Conheça a história das artes de incrustação de pedras
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Conheça a história das artes de incrustação de pedras
arte milenar I R A K N I H C R A P E A R U D PIETRisAtória das artes de incrustação Conheça a h ármore m em s sa o ci re ip m se texto: Paula Inácio de pedras texto Paula Ignacio Detalhe da entrada do Taj Mahal em mármore vermelho e motivos decorativos a partir da técnica Parchin Kari o termo “Comesso di Pietre Dure” é pouco conhecido no Brasil. Originário da Itália significa literalmente “composição de pedra dura” e diz respeito a uma técnica decorativa milenar de desenhos em pedras através de cortes e entalhes. Na Índia, uma arte muito parecida utiliza a mesma técnica, onde é chamada de Parchin Kari. Ambas se tornaram tradicionais, porém conhecidas apenas por aqueles que têm a oportunidade de visitar cidades como Florença na Itália e Agra, na Índia. A artesã Lu Heringer adora o trabalho artesanal asiático e explica: “As técnicas da Pietra Dura e do Parchin Kari na verdade são bem parecidas, e consistem no entalhe do mármore básico, que depois recebe uma aplicação de outras pedras cortadas. O mármore (geralmente branco ou o preto) é entalhado e pedras preciosas e semipreciosas são cortadas do tamanho exato do desenho original feito na base. Quando colocadas juntas, encaixam-se perfeitamente umas ao lado das outras, sem deixar espaços. Como se fosse um quebra-cabeças ou trabalho de marchetaria, só que feitos com mármore” – diz. Muitos confundem as técnicas com as do mosaico. Lu Heringer comenta: “No mosaico recortamos pastilhas de vidro e colamos sobre o desenho feito na base que vai ser a peça final, deixando espaços entre elas, o que confere a principal característica desse tipo de artesanato. Além disso, vários tipos de trabalhos com mosaico não precisam necessariamente seguir algum desenho, são pedaços de azulejos e vidros colados livremente, muito diferente das artes Parchin Kari e Pietra Dura”. Como surgiram as técnicas? Cibele Aldrovandi é Doutora em Arqueologia pela Universidade de São Paulo e pesquisadora da História da Arte e da Cultura Indiana. Ela explica que o termo “Pietra Dura” derivou dos painéis romanos conhecidos como “Opus Sectile”, termo em latim que significa “obra cortada”. “Esses painéis são encontrados nas paredes e pisos de basílicas italianas, especialmente em Florença. Detalhe do Taj Mahal. Mármore incrustado com gemas semipreciosas fotos: Matthew Wanamaker Detalhe externo Taj Mahal Na cidade de Agra ainda persiste a técnica do Parchin Kari, que é repassada de geração a geração Revista Regional CASA 53 fotos: Matthew Wanamaker arte milenar Taj Mahal, parte externa e Minarete ornamentados com motivos florais Taj Mahal, uma das sete maravilhas do mundo moderno São confeccionados em mármore colorido, madrepérola e vidro, e contém representações religiosas figurativas e geométricas” – diz. A arte da Pietra Dura permaneceu especialmente em Florença, na Itália, até meados do século XVI, quando migrou para a Pérsia e posteriormente para a Índia. Na época, a Índia estava sob o domínio do Império Mughal. Eles seguiam a religião islâmica, e todos os impérios que seguiam o Islã na época falavam a língua persa, estreitando seu contato cultural. Assim, o Imperador Mughal Shah Jahan (pronuncia-se Sá Jarrã) teve contato com a arte da Pietra Dura através dos persas e a levou para a Índia, onde ficou conhecida após a construção do suntuoso Taj Mahal. Aqui no Brasil temos pouco contato com o Islamismo de fato, mas há muito a aprender a respeito da sua arte. Cibele conta que os mulçumanos proíbem o culto de imagens, e daí surgiram os motivos não figurativos para ornamentar suas construções religiosas. “Com elementos geométricos, vegetais e florais foram ornamentados palácios, mesquitas e túmulos, que utilizavam a técnica do Parchin Kari. Esses motivos hoje conhecidos como arabescos são considerados símbolos de uma natureza transcendente e infinita de Deus” – diz. A técnica de incrustação em pedras permitia a criação de motivos geométricos que não feriam as crenças religiosas muçulmanas e tradições do povo Mughal. “A corte Mughal era um grande centro de excelência cultural e tinha grande apreciação pelas artes, poesia, música e arquitetura monumental” – conclui a pesquisadora. Taj Mahal Conhecido como uma das sete maravilhas do mundo moderno, o Taj Mahal realmente encanta os olhos e 54 Revista Regional CASA impressiona pela suntuosidade. Construído durante o século XVII sob as ordens do imperador Mughal Shah Jahan, o mausoléu é inteiramente revestido de mármore branco e de trabalhos em Parchin Kari. Para a ornamentação, foram recrutados cerca de 20 mil mestres e artesãos diretamente da Pérsia (hoje conhecida como Irã). Asha Goyal é fundador e proprietário de um atelier especializado na arte do Parchin Kari, e comenta: “A cidade de Agra foi a capital do Império Mughal, e também o local que o imperador Shah Jahan escolheu para a construção do Taj Mahal. Para isso, ele mandou trazer artesãos especializados em joalheria, que executavam um primoroso trabalho nas pedras semipreciosas que revestiriam o mármore da construção”. Como a técnica demandava muito tempo, esses artesãos fixaram residência na cidade e transmitiram de geração a geração a arte de incrustação de pedras. Ainda hoje é possível encontrar lojas e ateliês que vendem tampos de mesa, esculturas, pratos, cinzeiros, castiçais e pequenas caixas de mármore revestidas com as pedras semipreciosas. “Geralmente exportamos nosso trabalho para países europeus como França, Reino Unido e Alemanha, e fico feliz que vocês falem sobre o tema com os brasileiros” - diz Asha Goyal. fotos: Divulgação A arte geométrica foi criada para ornamentar construções religiosas dos muçulmanos Papa Clemente VIII em Pietra Dura, em trabalho de Jacopo Ligozzi e Francesco Romolo Ferrucci Gemas László Szalai Tampo de mesa de mármore feito por artesãos da cidade de Agra, Índia Gemas são minerais e rochas que quando lapidados ficam lustrosos e brilhantes e geralmente são usadas em joalheria, conhecidas como pedras preciosas e semipreciosas. Para a técnica do Parchin Kari na Índia, as gemas são preparadas em uma roda giratória que dá a forma desejada e o polimento a peça. Asha Goyal é fundador de uma loja que vende peças feitas com a técnica do Parchin Kari e diz que geralmente são utilizadas pedras como Lápis Lazuli, Ônix, Olho de Tigre, Cornalina, Coral, Turquesa, Jade, Cristal, Hematita e Turmalina. As flores do Taj Mahal Trabalho em Pietra Dura na Catedral Assunção da Virgem Maria O Taj Mahal é a principal construção do Império Mughal, povo muçulmano que habitou a Índia durante os séculos XVI e XVII. O projeto arquitetônico foi revestido inteiramente com mármore branco, além de trabalhos em Parchin Kari colocados em todos os ambientes. Estima-se que para fazer uma única flor com a técnica, sejam necessárias cerca de 60 peças encaixadas. “As flores são representadas de modo naturalista ou estilizadas, compostas por lótus, tulipas, íris, fúcsias, narcisos, crisântemos, entre outras espécies” – diz Cibele Aldrovandi, pesquisadora da história da arte e da cultura indiana. Revista Regional CASA 55