia
Ltda., que teve como objeto a “captação, fixação e transmissão dos sons e imagens de
jogos do Campeonato Bahiano de Futebol”, na temporada 2000 do Campeonato
Bahiano de Futebol, sugere a transferência de responsabilidade sobre os participantes
do campeonato da Federação para a empresa. Nesse sentido, cláusula contratual
específica prevê o compromisso da Federação em limitar em dez a quantidade de
clubes participantes da primeira divisão.
Depreende-se da análise do contrato e de denúncias divulgadas pelos
clubes Galícia Esporte Clube e Ypiranga Esporte Clube, que o determinante para se
chegar ao mencionado limite não seria a decisão dos clubes de futebol, conforme
alegou Ednaldo Rodrigues durante a Sessão da CPI em João Pessoa, mas os interesses
da empresa de televisão.
Trata-se de suspeita de ingerência da empresa Televisão Bahia Ltda., que
ao firmar o comando, passaria a controlar o calendário do principal evento futebolístico
estadual, no tocante ao desporto de rendimento.
7. RELAÇÃO COM OS CLUBES
A relação entre a Federação e os clubes não é tranqüila. Pode-se
observar, por meio de denúncias de clubes filiados, a insatisfação envolvendo o
Campeonato Bahiano de 1999, que não conheceu seu campeão. Nessa competição, a
Federação resolveu, por um lado, postergar a solução do problema, mantendo a
expectativa sobre quem seria o campeão, se o Esporte Clube Bahia ou se o Esporte
Clube Vitória (os maiores clubes do estado), e por outro, decidiu que os dois últimos
colocados na competição – o Galícia Esporte Clube e o Ypiranga Esporte Clube –
cairiam para a segunda divisão. Estes dois clubes passaram a questionar publicamente a
decisão, provocando um mal estar geral entre o grupo de clubes menores e a
Federação, supostamente melhor relacionada com os dois clubes maiores (Bahia e
Vitória).
Outra situação conflituosa nessa relação se deve aos questionamentos,
também por parte dos clubes menores, acerca de divisão do dinheiro oriundo do
contrato de transmissão de jogos do Campeonato Bahiano.
O Campeonato Bahiano de 2000 não cumprirá, segundo determinação da
Federação, o que dispõe a Lei Pelé em relação à necessidade de descenso dos clubes da
primeira para a segunda divisão. O critério técnico, exigido pela Lei, não será
observado, embora a decisão da Federação preveja a “subida” dos melhores colocados
na segunda para a primeira divisão a ocorrer na temporada imediatamente posterior.
Em seu depoimento à CPI, Ednaldo Rodrigues confirmou essa determinação.
A mais recente questão que se coloca entre a Federação e os clubes se
refere à decisão do Esporte Clube Bahia e do Esporte Clube Vitória de não participar
do Campeonato Bahiano da próxima temporada, em 2002. Os clubes desejam
participar apenas da Copa Nordeste, cujo gerenciamento foge da alçada da Federação
Bahiana de Futebol. A decisão gera um problema legal, vez que os clubes participantes
da Copa do Nordeste não se submeteriam ao critério técnico para acesso e descenso
(exigência da Lei nº 9.615/98).
8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DO FUTEBOL
Dos documentos encaminhados à CPI e da análise do depoimento do
Ednaldo Rodrigues, não foram levantadas informações ou denúncias de relevante
interesse na relação entre a Federação Bahiana de Futebol e os empresários do futebol.
9. CONCLUSÕES , ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES
Da análise de todos os documentos e do depoimento do Ednaldo
Rodrigues Gomes, conclui-se que a Federação Bahiana de Futebol apresenta-se com
problemas administrativo, financeiro e fiscal.
Constatou-se sonegação fiscal nos anos de 1995 a 1997 e informações
irreais encaminhadas à Receita Federal.
Suspeita-se de ingerência e controle político da emissora de TV sobre a
Federação, ao menos no ano de 2000.
Ao remunerar seus dirigentes em valores altos, incompatíveis com seu
patrimônio (não tem bens imóveis ou veículos), a Federação ofende seu próprio
estatuto, à medida que há nítida distribuição das verbas recebidas pela entidade,
facilmente identificadas como lucros.
Recomenda-se reformar os estatutos para suprimir a possibilidade de
remunerar os dirigentes da entidade e para limitar o mandato da diretoria da Federação
em um máximo de quatro anos, além de se buscar impedir a recondução aos cargos,
permitir uma maior autonomia do conselho fiscal, obrigar a realização de licitação para
a aquisição de bens e de material esportivo e estabelecer maior transparência nas contas
da Federação e nos repasses de verbas que envolvam a entidade e os clubes.
Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao
Ministério Público Federal, ao Ministério Público do Estado da Bahia – no tocante às
verbas recebidas pelos ex-diretores e diretores da Federação Bahiana de Futebol, aos
atos anti-estatutários dos próprios dirigentes, considerando-se a possibilidade de
devolução das verbas irregularmente percebidas, e aos atos que ofendem o direito do
consumidor, assegurados na Lei nº 8.078/90 e na Lei nº 9.615/98 (art. 42, § 3º e art.
89), em especial no que se refere à quebra do princípio de acesso e descenso.
BRASÍLIA
1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DAS FEDERAÇÕES
A Federação Metropolitana de Futebol constitui-se como uma associação
civil com finalidades desportivas, sem fins lucrativos. De acordo com seu presidente, a
Federação não remunera seus dirigentes.
2. S ITUAÇÃO ADMINISTRATIVA
A Federação Metropolitana de Futebol, anteriormente denominada
Federação Brasiliense de Futebol, é presidida por Weber Azevedo Magalhães desde
1996, que está em seu segundo mandato.
Weber Magalhães se iniciou em entidades de administração do futebol de
Brasília em 1989, quando foi designado representante da CBF em Brasília, função que
desempenhou por três anos, de acordo com reportagem do Correio Braziliense, de
2/3/2000. Funcionário do Senado, vice-presidente financeiro da Federação por três
anos (1992 a 1996) na gestão do presidente Tadeu Roriz, Weber Magalhães elegeu-se
presidente em 1996 com o apoio de Ricardo Teixeira.
Conforme a reportagem, Weber Magalhães exerceu a função de lobista da
CBF, durante a tramitação e posterior aprovação da Lei Pelé, sendo o anfitrião da
chácara que a entidade mantém no Lago Sul.
2.1 N EPOTISMO
A Federação mantém como funcionário o irmão do presidente, Wagner
Magalhães, que é também funcionário registrado da CBF (administra a casa da CBF, em
Brasília, no cargo de auxiliar de escritório). Já na Federação, Wagner tem o cargo de
“Assessor de Informática da Presidência”.
Além do irmão do Weber Magalhães, a Federação emprega o sobrinho
do presidente, Mário Vítor Magalhães, como assistente técnico do Departamento de
Futebol Amador/Profissional.
2.2 ELEIÇÕES NA FEDERAÇÃO
Em 2 de março de 2000, Weber Magalhães foi reeleito presidente da
Federação Metropolitana de Futebol. Para essa eleição a entidade publicou o edital das
eleições no Diário Oficial da União e na seção de pequenos anúncios do Jornal do Brasil,
do Rio de Janeiro. Isso foi o que informou o Correio Braziliense daquela data.
Disse o jornal, na reportagem intitulada “ Na Surdina”:
“A rigor, não há nada de errado nisso. Até porque a Lei Pelé determina
apenas que o edital seja publicado ‘em jornal de grande circulação’. Mas é
no mínimo estranho que uma publicação, de interesse apenas no âmbito
do Distrito Federal, não seja divulgada nos jornais da cidade. Tinha dirigente
de clube que nem sabia a data da eleição”.
(...)
O cartola argumenta que não tinha motivos para esconder nada até
porque não há concorrentes à presidência. ‘Ninguém apresentou chapa.
Não há outro candidato.’”.
(...)
O xeque-mate dado por Weber Magalhães para conseguir o apoio dos
eleitores foi a verba de R$ 600 mil obtida do Governo do Distrito
Federal. Desse valor, quase R$ 500 mil serão divididos entre os clubes
para que paguem as despesas nestes cinco meses de Campeonato
Brasiliense. Os outros R$ 100 mil serão divididos entre a FMF e as
categorias amadoras.
O anúncio do incentivo governamental foi feito numa festa, no início do
mês, mas até agora o dinheiro não saiu. Segundo Weber Magalhães, a
Secretaria da Fazenda deve repassar o valor até amanhã.” 16
2.3. D ESPESAS INADEQUADAS
Weber Magalhães, em seu depoimento em Goiânia, dia 09/05/2001,
contou para onde vai o dinheiro da Federação:
“O SR. WEBER MAGALHÃES – (...) A Federação, como
muitos dizem, é sem fim lucrativo, e eu tenho certeza que a nossa é,
porque tudo que entra para a Federação é diretamente enviado ao
futebol.”
(g.n.)
No entanto, a Federação Metropolitana vem realizando gastos não
condizentes para uma entidade que se diz em dificuldades financeiras, nem com as
palavras do seu presidente.
No ano de 1998, enquanto a mesada mensal da CBF ainda era de R$ 6 mil,
a Federação realizou despesas que não correspondem ao grau de dificuldades pelas
quais passam todas as entidades estaduais de futebol. Destacam-se gastos excessivos em
bares, restaurantes, telefones celulares, hotéis, supermercados, e até em lojas de festas
infantis ou escolas. A seguir tabela com alguns dos gastos:
D ESPESAS DA FEDERAÇÃO METROPOLITANA DE FUTEBOL EM 1998
Despesas
17
Bares e restaurantes
Telefone celular
Valor (R$)
10.331,82
4.148,75
70.942,27
Hotéis
Condomínio
Pgto. A Wagner Magalhães
Pgto. A Juarez Alberto Moreira
Doação Assoc. Empregados da CEB
Total
13.712,18
9.600,00
9.600,00
21.920,00
140.255,02
Secretaria da Fazenda do Governo do Distrito Federal. O Governador é Joaquim Roriz, parente de Tadeu
Roriz, ex-presidente da Federação Metropolitana de Futebol.
17 Alguns dos estabelecimentos utilizados pela Federação: Bar dos Cunhados, Bar do Professor, Sppadda Bar, Libanus,
Antártida Choperia, Pizzaria Castelinho, dentre outros.
16
Há despesas como o pagamento do “IPVA do Dr. Ricardo Teixeira”, em
maio de 1995 e de muitas notas de combustível, sem que a Federação tenha veículos.
Também em 1995, a Federação efetuou muitos empréstimos, sem que a
contabilidade da entidade se preocupasse em identificar os favorecidos, em sua grande
maioria. Essa conduta contraria princípios contábeis básicos, e pode colocar sob
suspeita a área financeira e contábil da Federação.
Segue uma tabela com os empréstimos feitos, em 1995, ano em que foi
vendido o estádio de futebol Pelezão:
Empréstimos da Federação Metropolitana de Futebol em 1995
DATA
30/04/95
30/04/95
30/04/95
30/04/95
30/04/95
30/04/95
31/05/95
31/05/95
31/05/95
31/05/95
31/05/95
31/05/95
31/05/95
31/05/95
31/05/95
31/05/95
31/05/95
31/05/95
31/05/95
31/05/95
31/05/95
31/05/95
31/05/95
31/05/95
31/05/95
31/05/95
31/05/95
30/06/95
30/06/95
31/08/95
31/08/95
31/10/95
31/10/95
TOTAL
31/12/95
VALOR (R$)
2.000,00
1.000,00
1.000,00
2.000,00
2.000,00
1.500,00
6.000,00
4.000,00
5.000,00
5.000,00
3.000,00
5.000,00
3.500,00
5.000,00
3.000,00
5.000,00
1.500,00
4.000,00
2.500,00
3.000,00
2.000,00
5.000,00
2.000,00
1.660,00
1.000,00
2.500,00
6.000,00
2.000,00
2.000,00
1.300,00
500,00
250,00
500,00
EMPRÉSTIMOS
Emprestimo
EMPRESTIMO A JOSE ELIO DE OLIVEIRA CH 140118.
EMPRESTIMO AO GUARA CH 140123.
EMPRESTIMO AO SOBRADINHO E.C CH 140116.
EMPRESTIMO AO SOBRADINHO E.C CH 140116.
Emprestimo.
PG. REF .EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO
CH 112734.
PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO
CH 112735.
PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO
CH 112736.
PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO
CH 112737.
PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO
CH 112738.
PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO
CH 112739.
PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 00011
PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 122297.
PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 122298.
PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 122308.
PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 122311.
PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 123872.
PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 123873.
PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 123874.
PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 123876.
PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 123877.
PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 123884.
PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 123885.
PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 123886.
PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO CH 140120.
PG. REF. EMPRESTIMO P/ POSTERIRO ACERTO
CH 112733.
EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO, RB 822.
EMPRESTIMO P/ POSTERIOR ACERTO, RB 822.
Emprestimo ao ADC Bandeirante, ch 192725.
Emprestimo ao Planaltina E.C., ch 000077.
Emprestimo para posterior acerto conf. recibo
Pgto ref. emprestimo a Ceilandia para posterioracerto
91.710,00
4.000,00 Liquidacao de emprestimos efetuados no ano.
Observe-se que os empréstimos foram feitos, porém os recursos não
retornaram à Federação. Apenas em maio de 1995, foram emprestados R$ 76.660,00.
Nesse mês, foi contabilizada a venda do estádio Pelezão.
Foram emprestados R$ 91.710,00 e apenas R$ 4.000,00 foram devolvidos
ao caixa da Federação.
Há uma despesa realizada em março de 1999, paga pelo cheque número
933.534, de R$ 5.000,00 que foi contabilizado assim: “R$ 5.000,00 - Cheque 933.534 Despesa não identificada”. Isso poderia ser visto como um desvio de dinheiro do caixa da
Federação, fato que deve ser investigado, mais profundamente. Do mesmo modo, a
imprensa divulgou que, em 1996, desapareceu soma expressiva de dinheiro do caixa, no
dia da posse do atual presidente, dinheiro ainda não recuperado. Registrou-se uma
ocorrência policial, sem que se tenha sido dado o prosseguimento às investigações.
3. SITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA
A Federação se comprometeu a encaminhar a contabilidade para a CPI e
não o fez. Weber Magalhães renovou o compromisso durante seu depoimento e
novamente não enviou a documentação necessária para a completa análise da
movimentação fiscal e financeira da entidade18. Com efeito, Weber Magalhães
prometeu também disponibilizar seu sigilo fiscal e bancário, além do comprovante de
que teria enviado à CPI os documentos contábeis; a CPI, no entanto, não recebeu por
parte desse dirigente nenhuma iniciativa nesse sentido. Segue abaixo o exame da quebra
de sigilo fiscal e bancário, à luz do depoimento do presidente da Federação.
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – A Federação, ela tem
uma contabilidade?
O SR. WEBER MAGALHÃES – Tem.
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – Por que não enviou os
documentos pedido por esta Comissão?
O SR. WEBER MAGALHÃES
– Enviamos todos os
documentos. Nós fomos um dos primeiros a enviar o documento.
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – A informação que nós
temos é que não foi enviado, não chegou.
O SR. WEBER MAGALHÃES – De qual ano? todos os
documentos. Nós fomos um dos primeiros a enviar os documentos.
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – A informação que nós
temos é que não enviado, que não chegou.
A Federação encaminhou parte dos documentos contábeis às vésperas de se encerrar este Relatório. Isso não
saneia o fato de a Federação não ter enviado todos os dados tempestivamente, conforme requisitado pela CPI,
visto que prejudicou o exame contábil e operacional da entidade.
18
O SR. WEBER MAGALHÃES – De qual ano?
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – Não foi envi... A
informação que ...
O SR. WEBER MAGALHÃES – Nós encaminhamos todos
documentos para a CPI, inclusive nós fomos o primeiro. Falamos até com
o Deputado Aldo Rebelo que nós estávamos encaminhando toda a
documentação, nós sendo de Brasília.
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – É justamente que teria
a maior facilidade, não é?
O SR. WEBER MAGALHÃES – Justamente.
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – Por acaso, o senhor tem
o comprovante de entrega?
O SR. WEBER MAGALHÃES – Não, aqui, não. Não temos
aqui. Mas levantarei sob rapidamente para informar aos senhores. Mas
o que me consta a nossa contabilidade encaminhou toda documentação
que foi solicitada.
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES
poderia encaminhar ...
– Então, o senhor
O SR. WEBER MAGALHÃES – Claro, não tem problema
nenhum. (g.n.)
Weber Magalhães não disse a verdade à CPI ao declarar que havia
encaminhado os documentos. Mesmo durante seu depoimento em Goiânia, a CPI teve
a confirmação de que nada havia sido entregue pela Federação Metropolitana.
Dias após o depoimento, Weber Magalhães encaminhou algumas
informações, sem, contudo, enviar os dados contábeis. Mesmo que o fizesse ao final
dos trabalhos da Comissão, o comportamento do Weber Magalhães configuraria
obstrução das investigações da CPI relativas à Federação, prejudicando portanto a
elaboração deste Relatório.
3.1 A NÃO-DECLARAÇÃO DE IMÓVEIS
A Federação, entre 1995 e 2000, não declarou suas rendas nos exercícios
de 1996 e de 1997. Na declaração de 1998 (ano calendário 1997), não constam veículos
e bens imóveis dentre as propriedades da Federação. Já na declaração de 1999 (ano
calendário 1998), consta o valor de R$ 9.590,91 na rubrica “imóveis” (valor incompatível
às dez salas e à loja, propriedades da entidade como admitido por Weber Magalhães em
seu depoimento). Já na declaração de 2000 (ano calendário 1999), o registro dos bens
volta à situação declarada em 1998 (ano calendário 1997), que aponta a inexistência de
bens.
3.2 A S SALAS E LOJA DA FEDERAÇÃO
Em seu depoimento, Weber Magalhães afirmou que a Federação é
proprietária de dez salas e uma loja, todos alugados e gerando rendimentos à entidade.
Seguem trechos do depoimento:
“O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – O senhor disse
que a sua Federação, a Federação que V.Sa. preside, tem entre outras
receitas, receitas de aluguel. Aluguel de que?
O SR. WEBER AZEVEDO MAGALHÃES – Aluguel de
salas, onde foi vendido em 95 um estádio e ficaram dez salas para a
Federação e hoje elas são alugadas. São em torno de 3 mil reais. São dez
salas e uma loja.”
A Federação sonegou informações e imposto junto a Receita Federal, não
só no tocante às salas e à loja. Segundo o depoimento do Weber Magalhães, estão em
nome da Federação outros imóveis, pertencentes aos clubes. Todos esses imóveis
foram frutos da venda de um estádio, que era da Federação. Parte do pagamento se deu
sob a forma de imóveis, ficando dez salas e uma loja para a Federação, e outros imóveis
para os clubes (esses imóveis mantêm-se em nome da Federação).
3.3 A VENDA DO ESTÁDIO
A Federação Metropolitana vendeu o estádio Pelezão, em maio de 1995,
estádio que a entidade havia recebido do Governo do Distrito Federal, anteriormente.
Tratou-se de uma permuta com o grupo empresarial Paulo Octavio: o estádio por
algumas lojas e salas. Esse negócio ainda levanta algumas dúvidas.
Durante essa transação, diversas despesas foram realizadas, dentre elas o
pagamento de R$ 80.000,00 em 10/04/1995, a Wilson Antônio de Andrade. Segundo
depoimento do Weber Magalhães, tal quantia refere-se a honorários advocatícios pagos
ao advogado Wilson Andrade, ex-presidente da Federação. A atuação do advogado
junto à Federação envolve a venda do estádio Pelezão:
“O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Conhece Wilson
Antônio?
(...)
O SR. WEBER AZEVEDO MAGALHÃES - Wilson Antônio
de Andrade, Dr. Wilson de Andrade? Conheço. Foi ex-Presidente da
Federação.
(...)
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - A Federação teria
alguma razão para pagar-lhe 80 mil reais?
O SR. WEBER AZEVEDO MAGALHÃES - Pagamos 80 mil
reais numa ação nessa venda do Estádio Edson Arantes do Nascimento,
o qual era... ele receberia honorários advocatícios.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Eu não entendi
bem. Por favor, ele recebeu como honorários?
O SR. WEBER AZEVEDO MAGALHÃES - Ele é advogado
numa ação, se não me engano, na... na... ação popular, alguma coisa
assim.” (g.n.)
A Federação pagou honorários significativos para o ex-presidente Wilson
e não os contabilizou devidamente. Há um lançamento no valor de R$ 80 mil, datado
de abril de 1995, que informa apenas: “Ref. 03/95 CH 056283”. Pode ser que se trate
do cheque para Wilson Andrade. Observe-se que, em julho do mesmo ano, a entidade
pagou R$ 750,00 (setecentos e cinqüenta reais) a título de honorários advocatícios
referentes a “medida cautelar” (cheque 122.296).
Segundo informações, Weber Magalhães era vice-presidente financeiro da
entidade à época da venda do estádio, o que o torna um dos responsáveis pelos atos
daquele negócio.
A forma de gestão patrimonial da Federação revela, segundo o Deputado
Jurandil Juarez, membro desta CPI, a existência de um caixa dois patrimonial, que
tornaria a Federação uma “latifundiária urbana”. Segue abaixo a conclusão do
Deputado, como parte do presente Relatório:
“O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – São imóveis que
não se coadunam com o objetivo da Federação. São imóveis que não
constam da declaração do Imposto de Renda, portanto, não constam dos
registros fiscais. Não constam dos registros contábeis, porque na
documentação fiscal tem balanços, inclusive com o registro do patrimônio,
isso não consta. Então, na verdade, isso, a Federação tem um lado que
eu imagino, e espero até que seja só esse (...) que caracteriza a existência
de um caixa 2 imobiliário, para usar o nome, mas, de uma
informalidade injustificável. Primeiro, para uma Federação tão nova.
Segundo, para uma Federação da capital da República. E, terceiro,
porque são coisas que não podem ser guardadas. Não são valores que
podem ser transformados em títulos, em ativos financeiros. São imóveis.”
Em que pese Weber Magalhães queixar-se de que a Federação
Metropolitana vive em situação financeira crítica, registre-se que há um auxílio
constante do governo do Distrito Federal em favor da entidade. Trata-se de verba
pública que entra diretamente na contabilidade da entidade. Assim, o interesse e o
patrimônio públicos estão presentes na estrutura da Federação Metropolitana. Diz o
presidente em seu depoimento:
“Fontes de receita da Federação são as ajudas que a CBF nos dá, são
três mil reais de aluguel de alguns imóveis que pertencem à Federação e
receitas de clubes quando estão na primeira divisão, segunda e terceira
divisão, 5% dessas rendas. E, a partir do ano passado, nós tivemos,
como o Governo nos ajudou, nós tínhamos 3% do valor das rendas, sendo
que nosso ingresso era um real. Ao todos, fizemos 170 mil torcedores.
Então, tivemos 3% de 170 mil. Este ano, abrimos mão dos 3%.
Teremos agora, no final do campeonato, porque o ingresso subiu, a
Federação terá novamente os 5% novamente este ano, mas nós não
estávamos recebendo ... Até o ano passado, até 99, 5%, e 2000 3%.
Esse ano, nada.
(...)
Através de convênio, no passado, o Governo nos ajudou não só na parte
amadora como também na parte profissional. Ajudou em torno do
amador em torno de 300 mil reais, aonde adquirimos material todo de
esportivo para as ligas, as 21 ligas, que são filiadas à Federação, mas
não têm direito a voto, que é até uma reivindicação das ligas, porque nós
estamos esperando chegar o momento certo para poder até eles terem
direito. É uma reivindicação deles. E tivemos uma ajuda para a Copa
João Havelange para o primeiro e o segundo, para primeira divisão,
segunda e terceira, que foram em torno de 450 mil reais e tivemos uma
ajuda de 600 mil reais para o futebol profissional, desses 600 mil reais,
500 mil reais foram divididos para os dez clubes, cabendo a cada um 50
mil reais e 100 mil reais para a Federação, sendo que desses 600
tivemos o desconto de 5% para o INSS. E esse ano também estamos
prestes a receber 800 mil reais sendo que 600 para os clubes e 200 para
a Federação.”
O Correio Braziliense, de 09/11/2000, publicou reportagem de Cida
Barbosa com denúncias relativas às negociações da Federação com o governo do
Distrito Federal, e referências à transação da Federação com empresa do grupo Paulo
Octavio:
“O estádio foi vendido por R$ 3 milhões a um pool de empresas liderado
pelo hoje deputado federal Paulo Octavio (PFL-DF). A FMF recebeu
R$ 1 milhão em dinheiro e R$ 2 milhões em salas e lojas da empresa
Paulo Octavio Empreendimentos Imobiliários. A negociação, porém, foi
parar na Justiça. A deputada distrital Maria José Conceição, a
Maninha (PT), entrou com ação no Tribunal de Justiça do Distrito
Federal contra a FMF, sob a alegação de que o patrimônio público fora
lesado. Na ação, Maninha argumenta que a FMF adquirira o estádio
do Governo do DF por preço simbólico, sem passar por processo de
licitação. A revenda, conforme argumento da deputada, gerou um ganho
milionário para a FMF. Na época, o presidente da entidade era Tadeu
Roriz. Weber Magalhães ocupava a vice-presidência financeira. O
processo continua em andamento na Justiça.” (g.n.)
A doação do estádio para a Federação e a sua venda (ou permuta) para
terceiros precisa ser investigada mais detalhadamente. A seguir, os lançamentos
contábeis referentes à transação do estádio para o grupo Paulo Octavio (ver Anexo CD
Rom Contabilidade Federação Metropolitana de Futebol):
Lançamentos contábeis da Federação Metropolitana de Futebol (1995)
DATA
LANÇAMENTO
31/05/95 1.13.304.00003
31/05/95
4.42.102.00002
VALOR (R$)
EVENTO
2.996.076,63
reavaliacao do estadio pelezao
2.996.076,63
REAVALIACAO DO ESTADIO PELEZAO
31/05/95 1.13.310.00001
190.000,00
REF. PERMUTA DE IMOVEIS CONF.ESCRITURA 92.061, FL 1357.
31/05/95 1.13.310.00002
190.000,00
REF. PERMUTA DE IMOVEIS CONF.ESCRITURA 92.061, FL 1357.
31/05/95 1.13.310.00003
190.000,00
REF. PERMUTA DE IMOVEIS CONF.ESCRITURA 92.061, FL 1357.
31/05/95 1.13.310.00004
190.000,00
REF. PERMUTA DE IMOVEIS CONF.ESCRITURA 92.061, FL 1357.
31/05/95 1.13.310.00005
190.000,00
REF. PERMUTA DE IMOVEIS CONF.ESCRITURA 92.061, FL 1357.
31/05/95 1.13.310.00006
50.000,00
REF. PERMUTA DE IMOVEIS CONF.ESCRITURA 92.061, FL 1357.
31/05/95 1.13.310.00007
500.000,00
REF. PERMUTA DE IMOVEIS CONF.ESCRITURA 92.061, FL 1357.
31/05/95 1.13.310.00008
500.000,00
REF. PERMUTA DE IMOVEIS CONF.ESCRITURA 92.061, FL 1357.
31/05/95
1.13.304.00003
1.000.000,00
REF. PERMUTA DE IMOVEIS CONF.ESCRITURA 92.061, FL 1357.
31/05/95
1.13.304.00003
1.000.000,00
REF. PERMUTA DE IMOVEIS CONF.ESCRITURA 92.061, FL 1357.
31/05/95 3.31.106.00002
1.11.102.00002
51.173,78
30/04/95
1.13.304.00003
1.000.000,00
Pagamento de ITBI, ch 088050.
Venda de 1/3 do Pelezao conf. Escrit. 92060
30/04/95 3.31.106.00001
580.839,37
30/04/95 1.11.104.00001
51.173,78
30/04/95 1.11.104.00001
9.500,00
30/04/95 1.11.104.00001
40.000,00
Valores a receber conf. Escritura 92060.
30/04/95 1.11.104.00001
99.326,22
Valores a receber conf. Escritura 92060.
Pago IPTU conf. diversos D.A.R.
Valores a receber conf. Escritura 92060.
Valores a receber conf. Escrit. 92060
30/06/95 3.32.101.00002
1.13.310.00001
38.000,00
Consult. 03 Bl. A da 915 sul, doado p/ C.R.
30/06/95 3.32.101.00002
1.13.310.00003
27.000,00
Consult. 203 Bl A da 915 sul, doado p/
Taguatinga E.C.
30/06/95 3.32.101.00002
1.13.310.00001
38.000,00
Consult 11 Bl A da 915 sul doado p/
A.D.C. Bandeirante.
30/06/95 3.32.101.00002
1.13.310.00008
50.000,00
Loja 04 do Bl. A QI 33, p/ Sobradinho E.C.
30/06/95 3.32.101.00002
1.13.310.00003
32.000,00
Consult. 204 Bl A da 915 sul, doado
30/06/95 3.32.101.00002
1.13.310.00006
50.000,00
Consult. 310 Bl. D da 915 sul, doado p/ G.E. Tiradentes.
30/06/95 1.13.310.00001
1.13.310.00001
38.000,00
Consult. 10 Bl. A da 915 sul, Samambaia F.C.
30/06/95 3.32.101.00002
1.13.310.00002
27.000,00
Consult. 103 Bl A da 915 sul, S.E. Ceilandense
30/06/95 3.32.101.00002
1.13.310.00005
63.000,00
Consult. 203 Bl C. da 915 sul, doado p/
S.E. Gama
30/06/95 1.13.310.00005
1.13.310.00005
63.000,00
Consult. 07 Bl C da 915 sul, doado p/
Planaltina E.c.
30/06/95 3.32.101.00002
1.13.310.00004
76.000,00
Consult. 308 e 309 Bl A da 915 sul, S.E.
30/06/95 3.32.101.00002
1.13.310.00007
125.000,00
Salas 201 e 202 da QI 27, p/C.R. Guar
30/06/95 3.32.101.00002
1.13.310.00008
125.000,00
Sala 207 da 915 sul, p/ C.R. Guara e
30/06/95 3.32.101.00002
1.13.310.00008
125.000,00
Sala 208 da 915 sul p/ Taguatinga E. C. e
S.C. Ceilandense.
30/06/95 3.32.101.00002
1.13.310.00005
63.000,00
Sala 210 da 915 sul, p/S.E. do Gama e
Samambaia E.C.
30/06/95 3.32.101.00002
1.13.310.00003
32.000,00
Sala 211 da 915 sul, p/ Brasilia E.C. e
31/05/95 3.31.106.00002
1.11.104.00001
40.000,00
Pagto ITBI PelezÆo.
31/05/95 3.31.105.00010
1.11.102.00002
4.000,00
Guara
p/ Brasilia E.C.
Ceilandense.
A.D.C. Bandeirante.
G.E. Tiradentes.
PG. REF. ESCRITURACAO E REGUL. DO IMOVEL CH 112732.
A Federação se encarregou de pagar o ITBI (imposto de transferência do
imóvel) relativo ao estádio, no valor de R$ 40 mil. Registre-se que, em geral, é o
comprador o responsável por esse tipo de pagamento.
A distribuição dos imóveis entre a Federação e os clubes afiliados não
está muito clara na contabilidade da entidade, com se vê acima. O próprio presidente
não soube explicar, em seu depoimento, com quem e em nome de quem estão esses
imóveis:
“O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Esses imóveis...
Pelo total, foram repassados à Federação ou eles foram repassados já
direta... o que coube aos clubes, diretamente aos clubes?
O SR. WEBER AZEVEDO MAGALHÃES - Não. Foram
repassados para a Federação e... foram repassados aos clubes, mas ficou
em nome da Federação, ainda, alguns imóveis. Ficou vários imóveis em
nome da Federação, porque tinha uma ação pendente de cadeiras cativas
e não poderia ser repassado.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - E eles continuam
em nome da Federação?
O SR. WEBER AZEVEDO MAGALHÃES - Alguns
continuam em nome da Federação.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Quer dizer que
tem mais imóveis no nome da Federação?
O SR. WEBER AZEVEDO MAGALHÃES - Tem mais
imóveis na Federação que...
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Quantos? Quantos
imóveis?
O SR. WEBER AZEVEDO MAGALHÃES - Agora, não
posso precisar. Tenho que levantar para o senhor e encaminhar tudo isso
aí. Porque tem alguns imóveis que estão de responsabilidade de clube,
mas com nome na Federação.
(...)
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Se o senhor quiser
vender, qual é... o que é que existe de disposição em contrário?
O SR. WEBER AZEVEDO MAGALHÃES – Hoje, nós
estamos quase já com as certidões negativas, tudo pronto, ganhando uma
ação das cadeiras cativas. E para que se venda esses imóveis precisaria,
primeiro, o clube, que é responsável dele, dar autorização. E, já que está
em nome da Federação...
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Não, não está no
nome do clube. Isso é o que eu quero dizer.
O SR. WEBER AZEVEDO MAGALHÃES - Não. Mas...
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Não estando no
clube, o clube não tem nada a ver com isso.
O SR. WEBER AZEVEDO MAGALHÃES - Mas está em
nome da Federação. Para mim vender e disponibilizar qualquer imóvel
da Federação, teria que convocar uma assembléia geral dos clubes filiados
para que seja dada autorização.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Quando foi
vendido o estádio foi esse o procedimento?
O SR. WEBER AZEVEDO MAGALHÃES - Foi esse o
procedimento.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - Sr. Presidente, eu
quero manifestar a minha preocupação com este fato. Porque existe um
caixa dois patrimonial. Eu tô acostumado até ver caixa dois financeiro”
3.4 C ONTROLE DA FEDERAÇÃO SOBRE O CONSELHO FISCAL
A movimentação financeira e fiscal da Federação não possui uma
fiscalização que se preza pela imparcialidade. Isto porque a composição do conselho
fiscal, órgão responsável pela fiscalização, foi articulada pelo próprio presidente da
Federação. Ao depor em Goiânia, Weber Magalhães assume que a composição do
conselho fiscal é de plena confiança da direção da entidade:
“Mas nós é que indicamos. Foi montado nossa chapa com Presidente,
Vice-Presidente, 2º Vice-Presidente e um Conselho Fiscal. Agora, eu
procurei, dentro do Conselho Fiscal, por pessoas que são trabalhadores,
que têm emprego e que a maioria são contadores.”
4. RELAÇÃO COM A CBF
A Federação Metropolitana de Futebol recebeu da CBF, entre 1998 a
2000, os seguintes valores: em 1998, R$ 6.000,00 por mês, com as exceções dos meses
de outubro (R$ 18.450,00) e novembro (R$ 46.000,00); em 1999, o repasse mensal foi
de R$ 12.000,00, com as exceções de janeiro (R$ 66.000,00) e maio (R$ 32.000,00); já
em 2000, manteve-se o valor de R$ 12.000,00 nos meses de janeiro a abril, junho a
agosto, e outubro a dezembro, sendo que em maio o valor foi de R$ 62.000,00 e em
setembro, de R$ 37.000,00. Ver gráfico abaixo:
DOAÇÕES DA CBF PARA A
FEDERAÇÃO METROPOLITANA DE FUTEBOL
1998 - 2000
R$
70.000
60.000
50.000
40.000
30.000
20.000
NOVEMB
MESES
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/2000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/99
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
0
JAN/98
10.000
A Federação recebeu mais recursos exatamente em períodos eleitorais, de
1998 e de 2000, o que sugere a possibilidade de que as doações recebidas possam ter
sido utilizadas para campanhas políticas.
“O SR. DEPUTADO JOSÉ ROCHA - Se a CBF deixar de
ajudar a Federação do Distrito Federal o que aconteceria com a
Federação?
O SR. WEBER AZEVEDO MAGALHÃES - Ficaria difícil
até porque não poderíamos ajudar o produto final que são os jogadores.
São até jogadores que tem dificuldades como sempre se tem aqui, o
dinheiro que entra para o futebol, repassamos para o futebol, pagamos a
arbitragem de futebol feminino, ajudamos o futebol juvenil, o futebol
infantil que não tem recursos, não tem renda. Então, tudo que entra na
Federação, quando temos condições de ajudar nós ajudamos tanto que eu
deixei bem claro se nós terminarmos o ano, por exemplo, entrando cem
mil e gastando cem mil eu estou satisfeitos porque sem dúvida nenhuma
nós encaminhamos para o futebol.”
(g.n.)
Todas as Federações admitem precisar das doações da CBF. Todas
precisam de um mesmo valor mensal, como se os déficits fossem idênticos. Como se
presume que muitas doações feitas pela Confederação tenham fins políticos, é de supor
que diversas doações para a Federação Metropolitana não tenham objetivos
estatutários.
A Federação Metropolitana mantém um vínculo especial com a CBF, no
que diz respeito à casa mantida pela CBF em Brasília. Do depoimento do Weber
Magalhães, pode ser destacado o seguinte trecho:
“O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – (...) O senhor
freqüenta aquela casa da CBF em Brasília?
O SR. WEBER MAGALHÃES – Eu, morando em Brasília, a
CBF tem representação em Brasília, eu sempre estive lá.
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – Tem acesso constante lá
e tudo? Quanto é que a CBF tem pagado de aluguel naquela casa?
O SR. WEBER MAGALHÃES – Agora, eu não sei, porque foi
feito contato direto com a CBF. Foi (ininteligível) Diretor de Assuntos
Legislativos na casa CBF. E eles renovaram o contrato. Eu não sei
quanto ela tá pagando hoje.”
Segundo informações, a casa foi adquirida graças ao Weber Magalhães,
intermediador do negócio. Um irmão de Weber, Wagner de Azevedo Magalhães,
trabalha como administrador da casa da CBF, conforme comentado no item 2.1 acima.
Sobre a casa da CBF em Brasília, há, no Relatório da CPI, um item
específico no capítulo VIII.
5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL
Os elementos relevantes encontrados referem-se às doações da CBF para
a Federação em períodos eleitorais. A Federação não encaminhou os documentos
contábeis exigidos pela CPI. Com isso, pode-se levantar a hipótese de que os recursos
recebidos tenham tido destinação diversa às previstas no estatuto da entidade, que, por
sua vez, também não foi encaminhado.
Weber Magalhães, em seu depoimento, afirmou que:
“A Federação, como muitos dizem, é sem fim lucrativo, e eu tenho
certeza que a nossa é, porque tudo que entra para a Federação é
diretamente enviado ao futebol”.
Há também uma ligação entre a Federação e o acompanhamento dos
interesses legislativos da CBF no Congresso Nacional. O depoimento do Weber
Magalhães, que é servidor público do Senado Federal, deixa evidenciado que suas
atribuições não se limitam à Federação, estendendo-se à CBF.
6. C ONTRATOS COM A TV
Pelos documentos enviados à CPI, a Federação Metropolitana de Futebol
não possui contratos de transmissão de jogos com emissoras de televisão.
7. RELAÇÃO COM OS CLUBES
Da análise dos documentos e do depoimento do Weber Magalhães, não
há informações ou denúncias relevantes na relação entre clubes e Federação. Destaque-
se apenas que a Federação cuida de repassar verbas para os clubes, como um modo de
intermediação.
Chamou a atenção, durante a discussão sobre a permanência do clube
brasiliense Gama na primeira divisão do futebol brasileiro, que o Weber Magalhães
tenha assumido lado oposto ao dos interesses do Gama. Assim retratou a situação o
Correio Braziliense, de 02/03/2000:
“O cartola Weber Magalhães é um cartola escorregadio, do tipo que, ao
menor sinal de pressão, corre para cima do muro. Isso pode ser
comprovado no episódio envolvendo a disputa judicial entre o Gama e a
Confederação Brasileira de Futebol (CBF). Em vez de bater de frente
com a entidade para defender os interesses do seu filiado - que luta na
Justiça comum para se manter na primeira divisão do Campeonato
Brasileiro -, o dirigente prefere se omitir. Uma atitude impopular num
momento em que toda a cidade está solidária ao clube.
A explicação para a omissão é simples. Weber Magalhães não quer
queimar o filme com o amigo Ricardo Teixeira, presidente da CBF. Ao
mesmo tempo, esforça-se para não desagradar o clube, o que não
conseguiu totalmente.” (g.n.)
8. C ONCLUSÕES, ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES
Da análise dos documentos enviados e que esta CPI teve acesso e do
depoimento do Weber Azevedo Magalhães, pode-se concluir que a Federação
Metropolitana de Futebol é gerida de forma temerária, seja em termos administrativo,
financeiro e fiscal.
Weber Magalhães não disse a verdade a esta Comissão, em seu
depoimento, em Goiânia.
A Federação Metropolitana não encaminhou a tempo a esta CPI os
documentos requeridos, impedindo assim o exame da documentação. Só depois de
muitos pleitos e no final de maio, parte dos documentos foram enviados, configurando
a tentativa de encobrir irregularidades em suas contas.
Constatou-se sonegação fiscal, admitida pelo presidente em seu
depoimento.
Recomenda-se uma reforma estatutária para limitar o mandato da
diretoria da entidade em no máximo quatro anos, impedindo a recondução aos cargos;
para evitar a contratação de parentes de dirigentes da entidade; para permitir
autonomia do conselho fiscal; para obrigar a realização de licitação para a aquisição de
bens e de material esportivo; e para estabelecer maior transparência nas contas da
Federação e nos repasses de verbas que envolvam a entidade e os clubes.
Sugere-se que o Ministério Público do Distrito Federal, através de
inquérito público civil, proceda um levantamento detalhado da compra e venda do
estádio que pertencia ao Distrito Federal e, com a transação, passou à Federação
Metropolitana de Futebol, estendendo-se às pessoas envolvidas, dentre elas os atuais e
os ex-diretores, em razão de indícios de irregularidades na negociação e o envolvimento
de patrimônio público.
Recomenda-se que o Ministério Público Federal e a Receita Federal
investiguem o pagamento feito pela Federação a Wilson Antônio de Andrade.
Sugere-se, ainda, encaminhar o presente Relatório, e cópias dos
documentos recebidos da Federação Metropolitana de Futebol, à Receita Federal, ao
Ministério Público Federal (considerando-se inclusive o não atendimento aos
requerimentos da CPI), ao Ministério Público do Distrito Federal, ao Tribunal de
Contas do Distrito Federal, para inspeção, tendo em vista que a Federação recebe
verbas do Governo do Distrito Federal e à Procuradoria Eleitoral do Tribunal Regional
Eleitoral do Distrito Federal, com base na Lei 9.504/97.
CEARÁ
1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DAS FEDERAÇÕES :
Conforme estatuto da entidade, aprovado por assembléia geral
extraordinária realizada em 05/01/1996 (art. 91 do estatuto), homologado pela CBF, a
Federação Cearense de Futebol é uma “sociedade civil e pessoa jurídica de direito
privado, de caráter desportivo (...) “cujo fim é dirigir e incrementar a prática do Futebol
em todo o estado, em caráter não profissional e profissional” (art. 1º).
Trata-se de típica entidade de direito privado sem fins lucrativos.
O estatuto veda que “os membros eleitos dos Poderes da FCF” sejam
remunerados pela entidade (art. 82). São poderes da Federação: a Assembléia Geral
(composta, conforme o art. 26, dos integrantes das divisões profissional e não
profissional, além das ligas agrupadas na divisão não profissional especial), a Justiça
Desportiva, o Conselho Fiscal, a Presidência, a Diretoria e o Conselho Arbitral (art. 3º).
O estatuto pauta-se no art. 217 da Constituição Federal, sendo a norma
geral que regula a Federação, subsidiado pela Lei nº 8.672/93, arts. 20 a 23 do Código
Civil Brasileiro, e das disposições normativas aplicáveis da CBF e da FIFA.
2. S ITUAÇÃO ADMINISTRATIVA :
A Federação Cearense de Futebol é presidida por Fares Cândido Lopes,
que se encontra em seu segundo mandato.
3. S ITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA
Segundo informações da receita federal, a Federação Cearense de
Futebol, entre o período entre 1995 e 2000, apenas declarou Imposto de Renda relativo
ao ano base de 1997, quando declarou-se isenta. Neste ano base, a Federação registrou
não haver bens ou imóveis.
O presidente da Federação alega que ajuizou Mandado de Segurança
junto ao Supremo Tribunal Federal contra a ordem da CPI de quebra do sigilo bancário
e fiscal da entidade por um exercício de cidadania, e por achar que não há qualquer
problema com a Federação.
3.1. INSS
A Federação Cearense é devedora do INSS. O valor da dívida é de R$
20.342,03.
3.2. CONSELHO FISCAL
Quanto ao controle fiscal e financeiro da entidade, Fares Cândido
confessa um certo descontrole. Conforme apontado acima, não foram declaradas as
rendas de forma satisfatória nos últimos anos, e a declaração encaminhada à receita
federal conta com erros relativos a valores de bens. O conselho fiscal não trabalha de
forma eficaz e nem tem autonomia para isso, tanto que tem sido escolhido junto com a
direção da entidade, como afirma Fares Cândido em seu depoimento:
“O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – (...) Como é que é o
conselho fiscal da Federação?
(...)
O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – Não tem nenhum parente,
nenhum funcionário, nenhum diretor.
(...)
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Mas como é a eleição dele?
O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – A eleição é como a ... a
minha.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Na mesma chapa.
O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – Na mesma chapa. É do
estatuto.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Do estatuto. É uma outra
questão que a gente tem... Nós temos estudado isso aí. Há muitas
entidades que a chapa do conselho fiscal é diferente da chapa... porque dá
mais legalidade, mais moralidade...
O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – O senhor sabe qual foi o
problema, Deputado? A Lei Pelé, a 9.615, diz no art. 16, que as
entidades e associações são entidades jurídicas de direito privado e que se,
se organizam... são autônomas e se organizam de acordo com os seus
estatutos. Então, não é? A própria lei, não é? Tem a Constituição no
217 que diz que o Governo tem que deixar livremente, né?
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Sim.
O SR. FARES CÂNDIDO LOPES – Então, tudo isso é
amarrado nas leis.”
4. RELAÇÃO COM A CBF
A Federação Cearense recebeu da CBF, entre 1998 a 2000, os seguintes
valores: em 1998, R$ 6.000,00 por mês, com exceção dos meses de abril e junho, cujos
valores foram de R$ 56.000,00; em 1999, o repasse mensal foi de R$ 12.000,00, com as
exceções em janeiro, que foi de R$ 6.000,00, e em abril, de R$ 24.000,00, sendo que não
houve repasse em março; já em 2000, o valor do repasse mensal foi de exatos R$
12.000,00.
Em seu depoimento à CPI, o presidente da Federação Cearense disse que
não compareceu à assembléia da CBF que aprovou as contas da entidade nacional dos
anos de 1998 e de 1999; em seu lugar, mandou um diretor da Federação.
5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL
Não foram registrados vínculos explícitos entre a Federação e a política
local.
Registe-se, porém, a denúncia do jornalista cearense Marconi Alves,
segundo o qual jornalistas cearenses receberiam pagamentos para tecer comentários
elogiosos à seleção brasileira, nas apresentações desta em estádios do Ceará
(“Observatório da Imprensa”, edição de 05/12/1998). A denúncia de Marconi Alves
estaria sendo apurada pela Comissão de Ética do Sindicato dos Jornalistas do Estado
do Ceará.
6. CONTRATOS COM A TV
A Federação Cearense de Futebol não possui contratos de transmissão de
jogos com emissoras de televisão. Segundo depoimento do seu presidente, a Federação
tentou vender seus jogos oferencendo-os gratuitamente a uma emissora de TV durante
uma temporada, na busca de um contrato futuro. A tentativa não teve resultados
interessantes para a entidade, como relata Fares Cândido:
“Eu quis fazer isso em 99. Eu dei alguns jogos para a
Televisão Verdes Mares, que é a repassadora da Globo, de graça. Todo
sábado eu dava um jogo, para ver se em 2000 motivava as empresas a ...
Quando foi em 2000, eles me apresentaram um contrato de cinco anos
pagando 200 mil reais por ano, em seis parcelas, para fazer três jogos por
semana. Eu digo, não, eu vou... Quando eu deixar... Mas eu não vou
cometer esse crime com o futebol cearense. E é por isso até que eles não
gostam muito de mim.”
7. RELAÇÃO COM OS CLUBES
A imprensa relata que há problemas entre clubes e Federação Cearense,
como os eventuais conflitos de locais para a realização de jogos (“Diário do Nordeste”,
edição de 12/07/2000), ou a confusa relação que se instalou com as duas entidades de
árbitros administradas pela entidade cearense (“Chute a Gol”, 01/04/2001).
Há notícias que o Ceará Sporting teria encaminhado ao Ministério
Público Estadual pedido para apurar a omissão da Federação em face de um caso de
doping. O Ceará Sporting também protagoniza outro fato que envolve a Federação:
trata-se da cobrança desta entidade de dívida do clube (“Tribuna do Norte”).
Registre-se que Fares Cândido, antes de assumir a Federação, ocupou a
presidência do Fortaleza duas vezes, tendo sido ainda diretor de futebol daquele clube.
8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DO FUTEBOL
Não foram levantadas informações relevantes quanto à relação entre a
Federação e empresários que exploram o futebol.
9. C ONCLUSÕES, ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES
Da análise dos documentos e do depoimento do Fares Cândido Lopes,
constata-se a forma temerária como a Federação Cearense de Futebol tem sido gerida
em termos fiscais, além de certo descontrole financeiro.
Constatou-se sonegação fiscal conforme a inexistência de declaração de
Imposto de Renda dos anos base de 1995, 1996, 1998, 1999 e 2000.
Tendo em vista aspectos administrativos e a atuação do conselho fiscal,
recomenda-se uma reforma estatutária para limitar o mandato da diretoria da entidade
em no máximo quatro anos, impedindo a recondução aos cargos; para permitir uma
maior autonomia do conselho fiscal; para obrigar a realização de licitação para a
aquisição de bens e de material esportivo; e para estabelecer maior transparência nas
contas da Federação e nos repasses de verbas que envolvam a entidade e os clubes.
Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal e ao
Ministério Público Federal.
ESPÍRITO SANTO
1. N ATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DA FEDERAÇÃO
A Federação de Futebol do Espírito Santo possui personalidade jurídica
de sociedade civil para fins esportivos, no ramo do futebol, conforme prevê o artigo 1º
de seu Estatuto.
2. S ITUAÇÃO ADMINISTRATIVA
A Federação Espírito-santense possui como presidente o senhor Marcus
Antônio Vicente, que, até depor nesta CPI, era Deputado Federal; hoje, ocupa o cargo
de Secretário no Governo do Espírito Santo. Assumiu a Federação em 94 e, segundo
suas palavras no depoimento à Comissão (Notas Taquigráficas nº 000329/01), nunca
recebeu nada a título de remuneração pelos serviços prestados à entidade.
Afirmou que assumiu a Federação em meio a uma crise do futebol no
estado. Sem recursos e com o Vitória Futebol Clube, principal time da capital, fora da
primeira divisão, o que levou à interiorização do futebol, teve que recorrer a diversos
empréstimos para viabilizar os campeonatos programados.
2.1 PROBLEMA COM A CONTABILIDADE
Inicialmente, verificou-se que jamais existiu contabilidade na Federação
de Futebol do Espírito Santo. Isso declarado pelo próprio presidente em seu
depoimento. Afirmou que, quando do pedido desta CPI de todos os documentos
contábeis da entidade, contratou os serviços de uma profissional para elaborá-los, e
pediu adiamento do prazo por mais trinta dias.
Foram, então, remetido Livros Diários originais, produzidos, no ano de
2001, pela profissional contratada. Esse fato veio explicar porque os livros diários
apresentavam, todos (de 1995 a 2000), o mesmo estado de conservação. Um outro fato
decorre dessa afirmação: todos os livros foram assinados com data retroativa pelo
presidente Marcus Antônio Vicente e pela contadora Tânia Maria Thomazini, ou seja, o
livro de 1995 possui todos os seus termos e demonstrativos assinados com a data de
2/1/1995, porém confeccionado e efetivamente assinado em 2001; o de 1996, idem; e
assim sucessivamente, até 2000. Os livros foram autenticados pelo Registro Civil das
Pessoas Jurídicas, Oficial Rodrigo Sarlo Antônio, Praça Costa Pereira, 132 – 1º Andar,
Vitória – ES.
2.2 EMPRÉSTIMOS COM PESSOAS FÍSICAS
Durante praticamente todo seu depoimento, senhor Marcus Antônio
procurou destacar a precariedade financeira da Federação do Espírito Santo. Como
conseqüência, constatou-se que a Federação recorre, freqüentemente, a agiotas, já que
bancos pedem garantias reais, e a Federação possui apenas seis salas, que valem
aproximadamente R$ 7.000,00, cada.
O pagamento feito a um desses agiotas, o senhor Gobbi, foi
contabilizado como prestação de serviços; porém, senhor Marcus afirmou
categoricamente que esse cidadão nunca prestou serviços para a Federação, uma vez
que é exportador de café; tal pagamento foi a devolução de um empréstimo feito ao
senhor Gobbi. Ocorreu, então, um erro na contabilidade contratada de última hora.
2.3 C ONTRATAÇÃO DE PARENTES E O CONSELHO FISCAL
Afirmou, também, que tem irmã como Diretora Financeira, recebendo
R$ 1.600,00 mensais, sendo a média de remuneração dos funcionários de R$ 270,00. O
senhor Marcus justificou, dizendo que, além de ser função de confiança por mexer com
dinheiro dos clubes, do INSS, muitas vezes, sua irmã trabalha mais de doze horas
diárias.
Outra incongruência administrativa é a norma estatutária, capitulada no
art. 29, que segue transcrito:
“Art. 29 O Conselho Fiscal será composto de (3) membros efetivos e (3)
três suplentes, indicados pelo presidente da FES, com mandato de (4)
quatro anos, podendo ser substituídos”
Pergunta-se: como se ter um controle interno eficaz, se é o próprio
presidente quem nomeia as pessoas que vão fiscalizá-lo? Naturalmente, as chances de
não existir controle algum é enorme. Essa total dependência do Conselho Fiscal ao
presidente da FES, pode ter gerado a inexistência de contabilidade e o déficit crônico
que tem levado à Federação a vários empréstimos. Inúmeras impropriedades
administrativas podem surgir, fruto da inexistência de um organismo de controle
independente que verifique os procedimentos adotados pelo dirigente.
É importante destacar que, apesar da administração sofrível que pôde-se
verificar, seu presidente colocou à disposição desta CPI seus sigilos bancário e fiscal de
dez anos atrás; informou, também, que não pretende se reeleger presidente da
Federação.
3. S ITUAÇÃO FISCAL /F INANCEIRA
Inicialmente, foi observado que a Federação Espírito-santense não
entregou as Declarações de Imposto de Renda de Pessoa Jurídica, referentes aos
exercícios de 1995, 1996 e 1997 e quando seu presidente foi questionado quanto à
omissão, respondeu que a Federação não declarava Imposto de Rendas, por ser isenta;
após alguns esclarecimentos e pelos argumentos apresentados pelo presidente, ficou a
impressão de que ele nem sabia que havia sido entregue as declarações relativas aos
anos de 1998 e 1999.
Confirmando as impropriedades no binômio contabilidade/declaração de
renda, foi constatado que a Federação declarou em 1998, como ativo, o montante de
R$ 18.000,00, enquanto que o valor constante do Livro Diário é de R$ 35.000,00; já em
1999, o valor declarado foi nulo, zero. Com relação ao faturamento, foi declarado um
faturamento de R$500.000,00; recorrendo-se ao livro contábil, chegou-se a R$
750.000,00. Também não houve explicação para o não recolhimento do COFINS.
O senhor. Marcus fez questão de afirmar que está em dia com as
parcelas do REFIS, porém, deixou bem claro, que a dívida com o INSS, é bastante
antiga, de mais de vinte anos.
A Federação recebe um montante do Governo do Estado, que se refere à
prestação de serviços dentro do programa estadual “Dinheiro Vivo”. Há um contrato,
que deveria ser fiscalizado pelo Tribunal de Contas do Estado, que estabelece as
obrigações da Federação dentro desse programa. Segundo o presidente da Federação,
foi graças a esses recursos que puderam realizar o campeonato do corrente ano. Como
houve demora do estado no pagamento à Federação, tiveram que fazer empréstimos a
empresas de Factoring, segundo o presidente, apreciados e aprovados pela diretoria.
Essa análise panorâmica da situação fiscal e financeira da Federação do
Espírito Santo, mais uma vez deixa claro a necessidade de uma reestruturação
administrativa, criando uma contabilidade eficiente, controle internos capazes de
detectar incorreções, a fim de que erros crassos, como os relatados acima, não venham
a se repetir.
4. RELAÇÃO COM A CBF
A Federação Espírito-santense recebe normalmente o auxílio mensal da
CBF; alguns repasses maiores, em 98 e 99, teriam sido para ajudar os times do ES a
disputarem o campeonato brasileiro, séries B e C; também para ajudar no campeonato
do estado, em suas rodadas decisivas. Seu presidente prometeu entregar, na semana
seguinte ao depoimento, todos os documentos comprobatórios dos gastos. Porém,
quatorze dias após seu depoimento, nada relacionado às questões sem resposta havia
dado entrada na Secretaria desta CPI.
Apenas para explicitar o bom relacionamento com a CBF, o presidente
da Federação Espírito-santense foi vice-presidente daquela Confederação, entre os anos
de 1995 a 2000; em maio de 1995, viajou com a Seleção Brasileira principal para Israel,
como chefe de delegação, oportunidade em que recebeu a quantia de U$ 100,00 por
dia, durante uma semana. Chefiou também a delegação da Seleção Sub-17, em viagem,
no ano passado, para Inglaterra; recebeu U$ 150,00 por dia.
O gráfico abaixo demonstra as doações realizadas pela CBF, entre 1998 e
2000:
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/2000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/99
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MARÇO
70.000
60.000
50.000
40.000
30.000
20.000
10.000
0
JAN/98
R$
MAIO
DOAÇÕES DA CBF PARA A
FEDERAÇÃO DE FUTEBOL DO ESPÍRITO SANTO
1998 - 2000
MESES
Pode-se perceber, com facilidade, que houve um aumento sensível de
doações entre agosto e dezembro de 1998, período eleitoral. Esta Comissão tem
confirmado a existência de um esquema de doações eleitorais realizado pela CBF (ver
Capítulo VIII). Algumas federações admitiram receber recursos para essa finalidade,
com o apoio de Ricardo Teixeira, mesmo com os repasses realizados por meio das
federações, e não diretamente aos candidatos. Com isso,
No caso da Federação capixaba, há indícios de que esse procedimento
tenha sido utilizado, como será visto a seguir.
5. C ONTRATOS COM TV
6. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL
É necessário destacar que o senhor Marcus foi vereador, em seguida,
prefeito por duas vezes, em sua cidade natal Ibiraçu-ES. Em janeiro de 1997, chegou à
Câmara Federal, reelegendo-se em 1998. Em maio do corrente ano, após prestar
depoimento a esta CPI, deixou o mandato de Deputado Federal, para assumir uma
Secretaria no Governo do Estado do Espírito Santo.
Durante seu depoimento, afirmou, por diversas vezes, que nunca recebeu
nenhum auxílio da CBF para sua vida política; poderia ter recebido, porque acha que é
legal; se fosse o caso, teria prestado conta ao Tribunal Regional Eleitoral. Também foi
categórico em afirmar que não recebeu nada da Federação Espírito-santense, nem doou
nada a ninguém; segundo ele, “a Federação, sim, estaria precisando de doações”.
Sobre dois cheques, emitidos pela Federação, nominais ao presidente
Marcus Vicente, no valor de R$ 10.000,00 e R$ 12.756,22, explicou que tinha sido o
avalista de dois empréstimos: o primeiro a Luciano Gobbi, e o segundo a Antônio
Cavaliere. Os cheques teriam saído nominais ao presidente, por ele ser o avalista, e
porque os credores teriam preferido receber os valores em dinheiro.... Soa estranho
alguém querer receber uma quantia relativamente alta, em espécie...Porque, então, a
Federação não pôde, ela própria, sacar o total e pagar os credores? Apesar das
explicações, esta Comissão não se convenceu da necessidade desses cheques terem sido
emitidos nominais ao seu presidente.
O senhor Marcus também se comprometeu a enviar à Comissão os
comprovantes dessa operação, o que não ocorreu.
A Federação recebeu um auxílio da CBF, no valor de R$ 50 mil, no dia
11/9/1998. No mesmo dia, a Federação emitiu o cheque 011.736, do Banco Real,
também de R$ 50 mil para um favorecido desconhecido, de acordo coma contabilidade
entregue pela Federação. Pelo Livro Diário da entidade, consta “Pgto. Verba (CBF) CF.
Ch. 011.736”.
O Banco Real informou a esta CPI que o favorecido do cheque 011.736,
da conta corrente da Federação do Espírito Santo é o senhor Adauto Gonçalves
Pinheiro. Perguntado sobre esse cheque, o senhor Marcus Vicente respondeu:
“O SR. DEPUTADO LÉO ALCÂNTARA – O senhor conhece,
V.Exa. conhece o senhor Adalto Gonçalves Pinheiro?
O SR. DEPUTADO MARCUS VICENTE – Adalto Gonçalves
Pinheiro é o empresário, salvo engano... Não. Adailton é Diretor da
Federação.
O SR. DEPUTADO LÉO ALCÂNTARA – Adailton
Gonçalves Pinheiro?
O SR. DEPUTADO MARCUS VICENTE – Adalto não!
O SR. DEPUTADO LÉO ALCÂNTARA – Isso!
O SR. DEPUTADO MARCUS VICENTE – Ele é diretor da
federação.
O SR. DEPUTADO LÉO ALCÂNTARA – Eu faço essa
pergunta por que um dos cheques V.Exa. recebeu, aliás, perdão, a
Federação Capixaba recebeu 50 mil da CBF no dia 11 de setembro. E
nesse mesmo dia, a Federação emitiu um cheque para o Sr. Adailton
Gonçalves Pinheiro. A título de que teria sido esse cheque?
O SR. DEPUTADO MARCUS VICENTE – Com certeza foi
para cobrir despesas de uma das equipes, que eu não me lembro qual, que
eu vou mandar os comprovantes para V.Exa, semana que vem,
disputantes do Campeonato Brasileiro da Série C ou também para
pagamento de outras despesas relativas ao Campeonato Estadual daquele
ano.
O SR. DEPUTADO LÉO ALCÂNTARA – Eu gostaria que
V.Exa., se pudesse, mandasse ainda esta semana, porque o nosso prazo
é exíguo para apresentar o relatório.
O SR. DEPUTADO MARCUS VICENTE – Não, vamos fazer
todo o possível.”
Não foi recebido, por esta CPI, documento que justificasse a despesa de
R$ 50 mil com qualquer clube. Apenas, foi mantida a informação do que já teria sido
contabilizado pela Federação.
Com isso, surgem indícios de que os R$ 50 mil doados pela CBF não
tenham sido, de fato, utilizados com finalidades estatutárias.
6. C ONTRATO COM TELEVISÃO
Consta, na documentação enviada à CPI pela Federação do Espírito
Santo, um contrato com a Gazeta do Espírito Santo Rádio e TV Ltda. Conforme o
ofício de encaminhamento, teria sido o único contrato com emissoras de rádio e
televisão, assinado pela Federação. Este contrato tem como objeto apenas o jogo da
final do campeonato do ano passado, entre o Serra Futebol Clube e o Desportiva
Capixaba. Chamou-nos atenção o valor irrisório do contrato: R$ 300,00 a ser rateado
entre os finalista e a Federação.
A cláusula décima desse contrato traz o compromisso da Federação em
negociar, prioritariamente, com a TV Gazeta as transmissões dos jogos dos
campeonatos dos anos de 2001 a 2004. Conforme deixou claro o presidente da
Federação em seu depoimento, esse possível contrato com a TV Gazeta é que dará uma
sobrevida ao Futebol no Espírito Santo.
Mais uma vez, restou comprovada a dependência financeira do futebol
aos interesses comerciais, dentre esses, e com maior força, o interesse televisivo.
7. RELAÇÃO COM OS CLUBES
8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DE FUTEBOL
Não se obteve informações relativas a empresários de futebol.
9. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES
GOIÁS
1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DA FEDERAÇÃO
A Federação Goiana de Futebol é uma sociedade civil de direito privado
para fins desportivos, com jurisdição em todo o estado de Goiás, constituída pela união
das Ligas e Associações que lhe são filiadas.
Tem como seu presidente Wilson da Silveira Pereira, que, interrogado
por deputados membros desta CPI, em 09/05/2001, afirmou que a diretoria não é
remunerada e que ele é juiz aposentado, empresário na área do álcool e do turismo.
2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA
A Federação Goiana não enviou a esta CPI os documentos contábeis
solicitados. Quando lhe foi perguntada a razão desse procedimento, o presidente
informou que, ao participar de uma reunião em Manaus, onde se encontravam vários
presidentes de federações, em Manaus, lá encontrou um advogado, levado por
Eduardo Viana, da Federação do Rio de Janeiro, que o convenceu da
“inconstitucionalidade da criação de uma CPI com relação ao futebol” e que, posteriormente, por
telefone, acabou convencido por Eduardo Viana de que nada mais seria necessário
encaminhar à CPI.
A documentação bancária, que é recebida através do Banco Central,
também veio incompleta no que se refere ao BEG – Banco do Estado de Goiás, tendo
chegado apenas os extratos de contas, sem as cópias dos documentos bancários
correspondentes. Esse fato foi, inclusive, motivo de questionamento feito ao
presidente, no sentido de se teria ele atuado junto ao Banco para que esse não enviasse
a documentação, o que foi negado.
2.1 CONTINUISMO
O atual presidente, Wilson da Silveira Pereira, foi vice-presidente da
Federação de 75 a 78 quando saiu para assumir a presidência de clube de futebol, sendo
novamente vice em 88. Assumiu a presidência no final desse mandato por seis meses e,
em 91, foi eleito presidente, permanecendo até os dias atuais. Tem previsão de
encerramento do mandato atual em 2002 quando completará 12 anos à frente da
federação.
