Cosmologia: Cem anos de descobertas e novos desafios para o

Transcrição

Cosmologia: Cem anos de descobertas e novos desafios para o
Cosmologia: Cem anos de descobertas e
novos desafios para o século XXI
CONVITE À FÍSICA
“The less one knows
about the universe,
the easier it is to explain”
L. Brunschvicg
5 de abril de 2006
Instituto de Física
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Ioav Waga
Uma visão do Universo por volta de 1900 d.C.
Composição: estrelas
Organização:
Sistema Solar
30,000 anos luz
Origem: ?
William Herschel
(1738-1822)
Questão chave 100 anos atrás !
Objetos em nossa própria galáxia?
Objetos distantes semelhantes à Via Láctea?
Andromeda
• Curtis: “ A evidência
hoje aponta fortemente
para a conclusão de
que as espirais são
galáxias individuais , ou
universos ilhas,
comparáveis à nossa
galáxia em dimensão e
número de
componentes.”
H. D. Curtis
•
H. Shapley
Shapley: “ Penso que a
evidência é oposta a que as
espirais são galáxias de
estrelas, comparáveis à
nossa própia galáxia. Até o
presente não há razão para
modificarmos a hipótese de
que as espirais são
simplesmente objetos
nebulosos.”
• A disputa não foi resolvida
então. O que faltava?
• Dados inquestionáveis sobre a
nossa distância às nebulosas.
Edwin Powel Hubble: 20/11/1889 - 28/9/1953
• 1923 - Hubble observa 2
novas e uma estrela
variável em Andrômeda.
• A estrela variável foi uma
descoberta fundamental!
• Por que?
• Após uma sequência de
observações Hubble
concluiu que a estrela
variável era uma Cefeida.
Andrômeda
Henrietta Leavit
• Em 1912 Henrietta Leavit
uma astrônoma de
Harward observou uma
correlação entre a
luminosidade absoluta
média de estrelas do tipo
cefeida e o período de
sua variação.
• Quanto maior o período
maior a luminosidade.
Luminosidade (em unidade solar)
Cefeidas
Período de pulsação (dias)
•
Hubble no telescópio Schmidt no
monte Palomar, Califórnia
Portanto, medindo o período
e o fluxo, Hubble pode determinar
a distância a Andrômeda .
• Hoje sabemos que essa distância
é ~ 670 000 pc.
• Sabia-se naquela época que o raio
da nossa galáxia era menor que o
valor obtido por Hubble.
Hoje sabemos que o raio da
galáxia é ~15000 parsecs.
• A conclusão era inescapável:
Andrômeda é de fato uma galáxia
espiral semelhante à nossa e que
está fora da Via Láctea.
ANDRÔMEDA
Um esquema de nossa galáxia
Grupo Local
Distância ou tamanho
Simbolo
Valor
Valor Relativo
Raio da Terra
RT
6371 Km
Raio do Sol
RS
696000 Km
100 RT
Distância Terra - Sol
AU
150 x 106 Km
200 RS
1 parsec
pc
Estrela + próxima
R*
1.275 pc
7 x 107 RS
RG
10 kpc
8000 R*
RA
670 kpc
70RG
RV
11 h-1 Mpc
30RA
RU
3000 h-1Mpc
300RV
Distância Sol - centro da
galáxia
Raio do grupo local
(Andrômeda)
Aglomerado + próximo
(Virgem)
Raio do Universo observável
3.09 x 1013Km
200000 AU
Idade
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
Universo – ~ 14 bilhões de anos
Terra – 4,5 bilhões de anos (45 anos)
Primeiras formas de vida (35 anos atrás)
A vida nos oceanos florece abundantemente (6 anos
atrás)
Plantas e animais na terra (4 anos atrás)
Dinossauros atingem o máximo 1 ano atrás e
desaparecem a ~ 4 meses
Os primeiros humanoides aparecem na última semana.
A nossa espécie (homo sapiens) só surge a 4 horas
atrás.
A agricultura foi inventada na última hora.
O Brasil foi descoberto a 3 minutos atrás.
O modelo padrão da Cosmologia
• A cosmologia moderna parte de algumas hipóteses de
trabalho.
9 As leis da física, válidas no sistema solar valem também
para o resto do Universo.
9 As leis da física, podem também ser extrapoladas para o
passado.
9 Gravitação é dominante em grandes escalas.
Alcance das interações fraca e forte ~ 10-13 cm. Embora
e2/GMp2 >>1, os grandes agregados são eletricamente neutros.
Principio de Copérnico: não ocupamos um lugar privilegiado
- somos observadores típicos.
