o projeto completo - Câmara Municipal de Foz do Iguaçu

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o projeto completo - Câmara Municipal de Foz do Iguaçu
PROJETO DE DECRETO LEGISLATIVO Nº 5/2016
Concede o Título de Cidadão Honorário
de Foz do Iguaçu ao Senhor ALUÍZIO
FERREIRA PALMAR.
Autoria: Vereador Nilton Bobato
A Câmara Municipal de Foz do Iguaçu, Estado do Paraná, Aprova:
Art. 1º Fica concedido ao Senhor Aluízio Ferreira Palmar, o Título de Cidadão
Honorário de Foz do Iguaçu, em reconhecimento aos relevantes serviços prestados ao
Município de Foz do Iguaçu.
Art. 2º A Câmara Municipal determinará a data para entrega solene do Título ora
concedido, nos termos da Lei nº 3.111, de 10 de outubro de 2005 e Lei nº 3.856, de 29 de
julho de 2011.
Art. 3º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
JUSTIFICATIVA
Aluízio Ferreira Palmar, jornalista, 73 anos, nascido em São Fidélis,
Rio de Janeiro, no ano de 1943, quando jovem estudou Ciências Sociais na Universidade
Federal Fluminense, em Niterói. Começou a se engajar na luta democrática durante o
governo de Juscelino Kubitschek (1956/1961). Com efeito, o Brasil vivia uma onda
reformista e de lutas pela reforma agrária, urbana e judiciária. Era um período forte de
conscientização política. Conhecendo, andando, ouvindo, lendo, vendo e vivendo, aos
poucos Palmar foi se envolvendo nos embates de seu tempo.
Na então capital fluminense, as lutas operárias e estudantis foram
talhando a percepção de Aluízio Ferreira Palmar. Aquele menino que saiu do interior cheio
de dúvidas, contestando de forma aleatória e inconsequente, começou então a conhecer os
mecanismos da sociedade.
No dia primeiro de abril de 1964, o presidente João Goulart foi
deposto da presidência da República, por força de um golpe empresarial e militar. Nessa
época Aluízio Ferreira Palmar era dirigente da União Fluminense de Estudantes e um dos
coordenadores do Plano Nacional de Alfabetização (PNA) no Estado do Rio. O PNA era
coordenado nacionalmente pelo professor Paulo Freire.
Quando ocorreu o golpe empresarial-militar em primeiro de abril de
1964, Aluízio decidiu resistir à ditadura, criando, juntamente com outros companheiros de
luta o Movimento Revolucionário Oito de Outubro. Depois de passar três anos organizando
e desenvolvendo no Estado do Rio de Janeiro várias formas de luta e devido à uma
incessante perseguição política, Aluízio decidiu vir para a Região Oeste do Paraná, onde se
dedicou a organizar a resistência à ditadura no campo. Aqui, casou, de forma clandestina,
com Eunice Rahmeier, filha de família pioneira de Foz do Iguaçu.
Devido a sua luta contra o regime tirano, Aluízio foi preso em 04 de
abril de 1969. No livro Cálices Quebrados, a jornalista Juliana Machado, conta como foi
sua conversa com Aluízio Palmar sobre os dias que ele passou na prisão:
“Sabe que em todos esses anos eu pouco detalhei esse episódio de minha vida.
Interrompe-se. Começa a contar a respeito de uma palestra dada por ele uma vez. Ele diz
que é comum nesses eventos que as pessoas o provoquem para que diga o que ele passou
dentro da prisão. Interrompe-se novamente. Em seguida, prossegue. “Eu passei tanto
tempo no pau-de-arara do DOPS [Delegacia de Ordem Política e Social] que carrego
até hoje as marcas no corpo e na alma. Eu era tirado do xadrez quase todas as noites e
os companheiros que viam eu saindo, quando viam, ficavam apreensivos. Quando eu
voltava, eu voltava diferente”. Insisto no que seja “voltar diferente”. Percebo que ele
vai continuar, mas não me responde. “Sabe, eu penso assim: será que eu tenho que
passar por tudo de novo contando? Não, eu prefiro não falar os detalhes, mas foi o ano
de 69 todo. Esse suplício, que se repetiu desde a minha prisão, aconteceu na Delegacia
de Polícia de Cascavel; no Batalhão de Fronteiras, de Foz do Iguaçu; no quartel da
Polícia do Exército, em Curitiba; no Centro de Informações da Marinha e nos centros de
tortura das ilhas das Cobras e das Flores, também situadas no Rio de Janeiro. Eram
torturas de todo tipo, desde choque elétrico, afogamento, pau de arara. As torturas eram
realizadas em plena luz do dia."
