simpósio 41 - iv simpósio mundial de estudos de língua portuguesa
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simpósio 41 - iv simpósio mundial de estudos de língua portuguesa
451 SIMPÓSIO 41 PORTUGUÊS COMO LÍNGUA NÃO MATERNA PARA CRIANÇAS E ADOLESCENTES AO REDOR DO GLOBO A Associação Internacional de Linguística do Português (AILP), sediada em Macau até 2013, dando continuidade a discussões levantadas a partir do III SIMELP, propõe aprofundar reflexões sobre a “formação de crianças e adolescentes falantes de português como língua não materna (PLNM) ao redor do globo”, tanto em países em que o português é língua oficial quanto nos que a tomam como língua estrangeira. Ao focalizar especificamente esses sujeitos no contexto de diversos continentes, espera-se que os trabalhos situem o português tanto como uma língua internacional, quanto como uma língua que convive mais ou menos intensamente com outras no espaço multilingue dos diferentes países/regiões em que se faz presente. Incentivamos que as apresentações abordem aspectos identitários, políticos, sociais, culturais a partir da análise de objetos empíricos como a interação em sala de aula, o material didático voltado a esse público, o desenvolvimentos de (multi)letramentos em PLNM por meio das produções orais e escritas dos discentes e documentos que explicitam as políticas linguísticas de diferentes espaços. COORDENAÇÃO Roberval Teixeira e Silva Universidade de Macau, AILP [email protected]) Kleber Aparecido da Silva Universidade de Brasília/ALAB [email protected]) Cláudia Hilsdorf Rocha Universidade de Campinas [email protected]) 451 452 NÓS E OS OUTROS: O PAPEL DAS REPRESENTAÇÕES NO CONTEXTO DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE PORTUGUÊS PARA ESTRANGEIROS Lucia Maria de Assunção Barbosa – UnB Inserida nas atividades do Grupo de Pesquisa Língua, Cultura, Representação (CnPq), esta comunicação pretende discutir o papel das representações na e para formação de professores de línguas em geral e de português para estrangeiros mais especificamente. Nosso ponto de partida retoma estudos como os de Zarate (1993) e Castelloti & Moore (2002), nos quais se evidenciam como as representações de uma língua-cultura interferem no percurso dos agentes envolvidos nesse processo. Isto se justifica, pois as imagens de si e do outro são aspectos dotados de forças mobilizadoras das quais muitas vezes se tem pouca consciência. Nessa perspectiva, o material didático quase sempre vem permeado por elementos exóticos, folclóricos e generalizantes. A sala de aula tem sido, por sua vez, o espaço privilegiado para se falar sobre a língua. Zarate (1993) assinala o fato de que as representações sociais não se configuram como um conjunto de subjetividades distintas, pois elas são produto de um trabalho coletivo, por meio do qual os agentes sociais constroem as formas de conhecimento da realidade. Nesse sentido, o professor exerce um papel fundamental, enquanto construtor do espaço entre o parecido e o diferente, o interior e o exterior, o próximo e o distante. No contexto do ensino-aprendizagem de Português para Estrangeiros, o campo de estudo das representações mostra-se terreno fértil para (re)pensarmos como elas têm influenciado nossos olhares, nossos discursos e, principalmente, nossas ações. MANUAIS ESCOLARES, RELAÇÕES RACIAIS E INTERCULTURALIDADE NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES EM PAÍSES DE LÍNGUA PORTUGUESA: ENSINAR QUAL LÍNGUA, LER QUAL LITERATURA? Aracy Alves Martins – CEALE/NERA/FAE-UFMG Miria Gomes Oliveira – CEALE/NERA/FAE-UFMG Esta proposta de comunicação apresenta a pesquisa em andamento, com apoio do CNPq, “Língua e Literatura: relações raciais, diversidade sociocultural e interculturalidade em países de língua portuguesa”, desenvolvida por pesquisadores integrantes do NERA (Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Relações Raciais e Ações Afirmativas), e do CEALE (Centro de Alfabetização Leitura e Escrita), ligados ao Curso de Especialização Lato Sensu da FAE/UFMG – LASEB -, para professores de Rede Municipal de Belo Horizonte, da área de “História da África e Culturas AfroBrasileiras: uma introdução à lei 10.639/03”. A presente pesquisa trabalha em três eixos de investigação: manuais escolares, literatura para crianças e jovens (letramento literário, Cf. PAULINO, 1999; COSSON, 2006); documentos oficiais e midiáticos relacionados às políticas linguísticas de cada nação (OLIVEIRA, 2009). Para isso, são utilizados pressupostos da análise crítica do discurso (DIJK, 2008) em impressos utilizados no Brasil, Angola, Cabo Verde, Guiné Bissau, Macau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor Leste. Nesta apresentação, serão focalizadas as análises de manuais escolares de Português e de História do Ensino Básico, por traduzirem traços dominantes do sistema cultural de uma sociedade (Forquin, 1993), quanto aos aspectos interculturais (MAHER & CAVALCANTI, 2007; HOPENHAY, 2009), quanto aos aspectos dialógicos (BAKHTIN, 2003 ) e, sobretudo, quando aos aspectos discursivos neles contidos, destacando-se o papel da cultura, da língua e da literatura na construção da identidade dos sujeitos leitores. O objetivo é discutir os gêneros textuais, verbais e visuais, escolhidos para compor essas obras, bem como as atividades destinadas aos alunos, no tocante à história, à literatura, às línguas maternas, às culturas afro-brasileiras, às representações sobre os negros e às relações étnico-raciais (MUNANGA & GOMES, 2006), tematizando racismo e 452 453 discurso (VAN DIJK, 2008, MARTINS, 2012), ou, ainda, mais especificamente no Brasil, tematizando a branquidade normativa - centralidade discursiva do branco como norma de humanidade (SILVA E ROSEMBERG, 2008). PORTUGUÊS PARA CRIANÇAS ESTRANGEIRAS E (TRANS) FORMAÇÃO CIDADÃ: MULTILETRAMENTOS, PLURILINGUISMO E TRANSCULTURALIDADE Kleber Aparecido da SILVA – UnB Cláudia Hilsdorf Rocha – UNICAMP Esta comunicação reúne trabalhos voltados ao ensino-aprendizagem de português para crianças estrangeiras nos anos iniciais da escolarização (Ensino Fundamental I), com vistas à reflexão sobre as diversas materialidades do processo nesse contexto e com foco na (trans) formação cidadã (MOITA LOPES & ROJO, 2004). Ao ser (re) conhecida como um dos importantes letramentos para o engajamento social e discursivo do cidadão no mundo atual, densamente multisemiotizado e marcado pela pluralidade cultural e identitária (MOITA LOPES, 2005, 2008; ROCHA, 2010), a língua estrangeira revela-se, ao lado de muitos outros, um elemento central na formação para a cidadania crítica, também no que diz respeito ao Ensino Fundamental I (ROCHA 2012, 2010; ROCHA, TONELLI & SILVA, 2010). Nessa perspectiva, são muitos e variados os fatores que merecem atenção, visando a um ensino de língua estrangiera efetivo, crítico e compatível com as características da sociedade contemporânea, no que diz respeito ao modo como hoje ocorrem as relações humanas por meio da linguagem, em suas múltiplas formas ou semioses (HIGGINS, 2009). Nesse contexto, orientando-se principalmente por uma visão enunciativa de linguagem (BAKHTIN, 2004 [1929]; 2003 [1953]) e sociointeracional de aprendizagem (VYGOTSKY, 1978), o principal objetivo desta comunicação é discutir estudos voltados a mapeamentos da área, parametrizações, material didático, interação em sala de aula e avaliação, no que diz respeito à língua estrangeira nos anos iniciais do EF, na medida que, entre tantos outros, esses temas revelam-se centrais para ações positivas rumo a um processo educativo mais informado, significativo e emancipatório (SILVA & TORRES, 2013; SILVA, ROCHA & TONELLI, 2010; FREIRE, 2004). CONSCIÊNCIA LINGUÍSTICA E COMPETÊNCIA DE ESCRITA DE CRIANÇAS MOÇAMBICAS DO ENSINO BÁSICO Francisco Vicente – UEM A consciência fonológica é referida na literatura sobre o assunto como importante para a aprendizagem da literacia. Nesta investigação, é avaliada a consciência fonológica e os desempenhos ortográficos de crianças moçambicanas do ensino básico, falantes do Português como L2. As suas línguas maternas são do grupo Bantu. Estas línguas, ao contrário do Português, apenas têm formatos silábicos do tipo Consoante-Vogal, não integrando na sílaba encontros consonantais / Ataques ramificados (CCV) e Codas (CVC). Assim, nesta investigação, avalia-se, em L2, o efeito desta propriedade da língua materna dos sujeitos na segmentação silábica e na grafia de palavras com sílabas complexas, formatos silábicos inexistentes na sua língua materna. Tal é feito tomando como base estudos sobre a língua materna que mostram a dificuldade que as crianças têm de manipular sílabas complexas em tarefas de consciência fonológica e de grafá-las durante o processo da aprendizagem da ortografia. Relativamente à consciência fonológica, os resultados obtidos nesta pesquisa, recolhidos com o recurso ao software E-prime, mostraram que, ao contrário dos achados em estudos sobre a língua materna, o desempenho dos sujeitos na tarefa de segmentação silábica não é afectado pelo formato silábico do estímulo em causa, mesmo tratando-se de um formato silábico inexiste na língua 453 454 materna. Tal foi notado apenas na segmentação silábica de Ataques, ficando para pesquisa posterior a avaliação da manipulação de Codas. Como explicações possíveis destes resultados, contrários ao esperado, pode-se referir que (i) as crianças processam o Ataque ramificado (CCV) como um único segmento, na sequência de imaturidade fonológica; (ii) dado que as línguas maternas dos sujeitos avaliados só possuem Ataque não ramificado (CV), há um efeito desta exclusividade do Ataque na língua materna, o que impede ainda as crianças de processarem as diferenças na L2 entre Ataque não ramificado (CV) e Ataque ramificado (CCV); (iii) as crianças são bilingues, logo, são mais bem sucedidas em (algumas) provas de consciência fonológica do que as crianças monolingues. Os resultados sobre os desempenhos ortográficos dos sujeitos, recolhidos com base num ditado de imagens, ainda estão a ser analisados, esperando-se que estes fiquem disponíveis para apresentação na conferência. PRODUÇÃO TEXTUAL NO ENSINO E NA AVALIAÇÃO DE PLE: PARALELO ENTRE O LIVRO DIDÁTICO E O EXAME CELPE-BRAS Rosana Salvini Conrado – USP Num cenário globalizado, em que a língua portuguesa é vista por muitos como um meio de acesso a um país em plena expansão econômica, como o Brasil, identifica-se entre as principais necessidades dos aprendizes de PLE o estabelecimento, num curto período de tempo, de uma comunicação eficiente que lhes habilite para um intercâmbio cultural e econômico com o país, bem como para a vivência plena em sua sociedade. Essa nova realidade pode exigir a certificação da proficiência, que se dá por meio do Exame Celpe-Bras. Considerando-se esse aspecto, é importante avaliar o processo de preparação dos candidatos ao exame, que pode se dar de diversas formas, individual ou coletivamente, em cursos presenciais ou à distância, e do qual podem fazer parte materiais diversos, entre eles os livros didáticos. Este estudo parte da pesquisa exploratória, que se insere no quadro da Linguística Aplicada, em que se adota como procedimento a análise qualitativa de materiais impressos, destinados ao ensino e à certificação de proficiência em Português Língua Estrangeira (PLE). Entre esses materiais estão três livros didáticos (LDs) e seis edições do exame Celpe-Bras. Ainda que os LDs nem sempre se destinem à preparação para o exame, a escassez de recursos específicos para esse fim pode levar o professor e os aprendizes/examinandos a escolher os materiais aqui analisados. A escolha pelo material impresso, inicialmente não analisado no contexto sala de aula, deve-se à necessidade de um olhar direcionado ao seu conteúdo, com vistas a identificar as formas de apresentação e abordagem dos textos que o constituem. Como os textos caracterizam-se como exemplos de representação social, cultural e ideológica privilegiamos a análise dos que podem ser classificados como autênticos, do ponto de vista da produção original, na medida em que são amostras da língua em uso, materializadas em exemplares de gêneros discursivos que circulam socialmente. Em resumo, mostramos o levantamento dos gêneros discursivos utilizados como recursos didáticos, distinguindo os exemplares autênticos, do ponto de vista da produção social, dos que foram produzidos pelos próprios autores para fins estritamente didáticos, aqui chamados de não-autênticos. Recortamos os textos/atividades que conduzem à leitura e à produção textual com a intenção de analisar a forma como esses textos são apresentados e que atividades são desenvolvidas a partir deles. Recortamos também os textos e atividades que orientam, especificamente, à produção textual, a fim de analisar a abordagem, as habilidades envolvidas e a correspondência existente entre elas e as avaliadas pelo exame. Nesse confronto, nossa intenção é verificar se as propostas dos LDs podem habilitar os aprendizes a uma proficiência satisfatória, no que diz respeito à produção de textos escritos, o que pode beneficiar também os candidatos ao Celpe-Bras. A fim de articular LDs e exame, propomos atividades que visam ao desenvolvimento da produção escrita de gêneros relacionados a diferentes esferas sociais, por meio de uma abordagem discursiva, em que se destacam finalidades comunicativas específicas. 454 455 PREPARATÓRIO PARA O CELPE-BRAS: ENSINO DE PLE TOTALMENTE A DISTÂNCIA Ana Luíza Gabatteli Vieira – UnB A popularização da internet e o desenvolvimento das tecnologias da informação e comunicação reformularam as relações entre alunos e professores e a concepção de sala de aula ao diversificar os espaços de construção do conhecimento. Considerando esse novo paradigma e o aumento significativo de estrangeiros à procura de comprovar seu conhecimento por meio do exame CelpeBras (Certificado de Proficiência em Língua Portuguesa para Estrangeiros), este trabalho visa à apresentação de um curso preparatório para o Celpe-Bras totalmente a distância. Esta proposta vai ao encontro da crescente procura por cursos mediados por computador, devido a sua característica flexível, que se adequa às características individuais dos aprendizes. Para isso, a construção desse curso será baseada em uma perspectiva pedagógica que busque novas alternativas à simples digitalização de livros e apostilas para o novo ambiente de aprendizagem e que prepare os candidatos/aprendizes a serem capazes de utilizar a Língua Portuguesa nos mais diversos contextos socioculturais brasileiros. ELABORAÇÃO DE LIVROS DIDÁTICOS PARA ENSINO DE PORTUGUÊS COMO SEGUNDA LÍNGUA PARA OS ÍNDIOS MUNDURUKÚ Tânia Borges Ferreira – UnB Nathalia Martins Peres Costa – UnB O povo Mundurukú residente do Pará apresenta realidades sociolinguísticas diversas, mas mesmo assim a língua Mundurukú é preservada, sendo a língua materna e, em alguns casos, a única. Considerados um povo guerreiro, lutam para manter sua autonomia em relação à cultura do nãoíndio. Uma das maneiras reconhecidas por eles de preservar sua cultura e identidade é por meio da educação, preocupando-se com uma proposta de escola que permita ao seu povo usufruir dos avanços técnicos e científicos externos sem perder sua identidade. Para concretizar seus ideais, em 2007 foi implantado o Ensino Médio Integrado ao Ensino Profissionalizante em Agroecologia, Enfermagem e Magistério, que tem como objetivo oferecer um ensino diferenciado e eficiente para os futuros profissionais que beneficiarão de forma direta a vida na aldeia. O ensino médio é dado por professores não-índios em Português e que contam com o auxílio de professores indígenas, que explicam os conteúdos também em Mundurukú. Como as leituras especializadas são feitas em Português, se faz necessário o ensino dele como língua funcional, porém mantendo-o como segunda língua. Com o objetivo de contribuir para o ensino do Português como Segunda Língua, surge o projeto de criação de seis livros didáticos para o ensino de Português dos alunos do ensino médio, sob a responsabilidade do Prof. Dr. Dioney Moreira Gomes (UnB). A metodologia segue uma perspectiva linguística e de letramento, de forma que os conteúdos abordados estão focados em desenvolver as habilidades textuais e discursivas, visando um maior domínio da leitura e da escrita de seus alunos. Para que esse objetivo seja atingindo, as atividades serão desenvolvidas focando os gêneros textuais fundamentais às suas necessidades e práticas sociais, abordando os aspectos gramaticais de forma reflexiva e contrastiva inseridos no uso da língua e realização nos diversos gêneros. O primeiro volume já foi publicado e trabalhado com os alunos, gerando reflexões para a elaboração dos demais. O conteúdo a ser abordado integrará o objetivo de promover a leitura e a escrita com o objetivo de promover as áreas técnicas abordadas no Ensino Médio Integrado (agrofloresta, enfermagem e magistério). Para tanto, serão usados textos dessas áreas, os quais serão explorados, assim como os demais textos, tomando como suporte a matriz de referência do Sistema de Avaliação de Educação Básica (SAEB), do Ministério da Educação. O objetivo de ensinar Português como Segunda Língua é proporcionar aos índios o direito ao bilinguismo pluralista e 455 456 funcional (cf. GOMES 2009), que se faz necessário em contextos específicos, como, por exemplo, solucionar problemas de ordem administrativa ou política. Assim, o Português deve atuar como uma língua funcional, continuando o Mundurukú como língua materna. O DISCURSO DOS MATERIAIS DIDÁTICOS DE ENSINO DE PLNM PARA CRIANÇAS E ADOLESCENTES EM MACAU NA CONSTRUÇÃO DE UM LETRAMENTO INTERNACIONAL EM LÍNGUA PORTUGUESA Roberval Teixeira e Silva – UMAC/AILP Este trabalho é caracterizado principalmente pela voz de um professor, em diálogo com outros educadores. Primeiramente, eu vou compartilhar a rota que eu fiz na Ásia: esta aventura de caminhar em diferentes ambientes culturais. Este percurso tornou-se um rico contexto de aprendizagem, ensino e pesquisa. Nesse trabalho, vou discutir um recorte de dados constituídos como instrumentos-lugares pedagógicos provenientes de materiais utlizados para o ensino de Português como língua não-materna (PLNM) para crianças e adolescentes em Macau. Desse material, vamos discutir a construção da imagem da língua e dos países de língua portuguesa, considerando que esta língua tem adquirido nesses últimos anos cada vez mais projeção mundial. Nesse sentido, trabalharemos no contexto do que vamos chamar de letramento internacional do português. Materiais didáticos são discursos eivados das ideologias, valores, crenças das sociedades onde são gerados e, assim, para nós, especificamente, apontam os diferentes lugares que são reservados para as culturas e línguas dos países de língua portuguesa. Observamos que, entre outras possibilidaes, podem ser o lugar do encontro e do desencontro entre sujeitos, línguas e culturas que por questões históricas, sociais e econômicas estão em contato em Macau. No processo de formação de novas gerações de falantes de língua portuguesa, entender esse idioma com a sua dimensão e projeção no mundo é fundamental não apenas para o apresentar em seu status atual, mas para debater a dinâmica sociocultural por que passam as sociedades e línguas. Dar oportunidade de construção dessa visão é criar espaço para a reflexão e elaboração de um olhar mais sofisticado desses jovens sujeitos para a língua que aprendem. Para analisar esses materiais, vou trabalhar a partir da perspectiva da Sociolinguística Interacional(TEIXEIRA E SILVA, 2012, 2011, 2009, 2008; GUMPERZ, 2008, 1982, 1991; RIBEIRO E GARCEZ, 2002; SCHIFFRIN, 1994, 1996; GOFFMAN, 1959, 1967, 1974), um campo interdisciplinar que interrelaciona cultura, discurso e sociedade em uma proposta de análise do discurso. Lançaremos mão também de conceitos importantes na discussão dos contatos entre sujeitos, culturas e línguas como o de (pós)multiculturalismo (MOREIRA, 2002; VERTOVEC, 2010) e o de superdiversidade (BLOMMAERT & BACKUS, 2011; VERTOVEC, 2007). 456 457 SIMPÓSIO 42 GRAMATICALIZAÇÃO E TEXTO: DESCRIÇÃO E APLICAÇÃO Este simpósio objetiva reunir trabalhos de pesquisadores interessados em analisar processos de variação e mudança linguística em textos ou sequências textuais argumentativas. Para isso, partimos de uma concepção que considera a língua em uso e a gramática como um sistema (HALLIDAY; MATTHIESSEN, 2004) sujeito às pressões do uso e às necessidades comunicativas. O texto, verbal e escrito, é compreendido como instanciador do sistema linguístico e capaz de oferecer pistas concretas de processos de variação e mudança em curso na língua. Neste simpósio, tais processos serão vistos a partir dos pressupostos da gramaticalização, compreendida como a mudança pela qual itens e construções lexicais assumem em certos contextos linguísticos para desempenhar funções mais gramaticais, ou, quando já gramaticalizadas, continuam a desenvolver novas funções gramaticais (HOPPER; TRAUGOTT, 2003). Trata-se de um fenômeno que não ocorre com palavras isoladas, mas envolve toda a construção à sua volta (BYBEE, 2010). Espera-se que os trabalhos aqui apresentados evidenciem especialmente fenômenos de gramaticalização em textos ou sequências textuais escritas de base argumentativa. Tais considerações poderão ser abordadas a partir de duas perspectivas, complementares ou isoladas: a perspectiva descritiva e/ou a aplicada. COORDENAÇÃO Madalena Teixeira Instituto Politécnico de Santarém/Universidade de Lisboa [email protected] André Luiz Rauber Universidade Federal do Mato Grosso [email protected] 457 458 A MULTIFUNCIONALIDADE DO ITEM “ATÉ” EM BLOGS BAIANOS: UM CASO DE GRAMATICALIZAÇÃO Geliane Fonseca Alves – CAPES/UESC A gramaticalização é um processo de mudança linguística segundo o qual categorias lexicais passam a funcionar como categorias gramaticais, e/ou categorias gramaticais passam a ser mais gramaticais; conceito esse assumido por Kurylowiscz, 1975; Heine et alii, 1991; Hopper e Traugott, 1993 (apud CEZARIO, 2012, p. 22) e Martelotta, Votre e Cezario, 1996. Com o intuito de pesquisar sobre esse tipo de processo na língua portuguesa, elegemos o item “até”, pois, em situações reais de fala, ele tem assumido funções sintático-semânticas variadas, tais como preposição, função prototípica com significado +concreto; operador argumentativo e marcador discursivo, com significado +abstrato, evidenciando, assim, uma escala de abstratização que vai em direção ao discurso e à argumentatividade. No propósito de constatar essa multifuncionalidade, escolhemos, como corpus, blogs baianos, por serem textos escritos que trazem em suas estruturas características da oralidade, pois se tratam de produções que relatam o cotidiano dos blogueiros, seus pensamentos, desabafos e opiniões sobre temas diversos. Acreditando que a mudança atinge também a língua escrita, propomos a investigação no sentido de comprovar que a multifuncionalidade do “até” é decorrente dos usos variados que os falantes fazem deles em suas práticas comunicativas. Reconhecer e entender as novas funções assumidas por tal item, em particular, possibilita contribuir com as práticas de análise linguística, que, tradicionalmente, têm como base as gramáticas normativas, que, por sua vez, não têm a pretensão de dar conta das amplitudes funcionais das palavras. GRAMATICALIZAÇÃO: UM ESTUDO DA CONSTRUÇÃO “CHEGAR + (A) + V2”A PARTIR DO GÊNERO NOTÍCIA Elizene Sebastiana de Oliveira Nunes – UFMG Sueli Maria Coelho – UFMG Motivadas pelo fenômeno dinâmico de variação e mudança das línguas, nosso objetivo, neste estudo, é investigar construções com o verbo chegar, observando o fenômeno da gramaticalização. Segundo Cunha (1992), o verbo chegar tem sua origem no verbo latino plicare e significava “dobrar”, “enrolar”. No processo de evolução semântica, esse verbo parece ter passado a ser utilizado mais comumente com o significado de vir, ou melhor, com a ideia de deslocamento de um ponto X a um ponto Y. Entretanto, uma simples e rápida investigação linguística, principalmente na linguagem em uso e/ou em corpora de referência, nos permite detectar outras acepções para esse verbo, que tem sido recorrentes no português brasileiro. Partindo dessa constatação, o presente trabalho, que faz parte de um estudo mais amplo sobre a construção “chegar + (a) + V2)” no português brasileiro, tem por objetivo investigá-la a fim de identificar seu grau de gramaticalização e a fim também de identificar a existência de valores modais e/ou aspectuais marcados nessa construção. Como dito, essa investigação se dará sob a perspectiva do processo de mudança linguística conhecido por gramaticalização e para medir o grau de gramaticalidade da perífrase/construção serão utilizados os critérios de auxiliaridade mais recorrentes nos autores que os abordam, conforme elencados por Fonseca (2010). Entende-se que essa construção é utilizada para expressar valores que nem o verbo chegar nem o outro verbo (V2) poderiam expressar sozinhos. Para consecução dos objetivos propostos, utiliza-se como corpus 1.500 dados oriundos do gênero notícia, coletados a partir da busca pela fórmula “cheg*” no Corpus do Português (www.corpusdoportugues.org). Os dados referentes ao gênero notícia neste Corpus são todos datados do século XX. O Corpus do Português foi organizado por Mark Davies e Michael Ferreira, em 2008, e está disponibilizado online. Após a organização dos dados, serão quantificadas as 458 459 ocorrências do verbo chegar conforme suas diferentes acepções contextuais e serão analisadas quali-quantitativamente as ocorrências da construção em estudo. UM ESTUDO DO PORTANTO COMO MARCADOR DE CONCLUSÃO TEXTUAL Cristina Lopomo Defendi – PG/USP/IFSP Em minha pesquisa de doutoramento sobre processos de conclusão em textos argumentativos, foi possível constatar que o elemento marcador de conclusão portanto apresentou uso muito frequente nos textos analisados. Sua função de marcador de conclusão textual chama atenção tanto nos textos considerados melhores (33,2%) quanto nos considerados piores (38,6%) no processo seletivo da Fuvest (Fundação para o Vestibular da Universidade de São Paulo – USP). Também é um uso frequente, ainda que em menor proporção (18,7%), nas redações escolares que compõem o material de controle. Essa constatação permitiu considerá-lo o marcador típico de conclusão no texto dissertativo-argumentativo escolar do PB. Adicione-se a isso o fato de que nem todos os autores, tais como Neves (2000), consideram-no uma conjunção. Assim, a funcionalidade dessa construção no contexto em questão revelou necessária uma investigação de seu uso ao longo da história do português de modo a favorecer o reconhecimento das variações e mudanças pelas quais vem passando. Para tanto, optou-se pela referendação histórica em um corpus diacrônico amplo e variado em gêneros, já que não se pode recuar no tempo em busca de materiais similares ao gênero textual escolhido, a redação de vestibular, um texto que se torna comum a partir da segunda metade do século XX apenas. Decidimo-nos por um que traz textos literários, documentos históricos e outros gêneros textuais escritos. Nesta comunicação, serão apresentadas (i) a etimologia da construção conclusiva instanciada por portanto; (ii) o portanto nos dicionários de língua portuguesa; (iii) considerações históricas e comportamento do portanto em variedades do português culturalmente diversas da do Brasil (PB): o português de Portugal (PE) e o de Macau (PM); (iv) pesquisa diacrônica em corpus de textos literários e documentos históricos e religiosos, tanto do português brasileiro (PB) quanto do português de Portugal (PE) e (v) aplicação de testes ao portanto segundo os parâmetros propostos por Lehmann (1985 e 2002), os critérios propostos por Kortmann (1997) e os testes aplicados por Neves (2002) e Pezatti (2002). Como resultado, constatou-se que o portanto passa por uma transferência metafórica de conjunção para marcador conclusivo, bem como uma mudança metonímica de advérbio para conjunção, sendo que isso ocorre no texto dissertativo-argumentativo. Justamente por esse comportamento com padrões funcionais distintos, o portanto encontra-se em graus variados de gramaticalização, dependendo do uso que for analisado. A GRAMATICALIZAÇÃO DE “SENDO QUE” NO PORTUGUÊS DO BRASIL E DE PORTUGAL Madalena Dias Teixeira – IP-Santarém/CEAUL André Luiz Rauber – UFMT/PGS-USP/CAPES Estudos de gramaticalização, como sugerem Hopper e Traugott (2003), têm demonstrado que algumas construções copulativas passam a funcionar como conectivos mais gramaticalizados em alguns contextos linguísticos. Essa é a hipótese que pode ajudar a explicar os usos da construção SENDO QUE no português do Brasil (PB) e de Portugal (PP). Para comprová-la, partimos de uma análise diacrônica de textos dos séculos XIII a XX, extraída do Corpus do Português de Davies e Ferreira (2006) e do corpus histórico organizado por Tarallo (1991). Encontramos registros de SENDO QUE já no século XVI no PP, introduzindo oração subordinada e com função de conjunção causal e/ou concessiva, funções estas já identificadas, por exemplo, por Ribeiro (1950 [1890]) e Simões (2007). A partir do século XX, contudo, observamos que SENDO QUE parece assumir 459 460 também o papel de uma espécie de distribuidor e/ou delimitador da informação apresentada na oração anterior, desempenhando, assim, uma função partitiva. Verificamos que sequências argumentativas favorecem o emprego dessa construção, mas ainda não sabemos se é fator condicionante para sua ocorrência. Assim, neste simpósio, apresentaremos alguns dos resultados de análises diacrônicas do PB e do PP que pretendem dar conta da hipótese do desenvolvimento de uma função partitiva com base em SENDO QUE. Para isso, empregamos uma perspectiva funcionalista, que considera os processos de variação e mudança linguística, via postulados da gramaticalização (LEHMANN, 2008, 2011; BYBEE, 2010; TRAUGOTT & DASHER, 2005). A metodologia adotada compreende as análises quantitativa e qualitativa dos dados. O estudo contrastivo e/ou comparativo das duas variedades do português possibilitar-nos-á uma visão do percurso semântico e funcional dessa construção ao longo dos últimos séculos e as implicações linguísticas e cognitivas envolvidas nesse processo. TUDO O QUE EXISTE, DESDE MARAVILHAS A CATÁSTROFES, É RESULTADO DE ALGUM TRABALHO, UMA VEZ QUE ELE NÃO SE LIMITA APENAS AO HOMEM, MAS, SIM, A TODO O UNIVERSO: O PAPEL DA CORRELAÇÃO INOVADORA, UM EXERCÍCIO COGNITIVO Marcello Ribeiro – USP-PG/UNINOVE/UNIP O objetivo desta pesquisa dedica-se ao estudo dos pares correlatos: NÃO...MAS, elementos linguísticos mobilizados a fim de construir uma argumentação sofisticada com a intenção de convencer o outro que lê o texto, empregados em redações de vestibulares, momento em que a pressão pela normatividade é bem grande. Entretanto, escreventes habilidosos se utilizam desse par, de forma criativa, não rompendo com o processamento cognitivo esperado. Entendemos correlação como um processo de articulação de cunho funcionalista, partindo do princípio de que existe “uma relação entre dois pares, em que o primeiro item serve de gatilho para o segundo, que seria psicológico” (LIMA-HERNANDES E BARROZO, 2010), termos interdependentes, em que “ao mencionarmos o primeiro termo, somos obrigados a mencionar o segundo” (OITICICA,1952). Ao expressar aquilo que pensa, o falante alavanca conhecimentos compartilhados, em que o modo de comunicação pragmático é acionado, mas não sem antes passar pelo revestimento sintático, em que “possíveis estruturas linguísticas congeladas são ativadas” (GIVÓN, 2011), e provavelmente adaptadas por meio de uma aprendizagem intencional (TOMASELLO, 2005). O corpus de análise foi constituído de 700 redações elaboradas por candidatos da FUVEST (Fundação para o Vestibular de São Paulo), entre os anos de 2004 a 2010. Para essa pesquisa, os princípios funcionallistas de iconicidade e plano discursivo, auxiliarão na compreensão do comportamento do par correlato não...mas, em questão. PROCESSOS COGNITIVOS (METONÍMICOS E METAFÓRICOS) ATRIBUÍDOS À GRAMATICALIZAÇÃO DA ESTRUTURA ‘FORA+QUE’ EM TEXTOS DE MODALIDADE ORAL E MIDIÁTICOS. Lídia Spaziani – USP-PG/UNINOVE/UNIP Esta pesquisa possui dois focos como seus objetivos: identificar o gatilho social/cultural e evidenciar o processo de gramaticalização da construção/item FORA+QUE. As constantes mudanças provenientes da função pragmática da língua nos impulsionam ao estudo de itens/construções (NOEL, 2007) emergentes na língua oral e recorrente na língua escrita midiática informal que mencionam os grupos minoritários, tais como o grupo dos ciganos. Para evidenciarmos o deslizamento gramatical que ocorre na estrutura “fora + que” levamos em 460 461 consideração os processos cognitivos por meio de estágios de mudança e seus mecanismos metafóricos e metonímicos (GONÇALVES; LIMA-HERNANDES; CASSEB-GALVÃO, 2007). Esses processos iniciais são acompanhados das motivações de mudança, a saber: reanálise, analogia e as relações icônicas, como afirma Haiman, 1985 (GONÇALVES; LIMA-HERNANDES; CASSEB-GALVÃO, 2007:51): um signo complexo representa um conceito também complexo. Com olhar voltado para o aspecto social e cultural, o “fora+que” é foco de análise por seu componente semântico, discursivo e gramatical no qual será analisado, pois como afirma Halliday (1978) é impossível conceber a língua oral ou escrita sem notar seu desenvolvimento ao redor, a partir e dentro do fato social, ou seja, o funcionamento da língua é efetuado dentro da sociedade. 461 462 SIMPÓSIO 43 DEMONSTRAÇÃO DA IDENTIDADE IDIOMÁTICA DO POVO (GOIANO) E HISTORIOGRAFIA LINGUÍSTICA A conceituação de norma, inicialmente estabelecida por Eugenio Coseriu, estende-se por uma vasta discussão diatópica, diastrática, diafásica etc. Cada grupo: família, local de trabalho, cidade, estado, classe social, grupo intelectual ou profissional, apresenta uma norma linguística especificamente sua. A configuração nacional desse fator é a existência de diferentes normas num mesmo espaço territorial. No Brasil, tal como exemplo, têm-se falares (variantes normativas) diferenciados em cada Unidade Federativa. Assim como, em cada Unidade Federativa, podem ser encontradas muitas variantes normativas regionais e locais. O tempo se configura no melhor elemento de institucionalização normativa. O isolamento de um povo causa arcaizamento da língua falada. Dessa forma é que o português do Brasil é arcaico em relação ao de Portugal; o do Nordeste Brasileiro é arcaico e conservador em relação ao do Sudeste; a região do Goiás permaneceu, por muito tempo, praticamente isolada do resto do país; isso num período ainda recente. Para não mais confundir o falar goiano como parte da variante caipira, para não mais afirmar que o goianos fazem isso ou aquilo em suas falas como os mineiros o fazem, ou como os paulistas o fazem, ou como os baianos o fazem. Concebe-se: do modo como toda língua é, pura em si mesma, como unidade de misturas, também é o falar goiano, com sua identidade idiomática pura, recortada da fala de tantos homens e mulheres que chegaram em Goiás, vindos de outras falas e de outras línguas. Esse simpósio tem por objetivo apresentações que reforcem o caráter da individualidade grupal idiomática, seja baseada em elementos diatópicos, diastráticos ou diafásicos. COORDENAÇÃO Sebastião Elias Milani Universidade Federal de Goiás [email protected] Daniel Marra da Silva Instituto Federal do Tocantins [email protected] 462 463 DO DICURSO HUMORÍSTICO AO DISCURSO DIDÁTICO José de Sousa Silva – UFG/UL À Semiótica interessa o humor enunciado em textos e em imagens. Enquanto objeto semiótico, o humor caracteriza-se como prática social e como tal, também é uma prática semiótica. Considerando-se a perspectiva semiótica de abordagem greimasiana, pode-se dizer que o humor possui um valor modal e outro descritivo. Seu valor modal é descrito como um fazer-rir, ou seja, um enunciado cujo objeto-valor a ser conjungido ao destinatário é um estado, portanto, fazer-rir equivale ao fazer-ser. Dito de outra maneira, enquanto desdobramento de uma modalidade factiva, o fazer-rir caracteriza-se como um fazer operatório que visa modificar o estado de outrem através de um fazer capaz de conjungir esse outro a um objeto tímico, o rir. Já o seu valor descritivo é notadamente subjetivo por se tratar de um estado de alma. Porém, ao considerarem-se os sujeitos ao nível do discurso (sujeito pragmático e sujeito cognitivo) devem-se distinguir o valor de uso do humor do seu valor de base. Assim sendo, o humor assume o valor de base quando o rir do sujeito cognitivo é o fim último ao qual se propõe o sujeito pragmático e assume o valor de uso quando o rir é o instrumento do qual o sujeito pragmático se serve para alcançar outro fim que não apenas o rir despretensioso do sujeito cognitivo. Se este outro fim for dotar o sujeito cognitivo de uma competência pode-se falar de uma didática do discurso humorístico, pois não se trata apenas de uma persuasão, mas do que Greimas chamava de competencialização. Aliás, o interesse de alguns professores de língua hodiernamente visa essa dotação de competência através do humor. Portanto, o humorista pode visar o ser (estado de espírito) ou o fazer (ação eventual) de outro sujeito. Para demonstrar esta tese, recorreu-se a textos nos quais o sujeito do fazer serve-se da variação diatópica do seu próprio povo (o chamado goianês) como tema autoderisório ao mesmo tempo em que seu fazer empresta um valor ético a sua variação regional a partir de uma deôntica particular. Ensina o falar de seu grupo linguístico como se tratasse de uma língua estrangeira, ou mesmo, estranha aos outros sujeitos fora de sua comunidade de fala, e para tanto assume o estilo de um lexicógrafo para o desenvolvimento de um programa narrativo de base. Os textos são caracterizados como humoresques, composições nas quais o senso de humor desponta como divertida, fantasioso e extravagante em vez de um senso de humor sarcástico, perspicaz e agudo marcado pelo sarcasmo, a ironia e a réplica. NORMA LINGUÍSTICA: DE HJELMSLEV A ATUALIDADE DA LÍNGUA PORTUGUESA Jonas Pereira Lima – ITOP Na perspectiva de reinterpretar os conceitos de língua e fala na teoria glossemática, o dinamarquês Louis Hjelmslev (1899-1965) desenvolveu três definições: como forma pura independentemente de suas realizações sociais e de suas manifestações materiais denomina-se esquema. Como forma material, isto é, atualização do aspecto social da língua, mas independente ainda dos traços pormenores de sua manifestação é chamado norma. Como um conjunto de hábitos adotados por uma comunidade linguística determinada e definidos através das manifestações observadas, constitui o uso. Nessa tricotomia hjelmsleviana, a principal dificuldade encontrada é a compreensão do conceito de norma em relação aos conceitos de esquema e uso. O conceito de língua desenvolvida por Ferdinand de Saussure aproxima-se aos de esquema e norma de Hjelmslev. Mas considera-se a norma como uma construção artificial derivada da realização funcional entre esquema e uso. Entre as três distinções hjelmsleviana, o conceito de norma foi o mais aceito pelos linguistas pós-Hjelmslev. Para o linguista romeno Eugenio Coseriu, a norma é um conjunto de realizações constantes e repetidas, de caráter sócio-cultural: não corresponde ao que se pode dizer, mas ao que já se disse e tradicionalmente se diz na comunidade idiomática. Para ele, a norma é 463 464 apreendida de forma imediata, conforme o grupo social de que o indivíduo faz parte e a região onde ele vive. Dentro de um mesmo sistema funcional pode-se identificar várias normas: no discurso familiar, no discurso popular, no discurso literário, na língua padrão, na lingua vulgar etc. Em língua portuguesa, o conceito de norma herdado de Hjelmslev, bem como de seu continuador Coseriu, foi aproveitado por alguns linguistas brasileiros. O gramático Evanildo Bechara aproveitou tal conceito, na perspectiva de desfazer as ideologias de inferioridade e superioridade linguística. Bechara foi um dos primeiros linguistas a apresentar a distinção entre norma culta e norma nãoculta no propósito de explicar que as duas distinções são modalidades constituídas do mesmo valor comunicativo, porém adequadas para uso em diferentes situações discursivas. O linguista brasileiro Francisco Borba empregou o conceito de norma herdado também de Hjelmslev. Para o linguista há realizações que são normais embora não pertencentes ao sistema da língua. Uma vibrante fonética, apesar de não alterar o sistema, pode caracterizar o falar de toda uma região. Nas regiões norte e nordeste, por exemplo, é comum, quando se fala espontaneamente, não se pronunciar o /r/ final das infinitivas, mesmo entre pessoas escolarizadas, como em cantar [cantá], vender [vendê], dividir [dividi] etc. Nessa perspectiva, a língua sendo um conjunto de possibilidades, a norma aparece como um dado número de realizações dela num momento e lugar. O linguista Marcos Bagno embasado nas concepções hjelmsleviana de língua como forma pura, conjunto de hábitos e forma material desenvolve uma abordagem teórica do conceito de norma para discutir o conflituoso problema da distinção entre norma padrão e norma não-padrão da língua. Assim, o linguista rompe com as teorias clássicas que considera a norma padrão como única modalidade a ter existência numa língua e, consequentemente, defende a emancipação da norma não-padrão como modalidade a possuir estrutura gramatical igual à norma padrão, perfeita para a realização do repertório comunicativo. Vale, finalmente, ressaltar que a linguística moderna aproveitou, como axioma hjelmsleviano, apenas o conceito de norma. Mesmo passando por uma série de reformações, a essência do conceito permanece viva em pesquisas bem atuais da linguística moderna e contemporânea. A versão atual do conceito de norma tem sido um instrumento decisivo para as explicações das diferenças linguísticas e no combate ao preconceito linguístico. ALGUNS CONCEITOS LINGUÍSTICOS DA OBRA DE ÉMILE BENVENISTE EM LINGUÍSTICA GERAL Rômulo da Silva Vargas Rodrigues – UFG Émile Benveniste, linguista de origem síria, naturalizado francês, professor da École Pratique des Hautes Études, viveu de 1902 a 1976. Dividiu sua atenção ao longo da vida entre três importantes áreas dos estudos linguísticos, sendo igualmente bem sucedido em todas: gramática comparativa das línguas indo-europeias; estudos sobre a família de línguas iranianas; e a linguística geral. Em linguística geral seus estudos recobrem três quartos do século XX. Acontece que esse século foi, sem sombra de dúvidas, o período da história humana em que mais se produziu conhecimento sobre a linguagem. A partir da delimitação teórica da língua por Ferdinand de Saussure no início do referido século, os estudos avançaram intensamente, definindo-se outros objetos e outras ciências da linguagem além da linguística. Benveniste participou intensamente de todo esse processo. Seus artigos em linguística geral são publicados de 1939 a 1972. Dessa maneira, seus estudos parecem compor uma síntese do avanço linguístico do século XX. Neste ensaio se trabalham alguns conceitos que Benveniste utiliza em sua obra. Após um longo período de intensa produção de conhecimento nas ciências naturais, sem que se obtivesse o mesmo resultado nas humanidades, Saussure (1957-1913) provoca o que ficou conhecido como virada linguística. Ao definir teoricamente o que é língua, o estudioso providencia concomitantemente um método para estudos da sociedade, do homem em sociedade e dos fatos sociais em geral. Esse método, por sua vez, ficou conhecido como “estruturalismo”. Seu emprego possibilitou que as humanidades fizessem a troca do enfoque dedutivo para o enfoque indutivo. Ao invés de colecionar um grande número de indícios 464 465 dos quais se deduziam respostas nem sempre creditáveis, como se trabalhava em linguística histórica; a partir da delimitação de seu objeto, a língua, a linguística pode se concentrar no objeto, induzindo dele o conhecimento, sendo que, esse conhecimento poderia ser relativamente facilmente verificável no próprio objeto. Isso conferia à linguística o tão almejado estatuto de cientificidade. As humanidades, ao se utilizarem do método estrutural, poderiam ser consideradas científicas devido à possibilidade de comprovação e de afastamento do pesquisador. E assim foi durante a primeira metade do século XX. Benveniste começou seus estudos em linguística geral a partir da obra de Saussure, Cours de linguistique générale, publicada em 1916. Benveniste segue a linha estruturalista, aprofundando e desenvolvendo conceitos que haviam sido formados por seu antecessor. Sua obra, contudo, recobre todo o século XX, dando vistas e consubstanciando teorias linguísticas da língua, da enunciação e do discurso. Pois, Benveniste viveu e, de certa forma, fomentou a chamada virada discursiva do final do século. Dentre os conceitos aqui trabalhados da obra de Benveniste estão os de discurso e enunciação, o conceito de sujeito, o conceito de planos de enunciação, os conceitos de pessoa e não pessoa, o conceito de signo linguístico ampliado, os conceitos de sentido e significado, o conceito de semiótica, a frase como unidade semântica, e conceitos de contexto. LÉXICO RELATIVO ÀS PROFISSÕES DE TROPEIROS E CONDUTORES DE GADO EM TROPAS E BOIADAS, DE HUGO DE CARVALHO RAMOS Cristiano Curtis Eliassim – PMEL/UFG-Catalão É pacífico entre todos os estudiosos da língua a estreita relação existente entre esta e a vida social. A relação entre os seres humanos e destes com o mundo que o cerca é permeada pelos usos que fazem da língua, sobretudo nas formas de nomear objetos, ações, sentimentos, sensações. Ao encontrar uma pessoa, determinado grupo ou até uma comunidade que faça uso da língua, é possível observar e analisar as expressões e palavras utilizadas nas diferentes atividades. Desta forma, ao ler a obra Tropas e Boiadas, do escritor goiano Hugo de Carvalho Ramos, foi possível deparar com inúmeras expressões e palavras utilizadas para se referir ao trabalho com as tropas e boiadas. Partindo desta identificação, propomos um trabalho de análise do léxico referente às atividades profissionais na obra acima citada, levantando as palavras e expressões relacionadas aos cargueiros e às boiadas. Um estudo que se propõe analisar a língua deve considerar que os contextos socioculturais em que ela ocorre são elementos básicos, e, muitas vezes, determinantes de suas variações, explicando e justificando fatos que apenas linguisticamente seriam difíceis ou até impossíveis de serem determinados. No caso específico do léxico, toda a visão de mundo, a ideologia, os sistemas de valores e as práticas socioculturais das comunidades humanas são nele refletidas. Selecionamos para tal fim a obra Tropas e Boiadas, de Hugo de Carvalho Ramos, uma vez que ela propicia a análise de palavras e expressões que recobrem as atividades profissionais dos tropeiros e boiadeiros. Acreditamos que a obra em questão possibilita uma análise pertinente do léxico, uma vez que a mesma lida com as tropas e com as boiadas, destacando assim atividades de trabalho que nos permitem pensar na relação intrínseca entre léxico e cultura. Além disso, é uma obra salutar dentro da literatura brasileira, e, na perspectiva histórico-cultural muito tem a ser explorada. Entendemos que a obra de Hugo de Carvalho Ramos muito tem a contribuir para os estudos lexicais e muito pouco foi feito nesta perspectiva de análise. Analisar o léxico relativo às atividades profissionais em tal obra oportuniza uma elaboração de um glossário, que se faz muito pertinente num estudo como este, identificando palavras e expressões específicas das atividades profissionais e seus respectivos significados num contexto específico. Propomo-nos também a analisar questões culturais do povo apontadas na obra e a relação destas com a linguagem em uso nas narrativas, levantar os campos lexicais relativos às atividades profissionais para que se possa proceder a uma verificação de seus significados específicos no contexto, analisar os campos lexicais, considerando a recorrência dos itens no corpus, estreitamente relacionada às atividades 465 466 profissionais dos tropeiros e boiadeiros, elaborar um glossário partindo dos campos lexicais levantados, com a intenção de sistematizar a lexicalização na obra em análise. A elaboração de um glossário nos permitirá melhor compreender os textos narrados, descrevendo situações distintas de usos da língua e possibilitando analisá-las de forma mais detalhada, em especial no que se refere ao léxico relativo às atividades profissionais. Destacamos que tal glossário agrupará os elementos lexicais que se referem aos cargueiros e às boiadas, que compõe o foco da atividade profissional dos personagens desta narrativa. A CONSTRUÇÃO DO ATLAS LINGUÍSTICO DE GOIÁS - A MONONTOGAÇÃO DE ALGUMAS PALAVRAS NO FALAR GOIANO Patricia Veronica Moreira – UFG Primeiramente, o atual projeto ALINGGO (Construção do acervo audiovisual da língua falada em Goiás e execução do atlas linguístico de Goiás), lotado na Faculdade de Letras da Universidade Federal de Goiás, e coordenado pelo professor Dr. Sebastião Elias Milani, tem como objetivo final a elaboração do Atlas Linguístico. Entretanto, esta meta antecede o seguinte percurso que tem como principais objetivos: mapear fatos linguísticos fonético-fonológicos; descrever a realidade linguística de Goiás fornecendo elementos para compreensão desta; identificar mudanças linguísticas em andamento a partir da fala dos informantes; documentar a fala Goiana através da aplicação do questionário semântico-lexical e a coleta de narrativas pessoais e locais; entre outros. Desta forma, esta comunicação pretende fornecer dados linguísticos que demonstrem o acontecimento da monotongação, processo no qual consiste na supressão de semivogal em ditongos. Neste caso, tal supressão foi diagnosticada na fala de goianos. A monotongação, segundo Simões (2006), é um processo contrário à ditongação, ou seja, é uma redução do ditongo que perdeu sua semivogal, e passa a ter uma vogal simples no lugar. Como constata o autor, este processo pode ocorrer ou devido a uma variação fonética, ou como marca dialetal. Considerado como um processo natural na oralidade, buscamos identificar se a monotongação na fala Goiana acontece em ditongos crescentes e/ou decrescentes. Para tal, selecionamos uma série de entrevistas gravadas, no início de 2012 até meados de dezembro, que incluem homens e mulheres naturais das cidades de Goiás pesquisadas para o desenvolvimento do projeto, ou que tenham vivido pelo menos 2/3 de suas vidas nos locais. Além disso, os informantes escolhidos eram de faixa etária e escolaridades diversas, desde que tivessem acima de 18 anos. Finalmente, após a coleta das entrevistas, fizemos a transcrição fonográfica e fonética do Inquérito semântico-lexical, elaborando tabelas comparativas, o que nos possibilitou analisar e perceber este fato linguístico no falar Goiano. OS CONCEITOS DE LÍNGUA E DERIVA SOB A VISÃO DE EDWARD SAPIR Raquel Queiroz de Almeida – FL/UFG Sebastião Elias Milani – FL/UFG A língua é variável. Dois indivíduos da mesma geração e localidade, que falam precisamente a mesma língua e frequentam os mesmos círculos sociais, não possuem os mesmos hábitos linguísticos. Ao investigar minunciosamente a fala de cada um, seriam encontradas inúmeras diferenças, como na escolha de vocábulos, na estrutura das sentenças, na relativa frequência com que são usadas certas formas ou combinações de palavras, na pronúncia de certas vogais e consoantes ou combinações de certas vogais ou combinações de certas vogais ou consoantes. Assim, em todos esses aspectos, além da rapidez da elocução, a intensidade e a entoação é que encontramos o que dá vida à língua falada. 466 467 A língua não é apenas uma coisa que cresça no espaço, por assim dizer, uma série de reflexos nos cérebros individuais de uma mesma e única pintura situada fora do tempo. Ela move-se pelo tempo num curso que lhe é próprio. Tem uma deriva. Sapir (1971) afirma que ainda que não houvesse fragmentação das línguas em dialetos, ainda que cada língua persistisse em firme e inflexível unidade, estaria em constante afastamento de toda forma consignável, desenvolvendo incessantemente aspectos novos, transformando-se tanto em referência ao seu ponto de partida que teria de dar na realidade uma nova língua. A deriva da língua só pode existir a partir das variações individuais que caminhem para determinada direção. Essa deriva é criada a partir da seleção inconsciente dos que a falam, de variações individuais que se juntam numa dada direção. Os usos feitos no presente são continuações de alguns do passado e prefiguram tendências futuras. A língua está em constante deriva, mas nunca sem rumo, ela tem uma direção definida. O conhecimento da deriva geral de uma língua é insuficiente para vermos aonde vamos chegar. Temos também de conhecer um pouco a potência e velocidade relativa das forças componentes da deriva. O processo de surgimento do dialeto intermediário está relacionado com certos desenvolvimentos sociais, tais como o advento de uma nação, a formação de literaturas que não se contentam com uma mera repercussão local, o movimento das populações rurais para as cidades, e todas as outras tendências destruidoras do intenso localismo que o homem simples sempre considerou natural. Os dialetos são próprios de grupos sociais estritamente circunscritos, e com homogeneidade tal que lhes garante um sentimento e propósito comum, necessário para criar uma norma. A deriva fonética é de caráter mais geral. É óbvio que praticamente não é um movimento no sentido de determinado grupo de sons, senão no sentido de determinados tipos de articulação. Uma mudança fonética isolada, ainda que não provoque uma convergência de sons, é em regra ameaça de subversão para o padrão fonético anterior, porque cria uma desarmonia no agrupamento dos sons. A espécie de evolução sem prejuízo do padrão, ou com perda mínima para ele, é provavelmente a tendência mais importante dos sons linguísticos. A convergência e a “desintegração” fonética contrariam-na até certo ponto, mas de maneira geral tal tendência é o regulador central inconsciente da marcha e velocidade das mudanças fonéticas. De maneira geral, portanto, associa-se as principais concordâncias e divergências de forma linguística, padrão fonético e morfologia, com a deriva autônoma das línguas, sem complicá-la com os efeitos de uma difusão de caracteres fortuitamente acumulados ora num sentido, ora noutro. A EXECUÇÃO DO ATLAS LINGUÍSTICO DO TOCANTINS – ALINTO Daniel Marra – IFTO O estado do Tocantins oferece uma vasta e variada cultura popular; toda ela pouco conhecida cientificamente. A integração da região como polo turístico integrante da Amazônia Legal desperta o interesse para a valorização da forma de se expressar nesse território. A invasão turística, no entanto, embora positiva economicamente, traz consigo o preconceito relacionado à forma com que os nativos utilizam a língua. Daí, ser comum perceber os falantes dessa região questionando se a forma como comunicam linguisticamente é errada e se a forma como os visitantes fazem uso da língua é mais correta. A atração que exerce as formas de falar prestigiadas, veiculadas pela televisão e outros veículos de comunicação tendem a modificar o comportamento de resistência cultural típico. Vê-se a necessidade de posicionar um estudo que, no mínimo, garanta o registro do substrato linguístico-cultural, em forma descritiva, para as futuras gerações. O desenvolvimento do Atlas Linguístico do Tocantins nasce desse desejo de ver o capital linguístico dessa região registrado e revelado como um capital cultural constitutivo da identidade linguística do povo tocantinense. Desse modo, o projeto do ALINTO tem o ALINGO, cujas pesquisas já se encontram em estágio avançado, como seu gestador e parceiro nas pesquisas. Embora o estado do Tocantins tenha sido desmembrado do estado de Goiás a pouco mais de duas décadas, uma análise comparativa das 467 468 identidades linguísticas dos povos dos dois estados poderá mostrar mais diferenças que semelhanças, dadas as extensões de seus territórios. ATLAS LINGUÍSTICO DE GOIÁS – ALINGO Sebastião Elias Milani – UFG/FL Antes de iniciar o trabalho de elaboração do Atlas Linguístico de Goiás - ALINGO, fez-se uma preparação do grupo envolvido: aos pesquisadores coube um levantamento bibliográfico minucioso, dos Atlas da Bahia, da Paraíba, de Sergipe, do Paraná e do Brasil (ALiB), aos alunos entrevistadores, coube um treinamento sociolinguístico e fonético-fonológico, bem como da história do Estado. Após um período de assimilação das leituras básicas de treinamento sociolinguístico, chegou-se na hora de ir a campo. O primeiro trabalho foi fazer um levantamento topográfico da região a ser estudada, mapeando os espaços habitados, recolhendo informações sobre esses habitantes. Quando já se sabia o suficiente sobre a região, suas estradas, suas características de relevo, de pluviosidade, e sobre seus habitantes, seus costumes, manifestações culturais, origens étnicas, sobrevivência, atividades econômicas e distribuição econômica, estava-se pronto para começar a fase das entrevistas. A cada faixa etária foram selecionados no máximo seis informantes para cada município. Idade mínima do informante mais jovem é de 18 anos. Os critérios foram: ter nascido no município ou nas proximidades, ser filho de pais nascido na região ou que tenha se mudado para ali jovem; ter ali residido por pelo menos dois terços de sua vida; de formação escolar variada: de zero ano de escolaridade ao nível superior completo; estar em condições boas de saúde no aparelho fonador e mental; de ambos os sexos; profissões variadas. O contato com comunicação de massa foi considerado: Rádio, Televisão e Internet. Também foi considerado o contato com pessoas de outras localidades, como turistas e viajantes, que podia levar a exclusão do informante na pesquisa. A partir desse parâmetro, com a ajuda da Polícia Militar, foram encontrados e entrevistados pela equipe de pesquisadores os informantes que estavam mais próximos desse ideal. Foram feitos esforços para entrevistar pessoas em todas as faixas etárias e escolaridade, mas isso não foi possível na maior parte das localidades e nem era necessário, já que a amostragem no documento Atlas linguístico de Goiás - ALINGO é restrita a três informantes por localidade, sempre tomando a qualidade das respostas e a qualidade elevada das informações prestadas como critérios eletivos. A CULTURA FRONTEIRIÇA DO SUL DE GOIÁS: AS INFLUÊNCIAS RECEBIDAS DO TRIÂNGULO MINEIRO Isadora Massad Giani Pinheiro – UFG As fronteiras geográficas são linhas as quais representam limites político-sociais que foram definidas a partir defatores socioeconômicos, étnicos, geográficos e culturais, dentro de um contexto histórico específico de conquistas territoriais, conflitos entre diferentes poderes, etc. O bombardeio de informações, de tecnologias e a tentativa de se instaurar um padrão não são suficientes para apagar identidades a fim de implantar uma única, pelo contrário, muitas das vezes a globalização auxilia na difusão de diferentes fenômenos culturais, de maneira geral, das mais variadas regiões do mundo. Pode ser que haja uma apropriação cultural amena por certas regiões, mas o apagamento total de costumes tradicionais é muito difícil, obviamente que desconsiderando o processo colonizador que, muitas das vezes, tinha a aculturação como objetivo final, facilitando assim a exploração ou o povoamento de determinado local. É possível observar também que o limite fronteiriço pode não acompanhar as identidades de determinadas comunidades, ou seja, aqui começa uma identidade cultural e ela terá fim junto com a fronteira geográfica determinada, seja ela 468 469 municipal, estadual ou federal. Assim como acontece com as fronteiras linguísticas, o que permite a existência das isoglossas, que são linhas virtuais que limitam formas e expressões linguísticas, contrastando-se ou assemelhando-se, podendo ser diatópicas, diastráticas ou diafásicas. (FERREIRA & CARDOSO, 1994) Segundo Guazzelli (2003), as pessoas que vivem nas fronteiras podem desenvolver uma cultura fronteiriça particular, pois além da cultura de origem, do país, do estado ou do município que moram, podem adotar certos elementos do “outro”, até mesmo linguisticamente, no caso, incorporando em seu falar, expressões “estrangeiras”. Com vistas na imprecisão dos limites linguísticos e culturais, é possível observarmos uma influência, nesses âmbitos, do triângulo mineiro sobre o sul goiano, uma vez que as regiões possuem bastante contato entre si, além de terem um passado histórico semelhante em suas respectivas fundações. A pesquisa a ser desenvolvida a partir desse projeto visa o estudo da identidade cultural e linguística do sul do Estado de Goiás. Com isso, a identidade de tal região poderá será traçada a partir da observação de elementos constituintes, próprios de Goiás ou influência do triângulo mineiro, e da origem desses, através do percurso histórico do desenvolvimento urbano do local, desde os primeiros descendentes de europeus exploradores de terras, ou pelos bandeirantes exploradores dos recursos naturais, além de uma pesquisa de campo para uma observação empírica dos fenômenos propostos. A HISTORIOGRAFIA LINGUÍSTICA DO SIGNO NA LÓGICA DE FREGE Hilda Rodrigues da Costa – UFG O aparecimento de múltiplas abordagens, de bases diferentes, mas que tornam a linguagem processo e produto da atividade histórica do homem representam a filosofia de uma determinada época. Kuhn (1996, apud Moschetti, 2004, p. 46) argumenta que “a emergência de novas teorias é geralmente precedida por um período de insegurança profissional pronunciada, pois exige a destruição em larga escala de paradigmas e grandes alterações nos problemas e técnicas da ciência normal”. Essa insegurança, na visão do autor, muitas vezes é gerada pelos fracassos da ciência em produzir os resultados esperados, o que não fora diferente com Friedrich Ludwig Gottlob Frege. A presente comunicação objetiva traçar o percurso historiográfico linguístico do signo na lógica de Gottlob Frege, demonstrando por meio dos discursos historiográficos a relevância e a grandeza do pensamento fregiano, as contribuições para o campo da lógica e da filosofia da linguagem, a interação e a influência de sua obra em outros campos do saber. Buscaremos por meio da pesquisa historiográfica conhecer os fatores internos e externos que motivaram seu pensamento e sua busca pela verdade, bem como sua história social e a influência do contexto vivenciado por Frege no século XIX. Pois, mesmo sendo considerado um pensador contemporâneo, pouco se sabe sobre a vida e a dedicação de Friedrich Ludwig Gottlob Frege na busca pela verdade, os pensamentos que influenciaram seus estudos e delinearam suas investigações, abrindo novos roteiros através das discussões que desenvolve em torno das noções de verdade, negação, sentença, pensamento, asserção, etc. Nossa pesquisa será de cunho historiográfico, fundamentada nos discursos científicos de Kuhn (1996), Frege (1978), Lopes (2010), Biro (1995), Cordeiro (1974), Dorneles (1993), Fidalgo, (1998), Frege (1967, 1972, 1977), Hénault (2006), Klemke (1968), Pêcheux (1997), Peirce (1974), Tamba (2006), Thiel (s/d.), Winfried (2008), dentre outros. 469 470 SIMPÓSIO 44 LINGUÍSTICA HISTÓRICA E ONOMÁSTICA O simpósio Linguística Histórica e Onomástica reúne estudos da língua (portuguesa) numa perspectiva diacrônica, com ênfase nos tipos de mudanças de sons, na mudança gramatical, semântica e lexical, contextualizando a teoria linguística, sua terminologia e e a análise de dados. O escopo teórico fornece a base para a compreensão da natureza dessas mudanças, e a terminologia, com a aplicação de termos necessários para a explicação científica, possibilita perceber os progressos desses estudos. Nessa perspectiva histórica, os trabalhos versam ainda sobre a função e a significação dos nomes próprios, mais precisamente dos topônimos e dos antropônimos, seus aspectosgeográficos e culturais. Os nomes próprios (topônimos e antropônimos, entre outros) são de importância histórica fundamental para os estudos linguístico-históricos, das relações de grupos humanos, das intervenções políticas e da lei. O ato cultural de nomear estabelece uma relação social entre o espaço natural e o utente da língua. No contexto brasileiro, a relação nome (topônimos, antropônimos eoutros) e sua vinculação de identidade com o espaço, com os grupos humanos e processos migratórios são atividades de pesquisa que contribuem para os estudos inovadores dos nomes de lugares, de pessoas e das diversas coisas. Tais considerações também são aplicáveis a trabalhos voltados para as línguas de sinais. COORDENAÇÃO Maria Suelí de Aguiar Universidade Federal de Goiás [email protected] Maria Célia Dias de Castro Universidade Estadual do Maranhão [email protected] 470 471 TOPONÍMIA DO POVOAMENTO RURAL: OS CONTINUADORES DO LATIM QUINTANA E SEUS DERIVADOS Maria Alice Fernandes – UAlg Esperança Cardeira – UL Os topónimos com origem no latim QUINTĀNA e seus diminutivos e derivados têm um interesse muito particular para a história da língua portuguesa e para a história do povoamento rural. Relativamente à história da língua, estes topónimos permitem diferenciar domínios linguísticos ibero-românicos (através da conservação ou síncope do N latino intervocálico, e.g., quintana vs quintã), fornecer dados para o estabelecimento da cronologia da sua fixação (por meio dos sufixos diminutivos usados, e.g., quintela vs quintãzinha) e de mudanças linguísticas arcaicas (como a crase vocálica e a ditongação das vogais nasais finais, e.g., quintãã >quintã >quintão), demarcar áreas dialetais (através de variantes específicas de zonas ou regiões, e.g., quintã/s ~ quintã/ães; quintã/s ~ quintão/s) e ainda contribuir para o esclarecimento da difusão geográfica do galego-português a sul do Vale do Vouga e para a identificação da proveniência regional dos colonos. Quanto à história do povoamento rural, a revisão da sua etimologia e da sua evolução histórica, formal e semântica, no espaço e no tempo concorre igualmente para a caracterização das formas de ocupação e organização do território, através da discussão da função sócio-económica e da estrutura das propriedades por eles denominadas, e para o estabelecimento da sua fixação toponímica e da origem dos povoados que lhes conservam o nome. AS REGIÕES ADMINISTRATIVAS DE CAXIAS DO SUL: UM ESTUDO ONOMÁSTICO Vitalina Maria Frosi – UCS Este estudo é parte do Projeto Antroponímia/Toponímia da Região de Colonização Italiana do nordeste do Rio Grande do Sul (RCI) em execução na Universidade de Caxias do Sul (UCS). A pesquisa tem como tema os nomes das 4 regiões administrativas em que se divide o município. O objetivo principal é a descrição etimológica e a análise dos aspectos interdisciplinares envolvidos na história desses signos onomásticos, originados no contexto bilíngue, cultural e histórico-político da RCI. A categorização desses nomes próprios segue a taxionomia proposta por Dick (1992), adaptada à realidade brasileira e seguida, em sentido amplo, pelos estudiosos de toponomástica do Brasil. Servem de apoio os princípios teóricos de Dauzat, 1946; os estudos de Rossebastiano; Papa, 2005; Caffarelli; Marcato, 2008; Queirazza et al., 2006; Oliveira; Isquerdo, 2001; Seabra, 2007; Guérios, 1973; Andrade, 2010. A pesquisa é documental, seu desenvolvimento tem caráter qualitativo e aborda os denominativos oficiais; eventualmente, consideram-se também nomes populares de atribuição espontânea. A RCI é formada atualmente por 55 municípios, dentre eles Caxias do Sul detentor de um parque industrial de expressão no estado e no país. É uma cidade fundada por imigrantes italianos em 1875 e, de acordo com o último recenseamento do IBGE, de 2010, possui uma população de 435.564 habitantes. Procurou-se respostas a questões relacionadas à importância do estudo dos logradouros do maior centro urbano da RCI e investigou-se a motivação presente no ato denominativo. O tema foi considerado relevante, em particular, no que diz respeito à produção de conhecimento novo e à sua socialização na comunidade como um todo. Além disso, os resultados mostram sua importância na formação dos cidadãos, especificamente, no âmbito da educação formal, como acréscimo em áreas interdisciplinares. 471 472 NARRATIVAS SOBRE AMARO LEITE: RESGATE DE UMA HISTÓRIA Maria Geralda de A. Moreira – UEG Maria Suelí de Aguiar – UFG O presente estudo objetiva analisar nomes de lugares, especificamente de Amaro Leite, resgatando a história social contida no nome para compreender a história do lugar e de seu povo. Nesse sentido, torna-se nosso objetivo também conhecer o processo de criação e “desaparecimento” de Amaro Leite, cidade fundada por bandeirantes em 1742. De acordo com documentos oficiais e com as narrativas dos moradores do local, o nome Amaro Leite foi uma homenagem ao seu fundador, o bandeirante Amaro Leite Moreira, quem empreendeu várias expedições de busca e apreensão de índios, de exploração e de reconhecimento geográfico pelos sertões de Goiás, fundando numa dessas viagens tal localidade. Analisaremos, ainda, os processos que envolveram a transferência da sede do município de Amaro Leite para onde se encontra Mara Rosa. Essa transferência ocorreu em 1963. Esse estudo busca, além disso, compreender os motivos que levaram a essa transferência, bem como à alteração do topônimo Amaro Leite para Mara Rosa, uma vez que, em 1953, Amaro Leite foi elevado à condição de município e, em 1958, passou a ter sob sua jurisdição o distrito de Formoso, o que demonstra a importância e expressividade de Amaro Leite na região. No entanto, por motivos que pretendemos esclarecer, dez anos depois, ocorre à transferência e a alteração toponímica. Esse estudo se fez a partir das narrativas orais coletadas junto aos moradores de Amaro Leite em 1998, 1999 e 2001, de documentos do Arquivo Histórico de Goiás, além de outros acervos existentes nas cidades de Pilar de Goiás, Uruaçu e Anápolis. Apresentaremos, também, um levantamento dos topônimos das cidades de Goiás e Tocantins que tenham origem na ação dos bandeirantes, no mesmo período de surgimento de Amaro Leite, ou seja, o século XVIII. Com isso, possivelmente, evidencia-se que o uso do nome de bandeirantes para denominar as localidades pelas quais passavam, ou nas quais encontravam ouro, era algo comum e estava ligado à necessidade simbólica e efetiva de estabelecer domínio sob uma região que só passou a pertencer efetivamente a Portugal com o Tratado de Madrid, mas que despertava grande interesse da Coroa Portuguesa. A reconstrução da história do município de Amaro Leite esbarra em diversos problemas, como a falta de documentação e a dificuldade de localizar personagens relevantes dessa região, as quais, por meio de suas histórias de vida, poderiam contribuir para a reconstrução da história dessa localidade. Nosso estudo é parte do projeto “A linguística e a história de colonização de Goiás”, o qual vem se desenvolvendo desde 1997. Vale ressaltar que esse projeto se iniciou a partir de outro projeto, Filologia Bandeirante, coordenado pela Universidade de São Paulo. TOPONÍMIA PERNAMBUCANA: O PERCURSO DO VALE DO RIO IPOJUCA Ana Gabriela Braga – UFPE Sivaldo Correia da Silva – UFPE As pesquisas toponímicas têm sido de grande relevo na preservação de aspectos da cultura local. Isto é possível graças ao caráter singular do topônimo por permitir a superposição de camadas da história ao longo de um continuum denominativo. Os topônimos irão refletir não apenas a imediata referência do objeto a ser denominado com o seu ambiente, mas a visão de mundo do que é relevante para o sujeito denominador. Diacronicamente, o topônimo irá passar por processos de mudança. Segundo Dick (1999), o vocábulo teria sua estrutura alterada por fatores como a distância do local, tempo de nascimento e a fixação em pontos distintos do foco de origem, ocasionando a perda do sentido primeiro ou a incorporação de outros traços semióticos. Essas mudanças, embora por motivações variadas, inclusive decorrem de processos fonológicos que podem tanto ser recuperados através do conhecimento da forma primeira na língua de origem quanto contribuir para 472 473 a recuperação dessa forma primeira por meio de analogia com estruturas pertencentes à mesma língua ou família linguística. Assim, buscaremos neste trabalho traçar, do século XVIII aos dias atuais, os processos motivadores de topônimos de provável origem indígena ou africana que cortam o Vale do Rio Ipojuca até o município de Bezerros, investigando também processos fonológicos sofridos por alguns topônimos no continuum histórico. A tese de Capistrano de Abreu é de que Duarte Coelho teria como um dos objetivos de seu governo a exploração do Rio São Francisco, e para isso escolheu a via marítima, sendo o Caminho do Ipojuca um dos três roteiros de penetração no território pernambucano na segunda metade do século XVIII. Pretendemos compreender quais fatores linguísticos e culturais estariam em jogo neste processo de desbravamento e concomitante denominação, buscando traçar os perfis étnicos e linguísticos dos grupos que habitavam a região e dos exploradores. Pretendemos também analisar em que medida houve predomínio da toponímia portuguesa em relação à indígena e africana, em meio à variedade linguística da época. Classificaremos os topônimos de acordo o modelo proposto por Dick (1990), utilizando como fontes documentos históricos de roteiros e mapas do século XVIII e cartas atuais do IBGE. DA ETIMOLOGIA COMPARATIVA DO TOPÔNIMO CEARÁ E RORAIMA Fabricio Paiva Mota – IFRR/PPGL-UFRR Eliabe Procópio – UECE/PPGL-UFC Maria Odileiz Sousa Cruz – PPGL-UFRR Informações sobre a origem das palavras sempre despertaram interesse não apenas no âmbito acadêmico, mas também popular. Contudo, nem sempre o que se apresenta como estudo etimológico foi realizado com base em critérios científicos, principalmente quando se tratam de palavras oriundas de línguas indígenas, faladas e difundidas durante séculos, já que nem todas foram documentadas, muito menos estudadas. De modo particular, notamos que a etimologia relacionada aos topônimos da região Norte e Nordeste é muitas vezes opaca, pois, os registros foram feitos por viajantes que não dominavam as línguas locais, tendo por consequência a nomeação de um topônimo arbitrário e unilateral. Para este trabalho, selecionamos dois topônimos, representantes dessas regiões com a finalidade de apresentar uma definição etimológica para os topônimos Ceará e Roraima, revisar a literatura referente à etimologia indígena brasileira e formação lexical da língua portuguesa, mapear, cotejar e analisar definições ou menções do termo Ceará e Roraima nos corpora analisados, inventariar fontes confiáveis para pesquisa em toponímia indígena-portuguesa e, finalmente, demonstrar que é possível uma metodologia de pesquisa em etimologia indígena por meio do método histórico-comparatista. Metodologicamente, esta pesquisa tem dois vieses, um teórico e outro prático. No primeiro, revisamos as referências bibliográficas referentes à nossa temática (BRAGANÇA JÚNIOR, 1992; DICK, 1987; NOLL, DIETRICH, 2010; RAMOS, 1999; VIARO, 2011). Após cada leitura, procedemos com o resenhamento teórico a fim de selecionarmos embasamento teórico para pesquisa deste perfil. No segundo viés, está o lado prático de uma pesquisa documental recortada para este trabalho, a saber: fontes bibliográficas que apresentaram definições a respeito dos termos Ceará e Roraima (livros de história, textos literários, dicionários/vocabulários etimológicos de língua indígena e portuguesa) e documentais (documentos históricos oficiais). Após esta etapa, iniciamos a análise a fim de verificar quais critérios utilizados nas explicações sobre o verbete Ceará e Roraima. Esta pesquisa encontra-se em processo, assim os dados não possibilitam uma análise aprofundada. Porém, notamos que as fontes bibliográficas analisadas não possuem nenhuma fundamentação teórica, muito menos uma análise do que é apresentado como ‘explicação etimológica’. Em alguns textos, encontramos três conceitos totalmente diferentes para a mesma palavra. Embora estas fontes apresentem etimologias para os verbetes, não apontam nenhum étimo. E há uma constante repetição de definições. Quanto às 473 474 poucas fontes documentais encontradas, destacamos a dificuldade de encontrarmos textos mais próximos da época, já que isso facilitaria uma cronologia léxica. Como resultados preliminares, esperamos incentivar a pesquisa em Linguística Histórica, aplicando pressupostos comparatistas e etimológicos no sentido de explicar movimentos de formação lexical da língua portuguesa, advindos das línguas indígenas brasileiras. Além de contribuir com uma metodologia estritamente linguística para a pesquisa em Etimologia. Academicamente, temos inserido alunos de graduação em projetos de pesquisa em linguística diacrônica. Socialmente, há a possibilidade de apresentarmos um conhecimento de interesse geral, afinal, neste trabalho, envolvem-se conhecimentos linguísticos, históricos, culturais, geográficos, os quais até o presente momento não ofereceram uma explicação satisfatória para boa parte das palavras de origem indígena incorporadas ao português. METONÍMIA E ICONICIDADE NOS NOMES DE ESPÉCIES ANIMAIS NA LIBRAS Mariângela Estelita Barros – UFG A onomasiologia é o estudo semântico das denominações (Dubois, 2001). Segundo Naves (2003), a classe dos nomes comporta a) nomes de espécies, b) termos de massa, c) nomes próprios, d) expressões indexicais, e) expressões dêiticas e f) descrições definidas. Esse trabalho é uma proposta de estudo onomasiológico, à luz da linguística cognitiva, sobre os nomes de espécies animais na Libras (Língua Brasileira de Sinais). Ao considerarmos uma espécie, não nos referimos a um ser em particular, mas a um grupo de seres que, por suas semelhanças podem ser reunidos sob um mesmo nome, como “cachorro” ou “boi”, por exemplo. A linguística cognitiva trata a metáfora e a metonímia não apenas como figuras de linguagem com efeitos poéticos/estéticos. Muito além disso, essa teoria reconhece-as como “os dois meios mais frequentes de extensão semântica dos itens lexicais” (SILVA, 1998) e detecta sua presença abundante na linguagem corrente, mesmo em situações em que o usuário de uma língua não reconhece que está se valendo de uma metáfora, ou metonímia para se expressar. A metonímia (relevante para esse estudo) realiza-se dentro de um único domínio cognitivo, destacando alguma propriedade saliente deste domínio para representá-lo, ou seja, usa um elemento para representar outro. Isso se dá na forma de “parte pelo todo”, objeto pelo usuário”, “personificação”, “parte da ação pela ação”, “instituição pelos responsáveis” e outros (ALBRES E XAVIER, 2012). Nos sinais da Libras que designam animais, as propriedades que em geral são metonimicamente reconhecidas como salientes são os formatos das orelhas e “bocas” de cada espécie. Esses elementos metonímicos são realizados linguisticamente na Libras por meio da iconicidade. Na Libras, bem como nas demais línguas sinalizadas, a iconicidade é um recurso linguístico bastante produtivo, o qual consiste em representar linguisticamente, ou seja, em conformidade com as regras linguísticas de cada língua de sinais, características visuais salientes dos seres em questão. Assim, segundo Quadros e Karnopp (2004), “há uma motivação do signo em relação ao referente”. No caso das línguas sinalizadas, a motivação é visual e sua representação também é de natureza visual, o que faz com que tais motivações acabem por ficar tão evidentes, tão explícitas, a ponto de ter rendido a essas línguas, por muito tempo, o equivocado status de mímica. Línguas orais também representam características visuais de referentes, porém, fazem-no fonologicamente, o que faz com que sua iconicidade seja mais opaca dos que nas línguas sinalizadas. Segundo a linguística cognitiva, como exposta por Lakoff e Johnson (1980), a realização de uma língua se dá principalmente por metáforas e metonímias elaboradas a partir das experiências físicas, corpóreas dos usuários e sua compreensão plena apenas é possível dentro de um modelo cognitivo cultural compartilhado. Assim, a transparência da iconicidade insere-se no sistema linguístico em que está sendo utilizada e só é percebida por usuários que compartilham conhecimentos e experiências semelhantes. Por exemplo, uma das variações do sinal para “urso” em Libras, representa metonímica e iconicamente uma orelha redonda. Em comunidades que convivem com a ferocidade e corpulência desse animal, é bastante provável que suas orelhinhas não 474 475 fossem o elemento mais saliente, escolhido para representá-lo, e talvez fosse considerado mesmo irrelevante. A arbitrariedade dos signos linguísticos é negada pela linguística cognitiva e a origem de todos eles está nas experiências corpóreas dos indivíduos com o mundo, nos esquemas imagéticos e demais modelos cognitivos criados a partir dessas experiências. Nesse trabalho, faremos um reconhecimento da abundância do uso dos recursos de iconicidade e da metonímia, um dos modelos cognitivos, na formação dos nomes de espécies animais na Libras. O JULGO DE PILAR:CONSIDERAÇÕES À LUZ DE UMA MEMÓRIA TOPONÍMICA Lisa Valéria Vieira Tôrres – UFG Maria Suelí de Aguiar – UFG Este artigo apresenta aspectos peculiares da história de Pilar de Goiás, identificados nos depoimentos coletados durante um trabalho de campo iniciado nessa cidade há três anos. A partir desta perspectiva o trabalho explora ,por meio da utilização de narrativas orais, a contribuição de estudos toponímicos que colaboraram para o resgate histórico, identificação e valoração da memória individual e coletiva. Nesta direção, as investigações foram encaminhadas por gravações de fala , seguidas de transcrição fonográfica.Os dados continham desde crendices até informações históricas. Por outro lado,os registros orais apontavam uma relação entre história e memória que impulsionou a revisão da participação da História Oral como recurso metodológico. (DEMARTINI,1992;FERRAROTTI,1993;BORELLI,1992). Esta discussão atravessa várias gerações de historiadores e, atualmente, a maioria dos autores concorda que a memória não pode ser vista simplesmente como um processo parcial e limitado de lembrar de fatos passados, de importância secundária para as ciências humanas. Trata-se da construção de referenciais sobre o passado e o presente de diferentes grupos sociais, ancorados nas tradições e intimamente associados a mudanças culturais.A partir desta leitura, utiliza-se recortes da Toponímia com o objetivo principal de entender um pouco da história de Pilar e de lugares pitorescos da cidade, de forma a atribuir significado aos depoimentos de quatro pilarenses, participantes desta pesquisa. As perguntas que vieram à tona foram: Poderá o nome de um lugar ser interpretação do imaginário, construído pela oralidade? Quais os critérios de verdade da comunidade daquela região? Em que se pautavam? Apesar de os depoimentos, por sua natureza híbrida, serem ordenados por critérios de verdade, distintos daqueles da racionalidade “hegemônica”(moderna), os que eram contados pelos moradores de Pilar de Goiás evocavam critérios também utilizados por essa racionalidade.A partir desta leitura, o posicionamento da Toponímia de procurar pensar na questão do nome, em sua aplicação ao lugar, poderá contribuir para responder algumas daquelas questões. Estudar a nomeação das coisas existentes é viajar no tempo e no espaço, porque percebemos que, pelo processo de nomeação, inserem-se a sabedoria e o conhecimento das gerações que ficaram cristalizados e eternizados, preservando do esquecimento o instante mágico em que as coisas passaram a ser conhecidas por tal nome.A Toponímia, como disciplina de investigação, parte do pressuposto de que nomes de lugares não se estabelecem aleatoriamente ou de maneira despropositada. Quando são estudados, revelam informações importantes; tanto à lingua em uso no local pesquisado quanto costumes e valores dos falantes. Nas falas dos pilarenses entrevistados, há marcas que demonstram acontecimentos históricos, além de influências sofridas por meio do contato com outros grupos étnicos que lá se instalaram.Como examina Dick (1998), os nomes são recortes de uma realidade vivenciada. Segundo ela, de uma forma consciente ou não, um indivíduo ou o próprio grupo assimila-os “numa absorção coletiva dos valores especiais que representam a mentalidade do tempo histórico ou ethos grupal ( op.cit.1998).Assim, seguindo a proposta de Dick (1990), o presente estudo traz uma breve análise; como esboço, na tentativa de demonstrar a estreita relação que se estabelece entre o homem e os topos que designam o espaço que o circunscreve. 