Legislação Desportiva - Secretaria do Esporte e do Turismo

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Legislação Desportiva - Secretaria do Esporte e do Turismo
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LEGISLAÇÃO DESPORTIVA - PROJETO DE LEI DE CONVERSÃO Nº 01/2003
QUE ALTERA A LEI Nº 9615/98 - SANÇÃO OU VETO?
Alexandre Hellender de Quadros
Marcílio Krieger
Paulo Marcos Schmitt∗
1. Apresentação
O presente estudo tem a exclusiva finalidade de interpretar as recentes inovações pretendidas
à Lei nº 9.615/98 (Lei Pelé) com a Medida Provisória nº 79/02, já aprovada pela Câmara e
pelo Senado - Projeto de Lei de Conversão nº 01/03, atualmente sujeito à sanção ou veto
presidencial.
Como consabido, os atos de sanção ou veto, no processo legislativo, são formas de
intervenção do Executivo no procedimento de elaboração da lei1. Sobre o tema, João
Jampaulo Júnior2 lembra que “a sanção e a promulgação são atos terminativos, finais, do
processo legislativo, que resultarão na formação da nova lei. (...) O veto somente poderá ser
aposto pelo Chefe do Executivo quando este considerar o projeto inconstitucional, ilegal ou
contrário ao interesse público, em mensagem fundamentada.”
O ato de sanção ou veto no processo legislativo é um ato eminentemente político,
consubstanciado na concordância ou recusa, total ou parcial, na aprovação de um projeto de
lei. Nessa linha de raciocínio, é imperioso dizer que esse ato político, quando a matéria em
lume é o desporto, costuma revestir-se de muita polêmica, notadamente diante da
manifestação do desporto profissional - futebol. Não é de hoje que o Executivo Federal tenta
modificar a legislação existente nesse campo “minado” ou “movediço” da paixão nacional,
eivado de interesses contrapostos e dotados de muita obscuridade.
Historicamente, clubes e entidades de administração do futebol sempre contaram com
medidas de proteção ou conivência do Poder Público às medidas de fiscalização e
arrecadação tributária. Na expectativa de resgatar a moralidade desportiva, abandonada pela
gestão temerária à condução das atividades do futebol profissional, inclusive culminando com
a instauração de CPIs no Congresso Nacional, impulsionadas pelos constantes escândalos
noticiados na mídia, chegou-se à conclusão de que o modelo existente não atendia aos
reclames sociais. Porém, a fúria legiferante avançou o sinal, iniciando com a MP 039/02
(rejeitada pelo Congresso) e, agora, com a MP 79/02 originando o projeto de lei nº 01/03.
Passamos, portanto, à análise sistemática do projeto de lei nº 01 de 2003, sobre o qual
cumpre, ao novo Governo, a árdua tarefa de sanção ou veto e para a qual ousamos fazer
algumas sugestões.
Os autores são advogados, professores de cursos em Direito Desportivo, membros de tribunais desportivos,
debatedores no fórum esportivo virtual CevLeis e contam com inúmeras publicações na área.
∗
1
Cléve, Clémerson Merlin. Atividade Legislativa do Poder Executivo. 2ª ed., Editora RT, São Paulo, 2000, p.110.
2
Júnior, João Jampaulo. O Processo Legislativo Municipal. Editora LED, São Paulo. p.114 a 117.
2
2. Desporto profissional, atividade econômica e princípios
"Art. 2º
Parágrafo único. A exploração e a gestão do desporto profissional constituem exercício de
atividade econômica sujeitando-se, especificamente, à observância dos princípios:
I - da transparência financeira e administrativa;
II - da moralidade na gestão desportiva;
III - da responsabilidade social de seus dirigentes;
IV - do tratamento diferenciado em relação ao desporto não profissional; e
V - da participação na organização desportiva do País."(NR)
Sugestão: Sanção
Fundamentos:
Considerar a gestão do desporto profissional como atividade econômica é o mandamento
nuclear das alterações pretendidas, colocando-o em patamares de modernidade e equilíbrio
com as demais atividades que produzem bens e serviços à sociedade. É inegável que o
diagnóstico de crise de moralidade e ética no desporto, notadamente no futebol profissional,
deram ensejo, tardio – diga-se – a um "pacote" de medidas que visam regular um
significativo setor da nossa economia.
Revelar o que há na "caixa-preta" do desporto profissional sempre foi um anseio da sociedade
em geral e diretamente consumidora, além dos órgãos estatais incumbidos de fiscalização
tributária e previdenciária. Entidades de administração e de prática do futebol sempre
contaram com protecionismos advindos do velho jargão "paixão nacional", adotando uma
redoma jurídica na forma associativa. Contudo, mesmo nas hipóteses em que entidades
envolvidas em transações de elevadas cifras na circulação de mercadorias e serviços
vinculados ao futebol, constata-se a existência de um passivo fiscal, previdenciário,
trabalhista e mesmo financeiro interna corporis, consubstanciados na gestão irresponsável de
seus dirigentes. O conformismo e a aceitação pacífica da ciranda deficitária e organizacional
desse modelo imantado de benesses capazes de gerar insegurança nas relações comerciais e
na captação da receita pública, dão lugar ao reconhecimento legal da atividade econômica
Os princípios eleitos, especialmente de transparência, moralidade e responsabilização, são
sustentáculos da reforma e que, coincidência ou não, são corolários dos alicerces da Lei de
Responsabilidade Fiscal3.
Edson Ronaldo do Nascimento e Ilvo Debus4 apontam alguns princípios que informam a
LRF. Podemos, de forma inequívoca, compará-los ao projeto de reforma da Lei Pelé, da
seguinte maneira: (i) LRF – Equilíbrio e planejamento, ou seja, não gastar mais do que se
arrecada e planejar, antes de executar. Princípio equivalente no PLV 01/03 – Moralidade na
gestão desportiva; (ii) LRF – Transparência, significando prestar contar e informar à
sociedade. Princípio equivalente no PLV 01/03 – Transparência financeira e administrativa;
(iii) LRF – Participação, caracterizada por governar com e não contra o cidadão. Princípio
equivalente no PLV 01/03 – Participação na organização desportiva do país.
3
Álvaro Melo Filho, in Novo Regime Jurídico do Desporto (p. 14), afirma que a Lei Pelé é um clone jurídico ao
repetir 53% da Lei Zico. Seria, então, a MP 79 / PLV 01, um clone conceitual ou principiológico da LRF?
4
Gestão Fiscal Responsável, JM Editora, Brasília/Df, 2001.
3
A importância do estudo dos princípios reside, principalmente, em aclarar o sentido das
normas – no caso o espírito da legislação desportiva. Preconiza-se, todavia, aplicar métodos
de interpretação dos textos das leis sem, contudo, distanciar-se do objetivo para as quais
foram editadas.
É indene de dúvidas que a LRF contribui para um maior controle do gasto público e
moralização da atividade administrativa, requerendo uma nova atitude dos administradores
públicos em matéria de finanças e orçamento. Todos esses valores aplicados às atividades
desportivas, revelam, no mínimo, que a MP79 é uma pretensa norma de “boas intenções".
Inobstante, não passarão de boas intenções, caso o debate não seja melhor aprofundado,
porquanto as exigências de administração responsável, com sanções aos dirigentes desidiosos
ou negligentes, no contexto da pretensa lei, ora trazem condições materiais de aplicabilidade
de seus preceptivos, ora revelam-se inconstitucionais, inadaptáveis ao sistema jurídicodesportivo ou contrários ao interesse público.
3. Ministério Público
"Art. 4º
I - O Ministério do Esporte;
II – (revogado)
III - O Conselho Nacional do Esporte — CNE;
.......................................
§ 2º A organização desportiva do País, fundada na liberdade de associação, integra o
patrimônio cultural brasileiro e é considerada de elevado interesse social, inclusive para os
fins do disposto nos incisos I e III do art. 5º da Lei Complementar nº 75, de 20 de maio de
1993."(NR)
Sugestão: Sanção
Fundamentos:
A modificação legislativa leva à avaliação do papel do Ministério Público como ente
fiscalizador da atividade desportiva e, indo mais a fundo, dos efeitos que a alteração pode
imprimir na persecução dos atos jurídicos ilegais praticados antes de sua entrada em vigor.
Preliminarmente, sabe-se que ao Ministério Público5 compete: a) defesa da ordem jurídica, ou
seja, o Ministério Público deve zelar, exercendo a atividade interveniente de ‘fiscal da lei’,
pela observância e pelo cumprimento do ordenamento positivo; b) defesa do patrimônio
nacional; do patrimônio público e social; do patrimônio cultural, do meio ambiente; dos
direitos e interesses da coletividade, especialmente das comunidades indígenas, da família, da
criança, do adolescente e do idoso; c) defesa dos interesses sociais e individuais
indisponíveis; d) controle externo da atividade policial.
Destaca-se a existência de grande discussão na doutrina pátria acerca da autonomia do
Ministério Público, bem como em torno de sua própria natureza jurídica. Por conta disso,
5
www.mpu.gov.br
4
verifica-se corrente de estudiosos que defendem que o Ministério Público constitui um
quarto Poder da República, devido a autonomia funcional e administrativa que lhes confere o
Texto Constitucional6.
Em sentido oposto, vislumbra-se entendimento que considera o Ministério Público como
instituição vinculada ao Poder Executivo7.
Não obstante a discussão que ainda reside sobre o tema, pode-se postular a independência do
Ministério Público em função das disposições constitucionais.
De outra parte, e aqui cabe um corte metodológico para inserir o desporto, a redação
originária do artigo 4º, §2º, da Lei nº 9615/93 dispunha que “a organização desportiva do País,
fundada na liberdade de associação, integra o patrimônio cultural brasileiro e é considerada
de elevado interesse social”. A nova redação da MP 79/02 (como pretendia a rejeitada MP
39/02), soma “inclusive para os fins do disposto nos incisos I e III do art. 5o da Lei
Complementar no 75, de 20 de maio de 1993.”
Como já salientado anteriormente, a Lei Complementar nº 75/93 determina que é função
institucional do Ministério Público da União, a defesa do patrimônio cultural brasileiro (art.
5º). Além disso, compete ao Ministério Público da União promover ações necessárias ao
exercício de suas funções institucionais, em defesa da ordem jurídica, do regime democrático
e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, especialmente quanto ao patrimônio
cultural brasileiro (art. 6º).
Portanto, despicienda a nova redação proposta pela Medida Provisória, visto que a inserção
legislativa expressa da organização desportiva no patrimônio cultural brasileiro e o seu
reconhecimento como de elevado interesse social, já relegavam ao Ministério Público – no
âmbito de suas funções institucionais – o papel estabelecido pela Lei Complementar n.º75/93.
