MELANOMA INTRAOCULAR PRIMÁRIO DE CORÓIDE EM UM

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MELANOMA INTRAOCULAR PRIMÁRIO DE CORÓIDE EM UM
MELANOMA INTRAOCULAR PRIMÁRIO DE CORÓIDE EM UM CÃO DA RAÇA ROTTWEILLER –
RELATO DE CASO
João Alfredo Kleiner, Enry Garcia Da Silva, Eduardo Kenji Masuda
* Trabalho apresentado durante a III Conferência Sul-Americana de Medicina Veterinária, no
período de 21 a 24 de Agosto de 2003 no Riocentro – RJ.
ABSTRACT: Primary choroidal melanoma in a Rottweiller. Melanocytic tumors are the most
common primary ocular neoplasia in dogs. They may arise from the iris, ciliary body and choroid.
Choroidal melanomas usually are secondary affections from uveal melanomas. Primary choroidal
neoplasias are very rare and they occur more frequently in Beagles. This report presents a sudden
onset of a choroidal melanoma with scleral infiltration in a Rottweiller.
KEYWORDS: Melanoma, choroidal, dog
INTRODUÇÃO:
Foi apresentada para atendimento uma cadela da raça Rottweiller adulta, hígida, com queixa de
queda na acuidade visual, dor ocular e córnea esquerda extensamente esbranquiçada. Ao exame
físico ocular pôde-se notar a presença de blefarospasmo, fotofobia, edema de córnea generalizado,
flare +++ e hipotonia ocular. O exame de fluoresceína foi negativo e a terapia inicial foi dirigida ao
controle da uveíte severa utilizando-se topicamente colírio de corticóide, colírio de antibiótico de
amplo espectro e midriático cicloplégico. Sistemicamente utilizou-se prednisolona e enrofloxacina.
Três dias após o início da terapia observou-se a presença de glaucoma severo secundário. Levandose em consideração a gravidade do caso e a uma resposta não satisfatória à terapia
antiglaucomatosa, optou-se pela enucleação do bulbo ocular. Durante o ato cirúrgico observou-se a
presença de uma significativa massa escleral infiltrativa com aspecto pigmentado e fibroso, onde
houve a necessidade de exenteração do bulbo. Ao exame histopatológico do material obtido
concluiu-se se tratar de um melanoma coroidal primário com infiltração escleral.
DISCUSSÃO:
Tumores de origem melanocítica representam a mais comum neoplasia ocular primária em cães e
ocorrem nesta espécie mais frequentemente que em qualquer outra espécie doméstica. Podem ser
provenientes da íris, corpo ciliar ou coróide, sendo os melanomas que afetam a coróide geralmente
relatados como alterações secundárias à extensão da neoplasia proveniente da úvea anterior, pois
a afecção primária é extremamente rara e pouco descrita. Se apresentam na sua maioria em cães
mais velhos, a partir de 8 anos, e não há uma predisposição racial bem definida. Segundo o que tem
sido relatado, o Beagle parece estar sob maior risco quanto ao melanoma de coróide, e raças
altamente pigmentadas como o Pastor Alemão e o Boxer, possuem maior incidência de melanomas
provenientes da úvea anterior, embora um estudo tenha demonstrado esta correlação hereditária
em uma família de cães labradores, mas baseava-se apenas no exame clínico.
O melanoma primário de coróide em cães se apresenta por 5% da frequência do de úvea anterior.
Geralmente é diagnosticado após causar alterações como uveíte não responsiva, hifema, opacidade
corneana, endoftalmite por necrose tumoral, massa tumoral visível e glaucoma secundário por
obstrução do ângulo de drenagem iridocorneano ou através da membrana fibrovascular préirídiana. Pela massa tumoral possuir uma forma cônica ou semi-cônica característica no segmento
posterior e muitas vezes invadindo a câmara vítrea, ainda podem ocorrer hemorragia intraocular,
descolamento de retina, infiltração para o nervo óptico e consequentemente cegueira.
A classificação dos melanomas oculares deve ser simples para o seu melhor entendimento e para
isto podem ser utilizadas apenas duas categorias: Melanoma maligno e benigno. Tem sido utilizado
o termo melanocitoma, para descrever o melanoma uveal ou limbal benigno, pela sugestão de
malignidade do termo melanoma propriamente dito. Todos os melanomas uveais caninos, benignos
ou malignos, que afetam principalmente o corpo ciliar e a coróide, possuem um grande potencial
de malignidade, por serem altamente invasivos. Causam um dano extenso em estruturas oculares
adjacentes, como invasão de esclera e órbita, elevando a partir de então, as chances de ocorrerem
metástases. Apesar de tal proliferação ocorrer por via hematógena, o potencial metastático de
melanomas benignos (4% em cães) e consequentemente as taxas de mortalidade, neste caso, são
baixas, levando a uma baixa frequência metastática. Adicionalmente, a maioria dos melanomas de
íris, corpo ciliar e até mesmo os de coróide é benigna (melanocitomas), ao contrário do melanoma
difuso de íris dos felinos e do melanoma da cavidade oral, neoplasias extremamente malignas e
com altas taxas de metástases. Em um estudo retrospectivo, de 244 casos de tumores oculares
melanocíticos, 56 eram melanomas malignos (23%) e 188 eram melanomas benignos (77%) sendo
que a maioria derivou do trato uveal anterior, para ambos os tipos (95% e 75% respectivamente).
Análises de sobrevivência destes animais demonstraram diferenças significativas entre grupos
controle e indivíduos contendo melanoma maligno, diferenças estas apenas sugestivas quando
comparados aos melanomas benignos. A pigmentação entre os melanomas é variável e formas
amelanóticas podem ocorrer. Este tipo de tumor possui um comportamento extremamente
maligno, geralmente causando lesões metastáticas diversas e em sítios variados. A propedêutica
principal para o diagnóstico de neoplasia intraocular é a oftalmoscopia indireta e a ultrassonografia,
sendo esta última de grande valia em casos onde há opacidade ocular que impossibilite a
oftalmoscopia, além de proporcionar o exame de estruturas extraoculares ou retrobulbares. O
diagnóstico diferencial inclui proliferações não tumorais, cistos, alterações granulomatosas,
metástases de neoplasias extraoculares e prolapso de íris. Tumores melanocíticos da coróide em
cães se apresentam com características comuns aos “nevus coroidais” e melanomas em seres
humanos. Os sítios de predileção tumoral variam entre homens e animais. No ser humano, o
melanoma primário coroidal, além de possuir um potencial metastático alto em relação ao de úvea
anterior, é o tumor intraocular mais comum, embora também seja uma neoplasia rara; ocorre com
maior frequência, quando comparado ao dos animais domésticos, que possuem uma incidência
maior deste tumor afetando a íris e o corpo ciliar. Na medicina humana, recentemente, tem sido
reconhecidas calcificações esclero-coroidais caracterizadas por típicas lesões branco-amareladas no
fundo de olho, geralmente bilaterais, simulando melanomas coroidais ou metástases tumorais. Esta
condição pode estar associada a alterações hipercalcêmicas como hiperparatiroidismo ou
pseudohipoparatiroidismo.
Foto 1: Bulbo ocular buftálmico apresentando edema difuso de córnea, hiperemia conjuntivoescleral, flare +++ e presença de vascularização corneana peri-limbal (“Ring Type”) .
Foto 2: Presença de melanócitos poligonais de núcleo proeminente e abundante pigmentação
melânica indicando malignidade. Coloração H & E. x 100.
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