faculdade de medicina e cirurgia de são paulo

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faculdade de medicina e cirurgia de são paulo
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FACULDADE DE MEDICINA E CIRURGIA DE SÃO PAULO
Denominações: Faculdade de Medicina e Cirurgia de São Paulo (1912); Faculdade de Medicina
de São Paulo (1925); Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (1934)
HISTÓRICO
Com a expulsão dos jesuítas das colônias portuguesas pelo Marquês de Pombal, em 1759, o
exercício da medicina passou a ser atribuição de físicos, cirurgiões, barbeiros e boticários. Exceto
os físicos, que eram formados pelas universidades européias, geralmente ibéricas, os cirurgiões e
boticários, mais numerosos, aprendiam seu ofício na prática, tendo como mestre um cirurgião já
habilitado. Para garantirem o direito de exercer apenas a cirurgia prestavam exames diante das
autoridades sanitárias competentes, quando obtinham a "carta de examinação". A partir do século
XVIII, o aprendizado para obter licença na colônia se dava geralmente nos hospitais da Santa
Casa da Misericórdia, em hospitais militares ou ainda nas residências dos mestres das principais
cidades e vilas. Na cidade de São Paulo, desde 1804, se teve notícia de que no Hospital Militar
eram ministradas aulas de cirurgia pelo físico-mor Mariano José do Amaral. (LOBO, 1964)
Entretanto, a primeira tentativa oficial de fundação de uma escola médica em São Paulo remonta
aos primeiros anos da República. A iniciativa partiu do governo estadual de Américo Brasiliense de
Almeida Mello, que sancionou a lei nº 19 de 24/11/1891, referendada pelo Secretário do Interior,
Augusto de Freitas Villalva, que criava " uma academia de medicina, cirurgia e farmácia nesta
capital, fazendo parte do plano geral de organização do ensino superior do Estado" (Apud
TEIXEIRA, 2001, p.90). Segundo Gabriela S.M.C. Marinho (2001) este decreto, que se inseria no
plano de organização do ensino superior no Estado de São Paulo, fracassou como ocorrera com
as tentativas anteriores para estabelecer escolas médicas. A autora indica a deposição de Américo
Brasiliense de Almeida Mello, em decorrência da queda do Marechal Deodoro da Fonseca
(novembro de 1891), entre os fatores para a não implantação da escola.
Naquela época, as únicas instituições de ensino médico no país reconhecidas pelo governo
republicano eram a Faculdade de Medicina e Farmácia do Rio de Janeiro e a Faculdade de
Medicina e Farmácia da Bahia, implantadas em 1808. No final do século XIX, o Estado de São
Paulo, principalmente sua capital, destacava-se no cenário nacional por apresentar um
crescimento populacional significativo, motivado pelo desenvolvimento da produção cafeeira, a
imigração e a facilidade dos transportes através da extensão da rede ferroviária, o que facilitava a
propagação de doenças transmissíveis. A inexistência de uma estrutura sanitária competente para
tratar das epidemias que se disseminavam, interferindo, inclusive, no crescimento econômico das
zonas urbana e rural, incentivou a organização do Serviço Sanitário do Estado, levando à criação,
no ano de 1892, do Laboratório de Bacteriologia do Estado de São Paulo e do Instituto
Vacinogênico entre outras instituições. Faltavam, contudo, naquela época, instituições de ensino
médico no estado paulista.
Com a criação da primeira associação de médicos no Estado, em 1895, denominada Sociedade de
Medicina e Cirurgia de São Paulo, novamente foi ventilada a idéia de implantação de um curso
médico vinculada à intenção de fundação de uma universidade, quando foi nomeada uma
comissão para a elaboração de um projeto para implantação de uma faculdade. Esta comissão,
nomeada pelo Secretário do Interior, Alfredo Pujol, era constituída por vários membros da
Sociedade de Medicina e Cirurgia de São Paulo, como Luiz Pereira Barreto, Carlos José de Arruda
Botelho, Francisco Franco da Rocha, e Ignácio Marcondes de Rezende. No seio desta comissão
surgiram dois projetos diferentes, em decorrência de divergências quanto à duração e à estrutura
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do curso (TEIXEIRA, 2001). Ambas as propostas foram encaminhadas para apreciação no
Congresso Estadual, mas não chegaram a ser votadas e a idéia de uma faculdade de medicina
não se viabilizou.
