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TDTOnline Magazine tdton TDTOnline Magazine tdtonline.org Sumário Editorial Dádiva altruísta ou de plástico? – Artigo de Opinião Higienista Oral – Saiba mais! Casos Clínicos do Radiology Picture of the Day |3 4| 2009 o cabo das tormentas – Artigo de Opinião 6| Esclerose Tuberosa: Revisão Clínica, Abordagem Neurofisiológica e Referenciação para Cirurgia da Epilepsia 31 | Fisioterapia e Terapia de Ondas de Choque extra-corporal |5 | 27 | 37 40 | Normas para a publicação de artigos científicos na TDTOnline Magazine TDTOnline Magazine Fundador: Fernando Leite Design e Redacção: Henrique Pimenta Administração: Marlene Brandão e Carolina Gasiba Colaboração Geral: Sílvia Silva e Vítor Paiva Responsável de Conteúdo: Susana Monteiro Colaboração por área profissional: Anatomia Patológica: Marta Ribeiro, Nuno Silva Neurofisiologia: Daniel F. Borges, Joana Ribeiro Dietética: Cecília Santos Ortoprotesia: Ana Vinagre, Cátia Frade Farmácia: Nuno Marques, David Estêvão Ortóptica: Luís Martins, Andreia Guerreiro Higiene Oral: Ricardo Pingo Terapia Ocupacional: Juliana, Diana Todos os artigos publicados na TDTOnline Magazine são da total e exclusiva responsabilidade dos seus autores. É interdita a reprodução total ou parcial do conteúdo da TDTOnline Magazine. Contacto Tecnologias da Saúde Online: [email protected] Contacto TDTOnline Magazine: [email protected] 2 TDTOnline Magazine tdtonline.org Editorial Caros Leitores e Utilizadores do TDT Online, Antes de mais, um feliz ano de 2009 a todos que aqui nos “espreitam”! Numa época em que cada vez mais nos enchemos de pessimismos e começamos a ter uma visão que apenas filtra os acontecimentos menos bons, achei por bem reanimar esta nossa consciência adormecida de valorização pessoal com alguns acontecimentos de 2008 que só nos podem encher de orgulho e deixar-nos ainda com mais força para chegarmos mais longe, nesta luta contínua pela valorização das nossas carreiras. Neste pequeno flashback a 2008 poderemos realçar o dia em que o nosso Portal sofreu um “extreme make-over”. A navegação pelo portal tornou-se assim mais simples, convidativa e agradável para todos os nossos caros utilizadores graças ao nosso incansável Webmaster. Também será importante realçar que o crescimento dos utilizadores que visitaram o nosso fórum foi exponencial, assim como o número de mensagens colocadas. O fórum TDT Online foi e continuará a ser um instrumento de excelência a dar voz à nossa comunidade. A criação da TDT Online Magazine também foi um marco importantíssimo de 2008. Todo este projecto da Magazine não teria sido possível sem os esforços aliados da nossa equipa de colaboração e da enorme contribuição dos nossos caríssimos utilizadores com artigos de elevado nível de interesse. Acreditamos, assim, incentivar a troca de conhecimentos, com artigos que abrangem as diversas áreas que constituem este pequeno universo das tecnologias da saúde, enriquecendo assim toda a nossa classe. Para 2009 temos a certeza que iremos continuar a ser “presenteados” com a vontade de colaboração de mais utilizadores nesta Magazine que é de todos nós. Foi também no ano velhinho de 2008 que vencemos esta luta denominada de “Bolonha”. Finalmente foi aprovado o plano curricular de quatro anos às licenciaturas de tecnologias da saúde, mostrando mais uma vez que quando “queremos… conseguimos!”. Para este recém-nascido ano já estamos de mangas arregaçadas e cheios de garra para chegarmos ainda mais além. A luta continua e como tal continuamos com a ponta da espada apontada ao exercício inqualificado das nossas profissões, ao número de desempregados, à subvalorização das nossas carreiras entre outros problemas que infelizmente se transpuseram para este ano novo. Mas o meu apelo para este novo ano pode-se traduzir como “Novo ano...Nova mentalidade”. Uma mentalidade mais positiva, mais entusiasta, e inovadora. Deixemos o desânimo e as lamúrias nas gavetas do armário de 2008. Quanto à primeira edição da TDT Online Magazine de 2009, começamos com dois artigos de opinião com a discussão de temas polémicos da actualidade, apostamos também na diversificação do conteúdo científico da Magazine, desta vez com a contribuição das áreas de Neurofisiologia, Higiene Oral e Fisioterapia, destaque também para o I Encontro de Terapia da Fala e Educação e o despacho referente ao Manual de boas práticas laboratoriais em Anatomia Patológica, e para terminar a apresentação de três casos clínicos do Radiology picture of the day. Boas Leituras, Susana Monteiro 3 TDTOnline Magazine tdtonline.org Ao raio-X – Artigo de Opinião Fernando Leite, 2009 2009 o tormentas cabo das Após a época natalícia, e diga-se que cada vez menos se sente o “Natal”, e a passagem de mais um ano, onde alguns audazes continuam a cometer a proeza de começar o ano com um mergulho “caloroso” no gélido oceano atlântico que banha Portugal, eis que a tripulação do beira-a-mar plantado se prepara para dobrar o “cabo das tormentas”. Foi esta a expressão que o Sr. Primeiroministro utilizou para metaforizar o péssimo ano de 2009 que vamos ter. Eu confesso que não posso deixar de achar piada a este tipo de previsão desastrosa porque não temos tido nada diferente de alguns anos para cá. Em 2005 diziase que 2006 ia ser mau, depois em 2006 que 2007 iria ser o fundo do poço e em 2007 a lengalenga repetiu-se para 2008. O ano avizinha-se quentinho, pois teremos 3 eleições, as autárquicas, as legislativas e as europeias. Começando pelas últimas óbvio que já existe vencedor anunciado à partida, a abstenção, pois os portugueses lá querem saber se é fulano ou sicrano que vai para o parlamento europeu defender os seus direitos (quais?) e os da nação. A ida às urnas será meramente para os mais fiéis ao direito e dever de cidadania e se forem marcadas para o verão, acho que mesmo os mais resistentes não irão querer perder uma bela tarde de sol na praia mais perto. As autárquicas irão ter mais interesse sem dúvida. Já estou a antecipar alguns personagens mais caricatos como a Dra. Fátima Felgueiras, o Dr. Isaltino Morais e o grande figurino das eleições, o irresistível Major Valentim Loureiro, a mandarem as suas postas de pescada do costume e ainda a defenderem-se das acusações que por todos pairam, mas que eles lá vão ludibriando o Zé-povinho, com ofertas generosas de arcas frigoríficas e televisões. Por fim temos as legislativas, e nestas confesso, tenho uma grande curiosidade para ver o que vai acontecer. Segundo as últimas sondagens o PS ganha as eleições perdendo a maioria absoluta, o PSD sobre ligeiramente mas fica muito aquém do PS e os outros dois partidos da esquerda ganham mais deputados. O CDS passa a ser a força política com menos força na assembleia. Até aqui nada de extraordinário mas a grande pergunta que se irá fazer é se Portugal irá ser governável quando o Eng. Sócrates tiver que se coligar com alguém. Até agora o Primeiro Ministro mostrou ser muito firme (ele rejeita o adjectivo arrogante) com os lideres da oposição mas como será quando tiver de ouvir o que os outros têm para dizer? Mas não só de política será este um ano interessante. Pergunto-me como estarão os preços da gasolina e gasóleo em Dezembro de 2009 e que valor terá a taxa Euribor na mesma altura do ano. Seja como for a melhor maneira de encarar a crise em 2009 é continuar a viver o dia-a-dia e não pensar muito no assunto, porque não tenham dúvidas e já em jeito de antecipação prevejo que no fim de 2009, os nossos políticos irão dizer que em 2010 é que vai ser terrível. Nada de novo portanto… ■ Veja toda a informação sobre as III Jornadas de Radiologia da ESTSP Clique aqui. 4 TDTOnline Magazine tdtonline.org Artigo de Opinião Liliana Silva, 2009 Dádiva altruísta ou de plástico? Já que acabámos de sair da época tradicionalmente solidária resolvi falar do verdadeiro significado da palavra solidariedade, isto se ainda fizer sentido a existência desta palavra. Se, rapidamente, consultarmos um dicionário aparece-nos algo parecido com “sentimento de partilha do sofrimento alheio, sentimento que leva a prestar auxílio a alguém, adesão ou apoio a uma causa, a um movimento ou a um princípio”. Tudo isto é muito bonito, mas será a solidariedade, hoje em dia, vista como um meio de ajudar, realmente, alguém? São imensas as campanhas que os meios de comunicação social fazem nesta altura do ano, com recurso à mais recente moda dos telefonemas para o 760 qualquer coisa (e às quais eu própria já aderi) em que o dinheiro reverte para a instituição x ou y. São imensos os concursos de televisão e galas inventadas para esta altura do ano que convidam figuras supostamente públicas para angariarem dinheiro para instituições a seu gosto. São imensas as campanhas realizadas pelos grandes grupos de empresas, como a Missão Sorriso e a Causa Maior, entre outras. São imensas também as campanhas realizadas mais localmente, por empresas das várias regiões com a pretensão de ajudar as pessoas necessitadas da região. Tudo isto é muito bom, porque permite que os reais necessitados sejam ajudados (pelo menos assim quero acreditar) e permite que as pessoas como nós possamos ajudar com o pouco que podemos e possamos conhecer certas instituições das quais falam e que nos eram desconhecidas. Mas será só este o objectivo das tais empresas? Não quererão eles apenas uma bela e barata publicidade? E todos aqueles convidados que aparecem na TV com aquelas frases feitas das quais todos nós estamos mais que fartos? A publicidade a eles, e isto a meu ver, também é capaz de lhes ser benéfica, não acham? Não será tudo isto – e podendo até querer ajudar, porque somos portugueses e segundo o povo diz o povo português até é muito solidário – uma relação de interesses? É que fica sempre muito bem fazer de solidário. Outra coisa que me faz uma certa impressão é este aparato todo se fazer sentir apenas, e apenas mesmo, nesta altura do ano. O Natal não é senão uma festa de aniversário, certo? Ora se há pessoas a celebrar os seus aniversários todos os dias, porque não inventar campanhas para todos os dias? Porque as pessoas que realmente precisam destas ajudas vivem com dificuldades durante todo o ano. Os verdadeiros necessitados comem, vestem-se, estudam, trabalham (nem que seja à procura de trabalho), educam, etc., todos os dias do ano. Os voluntários das tais instituições precisam de condições para trabalhar todos os dias do ano. As casas que estão a cair, e cujas janelas deixam entrar frio, estão a cair e com janelas a deixar entrar o frio todos os dias do ano. Os sem abrigo são sem abrigo todos os dias do ano. Dizem que é por estarmos mais sensíveis nesta altura. Não será antes falta de sensibilidade nos restantes meses? E para não ir mais longe, proponho-vos um desafio, ou vários. Pensem na quantidade de pessoas com quem trocamos presentes, SMS, emails, postais de Natal ou até telefonemas nesta altura e com as quais não nos relacionamos nos outros 11 meses do ano. Pensem na quantidade de pessoas que vos compram presentes ou a quem vocês compram presentes só porque parece bem fazê-lo ou parece mal não o fazer. Pensem na quantidade de pessoas a quem desejam ou vos deseja um bom Natal por mero cliché. Pensem na quantidade de pessoas que vos sorri só porque é Natal, mas que é capaz de passar por vocês na rua noutra ocasião qualquer e virar a cara. Já se lembraram de alguém? Aposto que sim. Eu cá já me lembrei de uns quantos. Esta pode ser uma época em que a solidariedade esteja ao rubro, mas não menos activa está a hipocrisia. Onde é que deixámos o verdadeiro espírito natalício? O que é que fizemos àquela alegria que sentíamos por estar uns com os outros sem esperar por mais nada em troca, sem aquele desdém do “eu dei-lhe mais a ele que ele a mim”? O que é que fizemos ao amor e ao carinho que distribuíamos nesta e noutras alturas e que eram as verdadeiras prendas com que presenteávamos os nossos entes mais queridos? Resta-me a esperança de que os nossos corações possam ser iluminados antes que seja tarde de mais e que possamos usar a nossa consciência humana para nos libertar destes sentimentos negativos de vez, para que não seja necessário disfarçá-los em Dezembro. É este o meu desejo para todos os dias de todos os meses de todos os anos das nossas vidas e das outras que hão-de vir.