2.2 N EPOTISMO
Durante o depoimento prestado a esta CPI em Goiânia, o próprio
presidente afirmou que tem dois parentes trabalhando na Federação.
2.3 C ONSELHO F ISCAL - ELEIÇÃO
O Conselho Fiscal da federação é eleito conjuntamente na chapa do
presidente. Não há a devida isenção necessária para o trabalho desse Conselho. Essa
situação é encontrada em todas as entidades estaduais examinadas e, principalmente, na
CBF. O presidente da Federação Goiana descreveu bem esse procedimento eleitoral,
ratificando tratar-se de uma prática normal no futebol de todo o Brasil:
“Sim, eu disse para o senhor. Se não é a forma eficiente, é a forma
normal que se faz no futebol de todo o Brasil, eu tenho a impressão de
que ... Eu já disse que nós temos um estatuto arcaico, mas é o futebol
brasileiro, infelizmente ou não, é assim. Então, sempre foi feito assim,
todas as eleições já vai a chapa, de um lado ou de outro, com os seus
fiscais.”.
2.4 CBF REPASSA R$ 63.920,00 A JAIME FERREIRA DE OLIVEIRA N ETO E R$
195.500,00 A W ILSON DA SILVEIRA PEREIRA
Jaime Ferreira de Oliveira Neto é o vice-presidente da federação para
quem o presidente endossou um cheque que acabara de receber da CBF destinado à
Federação, no valor citado, “para ressarcir dos débitos que ele já havia feito,...”. O saque foi
efetuado no Rio de Janeiro enquanto o presidente se encontrava naquela cidade,
conforme cópia do cheque (Anexo 03, Pasta 17).
O presidente, em pessoa, sacou no caixa do banco pelo menos mais dois
cheques oriundos da CBF para a federação: um de R$ 100.000,00, em dezembro/98 e
outro de R$ 95.500,00 em janeiro/99, conforme seu depoimento em 09/05/2001 e
cópias dos cheques (Anexo 03, Pastas 17 e 24).
3. S ITUAÇÃO FISCAL , FINANCEIRA E CONTÁBIL
A análise fiscal da federação não pôde ser completa em virtude das
manobras que a entidade goiana realizou para não enviar a documentação contábil,
dentre outras, conforme solicitado por esta CPI. Vale salientar que, durante
depoimento em audiência pública realizada em 09/05/2001, em Goiânia, quando não
conseguia responder satisfatoriamente às perguntas e atender aos pedidos de
explicações formuladas pelos deputados, o presidente fazia seguidas promessas de
envio de documentos que comprovariam as suas afirmações.
Assumido tal compromisso, eis que, no dia 22/05/2001, foi recebido um
expediente da Federação, com data do dia anterior, onde consta: “Conforme prometido por
mim... , encaminho a Vossa Excelência os documentos comprobatórios dos questionamentos realizados
naquela oportunidade, como segue:”. Em seguida relaciona uma série de documentos que
nada acrescentaram ou esclareceram com relação aos fatos inquiridos anteriormente,
configurando-se no envio de uma papelada inútil. Um exemplo típico foram os livros
contábeis. Estava constando da relação dos documentos enviados a cópia do livro
DIÁRIO, ano base 1998.
Essa cópia, no entanto, se resumia a quatro folhas, duas das quais eram
tão somente: o “Termo de Abertura” e o “Termo de Encerramento” (Pasta Federações
Centro-oeste, Vol 04). Assim, o expediente termina com o fechamento: “Certo de ter
cumprido com o prometido, subscrevo-me mui atenciosamente.” A seguir, alguns aspectos que
merecem comentários quanto à situação fiscal, financeira e contábil.
Foi verificado, em documentos de posse desta CPI, uma denúncia do
Ministério Público Federal, Procuradoria da República em Goiás, de 06/05/97, à
Justiça Federal, contra Wilson Silveira Pereira, presidente da Federação. Lá estão
tipificados crimes contra a Previdência Social, consubstanciados no desconto, quando
do pagamento de salários, férias e outros direitos de empregados da federação, sem
efetuar os repasses, havendo a apropriação dos mesmos. Essa conduta se deu de 1990
até 1994, sendo que, em 1994, ainda houve uma apropriação de parcelas retidas de
clubes referentes a partidas de futebol realizadas (Pasta Federações Centro-oeste, Vol
04).
A Federação Goiana tem uma dívida com o INSS de R$ 715 mil de saldo
de parcelamento do REFIS, efetuado em 25/04/2000 (Anexo 09, Pasta 01 - Fiscal).
Declarou ao Imposto de Renda, ano base 1998, uma receita de R$
266.575,64 proveniente de venda de bens e ou da prestação de serviços. O presidente,
no entanto, não soube explicar a origem desses recursos. Em 1999, recebeu de doações
e subvenções R$ 3.166.000,00, fato que também não foi explicado pelo presidente,
admitindo ter sido o montante de recursos patrocinado pelo governo do estado com
referência a um “campeonato de prêmios”, repassados aos clubes, do qual a federação
ficaria com 10%.
Ao ser inquirido por esta CPI a respeito de cheques sacados em espécie,
o presidente forneceu uma explicação onde, pelas suas palavras, ficam caracterizadas a
intenção e os artifícios utilizados para burlar o INSS:
“O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – Em 25/11/99 foram
depositados, na conta da Federação, o valor de 240 mil reais. No dia
30/11/99, todo esse dinheiro foi sacado em espécie. Por que esse
procedimento?
O SR. WILSON DA SILVEIRA PEREIRA – Esse é aquele
que eu disse ao senhor, eu recebi na verdade 100 mil, no dia 1º/12, e
depois mais 95 mais 15, no dia 8/1. Esse é o valor que foi repassado
para complementar, conforme o meu relatório, que está sendo apresentado
a vocês imediatamente sobre o campeonato brasileiro de futebol, que foi a
sua totalidade que vocês vão observar a legalidade, a honestidade e a
seriedade desse descompromisso com toda a documentação e que tudo é um
valor realmente justificável.
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – O senhor já disse, quem
a gente...
O SR. WILSON DA SILVEIRA PEREIRA – E esse valor,
complementando ao senhor, nós temos que buscar realmente em espécie, eu
não podia pôr na nossa conta, era ameaça do INSS de nos bloquear, aí
eu estava perdido. Então, foi feita essa razão.”
Segundo o presidente da entidade goiana, a federação é proprietária de
onze salas na Galeria Tocantins, alugadas por R$ 220,00 cada uma. Essa renda de
alugueis não consta expressamente em nenhuma das declarações de renda às quais
tivemos acesso: anos base 1997, 1998 e 1999. A sonegação foi admitida pelo presidente
que, como sempre misturando assuntos ou falando sobre o que não lhe foi perguntado e
não esclarecendo o que lhe é pedido, assim se expressou:
“Eu até liguei pra federação e consultei lá, ele não recolhia parece alguma
coisa de Imposto de Renda. E eu tinha a impressão também que
realmente nunca foi recolhido isso. Então, há essa deficiência. Há uma
série de erros dentro da própria federação, de administração, que ela vem
há anos assim. Então, eu acho que... eu tava vendo os estatutos arcaicos,
os estatutos que não dão condições de nada. A isenção da federação,
alguém nos disse da contabilidade que era isento dessa declaração...”
4. RELAÇÃO COM A CBF
Com relação à CBF, pode-se afirmar que existe um entrelaçamento muito
forte entre a federação Goiana e a CBF e entre os seus dirigentes.
A partir de cheques emitidos pela CBF, verificou-se que a federação
Goiana recebeu daquela os seguintes valores: R$ 100.080,00 em 1996, R$ 178.920,00
em 1998, R$ 175.500,00 em 1999, 103.924,00 em 2000. Em 1997, conforme
contabilidade da CBF, ela fez repasses de R$ 230.000,00 para a Federação Goiana. Na
rubrica referente a doações e subvenções, porém, há registro de apenas R$ 15.000,00,
dado verificado na declaração de renda daquele ano obtida através da Receita Federal.
DOAÇÕES DA CBF PARA A
FEDERAÇÃO GOIANA DE FUTEBOL
1998 - 2000
R$
250.000
200.000
150.000
100.000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/2000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/99
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
0
JAN/98
50.000
MESES
Fonte: Contabilidade CBF
Quando inquirido por esta CPI, o presidente discordou dos números,
afirmado terem sido os repasses em 1997, na realidade de R$ 125.000,00, o que lhe foi
mostrado que, mesmo assim, o valor seria muito maior do que os R$ 15.000,00
registrados e acrescentou, na hora, o deputado:
“O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ –Foi quanto o
senhor declarou. E nós voltamos àquela questão de que existem duas
vidas: uma verdadeira, na administração da federação, e uma fictícia. A
fictícia é a que vai pro papel, a fictícia é que é fiscalizada pelo Conselho
Fiscal, a fictícia é a que a sociedade toma conhecimento. Em
contrapartida, existe uma realidade concreta que ninguém toma
conhecimento. Esse é o caminho mais rápida pra catástrofe que tem hoje
administrativa no futebol. Você criar uma peça de ficção, você colocar
uma coisa, como o presidente que o antecedeu aí disse que ele pensava até
que ele podia colocar qualquer informação que não tinha problema,
porque não pagava Imposto de Renda. Na verdade, é exatamente por
não pagar é que deveria se ter a exigência, até a exigência moral, de que
as informações fossem verdadeiras. E as suas informações não são
verdadeiras.”
O presidente, durante o seu depoimento, por várias vezes reconheceu ter
recebido ajuda de CBF, seja para pagamento de 13º salário, ou até na forma de veículo,
a exemplo de um Tempra 1997 que teria custado à CBF R$ 25.000,00 e que, em
dezembro/98, teria sido vendido, conforme recibo existente, por R$ 15.000,00, à
Federação Goiana. Wilson da Silveira Pereira, porém, definiu a operação com esse
veículo como tendo sido uma doação da CBF. Esse carro, em 2001, ainda se
encontrava em nome da CBF. O presidente ainda informou estar reclamando da CBF
um carro novo, tendo se dirigido à essa Confederação, nesse sentido:
“Eu, este ano, procurei ao Marco Antônio, pedi a ele: olha, eu preciso
renovar o carro, preciso que vocês me troquem o carro, eu dou o carro de
volta e vocês me dão um carro novo. ... Então, eles falaram assim: Olha,
o senhor vende esse carro aí e vê o que você pode fazer. ... Eu não sei se
esse carro já foi vendido, eu mandei realmente colocá-lo à venda, mas eu
tenho aqui toda a documentação que esse carro pertenceu, até este ano, até
há quinze dias ele estava em nome da própria CBF, e não da Federação
Goiana de Futebol. Isso aqui foi uma doação realmente da CBF à
Federação, e o carro não tem mais condições, depois de quatro anos de
tráfego, de rodagem, ele não... Então, ele estava pedindo que eu mandaria
a eles e eles me mandariam um novo. Aí, não teve condições de fazer,
depois da dificuldade de CPI também, tudo agora é CPI, então, ficou por
elas. Não vale 15 mil mais o carro, pela consulta que fiz no mercado.”.
Quando do depoimento perante esta CPI na cidade de Goiânia, o
presidente se alongou falando sobre outros cheques recebidos da CBF em 1998 em
benefício da Federação. Reconheceu que um de R$ 63.920,00 foi endossado por ele e
depositado na conta particular do vice-presidente, Jaime Ferreira de Oliveira Neto,
“para ressarcir dos débitos que ele já havia feito,...”. Os demais valores recebidos, pelo menos
em 98/99, também nunca entraram nas contas da federação e, pelo menos, dois
cheques foram sacados em espécie pelo próprio presidente nos valores de R$
100.000,00 e de R$ 95.500,00, entre dezebro/98 e janeiro/99. As razões, conforme
explicações do presidente, Wilson da Silveira Pereira, seriam, na melhor das hipóteses,
fugir das obrigações fiscais, conforme as palavras do presidente:
“Então, esse valor, vocês, sei que vão perguntar porque que ele veio.
Fomos buscar em dinheiro e não trouxemos para cá ou não jogamos na
conta de ninguém. Esse dinheiro não foi gasto, a não ser nos
investimentos do Campeonato Brasileiro de Futebol Feminino. Não foi
jogado na conta porque a Federação na época tinha ameaças e agressões
por parte de um candidato de oposição a nós, que o INSS iria nos criar
problema. E eu tinha realmente uma ação do INSS. Nós cometemos um
erro, porque o INSS a Federação deve há muitos anos, vem sendo rolada
a dívida. E às vezes, pelas dificuldades, às vezes nós deixamos de pagar
um... fazer um pagamento ou outro, e vêm as pendências. A gente vai
sempre renovando, renovando, e sempre aumentando esses valores.”
Essa explicação não procede, pois, pouco depois, sem ter havido
qualquer acerto com o INSS, foram depositados em conta corrente da Federação no
BEG valores muito mais altos do que aqueles que estavam sendo questionados,
totalizando R$ 3.000.000,00, entre maio e setembro de 1999 (Anexo 09, Pasta 01 –
Sigilo Bancário). Eram recursos provenientes de contrato com o Governo do estado de
Goiás para a promoção de uma campanha pela exigência da nota fiscal por parte do
consumidor.
5. C ONCLUSÕES
O exame das contas da Federação Goiana de Futebol leva à conclusão de
que a entidade é mal administrada. O presidente desconhece, ou faz demostrar isso,
dados importantes relativos à entidade, tais como receitas, despesas, etc. E trata-se de
uma federação comandada pela mesma pessoa há mais de dez anos.
Não se vislumbra aqui os princípios básicos constitucionais da
moralidade, legalidade e impessoalidade.
6. RECOMENDAÇÕES
Alguns fatos devem ser imediatamente submetidos a uma investigação
minuciosa por parte das instituições competentes, tendo em vista a existência de
indícios mais do que suficientes para se crer em prática de atos ilícitos. São
apresentados, a seguir, algumas recomendações:
1. que seja feita uma auditoria na Federação Goiana, procurando-se, entre
outros, identificar os motivos da não contabilização dos recursos oriundos da CBF e a
real razão pela qual os recursos eram recebidos no caixa pelo presidente ou pelo vice;
2.. encaminhar ao Ministério Público cópia deste Relatório e dos anexos
referentes à Federação Goiana de Futebol, Anexo 09, duas pastas, incluindo-se, ainda,
os documentos relativos a entidade recebidos por esta CPI.
Na área administrativa, podem ser salientados os seguintes aspectos e as
correspondentes recomendações:
a) promover a revisão dos estatutos da Federação, especialmente no que
diz respeito às atribuições e à escolha/eleição dos membros do Conselho Fiscal;
b) denunciar ao Conselho Federal de Contabilidade, dando-lhe
conhecimento dos procedimentos contábeis adotados pela Federação;
c) comunicar à Receita Federal as irregularidades verificadas nas
declarações do Imposto de Renda dos anos recentes e recomendar uma fiscalização
severa nas contas da entidade, e de seus dirigentes.
Sugere-se, por fim, que seja decretada a intervenção na Federação Goiana
de Futebol, com base no art. 8, do Estatuto da CBF.
Sugere-se ainda que o MPF investigue a regularidade da atuação do
Banco do Estado de Goiás.
MARANHÃO
1. NATUREZA JURÍDICA/ESTATUTÁRIA DA FEDERAÇÃO
A Federação maranhense não encaminhou para a CPI os estatutos da
entidade. Pelas declarações de renda apresentadas, percebe-se que natureza jurídica da
entidade é de uma associação civil de direito privado, sem fins lucrativos.
De acordo com seu presidente, os dirigentes não são remunerados.
Como será verificado a seguir, o presidente sacou cheques destinados à Federação para
uso próprio. Uma verdade ficou clara para esta Comissão: o uso, ilimitado, dos
dirigentes da entidade como propriedade suas, por meio da qual se enriquecem, se
candidatam a cargos eletivos utilizando-se da estrutura e das oportunidades de aparecer
na imprensa em geral que dá o cargo.
No caso em questão, há indícios muito fortes de que o presidente
maranhense tenha se enriquecido às custas do cargo ocupado. Não se pode crer em
crescimento patrimonial de alguém que desde os dezoito anos milite na Federação e
que não seja remunerado.
O jornalista do Maranhão, Herbert Fontenele Filho, em depoimento à
CPI da Bola, ocorrida em 1994, na Assembléia Legislativa daquele Estado (que será
tratada a seguir), ao ser questionado a respeito do cargo de presidente de federação
estadual de futebol, afirmou que:
“Eu até agora não consegui entender porque eles se apegam a
esse cargo., já que recebem críticas, é difícil de administrar, criticados
sempre. Mas todos eles querem se perpetuar. O Presidente da Federação
Carioca vai fazer agora 24 anos, teve um em Pernambuco que passou
30, João Havelange vai para 24 anos na FIFA, agora. O voley do
Brasil deu uma guinada quando houve uma mudança de direção da
Confederação do Voley. Não é só no Maranhão, os presidentes das
Federações no Brasil todo se reelegem. Esse presidente agora da
Federação do Maranhão, ele modificou o Estatuto e ampliou o mandato
dele, prorrogou por mais um ano, para coincidir com a eleição do
Ricardo”.
É o que ocorre no Maranhão. O presidente atual é acusado de ter
adquirido patrimônio significativo, até empresa em São Paulo, sendo, por tantos anos,
dirigente da entidade, não remunerado.
Não há dúvidas, portanto, de que a natureza jurídica da Federação
maranhense seja de uma associação civil, sem fins lucrativos, com direito a alguns
benefícios da lei, desde que preenchendo todos os requisitos legais. Essa entidade,
nesse ponto, vem infringindo a lei em muitos aspectos, o que fará com que ela tenha de
arcar com o ônus de se utilizar dos benefícios de uma entidade sem fins lucrativos e
realizar atividades, omitir informações ou efetuar despesas não permitidas para esse tipo
de entidade.
2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA
A Federação Maranhense de Futebol é dirigida pelo senhor Carlos
Alberto Ferreira (CPF 075.295.543-87) desde março de 1991, completando dez anos,
em 2001. Está, no entanto, a serviço da entidade desde os seus dezoito anos de idade.
Antes de ser presidente, foi vice-presidente diversas vezes. Tudo isso faz com que
esteja há mais de trinta nos na Federação maranhense.
A Federação não encaminhou os dados referentes às eleições na entidade,
conforme exigido por esta Comissão, por meio do Requerimento n. XXX/0X, de
YY/YY/YYYY.
Pelos depoimentos obtidos em 25/1/2001 e em 11/5/2001, pôde-se
observar a extensão da desorganização administrativa da Federação. Não há
contabilidade e as declarações de renda não têm valor algum. O presidente até
confirmou ter sacado um cheque na boca do caixa e não ter contabilizado esse valor.
Na CPI maranhense da Bola, o jornalista Herbert Fontenele Filho
afirmou que a Federação tem a “estrutura mínima possível” e se se procurar
documentos arquivados não se encontra, pois não existe o mínimo de organização.
Segundo Fontenele,
“somem documentos importantes com muita facilidade. O cara
mete a mão no balcão, já sumiu súmula de jogo aqui, decisivo, é só meter
a mão no balcão, botou debaixo do braço, levou, ficou por isso mesmo”.
E continua Fontenele: “Ainda por cima da mesa os papéis, rolando, é assim. Não
tem ar condicionado, não tem gabinete, não tem porta, não tem chave, não tem gaveta trancada, não
tem sala no Tribunal, não tem mesa, não tem carteira.”
Por volta de 1990 e 1991, a Federação Maranhense de Futebol organizou
um bingo para arrecadar recursos para os clubes maranhenses 19. Ela contratou dois
empresários de Santa Catarina para realizar os eventos. Foram impressas 80.000
cartelas, naquela ocasião.
19
Depoimento do jornalista José Raimundo Rodrigues à CPI da Bola, em 5 de maio de 1994.
De acordo com o jornalista José Raimundo Rodrigues, hoje Deputado
Estadual maranhense, em depoimento na CPI da Bola, no dia 5 de maio de 1994, os
sorteios dos bingos foram gravados com 72 horas de antecedência e passados na rede
de TV Mirante, em diversas cidades, simultaneamente, por meio de fitas gravadas e
combinadas, como se tudo estivesse ocorrendo ao vivo. Foi feita a gravação na quintafeira à noite e passada a fita na TV no domingo, de manhã. Não houve dúvidas da
fraude, pois naquela época nem havia canalização (via Embratel) para a transmissão ao
vivo que possibilitasse isso ocorrer. Para ele, que denunciou em seu programa de TV,
foi um dos crimes mais graves praticados pelos dirigentes da Federação.
O bingo foi, para José Raimundo, “um jogo de cartas marcadas, compactuado
pela TV Mirante”. Esse assunto, na TV Mirante, segundo o jornalista era tratado pelo
senhor Guy Sobral, diretor geral. As gravações teriam sido feitas na “calada da noite” e
que “todos já sabiam, entre Federação e organizadores, quais as cartelas vencedoras”. “As cartelas
(“vencedoras”) foram retiradas de circulação e foram colocadas à venda (as restantes) até no sábado”,
véspera do “sorteio”, “em todo o interior do Maranhão, nas agências dos Correios”. Segundo
ele, a armação feita pela Federação foi objeto de um inquérito policial, aberto pelo
delegado Sebastião Justino, no qual o próprio jornalista depôs, sendo que, porém, não
resultou em nada.
Para o jornalista José Raimundo Rodrigues, os bingos foram “crimes contra
a economia popular dos mais graves” pois nem os prêmios foram entregues e não se sabe do
destino do dinheiro apurado. “Foi a coisa mais acintosa que já vi uma entidade fazer e não
acontecer absolutamente nada!”.
Nos depoimentos dados à CPI da Bola, verificou-se que o principal
responsável pelo golpe foi do então vice-presidente da FMF, Carlos Alberto Ferreira,
que assumira o presidência, com o afastamento de Mário Carneiro.
Quanto a Carlos Alberto Ferreira, este foi completamente desmascarado
por esta CPI. Além de não convencer a Comissão sobre seus relacionamentos com os
crimes de falsificação de documentos e de registros, do tráfico de menores para o
exterior, não soube explicar, dentre muitas outras coisas, como descontou um cheque
da CBF em nome da Federação na boca do caixa de uma agência no Rio de Janeiro, em
1996. Sobre isso respondeu que fora para efetuar alguns gastos e que a Federação não
podia ter talões de cheques, quando foi contestado pela CPI com a comprovação de
que a FMF teria movimentado conta na Caixa Econômica Federal, agência Conceição
dos Mulatos, em São Luís.
Os números apresentados pela Comissão quanto ao repasse de recursos
da CBF para a Federação chocaram-se com as informações dadas por Carlos Alberto
Ferreira. Para o dirigente, os valores enviados pela CBF eram em forma de auxílios, de
doações. A contabilidade da CBF, ao contrário, vem registrando esses repasses, em sua
maioria, como empréstimos e não como auxílio.
3. SITUAÇÃO FISCAL
Após a quebra dos sigilos bancário e fiscal da Federação maranhense,
algumas das federações, incluindo a do Maranhão, impetrou mandado de segurança,
procurando impedir que esta Comissão recebesse as informações das instituições
bancárias e da Receita Federal. De acordo como presidente Carlos Alberto Ferreira,
isso foi feito para atender a um pedido de um presidente de Federação e que não
buscava obstruir os trabalhos da CPI.
Com relação a essas doações, questionado sobre o recebimento de um
cheque da CBF, que teve como favorecido a Federação e que o próprio presidente
havia sacado, na boca do caixa, Carlos Alberto Ferreira não soube explicar o porquê do
saque:
“O SENHOR DEPUTADO EDUARDO CAMPOS- (...) Onde
foi parar um cheque de dezoito mil reais que foi passado do Banco
Bamerindus, o cheque de nº 136036 nominal a Federação Maranhense
de Futebol, sacado na agência Conde de Bonfim no Rio de Janeiro no
caixa, em espécie pelo o senhor, no dia dezessete de janeiro de 1996?
O SENHOR CARLOS ALBERTO FERREIRA- Ele veio para
a Federação da despesa que eu paguei determinadas despesas, eu recebi
lá e como para botar o cheque para ele não voltar para cá, eu ia ter que
esperar quatro ou cinco dias úteis, e eu saquei.
O SENHOR DEPUTADO EDURDO CAMPOS- E nunca
registrou esse dinheiro na contabilidade da Federação?
O SENHOR CARLOS ALBERTO FERREIRA - Não.”
Há a necessidade, portanto, de se fazer com que o presidente da
Federação devolva ao caixa da entidade o valor retirado sem comprovação, que,
aparentemente, foi utilizado em proveito próprio. E esse é apenas um caso apurado;
por falta de exame da contabilidade da entidade, pode-se levantar a suspeita de que
outros casos possam ter ocorrido. O Ministério Público, a quem caberá a continuidade
das investigações, poderá promover exame detalhado das contas da Federação e, com a
quebra dos sigilos bancário e fiscal dos dirigentes, em especial, do senhor Carlos
Alberto Ferreira, verificar a existência ou não de desvio de recursos da Federação para
o bolso do presidentes e diretores.
Cabe ressaltar que o presidente depôs afirmando que houve, em algum
tempo atrás, perda de documentos contábeis e fiscais da Federação, devido a um
arrombamento seguido de furto que lá ocorreu. Caberá ao Ministério Público apurar a
veracidade dessas informações, para se confirmar se não se trata de um atentado contra
a Federação, com o objetivo de ocultar informações que poderiam levar a outros
crimes.
Não se teve acesso à contabilidade da Federação, que se recusou a
atender requerimento aprovado pelo Colegiado desta Comissão. O não-atendimento
desse requerimento prejudicou o exame do quadro da contabilidade da entidade.
Aparentemente, a Federação não possui um sistema contábil eficiente, da mesma
maneira que tem controles muito deficiente de registro de atletas.
Corrobora para isso o fato de a Federação do Maranhão não ter
apresentado as declarações de renda conforme estabelece a Lei 9.532/97. A Receita
Federal encaminhou a esta Comissão dados que comprovam que a Federação não
entregou a declaração de renda relativa ao ano-calendário de 1998, que deveria ser
entregue em 1999. Além disso, as declarações entregues (ano-calendário 1997 e 1999)
contêm muitas irregularidades.
As declarações entregues em 1998 e 2000 não contêm, na verdade,
informações contábeis, ou outros dados que pudessem realizar algum exame. Elas
foram entregues totalmente em branco. Ou seja, apenas encaminharam o formulário da
Receita com dados cadastrais da Federação.
Somente essas omissões e declarações falsas certamente deverão fazer
com que a entidade maranhense tenha suspenso o benefício da isenção do imposto
sobre a renda (IR), como também da contribuição social sobre o lucro líquido (CSLL).
É o que estabelece a Lei 9532/97. Além disso, caberá à Receita calcular os tributos
devidos no período em que ficarem apuradas as irregularidades. Pelo se pode inferir do
depoimento do presidente da Federação e da condições administrativas dessa entidade,
pode-se facilmente supor que não há o recolhimento de tributos que caberiam até a
entidades isentas de IR, tais como o COFINS e o PIS.
Essas declarações fraudulentas não poderiam ser feitas sem contar com o
apoio do senhor José Ribamar Santos Barroso (CPF 237.892.393-72), contador de CRC
número 7557/03, responsável pelo preenchimento da declaração do ano de 2000 (ano
base 1999), que assina uma declaração em branco de uma entidade que, pela declaração
apresentada, não possui patrimônio, ativo, passivo, não obteve receitas nem gerou
despesas, etc.
Há, portanto, a necessidade de se considerar o contador como coresponsável, pela sonegação de informações prestadas e, possivelmente, sonegação de
tributos desde muitos anos atrás.
Certamente, nesse caso, torna-se necessário exame da contabilidade da
Federação por parte do INSS, que, por certo, também identificarão uma série de
irregularidades, dentre elas, o não recolhimento das contribuições sociais.
Outro problema grave encontrado na administração da Federação
maranhense refere-se ao registro de atletas. Como ficou provado durante a audiência
ocorrida em São Luís, entre os dias 25 e 26 de janeiro de 2001 (a audiência iniciou-se às
9 horas e somente terminou à 6 horas da manhã do dia seguinte), há inúmeras
irregularidades naquela Federação, incluindo-se falsificação de documentos, adulteração
de identidades e de registros, que serão tratados em capítulos especiais.
3.1 CONSELHO FISCAL
A Federação não possui um Conselho Fiscal adequado. Pelo o que pôde
ser apurado, diante dos obstáculos colocados pelo presidente Carlos Alberto Ferreira, o
Conselho Fiscal praticamente nem existe. Durante a CPI da Bola, o jornalista
Fontenele, perguntado sobre a existência de livro caixa, extrato de bancos, etc. advertiu
que:
“Isto é controlado por ele, mais um, que muda com facilidade, hoje é um,
amanhã é outro, sai um, entra outro, quer dizer, não tem Conselho. A CBF tem o que
eles chamam de Conselho Fiscal, que aprova as contas anualmente, e a Assembléia
Geral, que são esses Presidentes da Federação. Eles aprovam da mesma forma que
aprova aqui, faz a Ata, e pronto, e não querem saber”.
4. RELAÇÃO COM A CBF
Essa Federação é uma das unidades da CBF que menos recursos recebeu,
em formas de doações, nos últimos três anos. É o que se pode verificar no gráfico
abaixo. A entidade recebe um valor mensal fixo da CBF, em forma de um mesada, a
qual, segundo o dirigente, é gasta em despesas tanto administrativas quanto de
assistência a clubes amadores, a mais de cem ligas esportivas.
Além disso, Carlos Alberto Ferreira demonstrou forte grau de
subserviência perante Ricardo Teixeira, diante a CBF. De uma Federação que recebe
tão poucos recursos da CBF, e é tão mal atendida em termos de presença de clubes
maranhenses em torneios nacionais, aparentemente não se esperaria atitudes como
essas. A não ser que outras formas de compensação estejam envolvidas, não em
interesse público e do futebol do Maranhão.
Caberá ao Ministério Público, à Receita Federal, ao INSS, dentre outros
órgãos competentes, apurar, com mais detalhes, todos os indícios de irregularidades.
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/2000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/99
NOVEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/98
45.000
40.000
35.000
30.000
25.000
20.000
15.000
10.000
5.000
0
SETEMB
DOAÇÕES DA CBF PARA A
FEDERAÇÃO MARANHENSE DE FUTEBOL
1998 - 2000
R$
MESES
5. CONTRATOS COM TV
A Federação maranhense possui um contrato com a TV Globo para
quem transfere os direitos de transmissão dos jogos do Campeonato Estadual. Os
valores do contrato chegam a R$ XXX.XXX,XX.
6. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL
Os contextos esportivo e político estão intimamente interligados no
Maranhão. Não que isso não ocorra em outros Estados; no Maranhão, pelo que foi
percebido por esta Comissão, há um envolvimentos mútuo exacerbado.
Começando pela Assembléia Legislativa maranhense, que possui, como
seu presidente, o Deputado Estadual Manoel Ribeiro. Esse parlamentar acumula o
cargo ce presidente do Sampaio Correa, um dos três mais importantes clubes de futebol
do Maranhão com a presidência da Assembléia, cargo, este, que ocupa há mais de nove
anos.
Outros parlamentares têm participação no mundo futebolístico
maranhense, tal como o ex-Deputado, Sebastião Murad, ex-presidente do Moto Clube,
outro importante clube de São Luís.
Capítulo importante do futebol maranhense foi a CPI da Bola, que será
tratada, a seguir.
6.1 A CPI DA BOLA
MARANHENSE , DE
1994 -
UMA LIÇÃO HISTÓRICA AINDA
PRESENTE
Em 1994, foi instalada uma CPI, na Assembléia Legislativa maranhense,
destinada a apurar problemas do futebol maranhense. O principal foco das atenções foi
a própria Federação maranhense. O presidente da CI foi o então Deputado Estadual
Benedito Coroba, hoje promotor de justiça no sul do Maranhão. Dentre outros
membros se encontram os Deputados Gastão Vieira, Francisco Martins, José Genésio e
Kleber Branco. As reuniões ocorreram entre abril e maio daquele ano.
Esta Comissão, em sua audiência em São Luís, entre os dias 25 a 26 de
janeiro de 2001, procurou junto à Assembléia Legislativa do Maranhão as notas
taquigráficas ou fitas de áudio daqueles depoimentos. Houve grande dificuldade de se
conseguir qualquer informação sobre a CPI da Bola. Os funcionários da Assembléia
negavam com veemência a existência de alguma nota taquigráfica ou gravação daquelas
audiências. Tornou-se necessário contactar o ex-Deputado Coroba, por duas vezes,
para que se pudesse confirmar que as reuniões ocorrerm de fato.
Em um desses contatos, Deputado Coroba sugeriu que a CPI entrasse
em contato com o jornalista Herbert Fontenele Filho, que acompanhou bastante aquele
trabalho e poderia dar informações sobre o assunto. Questionado pela Comissão, o
senhor Fontenele negou a existência de audiências e disse que a CPI da Bola havia sido
abortada desde o início e que não teriam ocorrido audiências.
A resistência evidente dos funcionários da Assembléia só foi rompida a
partir de pedidos feito por Deputados em plena audiência e diante do fato de que
diversos Deputados confirmaram os depoimentos. Pressionados, os funcionários
apresentaram parte das notas taquigráficas e das fitas de áudio daquela CPI. Qual não
foi a surpresa da Comissão ao perceber que o primeiro depoimento, dentre os mais de
dez encontrados, foi feito prestado exatamente pelo jornalista Herbert Fontenele Filho.
O mesmo que havia negado a existência daqueles depoimentos...
Convidado a depor em nova ocasião, já em 12 de maio de 2001, durante
audiência desta CPI, em João Pessoa, o senhor Fontenele não compareceu. A única
falta percebida dentre todos os convidados.
Soube-se, inclusive, por intermédio do depoimento presidente da
Federação maranhense, que a esposa desse jornalista, a senhora Diva Maria Fontenele
era ou ainda é remunerada pela Assembléia maranhense, além de outra parente dele,
Cynthia Fontenele. O que leva a esta Comissão a crer que o jornalista Fontenele tenha
mentido para defender interesses de terceiros.
Assim, as notas taquigráficas descobertas auxiliaram a esta CPI a elaborar
questões importantes para os depoentes, como também vêm enriquecendo os trabalhos
desta Comissão. A CPI da Bola maranhense, de 994, precursora, atacou muitos
problemas do futebol que hoje são tratados pela CPI da CBF/Nike. Os Deputados que
a compunham são dignos, portanto, de louvores pela iniciativa honrada.
O mesmo não se pode dizer do grupo político que, por meio do
presidente da Federação maranhense, senhor Carlos Alberto Ferreira, entrou com ação
judicial contra a CPI da Bola, impedindo que esta chegasse às suas conclusões. Afinal, o
Poder Judiciário local admitiu a ação e permitiu que as forças contrárias às mudanças
sepultassem aquela CPI. Carlos Alberto Ferreira afirma que CPI foi usada por
Fontenele contra ele. Só que Ferreira se esqueceu de que outros depoentes também
denunciaram, com veemência, ações praticadas pelo presidente atual da Federação
maranhense, dentre eles o Deputado Estadual José Raimundo Rodrigues.
A CPI da Bola, enfim, ressurge para ficar. As notas taquigráficas constam,
em forma de anexo, deste Relatório, para exame de todos os cidadãos.
6.2 JORNALISTAS
E
CRONISTAS ESPORTIVOS -
RELAÇÕES COM PODERES
LOCAIS
As denúncias recebidas por esta Comissão foram comprovadas por meio
do depoimento do presidente da Federação maranhense, em seu segundo depoimento,
a 12 de maio de 2001. Carlos Alberto Ferreira foi claro ao afirmar que todos os
jornalistas e cronistas são remunerados pela assessoria de imprensa da Assembléia
Legislativa do Maranhão.
Esse fato pode ser corriqueiro para o maranhense, porém adquire uma
importância maior, e em nível nacional, quando se avalia a relação política e futebol. No
caso, há Deputados maranhenses que estão à frente de clubes daquele Estado. O
presidente da Assembléia, Deputado Manoel Ribeiro, é também presidente do Sampaio
Correa, um dos mais importantes clubes daquele Estado.
O fato de toda a imprensa esportiva ser remunerada pelos cofres da
Assembléia demonstra a parcialidade com que, possivelmente, ajam os jornalistas e
cronistas locais. Ao ponto de negarem fatos comprovados, como fez o jornalista
Herbert Fontenele Filho.
Além disso, há outro agravante. De acordo com o presidente Carlos
Alberto Ferreira, pelo menos três dirigentes do Sampaio Correa são remunerados pela
Assembléia. Certamente, esse fato, se comprovado, além de ilegal, não condiz coma
boa política, e, contrariará todos os cidadãos maranhenses que não são torcedores do
Sampaio, ou mesmo por simplesmente serem cidadãos e por perceberem ter seus
direitos violados. Direito como, por exemplo, de ter disponíveis informações imparciais
e isentas.
7. RELAÇÃO COM OS CLUBES
Há suspeitas fortes de que a relação da FMF com os principais clubes do
Estado seja promíscua. Os principais clubes da capital sempre estiveram presentes na
diretoria da Federação. Um dos exemplos é o senhor Antônio Cassas de Lima, que foi
conselheiro e vice-presidente do Moto Clube, e, ao mesmo tempo vice-presidente da
Federação Maranhense de Futebol.
Foram feitas muitas denúncias relativas à existência de muitas ligas
amadoras ou de pequenos clubes que foram criados com o apoio do presidente da
Federação com o intuito de que ele fosse favorecido durante as eleições.
A entidade maranhense não enviou os estatutos nem a forma pela qual se
realizaram as últimas eleições, o que fortalece a possibilidade de que sejam verídicas as
denúncias.
Há diretores da Federação que são presidentes de clubes, tal como o
senhor Emanoel dos Santos, que é o contador da entidade e presidente do clube
denominado de Boa Vontade, de São Luís. O senhor Emanoel, além disso, é
funcionário da Secretaria Estadual de Fazenda do Estado maranhense, o que pode ser
discutível do ponto de vista ético ou legal.
No caso do Americano, da cidade de Bacabal, que pertence ao
empresário Clóvis Dias, esta Comissão verificou a existência de uma relação obscura,
por meio da qual o clube maranhense se utiliza da Federação para registrar seus muitos
atletas. A irregularidade começa a partir do fato de que os jogadores quase nem vão à
Bacabal, ficando, inclusive, o presidente do clube em Fortaleza, no Ceará. A Federação
se presta, assim, apenas como local de regularizacão de documentos inidôneos, ou para
a adulteração de documentos, etc., como será tratado no Capítulo XIII específico
relativo à fábrica de gatos.
8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DE FUTEBOL
Há uma estreita ligação da Federação maranhense com empresários
ligados ao futebol. Um deles é o médico Antônio Cassas de Lima, que está sendo
indiciado por esta Comissão por crimes que vão da falsificação de documentos ao
tráfico de menores. Sobre Cassas de Lima ver capítulo XX.
Outro contato mantido com a Federação, com relativa freqüência é do
empresário Juan Figer Svirsk. Figer, ou alguém de sua empresa, a MJF, fez diversas
ligações para a Federação, para contatos telefônicos ou transmissão de faxes, durante o
mês de novembro de 1996 (ver Anexo Ligações Telefônicas de Juan Figer). Isso abre a
possibilidade de que transações de jogadores maranhenses para o exterior, ou mesmo
no País, possam estar tendo a participação de Figer em conjunto com Ferreira.
9. CONCLUSÕES , ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES
A Federação maranhense vem sendo muito mal administrada. Urge que
seja encaminhado à Secretaria da Receita Federal pedido de fiscalização nas contas da
entidade
Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao
Ministério Público Federal e ao Ministério Público Estadual.
Inciso XIII do art. 10 da Lei n. 8.429, de 18/7/1992.
Sugere-se, ainda, comunicar ao Ministério Público e à Receita Federal
sobre a possibilidade de desvio de recursos destinados à Federação e para clubes
maranhense, recursos provenientes da CBF (Ver Anexo Lista de Repasses CBF
Federações Clubes).
MATO GROSSO
1. NATUREZA JURÍDICA /ESTATUTÁRIA DA FEDERAÇÃO
Segundo Carlos Orione, presidente, que prestou depoimento a esta CPI,
em 9/05/2001, ficando registrado em notas, até 1978, chamava-se Federação
Matogrossense de Desportos, quando foram desmembradas as demais modalidades
desportivas e criadas as suas respectivas federações.
A Federação de Mato Grosso não encaminhou documentos referentes ao
seu estatuto. Diz seu presidente que participou do Fórum Norte/Nordeste em
dezembro/2000, realizado em Manaus, juntamente com uns vinte presidentes de
federações, para convencionar que se ia entrar com um mandato de segurança, no
Supremo, contra a quebra de sigilo bancário das federações.
Recebeu ofício do deputado Aldo Rebelo solicitando documentação
fiscal da entidade e que respondeu não poder atender no momento porque a Federação
estava em recesso e providenciaria tão logo fosse reaberta; entretanto sofreu
intervenção cirúrgica no início de janeiro, tendo ordenado ao seu vice-presidente o
envio dos documentos. Este, por sua vez, informou a Carlos Orione que não enviou a
documentação porque o Dr. Eduardo Viana, presidente da Federação do Estado do
Rio de Janeiro, disse que o mandato de segurança também atingia esse aspecto.
O deputado Dr. Olimpio Pires questionou se há remuneração para o
presidente da federação ao que Carlos Orione assim se expressou:
“Não senhor. Eu sou Procurador da Justiça aposentado e os meu
proventos me dão minha sustentação, como a da minha família.. E posso
dizer a V.Exa. que, até 31 de dezembro, eu pagava 3.500 reais de
imposto de renda. Passei a ser isento porque sendo portador de
cardiopatia grave eu fico isento de imposto de renda.”
Quanto ao recebimento de R$ 70 mil da Federação, alegou ser um
possível ressarcimento de despesas e que encaminharia os comprovantes o mais rápido
possível e ainda que houve período em que a Receita Federal bloqueou valores
depositados em qualquer banco, em nome da Federação, para quitação de débitos com
aquele órgão, tendo que dispor dinheiro seu para pagar despesas e admitindo retirar
dinheiro da Federação para repor o que havia colocado.
Inquirido sobre remuneração de dirigentes, pelo deputado Jurandil
Juarez, admitiu remunerar os dirigentes da Federação através de ajuda de custo, ao que
o deputado disse tratar-se de irregularidade uma vez que a entidade é sem fins
lucrativos. O depoente diz não receber remuneração mas o deputado questiona o
recebimento de dois cheques (valores de 12 e 10 mil reais) emitidos pela Federação ao
que responde:
...” Pode ter saído no meu nome, mas foi repartido, foi (ininteligível) para
a federação. A distância é muito grande. É como o senhor falar, por
exemplo, o senhor conhece o estatuto, não pode remunerar o diretor. Mas,
ninguém hoje ali se trabalhar sem remuneração. O senhor está
entendendo. A coisa mais difícil hoje é o senhor encontrar quem queira a
pessoa gabaritada que queira trabalhar de graça para a federação.
Indagado sobre um cheque de 23 mil reais, emitido em 08.02.99, da
Federação em seu favor disse não saber a que se refere; admitiu que a Federação possui
um estádio, que tem 6 a 7 funcionários, mais prestadores de serviços e que dá ajuda de
custo para os diretores que colaboram.
2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA
2.1 CONTINUISMO
A Federação Matogrossense vem sendo administrada, há 15 anos, por
Carlos Orione que disse ser membro do Ministério Público, aposentado como
Procurador de Justiça de Mato Grosso. Em 1976 recebeu convite para ser interventor da
Federação Matogrossense de Desportos permanecendo até 1980 com eleição de novo
presidente (nome não informado). Segundo Orione, foi convidado a se candidatar, e
eleito, em maio de 1986, herdando dívidas executadas que atingem a cifra de 200 mil
reais. Foi penhorado o estádio pertencente à Federação juntamente com sua área de 25
mil metros quadrados, no centro de Cuiabá. O INSS executou o presidente da
Federação em 1997 com prazo de pagamento em 24 horas; Carlos Orione penhorou,
então, uma propriedade rural e embargou a execução, o que vem rolando até os dias de
hoje.
Quanto a perpetuação do cargo, foi sugerida sua renúncia e convocação
de eleição, ao que retruca:
... “Eu vou dizer uma coisa para V. Exa. Lá em Mato Grosso, na
situação que está a federação, ninguém queria pegar a federação, a
verdade é essa. Eu estou lá segurando para manter o futebol ativo em
Mato Grosso com todos os sacrifícios possíveis, inclusive financeiro”.
2.2. P ROCESSO ELEITORAL
Indagado, Carlos Orione disse que são convocadas, para eleição, todas as
ligas (mais ou menos 70) de clubes profissionais e que as condições de registro de chapa
e de voto são informadas por edital; cada clube tem direito a dois votos: um para sua
filiação como profissional e outro como amadora; cada liga tem um voto e cada clube
amador também.
3. SITUAÇÃO FISCAL/FINANCEIRA
A Federação declarou à Receita Federal que não recolheu PIS nem
COFINS até hoje. Os valores apontados nas rubricas de 1998 (ano-base 1997) e 1998
(ano-base 1997) estão zerados. Os valores patrimoniais apontam: em 1997 - R$ 80,70
como total do Ativo, contra R$ 0,00 (zero) no total do Passivo e em 1998 – R$
1.712,36 como totais de Ativo e Passivo.
Entretanto informações quanto a Origem de Recursos , no ano de 1998,
aponta o valor de R$ 49.999,29, quando, somente a CBF remeteu, naquele ano, a
importância de R$ 142 mil. Não há informações naqueles demonstrativos (97 e 98)
sobre o estádio pertencente a Federação, pois disse Carlos Orione que o estádio existe
desde 1950 e que é de conhecimento público que é da Federação.
Questionado pelo valor recebido da CBF - R$ 50 mil, Carlos Orione
alegou toda a dificuldade em lutar na justiça pelo seu patrimônio, em lutar para manter
em dia seus pagamentos e promover competições esportivas é que somente no ano
passado contratou um contador pois não havia contabilidade montada na Federação;
era um caixa único.
O responsável técnico pelas declarações de renda da entidade é o
contador Tadafumi Takakura, CRC número 4384/MT.
Sobre o REFIS, disse ter negociado um valor próximo de R$ 400 mil
entre INSS e Receita.
Indagado sobre a não inclusão do estádio como bem da Federação em
suas declarações de renda, bem como nenhum valor de bens (zerado) e que o
patrimônio também é zero, disse não ver nenhuma infração, o estádio disse ser público e
notório que pertence à Federação e quanto aos bens:
“muitos eu comprei em meu nome, a nota saiu em meu nome; inclusive o
computador, recentemente, porque tem outras ações menores e volta e meia
poderiam ser penhorados”.
4. RELAÇÃO COM A CBF
A Federação Matogrossense recebeu mensalmente, durante o ano de
1998, a importância de 6 mil reais tendo sido elevados para 12 mil/mês em 1999 e
2000. Nos meses de: set/98 houve uma remessa a mais de 50 mil reais; dez/98 - 20,4
mil; jan/99 – 14 mil, fev/99 – 56 mil e julho/99 de 20 mil. Negou que essas remessas
tivessem sido com intenções de apoio a sua candidatura ou de Ricardo Teixeira, mas
admitiu ter pedido 50 mil a Ricardo Teixeira para ajudar alguns candidatos a Deputado
Estadual, Federal, Senador e Governador.
O gráfico abaixo mostra como foram feitas as doações para a Federação,
em dinheiro:
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/2000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/99
NOVEMB
SETEMB
MAIO
JAN/98
80.000
70.000
60.000
50.000
40.000
30.000
20.000
10.000
0
MARÇO
R$
JULHO
DOAÇÕES DA CBF PARA A
FEDERAÇÃO MATOGROSSENSE DE FUTEBOL
1998 - 2000
MESES
As respostas do presidente Carlos Orione foram as seguintes:
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – A Federação recebeu
diversas doações em 98. Como foi um ano eleitoral dentro da... Foi um
ano eleitoral dos dois lados, com eleição pra Presidente, Governador,
Senadores, Deputados e também do Presidente da Federação... Presidente
da CBF. O senhor acha que esse dinheiro foi com o intuito eleitoral?
O SR. CARLOS ORIONE – Excelência, eu recebo isso acho que
como uma ofensa, porque jamais eu iria vender o meu voto. Pela minha
posição (ininteligível) no Estado do Mato Grosso.
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – Todas as federações
receberam mais.
O SR. CARLOS ORIONE – Eu sei, mas não em compra, em troca
de voto, absolutamente.
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – Eu não estou dizendo
que é compra de voto.
O SR. CARLOS ORIONE – Eu tô entendendo V.Exa. como isso,
como fins eleitorais. Para quê fins eleitorais? Eu recebi, eu recebi da
CBF, do Dr. Ricardo Teixeira, uma importância de 50 mil reais que eu
pedi que era pra mim ajudar alguns candidatos a Deputado estadual,
federal, a Governador do Estado.
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Eu ia chegar nessa
pergunta.
O SR. CARLOS ORIONE - Então, logicamente, esse...
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Então, foi pra fim
eleitorais?
O SR. CARLOS ORIONE - Esses 50 mil foi pra eleitorais, não
meu nem dele, foi pra fins eleitorais de candidatos ligados ao futebol de
Mato Grosso, que me pediu esse...
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Eu não perguntei, eu
não perguntei se era pro senhor ou não. Eu te disse, ainda... Eu ainda
disse que era uma eleição pra Deputados, Governador, Governadores...
O SR. CARLOS ORIONE - Senadores.
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - ...Senadores e também
do Presidente da CBF.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - Aparte?
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Perfeitamente.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - É o seguinte,
Sr.Carlos, não é a sua Federação, todas as Federações, na análise que
nós fazemos, no ano de 98, aumentou a contribuição da CBF para essas
Federações. No depoimento do Deputado, do Sr. Ricardo Teixeira nós
constatamos inclusive o registro da colaboração da CBF com campanhas
eleitorais.
O SR. CARLOS ORIONE - Certo.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - Pelo estatuto há
duas interpretações e que nós vamos discutir no nos-so relatório. Há uma
interpretação, de alguns, que a CBF pode fazer isso. E há de outros,
advogados e Parlamentares, que não pode. Nós estamos nessa discussão.
Ao fazer...
O SR. CARLOS ORIONE - Eu só fiz a solicitação porque eu
fiquei sabendo realmente que lá na CBF estaria, o Presidente estaria
colaborando com algumas candidaturas.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - Pois é.
O SR. CARLOS ORIONE - Então, como esse pessoal é ligado ao
esporte, muitos foram Presidente de clubes, alguns até já participaram da
nossa administração, e eles... Só não vou declinar o nome, porque o
senhor tá vendo, eu não vou declinar o nome das pessoas pra quem eu
repassei, porque não foi em dinheiro, eu repassei em material esportivo. O
material esportivo era recolhido pelos coordenadores das campanhas, mas
eles tinham ciência do que estava fazendo.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - Então, como
Presidente do órgão, quero dizer pro senhor que, como o senhor foi
convidado, o senhor pode deixar de declinar o nome. Se o senhor tivesse
sido convocado, que foi até uma discussão que nós tivemos na Comissão
de não fazer as convocações dos Srs. Presidentes porque a gente entendia
que a colaboração pode vir sem tá convocado. Então, o senhor diz que
não gostaria de declinar...
O SR. CARLOS ORIONE – Não vou declinar.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - ...e nós da
Comissão gostaríamos muito que fosse declinado que houve colaboração
da Federação Mato-Grossense de futebol em material para alguns
candidatos no ano de 98.
O SR. CARLOS ORIONE - Com recursos oriundos que vieram da
CBF.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) - Com recursos
oriundos da CBF.
O SR. CARLOS ORIONE - A meu pedido.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha) – Obrigado pelo
aparte.
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Então, volto a repetir
que a
minha pergunta tem sentido. Quando eu disse que se esse dinheiro foi
repassado com a finalidade eleitoral.
O SR. CARLOS ORIONE - Eu vou explicar ao senhor. Eu acho
que o Dr. Ricardo Teixeira não precisava fazer, repassar dinheiro pra
outro, porque ele era candidato único. Pra que que ele ia ter gastar
dinheiro em eleição, em compra de votos? Invés de prestar uma
colaboração maior às Federações, se deu (??) várias Federações, qual é o
pecado nisso aí?
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Eu não sei, mas, às
vezes, às vezes ele poderia ter um receio que tivesse alguém, algum outro a
ser candidato. São suposições. São suposições.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – V.Exa. me
concede um aparte?
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Com muito prazer,
Deputado Jurandil Juarez.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Sob o intuito de
colaborar, eu queria esclarecer o nobre Depoente que não é uma
anormalidade fazer as doações para campanhas eleitorais. Existe uma lei
que disciplina isso.
O SR. CARLOS ORIONE - Certo.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Isso não impede.
Eu recebi, como Deputado Federal, eu recebi doações para a minha
campanha.
O SR. CARLOS ORIONE - Certo.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Essas doações
foram devidamente contabilizadas e apresentadas na prestação de contas,
apresentadas ao Tribunal Regional Eleitoral.
O SR. CARLOS ORIONE - Certo.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Então, esse é um
procedimento normal, isso existe e tem, inclusive, contornos muito bem
definidos. Agora, chamou a atenção o fato da CBF e de algumas
Federações fazerem essas doações, porque elas estão impedidas por lei e
pelo seu estatuto. A pessoa que recebe, se recebeu de boa-fé, não tem
problema nenhum. Agora, a entidade precisa saber que, mesmo sendo
pessoas que trabalharão, eventualmente eleitos, em favor do esporte, as
Federações não podem fazer essas doações. A CPI está apurando isso...
O SR. CARLOS ORIONE - Certo.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - ...e vai estabelecer,
certamente, um relacionamento, com as suas conclusões, através das suas
conclusões, que defina isso com muita clareza.
O SR. CARLOS ORIONE - Certo, certo.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Porque as
Federações não são empresas, elas não se incluem no rol daquelas
entidades que podem fazer doações. E, ainda que a pessoa receba de boafé, e pode fazê-lo, a entidade não pode. Agora, também queria lhe dizer
que os prazos para eventuais punições já se exauriram. Mesmo que o
senhor decline o nome da pessoa, a não ser que aconteça como se ele for do
PT... Porque o PT não desculpou o Presidente do Diretório Regional do
Rio de Janeiro que recebeu da Federação, da Confederação Brasileira.
Quer dizer, não, não é que não tenha perdoado, é que tomou-lhe
satisfações. Mas é um caso interno do partido. Quer dizer, se a
Federação Mato-Grossense de Futebol tiver feito doações ela o fez de
forma irregular.
O SR. CARLOS ORIONE - Certo.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Mas não há como
puni-la mais agora.
O SR. CARLOS ORIONE - E sem má-fe, né, Doutor?
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – E tampouco...
O SR. CARLOS ORIONE - E sem má-fe, né?
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – E tampouco a
quem recebeu. Tampouco a quem recebeu.
O SR. CARLOS ORIONE - Certo.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Eleito ou não.
O SR. CARLOS ORIONE - Certo. O problema é o seguinte, é que
esse de fazer doações, esse é um fato que não é só a de Mato Grosso faz,
outras Federações também fazem. Isso que eu sei, tenho ciência, não estou
acusando nenhuma Federação nem vou declinar o nome de Federação.
Eu, antes mesmo de 98, eu já fiz, não nesse valor, nessa quantidade,
mas sempre fazia doações de bola pra um candidato, isso e aquilo outro, e
amigo nosso, que é da Federação, mexe com esporte. Agora, posso
adiantar aos senhores que essa doação ela foi feita sem ver a cor
partidária. Eu dei pra candidatos de um partido, de outro partido, sem
colarização partidária, são pessoas diretamente ligada ao futebol, no
passado ou no presente.
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Eu acho que, não
condeno por dar, mas eu, quando o senhor diz que deu e declina o nome,
eu acho que a coisa não tem, não tá tendo transparência. Eu acho que
era importante que pudesse...
O SR. CARLOS ORIONE - Eu pra declinar o nome deles aqui eu
teria que consultá-los.
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Não, eu acho que
quando o senhor deu, não é agora.
O SR. CARLOS ORIONE - Certo.
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - O senhor não tem
obrigação de falar aqui. Mas eu acho que era uma questão de
transparência. Ó, eu estou fazendo isso, isso e isso e isso. O senhor tá
dando é um direito...
O SR. CARLOS ORIONE - Não vou declinar.
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES - Mas, agora, eu acho que
deve ser, que não deve ser declinado na, para, para as pessoas saberem no
Mato Grosso que a Federação doou, fez isso. Como a CBF doou, ela
doou pra diversos candidatos e veio a público. Ela veio a público dizendo
que doou. Temos Deputados, colegas nossos que estão lá que receberam.
O SR. CARLOS ORIONE - Eu quer deixar bem claro o seguinte,
que a importância veio porque eu fiz um pedido pro Dr. Ricardo
Teixeira, que eu gostaria de colaborar com determinados candidatos que
estavam envolvidos no futebol, alguns deles, inclusive, já exerceu funções
dentro da entidade, e se ele podia mandar. Ele me mandou 50 mil reais
que eu fui na casa de material esportivo e fiz a distribuição, que os
coordenadores iam lá buscar de acordo com o que foi distribuído.”
(g.n.)
Carlos Orione confessou que a CBF usa da prática de enviar recursos, no
caso em exame a pedido, para campanhas eleitorais nos Estados. Ele inclusive
menciona, especificamente, Ricardo Teixeira, dando o devido destaque entre CBF e seu
presidente. Daí se infere que a decisão do repasse de dinheiro é uma decisão pessoal do
presidente, e não de um colegiado ou da diretoria.
Esse esclarecimento do Orione contradiz o que Ricardo Teixeira afirmou
à CPI, em seu depoimento, em 10/4/2001:
“O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - Sr. Presidente, eu vou
voltar aqui a uma... a uma questão que foi levantada pelo Deputado
Pedro Celso, que é a questão das doações da CBF para campanhas
eleitorais. Foram relacionados um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito,
nove, dez, onze, doze, treze... treze candidatos que receberam doações que
perfizeram 562 mil e 500 reais. Além de isso ter sido considerado pelo
Deputado Jurandil Juarez como ilegal, e além de também não ser uma
iniciativa recomendada, dado aos enormes prejuízos que a CBF vinha
tendo naquele período, ficou sem resposta a questão de quais critérios a
CBF utilizou para fazer essas doações. O senhor poderia responder, por
favor?
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Essa grande...
Excelência, a grande maioria deles foi por um critério de ter, de alguma
forma, vinculação com o futebol.
O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - Dessa lista de treze, eu
consultei alguns... algumas pessoas que conhecem mais do que eu o
futebol, e nós encontramos, ligados ao futebol, o Deputado Eurico
Miranda, o Deputado Darcísio Perondi — não sei se é ele que é ligado
ao futebol ou a ligação se dá através do irmão — e o Deputado Paulo de
Almeida, que não sabemos... não posso dizer se ele é ou não. Ele é,
também. Os demais são todos eles... nenhum deles tem ligação com o
futebol direta, não tem vinculação com futebol. Então, esse critério que o
senhor diz ter seguido não... não bate com a realidade. Foi o senhor que
tomou essa decisão de... foi o senhor que escolheu as pessoas?
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Não, eu diria que foi
uma decisão da Diretoria da CBF, porque alguns outros Diretores
pediram para alguns partidos políticos, e nós fornecemos isso, e, no nosso
modo de entender, fui surpreendido pela configuração de que era ilegal, até
porque o senhor há de convir comigo que eu não conheço a lei eleitoral;
quer dizer, eu nunca soube que isso era ilegal — pagar depois, pagar
antes. Quer dizer, eu tenho que mandar fazer um estudo. Realmente, se
isso, dentro do contexto geral... Eu não sabia dessa eventual ilegalidade.
O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - Sim, mas o senhor que
autorizou? Essa é que é a minha pergunta. O senhor autorizou?
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - Autorizei, sim, senhor.
O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES - Os 562 mil reais foi o
senhor que autorizou?
O SR. RICARDO TERRA TEIXEIRA - A ajuda eu autorizei,
sim, senhor.” (g.n.)
Ricardo Teixeira asseverou que as doações são fruto de decisão da
diretoria da CBF. Ao que parece, pelas palavras do presidente Carlos Orione pode-se
depreender que quem decide por isso é o presidente da CBF.
5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL
Admitiu auxílios a políticos “muitos foram presidentes de clubes, alguns até já
participaram da nossa administração”, sem contudo declinar nomes pois alegou que não
houve ajuda financeira e sim distribuição de material esportivo.
Ocorre que a Lei Eleitoral de n. 9.504/97 impede, em seu art. 24, o
fornecimento de doação estimável em dinheiro. A doação realizada pela Federação do
Mato Grosso pode ter contrariado a legislação em vigor na época.
6. EMISSÃO DE CHEQUES
BANCO DO BRASIL S.A. (AGÊNCIA 3325-1) – CONTA Nº 46.095-8
DATA
VALOR(R$)
DOCUM.
BENEFICIÁRIO
08.02.1999
23.000,00
000141
Carlos Orione (ct. 7342-3
do Carlos Orione)
05.03.1999
22.000,00
000159
Carlos Orione (ct. 7342-3)
14.09.1999
10.000,00
000337
Federação Matogrossense
22.12.1999
15.000,00
000367
Federação Matogrossense
14.03.2000
12.000,00
000445
Carlos Orione
21.03.2000
10.000,00
000454
Carlos Orione (ct. 7342-3)
OBS. NÃO FORAM INFORMADOS OS DOCUMENTOS DOS SEGUINTES VALORES LANÇADOS A DÉBITO:
14.09.98
24.000,00
000101
18.02.99
11.600,00
212801
08.06.00
10.000,00
000555 (reap.)
14.09.00
10.930,00
000629
7. CONCLUSÕES
Se confirmada em seu estatuto, que não deve ser diferente das demais
federações, a característica de “entidade sem fins lucrativos” fica caracterizada a
irregularidade de remuneração de dirigentes.
Foi admitida a remessa de numerário da CBF com intuito de ajuda a
candidatos a eleições federais e municipais.
Houve promessa de envio de documentação para provar a origem dos
valores pagos pela Federação Matogrossense ao seu dirigente, o que não aconteceu até
o fechamento deste relatório.
8. RECOMENDAÇÕES
a) comunicar à Receita Federal as irregularidades encontradas em suas
declarações de renda;
b) comunicar ao Ministério Público Eleitoral do Tribunal Regional do
Mato Grosso sobre as possíveis irregularidades envolvendo as doações para campanhas
eleitorais;
c) comunicar ao Ministério Público Eleitoral sobre os indícios de
ilicitudes envolvendo a CBF e as Federações;
d) comunicar ao Conselho Federal de Contabilidade sobre as
irregularidades contábeis e fiscais, sob s responsabilidade do contador da Federação;
e) encaminhar cópia do Relatório e seus anexos para o Ministério Público
apurar irregularidades ou ilegalidades cometidas.
MATO GROSSO DO SUL
1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DAS FEDERAÇÕES :
Conforme estatuto da entidade, a Federação Sul-Matogrossense de
Futebol é uma “Sociedade Civil, com finalidade esportiva, com personalidade jurídica e
patrimônio próprio” (art. 1º), tendo como objetivos: “dirigir o Futebol (sic) todas as
suas manifestações (...), promovendo a sua difusão e o seu aperfeiçoamento”;
“promover campeonatos, torneios, palestras e simpósios de futebol”; e “facilitar o
progresso técnico e material de seus afiliados” (art. 2º).
Trata-se de típica entidade de direito privado sem fins lucrativos.
O estatuto define como “poderes” da entidade: a Assembléia Geral, o
Tribunal de Justiça Desportiva, o Conselho Fiscal, a Presidência e a Diretoria (art. 11).
2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA:
Francisco Cezário de Oliveira preside a Federação Sul-matogrossense de
Futebol desde 1998, já tendo ocupado o cargo entre 1983 e 1989.
A Federação não remunera seus dirigentes e não tem funcionários.
Segundo afirmou seu presidente em depoimento a esta CPI, a entidade depende do
trabalho voluntário dos seus membros.
3. S ITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA
3.1 I MPOSTO DE RENDA E CONTABILIDADE DA FEDERAÇÃO
A Federação Sul-matogrossense não entregou à receita federal as
declarações de Imposto de Renda dos exercícios de 1996 e de 1997. A Federação é
titular de quatro contas no banco HSBC (duas delas encerradas).
A entidade não tem sede própria e funciona em prédio alugado. Segundo
depôs Francisco Cezário, a Federação era proprietária de uma sala, que foi a leilão para
pagar dívidas junto à receita federal e ao INSS.
Há sérios indícios de que a Federação teria encaminhado informações
equivocadas à receita federal. Conforme a declaração de Imposto de Renda de 1998, a
Federação recebeu, de doações e subvenções, R$ 99.766,28; por outro lado, pela quebra
de sigilo bancário da CBF, verificou-se que esta repassou à Federação, no período
correspondente, 122 mil reais. Na declaração apresentada em 2000, vê-se que a
entidade declara ter recebido da CBF 230 mil reais, quando a CBF teria repassado 242
mil reais.
GASTOS COM ATIVIDADES AMADORAS
Os eventos relacionados a amadores movimentam valores que, conforme
a prestação de contas, aumentam significativamente ano após ano. E curiosamente, a
maioria das verbas que se destinam aos amadores ocupam a rubrica “outras despesas”,
de natureza indefinida. Em seu depoimento, Francisco Cezário não conseguiu justificar
essa movimentação em prol do amadorismo, tal como não apresentou quaisquer
justificativas em relação à concentração na misteriosa rubrica “outras despesas”.