Em 1898 foi fundada a Escola Livre de Farmácia de São Paulo, que, em 1901, passou a ministrar
também os cursos de odontologia e obstetrícia.
Em 1900 o médico Queiroz Mattoso, membro da Sociedade de Medicina e Cirurgia de São Paulo,
apresentou outra proposta de criação de uma faculdade de medicina, a qual foi bem aceita no meio
médico e desencadeou a organização de uma nova comissão para a elaboração do projeto. Com a
participação de Augusto Cesar de Miranda Azevedo, Mathias de Vilhena Valladão, Luiz Pereira
Barreto, Emílio Marc ondes Ribas, e João Alves de Lima, entre outros dos quadros da Sociedade
de Medicina e Cirurgia de São Paulo. O modelo proposto, baseado no da Escola Livre de Farmácia
de São Paulo, criada em 1898, não foi bem recebido no legislativo estadual e novamente não
concretizou-se a idéia de criação de uma faculdade de medicina.
O projeto da faculdade de medicina em São Paulo foi retomado por ocasião da Lei Orgânica do
Ensino Superior e Fundamental da República, referendada pelo Ministro da Justiça e Negócios
Interiores Rivadávia Corrêa, através do decreto nº 8.659 de 05/04/1911. Por esta reforma ficou
definida a autonomia didática e administrativa das faculdades, segundo a qual os programas de
ensino de outras escolas ou faculdades não tinham mais a obrigatoriedade de seguir os das
faculdades de medicina do Rio de Janeiro e da Bahia, desoficializando o ensino. Baseado nos
pressupostos desta nova legislação de ensino, um grupo de intelectuais paulistas, incluindo
médicos, farmacêuticos, dentistas e advogados, instalaram em novembro de 1911, a Universidade
Livre de São Paulo, que era mantida pelo setor privado sem a fiscalização do governo. Fundada
por Eduardo Augusto Ribeiro Guimarães, tinha os cursos de medicina, de belas artes, comércio,
engenharia, odontologia, farmácia e direito. Entre os presentes em seu corpo docente estavam
Ulysses de Freitas Paranhos (curso de microbiologia) e Antonio Carini (anatomia e histologia
patológica). Funcionando aproximadamente até 1917, essa Universidade chegou a formar alguns
médicos e farmacêuticos (CUNHA, 1980). A fundação da Universidade Livre de São Paulo
desencadeou o debate sobre a criação de uma faculdade de medicina oficial do Estado,
apresentando-se aqueles que eram defensores das escolas livres e os que as entendiam como
fábricas de diplomas. Em 1912, quando o Governo do Estado de São Paulo desencadeou o
processo de criação da faculdade de medicina, o debate assumiu maiores proporções,
ultrapassando os limites dos periódicos especializados e alcançando as páginas dos jornais de
grande circulação.
Neste contexto a lei nº 1.357, de 19/12/1912, aprovada pelo Presidente do Estado, Francisco de
Paula Rodrigues Alves, e referendada pelo Secretário do Interior, Altino Arantes, estabeleceu que
aquela Academia de Medicina, Cirurgia e Farmácia, criada em 1891 mas não regulamentada,
passava a ser a Faculdade de Medicina e Cirurgia de São Paulo. O médico Arnaldo Augusto Vieira
de Carvalho, que havia sido diretor do Instituto Vacinogênico (1892) e diretor clínico da Santa Casa
da Misericórdia de São Paulo (1894), e que desde 1891 vinha se empenhando na criação de uma
faculdade de medicina, ficou encarregado de organizar a instituição. Pelo decreto de 7 de janeiro
de 1913, Arnaldo Augusto Vieira de Carvalho foi nomeado seu diretor.
A lei de criação da Faculdade foi regulamentada pelo decreto nº 2.344 de 31/01/1913, quando foi
determinado que o programa do curso, a ser realizado em seis anos, ficava composto por 28
cadeiras, sendo três no curso preliminar e 25 no curso geral.