Princípio Cosmológico: em escalas suficientemente grandes
o Universo é espacialmente homogêneo e isotrópico.
Os 3 pilares básicos da
Cosmologia
1
2
3
1. A expansão do universo
• 1901, Vesto M.
Slipher é contratado
para trabalhar no
Observatório
Lowell.
• durante mais de 10
anos ele analisou o
espectro da luz
vinda de estrelas e
nebulosas.
Percival Lowell
Espectro contínuo
Tela
Prisma
fenda
Lâmpada
Espectro contínuo
+
linhas de absorção
Fótons reemitidos
Tela
Prisma
fenda
Gás frio
Lâmpada
Espectro contínuo
Tela
Prisma
Lâmpada
lho
e
m
ver verde
leta
o
i
v
linhas de emissão
Tela
Prisma
Hidrogênio aquecido
Hidrogênio
Sódio
Hélio
Neonio
Mercúrio
Espectro de emissão de alguns elementos conhecidos
• Em 1912 Slipher
percebeu que as linhas
espectrais de
Andrômeda estavam no
lugar errado, elas
estavam deslocadas
para o azul (região de
menor comprimento de
onda).
V. M. Slipher
• 1842 - Efeito Doppler
desvio
velocidade da fonte λobs − λ ref fonte
z = para o =
=
velocidade da luz
λ ref fonte
vermelho
C = 300 000 km/seg
Christian Doppler
Válido para v muito menor que c
Portanto a interpretação do resultado
de Slipher é que Andrômeda está se
aproximando de nós.
NGC 2276
http://www.astro.washington.edu/labs/hubble/
Hidrogênio α
Variação de λ
1 Angstrom = 0,0000000001 metro
o
λ f = 6562 ,8 A
o
λ obs = 6615 A
6615 − 6562 ,8
= 0 , 008
o
o
6562
,
8
λf = 6562,8 A
λobs = 6615 A
v = z c = 2 386 km/seg
Intensidade relativa
z =
6615 − 6562,8
= 0,008
6562,8
v = z c = 2 386 km/s
z=
1 Angstrom = 0,0000000001 metro
Comprimento de onda (Angström)
Intensidade relativa
Hidrogênio β
o
λ f = 4861 , 3 A
o
λ obs = 4900 A
4900 − 4861 , 3
= 0 , 008
4861 . 3
v = z c = 2 386 km/seg
z =
Comprimento de onda (Angström)
•
A velocidade de Andrômeda
estimada por Slipher foi de,
aproximadamente, 300km/seg.
•
•
V. M. Slipher
Em 1915 ele já tinha 40 medidas de
espectro de nebulosas com 15
velocidades estimadas, número que
sobe para 25 em 1917.
Contrariamente ao que fora
observado em Andrômeda a grande
maioria apresentava velocidades
positivas. Por exemplo, das 41
nebulosas com desvio para o
vermelho medido em 1923, apenas
5 (incluindo Andrômeda)
aproximavam-se de nós.
• 1917 - primeiro modelo
cosmológico relativista modelo de Einstein.
• características principais:
homogêneo, isotrópico,
curvatura positiva e estático.
• constante cosmológica (Λ)
“The most important fact that we draw
from experience is that the relative velocities of the
stars are very small as compared with the velocity of
light”.
A. Einstein
Albert Einstein
•
Einstein considerava que seu
modelo possuía as seguintes
virtudes:
•
Era possível construir um modelo
consistente para o universo usando
a relatividade geral.
•
Relacionava Λ com densidade
média da matéria; Estava em
acordo com o princípio de Mach
que relaciona a inércia (propriedade
local) com a distribuição de matéria
no cosmos.
•
Einstein acreditava ser esse o único
modelo admitido pela relatividade
geral que era estático e que estava
em acordo com o princípio de
Mach.
Efeito de Sitter
• Em 1917 de Sitter
(holandês) obtem novas
soluções da Relatividade
Geral com constante
cosmológica, estacionárias,
mas vazias !
• Efeito de Sitter: a
velocidade de afastamento
de objetos aleatoriamente
espalhados em um Universo
de de Sitter aumenta com a
distância.
Willem de Sitter
Modelo de FriedmannLemaître
A.G.
A.Lemaître
Friedmann
•
1922 - Aleksander
Aleksandrovich Friedmann
(russo) obtem soluções
expansionistas, sem Λ e com
matéria das equações de
Einstein.
•
O modelo de Friedmann é
considerado hoje o modelo
padrão da cosmologia.
•
Características principais:
homogeneidade, isotropia (em
relação a qualquer ponto) e
expansão.