Segue, abaixo, quadro com valores destinados ao esporte amador,
considerando-se, em cada ano, o quadrimestre que a Federação beneficiou o setor.
Curiosa a movimentação registrada no ano 2000, onde os valores destinados ao
amadorismo superam o próprio valor que a Federação declarou ter recebido da CBF.
Ano
1998
1999
2000
Valores que a Federação
teria recebido da CBF
(em reais)
56,5 mil
68,75 mil
134 mil
Valores destinados ao
esporte amador
(em reais)
19 mil
51 mil
155 mil
Peso do amadorismo em
relação ao repasse
(%)
33,6
74,0
115,7
3.2. I NSS
250.000,00.
A dívida da Federação junto ao INSS seria de aproximadamente R$
Segundo análise do Deputado Jurandil Juarez, a qual incorporamos ao
nosso Relatório, para que uma entidade como a Federação Sul-matogrossense atingisse
uma dívida de R$ 250.000,00, seria necessário que movimentasse uma receita em torno
de R$ 1.250.000,00, o que é uma incongruência face à situação falimentar da entidade,
relatada por seu presidente. Francisco Cezário alega tratar-se de dívida que foge à sua
responsabilidade, uma vez que teria sido constituída em gestões anteriores a sua.
REFIS.
A Federação negociou a dívida junto ao INSS por meio do programa
3.3. F INANCIAMENTO A CANDIDATOS E OUTROS REPASSES
Foram transferidos R$ 15.000,00, por meio do cheque nº 306.550,
emitido em 03/08/2000, para a conta corrente nº 56782 (agência 3936), no Banco do
Brasil, em Campo Grande (MS), pertencente à “Coligação Renov. C. Exp. Francisco C.
Oliveira”. “Francisco C. Oliveira” seria Francisco Cezário de Oliveira, o presidente da
Federação e candidato vencedor ao pleito municipal de 2000, em Rio Negro, cidade do
interior de Mato Grosso do Sul, a 150 quilômetros de Campo Grande. A Federação
Sul-matogrossense financiou R$ 15.000,00 à campanha do hoje prefeito municipal de
Rio Negro (Francisco Cezário já ocupou o cargo de prefeito do município entre 1976 e
1983). O quadro abaixo, colhido na página eletrônica do Tribunal Superior Eleitoral,
fornece os dados sobre as eleições em Rio Negro:
Candidato
Número de
Votos
% (em relação ao total de votos
válidos)
Francisco Cezário de Oliveira (PSDB)
Joaci Nonato Rezende (PMDB)
Marcelo Renato Coelho de Miranda (PT)
Total de votos validos
Nulos
Brancos
Total de votos apurados
1656
1474
310
3440
159
29
3628
48.14 %
42.85 %
9.01 %
Entre 30/08/2000 e 20/09/2000, foram emitidos quatro cheques
nominais em favor de Umberto A. Pereira, totalizando R$ 46.000,00. Segundo
depoimento do Francisco Cezário, Umberto Pereira é seu sobrinho e funcionou como
tesoureiro do município de Rio Negro de 1977 a 1983, sendo atualmente Vicepresidente de Finanças e Patrimônio da Federação Sul-matogrossense de Futebol.
Umberto Alves Pereira (cuja esposa é descendente de japoneses,
conforme informação do Francisco Cezário) viajou ao Japão, junto com Clarisse
Pereira, Daniele Pereira e Marcelo Pereira, com despesas pagas pela CBF à empresa
SBTR (Stella Barros), num custo de R$ 11.790,81. Trata-se de informação proveniente
da contabilidade da CBF (ver Anexo Cópias de Notas da SBTR), quando da visita da
CPI à sede daquela entidade. Francisco Cezário alega desconhecer se foi a CBF que
pagou a viagem.
Tal como Umberto Pereira, Eurico Ferreira Rezende, “companheiro político”
do Francisco Cezário e “ tesoureiro da campanha da nossa coligação”, segundo depoimento do
presidente da Federação, foi beneficiado pelas verbas da Federação. Um dos cheques
que envolvem Umberto Pereira teria sido depositado na conta do Eurico Rezende. O
Francisco Cezário não soube explicar, em seu depoimento, as razões dessa
movimentação.
3.4. CONSELHO FISCAL
A contabilidade da Federação é fiscalizada e controlada por um conselho
fiscal que não tem autonomia política em relação à direção da entidade. A eleição dos
membros do conselho fiscal é realizada de forma conjunta com a da diretoria, em uma
chapa única. Trata-se de dispositivo estatutário (art. 37).
4. RELAÇÃO COM A CBF
A Federação Sul-matogrossense recebeu da CBF, entre 1998 e 2000, os
seguintes valores: em 1998, R$ 6.000,00 por mês, com as exceções de setembro (R$
34.500,00), outubro (R$ 16.000,00), novembro e dezembro (R$ 12.000,00 cada mês);
em 1999, o repasse mensal foi de R$ 12.000,00, com as exceções de janeiro (R$
10.000,00), março (R$ 25.660,00), agosto (R$ 17.750,00), setembro e novembro (R$
24.000,00 cada mês) e outubro (R$ 27.000,00); não houve repasse em dezembro. Em
2000, manteve-se o valor de R$ 12.000,00, sendo que em agosto o valor foi de R$
64.000,00, em setembro de R$ 38.000,00 e em outubro de R$ 32.000,00.
Segue, abaixo, gráfico com as doações da CBF:
DOAÇÕES DA CBF PARA A
FEDERAÇÃO SUL-MATOGROSSENSE DE FUTEBOL
1998 - 2000
R$
70.000
60.000
50.000
40.000
30.000
20.000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/2000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/99
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
JAN/98
0
MARÇO
10.000
MESES
Segundo depoimento do Francisco Cezário, as verbas provenientes da
CBF são destinadas a atividades amadoras.
“Eu tenho o orgulho de dizer que eu fui um dos responsáveis de lançar o
dr. Ricardo Teixeira como candidato a Presidente da CBF (...) Confesso
a V.Exa. que eu nunca recebi nenhum tipo de dinheiro pra que desse ao
Dr. Ricardo Teixeira o meu apoio político. Sempre o fiz por entender
que ele como candidato, até mesmo por ser candidato único, nunca nos
permitiu que tivesse qualquer tipo de questionamento quanto a sua
candidatura. Eu quero dizer a V.Exa. que, em 98, eu... eu fui eleito,
tomei posse em 98. Eu votei na eleição do dr. Ricardo Teixeira e não
recebi nada (...)”
(g.n.)
Questionado sobre a razão dos repasses terem um valor maior em
períodos eleitorais, Francisco Cezário alegou que as despesas com o futebol amador são
mais elevadas no segundo semestre do ano.
5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL
Conforme registrado acima, a CBF aumentou sua ajuda financeira à
Federação exatamente em época eleitoral, sugerindo um financiamento à campanhas
eleitorais. Também ficou comprovado, conforme quebra de sigilo bancário da entidade,
que a Federação Sul-matogrossense de Futebol pagou R$ 15.000,00 à coligação
político-partidária em que era candidato Francisco Cezário. O presidente da Federação,
em seu depoimento, nega a ocorrência da mencionada movimentação (ver item 3.3.
acima).
6. C ONTRATOS COM A TV
A Federação Sul-matogrossense de Futebol tem contrato de transmissão
de jogos com a emissora Rede Mato-grossense de Televisão. A TV tem o direito de
transmitir os jogos e em troca custeia a despesa dos clubes e dos jogos. Assim informou
à CPI Francisco Cezário.
7. RELAÇÃO COM OS CLUBES
Não foram constatadas denúncias acerca da relação entre a Federação
Sul-matogrossense de Futebol e os clubes.
8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DO FUTEBOL
Do depoimento do Francisco Cezário e dos documentos analisados, não
foram observadas informações ou denúncias relevantes sobre empresários de futebol.
9. C ONCLUSÕES, ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES
Da análise de todos os documentos e do depoimento do Francisco
Cezário, conclui-se que a Federação Sul-matogrossense de Futebol é administrada de
forma temerária, além do descontrole financeiro e fiscal.
Há evidências de sonegação fiscal.
Há indícios de irregularidades nas transações envolvendo os senhores
Francisco Cezário de Oliveira, Umberto Teixeira e Eurico Ferreira Rezende, tanto no
aspecto da legislação tributária, quanto ao não cumprimento do Estatuto da Federação.
Recomenda-se alteração estatutária para permitir uma maior autonomia
do conselho fiscal e obrigar que os cheques da entidade sejam subscritos por pelo
menos dois dos seus dirigentes, sendo um deles o presidente, além de que seja
estabelecida maior transparência nas contas da Federação e nos repasses de verbas que
envolvam a entidade e os clubes.
Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao
Ministério Público Federal, ao Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul e
ao Ministério Público Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso do Sul,
com base na Lei nº 9.504/97.
MINAS GERAIS
1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DA FEDERAÇÃO
A Federação Mineira de Futebol é uma sociedade civil de direito privado,
sem fins lucrativos, constituída pela livre união de Ligas Municipais e Associações
Desportivas. Dirige o futebol não profissional, masculino e feminino, e o futebol
profissional no estado de Minas Gerais.
A Federação Mineira era isenta de impostos pelo menos até o ano
calendário de 1999, pois na DIPJ 2000 consta: “Forma de tributação do lucro: Imune do
IRPJ”. De acordo com a Lei 9.532/97, que condiciona o reconhecimento como
atividade recreativa, isenta, com a não remuneração dos dirigentes, a Federação não
poderia remunerar os dirigentes.
Com relação à remuneração dos dirigentes da federação, O Sr. Elmer
Guilherme Ferreira, presidente, quando interrogado por deputados membros desta
CPI, em 08/05/2001, assim se expressou, conforme notas taquigráficas:
“– Eu sou funcionário público, lotado na Secretaria de Esportes, Lazer
e Turismo de Minas Gerais, à disposição da Federação Mineira de
Futebol, e recebo da Federação uma verba de representação que o estatuto
permite que seja até quarenta salários mínimos, mas a minha verba de
representação hoje é em torno de 4 mil reais.”
Naquela oportunidades ele ainda acrescentou que recebe essa
remuneração desde que assumiu o cargo. O presidente faltou com a verdade com
relação ao que determina o estatuto ou, no mínimo, desconhece aspectos importantes
constantes nesse instrumento da entidade que dirige, pelo menos quando lhe convém
desconhecê-los, pois o referido estatuto, em seu artigo 9º, determina que
“É gratuito o exercício de funções, por parte dos membros integrantes de
qualquer dos poderes da Federação.”
Quando interrogado pela CPI, o presidente declarou-se desconhecedor
do impedimento. Portanto, a remuneração por ele e por outros dirigentes recebida da
federação estaria impedida por lei, além da proibição estatutária.
2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA
2.1 CONTINUISMO
O atual presidente, Sr. Elmer Guilherme Ferreira, já se encontra há 14
anos como presidente da Federação. O seu pai, Sr. José Guilherme Ferreira, foi
presidente da Federação Mineira por 16 anos, período iniciado em 1966.
Mesmo durante alguns poucos anos em que o pai, tendo deixado a
presidência, o filho ainda não assumira o cargo, este já ocupava o cargo de diretor
técnico e depois, de vice-presidente. Quando o Sr. Elmer vier a concluir o mandato
atual em 2004, estará sendo completado um período total de praticamente 38 anos de
uma mesma família à frente da Federação Mineira de Futebol.
Existem vários questionamentos a respeito dos critérios que o presidente
Elmer Guilherme adota para permanecer no cargo, sendo reeleito seguidamente. O
assunto será tratado abaixo no item correspondente ao processo eleitoral na federação.
2.2 NEPOTISMO
São severas as críticas quanto a esse aspecto observadas na imprensa há
bastante tempo. O jornal Estado de Minas de 09/05/2001, caderno Esportes, trouxe
que:
“Elmer emprega 27 familiares, entre irmãos, primos, cunhados, e até o
marido de uma sobrinha, como funcionários diretos da FMF ou
integrantes do quadro móvel”.
No dia 08/05/2001, quando inquirido por esta CPI sobre o assunto, o
presidente apenas ressaltou não haver empecilho legal que lhe impedisse de ter parentes
trabalhando na entidade que dirige, acrescentando:
“Procurei me cercar de elementos de minha confiança. São funcionários
legalmente contratados...”.
Admitiu explicitamente a existência de dois filhos lá regularmente
empregados, os quais seriam donos de uma empresa gráfica que confecciona ingressos
para a própria federação.
Durante o depoimento à CPI, o Sr. Elmer esteve sendo auxiliado por um
irmão, Geraldo Márcio, na manipulação de documentos pertencentes à Federação. No
dia 15/05/2001, o Estado de Minas/Esportes, trouxe uma lista de doze nomes de
pessoas da família Guilherme que teriam ou estariam sendo demitidos da Federação,
incluindo o pai, ex-presidente, vários irmãos, sobrinhos e tios do atual presidente.
2.3 PROCESSO ELEITORAL
Comentários da imprensa e de concorrentes ao cargo de presidente da
federação se referem a que o estatuto atribui excessivos poderes ao cargo, concedendolhe larga margem de manobras e operações junto às entidades votantes e seus
representantes, de forma que essas ações redundam em favorecimentos ao presidente
quando das eleições, permitindo-lhe a “eternização” no cargo.
Dentro desse espírito, a seção II do estatuto, “DAS ATRIBUIÇÕES DO
PRESIDENTE...” , contém 39 incisos, dentre os quais se destacam alguns que dizem
competir ao presidente:
Inciso III: “nomear, admitir, designar, comissionar, contratar e rescindir
contratos, exonerar, dispensar, demitir, punir, destituir, licenciar, conceder férias,
elogiar, premiar, abrir inquéritos, e instaurar processos;”;
Inciso IV: “nomear e dispensar os membros da diretoria que
independem de eleição, designar assessores e os componentes de comissões que
instituir...” ;
Inciso XI: “nomear e dispensar os membros da Comissão de
Arbitragem, designar seu presidente e vice-presidente...”;
Inciso XII: “nomear e dar posse aos membros do Poder Judiciário”;
Inciso XXXVI: “conceder moratória ou anistia” (aos seus filiados –
votantes nas eleições para a diretoria);
Um outro fator que tem levantado suspeitas é o relacionamento do
presidente da federação com a própria imprensa desportiva do estado de Minas. Há
quem atribua existirem favorecimentos a alguns setores da imprensa que, em
contrapartida, auxiliam o presidente quanto à formação de uma boa imagem nas
eleições.
Perguntado se a Federação tem algum contrato ou proporciona alguma
ajuda de custo a radialistas, à imprensa escrita, enfim, à mídia no geral, o Sr. Elmer
responde que não, mas acrescenta:
“O que pode ocorrer lá é o seguinte: nós temos, por exemplo, algumas
salas na Federação que são alugadas a alguns elementos da imprensa.
Então, nós fazemos com eles uma permuta. Eles não pagam o aluguel
dessa sala e, em contraproposta, eles prestam serviço na área de relações
pública à Federação. Mas pagamento de... de... salário, não”.
Em uma pergunta sobre a Rádio Itatiaia, se a Federação já fez alguma
espécie de pagamento a ela, a resposta:
“Fizemo. Fizemo um pagamento da mídia que foi feita pra Copa
Centenário. Na época da Copa Centenário, a Rádio Itatiaia fez
praticamente toda a mídia da Copa Centenário, nós inclusive ficamos
devendo por um grande período, e depois fizemos o pagamento daquilo
que era devido pela mídia que ela fez da Copa Centenário”. 20
A Copa Centenário foi realizada em Belo Horizonte, em comemoração aos cem anos de fundação da capital
mineira, datada de 12/12/1897.
20
O presidente acrescentou quanto a pagamento efetuado à empresa
Osvaldo Faria Publicidade e Promoções Ltda: que “foi também quem fez a promoção... outra
empresa que fez a promoção da Copa Centenário.” e admite que a federação efetua repasse
para a Associação Mineira de Cronistas Desportivos.
Posteriormente, a federação enviou a esta CPI nova documentação (Pasta
FEDERAÇÕES SUDESTE, Vol. 05) onde se verificaram diversos pagamentos
efetuados a pessoas ligadas a “comunicação”, “marketing” ou “imprensa”, conforme
relação a seguir:
A título
COMUNICAÇÃO:
de
prestação
de
serviços
de
SUPERVISOR
NOME
VALOR(R$)
DATA
Flávio Geraldo Anselmo Junior
1.167,65
06/10/2000
DE
A título de prestação de serviços de ASSESSOR DE MARKETING:
NOME
VALOR(R$)
DATA
Flávio Geraldo Anselmo Junior
1.415,70
06/10/2000
A título de prestação de serviços de IMPRENSA E RELAÇÕES
PÚBLICAS:
NOME
VALOR(R$)
DATA
Nina Abreu Carvalho
580,80
06/09/2000
Cláudio Luiz Maia Nunes
275,00
06/09/2000
Afonso Alberto Teixeira dos Santos
574,75
06/09/2000
Marco Antônio Salomão Bruck
193,60
06/09/2000
2.4 L ICITAÇÃO E RELAÇÃO COM EMPRESAS:
2.4.1 GRÁFICA
O caso mais visível e comentado pela imprensa é o da gráfica de
propriedade dos filhos do presidente em sociedade com o contador da Federação, Sr.
Wagner Soares. Essa empresa é quem confecciona os ingressos para jogos promovidos
pela Federação. Quando inquirido por esta CPI, o presidente declarou que não fazia
licitação para a confecção dos ingressos porque: “...a gráfica deles (dos filhos com o contador)
ofereceu um contrato melhor do que o anterior.”.
2.4.2 JB DUARTE E MINERAÇÃO LISBOA
A Federação Mineira emitiu muitos cheques para duas empresas. Uma
delas é a Mineração Lisboa, empresa muitíssimo modesta, que trabalha com rejeito de
minério, e para uma grande empresa industrial de óleo e comestíveis do gênero,
chamada JB Duarte S/A. Essa recebeu um cheque da Federação no valor de R$
375.000,00 em abril/1997.
Já a empresa mineradora recebeu da federação, em cheques nominais, o
total de R$ 1,606 milhão, entre abril e julho de 1997, mais R$ 50.671,00 em 1998 e R$
20.969,00 em 1999. Quase todos esses cheques à Mineração Lisboa foram endossados e
depositados em uma conta corrente no banco BCN, em São Paulo, pertencente à
empresa JB DUARTE.
No depoimento de 08/05/2001, o presidente não conseguiu explicar os
motivos dos cheques emitidos em favor das duas empresas, atribuindo ter sido para
pagamento de um adiantamento feito pelas mesmas com a finalidade de pagamento de
cotas do clube Milan, da Itália, iniciando por dizer:
“Deve ser para pagamento ao Milan, devem ser todos para pagamento ao
Milan, que foi feito pela JB Duarte.”
Perguntado sobre quem seria e o que faz a Mineração Lisboa, o
presidente revelou não conhecer, nem saber o que faz essa empresa que recebera 1,6
milhão de reais da Federação que dirige, empregando as seguintes palavras:
“Emprestou dinheiro. Eu não sei o que que é a Mineração Lisboa. O
coordenador da Copa Minas Gerais, que é o Sr. Marcos Perrela, é que
fez esses contatos e eles fizeram o adiantamento do dinheiro.”
Em virtude da existência de vários cheques nominativos à empresa
Mineração Lisboa Ltda, os seus proprietários, Srs. Jair Afonso Lisboa e Marcelo
Eustáquio Lisboa, foram entrevistados pelos deputados Jurandil Juarez e Leo Alcântara,
em Belo Horizonte, homens bastante humildes, no dia 17/05/2001, na presença do seu
advogado. Eles negaram conhecimento de qualquer transação envolvendo a sua
empresa com a Federação Mineira de Futebol ou com qualquer pessoa ligada à
federação, afirmando conhecer o nome do Presidente Elmer Guilherme apenas por
ouvir no rádio nos eventos futebolísticos.
Conforme documentação obtida por esta CPI, o Patrimônio Líquido da
Mineração Lisboa era de R$ 137.856,00 no balanço patrimonial levantado em
31/12/1999; a receita operacional líquida em 1999 foi de R$ 119.868,00 e o lucro no
período, de R$ 2.190,00.
Todas as cópias de cheques emitidos para essas duas empresas
encontram-se no Anexo 11, Sigilo Bancário, Pastas de 01 a 05, sendo que mais
especificamente na Pasta 05.
2.4.3 T RAFFIC ASS. COMUNICAÇÃO LTDA.
A Traffic efetuou os seguintes pagamentos à Federação Mineira: 1996 –
R$ 373.000,00, 1997 – R$ 300.000,00, 1998 – R$ 600.000,00, 1999 – R$ 800.000,00,
totalizando R$ 2,073 milhões (Anexo 02, Pastas 12, 21, 29 e 35).
Quando foi questionado ao presidente qual a relação da Federação
Mineira de Futebol com a Traffic, a resposta foi: “Nenhuma.”. Mais especificamente,
foi perguntado quanto ao recebimento de R$ 800.000,00 em março de 1999, o
presidente afirmou: “De 1999? Não, a Federação não recebeu nada da Traffic, eu posso
garantir para o senhor.”. Esta CPI, no entanto, possui cópia de dois cheques de R$
400.000,00, nominais à Federação Mineira, que entraram em conta corrente dessa
federação na Caixa Econômica Federal em datas de 12 e 31/03/1999 (Anexo 02,
Pastas 12, 21, 29 e 35).
Esta CPI não recebeu tempestivamente os documentos solicitados
referentes à contabilidade da Federação. Por isso, não pôde verificar qual o tratamento
dado às importâncias recebidas da Traffic. De qualquer maneira, por essa via seria
possível tão somente a constatação de uma dentre duas hipóteses. A primeira, que o
dinheiro recebido da Traffic, mesmo que destinado a pagamento à Federação Mineira,
não teria chegado lá. Isso porque, conforme declarações do presidente, citadas acima, a
federação não teria qualquer relação com a Traffic e nunca recebera pagamentos dessa
empresa. Por outro lado, se existem relações e a federação recebeu pagamentos da
Traffic, configurar-se-ia um total desconhecimento e ignorância, por parte do seu
principal dirigente, da atuação, das ocorrências e dos pagamentos importantes,
efetuados ou recebidos pela federação. Esta hipótese, apesar dos desmandos
verificados, é menos provável já que o desconhecimento de fatos por parte do
presidente foi percebido ser mais freqüente quando lhes são solicitadas explicações
sobre saídas de recursos de maneira injustificada ou inexplicável.
2.4.4 O UTRAS OCORRÊNCIAS :
2.4.4.1 P AGAMENTO DE R$ 455.000,00 À 28ª VARA CÍVEL DA JUSTIÇA DE MG
Essa importância foi paga mediante três cheques nominais durante o ano
de 1999 (Anexo 11, pasta 05). O presidente, quando inquirido por esta CPI, não
forneceu qualquer explicação para os pagamentos efetuados à 28ª Vara Cível, mesmo
tendo-lhe sido chamada a atenção para o fato de ser um valor altamente significativo
frente a toda arrecadação da federação no mesmo ano, que fora de R$ 712.000,00.
Prometeu fornecer as explicações posteriormente, mas nada apresentou até o momento
da elaboração deste relatório.
2.4.4.2 PAGAMENTO
PRAXEDES NETO
DE QUASE
R$ 160.000,00
AO FUNCIONÁRIO
GUSTAVO
Funcionário do Setor de Arrecadação, é sobrinho do presidente, segundo
informações do Jornal O Estado de Minas, caderno Esportes, de 15/05/2001. Recebeu
dois cheques de elevados valores, datados de 18 e 19/09/2000, de R$ 45.000,00 e R$
114.562,00, respectivamente (Anexo 11, Pasta 05). Esses cheques foram nominativos,
mas não trazem no verso qualquer explicação quanto ao motivo do pagamento.
Quando o presidente foi inquirido por esta CPI em 08/05/2001, chegou a ser-lhe
formulado um pedido de esclarecimento a respeito desses pagamentos ao Sr. Gustavo.
Ao fazer o questionamento, no entanto, o Deputado se confundiu, trocando o nome
Gustavo por Guilherme, formulando dessa forma o pedido de explicação. O inquirido
declarou taxativamente não conhecer tal pessoa e nenhuma explicação, portanto, foi
obtida.
2.4.4.3 PAGAMENTO
BRAGA
DE
R$ 60.000,00
A
CELSO EUSTÁQUIO FERNANDES
Efetuado em seis cheques de R$ 10.000,00 de julho a outubro de 2000
(Anexo 11, Pastas 04 e 05), o pagamento a Celso Eustáquio Braga teve como
explicação ser o elemento intermediário na compra pela Federação de uma fazenda em
Mato Grosso. Essa aquisição teria sido feita com a finalidade de se dá-la como parte de
pagamento de dívidas com impostos. Segundo palavras do presidente em seu
depoimento à CPI quanto à fazenda:
“Vamos vender. Era para entregar para o INSS, como nós fizemos o
REFIS, nós compramos a fazenda para entregar para o INSS, como foi
feito o REFIS...” .
Não soube informar o valor pelo qual foi adquirida, o tamanho, nem a
razão porque resolvera comprar a fazenda; assegurou, no entanto, que a propriedade
estaria em nome da Federação. Isso, porém, não justificaria, pois a compra de uma
fazenda foge aos objetivos da entidade, contrariando o seu estatuto.
Posteriormente, foi enviada a esta CPI cópia da escritura pública e do
registro em cartório de registro de imóveis datado de novembro/1998. O valor
registrado em escritura foi de R$ 400.000,00, cujos pagamentos teriam sido da seguinte
forma: R$ 20.000,00 no ato (não diz quando), R$ 40.000,00 em setembro/1996, R$
40.000,00 em setembro/1997 e R$ 300.000,00 em setembro/1998 (Pasta
FEDERAÇÕES SUDESTE, Vol. 05). Pela contabilidade, vê-se um esquema de
pagamento diferente do descrito aqui (mesma pasta anteriormente citada), tendo sido
feito em sua totalidade em novembro/1998, conforme registro contábil do dia
30/11/1998: uma parte de R$ 150.000,00, documento não identificado no histórico,
mais um cheque de R$ 250.000,00, de número 000569, da Caixa Econômica Federal.
Estranhamente, porém, esse cheque, conforme cópia em poder da CPI, foi emitido
nominalmente a Patrício da Rocha Rezende Junior, que seria, conforme informado pelo
presidente, o auditor que presta serviços para a federação, o qual será citado em
seguida.
2.4.4.4 PAGAMENTO
JÚNIOR
DE
R$ 265.000,00
A
PATRÍCIO
DA
ROCHA REZENDE
Pagamentos efetuados apenas entre novembro e dezembro de 1998
(Anexo 11, Pasta 05). Trata-se, segundo informações do presidente, de um profissional,
pertencente aos quadros da empresa CONFISCO, o qual presta serviços de auditoria
para a federação. Também foram efetuados pagamentos à Associação Jurídica Patrício
da Rocha Rezende S/C, no valor de R$ 38.770,00, no mesmo período. É altamente
questionável que a federação pague altos valores a um auditor e/ou uma assessoria
jurídica enquanto se verifiquem uma série de irregularidades na administração, na
contabilidade e nos procedimentos fiscais da entidade. Seria um caso merecedor das
atenções dos respectivos Conselhos de classe, se é que se trata de profissionais
habilitados junto a esses.
2.4.4.5 PAGAMENTO DE R$ 294.000,00 A HUMBERTO BOTINO
Efetuado em novembro de 1998, esse foi mais um dos pagamentos de
elevada monta efetuados pela Federação Mineira (Anexo 11, Pasta 05). A razão dessa
operação teria sido o pagamento de um empréstimo por essa pessoa concedido à
Federação Mineira, conforme explicações do Sr. presidente da Federação. O cheque, no
valor de R$ 293.682,50, da Caixa Econômica Federal, foi emitido nominalmente ao Sr.
Humberto Botino; no livro Razão está historiado como “pg. NF 308 de Casa
Engenharia LTDA” e, no verso, consta carimbo de Mendonça e Cia LTDA. Conforme
o “Razão”, no mesmo mês, foi efetuado um outro pagamento a essa Casa Engenharia
LTDA, no valor de R$ 36.117,50, tendo como histórico a mesma NF 308,
relacionando-a, porém, a despesas com reforma do prédio sede da federação. O Razão
encontra-se nas Pastas FEDERAÇÕES SUDESTE, Vols. 5, 6 e 7).
Ainda segundo o presidente, o pagamento ao Sr. Botino teria sido
efetuado quando do recebimento de um outro empréstimo, dessa feita de R$
1.500.000,00 concedido pela Federação Paulista de Futebol, cuja dívida foi,
posteriormente, absorvida pela CBF, segundo a mesma fonte, sem maiores explicações.
O empréstimo com a Federação Paulista será examinado no item
“Relação com a CBF e com a Federação Paulista”.
3. SITUAÇÃO FISCAL , F INANCEIRA E CONTÁBIL :
A Federação mineira não atendeu tempestivamente ao pedido desta CPI
de envio da documentação referente a sua contabilidade. Ao final dos trabalhos,
15/05/2001, foi recebida correspondência da federação com os seguintes termos:
“Estamos enviando cópias das demonsatrações financeiras completas (Balanço Patrimonial,
Demonstração do Resultado, Demonstração de Origens e Aplicações dos Recursos e das Mutações
Patrimoniais) e do Livro Razão Analítico, todos relativos ao exercícios de 1995 a 2000, bem como os
demais documentos solicitados.”. Na verdade, contrariamente ao texto da carta, foram
recebidos apenas o “Razão”, que oferece poucas condições para identificação e
esclarecimento dos lançamentos, e mais alguns outros documentos de pouco ou
nenhum valor para a elucidação dos fatos sobre os quais o presidente fora inquirido
(Pastas FEDERAÇÕES SUDESTE, Vols. de 4 a 7).
Se administrativamente a situação da federação é confusa e
desorganizada, com seu presidente dizendo desconhecer fatos relevantes, bem como as
operações de vulto realizadas pela entidade, no campo fiscal, financeiro e no contábil
não é diferente.
As ocorrências verificadas, a exemplo da falta de dados e de explicações
sobre relevantes operações, as suspeitas de existência de um “caixa dois”, a
desorganização e, especialmente, a participação do contador como sócio, juntamente
com outros sócios ainda mais suspeitos, em uma empresa gráfica prestadora de serviços
exclusiva, sinalizam para uma situação de total falta de confiabilidade na contabilidade
da Federação. Os reflexos são sentidos na área fiscal conforme descrito a seguir.
A Receita Federal informou a esta Comissão não constar registro de
entrega de declaração nos exercícios de 96 e 97.
No ano de 1997, conforme declaração apresentada em 1998, a federação
apresentou uma receita de R$ 3,904 milhões e uma despesa de R$ 6,057 milhões, o que
dá um déficit de R$ 2,153 milhões que, segundo o presidente, teria sido, na realidade
de R$ 4 milhões.
Nessa declaração consta como entidade isenta; não declara rendimentos
do presidente, Sr. Elmer, citando-o nominalmente com rendimentos zero. Lembrando
que esse, em depoimento, declarou receber da federação desde quando lá entrou, o que,
pelo menos como presidente, faz 14 anos, tal fato configura-se sonegação do
contribuinte Elmer Guilherme Ferreira, CPF 098.788.746-72, e uma omissão da
Federação frente ao fisco, não declarando o valor pago àquele contribuinte.
Na declaração apresentada em 1999, vem como “Forma de tributação do
lucro: Lucro Real” e a Federação indicou receita zero. No entanto, a movimentação
bancária foi superior a 4 milhões de reais nesse mesmo ano, conforme apurou a
Comissão
Já em 2000, declara: “Forma de tributação do lucro: Imune do IRPJ”.
Declara, dessa vez, rendimento do Sr. Elmer Guilherme Ferreira no total de R$
45.056,90, com desconto na fonte. Apresenta um déficit em 99, e um déficit muito
grande, porque há um recebimento de 712 mil e uma despesa de 1 milhão e 911, ou
seja, o déficit foi maior do que o total da receita. Mesmo aparentando não ter dinheiro,
a Federação auferiu, nesse mesmo período, rendimentos de aplicações financeiras.
Pode-se verificar o quadro em que se encontra a FMF levando-se em
conta o fato de ela ter declarado à Receita Federal ser imune, qualidade que
constitucionalmente é garantida, apenas, a algumas entidades, de modo taxativo. Isso
prova que a Federação mineira não possui o mínimo de controle do ponto de vista
fiscal e tributário.
Todos os documentos fiscais referentes aos tópicos levantados acima
encontram-se no Anexo 11, Pasta 01 – Sigilo Fiscal.
4. RELAÇÃO COM A CBF E COM A FEDERAÇÃO PAULISTA
Com relação à Federação Paulista, o Sr. Elmer disse ter um bom
relacionamento, inclusive com o presidente, Eduardo Farah. Contou que, terminada a
Copa Centenário, tendo havido prejuízos, procurou o presidente Farah, que concedeu
um empréstimo de R$ 1.500.000,00 à Federação Mineira. Afirma que, posteriormente, a
CBF assumiu o restante dessa dívida e que agora a dívida é com a CBF.
As respostas do presidente Elmer foram as seguintes:
O SR. DEPUTADO LÉO ALCÂNTARA - Existiu algum...
algum negócio, alguma transação financeira entre a Federação Paulista e
...
O SR. ELMER GUILHERME FERREIRA - Existiu.
Terminada a Copa Centenário, e... e... dado ao prejuízo, e como a
Federação não tinha nenhuma perspectiva e sufocado pelos credores que
todos cobravam, nós procuramos o Presidente Eduardo Farah, levamos a
ele esse... essa nossa aflição, e ele nos fez um empréstimo em torno de 1
milhão e 500. Esse empréstimo foi feito justamente... inclusive esse agora
me recordo, até o cheque desse Humberto Botino foi retirado desse
dinheiro, foi quando nós pagamos principalmente aquelas dívidas que
tava nos sufocando mais da Copa Centenário.
O SR. DEPUTADO LÉO ALCÂNTARA - É exatamente, casa
as datas. O senhor recebeu esse empréstimo da Federação Paulista em 20
de novembro e pagou ao Sr. Humberto Botino, em 27 de...
O SR. ELMER GUILHERME FERREIRA - É isso aí, eu
tenho certeza que foi um dos primeiros que foram pago com o dinheiro
que veio da Federação...
O SR. DEPUTADO LÉO ALCÂNTARA - E o senhor ainda
deve à Federação Paulista? Consta na sua contabilidade esse empréstimo,
essa entrada do dinheiro, e algum pagamento...
O SR. ELMER GUILHERME FERREIRA – Tenho, tem. A
Federação fez um pagamento em torno de 150 mil, e depois, como nós
não tivéssemos condições de saldar o resto, foi feito um acordo entre a
Federação, a CBF e o Eduardo Farah, e o Ricardo é... comprometeu a
liqüidar o restante dessa dívida junto à Federação Paulista.
O SR. DEPUTADO LÉO ALCÂNTARA - Ricardo que o
senhor chama...
O SR. ELMER GUILHERME FERREIRA Teixeira.
Ricardo
O SR. DEPUTADO LÉO ALCÂNTARA - É o Presidente
Ricardo Teixeira?
O SR. ELMER GUILHERME FERREIRA - É o Presidente
da CBF, é.
O presidente da Federação Paulista, Eduardo Farah, em seu depoimento
à CPI do Futebol, no Senado, em 22/5/2001, afirmou que cedeu o empréstimo, de
fato, à Federação de Minas Gerais. Disse que cobrou da Federação pelo atraso do
pagamento, chegando a ameaçar a execução de um imóvel que havia sido dado como
garantia. E que, como a Federação Mineira não tinha como pagar, foi feito um acordo
com Ricardo Teixeira, presidente da CBF, assumindo esta a dívida.
Entre os documentos de posse desta Comissão, consta apenas um
pagamento relativo a esse empréstimo pela CBF à Federação Paulista, no valor de R$
136.273,65, datada de 28/11/2000. Se a Federação Mineira diz ter pago apenas R$ 150
mil, restam, ainda, R$ 1.213.726,35 para a Federação Paulista receber, ao que parece, da
CBF.
Já a CBF, ainda perdoou a dívida acumulada, durante o ano de 2000, com
a Federação Mineira, no valor de R$ 763.508,40, sendo que desse total, apenas R$
136.273.65 se relacionam com o empréstimo. Outros R$ 627.234,75 foram, assim,
também perdoados.
Foram observadas cópias de cheques da CBF para a Federação Mineira
assim distribuídos: R$ 88.000,00, em 1995, R$ 200.000,00, em 1996, R$ 100.000,00, em
1997 e R$ 200.000,00, em 1998 (Anexo 03, Pastas 09, 19, 22, 25 e 26).
O ex-presidente da Federação Mineira, José Guilherme Ferreira, pai do
atual presidente, é um dos três membros titulares do Conselho Fiscal da CBF. Durante
muitos anos, exerceu o papel de dirigente maior da Federação, afiliada da CBF, o que
reforça, e muito, a ligação entre ele e Ricardo Teixeira. A relação de fatos observados,
possivelmente, retira do senhor José Guilherme a isenção necessária para que um
membro de Conselho Fiscal possa exercer suas atribuições.
5. CONCLUSÕES
Durante os interrogatórios realizados por esta Comissão, muitos foram
os compromissos assumidos pelos inquiridos, com promessas e garantias do envio de
explicações e documentação comprobatória da regularidade de fatos sobre os quais
foram levantadas suspeitas.
Muitos questionamentos, como já era previsto, permanecem sem
respostas, comprovando a inexistência de motivos ou de procedimentos lícitos nas
operações realizadas.
Ficou comprovado que a Federação Mineira está carente de dirigentes
que levem a sério os princípios universais da moralidade, impessoalidade e da
legalidade. A entidade é dominada por uma família já há quase quatro décadas e
apresenta sintomas de todas as conseqüências que advêm dessa longevidade no poder:
nepotismo, favorecimentos diversos, desvio de dinheiro, gestão temerária, apropriação
indébita, dentre outros vícios.
6. RECOMENDAÇÕES
Alguns fatos devem ser imediatamente submetidos a uma investigação
minuciosa por parte das instituições competentes, tendo em vista já existirem indícios
mais do que suficientes para se crer em prática de atos ilícitos. São apresentados, a
seguir, algumas recomendações:
1. utilização da Mineração Lisboa Ltda. como ponte para a saída
irregular de recursos da federação – prosseguir com as investigações junto à empresa
para se concluir pela sua participação ou não na operação e, em seguida, serem
indiciados os dirigentes da federação;
2. concluir pesquisas no sentido de se conhecer qual foi realmente a
participação da Indústria JB Duarte S/A no caso da saída de recursos, utilizando-se
da Mineração Lisboa;
Traffic;
3. procurar onde foram parar os pagamentos efetuados à Federação pela
4. esclarecer o total de pagamentos efetuados a 28ª Vara Cível (R$
455.000,00) e outros pagamentos de elevados valores;
5. investigar os pagamentos realizados a terceiros com o pretexto de
pagamento de empréstimos, tal como no caso do senhor Humberto Botino, cabendo à
Receita Federal apurar os recebimentos feitos pelos favorecidos (ver Anexo 11 e suas
pastas, bem como Relatório de Cheques de Federação Mineira);
6. encaminhar ao Ministério Público cópia deste Relatório e dos anexos
referentes à Federação Mineira de Futebol, Anexo 11, todas as pastas, incluindo-se,
ainda, os documentos relativos a entidade recebidos por esta CPI, dentre eles, o
estatuto da FMF.
Na área administrativa, podem ser salientados os seguintes aspectos e as
correspondentes recomendações:
a) promover a revisão dos estatutos da Federação, reduzindo-se as
atribuições e os poderes do presidente, incluindo regras que impedissem a prática do
nepotismo e de manipulações eleitoreiras; inclusão de condições e de requisitos
especiais para os integrantes do Conselho Fiscal;
b) denunciar ao Conselho Federal de Contabilidade, dando-lhe
conhecimento dos procedimentos do contador e do auditor contratado pela Federação;
c) comunicar à Receita Federal as irregularidades verificadas nas
declarações do Imposto de Renda dos anos recentes e recomendar uma fiscalização
severa nas contas da entidade, de seu presidente e do ex-presidente, pai do atual, o
senhor José Guilherme Ferreira; e
d) recomendar à Receita Federal e ao Ministério Público que investiguem
se a CBF arcou com o ônus do empréstimo de R$ 1.500.000,00 ou como se deu essa
transação nebulosa.
Sugere-se, por fim, que seja decretada a intervenção na Federação
Mineira de Futebol, com base no art. 8, do Estatuto da CBF.
PARÁ
1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DAS FEDERAÇÕES :
A Federação Paraense de Futebol é uma sociedade civil para fins
desportivos, com personalidade jurídica e patrimônios próprios. O art. 52 do estatuto
da entidade prevê que a presidência, os diretores, colaboradores e assessores “não
poderão ser remunerados, nem auferir gratificação”, o que foi confirmado pelo presidente
Antônio Carlos Nunes de Lima, que dirige a entidade há seis anos, somando-se os dois
períodos.
Abre, no entanto, espaço para o caso de despesas comprovadas com
hospedagem, transporte, alimentação, cópias de documentos, etc., no parágrafo único
do mesmo artigo.
2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA
A Federação paraense encaminhou a esta CPI parte dos documentos
exigidos, dentre os quais, os balanços contábeis dos exercícios de 1998 a 2000. A
entidade informou que não foram localizadas os documentos relativos aos exercícios de
1995 a 1997, que pertenceriam à administração anterior.
A entidade apresenta gastos excessivos com a justiça, principalmente
trabalhista. Segundo informações do jornal eletrônico Lancenet, de 3/8/2000, o clube do
Remo vem passando por sérias dificuldades financeiras. Incluem-se duas ações
trabalhistas, que, apenas elas, podem fazer com que o clube perca sua sede social, já
penhorada. Nos últimos cinco anos, a entidade despendeu cerca de R$ 300 mil apenas
com causas na justiça.
Em federação alguma se observou gastos como os dessa Federação com
ações trabalhistas. E, de acordo com Nunes Viana, apenas uma ação foi de R$ 46 mil.
Como o presidente desconhece, ou demonstra desconhecer, as atividades da gestão
anterior à sua, caberá aos órgãos competentes (Receita Federal e Ministério Público)
examinar a contabilidade da Federação para conferir a regularidade desses pagamentos,
e se se referem a funcionários da entidade ou jogadores de clubes paraenses, ou nada
disso.
A contabilidade apresentada a esta CPI demonstra que, em 1999, teriam
sido gastos apenas R$ 925,24 em indenizações trabalhistas. Somente de pagamentos
feitos à 4ª Junta de Conciliação e Julgamento de Belém foram pagos R$ 21.931,13 no
dia 13/7/1999.
3. SITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA
3.1 MOVIMENTAÇÃO BANCÁRIA DA FEDERAÇÃO
Há pagamentos também expressivos para uma empresa, a F.A. Meireles
Agência de Turismo. Para Viana, os gastos são para pagar passagens aéreas:
“O SR. DEPUTADO OLÍMPIO PIRES – E essa F.A. Meireles,
Agência de Turismo?
O SR. ANTONIO CARLOS NUNES DE LIMA – Noventa e
nove. No campeonato do Pará, ele interiorizou. Então, para você jogar
nas cidades de Marabá, como profissional, que lá tem uma (ininteligível)
de Marabá — nós temos em Santarém, 99, São Francisco e São
Raimundo — a dimensão continental que eu digo até do Estado do
Pará, sem pensar até no Amazonas, as passagens são via aérea, e elas
foram compradas na Empresa S. A Meireles.
O SR. DEPUTADO OLÍMPIO PIRES – A federação é que paga
as passagens.
O SR. ANTONIO CARLOS NUNES DE LIMA – Nós vamos
à cata de recursos. A CBF, Governo do Estado. Vamos atrás. Vamos
atrás. E conseguimos e pagamos.”
Em três anos, 1998 a 2000, a Federação gastou mais de R$ 180 mil
apenas com um agência de turismo.
3.2 DECLARAÇÕES DO IMPOSTO DE RENDA
A Federação Paraense não vem recolhendo a COFINS, tributo
obrigatório mesmo para as entidades sem fins lucrativos, do mesmo modo que é o
recolhimento do PIS. Esses valores deverão ser calculados pela Receita, ou pela
Federação, para pagamento.
3.3 INSS
A Federação paraense tem dívida pendente com o INSS no valor de R$
21.532,54, em 21/11/2000, sem ter optado pelo parcelamento dos débitos federais
(REFIS).
3.4 CONSELHO FISCAL
O Conselho Fiscal é composto pelos seguintes membros efetivos:
Francisco Moreira Pacheco, Carlos Souza de Figueiredo e Rui Guilherme Soares
Noronha, sendo, os três, contadores
4. RELAÇÃO COM A CBF
Nunes de Lima afirmou que há necessidade de mudanças urgentes na
relação CBF - Federações. Advertiu que o futebol está sofrendo muito devido ao
desencontro entre a CBF e as entidades estaduais. Nunes de Lima disse ainda:
“Acompanhei atentamente as manifestações de V.Exas. aqui, todas elas
mostrando que não estão aqui para, vamos dizer assim, um termo nosso
do interior, “cascaviar” a vida de nós, Presidentes de Federações. Muito
pelo contrário, lutar por nós, porque aquilo que o Ricardo Teixeira
chamou de “mesada”, ele deveria sim olhar a fazer um planejamento da
sua administração, porque, quando nós votamos, na última eleição, no
Ricardo Teixeira, era o seu planejamento a modernização do futebol
brasileiro, a ligação on line com as Federações, para que tudo fosse
transparente e nós não tivéssemos os problemas dessas grandes distâncias
que nós aqui do Norte sofremos e ficamos padecendo na administração do
futebol brasileiro. Por isso, Srs. Deputados, o momento é este, é um
momento de mudança.” (g.n.)
A Federação vem recebendo doações da CBF, como se pode ver pelo
gráfico a seguir:
DOAÇÕES DA CBF PARA A
FEDERAÇÃO PARAENSE DE FUTEBOL
1998 - 2000
R$
60.000
50.000
40.000
30.000
20.000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/2000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/99
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
0
JAN/98
10.000
MESES
Fonte: Contabilidade CBF/CPI CBF Nike
O presidente Nunes de Lima criticou Ricardo Teixeira. Para ele, Teixeira
deveria dar mais atenção aos clubes e federações do Norte, além de escolher um novo
diretor de futebol que atenda aquela região. Lima afirmou:
“Hoje nós estamos sem pai nem mãe, nós Presidentes de
federações do Norte, porque o Ricardo Teixeira, quer dizer, é nosso
amigo, é companheiro do mesmo ofício do futebol, ele não se dignou a
nomear ninguém para o Departamento Técnico de Futebol. Acredito que
isso aí não pode acontecer. Ele tem que imediatamente modificar isso aí e
colocar alguém lá. Foi indicado alguns companheiros. Não foi aceito. A
CBF tá anunciando de hoje pra manhã campeonato brasileiro. Quem é
que vai anunciar? O Secretário-Geral da CBF, que não é papel dele,
Excelência. Eu acredito que são essas coisas, esses desmandos que nós
temos que corrigir também no futebol brasileiro. Nós aqui que somos
Federações do Norte, aqui pobre, não temos pra quem falar.” (g.n.)
5. CONTRATOS COM A TV
A Federação Paraense, os clubes filiados e a TV Filme Belém Serviços de
Telecomunicações Ltda. firmaram um contrato referente a direitos de transmissão de
jogos do Campeonato Paraense da 1ª divisão, para as temporadas de 2000 a 2005. O
valor do total do contrato é de R$ 108 mil reais.
6. RELAÇÃO COM OS CLUBES
A Federação mantém relacionamento com os clubes do Estado. Somente
em 1999, a entidade repassou mais de R$ 200 mil tanto para o Clube do Remo, como
para o Paysandu Sport Clube. O Tuna Luso recebeu cerca de R$ 70 mil.
7. CONCLUSÕES , ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES
Há necessidade que a Federação atualize seus registros contábeis,
tomando as providências necessárias para regularizar os anos que estão incompletos. É
preciso que a entidade tome medidas para informatizar todos os sistemas contábeis,
tornando disponível, em tempo real, para os clubes filiados.
Comunicar a Receita Federal que a Federação não vem recolhendo
tributos, como a COFINS, ou vem declarando irregularmente à Receita, bem como
examinar a contabilidade da entidade com o objetivo de apurar os gastos com
passagens aéreas de clubes e o seu ressarcimento.
Sugere-se à Receita Federal que examine as contas relativas ao antigo
presidente, Euclides de Freitas Filho, quanto à regularidade e recolhimento de tributos
federais.
Comunicar ao INSS sobre indícios de não recolhimento devido, em
função do excessivo pagamento de ações trabalhistas.
Comunicar ao Conselho Federal de Contabilidade para que tome ciência
deste Relatório e tome as providências cabíveis quanto à entidade e seus contadores,
examinando as contas da entidade do atual presidente e de seu antecessor.
No aspecto administrativo, recomenda-se uma imediata reforma
estatutária para limitar o mandato da diretoria da entidade em no máximo quatro anos,
impedindo a recondução aos cargos; para permitir uma maior autonomia do conselho
fiscal; para obrigar a realização de licitação para a aquisição de bens e de material
esportivo; e para estabelecer maior transparência nas contas da Federação e nos
repasses de verbas que envolvam a entidade e os clubes.
Sugere-se, ainda, encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao
Ministério Público Federal e ao Ministério Público do Estado do Pará.
PARAÍBA
1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DAS FEDERAÇÕES :
Conforme estatuto da entidade, alterado por assembléia geral
extraordinária realizada em 29/07/1998 (art. 87 do estatuto), a Federação Paraibana de
Futebol é uma “sociedade civil, para fins desportivos, com personalidade jurídica (...) e
patrimônio próprio” (art. 1º), tendo como objetivos: “dirigir (...) o futebol amador e
profissional, promovendo a sua difusão e aperfeiçoamento”; “promover campeonatos,
torneios e competições de futebol”; e “incentivar, por meio de processos educativos,
compatíveis com o fundamento da atividade institucional, cultura moral, cívica e
intelectual, sobretudo no meio das gerações ais novas” (art. 2º).
Trata-se de típica entidade de direito privado sem fins lucrativos.
O estatuto define como “poderes” da entidade as seguintes instâncias:
assembléia geral (composta, conforme o art. 17, das associações das 1ª e 2ª divisões de
profissionais, associações de amadores da capital e ligas do interior), Tribunal de Justiça
Desportiva, Conselho Fiscal e, Presidência e Diretoria (art. 16). Os membros desses
“poderes” devem possuir reconhecida competência técnica e gozar de “conceito
público por suas atividades cívicas, sociais e desportivas” (art. 10, § 1º), estando
proibidos de receber “qualquer forma” de remuneração “pelas funções que exercem na
Federação” (art. 10, § 3º).
O estatuto é a norma geral que regula a Federação, sendo subsidiado pelo
estatuto da CBF e demais atos confederativos, além do disposto na Lei nº 9.615/98
(Lei Pelé).
2. S ITUAÇÃO ADMINISTRATIVA
A análise da situação administrativa da Federação Paraibana de Futebol
indica a existência de problemas de várias ordens, dentre as quais destacamos a prática
de nepotismo e grave ingerência dos interesses da família da presidente sobre a
Federação, e o domínio da presidente sobre o conselho fiscal da entidade. Em Sessão
desta CPI realizada em João Pessoa, em 12/05/2001, foi ouvida a Rosilene de Araujo
Gomes, atual presidente da Federação, que confirmou informações e denúncias
veiculadas em órgãos de comunicação e que já eram de conhecimento dos membros
desta CPI.
Segundo Rosilene de Araujo Gomes, a Federação possui um quadro de
dezoito funcionários, movimentando cerca de 4 mil reais por mês para o pagamento de
pessoal.
2.1. CONTINUISMO
Rosilene Gomes ocupa o cargo de presidente da Federação há quatro
mandatos, isto é, desde 1989. Seu marido, Juracy Pedro Gomes, foi presidente da
Federação de 1980 a 1986.
2.2. A F EDERAÇÃO TRATADA COMO UM NEGÓCIO DE FAMÍLIA
O domínio político da família da Rosilene de Araujo Gomes sobre a
Federação se estende à relação entre seus filhos e a entidade. A empresa que fornece
material esportivo pertence a dois dos filhos do casal Rosilene e Juracy Gomes.
Conforme denuncia de Laerson Almeida e de Lamir Motta, em depoimentos na Sessão
do dia 12/05/2001, a Federação exerce coerção sobre os clubes a ela filiados para que
estes contratem a mencionada empresa (denominada “Rei dos Esportes”). Rosilene de
Araujo Gomes contesta a denúncia, para quem não existiria ingerência da Federação na
relação entre os clubes e a dita empresa. No entanto, em seu depoimento, chega a
admitir a propriedade da mencionada empresa, conforme se revela abaixo:
“A Federação, eu estou, eu sou empresária há 40 anos, há 40 anos, eu
estou como Presidente a Federação há quase 12 anos, eu sou empresária,
há 40 anos que eu tenho casas comerciais, diversas e diversas casas, tanto
minha pessoa como também todos os meus familiares, eu digo esposo,
filhos e tudo mais, certo? E não só vendo material esportivo como também
eu vendo outros produtos, certo, como máquinas industriais e tudo mais.
Quer dizer, não vejo nenhum erro na hora que um clube, um clube
solicita uma ajuda e a Federação, a Federação autoriza aquela equipe
comprar, ela compra onde ela achar que seja conveniente porque já
comprou em outras lojas também.”
(g.n.)
2.3. NEPOTISMO E DESVIO DE VERBAS POR PARENTE
A influência da família da presidente Rosilene Gomes sobre a Federação
é confirmada ainda pelos fatos que envolvem o Judas Tadeu, sobrinho da Rosilene
Gomes. Judas Tadeu trabalhou na Federação de março de 1994 a 1999, recebendo o
equivalente a dois salários mínimos mensais. Ocorre que, durante um certo período, sua
remuneração era ampliada por gratificações oriundas do programa “vale-legal”, do
Estado de Alagoas, que correspondiam a uma média próxima de três salários mínimos
mensais. Esse fato demonstra um benefício direto e explícito ao parente da Rosilene de
Araujo Gomes.
Mais grave, no entanto, foi o procedimento administrativo verificado no
ano de 1998 e em parte de 1999, pelo mesmo funcionário Judas Tadeu, no tocante ao
desvio de cheques oriundos de clubes e destinados ao Departamento de Registro de
atletas da Federação. Ao invés de encaminhar o regular pagamento das taxas, o
funcionário embolsava os valores. O prejuízo desse procedimento estendeu-se aos
clubes, que utilizaram, sem saber, atletas irregulares; aos atletas, que também
desconheciam a falta de registro; e ao próprio futebol paraibano, no que diz respeito à
credibilidade em relação a outras Federações e clubes de outros Estados. Segundo
Rosilene de Araujo Gomes, a situação apenas foi corrigida quando o Santos Futebol
Clube encaminhou denúncia à Federação, que resultou em posterior auditoria e
regularização da situação dos atletas.
Mesmo diante de tal irregularidade, a Federação não denunciou o caso à
polícia e sequer se interessou em recuperar a verba desviada. A presidente da Federação
apenas dispensou seu funcionário.
A estes fatos, que confirmam a prática de nepotismo na gestão
administrativa da Federação Paraibana de Futebol, some-se a constatação de uma
direção centralizadora da Rosilene de Araujo Gomes sobre a entidade e um domínio
político explícito da presidente sobre o conselho fiscal. Ao longo do depoimento da
Rosilene Gomes, esta chegou a confirmar que a contadora da entidade, subordinada
diretamente a ela, também é membro do conselho fiscal, como se percebe a seguir:
“A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Ela foi eleita
membro do conselho fiscal.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – E é a contadora
também.
A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – É a contadora.”
Essa gestão quase “familiar” da Federação Paraibana é caracterizada por
uma desorganização administrativa generalizada, com explícita vantagem para os
membros da família de Rosilene Gomes. Sintomático, neste sentido, o fato de que a
Câmara Municipal de João Pessoa e a Assembléia Legislativa do Estado da Paraíba
tenham instituído Comissões Parlamentares de Inquérito, respeitando suas
competências e atribuições, para examinar a situação do futebol local e o papel da
Federação Paraibana de Futebol.
3. SITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA
Se administrativamente a gestão da Federação Paraibana é confusa e
desorganizada, no campo fiscal e financeiro a situação não é diferente. Quebrados os
sigilos fiscal e bancário, chegaram à CPI informações que comprometem a probidade
na administração dos recursos e no pagamento dos tributos e recolhimentos legais.
Parte significativa do que apontam os documentos oriundos da receita federal e dos
bancos foi confirmado pelas denúncias dos depoentes Jaerson Almeida e Lamir Motta,
e pelo próprio depoimento da Rosilene de Araujo Gomes.
A seguir, exporemos as irregularidades percebidas na declaração do
Imposto de Renda da Pessoa Jurídica da Federação; situação previdenciária;
movimentação irregular de verbas; gestão das verbas relativas ao vale-legal; ocorrências
de evasão de renda; desvio de cheques; comprometimento do conselho fiscal; e
beneficiamento de empresa dos filhos.
3.1. D ECLARAÇÕES DO IMPOSTO DE RENDA
A Federação, no período entre 1995 e 2000, apenas declarou imposto de
renda relativo ao ano base de 1998 e ao ano base de 1999. Nestes dois anos base não
foram declarados bens imóveis ou veículos no imposto de renda, em que pese Rosilene
Gomes ter confessado perante esta CPI ser a Federação proprietária de vários bens, a
saber: um prédio, um campo de futebol e veículos (foram citados um Pajero, adquirido
em 2000 e antes, um Corsa e depois um Siena). A presidente afirmou ainda não saber
avaliar quanto vale esse patrimônio. Sobre a sonegação daí decorrente, alega ter havido
lapso por parte da sua contadora. Rosilene Gomes assume a sonegação em seu
depoimento:
“O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Um Pajero, e a
partir do ano passado, por isso não está no imposto de renda
que ainda está lá. E anterior a isso, tinha carros?
A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Tinha.
Quando eu assumi a Federação, a Federação não tinha carro. Foi
comprado, se eu não me engano, foi um Corsa, foi o primeiro foi um
Corsa. Depois foi um Marea e posteriormente foi justamente uma Pajero.
Mas isso sem ser do dinheiro da Confederação, porque a Confederação
nunca mandou dinheiro nem para a Federação fazer doação aos clubes
como também a Confederação nunca mandou dinheiro para a compra de
carros.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Então, no ano de 98 e no
ano de 99 tinha carro?
A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Tinha sim
senhor.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Então, só para registrar
que também não foram colocados no imposto de renda declarados como
carro da Federação.
A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Certo. Isso daí
também é um caso para ser analisado com a contadora o porquê de não
ter sido declarado.”
E sobre a propriedade dos veículos, afirma Rosilene Gomes:
“Com o dinheiro da Federação e passado e toda documentação é em nome
da Federação Paraibana de Futebol.”
3.2. INSS
Junto à previdência social, a Federação comprometeu-se a pagar sua
dívida por meio do programa REFIS.
3.3. CONTRIBUIÇÕES IRREGULARES
A Federação recebeu contribuições irregulares. Consta que o Tribunal de
Contas do Estado destinou duas parcelas de R$ 125.000,00 em favor da Federação.
Perguntada à respeito, Rosilene de Araujo Gomes não soube explicar e alegou
desconhecer o fato, deixando a suspeita de que poderia ser um valor relativo ao repasse
do governo estadual, no programa “vale-legal” (o que não tem qualquer respaldo legal).
Destaca-se, em seu depoimento, a seguinte passagem:
“O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – (...) A Federação
Paraibana de Futebol tem algum convênio ou recebeu algum dinheiro do
Tribunal de Contas do Estado da Paraíba?
A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Tribunal de
Contas? Não. Tribunal de Contas, não.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Do Tribunal de Contas?
A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Não. Tribunal
de Contas, não.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Nunca prestou serviço?
A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Também não.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Em 1999, de acordo com
documentação enviada pra nós, a Federação recebeu 125 mil reais do
Tribunal de Contas do Estado da Paraíba.
A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Tribunal de
Contas?
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – E, em 2000, outra
parcela de 125 mil reais.
A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Tribunal de
Contas?
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – É.
A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Deve ter vindo
justamente através da Secretaria das Finanças, mas não sei se foi do
Tribunal de Contas.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Olha, eu vou até
especificar de acordo com a movimentação financeira da conta da
Federação. Dia 27/12/99, 125 mil.
A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – 27/12... Me dá
o extrato bancário.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - E dia 1/2/2000, mais
125 mil. Eu chamo a atenção...
A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Não... Foi
ajuda do Governo no valor de 250 mil reais. Mas eu não sei se foi do
Tribunal de Contas não.”
Outra movimentação que ficou sem esclarecimentos refere-se aos
repasses de R$ 128.883,37 a Luciano Wanderley Filho e de R$ 32.376,50 a Hebert Levy
de Oliveira: ambos são dirigentes do Botafogo (da Paraíba), sendo que o primeiro
negou o recebimento. Segundo Rosilene de Araujo Gomes, os pagamentos teriam sido
destinados ao Botafogo, e não às pessoas físicas.
3.4. P ROGRAMA “VALE-LEGAL ”
Já no que se refere ao programa do Estado da Paraíba denominado “valelegal”, restam vários questionamentos. Segundo a presidente da Federação, o governo
estadual pagaria as verbas do programa à Federação, que por sua vez as repassaria aos
clubes. Aparentemente, porém, esse procedimento não ocorria de forma regular. É o
que aponta o depoimento do Lamir Motta, para quem a Federação deve ao clube
Campinense a transferência de valores relativa ao “vale-legal”. O depoente Nelson Lira,
ex-dirigente do Botafogo da Paraíba, afirma que a Federação pagou a parte do clube
através de um cheque sem fundos. Ainda sobre o “vale-legal”, registre-se a ocorrência
que envolve o sobrinho da presidente, que recebia gratificações extras do programa.
Em seu depoimento, a Rosilene Gomes acaba confirmando que não
declarou a parte retida na Federação, oriunda do programa “vale-legal”:
“O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Dado que eles
estão certos, eu fiz uma conta. Cheguei que a Federação Paraibana
recebeu 150 mil, 396 e 25, número que eu venho repetindo de forma
recorrente. Isto não está declarado! Como é que a senhora explica isso?
A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Ela pode não
estar declarado no Imposto de Renda, mas ela está aqui declarado no
balancete.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Não, não vale.
A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Outra co... é...
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Não. Não vale.
Me desculpe.
A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Dr. Jurandil,
olhe, não é rendimento da Federação. A Federação abriu uma conta exclu-si-va! Exclusiva! Está aqui. Eu passo às suas mãos — certo? — o
extrato bancário do Vale Legal. Está aqui. Passo às suas mãos, Dr.
Aldo. Certo? Não é o senhor não? Pensei. (riso.) Desculpa. (riso.)
(...)
O SR. PRESIDENTE (O Deputado Aldo Rebelo) – O que ele está
dizendo é que a senhora não declarou essa receita da Federação a
senhora não declarou no imposto de renda.
A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES - Pronto! É isso
que eu estou dizendo, Dr. Aldo.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – A senhora
declarou?
A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES - Eu não sei se foi
declarado, mas se não foi será declarado. Por quê? Porque isso daqui eu
acredito que até mesmo o nosso Contador ele achou conveniente não fazer
esse repasse, aliás, essa declaração. Por quê? Porque era totalmente para
ser repassado para os clubes, porque a Secretaria das Finanças... Ia fazer
esse repasse para a Secretaria das Finanças...
(...)
A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES - Não, ele está
falando do imposto de renda. É isso que eu estou dizendo para ele. Não
houve a declaração do Imposto de Renda, eu acredito que a nossa
contadora, certo?, ela achou conveniente de não fazer por quê? Porque
esse repasse era para os clubes e não para a Federação. Mas mesmo
aqui... está aqui, Dr. Rosinha, todos os vales, todos os recibos, né?, de
todos os clubes, as doze equipes que receberam, não é?, o vale legal.
(...)
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – E chegando a
eles, se eles tinham declarado para o Imposto de Renda, porque, na
verdade, eu quero lhe dizer, se não foi declarado, a senhora sonegou a
contribuição correspondente, o Imposto de Renda correspondente. Significa
dizer que a Federação Paraibana sonega Imposto de Renda, sonega
contribuições.
A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Ela sonegou
justamente neste caso, certo? Agora que foi repassado, está aqui: todos os
recebidos que foram repassados para todos os clubes, certo?, sem haver
nenhuma contestação, porque foram repassados através de cheques.”
3.5. EVASÃO DE RENDAS
Na Sessão da CPI em João Pessoa, levantaram-se suspeitas de evasão de
rendas sob a responsabilidade da Federação. Segundo depoimento do Laerson Almeida,
há venda de ingressos por empresas controladas pela Presidente. Os outros depoentes
confirmaram essa possibilidade. Enquanto Lamir Motta apontou o exemplo do que
ocorreu no maior “clássico” do estado, Nelson Lira afirmou que ocorreu evasão no
jogo entre o Botafogo (PB) e o Bahia.
3.6. O SOBRINHO JUDAS TADEU
O caso do desvio de cheques envolvendo o sobrinho da presidente, Judas
Tadeu, analisado acima, é outro exemplo de administração financeira descuidada. Neste
mesmo sentido, o conselho fiscal, que tem como um dos membros a contadora da
Federação; o empréstimo de dinheiro da CBF a funcionários da Federação, sem juros,
(casos de Antônio Alves Gonçalves e de Sônia Maria); e o beneficiamento da empresa
de material esportivo de propriedade dos filhos, são fatores que sugerem estar a
entidade se distanciando do futebol, ao tempo em que mantém uma movimentação
financeira com o objetivo de enriquecimento da Rosilene Gomes e de sua família.
