Evolução da Desdolarização da Economia Angolana

Transcrição

Evolução da Desdolarização da Economia Angolana
Desdolarização da Economia Angolana
1
Departamento de Estudos Económicos (DEE)
Banco Nacional de Angola (BNA)
1
O presente documento é baseado na apresentação do Director do Departamento de Estudos Económicos
(DEE/BNA), Dr. Pedro Castro e Silva, no Seminário sobre “Os Desafios da Desdolarização”, organizada
a 13 de Maio de 2014. O documento beneficia das contribuições dos seguintes profissionais do
Departamento de Estudos Económicos do BNA: Pedro Castro e Silva, Diogo Martinho da Silva, Bruno
Damásio, Denise Maciel, Leonardo Massala e Martine Dias dos Santos. Este trabalho não reflecte uma
opinião geral do BNA, mas sim do referido grupo de trabalho do DEE/BNA, pelo qual assume a
responsabilidade por qualquer erro e/ou comentário encontrados no documento.
Sumário
As altas taxas de inflação e o elevado nível de depreciação da moeda nacional na economia
angolana verificadas no passado levaram os agentes a proteger a sua riqueza e os seus
rendimentos, utilizando a moeda estrangeira para efeitos de reserva de valor, meio de
pagamento e unidade de conta. O custo associado ao alto nível de dolarização da economia,
em particular no que diz respeito à eficácia da política monetária, justificou a intenção do
Banco Nacional de Angola em regular a utilização de moeda estrangeira para diversos fins.
Neste sentido, nos últimos anos tem sido introduzido um conjunto de directrizes
reguladoras que em articulação com a crescente estabilidade macroeconómica, reflectida na
desaceleração da taxa de inflação e estabilidade cambial, contribuíram para que o processo
de desdolarização financeira da economia fosse bem-sucedido. Numa abordagem empírica,
este estudo comprova que estes factores foram determinantes para o processo de
desdolarização da economia, e em concomitância, a desdolarização tem contribuído para a
estabilidade macroeconómica, do qual conclui-se a existência de uma relação de
causalidade bidirecional entre estes.
Palavras-chave: Desdolarização, Regulação Prudencial, Estabilidade Macroeconómica
Código JEL: E50, G20, G21, G28.
Abstract
High inflation rates and high level of depreciation on the domestic currency in the Angolan
economy experienced in the past led agents to protect their wealth and their income using
foreign currency for savings, exchange intermediary and measure of value. The cost
associated with the high level of dollarization of the economy, particularly in regard to the
effectiveness of monetary policy, explained the intention of Banco Nacional de Angola to
regulate the use of foreign currency for various purposes. According this, in recent years
there has been introduced a set of regulatory guidelines in conjunction with the increasing
macroeconomic stability, reflected in lower inflation rates and exchange rate stability,
which contributed to the process of financial de-dollarization of the economy to be
successful. This empirical approach shows that these factors were crucial to the process of
de-dollarization of the economy, and simultaneously, de-dollarization has contributed to
macroeconomic stability, which concludes the existence of a bi-directional causality.
Keywords: De-dollarization, Prudential Regulation, Macroeconomic Stability
JEL Codes: E50, G20, G21, G28.
2
Índice
1.
Introdução ............................................................................................................................. 4
2.
Enquadramento Conceptual .................................................................................................. 5
a.
Definição de Dolarização .................................................................................................. 5
b.
Revisão da Literatura ........................................................................................................ 7
3.
Evolução do Grau de Dolarização da Economia Angolana .................................................. 9
a.
Factos Estilizados da Desdolarização................................................................................ 9
b.
Condições Macroeconómicas .......................................................................................... 14
c.
Regulação Prudencial ...................................................................................................... 17
4.
Determinantes da Desdolarização em Angola: Uma Abordagem Empírica ....................... 21
a.
Os dados .......................................................................................................................... 21
b.
Estimação e Diagnóstico do Modelo ............................................................................... 23
c.
Resultados ....................................................................................................................... 28
5.
Conclusões .......................................................................................................................... 32
6.
Anexos................................................................................................................................. 35
7.
Referências .......................................................................................................................... 37
3
1. Introdução
A desdolarização, sendo um processo complexo que assume variadas conformações, é
caracterizada em termos mais simples, por uma redução progressiva e consistente do stock e dos
fluxos de moeda estrangeira, ao longo de um dado momento espácio-temporal. Neste ensaio,
discutem-se os principais determinantes da desdolarização da economia angolana.
A dolarização pode ter algumas vantagens, tais como a minimização dos riscos cambiais. Pois
pode ser garante de uma maior confiança aos investidores, aumentando o investimento e o
crescimento económico. Em contrapartida, tem também algumas desvantagens, tais como a
limitação da eficácia da política monetária, a diminuição da eficácia dos pagamentos, a
diminuição da liquidez do Estado e pode mesmo contribuir para o aumento da probabilidade de
ocorrência de uma crise de liquidez, sobretudo se a oferta de moeda nacional aumentar
significativamente. Estas têm sido as principais razões apontadas para a implementação de uma
panóplia de medidas pelo Banco Nacional de Angola com o objectivo de incentivar a utilização
da moeda nacional nas transacções reais e financeiras na economia angolana.
Adicionalmente, no caso da economia Angolana, após a adopção do acordo Stand-By com o
FMI, a boa gestão de políticas macroeconómicas tem permitido uma crescente estabilidade
macroeconómica no País, reflectida sobretudo na desaceleração da taxa de inflação.
Nos últimos anos tem-se registado, em termos gerais, uma tendência decrescente nos
indicadores de dolarização quer em termos de créditos quer em termos de depósitos (uma
evolução da desdolarização), portanto é pertinente também reflectir sobre as nuances dessa
mesma evolução, analisando, em particular, a desdolarização desagregada, em cada uma das
suas componentes. Em concomitância, este trabalho almeja fornecer uma abordagem empírica,
procurando também reflectir, não só sobre as determinantes e sobre as causas, mas também
sobre os efeitos da desdolarização na economia angolana.
A estabilidade macroeconómica tem sido apontada como um dos principais determinantes da
desdolarização das economias. Por outro lado, importa perceber até que ponto a adopção de uma
série de medidas regulatórias macroprudencias pode ser eficaz na redução dos índices de
dolarização. Este trabalho explora estas relações, reforçando igualmente o papel que a
ambiência regulatória (e a própria desdolarização), pode ter na estabilização macroeconómica e,
consequentemente, na desdolarização em si mesma, investigando, pois, as eventuais relações de
causalidade bidirecional entre estabilidade macroeconómica e desdolarização no contexto da
economia angolana.
4
O presente estudo encontra-se organizado do seguinte modo: na próxima secção, a secção 2,
explana-se o conceito de desdolarização, apresentando uma sucinta revisão da literatura sobre o
assunto; na secção 3 aborda-se o problema da dolarização no contexto da economia angolana,
bem como as principais razões para a sua crescente e paulatina desdolarização, analisando-se a
evolução do grau de dolarização real de crédito e depósitos desagregada (em termos between e
within; por estrutura de vencimento e por sector de actividade); na secção 4, apresenta-se o
modelo empírico, bem como os resultados econométricos obtidos; e, por fim, a secção 5
conclui.
2. Enquadramento Conceptual
a. Definição de Dolarização
Uma economia diz-se dolarizada nas circunstâncias em que as populações residentes detêm uma
parte significativa dos seus activos em moeda estrangeira, em particular, tal como o nome
sugere, em dólares norte-americanos. Podemos grosso modo distinguir dois tipos de
dolarização, a saber, dolarização oficial (ou completa) e dolarização não oficial (ou incompleta).
Com efeito, a primeira remete para a circunstância em que a moeda estrangeira detém o estatuto
de moeda oficial, na medida em que a dita moeda estrangeira pode ser utilizada, em paralelo
com a moeda local ou mesmo em exclusividade, tanto como meio de troca oficial, para fins de
transacções, como para fins de poupança, Bogetić (2000). Quanto à dolarização não oficial, de
acordo com Baliño, Bennett, and Borensztein (1999), remonta às circunstâncias nas quais a
moeda estrangeira carece dos privilégios legais da moeda nacional, Alvarez-Plata e GarciaHerrer (2008).
De uma outra perspectiva, podemos também balizar o conceito de dolarização em termos de
dolarização financeira, dolarização das transacções e dolarização real. A dolarização financeira,
implica a substituição de activos (e de passivos) em moeda nacional por activos (e passivos) em
moeda estrangeira; a dolarização das transacções, tal como o nome sugere, aplica-se,
usualmente, à intensificação de fluxos de transacções em moeda estrangeira; e, por último, a
dolarização real acarreta a denominação de preços e de salários em moeda estrangeira, Erasmus
et al. (2009).
No entanto, vários estudos sustentam também a tese de que a dolarização é não mais do que
uma consequência inata, e não necessariamente negativa, do advento do capitalismo financeiro,
na medida em que esta decorre da natural abertura das economias dos países emergentes. Ou
seja, a dolarização foi a melhor estratégia para fazer face a três grandes circunstancialismos que
decorreram da progressiva abertura dessas economias, em particular, as economias latino5
americanas e africanas. Mais concretamente, grandes desequilíbrios macroeconómicos, tais
como a hiperinflação (Galindo and Leiderman, 2005; Herrera and Valdés, 2005; Kokenyne et
al, 2010); repressões financeiras, em particular, forte controlo dos mercados de capitais
(Reinhart, Rogoff, and Savastano, 2003); e a possibilidade do dólar norte-americano funcionar
enquanto uma âncora para o equilíbrio macroeconómico (Berg and Borensztein, 2000).
Desta feita, a dolarização pode ser entendida enquanto um resultado natural da progressiva
abertura das economias dos países emergentes, sobretudo a partir da década de 80 do século
passado, dada a maior exposição dessas economias à economia-mundo e consequente exposição
a vários tipos de choques endógenos e exógenos. Estes fenómenos dolarizantes minimizaram,
em certa medida, os riscos cambiais, tendo também, garantido, uma maior confiança aos
investidores, aumentando o investimento e o crescimento económico, tendo, por isso,
contribuindo para um rápido desenvolvimento dos mercados financeiros desses países. Em
suma, como sugere (Chavez, 2012), os empréstimos em moeda estrangeira podem ter tido um
impacto significativamente positivo na procura doméstica, i.e., no consumo e no investimento
interno, consequentemente no crescimento económico, contrariando, pois, a instabilidade e a
volatilidade de certos indicadores macroeconómicos fundamentais. Deste modo, a dolarização
resulta não só em maior capacidade de financiamento, quer em temos de custos de
financiamento, quer ao nível do próprio volume desse financiamento, mas também em
melhorias na credibilidade externa dos governos dos países dolarizados.