Curvatura espacial positiva
Curvatura espacial nula
Curvatura espacial negativa
• Em 1929 e nos anos
subsequentes Hubble
sistematicamente
estende suas medidas de
distância, e usando
desvios para o vermelho
medidos por Humason,
coloca sobre uma base
firme a validade da
relação que viria a se
chamar Lei de Hubble
Milton Humason e Hubble
velocidade
H0
desvio para o vermelho =
× distância
de
= Hc × distância
c z = v = H 0 d ⇒ (lei de Hubble dos astrônomos )
recessão
20000
15000
10000
5000
0
0
10
20
30
distance (Mpc)
[Hubble (1929)]
[Hubble & Humason (1931)]
H 0 = 100 h km /( s Mpc)
Kolb
•Para onde estão as galáxias se
expandindo?
• Onde está o centro do Big-Bang?
• O sistema solar está em expansão?
•A lei de Hubble viola a relatividade
especial?
•A velocidade com que o Universo está se
expandindo aumenta, diminui ou permanece
constante?
• Irá o Universo expandir-se para sempre
ou haverá no futuro uma contração?
Separação entre galáxias
A expansão do Universo
Acelerado
Desacelerado sem recolapso
Desacelerado com recolapso
tempo
Kolb
Os 3 pilares básicos da
Cosmologia
1
2
3
2. A formação de elementos leves
A formação de elementos leves
Alpher
Bethe
Gamov
Herman
“Delter”
Em 1946, Alpher, Bethe e Gamov sugeriram a
possibilidade de que todos os elementos químicos teriam
sido gerados através de uma longa cadeia de captura de
nucleons em 1 Universo primordial em expansão e que
estaria esfriando-se. O esquema falha pois não há
elementos leves estáveis com número de massa 5 e 8.
A formação de elementos leves
Nucleosíntese Primordial
p
Predições da teoria:
H
n
– Forma, essencialmente,
Hydrogênio & 4Hélio
p
He
– Também forma 2H, 3He,
n
He
Li.
– Depende da razão entre
prótons e neutrons na
+ He
(Raro)
época e da taxa de
Be
Li
decaimento do neutron.
Li
He
He
• Razão (p:n) ~ 7:1
H
H
A=8
A=5
– Abundância (por massa)
de hélio ~ 25% do total.
Predições estão baseadas em física bem conhecida
2
3
4
2
9
7
6
1
2
3
4
A formação de elementos leves
Nucleosíntese Primordial
ƒ Forte suporte ao
modelo padrão da
Cosmologia
ΩB =
ρB
; hoje ρ cr ≅ 5 prótons/m 3
ρ cr
H 0 = 100 h km / seg M pc − 1
Valor Predito
1
Abundância Relativa
ƒ As observações estão
em excelente acordo com
as previsões teóricas.
Valor Observado
He
~25%
Região
permitida
10-3
D
10-6
Li
10-9
0.005
0.01
0.02
Densidade Atual de Bárions ΩBh2
Dunkle Materie
– Fritz Zwicky, em 1933,
mostrou que a materia visivel
constitui somente uma
pequena fracao de toda a
massa do Universo.
Fritz Zwicky
– Ele mediu a velocidade radial
de 8 galaxias no aglomerado
de Coma e, estimando a
dispersao de velocidade,
concluiu que a densidade
media de materia era 400
vezes (50) maior do que a
densidade estimada pelas
observacoes de materia
luminosa. Essa discrepancia
ficou conhecida como o
“problema da massa faltante”.
v2
G MSOL
=
R
R2
R
v
medindo v & R
2R
v2
G MGALÁXIA
=
R
R2
medindo v & R
E. Kolb
MSOL
MGALÁXIA
Os 3 pilares básicos da
Cosmologia
1
2
3
3. A existência de uma radiação
cósmica de fundo de microondas
A Radiação Cósmica de Fundo
• descoberta:
A. A. Penzias & R. W. Wilson,
em 1964, Bell Laboratory
• interpretação:
R. H. Dicke, P. J. E. Peebles,
P. G. Roll e D. T. Wilkinson,
em 1964, Princeton
University
Penzias e Wilson
Núcleos e
elétrons livres
Átomos
Universo
opaco
Universo
transparente
Terra
Superfície de último
espalhamento (z ~1000)
A Radiação Cósmica de Fundo
COBE
1989
• Características principais:
•
•
•
É uma radiação de corpo negro
de microondas (T ~ 3 oK).
A radiação é, altamente
isotrópica ∆T/T ~ 1.2 x 10-5 .