3.7. CHEQUES AO PORTADOR
Outra ocorrência observada no exame da quebra de sigilo bancário é a
emissão de cheques com valores altos, ao portador.
4. RELAÇÃO COM A CBF
4.1. VERBAS DA CBF
A Federação Paraibana recebeu da CBF, nos anos de 1998 a 2000, os
seguintes valores: em 1998, seis mil reais por mês, com exceção do mês de fevereiro,
quando a Federação recebeu vinte e um mil reais; em 1999, o repasse mensal foi de
doze mil reais, com as exceções de janeiro, que foi de seis mil reais, e de setembro, de
quarenta e dois mil reais; já em 2000, de janeiro a agosto, e em outubro e novembro, o
repasse mensal manteve-se em doze mil reais, sendo que em setembro foi de trinta e
dois mil e em dezembro de vinte e sete mil cento e onze reais.
4.2. ASSEMBLÉIA DA CBF
Perguntada se compareceu à assembléia geral da CBF em janeiro de 1999,
que aprovou as contas da CBF de 1998, a presidente da Federação Paraibana, em seu
depoimento, afirmou que não estava presente àquela reunião; abaixo, o trecho do
depoimento:
“O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Não, 99. A senhora
esteve presente na reunião realizada em janeiro de 99, onde foram
aprovadas as contas referentes ao exercício de 98, essa é a pergunta.
A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Olha, eu
acredito que este ano eu estava na ... na ... no Paraguai, na sulamericana, eu tenho quase certeza.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – A senhora não estava
presente então?
A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Não estava
presente.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Está muito bem.
A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES – Dois anos, eu
passei dois anos sem comparecer a assembléia.”
No entanto, de acordo com a lista de presenças da assembléia geral do
dia 11/01/1999, documento enviado pela CBF à CPI, Rosilene Gomes não apenas
esteve no evento, como registrou sua presença na mencionada lista. Conclui-se que
Rosilene Gomes mentiu em seu depoimento.
5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL
A Federação Paraibana de Futebol, segundo sua presidente nunca se
envolveu com política, em que pese a própria Rosilene de Araujo Gomes já ter sido
candidata a Deputada Estadual durante a sua gestão, e seu marido e antigo presidente
da Federação, Juracy Gomes, ter sido eleito Prefeito do Município de Sossego, interior
da Paraíba. Curiosamente, a Federação recebeu doação de vinte mil reais no último dia
útil antes das eleições de outubro de 2000, quando foi eleito o Juracy. Em que pese a
afirmação de Rosilene Gomes, em nossa passagem por João Pessoa, observamos que
Rosilene de Araujo Gomes é conhecida nos meios políticos, estando envolvida, como
já citado, nas CPI’s locais.
Sobre sua própria candidatura, comenta a Rosilene de Araujo Gomes:
“Fui candidata, se não me engano, em 1994, certo, mas, é, não foi, é,
por querer mesmo. O querer é uma coisa. Foi assim vários amigos que
me lançaram candidata, mas eu, em nenhum momento, eu tenho
nenhuma tendência a ser candidata.”
Acerca da legalidade ou não da doação eleitoral, seja pela CBF ou pela
Federação, a Rosilene de Araujo Gomes, aparentemente, não percebe irregularidades, é
o que se supõe do seu depoimento, abaixo transcrito:
“O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – A CBF,
segundo constatado pelo trabalho que nós fizemos, a CBF teve por hábito
apoiar candidaturas, através de doações, em vários Estados, e a senhora,
por acaso, não recebeu auxílio financeiro?
A SRA. ROSILENE DE ARAÚJO GOMES - Não, não foi
necessário, a CBF nos passar essa doação, porque também nunca solicitei
à CBF ajuda financeira nesse sentido. Talvez se tivesse solicitado, não
sei, até...”
6. CONTRATOS COM A TV
A Federação Paraibana de Futebol não possui contratos de transmissão
de jogos com emissoras de televisão.
7. RELAÇÃO COM OS CLUBES
Constatou-se que a relação entre a Federação Paraibana e os clubes a ela
filiados é de subordinação. No controle da Federação há quase doze anos, tendo seu
marido ocupado a presidência no período de 1980 a 1986, Rosilene Gomes é
denunciada por Lamir Motta por seu caráter autoritário, com ocorrência de intervenção
em clubes. A relação com os clubes não se resume ao vínculo político e invade o
campo econômico, seja no favorecimento da empresa “Rei dos Esportes” (dos filhos
da presidente), cujos produtos os clubes seriam obrigados a comprar, seja na
manipulação de repasses de verbas aos clubes (conforme descrito em vários casos
acima).
8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DO FUTEBOL
Do depoimento da Rosilene Gomes, apenas foi apurado que o
empresário de nome José Luiz Galante, envolvido em negociações de atletas em
Pernambuco, e apresentado à presidente pelo vice-presidente da Federação
pernambucana, limitou-se a intermediar o contrato entre a Federação e a Telemar, que
vigeu em 2000, e teve como objeto a publicidade dos clubes em cartões telefônicos.
Dois empresários foram denunciados na CPI da Câmara Municipal –Flávio Almeida e
Carlos Gonzaga. Segundo a presidente, a Federação não tinha contato com essas
pessoas.
9. CONCLUSÕES , ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES
Da análise de todos os documentos e dos depoimentos de Rosilene de
Araujo Gomes, Laerson Almeida, Lamir Motta, Nelson Lira e Luciano Wanderley
Filho, conclui-se que a Federação Paraibana de Futebol tem uma gestão temerária, seja
em termos administrativo, financeiro e fiscal.
Constatou-se sonegação fiscal, admitida pela presidente. Há ingerência e
controle político e econômico da Federação sobre os clubes. Há, por parte de Rosilene
Gomes, desvio de verbas, nepotismo e permanente ofensa aos dispositivos do próprio
estatuto da entidade. Vê-se ainda, dentre outras irregularidades, a suspeita de
beneficiamento eleitoral ao seu marido, Juracy Pedro Gomes, no ano de 2000.
Por esses motivos, recomenda-se uma reforma estatutária para limitar o
mandato da diretoria da entidade em no máximo quatro anos, impedindo a recondução
aos cargos; para permitir uma maior autonomia do conselho fiscal; para obrigar a
realização de licitação para a aquisição de bens e de material esportivo; e para
estabelecer maior transparência nas contas da Federação e nos repasses de verbas que
envolvam a entidade e os clubes.
Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao
Ministério Público Federal, ao Ministério Público do Estado da Paraíba – no tocante às
verbas que envolvem o Tribunal de Contas do Estado e aos atos que ofendem o direito
do consumidor, assegurados na Lei nº 8.078/90 e na Lei nº 9.615/98 (art. 42, § 3º) –, e
ao Ministério Público Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba, com base na
Lei nº 9.504/97.
PARANÁ
1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DA FEDERAÇÃO :
O Estatuto da Federação paranaense dispõe, em seu art. 1º, sobre sua
natureza: trata-se de sociedade civil com fins desportivos com personalidade jurídica
própria. A norma fundadora e reguladora das atividades da Federação não prevê
maiores detalhamentos de sua qualificação jurídica, o que nos remete à legislação geral,
qual seja, o Código Civil Brasileiro.
2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA :
O presidente da Federação, Onaireves Nilo Rolim de Moura, ocupa esse
cargo há dezesseis anos; não há previsão estatutária para que receba remuneração.
Não foi constatado nenhum pagamento que indicasse remuneração regular e mensal a
Onaireves Nilo.
O que mais chama atenção com ralação à situação administrativa da
Federação Paranaense é a enorme quantidade de dívidas que essa Federação possui, as
quais serão abordadas com mais detalhes no item a seguir.
2.1 INTERVENÇÃO
Em março de 1998, a Federação sofreu intervenção do governo
municipal de Curitiba, tendo como fundamento sua dívida fiscal com o município. Essa
intervenção durou seis meses, e Onaireves Nilo reassumiu por determinação judicial.
Nessa mesma época, foi acusado de estelionato, por seu envolvimento com a
exploração de bingos.
Antes de assumir a Federação Paranaense, o Interventor, Vicente
Rodachi, contratou a empresa Assessoria Contábil Ferraz S/C Ltda., para a realização
de auditoria contábil. A seguir alguns trechos, que dão uma idéia de como estava a
Federação em 1998:
“(...)
A metodologia adotada está fora dos padrões geralmente aceitos. A
contabilidade foi executada de forma resumida, não atendendo ao regime
de competência, não identificando o número do documento, o nome do
beneficiário, e também não lançando em conta devida, ocasionando
distorções em seu conteúdo. A sistemática administrativa adotada no
período apresentou muitas irregularidades, não havendo controles, tais
como orçamento, contas à pagar e à receber, conta corrente bancária,
dentre outros.
A forma de contabilização do movimento de caixa, não apresenta
nenhuma garantia da veracidade dos fatos, pois apresenta vícios,
afrontando os princípios básicos de contabilidade, deixando muito à
desejar, principalmente quanto à clareza dos fatos. A contabilidade não
tem condições de ser considerada correta.
(...)
Enfim, para se chegar a uma conclusão, haveria necessidade de se fazer
nova contabilização, desprezando tudo ao que foi feito, às vistas dos
documentos existentes e alguns à serem solicitados.
(...)
O controle das receitas estão insuficiente. Não há forma de comprovação
através dos blocos de recibos.
(...)
Os relatórios apresentados foram executados mediante a documentação
fornecida pela Federação Paranaense de Futebol, comprovando-se a
necessidade de uma restruturação administrativa financeira, com a
implantação de controles que possibilitem uma transparência em suas
informações, permitindo a contabilização dentro dos padrões geralmente
aceitos, obedecendo os princípios estabelecidos pelo Estatuto desta
Entidade e de acordo com a legislação em vigor.
(...)
Relatório movimento de caixa:
(...)
f) os demais princípios básicos da contabilidade, foram integralmente
afrontados, pela forma dos controles apresentados, deixando muito a
desejar, principalmente, quanto a clareza dos fatos;
g) Todas as despesas efetuadas, estão de acordo com a autonomia do
presidente, prevista no estatuto, portanto, de sua inteira responsabilidade.
(...)
q) Mediante o relatado, não nos é possível apurar a real situação
financeira da entidade, visto a precariedade da forma que as informações
se encontram.”
O presidente da Federação prestou depoimento a esta CPI em duas
oportunidades; na primeira delas, em 21/03/2001, ao pronunciar suas palavras iniciais,
quis deixar claro que o interventor comprometeu ainda mais as finanças da Federação,
inclusive tendo denunciando-o por roubo. Nessa ocasião, procurou justificar a dívida
com o Município e com o INSS, afirmando que assumiu a presidência com um enorme
déficit.
Seguem, abaixo, trechos do segundo depoimento do Onaireves Nilo,
realizado em Florianópolis, em que o presidente da Federação comenta a gestão do
interventor:
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Consta aqui, Dr.
Onaireves, que esses 40 mil reais da CBF, feito como doação, feito em
março de 98, não foi contabilizado pela Federação, de acordo com os
documentos enviados pela Federação para a CPI. Como é que o senhor
explica isso, Dr. Onaireves?
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Há todos
os documentos, todos os valores repassados à Federação sempre foram
contabilizados. Na verdade, eu gostaria de ter o valor e a data para que
eu possa encaminhar à Comissão onde isso foi contabilizado. Mas a
Federação sempre fez... Agora recordo dos 40 mil, esses 40 mil
especificamente. Esse dinheiro foi dado à Federação, emprestado, eu não
sei, ao interventor. E se esse dinheiro não estiver contabilizado...
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Março de 98.
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA –
Exatamente, é período da intervenção municipal. Se esse dinheiro não foi
contabilizado foi mais 40 mil reais que ele roubou. Essa pessoa foi
afastada da Federação, por determinação judicial, por ter roubado da
Federação, inclusive consta dos balanços da Federação que ele se
apropriou indevidamente de cerca de 29 mil reais da Federação. Então,
se esse dinheiro não entrou na Federação, são mais 40 mil reais que ele
roubou. Eu faço questão, inclusive, de procurar verificar essa questão
porque seriam mais 40 mil reais que essa pessoa teria roubado da
Federação.
2.2 CONSTRUÇÃO DO ESTÁDIO DO PARANÁ – COCEP
Ainda com relação à situação administrativa, a Federação do Paraná
criou, em 1970 – antes, portanto, de o Onaireves Nilo assumir a presidência –, uma
Comissão de Construção do Estádio do Paraná – COCEP –, que tem personalidade
jurídica própria e arrecada e manipula recursos, com o fito de administrar a obra de
construção do Estádio do “Pinheirão”. Essa comissão ainda existe e, na análise do
primeiro depoimento do Onaireves Nilo a esta CPI, percebe-se uma mistura entre as
atividades da COCEP com as da Federação, uma vez que o presidente daquela
comissão é o próprio Onaireves Nilo, e o contador da comissão é o mesmo da
Federação. São duas pessoas jurídicas distintas, acionadas conforme conveniências da
situação fiscal, bancária, de cada uma delas. Segue parte do depoimento do Onaireves
Nilo, ocorrido em Florianópolis:
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Essa conta da Comissão
de Construção do Estádio, quem que assina os cheques dela?
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Quem
assina sou eu e mais o Diretor Financeiro, que é o Dr. Cirus Itiberê da
Cunha.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Se um só assinar, um tem
procuração com o outro para poder assinar? O senhor deu procuração pra
ele que possa assinar sozinho ou vice-versa?
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Não, às
vezes o que ocorre, às vezes, quando se precisa sacar um dinheiro porque
nós temos, nós temos uma afinidade muito grande, principalmente com o
banco do Estado, que é ao lado da Federação, muitas vezes são pagos
cheques com uma assinatura só, depois vai lá, a gente vai lá no outro dia
e assina. Algumas vezes pode ter ocorrido de ter sido pago cheque com
uma assinatura só. Mas em função de que eu, tanto eu quanto o Dr.
Cirus, inclusive que mora em Quatro Barras, nem sempre estão na
Federação o dia inteiro e, portanto, às vezes, é preciso sacar o dinheiro
pra uma determinada coisa e pode ocorrer de normalmente não ter as
duas assinaturas. Então, muitas vezes ocorre isso de se sacar com uma
assinatura só e no outro dia ir até o banco e sacar com a outra assinatura
e completar as assinaturas.
Constatou-se que vários pagamentos destinados à Federação (da
TRAFFIC, TV Paranaense, etc.), não foram registrados em sua movimentação
bancária, por terem sido destinados às contas bancárias da COCEP. Em linguagem
vulgar, poder-se-ia entender que a COCEP constitui-se como o “caixa dois” da
Federação Paranaense.
A comissão para a construção do estádio foi constituída há 31 anos e a
obra não chegou nem na metade, conforme afirmou o presidente da Federação:
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – E o estádio, ainda falta
muito para terminar?
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Bastante,
bastante. Nós estamos com um contrato com o Paraná Clube, que tem a
administração do estádio. E o estádio, eu diria que falta cerca de 60%
ainda para poder ficar concluído.
3. SITUAÇÃO FISCAL/FINANCEIRA
3.1. IMPOSTO DE RENDA
Inicialmente, foi observado que a Federação não entregou as declarações
de Imposto de Renda de Pessoa Jurídicas referentes aos exercícios de 1996 e 1997.
Como se não bastasse, as declarações referentes aos três anos seguintes contém, em
todas as suas contas de todas as demonstrações, o valor 0,00.
Com relação a situação fiscal descrita acima, Onaireves Nilo, quando
inquirido em seu primeiro depoimento, não teve explicações para a forma como foi
declarado o Imposto de Renda; comprometeu-se a enviar os balanços, o que o fez de
forma bastante precária, dada a informalidade dos documentos e a falta de alguns deles.
De todo modo, não ficaram esclarecidas as razões dos equívocos e omissões
relacionados às declarações de Imposto de Renda da Federação, talvez por que não as
tenha, sendo, de pronto, passível de ser indiciado por sonegação fiscal.
3.2. I NSS
Com relação ao INSS, Onaireves Nilo deu uma série de explicações sobre
a dívida da Federação com o Instituto, informando que teria optado pelo REFIS e que
estaria em dia com o pagamento das prestações. Apesar disso, a informação dada pela
Previdência Social impressiona pelo montante: em 22/11/2000 a Federação Paranaense
possuía uma dívida, de R$ 4.889.753,69. Onaireves Nilo ainda foi preso em
08/07/2000, acusado de ter desviado, aproximadamente, R$ 525 milhões que os clubes
encaminharam à Federação, a qual deveria efetuar o pagamento junto ao INSS. Por essa
acusação, Onaireves Nilo responde a processo judicial em uma das Varas Federais do
Paraná.
3.3. O GOVERNO MUNICIPAL COMO CREDOR
Ainda existe a já citada dívida com o fisco municipal, no montante de 1,4
milhões de reais, a qual deu causa à intervenção. Segundo Onaireves Nilo, essa dívida
foi negociada e a Federação vem pagando regularmente as parcelas.
O principal questionamento desta CPI com relação a essas dívidas ficou
sem respostas convincentes: como, de que maneira, em dezesseis anos à frente da
Federação, Onaireves Nilo conseguiu endividar tanto o futebol paranaense? Que tipo
de administração o levou a tamanho défcit?
3.4. OPERAÇÕES COM OURO
Para finalizar a análise sobre a situação fiscal/financeira, cabe um breve
comentário sobre sete operações no mercado flutuante com ouro, no montante de US$
328.727,81, de 1995 a 2000. Segundo Onaireves Nilo, essas operações eram feitas
automaticamente pelo Banco Bamerindus, a todo depósito cujo valor ultrapassasse 600
reais; como o dinheiro permanecia no banco, a espera da distribuição aos clubes, era
automaticamente aplicado em ouro.
3.5. AS CONTAS BANCÁRIAS DA FEDERAÇÃO E DA COCEP
Conforme comentado no item 2.2. acima, a Federação possui conta
bancária que serve como uma espécie de “caixa 2”. Inicialmente criada para financiar a
construção do estádio “Pinheirão”, a conta é, de fato, uma segunda conta da entidade.
Segue, abaixo, trecho do primeiro depoimento do Onaireves Nilo:
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Uma pergunta: a conta
n.º 7171-2, Agência 323, essa conta é da Federação?
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – A
Federação, na verdade, ela tem... não a Federação. Nós temos duas
contas no Banco do Estado do Paraná.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Isso. Essa é do Banco do
Estado do Paraná.
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA –
Exatamente. Uma é 70 e a outra é 71. A 71 é da Comissão de
Construção do Estádio do Paraná. Ali nós depositamos valores
arrecadados do patrimônio da Federação. Essa comissão é que
movimenta, que administra, enfim, a obra do Pinheirão, a manutenção
do patrimônio. Essa comissão foi criada em 1970. Não foi criada por
nós. Nós simplesmente demos seqüência a essa comissão. Porque a
Federação — deixa eu explicar bem isso — a Federação tem a
finalidade de gerir futebol. A Federação não tem a finalidade de construir
estádio ou de fazer obra. Então foi criada essa comissão para poder
administrar a obra, enfim, o patrimônio.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Essa comissão, ela existe
ainda?
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Existe.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – E essa conta existe?
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Existe,
sim, senhor.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Pois é. Esse cheque da
Traffic foi parar nessa conta.
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Bem,
ocorre que, por alguns meses ou anos — anos eu não diria, meses — a
conta da Federação, em função de dificuldades que nós tivemos, esteve sem
condições de obter movimentação através de talão de cheque. Então,
certamente, foi depositado nessa conta para poder fazer a movimentação.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Então, essa conta não
serve só para construção do estádio. Serve também...
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Nesse
momento de dificuldades que a Federação teve, ela serviu para
movimentar outras coisas também.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Essa conta não está no
nome da Federação?
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Está
numa Comissão de Construção do Estádio Pinheirão, cujo presidente sou
eu também.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Porém essa conta não é da
Federação Paranaense de Futebol?
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Não.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Não é.
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Não é.
Essa comissão tem um CGC próprio, certo, um outro CGC. Essa
comissão existe desde 1970, como eu disse.
4. RELAÇÃO COM A CBF
4.1. MOVIMENTAÇÃO DE VALORES DA CBF À FEDERAÇÃO
Ao contrário do que acontece com as demais Federações, a Federação
Paranaense não recebe a “mesada” da CBF, e se orgulha por isso. Porém, em 2000,
houve uma remessa financeira de R$ 100.000,00 em agosto, R$ 40.000,00 em setembro
e R$ 60.000,00 em outubro, totalizando R$ 200.000,00 em um período eleitoral. Em
seu segundo depoimento, Onaireves Nilo foi categórico em afirmar que não foi
candidato e não apoiou ninguém; esse montante teria sido para sanar dificuldades
financeiras. Há uma controvérsia entre a palavra da CBF e o que diz Onaireves Nilo:
para a contabilidade da CBF, esse valor foi contabilizado como auxílio; já para
Onaireves Nilo, trata-se de empréstimo, sendo que o presidente da entidade paranaense
afirma que faz questão de devolvê-lo à CBF.
4.2. O QUE PENSA ONAIREVES NILO MOURA SOBRE A CBF
Segue, abaixo, depoimento do Onaireves Nilo acerca da gestão da CBF:
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – O que o senhor acha da
administração do Sr. Ricardo Teixeira à frente da CBF, Dr. Onaireves?
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – O futebol
brasileiro, a cerca de, a partir de 1980 passou a ter algumas dificuldades.
Porque o futebol brasileiro, a partir de 1970, com a criação da loteria
esportiva, até a década de 80, teve, a CBF tinha um teste da loteria
esportiva, os Clubes, as Federações tinham uma situação normal. A
partir daí a CBF teve que buscar patrocínios. E a CBF obteve, com esse
contrato que é feito com a Nike, a condição de poder liberar os clubes do
pagamento de taxas de borderô, poder ajudar algumas Federações,
patrocinar alguns campeonatos de categorias de base. Eu entendo que o
fato da CBF ter conseguido esse contrato foi importante para o futebol
brasileiro. Se não fosse esse contrato, em função das enormes dificuldades
que tem o futebol brasileiro como um todo, também a Confederação
estaria numa situação muito mais difícil do que está.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – O senhor me desculpe,
Dr. Onaireves, então, o senhor acha que o Sr. Ricardo Teixeira faz uma
boa administração na frente da CBF?
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Eu falei
da assinatura do contrato com a, com esse empresa, acho que foi
interessantíssimo porque, segundo me consta, é o maior contrato assinado
por uma Confederação.
5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL :
Não foi identificada, explicitamente, nenhuma doação da CBF ou da
própria Federação a políticos do Estado, prática que foi negada pelo presidente da
Federação Paranaense, em seu segundo depoimento a esta Comissão. Cabe registrar
que Onaireves Nilo foi eleito Deputado Federal em 1990, quando já era presidente;
porém, também negou qualquer utilização da Federação de Futebol para fins políticos.
Foi cassado, sob acusação de ter pago US$ 50 mil para alguns parlamentares mudarem
de partido.
5.1 RELAÇÃO COM CASAS DE BINGO
Sabe-se que Onaireves Nilo é proprietário, juntamente com seus filhos,
de várias casas de bingo no Paraná. Uma dessas casas seria a “Mônaco Bingo Show”,
em Foz do Iguaçu. Essa casa é operada pela empresa Sport House Franquias, cujos
sócios-proprietários são pessoas próximas da diretoria da Federação Paranaense de
Futebol, além dos filhos do Onaireves Nilo Moura. O advogado Telmar Schossler
(defende 17 das 28 ações trabalhistas contra a Sport House) enviou a esta Comissão
cópias de depósitos bancários, no valor de R$ 8.000,00, da Federação Paranaense de
Futebol para Maria Aparecida da Costa, administradora do bingo.
Onaireves Nilo Moura disse que havia dado R$ 8 mil para um office-boy
depositar para Maria Aparecida, mas a caixa do banco teria se enganado e colocado
como remetente a FPF.
As provas contra Onaireves Nilo Moura foram encaminhadas à CPI no
início do ano 2001, após seus funcionários, revoltados com a falta de compromisso dos
donos da casa, terem recolhido documentos comprobatórios da ligação direta do
presidente com o bingo Mônaco.
6. CONTRATO COM TELEVISÃO
Em uma análise global do contrato, esta CPI concluiu que a TV
Paranaense adquiriu significativo poder de ingerência sobre o futebol do Estado,
tornando-o refém da empresa, uma vez que até a tabela de jogos faz parte do contrato.
Como ocorre em outras federações, o futebol paranaense também é vitima dos
interesses comerciais, dentre eles e com maior força, o televisivo.
7. RELAÇÃO COM OS CLUBES
A Federação paranaense permitiu a exploração de bingos de forma
articulada com os maiores clubes do estado. Seguem trechos do primeiro depoimento
do Onaireves Nilo:
O SR. DEPUTADO EURICO MIRANDA – (...) O bingo era
uma atividade, era considerado uma atividade legal ou não?
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA - Nós
realizávamos os bingos no Paraná através de liminares conseguidas na
Justiça, portanto eram legais.
O SR. DEPUTADO EURICO MIRANDA - Eram legais porque
se conseguia liminares na Justiça. Muito bem. E por que... A Federação
realizava muitos bingos, né, realizou muitos bingos?
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA - A
Federação e os clubes. Nós fazíamos... a Federação e todos os clubes do
Paraná participavam dos bingos. Admitindo que... Londrina. Todas as
cartelas vendidas em Londrina, o Londrina participava. Isso era,
realmente, na época uma grande receita para os clubes.
(...)
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA - Veja,
quem geria o bingo não era exclusivamente a Federação. Era a
Federação e os três clubes da Capital. Na época, ainda não existia o
Paraná Clube, era o Colorado. Era Atlético, Coritiba, Colorado, a
Federação e todos os clubes do Paraná. Então, nós fazíamos essas
doações. Isso era anunciado de forma bastante transparente. Todos
tomavam conhecimento de que havia essas doações e foram feitas. Em
cada um dos festivais — nós chamávamos de festivais esses bingos —
havia uma doação.
O SR. DEPUTADO EURICO MIRANDA - E a fiscalização da
aplicação disso?
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA - Bom, aí
não compete à Federação fiscalizar essa aplicação.
8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DO FUTEBOL
Há, entre a Federação paranaense e Juan Figer, uma relação de razoável
aproximação. O empresário foi contratado pelo Atlético Paranaense, e provocou uma
grande movimentação em termos de transação de atletas. Como há um Capítulo
específico sobre a atuação e os negócios de Juan Figer neste Relatório, o presente item
limita-se a registrar a relação e expor parte do depoimento do Onaireves Nilo sobre a
questão:
O SR. DEPUTADO EDUARDO CAMPOS – O senhor não tem
participação na negociação, mas a Federação, ela registra atletas e atletas
e atletas que são cedidos de um mesmo clube dos mesmos dois clubes no
Uruguai?
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Não. A
Federação, ela recebe o contrato, quando o clube contrata o jogador, ela
recebe pra ser registrado e encaminhado à CBF. Todo jogador
profissional, ele é registrado na Federação e na Confederação. Muito bem.
Quando o atleta é vendido também vem o contrato de, digamos, de
transferência e autorização pra que ele seja transferido para um clube
nacional ou para um clube do exterior. E a Federação faz isso, o clube
determina que se faça a transferência, a Federação faz. A quem, a quem
está sendo transferido o atleta não compete à Federação discutir isso aí.
Isso não compete à Federação.
O SR. DEPUTADO EDUARDO CAMPOS - V.Sa. está tendo
uma preocupação muito grande em dizer que não participa. Eu não estou
querendo dizer que V.Sa participa das transações...
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA - O senhor
quer saber se eu tenho conhecimento?
O SR. DEPUTADO EDUARDO CAMPOS - Se o senhor tem
conhecimento das transações.
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA - Ah! sim.
Vamos, então.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Ele acabou de
dizer que trinta e tantos jogadores do Atlético Paranaense foram
vendidos só no ano passo. Do Coritiba, quantos foram vendidos?
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Três.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Do Paraná
Clube?
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA - Dois.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Do Irati?
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA - Que eu
saiba nenhum.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Do Londrina?
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA - Um
O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Do Pato Branco?
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Nenhum.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Então eu quero
saber o seguinte? Por que o Atlético vende tanto jogador?
O SR. DEPUTADO EDUARDO CAMPOS - Como é que é
isso? O senhor sabe. Então, o senhor está aqui, o senhor sabe
exatamente. O senhor não participa, é verdade. A Lei Zico, não tem
percentual, mas o senhor sabe qual é a lógica, e nós estamos aqui pra lhe
perguntar esperando que o senhor não falte com a verdade.
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA - Veja...
Claro, nem estou aqui pra faltar com a verdade. Eu conheço o empresário
Juan Figer há bastante tempo, não conheço tão bem pessoalmente como eu
conheço as transações que ele fez já no futebol brasileiro, internacional,
não é? Ele foi um dos primeiros empresários FIFA no Brasil. E ele fez
diversas negociações para o São Paulo, para Palmeiras, enfim, para
clubes do Rio de Janeiro, e o clube Atlético Paranaense também se utiliza
desse empresário pra fazer negociações, principalmente com o interior,
apesar dele também ter participado de negociações com clubes nacionais,
no caso do Oséias, quando foi vendido ao Palmeiras, também o
empresário nessa transação foi o Sr. Juan Figer.
O SR. DEPUTADO EDUARDO CAMPOS - Como é que é o
processo exatamente que envolve o Atlético, que é um clube federado à
usa Federação, o empresário Juan Figer e o Rentistas e o Central
Español?
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA - Veja, o...
O SR. DEPUTADO EDUARDO CAMPOS – Por que isso só
lá? Como é que se dá? Por que se dá?
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA - Bom, na
verdade, o Clube Atlético Paranaense, há questão de, eu diria, três anos
atrás, ele não fazia nenhuma transação com o exterior. Não fazia. As
transações começaram a ocorre depois da participação desse Sr. Juan
Figer como empresário do Clube Atlético Paranaense. Então, na
verdade, os contatos que esse empresário tem com o exterior, com clubes do
mundo inteiro, é que facilitaram essas negociações. Esse é o entendimento
que eu tenho.
O SR. DEPUTADO EDUARDO CAMPOS – Esses jogadores
são... Os contratos que têm registro na Federação são contratos de cessão
de jogadores do Rentistas ou do Central ao Atlético, ou a metade do
passe pertence ao Atlético, do jogador?
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Vamos
falar do caso mais recente. O Lucas, por exemplo, foi um atleta que foi
comercializado pelo Atlético com o Botafogo de Ribeirão Preto. Foi
comprado o Lucas mais dois jogadores — eram três jogadores — por 1
milhão e meio de reais. E daí foi vendido a esse Rentistas, do Paraguai,
ou melhor do Uruguai, 50% do valor desse passe. Isso seis meses depois,
eu diria, da aquisição. O Atlético comprou do Botafogo e daí vendeu
metade do passe para esse Rentistas. E, depois, quando vendeu, ele
vendeu os seus 50% ao Rentistas, que daí vendeu ao exterior. Isso é o
que eu sei pela documentação que entrou na Federação e saiu da
Federação.
O SR. DEPUTADO EDUARDO CAMPOS – O senhor conhece
a situação econômico-financeira do Atlético Paranaense. Como é que é?
Ele é um clube que…
O SR. ONAIREVES NILO ROLIM DE MOURA – Eu diria
que o Atlético Paranaense conseguiu, com essa vinculação com o Sr. Juan
Figer, vamos chamar assim, com esse contrato, não sei que tipo de
relacionamento comercial ele tem, mas, depois desse relacionamento, o
Atlético conseguiu construir o seu centro de treinamento, conseguiu
construir o seu estádio, conseguiu saldar até impostos que tinha atrasados
na área da Previdência, enfim, com essas transações. Eu diria que o
Atlético conseguiu neste período arrecadar um dinheiro invejável para...
Tanto é que hoje a sua situação patrimonial é muito diferente daquela
que tinha há três anos atrás.
9. CONCLUSÕES , ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES
Da análise de todos os documentos e dos depoimentos de Onaireves
Nilo Moura, conclui-se que a Federação Paranaense de Futebol é gerida de forma
temerária nos campos administrativo, fiscal e financeiro.
Constatou-se sonegação fiscal, ingerência de ordem econômica da
Federação sobre os clubes e da empresa transmissora de jogos sobre a Federação. Além
disso, a Receita Federal deve ser comunicada para que examine as contas bancárias
utilizadas pela Federação, em especial aquela constituída para a construção de estádio
de futebol.
Recomenda-se uma reforma estatutária para limitar o mandato da
diretoria da entidade em no máximo quatro anos, impedindo a recondução aos cargos;
para permitir uma maior autonomia do conselho fiscal; para obrigar a realização de
licitação para a aquisição de bens e de material esportivo; e para estabelecer maior
transparência nas contas da Federação e nos repasses de verbas que envolvam a
entidade e os clubes.
Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao
Ministério Público Federal, ao Ministério Público do Estado do Paraná e ao Ministério
Público Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná, com base na Lei n.º
9.504/97.
PERNAMBUCO
1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DAS FEDERAÇÕES :
O estatuto da entidade, alterado pela última vez em 04/07/2000, por
assembléia geral extraordinária, dispõe que a Federação Pernambucana de Futebol é
uma “sociedade civil para fins desportivos, com personalidade jurídica e patrimônio próprios” (art.
1º).
Trata-se de uma entidade sem fins lucrativos.
O estatuto define como “poderes” da entidade: a assembléia geral, o
Conselho Fiscal, a Diretoria e a Presidência (art. 6º).
2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA:
A Federação é presidida por Carlos Alberto Gomes de Oliveira.
3. SITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA
3.1. DOAÇÕES DA FEDERAÇÃO A TERCEIROS
A Federação Pernambucana pagou à empresa Brasifactor Fomento
Comercial Ltda, em diversas parcelas, o montante de R$ 397.569,15, em 1998, e de R$
44.000,00, em 1999. Conforme depoimento do presidente da Federação, esse dinheiro
refere-se a contratos que os clubes Náutico e Santa Cruz fizeram com a mencionada
empresa, como adiantamento dos recebimentos que estes teriam, fruto do contrato
entre a Federação e a Secretaria da Fazenda do Estado (referente à troca da nota fiscal
por ingressos). Assim sendo, a Secretaria repassaria à Federação uma determinada
verba, e parte desta seria encaminhada a cada um dos clubes envolvidos. A empresa
Brasifactor anteciparia a receita dos clubes. A Brasifactor que tem como um dos seus
dirigentes o presidente do Sport Recife o Deputado Federal Luciano Bivar.
Outra movimentação observada pela CPI refere-se a que envolve a
empresa Meta Iniciativas Culturais e Marketing, beneficiada, em 1998, por um
montante equivalente a R$ 600.000,00. Em seu depoimento, o presidente da Federação
esclareceu o fato:
“ Marketing, foi o seguinte: o Governo para promover a campanha
Todos com a Nota, fez uma concorrência e essa empresa ganhou a
concorrência do Governo. Então, ela fez toda a publicidade da campanha
Todos com a Nota, e a federação pagava para ela, porque as verbas do
Governo, ele já repassava para a federação com o compromisso de pagar
as notas.”
Quanto à movimentação financeira gerada pelo programa “todos com a
nota”, verifica-se um aumento significativo no ano de 1998. Carlos Alberto tentou
esclarecer a movimentação em seu depoimento, deixando, no entanto, dúvidas quanto
às diferenças verificadas nos diferentes períodos. Seguem, abaixo, trechos do seu
depoimento:
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Dr. Carlos Alberto, por
quais motivos o ano de 98 se destaca como o que mais teve doações da
federação a terceiros? Se o senhor quiser ver a tabela: 95,
R$275.000,00; 96, R$541.000,00; 97, R$781.000,00; 98,
R$2.604.190,00...
O SR. CARLOS ALBERTO GOMES DE OLIVEIRA – Por
causa desse projeto. O dinheiro entrou e o dinheiro saiu.
Relação das doações da Federação a terceiros, incluindo os valores referentes ao
programa “Todos com a nota”
Ano
Valores (em reais)
1995
275.000,00
1996
541.902,18
1997
781.938,86
1998
2.604.109,68
1999
1.804.075,14
2000
1.031.947,54
3.2. INSS
Junto à previdência social, a Federação tem uma dívida de R$ 28.604,70,
não tendo optado pelo programa REFIS.
4. RELAÇÃO COM A CBF
Entre os anos de 1998 e 2000, a CBF não repassou verbas
mensais regulares à Federação Pernambucana, limitando-se a ter
encaminhado R$ 100.000,00, de uma só vez, em novembro de 1999. O
presidente explicou que se tratava de uma remessa para o Náutico, de
Recife:
“Eu tô falando isso porque a Federação Pernambucana nunca
recebeu um centavo da CBF. Eu nunca recebi um centavo da CBF. Os
senhores podem encontrar aí uma transferência de cem mil reais, mas foi
para o Náutico a pedido do Deputado Wilson Santos(?), do Deputado
Inocêncio Oliveira que foram ao Ricardo Teixeira e pediram e ele
mandou para o Náutico. E eu tenho o recibo aqui do Náutico recebendo
os cem mil reais e vou mostrar aos senhores. A Federação como
instituição nunca recebeu um centavo de CBF.”
Curioso é o fato de que o Náutico não vem recebendo recursos da CBF,
nem da Federação Pernambucana, pelos dados obtidos por esta Comissão. Já o Sport
recebeu próximo de R$ 3 milhões, da CBF, e cerca de R$ 2 milhões da Federação, nos
últimos cinco anos. O Santa Cruz, R$ 140 mil, da CBF, e R$ 1,13 milhão da Federação.
Conforme critério adotado e publicamente assumido por Ricardo
Teixeira, apenas as entidades com dificuldades financeiras seriam beneficiadas por
repasses mensais da CBF. Por esse critério, a Federação Pernambucana estaria, aos
olhos da CBF, em uma situação considerável estável.
Em seu depoimento à CPI, o presidente da Federação afirmou que a
aprovação das contas da CBF não se dá de forma adequada. À assembléia são
disponibilizadas informações contábeis de maneira tal que seus membros ficam
impossibilitados de realizar qualquer tipo de conferência. A aprovação se dá, pois, sem
o conhecimento real das contas e de forma sumária, contrariando qualquer regra de
probidade e transparência.
O presidente da Federação pernambucana questiona, em seu
depoimento, a postura da CBF em face à própria gestão do futebol brasileiro, em
especial no tocante à ausência de uma direção específica para o futebol. É o que nos
aponta o depoimento:
“Então, era um dilema terrível que eu não tenho hoje mais,
porque os clubes já têm quem os defenda, não precisam mais de mim, eu
esto livre, stand-by, para dizer aos senhores aqui o que estou dizendo
ao Brasil: o futebol brasileiro está desorganizado, o futebol brasileiro está
sem comando, a CBF está desde janeiro sem um diretor técnico e de
futebol, em cima de uma competição, fervendo uma competição, que é a
Copa do Brasil. E, na iminência de começar o campeonato brasileiro,
não tem um diretor de futebol. Isso é um descaso administrativo que nós
não podemos concordar”.
5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL
Não foram levantadas informações e denúncias relevantes no tocante à
relação entre a Federação Pernambucana de Futebol e a política local.
6. CONTRATOS COM A TV
Conforme documentação encaminhada à CPI, a Federação
Pernambucana firmou os seguintes contratos envolvendo a transmissão de jogos de
futebol por TV:
Contrato de cessão de direitos com a Traffic Assessoria e Comunicações S/C
Ltda., prevendo-se a exclusividade “absoluta” dos direitos de exploração, por parte da
Traffic, dos jogos dos campeonatos pernambucanos da 1ª divisão dos profissionais, dos
anos de 1995 a 1998, com a possibilidade de multa, em caso de rescisão e contra o
culpado pela rescisão, no valor de R$ 1.538.916,00 (o dobro das parcelas que a
Traffic obriga-se a pagar);
Contrato de intermediação com a Traffic Assessoria e Comunicações S/C
Ltda., o qual prevê o recebimento, pela Federação, de R$ 47.520,00 pelo papel de
intermediação desta junto aos clubes, tendo como referência o contrato acima, vigente
entre os anos de 1995 a 1998;
Contrato de cessão de direitos com a Luva – Propaganda e Promoções Ltda.,
prevendo-se a exclusividade “absoluta” dos direitos de exploração, por parte da Luva,
dos jogos dos campeonatos pernambucanos da 1ª divisão dos profissionais, dos anos de
1999 a 2002, num valor total de R$ 2.146.000,00, com possibilidade de multa, em
caso de rescisão, e a permissão para a empresa comercializar os direitos adquiridos com
terceiros, sem a necessidade de permissão da Federação;
Contrato de cessão de direitos de transmissão do campeonato profissional de
futebol da temporada do ano 2000, tendo como cedente a Costa Dourada Mídia e
Eventos Ltda., como cessionária a TV Globo de Recife Ltda, e como anuente a
Federação Pernambucana de Futebol. A cessionária passa a gozar do direito de
transmissão da temporada, mediante pagamento à cedente de valor correspondente a
R$ 870.000,00, além do já compromissado conforme contrato acima, de R$
550.000,00 em favor da Federação.
Da análise dos contratos celebrados pela Federação envolvendo a
transmissão dos jogos dos campeonatos pernambucanos de futebol, desde 1995,
conclui-se que a Federação “vendeu” seu produto de qualidade por preço insatisfatório,
considerando-se ainda como custo a possibilidade real de intromissão das empresas
contratadas na definição de calendários, detalhes, critérios e participantes dos
campeonatos. Do depoimento do Carlos Alberto, confirma-se a qualidade do produto
vendido pela Federação:
“Nós fizemos um contrato com a Traffic, na esperança de
transmitir nosso campeonato. A Traffic comprou nosso campeonato e
botou na gaveta. Aí, não passou nenhum jogo. Foi aí que eu rompi com
a Traffic e fiz um contrato com a luva co-assegurado pelo Luciano do
Valle, que começou a transmitir os jogos do Campeonato Pernambucano.
Os jogos eram transmitidos na segunda-feira à noite, tinham uma
audiência muito grande, e aí a Globo interessou. Então a Globo
mandou me chamar no Rio de Janeiro. Disse: Eu quero o Campeonato
Pernambucano. Eu digo: Olha, eu sou um homem de palavra. Meu
campeonato eu vendi a Luciano do Valle, e já ofereci à Rede Globo a
mais de 5 anos e os senhores nunca me deram a menor atenção. Eu vendi
a Luciano do Valle e chegou. Eu vendi a Luciano. Luciano é que
começou a desenvolver através da TV de Pernambuco que era do
Governo naquela ocasião. E o Campeonato ganhava em mídia da
Globo. Foi um sucesso a segunda-feira as 8, porque era o melhor dia
para televisão, segunda-feira às 8. Aí, a Globo em cima. Eu digo: olhe,
eu não abro mão de Luciano do Valle. Os senhores conversem com
Luciano do Valle. Eles conversaram com Luciano do Valle e Luciano
fechou com eles e fechou o contrato com a Globo.”
7. RELAÇÃO COM OS CLUBES
Dos documentos enviados à CPI e da ouvida do Carlos Alberto Oliveira,
não apuramos problemas relevantes na relação entre a Federação e os clubes. Registrese, no entanto, o protesto do presidente da Federação, publicado pela imprensa em
novembro de 2000, contra a idéia dos clubes bahianos Bahia e Vitória, e do
pernambucano Sport de Recife, quanto à possibilidade destes não disputarem mais os
respectivos campeonatos estaduais, mas apenas o Campeonato do Nordeste.
8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DO FUTEBOL
O Deputado Federal José Mendonça denunciou, em Sessão dessa CPI,
que o empresário José Luiz Galante, atuante no estado de Pernambuco, explorava
atletas adolescentes, impondo-lhes contratos com cláusulas explicitamente abusivas.
Conforme investigado por essa CPI, e tendo acesso a um dos contratos do José
Galante, encaminhado pelo mencionado Deputado, o “empresário” José Luiz Galante
atua em duas atividades: na intermediação de contratos entre Federações e a Telemar,
com o objetivo de imprimir cartões telefônicos com as marcas dos clubes; e no
agenciamento de atletas junto aos clubes.
O Deputado José Mendonça apresentou à CPI o contrato entre o
mencionado empresário e o atleta Laércio José dos Santos.
8.1. CONTRATO ENTRE EMPRESÁRIO JOSÉ LUIZ GALANTE E ATLETA
O contrato denomina o empresário de representante, e o atleta de
representado. Conforme o contrato, o tempo do atleta seria dedicado exclusivamente a
atividades desportivas. Na hipótese de se tratar de adolescente (maior de doze e menor
de dezoito anos), a cláusula contraria o que dispõe o Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA), que determina ser a educação direito da criança e do adolescente e
dever do Estado. A prioridade nesta fase não é o trabalho, mas a educação, e ao tratar
de atividade laboral, esta deve se pautar na formação técnica do indivíduo.
O objeto do contrato é a regulação da relação profissional entre as partes,
o que põe em dúvida um elemento essencial no contrato de trabalho entre o atleta e o
clube, que é a vontade. A ingerência do empresário como representante do atleta na
relação de emprego deste com o clube, é estranho ao Direito do Trabalho.
Prevê-se, pelo contrato, que a atuação do empresário não se limitaria ao
território nacional, se estendendo ao exterior. O deslocamento do atleta menor de
dezoito anos é regulado pelo ECA. O contrato, mesmo que assinado pelos pais ou
responsáveis do adolescente, não pode conter uma liberalidade geral ao empresário, a
ponto deste promover deslocamentos ou viagens do menor. Cada viagem ao exterior
deve ser acompanhado de uma autorização prévia, o que não é previsto no contrato.
O contrato dispõe sobre o direito exclusivo do empresário à exploração
da imagem do atleta. Em outra cláusula, o empresário passa a ser credor de 10% de
todos os ganhos do atleta, inclusive seus salários, o que também contraria os
dispositivos do Direito do Trabalho (já que os salários são irrenunciáveis).
O prazo de vigência do contrato é de dez anos, o que demonstra o
quanto é arbitrário o instrumento. A parte que der causa à rescisão do contrato ou que
contrariar seus dispositivos, deverá pagar multa de dois milhões de dólares à outra. O
valor estabelecido como multa desrespeita os princípios gerais dos contratos, seja ao
dispor sobre valor que exorbita, em muito, o próprio objeto do contrato, ou ao
promover um imenso desequilíbrio entre as partes.
Na hipótese do atleta desejar rescindir o contrato, certamente não poderá
fazê-lo, Sendo assim, configura-se uma situação de “compromisso” do atleta análoga ao
trabalho escravo (neste sentido, a legislação brasileira conta com importantes inovações
que prevêem tais situações, a saber: as Leis nº 8.683/93 e nº 9.777/98).
É prevista ainda a possibilidade de solução de conflitos por meio da
figura do “árbitro”, sem que haja um detalhamento das suas atribuições no contrato.
Ao dispor sobre arbitragem sem um regramento específico, que permitam a liberdade e
o equilíbrio das partes, o contrato provoca uma situação de temeridade para o atleta,
tendo em vista o evidente desequilíbrio entre as partes contratantes. Tendo em vista o
que dispõe o contrato, trata-se de mais uma cláusula que proporciona ao empresário
um pleno domínio sobre a vontade do atleta.
Perguntado sobre o pagamento de R$ 89.658,00, em 01/02/2000, a José
Luiz Galante, o presidente da Federação respondeu que esse valor referia-se à parte do
empresário quando da intermediação no contrato firmado entre a Federação e a
Telemar. Carlos Alberto Gomes de Oliveira afirmou ainda que o referido empresário é,
hoje, “persona non grata” nos meios futebolísticos de Pernambuco. Seguem, abaixo,
trechos do depoimento do Carlos Alberto acerca do mencionado empresário:
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – O senhor José Luiz
Galante atua como empresário de jogador em Pernambuco?
O SR. CARLOS ALBERTO GOMES DE OLIVEIRA – Até
essa data, pra mim, ele atuava como empresário assim de arranjar
contratos. Depois que o Santa Cruz me denunciou que ele tinha,
digamos, procuração de jogadores, que eu achei um absurdo, e eu vi um
contrato, eu mandei um recado para que ele não me procurasse mais na
federação, porque eu não o receberia mais. Eu não gosto de explorador de
menino.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Então, o senhor, como
Presidente da Federação, não tinha conhecimento desses contratos.
O SR. CARLOS ALBERTO GOMES DE OLIVEIRA –
Nenhum. Eu fiquei horrorizado, o sujeito pegar um menino e botar uma
multa de 2 milhões de dólares. Isso não existe, não cabe na cabeça de
ninguém. É a escravidão branca.
9. CONCLUSÕES , ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES
Da análise de todos os documentos e do depoimento do presidente da
Federação Pernambucana de Futebol, verificam-se problemas de ordem administrativa,
financeira e fiscal.
Constatou-se ausência de entrega de declaração de Imposto de Renda nos
exercícios de 1996 e 1997.
Suspeita-se de ingerência e controle político da emissora de TV sobre a
Federação, ao menos no ano de 2000.
Recomenda-se reformar os estatutos para suprimir a possibilidade de
remunerar os dirigentes da entidade e para limitar o mandato da diretoria da Federação
em um máximo de quatro anos, além de se buscar impedir a recondução aos cargos,
permitir uma maior autonomia do conselho fiscal, obrigar a realização de licitação para
a aquisição de bens e de material esportivo e estabelecer maior transparência nas contas
da Federação e nos repasses de verbas que envolvam a entidade e os clubes.
Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao
Ministério Público Federal, ao Ministério Público do Estado da Pernambuco – no
tocante ao tratamento que o empresário José Luiz Galante dispensa a atletas
adolescentes, e no que se refere à provável ingerência de empresas transmissoras de
jogos pela TV sobre os critérios e calendários dos campeonatos pernambucanos, assim
como a escolha dos clubes participantes –, e ao Ministério Público do Trabalho – em
face da imposição contratual que o empresário José Luiz Galante ao atleta, em que o
mesmo pode vir a ser tratado em situação análoga ao trabalho escravo.
PIAUÍ
1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DA FEDERAÇÃO
Conforme seu Estatuto, a Federação de Futebol do Piauí é sociedade civil
de direito privado, com personalidade jurídica própria, regida pelos artigos 20 e 23 do
Código Civil Brasileiro.
Trata-se de típica entidade de direito privado sem fins lucrativos.
2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA
Luís Joaquim Lula Ferreira preside a Federação há oito anos.
Anteriormente, Luís Joaquim foi tesoureiro e diretor financeiro da entidade.
O que mais chamou atenção a esta Comissão, no tocante à situação
administrativa da Federação Piauiense, foi o fato de seus dirigentes estarem totalmente
voltados, até 1999, para a operacionalização do bingo Poupa Ganha, o que consumia
todo o esforço administrativo daquela entidade. Analisando o estatuto, percebeu-se
desvio dos objetivos capitulados nas alíneas do art. 3º. Questionado sobre o assunto,
seu presidente, Luís Joaquim Lula Ferreira, afirmou que assembléia geral da entidade
havia deliberado favoravelmente à vinculação da Federação com os bingos:
“O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Permite, foi os
próprios clubes que decidiram, porque era um repasse que era feito
diretamente aos clubes de futebol. Foi quem conseguiu em 97 e 98
segurar o futebol do Piauí.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Consegue dizer qual é o
artigo do estatuto que permite?
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Não, isso foi
decidido em assembléia geral. Pra gente assinar, nós convocamos uma
assembléia geral.”
No item seguinte, o bingo será examinado de forma mais detalhada.
Não foi constatada remuneração oficial da Federação aos seus dirigentes.
3. SITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA
3.1. IMPOSTO DE RENDA E OUTROS TRIBUTOS
A Federação não entregou as declarações de Imposto de Renda de
Pessoa Jurídicas referentes aos exercícios de 1996 e 1997.
A entidade também não recolheu o COFINS, conforme as declarações
de Imposto de Renda. Perguntado à respeito, Luís Joaquim não esclareceu o assunto:
“O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - O que nós estamos
observando aqui esse Imposto de Renda é a questão como outras
Federações, não é exclusividade do senhor, também não têm recolhido o
COFINS.
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Tem que ver com
minha contabilidade.”
A Federação declarou à Receita Federal ser proprietária de bem imóvel
de valor inexpressivo, incompatível com a qualificação do imóvel mencionado por Luís
Joaquim:
“O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - A Federação do Piauí
tem algum bem imóvel?
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Tem o prédio
dela.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Tem um prédio?
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Tem sim, senhor,
um prédio próprio.”
3.2. F EDERAÇÃO E BINGO
Fazendo um cruzamento de sua movimentação financeira e o que foi
declarado à Receita Federal, esta CPI deparou-se com um paradoxo: o de como uma
entidade que tem a receita bruta (desconsiderando todas as despesas) de R$
1.304.090,71, entre 1997 e 1999, poderia ter gasto, no mesmo período, a quantia
aproximada de R$ 6.867.660,00, sendo R$ 2.588.397,00 com compras de veículos e R$
4.279.263,00 em premiações. Uma análise mais pontual dos cheques revelou que a
Federação foi uma das operadoras do bingo Poupa Ganha, com cerca de 97% de sua
movimentação financeira relacionada com as atividades necessárias para o
funcionamento do bingo.
Apesar de constarem em sua relação de cheques emitidos retenções e
recolhimentos do Imposto de Renda, relativos aos prêmios pagos em dinheiro, não foi
constatada, em suas declarações e em seus balanços, qualquer indicação da atividade de
bingo por parte da Federação, apesar do expressivo dinheiro mencionado
anteriormente. O Poupa Ganha “passa ao largo” nos documentos fiscais da Federação
de Futebol do Estado do Piauí.
Com efeito, o art. 75 do Estatuto da Federação traz a seguinte vedação:
“Art. 75 Além das proibições resultantes dos deveres impostos
neste Estatuto e na legislação vigente, é expressamente vedado às Ligas
Municipais e Associações:
...............................................................
3- Interessar-se em apostas de qualquer espécie de jogo proibido
ou permitir que se façam em suas dependências;”
Ainda relacionado ao bingo, a movimentação bancária da Federação
revelou que vários prêmios foram adquiridos, ou pagos, através de valores em espécie
oriundos de cheques nominais emitidos pela própria Federação. O procedimento mais
comum seria emitir o cheque nominal à concessionária do veículo ou ao ganhador do
prêmio, como, aliás, por vezes aconteceu.
Acerca dos bingos, seguem abaixo trechos do depoimento do Luís
Joaquim que esclarece a potencialidade do negócio e o controle da exploração dos
bingo sobre a entidade que tem por função a valorização do futebol:
“O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - A Federação recebia
quanto?
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Sete por cento.
Na... no bingo de dezessete a dezoito mil
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO –Dezessete a dezoito mil?
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - É.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - O que o senhor disse ao
Ministério Público Federal é que a Federação recebia entre trinta e
quarenta mil mensais.
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Não, eu tô
falando em termos de bingo, dependendo da (Ininteligível.).
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Do bingo, pois é.
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Pois é, isso é por
semana. Isso é em... em... todo é... esse bingo era semanal. Era semanal.
Dependia do mês, ele podia chegar a trinta, a quarenta mil reais.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Pois é, a movimentação
bancária do senhor mostrou... da Federação mostrou uma movimentação
pelo menos dez vezes superior a isso.
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – Ah, tudo bem,
mas é o que nós recebíamos.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Mas o senhor fala de
trinta e quarenta mil reais e tem uma constatação de dez vezes acima
desse valor.
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Olha, veja
(Ininteligível.).
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - O senhor confirma isso?
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – Não, veja o
seguinte: eu disse agora pra... a Receita, a gente conversando, eles
mostraram agora uma conta... tinha uma conta do Poupa-Ganha que
era em nome da Federação que era pra compra da venda das cartelas.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Eu não entendi. Pode
repetir por favor.
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Tinha uma conta
do... do Poupa-Ganha em nome da Federação, com procuração pública
pra eles, que eles colocavam da venda das cartelas na conta da Federação,
que eles movimentavam.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Sonegação fiscal,
movimentação (ininteligível.) não declarada.
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Não, eles me
garantem que tá tudo legal. O que eles passam pra gente é isso: a coisa
que (ininteligível.) pra V.Exa. Nós acreditamos (Ininteligível.)
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - A Federação não tem
assessoria jurídica, não tem advogado?
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Tem sim, senhor.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Tem?
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA –Tem, e a gente...
(?)
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - E esses contratos que o
senhor firmou com o Poupa-Ganha não passou pela consultoria jurídica.
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Nós conversamos
com todos, até com os próprios filiados.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - E os advogados disseram
que tá tudo bem, que tá tudo OK, ninguém (ininteligível) nada.
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Não, no início
tava tudo OK, não tem por que reclamar. Nós tamos agora recebendo a
coisa que eu tô dizendo a V.Exa. da fiscalização da Receita.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Quarenta por cento de
sonegação fiscal?
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Eu não sei.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - É o que tá aqui
(Ininteligível.)
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Eu não...
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - O senhor sabe quem
sabe?
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Hum.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - O Ministério Público e a
Polícia Federal.
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Tudo bem. Nós
falhamos na defesa.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Eles sabem disso. O
senhor não sabe.
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Não, eu tô
sabendo a coisa que eu tô dizendo pra V.Exa: a Receita Federal foi até
nós e nós tamos junto ao Poupa-Ganha pra provar isso a eles.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Tem um número aqui,
Sr. Luís, que me impressiona, Presidente: de 97 a 2000, houve uma
movimentação dessa história do Poupa-Ganha, certo, de ... de compra de
carros de 6,5 milhões de reais de compra de veículos. É muita coisa, é
não, Sr. Luís?
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Eles compravam
toda semana seis carros, eram premiados seis carros.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Seis carros toda semana?
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Toda semana.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Um negócio gigantesco
esse, hein?
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Era seis... seis
carro toda semana, com certeza. Não era só no Piauí.”
(g.n.)
Outros aspectos importantes sobre bingos foram tratados no depoimento
do Luís Joaquim. Quanto ao histórico da relação entre bingos e Federação piauiense, o
presidente esclarece a questão em seu depoimento:
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Do início do
pedido até, do iniciozinho, que decidiu que ia ter esse bingo, até a
autorização do INDESP, quanto tempo demorou?
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – Não,
veja bem o Senhor, esse bingo começou no Piauí em 95, não com a
Federação. Em 95, esse bingo começou com o Piauí, lá no Piauí, e foi
até com um filiado nosso, o River Atlético Clube, porque em 97, o
próprio Paulo Guimarães resolveu fazer com a Federação, porque tava
ajudando só o River, e começou uma pressão, tanto da parte da..., porque
lá os dois clubes de maiores torcidas é River e Flamengo. A torcida do
Flamengo começou a não comprar, a fazer uma pressão pra ajudar o
esporte num todo. Aí, foi decidido fazer com o nome da Federação, que
essa repassaria para os clube. Então, em 95 a 97 foi feito com o River
Altético Clube, em 97 a 99 feito com a Federação de Futebol. Em
novembro de 99, desculpe, não é 97, em 99, passou a ser feito com o
Comitê Olímpico Brasileiro.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Depois que
fechou o Poupa-Ganha nessa relação de bingo com a Federação do Piauí,
a Federação continuou fazendo bingos?
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – Nós
temo um bingo permanente, que é o Bingo Royale, é aquele de salão de
jogos só.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Que é de
propriedade da Federação?
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – Não,
não, não, não, nós só cedemo o nome da entidade pra realização do bingo,
nós não fizemo nenhum bingo.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – E qual é a
arrecadação com esses bingos?
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – É 7%,
o do Pupa-Ganha dava...
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – A Federação
cedeu o nome...
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – Cede o
nome pra empresa.”
Já no que se refere à fiscalização da prestação de contas dos bingos pela
Federação, observa-se uma absoluta precariedade, mesmo considerando-se que o
responsável pelo bingo, o Paulo Guimarães, está sendo processado por sonegação de
impostos:
“O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – A Federação faz
fiscalização sobre esse, esses bingo pra ver se esses 7% tá correto ou tá
sonegado?
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – Faz, eles
mostram a vendagem, o Poupa-ganha mostrava a vendagem de cartela
toda, que vinha pra...
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Isso aí é tranqüilo,
mostrar a vendagem, ...
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – É verdade.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - ... a gente mostra.
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – É, não adianta
eu também dizer aqui pro Senhor ou a Federação. Ele mostrava e a
gente concordava. A gente tinha confiança, como temo confiança. A coisa
que eu digo pra V.Exa.: o Paulo Guimarães pra gente é um empresário
da cidade, conhecido, que tem residência fixa lá.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – E sonega imposto em
Minas Gerais. Então, ...
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – V.Exa. tá
dizendo, eu não...”
3.3. OUTRAS MOVIMENTAÇÕES
A movimentação bancária também revelou que houve vários depósitos
de cheques emitidos pela Federação, nominais a ela própria, em bancos nos quais a
entidade sequer possuía conta corrente.
4. RELAÇÃO COM A CBF
Como acontece com as demais Federações, também ocorreram doações
questionáveis da CBF. Em setembro de 1998, a Confederação repassou R$ 36.000,00 à
Federação Piauiense, seis vezes a mais que nos meses anteriores e posteriores.
Setembro foi exatamente o mês anterior às eleições. Ficou sem explicação em que foi
gasto esse dinheiro “extra”. A seguir, gráfico com doações da CBF para a Federação:
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/2000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/99
NOVEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
70.000
60.000
50.000
40.000
30.000
20.000
10.000
0
JAN/98
R$
SETEMB
DOAÇÕES DA CBF PARA A
FEDERAÇÃO DE FUTEBOL DO PIAUÍ
1998 - 2000
MESES
Fonte: Contabilidade CBF / CPI CBF Nike
Ainda cabe destacar que o Presidente da Federação Piauiense admitiu que
esteve presente na reunião que aprovou as contas da CBF, em 1998 e 1999. Nessa
reunião, foram aprovadas as contas da Confederação relativas a 1998, ano em que a
CBF contratou os dois primeiros empréstimos junto ao Delta Bank, transações que
estão sendo investigadas por esta CPI.
5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL
Não foi identificada, explicitamente, nenhuma doação da CBF ou da
própria Federação a políticos do estado, tendo inclusive a negativa do presidente da
Federação, durante seu depoimento; restou apenas a “coincidência” de datas apontada
no item anterior.
O proprietário do bingo Poupa Ganha, Paulo Guimarães, foi citado no
Relatório da CPI do Narcotráfico, que sugeriu ampliar investigações sobre o bingo.
Segundo concluiu a CPI do Narcotráfico, o crime no estado do Piauí tem uma forte
base no desmonte de veículos e na fraude de seguros. Como a Federação premiou seus
ganhadores com inúmeros veículos, pode-se dizer que houve um incremento de
aproximadamente R$ 2.600.000,00 no comércio de veículos do Piauí, o que,
teoricamente, aumentaria a possibilidade de desmonte de veículos e fraudes a seguros.
6. CONTRATO COM TELEVISÃO
A Federação do Piauí, e dez clubes locais, assinaram contrato com o
Sistema Timon de Radiodifusão Ltda., para a transmissão dos jogos do campeonato
pela TV da temporada 2000. O contrato está plausível, não havendo ingerência do meio
de comunicação na condução das atividades futebolísticas no estado.
7. RELAÇÃO COM OS CLUBES
Não houve denúncias ou informações relevantes sobre a relação entre
clubes e Federação. No entanto, cabe o registro sobre o grau de desinformação do
presidente da Federação do Piauí no tocante ao futebol amador do seu estado. Esse
tema merece relevo tendo em vista que a Federação movimentou um valor expressivo
de dinheiro na exploração de bingos e, por outro lado, não conhece a realidade do
futebol local. Seguem trechos do seu depoimento:
O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Também quero
registrar que não tenho nenhuma oposição a que o futebol receba dinheiro
público. Se o Estado pode dar, o Governo, a União pode dar bilhões de
dólares de subsídios para empresas multinacionais que se instalam no
Brasil, que não recolhem impostos — como deu recentemente para a
Ford lá no Estado da Bahia, mais de 1 bilhão e 600 milhões —, dá na
Zona Franca de Manaus, dá no Brasil inteiro, por que que não pode dar
pro futebol também? Por que não pode dar subsídio, e isenção fiscal para
os clubes e as federações? O problema é dar, e quem recebe prestar contas,
porque é uma forma de dinheiro público. O clube então presta contas: “
Deixei de recolher tais impostos, contribuições e taxas, e apliquei esse
dinheiro no centro de treinamento, no amparo de crianças, na assistência
médica, odontológica, escolar”, eu acho que essa é que é a questão. A
minha opinião é que o Estado deve também subsidiar o esporte, se
subsidia bancos, empresas multinacionais que fazem um PROER pra
enterrar 20 bilhões de dólares, então, que subsidie crianças também, que
podem jogar, se proteger da droga e da marginalidade jogando futebol.
Agora, a contrapartida é que os clubes e as federações devem prestar
contas disso, porque é dinheiro do povo; não é nem prestar contas porque
é dinheiro público, é dinheiro do trabalhador. Seu Luís quanto
praticantes de futebol há no Piauí, entre profissionais, amadores,
quantos praticantes?
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – Excelência, na
federação, a federação, quando nós assumimos, nós acabamos com as
ligas, ficamos só com os times profissionais, coisa que tô dizendo pra
V.Exa, hoje nós temos 7 times profissionais, e os outros 3, a Sociedade
Esportiva Tiradentes, que só tá com um time sub-15, sub-17; o Piauí
Esporte Clube, e o (Ininteligível) Esporte, que também estão com sub15, sub-17, sub-20.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Você não sabe,
então?
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – Não, não sei
mesmo.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Certamente o
senhor foi em Floriano, em Parnaíba, em Picos, em Piripiri, ...
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – Não.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Em Santa
Cruz, em qualquer cidade do Piauí o senhor vai encontrar 4, 5, 8, 10
times.
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA – Não...é isso que
eu tô dizendo...
