Texto integral do livro

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Texto integral do livro
o autor
Um poeta no jornalismo
O poeta e jornalista Luis Turiba (1950) é culturalmente fruto de um caldo
político-existencial que vem se derramando pelo planeta Terra a partir da década
de 60. No seu livro de poemas, Cadê?, o crítico literário Maurício Melo Júnior,
fez o seguinte apontamento: “Tropicália, Jovem Guarda, Bossa Nova, Cinema
Novo, estética da fome, concretismo, Brasília, repressão política, sindicalismo,
ligas camponesas, João Gilberto, Caetano Veloso, Roberto Carlos, Gregório
Bezerra, Haroldo e Augusto de Campos, Jango, JK, Glauber Rocha e outros tantos
carnavais. A trajetória pessoal de Turiba é síntese da euforia nacionalista que
tomou o País de assalto neste período. Depois do rescaldo e da quase maturidade,
seu destino estaria incompleto se não tivesse, enfim, aportado em Brasília, em
1979.” Sua estréia poética se deu em 1977, na Poesia Marginal, quando publicou
o livreto Kiprokó, no Rio de Janeiro. O poeta tem o título de Cidadão Brasiliense
e na capital publicou três outras experiências guerrilheiras de poesia: Clube do
Ócio, Luminares e Realejos. Em 1985, Turiba criou junto com João Borges,
Lúcia Leão, Resa, Regina Bitencourt, Paulo Andrade, Regina Ramalho, Ivan da
Livraria Presença e outros parceiros, a inesquecível e experimental revista Brica-Brac, que durou até 1991. Turiba recebeu o Prêmio Candango de Literatura,
do GDF, em 1998, pelo livro-CD Cadê?. Neste século XXI, aceitou o convite
para dar sua colaboração, como assessor de imprensa, na construção do novo
Ministério da Cultura na gestão de Gilberto Gil. Em setembro deste 2005,
publicou pela P555 o livro Bala que mereceu o seguinte comentário da poetaprofessora da UnB, Sylvia Cyntrão: “os poemas de Bala descontróem e
ressignificam vigorosamente a aventura viva da contemporaneidade”. Turiba têm
dois livros inéditos: um de poemas infantis, para suas filhas Luísa e Manuela, e
outro de crônicas e fotos sobre o pulsar “nada mudo” da cultura brasileira.
Contato com o autor: [email protected]
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*eu*amo*meu********mundo*
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*eu*amo*meu*******tempo*
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*eu*amo*minhas*crianças*crescendo*
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*eu*amo*meus****ancestrais*******
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*eu*amo*minhas***cerimônias*
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Extraído do livro “Técnicos do Sagrado” do poeta Jerome Rothenberg, publicado no “Cadê”
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Luis Turiba
MEUS BRIC-A-BRACS
Bric-a-Brac: “O que é bom para o lixo, é bom para a poesia”,
ensina Manoel de Barros, poeta dos pantanais da linguagem.
Bric-a-Brac: Foi bom para o lixo e para o luxo. Uma química
gráfica fez brilhar poemas. “Gente é para brilhar, não para
morrer de fome”. Maiakovski/ Caetano Veloso
Bric-a-Brac: s.m. Conjuncto de objectos antigos e variados,
de arte, mobiliário, cerâmica, etc.; armazém ou depósito de
esses objetos. (Encyclopédia & Diccionário Internacional,
edição 1910)
Bric-a-Brac: o jornalismo a serviço da poesia nas históricas
entrevistas com Augusto de Campos, Manoel de Barros,
Pierre Verger, José Mindlin, Paulinho da Viola, Dona Nise
da Silveira, Caetano Veloso.
Bric-a-Brac: poesia clip na idade mídia. Rumo ao Ano 2100.
Um laboratório poético gráfico-verbal-musical derramado
em redes e teias a partir do Planalto Central. Um mercado
de pulgas raras, vivas e únicas.
Bric-a-Brac: compromisso firmado com a linguagem, com
os códigos, com os fragmentos do nosso tempo, nossa era,
nossa vez e voz. Pacto com a estética, criação e libertação.
Bric-a-Brac: vestir os parangolés e dar-lhe asas parabólicas.
Minha poesia é Bric-a-Brac.
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Micro-antologia
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Luis Turiba
BICO
DA
TORRE
A sombra do bico da torre na terra
Faz o ponteiro
Que marca o preciso momento e o destino
Da gente se amar.
São flocos de nuvens que pairam
No céu de Brasília
Dão na vista textura arquitetura obra de artista
São blocos caiados de branco
Banhados de chuva e de luz
Necessidade nessa cidade
De afeto é o que conduz
Me induzo a ficar a pensar
Que sou o céu.
E o bico da torre é a antena
Que marca o momento apenas
F LAGRANTE
Lágrima na floresta
Testemunha sexo selvagem
Entre a motosserra e a árvore
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Micro-antologia
GAROTA
DO
PARQUE
Toda vez que estou
No parque
E você passa
No seu compasso
De garça
Todo o parque
Se disfarça
Em farta passarela
Tudo pira
Tudo paira
A tua espera
Do pedalar
Da sandália
Ao coração
Da donzela
Sopra o verde
Sopra o parque
Sopra o tempo
Sopra e late
Só pra ela
Toda vez que
Você parte
...já era...