As primeiras nomeações de professores ocorreram em fevereiro de 1913, sendo eles: Edmundo
Xavier (física médica); Celestino Bourroul, substituto da 1ª seção (física médica e história natural
médica); Raphael Penteado de Barros (preparador de física); e Léo Lopes de Oliveira (preparador
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de história natural). Neste mesmo ano, ainda foram nomeados os doutores João de Aguiar Pupo
(preparador de química médica) e Guilherme Bastos Milward (química médica).
A aula inaugural, versando sobre física, foi proferida pelo professor Edmundo Xavier na Escola
Politécnica de São Paulo, no dia 2 de abril de 1913. Nos anos seguintes foram contratados
professores estrangeiros para lecionarem diversas cadeiras: Alphonso Bovero (anatomia descritiva
e histologia – 1914-1937) e Alessandro Donati (patologia geral e experimental – 1917-1923), da
Universidade de Turim, na Itália; Emile Brumpt (parasitologia – 1913-1915), da Faculdade de
Medicina de Paris; Lambert Mayer (fisiologia – 1913-1914), da Faculdade de Nancy, na França;
Antônio Carini, da Suíça (microbiologia – 1916-1920); e Walter Haberfeld, da Alemanha (anatomia
e histologia patológicas – 1916-1920).
A estrutura curricular da Faculdade de Medicina e Cirurgia de São Paulo "buscava dosar aulas
teóricas e práticas de laboratório, abrindo assim a possibilidade de os estudantes receberem uma
formação de cunho mais científico e não meramente clínico" (MARINHO, 2001, p.53).
A Faculdade foi instalada, provisoriamente, nas dependências da Escola Politécnica de São Paulo
e da Escola de Comércio Álvares Penteado, evitando-se a sua vinculação com a Santa Casa da
Misericórdia de São Paulo. No dia 23 de março de 1914 sua sede foi transferida para um prédio
alugado, situado na rua Brigadeiro Tobias, 42. Nos fundos deste prédio foi construído um
anfiteatro, onde funcionaram as cadeiras de física, química, história natural, anatomia, fisiologia,
farmacologia, histologia, anatomia médico-cirúrgica, operações e aparelhos, e terapêutica
experimental e arte de formular. Além deste prédio, foi alugado outro na esquina da mesma rua
com a ladeira de Santa Efigênia, casa nº 1, antiga residência da Marquesa de Santos (Maria
Domitília de Castro Canto de Mello). Neste local, funcionaram as cadeiras de histologia, anatomia
patológica, microbiologia e patologia geral.
No ano de 1916, pela lei nº 1.504, foi autorizada a construção de um edifício para a Faculdade,
porém não foi executada. Na mesma rua Brigadeiro Tobias, onde funcionava a Faculdade, foi
arrendado um terceiro prédio, destinado à cadeira de higiene.
Neste mesmo ano foram nomeados para o corpo docente da Faculdade: Sérgio Florentino de
Paiva Meira Filho (catedrático de anatomia médico-cirúrgica, operações e aparelhos), Domingos
Rubião Alves Meira (catedrático de clínica médica 1ª cadeira, propedêutica), Antônio Cândido de
Camargo (catedrático de clínica cirúrgica 1ª cadeira, propedêutica), João Paulo da Cruz Britto
(catedrático de cliníca oftalmológica), Adolpho Carlos Lindenberg (catedrático de clínica
dermatológica e sifiligráfica), Henrique Lindenberg (catedrático de clínica otorrinolaringológica),
Benedicto Augusto de Freitas Montenegro (substituto da 3ª seção), João Maria Ayrosa Galvão
(substituto da 4ª seção, histologia, microbiologia, anatomia e histologia patológicas), Antônio de
Almeida Prado (substituto da 8ª seção, clínica médica, 1ª, 2ª e 3ª cadeiras), Affonso Regulo de
Oliveira Fausto (substituto da 7ª seção, clínica cirúrgica, 1ª e 2ª cadeiras), Álvaro de Lemos Torres
(assistente de clínica médica 1ª cadeira), Zephirino Alves do Amaral (assistente de clínica cirúrgica,
1ª cadeira), José Pereira Gomes (assistente de clínica oftalmológica), José Ataliba Ferraz de
Sampaio (assistente de clínica dermatológica e sifiligráfica), Adolfo Schmidt Sarmento (assistente
de clínica otorrinolaringológica), Joaquim Pires Fleury (preparador de microbiologia), Adolpho
Corrêa Dias Filho (prepardor de anatomia médico-cirúrgica, operações e aparelhos), Ludgero da
Cunha Motta (preparador de anatomia e histologia patológicas), Luciano Gualberto (preparador de
anatomia descritiva 2ª parte), João Moreira da Rocha (preparador de anatomia descritiva 1ª parte),
e Diaulas de Sousa e Silva (preparador de histologia).
