Ler na íntegra em PDF

Transcrição

Ler na íntegra em PDF
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2012 5 (9): 320 – 334.
Infecção por Morganella morganii como causa de abscesso
subcutâneo em Boa constrictor em conservação ex situ
Morganella morganii infection as a cause of subcutaneous
abscess in Boa constrictor in ex-situ conservation
Infección por Morganella morganii como causa de absceso
subcutâneo en Boa constrictor en la conservación ex situ
Paulo Roberto Bahiano Ferreira1, Alberto Vinícius Dantas Oliveira2,
Sônia da Silva Laborda3, Lúcio José da Silva Freire Jr4, Laís Diniz
Teixeira de Queiroz5, Antônio Vicente Magnavita Anunciação6
Resumo
As jibóias B. constrictor são serpentes constritoras e de ampla distribuição
no território brasileiro. As doenças infecciosas são relatadas como
principais causas de morbidade e mortalidade em serpentes, destacandose as doenças bacterianas causadas por bacilos Gram negativos, tais
como a Morganella morganii. O presente trabalho tem por objetivo
descrever o quadro clínico, o diagnóstico e o tratamento da infecção por M.
morganii em uma jibóia em conservação ex situ no Parque Zoobotânico
Getúlio Vargas, Salvador – Bahia (PZGV-BA). Foram realizados os exames
físico e complementares, citologia e exame radiográfico. Após suspeita
clínica de um abscesso subcutâneo, foram removidos cirurgicamente
diversos cáseos situados na região do terço inicial do corpo da serpente. A
amostra do material (cáseos) foi colocada em recipiente esterilizado,
identificado e enviado sob refrigeração para o Laboratório de Bacterioses
1
Médico Veterinário. Mestre em Ciência Animal nos Trópicos. Escola de Medicina Veterinária/UFBA.
Técnico do Setor da Herpetologia – PZGV-BA. *Email: [email protected].
2
Médico Veterinário. Coordenação Técnica do Parque Zoobotânico Getúlio Vargas (PZGV-BA).
3
Bióloga. Funcionária nível superior, Laboratório de Bacterioses – Hospital de Medicina Veterinária –
Escola de Medicina Veterinária /UFBA.
4
Biólogo autônomo.
5
Bióloga autônoma.
6
Professor Adjunto, Mestre, Departamento de Medicina Veterinária Preventiva da Escola de Medicina
Veterinária – UFBA.
320
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2012 5 (9): 320 – 334.
do Hospital de Medicina Veterinária/UFBA, sendo isolada e identificada a
bactéria M. morganii. No exame físico foi constatado um aumento de
volume de consistência firme na região afetada. No exame radiográfico
ainda foi observada uma lesão não invasiva com alteração da densidade
radiológica, porém o exame citológico apresentou-se inconclusivo. O
tratamento com Banamine® / flunixin meglumine (1mg/kg/SID) e Tetrabac®
/ oxitetraciclina (7mg/kg/SID) aplicados por via intramuscular mostrou-se
satisfatório, de acordo com o acompanhamento clínico de dois meses
pelos autores. O registro das espécies de microrganismos responsáveis
por enfermidades bacterianas em serpentes, em conservação ex situ,
comuns também aos humanos, é importante para a construção do perfil
epidemiológico e a elaboração de protocolos com maiores cuidados
preventivos na rotina clínica e manejo geral destes animais.
Palavras-chave: bacteriose, serpente, silvestre, Enterobacteriaceae.
Abstract
The common boa, or Boa constrictor, are constrictor snakes in wide
distribution in the Brazilian territory. Infectious diseases are reported as
major causes of mortality in snakes, especially the bacterial diseases
caused by gram-negative bacilli, such as Morganella morganii. This paper
aims to describe the clinical picture, diagnosis and treatment of infection by
M. morganii a common boa in ex situ conservation in Parque Zoobotânico
Getúlio Vargas, Salvador - Bahia (PZGV-BA). We performed the clinical
assessment, cytology and radiographic examination.