475 476 SIGNO E SIGNIFICADO NO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA PARA SURDOS: NÚMEROS SEMÂNTICOS, DESMISTIFICANDO O PROCESSO ENSINO APRENDIZAGEM Anderson Simão Duarte – UFMT Claudio Alves Benassi – UFMT A presente pesquisa aborda o ensino da Língua Portuguesa para jovens surdos como segunda língua sob uma perspectiva interacional, tendo como forma de comunicação dialógica à Língua Brasileira de Sinais – Libras, sendo esta a língua materna dos surdos por termos a certeza da sua complexidade abstrata e concreta em que língua sustenta. A grande problemática social na esfera educacional é a baixa ou inexistência do contato íntimo, logo interacional do surdo com a Língua Portuguesa - LP, tem-se a crença de que surdo não aprende a Língua Portuguesa, motivo pelo qual o sujeito em questão não escuta e/ou ainda que o surdo tenha o seu jeito “próprio” de escrever a Língua Portuguesa. A pesquisa deu-se em uma sala de aula do Instituto de Linguagens da Universidade Federal de Mato Grosso, no segundo semestre letivo de 2012, período noturno com a presença de 10 jovens surdos entre 16 a 22 anos, além de uma aluna com 43 anos. Todos oriundos de escolas públicas de 6º ano do Ensino Fundamental ao 2º ano do Ensino Médio. Todas as aulas foram filmadas e ministradas exclusivamente na língua materna dos surdos através de professores mestrandos e doutorandos em Língua Portuguesa e Língua de Sinais. Público alvo foi trabalhar somente com jovens e adultos surdos tendo como objetivos o ensino da Língua Portuguesa excepcionalmente na modalidade escrita e interpretações de textos em LP. Toda a pesquisa filia-se à luz dos conceitos enunciativo-discursivos do Círculo de Mikhail Bakhtin, sócio-históricos de Levy Vygotsky dialogando com a teoria da subjetividade de González-Rey dentre outros pesquisadores. A investigação inicia-se desde a escolha aleatória dos sujeitos nas escolas públicas de ensino regulares aos exercícios introdutórios com o propósito de diagnosticar na modalidade escrita da Língua Portuguesa através de textos e desenhos interpretativos. O processo de ensino deu-se inicialmente com os pronomes retos e verbos regulares nas três conjugações – AR, ER e IR, e nos três tempos simples – passado, presente e futuro, adjetivos, artigos e preposições, além de aplicação diária de vocábulos em contextos reais. Cada conteúdo repetia-se inúmeras vezes por inúmeros métodos didáticos adaptados e reconstruídos em conformidade as necessidades diárias, como exemplos: lousa imantada com letras móveis, recortes de jornais e revistas, tabela individual de verbos, objetos concretos para fins de descrições, releituras de gravuras, brincadeiras, atendimentos individualizados na lousa no decorrer das atividades e dinâmicas entre os próprios alunos e uso dos números semânticos para a compreensão das estruturas sintáticas da Língua Portuguesa tendo como referencial linguística a Língua Brasileira de Sinais. Os resultados já coletados são diversos e merecedores de vários apontamentos, questionamentos, esclarecimentos e acima de tudo a ruptura de pré-conceitos a respeito do processo de ensino aprendizagem da LP frente à comunidade surda. Temos resultados de jovens surdos escrevendo frases inteiras dentro das normas estruturais sintáticas da LP tais como: sujeito, verbo e objeto. Além de compreensão lógica dos textos em detrimento a afetividade com a língua escrita. MULTUS E SEUS COGNATOS NAS LÍNGUAS ROMÂNICAS Gisélia Brito dos Santos – UFG Maria Suelí de Aguiar – UFG Este trabalho apresenta uma abordagem histórica da palavra multus, desde a sua origem na língua latina e sua transformação na passagem para as línguas românicas, português, espanhol, italiano, catalão, galego e romeno até os usos na atualidade, especificamente, na língua portuguesa. A investigação baseia-se nos estudos históricos comparativos, nos estudos da história do latim e da 476 477 formação das línguas românicas, apresentados por Bassetto (2001), Ilari (1999), Elia (1970), e na concepção do método histórico comparativo da Linguística Histórica, apresentada por Crowley (2003). Realizamos uma retomada da história do latim e da história da constituição das línguas românicas e uma breve exposição sobre a Linguística Histórica e sobre o método histórico comparativo. Analisamos os cognatos de multus e algumas particularidades de muito, na oralidade, na língua portuguesa. O estudo histórico desse vocábulo compreende a análise comparativa de suas transformações morfológicas e fonético-fonológicas que deram origem aos cognatos muito ~ mucho/muy ~ molto ~ molt ~ moito/moi ~ mult das seis línguas românicas citadas. O estudo sincrônico compreende a análise morfossintática desses cognatos que são categorizados como advérbios de quantidade, pronomes indefinidos ou determinantes indefinidos, adjetivos e substantivos, conforme o contexto oracional em que se encontram. Multus, -a, -um é um adjetivo de primeira classe na língua latina e forma o advérbio derivado de adjetivo multum; é declinado na primeira e na segunda declinação e apresenta formas para os três gêneros latinos, masculino, feminino e neutro. Os cognatos dessa palavra mantiveram forma, significado e função parecida na maioria das línguas românicas e continuam sendo empregados como adjetivo, advérbio, além de pronome e de substantivo. A partir dessas observações, apresentamos as transformações morfológicas e fonológicas ocorridas na formação dos cognatos nas línguas referidas e o estágio morfológico e sintático destes em algumas línguas românicas. Realizamos este estudo com o intuito de registrar o que foi conservado e o que mudou nessas palavras, comparando-as com seu étimo latino, e ainda que semelhanças elas apresentam na forma e no uso entre uma língua e outra. Apresentamos também, na abordagem sincrônica, uma análise do cognato muito no português do Brasil, em especial, da comunidade de fala de Fortaleza dos Nogueiras-MA, em que se observam, na oralidade, algumas variantes desse vocábulo na função de advérbio e de pronome indefinido. LÍNGUA PORTUGUESA: FUNÇÃO DO ADVÉBIO, NOS SÉCULOS XIX E XX, EM UMA ABORDAGEM HISTORIOGRÁFICA Sônia Maria Nogueira – UEMA/CESI-NELLCINE/IP-PUC/SP Wemylla dos Santos de Jesus – UEMA/CESI-NELLCINE Essa pesquisa reflete sobre o processo de ensino da Língua Portuguesa, no Brasil, com a descrição e compreensão dos fenômenos linguísticos, da segunda metade dos séculos XIX e XX. Nessa perspectiva, embasamos nosso estudo em Historiografia Linguística em Swiggers (2009) e Köener (1996), especificamente, adotando seus três princípios: o princípio da contextualização trata do espírito de opinião, uma vez que aborda os aspectos intelectuais, socioeconômicos, políticos e culturais. Além disso, o princípio de imanência esforça-se em estabelecer um entendimento total tanto histórico quanto crítico, se necessário filológico, do texto em apreciação e, por fim, o princípio de adequação faz aproximações modernas do vocabulário técnico do trabalho em estudo. Recordamos, desse modo, as condições socioeconômicas particulares, os acontecimentos históricos, as situações políticas e educacionais que têm considerável influência na motivação para se apresentar a história de uma disciplina. Buscamos, com isso, o aprofundamento de conhecimentos nos vários campos, o que demanda uma amplitude de estudos que visam a cumprir a tarefa de descrever, interpretar e explicar o ocorrido sobre a língua. Desse modo, a Historiografia Linguística torna-se fundamental ao esclarecimento da Língua Portuguesa, uma vez que serviu como base às informações gramaticais que temos hoje. Leva-se em consideração todo esse percurso histórico, por isso, não pode ser desprezada pelos pesquisadores da própria língua. Convém ressaltar que, para a análise, abordamos três aspectos, a saber: a Organização das obras, os Prefácios e a Função do Advérbio. Buscamos verificar, em especial, o ensino de sintaxe, suas abordagens e concepções sobre esse assunto, a metodologia aplicada, bem como o interesse dos autores ao produzirem as obras selecionadas nessa pesquisa. Para tanto, enfocando a organização das partes das obras de estudos gramaticais, no que tange ao tema linguístico: função do advérbio, procedemos à seleção, 477 478 ordenação, reconstrução e à interpretação do corpus: a obra Syntaxe e construcção da Lingua Portugueza, de Thomas da Silva Brandão (1888), e a obra Novas Lições de Análise Sintática, de Adriano da Gama Kury (1984). Constamos que, entre 1888 e 1984, o tratamento dado à função do advérbio apresentou algumas alterações discutidas nesse trabalho. ANTROPÔNIMOS DOS GRUPOS INDÍGENAS PÁNO Maria Suelí de Aguiar – UFG O presente trabalho analisa os antropônimos pelos quais os grupos Páno são reconhecidos na literatura, dando atenção, mais especificamente, àqueles antropônimos terminados em -bo, náwa e huaca. Uma primeira versão deste trabalho foi publicada em inglês com o título Names of the endins -bo, nawa and huaca, na revista UniverSOS (AGUIAR, 2008, p. 9-70). Oportunamente revimos nosso texto, aproveitando para aprofundar alguns pontos que nos pareceram pouco claros, como a expressão nawa, que tanto acontece como [náwa] quanto [nawá], o que implica uma situação de grande relevância no seu uso. Isso é, demonstra que há uma implicação fonológica na expressão seguindo o que reza a estrutura acentual das línguas Páno num caso e em outro não. A análise dos antropônimos dos grupos indígenas Páno visa a apreender os possíveis significados desses nomes e levantar hipóteses acerca da motivação de cada antropônimo. Ao considerar o significado e a contextualização que motivaram tais antropônimos, podemos obter elementos para compreender a pouca aceitação desses nomes por parte de vários grupos Páno. Seguramente, outros antropônimos de grupos indígenas também não levam tais grupos a se sentirem referenciados autonomamente e terminam por se sentirem desrespeitados em suas vontades e tradições. A análise é precedida por uma discussão a respeito do ato de nomear e por uma explicação sobre as motivações que determinaram, de modo geral, os antropônimos dos grupos Páno. Nesse sentido, observamos o que há de comum entre os nomes dos grupos Páno, bem como as condições prováveis em que tais grupos foram nomeados. Enfocamos em nossa análise, como ponto central, as expressões bo, nawa e huaca, suas variedades, origens e aplicações aos antropônimos de grupos da família linguística Páno. Essa análise nos leva a considerar também os antropônimos de grupos Páno que não receberam essas expressões. Antropônimos esses que são classificados em duas modalidades: os de origem Páno e os de origem não-Páno, estando essa última modalidade subdivida em antropônimos de origem românica e Tupi. Através do presente trabalho, espera-se ter contribuído para o esclarecimento sobre os antropônimos dos grupos Páno. Consequentemente, espera-se, além disso, ter formado uma base mais segura para retomar a questão dos antropônimos pelos quais os grupos indígenas Páno são identificados, um ponto que tem sido polêmico. Julgamos, todavia, que essa discussão é quase tão necessária e oportuna como a análise da construção desses antropônimos. Nossa discussão não visa a promover mudanças nos antropônimos dos grupos indígenas Páno e nem de outros grupos. O que propomos aqui consiste em apresentar questões de cunho histórico e linguístico que oportunizem aos estudiosos e aos grupos emitirem opiniões sobre os antropônimos. ASPECTOS MORFOLÓGICOS DOS NOMES DE LUGARES MARANHENSES: INDÍCIOS DA FORMAÇÃO SÓCIO-HISTÓRICA Maria Célia Dias de Castro – UEMA Fatores de natureza cultural e linguística desempenham um papel relevante na constituição de que se revestem variadas construções denominativas e ou designativas de lugares maranhenses (CASTRO, 2012). Estes fatores evidenciam a existência de motivação entre a forma do topônimo, o que equivale a seus componentes constitutivos, de modo que o processo designador ou 478 479 denominador está relacionado às estruturas linguísticas e aos sentidos que eles portam, ao desempenharem seu papel na interação discursiva. Os elementos que compõem a estrutura desses nomes podem dizer acerca do processo de criação do nome de lugar e da filiação do lugar que sugere o nome. Esta filiação é trazida para a forma pelos sufixos que representam o termo genérico “cidade de”. Os sufixos mais conhecidos formadores dessas relações são -lândia (de origem germânica): Açailândia , Cidelândia, Joselândia, Palmeirândia, Tufilândia, que expressam ‘a cidade dos açaís’, ‘a cidade de José’, ‘a cidade das palmeiras’, ‘a cidade de Tufi’; -polis (de origem grega), Davinópolis e Esperantinópolis, que espressam a ‘cidade de Davi’ e a ‘cidade da esperança’. Há ainda os sufixos latinos que trazem a ideia de pertencimento ao lugar e/ou posse do lugar, agregada à ideia de abundância, de aglomeração, de coleção: -ado, Lajeado, o lugar que possui muitas pedras em formato de lajes; -al, em Bacabal, o lugar que possui muitas bacabas; Cedral, o lugar que possui muitos cedros; Mirinzal, uma ideia de pluralidade de mirim; Central,além da ideia de pertencimento, agrega valor locativo, o que está ao centro; -ario, -aria, eria, do latim -ariusari(i)>ar, Rosário, em que a acepção de rosas está opaca, no nome próprio;e eira, em Bacabeira, Pedreiras, lugar em que se encontra a bacaba, a pedra. Há os sufixos de origem Tupi que expressam relações não exatamente de pertencimento, mas de abundância como -tyba> tuba ou -tiba, em Bacurituba (abundância de bacuri); -rana, relações de semelhança, parecido a, Buritirana. Citamos, ainda, formações compostas como Buriticupu buriti + cupu; Pirapemas pira +pemba. O sufixo -caba, formador de substantivo, aparece em Bacabal e Bacabeira (ybá-caba, a fruta oleosa ou gorda), que posteriormente receberam o sufixo português -al e eira,respectivamente, formador de coletivo. Um morfema de origem indígena que está muito presente nos topônimos é -y ou -u, indicador da existência de água Arara-y > Arari, Ytinga > Itinga, o qual se manteve como /i/, nos topônimos maranhenses. A análise morfológica, centrada numa perspectiva linguístico-histórica, com foco para o campo da Onomástica revela relações que indiciam a origem destes topônimos e o processo histórico-colonial constituidorde cidades do Estado do Maranhão. PANORAMA DA DISTRIBUIÇÃO DO DITONGO DECRESCENTE [EY] SEGUIDO DE SIBILANTES PALATAIS NO PORTUGUÊS BARSILEIRO Evilázia Ferreira Martins – UFMG Os glides de ditongos decrescentes variáveis no Português Brasileiro (doravante PB) são segmentos que podem ser apagados ou inseridos sem alterar a informação lexical transmitida pela palavra. Respectivamente, esses processos são rotulados ditongação e monotongação. No primeiro caso, há formação de uma sequência composta de dois segmentos foneticamente vocálicos por meio da inserção de um glide à direita do segmento vocálico (‘três’ [tRes] ~ [tReI9s]). No segundo caso, o glide, segmento menos sonoro, é apagado (‘ouro’ [oU9RU] ~ [oRU]). Devido à natureza variável destes ditongos, esses processos não estão dispostos de maneira homogênea nos dialetos brasileiros, podendo, assim, apresentar influências diatópicas e diastráticas (ARAÚJO, 1999). Dentre os ditongos variáveis existentes no PB, destaca-se o objeto deste estudo: a sequência [eI9] antes de sibilantes palatais [S, Z]. Neste contexto, esse ditongo pode sofrer o apagamento de seu glide, como, por exemplo, na palavra ‘peixe’ [peI9SI] ~ [peSI]. Visto isso, o presente trabalho resume-se na apresentação de um panorama (isto é, uma análise comparativa) e a distribuição geográfica, da ocorrência desse fenômeno. A necessidade desse panorama fica explícita nas leituras realizadas sobre o tema. Elas demonstraram que as análises dialetais sobre o fenômeno discordam bastante entre si, pelo menos, com relação aos contextos linguísticos e extralinguísticos que favorecem sua aplicação (ver também Araújo (1999)). Além disso, observou-se que essa diversidade ocasiona problemas para as análises de interface fonético-fonológicas existentes (por exemplo, Bisol (1989, 1994); Martins (2011)) e demonstram a necessidade de se repensar os dados sob esse ponto de vista. 479 480 Este estudo é composto por dados que representam as 5 regiões do país e apresentará as tendências lexicais do fenômeno em cada região, agrupando, deste modo, e, pelo menos parcialmente, os resultados dos estudos sobre o tema. Seu corpus é composto, principalmente, por pesquisas fundamentadas pela escola variacionista. Na ausência desses estudos, serão apresentados, dados de estudos fonológicos para sua complementação. Durante a pesquisa bibliográfica e coleta dos dados, preteriu-se por teses, na ausência dessas, por dissertações e, por fim, artigos. Enseja-se responder as seguintes questões: a) Os processos têm ocorrência quantitativa semelhante, nos dialetos, ou eles são mais presentes em determinadas regiões em detrimento de outras, podendo ser, assim, considerados marcas particulares dessas regiões? b) Quais são as variáveis que influenciam nesses processos e como estão distribuídas? c) O que as análises de interface fonético-fonológicas devem considerar sobre o fenômeno? Este trabalho baseia-se, inicialmente, nas leituras dos trabalhos de: Farias (2008), Lopes (2002) e Santos e Chaves (2010), representando a região norte; Araújo (1999), Carvalho (2007) e Machado (2011), representado a região nordeste; Leite, Callou e Moraes (2001) e Silva (1997), representando a região sudeste; Cristofolini (2011), Haupt (2007, 2011, 2012), Ribeiro (1990), Toledo (2010, 2011) e Toledo e Monaretto (2010), representando a fala da região sul. OS NOMES DOS GRUPOS INDÍGENAS E A COLONIALIDADE DO PODER/SABER Sâmela Ramos da Silva – UFG Neste trabalho levantaremos uma discussão preliminar sobre os nomes dos grupos indígenas no Brasil, refletindo sobre a denominação dada aos diferentes grupos porestudiosos e pela sociedade não-indígena, que acabaram sendo difundidos como osverdadeiros nomes desses grupo. Nossos pressupostos teóricos estão baseados nasrelações da colonialidade do poder/saber que subalternizou os grupos indígenas, suasculturas e línguas, assim como a forma como eles foram nomeados, por issoconsideramos a colonialidade, porque é um processo que se estende e se solidifica até hoje. Essa situação configura-se como violência epistêmica, ao passo que não sereconhece a autonomia e o direito de reconhecer seu nome original e subjugá-lo atravésde outro nome, que de alguma forma discrimina essas pessoas. Dentro dessa perspectivada colonialidade do poder/saber utilizamos os trabalhos de Aníbal Quijano (2005),Castro-Gomez (2005) e Walter Mignolo (2003). Refletimos sobre a denominação dadaaos diferentes grupos por estudiosos e pela sociedade não-indígena, que acabaram sendodifundidos como os verdadeiros nomes desses grupos. Por conta dessa nomeação exógena, muitos desses nomes não são reconhecidos pelos próprios grupos, e possuem sentido pejorativo e discriminador. Assim, consideramos importante esse processo derevitalização das autodenominações, pois possibilita a esses grupos rever os nomespelos quais eles são reconhecidos, reivindicando a utilização daqueles com as quais elesrealmente se reconhecem. Essa revisitação das autodenominações pode servir para queos grupos possam refletir também sobre outras questões que os fizeram serem tratadoscomo inferiores, situação forjada pelo colonizador através da colonialidade dopoder/saber. No entanto, em outras situações, o grupo já se sente tão próximo da nomeação exógena que esta passa a ser a sua própria, como se não tivesse existido outra. Nesses casos, os nomes “antigos” nem chegam a serem lembrados pelas geraçõesatuais, às vezes só na memória dos anciãos. CULTURA, MEMÓRIA E TOPONÍMIA: OS NOMES DAS COMUNIDADES REMANESCENTES DE QUILOMBOLAS DO ESTADO DO TOCANTINS Karylleila dos Santos Andrade – UFT/PPGL Todo grupo tem um saber cumulativo de si proveniente da memória, e a culturaé determinada pelo uso que esse grupo faz de sua própria memória. Conforme Halbwachs (1990), a memória individual 480 481 existe sempre a partir de uma memória coletiva. Nesse sentido, todas as lembranças, como elemento de uma sociedade, sãoformadas no interior de um grupo. Quando nomeamos pessoas, coisas, lugares, todos em si carregam as nossas experiências, emoções, guardam e refletem lembranças de um tempo, uma vida, uma cosmovisão de um grupo ou de um indivíduo. Em particular, o nome e o significado de lugares são essenciais para a cristalização da identidade de um grupo, pois “reforçam fortemente as sugestões de identidade ou de estrutura que podem estar latentes na própria forma física” (LYNCH, 1997, p. 120). Nesse sentido, os topônimos podem traduzir o simbolismo, a história, a memória, a identidade e as peculiaridades naturais de uma dada comunidade, região, país, continente. O estudo da toponímia pode traduzir omodus vivendi de um grupo ou responder a outros interesses. Na geografia, a toponímia pode dar informações relevantes sobre vários aspectos: relevo, flora, fauna etc. Pode ainda auxiliar na delimitação da separação entre duas zonas geográficas (por exemplo, entre a zona dos cocais e a caatinga do sertão brasileiro). É considerada uma fonte de informação para os historiadores (colonização, imigração, história e memória oral, etc.), antropólogos (identidade, relação homem, cultura e meio social), biólogos (nomes de seres que compõem determinado bioma), botânicos (nomes de plantas) e outros pesquisadores. A linguística, particularmente, permite estudar a evolução fonética, a etimologia, os aspectos morfossintáticos e semântico-lexicais.Na concepção de Sapir, explicar todo o traço da cultura humana, apenas pela ação do ambiente, parece ser ilusão. O ambiente é sempre consolidado ou mudado pelas forças sociais, e compreende fatores físicos e sociais. “O ambiente físico só se reflete na língua na medida em que atuarem sobre ele as forças sociais.” (SAPIR, 1984, p. 46). Para ele, no caso dos léxicos especializados, não são de fato os aspectos da fauna, elementos topográficos, em si mesmo, que a língua reflete, mas antes o interesse da nação nesses traços ambientais. Considerando a formação dos topônimos e observando que a Toponímia e Antroponímia são co-responsáveis pela preservação dos fatos culturais em determinado espaço-temporal, funcionando com retentoras da memória de um grupo, Dick (1999) afirma que essas duas disciplinas podem se inscrever no campo da terminologia e socioterminologia. Como base metodológica, recomendam-se procedimentos etnográficos que não diferem daqueles da observação do participante. Esta pesquisa consiste em realizar um estudo dos nomes das comunidades remanescentes de quilombolas do estadodo Tocantins com foco nos estudos onomásticos e nas práticas culturais e históricas.Como procedimentos teórico-metodológicos, utilizaremos Dick (2010), Montenegro (2001) e Halbwachs (1990). MEMÓRIAS HISTÓRICO-CULTURAIS DO TOPÔNIMO JARAGUÁ Ester Ferreira – ISEP Maria Suelí de Aguiar – UFG Neste trabalho, apresentam-se questões referentes à nomeação da cidade/município deJaraguáGoiás-Brasil. A região onde se localiza o referido município foi povoada noinício do século XVIII, tendo em vista a descoberta de jazidas de ouro nas margens doRio Pari próximo à atual Serra de Jaraguá. Quanto aos primeiros habitantes, há algumascontrovérsias entre os historiadores, alguns assinalam que a região já era povoada pelosíndios Kayapó, em contrapartida outros não reconhecem vestígios dessa comunidadeindígena ou de qualquer outra no local. Há também controvérsias quanto aodescobrimento das minas auríferas na região. Os registros históricos atribuem odescobrimento a negros fugitivos ou negros faiscadores, contudo, os historiadorescontemporâneos atribuem esse fato ao mineiro português Manoel Tomar. De qualquerforma, os primeiros residentes dessa região foram os bandeirantes paulistas, atraídospela notícia da abundância em ouro, e os negros africanos e seus descendentes, queconstituíram a mão de obra utilizada na exploração do ouro. Inicialmente, a região foinomeada de Arraial do Córrego do Jaraguá, em 1737; em 1833, por meio do DecretoProvincial nº 08, de 1º de julho de 1833, eleva-se à categoria de vila, sendo nomeada deVila de Nossa Senhora da Penha de Jaraguá; e, em 25 de julho de 1882, foi elevada 481 482 àcategoria de cidade, desmembrando-se de Pirenópolis, através da Resolução nº 666, cujadenominação torna-se somente Jaraguá. Segundo informações registradas em Houaiss(2001, p. 1674), a partir da definição de alguns autores, etimologicamente, o topônimojaraguá originou-se do tupi yara’wa (Nascentes,1964); de acordo com Sampaio ([sd]),jaraguá veio do tupi yara-guá que significa o vale do dono, a baixa do senhor; econforme Tibiriçá (1989), jaraguá veio do tupi jaraguá, que é um tipo de planta quecontém fibras têxteis. Vale destacar ainda que esse nome designa uma espécie de capimque era muito abundante na região, o chamado capim-jaraguá. O texto do IBGE (2010)e as historiadoras Canesin e Silva (1983) afirmam que a nomeação do lugar foimotivada pela presença de indígenas denominados Jaguará. No entanto, a maioria dosregistros históricos sobre Jaraguá assevera que o nome da região foi dado devido à semelhança do local com uma região no Estado de São Paulo. Partindo-se dopressuposto de que o topônimo registra, acumula e revela as aquisições e percepçõesculturais, políticas e ideológicas de um determinado povo, podendo ser testemunha deuma época, este estudo ocupa-se de analisar o contexto histórico e os aspectos culturaise ideológicos do topônimo Jaraguá, considerando os elementos indígena, africano,português e paulista (bandeirantes). Do ponto de vista qualitativo, o estudo apresenta arelevância do topônimo como testemunha de uma realidade histórica, política, ideológica, cultural, retratando um contexto histórico-social de uma determinada época. TOPÔNIMOS DE ORIGEM INDÍGENA: O PAPEL DO TUPI NA NOMEAÇÃO DOS LUGARES GOIANOS Kênia Mara de Freitas Siqueira – UEG Uma característica fundamental do signo toponímico que, inclusive, o diferencia dos demais signos linguísticos, é seu caráter motivado em relação ao referente nomeado e ainda por apresentar uma particularidade específica de sua função cuja força não é impositiva, mas identitária já que situa o objeto nomeado no quadro das significações, retirando-o do anonimato. Direciona-se assim, pela função onomástica: identificar nomes. Considerando que a nomeação reflete aspectos importantes dos valores sociais, políticos e culturais da memória coletiva local, o objetivo desta pesquisa é fazer o levantamento dos macrotopônimos (municípios) do Estado de Goiás de origem indígena e classificá-los de acordo com o sistema taxionômico dividido em dois grupos: topônimos de natureza físico-natural e de índole antropocultural, e ainda analisá-los sob a ótica ecolinguística no que concerne à inter-relação língua meio ambiente, pois é possível constatar que se tem uma nova comunidade no momento em que o agrupamento recebe um nome, normalmente derivado do nome do T (Território), configura assim uma importante manifestação das relações entre T e L (Língua), ou melhor, toponímia. A metodologia consiste no levantamento de dados por meio de pesquisa documental e se atém ao reconhecimento dos remanescentes lexicais na rede toponímica goiana cuja origem remonta a nomes indígenas, mais especificamente, línguas do tronco tupi em contraponto com as línguas (Macro) Jê, dos povos que habitavam a então “Província de Goyaz”, observando assim, a motivação subjacente à escolha dos nomes para designar os lugares goianos. Nesse sentido, tem-se o intuito de desenvolver uma teoria nos moldes da Ecolinguística que dê conta da análise ecossitêmica dos topônimos de origem indígena, o que requer um estudo voltado para as relações constitutivas do Ecossistema Fundamental da Língua, constituído por um povo que habita um determinado território e a língua, pois o topônimo representa uma projeção aproximativa do real, em outras palavras, do ambiente. 482 483 ESTUDO TOPONÍMICO DO VALE DO MUCURI Sônia de Carvalho Caldas Machado – UFMG A presente pesquisa tem como objetivo o estudo toponímico do Vale do Mucuri, situado no Nordeste mineiro, uma das últimas regiões da província de Minas Gerais a ser colonizada devido às dificuldades apresentadas pela região, como as densas matas virgens tropicais da mata Atlântica, e da presença de índios na região, os temíveis Botocudos. É um estudo que se integra ao Projeto ATEMIG – Atlas Toponímico do Estado de Minas Gerais – coordenado e desenvolvido na Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais, pela Profª. Dra. Maria Cândida Trindade Costa de Seabra e que se caracteriza como o estudo dos nomes de lugares que abrange o território mineiro. Nossa proposta é demonstrar que por meio da toponímia é possível, além de recuperar traços da historia social e cultural (grupos étnicos, processos migratórios etc.) de uma comunidade, podemos também conhecer as características do ambiente físico. Como referencial teórico-metodológico, adotamos os modelos toponímicos de Dauzat (1926), e Dick (1990a) e Dick (1990b). A partir da catalogação, classificação, descrição e análise dos nomes de acidentes geográficos – físicos e humanos – extraídos em mapas municipais estatísticos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), buscamos levantar remanescentes lexicais na rede toponímica cuja origem remonta a nomes portugueses, indígenas, africanos, etc., além de classificar os topônimos encontrados em nosso Corpus, segundo suas categorias taxionômicas que representam os padrões motivadores dos topônimos no Brasil. Os resultados obtidos em nosso trabalho mostraram que os povos que habitaram nessa região, assim como os conquistadores deixaram vestígios na toponímia local, revelando a designação como uma forma de registrar o processo histórico em que a civilização portuguesa predomina, contudo, com influências étnicas como as de origem indígena. A pesquisa também revela que a água, importante fator desencadeador do povoamento da região, continua até hoje a marcar a história deste vale, haja vista o grande número de hidrotopônimos presente no território analisado, revelando a influência do ambiente designativo. Paralelamente a hidronímia, em nível semelhante de ocorrências toponímicas temos os nomes próprios individuais – os antropotopônimos - representados por nomes e apelidos de família, talvez como um indicativo de posse, o que pode ser justificado pelo processo derivado das expedições humanas encarregadas de desbravar, explorar e fixar na região. 483 484 SIMPÓSIO 45 DISCUTINDO O PARADOXO DO GÊNERO O objetivo deste simpósio é dicutir o Paradoxo do Gênero em fenômenos de variação e mudança linguística, repensado por Labov em termos do Paradoxo da Conformidade (The ConformityParadox), que culmina com a proposição do Princípio da não-conformidade (NonconformityPrinciple) para dar conta da liderança de diversas mudanças abaixo da consciência (changefrombelow) pelas mulheres, não em função do gênero, mas em função de seu comportamento não conformista (nonconformitybehavior) (Labov, 1990; 2011: 366-367; 516). As reflexões se encaminham no sentido de avaliar a propossta de Scherre e Yacovenco (2012) de que há, sim, um papel específico do sexo/gênero nos fenômenos linguísticos variáveis, e de que este papel pode ser mais amplamente entendido em função da noção de marcação: marcação linguística, quanto ao critério de distribuição de frequência; marcação sociocultural, na perspectiva do poder e do controle, nos termos de Givón (1995); e marcação interacional, no sentido de dependência da relação entre os pares. Para tanto, pretende-se congregar pesquisas que analisam o efeito da variável sexo/gênero em pesquisas sobre a língua portuguesa, com ênfase nas pesquisas sobre português brasileiro, com diversas bases de dados em diversas áreas geográficas. COORDENAÇÃO Maria Marta Pereira Scherre Universidade Federal do Espírito Santo/Unievrsidade de Brasília [email protected] Lilian Coutinho Yacovenco Universidade Federal do Esírito Santo [email protected] 484 485 A ATUAÇÃO DAS MULHERES NA VARIAÇÃO LINGUÍSTICA COM PRIMEIRA PESSOA DO PLURAL EM GOIÁS Shirley E R Mattos – UEG Apresentamos resultados estatísticos de pesquisa de base variacionista que se prestam à discussão do Paradoxo de Gênero no que se refere ao comportamento não conformista das mulheres em situação de mudança from below (abaixo do nível da consciência) nos termos de Labov (1972, 2001). Em Goiás, o uso de verbo no singular com nós configura uma prática linguística identitária, ligada à cultura de base rural valorizada no estado, mas desafiante ao padrão linguístico majoritário em vigor nas áreas urbanas do país. PADRÃO SOCIOLINGUÍSTICO (?) – GÊNERO, MARCAÇÃO SOCIAL E PRONOMES DE SEGUNDA PESSOA Leandro Babilônia – UFSC Objetiva-se com este trabalho discutir a relação entre gênero e formas de tratamento no português brasileiro (PB), especificamente os pronomes tu e você. Por se partir, comumente, da premissa de que as mulheres tendem a usar mais as formas dotadas de prestígio social em detrimento daquelas que não o possui, muitos estudos (sobre os mais diferentes fenômenos) restringem-se apenas à estratificação dos dados. No que se refere ao objeto supracitado, pode-se afirmar que o problema é bastante complexo, pois são notórios diversos usos no PB quando se destaca gênero e formas de tratamento, entre os quais: i) tu usado por adolescentes homens como marca identitária de grupo (Lucca, 2005; Mota, 2008); ii) uso amplo de tu por homens e mulheres quando em contexto de solidariedade, contudo, quando em situação oposta, as mulheres permanecem à frente utilizando mais esse pronome (Martins, 2010); iii) relação entre gênero, formas de tratamento e localidade, em que Norte, Nordeste e Sul sobressaem-se pelo uso de tu por mulheres e Sudeste e Centro-Oeste, pelo uso de você (Scherre & Yacovenco, 2011). Assim, pretende-se contribuir com esta questão pensando, sobretudo, a partir deste ponto: se as mulheres “orientam sua conversação de uma forma mais solidária, que busca o envolvimento do interlocutor” (Paiva, 2010, p. 35) e sendo o pronome tu conhecido como o trato solidário, por que se nota essa diversidade de resultados no PB? Com essa pergunta, busca-se dialogar com o texto de Scherre & Yacovenco (2011), no qual inventariaram nove pesquisas realizadas sobre este fenômeno nas cinco regiões do Brasil, ampliando o corpus por elas utilizado, e colaborando para a construção do panorama que elas iniciaram. Para tanto, foi feito um levantamento dos estudos sobre a concorrência entre tu e você (sobretudo teses e dissertações) realizados nos últimos anos e que tenham considerado em suas análises o fator gênero. Os resultados apontam que, para este fenômeno, não é cabível aceitar a categórica asserção feita por Labov em seus Padrões sociolinguísticos (2008 [1972]), pois muitos outros fatores devem ser considerados, resultando, assim, na não existência de um padrão. O EFEITO DA VARIÁVEL ‘SEXO/GÊNERO’ NA EXPRESSÃO DO FUTURO VERBAL EM LÍNGUA PORTUGUESA Josane Moreira de Oliveira – UEFS A expressão do futuro verbal é um fenômeno variável nas línguas naturais. Em português, trabalhos variacionistas sobre o tema (SANTOS, 1997; GIBBON, 2000; SANTOS, 2000; MALVAR, 2003; OLIVEIRA, 2006; MALVAR e POPLACK, 2008; SILVA, 2010; TESCH, 2011; OLIVEIRA e MENON, 2012) apontam uma mudança em curso no sentido de a forma de futuro simples (“farei”) 485 486 ser substituída pela forma perifrástica com ir + infinitivo (“vou fazer”). Considerando que os fenômenos de variação e mudança estão intrinsecamente associados a fatores internos (linguísticos) e externos (sociais), esta comunicação tem como objetivo apresentar e discutir os resultados da variável ‘sexo/gênero’ do informante na expressão do futuro verbal, já que as variáveis ‘sexo/gênero’ e ‘faixa etária’ são de extrema importância quando do estudo de processos de mudança (ECKERT, 1989; OLIVEIRA E SILVA e PAIVA, 1996;LABOV, 2001). O corpus deste trabalho é formado de dados dos anos 1970 (elocuções formais e diálogos entre informante e documentador) e dos anos 1990 (diálogos entre informante e documentador) das cidades de Salvador e Rio de Janeiro do banco de dados do Projeto de Estudo da Norma Urbana Culta no Brasil (Projeto NURC). Seguindo o quadro teórico-metodológico da sociolinguística quantitativa (LABOV, 1972), os dados foram codificados e submetidos ao Programa GoldVarb (ROBINSON, LAWRENCE e TAGLIAMONTE, 2001). A análise dos resultados revela, em linhas gerias, que: a) na década de 1970, o sexo/gênero é uma variável importante na fala mais formal, em que a forma considerada mais inovadora alcança maior aplicação entre a mulheres; já na fala mais informal, há uma neutralização das falas masculina e feminina; e b) na década de 1990, a variável dependente já não é mais sensível ao sexo/gênero do informante. De uma década para outra, o futuro perifrástico é usado por homens e mulheres de todas as faixas etárias de forma quase indiferente, o que corrobora a expansão dessa variante no intervalo de tempo considerado. A principal questão a ser respondida é: no caso do fenômeno em estudo, a variável ‘sexo/gênero’ reflete o paradoxo da conformidade (conformity paradox) (LABOV, 1990) ou confirma o princípio da não conformidade (nonconformity principle) (LABOV, 2011)? UMA ANÁLISE DOS PRONOMES DE SEGUNDA PESSOA EM TEFÉ-AM Germano Ferreira Martins – UEA Este trabalho trata da alternância tu/você/senhor na cidade de Tefé-Am descrevendo os fatores linguísticos e sociais que condicionam a variação nesta comunidade de fala. O estudo toma por base a Teoria Variação e Mudança Linguística desenvolvida a partir da proposta de Weinreich, Labov e Herzog (1968). De acordo com essa teoria, a variação é inerente às línguas e nem é aleatória, nem livre, mas governada por regras. Assim, o uso da língua é condicionado tanto por fatores internos quanto externos ao sistema linguístico. O conceito de footing, da Sociolinguística Interacional, também foi utilizado para a análise do pronome você. Os dados foram obtidos basicamente através de entrevistas tipicamente labovianas, cujo objetivo é captar o vernáculo do falante, i. e., o estilo em que se presta o mínimo de atenção ao monitoramento da fala. Das 19 entrevistas que compõem nosso corpus (em algumas entrevistas há mais de um informante), 4 foram feitas sem o conhecimento prévio do informante. Em cada um desses casos, os informantes foram posteriormente avisados do propósito da gravação e do direito de se recusarem a participar do estudo. Todos concordaram e suas entrevistas foram integradas ao corpus para análise. Os 30 informantes (15 homens e 15 mulheres) foram divididos em três faixas etárias (de 7 a 10 anos, de 20 a 35 anos e de mais de 50 anos) com escolaridade nos níveis fundamental e superior. Dos 1213 dados iniciais, que incluem, além das formas plenas tu, você e senhor, as formas cê e os casos de forma pronominal zero, 865 dados foram analisados com o suporte da ferramenta estatística conhecida por Varbrul. Não fizeram parte da análise com o Varbrul os dados de pronome zero (347 dados) e 1 dado de senhor. Os resultados indicam que o tu é a forma pronominal mais usada na variedade tefeense, e que sua concordância com a forma verbal canônica de segunda pessoa é muito baixa. As mulheres e as crianças (7 a 10 anos) são os maiores usuários de tu. O pronome você é um pronome mais formal e também tem a função de contato. O pronome senhor faz parte da comunidade de fala tefeense, mas os resultados indicam que uma possível mudança no sentido senhor _ +tu nas relações assimétricas íntimas pode estar em curso. 486 487 EFEITO DA VARIÁVEL SEXO EM FENÔMENO DE VARIAÇÃO MODO-TEMPORAL: O USO DO SUBJUNTIVO Hebe Macedo de Carvalho – UFC A atuação de fatores linguísticos e sociais sobre fenômenos de variação e mudança linguística constitui premissa básica dos pressuspostos teórico-metodológicos da Sociolinguística (LABOV, 1972; 1994). Este estudo tem como objetivo apresentar uma análise variacionista do uso do subjuntivo em orações substantivas introduzidas pela partícula que. O subjuntivo pertence ao domínio irrealis, exprimindo noções de volição, opinião, avaliação. Nas palavras de Givón (2001), constitui um subdomínio do irrealis por expressar um julgamento, avaliações em grau de crença e de obrigação. Investiga-se, neste trabalho, a atuação dos fatores linguísticos: verbo da oração principal, tempo verbal da oração e da variável social sexo sobre o uso do subjuntivo. A Gramática Tradicional apresenta o verbo da oração principal como um fator determinante para a seleção do modo verbal da oração encaixada, esse dado é corroborado por estudos de cunho variacionista (ROCHA, 1997; CARVALHO; 2007, por exemplo). Esses estudos têm demonstrado que o verbo/carga semântica da oração principal constitui um fator determinante na seleção dos modos da oração encaixada: o subjuntivo é altamente frequente em sentenças com verbos matrizes volitivos; não ocorre em sentenças com verbos matrizes factivos do tipo saber; coocorre com o indicativo em sentenças com verbos matrizes cognitivos/de opinião, do tipo acreditar, crer, pensar, achar que. O estudo em tela considerou, para efeito de coleta e análise de dados, sentenças com verbos volitivos, factivos e de opinião. Foram adotados os procedimentos metodológicos da sociolinguística laboviana para a delimitação das variáveis sociais. Nesse sentido, o grupo de fatores sexo será considerado nos moldes da delimitação clássica da Sociolinguística. A amostra de dados de fala é formada por 24 informantes da cidade de Fortaleza, sendo 12 do sexo masculino e 12 do sexo feminino, estratificados em 3 faixas etárias (15-25; 26-49; + de 50 anos), com 0-4 anos e 9-11 anos de escolaridade. Os dados foram submetidos ao Programa GOLDVARB X (SANKOFF, TAGLIAMONTE, SMITH, 2005), disponível no link http://individual.utoronto.ca/tagliamonte/goldvarb.htm, para análise multivariada de fenômenos linguísticos. Os resultados mostram uma baixa frequência de uso do subjuntivo, estando esses usos concentrados no conjunto de verbos matrizes altamente favorecedores da forma subjuntiva: do total de apenas 341 ocorrências de orações subordinadas substantivas, apenas 63, ou seja, 18,5% ocorreram com o modo subjuntivo na oração encaixada. As mulheres usaram mais a forma subjuntiva do que os homens, contudo, é importante analisar o efeito da variável sexo em correlação com o verbo da oração matriz, bem como considerar as restrições linguísticas impostas pelo uso do subjuntivo e a distribuição da frequência dessa forma por verbo da oração matriz. A VARIÁVEL SEXO/GÊNERO E O USO DE VOCÊ(S), OCÊ(S) E CÊ(S) NO PARANÁ Loremi Loregian-Penkal – UNICENTRO/CNPq O estudo – sincrônico e diacrônico – dos pronomes de segunda pessoa no Português do Brasil (PB) é necessário para que se possa tentar reconstituir a história e estabelecer a sua distribuição pelo território nacional. Assim, trazemos à tona parte dos resultados da pesquisa sobre as formas de realização de você(s) e de suas variantes nas cidades paranaenses que integram o banco de dados Variação Linguística Urbana na Região Sul – VARSUL. Para tanto, a presente comunicação busca socializar os resultados da análise empreendida nas cidades de Curitiba, Irati, Londrina e Pato Branco, Paraná, no tocante à variável sexo/gênero para, assim, tentar revelar tendências sobre o uso e os papéis sociais da forma pronominal "você" e suas variantes "ocê" e "cê". Para dar conta da análise, adota-se os pressupostos teórico-metodológicos da Sociolinguística Variacionista. A amostra analisada compreende a análise de 136 informantes; 44 de Curitiba e 44 de Irati, 487 488 estratificados de acordo com o sexo/gênero (masculino e feminino); a escolaridade (1 a 4; 5 a 8; mais de 8 anos de escola) e a idade (12 informantes de 14 a 24 anos; 12 de 25 a 50 anos; 12 de mais de 50 anos; 08 universitários de cada localidade); 24 informantes de Londrina e 24 de Pato Branco (12 de 25 a 50 e 12 de mais de 50 anos). Os dados são provenientes do banco de dados do projeto VARSUL e do banco de dados Variação Linguística de Fala Eslava – VARLINFE. Além da análise das entrevistas formais, fizemos, também, com o suporte de LABOV (1972; edição de 2008, p. 32), observações em muitas situações espontâneas: nos ônibus de Curitiba, Irati, Londrina e Pato Branco; em reuniões de escola; em lanchonetes; em restaurantes e em outros locais públicos nos quais o som da conversa pública pudesse ser ouvido e anotado (e, eventualmente, gravado). Da mesma forma como procedeu Labov, não nos valemos dessas anotações para a análise propriamente dita: elas serviram apenas como “amostras de controle” para se checar as variantes em uso de você(s). Os dados foram submetidos ao tratamento estatístico do Programa GoldVarb. PRONOMES DE SEGUNDA PESSOA NA FALA TOCANTINENSE: REFLEXÕES PRELIMINARES Cícero da Silva – SEDUC-TO O presente trabalho objetiva apresentar reflexões, ainda que preliminares, acerca dos pronomes de segunda pessoa na variedade da fala tocantinense. Levando-se em consideração que o estado do Tocantins está situado no centro do território brasileiro e possui limites geográficos com 06 (seis) estados diferentes, sua composição populacional apresenta uma grande miscigenação. A partir do século XVII ocorre um longo processo de ocupação da região (CAVALCANTE, 1999), iniciado por bandeirantes oriundos do sudeste do país, os quais vinham à procura de ouro e índios. Outros ocupantes pioneiros são os religiosos. De origem das regiões norte e nordeste, estes tinham a missão de “catequizar” os nativos, em especial ao longo dos Rios Tocantins e Araguaia. Além das várias tribos indígenas que já viviam na região do antigo norte goiano (atual estado do Tocantins), após a chegada dos bandeirantes e religiosos duas correntes migratórias dominam a ocupação. Uma é de origem nordestina, formada principalmente por maranhenses criadores de gado e pequenos agricultores. A outra frente de colonizadores é representada por goianos que se estabeleciam na região para explorar minerais, as terras e os tributos. De acordo com a área geográfica tocantinense em que os migrantes fixaram residência, observa-se que a variação parece ser bastante distinta quanto aos usos dos pronomes de tratamento tu e você (e suas variantesocê, cê). Percebe-se que no centro-sul do Tocantins – regiãohabitada em sua maioria por descendentes de goianos (inclusive mineiros) – ouso de você (e ocê/cê) aparentemente é mais recorrente. Já no norte tocantinense e Bico do Papagaio – região em que a ocupação majotária é de descendentes maranhenses – o uso do pronome tu parece ser mais frequente que você, embora dificilmente note-se concordância. À luz dos pressupostos teóricos da sociolinguística quantitativa variacionista(LABOV, 2008) e de estudos sobre os pronomes de segunda pessoa (SCHERRE, LUCCA, DIAS, ANDRADE & MARTINS, 2009; SCHERRE & YACOVENCO, 2012), a pesquisa considera tanto os aspectos linguísticos quanto os aspectos sociais dessa variação. Propõe-se investigar a variação sob a ótica dos fatores sociais, poisé necessário verificar a tendência de uso de tu/você segundo as variáveis gênero/sexo, idade e escolaridade. Evidentemente, a identidade do falante é outro aspecto importante a ser considerado. Logo, essas variantes corroboram a necessidade de estudos específicos sobre elas para conhecer melhor o fenômeno da variação linguística no Tocantins. Mediante tal estudo, pretende-se contribuir para a constituição do perfil linguístico tocantinense e a descrição do Português Brasileiro (PB) falado no Tocantins. 488 489 SIMPÓSIO 46 A ABORDAGEM CONSTRUCIONAL NA PESQUISA FUNCIONALISTA – TENDÊNCIAS E PERSPECTIVAS Uma das mais recentes e promissoras tendências da pesquisa funcionalista atual, em sua vertente norte-americana (Bybee, 2010; Traugott e Dasher, 2005), reside na inteface com estudos cognitivistas sobre construção, na linha de Golberg (1995, 2006), Croft (2001) e Croft e Cruse (2004). Essa vertente de pesquisa, nomeada de “gramaticalização de construções” (Noël, 2007), tem se mostrado produtiva nos estudos sobre mudança gramatical, em perspectiva histórica, e na detecção de clines de gramaticalidade, em perspectiva sincrônica. Um dos propósitos do simpósio é a discussão, em termos teórico-metodológicos, de como os estudos sobre construção, oriundos do Cognitivismo, podem ser tomados para dar conta dos processos de gramaticalização, no âmbito do Funcionalismo, tal como tem demonstrado Traugott (2008; 2012). Este simpósio, assim posto, visa reunir, apresentar e discutir pesquisas em desenvolvimento voltadas para a referida interface, com a criação de espaço acadêmico que proporcione condições adequadas à troca e ao intercâmbio entre funcionalistas envolvidos com a abordagem construcional. COORDENAÇÃO Mariângela Rios de Oliveira Universidade Federal Fluminenese [email protected] Ivo da Costa do Rosário Universidade Federal Fluminense [email protected] 489 490 LINGUÍSTICA E COGNIÇÃO: A GRAMATICALIZAÇÃO E SUAS MOTIVAÇÕES COGNITIVAS Priscilla de Almeida Nogueira – USP A presente pesquisa tem como objeto o estudo das construções de base aproximativa quase e quase que e como objetivo principal, analisar o processo de gramaticalização dessas construções a partir do estudo de motivações intencionais e cognitivas. Em estudo anterior (NOGUEIRA, 2010), ao considerar a trajetória de mudança operada pelo item meio, a hipótese de que a codificação de atitudes linguísticas se daria via processo de gramaticalização revelou-se ratificado. Em estudos posteriormente realizados, com o intuito de se dar continuidade ao trabalho com a gramaticalização, foi verificado que esse encaminhamento também respaldava os estudos de Mendonza & Baicchi (2007) e de Margerie (2007) com outras construções. A partir dessas constatações, foi-se questionado se o mesmo estaria ocorrendo com a construção quase que. Para compor o corpus da atual pesquisa, analisou-se um conjunto de redações dissertativas de candidatos ao vestibular da Fuvest referente aos anos de 2004 a 2011. Além da realização de um trabalho de análise dos dados à luz de princípios funcionalistas, dentre os quais se inclui o princípio de iconicidade, especialmente em sua subcategoria de quantidade (CUNHA, COSTA, CEZARIO, 2003), foi necessário lidar com a materialização linguística de processos intencionais e cognitivos, tal como postulado por Givón (2011), uma vez que entender o processo de deslizamento funcional de uma construção exige atentar a motivações também extralinguísticas. Tornou-se imprescindível analisar o estatuto informacional, a ordem e mesmo seu escopo dentro da construção sentencial. Reconheceu-se, ainda, em que parte da dissertação é empregada a construção inovadora e verificou-se se houve paralelo em cada ano investigado. Para aprofundamento dos conhecimentos a respeito de cognição, recorremos a Tomasello (1999, 2008) e Croft (2009). A CONSTRUÇÃO DE QUANTIFICAÇÃO INDEFINIDA COM DETERMINANTES POLILEXÊMICOS NO PORTUGUÊS DO BRASIL Thais Fernandes Sampaio – UFJF Tatiane Silva Tavares – UFJF A FrameNet é um projeto léxicográfico computacional, coordenado por Fillmore e Baker, que identifica e descreve frames semânticos. A FrameNet Brasil (FN-Br), em parceria com o projeto supracitado, objetiva construir uma fonte de pesquisa lexical para o Português do Brasil (PB) baseada em frames e sustentada por evidências de corpus. Uma das frentes de trabalho da FN-Br é a implementação de um “Constructicon”, que seria, simplificadamente, um repertório de construções do PB. Este trabalho se desenvolve, portanto, no âmbito da FN-Br, com o objetivo de implementar o Constructicon do PB. Os dois pilares de fundamentação teórica da pesquisa são a Semântica de Frames (FILLMORE, 1982) e a Gramática das Construções (GOLDBERG, 1995). A pesquisa desenvolvida tem por objeto a Construção de Quantificação Indefinida com Determinantes Polilexêmicos, que pode ser ilustrada por instanciações do tipo: uma enxurrada de críticas, um mar de problemas, uma floresta de pincéis. A estrutura dessa Construção pode ser assim esquematizada: um(a) N1 de N2; sendo N1 o elemento quantificador e N2 a entidade quantificada. Estão sendo analisados dados reais de uso linguístico, seguindo uma tendência contemporânea da Linguística Cognitiva, qual seja a de adoção de uma Metodologia de Linguística de Corpus. Inclusive, tendo em vista o macroprojeto ao qual está vinculado, um dos produtos do estudo será um conjunto de sentenças anotadas que represente os contextos de uso da Construção. Nesse enquadre metodológico, trabalhamos com o Modelo Baseado no Uso (BYBEE, 1985, 1995 apud CROFT; CRUSE, 2004). A pesquisa indica que a Construção analisada apresenta alta frequência de tipo. Focando apenas nos quantificadores indefinidos de grande quantidade, já foram identificados mais 490 491 de dez tipos diferentes (oceano; vendaval; enxurrada; caminhão; montanha; floresta; mar; porrada; pilha; montão). Em relação à frequência de ocorrência, verificamos uma variação considerável, de modo que há tipos de alta frequência de ocorrência (mar e porrada) e outros que apresentam baixa frequência de ocorrência (galáxia; vendaval). Nesta fase da pesquisa, investigamos as restrições combinatórias da Construção. Resumidamente, buscamos entender porque algumas combinações de N1 e N2 são licenciadas pela Construção e outras não. (1) Um mar de dinheiro (2) Um mar de luto (3) Uma montanha de dinheiro (4) *Uma montanha de luto. Nossa proposta de análise dessas restrições recorre à noção de esquemas imagéticos (JOHNSON,1987), entendendo que as unidades lexicais que ocorrem nas construções tendem a preservar seus respectivos esquemas (SWEETSER, 1988). Nessa perspectiva, tais restrições seriam explicadas, portanto, pela (im)possibilidade de combinação dos esquemas imagéticos subjacentes a N1 e N2. “EU FIQUEI DE FAZER ISSO”: GRAMATICALIZAÇÃO DE CONSTRUÇÕES DEÔNTICAS NO PORTUGUÊS Angélica Rodrigues – UNESP O objetivo do projeto é analisar as construções do tipo FICAR DE + INFINITIVO, seus valores e funções, além de sua relação com as construções TER/FALAR/PENSAR DE + INFINITIVO: (1) Fiquei de fazer a decoração da FESTA de Reveillon lá de casa. Alguém tem idéias? Essas construções estão associadas à expressão da modalidade deôntica, envolvendo noções escalares que vão de uma obrigatoriedade máxima (ter de) até uma relativa obrigatoriedade, como nos casos em que observamos uma obrigação autoimposta (2) e uma obrigação fraca (3 e 4), ambas associadas a uma circunstância de impedimento do cumprimento do dever/obrigação/vontade. A circunstância de impedimento se configura de duas maneiras: quando o compromisso assumido ou autoimposto não foi de fato cumprido, a circunstância de impedimento é apresentada (ainda que em algumas vezes as razões para a não realização do dever/obrigação/vontade sejam fracas); quando, por outro lado, o compromisso, autoimposto ou não, refere-se a uma ação projetada para o futuro (1 e 4), a circunstância de impedimento aparece vinculada à realização de uma outra ação, do próprio agente ou de outros (pedido de ajuda), cuja não realização poderá funcionar como empecilho à realização do dever/obrigação/vontade. (2) Há alguns meses atrás vi a receita no programa do Olivier Anquier na qual ele visitou algumas cidades da Itália. Ele deu a receita e a preparou em um lugar maravilhoso. Fiquei de fazer e nada. (3) Já visitei a agencia, fiquei de fazer book, porém não pude fazer na época (4) fiquei de sair com uns amigos neste sábado e ainda n sei o que eu uso, me ajudem Para fundamentar nossa pesquisa, estando endossando os pressupostos teóricos da gramática das construções (GOLDBERG, 1995), com o objetivo principal de organizar, a partir das evidências empíricas, uma rede construcional das construções em foco. Interessa-nos investigar as motivações para a emergência dessas construções a partir de dois eixos principais. No eixo da mudança interconstrucional, em que buscaremos evidências da mudança direcional entre as construções [ ficou combinado X] > [Suj ficar[+ flex] combinado X] > [Suj. ficar[+ flex] de X]. Num outro eixo de investigação, discutiremos a relação analógica entre as construções ter de, como padrão [+ prototípico] de significados deônticos, e as construções ficar/falar/dizer/pensar de.A pesquisa está 491 492 em fase inicial e as ocorrências apresentadas foram coletadas da internet, através do sistema de busca do Google. CONTRIBUIÇÕES DA ABORDAGEM CONSTRUCIONAL PARA O ESTUDO DAGRAMATICALIZAÇÃO DE ORAÇÕES COMPLETIVAS Gisele Cássia de Sousa – UNESP Nos estudos sobre gramaticalização de orações completivas, dois processos têm se revelado principais atuantes na simplificação do complexo oracional completivo, isto é, na redução do complexo subordinativo, originalmente bi-oracional, a complexo monooracional. Esses processos são: (i) a dessentencialização da oração completiva, refletida na alteração de sua forma de expressão, que passa de finita à não-finita (LEHMANN, 1988; GIVÓN, 1990; CEZARIO, 2001, 2004; CARVALHO, 2004); e (ii) a gramaticalização dos predicados matriz de completiva, que em geral se desenvolvem a marcadores de modalidade e evidencialidade (LEHMANN, 1988; THOMPSON; MULAC, 1991; GONÇALVES, 2003; CASSEB-GALVÃO, 2001). Uma terceira via pela qual pode ocorrer a simplificação do complexo oracional completivo, e que escapa a esses dois processos, também tem sido identificada: a reanálise do complementizador (que, como, se) como parte do predicado matriz (SOUSA, 2007, 2012), formando com ele um único bloco significativo, uma “construção” no sentido em que a define Goldberg (1995, 2006). As construções resultantes dessa gramaticalização, identificadas até o momento, são de diferentes tipos e operam sobre o significado da oração a que se ligam como indicadoras de atenuação de um ato imperativo (veja se, vê se), de modalidade epistêmica (quem sabe se), de evidencialidade (diz que), de estado de indignação do falante (não sei como) e de retomada de tópico discursivo (eu sei que). Como demonstrado em Sousa (2007, 2012), acompanham esse modo de gramaticalização os mesmos processos de integração semântica-cognitiva e morfossintática operantes sobre os dois outros modos de simplificação da sentença completiva. Assim, conforme se pretende discutir no âmbito do Simpósio, importante contribuição da abordagem construcional revela-se, para esse caso específico, a partir da identificação que a abordagem permite de ocorrência atípica de gramaticalização do complexo oracional completivo. Também constitui aspecto positivo da adoção dessa abordagem para este estudo, assim como para os estudos de gramaticalização em geral, conforme aponta Diewald (2006), a possibilidade de se descrevem conjuntamente as propriedades formais e semântico-pragmáticas que acompanham e determinam a gramaticalização, dado o pressuposto nas abordagens construcionais de que construções são unidades formadas por complexo indissociável de fatores semânticos, pragmáticos e formais. Outro ponto que se pretende discutir com o trabalho a ser apresentado é, por fim, em que medida o tipo de gramaticalização enfocado poderia ser tratado como caso de “construcionalização”, conforme proposta de Traugott (2012), especificamente com referência à adequação e a possíveis vantagens desse tratamento para o estudo em questão. A CONSTRUÇÃO SE NÃO ME ENGANO Taísa Peres de Oliveira – UFMS Recentemente, muito se tem discutido a respeito do papel das “construções” no entendimento da gramaticalização. Tendo em vista o conceito de construções de contexto específico, desenvolvido por Traugott (2003), neste trabalho propõe-se analisar a condicional ‘se não me engano’, a fim de averiguar se este seria ou não um caso de gramaticalização. Por meio da análise realizada aqui é possível identificar algumas especificidades na configuração formal e semântica da condicional ‘se não me engano’. O valor de incerteza que figura nessas orações não parece ser decorrente apenas do sentido atualizado pela conjunção condicional. A expressão da modalização epistêmica que se 492 493 verifica nesse tipo de construção emerge da relação estabelecida entre os vários elementos que compõem a condicional ‘se não me engano’ e o contexto gramatical em que essa construção ocorre. Como consequência desse processo, a condicional ‘se não me engano’ se torna uma estrutura fechada, o que acarreta uma série de restrições formais que a diferenciam de uma oração condicional qualquer. Para confirmar o estatuto mais gramaticalizado da construção, a oração ‘se não me engano’ é analisada, neste trabalho, segundo os parâmetros de gramaticalização de Lehmann (1995) e de Hopper e Traugott (2005). Além disso, para verificar o grau de dessentencialização da oração ‘se não me engano’, considera-se a proposta de Lehmann (1988). Por meio da análise realizada neste trabalho pode-se dizer que a condicional ‘se não me engano’ passa por um processo de subjetivização, já que se gramaticaliza como expressão das atitudes/crenças do falante. No entanto, não se trata de um caso clássico de gramaticalização - no sentido de um item lexical se tornar gramatical - mas sim da gramaticalização de uma construção de contextoespecífico, que se especializa, num determinado contexto, com a função de expressão atitudinal. Os dados analisados neste trabalho foram coletados no banco de dados do corpus no <www.corpusdoportugues.org >, que contempla as variedades do português do Brasil e de Portugal, nas modalidades oral e escrito. ANÁLISE DOS LOCATIVOS EM TEXTOS OPINATIVOS DO SÉCULO XVIII AO XX Monique Petin Kale dos Santos – UFF O presente trabalho tem por objetivo analisar a ordenação e referenciação dos advérbios locativos (cá, aqui, lá, aí, ali) e seus aglutinados (daqui,daí,dali) em textos opinativos dos séculos XVIII, XIX e XX, com base nos pressupostos teóricos do funcionalismo norte-americano (Furtado da Cunha, Oliveira e Martelotta, 2003). Trabalhamos também com o conceito de unidade pré-fabricada (Erman e Warren, 2000) e o conceito de construção, nos termos de Goldberg (1995). A escolha desses pronomes deve-se à alta frequência com que os pronomes locativos são encontrados em relação aos demais membros das classes adverbiais, conforme propõe Givon (2001). Para interpretação e comparação dos dados, utilizamos como corpora as obras: Reflexão sobre as Vaidades dos homens, de Matias Aires (Século XVIII); Verdadeiro Método de Estudar, de Luis António Verney (Século XVIII); Segundo livro de crítica: arte e litteratura portugueza d'hoje : (livros, quadros e palcos), de Luciano Cordeiro (Século XIX); Críticas, de Machado de Assis (Século XIX); Formação da Literatura Brasileira (Momentos decisivos) 1º. Volume (1750-1836), de Antônio Candido (Século XX) we, finalmente, Nó e a Europa: ou as suas razões, de Eduardo Lourenço (século XX). Ademais, estabelecemos uma relação discursivo-gramatical, a partir do perfil dos remetentes e destinatários e a influência deste aspecto no uso dos locativos. Observamos nas obras analisadas a ordenação dos pronomes locativos em relação ao verbo, a polissemia desses pronomes e o processo de gramaticalização ocorrida nessas sincrônias. Nos resultados parciais de nossa pesquisa, confirmamos alguns dados de nossas hipóteses. Dessa forma, nas obras pesquisadas no século XVIII, a grande parte dos advérbios encontra-se em posição pré-verbal, considerada a posição mais regular em sincronias mais antigas da língua portuguesa (MARTELOTTA, 2006). Outro aspecto que aponta o alto índice desses locativos deve-se à presença de unidades préfabricadas, tais como: “daqui vem (que)” , “daqui procede”, entre outras. Entretanto, no século XIX, a ordenação não-marcada, ou prototípica, do advérbio pronominal locativo tende a ser pósverbal, situando-se, imediatamente. após o verbo. No século XX, porém, encontramos a maioria dos locativos em posição pré-verbal. Esse resultado deve-se ao aumento desses elementos em início de oração, revelando tanto um aspecto conectivo e⁄ ou um aspecto temporal e confirmando, assim, a trajetória de gramaticalização dos mesmos. Quanto à referenciação dos advérbios nos séculos estudados, a grande parte articula elementos de coesão textual, indicando uma sequência expositiva de fatos ocorridas no texto. Uma pequena parte relaciona-se à espaços físicos virtuais presentes nos textos, tais como: pensamentos e críticas. Esta última parte refere-se à espaços não concretos e 493 494 mensuráveis. Relacionamos esses resultados ao fato de, nessas obras, haver uma tendência dos advérbios de abordar assuntos mais abstratos, tal como: o sentimento humano e, em outros casos, exibir um aspecto conectivo entre um elemento que já foi citado e um novo elemento. Logo, com base nos dados mostrados, procuramos demonstrar a correlação entre gramaticalização e o gênero de textual pesquisado. Essa relação gera uma maior frequência de sequências expositivas, verificando, assim, uma grande ocorrência de espaços virtuais ou mais “abstratos”. Outro aspecto importante pode ser visto no fato de que as obras de cunho opinativo motivam ainda usos das unidades pré-fabricadas, como “daqui vem”, em trajetória de gramaticalização. PADRÕES DE USO DA CONSTRUÇÃO LOCV: GRAMATICALIZAÇÃO E GRAMÁTICA DE CONSTRUÇÕES Rossana Alves Rocha – UFF Investigação dos padrões de uso da construção LocV, em expressões como “lá vai” e “aí está”, e identificação de possível articulação mais gramatical veiculada por esse esquema construcional. A pesquisa é de caráter qualitativo, baseando-se em corpora referentes ao século XX e início do XXI, e fundamenta-se no funcionalismo linguístico, a partir do estudo da gramaticalização - entendido como processo pelo qual um item gramatical ou, em nosso caso, sequências de itens gramaticais, tendem a se regularizar e convencionalizar seu sentido - e dos mecanismos de extensão metafórica e metonímica, nos termos de Bybee (2010), Heine e Kuteva (2007), Traugott e Dasher (2005), entre outros, e na abordagem cognitiva da Gramática de Construção, mormente, nos termos de Croft (2001). Levamos em conta, desse modo, mecanismos dominantes de mudança como a metáfora e a metonímia: esta relacionada às pressões estruturais, numa relação de superfície em que a contiguidade conceitual reflete associação e indexicalidade, atuando, assim, no nível sintagmático; e aquela se referindo à transferência de domínios, sendo a consequência, o resultado das relações metonímicas, atuando no nível paradigmático. Parte-se da hipótese de que as construções LocV, tais como ai está e lá vai, além de constituírem uma unidade de sentido e forma que articula um tipo de referência semântico-sintático distinto daquele advindo da soma de seus constituintes, são resultantes do processo de gramaticalização. Relaciona-se esse processo ao que Traugott e Dasher (2005) chamam de “inferência sugerida”, já que o emissor lança mão de elementos originalmente do nível da gramática, como o pronome locativo e o verbo de movimento, para a articulação de outro sentido, com vistas à adesão e anuência de seu interlocutor. Nessa trajetória ascendente de gramaticalização, está envolvida a alteração do estatuto categorial dos elementos, atribuindo funções gramaticais aos materiais lexicais, e, se já gramaticais, funções ainda mais gramaticais em contextos morfossintáticos e semântico-pragmáticos altamente restritos (TRAUGOTT, 2003:645). Assumindo que fatores de ordem pragmática e cognitiva interagem para a criação de aí está e lá vai, analisamos suas propriedades semântico-sintáticas e discursivo-pragmáticas, via modelo top down, quando o sistema linguístico é afetado descendentemente, promovendo assim o surgimento dessas expressões e, via bottom up, quando a fixação de seus usos afetam o sistema, ampliando sua representação. Em vista disso, nos fragmentos destacados na análise, observamos o grau de integração sintático-semântico, a função exercida em contextos específicos, a possibilidade de inserção de algum elemento e o tipo de referência feita. Detectam-se, assim, múltiplas funções de “aí está” e “lá vai”. Quando não foi possível identificar uma função única para as expressões, tais dados foram chamados de casos imbricados. Objetiva-se, assim, verificar as motivações para a mudança linguística quais sejam cognitivas, subjetivas, discursivas e/ou pragmáticas; evidenciar os traços que diferenciam os distintos usos das construções LocV na formação de contextos específicos e, a partir de questões semânticas e formais, propor um cline de gradiência dessas microconstruções. 