Mais do que isso, esta afirmação permite concluir que, mesmo com a inserção da nova
redação ao artigo 4º, §2º da Lei n.º9.615/98, permanece inalterável a possibilidade de
persecução sobre os atos realizados antes do advento da MP 79/02. Ora, se a promoção de
ações necessárias ao exercício das funções institucionais do Ministério Público está garantida
e o reconhecimento da organização desportiva do âmbito do patrimônio cultural brasileiro é
anterior à referida Medida Provisória, não há dúvidas de que atos praticados antes de sua
edição estão sujeitos à mais ampla investigação.
6
Hely Lopes Meirelles (Justitia, 123:183) emitiu parecer, mencionado por Hugo Nigro Mazzilli, in Regime
Jurídico do Ministério Público, Saraiva, p. 88, no qual afirma: ‘Ora, no que concerne ao desempenho da função
ministerial, pelo órgão (Ministério Público) e seus agentes (Promotores, Procuradores), há independência da
atuação e não apenas autonomia funcional (...). os membros do Ministério Público só se sujeitam ao controle de
órgãos superiores e diretivos da Instituição (Procuradoria-Geral da Justiça, Colégio de Procuradores, Conselho
Superior do Ministério Público e Corregedoria Geral do Ministério Público), na sua conduta administrativa ao
longo da carreira, ou nos seus atos pessoais que afrontem a probidade e o decoro que se exigem de todo
agente público, principalmente dos que desfrutam de alguma parcela da autoridade estatal. No mais, os
membros do Ministério Público atuam com absoluta liberdade funcional, só submissos à sua consciência e aos
seus deveres profissionais, pautados pela Constituição e pelas leis regedoras da Instituição.’
7
Apoiado em José Frederico Marques, destaca José Afonso da Silva, in Curso de Direito Constitucional
Positivo, Malheiros, p. 585: ‘Ainda assim não é aceitável a tese de alguns que querem ver na instituição um
quarto poder do Estado, porque suas atribuições, mesmo ampliadas aos níveis acima apontados, são
ontologicamente de natureza executiva, sendo, pois, uma instituição vinculada ao Poder Executivo.’
5
O grande argumento contrário à atuação do Ministério Público às atividades desportivas é a
chamada "autonomia desportiva". Contudo, não é nenhuma novidade que a autonomia das
entidades desportivas, prevista no art. 217 da CF/88, não pode ser interpretada como
independência, muito menos como soberania. A exemplo do que ocorre com as
Universidades (art. 207 da CF) a sua constitucionalização não teve o condão de ampliar o seu
alcance, nem afastá-las do controle administrativo ou jurisdicional competentes, pois
autonomia é autodeterminação dentro da lei, e toda entidade privada dela usufrui (STJ - MS MANDADO DE SEGURANÇA 3318 Processo: 1994.00.03012-6 UF: DF).
Todos os atos que, de qualquer forma, prejudiquem a organização desportiva do país, sejam
através das entidades de prática ou mediante as entidades de administração do desporto, são
passíveis de oposição pela via administrativa ou judicial, conforme o caso, porquanto discutese lesão a um bem de natureza imaterial, devidamente reconhecido como integrante do
patrimônio cultural brasileiro8.
Pelo exposto, é forçoso concluir que já existe instrumento normativo suficiente para a
promoção da responsabilidade civil e criminal daqueles que usurpam função, desviam
dinheiro ou praticam a corrupção no ambiente desportivo, através da participação do
Ministério Público como titular na propositura das ações, ou pela intervenção nas relações
processuais. Tal prerrogativa de atuação do Ministério Público em matéria desportiva é
amplamente reconhecida pela Justiça Comum:
“Acórdão
Origem:
TRF
PRIMEIRA
REGIÃO
Classe: AG - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 01000573244
Processo: 1998.010.00.57324-4 UF: DF Orgão Julgador: QUARTA TURMA
Data da Decisão: 14/12/1999 Documento: TRF100093790 Fonte DJ DATA:
17/03/2000 PAGINA: 397 Relator JUIZA SELENE ALMEIDA (CONV.)
Decisão Por unanimidade, dar provimento parcial ao agravo. Ementa
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CAMPEONATO
BRASILEIRO DE FUTEBOL DE 1997. REBAIXAMENTO DO FLUMINENSE
FOOTBALL CLUBE E DO CLUBE ATLÉTICO BRAGANTINO PARA A
SEGUNDA DIVISÃO. LEI 8.672/93. DANO MORAL CAUSADOS AOS
VALORES DESPORTIVOS. INTERESSE JURÍDICO NA LIDE. FORO
COMPETENTE.
...
7. A Lei Complementar nº 75, de 23 de maio de 1993 (Lei Orgânica do
MINISTÉRIO PÚBLICO da União) atribui competência ao MINISTÉRIO
PÚBLICO para "prover outras ações necessárias ao exercício de suas
funções institutionais, em defesa da ordem jurídica, do regime democrático e
dos interesses sociais e individuais indisponíveis, especialmente quanto: (...)
ao patrimônio cultural brasileiro" (art. 6º, inciso XIV, alínea d).”
8
Somente a título ilustrativo, o Novo Código Civil prevê que, para caso de abuso da personalidade jurídica,
caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da
parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas
relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa
jurídica (art. 50).
6
Resta evidente que se fala, regra geral, em participação/fiscalização do MP e não de pura,
simples e direta intervenção, a não ser nas hipóteses retrocitadas. Repisamos que a autonomia
das entidades esportivas configura mera autodeterminação exercitável de modo consentâneo
com os limites impostos pela lei. Neste contexto, o ordenamento jurídico já conferia a
possibilidade (e porque não dizer a obrigatoriedade) de participação do MP consubstanciada
em atividades fiscalizatórias na organização desportiva do país. Antes ou depois da Medida
Provisória n.º79/02, é inimaginável que exista autonomia desportiva acima da lei.
Enfim, o texto que acrescenta a MP 79 / PLV 01, embora desnecessário, reforça, na letra da
lei, aquilo que já conferia à participação do Ministério Público em matéria de organização
desportiva. Importa destacar, entretanto, que a inserção legislativa não poderá autorizar a
defesa de teses contrárias à responsabilização por atos praticados antes da entrada em vigor
deste dispositivo, à medida que a competência do Ministério Público, em matéria desportiva,
já se encontrava estabelecida pelo ordenamento jurídico então vigente.
4. Ministério do Esporte
"Art 5º O Ministério do Esporte, no âmbito da sua competência, incumbir-se-á,
especialmente:
I — da política nacional de desenvolvimento da prática dos esportes;
II - do intercâmbio com organismos públicos e privados, nacionais, internacionais e
estrangeiros, voltados à promoção do esporte;
III - do estímulo às iniciativas públicas e privadas de incentivo às atividades esportivas; e
IV - do planejamento, coordenação, supervisão e avaliação dos planos e programas de
incentivo aos esportes e de ações de democratização da prática esportiva e inclusão social
por intermédio do esporte.
§ 1º (revogado)
§ 2º (revogado)
§ 3º Caberá ao Ministério do Esporte, ouvido o Conselho Nacional do Esporte - —CNE,
propor o Plano Nacional de Esporte, observado o disposto no art. 217 da Constituição
Federal.
§ 4º O Ministério do Esporte expedirá instruções e desenvolverá ações para o cumprimento
do disposto no inciso IV do art. 217 da Constituição Federal e elaborará o projeto de
fomento da prática desportiva para pessoas portadoras de deficiência."(NR)
"Art. 6º Constituem recursos do Ministério do Esporte:
"(NR)
"Art. 7º Os recursos do Ministério do Esporte terão a seguinte destinação:
"(NR)
"Art. 8º
IV - quinze por cento para o Ministério do Esporte.
"(NR)
"Art. 11. O CNE é órgão colegiado de normatização, deliberação e assessoramento,
diretamente vinculado ao Ministro de Estado do Esporte, cabendo-lhe:
IV — propor prioridades para o plano de aplicação de recursos do Ministério do Esporte;
Parágrafo único. O Ministério do Esporte dará apoio técnico e administrativo ao
CNE."(NR)
Sugestão: Sanção
7
Fundamentos:
Os dispositivos legais sob análise visaram, de um lado, reiterar a competência do Ministério
do Esporte, no estabelecimento de seus programas, projetos e atividades centrados em uma
política estatal para o setor e, de outro, apenas corrigir o que, de muito, já estava defasado na
legislação desportiva (Lei nº 9615/98) com as sucessivas reformas administrativas do
Executivo Federal. Em síntese, tratou-se de substituir o extinto INDESP (ex-autarquia
vinculada ao então Ministério do Esporte e Turismo) pelo atual Ministério do Esporte.
5. Conselho Nacional do Esporte
"Art. 12A. O CNE será composto por vinte e dois membros indicados pelo Ministro do
Esporte, que o presidirá.
"(NR)
Sugestão: Veto
Fundamentos:
Os agentes políticos, a exemplo dos Ministros de Estado são, regra geral, cargos de
confiança, cuja peculiaridade é a transitoriedade e precariedade. Contrapõe-se aos cargos de
provimento efetivo, cujo preenchimento tem caráter de definitividade, ou seja, de ocupação
permanente, pois transcorrido prazo estatutariamente previsto, o servidor que o ocupa adquire
a estabilidade.
Ora, situações diferenciadas demandam tratamento diverso, sob pena de lesão ao princípio da
isonomia. Em face da natureza do vínculo estabelecido, a relação de confiança ou
comissionada está jungida a disciplina diversa da relação cujo vínculo é efetivo, no qual a
permanência se sobressai. Afiguram-se, pois, oportunas as lições de Adilson Abreu Dallari,
ao discorrer sobre o tema:
“No tocante a cargos públicos, a Constituição Federal já prevê a existência de
cargos em comissão, de livre nomeação e exoneração. Tais cargos, por não
gerarem direito de permanência, por corresponderem a funções de confiança,
não requerem a realização de concurso público para seu provimento.”9
Resta cristalino que a natureza jurídica do vínculo relativo aos cargos de provimento em
comissão ou de confiança tem contornos próprios, diversos, portanto, do vínculo referente
aos de provimento efetivo. E, por certo, assegurar ao sabor ou dissabor de apenas um agente a
composição de um órgão colegiado, cuja natureza nada mais é do que fazer uma "ponte" e
servir de caixa de ressonância da sociedade esportiva, como no caso do Conselho Nacional
do Esporte, desnatura por completo a razão de ser do CNE.
As atribuições do CNE exigem a presença plural dos segmentos que constituem o Sistema
Brasileiro do Desporto, ou seja: O COB (um representante); o CPB (idem); um representante
das entidades nacionais de administração de desporto, modo profissional; um representante
9
Regime constitucional dos servidores públicos, 2. ed., revista e atualizada, São Paulo, R.T., 1990, p. 40).