■ 5 TDTOnline Magazine tdtonline.org Esclerose Tuberosa: Revisão Clínica, Abordagem Neurofisiológica e Referenciação para Cirurgia da Epilepsia Daniel F. Borges, Eulália Calado, Ana Isabel Dias, Ana Moreira, José Pedro Vieira, Alberto J.R. Leal, 2009 Resumo: A Esclerose Tuberosa é uma síndrome neurocutânea ou facomatose autossómica dominante de proliferação e diferenciação celular, com displasias e hamartomas multissistémicos, afectando frequentemente cérebro, pele, coração, olhos e rins. O envolvimento frequente do sistema nervoso central leva a que esta doença se manifeste por epilepsia na quase totalidade dos casos, sendo frequente a presença de crises convulsivas focais e/ou generalizadas no primeiro ano de vida, muitas vezes refractárias ao tratamento farmacológico. A neurofisiologia desempenha um papel importante na avaliação para cirurgia da epilepsia. O estudo neurofisiológico, como parte integrante de um processo multidisciplinar de avaliação desta patologia, apresenta-se como indispensável para indicar qual das múltiplas lesões cerebrais origina as crises epilépticas e assim orientar a intervenção cirúrgica. Uma cirurgia bem sucedida implica fundamentalmente no controlo das crises, e por conseguinte na prevenção da deterioração do funcionamento cognitivo, com francas melhorias no comportamento e socialização, culminando em uma melhor qualidade de vida. Introdução e Caracterização Genética A Esclerose Tuberosa (ET) foi descrita no século XIX pela primeira vez, por autores que se basearam em achados clínicos e patológicos. O atlas de Rayer de 1835 ilustra as “vegetações vasculares faciais” características da patologia, mas é Pringle que intitula as mesmas de “adenoma sebaceum”, e associa aos sintomas o défice cognitivo (Pringle JJ, 1890). Em 1862, Von Recklinghausen associa à patologia o envolvimento cerebral conseguindo, através da realização de uma autópsia a um recém-nascido, descobrir lesões de esclerose cerebral juntamente com miomas cardíacos. Apesar destes achados, a descrição da patologia cerebral e dos sinais neurológicos são da autoria do médico francês Désiré Maglorie Bourneville, que propôs inicialmente a designação de “sclérose tubéreuse des circonvolutions cérébrales”, para caracterizar as extensas lesões que encontrou nas circunvoluções corticais de dois pacientes epilépticos falecidos. Nos mesmos doentes, Bourneville encontrou massas anómalas nos rins (Bourneville DM, 1880; Bourneville DM, 1881). A associação entre lesões cerebrais, renais, cardíacas e dermatológicas foi pela primeira vez identificada pela primeira vez em 1905, levando à tríade de diagnóstico clínico: epilepsia, défice cognitivo e adenomas sebáceos, frequentemente designada após Vogt. Van der Hoeve, que caracterizou hamartomas da retina, introduziu o nome de facomatose (phakomatosis – onde phako significa ‘mancha’, incluindo ET e Neurofibromatose. Após as primeiras descrições de calcificações radiológicas, o aparecimento da tomografia computorizada (TC) e da ressonância magnética (RMN) optimizou todo o processo diagnóstico. Gomez, o ‘‘padrinho” da investigação em esclerose tuberosa, publicou pela primeira vez o espectro clínico e subclínico completo da doença em 1979 (Gomez MR, 1999). A ET é uma doença neurocutânea, de transmissão autossómica dominante com penetrância variável e elevada taxa de mutabilidade (Kandt RS et al., 1993; Van Slechtenhorst M et al., 1997). É a segunda facomatose mais comum depois da Neurofibromatose tipo 1. Tem uma expressão fenotípica variável, caracterizada fundamentalmente pelo crescimento de múltiplos hamartomas em vários órgãos, incluindo os rins (Neumann et al., 1998), pulmões (Vicente et al., 2004), coração (Jozwiak et al., 2005), pele (Roach e Sparagana, 2004) e sistema nervoso central (Gomez MR, 1999). A ET surge em todas as raças, atingindo ambos os sexos. O’Callaghan FJK et al., em 1998, estimaram uma prevalência global na população de cerca de 7 a 12 casos por 100,000, sendo que mais de metade dos casos estariam não diagnosticados. Esta estimativa é significativamente superior àquela encontrada em estudos mais antigos, quando se pensava que esta doença era extremamente rara. A prevalência ao longo do tempo tem aumentado gradualmente de 1:150.000 em 1956, 1:100.000 em 1968; 1:70.000 em 1971; a 1:34.200 em 1984 até aos números mais recentes de 1:12.500 em 1998 (in Curatolo P, 2003). Em cerca de 80% dos casos de ET a mutação genética responsável pela doença é espontânea, sendo que os restantes 20% se devem a uma transmissão hereditária autossómica dominante (Dabora et al., 2001; Au KS et al., 2004). Em condições normais, a hamartina, codificada pelo braço longo do cromossoma 9q34, e a tuberina, codificada pelo braço curto do cromossoma 16p13.3, agem como proteínas 6 TDTOnline Magazine tdtonline.org de supressão tumoral. Na ET, mutação do cromossoma 9q34 (TSC1) e cromossoma 16p13.3 (TSC2) inactiva estas proteínas dando origem à diferenciação celular anómala (Kwiatkowski and Manning, 2005; Jozwiak, 1997; European Chromosome 16 Tuberous Sclerosis Consortium, 1993; Van Slegtenhorst M et al., 1997; Henske EP, 2005). Ambas as proteínas formam um complexo intracelular (designado por complexo esclerose tuberosa - TSC), responsável pela identificação de uma grande variedade de sinais extra e intracelulares, como por exemplo, a estimulação de factores de crescimento (actuando via proteínas quinases), hipóxia via transcrição de proteína 4 indutora de alteração de DNA (REDD-1); e níveis energéticos através da proteína quinase 5’-AMPactivada. A rapamicina, fármaco imunossupressor usado para evitar reacções de rejeição em transplantação de orgãos (principalmente rins), tem demonstrado resultados promissores em doentes com ET (ensaios clínicos de fase III têm relacionado o uso da droga com a remissão de astrocitomas subependimários de células gigantes, embora com recidiva após suspensão). O alvo da rapamicina nos mamíferos – mTOR – é uma proteína serina-treonina quinase que regula o crescimento, proliferação, motilidade e sobrevivência celular, bem como a síntese proteica e transcrição. É fundamentalmente um sensor de disponibilidade de aminoácidos intracelular através de um mecanismo que usa fosfatidilinositol 3quinase (PI3K). O complexo TSC possui propriedades activadoras de GTPase para uma pequena proteína G, homóloga de Ras encontrada no cérebro - Rheb, que activa directamente o mTOR (Zhang Y et al., 2003). Quando um dos genes sofre mutação, o complexo TSC não funciona normalmente, o que leva a uma upregulation de mTOR. Esta quinase, por sua vez, fosforiliza o factor eucariótico de iniciação de translação – proteína 1 4E-binding (4E-BP1), proteína beta-1 quinase S6 ribossómica (S6K1) e o factor 2 de iniciação de translação eucariótica, proteínas envolvidas na biogénese e recrutamento de ribossomas bem como a fase inicial da translação (Jozwiak J et al., 2005). As células desencadeiam a translação de proteínas, incluindo aquelas responsáveis pela progressão do ciclo celular (por exemplo, ciclina D1 ou descarboxilase da ornitina). Um mecanismo alternativo desta regulação do ciclo celular pelo complexo TSC pode ser explicado pela capacidade da tuberina em se ligar ao inibidor 1B quinase dependente da ciclina (p27Kip1), protegendo dessa forma da degradação (Rosner M et al. 2004). A perda do complexo TSC leva à formação de hamartomas (tumores benignos constituídos por uma mescla de elementos tecidulares) ou neoplasias mais agressivas. Figura 1 - Regulação do complexo TSC controlando a actividade do alvo da rapamicina nos mamíferos - mTOR (Jozwiak J.,2008) Manifestações Cutâneas Existe uma grande variedade de manifestações cutâneas características de ET, presentes na quase totalidade dos pacientes com esta doença (Jozwiak S et al., 1997; Sun XF et al., 2005). Angiofibromas faciais Os adenomas sebáceos manifestam-se em cerca de 42 a 90% dos doentes de ET (Butterworth T et al., 1941; Hori K et al., 2006; Weiner DM et al., 1998). A lesão é um harmartoma composto por elementos vasculares e conjuntivos desprovidos de glândulas sebáceas designandose, por isso, mais correctamente por angiofibroma. Os angiofibromas são caracterizados por hipertrofia da pele, aumento do volume e número de vasos sanguíneos, diminuição do número de fibras elásticas, atrofia das glândulas sebáceas, e proliferação de fibras de colagénio (Hori K et al., 2006). Ocorrem normalmente na região malar, embora possam estender-se a outras partes da face. Máculas hipomelanóticas / Lesões “ash-leaf" Estas manchas têm usualmente uma dimensão entre 1 a 3 cm de diâmetro, e localizam-se preferencialmente no tronco e região glútea, podendo ser facilmente identificadas quando expostas ao espectro luminoso de uma lâmpada de Wood (Lendvay TS e Marshall FF, 2003; Quigg M et al., 2005). Estão presentes em cerca de 90% dos pacientes antes dos 2 anos de idade (Jozwiak S et al., 1997). Estas máculas não são específicas desta patologia, ainda que um elevado número destas sugira fortemente o diagnóstico de esclerose tuberosa. Tornam-se menos óbvias com a idade, chegando mesmo a desaparecer (Lendvay TS e Marshall FF, 2003). 7 tdtonline.org Figura 2 - Mácula hipopigmentada (mancha de Fitzpatrick) (Schwartz RA et al., 2007) Shagreen patch Estas lesões são geralmente áreas de pele mais densa e pigmentada na zona lombo-sagrada em 50% dos pacientes, constituída por camadas de fibras de colagénio densas e amplas. Tem aspecto de “pele de elefante” ou “casca de laranja”, e a sua dimensão varia de 1 a 10 centímetros de diâmetro (Thappa D et al., 2003). Fibromas peri e subungueais TDTOnline Magazine São também conhecidos por tumores de Koenen, e surgem aproximadamente em 15% dos pacientes com ET (Berlin AL et al., 2002). Os fibromas ungueais aparecem normalmente antes da puberdade, são relativamente frequentes e conferem aos dedos um aspecto incómodo. A análise histológica das lesões denuncia a presença de tecido fibroso com dilatação capilar excessiva (Aste N et al., 2003). Figura 3 - Fibromas ungueais (Hamida FB et al., 2006) Manifestações Renais As manifestações renais na ET ocorrem frequentemente e com gravidade significativa (Ewalt DH et al., 1998; Zimmerhackl LB et al., 1994). Estudos apontam para uma incidência de compromisso renal entre 60 a 75% dos doentes com ET (Cook JA et al., 1996; O’Callaghan FJK et al., 2004). Angiomiolipomas Os angiomiolipomas (AML) identificam-se em 34-80% dos doentes, são mais frequentes em jovens do sexo feminino e na ET tipo TSC2 (Ewalt DH et al., 1998; O’Callaghan FJK et al., 2004). São tumores renais benignos, constituídos por adipócitos, malformações vasculares e pequenas células musculares (Bissler JJ et al., 2004). Estas estruturas podem provocar complicações como hemorragias ou efeitos de massa, que por sua vez provocam desconforto ou dor ao doente e podem comprometer a função renal por compressão das estruturas urinárias e alteração da configuração normal do parênquima renal. Cerca de 25% dos casos complicam-se com a ruptura espontânea do tumor, provocando uma hemorragia retroperitoneal (Bissler JJ et al., 2004). Os AML renais estão também associados ao desenvolvimento de linfangioleiomiomatose pulmonar, uma doença quística que afecta quase exclusivamente indivíduos do sexo feminino (Ryu JH et al., 2006). Quistos renais Os quistos renais são observados em 14 a 32% dos doentes com ET (Cook JA et al., 1996; O’Callaghan FJK et al., 2004), tendo duas formas de apresentação. A mais comum caracteriza-se por pequenas lesões múltiplas singulares, que são histologicamente uniformes e raramente sintomáticas (Ewalt DH et al., 1998). A forma menos comum, é também a mais grave, caracterizando-se por coexistirem com a doença renal policística, que apresenta um mau prognóstico da sobrevivência do rim (Laass MW et al., 2004). Manifestações Oculares Estima-se que 50% dos casos com ET apresentem hamartomas da retina uni ou bilaterais (Gunduz K et al., 1999; Rowley SA et al., 2001). O tumor tem estrutura do tipo fibrosa, sendo composto por focos de distrofia calcificada e vários tipos de células gliais na camada fibrosa do nervo óptico (astrócitos polimórficos, grandes astrócitos gemistocíticos e células de Muller) (Mennel S et al., 2007). Embora a maior parte dos hamartomas sejam assintomáticos ou regridam gradualmente durante a vida, alguns casos excepcionais podem desencadear uma exudação subretiniana ou hemorragia no corpo vítreo (Sahli O et al., 1997; Zimmer-Galler IE e Robertson DM, 1994). Manifestações Cardíacas A ET é frequentemente associada à formação de rabdomiomas cardíacos, que podem resultar num comprometimento hemodinâmico e em perturbações do ritmo cardíaco (taquicardia ectópica atrial, a disfunção do nódulo atrioventricular e pré-excitação ventricular). Estas massas anómalas usualmente desaparecem com o avançar da doença (Bar-Cohen Y et al., 2007). Estes achados são os principais responsáveis pelo aumento do índice de suspeição do diagnóstico pré-natal de ET. 8 TDTOnline Magazine tdtonline.org hipofisária ou por mecanismos gonadotrofinaindependentes. Para além da puberdade precoce, os pacientes com ET podem manifestar outros estados de disfunção hipotalâmica e hipofisária, incluindo diabetes insípida, hiperprolactinemia e excesso ou défice de hormona do crescimento. Já foi também descrito hiperparatiroidismo em alguns destes pacientes (Adhvaryu K et al., 2004). Figura 4 - Ecocardiograma 3D de um feto com 20 semanas de gestação, mostrando massas anómalas – rabdomiomas cardíacos (Bar-Cohen Y et al., 2007) A linfangioleiomiomatose (LAM) e a hiperplasia pneumocística micronodular produzem quistos e patologia nodular, respectivamente, nos pulmões dos pacientes com ET (McCormack F et al., 2002). Existe uma proliferação benigna do músculo liso nos pulmões, e tem como complicações mais comuns a dispneia, hemoptise, pneumotórax e quilotórax (Luna CM et al., 1985). Em imagem radiográfica, os pulmões apresentam um padrão reticular difuso, devido à aparência espongiforme dos mesmos. Manifestações Ósseas Displasia Fibrosa A displasia fibrosa (DF) é uma doença