Em 25 de janeiro de 1920 foi lançada a pedra fundamental da sede própria da Faculdade de
Medicina e Cirurgia de São Paulo, em frente ao Cemitério do Araçá. Dentre os prédios planejados,
o único concretizado foi o do Pavilhão de Medicina Legal, finalizado em dezembro de 1921.
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No dia 28 de fevereiro de 1919 foi realizada a solenidade de formatura da primeira turma de
médicos diplomados pela Faculdade, constituída por 27 profissionais, entre os quais duas
mulheres: Benedicto Oscar de Carvalho Franco, Benjamin Reis, Sebastião Comparato, José dos
Passos da Silva e Cunha, Délia Ferraz, Flamínio Fávero, Horacio Figueiredo, Floriano Smith
Bayma, José Ferreira dos Santos, João Procópio, Simeão dos Santos Bonfim, Ernesto de Souza
Campos, Odete Nora de Azevedo Antunes, Altino Augusto Azevedo Antunes, Sebastião Ozorio de
Azevedo Antunes, João Baptista Brasiliano, Messias da Fonseca, Antonio Leopoldino Passos
Junior, Sebastião de Camargo Calazans, José de Toledo Piza, José de Toledo Mello, Gumercindo
de Godoy, Henrique Dante de Castro, Octavio Pinto Ferraz, Austin Ribeiro Villela, Eugenio
Nogueira Ferraz, e Alfredo Pujol Filho.
Neste período, entre 1916 e 1931, a atuação da Fundação Rockefeller destacou-se no apoio e
colaboração prestados à Faculdade de Medicina. A primeira comissão de estudos da Fundação
Rockefeller, composta pelo bacteriologista William Henry Welch e por Wickliffe Ross (Presidente da
International Health Board- IHB), chegou ao Brasil em 1915, com o objetivo de identificar os
centros médicos de excelência. Em 1916 duas novas comissões retornaram à América do Sul,
sendo o Brasil visitado na segunda empreitada, que tinha como objetivo identificar os centros de
ensino médico adequados para a implantação de disciplinas de higiene e saúde destinadas à
formação de quadros para atuar na prevenção e em campanhas de saúde pública. Foram
realizados os primeiros contatos com a recém-criada Faculdade de Medicina e Cirurgia de São
Paulo, sendo recomendado pela comissão a criação de uma cadeira de higiene nesta instituição, a
qual foi implementada em 1918. Além disso, em 1928, financiou uma Comissão formada pelos
professores Benedicto Augusto de Freitas Montenegro, Luiz Manoel de Rezende Puech e Ernesto
de Souza Campos, visando a organização do projeto de construção e equipamento das cátedras
da Faculdade. Incumbidos dessa missão, seguiram os professores rumo aos Estados Unidos,
Canadá e vários países da Europa para coleta de dados em visita a diversas instituições médicas.
Após as viagens, tendo recebido mais recursos da Fundação Rockefeller, a Faculdade executou o
projeto elaborado pela Comissão, com o auxílio do arquiteto João Serato. A construção do prédio
ficou a cargo da empresa F. P. Ramos de Azevedo & Cia., sendo dirigida pelos professores
Ernesto de Souza Campos e Luiz Manoel de Rezende Puech. Em 15 de março de 1931, foi
inaugurado o Edifício Central, na então Estrada do Araçá, depois Avenida Municipal, que a partir
de 1931 foi denominada Avenida Dr. Arnaldo. Nesse prédio funcionavam a administração e os
laboratórios. Mais tarde, no dia 20 de abril de 1944, ficava pronto o Hospital das Clínicas e, em
1950, o pavilhão especial de ortopedia.