8
das entidades nacionais de administração de desporto, modo não- profissional; um
representante das entidades de prática, modo profissional; um das entidades de prática, modo
não-profissional; um dos atletas profissionais; um dos atletas não-profissionais; um dos
árbitros do modo profissional; um dos árbitros do modo não-profissional. A Presidência será
do Ministro do Esporte e, nos seus impedimentos, do Secretário-Executivo do Ministério dos
Esportes.
Destarte, um órgão normativo, deliberativo e consultivo como o CNE, embora vinculado ao
Ministério do Esporte, não é um órgão público por excelência ou uma unidade do
organograma administrativo propriamente dito. Serve para auxiliar o Executivo no
cumprimento de suas finalidades precípuas, ou seja, na orientação e implementação de uma
Política Nacional do Esporte, dentre outras atribuições conferidas por lei. Há que existir
membros com mandato fixo e que representem a sociedade civil desportiva, através de
indicação das respectivas instituições públicas ou privadas vinculadas à área e não mediante
um liame frágil através de uma discricionaridade ímpar à composição do CNE por um agente
político transitório.
Duas idéias merecem fixação neste ponto, ambas vinculadas ao caráter representativo do
colegiado. Na primeira, é preciso considerar que a indicação discricionária impede o
reconhecimento de legitimidade para o Conselho, o que pode desfigurá-lo como entidade
representativa. Na segunda, urge destacar a importância de formação paritária – na medida do
possível – destinada à representatividade das diversas modalidades desportivas, não apenas
do futebol.
5. Ligas/entidades de administração - Calendários
"Art. 20
§ 6º As ligas formadas por entidades de prática desportiva envolvidas em competições de
atletas profissionais equiparam-se, para fins do cumprimento do disposto nesta Lei, às
entidades de administração do desporto.
§ 7º As entidades nacionais de administração de desporto serão responsáveis pela
organização dos calendários anuais de eventos oficiais das respectivas modalidades."(NR)
Sugestão: Sanção
Fundamentos:
As ligas são entidades criadas com a finalidade de congregar entidades de prática para a
organização e administração de eventos esportivos. A proposta equipara acertadamente essas
figuras aparentemente distintas - Entidades de administração X Ligas. Em verdade, a
sobredita equiparação está fundada na impossibilidade de utilização, por via transversa, de
uma figura jurídica própria - liga, para escapar das amarras da lei. Demais disso, parece
possuir endereço certo e impedir que tais entidades venham a substituir ou ganhar força em
detrimento das entidades oficiais. Todavia, é preciso dizer que existem ligas esportivas
remanescentes de um modelo arcaico e filiadas a entidades diretivas como sendo entidades de
prática do desporto. Prática, aliás, muito comum em federações de futebol para angariar votos
em processos eleitorais.
9
Parece óbvio, mas é preciso uma lei para dizer que as entidades nacionais são as
responsáveis pela elaboração do calendário anual oficial da respectiva modalidade. Isto
porque, provavelmente, pretende-se a responsabilização das entidades nacionais ao seu
descumprimento. Demais disso, os calendários do futebol sempre foram alvo de inúmeras
críticas. Daí a finalidade da proposta que se apresenta.
Destaque-se, a despeito da adequada finalidade pretendida pelo dispositivo, sua aparente
inadequação terminológica quando menciona ‘entidades de prática envolvidas em
competições de atletas profissionais’. Isso porque o sistema vigente reconhece como
profissional apenas o atleta com vínculo empregatício refletido em CTPS, firmado com
entidade de prática desportiva (Art. 3o, da Lei n.º9.615/98). Sendo assim, a entidade de
prática é ou não contratante de atleta profissional. Nesta hipótese, portanto, melhor seria que
o dispositivo estipulasse ‘As ligas formadas por entidades de prática contratantes de atletas
profissionais (...)’.
Mesmo porque, profissionalismo está relacionado à pessoa física do atleta. O atleta é
profissional, não a competição, o clube, a liga, a federação, a confederação ou o esporte.
Sendo profissional, o atleta levará seu profissionalismo à competição e assim sucessivamente.
6. Afastamento preventivo de dirigentes
"Art. 23
Parágrafo único. Independentemente de previsão estatutária é obrigatório o afastamento
preventivo e imediato dos dirigentes, eleitos ou nomeados, caso incorram em qualquer das
hipóteses do inciso II, assegurado o processo regular e a ampla defesa para a
destituição."(NR)
Sugestão: Sanção
Fundamentos:
Seguindo a linha delineada pelo princípio da responsabilização social do dirigente desportivo,
a MP 79 avança para criar uma espécie de suspensão preventiva da atuação do dirigente pela
prática de atos lesivos às entidades sob sua administração, por problemas com prestações de
contas, em decorrência de condenação na esfera criminal etc.
A MP 79 preconiza um afastamento imediato e preventivo para o suposto gestor
irresponsável. Como a redação originária da Lei Pelé previa apenas a inelegibilidade, os
dirigentes praticantes dos atos capitulados no inc. II do art. 26, continuavam no poder até o
advento do próximo processo eleitoral. Veio em boa hora o afastamento imediato para
apuração dos fatos lesivos, desde que assegurado o devido processo legal.
Como alardeiam os defensores do associativismo no desporto exercido profissionalmente, a
atividade diretiva é uma atividade diletante por excelência, razão pela qual não haveria
prejuízos de ordem econômica pessoal no período de suspensão temporária para o exercício
das funções dirigentes.
Por outro lado, reconhecidos os princípios vinculados ao exercício de atividade econômica,
agigantam-se razões de precaução em relação ao afastamento preventivo. Sob tais
10
fundamentos, imantados pelo princípio do devido processo legal insculpido pela
Constituição Federal, deve-se assegurar o contraditório e a ampla defesa prévios à destituição
dos dirigentes.
Neste caso, para assegurar o contraditório e ampla defesa, não há que se falar em
procedimentos simplificados ou julgamentos sumários. A forma de destituição, regra geral,
dependerá de previsão no estatuto ou contrato social. Aliás, a destituição de administradores
está prevista no art. 59, II do novo Código Civil, sendo exigido o voto concorde de dois
terços dos presentes à assembléia especialmente convocada para esse fim, não podendo ela
deliberar, em primeira convocação, sem a maioria absoluta dos associados, ou com menos de
um terço nas convocações seguintes.
7. Competição profissional - conceito
"Art. 26.
Parágrafo único. Considera-se competição profissional para os efeitos desta Lei aquela
promovida para obter renda e disputada por atletas profissionais cuja remuneração decorra
de contrato de trabalho desportivo."
Sugestão: Veto
Fundamentos:
A proposta consiste em definição de ‘competição profissional’, como sendo aquela que
objetiva obter renda aliada à participação de atletas remunerados mediante contrato formal de
trabalho.
O sistema jurídico desportivo brasileiro, até este momento, positivou exclusivamente o
conceito de atleta profissional, aliado à classificação das formas de prática do desporto,
notadamente do desporto de rendimento.
A Lei n.º8.672/93 estabelecia, de forma textual, que o desporto profissional caracterizava-se
por remuneração pactuada em contrato formal de trabalho ou demais formas contratuais
pertinentes. A Lei n.º9.615, por seu turno, restringiu ainda mais o conceito, para reconhecer a
presença do atleta profissional apenas quando o mesmo faça parte de contrato formal de
trabalho.
Esta situação, nobre no objetivo de evitar contratos paralelos que ocultem a relação de
emprego, acaba por deixar a descoberto diversos atletas que, apesar de exercer suas
atividades com profissionalismo, não são reconhecidos como profissionais. Assim ocorre
porque o conceito de atleta profissional não deveria partir dos elementos do contrato de
trabalho, mas dos requisitos do profissionalismo. Como leciona Orlando Gomes, a profissão
pode estar vinculada ou não ao contrato de trabalho subordinado, ‘...é a particular forma de
atividade que o indivíduo escolhe como seu trabalho ordinário e contínuo, com fim de
sustento quase sempre, mas sobretudo a serviço das necessidades gerais.’10
10
GOMES, Orlando. GOTTSCHALK, Elson. Curso de Direito do Trabalho. 11ª ed. Rio de Janeiro: Forense.
1990, p. 131.
11
Deste ponto, a despeito da crítica à opção do conceito legislativo, é inegável que o centro
do profissionalismo encontra-se no atleta. Sendo assim, constata-se uma tentativa de
inovação através da conceituação legal da ‘competição profissional’.
Na realidade, é possível adjetivar uma competição como profissional, ainda que se revele
desnecessário. Bastaria fazer referência à competição da qual participem atletas profissionais.
Ocorre que a opção legislativa transcendeu este requisito, para exigir que a competição, para
ser considerada profissional, ‘seja promovida para obter renda’. O legislador – neste caso –
parece compelido a evitar inserir no conceito aquelas competições em que o profissional
participa, mas não há objetivo de renda.
Ora, uma competição que envolva atletas profissionais será, sempre, uma competição
profissional, ainda que não seja cobrado ingresso. Por outro lado, uma competição entre
associações do modo não-profissional, na qual haja cobrança de ingressos, não passará a ser
profissional por esse motivo.
Por outro lado, o critério de conceituação pela ‘renda’ pode causar uma série de empecilhos,
especialmente aos atletas não profissionais, que poderão ser restringidos a participar de
competições, simplesmente porque as mesmas objetivam renda.
8. Entidades de administração, ligas e entidades de prática - Gestão - Recursos públicos
- Forma jurídica - Reescalonamento de dívidas
"Art. 27. As entidades de prática desportiva participantes de competições profissionais e as
entidades de administração de desporto ou ligas em que se organizarem, independentemente
da forma jurídica adotada, sujeitam os bens particulares de seus dirigentes ao disposto no
art. 50 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2.002, além das sanções e responsabilidades
previstas no caput do art. 1.017 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, na hipótese de
aplicarem créditos ou bens sociais da entidade desportiva em proveito próprio ou de
terceiros.
§ 3º (revogado)
§ 4º (revogado)
§ 5º O disposto no art. 23 aplica-se, no que couber, às entidades a que se refere o caput deste
artigo.
§ 6º Sem prejuízo de outros requisitos previstos em lei, as entidades de administração do
desporto, as ligas e as entidades de prática desportiva, para obter financiamento com
recursos públicos deverão:
I - realizar todos os atos necessários para permitir a identificação exata de sua situação
financeira;
II - apresentar plano de resgate e plano de investimento;
III - garantir a independência de seus conselhos de fiscalização e administração, quando
houver;
IV - adotar modelo profissional e transparente; e
V - elaborar e publicar suas demonstrações financeiras na forma definida pela Lei nº 6.404,
de 15 de dezembro de 1976, após terem sido auditadas por auditores independentes.
§ 7º Os recursos do financiamento voltados à implementação do plano de resgate serão
utilizados:
I - prioritariamente, para quitação de débitos fiscais, previdenciários e trabalhistas; e
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II - subsidiariamente, para construção ou melhoria de estádio próprio ou de que se
utilizam para mando de seus jogos, com a finalidade de atender a critérios de segurança,
saúde e bem estar do torcedor.