Por seu turno, vários autores enfatizam os efeitos deletérios da dolarização dos países ditos
menos desenvolvidos. Nomeadamente, Chang (2000) assevera que a dolarização acarreta custos
tanto para os bancos centrais, como para os governos. Se, por um lado os seus bancos centrais
perdem o controlo total ou parcial da política monetária e, ainda, perdem o estatuto de
prestamista de último recurso da banca comercial, por outro lado, os governos nacionais, em
certa medida, abdicam das receitas inerentes à criação de moeda própria – a questão da
senhoriagem.
Tal como Ize e Yeyati (2005) sustenta, a dolarização limita a eficácia da política monetária dos
países dolarizados e, de acordo com Kokenyne et.al. (2010), como os bancos estrangeiros não
estão completamente adaptados às lógicas e mecanismos de pagamentos e transacções
domésticas, a dolarização pode diminuir a eficácia dos pagamentos dado que as autoridades dos
países dolarizados perdem o controlo da qualidade das notas em circulação. Chavez (2010)
sugere ainda que a dolarização, ainda que mesmo parcial, pode diminuir substancialmente a
liquidez dos Estados, na medida em que a desvalorização pode contrapor o benefício da taxa de
juros de empréstimos em moeda estrangeira limitando, assim, a capacidade dos devedores para
pagar dívidas em dólar, agravando a liquidez dos Estados e precipitando a ocorrência de uma
6
crise macroeconómica. Mais grave ainda, segundo o autor, a dolarização pode mesmo contribuir
para aumentar a probabilidade de ocorrência de uma crise de liquidez, sobretudo se a procura de
moeda aumentar significativamente, porque o pânico nos detentores de moeda estrangeira
determina fortemente as suas expectativas, na medida em que os bancos centrais locais podem
emitir moeda doméstica mas não podem emitir dólares.
b. Revisão da Literatura
Desde o início do século XXI várias economias dolarizadas assistiram a uma redução gradual
dos níveis de moeda estrangeira nas suas economias. Com efeito, várias economias que outrora
se atestavam enquanto dolarizadas se têm vindo a deparar com processos de desdolarização,
fundamentalmente nas regiões latino-americanas e africanas. No entanto, se a literatura em
torno da dolarização é abundante (Broda e Yeyati 2001; Yeyati e Sturzeneggerm, 2001; Calvo,
1999; Ize e Yeyati, 2003; Alesina e Barro 2001 entre muitos outros), menos atenção tem sido
dedicada ao tema da desdolarização.
Não obstante, de alguns anos a esta parte, alguns estudos têm discutido os moldes em que esses
processos de desdolarização se desenrolaram e quais os seus principais determinantes. Assim,
García-Escribano e Sosa (2010), constatando uma redução gradual dos níveis de dolarização nas
economias latino-americanas desde o início do século XXI, procuraram perceber as principais
forças motrizes da desdolarização das economias da Bolívia, Perú, Paraguai e Uruguai. Assim,
os autores adoptaram quatro modelos vectoriais autorregressivos (VAR), um para cada uma das
economias, e concluíram que, em geral, os principais determinantes da desdolarização das ditas
economias foram a estabilidade macroeconómica, alcançada fundamentalmente, à custa da
manutenção de taxas de inflação baixas e taxas de câmbio estáveis; da adopção de determinadas
medidas macroprudenciais, tais como uma gestão activa da taxas de reservas obrigatórias, que
objectivaram uma apropriada internalização do risco cambial por parte dos agentes económicos
e, finalmente, do progressivo desenvolvimento dos mercados de capitais em moeda nacional.
Mais recentemente, García-Escribano (2011) constituiu um modelo VAR para analisar os
determinantes da desdolarização no Perú concluindo os mesmos resultados de García-Escribano
e Sosa (2010).
Por outro lado, Pacajes (2012), analisando os processos de desdolarização da economia peruana,
através da implementação de modelos vectoriais autorregressivos estruturais (SVAR) e de
correcção do erro (VECM), concluíram que a desdolarização no Perú decorreu, essencialmente,
de medidas fiscais e prudenciais que contribuíram para a credibilização das autoridades
7
monetárias cuja política se veio a traduzir em controlo das tensões inflacionistas e em
estabilidade cambial.
Kuscevic e Rivera (2011), através da utilização de um modelo de optimização de portfólio,
concluíram a bolivianização – o processo de desdolarização da Bolívia, se alicerçou
fundamentalmente em medidas fiscais, com a criação de um imposto sobre transacções
financeiras, no aumento do spread cambial, através da amplificação do diferencial da taxa de
reservas obrigatórias entre moeda estrangeira e doméstica e no processo de reavaliação do tipo
de regime cambial, adoptando um regime de flutuação administrativa.
Chavez (2012), trabalhando também sobre a temática da bolivianização, atráves da estimação de
um modelo VAR, concluiu, ao contrário dos estudos anteriores, que a estabilidade
macroeconómica foi uma consequência, e não uma causa, da desdolarização. Desta feita, as
causas da bolivianização foram, por um lado, a implementação de um conjunto de medidas de
índole cambial, tal como a desvalorização cambial e diminuição da variabilidade da taxa de
câmbio, e, por outro lado, de medidas monetárias de controlo de liquidez, como emissões
obrigacionistas de maturidades elevadas.
Ponomarenko, Solovyeva e Vasilieva (2011) analisaram a questão da desdolarização na Rússia,
através da estimação via método dos momentos generalizado (GMM), concluindo que o
principal factor impulsionador da desdolarização na Rússia foi a política cambial,
designadamente, a sucessiva apreciação do rublo face ao dólar e face ao euro.
Uma visão comum entre os ditos economistas é que a dolarização torna a política monetária
mais complicada e menos eficaz, uma vez que os custos reduzidos de troca de moeda doméstica
para participações em moeda estrangeira, a fim de evitar os efeitos inflacionistas, demonstram
que a dolarização pode aumentar a volatilidade da procura por moeda e, por sua vez, a
volatilidade da taxa de câmbio2.
Assim sendo, a desdolarização surge enquanto uma consequência da adopção de um conjunto de
políticas e de medidas macro e microeconómicas com o objectivo de promover a utilização da
moeda nacional nas transacções económicas de forma voluntária (Kokenyne et al., 2010). Como
tal, torna-se pertinente abordar o problema da dolarização no contexto da economia angolana,
bem como as principais razões para a sua crescente e paulatina desdolarização.
2
Segundo Calvo e Vegh (1992, 1996), por exemplo, há uma forte correlação positiva entre a troca de
moeda e a volatilidade da taxa de câmbio.
8
3. Evolução do Grau de Dolarização da Economia Angolana
a. Factos Estilizados da Desdolarização
Ao definirmos o grau de dolarização da economia angolana foram utilizadas duas dimensões, a
dolarização dos depósitos efectuados nos bancos angolanos e a dolarização do crédito concedido
por estes. À semelhança de Mercedes García Escribano (2011), as séries são expressas em um
valor constante da taxa de câmbio nominal. A série de dolarização real do crédito à Economia,
, e dolarização real dos depósitos,
câmbio de Dezembro de 2010, ,
, utilizados na análise foi construída com a taxa de
, como base para evitar mudanças na composição entre os
tipos de empréstimos e depósitos. De um modo formal, para um período , seja
e
os
depósitos em moeda estrangeira expressos em moeda nacional à taxa de câmbio do período ,
, e seja
e
os depósitos e créditos concedidos em moeda nacional, a dolarização de
crédito e depósitos são dados, respectivamente, por 1 e 2:
(
(
)
(
(
(1)
)
)
(2)
)
Tal como se pode visualizar no gráfico 1, a dolarização tem seguido uma tendência decrescente
ao longo dos últimos anos. Se em 2006, a média da dolarização dos créditos e depósitos era,
respectivamente, de 71,42% e 69,42%, já em 2013 aqueles indicadores situavam-se em 38,57%
e 46,70%.
Gráfico 1: Evolução do Grau de Dolarização do Crédito e Depósitos (2006-2013)
80%
70%
60%
50%
40%
Dolarização dos Depósitos
Dolarização do Crédito
30%
2005 2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
Fonte: DES/BNA; Cálculos efectuados por DEE/BNA.
Nota: Séries de dolarização estão expressas em termos reais à taxa de câmbio média de Janeiro de 2010.
9
Não obstante a tendência decrescente dos indicadores de dolarização, é importante
reflectir sobre como tem evoluído o nível de desdolarização na economia. Tal como
argumentado em Garcia–Escribano (2010), os fluxos de depósitos e de créditos são
decompostos em duas componentes, a saber, as componentes within e between. Esta
decomposição permite averiguar não só o processo de dolarização por sector de
actividade económica como também nas alterações da composição do crédito em moeda
externa por todos esses sectores. Da mesma forma, o nível de dolarização de depósitos
totais reflecte as alterações na composição dos depósitos com diferentes estruturas de
vencimento. Garcia–Escribano (2010) definem a decomposição da evolução do grau de
dolarização de crédito com base na equação (3):
∑(
onde
)
∑
é a dolarização do crédito no sector i no ano t, e
(
)
(3)
é o crédito total concedido
ao sector i no ano t. O primeiro termo, within, capta a alteração, ao longo de um período
analisado, nos níveis de dolarização nos sectores e o segundo termo, between, reflecte o
efeito da alteração da composição de crédito. Na tabela I, pode ser observado a
decomposição das componentes between e within para a dolarização de depósitos em
termos de maturidade e do crédito à economia, em termos de sector público e sector
privado.
Na decomposição da desdolarização dos depósitos nas componentes between e within,
pode ser constatado que os depósitos com maior grau de liquidez foram os que
contribuíram mais para a desdolarização, tanto na composição nos depósitos em moeda
estrangeira, between, como na redução real dos depósitos à ordem efectuados nessa
moeda. No caso dos depósitos de liquidez menor, que pode ser vista como as poupanças
aplicadas no sistema financeiro, os efeitos totais do between e within contribuem
positivamente, apesar de ligeiro, para o grau de dolarização da economia, pois apesar de
a dolarização dos depósitos a prazo per si ter descido, de 65,3% em 2006 para 43,1%
em 2013, a sua participação nos depósitos totais aumentou quase na mesma proporção,
de uma média de 24% em 2006 para 44% em 2013.
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Tabela I: Decomposição Between e Within da desdolarização (2006-2013)
Participação (%)
2006
2013
Depósitos à Ordem
Depósitos a Prazo
Depósitos
76,0
24,0
Dolarização (%)
2006
2013
56,0
44,0
82,1
65,3
Within
51,3
43,1
2006 – 2013
Between Contribuição
-23,4
-5,3
-10,3
8,6
-28,8
1,3
100,0
100,0
69,4
46,7
-28,7
-1,6
-30,4
Nota: Séries de dolarização estão expressas em termos reais à taxa de câmbio média de Janeiro de 2010
Assim, pode inferir-se que a desdolarização tem ocorrido mais no sentido da utilização
da moeda nacional como meio de pagamento para despesas de consumo do que
propriamente para efectuar poupança. Pode ser visualizado nos gráficos abaixo que nos
últimos anos o diferencial das taxas passivas entre moeda nacional e moeda estrangeira
tem diminuído, podendo indicar menor atracção na recolha de depósitos em moeda
nacional pelas instituições. Ao nível dos agentes, a maior rigidez da utilização de moeda
nacional nos depósitos a prazo pode ser justificado pelas taxas de juros reais negativas
para instrumentos de poupança em moeda nacional.
