Breves considerações sobre validação de escritura pública

Transcrição

Breves considerações sobre validação de escritura pública
BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE VALIDAÇÃO DE ESCRITURA PÚBLICA DECLARADA
INCOMPLETA POR FALTA DE ASSINATURA
Entende-se por escritura pública a interpretação formal ou instrumental de ato ou
negocio jurídico, feita por notário público, a pedido das partes interessadas, em
consonância com os preceitos legais1.
Escritura pública – por trata-se de ato solene – deve conter os requisitos obrigatórios,
para então ventilar seus efeitos no mundo jurídico.
Dentre os requisitos necessários, está à obrigatoriedade de colher as assinaturas das
partes presentes ao ato, conforme determina o inciso VII, § 1º, art. 215, do Código Civil
Brasileiro, que dispõe in verbis:
Art. 215. A escritura pública, lavrada em notas de tabelião, é documento dotado de fé
pública, fazendo prova plena.
§ 1º Salvo quando exigidos por lei outros requisitos, a escritura pública deve conter:
(...)
VII - assinatura das partes e dos demais comparecentes, bem como a
do tabelião ou seu substituto legal, encerrando o ato. (Itálico nosso).
(...)
Como se extrai da interpretação lógica deste inciso consoante com o seu caput e
parágrafo, as assinaturas das partes comparecentes ao ato notarial é requisito solene
exigido por lei, que simboliza o consentimento emitido, ou seja, é a manifestação de
vontade livre de qualquer coação, induzimento ou constrangimento.
Paulo Roberto G. Ferreira2, Tabelião de Notas, leciona que:
“Não se admite ato notarial sem consentimento, salvo a exceção feita
à ata notarial3”.
Na eventual falta de assinatura de uma das partes envolvidas no ato notarial, as
Normas de Serviço Extrajudicial da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de São
Paulo, precisamente no item 26.1, prevê que:
“Na ausência de assinatura de uma das partes, o tabelião declarará
incompleta a escritura, consignando as assinaturas faltantes; pelo ato
serão devidos emolumentos e custas, ficando proibido o fornecimento
de certidão ou traslado sem ordem judicial” (Itálico nosso).
Dessa forma, confirmada a vontade de uma das partes em não celebrar a escritura, o
ato torna-se incompleto por força normativa, cuja eficácia fica suspensa no plano da
teoria do fato jurídico, não tendo os seus efeitos ventilados no mundo jurídico.
Aliás, para nós, esse ato notarial não é anulável nem nulo, uma vez que não preteriu
solenidade que a lei considera essencial para a sua validade, consoante estabelece o
art. 166, V, do Código Civil Pátrio, isto é, para ser nulo, o instrumento público teria que
transitar incompleto no trafego jurídico.
Ademais, haveria nulidade do ato notarial, se p. ex., houvesse à ausência de advogado
na ocasião da lavratura da escritura pública de divórcio ou não sendo ela lida perante
as partes, a teor do art. 166, inc. V do Código Civil.
Vale notar, que o ato notarial nulo não é possível de convalidação, cf. prevê o art. 169
do Código Civil, o qual merece transcrição:
“Art. 169. O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação,
nem convalesce pelo decurso do tempo”. (Itálico nosso).
Feita estas considerações, a falta de assinatura de uma das partes na escritura pública
por si só torna o ato notarial incompleto, exceto se do próprio ato consignar tal
exigência.
Visualizando um caso concreto, a parte vendedora assina a escritura e a parte
compradora se recusa a assinar por motivos alheios ao negócio celebrado. Meses
depois a parte compradora manifesta a vontade de convalidar o ato declarado
incompleto por falta de sua assinatura. Pergunta-se: é possível a lavratura de uma
nova escritura de ratificação do negócio pendente de aperfeiçoamento?
A resposta não é das mais fáceis, não obstante as normas de serviço paulista nada
mencionar a respeito, cremos pela possibilidade da ratificação de escritura pública
declarara incompleta, desde que a assinatura faltante seja da parte compradora e a
parte vendedora tenha assinado a escritura dando quitação do preço; ou se a
assinatura faltante for do vendedor, este assinará a escritura de ratificação, inclusive
dando quitação do preço.
Se a parte compradora ou vendedora – de livre e espontânea vontade – deseja validar
o ato notarial declarado incompleto, não percebemos vedação nesse sentido.
Corrobora o nosso entendimento, alguns itens do Código de Normas da CorregedoriaGeral da Justiça do Estado do Paraná, que prevêem expressamente a possibilidade de
validação do ato declarado incompleto:
11.2.9.4 - Em casos excepcionais a escritura anteriormente declarada
incompleta poderá ser ratificada, desde que a assinatura faltante seja
da parte compradora e a parte vendedora tenha assinado a escritura
dando quitação do preço.
11.2.9.5 - Para a convalidação da escritura o notário deverá lavrar
escritura de ratificação, aproveitando o ato praticado, sendo que a
parte que não compareceu na data designada para assinatura deverá
assumir a responsabilidade civil e criminal pelas declarações inseridas
na nova escritura.
11.2.9.6 - Havendo qualquer dúvida ou não podendo entrar em
contato com a parte vendedora, o notário deverá abster-se de lavrar a
escritura de ratificação, sob pena de responsabilidade.
11.2.9.7 - O notário deverá anotar a lavratura da escritura de
ratificação junto à escritura anteriormente declarada incompleta,
revalidando o ato. (Itálico nosso).
Outra questão não menos tormentosa, trata-se do princípio da unicidade do ato
notarial. Por ele, ato deve conter uma unicidade de contexto, tempo e lugar4. A nosso
ver, tal princípio – no presente caso – dever ser aplicado de forma mitigada por suas
peculiaridades, uma vez que os elementos formadores do ato foram observados no
ato declarado incompleto, sendo o mesmo aperfeiçoado com a subscrição da
assinatura (leia-se consentimento) na escritura validadora.
Sem mais delongas, para concluirmos, algumas cautelas devem ser tomadas:
i) o tabelião que declarou incompleto o ato notarial originário deve
lavrar a nova escritura de validação, em razão de obter elementos que
balizem o novo ato notarial; bem como proceder a devida anotação à
margem do ato originário das informações da escritura de validação
do negócio;
ii) o notário deve individualizar e especificar a assinatura faltante.
iii) o tabelião não poderá alterar as cláusulas da escritura originária;
iv) o ato notarial tornado sem efeito não é passível de convalidação ou
ratificação;
v) no registro, a parte interessada, deve apresentar as duas escrituras
(a originária e a ratificadora), ocasião em que o Registrador Imobiliário
analisará os atos notariais, em especial, o motivo que levou o tabelião
a declará-la incompleta. Convicto do aperfeiçoamento e demais
elementos da escritura, o Oficial registrará as escrituras num só
registro.
Referências:
MARTINS, Cláudio. Teoria e Prática dos Atos Notariais. Rio de Janeiro: Forense, 1979.
2
FERREIRA, Paulo Roberto Gaiger Ferreira em co-autoria com Francisco José Cahali,
Antonio Herance Filho e Karin Regina Rick Rosa. Escrituras Públicas - Separação,
Divórcio, inventário e Partilha Consensuais. São Paulo: RT, 2007.
3
Na recusa imotivada do solicitante em assinar a ata notarial, o tabelião portará por fé
tal circunstância e subscreverá o ato, perfectibilizando-o, já que tal falece de outorga.
4
Idem.
1

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