Contudo ela possui uma
anisotropia dipolar, ∆T/T ~ 1.2 x
10-3 , que decorre da nossa
velocidade em relação ao
referencial da radiação de
fundo; v ~ 360 km/seg
ANISOTROPIAS
COBE:
US$ 600 M,
4 anos
( fim 1993)
OBSERVAÇÕES
• COBE:
T = 2.725 + 0.001
T = 2.725 − 0.001
∆T −5
10
T
WMAP
WMAP:
US$ 150 M,
(2 anos)
(fim 2004)
Inflação Cósmica – 1980
O Problem da chateza
do universo (ou
problema da entropia)
– Por que a densidade de
energia era tão próxima a
unidade no Universo
primordial?
O Problema do
Horizonte
– Por que a RCF é tão
uniforme?
Alan Guth
O Problema do Horizonte (isotropia)
t
.
O
x
td
tpl
B
A
Sne Ia como ferramenta para a
cosmologia
The High-z Supernova Search Team
The Supernova Cosmology Project
(B. Schmidt et al – Mt Stromlo Obs)
(S. Perlmutter et al - Berkeley)
Sne Ia como ferramenta
para a cosmologia
Vantagens
• Luminosos
(109 - 1010 Lο).
• muito
homogêneos.
Problemas
• Raros,
~ 1/500 ano/galáxia.
• aleatórios.
• rápidos.
•Sne Ia atinge o máximo em alguns dias.
• em alto “z” nao é mais possível detecta-las
com os mais poderosos telescópios dentro de 1 ou 2 meses.
Supernova do tipo Ia
Anã Branca
Explosão resultante de uma detonação termonuclear
de uma estrela Anã Branca.
SN 1997ck é uma das supernovas mais distante até hoje descobertas.
4 de abril de 1997
28 de abril de 1997
SN 1997ck afasta-se com ~ 60% da velocidade da luz
A luz dessa supernova leva 8 bilhões de anos para chegar a Terra
m = M + 5log DL (θ1 ,θ 2 ,...)
Perlmutter et al.
www.snap.lbl.gov
Concordância Cósmica
Allen et al. – astro-ph/0405340
Inventário Cósmico
‰ Fótons (CMB)
Ωfótons ~ 0.00005 (0.005%)
‰ Neutrinos
‰ Há evidências que mais de
90% de toda a matéria é
escura.
¾ Aglomerados e dinâmica de
galáxias.
Ωneutrinos ~ 0.003 (0.3%)
‰ Matéria Luminosa (estrelas)
Ωlum ~ 0.005 (0.5%)
‰ Matéria Bariônica (prótons e
neutrons)
Ωbarion ~ 0.04 (4%)
‰ Matéria Escura (não barionica)
¾ Lentes Gravitacionais
ΩM ~ 0.25 (25%)
‰ Energia Escura
ΩΛ ~ 0.7 (70%)
¾ Fração de massa barionica em
aglomerados.
ρi
;
Ωi =
ρc
3H 2
ρc =
8π G
Dark Energy
~70%
Ordinary Matter
~4%
Cold Dark Matter
~25%
Maiores avanços teóricos e sucessos da Cosmologia no século XX
Relatividade Geral como teoria de gravitação ; existência de um quadro
auto-consistente.
Expansão do Universo e a lei de Hubble (1929) .
Alpher, Herman e Gamov fazem a previsão da existência de uma RCF de 3oK.
Descoberta da RCF por Penzias e Wilson (1964).
Previsão da nucleosíntese primordial (Alpher, Bethe e Gamov - 1948).
Concordância da teoria com as observações.
Previsão da existência de matéria escura (não bariônica) e seu papel na
formação de estruturas.
Inflação e o problema das condições iniciais no Universo (Guth – 1980). Origem
das flutuações de densidade para formação de estruturas.
Bariogênese e assimetria matéria e antimatéria.
Energia escura e a aceleração da expansão (1998).
Grandes questões abertas
Natureza da matéria e da energia escura.
Topologia do Universo
Gravitação quântica e a origem do Universo.
Quadro mais completo para a formação de galáxias e aglomerados.
Pablo Picasso
Pablo Picasso
Pablo Picasso
• Cosmology: The Science of the Universe - E. R. Harrisson
• A Expansão do Universo - Revista Brasileira de Ensino de
Física vol 22, p.163 (2000) - I. Waga.
• Cem Anos de Descobertas em Cosmologia e Novos
Desafios para o Século XXI – Revista Brasileira de Ensino
de Física –vol 27, n.1, p.157, março de 2005 – I. Waga.
• Edwin Hubble the discoverer of the Big Bang - A. S.
Sharov & I. D. Novikov
• Equívocos sobre o Big Bang – Scientific American Brasil
– número 35, abril de 2005 , p.32, Charles H. Lineweaver e
Tamara M. Davis.
http://www.if.ufrj.br/~ioav/nota.html