caracterizada pela substituição progressiva de elementos ósseos normais por tecido fibroso, envolvendo o crânio e os ossos faciais. As alterações radiográficas do esqueleto descritas na ET incluem alterações osteoblásticas ou osteoescleróticas na coluna vertebral, e alterações quísticas nas falanges (Neto EL et al., 2003). Existe um caso de ET documentado que apresenta anomalias radiográficas caracterizadas por esclerose e espessamento da asa direita do osso esfenóide e áreas osteoescleróticas no acetábulo esquerdo (Breningstall et al., 1988). Esta alteração esquelética é observada frequentemente em adolescentes e adultos jovens e consiste num défice do desenvolvimento da medula óssea, que é substituída por tecido fibroso e ósseo. Estes achados suportam a presumível associação entre alterações ósseas e a ET e dão ênfase à possibilidade de que a DF possa ser uma das componentes da patologia (Neto EL et al., 2003). Manifestações Hormonais As glândulas endócrinas estão raramente envolvidas nos pacientes com ET. Os adenomas papilares da tiróide, que são incomuns na população geral, estão entre as lesões da tiróide mais comuns encontradas nestes doentes. A ET tem sido associada com um número de anomalias em tecidos endócrinos, sendo a glândula supra-renal a mais afectada. As alterações hormonais em pacientes com ET incluem puberdade precoce, que pode ser devido à activação Manifestações do Sistema Nervoso Central As manifestações neurológicas da ET são a causa mais comum de morbilidade e mortalidade nestes doentes. Estas complicações incluem crises epilépticas, perturbação do desenvolvimento psicomotor, problemas comportamentais e autismo (Rosser T et al., 2006; Wiznitzer M, 2004). As crises epilépticas são o sintoma mais comum da ET. Cerca de 50% apresentam atraso mental, sendo que estas crianças possuem provavelmente uma mutação TSC2 (Prather P, de Vries PJ, 2004; Maria BL et al., 2004). As mutações do TSC, independentes do gene, influenciam os percursores neuronais entre a sétima e a vigésima semana de gestação, resultando numa diferenciação anormal das células e uma desrregulação do controlo das dimensões celulares. Estas células posteriormente migram de uma forma atípica para o córtex, provocando uma disposição errada de um grande número de neurónios (Curatolo P, 2006). As lesões cerebrais mais comuns incluem hamartomas corticais, vulgarmente designados de túberes, nódulos subependimários (NSE), astrocitomas subependimários de células gigantes (ASCG), migração radial da substância branca, microdigenesia, heterotropia da substância cinzenta, esquizencefalia, hemimegalencefalia e displasia cortical transmântica. Túberes Os túberes corticais são lesões patognomónicas da ET e estão localizados predominantemente nas zonas neocorticais, especialmente no córtex frontal e parietal, assim como no giro cingulado anterior (Gomez 1999; Ridler K et al., 2006). Estas lesões consistem em células patológicas com marcadores proteicos tanto neuronais como gliais, sugerindo que as mesmas têm formação numa fase primitiva do desenvolvimento embrionário do sistema nervoso (Barkovich et al., 2005). Podem apresentar-se atipicamente, pelo que quando são solitárias e o paciente não apresenta outros sintomas da patologia, podem ser confundidos com neoplasia cerebral (DiPaolo D e Zimmerman RA, 1994). O diagnóstico destas estruturas é feito radiologicamente (Fig. 5) e verificado por estudo histopatológico, e devido a serem frequentemente associadas epilepsias, devem ser juntamente com o seu 9 TDTOnline Magazine tdtonline.org espaço circundante, examinados em detalhe ao nível da histopatologia e biologia celular. zona cortical ou sub-cortical, com ou sem expansão focal (Menor F et al., 1992). Astrocitoma subependimário de células gigantes Figura 5 - RMN com características de Esclerose Tuberosa. (A) Nódulos sub-ependimários periventriculares (setas). (B e C) Túberes corticais (setas) em T2. (D) Túber cortical em T1 sagital. (Holmes G et al., 2007) As características histopatológicas incluem regiões de córtex com hamartomas e desorganizado com uma morfologia celular anormal, neurónios displásicos, células gigantes, neurónios heterotrópicos, placas dendríticas anormais, projecções axonais anómalas e proliferação irregular de astrocitos (White et al., 2001). É ainda uma incógnita a capacidade dos túberes para se tornarem epileptogéneos ou simplesmente irritativos ao seu espaço circundante. Pelo contrário, alguns autores suportam a ideia de que as crises são despoletadas nas áreas adjacentes de determinados túberes, e que a remoção cirúrgica dos mesmos ostenta um sucesso significativo na redução do número das crises (Cusmai et al., 1990; Bebin et al., 1993; Thiele, 2004; Weiner et al., 2004). São vários os mecanismos exequíveis para o desenvolvimento de crises epilépticas pelos túberes e/ou espaço circundante dos mesmos, embora o principal se deva a um desequilíbrio entre os mecanismos de excitação e inibição neuronal, numa determinada região cortical. Várias características da lesão podem contribuir para a sua propensão para desenvolver crises (White et al., 2001): Alteração da citoarquitectura cortical Proliferação de astrócitos Calcificações Alterações da anatomia vascular Edema Alteração da expressão dos neurotransmissores Proliferação e morte celular Na tomografia computorizada crânio-encefálica (TC-CE) a aparência típica dos túberes é de lesões hipodensas na Uma pequena percentagem dos pacientes com ET desenvolve astrocitomas subependimários de células gigantes. Os ASCG são lesões neoplásicas benignas, cujo principal dano poderá ser provocado pelo respectivo crescimento com um consequente aumento da pressão intracraniana e hidrocefalia por compressão do sistema ventricular (Shepherd ET al., 1991; Ribaupierre S et al., 2007). Localizam-se preferencialmente na parede do ventrículo lateral, próximo do foramen de Monro. Macroscopicamente apresentam nódulos, quistos e calcificações e uma consistência firme (Wiestler et al., 2000). Devido à alta taxa de mortalidade atribuída a estas lesões e ao aumento da dificuldade cirúrgica com o desenvolver da lesão, considera-se que a remoção deve ser efectuada logo que se verifique um crescimento da estrutura (Ribaupierre S et al., 2007). Nódulos subependimários Os NSE são lesões benignas proliferativas que demarcam a superfície dos ventrículos cerebrais. Estas lesões tendem a calcificar e a aumentar o seu tamanho ao longo do tempo (Shepherd ET al., 1991). Tal como os ASCG, não são normalmente epileptogéneos, embora possam interagir com o mecanismo de excitabilidade cortical (Rott et al., 2002). Patofisiologia da Epilepsia A epilepsia é o sintoma e/ou sinal neurológico mais comum na ET. Cerca de 60-90% dos indivíduos diagnosticados com a doença tendem a desenvolver crises epilépticas mais frequentes com o avançar da doença (Webb et al., 1994; Gomez, 1999; Cross, 2005). Os túberes podem ser altamente epileptogénicos, mas existe uma considerável variabilidade nesse grau de epileptogenicidade, permanecendo a dúvida sobre a razão de determinados túberes serem mais activos do que outros. Os mecanismos moleculares precisos da epileptogénese na esclerose tuberosa está ainda pouco entendida, embora já tenham sido documentadas anomalias nas subunidades dos receptores glutamatérgicos excitatórios e inibitórios do GABA em túberes corticais (White R et al., 2001; Connolly M et al., 2006). Mais, em modelos animais (ratos) de ET foram igualmente demonstradas alterações no transporte glutamatérgico nos astrócitos (Wong M et al., 2003). Os túberes corticais formam-se durante o desenvolvimento fetal, representando uma condição dependente da proliferação que se manifesta entre a sétima e a 12ª semana de gestação (Barkovich et al., 2005). O número e a localização de túberes corticais pode ser responsável pela 10 TDTOnline Magazine tdtonline.org variabilidade fenotípica observada em pacientes com ET. Estes localizam-se frequentemente na fronteira entre a substância branca e cinzenta. É possível a coexistência de múltiplos focos epilépticos, dada a possibilidade de um grande número de túberes estar presente. Uma vez que os túberes (ou o córtex perituberal) têm sido considerados os substratos das crises, é necessário perceber pormenorizadamente a histopatologia, biologia celular e patofisiologia destes. De entre outras questões, ainda não está bem explícito se as crises se originam nos ou perto dos túberes, como foi mencionado anteriormente, se a patofisiologia das crises na ET difere de outros síndromes epilépticos e como é que o desenvolvimento de túberes afecta a maturação dos circuitos neuronais. Outra questão por resolver assenta na questão de como é que a mutação genética especificamente leva à formação dos túberes, quais as células originárias e quais os aspectos que determinam a localização e número destes. Com a crescente experiência de cirurgia da epilepsia em indivíduos com ET, compreende-se actualmente que alguns dos túberes podem ser relativamente silenciosos electricamente enquanto outros e córtex adjacente podem ser altamente epileptogénicos (Koh S. et al., 2000). Em algumas séries de cirurgia da epilepsia nesta doença, o grau de epileptogenicidade parece estar correlacionado com o tamanho do túber, mas não é consensual (Cusmai et al., 1990). Curatolo et al. (1991) observaram que a idade de início da epilepsia se correlacionava com a localização e volume dos túberes corticais observados na ressonância magnética, sendo as lesões temporo-occipitais responsáveis por mais complicações do que os túberes do lobo frontal. Numa meta-análise que examinou a correlação entre o número de túberes corticais e a gravidade da epilepsia, Goodman et al. (1997) compararam cinco estudos que mostravam que o número de túberes, identificados por RMN, era superior em indivíduos com epilepsia grave e défice intelectual do que aqueles sem nenhuma destas complicações. Os pacientes com esclerose tuberosa usualmente apresentam mais de um tipo de crises epilépticas: - Crises tónico-clónicas generalizadas - Crises parciais complexas - Crises parciais simples - Abalos mioclónicos As crises desenvolvem-se quase sempre durante o primeiro ano de vida (Gomez 1999; Jozwiak et al., 2000; Thiele, 2004), em forma de espasmos infantis, embora possam na adolescência evoluir para crises parciais complexas, abalos mioclónicos e crises tónico-clónicas generalizadas (AnisyaVasanth AV et al., 2004; Curatolo, 1993). Espasmos infantis Os espasmos infantis são contracções bilaterais, súbitas e breves da musculatura axial. Podem ser sintomáticos, idiopáticos ou provavelmente sintomáticos (criptogénicos). Alguns autores mencionam distinção entre as causas idiopáticas ou provavelmente sintomáticas, sendo as idiopáticas referentes aos pacientes com uma predisposição genética, assim como uma história familiar de epilepsia, crises febris ou padrões de EEG genéticos, e as segundas referentes a pacientes com uma etiologia presumivelmente sustentada, embora não possa ser demonstrada (Dulac et al. 1993; Vigevano et al. 1993). Os casos sintomáticos rondam os 85%, sendo os restantes casos criptogénicos/idiopáticos (Dulac et al. 1993). A recorrência familiar de espasmos infantis é rara, salvo doentes com esclerose tuberosa ou gémeos. Estas contracções podem apresentar-se em flexão, extensão ou de ambas as formas. A apresentação das crises depende da afecção predominante dos músculos extensores ou flexores, e do número e distribuição do grupo de músculos envolvidos (Kellaway et al., 1979). Deste modo, os espasmos podem variar entre contracções da totalidade dos músculos extensores ou flexores, ou os músculos do pescoço ou mesmo os músculos rectos abdominais. Podem também resumir-se a um breve e vertical desvio ocular ou movimentos de nistagmo. Os espasmos mistos são comuns, seguidos dos espasmos flexores e, por último, os espasmos em extensão, embora seja o tipo mais comum de espasmos no síndrome de West cuja tríade diagnóstica é: padrão hipssarítmico no EEG, regressão do desenvolvimento psicomotor e espasmos infantis. Muitas crianças apresentam formas de espasmos múltiplas e muitas vezes, dependentes da posição corporal. Apesar do tipo de espasmo não afectar a etiologia ou o prognóstico da patologia, a simetria deve ser valorizada por servir de contributo para a identificação de algum tipo de lesão cortical. Estes episódios têm propensão para ocorrer ao acordar ou ao adormecer, e tendem a ocorrer em salvas, ou seja, os espasmos ocorrem sucessivamente, com intervalos inferiores a 60 segundos. A sua frequência pode atingir os 100 episódios diários (Hrachovy and Frost 1989). Conhecem-se, entretanto alguns factores que podem desencadear estes episódios, nomeadamente um ruído forte e repentino ou uma estimulação táctil. Embora estes tipos de espasmos sejam os mais frequentes neste contexto, podem ocorrer outros tipos de crises, como crises clónicas e/ou focais (Pachatz et al., 2003). O Gráfico 1 ilustra os resultados de um estudo que relaciona o coeficiente de inteligência (QI) com o número total de túberes identificados por ressonância magnética e a história de espasmos infantis. Verifica-se, nesta figura, que uma história positiva de espasmos infantis é influenciada pelo aumento de número e túberes, e influencia negativamente o coeficiente de inteligência. Por 11 TDTOnline Magazine tdtonline.org outro lado, verifica-se que os pacientes com ausência de história de espasmos infantis possuem uma menor quantidade de túberes corticais, apresentando assim um maior nível de QI (O’Callaghan FJK et al., 2004). na infância e adolescência. Nos adultos as mais descritas são as perturbações de ansiedade e depressivas (Houston MA et al., 1998).O declínio das funções mentais é relativamente lento, embora seja precoce, o que pode possibilitar uma referenciação e observação clínica mais rápida. Tabela I - Dificuldades cognitivas e comportamentais associadas à ET (adaptado de Houston M A et al., 1998) Problemas Cognitivos Problemas do comportamento Autismo, Asperger e outras perturbações autistas Atraso mental Gráfico 1 - Relação entre a história de espasmos infantis na ET, inteligência e número de túberes.