O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Quantas pessoas,
quantos atletas, entre amadores e profissionais, praticam o futebol do
Piauí? Eu pergunto isso porque no Brasil, a Fundação Getúlio Vargas
calcula que 22 milhões de brasileiros são praticantes desse esporte no
País, o que mostra o peso e o significado que ele tem para o Brasil.
Quantos têm no Piauí? Porque eu quero levar essas informações também
pra pôr no relatório, pra mostrar pra CBF que isso também é futebol.
Quer dizer, o futebol não é só o salário de 400 mil reais que o Flamengo
paga pro Gamarra, ou que o Santos paga pro Rincón, ou que o
Palmeiras e o Vasco podem pagar pro Edmundo ou sei lá pra quem,
pro jogador lá que ganha... O futebol também é essa prática amadora,
muitas vezes só do time que se reúne fim de semana, que eu acho que
integra esse patrimônio comum que é o futebol, que a CBF tem que
levar em conta, que as federações também tem que levar em conta. É
por isso que estou pedindo essa informação, se o senhor tem.
O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - Não, senhor,
tenho não, os dados corretos eu não tenho.”
8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DO FUTEBOL
Também não houve denúncias ou informações relevantes sobre a relação
entre Federação e empresários do futebol.
É relevante registrar que a relação entre bingos e Federação conta com a
presença do empresário Paulo Guimarães, que não explorava apenas bingo mas outras
atividades, conforme esclareceu Luís Joaquim em seu depoimento:
“O SR. LUÍS JOAQUIM LULA FERREIRA - ... ele como
V.Exa. tá falando, ele é um empresário, que tem um canal de televisão
no Estado do Piauí, tem um jornal, tem..., a revendedora da, da
Chevrolet é dele, tem uma distribuidora de remédio, tanto no Piauí,
Maranhão e Ceará, e, eu lhe digo com toda franqueza, não sabia.”
9. CONCLUSÕES , ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES
Da análise de todos os documentos e do depoimento do Luís Joaquim,
conclui-se que a Federação Piauiense de Futebol tem uma gestão temerária, seja em
termos administrativo, financeiro e fiscal.
Constatou-se sonegação fiscal e ingerência de atividade estranha ao
futebol (bingos) na Federação.
Por esses motivos, recomenda-se reforma estatutária para limitar o
mandato da diretoria da entidade em no máximo quatro anos, impedindo a recondução
aos cargos e para permitir uma maior autonomia do conselho fiscal, além de se
estabelecer maior transparência nas contas da Federação e nos repasses de verbas que
envolvam a entidade e os clubes.
Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao
Ministério Público Federal, ao Ministério Público do Estado do Piauí – no tocante à
ingerência da atividade relacionada a bingos –, e ao Ministério Público Eleitoral do
Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba, com base na Lei nº 9.504/97.
RIO DE JANEIRO
1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DA FEDERAÇÃO :
O Estatuto da Federação do Rio de Janeiro prevê, em seu art. 1º, que sua
personalidade jurídica seja de uma sociedade civil, constituídas pelas Associações e
Ligas Municipais, para fins desportivos. Cala, portanto, sua norma fundadora e
reguladora de suas atividades, sobre maiores detalhamentos de sua qualificação jurídica,
o que nos remete à legislação geral, qual seja, o Código Civil Brasileiro.
2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA :
O Presidente da Federação, Sr. Eduardo Augusto Viana da Silva, está a
frente há dezesseis anos. Não há previsão estatutária para que receba remuneração.
Também não foi constatado nenhum pagamento que indicasse remuneração ao Sr.
Eduardo Viana.
Cabe explicitar que a mídia, sistematicamente, afirma que o Sr. Eduardo
Viana vem se perpetuando à frente da Federação Carioca, em troca de favores às ligas
municipais interioranas e aos pequenos clubes. Os jornais apontam ainda o crônico
déficit da Federação carioca como conseqüência das despesas geradas para viabilizarem
tais favores.
Questionado sobre essas colocações da mídia, o Presidente da Federação
explicou o que consta nas alíneas de “a” a “e”, do art. 16 do Estatuto: quantidade de
votos diretamente proporcional à qualificação técnica do Clube, ou seja, time de
primeira divisão teria direito a mais votos do que time teoricamente mais desqualificado
tecnicamente.
Porém, esta CPI entende que tal fórmula de eleição não garante que haja
paridade eleitoral, senão vejamos: é trivial que clubes grandes e pequenos não
comungam de interesses comuns; como a quantidade de clubes e associações menores é
muito grande em relação aos clubes com direito a mais votos (86 contra 12), a equação
eleitoral fica desequilibrada, o que torna perfeitamente factível que os pequenos possam
decidir o resultado das eleições.
E como quem pode decidir são aqueles com menor capacidade técnicofinanceira, e por isso, naturalmente mais vulneráveis a qualquer tipo de acordo ou
favores, o Senhor Eduardo Viana, alia-se aos interesses dos pequenos, fornecendo
suporte financeiro, material, prestando favores, havendo, com isso, uma cooptação
inconsciente dos pequenos. Assim, o Presidente vem se mantendo há dezesseis anos no
comando do futebol carioca, a despeito de uma administração constantemente
deficitária, a despeito do descrédito que o futebol carioca enfrenta, da oposição dos
torcedores, enfim, a despeito de atitudes, muita das vezes ditatoriais, que maculam a
tradição do futebol do Rio de Janeiro.
Ressalte-se que o Sr. Eduardo Viana é cientista político, professor
universitário da matéria, portanto, tecnicamente habilitado para “trabalhar” qualquer
processo eleitoral. Tal habilidade restou comprovada, quando trouxe a baila, durante
seu depoimento, autores e personagens renomados da Ciência Política. Ressalte-se
ainda que ele participou da elaboração do Estatuto da Federação, onde constam as
regra da eleição.
CRÍTICAS À LEGISLAÇÃO ESPORTIVA
Há 16 anos no comando da FERJ, Eduardo Viana, 62 anos, fez críticas
duras a legislação desportiva. Considera que o País é infeliz em matéria de legislação,
comparada com a era Vargas, que teve a melhor legislação desportiva, considerando em
relação ao momento histórico. Analisou como modismo a Lei Zico e cheia de
inconstitucionalidades. Quanto a Lei Pelé, fez críticas severas, considerando que ela é a
grande culpada pela crise que se alastra no futebol. “Essa lei só prejudica o esporte”
disse o dirigente. Ela apenas modificou 11% da Lei Zico e serviu apenas para dar sanha
a uma vaidade pessoal e que a Nação paga pelo preço da irresponsabilidade dessa nova
lei.
Perguntado sobre o processo eleitoral informou que este se processa por
intermédio do voto plural paritário por nível de vinculação técnica. A prática do voto
plural foi motivação de ações judiciais e ocorreu após a mudança estatutária da
Federação. Não existe processo de voto por procuração.
Sobre os campeonatos regionais argumenta que estes representam a
vivência das células comunitárias em todos os segmentos, são mais de 600 clubes
profissionais no Brasil , que tendem a extinção se não ocorrem mudanças. O Futebol
pode ficar reduzido com 15 a 30 clubes, o que considera uma grande ameaça. Para a
grande mídia não interessa Ter pequenos clubes competindo, para ela interessa poder
contar e realizar jogos de grandes símbolos nacionais. O futebol não é o futebol das
grandes agremiações. O futebol é um fenômeno no Brasil, é uma atividade social,
melhor definindo, que alcança as áreas mais restritas e menos aquinhoadas da sociedade
brasileira, acrescenta o dirigente.
Em seguida, afirmou o Sub-Relator Léo Alcântara:
“O SR. DEPUTADO LÉO ALCÂNTARA - Sr. Presidente,
companheiros Deputados, Sr. Eduardo Viana. Sr. Eduardo Viana, o
senhor é presidente de uma federação importante, federação carioca que,
juntamente com a paulista, detêm, eu acho que provavelmente, 70% do
futebol nacional em termos de importância e de volume de recursos que
movimenta. Em primeiro lugar, eu queria deixar V.Sa. bastante
tranqüilo com relação à imparcialidade com que essa CPI vem hoje aqui
a Belo Horizonte. Eu sempre, quando tenho sido procurado, seja pela
imprensa, seja por colegas, eu sempre tenho procurado agir com a
imparcialidade em que o meu mandato e a minha qualidade de SubRelator das federações exigem. Quando sou indagado sobre
irregularidades nas federações, eu sempre tenho dito que houveram
denúncias, mas eu só irei me pronunciar sobre elas após ouvir as
explicações de V.Sas., porque a partir daí é que eu poderei fazer um
julgamento. Denúncias são feitas muitas, e a maioria irresponsáveis.
Então eu não posso fazer com que a minha boca seja a boca de pessoas
que não têm responsabilidade. Então daí a minha total imparcialidade
em estar aqui hoje presente para que nós possamos tirar quaisquer
dúvidas que existam e, mais ainda, o que nós da CPI queremos levar, e
faremos em nosso relatório final, é sugestões para que o futebol brasileiro
volte a ser o que era. Sugestões até mesmo para V.Sas., porque quando
passamos muito tempo vivenciando uma realidade, talvez fique até difícil
a gente olhar outras sugestões que iriam aumentar e proporcionar
melhorias nas entidades de V.Sas. e no futebol, porque o futebol é de
interesse público e de interesse nacional. Isso é o que eu tenho procurado
fazer e acredito que tenho feito com responsabilidade.”
3. SITUAÇÃO FISCAL/FINANCEIRA
A Federação não entregou as Declarações de Imposto de Renda de
Pessoa Jurídicas referentes aos exercícios de 1996 e 1997. Questionado sobre tal fato,
informou que não declarava, achando não ser obrigatório, uma vez que era isenta.
Perguntado sobre o déficit, o Sr. Eduardo Viana relatou acontecimentos
pontuais, tais como “WO” em jogos, fracasso do contrato com a TV Bandeirantes,
problemas com a loteria esportiva e outros, que não explicaram o porquê da constância
dos déficit, mesmo a despeito de um incremento na receita, como o observado em
1999 (181,6% a maior que 1998).
Nesse mesmo ano, a despesa com manutenção foi 113,7% maior que em
98, fato que suscitou a seguinte dúvida: Como pode tais despesas dobrarem, se o Ativo
Permanente praticamente se manteve o mesmo?? (R$ 1.205.551,92 em 1998, e R$
1.562.463,16 em 1999). Depreende-se, sem dificuldades, que despesa com manutenção,
basicamente, cuida do Ativo Permanente. As respostas, mais uma vez não foram
convincentes, gerando uma série de outras dúvidas e inconsistência entre respostas e
levando à conclusão de que a entidade gasta mais do que poderia, e que tais gastos são
precariamente lançados na contabilidade da Federação.
Ainda como exemplo do descontrole contábil aparecem os pagamentos
das quantias de R$ 220.000,00 ao Sr. Aremithas José de Lima, funcionário do Clube
Regatas Vasco da Gama, e R$ 100.000,00 ao Sr. Juan Figer Svirski, empresário que faz a
intermediação de jogadores. Sobre esses pagamentos, o Sr. Eduardo Viana não soube
dar explicações (uma alta quantia paga a pessoas físicas, por uma entidade deficitária) e
prometeu enviá-las a esta CPI, o que, dez dias após seu depoimento, ainda não havia
ocorrido.
4. RELAÇÃO COM A CBF:
Inquirido sobre a relação da Federação Carioca com a CBF, o Sr.
Eduardo Viana esclareceu que era membro nato da Assembléia Geral e que,
eventualmente, recebia ajuda da Confederação, citando o montante recebido em
dezembro de 1988 (R$ 155.000,00), a título de auxílio, quando a Federação passava por
dificuldades financeiras. Outros montantes menores foram repassados durante o ano de
1998, totalizando R$ 249.205,00, que não figuraram na declaração de Imposto de
Renda. Também sobre essa omissão, o Presidente da Federação entrou em contradição
por diversas vezes, sem conseguir ser convincente.
A seguir, gráfico com as doações da CBF para a Federação:
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/2000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/99
NOVEMB
SETEMB
MAIO
JAN/98
180.000
160.000
140.000
120.000
100.000
80.000
60.000
40.000
20.000
0
MARÇO
R$
JULHO
DOAÇÕES DA CBF PARA A
FEDERAÇÃO DE FUTEBOL DO RIO DE JANEIRO
1998 - 2000
MESES
5. CONTRATO COM TELEVISÃO
Uma análise do contrato da federação com a TV Globo, revela que a TV
Globo adquiriu uma enorme capacidade de ingerência sobre o futebol do Estado do
Rio de Janeiro, tornando-o seu refém, uma vez que até a tabela com jogos a serem
realizados compõe o contrato, como anexo. A predominância da emissora foi
corroborada com a multa que a Globo anunciou que aplicaria à Federação Carioca, em
abril de 2001, no valor de nove milhões de reais! Segundo o Sr. Eduardo Viana, nada
foi pago nem o será; pelo visto, a Justiça decidirá. A impressão que fica para esta
Comissão é que, verdadeiramente, como nas outras federações, o futebol carioca
também é vitima dos interesses comerciais, dentre eles e com maior força, o televisivo.
RIO GRANDE DO NORTE
1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DAS FEDERAÇÕES
Conforme estatuto da entidade, cuja reforma foi registrada em
21/07/1997, a Federação Norte-Riograndense de Futebol é uma “sociedade civil, para
fins desportivos, com personalidade jurídica (...) e patrimônio próprio” (art. 1º), tendo
como objetivos: “dirigir (...) o futebol amador e profissional, promovendo a sua difusão
e aperfeiçoamento”; “promover campeonatos, torneios e competições de futebol”;
“incentivar, por meios de processos educativos compatíveis com o fundamento da
atividade institucional, a cultura moral, cívica e intelectual, sobretudo no meio das
gerações ais novas”; “estimular (...) a criação de bibliotecas”; e “facilitar o progresso
material e técnico de suas filiadas” (art. 2º).
Trata-se de típica entidade de direito privado sem fins lucrativos.
O estatuto define como “poderes” da entidade: a assembléia geral
(composta, conforme o art. 16, das associações das divisões de profissionais da capital,
das associações de amadores da capital e do interior e das ligas), o Tribunal de Justiça
Desportiva, o Conselho Fiscal, a Presidência e a Diretoria (art. 15). Os membros desses
“poderes” são proibidos de receber “qualquer forma” de remuneração “pelas funções
que exercem na Federação” (art. 10, § 3º).
2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA
Nilson Gomes da Costa ocupa o cargo de presidente da Federação há
três mandatos, ou oito anos.
3. SITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA
3.1. IMPOSTO DE RENDA E BENS NÃO DECLARADOS
A Federação, no período entre 1995 e 2000, apenas declarou Imposto de
Renda relativo aos exercícios de 1998 a 2000. Nestas declarações, não constam bens
imóveis ou veículos de propriedade da Federação. Ocorre que ao depor a esta CPI,
Nilson Gomes disse que a Federação tem como bem um estádio de futebol. Diante da
contradição entre seu depoimento e o que declarou à receita federal, o presidente
afirmou que aceitaria abrir seu próprio sigilo bancário, fiscal e telefônico. Acerca do
estádio e da exploração de lojas, não registradas em qualquer declaração de Imposto de
Renda, transcrevemos o seguinte depoimento do Nilson Gomes:
“O SR. NILSON GOMES DA COSTA – Mas... o ano passado a
Federação construiu algumas lojas pra... tanto pra servir seus filiados
como pra Federação alugar, para ter também alguma fontezinha de
renda. E contou exatamente com o apoio do Presidente Ricardo Teixeira.
Como também as Ligas, clubes amadores, que são em torno de quase...
(...)
Tem um estádio antigo que..., onde funciona a sede da Federação. Era,
foi o primeiro estádio construído em Natal, um terreno doado pelo exGovernador Juvenal La Martini, que foi construído esse estádio. O
terreno é do Governo do Estado.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Então sim, então, tem um
estádio. Além do estádio, qual outro patrimônio?
O SR. NILSON GOMES DA COSTA – Não tem nenhum outro
patrimônio.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – E essa questão da
construção de lojas que o senhor disse? O senhor disse que tava
construindo lojas para auferir aluguel.
O SR. NILSON GOMES DA COSTA – É, tem o estádio, e na
frente do estádio nós fizemos as lojas, as salas servem para alugar e a
Federação aluga a trezentos reais para cada.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – E quando que foi feita, e
quando foram feitas essas salas?
O SR. NILSON GOMES DA COSTA – Foram feita o ano
passado.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Ah, o ano passado.
O SR. NILSON GOMES DA COSTA – Foi.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Então, só dizer pro
senhor...
O SR. NILSON GOMES DA COSTA – Todas as lojas prontas.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - ...,então, pro senhor não
esquecer de declarar que foi, que tem essas salas no Imposto de Renda este
ano, ano/base, ano passado, bem como declarar que a Federação tem um
estádio, porque pela Receita Federal, ela não tem patrimônio nenhum na
Declaração do Imposto de Renda.
O SR. NILSON GOMES DA COSTA – É, o terreno, o terreno é
do Governo do Estado. Agora, o estádio é que é da Federação.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – O terreno é...
O SR. NILSON GOMES DA COSTA – É do Governo do
Estado.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Aí, tem concessão de uso
legal?
O SR. NILSON GOMES DA COSTA – Isto foi feito na época,
hoje, inclusive há a possibilidade até do Governo receber de volta esse
terreno. Eles tão querendo não só do estádio da Federação, mas como
outros, outras, como... Tem outro clube lá também que tem o clube dessa
maneira, e que eles conseguiram tomar agora recentemente.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Então, o que nós podemos
dizer é que esse patrimônio é administrado pela Federação, porém, não é
da Federação.
O SR. NILSON GOMES DA COSTA – Não é da Federação. O
terreno, não. Quando construíram, foi construído, naturalmente com a
ajuda também do Governo, que faz muitos anos, não sei, sessenta,
setenta anos, e que ele hoje é utilizado apenas para os jogos amadores de
segunda ao sábado.”
3.2. RECEITAS DA FEDERAÇÃO E DESCOMPASSO COM A CONTABILIDADE DA
CBF
As receitas contabilizadas pela Federação Norte-Riograndense de Futebol
são de pequena expressão. De acordo com a demonstração de resultados enviados à
CPI, nos últimos anos sua receita foi a seguinte:
RECEITAS ANUAIS DA FEDERAÇÃO (1997 A 2000)
Ano
Receita (R$)
1997 231.483,12
1998 105.078,99
1999 741.233,19
2000 Não disponível
Com relação à receita declarada na demonstração de resultados,
observamos que no ano de 1998 há uma discrepância em face dos valores enviados pela
CBF. Tendo como base o livro razão da entidade, a CBF enviou, em 1998, R$
155.920,00 para a Federação Norte-Riograndense, o que sugere que um montante de
no mínimo R$ 50.841,01 deixou de ser contabilizado, visto que a Federação possui
outras fontes de receita. As declarações de Imposto de Renda a partir do ano de 1998
não fornecem dado algum sobre as receitas da Federação e suas despesas.
Conforme a análise dos balanços da Federação, não foram contabilizadas
as verbas recebidas pela CBF; em seu depoimento, porém, o presidente da entidade
alega que a contabilização foi feita.
A Federação Norte-Riograndense emitiu cheques de valores altos ao
portador, o que demonstra irregularidade no procedimento bancário. Os valores, nesses
casos, são de R$ 12.252,65 (em 26/10/1998, Banco Itaú) e de R$ 14.054,95 (em
28/02/1996, Banco Itaú). Outros cheques foram emitidos, aparentemente, ao portador,
sendo o nome do beneficiário colocado posteriormente.
O presidente da entidade queixou-se, em sessão desta CPI em João
Pessoa, ter dificuldades financeiras para gerir a Federação. Por outro lado, ele não
explicou como a movimentação da entidade acabou por beneficiar algumas pessoas, a
saber: Judas Tadeu Gurgel (recebeu R$ 46.770,61, através de cheque nominal em
18/08/1999), Antônio Ricardo Araújo Carvalho (recebeu R$ 46.770,61, através de
cheque nominal em 18/08/1999), Carmem Lúcia de O. Alves (recebeu R$ 45.000,00
através de cheque nominal em 28/04/2000), Jaerson José de Amorim (recebeu R$
10.358,10 em 15/07/1997; R$ 12.907,63 em 25/08/1998, R$ 10.604,44 em
06/10/1998 e R$ 12.206,28 em 08/10/1998, todos em cheques nominais), Aluizio
Pedro dos Santos (recebeu R$ 14.097,27, por meio de cheque nominal em
23/10/1998), além do Diretório Municipal do PFL de Natal (beneficiado com R$
1000.000,00). Não restou esclarecida, nas pesquisas dessa CPI, a relação entre esses
beneficiários e os objetivos estatutários e legais da Federação Norte-Riograndense.
4. RELAÇÃO COM A CBF
4.1. VERBAS DA CBF À FEDERAÇÃO
A Federação Norte-Riograndense recebeu da CBF, nos anos de 1998 a
2000, os seguintes valores: em 1998, R$ 6.780,00 por mês, com as exceções dos meses
de abril, setembro, outubro e dezembro, cujas parcelas foram de, respectivamente, R$
27.120,00, R$ 21.780,00, R$ 21.780,00 e R$ 31.000,00; em 1999, o repasse mensal foi de
R$ 12.780,00, com as exceções dos meses de janeiro (R$ 6.780,00), julho (não houve),
setembro (R$ 20.780,00) e novembro (R$ 30.780,00); em 2000, o valor de R$ 12.780,00
foi percebido nos meses de janeiro a março, maio a julho, novembro e dezembro,
sendo que em abril o valor foi de R$ 62.780,00, em agosto de R$ 52.780,00, em
setembro de R$ 112.780,00 e em outubro de R$ 32.000,00. Percebe-se que os anos
eleitorais de 1998 e 2000 foram marcados pelo aumento de repasses, exatamente em
períodos próximos às datas em que os pleitos foram realizados.
DOAÇÕES DA CBF PARA A
FEDERAÇÃO NORTERIOGRANDENSE DE FUTEBOL
1998 - 2000
R$
120.000
100.000
80.000
60.000
40.000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/2000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/99
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
0
JAN/98
20.000
MESES
Fonte: Contabilidade CBF / CPI CBF Nike
Nilson Gomes negou que a Federação tenha recebido verbas extras da
CBF, referindo-se em especial àquele valor de R$ 100.000,00, em 19 de setembro de
2000 (cheque da CBF ao Diretório Municipal de Natal do Partido da Frente Liberal).
Alega que se houve repasses extras, foram destinados aos clubes, via Federação; o
estranho é que esse mecanismo não é comum e sequer há registros desse procedimento
nas contas da Federação.
Conforme afirmou em depoimento na cidade de João Pessoa à esta CPI,
as únicas receitas da Federação Norte-Riograndense são principalmente os repasses da
CBF, e secundariamente as rendas dos jogos, os quais têm uma média de mil e
quinhentos torcedores.
4.2. ASSEMBLÉIA DA CBF E A FEDERAÇÃO
Perguntado se compareceu à assembléia geral da CBF que aprovou as
contas da gestão de 1998, em janeiro de 1999, o presidente da Federação NorteRiograndense respondeu que as contas são feitas pelo conselho fiscal e aprovada pela
assembléia. Expôs, em seu depoimento, o mecanismo de aprovação que, de fato, não
esclarece as contas para os membros da assembléia, a exemplo do que ocorreu quando
da aprovação do empréstimo envolvendo o Banco Delta:
“Bom, já foi mais ou menos explicado, mas a prestação de
contas da CBF é examinada pelo Conselho Fiscal e emitido um parecer.
E esse parecer, com toda a documentação, é colocado à disposição dos
membros da Assembléia. Na verdade, não é dito, não é lido naquela
hora, porque foi aprovado pelo Conselho, para aprovação dos Clubes.
Não me recordo de que ele tenha falado quanto pagou ou de quanto foi o
empréstimo. Salvo engano, acho que não houve esse assunto.”
(g.n.)
5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL
Três fatos são relevantes na relação entre a Federação NorteRiograndense de Futebol com a política local: o primeiro, já apontado acima, diz
respeito a um substancial aumento de repasses da CBF para a Federação em períodos
próximos às datas dos pleitos eleitorais nos anos de 1998 e de 2000. O segundo,
também levantado acima, refere-se à doação de R$ 100.000,00 ao Diretório Municipal
do PFL de Natal (RN), efetuada nos dias que antecederam o pleito eleitoral de 2000. O
terceiro fato, que combina-se ao primeiro, é que nas eleições de 2000, Nilson Gomes da
Costa foi candidato eleito a vereador no município de Parnamirim (RN). Considerando
esses fatos, suspeita-se que há uma forte relação de financiamento entre a entidade de
administração do desporto do Rio Grande do Norte, e a política local, a ser confirmada
futuramente pelo Ministério Público.
6. CONTRATOS COM A TV
A Federação Norte-Riograndense de Futebol não possui contratos de
transmissão de jogos com emissoras de televisão.
7. RELAÇÃO COM OS CLUBES
Segundo informações oriundas da quebra de sigilo bancário da
Federação, verificou-se o repasse de verbas da Federação, por meio da emissão de
cheques, aos clubes ABC Futebol Clube e ao América Futebol Clube (cada um
recebeu, em 28/03/2000, R$ 15.000,00). Foi identificado também um pagamento ao
presidente do ABC Futebol Clube, Judas Tadeu Gurgel, em 18/08/1999, no valor de
R$ 46.770,61 (outros cheque, de valor idêntico, foi emitido em favor de Antônio
Ricardo Araújo Carvalho). Em seu depoimento, o presidente não justificou esses
pagamentos, sendo que não é costumeiro que a CBF repasse verbas para clubes via
Federação, como Nilson Gomes afirma ter ocorrido no caso da Federação NorteRiograndense.
Segundo depoimento do Nilson Gomes, a Federação NorteRiograndense de Futebol não cobra nada dos seus filiados.
8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DO FUTEBOL
Do depoimento do Nilson Gomes, apenas foi apurado que o empresário
de nome José Luiz Galante, envolvido em negociações de atletas em Pernambuco,
limitou-se a intermediar o contrato entre a Federação Norte-Riograndense e a Telemar,
que vigeu em 2000, e teve como objeto a publicidade dos clubes em cartões telefônicos.
9. CONCLUSÕES , ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES
Da análise de todos os documentos e do depoimento do Nilson Gomes
da Costa, conclui-se que a Federação Norte-Riograndense de Futebol vem sendo gerida
de forma temerária, em especial nos aspectos administrativo, financeiro e fiscal.
Constatou-se sonegação fiscal.
Verificou-se, ainda, forte suspeita de beneficiamento eleitoral em favor
do presidente da Federação Norte-Riograndense e do PFL de Natal (RN).
Recomenda-se uma reforma estatutária para limitar o mandato da
diretoria da entidade em no máximo quatro anos, impedindo a recondução aos cargos;
para permitir uma maior autonomia do conselho fiscal; para obrigar a realização de
licitação para a aquisição de bens e de material esportivo; e para estabelecer maior
transparência nas contas da Federação e nos repasses de verbas que envolvam a
entidade e os clubes.
Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao
Ministério Público Federal, ao Ministério Público Estadual e ao Ministério Público
Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Norte, com base na Lei nº
9.504/97.
RIO GRANDE DO SUL
1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DAS FEDERAÇÕES :
A Federação Gaúcha de Futebol (FGF), conforme seus estatutos, é uma
“associação civil de direito privado, de caráter e fins desportivos, sem fins lucrativos”
(art. 1º). O art. 5º, § 5º, do estatuto, impede a remuneração dos dirigentes, no entanto e
de forma contraditória, o mesmo dispositivo prevê a possibilidade de recebimento de
honorários, a serem arbitrados pela Diretoria, em decisão unânime.
Em seu depoimento a essa CPI, o presidente da entidade confirmou que
a Federação não visa lucros e que não remunera seus dirigentes.
2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA
A Federação Gaúcha de Futebol é presidida por Emídio Odósio Perondi
há mais de nove anos.
A entidade não encaminhou documento contábil algum requisitado por
esta CPI. Mais ainda, impetrou mandado de segurança junto ao Supremo Tribunal
Federal (STF), para evitar a quebra de seus sigilos bancário e fiscal. Diante disso, vê-se
que a FGF procurou, de muitas maneiras, trazer obstáculos aos trabalhos de
investigação desta Comissão Parlamentar de Inquérito.
2.1 CHEQUES
NOMINAIS À
FGF
DEPOSITADOS EM OUTRAS CONTAS
CORRENTES
A Federação vem emitindo muitos cheques nominais à própria entidade,
uma grande parte deles descontada em espécie. Conforme apurado pela CPI, muitos
desses cheques nominais, emitidos pela FGF, foram depositados em contas correntes
diversas. Tal procedimento não é apropriado se se pretende dar transparência aos atos
da entidade.
Dois desses exemplos são as empresas Núcleo Promoções e Eventos
Ltda. e a Duplo Distr. de Bilhetes Promocionais Ltda. Nos dois casos, a Federação
emitiu os cheques em seu nome e eles foram depositados nas contas das empresas,
após o endosso. Quando questionado sobre isso, o senhor Perondi respondeu:
“O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Como eu disse pro
senhor, nós analisamos o sigilo bancário da federação e há muitos cheques
da Federação Gaúcha que são nominais, ou à própria federação, ou a
bancos, como no caso da conta do... como é o caso do Banco do Brasil. A
que título os cheques não são emitidos corretamente, com o favorecido
identificado?
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Olha, especialmente,
(ininteligível.) federação e retira o dinheiro, porque a gente, quando sai
pro interior do Estado — isso é contumaz; não agora, porque nós tamos
com pouco dinheiro —, quando tem dinheiro, nós distribuímos para os
clubes 2 mil, 5 mil, 3 mil. Nós fizemos muito disso, fizemos muito disso,
pra escolhinhas de futebol. E a documentação é farta e está lá. É só
pegar... me dar os dados, que o senhor terá. Não tem mistério nenhum.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – E a Núcleo Promoções e
Eventos, eu vou dar uma idéia pro senhor, que eu volto a ela. No ano de
2000, portanto, bastante recente, dia 07/08/2000, foi depositado um
cheque de 30 mil pra essa empresa.
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Núcleo...
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Núcleo Promoções e
Eventos Ltda. A que se deve esse pagamento?
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Mas eu tenho certeza de
ter lá e lhe mando... até quarta-feira tá nas suas mãos, em Brasília.”
(g.n.)
3. SITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA
A Federação, no período entre 1995 e 2000, apenas declarou Imposto de
Renda em 1998, 1999 e 2000. Nessas ocasiões, a Federação declarou-se “entidade
isenta”, em que pese, conforme se verá abaixo, tenha se envolvido com empresa de
bingo e contratado transmissão de jogos, atividades que geraram altos rendimentos.
3.1 INSS
252.687,82.
Junto à previdência social, a Federação Gaúcha tem uma dívida de R$
3.2 FEDERAÇÃO GAÚCHA E BINGOS
A Federação Gaúcha, conforme seus estatutos, não tem como finalidade
envolver-se com bingos. Ao tratar das receitas da entidade (art. 70), os estatutos
também não prevêem a utilização de bingos ou mecanismos similares. O presidente da
entidade, em seu depoimento, confessa que a Federação contratou bingos por meio da
empresa “Assessoria e Marketing e Promoções Real Ltda.” e fez, desse procedimento, uma
fonte de receitas. Aparentemente, ao mesmo tempo em que executou uma atividade
sem relação com o futebol, a Federação beneficiou uma empresa sonegadora de
impostos. Segue, abaixo, parte do depoimento:
“O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – É bingo, é bingo. E a
federação, em função desses bingos... isso aí só me trouxe incômodo e
ações. Só com Imposto de Renda fui autuado... um ano e meio...
(...)
Com essa empresa aí, pelo espaço de agosto de 94, se não me falha a
memória, a março de 98. Quando a empresa foi autuada, ela foi
autuada, eu rescindi o contrato no outro dia. E obviamente não existia a
lei que... hoje a lei aplica só na firma prestadora de serviço, e as
federações e os clubes caem fora. E eu ainda estava enquadrado. Porque
antes era a federação ou os clubes responsáveis por esses... por esses
valores. E o Imposto de Renda nos atuou a nós e à empresa: a empresa,
uns 14 milhões e nós 8 milhões e pouco. Inclusive, com o .... sei lá,
aquilo, 1 milhão e 600, que é até fora da lei.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Então, era um contrato
que a Federação tinha...
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - Que tem o clube comigo,
lá.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Que tinha?
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - E podem mandar todos
eles. Querendo, né.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Então, para nós é
interessante, porque essa empresa... o senhor tá dizendo que ela foi
condenada. Realmente, ela foi.
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - É.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - E, a posteriori, ela foi
também condenada a indenizar pessoas que foram agredidas por
seguranças dela, pela 1ª Câmara Especial e Cível de Porto Alegre. Ela
teve, depois, também, condenação por agressão física.
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - Não ela é horrível, é
horrível, só isso que eu digo. Entrei e não posso dizer que não teve boa-fé
ou má-fé. Mas isso, aí, foi penalizado, e penalizado e penalizado forte.
Mas, tudo bem.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - E por que a Federação
pagava esses valores a ela? Porque, na nossa análise, não consta entrada
de dinheiro dessa empresa para a Federação, mas saída de dinheiro.
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - Tenho. Tomara que tenha.
Eu tenho direitinho, doutor, todos os pagamentos de todos os meses.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Que consta um pagamento
de 118 mil, em 96; depois, consta mais 110 mil em junho de 96... essa
foi 21 de junho. Que foi feito outro em junho.
(...)
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - Pode ver aqui, ó: isso aqui
foi um financiamento feito no Banco do Brasil. Fizemos na empresa.
Está lá, dentro da contabilidade tudo marcado. Que eu adiantei para
essa empresa.
(...)
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - E a empresa pagou de
volta esse dinheiro?
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - Não pagou ainda, está me
devendo. Estou pagando. Ah! tá me devendo. Fica claro que tá me
devendo. Isso é verdade? Eu não sei se isso aqui atinge, aqui. Isso aqui é
um comércio normal, que eu perca ou que eu ganhe. E, aqui, ninguém...
eu não perdi nada, aqui, ainda. Eu só disse que a empresa que me
prejudicou foi em função do seu... dos seus problemas pra fiscalização que
me arrastou junto antes da nova lei, que os senhores mesmos fizeram.
(...)
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Sr. Emídio, eu vou voltar
só um pouquinho: essa parceria com o bingo durou quanto tempo?
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - Foi de quatro... foi de
agosto de 94, agosto de 94 a março de 98. Eu, agora, fiquei... março de
98, sim.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Março de 98?
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - É. Desde os contratos que
ele tinha.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - E essa... essas empresas de
bingo chegou a dar prejuízo em algum momento?
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - Para a Federação?
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Para a Federação.
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - Se não me pagarem, estão
pagando lentamente 3 mil, 4 mil, 2 mil, agora, terá prejuízo. Mas o que
se recebeu da... do Real Bingo foram 220 mil, um ano, mais ou menos
isso. E da Marte, mais ou menos, uns 130 mil, 140 mil. Está tudo
contabilizado. Vocês podem também mandar, achando que devo mandar,
lhe mando direitinho.”
3.3 EMPRÉSTIMOS A TERCEIROS MESMO ESTANDO A FEDERAÇÃO EM CRISE
O Presidente da Federação, em seu depoimento, afirma que a entidade
está em situação deficitária, e para evitar a falência, recorreu a contratos de transmissão
de jogos pela TV. Ocorre que, diante de tal crise, a entidade foge do que estabelece seus
estatutos (art. 72) e empresta dinheiro, é o que afirma Emídio Perondi, abaixo:
“O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - Não, não, não. Eu tenho
certeza que não, doutor, isso é outra coisa. (Ininteligível) César Cabral,
que é meu funcionário do TJD. Paulo Quintana Cabral? Não me vem o
nome agora. Eu empresto dinheiro, também, lá. Lá, não digo... tenho
dinheiro emprestado lá. Pra Presidente de Clube também empresto
dinheiro.” (g.n.)
Cabe ressaltar que o senhor Perondi se refere ao funcionário do TJD
(Tribunal de Justiça Desportiva) como sendo dele. O TJD, pelo estatuto da Federação,
art. 9°, § 2°, é, na realidade, uma “unidade autônoma e independente da FGF”. O § 3° do
referido artigo ratifica esse entendimento:
“Os órgãos de Justiça Desportiva terão a composição, organização,
administração, funcionamento e competência previstos na legislação
desportiva”.
3.4 OUTRAS MOVIMENTAÇÕES DUVIDOSAS
O presidente da Federação, em seu depoimento, não esclareceu as
movimentações da entidade envolvendo instituições como a Núcleo Promoções e
Eventos Ltda. (citada no item 2.1., acima) e o Sindicato dos Estabelecimentos da
Cultura Física, e pessoas como Luiz Tadeu Ceccato e outros.
4. RELAÇÃO COM A CBF
A Federação Gaúcha recebeu da CBF, entre 1998 e 2000, os seguintes
valores: R$ 6.000,00 em março de 1998 e R$ 30.000,00 em dezembro de 1998; R$
80.000,00 em janeiro de 1999 e R$ 60.000,00 em agosto de 1999; e R$ 50.000,00 em
setembro de 2000. Perguntado a esse respeito, responde o presidente da entidade:
“O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Por exemplo: 50 mil, em
setembro de 2000. Isso foi bem recentemente.
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Tá. Torneio que foi
repassado, tenho absoluta certeza, pra atividade que patrocina um torneio
deste ano que agora tamos entrando, com mais de 120 Municípios. Ano
passado foram 117 Municípios. Este ano são 120 Municípios. Chamase Futebol Sub-20, que é patrocinado... a CBF deu auxílio de 50 mil.”
Curiosamente, o auxílio da CBF a um torneio municipal se dá exatamente
no mês anterior à eleição aos cargos municipais. Ao enviar verbas para a Federação para
que esta distribua a clubes de âmbitos municipais, revela uma aproximação razoável de
objetivos de financiamentos eleitorais.
A seguir, gráfico com os repasses da CBF:
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/2000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/99
NOVEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/98
90.000
80.000
70.000
60.000
50.000
40.000
30.000
20.000
10.000
0
SETEMB
DOAÇÕES DA CBF PARA A
FEDERAÇÃO GAÚCHA DE FUTEBOL
1998 - 2000
R$
MESES
4.1 P ERONDI: EMPRÉSTIMO PARTICULAR PARA A CBF
Há uma movimentação não explicada no valor de R$ 50.000,00 entre
Emídio Perondi e a CBF, em setembro de 1998: ele teria feito um empréstimo à CBF e
esta devolvido o dinheiro quinze dias depois. Segundo a entidade nacional, teria
ocorrido um engano do Emídio Perondi nessa movimentação 21, que se equivocou ao
Essa informação foi passada pela diretoria da CBF aos membros e técnicos da CPI, durante a diligência à
Confederação, em 5/4/2001.
21
enviar o dinheiro. A versão do Emídio Perondi é diferente; ele afirmou que teria feito
um empréstimo à CBF:
“O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Então, é 50 mil. Daí a
quinze dias, a CBF devolveu os 50 mil pra mim, que era meu dinheiro.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Por que ela fez essa
devolução?
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – A CBF tava sem caixa
naquela época de 98, logo depois da Copa do Mundo.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – O senhor, como pessoa
física, fez empréstimo à CBF?
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – E ela me devolveu daí a
quinze dias. E esse documento também deve estar com V.Exa., não
sei... Eu tenho eles. Eu tenho os documentos, não aqui.”
(g.n.)
A versão da CBF de que Emídio Perondi teria se enganado se choca com
a prática do dia-a-dia. Em geral, as transferências de valores maiores do que o normal
são feitas com um alto grau de atenção, pelo risco elevado que faz correr. No caso
concreto, R$ 50 mil, em 30/9/1998, eqüivaliam a quase US$ 50 mil, o que representa
uma verba significativa.
4.1 Relação Federação / CBF
Segundo depoimento do presidente da Federação Gaúcha, a relação da
entidade com a CBF é excelente. Avalia como positivo o recente acordo entre Pelé e
Ricardo Teixeira, em que pesem as críticas do presidente da Federação a Pelé e a Zico,
ex-jogadores que não deveriam, segundo ele, ter ocupado os cargos de ministro no
governo federal.
5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL
O presidente da Federação é ex-Deputado Federal e irmão do Deputado
Federal Darcísio Perondi, beneficiado por doações, em 1998, da CBF (duas parcelas de
R$ 50.000,00 cada) e da Federação Gaúcha (R$ 5.444,20).
Segundo o presidente da FGF, a entidade pode financiar campanhas
eleitorais como qualquer empresa privada. Pela justificativa que apresenta, reafirmada
em seu depoimento, o presidente da Federação contraria dispositivo estatutário, que
aponta a entidade como associação sem fins lucrativos. Dentre as finalidades da
entidade não se encontra a promoção de campanhas políticas, nem favorecimentos a
parentes em campanhas (ver Anexo Estatuto da FGF).
Mais do que a doação confessa ao seu irmão candidato, o presidente da
Federação sugere ser normal o financiamento, por parte da Federação, a qualquer
candidatura que o presidente deseje. Seguem, abaixo, passagens do depoimento do
Emídio Perondi:
“O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Pra dizer que não
ajudei, acho que ajudei um ou dois Deputados. E fora a federação, digo a
V.Exa., ajudo todos eles, porque só ajuda político quem foi político,
quem é político. Quem não é político, não ajuda político. Parece que tem
medo de ajudar político. E eu ajudo, e continuo ajudando, e de todos os
partidos. E pela federação, se não me falha a memória, foram dois
candidatos que eu ajudei. E, se eu pudesse ajudar e tivesse dinheiro,
ajudaria muito mais. Porque não existe candidato, meu caro Deputado,
que não pegue dinheiro de alguém. Não adianta essa história, dizer que
você não pega dinheiro. Todos nós políticos — e eu faço política desde
1962 — pegam dinheiro. Quem me ajudava eram os fazendeiros,
agricultores, que me ajudavam na época. E hoje, se estivesse concorrendo,
pegaria de empresários, pegaria de futebol, pegaria de quem pudesse me
ajudar. Porque a política tá muito cara. Então, alguém tem que ajudar
os outros. Era eu. E quem não pega que me atire a primeira pedra.
Quem não pegou dinheiro pra campanha.”
(...)
“O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Mas, aí, a federação faz
doação?
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Como lhe disse: acho que
fiz uma ou duas pequenininhas, mas fiz, viu, doutor. Não tenho
certeza...
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Não, ela fez.
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Fez, fez, tenho certeza.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Fez. Nós temos aqui, na
prestação... na análise das contas da Federação Gaúcha tem
contribuição...
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Cinco mil pro Darcísio e
mais...
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Isso, cinco mil...
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – ... mais três mil, dois mil,
uma coisa assim. Não me recordo bem, doutor, agora. Teria que fazer...
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Cinco mil, quatrocentos e
quarenta e quatro e vinte centavos...
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – É, pode ser, pode ser.”
(...)
“O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Então, muito bem. O
senhor acusou, acha normal a CBF fazer doações pra campanhas
políticas, doutor?
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Como qualquer empresa
faz doações pra campanhas políticas. Qualquer empresa, em
(ininteligível) de uma empresa estado civil... (Ininteligível) se o Ricardo
tivesse organizado o nome dos Deputados, a história hoje de uma
maneira seria diferente.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – A CBF não é
empresa, não, Dr. Emídio.
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Não, ela é uma empresa.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Nem a Federação
que o senhor preside é empresa, não.
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Não é uma empresa?
O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) – Não, não senhor.
Empresa é se alguém pudesse chegar em Porto Alegre, abrir uma
federação e concorrer com a sua, organizar o campeonato gaúcho. Aí,
seria uma empresa. Se alguém pudesse chegar no Rio de Janeiro, abrir
uma CBF, convocar a Seleção Brasileira, nomear o técnico da Seleção
Brasileira, organizar a Copa do Brasil, escolher os times pra Copa do
Brasil, escolher os árbitros pros jogos. Aí, seria um sistema empresarial.
(...)
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Olha, inclusive consta
uma doação da Federação gaúcha de futebol, presidida pelo senhor, para
a campanha do seu irmão, Darcísio Perondi.
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Cinco mil reais. Cinco
pila.” (g.n.)
6. CONTRATOS COM A TV
A Federação Gaúcha de Futebol possui contratos de transmissão de
jogos com a RBS, retransmissora da Rede Globo, no estado do Rio Grande do Sul.
A Traffic tem como uma de suas principais finalidades a intermediação
de contratos entre as Federações e as redes de televisão. Ao emprestar dinheiro à
Federação, como alega Emídio Perondi, a Traffic estaria garantindo um clima favorável
para o fechamento de contrato de transmissão dos jogos gaúchos, que traria ganhos
futuros para a intermediadora, isto é, a própria Traffic.
A CPI apurou repasses de verbas da Traffic à FGF, que podem ser tanto
relacionados a empréstimos solicitados por Emídio Perondi, quanto a contratos
envolvendo a empresa e a entidade:
Pagamentos da Traffic à Federação Gaúcha de Futebol (1996/1997):
Data dos pagamentos
12/02/1996
16/02/1996
10/06/1996
16/01/1997
23/01/1997
06/02/1997
21/03/1997
14/07/1997
Valores (em reais)
101.266,24
24.560,00
30.000,00
100.000,00
50.000,00
50.000,00
100.000,00
127.500,00
Emídio Perondi recebeu os valores diretamente da Traffic.
Pagamentos da Traffic a Emídio Odósio Perondi (1996/1998):
DATA DOS PAGAMENTOS
19/03/1996
12/06/1996
02/09/1998
Valores (em reais)
98.640,00
34.965,00
20.000,00
A relação entre a Federação e a Traffic é assim comentada por Emídio
Perondi:
“É uma empresa que me ajudou desde que eu assumi a
federação, que é a empresa do J. Hawilla, que é a Traffic. Essa, eu
tenho... é essa a empresa... a única empresa que me ajudou mesmo no
futebol, é a Traffic, de São Paulo. E inclusive eles me falaram... mandei
esses dias... vocês vão receber agora, acho que deve estar chegando hoje em
Brasília. Mandei um ofício de todos os movimentos meus com a Traffic.
Mandei pra Câmara; mandei pro senhor. Já mandei, isso já mandei.”
7. RELAÇÃO COM OS CLUBES
A Federação Gaúcha tem a prática de cobrar dos clubes. Em várias
ocasiões funciona mesmo como um pedágio. Quando há repasse da CBF ou de outras
entidades ou instituições aos clubes, e esse repasse é encaminhado via Federação, esta
fica com uma parte independente de consulta ou permissão do clube.
Esse mecanismo foi assumido por Emídio Perondi, sob a justificativa de
que a Federação é credora dos clubes. Há, pois, uma relação de subordinação,
controlada diretamente pelo presidente da Federação. Além disso, há a cobrança de
taxas, que fortalece esse canal de verbas a partir dos clubes como fonte de recita da
Federação. Abaixo, seguem trechos do depoimento sobre a questão:
“O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Essas taxas são cobradas
de quê? De clubes?
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - De clubes, de clubes. E
com a renda da... sem considerar se é bom pra CPI, posso te mandar os
anos que o senhor pedir. Todos eu tenho lá: o analítico de receita e
despesa, os valores da Federação. Eu não tenho segredo nenhum, doutor.
Porque não tenho. Eu devo fazer alguma errada? Posso ter feito, mas
não buscando em cima, aplicado em alguma coisa, pode ficar tranqüilo.”
(...)
“O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Não, porque nos últimos
quatro anos, fazendo a somatória de todo o período, nos últimos quatro
anos dos cheques, o Grêmio recebeu 250 mil e o Inter 1 milhão.
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - É bem possível, é bem
possível. Mas isso foi dinheiro emprestado para próprio benefício. Foi
dinheiro ida e volta...
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Todo emprestado?
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - Não. Todo, não. Alguma
coisa... Não, do lado, eu não dei nada, eu tenho certeza. Que eu dei
dinheiro para ele? Muito difícil.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Tô perguntando.
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI - Não, não dei.”
7.1 CONIVÊNCIA DA CBF NOS DESCONTO DA FEDERAÇÃO AOS CLUBES :
A CPI apurou que a FGF faz a intermediação de repasses entre a CBF,
com a conivência desta, e os clubes gaúchos. Seguem outros trechos do depoimento do
presidente da Federação:
“O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Há um cheque, Sr.
Presidente, e Dr. Perondi, de 260 mil reais da CBF para a Federação
Gaúcha em 09/96. Consta na contabilidade da CBF que se trata de
dinheiro para o Internacional de Porto Alegre por adiantamento de cotas
de televisionamento do campeonato brasileiro série A. O senhor se recorda
disso?
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – É verdade.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – De um cheque no valor
de 260 mil reais.
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – É.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Mas nós localizamos que
o senhor só repassou para o Internacional 250 mil reais, e os outros 10
mil reais?
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Os outros 40? Os outros
10? Deve ter ficado conosco na CBF.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Há um cheque de 260
mil reais...
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Não. Mas aí ficou 10
mil pra Federação.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Fica 10 mil pra
Federação.
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Tá me...tá me devendo,
tão me devendo, pomba! Eu tiro um pouquinho de cada um. Ou vai ficar
só no...no...no vento. Eu agora, em seguida da televisão, tirava cinco
dum, dois do outro, dez do outro, porque senão não tenho caixa, né?
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Deve ser o que explica
também outro repasse que a Federação, que a CBF fez no valor de 113
mil reais para o Internacional e o senhor só repassou 25 mil reais pro
Internacional. Oitenta e oito mil reais...
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Porque já estavam me
devendo. Já estavam me devendo. Tenho certeza disso. Pode, Deputado, a
hora que o senhor pegar a documentação, tá lá. Mas o Internacional eu
repasse, Deputado, repassava todos os mês, 10, 20, 30. Eu acabei dizer
que tinha do papagaio, eu queria fazer de cinco dias, de quinze dias, pra
repassar pro Internacional.” (g.n.)
Conforme seu próprio depoimento, o presidente da Federação se
apossou (ou ainda se apossa) de recursos que não pertencem à entidade. Um exame
mais aprofundado dessas transações pode revelar algum tipo de irregularidade ou,
mesmo, ilegalidade.
Há, também, o outro lado do negócio: a CBF, por vezes, envia recursos
para a Federação Gaúcha, os quais sequer são contabilizados na entidade, pois vão
diretamente aos clubes, via endosso no cheque. O presidente Emídio Perondi assim
depôs sobre esse item:
“O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Em 98, um cheque de
72 mil, da CBF, datado de 03/09/98.
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Três do nove?
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – É, 03/09/98. Cheque
de 72 mil, 975, da CBF, para a Federação Gaúcha. Ele foi endossado
e depositado na conta do Grêmio. Por que esse depósito?
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Ah! Eu não tenho nada
tomado nota aqui, mas vou tentar de cabeça explicar. São os repasses, ou
da Copa Sul-Brasileira, ou Sul-Minas, melhor, Minas... ou o repasse da
Copa Brasil, que vem para a federação o cheque nominal, e nós daí
endossamos para o Grêmio.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Por que a CBF não faz
direto ao Grêmio?
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Eu tenho impressão que
isso aí faz parte do currículo de uma empresa que quer valorizar
especialmente sua afilhada, já que a valorização é muito forte. Quer
dizer, a sua afilhada tem que ser valorizada. Quer dizer, se o senhor tem
uma empresa, o senhor não quer dizer: “Vou passar direto, passar por
cima”. Então, passa pelo critério da própria federação. Eu quero ver o
que tá acontecendo.” (g.n.)
7.2 BENEFÍCIO DESIGUAL AOS CLUBES
A Federação gaúcha beneficiou desigualmente os dois grandes clubes do
Estado. No esforço da Federação em ajudar os clubes, o Internacional recebeu uma
parcela maior que o Grêmio. Em seu depoimento, Emídio Perondi não apresenta
justificativas para essa distinção de tratamento.
8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DO FUTEBOL
Conforme analisado no item “Contratos com a TV” acima, há um
vínculo forte entre a Federação e a Traffic, notado especialmente, em termos
financeiros, em 1996 e em 1997. Transcreve-se, a seguir, parte do depoimento em que o
presidente da Federação declara sua aproximação com a Traffic, demonstrando haver,
ou ter havido, uma forte relação de dependência com aquela empresa:
“O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Tem a televisão também,
de 94 a 97 ou 98, quando fizemos rádio com a RBS, 99/2000. E a
Traffic também me repassava dinheiro, botei e mandei esse ofício, como
lhe disse no início. O senhor recorda que já mandei ofício pra...pra CPI.
E deve tá lá.
(...)
Total. Amizade total. Inclusive me ajudaram muito. Essa foi a única
empresa privada que me ajudou muito nesses últimos nove anos pela
Federação foi a Traffic.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – A título de que o senhor
presta serviço à Traffic?
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Repassei e o senhor vai
receber todos os documentos dos convênios que foram feitos, especialmente
para as categorias de base.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Não. Mas com o senhor,
pessoa física. Emílio Odósio Perondi.
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Exatamente. Erraram
até o nome. Botaram até José. Pode ver que tem até o nome de José. Não
tem? Pode ver que tem.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Só encontrei esse nome.
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Vou te mandar tudo isso
essa semana pra Brasília. Pode ficar tranqüilo.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Então, o senhor presta
serviço pra Traffic como pessoa física.
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Não. Não é prestar
serviço pra pessoa física, não. Isso seria até indecoroso se dissesse isso
aqui, ô, Dr. Rosinha. Eu tô dizendo, que a Traffic foi a firma que me
ajudou. Eu precisava de 20 mil, 30 mil, telefonava por Hawilla, ele me
mandava, tá. E eu aplicava, esse dinheiro eu tenho todo ele direitinho
aplicado e já entreguei pra Traffic, e os senhores estão recebendo em
Brasília.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Em 96, foi 133 mil,
605.
O SR. EMÍDIO ODÓSIO PERONDI – Exatamente. Um valor
de noventa e poucos mil, um valor de 20mil ou 15 mil, em 94. Em 98,
foi 20 mil. Em dezembro eu fiz uma festa em Porto Alegre de 20 mil e
me mandaram também. Eu tenho os recibos direitos, doutor. Pode ficar
tranqüilo.”
9. CONCLUSÕES , ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES
Da análise de todos os documentos e do depoimento de Emídio Odósio
Perondi, conclui-se que a Federação Gaúcha de Futebol é gerida de forma temerária
nos campos administrativo, fiscal e financeiro.
Constatou-se sonegação fiscal, além de ingerência de ordem econômica
da Federação sobre os clubes. Além disso, a Receita Federal deve ser comunicada para
que examine o sistema contábil da entidade, bem como apure possíveis créditos
tributários.
Sugere-se o Ministério Público apure os indícios de irregularidades que
envolvem as emissões de cheques nominais à entidade.
Sugere-se que a Receita Federal e o Ministério Público examinem as
transações que envolveram o presidente da entidade e a CBF.
Recomenda-se uma reforma estatutária para limitar o mandato da
diretoria da entidade em no máximo quatro anos, impedindo a recondução aos cargos;
para permitir uma maior autonomia do conselho fiscal; para obrigar a realização de
licitação para a aquisição de bens e de material esportivo; e para estabelecer maior
transparência nas contas da Federação e nos repasses de verbas que envolvam a
entidade e os clubes.
Sugere-se o indiciamento do presidente da FGF por desobediência
(Código Penal).
Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao
Ministério Público Federal, ao Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul e ao
Ministério Público Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul, com
base na Lei n.º 9.504/97.
RONDÔNIA
1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DAS FEDERAÇÕES :
estatutos.
A Federação de Futebol do Estado de Rondônia não enviou à CPI seus
Do depoimento do seu presidente à esta Comissão Parlamentar de
Inquérito, colheu-se a informação de que a Federação não remunera os seus dirigentes.
Trata-se de típica entidade de direito privado sem fins lucrativos.
2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA:
Heitor Luiz da Costa Júnior preside a Federação de Futebol desde 1990.
Heitor Luiz foi vereador em Uberaba, Minas Gerais, e Deputado Estadual em
Rondônia por quatro mandatos consecutivos.
A Federação não remunera seus dirigentes e não tem funcionários.
Segundo afirmou seu presidente em depoimento a esta CPI, a entidade depende do
trabalho voluntário dos seus membros.
3. SITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA
3.1. IMPOSTO DE RENDA
Não consta registro de entrega, por parte da Federação de Futebol do
Estado de Rondônia, de declaração de Imposto de Renda nos exercícios de 1996 a
1998. A Federação é titular de três contas (bancos Real, do Brasil e Sudameris).
3.2. D ESCONTROLE CONTÁBIL
Tendo em vista que a Federação não encaminhou à CPI seu balanço
contábil ou qualquer tipo de informação sobre seu balanço, e tomando como fontes as
informações provenientes da quebra dos sigilos bancário e fiscal da entidade e da CBF
e o depoimento do Heitor Luiz, constatamos haver na Federação um grave descontrole
contábil e fiscal.
A Federação declara ser proprietária de bem imóvel que, segundo seu
presidente, não existe. Esse imóvel seria a sede da Federação, que não seria próprio da
entidade, mas público, de propriedade do Estado de Rondônia, assim como móveis lá
instalados, todos sediados pela SEPLAN (Secretaria de Planejamento).
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – O senhor falou,
também, que a... a sede da Federação é uma sede própria, mas não é
uma sede própria de direito, como é que o senhor me explica isso? O que
significa uma sede própria que não é de direito?
O SR. HEITOR LUIZ DA COSTA JÚNIOR – Não, é
porque ela foi construída pelo Governo do Estado para a
Federação de futebol, então ela... ela pertence ao Governo do
Estado até que se faça a tramitação legal de termo de doação.
Foi... foi... essa... esse sentido que eu quis tentar é... interpretar
pra V.Exa.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Sim, mas qual é
a relação que existe hoje? O... a Federação... o imóvel está em
nome de quem?
O SR. HEITOR LUIZ DA COSTA JÚNIOR – Ela está em
nome do Governo do Estado.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Ah, então na
verdade, não existe a... não existe a propriedade... o senhor...
O SR. HEITOR LUIZ DA COSTA JÚNIOR – Não, não.
(...)
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Existe uma
relação, o que é que o... qual é o documento que o senhor tem
assinado com o Governo que diz que o senhor pode ocupar
lá? Qual é o contrato que o senhor tem? Eu falo assim: se ele
pode, amanhã, chegar pro senhor e dizer: olha, vai embora
daqui que eu não quero mais.
(...)
O SR. HEITOR LUIZ DA COSTA JÚNIOR – O que nós
temos é a... que o... os móveis, como consta na nossa... no
nosso relatório, é... pertencem à SEPLAN, que é a Secretaria
do Planejamento, né, que é responsável e o... a reivindicação é
a... ao Governador do Estado pra fazer a doação definitiva pra
Federação de futebol. Teria um patrimônio próprio.
(...)
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Eu tô lendo a sua
declaração... da declaração do Imposto de Renda da sua Federação. Ela
tem aqui, no seu ativo permanente, imóveis no valor de 5 mil, 231.
Como é hábito e a lei permite que se faça declarações pelo valor histórico,
isso significa dizer que o senhor tem alguma coisa que declara aqui pra
Receita Federal. Se não tiver, é porque o senhor falsificou a sua
declaração.
(...)
O... quando chega na demonstração de patrimônio diz que
tem bem imóveis 5.231 reais e 76 centavos, isso no ano
calendário 1997. Quer dizer que em 1997 a sua Federação
tinha imóvel nesse valor. O senhor disse que não tem imóveis,
isso me chamou a atenção.
(...)
O SR. HEITOR LENIZ DA COSTA JÚNIOR – Não,
senhor. Eu pediria até desculpa a V.Exa. porque de
contabilidade infelizmente eu não entendo nada. Isso aqui,
pelas informações, que ela é anual, tem como aqui o bem da
SEPLAN, que é essa Secretaria do Planejamento, que são os
móveis existentes na Federação.”
O presidente da Federação sequer conhece os gastos declarados junto à
Receita Federal. A desorganização contábil tem reflexos no campo fiscal,
demonstrando absoluta fragilidade da gestão do Heitor Luiz. Seguem, abaixo, trechos
do depoimento do presidente que apontam essa tendência:
“O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – O senhor, em
1997, estou pegando dados que são mais fáceis, o senhor pagou de
impostos, taxas e contribuições 9 mil 355 reais, para uma receita total de
130 mil reais. Que tipo de impostos o senhor paga lá assim que são tão
pesados?
O SR. HEITOR LENIZ DA COSTA JÚNIOR – Eu não estou
entendendo o que V.Exa...V.Exa. está perguntando o que significa esse
imposto?
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Sim. Que tipo de
imposto o senhor paga?
O SR. HEITOR LENIZ DA COSTA JÚNIOR – Ah, eu pago
Imposto de Renda, eu pago INSS, eu pago os encargos.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – Não, Imposto de
Renda, eu queria saber então do que seria o Imposto de Renda, referente
a quê? Seria Imposto de Renda retido na fonte?
O SR. HEITOR LENIZ DA COSTA JÚNIOR – Eu não vou
saber informar a V.Exa. porque eu não entendo infelizmente
contabilidade. O meu contador fez um trabalho para mim, eu pago ele
para fazer e infelizmente eu não sei manusear a parte contábil.”
3.3. CONSELHO FISCAL
As contas da Federação não são fiscalizadas e controladas
adequadamente, uma vez que o conselho fiscal que não tem autonomia política em
relação à direção da entidade. A eleição dos membros do conselho fiscal é realizada de
forma conjunta com a da diretoria, conforme informou à CPI o presidente da
Federação. Segue, abaixo, parte do seu depoimento a respeito do assunto:
“O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – (...) A sua
permite que seja eleito junto com o Presidente, não é isso?
O SR. HEITOR LENIZ DA COSTA JÚNIOR – Sim, junto
com o Presidente.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – O senhor alguma
vez já teve um conselho fiscal que tenha feito restrições, já tenha feito
recomendações sobre a sua prestação de contas?
O SR. HEITOR LENIZ DA COSTA JÚNIOR – Não, senhor.”
4. RELAÇÃO COM A CBF
A Federação de Futebol rondoniense recebeu da CBF, entre 1998 e 2000,
os seguintes valores: em 1998, R$ 6.000,00 por mês, com as exceções de agosto
(quando foram enviados R$ 41.000,00), setembro e outubro (R$ 21.000,00) e dezmebro
(R$ 56.000,00); em 1999, o repasse mensal foi de R$ 12.000,00, sendo que em janeiro o
valor foi de R$ 6.000,0, em fevereiro de R$ 22.000,00, julho, R$ 32.000,00 e agosto, R$
20.000,00; em maio não houve repasse da CBF.
Em 2000, o valor de R$ 12.000,00 foi recebido pela Federação nos meses
de janeiro, março a agosto e de outubro a dezembro; em fevereiro foi R$ 37.000,00 e
em setembro, R$ 21.216,00. Conforme já percebido em outras tantas Federações, há
um aumento do repasse da CBF à Federação rondoniense em períodos eleitorais. No
caso concreto, foi registrada essa movimentação extra nos meses próximos ao pleito
eleitoral de 1998.
A seguir, gráfico com as doações da CBF:
DOAÇÕES DA CBF PARA A
FEDERAÇÃO DE FUTEBOL DE RONDÔNIA
1998 - 2000
R$
60.000
50.000
40.000
30.000
20.000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/2000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/99
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
0
JAN/98
10.000
MESES
Fonte: Contabilidade CBF/CPI CBF Nike
Em seu depoimento, Heitor Luiz defende a necessidade desses repasses,
ao tempo em que recusa a suspeita de seu uso em financiamento de campanhas
políticas. Diz o presidente da Federação:
“Vou me permitir, nobre Deputado, as verbas que nós
recebemos da Confederação Brasileira de Futebol, caso contrário,
Deputado, com toda a sinceridade seria muito difícil, nós administrarmos
a nossa Federação de Futebol. Nós temos a folha pessoal, nós temos
pagamento de energia elétrica, pagamento de telefone, pagamento de água,
material de expediente, os encargos sociais, material esportivo, material de
consumo, propaganda e publicidade, correios e malotes, assinaturas de
revistas, ajudas a ligas de clubes, como já informei a V. Exa.,
manutenção e conservação. Então, dentro de um contexto que vem, eu
afirmo e confirmo para V. Exa., com toda a sinceridade da alma, que
ele é empregado, muito bem empregado dentro do que manda a legislação,
dentro do que manda a nossa responsabilidade, inclusive a essa ajuda ou
auxílio ou mesada, como foi dito, ela realmente tem nos ajudado a
manter a nossa Federação de Futebol do Estado.”
Ocorre que a afirmação do presidente não encontra sustentação e
coerência em sua conduta na gestão da entidade.
As contas da Federação, geridas de forma desorganizada como registrado
acima (item 3.2), não oferecem as mínimas condições técnicas e de rigor contábil para
pautar a opinião do Heitor Luiz. Enfim, não é factível nem verossímil a organizada
destinação, supostamente criteriosa, das verbas da CBF, apresentada pelo presidente em
seu depoimento.
5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL
5.1. ENVOLVIMENTO COM CAMPANHAS POLÍTICAS
Sobre auxílios das entidades do futebol a campanhas eleitorais, o
presidente da Federação afirma não ter recebido recursos financeiros, mas quanto a
materiais esportivos, alega que os recebeu e que serviram para fins políticos e eleitorais:
“O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – O senhor também foi
contemplado na sua campanha com alguma ajuda da CBF?
O SR. HEITOR LUIZ DA COSTA JÚNIOR – Não.
Financeiramente não. Eu tive ajuda de material esportivo, como nós
temos constantemente, nós recebemos o material esportivo. Então, para a
minha campanha, especificamente, eu não tive ajuda. Especificamente,
para minha campanha, eu não tive ajuda.”