§ 8º Na hipótese do inciso II do § 7º, a entidade de prática desportiva deverá apresentar à
instituição financiadora o orçamento das obras pretendidas.
§ 9º É facultado às entidades desportivas profissionais constituírem-se regularmente em
sociedade empresária, segundo um dos tipos regulados nos arts. 1.039 a 1.092 da Lei nº
10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil.
§ 10. Considera-se entidade desportiva profissional, para fins desta Lei, as entidades de
prática desportiva envolvidas em competições de atletas profissionais, as ligas em que se
organizarem e as entidades de administração de desporto profissional.
§ 11. Apenas as entidades desportivas profissionais que se constituírem regularmente em
sociedade empresária na forma do § 9º não ficam sujeitas ao regime da sociedade em comum
e, em especial, ao disposto no art. 990 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código
Civil.
§ 12. Observado o disposto nos parágrafos anteriores, as entidades de prática desportiva
profissional poderão ser beneficiadas por programa especial de reescalonamento relativo a
tributos e contribuições fiscais e parafiscais, inscritos ou não em dívida ativa, ajuizados ou a
ajuizar, com exigibilidade suspensa ou não, inclusive decorrentes de falta de recolhimento de
valores retidos, podendo tais dívidas ser pagas, na forma e hipóteses definidas em
regulamentação específica, com:
I - a prestação de serviços desportivos sociais em prol de comunidades carentes; e
II - a compensação das despesas comprovadas e exclusivamente efetivadas na formação
desportiva e educacional de atletas.
§ 13. Para os fins de fiscalização e controle do disposto nesta Lei, as atividades profissionais
das entidades de prática desportiva, das entidades de administração de desporto e das ligas
desportivas, independentemente da forma jurídica como estas estejam constituídas,
equiparam-se às das sociedades empresárias, notadamente para efeitos tributários, fiscais,
previdenciários, financeiros, contábeis e administrativos."(NR)
Sugestão: Veto parcial
Fundamentos:
A adoção do modelo empresarial para as entidades de prática desportiva tornou-se o tema
mais debatido no âmbito da legislação desportiva, desde a proposta de alteração
paradigmática apresentada pela Lei Zico (n.º8.672/93). Como sabido, a imposição do ‘clubeempresa’ consistiu-se em pretensão do Estado, diversas vezes rechaçada pela maioria dos
clubes e seus dirigentes.
Entretanto, a retirada deste ponto específico da Medida Provisória desnaturou o dispositivo
ora comentado. De qualquer maneira, o caput preserva um objetivo de transparência, retidão
e probidade inerentes aos princípios ora instituídos pela legislação desportiva e já
reconhecidos pela legislação civil.
Finalmente, no que concerne ao reescalonamento de dívida, constitui uma medida de
saneamento de entidades desportivas, sob o aspecto tributário. Evidencia-se que a referida
previsão legal veio para minimizar o impacto do chamado "clube-empresa". Sob a bandeira
da moralização, a barganha legislativa parece ultrapassar o limite do razoável.
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Já não é de hoje que se discute a necessidade de uma lei de incentivos fiscais para o desporto
não profissional. No entanto, no passado, além da falta de vontade política, tecnicamente
justificava-se a inexistência pelo seu elevado potencial de evasão fiscal. Em outras palavras,
o incentivo daria margem à efetiva sonegação. Como no esporte as coisas são sempre
“nebulosas”, tais incentivos seriam um “prato cheio”. Com efeito, partíamos da seguinte
premissa: se os poderes instituídos querem destinar recursos para o desporto, que o façam
através de valores mais consistentes no momento da elaboração dos orçamentos públicos e
não mediante isenção tributária. Todavia, o reclame da social por uma lei próxima da Lei
Rouanet de apoio a projetos culturais, para o desporto, no projeto atual, reveste-se de uma
medida incentivadora da adesão ao modelo empresarial que mistura reescalonamento de
dívida tributária de qualquer natureza e em todas as dimensões com possibilidade de isenção
fiscal a projetos sociais desportivos. Seria a tradicional mágica das festas de aniversário ou
um ilusionismo em grandes proporções? Qual o problema então? A resposta é simples: Lei
de Responsabilidade Fiscal - LRF.
A Lei de Responsabilidade Fiscal estabelece:
“Art. 11 – Constituem requisitos essenciais da responsabilidade na gestão
fiscal a instituição, previsão e efetiva arrecadação de todos os tributos da
competência constitucional do ente da Federação.
Art. 14. A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza
tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar acompanhada de
estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva
iniciar sua vigência e nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de
diretrizes orçamentárias e a pelo menos uma das seguintes condições:
I - demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na
estimativa de receita da lei orçamentária, na forma do art. 12, e de que não
afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de
diretrizes orçamentárias;
II - estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado
no caput, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de
alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou
contribuição.
§ 1o – A renúncia compreende anistia, remissão, subsídio, crédito presumido,
concessão de isenção em caráter não geral, alteração de alíquota ou
modificação de base de cálculo que implique redução discriminada de tributos
ou contribuições, e outros benefícios que correspondam a tratamento
diferenciado.
...”
A receita tributária é oriunda da cobrança dos tributos em geral, englobando os impostos,
taxas e contribuições de melhoria que são pagas pelos contribuintes em razão de suas
propriedades, rendas, atividades, operações financeiras e dos benefícios diretos e imediatos
que recebem do Estado. Essa receita tributária decorre do poder que o Estado tem de exigir
da população prestações pecuniárias destinadas ao custeio das atividades gerais de
atendimento ao interesse público.
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A Lei Complementar nº 101/00 (LRF), em seu art. 11, estabelece como requisito essencial da
responsabilidade na gestão fiscal a instituição, previsão e efetiva arrecadação de todos os
tributos de competência constitucional dos respectivos entes da Federação. Em outras
palavras devem União, Estados e Municípios arrecadar valor monetário (devidamente
instituído em lei e tecnicamente previsto) para cada uma das modalidades de tributos que a
Constituição Federal lhes atribui (competência para instituir, nos termos de seu artigo 145).
Existe diferença entre instituir e prever a arrecadação de determinado tributo. Instituir
significa estabelecer na legislação tributária da pessoa jurídica de direito público interno,
mediante autorização da Casa Legislativa, as condições gerais para identificar o fato gerador,
o sujeito passivo da obrigação tributária e as formas de lançamento, arrecadação e
recolhimento de determinado tributo. Prever é realizar estudos técnicos especializados para
projeção quantitativa e qualitativa dos contribuintes potenciais, dimensionar época própria
para impor o crédito tributário e detectar o aparelhamento administrativo necessário à
concretização da arrecadação e do recolhimento.
Quando a lei exige a efetiva arrecadação de todos os tributos, não basta dispor de toda uma
estrutura de normatização legal, previsão e planejamento de todos os tributos da competência
constitucional. Deve-se, além disso, possuir alguma arrecadação concreta que justifique
monetariamente a existência do tributo.
Pode-se entender, então, por efetiva arrecadação o manifesto esforço do administrador
público em arrecadar os tributos de sua competência. Faz-se tal ressalva em virtude da
possibilidade de ocorrerem situações em que, por razões alheias à vontade da Administração,
o valor do tributo não venha a ingressar nos cofres públicos, embora tenha o agente público
adotado todas as providências cabíveis.
E a renúncia de receita compreende situação em que o ente federativo, abdica do direito de
arrecadar parte das receitas de sua competência (envolvendo perda fiscal), pela concessão de
benefícios a grupo de pessoas ou contribuintes.
A renúncia de receita é decorrente de autorização legal, seja esta genérica ou específica, com
vistas ao incentivo e/ou ampliação competitiva nos setores de produção ou desenvolvimento
regional deverá atender às condições do art.14, incisos I e II da LRF ressalvados os casos
descritos no § 3o, incisos I e II, do referido artigo.
Segundo Flávio da Cruz, “A Lei de Responsabilidade Fiscal, nitidamente, visa dificultar a
realização de medidas de renúncia de receita ou compensações que resultem em dúvidas
sobre a aplicação de critérios igualitários aos contribuintes.”
No caso das atividades desportivas, resta evidenciado pelas denúncias veiculadas na imprensa
e resultados das investigações das CPIs da Câmara e do Senado que, regra geral, as entidades
esportivas vinculadas ao desporto profissional não vem recolhendo os respectivos tributos,
notadamente INSS, FGTS e Imposto de Renda. Além disso, não se pode ignorar que muitos
clubes, federações e confederações comercializam produtos ou prestam serviços de natureza
esportiva, portanto, também é imperioso que haja o recolhimento de ISS, ICMS, Contribuição
Social, e Cofins, conforme o caso. No caso da Seguridade Social a questão é ainda mais
grave, pois existe a obrigatoriedade de retenção previdenciária, consoante a Ordem de
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Serviço nº 209 do INSS e não ocorre apenas na transação ou pagamento de salários a
atletas, mas com os referenciados “borderôs” – anotação consolidada de ingressos em
estádios de futebol.
Assim, mesmo que seja atinente a atividades desportivas em geral, não haverá
discricionariedade em cobrar ou não os tributos de competência da União, Estados e
Municípios.
O reescalonamento de dívida conjugado com incentivo a projetos sociais (troca da tributação
tradicional por aplicação de recursos em projetos) via regulamento e nos moldes propostos é
o que se denomina de "excrescência" jurídica, conspirando com os ditames da LRF e da
austeridade fiscal do novo Governo.
É importante, ainda, alertar que o Administrador Público que não observar as prescrições
contidas na lei de responsabilidade fiscal, quanto à efetiva instituição, arrecadação e cobrança
de tributos de sua competência ou, que realizar renúncia de receita sem as devidas medidas
compensatórias estará sujeito às penalizações fiscais previstas na LRF e Lei de Crimes
Fiscais, bem como as contidas na Lei 8429/92 e Decreto Lei nº 201/67.
De todo modo, as regras da LRF não impedem que haja renúncia de receita (isenção fiscal)
para aplicação no desenvolvimento do desporto. Apenas estabelece, como se disse, requisitos
inafastáveis à sua implementação, à medida que projetos de lei dessa natureza devem estar
acompanhados de estimativas que demonstrem, objetivamente, quanto o Poder Público
deixará de arrecadar e, ainda: (i) previsão nos instrumentos orçamentários de modo que a
renúncia não comprometa as metas fiscais estabelecidas no Anexo de Metas Fiscais à Lei de
Diretrizes Orçamentárias – LDO; (i) medidas de compensação, como elevação de alíquotas,
ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.