Além da dor física, tinha a psicológica. Teve um tenente de Foz do Iguaçu que ameaçou
provocar um aborto na esposa de Aluízio assim que ela fosse presa. “Filho de comunista,
comunista é. A ideologia é transmitida pelo sangue.”
No final do ano de 1970, Aluízio estava na solitária do Presídio da
Ilha Grande quando foi trocado, juntamente com outros 69 presos políticos, pelo
Embaixador da Suíça no Brasil. O Embaixador havia sido capturado pela Resistência à
ditadura e sua liberdade foi trocada pela libertação dos presos políticos que estavam sendo
torturados.
Em 14 de janeiro de 1971, os presos trocados pelo Embaixador foram
enviados para o Chile, que era governado por uma coalizão de esquerda - a Unidade
Popular. Aluízio Palmar ficou exilado por um ano e meio no país governado por Salvador
Allende. Inquieto e com vontade de lutar, Palmar saiu clandestinamente do Chile para
retornar à luta contra a ditadura; "Voltei descaracterizado. Os olhos azuis viraram
castanhos por causa das lentes de contato , cabelos negros bem penteados.” De 1972 até
1979, lutou clandestinamente pelo retorno da democracia em nosso país.
Em 28 de agosto de 1979, a lei da anistia foi promulgada. Aluízio
retornou à fronteira no início de setembro de 1979 e começou a trabalhar como jornalista
profissional no semanário “Hoje Foz”. Assim que esse jornal foi adquirido por políticos da
antiga Arena, partido de sustentação da ditadura, Aluízio e os colegas que trabalhavam
com ele, João de Adelino de Souza e Juvêncio Mazzarollo, saíram para fundar um novo
jornal, com uma linha editorial engajada nas ideias políticas, sociais e democráticas.
Foi, então ,que os três jornalistas criaram o jornal “Nosso Tempo”,
cuja primeira edição foi lançada em 1980. A reportagem principal foi sobre a existência de
tortura na delegacia de polícia de Foz do Iguaçu. A empresa foi vendida em 1994 por conta
da mudança do contexto político nacional.
Em todos esses anos de vida, Aluizio Ferreira Palmar não esmoreceu.
Foi em busca dos desaparecidos políticos e o resultado de suas buscas estão no livro "Onde
foi que vocês enterraram nossos mortos?, de sua autoria e no relatório final da Comissão
Nacional da Verdade.
Como parte de sua luta pelo resgate e preservação da memória
histórica, Aluízio trouxe para Foz do Iguaçu, em outubro de 2011, a Caravana da Anistia,
que realizou, no Plenário da Câmara Municipal de Foz do Iguaçu, uma concorrida sessão
de reparação às vitimas da ditadura na região.
Incansável em sua caminhada no resgate das memórias reprimidas,
Aluízio Ferreira Palmar promoveu e organizou, também no Plenário da Casa de Leis
Municipal, em 27 de junho de 2013, uma Audiência Pública da Comissão Nacional da
Verdade, quando as vítimas da ditadura verteram lágrimas ao relatar as torturas sofridas
nos centros de tortura.
Aos 73 anos de idade, Aluízio Palmar presta serviços ao Centro de
Direitos Humanos e Memória Popular de Foz do Iguaçu, que ele, juntamente com outros
ativistas sociais, refundou em 2010; é membro do Comitê de Acompanhamento da
Sociedade Civil na Comissão de Anistia, ligada ao Ministério da Justiça e mantém o site de
referências históricas: www.documentosrevelados.com.br onde disponibiliza cerca de 80
mil documentos.
Dessa forma, esta Casa de Leis, em franco reconhecimento aos seus
atos, vem, por meio deste Título de Cidadão Honorário, reconhecer, em vida, a pessoa do
Senhor Aluízio Ferreira Palmar.
kf