After clinical
suspicion of a subcutaneous abscess, several examples of shedding in the
area in the initial third of the body of the snake were surgically removed. A
sample of the material (caseous) was placed in a sterile container,
identified and shipped under refrigeration to the Laboratory of Bacterioses
Hospital for Veterinary Medicine / UFBA, being isolated and identified the
bacterium M. morganii. The physical exam revealed an increase in volume
of firm consistency in the affected region. The radiography was also
observed a noninvasive lesion with abnormal radiological density, but the
cytologic presented inconclusive. Treatment with Banamine® / flunixin
321
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2012 5 (9): 320 – 334.
meglumine (1mg/kg/SID) and Tetrabac® / oxytetracycline (7 mg/kg/SID),
applied intramuscularly, was satisfactory, according to the clinical follow-up
two months by the authors. The record of the species of microorganisms
responsible for bacterial diseases in snakes from ex situ conservation, also
common to humans, is important to build the epidemiological profile and
development of protocols with more preventive care in routine clinical and
general management of these animals.
Key words: bacteriosis, snake, wild, Enterobacteriaceae.
Resumen
Las Boas, B. constrictor, son serpientes constrictoras de amplia
distribución en el territorio brasileño. Las enfermedades infecciosas son
relatadas como las principales causas de morbilidad y mortalidad en
serpientes, destacándose las enfermedades bacterianas, causadas por
bacilos Gram negativos, tales como la Morganella morganii. El presente
trabajo tiene como objetivo describir el cuadro clínico, el diagnóstico y el
tratamiento de la infección por M. morganii en una boa en conservación ex
situ en el parque Zoobotánico Getúlio Vargas, Salvador- Bahía (PZGV-BA).
Se realizaron exámenes físico y complementarios, citología y examen
radiológico. Tras la sospecha clínica de absceso subcutáneo, fueron
removidos quirúrgicamente diversos caseosos situados en la región del
tercio inicial del cuerpo de la serpiente. La muestra del material caseoso
fue colocada en un recipiente estéril, identificado y enviado bajo
refrigeración para el laboratorio de Bacteriología del Hospital de Medicina
Veterinaria/UFBA, siendo aislada e identificada la bacteria M. morganii. Al
examen físico fue constatado un aumento de volumen de consistencia
firme en la región afectada. Al examen radiográfico fue observada una
lesión no invasiva con alteración de la densidad radiológica, pero el
examen citológico se presentó poco concluyente. El tratamiento con
Banamine®, flunixin meglumine (1mg/kg/SID), y Tetrabac®, oxitetraciclina
(7mg/kg/SID), aplicados por vía intramuscular, se mostró satisfactorio, de
acuerdo con el acompañamiento clínico de dos meses por los autores. El
registro
de
las
especies
de
microrganismos
responsables
por
322
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2012 5 (9): 320 – 334.
enfermedades bacterianas en serpientes, en conservación ex situ, común
también en humanos, es importante para la construcción del perfil
epidemiológico y la elaboración de protocolos con mayores cuidados
preventivos en la rutina clínica y el manejo general de estos animales.
Palabras-clave: Bacteriana, serpiente, silvestre, enterobacteriaceae.
bacterianas5. Os principais agentes
Introdução
As jibóias Boa constrictor são
animais
da
ordem
Squamata
(subordem Ophidia), serpentes não
peçonhentas,
ampla
constritoras
distribuição
no
e
de
etiológicos são os bacilos Gramnegativos, tais como a bactéria M.
morganii5,1.
A
M.
tem
morganii
território
distribuição mundial, sendo relatada
brasileiro. Essa espécie ainda se
como parte da microbiota normal
encontra entre as serpentes de
dos ofídios, tanto da cavidade oral
maior interesse em cativeiro no
quanto
1
Brasil .
cloacal6,3,.
Este
microrganismo é um dos agentes
O maior convívio entre os
humanos e as serpentes evidencia
a
a
importância
da
compreensão
científica sobre a prevenção e o
tratamento
nas
complicações locais por necrose
secundária no humano após o
acidente ofídico8,9.