Diante de todo esse contexto, o que fazer? A resposta também é simples: Aproveitar as leis
de incentivo existentes, direcionando parte ou a totalidade dos valores renunciáveis para as
atividades de fomento do desporto NÃO PROFISSIONAL (verdadeiros beneficiários) E NÃO
PARA BENEFICIAR ÀQUELAS QUE JÁ ENCONTRAM-SE INADIMPLENTES PERANTE O FISCO.
É importante ressaltar que no Anexo de Metas Fiscais, peça integrante da Lei da Diretrizes
Orçamentárias- LDO, são estabelecidas metas anuais relativas a receitas, despesas, resultados
nominal e primário e montante da dívida pública para o exercício de referência e para os dois
subsequentes. O referido Anexo, além das metas anuais mencionadas, deverá conter, nos
termos do § 2o do art.4o da LRF, o demonstrativo da estimativa e compensação da renúncia
de receita e da margem de expansão das despesas obrigatórias de caráter continuado.
Assim, a Administração ao estabelecer as metas anuais de receita, com memória e
metodologia de cálculo fixa os resultados pretendidos, tendo em conta os três exercícios
anteriores. Importante observar que as estimativas de receita para determinado exercício são
elaboradas no ano anterior, em função dos prazos constitucionais para encaminhamento ao
Legislativo das propostas orçamentárias anuais do Governo.
Neste sentido, presume-se que as estimativas de receita, fixação de despesa e metas anuais,
são elaboradas de maneira a considerar todas as ocorrências possíveis dentro do que foi
adequadamente planejado para o exercício financeiro, observada a legislação vigente.
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Conclui-se, portanto, que o legislador foi além do razoável para tentar seduzir as entidades
desportivas ao modelo empresarial. Qualquer empresa à beira da falência por falta de
recolhimento regular de tributos e que emprega inúmeros trabalhadores, ou mesmo os clubes
sociais que não participam de competições profissionais, deveriam possuir tratamento
idêntico - isonomia. É um REFIS às avessas, com privilégios sem precedentes e totalmente
contrário ao interesse público. Em síntese, a proposta sob análise denomina de
reescalonamento o que, na verdade, constitui renúncia de receita, ou mesmo vinculação da
receita tributária através de incentivo à aplicação em projetos sociais desportivo. Vai além, ao
dispor que será definido por regulamento as hipóteses de transação com a prestação de
serviços desportivos sociais em prol de comunidades carentes e a compensação das despesas
comprovadas e exclusivamente efetivadas na formação desportiva e educacional de atletas.
Ou seja, pretende-se tornar disponível o que, por essência, é indisponível e que deve sujeitarse ao princípio da supremacia do interesse público - quais sejam os tributos e contribuições
fiscais e parafiscais, inscritos ou não em dívida ativa, ajuizados ou a ajuizar, com
exigibilidade suspensa ou não, inclusive decorrentes de falta de recolhimento de valores
retidos.
Em síntese, a redação do parágrafo 11, institui um privilégio contrário ao princípio da
transparência que instigou o surgimento da iniciativa: basta transformar o clube em empresa
para que os desmandos administrativos sejam perdoados e os administradores ímprobos
possam continuar impunes.
9. Impedimento de veiculação da marca ou patrocínio da mídia
"Art. 27A
§ 4º A infringência a este artigo implicará a inabilitação da entidade de prática desportiva
para percepção dos benefícios de que trata o art. 18 desta Lei.
§ 5º As empresas detentoras de concessão, permissão ou autorização para exploração de
serviço de radiodifusão sonora e de sons e imagens, bem como de televisão por assinatura,
ficam impedidas de patrocinar ou veicular sua própria marca, bem como a de seus canais e
dos títulos de seus programas, nos uniformes de competições das entidades desportivas.
§ 6º A violação do disposto no parágrafo § 5º implicará a eliminação da entidade de prática
desportiva que lhe deu causa da competição ou do torneio em que aquela se verificou, sem
prejuízo das penalidades que venham a ser aplicadas pela Justiça Desportiva."(NR)
Sugestão: Sanção – divergência quanto à aplicabilidade do § 6º.
Fundamentos:
A restrição objetiva, ao que se pode concluir, evitar que a empresa exploradora da
radiodifusão da competição seja prejudicada pela marca de concorrente do mesmo mercado.
Trata-se de regulação de um mercado, para o qual o desporto vêm se mostrando cada vez
mais dependente.
Contudo, anotamos uma divergência nesse ponto específico. A redação do parágrafo 6°
desrespeitaria o princípio constitucional da isonomia, estabelecido no art. 5°, I da Carta
Magna/1988. Destarte, o princípio da igualdade jurídica que assegura tratamento isonômico
está sendo desrespeitado pela dicção do texto ora comentado, seja ao dispor que a violação à
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proibição de veiculação de marca ou logotopia de empresas de radiodifusão sonora e de
sons e imagens nos uniformes das entidades desportivas alcança apenas e tão somente essas
entidades, seja, mais ainda, por estar restringindo a penalização às entidades de prática.
Ora, salvo situações muito específicas que, desde logo, não podem ser objeto de tratamento
preferencial em uma lei geral sobre desportos, a previsão do parágrafo deveria contemplar a
penalização de todos quantos contribuíram/participaram para que viesse a ocorrer a infração
prevista
na
primeira
parte
do
texto
que
deve
ser
vetado.
Com efeito, o incidente ocorrido na partida entre Vasco da Gama e São Caetano,
perfeitamente resumido no dispositivo ora comentado, circunscreveu-se àquele evento
desportivo
e
não
merecia
tanta
consideração
legislativa.
A lei não pode restringir seu campo normativo/sancionador à situações específicas, nem deve
o legislador assumir o deliberado propósito de discriminalizar uma das partes, penalizando
uma atitude e não considerando punível outra que, igualmente, fere o mesmo dispositivo.
Essa disparidade de tratamento representa desrespeito ao princípio da igualdade jurídica e, ao
demais, fere, também, o princípio da finalidade - segundo o qual toda ação do Poder Público
dirige-se
para
a
satisfação
do
bem
comum,
do
interesse
público.
10. Atleta - vínculo desportivo - empresários - cláusula penal - ressarcimento - custos de
formação
"Art. 28.
§ 2º O vínculo desportivo do atleta com a entidade desportiva contratante tem natureza
acessória ao respectivo vínculo trabalhista, dissolvendo-se, para todos os efeitos legais:
I - com o término da vigência do contrato de trabalho desportivo; ou,
II - com o pagamento da cláusula penal nos termos do caput deste artigo; ou ainda,
III - com a rescisão decorrente do inadimplemento salarial de responsabilidade da entidade
desportiva empregadora prevista nesta Lei.
§ 4º Far-se-á redução automática do valor da cláusula penal prevista no caput deste artigo,
aplicando-se, para cada ano integralizado do vigente contrato de trabalho desportivo, os
seguintes percentuais progressivos e não-cumulativos:
I - dez por cento após o primeiro ano;
II - vinte por cento após o segundo ano;
III - quarenta por cento após o terceiro ano;
IV - oitenta por cento após o quarto ano.
§ 6º (revogado)
§ 7º É vedada a outorga de poderes mediante instrumento procuratório público ou particular
relacionados a vínculo desportivo e uso de imagem de atletas profissionais em prazo
superior a um ano."(NR)
"Art. 29. A entidade de prática desportiva formadora do atleta terá o direito de assinar com
este, a partir de dezesseis anos de idade, o primeiro contrato de trabalho profissional, cujo
prazo não poderá ser superior a cinco anos.
§ 3º A entidade de prática desportiva formadora detentora do primeiro contrato de trabalho
com o atleta por ela profissionalizado terá o direito de preferência para a primeira
renovação deste contrato, cujo prazo não poderá ser superior a dois anos.
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§ 4º O atleta não profissional em formação, maior de quatorze e menor de vinte anos de
idade, poderá receber auxílio financeiro da entidade de prática desportiva formadora, sob a
forma de bolsa de aprendizagem livremente pactuada mediante contrato formal, sem que
seja gerado vínculo empregatício entre as partes.
§ 5º É assegurado o direito ao ressarcimento dos custos de formação de atleta não
profissional menor de vinte anos de idade à entidade de prática de desporto formadora
sempre que, sem a expressa anuência desta, aquele participar de competição desportiva
representando outra entidade de prática desportiva.
§ 6º Os custos de formação serão ressarcidos pela entidade de prática desportiva
usufruidora de atleta por ela não formado pelos seguintes valores:
I - quinze vezes o valor anual da bolsa de aprendizagem comprovadamente paga na hipótese
de o atleta não profissional ser maior de 16 e menor de 17 anos de idade;
II - vinte vezes o valor anual da bolsa de aprendizagem comprovadamente paga na hipótese
de o atleta não profissional ser maior de 17 e menor de 18 anos de idade;
III - vinte e cinco vezes o valor anual da bolsa de aprendizagem comprovadamente paga na
hipótese de o atleta não profissional ser maior de 18 e menor de 19 anos de idade;
IV - trinta vezes o valor anual da bolsa de aprendizagem comprovadamente paga na hipótese
de o atleta não profissional ser maior de 19 e menor de 20 anos de idade.
§ 7º A entidade de prática desportiva formadora para fazer jus ao ressarcimento previsto
neste artigo deverá preencher os seguintes requisitos:
I - cumprir a exigência constante do § 2º deste artigo;
II - comprovar que efetivamente utilizou o atleta em formação em competições oficiais não
profissionais;
III - propiciar assistência médica, odontológica e psicológica, bem como contratação de
seguro de vida e ajuda de custo para transporte;
IV - manter instalações desportivas adequadas, sobretudo em matéria de alimentação,
higiene, segurança e salubridade, além de corpo de profissionais especializados em
formação técnico-desportiva;
V - ajustar o tempo destinado à formação dos atletas aos horários do currículo escolar ou de
curso profissionalizante, exigindo o satisfatório aproveitamento escolar."(NR)
Sugestão: Veto
Fundamentos:
A sugestão de veto é decorrente da extrema desigualdade com que são tratadas as partes na
relação empregatícia, notadamente pela cláusula penal absolutamente desproporcional,
inexistência de limite à clausula penal nas transferências internacionais, adicionada ao
ressarcimento aos custos de formação que acabam por disfarçar a manutenção ou
ressurgimento do extinto "passe".
11. Art. 479 CLT - Rescisão - Notificação
"Art. 31.
§ 3º Sempre que a rescisão se operar pela aplicação do disposto no caput deste artigo, a
multa rescisória a favor do atleta será conhecida pela aplicação do disposto no art. 479 da
CLT.
§ 4º A constituição da entidade de prática desportiva em mora para fins de rescisão do
contrato de trabalho desportivo, ocorrendo quaisquer das hipóteses deste artigo, dependerá
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de prévia e expressa notificação, judicial ou extra judicial, com antecedência mínima de
quinze dias."(NR)
Sugestão: Veto
Fundamentos:
A notificação prévia prevista na proposta, como requisito para constituição em mora, só
atende aos interesses das entidades inadimplentes, que de forma contumaz deixam de
recolher verbas previdenciárias. Trata-se de um meio transparente de favorecer a parte mais
forte da relação de emprego, em detrimento do atleta.