(O’Callaghan FJK et al., 2004) Autismo A coexistência de autismo e de ET está bem estabelecida (Curatolo P, 1993; Asato and Hardan, 2004; Bolton PF, 1997;Wiznitzer, 2004). O autismo é uma perturbação genética e heterogénea do neurodesenvolvimento caracterizada por défices de comunicação, interacção social recíproca e padrões restritos e estereotipados de interesses e actividades. Estão presentes características do espectro autista em 25-50% dos indivíduos com ET (Gillberg, 1992; Smalley et al., 1992; Fombonne et al., 1997; Wiznitzer, 2004; Bolton PF, 1997). A causa da associação das duas patologias poderá ser um ‘bloqueio’ da função cerebral devido às crises e à localização dos túberes corticais, e o seu efeito no desenvolvimento cerebral (Bolton PF, 1997). A possibilidade de desenvolver autismo é maior se a criança tem espasmos infantis precoces que são difíceis de controlar. Alguns estudos mostraram uma associação entre a presença de túberes no lobo temporal e perturbação autista (Curatolo P et al. 1993; Bolton PF, 1997). Esta evidência é consistente com a noção de que perturbações electrofisiológicas inicialmente precoces no interior dos lobos temporais têm um efeito causador de danos no desenvolvimento e na estabilização de representações cognitivas chave relacionados com o processamento de informação social, especialmente no que diz respeito ao reconhecimento da expressão facial e aspectos emocionais (Bolton PF, 1997). Alterações Cognitivas e Comportamentais A ET está associada a uma grande variedade de dificuldades cognitivas e comportamentais graves, afectando 40 a 80% dos doentes (Jambaqué I et al., 1991; Osborne and Webb, 1993; O’Callaghan JFK et al., 2004). As perturbações de desenvolvimento, os comportamentos anti-sociais e os comportamentos disruptivos são os sintomas mais usuais Défice de atenção/hiperactividade Dificuldades de aprendizagem Défice de comunicação pessoal Défice de linguagem expressiva e receptiva Défices de execução de tarefas Défices de memória Comportamentos agressivos Negativismo Labilidade emocional Perturbações depressivas Perturbações de ansiedade Perturbações do sono Perturbações psicóticas relacionadas com epilepsia A prevalência de atraso mental na ET é 45 a 70% (Curatolo et al., 1993; Lewis et al., 2004). Tem vindo a ser associado à distribuição dos túberes corticais, início precoce das crises, espasmos infantis, múltiplos tipos de crise e um insuficiente controlo destas (Jambaqué I et al., 1991; Goodman et al., 1997). Estudos anteriores sugeriram uma distribuição segundo um quociente bimodal QI/desenvolvimento na população com ET mas não se comprovou ser suficiente robusto para um modelo teórico (Joinson T et al., 2003). Diagnóstico O diagnóstico da doença é feito clinicamente, e por evidência imagiológica. Raramente podem concorrer para este diagnóstico os testes genéticos e achados histológicos (Holmes G et al, 2007). Tabela II - Critérios de diagnóstico de esclerose tuberosa Diagnóstico Definitivo: Dois critérios major ou um critério major mais dois minor; Diagnóstico Provável: Um critério major mais um critério minor; Diagnóstico Possível: Um critério major ou dois critérios minor (Holmes G et al., 2007) Critérios Major Critérios Minor 1.Túberes Corticais 1. Lesões do esmalte dentário 2. Nódulos Subependimários 2. Pólipos Rectais Hamartomosos 12 TDTOnline Magazine tdtonline.org 3. Astrocitoma Subependimário de Células Gigantes 4. Máculas Hipomelanóticas 7. Lesões da pele tipo “confetti” particularmente frequente em situações onde a descarga tem origem em zonas frontais do córtex. As crises frontais são normalmente caracterizadas por manifestações clínicas bilaterais, correspondendo a uma rápida generalização electrográfica sugestiva de interacções corticais bilaterais (Curatolo P et al., 2003). Menos comummente os espasmos em salvas podem ocorrer sem apresentação de um padrão hipsarrítmico. Este mesmo padrão representa um subtipo de espasmos infantis que geralmente são refractários à medicação anti-epiléptica (Connoly M et al., 2006). 8. Placas Acromáticas da Retina Avaliação de pacientes com epilepsia refractária e esclerose tuberosa para cirurgia da epilepsia 3. Quistos Ósseos 4. Migração Radial da Substância Branca 5. Shagreen Patch 5. Fibromas Gengivais 6. Angiofibromas Faciais 6. Hamartoma não-renal 7. Hamartomas Nodulares Múltiplos da Retina 8. Fibromas Ungueais Não-Traumáticos 9. Rabdomiomas Cardíacos 10. Linfangioleiomiomas 9. Quistos Renais Múltiplos Pulmonares Electroencefalografia Embora as técnicas de imagiológicas e funcionais sejam bastante importantes na abordagem de doentes com ET, a actividade epileptiforme apenas pode ser registada por técnicas neurofisiológicas (Jansen FE et al., 2006). Cerca de 78% dos doentes e ET apresentam anomalias epileptiformes, 10% apresentam actividade lenta e apenas 12% apresentam um padrão EEG normal. Dos 35% de pacientes com ET que apresentam padrão epileptiforme, 35% têm pontas focais, 22% hipsarritmia e 10% anomalias epileptiformes generalizadas (Connoly M et al., 2006).A hipsarritmia é um traçado EEG caótico e desorganizado, com pouca sustentabilidade do ritmo posterior, associado a uma anomalia epileptiforme lenta (ocasionalmente com componente abrupta associada) e multifocal (Connolly M et al., 2006). O EEG interictal anormal comum consiste numa actividade paroxística difusa, de hipervoltada e assíncrona, ondas lentas teta, e actividade delta, com perda do ritmo posterior dominante. O EEG interictal dos espasmos infantis na ET é usualmente caracterizado por hipsarritmia com actividade de pontas contínuas, irregulares, aleatórias, em constante mudança, desorganizadas, de elevada amplitude e actividade de ondas lentas. O EEG ictal tem uma duração com um intervalo de 2 a 106 segundos e caracteriza-se normalmente por um padrão de EEG decremental (O’Callaghan FJK et al., 2004).O início do padrão ictal focal pode variar entre ponta-onda rítmica localizada, ondaslentas delta semi-rítmicas, actividade alfa-delta focal ou ainda descargas de pontas generalizadas (Koh S et al., 2000).Num padrão EEG com uma actividade síncrona de ponta-onda, é difícil reconhecer a origem focal da mesma actividade pela análise visual do traçado. Este fenómeno é A avaliação básica de pacientes com ET e epilepsia contempla monitorização vídeo-EEG, RMN-CE de alta resolução com sequências FLAIR e avaliação neuropsicológica.. A imagiologia cerebral com TC e RMN, mostram eficazmente a localização dos túberes e áreas de calcificação (Cusmai R et al., 1990; Nixon JR et al., 1989; Roach ES et al., 1987; Takanashi J et al., 1995). As imagens de difusão da RMN podem acrescentar mais informações sobre os túberes (Jansen et al., 2003). De referir também que para auxiliar na identificação do túber epileptogénico, foram realizadas diversas investigações com tomografia computorizada de emissão de fotão único (SPECT) corregistado com RMN tomografia de emissão de positrões (PET) interictal com fluorodeoxiglucose (FDG) (Asano et al., 2000; Chugani DC et al., 1998; Jansen et al., 2003; Kagawa K et al., 2005; Lachhwani M et al., 2005; Szelies B et al., 1983). O PET-FDG demonstra uma diminuição do consumo interictal de glucose correspondendo à localização de túberes e áreas de calcificação (Rintahaka et al., 1997; Szelies B et al., 1983). Foi comprovado um aumento da captação de alfa 11-C-metil-Ltriptofano (AMT) nos túberes epileptogénicos na ET (Kagawa K et al., 2005; Asano et al., 2000; Chugani DC et al., 1998). Num estudo recente, o aumento de 1.0 ou superior da captação de AMT foi associado a um melhor resultado na cirurgia (Kagawa K et al., 2005). Se o túber está localizado perto de uma área eloquente do cérebro, pode ser necessário usar estudos funcionais para identificar áreas corticais relacionadas com a linguagem ou função motora, por exemplo, RMN funcional, magnetoencefalografia (MEG), teste de Wada e estimulação cortical. Em alguns pacientes pode eventualmente ser necessária monitorização vídeo-EEG invasiva usando eléctrodos subdurais ou eléctrodos profundos. Nestes pacientes existem informações concordantes de localização da zona epileptogénica (após avaliação pré-cirúrgica), logo uma única cirúrgia para fazer ressecção desta mesma zona tende a ser segura e eficaz. Recentemente têm existido investigações que contemplam uma abordagem cirúrgica em vários passos em pacientes 13 TDTOnline Magazine tdtonline.org com anomalias ictais e interictais multifocais no EEG (Weiner et al., 2004) Cirurgia da Epilepsia Um dos mais complicados problemas neurocirúrgicos nas crianças com ET é o aumento de volume dos ASCG. Estes tumores, que surgem ao nível do forame de Monro, apresentam-se tipicamente com hidrocefalia obstrutiva, não causando crises epilépticas. Estes ASCG são tratados cirurgicamente com a remoção da lesão. As opções cirúrgicas para epilepsias refractárias em pacientes com ET incluem a lesionectomia, calosotomia e implantação de estimulador do nervo vago (Avellino et al., 1997; Bebin EM et al., 1993; Guerreiro MM et al., 1998; Koh S et al., 2000; Ohtsuka et al., 1998). Dado que a actividade epiléptica quase sempre se origina em um ou mais túberes corticais, a ideia do tratamento cirúrgico, e aquele com maior probabilidade de controlo das crises, é a ressecção do(s) túber(es) epileptogénico(s). A dificuldade neste campo, nesta população concreta, é a frequente presença de múltiplos túberes corticais, distribuídos por ambos os hemisférios. Mesmo neste caso, o foco epileptogénico primário pode residir num único túber, geralmente, (mas não sempre) o de maiores dimensões no hemisfério onde as crises se apresentam semiologicamente lateralizadas. Caso esta condição se verifique, e toda a informação proveniente de diferentes meios de investigação seja concordante, avança-se para a lesionectomia com o intuito de remover o túber em causa e todo o tecido cortical epileptogénico adjacente, dentro de limites anatómicos razoáveis que não envolvam áreas de funções motoras, sensitivas ou de linguagem. Na altura da cirurgia, o túber pode estar ou não aparente na superfície do cérebro (Fig. 7a,b). As áreas corticais envolvidas tendem a ser mais pálidas que o normal e geralmente mais rígidas ao toque. A circunvolução onde o túber está localizado pode-se apresentar ligeiramente expandida como na Fig. 7a. Isto geralmente é notório em casos de túberes únicos ou isolados espacialmente, mas pode constituir um desafio considerável quando existem outros na mesma área anatómica. O túber apresenta uma consistência mais rígida que o córtex adjacente, sendo que é normalmente possível contornar exteriormente, removendo gradualmente a lesão e separando o tecido cerebral normal. É comum optar-se por coagulação bipolar dos vasos que estejam associado ao túber. Se porventura o túber estiver situado no córtex motor, sensitivo ou em áreas de linguagem, pode-se optar por transecções subpiais múltiplas no córtex eloquente envolvido (Romanelli P et al., 2004). Geralmente recorre-se a electrocorticografia intraoperatória durante a ressecção dos túberes. Mesmo quando a delimitação do túber é óbvia, é de todo conveniente analisar a actividade do EEG na área sobreposta ao túber e áreas circundantes de modo a aumentar a probabilidade de uma ressecção eficaz de todo o tecido anómalo (i.e. epileptogénico). Como requisito mínimo esta análise neurofisiológica deve envolver a área do túber em si e algum tecido adjacente de tecido cerebral aparentemente normal. Em pacientes cujas crises podem ser lateralizadas a um hemisfério, mas no qual não é possível mesmo com PET, identificar o túber epileptogénico específico, é aconselhável recorrer-se a monitorização invasiva com grelhas subdurais. Quando as crises surgem bilateralmente, existe uma compreensível relutância em avançar para a ressecção de túberes de um lado e do outro. No entanto, a morbilidade de lesionectomias bilaterais é geralmente baixa e se for possível identificar em ambos os hemisférios os túberes responsáveis pelas crises, não é absurdo tentar remover ambos. Recentemente, foi sugerido dividir este tipo de procedimento cirúrgico em 3 etapas: monitorização invasiva por grelhas subdurais; depois ressecção