494 495 MARCADORES DISCURSIVOS COMO INSTANCIAÇÕES DA CONSTRUÇÃO VLOC: FATORES CONTEXTUAIS DE ANÁLISE Ana Cláudia Machado Teixeira – UFF/CNPq Este trabalho explora alguns aspectos da formação de marcadores discursivos, tais como: chega aí, diga aí, escuta aqui, (es)per(a) aí, (es)t(á) aí, olha lá, segura aí, vá lá, vam(os) lá, vê lá e vem cá, entre outros, como instanciações da construção VLoc. Investiga-se os contextos específicos motivadores da mudança linguística em curso e os fatores de ordem sintática, fonológica, morfológica, semântica, pragmática e discursivofuncional envolvidos. Parte-se da hipótese de que os elementos verbais e locativos são dependentes e tornam-se uma construção, uma unidade de sentido e forma, nos termos de Croft (2001), classificadas como microconstrução, de acordo com Traugott (2008). Embasados na fundamentação teórica que alia as perspectivas da gramática de construções e da gramaticalização nos termos de Croft (2001), Croft e Cruse (2004) por um lado e de Bybee (2003, 2010, 2011), Furtado da Cunha, Oliveira e Martelotta (2003), Heine e Kuteva (2007), Traugott (2003, 2008, 2011), Traugott e Dasher (2005) de outro, objetiva-se examinar: i) as funções que as microconstruções podem assumir de acordo com a situação comunicativa, ii) seus contextos preferenciais de uso e iii) a influência da estrutura sintático-semântica, pragmática e discursiva na mudança linguística. Esses marcadores de base construcional têm atuação relevante no nível pragmático, na negociação ou modalização dos sentidos veiculados, mais frouxo do ponto de vista sintático e em cláusulas destituídas do frame original. Tal atuação leva em conta pressões metonímicas advindas dos contextos interacionais em que também atuam estratégias de (inter)subjetivação, no âmbito das inferências sugeridas (Traugott e Dasher, 2005), agindo como força coercitiva para que se constituam ao mesmo tempo em que se gramaticalizam. Em (es)tá (a)í, por exemplo, o verbo passa a articular e encaminhar a posição do falante e, seu locativo, a localizar sua opinião, como em "E propôs que desencadeasse uma campanha nacional contra saudações lambuzadas. Taí , gostei da idéia! Alô, vítimas do abuso oscular do Brasil! Façam como eu!" Em vá lá, o verbo passa a marcar o movimento da intenção do falante em direção a sua opinião expressa na proposição seguinte e, o locativo, a indicar o nível de concessão que é feita em relação a proposição anterior, como em: "Um boa questão: que elas continuem públicas, vá lá… Mas por que precisam ser gratuitas mesmo para quem pode pagar?". Em vamos lá, o verbo passa a marcar o deslocamento da opinião do falante em relação ao seu interlocutor, uma vez que objetiva convencê-lo e seu locativo direciona tal intenção, como em: "Os mais românticos tenderiam para a opção pela namorada – vamos lá, coragem, ouse ser feliz". A análise das ocorrências do corpus foca sequências tipológicas, nas quais se percebe a atuação de pressões metonímicas em nível stricto. Tais sequências estão inseridas em artigos de opinião, blogs, entre outros gêneros, em que atuam pressões metonímicas em nível lato. Em ambos os níveis, essas pressões contribuiriam para a gramaticalização das construções, na medida em que padrões de uso são rotinizados em contextos específicos, compondo, assim, um esquema mental acessível aos falantes. A GRAMATICALIZAÇÃO DAS CONSTRUÇÕES MODAIS “TER QUE + V2”, “DEVER +V2” E “PODER + V2”: UM CASO DE MACRO-CONSTRUÇÃO? Patrícia Fabiane Amaral da Cunha Lacerda – UFJF O presente trabalho tem como objetivo analisar a gramaticalização das construções modais “ter que +V2”, “dever + V2” e “poder + V2” na língua portuguesa, buscando estabelecer se revelariam um caso demacro-construção, nos termos de Traugott (2008a, 2008b). Assumimos, desse modo, a perspectiva dagramaticalização de construções, uma vez que consideramos que as construções são as unidades básicasda língua, instanciadas a partir do pareamento entre forma e sentido, e que a construção inteira, e nãoapenas o significado lexical de um item, é precursora do sentido gramatical 495 496 (TRAUGOTT, 2003, 2008a,2008b, 2009, 2012). Nesta pesquisa, trabalhamos com a hipótese de que as construções analisadasenvolveriam a instanciação de meso-construção e de macroconstrução, uma vez que identificamossimilaridades em seus padrões construcionais, o que nos leva a considerar a existência de um esquemaabstrato para construções com verbos modais, que se estabeleceria cognitivamente e envolveria omecanismo da analogia. Nesse caso, os resultados obtidos com a pesquisa nos levam a considerar aemergência de uma extensa rede construcional para as construções com verbos modais. Com o intuito devalidar o objetivo apontado acima e de confirmar a hipótese levantada, realizamos uma extensa pesquisapancrônica, que considerou a distribuição das construções analisadas desde o século XIII até o portuguêscontemporâneo. Os dados sincrônicos foram coletados em dois corpora: o corpus do projeto “Mineirês: aconstrução de um dialeto” e o corpus do projeto “PEUL - Programa de Estudos sobre o Uso da Língua”.Já os dados diacrônicos foram retirados do corpus do projeto “CIPM – Corpus Informatizado doPortuguês Medieval” e do corpus do projeto “Tycho Brahe”. Neste trabalho, assumimos que olevantamento da frequência de uso – tanto na sincronia como na diacronia – permite que sejam, de fato,mapeados os quatro níveis – construtos, micro-construções, meso-construções e macroconstruções – queenvolvem o processo de gramaticalização (TRAUGOT, 2008a, 2008b) e o estabelecimento de redesconstrucionais. Assumimos, portanto, que o levantamento de frequência pode fornecer evidênciasempíricas de que as inovações que emergem no fluxo da interação estão se padronizando/regularizandona língua como construções formalmente identificáveis e que, nesse contexto, a consideração de dados denatureza diacrônica pode contribuir substancialmente para a percepção de que estamos lidando, no casodas construções com verbos modais, com mesoconstruções e, em um nível, mais abstrato e esquemático,com macro-construção. A GRAMATICALIZAÇÃO DE VERBOS VOLITIVOS NO PORTUGUÊS A PARTIR DA PERSPECTIVA CONSTRUCIONAL Nathália Felix de Oliveira – UFJF Este trabalho visa a investigar, inicialmente, a gramaticalização dos verbos “buscar”, “esperar”,“procurar” e “tentar” como volitivos na língua portuguesa. Para tanto, opera com as hipóteses de que essesverbos: (i) teriam passado por um processo de mudança semânticopragmática, desenvolvendo um sentidovolitivo; e (ii) estariam relacionados a uma macroconstrução (TRAUGOTT, 2003, 2008a, 2008b, 2009,2012). O padrão observado nos verbos “buscar”, “esperar”, “procurar” e “tentar” também poderia serobservado nos verbos “almejar”, “desejar”, “pretender” e “querer”, os quais possuem a noção de voliçãoem seus usos mais basilares. Assim sendo, assumimos, nesta pesquisa, a abordagem da gramaticalizaçãode construções (TRAUGOTT, 2003, 2008a, 2008b, 2009, 2012), a qual compreende o fenômeno como “amudança pela qual, em certos contextos linguísticos, os interlocutores usam (partes de) uma construçãocom uma função gramatical ou designam uma nova função para uma construção já existente”(TRAUGOTT, 2009, p. 91). Procurando entender o processo de gramaticalização dos verbos “buscar”,“esperar”, “procurar” e “tentar” bem como as similaridades e diferenças dos padrões construcionais dessesverbos em relação a “almejar”, “desejar”, “pretender” e “querer”, observamos os quatro níveis propostospor Traugott (2008a, 2008b), a saber: construtos, microconstruções, meso-construções e macroconstruções.A partir desses níveis, buscamos compreender a atuação dos mecanismos – a frequência, areanálise e a analogia – que propulsionariam a gramaticalização (TRAUGOTT, 2011). A fim de cumpriros objetivos estabelecidos acima, consideramos a distribuição dos verbos “buscar”, “esperar”, “procurar”,“tentar”, “almejar”, “desejar”, “pretender” e “querer” desde o século XIII até o português contemporâneo.Os dados diacrônicos foram selecionados do corpus do projeto “CIPM – Corpus Informatizado doPortuguês Medieval” e do corpus do projeto “Tycho Brahe”. Os dados sincrônicos, por sua vez, foramcoletados em três corpora distintos: o corpus do projeto “Mineirês: a construção de um 496 497 dialeto”, o corpusdo projeto “PEUL - Programa de Estudos sobre o Uso da Língua” e o corpus do projeto NURC/RJ -Projeto da Norma Urbana Oral Culta do Rio de Janeiro. GRAMATICALIZAÇÃO DO VERBO ESPERAR SOB A PERSPECTIVA DA (INTER)SUBJETIVIZAÇÃO Nathália Felix de Oliveira – UFJF O presente trabalho descreve os usos sincrônicos do verbo “esperar” na língua portuguesa,partindo da hipótese de que os novos usos gramaticalizados revelariam um caminho decrescente (inter)subjetivização (FINEGAN, 1995; TRAUGOTT, 1995; TRAUGOTT &DASHER 2005; DAVIDSE, VANDELANOTTE & CUYCKENS, 2010). E que esseprocesso estaria vinculado à emergência de possíveis padrões construcionais (TRAUGOTT,2003, 2008, 2009). A fim de comprovar tais hipóteses, realizamos também umlevantamento diacrônico, o qual buscou comprovar, com maior propriedade, quais usosseriam anteriores e [- (inter)subjetivos]. Os dados sincrônicos recobrem tanto a modalidadeoral quanto a modalidade escrita da língua. Os dados orais foram coletados em três corporadistintos, a saber: o corpus do “Projeto Mineirês: a construção de um dialeto”, o corpus doprojeto “PEUL - Programa de Estudos sobre o Uso da Língua” e o corpus do projeto“NURC/RJ - Projeto da Norma Urbana Oral Culta do Rio de Janeiro”. Já os corporasincrônicos escritos foram compostos por textos disponíveis na Internet, retirados de blogse de revistas de grande circulação nacional (“Revista Veja”, “Revista Isto é”, “RevistaÉpoca”, “Revista Caras”, “Revista Cláudia” e “Revista Ana Maria”). Os dados diacrônicos,por sua vez, foram selecionados do corpus do projeto “CIPM – Corpus Informatizado doPortuguês Medieval” – e do corpus do projeto “Tycho Brahe”. Na análise dos dados,descrevemos pontualmente os diferentes usos do verbo “esperar”, bem como seus possíveispadrões construcionais. Além disso, consideramos a distribuição e a frequência de uso doverbo “esperar”, uma vez que assumimos que o levantamento da frequência pode atuarcomo um subsídio relevante na definição de processos de gramaticalização (BYBEE,2003). Os resultados apontam que o verbo “esperar”, na língua portuguesa, partiu daacepção inicial e [- subjetiva] de “aguardar do tempo” e desenvolveu os usos [+subjetivos]de “volição” e “ter expectativa/contraexpectativa”. Nesse processo, o verbo “esperar” deixade atualizar a noção aspectual de duratividade, que caracteriza sua acepção inicial. Atuandocomo volitivo, “esperar” se configura como um verbo modal, passando a projetar o futuroe, por sua vez, ao manifestar as expectativas (ou não) do falante, passa a indicar suascrenças no campo da hipótese. O verbo “esperar”, conforme verificamos, também figuraem outras construções, como a construção “espera aí/peraí”, a qual, dentre as diferentesfunções que pode exercer, se apresenta como marcador discursivo, revelando um uso [+intersubjetivo] do verbo. MARCADORES DISCURSIVOS DERIVADOS DOS VERBOS DE PERCEPÇÃOVISUAL “OLHAR” E “VER”: UMA ANÁLISE A PARTIR DA GRAMATICALIZAÇÃO DE CONSTRUÇÕES Lauriê Ferreira Martins – UFJF O presente trabalho tem como objeto de estudo os marcadores discursivos (doravante, MDs) derivados dos verbos de percepção visual “olhar” e “ver”, que, em sua configuração construcional, apresentem a forma imperativa. Tomamos como base os pressupostos teóricos da gramaticalização de construções (TRAUGOTT, 2003, 2008a, 2008b, 2009, 2010, 2011, 2012; FISCHER, 2011; GISBORNE & PATTEN; 2011; NOEL, 2007; BYBEE, 2010, 2011). Também partimos de estudos anteriores a respeito da mudança semântico-pragmática dos verbos de percepção visual “olhar” e “ver”, desde sua realização como verbos plenos até seu comportamento como MDs, além do 497 498 trabalho pontual de Rost Snichelotto (2004, 2009, 2011), que trata do comportamento dos marcadores em corpora do projeto VARSUL e em textos de peças teatrais escritos entre os séculos XIX e XX por escritores catarinenses. Realizamos uma abordagem sincrônica a partir de amostras do português falado contidas em três corpora distintos: o corpus do “Projeto Mineirês: a construção de um dialeto”, o corpus do projeto “PEUL – Programa de Estudos sobre o Uso da Língua” e o corpus do NURC/RJ – Projeto da Norma Urbana Oral Culta do Rio de Janeiro”. Os dados sincrônicos contam, ainda, com uma amostra da modalidade escrita da língua, composta por textos disponíveis na Internet, retirados de blogs e de revistas de grande circulação nacional, a saber: “Revista Veja”, “Revista Isto é”, “Revista Época”, “Revista Caras”, “Revista Cláudia” e “Revista Ana Maria”. Também realizamos uma análise diacrônica a partir de dados levantados no corpus do projeto “CIPM – Corpus Informatizado do Português Medieval” e no corpus do projeto “Tycho Brahe”. Neste trabalho, nossos objetivos são descrever os usos sincrônicos dos MDs derivados dos verbos de percepção visual “olhar” e “ver”, verificar se há regularidade entre as microconstruções, entender por que a forma imperativa integra a configuração destes MDs e confirmar se é possível falarmos em macroconstruções entre os MDs analisados (TRAUGOTT, 2003, 2008a, 2008b, 2009). Nossa análise conta com o levantamento da frequência (VITRAL, 2006; BYBEE, 2003, 2011; MARTELOTTA, 2009), o qual nos permite definir o processo de gramaticalização dos marcadores analisados, e com uma análise qualitativa, para a descrição e interpretação dos contextos específicos de uso de cada um dos tipos de MDs analisados. Os resultados apontam que: (i) o domínio funcional em que os MDs atuam é o da chamada de atenção do interlocutor; (ii) há uma tendência à fixação dos MDs derivados de “olhar” e “ver”, em configuração imperativa, na segunda pessoa do discurso (P2) e no modo indicativo dos verbos; (iii) os MDs derivados do verbo “olhar” tendem a ocorrer com mais frequência em contextos sintaticamente independentes, enquanto os MDs derivados do verbo “ver” tendem a ocorrer com mais frequência em contextos sintaticamente dependentes; (v) MDs derivados do verbo “olhar” estão mais avançados no processo de gramaticalização, se comparados aos MDs derivados do verbo “ver”. ROTA DE GRAMATICALIZAÇÃO DO “DAÍ QUE” COMO OPERADOR DE CONCLUSÃO: CONTEXTOS E PADRÕES DE USO EM PERSPECTIVA FUNCIONAL Ana Beatriz Arena – UFF Concluir não só é um processo cognitivo subjacente à elaboração do conhecimento e, como tal, pertinente à condição humana, como também é uma ação argumentativa, codificada linguisticamente por meio de diferentes formas. Uma delas é a expressão “daí que”, objeto deste estudo, para a qual se defende que segue uma trajetória diacrônica de gramaticalização, assumindo sincronicamente o estatuto de operador argumentativo de conclusão. Seguimos os pressupostos teóricos do Funcionalismo Linguístico no que diz respeito à gramaticalização de construções, nos termos principalmente de Traugott (2008) e Bybee (2010), em articulação com a Gramática de Construções, de perspectiva cognitivista, segundo Croft (2001). Entendem-se construções como expressões formadas por duas ou mais palavras, constituindo estruturas relativamente fixas. No caso em estudo, à contração da preposição “de” com o locativo “aí”, soma-se a conjunção subordinativa integrante “que”, formando um todo sintático-semântico de valor conclusivo. Nossos achados iniciais indicam que “daí que” é uma inovação linguística bastante recente, remontando provavelmente ao início do século XX, cujo lócus preferencial de ocorrência são as sequências argumentativas. A análise diacrônica aponta para instanciações de construções possivelmente participantes na gênese do operador “daí que”: “de aí se infere que” (século XVII), “Daí se seguirá que” (século XVIII) – em estruturas linguísticas que Diewald (2006) chama de “contextos atípicos”; “seguiu-se daí que” (século XVIII), “Concluir daí que” (século XIX) e “Não se infira daí que” (século XX) – “contextos críticos”, segundo a mesma autora. Em análise sincrônica, verificamos que “daí que” sofre reanálise, sendo empregado como operador de conclusão, 498 499 apresentando perda de fronteira e de composicionalidade entre seus componentes, pareando forma e sentido: “A leitura do mundo precede a leitura da palavra, daí que a posterior leitura desta não pode prescindir da continuidade da leitura daquele” (Paulo Freire, 1981). Com este estudo, objetivamos investigar a ontogênese do operador “daí que”, consultando textos escritos de base argumentativa dos períodos arcaico, moderno e contemporâneo da língua portuguesa. Por meio do levantamento das frequências type e token (Bybee, 2003), objetivamos, ainda, verificar a produtividade da expressão sob investigação e reconhecer padrões de uso determinantes na sua fixação como operador de conclusão. OS GRAUS DE GRAMATICALIDADE DE CONSTRUÇÕES COM ADVÉRBIOS TERMINADOS EM –MENTE COMO PROJEÇÃO DE POSSIBILIDADE: UM ESTUDO DE CASO Ana Paula Cristina da Silva – UFJF O presente trabalho tem como objetivo analisar os graus de gramaticalidade de construções com os advérbios terminados em –mente que expressem a projeção de uma possibilidade. Para tanto, adotase a perspectiva da gramaticalização de construções (TRAUGOTT, 2003, 2008a, 2008b, 2009, 2012), já que partirmos do princípio de que a gramaticalização não pode ser resumida a uma mudança do tipo léxico > gramática. Na verdade, a gramaticalização envolveria a mudança construção > gramática. Assume-se também a gramaticalização como um processo de (inter)subjetivização (TRAUGOTT, 1995, 2010; TRAUGOTT; DASHER, 2005), uma vez que consideramos que a emergência de novos padrões construcionais na língua está intimamente relacionada ao desenvolvimento de expressões gramaticalmente identificáveis que visam a indicar as crenças e atitudes dos falantes acerca do que dizem. Para o levantamento de dados, utilizamos os seguintes corpora: o Projeto “Mineirês: a construção de um dialeto”, coordenado pela professora Jânia Martins Ramos na UFMG, e o corpus do projeto “PEUL - Programa de Estudos sobre o Uso da Língua”, coordenado pelos professores Anthony Naro, Claudia Roncarati e Christina Abreu na UFRJ. Os dados levantados são analisados quantitativa e qualitativamente. Quantitativamente, entende-se que a verificação da frequência de uso dos padrões construcionais identificados é relevante para que se atestem os diferentes graus de gramaticalidade (VITRAL, 2006). Qualitativamente, busca-se descrever os contextos de uso dos advérbios terminados em –mente que expressem a projeção de uma possibilidade, verificando em que medida o falante desejaria atenuar uma ameaça potencial à face do interlocutor e, portanto, descomprometer-se com o que diz. Com a realização deste trabalho, esperamos comprovar que os padrões construcionais em que figuram advérbios terminados em –mente que expressem a projeção de uma possibilidade seriam pragmaticamente estabelecidos a partir da expectativa que têm os falantes de qualificar, sob a perspectiva epistêmica, o conteúdo proposicional com base em seus julgamentos e crenças pessoais. CONSTRUÇÕES CORRELATAS EM PERSPECTIVA FUNCIONAL Ivo da Costa do Rosário – UFF Grande parte dos gramáticos, por influência da NGB, não incluiu em suas obras a correlação, apesar de esta apresentar especificidades bem particulares em relação aos processos mais canônicos de estruturação sintática. Segundo Hopper & Traugott (1997), "todas as línguas têm dispositivos para interligar as cláusulas no que chamamos de períodos complexos". Esses mecanismos de ligação intersentencial diferem radicalmente de uma língua para outra, desde construções justapostas razoavelmente independentes até construções retóricas dependentes e complexas. Os autores propõem a existência de três pontos de aglomeração: a parataxe, a hipotaxe e a subordinação. Esses 499 500 três processos, segundo grande parte dos funcionalistas, expressam um crescendum de integração, e, certamente, envolvem entre um ponto e outro variadas formas de integração clausal constatadas nas diversas línguas do mundo. Quanto à correlação, verificamos asserções esparsas na literatura linguística funcionalista, o que de per si já justificaria um estudo mais aprofundado sobre o assunto. Castilho (2004), Módolo (1999), Rodrigues (2007), entre outros autores, se debruçam sobre essa questão, filiando‐se às ideias de Oiticica (1952). Na correlação, segundo esses autores, a cada elemento gramatical na primeira oração corresponde outro elemento gramatical na segunda, sem o quê o arranjo sintático seria inaceitável. Sob essa ótica, a definição apresentada, de caráter genérico, já seria suficiente para contrapor a correlação aos outros dois processos mais clássicos de estruturação do chamado período composto. Assim, rompendo com a tradição gramatical e ainda com a força do paradigma formal estruturalista, intentamos analisar a correlação como um processo distinto dos demais à luz da linguística funcional centrada no uso. Em termos metodológicos, nossa pesquisa persegue, em um primeiro momento, um viés estritamente teórico. Em um segundo momento, aplicaremos o instrumental teórico adotado ao corpus, que é formado por textos políticos, extraídos do site da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro. O diálogo a ser travado entre correlação e gramática das construções permitirá uma tipologização das correlatas aditivas em micro, meso e macro‐construções (cf. Traugott, 2010). Nossos resultados apontam para um uso bastante especializado das construções correlatas, inseridas em contextos com alta carga de argumentatividade, como no seguinte exemplo: Das estatais está sendo exigido não apenas mais comedimento na fixação dos preços e tarifas como maior transparência nos negócios. Nosso objetivo, em síntese, é descrever e analisar essas construções, buscando suas especificidades e peculiaridades. A PERSPECTIVIZAÇÃO ESPACIAL EM PADRÕES CONSTRUCIONAIS DO PORTUGUÊS Mariangela Rios de Oliveira – UFF/CNPq/Faperj Fundamentados nos pressupostos da chamada linguística funcional centrada no uso, com base em Bybee (2010) e Traugott (2008; 2012), entre outros, tratamos, nesta apresentação, de como pronomes locativos, atinentes à perspectivização do espaço, atuam em arranjos mais fixos do português contemporâneo do Brasil. Estamos interessados no modo pelo qual os usuários se colocam ou se localizam diante do interlocutor, do conteúdo veiculado e dos demais fatores envolvidos na interação, no entrincheiramento distintivo de pares como espera aí / espera lá, meu amigo aqui / um cara lá, vem cá / vem aí, entre outros. Desenvolvemos nossa pesquisa a partir da compatibilização do paradigma funcionalista e do cognitivista, fundamentos na teoria localista (BATORÉO, 2000). Estamos interessados em identificar, nos usos assim fixados, as expressões exemplares (BYBEE, 2010), que servem de base analógica (FISCHER, 2009) para a replicação de novos tokens. Assim orientados, assumimos a hipótese de que contextos de referência espacial, articuladores de conteúdo mais físico e concreto, motivam, via basicamente metonímia ou analogia, usos no nível sintático ou mesmo pragmático‐discursivo. Consideramos ainda que fatores de ordem textual, como tipo de texto e genero‐discursivo, são relevantes na seleção e frequência dos padrões investigados, ratificando a forte correlação entre a dimensão gramatical e a discursiva. Dos pronomes de uso mais frequente no PB, identificamos lá e aí como os sistematicamente recrutados para a formação de expressões nominais (um garoto lá, uns troços aí) e verbais (vamos lá, diga aí) mais fixas, em termos de sentido e forma (CROFT; CRUSE, 2004); por consequência, trata‐se dos mais gramaticalizados também. De outra parte, aqui e ali tendem a funcionar prototipicamente como advérbios locativos, como representantes mais exemplares da categoria, em contraste com aqueles. De acordo com a abordagem construcional (GOLDBERG, 1995; 2006), o sentido de uma expressão não se configura como a mera soma de suas subpartes, por outro lado, tais subpartes são essenciais para que se instaure o sentido maior, como ratificam nossos resultados. 500 501 SIMPÓSIO 47 LINGUÍSTICA BASEADA NO USO E ENSINO DE PORTUGUÊS A investigação de fenômenos linguísticos baseada na língua em uso tem revelado motivações semântico-discursivas e cognitivas neles implicadas (BYBEE, 2010). Pesquisadores assim orientados reconhecem que fatores de natureza interacional e cognitiva desempenham papel relevante na configuração estrutural de que se revestem variadas construções linguísticas. Isso equivale a dizer que há, de algum modo, uma motivação entre forma e função, de sorte que a codificação linguística de determinadas estruturas tem a ver com as funções que elas desempenham na interação discursiva e se relaciona diretamente aos propósitos que se quer alcançar (GIVÓN, 2001; FURTADO DA CUNHA et al, 2003). É nesse sentido que se justifica a relevância do estudo da língua em uso, conforme defendem linguistas de várias tendências teóricas. Pesquisas desenvolvidas sob essa orientação têm grande contribuição a dar em prol da melhoria da qualidade do ensino de língua portuguesa ministrado na educação básica, uma vez que esse ensino é frequentemente alvo de discussão, debates e críticas, sobretudo no que diz respeito ao tratamento da análise linguística ou, mais especificamente, das chamadas aulas de gramática. Isso porque a tradição escolar, por muito tempo, limitou o ensino de língua ao ensino de gramática da língua (BECHARA, 1993). Baseado em compêndios gramaticais mais conservadores, esse ensino, de caráter prescritivo, privilegiava uma variedade de uso da língua – a norma padrão –, que poucos usuários dominam e que um número bem menor ainda emprega efetivamente, mesmo em situações formais. Além disso, o trabalho em sala de aula parece não lograr muito êxito, visto que exames oficiais de verificação do desempenho de estudantes da educação básica, como o Enem, têm mostrado um resultado insatisfatório quanto à leitura e à escrita, incluindo-se aí o domínio da norma padrão (BISPO, 2010). Nesse sentido, o simpósio aqui proposto volta-se à análise linguística numa perspectiva centrada no uso, com vistas a um trabalho mais produtivo nas aulas de língua materna. Essa proposta possibilita reunir pesquisas que se apoiam em dados extraídos de situações reais de interação comunicativa, correlacionando-as ao ensino de língua portuguesa. COORDENAÇÃO Maria Angélica Furtado da Cunha Universidade Federal do Rio Grande do Norte [email protected] Edvaldo Balduino Bispo Universidade Federal do Rio Grande do Norte [email protected] 501 502 A ALTERNÂNCIA ENTRE O FUTURO DO PRETÉRITO E O PRETÉRITO IMPERFEITO DO INDICATIVO: CONTRIBUIÇÕES PARA AS AULAS DE LÍNGUA PORTUGUESA Fernando Augusto de Lima Oliveira – UNEAL/UFAL/CAPES Thaise dos Santos Tenório – UFAL O pretérito imperfeito do indicativo (PII) é definido como um tempo que expressa uma ação habitual ocorrida em um intervalo de tempo passado, ao passo que o futuro do pretérito (FP) é caracterizado por noções de hipótese, incerteza ou futuro relativo a um momento passado. Os dados da pesquisa evidenciaram que as duas formas são recorrentes na língua e que seu uso não é estigmatizado, uma vez que os falantes se utilizam tanto de uma forma verbal como da outra sem distinção. Levando em consideração as aulas de Língua Portuguesa (LP), vemos que os assuntos gramaticais são sempre abordados do ponto de vista tradicional, não levando os alunos a uma reflexão sobre a funcionalidade da língua. O mesmo problema acontece quando estudamos tal alternância, já que o conteúdo morfológico 'verbo' não é estudado de forma satisfatória. Acreditamos que as noções semântico-discursivas de tempo, aspecto e modalidade devam estar inseridos no estudo verbal. Assumindo a concepção de que a língua é dinâmica e heterogênea, consideramos o estudo dessa alternância relevante. O presente trabalho foi desenvolvido seguindo os parâmetros teórico - metodológicos da Sociolinguística Variacionista (LABOV, 2008). O PERFIL DO PROFESSOR E DA MATÉRIA DE LÍNGUA PORTUGUESA ATRAVÉS DA PERSPECTIVA DISCENTE Amanda Cristina Testa Siqueira – UFJF O presente trabalho faz parte do Macro Projeto Ensino de Língua Portuguesa- da Formação Docente à Sala de Aula e tem por objetivo principal identificar o motivo do crescente desinteresse dos alunos com relação à disciplina de Língua Portuguesa nos dias atuais. Essa identificação será realizada a partir da imagem que esses sujeitos têm a respeito dos professores e da referida matéria, através de discursos narrativos de 354 alunos de 9º ano do Ensino Fundamental e 2º ano do Ensino Médio de sete escolas estaduais do município de Juiz de Fora. A escolha da narrativa é pautada nos pressupostos advindos da sociolinguística (Thornborrow e Coates,2005;Fabrício e Bastos,2009;Threadgold,2005;Bauman,1986;Coupland,Garrett e Williams,2005). A análise dos dados se baseia na Linguística Cognitiva e na Antropologia Evolucionista de Tomasello(2003). A semântica de frames nos termos desenvolvidos por Fillmore(1979,1982) e, em especial, o projeto lexicográfico FrameNet, fornece a principal categoria analítica – o conceito de frame. Portanto, a partir dos frames evocados nos textos recolhidos, podemos constatar quais são as atitudes e as experiências mais marcantes para os alunos na convivência diária do ambiente escolar, a fim de que possamos entender qual é a visão deles acerca dos professores e da matéria de língua portuguesa. A análise dos dados ainda está em fase inicial, por isso não obtivemos, ainda, grandes resultados para serem expostos no presente resumo. A princípio, os alunos demonstram uma preferência por professores mais competentes, dinâmicos e responsáveis. O estudo tem previsão para acabar em agosto de 2013. 502 503 A RELAÇÃO ENTRE O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA E A TRANSITIVIDADE EM TEXTOS DE OPINIÃO DE ESTUDANTES KALUNGA (GO): UMA ABORDAGEM FUNCIONAL-TIPOLÓGICA Roberta Rocha Ribeiro – PPGL/UnB Dioney Moreira Gomes – PPGL/UnB Este trabalho pretende apresentar parte dos resultados de um projeto de doutoramento ora desenvolvido na Universidade de Brasília, o qual analisa a transitividade em textos de opinião escritos em Português Brasileiro (PB). Nosso recorte aqui será composto por três estudantes kalunga da Licenciatura em Educação do Campo (Universidade de Brasília), bem como de seus alunos do Ensino Fundamental II de duas escolas quilombolas de Cavalcante-GO sob a égide da sintaxe funcional-tipológica. O objetivo principal dessa coleta de dados em diferentes níveis de estudo é verificar se há um continuum entre usos linguísticos do professor em formação e do seu alunado. Isso pode revelar inter-relações entre transitividade, gêneros textuais, ensino e letramento. Nesse sentido, cumpre destacar que a sintaxe funcional-tipológica, em geral, apresenta como escopo teórico-metodológico a verificação dos fenômenos linguísticos a partir da língua em uso, da interação entre os falantes. Isso favorece, conforme Haspelmath (2007), a construção da tipologia de uma língua para, enfim, realizar a translinguística com comparações entre diferentes línguas naturais. Assim, a fim de tecer a tipologia linguística do PB acerca da transitividade, são utilizados os estudos seminais sobre o fenômeno em tela de Hopper; Thompson (1980) e Givón (2001), que reconhecem o fenômeno como gradiente e de cunho sintático-semântico-pragmático, respectivamente. Como os dados de análise são coletados e observados em textos de opinião (artigo, resenha, editorial, carta argumentativa), a presente pesquisa possui também como suportes teóricos os trabalhos a respeito de gêneros do discurso de Bakhtin (2000), de tipos ou sequências textuais (ADAM, 2001; MARCUSCHI, 2005), de letramento (BARTON, 1994; STREET, 1993) e de Etnografia Sociolinguística (HYMES, 1974). Os textos de opinião possuem características e funcionalidades próprias, que garantem suas veiculações no mundo. Essas características e funcionalidades se dão tanto em âmbito sintático, estrutural quanto em âmbito do sentido, do discurso. Dessa maneira, a relação existente entre transitividade, gêneros, tipos é a de que mecanismos gramaticais que constituem e organizam a sentença contribuem na formação dos tipos, dos textos, dos gêneros, dos discursos. Já os processos ligados ao letramento podem ser visualizados nas estruturas linguísticas, mostrando a língua(gem) a serviço das práticas sociais dos pesquisados. Gêneros do argumentar e do opinar apresentam exercícios efetivos de cidadania e geram discussões ampliadas do letramento, não o restringindo às práticas escolares, mas os associando às referidas práticas, uma vez que o letramento, além de ser visto aqui como um processo, é orgânico, ecológico, ocorre em instâncias variadas de interação. Por fim, a Etnografia Sociolinguística entra em cena para mapear/delinear as realidades linguísticas e sociais que permeiam as vivências dos discentes kalunga em questão. Nessa linha, a transitividade é vista partindo de estruturas e finalidades diversificadas, da interação social ligadas às práticas pedagógicas. Tal concepção pretende demonstrar o dinamismo linguístico inerente às línguas naturais conforme as intenções e situações comunicativas, além de trazer à linguística uma responsabilidade social. A ACESSIBILIDADE DAS CONSTRUÇÕES RELATIVAS E A AQUISIÇÃO DA ESCRITA Gabriela Oliveira – UNESP-São José do Rio Preto O objetivo deste trabalho é apresentar algumas reflexões preliminares sobre o estudo das orações relativas (ORs) no processo de aquisição da escrita do português brasileiro, de modo a estabelecer as restrições à acessibilidade e a fim de confirmar ou não a hipótese de que a aquisição dessa 503 504 construção é regida pela Hierarquia de Acessibilidade de Keenan e Comrie (1977). Segundo esses autores, quanto mais alta a função na hierarquia, mais fácil é o entendimento da relativa e, por isso, mais acessível à relativização é a categoria gramatical envolvida. Com base numa amostra de aproximadamente 50 línguas, Keenan e Comrie (1977) observam que a variação existente obedece a padrões regulares de distribuição tipológica e, assim, propõem a seguinte hierarquia de acessibilidade das orações relativas: Sujeito > Objeto Direto > Objeto Indireto > Oblíquo > Genitivo > Objeto de Comparação. A aplicabilidade da hierarquia de Keenan e Comrie (1977) como hipótese de facilidade de processamento se confirma em evidências obtidas no processo de aquisição da oralidade; com efeito, Perroni (2001) mostra que a maioria das orações relativas construídas por crianças entre dois e cinco anos retomam referentes na função de Sujeito e Objeto Direto, justamente os dois graus superiores da Hierarquia de Acessibilidade. Tendo como suporte metodológico os dados discutidos por Perroni (2001), este trabalho propõe uma investigação semelhante de acessibilidade à oração relativa, tendo como ponto de partida a Hierarquia de Acessibilidade de Keenan e Comrie (1977) e diferindo do trabalho de Perroni (2001) ao focalizar a aquisição da escrita. Além disso, dois aspectos inovadores em relação aos trabalhos de Perroni (2001) e de Keenan e Comrie (1977) guiam este trabalho: (i) o enfoque não se limita aos critérios sintáticos, mas os estende aos semânticos e pragmáticos. (ii) É extremamente relevante para este trabalho responder se as estratégias copiadoras e cortadoras, na terminologia de Tarallo (1983), persistem nas primeiras fases de aquisição de escrita como estratégias de aquisição das posições mais baixas, levando em conta que as construções não-padrão de oração relativa já tenham sido adquiridas oralmente e que são de mais fácil compreensão que a estratégia padrão. Concordando com Kenedy (2007) que a relativa-padrão em posições preposicionadas é antinatural, consideramos como hipótese que essa alternativa é adquirida pela criança apenas em situação de letramento escolar quando se amplia seu contato com a norma culta; além disso, consideramos como hipótese que as construções que relativizam as posições mais altas na HA (Sujeito e Objeto), juntamente com a alternativa copiadora e a cortadora das posições mais baixas (Objeto Indireto, Oblíquo e Genitivo), devem ser mais prontamente adquiridas, mesmo na situação de letramento formal. Para o desenvolvimento desta pesquisa, serão utilizados dados do corpus de textos escritos coletados pelo Grupo de Pesquisa Estudos sobre a Linguagem (GPEL/CNPq), coordenado por Chacon (20012004). ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O VALOR ASPETUAL ITERATIVO NO PORTUGUÊS EUROPEU E EM POLACO Justyna Wisniewska – UMCS-Polônia Propomo-nos, no presente estudo, comparar os processos de expressão da iteratividade no Português Europeu e em Polaco. Partimos do princípio de que a iteratividade é um dos valores específicos da categoria linguística Aspeto. Esse valor é uma das variantes do valor aspetual durativo.Se compararmos os meios linguísticos disponíveis nas duas línguas em questão, verificamos que, enquanto o Polaco exprime obrigatoriamente o valor aspetual iterativo pelos recursos linguísticos circunscritos à morfologia derivacional, o Português utiliza meios linguísticos diversificados para atingir o mesmo alvo; trata-se de meios morfológicos, morfossintáticos, lexicais, construções sintáticas complexas e meios textuais. Assim, os estudiosos não-nativos costumam encontrar grandes dificuldades na expressão do mesmo valor aspetual em Português que possui a riqueza de recursos linguísticos para exprimir a iteratividade inerente à forma verbal polaca, marcada morfologicamente.Com a análise efetuada procura demonstrar-se que o valor aspetual iterativo encontra, nas línguas em questão, os seus processos de expressão e que estes não costumam coincidir. 504 505 A CONSTRUÇÃO MEDIAL NO PB: UMA ABORDAGEM FUNCIONAL CENTRADA NO USO Nádia Maria Silveira Costa de Melo – UFRN/UERN Neste trabalho, investigamos um fenômeno linguístico do português do Brasil denominado construção de estrutura argumental medial, ou apenas, Construção Medial. Nosso objetivo consiste em analisar a sua constituição interna em termos sintáticos e semânticos, observando as condições pragmáticas que motivam seu uso no discurso. A construção medial é inteiramente aberta quanto ao seu preenchimento lexical (como qualquer construção de estrutura argumental), o que revela a existência de total imprevisibilidade quanto ao seu preenchimento. O material de análise provém corpora Discurso & Gramática, em suas cinco versões: Natal, Rio Grande, Rio de Janeiro, Niterói e Juíz de Fora; ainda, de textos que circulam na Web. As amostras analisadas constituem um corpus com 100 ocorrências de Construção medial da língua em seu uso real, quantidade satisfatória para cumprir com nossos propósitos. A variedade textual surgiu como uma tentativa de captar a diversidade dos modos de codificação morfossintática dessa construção. Para este trabalho foram analisadas 100 ocorrências produzidas por informantes de ambos os gêneros e de variados os níveis escolares. O suporte teórico adotado é a Linguística Funcional Centrada no Uso (Usage-Based Linguistic) ou Linguística Cognitivo-Funcional, conforme os postulados de Tomasello (1998), Martelotta (2008), Bybee (2010) Furtado da Cunha (2011), entre outros. Alguns dos pressupostos defendidos aqui são: a) a língua é uma atividade sociocultural, que serve a funções comunicativas e cognitivas. b) a linguagem humana é um sistema simbólico mediador entre a linguagem, o mundo e a cognição. c) a gramática é um conjunto mutável de rituais linguísticos que está sempre a se adaptar a pressões comunicativas e cognitivas; logo, resulta da cristalização ou regularização (numa ótica sincrônica) de estratégias discursivas recorrentes, que decorrem de pressões cognitivas e, sobretudo, de pressões de uso (FURTADO DA CUNHA, 1996). Os resultados apontam que o uso da construção medial é produtivo em situações em que o falante não quer omitir ou ignora a autoria do evento expresso na construção. SUBJETIVIZAÇÃO E GRAMATICALIZAÇÃO NAS CONSTRUÇÕES VAI VER E VAI QUE Maria Aparecida da Silva Andrade – UFRN A linguagem humana não codifica apenas aquilo que é palpável, visível, objetivo, mas também a forma como o ser humano percebe o mundo ao seu redor, conforme suas expectativas, crenças e atitudes. Assim este trabalho visa analisar a interface entre a manifestação da subjetividade e a codificação morfossintática no emprego das construções vai ver e vai que pelo falante. A metodologia segue a abordagem qualitativa, procurando-se compreender as motivações que orientam o falante para o uso das construções linguísticas em estudo na manifestação de crenças e atitudes. Os dados para composição da análise foram coletados do corpus D&G e de alguns jornais on line. Este trabalho respalda-se teórica e metodologicamente na Linguística Funcional e na Linguística Cognitiva, também denominadas Linguística Cognitivo-Funcional, conforme Tomasello (1998, 2003). Essas duas correntes teóricas compartilham vários pressupostos teóricos e metodológicos como rejeição à autonomia da sintaxe, a incorporação da semântica e da pragmática às análises, a não distinção estrita entre léxico e gramática, a relação estreita entre a estrutura das línguas e o uso que os falantes fazem delas nos contextos reais de comunicação, o entendimento de que os dados para a análise linguística são enunciados que ocorrem no discurso natural, entre outros. A gramática é vista como representação cognitiva da experiência dos indivíduos com a língua; portanto, ela pode ser afetada pelo uso linguístico (FURTADO DA CUNHA; BISPO; SILVA, 2012). Destacamos da vertente funcionalista o paradigma da gramaticalização na acepção 505 506 de Traugott (1995) para quem esse modelo compreenderia um processo de subjetivação, cujos significados, baseados nas crenças e atitudes do falante, são resultantes de processos semânticopragmáticos. Assim, a subjetivização é codificada morfossintaticamente por construções gramaticais que correspondem às crenças e atitudes do falante a respeito da proposição. Acreditamos que isso ocorra com a construção vai ver quando o falante conjectura um evento a partir de outro instanciado, fazendo uma suposição a respeito do que diz, bem como a construção vai que quando empregada para codificar probabilidade acerca do que o falante observa. Espera-se com este trabalho contribuir para uma reflexão em torno da relação codificação morfossintática e manifestação da subjetividade considerando-se o contexto em que os enunciados ocorrem efetivamente. UMA ANÁLISE DO ASPECTO VERBAL DO PB EM GRAMÁTICAS NORMATIVAS Thaís Ludmila da Silva Ranieri – UFPE O presente trabalho pretende fazer uma análise do estudo sobre aspecto verbal em gramáticas normativas de Língua Portuguesa. Para isso, apresentaremos uma discussão sobre o aspecto verbal dentro das teorias linguísticas, ao passo que traremos exemplos de diversas línguas, confrontandoos com exemplos do Português Brasileiro. Podemos anunciar, de antemão, que o aspecto verbal em Português Brasileiro (PB) vem sendo tratado dentro dos estudos gramaticais tradicionais associados às categorias de tempo e modo, restringindo a discussão ao plano morfológico. Por vezes, o aspecto nem é apresentado como categoria verbal. No entanto, vários trabalhos desenvolvidos, desde a década de 60 aqui no Brasil, mostram que tal questão vai além do plano morfológico. Givón (1984) ressalta que o tempo, o modo e o aspecto são as categorias mais comuns universalmente encontradas dentro da classe dos verbos. Para Payne (1997, p. 238, tradução nossa), “o aspecto descreve a forma temporal interna de eventos ou estados”. Em sua visão, o aspecto está associado à realização e à duração de eventos ou estados dentro de um plano temporal, ainda que para ele um não seja intrínseco ao outro. O referencial teórico ainda é composto pelas discussões de Castilho (2010) e Ilari (2008), referente às discussões em Língua Português. Em nosso caso, por assumirmos uma vertente de base funcionalista que nos leva a ver além da estrutura linguística, trataremos língua como uma atividade social que se realiza a partir do uso dos falantes de uma determinada comunidade linguística. Para tanto, acionamos questões de ordem pragmática, cognitiva e social em nossas práticas rotineiras de uso da língua. Não descartamos a estrutura que sustenta um sistema linguístico, mas acreditamos que apenas ela não permite a realização de todas as intenções de seus falantes. Retomamos aqui as palavras de Ilari (2003) para quem as características formais se associam a características de sentido. Entendemos, portanto, que língua se realiza na interação social entre seus sujeitos. Em vista disso, confrontaremos tais trabalhos com os estudos apresentados nas gramáticas normativas de Língua Portuguesa. Confrontaremos, em alguns momentos, a visão da Gramática Tradicional, representada por algumas gramáticas normativas, com pesquisas desenvolvidas por linguistas brasileiros que se encontram em gramáticas descritivas. O corpus é composto por uma coletânea de gramáticas normativas, desenvolvidas por Napoleão Mendes de Almeida, Rocha Lima, José Carlos Azeredo e Evanildo Bechara. Sabemos que há inúmeras pesquisas que versam sobre o tema, no entanto priorizaremos aqui, por questões dimensionais, as discussões mais abrangentes e desenvolvidas por pesquisadores mais conhecidos dentro dos estudos da Linguística. De modo geral, o trabalho centra-se em estudos de ordem funcionalista. 506 507 A GRAMÁTICA TEXTUAL NO ENSINO DE PORTUGUÊS Clemilton Lopes Pinheiro – UFRN Os estudos que abordam a análise linguística numa perspectiva centrada no uso, com vistas a um trabalho mais produtivo no ensino de língua portuguesa na educação básica, ficam circunscritos ao nível morfossintático e desconsideram a gramática da língua no nível textual. No entanto, defendemos que há fenômenos gramaticais no nível do texto, entendendo-se o texto não como unidade linguística hierarquicamente mais alta, superior à sentença, mas como entidade do sistema linguístico, com estruturas determinadas por regras de uma gramática textual. Esses fenômenos gramaticais verificados no nível do texto são, comumente, negligenciados no ensino. Nesta comunicação, pretendemos discutir essa questão. Nosso objetivo é focalizar um aspecto da gramática do texto para mostrar como ele pode ser abordado na sala de aula. A articulação tópica, maneira como os segmentos tópicos e enunciados se vinculam linguisticamente na materialidade do texto, é o aspecto da gramática textual focalizado. A perspectiva teórica é a da Gramática TextualInterativa, segundo a qual o texto congrega a atividade discursiva, comportando uma análise integrada de sua construção e dos fatores enunciativos que lhe dão existência e se mostram na sua própria constituição. O PERCURSO GRAMÁTICA < LÉXICO NO PORTUGUÊS BRASILEIRO: UM ESTUDO DE CASOS José Romerito Silva – UFRN Um dos postulados mais caros à teoria da gramaticalização é o que diz respeito à unidirecionalidade, ou seja, à trajetória léxico > gramática que as formas linguísticas parecem seguir na emergência e regularização de padrões gramaticais. Significa dizer que, nesse percurso, componentes linguísticos passam de palavras substantivas, de conteúdo mais “concreto”, a palavras ou morfemas funcionais, de conteúdo esvaziado/ mais abstrato, conforme atestam diversos estudos sobre esse fenômeno, tais como os de Lehmann (1985), Heine et al. (1991), Bybee et al. (1994), Hopper e Traugott (2003), Martelotta (2010), entre outros. Entretanto, pesquisas como as de Norde (2011), Diewald (2011), por exemplo, apresentam evidências da possibilidade de inversão desse percurso, no qual determinadas formas migram da gramática para o léxico. É o que ocorre, por exemplo, com super ou com extra, os quais, a princípio, eram utilizados apenas como prefixos, contudo, atualmente, exibem comportamento lexical em alguns contextos, sendo também utilizados como adjetivos, em função adjuntiva (i.e., modificadores nominais) ou predicativa. Nesse sentido, este trabalho tem como foco de interesse casos do português brasileiro contemporâneo que parecem ratificar a ideia de que o movimento contrário gramática < léxico, embora mais raro e idiossincrático, também é possível. O objetivo é verificar a suposta trajetória inversa ao percurso unidirecional de itens como esses, procurando identificar motivações funcionais implicadas nesse fenômeno. O material de análise é proveniente de dados de fala e de escrita, colhidos do Corpus Discurso e Gramática, em suas variadas seções (Natal, Juiz de Fora, Niterói, Rio de Janeiro e Rio Grande), do Banco Conversacional, bem como de textos diversos que circulam em jornais, revistas e sites da internet. Conferem suporte teórico a esta investigação recentes trabalhos sobre degramaticalização (NORDE, 2011; DIEWALD, 2011), unidirecionalidade (BÖRJARS; VINCENT, 2011; FISCHER, 2011), lexicalização (BRINTON; TRAUGOTT, 2005; LIGHTFOOT, 2011), entre outros que tratam dessa temática. 507 508 TRANSITIVIDADE: ENSINO REFLEXIVO DE GRAMÁTICA Maria Angélica Furtado da Cunha – UFRN Edvaldo Balduino Bispo – UFRN Esta comunicação aborda as relações entre o significado do verbo e a organização estrutural da oração, mais especificamente dos verbos tradicionalmente classificados como transitivos diretos, ou seja, aqueles acompanhados de sujeito e objeto direto. Esta discussão orienta-se por dois objetivos principais: por um lado, trata das relações entre sintaxe e semântica responsáveis pela codificação da oração, com base no significado do verbo e nos papéis semânticos dos argumentos que ele seleciona; por outro lado, apresenta uma proposta de trabalho com interface entre sintaxe e semântica em sala de aula, no âmbito da educação básica, tomando como exemplo um texto narrativo. A perspectiva teórica aqui considerada é a da linguística funcional centrada no uso. 508 509 SIMPÓSIO 48 FERRAMENTAS DIGITAIS E RECURSOS DIDÁTICOS COMPLEMENTARES PARA O ENSINO DE PORTUGUÊS COMO LÍNGUA ESTRANGEIRA Neste simpósio, pretende-se apresentar reflexões e/ou propostas relacionadas às ferramentas digitais e aos variados recursos complementares que se podem utilizar no ensino de português como língua estrangeira. O mercado editorial voltado para este contexto de ensino tem crescido bastante nos últimos anos, com livros didáticos (LDs) mais atuais, tanto no que diz respeito às abordagens quanto à realidade brasileira. No entanto, apesar de os livros didáticos exercerem relevante papel, seja como um elemento centralizador ou provocador, como bem sabem aqueles que atuam como professores, as atividades de ensino requerem materiais complementares de natureza diversa. Gramáticas pedagógicas, por exemplo, se fazem bastante necessárias, uma vez que o tratamento de certos aspectos gramaticais em LDs deixa muito a desejar e, mesmo que seja satisfatório, ainda assim será insuficiente para um aprofundamento da gramática da língua a ser aprendida. Dicionários de aprendizagem também poderiam auxiliar o aluno em seu processo de compreensão ou produção de textos, assim como na realização de exercícios. Em suporte digital – em CD ou como página na internet –, há uma gama de possibilidades que podem ser disponibizadas, como exercícios, atividades, glossários, textos etc., seja para uso em sala de aula, seja como material que exige um aprendizado mais autônomo. Assim, as discussões a serem realizadas neste simpósio certamente contribuirão para o aprimoramento do trabalho do aluno e do professor e para a divulgação da língua portuguesa. COORDENAÇÃO Orlene Lúcia de Saboia Carvalho Universidade de Brasília [email protected] Daniele Marcelle Grannier Universidade de Brasília [email protected] 509 510 NÚMEROS SEMÂNTICOS: O RECURSO DIDÁTICO E SUA APLICAÇÃO NO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA PARA SURDOS E DE LIBRAS PARA OUVINTES Claudio Alves Benassi – UFMT Anderson Simão Duarte – UFMT Na atualidade, o assunto inclusão tornou-se “moda’’ recorrente nas instituições de ensino em todos os níveis educacionais e também não poderia ser diferente nas esferas sociais. A inclusão na sua forma de lei tem o papel de interação social, com uma perspectiva de intercâmbio entre os indivíduos diretamente envolvidos no processo sócio-cultural. As políticas públicas têm norteado as ações de envolvimento dos ditos “sujeitos especiais”, sujeitos estes reconhecedores de seus direitos sociais e legais junto aos órgãos públicos e privados, vale ressaltar, que fora muito diferente dos dias atuais. Direitos conquistados com exclusões, lutas e muitas mortes. A educação é a pedra fundamental da dita inclusão social, figura que representa a aceitação e acomodação entre os indivíduos na tentativa de mostrar ou tenta mostrar a realidade de acessibilidade. A instituição educação está passando por um processo árduo, entretanto, necessário para a legitimidade do tão sonhado e idealizado “direitos iguais para todos”, transformação de um social contemporâneo. Tenta-se criar modelos, regras e/ou fórmulas para o processo ensino-aprendizagem das crianças, jovens ou adultos com algum tipo de “deficiência”, sejam elas: auditiva, física, intelectual, visual ou outras. Os modelos atuais de ensino no processo da escrita da Língua Portuguesa – LP e/ou ensino da Língua Brasileira de Sinais – Libras aos surdos e não surdos são usados na atualidade de forma errônea e descontextualizados. Temos como intuito alcançar os pesquisadores, professores e alunos que estejam engajados no ensino da Libras como L2 aos alunos ouvintes e o ensino de LP como L2 aos alunos surdos. Os Números Semânticos – NS, tem o caráter de preservar a estruturas sintáticas de ambas as línguas envolvidas no processo na modalidade escrita da LP e na modalidade visualespacial da Língua de Sinais – LS. O objetivo central desta pesquisa é nortear os educadores das universidades públicas e privadas no ensino de LS para acadêmicos ouvintes nos cursos de licenciaturas e saúde em conformidade a Lei Nacional 10.436 de 24 de abril de 2002. E também no ensino de LP para acadêmicos surdos. Dialogamos com alguns conceitos teóricos de Bakhtin e Levy Vygostiky além de alguns pesquisadores do campo linguagem e da linguística, tais como Santaella, Bailello Junior, Ronice Quadros, González-Rey, dentre outros. A grande problemática no processo ensino-aprendizagem da LS para ouvintes e LP para surdos em questão é o baixo índice de pesquisas e publicações de artigos que trate do assunto, tema este tão emergente em nossas academias. A pesquisa já resultou em avanços consideráveis de uma nova proposta no ensino de LP e LS para surdos e ouvintes respectivamente tendo como instrumento didático e metodológico os NS. Os Números Semânticos tem a característica visual na modalidade escrita, constituindo, portanto, uma relação visual-espacial estreitando e favorecendo o processo de aprendizagem frente ao aluno surdo pela afinidade com sua língua materna. E ao mesmo tempo o aluno ouvinte constitui um aprendizado facilitador em detrimento ao campo visual de LP e LS de forma simultânea. Portanto, a presente pesquisa pretende contribuir sistematicamente na construção de novos saberes das línguas envolvidas. RECEITAS CULINÁRIAS NO ENSINO DE PLE Orlene Lúcia de Saboia Carvalho – UnB Daniela Emerich da Cruz – UnB Os materiais utilizados no ensino de Português como Língua Estrangeira (PLE) apresentam desafios constantes, desde sua adequação ao público-alvo até a necessidade de materiais complementares para suprir possíveis lacunas dos livros didáticos (LDs) adotados em sala de aula. A elaboração de materiais, sejam LDs ou materiais complementares, deve ter como base os diferentes gêneros, visto 510 511 que estes são formas textuais (escritas ou orais) bastante estáveis, com padrões sociocomunicativos característicos, histórica e socialmente situados, além de serem essenciais na intermediação das práticas sociais (MARCUSCHI, 2008). Entre as diversas possibilidades de complementação do material básico utilizado no ensino de PLE, o gênero textual “receita culinária” não tem sido devidamente explorado, apesar de ser uma relevante fonte de língua e cultura. O uso da receita culinária permite múltiplas associações, questionamentos e envolve necessariamente um fator extremamente importante para o ser humano, a alimentação. Assim, propomos a elaboração de material complementar com base em tradicionais e culturalmente variadas receitas culinárias brasileiras. Utilizar a receita culinária com propostas de atividades propicia a discussão e a análise de vocabulários, estruturas gramaticais, hábitos, tradições culinárias, representações, identidades e práticas sociais. Trata-se de um gênero textual cuja estrutura e tipo textual são bastante estáveis: as partes componentes básicas costumam ser Ingredientes e Modo de preparo, com predominância dos tipos descritivo e injuntivo, e uma certa sistematicidade no uso do modo verbal imperativo (BAGNO, 2011), que é utilizado tanto pela necessidade de evidenciar as transições de uma etapa para a outra durante o preparo, quanto pela sua característica tradicionalmente descrita como comando. A seleção das receitas que comporão o material tem como critério a formação cultural do Brasil. As heranças dos povos que aqui habitavam e daqueles que para cá imigraram estão presentes na culinária das várias regiões brasileiras. Para tanto, buscamos historicamente a formação da culinária brasileira, com o objetivo de encontrar o lugar de cada cultura na nossa alimentação e a fim também de compreender e evidenciar a diversidade regional. Sendo assim, a nossa seleção de receitas propõe um quadro do que realmente é o Brasil, indo além dos estereótipos, como feijoada e caipirinha, e revelando a verdadeira multiculturalidade brasileira. A POLIDEZ BRASILEIRA E OS FALANTES DE ESPANHOL Rodrigo Albuquerque – UnB O presente estudo consiste em evidenciar estratégias de polidez negociadas no curso da interação entre o professor nativo de língua portuguesa e os estudantes cuja língua materna seja a espanhola. Para a geração de dados serão utilizadas narrativas orais e escritas, de estudantes do nível intermediário do Programa de Ensino e Pesquisa em Português para Falantes de Outras Línguas, da Universidade de Brasília (UnB), com vistas a investigar, por meio de grupo focal, situações de (falta de) polidez, vivenciadas em suas experiências cotidianas no país. Em consonância com esses dados, serão usados como suporte básico a Pragmática (BROWN & LEVINSON, 1987; GOFFMAN, 1981; 1972; GRICE, 2006; LAKOFF, 1972 E LEECH, 1983) e a Sociolinguística Interacional (GUMPERZ, 1982a; 1982b). As pistas de contextualização verbal e não-verbal mantêm estreita relação com a teoria de polidez, por constituírem práticas interacionais socioconstruídas e negociadas no curso da interação e basearem-se em convenções socioculturais. A metodologia qualitativa (descritiva e interpretativa) enquadra-se na pesquisa por permitir a geração e a análise de dados de maneira natural, a partir dos relatos realizados pelos colaboradores de pesquisa, favorecendo a construção de estratégias de polidez mais eficazes na busca de interação mais harmônica entre os interlocutores e aperfeiçoamento das interações com brasileiros em contextos diversos. 511 512 TRAZENDO O BRASIL PARA A SALA DE AULA DE UMA UNIVERSIDADE AMERICANA: TECNOLOGIA E ENSINO DE PLE E CULTURA BRASILEIRA Vivian Flanzer – University of Texas Os educadores de língua estrangeira concordam que é importante desenvolver a competência intercultural na língua estrangeira (SCHULZ, 2007). Partindo do princípio de que língua e cultura estão intrinsicamente relacionadas, desenvolvi um website, ClicaBrasil, para ensinar Português como língua estrangeira e cultura brasileira para alunos do nível intermediário. ClicaBrasil reúne vídeos e atividades que desenvolvem simultaneamente a competência intercultural e as habilidades linguísticas sugeridas por Levy (2009). Minha participação consistirá de uma apresentação do website (http://www.laits.utexas.edu/clicabrasil) e de uma discussão sobre a experiência de alunos e professores que o utilizam em uma universidade americana, bem como de diretrizes para o ensino concomitante de língua e cultura na sala de aula. SELEÇÃO DAS VARIANTES FONÉTICAS DAS CONSOANTES FRICATIVAS PARA O DICIONÁRIO SEMIBILÍNGUE DE APRENDIZAGEM DO PORTUGUÊS BRASILEIRO Antônio Augusto Souza Mello – LIP/UnB Orlene Sabóia – LIP/UnB Os materiais didáticos de português como língua estrangeira (LE) não têm dado a devida importância à fonética. No entanto, com apenas alguns conceitos desta disciplina e a familiarização com alguns símbolos fonéticos, o aprendiz pode praticar e assimilar com maior facilidade a pronúncia da língua estudada. Essa falha é agravada pelo fato de ainda não haver uma obra lexicográfica direcionada aos aprendizes, material complementar de grande relevância para a aprendizagem, em que constariam as transcrições fonéticas das palavras componentes da nomenclatura. Devido a essas lacunas, estamos desenvolvendo um projeto de elaboração de um dicionário semibilíngue de aprendizagem do português brasileiro como LE, em que haverá espaço para a fonética: uma introdução à fonética do português brasileiro, com algumas variações; e, no corpo da obra, a transcrição fonética dos lemas. Neste trabalho, discutiremos as escolhas das variantes fonéticas para transcrição com base na seleção das variantes menos marcadas, considerando as diversas variações dialetais do português do Brasil. Trataremos das consoantes fricativas alveolares, palatoalveolares e velares, cuja variação é grande no português brasileiro, e a escolha de determinada variante para transcrição, cujos critérios podem ser o número de falantes ou facilidades de determinadas línguas com determinadas sequências fonotáticas. A escolha da fricativa velar desvozeada (“x”) ao invés da vibrante simples em certos contextos se deve à distribuição mais ampla no Brasil da primeira variante. Mas, quando é a 2ª consoante de uma sílaba CVC, entre as fricativas alveolar e palato-alveolar optamos pela alveolar por haver maior facilidade dos falantes de português como segunda língua com esta variante. Apesar de termos de tomar decisões, na introdução exporemos as variáveis e suas diferentes distribuições geográficas, cujo principal objetivo é expor as alternativas e deixar que o aprendiz se adapte à variante com que ele tenha maior facilidade. Por exemplo, um falante de inglês ou espanhol tem grandes problemas em emitir uma palatoalveolar diante de uma outra consoante, algo que não ocorre com o falante de alemão. 512 513 GRAMÁTICA PEDAGÓGICA E ATIVIDADES PRÁTICAS COMPLEMENTARES Daniele Marcelle Grannier – UnB O ensino de português como língua estrangeira a diferentes públicos requer materiais didáticos, manuais ou roteiros de cursos que contemplem as especificidades de cada grupo, definidas em função de sua idade, de seus interesses e principalmente da sua experiência linguística anterior (língua materna, entre outras). Há questões, entretanto, que são bastante comuns entre os aprendizes estrangeiros, como por exemplo, a dificuldade em distinguir os usos de tempos verbais como o futuro e o pretérito do subjuntivo (quiser x quisesse), e podem ser tratadas em materiais complementares ao material didático básico. Esta comunicação se fundamenta em um levantamento das dificuldades mais comuns entre os aprendizes estrangeiros estudando português no Brasil, na análise preliminar dos pontos envolvidos nessas dificuldades e da formulação de explicações gramaticais simples, baseadas em exemplos de uso, que constituem uma versão leve de uma gramática pedagógica. Para a proposta didática, foram selecionados dois tipos de dificuldades gramaticais e, com base nas regras de uso das formas envolvidas, foi elaborada uma amostra de recurso didático complementar que pode ser usado tanto para atividades em sala de aula como para atividades extraclasses, em versão digitalizada ou não. Esse material propõe atividades práticas e segue a diretriz do foco-na-forma de Long (1991), associada a atividades indutivas, no contexto de uma abordagem interacional (ELLIS, 1999). Serão discutidas as vantagens da utilização desse tipo de recurso didático que pode ser articulado com diferentes manuais adotados como roteiros básicos de cursos de português para estrangeiros. 513 514 SIMPÓSIO 49 LÍNGUA, HISTÓRIA E MOVIMENTOS NO DISCURSO Com base nas formulações de Michel Foucault e de Michel Pêcheux acerca das possibilidades do dizer, pretende-se, neste simpósio, reunir trabalhos que discutam a relação entre língua e história, considerando as contradições produzidas nas práticas discursivas contemporâneas, dado o controle sobre a língua que, como contraefeito, provoca uma intensificação dos discursos, redefinindo as regras das formações discursivas. A análise dessa relação deverá ser conduzida pela discussão de Michel Foucault em: As palavras e as coisas para a reflexão sobre as configurações do saber responsáveis pelo arquivo que fornece as condições do que é dito e da construção dos objetos de conhecimento; História da sexualidade para estender seus pressupostos a outros temas da atualidade, com a discussão a respeito das contradições instauradas pela política da língua e da palavra que produz, no nível discursivo, um fenômeno inverso ao mutismo esperado pela censura; A arqueologia do saber para subsidiar a análise das regras de formação dos discursos que impõem à língua certos movimentos e certas condições de existência, com base na discussão sobre enunciado e formação discursiva. Michel Pêcheux deverá compor a discussão por meio de suas ideias acerca da relação entre língua e história em A língua inatingível e da heterogeneidade e dispersão dos lugares enunciativos do sujeito, demonstradas em Discurso: estrutura ou acontecimento. A proposta deste simpósio centra-se, inicialmente, na hipótese de que o controle dos enunciados delimita o lugar e o momento em que certos ditos podem ser efetivados, redistribuindo os enunciadores, redefinindo conceitos e teorias, movendo os sistemas de dispersão das formações discursivas. COORDENAÇÃO Kátia Menezes de Sousa Universidade Federal de Goiás [email protected] Cleudemar Alves Fernandes Universidade Federal de Uberlândia [email protected] Roberto Leiser Baronas Universidade Federal de São Carlos [email protected] 514 515 DA LINGUÍSTICA E OUTRAS CONTROVÉRSIAS: IMPLICAÇÕES PARA UMA ANÁLISE DISCURSIVA DAS RELAÇÕES DE PODER NOS ESTUDOS LINGUÍSTICOS Josiane dos Santos Lima – UFG/FL O que é a Linguística? E, por conseguinte, o que faz um linguista? Quantos estudiosos, autodenominados linguistas, não fizeram tais questões ou, na melhor das hipóteses, já se encontraram na difícil situação de ter que explicar a um leigo o seu ofício? A Linguística, definitivamente, não é algo fácil de explicar. O fazer do linguista segue o mesmo caminho. Por outro lado, torna-se impossível negar que para qualquer lugar que se olhe, no campo dos estudos linguísticos, só há diferenças! Parece-nos pertinente enxergar na história dos estudos linguístico não a busca desinteressada da verdade, ou mesmo uma evolução de estudos ou progresso científico. Admitimos, sim, que há uma via constante de produção do verdadeiro. Por outro lado, como ocorre de dados enunciados serem possíveis ou serem perpetuados sobre a língua como conceito; a própria possibilidade de ver em tal esfera algo em torno do qual se possa fazer ciência e, ainda, o que o suposto “convívio” das várias perspectivas teóricas na Linguística revela sobre este espaço de produção de saber, de relações de poder e de constituição de sujeitos? De maneira geral, podemos afirmar que a pesquisa dimensiona a própria constituição da ciência Linguística a partir de um aporte discursivo. Em outros termos, o trabalho procura, pela Análise do Discurso, explicitar como se dá a institucionalização de uma ciência da linguagem fundada, supostamente por Ferdinand Saussure a partir das propostas do Curso de Linguística Geral e os desdobramentos posteriores que são materializados seja na rivalidade Linguística X Estudos de Gramática Tradicional; na heterogeneidade em torno das teorias dos fatos linguísticos; diversidade de objeto e, sobretudo, na produção de subjetividade. Tratamos, aqui, de um discurso de ciência e, não existe, para alguns, algo mais propício para a produção de verdade. Não há lugar mais “neutro” para dizer ao outro o que é e o que não é, não apenas no estrito espaço do certo ou errado, mas na própria possibilidade do que se pode autorizar existir. Pensar o Governo em nossa pesquisa não possuiria a finalidade última de atestar sua existência no campo proposto. Devemos tomar tal conceito para explicitar nos estudos científicos da língua uma economia que engendra práticas de subjetivação. Também devemos ter em mira que as práticas de subjetivação são ainda formas de objetivação, ou seja, das formas como o sujeito foi objeto de saber e de poder, tanto em relação a si como para os outros, posto que no quadro geral das Ciências Humanas não conta para o seu desenvolvimento somente os aspectos puramente epistemológicos. Assim, se queremos entender a constituição da Linguística a partir de uma analítica do poder, o conceito de Governo parece ser requisitado de alguma forma. Quando se faz ciência não se produz somente resultados “externos”, mas se produz, substancialmente, o próprio fazer, se produz o cientista, em nosso âmbito, o linguista. A LINGUAGEM COMO ELEMENTO REPRESENTACIONAL DO INTINERÁRIO DE VIDA DOS IDOSOS Carla Eliana da Silva Tanan – UFBA A memória contribui para a formação de identidade do sujeito no espaço e no tempo. Esta pesquisa foi desenvolvida a partir dos relatos de vida dos idosos moradores do Lar dos Velhos localizado no município de Itaberaba-BA, com o intuito de perceber como os elementos históricos presentes na memória dos idosos atuam como elemento constitutivo da sua história. Utilizamos como dispositivo para conhecermos a história de vida dos idosos a literatura de Cordel, por considerarmos que este possui uma linguagem que se adequa ao seu contexto de vida. A partir das conotações e das histórias compartilhadas passamos a conhecer a importância das Cantigas de Rezas e de Reis para a constituição de história de vida desses sujeitos. Após realizar a coleta de dados através de entrevista e diário de campo, realizamos o estudo e análise dos dados. Para fundamentar esta pesquisa 515 516 utilizamos os teóricos que discutem identidade, memória e linguagem como: Hall (2006), Sigorini (1998), Hanks (2008) e muitos outros autores. A partir do estudo realizado, percebemos o quanto as Cantigas de Rezas e de Reis estão presente na memória dos sujeitos, estabelecendo uma relação de passado e presente com a sua história de vida, pois sempre que se remetem a sua história de vida apresentam os momentos que viveram e as cantigas que lhes marcaram ao longo de seu itinerário de vida. Sendo assim, as histórias de vidas estão atreladas as Cantigas de Rezas e de Reis sendo um dispositivo para constituição e reconstituição de suas histórias como agentes sociais. FOLHA DE S. PAULO – DOENÇA OU... POLÍTICA? Anderson da Silva Buzato – CEETEPS/SEE-SP O presente trabalho pretende analisar, por meio dos estudos discursivos, especificamente teoria da Análise de Discurso, notícias referentes à doença da então presidenciável Dilma Rousseff. O trabalho – que foi objeto de obtenção do grau de Especialista em Estudos da Linguagem - está dividido em duas partes/capítulos, a saber: o primeiro capítulo diz respeito ao aporte teórico utilizado, ou seja, explanação da teoria e caminhos (método) que orientaram o trabalho. No capítulo um temos dois subcapítulos; sendo o subcapítulo um dividido em três partes, nas quais discutiremos as ideias relativas à heterogeneidade - explicando sucintamente a teoria -, a polifonia, a modalização do discurso por meio de aspas e o ethos. Para explicarmos as ideias referentes a este capítulo, utilizaremos como base os textos de Maingueneau (1997/2005). Ainda no capítulo um, temos o subcapítulo dois, no qual faremos a explicação dos métodos de análise e, aqui, vale destacar a questão da escolha dos textos que servirão de corpus. Ao todo são 19 textos/artigos, que por questão metodológica optou-se por designar cada um deles de SEQUÊNCIA DISCURSIVA (doravante SD), as quais foram retiradas dos cadernos “BRASIL” e “CIÊNCIA E SAÚDE”, sendo 17 SDs do caderno “BRASIL” e 2 do caderno “CIÊNCIA E SAÚDE”. Vale lembrar também, que os textos são da versão on line do jornal e as notícias foram publicadas entre os dias 25/04 e 28/04/2009. Tais datas não foram escolhidas aleatoriamente, trata-se do período de quatro dias subsequentes à divulgação oficial da notícia da doença e período em que se começava a discutir os rumos da política brasileira, ou seja, a sucessão do então presidente Lula. A segunda parte refere-se à análise e contextualização. Nesta etapa, temos duas divisões, sendo a primeira responsável por contextualizar tanto o jornal Folha de S. Paulo quanto Dilma Rousseff, trata-se, todavia, de um relato histórico para situar o leitor. Já na segunda etapa, temos análise de dados, isto é, a aplicação da teoria ao corpus. Ao longo da pesquisa buscaremos estudar os múltiplos aspectos que envolvem a heterogeneidade, para tanto, trataremos de temas já estudados na área da linguística como é o caso da polifonia. Além da polifonia, estudaremos também os aspectos relacionados à constituição/construção da imagem. O trabalho terá como corpus as notícias – SDs – do jornal Folha de S. Paulo em sua versão on line e todas as notícias escolhidas versam sobre o câncer em Dilma Rousseff e. Com as SDs, iremos investigar quais são as reais intenções das notícias, ou seja, investigaremos, a partir da análise de dados, se as notícias divulgam o fato, no caso, levando informação aos cidadãos, ou se há a exploração do problema, neste caso da doença, da ministra para fins eleitoreiros e se há uma posição formal do jornal em relação à doença na política. Para esta análise, partiremos do pressuposto que o jornal não é um mero transmissor de informação, mas, sim, um instrumento que exerce grande poder sobre a sociedade e, de certo modo, as ideias que são veiculadas por esse meio de comunicação são as ideias dominantes e, muitas vezes, além das ideias dominantes, os jornais - e principalmente este de que trataremos neste trabalho, dada sua tiragem diária e seu alcance, tanto em sua versão impressa quanto online – contribuem para disseminar e construir estereótipos. 516 517 FORMAÇÕES DISCURSIVAS SOBRE A EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA EM PUBLICAÇÕES VIRTUAIS DO SITE DA ABED Roberta Kerr dos Santos – UFF Segundo Michel Pêcheux, uma das figuras mais importantes da Análise de Discurso de linha francesa, as formações discursivas representam “na linguagem” as formações ideológicas que lhes são correspondentes (1988, p.147). A partir desse viés teórico, a presente pesquisa busca analisar os discursos presentes em arquivos digitais selecionados e divulgados na seção Clipping do site da Associação Brasileira de Educação a Distância (ABED). Esses dizeres são importantes por retratarem, em determinados contextos sócio-históricos, diversos momentos em que caminha a Educação a Distância no cenário nacional, principalmente pelo crescimento que essa modalidade de ensino vem alcançando, agregando cada vez um maior número de instituições públicas e privadas nos mais diferentes níveis de ensino. Segundo a ABED, o número de alunos virtuais é de aproximadamente dois milhões, crescendo cerca de 40% ao ano. Por isso, através das materialidades linguísticas das publicações virtuais, buscou-se perceber como se constroem os dizeres e a memória discursiva sobre o tema, assim como identificar se as formações discursivas sobre a EAD apresentam modificações, nesses últimos anos, considerando as mudanças comportamentais nas interações multimidiáticas. Afinal, ainda predominam os dizeres que revelam, no interdiscurso, opiniões de resistência sobre os resultados educacionais da Educação a Distância? ANALISANDO VERBETES RELACIONADOS A PATOLOGIAS NOS DICIONÁRIOS DE BLUTEAU E MORAES Amanda Bastos Amorim de Amorim – UNICAMP Os primeiros dicionários monolíngues foram editados no século XVIII, um período particularmente interessante do ponto de vista de quem lida com áreas da saúde. Nesse mesmo período a Medicina encontra-se no que se pode chamar fase nominalista, que antecede a classificatória hoje hegemônica (cf. Foucault, O Nascimento da Clínica, 1963). Tomando por base estes fatos históricos, nossos objetivos são os seguintes: (i) explicitar possíveis eixos parafrásticos a partir da análise de determinados verbetes do Vocabulário Portuguez e Latino de Bluteau (1712-1728) e do Diccionario da Lingua Portuguesa de Moraes (1789), considerando os dispositivos teóricos e analíticos indicado por Nunes (2006) em Dicionários no Brasil: Análise e História do Século XVI ao XX; (ii) relacionar tais discursos às reflexões sobre a Medicina até o século XIX indicadas por Foucault em O Nascimento da Clínica (1963), por Coudry em Diário de Narciso – discurso e afasia (1986) e Novaes-Pinto em Uma contribuição do estudo discursivo para uma análise crítica das categorias clínicas (1999), contrastando com o que os mesmos autores indicam ter ocorrido com a instauração da Clínica; (iii) por fim, relacionaremos as reflexões suscitadas pelas análises a questões pertinentes para a Neurolinguística. A seleção do corpus foi realizada inicialmente a partir de itens semiológicos analisados por Amorim em A Semiologia das Afasias: Contribuições de uma abordagem enunciativo-discursiva (2011). Entretanto, muitos dos termos não estão presentes nos dicionários ou suas definições não mencionam relações com a Afasiologia, o que, por si só, significa. A partir da ausência dos termos afasia e síndrome e da definição encontrada de cérebro, tornou-se mais interessante analisar os verbetes relacionados a patologias, de maneira mais geral, uma vez que este também constitui tema interessante para a área. Dessa forma, foram selecionados os verbetes cérebro, demência, doença, saúde, loucura, patologia, sinal e sintoma. Assim, espera-se contribuir para as discussões sobre a constituição da semiologia médica que vem sendo cada vez mais problematizada pela Neurolinguística de orientações sócio-histórico-culturais. 