Segundo o professor Jairo Ramos (Apud LACAZ, 1999), a Faculdade de Medicina de São Paulo
acabou por adotar os padrões norte-americanos de ensino médico, abandonando o modelo de
ensino francês, considerado retrógado.
Diretores:
Arnaldo Augusto Vieira de Carvalho (1913-1920); Ovídio Pires de Campos (1920-1921); Edmundo
Xavier (1921-1922); Celestino Bourroul (1922); Adolpho Carlos Lindenberg (1922-1924); Pedro
Dias da Silva (1924-1930); Ernesto de Souza Campos (1930); Sérgio Florentino de Paiva Meira
Filho (1930-1932); Cantídio de Moura Campos (1932-1935); João de Aguiar Pupo (1935-1937);
Flamínio Fávero (1937-1938); Ludgero da Cunha Motta (1938-1941); Benedicto Augusto de Freitas
Montenegro (1941-1947); Renato Locchi (1947-1950).
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ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO
Com a necessidade de começar o ensino clínico, foi estabelecido um acordo, em 1915, entre o
Governo do Estado e a Mesa Administrativa da Santa Casa da Misericórdia de São Paulo. No seu
Hospital Central foram instaladas todas as clínicas, com exceção da obstétrica e da psiquiátrica, a
primeira alojada na Maternidade de São Paulo, e a segunda no Juqueri e no Recolhimento das
Perdizes. As aulas práticas de clínica e cirurgia foram ministradas na Santa Casa até 1948, mesmo
depois da inauguração do Hospital das Clínicas da Faculdade, em 1944.
O acordo que se estabeleceu entre o Governo do Estado e a International Health Board (IHB –
Junta Internacional de Saúde), da Fundação Rockefeller, para a organização de um Departamento
de Higiene destinado ao ensino dessa disciplina, foi oficializado no dia 9 de fevereiro de 1918, o
qual definiu o valor das contribuições da Fundação para equipar os laboratórios e para
manutenção do departamento, a concessão de duas bolsas de estudos nos Estados Unidos para
estudantes brasileiros e envio de um especialista norte-americano para assumir o departamento de
higiene. Os cientistas norte-americanos Samuel Taylor Darling e Wilson George Smillie foram
designados para dirigir o departamento nos períodos 1918-1920 e 1920-1922, respectivamente.
Mais tarde, foram substituídos pelos brasileiros Geraldo Horácio de Paula Souza e Francisco
Borges Vieira. Posteriormente, esse departamento, como Instituto de Higiene, desvinculou-se da
Faculdade de Medicina e Cirurgia, constituindo o Instituto de Higiene de São Paulo, dando origem,
em 1945, à Faculdade de Higiene e Saúde Pública da Universidade de São Paulo.
Richard Mills Pearce, representante da Fundação Rockefeller, foi encarregado da promoção de
estudos e negociações referentes ao ensino médico, destacando-se na implantação do modelo de
ensino proposto pela instituição norte-americana na Faculdade de Medicina e Cirurgia de São
Paulo. Esse modelo baseava-se na limitação de número de vagas, tempo integral nas disciplinas
pré-clínicas, hospital de clínicas anexo à faculdade (MARINHO, 2001). Em suas diversas vindas a
São Paulo, Pearce estabeleceu contactos com Arnaldo Augusto Vieira de Carvalho, e foi
intermediado por um ex-aluno seu, Alexandrino de Moraes Pedroso, então do Instituto
Bacteriológico do Estado de São Paulo.
Em 18 de abril de 1918, Oscar de Carvalho Freire, catedrático de medicina legal da Faculdade de
Medicina da Bahia, inaugurou a cadeira de mesmo nome no antigo Laboratório de Higiene da
Faculdade de Medicina e Cirurgia de São Paulo, na rua Brigadeiro Tobias. Em 1932, com a sua
morte, foi substituído pelo professor Flamínio Fávero. As atividades do então Instituto Oscar Freire
compreendiam incentivo ao ensino teórico e prático da cadeira de medicina legal; entrosamento do
aludido ensino com o de outras faculdades; incentivo às pesquisas e trabalhos de medicina legal e
aos cursos de extensão universitária; exercício de perícia, sob licitação da justiça e da polícia;
serviço de identificação e biotipologia da Universidade; e edição, com recursos próprios, do Boletim
do Instituto Oscar Freire.