como planeado, mas deixando os eléctrodos subdurais colocados para subsequente monitorização pós-operatória; e finalmente remoção destas mesmas grelhas e ressecção mais extensa se permanecer tecido considerado como epileptogénico (Romanelli P et al., 2004; Weiner HL et al., 2004) Figura 6 - Electrocorticografia intraoperatória em paciente com esclerose tuberosa. Fonte: Grupo de Cirurgia da Epilepsia do Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental (2008). Resumindo, o processo cirúrgico nas epilepsias refractárias é restringido a pacientes com um gerador ictal associada a uma lesão localizado no córtex. Na ET, os pacientes com achados clínicos, electrofisiológicos e imagiológicos congruentes, tem um prognóstico cirúrgico favorável. Os critérios de muitos centros de cirurgia de epilepsia por vezes rejeitam crianças com ET e crises multifocais devido à multiplicidade de túberes ou focos epilépticos. Estes pacientes, acarretam um risco significativamente grande de virem a sofrer um declínio mental grave, consequência do grande número de crises e da sobrecarga de tuberes. Estas têm teoricamente o prognóstico de sucesso de cirurgia de epilepsia menos favorável por vários motivos (Bauman J et al., 2005; Romanelli P et al., 2002; Weiner H et al., 2004): 14 TDTOnline Magazine tdtonline.org - Túberes epileptogéneos extratemporais, multifocais e bilaterais que podem sobrepor-se a áreas funcionais do córtex - A monitorização com eléctrodos intracranianos está limitada à ampla distribuição dos túberes, muitos dos quais estendidos até áreas subcorticais - Presença de focos epilépticos secundários. Além dos factos apresentados, alguns dos focos secundários podem apenas ser identificados aquando da remoção do foco primário, fenómeno que está relacionado com o insucesso de cirurgia a pacientes sem ET (Asano ET al., 2000; Ohtsuka Y et al., 1998). Embora a manifestação epiléptica ocorra normalmente antes dos dois anos de idade, vários estudos efectuados anteriormente apresentaram uma média para a cirurgia de 10 anos de idade. Devido ao longo período de desenvolvimento das crianças até esta idade, o potencial benefício cirúrgico da intervenção será mais reduzido (Weiner H et al., 2004). Existem ainda assim várias divergências nas opiniões quanto à prematuridade da cirurgia embora devida também à alta taxa de morbilidade e complicação do processo cirúrgico com o avançar da doença, se deva proceder à remoção de lesões logo que existam sinais de crescimento das mesmas (Ribaupierre S et al., 2007). A intervenção cirúrgica prematura apresenta uma óptima relação custo-efeito nos pacientes com síndromes refractários à terapêutica medicamentosa e podem delegar ao paciente uma grande oportunidade para prevenir o declínio irreversivel da função cognitiva e de inteligência (Liu S et al., 2007). Contudo, este tipo de terapêutica pode, acarretar complicações pós-cirúrgicas relativamente graves. As mais comuns são as infecções pós-operatórias, hemiparésias transitórias, e outras complicações relacionadas com a área cortical afectada. Em conclusão, assume-se que o tratamento cirúrgico deve ser considerado em pacientes com multi-resistência farmacológica para a epilepsia. Mesmo em pacientes com défices cognitivos graves, a hipótese de uma redução substancial das crises é necessária e recompensadora (Jansen FE et al., 2007). Figura 7 - (a) Pré-resecção de túber frontal direito, com ligeiro espessamento do giro (asteriscos). (b) Pós-resecção do túber em (a) Com a evolução das novas técnicas, poder-se-á fazer um estudo cada vez mais detalhado nesta área, aumentando ainda o sucesso cirúrgico já demonstrado no passado, em doentes com ET (Weiner H et al., 2004). Em suma pode-se então verificar que os focos bilaterais ou múltiplos não são uma contra-indicação para todos os pacientes com ET. A remoção das regiões homólogas bilaterais é evitada devido ao risco de provocar défices neurológicos ou neuropsicológicos. O follow-up de longo termo determina o sucesso desta opção terapêutica. Todavia, uma redução das crises durante o desenvolvimento crítico da criança é significativamente benéfico para a mesma, mesmo que as crises ocorram apenas com menor intensidade e frequência. O benefício a longo prazo da cirurgia de epilepsia nestes doentes corresponde ao controlo de crises, que por sua vez conduzirá ao melhoramento cognitivo, social e de desenvolvimento comportamental, e, acima de tudo o mais importante, uma melhor qualidade de vida para o paciente (Weiner H et al., 2004). Casos Clínicos Metodologia Foram incluídos no estudo quatro pacientes do Serviço de Neurologia Pediátrica do Hospital de Dona Estefânia com o diagnóstico de ET e epilepsia refractária ao tratamento médico. Os pacientes estavam a ser considerados para cirurgia da epilepsia, sendo que a informação neurofisiológica e neuroimagiológica foram obtidas com este propósito em mente. Todos os pacientes foram submetidos a registos vídeo-EEG de longa duração, usando 19 (pacientes 2 e 4) ou 27 (sistema 10-20 mais F9/10, T9/10, P9/10, Foz e Oz, nos pacientes 1 e 3) eléctrodos de ouro fixos no escalpe com colódio. A taxa de amostragem foi de 256 Hz e a banda de frequências estabelecida em 0.1–70 Hz. As posições dos eléctrodos foram medidas usando o método de De Munck et al. (1991) para os pacientes 1 e 3 e obtidos das posições estandardizadas do sistema 10-20 para os pacientes 2 e 4. As RMN-CE foram obtidas usando protocolos clínicos que incluíram em todos os casos sequências T1 volumétricas possibilitando a reconstrução da anatomia cerebral e corregisto com os eléctrodos no escalpe. As pontas interictais foram divididas em classes topográficas através de inspecção visual por um neurofisiologista clínico com experiência (AL). Para cada topografia, foi seleccionada uma ponta representativa usada para realizar uma busca automática de pontas similares usando o software BESA 5.1 (MEGIS, Graefefing, Germany). Procedeu-se à determinação da ponta média (N=15-40) e submetida à análise de gerador. Os registos ictais foram processados (três por paciente) usando a toolbox EEGLAB (Delorme and Makeig, 2004) com métodos já detalhados anteriormente (Leal AJR et al., 2006). O EEG foi dividido em épocas de 20 a 30 s, com zero como início 15 TDTOnline Magazine tdtonline.org da crise. A decomposição em componentes independentes (IC) foi realizada usando o algoritmo Infomax algorithm (Bell and Sejnowski, 1995; Makeig et al., 1997) e foram seleccionados os ICs que expressavam actividade rítmica após o início da crise para análise dos seus componentes espaciais. Finalmente foi usado o pacote de software sLORETA (Pascual-Marqui, 2002, disponível em http://unizh.ch/keyinst/NewLORETA/LORETA01.htm) para analisar os geradores para as pontas médias interictais e componentes ICA ictais seleccionados. Informação Clínica Os pacientes incluídos nesta amostra foram sistematicamente estudados no nosso serviço com vídeoEEG para documentar crises parciais refractárias (Tabela C). Em todos eles, estávamos convencidos da existência de uma única zona epileptogénea que originava as crises, independentemente da variabilidade de características do EEG e diferentes manifestações clínicas das crises ao longo do tempo. O paciente 1 começou com crises motoras precoces (2 meses) que envolviam a hemiface e membro superior direito, durando 1 – 3 minutos cerca de 15 – 20 vezes por dia. O estudo por vídeo-EEG aos 3 meses demonstrava pontas inter-ictais focais com inversão de fase, em montagem bipolar, sobre C3 (Fig. 8c, esquerda) e várias crises registadas com início claro sobre este eléctrodo (Fig. 8a). Estudos posteriores aos 8 e 10 anos confirmaram o mesmo local de início das crises, apesar de uma análise mais complicada do EEG devido ao aumento da actividade de baixas frequências bem como diminuição da amplitude dos ritmos ictais. A actividade interictal demonstrou pontas multifocais (Fig. 8c, direita). A RMN apresentava uma lesão frontal esquerda envolvendo o giro inferior, que foi interpretada como provável túber epileptogénico (Fig. 8e). direita e occipital ipsilateral como o gerador das crises (Fig. 9e). Paciente 2 teve também um início precoce das crises epilépticas, que consistiam em episódios de interrupção da consciência durando vários segundo, com predomínio no período matinal. Ocorriam diária e repetidamente, em surtos que podiam durar de 1 a 2 horas, seguidos de confusão pós-crítica de várias horas. Desenvolveram-se problemas comportamentais graves com défice de atenção, perda de contacto social e episódios recorrentes de agressão aos seus pares na escola. Uma nova avaliação com vídeo-EEG e EEG ambulatório de longa duração permitiunos identificar um ritmo ictal consistente sobre a região occipital direita (Fig. 9a), enquanto as pontas inter-ictais era multifocais, com um foco mais consistente sobre região occipital direita (Fig. 9a), enquanto as pontas inter-ictais era multifocais, com um foco mais consistente sobreimplicaram uma grande lesão displásica temporal. O paciente 3 apresentava características clínicas e de EEG muito similares aos do paciente 1, com início precoce de crises focais motoras envolvendo o braço direito, tendo associado actividade ictal nos eléctrodos C3-F3 (Fig. 10a), reproduzível em três estudos. A neuroimagem identificou um túber associado no giro inferior do lobo frontal esquerdo (Fig. 10b). A mãe do paciente recusou cirurgia. Por sua vez a paciente 4 apresentou ao início crises parciais motoras que atingiam o membro superior esquerdo aos 12 meses de vida. Os episódios ocorriam 5 – 10 vezes por dia e estavam associados a um ritmo rápido ictal de início no lobo frontal direito (Fig. 11a). A actividade inter-ictal era multifocal, mas mais consistente nos eléctrodos frontais (Fig. 11c, esquerda). Identificaram-se vários túberes de pequenas dimensões sobre a região frontal direita através da RMN (Fig. 11e). O paciente 1 foi operado no nosso hospital, enquanto os pacientes 2 e 4 foram submetidos a cirurgia noutra instituição. Após a cirurgia todos os pacientes ficaram sem crises. No paciente 1 houve uma melhoria significativa do desenvolvimento cognitivo e da aptidão social e comunicação. O paciente 2 demonstrou uma franca redução nas alterações do comportamento, com melhoria na atenção e integração social. Não foram detectados perturbações comportamentais antes ou depois da cirurgia. Tabela III - Informações clínicas e neurofisiológicas 16 TDTOnline Magazine tdtonline.org Figura 8 - (a) Crise no paciente 1, com início da actividade rítmica nos eléctrodos F3-C3 (seta e asteriscos) e os dois componentes independentes (IC) demonstrando actividade síncrona (IC1 e IC2). À direita, mostra-se a topografia dos 2 ICs, que têm uma distribuição dipolar no escalpe (escala vertical é 400 µV e escala horizontal é 2 s). (b) Análise de geradores usando o método sLORETA. Representação do máximo interictal da média das pontas, projectando no plano de RM com o túber suspeito (círculos, esquerda) e para os 3 eventos ictais (círculos, quadrado e triângulo à direita). As soluções estão localizadas na interface da lesão e do cérebro normal. Quando mais que um IC está presente por crise, estão numerados. (c) Média das pontas interictais com a dominante à esquerda (escala horizontal 200ms, escala vertical 100 µV). (d) RMN-CE após cirurgia da epilepsia bem sucedida, demonstrando a remoção do túber. (e) Sequência T2 comprovando os vários túberes no paciente 1. (A.J.R. Leal et al, 2008) 17 TDTOnline Magazine tdtonline.org Figura 9 - (a) Crise no paciente 2, com início de actividade rítmica no eléctrodo O2 (seta e asteriscos). Esta actividade foi obtida através de um IC único, com o máximo sobre as áreas posteriores direitas (em baixo, à direita) (escala vertical 750 µV; escala horizontal 2 s). (b) Resultados da análise por sLORETA para a média das pontas interictais (esquerda) e para os eventos ictais (direita). Existe uma grande discrepância espacial entre as duas soluções. (c) Média das pontas do EEG (escala horizontal 300 ms; escala vertical 100 µV). (d) RM-CE após cirurgia bem sucedida. (e) Sequência de RM demonstrando os múltiplos neste paciente. (A.J.R. Leal et al, 2008) 18 TDTOnline Magazine tdtonline.org Figura 10 - (a) Crise no paciente 3, demonstrando o inicio de actividade rítmica no eléctrodo C3 (seta). Esta actividade foi obtida através de um IC único (em baixo, à direita) (escala vertical 500 µV; escala horizontal 2 s). (b) Resultados de sLORETTA para a média das pontas interictais (esquerda) e para os eventos ictais (direita). Existe uma sobreposição parcial dos geradores destes dois tipos de actividade epiléptica. (c) Média das pontas do EEG (escalas idênticas à Fig. 15). (A.J.R. Leal et al, 2008) 19 TDTOnline Magazine tdtonline.org Figura 11 - (a) Crise no paciente 4, demonstrando o inicio de actividade rítmica no eléctrodo F4 (seta). Esta actividade foi obtida através de dois ICs, com o máximo sobre o lobo frontal direito (em baixo, direita) (escala vertical 750 µV; escala horizontal 2 s). (b) Resultados na análise com sLORETA com a média das pontas interictais (esquerda) e para os eventos ictais (direita). (c) Média das pontas do EEG (escalas idênticas