517 518 DISCURSO LEXICOGRÁFICO: UMA PROPOSTA DE ANÁLISE DA RELAÇÃO LÍNGUA/ENUNCIADO/HISTÓRIA Odália Bispo de Souza e Silva – UFG Conforme Foucault em A Arqueologia do Saber (2008, p. 28), “é preciso estar pronto para acolher cada momento do discurso em sua irrupção de acontecimento, nessa pontualidade em que aparece e nessa dispersão temporal que lhe permite ser repetido, sabido, esquecido, transformado [...]”. Assim, considera-se que há um conjunto de condições que determinam a aparição de certos enunciados, sua estabilização, seu caráter “de verdade”, surgindo em um dado momento e em uma sociedade específica, o que caracteriza sua existência paradoxal de acontecimento. Na perspectiva foucaultiana, tomar o discurso como acontecimento enunciativo é reconhecer que ele não é independente, nem solitário, nem soberano, podendo se articular com acontecimentos que não são, necessariamente, de natureza discursiva. Assim, tendo em vista que relações podem ser determinadas a partir da irrupção do enunciado, emerge a necessidade de determinar as suas condições de existência, reconhecer seus limites e estabelecer correlações com outros enunciados aos quais ele eventualmente possa estar vinculado, evidenciando, portanto, que outras formas de enunciação ele exclui. Visto dessa forma, o discurso está inserido em uma rede que envolve, por um lado, o quadro das instituições em que é produzido, as quais possuem o poder de delimitá-lo, bem como os embates históricos e sociais que se cristalizam na sua materialização e, por outro lado, o espaço que cada discurso configura para si mesmo no interior de uma rede discursiva. O efeito de sentido provocado por essa teia discursiva é resultante de um embate que se trava na trama da história de uma sociedade, uma vez que o discurso enunciado constitui-se como o espaço de confrontos materializados em acontecimentos discursivos. A produção dos sentidos construídos nesse viés, por sua vez, é decorrente do embate discursivo que se estabelece na teia que mantêm imbricadas história e sociedade, em uma lógica na qual perpassam as mentalidades de uma época e as influências que monitoram o pensamento e as formas de dizer daquele que enuncia. Neste trabalho, propomos uma retomada de alguns postulados da Análise do Discurso de linha francesa, sobretudo de conceitos foucaultianos tomados por essa vertente linguística, seguida da análise de verbetes extraídos de dois dicionários, publicados em contextos sócio-históricos distintos, a saber, Pequeno Dicionário Brasileiro de Língua Portuguesa (1964) e Novo Aurélio Século XXI (1999). Partimos do pressuposto de que os enunciados lexicográficos não se constituem como neutros e estaques, necessitando ser examinados na condição de acontecimento discursivo, isto é, sua emergência resulta da relação entre elementos de ordem linguística, ideológica e histórica, determinados pelas condições de (re)produção. Dito de outra forma, compreendemos que o enunciado lexicográfico contempla a noção de acontecimento discursivo e pressupõe a relação entre os dizeres que, no entrelaçamento que os caracteriza, promovem rupturas e viabilizam sentidos a partir das possibilidades enunciativas que os encerra. Assim, pensar o discurso do dicionário é considerar que ele não pode ser analisado apenas e simplesmente sob seu aspecto linguístico, mas como inserido em um jogo estratégico em que estão envolvidas as suas condições de produção e seus efeitos de sentido, que resultam, inclusive, do lugar social ocupado pelo dicionarista em nossa sociedade. Isto é, aquele que detém as informações “verdadeiras” sobre o significado das palavras em uma língua. Além disso, tendo em vista que, numa perspectiva foucaultiana, o corpo recebe novas configurações na sociedade contemporânea, os verbetes saudável e gordo serão analisados, considerando-se que, em conformidade com seu caráter de enunciado lexicográfico, reflete as relações de saber/poder e os mecanismos de controle que os engendram. 518 519 O ENUNCIADO “FAMÍLIA” NO CALDAS COUNTRY DE 2012 Aldenir Chagas Alves – GEDIS/CAPES/UFG-CAC-PMEL Rozely Martins Costa – GEDIS/UFG-CAC-PMEL Ao selecionar o recorte “família” como objeto de estudo neste trabalho, propomos apresentar algumas equivocidades inscritas no acontecimento Caldas Country através de enunciados divulgados pela organização do evento. Em Caldas Novas, sul de Goiás, é realizado o “Caldas Country Show” considerado pelos realizadores e meios de comunicação como o maior evento de música sertaneja no Brasil no segmento sertanejo universitário. Com uma população de aproximadamente 75 mil habitantes e a vinda de mais 200 mil turistas em 2012, a estrutura dos setores comerciais e órgãos governamentais não são suficientes para atender aos visitantes ou garantir a segurança a todos. Ocorrências como assassinatos, sexo nas ruas em meio à multidão, uso abusivo de bebidas alcoólicas, uso de drogas foram divulgados na imprensa nacional. Diante das consequências desta situação, houve uma reação das igrejas e setores políticos da cidade e, como resposta, os organizadores do festival divulgaram um panfleto intitulado Carta aberta ao comércio de Caldas Novas, explicando a importância do evento através de valores em dinheiro que o comércio e a cidade recebem. Na parte de finalização da carta há a seguinte frase destacada em letras maiores: “Os jovens turistas de hoje, serão as famílias que nos visitarão amanhã”. Ao selecionar este enunciado situamos as noções de formação discursiva e enunciado teorizados por Foucault (2012), observando a organização do campo em que eles aparecem e circulam, verifica-se que não há aqui uma instância fundadora do enunciado ‘família’ se apresentando, mas correlações e exclusões. No recorte ‘família’, os pressupostos teóricos de Pêcheux (2012) demostram que durante o acontecimento inscrito no enunciado há um apagamento, neste caso isso ocorreu devido às posições ou imposições de opiniões a respeito do evento “Caldas Country Show”. Na busca em compreender os efeitos do acontecimento através dos diversos enunciados percebemos que, de acordo com Pêcheux, há um espaço de entremeio que se configura dentro dos espaços estabelecidos pelos enunciados que são divulgados com exaustão pelos autores do festival. Inscreve-se nesse panfleto um real com uma regulação das interpretações, feita com uma lógica que repousa como verdadeira aos comerciantes e também a toda população de Caldas Novas. Nesta enunciação que os jovens voltarão à cidade, já com família constituída, nos remete a uma homogeneidade da qual nós nos confortamos, porém, atravessada por equívocos. LÍNGUA, SOCIEDADE, HISTÓRIA E MEMÓRIA: UMA ANÁLISE DO SUJEITO PAI NA CONTEMPORANEIDADE Iraneide Santos Costa – UFBA Neste trabalho, elegeu-se como precípuos objetivos discutir a constituição da identidade do sujeito pai na contemporaneidade para que se pudesse, então, se apropriar de sua discursividade; bem como apurar de que forma a relação saber/poder se instaura. A partir daí, impuseram-se algumas indagações, tais quais: quais as imagens atribuídas ao sujeito pai pelas discursivizações em torno deste? Como e quais práticas discursivas se entrelaçam compondo um conjunto de possibilidades de dizer (do/sobre o pai) e de agir (do/ em relação ao pai), engendrando uma identidade baseada em critérios arbitrários, que se apresentam com caráter atemporal (FOUCAULT, 1987) e constituem o(s) sujeito(s) pai? Para respondê-las, nas discussões a que se procedeu, valemo-nos como embasamento teórico da Análise do Discurso pecheutiana e dos postulados foucaultianos. Quanto ao corpus, optou-se por trabalhar com textos midiáticos e disponíveis na internet por se entender que, substituindo o papel desempenhado pelas religiões nas sociedades tradicionais, hoje se percebe que a legitimação de verdades se dá muito na mídia, a comunicação servindo para legitimar os discursos, os comportamentos e as ações. É importante salientar que: a) verdade aqui foi tomada 519 520 como “conjunto das regras segundo as quais se distingue o verdadeiro do falso, e se atribui ao verdadeiro efeito específico de poder” (FOUCAULT, 1984, p.13), levando-se em conta que “cada sociedade tem seu regime de verdade”; b) trabalhou-se o conceito de práticas discursivas tal como preconizado por Foucault (1972, p. 136), ou seja, como “um conjunto de regras anônimas, históricas, sempre determinadas no tempo e no espaço, que definiriam, em uma dada época e para uma determinada área social, econômica, geográfica ou linguística, as condições de exercício da função enunciativa” (FOUCAULT,1972, p.136), explicitando-se especificidades de práticas discursivas em torno do objeto em análise e seus efeitos de sentidos a partir do entrecruzamento língua/ sociedade/ história/ memória. Buscou-se, pois, discutir como se instaura a produção do sujeito pai pelo discurso, como o mesmo entra nessa ordem do discurso, o que o sujeito diz e/ou é dito sobre ele e o que lhe é permitido dizer e/ou ser dito sobre ele, sua dispersão nos diversos lugares e as posições que ocupa no discurso. O CONCEITO DE TRANSGRESSÃO Wilton Divino da Silva Júnior – UFG Partindo das reflexões propostas em nossa dissertação A transgressão no Evangelho de Saramago: um efeito discursivo (2009), procuramos nesta pesquisa através de uma problematização das práticas transgressoras, ensaiar a conceituação do termo transgressão fundamentado nas considerações foucaultianas sobre o tema (“Prefácio à Transgressão”, 1963). Afirma Foucault que “a transgressão é um gesto relativo ao limite” que não apaga a ordem vigente e nem cria uma ordem paralela ou ainda que não deve, o acontecimento transgressor, ser considerado como negativo, escandaloso, subversivo ou que objetiva “abalar a solidez dos fundamentos”; essa caracterização opõem-se ao modo como o senso comum compreende a transgressão, o que nos colocou em seu encalço, abrindo caminhos para uma série de hipóteses na tentativa de compreender melhor tanto as múltiplas possibilidades de aplicabilidade do termo (nos referimos aos diversos campos de saber que a utilizam) quanto a cristalização atual de uma de suas acepções (destruição, ruptura). Primeiramente, entendemos que a transgressão se produz no âmbito discursivo, pois, ela se efetiva como acontecimento conjugando linguagem, história e sujeito num constante movimento de mudança que sempre surge na relação com outros discursos. Como hipótese fundamental, compreendemos a transgressão como conservadora, na medida em que desejamos problematizar sua acepção como destruição de princípios estabelecidos, para tanto, afirmamos que a transgressão é um investimento de sentidos numa mesma ordem discursiva, isto é, uma ampliação nos horizontes dos sentidos que se contrapõem. Discutir o conceito de transgressão implica uma abordagem do conceito de verdade, ou melhor, as práticas transgressoras parecem organizar-se a partir da instauração, legitimação e reconfiguração de jogos de verdade, que pressupõem determinados saberes e relações de poder. Ainda de modo ensaístico, pensamos que a transgressão pode materializar-se como carnavalização, como resistência, como subversão e como transvaloração. Tais afirmações não pretendem de modo algum uma redução do que é a transgressão, outrossim, a construção de um espaço conceitual, via discursividade, para o termo transgressão, na tentativa de compreender as operações discursivas que permitem sua existência e sua reconfiguração. Partimos da dificuldade em apontar claramente práticas transgressoras na contemporaneidade e retomamos acontecimentos reconhecidamente transgressores na história e sua reformulação como discurso hegemônico e as novas formas de transgressão desencadeadas. O que nos inquieta é compreender o que se altera (constituição de objetos, modos de enunciar, teorias e conceitos) e por que se altera (se é que realmente há uma transformação) neste “gesto relativo ao limite” quando há a incorporação (nem sempre necessária) da transgressão como discurso hegemônico, e para isso, entendemos como fundamental problematizar a constituição de seu conceito. 520 521 A CONSTITUIÇÃO DISCURSIVA E IDENTITÁRIA DE AUSTREGÉSILO CARRANO, EM CANTO DOS MALDITOS, DE AUSTREGÉSILO CARRANO BUENO Jaquelinne Alves Fernandes – UEG O estudo que iremos apresentar nesse momento é o resultado do trabalho desenvolvido no Mestrado em Linguística, na Universidade Federal de Uberlândia. Tomamos como corpus livro Canto dos Malditos, de Austegésilo Carrano Bueno. O “Canto dos malditos” é um relato autobiográfico, por meio do qual Austregésilo Carrano Bueno (1957-2008) constitui-se como sujeito, contando suas passagens pelos hospícios de Curitiba e Rio de Janeiro. Embora a obra que escolhemos para corpus de estudo seja classificada como autobiográfica, a abordamos como uma escrita de si, conforme propõe Foucault (1983), uma vez que acreditamos que por meio da escrita de si Austry constitui-se como sujeito discursivo, assumindo diferentes posições-sujeito. Nesse sentido, nos propusemos a analisar a constituição discursiva e identitária desse sujeito, por meio de práticas de subjetivação e da tomada de uma pluralidade de posições-sujeito – dentre elas, a de sujeito de razão e a posiçãosujeito de desrazão – das quais nos ocupamos para desenvolver a pesquisa em questão. Para tal, nos apoiamos na Análise do Discurso de linha Francesa, pautados numa perspectiva foucaultiana, observando os processos de subjetivação e objetivação que levam um adolescente comum a ser enquadrado na posição-sujeito “louco” e a constituir-se por ela. Desse modo, tratamos da constituição histórico-discursiva do objeto loucura e de sua emergência no corpus de análise a partir de superfícies de emergência e de grades de especificação. Abordamos, também, os procedimentos de controle do discurso que levam um sujeito a inserir-se na posição de louco. Para tanto, tratamos o manicômio como um espaço heterotópico, no qual discursividades são instauradas. Abordamos em nossas análises, também, os procedimentos de controle do discurso (disciplinarização, rejeição, separação etc.) que determinam se um sujeito está ou não autorizado a falar de determinado lugar. Em Canto dos Malditos, o sujeito discursivo, a partir de suas experiências, compõe uma observação do coletivo, que resulta em um documento histórico de grande relevância para a compreensão do ultrapassado sistema manicomial. O relato se constitui como uma crítica à instituição manicomial a partir do olhar de um ex-interno; que, enquanto lá esteve encerrado, foi desapropriado da cidadania, teve o corpo detido, interditado e inserido no processo disciplinatório, e mum jogo de relações entre poderes e saberes. O Canto dos Malditos representou a reação ao micropoder, ao controle, à padronização de gestos e, sobretudo, de discursos, ou seja, a situações normatizadoras, obviamente agravadas no domínio do hospício. O relato que tomamos como corpus, construiu uma narrativa em meio a uma sociedade em que a disciplina era o grande instrumento do poder, composta, segundo Foucault (2004d) por “métodos que permitem o controle minucioso das operações do corpo, que asseguram a sujeição constante de suas forças e lhes impõem uma relação de docilidade-utilidade”. AUTORIA E MORTE NA ESCRITA HILSTIANA Jaciane Martins Ferreira – UFU/CAPES Em nossa pesquisa de doutorado, temos como principal objetivo pensar o sujeito que emerge de uma seleção de alguns livros da obra de Hilda Hilst e como essa emersão se dá a partir de uma dada escritura de si, de uma exterioridade criada a partir da temática morte. Foucault (2009a) acredita que a literatura (ou o discurso literário) muitas vezes não se curva ao que está posto pela representação e toma forma a partir dela mesma, isso significa que a literatura se situa no movimento de fazer a linguagem se distanciar dela mesma. Quanto ao sujeito construído em meio a essa linguagem, o sujeito do exterior, ele está nesse vazio deixado pela linguagem ao enunciar algo, toma forma e dialoga com outros sujeitos (também de linguagem) constituídos no âmbito desse espaço literário. Trabalhamos, então, com o livro Estar sendo/Ter sido, Hilst (2006), como livro central de nossa pesquisa. Esse livro traz a história de um personagem chamado Vittorio, senhor de 521 522 65 anos, cuja idade e experiência o levam a preparar-se para a morte. Vittorio é escritor de peças teatrais, o livro, escrito em diálogos ininterruptos, gira em torna de questões sobre a morte, sexo e a escrita literária. Tema esse que aparece em outros livros da mesma autora, como por exemplo, o livro Cartas de um sedutor (HILST, 2002), cujos personagens principais são dois escritores, o bem sucedido (Karl) que se entregou aos pedidos do editor e o outro (Stamatius) que decidiu desistir da vida, virar mendigo por não acreditar que a literatura deva obedecer a uma política mercadológica. Neste trabalho, pretendemos trabalhar com o princípio de regularidade discursiva, apontado por Foucault (2008), para olhar como o discurso sobre a morte aparece imbricado com o discurso sobre sexo e autoria no âmbito da obra hilstiana. Considerando que o nome de autor Hilda Hilst, dentro da possibilidade oferecida pela escrita literária, tem-se uma função dita vazia porque está sempre suscetível de desaparecer. O nome da autora se perde dentro desse simulacro criado pelo ser da linguagem e abre possibilidade de novos sujeitos emergirem. Tais sujeitos, também exercem uma função autor nessas obras. Para esse trabalho, selecionaremos excertos dos livros Estar sendo/Ter sido, Hilst (2006a), Cartas de um sedutor (HILST, 2002a) e Contos D’Escárnio/Textos grotescos, (HILST, 2002b). Como aporte metodológico, faremos uso dos postulados de Foucault sobre o enunciado, arquivo para, então, buscarmos as regularidades discursivas. MODA: ESTRUTURA OU ACONTECIMENTO? Humberto Pires da Paixão – UFG Embasando nossas reflexões nos postulados teóricos da AD de vertente francesa e pensando a moda, a partir desse ancoradouro, como fruto de um processo que se dá por meio de práticas discursivas ocorridas no interior mesmo do meio social, requer que sejam levantados alguns questionamentos: É possível considerar a moda sob a perspectiva do acontecimento discursivo? Ou seria um sistema, um todo estruturado? Que desdobramentos haveria para um empreendimento que a tomasse sob tal enfoque? Como o discurso midiático contribui na/para a irrupção de acontecimentos no campo da moda? Na tentativa de buscar respostas para tais questões, necessário se faz, pois, focar sobre a noção de acontecimento e as implicações para a Análise do Discurso. Dessa forma, o presente trabalho pretende colocar em evidência e analisar o discurso da moda sob a ótica do acontecimento discursivo. Conceito fundamental para a AD francesa, de base foucaultiana, o acontecimento relaciona-se com a História e sua emergência delimita os enunciados efetivamente produzidos numa dada formação discursiva. Tomar a moda como tal significa, pois, tratá-la não como objeto artístico ou fruto das diferenças sociais, mas, sobretudo, como resultado do atravessamento de diferentes práticas discursivas determinadas sociohistoricamente fundamentais no processo de objetivação/subjetivação dos indivíduos. Dessa forma, a moda, entendida aqui como análoga ou correlativa à noção de vestuário, apesar de no campo prático não se circunscrever apenas a esse recorte, para que tenha existência, configura-se, num primeiro olhar, como um sistema com regras e coerções, mas também – e principalmente - com suas falhas, brechas. Adotando, pois, um ponto de vista discursivo, como aquele advindo das formulações pecheutinanas e transformados pelas reflexões foucaultianas, poder-se-ia cambiar esta noção de sistema por outra, pensando, assim, numa ordem de funcionamento do discurso ou, mais precisamente, numa ordem de funcionamento do discurso convencionalmente chamado de moda. 522 523 DISCURSO E ENUNCIADO NA PUBLICIDADE: O MACHISMO NA BOMBRIL Lady Daiane Martins Ribeiro – UFG/CAC/GEDIS/FAPEG Bruno Silva de Oliveira – UFG/CAC/LIMES/FAPEG Este trabalho tem como propósito analisar os enunciados presentes nas propagandas da Bombril. Como recorte de análise, optamos por analisar uma propaganda de 1980 e outra de 2011, utilizando como aparato teórico os pressupostos de Michel Foucault desenvolvidos no livro Arqueologia do saber (2008) sobre enunciado e discurso. Sob essa perspectiva de estudo, o trabalho basear-se-á nas noções de discurso e enunciado, de modo a pensarmos sobre esses conceitos em relação às construções discursivas das propagandas. Na acepção foucaultiana, o discurso é constituído por um emaranhado de enunciados que possuem uma identidade comum relacionada a determinadas formações discursivas e, ao serem analisados, são imbricados por conteúdos ideológicos, políticos e sociais, os quais se inscrevem e/ou materializam em diversos suportes. A noção de enunciado não se restringe somente a estruturas lexicais e fonéticas, e sim, como uma função que existe a partir dos signos verbais e não verbais, vinculadas a uma dada posição de sujeito, que o caracteriza como algo efetivamente produzido, e a partir do qual pode se depreender, pela análise, determinados efeitos de sentidos. Dessa forma, o que marca o enunciado, enquanto discurso, é a função enunciativa, pois implica uma posição de sujeito, um campo associado, um já dito, uma materialidade repetível. Por esse motivo, ele poder ser reutilizado, atualizado e tornar-se outro, pois nesse deslocamento, muda-se a posição de sujeito, o suporte e materialidade, isto é, sua função enunciativa que está sendo exercida, função essa ancorada por elementos concretos, num dado contexto social, logo, a importância do acontecimento na construção e no entendimento dos enunciados. Nessa perspectiva, o discurso e enunciado são produzidos por um sujeito sóciohistórico que tem as suas ideologias, que ao produzir discursos o faz a partir de um lugar na sociedade, isto é, em seu discurso sinaliza elementos de um dado contexto histórico-social. Por isso nas reutilizações dos enunciados, estes sofrem alterações dependendo da materialidade empregada, pois as mesmas estão localizadas num tempo e espaço específico, ou seja, pode haver dois enunciados diferentes que remetem a grupos discursivos diversos. Na propaganda da década 80, do século XX, a Bombril utiliza enunciados que relacionam a praticidade e qualidade de seus produtos a concepções sobre a mulher como “senhora”. O enunciado “senhora” está colocado nessa formulação discursiva por dizer de uma época em que “a típica mulher dos anos 80” é estereotipada como a mulher-mãe, mulher-dona-de-casa, mulher-esposa. A Bombril costuma veicular a imagem do seu produto diretamente com o seu público alvo, a dona de casa. Percebendo a emancipação da mulher, a empresa criou em 2011 uma campanha cujo jogo discursivo demonstra um estilo de mulher semelhante à construção masculina tradicional, de que o homem é um indivíduo autoritário, chantagista, colocando a mulher em termos de igualdade ao homem. Esses enunciados presentes nessas duas propagandas demonstram a presença do discurso machista na década de 1980 e sua atualização em 2011 com a composição de enunciados que exalte a mulher como “evoluída” em detrimento ao homem como “cachorro”. Com esse pensamento, a hipótese deste estudo é que a propaganda da Bombril, ao (re)utilizar enunciados estruturalmente diferentes, que parecem até contraditórios, mantém o discurso machista em torno da mulher, cuja visão é de uma mulher exclusivamente vinculada as atividades domésticas. Portanto, a partir da análise dos corpora, propõe-se uma reflexão acerca do discurso machista produzido pela publicidade da Bombril percebendo que efeitos de sentido esses enunciados produzem sobre as identidades masculinas e femininas na contemporaneidade. 523 524 CENAS DA ENUNCIAÇÃO E ETHOS NA EXPEDIÇÃO RONCADOR-XINGU: ANÁLISE DISCURSIVA Karla Amorim Sancho – UFMT Esta pesquisa está inserida no campo dos estudos discursivos e tem como objetivo geral fazer uma análise discursiva da produção literária e midiática relativa à Expedição Roncador-Xingu. Inserida neste simpósio, pretende discutir a relação entre língua e história, atentando para as contradições produzidas nas práticas discursivas contemporâneas, que, devido ao controle sobre a língua, provocam uma redefinição das regras das formações discursivas. Este trabalho à luz da Análise do Discurso de orientação francesa se debruçará sobre os mais variados textos (manuscritos, impressos, eletrônicos, fílmicos e digitais) que deram em narrativa os principais acontecimentos da expedição que os Irmãos Villas-Bôas conduziram pelas entranhas do Brasil a partir de 1944, e que culminaram com a criação do Parque Nacional do Xingu em 1961. A presente pesquisa ao se inscrever no mirante teórico-metodológico da Análise do Discurso toma as discusividades (re)produzidas sobre o acontecimento Expedição Roncador-Xingu numa concepção materialista na qual os efeitos dos discursos que estão na base da constituição desse evento não se resolvem em um ponto de integração, mas se engendram a partir de contradições histórico-sociais. Nessa perspectiva, nosso estudo objetiva investigar por meio das categorias de análise: cena da enunciação, cena genérica, cena genérica, cenografia e éthos (MAINGUENEAU, 2006), as razões pelas quais as narrativas que dizem a Expedição produzem majoritariamente imagens eufóricas sobre o papel dos Irmãos VillasBôas à frente da Expedição Roncador-Xingu. Interessa-nos mais especificamente descrever/interpretar os recursos discursivos mobilizados nas cenas enunciativas que constituem as narrativas, silenciando a possibilidade de produzir sentidos disfóricos em relação aos Irmãos VillasBôas. Em outros termos, procuraremos descrever/interpretar as estratégias discursivas utilizadas pelos enunciadores de tais narrativas, destinadas a evacuar qualquer contradição de sentido que não o eufórico e a mascarar a existência da conflituosa relação entre brancos e índios. A proposta é contribuir com a discussão neste simpósio, cuja hipótese inicial é a de que o controle dos enunciados delimita o lugar e o momento em que certos ditos podem ser efetivados, redistribuindo os enunciadores, redefinindo conceitos e teorias. AFORIZAÇÃO E HIPERENUNCIAÇÃO EM PROVÉRBIOS QUE TEMATIZAM O NEGRO: CIRCULAÇÃO DE FÓRMULAS E ESTEREÓTIPOS Paulo Rogério de Oliveira – PPGEL/UFMT/REUNI Nosso estudo se constitui numa pesquisa de Mestrado em andamento, desenvolvida no âmbito do Programa de Mestrado em Estudos de Linguagem, na Linha de Pesquisa: Práticas Textuais e Discursivas - Múltiplas Abordagens. Nessa pesquisa temos como objetivo descrever/interpretar as razões pelas quais, mesmo em tempos de “rigoroso politicamente correto” circulam nos mais variados gêneros e suportes textuais estereótipos sobre os negros. Para dar conta da problemática eleita, frequentaremos um arquivo de pesquisa constituído pelos mais variados suportes e gênero textual provérbio (dicionários de provérbios portugueses e brasileiros, textos da mídia em geral) que tematizam o negro. Mobilizaremos para a nossa análise discursiva os conceitos de citação, destacabilidade, sobreasseveração, aforização, hiperenunciação e particitação propostos por Dominique Maingueneau (2006 e 2011), procurando entender como esses provérbios circulam sócio-historicamente entre nós, evocando e cristalizando alguns tipos de preconceitos e estereótipos em relação à imagem do negro. Além disso, essa pesquisa tem o propósito de problematizar o(s) discurso(s) relacionado(s) ao preconceito racial, dominante em nossa sociedade, enraizado no colonialismo como salienta Van Dijk (2008, p. 14), contribuindo para que brechas, fissuras, sejam feitas, no fio desse(s) discurso(s), possibilitando para que novos questionamentos irrompam, e 524 525 assim, haja mudanças de olhares e posturas sobre o negro, dentro dessa sociedade que se apresenta enquanto multiculturalista e multiétnica. OS ATRAVESSAMENTOS DA MORAL CRISTÃ NO DISCURSO DE AUTOAJUDA Edilair José dos Santos – GEDIS/PMEL/UFG Samuel Cavalcante da Silva – GEDIS/PMEL/UFG/FAPEG O presente trabalho busca analisar os atravessamentos do discurso religioso e da moral cristã na obra de autoajuda O Monge e o Executivo, de James C. Hunter, com o objetivo de discutir como este livro utiliza-se de um discurso reconhecido para referendar o que está sendo dito e assim lhe atribuir autoridade e ganhar legitimidade. Como referencial teórico utilizaremos os pressupostos foucautianos voltados para as reflexões sobre o discurso, memória e formação discursiva. Em A Ordem do Discurso, Foucault refere-se ao procedimento interno de funcionamento do discurso, o comentário, que se caracteriza pela repetição disfarçada, ou seja, os discursos que são sempre retomados como o discurso religioso. Nesse sentido, há sempre um já dito que funciona em um dado discurso, pois o enunciado, unidade elementar de análise, possui uma materialidade repetível, entretanto o acontecimento possibilita a emergência de algo novo (um novo sentido) ao enunciado produzido, uma vez que este é reatualizado em vista da posição de sujeito, dos sentidos produzidos e das relações discursivas estabelecidas. Assim como o enunciado caracteriza-se pela sua relação com a história, ou seja, com o que foi efetivamente produzido, as formações discursivas, também, são vistas como construções sócio-históricas, considerando a posição do sujeito, o momento histórico, o espaço e o lugar da enunciação. Ao (re)produzir um enunciado o sujeito aciona uma memória discursiva (um já dito) que possibilita a atualização, a legitimação ou o apagamento de determinados discursos. Nesse contexto, buscaremos perceber, na obra escolhida para análise, como o discurso de autoajuda se constitui por meio de atravessamentos do discurso religioso cristão que, ao ser (re)produzido aciona um arquivo a partir da memória discursiva, produzindo determinados efeitos de sentido que lhe conferem legitimidade e valor de verdade. Foucault, em A Arqueologia do Saber, define arquivo enquanto sistemas que instauram os enunciados como acontecimentos e coisas (enquanto sua possibilidade e campo de utilização). Na obra analisada, James C. Hunter, utiliza-se da figura de Jesus Cristo, enquanto líder, para propor ensinamentos sobre liderança, apresenta, também, exemplos bíblicos sobre a vida de Jesus, fazendo com que o discurso pronunciado adquira lugar de verdade, uma vez que o discurso religioso se coloca neste lugar. Sendo assim, James C. Hunter estabelece uma relação de saber, pois é capaz de apresentar verdades bíblicas aos seus leitores que lhes eram desconhecidas, exercendo assim certa autoridade sobre os mesmos. Logo, a este trabalho interessa o discurso de autoajuda enquanto um novo acontecimento que produz novos enunciados atravessados por enunciados consolidados pela ideologia cristã (arquivo) que permeia toda uma memória social, resultando numa relação de saber/poder sobre o sujeito leitor. SINCRETISMO E POSITIVIDADE LINGUÍSTICA Allice Toledo Lima da Silveira – UFG Alexandre Costa – UFG O objetivo desta comunicação é discutir os efeitos da positividade linguística que se constitui no processo de formação da noção de “sincretismo” no âmbito das ciências humanas brasileiras. Tomamos como caso exemplar a obra Repensando o sincretismo, do pesquisador brasileiro Sérgio Ferreti (1995), em sua tentativa de estabilizar a noção como conceito operacional. No escopo da tensão entre língua e história (PÊCHEUX, 2004) e da relação entre “tema” e “significação” 525 526 (BAKHTIN, 2006), examinamos o sistema de dispersão em que se dá a propagação de seus enunciados constituintes no entremeio de diferentes campos de exterioridade, seja como formações discursivas (FOUCAULT, 2008), seja como ordens de discurso (FAIRCLOUGH, 2001). Reconhecemos na circulação dessas compreensões similares e distintas, convergentes e divergentes, as possibilidades de constituição dos dispositivos analíticos do discurso, com seus diferentes escopos e propósitos, mas sempre como equações resultantes da objetivação (estrutura) das refrações enunciativas (dialogia) por meio da constituição de regularidades resultantes de sistemas de diferenças e cadeias de inferência (dispersão). Tentaremos demonstrar, no estudo do objeto em foco, como o aparente oximoro formulado por Foucault – o de um “sistema de dispersão” – é, propriamente, uma deriva das noções de “sistema” e “dialogia”, tal como as encontramos nas obras de Ferdinand de Saussure e de Mikhail Bakhtin. Nesse sentido, este estudo afasta-se das explicações de cunho historiográfico para a formulação dessas categorias de análise e suas dimensões operacionais, pautando-se pelo esforço “empobrecedor” de sua lexicalização no contexto de sua aplicação nos estudos das disciplinas de História, Antropologia e Sociologia, da academia brasileira e de suas pesquisas sobre o fenômeno sincrético das práticas religiosas brasileiras. Essa dupla demanda descritivo-explicativa, parte do surgimento pejorativo da noção social de sincretismo, passando por sua afirmação político-ideológica e culminando em sua redução como problema teórico que fundamenta as condições de possibilidade de estudo rigoroso e sistemático. DAS PRÁTICAS NÃO-DISCURSIVAS ÀS PRÁTICAS DISCURSIVAS: UMA TRAJETÓRIA DE COMPREENSÃO Antônio Fernandes Júnior – UFG/CAC Carine Fonseca Caetano de Paula – UFG/CAC Em Á Beira da Falésia (2002), Chartier afirma que na esteira da “reviravolta linguística” em que parece não haver “realidade fora do discurso”, as noções de discurso, prática e representação, contemporaneamente, vêm sustentando a reflexão das ciências humanas e sociais. A partir de uma problematização referente ao entrecruzamento de perspectivas que ocorre no campo dos discursos, o qual se dá entre a língua e a história, a memória e as práticas culturais, as midiáticas, as sociais e as institucionais, coloca-se em questão o seguinte: se há práticas fora do discurso, quais relações de distinção e de imbricamento podem-se estabelecer entre práticas não-discursivas e práticas discursivas? Em A Arqueologia do Saber, Foucault (2009) elabora a noção de formação discursiva como um feixe de relações indissociáveis que compreendem regras de formação de objetos, de conceitos, modalidades enunciativas, de teorias que implicam escolhas temáticas estratégicas, ou seja, a formação discursiva parece se constituir a partir de um cruzamento de elementos, a priori, não-discursivos. Enquanto um conjunto de regras anônimas e históricas, as práticas discursivas parecem ser reguladas por práticas outras, construídas historicamente, nas relações entre fatores sociais, institucionais, culturais, políticos, econômicos, nas relações entre práticas e regularidades específicas a campos distintos do saber e do fazer que se configuram como condições de produção de um certo discurso. No caso deste trabalho, se for atribuído ao livro A Erva do Diabo (1968), de Carlos Castaneda, antropólogo de formação e escritor, um caráter de acontecimento histórico, um enunciado inserido nas suas condições de existência, no sentido proposto por Foucault (2009), em que possibilidades de leituras podem nele estar inscritas, uma possível leitura a se procurar no livroenunciado em questão seria a construção de dois tipos de formações discursivas que estruturam a obra (a feiticeira e a científica) e as posições de sujeito que delas derivam. Efetua-se o mapeamento da rede de relações interdiscursivas que se constrói a partir do livro-enunciado, e por meio dele, propõe-se a reflexão sobre o modo como as práticas discursivas da feitiçaria e da ciência estabelecem relações tensas, de dispustas, e produzem diferentes tipos de saberes, onde se configuram distintas posições de sujeitos. Portanto, o objetivo deste trabalho é traçar uma possível trajetória de compreensão para essas questões e, após percorrê-las, chegar a um lugar em que as 526 527 noções de discurso, enunciado e posições de sujeito sejam acionadas de modo a considerar que fatores históricos, socioculturais, políticos, teóricos, dentre outros, regulam as práticas discursivas e condicionam suas formações. Pretende-se, a partir dessas considerações, elaborar uma trajetória teórico-conceitual que explore e compreenda como ocorre essa implicação mútua entre práticas não-discursivas e discursivas e, com isso, problematizar essa articulação no campo dos estudos discursivos, de orientação foucaultiana. DO DESAFIO PRAZEROSO DE ANALISAR A ESCRITA CONTEMPORÂNEA: AUTORIA E (DES)CONTINUIDADE HISTÓRICA Sirlene Cíntia Alferes Lopes – UFU Tomar como objeto de estudo a escrita de autores da literatura contemporânea torna-se um desafio prazeroso. Desafio: por ter caráter contemporâneo, muito do que constitui sociohistoricamente e ideologicamente a escrita da literatura contemporânea também constitui o sujeito que ocupa a posição de analista ou de leitor dessa escrita; isso pode implicar e, ouso dizer, certamente implica uma análise ou uma leitura que, por vezes, silencia interpretações que seriam possíveis somente àquele que se inscreve sociohistoricamente em outro lugar, em outro espaço de acontecimentos históricos. Nesse sentido, essa análise e essa leitura são um desafio e não um problema, pois a completude de uma análise ou de uma leitura está inscrita apenas no que é da ordem de um imaginário. A interpretação não se fecha, o sentido não é único. Prazeroso: estudar algo da literatura possibilita entrar em contato com diversas temáticas, as quais podem surpreender o leitor e o analista devido à, por exemplo, tamanha complexidade de relações linguísticas e sociohistóricas, levando-os para outros lugares (contemporâneos ou não à escrita). Surge a possibilidade de se situar em um lugar atemporal, em um mo(vi)mento de abrir e fechar relações com espaços de acontecimentos históricos e fazer relações outras com os enunciados que ali apresentam-se constituindo um discurso. Daí o motivo de ser prazeroso. Todavia, saliento que o sentido de prazer aqui tomado não está para a ordem de uma distração. Trata-se de um prazer que promove o desejo de produzir relações e, inclusive, construir um corpus para análise. É nesse sentido que recorro a duas produções escritas de Arnaldo Antunes, tomando como base a noção de autor em Foucault, justamente para separar o sujeito empírico do efeito produzido por meio da escrita pela via do ser de linguagem. Ou seja, não tratarei aqui do sujeito empírico, mas sim do que emerge enquanto efeito da escrita pela função autor. Elegi como material para análise, no presente trabalho, a canção Miséria, escrita em parceria com os Titãs, e o escrito Riquezas são diferenças, com a finalidade de discutir algumas das possibilidades de construção de sujeitos discursivos, afetados obviamente pela história nessas duas produções. Para tanto, embasar-me-ei em formulações de Michel Foucault e de Michel Pêcheux para discutir as questões da autoria e da descontinuidade histórica naquelas produções escritas. LEITURA, INTERPRETAÇÃO E ESCRITURA EM ANÁLISE DO DISCURSO PROCESSOS QUE SE ENTRELAÇAM Ercília Ana Cazarin – UCPel Escritos de Pêcheux (1981) nos dão suporte para partirmos do pressuposto de que “um trabalho de leitura conduz a dar lugar ao inconcebível em um duplo gesto: conceber claramente o concebível para mostrar o inconcebível, isto é, regular um sistema e um intradiscurso e destruir a homogeneidade imaginária dos mesmos”. Neste texto, propomos compreender: 1. Como a análise do discurso pode contribuir para as práticas de leitura e de produção textual no âmbito escolar e/ou acadêmico; 2. Como nós, analistas de discurso, estabelecemos relações com o processo de escritura, 527 528 como atuamos e/ou nos movimentamos em relação ao processo de escritura de nossas análises? Para nós, analistas de discurso, o entendimento é o de que, para além dos elementos linguísticos, a leitura e a escritura de um texto são atravessadas pelo imaginário, pela ideologia e pela historicidade, constitutivas do ler/escrever. Pêcheux (1990) salienta que um discurso deve ser analisado a partir da rede de memória e do trajeto social em que tem origem, mas que é preciso considerar a possibilidade de desestruturação-reestruturação dessa rede e desse trajeto. Conforme o autor, a interpretação é possível porque há o outro nas sociedades e na história. É com esse outro que se estabelece uma relação de ligação, de identificação ou de transferência que possibilita a interpretação. É nesse sentido que o interdiscurso funciona como o “lugar do outro” - espaço de latência de sentidos. Tanto na produção da leitura, quanto no processo de escritura de um texto, convivem os campos da história, da língua e do inconsciente sem fronteiras fixas, e o papel do sujeito-leitor ou do sujeito-autor é produzir gestos de interpretação; gestos esses, afetados pela projeção imaginária que fazem de si, do outro e do “lugar social” em que estão inscritos. Processos esses concebidos como práticas sociais que mobilizam a memória do dizer e que conduzem o sujeito-leitor e o sujeito-autor, enquanto sujeitos históricos, a inscreverem-se em uma disputa de interpretações. E o analista de discurso também não é isento desse processo. Quando atuamos como analistas, a interpretação dá lugar à compreensão do texto, pois conforme Orlandi (1999), nosso trabalho é “compreender – e não refletir - o gesto de interpretação do sujeito e expor sobre seus efeitos de sentido”. É no momento dessa exposição dos efeitos de sentido que, no nosso ponto de vista, entra a escritura do analista – muito embora a mesma já venha sendo gestada desde a leitura e compreensão do material que está sendo objeto da análise. O analista “num retorno contínuo do objeto de análise para a teoria, num movimento constante de descrição e interpretação, tece as intrincadas relações do discurso, da língua, do sujeito, dos sentidos, articulando ideologia e inconsciente” (ORLANDI, op. cit.). A autora escreve que o analista “interroga a interpretação, trabalha sobre ela” (op. cit.). Interroga no sentido de que, para compreender o processo discursivo, (des)constrói o percurso interpretativo realizado pelo produtor do texto e, concomitantemente, (re)textualiza. A partir disso, entendemos que se ler já é interpretar e, interpretar também é uma maneira de ler, da mesma forma, compreender já é um momento de escritura - “compreender significa explicitar os gestos de interpretação feitos pelo sujeito, gestos inscritos no texto” (ORLANDI, 2012). Em síntese, as questões sobre as quais estamos nos propondo discutir nos permitem explicitar o entrelaçamento entre esses processos intrinsicamente ligados entre si – o de leitura, o de interpretação e o de escritura do texto, quer no cotidiano escolar e/ou acadêmico, quer nas análises que realizamos. OPERACIONALIZAÇÃO DO CONCEITO DE DISPOSITIVO NA CONSTRUÇÃO DISCURSIVA DA IDENTIDADE DO ALUNO HIPERATIVO Bruno Franceschini – PG/UFU Este projeto de tese tem por objetivo verificar os processos discursivos que objetivam e subjetivam o sujeito aluno hiperativo, nos quais são observados os discursos constituintes da identidade desse sujeito da educação verificando a ocorrência de regularidades discursivas entre o discurso médico e escolar em suas diferentes modalidades. Nesse sentido, para além do que fora discutido no mestrado, sentimos a necessidade de compreender os aspectos não-discursivos que contribuem para a construção da identidade do aluno hiperativo, porque, devido ao tempo limitado para a execução da pesquisa, não foi possível a realização de observação em escolas, aplicação de questionários e entrevistas com alunos considerados hiperativos, pais, professores, pedagogos, psicólogos, psiquiatras e neurologistas, com vistas a observar e descrever como o sujeito da educação governa a si mesmo e como este é governado pelos outros sujeitos relacionados, bem como esses sujeitos trabalham a questão do Transtorno por Déficit de Atenção e Hiperatividade. Para tanto, de forma a cumprir com a proposta, são utilizados preceitos teórico-metodológicos propostos pelo filósofo 528 529 francês Michel Foucault, em especial, o conceito de dispositivo. A justificativa para o trabalho com esse conceito reside no fato de que, no processo de construção da identidade do aluno hiperativo, o discurso, considerando o seu aspecto sócio-histórico, movimenta fatores de ordem discursiva e nãodiscursiva, como expõe Veyne (2011, p. 57), “o dispositivo mistura, portanto, vivamente, coisas e ideias (entre as quais a de verdade), representações, doutrinas, e até mesmo filosofias, com instituições, práticas sociais, econômicas, etc.”. Nesse sentido, levantamos como hipótese para este trabalho que os saberes, as instituições, os modos de agir e de pensar dos sujeitos e das instituições envolvidos com o sujeito aluno hiperativo, sejam tanto da ordem familiar, quanto da saúde ou da educação, contribuem, em suas práticas cotidianas e com seus discursos, na construção da identidade do aluno hiperativo. Portanto, com o objetivo de operacionalizar a noção de dispositivo em consonância com o estudo sobre a construção discursiva da identidade do aluno hiperativo é que justificamos a mobilização desse conceito e de outros conceitos também arrolados a essa questão, tais como: discurso, história, verdade, poder, e demais conceitos imanentes a essa discussão. O GÊNERO EDITORIAL- UM CONTROLE DO DISCURSO Janete Abreu Holanda – UEG Este trabalho, com base nas formulações de Michel Foucault acerca das possibilidades do dizer, tem como objetivo principal verificar como o sujeito escritor, Mino, ao se inscrever no gênero editorial para falar na função de sujeito-autor, defende a posição assumida, mas não diz o que quer, não é livre para formular qualquer discurso, pois só pode ser formulado aquele que está submetido aos limites impostos pelo lugar de onde fala e deve seguir certos ordenamentos. Ou seja, deve seguir regras discursivas postas pela instituição, pelo gênero discursivo e pelo próprio discurso, que se auto-controla. Assim, há uma “hierarquia discursiva”, pois esse sujeito-editorialista precisa se submeter à ordem discursivo-social, à ordem discursiva-institucional e à ordem discursiva do gênero. Dessa forma, desfaz-se toda e qualquer possibilidade de o sujeito ter total domínio sobre seu discurso e sobre as escolhas sintáticas e semânticas que faz e ser o centro de todo conhecimento bem como manifestar-se apto a escolher e dizer verdades da/na história. Para tal análise, selecionamos editoriais produzidos em época da eleição presidencial de 2010 sobre a candidata Dilma Rousseff, da revista Carta Capital. Dessa forma, esse suporte analisado, por ter uma linha editorial diferenciada, traz uma contextualização, dos “acontecimentos políticos”, ou seja, recorta os fatos e os apresenta do ponto de vista em que “se devem” ser visto, tentando “informar” ao sujeitoleitor as verdades sobre Dilma. Portanto, ao analisarmos os discursos produzidos nos editoriais que compõem o corpus desta pesquisa, encontramos um sujeito-editorialista afetado e controlado pelo discurso que ocupa lugares (posições) diferentes ao produzir os seus enunciados. Essa diferença está no fato de que, “estrategicamente”, esse jornalista-editorialista é, em primeira instância, “cindido”, pois ele exerce a função, ao mesmo tempo, de jornalista-editorialista e também de jornalista-autor. Este organiza as vozes discursivas no momento em que produz o texto, e aquele representa uma instituição. SABER E BIOPODER NAS PRÁTICAS DISCURSIVAS CONTEMPORÂNEAS: O CONTROLE SOBRE OS ENUNCIADOS Cleudemar Alves Fernandes – UFU Kátia Menezes de Sousa – UFG Para encerramento do Simpósio “Língua, história e movimentos no discurso”, pretendemos retomar questões suscitadas pelos trabalhos apresentados e possibilitar reflexões que considerem as contradições produzidas nas práticas discursivas da atualidade. Discutiremos, em nossa 529 530 apresentação, a relação língua/discurso/história por meio da análise de enunciados divulgados na mídia impressa, com a finalidade de compreender a inter-relação entre os saberes e as formas de exercício de poder no (des)(re)aparecimento de certos enunciados e não de outros. Assim, esperamos ser possível a confirmação da hipótese de que haja determinados saberes que instrumentalizam o exercício do poder, mais especificamente do biopoder (FOUCAULT, 2001), que estabelecem o controle de certos enunciados e sustentam as formas de objetivação dos temas da atualidade e, consequentemente, as técnicas de subjetivação que delineiam, para os indivíduos, as possibilidades de identificação. O controle, por meio de diversificadas formas de censura, atua no interior das Formações Discursivas (FOUCAULT, 1995), redefinindo tanto o que é dito quanto a posição que deve ser ocupada para ser o sujeito desse dito. NOTAS SOBRE PERFORMATIVOS POLÍTICOS EM POLÍTICA Roberto Leiser Baronas – UFSCAR/UFMT/CNPq Em seu texto “Foi propaganda mesmo que você disse?”, Michel Pêcheux (1979) em uma análise histórica exemplar, chama-nos atenção para o fato de que a propaganda política em geral e, a governamental em especial, com o advento do capitalismo, desenvolveu diferentes formas de assujeitamentohistórico dos indivíduos se configurando numa nova maneira de gerir os corpos e as práticas dos indivíduos. Esse novo tipo de gestão dos indivíduos, sobretudo com o advento dos modernos meios de comunicação de massa se dá por meio de toda uma política dos performativos, interpelando os indivíduos a partir de seus próprios narcisismos. Nesse sentido, a política do performativo potencializada pelos meios de comunicação de massa tem atualmente um papel decisivo na propaganda política contemporânea, visto que o dito tende a se apresentar como o feito, silenciando qualquer possibilidade mais efetiva de embate e/ou polêmica, ou nas palavras do próprio Pêcheux “a política tende a se tornar uma atividade imaginária que se parece ao sonho acordado”. Nesta comunicação com base nas reflexões de Michel Pêcheux (1979), analisamos discursivamente um conjunto de propagandas do Governo do Estado do Paraná veiculadas nos últimos dois anos em diversos meios de comunicação paranaenses. Concentramo-nos mais especificamente nas relações de sentido instauradas entre os slogans, outras pequenas frases e as imagens veiculadas nessas campanhas; as instituições que dão a circular tais enunciados e imagens e os modos de subjetivação que tais performativos políticos (verbais e verbo-visuais) buscam engendrar nos indivíduos. A QUESTÃO DA LÍNGUA COMPANHEIRA DOS IMPÉRIOS PORTUGUÊS E MALAIO NO SUDESTE ASIÁTICO, O CASO DE TIMOR-LESTE Simone Michelle Silvestre – UNICAMP Propomo-nos aqui a apresentar e a analisar discursivamente algumas narrativas históricas e políticas da colonização portuguesa sob uma das ilhas da região da Insulíndia, no Sudeste Asiático, mais especificamente o caso de Timor-Leste. Interessa-nos alguns possíveis sentidos produzidos pelas narrativas no tocante às línguas da região, à tensão entre elas e os seus falantes, dando início ao processo do que se passou a denominar colonização linguística (Mariani, 2004) na Ásia do Sudeste do século XVI. A narratividade apontada no trabalho faz parte do levantamento inicial nas produções de historiadores portugueses dos séculos XX e XXI (Luís Filipe F.R.Thomaz e Ivo Carneiro de Sousa) a respeito da atuação (dominação) da metrópole portuguesa no projeto de expansão ultramarina no continente asiático, especialmente em Timor-Leste, e alguns dos possíveis desdobramentos de tais interferências na ilha e alguns territórios no seu entorno. Já para uma análise 530 531 primeira, recorremos a conceitos apontados pela pesquisadora Bethania Mariani (2004) que dialoga com os fundamentos da Análise de Discurso (Pêcheux e Orlandi), com ideias de Hélène Merlinkajman (2003), especialmente no tocante ao que nomeia ser a “lei histórica da língua companheira do império” (p.79) e as possíveis contradições e sentidos que tal ideia produz no processo de constituição das línguas entre povos colonizados e os colonizadores. Já levando-se em conta algumas ideias de Sylvain Auroux (1992), a projeção e imposição dos vernáculos europeus, com sua poderosa tecnologia linguística (a escrita) e seus instrumentos linguísticos (gramáticas e dicionários) nos territórios descobertos e a relação daqueles com as línguas regionais das terras conquistadas e as de outros impérios, já há mais tempo por lá, e o estado de tensão e conflito que, desde sempre, marcaram o contato entre as línguas e seus falantes, no caso do atual trabalho, do século XVI ao XIX. Foi-nos possível apontar que, no caso da colonização linguística de Portugal em Timor-Leste, a língua portuguesa enquanto “companheira do império” funcionou de modo bastante diverso em diferentes momentos, ainda que, no século XVI, o português ocupasse a posição de língua mercantil (com atuação mais externa do que propriamente no interior dos territórios, espécie de língua global, como é o inglês hoje) em diferentes redutos asiáticos, como Japão, Macau (China), Goa (Índia), Malaca, Ternate, Ambeno e Java, africanos e americanos (o caso do Brasil), e contraditório. Entender esse processo e os efeitos produzidos, geralmente, é muito produtivo, como será apontado nos acontecimentos e na análise realizada, pois, torna-se possível verificar que o processo de colonização linguística aconteceu em todos os territórios (do mais rico ao mais pobre, nenhuma nação escapou dele!), mas que a constituição, os modos e os sentidos na configuração de cada Estado-Nação e colônia são capturados pelas línguas, pelo político (a ideologia) que interpela os indivíduos em sujeitos (Pêcheux) e as relações de poder entre as classes envolvidas, seja através das suas tensões, dos seus equívocos e fronteiras, geralmente não muito bem definidas, uma interpenetrando na outra. O GÊNERO “MANUAL” COMO FORMA IDEOLÓGICA: CONTRADIÇÕES DAS POLÍTICAS PUBLICAS EM TORNO DA CIÊNCIA E SABER POPULAR Carla Macedo Martins – FIOZRUZ Anakeila de Barros Stauffer – FIOCRUZ No campo da atenção básica à saúde no Brasil, podemos afirmar que as cartilhas e os manuais constituem hoje um importante material didático e uma ferramenta de gestão do trabalho. Neste contexto, destacamos os materiais dirigidos aos agentes comunitários de saúde - profissionais de educação e promoção à saúde e de prevenção de doenças, que atuam como elo entre serviços de saúde e comunidade, na Estratégia Saúde da Família. Martins e Stauffer (2012) analisam o discurso de dois manuais dirigidos aos agentes, identificando as paráfrases como processos de construção de uma “evidência” de identidade do agente comunitário (“agente comunitário de saúde”/”agente de promoção da saúde”/”agente de mudanças”); e os pré-construídos em torno de “participação popular”, “controle social” e “problemas de saúde”. A análise referida indica, assim, em primeiro lugar, que os manuais cumprem uma função identitária de definir o trabalhador em questão, em um contexto histórico de emergência de uma (nova) ocupação laboral; e, em segundo lugar, que os manuais funcionam como espaço de disputa de sentidos em torno de “comunidade” e “participação”, ou seja, estes materiais também se constituem como espaços de produção identitária sobre o “ser cidadão”. A análise do movimento discursivo hegemônico presente nos manuais, portanto, aponta para uma tentativa de circunscrever as ações potencialmente transformadoras dos agentes e da população aos programas de saúde já instituídos ou a uma visão restrita do Direito (à saúde), corroborando as formas de participação vigentes e esgotando as funções de agente de saúde no “vigiar constantemente e de forma responsável” (Brasil, 2009, p.68). A presente comunicação tem como objetivo dar continuidade à análise destes manuais, considerando-os em termos de “gênero textual-discursivo” (Bakhtin, 2003). O gênero é tomado aqui como materialidade histórica, 531 532 constituindo-se tanto como estruturas verbais tipificadas, quanto como formas “em movimento” para a produção de sentido. A análise preliminar destes materiais à luz da noção de gênero indica a presença de estruturas textuais discursivas específicas (seqüências pergunta-resposta e glossários), assim como de formas de enunciação que buscam apagar a historicidade do sujeito. Na análise deste gênero “manual”, almejamos também enfocar a relação entre os chamados “saberes populares” e o denominado “saber científico”. Nossa hipótese é que os manuais de saúde do campo da atenção básica tendem a reproduzir dois movimentos contraditórios, porém combinados: apresentam ora uma perspectiva instrumentalizante dos saberes populares, ora uma perspectiva dos saberes populares como algo impeditivo ao trabalho do agente. Nesta linha, a legitimidade do discurso científico que embasa as ações de saúde não é questionada, funcionando, de forma não excludente, com a referida (suposta) consideração ou até mesmo valorização dos saberes populares. A comunicação, portanto, ao discutir tais manuais como gênero discursivo, aponta para o enfrentamento das questões ideológicas que atravessam a produção discursiva no campo da atenção básica: em primeiro lugar, a de-historicização do saber popular e do discurso científico; em segundo lugar, o apagamento epistemológico e ontológico do sujeito discursivo e histórico; em terceiro lugar, o controle da interação verbal e da participação popular pelo Estado e as contradições oriundas deste processo; e, por fim, a busca de legitimação acritica das políticas de saúde vigentes junto à população. ANÁLISE DAS FORMAÇÕES DISCURSIVAS NA MEDIAÇÃO DE CONFLITOS E AS POSIÇÕES-SUJEITO NA CONCILIAÇÃO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL Lúcia Fajardo – UFBA O tema Mediação de conflitos sob o olhar da Análise de Discurso Pecheutiana nesta pesquisa, se deve ao fato de tal meio alternativo de disputa ser um forte aliado do Poder Judiciário e da sociedade, pois, para o Poder Judiciário, a mediação desafoga a justiça comum - a qual é morosa pelo acúmulo de processos a serem julgados - oferecendo à sociedade decisões mais céleres e de maior qualidade, uma vez que há a intenção de que os conflitos sejam resolvidos por meio do diálogo entre as partes, possibilitando um acordo que atenda os interesses de ambas. O objetivo desse trabalho foi analisar as formações discursivas mostrando o funcionamento dos textos escritos (discursos), observando sua articulação com as formações ideológicas presentes no contexto das mediações no Juizado Especial Cível, bem como, analisar as posições-sujeito presentes na interação negociada entre os sujeitos participantes da conciliação em relação ao seu interlocutor (o mediador ou a outra parte). Este trabalho se baseia no referencial teórico sobre mediação e nos pressupostos teórico-metodológicos da Análise de Discurso Pecheutiana, dado que a análise das formações discursivas dos sujeitos participantes emergirá da contingência da situação de interação na mediação do Juizado Especial Cível. Também explicitará as relações entre o dito e o não dito, ou seja, lidará com as relações do interdiscurso. Chegará à formação discursiva (FD) que domina os discursos na conciliação no Juizado Especial Cível (JEC), bem como identificará a relação dessa formação discursiva dominante com outras formações discursivas que se entrecruzarem, atingindo assim, a formação ideológica implícita nos diversos discursos. Para a análise das formações discursivas será usada gravação em áudio de conciliação no Juizado Especial Cível. Esta gravação ocorreu em uma base de pesquisa etnográfica. O corpus já está coletado. Foram feitas as notas de campo por esta pesquisadora. A escolha da gravação da conciliação denominada “Perda do cartão” se deu por esta, dentre as nove gravações feitas, ser a que contém as três partes: vítima, réu e mediador, e por ter ao final, chegado a um acordo entre as partes. Levando assim, a uma boa análise da mediação de conflitos. A conciliação “Perda do cartão” foi gravada por esta pesquisadora, num Juizado Especial Cível em um dia. A gravação tem a duração de 1: 15 h. Foram oito os participantes 532 533 desta conciliação, sendo eles: (1) A vítima, da qual o cartão foi roubado e foi cobrada por um banco, uma loja e um posto de gasolina por compras que não fez. (2) Seu esposo. (3) A advogada do banco. (4) O advogado do posto. (5) A vendedora da loja. (6) A advogada da loja. (7) O mediador. (8) A advogada do JEC. A transcrição dos dados será de acordo com critérios do NURC. Essa pesquisa fornece um retorno para a comunidade, no sentido de buscar melhorar a mediação, na medida em que incentiva a cultura do diálogo e a efetivação da democracia. PONTOS DE DERIVA: EFEITOS DA LÍNGUA PORTUGUESA, DA ESCOLA/ESCRITA NA CONSTITUIÇÃO DA RESISTÊNCIA DO POVO XAVANTE Águeda Aparecida da Cruz Borges – UFMT A nossa proposta para o Simpósio: LÍNGUA, HISTÓRIA E MOVIMENTOS NO DISCURSO, é discutir com base nas análises de um corpus heterogêneo o modo como se dão os processos de naturalização, oficialização, interdição acerca do discurso sobre a língua, em relação ao povo Xavante, determinantes no processo de identificação/subjetivação desses sujeitos, presentes, frequentes na cidade de Barra do Garças, MT, Brasil. Contrariando, por exemplo, a imposição da “educação” jesuítica e salesiana, o contato inevitável, os Xavante, ainda, mantém vigorosa a língua própria. Fundamentamo-nos na Análise de Discurso Materialista - Pêcheux-França - difundida e renovada por - Orlandi-Brasil, pela qual compreendemos que a memória discursiva concerne ao que se inscreve na constituição do sujeito e, assim, sustenta o seu (in)dizível, pois onde se produzir memória, produz-se linguagem: uma forma de o sujeito se dizer e dizer o mundo. Um fio do discurso se explica pelo real da língua, onde há lugar para o “impossível”, para o equívoco, para a elipse, para a falta, enfim, há lugar para a deriva: “tudo não se diz, pois há um impossível próprio da língua” (Milner, 1987, p. 6). Os autores de La Langue Introuvable (Gadet e Pêcheux, 1984) trabalham as contradições no jogo do “universal” e do “histórico”. Mostram como se idealiza um “universal”, funcionando simultaneamente, segundo a figura jurídica do Direito e segundo a figura biológica da Vida; uma igualdade ideal que cria, pelo mesmo gesto, a desigualdade real. O corpus se constitui de sequências discursivas da monografia de Uratsé Tsi’õmowê; de conversas com o Cacique Urebete Aírero, sobre a “Escola Tatu” (Iró’ Órãpe), da imagem/fotografia do prédio da referida Escola e de uma notícia do jornal online “Olhar Direto” que trata da sua inauguração. Mostramos nas análises que a língua não será nunca igual, contudo consideramos os efeitos de sentido da memória, que funciona de modo resistente imprimindo no encontro das línguas com a escrita, a escola ocidental/diferente, uma possibilidade de esse povo manter a própria língua, a cultura na dinâmica da vida. 533 534 SIMPÓSIO 50 TRATAMENTO DE ORAÇÕES COMPLEXAS NO PORTUGUÊS No Brasil, os linguistas de orientação funcionalista vêm, nas últimas décadas, privilegiando a análise das orações complexas de diversos tipos (DECAT 1993, DIAS 2001, GONÇALVES 2001, NEVES 2000, PAIVA 1991, BRAGA 2008, a título de exemplo). Usualmente rejeitam a dicotomia adotada pela abordagem tradicional dos estudos sobre a linguagem, de acordo com a qual as orações constitutivas de uma oração complexa se vinculam ou por coordenação ou por subordinação, e endossam um enfoque segundo o qual as orações complexas podem ser distribuídas ao longo de um continuum conforme o maior ou menor grau de vinculação de seus segmentos constitutivos. Os mencionados estudiosos tomam como ponto de partida a proposta de Halliday (1985), retomada em Matthiessen e Thompson (1988) e Hopper e Traugot (1993, 2003), para quem as orações podem se combinar por parataxe, hipotaxe e encaixamento, processos estes identificáveis pelos traços dependência e encaixamento. A parataxe se caracteriza pelos traços [-dependência][-encaixamento], a hipotaxe, pelos traços [+dependência] e [-encaixamento] e a subordinação, pelos traços [+dependência] [+encaixamento]. Algumas investigações se valem, com frequência, do modelo desenvolvido por Lehmann (1988) que propõeuma gradiência mais fina no que se refere à “degradação hierárquica das orações” postas em combinação: orações independentes, orações adjungidas, díades correlativas, orações mediais e orações governadas. Os trabalhos usualmente defendem a hipótese de desvinculação entre processo sintático de articulação e tipo de relação semântica que emerge no período complexo, sustentando que uma relação semântica particular pode ser sinalizada por processos sintáticos diferenciados. Priorizam a investigação de dados empíricos reais, rejeitando os exemplos artificiais criados para ilustrar uma hipótese específica. Inicialmente mais voltados para a dimensão sincrônica, se ampliaram para uma dimensão diacrônica, buscando-se explicações para a forma de desenvolvimento dos processos de articulação de orações. Variáveis linguísticas e sociais diversas têm sido contempladas com vistas a dar conta tanto de aspectos morfossintáticos, semânticos e discursivo-pragmáticos quanto do efeito que as características dos falantes possam ter sobre a estrutura linguística. Este simpósio, intitulado “Tratamento das orações complexas no Português”, visa a discutir estudos sobre combinação de orações sob a perspectiva brevemente esboçada acima e aceitará trabalhos que examinem as orações complexas em qualquer variedade do português – brasileiro, europeu, africano, asiático e insular. Serão aceitos trabalhados que incidam sobre qualquer dos processos de vinculação das orações complexas – parataxe, hipotaxe e subordinação. COORDENAÇÃO Maria Luiza Braga Universidade Federal do Rio de Janeiro [email protected] Maria da Conceição Paiva Universidade Federal do Rio de Janeiro [email protected] 534 535 A RELAÇÃO DE FINALIDADE EM CONSTRUÇÕES V+INF. Patrícia Oréfice – UNESP O objetivo desse trabalho é investigar acerca da atualização da relação de finalidade em construções como (1). Essas construções representam casos [- prototípicos] de orações de finalidade, as quais, segundo Dias (2001, p.95), são construídas, no PB, quase que categoricamente a partir da estrutura para + infinitivo. A justificativa apresentada pela autora para a seleção da preposição para como introdutora das cláusulas de finalidade está associada ao seu valor semântico de finalidade e meta, além de para selecionar infinitivo, diferentemente das outras locuções conjuntivas de finalidade (a fim de que, por exemplo) que selecionam subjuntivo, modo menos produtivo no PB. (1) Miga, tem dias que eu tô com humor cinza, que eu saio ver vitrines, nao há nada mais medicinal. Torrent (2009), por sua vez, defende que a ocorrência da preposição “para” seguida de infinitivo “(...) parece ser decorrência de uma necessidade de maior marcação sintático-semântica das cláusulas de finalidade em face do desmantelamento do sistema latino fundado nas relações de consecutio temporum e de complementação” (TORRENT, 2009:131). Segundo Lakoff e Johnson (2002 [1980]) e Lakoff (1987), as cláusulas de finalidade são aquelas que “codificam o movimento no mundo das intenções. O sujeito e/ou locutor estabelecem um propósito ou finalidade, cuja execução do objetivo demanda o deslocamento de uma origem a uma meta, com uma trajetória, no mundo das intenções. Nosso objetivo é, portanto, discutir se é mesmo a construção para+infinitivo responsável pela marcação da noção de finalidade, como ainda podemos interpretar (1) como uma construção de finalidade? Nossa hipótese inicial é a de que para, assim como aponta Torrent (2009), apenas explicita uma relação de finalidade e é fundamental nessa função apenas quando o verbo da oração principal não perfila nenhum sentido de finalidade. Considerando que as construções finais sem a preposição para não podem ser elaboradas com todos os verbos, pretendemos investigar quais verbos permitem o apagamento da preposição. Para tanto, iniciaremos nossa pesquisa buscando identificar os verbos associados ao frame de finalidade para verificar se seriam esses verbos que aceitariam a adjunção de uma construção final. PADRÕES DE ESTRUTURAÇÃO DA RELAÇÃO ADVERBIAL DE PROPÓSITO NO PORTUGUÊS Michel Gustavo Fontes – IBILCE/UNESP O trabalho que aqui se propõe é desenvolvido no âmbito do projeto “Construções subordinadas nas variedades lusófonas: uma abordagem discursivo-funcional”, desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa em Gramática Funcional (GPGF), sob a coordenação da Profa. Dra. Erotilde Goreti Pezatti, no Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas (IBILCE/UNESP) de São José do Rio Preto. Esse projeto objetiva fornecer um quadro da subordinação nas variedades lusófonas de forma a descrever, o mais abrangente possível, o sistema de subordinação nas oito variedades do português. No tocante à subordinação adverbial, o objeto está em investigar as relações adverbiais nas variedades lusófonas de forma a determinar as motivações funcionais subjacentes à relação entre as estruturas morfossintáticas usadas para codificar essas relações e as situações conceituais que elas expressam. Ao integrar o projeto citado, este trabalho pretende analisar as formas de expressão da relação adverbial de propósito, tradicionalmente denominada de finalidade, no Português. Segundo Cristofaro (2003), a relação de propósito articula dois estados de coisas de forma que um deles (o principal) é realizado com o objetivo de obter a realização do outro (o dependente). Segundo Wakker (1987, p. 89), as oração de propósito se caracterizam, principalmente, por (i) serem constituintes opcionais, (ii) expressarem o propósito que a entidade controladora do estado de coisas da oração principal quer atingir por meio da realização de tal estado de coisas; (iii) ligarem-se ao estado de coisas da oração principal como um todo, não somente a um único constituinte, como em 535 536 “maravilhoso para se olhar”, e, por fim, (iv) o estado de coisas da oração principal ser controlado. Partindo dessas considerações, nosso objetivo é o de verificar as propriedades pragmáticas, semânticas e morfossintáticas envolvidas na estruturação da relação de propósito para, assim, propor quatro padrões de estruturação para a relação de propósito. Esses quatro padrões, mesmo sendo distinguidos com base em sua estrutura morfossintática, apresentam diferentes propriedades semânticas e pragmáticas. A Gramática Discursivo-Funcional (cf. HENGEVELD; MACKENZIE, 2008), enquanto um modelo de gramática organizado hierarquicamente em níveis e camadas, oferece parâmetros bastante adequados para a proposição desses quatro padrões de estruturação da relação de propósito, já que tais padrões demonstram, de certa maneira, o alinhamento entre a operação de codificação, no Nível Morfossintático, e a de formulação, nos Níveis Representacional e Interpessoal, isto é, esses padrões que aqui propomos evidenciam como a estrutura, no Nível Morfossintático, é moldada por fatores de ordem semântica, do Nível Representacional, e de ordem pragmática, do Nível Interpessoal. Para a análise, são utilizadas ocorrências reais de uso extraídas do corpus oral organizado pelo Centro de Linguística da Universidade de Lisboa, em parceria com a Universidade de Toulouse-le-Mirail e a Universidade de Provença-Aix-Marselha. As ocorrências, por sua vez, são analisadas à luz de alguns fatores, como: 1. Tipo de entidade expressa pelo constituinte adverbial; 2. Morfema subordinador; 3. Posição na oração matriz; 4. Dependência do verbo da oração subordinada; 5. Factualidade; 6. Forma do verbo; 7. Codificação dos participantes; 8. Identidade dos sujeitos; e 9. Pressuposição. Espera-se assim fornecer uma descrição mais adequada a respeito da relação adverbial de propósito, relacionando dados empíricos a bases teóricas de natureza funcional. RELAÇÃO DE CAUSALIDADE: MECANISMOS DE CONEXÃO FRÁSICA E NÍVEL DE ESCOLARIDADE Joana Aguiar – CEHUM/Universidade do Minho Conceição Paiva – UFRJ Nesta comunicação, focalizamos a correlação entre os mecanismos de expressão da relação de causalidade e variáveis sociais como sexo, idade e escolaridade do falante. Tendo em consideração a complexidade da noção de causalidade e a multiplicidade de propostas teóricas que se debruçam sobre esta noção (HALIDAY & HASAN, 1976; MANN & THOMPSON, 1986; SWEETSER, 1990; SANDERS ET AL., 1992; ASHER & LASCARIDES, 2003), assumimos que as relações de causalidade operam em domínios distintos e podem ser subdivididas em: causa real, causa explicativa e causa modificadora do ato de fala, na linha do proposto por Sweetser (2000). Partindo desta tripartição, discutimos a frequência de ocorrência das relações de causalidade num corpus de textos expositivo-argumentativo, redigidos por falantes do Português Europeu, estratificados de acordo com o sexo, grau de escolaridade e faixa etária. Cada estrutura é analisada de acordo com: tipo de relação causal (SWEETSER, 1990); o tipo de estrutura sintática que veicula a relação de causalidade (justaposição, coordenação, subordinação); e o elemento de ligação entre as orações. A partir da análise destas variáveis pretende-se observar de que forma varia a representação sintática das relações de causalidade e verificar a importância dos fatores sociais na clarificação da variação observada. Em relação à influência do nível de escolaridade, sabe-se que os mecanismos utilizados para veicular relações de causalidade ainda estão em desenvolvimento no nono ano (LOPES, 2004). Como tal, espera-se obter uma maior percentagem de estruturas subordinadas, principalmente introduzidas por porque, nos falantes mais jovens e com menos escolaridade, uma vez que estas são apresentadas, em contexto escolar, como prototípicas no estabelecimento da relação de causalidade. A partir de uma análise estatística que verifica a significância das diferenças observadas entre os diferentes grupos, são obtidas evidências favoráveis a esta hipótese. Os resultados indicam que os informantes com menos escolaridade (e mais jovens) apresentam uma maior percentagem de causa real e, como previsto, maior uso do mecanismo de subordinação, principalmente quando 536 537 estabelecida através de porque. Por outro lado, a justaposição é mais frequente em adultos com mais anos de escolaridade, que preferem estabelecer as relações de causalidade de uma forma mais indireta. Outro dado importante é o aumento de relações de causa explicativa nestes falantes, influenciado não só pelo desenvolvimento de outros mecanismos de conexão, mas também pelo desenvolvimento de estratégias de argumentação. A CONEXÃO CAUSAL NO PORTUGUÊS ARCAICO Fabrício da Silva Amorim – UNESP Mattos e Silva (1989; 2008), ao descrever a conexão causal no português arcaico, identifica a existência da “coordenação explicativa”, prototipicamente representada pelas orações introduzidas por ca, e da “subordinação adverbial causal”, que apresenta como orações prototípicas as que são introduzidas pelos conectores porque, pois/pois que e que. Embora aponte os usos prototípicos dos conectores causais no português arcaico, Mattos e Silva reconhece a fluidez semântica e sintática das orações causais nesse período. Sobretudo em relação às orações introduzidas por ca, assinala a autora que esses enunciados “estão naquela duvidosa zona limítrofe da coordenação e da subordinação” (MATTOS e SILVA, 1989, p. 690). Numa visão funcionalista (HALLIDAY, 1985), poder-se-ia afirmar que a “duvidosa zona limítrofe” a que a autora se refere diz respeito aos casos de hipotaxe. Assim, à luz do Funcionalismo (HALLIDAY, 1985) e da abordagem da Gramaticalização (HEINE, 2003; HOPPER; TRAUGOTT, 1993), este trabalho é conduzido a partir do seguinte problema: como se caracteriza o pareamento “arquitetura sintática/relações de sentido” (RAIBLE, 2001) das orações causais no português arcaico? Para responder a essa questão, este estudo busca (i) descrever as relações de sentido codificadas pelas orações causais com base na proposta dos domínios de causalidade (SWEETSER, 1991), em correlação com os mecanismos de articulação de orações (HALLIDAY, 1985) e (ii) identificar processos de especialização semântica (HOPPER, 1991) dos conectores que introduzem essas orações. O corpus da pesquisa é constituído por nove textos representativos do português arcaico – século XIII ao século XV –, que totalizam 82.685 palavras. AS ORAÇÕES CONDICIONAIS INTRODUZIDAS PELA LOCUÇÃO CONJUNCIONAL “NO CASO DE (QUE)” NO PORTUGUÊS BRASILEIRO Kátia Elaine de Souza Barreto – UFMS/Três Lagoas Edson Rosa Francisco de Souza – UFMS/Três Lagoas Em geral, a tradição gramatical distingue apenas dois tipos de períodos compostos: a coordenação e a subordinação, sendo a primeira caracterizada por uma relação de independência e a segunda caracterizada por uma relação de dependência (em que as orações possuem um estatuto diferente, ou seja, uma oração funciona como parte da outra). No entanto, a noção de dependência ora é tratada na tradição gramatical como uma dependência sintática (formal) ora como uma dependência semântica (de incompletude significativa), definição esta que tem sido bastante criticada nos estudos linguísticos (PAIVA, 1991; DECAT, 1993; HOPPER & TRAUGOTT, 1993; NEVES, 2000; CRISTOFARO, 2003; HENGEVELD e MACKENZIE, 2008; BRAGA, 2008; GONÇALVES, SOUSA & CASSEB-GALVÃO, 2009), sobretudo no que diz respeito aos critérios utilizados para identificar os tipos de combinação de orações (PAIVA, 1991; DECAT, 1993; HOPPER & TRAUGOTT, 1993; NEVES, 2000; BRAGA, 2008; GONÇALVES, SOUSA & CASSEB-GALVÃO, 2009). Para esses autores, os processos de combinação de orações são, geralmente, divididos em parataxe [-encaixamento, -dependência], hipotaxe [-encaixamento, +dependência] e subordinação [+encaixamento, +dependência], que, diferentemente da tradição 537 538 gramatical, resultam da combinação de traços sintáticos e semânticos [+/- dependência] e [+/encaixamento]. De posse dessas informações, o objetivo principal do trabalho é analisar, sob a perspectiva teórica da Gramática Discursivo-Funcional (HENGEVELD e MACKENZIE, 2008) e da Gramaticalização (HOPPER e TRAUGOTT, 1993; TRAUGOTT, 1995; BYBEE, 2003), as orações condicionais introduzidas pela locução conjuncional “no caso de (que)” no português brasileiro, tendo em vista os aspectos sintáticos, semânticos e pragmáticos atrelados ao uso do referido conectivo para articular orações. Em termos específicos, a proposta é (i) verificar as motivações funcionais que regulam a escolha da locução conjuncional “no caso de (que)” para indicar condicionalidade, considerando-se o fato de que o português brasileiro dispõe de várias outras conjunções simples e complexas para marcar a relação semântica de condição, (ii) analisar o processo de gramaticalização porque vem passando a locução conjuncional “no caso de (que)” no português brasileiro [do nome “caso” à locução conjuncional “no caso de (que)”], em que se observa um deslocamento funcional do domínio concreto [lexical] para o domínio mais abstrato [gramatical], com usos que vão, conforme Traugott (1982), desde a esfera proposicional (usos lexicais) até a esfera expressiva (usos interacionais), passando pela esfera textual (articulação de orações). Para tanto, utilizaremos como universo de investigação o Corpus do Português (DAVIS e FERREIRA, 2006), disponível no endereço (www.corpusdoportugues.org), e os seguintes parâmetros de análise: unidade composicional da oração principal, unidade composicional da oração subordinada, correferência entre os sujeitos, factualidade, tempo verbal da oração principal, tempo verbal da oração subordinada, forma verbal da oração subordinada, posição da oração subordinada e tipo de gênero discursivo. ORAÇÕES COMPLEXAS DE TEMPO SOB UMA PERSPECTIVA DIACRÔNICA Maria Luiza Braga – UFRJ/CAPES/CNPq Maria da Conceição Paiva – UFRJ/CNPq Neste trabalho, investigamos as orações hipotáticas que sinalizam a relação semântica de tempo e que são introduzidas por um conector. As orações em pauta são examinadas sincrônica e diacronicamente com vistas a verificar sua estabilidade/instabilidade sistêmica no PB, ao longo dos quatro últimos séculos, salientando a forma como uma análise diacrônica pode contribuir para esclarecer as convergências entre diferentes tipos de oração temporal. O trabalho compreende quatro partes: na primeira, retomamos criticamente as abordagens funcionalistas para o tratamento das orações complexas. A seguir, consideramos as subespecificações do espaço semântico recortado pelas orações de tempo que podem ser, assim, denominadas: superposição, simultaneidade coextensiva entre os estados-de-coisas expressos pelas orações hipotática e nuclear, anterioridade do estado-de-coisas expresso pela oração hipotática, posterioridade do estado-de-coisas expresso pela oração hipotática, anterioridade imediata do estado-de-coisas expresso pela oração hipotática, contingência e limite temporal. Consideramos, então, sob uma perspectiva diacrônica, os conectores que se prestam à sinalização destas subespecificações, ressaltando a estabilidade de alguns deles. Na terceira parte, examinamos, também sob um viés diacrônico, a correferencialidade entre os sujeitos das orações hipotática e nuclear. Nas conclusões, mostramos que a forma diferenciada como cada conector subespecifica o continuum temporal culmina numa certa associação com a propriedade morfossintática correferencialidade entre os sujeitos. Salientamos as particularidades, no percurso histórico, dos conectores que instanciam simultaneidade/superposição entre dois estados de coisas e as dos que expressam sequencialidade. As primeiras se caracterizam por maior regularidade quanto a não-correferencialidade entre sujeitos das orações hipotática e nuclear; as segundas, por sua vez, oscilam de forma mais evidente entre sujeitos [+ correferencial] e [correferencial] e mantêm esta espepcificcidade no estágio atual do português. 