Em 1920, foi feito um novo acordo com a Fundação Rockefeller para o ensino da patologia. No ano
seguinte, a entidade concordou em colaborar, desde que aceitas certas sugestões, tais como
limitação do número de matrículas; adoção do tempo integral para as cadeiras básicas; e
construção, nas proximidades da Faculdade, de um hospital para o ensino das clínicas. Para
ocupar a cadeira de anatomia patológica foram enviados então os especialistas estrangeiros Oscar
Klotz (1921-1923) e Robert Archibald Lambert (1923-1925).
Tomando conhecimento das sugestões da Fundação Rockefeller, o diretor da Faculdade
conseguiu o apoio do governador paulista Carlos de Campos e do Congresso Estadual. A
Assembléia Legislativa votou a lei nº 2.016 de 26 de dezembro de 1924, instituindo o regime de
tempo integral e autorizando a reforma do regulamento da Faculdade, no qual, entre outras
disposições, aparecia a limitação do número de alunos.
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Neste período, a lei nº 4.615 de 07/12/1922, assinada pelo Presidente da República, Arthur
Bernardes, reconhecia em todo o país os títulos emitidos pela Faculdade de Medicina e Cirurgia de
São Paulo. A partir de então, a Escola teve de se submeter à vigilância e fiscalização do Conselho
Superior de Ensino. Pelo decreto estadual n° 3.874 de 11/07/1925, foi organizado o primeiro
regimento interno da instituição aprovado pela Congregação na sessão de 21 de outubro de 1925,
tendo sido referendado em 17 de abril de 1926, por ato do Secretário do Interior. A partir daí, sua
denominação mudou para Faculdade de Medicina de São Paulo (art. 1°). O ensino médico
ministrado foi reorganizado, ficando as cadeiras assim distribuídas pelos seis anos de duração do
curso (art. 2°):
1° ano: física; química geral e mineral; biologia geral e parasitologia; anatomia (1ª parte);
2° ano: anatomia (2ª parte); química orgânica e biológica; histologia e embriologia; fisiologia (1ª
parte);
3° ano: fisiologia (2ª parte); microbiologia; farmacologia; patologia geral;
4° ano: anatomia patológica; anatomia médico-cirúrgica e medicina operatória; patologia cirúrgica;
patologia médica; clínica cirúrgica (1ª cadeira); clínica médica (1ª cadeira); propedêutica;
5° ano: terapêutica e arte de formular; higiene; clínica cirúrgica (2ª cadeira); clínica médica (2ª
cadeira); clínica otorrinolaringológica; clínica oftalmológica; clínica dermatológica e sifilográfica;
6° ano: medicina legal; clínica médica (3ª cadeira); clínica pediátrica, obstetrícia e clínica obstétrica;
clínica ginecológica; clínica cirúrgica infantil e ortopédica; clínica psiquiátrica e neuriátrica e
medicina tropical.
Todo o corpo docente ficou constituído por médicos, podendo ser professores catedráticos ou
contratados, docentes-livres e auxiliares de ensino (art. 5°). O diretor era escolhido entre os
professores, sendo nomeado livremente pelo Governo (art. 6°).
Quanto ao hospital para as clínicas da Faculdade, o congresso paulista votou a lei nº 2.124 de
30/12/1925, autorizando a abertura de um crédito especial para o início da construção (1926),
devendo este crédito ser renovado nos exercícios de 1927 e 1928. Contudo, o governador Carlos
de Campos faleceu, e o sucessor Júlio Prestes suprimiu os créditos destinados à Faculdade.
Sendo assim, o hospital para o ensino das clínicas, um dos pontos defendidos pela Fundação
Rockefeller na introdução de seu modelo baseado na medicina experimental, só se concretizou em
1944.