Outras atividades profissionais permitem ou até mesmo obrigam a realização de contratos de
trabalho por prazo determinado. Nem por isso, se estabelecem tantos benefícios para o
empregador. Ao contrário, a própria CLT estabelece as formas de impor pena à parte que
rescinde o contrato por prazo determinado. Trata-se da aplicação dos artigos 479 e 480 da
Consolidação. Esta deveria ser, exclusivamente, a forma de solucionar a questão da multa
rescisória e da cláusula penal, no âmbito desportivo.
Assim, o dispositivo acaba por criar uma odiosa discriminação, até porque estabelece,
legalmente, a mora salarial por noventa dias, sem a necessidade de qualquer ressarcimento e,
mais ainda, significando uma obstrução aos princípios constitucionais do direito ao trabalho e
à justa remuneração.
12. Espetáculo esportivo - Estádios de futebol - Laudos - Capacidade - Sanções Organização de competições - Teoria da Responsabilidade Objetiva
"Art. 90A. A entidade responsável pela organização da competição apresentará ao
Ministério Público dos Estados e do Distrito Federal, previamente à sua realização, os
laudos técnicos expedidos pelos órgãos e autoridades competentes pela vistoria de condições
de segurança dos estádios a serem utilizados na competição.
§ 1º Os laudos atestarão a real capacidade de público dos estádios, bem como suas
condições de segurança.
§ 2º Perderá o mando de jogo por, no mínimo, seis meses, sem prejuízo das demais sanções
cabíveis, a entidade de prática desportiva profissional detentora do mando do jogo em que:
I - tenha sido colocado à venda número de ingressos maior do que a capacidade de público
do estádio; ou
II - tenham entrado pessoas em número maior do que a capacidade de público do estádio."
Sugestão: Sanção
"Art. 90B. Sem prejuízo do disposto na Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, a entidade
responsável pela organização da competição, bem como seus dirigentes, respondem
solidariamente com a entidade detentora do mando de jogo e seus dirigentes,
independentemente da existência de culpa, pelos prejuízos causados a espectadores que
decorram de falha de segurança no estádio.
Parágrafo único. O detentor do mando de jogo será uma das entidades de prática desportiva
envolvidas na partida, de acordo com os critérios definidos no regulamento da competição."
20
Sugestão: Veto
Fundamentos:
Metodologicamente partiremos da investigação do dispositivo mais polêmico - art. 90 B, para
depois, concluir com o antecessor.
Inicialmente, faremos uma abordagem genérica da responsabilidade objetiva tratada pelo
Direito Administrativo e também no Direito Civil com as recentes modificações da sua
codificação. Fernando Borges de Moraes11, sobre a Responsabilidade Objetiva do Estado,
assevera:
“3. A RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO
...
A responsabilidade objetiva enuncia ser o estado responsável pela indenização
do particular sem qualquer perquirição quanto à postura do agente público ou a
ilicitude de sua atividade. A falta de serviço também é irrelevante, sendo
avaliável apenas o fato decorrente do serviço, podendo este não ser falho.
Assim, sem necessidade de elementos subjetivos, é necessária, após a
superveniência do dano, apenas a ocorrência do nexo de causalidade.
Evidentemente que a teoria do risco, conforme consagrada no ordenamento
brasileiro, permite a exclusão da responsabilidade desde que comprovada a
culpa exclusiva da vítima, o caso fortuito ou força maior.
...
4. O ATUAL REGIME CONSTITUCIONAL DA RESPONSABILIZAÇÃO
A atual Constituição Federal de 1988 alargou, ex lege, o regime de
responsabilidade objetiva. (...) O ideal de justiça distributiva impõe esta
perspectiva de socialização dos riscos na atividade econômica e, como não
poderia deixar de ser, na atividade estatal. O constituinte expressamente previu
hipóteses de responsabilidade objetiva, neste viés de socialização do risco,
com os arts. 7º, inc. XXVIII; 21, XXIII, "c"; 37, § 6º e também com a
possibilidade de acumulação de danos morais e materiais do art. 5º, V, X.
...
O Supremo Tribunal Federal reconhece plenamente este caráter objetivo do
dever de indenizar e interpreta o dispositivo do art. 37, par. 6º enunciando os
seguintes elementos como componentes da estrutura da responsabilidade civil
objetiva do poder público: "a) a alteridade do dano; b) a causalidade material
entre o eventus damni e o comportamento positivo (ação) ou o negativo
(omissão) do agente público; c) a oficialidade da atividade causal e lesiva,
imputável a agente do poder público, que tenha, nessa condição funcional,
11
Informativo de Direito Administrativo - IDA, www.zenite.com.br.
21
incidido em conduta comissiva ou omissiva, independentemente de licitude,
ou não, do comportamento funcional (RTJ 140/636); e d) a ausência de causa
excludente da responsabilidade estatal (RTJ 55/503 - RTJ 71/99 - RTJ 91/377
- RTJ 99/1155 - RTJ 131/417)".”
O dever de indenizar surge para o Poder Público sempre que restar demonstrado que, em
razão de uma ação ou omissão, atribuível a esse, houve lesão à esfera patrimonial de
terceiros.
Nesse sentido é a orientação de Celso Antônio Bandeira de Mello12:
“Como qualquer outro sujeito de direitos, o Poder Público pode vir a se
encontrar na situação de quem causou prejuízos a alguém, do que lhe resulta a
obrigação de recompor os agravos patrimoniais oriundos da ação ou abstenção
lesiva.
...
Um dos pilares do moderno Direito Constitucional é, exatamente, a sujeição de
todas as pessoas, públicas ou privadas, ao quadro da ordem jurídica, de tal
sorte que a lesão aos bens jurídicos de terceiros engendra para o autor do dano
a obrigação de repará-lo.”
Nesses termos, quando efetivamente comprovado, através de laudo, que quem deu causa ao
dano foi o Poder Público, através de seu agente, nessa qualidade, surge para a Administração
o dever de indenizar o particular lesado, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição da
República13.
De outra parte, na seara do Direito Civil, o art. 186 do Novo Código Civil Brasileiro (antigo
art. 159) estabelece:
“Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou
imprudência, violar direito ou causar prejuízo a outrem, ainda que
exclusivamente moral, comete ato ilícito.”
Sílvio de Salvo Venosa, ressalta que “todas as teorias e adjetivações a responsabilidade
objetiva decorrem da mesma idéia. Qualquer que seja a qualificação do risco, o que importa é
sua essência: em todas as situações socialmente relevantes, quando a prova da culpa é um
fardo pesado ou intransponível para a vítima, a lei opta por dispensá-la.”14
Ainda, sobre a matéria, trazemos à colação os ensinamentos de Gustavo Tepedino:
12
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 11ª ed., São Paulo: Malheiros, 1999,
pp. 654 e 657.
13
“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência e, também ao seguinte:
.............
§ 6º. As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos
responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de
regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.
14
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil – responsabilidade civil. Ed. Atlas: 3ª ed, São Paulo, 2003, 17.
22
“Nota-se que, no novo Código, o legislador suprimiu na cláusula geral do
art. 186 qualquer referência expressa à culpa, ao contrário do que fazia na 2ª
parte do art. 159 do revogado Diploma de 1916. O que isto poderia significar:
Num primeiro momento, diante de tal deliberada omissão e, ainda, por se
manter a simples ação ou omissão voluntária como conduta que eventualemnte
dê ensejo a um ato ilícito (ao lado negligência ou imperícia), alguns poderiam
afirmar que o novo art. 186 em regra excluiria, do ato ilícito, a avaliação da
culpa, ressalvadas apenas as hipóteses de coação moral ou física irresistível.
Tal entendimento, contudo, significaria desmontar todo o arcabouço teórico
até aqui construído em torno do ato ilícito. E não há razão nem tampouco
vantagens para tanto. A rigor, referida supressão busca, sob o prisma
sistemático, guardar (e nada mais que isto) estrita coerência com a tendência
objetivista trazida pela nova codificação, o que pode ser claramente percebido
no novo Título IX (arts. 927/954), especificamente reservado à disciplina da
responsabilidade civil. Em boa hora, diga-se, assim o fez, trazendo ares de
contemporaneidade à matéria.
(...)
Atualmente, superada a rigidez dogmática do subjetivismo, a questão colocase no plano da extensão que deve ser dada à responsabilidade objetiva. Não se
deve ceder à tentação de reduzir o problema, por sua (apenas) aparente
simplicidade, a ponto de, em substituição ao critério da culpa, escolher outro
critério que, quase às cegas, atribua sempre a alguém o dever de indenizar a
vítima. Sem embargo de suas numerosas vantagens, a responsabilidade
objetiva não pode ainda pretender, mesmo nos dias atuais, aplicação plena. Ela
assim, com efeito, não substitui a responsabilidade por ato ilícito. Risco e
culpa consistem, hoje, em duas fontes de responsabilidade, que, embora
distintas, convivem em harmonia. É necessário, então, estabelecer a causa da
responsabilidade, que deve estar num fundamento ético cuja apuração dar-se-á
de forma direta ou indireta. Nesse diapasão, tem-se ressaltado que, nas
relações interindividuais, a aplicação da responsabilidade subjetiva é mais
conveniente, ao passo que a responsabilidade objetiva fica reservadas àquelas
hipóteses especificadas em lei, - responsabilidade ex lege. Tradicionalmente, a
responsabilidade objetiva tem sido aplicada às situações onde o desequilíbrio
entre as partes é flagrante (como nas relações de consumo) ou quando a
atividade exercida por uma das partes revela-se de elevado potencial lesivo
(como a exploração de energia nuclear).”15
Feitas as considerações preliminares sobre a teoria da responsabilidade objetiva, ou
simplesmente teoria do risco, em matéria de Direito Administrativo e Direito Civil, cumpre
analisar as pretensões do legislador ao dispor sobre a responsabilidade solidária da entidade
responsável pela organização da competição com a detentora do mando de jogo e seus
dirigentes, independentemente da existência de culpa, pelos prejuízos causados a
espectadores que decorram de falha de segurança no estádio.
15
A parte Geral do Novo Código Civil, ed. Renovar, Rio de Janeiro – São Paulo, 2002, pp. 348, 349 e 354.
23
A interpretação precipitada das citações doutrinárias acima poderia conduzir ao
entendimento de que, em qualquer hipótese especificada em lei, haveria a possibilidade de
adoção da teoria da responsabilidade sem culpa ou por ato ilícito, assim considerada no novo
Código Civil. A MP 79/02, nesse particular, passou como um "rolo compressor" instituindo
que, sem prejuízo das disposições do Código de Defesa do Consumidor (que, aliás, adota a
tese da responsabilidade objetiva), respondem, independentemente de culpa, as entidades
desportivas envolvidas na organização ou mando de jogo do espetáculo por falhas de
segurança.