538 539 ORAÇÕES SUBJETIVAS E ALÇAMENTO DE CONSTITUINTES SOB PERSPECTIVA FUNCIONALISTA Sebastião Carlos Leite Gonçalves – UNESP/CNPq A ocorrência, nos limites de uma oração matriz, de constituinte que, semanticamente, pertence à oração encaixada, mais precisamente de constituinte que é termo argumental do predicado encaixado, geralmente na forma de infinitivo, identifica fenômeno referido como alçamento (ou elevação) na literatura linguística tanto de orientação gerativista (RAPOSO, 1992; PERES; MOIA, 1995) quanto de orientação funcionalista (NOONAN, 1985; GIVON, 2001a, b). A diferença entre essas duas abordagens diz respeito ao modo como cada uma concebe a origem do constituinte alçado: como resultante de movimentos do constituinte de uma posição hierarquicamente mais baixa para uma mais alta na sentença, como postulam os gerativistas, ou como resultado de motivações pragmáticas, semânticas e/ou morfossintáticas que levam os constituintes a assumirem a posição que ocupam na estrutura da frase, como postulam os funcionalistas, que, apesar de preservarem o termo que identifica o fenômeno, não concebem o envolvimento de transformação de uma configuração básica em outra derivada (HENGEVELD; MACKENZIE, 2008). No âmbito da linguística brasileira, construções de alçamento sempre constituíram tema de investigação privilegiado mais de formalistas (KATO; MIOTO, 2000; FERREIRA, 2001; MIOTO; KATO, 2002; MARTINS; NUNES, 2005; HENRIQUES, 2008; dentre outros) do que de funcionalistas (GORSKI, 2008; MITTMANN, 2006). Diante disso, o presente trabalho, parte de um projeto maior que investiga orações subjetivas na história do português, tem por objetivo oferecer, sob perspectiva funcionalista, um quadro tipológico de construções de alçamento presentes no português brasileiro. A partir de um conjunto de parâmetros morfossintático, semânticos e pragmáticos, e com base em pesquisa em corpus de língua falada, apresentam-se os dois tipos de alçamentos mais produtivos, de sujeito a sujeito (ASS) e de objeto a sujeito (AOS), diferenciando-os de simples casos de topicalização e de deslocamento à esquerda. Os resultados, ainda preliminares, mostram que, na maioria dos casos, o tipo de alçamento está fortemente correlacionado com fatores semânticos e pragmáticos, sendo o tipo semântico de predicado matriz (epistêmicos e avaliativos) o fator mais determinante do tipo de alçamento (ASS e AOS, respectivamente). (Proc.CNPq 305264/2011-7). SENTENÇAS COMPLETIVAS DO VERBO ACHAR: GRAUS DE VINCULAÇÃO SINTÁTICA, CONTEXTO MORFOSSINTÁTICO E GRAMATICALIZAÇÃO Cristina dos Santos Carvalho – UNEB Para a tradição gramatical, os dois principais processos de combinação de orações são a coordenação e a subordinação, cuja distinção é estabelecida a partir da noção de (in)dependência sintática e/ou semântica. Como a dicotomia coordenação/subordinação tem se mostrado insuficiente para dar conta das sentenças complexas possíveis nas línguas humanas, ela tem sido questionada por estudos linguísticos de diferentes orientações teóricas. Entre esses, destacam-se os estudos funcionalistas (de diversas vertentes), que têm proposto a revisitação e, por conseguinte, novas classificações para orações complexas (HALLIDAY, 1985; MATTHIESSEN e THOMPSON, 1988; LEHMANN, 1988; HOPPER e TRAUGOTT, 1993, dentre outros). Algumas dessas propostas, como as de Lehmann (1988) e Hopper e Traugott (1993), apresentam uma tipologização dessas orações a partir de continua que levam em conta níveis de maior ou menor vinculação sintática entre cláusulas (CARVALHO, 2004b). A título de ilustração, Hopper e Traugott (1993) consideram os seguintes tipos de sentenças complexas, que podem ser dispostos em um continuum de gramaticalização: parataxe > hipotaxe > subordinação. Tradicionalmente, o termo subordinação abarca sentenças complexas com diferentes estatutos semântico-sintáticos, mais especificamente, as orações substantivas, adjetivas e adverbiais. Na proposta de Hopper e Traugott (1993), as 539 540 construções subordinadas abrangem somente as cláusulas relativas restritivas e as completivas: as primeiras funcionam como modificadores de um nome da oração matriz; as últimas, como argumentos externos ou internos da matriz. Independente do tipo de argumento, as completivas têm se atualizado em padrões configuracionais diversos. Por exemplo, Gonçalves (2001, 2011) identifica, com base em critérios como grau de finitude da encaixada, correlação modo-temporal, tipo de modalidade e classe semântica do predicado matriz, padrões de orações subjetivas exclusivos da fala e da escrita do português brasileiro e comuns a essas duas modalidades. Em Carvalho (2004a), ao examinar sentenças que constituem argumentos internos de verbos causativos e perceptivos, demonstrei que essas sentenças se distinguem, representando diferentes níveis de integração sintática: embora elas estejam alocadas em pontos à direita dos continua de articulação de orações de Lehmann (1988) e Hopper e Traugott (1993), não se situam exatamente no mesmo ponto devido à atuação de parâmetros semântico-pragmáticos e formais que não partilham. Resultados como os supracitados servem como evidências empíricas da afirmação de Givón (1990) sobre a imbricação entre propriedades sintáticas das completivas e propriedades semânticas do verbo da matriz no domínio da complementação verbal. Ademais, um mesmo item verbal, enquanto predicado matriz, pode apresentar distintos usos em construções complexas e tais usos podem se refletir na codificação estrutural das suas cláusulas encaixadas. Na contramão, aspectos semânticofuncionais da completiva também podem concorrer para a realização de formas distintas de complementação ou até mesmo para a determinação de valores do predicado matriz (SOUSA, 2011). Neste trabalho, fundamentando-me em postulados funcionalistas, analiso os usos do verbo achar e de suas completivas instanciados sobretudo no contexto morfossintático de primeira pessoa do singular. A ênfase a esse contexto se justifica pelo fato de ele ter se mostrado produtivo para a gramaticalização de achar em sentenças complexas como modalizador de opinião e advérbio de dúvida (GALVÃO, 1999; FREITAG, 2003); nesse último uso, ocorre uma dessentencialização de achar (LEHMANN, 1988) e, consequentemente, uma reanálise da construção complexa em simples. Assim, baseando-me em algumas propriedades linguísticas (presença e tipo de argumento interno, posição de achar na sentença, ausência/presença de material interveniente, presença/ausência da conjunção integrante que), verifico os graus de vinculação sintática entre achar e as suas completivas, relacionando-os aos usos gramaticalizados ou não desse verbo. Para tanto, utilizo-me de dados da modalidade falada do português brasileiro extraídos do Programa de Estudos sobre o Português Popular Falado em Salvador (PEPP). GRAMATICALIZAÇÃO DE PREDICAÇÕES AVALIATIVAS REDUZIDAS ENCAIXADAS NO VERBO ACHAR Ana Caroline de Lima Parreira – UNESP/IBILCE O presente trabalho aborda as predicações reduzidas avaliativas encaixadas no verbo achar, com o objetivo de discutir o estatuto da predicação encaixada, do ponto de vista da gramaticalização (HOPPER; TRAUGOTT, 1993; LEHMANN, 1998). São conhecidas e bastante investigadas na língua portuguesa orações complexas compostas de predicado matriz avaliativo ou modalizador no qual se encaixam uma oração na forma finita, como em “Acho [que é muito importante você ter o controle sobre você]”. Interessa-nos, no entanto, a investigação do complexo oracional em que, em uma predicação avaliativa estruturada pelo verbo achar, encaixa-se uma predicação não verbal reduzida, estruturada por um predicador adjetival avaliativo sem recurso à cópula, como em “Acho [essa cadeira confortável / confortável essa cadeira]”, um complexo oracional fortemente integrado do ponto de vista sintático, semântico e pragmático, quando se contrasta esse tipo de predicação reduzida a sua contraparte desenvolvida “Acho que [essa cadeira é confortável / é confortável essa cadeira]. Por meio da presente pesquisa, pretende-se ampliar as descrições disponíveis acerca do estatuto de orações encaixadas reduzidas, considerando a existência de orações reduzidas sem cópula um tipo mais dessentencializado do que aqueles tradicionalmente reconhecidos como 540 541 orações infinitivas, hipótese a ser investigada que toma por base a proposta de gramaticalização de orações, tal como postulada por Lehmann (1988). Os resultados preliminares revelam que esse tipo de predicação pode apresentar-se sob dois tipos no que respeita a ordem da entidade avaliada em relação ao predicador avaliativo. No primeiro tipo, considerado o mais frequente em nosso córpus, a entidade avaliada aparece anteposta ao predicador avaliativo, como se observa na seguinte ocorrência extraída do Banco de dados Iboruna: “eu acho [um lugar [muito bonito]]” (AC- 035). Já no segundo tipo, menos frequente, a entidade avaliada está posposta ao predicador avaliativo, como ocorre em “eu acho [interessante [assim:: a a pesquisa né]” (AC - 044), ocorrência extraída do banco de dados já mencionado. Outro resultado obtido aponta que em mais de 85% das ocorrências há o predomínio da primeira pessoa do discurso, o que permite afirmar que esse tipo de construção é especializado na expressão da avaliação subjetiva do falante (muito bonito, interessante) acerca de um referente (um lugar, a pesquisa). A ocorrência desse tipo de predicação com outras pessoas do discurso também se dá, mas sempre da perspectiva do enunciador discursivo, conforme se verifica em “ele achô(u) [ela [boni::ta]]” (AC - 016), ocorrência na qual o falante relata a avaliação de um pretendente de sua irmã sobre a aparência física dela. Aspecto importante ainda a ser averiguado diz respeito ao estatuto sintático da entidade alvo da avaliação, que se encontra nos limites da predicação reduzida, a qual pode ser interpretada como sujeito do predicado (muito bonito/interessante) quanto objeto da oração matriz de nível mais alto (acho), dada a possibilidade de sua pronominalização por meio de forma de acusativo (acho-o muito bonito/acho-a muito interessante). Esse fato sugere que, na construção considerada nesse estudo, não estão envolvidos apenas fatores de gramaticalização de orações, mas também fatores desencadeadores do fenômeno de alçamento de sujeito do predicado encaixado a objeto do predicado matriz (NOONAN, 1985). A CORRELAÇÃO ENTRE MODO E TEMPO DA ORAÇÃO MATRIZ E DA ORAÇÃO ENCAIXADA EM PREDICADORES VERBAIS EVIDENCIAIS, EPISTÊMICOS E DEÔNTICOS Marize Mattos Dall’Aglio Hattnher – UNESP/CNPq Segundo Gonçalves (2001), predicadores verbais expressam uma avaliação do falante sobre o conteúdo da proposição encaixada, ocorrem categoricamente na 3ª. pessoa do singular e geralmente no presente do indicativo. Por seu turno, as orações subjetivas podem ser finitas ou não-finitas. É exatamente essa possibilidade de variação que será aqui investigada. Considerando os diferentes campos semânticos da avaliação expressa pelo predicador, este trabalho investiga: i) a associação entre o domínio da avaliação (deôntica, epistêmica ou evidencial) e as variações de forma da oração encaixada; ii) a correlação entre o modo e tempo da oração matriz e da oração encaixada. A hipótese aqui defendida é a de que quanto mais alto o nível na escala hierárquica das qualificações, menor será o grau de entrelaçamento entre as orações matriz e encaixada, fato esse expresso pela correlação não obrigatória de tempo e modo nas construções subordinadas com predicador verbal epistêmico e pela correlação obrigatória no caso dos predicadores verbais deônticos. Da mesma forma, a correlação temporal também é afetada pelo tipo de evidencialidade expressa pelo predicador variando conforme a camada em que se insere o evidencial. Para a análise dos predicadores verbais evidenciais será considerada a classificação proposta por Hengeveld e Dall’Aglio-Hattnher (2012), que identificam quatro tipos de evidencialidade alojados em diferentes camadas: evidencial reportativo, inferencial, dedutivo e de percepção de evento. Para a análise dos predicadores verbais, será considerada a tipologia das modalidades proposta por Hengeveld (2004), que identifica as modalidades nas camadas do evento, do episódio e da proposição. Este estudo faz parte de um projeto de pesquisa mais abrangente, denominado “Construções subordinadas nas variedades lusófonas: uma abordagem discursivo-funcional”, desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa em Gramática Funcional (GPGF – UNESP/CNPq), que tem por objetivo estudar os três tipos de subordinação (completivas, adjetivas e adverbiais) nas variedades do português. No âmbito deste 541 542 trabalho, interessam-nos, especialmente, as orações subordinadas encaixadas em predicadores verbais. AS CONSTRUÇÕES COMPLETIVAS PREDICATIVAS NAS VARIEDADES LUSÓFONAS Cibele Naidhig de Souza Carrascossi – UNESP Lisângela Aparecida Guiraldelli – UNESP Examinam-se as construções completivas predicativas, com o objetivo de traçar um perfil do seu comportamento. O trabalho faz parte de um projeto maior, “Construções subordinadas nas variedades lusófonas: uma abordagem discursivo-funcional”, desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa em Gramática Funcional da UNESP de São José do Rio Preto. A proposta do projeto é estudar, com base no modelo teórico da Gramática Discursivo-Funcional (HENGEVELD e MACKENZIE, 2008), as construções subordinadas substantivas (completivas), adjetivas e adverbiais, nas variedades lusófonas. O corpus utilizado pelo projeto, denominado Português Oral, contempla variedades do português europeu, africano e brasileiro. Nesta comunicação, investigam-se propriedades semânticas, discursivas e formais das completivas predicativas. O que se ressalta ao exame das ocorrências é a função predominantemente atitudinal dessas estruturas, em que o conteúdo encaixado, a oração predicativa, é qualificado pelo enunciador, sendo tal avaliação marcada por um nome (tal como, problema, interessante, verdade, duro, foda, etc), sujeito da oração principal. CONSTRUÇÕES RELATIVAS E PROCESSAMENTO COGNITIVO Roberto Gomes Camacho – UNESP-São José do Rio Preto Das quatro estratégias reconhecidas por Keenan (1985) e Comrie (1989), o português dispõe da construção de pronome relativo ou pied-piping, entendida como a variante-padrão, que, nas posições preposicionadas, alterna com estratégia de retenção pronominal ou variante cortadora e com a construção de lacuna ou variante cortadora. Em situações mais restritas, em que a posição relativizada é regida por preposições lexicais simples e complexas, é possível ainda contar com uma variante de encalhamento de preposição (prepsition stranding). Há, por outro lado, uma relação dialética entre transparência e opacidade, que se acha ligada, ao Princípio de Economia, em contraposição ao de Iconicidade (GIVÓN 1980, 1990; HAIMAN 1985), que constituem duas motivações funcionais em competição (DU BOIS 1985), especialmente reconhecidas pela pesquisa tipológica (HENGEVELD, 2011). A iconicidade é a tendência para o máximo grau de transparência entre forma e conteúdo. Tendo o fenômeno da relativização como objeto de estudo e essas premissas como possíveis hipóteses explicativas, este trabalho pretende discutir em que medida a seleção entre as diferentes estratégias é motivada por um grau maior ou menor de transparência entre forma e função, em face da correlação grau de transparência e processamento cognitivo. Pretende discutir, além disso, se essa correlação permite, além disso, postular que a ordenação entre as estratégias com base no uso corresponde a uma escala diretamente proporcional de processamento cognitivo 542 543 RELAÇÕES MULTINUCLEARES NA ARTICULAÇÃO DE ORAÇÕES EM PORTUGUÊS. Maria Beatriz Nascimento Decat – UFMG Este estudo é uma análise da articulação de orações que exibem relações multinucleares (de lista, de sequência e de contraste). A análise fundamenta-se nos postulados da Teoria da Estrutura Retórica (Rhetorical Structure Theory - RST), uma teoria funcionalista - desenvolvida por estudiosos da costa oeste norte-americana, tendo como iniciadores Mann e Thompson (1983) - que procura descrever a maneira como as orações e outras porções de texto se articula para formar discurso coerente. Além das relações retóricas de núcleo-satélite, em que uma oração (o satélite) é subsidiária de outra (o núcleo), essa teoria propõe outro tipo de combinação de orações, combinação essa que se dá através das relações multinucleares, em que nenhuma oração é subsidiária de outra, mas todas se articulam num mesmo nível hierárquico, com um mesmo estatuto e com núcleos distintos. Analisam-se, neste trabalho, os tipos de “proposições relacionais” (proposições implícitas que surgem das relações entre as porções de texto) que emergem dessas relações multinucleares, a partir das ocorrências dessas estruturas em um corpus oral lusófono, constituído de entrevistas, e em um corpus escrito, constituído de ocorrências extraídas de textos de gêneros textuais diversos do português brasileiro em uso. Os dados do corpus lusófono têm origem em entrevistas coletadas em diversas comunidades de fala portuguesa, tais como Brasil, Portugal, Angola, Cabo Verde, GuinéBissau, Moçambique, São Tomé e Príncipe, Timor-Leste. Esse corpus oral foi organizado pelo Centro de Linguística da Universidade de Lisboa, em parceria com a Universidade de Toulouse-leMirail e a Universidade de Provença-Aix-Marselha. Objetiva-se, também, neste estudo, verificar como as relações retóricas/proposições relacionais são assinaladas em português, ou seja, com ou sem a presença de conectivos, e que processos, dentre os do sistema tático (parataxe e hipotaxe) e o de encaixamento (ou integração, caracterizando a subordinação), mais se assemelham à articulação multinuclear e a propiciam ou coocorrem com essa articulação. O estudo procura apontar, portanto, para a relação existente entre a estrutura retórica e a articulação de orações, articulação essa que, segundo Matthiessen e Thompson (1988), reflete a organização do discurso; e, ainda, apontar as semelhanças e diferenças, nos dados orais e nos escritos, quanto à materialização das relações retóricas através da articulação de orações, levando-se em conta o contexto do discurso em que as orações se realizam. 543 544 SIMPÓSIO 51 GÊNEROS E MÍDIAS NA ESCOLA, E O PLANEJAMENTO DAS PRÁTICAS DE ENSINO E APRENDIZAGEM DE PORTUGUÊS LM Desde a publicação dos PCNs (BRASIL, 1998) tem havido um esforço da educação básica em efetivar um ensino e aprendizagem de linguagem de forma contextualizada a partir do conceito de gênero discursivo. A abordagem da linguagem como um fenômeno sócio-histórico resultante da articulação de aspectos de natureza extralinguística impõe aos professores em formação inicial/ continuada novo foco como ferramenta de ensino: as formas de enunciação produzidas em uma sociedade. Os documentos oficiais determinam que os estudantes devem, em situações de aprendizagem, participar de atividades em que as práticas de linguagem sejam mais próximas possíveis das situações naturais de uso da língua, em diferentes modalidades e suportes. Desse modo, outras possibilidades didáticas são demandadas dos professores em formação inicial/continuada, de maneira que os alunos da educação básica possam ser inseridos em práticas mais significativas de letramento, envolvendo as capacidades de linguagem ao ler/ouvir e escrever/falar. Entretanto, ainda há dúvidas por parte de professores e demais envolvidos na educação de como implementar essas práticas, de modo que o “planejamento” (visto como um conjunto de práticas do trabalho do professor) é um importante objeto de debates dentro dessa configuração, refletindo-se em questões como: Qual gênero ensinar? Qual conteúdo de linguagem trabalhar? Como dar conta das necessidades de aprendizagem dos alunos? Interessa a esse simpósio agrupar trabalhos de pesquisa que focalizem planejamentos realizados pelos professores ou propostas de planejamento de práticas de ensino de leitura, produção textual e análise linguística, tendo em conta os conceitos de gênero discursivo e mídia. Serão aceitos relatos informado por diversas perspectivas teóricas atinentes ao debate sobre ensino e aprendizagem de português LM (análise crítica de gêneros, dialogismo, interacionismo sociodiscursivo, letramento, práticas de escrita via web a partir de ferramentas digitais diversas, tais como fórum, MSN, e-mail, wiki, etc.). COODENAÇÃO Adair Bonini Universidade Federal de Santa Catarina [email protected] Adair Vieira Gonçalves Universidade Federal da Grande Dourados [email protected] 544 545 A CONSTRUÇÃO DO JORNAL COMO MÍDIA ESCOLAR E O PLANEJAMENTO DAS ATIVIDADES DE ENSINO E APRENDIZAGEM DE LÍNGUA PORTUGUESA Adair Bonini – UFSC O planejamento das atividades de ensino e aprendizagem de linguagem está intimamente relacionado à orientação teórica adotada pelo/a professor/a. A perspectiva sócio-histórica encampada pelos Parâmetros Curriculares Nacionais e amplamente presente nas propostas curriculares estaduais e municipais pressupõe a existência de um aluno que exerce sua prerrogativa de sujeito histórico e autor e, como tal, que seja participante ativo nas práticas de ensino e aprendizagem desencadeadas na escola. Em contraposição com o ensino tradicional, nesse caso, o ensino deixar de ter um conteúdo fixo (programático) para considerar a imersão dos alunos nas práticas que possibilitarão o desenvolvimento do conhecimento. Nesse cenário, o planejamento das atividades em classe envolvem inúmeras decisões do/a professor/a no sentido de evitar dois extremos: o engessamento das práticas dos alunos em atividades que não lhes permitirão exercer o ato criativo ou o espontaneísmo que não lhes possibilitará ir além da esfera imediata, não ampliando o conjunto de práticas e saberes. Nas escolas que se orientam pela perspectiva sócio-histórica, o jornal escolar tem se mostrado uma ferramenta de ensino e aprendizagem essencial não só por permitir que os alunos realizem práticas efetivas de linguagem, mas também por favorecer a construção de saberes sobre a presença das mídias em uma sociedade essencialmente semiotizada. É importante, portanto, que sejam produzidas reflexões acadêmicas sobre o modo como essas experiências tem ocorrido, em especial sobre o papel que o/a professor/a ocupa em seu planejamento. Nesta apresentação são analisados dados referentes à implantação de jornais escolares nas escolas da rede pública municipal da cidade de Florianópolis. Na pesquisa realizada, precedeu-se a um levantamento das experiências desenvolvidas nessa rede de ensino, coletando-se jornais e entrevistando-se os/as professores/as que as coordenavam. Das 26 escolas que compõem a rede, 14 têm ou tiveram projetos de jornais escolares. Desse montante, foram entrevistados apenas os/as professores/as dos 5 projetos em execução. A análise aqui apresentada focaliza especificamente os relatos atinentes ao planejamento das atividades de ensino e aprendizagem no interior de cada projeto, tendo como contraponto os jornais produzidos. O ENSINO DE LINGUAGEM NA PRÁTICA: UMA EXPERIÊNCIA COM O JORNAL ESCOLAR Vanessa Wendhausen Lima – UNISUL Este trabalho surgiu da aplicação de uma pesquisa de doutorado que tem por objeto a produção de jornal escolar com uma turma de correção de fluxo de Ensino Fundamental II, com o intuito de incentivar a utilização das práticas de letramento discentes (BARTON, HAMILTON, 1998), apoiado nas bases freireanas para uma educação crítica e libertadora (FREIRE, 1967). É comum ao trabalho docente o planejamento das aulas, principalmente quando as aulas envolvem a aplicação de um projeto de letramento (KLEIMAN, 2001). Também é comum ao trabalho docente, que o planejamento sofra alterações pragmáticas no decorrer da aula, por se deparar com uma série de acontecimentos (im)prováveis. Porém, em muitas dessas vezes, o professor não está preparado para a prática de sala de aula, mas não por falta de conhecimento teóricotécnico; e sim, por falta de conhecimento de uma realidade que difere da dele em muitos aspectos; por se deparar com situações que fogem totalmente ao seu controle e o impedem de seguir com o planejado. O objetivo deste trabalho é expor uma série de situações reais ocorridas durante a produção desse jornal escolar e que podem impedir ou impulsionar o ensino de linguagem. Além de mostrar que, apesar da realidade escolar, muitas vezes, ser uma completa desconhecida de muitos docentes, ainda assim, é possível re-planejar e seguir adiante tanto no que se refere ao andamento das aulas quanto ao ensino 545 546 de linguagem. Estruturada como pesquisa participante, os resultados mostram que, muitas vezes, o conhecimento teórico pode ser insuficiente para dar conta de uma prática tão alheia aos livros e à academia; mas, ainda assim, é possível trabalhar com a linguagem, incentivando uma prática educativa crítica e libertadora. TRANSPOSIÇÃO DIDÁTICA: LIMITES DE UM CONCEITO E RELAÇÕES MOVENTES Adair Vieira Gonçalves – UFGD Este trabalho será fundamentado nos pressupostos do Interacionismo Sociodiscursivo (ISD), tanto no seu quadro epistemológico de base, no seu modelo teórico-metodológico de análise de textos, na sua vertente didática consolidada em uma engenharia movida por instrumentos didáticos e na concepção de Transposição Didática (TD) de Chevallard (1991). São dois os níveis de TD, segundo Dolz, Gagnon & Canelas-Trevisi (2009): externa e interna. A externa vai dos objetos do saber, chamados de “duros” ou localizados fora da instituição escolar para os saberes a ensinar. A interna diz respeito à passagem dos saberes a ensinar aos objetos ensinados e à criação de dinâmicas para situações efetivas de ensino. A respeito da TD, Corrêa afirma que “...essa noção contradita a pecha de aplicadora que tem sido imposta à LA, já que busca dar contornos teóricos à prática didática. Ora, tal tratamento dos dados linguísticos, baseado na informação que a prática fornece à teoria, já permite pensar que a LA trabalha com um objeto complexo, constituído no diálogo nunca acabado entre seus dois modos de abordar a linguagem: como objeto de estudo/de ensino. Por outro lado, [...] parece manter-se a ideia de separação de dois lugares de reflexão: uma dimensão configurada num espaço-tempo (o da teoria) que, num momento posterior, deverá ser levada (transposta) a uma outra configuração espacio/temporal ( a da prática)” (CORRÊA, 2011, p.246). A partir das considerações anteriores, objetiva-se: a) analisar criticamente o conceito de TD a partir de Chevallard (1991); e b) analisar algumas relações moventes ocorridas após a construção do modelo didático por um pesquisador e sua posterior didatização numa turma de 2ª série do Ensino Médio de uma instituição pública de Dourados/MS. O GARIMPO TEXTUAL E(M) MÚLTIPLOS LETRAMENTOS CRÍTICOS: AS MÍDIAS NO E PARA O GESTO FUNDADOR DO TRABALHO DE SELEÇÃO DE TEXTOS PARA OBJETO DE ENSINO E DE TRABALHO DO PROFESSOR EM SALAS DE AULA DO ENSINO FUNDAMENTAL Fernanda de Castro Batista Coelho – UESB Ester Maria de Figueiredo Souza – UESB Cristina Arcuri Eluf – UESB No esteio de nossas proposições para esta comunicação, está a crença de que a docência seja ressignificada como um exercício dialógico pensado e analisado no interior de uma teia de saberes, práticas, métodos e discursos construídos à luz do que reconhecemos hoje como campo de pesquisa da e para a formação do professor. Um dos modos de se reconceber os saberes e fazeres com a linguagem em espaços sociodiscursivos e interacionais da formação inicial, tendo em vista gestos de transposição didática e trabalho com o texto em salas de aula da educação básica requer considerar e dialogar com outras e diferentes formas de enunciação produzidas em sociedade e(m) mídias. Daí pensarmos nas escolhas e nas crenças que parametrizam a escolha dos gêneros a serem objeto de trabalho na escola como uma releitura de gestos profissionais fundadores do trabalho educacional. Os dados que trazemos configuram investidas metodológicas de trabalho com a categoria gênero como mediação formativa, daí a proposta do Garimpo textual (COELHO; SOUZA, 2012) à luz da ótica teórico-conceitual dos multiletramentos críticos (ELUF, 2010) e da 546 547 docência como um exercício de dialogia (COELHO; SOUZA, 2012). O Garimpo textual – atividade que integra a agenda de trabalho semanal de licenciandos em Letras (bolsistas PIBID, FAPESB, CNPQ e UESB) e professores em exercício (bolsistas PIBID) da educação básica – consiste na escolha processual, semanal e individual de textos (vinculados a diferentes semioses e socialmente reconhecidos como diferentes gêneros discursivos) que se julga adequados e interessantes para o trabalho em aulas de português e inglês da educação básica. Escolhidos os textos, que passam a integrar um banco de dados coletivo, eles são catalogados à luz das noções de intercalação de gêneros tendo em vista a proposição de sequências didáticas para sua exploração como enunciado em sala de aula. A tematização e sistematização dessas escolhas pelos professores formadores impactam em gestos de transposição didática, reelaborações no modo como se percebe o ensino de língua(s) e a noção de texto e, consequentemente, como os sujeitos representam a si mesmos e(m) seus processos formativos e campos de atuação profissional. GÊNEROS TEXTUAIS: UMA PRÁTICA PEDAGÓGICA INTERDISCIPLINAR NO ENSINO MÉDIO Maria do Rosário do Nascimento Ribeiro Alves – UnB Esta comunicação expõe os resultados parciais de uma pesquisa desenvolvida em duas turmas da 3ª série do Ensino Médio, em uma escola pública do Distrito Federal, durante o ano letivo de 2012, cujo tema foi “Gêneros textuais: uma prática pedagógica interdisciplinar no Ensino Médio”. Como se sabe, os Parâmetros Curriculares Nacionais consideram que o ensino da Língua Portuguesa deve voltar-se para a função social da língua como requisito básico para que o indivíduo ingresse no mundo letrado e possa construir seu processo de cidadania. E, para isso, é imprescindível aprender textos de vários gêneros, sobretudo os voltados para o uso público da linguagem. Por outro lado, a Educação Ambiental objetiva estimular e fortalecer uma consciência crítica sobre a problemática ambiental e social, desenvolvendo-se de forma interdisciplinar, nos diferentes níveis e modalidades de ensino. Para tanto, deve-se buscar alternativas curriculares e metodológicas de capacitação dos professores. Nesse sentido, o objetivo geral da pesquisa foi analisar o ensino de gêneros textuais integrando Língua Portuguesa e Educação Ambiental no Ensino Médio, partindo-se da postulação de que o ensino de gêneros possibilita a integração dessas duas áreas. Como o conceito de gênero textual pressupõe metodologias mais adequadas ao ensino da escrita, dois dos objetivos específicos da pesquisa foram identificar e caracterizar os gêneros textuais mais frequentes na Educação Ambiental que podem ser objetos de ensino nas aulas de Língua Portuguesa no Ensino Médio; e aplicar uma metodologia que contemple as duas disciplinas. Para alcançar esses objetivos, o referencial teórico sobre gêneros textuais e ensino partiu de Bakhtin, passando por Dolz, Noverraz, Schneuwly e Bazerman, com a mediação de Marcuschi, entre outros, considerando-se que o trabalho com gêneros engloba uma análise do texto e uma descrição da língua e visão da sociedade, que tenta responder a questões de natureza sociocultural no uso da língua de maneira geral. O planejamento das ações pedagógicas partiu das noções de que o trabalho com gêneros pressupõe uma situação de produção, uma circulação efetiva e a possibilidade de trabalharmos com práticas sociais. Para atender a esses requisitos, buscamos situações de produção reais, quando possível, com a temática ambiental atual, haja vista a realização da Conferência Rio+20, em 2012, e a publicação das atividades e produções escritas dos alunos em um blog. 547 548 OS DISCURSOS SOBRE A EDUCAÇÃO NOS QUADRINHOS DE CALVIN E HOBBES, MAFALDA E CHICO BENTO Mayara Barbosa Tavares – UFG Nesta pesquisa, busca-se analisar os discursos sobre a educação nos quadrinhos de Calvin e Hobbes, do quadrinista norte-americano Bill Watterson, de Mafalda, do argentino Quino e de Chico Bento, do quadrinista brasileiro Maurício de Sousa. São analisadas vinte e oito histórias em quadrinhos e tem-se como fundamentação teórica a Análise do Discurso de orientação francesa, com foco nas obras de Michel Pêcheux (1990a; 1990b; 1999; 2006; 2009) e as noções de efeito de sentidos e condições de produção; de Denise Maldidier (2003) e a historização da Análise do Discurso, com ênfase nas obras de Pêcheux; Eni Orlandi (2003) e as noções de dispositivo teórico e analítico; Michel Foucault (2004) e as contribuições para o conceito de formação discursiva; Authier-Revuz (2004), com as conceitualizações para a teoria da AD, com base nas obras de Bakhtin (1997; 2003), no que se refere à heterogeneidade, à ideologia; dentre outros. Por conseguinte, utilizamos a teoria das histórias em quadrinhos, com base em Eisner (2001; 2005) e as noções de arte sequencial e narrativa gráfica; em Ramos (2009a; 2009b); 2010) e as contribuições acerca formato e a linguagem dos quadrinhos; em Bakhtin (2003) e Maingueneau (2010) com as noções, respectivamente de gênero e hipergênero; e outros autores. É utilizada, também, como fundamentação teórica, a teoria acerca da educação, embasada na obra-síntese de Mizukami (1986) e as delimitações das abordagens de ensino/aprendizado em tradicional, comportamentalista, humanista, cognitivista e sócio-cultural; e para problematizar os discursos e as formações discursivas materializadas nas histórias em quadrinhos acerca da educação escolar, tem-se como foco as obras de Paulo Freire (1987; 1991; 1996; 1997), dentre outros. A pesquisa realizada é qualitativa, com método interpretativista. É utilizada exclusivamente a metodologia de análise de documentos – histórias em quadrinhos. A partir das análises dos discursos e, em especial, das formações discursivas, nos quadrinhos de Calvin e Hobbes, Mafalda e Chico Bento, é perceptível a predominância da abordagem tradicional de ensino e aprendizado. Há a crítica à educação repressora, embasada na repetição e na autoridade docente, à educação meramente utilitarista e capitalista, ao planejamento rígido das aulas que não possibilita a interdisciplinaridade, à metodologia de avaliação, ao ensino/aprendizado distanciado da realidade dos discentes, ao preconceito linguístico, dentre outros. Por conseguinte, com base nos discursos e nas formações discursivas materializadas nas histórias em quadrinhos analisadas, verifica-se a ironização e o questionamento da abordagem tradicional de ensino, o que ocasiona na aproximação com a acepção sócio-cultural, preconizada por Paulo Freire, que objetiva auxiliar na formação de sujeitos autônomos, críticos e reflexivos, que interajam e ajam em benefício do bem estar social, do contexto de inserção. Por isso, frisa a importância da interação entre professor e aluno, pois a educação escolar necessita das contribuições e interações entre os docentes, os alunos e a sociedade, para a construção contínua do conhecimento, o que caracteriza a relação professor-aluno como horizontal e não imposta. A ARGUMENTAÇÃO NO GÊNERO DEBATE REGRADO: OPINIÕES DE UM SUPOSTO RACISMO EM CONFRONTO José Anchieta de Oliveira Bentes – PGGED/UEPA Alessandro Barbosa Fernandes – UEPA Tiago Sousa Santos – UEPA O interesse primário desta comunicação é a identificação dos tipos de argumentos utilizados em uma simulação de debate regrado de opinião, por parte de alunos do ensino médio de uma escola pública de ensino médio tecnológico de Belém (PA). O objetivo principal é descrever e analisar os argumentos que ocorreram, tendo como motivação o episódio de suposto racismo impetrado por 548 549 uma professora universitária para com um vigilante de pele negra. A pesquisa realizada foi construída utilizando-se de uma metodologia que se aproximou do tipo etnográfico-descritivo da prática docente, com os seguintes procedimentos: observação participante na escola, construção de diários de pesquisa; elaboração de uma proposta de sequência didática com o gênero debate regrado realizado pela professora da turma; gravação do evento e análise dos argumentos, no sentido de defender a professora ou condenar a sua atitude como racista. Tal análise possui ancoragem nas concepções que estudam linguagem como objeto de interação e dialogismo. As categorias de análise foram construídas a partir de argumentos favoráveis e desfavoráveis, utilizando-se do dialogismo com outros discursos, para aderir ou discordar, com uso de argumentos de autoridade, de consenso, de provas concretas, de contraposição ou de sustentação de um argumento anteriormente proferido, com a possibilidade de descaracterização da figura do interlocutor. Os resultados indicam que ocorreram poucos argumentos de autoridade. Em todo caso, a efetivação do evento simulado de debate municiou os alunos com argumentos para um posicionamento a respeito do racismo. PDG FOTONOVELA DIGITAL - DO PROCESSO DE LEITURA AO TEXTO NA TELA Renata Garcia Marques – UNISINOS O presente trabalho visa relatar e refletir sobre a experiência do desenvolvimento de um PROJETO DIDÁTICO DE GÊNERO (PDG) fotonovela digital, aplicado com alunos do Projeto Seguindo em Frente. O Seguindo em Frente é composto por alunos em distorção de série e idade (15 a 17 anos, estudantes de 5ª a 8ª série, da rede municipal de São Leopoldo- RS), alunos multirrepetentes, que apresentam sérios problemas de escrita. O objetivo do projeto foi desafiá-los, em um projeto que envolveu a leitura de um livro, à análise e produção de textos de dois gêneros (roteiro de fotonovela e fotonovela digital). A aplicação desse PDG, com esses alunos, permitiu uma série de análises e reflexões sobre a importância de trabalhar o gênero, explorando sua estrutura, mas principalmente a sua função na sociedade. Foi possível também construir conhecimento sobre o ensino da língua materna e sua vinculação com a prática social, sobre letramento literário e letramento digital para o aprimoramento e qualificação do processo de leitura e, principalmente, do desenvolvimento da escrita. Conforme Kersch e Guimarães (2012), o PDG representa uma co-construção de conhecimento para uma prática social que possa se inscrever em situações significativas, tanto para o aluno e quanto para o professor. Nesse contexto, a linguagem é vista como forma de interação, trabalho coletivo e social, historicamente situado e, por tal motivo, o(s) gênero(s) produzidos no âmbito do PDG caracteriza(m)-se por ter uma finalidade específica, que se realiza nas práticas sociais existentes de diferentes grupos e comunidades sociais. O trabalho mostrou que é possível apresentar o desafio de ensinar com gêneros a partir do conceito de PDG. A elaboração de um projeto que visava explorar a leitura e a escrita, desenvolvendo o letramento digital de alunos que normalmente são vistos, muitas vezes, como incapazes, mostrou o avanço dos alunos, que se aprimoraram com entusiasmo, aumentando sua autoestima e reconhecendo seu crescimento no processo de escrita em uma atitude responsiva e ativa, como propõem Voloshinov e Bakhtin. 549 550 O GÊNERO CURTA METRAGEM NO ENSINO DE LEITURA E ESCRITA: UMA PROPOSTA DE LETRAMENTO VERBO-ÁUDIO-VISUAL A PARTIR DO CURTA “XADREZ DAS CORES” Jean Carlos Dourado de Alcântara – UFMT Renato Augusto Azevedo – UFMT Há muito, os filmes (curtas, médias, longas, documentários) vêm sendo frequentemente utilizados em Sala de aula como apoio pedagógico no ensino de Língua Portuguesa, como forma de ilustrar conteúdos - estruturas narrativas, tipos de personagens, enredo, etc. E, mais recentemente, seguindo orientações dos PCNs, para abordar temas de urgência social. Contudo, apresentar um filme apenas com tais objetivos, pode ser tão ineficaz quanto o uso de alguns livros didáticos. Com intuito de mudar um pouco esse panorama, a Petrobrás criou, em 2002, o projeto Porta Curta, que, entre outras idéias, havia também a pretensão de incentivar o uso de filmes brasileiros de curta metragem como material de apoio pedagógico em salas de aula. Esse projeto culminou na criação da Coleção Curta na Escola, já são três volumes em DVD, cada um contendo oito curtas-metragens, cuidadosamente selecionados, com pareceres pedagógicos elaborados por educadores especialistas de cada área. Este trabalho pretende desenvolver uma proposta de aplicabilidade da Teoria de Gênero Discursivo na utilização do curta metragem “Xadrez das Cores” como ferramenta no ensino-aprendizagem de leitura e escrita nas aulas de Língua Portuguesa. Para tanto abordaremos aspectos relevantes do letramento áudio-visual, bem como as capacidades leitoras exigidas por esse gênero. Nesta empreita, percorreremos os caminhos dos pressupostos enunciativo-discursivos de abordagem sócio-histórica do Círculo de Bakhtin, aliados aos fundamentos da Semiótica Social com fins de compreender a dinâmica da linguagem multissemiótica presente no gênero curta metragem. Utilizaremos como ponto de partida alguns pareceres pedagógicos fornecidos pelo projeto da Petrobrás Curta na Escola, os quais propõem sequências didáticas para trabalhar com o referido Curta em atividades de leitura e escrita, bem como relatos de professores que fizeram uso desse filme, baseados nesses pareceres. Esta proposição é fruto de uma constatação em nossa pesquisa de mestrado de que a incidência dos gêneros midiáticos nas propostas de atividades de ensino de leitura e escrita é pouco representativa. O tratamento didático nas atividades que envolvem essa dimensão do ensino de Língua não favorece a mobilização de capacidades leitoras específicas para esses gêneros e pouco contribui para a formação do letramento aúdio-visual dos alunos. Daí a nossa preocupação em contribuir com o crescimento do uso de gêneros midiáticos em propostas de atividades envolvendo a leitura e a escrita. POR UMA FORMAÇÃO CONTINUADA COOPERATIVA EM UM AMBIENTE VIRTUAL Vanessa de Oliveira Dagostim Pires – UNISINOS Pretendo analisar neste trabalho o desenvolvimento dos ambientes virtuais das edições dos cursos do projeto “Por uma formação continuada cooperativa para o desenvolvimento do processo educativo de leitura e produção textual escrita no Ensino Fundamental” desenvolvido junto ao PPG em Linguística Aplicada da Unisinos, com apoio do Programa Observatório da Educação da CAPES. Ao longo dos três anos do projeto, vários cursos já foram desenvolvidos, sempre contando com o apoio dos ambientes virtuais de aprendizagem, e promovendo reflexão e construção de projetos didáticos de gêneros de diversos domínios pelos cursitas (professores de Língua Portuguesa de uma rede pública de ensino). Os cursos são realizados em parceria com a UNISINOS Virtual, setor de educação a distância da Universidade do Vale do Rio dos Sinos, e contam com os recursos disponíveis na Plataforma Moodle, disponibilizado pela universidade, como utilização de imagens, vídeos, chats, fóruns de opinião, ferramentas de escrita coletiva, pesquisa na internet, criação de 550 551 textos, materiais para leitura, entre outros que foram considerados convenientes para este projeto. Todas as edições dos cursos são desenvolvidas em conjunto pela equipe que denominamos “comunidade de indagação”, formada por professoras do curso de pós-graduação, doutorandos, mestrandos, graduandos e professores de Língua Portuguesa da rede pública de ensino, na tentativa de consolidação de uma rede de formação continuada cooperativa. As estruturas dos cursos são construídas com toda a equipe antes do início dos mesmos, e, em reuniões periódicas, discutem-se os ajustes necessários nos conteúdos e materiais a serem utilizados, à medida que recebemos o feedback dos professores cursistas e de todos os integrantes do projeto, que participante conjuntamente do curso. Assim, buscamos perceber as necessidades, progressos e dúvidas dos professores cursitas. Além do conteúdo, há uma preocupação com as ferramentas a serem utilizadas nas atividades, pois é visível a heterogeneidade existente em relação ao nível de letramento digital entre os participantes. Neste trabalho, procuro analisar as provocações em relação ao letramento digital dos professores, nas atividades do ambiente virtual, ao longo do projeto, e se estas, de alguma forma, refletiram nos projetos didáticos de gênero de Língua Portuguesa produzidos pelos cursistas. DIFERENÇAS E SEMELHANÇAS NO MODO COMO ORIENTADORES DE TRABALHOS CIENTÍFICOS CONCEBEM A ORIENTAÇÃO Rute Izabel Simões Conceição – FACALE/UFGD Rafaela Q. M Valente – FACALE/UFGD Vinculado à pesquisa “Ensino-aprendizagem da escrita: estudo da didática da reescrita e de seu impacto na qualidade textual”, em andamento no Curso de LETRAS/FACALE/UFGD, este trabalho tem por objetivo apresentar os resultados de um estudo comparativo entre dois grupos de pesquisadores sendo um da Área de Linguística, Letras e Artes (80000002/CNPq) e outro da Área de Ciências Agrárias (50000004/CNPq). O processo de letramento científico requer grande esforço intelectual dos pesquisadores em formação (os orientandos), e muita dedicação de professores pesquisadores com mais experiência em pesquisa que assumem a tarefa de orientar o processo investigativo e a redação de trabalhos escritos para a divulgação dos resultados, contudo, muito pouco se sabe a respeito da interação e do processo de idas e vindas, de escritas e de reescritas que se desenvolve ao longo do período de orientação. A geração de dados deu-se a partir de um questionário de entrevista com questões estruturadas, utilizado para entrevistar orientadores (de diferentes Áreas do conhecimento) com experiência na orientação de trabalhos de Iniciação Científica, Trabalhos de Conclusão de Curso, Dissertações de Mestrado e Teses de Doutorado. A investigação procurou descobrir em quais aspectos há diferenças ou semelhanças no modo como os orientadores das duas Áreas comparadas concebem a interação orientador x orientando na prática da produção de trabalhos científicos escritos. 551 552 SIMPÓSIO 52 COMO OS TEXTOS ANTIGOS PODEM (OU NÃO) FORNECER SUBSÍDIOS PARA OS ESTUDOS DE POSSÍVEIS MUDANÇAS LINGUÍSTICAS NO PORTUGUÊS A proposta deste simpósio é congregar trabalhos de edição de textos em língua portuguesa escrita no Brasil visando à posterior pesquisa linguística. Com base em edições de textos antigos em língua portuguesa escrita no Brasil (séc. XVI a XIX) concluídas ou em andamento pretende-se discutir como os textos antigos podem (ou não) fornecer subsídios para os estudos de possíveis mudanças linguísticas no português que veio a constituir-se no Brasil. São convidados enfoques que sejam orientados por uma teoria que define de antemão que dados coletar, como aqueles orientados pelos dados. Muitos são os pesquisadores que têm se debruçado sobre a árdua tarefa da edição de textos em língua portuguesa antiga, seja lusitana, seja brasileira, com o intuito de fornecer dados confiáveis para a pesquisa linguística. Tal renovação foi ainda prolongada pelo advento das facilidades da internet. Como se sabe, a partir dos anos 1980 o interesse por estudos históricos e diacrônicos teve novo impulso na linguística brasileira, muito, mas não exclusivamente, como decorrência dos trabalhos de sociolinguística de William Labov, em que os estudos de mudança linguística dos vernáculos atuais conduziram a uma consulta a estados pretéritos dessas línguas. A partir dos meados dos anos 1990, começam a surgir no Brasil softwares, editores de texto, de início mais utilizados por lexicógrafos, que permitem a busca e a quantificação de dados em variadas formas. O progresso tecnológico da área da informação, portanto, muito favoreceu os estudos da linguagem, não só com os processadores de textos, mas também com a Internet, através da possibilidade de disponibilização de dados linguísticos num volume tal e com tal velocidade inconcebíveis há 30 anos atrás. Nesse sentido, deve-se relativizar a famosa citação de Labov de que a linguística histórica é a arte de se fazer o melhor uso de maus dados: os dados pretéritos − e mesmo os contemporâneos − não são mais “maus dados”, dada a facilidade de seu armazenamento, busca e processamento que os novos softwares tornam accessíveis. Dentro desta contextualização geral propõe-se o presente simpósio. COORDENAÇÃO Maria Antonieta Amarante de Mendonça Cohen Universidade Federal de Minas Gerais [email protected] Soélis Teixeira do Prado Mendes Universidade Federal do Pará [email protected]; 552 553 EDIÇÃO E ESTUDO LINGUÍSTICO DE DOCUMENTOS DA BATALHA DE GUAXENDUBA (1614/1615) Eliabe Procópio - UECE/PPGL-UFC Este trabalho é parte do projeto de pesquisa Edição e Estudo Linguístico de Documentos Portugueses no Arquivo Geral de Indias/Espanha (sécs. XV, XVI, XVII, XIX), o qual congrega documentos escritos em Língua Portuguesa em colônias portuguesas na América e na Ásia, tendo com autores lusofalantes ou estrangeiros. Como resultado preliminar, selecionamos a edição e o estudo linguístico dos textos referentes à Batalha de Guaxenduba (1614), confronto militar ocorrrido entre militares portugueses/brasileiros e franceses, os quais haviam ocupado a ilha de São Luis/Maranhão, fundando a França Equinocial. Aqui, analisam-se apenas três textos – um auto de interrogatório, integrado a uma capitulação (D12/1614), e um roteiro (D14/1615) e um relato de viagem (D13/1615) – todos eles escritos por lusofalantes, em território brasileiro. Objetivamos fornecer dados novos e primários para a história da Língua Portuguesa, tornar conhecidos textos escritos em português e arquivados nos arquivos espanhóis, e descrever o Português utilizado no Brasil colonial, a partir dos níveis fonético-gráfico, morfossintático, sintático-semântico e léxico. Na Filologia, executamos os seguintes procedimentos: coleta, seleção e edição paleográfica, crítico-anotada e fac-similar dos textos. Na Linguística, realizamos descrição gráfico-fonética, morfossintática, sintático-semântica e lexical; e consulta a corpora de língua portuguesa. Após análise, verificamos que os três textos estão em escrita humanística e de fácil leitura, exceto o D12, por seu caráter imediatista, apresenta uma leitura mais difícil. Algo interessante sobre estes documentos, é que estão acompanhados de suas respectivas traduções ao espanhol, já que, durante esta época, o Brasil fazia parte da União Peninsular (1580-1640) e havia ordem do rei Felipe III de Espanha para que se traduzissem todos os documentos do Português para o Espanhol. Uma peculiaridade do D12 é que se trata de um interrogatório tomado em Língua Francesa a prisioneiros franceses, transcrito em Português; a escrita denuncia o caráter imediatista da escrita, pois além de registrar a fala do interrogado, havia de fazê-lo fielmente. Este fato ainda exemplifica que, na América, havia um contato linguístico lusófono não apenas com línguas indígenas, mas também europeias. Quantos aos aspectos linguísticos destacamos alguns exemplos, a saber: variações gráficas (Almazonas/ Amazonas; jra/irá); variações vocálicas próprias do século (igoais/iguais); variação consonântica, principalmente com as fricativas alveolares e palatais (registir/resistir; pregidio/presídio); uso do prefixo ‘vizo(rrei)’; utilização da preposição ‘pera’ em lugar de para; emprego da perífrase ir + infinitivo/gerúndio, marcando o domínio funcional Tempo, Aspecto e Modalidade (TAM), como futuro perifrástico (yra tomar, jra surguir; vai corremdo); uso de perífrases modais (hadir recolher; podera ilo comquistando); registro de nomes próprios, possibilitando estudos biográficos; uso de léxico marinhático e bélico, e inúmeros tupismos incorporados à Língua Portuguesa (macoripe, Siara), os quais quase sempre vem acompanhados de explicações etimológicas, já que havia orientação de que sempre quando se grafasse uma palavra estrangeira, ao lado, entre vírgulas se indicasse o significado (Tatajiba, pau amarelo; Jeriquoaquoara, buraco das tartarugas). É satisfatório poder apresentar a edição e o estudo linguístico de textos que retratam um importante momento histórico brasileiro, principalmente por que tais documentos se encontram em outro país. Do ponto de vista histórico, notamos que estes textos mencionam localidades costeiras de Fortaleza, cuja data de fundação, 1729, ainda é polêmica, pois não existem documentos que precisem essa informação. Do ponto de vista linguístico, vemos que são textos uteis, principalmente para o estudo diacrônico do léxico do Português brasileiro, além de possibilitar uma aproximação descritiva do falar nordestino do início do século XVII. 553 554 A ARCAICIDADE DO PORTUGUÊS VERNACULAR FALADO PELOS GURUTUBANOS Maria do Socorro Vieira Coelho – UNIMONTES/UFMG A comunicação que aqui se propõe apresenta resultados da nossa pesquisa do estágio pos-doutoral desenvolvido no Programa de Pós-graduação em Linguística na Universidade Federal de Minas Gerais, sob a orientação da Profª. Dra. Maria Antonieta Amarante de Mendonça Cohen, em cuja pesquisa investiga-se casos de conservadorismos/arcaísmos, ou seja, verifica-se se os traços ‘arcaicos’ encontrados no português brasileiro, registrados no vernáculo falado pelos gurutubanos, apontam para a hipótese da retenção linguística de aspectos do português europeu ou do português resultante do convívio com línguas diversas: africanas ou indígenas, a das transformações linguísticas -variação e mudança- pelas quais a língua passou, em seu processo histórico em nosso país. Esclarece-se que são as formas linguísticas empregadas pelo povo da comunidade em estudo, aliadas às questões sociais, históricas, geográficas bem como culturais que os marcam como um grupo identitário rural e étnico diferente dos demais grupos brasileiros que se encontram em vias de extinção. Trata-se de uma variante/dialeto que se depara com a concorrência das variantes, a culta e a popular; são fenômenos linguísticos não mais usados atualmente que sofrem o descaso dos falantes brasileiros não gurutubanos. Com base no corpus, constituído por dados linguísticos do português falado pelos gurutubanos, que atestam a sobrevivência de fenômenos considerados pela literatura como ‘arcaísmos’, e a partir do arcabouço teórico dos conceitos sobre ‘arcaísmos’, analisa-se junto às fontes escritas a ancianidade de fenômenos linguísticos presentes no português falado pelos gurutubanos. Intenciona-se, então, demonstrar, dentro dos limites possíveis, a arcaicidade de traços que marcam o português falado pelos moradores do Vale do Gurutuba. Por fim, acredita-se que com esta pesquisa forneceremos informações relevantes para o conhecimento das raízes do português no Brasil, via processos de introdução da Língua Portuguesa falada nos primeiros séculos, transplantada pelos primeiros colonizadores, descobridores e povoadores, em substituição as várias línguas nativas, na região norte mineira. DOCUMENTOS ADAMANTINOS SETECENTISTAS COMO FONTE DE DADOS PARA ESTUDO DA CONSOLIDAÇÃO DE UMA GRAMÁTICA NACIONAL? Sueli Maria Coelho – Fale/UFMG/Fapemig É consensual, até então, nos estudos linguísticos a afirmativa de que no século XIX ocorreram profundas mudanças sintáticas no português do Brasil, o que atesta ter se dado nesse período a consolidação de uma gramática nacional. Entretanto, a análise da colocação de clíticos pronominais em textos escritos na região de Ouro Preto no século XVIII (cf. COELHO e PAULA, 2011) acusou que, já nesse período, a sintaxe de colocação mineira exibia traços semelhantes ao da sintaxe atual, tal como a preferência pela próclise e a recusa pela mesóclise. Frente a tal dado, passou-se a cogitar a hipótese de que a constituição de uma gramática nacional pode ter sua gênese em uma sincronia anterior ao propalado século XIX, radicando-se, dessa forma, no período setecentista, conjetura que este trabalho se propôs a investigar. Para tanto, estudou-se o quadro pronominal mineiro, atendo-se para a segunda pessoa, com o objetivo de verificar se, no século XVIII, já havia ocorrido a implementação do pronome você, fato apontado na literatura (cf. DUARTE, 1989) como desestabilizador do sistema de concordância e desencadeador de mudanças sintáticas significativas. O corpus utilizado é constituído de quatro Estatutos de Irmandades e de oitenta termos de devassa, documentos adamantinos até então inéditos, escritos no período setecentista e editados por Coelho e Duchowny (2011). Os dados coletados sinalizam que, nas minas setecentistas, já havia a concorrência entre as formas seu/sua, empregados, respectivamente, como possessivos de segunda e de terceira pessoa, atestando o processo de implementação de você. 554 555 PORTUGAL PARADIGMA DE LÍNGUA, LITERATURA E CULTURA NA IMPRENSA PERIÓDICA LUSO-BRASILEIRA (1900-1920) Fernanda Suely Muller – USP/FAPESP Tendo como premissa a pesquisa que desenvolvemos acerca das relações lusobrasileiras estabelecidas por/através de algumas revistas literárias publicadas tanto no Brasil quanto em Portugal no início de século XX (1900-1922), neste trabalho pretendemos analisar alguns artigos publicados especialmente nas revistas O Ocidente (1878-1915), Serões (1901-1911) e Ilustração Portuguesa (1903-1924). Nesses artigos, pretendemos demonstrar como certa elite intelectual lusitana, responsável pela publicação dos periódicos mencionados, utilizava essas revistas não só como instrumento de propaganda de Portugal no Brasil mas também como um veículo de manutenção de certo “poder simbólico” sobre a intelectualidade brasileira através da “supremacia” linguística do Português de Portugal (PP). Assim, procuraremos identificar alguns elementos que comprovem a utilização dessa imprensa como um arsenal de manutenção de uma “hegemonia imperialista” nas (ex) colônias portuguesas (nomeadamente Brasil, Angola, Moçambique e Macau), tal como conseguimos comprovar através da análise de outras revistas lusitanas publicadas no mesmo período em nossa pesquisa de doutoramento. Malgrado os periódicos mencionados fossem editados em Portugal, seu conteúdo e seu público-alvo eram aqueles direcionados para as “colônias” e para os falantes de língua portuguesa de além-mar. Nesse sentido, analisar mais pormenorizadamente o conteúdo desses artigos pode revelar aspectos interessantes do direcionamento discursivo empregado pela elite cultural lusitana para reforçar e justificar as práticas “imperialistas” não só em suas “colônias” de fato, mas também através da permanência de certa hegemonia cultural e linguística, como no caso do Brasil. A VARIAÇÃO DA CONCORDÂNCIA VERBAL E NOMINAL EM MANUSCRITOS DO SÉCULO XVIII. Soélis Teixeira do Prado Mendes – UFPA Este trabalho pretende apresentar dados coletados de minha pesquisa de doutoramento, realizada na FALE-UFMG, defendida em 2008. A análise de concordância variável não foi o tema central da tese, mas, como foram transcritos 32 processos-crime, esse fenômeno é recorrente em alguns deles. Assim, objetiva-se apresentar e analisar dados extraídos de manuscritos do século XVIII relativos à variação no uso da concordância nominal e verbal; além disso, pretende-se discutir que tal variação não é um "fenômeno" atual e discutir de que forma documentos pretéritos contribuem para entendermos o presente de nossa língua. VARIAÇÃO LINGUÍSTICA NO PORTUGUÊS DO SÉCULO XVIII Maria Antonieta Amarante de Mendonça Cohen – Fale/UFMG/CNPq Dentro do tema deste simpósio que é o de congregar trabalhos de edição de textos em língua portuguesa escrita no Brasil visando à posterior pesquisa linguística, discutiremos a questão da variação linguística presente em documentos escritos em português do século XVIII. Neste sentido apresentaremos a edição politestemunhal que vimos realizando na Fale/UFMG de texto referente aos caminhos que levavam às minas de ouro, partindo de São Paulo ou do Rio de Janeiro. A questão que se coloca é e que se pretende testar é a do valor de uma edição politestemunhal para a pesquisa linguística. Nossa hipótese é a de que o leque da variação registrado neste tipo de edição deva ser maior do que a de edições monotestemunhais. 555 556 SIMPÓSIO 53 ESTUDOS TEÓRICOS E DESCRITIVISTAS DE ORIENTAÇÃO LINGUÍSTICO-COGNITIVA A linguística cognitiva, desde 1980, quando se estabeleceu como mais um campo de estudos da linguística, tem servido como referencial teórico para diversos estudos de abordagem funcionalista, além de contribuir para investigações no campo da tipologia linguística e os universais da linguagem. A linguística cognitiva concebe que a linguagem não é uma faculdade cognitiva autônoma, que a gramática é uma conceptualização que se fundamenta em percepções compartilhadas acerca da realidade objetiva, e que o conhecimento linguístico emerge da língua em uso. Em vista desses princípios, que de algum modo se cruzam com a abordagem funcional, este simpósio tem por objetivos: (i) discutir pesquisas que adotam uma abordagem cognitivo-funcional para a descrição de línguas naturais. Neste escopo, embora o foco recaia principalmente sobre a análise do Português falado no Brasil, o interesse se estende às variedades da língua portuguesa falada noutras partes do mundo, bem como a outras línguas brasileiras em contato com o Portugues local, tais como as línguas indígenas e a Língua Brasileira de Sinais; (ii) explorar os aspectos teóricos trazidos à luz pelos dados empíricos, tais como a metáfora enquanto mecanismo cognitivo capaz de conceptualizar as coisas do mundo; a teoria dos espaços mentais; os modelos cognitivos idealizados; o modelo semântico de interação de forças; sistemas de referência; as relações entre linguagem, cognição e corporeidade; a gramática de construções; e os aspectos sociocognitivos de línguas em contato, tais como o português brasileiro, as línguas indígenas e a LIBRAS; e (iii) apreciar, sob uma perspectiva tipológica, os resultados da pesquisa acerca de mecanismos cognitivos relacionados ao processamento da linguagem, levantando elementos para uma discussão sobre os universais da linguagem. Trabalhos com tais temáticas ajudarão a compor um quadro panorâmico das aplicações da linguística cognitiva relacionadas à língua em uso, às línguas em contato e à investigação sobre os universais da linguagem. COORDENAÇÃO Christiane Cunha de Oliveira Universidade Federal de Goiás [email protected] Leosmar Aparecido da Silva Universidade Federal de Goiás [email protected] 556 557 PADRÃO DE ALINHAMENTO EM NHEENGATU Aline da CRUZ – UFG O objetivo deste trabalho é investigar o padrão de alinhamento sintático do Nheengatu (TupiGuarani, subgrupo III). Em virtude de seu uso como língua geral amazônica, o Nheengatu sofreu mudanças estruturais, que o diferencia do Tupinambá e de outras línguas da família Tupi-Guarani. Reich (2003), a partir da análise de descrições do Nheengatu do século XIX e do XX, levanta a hipótese de uma mudança tipológica no padrão de alinhamento do Nheengatu. Para este autor, o Nheengatu teria deixado de ser um sistema ativo/estativo, como teria sido o Tupinambá, e passado a se comportar como um sistema nominativo/acusativo. Grosso modo, o Nheengatu teria se distanciado do padrão de alinhamento observado nas línguas da família Tupi-Guarani e adotado o padrão de alinhamento do Português Brasileiro, língua com a qual mantém contato duradouro. Com base em dados recolhidos a partir de trabalho de campo entre falantes do Nheengatu do Alto Rio Negro, esta análise propõe que esta variedade de língua geral mantém as principais características de um sistema ativo/estativo, tal como proposto por Klimov (1974): (a) ausência de uma classe de adjetivos, (b) divisão da classe dos nomes em duas subclasses, (c) divisão dos verbos em ativos e estativos. O sistema do Nheengatu, porém, inova em relação às demais línguas da família TupiGuarani, por subdividir a classe de verbos estativos em flexionáveis e inflexionáveis. A análise propõe que as peculiaridades encontradas no sistema ativo/estativo do Nheengatu do Alto Rio Negro têm resultado em um sistema de alinhamento que diferencia esta língua tanto das línguas Tupi-Guarani mais conservadoras, quanto do Português Brasileiro. A GRAMATICALIZAÇÃO DE VERBOS EM PARTÍCULAS NA LÍNGUA GUAJÁ Marina Maria Silva Magalhães – UNB/IL/LIP A definição clássica de gramaticalização difundida por Kurylowicz (1965:52) é a de que esse fenômeno “consiste no aumento da amplitude de um avanço a partir de um morfema lexical para um morfema gramatical ou de um status menos gramatical para um mais gramatical”. O presente trabalho propõe discutir a existência de determinadas partículas direcionais, posicionais e aspectuais da língua indígena Guajá (família Tupí-Guaraní) dentro do quadro teórico proposto para explicar o processo cognitivo responsável pelo desenvolvimento de auxiliares nas línguas do mundo. As pesquisas realizadas acerca da origem de expressões gramaticais sugerem que tais expressões derivam quase sempre de conceitos concretos, e que a morfologia gramatical tende a se desenvolver a partir de estruturas lexicais, especialmente a partir de categorias como nomes e verbos. Ao assumir que auxiliares expressam conceitos gramaticais tipicamente relacionados a tempo, aspecto e modalidade, quase que invariavelmente, podemos afirmar que as expressões linguísticas para tais conceitos são derivadas de entidades concretas que descrevem tais noções gerais como locação, movimento, atividade, desejo, postura, relação e posse. Tais noções tendem a ser expressas linguisticamente por meio de verbos, que são parte de conceitos mais complexos. Muitos autores têm tratado da descrição da natureza dos verbos utilizados nas línguas como fonte de conceitos expressos por auxiliares e chegado a conclusões similares segundo as quais os verbos que normalmente se gramaticalizam são aqueles que codificam conceitos pertencentes aos quatro domínios seguintes (Kuteva, 1991): o domínio físico (p. ex. ser/estar, ir/vir, ter), o domínio temporal (ex. fazer, iniciar/tornar-se, terminar, permanecer), o domínio intra-subjetivo (ex. querer), e o domínio inter-subjetivo (ex. dever, permitir). A questão sobre que tipos de verbos tendem a se gramaticalizar em auxiliares parece estar relacionada a generalidade dos conceitos expressos por eles e ao maior escopo de utilização. Uma análise comparativa das partículas direcionais, posicionais e aspectuais da língua Guajá com verbos plenos desta mesma língua e de línguas geneticamente relacionadas permite estabelecer o processo dinâmico que as originou, 557 558 principalmente quando interpretadas como resultado de um processo de gramaticalização a partir de verbos plenos pertencentes aos domínios supracitados. PRONOME ‘ELES’: UMA ANÁLISE DAS CONSTRUÇÕES IMPESSOAIS DE TERCEIRA PESSOA NO PB Elizete Maria de Souza – UFMG O presente estudo trata das construções impessoais com o pronome ‘eles’, no português brasileiro não padrão. A primeira observação que fazemos é que as construções impessoais, de modo geral, não são per se um objeto de estudo homogêneo. Trata-se de um conjunto heterogêneo de estratégias, em diferentes línguas, para tornar o sujeito impessoal. Nosso foco, porém, são basicamente as construções que trazem o pronome ‘eles’ impessoal na posição de sujeito, em sentenças como em (1) “Eles estão descobrindo propriedades incríveis do alecrim” (SOUZA, 2011: 8) e (2) “Es comeu tudo” (CORRÊA, 1998: 51), já que buscamos investigar a conexão da impessoalização com o fenômeno de preenchimento do sujeito no português brasileiro contemporâneo. Outra observação importante que fazemos é que o pronome ‘eles’, no PB, pode apresentar diferentes realizações, isto é, uma única forma do pronome ‘eles’ pode apresentar diferentes proformas. Essa observação ganha real sentido quando verificamos que o pronome ‘eles’ possui propriedades que licenciam sua ocorrência tanto com referência definida quanto indefinida, podendo também recuperar DPs de tipos semânticos distintos, ou seja, com referência locativa, coletiva ou genérica, conforme amplamente documentado por Souza (2007). A autora, entretanto, não oferece uma análise teórica destas diferentes retomadas de DPs diversos, seja pelo pronome ‘eles’ pleno ou por sua variante reduzida ‘es’, ficando essa lacuna a ser preenchida. Sendo assim, as perguntas iniciais que formulamos ao propor este estudo são: (i) como o pronome ‘eles’ passou a ser uma opção de realização de sujeito em construções impessoais; (ii) o processo de mudança acima referido constitui mais um passo na alteração do PB para uma língua de sujeito nulo parcial? Para tratar destas questões, Souza (2007) toma como ponto de partida o estudo de Corrêa (1998), que apresenta evidências de natureza quantitativa e qualitativa de que o pronome ‘eles’ é uma forma deficiente morfológica e sintaticamente no PB dialetal. No referido trabalho, Corrêa identifica ocorrências de formas plenas e reduzidas dos pronomes de 3ª. pessoa, chamando a atenção para o fato de que a redução ‘es’ constitui uma forma variante do pronome ‘eles’ pleno. O autor mostra que, em geral, tanto uma forma quanto a outra é capaz de retomar um DP singular ou até mesmo um DP feminino, colocando em evidência o fato de que nem sempre há concordância total de traços de gênero e de número entre o pronome e o DP correferente. Corrêa, entretanto, não oferece também uma análise teórica dos dados, o que nos leva a formular uma nova pergunta: (iii) quando o pronome ‘eles’ busca sua referência em contextos em que há locativo > coletivo > genérico > indefinido, qual seria a estrutura interna do pronome ‘eles’? Essa pergunta exige de nós uma tomada de posição. Ou tratamos os pronomes de modo uniforme, ou reconhecemos os pronomes como itens de estrutura interna variável. É nosso objetivo, portanto, mostrar que o pronome ‘eles’ é um item de estrutura interna variável, que ocupa a posição de sujeito de construções impessoais, e que tais construções podem ser descritas tipologicamente, levando em conta a noção de subespecificação de traços formais, defendida por Carvalho (2008). Em suma, buscaremos responder todas as questões anteriormente colocadas, a fim de oferecer uma análise das construções impessoais com o pronome ‘eles’ no PB. 558 559 INOVAÇÕES NO SISTEMA FONOLÓGICO DE DÂW RESULTANTES DE BILINGUISMO EM PORTUGUÊS: UMA ANÁLISE DE ASPECTOS SOCIOCOGNITIVOS DE LÍNGUAS EM CONTATO Valteir Martins – UEA Silvana Andrade Martins – UEA A língua indígena Dâw é falada por um grupo minoritário composto por cerca de 120 pessoas que habitam na margem esquerda do rio Negro, confronte à cidade de São Gabriel. Segundo o último Censo do IBGE, esta localidade possuiu o maior contingente indígena do Brasil, sendo que 95% de sua população são de origem indígena. São falantes de 22 línguas, de quatro famílias linguísticas, sendo que 3 delas são cooficiais, juntamente com a língua portuguesa. Neste contexto multilinguístico e cultural, todos os Dâw falam sua língua étnica como língua materna, além do Nheengatu, que é falado pelos mais idosos, e da língua portuguesa, que em graus diferentes de proficiência, é utilizada por todos. Até o início dos anos 90, quem falava o português com razoável fluência eram sobretudo os homens abaixo de 30 anos. As mulheres, em geral, somente entendiam o português e falavam apenas algumas palavras e frases simples. A maioria das crianças entendia o português, mas preferia responder em Dâw. Com o aumento do contato dos Dâw com falantes do português e, em particular, com a implementação da escola bilíngue da prefeitura de São Gabriel na comunidade indígena, o conhecimento e a utilização da língua nacional têm crescido entre eles. Com isso, verifica-se que essa elevação de grau de bilinguismo em português tem provocado mudanças no sistema fonológico da língua, tendo como entrada os processos de nativização dos empréstimos mais recentes de palavras do português em Dâw. A partir das estratégias de reparações fonológicas das palavras oriundas do português para a língua nativa, conforme descritas por S. Martins e V. Martins (SIMELP, 2011), constata-se que, na integração de empréstimos recentes, tem ocorrido uma diminuição de graus de nativização na escala de nativização de empréstimos, de conformidade com o modelo de nativização pré-estabelecido pelos nativos. Algumas estratégias básicas, como a reparação de sons ilícitos, não estão sendo acionadas. Como exemplo, entre outros, citam-se os fonemas /f, r/ que não constavam na fonologia Dâw e que passam a ocorrer restritamente em empréstimos recentes. Assim também a característica monossilábica das palavras em Dâw, mantida pela preferência de nativizar empréstimos preservando somente a sílaba tônica do input da língua doadora, já não é tão usual. Essas inovações fonológicas implementadas em Dâw, tendo como input a adaptação dos empréstimos do português, são analisadas numa abordagem teórica da tipologia cognitiva. Analisam-se, no âmbito dos estudos das línguas em contato, os mecanismos sociocognitivos relacionados ao processamento de nativização dos empréstimos, considerando o aumento do grau de bilinguismo em português, principalmente dos jovens escolarizados. Concebe-se o modelo de nativização estabelecido pelos nativos como oriundo de processos em que as entradas da língua estrangeira são adaptadas à língua receptora a partir de construtos mentais que operam reparações fonológicas para que a palavra estrangeira se torne familiar aos ouvidos dos nativos. Logo, essas inovações fonológicas apontam para mudanças subjacentes na representação mental perceptual dos falantes Dâw com maior grau de bilinguismo em português. Os resultados dessa análise explicitam que operações de reparação estão estocadas na memória permanente dos Dâw e que se tornam a representação subjacente para um determinado empréstimo. Elucida-se, portanto, que estruturas fonotáticas subjacentes são empregadas na adaptação de empréstimos recentes, considerando o aumento do bilinguismo em português, numa perspectiva sociocognitiva. 