A ajuda em material desportivo, desde que quantificável em dinheiro é,
de acordo com a Lei nº 9.504/97, comparável a doação em dinheiro. Neste sentido,
evidencia-se, pelo depoimento acima transcrito, o auxílio da CBF a campanhas
eleitorais.
Segue, abaixo, quadro informativo sobre as eleições de 1994, quando o
Heitor Luiz foi reeleito Deputado Estadual.
Resultado das eleições do Estado de R ONDÔNIA, EM 1994, PARA O CARGO DE
DEPUTADO ESTADUAL
Candidato
15110 MARCOS ANTONIO DONADON
15160 RENATO EUCLIDES CARVALHO DE VELLOSO VIANNA
33140 LUIZ CARLOS COELHO DE MENEZES
36101 JOAO BATISTA DOS SANTOS
12121 JOSE MARIO DE MELO
22199 MILENI CRISTINA BENETTI MOTA
12200 JOAO BATISTA DE LIMA
20110 LUCIA TEREZA RODRIGUES DOS SANTOS
12132 CESAR CASSOL
20111 FRANCISCO DE SALES DUARTE AZEVEDO
14110 JOAO FERREIRA MARTINS
14140 JOSE CARLOS OLIVEIRA
33111 HEITOR LUIZ DA COSTA JUNIOR
22220 ELIZEU FERREIRA DA SILVA
45111 MAURO NAZIF RASUL
15109 AUGUSTO TUNES PLACA
33101 JOSE CUNHA E SILVA JUNIOR
33144 IVONE ABRAO DE FREITAS PEREIRA
13200 DANIEL PEREIRA
Partido
PMDB
PMDB
PMN
PRN
PDT
PL
PDT
PSC
PDT
PSC
PTB
PTB
PMN
PL
PSDB
PMDB
PMN
PMN
PT
Votação
9.549
7.010
5.972
5.556
5.494
5.272
5.234
5.076
4.585
4.479
4.260
4.080
4.067
4.055
3.954
3.718
3.553
3.362
3.241
Candidato
15200 SUELI ALVES ARAGAO
45112 ALTAIR SCHONS
13133 ROSARIA HELENA DE OLIVEIRA LIMA
25101 CARLOS MAGNO RAMOS
25250 DONIZETTI JOSE
Partido
PMDB
PSDB
PT
PFL
PFL
Votação
3.157
3.006
2.694
2.484
2.463
Fonte: Tribunal Superior Eleitoral.
5.2. A AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM QUE O HEITOR LUIZ CONSTA COMO RÉU
O presidente da Federação é réu, junto com Jaime de Melo Bastos de
Lima e Oscarino Mário da Costa, em ação civil pública, movida pelo Ministério Público
do Estado de Rondônia. O objeto da ação pauta-se na ocorrência de improbidade
administrativa. Jaime de Melo Bastos de Lima – candidato a vereador em Porto Velho
derrotado nas eleições de 2000 –, tal como Heitor Luiz, tem vínculos com o desporto,
uma vez que ocupa o cargo de Secretário Municipal de Cultura e Esportes de Porto
Velho, capital de Rondônia. Oscarino Mário da Costa também ocupa cargo público, no
governo do Estado de Rondônia, como Presidente da Comissão Permanente de
Licitações de Materiais e Serviços, da Superintendência Estadual de Licitações.
Considerando-se o que até aqui foi colhido pela CPI quanto à Federação
rondoniense, tendo em vista a não colaboração da entidade à essa Comissão quanto ao
não envio de seus balanços e movimentos contábeis, e com base no descontrole
administrativo e contábil da Federação, é possível concluir que a atitude do Ministério
Público na mencionada ação judicial tem algum fundamento. Não é papel deste
Relatório fazer ilações acerca daquela ação judicial, mas é inevitável apontar que a má
gestão em uma entidade como a Federação sugere um descuido na responsabilidade do
administrador, no caso concreto, do Heitor Luiz.
Ainda sobre esta questão, é importante registrar a opinião do Heitor Luiz
sobre a ação em que é réu, após questionamento feito pelo Deputado Olímpio Pires:
“Eu era Líder do Governo na Assembléia e tinha uma
instituição de economista mista, que é a Empresa de Navegação de
Rondônia, essa empresa fez várias contratações. Eu como Líder do
Governo, o pessoal me procurava, eu encaminhava, entendendo por
questão, como V. Exas. são políticos sabem, nós encaminhávamos a essa
empresa e algumas pessoas foram contratadas e virou-se esse processo de
onde que se diz que foi, que está sendo por improbidade administrativa.
Mas eu não concordo que seja improbidade administrativa, porque eu
nunca contratei, eu nunca fiz contrato, porque eu era Deputado na época,
por questão de Liderança de Governo, eu fiz algumas indicações. E uma
pessoa foi lá e denunciou que eu havia enviado, autorizado essa
contratação. Aí o Ministério Público achou por bem, em novembro de, se
não me engano, de 98, abria-se esse processo novamente, que inclusive
está envolvido o atual Prefeito de Porto Velho. Então, eu e ele.”
6. CONTRATOS COM A TV
A Federação de Futebol do Estado de Rondônia enviou ofício à CPI, em
30/10/2000, informando que a entidade “nunca celebrou contratos com redes e
emissoras de televisão sediados no Brasil ou no exterior”.
7. RELAÇÃO COM OS CLUBES
Em seu depoimento, o presidente da Federação afirmou que sua relação
com os clubes é de auxílio material. Não chegaram à CPI denúncias ou informações
relevantes acerca da relação entre Federação e clubes. Reproduzimos, a esse respeito,
trechos do depoimento do Heitor Luiz:
O SR. HEITOR LUIZ DA COSTA JÚNIOR – Ajudo
determinadas ligas. Algumas ligas que necessitam de troféus, de material
esportivo, até pra deslocamento quando vão à Capital, ajudo na
organização de competições. A nível municipal, nós temos dado ajuda.
O SR. DEPUTADO OLIMPIO PIRES – E aos clubes, o senhor
ajuda?
O SR. HEITOR LUIZ DA COSTA JÚNIOR – Ajudamos os
clubes. Nós temos clube que participou recentemente da Copa Norte.
Então, ele tem a dificuldade de deslocamento ou mesmo o próprio repasse
das TVs que compram a competição, por exemplo a Copa Norte. Nós
sempre, dentro das nossas possibilidades, nós ajudamos esses filiados.
8. CONCLUSÕES , ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES
Da análise de todos os documentos e do depoimento do Heitor Luiz da
Costa Neto, conclui-se que a Federação rondoniense de futebol é administrada de
forma temerária, além do descontrole financeiro e fiscal.
Há evidências de que as informações declaradas à Receita Federal não
refletem a realidade.
Recomenda-se alteração estatutária para permitir maior autonomia do
conselho fiscal em relação com a direção da entidade.
Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao
Ministério Público Federal, ao Ministério Público do Estado de Rondônia, ao Tribunal
de Contas do Estado de Rondônia, a fim de que seja esclarecida a questão da sede da
Federação de Futebol, e o contrato entre a Federação e o Estado para o uso de
mencionado imóvel, e ao Ministério Público Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral de
Rondônia, com base na Lei nº 9.504/97.
RORAIMA
1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DA FEDERAÇÃO
Segundo José Gama Xaud, presidente, que prestou depoimento a esta
CPI, em 10/05/2001, a Federação nunca cobrou taxa de clube e que sobrevive dos
valores repassados pela CBF.
A Federação de Roraima não encaminhou documentos referentes ao seu
estatuto. Disse seu presidente :
“...agora apareceram o meu contador, que não ganha nada, e me disse:
“Presidente, nós precisamos ver o problema da receita, porque a
Federação tem que pagar o imposto de renda”. Eu disse: “Mas rapaz,
você não sabia disso?” Disse: “Não, mas com aquelas... Antes era tido
como filantrópica, e agora, depois de 98, com a lei de empresa pública, foi
obrigado a recolher aos cofres públicos.” Com a indicação do Deputado
Rosinha, que nos fez vários pedidos, e 90% deles foram cumpridos, em
função de nós mandarmos as nossas prestações de contas desde 95,
deixamos um prazo e, pela indicação dos senhores, é preciso, e foi
convocado uma pessoa de gabarito para que se fizesse essa juntada não de
documentos, que eles existem, sim uma organização contábil mais
apreensível(?), mais reconhecida e, como dizer, mais, vamos dizer,
lealmente computada. E nós estamos já há 2 anos para ser cumpridas
todas de 95 a 2000. E, com isso também solicitei a esses técnicos que
fizessem o levantamento dos nossos débitos com a receita, para que nós
possamos comercializar e aí, daqui para a frente, dizer que a Federação
Roraimense de Futebol, de fato, cumpre todos aqueles mandatos, cumpre
tudo aquilo que é necessário, pelo menos para uma pequena organização
do nosso futebol do Norte. Por isso, Excelências, espero que também
vocês possam nos ajudar nessa parada com a Receita. Possam reivindicar
que nós possamos parcelar isso aí e sim concretizar tudo aquilo que nós
pensamos e que V.Exas. também têm em mente sobre a organização do
futebol brasileiro. Obrigado.” (g.n.)
O deputado Dr. Olímpio Pires questionou se há remuneração para o
presidente da federação o que foi negado por Xuad. Disse, ainda ser Contador
aposentado.
Inquirido sobre remuneração de dirigentes e funcionários, disse o José
Gama Xaud:
“O SR. DEPUTADO OLÍMPIO PIRES – Quantos funcionários
tem a Federação?
O SR. JOSÉ GAMA XAUD – A Federação não tem nenhum. A
gente paga uma gratificação porque geralmente vem... Antes o Governo
nos dava funcionários da Educação para ajudar as Federações. Então,
nós gratificávamos ele com uma ajuda de custo mensal para que ele
pudesse se locomover.” (g.n.)
A Federação, assim, não tem funcionários remunerados, de acordo com
seu presidente. Diz não haver remuneração a dirigentes e que dava gratificação aos
funcionários que antigamente o Governo liberava da área de Educação.
2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA
2.1 CONTINUISMO
A Federação Roiramense vem sendo administrada, há 27 anos,
intercalados, por José Gama Xaud. Foi convidado em 1976 pelo trabalho que realizou
na Federação de Basquete, tendo saído por causa da Lei do Conselho Nacional que
somente permitia a permanência por três mandatos. Foi feito novo convite para sua
volta e, conforme estatuto, os filiados votaram por sua eleição (sete).
O deputado Luis Barbosa perguntou se o estatuto da Federação permite
continuidade da reeleição, e foi assim respondido:
“Claro, claro. Permite, porque a Constituição de 88 assim o
fez. Os Direitos Individuais e Coletivos às pessoas jurídicas foi
aprovado.”
E que esse estatuto data de 1994.
2.2 PROCESSO ELEITORAL
Indagado, José Gama Xaud disse que são convocadas, para eleição, todas
os clubes (sete) e que não há ligas, oficialmente.
2.3 CONTAS BANCÁRIAS
A Federação Roraimense de Futebol é o titular da conta 09820.3000-8, da
agência 090 do banco Sudameris. O banco enviou a esta CPI somente os extratos da
conta, sem os devidos comprovantes de débito/crédito. Há suspeita de que também
seja responsável pela conta 0090706315, provavelmente do Bancrevea, pelo fato de o
cheque 225877, datado de 12.01.99, emitido pela CBF, no valor de R$ 20.000,00 trazer
exarado em seu anverso aquele número de conta.
2.4 DESPESAS DIVERSAS
Verificando-se documentos que a Federação enviou a esta CPI, após a
audiência em Manaus, já às vésperas de se concluir este Relatório, observa-se que a
entidade roraimense realiza gastos bastante freqüentes com restaurantes, combustíveis,
além de gratificar a diretoria.
A entidade não possui veículos, porém tem gasto expressivo com
combustíveis. O diretor financeiro Haroldo de Assis Medeiros recebeu gratificação em
4/1/1999, no valor de R$ 250,00 o que se supõe proibido pelo estatuto da entidade.
O presidente Xaud afirmou até que:
“O SR. JOSÉ GAMA XAUD - Isso é verdade. Eu fiz ver ao
nosso... O que acontece também Excelência é que, por exemplo, as nossas
diretorias, o pessoal que nos ajuda não recebe nada. Então, fica até difícil
por exemplo às vezes você exigir, porque é tão difícil nessa região arranjar
pessoas que nos ajudem nesse futebol, que a gente fica naquela da
exigência e a gente tem que cumprir lei.”
(g.n.)
Verifica-se que o presidente não disse a verdade em seu depoimento, pois
há provas de que a diretoria receba valores em forma de gratificações.
2.5 OUTROS ASPECTOS
O presidente da Federação Roraimense teceu comentários sobre a
decadência do futebol, atribuindo-a aos seguintes fatos:
“O Estado de Roraima não tem como tirar dinheiro pro
futebol;
O Governo brasileiro, que é o principal, tirou incentivos fiscais,
tirou até do material esportivo;
Nós não temos uma indústria. Se você for pedir naqueles
comerciantes que têm recursos, eles choram tanto que você acaba dando
presente pro comerciante;
Os clubes não têm recursos;
Nós não vendemos nada. Enquanto a mídia compra as suas
propagandas nos estádios, Roraima nem transmite coisa nenhuma;
Não existe verba para o futebol profissional, existe para o
amador.”
3. SITUAÇÃO FISCAL/FINANCEIRA
Não foi entregue à Receita Federal declaração de renda alguma por parte
da Federação. Questionado, o presidente da entidade afirmou que a entidade não
possui patrimônio algum, nem veículo nem nada.
Quanto a afirmação do Deputado Olímpio Pires, de que em 1998 a
Federação Roraimense apresentou balanço à Comissão informando o valor de R$
78.529,00 como despesas operacionais e R$ 40.142,00 como despesas de veículos e de
conservação de bens e instalação, José Gama Xaud diz haver alguma coisa errada e
ainda:
“...Não. É preciso averiguar isso aí direito, porque o que nós
fazemos, Excelência, por exemplo, recentemente o nosso vice ele se
descolocou (entendido por deslocou) e nós damos às vezes o vale de óleo
diesel em paga. Óleo diesel ou gasolina. Certo? Óleo diesel ou gasolina.
Agora, esse montante aí não. ... Não, não. Isso daí está errado. Isso não
existe. Eu acho que confundiram as federações. Isso não existe.”
E quanto a não apresentação de Imposto de Renda:
“...É, veja bem, o que acontece é que são tantas normas, tantas
leis, tantas exigências, que tem hora que você se perde. Eu sei que a
pessoa física, certo, e praticamente a jurídica tinha que declarar. Agora,
as Federações nossas, amadoras como eram, eram tidas como
filantrópicas. Nós não temos recursos.”
O deputado Léo Alcântara questionou-o sobre o conhecimento de que
mesmo as entidades filantrópicas são obrigadas a declarar renda, ao que José Gama
Xaud respondeu:
“...Elas tinham que declarar ...Isso é verdade. Eu fiz ver ao
nosso... O que acontece também Excelência é que, por exemplo, as nossas
diretorias, o pessoal que nos ajuda não recebe nada. Então, fica até difícil
por exemplo às vezes você exigir, porque é tão difícil nessa região arranjar
pessoas que nos ajudem nesse futebol, que a gente fica naquela da
exigência e a gente tem que cumprir lei. Hoje, a Federação Roraimense de
Futebol está estabilizada financeiramente. Está estabilizada. E com essa
nova organização nós vamos ter que pagar alguns técnicos para que de
fato nós possamos, nos relatórios administrativos financeiros, cumprir
essas cláusulas todas. Eu estou lhe dizendo que nós não declaramos, mas
já estamos embuídos... não fizemos agora se não iria parecer uma
enganação, porque nós fomos convocados. Se fizéssemos isso até os
senhores iriam desconfiar: “Estão vendo como eles estão correndo?” Mas
não é isso não. Nós daqui saindo, semana que vem nós já vamos
conversar com a receita. Por isso, que estou pedindo o apoio dos senhores,
porque não sei nem se tem multa. E se for de fato cobrado multo, aí vai
pesar muito para nós. Nós pedimos esse apoio para que vocês possam nos
ajudar a esse respeito.”
E em relação a dívidas existentes:
“Olha, nós fizemos uma dívida foi com o bingo. Fizeram o
bingo lá em Roraima e ele enganaram todas as federações. Todas foram
enganadas. Depois de quase cinco anos, achou por bem a Receita
comunicar que existia, ninguém sabia, que exista esse débito, porque eles
não recolheram o imposto devido dos veículos que foram bingados. Nós
não tínhamos nem conhecimento. Quando apareceu, o que era 13 mil
reais foi para 26 mil reais. Tivemos que comercializar também na
Receita e estamos pagando acho que praticamente já está quitado esse
débito. Foi o único débito. Nós não devemos à ninguém.”
Quanto aos recursos recebidos da CBF:
“Olha, Excelência, ali, a parte financeira de recurso, por
exemplo, ajuda o clube, dou ajuda de custa a pessoas que trabalham,
hoje, que nós já temos recurso — antes não podíamos fazer, hoje nós já
temos —, coquetéis, festas, isso nós fazemos com bom grado para aqueles
que trabalham no futebol.” (g.n.)
Indagou o Deputado Olímpio Pires:
“Você por acaso tinha algum livro caixa para controlar isso?
Por que, como não tem contabilidade, como que você controlava isso aí?”
Ao que respondeu José Gama Xaud:
“Não. Veja bem. A nossa contabilidade, a base principal que
é primeiro ter receita para poder fazer a despesa, certo?, Com isso,
quando nós recebemos a verba, ela entra em banco via cheque e sai via
cheque, certo? Comprovando com recibos e com notas fiscais. Ela não sai
avulsa e nem dinheiro em mãos. Nós não temos caixa dois. Não temos.
Agora, com essa organização, que estou falando aos senhores, vai ser
preciso, porque se não tiver livro caixa e um razão, às vezes é difícil você
identificar a despesa, porque passa o tempo e às vezes você esquece.”
O Deputado Olímpio Pires disse acreditar que há uma desorganização
generalizada quanto a não apresentação de documentos e que se os mesmos não forem
apresentados até a apresentação do relatório, vai passar por fraude.
Respondeu José Gama Xaud:
“Veja bem, o nosso recurso, o único recurso que nós recebemos
diretamente é da CBF ou quando, por exemplo, agora, o Governador do
Estado, ele gosta de futebol nos comprou, fizemos uma proposta e ele nos
comprou o primeiro turno para dar 5 mil reais para cada clube, e os 15
restante, para pagar as despesas do campeonato. Tem mais uma coisa
doutor, quero lhe avisar, a federação paga arbitragem, paga gandula. Os
times não pagam um tostão, nada. Isso a não ser quando tem os jogos
que são programados pela Confederação Brasileira de Futebol. Aí, sai do
borderô. Mas o nosso futebol lá, 98% tem renda negativa, e os clubes não
tem dinheiro e a federação paga. Aí o senhor me pergunta: "Xaud, a
federação tem dinheiro, tem saldo positivo. A pessoa só consegue ter saldo
positivo nas federações, que nós sabemos, com o uso da lealdade com o
desenrolar do dinheiro público, como o senhor falou. Isso eu lhe garanto
que a gente faz. É por isso que nós temos um saldo . Graças a Deus não
devemos à ninguém, a não ser agora à Receita, que nós vamos
comercializar, para que fique a federação totalmente regularizada. Que só
dessa maneira se faz. (...) Já houve abuso de poder para me tirarem da
federação, e não conseguiram. Já houve abuso de poder. Já recebi pressões.
Muitas pressões, até de Brasília, e nós conseguimos, sem um tostão no
bolso, vencer essa política da federação. (...) Digo que a CPI tendo
declarado em pleno jornais vai ter valor par ao futebol brasileiro. Pelo
menos, se inicia uma nova época de responsabilidade e respeito daquilo
que está fazendo. Já se vê uma mudança. Eu não quero dizer com isso
que culpado é o senhor Ricardo Teixeira ou o clube. (...).”
Observa-se que a Federação de Roraima tem poucos gastos registrados
em relação aos recursos que obtém. Da documentação recebida já na fase final do
relatório, percebe-se, por exemplo, que em outubro de 1999 a entidade recebeu,
somente da CBF, R$ 12 mil. No entanto, contabilizou apenas R$ 480,00 de despesas. O
mesmo é válido para a maior parte dos meses examinados. Em janeiro de 1999, a CBF
repassou um valor adicional de R$ 20 mil. As despesa, nesse mês, chegaram a R$
5.288,00. Com isso, não se pode afirmar para onde estão os recursos da Federação
Roraimense de Futebol.
A federação não possui contabilidade, apesar de o seu presidente, há mais
de 27 anos usufruindo daquela entidade, ser contador aposentado.
O Deputado Luís Barbosa perguntou sobre fontes de recursos da
Federação e o Xaud disse que além das remessas da CBF, o governo do Estado,
recentemente, comprou o primeiro turno do campeonato.
Quanto a prestação de contas, pergunta o deputado:
“O SR. DEPUTADO LUIS BARBOSA – V.Sa. pode dizer se a
prestação de contas da Federação Roraimense de Futebol está em dia?
O SR. JOSÉ GAMA XAUD – Tá, sim. Nós tamos agora
conscientes...
O SR. DEPUTADO LUIS BARBOSA – Com o Imposto de
Renda, com o INSS...?
O SR. JOSÉ GAMA XAUD – Não, não. Veja bem: o..., o
Imposto de Renda, que nós estamos (ininteligível), com eu já disse, nós
estamos fazendo o levantamento... Tá..., tá sendo feito um diagnóstico,
uma prestação de conta pra que nós possamos chegar na Receita e
conversar como nós vamos pagar. Porque nós não tamos nos omitindo de
pagar; nós queremos pagar; agora, é preciso que se faça parcelado e, como
eu já pedi o apoio de vocês, possamos fazer isso sem... derivar(?) nenhuma
multa contra clubes e Federação.”
Quanto a patrimônio, José Gama Xaud afirma que a Federação não
possui nenhum, nem equipamentos, nem veículos, nada. Vai solicitar à Prefeitura uma
doação para que possa iniciar a sede da Federação, “porque já temos o recurso para isso e nós
vamos tocar isso pra frente...”, afirmou
4. RELAÇÃO COM A CBF
A Federação Roraimense recebeu mensalmente, durante o ano de 1998, a
importância de 6 mil reais tendo sido elevados para 12 mil/mês em 1999 e 2000. No
mes de: jan/999 houve uma remessa a mais de 14 mil reais; no mês de setembro/99
não consta remessa; totalizando por ano:
1998 – R$ 72.000,00
1999 – R$ 146.000,00
2000 – R$ 144.000,00.
A seguir, gráfico com as doações da CBF:
DOAÇÕES DA CBF PARA A
FEDERAÇÃO RORAIMENSE DE FUTEBOL
1998 - 2000
R$
30.000
25.000
20.000
15.000
10.000
Fonte: Contabilidade CBF/CPI CBF Nike
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/2000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/99
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
0
JAN/98
5.000
MESES
5. CONTRATOS COM TV
A Federação não tem contratos para transmissão de jogos pela TV.
6. RELAÇÃO COM OS CLUBES
Admitiu ajuda financeira aos clubes, quando o procuram e que possui
comprovantes dessas ajudas. Há empréstimos que, devido ao fato de a Federação não
ter encaminhado seus documentos contábeis, não pôde se apurar se eles foram pagos.
7. CONCLUSÕES
Quase todos os problemas que afetam as federações estão presentes aqui.
O continuismo aparece de forma destacada. O uso indiscriminado dos recursos da
federação também se evidencia. Faltam documentos, há indícios de muitas
irregularidades, ausência de Declarações de Renda, não existência de balanços e livros
contábeis e os comprovantes da destinação das contribuições recebidas, principalmente
por parte da CBF.
8. RECOMENDAÇÕES
Comunicar à Receita Federal quanto a não apresentação das declarações
de renda da Federação dos últimos anos.
Informar ao Ministério Público a ausência de documentação fiscal e
contábil da entidade.
Solicitar à Federação o envio dos comprovantes de pagamentos
referentes aos recursos enviados pela CBF, compromisso assumido pelo seu presidente
no depoimento prestado junto a esta Comissão.
Recomenda-se encaminhar cópia deste Relatório ao Conselho Federal de
Contabilidade, para providências.
Recomenda-se uma reforma estatutária para limitar o mandato da
diretoria da entidade em no máximo quatro anos, impedindo a recondução aos cargos;
para permitir uma maior autonomia do conselho fiscal; para obrigar a realização de
licitação para a aquisição de bens e de material esportivo; e para estabelecer maior
transparência nas contas da Federação e nos repasses de verbas que envolvam a
entidade e os clubes.
Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao
Ministério Público Federal, ao Ministério Público do Estado de Roraima – no tocante
às verbas que envolvem o Governo estadual.
SANTA CATARINA
1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DA FEDERAÇÃO
A Federação de Santa Catarina possui personalidade jurídica de sociedade
civil de direito privado, regida pelos artigos 20 a 23 do Código Civil Brasileiro,
conforme prevê o artigo 1º de seu Estatuto.
2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA
A Federação Catarinense vem sendo administrada, há 16 anos, por
Delfim de Pádua Peixoto Filho, que prestou depoimento a esta CPI, em 07/05/2001,
ficando registrado em notas taquigráficas nesta Casa.
Antes do depoimento do presidente catarinense, falou a esta Comissão o
senhor Dalmo Bozzano, ex-árbitro da FIFA. Seu depoimento foi marcado por
acusações contra a administração do senhor Delfim, as quais se resumem como segue:
a) o recebimento de terreno e material para construção da sede da
Federação, sem ter sido nada realizado, o que resultou na retomada do terreno pela
Prefeitura, a doadora, e no desaparecimento dos materiais doados;
b) o presidente do Tribunal de Justiça Desportiva é nomeado pelo
Presidente da Federação de Futebol, com funcionamento do Tribunal na sala do prédio
da Federação, isso confirmado pelo senhor Delfim em seu depoimento. Essa ingerência
da Federação sobre o Tribunal Desportivo, segundo o senhor Dalmo, comprometeria a
independência do Tribunal no julgamento das causas, especialmente quando forem
relacionadas ao futebol;
c) aumento do percentual destinado à Federação, do arrecadado de
algumas partidas; os clubes aceitam, devido ao receio de sofrerem retaliações; o
regulamento da competição estabelecia 7% e foram arrecadados 14% em alguns jogos;
esta denúncia e outras já haviam sido enviada anteriormente a esta CPI pelo senhor
Osni Aguiar, aposentado que trabalhou na arrecadação dos jogos;
d) permissão estatutária para convocar eleições para presidência seis
meses antes do término do mandato; ao par disso, exigência, também estatutária, de
40% de adesões dos filiado para aprovação do candidato e sua chapa, o que,
naturalmente, permite que somente dois candidatos disputem a presidência, já em que
caso de duplicidade vale a primeira adesão. Por essa regra, um candidato que consiga
61% de adesão dos filiados, seria candidato único. Cabe registrar que o estatuto foi
elaborado pelo senhor Delfim;
e) remuneração de seu dirigentes;
f) apoio à políticos, notadamente a Maurício Magalhães, candidato
apoiado pela Federação Catarinense, sob a promessa de melhoria do futebol no Estado;
isso, mesmo ante a proibição constante do art. 110 do Estatuto:
“Na Federação, não será permitida atividade de natureza política, racial
ou religiosa”; e
g) acúmulo, por parte do senhor Delfim, dos cargos de presidente da
Federação com o de presidente da Comissão de Arbitragem, também contrariando o
prescrito no artigo 53 do Estatuto:
“Além das incompatibilidades referidas em outros capítulos ou na
legislação superior, ninguém poderá, na Federação, acumular, salvo em
casos especiais e em caráter transitório , o exercício de cargos na
Diretoria”
De acordo com o entendimento do senhor Delfim, o Estatuto proíbe a
acumulação entre os cargos de direção, não sendo o que acontece com ele, uma vez que
a Comissão de Arbitragem não pertence aos Órgãos Diretivos da Federação; é apenas
uma simples comissão.
Após as palavras do senhor Dalmo, passou a depor o senhor Delfim que,
em suas palavras iniciais, relatou os fatos que levaram à inimizade com o senhor
Delmo; defendeu-se das denúncias, afirmando o seguinte:
a) que nunca recebeu tijolos nem recursos de ninguém para construção
da Sede da Federação. Recorte de jornal da época, entregue a esta Comissão pelo
senhor Delmo, mostra que o senhor Delfim afirmou ter recebido todo o material e o
terreno, tendo, inclusive, marcado data para início das obras; e
b) que somente nos jogos finais do campeonato, a parcela destinada à
Federação foi aumentada para 14% , de comum acordo com os quatro finalistas da
competição.
Sobre o Tribunal, disse que Santa Catarina foi o primeiro estado a se
adaptar as exigências da Lei Zico e Lei Pelé, uma vez que seus membros são indicados
pela OAB, pelos clubes, pelos árbitros e pela Federação, sendo seu presidente escolhido
pelos membros. Confirmou que a Federação e o Tribunal Desportivo funcionam no
mesmo prédio;
Passando às perguntas dos Deputados, o Deputado Dr. Rosinha voltou à
questão da arrecadação e de falsificação de ingressos, explicando que já sabia dos fatos,
por meio dos documentos enviados pelo senhor Osni Aguiar. Respondendo a esses
questionamentos, o senhor Delfim destacou que existe um corpo fiscal da Federação,
composto por ex-militares, que nunca detectou problema de arrecadação. Teria havido,
sim, problemas de falsificação de ingressos, que foi sanado pela prisão de falsificadores
paranaenses e aberturas de diversos inquéritos.
Sobre a remuneração dos dirigentes, afirmou que, com o advento da Lei
9532 a Federação deixou de ser sem fins lucrativos, passando a pagar tributos, a
remunerar seus dirigentes, enfim, a proceder como entidade de fins lucrativos. Sua
remuneração é de R$ 5 mil reais, enquanto que a dos diretores é de R$ 2,5 mil reais.
Ainda com relação a situação administrativa, verificou-se que, como
acontece nas demais federações, o Conselho Fiscal é eleito em chapa única com a
Diretoria. O senhor Delfim admitiu, também, que há voto por procuração nas eleições;
acha que não há problema algum; porém não soube precisar a quantidade exata, disse
apenas que “não foram muitos, não”.
Uma observação: Conselho Fiscal em chapa única com Diretoria, 40% de
adesão dos filiados para inscrição da chapa (regra do estatuto elaborado pelo atual
presidente), voto por procuração e Diretoria remunerada. Um quadro que naturalmente
dificulta qualquer pretensão de renovar os dirigentes do futebol catarinense.
3. Situação Fiscal/Financeira
Inicialmente, foi observado que a Federação não entregou as Declarações
de Imposto de Renda de Pessoa Jurídicas referentes aos exercícios de 1995, 1996 e
1997 e quando seu presidente foi questionado quanto à omissão, disse que o assunto
era do Diretor Financeiro, que estava no local e informou que não havia nenhuma
notificação da Receita Federal quanto a isso. Também não houve explicação para o não
recolhimento do COFINS referente ao ano de 1998.
Da análise da movimentação financeira da Federação Catarinense,
verificou-se vários pagamentos, em cheques nominais a Túlio Portinoi Filho, durante
1999 e 2000. O montante pago chegou a R$ 257.285,60, ou seja, mais de 20% da receita
total da Federação pagos para uma pessoa física. Isso, de uma entidade que, conforme
o declarado no Imposto de Renda, vem apresentando seguidos prejuízos . Questionado
sobre essa incoerência, o senhor Delfim respondeu simplesmente que desconhecia tais
pagamentos; resposta idêntica foi dada pelo Diretor Financeiro, senhor Arlindo Pedro
Reis. Ressalte-se, por mais estranho que possa parecer, que quem assina os cheques da
Federação são, justamente, o senhor Delfim, na qualidade de presidente, e o senhor
Arlindo, como Diretor Financeiro. Foi verificado ainda que tais despesas com o senhor
Túlio não constaram nas Declarações de Imposto de Renda.
4. RELAÇÃO COM A CBF
A Federação Catarinense recebe mensalmente a “mesada” da CBF;
segundo seu presidente é de fundamental importância para o desenvolvimento das
atividades da Federação, dada a escassez de recursos no desporto do Estado. Segundo
o senhor Delfim, o Conselho Fiscal coloca, anualmente em suas atas, o fato de a
entidade depender financeiramente da CBF. Porém, negou, veementemente, que tivesse
utilizado algum recurso financeiro oriundo da CBF para auxiliar políticos, como está
examinado a seguir.
O gráfico abaixo demonstram as doações feitas, em dinheiro, pela CBF, à
Federação catarinense:
DOAÇÕES DA CBF PARA A
FEDERAÇÃO DE FUTEBOL DE SANTA CATARINA
1998 - 2000
R$
120.000
100.000
80.000
60.000
40.000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/2000
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
MARÇO
JAN/99
NOVEMB
SETEMB
JULHO
MAIO
JAN/98
0
MARÇO
20.000
MESES
Pode-se observar que as doações da CBF se concentram nos meses
próximos às eleições de 1998 e de 2000.
5. CONTRATOS COM TV
Em uma análise global do contrato, esta Comissão ficou com o
sentimento de que a TV Catarinense adquiriu uma enorme capacidade de ingerência
sobre o futebol do estado, tornando esse último refém da primeira, uma vez que até a
tabela com jogos a serem realizados compõe o contrato, como anexo.
Verdadeiramente, como nas outras federações, o futebol catarinense também é vitima
dos interesses comerciais, dentre eles e com maior força, o televisivo.
6. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL :
Durante seu depoimento, o senhor Delfim foi questionado sobre
possíveis auxílios financeiros a políticos. Sobre esse assunto, respondeu invocando a
Lei 9532/97 e afirmando que poderia ter dado apoio financeiro a políticos; porém,
nunca o fez. Apoiou pessoalmente e de outras formas, que não a financeira,
governador, senador e candidato a deputado que não se elegeu. Esse último seria
Maurício Magalhães (Dr. Fritz), genro do senhor Delfim, à época das eleições de 1998.
Maurício Magalhães recebeu da CBF duas doações para sua campanha
política. Ambas de R$ 25 mil, a primeira em 11/9 e a segunda em 30/9/1998. Isso
reforça a hipótese de que o dinheiro da CBF, repassado para as federações, estarem
sendo para promover campanhas eleitorais (Ver Capítulo VIII)..
7 RELAÇÃO COM CLUBES
A federação não presta nenhum tipo de auxílio aos clubes de Santa
Catarina, porém, o senhor Delfim afirmou que ajudava as ligas existentes no estado,
com materiais de informática e quantias em cheques. Só que esta Comissão, de posse
do sigilo bancário da entidade, não constatou nenhum cheque emitido para as ligas.
Quando foi dito ao senhor Delfim que não havia nenhum cheque, inicialmente, ele
tentou mudar suas resposta, disse que a quantia não era muita...depois admitiu não
saber por que os cheque não constavam na movimentação financeira da Federação. O
curioso é que, no caso dos pagamentos ao senhor Túlio Portinoi Filho, havia cheques
que o presidente catarinense desconheceu; agora, o presidente afirma ter efetuado
pagamentos em cheques que não constam nas informações repassadas pelo Banco
Central. No mínimo, existe algum descontrole na movimentação bancária da Federação
Catarinense de Futebol
8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DE FUTEBOL
9. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES
SÃO PAULO
1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA
O Estatuto da Federação Paulista de Futebol prevê, em seu art. 1º, que
sua personalidade jurídica é de uma associação civil de direito privado, sem fins
lucrativos, para fins desportivos. Cala, portanto, sua norma fundadora e reguladora de
suas atividades, sobre maiores detalhamentos quanto à sua qualificação jurídica, o que
nos remete ao Código Civil.
O estatuto não prevê qualquer tipo de remuneração para a Diretoria. No
depoimento a esta CPI, o presidente da FPF, Eduardo José Farah, afirmou que nada
recebia da Federação, apesar de haver sido aprovada, em Assembléia Geral, uma verba
de representação de R$ 17 mil reais mensais, em seu favor, desde 1996. Farah está à
frente da Federação Paulista há 14 anos.
Comentário do Presidente desta Comissão, Deputado Aldo Rebelo sobre
a concessão de poderes excessivos a Farah no Estatuto da FPF:
“O SR. PRESIDENTE (Deputado Aldo Rebelo) - ... eu tive dando
uma olhada no Estatuto aqui, Presidente Farah, e há aqui, no Capítulo
V, no art. 29, na... no item “v” que permite à Presidência da Federação
“praticar qualquer ato necessário ao bom andamento das atividades da
Federação ad referendum do poder próprio, quando for o caso”. E
curiosamente esse item do art. 29, combinado com o item “f” do art. 8º,
que “é da competência da Assembléia Geral autorizar ou determinar a
aquisição, alienação ou gravação de bens imóveis, depois de ouvido o
Conselho Fiscal”, me chega à conclusão que dá ao Presidente da
Federação o poder inclusive de vender a sede da Federação ad
referendum da Assembléia Geral. Eu faço essa curiosidade não em
referência ao senhor, naturalmente. É porque estatutos — o da CBF
permite amplos poderes ainda mais amplos ao Presidente... estatutos
dessas entidades concentram de tal forma poderes na Presidência que,
naturalmente, dificultam aquilo que eu acho que é a fiscalização, o
controle das instituições que deveriam ter esse papel dentro da entidade.”
O Presidente Farah concordou com as palavras do Deputado e
prometeu corrigir o Estatuto.
2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA
A Federação se mostra saudável quanto à sua administração.
O
presidente declarou que há alguns anos a Federação vem sendo superavitária; tem uma
contabilidade bem organizada; possui um sistema de compras e recebimento de
recursos somente por transferência bancária; qualquer gasto da Federação é realizado
após um orçamento triplo, apesar de não tornar público esse procedimento. O
Conselho Fiscal tem relativa independência. A organização dos campeonatos da FPF
têm recebido elogios da imprensa, e também a delegação do controle da arrecadação à
responsabilidade dos clubes. Esses e outros procedimentos, comprovados por
documentos enviados a esta Comissão, pelo menos dão a aparência de uma
administração eficiente e eficaz, no que diz respeito à suas metas, àquilo que seu
estatuto prescreve.
A Federação Paulista tem 60 funcionários contratados pela CLT, mais 10
contratados temporariamente. Existe um grupo de garotas que atua nos intervalos dos
jogos, com intuito de promover o evento e preencher o tempo vago do torcedor. As
garotas não são contratadas da Federação; pertencem a uma empresa, e a Federação
paga essa empresa, com recursos de patrocinadora, uma loja de construção.
A Federação mantém dois programas de televisão, um na Rede Vida e
outro na Rede TV; há também um página na Internet, mantida por empresa
especializada.
3. SITUAÇÃO FISCAL/FINANCEIRA
Apesar de uma administração satisfatória, conforme visto no item
anterior, a situação fiscal/financeira da FPF apresenta alguns aspectos pontuais, que
merecem ser relatados.
Observa-se, inicialmente, que a Federação não entregou as Declarações
de Imposto de Renda referentes aos anos calendários de 1995 e 1996. Ainda com
relação ao fisco federal, o Presidente de Federação afirmou, em seu depoimento a esta
Comissão, que a Federação possui, em aplicações financeiras, o montante de R$ 23
milhões, mas nas declarações de renda da entidade não foi encontrado nada que faça
referência a este valor.
Com relação à Previdência, a despeito do confortável quadro financeiro,
evidenciado a todo instante no depoimento de Farah, há uma dívida no valor de R$
5.233.943,20, apontado no Relatório do INSS, de 22.11.2000.
3. 1 DAS FONTES DE RENDIMENTO
Farah informou que todo aporte financeiro da Federação é originário
dos contratos com a televisão aberta e fechada; de 10% sobre o valor dos contratos
com a publicidade estática (os 90% restantes vão para os clubes participantes da
partida), e, por último, do contrato com a Penalty.
3.2 O CASO DO JOGADOR PIERKASKI
O jogador Pierkaski foi adquirido pela Federação Paulista de Futebol, de
um clube uruguaio , chamado Rentistas, pelo valor de R$1.200.000,00; depois foi
“cedido” ao Mogi-Mirim, e seis meses após, vendido ao Bastia, da França, pelo valor de
US$1.800.000,00, em três parcelas de 600 mil dólares, das quais a Federação recebeu
duas, que em reais totalizam R$2.348.973,44. Comentários: de acordo com a Lei Pelé, o
passe de jogador não pode pertencer à Federação de Futebol; o Rentistas é um clube
bastante utilizado pelo empresário Juan Figer em suas transações; antes de ir para o
Rentistas do Uruguai, o jogador passou, num curto período, pelo Clube Regatas
Flamengo e pelo Atlético Paranaense (também utilizado por Juan Figer), havendo,
inclusive, superposição de datas.
Questionado sobre esta transação, Farah afirmou que não havia
comprado o passe do jogador, mas sim os direitos financeiros dele; disse que quem era
dono do passe do jogador, e, portanto, autorizava ou não sua liberação, era o MogiMirim. Porém, documentos entregues a esta CPI comprovam que toda a negociação
com o Bastia da França foi realizada com a Federação, por meio de seu vice-presidente,
e uma justificativa dada pelo clube francês para não honrar o pagamento da terceira e
última parcela, foi a constatação de que o clube Mogi-Mirim estaria envolvido no
negócio.
A transação aconteceu em 30/07/99 e houve uma empresa encarregada
da cobrança (Lavingstone Holding), que, segundo o Sr. Farah, teria recebido nos
vencimentos das operações e aplicado os recursos no exterior, gerando um lucro de
aplicações num valor acima de 120 mil dólares, que ainda não foi enviado ao Brasil. O
que foi efetivamente remetido em 20.11.2000 (US$1.200.000,00, referente ao principal)
proporcionou um ganho pela paridade dólar/real de quase 100%, entre julho/99 e
novembro/2000. A Lavingstone Holding ainda está encarregada da cobrança da última
parcela e é responsável pelo envio dos 120 mil dólares referentes ao lucro da aplicação
no exterior.
Houve pagamentos ao Central Español, clube uruguaio também utilizado
pelo empresário Juan Figer, que o Presidente da Federação Paulista não soube explicar,
mesmo tendo assinado cheques de R$ 100 mil reais:
“O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – sim, mas tem? não
entendi. não, quero saber se houve o pagamento ao central español ou não
houve um pagamento.
O Sr. Eduardo José Farah – tá dizendo que houve.
O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – e a razão desse
pagamento?
O SR. EDUARDO JOSÉ FARAH – não sei, excelência. não
sabia nem que houve pagamento. isso aí eu vou informar. ela tá aí, é o
financeiro. a federação é...
O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – mas ela ou qualquer
outro diretor poderia efetuar um pagamento ou autorizar pagamentos no
valor de 400 mil reais sem o seu conhecimento, sem que o senhor se
lembrasse?
O SR. EDUARDO JOSÉ FARAH – É lógico. eu saio de licença,
tem outro presidente na federação. pode até ter acontecido. não tô dizendo
que aconteceu. se tiver pagamento, nós vamos apresentar pro senhor o
documento. eu só não estou sabendo de memória aqui. se o senhor tiver
uma informação...
O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – eu tenho cópias de
cheques assinados pelo senhor que...
O SR. EDUARDO JOSÉ FARAH – hein? ah! eu vou mandar pro
senhor os documentos. o senhor fique tranqüilo.
O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – no valor de cem...
O SR. EDUARDO JOSÉ FARAH – deve ter uma razão
absolutamente (ininteligível).”
Comentários do Deputado Léo Alcântara sobre o tema:
“(...) afigura-se estranho e anormal que a Federação tenha
mantido aplicação financeira em dólares no exterior, deixando de declarar
esses valores à Receita. Os indícios aqui colhidos apontam para a prática
do crime de sonegação fiscal, já que qualquer bem ou valor mantido fora
do País deve constar obrigatoriamente da declaração de renda do
contribuinte, pessoa física ou jurídica.
Além do mais, embora o Presidente da Federação
Paulista de Futebol alegue que a venda do jogador foi feita
pelo clube Mogi Mirim, a nosso ver, isto não restou
demonstrado. Ao contrário, o contrato envolve a Federação e
o Clube Bastia da França, o valor foi pago à Federação e
aplicado no exterior através do Leving Stone Holding S.A.”
3.3 C ASO MARCELINHO
O jogador foi adquirido do Valência (Espanha), tendo a FPF pago o
valor de 7 milhões de dólares nos mesmos termos do jogador Pierkaski, ou seja, a
Federação estaria comprando os direitos financeiros do jogador Marcelinho. Como
forma de angariar recursos para a compra do passe, criou-se um 0900 (disque
Marcelinho), em contrato com a Rede Bandeirantes. Esse “disque” indicaria o clube
que receberia o Marcelinho por dois anos, a depender da torcida que mais ligasse em
favor de seu clube (São Paulo, Palmeiras, Santos e Corinthians) . O resultado apontou o
Corinthians como vencedor, com 62,5% dos telefonemas. Do total arrecadado, coube à
Federação o valor de 580 mil reais que estão sendo questionados pelo Ministério
Público, em ação contra 0900, de uma forma geral.
Antes de decorrido o prazo, o Corinthians resolveu adquirir os direitos
financeiros do jogador, e a Federação cobrou apenas 40% do valor pago ao Valência da
Espanha, ou seja, R$ 2 milhões e 800 mil, o que representou um prejuízo de R$ 4
milhões e 200 mil. Questionado, Farah disse que não considera um prejuízo, uma vez
que ajudou o Corinthians e, conseqüentemente, o futebol paulista...
“O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ - ou seja, para a
federação paulista de futebol o senhor perdeu 4 milhões e 200 mil
dólares?
O SR. EDUARDO JOSÉ FARAH - depende da ótica. para a
federação paulista de futebol, nós fizemos um benefício ao Corinthians e
ao esporte de São Paulo. não há prejuízo nenhum.
O SR. DEPUTADO JURANDIL JUAREZ – entendo. na
questão financeira, o senhor perdeu, a federação paulista perdeu 4 milhões
e 200 mil dólares.”
O Sr. Farah ainda afirmou que a Federação também ajudou na compra de
Evair para a Portuguesa de Desportos, de Viola para o Santos, e de outros jogadores
para os clubes do interior.
Como última informação sobre a situação fiscal/financeira da Federação
Paulista, observou-se, por meio da análise da movimentação bancária, que foi
despendido o montante de R$ 5.716.750,60 com a empresa Vale Refeição Ltda., apenas
nos meses de abril e maio de 1998.
O gasto poderia ser melhor esclarecido, caso tivéssemos tido acesso à
contabilidade do ano de 1998, conforme solicitado por esta Comissão, por intermédio
do Ofício nº 264//00-P. Em resposta a esse Ofício, a Federação enviou um CD-Room,
contendo documentos contábeis, supostamente relativos aos anos de 1995 a 2000;
porém, não foi possível o acesso ao triênio 1998/2000, por falta de um programa
instalador que não constava do CD enviado.
Essa constatação foi confirmada pelo departamento de contabilidade da
Federação, via contato telefônico, mais especificamente, pela Sra. Conceição,
responsável pela confecção do CD. Instada a remeter, por e-mail, o programa, disse
não ser possível, dada a informalidade. É importante destacar que, justamente nesse
triênio, encontram-se as operações financeiras mais questionáveis da Federação, e que
não foram analisadas contabilmente.
4. RELAÇÃO COM A CBF:
Evidentemente, tendo em vista que suas contas estão saneadas, a
Federação não recebe nenhum tipo de auxílio da CBF.
Para se ter uma idéia do relacionamento da CBF com a Federação
Paulista, transcrevemos um trecho do depoimento de seu presidente:
“O SR. DEPUTADO SILVIO TORRES – (...) O senhor
creditaria à CBF a responsabilidade pela crise do futebol brasileiro atual,
à administração da CBF?
O SR. EDUARDO JOSÉ FARAH – Dizem os meus
companheiros de trabalho que eu sou um homem coerente, e vou manter a
minha coerência. Em termos internacionais, em muitas oportunidades dei
nota dez para o Ricardo Teixeira; reduzi agora para sete, em razão dos
últimos tempos. E, em termos nacionais, a administração da CBF tem
merecido de minha parte nota três.”
Farah acredita que não tem sido consultado acerca de decisões
importantes do futebol brasileiro, por manifestar essas opiniões publicamente.
Afirmou, ainda, não ser candidato à presidência da CBF e que não se candidatará à
presidência da Federação Paulista, passando ao seu sucessor em 2002.
5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL :
Não foi identificada, explicitamente, nenhuma doação da CBF, ou da
própria Federação, a políticos do estado.
6. Contrato com Televisão
Com relação aos contratos com televisão, a Federação tem um contrato
com a TV Globo de Televisão, no valor de R$ 44 milhões. Segundo seu presidente, a
Federação é apenas uma “mandatária” do contrato, aconselhando os clubes quanto às
melhores opções e, por esse trabalho, ficando com 10% do valor do contrato; os 90%
restantes são rateados entre os clubes signatários. Existe um outro contrato, também
com a Globo, de publicidade estática; existem outros contratos de repasse de imagens
para as emissoras de canais fechados (ESPN, Sport TV, Globosat).
Em uma análise global dos contratos, esta Comissão avalia,
contrariamente ao que vem acontecendo com as outras Federações, que os contratos
são plausíveis, até porque, no caso do futebol paulista, há um razoável concorrência
entre as emissoras, o que possibilita melhores condições para negociação. Segundo
Farah, os contratos com empresas de televisão são as principais fontes de receita para a
entidade.
Segue um trecho do depoimento que retrata essa situação:
“O SR. DEPUTADO RUBENS FURLAN: (...) Por outro lado,
nós temos conhecimento de que a Rede Globo às vezes consegue modificar
o horário das competições pela conveniência da sua... da sua audiência. E
ontem nós estávamos, anteontem, discutindo essa questão e observamos
que ela é, praticamente ela detém o monopólio de transmissão e de
publicidade. Eu quero perguntar pro senhor se esses patrocinadores, até,
principalmente, vamos colocar aqui com muita franqueza, a Rede Globo,
ela atrapalha o desenvolvimento dos nossos campeonatos?
O SR. EDUARDO JOSÉ FARAH – Nós já jogamos nesse
campeonato, na série A-1, oitenta partidas de futebol: 10 rodadas com 8
jogos. Nenhum jogo foi mudado dia e horário, neste ano, felizmente.
Anteriormente tivemos algumas mudanças.. A Globo compra e paga. E,
se ela conseguir colocar um jogo às duas horas da manhã, ela vai procurar
conseguir colocar o jogo às duas horas da manhã; agora, o dirigente tem
que passar uma certa autoridade. (...) Vai jogar no Morumbi. Não tem
transporte. Então, o senhor nota que no campeonato paulista, 80 jogos,
não houve uma única mudança. E em outras competições já aconteceram
muitas mudanças. Então, é a fragilidade do comando. Infelizmente, o
futebol brasileiro está carente de um comando mais rígido, mais duro.”
SERGIPE
1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DAS FEDERAÇÕES :
A Federação Sergipana de Futebol é uma associação civil, para fins
desportivos, que não remunera seus dirigentes.
Trata-se de típica entidade de direito privado sem fins lucrativos.
2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA:
A Federação Sergipana de Futebol é presidida por José Carivaldo de
Souza há dez anos.
3. SITUAÇÃO FISCAL E FINANCEIRA
3.1. IMPOSTO DE RENDA E BENS DA FEDERAÇÃO
A Federação, conforme dados da receita federal, não declarou Imposto
de Renda nos exercícios de 1996 e de 1997. José Carivaldo afirmou, em seu
depoimento, que a Federação não tem bens. Contudo, pelas informações declaradas
junto à receita federal em 2000 (referindo-se ao exercício de 1999), a Federação tem
bens imóveis no valor de R$ 1.636,00. Estranhamente, no ano anterior, há registro
apenas no item “outros bens e direitos do ativo permanente”, declarado em R$
1.470,20. Já em 1998, com referência ao ano-calendário 1997, verifica-se o registro de
bens apenas neste último item, num valor de R$ 2.623,90 (conforme Anexo 29/01,
sigilo fiscal). O conflito entre o dito e o declarado no Imposto de Renda demonstra
certo descontrole das contas e do patrimônio. Segue, abaixo, depoimento do José
Carivaldo acerca da propriedade ou não de bens pela Federação:
“Não tem não. Que eu saiba, não. Eu cheguei junto à
Federação, quando eu assumi, nós tínhamos mais de trinta ganhos de
causa na Justiça do Trabalho de árbitros. Esse trabalho todo foi feito em
fazer todos esses pagamentos. Agora, nós não temos nenhum bem de jeito
e hipótese nenhuma. Nunca tivemos. Vou procurar saber lá da
contadora, onde o que ela achou.”
3.2. OUTRAS MOVIMENTAÇÕES BANCÁRIAS DA FEDERAÇÃO
Da movimentação financeira anual da Federação Sergipana, verifica-se a
destinação de verbas a clubes do estado. No entanto, constatou-se o pagamento, em
cheque único datado de 12/04/2000, no valor de R$ 101.937,50, em favor de Antônio
Costa de Saraiva. Trata-se de pagamento que foge à realidade da Federação, de pouca
movimentação financeira, e que ficou sem esclarecimentos.
4. RELAÇÃO COM A CBF
4.1. AUXÍLIOS DA CBF À FEDERAÇÃO
A Federação Sergipana de Futebol recebeu da CBF, nos anos de 1998 a
2000, os seguintes valores: em 1998, R$ 6.000,00 por mês, com exceção do mês de
dezembro, quando a Federação recebeu R$ 16.000,00; em 1999, o repasse mensal foi de
R$ 12.000,00, com as exceções de janeiro, que foi de R$ 6.000,00, maio, de R$
22.000,00, agosto, de R$ 14.030,00 e novembro, de R$ 42.000,00; já em 2000, os
repasses, mês a mês, foram os seguintes: janeiro, R$ 42.000,00; fevereiro, maio a julho,
setembro a dezembro, R$ 12.000,00; março e abril, R$ 62.000,00, e agosto, R$
52.000,00. Estranha-se o aumento dos valores oriundos da CBF no ano 2000,
exatamente quando houve o pleito eleitoral para cargos municipais, o que levanta
suspeitas sobre o presidente da Federação, eleito Prefeito do município de Macambira,
estado de Sergipe, em outubro de 2000. José Carivaldo, em seu depoimento, nega a
hipótese de beneficiamento à sua candidatura ou a outras:
“O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Nós sabemos que o
senhor é Prefeito de Macambira.
O SR. JOSÉ CARIVALDO DE SOUZA – Isso.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Parabéns pela vitória
eleitoral. Em seguida, faço a pergunta que eu já fiz a outro. A federação
do senhor ajudou na campanha de alguém?
O SR. JOSÉ CARIVALDO DE SOUZA – Não senhor.
Inclusive quando, três, quatro meses. Teve um ano inclusive que eu sou
reeleito. Fui eleito em, fui reeleito, agora, com sete vezes mais a diferença
com 70% quase do eleitorado de minha terra. Inclusive digo aqui aos
senhores que procuram até saber pelo trabalho que nós estamos fazendo
realmente na administração pública lá do nosso Município. Mas, eu
nunca usei a federação para fins políticos.”
4.2. A PARTICIPAÇÃO DA FEDERAÇÃO NA ASSEMBLÉIA DA CBF
José Carivaldo afirma que as contas da CBF são aprovadas apenas
formalmente, sem qualquer discussão dos membros da Assembléia. A atitude da CBF,
criticada pelo presidente da Federação sergipana, demonstra certo desprezo da entidade
nacional pela instância que é a assembléia geral. Segue abaixo trechos do depoimento
do José Carivaldo:
“O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Presidente José
Carivaldo, o senhor esteve presente na reunião na assembléia que aprovou
as contas do senhor Ricardo Teixeira?
O SR. JOSÉ CARIVALDO DE SOUZA – Em todos os anos da
minha administração, no final do ano, eu estive presente e aprovei as
contas. E digo aos senhores lá, assim que nós chegamos, no horário, nos
passam um caderno dessa altura com todo o movimento da CBF durante
todo o ano e com o parecer do conselho fiscal. Quando todas foram por
unanimidade, salvo engano. E não era uma federação sergipana já tão
sacrificada e tão pequena que iria, naquela hora, discordar e também não
teria condições. Porque, nós não temos condições de verificar as contas
naquele momento. Porque, pegam as contas, vai um presidente da
federação presidir os trabalhos e diz ‘quem aprova fique sentado, quem
não aprova me levante’.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Me deixa entender, a
reunião, a assembléia é um dia, dois dias?
O SR. JOSÉ CARIVALDO DE SOUZA – É um dia não. É só
um horariozinho. Começa um horário e termina.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – E vocês tomam
conhecimento desse calhamaço de números então na hora lá.
O SR. JOSÉ CARIVALDO DE SOUZA – Na hora , entrego lá
o relatório.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Daí a meia hora tem que
tá votando.
O SR. JOSÉ CARIVALDO DE SOUZA – Daí a meia hora já
tá aprovado.”
5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL
O presidente da Federação Sergipana de Futebol é prefeito reeleito do
município de Macambira, estado de Sergipe. Conforme observado acima, o período
eleitoral municipal de 2000 coincidiu com um aumento substancial das verbas enviadas
pela CBF à Federação. A suspeita de utilização da doação em campanha eleitoral tem
um forte fundamento nesses dados, embora em seu depoimento à CPI, o José
Carivaldo tenha negado vínculos entre a entidade e as eleições.
6. CONTRATOS COM A TV
A Federação Sergipana de Futebol não possui contratos de transmissão
de jogos com emissoras de televisão.
7. RELAÇÃO COM OS CLUBES
7.1. SOBRE A FINAL DO CAMPEONATO SERGIPANO EM 2000
Constatou-se que em 2000, a relação entre a Federação Sergipana e a
Associação Desportiva Confiança foi conflituosa. É que a data marcada para a
realização da final do campeonato sergipano da 1ª divisão foi adiada, de modo que o
Confiança, que compareceu ao local e horário determinados para disputar a partido
com o Clube Sportivo Sergipe, viu-se prejudicado com a decisão da Federação. O
Confiança protocolou seu protesto na Federação em 27/11/2000, assim como o
pedido para que fossem tomadas as medidas necessárias, tendo em vista a ausência do
Clube Sergipe. Posteriormente, em outra data, o Clube Sergipe compareceu e o
Confiança não, tendo este último sofrido WO.
A CPI recebeu denúncias dando conta que a Federação beneficia o Clube
Sergipe. Perguntado a respeito, o José Carivaldo negou as suspeitas e justificou o
adiamento daquela final de campeonato em função de problemas no estádio “Batistão”.
A questão foi assim tratada na sessão desta CPI que ouviu o presidente da Federação:
“O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Nós tomamos
conhecimento que o campeonato estadual do ano passado conheceu o seu
campeão, mas, porém, não foi de uma forma pacífica. O senhor pode
explicar os fatos?
O SR. JOSÉ CARIVALDO DE SOUZA – Explico. Nós
tivemos problema com o Batistão, que infelizmente desabou as suas
marquises e, desde o campeonato de 89 e 90, nós estávamos sem estádio
em Aracaju. E depois nós vamos chegar lá, inclusive com alguma ajuda
financeira que nós solicitamos para esse respeito. E numa partida, a
decisão de um turno, a Polícia Militar do nosso Estado disse que não se
responsabilizaria pelo jogo no estádio do Confiança. Aí nós tomamos a
providência de cancelar a partida e o meu desejo era fazer no próprio
estádio, fazendo algumas modificações, inclusive me responsabilizando,
dividindo, fazendo aquilo que a Polícia Militar quisesse. Infelizmente, a
diretoria do clube não aceitou, não nos deixou entrar e eu comunico: a
única coisa que eu tinha condições de fazer era transferir para o estádio
de uma cidade, Itabaiana, que dista 40 quilômetros da capital, o jogo, e
o Confiança não compareceu e nós demos o jogo como W-O.”
7.2. MATERIAL ESPORTIVO
Denúncias que chegaram à CPI sugeriam que o presidente da Federação
adquiria material esportivo destinado aos clubes e que não efetuava esse repasse
devidamente. Perguntado a esse respeito, José Carivaldo negou a denúncia, conforme
se verifica abaixo:
“O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Senhor José Carivaldo,
em 1993, a federação recebeu material esportivo da CBF para ser
repassado aos clubes. Esse material chegou aos clubes?
O SR. JOSÉ CARIVALDO DE SOUZA – Chegou. Chegou.
O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Porque, tem muita
conversa que não chegou, doutor José Carivaldo.
O SR. JOSÉ CARIVALDO DE SOUZA – Não. Aí, ao
contrário. Eu dou material esportivo todo ano aos clubes. E se é uma
coisa, mesmo aqui, eu tenho em minha vida e vou levar é minha
honestidade com tudo que eu faço. Eu posso até errar
administrativamente. Agora, honestamente, é eu jamais fiz uma coisa
que viesse denegrir a minha imagem.”
8. RELAÇÃO COM EMPRESÁRIOS DO FUTEBOL
Da análise do depoimento do José Carivaldo e dos documentos enviados
à CPI, não foram encontradas informações ou denúncias relevantes na relação entre a
Federação e empresários do futebol.
9. CONCLUSÕES , ENCAMINHAMENTOS E RECOMENDAÇÕES
Da análise dos documentos e do depoimento do José Carivaldo de
Souza, conclui-se que a Federação Sergipana de Futebol é gerida de forma temerária em
termos administrativo, financeiro e fiscal.
Recomenda-se uma reforma estatutária para limitar o mandato da
diretoria da entidade em no máximo quatro anos, impedindo a recondução aos cargos;
para permitir uma maior autonomia do conselho fiscal; para obrigar a realização de
licitação para a aquisição de bens e de material esportivo; e para estabelecer maior
transparência nas contas da Federação e nos repasses de verbas que envolvam a
entidade e os clubes.
Sugere-se encaminhar o presente Relatório à Receita Federal, ao
Ministério Público Federal, ao Ministério Público do Estado de Sergipe – no tocante a
eventuais ofensas à Lei nº 8.078/90 e à Lei nº 9.615/98 (art. 42, § 3º) –, e ao Ministério
Público Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral de Sergipe, com base na Lei nº
9.504/97.
TOCANTINS
1. NATUREZA JURÍDICA / ESTATUTÁRIA DA FEDERAÇÃO :
A Federação de Tocantins possui personalidade jurídica de sociedade
civil de direito privado, regida pelos artigos 20 a 23 do Código Civil Brasileiro.
2. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA :
Pôde-se perceber que a Federação de Tocantins é de porte bastante
modesto, quer técnico, financeira e administrativamente (possui apenas três
funcionários).
Fundada há onze ano por seu atual Presidente, Senador Leomar de Melo
Quintanilha, esteve durante todo esse tempo sob o comando do Senador. O Sr.
Leomar, em seu depoimento (Notas Taquigráficas 000345/01), fez questão de deixar
claro que não recebe qualquer tipo de remuneração e que, por duas vezes, foi reeleito
contra sua vontade, já que, apesar de gostar da atividade, absorve muito seu tempo
devido as dificuldades próprias de um futebol de pequena expressão no contexto
nacional.
2.1 CONTABILIDADE E PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS DE GESTÃO DA
DESPESA:
Com relação à contabilidade da Federação, pôde-se perceber, com base
no confrontamento da movimentação financeira e os lançamentos constantes dos
documentos contábeis, enviados a esta Comissão, várias inconsistências nos últimos
cinco anos, de modo a tornarem a contabilidade da Federação Tocantinense não
confiável, no que diz respeito a espelhar fielmente a vida financeira da Entidade.
Por vezes, o procedimento de compras e pagamento de despesas,
inclusive salários de contratado, da FTF é, no mínimo, questionável: são emitidos
cheques nominais a funcionários da Federação, normalmente de valores elevados
(acima de R$ 60.000,00), os quais são descontados na “boca do caixa” (conforme
extratos bancários), e os pagamentos são feitos em espécie.
3. SITUAÇÃO FISCAL/FINANCEIRA
Inicialmente, foi observado que a Federação não entregou as Declarações
de Imposto de Renda de Pessoa Jurídicas referentes aos exercícios de 1996 e 1997, e
quando seu Presidente foi questionado quanto à omissão, sinalizou que não tinha
conhecimento da obrigatoriedade de, mesmo isenta, apresentar a declaração; em
seguida, reconheceu a falha.
Com relação às demonstrações constantes da Declaração de Renda, foi
questionada a falta, na Demonstração de Origens e Aplicação de Recursos do ano
calendário de 1998, do registro das doações da CBF; após algumas ponderações e
dúvidas, o Sr. Leomar concordou que houve um deslize por parte do contador.
3.1 CONSTRUÇÃO DO ESTÁDIO
Por meio da análise da movimentação financeira da Federação, observouse emissões de cheques que totalizaram, em 1999 e 2000, mais de três milhões e
setecentos mil reais, tudo sem passar pela contabilidade da Federação. Se
aumentarmos o período da análise para 1995-2000, verifica-se que houve o ingresso nas
diversas contas da Federação do montante de R$ 7.666.864,38.
Questionado, o Sr. Leomar explicou que trata-se de um convênio com o
Governo do Estado, para a construção de um estádio de futebol. Todo o recurso
destinado para a obra é apenas repassado para construtora, sem ser apropriado ao
patrimônio da Federação, uma vez que por determinação legal, o convênio possui conta
bancária específica.
Considerando as dimensões do futebol no estado e as condições
financeiras daquela Unidade da Federação, cabe um questionamento do binômio custobenefício desses gastos, observando-se os retornos da empreitada.
Um outro aspecto que ficou claro é a ausência de fiscalização desses
recursos, por parte do Estado.
3.2 EMPRÉSTIMOS
Foram observados vários empréstimos da Federação ao seu presidente,
que totalizaram R$ 41.506,65.
Um outro fato relevante, é que alguns empréstimos foram simplesmente
anistiado pelo dirigente da entidade, sem nenhum motivo aparente. O Conselho Fiscal
também não questionou tal atitude.