Gráfico 2: Taxas de Juros Passivas Anualizadas
8
7
16%
Diferencial Dep. Prazo a mais de 1 ano
Diferencial Dep. Prazo inferior a 1 ano
14%
Inflação
Dep. prazo a mais de 1 ano MN
Dep. Prazo inferior a 1 ano MN
pontos percentuais
6
12%
5
10%
4
3
8%
2
6%
1
4%
0
-1
2%
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
Fonte: DES/BNA; Cálculos efectuados por DEE/BNA.
Nota: A linha a tracejado refere-se ao período a partir do qual é introduzido o conjunto de medidas mais
relevantes para desdolarizar o sector financeiro.
Estas taxas de juros reais negativas para instrumentos de poupança em moeda nacional
implicam que, não obstante a redução da inflação, os agentes que desejam efectuar
poupança em Kwanzas, o juro recebido desses depósitos não compensa o juro de adiar
consumo para o futuro, ou seja, a taxa de inflação. Adicionalmente sendo de esperar que
o Kwanza tenha uma depreciação ligeira face ao dólar, isto traz um custo ainda maior de
se efectuar depósitos denominados em moeda nacional pelos agentes. Este custo de
oportunidade dos agentes em deter poupanças em moeda nacional justifica a maior
resistência em se efectuar poupança denominada em Kwanzas.
11
Gráfico 3: Taxas de Juros Reais dos Depósitos
8%
8%
6%
4%
4%
2%
0%
0%
-4%
-2%
-4%
-8%
-6%
-12%
-8%
-10%
-16%
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2006
2007
Taxas de Juros Passivas Moeda Estrangeira a mais de 1 ano
Taxas de Juros Passivas Moeda Nacional a mais de 1 ano
2008
2009
2010
2011
2012
2013
Taxas de Juros Passivas Moeda Estrangeira inferior a 1 ano
Taxas de Juros Passivas Moeda Nacional a mais de 1 ano
Fonte: DES/BNA e Bloomberg; Cálculos efectuados por DEE/BNA.
Nota: Às taxas de juros reais em moeda estrangeira é deduzido a inflação homóloga norte-americana.
Na tabela II pode ser visualizada a evolução dos termos between e within do crédito à economia
em termos de estrutura de vencimento do crédito fornecido por sector da economia para o
3
período 2008-2013 . A tabela sugere que na dolarização do crédito à economia tanto o Crédito
ao Sector Público como o Crédito ao Sector Privado contribuíram positivamente para a
desdolarização, sendo que no Crédito ao Sector Privado o efeito foi mais relevante. Pode
também inferir-se que tanto o crédito de curto prazo como o crédito de médio prazo têm
contribuído para a desdolarização do crédito. O crédito a médio prazo tem sido o que teve maior
descida no nível de dolarização, em particular, o crédito ao sector privado a médio prazo. Por
exemplo, dos 32,4% de desdolarização real ocorrida no crédito à economia, podemos atribuir
20,7 % de contribuição ao crédito a médio prazo, onde 18,3% pertenciam à contribuição do
Crédito ao Sector Privado a Médio Prazo.
Tabela II: Decomposição Between e Within da desdolarização (2008-2013)
Participação (%)
2008
2013
Dolarização (%)
Within
2008
2013
2008 – 2013
Between Contribuição
Sector Privado Curto Prazo
Sector Público Curto Prazo
Crédito Curto Prazo
Sector Privado Médio Prazo
Sector Público Médio Prazo
Crédito Médio Prazo
32,4
31,8
53,4
24,1
-9,5
-1,1
-9,6
3,1
1,5
63,8
13,3
-1,6
-0,2
-1,8
35,5
33,4
54,8
23,3
-11,0
-0,3
-11,7
61,4
64,7
78,7
46,4
-19,9
1,5
-18,3
3,1
1,9
82,5
8,2
-2,3
-0,1
-2,4
64,5
66,6
70,4
46,4
-22,2
1,4
-20,7
Crédito à Economia
100,0
100,0
70,5
38,0
-33,2
1,1
-32,4
Nota: Séries de dolarização estão expressas em termos reais à taxa de câmbio média de Janeiro de 2010
3
A utilização de períodos diferentes teve a finalidade de poder ser utilizado a máxima informação de
acordo com a disponibilidade estatística.
12
Utilizando um horizonte temporal diferente, 2011-2013, podemos visualizar, a partir da Tabela
III, como tem sido impulsionado o processo de desdolarização pelas mudanças que ocorreram
na concessão de crédito por sector de actividade económica. Assim, podemos inferir que, entre
os anos de 2011 e 2013, os créditos concedidos ao Comércio para Grosso e a Retalho, a
Construção e Transportes, aos Organismos Internacionais e Instituições Territoriais e às
Indústrias Extractivas são os sectores de actividade económica com maior poder explicativo na
desdolarização do crédito naquele período. A soma destes 3 sectores corresponde a cerca de
13,3% da desdolarização do crédito à economia naqueles 3 anos
Já o sector da Agricultura, Produção de Animal, Caça e Silvicultura e o sector de Outras
Actividades de Serviços Colectivos, Sociais e Pessoais foram os sectores que têm colocado
maior oposição à tendência de desdolarização da economia angolana. No primeiro sector
referido pode ser constatado que tanto a mudança dos níveis de dolarização como o peso do
crédito nesse sector no crédito total fornecido foram no sentido de aumentar a dolarização do
crédito à economia. Já nas Outras Actividades de Serviços Colectivos, Sociais e Pessoais, não
obstante o termo within ter diminuído, o aumento da dolarização do crédito a este sector está
relacionado com a sua maior participação comparativamente aos restantes sectores.
Tabela III: Decomposição Between e Within da desdolarização (2011-2013)
Crédito por Sector de Actividade Económica
Outras Act. de Serv. Colectivos, Sociais e Pessoais
Indústria Transformadora
Actividades Financeiras
Comércio p/ Grosso e a Retalho e Reparaç de Bens
Construção
Particulares
Acividades Imob, Alug. e Serv. Prestados às Emp.
Agricultura, Produção Animal, Caça e Silvicultura
Alojamento e Restauração
Transportes, Armazenagem e Comunicações
Educação
Pesca
Saúde e Acção Social
Prod. e Dist. de Electricidade, de Gás e de Água
Indústrias Extractivas
Org. Internacionais. e Inst. Extra – Territoriais
Famílias com Empregados Domésticos
Total
Participação
2011
2013
11,8
20,9
8,1
7,1
3,6
2,1
16,9
16,3
7,8
10,0
18,1
18,4
13,0
10,1
1,5
4,3
0,6
1,5
3,9
2,9
0,3
0,3
0,1
0,2
0,3
0,3
0,1
0,1
8,1
7,1
5,3
0,1
0,0
0,2
100
100
Dolarização
2011 2013
69,3
50,1
67,6
58,8
39,0
21,8
58,7
30,2
59,7
27,5
41,6
28,8
53,1
49,5
51,9
54,3
64,9
39,2
74,7
35,5
69,3
46,9
40,4
28,6
92,7
51,5
48,9
15,0
82,6
40,6
87,6
37,7
50,6
18,6
55,0
38,6
Within
-2,3
-0,7
-0,6
-4,8
-2,5
-2,3
-0,5
0,0
-0,2
-1,5
-0,1
0,0
-0,1
0,0
-3,4
-2,6
0,0
-16,5
2011 – 2013
Between Contribuição
4,6
2,3
-0,6
-1,3
-0,3
-0,9
-0,2
-5,0
0,6
-1,9
0,1
-2,2
-1,4
-1,9
1,5
1,5
0,3
0,2
-0,4
-1,9
0,0
0,0
0,0
0,0
0,0
-0,1
0,0
0,0
-0,4
-3,8
-2,0
-4,6
0,0
0,0
0
-19,7
Nota: Séries de dolarização estão expressas em termos reais à taxa de câmbio média de Janeiro de 2010.
O diferencial das taxas de juros activas em moeda nacional e em moeda estrangeira têm vindo a
reduzir-se, sobretudo a partir de meados de 2010, período em que, tal como veremos adiante, o
Banco Nacional de Angola planeou a inserção de medidas de carácter regulatório e prudencial
13
para incentivar a intermediação financeira na moeda local. Assim, as taxas de juros activas em
moeda nacional apresentaram uma tendência decrescente, enquanto nas taxas de juros activas
em moeda estrangeira se verificou o oposto – uma tendência crescente. Considerando a inflação
angolana e da economia norte-americana podemos observar que as taxas de juros activas
exigidas para o crédito em cada moeda se têm aproximado.
Gráfico 4: Evolução das Taxas de Juros Reais Activas
25%
50%
CSE 180 DIAS ME
CSE 180 DIAS MN
20%
40%
15%
30%
10%
20%
5%
10%
0%
0%
-5%
CRP 180 ME
CRP 180 MN
-10%
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2014
2006
25%
60%
CSE 181 a 1 Ano ME
CSE 181 a 1 Ano MN
50%
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2014
CRP 181 a 1 ME
CRP 181 a 1 MN
20%
40%
15%
30%
10%
20%
5%
10%
0%
0%
-5%
-10%
2006
40%
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2006
2014
35%
CSE 1 Ano ME
CSE 1 Ano MN
30%
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2014
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2014
CRP 1 Ano ME
CRP 1 Ano MN
30%
25%
20%
20%
15%
10%
10%
5%
0%
0%
-10%
-5%
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2014
2006
2007
Fonte: DES/BNA e Bloomberg; Cálculos efectuados por DEE/BNA;
Nota: A linha a tracejado refere-se ao período a partir do qual é introduzido o conjunto de medidas mais relevantes
para desdolarizar o sector financeiro. Às taxas de juros reais em moeda estrangeira é deduzido a inflação homóloga
norte-americana.
b. Condições Macroeconómicas
A dolarização surge quando as altas taxas de inflação de um país implicam que os agentes
económicos procurem moedas mais seguras e estáveis como forma de criar uma reserva segura
da sua riqueza. De facto, no passado as altas taxas de inflação e o elevado nível de depreciação
da moeda nacional, levaram os agentes a proteger a sua riqueza e os seus rendimentos,
utilizando a moeda estrangeira para efeitos de reserva de valor meio de pagamento e unidade de
conta. Contudo, nos anos após a crise de 2009 tem sido evidenciado uma crescente estabilidade
macroeconómica.