No ano de 1926, o ensino ganhou novo impulso com a contratação dos especialistas em
helmintologia do Instituto Oswaldo Cruz, Lauro Travassos e seu assistente César Pinto para a
cadeira de parasitologia, acompanhada da adoção do regime integral. O estabelecimento do
ensino em tempo integral fez com que as cadeiras básicas fossem organizadas em forma de
departamentos. Isso permitiu o desenvolvimento da pesquisa científica no interior da Faculdade.
A Fundação Rockefeller destacou-se também no auxílio prestado ao estudo da genética, através
do trabalho do professor André Dreyfus, que lecionava, desde 1926, histologia e embriologia na
Faculdade e assumiu a chefia do laboratório de biologia geral em 1934. Nesse laboratório, ele
trabalhou com o bolsista da Fundação, Crodowaldo Pavan.
Em 21 de fevereiro de 1929, foi aprovado o decreto estadual nº 4.554-A, que regulamentou a
Faculdade de Medicina de São Paulo.
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No dia 25 de janeiro de 1934, foi aprovado pelo interventor federal do Estado de São Paulo,
Armando de Salles Oliveira, o decreto nº 6.283, que criava a Universidade de São Paulo. A
Faculdade foi integrada à nova instituição, com a denominação de Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo. Os professores Raul Carlos Briquet (obstetrícia) e André Dreyfus, da
Faculdade de Medicina, participaram da comissão que discutiu e elaborou o decreto de criação da
Universidade. Essa foi a primeira a ser instalada no país segundo os moldes de sistema
universitário estabelecidos pela nova legislação de ensino, denominada Reforma Francisco
Campos (decreto nº 19.851 de 11/04/1931). A originalidade da Universidade de São Paulo
encontrava-se na incorporação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras como ponto central do
sistema universitário, além de sua atenção especial à pesquisa científica. A Faculdade de Medicina
acabou firmando-se como um dos mais importantes centros de formação de recursos humanos e
de desenvolvimento de pesquisas na área médica. Em 1951, a Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo recebeu o título de padrão "A" pelo Conselho Executivo da Associação
Médica Americana, dos Estados Unidos, tornando-se merecedora das mesmas considerações e
dos mesmos direitos que as escolas médicas aprovadas naquele país.
Centro Acadêmico Oswaldo Cruz
A atuação do corpo discente da instituição se destacou a partir das atividades do Centro
Acadêmico Oswaldo Cruz, criado no dia 14 de setembro de 1913. Formado pela associação dos
alunos, logo foi reconhecido pelo diretor Arnaldo Augusto Vieira de Carvalho, sendo presidido pelo
aluno Ernesto de Souza Campos. O Centro Acadêmico atuou nos campos educacional, político e
de assistência à saúde.
Inicialmente, seus integrantes promoveram diversas palestras médicas proferidas pelos
professores da Faculdade. Durante o ano de 1914, se teve notícia da visita de grupos de
estudantes ao Instituto Oswaldo Cruz para prestarem homenagem ao seu fundador, o sanitarista
Oswaldo Gonçalves Cruz. Este, em retribuição, visitou no mesmo ano a Faculdade. Em 1918, o
Centro Acadêmico fundou a Liga de Combate à Sífilis, participando ativamente da Liga
Nacionalista e no combate à gripe espanhola, quando sobressaíram as atuações do diretor Arnaldo
Augusto Vieira de Carvalho na Santa Casa e de Ernesto de Souza Campos na presidência do
Centro Acadêmico. Com fins de promover a aproximação entre os alunos diplomados pela
Faculdade e manter vivo o interesse pela instituição, em 26 de março de 1930 foi fundada a
Associação dos Antigos Alunos da Faculdade de Medicina de São Paulo pelos ex-presidentes do
Centro Acadêmico Oswaldo Cruz. No dia 25 de junho, tomou posse a primeira diretoria da
Associação. Nesse mesmo ano, em setembro, era criado o Departamento Científico do Centro
Acadêmico Oswaldo Cruz, promovendo a colaboração exclusiva de estudantes no seu periódico
Revista de Medicina.