3.3 GASTOS QUESTIONÁVEIS
Da análise da documentação enviada a esta Comissão, verificou-se vários
gastos que refogem aos ditames estatutários. Como exemplo, podemos citar publicação
em jornal, paga pela Federação, de matérias não relacionadas ao Futebol, pagamento de
indumentárias carnavalescas, organização de eventos direcionados a outros fins, que
não o desportivo, etc.
4. RELAÇÃO COM A CBF:
A Federação Tocantinense recebe mensalmente a “mesada” da CBF;
segundo seu Presidente é de fundamental importância para o desenvolvimento das
atividades da Federação, dada a escassez de recursos no desporto do Estado.
5. RELAÇÃO COM A POLÍTICA LOCAL :
Não foi identificada, explicitamente, nenhuma doação da CBF ou da
própria Federação a políticos do estado, tendo inclusive a negativa do Sr. Leomar,
durante seu depoimento a esta Comissão. Cabe registrar que o Sr. Leomar foi eleito
Senador em 1995, quando já era Presidente; porém, também negou qualquer utilização
da Federação de Futebol para fins políticos.
6. CONCLUSÃO
Conclui-se, assim, que é necessário uma análise mais acurada, por parte
dos órgãos de controle, das esferas federais e estaduais, com o objetivo de esclarecer
aspectos duvidosos que surgiram da análise da administração da Federação
Tocantinense de Futebol.
CAPÍTULO XI – P ASSAPORTES FALSOS DE JOGADORES
Sub-Relatorio sobre Passaportes
Deputado JURANDIL JUAREZ
Sub-Relator da CPI da NIKE,
para assuntos de passaportes falsos
INTRODUÇÃO
Tendo em vista artigos publicados nos jornais Folha de São Paulo e O
Estado de São Paulo sobre violação dos princípios que regem o desporto nacional – Lei
nº 9.615/98 –, perpetrada em cláusulas do contrato de patrocínio o firmado entre a
Confederação Brasileira de Futebol e a NIKE, foi criado esta Comissão Parlamentar de
Inquérito, por Ato da Presidência da Câmara dos Deputados, a requerimento do Sr.
Deputado Aldo Rebelo e outros.
Em virtude das graves denúncias divulgadas pela imprensa acerca de
irregularidades no futebol brasileiro, envolvendo, inclusive, a utilização de documentos
falsos de jogadores, como passaportes de outras nacionalidades, diminuição da idade,
uso de documentos de terceiros, com o fim de transferir jogadores brasileiros para
outros países, foi criado, no âmbito da Comissão, uma Sub-Relatoria para investigação
de passaportes falsos.
Assim a realização de algumas investigações e da oitiva de testemunhas,
tornou-se possível entender o desenvolvimento desse esquema de falsificação de
documentos, com o objetivo de transacionar jogadores com times estrangeiros.
Neste relatório , procedemos a um relato dos principais fatos aqui
denunciados e investigados.
O Esquema de Passaportes Falsos com Portugal - Lisboa
Do encontro com o Embaixador Synésio Sampaio Goes
Em reunião protocolar, foi relatado ao Embaixador Synésio Sampaio
Goes o objeto da diligência a ser efetuada em Portugal, tendo sido designado um
funcionário daquela representação brasileira para acompanhar os trabalhos a serem
desenvolvidos em território português.
DAS CONVERSAS COM JORNALISTAS PORTUGUESES
O jornalista João Esteves e o Diretor Victor Serpa do jornal A Bola
relataram ser a questão da emissão de passaportes falsos portugueses um problema
antigo. Já em 1977, noticiava-se o caso de oito jogadores brasileiros do Celta da
Espanha. Naquela oportunidade, os passaportes falsos dos jogadores brasileiros
também foram utilizados para apresentá-los com idade menor do que a verdadeira.
Jogadores da Seleção de Camarões, que nunca haviam estado em Portugal, foram
identificados portando passaportes portugueses. Jogadores africanos foram também
apontados como portadores de passaportes falsos franceses, belgas e portugueses.
Informaram que, segundo a imprensa local, o Sr. Hermínio Menendez estaria disposto
a prestar esclarecimentos sobre o Caso Edu e sugeriram que fossem contatadas
autoridades do Ministério da Administração Interior e da Policia Judiciária. Sobre o
assunto, reportagem do Jornal A Bola, de 23 de novembro, e o dossiê “O caso dos
passaportes falsos”.
O jornalista Hélio Nascimento (Jornal Record) e o correspondente do
Jornal do Brasil em Lisboa, jornalista Tedesco, relataram o interesse da imprensa
portuguesa em pesquisar e noticiar o assunto, e as dificuldades enfrentadas para obter
informações junto à Polícia Judiciária. Não detinham dados sobre o nível de
aprofundamento das investigações efetuadas pelas autoridades policiais sobre o caso .
Foi efetuada coletiva com profissionais da imprensa local (jornal, rádio e
televisão), convocados pela Embaixada brasileira em Portugal. Na oportunidade, foram
repassadas as informações até então obtidas junto aos órgãos oficiais portugueses.
DOS FATOS RELATADOS PELO CÔNSUL -GERAL DO BRASIL EM LISBOA
O Ministro Pedro Motta, Cônsul-Geral do Brasil em Lisboa, apresentou
relato informando sobre o aumento significativo do fluxo migratório de brasileiros para
Portugal, especialmente nos últimos 10 meses. Muitos brasileiros encontram-se em
situação irregular naquele país, vivendo em condições precárias, alguns inclusive
morando em containers de lixo. Em média, 350 brasileiros procuram diariamente o
Consulado para obter registro. Apontou para a necessidade do estabelecimento de uma
política brasileira de imigração, mostrando-se especialmente preocupado com a situação
dos jogadores brasileiros menores de idade. Relatou que atualmente agem no território
português diversas quadrilhas organizadas – as máfias portuguesa, africana, russa e a
albanesa –, sendo o país utilizado como ponto de entrada de imigrantes ilegais na
Europa e como trampolim para os que têm como destino os USA .
DO ENCONTRO COM AUTORIDADES POLICIAIS PORTUGUESES
Alegando segredo de justiça, o Diretor da Interpol, Dr. Chaves de
Almeida, declarou-se impedido, não podendo fornecer informações aprofundadas
sobre processo recentemente instaurado com o objetivo de averiguar o caso de
passaportes falsos portugueses. Com a interveniência do Diretor da Interpol no Brasil,
Dr. Washington, foram obtidos os nomes dos jogadores brasileiros que estariam
arrolados no processo, a seguir identificados:
André Augusto Leoni
Jedias Capucho Neves
Nelson de Jesus Neves
Edmilson Rocha Andrade Mendes
Jorge Henrique Amaral de Castro
Marcos Assunção
José Vitor Roque Junior
Varley Silva Santos
Alberto Valentin do Carmo Neto
O Dr. Luís Filipe Ramos bonina, Diretor-Geral da Polícia Judiciária,
afirmando ser a questão dos passaportes falsos um assunto que tem merecido especial
atenção das autoridades policiais portuguesas, informou sobre a alteração a ser
introduzida brevemente na formatação dos passaportes portugueses com a finalidade
de inibir a atuação dos falsários. Perguntado sobre os processos instaurados contra
brasileiros, declarou que estão sendo tratados com prioridade, mas, a exemplo da
autoridade policial ligada à Interpol em Portugal, alegou ser uma matéria que tramita
em segredo de justiça. Para viabilizar a entrega de cópia do processo, solicitou envio de
requerimento do presidente da CPI da CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE
FUTEBOL/Nike àquele órgão.
O Dr. Antônio de Lencastre Bernardo, Diretor-Geral do Serviço de
Estrangeiros e Fronteiras, informou ser da competência do Serviço de Estrangeiros e
Fronteiras emitir passaporte tão-somente para cidadãos estrangeiros residentes em
território português, cujos países de origem não tenham representação diplomática em
Portugal. Sugeriu que a solicitação de cópia dos processos sobre envolvimento de
jogadores brasileiros com passaporte falso (lista do item “e”) fosse efetuada por
intermédio da Embaixada brasileira.
Ressaltou que as medidas a serem adotadas, a partir de 2 de janeiro de
2001, no tocante à formatação dos passaportes portugueses, resultarão em substancial
diminuição da possibilidade de fraude. Até o momento, não detém dados que
possibilitem estabelecer uma conexão entre brasileiros e as quadrilhas que agem em
Portugal, alegando, inclusive, que as autoridades italianas não estariam repassando
informações adicionais sobre a ocorrência de furto de passaportes em branco nos
consulados portugueses em Genebra/Suíça e Vizeu/Portugal. Informou, ainda, sobre a
existência de uma quadrilha de fraudadores (grupo de Governador Valadares) que
estaria enviando brasileiros para os USA, via Portugal.
Abordou, também, a preocupante questão do forte fluxo migratório de
brasileiros que, em Portugal, passam a viver em condições precárias, assumindo postos
de trabalho na construção civil, casando-se com prostitutas para obter visto de
permanência, principalmente nas regiões de Mafra e de Costa de Taparica. Seriam
responsáveis pela migração desses brasileiros intermediários de mão-de-obra e agências
de viagem.
DO ENCONTRO COM O DEPUTADO OCTÁVIO TEIXEIRA
O Deputado Octávio Teixeira, do Grupo parlamentar do PCP –
Assembléia da República, declarou que, no âmbito do Parlamento Português, registrouse tão-somente a iniciativa de apresentação de um Requerimento de Informações sobre
as denúncias veiculadas na imprensa acerca do surgimento de passaportes falsos, do
Deputado Hermínio Loureiro, do PSD (Partido da bancada governista), em anexo.
Informou sobre a existência de problemas no futebol português, que age com total
independência, financiado por off shores e máfias.
Paralelamente, alertou para a situação degradante e precária em que
vivem brasileiros (principalmente nas ilhas de Açores), entregando matéria publicada no
jornal O Público, sobre o assunto.
Sobre a eficácia das entidades policiais, ressaltou que existe confiança na
qualidade dos trabalhos desenvolvidos.
DO ENCONTRO COM PESSOAS ENVOLVIDAS NO PROCESSO DE AQUISIÇÃO DE
PASSAPORTES
O Sr. Antônio Carlos de Almeida Castro apresentou-se como advogado
do Sr. Juan Figer, que teria sido enviado a Portugal pelo seu cliente para esclarecer
fatos relativos ao Caso Edu, propondo-se, inclusive, a comparecer a uma reunião
acompanhado de pessoas que deteriam informações sobre o assunto (advogado João
Gonçalves, empresário espanhol Hermínio Menendez e o empresário ioguslavo
Miroslav Nestorovic).
Os Srs. Hermínio Menendez e Miroslav Nestorovic, acompanhados do
seu advogado de nacionalidade portuguesa, Dr. João Gonçalves, apresentaram-se como
sócios em um empreendimento – Centro Desportivo em Marbella, Espanha,
denominado Marpafut – local que seria utilizado por grandes times do mundo inteiro
para pré-temporadas. O Sr. Menendez informou ter sido Diretor-Geral do Clube
Sevilha, Sub-Diretor-Geral do Sporting da Espanha e detentor de 3 medalhas
olímpicas.
Perguntado sobre seu relacionamento com o Sr. Juan Figer, Sr.
Menendez negou manter sociedade com o mesmo, informando ser apenas um
colaborador, tendo intermediado a realização de jogos, torneios e cuidado dos
interesses de alguns jogadores na Espanha, cujos passes foram negociados pelo Sr. Juan
Figer. Mantém escritório em Madri (Padre Darnian 42-10, Madrid, fone: 913458981).
Passaram a relatar o seguinte:
O avô do Edu seria português. O Sr. Juan Figer teria comentado com o
Sr. Menendez que estaria negociando o passe do jogador brasileiro Edu com o Clube
Arsenal da Inglaterra e enfrentando dificuldades com o passaporte do jogador. Na
qualidade de amigo, teria tentado ajudá-lo e comentou o caso com seu sócio iugoslavo,
o Sr. Nestorovic, que, em Marpafut, conversando sobre o assunto com um português
de nome Caldeira (branco, cabelos negros, boa apresentação, de 35 a 40 anos, fone:
00351 918325370), soube que o mesmo tinha uma empresa por meio da qual poderia
resolver o problema do passaporte do jogador em Portugal, em duas semanas. Em
troca, queria tão-somente vaga nos meses de janeiro e fevereiro de 2001 no Centro
Desportivo Marpafut para uma equipe alemã de futebol. O Sr. Caldeira comprometeuse a entregar o passaporte português do jogador em 2 semanas. Para viabilizar a
confecção do passaporte, o Sr. Nestorovic entregou documentos do jogador Edu para
o Sr. Caldeira em Marbella, que, após 30 a 45 dias, entregou-lhe o passaporte português
do jogador Ed. O Sr. Nestorovic repassou o passaporte para o Sr. Menendez que, em
Londres/Inglaterra, entregou ao Sr. David Tean, funcionário do Clube Arsenal, que,
após fazer uma cópia do documento devolveu o original. Edu encontrava-se em
Londres para fazer exames médicos, oportunidade em que, na presença do Sr. Marcel
Figer, recebeu seu passaporte português, retornando ao Brasil. O Sr. Menendez e o Sr.
Nestorovic afirmam que não houve participação do Sr. Juan Figer neste caso de
emissão do passaporte português do jogador Edu.
Em espécie, o Sr. Nestorovic entregou ao Sr. Caldeira mais ou menos
400 dólares para pagamento de taxas e serviços relativos à emissão do passaporte em
Lisboa, afirmando não recordar o valor exato que teria repassado (68 ou 86 mil
pesetas). Os encontros entre os dois ocorreram em Marbella (duas vezes) e os demais
contatos foram telefônicos (três vezes).
O Sr. Nestorovic afirmou, ainda, ter ido a Lisboa apenas quando o caso
veio à tona, em julho deste ano, alertado que foi pelo Sr. Hermínio.
Os advogados e empresários presentes ao encontro afirmaram
desconhecer se o Sr. Juan Figer seria empresário dos jogadores Dida, Marcos Assunção,
Jorginho e Alberto. Na oportunidade, o Dr. Antônio Carlos ligou para o Sr. Marcel
Figer que afirmou serem (ele e seu pai, Sr. Juan Figer) empresários apenas do jogador
Warley. O passe do jogador foi vendido ao clube italiano Udinese, que se
responsabilizara pela sua documentação.
O Sr. Nestorovic informou, também, que o Sr. Caldeira teria afirmado
que, no caso do passaporte português do jogador Edu, fora auxiliado por dois
portugueses: o Sr. Joaquim Silva residente à Av. Dom Carlos I, nº 2770,
Amadora/Portugal, fone 9653.66866) e o Sr. Domingos Djalo (residente à, Av. 25 de
Abril nº 7, loja 2750, Cintra/Portugal, fone 9670.35405). Essa informação do Sr.
Nestorovic obteve quando o caso do passaporte Edu foi noticiado. Apesar de ter
tentado manter contato telefônico com as pessoas nominadas, o Sr. Nestorovic afirmou
não ter conseguido contatá-las.
Informou, ainda, o Dr. Gonçalves que o Sr. Caldeira foi recebido em seu
escritório por seus auxiliares, acompanhado do Sr. Nestorovic, oportunidade em que
devolveu os documentos do avô do Edu, tais como, certidões de nascimento e de
casamento. Concluíram, afirmando que iriam registrar queixa na polícia portuguesa
contra o Sr. Caldeira .
Das Investigações Realizadas em Vicenza, Itália
DOS CONTATOS COM JORNALISTAS EM VICENZA
Em Vicenza, foi mantido contato com os jornalistas Pier Paolo Marino,
da imprensa italiana, e Paola Roleta, da imprensa portuguesa, com os quais foram
trocadas impressões sobre o curso da diligência. Os jornalistas foram incisivos em
afirmar o envolvimento do empresário Juan /Figer com grande número de jogadores
portadores de passaporte sob investigação, entre eles Marcos Assunção e Alberto, fato
peremptoriamente negado pelo representante do empresário Juan Figer em Portugal.
DOS RELATOS FEITOS PELO DR. STEFANO SARTORI
Dr. Stefano Sartori, Responsável do Setor Sindical da “Associazione
Calciatori Professionisti Italiani” relatou que, sobre a emissão de passaportes falsos, só
dispõe das informações veiculadas pela imprensa. A Associação possui uma relação
com os nomes dos jogadores brasileiros e argentinos no futebol italiano, que demonstra
ter o número de jogadores dessas nacionalidades crescido nestes últimos cinco anos.
Dr. Sartori acredita que esse crescimento decorre da sentença Bosman (jogador do
Liege da Bélgica), que, a partir de dezembro de 1995, permitiu ampla liberdade de
circulação de jogadores de futebol na União Européia. Isso estimulou o surgimento de
passaportes falsos, não apenas de nacionalidade portuguesa, mas também espanhóis e
italianos. A Associação, por intermédio de uma greve, conseguiu limitar o número de
jogadores estrangeiros (extracomunitários) nas equipes italianas (máximo de cinco
jogadores por equipe). Afirmou que os grandes responsáveis pela situações irregulares
dos passaportes são os clubes e os procuradores dos jogadores, ressaltando sua
preocupação com a presença de menores no futebol italiano. Segundo registro do Setor
Juvenil e Escolar da Federação Italiana de Futebol, existem 4.809 menores, na faixa de
6 a 16 anos, extracomunitários, de várias nacionalidades, atuando no futebol italiano.
Informou, ainda, não saber se algum procurador de jogador de futebol estaria
respondendo processo na Justiça.
DAS CONVERSAS MANTIDAS COM AUTORIDADES POLICIAIS
Os Drs. Marcello Moracca, Delegado de Vicenza (Questore di Vicenza),
e Edoardo Cuozzo, Dirigente do Departamento de Estrangeiros (Ufficio Stranieri),
informaram que os jogadores brasileiros entram na Itália com passaporte brasileiro.
Posteriormente é que apresentam o passaporte comunitário. Há processos correndo
naquela instituição para apurar os crimes de falsidade ideológica e de favorecimento de
imigração clandestina contra Careca, Jeda, Dedé e Mário Pavan, em fase de instrução.
O juiz encarregado do processo, Dr. Mazza, irá decidir quanto à abertura ou não do
processo criminal.
Informou também a autoridade policial que no contrato de venda do
passe do jogador Jeda encontram-se estipulados dois valores: US$ 300 mil, na hipótese
de passaporte extracomunitário, e US$ 1 milhão, se obtivesse passaporte comunitário.
Acusa dificuldade para prestar informações sobre casos ocorridos em outras regiões,
haja vista que a Questura di Vicenza tem jurisdição apenas sobre aquela região.
Sobre o contrato do jogador Dedé, informou que o mesmo é de US$ 600
mil e refere-se tão somente à hipótese de porte de passaporte comunitário.
Sobre o processo contra o ex-jogador e empresário Careca, informou a
autoridade policial que o mesmo já havia prestado depoimento em 25 de novembro,
tendo a inquirição durado 7 horas.
Por sugestão do Dr. Marcello Moracca, foi solicitado ao Consulado
Brasileiro em Milão que encaminhasse oficialmente documento requerendo cópia do
inteiro teor do referido processo, conforme cópia anexa (Anexo). A solicitação foi
atendida pelo juiz e os documentos, dado o grande volume, serão encaminhados, por
correio, de Vicenza para Milão e, posteriormente, para esta CPI.
DAS INFORMAÇÕES PRESTADAS PELO JOGADOR JEDAÍAS CAPUCHO NEVES
O jogador Jeda, Jedaías Capucho Neves, informou que chegou à Itália
levado pelo ex-jogador Careca. Jogava, à época, no Clube União São João de Araras que
o emprestou ao Clube campinas de propriedade dos ex-jogadores Careca e Edmar. Na
Itália, participou de um torneio conhecido como Copa Carnevale na toscana, do qual
foi vice-artilheiro.
Retornando ao Brasil, voltou a jogar normalmente no União. Em razão
de sua atuação destacada na Itália, despertou interesse do Clube de Vicenza, que enviou
ao Brasil um de seus diretores de nome Manfredone.
As negociações foram intermediadas pelo Careca que, nesta ocasião, lhe
perguntou se tinha alguma ascendência portuguesa. Jeda informou ao Careca ser
possível, mas que não teria documentos comprobatórios, nem meios para obtê-los.
Em junho de 2000, o atleta realizou teste no Clube Vicenza,
acompanhado do Sr. José Mário Pavan, presidente do União, e do ex-jogador Careca.
Nessa oportunidade, o jogador Jeda utilizou passaporte brasileiro, tanto para entrar,
quanto para sair da Itália.
Numa reunião preliminar destinada a estabelecer as condições para
assinatura do contrato, houve discordância quanto às bases financeiras oferecidas.
Acertadas as condições, foi assinado o contrato do atleta com o clube, sem cláusula
sobre porte de passaporte comunitário. Posteriormente, afirmou o jogador Jeda, ficou
sabendo que o contrato de transferência do Clube União São João para o Vicenza teria
dois valores:
US$ 300 mil, se o passaporte fosse extracomunitário, e US$ 1 milhão,
na hipótese de obter passaporte comunitário.
Lembrou que, em março de 2000, havia entregue documentação para a
emissão de novo passaporte, sem indicar, entretanto, que tivesse ascendência
portuguesa. Essa documentação foi entregue ao Careca, por intermédio de um
funcionário em Campinas.
Soube, posteriormente, por intermédio do Sr. Mário Pavan, que Edmar
havia conseguido o passaporte comunitário. O Sr. Paiva foi a Portugal para buscar o
documento e fez contato com o Jeda para que este fosse a Milão a fim de assinar o
passaporte. Isto feito, foi o passaporte português do jogador entregue ao Sr. Massimo
Breash, italiano e procurador do Jeda na Itália, que o entregou ao Clube Vicenza. Nesta
oportunidade, Jeda havia retornada a Bari, onde se encontrava em companhia de um
amigo, o jogador João Paulo.
O jogador Jeda afirmou que teria questionado o Sr. Edmar, por telefone,
quanto à legalidade de seu passaporte português, tendo sempre sido informado de que
o documento era legal.
Informou o jogador que seu passaporte e o do Dedé foram
confeccionados na mesma época. Em setembro deste ano, Jeda foi informado pelo
Clube Vicenza que a Federação Italiana havia comunicado que os passaportes (do Jeda
e do Dedé) não tinham registro no Consulado português.
Descoberta a fraude do passaporte. Jeda foi orientado pela diretoria do
Vicenza para que o entregasse à questura de Vicenza. O funcionário responsável pelo
caso naquela questura, Sr. Cozzo, recomendou ao jogador que retornasse ao Brasil para
obter visto, legalizando sua situação na Itália. Assim procedeu, obtendo junto ao
Consulado italiano em São Paulo o visto necessário, tendo contado com o apoio do Sr.
Eliseu de Oliveira (Tiroga), seu empresário responsável pela venda de seu passe ao
União São João.
Retornando à Itália, foi intimado a comparecer à questura de Vicenza,
ocasião em que foi indiciado em inquérito.
O atleta declarou, ainda, não saber o real valor da venda de seu passe,
afirmando que, ao questionar o Careca sobre os 15% sobre o valor do referido passe a
que faria jus, foi informado que para ter direito a recebê-los, deveria ter estado, no
mínimo, por um ano no clube União São João. Disse, ainda, não ter recebido qualquer
valor a título de luvas. Recebe, tão-somente, seu salário e está inscrito na Federação
Italiana como atleta extracomunitário.
Afirmou, também, ter ouvido um diretor do Vicenza, bastante nervoso,
afirmar que iria recuperar o dinheiro que havia pago a mais pelo seu passe, de qualquer
forma.
DAS INVESTIGAÇÕES EM MILÃO, I TÁLIA
Das informações prestadas pelo Secretário-Geral da Liga Calcio
A Posição da Liga Calcio frente à Questão da Reserva de Mercado o Dr.
Giorgio Marchetti, Secretário Geral da Liga Calcio, declarou que as únicas informações
que dispunha sobre a questão dos passaportes falsos eram aquelas veiculadas pela
imprensa, afirmando ter conhecimento sobre os processos que estavam aguardando
uma posição da magistratura.
Quando perguntado sobre os contratos baseados em passaportes falsos,
como o do Jeda e o do Dedé, disse que a Liga não mantinha controle sobre os
contratos, afirmando saber que, em várias cidades, tais como Vicenza, Milão, Udine e
Perugia, estavam sendo efetuadas investigações sobre brasileiros e argentinos, nesta
situação.
A exemplo da Associação de jogadores, declarou-se favorável à
manutenção da reserva de mercado, considerando, entretanto, estar cada vez mais
difícil a sua manutenção, em decorrência dos tratados da Comunidade Européia.
Sobre a circulação de trabalhadores, declarou considerar discriminatória a
qualificação dos jogadores em comunitários e extracomunitários, e que tal prática induz
a práticas ilegais.
Sobre o caso do jogador nigeriano Ikonga, de um time da 3ª divisão do
futebol italiano, que obteve na Justiça o direito de jogar sem obedecer à regra da reserva
de mercado, afirmou ser esta decisão da justiça um marco que poderia alterar o
mercado italiano, liberando-o completamente.
Afirmou, ainda, que a União Européia estaria contestando a FIFA sobre
as normas para contratação de jogadores e que, qualquer mudança nas regras implicaria
repercussão nos demais países do mundo.
Quando perguntado sobre a questão dos menores estrangeiros que atuam
no futebol italiano, informou que a justiça italiana trata de várias irregularidades, não
apenas as ocorridas no âmbito do futebol, como também as relativas a pedofilia e a
prostituição. Informou, também, que a Liga cuida tão-somente das questões da série A.,
sendo da responsabilidade da Federação Italiana de Futebol os casos dos menores.
DO CONTATO FEITO COM O DELEGADO DE MILÃO
Acerca da situação irregular de brasileiros na Itália, o Dr. Giovanni
Finazzo, Delegado de Milão (Questore di Milano), relatou que o caso Dida, do clube
Milan, decorre do caso Warley, amplamente divulgado pela imprensa. O presidente do
clube, ao constatar a semelhança entre as assinaturas constantes dos passaportes dos
dois atletas, procurou a questura de Milão e denunciou a irregularidade notada no
passaporte do Dida. A caderneta e os dados eram absolutamente falsos.
Por causa da irregularidade constatada, o jogador Dida responde à
acusação de falsidade ideológica. O processo encontra-se em fase de instrução e foi
enviado, em 4 de outubro do corrente ano, para o juiz encarregado do assunto, Dr.
Raimundini.
Questionado sobre outros casos de brasileiros em situação irregular
naquele país, apontou, como mais premente a situação de diversos travestis que chegam
ao país com contrato de trabalho de operário ou de empregado doméstico ou como
turista. Em ambos os casos, não necessitam visto.
DAS INVESTIGAÇÕES REALIZADAS NO BRASIL
Em sequência aos trabalhos de investigação da sub-comissão, no brasil,
no âmbito da cpi, foram realizadas audiências públicas oitiva de pessoas cujas
atividades evidenciaram envolvimento direto ou indireto, com a emissão de passaportes
falsos para jogador de futebol.
fruto desse trabalho foram os depoimentos a seguir, que passamos a
analisar afim de investigar mais detalhadamente esse esquemas de passaportes e
identificar os responsavéis que essas atividades ilegais.
Depoimento do Sr. Luiz Landir Amim Castro – PRESIDENTE
CLUBE . DO MARANHÃO .
DO
MOTO
O depoente informou sobre a venda dos jogadores Kléber e Delson, este
vendido para o Monastir da Tunísia. O dinheiro relativo a essa venda foi recebido pelo
Sr. Antônio José Cassas Lima, ex-Presidente do Conselho Deliberativo do Moto.
De acordo com o depoente, existem, na Bélgica, cerca de quarenta e oito
pessoas que tentaram ser jogadores de futebol. Um dos meninos enviados ao exterior
foi o Oliveira, filho do atleta Zé Zico do Moto Clube do Maranhão. As notícias
divulgadas sobre essa transação apontavam como responsáveis os Srs. Cassas de Lima e
Braid Ribeiro. Braid Ribeiro é um empresário, que se encontra hoje na Tunísia. Outro
empresário citado pelo depoente foi Oceonir Barreto, que também atua na
transferência de jogadores do Maranhão para outros pontos, no eixo Rio/São
Paulo/Paraná.
Confirmou também que, para vir do País, todo atleta tem de passar pela
Federação local.
Indagado sobre as carteiras de atletas dos jogadores, o depoente
confirmou que para sua confecção é necessária a apresentação da certidão de
casamento. Concernente à diferença entre a idade constante da certidão de nascimento
e aquela lançado na carteira, explicou que quem participa do registro é a Federação
Maranhense. O clube prepara as carteiras e as leva à Federação para sua respectiva
homologação. Há um departamento específico de registro de jogadores. Foi apontado o
nome do Sr. Raimundo Nonato como o diretor desse departamento.
DEPOIMENTO DO SR. ANTÔNIO CASSAS DE LIMA.
Disse o depoente conhecer o empresário Rubolotta. Segundo o
depoente, Rubolotta estava à procura de jogadores no Brasil e ele o fez com que no
Estado do Maranhão há vários jogadores bons. Desse modo, Rubolotta foi ao
Maranhão e comprou diversos jogadores vendidos por Presidentes dos clubes.
Confirmou a venda dos jogadores Delson Pereira da Silva e Domingos Marinho Rosa
Júnior para a Tunísia. Segundo o depoente, o responsável pela venda foi o Sr. Henrique
de Moraes Rego, Presidente do Moto em 98.
Negou, todavia, que existem jogadores menores entre os que são
enviados ao exterior.
Citou o depoente vários outros nomes de jogadores enviados ao exterior.
Entre eles: Vamberto, Rubenilson, Clayton, Geraldo, Oliveira, Domingos Júnior.
Vários jogadores levados ao exterior foram indicados pelo depoente.
Disse ter ouvido falar no caso do jogadores Jackson, que tem uma
certidão de nascimento sem a data de 1977 e uma ficha na Confederação Brasileira de
Futebol com a data de 1973. Afirmou que há casos em que até mesmo o nome foi
mudado.
As falsificações são providenciadas pelos empresários que o depoente
denominou de “empresários barca-furada” ou “bolso-furado”.
O depoente confirmou que chegou a assinar um documento relativo ao
jogador Gil, com dados que não eram dele.
DEPOIMENTOS DOS SRS. ANTÔNIO DE OLIVEIRA , EDMAR BERNARDES,
ANDRÉ AUGUSTO LEONE, ELISEU OLIVEIRA E JOSÉ MÁRIO PAVAN.
seguintes:
Os pontos mais importantes destacados nestes depoimentos são os
O Sr. Antônio Oliveira reportou-se à transação de transferência dos
jogadores Jeda e Dedé para a Vicenza da Itália. Todavia, a existência de um passaporte
emitido por um país da Europa era importante, já que eles entrariam não como extra
comunitários, mas como comunitários. Daí a indagação sobre a existência de parentes
portugueses.
Esses jogadores pertenciam ao Campinas Futebol Clube, conforme
afirmação do Sr. Edmar Bernardes.
O Campinas realiza um trabalho com atletas jovens e tem uma escola de
futebol para quinhentos alunos, na faixa de cinco a dezesseis anos.
O Sr. Eliseu Oliveira se denominou um olheiro do futebol, e não
empresário. Disse que o primeiro jogador seu a ir para a Europa através do Careca e do
Edmar, foi o Jeda.
do Careca.
Disse, ainda, que foi ele quem encaminhou a documentação ao escritório
Quando ocorreu a negociação o depoente foi convidado a viajar, pelo
Vicenza, para acertar o contrato do atleta.
Foi-lhe perguntado, quando da negociação, se o jogador era ou não
comunitário. O depoente então informou que essa documentação estava sendo
providenciada. Essa negociação foi que resultou na produção do passaporte do jogador
Jeda.
Restou claro, dos depoimentos, que havia dois valores, dependendo de
ser o jogador comunitário ou não. Daí o interesse dos agenciadores em providenciar
passaporte de um país europeu.
De acordo com o depoente Edmar Bernardes quem providenciou o
passaporte português para o jogador Jeda foi o Sr. Jimmy Martins, contratado para
realizar os trabalhos de despachante. Este mesmo Jimmy Martins providenciou o
passaporte português do jogador Dedé.
Recebido o passaporte do Dedé das mãos de Jimmy Martins, o Sr. Edmar
Bernardes foi até a Itália entregá-lo ao Vicenza. O passaporte do jogador Jeda foi
entregue ao Vicenza pelo Sr. José Mário Pavan, após tê-lo recebido em Portugal das
mãos de Jimmy Martins.
Coube ao Sr. Antônio de Oliveira Filho a contratação dos serviços de
Jimmy Martins para conseguir os passaportes portugueses dos jogadores Jeda e Dedé.
O depoente Antônio de Oliveira Filho afirmou que Edgar Moura
também era parceiro nessas transações com jogadores e agora está movendo um
processo contra ele. Todavia, o depoente afirma possuir documentos que comprovam
o envolvimento de Edgar Moura nesses negócios.
O preço do passaporte, de acordo com o Sr. Antônio de Oliveira Filho
ficava em torno de quarenta mil reais, valor cobrado por Jimmy Martins. O passe do
jogador Dedé teria custado algo em torno de 350 mil dólares.
De acordo com o depoente Edmar Bernardes o passe de um jogador
comunitário está em torno de um milhão. Não sendo comunitário, o valor fica em 300
mil. Disse, ainda, o Sr. Edmar Bernardes que Edgar Moura foi um parceiro que ajudou
a bancar a viagem, pois eles não tinham o dinheiro para fazê-lo. Desse modo Edgar
teria um percentual em cima do sucesso obtido com a negociação dos jogadores.
Foi mencionado, pelo depoente Antônio de Oliveira, o nome do Sr.
Máximo Briaschi como um procurador que participou das negociações.
O Sr. André Augusto Leone, o Dedé, afirmou que não tinha certeza da
sua descendência portuguesa. O caso teria sido entregue ao Edmar, para que a busca
fosse feita.
Esse passaporte segundo o depoente encontra-se preso na questura.
O jogador Dedé confirmou que foi à questura para apresentação do seu
passaporte, quando a diretoria do Vicenza lhe informou que seu passaporte era falso. O
passaporte foi retido e o jogador está sendo processado na Itália por falsidade
ideológica.
Foi informado, pelo Sr. Antônio Oliveira, a existência do Careca Sport
Center, que tem uma escola de futebol, trabalhando com jovens de cinco, seis, até
dezesseis ou dezessete anos. Os jovens que se destacam no Careca Sport Center são
levados para o juvenil do Campinas.
Atualmente, de acordo com os depoentes, está sendo providenciada a
requisição da cidadania por parte do jogador Dedé. Os mesmos empresários que
providenciaram o passaporte português auxiliam o jogador no sentido de conseguir um
passaporte italiano, mesmo depois de descoberta a fraude em relação aos passaporte
português. O objetivo disto é recolocá-lo num time europeu.
O Sr. José Mário Pavan é Presidente do Clube União São João. Esse
clube tem, segundo o depoente, cerca de 150 garotos acima de dezesseis anos
praticando futebol em Araras. É exatamente do União São João a origem do jogador
Jeda negociado para a Itália, com a intermediação de Edmar e Antônio Oliveira, o
Careca.
De acordo com o depoente, foram os Srs. Edmar e Careca que o
colocaram em contato com Jimmy Martins.
No entender do Sr. Mário Pavan, os maiores beneficiários com a venda
do passe do jogador são os empresários e procuradores, que estão ricos.
O depoente confirmou também a existência de dois valores, um para o
jogador com passaporte comunitário e outro quando o jogador é extracomunitário.
Nas negociações com o jogador Jeda, teria ficado claro que o valor de um
milhão só seria pago, se o passaporte estivesse em ordem.
Afirmou, todavia, que jamais tirou passaporte para qualquer jogador. O
passaporte do Jeda teria ficado em suas mãos por apenas uma hora e meia ou duas, que
é o tempo de vôo de Lisboa a Milão.
Quanto ao seu contato com Jimmy Martins, disse ter ficado máximo seis
minutos, no hotel, e três, no aeroporto, em sua companhia. Ainda no seu entender, o
culpado por todo esse problema dos passaportes falsos é o Sr. Jimmy Martins, que, de
acordo com investigações do depoente, chama-se César.
Indagado sobre negociações com jogadores para o exterior, afirmou que
o União São João vendeu cerca de dez jogadores. Quanto ao Sr. Eliseu Oliveira, o
Tiroga, trata-se, segundo o depoente, de uma pessoa de confiança do União São João,
que opina sobre a qualidade técnica do jogador.
Disse ainda que só vendeu o jogador porque os Srs. Careca e Edmar lhe
garantiram que a mãe de Jeda era Portuguesa e que o jogador era português, após terem
colhido a documentação respectiva.
Relatou que, na primeira reunião como Vicenza, na qual estavam
presentes os Srs. Careca, Edmar e Máximo Briaschi, foi informado de que a quantia
pretendida pelo clube só seria paga se o jogador tivesse um passaporte comunitário.
Todavia, entra em contradição o depoente, ao dizer que tinha exigido
quinhentos mil dólares pelo jogador, mas acabou aceitando trezentos mil, mesmo
sabendo da existência do passaporte comunitário, que segundo Edmar e Careca era
“quente”.
Este fato também se contrapõe ao depoimento do Sr. Edmar, segundo o
qual o próprio Sr. José Martins Pavan é quem teria proposto valores diferenciados em
face do passaporte comunitário.
Negou o depoente José Mário Pavan que esteja sendo processado pela
justiça italiana por facilitação de imigração clandestina. Informou, ainda, o depoente
que para uma transferência internacional, não é a Federação local que a autoriza, mas a
CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE FUTEBOL.
DO DEPOIMENTO DE GEORLAM GOMES BASTOS
Relatou o depoente que foi procurado na sua cidade, Matinha, no
Maranhão, por um senhor de nome Araújo, que lhe fez uma proposta para jogar fora
do Brasil no time espanhol Lorca. Essa transferência se deu através de documentação
forjada a partir de documentos de outra pessoa.
Um amigo seu, de nome Ronaldo, o apresentou a esse senhor Araújo,
que se identificou como sendo Vice-Presidente do Americano de Bacabal. Assim, se
pronunciou o depoente sobre a proposta feita:
“Ele disse que ele tinha um documento, não é ? Em sua posse,
me mostrou o documento, mas eu não cheguei a olhar na hora. Aí ele
disse: “Só que tu vai ter que tirar tuas fotos urgentes, umas foto, e vem
aqui.” Aí eu fui, tirei as fotos, ele me deu 10 reais, eu tirei as fotos,
voltei á casa dele, aí foi que ele foi me explicar que era um documento
que, tipo um documento de uma pessoa que já não existia mais, que
tinha, não tinha tido o atestado de óbito, e que não era para mim me
preocupar com isso, que era lá do interiorzão, que ninguém ia, ninguém
ia perceber nada, que apenas que tudo ia dar certo, que para não me
preocupar com tudo. (...) Na hora, eu não cheguei a olhar. Depois, que
eu voltei com as fotos, que ele foi me explicar tudinho direitinho o que é
que eu tinha que fazer. Aí ele mandou que eu, que eu tinha que tirar os
documentos, não é? Para poder tirar o passaporte. Eu falei que eu não
sabia onde é que tirava os documentos. Ele disse que não era para eu me
preocupar, no outro dia alguém ia me procurar. Aí eu fui para casa do
meu tio, e, no outro dia, uma pessoa me ligou, era para mim encontrar ele
num local, pegar um ônibus, me explicou tudinho direitinho. Eu fui, me
encontrei com ele. Aí chegou no Shopping do Cidadão, eu já com a
documentação, com a certidão que o Araújo tinha me entregue, aí eu tirei
os documentos, tive que colocar o dedo lá.”
O depoente conta que tirou todos os documentos na ocasião. Com essa
documentação ele foi até o Araújo novamente, que providenciou toda a documentação
e a levou para a Federação Maranhense de Futebol.
Feito o registro, Araújo teria dito ao depoente:
“Ô, Gil, eu já conversei com o Clóvis que eu tenho um jogador
muito bom na minha mão e tal.”
Foi então que o depoente conheceu o Sr. Clóvis Dias, tendo-se
encontrado com ele no Aeroporto de Fortaleza. Alguns dias depois o depoente viajou
para a Espanha, com a documentação nova. Desse modo, ele passou a ter dois
passaportes: um verdadeiro e outro falso.
Chegando à Espanha, Gil fez teste num time chamado Hércules. O
técnico não o aprovou, porém uma pessoa do Lorca que observava o treinamento o
convocou para jogar nesse time.
Nada tinha acertado até então sobre pagamento ou contrato com o
jogador. No Lorca o jogador assinou contrato com salário em torno de quase quatro
mil reais.
Posteriormente, o próprio Araújo veio a denunciar a ilegalidade que havia
cometido, num momento em que se encontrava bêbado.
O passaporte utilizado pelo jogador era em nome de Jurcilan Rodrigues.
No Lorca, o jogador recebeu outro passaporte dado pelo clube. Tratava-se de um
passaporte português. Assim, Gil passou a ter três passaportes. Segundo me disseram,
esse documento só serviria para jogar, porque havia muitos estrangeiros no clube.
Nessa ocasião, o Clóvis Dias ligou para o depoente e lhe avisou que o
Araújo havia denunciado os fatos relativos ao passaporte falso. Então o depoente
voltou ao Brasil, tendo ficado parado durante todo o ano de 2000.
Na época da falsificação dos documentos, o depoente tinha vinte anos,
mas nos novos documentos, constava a idade de dezoito anos.
Quando retornou ao Brasil, o depoente descobriu que Jurcilan era uma
pessoa viva.
A diminuição da idade nos documentos valoriza o passe do jogador lá
fora, conforme explicou o depoente.
Para não ser identificado, o Sr. Araújo sugeriu ao depoente que, em vez
de Gil, utilizasse o nome de Rodrigues.
DO DEPOIMENTO
BACABAL.
DE
CLÓVIS DIAS – DIRIGENTE
DO
AMERICANO
EM
Afirmou que conheceu o jogador Gil por meio de Francisco Alves
Araújo.
Disse que não tinha como concluir pela falsidade dos documentos do
jogador, uma vez que órgãos públicos responsáveis haviam emitido tais documentos
como se fossem verdadeiros.
Relatou que quando soube das denúncias de Araújo ligou imediatamente
para o jogador que confirmou a falsidade dos documentos e, neste momento, lhe disse
para voltar imediatamente.
Disse também que tomaria todas as providências legais cabíveis para
punir o Sr. Araújo.
Como era de se esperar, o depoente não assumiu qualquer culpa pelo
episódio ocorrido com o jogador Gil.
outros países.
Não negou, entretanto, que seu clube realiza venda de jogadores para
DEPOIMENTO DE ALEX DIAS DE ALMEIDA – JOGADOR
SAINT- ETIENNE .
DE
FUTEBOL
DO
O depoente foi para fora do País com um passaporte brasileiro, regular.
Somente após disputar o campeonato francês e ser vice artilheiro pelo Saint-Etienne,
fizeram-lhe a proposta de adquirir uma nacionalidade extracomunitária, o que poderia
ajudar o clube. Assim foi-lhe proposto tirar um passaporte europeu.
O depoente então entregou os documentos ao clube, a mando do
Presidente para o R. Edinho, empresário do Aloísio, amigo e companheiro do jogador
Alex.
O depoente desconhece qualquer relacionamento de parentesco com
portugueses. Todavia, assinou o passaporte, porque o clube tinha providenciado uma
consulta junto à polícia francesa.
ele utilizado.
Esse passaporte, segundo o jogador, ficou com o clube e nunca foi por
Posteriormente, houve uma denúncia quanto à falsidade do passaporte, o
que acabou sendo confirmado pela polícia. O depoente desconfia de que a denúncia
partiu de seu ex-treinador, que foi treinar o Toulouse. A denúncia foi feita um dia antes
do jogo contra o Toulouse, do qual o jogador Alex não pôde participar.
DO DEPOIMENTO DE JUAN FIGER SVIRSK – EMPRESÁRIO E AGENTE FIFA.
Com relação ao caso do jogador Edu, relatou o seguinte:
“Edu estava sendo vendido ao Arsenal da Inglaterra e tinha
direito ao passaporte comunitário. Seu avô é natural de Portugal, e que,
pelas leis daquele país, dava-lhe o direito à nacionalidade portuguesa.
Um empresário espanhol de minha relação, o Sr. Hermínio Menendez,
atleta reconhecido na Espanha, único espanhol a ganhar três medalhas
olímpicas, ligou-me e afirmou poder tirar o passaporte de Edu em um
tempo não muito longo, porque o seu sócio em um centro de treinamento
em Marbella afirmava conhecer pessoas que trabalhavam em Portugal.
Os documentos foram encaminhados ao Sr. Hermínio, que, segundo ele
próprio afirmou aos dois nobres Deputados que foram a Portugal, os
entregou a um sócio que contratou o serviço de um despachante em
Lisboa, com o intuito de agilizar a documentação. É como se se pagasse o
serviço de uma agência de turismo para conseguir um visto com rapidez.
Ocorre que, comprovou-se depois, que o tal despachante era uma pessoa
desonesta e entregou um passaporte falso. Vejam bem, Srs. Deputados,
eu próprio não acompanhei a contratação, não me envolvi com a retirada
do passaporte e não poderia sequer sonhar ser este cidadão, que não
conheci e que não conheço, um membro de uma quadrilha de falsificadores
de passaportes. Quadrilha, sim, pois, ao que tudo indica, segundo os
dignos Deputados desta Comissão levantaram em Portugal, a falsificação
de passaportes de jogadores na Europa é apenas a ponta de um
iceberg, pelo que se viu do excelente trabalho desta CPI na Europa.
Há uma evidência de falsificação muito mais ampla, que mostram os
desdobramentos da missão cumprida pelos nobres Deputados Pedro Celso
e Jurandil Juarez, que alertaram a comunidade européia para estes fatos.
Tão logo soube dos fatos, comuniquei-me com o Sr. Hermínio, que, de
pronto, se manifestou, isentando-me de qualquer responsabilidade. Fiz
mais: pedi a meu advogado que fosse a Portugal a fim de contribuir para
o êxito das investigações, fornecendo o nome de Hermínio e solicitando a
este que estivesse à disposição dos Srs. Deputados brasileiros e da Polícia
portuguesa. Mais ainda, Srs. Deputados, procurei, junto ao jogador, um
dos escritórios mais conceituados de Portugal, a fim de solucionar este
problema, que estava se tornando enorme, a ponto de prejudicar
seriamente a carreira de um jovem jogador. Felizmente, hoje, Edu já está
com seu passaporte português, ao qual já tinha direito, estando em plena
atividade no Arsenal. Mas o que é grave, Srs. Deputados, é que eu fui
vítima, tanto como o jogador, neste episódio grave e sério.”
Afirmou o depoente que atua como agente de jogadores, representando
os mesmos no Brasil e em qualquer país em onde um jogador poderia ser contratado.
Na Europa, na América do Sul, em qualquer continente tem licença outorgada pela
FIFA para atuar.
Disse representar a parte dos jogadores brasileiros, um jogador
colombiano, que está prestando serviços ao Clube San Lorenzo de Almagro, de nome
Pedro Portocarrero, que joga em San Lorenzo de Almagro.
Afirmou não ser proprietário de nenhum clube de futebol, nem mesmo
dirigente.
Disse à Comissão que nenhum jogador por ele agenciado tem problema
de adulteração de partidas de nascimento, de idade, de certidões de nascimento.
Indagado sobre a transformação do mercado de jogadores numa bolsa de
mercadorias, respondeu que não existe bolsa de jogadores.
O que existe é a
necessidade dos clubes de tentar vender jogadores.
Afirmou que o jogador Zé Roberto foi transferido para o Central
Español, de Uruguai e que ele intermediou a operação entre Real Madrid, Central
Español e Associação Portuguesa de Desportos.
Indagado sobre notícias da imprensa de que teria conseguido os
passaportes portugueses falsos para os atletas Warley, Jorginho Paulista e Alberto,
respondeu que, desses três jogadores, é agente do atleta Warley. Dos outros atletas não
é agente. Nem de Jorginho Paulista, nem de Alberto. No caso específico de Warley,
este foi transferido também para o Udinese e se integrou a jogar como jogador
brasileiro. Disse ter uma informação de que a senhora de Warley teria a possibilidade de
obter algum passaporte italiano, até que foi informado pelo Sr. Warley de que ele havia
obtido um passaporte português.
Afirmou que nunca transacionou um jogador com cláusula onde os
preços variavam segundo a nacionalidade do jogador e que não é de seu conhecimento
contratos que se realizam dessa maneira.
Explicou o seguinte sobre a supervalorização dos passes de alguns
jogadores:
“Existem realmente certas diferenças entre o que é preço bruto e
preço líquido. Quando um jogador é vendido por determinada quantia, e
essa é uma quantia total, podem incluir diversos custos, como participação
do próprio jogador, comissões e valor de passes. Também pode influir a
parte de financiamentos, os times europeus, faz muito tempo, não estão
comprando jogadores para pagamento a vista, compram jogadores com
prazos que variam de acordo com o contrato do próprio jogador com o
clube comprador. Como os clubes que vendem necessitam dos recursos
financeiros, terminam obtendo dinheiro mediante despesas que pagam por
financiamentos, e o preço que entra ao final que o clube recebe deve ser um
preço inferior ao expressado no contrato, por quê? Porque estão
estabelecidos todos esses custos, financiamentos, comissões, participação do
próprio jogador na venda do passe. Completando sua pergunta referente à
subvalorização de jogador, não conheço nenhum caso, não é do meu
conhecimento.”
Sobre a prisão do jogador no aeroporto, na Inglaterra, porque portava
um passaporte português falso, o depoente respondeu o seguinte:
“Não foi preso; não se lhe permitiu a entrada na Inglaterra e o
jogador teve que voltar para o Brasil. Posteriormente a todas essas coisas
que ocorreram, ao que sucedeu com o Edu, eu tomei a intervenção para
estabelecer, porque isso, para mim, foi uma grande surpresa, devido a que
Edu, para obter seu passaporte, apresentou um sua primeira
oportunidade toda sua documentação e acreditando que o avô dele,
português e vivo, o pai, porém, tem todos os direitos de português e o filho
também. Se entregou ao jogador Edu um passaporte falso. Aí quando
Edu retornou ao Brasil, eu fiquei muito preocupado, comecei a fazer
todas as averiguações necessárias e contratamos os serviços de um
escritório de advocacia de Portugal e Inglaterra. Se ele entregou
exatamente a mesma documentação, se seguiu toda a tramitação com o
apoio do cônsul de Portugal em São Paulo, e o jogador Edu optou por
seu passaporte português e com esse passaporte português foi jogar e
prestar seus serviços profissionais ao Arsenal. Não poderia entrar na
Inglaterra um jogador sem ser comunitário ou poderia entrar como
estrangeiro, por uma regulamentação específica da Inglaterra, que não
haja participado de no mínimo de 75% dos jogos de suas respectivas
seleções. Edu não poderia ir como estrangeiro, porque não tinha esses
75% de jogos e foi jogar ao Arsenal com seu novo passaporte português
que eu pedi aqui a fotocópia dos documentos e entregar à Presidência. (...)
Nós estamos encaminhando toda a documentação de Warley, do Sr.
Warley e da Senhora Warley, que está totalmente feita para poder obter
a cidadania italiana, a mulher do Warley, não o Warley. Posteriormente
quando sua senhora conseguir sua efetiva cidadania, o jogador pode optar
pela cidadania da esposa.”
Sobre o valor do passaporte falso de Edu, disse ter a informação de que
custou o equivalente a 500 dólares.
Confirmou que conhece o Sr. Hermínio Menendez, que é colaborador
seu e de outros agentes e que se trata de uma espécie de consultor que utiliza, quando
necessita de alguma informação referente à Espanha.
Negou que tenha feito qualquer tipo de negociação com o Clube Betis,
referentemente ao jogador Denilson.
DEPOIMENTO DE AFONSO MARTINS COSTA FILHO (JIMMY MARTINS )
o seguinte:
Acerca da venda de brasileiros menores para o exterior, o depoente disse
“Bem, sobre os jogadores menores, em absoluto, em nenhum
momento na minha vida, sozinho ou em companhia de outros
empresários, eu levei garotos para o exterior. Essa é a número um. Sobre
os passaportes falsos: por meios que pensava na época serem normais e
legais, eu realmente ajudei alguns empresários brasileiros na obtenção de
três ou quatro passaportes de jogadores, entre eles Jeda, que estava em
processo de venda para o exterior. Não havia na época, pelo menos na
nossa visão, na visão empresarial, nenhuma ilegalidade nessa obtenção.
Eu tratava com os despachantes que eu vou passar pra vocês, o Sr.
Domingos Djalo e Jota Caldeira, que vinham ao nosso encontro, meu e
de outros vários empresários de futebol no Hotel Altesi, de Lisboa, de
propriedade de um ex-Presidente do Benfica, se não me engano é Dom
Fernando o proprietário do hotel. A gente tinha que preencher
requerimentos, como eu vou passar pra V.Sas., os senhores, os anexos
com custas de documentos que provam que esses documentos saíam de
dentro da polícia portuguesa. Isso é interessante para vocês. Eu sou
culpado de ter sido enganado num procedimento que parecia legal. Os
passaportes eram falsos? Pelo que se sabe hoje os passaportes..., na
época... Desculpe, pelo que se sabe hoje, os passaportes não eram falsos.
Eram feitos por gente interna da polícia de Portugal etc., etc. Houve
jogadores que entraram, inclusive com esses documentos, e saíram de
vários países com esses passaportes sem nunca terem sido barrados. E
outra coisa: quando o jogador, ele recebia esse passaporte, inclusive na
Itália, no caso o jogador Jeda, na Itália existe o que se chama de
permesso de soggiorno. Isto é, o jogador tem que pegar o passaporte, levar
para a questura, que é a Polícia Federal deles, e fica lá um dia, não sei
quanto tempo que ficam, e eles devolvem ao clube. E isso não aconteceu
em nenhum caso. Quer dizer, quando as coisas aconteceram, depois que
houve aquele segundo check-in, que realmente descobriram todas essas
ilegalidades. Essa investigação, por incrível que pareça, começou em abril
do ano passado, sobre o jogador Veron, Juan Sebastião Veron, da
Lazio. Que eu tenho aqui os recortes dos jornais, foi de abril de 2000.
Eu acho o seguinte: se a Magistratura italiana tivesse agido com a
firmeza que vocês estão agindo agora, o Senado italiano, nada disso teria
acontecido depois. Porque teria tempo. A gente teria descoberto em tempo.
Essas pessoas estão no futebol e teríamos..., seria um alerta pra gente, a
gente não teria se metido nessa confusão toda. Então, vocês estão de
parabéns, porque às vezes, muitas vezes, eu falo isso do coração, falam
que nossa Justiça é lenta, que o nosso é isso, é aquilo. Mas, pelo que...,
meus trinta anos que eu morei no exterior, eu sinto do coração que vocês
estão adiantados em relação a eles. E vocês estão de parabéns por ter feito
isso. Porque se tivesse acontecido isso... Por exemplo, o caso do jogador
Veron em abril. Óbvio, se saiu em abril no jornal, é de dois a três meses
antes, a Magistratura italiana sabia, e ninguém foi comunicado. Então,
o que acontece? Inclusive o jogador Veron, já sabe que faz 14 meses que
está com esse processo na Justiça italiana. Ontem foi reenviado por mais
dois meses, porque não havia um “translador” em italiano para espanhol
dentro da Magistratura italiana. Eu acho que é estranho, e eu gostaria
de dizer isso, porque eu acho que vocês, V.Sas., desculpe, estão fazendo
um trabalho e estão de parabéns pelo que estão fazendo. Inclusive há
centenas de jogadores envolvidos, não só de países sul-americanos, como do
leste europeu. Eu tenho aqui todas as reportagens que falam todo esse
histórico que eu falei pra vocês, agora. Eu acho que talvez isso aconteça,
porque eu acho que há gente dentro do Governo envolvida nessa história,
principalmente de Portugal. Inclusive, eu sinto isso também nos próprios
contatos que eu tive lá.”
Disse conhecer o Presidente do time União São João de Araras e que
teve a oportunidade de conhecê-lo uma vez em Lisboa, em Portugal, uma vez, quando
houve o episódio do Antônio Oliveira da documentação que foi feita em Portugal.
Disse conhecer o Sr. Edmar.
Edmar.
Confirmou que teve contato com o Careca e algumas conversas com o
Confirmou que o Careca o procurou, a fim de resolver problemas de
documentos de jogadores, conseguindo passaportes portugueses para eles, e que
recebeu a quantia de 40 mil reais pelos serviços prestados.
Disse que o levantamento dos dados dos brasileiros foram feitos por
outros despachantes em Portugal.
Mencionou o nome do Sr. Caldeira, como um despachante relacionado à
polícia de Portugal, atuando na área de imigração portuguesa.
DEPOIMENTO DE ALOÍSIO JOSÉ DA SILVA
Afirmou que foi para o Saint-Etienne com passaporte brasileiro.
Posteriormente o clube lhe ofereceu um passaporte europeu. Esse
passaporte foi providenciado pelo clube que lhe trouxe o documento pronto para ser
assinado.
Esse passaporte foi apreendido posteriormente pela polícia francesa.
O procedimento é sempre o mesmo. O clube iria averiguar qualquer
parentesco do jogador com portugueses. O jogador sequer precisou ir a Portugal. Tudo
foi providenciado pelo clube.
Disse o depoente que alguém denunciou a existência do passaporte falso,
mas não soube dizer quem foi.
DEPOIMENTO DE EDINO NAZARETH FILHO
Relatou sua experiência como jogador e técnico de futebol. Em seguida
passou a comentar sua atuação como agente de jogadores. Ao deixar o Grêmio, viajou
para a Itália, com a finalidade de observar jogos e treinos, e estreitar contatos com
técnicos, jogadores e dirigentes de clubes na Europa, em especial o Milan. Contou o
depoente que nessa época, já tinha proposta do Milan para que, no Brasil, funcionasse
como observador para indicar jogadores ao clube, mas a proposta foi efetivamente
concretizada somente quando deixou a Itália.
Depois, de ter montado escritório no Rio de Janeiro, uma de suas
primeiras atuações como agente, foi tentar intermediar a venda do jogador Aloísio para
a Europa. Contudo ao chegar a Goiás, descobrir que o jogador já estava contratado,
pelo Saint-Etienne, embarcando para a França sem dar muitas explicações. Disse o
depoente que nada ganhou que não teve qualquer participação nessa transação. Após o
retorno de Aloísio ao Brasil, o depoente continuou como seu representante, inclusive
para a renegociação do contrato com o Saint-Etienne. Essa transação foi relatada pelo
depoente nos seguintes termos:
“Assim, em 5 de abril de 2000, viajei para Paris e SaintEtienne, com a finalidade de renegociar o contrato de Aloísio para a
temporada 2000 e 2001, que já estava defasado. No dia 8 de abril de
2000, assistimos jogo do Saint-Etienne contra o Paris Saint-Germain.
Três dias depois, no dia 11 de abril de 2000, reuni com o Presidente do
Clube Saint-Etienne para tratar do salário de Aloísio, a quem
representava, e Alex, a quem jamais representei, atendendo pedido do
próprio jogador. Contudo, não houve negociação. Lembro-me, no decorrer
dessa reunião, o presidente do clube mencionou que seriam providenciados
passaportes espanhóis para os jogadores, para que integrassem a lista de
profissionais da Comunidade Européia, o que pra mim não foi notícia
nova, pois Aloísio e Alex já haviam mencionado a intenção do clube em
providenciar os referidos passaportes. Contudo, achei aquilo muito
estranho e disse-lhe que não entendia como ele poderia fazê-lo, já que
nenhum dos dois tinha, nem mesmo remotamente, ascendência espanhola.
Diante da minha colocação, a diretoria me indagou quanto à
possibilidade de que os jogadores obtivessem nacionalidade portuguesa.
Disse a eles que, de modo geral, todo brasileiro descende de portugueses,
mas que não conhecia essa ascendência por parte dos jogadores. Prossegui
nos meus contatos com o Saint-Etienne para renegociação dos contratos
dos jogadores, retornando ao clube em 17 de abril de 2000, para nova
rodada de negociações, mas nada consegui em termos de melhora dos
contratos. Participei ainda de outra reunião em 18 de abril, que, da
mesma forma, não resultou em acordo. Pouco depois, quando retomei ao
Brasil, 0 clube me pediu que providenciasse documentos de Alex e
Aloizio, para que procedesse à tal pesquisa genealógica. Obtive tal
documentação dos parentes dos jogadores e repassei aos cuidados do clube.
Nunca mais vi esses documentos. Logo após remeter os documentos, Alex
me telefonou e pediu para que não adotasse qualquer iniciativa em seu
favor, revogando o mandato que, anteriormente, havia me outorgado
verbalmente para ser seu agente junto ao Saint-Etienne, quando lá estive
para negociar o salário do Aloísio. Naquela ocasião, remeti ao clube
apenas a certidão de nascimento de Alex e certidão de óbito do seu pai,
uma vez que, após a revogação do mandato informal, não mantive mais
contato com o jogador, e o clube me cobrou a imediata remessa dos
documentos que estavam disponíveis, razão pela qual remeti apenas o que
havia recebido de seus parentes. Quase um mês depois, soube que Aloísio
recebeu um telefonema do jogador Anderson, do Olimpique de Lyon, que
Ihe falou o interesse do clube em contratá-lo. No dia seguinte, o
Anderson me telefonou também reportando interesse do Olimpique de
Lyon em contratar Aloísio. Em meados do mês de maio do ano passado,
Aloísio retornou ao Brasil em férias. Nesse período, recebi telefonema do
Olimpique de Lyon, do Sr. Marino, no qual manifestou interesse em
iniciar tratativas para contratação de Aloísio, indagando-me da
possibilidade de ir até a França para debater sobre a contratação do
jogador. Dias depois, recebi novo fax do Sr. Marino, do Olimpique,
insistindo para que fosse à França, para debater sobre a contratação do
jogador. No dia seguinte a esse telefonema, recebi um fax do clube com o
convite. Assim, em 21 de maio de 2000, embarquei para Lyon, para
conversar com diretores do clube. Lá chegando, fui direto para a reunião.
Depois de exaustivas tratativas com o Olimpique de Lyon, consegui um
acordo na negociação da proposta para a futura contratação do Aloísio.
Em 24 de maio de 2000, fui a Paris conversar com o diretor do clube,
Soler, diretor do Saint-Etienne, onde jogava Aloísio, sobre a proposta
feita pelo Olimpique para contratação do jogador. Todavia, Soler sequer
quis falar no assunto . Entretanto , solicitou uma proposta de
renegociação do contrato de Aloísio, que deveria ser transmitida por fax
do Brasil. O encontro foi no Hotel Meridien Mayor, em Paris. Logo
após, fui assistir à final da Copa dos Campeões, retomando ao Brasil em
seguida. Já no Brasil, transmiti ao SaintEtienne, por fax, a proposta de
renegociação do contrato de Aloísio para a temporada 2000/2001.
Falando com Soler ao telefone, não consegui chegar a um acordo
satisfatório, ocasião em que me convidou para nova reunião no clube,
para tratar do assunto pessoalmente, com o presidente do clube. No inicio
de julho, viajei para Saint-Etienne, para estar com o presidente do clube.
Participei de reunião com o presidente Bompart, na qual Soler esteve
ausente por problemas de saúde. A renegociação do contrato de Aloísio
foi feita com o próprio presidente do clube. Em seguida, fomos almoçar,
ocasião em que falamos a respeito de vários jogadores, em especial Lúcio,
do Internacional, pelo que me outorgou procuração para providenciar a
contratação do referido jogador. Logo após retomar ao Brasil, recebi
telefonema de Aloísio, informando que o mesmo já havia sido chamado
ao clube, para assinar seu passaporte português, o que não foi para mi
surpresa, pois sabia das diligências do clube e imaginei que a pesquisa
havia-se mostrado frutífera.”
Outro jogador encaminhado ao Saint-Etienne por Edino foi Thiago
Gama. A negociação foi feita no estádio de Toulouse. Entretanto, o jogador já não quis
mais ficar no clube e retornou ao Brasil. Nessa ocasião, depoente indicou Luís
Alberto, jogador do Flamengo, que segundo ele afirma foi a única venda de jogador
que, efetivamente, ele intermediou na qualidade de agente FIFA. Com relação aos fatos
noticiados pela imprensa, envolvendo jogadores com passaporte falso, desse que
tomou conhecimento do assunto quando divulgados pelos jornais. Nessa ocasião, ele
teria procurado o Saint-Etienne, preocupado com o jogador Aloísio, já que o clube
havia-lhe providenciado seu passaporte.
Posteriormente, o Toulouse ofereceu representação contra o SaintEtienne alegando a escalação de um goleiro ucraniano e do jogador Alex, ambos
portadores de passaportes falsos. O primeiro, teria um passaporte grego, e o segundo, o
jogador Alex, um passaporte português. Em face disso, o Saint-Etienne apresentou um
pedido ao juiz da cidade concernente a esses jogadores, incluindo também o jogador
Aloísio, como portadores de passaportes falsos. Nesse documento, o clube
mencionava o nome do depoente como responsável pelos documentos para a obtenção
desses passaportes falsos.
de defesa.
O depoente atribuiu essa acusação pelo Clube contra ele como estratégia
O depoente afirmou que é procurador de muitos jogadores, entre eles o
próprio Aloísio. Negou qualquer envolvimento com o Sant-Etienne na questão dos
passaportes falsos.
Confessou, ainda, o depoente que o jogador Luís Alberto foi vendido
por 2 milhões de dólares e revendido para um clube da Espanha por 4,5 milhões de
dólares.
O clube teve ganho de 2,5 milhões de dólares em apenas três meses, e,
nesta transação, o depoente teve a participação de dez por cento, como agente.