14
Em primeiro lugar, a política macroeconómica prudente do Governo foi importante na ajuda a
repor e a fortalecer as contas públicas. Aproveitando-se da excelente situação económica nos
últimos anos, ficou registado nas contas do Governo superavits fiscais significativos de 3,4%,
8,7% e 5,1% do PIB em 2010, 2011 e 2012 respectivamente, conduzindo a uma redução da
dívida pública para níveis inferiores a 30 por cento do PIB.
Adicionalmente, a acumulação de reservas de divisas pelo BNA permitiu fortalecer os níveis de
solvabilidade externa do País. As Reservas Internacionais Líquidas que, em Janeiro de 2006, se
posicionavam em Kz 271.029,16 Milhões, aumentaram para Kz 3.020.833,57 milhões em
Dezembro de 2013.
Esta acumulação de divisas tem sido justificada essencialmente pelo desempenho das contas
externas do país, em particular das receitas de exportação de petróleo e permitiu que desde 2010
até ao presente o BNA disponibilizasse divisas no mercado cambial de modo a satisfazer a
procura de moeda estrangeira pelas instituições financeiras e permitir uma evolução estável da
taxa de câmbio. As perspectivas quanto ao crescimento real de longo prazo também foram
positivas com base na esperada gradual expansão da produção de petróleo e gás natural e,
sobretudo, pelas políticas de incentivo de diversificação da economia e reformas estruturais
implementadas.
A crescente estabilidade macroeconómica está sobretudo evidenciada na evolução da taxa de
Inflação. De ressalva que o Banco Central, através da introdução do Novo Quadro Operacional
de Política Monetária em 2011, implementou instrumentos com a finalidade de absorver o
excesso de liquidez na economia e, por esta via, obter um maior controlo inflacionista. Assim,
começou a estipular metas de inflação que nos últimos anos têm sido alcançadas com sucesso.
De referir que, em 2012, ficou registada uma inflação de 9,02%, abaixo da meta dos 10%, e que,
em 2013, a inflação atingiu os 7,69%, abaixo dos 9% de meta estipulada pelo Executivo.
Tal como pode ser verificado no mapa de gráficos ilustrados em baixo, após uma desvalorização
da taxa de câmbio ocorrida após os efeitos da crise, a maior acumulação de reservas permitiu a
venda de divisas, o que permitiu uma estabilização da taxa câmbio, verificado por variações
ligeiras destas como também menores níveis de volatilidade. Estudos do BNA têm provado que
a estabilidade da taxa de câmbio foi um factor importante no sucesso da redução da inflação,
que acompanha bem a evolução dos níveis de dolarização.
15
Gráfico 5: Estabilidade Macroeconómica e Desdolarização da Economia
Fonte: DES/BNA; MINFIN, INE-Angola; DEE/BNA.
Estes factores importantes na desaceleração da taxa de inflação ocorrida e na estabilização da
taxa de câmbio no mercado cambial, vão ao encontro do objectivo principal do BNA que passa
por preservar o valor da moeda nacional, incentivando o uso da mesma. Todo este contexto
económico e financeiro fez com que, em 2012, a agências de notação de risco Fitch e
MOODY’S revissem em alta o Outlook para a dívida soberana de Angola de estável para
positivo.
Assim, pode ser inferido que no período após a crise ficaram reunidas as condições para o
processo de desdolarização através da estabilidade a nível macroeconómico e da credibilidade
das políticas conduzidas pelo Executivo (Tabela IV). Uma vez que a dolarização requer que os
agentes económicos sintam confiança e segurança ao deterem moeda nacional e utilizaram-na
para as suas transacções, esta estabilidade e a percepção desta estabilidade por outras
organizações internacionais têm eliminado factores que conduziram à dolarização da economia.
16
Tabela IV: Indicadores de Estabilidade Macroeconómica
Taxa de Inflação Homóloga (%)
Saldo Orçamental (% PIB)
Dívida Pública (% PIB)
Cobertura de Meses de Importação (nº de meses)
Taxa de Crescimento Real (%)
2008
2009
2010
2011
2012
2013
13,2
8,8
17,6
5,0
13,8
14,0
-9,6
22,6
3,8
2,4
15,3
6,8
38,0
6,6
3,5
11,4
10,2
32,4
7,8
3,9
9,0
6,7
30,1
8,6
5,2
7,7
0,3
26,5
8,0
7,4
Fonte: DES/BNA; MINFIN, INE-Angola; DEE/BNA.
Nota: Relativamente às metas de convergência da SADC (2013-2018), à excepção da inflação o País cumpre com
estas imposições. Passam pela taxa de inflação anual inferior a 3%, deficit orçamental inferior a 3% do PIB, Dívida
Pública inferior a 60% do PIB; Cobertura de meses de importação em pelo menos 6 meses e uma taxa de crescimento
superior a 7%.
c. Regulação Prudencial
Para além da estabilidade macroeconómica, o Banco Nacional de Angola tem introduzido
diversas medidas de ordem prudencial e um novo quadro regulamentar com a introdução de
instrutivos destinados a garantir a gestão adequada do risco cambial nas instituições financeiras
e internalizar um custo real maior das suas carteiras de activos compostos em moeda
estrangeira. Este tipo de medidas contribuem para condições de concorrência equitativas para os
produtos financeiros em moeda nacional limitando o incentivo da intermediação financeira na
moeda estrangeira, bem como o uso desta como meio de pagamento nas operações a nível
nacional. Desde logo a taxa de reservas obrigatórias que, sendo indiferente para o tipo de moeda
utilizado nos depósitos, começou a ser diferenciada desde Junho de 2010. Nesta data a taxa de
reservas obrigatórias em moeda nacional passou de 30% para 25%, enquanto a taxa de reservas
obrigatórias em moeda estrangeira passou de 30% para 15%. Desde então, a taxa de reservas
obrigatórias em moeda nacional tem vindo a diminuir, reduzindo o diferencial face a esta
exigência em moeda externa, até que em Julho de 2013 esta diferença foi anulada com o
requerimento em moeda nacional a ser de 15%. Esta gestão activa das exigências de reservas
sobre os depósitos em moeda nacional sinaliza a intenção do BNA em reduzir os custos de
financiamento dos agentes económicos que recorrem ao crédito em moeda nacional, o que
incentiva a utilização da moeda nacional no sistema financeiro angolano.
Por outro lado, desde 2011 o rácio de solvabilidade regulamentar passou a incorporar uma
exigência de cobertura para o risco cambial. Deste modo, os bancos com maior negociação em
moeda externa terão de reter mais capital.
Ainda na óptica prudencial, no sentido de se regulamentar o limite de exposição ao risco de
câmbio e ouro das instituições financeiras sujeitas à supervisão do BNA, insere-se o Aviso nº
5/2010 nos termos do qual a exposição cambial líquida daquelas instituições ficou limitada a
20% dos fundos próprios regulamentares, ou seja, os recursos de que os bancos precisam de
17
dispor em função da natureza e escala das suas operações, tanto ao nível da exposição cambial
longa, como para a exposição cambial curta. Deste modo, foi implementado um cronograma de
forma a permitir a adequação das instituições financeiras ao limite de exposição ao risco
cambial, consoante se pode verificar resumidamente na tabela V:
Tabela V: Cronograma de implementação do Aviso 5/2010 de Novembro – Exposição
Cambial
31 de Dezembro de 2010
30 de Junho de 2011
31 de Dezembro de 2011
30 de Junho de 2012
Posições Longas
70%
50%
30%
20%
Posições Curtas
40%
30%
20%
20%
Fonte: Aviso 5/2010.
Por outro lado, a regulação sobre a compra e venda de divisas, em conformidade com o artigo 8º
do Aviso nº 10/2003, de 22 de Agosto, revestiu-se de características que a fixaram num
contexto histórico que se mostrou necessário rever devido à necessidade de um melhor
atendimento à procura de divisas e uma gestão adequada do volume de reservas bancárias livres.
Assim o instrutivo 4/2011 de 4 de Junho indicou que as instituições financeiras ficassem
expressamente impedidas de realizar operações de créditos, por desembolso, em moeda
estrangeira, em quaisquer prazos, para as seguintes finalidades: adiantamentos a depositantes ou
descobertos ou outros créditos com natureza de curto prazo (inferior a um ano), assistência
financeira de liquidez (incluindo, entre outras, as contas correntes caucionadas; financiamento
automóvel; crédito ao consumo; microcrédito).
Por fim, a norma regulatória mais relevante e que poderá ser mais significativa no combate à
dolarização prende-se com a entrada do Novo regime Cambial para o Sector Petrolífero. Em
Janeiro de 2012, o Governo Angolano promulgou a Lei Cambial do Sector Petrolífero (Lei Nº
2/2012), no sentido de estabelecer o regime cambial para a liquidação de operações de capital,
mercadoria e de invisíveis correntes resultantes da actividade de pesquisa, avaliação, prospecção
e desenvolvimento e produção de petróleo bruto e gás natural. Pois, considerando que as
operações petrolíferas geram grandes volumes de investimentos para a economia Angolana,
sentiu-se a necessidade de um regime cambial diferenciado do que vigorava para as restantes
actividades económicas. Deste modo, procedeu-se a uma uniformização dos regimes cambiais
aplicáveis ao sector petrolífero de forma a estabelecer um sistema de equidade de tratamento das
entidades investidoras.
Segundo a Nova Lei Cambial do Sector Petrolífero, a liquidação de operações cambiais do
sector petrolífero corresponde à aquisição ou alienação de moeda estrangeira, e à liquidação de
quaisquer transacções de mercadorias, de invisíveis correntes ou de capitais, à abertura e
18
movimentação no país, de contas em moeda nacional, por não residentes, à abertura e
movimentação no país, de contas em moeda estrangeira por residentes ou por não residentes. Na
lei referida, estas operações deverão ser efectuadas por intermédio de uma instituição financeira
bancária domiciliada no país autorizada a exercer o comércio cambial, nos termos da legislação
em vigor.
Após a venda da moeda estrangeira ao Banco Nacional de Angola, os saldos das contas abertas
em instituições financeiras bancárias domiciliadas no país devem ser utilizados no pagamento
de despesas correntes (cash-call), nomeadamente, na liquidação de importações de bens e
serviços fornecidos por entidades não residentes.
Deste modo, o saldo excedentário resultante do pagamento das despesas correntes das contas
das sociedades investidoras estrangeiras, pode ser aplicado quer no mercado interno como no
externo. Isto obriga-nos a reflectir sobre o impacto destas transacções no câmbio e
consequentemente sobre a posição das divisas do país, que no caso de Angola, devido à
caracterização da sua economia, tendem a ser usadas como hedging.
A tabela VI apresenta um cronograma sobre as fases de implementação da Nova Lei Cambial do
Sector Petrolífero.
Tabela VI: Fases de implementação da Nova Lei Cambial do Sector Petrolífero
1ª Fase - Maio de
Abertura de contas em MN e ME em instituições bancárias domiciliadas no País
2012
para que os montantes relativos a obrigações fiscais sejam depositados em ME.