559 560 MODALIDADE, ESTRUTURA E LINGUAGEM Christiane Cunha de Oliveira – UFG Nos estudos relativos às línguas de sinais, o conceito modalidade refere-se ao modo como uma dada língua é produzida e percebida, estabelecendo-se desta forma o contraste entre línguas de modalidade oral-auditiva e línguas de modalidade visogestual. As primeiras caracterizam-se por serem produzidas através do aparelho fonador e percebidas pelo canal auditivo; as segundas são produzidas através do uso do corpo – sendo principais articuladores as mãos, os braços e a face – e percebidas pelo canal visual. Uma questão sobre a qual alguns pesquisadores têm se debruçado diz respeito aos efeitos que a modalidade poderia ter sobre a estrutura das línguas (MEIER; CORMIER; QUINTO-POZOS 2002; SANDLER; LILLO-MARTIN 2006). O que se busca, nesse caso, é compreender até que ponto as categorias lingüísticas coincidem ou não, entre as línguas faladas e as sinalizadas, e quais as conclusões a que se pode chegar sobre a natureza da linguagem humana, a partir dessas observações. Um ponto problemático a ser levantado em algumas dessas análises, no entanto, é a tendência à pressuposição de que as mesmas categorias que se reconhecem nas línguas orais serão encontradas também nas línguas de sinais. Tal tendência muitas vezes emerge do próprio modelo teórico adotado para a análise, o qual, por sua vez, é constituído conforme a concepção que se tem de língua: assim, se o modelo teórico prevê a existência de certa categoria estrutural em toda e qualquer língua, a interpretação que se atribui à análise empírica acaba sendo influenciada pela necessidade epistemológica da existência dessa categoria nos dados. Diante disso, uma nova questão se apresenta: até que ponto é realmente útil uma busca por similaridades ou diferenças no plano estrutural? Afinal, se olhamos para os dados já pressupondo aquilo que iremos encontrar, perdemos a oportunidade de enxergar as novidades que os dados poderiam nos revelar. O presente estudo propõe uma discussão sobre como a concepção que se tem de língua pode influenciar nos resultados da análise descritiva das línguas e como, no caso das línguas sinalizadas, uma visão mais ampla de língua – até certo ponto livre das restrições estruturais que caracterizam o estudo das línguas orais – poderia oferecer vantagens para uma melhor compreensão dos fenômenos da linguagem. UNIVERSAIS LINGUÍSTICOS APLICÁVEIS ÀS LÍNGUAS DE SINAIS Karime Chaibue – UFG/FL A tipologia linguística tem como objetivos avaliar semelhanças e diferenças encontradas nas línguas do mundo e buscar os universais linguísticos a partir do exame de dados comparativos entre línguas genealogicamente não relacionadas, onde se verifica a ocorrência de certa característica comum a todas as línguas do corpus (Zeshan, 2008). É a partir dessa análise que se propõem os universais da linguagem, tal como o seguinte postulado proposto por Greenberg (1963): “todas as línguas fazem distinção entre Nomes e Verbos”, entendido como um universal absoluto — um traço compartilhado por todas as línguas do mundo. Tais proposições, no entanto, fundamentaram-se num corpus composto de línguas orais, deixando de lado as línguas de sinais utilizadas pelas comunidades surdas em nível mundial. Assim, o propósito deste trabalho é discutir até que ponto este universal se confirma, mediante os dados das línguas de sinais, em particular, os dados da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS). Esta pesquisa apresenta as características de uma pesquisa qualitativa e do estudo de caso como método de coletas de dados. Analisaremos narrativas livres de aproximadamente cinco surdos fluentes no uso da LIBRAS. Os vídeos das narrativas em LIBRAS são produzidas por surdos de diferentes localizações no Brasil, encontrados na internet, em materiais didáticos ou em outros meios. Os vídeos não possuem legenda ou tradução oral na Língua Portuguesa, e são de temas variados, tais como educação, religião, histórias pessoais e anedotas. Um questionário será aplicado aos surdos participantes da pesquisa, com o intuito de obter o perfil 560 561 de cada um, no que diz respeito ao modo de aquisição de língua e à aceitação e postura da família diante do processo de aprendizagem da LIBRAS. Quadros e Karnopp (2004) apontam o parâmetro movimento como sendo o diferenciador de Nomes e Verbos, afirmando que os Verbos na LIBRAS possuem um movimento mais longo e a derivação de Nomes acontece com a repetição e o encurtamento do movimento. Felipe (2006) acredita que a distinção entre as duas categorias lexicais acontece simplesmente pelo contexto. Pizzio (2011) discorda sobre a possibilidade de se aplicar o movimento como diferenciador entre Nomes e Verbos, pois a autora não conseguiu identificar uma unidade responsável por tal distinção nos sinais em LIBRAS. Em nossas análises dos vídeos de narrativas livres também não percebemos uma padronização da distinção entre Nomes e Verbos na LIBRAS, o movimento não foi o fator distintivo. Percebemos que a literatura existente e o corpus deste trabalho não apresentam um elemento distintivo de Nomes e Verbos na LIBRAS, exceto o contexto em que o sinal é produzido. Diante disso, acreditamos que nosso trabalho contribuirá para uma discussão do universal linguístico absoluto apresentado em Whaley (1997, p. 32): "todas as línguas fazem distinção entre Nomes e Verbos", uma vez que buscaremos uma análise minuciosa de dados na LIBRAS, proferidos em contextos e desprendidos ao máximo de influências de outras línguas. UM OLHAR DA LINGUÍSTICA COGNITIVA SOBRE OS CLASSIFICADORES NAS LÍNGUAS DE SINAIS Bruno Gonçalves Carneiro – SESI/ Facdo/ Itpac Christiane Cunha de Oliveira – UFG Houve um período recente que linguistas precisavam comprovar, nas línguas de sinais, todas as teorias aplicadas às línguas orais, numa tentativa de demonstrar que estas eram, de fato, naturais. Devido ao império do postulado da arbitrariedade/ não motivação do signo linguístico, muitos mitos e preconceitos foram gerados, rebaixando-as a representações miméticas, encenações e, quando admitidas como sistemáticas, incapazes de expressar idéias abstratas (TAUB, 2001). Outra grave consequência foi a atenuação da importância do caráter icônico e do papel desempenhado pelos gestos na organização desses sistemas (LEITE, 2008; MCCLEARY; VIOTTI, 2011; LIDDELL, 2003), o que provavelmente originou a suposição inicial que toda fonte de significado nas línguas de sinais provinha de morfemas (LIDDELL, 2003). Segundo Duncan (2003) e Schembri (2003), os estudos sobre línguas sinalizadas são recentes e a emergência repentina de pesquisas nessa área da linguística, criou a necessidade urgente de nomear os fenômenos observados. O mais adequado, naquele momento, foi lançar mão de termos usados na descrição das línguas orais que, de acordo com os autores, parece ser o caso dos classificadores. Numa visão tradicional e categórica, os classificadores são sinais polimorfêmicos, estruturas icônicas em que cada aspecto formacional é um morfema, dentre eles: a configuração de mão, a característica do movimento, ponto inicial e final do movimento, orientação da palma, disposição do corpo e de parte do corpo do sinalizante. Cada parâmetro, caracterizaria um grupo de referentes. Considerando a língua um sistema simbólico atrelado a processos cognitivos gerais e à nossa experiência corporal diária (JONHSON, 1992; LANGACKER, 2008), analisamos três textos, em que identificamos estruturas tradicionalmente conhecidas como classificadores, que chamamos de representação (DUDIS, 2008). A partir dos dados imos que, na concepção de eventos, o sinalizante cede seu corpo de forma a elaborar uma codificação transparente, através do corpo, daquilo que é concebido pelo corpo. As ações de ver, verificar, correr, remar, lançar e colocar, por exemplo, identificadas nessa pesquisa como construções representativas (classificadores), refletem as ações que experienciamos na relação com o mundo. Percebemos os classificadores como uma mimese corporal, o que não elimina a presença de elementos lexicalizados nessas construções. Com essa integração, a representação permite explicitar informações pragmáticas sobre o evento concebido (KENDON, 2004). Em relação às línguas sinalizadas, é impossível destituir da análise descritiva os aspectos 561 562 gradientes da posição das mãos, orientação da palma, corpo, cabeça, direção do olhar no espaço de sinalização e da “encenação” e “mimese” feita pelo sinalizante (DUNCAN, 2003; FELIPE, 1998; MCCLEARY; VIOTTI, 2011; LIDDELL, 2003a, 2003b; OKRENT, 2002; SCHEMBRI, 2003). Apesar de não ter sido nosso objetivo distinguir sinais de gestos, sugerimos que a performance do corpo do sinalizante, durante a representação, é uma fonte importante para a construção de significado nas línguas de sinais. Gestos são gradientes, não categóricos, fazem parte da linguagem humana e do processo de produção das línguas naturais. São abundantes e onipresentes, podendo ser considerado um universal linguístico (DUNCAN, 2003). Certamente, a ação gestual nas línguas de sinais parece acontecer de forma sistematizada, bem mais articulada e controlada que nas línguas orais. Resta agora à linguística das línguas sinalizadas desvendar a regularidade do uso da gestualidade. AMPLIAÇÃO LEXICAL EM LÍNGUA DE SINAIS BRASILEIRA – ASPECTOS ICÔNICOS Ester Fernandes Nunes – SEMED/ Araguaína Bruno Gonçalves Carneiro – SESI/ Facdo/ Itpac A língua é um fenômeno que nos permite apreender o mundo, um sistema simbólico atrelado a processos cognitivos gerais e à nossa experiência corporal diária, pelo qual concebemos e codificamos os acontecimentos da realidade objetiva. É nesse conjunto de percepções e sensações mais elementares que realizamos novas concepções e projetamos estruturas imaginativas a fim de entendermos situações mais elaboradas e abstratas. Assim, o corpo é fundamental na concepção do mundo (JONHSON, 1992; LANGACKER, 2008). De acordo com Taub (2001), iconicidade não é uma relação objetiva entre imagem e referente, mas uma relação entre nossos modelos mentais de imagem e referente, sendo uma característica que tende a se manifestar em todas línguas. De acordo com Givón (1985), o princípio da iconicidade vai de acordo com a economia de esforço mental, justamente por contar com uma transparência na representação linguística. Um sistema que consiste de uma experiência codificada é mais fácil para armazenar, recuperar e ser usado na comunicação. Para o autor, o processo de abstração necessariamente envolve um aumento da arbitrariedade do código linguístico, mas não implica na ausência de motivação. Segundo Taub (2001) e Brennan (2005), vivemos num mundo visual. Ao observarmos o nosso redor, verificamos que estamos rodeados por contornos, formas, dimensões, e nem sempre essas mesmas entidades contam com um som associado a elas. Até mesmo as noções mais abstratas remetem à experiência corporal diária. Logo, há maior número de esquemas de imagem visuais e cinestésicos associados a conceitos, do que sonoros. Daí a prevalência da relação transparente entre forma e significado nas línguas de sinais em relação às orais, visto que tais características imagéticas podem ser preservadas pelo sistema articulatório manual-corporal-espacial das línguas de sinais e dificilmente manifestam-se num meio de representação acústico. Considerando o papel da iconicidade na organização linguística das línguas sinalizadas, observamos a presença do caráter icônico em um conjunto de novos sinais criados por sinalizadores na cidade de Araguaína/TO. A comunidade surda de Araguaína/TO realizou um trabalho com o intuito de ampliar o conjunto lexical da libras falada na cidade. As atividades aconteceram por meio de encontros semanais, que incluiu um levantamento de pontos estratégicos da cidade que ainda não possuíam um sinal em libras. A ideia desses encontros parte da necessidade urgente, entre os sinalizadores, de ampliação lexical da libras em Araguaína. Nas reuniões, realizadas em libras, membros do grupo (composto por surdos e ouvintes) apresentavam propostas a respeito dos possíveis sinais para um local escolhido. O sinal que recebe a maioria de votos é convencionado e após, passa a ser validade dentro da comunidade surda. Observamos que uma a estratégia usada para criação de novos sinais foi apresentar característica físicas do referente, como imagens do local, características do imóvel, disposição da construção ou o símbolo/logomarca do empreendimento. Notamos também a influência de características do 562 563 referente, ou o input visual concebido pela comunidade surda sobre tais referentes, como um recurso para a ampliação lexical da libras. METÁFORAS NA LIBRAS Maria Luísa Mendes – UFG Esta pesquisa propõe uma investigação sobre o uso de metáforas na Língua Brasileira de Sinais (Libras) e tem por objetivo principal analisar e descrever como se dá a composição de metáforas nessa língua. A visão tradicional de que a metáfora é apenas um recurso de estilo, de ornamentos, foi derrubada principalmente pelas pesquisas de Lakoff & Johnson (1980). Para esses teóricos, o sistema conceptual que dirige nosso pensamento e também nossas ações é essencialmente metafórico. Daí a definição de Metáfora Conceptual como uma forma convencional de conceber um domínio de experiência em termos de outro, e que de modo geral é inconsciente e permeia toda a organização linguística. Os pressupostos da teoria da Metáfora desenvolvida por George Lakoff e Mark Johnson, bem como a teoria dos Espaços Mentais formulada em Fauconnier (1994), constituem a base teórica para a investigação proposta aqui. Faria (2003) oferece uma das primeiras análises sobre o uso de metáforas na Libras. Contudo, o objetivo daquele estudo é investigar as expressões metafóricas da Língua Portuguesa que se manifestam também na Libras. Neste trabalho,por outro lado, propomo-nos a investigar a produção de metáforas na própria língua de sinais, no intuito de identificar aquelas criações metafóricas que são inerentes à Libras, e não resultantes do contato com a língua nacional. Especificamente, nosso estudo visa identificar metáforas conceituais, orientacionais e ontológicas na Libras, a partir de um corpus em que o uso da língua se contextualiza em situações de interação entre sinalizantes, geralmente surdos, fluentes em Libras. Procuramos explicitar também os domínios fonte e alvo no processo de construção destas expressões metafóricas por meio da análise de vídeos coletados da internet, nos quais os usuários de Libras expressam opiniões acerca de determinados temas ou mesmo produzem falas espontâneas do dia a dia. A análise dos dados da Libras apóia-se nas teorizações de Taub (2004) e Wilcox (2000) sobre a manifestação da metáfora na Língua Americana de Sinais (ASL) e revela que as metáforas orientacionais na Libras coincidem com as da língua portuguesa, uma vez que a composição de metáforas está intimamente relacionada ao sistema conceptual que é partilhado tanto pelos ouvintes como pelos surdos brasileiros em geral. Por exemplo, a metáfora orientacional FELIZ É PARA CIMA fica evidente no sinal ALEGRIA (mãos abertas tocando os ombros de baixo para cima em movimento circular). Outro exemplo, de metáfora conceitual/estrutural identificada na Libras, é COMUNICAR É ENVIAR. Ainda outras metáforas são resultantes da corporificação, também postulada por Lakoff e Johnson. Para os autores, a mente é estruturada com base nas experiências corporais dos sujeitos. Assim, o sinal ESQUECER é, ao mesmo tempo, metafórico e corporificado. Esse sinal é articulado passando-se uma das mãos sobre a testa, como se fosse uma borracha que apaga algo da superfície de uma folha de papel. Finalmente, nota-se também que, assim como na ASL, a Libras possui sinais que têm iconicidade metonímica e sinais com iconicidade metafórica. A Iconicidade metonímica está presente quando, ao articular um sinal, toma-se uma característica do conceito/objeto que é representado de forma icônica, como no sinal “árvore”. Em um sinal icônico metafórico, o conceito é entendido em termos de outro e, para a sua articulação, um traço desse conceito é representado de forma icônica. Os sinais “comunicar” e “avisar” são exemplos de iconicidade metafórica da metáfora – COMUNICAR É ENVIAR. 563 564 A ANTROPONÍMIA TEMBÉ E KA’APOR: UMA ABORDAGEM COGNITIVA DOS DIFERENTES MODOS DE NOMEAR Raimunda Benedita Cristina Caldas – UFPA Tabita Fernandes da Silva – UFPA O presente trabalho resulta de investigações em andamento sobre a antroponímia de duas línguas do tronco Tupí: o Tembé e o Ka’apór, pertencentes aos sub-ramos IV e VIII da família Tupí-Guaraní, respectivamente (RODRIGUES, 1985/1986). O estudo, por um lado, mostra as estratégias adotadas pelos indivíduos dessas culturas no processo de nomeação de pessoas, bem como as motivações antroponímicas que governam tal processo. Por outro lado, o estudo também aborda como se dá a escolha de antropônimos da cultura não indígena adotados por índios dessas duas etnias como uma espécie de segundo nome ou mesmo como primeiro nome, bem como verifica quais as motivações dessa segunda antroponímia e se há correspondência entre as motivações que regem a escolha do nome indígena e a motivação da escolha ou adoção do nome em língua portuguesa. As línguas em estudo encontram-se em diferentes graus de bilinguismo, o que tornou bastante viável a presente investigação. Na abordagem feita a respeito dos nomes próprios nas línguas referidas consideramos aspectos de referenciação relacionados à apresentação metafórica e metonímica no que respeita à visão de mundo desses falantes no momento de nomear alguém. O estudo enquadra-se no campo da Onomástica uma vez que trata do referencial individual do nome indígena que passa a ser antropônimo, mas continua disponível no uso comum para a nomeação de elementos da natureza e eventos do cotidiano e porque trata, também, dos nomes apreendidos do português na relação de contato. Vale-se, ainda, da Linguística Cognitiva ao privilegiar aspectos de análise de referência e de nomeação dentro de uma concepção lingüística que leva em conta o referencial cognitivo desses usuários frente ao convívio com os modos diferentes de nomear. O suporte teórico para o tratamento dado ao estudo dos antropônimos segue os estudos semânticos e lexicais, conforme tratados por Lakoff (1987), Silva (1992), Shopen (1985) e Goossens (1990). O ESTUDO DA LINGUAGEM EM CRIANÇAS COM TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE: NOVAS METODOLOGIAS EXPERIMENTAIS Vanessa Cristina de Jesus Pinha – UFMG Os estudos do médico francês Pierre Paul Broca (1824/1880) e do neurologista alemão Carl Wernicke (1848/1905) sobre a relação entre lesões no cérebro e a linguagem levaram à descoberta de áreas específicas no cérebro que se relacionam com a produção e a compreensão da linguagem – área de Broca e área de Wernicke. Esses achados despertaram o interesse de especialistas de diversas áreas como linguistas, neurologistas, psicólogos, fonoaudiólogos, entre outros, que, desde então, investigam as relações entre cérebro e linguagem, com enfoque nas patologias cerebrais. Entre os distúrbios psicológicos que afetam o aprendizado e o desempenho da linguagem, destacase o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), por apresentar comprometimento da atenção e da memória, processos mentais indispensáveis para o desenvolvimento das habilidades linguísticas. O TDAH consiste em uma desordem neurobiológica, de causas genéticas, caracterizada pelo comportamento desatento, inquieto e/ou impulsivo (DSM-IV-TR, 2002). Inúmeros trabalhos realizados em diversas áreas associam o TDAH a problemas na área da linguagem, tais como dificuldade com a fala e/ou atrasos na aquisição da linguagem, distúrbios na leitura e/ou na escrita, além de prejuízos referentes à competência comunicativa como linguagem receptiva e expressiva e processamento auditivo (BROWN, 2007; COHEN et al, 2000; LOBO e LIMA, 2007; TANNOCK, 2000, 2005). No campo da linguística, no entanto, há poucos estudos que investigam a relação entre TDAH e linguagem. Podem ser citados os trabalhos de Albuquerque (2008), que investigou o processamento da leitura em crianças e adolescentes portadores de TDAH e de Klein (2009), que 564 565 pesquisou a compreensão em leitura e a consciência fonológica em crianças com TDAH. Diante da escassez de pesquisas que investigam o tema em questão, o presente trabalho tem por finalidade apresentar, discutir e difundir o uso de técnicas da psicolinguística experimental no estudo do TDAH. Visto que há diversas evidências sobre a associação entre TDAH e problemas com a linguagem, torna-se de extrema importância a incorporação de contribuições da linguística e da psicolingüística nos estudos dessa patologia. Entre as diferentes metodologias de investigação da relação entre língua e cérebro, merecem destaque o rastreamento ocular (Eye tracking) e a eletroencefalografia (EEG) – técnicas utilizadas no campo da psicolinguística experimental – por investigarem os processos mentais que ocorrem no cérebro no momento em que o processamento da linguagem acontece. A técnica de rastreamento ocular consiste na utilização de um aparelho (Eye tracker) que acompanha e grava os movimentos dos olhos de um indivíduo enquanto ele lê textos verbais e não-verbais. Tais movimentos fornecem padrões que, após serem mensurados e analisados, evidenciam como o falante/ouvinte integra e utiliza as informações linguísticas visuais durante a compreensão da linguagem (RAYNER e LIVERSEDGE, 2004). O EEG, por sua vez, consiste no registro das correntes elétricas do cérebro com ênfase nas atividades elétricas geradas logo após a ocorrência de algum evento específico – método de potenciais relacionados a eventos (ERPs). No caso, o evento seria a leitura ou audição de uma determinada palavra ou sentença (KUTAS et al., 2006). Pela eficácia e sensibilidade das aferições, a utilização dos procedimentos metodológicos descritos anteriormente configura uma poderosa ferramenta para o estudo da relação entre transtornos como o TDAH e a linguagem. CONVERGÊNCIAS ENTRE O FUNCIONALISMO E A NEUROLINGUÍSTICA DE ORIENTAÇÃO ENUNCIATIVO-DISCURSIVA Amanda Bastos Amorim de Amorim – UNICAMP Segundo Ataliba em “Funcionalismo e gramáticas do português brasileiro” (2010), são possíveis as seguintes definições de função: “(i) o uso das línguas para um determinado propósito, (ii) as relações estruturais entre signos, e (iii) os papéis assumidos pelos constituintes numa sentença”. Adotando primordialmente a primeira definição, buscarei indicar aqui pontos de encontro e distanciamento entre as bases teóricas do Funcionalismo e da Neurolingüística de orientação enunciativo-discursiva. Uma aproximação fundamental – e a que torna o Funcionalismo o modelo mais interessante para discutir questões gramaticais em Neurolinguística - é que ambas se importam com processos, enquanto as teorias formais estudam produtos. Segundo Vygotsky em A formação social da mente (1984), é a análise dos processos – em oposição à tradicional análise dos objetos ou produtos – que permite a compreensão da essência dos fenômenos. Além disso, a contextualização da comunicação, levando em conta o sujeito, o que ele diz e em quais condições ele diz, são tratados por Vygotsky (idem) como extracorticais, ou seja, o que está fora do cérebro, mas a ele se relaciona. O que o autor faz é expandir a própria noção de cérebro para além da visão organicista praticada na Clínica. Além dessa convergência fundamental, temos: (i) a análise parte dos dados singulares para generalizações, como fazemos freqüentemente com os estudos de casos; (ii) a sintaxe é vista como um modelo do processamento verbal – embora o termo processamento venha sendo abandonado na Neurolingüística de orientação discursiva, pois remete a metáforas computacionais e concepções – preferimos a utilização do termo funcionamento em seu lugar; (iii) ambos admitem a natureza flexível das línguas naturais, que tomam a língua como um conjunto de escolhas, de forma que não haverá uma gramaticalização definitiva, mas processos de gramatização que buscarão descrever as línguas de acordo com certos paradigmas; (iv) ambos também pressupõem a não autonomia das estruturas linguísticas, uma vez que as estruturas são vistas como construtos que buscam escrever os processos subjacentes ao funcionamento da língua. Para além de tais semelhanças, é importante ressaltar que ambos, de maneiras bastante compatíveis, são constantemente reformulados e buscam, em outros autores e novos projetos caminhos possíveis 565 566 para a ampliação das teorizações sobre os processos comunicativos, bem como nascem em oposição às teorias formalistas, conforme Coudry em Diário de Narciso – discurso e afasia (1986). O ALUNO SURDO NA ESCOLA REGULAR: CONTEXTOS DE ENSINOAPRENDIZAGEM DA LÍNGUA PORTUGUESA Bruna Crescêncio Neves – UFSC O reconhecimento da língua de sinais como língua natural do surdo e do acesso da mesma na escola regular por meio das diretrizes nacionais para a educação especial (resolução CNE/CEB n. 2, de 2001, a lei 10.098/94 - VII, que trata sobre a acessibilidade à língua de sinais), da lei 10.436/02 que estabeleceu que LIBRAS é o meio legal de comunicação e expressão do surdo e do Decreto 5.626/ têm ocasionado algumas mudanças na educação dos surdos em nosso país. Desse modo, as instituições de ensino buscam adequar-se às novas diretrizes para atender esses alunos; entretanto, a realidade encontrada nas escolas difere daquela que seria a ideal. Nesse sentido, o presente artigo focaliza a análise nas seguintes questões: a) O contexto escolar de ensino-aprendizagem da língua portuguesa dos alunos surdos nas escolas regulares, nas cidades de Laguna, Tubarão e Garopaba, todas em Santa Catarina; b) O cotidiano escolar que envolve surdo, professor e intérprete e c) A aprendizagem da língua portuguesa como segunda língua. Os primeiros resultados desta pesquisa têm mostrado alunos integrados no ambiente escolar, com professores intérpretes como exige a lei, mas com relevantes limitações na aprendizagem da língua portuguesa. LÍNGUA PORTUGUESA PARA SURDOS: POR UMA PROPOSTA DE LETRAMENTO ACADÊMICO Maria Clara Maciel de Araújo Ribeiro – UFMG A população surda brasileira, usuária nativa da Língua de Sinais Brasileira (L1) e usuária estrangeira da Língua Portuguesa (L2), apenas recentemente tem tido a oportunidade de ingressar em cursos de graduação e pós-graduação stricto sensu oferecidos por instituições públicas brasileiras. A política de cotas do Governo Federal e o advento do curso de Letras/Libras empreendido pela Universidade Federal de Santa Catarina (e oferecido em 18 polos pelo Brasil) talvez sejam os principais motivadores desse movimento. A partir daí, vemos surgir uma produção acadêmica de autoria surda, cunhada na pós-graduação, dotada de especificidades: i) tal produção costuma ser representante autêntica de um modelo de racionalidade científica emergente, que relaciona ao fazer acadêmico um fazer militante ou ativista-social (RIBEIRO, 2012); ii) a posição linguístico-cultural do sujeito surdo frente à produção de discursos acadêmicos em Língua Portuguesa acaba por gerar uma série de processos discursivos regidos pela tensão sujeito/língua; iii) tal tensão tem feito crescer nos surdos o desejo de produzir suas dissertações e teses em Língua Brasileira de Sinais – questão extremamente polêmica; iv) não se têm notícias de cursos de português para surdos voltados especificamente para o desenvolvimento de habilidades de escrita acadêmica e, ao mesmo, para o gerenciamento das facetas acadêmica e ativista-social no fio do discurso. Diante disso, o objetivo deste estudo é discutir a produção acadêmica de autoria surda com vistas a evidenciar a necessidade de se pensar em cursos de português para este específico fim: letramento acadêmico para surdos usuários de português como L2. Além da abordagem presencial, discute-se ainda a pertinência da elaboração de cursos on-line, que maximizam o tempo de contato do sujeito com atividades de leitura e escrita da Língua Portuguesa. Por fim, serão apresentados os eixos norteadores de um possível curso de letramento acadêmico para surdos seguido de atividades preliminares. O que se pretende, pois, é discutir o papel da língua portuguesa na formação de pesquisadores surdos. 566 567 O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA PARA SURDOS NO CMAI E CAS GOIÁS Kelly Francisca da Silva Brito – CAS/CMAI A Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) é uma língua gesto-visual e é reconhecida pela Lei nº 10.436/2002 e decreto nº 5.626/2005. O português é a segunda língua (L2) para as comunidades surdas brasileiras na modalidade escrita. O pouco conhecimento de Língua Portuguesa que a maior parte dos educandos surdos apresenta, demonstra as dificuldades para escrever e ler. Por não ser o português sua primeira língua o surdo não terá o desenvolvimento igual aos ouvintes. A legislação vigente trás em seu aparato legal que o ensino deve ser ofertado desde a educação infantil, com metodologias especificas e formas de avaliação diferenciadas pautados na educação bilíngue e nas especificidades dos sujeitos surdos. Educação bilíngue envolve duas línguas no contexto educacional. Ao optar em oferecer uma educação bilíngue, a instituição está assumindo uma política linguística em que duas línguas passarão a existir no espaço escolar (SALLES, 2004). O primeiro contato com um texto escrito por um surdo é, para o ouvinte, desconcertante. Isso decorre do fato de que o ouvinte, que desconhece a realidade do surdo, supõe que o escritor surdo tenha como língua única e/ou materna a língua portuguesa. Uma vez lembrado que a percepção sensorial do surdo é essencialmente visual, tendo ele, portanto, acesso restrito, ou nenhum acesso, a modalidade oral do português, o ouvinte ainda se surpreende com o fato de que o surdo escolarizado demonstre domínio tão restrito da língua portuguesa. A educação dos surdos está vinculada ao bilinguismo, o ensino de segunda língua (L2) está vinculado a sua primeira língua (L1). Esta comunicação objetiva-se em apresentar, divulgar e mostrar como ocorre o processo de ensino-aprendizagem do educando surdo em duas instituições públicas e referências em educação de surdos em Goiás pautas no bilinguismo e os resultados obtidos por esses educandos que tem atendimentos preparados respeitando a sua singularidade linguística, cultura e identidade surda, fato que ainda não ocorre em escolas que não trabalham com a perspectiva bilíngue. LÍNGUA E COGNIÇÃO: A GRAMÁTICA DAS LÍNGUAS COMPORTA O CORPO Leosmar Aparecido da Silva – UFG Cognição, comumente conhecida como processo pelo qual se adquire algum tipo de conhecimento, nas últimas décadas tem sido objeto importante para os estudos da linguagem. Alguns estudiosos a definem como aquilo que ocorre quando o corpo engaja-se no mundo físico e cultural, devendo, portanto, ser estudada em termos das interações dinâmicas entre as pessoas e o ambiente. A hipótese da embodied mind acredita que associações do corpo em ação, principalmente relacionadas às atividades orais e à cabeça, são fundamentais para se buscar o domínio-fonte de certas estruturas linguísticas. Para Gibbs (2006), certos movimentos do corpo podem revelar surpresa, desconforto e também raiva, alegria, tristeza. Essas ações normalmente vêm acompanhadas de um ato de fala específico. Em vista dessas considerações, esta comunicação tem o propósito de discutir e problematizar como as experiências corporais, construtoras de esquemas imagéticos que podem ser projetados metaforicamente, integram o sistema gramatical das línguas. Dados de diferentes línguas e também do Português Brasileiro serão mostrados como forma de se verificar a presença do corpo nas construções indicativas de movimento, no sistema adposicional (preposicional e posposicional), no sistema numérico, no sistema dêitico, nas construções idiomáticas, modais e evidenciais. 567 568 CONSCIÊNCIA METALINGUÍSTICA NA AQUISIÇÃO BILÍNGUE: ESTUDO DE CASO DE UMA CRIANÇA BILÍNGUE EM ESPANHOL E PORTUGUÊS DO BRASIL AOS NOVE-DEZ ANOS DE IDADE. Milla Paiva Di Ferreira, UAb O presente trabalho tem como principal objetivo apresentar uma visão global do processo de aquisição bilíngue de uma criança em Espanhol (E) e Português do Brasil (PB). Trata-se de um estudo de caso em condições desfavoráveis ao bilinguismo infantil até os 9 anos de idade da criança em observação. Empregando uma abordagem cognitiva, nomeadamente no campo da psicolinguística (Houwer, 1990, 1995 e 2009; Batoréo, 2000 e 2004; Siguan, 2001; Bialystok, 2001a; Bialystok & Crago, 2007; Bialystok & Craik, 2009), tratamos de investigar o desenvolvimento da consciência metalinguística de uma criança bilíngue, considerando, especificamente, as variáveis motivação, afetividade e atitude linguística, amparadas em relevantes pesquisas efetuadas sobre esta temática (Gardner & Lambert, 1959 e 1972; Lalonde & Gardner, 1984 e 1985; Baker, 1993, 2007 e 2011; Gardner, 2009). Neste sentido, expomos um historial linguístico conciso da criança até os 10 anos de idade, que se destaca por três etapas marcantes e decisivas no seu desenvolvimento e crescimento linguísticos no PB - (i) até os 4 ½ anos (1ª etapa), (ii) dos 4 ½ aos 9 anos (2ª etapa) e (iii) a partir dos 9 anos (3ª etapa, coincidente com o início à leitura no PB). Apresentamos, igualmente, uma amostra ampla e diversificada constituída por produções linguísticas orais da criança, provenientes de anotações de campo realizadas até os seus 10 anos e de gravações realizadas entre os 8 e 10 anos de idade. Concluímos que, in casu, os fatores decisivos para que a criança alcançasse o bilinguismo num ambiente inicialmente desfavorável se caracterizaram, em essência, (i) pela motivação integrativa da criança, (ii) pela afetividade (conjunto de vivências, emoções e sentimentos inerentes tanto à criança como à família em geral) e (iii) pela mudança radical de atitude linguística no ambiente familiar a partir dos 9 anos de idade da criança, que passou a ser amplamente favorável. Com efeito, pensamos que os três fatores, de forma conjunta e inter-relacionada, foram, ao mesmo tempo, o alicerce e o motor do bilinguismo da criança em questão. “KEEP WALKING, BRAZIL”: METÁFORAS DE UM PAÍS EMERGENTE Adriano Dias de Andrade – UFPE Desde o início da última década, através de programas de distribuição de renda, da geração de emprego e da estabilidade econômica e política, o Brasil tem alcançado lugar de destaque no cenário mundial. O país apresenta-se hoje como uma potência em ascensão, como um líder entre os BRICS (grupo que reúne as potências emergentes Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). Além disso, com a confirmação da realização da Copa do Mundo de Futebol em 2014 e os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro em 2016, tanto o Governo Federal quanto a mídia nacional e estrangeira têm sido recorrentes ao conceituar o Brasil de maneira entusiasmada e com atributos positivos. As práticas discursivas que se originam na esfera do governo e da mídia têm assumido a categorização do país como o despertar de uma nova potência mundial. Tendo em vista que as metáforas constituem a linguagem e o pensamento humanos e que não há comunicação que se exima totalmente de metáforas, podemos afirmar que parte significativa desses discursos é gerada através de metáforas. Partindo dessas premissas, este trabalho investiga a produção de Metáforas Conceituais que licenciam Expressões Linguísticas Metafóricas nos discursos sobre o Brasil. Nosso objetivo principal é o de verificar como essas metáforas categorizam o Brasil. Utilizamos como corpus de análise textos da esfera política e da mídia: (i) Discursos proferidos pela Presidenta da República do Brasil, Sra. Dilma Rousseff, disponíveis no sítio da Presidência da República na internet e (ii) a Peça Publicitária “Keep Walking, Brazil – O Gigante Não Está Mais Adormecido” 568 569 da marca de uísques Johnnie Walker, também disponível na internet. Tomamos como aporte teórico contribuições da Semântica Cognitiva, que trata a metáfora como uma operação cognitivolinguística essencial para nosso entendimento do mundo e, também, a contribuição de estudos críticos do discurso sobre a questão do contexto enquanto modelo cognitivo. Dentre outros autores, apoiamo-nos nas pesquisas de Lakoff & Johnson (1980), Lakoff (1987, 1993, 2008) e van Dijk (2012). Trata-se de uma pesquisa qualitativa, na qual fazemos uma análise semântico-cognitiva do corpus. Utilizamos o método da leitura para o levantamento das metáforas. Esse método é bastante simples e consiste na leitura atenta do corpus, observando-se as ocorrências que julgamos metafóricas. Esperamos com os nossos achados demonstrar como os discursos do Governo e da Mídia têm tratado o Brasil de forma neo-ufanista, termo que cunhamos neste trabalho para nos referir a uma supervalorização nacional e a um resgate da autoestima brasileira coletiva. Mostraremos como as metáforas atuam na configuração dos textos investigados e como os produtores desses discursos conceituam o país através de metáforas. COMO ESTUDAR AS RELAÇÕES ENTRE A LINGUAGEM E A CULTURA NO PORTUGUÊS EUROPEU (PE) E NO PORTUGUÊS DO BRASIL (PB)?: FUNDAMENTOS DA LINGUÍSTICA CULTURAL NO SEIO DA LINGUÍSTICA COGNITIVA Hanna J. Batoréo – Universidade Aberta de Lisboa Tal como se vem destacando na literatura linguística das últimas décadas (cf. Faria et al., org., 1996: 20), as grandes mudanças que têm vindo ultimamente a envolver a Linguística se devem, sobretudo, à relação, muitas vezes pouco assumida com outras ciências e com as novas tecnologias, nomeadamente com as Ciências Exactas, as Ciências Sociais e as Ciências Cognitivas. Um destes encontros interdisciplinares se dá precisamente no caso da Linguística Cultural, quando esta vertente da Linguística Cognitiva surge claramente assumida nas propostas do fim do século passado apresentadas por Holland & Quinn 1987, D’Andrade 1987, Anusiewicz 1994, Palmer 1996, Bernárdez 2000, sendo impulsionada, numa segunda fase, dez anos mais tarde, pelas novas propostas de Sharifian & Palmer 2007, Janda 2008, Sharifian 2010 e 2011. Todos estes trabalhos resultam, precisamente, da preocupação em estudar a Linguagem no seu enquadramento cognitivo, social e cultural, que emerge, sobretudo, do encontro da Linguística com as Ciências Sociais (Antropologia, Sociologia, Etnografia, entre outras) e as Ciências Cognitivas (Psicologia Cognitiva e Antropologia Cognitiva), sendo fortemente inspirada pelas Ciência Exactas, sobretudo pelas Neurociências e a Inteligência Artificial: (Sharifian 2010: 3368) (cf. Batoréo 2000, 2004). A Linguística Cultural emerge, assim, no seio da Linguística Cognitiva, com particular destaque para a Semântica Cognitiva de Wierzbicka (1979,1991, 1992, 1996, entre outros), partilhando com ela o enquadramento teórico-metodológico (cf. Langacker, 1994, p. 31; Palmer, 1996, p. 3; Sharifian 2011b). Pela Linguística Cultural entendemos, portanto, um ramo da Linguística Cognitiva que se dedica ao estudo do modo como as línguas naturais, bem como as suas variantes (como o PE e PB) e os seus dialectos, reflectem e “corporizam” as culturas que veiculam. Perspectivado deste modo, o nosso entendimento da Linguagem é cognitivo-funcional, social e culturalmente inserido, conforme defendido globalmente pela Linguística Cognitiva (cf. Silva 2009). Nele, a Linguagem surge como meio de conhecimento em ligação com a experiência humana do mundo – ou seja, a base pragmática e experiencial da linguagem-no-uso) – sendo observada e analisada ao nível de línguas particulares usadas em multiplicidade de registos, em contextos sociais e culturais diferenciados (diferentes níveis e tipos de variação linguística). A Cultura é pensada, aqui, na dimensão cognitiva das interacções humanas – com grande destaque para a interacção verbal – , em função dos modelos de percepção, associação e interpretação do mundo, partilhados pelos intervenientes sociais (dimensão sociolinguística) e guardados na mente (dimensão psicolinguística). O estudo da rede de ligações e interdependências entre a Linguagem e a Cultura implica um conceito da Linguagem como um sistema fortemente enraizado na Cultura e 569 570 na vida social, em geral, determinando a comunicação intra e intercultural (i. e., cross-linguistic studies, na literatura anglossaxónica), bem como o ensino e a aprendizagem das línguas (cf. Silva 2009; Janda 2008: 10-12). 570 571 SIMPÓSIO 54 DESCRIÇÕES FUNCIONALISTAS DO PORTUGUÊS CONTEMPORÂNEO E SUAS VARIEDADES De conformidade com Castilho (2010), a língua como substância é um conjunto ordenado de itens ou classes linguísticas que estabelecem entre si relações e desempenham funções identificáveis pelos contrastes entre eles. Como sistema, a língua constitui-se num conjunto de unidades distribuídos em níveis hierárquicos. Numa perspectiva funcional, a colocação dessas unidades no uso contribui para que elas variem e possam mudar de função frente às necessidades comunicativas do falante. Diferentes estágios de variação e mudança compõem um continuum no qual determinado item ou construção assume, consequentemente, multifunções na língua. Em vista disso, este simpósio tem o objetivo de agregar trabalhos descritivos sobre o Português contemporâneo falado no Brasil e em outras partes do mundo em que se analisam fenômenos sintáticos como transitividade, valência, variação na representação do sujeito, objeto anafórico, objeto nulo, modalidade, evidencialidade, construções de voz, fluidez de categorias como verbos, preposições, conjunções, pronomes etc. Trabalhos comparativos que envolvem a Língua Portuguesa e suas variedades ou a Língua Portuguesa e outras línguas também podem ser inscritos no simpósio proposto. COORDENAÇÃO Leosmar Aparecido da Silva Universidade Federal de Goiás [email protected] Elisandra Filetti Universidade Federal de Goiás [email protected] 571 572 USOS EVIDENCIAIS NA FALA GOIANA Vânia Cristina Casseb Galvão (UFG/CNPQ) Apresento os resultados do projeto de pesquisa individual (Processo/CNPq 309558/2009-3 / PQ – 2009), vinculado ao Projeto Temático O português contemporâneo falado em Goiás - “Fala goiana”, que analisou e descreveu o estatuto semântico-sintático e discursivo de evidenciais derivados do predicado dizer, entre outros, no português contemporâneo falado em Goiás. Evidenciais são itens lexicais, construções ou operadores gramaticais relativos à fonte do conhecimento asseverado na proposição. Os postulados teóricos integram a Gramática Discursivofuncional (GDF) (Hengeveld; Mackenzie, 2005, 2006), modelo que dá sequência à Teoria da Gramática Funcional (GF), proposta por Simon Dik (1989; 1997). Fez-se um cotejo entre a GDF e a Teoria da Gramaticalização (TG), que busca identificar, descrever e mensurar o grau de gramaticalidade dos elementos linguísticos, os deslizamentos discursivo-funcionais que usos de uma mesma forma apresentam na transposição do léxico para a gramática ou, numa visão mais ampla, para a o discurso (visto como uma unidade interpessoal).Entre os resultados verificados está o reconhecimento da limitação do modelo da GDF para descrever fenômenos de gramaticalização. Os usos derivados de dizer realizados na forma [diski], especialmente do tipo, token de narrativa e indicador de genericidade, por exemplo, ocupam camadas mais altas na organização lingüística, tomando-se como base o modelo da Gramática Funcional do Discurso, que alocaria esses usos na camada semântica, representacional. Essa constatação questiona o princípio da unidirecionalidade, dogma da Teoria Clássica da Gramaticalização, que prevê o desenvolvimento de elementos em gramaticalização dos usos mais conceituais para mais gramaticais ou mais discursivos, direcionando-se do nível semântico para o nível pragmático - Interpessoal. Essa mesma generalização pode ser feita em relação a outros usos derivados de dizer, de função evidencial lexical, como “Todo mundo diz que”, “Como diz o outro”, “Como diz”, observados na Fala goiana. Tais constatações reforçam a necessidade de adaptação no modelo da GDF (conforme já adiantado em Casseb-Galvão, 2011), sugerindo-se a postulação do Nível retórico, superior ao Interpessoal. OBJETO E SUJEITO: CADA UM COM SEU PRONOME? O DESAPARECIMENTO DO CLÍTICO ACUSATIVO NO PORTUGUÊS DO BRASIL Bianca Fagundes – UNICEUB Este ensaio traz à tona a noção de “erro” a partir do estudo trazido por Duarte (1989) que expõe que, no Português do Brasil, os falantes tendem a substituir o Clítico Acusativo por um Pronome Lexical. Além disso, busca mostrar que a regra imposta pela gramática é débil e não opera com total eficácia atualmente. Com este trabalho, pretende-se defender a escrita como uma ferramenta da língua e da comunicação. Mostrando assim, que o registro escrito deve se aproximar da oralidade dos falantes, pois não são admissíveis a defasagem e a não representação escrita fiel de uma língua, uma vez que a proposta da escrita é justamente a representação. 572 573 A FUNCIONALIDADE DAS EXPRESSÕES CRISTALIZADAS FORMADAS COM O PRONOME SE: UM FENÔMENO EM VIAS DE GRAMATICALIZAÇÃO NO DIALETO GOIANO Déborah Magalhães de Barros – UEG Segundo as normas da Gramática Tradicional, o pronome clítico deve ser empregado em determinados contextos a fim de expressar a noção de reflexividade da ação do verbo sobre o seu sujeito sintático. Contudo, observa-se que no português brasileiro, em algumas regiões do Brasil, está ocorrendo uma alta incidência de não uso do pronome em função reflexiva. No dialeto goiano, o não uso do pronome nas situações em que a Gramática Tradicional solicita é altamente recorrente, indicando um processo de mudança acelerado. A partir de pesquisa de Barros (2011) verificou-se que a regra no dialeto goiano é a não marcação pronominal e os dados mostram fortes indícios de implementação da regra zero para o pronome em contextos exigidos. Por outro lado, a marca pronominal aparece em outros contextos altamente marcados, dentre eles estão as “expressões cristalizadas”. Construções, como “dane-se”, “e vire”, “se manda” e outras, integraram o grupo classificado como “Expressões Cristalizadas”. As “Expressões Cristalizadas” são construções que sempre se apresentam com a presença do pronome clítico, e nelas não é possível perceber ou analisar os seus constituintes (verbo e pronome) de modo isolado. Eles assumem um significado conjunto na expressão, assinalando um processo de gramaticalização, fato que pode justificar o favorecimento do uso da expressão na língua falada do dialeto goiano uma vez que ela pode assumir novos significados discursivos que são produtivos e funcionais para o aspecto interacional. Dessa forma, esta pesquisa pretende verificar quais os indícios de gramaticalização nessas expressões e qual a funcionalidade do emprego delas. Os pressupostos teóricos que sustentam este estudo estão na Teoria de Gramaticalização, especialmente o que consta em Heine, Claudi e Hünnemeyer (1991), Traugott (1993, 2003), Bybee, Perkins e Pagliuca (1994), Hopper (1991, 1996) e na Gramática de Construções de Goldberg (1996, 2006), Croft e Cruse (2004) e Croft (2007). O corpus é constituído de dados do Projeto “O português contemporâneo falado em Goiás - Fala goiana”. Analisamos trechos de falas de homens e mulheres com até 7 anos de escolaridade UMA PROPOSTA FUNCIONALISTA PARA OS OBJETOS IMPLICITOS NO PORTUGUES FALADO EM GOIAS Elisandra Filetti – UFG A presente comunicação tem por objetivo discutir os usos de objetos implícitos no português falado em Goiás sob o arcabouço da Gramática Funcional de Dik (1989, 1997) e da Gramática Discursivo Funcional, de Hengeveld e Mackenzie (2008). Partindo do princípio de que o uso revela o funcionamento da gramática de uma língua, sujeito a variações oriundas das necessidades comunicativas do falante, é que nos propomos a discutir as ocorrências de apagamento de objeto como fenômeno de intereface dos níveis morfossintático, representacional e interpessoal. O sistema da língua é dinâmico por natureza e, sendo assim, toda a organização léxico-sintática, semântico-pragmática se mobiliza para estabelecer estruturas valenciais que venham realizar, por fim, as intenções comunicativas dos falantes. O trabalho aqui apresentado se desenvolve a partir dos dados coletados do Português Goiano Falado (Projeto Fala Goiana, 2010) desenvolvido pelo Grupo de Estudos Funcionalistas – GEF, da Universidade Federal de Goiás/UFG. Pretendemos discutir como os apagamentos de objeto se realizam num contexto mais amplo que o de estruturas frasais, de modo a entendermos como falante/ouvinte constroem o sentido de tais categorias, considerando-se, principalmente, as retomadas referenciais de tais objetos, os encadeamentos de sentido que permitem a recuperação e interpretação de objetos implícitos no português brasileiro falado. Em vista disso, torna-se necessário investigar o papel dos objetos 573 574 implícitos, sob uma perspectiva interacional de linguagem, que analise como esses “apagamentos” tornam produtivos e salientes o fenômeno dos objetos implícitos. Para a análise de tais objetos, recorremos aos critérios estabelecidos por Dik (1989), Hopper e Thompson (1980; 2001) e García Velasco e Portero Munõz (2003), entre outros, cujas pesquisas têm buscado elucidar a influência de aspectos pragmáticos, interacionais na produção e recepção de objetos implícitos nas línguas, objetivo estendido também ao presente trabalho. É importante salientar que estão envolvidos no processo de interação funções da linguagem, a fluidez das categorias linguísticas, os papéis semânticos desempenhados pelas formas gramaticais, a relação tópico-foco, entre outras. Nesse sentido, considera-se, sobretudo, que o fenômeno de transitividade implica um movimento gramatical que enreda intencionalidade, natureza verbal, papéis semânticos, bem como condições pragmáticas e interacionais que recaem sobre toda a estrutura argumental. Essas necessidades, de cunho pragmático, determinam a moldura de um ato de fala que, segundo Mackenzie e Hengeveld (2002), constitui a unidade de análise da gramática numa camada superior à da oração, evidenciando a ocorrência dos fenômenos linguísticos também no nível interpessoal, pragmático. Compreender como as ocorrências de objetos implícitos são motivadas, discursivamente, assim como os graus de transitividade, no nível pragmático-discursivo, é uma questão que emoldurará esta pesquisa, observando, assim, que processos são oriundos do sistema linguístico e quais estratégias comunicativas interferem na transitividade verbal e no sistema de objetos do Português do Brasil. É o uso a dimensão responsável por aquilo que o falante faz da língua ao ilustrar, por exemplo, suas necessidades expressivas como narrar acontecimentos, alterar a transitividade de maneira a refletir linguisticamente sobre suas experiências no mundo. O USO DE INTENSIFICADORES E ATENUADORES COMO ESTRATÉGIAS DE POLIDEZ Erika Hoth Guerra Sathler – UnB O objetivo deste trabalho é investigar o uso de intensificadores e atenuadores como estratégias de polidez. O estudo se baseia em teorias da Pragmática, principalmente na teoria de Polidez desenvolvida por Brown e Levinson ([1978] 1987), nos princípios pragmáticos propostos por Leech (1983) e nos estudos de Kerbrat-Oreccioni (2005). Foram analisados eventos festivos com número reduzido de participantes, realizados em restaurantes ou na casa dos colaboradores. Metodologicamente, o estudo se vale da tradição etnográfica e utiliza como técnicas de geração de dados a observação participante e o grupo focal. Os participantes foram selecionados a partir de contatos pessoais e profissionais da pesquisadora. A análise mostrará que há diferença significativa em relação ao uso de estratégias de polidez pelas diferentes gerações envolvidas no estudo. Os resultados deste estudo apontaram que as gerações mais velhas utilizam mais atenuadores e intensificadores como estratégias de esquiva, enquanto as gerações mais novas não se valem tanto dessas estratégias. As diferenças podem ser explicadas pelas relações sociais que se estabelecem de modo diferente em cada geração. Enquanto os contatos sociais nas gerações mais velhas são marcados pela deferência e pela valorização das faces dos interagentes, nos relacionamentos sociais entre as gerações mais novas não há tanta preocupação com a manutenção de faces. A ORDENAÇÃO DE CONSTITUINTES NÃO-HIERÁRQUICOS DO NÍVEL REPRESENTACIONAL EM PORTUGUÊS Erotilde Goreti Pezatti – UNESP/SJRP Sob a perspectiva da Gramática Discursivo-Funcional (Hengeveld e Mackenzie, 2008), que se caracteriza por considerar muito seriamente o fato de que os enunciados são produzidos e 574 575 entendidos no contexto, já que a intenção do falante não surge em um vacuum, mas sim em um multifacetado contexto comunicativo, este estudo tem como objetivo descrever a ordenação de constituintes da predicação nuclear (Dik, 1997). A Gramática Discursivo-Funcional considera que, para explicar a linearização de constituintes em português, é necessário considerar três posições básicas, denominadas PI, para a posição inicial, PM, posição medial e PF para a posição final, e várias posições relativas derivadas dessas três. As duas posições periféricas (PI e PF) são psicologicamente salientes, enquanto a posição medial é menos saliente e depende do número de constituintes que uma oração pode conter. As posições relativas (PI+n, PM+/-n e PF-n) só podem ser preenchidas quando a posição absoluta já estiver preenchida, como em: PI PI+1 PI+n PM-n PM-1 PM PM+1 PM+n PF-n PF-1 PF Partimos da hipótese de que a posição PM e suas relativas são reservadas para os constituintes não hierárquicos – o predicado e seus argumentos –, ficando as posições PI e PF reservadas para constituintes com funções pragmáticas e para os operadores e modificadores das diferentes camadas do Nível Interpessoal e do Representacional. Como universo de pesquisa, tomam-se ocorrências reais de uso, extraídas do corpus oral organizado pelo Centro de Linguística da Universidade de Lisboa, em parceria com a Universidade de Toulouse-le-Mirail e a Universidade de Provença-Aix-Marselha, que recebe o nome de “Português oral” e desenvolveu-se no âmbito do Projeto “Português Falado: Variedades Geográficas e Sociais”, do qual resultou um corpus de amostragens de variedades do português falado. Os resultados revelam que a posição PM e suas relativas abrigam a predicação nuclear, com o predicado assumindo sempre a posição absoluta PM. Os constituintes argumentais são colocados à direita de PM, e só mudam de posição se houver interferência da dimensão pragmática, como a atribuição de função Tópico (PI) ou Foco (PF) a um constituinte, ou seja, vai depender do molde de conteúdo escolhido pelo Falante – Tético, Apresentativo ou Categorial –, na formulação da Expressão Linguística, para o alcance do objetivo comunicativo. CNPq (Proc. 301210/2009-8); CAPES (Proc. 5784/10-7). AS MODALIDADES FACTUAL, CONTRAFACTUAL E EVENTUAL COMO POSSIBILIDADES DE COMPREENSÃO DO MODO SUBJUNTIVO Graziela Jacques Prestes – UFRGS Com base, sobretudo, na Teoria do Tempo Relativo e nas modalidades proposicionais factual, contrafactual e eventual (Neves & Souza, 1999; Neves, 2000), Prestes (2003) encontrou um determinado padrão para o funcionamento do Pretérito Imperfeito do Subjuntivo (PIS). A partir de corpus de língua escrita, verificou-se que PIS factuais tendem a ocorrer com eventos que expressam tempo passado (A novidade fez com que ganhasse corpo a ideia de...), contrafactuais, com eventos presentes (Não estivéssemos numa crise de liquidez...) e eventuais ou hipotéticos, com eventos futuros (Talvez os índios achassem até graça se extraterrestres viessem à Terra como amigos...). Em Prestes (2011 e 2012a), apresentaram-se sugestões sobre como o tema poderia ser trabalhado em sala de aula. Em Prestes (2012b), com novo corpus, também de língua escrita, verificou-se novamente que PIS contrafactuais tendem a indicar eventos presentes; porém, dessa vez, valendo-se da subdivisão das contrafactuais em nômicas e anômicas, conforme Bunge (2010), pôde-se entender mais nitidamente a organização das contrafactuais que expressam tempo passado ou futuro. As nômicas são aquelas cuja proposição sugere apenas um não-fato, enquanto as anômicas são aquelas cuja proposição sugere um não-fato e um fato. Respectivamente, são exemplos (a) “Se não fosse pelos cartazes lituanos, ninguém diria que era um bar da colônia”, cujo não-fato é “é pelos cartazes”, e (b) “Se tivesse, porém, de dizer qual deles mais me enternece, escolheria o primogênito”, cuja proposição sugere tanto o não-fato “não tenho de dizer” quanto o fato “estou dizendo”. As contrafactuais nômicas com PIS tendem a indicar eventos presentes ou passados, enquanto as contrafactuais anômicas com PIS tendem e indicar eventos presentes ou futuros. Tais resultados revelam, significativa e essencialmente, a constituição semântica do PIS pelos elementos 575 576 temporais e modais, o que pode vir a ser um caminho para pesquisas futuras sobre os demais tempos verbais do modo subjuntivo. CONSTRUÇÕES INCETIVAS NO PORTUGUÊS EUROPEU Henrique Barroso – Universidade do Minho São objetivos desta comunicação: (i) proceder, em primeiro lugar, à identificação e breve caracterização das formas perifrásticas que focalizam o limite inicial de uma situação, isto é, das construções de incetivo, tais como (mas há mais) começar a, principiar a, desatar a, deitar a, largar a, romper a, meter-se a, pôr-se a, ficar a, passar a; (ii) investigar, depois, o seu estatuto de operadores (aspetuais), ou seja, a sua capacidade de alterar os valores aspetuais básicos dos predicados. Por exemplo, começar a, que se combina preferencialmente com eventos (processos e processos culminados) e estados faseáveis, transforma-os, ao atuar como operador, em eventos pontuais; (iii) perscrutar, por fim, a sua combinatória, tanto morfo-sintática quanto semânticolexical. O corpus, para esta análise, é constituído por material lingüístico autêntico, recolhido predominantemente na imprensa escrita e em textos literários. A DIFERENTE FUNÇÃO ARGUMENTATIVA DOS APOSTOS E DAS ORAÇÕES ADJETIVAS EXPLICATIVAS COMO MAIS UM FATOR A DIFERENCIÁ-LOS Érica Portas - UERJ Nara Soares - UERJ Em primeiro lugar, vamos ver o que defendem os pragmaticistas: “linguistas que se dedicam a estudar a língua não como sistema autônomo, mas por meio de seu funcionamento em situações concretas de uso. Sob essa perspectiva, o texto passa a ser visto como o lugar entre sujeitos sociais.” Este trabalho tem por objetivo analisar a relação, em casos estritos, entre texto e contexto de estruturas apositivas e de estruturas subordinadas adjetivas explicativas, e, consequentemente, as funções argumentativas dessas, motivadas pela intenção do autor. Para tanto, artigos da revista VEJA foram utilizados, nos quais pudemos selecionar cláusulas apositivas e orações adjetivas explicativas introduzidas por verbos denominados de cópula, a fim de supor que essa estrutura funcionará como uma função argumentativa diferente da função do termo aposto. Destarte, parece-nos que os autores dos corpus estudados, ao fazer uso de estruturas apositivas, pretendem dar foco ao fundamental; ao passo que, ao fazer uso de orações adjetivas explicativas, parece-nos pretender dar mais ênfase às informações que essas relacionam por meio das características semânticas que os verbos de ligação alcançam e do predicador. O objetivo do escritor diante de seus estímulos determina a escolha de uma ou outra estrutura. Então, o presente artigo aponta a diferença pragmática, através do reconhecimento de estratégias argumentativas, de seus usos, constatando, por meio deste trabalho, que além de sintaticamente, o aposto e a oração subordinada explicativa são, ainda que semanticamente próximos, pela óptica da pragmática, nesses casos analisados, elementos diferentes. Logo, observamos que estudos funcionalistas, que apoiam-se na tese de que a função explica a forma, preocupando-se com a relação entre a estrutura gramatical das línguas e os diferentes contextos comunicativos em que elas são usadas, generalizam a classificação dessas estruturas, sem levar esses contextos de que falam em consideração. Com isso, esperamos propor um novo olhar para esses elementos, de modo a entendê-los sob as suas diferentes particularidades discursivas e estruturais. 576 577 O SINCRETISMO PRONOMINAL DA 2ª PESSOA DO SINGULAR NO PORTUGUÊS POPULAR DO INTERIOR DE SÃO PAULO – UMA DISCUSSÃO SOCIOCOGNITIVA DA LINGUAGEM Ivanilde da Silva – USP O presente trabalho tem por objetivo primeiro apresentar o sincretismo pronominal existente no paradigma da segunda pessoa do singular nas formas tu e você nas funções sintáticas de sujeito, complementos (átonos e tônicos) e possessivos no Português Popular Falado Interiorano de São Paulo. Parti do pressuposto funcionalista de que o uso molda a estrutura linguística e que estes pronomes relacionados à segunda pessoa do singular estariam em variação a depender de fatores internos e externos à língua como já evidenciados em trabalhos que analisaram a variação entre tu e você em diversas regiões brasileiras (Cf.: PENKAL, 2004; ARDUIN, 2005; MODESTO, 2006; LUCCA, 2006; MARTINS, 2010), podendo assim provocar combinações das mais diversas em funções sintáticas diferentes não descritas pela tradição gramatical (Cf. BECHARA, 2001), mas evidenciadas também em estudos diacrônicos como os de Lopes (2006), Lopes e Machado (2005), Rumeu (2008) e Lopes e Cavalcanti (2012) e que atualmente fazem parte do repertório linguístico dos falantes do Português Brasileiro (PB). Procurarei, sobretudo, observar a maneira pela qual este sincretismo pronominal se constrói na fala de pessoas com baixa ou nenhuma escolaridade, mostrando com bases teóricas e metodológicas da Sociolinguística Variacionista (Cf. LABOV, 1972) e teorias cognitivas (modelos baseados no uso) padrões linguísticos em uso. Para isso fatores linguísticos, sociais e cognitivos serão abordados a partir das teorias e metodologias já mencionadas, tentando incorporar nos estudos da linguagem de base cognitiva, concebidos como modelos baseados no uso, a noção quantitativa de análise de dados, o corpus representativo de fala real e a noção de multivariação de fatores como os estilísticos (ambiente sociocultural). Segundo Silva (2008), fatores estilísticos como os usos de senhor/senhora, por exemplo, dizem respeito aos usos sociais desses termos, além disso, trazem também a importante noção abordada por Eckert (2012) que o falante é um agente estilístico natural, pois o falante ao falar sobre o mundo e no mundo tem muito o que dizer (sabe muito de tudo que fala) para quem dizer (precisa do outro para falar/ouvinte/ato colaborativo) e porquê dizer (intenção para atingir o ouvinte), necessitando antes de tudo de MODELO COGNITIVO, construído, compartilhado e organizado para apreender as coisas do mundo a partir de experiências humanas associadas ao pensamento e à linguagem, construindo assim significados em movimento contínuo que são incorporados durante a interação social, levando esta presente discussão a uma abordagem sociocognitivista da linguagem. Além disso, enfatiza a importância do contexto rico e dinâmico nos processos de significação social ou na construção dos sentidos e o aspecto social da cognição humana. A CONSTRUÇÃO DA IMPERATIVIDADE E A CONFIGURAÇÃO MODAL NO DISCURSO PUBLICITÁRIO. Izac Vieira Chaves – PG/UFG Este trabalho, baseando-se na teoria funcionalista da linguagem, descrita como sendo aquela que volta a atenção para os aspectos funcionais, situacionais, contextuais e comunicativos no uso da língua e que concebe a linguagem como instrumento de interação social, apresenta algumas reflexões a respeito do uso do modo imperativo no discurso da publicidade. A ideia é verificar a funcionalidade das diferentes formas de realização do uso desse modo, principalmente seu uso de forma implícita, além dos efeitos de sentido que esses usos provocam. Nossa hipótese é a de que o modo extrapola as regras e as indicações de ocorrências descritas pela tradição, construindo, assim, a imperatividade. Parte-se do pressuposto de que no nível interpessoal descrito por Hengeveld Mackenzie; (2008), como o nível que lida com todos os aspectos formais de uma unidade 577 578 linguística, que refletem o seu papel na interação entre o orador e o destinatário, o uso do imperativo configura-se como estratégias retóricas, pragmáticas e ilocucionárias, em outras palavras, trata-se de uma estratégia constituidora da relação falante/ouvinte, no nosso estudo, especificamente, relação anunciante/potencial comprador. Em termos retóricos, Perelman; Tyteca (2005) nos dizem que para argumentar, para que haja a adesão do interlocutor, é preciso usar estratégias argumentativas, para que haja um consentimento desse interlocutor nessa participação mental. O que o corpus nos mostra é que as formas implícitas de imperativo tem sido recorrentes e superiormente utilizadas. Perelman; Tyteca (2005) argumentam ainda que os seres desejam que não lhe ordenem mais, que lhes ponderem que se preocupe com suas reações, que os considere como membros importantes de uma comunidade. Nesse sentido, o discurso de publicidade se arma de uma gama de instrumentos, procurando agir discursiva e pragmaticamente no grupo consumidor, atingindo e prometendo cumprir cada um de seus desejos. FALA GOIANA: AS CONSTRUÇÕES DE VOZ E A PERSPECTIVIZAÇÃO DAS REPRESENTAÇÕES DO LOCUTOR Lennie Aryete Dias Pereira Bertoque – UFMT/PG-UFG Este trabalho objetiva apresentar as construções de voz, no Português Brasileiro (PB), analisando a organização e a funcionalidade das construções em dados da fala goiana, considerando os vários pontos de vista do locutor. Esse trabalho é de cunho funcionalista e, portanto, o fenômeno “voz” é analisado na inter-relação entre os domínios pragmático, semântico e sintático, com base nos estudos de Dik (1997 [1989]), de Givón (1990, 1994), de Camacho (2006), de Keenam e Dryer (2007[1985]), de Bertoque (2010), entre outros. O corpus analisado faz parte do banco de dados do projeto “Português contemporâneo falado em Goiás – Fala Goiana”, desenvolvido pelo Grupo de Estudos Funcionalistas da Universidade Federal de Goiás, que tem descrito e estudado a fala do goiano, numa perspectiva funcionalista da linguagem. No estudo das construções de voz, o que, de fato, determina a organização linguística é a perspectivização (o ponto de vista que o enunciador apresenta) para produzir um determinado efeito de sentido (ainda que não seja uma atitude intencional). Com base nisso, os dados analisados têm mostrado que algumas construções não são produtivas para que os falantes goianos entrevistados pudessem expressar seus pontos de vista e isso está relacionado também com as características discursivas que constituem a atividade interativa dos temas abordados nas entrevistas (família, saúde, morte, política, etc.). Na análise, consideramos também a noção de figura e fundo. Nos dados analisados, a voz passiva prototípica teve uma ocorrência pequena e a voz ativa se mostrou mais produtiva para enfatizar a argumentação do falante. A recorrência da voz ativa se dá com base no princípio da iconicidade, no qual o falante tende a transferir para a estrutura linguística, aspectos correspondentes ao mundo extralinguístico, como a ordem dos acontecimentos, o que também permite dar relevo ao tópico, que tende a ser o próprio entrevistado que fala de si (a construção ativa permite que o entrevistado fale de si, partindo sempre de si - relação sociocognitivista). Quando o entrevistado precisa expressar um sujeito sintático afetado (noção de passividade), a construção usada é a média e não a passiva prototípica, isso é possível por causa dos aspectos semânticos dos verbos. O estudo das construções de voz, na fala goiana, ajudará a compreender a organização linguística e a perspectivização do falante de PB. 578 579 DESLIZAMENTOS FUNCIONAIS DE VERBOS DE PERCEPÇÃO NO PORTUGUÊS BRASILEIRO Leosmar Aparecido da Silva – UFG A perspectiva cognitivo-funcional da linguagem, dentre outras questões, trabalha com a maneira como o falante apreende, armazena, produz expressões linguísticas e, em diferentes situações, utiliza-as criativamente. Nessa perspectiva, acredita-se que tais atividades são possíveis porque o falante toma por base aquilo que está no seu derredor: primeiramente a sua constituição física e também elementos que compõem a sua cultura. Esta comunicação tem o objetivo de mostrar alguns resultados de pesquisa em que foram analisados os deslizamentos funcionais dos verbos de percepção ver, olhar, ouvir, escutar, saborear e provar. Foram utilizados dados de fala do Projeto Fala Goiana e de outros corpora como o do PEUL, do Grupo Discurso & Gramática, da Internet e um Corpus Não Sistematizado. A escolha desses verbos está relacionada ao fato de que os sentidos, principalmente aqueles que se localizam na cabeça/face (visão, audição, paladar) constituem sistemas de percepção básicos para o ser humano, por isso, é de se esperar que sejam fornecedores de esquemas e imagens para a formação de conceitos e o desempenho de funções variadas nas línguas. Como resultado, percebeuse que grande parte dos conceitos abstratos formados pelos falantes do Português Brasileiro a partir dos verbos anteriormente citados tem origem nos corpos específicos dos falantes. Verificou-se também que os verbos de percepção assumem tanto a função de verbos plenos quanto funções gramaticais e discursivas. ORALIDADE NA LÍNGUA ESCRITA COMO ESTRATÉGIA DE PRODUÇÃO TEXTUAL: SITUAÇÕES DE USO DO PRONOME PESSOAL DE TRATAMENTO “VOCÊ” Márcia de Souza Luz-Freitas – UNIFEI Estudos diacrônicos apresentam análises das transformações mórficas do pronome pessoal de tratamento você. Estudos sobre referenciação também exploram as mudanças de forma observadas. Poucos deles, entretanto abordam tais transformações considerando-se as práticas sociais de linguagem que as propiciaram. Tem-se, como pressuposto, no estudo que gera esta comunicação, que, para além do campo mórfico e dos processos de referenciação, esse pronome, no português falado (a análise recai sobre o português do Brasil - PB), é marca discursiva conversacional de forte apelo dialógico. Pela observação de situações de uso desse pronome em substituição ao que, a Gramática Normativa caracteriza como indeterminação do sujeito, é possível afirmar que há um processo de gramaticalização do vocábulo, por meio de recategorização, decorrente dos mecanismos interacionais da língua falada. Dessa forma, a fundamentação teórica que norteia a discussão assenta-se em uma perspectiva sociointeracionista, reunindo estudos sobre gramaticalização e oralidade em textos escritos. Constitui o corpus um artigo de opinião publicado em jornal de larga projeção no cenário brasileiro. Objetiva-se, principalmente, abordar a ocorrência do fenômeno da oralidade na língua escrita como estratégia discursiva de personalização em enunciado aparentemente impessoal, dada a característica peculiar de interlocução instaurada no texto analisado. Diferentemente de outros gêneros textuais marcados pela presença do oral, a expectativa em relação ao gênero textual “artigo de opinião” é que este se construa em conformidade com a norma culta da língua na modalidade escrita. O que se conclui é que, para atender ao propósito discursivo, o autor do texto usa marcas da oralidade somadas ao conteúdo explorado para evidenciar sua intenção de negar a competência de um suposto interlocutor que, ressalta-se, não é o interlocutor esperado como leitor. Assim, pode-se afirmar que aspectos morfossintáticos e semânticos resultantes das relações do continuum estabelecido entre língua falada e língua escrita contribuem para a dimensão discursiva de determinadas práticas sociais de linguagem. 579 580 A MULTIFUNCIONAL IDADE DO ITEM LINGUÍSTICO ONDE NOS TEXTOS JURÍDICOS: UMA ANÁLISE FUNCIONALISTA Tadeu Luciano Siqueira Andrade – UCSAL/UNEB A Linguagem jurídica tem um caráter peculiar, que constitui um dado de toda e qualquer linguagem especial. Analisando o emprego do ONDE me petições, denúncias, despachos, sentenças entre outros textos jurídicos, percebemos uma grande escala dos usos desse item linguístico em tais textos. Trata-se, portanto, de uma análise à luz da gramática funcional, tendo como ponto de partida a noção de uma gramática emergente (Hopper) que a considera sempre em processo de criação e renovação, emergindo das necessitadas discursivas do falante. Sabemos que o uso do ONDE, no português brasileiro, está cada vez mais se distanciando da norma prescritiva, fato que comprova a migração desse advérbio para outras categorias gramaticais, passando por um processo de metaforização e abstratização, conforme verificamos em trabalho de Andrade, (2009), Portela (2001), Oliveira (1997), Coelho (2000) e outros. Considerando que no latim o item linguístico ONDE já apresentava várias funções, investigaremos se tais funções nos usos atuais consistem em uma inovação de formas já existentes ou de um uniformatirismo na perspectiva de Labov, dando-se por intermédio de retomadas de termos já usados no Direito romano, aplicando-os ao direito atual, que teve como fonte o direito romano. Este trabalho está dividido em quatro partes: (i) a etimologia do ONDE no latim e sua mudança para o português (ii) o ONDE nas gramáticas: entre advérbio e pronome; (iii) funcionalismo linguístico: teoria e métodos; (iv) análise do comportamento funcional do onde nos textos jurídicos. Este estudo se fundamenta nos estudos de Neves (1999). Martelotta (2000), Furtado da Cunha (2000) Andrade (2009), Tavares (2008) e adota os pressupostos teóricometodólogicos da linguística funcional. NUNCA VI NÃO: ESTRATÉGIAS DISCURSIVAS DE NEGAÇÃO NA REGIÃO OESTE NA BAHIA. Zoraide Magalhães Felício – UNEB Nesta dissertação, analisamos as estratégias discursivas de negação presentes no falar do oeste baiano, especificamente na cidade de Barreiras. O foco deste trabalho é o estudo do uso do item nunca que se apresenta com uma semântica ainda fora da pauta das análises linguísticas contemporâneas. O objetivo é interpretar o processo de mudança semântica que envolve esse item e também indicar as implicações discursivas desse processo. O quadro teórico foi composto pela associação de postulados do Funcionalismo Linguístico, quais sejam os princípios funcionalistas marcação e iconicidade, a gramaticalização e também a semântica argumentativa. Reforçamos que o foco central e orientador da pesquisa é funcionalista e que a concepção de língua na qual esta se ancora é aquela que prevê sua manipulação pelo falante. Optar por este foco obrigou-nos à concatenação de vários aspectos desta teoria, quais sejam: os princípios de identificação do processo de gramaticalização; princípios subjacentes a esse processo: iconicidade e marcação; e a gênese cognitiva representada pela metáfora e metonímia aliados à teoria multissistêmica da linguagem. Para a realização desta pesquisa, foram analisadas quarenta ocorrências coletadas por meio de observações informais. Após mapear as ocorrências do nunca, observamos as possíveis funções desse item. Os resultados mostraram a multifuncionalidade semântica do item em estudo. Concluímos este trabalho mostrando que o item nunca inicia um processo de mudança, uma vez que migra de uma função gramatical para uma função mais gramatical, ou de um domínio tempo para o domínio da negação e assume no discurso papéis diferenciados de sua função primária. 