à Fig. 9). (d) RM-CE após cirurgia de epilepsia bem sucedida. (e) Sequência de RM-CE comprovando os múltiplos túberes no lobo frontal deste paciente. (A.J.R. Leal et al, 2008) 20 TDTOnline Magazine tdtonline.org Discussão Uma das principais conclusões é que a análise de geradores de ritmos ictais em pacientes com epilepsia associada a ET, produz resultados consistentes em crises distintas, com íntima relação especial com a área cerebral removida em cirurgia de epilepsia bem sucedida. Este aspecto particular contrasta com a actividade complexa e multifocal interictal típica destes pacientes, o que torna muito difícil a construção de uma visualização da dinâmica destas actividades oriundas deste tipo de registos. Em alguns casos, como o apresentado caso 2, existe uma separação espacial significativa entre as fontes ictais e interictais, tornando pouco fiável uma possível extrapolação sobre qual a área cerebral que está a originar as crises através somente da actividade interictal. Na neurofisiologia clínica, a análise de EEG ictal, que é fundamental na selecção de pacientes para cirurgia, tem sido pouco valorizado em relação à análise de actividade interictal (Jansen et al., 2006; Iida et al., 2005; Kamimura et al., 2006; Sperli et al., 2006), principalmente devido à deficiente relação sinal – ruído (SNR). Vários factores podem ser responsáveis por este facto particular, sendo os mais importantes os movimentos e artefactos electromiográficos induzidos pelas manifestações comportamentais ictais, bem como pelo carácter dinâmico da actividade epiléptica que propaga para várias zonas do córtex usando vias complexas e pouco conhecidas. Mais, os métodos comuns para melhorar o SNR como o averaging e filtragem de frequências não são muito eficazes neste contexto. A introdução de métodos como a análise de componentes independentes (ICA) (Makeig et al., 1997) e filtragem especial oferecem uma metodologia mais promissora na optimização do SNR, que é requisito para o uso de métodos de análise mais sofisticados. O poder da decomposição do EEG em ICA para identificar e remover artefactos de movimentos está bem estabelecido (Makeig et al., 1997; Urrestarazu et al., 2004) tendo sido confirmado nestes casos clínicos. A elevada amplitude e evolução temporal de tais componentes facilita a sua identificação e a sua remoção permite uma perspectiva mais detalhada na inspecção de actividade crítica. Nestes pacientes a observação do EEG livre de artefactos revelou que a actividade rítmica presente durante a crise estava igualmente presentes nos restantes ICs. Com o objectivo de se estudar os ICs especificamente relacionados com os eventos ictais, seleccionaram-se os componentes rítmicos demonstrativos de actividade síncrona com os ritmos dos EEGs originais (Figs. 8a, 9a, 10a e 11a). Com isto, reduziu-se a informação ictal a um número restrito de ICs (um ou dois), cujo padrão temporal de activação correspondia aos ritmos que no EEG original se apresentavam dispersos no escalpe, produzindo uma convergência significativa de informação. O facto de os mapas no escalpe destes ICs terem topografia dipolar torna ainda mais robusta a hipótese que as fontes fixas e focais podem ser bons modelos para estes geradores de interesse. A ICA permite ultrapassar as duas maiores limitações de análises de ritmos ictais: distingue e selectivamente elimina os artefactos que geralmente possuem dinâmicas temporais muito diferentes da actividade epiléptica intrínseca; e também permite separar a contribuição desta actividade ictal de diferentes áreas cerebrais o que pode levar à condução de volumes de potenciais de escalpe. As tentativas anteriores de análise de eventos ictais com dipolos temporo-espaciais restringiam a investigação a crises com poucos artefactos e SNR, como por exemplo crises do lobo temporal (Assaf and Ebersole, 1997). Na tentativa de melhor entender e caracterizar a localização intracraniana dos geradores dos padrões de IC vistos no escalpe, adoptou-se o algoritmo de sLORETA (PascualMarqui, 2002), q ue apresenta óptimas capacidades focalizadoras para fontes locais (Wagner et al., 2004). A actividade de pontas interictais nestes pacientes é multifocal, mas em todos eles foi possível identificar uma topografia dominante que tinham fontes na vizinhança das lesões epileptogénicas. Esta análise vai de encontro com os resultados de Seri et al. (1998), que também conseguiram identificar os geradores perto de túberes no lobo frontal em casos de TSC e pontas frontais. Ainda assim, em 2 dos 4 pacientes apresentados existiu uma topografia discrepante e por conseguinte uma localização de geradores diferentes entre os dois tipos de actividade epiléptica, com os resultados a sugerir que a análise ictal leva a novas e espacialmente mais consistentes localizações quando em comparação com a investigação isolada de actividade interictal. Os resultados cirúrgicos nos nossos casos foram muito bons e suportam a sugestão de outros estudos anterior que sugerem que as áreas cerebrais mais displásicas são geralmente as responsáveis pela origem da actividade epiléptica (Bebin et al., 1993). No nosso entender existem dois grandes obstáculos que se colocam no caminho para a cirurgia destes pacientes: um é actividade deveras complexa e variável das pontas interictais que raramente aponta sem ambiguidades para uma área cerebral em particular; outra é a alteração nas manifestações comportamentais ictais, muitas vezes não devido ao aparecimento de novo foco, mas antes devidas aos diferentes padrões de propagação de actividade epiléptica do foco epileptogéneo. Na nossa opinião, consegue-se uma boa selecção de pacientes candidatos a cirurgia, desde que se consiga demonstrar inequivocamente um padrão de actividade ictal no EEG de várias crises, eventualmente em diferentes idades. Apenas nessa altura podemos estar confiantes que apenas um 21 TDTOnline Magazine tdtonline.org único foco pode ser responsável pela explicação da presença de epilepsia em cada paciente. Bourneville DM. Sclerose tubereuse des circonvolutions cerebrales. Arch Neurol. France, 1880. 1:81– 91. Nesta estratégia, a convergência de informação oferecida pela ICA, complementada com outras técnicas de análise de geradores, parece ser uma ferramenta promissora na avaliação pré-cirúrgica de pacientes com esclerose tuberosa e epilepsia. ■ Bourneville DM, Brissaud E. Encephalite ou sclerose tubereuse des circonvolutions cerebrales. Arch Neurol. France, 1881. 1:390–410. Referências Bibliográficas: Adhvaryu K, Shanbag P, Vaidya M. Tuberous Sclerosis with hypothyroidism and precocious puberty. Indian J Pediatr. India, 2004. 71:273-275. Anisya-Vasanth AV et al. Spectrum of epilepsy in tuberous sclerosis. Neurol India. India, 2004. 52:210-212. Asano E, Chugani DC, Muzik O, et al. Multimodality imaging for improved detection of epileptogenic foci in tuberous sclerosis complex. Neurology. USA, 2000. 54:1976–1984. Asato MR, Hardan AY. Neuropsychiatric problems in tuberous sclerosis complex. J Child Neurol. 2004 Apr;19(4):241-9. Breningstall GN, Faerber EN, Kolanu R. 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Leal ‡† *Programa de Doutoramento em Neurociências - Faculdade de Medicina da Universidade do Porto ‡ Serviço de Neurologia Pediátrica, Centro Hospitalar de Lisboa Central Hospital Dona Estefânia † Serviço de Neurofisiologia, Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa Hospital Júlio de Matos 25 TDTOnline Magazine tdtonline.org Tem um trabalho, artigo ou monografia que gostaria de partilhar? Envie-nos os seus artigos para [email protected] 26 TDTOnline Magazine tdtonline.org Higienista Oral – Saiba mais! Ricardo Pingo, 2008 Um higienista oral é um técnico de diagnóstico e terapêutica que trabalha principalmente nos cuidados de saúde primários e como tal, tem como objectivo máximo a prevenção, promoção e manutenção da saúde oral da população. Este pode actuar em dois âmbitos: o Clínico e Comunitário. Após avaliação, o higienista pode realizar vários tipos de tratamentos profilácticos e um plano de tratamento adequado a cada indivíduo. Se necessário, é realizado o encaminhamento do paciente para a especialidades de Medicina Dentária correspondente. Os tratamentos profilácticos que podem ser realizados são: Em meio clínico, o higienista oral realiza recolha de dados para diagnóstico, tratamentos profilácticos e aconselhamento ao paciente. Toda a primeira consulta é iniciada com a anamnese para avaliar se existem patologias que influenciem o tratamento dentário ou que sejam potenciais fontes de problemas orais e sistémicos (quer pela própria acção da doença, quer pelos fármacos associados) e podem ser feitos os seguintes exames de diagnóstico: Medição de Sinais Vitais – registo de pulsação, respiração e tensão arterial Exame da Cabeça e do Pescoço - avaliação de estruturas como gânglios linfáticos, tiróide, ou articulação temporo-mandibular. Exame Intra-Oral – avaliação das estruturas intraorais como a língua ou as amígdalas Exame do Periodonto - avaliação do estado dos tecidos gengivais e de suporte do dente. Exame da Dentição - avaliação dos dentes em termos de cáries, obturações ou anomalias dentárias. Realização de raio-x intra-orais ou extra-orais (ortopantomografia) Avaliação da dieta Destartarizações - remoção de tártaro sub e supragengival Figura 13 - Instrumentos para remoção de tártaro – à esquerda, destartarizador EMS minipiezon; à direita cureta universal da HuFriedy Alisamento Radicular – raspagem de irregularidades na superfície radicular dos dentes. Figura 14 - Técnica de Alisamento radicular Remoção de manchas exógenas – remoção de pigmentos de tabaco, café, chá, etc. Figura 15 - Instrumentos para polimento e remoção de manchas exógenas. À esquerda temos um prophyjet da Dentsply, à direita um contra-ângulo da Microdent. Figura 12 - Algumas das estruturas avaliadas nos exames de diagnóstico. Aplicações tópicas de fluoretos – colocação profissional de fluoretos para prevenir cáries e fortalecer o esmalte. 27 TDTOnline Magazine tdtonline.org envolve programas que têm como objectivo a avaliação e melhoria da saúde oral da população. Podem ser realizados: Rastreios – identificação de problemas dentários ou gengivais. Figura 16 - Moldeira para colocação do gel de flúor. Aplicação de selantes de fissura – colocação de resinas dentárias que vão selar as fissuras da face oclusal do dente. Figura 18 - Exemplo de um odontograma com registo de CPO (cariados, perdidos e obturados) Acções de educação para a saúde – ensinos teórico-práticos sobre patologias orais e o que fazer para as evitar. Figura 17 - Aplicação de selante de fissura. Com o crescimento dos tratamentos estéticos poderão surgir novas competências num futuro próximo, temos como exemplo: Branqueamento dentário – aplicação profissional de produtos que visam clarear os dentes. Aplicação de piercings dentários – colocação de um brilhante ou adesivo no dente. Outro aspecto importante é o conteúdo pedagógico da consulta de higiene oral. Não nos devemos esquecer que a prossecução do melhor estado de saúde possível é um objectivo para TODOS os profissionais de saúde. Como não podia deixar de ser, os ensinos de higiene oral são uma constante nas consultas porque permitem ao paciente melhorar a sua saúde e prevenir doenças orais. Podem ser transmitidos ensinos sobre técnicas de escovagem e/ou fio dentário, a importância do flúor para o esmalte dentário, o consumo de açúcares como factor de risco para a cárie dentária, etc. No âmbito de trabalho comunitário o higienista oral pode fazer trabalho em centro de saúde, lares de idosos, jardinsde-infância, instituições de pessoas com necessidades de cuidados especiais, entre outros. O trabalho comunitário Figura 19 - Diapositivo típico de uma Acção de Educação para a Saúde Aplicação de selantes de fissura – colocação de selantes às crianças abrangidas pelo Programa Nacional de Promoção da Saúde Oral (Circular Normativa n.