2 Fase - Outubro
Os pagamentos efectuados pela Sonangol e suas Associadas devem ser
de 2012
efectuados através de contas domiciliadas no País.
Maio de 20131\
3ª Fase - Julho de
2013
Os montantes relativos a obrigações fiscais têm de ser depositados em contas
específicas em MN em bancos domiciliados no País.
Os pagamentos a Residentes Cambiais devem ser efectuados em MN.
4ª Fase - Outubro Os pagamentos de fornecimento de bens e serviços a Não Residentes Cambiais
de 2013
devem ser efectuados através dos bancos domiciliados no País.
Fonte: Lei Cambial do Sector Petrolífero (Lei Nº 2/2012)
Nota: - 1/ Por norma existem 4 fases oficiais. No entanto, Maio de 2013 também foi um dos marcos desta lei e, como
tal, também foi focada na tabela.
Tal como reparámos no gráfico 1, a desdolarização tem apresentado uma tendência decrescente,
contudo no momento em que se introduz o NRSC, verifica-se uma estabilização desta
tendência. Especialmente, se consultarmos o mapa de gráficos 6, cada momento de
implementação das duas primeiras fases era coincidente com uma descida contemporânea da
dolarização, porém era precedida com o aumento destes valores. Este abrandamento no processo
de desdolarização era mais evidenciado nos depósitos a prazo. A excepção está desde o início da
19
implementação da 3ª fase cuja dolarização foi continuamente descendente até o final do ano. É
importante referir que neste período a dolarização real teve uma descida merecedora de realce,
com um processo de desdolarização real dos depósitos nos últimos 6 meses do ano em 10,26
p.p., representando mais de um terço da desdolarização total de 2006 a 2013 (27,06 p.p.).
Adicionalmente, uma nota importante para o período desde que se introduziu o NRSC, é que
este é coincidente com o aumento do risco cambial em várias perspectivas, a saber:
(i) A posição cambial aberta líquida em termos de fundos próprios regulamentares apresentou
uma tendência ligeira de subida e, em particular, desde Março de 2013, com um rácio de 4,62%,
até o final do ano, com um rácio de 21,76% em Dezembro de 2013, sendo que em Julho,
Setembro, Outubro, Novembro e Dezembro o rácio apresentou-se sempre acima dos 20%
exigidos pelo Aviso nº 05/2010;
(ii) Desde a implementação da 1ª fase até o Fevereiro de 2013 o diferencial face à taxa de
câmbio do mercado informal aumentou consideravelmente (de -5,7 Kz/USD em Maio de 2012
para -10,5 Kz/USD em Fevereiro de 2013);
(iii) Desde o início de 2010, o período após a implementação da 3ª fase do NRSC até o final do
ano foi o período cuja volatilidade da taxa de câmbio foi mais elevada. A implementação das
últimas fases da Lei implicou que os bancos reduzissem a sua dependência aos leilões de vendas
de divisas do BNA, podendo recorrer aos depósitos dos seus cliente e ao mercado cambial
interbancário. Contudo este risco da volatilidade atenuou-se no final do ano e com a informação
que se detém nos primeiros meses de 2014, podendo-se associar a maior volatilidade da taxa de
câmbio a choques decorridos das inovações estruturais ocorridas no sistema. Porém a
persistência destes choques pode ser considerado fraco. Uma novidade relevante desta análise
ao que é sugerido na maioria da literatura sobre o tema em análise prende-se com o facto de o
momento em que a desdolarização foi maior, foi igualmente o momento em que a taxa de
câmbio teve períodos de maior volatilidade.
20
Gráfico 6: NRSC, Volatilidade da Taxa de Câmbio e Dolarização dos Depósitos
12%
52%
60%
10%
50%
10%
56%
8%
48%
8%
52%
6%
46%
6%
48%
4%
44%
4%
44%
2%
42%
2%
0%
40%
64%
Limite
Cambial
40%
I
II
III
IV
I
II
2010
III
IV
I
2011
-4
Limite
Cambial
1ª Fase
NRSC
A4
II
III
IV
I
II
2012
III
2ª Fase
II
III
IV
I
II
2012
2013
Volatilidade da Taxa de Câmbio (E.L.D.)
14%
12%
-6
10%
-7
8%
-8
6%
-9
4%
-10
2%
III
IV
2013
Dolarização Real dos Depósitos
12%
Limite
Cambial
80%
-5
12%
0%
I
IV
A4
4ª Fase
3ª Fase
A4
3ª Fase
NRSC
10%
40%
8%
0%
6%
-40%
-11
4%
2%
-80%
0%
I
II
III
IV
I
2010
II
III
IV
2011
I
II
III
2012
IV
I
II
III
2013
Diferencial da taxa formal face à taxa informal em Kz/USD (E.L.E.)
Volatilidade da taxa de Câmbio
IV
0%
I
II
III
2010
IV
I
II
III
2011
IV
I
II
III
IV
2012
I
II
III
IV
2013
Exposição Cambial líquida (E.L.E.)
Volatilidade da Taxa de Câmbio (E.L.D.)
Nota: A linha a tracejado refere-se ao período a partir do qual é introduzido o conjunto de medidas mais relevantes
para desdolarizar o sector financeiro.
4. Determinantes da Desdolarização em Angola: Uma Abordagem Empírica
a. Os dados
Com o intuito de investigar os determinantes dos processos de desdolarização da economia
angolana foi levada a cabo uma abordagem empírica. Com efeito, foram edificados dois
modelos vectoriais autorregressivos (VAR), tal como explicaremos mais adiante, objectivando a
estimação de sistemas equacionais capazes de caracterizar estruturalmente as relações entre os
principais blocos que caracterizam o processo de desdolarização da nossa economia. Como se
discutiu anteriormente, os blocos de variáveis distintos que devem ser tidos em conta num
estudo como este vão ao encontro com o que a literatura sugere: desdolarização, estabilidade
macroeconómica e medidas macroprudenciais. Assim, uma vez definidos os blocos (ou seja, as
variáveis que por definição são inobserváveis per si) o segundo passo é o de escolher as
variáveis concretas que melhor caracterizam cada um dos três blocos seleccionados, ou seja, as
variáveis proxy.
Duas especificações VAR foram estimadas a partir de dados mensais para o período de 2006 a
2013. A primeira especificação estende García-Escribano (2010) ao incluir a dolarização do
crédito e depósitos especificados por estrutura de vencimentos, em primeiras diferenças, como
21
variáveis endógenas (bloco da desdolarização). A segunda especificação inclui essas variáveis
mais a taxa de inflação, a volatilidade da taxa de câmbio como variáveis endógenas (blocos da
desdolarização e da estabilidade macroeconómica). Esta última especificação difere do estudo
de García-Escribano (2010) pois visa investigar uma possível relação de causalidade
bidirecional entre a desdolarização e a estabilidade macroeconómica.
A título de exemplo, este capítulo procura dar resposta cabal, entre outras, às seguintes
questões: (i) em que medida a estabilidade macroeconómica e o quadro regulamentar do BNA,
consubstanciado em certas medidas prudenciais, concorrem para ditar o comportamento da
desdolarização da economia angolana?; (ii) será que este processo desdolarizante também
concorre para a estabilização dos principais indicadores macroeconómicos?; (iii) ou estabilidade
macroeconómica e desdolarização da economia são dois processos que se influenciam
mutuamente, cruzando-se e entrecruzando-se, numa lógica de causalidade bi-direccional, cujo
principal determinante é a política posta em marcha pelo BNA?
Em suma, podemos subdividir as variáveis subjacentes ao nosso ensaio em três grandes
grupos/blocos:
1 – Indicadores sobre o grau de dolarização real da economia: crédito a curto prazo - D_C_CP;
crédito a médio prazo - D_C_MP; depósitos à ordem – D_DO; e depósitos a prazo - D_DP.);
2 - Variáveis relacionadas com estabilidade macroeconómica (taxa e inflação homóloga – inf;
volatilidade da taxa de câmbio a 10 dias – VOLAR_TCO; dummy que vale 1 nos períodos cujas
apreciações foram superiores a 1% - D_APR; dummy que vale 1 nos períodos cujas depreciações
foram superiores a 1% - D_DEP; e uma dummy para ajustar as estimações a um período
considerado de crise, como o do ano de 2009, após a queda do preço do petróleo nos mercados
financeiros internacionais - D_CRISE;
3 - A introdução de medidas prudenciais para criar incentivos para que os agentes internalizem
os riscos da dolarização financeira – PRUD.
Importa referir que todas as séries de desdolarização são expressas em um valor constante da
taxa de câmbio nominal. Tal como referido anteriormente, a série de dolarização de
empréstimos e depósitos utilizados na análise foram construídas com a taxa de câmbio de
Janeiro de 2010 de modo a isolar o efeito da composição do crédito e depósitos em moeda
estrangeira sem que esteja inserido a taxa de câmbio. Na Tabela VII, encontram-se resumidos as
principais estatísticas descritivas dos dados em questão.
22
Tabela VII: Estatísticas Descritivas
Média
Mediana
Máximo
Mínimo
Dev. Pad.
Obs
D_C_CP
D_C_MP
D_DO
D_DP
INF
VOLAT_TCO
39,695
42,278
51,692
19,443
8,746
73
65,319
69,375
79,371
47,066
9,951
73
60,671
56,882
82,768
48,061
10,467
73
52,867
52,388
68,472
34,509
8,012
73
0,943
0,956
2,772
0,408
0,303
73
1,141
0,233
17,747
0,000
2,510
73
b. Estimação e Diagnóstico do Modelo
Como é sabido, tanto a consistência como a eficiência das estimativas obtidas dependem da
especificação das variáveis, principalmente em modelos da família das especificações dinâmicas
como é o caso. Assim, é importante perceber qual a especificação mais indicada a considerar
para as variáveis endógenas. Portanto as variáveis sujeitaram-se aos habituais testes de raíz
unitária de modo a decidir sobre a especificação mais adequada.
Como todas as séries, à excepção da taxa de inflação e da volatilidade da taxa de câmbio,
exibem um comportamento errático fruto da presença de uma raiz unitária nos polinómios das
suas representações autorregressivas, consideram-se as suas primeiras diferenças simples. Com
efeito, a dolarização dos depósitos à ordem e a prazo (D_DO e D_DP) e a dolarização dos
créditos de curto e de longo prazo (D_C_CP e D_C_MP) vêm diferenciadas.
Tabela VIII: Testes de raíz unitária
D_C_CP
D_C_MP
D_DO
D_DP
VOLAT_TCO
INF
Estatística DF
-2,135
-1,469
-2,782
-0,246
-7,529
-6,6971
Valor-p
0,5177
0,8311
0,2076
0,9276
0,000
0,000
Por último, é importante referir o facto de se ter tentado perceber a possibilidade de existir uma
relação de equilíbrio de longo prazo que governasse as variáveis originais em níveis isto é, a
possibilidade de as séries partilharem a mesma tendência estocástica. Com efeito, efectuaram-se
testes de cointegração na senda da metodologia multivariada de Johansen. Tanto o teste do traço
como o teste do máximo sugeriram a inexistência de cointegração em ambos os casos.