No caso em comento, a teoria do risco seria aplicável, não fosse um pequeno detalhe - o
Poder de Polícia.
Conforme Maria Sylvia Zanella Di Pietro, “Pelo conceito moderno, adotado no direito
brasileiro, poder de polícia é a atividade do Estado consistente em limitar o exercício dos
direitos individuais em benefício do interesse público”.16 (Grifos da autora.)
Sobre o interesse público que é tutelado pelo exercício do poder de polícia, destaca, também a
autora:
“Esse interesse público diz respeito aos mais variados setores da sociedade,
tais como segurança, moral, saúde, meio ambiente, defesa do consumidor,
patrimônio cultural, propriedade. Daí a divisão da polícia administrativa em
vários ramos; polícia de segurança, das florestas, das águas, de trânsito,
sanitária, etc.”.17 (G.n).
Hely Lopes Meirelles apresenta noção simplificada do poder de polícia, dizendo que:
“Em linguagem menos técnica, podemos dizer que o poder de polícia é o
mecanismo de frenagem de que dispõe a Administração Pública para conter os
abusos do direito individual. Por esse mecanismo, que faz parte de toda a
Administração, o Estado detém a atividade dos particulares que se revelar
contrária, nociva ou inconveniente ao bem-estar social, ao desenvolvimento e à
segurança”.18
O poder de polícia exercido pela Administração apresenta certos atributos específicos, que
são a discricionariedade, a executoriedade e a coercibilidade.
Ora, não estamos aqui falando em promoções a encargo exclusivo de entidades privadas, à
medida que a própria legislação desportiva (Lei nº 9615/98) define, em seu art. 2º, que a
organização desportiva do país integra o patrimônio cultural brasileiro é considerada de
elevado interesse social. Não versa o assunto em foco sobre shows, peças de teatro, parques
de diversões, bares, restaurantes, supermercados, etc, aonde existe aglomeração de pessoas,
mas por interesses diametralmente opostos dos protagonizados em competições desportivas.
É da natureza do ser humano a disputa e o torcedor, num espetáculo desportivo, está
impregnado em um estado de ânimo peculiar. E mais, temos um Estatuto do Torcedor ainda
16
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 12. ed. São Paulo: Editora Atlas, 2000, p. 110.
17
Op cit., 110.
18
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 20. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1995, p.
115.
24
por votar no Congresso, sendo certo que a disposição legal pretendida desconsidera por
completo esse complexo debate.
Com efeito, os estádios de futebol estão sob a tutela da polícia ostensiva repressiva. Do
contrário, teremos que admitir a contratação de seguranças particulares em um contingente
inviável e sem preparo para conter a massa de milhões de pessoas motivadas pelo sucesso do
seu clube do coração. A permanecer a idéia da responsabilidade objetiva, sem culpa, é
inimaginável qual seria o preço de um ingresso nos estádios de futebol desse país. Isto sem
contar que inúmeras praças esportivas são bens públicos por natureza ou estão instaladas em
patrimônio público doado pelo Estado.
Por que Poder de Polícia? Em razão das disposições constitucionais que regem a matéria e
consoante o que prescreve o Decreto nº 88.777/83 - Regulamento da polícia militar e do
corpo de bombeiros, senão vejamos:
"Art. 2º...
27) Policiamento Ostensivo - Ação policial, exclusiva das Policias Militares
em cujo emprego o homem ou a fração de tropa engajados sejam identificados
de relance, quer pela farda quer pelo equipamento, ou viatura, objetivando a
manutenção da ordem pública.
São tipos desse policiamento, a cargo das Polícias Militares ressalvadas as
missões peculiares das Forças Armadas, os seguintes:
- ostensivo geral, urbano e rural;
Art . 4º - A Polícia Militar poderá ser convocada, total ou parcialmente, nas
seguintes hipóteses:
...
2) Para prevenir ou reprimir grave perturbação da ordem ou ameaça de sua
irrupção, e nos casos de calamidade pública declarada pelo Governo Federal e
no estado de emergência, de acordo com diretrizes especiais baixadas pelo
Presidente da República."
Se um jogo de futebol não representa uma atividade que requer prevenção de grave
perturbação da ordem ou ameaça de irrupção, a cargo de um efetivo que conte com o tipo de
policiamento ostensivo geral, urbano ou rural, PRECISAMOS REVER NOSSOS
CONCEITOS.
Enfim, a MP 79 - PLV 01, através do art. 90B transfere a responsabilidade estatal de
persecução policial, repressiva e ostensiva, ao particular. Todavia, tal atividade é indelegável,
sendo, por conseguinte, inconstitucional. Falar em segurança nos estádios (na expressão da
MP79 - falha de segurança) é falar em segurança pública - atividade típica do Poder Público.
Mais que isso, é um processo de conscientização que requer prevenção e cautela
permanentes, caracterizada por um "barril de pólvora" cujo estopim pode ser aceso a qualquer
momento.
Além disso, nas palavras de Gustavo Tepedino, risco e culpa são fontes de responsabilidade e
já se encontram adequadamente previstas no art. 90 A. Este dispositivo, sim, guarda
coerência quando imputa a responsabilidade e estabelece sanções ao mandante do jogo que
tenha colocado à venda número de ingressos maior do que a capacidade de público do estádio
25
ou sejam culpados pela falta de fiscalização tendo entrado pessoas em número maior do
que a capacidade de público permitia. Como dissemos anteriormente, toda essa matéria estará
em breve sendo discutida com o projeto de lei que institui o Estatuto do Torcedor, sendo
inoportuno e inconveniente a inclusão desse tema nas alterações pretendidas da Lei Pelé.
13. Transferência internacional
"Art. 40. Na cessão ou transferência de atleta para entidade de prática desportiva
estrangeira observar-se-ão as normas da respectiva entidade nacional de administração do
desporto, vedado a esta conceder ou autorizar transferência internacional de atletas menores
de dezoito anos.
§ 2º Se a entidade de prática desportiva cedente de atleta profissional para entidade de
prática desportiva estrangeira tiver sido cessionária do atleta, no prazo inferior a doze
meses, em transferência definitiva ou empréstimo, oneroso ou gratuito, para qualquer outra
entidade de prática desportiva, será caracterizada como entidade repassadora fazendo jus a
vinte e cinco por cento do valor pactuado para a cessão ou transferência internacional,
ficando a entidade formadora com direito de receber setenta e cinco por cento do valor pago
pela entidade estrangeira, desde que a entidade formadora do atleta não tenha sido
previamente indenizada."(NR)
Sugestão: Veto
Fundamentos:
Trata-se de uma vedação às entidades nacionais de administração do desporto: estão
proibidas de conceder ou autorizar transferência internacional de atletas menores de dezoito
anos.
Sob o aspecto da adequação desta norma ao sistema jurídico brasileiro, a primeira pergunta
consiste numa possível restrição ao exercício do trabalho, em razão de previsão
constitucional. O artigo 5.o, XIII, CF/88 estabelece que 'é livre o exercício de qualquer
trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer.'
Em verdade, refere-se aoprincípio de liberdade ao exercício do trabalho, respeitados os
limites estabelecidos pela norma infraconstitucional. Aqui se apresenta uma questão
interessante: se norma infraconstitucional pode restringir o espetro de aplicabilidade da
norma constitucional. A resposta é positiva, porque estamos diante de uma norma
constitucional de eficácia contida, na classificação de José Afonso da Silva (normas de
eficácia absoluta, plena, contida e limitada): (i) As normas de eficácia absoluta possuem toda
a aptidão para sofrer aplicação imediata, porém não podem sofrer amesquinhamento, nem
mesmo por emenda constitucional. São as cláusulas pétreas. (ii) As normas de eficácia plena
sofrem aplicação direta e imediata, podendo sofrer o influxo de emendas à constituição.
Exemplo: normas que estabelecem a competência dos órgãos, estabelecem vedações,
proibições, fixam direitos fundamentais e não podem sofrer amesquinhamento. (iii) As
normas de eficácia contida podem sofrer aplicação direta e imediata, todavia a sua eficácia
pode ser restringida pelo legislador ordinário, sem que se ofenda o núcleo essencial da norma.
(iv) As normas de eficácia limitada não podem sofrer uma aplicação concreta e imediata.
Desafiam a atuação legislativa para que o comando constitucional sofra a complementação de
um comando normativo votado pelo legislador ordinário. (iv.i) As normas de princípio
26
institutivo são aquelas que criam um novo órgão, um novo instituto, um novo regime
jurídico. (iv.ii) As normas de princípio programático são as que impõem deveres, obrigações
positivas por parte do Estado, vetores orientadores da ação governamental.
No caso concreto, o artigo 5o., XIII, CF/88 é uma norma de eficácia contida, ou contível,
porque encerra um princípio constitucional geral que pode ser restringido pela norma
infraconstitucional. Se não houver restrição, seu espectro de aplicabilidade é máximo. Só que
a lei desportiva impôs uma restrição, da mesma forma que se encontram restrições protetivas
ao trabalho do menor impostas pelos artigo 402 e ss da CLT e 60 a 69 do Estatuto da Criança
e do Adolescente. Sob o aspecto jurídico-constitucional, portanto, não parece que o
dispositivo se encontre destoado do sistema positivo, vale dizer, não há inconstitucionalidade.
Por outro lado, não parece razoável simplesmente restringir a saída de menores de 18
(dezoito) anos do País, notadamente em razão, dentre outras, (i) da possibilidade dos pais
representarem ou assistirem o menor, (ii) da inexplicável ‘reserva de mercado’ vinculada aos
atletas, (iii) das normativas sobre o tema já expedidas pela FIFA.
14. Transparência das entidades esportivas - Publicação de demonstrações contábeis Sanções
"Art. 46A. As ligas desportivas, as entidades de administração de desporto e as de prática
desportiva envolvidas em qualquer competição de atletas profissionais, independentemente
da forma jurídica adotada, ficam obrigadas a:
I - elaborar e publicar, até o último dia útil do mês de abril, suas demonstrações financeiras
na forma definida pela Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, após terem sido auditadas
por auditores independentes;
II - apresentar suas contas juntamente com os relatórios da auditoria de que trata o inciso I
ao Conselho Nacional do Esporte - CNE, sempre que forem beneficiárias de recursos
públicos, na forma do regulamento.