Durante a Revolução Constitucionalista de 1932, a Faculdade de Medicina também se manifestou,
posicionando-se a favor dos "rebeldes" contra o Governo Provisório de Getúlio Vargas. Alguns
alunos, inclusive o presidente do Centro Acadêmico, Raul de Almeida Braga, e os médicos João de
Lorenzo, Piragibe Nogueira, Eurico Bastos e Reinaldo Neves Figueiredo, se envolveram na
organização da Unidade Cirúrgica Itália, chefiada pelo professor Benedicto Augusto de Freitas
Montenegro. O Hospital do Sangue do Cruzeiro, chefiado pelo professor Alípio Corrêa Netto,
contou com a colaboração de Eduardo Etzel, Francisco Cerruti e vários acadêmicos, destacandose também na cirurgia de guerra (LACAZ, 2000).
Além da participação nesses acontecimentos, a Faculdade de Medicina depois de incorporada à
Universidade de São Paulo, através de seus antigos alunos, contribuiu significativamente na
implantação de outras escolas médicas pelo Estado de São Paulo, tais como a Faculdade de
Medicina Veterinária, a Escola Paulista de Medicina, a Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, a
Faculdade de Medicina de Campinas, a Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa da
Dicionário Histórico-Biográfico das Ciências da Saúde no Brasil (1832-1930)
Casa de Oswaldo Cruz / Fiocruz – (http://www.dichistoriasaude.coc.fiocruz.br)
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Misericórdia, a Faculdade de Medicina de Botucatu, a Faculdade de Medicina de Sorocaba, a
Faculdade de Medicina de Santos e a Faculdade de Medicina de Taubaté.
PUBLICAÇÕES OFICIAIS
Em julho de 1916, foi publicado o primeiro número da Revista de Medicina, órgão do Centro
Acadêmico Osvaldo Cruz. Ernesto de Souza Campos era o presidente da Comissão de Redação,
que também era formada por Jaime Candelária, Altino Augusto Azevedo Antunes, Flamínio Fávero,
Antônio Ferreira de Almeida Júnior, Ibrahim Madeira e J. Cardoso.
Entre os anos de 1926 e 1957, circulou o periódico Annaes da Faculdade de Medicina de São
Paulo, publicado anualmente com o fim de divulgar a atividade científica da instituição, como os
trabalhos de professores, de docentes e de auxiliares de ensino. Apresentava também uma
coletânea de trabalhos originais, notícias, dados históricos, resumos de teses e biografias,
procurando estabelecer uma ligação entre a faculdade e outras instituições científicas nacionais e
estrangeiras. A comissão de redação no seu início ficou constituída pelos professores Pedro Dias
da Silva (presidente), Flamínio Fávero (secretário), Antônio de Almeida Prado, Alphonso Bovero,
Raul Carlos Briquet e José Pereira Gomes.
No primeiro número dos Annaes da Faculdade de Medicina de São Paulo, em 1926, foram
publicados trabalhos de: Arthur Neiva, César Pinto, Lauro Travassos, Alphonso Bovero, João
Moreira da Rocha, Renato Locchi, Moacyr de Freitas Amorim, Franklin de Moura Campos, J. A.
Lambert, Juvenal Ricardo Meyer, Bonifácio de Castro Filho, Ludgero da Cunha Motta, João de
Aguiar Pupo, Francisco Borges Vieira.
Além desses periódicos, em 1930 era editado o primeiro número de um jornal de estudantes da
Faculdade, denominado Bisturi, no qual era divulgada a produção de seus poemas e comentários
sobre professores. Tinha como redatores Luiz Baptista, Mário Altenfelder Silva, Mathias Roxo
Nobre, Paulo Vilela de Andrade e Gil Spilborgs.
FONTES
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1946-1996. São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte: Editora Atheneu, 1999. (FM-USP)
FICHA TÉCNICA
Pesquisa - MªRachel Fróes da Fonseca, Alex Varela
Redação - Alex Varela, MªRachel Fróes da Fonseca, Verônica Pimenta Velloso
Revisão - Francisco José Chagas Madureira.
Dicionário Histórico-Biográfico das Ciências da Saúde no Brasil (1832-1930)
Casa de Oswaldo Cruz / Fiocruz – (http://www.dichistoriasaude.coc.fiocruz.br)