- Primeira especificação: VAR bivariado
Na primeira especificação do modelo, tal como anteriormente discutido, consideram-se
enquanto variáveis endógenas a dolarização dos depósitos e a dolarização em termos de
créditos. O objectivo é o de perceber em que medida as medidas macroprudenciais
operacionalizadas pelo BNA e a estabilidade macroeconómica concorrem para a desdolarização
23
da nossa economia, à semelhança de Garcia-Escribano e Sosa (2010) e de Garcia-Escribano
(2011). Note-se que a desdolarização vem desagregada por créditos de curto e de médio prazo e
por depósitos à ordem e a prazo, portanto, o modelo também procura captar as relações de
(inter)dependência entre desdolarização nos créditos de diferentes maturidades e desdolarização
nos diversos tipos de depósitos.
Os resultados da estimação da primeira especificação do modelo vectorial autorregressivo
encontram-se na tabela VIII em baixo. Resultados, esses, que serão analisados com mais detalhe
na próxima secção – Resultados e Comentários.
Tabela IX: Estimações VAR Bivariado
Δ(D_C_CP)
Δ (D_C_MP)
Δ (D_DO)
Δ (D_DP)
Dolarização
0,096199
0,06976
0,03895
Δ (D_C_CP(-2))
0,204161***
0,052473
0,148419***
-0,011475
0,16649
Δ (D_C_MP(-1))
-0,340062**
-0,001697
-0,120388
Δ (D_C_MP(-2))
-0,052744
0,003429
Δ (D_DO(-1))
0,228529**
-0,075792
-0,137691
0,272284***
0,003232
Δ (D_DO(-2))
-0,029258
0,020735
-0,038546
-0,148054
Δ (D_DP(-1))
0,132853
0,037478
0,102555
Δ (D_DP(-2))
0,021831
-0,140621
0,501811**
-0,126142
0,237573**
Δ (D_C_CP(-1))
0,13127
-0,107712
Estabilidade Macroeconómica
D_APR
0,649515
-2,12394**
-0,197888
0,188204
D_DEP
VOLAT_TCO
-0,056142
-0,947832
-6,757856*
-0,100805
0,075642
0,350964*
0,139706
-0,003565
INF
-0,044722
1,50415
-1,984912
2,445044**
-0,78104
0,989572
D_CRISE
-2,113144*
0,383037
-1,606832*
1,235024
Regulação Prudencial
PRUD
-1,527186*
0,664488
Um dado importante e merecedor da nossa atenção prende-se com o comportamento estável que
o modelo patenteia. Assim, verifica-se que as raízes do polinómio característico estão todas
dentro do círculo unitário, circunstância que sustenta a estabilidade do modelo.
24
Gráfico 7: Raízes Invertidas do Polinomial Característico AR
Inverse Roots of AR Characteristic Polynomial
1.5
1.0
0.5
0.0
-0.5
-1.0
-1.5
-1.5
-1.0
-0.5
0.0
0.5
1.0
1.5
Nota: Os pontos azuis dentro do círculo unitário representam raízes invertidas do polinomial característico AR
No que concerne ao comportamento do modelo, importa fazer alguns ensaios pós-estimação que
atestem as boas valências e fiabilidade das estimativas obtidas. Onde, em termos de bateria de
testes de diagnóstico, efectuaram-se testes de autocorrelação residual e de heterocedasticidade.
Por outro lado, analisou-se a estabilidade do modelo através do cálculo das raízes inversas dos
polinómios das equações características.
Em relação ao teste de autocorrelação residual empregou-se o teste LM do multiplicador de
Lagrange que sugere o bom comportamento das perturbações do modelo.
Tabela X: Teste LM de Autocorrelação
Lags
LM-Stat
Prob
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
3,767630
5,058586
3,397596
6,020843
5,291196
1,972847
7,857061
1,566481
0,870016
0,784606
3,916937
4,095690
0,4384
0,2813
0,4936
0,1976
0,2587
0,7408
0,0970
0,8148
0,9288
0,9405
0,4174
0,3932
O teste de heterocedasticidade de White, na senda do teste de autocorrelação LM, aponta
também para o bom comportamento dos erros na medida em que sugere alguma estabilidade no
comportamento da variância condicional dos erros das equações do modelo.
25
Tabela XI: Testes de Heterocedasticidade de White
Segunda
especificação:
Chi-sq
df
Prob.
254,6912
240
0,2458
VAR
tetravariado
ou
a
endogeneização
da
estabilidade
macroeconómica
Na senda da ideia de se poder captar indícios de causalidade bidirecional entre desdolarização e
estabilidade macroeconómica, ou seja, procurando perceber as relações de causalidade mútua
entre desdolarização e entre estabilidade macroeconómica, ao VAR bivariado foram
acrescentadas duas variáveis. As variáveis incluídas são a estimativa da volatilidade da taxa de
câmbio e a inflação dado serem variáveis proxy para a estabilidade macroeconómica que, sendo
uma variável latente e complexa, que resulta da interacção entre as diversas forças materiais e
imateriais, é inobservável. Portanto, esta especificação vem, no fundo, endogeneizar a
materialidade da estabilidade macroeconómica. A estimação encontra-se sumarizada em baixo
e, à semelhança da primeira especificação será objecto de discussão na próxima secção do
trabalho.
Tabela XII: Estimações VAR Tetravariado
Δ (D_C_CP)
Δ (D_C_MP)
Δ (D_DO)
Δ (D_DP)
INF
VOLATILIDADE
0,059132
0,090413
0,018365**
0,097241
-0,031885
0,226217*
0,017248*
-0,074544
Dolarização
Δ (D_C_CP(-1))
-0,143042
0,103635
***
Δ (D_C_CP(-2))
0,116775
Δ (D_C_MP(-1))
-0,277186*
-0,12699
-0,057456
-0,145429
0,003881
-0,055801
Δ (D_C_MP(-2))
-0,019479
0,021898
-0,232248
0,148106
0,013741
0,029842
-0,017462
-0,12489
***
-0,003636
-0,13158***
Δ (D_DO(-1))
0,182913
***
0,119774
-0,109692
***
-0,057761
0,066843
-0,05797
-0,13288**
0,006189
Δ (D_DP(-1))
0,180682
0,002676
0,062066
-0,069617
0,012934
*
-0,137424
Δ (D_DP(-2))
0,031861
-0,10754
0,467041*
-0,18669***
0,014727
-0,054916
Δ (D_DO(-2))
-0,04558
Estabilidade Macroeconómica
INF(-1)
INF(-2)
VOLAT_TCO(-1)
1,28348**
-1,051319
0,467321**
0,238074**
-0,359377
-0,003241
0,899914
-0,523204
0,323339
-0,011442
0,070603
-0,122387
*
-0,012504
**
0,087285
-3,195601
**
0,335895
-0,005173
-0,02011
**
VOLAT_TCO(-2)
-0,064461
-0,064657
-0,14259
-0,00276
-0,020105
C
4,587267
-4,012103
2,913367
-0,732945
0,928644
0,076843
*
0,313116
-0,067899
1,104245**
D_CRISE
-1,26501
***
1,93997
*
-2,34771
-0,033831
D_APR
1,131593
-0,386244
0,085551
0,755579
0,31050*
5,325309*
D_DEP
-0,651455
1,101312
-6,91682*
-0,072887
-0,012479
3,311288*
0,381502
-0,28088*
0,462712
Regulação Prudencial
PRUD
-2,88090
*
1,253243
-1,6868**
26
O modelo estimado para a segunda especificação foi também sujeito a uma bateria de testes de
diagnóstica pós-estimação. Em baixo, verifica-se que todas as raízes do polinómio característico
se encontram dentro do círculo unitário, onde, a estabilidade do sistema está garantida.
Gráfico 8: Raízes Invertidas do Polinomial Característico AR
Inverse Roots of AR Characteristic Polynomial
1.5
1.0
0.5
0.0
-0.5
-1.0
-1.5
-1.5
-1.0
-0.5
0.0
0.5
1.0
1.5
Nota: Os pontos azuis dentro do círculo unitário representam raízes invertidas do polinomial
característico AR
A segunda especificação do modelo exibe, tal como a primeira especificação, erros
invejavelmente bem comportados. Assim, o comportamento próximo de um ruído branco
gaussiano é atestado pelos testes LM de autocorrelação e de heterocedasticidade de White.
Tabela XIII: Testes LM de Autocorrelação
Lags
LM-Stat
Prob
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
26,03268
32,0268
37,97299
23,26295
31,10523
38,58037
43,08599
40,55953
43,50444
34,48327
46,80004
46,2009
29,25637
32,25929
25,06348
26,71665
42,49944
24,79882
29,54703
41,56148
21,65047
33,19883
30,1251
22,53996
0,8896
0,6581
0,3795
0,9501
0,7005
0,3537
0,194
0,2762
0,1822
0,5408
0,1073
0,1187
0,7795
0,6472
0,9144
0,8697
0,2114
0,9204
0,7678
0,2413
0,9718
0,6025
0,7435
0,9609
27
Tabela XIV: Teste de Heterocedasicidade de White
Chi-sq
df
Prob.
593,6209
588
0,4275
c. Resultados
Na secção anterior expuseram-se e justificaram-se as metodologias de estimação e analisou-se a
qualidade das estimativas obtidas através da análise pós-estimação. Por agora é pertinente
fazerem-se alguns comentários acerca dos resultados produzidos pelos modelos.
Primeiramente deve ser aludido ao facto de significância estatística e significância económica
serem dois conceitos distintos. Com efeito, se a primeira remete para as circunstâncias em que
os coeficientes de uma determinada variável são estatisticamente diferentes de zero; a segunda,
por seu turno, remonta essencialmente à magnitude e sinal dos coeficientes. Deste modo,
ausência de significância estatística não implica ausência de significância económica (e viceversa), na medida em que o problema poderá somente residir em desvios padrão artificialmente
inflacionados. Por outro lado, existem diversos factores que podem contribuir para uma aparente
ausência de significância estatística, quando, na realidade, os coeficientes até podem ser
significativos, quer económica quer estatisticamente, a saber:
1. Baixa variabilidade amostral das variáveis a que os coeficientes estão associados;
2. Dimensão amostral reduzida
3. Multicolinariedade elevada (ou mesmo moderada) entre as ditas variava
4. Heterocedasticidade
5. Autocorrelação residual
Se tanto o primeiro como o segundo modelo não padecem de problemas inerentes aos efeitos
deletérios que a presença de autocorrelação e/ou de heterocedasticidade podem acarretar, em
relação aos pontos 1. a 3. o caso muda de figura. É sabido que um dos grandes problemas da
abordagem VAR se prende com a elevada colinariedade entre as variáveis endógenas e entre as
endógenas e as exógenas quando as últimas surgem desfasadas. Doutro prisma, a dimensão da
amostra coligida é altamente insatisfatória e, ainda, muitas variáveis apresentam uma pequena
variabilidade amostral. Consequentemente, a baixa precisão com que os desvios padrão dos
coeficientes foram estimados pode concorrer para insignificâncias estatísticas espúrias.