O manejo inadequado dos
Algumas
répteis em conservação ex situ pode
bactérias com o potencial zoonótico
predispor os animais às infecções
já foram isoladas como parte da
secundárias, que são relacionadas
microbiota normal dos ofídios2,3,4.
principalmente à imunodepressão e ao
as
zoonoses
envolvidos
entre
ambas
das
bacterianos
espécies.
As doenças infecciosas são
relatadas como principais causas de
morbidade
e
mortalidade
em
ofídios, destacando-se as doenças
estresse de cativeiro10,5.
As enfermidades bacterianas
em ofídios são caracterizadas por
diferentes
manifestações
clínicas,
323
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2012 5 (9): 320 – 334.
sendo
observadas
estomatites,
comprimento total de 1,99 m e
abscessos subcutâneos e oftálmicos,
pesando 5,6 Kg, pertencente ao
glossites, gastroenterites, pneumonias,
Parque Zoobotânico Getúlio Vargas
ooforites e septicemia1, 11.
(PZGV)
O diagnóstico é alcançado
conforme
o
quadro
clínico
do
paciente, isolamento e identificação
do
agente
etiológico.
Como
tratamento inicial, até o resultado de
isolamento
e
recomendada
antibiograma,
a
utilização
é
de
antibióticos de largo espectro5. Em
casos de abscessos preconiza-se,
como
parte
remoção
do
tratamento,
cirúrgica
devido
a
à
tendência dos répteis em formar
granulomas e cáseos1.
No presente trabalho foram
de
Salvador
(Ba),
apresentou aumento de volume na
região lateral esquerda do terço
inicial de seu corpo entre os meses
junho e julho do ano de 2008. Após
ser encaminhada para o Setor de
Clínica do PZGV-BA foi realizado o
exame
clínico
do
animal
constatando-se, à palpação direta
da
região,
um
nódulo
de
consistência endurecida, móvel e de
aproximadamente 2 cm de diâmetro
(figura 1). Em seguida o animal foi
enviado para o Hospital de Medicina
Veterinária
(HOSPMEV)
Universidade
Federal
da
da
Bahia
investigados os possíveis fatores
(UFBA), onde se realizou um exame
predisponentes da infecção por M.
radiológico,
observando-se
uma
(B.
lesão não invasiva com uma leve
constrictor) em conservação ex situ,
alteração da densidade radiológica
bem como foram descritos o quadro
em projeção látero-lateral esquerda.
clínico, o diagnóstico e o tratamento
Foi obtida uma amostra de aspirado
da infecção bacteriana.
da lesão que, submetida ao exame
morganii
em
uma
jiboia
citológico, realizado no Laboratório
de
Relato de caso
Patologia
Clínica
HOSPMEV/UFBA,
do
apresentou
resultado inconclusivo.
Uma serpente da espécie B.
constrictor, fêmea, adulta, com um
Desta
cirurgia
para
forma,
a
realizou-se
remoção
e
324
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2012 5 (9): 320 – 334.
identificação do material nodular,
de
quando foi constatada a presença
HOSPMEV/UFBA,
de cáseos. Resumidamente, sob
semeada
temperatura e umidade ambientes,
enriquecido com 10% de sangue de
a
carneiro, caldo tryptose e ágar
serpente foi posicionada em
decúbito
lateral
direito
sob
Bacterioses
em
MacConkey,
do
onde
ágar
sendo
foi
sangue
incubadas
contenção física, para a anestesia
aerobicamente a 37°C durante 24 a
local infiltrativa circular, utilizando-se
48
mevacaína
mg/Kg),
crescimento de colônias que foram
aplicada por via intramuscular ao
identificadas pela verificação ou não
redor da lesão no terço inicial de
de
seu corpo. O acesso ao tecido
morfológicas e tintoriais. Em ambos
subcutâneo foi feito através da
os meios verificou-se bacilos Gram
incisão de pele em sentido cranio-
negativos, que em seguida foram
caudal no local da lesão. Foram
semeados em ágar tríplice açúcar
retirados
diversos
(TSI) e submetidos ao teste de
cáseos de diferentes tamanhos com
oxidase, cujo resultado foi negativo,
auxílio de pinça anatômica, entre as
caracterizando-se
camadas muscular e subcutânea,
bactéria
sendo
Enterobacteriaceae.