580 581 A CORRELAÇÃO ENTRE O CONTEXTO DE ORIGEM E O CONTEXTO DE USO DE UNIDADES FRASEOLÓGICAS Maurício Moreira Cardoso – UECE O presente artigo é uma análise que leva em consideração a relação discursiva entre o contexto/significado de origem de unidades fraseológicas e o seu uso atual. À primeira vista parece bastante claro o propósito da aplicação dos conhecimentos até agora obtidos sobre a Fraseologia, no ensino de língua estrangeira. Mas o que dizer do uso dos conhecimentos que se tem sobre fraseologia na formação de habilidades de composição textual e na caracterização do estilo no âmbito da escrita? Neste estudo, procuramos verificar se associação próxima com o contexto/significado de origem de unidades fraseológicas atualmente usadas gera algum efeito discursivo que possa ser considerado em relação à aquele uso de unidades fraseológicas semânticocontextualmente vazias da motivação original. No tocante aos procedimentos metodológicos utilizados no presente trabalho, trabalhamos da seguinte forma. Como primeiro passo fizemos a seleção das bases teóricas que apoiaram as discussões que queremos fazer acerca das hipóteses acima mencionadas. Em um segundo momento, pinçamos algumas unidades fraseológicas constantes em dicionários de fraseologia disponíveis em Língua Portuguesa. Para cada UF (unidade fraseológica), fizemos uma busca em textos digitais utilizando a ferramenta de busca www.google.com.br. Coletamos o texto em que há ocorrência de UFs selecionadas. Como terceira medida, verificamos a origem e a significação da UF para a qual há ocorrência (artigo jornalístico, textos de um modo geral) e procuramos pistas contextuais que evidenciem, ou não, a ligação da UF em uso com seu significado e contexto de origem. Como quarto procedimento, discutimos os dados resultantes – sejam aqueles dados que demonstrem afirmativamente a relação acima mencionada, sejam aqueles que evidenciem a ausência dessa relação. As bases teóricas que selecionamos consistem, fundamentalmente, em Hausmann (1990) e Molina (2007). A análise que fizemos aponta para o fato de que a relação de proximidade semântica – contexto de origem/contexto de uso – gera possibilidades retórico-discursivas consideráveis em relação ao distanciamento semântico da referida relação. O USO DE VOCÊ EM CONTEXTOS DE FORMALIDADE Juliana Batista do Prado – UnB Paulo Ricardo Dias Fernandes – UFG A variação entre as formas pronominais do português do Brasil (PB) tem sido amplamente discutida. É de conhecimento geral a existência de diversas formas de tratamento entre as pessoas nos diferentes contextos de conversação e ainda são frequentes as variações entre pronomes de categorias distintas (pessoal/tratamento) para fazerem referências a uma mesma pessoa do discurso. Segundo Câmara Jr. (1977), o tratamento é “a forma por que se designa o ouvinte numa comunicação oral ou escrita”. O presente trabalho analisa o pronome você em um contexto histórico - desde Vossa Mercê - e formal de interação, a partir de uma sessão em um Tribunal do Júri. Tratase de situação interacional que possui regras relacionadas à hierarquia na interação verbal e, consequentemente, tem suas situações orais caracterizadas por condições específicas que configuram tal modelo. A partir da gravação da sessão e análise dos dados, identifica-se na situação sociodiscursiva os aspectos que motivam a escolha dos interlocutores pela forma você, baseada em definições de conceitos – como pronome, nível de formalidade, polidez, estilo, variação cultural, relação interpessoal dos interactantes, entre outros – de autores como Coupland (2007), Bechara (2009), Cunha e Cintra (2008), Sandig e Selting (1997), Irvine (1978) Loregian-Penkal (2004), Said Ali (1964), Kerbrat-Orecchioni (2006), Tannen (1997), Gumperz (2007), Goodwin e Duranti (1992), Van Dijk (2012). Partindo de uma análise dentro da Sociolinguística Interacional que 581 582 abrange vários tópicos presentes nas interações verbais relacionados aos contextos de formalidade, este trabalho evidencia as razões do uso de você como pronome de tratamento que faz referência à segunda pessoa do discurso. A pesquisa enquadra-se na perspectiva da Sociolinguística Interacional, com contribuições da Pragmática e da Análise de Discurso. Seguiu orientação etnográfica e utilizou também a Análise da Conversação para transcrição de dados. ESTRUTURAÇÃO E FUNCIONALIDADE DE MANCHETES INTERROGATIVAS DE CAPAS DA REVISTA VEJA Neide Domingues da Silva – UFG Nesta pesquisa, investigaram-se a estruturação e funcionalidade do gênero discursivo Manchete de Capa da Revista Veja (MCRV), mais especificamente das manchetes constituídas a partir de uma forma interrogativa. Para isso, recorreu-se à Gramática Funcional, com base, principalmente, em Dik (1997), Halliday e Matthiessen (2004), Neves (1997, 2000, 2002, 2006, 2010), Borba (1991, 1996) e Perini (2008). A partir do Funcionalismo, a gramática está a serviço de gêneros, os quais servem às necessidades humanas de interação. Assim, pressupõe-se uma confluência entre fatores sintáticos, semânticos e pragmáticos na composição de uma MCRV. Consideram-se as especificidades desse gênero a partir da relevância das informações pragmáticas de um leitor presumido, que interferem na seleção e ordenação de constituintes pelo redator. O corpus de pesquisa corresponde a 2233 manchetes de capa publicadas entre 11 de setembro de 1968 e 7 de setembro de 2011 pela Revista Veja. Foram selecionadas 205 MCRV a partir do uso de formas interrogativas, dentre elas, como, por que, o que, quem, categorizadas por Dik (1997a, p. 328) como open forms (formas aberta). As manchetes analisadas foram coletadas em ambiente virtual a partir das edições da revista digitalizadas e disponibizadas em página específica pela Editora Abril. Do ponto de vista ilocucionário, verificou-se que, apesar do uso de formas interrogativas, ocorreu a ilocução declarativa, em que não se usa o ponto de interrogação, em 90% (184/205) das manchetes analisadas. Essa recorrência sugere que, em MCRV, predomina a força ilocucionária assertiva por meio da qual se pretende afirmar, asseverar. Verifica-se a funcionalidade dessas formas interrogativas no “contexto de situação” (HALLDAY, 1978, p.143, apud NEVES, 2010, p.78) midiática, considerando-se que são usadas por um redator que acumula os papéis discursivos de perguntante e respondente. Em outras palavras, essas perguntas são pseudoperguntas, pois o redator não espera uma resposta por parte do leitor. Na verdade, o redator presume uma pergunta do leitor e a materializa em forma de MCRV. Desse modo, nesta pesquisa, comprova-se que a organização sintática, semântica, bem como, a instauração de forças ilocucionárias vinculam-se, sobretudo, a fatores discursivos e cooperam para a produção de sentidos. MARCADORES DISCURSIVOS DERIVADOS DOS VERBOS “OLHAR” E “VER” – UMA ASSOCIAÇÃO ENTRE AS ABORDAGENS DA SOCIOLINGUÍSTICA VARIACIONISTA E DA GRAMATICALIZAÇÃO DE CONSTRUÇÕES Lauriê Ferreira Martins (UFJF) O presente trabalho tem como objeto de estudo os marcadores discursivos (doravante, MDs) derivados dos verbos de percepção visual “olhar” e “ver”, que, em sua configuração construcional, apresentem a forma imperativa. Dessa forma, nos baseamos nos pressupostos da Sociolinguística Variacionista (LABOV, 2009 [1972]; WEINREICH, LABOV & HERZOG, 2006 [1968]) e da 582 583 gramaticalização de construções (TRAUGOTT, 2003, 2008a, 2008b, 2009, 2012). Para tanto, partimos de estudos anteriores de Rost Snichelotto (2004, 2009, 2011) acerca do funcionamento dos MDs olha e vê em corpora do projeto VARSUL/SC e em textos de peças teatrais escritos entre os séculos XIX e XX por escritores catarinenses. Com a análise variacionista, objetivamos identificar o domínio funcional em que os MDs derivados dos verbos “olhar” e “ver” funcionam como variantes, identificar quais fatores condicionam o uso de uma ou outra variante e, portanto, descrever e analisar seus contextos de uso. No que tange à gramaticalização, nossos objetivos são descrever os usos sincrônicos dos MDs derivados dos verbos de percepção visual “olhar” e “ver”, verificar se há regularidade entre as micro-construções, entender por que a forma imperativa integra a configuração destes MDs e confirmar se é possível falarmos em macro-construções entre os MDs analisados. A hipótese é de que os novos MDs, ao serem gramaticalizados na língua, se tornariam [+ intersubjetivos] (FINEGAN, 1995; TRAUGOTT, 1995, 2010; TRAUGOTT & DASHER, 2005; CUYCKENS et al., 2010). Acreditamos, ainda, que o processo de (inter)subjetivização estaria vinculado ao surgimento de possíveis padrões construcionais (TRAUGOTT, 2003, 2008a, 2008b, 2009, 2012). Ainda, partimos da hipótese de que uma análise quantitativa, pautada nos pressupostos da Sociolinguística Variacionista, pode contribuir substancialmente para a definição dos padrões construcionais a partir dos quais se estabelecem os MDs sob análise. Realizamos, portanto, uma abordagem sincrônica a partir de amostras do português falado contidas em dois corpora distintos: o corpus do “Projeto Mineirês: a construção de um dialeto” e o corpus do projeto “PEUL – Programa de Estudos sobre o Uso da Língua”. Os resultados apontam que: (a) o domínio funcional em que os MDs atuam como variantes é o da chamada de atenção do ouvinte; (b) os MDs derivados do verbo de percepção visual “olhar” estão em um processo mais avançado de gramaticalização, se comparados aos MDs derivados do verbo “ver”; (c) há uma tendência à fixação dos marcadores na segunda pessoa do discurso e no modo indicativo dos verbos; (d) os MDs derivados do verbo “olhar” tendem a ocorrer com mais frequência em contextos sintaticamente independentes, enquanto os MDs derivados do verbo “ver” tendem a ocorrer com mais frequência em contextos sintaticamente dependentes; (e) os contextos de “pausa posterior” são os mais favorecedores da ocorrência tanto dos marcadores derivados do verbo “olhar” quanto dos derivados do verbo “ver”; (f) a “forma simples” é o contexto preferencial para a ocorrência dos MDs derivados de “olhar”, enquanto os MDs derivados de “ver” realizam-se de maneira equilibrada tanto em contexto de “forma simples” quanto em contexto de “forma composta”; (g) as presenças dos pronomes “tu” e “você” constituem-se como contextos categóricos para a ocorrência de MDs derivados do verbo “ver”, enquanto a presença de vocativo favorece, em maior medida, a ocorrência de marcadores derivados do verbo “olhar”, em comparação aos do verbo “ver”; (h) no Estado do Rio de Janeiro, há a ocorrência mais frequente dos MDs derivados de “olhar”, enquanto os MDs derivados de “ver” têm a mesma frequência de uso nos dois Estados analisados. O MODIFICADOR TEMPORAL DO ESTADO-DE-COISAS: UMA ANÁLISE DO TEMPO RELATIVO SOB A PERSPECTIVA DA GDF Ana Paula de Oliveira – UNESP Este estudo se propõe a investigar, na lusofonia, o modificador temporal, constituído de um sintagma adverbial ou preposicional, sob a perspectiva da Gramática Discursivo-Funcional (Hengeveld & Mackenzie 2006, 2008), um novo modelo de gramática, de orientação funcionalista Segundo Hengeveld (2008), cada unidade linguística consiste de uma parte obrigatória, o núcleo, e outra opcional, o modificador, denominado satélites na GF de Simon Dik (1989). Em termos gerais, modificador é um item lexical que traz informação adicional a algum núcleo, por isso sua retirada não prejudica a informação essencial. O modificador se distribui nas diversas camadas que 583 584 compõem os níveis Interpessoal e Representacional, postulados pela GDF. Sua posição é geralmente determinada por relações semânticas de escopo, de acordo com as especificidades de cada camada, tendo posições fixas, que, contudo, podem ser modificadas por motivações pragmáticas, semânticas ou estruturais, nos níveis Interpessoal, Representacional ou Morfossintático, respectivamente. De acordo com Hengeveld & Mackenzie (2008), para designar categorias temporais, as línguas dispõem de expressões específicas. Algumas dessas expressões têm como referência o momento da fala, outras estabelecem posições relativas em uma linha do tempo, enquanto outras se relacionam com um calendário socialmente estabelecido. Algumas expressões temporais podem ainda identificar um ponto específico na linha do tempo, enquanto outras indicam um período. O objetivo deste estudo é verificar as propriedades pragmática, semânticas, morfossintáticas e fonológicas do modificador temporal, constituído de um sintagma (adverbial ou preposicional), cuja função é localizar temporalmente o estado-de-coisas. Para isso, são utilizadas ocorrências reais de uso extraídas do corpus “Português oral”, organizado pelo Centro de Linguística da Universidade de Lisboa, em parceria com a Universidade de Toulouse-le-Mirail e a Universidade de Provença-Aix-Marselha, o qual contempla amostragens de variedades do português falado em Portugal, no Brasil, nos países africanos de língua oficial portuguesa e em Macau. Este trabalho restringir-se-á aos modificadores do Estados-de-Coisas, que marcam o tempo relativo. Como parâmetros de análise incluem-se: (i) a camada em que se encontram modificador e núcleo, (ii) a natureza da relação temporal, ou seja, anterioridade, posterioridade ou simultaneidade; (iii) a preposição que introduz o sintagma preposicional; (iv) a posição ocupada pelo modificador na oração que modifica; (v) quebra entonacional entre núcleo e modificador, como pausas - breves ou longas, preenchidas ou não - e mudança na tessitura. Os resultados alcançados até o presente momento indicam que, quanto à posição, os modificadores situam-se, predominante, antes do verbo da oração em que estão inseridos. Além disso, grande parte das ocorrências levantadas é introduzida por preposição, sendo a mais comum dentre elas a preposição “em” - e combinações. Nota-se ainda a presença grande variação quanto ao tipo de relação expressa, que pode ser anterior, simultâneo ou posterior, ao contrário do que se têm com as orações, que predominantemente apresentam tempo simultâneo. 584 585 SIMPÓSIO 55 TRANSPOSIÇÃO DIDÁTICA: TÓPICOS DE LINGUÍSTICA TEÓRICA E ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA O presente simpósio tem como principal objetivo reunir pesquisadores preocupados com a transposição didática e o ensino de Língua Portuguesa, ou seja, de que maneira podem ser repensados os conhecimentos teóricos advindos de diferentes paradigmas sobre língua e literatura e a sua relação com o ensino. A necessidade de diálogo mútuo entre teoria e aplicação faz-se presente a partir das constatações dessa dialética como atividade fundamental para a construção epistemológica. Embora seja condição sinequa non para a construção do conhecimento, questões importantes têm sindo negligenciadas nas academias, sinalizando um distanciamento entre teoria e prática, entre pesquisa e aplicação, entre universidade e escola. Partindo desse pressuposto, a ideia é trazer essas questões para o âmbito acadêmico e discutir propostas de ensino que viabilizem o diálogo teoria-prática, buscando entender os entraves, os riscos e as possibilidades de pensar o conhecimento sobre a língua e a literatura em sala de aula. Essa preocupação também se soma ao que já vem sendo proposto em documentos oficiais como PCNS e OCEMS. Refletir sobre essas questões e apresentar as vantagens de propostas de ensino que considerem as contribuições da Linguística Teórica ao ensino de Língua Portuguesa é a pretensão maior deste simpósio. COORDENAÇÃO Mirian Santos de Cerqueira Universidade Federal de Goiás [email protected] Israel Elias Trindade Universidade Federal de Goiás [email protected] 585 586 ESTRATÉGIAS DE PREENCHIMENTO DA POSIÇÃO OBJETO: GRAMÁTICA DA FALA VERSUS “GRAMÁTICA” DA ESCRITA Cláudia Roberta Tavares Silva – UFRPE Telma Moreira Vianna Magalhães – UFAL Pesquisas linguísticas têm chamado a atenção para as diferenças entre a gramática da fala e a “gramática” da escrita no Brasil (Kato, 2005; Magalhães, 1999, 2000; Corrêa, 1991; Amorim & Magalhães, 2007; Costa & Magalhães, 2008). Tarallo (1996, p. 70) observa que “[o] perfil da nossa gramática brasileira (no sentido da gramática normativa) tem sido ditado pela tradição portuguesa e só esse fato torna o vácuo entre língua oral e escrita muito mais profundo no Brasil do que em Portugal”. É fato ainda que a gramática do português brasileiro (PB) vem passando por um processo de reorganização (Galves, 2001), o que nos leva a discutirmos aspectos da sintaxe dessa gramática em dados de fala e de escrita, buscando verificar, até que ponto, a “gramática” da escrita distanciase da gramática da fala. Para tanto, centraremos nossa atenção nas estratégias de preenchimento da posição objeto, em específico, do objeto direto, a saber: sintagma nominal (ex.: Eu já encontrei o professor.), objeto nulo (ex.: Eu já encontrei ___.), clítico (Eu já o encontrei.) e pronome lexical (ex.: Eu já encontrei ele.), tomando por base o que estudos realizados sobre a temática têm verificado, não perdendo de vista as possíveis contribuições desses estudos para o ensino de língua portuguesa. Durante a análise, será adotado o quadro teórico da gramática gerativa (Chomsky, 1981, 1986 e seguintes), tomando por base as seguintes questões norteadoras apresentadas em Magalhães (2000): a) o que a criança traz de sua gramática internalizada para a escola?; b) a escola consegue reverter as inovações apresentadas pela gramática do PB com o processo de mudança? e c) como os itens gramaticais se desenvolvem durante a escolarização, isto é, eles apresentam as mesmas restrições encontradas na fala e na intuição do falante adulto? Sobre o uso do clítico acusativo, tem-se observado que o processo de escolarização exerce um papel na recuperação e manutenção dos clíticos no PB (cf. Corrêa, 1991; Amorim & Magalhães, 2007): nas séries iniciais, assim como ocorre na fala, os clíticos acusativos ocorrem de maneira inexpressiva, havendo uma ascensão de seu uso nas séries finais. Em suma, esperamos promover, através da reflexão teórica, o aprofundamento do conhecimento da sintaxe do PB no que se refere ao preenchimento da posição objeto, fundamentando-nos no pressuposto de que essa reflexão é “prévia à acção e dirigida para a acção.” (Fonseca, 2001, p. 24). PRODUÇÃO TEXTUAL EM SALA DE AULA: INTERVENÇÃO A PARTIR DE SITUAÇÃO-PROBLEMA Israel Elias Trindade – FL/UFG O trabalho com textos nas aulas de português tem sido um desafio aos educadores da educação básica. Essa dificuldade foi diagnosticada durante dois anos de observação com alunos do estágio do português da FL/UFG que, ao ingressarem na prática docente, não se reconheciam como preparados para o cumprimento dessa tarefa. Nossas observações revelaram ainda que essa realidade não é diferente das dos demais educadores das escolas-campo, alguns deles, inclusive, supervisores dos trabalhos desses estagiários. As causas de tal problemática podem ser inúmeras, mas certamente, as dificuldades de acesso dos educadores às publicações sobre o assunto e os poucos momentos destinados à formação e à capacitação dos professores na lida com o texto em sala de aula têm sido as principais para a pouca eficiência dessa prática. O resultado disso é o fortalecimento da tradição de um trabalho textual descontextualizado e desvinculado dos estudos gramaticais. Nos últimos dois anos (2011 e 2012), durante as atividades de estágio da FL/UFG, desenvolvemos um projeto de pesquisa-ação cuja proposta foi a aplicação de estratégias diversificadas de trabalho com textos em sala de aula de escolas pública da cidade de Goiânia-GO, 586 587 com vistas na constituição de subsídios ao ensino com textos na educação básica. O suporte teórico que subsidiou a pesquisa-ação foi da análise linguística (Geraldi, 1984). Os dados obtidos da prática foram analisados pelos alunos de estágio da FL/UFG, sob nossa supervisão. Os resultados do trabalho, em linhas gerais, confirmam a necessidade de se propor atividades com textos que partem de situações-problema e apresente propostas concretas de intervenção, pois é uma das formas mais eficientes de significar/ressignificar a prática textual. A produção do texto, nessa proposta, deve emergir de uma necessidade pragmática e a gramática, por sua vez, deve cumprir o papel essencial para que tal objetivo seja atingido. Dessa forma, percebe-se que o exercício do texto é, por natureza, uma atividade que rompe os limites disciplinares, pois envolve, necessariamente, a aplicação de conhecimentos diversificados. O papel do professor de português, portanto, é o de colaborar para que o aluno estabeleça diálogos entre conhecimentos das disciplinas, com o fito de resolução de situações-problema de seu cotidiano. O presente trabalho, portanto, se constitui na apresentação dos dados obtidos nessa pesquisa e na discussão dos mesmos, com vistas em contribuir, em linhas gerais, com sugestões e orientações à prática do texto em sala de aula, em turmas de língua portuguesa da educação básica. GRAMÁTICA DO PORTUGUÊS BRASILEIRO: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES A PARTIR DE TEXTOS ESCRITOS DE ALUNOS GOIANIENSES Mirian Santos de Cerqueira – FL/UFG O presente estudo tem como principais objetivos descrever e analisar alguns fenômenos encontrados no Português Brasileiro (tais como concordância nominal e verbal, o (des)uso do clítico se, topicalização, estratégias de relativização, dentre outros), tomando como ponto de partida dados de escrita encontrados em textos de alunos goianienses. A ideia é tentar compreender se a gramática dos falantes mencionados aproxima-se da gramática ensinada na escola ou da gramática adquirida no processo natural de aquisição. Esse estudo segue as propostas de autores como Kato (2005), Magalhães (2006; 2008) e Silva (2011), uma vez que tais estudos postulam a existência de uma gramática da fala com propriedades distintas da gramática da escrita. Além disso, o presente estudo segue a mesma trilha dos trabalhos já mencionados ao lançar mão dos pressupostos teóricos do Programa de Investigação da Gramática Gerativa (CHOMSKY, 1986 e obras seguintes). Como metodologia, foram coletados textos escritos argumentativos produzidos por alunos do Curso de Letras da UFG, campus de Goiânia, Goiás. Os resultados preliminares confirmam a hipótese de estar havendo um distanciamento entre o conhecimento linguístico que o falante adquiriu no processo inicial de aquisição de sua língua materna e o conhecimento formal das regras da modalidade escrita da língua via gramática normativa pelas escolas, levando a confirmar, de algum modo, os estudos já mencionados, segundo os quais o Português Brasileiro falado não coincide com aquilo que é ensinado nas escolas brasileiras, razão pela qual os alunos o "interpretam" como uma segunda língua (cf. KATO, op. cit.). Além disso, os dados ratificam, também, a hipótese de que o Português Brasileiro tem se distanciado cada vez mais do Português Europeu. A partir dos resultados do presente estudo, pretendemos refletir sobre estratégias de ensino e aprendizagem de língua portuguesa nas escolas brasileiras, de modo a repensar as atividades didáticas em torno de conceitos como sujeito gramatical, tópico, concordância, dentre outros. 587 588 DISCURSOS SOBRE O TEXTO: MATERIALIDADES NO LIVRO DIDÁTICO DE LÍNGUA PORTUGUESA Juliene da Silva Barro-Gomes – UFRPE/UAG A produção acadêmica realizada nas duas ultimas décadas sobre o conceito de texto mostra uma grande evolução. Do discurso mais estruturalista, que concebia o texto como um nível de análise maior que a frase, objeto muitas vezes do escrutínio meramente gramatical, passou-se ao conceito de texto como unidade mínima de comunicação e interação, cujo foco era centrado na perspectiva das relações entre os elementos do texto e entre estes e fatores de ordem extralinguística, tendo-se na atualidade conceituações de texto como correlato teórico de manifestações concretas chamadas gêneros discursivos, texto como hipertexto, superfície material de um conjunto de conexões realizadas numa memória discursiva, de forma real ou virtual, além da noção muita vezes incompreendida de texto como discurso. Essas diferentes enunciações, que não resumem todos os conceitos de texto que circulam atualmente, mostram, ora uma perspectiva mais centrada na ideia de forma, ora uma perspectiva mais centrada no funcionamento, ora uma perspectiva mista, evidenciando a confluência ou a convivência de muitas e diversas linhas conceituais. Do contexto plural e por natureza polemico da teoria, esses conceitos migram, às vezes sem lembranças de seus paradigmas definidores, para o ambiente aparentemente pacífico e sem polêmica das didáticas escolares. E aí se verifica a materialização de diferentes discursos sobre o texto. As páginas dos livros didáticos de língua portuguesa são exemplares privilegiados desta apropriação de conceitos teóricos da linguística para o contexto de ensino. Neste trabalho, interessa-nos a análise de como diferentes discursos sobre o texto se materializam nas páginas do livro didático, tornando-o uma encruzilhada interdiscursiva, de pouca clareza e explicitude para professores e alunos. Longe de evidenciarem uma adequada transposição didática dos conteúdos da linguística, os livros são, por vezes, meramente panfletários de novas ideologias que atendem mais à logica do mercado e menos aos interesses da aprendizagem dos alunos. Faremos a análise de páginas de livros didáticos do ensino fundamental de diferentes editoras e coleções, buscando explicitar, a partir dos fragmentos textuais materializados, a diversidade de discursos sobre o conceito de texto e analisar em que medida esse jogo de vozes e posições, muitas vezes desenraizadas da memória que os sustem, auxiliam de fato na compreensão do conceito de texto, seus modos de funcionamento, e as possibilidades didáticas para o ensino de línguas a partir de tal conceito. Tomaremos como autores de base para nossa análise BARROS (2007), BITTENCOURT (2004), CHOPIN (2004), KOCH (2007),COSCARELLI (2009) e POSSENTI (2008). Dessa forma, buscaremos colaborar com a reflexão teórica sobre a transposição didática dos conteúdos de linguística para o contexto de ensino de língua portuguesa. AS TEORIAS LINGUÍSTICAS E O VESTIBULAR DA UFG Erislane Rodrigues Ribeiro – CAC/UFG Os estudos linguísticos avançaram sobremaneira quando se passaram a definir melhor as teorias e as metodologias para o estudo de seus objetos. Tais avanços podem ser observados tanto em publicações como em apresentações de pesquisas em eventos científicos concernentes às variadas disciplinas da Linguística. Entretanto, não é apenas nos livros especializados e em eventos científicos que se pode avaliar o desenvolvimento das teorias linguísticas. Os livros didáticos de Português e certos documentos institucionais, por exemplo, são um rico material cuja análise pode revelar bastante acerca da história e da repercussão dos estudos linguísticos no Brasil. Deste modo, o objetivo principal neste trabalho é investigar como algumas das contribuições de diversas disciplinas da Linguística influenciaram o que tem sido proposto para as provas de Língua portuguesa do vestibular da UFG ao longo do tempo e por que razões certas tendências teóricas da 588 589 linguística sobressaíram em dados momentos sócio-históricos. Para tal, são analisados, sob a ótica de pesquisadores tais como Mendonça (2006), Soares (2002) e Gregolin (2007), manuais do candidato da UFG publicados entre os anos de 1975 e 2011. Adotou-se uma metodologia em que foram agrupados manuais por períodos sócio-históricos, pois em tais períodos não se observam mudanças significativas com relação às teorias linguísticas que os subsidiam. O PAPEL DO PROFESSOR DE LETRAS NA TRANSPOSIÇÃO DIDÁTICA DOS SABERES ACADÊMICOS COMO SABERES ESCOLARES Lezinete Regina Lemes – UFMT A presente comunicação tem como objetivo apresentar propostas de trabalho realizadas na disciplina Linguística I no curso de Letras da Universidade Federal de Mato Grosso. É sabido que muitos acadêmicos questionam certas teorias e sua aplicação em sala de aula, por não compreenderem como os saberes acadêmicos são operacionalizados nas aulas de Língua Portuguesa na Educação Básica. Além disso, os documentos parametrizadores — Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa e as Orientações Curriculares do Ensino Médio — orientam que a prática do professor deve ser sociossituada, buscando um ensino de língua alicerçado na concepção de linguagem como interação social. Tais orientações nos levam a refletir sobre o papel do professor de Letras na difusão das contribuições das teorias linguísticas no ensino-aprendizagem de língua materna e suas convergências e divergências. Essa prática docente é desafiador, pois o profissional de Letras precisa saber compreender e aplicar essas teorias no ensino, considerando as diferentes perspectivas teóricas e seu espaço na esfera acadêmica e escolar. Trata-se de uma prática, ainda, incipiente no curso de Letras, pois levar os alunos a refletirem sobre os processos de transposição didática e didatização dos saberes acadêmicos como objetos de ensino de uma forma prática, é romper com certas posturas teórico-metodológicas presentes no ensino superior. Considerando esse fato, esta comunicação visa apresentar propostas iniciais em que se busca estudar o processo de transposição didática e didatização de conceitos advindos da Fonética e Fonologia em manuais didáticos de Língua Portuguesa do Ensino Médio. Pensou-se em um estudo direcionado, em que os acadêmicos foram levados, num primeiro momento, a estudarem a base teórica dessas duas correntes da linguística teórica, para em seguida, analisarem os livros didáticos. Verificar o tratamento didático dado pelos autores nos livros é permitir que os futuros professores vejam na prática como as bases teóricas são operacionalizadas, neste caso, os saberes acadêmicos como saberes escolares e também levá-los a compreenderem os diferentes fenômenos linguísticos a que tiverem acesso durante sua atuação como professor de língua portuguesa. MULTIPLICIDADE E COERÊNCIA DE CRITÉRIOS EM RELAÇÃO ÀS CLASSES DE PALAVRAS DO PORTUGUÊS BRASILEIRO Paulo Ricardo Dias Fernandes – UFG Alcir Horácio da Silva – UFG O estudo das classes de palavras está presente desde as primeiras séries da vida escolar e continua sendo o assunto principal, ou dos mais estudados, nas aulas de Português, tanto no ensino fundamental como no ensino médio. A partir de consultas a programas escolares e a livros didáticos, nota-se que, muitas vezes, o estudo das classes se restringe a um conhecimento da nomenclatura apenas. As gramáticas normativas de língua portuguesa trazem uma razoável quantidade de definições para distinguir as classes gramaticais hoje reconhecidas, poder analisar em quais pressupostos esses autores se fundamentam ao expor sua definição para determinada classe de palavras é demonstrar formação e conhecimento alicerçado em pressupostos linguísticos. Quando se 589 590 sabe o porquê de tal definição referente a uma categoria de palavras, reforça-se o pensamento analítico, comparativo, contestador com relação às demais, para assim melhor reconhecê-las ou distingui-las. A proposta para estudo consistiu na análise do conhecimento apresentado por alunos da segunda fase do Ensino Fundamental sobre os diferentes conceitos que podem ser identificados em cada classe de palavras reconhecidas pela Norma Gramatical Brasileira (NGB), bem como a multiplicidade de critérios que os levaram à elaboração dessas definições, tal análise foi realizada através de questionários aplicados a alunos da segunda fase do Ensino Fundamental do município de Anápolis, interior de Goiás. O linguista Joaquim Mattoso Câmara Junior em sua obra Estrutura da Língua Portuguesa, publicada pela primeira vez em 1970, material fundamental para a execução da pesquisa, aponta a utilização de três critérios: semântico, morfológico e funcional, para a elaboração do conceito de uma classe de palavras; todos os três critérios apontados pelo autor são bem elucidados e discutidos pelo trabalho, juntamente com uma prévia apresentação de questões como o conceito de gramática e a organização das classes gramaticais. O que se observou após a coleta dos dados (definições das classes de palavras apresentadas pelos alunos no questionário) foram respostas incoerentes, que não contemplavam todos os critérios de classificação propostos pelo linguista, com grande incidência do critério semântico (baseado no universo biossocial que se incorpora na língua), casos de critério morfológico (referente às propriedades gramaticais que a palavra pode apresentar) e escassez de critério morfológico (papel que a palavra desempenha em uma sentença). Nesse contexto, a pesquisa que não procurou esgotar o tema serve como um suporte a professores, em especial os de língua portuguesa, visto que toda ciência trabalha com objetos empíricos ou teóricos e, para tornar o trabalho de investigação mais racional, esses objetos são agrupados em categorias, classes, tipos, gêneros, espécies etc. Para um leigo, uma pedra é apenas uma pedra, mas para um geólogo cada pedra é um desafio científico, é um objeto que exige uma apreensão racional, uma categorização que se fará segundo princípios e critérios estabelecidos pelo acúmulo de conhecimento de sua área de estudo. O mesmo vale para as categorias gramaticais. É uma ilusão, muito prejudicial à pedagogia de língua, acreditar que as classes de palavras que aparecem nos compêndios normativos correspondem a uma verdade nítida e definitiva sobre o funcionamento da língua. É realmente necessário o domínio pelo professor dos critérios que podem ser identificados nas classificações de palavras da língua portuguesa a fim de, durante seu exercício profissional, ressaltar com seus alunos as distinções e semelhanças entre as palavras justificando a organização delas em determinada classe. O ENSINO DE CONCEITOS NA LÍNGUA PORTUGUESA: UMA EXPERIÊNCIA COM PROFESSORES DO II CICLO. Gilves Furtado de Queiroz – CEFAPRO Nesta comunicação, pretende-se apresentar os resultados da pesquisa O ensino de conceitos na Língua portuguesa: uma experiência com professores do II Ciclo que será realizada com os professores da rede pública estadual de Barra do Garças – MT que atuam no II Ciclo do ensino fundamental. Trabalhando com a formação continuada dos pedagogos fez com que se levantasse alguns questionamentos: como o professor trabalha a leitura, a interpretação, a gramática e a produção textual? Como ensinar os conceitos básicos de Língua Portuguesa se o professor ainda carece de construí-los? É preciso ensinar esses conceitos nos II Ciclos? O que os professores entendem por Texto, Discurso e Gêneros Textuais? Como trabalhar com o professor para que ensine por meio de conceitos? Os professores acreditam que é possível desenvolver a competência discursiva do estudante a partir da apropriação de conceitos? O problema de pesquisa que consiste em: A teoria histórico-cultural pode contribuir, na formação continuada, para que os professores pedagogos que atuam no II ciclo do ensino fundamental da rede estadual de Barra do Garças se apropriem, de forma teórica, dos conceitos de Texto, Gêneros do Discurso e Gêneros Textuais? A intenção é realizar um experimento didático, em uma perspectiva 590 591 dialética, em que os professores desenvolverão uma sequência de ações, coletivas e individuais, que possibilitam a formação de conceitos, ascendendo do pensamento empírico ao pensamento teórico. A hipótese é que os professores do ensino fundamental carecem de uma formação que garanta o ensino dos conceitos essenciais da Língua Portuguesa. Talvez essa carência seja devido a uma formação acadêmica que deixou de contemplar em seus currículos um aprofundamento dos conceitos, não somente em Língua Portuguesa, mas nas diferentes áreas do conhecimento escolar. A formação será realizada nas dependências do Centro de Formação e atualização dos profissionais da educação Básica- CEFAPRO, em um curso de formação continuada de 50 (quarenta) horas, sendo 40 horas presenciais e 10 horas à distância. Os encontros serão semanais, de março a junho de 2013. O Objetivo geral é compreender se a teoria histórico-cultural contribui para que os professores pedagogos que atuam no II ciclo do ensino fundamental se apropriem, de forma teórica, dos conceitos de Texto, Gêneros do Discurso e Gêneros Textuais. E os Objetivos específicos são: investigar os conhecimentos dos professores em relação aos conceitos de Língua, Texto, Gêneros do Discurso e Gêneros Textuais; acompanhar o processo de apropriação dos conceitos pelos professores, de acordo com a organização didática estabelecida; avaliar a construção dos conceitos pelos professores. Far-se-á uso da metodologia qualitativa e de diferentes procedimentos, tais como: a observação (por meio da descrição e reflexão), a entrevista semi-estruturada e a análise da produção dos participantes que permitirão avaliar a organização do ensino e a apropriação dos conceitos por parte dos pedagogos que atuam no II Ciclo da rede estadual de ensino. REFLEXÕES SOBRE FORMAÇÃO DOCENTE: OS LETRAMENTOS DO PROFESSOR Renata Silva Siqueira – UFMT Objetiva-se com este trabalho, realizar uma reflexão sobre as questões que cercam o ensino de língua materna, focando o nosso olhar a quem consideramos um personagem importante nesse percurso, o professor. A formação docente é cada vez mais criticada, tanto inicial quanto continuada, com um viés de reprovação e de fracasso no que concerne à relação teoria e práticas pedagógicas. Desde o advento dos PCN (1998) e até antes (Geraldi, 1984; Soares, 1986), estudiosos observam que se requer uma mudança paradigmática no ensino de língua materna que possibilitaria estratégicas renovadas de leitura e produção textual, considerando o importante envolvimento interacional de ensino-aprendizagem em que o aluno e o educador estão inseridos. Nesse contexto, identificamos que a relação de leitura/escrita está além da decodificação e que é necessário um aperfeiçoamento na prática de leitura/escrita do professor, é preciso um olhar mais amplo, para os letramentos desse sujeito em formação e este, por sua vez, mediante as situações concretas de enunciados em diferentes cenários no seu cotidiano, precisa exercitar a criticidade e autonomia na negociação de sentido de suas leituras. Não podemos também deixar de observar que o professor, formador de opiniões ou pelo menos um dos sujeitos que deveria ser facilitador desse processo da mudança para o aluno, também sofre com suas dificuldades e limitações, como leitor e escritor proficiente. No nosso projeto de pesquisa, analisaremos os resultados de uma oficina de formação continuada para professores da rede pública, cujo objetivo primordial é auxiliá-los nesse trajeto do ‘‘repensar’’ suas vivências de leitura/escrita, de contextualizar sua prática no ambiente escolar. Assim, buscaremos identificar - O que foi relevante no processo de formação continuada? Quais limitações e possibilidades em relação à leitura e escrita foram observadas/descritas? O que da formação continuada, através de um processo de reflexão, está sendo colocado em prática, no dia a dia da sala de aula? Quais ações transformadoras da prática escolar apontam para o protagonismo do professor? Diante das respostas, podemos imaginar que mudanças não seriam possíveis se o professor não gostasse efetivamente do que faz, e que o comprometimento dele mesmo com o outro, o aluno, são tão fundamentais quanto os conhecimentos teóricos. Enfim, para a realização deste trabalho nossos alicerces teóricos se inscrevem nos estudos bakhtinianos sobre a linguagem e na teoria sócio- histórica de aprendizagem de Vygotsky. Essa investigação está inserida no projeto 591 592 de pesquisa “Relendo Bakhtin: contribuições do Círculo de Bakhtin para uma análise dialógica de discursos produzidos em diferentes esferas da atividade humana”, desenvolvida pelo Grupo de pesquisa RELENDO BAKHTIN (REBAK), do Programa de Pós-graduação em Estudos de Linguagem, da Universidade Federal de Mato Grosso. FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES, TEORIA E PRÁTICA Maria Rosalina Alves Arantes – SEDUC/MT Marilza Jiacomini Rubinho Vaz – SEFAPRO/SEDUC Este artigo objetiva em trazer reflexões sobre a formação continuada de professores, vinculada ao Programa da Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro, no ano de 2012, na cidade de Pontes e Lacerda, Mato Grosso. Desse modo faremos uma descrição da estruturação do projeto de formação continuada e de como ocorreu na prática, uma reflexão histórica sobre o Programa e da fundamentação teórica da formação continuada, da sequência didática proposta nas oficinas para o desenvolvimento da leitura e escrita e algumas considerações. A formação continuada de professores é de grande importância para educação, uma vez que no mundo globalizado vivenciamos constantes mudanças e a sociedade contemporânea exige a quebra de paradigmas do ensino e aprendizagem. Nesse contexto, a referida formação continuada, visou mediar, fomentar e fortalecer por meio de reflexões teóricas e práticas o trabalho de leitura e escrita do professor de língua portuguesa, não estamos aqui defendendo a adoção da sequência didática proposta pelos cadernos do professor do Programa Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro, mas, sim, propomos refletir as possibilidades de uso da mesma, na busca da melhoria da aprendizagem significativa no trabalho com a leitura e produção textual. OBSERVATÓRIO DE EDUCAÇÃO: POSSIBILIDADES INTERDISCIPLINARES E PRÁTICAS CULTURALMENTE SENSÍVEIS NO ENSINO EM CONTEXTO DE FRONTEIRA Maria Elena Pires Santos – UNIOESTE Mariangela Garcia Lunardelli – UNIOESTE O objetivo desta comunicação é apresentar alguns resultados das atividades desenvolvidas pelos participantes do Projeto Observatório de Educação – Núcleo de Pesquisa/Extensão: Formação Continuada em Leitura, Escrita e Oralidade – financiado pela CAPES/INEP e desenvolvido em parceria entre o Mestrado Interdisciplinar em Sociedade, Cultura e Fronteiras e o Curso de Letras, ambos da UNIOESTE – campus de Foz do Iguaçu, o Núcleo Regional de Educação de Foz do Iguaçu/SEED e o Colégio Estadual Ipê Roxo. A finalidade desse projeto é a constituição de um Núcleo de Pesquisa/Extensão que fomente cursos de formação continuada em leitura, escrita e oralidade para professores dos ensinos Fundamental e Médio das escolas públicas e que fomente também a pesquisa e a formação de pesquisadores em nível de graduação e pós-graduação, principalmente em cenários plurilíngues/pluriculturais de fronteira, como se caracteriza a região oeste do Paraná. Dando suporte ao desenvolvimento do projeto, são centrais os conceitos de linguagem, leitura, escrita e gêneros do discurso. Para atingir aos objetivos do projeto, são propostas atividades, em uma perspectiva interdisciplinar, que visam contribuir para a formação inicial e a formação continuada do professor aliada à pesquisa, entendendo o conhecimento não como um fato pronto e acabado, mas como um processo em permanente construção, o que preconiza, conforme propõem Kleiman (2001) e Magalhães (2004), a formação de um professor reflexivo, no sentido de adquirir uma maior consciência crítica de seus valores, pensamentos e práticas. Será apresentado aqui, em especial, o Projeto Memória, desenvolvido com a participação de toda a equipe do 592 593 Observatório, da comunidade escolar do Colégio Estadual Ipê Roxo e moradores do bairro Cidade Nova, onde se localiza o referido colégio, na cidade de Foz do Iguaçu. Atenta-se aqui para dois aspectos relevantes do Projeto Memória: as ações multi e interdisciplinares e os trabalhos com os gêneros discursivos, propostas ancoradas em uma concepção de linguagem dialógica, concreta e assinada, em que leitura e escrita são vistas como práticas sociais específicas. Desestabilizando velhas certezas e abrindo brechas para o rompimento com o status quo vigente, buscam-se alternativas para tecer um eterno devir, um constante deslocamento dos resultados da educação no sentido que todos nós almejamos em nosso país. DISCUTINDO NOÇÕES DE LÍNGUA PARA SUBSIDIAR A COMPREENSÃO DE PRÁTICAS DISCURSIVAS Maria Bernadete Fernandes de Oliveira – UFRN Os estudos da Linguagem, em sua grande maioria, desenvolveram-se a partir de postulados advindos da Lógica, em uma visão leibniziana que conferia ao signo linguístico um modo de funcionamento semelhante ao signo matemático. A chamada “virada linguística”, representada principalmente nos escritos de Wittgenstein e posteriormente no âmbito da Pragmática de filiação austiniana, discorda dessa concepção de signo questionando o primado da função representativa da linguagem e de seu valor como verdade universal. A Linguística Aplicada, área específica de produção de conhecimentos no campo dos estudos da linguagem situada e em uso, considera que os processos de globalização, o reconhecimento (tardio) do fenômeno da diversidade cultural, as novas tecnologias e os processos de construção identitária, entre outros, surgidos no bojo de uma modernidade fluida (BAUMAN, 1998), sugerem repensar a noção clássica de língua, como condição de acesso às verdades contingentes presentes nas práticas discursivas, em circulação em dadas esferas das atividades humanas. Nessa comunicação, nosso objetivo é defender a necessidade de uma ressignificação da noção hegemônica de língua, presente nos estudos clássicos da linguagem, ancorada em princípios presentes nos Estudos Culturais e no Círculo de Bakhtin. ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA: CONCEPÇÕES E PRÁTICAS Willie Macedo de Almeida – PPGMEL/UFMS Raimunda Madalena Araújo Maeda – PPGMEL/UFMS Nesta comunicação, propomos um diálogo entre as concepções que norteiam o ensino de língua portuguesa e as práticas de sala de aula observadas durante o desenvolvimento da nossa pesquisa intitulada “Competência discursiva e reflexão gramatical no ensino de língua portuguesa: um diálogo entre os Parâmetros e as variáveis”. Para isso, apresentamos como o nosso trabalho foi desenvolvido e quais foram os resultados alcançados. Desde a elaboração do projeto, partimos da hipótese de uma incoerência verificada na relação entre os métodos de ensino de língua materna perpetuados pelas práticas pedagógicas nas escolas e a proposta estabelecida nos Parâmetros Curriculares Nacionais: Língua Portuguesa. Ao longo da pesquisa, avaliamos a validade dos processos didáticos relativos ao ensino da língua portuguesa na educação básica – do nono ano do ensino fundamental ao terceiro ano do ensino médio, por meio da pesquisa qualitativa, na qual analisamos os procedimentos metodológicos e os pressupostos teóricos utilizados pelos professores; as aulas em si; e as produções escritas dos alunos. A análise dos dados coletados partiu da revisão das propostas curriculares e da (re)aplicação das concepções teóricas que os embasaram. Nesse ínterim, demos destaque aos conceitos de competência discursiva e reflexão gramatical, citados no texto dos PCN. Paralelamente, o conhecimento teórico foi testado e aplicado através do estudo de campo nas escolas públicas estaduais do município de Miranda, Mato Grosso do Sul. Para 593 594 promover o diálogo a que nos propusemos inicialmente, valemo-nos da análise de pequenos trechos das seis entrevistas realizadas com os professores colaboradores e de dados resultantes da observação das aulas e dos planejamentos. Acreditamos que os princípios estabelecidos nos permitem avaliar a natureza da relação entre a teoria que fundamenta os PCN e as variáveis observadas na prática. Esperamos, a partir da nossa pesquisa, estimular os educadores a refletir sobre os parâmetros que eles seguem, de forma adequada e coerente com o desenvolvimento de seus alunos. REFLEXOS COGNITIVOS À LUZ DA LEITURA Diva Conceição Ribeiro – UTFPR/CESUPI Este trabalho prende-se a estudos ligados à área da leitura e da interpretação de textos mediante o contexto e suas implicações históricas em suas diferentes diretrizes. Tem como objetivo geral levar o leitor a praticar competências específicas para ler textos com propriedade, estabelecer ligações com a historicidade e revelar aspectos singulares residentes nos diferentes contextos acerca da história da evolução humana, registrada por meio da escrita e revelada nos diferentes discursos, seja no modo escrito, seja no modo verbal. A metodologia para desempenhar esta ocupação intelectual compreende alguns percursos a serem seguidos. Estes se ramificam em outras pegadas e estas, por sua vez, espraiam-se na decodificação de termos relacionados entre si e na relação com o contexto. Entendemos por contextos as diferentes esferas nas quais os fatos ocorreram e continuam (ou não) a influenciar ou a sofrerem a influência do entendimento humano para apresentarem diferentes consistências e colorações de acordo com o cognitivo empírico armazenado na biblioteca interior do sujeito que põe em prática o ato de ler. Essas práticas de leitura encontram ecos na vida do leitor, são formadas e tornam-se fortalecidas de acordo com suas múltiplas leituras acerca do universo pessoal, conforme conceitos estabelecidos pela célula social na qual o leitor desponta como sujeito pensante e, a partir de outras reflexões, este reconstrói os paradigmas herdados e passa a agir por conta de sua competência reflexiva. Evidentemente, a sua própria língua passa a ser definida por suas escolhas e esta passa a categorizá-lo, socialmente. Temos, assim, uma das muitas formas de o sujeito poder exercer a cidadania dentro de características democráticas, já que este ator e portador de suas realidades, dispõe de opções para selecionar e agir, conforme construção própria cujos reflexos, certamente, serão sentidos no meio social e no mundo. Estas atividades encontram respaldo em importantes teóricos sobre o assunto, dentre os quais apontamos Marcos Bagno(2000), Marcuschi(2001), Geraldi(2005), Possenti(1996), Koch(2005), Vincent Jouve(2002), Orlandi(2008). Para dar formas pedagógicas aos nossos pensamentos recorremos a Hoffman(on line) e Vasconcelos(on line), dentre outros pedagogos que sediam nossas atividades em torno do se seja a leitura em trânsito, de interpretação de textos e de sua função sobre o sujeito enquanto ser e estar no mundo. Esperamos que, mediante conhecimentos valiosos e aquisições de práticas docentes diferentes, possamos contribuir, ainda que minimamente, com ações didático-pedagógicas mais firmes no ensino de ler e decodificar textos de acordo com os diferentes contextos nos quais foram produzidos e possam preparar outros contextos mais amadurecidos em virtude de essa clareza ganhar dinamicidade na compreensão dos modelos estabelecidos e necessários, antes a uma determinada coletividade, e, no trânsito do percurso humano evolutivo, passaram a acomodar outros perfis em consequência de novos e diferentes acontecimentos, segundo o mundo no qual o leitor vive e estabelece suas relações com os seus pares e com suas práticas de leitura. É importante ressaltar a importância dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) no direcionamento dos pilares a serem desenvolvidos com exercícios efetivos e referentes ao ensino da leitura e da interpretação de textos. 594 595 A IMPORTÂNCIA DO SUPERVISOR NO PROCESSO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE PORTUGUÊS NO PIBID - PROGRAMA INSTITUCIONAL DE INICIAÇÃO À DOCÊNCIA Élia Martins da Silva – PIBID/USP Este trabalho trata da importância do PIBID para a formação continuada do professor supervisor no processo de formação de professores de iniciação à docência de Língua Portuguesa, iniciado em agosto de 2011, na EE Bibliotecária Terezine Arantes Ferraz. A função do professor supervisor neste novo contexto é mediar, interagir e subsidiar o trabalho de profissionais comprometidos em buscar uma educação de qualidade, ou seja, fazer a inter-relação entre o novo e o velho. Segundo as diretrizes do PIBID, a função do supervisor na U.E será de orientar, contribuir, facilitar, analisar, promover, propiciar as ações, modos, relações dos professores em formação inicial, fazendo a tríade ESCOLA-CAPES–UNIVERSIDADE. Faz-se necessário, também, realizar ações que proporcionem aos professores em formação inicial momentos de reflexão sobre o ensino de língua portuguesa na complexidade contemporânea, considerando-se as relações oralidade - escrita, pesquisa – docência, além do uso de recursos tecnológicos, a inovação em práticas pedagógicas e o trabalho com projetos. No mundo atual, cada vez mais globalizado, acredita-se de modo geral que seja extremamente importante saber usufruir, com sucesso, de uma didática eficaz. Segundo Góes (1997), é lição sabida que o novo não se constrói só e nem surge por passe de mágica. O novo nasce do arcaico, mas não repete o arcaico. O novo cria outros paradigmas, mas preservam dos arcaicos, valores e práticas indispensáveis à construção da ponte para o futuro. A transição do velho para o novo é um processo. Esta concepção de processo histórico é uma norma que é visível até mesmo nos tensos momentos de ruptura. Embora a formação inicial de professores tenha recentemente ocupado a agenda de investigação de pesquisadores brasileiros (G Gimenes, 20002 e 2003; Vieira Abrahão, 2004; Gil, 2003), a prática de ensino ainda sofre limitações em virtude de arranjos institucionais que favorecem o desenvolvimento de uma práxis crítico–reflexiva. Portanto, esta comunicação tem por objetivo mostrar as atividades parcialmente desenvolvidas para sensibilizar os futuros docentes para a profissão. Outra finalidade com o projeto é propiciar aos professores que estão na prática docente à reflexão num ambiente em que professores da universidade e futuros professores participem da elaboração de material educacional, de cursos de formação, palestras acadêmicas etc.; busca-se, assim, promover melhorias para a prática docente em aulas de Língua Portuguesa. Além disso, serão discutidas, também, ações positivas e negativas que tem surgido até o momento com o desenvolvimento do projeto de formação. DOCÊNCIA, REFLEXÃO E CRÍTICA: (RE)CONSTRUINDO UM MODELO DE FORMAÇÃO INICIAL E CONTINUADA PARA PROFESSORES DE LÍNGUA PORTUGUESA Francieli Matzenbacher Pinton – UFFS Este trabalho tem por objetivo refletir criticamente sobre a formação inicial e continuada de professores de língua portuguesa em um contexto situado de ação docente. O quadro teórico e metodológico adotado pelo grupo concebe a linguagem como prática social com vistas à (re)construção das práticas de letramento no contexto escolar (SOARES, 2006; ROJO, 2009; MOTTA-ROTH, 2006; SHON, 1992; 2000; ALARCÃO, 2003). A metodologia de trabalho adotada pelo grupo enfoca a ação-reflexão-ação da prática docente, a partir de atividades de intervenção didática voltadas para o Grupo de Estudos de Educadores de Língua Portuguesa (GEELP). O grupo é constituído por 24 professores de língua portuguesa em formação inicial e continuada que se encontram mensalmente para dialogar sobre os conhecimentos teóricos e metodológicos que norteiam o ensino de língua materna na escola de Ensino Fundamental II, com o objetivo de 595 596 identificar novas possibilidades de ação. Como resultado preliminar, constata-se que a abordagem utilizada nos encontros, baseada na reflexão da realidade escolar e docente, na (re)construção teórica e metodológica e na ação pedagógica de sala aula, aliada à reflexão crítica de cada um desses momentos, contribuiu para que os participantes (re)construíssem seus objetos de ensino, fato comprovado na análise documental dos dados obtidos com o grupo. ENSINO DA PONTUAÇÃO: PRESCRIÇÕES E PROPOSTAS EM DUAS COLEÇÕES DIDÁTICAS DE ENSINO FUNDAMENTAL Anderson Cristiano da Silva – LAEL/PUC-SP Este trabalho trata-se de parte da nossa tese em andamento que tem por objetivo analisar as prescrições e propostas sobre o ensino da pontuação (parte teórica e exercícios) nos volumes do 6º ao 9º ano de duas coleções didáticas: Português: uma proposta para o letramento, de Magda Soares, e também a coleção Português: linguagens de William Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães. A motivação dessa pesquisa surgiu da preocupação que temos sobre como os sinais de pontuação são abordados nos livros didáticos do Ensino Fundamental (Anos Finais) utilizados nas escolas públicas. Com efeito, as pessoas geralmente percebem as nuanças de entoações na fala, conseguindo distinguir os efeitos de sentido a partir das pausas na oralidade, no entanto, isso deixa de ocorrer na transposição para a escrita, uma vez que ao longo do processo de aprendizagem sobre os sinais de pontuação, percebem-se falhas no ensino desse conteúdo. Este trabalho justifica-se, portanto, pela necessidade de refletirmos a respeito do assunto com vistas ao aprimoramento das práticas de ensino, revelando-se uma forma de questionar as propostas de ensino em uso, permitindo também novos olhares sobre o conteúdo da pontuação, cujos resultados possam contribuir para expansão do assunto no campo dos Estudos da Linguagem. Assim sendo, temos como principal questão de pesquisa a seguinte pergunta: As propostas de ensino sobre a pontuação encontradas em nas coleções de livros didáticos distribuídas nas escolas públicas por meio do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) conseguem suprir as lacunas que a perspectiva normativo-prescritiva não consegue abarcar? Para responder a essa pergunta, nossa hipótese é a de que abordagens de ensino baseadas unicamente na perspectiva prescritivo-normativa não dão conta de sanar tal deficiência. Para alicerçar nossa investigação, a pesquisa terá como arcabouço teórico as contribuições da Análise Dialógica do Discurso (ADD), tendo como aporte os principais conceitos-chave desenvolvidos por Bakhtin e os demais membros do Círculo. Da perspectiva metodológica, seguiremos o seguinte percurso: (a) analisar as duas coleções didáticas elencadas a partir das características que cada uma apresenta sobre as propostas de ensino da pontuação; (b) levantar a tradição prescritivo-normativa sobre os sinais de pontuação em gramáticas normativas contemporâneas, tendo como critério uma visão sincrônica contrastiva, ademais, também faremos uma busca diacrônica na gramática normativa vislumbrando estabelecer parâmetros críticos para análise do nosso corpus. Alguns resultados preliminares apontam para um número ainda reduzido de exercícios em comparação a outros assuntos gramaticais, além disso, percebe-se que há proposta de ensino que enfatiza apenas atividades orais, deixando de explorar exercícios escritos sobre o emprego da pontuação. 596 597 JOGOS DIDÁTICOS E SUA CONTRIBUIÇÃO PARA O DOMÍNIO DAS REGRAS ORTOGRÁFICAS Telma Maria Tafarelo Moreno – UFGD Mariel Costa Ferreira da Motta – UFGD Rute Izabel Simões Conceição UFGD Neste trabalho apresentamos os resultados de uma pesquisa-ação desenvolvida em uma escola pública de Dourados-MS, cujo objetivo principal foi investigar as dificuldades ortográficas diagnosticadas na escrita de alunos numa sala de 6º ano do Ensino Fundamental com intuito de contribuir para a recuperação dos problemas, por meio de atividades prioritariamente planejadas e aplicadas em forma de jogos didáticos, durante dois meses. Fundamentados em Wittgenstein (1970), a respeito da analogia entre a noção de linguagem e a noção de jogo, e em Lemle (1990), a respeito dos fundamentos linguísticos para o diagnóstico e a classificação dos problemas ortográficos. As dificuldades diagnosticadas foram agrupadas em três ordens de acordo com a proposição de Lemle: a) falhas de 1ª ordem (aquelas provenientes da primeira fase de aquisição da escrita, quando a criança troca letras ou deixa de escrevê-las); b) falhas de 2ª ordem (aquelas decorrentes da transcrição da fala, em que ocorre a tendência a escrever conforme se ouve ou se fala) e c) falhas de 3ª ordem (aquelas decorrentes da concorrência que as letras tem entre si pelo valor sonoro). Feita a análise comparativa dos dados obtidos no início e após dois meses de trabalho constatou-se que o nível de aprendizado/compreensão das regras trabalhadas foi positivo, com percentual geral de 70% de aquisição por parte dos sujeitos. O DOMÍNIO ORTOGRÁFICO NA ESCRITA DOS ALUNOS DE ENSINO SUPERIOR Darlene da Silva Pereira – ESBAM A ortografia tem assumido um lugar de destaque entre as pesquisas atuais na área de linguagem, devido ser a mais básica das condições para se escrever corretamente, qualidade tão exigida para aqueles que vivem em uma sociedade letrada, a qual prioriza o domínio da norma culta como forma de comunicação oficial entre todos os seus usuários. Nesta perspectiva, este artigo realizou uma análise sobre o domínio ortográfico na escrita de 164 acadêmicos de primeiro período de graduação de duas faculdades da cidade de Manaus, sendo uma pública e a outra particular. Subsidiado teoricamente nos trabalhos realizados por Zorzi (1998; 2003), Morais (2000; 2003), Cagliari (2008), Guimarães (2005), Kato (2004) e outros autores pesquisados, os quais analisam os processos de aprendizado da ortografia, as dificuldades vivenciadas pelos usuários no momento da escrita e a teoria da classificação dos desvios ortográficos. A pesquisa ocorreu no segundo semestre de 2010 com alunos provenientes da zona urbana de Manaus com média de idade entre 24 e 26 anos. Para tanto, a pesquisa envolveu a utilização de duas atividades primordiais para a coleta de dados, um questionário e um teste de observação ortográfica nos moldes de um ditado de palavras isoladas. No que se refere aos resultados dos questionários oportunizaram avaliar o perfil do aluno ingressante no curso superior e suas expectativas. Tais expectativas são de um melhor aprimoramento da escrita durante o período na universidade. Por último, a análise do teste de observação ortográfica revelou que as mesmas categorias de desvios ortográficos são compartilhadas pelos dois grupos estudados, mas em posições diferentes. Além disso, os sujeitos da faculdade particular apresentam um número maior de desvios ortográficos identificados em sua escrita, são exatamente 300 desvios a mais do que o encontrado no grupo da faculdade pública. Destaca-se que o resultado do ditado de palavras demonstrou que as principais dúvidas ortográficas dos alunos são decorrentes da não correspondência entre o número de grafemas e o de fonemas, presentes na língua escrita (representação múltipla) e também quanto à acentuação das palavras (acentos gráficos). Estes dados que podem direcionar os estudos de Língua Portuguesa nas disciplinas dos cursos de graduação 597 598 frequentados pelos sujeitos da pesquisa, com a finalidade de auxiliá-los na superação de suas dificuldades. OLIMPÍADA DE LÍNGUA PORTUGUESA: MARCAS DA PRÁTICA DOCENTE Ernandes Araujo Nascimento – UFMT Esta comunicação tem como base um recorte do Projeto MARCAS DA PRÁTICA DOCENTE EM TEXTOS DE ALUNOS PARTICIPANTES DA OLIMPÍADA DE LÍNGUA PORTUGUESA (UFMT/MESTRADO EM ESTUDOS LINGUÍSTICOS) e objetiva, identificar as marcas da atuação docente (positivas ou negativas) no ensino de escrita da Língua materna, presentes em textos de alunos participantes desse programa do Governo Federal em sua etapa municipal nas escolas de Barra do Garças-MT. Iremos analisar textos escritos por esses alunos nos gêneros artigo de opinião e crônica que tem como tema “O lugar onde vivo”. Nossa proposta é identificar nos textos produzidos, marcas da compreensão ou não de professores e alunos, relativos às orientações estabelecidas pela olimpíada conforme estabelece o manual do professor, tendo como referencial a proposta de sequência didática e os critérios avaliativos fornecidos pelo programa para o ensino dos gêneros propostos. Nossa pesquisa está embasada na teoria do gênero do discurso a partir da leitura de Bakhtin e nos estudos dos gêneros orais e escritos na escola, elaborados por Bernard Schneuwly e Joaquim Dolz, que nos explicam questões básicas e fundamentais do que são os gêneros e qual a melhor forma de organizar o trabalho com eles ao longo do currículo. Em nossa investigação iremos adotar o método qualitativo, a partir da análise dos textos de alunos vencedores da etapa escolar, enviados a comissão julgadora municipal. Com o intuito de identificarmos o planejamento realizado pelo professor, elaboramos questionários que foram respondidos pelos professores dos alunos produtores dos textos e confrontamos com o resultado da análise. Utilizamos como referencial teórico, obras de diferentes autores que fazem abordagem sobre a produção textual, como também os cadernos do professor, ofertado pelo Programa Olimpíada de Língua Portuguesa escrevendo o futuro, ancorado na proposta de sequência didática elaboradas por Schneuwly e Dolz. Como professor formador dos profissionais das Escolas Municipais e Estaduais, pertencentes ao polo do CEFAPRO de Barra do Garças – MT, desejamos que haja a compreensão sobre o potencial pedagógico da Metodologia de Sequência Didática no ensino da Língua e esperamos que por meio da utilização dessa metodologia, esses professores aprimorem os seus conhecimentos acerca dos pressupostos teóricos que embasam as práticas de leitura e de escrita, pois o trabalho com sequência didática permite criar situações com contextos que possibilitam reproduzir em grandes linhas e no detalhe a situação concreta de produção textual, incluindo sua circulação, ou seja, com atenção para o processo de relação entre produtores e receptores. A CONSTRUÇÃO DE SENTIDO EM TEXTOS DE OPINIÃO DE ALUNOS DO 9º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL SOB A LUZ DA TEORIA DOS TOPOI Ana Paula Martins Alves – UFC Mônica de Souza Serafim –UFC Segundo a Teoria da Argumentação na Língua (TAL), defendida por Oswald Ducrot, a argumentação encontra-se marcada nas escolhas linguísticas, em que os encadeamentos argumentativos possíveis no discurso não estão ligados apenas às informações que elas veiculam, mas à estrutura linguística dos enunciados, de forma que os sentidos dos enunciados indicam a direção da continuação do diálogo, orientando o interlocutor a certo tipo de conclusão. Nesse ponto do vista, a Teoria dos Topoi, segunda fase da TAL, analisa as expressões argumentativas que, fundamentadas em princípios gerais (topos), justificam certa conclusão. Para a TAL, o topos se 598 599 constitui como crenças gerais aceitas pela sociedade, ou ainda, princípios gerais que fundamentam os raciocínios que permitem o acesso a uma conclusão, sem precisar estar expressamente ditos. Destarte, sob o ponto de vista da Teoria dos Topoi, a presente pesquisa teve como escopo investigar a construção do sentido em textos de opinião de estudantes do 9º ano do ensino fundamental de uma escola pública do município de Fortaleza. Este estudo caracterizou-se como uma pesquisa do tipo explicativa, de base interpretativa e de caráter descritivo. Os dados foram coletados no 1º semestre de 2012 num contexto de estudo sobre produção textual e contou com a participação de 50 alunos. Após a exibição do vídeo “Vida Maria” e debate sobre questões levantadas a partir da percepção dos alunos, estes produziram um artigo de opinião. A análise dos dados pautou-se nos pressupostos teóricos ducrotianos da Teoria da Argumentação na Língua (TAL), focando-se especificamente na segunda fase, a da Teoria dos Topoi. Nesse contexto, buscamos identificar nas produções dos alunos o(s) ponto(s) de vista(s), o(s) enunciador(es), assumidos pelo locutor, bem como analisar os argumentos utilizados pelos produtores dos textos, a partir da noções de escala argumentativa e classe argumentativa postuladas por Ducrot. O USO DE GÊNEROS EMERGENTES NA ESCOLA: UMA REFLEXÃO DE PRÁTICAS EDUCATIVAS Rosilda Maria Araújo Silva dos Santos – UE Cláudia Graziano Paes de Barros – UFMT Os recursos tecnológicos tem se tornado fundamentais no cotidiano do usuário da Língua Portuguesa e a necessidade disto está criando um novo momento histórico para a humanidade. Em cada esfera há gêneros diferentes que estão sendo utilizados e que não podem passar despercebidos pela escola, porque são gêneros emergentes, que como disse Marcuschi (2010, p.16) há “discursos eletrônicos” que podem servir de análise de efeito na linguagem e no papel desta linguagem nas tecnologias. Este artigo tem como tema Os gêneros emergentes na escola e pretende discutir sobre a ótica de professores de escolas públicas quanto ao uso destes gêneros em sala de aula. A ideia parte da hipótese inicial de que apesar de haver investimento tecnológico nas escolas, o ensino da Língua Materna ainda sinaliza lacunas quanto à potencialização de gêneros. Neste sentido, a pesquisa está alicerçada teoricamente em Bakhtin ([1979], 2003), Schneuwly e Dolz (2004) e Bazerman (2006) ao tratarem sobre gêneros discursivos, Marcuschi (2010) e Xavier (2011) ao falarem sobre gêneros emergentes, Meurer (2005) ao propor enriquecimento no cenário de debates sobre os gêneros oportunizando reflexões sobre a metodologia de ensino da Língua, Geraldi (1997) e Elias (2011) quando discorrem sobre o ensino da Língua Portuguesa. A metodologia adotada para desenvolver este estudo foi por meio de entrevista com doze professores e vinte alunos de Ensino Médio de três escolas públicas da cidade de Escada-PE, além de se observar algumas aulas para estabelecer comparação entre as respostas apresentadas pelos entrevistados com a prática do cotidiano. Enfim, este artigo pode potencializar os gêneros emergentes em sala de aula, ampliando a visão de profissionais da educação quanto à imprescindibilidade do uso destes recursos didáticos nos dias atuais, já que as inovações tecnológicas podem atingir o processo de ensino e aprendizagem aproximando os alunos e professores desta conjuntura histórica, política e social que é a era da tecnologia, além de possibilitar reflexões sobre práticas educativas. 599 600 PROJETO DIDÁTICO DE GÊNERO CARTA DE RECLAMAÇÃO: UMA PROPOSTA DE AÇÃO SOCIAL Andreza Mara Formento – SMED NH/UNISINOS O projeto “Por uma formação continuada cooperativa para o desenvolvimento do processo educativo de leitura e produção textual escrita no Ensino Fundamental”, coordenado pela Profa. Dra. Ana Maria Guimarães e apoiado pelo Programa Observatório de Educação da CAPES, surgiu da necessidade de fazer interagir o saber acadêmico sobre ensino da língua materna e o saber prático de professores da Educação Básica. Os professores, bolsistas do Projeto, desenvolveram um programa de leituras e discussões de conceitos que fundamentaram as demais etapas da pesquisa. Ao final da primeira etapa, o grupo de professores bolsistas foi desafiado a planejar um projeto didático de gênero (PDG) a partir de uma temática observada pelo professor em sala de aula e de um gênero de texto por ele escolhido. Os projetos serviram de base para novas discussões sobre a didática de gêneros, propostas de escrita, leitura e formas de avaliação. A ideia é desenvolver o ensino de língua materna com base em gêneros, mas amparado em práticas sociais dos próprios alunos e embasar o trabalho docente através da fundamentação teórica da sua criação. No projeto a ser apresentado, a temática social escolhida foi a questão dos problemas de trânsito em frente à escola. O gênero textual escolhido para trabalhar neste projeto é a carta de reclamação, que faz parte do domínio do argumentar. Na área de Língua Portuguesa, foram trabalhadas questões da estrutura do gênero e gramaticais, a partir da análise das produções iniciais dos alunos. Assim, após a verificação das reais necessidades dos aprendizes, foram organizadas oficinas para produzir, passo a passo, a estrutura do gênero proposto: posicionamentos, argumentos, destinatário, remetente; valorizando a autocorreção. O PDG proposto vai além das aulas de produção textual, pois, a partir do tema problemas de trânsito, propõe-se um projeto interdisciplinar, buscando parcerias entre diversas áreas. A disciplina de Arte trabalhou o assunto apresentando a história do grafite, como forma de manifestação artística em espaços públicos, conhecendo e aplicando termos e técnicas desta arte, estudando alguns artistas que retratam a realidade através da grafitagem. Os alunos participaram da aplicação de grafite no muro da escola a partir do tema e observando a diferença existente entre a pichação. Em Ciências, foram desenvolvidos conteúdos sobre a atmosfera, os gases que compõem e os problemas que afetam: poluição, efeito estufa, aquecimento global, destruição da camada de ozônio. Na disciplina de Matemática, abordaram a leitura de gráficos sobre a composição do ar, histórias matemáticas envolvendo os problemas ambientais causados pela poluição dos automóveis. Estudaram as multas de trânsito e cálculos relacionados à sua pontuação. Em História e Geografia, analisaram os impactos sobre a vinda do trem a cidade de Novo Hamburgo e ao bairro da escola. Observaram questões sociais sobre o trânsito, tais como a questão da poluição, a evolução dos meios de transporte e o uso da matéria prima para desenvolvê-los. A professora de inglês trabalhou com vocabulário relacionado ao trânsito questionando sobre a opinião dos alunos com relação ao tema para evoluir para regras de trânsito e questões de cidadania e meio ambiente, propôs paralelamente a leitura de notícias relacionadas ao trânsito e nas quais o mesmo vocabulário foi trabalhado em inglês e português. Findo o estudo sobre os problemas de trânsito na rua da escola, utilizamos alguns dados para embasar a carta de reclamação que foi enviada ao órgão municipal competente com a intenção de utilizar o trabalho dos alunos para transformar sua realidade social. UMA REFLEXAO BAKHTINIANA SOBRE GENEROS DISCURSIVOS Renata Silva Siqueira – UFMT Neste presente trabalho pretendemos reconhecer os direcionamentos teóricos e metodológicos propostos pelos PCNS para realização das atividades docentes de Língua Portuguesa do Ensino 600 601 Fundamental. Utilizaremos o livro didático (LD): Língua Portuguesa – Linguagem e textos do Ensino Fundamental, adotado por inúmeras escolas do estado de Mato Grosso, para observações quanto as atividades/propostas de produção textual e considerar a página de “apresentação“ do livro em que o autor pronuncia o seguinte enunciando -–“Os textos deste livro falam de você, De seu estar na vida, De seus sonhos, De seus prazeres, De seus medos, Falam de muitas coisas que o cercam: da natureza, do seu dia-a-dia, da sua casa e de seu pais”,“A linguagem, concretizada em páginas deste livro, nos gêneros textuais verbais e não–verbais, ‘e o meio que pode oferecer a você um caminho para entender a tudo isso e a si mesmo”, nesse inicio o autor esclarece o seu ponto de vista e em qual fundamentação teoria está inscrito. Almejamos identificar se o livro abordado consegue de fato atender aos pressupostos na teoria bakhtiniana sobre gêneros discursivos e sua concepção de linguagem, com base nos PCNs. O LD em questão oferece diversificadas atividades que propõem a interdisciplinaridade de produção oral e escrita, trazendo ao aluno prática das suas habilidades de leitura e espaço em que exercitará situações reais de interação com os mais diversos enunciados possíveis. No livro é trabalhado em cada unidade um gênero diferente, de maneira contextualizada e favorecendo a maioria das competências defendida pelos Parâmetros Curriculares. As atividades de produção textual estão na maioria das vezes condizentes com o gênero abordado na unidade, sendo oferecido ao decorrer das páginas, subsídios para que o aluno produza seu texto. Para a realização deste trabalho nossos alicerces teóricos se inscrevem nos estudos bakhtinianos sobre a linguagem e na teoria sócio- histórica de aprendizagem de Vygotsky. EDUCAÇÃO LINGUÍSTICA- A VOZ DISCENTE SOBRE O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA Luciene Fernandes Loures – UFJF O presente trabalho Educação linguística- a voz discente sobre o ensino de Língua Portuguesa vincula-se ao Projeto “ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA DA FORMAÇÃO DOCENTE À SALA DE AULA”, inscrito na linha de Pesquisa Linguística e Ensino de Língua do PPG Linguística - UFJF. O principal objetivo deste estudo é traçar o perfil dos alunos de Língua Portuguesa, ou seja, observar como esses estudantes caracterizam a si mesmos, assim como a seus colegas, buscando, ainda, compreender quais são suas experiências mais marcantes (positivas e negativas). Para tanto, possui como objeto investigativo os discursos discentes sobre as experiências vividas durante as aulas de Língua Portuguesa. O cenário escolhido corresponde a 20% das 31 escolas da rede estadual de ensino que possuem ensino fundamental e médio do município de Juiz de Fora. Este percentual nos levou a sete colégios com diferentes graus de risco social e de desempenho de acordo com as avaliações governamentais. Os estudantes pesquisados pertencem ao nono ano de ensino fundamental e ao segundo do ensino médio, resultando num total de 364 alunos. Para esta pesquisa, foram utilizados apenas os discursos em primeira pessoa. Desse modo, foram excluídos os segmentos referentes aos professores, à matéria e à escola, resultando, assim, em 126 alunos. O instrumento aplicado contem uma parte fechada (que busca traçar o perfil sócio econômico do aluno) e outra aberta. A parte aberta foi composta por apenas um enunciado, que deu ao discente a possibilidade de escrever uma narrativa sobre sua história como aluno de português, relatando suas vivências mais marcantes. A utilização da narrativa se deu devido ao fato deste tipo textual possibilitar ao aluno a escolha do que vai falar, do que ele considera mais relevante. Portanto, este trabalho não pretende demonstrar a realidade das salas de aula de Português, mas sim a realidade que os alunos desejam passar. Nosso escopo teórico baseia-se da Linguística Cognitiva (LAKOFF, 1987; LAKOFF e JOHNSON, 1999, 2002; FILLMORE, 1982), em especial da Semântica de Frames ((FILLMORE, 1979, 1982 e 2006) e, ainda, utiliza-se do projeto de anotação lexicográfica FrameNet (www.framenet.icsi.berkeley.edu). A utilização dos frames têm se mostrado uma ferramenta muito importante para a análise do discurso dos discentes. O número elevado de ocorrências de frames como o frame de dificuldade, por exemplo, demonstra a perpetuação de 601 602 determinados mitos associados à língua, assim como um não reconhecimento na disciplina ensinada. Para compor nossa teoria e a fim de promover uma análise mais ampla e apurada, temos, ainda, a Linguística Aplicada, Sociologia, Psicologia Social, Educação e a Antropologia Evolucionista,o que nos possibilita um olhar multidisciplinar sob nosso objeto de pesquisa. A FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES NO SUL DO MATO GROSSO: NOVAS PERSPECTIVAS PARA O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA NO ENSINO MÉDIO? Agameton Ramsés Justino – UFMT/CUR Uma vez que os documentos oficiais do ensino básico brasileiro redefiniram o paradigma do ensino de língua portuguesa a partir de 1998 - com os PCN, os PCNEM (2000) e depois com o OCEM (2006), são consideráveis os avanços nas concepções dos objetivos do ensino de língua e dos fundamentos epistemológicos e metodológicos advindos de então. Até aquele momento, as pesquisas vinham demonstrando a urgente necessidade de novos caminhos para o ensino. Possenti, Franchi, Neves, Geraldi, Perini, para citar alguns dos principais autores na área, demonstravam que a Língua Portuguesa era uma disciplina com objetivos equivocados, metodologia ineficiente e resultados bastante insatisfatórios, do ponto de vista do desenvolvimento dos alunos em suas competências gramaticais, textuais e comunicativas. Hoje, são significativos os avanços nas propostas de se trabalhar o ensino da língua em torno da concepção de gêneros, tal como preconizam, por exemplo, Rojo (2006) e Antunes (2008). E, embora muitos professores do ensino básico já demonstrem alguma familiaridade com noções do ensino de língua fundamentadas nesses novos paradigmas, ainda é preciso observar melhor se a estes professores estão sendo oportunizadas condições de aprimoramento para o trabalho em sala de aula. Sendo assim, o presente trabalho investiga se o modelo atual de formação continuada tem oferecido aos professores de Língua Portuguesa subsídios teórico-metodológicos para uma abordagem sócio-interacionista do ensino no nível médio. Estudamos especificamente os cursos oferecidos pelo CEFAPRO (Centro de Formação Continuada de Professores, vinculado à Secretaria Estadual da Educação do Mato Grosso), de Rondonópolis-MT, aos professores de Língua Portuguesa do Ensino Médio dos 14 municípios da região sul de Mato Grosso. Ao estudarmos a formação promovida por este órgão aos professores da região no ano de 2012, verificamos a oferta de apenas um curso, sendo este voltado para a preparação para as Olimpíadas da Língua Portuguesa, promovidas em todo Ensino Médio brasileiro anualmente pelo MEC. O principal objetivo desse curso foi melhorar o desempenho das escolas da região nas Olimpíadas. Para isso, os formadores utilizaram-se de bibliografia atualizada na elaboração do seu material de apoio, a fim de preparar os professores de Língua Portuguesa ao ensino de produção textual, de acordo com os gêneros propostos pelo MEC. Entretanto, nos perguntamos em que medida os professores têm recebido uma formação que lhes garanta uma ressignificação das suas próprias concepções de linguagem, do ensino de língua e de gramática. A análise do material oferecido aos professores pelo CEFAPRO mostra avanços, como a orientação do aprimoramento da produção textual a partir de sequencias didáticas, conforme os modelos de Dolz e Schneuwly (2004). Todavia, é incipiente uma formação efetiva que promova a renovação das práticas em sala de aula de língua portuguesa, uma vez que a interação com os gêneros ainda ocorre de forma artificial e o ensino de gramática neste contexto apenas reproduz os modelos prescritivistas tradicionais. 