Portanto, daqui para a frente as estimativas serão analisadas tendo em conta, sobretudo, a
significância económica dos coeficientes, empregando para efeitos de significância estatística
um nível de significância nominal de 15%.
28
- Resultados da Primeira especificação: VAR bivariado
No que ao primeiro modelo diz respeito, verifica-se que os grandes determinantes da
desdolarização dos créditos são variáveis que remetem tanto para a estabilidade
macroeconómica quanto para as medidas macroprudenciais. Com efeito, apesar de a inflação e
da taxa de câmbio (volatilidade e variações consideráveis) não aparentarem determinar
significância da dolarização dos créditos de curto prazo, contudo, quanto aos créditos de médio
prazo o caso muda de figura. Assim, tanto as apreciações extremas na taxa de câmbio, como a
variabilidade dos retornos da taxa de câmbio concorrem significativamente para incrementos e
para decrescimentos, respectivamente, na desdolarização dos créditos de médio prazo.
Com apreciações mensais acima de 1%, são alteradas as expectativas dos gerentes bancários
quanto à rentabilidade exigida para créditos de prazo maior. Assim, os agentes podem expectar
que uma provável depreciação até o vencimento não será tão elevada. Deste modo, para uma
margem de lucro já definida, os bancos podem exigir rendibilidades menores para estas
estruturas de vencimento do crédito em moeda nacional aumentando, nesta forma, a sua
concessão.
Quanto à volatilidade, esta cria maior incerteza na evolução do valor da moeda nacional a médio
prazo e, consequentemente, a rentabilidade esperada nos créditos nesta moeda. Tal situação
implica uma exigência de rentabilidade maior para compensar os cenários mais pessimistas.
Por outro lado, o período pós introdução dos limites à exposição cambial foi uma situação que
contribuiu para a redução da dolarização dos créditos. Tal como argumentámos supra, um ponto
interessante na proxy para o período iniciado com a imposição de limites à exposição cambial
prende-se com o facto de esta ter sido, entre as medidas macroprudenciais introduzidas, a que se
iniciou num período mais antigo, e assim pode ser interpretado também como o período em que
entrou em vigor o conjunto de medidas regulatórias mais relevantes para diminuir o grau de
dolarização da Economia. Importa referir que foram experimentadas outras proxies para além
desta, particularmente referentes ao período de introdução do instrutivo 4/2011 de 4 de Junho e
o período referente à introdução do NRSC. No entanto, a introdução de mais variáveis cuja
interpretação era semelhante implicava redundância dos resultados e impossibilidade de se obter
uma conclusão única quanto aos efeitos das políticas macroprudenciais. Por exemplo, ao
adicionarmos a proxy para o período de introdução do instrutivo 4/2011 de 4 de Junho, que
limitava a concessão de crédito em moeda estrangeira, o modelo não fornecia significância
estatística a esse período no combate à dolarização do crédito e, inclusive, o sinal do coeficiente
indicava uma relação positiva com a dolarização do crédito. Tal situação não significava que de
facto este período não tenha sido influente no processo de desdolarização, mas sim, que os
29
efeitos deste instrutivo não foram de impulso diferenciador relativamente ao efeito das outras
variáveis pois o seu efeito poderá estar subjacente ao período a que corresponde a variável prud.
De facto, tal como abordado no capítulo 3, a desdolarização do crédito decomposta pelos termos
within e between tem sido reduzida em todas as maturidades, tanto nos sectores públicos como
no sector privado. Adicionalmente, esta redução também é relevante para a maioria dos sectores
de actividade económica. Podemos aferir que a dimensão macroprudencial tem sido relevante
para desincentivar a intermediação financeira em moeda estrangeira, e tal ficou comprovado
com a redução do diferencial das taxas de juros em moeda nacional após a inserção daquelas
medidas.
No que toca à desdolarização dos depósitos, é mais evidente a contribuição de certas medidas
macroprudenciais postas em marcha pelo BNA o que evidencia a proficiência da ambiência
regulatória criada pela instituição. Mais precisamente pode notar-se que Prud contribui em larga
medida para explicar os fenómenos desdolarizantes da economia angolana em termos de
depósitos, particularmente nos depósitos cuja estrutura de vencimento é menor.
De outra perspectiva verifica-se que a crise financeira internacional, d_crise, teve um impacto
significativo, para o avigoramento da desdolarização dos depósitos à ordem, ao provocar uma
saída de dólares no sistema. Este resultado está em linha com o efeito da dummy d_dep. Apesar
da ligeira significância nos resultados com o modelo, pode-se deduzir que este efeito é
sobretudo nos depósitos à ordem em vez de os depósitos totais, neste caso não pelo aumento da
confiança na moeda nacional mas pela diminuição, em termos reais, dos depósitos efectuados
pelos clientes.
Importa referir que, ao contrário de Garcia-Escribano (2010), não foi especificado a diferença
entre as taxas de reservas obrigatórias em moeda nacional e moeda estrangeira. Apesar da
recente gestão activa das reservas exigidas sobre os depósitos em moeda nacional, devido às
limitações características de intermediação financeira evidenciados, esta não tem a eficácia
desejada que em outros benchmarks de sistemas financeiros mais desenvolvidos. Os bancos, por
norma, actuam com uma folga para além da taxa de reservas obrigatórias, pois costumam reter
estas, de acordo com o que Banco Nacional de Angola estipula, mais um excedente de liquidez
utilizado em muitos casos como reservas livres que advém da gestão de políticas internas de
cada banco. Adicionalmente, por questões específicas da nossa economia e sistema financeiro
na altura, a partir do momento em que se diferenciou esta exigência por tipo de moeda a
exigência de reservas para depósitos efectuados em moeda estrangeira era menos restritiva que
em moeda nacional. Porém, se adicionássemos o horizonte temporal até o momento em que se
escreve este documento, Junho de 2014, com a taxa de reservas obrigatórias em moeda nacional
a ser inferior à mesma taxa em moeda estrangeiras, pode-se esperar que doravante exista um
30
contributo mais significativo da gestão deste instrumento por parte do BNA. Assim, com as
reservas obrigatórias a serem mais elevadas para os depósitos em ME do que em MN, poderá
implicar o aumento diferencial das taxas de juros em MN e ME, ou seja, menor renumeração
para os depósitos em ME.
Por fim, deve-se invocar igualmente o facto de que tanto a desdolarização ao nível dos depósitos
concorrer para explicar a desdolarização ao nível dos créditos, como vice-versa. Ou seja, existe
uma relação de causalidade bidirecional entre ambos os processos.
- Resultados da Segunda especificação: VAR tetravariado ou a endogeneização da
estabilidade macroeconómica
Como asseverámos há pouco, importa perceber também em que escala a causalidade entre a
estabilidade macroeconómica e desdolarização é verificável num ambiente de introdução de
medidas macroprudencias observado nos últimos tempos na economia angolana.
Assim, verifica-se que a desdolarização concorre em larga medida para a estabilidade
macroeconómica. Com efeito, tanto o processo de desdolarização dos créditos como dos
depósitos contribuíram não só para o controlo de tensões inflacionistas e estabilidade cambial,
como para a manutenção de taxas de inflação reduzidas ao longo do tempo, dado o efeito ser
tanto permanente como transitório.
Por outro lado, a maioria das observações que efectuámos na secção anterior mantêm-se
pertinentes, dado que não só se dá uma relação de causalidade bidirecional entre desdolarização
nos créditos e nos depósitos, como também se mantêm as relações entre estabilidade
macroeconómica e desdolarização. Mais ainda, a ambiência macroprudencial criada pelo BNA
surge reforçada nesta nova especificação. Se continua a ter efeitos positivos ao nível da
desdolarização, e consequentemente na estabilidade macroeconómica, este modelo permite
perceber ainda que tem efeitos também na estabilidade macroeconómica em si.
Um facto deveras importante e que vem corroborar a ideia da proficiência e eficácia das
medidas macroprudenciais postas em prática pelo BNA está relacionado com o período iniciado
com a imposição dos limites à exposição cambial. Verificamos que a regulação foi determinante
quer no controlo e estabilidade duradoura, bem como nas expectativas do comportamento
futuro, dos níveis de preços. Tal como argumentámos em cima, a interpretação que se pode dar
a esta variável para além da lei que impõe os limites à exposição cambial passa por esta
corresponder ao período desde então que o BNA tem introduzido um pacote de normas para
combate à dolarização da economia, como o Aviso que limita a concessão de crédito em moeda
estrangeira e a introdução faseada do NRSC. Acresce ainda a circunstância de ter concorrido
31
também de forma directa para a estabilidade do crescimento dos preços e numa relação indirecta
para a estabilidade cambial, e consequentes expectativas, dada a magnitude e sinal do
coeficiente que está associado ao processo de desdolarização e a relação desta com a
estabilidade macroeconómica.
Portanto, da análise dos resultados dos dois modelos anteriores decorre que a desdolarização da
economia angolana e a estabilidade macroeconómica observada nos últimos tempos são dois
processos complementares que se cruzaram e entrecruzam causando-se mutuamente. No
entanto, em última instância, ambas partilham a mesma origem, têm um denominar comum: o
quadro regulamentar que tem sido posto em marcha pelo BNA, quadro, esse, que se tem
consubstanciado numa panóplia de medidas macroprudenciais altamente eficazes. Estes
aferimentos não se prendem somente em atribuir o processo de desdolarização como uma
consequência a nível administrativo, mas sim um impulso inicial que apoiou a desdolarização
que, por sua vez, influenciou positivamente a estabilidade da taxa de câmbio, fornecendo
confiança aos agentes na moeda nacional e assim o processo de desdolarização é influenciado
numa magnitude ainda maior associado à visão que o mercado tem na estabilidade das variáveis
financeiras e reais da economia.
5. Conclusões
Este trabalho cientificou em torno da complexidade que caracteriza os avanços e os recuos dos
processos de dolarização da nossa economia. A secção 1 introduziu o problema; a secção 2
apresentou o quadro teórico fazendo uma breve revisão da literatura. A secção 3 analisou a
evolução do grau de dolarização real de crédito e depósitos no contexto da economia angolana
decomposto pelos termos between e within por estrutura de vencimento dos depósitos e crédito
à economia e no crédito sector de actividade económica. Aqui conclui-se que os depósitos com
maior grau de liquidez têm sido os que mais contribuíram para a desdolarização dos depósitos e
o crédito ao sector privado de médio prazo na desdolarização do crédito. Da análise da evolução
da dolarização do crédito, pode concluir-se que entre os anos de 2011 e 2013 os créditos
concedidos aos Organismos Internacionais e Instituições Territoriais, o Comércio para Grosso e
a Retalho, a Construção e Transportes, Armazenagem e Comunicações são os sectores de
actividade económica com maior poder explicativo na desdolarização do crédito para o período
de 2011 a 2013. Por outro lado os sectores da Agricultura e de Outras Actividades de Serviços
Colectivos, Sociais e Pessoais são os sectores que têm colocado maior oposição à tendência de
desdolarização da economia angolana.