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Luis Turiba
DECLARAÇÃO
DO
CLUBE
DO
ÓCIO
Nhô no to saben donde cô tô
GRITO
DE
GUERRA
DO
CLUBE
Sete e sete são catorze
Três vez sete, vinte e um
Tive sete sonhos eróticos
Mas não gozei em nenhum
Zum zum zum
Parara tim pum
Ócio
Ócio
Ócio
C ONEXÃO A MAZÔNICA
Sou selva una
Querem-me toras
Se viva, verde
Se morta, dólar
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Micro-antologia
VISÃ
O
e
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l
e
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q
go é a
e
c
r
o
O pi
BORBOLETRAS,
BORBOLETREM!
Quando você borboleta
Eu te aero o porto
Quando você bicicleta
Eu me arco e flecha
Quando você me poeta
Eu te arreio rimas
Quando você se planeta
Eu te arejo o cosmos
Quando você me soletra
Eu te armo pousos
Quando você se escopeta
Eu te arte em balas
Quando você biblioteca
Eu te aço as bíblias
Quando você m’encapeta
Eu te a eros gozos
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Luis Turiba
NA
GIRA DAS GIRAFAS
Como são gostosas as girafas
olham as estrelas de frente
conversam nos olhos de Deus
penteiam em plenas nuvens
os cílios de Carmem Miranda
& aquelas antenas a ligá-las
aos desfiles das savanas
são gêmeas das senegalesas
na altura na graça & beleza
as pernas mais altas da África
são retilíneas falsas magras
as curvas cheias de carne
quadris de Noami Campbell
o andar de Gisele Bündchen
são afro-pop as top models
sacodem as bundas a valer
tão nuas em seus pijamas
de listras lindas & leopardas
ouvir dizer que elas dormem
dez minutos a cada hora
também pudera, natureza mátria
com aquele pescoço quilométrico
(que um dia ainda vou beijá-lo)
um cochilo (ah!!!) faz descansá-lo.
Assim sendo ofereço-lhes
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Micro-antologia
um espaço de pouca mata
não tão afro como a África
mas confortável & afável
numa posição de vanguarda
aceitem, pois, minha pauta
um convite um cheque-mate:
Venham cumpridas girafas
(e isso não as desagravam)
dormir em minhas gravatas
O sono de quem lida em altas
nada custa, é puro charme
ÁBSONO
sambo espalhafatosamente
para dentro
como quem não quer nada
sambo parado
no espaço do meu corpo
com minhas víceras
meus testículos
meus intestinos
minhas moléculas
minhas cartilagens
minhas células em permanente renovação rumo à morte
meus glôbulos brancos vermelhos desbotados
meus neurônios
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Luis Turiba
minha aura vital
minhas correntes sangüíneas
no trânsito intenso e interno de veias e vácuos
sambo com meus buracos
descalço
nu como nasci
meio preso meio solto
ábsono & absorto
quase com sono
sambo meio grogue
minha apoteose
é iogue
de mãos no bolso
T REMULAI
Para José Roberto Aguilar,
Que fez a Bandeira dos Poetas
Bandeira de todas as bandeiras
Dançai nua no mastro que te ergue
Afastai de ti dos teus a luz das trevas
Anunciai as novas que em ti ferve
Tremulai teus trunfos em desatinos
Tremulai qual lençóis soltos no arame
Sem temores tumores sem tropeços
Ó bandeira da luz da chama em verve
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Micro-antologia
Teus bestiais sonhos do impossível
Tua beleza de signos sinos símbolos
Merece o topo santo de uma tomada
Merece mais – quem sabe até um hino
Tremulai todos os tremas do poema
Tremulai no oratório santo e no Divino
Tremulai toda azul na onda cósmica
Tremulai do fim do poço ao infinito
Tremulai! De pé oh vítimas da fome
Tremulai! Nas bocas de uma favela
Tremulai! Bandeira branca Oxalá-ONU
Tremulai! Lusa África & Índiamérica
Língua à brasileira
Ó órgão vernacular alongado
Hábil áspero ponteado
Móvel Nobel ágil tátil
Amálgama lusa malvada
Degusta deglute deflora
Mas qual flora antropofágica
Salva a pátria mal amada
Língua-de-trapo Língua solta
Língua ferina Língua douta
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Luis Turiba
Língua cheia de saliva
Savará Língua-de-fogo e fósforo
Viva & declinativa
Língua fônica apócrifa
Lusófona & arcaica
Crioula iorubaica.
Língua-de-sogra Língua provecta
Língua morta & ressurecta
Língua tonal viperina
Palmo de neolatina
Poema em linha reta
Lusíadas no fim do túnel
Caetano não fica mudo
Nem “Seo” Manoel lá da esquina
Por ti Guesa Errante, afro-gueixa
O mar se abre o sol se deita
Por Mários de Sagarana
Por magos de Saramago
Viva os lábios!
Viva os livros!
Dos Rosas Campos & Netos
Os léxicos Andrades, os êxtases
Toda a síntese da sintaxe
Dos erros milionários
Desses malandros otários
Descartáveis, de gorjetas.
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Micro-antologia
Língua afiada a Machado
Afinal, cabeça afeita
Desafinada índia-preta
Por cruzas mil linguageiras
A coisa mais Língua que existe
É o beijo da impureza
Desta Língua que adeja
Toda a brisa brasileira
Por mim
Tupi,
Por tu Guesa
A VISO
Jamais tente suicídio
Em barco salva-vidas
D ESARME- SE
Bala perdida
Encontra coração solitário
Poemas do livro “Bala” publicado pela P555, Salvador-BA.
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