1%
e
(0,2
coletados
caracterizado um
quadro
horas.
Observou-se
hemólise,
o
características
como
pertencente
à
família
clínico de abscesso subcutâneo
Presumivelmente,
(figura 2).
bacteriana previamente isolada no
Após a limpeza e drenagem
da ferida cirúrgica, adotou-se uma
sutura aposição, empregando-se o
fio Catgut cromado, em pontos
separados
camadas
simples,
de
pele
sobre
e
as
tecido
subcutâneo. A amostra do material
(cáseos) foi colocada em recipiente
esterilizado, identificado e enviado
sob refrigeração para o Laboratório
TSI
foi
submetida
a
uma
colônia
a
testes
bioquímicos identificando-se a M.
morganii12,13.
No período pós-
cirúrgico, realizou-se a observação
clínica diária do indivíduo até a
completa
recuperação
e
cicatrização da lesão. Nesta fase,
também foi realizada a aplicação de
Banamine® / flunixin meglumine
(1mg/Kg),
durante
dois
dias
325
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2012 5 (9): 320 – 334.
consecutivos,
e
Oxitetraciclina
(7mg/Kg),
/
para o ajuste da umidade, no
durante
entanto, durante o maior período de
Tetrabac®
sete dias consecutivos, ambos uma
recuperação
vez ao dia, além de limpeza tópica
cirúrgico, a serpente foi mantida em
diária
com
seu próprio recinto, sob valores
solução de clorexidina a 0,5%. Os
médios de temperaturas máxima e
dois medicamentos foram aplicados
mínima
por via intramuscular (IM) no terço
respectivamente, com 80,9% de
inicial de seu corpo. Inicialmente, o
umidade relativa do ar no mês de
animal foi mantido em temperatura
julho, dados cedidos gentilmente
e umidade parcialmente controladas
pelo
através do uso de fonte de calor e
Meteorologia.
da
ferida
cirúrgica
no
26,2°C
Instituto
período
e
pós-
19,3°C
Nacional
de
borrifações de água diariamente
Figura
1:
Mensuração
do
comprimento
do
nódulo
subcutâneo com auxílio de um paquímetro. Salvador-BA.
2008.
326
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2012 5 (9): 320 – 334.
Figura 2: Cáseos de diferentes tamanhos enviados para
exame microbiológico. Salvador-BA. 2008.
sistema imunológico das serpentes,
Discussão
A literatura científica descreve a
ocorrência de abscesso subcutâneo
como
consequência
de
doenças
5
bacterianas em serpentes . O sinal
clínico é um aumento de volume
subcutâneo de consistência firme e
este pode estar associado à bactéria
do gênero M. morganii14,1, já relatada
tornando-as
infecções
suscetíveis
às
secundárias5,14.
Nos
casos de doenças virais, a M.
morganii tem sido relacionada às
infecções
secundárias
serpentes
infectadas
em
com
o
Paramyxovirus15.
O
PZGV-BA
plantel
cultura de sangue de Boa Constrictor
serpentes,
imperator14 .
semi-intensivo16. São totalizados 16
de cativeiro e as acomodações
inadequadas podem comprometer o
38
exemplares
um
com o crescimento acentuado em
As doenças virais, o estresse
de
possui
criadas
em
de
sistema
viperídeos, dois colubrídeos e 20
boídeos, dentre estes, 11 são da
espécie B. constrictor. Contudo,
327
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2012 5 (9): 320 – 334.
apenas um indivíduo do plantel
defensivos18, deferindo bote e emitindo
(01/38)
um chiado de advertência em qualquer
apresentou
o
abscesso
subcutâneo entre o período de
tentativa
constatação
e
de
proximidade
do
tratamento
da
manipulador. Em serpentes recém-
serpentes
são
chegadas, o estresse ao ambiente é
acondicionadas em 23 terrários com
descrito como uma Síndrome da má
diferentes ambientações (serrapilheira,
adaptação19.