Comissão.
Estas são, em síntese, as principais declarações do Sr. Edino a esta
DEPOIMENTO DO JOGADOR LEONARDO SANTIAGO , DO CLUBE FEYENOORD,
EM 17/3/2001, NO CONSULADO BRASILEIRO DA CIDADE DE ROTERDÃ
Inicialmente o jogador mostrou-se receoso por não entender o que
significava uma CPI. Pediu para falar a sós com os Deputados sem a presença dos
funcionários do Consulado.
Depois de receber as explicações de que a presença dos funcionários do
Consulado poderia representar maior apoio para si, o jogador concordou em falar na
presença de todos. Estiveram presentes, também, o advogado do jogador e o advogado
do clube.
Em suas declarações, Leonardo disse que chegou a Holanda em fevereiro
de 1995, quando tina apenas 11 anos de idade (completaria 12 em 09 de março).Veio
do Rio de Janeiro, onde morava com sua família. Jogava na escolinha do Aterro do
Flamengo. Seu futebol ficou conhecido na Holanda através de um filme, no qual ele e
outros garotos mostravam suas habilidades.
Veio com mais dois jogadores, dos quais não citou os nomes, que não
aprovaram. Após os testes que realizou no Feyenoord, voltou ao Brasil, tendo
retornado a Holanda, em novembro do mesmo ano (1995). Dessa época até o ano de
1998, morou em diversos casas, com as despesas pagas pelo Clube. Nesse período
sempre estudou por ser obrigatório no país. Em 1999, machucou-se e recebeu toda a
assistência do Clube, até ficar recuperado.
Em 1998, quando tinha apenas 15 anos, assinou um contrato de gaveta
como se fosse adulto. Sua mãe assinou junto com ele. O acertado era para o contrato
ter a duração de dois anos, a partir de 2001, quando completaria 18 anos. Mais tarde ele
descobriu que o Clube tinha colocado o prazo de 06 (seis) anos.
Para assinar esse novo contrato disse ter sido pressionado pelo seu
empresário, que se chama HANS CORET, é holandês e trabalha para o Clube
Feyenoord. Falou que existe uma outra pessoa, de nome Indalécio, que também se diz
seu empresário, mas que, na verdade não é.
O advogado do clube, falando sobre o contrato, disse que é um contrato
muito favorável para o jogador, que não é normal na Holanda, um atleta com a idade
de Leonardo, ganhar tanto em termos financeiros. Respondendo, Leonardo disse não
concorda, pois recebe mensalmente o equivalente a US$ 7.500 (não revelou o valor em
(Florins, moeda holandesa), e que havia no Clube, jogadores que se quer ficavam no
banco de reservas e recebiam até 20 (vinte) vezes mais que ele.
Sobre o passaporte falso, declarou que foi o seu empresário que
providenciou tudo e o entregou diretamente ao Clube. Ele nunca chegou a tê-lo em seu
poder permanentemente.
Quando lhe solicitaram a documentação, informou que não tinha
ascendência portuguesa. Não chegou nem ir a Portugal, nem pagou nada pelo
passaporte, tudo foi providenciado pelo empresário.
A finalidade do passaporte comunitário seria a de facilitar a sua
transferência para um clube de outro país europeu, que não soube precisar qual. Por já
estar no futebol holandês há mais de 05 (cinco) anos, não precisaria de passaporte
comunitário, caso o seu fosse vendido para outro clube da Holanda.
A descoberta da irregularidade do passaporte, ocorreu em 07 de
dezembro de 2000, em decorrência da investigação de Inspetores do Ministério do
Trabalho da Holanda. Leonardo atribuiu à denúncia de alguém, já que o assunto
passaporte falso estava repercutindo muito na Europa e no Clube todos sabiam que ele
era brasileiro e não tinha ascendência portuguesa.
Segundo Leonardo, as investigações começaram com o caso do jogador
brasileiro Vamberto, que era “gato”, tinha idade adulterada.
Leonardo disse que respondeu processo regularmente e foi condenado a
pagar multa e prestar serviço social. Foi ele mesmo que contratou o advogado para
defendê-lo, mas, os honorários foram pagos pelo clube. Finalizando disse estar se
sentindo prejudicado na situação em que se encontra. Nada teve a ver com a
falsificação do passaporte, cuja responsabilidade foi do empresário e do clube, de quem
o empresário é funcionário, mas o punido foi ele. Leonardo declarou estar disposto até
parar de jogar futebol, caso o clube insista em manter as condições do Contrato atual,
que tanto ele quanto a diretoria sabem ter sido adulterada. Disse ainda que gostaria de
retornar ao futebol brasileiro, caso algum clube se interessasse pelo seu trabalho e
pagasse quanto ele vale.
CONCLUSÃO DAS INVESTIGAÇÕES
É relevante considerar o resultado da missão em Portugal e na Itália, que
se revestiu de êxito total. A agenda, ainda que muito extensa para o tempo disponível,
foi cumprida na íntegra. Foram efetuados contatos com todas as principais autoridades
de Lisboa, Milão e Vicenza, que estão tratando da questão dos passaportes falsos dos
jogadores brasileiros, além de representantes da imprensa italiana e portuguesa e do
setor do futebol italiano. Conclusivamente, pode-se afirmar que o epicentro da emissão
desses documentos é Portugal, mas, das investigações policiais e judiciais, tanto de
Portugal quanto da Itália, pode-se inferir que esta é uma praga que se alastra por toda
Europa, em razão das vantagens que tem um jogador de futebol com passaporte
comunitário, em relação ao portador de passaporte extracomunitário, com repercussão
direta no Brasil. É uma extensa rede que envolve empresários, clubes e jogadores.
Levantada a ponta do tapete dos passaportes falsos, aparece também uma
realidade maior e muito preocupante, relativa ao imigração ilegal de brasileiros. A rigor,
pode-se afirmar que os jogadores são uma vertente de um problema muito mais
complexo que envolve trabalhadores de todas as matizes, travestis, prostituição, tráfico
de menores, entre outros. O pano de fundo são as oportunidades de trabalho que
existiriam tanto na Europa quanto nos Estados Unidos. Assim, os brasileiros estão
sendo iludidos por verdadeiras quadrilhas e aliciadores, com articulações no Brasil e na
Europa, que vendem a ilusão de bons empregos e bons salários. Na Europa, essas
pessoas ficam entregues à sua própria sorte, vivendo em condições subumanas. Em
Portugal, existem verdadeiros guetos de brasileiros vivendo em situações deploráveis,
dormindo em contamines de lixo. A imprensa portuguesa denuncia fartamente a
ocorrência de trabalho escravo nos Açores.
De todas as investigações realizadas dentro e fora do Brasil, resultantes
de audiências públicas, entrevistas ou compulsão de documentos, não ficou dúvidas do
envolvimento de clubes e seus dirigentes, empresários ou agenciadores e dos próprios
jogadores na produção de passaportes falsos. Com esses documentos todos lucrariam.
Os clubes, porque poderiam fugir da reserva de mercado imposta para jogadores extracomunitários, no futebol europeu. Os intermediários (empresários, procuradores e
agenciadores) pela valorização das transações. Em alguns casos o valor do passe do
jogador mais que triplicava se ele tivesse um passaporte comunitário. E o jogador, pelas
vantagens financeiros decorrentes e pela facilidade que teria para se transferir a um
outro clube.
As investigações realizadas no Estado do Maranhão não deixam dúvidas
quanto ao envolvimento de dirigentes da Federação Maranhense de Futebol e de dois
clubes maranhenses, o Americano de Bacabal e o Moto Clube de São Luís, na
adulteração da documentação pessoal de atletas para facilitar a falsificação de
passaportes. E isso não é de agora. O atleta Raimundinho ( José Raimundo Rodrigues
Lopes ), hoje aposentado, um dos melhores jogadores da história do futebol
maranhense, inclusive com passagem pelo futebol do exterior, apesar de sua grande
notoriedade no Estado, pôde fazer um novo registro na Federação, com o nome e
idade adulterados. Com a nova documentação, adquiriu um passaporte português falso
e foi jogar na Bélgica.
Mais recentemente, em 1999, aconteceu um caso escabroso, com um
atleta assumido a identidade de uma outra pessoa. Foi o caso do jogador Gil (Georlan
Gomes de Bastos) que passou a usar a documentação de Jucirlan Araújo, dois anos
mais novo que ele. Com a nova identidade, adquiriu um passaporte português falso e
foi atuar no futebol espanhol, no clube Lorca. A documentação falsificada foi
conseguida com o concurso dos dirigentes do Clube Americano, de Bacabal, e o
passaporte fornecido pelo próprio clube espanhol. Este caso está sendo investigado
pela Polícia Civil do Maranhão.
Outro caso é do jogador Canhoto, também conhecido como
Esquerdinha. Seu nome verdadeiro é Rozenilton Torres Araújo. Com um novo registro
de nascimento, reduziu em 7 anos sua idade e estaria jogando na Bélgica.
O jogador Kleber , quando atuava no Moto Clube, também teve sua
identidade adulterada quando esteve para ser transferido para o futebol francês .
Descoberto, respondeu inquérito instaurado pela Polícia Federal. Hoje joga no Clube
Atlético Paranaense.
Os casos dos jogadores Varley, Jorginho, Dida, Cafu, Alberto, Roque
Júnior, Jeda e Dedé , que foram negociados com o futebol italiano, mostra também o
envolvimento de agenciadores e dirigentes de clubes na falsificação de passaportes.
O jogador Varley ganhou notoriedade porque foi quem desencadeou a
descoberta de passaportes falsos de jogadores brasileiros e de outras nacionalidades, na
Itália. Quando o seu clube, a UDINESE foi jogar na Polônia constatou-se a falsidade
do documento, que o atleta alega ter sido fornecido pela Diretoria do Clube.
Varley foi negociado para a UDINESE, através de seu empresário Juan
Figer. Tanto o clube quanto o empresário sabiam que ele não tinha ascendência
portuguesa.
Os jogadores Jeda e Dedé, foram negociados com o Clube Vicenza com
a intermediação dos ex-jogadores e empresários Careca e Edmar Bernardes, tendo
também participado das negociações o presidente do Clube S. João de Araras JOSÉ
MÁRIO PAVAN. Todos sabiam que os atletas não tinha ascendência européia. Os
passaportes falsos foram conseguidos através do empresário JIMMY MARTINS, que
se dizia agente FIFA.
O caso do jogador EDU, negociado pelo Corinthians Paulista com o
Clube Arsenal, da Inglaterra, guarda semelhança com os outros casos no que se refere
ao envolvimento de dirigentes e empresários na falsificação de passaportes. Tem, no
entanto, uma diferença básica: o atleta possui ascendência portuguesa, poderia,
portanto, pleitear legalmente um passaporte português.
Aí parece que funcionou o costume do cachimbo. Talvez levado pelo
hábito das facilidades, seu empresário JUAN FIGER, o mesmo de Varley, contratou os
serviços de intermediários para conseguir o passaporte em Portugal. Uma história
pouco verossímil, que passa por dois empresários, um espanhol e outro iugoslavo, e
despachantes portugueses, resultou num passaporte falso que levou à detenção do
jogador no aeroporto de Londres. Hoje a situação de EDU está regularizada,
ostentando a dupla nacionalidade brasileira e portuguesa, mas o exemplo é ilustrativo
do método utilizado para produzir documentação falsa.
Para o futebol espanhol, além de Gil, que veio do futebol maranhense
com toda sua identidade falsificada, foi negociado também o goleiro Francisco José de
Oliveira. Oriundo do Clube União São João de Araras, de São Paulo, que foi negociado
com o clube Mallorca com passaporte falso. Descoberto retornou ao Brasil e fez chegar
à CPI o original do documento falsificado.
Mais recentemente, surgiram os casos dos jogadores Alex e Aloísio, que
foram negociados do Clube Goiás, do Estado do mesmo nome, para o Clube Saint Etienne, da França. Em suas declarações, os dois afirmaram saber que não tinham
ascendência portuguesa e que foram induzidos a assinar os passaportes falsos pela
própria diretoria do Saint Etienne, na pessoa de seu presidente, Gérard Soler. Segundo
eles os passaportes teriam sidos providenciados pelo empresário de ambos, o exjogador Edinho, que jogou no Clube Fluminense e na Seleção Brasileira.
Na Holanda, o caso mais importante é do jogador Leonardo, que atua no
Feyenoord. Esse atleta foi levado para aquele País em 1995 com apenas 11 anos de
idade, ao que tudo indica sem o preenchimento das formalidades legais exigidas para
menores de sua idade. Induzido por seu empresário e certamente com o conhecimento
e o consentimento da Diretoria da Clube, adquiriu um passaporte português falso.
Descoberto, foi punido com multa e obrigado a prestar serviço à comunidade. O
passaporte português não era exigência para atuar no futebol holandês, mas serviria
para facilitar a transferência do jogador para outro clube fora da Holanda. O fato do
empresário de Leonardo ser funcionário do Feyenoord sugere que o clube patrocinou a
emissão do passaporte. Como seria usado para valorizar o passe do jogador, o clube
seria o principal beneficiário da falcatrua.
Dentre os empresários que fazem parte do esquema dos passaportes,
podem ser citados os seguintes:
- Antônio de Oliveira, o Careca, e Edmar Bernardes, sócios do Careca
Sport Center, que negociaram os jogadores Jeda e Dedé com o Vicenza da Itália, como
atletas portadores de passaportes Portugueses.
- Afonso Martins Costa Filho (Jimmy Martins), o despachante que
recebeu os documentos de Jeda para providenciar a cidadania portuguesa ao jogador.
Também foi acusado de ter conseguido passaporte falsos para Dedé, do Vicenza da
Itália. Pela confecção de cada passaporte Jimmy Martins teria recebido vinte e quatro
mil dólares.
- Roberto Gambaster, acusado de ter conseguido passaporte falso para o
jogador Kléber- ex-atleta do Moto Clube, para jogar na França, com o nome alterado
para Klebernilson.
- Juan Figer, uruguaio que atua como agente de futebol no Brasil.
Intermediou a venda de Warley para o Udinese da Itália e encomendou o passaporte de
Edu a um despachante de Portugal.
- José Mário Pavan, Presidente do União São João, que responde a
processo em Vicenza por falsidade ideológica e favorecimento de imigração
clandestina. Foi o responsável pela entrega do passaporte de Jeda ao Vicenza, após têlo recebido das mãos de Jimmy Martins.
- Antônio Cassas de Lima, ex-Presidente do Conselho Deliberativo do
Moto Clube, responsável pela transferência de vários jogadores para o exterior, chegou
a assinar documento falso referente ao jogador Gil, com dados de outra pessoa. Foi
apontado como a pessoa que recebeu o dinheiro relativo à venda dos jogadores Kléber
e Delson para o Monastir da Tunísia.
- Clóvis Dias, dirigente do Americano em Bacabal, intermediou a
transferência do jogador Gil para a Espanha, com passaporte falso.
- Edino Nazareth Filho, (Edinho) intermediário da venda de jogadores
para o exterior, entre eles Aloísio e Luís Alberto. Os jogadores Aloísio e Alex, do
SAINT ETIENNE confirmaram na CPI que Edinho participou do esquema de
falsificação dos passaportes de ambos.
Além desses empresários, dirigentes de clubes, como o Vicenza, Milan,
Udinese, Saint Etienne e o Feyenoord, e dirigentes de Federações locais de Futebol
participaram desses esquemas.
DAS
PROVIDÊNCIAS
TOMADAS
POR
POLICIAIS, JUDICIAIS E ENTIDADES ESPORTIVAS.
ORGANISMOS
1) NO BRASIL
A Polícia Federal, através de sua Superintendência Regional de São Paulo
instaurou inquérito policial para apurar a ocorrência de crime no caso da emissão de
documentação inidônea para falsificação dos passaportes dos jogadores Warley,
Alberto, Edu, Jeda e Dedé.
A Polícia Civil do Maranhão e o Ministério Público, instauraram
inquéritos para apurar irregularidade na emissão de documentos que permitiram a
falsificação das identidades de jogadores pertencentes a clubes filiados a Federação
Maranhense de Futebol.
2) NO EXTERIOR
Em Portugal, a INTERPOL e a Polícia Judiciária instauraram
procedimentos para investigar a falsificação de passaportes para jogadores brasileiros,
argentinos, uruguaios e de outras nacionalidades. Os jogadores brasileiros que estão
oficialmente sendo investigados pela INTERPOL, são: André Augusto Leoni, Jedaías
Capucho Neves, Nelson de Jesus Neves, Edmilson Rocha Andrade Mendes, Jorge
Henrique Amaral de Castro, Marcos Assunção, José Vitor Roque Júnior, Warley Silva
Santos e Alberto Valentin do Carmo Neto.
Na Itália, em praticamente todas as cidades onde existem grandes clubes
foram instaurados inquéritos pela polícia ou pelo Ministério Público . Por exemplo, na
Questura de Vicenza, respondem processo que apuram crimes de falsidade ideológica e
favorecimento de imigração clandestina os jogadores Jeda e Dedé, além de ex-jogador
Careca e o dirigente José Mário Pavan. Na Questura de Milão está sendo investigado o
goleiro Dida. Em Roma há inquérito apurando a situação de Cafu. Em Udine, o
Ministério Público investiga as situações de Warley e Alberto.
Na França, o Ministério dos Esportes determinou que todos os jogadores
estrangeiros tivessem confirmada a regularidade dos passaportes. A Federação de
Futebol resolveu, além de suspender os atletas estrangeiros com passaportes falsos,
punir com a perda dos pontos os clubes pelos quais tenham atuado. Esse foi o caso do
SAINT- ETIENNE, que perdeu os pontos dos jogos em que atuaram os jogadores
Alex e Aloísio.
A Federação Espanhola, por recomendação da FIFA, passou a usar mais
rigor na investigação da autenticidade da documentação de jogadores estrangeiros (não
europeus) portadores de passaportes comunitários. Entre outros jogadores brasileiros
que atuam no futebol espanhol, foram investigados Jameli, do Zaragoza, Doriva, do
Celta, Magno, do Alavés e Baiano, do Las Palmas.
No mês de Março, reuniram-se em Paris, Promotores Públicos e
autoridades policiais de seis países europeus, Itália, França, Portugal, Espanha,
Alemanha e Inglaterra, para discutir ações conjuntas e coordenadas para combater
passaportes falsos de jogadores de futebol. O objetivo do encontro foi a criação de
uma estratégica comum, no âmbito europeu, para repressão a essa prática ilegal.
DA FIFA
A Entidade mentora do futebol mundial, convidou no mês de março, os
membros da CPI para discutir a questão dos passaportes falsos e, assim se inteirar do
andamento das investigações. O encontro ocorreu em Zurique, no dia 15 de março,
tendo a Entidade recepcionado todas as recomendações emitidas pela CPI sobre o
assunto.
Algumas das providências tomadas pela FIFA para reprimir o uso de
passaportes falsos:
a) Solicitou a FEDERAÇÕES NACIONAIS e à UEFA que tivessem
rigor nas investigações sobre o passaportes de jogadores estrangeiros que se
apresentassem como comunitários.
Recomendou punição exemplar tanto para jogadores
clubes, envolvidos com passaportes falsos.
como para os
c) Recomendou que essas punições fossem aplicadas o mais rápido
possível, independentemente da atuação da Justiça Comum.
d) Punir o jogador HECTOR DIEGO GARAY, argentino que joga no
RAGING CLUB DE ESTRASBURGO, da França, portador de um passaporte
falsificado. Hector Garay já havia recebido da Federação Francesa de Futebol uma
suspensão pelo período de 03 meses, restrita ao futebol francês. A FIFA decidiu usar de
mais rigor e ampliou a punição do argentino, suspendendo-o de toda e qualquer
atividade relacionada ao futebol, em qualquer lugar do mundo.
SUGESTÕES APRESENTADAS À FIFA À CBF
FIFA
1. Instituição obrigatória
de um cadastro de jogadores extracomunitários, por clube. Esse cadastro seria encaminhado à UEFA e à FIFA,
anualmente, que assim acompanhariam as mutações ocorridas. O objetivo seria evitar
que um jogador inicialmente contratado como extra-comunitário fosse posteriormente
inscrito como comunitário através da falsificação do seu passaporte.
2. Divulgação periódica e atualizada da lista dos Agentes FIFA, que
estivessem regulamente autorizados pela Entidade para atividade de intermediação de
negócios no futebol.
1. Descredenciamento do Agente FIFA envolvido em questão de
falsificação de passaportes.
2. Comunicação obrigatória, pelos clubes, aos órgãos nacionais de
controle de migração, da contratação de jogadores estrangeiros. Essa comunicação seria
acompanhada de documentação do atleta, inclusive cópia do passaporte.
3. Uniformização dos procedimentos quanto às cotas estabelecida para os
clubes na contratação de jogadores extra-comunitários.
CBF
1. Instituição de um cadastro de jogadores brasileiros negociados com o
clubes estrangeiros. Esse cadastro, atualizado anualmente, seria encaminhado à CBF e à
FIFA para efeito de acompanhamento das mutações ocorridas.
2. Divulgação periódica e atualizada da lista das pessoas credenciadas
junto à ENTIDADE para intermediação de negócios no futebol.
3. Intervenção em clubes e federação nos quais comprovadamente
existirem procedimentos de falsificação de documentos de atletas.
4. Descredenciar ou desautorizar
agentes intermediadores que,
comprovadamente, se envolvam na prática de facilitação de documentação falsa para
atletas.
SUGESTÕES APRESENTADAS ÀS AUTORIDADES BRASILEIRAS
1. Ministério das Relações Exteriores – recomendar às autoridades
diplomáticas e consulares que prestem apoio aos jogadores brasileiros envolvidos com
passaportes falsos, estimulando-os à regularização de suas situações e assistindo-os nos
casos em que respondam processos criminais em países estrangeiros.
2. Ministério Público – investigar a ocorrência de crime contra a ordem
legal brasileira nas transações de jogadores brasileiros para o exterior, com passaportes
falsificados.
3. Receita Federal e Banco Central – investigar a possível ocorrência de
crime contra o Sistema Financeiro do Brasil de evasão de divisas, nas transações dos
jogadores brasileiros para clube estrangeiros, envolvidos ou não com passaportes falsos.
Dos indícios da prática de crimes, apurados no âmbito desta Comissão.
Em face dos documentos examinados e dos depoimentos prestados,
concluí-se pela existência de indícios da prática dos seguintes delitos:
1. Crime contra a ordem tributária, previsto na Lei nº 8.137, de 1990,
cujo art. 2º, inciso I, dispõe:
“Art. 2º.- Constitui crime da mesma natureza” – contra a
ordem tributária:
“I – fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas,
bens ou fatos, ou empregar outra fraude, para eximir-se, total ou
parcialmente, de pagamento de tributo.”
A pena aplicada e de detenção, de seis meses a dois anos, e multa.
Ocorre que, de modo geral, os empresários responsáveis pela
transferência de jogadores deixam de declarar os ganhos obtidos nessa transação.
2. Crime contra o sistema financeiro nacional, previsto no parágrafo
único do art. 22 da Lei nº 7.492/86, cujo teor é o seguinte:
“Art. 22. Efetuar operação de câmbio não autorizada, com o
fim de promover evasão de divisas do País.
Pena. Reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa.
Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem, a qualquer
título, promove, sem autorização legal, a saída de moeda ou divisa para o
exterior, ou nele mantiver depósitos não declarados à repartição federal
competente.”
Ao que se pode apurar, os intermediadores de atletas para o exterior
costumam manter o dinheiro obtido nessa atividade em contas no exterior, sem a
devida declaração prevista em Lei.
3. Crime de falsificação de documento público, tipificado no art. 297 do
Código Penal, nos seguintes termos:
“Art. 297. Falsificar, no todo ou em parte, documento público,
ou alterar documento público verdadeiro:
Pena – reclusão, de dois a seis anos, e multa.
§ 1º. Se o agente é funcionário público, e comete o crime
prevalecendo-se do cargo, aumenta-se a pena de sexta parte.”
A falsificação de passaporte inclui-se nesta tipificação.
4. Crime de falsidade ideológica, assim disposto no art. 299 do Código
Penal:
“Art. 299. Omitir, em documento público ou particular,
declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir
declaração falsa ou diversa do que devia ser escrita, com o fim de
prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato
juridicamente relevante.
Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é
público, e reclusão, de um a três anos, e multa, se o documento é
particular.
Parágrafo único. Se o agente é funcionário público, e comete o
crime prevalecendo-se do cargo, ou se a falsificação ou alteração é de
assentamento civil, aumenta-se a pena de sexta parte.”
Desse modo, a prestação de informações falsas, inclusive a adulteração de
certidão de nascimento, para fim de aquisição de passaportes, constitui o crime aqui
descrito.
5. Envio de criança e adolescente ao exterior de forma irregular. O art.
239 da Lei nº 8.069, de 1990, dispõe:
“Art. 239. Promover ou auxiliar a efetivação de ato destinado
ao envio de criança ou adolescente para o exterior com inobservância das
formalidades legais ou com o fito de obter lucro:
Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 6 (seis) anos, e multa.”
Caracteriza este delito o envio de jogadores adolescentes para o exterior,
em desacordo com a legislação pátria.
5. Aliciamento para o fim de emigração. É a hipótese prevista no art. 206
do Código Penal que dispõe:
“Art. 206. Aliciar trabalhadores, para o fim de emigração:
Pena – detenção, de um a três anos, e multa.”
Este e o caso dos agenciadores que aliciam jogadores para trabalhar no
exterior, os quais, muitas vezes, nem mesmo são colocados em times de futebol,
passando a trabalhar como motoristas de táxi, entre outras atividades.
Desse modo, o entendimento é de que o Relatório Final da Comissão,
com os documentos e depoimentos que comprovam esses ilícitos, devem ser
encaminhados ao Ministério Público, à Polícia Federal e à Receita Federal para
promoção da responsabilidade penal desses agentes.
Com estas investigações, a CPI dá um passo importante no sentido de
extirpar esta prática criminosa que depõe contra as glórias do futebol brasileiro.
CAPÍTULO XII - FÁBRICA DE “ GATOS ”. F ALSIFICAÇÃO DE
IDENTIDADES E TRÁFICO DE MENORES PARA O
EXTERIOR .
TRÁFICO DE ATLETAS MENORES
Numa referência ao Seminário Internacional sobre o Tráfico de Seres
Humanos, realizada em Brasília, a jornalista Ana Beatriz Magno 22, identifica três
modalidades de tráfico de pessoas: o comércio de mulheres e crianças para a
prostituição; o comércio de homens, mulheres e crianças para o trabalho escravo em
diversos países; e o comércio de crianças para a adoção internacional:
“O comércio de seres humanos, comentava, é a terceira
atividade mais rentável praticada pelo crime organizado internacional.
Perde apenas para a venda de drogas e armas e movimenta algo em torno
de U$ 5 a U$7 bilhões, segundo dados do Programa das Nações
Unidas para o Controle Internacional de Drogas (ANDCP),
departamento da ONU que trata da criminalidade transnacional”.
A reportagem “Vende-se gente” lembra outra, intitulado “Meninos do Brasil”,
que o Estado de Minas publicou na segunda quinzena de julho do ano anterior e que
revelou a situação de miséria e abandono em que se encontram muitos dos atletas
mirins levados à Europa por agentes de jogadores. Trata-se de garotos de origem
humilde, que sonham com uma vida melhor, buscam o sucesso e a fortuna, têm
vontade de fazer a independência financeira e de dar uma condição digna à família. A
situação de carência em que vivem no Brasil e a falta de oportunidades de trabalho
aqui facilmente os tornam vítimas de empresários inescrupulosos.
Em síntese, o esquema desse tipo de tráfico de menores funcionaria da
seguinte maneira: O empresário, pessoalmente ou através de olheiros, sai pelo País
afora à cata de menores que demonstram algum potencial desportivo, mas ainda não
têm vínculo contratual com algum clube. Daí entra em contato com a família, à qual
oferece dinheiro em troca de uma procuração pela qual consegue autorização tanto
para, em nome dos pais, assinar um contrato de trabalho ou de estágio com um clube
estrangeiro, quanto para levar o menor ao exterior. Seriam conhecidos diversos casos
em que o contrato está redigido em língua estrangeira. Os garotos viajam como
turistas 23.
Correio Braziliense, 28.11.2000.
Há notícia também de “tráfico” de atletas menores vinculados a clubes brasileiros, inclusive com o uso de
passaportes “comunitários” falsos, que valorizam o passe. Pela lei brasileira, o atleta pode ser profissional a partir
dos 17 anos de idade. A transferência do atleta profissional para clubes estrangeiro é processado segundo regras
estabelecidas pela CBF e pela Fifa, devendo as condições dessa transferência constar do contrato de trabalho.
Neste caso, pois, pelo menos em tese, as próprias entidades desportivas dispõem de mecanismo de controle
22
23
No exterior, o menor é entregue ao clube que o “contratou”, cuja
primeira providência é tomar-lhe o passaporte “a fim de legalizar sua situação”. O garoto,
então, passa a jogar bola, em competições onde o estilo de jogo é muito diferente
daquele a que estava acostumado aqui no Brasil. Por ser estrangeiro (e, pior, sulamericano), é socialmente discriminado. O empresário dá sua missão por encerrada,
literalmente some no mundo, deixando o menor entregue à própria sorte.
As condições de trabalho são tão miseráveis (salário de fome, comida
ruim, inexistência de plano de saúde, comunicação difícil) que não há como viver fora
do alojamento do clube. Se, porém, assim mesmo resolver sair, para tentar a sorte em
outro clube ou outro emprego, ou, ainda, se resolver voltar para casa, não adianta: o
prazo do contrato (que assinou sem ler) é de longo prazo, podendo chegar a dez anos,
e, assim, ele está contratualmente preso ao clube em razão da “lei do passe”. A não ser,
claro, que pague a indenização por rescisão unilateral de contrato, cujo valor pode
chegar a U$ 15 mil.
O autor da reportagem discutiu o problema com diversas autoridades.
Um delegado da Polícia Federal (órgão que, como se sabe, controla a saída dos
brasileiros do Brasil para o exterior), disse que os menores têm sua documentação
devidamente inspecionada e que a PF não pode fazer nada, uma vez que a autorização
dos pais torna a saída do menor perfeitamente legal. Disse mais: que a Polícia Federal
e o Ministério Público só poderiam entrar no circuito, inclusive para investigar
criminalmente os agentes de jogadores, se o Juizado da Infância e da Juventude
tomasse a iniciativa de acioná-los.
Para um Juiz da Infância e da Juventude, os maiores responsáveis pela
saída desses menores são os pais: “O fato de uma família ser pobre ou ignorante em
determinados assuntos não atenua a responsabilidade”. Essa autoridade também disse
que é preciso identificar, prender e punir (os agentes), para que fatos como esses não
ocorram mais. Finalmente afirmou que “para se dar uma autorização judicial para a
viagem de um menor ao exterior é preciso uma análise mais detalhada de cada caso”,
cabendo investigar para onde o menino vai e com quem vai.
Foi ouvido ainda o chefe do Departamento de Assistência a Brasileiros
no Exterior, do Ministério de Relações Exteriores. O diplomata observou que, se um
garoto ou seus pais assinaram um contrato em língua estrangeira, “automaticamente
esse documento não tem valor legal e pode ser anulado facilmente”. Ele também
estranha que “alguém com uma procuração consiga obter do juiz autorização para levar um menor
ao exterior”. De qualquer forma, se uma prevenção é difícil, na medida em que a
decisão de deixar um cidadão entrar em seu território cabe exclusivamente a cada País,
o Ministério reconhece que pode e deve dar toda a assistência possível aos menores.
A respeito do problema foi consultado, ainda, um advogado que se
manifestou disposto a representar os jovens na luta pelo passe. Segundo ele, é possível
anular os contratos porque:
sobre a saída do atleta para o exterior. No caso de menores sem vínculo com clube, o contrato é firmado entre o
clube estrangeiro e a família, e, aí, só resta apelar para as autoridades civis.
Já que foram assinados no Brasil, devem obedecer à legislação do País.
Além disso, na época em que foram assinados, a lei não permitia contrato com um
clube por tempo superior a dois anos.
Não tem valor jurídico o contrato em língua estrangeira sem a tradução.
E se tiver a assinatura de pessoa responsável, ela deve conhecer o idioma, caso
contrário, o documento não tem valor.
Os contratos não contêm o que os agentes prometeram, principalmente
em termos de salários. Isso fere o princípio da boa-fé.
Os garotos foram contratados para a prática do futebol em locais que
oferecem boas condições de trabalho. Submete-los a tratamento sub-humano é
proibido pela Declaração dos Direito Humanos.
Brunoro24 define o empresário do futebol como um profissional
independente, que atua na intermediação de jogadores entre os clubes. Fora do Brasil,
o empresário é conhecido como agente de jogadores. A intermediação consiste na
compra e venda de passes de jogadores, ou seja, na negociação das condições de
transferência do jogador de um clube a outro, obviamente em nome do próprio. Pela
reportagem anteriormente citada, há empresários que (também?) se dedicam ao
recrutamento de possíveis talentos desportivos e cuidam de seu encaminhamento ao
primeiro emprego, não se tratando, pois, de transferência entre clubes.
Existe uma Associação Internacional de Agentes de Jogadores (Iafa).
Freqüentemente, a intermediação é exercida paralelamente a (ou confundida com) as
atividades de procurador ou olheiro. O primeiro é o profissional que cuida da imagem
do atleta, administra suas rendas, agenda os compromissos sociais, negocia a renovação
do contrato de trabalho e cobra a parte que cabe ao atleta no direito de arena; o
segundo é especialista na identificação de bons negócios na área de compra e venda de
passes
A atividade do empresário desportivo ou agente de jogadores é
regulamentada pela Fifa, desde 1990. O Estado de Minas de 23 de julho de 2000
informa que, segundo pesquisa feita na Internet, a Fifa teria atualmente registrados 573
agentes de jogadores. Na relação oficial, o Brasil aparece com 18 nomes de agentes
credenciados e autorizados pela Fifa para atuar no Brasil como intermediários nas
transferências de jogadores de futebol.
O processo de credenciamento do agente é iniciado na CBF, mediante
solicitação escrita de concessão de licença. O candidato não pode ocupar qualquer
cargo em entidade desportiva. Os critérios de avaliação da aptidão para atuar como
intermediário são livremente estabelecidas pela própria CBF.
A concessão da licença é comunicada à Fifa, que pode reconhecê-la ou
não. No primeiro caso, a licença só se torna efetiva se o candidato fizer um depósito
24
Parágrafos baseados em BRUNORO, José Carlos & AFIF, Antônio. Futebol 100% profissional. São Paulo: Editora Gente,
1997.
no valor de 200 mil francos suíços, como garantia de que, caso o jogador que sofrer
danos nas suas relações contratuais com o agente possa ser indenizado.
Pelas normas da Fifa,
é de dois anos a duração máxima do contrato entre o agente e o jogador;
não pode o clube negociar contrato de trabalho com agente não
credenciado, nem o atleta utilizar seus serviços;
é vedado o agente de jogadores estabelecer contato com o jogador que
tenha vínculo empregatício com qualquer clube, na intenção deliberada de persuadi-lo a
romper o contrato de trabalho;
pode a Fifa punir o mau agente, bem como o jogador de futebol e o
clube que transacionarem com intermediário não credenciado.
No que se refere ao problema dos menores acima descrito, dispõe o
Estatuto da Criança e do Adolescente:
“Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de
qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência,
crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação
ou omissão, aos seus direitos fundamentais.
Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do
adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento,
aterrorizante, vexatório ou constrangedor.
Art. 83. Nenhuma criança poderá viajar para fora da
comarca onde reside, desacompanhada dos pais ou responsável, sem
expressa autorização judicial.
Art. 84. Quando se tratar de viagem ao exterior, a
autorização é dispensável se a criança ou adolescente:
I – estiver acompanhado de ambos os pais ou responsável;
II – viajar na companhia de um dos pais, autorizado
expressamente pelo outro através de documento com firma reconhecida.
Art. 85. Sem prévia e expressa autorização judicial, nenhuma
criança ou adolescente nascido em território nacional poderá sair do País
em companhia de estrangeiro residente ou domiciliado no exterior.
Art. 136. São atribuições do Conselho Tutelar:
IV – encaminhar ao Ministério Público notícia de fato que
constitua infração administrativa ou penal contra os direitos da criança e
do adolescente.
Art. 201. Compete ao Ministério Público:
X – representar ao juízo visando à aplicação de penalidade por
infrações cometidas contra as normas de proteção à infância e à juventude,
sem prejuízo da promoção da responsabilidade civil e penal do infrator,
quando cabível;
Art. 238. Prometer ou efetivar a entrega de filho ou pupilo a
terceiro, mediante paga ou recompensa:
Pena - reclusão de um a quatro anos, e multa.
Parágrafo único. Incide nas mesmas penas quem oferece ou
efetiva a paga ou recompensa.
Art. 239. Promover ou auxiliar a efetivação de ato destinado
ao envio de criança ou adolescente para o exterior com inobservância das
formalidades legais ou com o fito de obter lucro:
Pena - reclusão de quatro a seis anos, e multa.
Art. 251. Transportar criança ou adolescente, por qualquer
meio, com inobservância do disposto nos arts. 83, 84 e 85 desta Lei:
Pena – multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se
o dobro em caso de reincidência.”
Do que precede, extrai-se a) que a saída de menores do País, sejam
atletas ou não, está disciplinada no Estatuto da Criança e do Adolescente; b) que a Fifa
tem normas específicas para atuação dos agentes de jogadores (empresários). Não
compete à lei brasileira estabelecer regras para a entrada de brasileiros nos diversos
países, mas nada impede que, pelas vias diplomáticas, o Brasil sugira a adoção de
normas disciplinadoras da concessão de visto a atletas estrangeiros menores de idade
faça acordos específicos para um controle mais rigoroso 25, e discuta alternativas de
prevenção.
De qualquer forma, a CPI considerou a apuração dos fatos relativos ao
tráfico atletas menores de idade um ponto de honra, ainda mais em razão dos fortes
indícios de que essa imoralidade prospera na medida em que está associada aos crimes
de falsificação de passaporte e de emissão fraudulenta de certidões de nascimento, os
quais, respectivamente, valorizam o passe do atleta (maior liberdade de circulação nos
países da Comunidade Européia) e tornam mais lucrativa a ação de olheiros e
empresários
25
A Resolução Normativa nº 26, de 25.11.98, do Conselho Nacional de Imigração disciplina a concessão de visto destinado
à prática intensiva de treinamento na área desportiva por atletas por atletas estrangeiros menores de 21 anos. Normas
semelhantes poderão ser sugeridas a outros países.
SUB-RELATÓRIO
DEPUTADO EDUARDO CAMPOS
SUB-RELATOR PARA TRANSAÇÕES IRREGULARES DE MENORES NO FUTEBOL
I - I NTRODUÇÃO
No contexto sócio-econômico brasileiro o futebol tem tido papel
relevante. O Brasil possui mais de 153 milhões de habitantes, dos quais 49 milhões são
crianças de 0 a 14 anos. Desse total, 19,8 milhões (40,4%) vivem em famílias com renda
per capita inferior a meio salário mínimo. Essa dura realidade faz com que cada vez
mais milhares de crianças em todo o país, incentivados pelos pais, sonhem com a
ascenção social através do futebol, se sujeitando, na maioria das vezes, à exploração de
empresários inescrupulosos, a maus tratos e a outras práticas criminosas.
Esta Subcomissão do menor foi criada para aprofundar as investigações e
a descrição das diversas formas de atuação, bem como o registro de casos e, por fim, a
propositura de sugestões para evitar os ilícitos aqui consignados.
As investigações realizadas têm apontado para a existência de
verdadeiras máfias de transferência de jogadores de futebol do Brasil para outros países.
Os jovens, geralmente com menos de 15 anos de idade, se destacam em
“peneiras”, uma espécie de avaliação, realizadas por todo o País, através de olheiros de
clubes com tradição nas categorias de base.
Estados como Maranhão e Tocantins estão entre os mais visados. Um
exemplo foi levantado por esta comissão na cidade de São Luiz – Maranhão, onde o
esquema funciona dentro da própria Federação Maranhense de Futebol, com a
participação do diretor do departamento de registros e transferências, Sr. Raimundo
Nonato Pereira e a conivência do seu presidente, Sr. Carlos Alberto Ferreira.
Com o interesse dos clubes, os pais e empresários desses jogadores
“diminuem” a idade dos atletas, falsificando a certidão de nascimento e depois tirando
os outros documentos, de forma "normal”, com a certidão adulterada.
Sem a fiscalização dos clubes, que, na maioria dos casos não checam a
validade dos documentos apresentados, os jogadores são inscritos em categorias com a
data de nascimento acima do limite. Com isso, acabam se destacando pela vantagem
física.
Dada a valorização dos jogadores de futebol, as adulterações são
comandadas por pessoas quase sempre alheias ao dia a dia dos clubes, visando,
exclusivamente, à obtenção de elevados ganhos financeiros.
“Máfias”, verdadeiras quadrilhas, com conexões que vão de locais
remotos do interior do Brasil até capitais européias, foram montadas para negociar
atletas menores tanto para o Brasil, como para o Exterior.
A realização de algumas investigações, e a oitiva de testemunhas,
tornaram possível entender o funcionamento desse esquema de falsificação de
documentos, com o objetivo de transacionar jogadores com times estrangeiros.
“Gato” é o jargão utilizado no Futebol para definir o jovem portador de
documentos alterados para burlar os limites de idade em torneios.
MODO DE ATUAÇÃO
principais.
O esquema montado para traficar atletas menores tem duas vertentes
A primeira é formada por “olheiros”, técnicos das categorias de base,
empresários e seus prepostos. Utilizam a estrutura de clubes filiados a federações,
garimpando “mercadoria” entre jovens que tentam chance no profissionalismo.
A segunda, que opera a partir dos chamados centros de treinamento,
financiados por empresários, ou clubes nacionais e estrangeiros, promovem o
recrutamento e a seleção de garotos para depois vendê-los a clubes do Brasil ou do
Exterior.
O esquema de “exportação” é claramente segmentado em dois tipos de
mercados: o que trabalha com adolescentes ainda sem projeção nos meios
futebolísticos e o que atua junto aos jovens atletas cujos nomes já despontaram no
cenário esportivo, muitas vezes através de um processo de valorização que inclui
convocação para as seleções sub – 17 e sub – 20.
O “gato”, em razão do maior amadurecimento, tem mais chance de se
destacar em competições nas quais os outros jogadores são fisicamente mais frágeis.
Esse fato possibilita sua promoção para as categorias principais ou mesmo às seleções
brasileiras sub – 17, sub – 20, o que eleva o valor do seu passe a milhões de dólares.
II - SUÍÇA
Em Zurique, os parlamentares entregaram relatório preliminar ao
Presidente da FIFA, Joseph Blatter, sobre as investigações referentes à falsificação de
passaportes e à transferência de menores. Algumas sugestões da comissão já serão
adotadas, de pronto, pela FIFA: a criação de um cadastro internacional dos jogadores
de futebol que atuam no exterior; a padronização dos contratos com cópia no idioma
do atleta
III - HOLANDA
O CASO LEONARDO
Em Roterdã, os deputados foram conhecer detalhes da história do
jogador Leonardo Santiago, de 17 anos, do Rio de Janeiro, que foi condenado pela
justiça daquele país, pelo uso de passaporte falso para jogar no Feyenoord. O brasileiro
foi condenado a uma pena de prestação de serviços comunitários (40 horas de trabalho
alternativo) e a uma multa de 3 mil florins, equivalente a R$ 2,55 mil.
IV - BÉLGICA
Dados da imprensa e informações prestadas perante esta Comissão
indicaram a Bélgica como rota principal desse tráfico, em virtude da ausência de cotas
para a participação de atletas estrangeiros em seus clubes, e pelo fato de a lei belga
privilegiar atletas amadores de menor idade.
Na Bélgica, a CPI manteve contato com seu Parlamento; com jornalistas
dos maiores periódicos da área de esporte, treinadores brasileiros e estudantes, o que
nos permitiu vislumbrar melhor o esquema montado de tráfico de jogadores, como
relataremos a seguir:
Esses garotos (muitos deles não registrados) são recrutados nos famosos
centros de treinamento através de olheiros, empresários e prepostos de empresários.
Há diversos agentes envolvidos nessa atividade criminosa, distribuídos em duas
categorias bem claras. Uns que trabalham com jogadores ainda não revelados, ou seja,
recrutam os menores ainda antes de serem jogadores notórios e conhecidos.
Na rota Brasil/Bélgica, nessa área, foram citados os nomes de Expedito
da Silva Júnior, o Ted Júnior, que trabalha em parceria com o Sr. Rachid Tasmuth,
marroquino, dono de café em Bruxelas, Emílio Ferreira. Outros que atuam na área de
valores já conhecidos, e em articulação com os times da primeira divisão, onde se
destacam o Sr. Giuseppe Robolotta, em parceria com o agente de nome Enéas, hoje
radicado na Inglaterra, o ex-jogador Wagner, o Sr. Braid Ribeiro, Rogério Henrotay, o
espanhol Emílio Ferreira e Daniel Gurard. Na categoria dos que já se projetaram, atua
o empresário Juan Finger, cuja atuação indica ações suspeitas de elisão fiscal e burla à
Lei 9.615/98 (Lei Pelé).
A Bélgica funciona como um grande entreposto para os demais países da
Europa, entre eles, a Itália, Holanda, Espanha, França e Portugal, porque apresenta o
controle de fronteira mais democrático da União Européia: não existe restrição de cota,
de participação de estrangeiros extracomunidade européia nos times de futebol,
podendo chegar a até 11 jogadores, se assim entenderem os dirigentes e o técnico.
Além do mais, a Bélgica concede tratamento ao menor atleta estrangeiro diferenciado
dos outros países, pois o considera como se tivesse um visto de estudante, ou seja,
confere-lhe tratamento de cidadão.
Outro grande atrativo é a existência de muitos times belgas de segunda e
terceira divisão, que têm uma visão unicamente empresarial de preparar essas crianças
para fazer negócio com o futebol europeu. Para os brasileiros a Bélgica ainda é mais
atrativa, pela experiência bem sucedida do Oliveira, do Maranhão; pela presença de
muitos brasileiros, ex-jogadores atuando nesse esquema e, ainda, pela existência de um
vôo direto São Paulo-Bruxelas, da VASP. Esse processo vivido na Bélgica é sentido já
há alguns anos, tanto que há um livro do jornalista Daniel Renard, com quem
estivemos, baseado na experiência de quatro brasileiros que foram levados pelo
Robolotta e abandonados por ele. Um livro bastante conhecido no mundo do futebol.
A exploração de jogadores brasileiros na Bélgica assumiu proporções tais
que já despertou interesse da Comissão de Direitos Humanos do Parlamento Belga.
Recentemente, houve mudança em sua legislação: os times belgas estão proibidos de
contratar menores de 18 anos e são obrigados a atribuir aos contratos valor de, no
mínimo, US$ 3,000.00 mensais, como uma maneira de barrar a iniciativa dos times de
trazer jogadores irregulares.
V - O ESQUEMA
O esquema funciona com a recepção de meninos brasileiros, que são
levados para o exterior, pelo esquema do empresário brasileiro com o empresário
estrangeiro, sendo mantidos em apartamentos ou repúblicas, enquanto treinam em
equipes inexpressivas, via de regra, sem remuneração, recebendo apenas a alimentação.
Aqueles que vão já como jogadores assinam contrato, alguns, inclusive, em Flamengo
ou Francês, sem conhecer o idioma e conseqüentemente o teor das cláusulas.
Esses contratos muitas vezes são rescindidos sem o conhecimento do
jogador. Os menores são levados para esses times, que aqui nós chamaríamos de times
de várzea, com campos para treinamento, e são colocados sob a guarda do empresário
ou do preposto local do empresário, que fica fazendo a supervisão deles. Os que são
aprovados (minoria) são negociados com clubes, dentro e fora da Bélgica. Os times
geralmente querem selecionar apenas um jogador, enquanto que o empresário quer
negociar o grupo todo.
Quando não dá certo, o empresário acaba abandonando todo o grupo ou
parte dele. Assim, a maioria, por não ser aproveitada, é abandonada à própria sorte, sem
qualquer indenização, sequer direito à passagem de volta. Isso em um País estranho,
sem o conhecimento do idioma local, enfrentando toda sorte de dificuldades.
Essas vítimas ou são apoiadas por algum brasileiro ou vão trabalhar na
construção civil, no comércio ou em outra atividade, em situação ilegal. Termina sendo
esse o caminho para obter algum recurso para voltar, quando é possível. Nós
encontramos muitos jogadores brasileiros nessa situação. A maioria deles levados por
agentes. Com a nossa chegada, houve um grande número de jogadores que queriam
voltar para o Brasil, tanto que foi solicitado à funcionária da embaixada que fizesse uma
lista desses jogadores. A Comissão escolheu o Fábio, um desses jogadores, por ter sido
um dos primeiros a fazer contato conosco.
O CASO FÁBIO
O depoente FÁBIO FARIA DOS SANTOS conta que, em 1999, foi para a
capital paulista tentar “alguma coisa no futebol”. Lá ficou treinando no Juventus
durante três meses, quando foi apresentado, através do Sr. Jota, de São Paulo, a Ted
Júnior e a convite do empresário foi treinar em seu centro desportivo em Pouso AlegreMG (o treinador, o preparador físico, etc. era o Sr. Fidelis). Relata que o centro possuía
apenas o campo, o alojamento e o lugar das refeições e que por lá permaneceu por 15
dias. Ao voltar para São Paulo recebeu o convite do empresário para viajar para a
Bélgica (quando teve que desembolsar, no total, cerca de R$ 7.100,00).
Chegando à Bélgica, levado pelo Sr. Ted Júnior, foi morar em um
apartamento juntamente com outras cinco pessoas em cima de um café de nome Go
Go Bar, de propriedade do Sr. Rachid. Treinou em alguns times até se acidentar,
ficando um mês e meio parado, sem receber tratamento algum. Dois meses depois, o
Sr. Ted parou de visitá-lo, abandonando-o, quando Paulo, um brasileiro que mora lá, o
amparou. Relata, ainda, que seu pai assinou procuração dando poderes ao empresário
para negociar seu passe e que durante sua permanência naquele país nunca lhe fora
dado nenhuma quantia para custear suas despesas pessoais.
Informou, também, que lhe fora dito que com um passaporte português
ficaria mais fácil jogar, mas que teria que pagar uma taxa exigida pela federação belga
para obtê-lo.
Declarou que em solo Belga manteve contato com alguns atletas
brasileiros, são eles: Pithon Júnior, dois Eduardos, Emerson, Fábio, Lima e Rogério.
Informou, também, que não conhecia nada a respeito do Ted Júnior, ou melhor, a
única referência conhecida a respeito do empresário era a de que ele teria ouvido, no
ano de 2000, que no ano de 1994, o Sr. Ted levou jogadores para Europa.
Em seu depoimento, o atleta Fábio registrou que o Sr. Ted morou com
o grupo em Bruxelas, mas, o seu domicílio era no Brasil - Santo André/SP. O
depoente embarcou sozinho para a Europa, com 16 anos de idade, mediante uma
autorização de viagem dada ao Sr. Ted, que já se encontrava na Bélgica, que concedialhe poderes para manter o atleta naquele país, o que torna o empresário responsável
pelo menor.
Quando indagado se fora alvo de alguma agressão, respondeu que não,
mas que fora testemunha de uma agressão física praticada pelo Ted Júnior - um tapa,
contra um garoto, Emerson, motivado por um comentário do menor de que o tempo
da escravidão já tinha passado, isso em contraposição a uma ordem sua.
Inquirido o atleta sobre se tinha conhecido ou ouvido falar de um certo
Sr. de nome Wagner, respondeu que não conheceu tal pessoa, somente ouvira falar dele
nos comentários feitos pelo Ted Júnior; que era para ele (depoente) tomar cuidado,
porque aquele empresário pegava jogadores e levava para outros times; este empresário,
segundo seu depoimento, vive na Bélgica.
Entretanto, quando perguntado se ele teria conhecimento da existência
de um outro menor jogador de nome Pablo, respondera que só o conhecera por
fotografia e que a história que se contava, na Bélgica, era que ele havia sido levado pelo
Ted Júnior para a Bélgica, mas teria sido aliciado pelo Wagner que o levou para jogar
no futebol francês.
DEPOIMENTO DE GEORLAN GOMES BASTOS - GIL
O depoente admitiu ter utilizado documentos falsos durante o período
que jogou na Espanha, “no momento em que usei documentos falsos eu só pensei em
jogar na Europa, que é o sonho de todo jogador do interior do Brasil, e também porque
queria ajudar minha família”. Informou que o então Vice-Presidente do Clube
Americano de Bacabal no Maranhão, o Sr. Francisco Alves de Araújo, providenciou
para que ele arranjasse uma outra identidade antes de contratá-lo, para escapar do cerco
do Clube Santo André de São Paulo, que era o dono de seu passe.
O jogador passou a se chamar Jucerlan Rodrigues e a possuir dois anos a
menos. Contou, ainda, que o “Araújo disse que aquele documento era de uma pessoa
morta lá do interiorzão, que ninguém conhecia.” De posse da nova documentação,
viajou de Maranhão para Fortaleza, onde foi recebido pelo presidente do Americano
de Bacabal, Sr. Clóvis Dias, que o embarcou para a Espanha, entrando por Portugal,
portando dois passaportes. Um dele próprio e outro que foi apresentado na Aduana,
em nome de Jucerlan. Com esse passaporte fez teste no Hércules, um time de segunda
divisão, como a preferência era por um jogador mais alto, Gil foi emprestado pelo
Americano para o Lorca, onde, segundo ele, recebeu outro passaporte somente para
jogar.
Em suas férias, retornou à Matinhas-MA, sua cidade natal, quando
conheceu pessoalmente o verdadeiro dono dos documentos que disse ter entregue sua
certidão de nascimento a uma outra pessoa para que ela o ajudasse a tirar a carteira de
identidade e o CPF. Conforme o depoente, o esquema foi denunciado pelo próprio
Araújo aos jornais e rádios do Maranhão, após sua destituição da vice-presidência do
Clube.
DEPOIMENTO DE SÉRGIO FERREIRA DA SILVA
O depoente declarou que no ano de 2000, durante a realização do
campeonato pernambucano de futebol - Juniores, foi convidado por um empresário de
nome “Nino”, que se dizia angolano, naturalizado português, a embarcar para a
Europa com dois garotos treinados por ele: o menor Gustavo (17 anos) e o Wilton (18
anos), para jogarem num time da Alemanha.
O convite foi aceito, porém os três foram detidos no aeroporto em
Bruxelas, onde iriam fazer a conexão para Berlim. Contou que eles recorreram à
embaixada brasileira que alegou nada poder fazer. Nesse período da detenção
conheceram outros dois garotos paulistas na mesma condição (Ígor e Rodolfo), levados
por Ted Júnior.
No décimo segundo dia de espera, apareceu Otávio Monteiro Barros,
funcionário da embaixada, que prometeu ajudá-los, desde que pudesse negociar o passe
dos quatro atletas. Otávio liberou-os apresentando cinco cartas-convites de um clube
belga, prometendo contratá-los.
Ficaram nove meses na Bélgica, sem nada conseguir, mantidos por
Monteiro Barros e por um espanhol de nome Ramom, que o depoente afirma serem
sócios num café de nome CEBESG, onde havia jogo. O depoente confirmou também
conhecer o marroquino Rachid, que logo nos primeiros dias de sua chegada na Bélgica,
havia ido pegar os atletas Igor e Rodolfo no aeroporto. Sérgio revelou ter conhecido
um garoto brasileiro que sobrevivia tocando pandeiro no metrô e que soube de uns 4
ou 5 casos de garotos que haviam se prostituído para se manter.
Um fato que chamou bastante atenção em seu depoimento é que o Sr.
Sérgio diz manter uma instituição que recebe patrocínio do conselho da Criança e do
Adolescente e, entretanto, leva garotos para fora do país, irregularmente, sem nunca ter
recebido qualquer advertência ou punição.
O funcionário OTÁVIO MONTEIRO BARROS, ao ser interrogado pelos
deputados, tendo vista a acusação de negociar jogadores menores, negou que tenha
feito negócios no esporte, entretanto, declarou que os depósitos de US$ 10 mil e US$
70 mil efetuados em sua conta, referentes à compra dos passes do jogador Jeferson pelo
Lense e do goleiro Pablo pelo Saint Germaim, foram repassados integralmente aos
atletas, que não teriam contas.
DEPOIMENTO DE MARCOS ANTÔNIO COSTA - PRETO
Declarou que o Juventus teria depois da copa São Paulo de 2000,
emprestado o seu passe para o Santos por um ano, quando foi verificado que a
documentação do jogador continha datas de nascimento alteradas. O original de
nascimento do jogador é de 1978 e o jogador estava registrado na Federação Paulista de
Futebol, como sendo do ano de 1980. Conforme contou, entregou sua documentação
ao Sr. Peçanha (empresário responsável pela sua transferência do Primavera de
Indaiatuba para o Juventus) e ele a alterou.
DEPOIMENTO DE MARLON DA SILVA SANTOS
Em depoimento na Assembléia Legislativa de São Paulo, os Sr. Marlon,
do São Caetano, admitiu que teve a certidão de nascimento adulterada por um Cartório
de São Luis do Maranhão. Revelou que foi levado pelo procurador Valmir Pinheiro
Bastos, do Clube Boa Vontade, do Maranhão, para o União São João, de Araras, no
interior de São Paulo e que a partir desta venda, a data de seu nascimento foi alterada
em quatro anos, assim como seus dados relativos à filiação.
DEPOIMENTO DE RAUL MENEZES
Segundo o depoimento do Senhor Raul Menezes, o senhor Antônio
Benedito Braid Ribeiro intermediava a saída de jogadores menores do futebol do
Maranhão para o exterior. Informou também que Alessandro, jogador menor, foi
levado para a Tunísia sendo posteriormente descoberto na Grécia com documentos
arranjados e fraudados pelo referido senhor. Esclareceu, ainda, que o Sr. Braid teve a
ajuda de Giuseppe Robolota. Contou que o Sr. Braid vive disso: é preparador físico e
que seu principal objetivo de se empregar no exterior, é a obtenção de facilidades para
transferir jogadores de futebol do Maranhão para fora do país. O depoente afirma
possuir um bilhete assinado pelo Sr. Braid, onde ele lhe manda um jogador para treinar
no Moto e ser observado, com o objetivo de levá-lo para o exterior.
DEPOIMENTO DE ESTELMAR BASTOS
Em seu depoimento, o Sr. Estelmar Bastos informa que o Sr. Sérgio
Alves da Silva leva jogadores, menores, para a Bélgica e que possui um sócio com a
alcunha de Preto. Que, inclusive, pegou um monte de jogadores dele, em 1996, uma
vez que seu time, o Expressinho, havia sido eliminado da Federação durante três anos.
Informou, ainda, que Serginho era dono do Américo.
Depoimento de Antônio Henrique
Em seu depoimento, o Sr. Antônio Henrique afirma que Antônio Cassas
de Lima é um dos chefes do esquema de falsificação de documentos de jogadores do
Maranhão. Informa, ainda, que há suspeita de que existam várias ramificações de
exportação de jogadores, e que ele seja um dos mais atuantes. Confirmou que a
documentação do jogador Kleber João Boás Pereira, foi adulterada pelo Cassas e pelo
Gambasto (Roberto Gambaster), um empresário, provavelmente, belga. Afirma,
também, que Cassas enviou dezenas de jogadores para a Bélgica e que Cassas é amigo
da Dra. Margarida, titular de cartório em São Luiz, de onde foram roubadas mil
certidões de nascimento. Por último, declarou que acredita que Cassas não tem relação
com a embaixada na Bélgica, pois não necessita já que falsifica tudo.
DEPOIMENTO DE JAECI CAVALCANTE DE CARVALHO
Em seu depoimento, o jornalista Jaeci de Carvalho denunciou que os
empresários Adailton Nunes e Antônio Carvalho negociaram 23 jogadores brasileiros
de futebol menores de idade para a Polônia, durante o ano de 1997, inclusive o
jornalista apresentou contratos assinados pelo Sr. Adailton Nunes, com o percentual
que recebeu por cada garoto, comprovadamente. Segundo o depoente, os empresários
prometiam casa e conforto para os garotos. Mas chegando lá, o salário era apenas de
US$ 250 e eles dormiam na arquibancada do clube Polonês LKS.
Admitiu o depoente que os jogadores são orientados pelos empresários
inescrupulosos a não procurarem as embaixadas e nem os consulados brasileiros no
exterior. Afirmou, ainda, que existem mais de cinco mil jogadores estrangeiros menores
de idade espalhados pelo mundo sem qualquer tipo de assessoria.
VI - NO BRASIL
No Brasil há uma extensa rede de empresários e prepostos deles, com
fortes ligações com presidentes de federações e de clubes de futebol, técnicos das
categorias de base, etc. Como ficou amplamente noticiado nos trabalhos da CPI da
CBF/NIKE, vários ex-jogadores famosos, intermediam a ida de jogadores para fora do
país, a exemplo de Careca, Edinho e outros.
Esta CPI, em viagem à Europa, conseguiu reunir documentos sobre a
participação de Careca, Edmar e do presidente do Clube União São João na venda do
passe de Jedaias Capucho, o Jeda. O jogador possuiu um passaporte falso, joga
atualmente no Clube Vicenza, na Itália.
DEPOIMENTOS DE ANTÔNIO DE OLIVEIRA FILHO (CARECA), EDMAR
BERNARDES, ANDRÉ AUGUSTO LEONE (DEDÉ), ELISEU OLIVEIRA (TIROGA)
E JOSÉ MÁRIO PAVAN (PRESIDENTE DO UNIÃO SÃO JOÃO ESPORTE CLUBE )
Desses vários depoimentos pode-se depreender que Jeda, jogador
oriundo do clube União São João, do interior do Estado de São Paulo, foi vendido por
seu então procurador Eliseu Oliveira (Tiroga), para um clube na Ítalia, Vicenza. A
operação foi intermediada, no Brasil, pelo Campinas Futebol Clube, através de Antônio
de Oliveira Filho (Careca) e, no exterior, pelo Senhor Máximo Briaschi, com a
participação da venda do passe pelo então Presidente do União São João o Senhor José
Mário Pavan.
No contrato de Jeda há uma cláusula fixando em US$ 300 mil o passe do
jogador e, em seguida, a informação de que esse valor poderia subir para US$ 1 milhão
caso Jeda deixasse de ser um atleta extracomunitário (com cidadania de um dos países
da União Européia). Assim, existe uma distinção com relação ao valor dos passes na
Europa, baseada na origem do jogador.
Quando surge Jimmy Martins, cujo verdadeiro nome é Afonso Martins
Costa Filho, que segundo Careca, se apresenta como agente FIFA, (esse apresenta um
cartão de visita “FIFA Play, Bernardo Chalen e Mr. Jimmy Martins FIFA, agentes
representantes”) pessoa contratada para providenciar o passaporte comunitário tanto
do Jeda quanto do Dedé. Assim, o passaporte é emitido, elevando, sobremaneira, o
valor de venda do atleta.
O jogador Alex Dias de Almeida, do Saint Etiènne da França, em
depoimento à CPI, confirmou que foi induzido pela direção do clube a usar o
passaporte comunitário, e que Edinho, ex-jogador da seleção brasileira, providenciou
seu passaporte português, sem que ele tenha pago por isso. Alex esclareceu, ainda que
não possui ascendência portuguesa.
Depoimento de Leandro Quesada
O Sr. Leandro Quesada, comentarista esportivo, baseou seu depoimento
em histórias de garotos brasileiros que vão tentar a vida de jogador de futebol em
outros países, influenciados por pseudo-empresários e acabam se decepcionando.
O ÔNIBUS DE GOIÂNIA
Contou o comentarista que, em conversa com o delegado Sr. Alfredo
Luís Ondas, descobriu que ele investigava o Sr. Edson Cristino de Sousa que é um
fabricante de “gatos”. Esse fato lhe foi confirmado por SAMUEL MOTA, um garoto
de 17 anos, de Santa Helena de Goiás, que lhe contou que o Sr. Edson Cristino de
Sousa passava com um ônibus em sua cidade, recrutando alguns garotos com a
promessa de que eles se dariam bem no futebol de São Paulo, jogando em grandes
clubes. Esse senhor levou um monte de garotos para a cidade de Americana e de lá
fugiu, ao ser descoberto, estando foragido.
A COPA DE SÃO PAULO
No painel para ouvir convidados sobre o tema “ O futebol de várzea”
realizado pela CPI, o Sr. JOSÉ FIOQUE, Secretário Municipal de Esportes, da cidade
de Americana-SP, declarou que a organização da Copa São Paulo tomou um perfil
diferente, tornou-se uma competição praticamente profissionalizada. Perdeu o seu
principal objetivo de mostrar atletas para o futuro.
Nesse mesmo painel, o Sr. FLÁVIO ADAUTO IÓRIO LOPES
declarou acreditar que o poder público já perdeu o controle sobre essa competição que
hoje tem muito pouco a ver com o futebol de base. É uma competição elitizada por
grandes equipes do futebol brasileiro como o Corinthians, Flamengo, Vitória, Bahia.
Informou que ali os garotos já são comercializados com 16, 17 e 18 anos de idade.
A CPI recebeu denúncias relativas à Copa São Paulo de Futebol Júnior.
Uma delas trata da existência de gatos, entre os participantes do torneio, o alvo são os
jogadores do Roma, equipe campeã da competição em 2000. Em matéria divulgada
pelo jornal Estado de São Paulo do dia 31/01/01, Ílton José da Costa, dirigente do
Roma, contou que os clubes não são obrigados a fiscalizar a documentação de seus
atletas e não sofrem punição por isto. A outra é sobre a inscriç