§ 1º Sem prejuízo da aplicação das penalidades previstas na legislação tributária,
trabalhista, previdenciária, cambial, e das conseqüentes responsabilidades civil e penal, a
infringência a este artigo implicará:
I - para as entidades de administração do desporto e ligas desportivas, a inelegibilidade, por
dez anos, de seus dirigentes para o desempenho de cargos ou funções eletivas ou de livre
nomeação, em quaisquer das entidades ou órgãos referidos no parágrafo único do art. 13
desta Lei;
II - para as entidades de prática desportiva, a inelegibilidade, por cinco anos, de seus
dirigentes para cargos ou funções eletivas ou de livre nomeação em qualquer entidade ou
empresa direta ou indiretamente vinculada às competições profissionais da respectiva
modalidade desportiva.
§ 2º As entidades que violarem o disposto neste artigo ficam ainda sujeitas:
I - ao afastamento de seus dirigentes; e
II - à nulidade de todos os atos praticados por seus dirigentes em nome da entidade após a
prática da infração.
§ 3º Os dirigentes de que trata o § 2º serão sempre:
I - o presidente da entidade, ou aquele que lhe faça as vezes; e
II - o dirigente que praticou a infração ainda que por omissão.
§ 4º Constitui inadimplência na prestação de contas da entidade para fins de apenação de
seus dirigentes o descumprimento do disposto neste artigo."(NR)
27
Sugestão: Veto parcial
Fundamentos:
O veto aqui é parcial, especialmente em razão do art. 5º, XVIII da CF/88:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
...
XVIII - a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas
independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu
funcionamento;”
Sobre o dispositivo constitucional supra, assevera Alexandre de Moraes19:
“A lei poderá estabelecer requisitos objetivos para a criação das associações,
que, porém, independem de qualquer autorização discricionária do poder
público, sendo, igualmente, vedada a interferência estatal em seu
funcionamento. O direito à livre associação, embora atribuído a cada pessoa
(titular), somente poderá ser exercido de forma coletiva, com várias pessoas. A
existência de uma associação como pessoa jurídica depende somente do ato
voluntário de seus membros e não do reconhecimento do Estado, do mesmo
modo que o nascimento das pessoas naturais não se confunde com o seu
registro. Assim, o Estado não pode limitar a existência de associação, salvo
nos casos previstos na Constituição, podendo tão-só estabelecer requisitos para
classificação de associações em diversas categorias (civis, mercantis –
sociedade anônima, responsabilidade limitada etc.), que conseqüentemente
produzirão efeitos jurídicos diversos.”
No mesmo sentido, aduz Uadi Lammêgo Bulos20:
“A correlação entre o associativismo e o cooperativismo recebeu guarida do
constituinte. Trata-se da influência do princípio da liberdade de associação,
que propicia, às entidades, o direito de auto-organização. O direito de autoorganização significa que as associações e cooperativas possuem autonomia,
permitindo-lhes elaborar os seus próprios atos constitutivos, escolhendo
livremente as pessoas sem qualquer interferência do Poder Público. Por isso,
os seus atos não podem ficar na dependência de aprovação ou homologação
administrativas, sob pena de violação da ordem infraconstitucional. Em suma,
este dispositivo engloba: 1. O direito de criar associação e cooperativa,
intependentemente de autorização...”
Da análise das argumentações doutrinárias e do art. 5º da CF acima, extraímos que vige no
direito pátrio a liberdade de associação, vedada a interferência estatal quanto ao
19
Alexandre de Moraes. Constituição do Brasil Interpretada: ed. Atlas, São Paulo/2002, p.261.
20
Uadi Lammêgo Bulos. Constituição Federal Anotada: ed. Saraiva, 4ª ed, São Paulo/2002, p.140.
28
funcionamento de tais entidades. Portanto, a exigibilidade de publicação de demonstrações
contábeis das entidades desportivas e sanções ao descumprimento, independentemente da
forma jurídica adotada, viola o preceito constitucional apontado. Tal providência serve
apenas às entidades constituídas como empresas. O projeto de modificação da legislação
desportiva estabelece procedimentos contábeis a quem não possui tais obrigações. Ainda,
impõe regras rígidas - auditoria independente - a entidades desportivas que encerram
realidades muitas vezes distintas.
Não são todos os clubes de futebol participantes de competições profissionais que, ainda que
fosse viável legalmente, terão condições materiais ao cumprimento da norma. Mesmo que
partíssemos de um pressuposto de "atividade econômica" é preciso lembrar que a
Constituição Federal determina que a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho
humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os
ditames da justiça social, observados os princípios da livre concorrência, redução das
desigualdades regionais e sociais, busca do pleno emprego e tratamento favorecido para as
empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e
administração no País (art. 170). Ou seja, colocar todos os clubes de futebol em uma mesma
"vala" conspira, inclusive, com os princípios que orientam o desporto profissional como
atividade econômica. Não em razão de qualquer óbice na transparência e publicidade de suas
contas para análise da viabilidade econômica, mas pelo simples fato de que a atividade
profissional do desporto não pode destinar tratamento igualitário àqueles que se encontram
em uma realidade jurídica distinta - princípio da igualdade. Se o legislador não teve a
coragem de enfrentar o tema do clube-empresa como deveria, não cabe aqui estabelecer
regras de compensação.
15. Justiça Desportiva das Ligas
"Art. 50. A organização, o funcionamento e as atribuições da Justiça Desportiva, limitadas
ao processo e julgamento das infrações disciplinares e às competições desportivas, serão
definidas em códigos desportivos, facultando-se às ligas constituir seus próprios órgãos
judicantes desportivos, com atuação restrita às suas competições."
Sugestão: Sanção
Fundamentos:
Apesar da aparente contradição com o disposto no § 6º do art. 20 do projeto, quando equipara
as ligas às entidades de administração do desporto, a interpretação sistemática permite que
tais ligas possam estabelecer seus próprios órgãos judicantes em matéria de Justiça
Desportiva. Seria inconcebível que um modelo paralelo e simplificado de organização
desportiva - ligas - tivesse que observar a estrutura burocrática da Justiça Desportiva
destinadas às demais entidades de administração. Impor um sistema jurídico-desportivo com
STJD, TJD e Comissão Disciplinar com composição paritária de seus membros, seria um
retumbante fracasso, obstaculizando qualquer implementação na apuração da
responsabilidade desportiva em processos disciplinares nas Ligas. A leitura mais correta e
conforme a legislação desportiva do § 6º do art. 20 é: "§ 6º As ligas formadas por entidades
de prática desportiva envolvidas em competições de atletas profissionais equiparam-se, para
fins do cumprimento do disposto nesta Lei, às entidades de administração do desporto, à
exceção do disposto no art. 50."
29
16. Conclusões
A autonomia desportiva guarda congruência com preceitos perversos que preservam o
interesse exclusivo e protecionista das entidades de prática e de administração do desporto
(notadamente no futebol profissional), em detrimento dos interesses técnicos, de
performance, de consumo, comerciais, institucionais e de todo o corpo social.
É dever do estado regular a atividade econômica do desporto profissional. No entanto, como
vimos, o projeto de lei em apreço fio além do razoável, encerrando desequilíbrio e medidas
de pouca proporcionalidade. É, indene de dúvidas, uma proposta de "boas intenções",
impulsionada com mais intensidade pela voracidade da mídia do que pela racionalidade de
seu texto.
O mero reconhecimento legal da exploração e a gestão do desporto profissional como
exercício de atividade econômica já é um avanço significativo, instrumentalizando o Poder
Público para atividades de fiscalização e cumprimento de obrigações de ordem econômica e
tributária. Ir além, requer um debate aprofundado, pois, apenas nesse breve arrazoado,
enfrentamos questões atinentes às áreas do Direito Constitucional, Administrativo, Tributário,
Civil, Comercial, entre outros.
O desporto é uma área complexa por excelência. A existência de uma disciplina autônoma
está condicionada a um conjunto sistematizado de princípios e normas, identificadoras e
peculiares de uma realidade, distintas de demais ramificações do Direito. Assim, o
reconhecimento do Direito Desportivo passa, necessariamente, pela formação de uma
unidade sistemática de princípios e normas.
Com efeito, na perspectiva do regime desportivo, o arcabouço de princípios informativo de
normas que consideram as atividades desportivas em suas diversas prerrogativas e
manifestações, estabelece meios eficazes de aglutinação dessas mesmas normas e princípios.
Exclui-se, assim, um plano de normas e princípios estanques, restritos a determinado método
de interpretação.
Nesse contexto, o projeto de lei nº 01 de 2003 conspira contra o reconhecimento do Direito
Desportivo como ciência autônoma, porquanto traz obscuridade, dúvidas e contradições,
desequilibrando o sistema que informa o regime jurídico desportivo.
Como asseveramos de início, a "fúria legiferante" é fruto de conchavos e barganhas que
desconfiguram uma proposta que poderia ser coesa. Para seduzir clubes ao modelo
empresarial fez-se, de um lado, concessões inimagináveis e, de outro, exigências do
inexigível.
As principais concessões ficam por conta de (i) medidas excessivamente protetivas de clubes
nos contratos com atletas, através de cláusulas penais desproporcionais, ressarcimento de
custos de formação, notificações de mora, etc, chagando a supor que houve a ressurreição do
famigerado "passe", agora travestido dos referenciados protecionismos exacerbados; (ii)
reescalonamento de dívidas, mediante formas de pagamento como contributo social
desportivo (por decreto), ocasionando renúncia fiscal ao desporto profissional, quando a
sociedade clama por uma lei de incentivo ao desporto não profissional.
30
Já, as regras rígidas originalmente concebidas pelo Governo estão centradas em ações que,
em princípio, já estavam consagradas no ordenamento implícita ou explicitamente, como a
gestão desportiva profissional como atividade econômica e participação do Ministério
Público em matéria de desporto. Outras, são inconstitucionais, ilegais ou simplesmente
contrariam o interesse público como a composição do CNE, obrigatoriedade de publicação de
demonstrações contábeis e sanções a dirigentes organizados na forma associativa e teoria da
responsabilidade objetiva nos casos de falha de segurança nos estádios.
Surpreende que esse pacote de medidas, sob a bandeira da moralização do desporto, seja
encampado incondicionalmente pelo novo Governo, mesmo sendo uma herança da
administração anterior. Parece não guardar coerência, pois o Governo atual é marcado por
lideranças que adotam o debate com a sociedade à exaustão. Em tempos de votações no
Congresso de várias matérias desportivas (Estatuto do Desporto, Estatuto do Torcedor, para
citar os principais), terá muito trabalho o Presidente para a sanção ou veto das propostas
apresentadas. Um passo em falso, não fazendo uma leitura sistemática das normas existentes
e das que estão por vir, pode desmoralizar a atuação estatal na matéria. Nesse emaranhado de
leis e projetos, esquecemos que a mudança de conduta por uma efetiva moralização e ética no
desporto não se faz por lei, nem por decreto. Já dispõe o Poder Público de mecanismos de
atuação. Chega-se ao cúmulo a constatação de que está cada vez mais longe a inclusão de
outras modalidades esportivas (à exceção do futebol) ao modelo profissional.