pedras, troncos, plantas) utilizando-se
patologia
a vermiculita (19/23), jornal (3/23) ou
anorexia, fragilidade dos tecidos e
areia (1/23) como substrato. Todos
aumento
os
tratados
infecções secundárias20. A serpente
periodicamente com vassoura de
estava mantida no zoológico há
fogo e remoção de fezes, sendo a
mais de um ano e ao longo de seu
água trocada diariamente. O terrário
histórico clínico, tinha o apetite
da jibóia que apresentou a lesão era
normal,
o único que possuía a areia como
dotada de um bom estado corporal.
substrato (figura 3), sendo esta
Com
apontada como causa de dermatite
enquadra
em
adaptação.
anormalidade.
As
terrários
algumas
eram
espécies
de
O animal com esta
apresenta
da
inapetência,
susceptibilidade
às
consequentemente
isto,
este
na
caso
era
não
se
da
má
Síndrome
5
serpentes . A dermatite vesicular
pode progredir para a necrose e
abscessos
subcutâneos17.
No
entanto, nesse trabalho não foram
observadas lesões características
de dermatite vesicular que também
servissem como uma porta de
entrada para o desenvolvimento do
abscesso subcutâneo na jibóia.
No presente trabalho não foi
possível determinar especificamente o
fator predisponente da infecção por M.
morganii na serpente.
No entanto,
existem potenciais riscos, tais como o
substrato de areia no desenvolvimento
de
dermatite,
como
também
a
hipótese dessa serpente ter sofrido
uma lesão traumática causada pela
A serpente infectada possui um
mordedura de sua companheira de
temperamento agressivo e sinais de
terrário ou de um roedor vivo
estresse na contenção física. São
(camundongo
constatados
utilizado
comportamentos
na
ou
rato),
este
alimentação
como
328
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2012 5 (9): 320 – 334.
presa
brigas
incapacidade de alimentação da
esporádicas entre companheiras de
serpente, dentre elas temperatura
recinto da espécie B. consrictor já
inadequada
foram observadas no PZGV-BA por
enfermidade, espécie ou tamanho
este autor após manipulação e no
do
instante de retorno da mesma ao
indicada a retirada do roedor caso a
terrário. Já a mordedura por presas
serpente não o capture em 15
vivas é relatada em razão de uma
minutos17.
série
viva.
de
Algumas
causas
associadas
roedor
do
e
terrário,
estresse,
sendo
à
Figura 3: Ambientação do terrário da jibóia que apresentou
abscesso subcutâneo. Salvador-BA. 2008.
Em
caso
de
mordedura
por
cavidade oral de colubrídeos e
serpentes, o microrganismo poderia
viperídeos2,3.
ser transmitido por contato direto,
necessários trabalhos com boídeos,
pois
especificamente B. constrictor, para
alguns
isolamento
autores
de
M.
relatam
morganii
o
da
a
investigação
Entretanto
e
avaliação
são
da
329
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2012 5 (9): 320 – 334.
presença de M. morganii como
dos répteis22. A antibioticoterapia foi
parte
bacteriana
considerada satisfatória, pois não
normal da cavidade oral desses
houve recidiva do abscesso com
animais em condições
dois meses de acompanhamento
da
microbiota
ambientais
específicas.
clínico pós-tratamento (figura 4).
Perante a impossibilidade da
realização
do
antibiograma,
foi
indicado o uso da oxitetraciclina no
período
pós-operatório,
um
antibiótico de curta duração e de
amplo espectro21, considerando a
dose recomendada para a maioria
Contudo,
o
tratamento
específico
com
o
auxílio
mais
de
antibiograma é ideal para o sucesso
terapêutico, já que a literatura relata
a resistência deste microrganismo
aos diversos antibióticos utilizados
na
rotina
clínica
da
medicina
humana e de répteis5,9.