Concludentemente, a secção 4 edificou um modelo econométrico, através da metodologia VAR,
e conclui que: i) o novo quadro regulamentar introduzido pelo Banco Nacional de Angola é
32
determinante para explicar a desdolarização; ii) a estabilidade macroeconómica que tem
assistido nos últimos anos a economia angolana tem também sido fundamental para explicar e
determinar a evolução da desdolarização em Angola; iii) o quadro regulatório edificado pelo
BNA tem também contribuído em certa medida para a estabilização da conjuntura
macroeconómica angolana; iv) a desdolarização tem contribuído para a estabilidade
macroeconómica que se tem observado nos últimos anos na economia angolana.
Destes quatro pontos decorre o seguinte corolário lógico: entre desdolarização e estabilidade
macroeconómica existe uma relação de interdependência, ou seja, uma relação de causalidade
bidirecional. Portanto, não só a estabilidade macroeconómica influencia a desdolarização como
também o oposto se verifica: a desdolarização tem sido uma circunstância que tem contribuído
para a preservação da estabilização dos principais indicadores da conjuntura macroeconómica
pois, em última instância, tem sido a actuação do BNA a principal determinante, tanto da
estabilização macroeconómica como o principal motor da desdolarização da economia
angolana.
Este trabalho é directamente comparável com os trabalhos de Garcia-Escribano e Sosa (2010) e
de Garcia-Escribano (2011) no entanto, o modelo empírico construído neste estudo é mais geral,
já que procura captar uma maior mundividência quando comparado com Garcia-Escribano e
Sosa (2010) e com Garcia-Escribano (2011). Assim, não assumimos uma causalidade
unidireccional, tanto da estabilidade macroeconómica como das medidas macroprudenciais para
a desdolarização, como implicitamente definido nos ditos trabalhos. A metodologia apresentada
neste estudo, assim, generaliza a adoptada nos artigos referidos permitindo captar as relações de
causalidade bidirecional entre estabilidade macroeconómica e desdolarização através da
endogeneização do bloco da estabilidade macroeconómica. As relações de dependência destes
dois blocos das medidas macroprudenciais e da crise de 2009 também são captadas pela nossa
metodologia.
Por razões óbvias não se endogeneizou o bloco das medidas macroprudenciais do BNA, pois
apesar do ambiente regulatório e macroprudencial depender fortemente da conjuntura (e das
expectativas em torno da própria conjuntura) são ainda variáveis com o seu quê de
determinístico, já que são completamente controláveis pelas autoridades em geral e pelo BNA
em particular. De qualquer forma, num futuro estudo pode ser pertinente efectuar-se uma
tentativa de modelar e prever a probabilidade de determinada medida macroprodencial/
regulatória ser implementada, não só pelo BNA, como pelos bancos centrais dos diversos países
do SADC adoptando, a título de exemplo, um modelo da família dos Probit dinâmicos.
Finalizando, importa abordar as perspectivas e desafios da desdolarização da economia. De
facto a dinâmica no mercado cambial e a introdução de novas regras de controlo cambial
33
indicam que o mercado financeiro ainda se encontra num processo de ajustamento para um
mercado largamente activo em moeda nacional. Apesar da regulação macroprudencial
identificados neste documento e a estabilidade macroeconómica, factores como uma boa
conduta em termos de compliance e governance são igualmente importantes. Por exemplo, as
medidas de combate ao branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo estão a
desempenhar cada vez mais um papel preponderante na regulação cambial. Apesar de o
processo de desdolarização estar cada vez menos dependente de aspectos administrativos
introduzidos pelo BNA, é importante que o BNA, no âmbito da supervisão prudencial, torne
mais gravoso as transacções comerciais e financeiras denominadas em moeda estrangeira. Por
fim, e baseado em aspectos menos administrativos, a manutenção da estabilidade
macroeconómica e respectiva diversificação económica são os principais desafios para dar
continuidade ao processo de desdolarização efectuado, pois só desta forma a produção nacional
pode ser estimulada e, consequentemente, a dependência de moeda nacional para fins, por
exemplo, de importação será reduzida.
34
6. Anexos
a. Custos e Benefícios da Inflação: Revisão de Literatura
Autores
Calvo (1999a,b)
Schuler (1999)
Calvo and Reinhart (1999)
Hausmann (1999)
Goldfajn and Olivares (2000)
Panizza et al.(2000)
Mendoza (2000)
Panizza et al.(2000)
Lizano (2000)
Morandé and Schmidt-Hebbel
(2000)
Berg and Borensztein (2000)
Lizano (2000)
Mendoza (2002)
Mendoza (2000)
Edwards and
Magendzo
(2001)
Chang (2000)
Calvo (1999 a,b)
Berg and Borensztein (2000)
Benefícios
Observações
A integração financeira e do sistema bancário
Menor probabilidade de crise externa e
Berg e Borensztein (2000): Investimentos
contágio.
podem não ser efectuados devido a
problemas de foro fiscal e na solidez do
sistema. Como tal, não elimina o risco de
crises externas.
Acelera a consolidação do sistema bancário
Melhora (elimina) o problema de paragem
Berg and Borensztein (2000): Não reduz
súbita do sistema
o impacto de choques reais externos.
Promove a estabilidade financeira facilitando Goldfajn y Olivares (2000): Não é uma
a integração internacional.
garantia de acesso imediato aos mercados
internacionais.
Aumenta a eficiência dos mercados
Sims (2002): Reduz a gama de activos
financeiros.
impossibilitando o governo de intervir
em crises financeiras.
Pode reduzir a fragilidade financeira,
reduzindo a volatilidade dos preços e
contribuindo para o desenvolvimento do
sistema bancário.
Enfraquecimento de fricções financeiras e um Com base numa análise empírica para
melhor acesso aos mercados de capitais
países da América Central.
globais.
Comércio e posição da conta corrente
Menores custos de transação relativos aos
Klein (2002): O efeito da dolarização no
produtos comerciais e activos denominados
comércio com os EUA não é
em moedas diferentes.
estatisticamente diferente do efeito de
uma taxa de câmbio fixa do dólar no
comércio com os EUA.
Reduz a incerteza e risco de volatilidade da
taxa de câmbio.
Menor segmentação de mercado e maior
integração de mercado. Comércio
internacional mais elevado devido ao menor
risco cambial.
I nvestimento e crescimento
Não há incentivos à saída súbita de capitais
Edwards (2001a, b): O caso do Panamá
motivados pela desvalorização da moeda, pelo sugere que os choques externos resultam
que, promove um maior nível de confiança
em maiores custos em termos de menor
entre os investidores internacionais, mais
investimento e de crescimento do que nos
investimento e crescimento.
países não dolarizados
Melhora a possibilidade de atrair investidores
estrangeiros.
Os investidores estrangeiros não precisam
pagar para obter informações sobre a política
monetária da economia dolarizada.
A inflação e estabilização
Ganhos de bem-estar, removendo a falta de
Berg e Borensztein (2000): a estabilidade
credibilidade de estabilização.
em resultado da dolarização é relativa,
uma vez que o dólar dos EUA oscila em
valor frente relativamente a outras
moedas amplamente negociadas.
A inflação tem tido níveis relativamente mais
baixos em nações dolarizadas do que em
economias não dolarizadas.
Política Fiscal
Pode aumentar a credibilidade da política
Goldfajn e Olivares (2000): A ausência
fiscal, mesmo se o governo não escolher
de senhoriagem não implica
políticas sólidas.
necessariamente a disciplina fiscal.
As taxas de juros, desvalorização e risco de default
Menor nível e volatilidade das taxas de juros Savastano (1999): Haveria uma tendência
domésticas.
decrescente das taxas de juros, mas elas
não convergem totalmente ao nível das
taxas de juros internacionais devido ao
risco-país, que não diminuiria
necessariamente.
Elimina o risco repentino de fortes
desvalorizações, e, assim, reduz o prémio de
risco do empréstimo internacional.
35
Autores
Rojas-Suárez (1999)
Custos
Política monetária e cambial
Perda da taxa nominal de câmbio como
instrumento para atenuar os choques dos
termos de troca.
Berg and Borensztein (2000),
Mendoza (2002)
O banco central pode não afectar a oferta de
moeda da economia, porque isso resulta da
balanço de pagamentos.
Berg and Borensztein (2000)
Savastano (1999), Mendoza
(2002)
Goldfajn and Olivares (2000)
Edwards (2001), Edwards and
Magendzo (2001)
Emprestador de última instância
Perda de emprestador de última instância
(LLR) e, portanto, perda do poder de resposta
do banco central em casos de crise do sistema
financeiro, embora não percam a capacidade
de fornecer liquidez de curto prazo.
Política Fiscal
Perda de Senhoriagem
I nvestimento e Crescimento
A ausência de uma política monetária e
cambial poderá provovar maior volatilidade
do produto em comparação com um regime
de taxa de câmbio flexível.
Observações
Calvo (1999 a, b): A depreciação da
moeda doméstica é contracionista em
economias emergentes, e em vez de taxa
de câmbio nominal, preços e salários
poderiam ajustar a choques dos termos de
troca. Os autores argumentam que
ganhos de competitividade podem ser
alcançado através da política fiscal.
Calvo (1999a, b): Economias emergentes
dependem de política monetária dos EUA
através das mudanças da taxa de
Obrigações do Tesouro, como tal, a perda
do poder da política monetária não é
significativa.
Gavin (1999): O banco central poderia
providenciar liquidez aos bancos
comerciais se mantiver excesso de
dólares em reserva
Dornbusch (2000): A perda de
senhoriagem em resultado da redução
dos custos do serviço da dívida pública
resulta da redução das taxas de juros.
Carrera et al. (2002): De acordo com uma
análise empírica efectuada para a Nova
Zelândia, não houve diferença estatística
na volatilidade macroeconómica entre as
economias dolarizados e não dolarizadas.
Os Países dolarizados têm crescido a uma
taxa significativamente mais baixa do que os
países não dolarizados.
Fonte: Adaptado a partir de Angel García Banchs (2004)
36
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Aviso 4/2011 de 4 de junho - Crédito em moeda estrangeira
Decreto Legislativo Presidencial nº10/13, de 22 de Novembro
Lei Cambial do Sector Petrolífero (Lei Nº 2/2012)
Relatórios:
Relat rio do MI n.o 4/8 , Março de 20 4,“Segunda monitorização p s-programa,
comunicado de imprensa e declaração do dministrador do MI para ngola”
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