º 1/DSE de 18/01/05) Figura 20 - Programa Nacional de Promoção da Saúde Oral da DGS 28 TDTOnline Magazine tdtonline.org Onde posso então encontrar um higienista oral? Clínicas privadas Hospitais / Centros de saúde Lares de idosos / Jardins-de-infância / Escolas Empresas da área da medicina dentária. ■ Autores: Ricardo Pingo (Higienista Oral) Manual de Boas Práticas Laboratoriais Anatomia Patológica Disponível para download, aqui. 29 TDTOnline Magazine tdtonline.org Esta página pode ser sua! Anuncie na TDTOnline Magazine, garanta que a sua publicidade atinge o seu públicoalvo! Contacte-nos em: @ [email protected] 30 TDTOnline Magazine tdtonline.org Fisioterapia e Terapia de Ondas de Choque extra-corporal Paula Oliveira, 2008 Resumo A terapia de ondas de choque extra-corporal é cada vez mais utilizada na área das lesões músculo-esqueléticas, uma vez que é uma terapia alternativa e pouco invasiva que deve ser considerada antes da cirurgia. Desta forma é de todo útil conhecer o seu mecanismo de actuação e para que patologias se encontra indicada e qual a sua evidência. Palavras-Chave: terapia ondas de choque extra-corporal, mecanismo, indicações, limitações. Ondas de choque extracorporais As ondas de choque, foram inicialmente aplicadas na urologia e gastrenterologia, tendo sido introduzidas a meio da década passada, na Alemanha, para tratar diferentes patologias do sistema músculo-esquelético (1-8). As ondas de choque, usadas na área da medicina, são ondas acústicas de um impulso. A onda é focada por um aplicador, sendo necessário reajustar permanentemente o aplicador na zona a tratar (9, 10). As ondas de choque, podem ser classificadas pelos níveis de energia. Para a maioria das lesões dos tecidos moles são aplicadas ondas de choque de baixa energia (7, 10). A aplicação de baixas energias, evita a necessidade de anestesia local ou de repouso após tratamento. As complicações pela sua aplicação são mínimas, podendo no entanto ocorrer hematoma ou pequenas hemorragias no local de aplicação (7, 11). O efeito terapêutico das ondas de choque de baixa energia em entesopatias dolorosas, baseia-se em mecanismos neurofisiológicos (10). Esta terapia é usada para provocar estimulação dos níveis de dor, estimula o processo de cura e reduz a calcificação (2, 5, 7, 9, 11, 12). O resultado da aplicação das ondas de choque é mais consistente e mais efectivo quando o paciente dá o feedback, permitindo assim direccionar o tratamento para a área mais dolorosa, em comparação com aplicação na zona por anatomia e exames (13). Mecanismo O exacto mecanismo da terapia das ondas de choque permanece desconhecido (12, 14). As ondas de choque em ortopedia não têm como objectivo desintegrar tecidos mas antes induzir a neovascularização, aumentar as reservas de sangue e regeneração tecidular (1, 12). Com base nos resultados em animais, parece que o mecanismo das ondas de choque, estimula primeiramente a quantidade de angiogénese relacionada com os factores de crescimento, induzindo posteriormente o crescimento interno, neovascularização, que aumenta as reservas de sangue estimulando a proliferação celular e eventual regeneração tecidular para recuperar o tendão ou o osso. O aumento dos marcadores angiogénicos ocorre na primeira semana e dura até oito semanas, enquanto que a neovascularização é notada inicialmente na quarta semana e persiste durante doze semanas ou mais em associação à proliferação celular. Estas descobertas comprovam que os resultados resultam da dependência da dosagem das ondas de choque e dos sintomas (12). Segundo Wang e seus colegas (2003), que realizaram o estudo em coelhos, verificaram que as ondas de choque induzem o crescimento da neovascularização associado a um aumento da libertação dos marcadores de angiogeneses na junção tendão-osso de Aquiles. A neovascularização pode ter um papel importante no aumento das reservas de sangue e na regeneração do tecido na junção tendão-osso (14). Aplicação das ondas de choque A aplicação das ondas de choque é feita há cerca de 15 anos na união de fracturas de osso longo, tendinite calcificada do ombro, epicondilite e fasceíte plantar (1, 4, 8, 9, 11, 13), tendo um sucesso de aproximadamente 65% a 91% (12). Recentemente esta terapia estende-se para tratar condições como necrose avascular da cabeça do fémur, tendinite do routuliano, tendinite do tendão de Aquiles, pseudoartroses, miosite ossificante, osteocondrite e tendinites não calcificantes do ombro (1, 4, 11, 12). Ombro: Tendinite crónica A tendinite calcificada do ombro é um problema observado comummente (7), caracterizado por depósitos de cristais de fosfato de cálcio nos tendões da coifa dos rotadores, que ocorre entre os 40 e 50 anos de idade. Frequentemente afecta o tendão supraespinhoso próximo da inserção, seguida do infraespinhoso, pequeno redondo, e por ultimo o tendão do subescapular. A etiologia e patogénese da tendinite calcificadas do ombro são desconhecidas. As causas sugeridas são a hipovascularização e degeneração do local com mudanças proliferativas do tecido tendinoso da coifa dos rotadores. Esta patologia leva a dor e particularmente a desconforto nocturno em cerca de 50 % dos pacientes, originando frequentemente limitações das amplitudes articulares. A progressão desta patologia não é 31 TDTOnline Magazine tdtonline.org clara, os sintomas podem durar alguns dias e desaparecer como podem tornar-se crónicos. O tratamento de tendinites calcificadas é por norma conservativo, incluindo terapia manual, iontóforese, aplicação de anti-inflamatórios, injecção de esteróides, entre outros. Se a dor for crónica ou intermitente após vários meses de tratamento conservativo, passa-se para a artroscopia. Como alternativa, as ondas de choque têm sido referidas como uma opção de tratamento de tendinites calcificadas no ombro, antes da cirurgia (15). Spindler e colegas (1998), estudaram a aplicação das ondas de choque na tendinite crónica calcificada do ombro através de uma resposta clínica e radiológica. Foram incluídas 3 mulheres com limitação das amplitudes e dor severa no ombro. Foi feita uma aplicação e, após 24 horas, ocorreu a fragmentação da calcificação e as pacientes não tiveram dor e ainda tiveram aumento das amplitudes articulares. Após 2 anos, clinicamente e radiologicamente, apresentaram-se assintomáticas não existindo efeitos adversos ou outras complicações. Por terem uma boa tolerância, resposta clínica e radiológica as ondas de choque devem ser consideradas como uma terapia alternativa para a tendinite crónica calcificada do ombro (16). Cosentino e colegas (2003), avaliaram a resposta clínica e radiológica da tendinite calcificada crónica do ombro, à aplicação das ondas de choque. Verificaram após um mês de aplicação, a diminuição dos sintomas e melhoria da função do ombro, mesmo nos casos em que os depósitos de cálcio não tiveram alteração. Os resultados mantiveramse por um período superior a 6 meses. Em 40% dos casos ocorreu reabsorção parcial e em 31% dos casos reabsorção completa dos depósitos do cálcio (17). Gerdesmeyer e colegas (2003), verificaram que a aplicação da terapia das ondas de choque tanto em baixa como em alta energia parece ter um efeito positivo na função do ombro, com diminuição da dor e diminuição do tamanho da calcificação (18). Por outro lado a revisão sistemática, conduzida por Harniman e colegas (2004), que teve como objectivo verificar a eficiência das ondas de choque no tratamento de tendinites com e sem calcificação dos rotadores da coifa, verificaram que a terapia das ondas de choque tem sido sugerida como tratamento alternativo para a tendinite crónica dos rotadores da coifa, por diminuir a necessidade de cirurgia. Para alem da sugestão do uso das ondas de choque, há uma evidência moderada da aplicação das ondas de choque de alta energia no tratamento de tendinites crónicas calcificadas dos rotadores da coifa, quando o tratamento foca os depósitos de calcificação (19). Como também existe uma evidência moderada que as ondas de choque de baixa energia não são efectivas no tratamento de tendinites crónicas não calcificadas dos rotadores da coifa (19, 20). Peters e colegas (2004), investigaram clinicamente a dor e mobilidade e radiologicamente a resolução de depósitos de cálcio na eficácia de diferentes níveis de energia das ondas de choque em tendinites calcificadas do ombro. Foram incluídos no estudo 90 indivíduos, aos quais foram administradas 5 aplicações de ondas de choque espaçadas. Após a aplicação, a única complicação observada foi a presença de pequenos hematomas em 8 indivíduos. Os autores concluíram que o resultado da aplicação das ondas de choque em tendinites calcificadas do ombro é muito efectivo, não tendo efeitos secundários significantes, levando os autores a afirmar que é uma terapia recomendada para este tipo de patologia (21). Moretti e colegas (2005), avaliaram o uso de energia média na tendinite calcificada dos rotadores da coifa. Concluíram que a energia media das ondas de choque, dá bons resultados na modulação da dor, visto que nem todos apresentavam modificação dos depósitos de cálcio, mas apresentavam diminuição da dor (22). Sabeti-Aschraf e colegas (2005), através da avaliação dos resultados da aplicação das ondas de choque por programa de computador, verificaram resultados positivos no uso das ondas de choque na tendinite calcificadas dos rotadores da coifa (23). Albert e colegas (2007), verificaram que os sintomas na tendinite calcificada no ombro melhoraram significativamente após 3 meses de tratamento, mas os depósitos de cálcio mantiveram-se inalterados na maioria dos pacientes (24). Em 2008, Hsu estudou a aplicação das ondas de choque em 46 pacientes com tendinite calcificada. O estudo mostrou que as ondas de choque apresentam resultados promissores no alívio da dor e restauração funcional na tendinite calcificada com complicações insignificantes (25). Lorbach e colegas (2008), pretenderam avaliar a possibilidade de diminuir os depósitos de cálcio préoperativo. Vinte e quatro pacientes foram avaliados de uma amostra inicial de 65, que se submeteram à aplicação das ondas de choque. Concluíram que a artroscopia para a remoção de depósitos de cálcio mostra bons resultados clínicos, como a redução de dor, melhoria da função do ombro e satisfação do paciente. O tipo de depósitos de cálcio e o tratamento pré-operatório com as ondas de choque não apresenta qualquer impacto nos resultados do pós-operatório (26). 32 TDTOnline Magazine tdtonline.org Cotovelo: Epicondilite – Epitrocleite Joelho: tendinopatia do rotuliano, osteoartrite A epicondilite lateral, foi inicialmente descrita à mais de 100 anos, mas a sua etiologia e patofisiologia permanece incerta (1, 11, 27). Derivada de um uso exagerado dos extensores do antebraço, afecta de forma igual homens e mulheres e é comum em pessoas com 40 anos ou mais (27). Alterações na postura da rótula são frequentes por tendinopatia, principalmente em atletas que participam em actividades de salto. O tipo de tratamento depende da escolha do profissional, podendo ser; repouso, modificação de actividades, analgésicos, fisioterapia, injecções entre outros (1, 27, 28). Rompe e colegas (1996), numa avaliação de 100 pacientes com epicondilite que tinham sintomas há mais de 12 meses, verificaram que, no grupo que recebia 3000 impulsos a 0,08 mJ/mm2, houve uma diminuição da dor e melhoria da função após tratamento, demonstrando que, baixas doses de ondas de choque são efectivas no tratamento de dor no cotovelo em casos isolados, hiperestimulando analgesia que pode aliviar a dor crónica por dias, semanas e algumas vezes permanentemente (11). Krischek e colegas (1998), tentaram testar se a eficácia do uso das ondas de choque na epicondilite era a mesma que na epitrocleite. Para tal foram testados 60 indivíduos (30 com epicondilite e 30 com epitrocleite) verificando diferenças significativas no alívio da dor e melhoria funcional no grupo da epicondilite. O uso das ondas de choque na epitrocleite deve ser questionado (29). Maier e colegas (2001), por ressonância magnética avaliaram antes e depois da aplicação das ondas de choque 23 mulheres e 19 homens com epicondilite do braço dominante. Verificaram melhorias após aplicação das ondas de choque, tendo sido encontradas maiores diferenças nos exames efectuados nos homens (30). Wang e colegas (2002), verificaram que os resultados de tratamento não operativo ou cirúrgico para a epicondilite são inconsistentes. Como também verificaram que a terapia de ondas de choque mostrou um efeito favorável a curto prazo no tratamento da epicondilite sem apresentar complicações na sua aplicação (31). Contudo, Boisauber e colegas (2004), que analisaram a literatura do tratamento não cirúrgico da epicondilite, concluíram que o uso das ondas de choque não tem evidência suficiente para ser considerada como tratamento eficaz na epicondilite (32). Os resultados dos diferentes estudos são conflituosos relativamente à aplicação das ondas de choque na epicondilite crónica. Existe pouca evidencia da aplicação das ondas de choque quando comparadas com outros tratamentos (32-34). Peers e colegas (2003), compararam as medidas da tendinopatia crónica patelar resistente ao tratamento conservador, tratada cirurgicamente com a terapia das ondas de choque. Concluíram que a terapia das ondas de choque apresentam medidas funcionais comparaveis com as obtidas na cirurgia (35). Vulpiani e colegas (2007), estudaram 73 pacientes (83 joelhos) submetidos a ressonância magnética, radiografia e ultrasonografia para identificar a tendinopatia. As ondas de choque foram feitas em 3 a 5 sessões e, em cada sessão foram administrado 1500-2500 impulsos, obtendo resultados satisfatórios em 73,5% dos casos. Os resultados satisfatórios confirmaram as ondas de choque como tratamento alternativo nas patologias de tendão (36). Wang e colegas (2007), tentaram demonstrar a efectividade das ondas de choque em comparação com o tratamento conservador. Verificaram que a terapia das ondas de choque parece ser mais efectiva e segura que os tratamentos conservadores no tratamento de pacientes com tendinopatia crónica do routuliano (37). Ao nível da osteoartrose do joelho, a eficácia das ondas de choque não está clarificada. Ochiai e colegas (2007), pretenderam avaliar a eficácia das ondas de choque na osteoartrite de joelho em ratos, tendo sido avaliado a duração da caminhada. Verificaram melhoria na capacidade de andar concluindo que as ondas de choque são úteis no tratamento da osteoartrose do joelho (38). Pé: Fasceíte plantar tendinopatia do tendão de aquiles A fasceíte plantar é a causa mais comum de dor no pé (2, 4, 8, 39), afectando 10% da população (2), sendo muito limitativa no dia a dia (8). Muitas das modalidades não cirúrgicas que são usadas para controlar as disfunções incluem: Repouso, massagem, medicamentos antiinflamatórios, ortoteses, injecções e modalidades de fisioterapia como as ondas de choque. O tratamento não cirúrgico da fasceíte plantar tem um sucesso aproximado de 90% (4, 8, 39, 40). As diferentes modalidades de tratamento não respondem às necessidades dos pacientes, o tratamento conservador falha em 10%, a cirurgia falha ente 2% a 35% dos pacientes (2). Desta forma, antes de se ponderar a cirurgia, deve-se considerar outras opções de tratamento como é o caso das ondas de choque (41, 42). 