Figura 4. Aspecto da cicatrização da ferida cirúrgica após 58
dias da remoção dos cáseos em B. constrictor. Salvador-BA.
2008.
Os animais de zoológicos têm sido
importantes
relatados
potenciais patogênicos aos seres
como
reservatórios
de
bactérias
com
330
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2012 5 (9): 320 – 334.
como
mantidas em conservação ex situ é
cepas
útil para a elaboração de protocolos
bacterianas resistentes a diversos
com maiores cuidados preventivos
antimicrobianos, estes amplamente
na rotina clínica e manejo geral
utilizados em hospitais humanos23.
destes animais.
humanos,
assim
disseminadores
de
Recentemente, foram identificados
mais de 25 casos de doenças
Agradecimentos
infecciosas em seres humanos nos
Aos
apoios
técnicos
e
Estados Unidos da América sendo
administrativos
adquiridas
após algum tipo de
Laboratório de Bacterioses e o de
contato com animais de zoológicos,
Análise Clínica do Hospmev-UFBA.
24
fazendas e lojas pets . .
O
Ao
registro
dos
microrganismos responsáveis por
doenças infecciosas nos répteis é
importante, pois é imprescindível a
construção do perfil epidemiológico
desses animais25. Presumivelmente,
o isolamento de M. morganii do
abscesso
contribui
subcutâneo
da
cientificamente
jibóia
e
parcialmente com a epidemiologia
deste
microrganismo
nessa
espécie. Sendo assim, o estudo dos
patógenos
responsáveis
por
enfermidades bacterianas comuns
entre
humanos
e
serpentes
professor
do
PZGV-BA,
Alexander
Gerard
Steevert van Herk (Emev/UFBA)
pela
realização
do
exame
radiológico e contribuição com o
presente trabalho. Ao INMET pela
disponibilização dos dados oficiais
de temperatura e umidade relativa
do ar local. Para o acadêmico
Álvaro Lima Barros, que participou
ativamente do manejo e da rotina
clínica
da
serpente.
médicos
veterinários
Kiyomi
Miyaji
Para
os
Cristiane
Kolesnikovas,
Kathleen Fernandes Greco e Danilo
Rorhs (Emev-UFBA) pelas valiosas
discussões e sugestões no decorrer
do trabalho.
Referências bibliográficas
1. Kolesnikovas CKM, Greco KF, Rahme-de-Albuquerque LC. Répteis Ordem Squamata - Subordem Ophidia. In: Cubas ZS, Silva JCR, Catão-
331
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2012 5 (9): 320 – 334.
Dias JL (2006). Tratado de animais selvagens – Medicina veterinária.
1.ed. São Paulo: Editora Roca Ltda, 68-85.
2. Goldstein EJ et al (1981). Aerobic bacterial oral flora of garter snakes:
development of normal flora and pathogenic potential for snakes and
humans. Journal of Clinical Microbiology, 13: 954-956.
3. Jorge MT et al (1990). Flora bacteriana da cavidade oral, presas e veneno
de Bothropos jararaca: possível fonte de infecção no local da picada.
Revista do Instituto de Medicina Tropical de São Paulo, 32: 6-10.
4. Bruins MJ, De Boer AM, Ruijs GS (2006). Gastroenteritis caused by
Salmonella from pet snakes. Ned Tijdschr Geneeskd, 150: 2.266-9.
5. Mader DR (1998). Common bacterial disease and antibiotic therapy in
reptiles. Supl. Compend. Contin. Educ. Pract. Vet, 20: 23-33.
6. Moreno G et al. (1973). Enterobactérias isoladas de anfíbios e répteis.
Rev. Inst. Med. Trop. São Paulo, 15: 122-126.
7. Coutinho SD et al. (2001).Bacterial septicemia in water snakes (Helicops
modestus) in Brazil. Arquivos Brasileiros de Medicina Veterinária e
Zootecnia, 53: 447-448.
8. Ministério da Saúde (2001). Manual de diagnóstico e tratamento de
acidentes por animais peçonhentos. 2.ed. Brasília: Fundação Nacional
de Saúde., 120p.
9. Chithra Valsan MD; Rao TV; Sathiavathy A (2008). A case of Snakebite
complicated by Morganella morganii subspecies morganii Biogroup I
infection. The Internet Journal of Infectious Diseases, 6. Disponível em:
<http://www.ispub.com/ostia/index.php?xmlFilePath=journals/ijid/vol6n2/s
nake.xml>. Acesso em: 16 setembro 2011.
10. Mracus LC (1971). Infectious diseases of reptiles. Journal of the
American Veterinary Medicine Association, 159: 1626-1631.
332
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2012 5 (9): 320 – 334.
11. Soveri T (1984). Observations of bacterial diseases of captive snakes in
Filand. Nord Vet Med, 36: 38-42.
12. Brenner DJ et al. (1978). Deoxyribonucleic acid relatedness of Proteus
and Providencia species. Int. J. Syst. Bacteriol, 28: 269-282.
13. Jensen KT et al. (1992). Recognition of Morganella subspecies, with
proposal of Morganella morganii subsp. morganii subsp. nov.
and
Morganella morganii subsp. sibonii subsp. nov. International Journal of
Systematic Bacteriology, 42: 613-620.
14. Jacobson ER (2007). Infectious diseases and pathology of reptiles: Color
atlas and text: 1.ed. Boca Raton: CRC Press, 736p.
15. Jacobson ER et al. (1992). Epizootic of ophidian paramyxovirus in a
zoological collection: pathological, microbiological, and serological
findings. Journal of Zoo and Wildlife Medicine, 23: 318-327.
16. Goulart CES. Princípios gerais de herpetocultura.In:_______________
______(2004). Herpetologia, herpecultura e medicina dos répteis.1.ed.
Rio de Janeiro: L.F. Livros de Veterinária, 173-194.
17. Hiinajeros DP, Divers-Hernandez SM, Divers-Hernandez SJ. Ofídios. In:
Aguilar RF, Divers-Hernandez SM, Divers-Hernandez SJ (2007). Atlas
de medicina, terapêutica e patologia de animais exóticos. 1. ed. São
Caetano do Sul: Interbook, 119-140.
18. Martins M, Oliveira ME (1999). Natural history of snakes in forests
of the Manaus region, Central Amazonia, Brazil. Herpetological
Natural History, 6:78-150.
19. Hoge AR, Federsoni PA (1981). Manutenção de Serpentes em Cativeiro.
Biotério, 1: 63-77.
20. Barbosa AR et al. (2006). Contribuição ao estudo parasitológico de
jibóias, Boa constrictor constrictor Linnaeus, 1758, em cativeiro. Revista
333
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2012 5 (9): 320 – 334.
de Biologia e Ciências da Terra, 6: 1-18.
21. Andrade SF, Giuffrida R, Ribeiro MG. Quimioterápicos, antimicrobianos e
antibióticos. In: Andrade SF (2002). Manual de Terapêutica Veterinária.
.2.ed. São Paulo: Roca, 13-58.
22. Funk RS, Diethelm G.Reptile Formulary. In: MADER, D (2006). Reptile
medicine and surgery. St. Louis: Saunders Elsevier, 1119-1139.
23. Ahmed AM et al. (2007). Zoo animals as reservoirs of gram-negative
bacteria harboring integrons and antimicrobial resistance genes. Appl.
Envir. Microbiol, 73: 6686-6690.
24. Bender JB et al. (2004). Reports of zoonotic disease outbreaks
associated with animal exhibits and availability of recommendations for
preventing zoonotic disease transmission from animals to people in such
settings. Journal of the American Veterinary Medicine Association, 224:
1105-9.
25.
Goulart
CES.
Abordagem
In:_____________________(2004).
clinica
Herpetologia,
de
répteis.
herpecultura
e
medicina dos répteis.1.ed. Rio de Janeiro: L.F. Livros de Veterinária,
211-215.
Recebido em: Setembro de 2011
Aceito em: Junho de 2012
Publicado em: Julho de 2012
334