33 TDTOnline Magazine tdtonline.org Embora a aplicação das ondas de choque de baixa energia no tratamento de patologias do foro músculo-esquelético seja controverso, os resultados da sua aplicação são no geral positivos no tratamento da fasceíte plantar crónica. A amostra continha 112 indivíduos. Concluíram que três tratamentos com 1000 impulsos de ondas de choque de baixa energia, parece ser uma terapia efectiva para a fasceíte plantar e pode ajudar o paciente a evitar a cirurgia. Em contraste, três aplicações de dez impulsos não melhoraram os sintomas substancialmente (34). Ogden e colegas (2001), avaliaram 302 pacientes com fasceíte plantar com consequente administração das ondas de choque. Os resultados positivos, sugerem que esta modalidade terapêutica deva ser considerada antes de qualquer opção cirúrgica e até pode ser preferível a injecção de cortisona que tem um risco reconhecido de ruptura da fáscia plantar e retorno de sintomas (43). Wang e colegas (2002), investigaram o efeito das ondas de choque em 79 pacientes com fasceíte plantar (59 mulheres e 20 homens). O efeito das ondas de choque foi cumulativo e dependente do tempo de aplicação, não tendo existido nenhuma complicação secundária (41). Ao nível da tendinopatia crónica do tendão de Aquiles, as ondas de choque mostraram-se eficazes. Segundo Fúria (2008), a terapia ondas de choque é um tratamento eficaz na tendinopatia crónica não insercional do tendão de Aquiles (44). Rompe e colegas (2008), propuseram-se comparar o uso de carga excêntrica e as ondas de choque no tratamento da tendinopatia crónica recalcificante na inserção do tendão de Aquiles. Verificaram que as ondas de choque apresentam resultados superiores ao da carga excêntrica após 4 meses de tratamento, concluindo que são necessários estudos para definir as indicações da modalidade das ondas de choque (45). Fracturas não unidas As ondas de choque estão indicadas para o tratamento de lesões crónicas dos tecidos moles e da consolidação de fracturas não unidas. Não existindo ate agora estudos sobre o efeito das ondas de choque no atraso de consolidação na junção tendão-osso (46). Uslu e colegas (1999), tiveram como objectivo investigar o efeito das ondas de choque na formação de calo ósseo na fractura do rádio em coelhos. Verificaram que as ondas de choque são desorganizadas e dispersas em vez de um efeito osteo-indutivo na formação do calo ósseo. Este efeito poderá ser importante nas lesões do osso e em situações em que é necessário uma grande quantidade de calo ósseo (47). Bulut e colegas (2006), centraram-se na investigação dos efeitos das ondas de choque na união do osso, usando para tal a análise do volume do cálcio ósseo por tomografia e histologia. Para tal, foram usados 13 coelhos em que foi induzido fractura no rádio. Verificaram que após aplicação das ondas de choque, esta terapia acelera o processo de união do osso por aumentar o volume e a velocidade da formação de calo ósseo (48). Wang e colegas (2008), estudaram o efeito das ondas de choque na consolidação na junção tendão-osso em 28 coelhos. Concluíram que as ondas de choque promovem a osteogenese, regeneração da zona fobrocartilaginosa e remodelação na junção não consolidada tendão-osso. Resultados que fomentam pesquisas futuras com o objectivo de estabelecer indicações clínicas para o tratamento de fracturas não consolidadas da junção tendão-osso (46). Em humanos, Xu e colegas (2008), avaliaram os resultados de 7 anos em 69 pacientes com fracturas não unidas de ossos longos, tratadas com as ondas de choque. Verificaram um sucesso de união do osso de 75,4%. Concluíram que as ondas de choque são eficazes em não uniões hipertróficas e parece não existir evidência em não uniões atróficas do osso. Concluindo portanto que as ondas de choque são uma boa opção de união de fracturas de ossos longos, especialmente em não uniões hipertróficas (49). Evidências As ondas de choque constituíram um tratamento revolucionário na área de urologia. Hoje em dia, as ondas de choque são extensamente usadas em ortopedia. O seu mecanismo ainda não é conhecido, resultado de poucos estudos metodologicamente fortes. Segundo a pesquisa realizada sobre a terapia das ondas de choque, verificou-se que não há consenso entre eles. Quando falha o tratamento conservador, esta terapia apresenta tanto efeito positivo (diminuição da dor e aumento da funcionalidade), como pode apresentar efeito placebo, independente da patologia em estudo. Nos diversos estudos não há entendimento nas dosagens das ondas de choque e os parâmetros de tratamento permanecem empíricos. Parte dos artigos publicados sobre as ondas de choque apresentam metodologia inadequada e amostras pequenas. É necessário a publicação de artigos adequados para estabelecer os diversos parâmetros da aplicação da terapia das ondas de choques e estimar o valor desta 34 TDTOnline Magazine tdtonline.org terapia no tratamento de algumas das patologias referidas como é o caso da fasceíte plantar. 13. Sems A, Dimeff R, Iannotti JP. Extracorporeal shock wave therapy in the treatment of chronic tendinopathies. J Am Acad Orthop Surg. 2006 Apr;14(4):195-204. Devido às diferenças entre artigos existe uma grande dificuldade em comprar diversos estudos pela diferença de parâmetros usados, como a quantia de energia usada, o método usado, a frequência e o tempo de aplicação e se existiu ou não o uso de anestésicos. 14. Wang CJ, Wang FS, Yang KD, Weng LH, Hsu CC, Huang CS, et al. Shock wave therapy induces neovascularization at the tendon-bone junction. A study in rabbits. J Orthop Res. 2003 Nov;21(6):984-9. Referências Bibliográficas: 1. Crowther MA, Bannister GC, Huma H, Rooker GD. A prospective, randomised study to compare extracorporeal shockwave therapy and injection of steroid for the treatment of tennis elbow. J Bone Joint Surg Br. 2002 Jul;84(5):678-9. 2. Haake M, Buch M, Schoellner C, Goebel F, Vogel M, Mueller I, et al. Extracorporeal shock wave therapy for plantar fasciitis: randomised controlled multicentre trial. Bmj. 2003 Jul 12;327(7406):75. 3. Ogden JA. Extracorporeal shock wave therapy for plantar fasciitis: randomised controlled multicentre trial. Br J Sports Med. 2004 Aug;38(4):382. 15. Mouzopoulos G, Stamatakos M, Mouzopoulos D, Tzurbakis M. Extracorporeal shock wave treatment for shoulder calcific tendonitis: a systematic review. Skeletal Radiol. 2007 Sep;36(9):803-11. 16. Spindler A, Berman A, Lucero E, Braier M. Extracorporeal shock wave treatment for chronic calcific tendinitis of the shoulder. J Rheumatol. 1998 Jun;25(6):1161-3. 17. Cosentino R, De Stefano R, Selvi E, Frati E, Manca S, Frediani B, et al. Extracorporeal shock wave therapy for chronic calcific tendinitis of the shoulder: single blind study. Ann Rheum Dis. 2003 Mar;62(3):248-50. 18. Gerdesmeyer L, Wagenpfeil S, Haake M, Maier M, Loew M, Wortler K, et al. Extracorporeal shock wave therapy for the treatment of chronic calcifying tendonitis of the rotator cuff: a randomized controlled trial. Jama. 2003 Nov 19;290(19):2573-80. 4. Rajkumar P, Schmitgen GF. 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Clique aqui. 36 tdtonline.org Casos Clínicos do Radiology Picture of the Day Deixamos aqui mais 3 casos do site Radiology Picture of The Day, desta vez apresentando um caso sobre Tumor da Glândula Pineal, Pólipos Vesiculares e Fibroma Não Ossificante. Gostaríamos de relembrar os colegas que queiram ver algum caso clínico seu publicado na TDTonline Magazine, podem mandá-los para o nosso email em: [email protected] TDTOnline Magazine Pineal Tumour There is a well-defined, lobulated, heterogeneouslyenhancing mass seen in the pineal region. There is dilatation of the third ventricle with bulging of the infundibular and optic recesses. There is also mass effect on superior aspect of cerebellum. The differential diagnosis for this mass includes: 1. 2. Germinoma Teratoma 3. 4. 5. Pineoblastoma / Pineocytoma Astrocytoma of pineal gland Metastasis Reference: JG Smirniotopoulos, EJ Rushing, and H Mena. Pineal region masses: differential diagnosis. RadioGraphics 1992; 12: 577. Credit: Dr Abhijit Datir 37 tdtonline.org TDTOnline Magazine Gallbladder Polyps This ultrasound demonstrates multiple non-shadowing, non-mobile, polypoid lesions measuring less than 7mm diameter. This appearance is typical of cholesterol polyps, representing the focal form of gallbladder cholesterolosis. Cholesterolosis is a common idiopathic non-neoplastic condition, which may be focal (polyps) or diffuse (strawberry gallbladder). The diffuse form is not visible on imaging. Cholesterol polyps are typically 2-10mm in diameter, and are multiple in 80% of cases. Lesions larger than 10mm, with a broad base, or with irregular margins should raise the possibility of an alternative diagnosis. Differential diagnoses include inflammatory polyps, adenoma (less than 5% of gallbladder polyps), focal adenomyomatosis, gallbladder adenocarcinoma, or metastases (especially melanoma). Reference: Rumack CM, et al. Diagnostic Ultrasound Elsevier Mosby, 3rd edition, 2005. Credit: Rocco Pozzolungo 38 tdtonline.org TDTOnline Magazine Non-Ossifying Fibroma (Fibroxanthoma) This 14 year-old boy had radiographs of the ankle performed following a sporting injury. An incidental finding is shown. Fibroxanthoma can be divided into: 1) Non-ossifying fibroma (> 2cm) 2) Fibrous cortical defect (< 2cm) Both are pathologically identical. Non-ossifying fibromas have the following features (all shown here): 1. Present in adolescents and young adults 2. 3. 4. 5. 6. Commonest location is the femur and tibia Dia-metaphyseal in location Eccentric with mild expansion Well defined lucent lesion with a sclerotic margin Cortical thinning, but not breach. Lesions are asymptomatic and are usually an incidental finding. Lesions often spontaneously regress.■ Reference: Paediatrics, Donnelly, 6, p90-1. Credit: Dr Ian Bickle 39 TDTOnline Magazine tdtonline.org Normas para a publicação de artigos científicos na TDTOnline Magazine Com a finalidade de uniformizar os artigos recebidos pela Equipa do Tecnologias da Saúde Online e consequentemente divulgados na TDTOnline Magazine, torna-se necessária a definição de normas próprias para a publicação de artigos científicos, de forma a estimular o interesse e curiosidade dos visitantes/leitores. Selecção de Artigos 1. Serão aceites os temas que se enquadrem no âmbito de cada publicação e da temática do site “Tecnologias da Saúde Online”, após avaliação pelos membros designados pela administração do supracitado site. Apresentação e Estruturação de Artigos 1. Os artigos devem ser redigidos em português, no formato .doc (Microsoft Office Word™), letra tipo Arial, tamanho 12 com um espaçamento de 1,5 linhas. 2. A extensão máxima do artigo será de 10 páginas, incluindo espaços, figuras, tabelas, quadros, gráficos, notas, bibliografia e fotografias, todos devidamente legendados e identificados. 3. Na primeira página e depois do título do artigo, deverá constar a identificação de todos os autores (máximo 6) de acordo com o formato seguinte: Título do trabalho Autor 1 (Instituição); Autor 2 (Instituição) 2. O envio de um trabalho/artigo implica o compromisso por parte dos autores em como todas as declarações nele constantes são da sua exclusiva responsabilidade. 4. Os artigos deverão respeitar a estrutura geral: introdução, desenvolvimento, conclusão e referências bibliográficas. 3. Qualquer texto deve respeitar os princípios éticos aceites, nomeadamente no que diz respeito à confidencialidade. 1. Os artigos devem ser enviados por correio electrónico (com aviso de leitura) para [email protected], com os seguintes dados de identificação: 4. Serão aceites para publicação monografias, cujas regras de selecção, apresentação e estruturação deverão obedecer ao que aqui é pré-estabelecido, salvaguardando as características inerentes ao tipo de publicação a que nos referimos, com excepção para o limite do número de páginas que não se aplica. Envio de Artigos - Nome completo - Morada - Nº Cédula Profissional 2. Todos os artigos apresentados na TDTOnline Magazine serão devidamente certificados, sendo os certificados enviados para a morada de um dos autores referenciados, após lançamento da TDTOnline Magazine em questão. 40