602 603 A LEITURA LITERÁRIA E SUAS POSSIBILIDADES NA FORMAÇÃO DO SUJEITOLEITOR Renato de Oliveira Dering – UFG/CAJ A leitura literária em ambiente de sala de aula é um fator imprescindível no ensino de uma Língua. Portanto, é eficaz a percepção de que a leitura uma das principais responsáveis pelo vínculo entre sujeito e sua representação, seja essa social, histórica ou cultural. Tomando como perspectiva os apontamentos de Umberto Eco (2011), em Sobre a literatura, podemos verificar que a literatura é fundamental para a formação da Língua e sua evolução, pois além de criar identidade, ela institui comunidade entre esses sujeitos. Não apenas, Eco ainda ressalva que a prática da leitura remete a um exercício com a nossa Língua individual. Não obstante e corroborando, Wolfgang Iser (1999), em O ato da leitura, levanta a proposição de que o lugar vazio do texto é que permite a esse leitor se construir e participar dos acontecimentos que o envolvem e perfazem, e, desse modo, agindo sobre os mesmos. Por assim ser, esse sujeito se constitui e também constrói esse meio, em uma relação dialógica. Observando esses apontamentos, é importante defender a ideia de que o Professor de Língua deve ser um dos responsáveis por aproximar seu aluno (sujeito-leitor) da prática de leitura, uma vez que a Língua não se dissocia de sua cultura, e que a literatura é uma prática que emerge dessa. Deste modo, entre os gêneros literários, o conto se torna um texto de melhor manejo em sala de aula, observando, principalmente, sua extensão e suas articulações no que tange sua literariedade. Por assim entendermos essa relação, o presente estudo objetiva contribuir para uma análise reflexiva acerca dos contos brasileiros em sua relação com a formação desse sujeito-leitor e da sociedade que o tange. Para tanto, articularemos a teoria e crítica literária a respeito da contística, em intersecção aos aspectos socioeducativos e as leis que regem o ensino de literatura no ensino básico e superior. O PROCESSO DE FORMAÇÃO DE LEITORA NAS HISTÓRIAS VIDA DE ALUNOS E ALUNAS DO PRONERA, BAHIA Antonilde Santos Almeida – UNEB Este artigo apresenta a contextualização da pesquisa, o problema e objetivos da investigação para análise do processo de formação leitora na historia de leitura dos alunos/alunas do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária - PRONERA na Regional de Itaberaba, verificando se as leituras realizadas contribuíram e contribuem para a constituição de ser e de viver assentados. Além de mostrar um pouco dos antecedentes teóricos nos âmbitos nacional e internacional sobre a educação do campo, os aspectos teóricos sobre leitura, algumas histórias de vida dos assentados e a importância que eles dão à formação leitora. A parte metodológica deste estudo percorreu a história de vida dos sujeitos, as técnicas, e os instrumentos como entrevista semi-estruturada (oral e escrita), roteiro com tópico- guia (temas específicos): historias de leitura construídas, roteiro com tópico guia, questionário e o inventário de leitura: cadastro de dados, investigação (práticas de leitura), reconhecimento (dificuldades, potencialidades, suportes textuais e espaços possibilitadores de leitura). Para a análise dos dados, foram vistas algumas falas de atores sociais que fazem parte de movimentos sociais do campo e luta pela terra: Movimento Estadual de Trabalhadores Assentados e Acampados e Quilombolas - CETA, Fundação de Apoio à Agricultura Familiar do Semiárido da Bahia – FATRES e Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado da Bahia - FETAG. A análise foi baseada na fundamentação teórica construída a partir de Costa (2000), Freire (2001), Hall (2006), Kleiman (1989), Santos (2000), Souza e Cordeiro (2007). Como considerações finais, foram percebidas nas respostas para as questões que houve o alcance de um dos objetivos principais para responder a seguinte pergunta de investigação: como se configura o processo formação leitora 603 604 na história de vida dos alunos e as alunas do curso de magistério PRONERA/Itaberaba, assentados e assentadas, em movimentos sociais do campo. DIMENSÕES E HABILIDADES LINGUÍSTICAS A PARTIR DE UMA SEQUÊNCIA DIDÁTICA NOS DIFERENTES GÊNEROS. Maria Goreti Barichello Cerqueira – UFG Esta comunicação, com base na teoria funcionalista da linguagem difundida por Halliday e Dick desenvolvida aqui no Brasil por Maria Helena de Moura Neves, tem o propósito de apresentar a relação entre estrutura gramatical das línguas e os diferentes contextos comunicativos em que elas são usadas, bem como refletir a respeito da necessidade de se compreender a organização discursiva de determinados gêneros, considerando o contexto de situação e o contexto de cultura, como tipo de organização simbólica dos significados ideacionais e interacionais em textos coerentes e relevantes operacionalizados na função textual. Com base na teoria de linguagem originada no dialogismo bakhtiniano, desenvolverei uma proposta teórico-metodológica de análise funcional dos gêneros, baseada nas metafunções (a ideacional, a interpessoal e a textual) do sistema linguístico que prevê o reconhecimento de diferentes dimensões linguístico-discursivas que podem auxiliar na operacionalização do ensino baseado na noção de gêneros o que, consequentemente, também, pode contemplar a demanda pelo desenvolvimento de competências diversas. No presente trabalho, farei um recorte do projeto de pesquisa que será desenvolvido, com objetivo de divulgar o estudo analítico das dimensões e habilidades linguísticas em um texto de humor (tira, piada, história em quadrinhos, lances divertidos de uma crônica, ou até mesmo em uma conversa informal) que podem ser exploradas, a partir do enfoque nos fenômenos de linguagem específicos que compõem a metafunção discursiva, partindo do pressuposto de que a língua se constitui como evento de interação e como expressão de conteúdo, a partir de diferentes dimensões da atividade interativa visíveis nos gêneros discursivos. Portanto, a ideia é provocar a sensibilidade do aluno para o fenômeno linguístico, a partir de experiência singular com o texto, haja vista se o ideal que a aula de língua Portuguesa favoreça ao aluno a possibilidade de agir refletidamente, de enfrentar desafios, de discutir questões, de perceber a funcionalidade das escolhas linguísticas promovidas nos textos. Assim, diante do exposto, precisamos que os estudos mais recentes da teoria linguística – estudos baseado em gêneros, que privilegiam o reconhecimento de diferentes dimensões linguísticodiscursivas para o desenvolvimento de competências diversas – cheguem, de fato, aos programas de ensino das salas de aula. GÊNERO TEXTUAL: ESTRATÉGIA INTERATIVA NO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA. Expedito Wellington Chaves Costa – IFCE A linguagem é, hoje, reconhecida como instrumento de interação social, empregado pelos sujeitos humanos com o objetivo primordial de transmitir informações diversas entre interlocutores e contextos reais. Por isso, as regras do sistema linguístico devem ser usadas como meios aos objetivos da interação verbal e da aprendizagem da língua materna. Nesse sentido, os gêneros textuais se apresentam como uma forma de comunicação capaz de realizar objetivos específicos em situações sociais particulares, o que, no ensino de Língua Portuguesa, garante a relação entre a aprendizagem e os contextos comunicativos do cotidiano dos alunos e dos professores, uma vez que cada gênero supre pelo menos uma necessidade comunicativa oral ou escrita. Além disso, ao usar os gêneros textuais nas aulas, os professores podem explorar todos os aspectos (como forma, função, estilo e conteúdo), para ensinar estrutura e uso dos fenômenos linguísticos, para aquisição e 604 605 desenvolvimento de competência comunicativa. Por sua vez, os alunos se tornarão usuários mais competentes da língua natural na proporção em que produzem e fazem circular discursos coerentes com a circunstância de comunicação e com o perfil do interlocutor. Os discursos são considerados aqui enquanto unidades de sentido, capazes de mobilizar locutor e interlocutor no processo de transmissão e compreensão de mensagens variadas. A propósito disso, o objetivo deste artigo é apresentar o potencial dos gêneros textuais no ensino de Língua Portuguesa e algumas estratégias de como utilizá-los para o aprimoramento das competências linguísticas e comunicativas dos estudantes, independente do nível em que se encontrem. A seleção dos gêneros a serem usados é facilitada pela ocorrência deles em diversos portadores, entre os quais o jornal impresso é um dos mais profícuos. Conclui-se que a necessidade e a diversidade da comunicação contemporânea exigem contato permanente dos estudantes com a diversidade de discursos e gêneros textuais, para garantir-lhes desenvolvimento de competência comunicativa e aprendizagem real das funções da língua materna. EXPERIÊNCIAS DO PROFESSOR DE LÍNGUA PORTUGUESA COM LEITURA E ESCRITA NA PERSPECTIVA BAKHTINIANA Lucimeire da Silva Furlaneto – UFMT/MeEL RESUMO: Este trabalho consiste num projeto de dissertação que enfoca o letramento do professor de língua materna. Desde o advento dos PCN, nos anos 90, o ensino de língua materna (língua portuguesa, em nosso caso), vem sofrendo diversas modificações, tanto nos aspectos teóricos quanto metodológicos. Isso tem reverberado sobre as práticas do professor, e inúmeros esforços das políticas públicas, como cursos de formação continuada, como GESTAR II, Eterno Aprendiz, têm contribuído para este processo. Entretanto, verificamos, apesar de todos os esforços, que as práticas do professor ainda estão alicerçadas em abordagens transmissivas e as considerações e concepções sobre a língua ainda são bastante tradicionais. A que se deve esta ausência de mudança nas práticas em sala de aula de língua portuguesa? Assim, preocupados com o ensino básico, principalmente com os anos de ensino fundamental, lançamos a hipótese de que as dificuldades encontradas com o professor residem, ainda, em suas próprias dificuldades individuais no trato com a leitura e a escrita, ou seja, naquilo que podemos chamar de “letramentos do professor”, para bem exercício de sua profissão. Para gerarmos dados, buscaremos, portanto, observar um projeto de Formação Continuada a ser realizado pela UFMT, a ser oferecido a professores da Rede Municipal de Cuiabá, no segundo semestre de 2012: “LETRAMENTOS DO PROFESSOR: VIVÊNCIAS DE LEITURA E ESCRITA EM LÍNGUA MATERNA”, através do Grupo de Pesquisa “Relendo Bakhtin” (REBAK), subgrupo REBAK FORMAÇÃO, dentro do projeto de pesquisa “Relendo Bakhtin: contribuições do Círculo de Bakhtin para uma análise dialógica de discursos produzidos em diferentes esferas da atividade humana”, inscrito no Programa de Pós-graduação em Estudos de Linguagem da Universidade Federal de Mato Grosso (MeEL). O curso será presencial e a distância, e tem como carro-chefe a vivência em leitura e escrita com foco na melhoria do letramento do professor. As questões de pesquisa a serem investigadas são: 1) Como os professores, no curso de formação, lidam com as atividades de leitura e escrita, propostas pelo material do curso? 2) Quais os resultados do processo formativo, em termos das práticas efetivas em sala de aula? Para tanto, utilizaremos de observação participante, entrevistas, análise de textos produzidos pelos professores, e de respostas de exercícios, bem como da correspondência (emails) utilizados pelos professores e os formadores durante o processo. A pesquisa, ainda inicial, é de cunho enunciativo-discursivo, nas perspectivas bakhtinianas e vygotskyana. 605 606 PERSPECTIVAS E ABORDAGENS NO ENSINO DE LITERATURA: O GÊNERO DRAMA EM SALA DE AULA Rodrigo Damacena Alves – UFG/NELIM Renato de Oliveira Dering – UFG/CAJ O ensino de literatura requer certo cuidado didático, para que não recaia em análises voltadas ao estudo de gramática normativa ou no simples ato de ler e entender o que o autor disse quis dizer. Quando se aborda questões de gêneros literários, principalmente, o zelo deve ser ainda maior, e o ensino mais cauteloso. Esse cuidado recai, também, na preocupação de não tornar a aula de literatura algo decorativo e de mera repetição, isto é, não fazer com que a disciplina fique chata e desinteressante para o aluno e fuja das funções da própria literatura. Isto, pois, é relevante no que tange o ensino de literatura, porque pode afastar o aluno do hábito da leitura e, consequentemente, da literatura e do ensino, em uma abordagem mais ampla. Assim, o presente estudo aborda outras possibilidades nos processos de ensino-aprendizagem de literatura, através do estudo do gênero e da leitura literária. Deste modo, nossa proposta vai contra a prática de ensino recorrente em grande parte das escolas, que consiste em repassar ao aluno fórmulas e maneiras de decorar datas, estilos, nomes de autores e obras, ensinando, portanto, apenas história da literatura. A história da literatura precisa ser veiculada ao viés crítico e teórico, abordando aspectos literários e extraliterários. Para levantar tais pressupostos para essa perspectiva de ensino, Uma noite em cinco atos, do escritor contemporâneo Alberto Martins, foi a obra utilizada nesta pesquisa. Busca-se, com esse diálogo entre obra e leitor, mostrar que a literatura não é um método decorativo, nem simplesmente voltado à leitura do texto por ele mesmo, mas mostrar as potencialidades da literatura em suas possibilidades Por essa verificação, também se pretende adentrar a questões de letramento literário, ampliando, assim, a capacidade de compreensão e aprendizado dos alunos. Visa-se, então, à formação desses sujeitos-leitores, entendendo que é nas atividades de linguagem que esse sujeitoleitor (aluno) se constitui, bem como em suas diversas relações com o meio, com outros sujeitos e com a arte que suscita deles: a literatura. 606 607 SIMPÓSIO 56 RECURSOS ELETRÓNICOS, MULTILETRAMENTOS E ENSINO DE PORTUGUÊS COMO LÍNGUA ESTRANGEIRA (PLE) O Português é atualmente a sexta língua mais falada no mundo e, perante os progressos dos países lusófonos no cenário internacional, está cada dia mais explícita sua importância em vários contextos. O ensino de PLE - Português como Língua Estrangeira - depende de materiais didáticos atualizados que façam parte do processo ensino-aprendizagem. Mesmo que haja um grande desenvolvimento na publicação de manuais de PLE destinados aos aprendentes, continuamos a sentir grande falta de referências tanto para aulas como para pesquisas a respeito do ensino de PLE no contexto dos multiletramentos e das tecnologias digitais. De modo tradicional, tem-se ainda acesso a materiais nas bibliotecas, os quais, de certa maneira, não servem para satisfazer completamente as exigências do novo perfil de geração de aprendizes de PLE, por diversos motivos. Os aprendentes jovens têm preferência por materiais atualizados e, de preferência, com acesso a novas tecnologias, mobilidade e midiaseletrónicas. Com o avanço de novas tecnologias nota-se cada vez mais a utilização de recursos eletrónicos para as aulas ou como materiais de referência para pesquisas. No entanto, perante uma imensa variedade de materiais eletrónicosa que se tem acesso na internet, é natural formular diversos questionamentos: serão confiáveis todos os materiais eletrónicosa que temos acesso? Que tipo de materiais eletrónicos se usa com mais frequência? Qual é a estratégia que se usa na selecção dos materiais electrónicos? Como é que se faz a adaptação dos materiais para serem utilizados nas aulas? O que é que os aprendentes acham dosmateriais eletrónicos escolhidos pelo professor? Como devem ser os livros didáticos se pensados no contexto do mundo digital? Por que os multiletramentos na escola, especialmente o letramento digital, tornam-se importantes para o ensino de PLE? Esperamos que tais questionamentos possam promover discussões entre os participantes de diversos países com o objetivo de trocar experiências exitosas de uso de recursos tecnológicos visando promover o ensino de PLE no contexto dos multiletramentos e da cultura digital. COORDENAÇÃO Acir Mário Karwoski Universidade Federal do Triângulo Mineiro [email protected]; [email protected] Zhang Weiqi Universidade de Estudos Internacionais de Shanghai [email protected] [email protected] 607 608 QUE GRAMÁTICA DO PORTUGUÊS BRASILEIRO USAR NO ENSINO DE PORTUGUÊS COMO LÍNGUA ESTRANGEIRA? Luiza Ujvari Pabst – UFRGS Considerando o grande crescimento econômico do Brasil e a atração de olhares para o país, que hoje se configura como uma economia emergente, cheia de potenciais e oportunidades, e a consequente expansão do ensino de português como língua estrangeira (PLE) no mundo, é necessário pensar de forma mais criteriosa sobre o ensino de português que é oferecido para estrangeiros no Brasil. Assim, várias questões ainda sem resposta surgem constantemente para os professores brasileiros de PLE, como a questão da variação linguística, ponto central nas mais diversas discussões sobre o ensino de línguas e, é claro, também central nas discussões sobre o ensino de português brasileiro (PB). Sendo assim, após discorrer brevemente sobre a constituição e a formação do PB e sobre a definição de norma culta no Brasil, analiso dois livros didáticos de PLE (Novo Avenida Brasil, 2010, e Muito Prazer, 2008) e duas gramáticas de PB (PERINI, 2010 e BAGNO, 2012) em três pontos gramaticais considerados polêmicos para o ensino (a concordância nominal, o uso dos pronomes demonstrativos esse x este e o uso e a colocação dos pronomes oblíquos), tentando buscar uma resposta para a pergunta que intitula este trabalho: “que gramática do português brasileiro usar no ensino de português como língua estrangeira?”. Neste trabalho, entende-se o conceito de “gramática” de duas formas: “gramática” como “norma gramatical” e “gramática” como “compêndio gramatical”. Assim, busca-se uma definição de norma culta do PB, considerando especialmente o ensino de português para estrangeiros (PPE), bem como um livro didático e um compêndio gramatical que se mostrem adequados para auxiliar o professor de PLE/PPE no seu trabalho. Para isso, analisam-se os quatro livros acima citados, que foram escolhidos de acordo com dois critérios gerais: publicação recente e relevância. No caso dos livros didáticos, foi escolhido um livro bastante conhecido e outro não muito popular, possibilitando a discussão de uma obra bastante utilizada e de outra pouco conhecida. Os compêndios gramaticais foram escolhidos pelos mesmos critérios gerais e pelo fato de ambos descreverem o PB (norma falada no Brasil). MULTILETRAMENTOS NO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA E LITERATURA COM ALUNOS SURDOS Alessandra Gomes da Silva – INES A presente comunicação tem como objetivos descrever e refletir acerca de atividades propostas para o ensino de literatura e língua portuguesa escrita como segunda língua, no contexto de educação de surdos, no Instituto Nacional de Educação de Surdos. Nele, pretendemos, então, buscar compreender como se desenvolve a construção das habilidades de leitura e escrita desses alunos, por meio do uso de diferentes tecnologias, aliadas ao seu processo de letramento, tendo como base um trabalho com textos de diferentes gêneros e suportes. Nesse sentido, consideramos que letramento é, citando Kleiman (1995:18/19), “um conjunto de práticas sociais, que usam a escrita, como sistema simbólico e como tecnologia, em contextos específicos, para objetivos específicos”. Por conseguinte, acredita-se que o desenvolvimento das habilidades de leitura e escrita deva favorecer tanto uma leitura crítica dos textos, como da própria sociedade em questão. Atualmente, percebe-se ainda que o conceito de letramento envolve o domínio de diversas linguagens que caracterizam nossa sociedade multissemiótica. Ao abordar a questão desses múltiplos letramentos, Rojo (2009) questiona as práticas utilizadas pela escola que já não contemplam a multiplicidade de códigos envolvidos nos textos atuais. Considera-se, assim, que com o uso das novas tecnologias, houve uma diversificação dos gêneros textuais. Tais linguagens, contudo, não se limitam ao uso da imagem ou ao uso da palavra, mas funcionam na imbricação de tais códigos que implicam em 608 609 formas diferenciadas de apropriação da mensagem. Por conseguinte, esperamos que a escola torne nossos alunos eficientes nos mais variados usos de linguagem, incluindo a literária. No tocante mais especificamente à educação de surdos, com a publicação da lei de Libras, (Língua Brasileira de Sinais, 2002)1, legitima-se o direito de o surdo ter acesso a uma língua que seria sua língua natural, como 1° língua, ponto de partida para qualquer outra aprendizagem. Tal aceitação acarretará numa experiência de bilinguismo, calcada na compreensão da surdez enquanto diferença (Skliar, 1998), reconhecendo seu direito ao aprendizado da língua de sinais e a língua portuguesa, em sua modalidade escrita, como 2° língua, aproximando-o do ensino de língua portuguesa para estrangeiros, ainda que para o surdo a aprendizagem do português escrito não seja uma opção, uma vez que dele é exigido, nesta modalidade, como qualquer outro falante nativo. Baseado em Salles (et al.,2004), analisamos também a possibilidade de algumas características da língua de sinais possam interferir no processo de aprendizado desses alunos. Cita-se, como exemplo, a questão da LIBRAS ser uma língua com estruturas linguísticas simultâneas e não lineares, na qual há superposição de categorias gramaticais, enquanto o português é uma língua linear. Nesse contexto, tendo como base os estudos de Fernandes (2006:6), consideramos a necessidade de que os surdos “mergulhem no mundo da leitura e da escrita por processos visuais de significação que têm a língua de sinais seu principal elemento fundador”. Aliás, compreende-se, portanto, que as ferramentas oriundas dos recursos digitais possibilitam uma maior visibilidade da Libras e podem potencializar a aprendizagem do português. Tal aprendizado deverá ter um caráter instrumental, voltado para o uso em práticas sociais, nas se quais se façam necessárias as habilidades de leitura e escrita. Assim, sabemos que são muitos os desafios para a inserção dos nossos alunos no universo da cultura letrada. Buscamos, com trabalhos como esse, discutir como o uso das novas tecnologias em sala de aula pode permitir outras formas de ensinar e aprender, contribuindo para um maior domínio da língua portuguesa escrita, bem como para a formação de alunos capazes de produzir análises mais refinadas e criativas de leitura, tornando-os ainda mais críticos, além de possibilitar uma ampliação de seu repertório cultural. USO DE RECURSOS ELETRÓNICOS NO ENSINO DE PLE Zhang Weiqi – Universidade de Estudos Internacionais de Shanghai (SISU) Há mais de 50 anos que começou o ensino de Português na República Popular da China e limita-se, sobretudo, nas Universidades enquanto estas não se regularizavam a admissão de estudantes. Comparando com o ensino de outras línguas estrangeiras no território chinês, o ensino da Língua Portuguesa não possui uma grande relevância. Assim, é natural a carência de todas as condições relacionadas ao ensino e à aprendizagem de Português, inclusive os materiais didácticos para concretizar o nosso trabalho. Hoje em dia, mesmo que haja grandes desenvolvimentos no ensino de Língua Portuguesa, bem como esforços na publicação de manuais de PLE destinados aos aprendentes, continuamos a sentir uma grande falta tanto para as aulas, como para as pesquisas. Porém, o avanço tecnológico, especialmente a Internet, fornece-nos possibilidades de aproveitamento de recursos electrónicos para as aulas, superando a barreira geográfica entre os principais países de Língua Portuguesa e a China. Ao mesmo tempo, como professores, para atender as exigências de aprendizagem dos nossos alunos, nós devemos formular estratégias de utilização dentro de uma vasta quantidade de recursos electrónicos disponível na Internet, bem como prestar assistência ou orientação aos nossos alunos na hora de usarem tais recursos. Nesta comunicação, gostaríamos de atribuir ênfase ao desenvolvimento apropriado e ao uso adequado de recursos electrónicos para o ensino de PLE na China, particularmente do aproveitamento de bancos de dados comerciais, de recursos electrónicos de consulta, de recursos multimédia, entre os outros, contribuindo, desta maneira, para a sistematização de recursos electrónicos aplicáveis ao ensino, assim como para a melhoria das condições ligadas ao ensino e aprendizagem de Português. 609 610 POSSIBILIDADES DE CONSTRUÇÃO E APLICAÇÃO DE MATERIAL DIDÁTICO PARA DISPOSITIVOS MÓVEIS: UM METODOLOGIA PARA PRODUÇÃO E USO DE CONTEÚDOS E EXERCÍCIOS EM SMARTPHONES Lafayette Batista Melo – IFPB Este trabalho descreve uma metodologia de produção de conteúdos e exercícios para smartphones. É feita uma descrição dos apps e websites móveis bem como de suas vantagens para usos gerais na educação. São mostradas as características necessárias a bons apps e websites móveis, detalhando o que deve ter: nos layouts e telas específicas dos smartphones e outros dispositivos, na tela de abertura, nas permissões de uso, na usabilidade, na funcionalidade, no uso online e offline, quanto à simplicidade e ao desempenho e em relação à definição de padrões. Em seguida, são detalhados os cuidados que devem ser levados em consideração para a construção dos websites móveis educacionais e apps com finalidades pedagógicas: dispositivos usados por alunos e professores (compatibilidades), verificação dos recursos comuns e não comuns para alunos e professores, verificação da apresentação correta do conteúdo, identificação de recursos ou componentes necessários para o app ou website mobile educacional, tela / página introdutória do assunto a ser tratado, tabela de conteúdos, tutoriais, quizzes, questionários e surveys, formulários e formatos de entrada específicos. Posteriormente, são analisadas ferramentas de construção sem necessidade de programação, considerando as características de bons programas na educação móvel, conforme os recursos tecnológicos que dispõem, mas também de acordo com o que podem fornecer para um usuário leigo em programação. É feita uma descrição delas, procurando-se balancear as necessidades dos professores com o que os construtores rápidos podem fazer, comprometendo o mínimo possível as boas características desejáveis em programas na educação móvel. As ferramentas construtoras descritas são essas: Holly Cow, DroidGenerator, SkyBuilder, TapCrowd, AppsGeyser, BuzzTouch, AppsBar, WizardApp, Appsbuilder, Onbile, Mimplt, Andromo, HAC, AppInventor, Mobile Roadie, Appacelerator, Mobione, Lianja, Learncast, APPMK, App Maker for Android, Mobile Test eThe App Builder. A partir da escolha de uma das ferramentas, são mostrados o passo a passo da metodologia de construção e aplicação em nove atividades: 1) pesquisa de material gratuito para utilização, 2) construção do design conforme a necessidade da disciplina, 3) criação, distribuição e publicação de conteúdo para os alunos, 4) verificação do progresso dos alunos, 5) disponibilidade de conteúdo no formato de imagens, vídeo, áudio e documentos para o assunto tratado, 6) verificação de respostas dos alunos e comentário dos professores, 7) formatos prontos de quizzes, questionários e surveys, 8) criação de turmas e grupos e 9) integração com blogs, redes sociais e ambientes virtuais de aprendizagem. Para validar a metodologia, é construído um aplicativo para a disciplina de “Fundamentos de EaD” de um curso de Letras a Distância cuja experimentação é realizada com os tutores em formação. São analisados os usos conforme as das boas diretrizes de apps e websites móveis e é aplicado um questionário de satisfação com os tutores. Pôde-se verificar um alto grau de satisfação com os tutores, que pretendem também disponibilizar novas versões do material para os alunos do curso. LIVROS DIDÁTICOS DIGITAIS (LDD) PROTÓTIPOS PARA ENSINO DE LÍNGUAS Acir Mário Karwoski – UFTM/LABELFE/UFTM O cenário com as inovações tecnológicas aponta para a iminente implantação de livros didáticos digitais (LDD) nas escolas em substituição ao livro didático impresso. A mídia traz noticias de que muitas escolas da rede privada substituem gradativamente o livro didático impresso por dispositivos móveis tais como tablets. Assim, não será possível apenas transferir para o formato digital em pdf (portable document format) o teor do livro impresso. É preciso que o livro didático digital configure-se como uma ferramenta interativa de ensino. Nossa comunicação tem como objetivo 610 611 apresentar protótipos visando à implementação de atividades de ensino de língua portuguesa no contexto dos multiletramentos e da cultura digital. Nos livros didáticos digitais há necessidade de atenção para a congruência das múltiplas semioses dos gêneros de textos (palavras, imagens, sons, cores, movimentos) bem como possibilidades de interação (verbal falada e escrita) entre professores, estudantes, comunidade. desafio de desenvolver em sala de aula experiências e protótipos didáticos inovadores no ensino de língua portuguesa visando ao letramento crítico. O Brasil precisa de professores críticos, ousados, inovadores e motivados que topem o desafio de repensar a divisão canônica disciplinar das escolas – que comprovou não ser atrativa aos estudantes da atual geração - para implantar uma cultura de práticas de leitura e escrita voltada à formação crítica dos estudantes, capazes de criar novos sentidos numa sociedade hipermultimodal em constante transformação. Faz-se possível implantar nas escolas, por meio dos livros didáticos digitais, a pedagogia dos multiletramentos. Na multiplicidade de linguagens, mídias e tecnologias, dominar novas ferramentas tais como áudio, vídeo, tratamento da imagem, edição e diagramação requer novas práticas de leitura, escrita e análise crítica; são necessários novos e multiletramentos. Os multiletramentos funcionam, pautando-se em algumas características importantes: a) são interativos (colaborativos); b) fraturam e transgridem as relações de poder estabelecidas; e c) são híbridos, fronteiriços, mestiços (de linguagens, modos, mídias e culturas), conforme Rojo (2012). Nos protótipos de livros didáticos digitais torna-se possível vivenciar os multiletramentos no ensino de línguas. 611 612 SIMPÓSIO 57 SISTEMATIZAÇÃO LINGUÍSTICA DO PORTUGUÊS O contato entre os povos, as misturas das línguas e a modificação dos sistemas linguísticos, assim como a emergência de sistemas linguísticos novos, a partir das línguas em contato, são fenômenos naturais e comuns em qualquer lugar e em qualquer época. Todavia, diferentes situações de contato imprimem características e ritmos específicos aos processos de definição dos novos sistemas linguísticos. A expansão portuguesa, com ocupação territorial sumária, levou à intensa difusão da língua portuguesa, acarretando uma ocupação linguística de territórios situados nos quatro continentes. Nesse contexo, o contato entre os povos promoveu a interação entre as línguas desses povos. O resultado dessa interação linguística foi uma profunda modificação da língua portuguesa e o surgimento de diferentes sistemas linguísticos, todos ancorados na língua portuguesa. Esses novos sistemas linguísticos vêm se firmando ao longo do tempo, apresentando instabilidades sistêmicas, tais como as variações de múltiplas ordens, as mudanças em progresso, dentre outras. Diante disso, pretendemos reunir pesquisadores interessados em discurtir os processos de sistematização do português, situado nos distintos territórios, onde essa língua é usada, seja como idioma oficial seja como idioma extra-oficial. As discussões podem-se apoiar em qualquer um dos domínios de análise da linguagem, abordando o tema de forma comparativa ou interna, sob as perspectivas descritiva ou tipológica – diacrônica e sincrônica. Enfim, esperamos, com este tema, discutir resultados de pesquisas que versem sobre a formação e sistematização de novas línguas, a partir do português, em decorrência do processo das conquistas ultramarinas. COORDENAÇÃO Tânia Ferreira Rezende Universidade Federal de Goiás [email protected] Roland Schmidt-Riese Katholische UniversitätEichstätt-Ingolstadt [email protected] Mathias Arden Katholische UniversitätEichstätt-Ingolstadt mathias.arden@ku- eichstaett.de 612 613 O PORTUGUÊS COMO LÍNGUA PLURICÊNTRICA: O CASO DE ÁFRICA Benjamin Meisnitzer – Munique A expansão ultramarina nos séculos XV e XVI levaram a Língua Portuguesa a quatro continentes. Nas regiões que na Filologia Românica de tradição germânica são designadas de „romania nova“, o Português tomou rumos distintos na sua evolução motivado por contatos linguísticos locais e um contato de grau variado com o Português europeu com as suas inovações e mudanças lingüísticas ao longo dos tempos. Partindo do postulado do Português como língua pluricêntrica, com uma norma na Europa e uma no Brasil (pelo menos!) (cf. Pöll 2001, Arden 2010), a presente comunicação pretende refletir a complexidade da realidade do Português em África, que não pode de todo ser entendida como uma realidade homogênea conforme sugere o termo por vezes utilizado na literatura. Procurar-se-á explicar a diversidade e o caráter multifacetado do Português em África recorrendo a aspectos de contato linguístico, a cenários de aquisição de linguagem, ao papel dos mídia e a aspetos sociolinguísticos, determinantes na implementação de uma norma endógena fora dos centros normativos europeus decisivos na altura da expansão, no caso da presente comunicação, para o Português. Partindo da necessidade de coadunar a percepção dos falantes e a sua valorização da própria língua com aspetos estruturais internos da mesma para se poder falar de pluricentrismo no sentido do termo cunhado por Clyne (1992 e 2004) e Oesterreicher (2001), procuraremos aclarar o impacto que os divergentes cenários de contato e aquisição e as diferentes realidades lingüísticas nos PALOP têm no(s) diassistema(s) do Português, conduzindo nalguns casos à emersão de novas normas standard, a par das normas do PE e do PB, situação até à data apenas abordada marginalmente nalguns estudos pontuais (cf. Endruschat 1997 e 2008, Gonçalves 1996 e 2005). ‘OS CARA CONFIA EM MIM’: VARIAÇÃO MORFOSSINTÁTICA, ESTILO E (SOCIO)INDEXICALIDADE NO PORTUGUÊS BRASILEIRO Mathias Arden – Universidade Católica de Eichstätt-Ingolstadt, Alemanha Ultimamente, novos rumos no âmbito da sociolinguística têm lançado um olhar privilegiado sobre o comportamento estilístico do falante individual conforme suas intenções sociais (Agha 2003, Reich 2009, Cutillas-Espinosa & Hernández-Campoy 2012). Enquanto na linguística de variedades (Coseriu 1988, Koch/Oesterreicher 2007) os estilos linguísticos são subcategorizados como pertencendo à dimensão diafásica do diassistema, que define a marcação de formas linguísticas a partir da situação comunicativa na qual os falantes as utilizam (p.e. estilo familiar vs. formal/elevado), a sociolinguística atual encara estilos numa perspectiva holística focalizando aspectos socio-psicológicos da interação e seus participantes. De um ponto de vista diacrônico, a relevância de tal visão para a variação interna do (dias)sistema reside no fato de uma forma linguística originalmente considerada como regional ou social se poder tornar um marcador estilístico, num processo de reindexicalização (Eckert 2008, Auer 2012). Sincronicamente, a análise estilística que compreende a escolha de formas linguísticas no discurso como uma manifestação de símbolos sociais e como ato intencional revela fatos interessantes para a competência linguística ao nível pragmático. A contribuição pretende lançar um olhar diferenciado sobre o uso estilístico de três variáveis morfossintáticas no português brasileiro, a variação tu/você, a concordância de número em sintagmas nominais, e a concordância verbal na 3ª pess. do plural. A comparação leva em conta resultados de estudos que se baseiam em parâmetros (socio-)estilísticos tradicionais, isto é, o nível de formalidade da situação comunicativa (Paredes Silva 2003, Lopes et al. 2009), e dados de estudos que mostram a relevância da orientação socio-cultural do falante na escolha estilística das variantes. Neste âmbito, serão apresentados dados oriundos de entrevistas com cantores de rap paulistas (Bentes 2009), como também de diálogos de novelas da Globo. As falas de gêneros populares veiculadas pela mídia são de especial interesse, visto que tornam nitidamente visível o 613 614 processo de meta-reflexão lingüística conhecido por ‘estilização’ (stylization, vj. Coupland 2007), no qual variantes linguísticas são instrumentalizadas, segundo as convenções do gênero, para a projeção de personae, refletindo atitudes individuais e ideologias, e sinalizando a pertença a um determinado grupo social. CONTATOS E DESACATOS: OS LÍNGUAS NA FRONTEIRA ENTRE SOCIEDADE COLONIZADORA E INDÍGENAS (1740 A 1889) - GOIÁS. Thiago Cancelier Dias – UFG O texto versa sobre a existência de um cargo ou função de poder destinado a indígenas que são conhecidos pela designação de línguas nos documentos históricos por possuírem a capacidade de se comunicarem em língua materna e português. Esses faziam a interlocução entre a sociedade colonizadora e as comunidades indígenas nos descimentos e aldeamentos realizados pelos colonizadores no intuito de liberar as terras e angariar mão de obra indígena nos séculos XVIII e XIX. Tem-se a hipótese que os aldeamentos eram os espaços próprios para a formação dessas pessoas em Goiás, e que as possibilidades de atuação, a maneira como eram representados, e o processo formativo no qual estavam envoltos se alterou com o processo histórico de expansão da fronteira colonialista e consolidação do Estado Nacional. A pesquisa é elaborada a partir de preceitos da microhistória social, e parte do jogo de escalas de analise para investigar os diferentes contextos que permearam a trajetórias de vidas de pessoas com experiências de vida emblemáticas para a compreensão histórica. Entende-se que os interpretes militares, ou línguas, assumiam importância singular pela dificuldade de compreensão e diálogo entre os colonizadores e os indígenas falantes de línguas do tronco macro-jê. Estudam-se as formas de agencia e o processo formativo desses indígenas a partir da investigação sobre o aldeamento de Mossâmedes (17811832) e do Colégio de Línguas Princesa Imperial Dona Isabel (1870-1889). O aldeamento é inquirido a partir do estudo da agencia de duas indígenas, uma era a karajá cuja atuação é descrita na carta enviada pelo alferes José Pinto da Fonseca sobre a bandeira entre os karajá da ilha do Bananal (1798) ao general de Goyases. Enquanto a outra língua é a kayapó Damiana da Cunha que foi a responsável pelo descimento de indígenas e pela manutenção do aldeamento por vários anos. Com a consolidação do Estado brasileiro e com a elaboração de novas leis quanto aos indígenas, colégios passaram a ser fundados nos aldeamentos, na maioria conduzidos por missionários capuchinhos, com a especificidade de formar, também, línguas. Momento que é indagado no texto à existência do Colégio de Línguas Princesa Imperial Dona Isabel. ESCOLAS QUE CONTAM HISTÓRIAS: O PROCESSO DE NOMEAÇÃO NAS CIDADES DE GOIÁS Henrique Silva Fernandes – UFG Lorena Araújo de Oliveira Borges – UFG/CAPES Tânia Ferreira Rezende Santos – UFG O principal objetivo desse artigo é discutir de que forma os nomes das escolas estaduais de Aruanã, Pirenópolis e Cidade de Goiás contribuem para a constituição da identidade histórica dessas cidades. A história de uma determinada região pode ser contada tanto a partir dos fatos e acontecimentos que marcaram aquele local, quanto pelo estudo das impressões deixadas na memória da população. Nesse último caso, uma investigação que tem ganhado cada vez mais destaque é a análise dos topônimos. Tal investigação é realizada pela toponímia que, de acordo com a perspectiva de Dick (1990), é o estudo dos enunciados lingüísticos formados por um universo transparente significante que reflete aspectos culturais de um núcleo humano existente ou pré614 615 existente. Nesse sentido, os nomes dos lugares se constituem enquanto memória lexical de um determinado lugar, que pode ser mapeada a partir da investigação das motivações que levaram àquelas designações. Para alcançarmos esse objetivo, realizamos o levantamento dos nomes das escolas estaduais dos municípios em questão no banco de dados da Secretaria de Estado da Educação e adotamos a metodologia que Dick (1996) propôs para a pesquisa antroponímica, que implica (i) a quantificação dos nomes e das taxonomias, analisando a maior ou menor freqüência de classes ou itens lexicais; e (ii) o estudo dos nomes a partir de um enfoque etnolingüístico. UMA REFLEXÃO SOBRE O SISTEMA DOS PRONOMES EM CRIOULO DE GUINÉBISSAU Rogério Vicente Ferreira – UFMS O presente trabalho abordará a questão pronominal do falar crioulo (forma de escrita atual, adotada pelo Ministério da Educação) de Guiné-Bissau (KGB). O crioulo, apesar de não ser considerada pelo governo atual como língua oficial, é a mais falada por todo território guineense. Fora da capital, a população utiliza somente a fala crioulo, além da língua tribal (Balanta, Mandjinga, Manjaco, Papel, Bijagol, Felupe, entre outras). Há um escasso número de trabalhos linguíticos em Guiné-Bissau, tanto com as línguas maternas quanto o falar português e o crioulo. No caso da língua portuguesa a população daquele país a utiliza basicamente para comércio, apesar do governo “forçar” seu ensino nas escolas, o que tem acarretado um grande problema na alfabetização. Hildo (1996) afirma que a situação lingüística de Guiné-Bissau é muito semelhante a da Papua-NovaGuiné. Ele constata, a partir de dados de Ferraro (1991), que 75% da população é falante de crioulo. No entanto, para o governo atual, o estudo dessa língua não é prioridade, nem há interesse no seu uso na escola, apesar de ser o meio de comunicação de toda a população. (1996, p.70). Tendo isso em vista, há muito que ser investigado nesta língua, pois são poucos os trabalhos que descrevem aspectos linguísticos do crioulo de Guiné-Bissau. Assim, nos propomos realizar uma breve reflexão do sistema pronominal, tendo como suporte teórico pressupostos do funcionalistas. Quanto aos dados estes foram coletados através de livretos, da bíblia em crioulo, de livros de histórias infantis e de dados coletados in loco. Schachter (1984) aponta que “todas as línguas do mundo fazem distinção entre classes abertas e classes fechadas quando se referem às partes do discurso.” Como parte das classes abertas os nomes, verbos, adjetivos e advérbios, e das classes fechadas os pronomes, adjuntos nominais, adjuntos verbais, conjunções e outras categorias. Para Bhat (2004: 02) os pronomes podem ser divididos em dois tipos: (i) os pessoais e (ii) e aqueles remanescentes de outros pronomes, dependendo da sua função na língua (demonstrativo, interrogativo, etc), para isso o autor coloca que é importante fazer uma distinção básica entre pronomes pessoais e pro-formas. Os pronomes pessoais são geralmente associados a marcas de caso (benefactivo, experenciador, etc); as proformas, por outro lado, são geralmente usados como: identificador de participantes em um evento, podem funcionar como marcadores de referência, ou como marca de escopo de uma sentença. Diante disso, nosso objetivo, inicialmente, é trabalhar com os pronomes em crioulo, primeiramente por meio de um trabalho comparativo, ou seja, notar com os pronomes das outras línguas krioulas de base portuguesa se formaram e como se comportam. Com isso, comparar como os pronomes em KGB é formado e quais as influências das línguas de GB nesse processo. Em um primeiro momento de nossa análise dividimos em pronomes pessoais, demonstrativos, possessivos e interrogativos. A relação com a forma pronominal do português é clara quanto os demonstrativos e interrogativos, no entanto, os pessoais e possessivos, são originários de outras línguas, que buscaremos compreender no decorrer de nossa análise. Assim, este trabalho é um início a uma descrição e reflexão sobre a situação desta língua dentro da crioulística. 615 616 CONSTRUÇÃO DE FOCO NA POSIÇÃO DE SUJEITO NO CRIOULO DE SÃO NICOLAU: COMPARAÇÃO COM PB, PE E LAs Maria de Lurdes Zanoli – USP O crioulo de São Nicolau (CSN) é um dos nove dialetos do crioulo caboverdiano, inserido no grupo de Barlavento, região que abrange também as ilhas de Boa Vista, Sal, São Vicente e Santo Antão (Quint, 2000: 9). Neste trabalho apresenta-se um estudo preliminar sobre a categoria sintático-discursiva foco na posição de sujeito em CSN, fazendo uma sucinta comparação com a focalização do sujeito no português brasileiro (PB) e em línguas africanas (LA). Para tal, assumimos a definição de foco de Zubizarreta (1997: 1) em que “[...] foco é definido em termos da noção discursiva de pressuposição: o foco é a parte não pressuposta da sentença”. Corroboramos ainda a proposta da autora (op.cit) de que a interpretação de um constituinte focalizado deve ser representada por meio de duas asserções (A) no nível da Forma Lógica (LF): A1, A2, chamadas de estrutura de asserção por Zubizarreta. A categoria foco aponta para uma interface discursiva com praticamente todas as áreas da gramática: interface fonologia/discurso por meio da entonação; interface morfossintaxe/discurso. Em português, por exemplo, a entonação é uma marcação imprescindível para se assinalar o foco como nos mostra Fernandes (2007), apontando para as diferenças entre o PB e PE: (1) Sentença Neutra em PB (2) Sentença Neutra em PE (3) Sentença com Foco Prosódico no PB 616 617 (4) Sentença com Foco Prosódico no PE Estudiosos sobre o foco na posição de sujeito no PE e no PB - Kato & Raposo (1996) entre outros apontam que, no PE, o sujeito focalizado ocorre posposto ao verbo (ordem VS) diferentemente do que se atesta no PB. Em PB o sujeito pode ser focalizado como foco de informação, foco contrastivo ou exaustivo. Em línguas africanas, estudos em aghen levaram os estudiosos como Watters (1979) a reconhecerem a existência do foco polar e polar contra-assertivo. No tocante ao foco no caboverdiano Quint (2010) ressalta que são vários os constituintes que podem ser movidos para a posição de foco: o sujeito, um complemento direto, um complemento preposicional. A sentença com foco contrastivo em (5b) foi conseguida com a seguinte sentença em (5a): (5) a. Anton na Saninklau ta falód ma jent mdjer ta papia d’más, é dvera? “Então, em São Nicolau se diz que as mulheres falam demias, não é verdade?” b. Mtira, ôm é k’ta papia d’más é k' Mtira ôm Mentir home COP COM a m Mentira, homem é que fala demais. 617 ta HAB papia falar d'más demais 618 Para o estudo da focalização do sujeito no crioulo de São Nicolau, partimos da hipótese inicial de que, em CCV, ateste-se a marcação dos tipos de foco ‘assertivo’ e ‘contrastivo’, como se dá em português e em línguas africanas do oeste da África. Na figura acima, obtida a partir do programa praat é possível observar uma elevação da curva entoacional formando um pico entoacional que corresponde ao elemento ôm “homem” na posição de sujeito da sentença, logo o constituinte focalizado. Logo, o propósito desse trabalho é buscar semelhanças e/ou diferenças entre PB, PE, LÃS e CSN no tocante a focalização de sujeito nessas línguas. A ELEVAÇÃO DAS VOGAIS MÉDIAS ÁTONAS FINAIS NO PORTUGUÊS FALADO POR DESCENDENTES DE IMIGRANTES POLONESES EM VISTA ALEGRE DO PRATA – RS Ivanete Mileski – PUCRS Neste trabalho são apresentados os principais resultados de uma pesquisa de mestrado sobre a elevação das vogais médias átonas finais no português falado por descendentes de imigrantes poloneses na cidade gaúcha de Vista Alegre do Prata. A partir dos pressupostos teóricometodológicos da Sociolinguística Variacionista (LABOV, 2008 [1972]), foram realizadas 24 entrevistas de experiência pessoal com falantes representativos da comunidade. Pautados nos estudos de Schmitt (1987), Vieira (1994, 2002, 2010), Roveda (1998), Carniato (2000), Mallmann (2001) e Machry da Silva (2009), todos sobre elevação das vogais médias postônicas na fala do Sul do Brasil, foram controladas variáveis linguísticas e extralinguísticas. A análise estatística dos dados foi realizada com o programa Rbrul (JOHNSON, 2009). Foram encontrados 12.521 contextos para aplicação da regra com a vogal /o/, e 5.980 contextos para a vogal /e/; como se esperava inicialmente, o uso de elevação das vogais médias átonas finais é modesto na comunidade, com o alçamento de /o/ mais freqüente que o de /e/. Mostraram ter papel na elevação de /o/ átono final os variáveis linguísticas Tipo de Sílaba, Contexto Precedente, Contexto Vocálico da Sílaba Tônica, Contexto Seguinte, Localização da Vogal Átona na Palavra, e as variáveis sociais Faixa Etária, Ocupação Profissional e Escolaridade. Na elevação de /e/ átono final, a análise estatística apontou como relevantes as variáveis linguísticas Classe Gramatical, Contexto Precedente, Localização da 618 619 Vogal Átona na Palavra, Contexto Vocálico da Sílaba Tônica, e as variáveis sociais Escolaridade e Sexo. NA MARGEM DO FUTURO – A MODULAÇÃO DO PRÓXIMATIVO NO PORTUGUÊS Sarah Bürk – Katholische UniversitätEichstätt-Ingolstadt Os seres humanos são seres temporais. A faculdade da memória junto com a faculdade de poder gerar expetativas e probabilidades perante o futuro lhes dá a impressão de se encontrar em um perpétuo fluxo do tempo. Porém, o passado e o futuro se distinguem, e isso de maneira fundamental, em sua respectiva natureza fenomenológica. Enquanto que o passado existe em forma de memórias individuais e episódicas, o futuro é uma massa amorfa, imprevisível e em constante mutação. O futuro surge do presente e muda com ele. Embora, perante ele, devido a sua indeterminação empírica, não se podem avançar certezas absolutas, estamos constantemente obrigados a formular projetos e expectativas, seja na nossa concepção individual como pessoa, seja na interação com os outros. Surgindo o futuro do presente, são as condições dele – tanto das pessoas que nele agem, suas intenções e estados atuais, como das disposições materiais e atmosféricas que o definem – que nos deixam tirar conclusões respeitante à presumida proximidade dos eventos esperados no futuro. Quanto mais fatores indicarem no momento presente para a realização de um tal evento, tão mais certo nos parece que ele se realize e tão mais perto se apresenta o momento da realização dele. Resulta de esta constante discrepância entre o criar expetativas e a concretização das mesmas um estado de suspense. Nós em função de falantes e criadores do discurso podemos tomar em consideração esses parâmetros de certeza e proximidade na codificação do futuro, simplesmente descrevendo as impressões do presente ou seguindo nossas intenções comunicativas. Na mesma, podemos muito bem ignorá-los quando se mostra prescindível especificá-los. Assim resulta que podemos superar essa fase de suspense e de indeterminação fenomenológica deixando começar eventos, em princípio localizados no futuro, já no momento da fala ou, pelo contrário, encenar essa fase mediante estruturas linguísticas que intencionam precisamente fazê-la visível. Na tipologia esse conceito se chama ‘próximativo’. O próximativo enfoca a fase de um evento que se situa na margem inicial do mesmo e que lhe atribui a qualidade de ‘estar ao ponto de acontecer’. Essa contribuição pretende, por tanto, analizar quais as realizações do próximativo que desenvolveu o português, tanto na sua expressão brasileira como europeia, e quais as diferenças entre elas. A contribuição pretende abordar o tema partindo de um enquadramento mais global do subconceito do próximativo no conceito maior do futuro para desembocar em uma exposição mais específica da respetiva actualização do conceito do próximativo no português. SISTEMATIZAÇÕES NO USO DAS FORMAS DE TRATAMENTO. UMA ABORDAGEM HISTÓRICA DO PB Roland Schmidt-Riese – Katholische UniversitätEichstätt-Ingolstadt Os sistemas de tratamento das línguas europeias passaram por um profundo processo de reestruturação, quando as sociedades europeias passaram da Idade Média para a Idade Moderna. Os sistemas ancestrais que distinguiam simplesmente entre uma forma de respeito (vos) e outra de intimidade (tu) ficaram ampliadas mediante o uso de outros pronomes (ele) ou de sintagmas nominais (vossa mercê) que mesmo integrando possessivos de segunda pessoa levaram a obscurecer o limite entre essa (precisamente a pessoa da alocução) e a terceira pessoa (de referência extrasituacional). O obscurecimento foi o modo de operar das formas inovadoras de respeito máximo. Enquanto que o português europeu se mostra relativamente conservador com respeito a outras línguas europeas, considerando as mudanças ocorridas desde a Primeira Idade Moderna, o PB procede a reestruturar esse sistema em função de necessidades sociais bem diferentes. A 619 620 contribuição vai procurar determinar o grau de sistematização das formas de tratamento no PB, levando em conta os paradigmas pronominais, a aceitabilidade variável das antigas formas da segunda pessoa nesses vários paradigmas, efeitos semânticos e pragmáticos que possam estar relacionados com o uso de umas e outras formas, a variação regional do PB. ANÁLISE SOCIOLINGUÍSTICA DA ALTERNÂNCIA DOS PRONOMES TU E VOCÊ NO RECÔNCAVO BAIANO Ludinalva Santos do Amor Divino - UNEB O estudo trata da variação das formas tu/você em Santo Antônio de Jesus – Ba. Objetivamos identificar os fatores lingüísticos e sociais que determinam a seleção de uma ou de outra forma. O estudo foi realizado dentro dos pressupostos da sociolingüística variacionista descritos por Weinreich, Labov e Herzog (1968). São analisadas amostras de fala de pessoas de três faixas etárias, de 15 a 35 anos; de 36 a 55 anos e acima de 55 anos, dos sexos feminino e masculino, com escolaridade de nível superior; nível fundamental e semi-analfabetos.Os corpora foram constituídos por: a) um questionário pré-elaborado com 22 questões de caráter objetivo e subjetivo aplicados com 18 informantes, o que denominamos de gravação não secreta; b)dez conversas informais sem controle dos fatores sociais: idade, sexo e escolaridade, obtidas de forma secreta, envolvendo de três a seis participantes. A análise dos dados resultante da aplicação do questionário demonstra que o pronome você (79%) tem a preferência dos falantes santoantonienses uma vez que, o mesmo corresponde ao triplo de uso do tu (21%). Buscamos também analisar outros fatores de cunho lingüístico: monitoramento; tipo de relação: íntima e não íntima; correlação dos pronomes pessoais com pronomes possessivos; relação de poder e referenciação direta e referenciação indireta. A CONCORDÂNCIA NOMINAL DE GÊNERO NA LÍNGUA FALADA DE RIO DE CONTAS-BAHIA Evani Pereira Rodrigues – UEFS Norma Lúcia Fernandes de Almeida – UEFS Este trabalho tem como tema a análise variacionista da concordância nominal de gênero em sintagmas nominais a partir dos corpora de Língua falada das comunidades rurais de Bananal-Barra dos Negros, localizadas no município de Rio de Contas, Chapada Diamantina, Bahia. O estudo tem como objetivo identificar os fatores extralinguísticos que interferem no uso da concordância nominal de gênero no SN. A análise sobre concordância nominal nos sintagmas em estudo baseouse na relação língua e sociedade com a adoção da metodologia sociolinguística quantitativa laboviana (SANKOFF, 1988). A partir dos dados numéricos, foi feita uma abordagem qualitativa, pois foram discutidas questões que envolveram aspectos lingüísticos e extralinguísticos. Os corpora analisados constituem-se de entrevistas com homens e mulheres de diferentes faixas etárias e níveis de escolaridade. Essas entrevistas foram feitas através da configuração DID, ou seja, Diálogo entre informante e documentador. Inicialmente, destacamos a ocorrência de uso da concordância nominal de gênero em sintagmas nominais presentes na amostra (a variável dependente), seguida pela identificação do conjunto de elementos linguísticos e extralinguísticos que favoreceram ou não o uso da concordância em análise. Dentre os elementos linguísticos foram analisados a posição sintática do SN; constituição sintagmática do SN; constituição morfológica do nome núcleo do SN; caracterização semântica do nome núcleo do SN. Já os fatores extralinguísticos destacamos: o sexo/gênero; faixa-etária; o nível de escolaridade; a língua nativa; o informante e a comunidade. Para obtenção dos resultados estatísticos desta pesquisa, utilizou-se o programa computacional Goldvarb, que selecionou os grupos de fatores mais significativos e calculou os pesos relativos dos 620 621 fatores em relação à variável dependente e sua frequência de uso de acordo às variáveis lingüísticas e extralingüísticas. Os resultados nos levam a afirmar que não há variação significativa nas amostras analisadas. A ALTERNÂNCIA DOS PRONOMES TU E VOCÊ NO FALAR POPULAR DE FORTALEZA: UMA PERSPECTIVA VARIACIONISTA Tatiane de Araújo Almeida Studart Guimarães – UECE/FUNCAP Aluiza Alves de Araújo – UECE Este trabalho aborda a alternância dos pronomes tu e você no português falado em Fortaleza, com o intuito de contribuir para o ensino de língua materna e de língua estrangeira, além de conhecer melhor o sistema pronominal do português brasileiro. Os alicerces teóricos que sustentam esta pesquisa pertencem à teoria variacionista, que tem como concepção a de que a variação e a mudança são inerentes à língua, que é vista como sendo motivada tanto por fatores linguísticos quanto por fatores extralinguísticos. No português brasileiro falado, observam-se diversos fenômenos variáveis, entre eles, um bastante frequente, a alternância do uso das formas de tratamentos tu e você. Sobre este fenômeno, vários estudos, sob a perspectiva variacionista, vêm sendo realizados nas mais diversas regiões do Brasil. Em Fortaleza, apesar de haver estudos sobre o uso dos pronomes, ainda não houve estudos de cunho variacionista e que tenha, para análise dos dados, um suporte de ferramenta estatística. Para desenvolvermos esse trabalho, temos uma amostra constituída por 36 inquéritos do tipo D2 (Diálogo entre dois Informantes), extraídos do banco de dados NORPOFOR (Norma Oral do Português Popular de Fortaleza), realizado no período de agosto de 2003 a julho de 2006. O perfil dos informantes que constituem este corpus é o seguinte: todos são nascidos em Fortaleza ou vieram morar nesta cidade com, no máximo, cinco anos de idade; possuem pais cearenses; nunca se ausentaram de Fortaleza por um período superior a dois anos consecutivos; mantém residência fixa na capital cearense. Estes critérios servem para tentar reduzir a influência de outras regiões. Os participantes foram selecionados em função do gênero (masculino e feminino), da faixa etária (I: 15 a 25 anos; II: 26 a 49 anos; e III: a partir dos 50 anos), escolaridade (A: 0 a 4 anos; B: 5 a 8 anos; e C: 9 a 11 anos) e tipo de registro (Diálogo entre Informante e Documentador: DID; Diálogo entre dois Documentadores: D2; e Elocução Formal: EF). Quanto ao último critério, selecionamos o D2, por ser o estilo de fala menos monitorado e, por isso, o mais propício ao estudo dos pronomes. Pretendemos verificar qual pronome (tu ou você) é mais frequente e quais fatores sociais, dentre os analisados, mais influenciam a ocorrência desses pronomes no falar popular do fortalezense. Como esse trabalho está em andamento, os resultados ainda estão inconclusos. MORFEMA ZERO NO PORTUGUÊS BRASILEIRO: CONCEITOS E PRINCÍPIOS DE ANÁLISE Carolina Gonçalves Gonzalez – UNB Edite Consuêlo da Silva Santos – UNB Letícia da Cunha Silva – UNB Magnolia de Souza Lira – UNB Maria Felícia Romeiro Mota Silva– UNB O morfema zero é um fenômeno linguístico comum que ocorre em casos de flexão, mas mesmo assim não é discutido pela gramática tradicional e é ainda pouco explorado na área da Linguística. Segundo Silva e Koch (1999, p.23), essa categoria “resulta da ausência de marca para expressar determinada categoria gramatical”; a sua função é cumprida pelo vazio (representado por Ø) que é 621 622 considerado significativo pelo sistema da língua. Assim, postula-se morfema zero quando há ausência do morfe, que só pode ser percebido em contraste com outros. O que se avalia desta questão é que o silêncio também traz muitas informações, uma vez que o significado resulta de um significante zero. O vazio (ausência de configuração fonemática) que representa uma realidade morfêmica será considerado morfema zero se, e somente se, for sistemático, inerente à classe gramatical que está em análise e nos casos de flexão. Sem a formação de pares opositivos para análise de elementos gramaticais não se poderia cogitar esses conceitos. No Português Brasileiro, são frequentes os casos de morfema zero em flexão verbal (modo-tempo e número-pessoa) e em flexão nominal (número e gênero). O propósito deste artigo é apresentar conceitos que caracterizem o morfema zero no Português Brasileiro, bem como os postulados teóricos que sustentam estes conceitos. Serão os dados do referido sistema linguístico que servirão de exemplo para ilustrar as correntes teóricas apresentadas nesta pesquisa. Para tanto, buscou-se realizar uma revisão de literatura com base nas análises de Câmara Jr. (2009, 2011); Lopes (2008); Mel’čuk (2001); Silva e Koch (1999); Zanotto (1986) e outros. Essa temática pertence à área da Morfologia definida por Aronoff & Fudeman (2005, p. 01-02) como um “sistema mental envolvido na formação de palavras ou com o ramo da Linguística que lida com palavras, a sua estrutura interna, e como são formadas”. E é por esse caminho que enveredaram as análises desta pesquisa. IDENTIDADE LINGUÍSTICA EM ZONA DE MIGRAÇÃO NA AMAZÔNIA Emanuel da Silva Fontel – UFPA Regina Célia Fernandes Cruz – UFPA O presente trabalho examina aspectos identitários, presentes em narrativas de caráter pessoal de falantes que migraram para a região da Amazônia paraense, em virtude de projetos econômicos ali implantados. As narrativas compõem o “corpus” de um projeto de pesquisa intitulado Vozes da Amazônia, que investiga uma série de aspectos do contato interdialetal em zona de migração da Amazônia paraense. Tal projeto está vinculado oficialmente à Faculdade de Letras do Instituto de Letras e Comunicação da Universidade Federal do Pará. As perspectivas teóricas que embasaram a análise dos dados compreendem a Sociolinguística Variacionista de Willian Labov, Os Estudos da Identidade Cultural, segundo Stuart Hall em consórcio com a Análise de Discurso de Linha Francesa. 622 623 SIMPÓSIO 58 POLÍTICAS LINGUÍSTICAS E PRÁTICAS DE ENSINO DE PORTUGUÊS EM CONTEXTOS INTERCULTURAIS Neste simpósio, pretendemos reunir pesquisadores e professores de português que desenvolvem estudos e reflexões sobre a prática de ensino de português, em contextos de interculturalidade, no âmbito da lusofonia. No século XXI, vivemos um momento de, que pode ser denominado genericamente de Paradigma das Políticas de Diversidade. Em todas as esferas sociodiscursivas, a diversidade é reconhecida, valorizada e exaltada. Apesar disso, as línguas minorizadas continuam desaparecendo e as comunidades minorizadas continuam relegadas à margem dos direitos humanos mínimos e inalienáveis. As políticas linguísticas e de letramento, com suas práticas de ensino ancoradas na interculturalidade e na sustentabilidade linguística e cultural, por meio da educação escolar bilíngue, não têm conseguido evitar o deslocamento e a morte das línguas e das cultuas que se encontram em contato com línguas majoritárias em contextos de construção hegemônica de sociedades integradas economicamente. Nesse sentido, nosso objetivo, no momento, é refletir sobre as práticas de ensino de Português como L1, L2, L3 ou LE. Para tanto, intentamos reunir porfessores e pesquisadores preocupados com o ensino de português em contextos interculturais, como os estudos sobre os usos e as práticas de ensino de português em territórios lusófonos resultantes de processos de colonização, em territórios fora da lusofonia, como LE, e em comunidades minorizadas, como as indígenas, as quilombolas e as remanescentes dos processos de imigração ocorridos no final do século XIX e início do século XX, nas américas. COORDENAÇÃO Maria Gorete Neto Universidade Federal de Minas Gerais [email protected] Tânia Ferreira Rezende Universidade Federal de Goiás [email protected] 623 624 PORTUGUÊS-ACADÊMICO E INDÍGENAS: PRÁTICAS DE ENSINO DE LÍNGUAS NA UNIVERSIDADE Maria Gorete Neto – UFMG O objetivo deste artigo é discutir o processo de apropriação do português-acadêmico por universitários indígenas. As reflexões, em andamento, são frutos de minha trajetória como professora de língua portuguesa para indígenas, função esta que tem me desafiado desde 1999 quando comecei a dar aulas de português como segunda língua, no ensino fundamental da escola do povo Tapirapé, no Mato Grosso. Posteriormente, minha prática concentrou-se no Ensino Médio Tapirapé e, atualmente, tenho atuado no curso de Licenciatura Intercultural para Educadores Indígenas da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais, que atende distintas etnias como Xacriabá, Pataxó, Pankararu, Guarani e Tupiniquim. Embora minha prática docente tenha se dado nos três níveis de ensino distintos citados e que cada um destes tenha características próprias, permanecem alguns questionamentos em relação ao processo de ensinoaprendizagem da língua portuguesa para indígenas que parecem independer de a educação escolar ocorrer dentro dos territórios indígenas ou na universidade. Inicialmente deve ser dito que o ensino de português para indígenas guarda algumas especificidades. Em primeiro lugar, a língua portuguesa é para o índio a língua do colonizador e, assim sendo, traz o ranço da violência do contato e do silenciamento das línguas indígenas. Em segundo lugar, aprender o português pode significar para o índio poder lutar pelos seus direitos. O português configura-se assim numa língua instrumento, arma, ferramenta, quase um mal necessário. Por fim, a língua portuguesa traz um referencial cultural – a saber, o ocidental capitalista – completamente diverso do referencial cultural e cosmológico dos povos indígenas. Estas diferenças é que tornam o processo de ensino-aprendizagem do português para indígenas extremamente complexo e desafiante uma vez que perguntas como: “Quais metodologias? Quais materiais? Que tipo de avaliação/como avaliar?”, dentre outras, não podem ser respondidas apressadamente. É possível afirmar que o ensino de português para populações indígenas pode vir a ser mais efetivo caso parta de uma perspectiva intercultural (vide BRASIL/RCNEI, 1998), ou seja, o ensino que tenha como pressuposto que o ambiente escolar é espaço de manifestação e negociação de conflitos inter-étnicos e também espaço para a criação de novas formas de convívio e reflexões sobre as alteridades em jogo – a saber, indígenas e nãoindígenas. Por outro lado, a especificidade das cosmologias indígenas não permite ao professor utilizar planejamentos ou materiais de português elaborados para culturas ocidentais. É preciso ressaltar também que mesmo o material didático pensado para determinado povo indígena não necessariamente servirá a outro povo, devido às diferenças culturais e linguísticas existentes entre os indígenas. Esta diversidade exige que cada escola indígena tenha seu próprio projeto pedagógico, com currículo específico que considere a cultura do povo envolvido e, por conseguinte, materiais didáticos que reflitam a realidade sociolinguística de cada povo. No caso dos cursos de licenciatura indígena, como lidar com a diversidade de povos que aí adentram? Como organizar projetos coletivos de ensino? Como pensar no ensino de português que prepare os universitários indígenas para leitura e produção de textos acadêmicos sem que o português-indígena seja desconsiderado? Esperando contribuir nessa discussão, este artigo faz uma reflexão sobre o ensino de língua portuguesa para falantes indígenas e busca traçar algumas implicações para a formação de professores-índios. A análise focaliza textos escritos por alunos Tapirapé do Ensino Fundamental e por universitários indígenas e indica existir uma premência pela apropriação do portuguêsacadêmico pelos povos analisados, impulsionada pela exigência do mesmo pela academia. Por outro lado, o português-indígena tem características linguísticas próprias e constitui-se em importante construtor/veiculador das identidades indígenas devendo, assim, ser considerado na universidade. Desta forma, urge um debate acerca desta tensão bem como uma problematização das metodologias de ensino de línguas para povos indígenas. 624 625 PEC-G, PRÁTICAS DE LETRAMENTO ACADÊMICO, IDENTIDADES E INTERCULTURALIDADE Cloris Porto Torquato – UEPG Neste trabalho, analiso algumas práticas de letramento acadêmico desenvolvidas por estudantes africanos do Programa Estudante Convênio – Graduação (PEC-G) no âmbito do Projeto de Extensão “Letramento Acadêmico”, sob minha coordenação, na Universidade Estadual de Ponta Grossa, com vistas a refletir sobre a constituição das identidades desses estudantes no contexto acadêmico, que se configura como um contexto intercultural. Este trabalho – parte de uma pesquisa mais ampla sobre políticas linguísticas, políticas de letramentos e de identidades – mobiliza fundamentalmente os conceitos de signo, gênero do discurso, dialogismo e exotopia do arcabouço teóricometodológico do Círculo de Bakhtin (VOLOCHINOV/ BAKHTIN, 1986; BAKHTIN, 2003) e os conceitos de hibridismo e identidade, dos estudos de Homi Bhabha (1998), relacionando este último ao conceito de identidade, dos estudos de Stuart Hall (2001; 2003). A esta fundamentação teórico-metodológica, associo estudos sobre interculturalidade (JANZEN, 1998; 2005) – observando o diálogo intercultural que se constrói nas práticas discursivas letradas acadêmicas (configuradas especialmente nos gêneros: relatos escritos, apresentações orais subsidiadas por texto escrito, resumos, cartazes) – e conflito linguístico (HAMEL, 1989; 2008). Nessas práticas, são constituídas as identidades culturais, linguísticas, étnicas e raciais daqueles estudantes no contexto acadêmico acima referido. No diálogo intercultural dos estudantes africanos de diferentes nacionalidades com estudantes universitários brasileiros, professores da rede pública brasileiros e professores universitários brasileiros são postos em questão diferenças linguísticas, diferenças e preconceitos culturais, preconceitos raciais, estereótipos e as expectativas desses sujeitos. Neste sentido, entendo que o PEC-G configura um importante processo de re-constituição identitária dos sujeitos envolvidos e um produtivo e conflituoso diálogo intercultural, de modo que é necessário investigar as práticas discursivas e identitárias que o constituem e os mecanismos de interação e reconstituição de identidades nele engendrados. Além disto, considerando as diferenças linguísticas, entendo que o PEC-G configura também políticas linguísticas, uma vez que implica a difusão da língua portuguesa em países não lusófonos, a realização do CELPEBras por parte de estudantes provenientes de países em que a língua portuguesa não é oficial e a configuração de encontros de variedades distintas da língua portuguesa (no caso de estudantes provenientes de países lusófonos) e de diferentes línguas no contexto acadêmico e social mais amplo. Esses encontros linguísticos são frequentemente marcados por conflitos linguísticos (bem como pelas respostas dos sujeitos a estes conflitos) e identitários. ENSINO-APRENDIZAGEM DE LÍNGUA PORTUGUESA, EM UMA PERSPECTIVA HISTÓRICO-SÓCIO-CULTURAL. Nathalia Pereira de Oliveira Sousa – UFG Tânia Ferreira Rezende Santos – UFG Esta pesquisa tem o propósito de investigar, em uma escola de ensino fundamental da rede municipal de ensino de Goiânia, se o tratamento da variação linguística em sala de aula e as concepções de variação linguística, de linguagem e de ensino de língua portuguesa, presentes nas práticas pedagógicas dos professores, refletem as orientações dos Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa para o ensino fundamental. A hipótese é a de que os resultados inoperantes de inúmeras políticas públicas destinadas a promover uma melhoria na Educação no Brasil podem ser reflexo da forma como a gramática da língua é ensinada, revelando um distanciamento entre o ideal linguístico e aquele praticado socialmente pelo aluno; e que as dificuldades encontradas na produção, oral ou escrita, da língua portuguesa e do atual fracasso 625 626 escolar, no que diz respeito ao ensino-aprendizagem de LP, podem estar relacionadas ao ensino de língua pautado em uma concepção uniformista e padronizadora, tanto de linguagem quanto de ensino de línguas. O objetivo aqui é investigar se o tratamento da variação linguística em sala de aula e as concepções refletidas nas práticas pedagógicas dos professores estão de acordo com as orientações dos PCN de língua portuguesa para o ensino fundamental que prima o raciocínio e a reflexão em detrimento do reconhecimento cristalizado da língua e daquilo que é certo ou errado nela. Nessa perspectiva, um raciocínio reflexivo do funcionamento da língua portuguesa, no ensino fundamental, deveria estar pautado no entendimento da língua como um fenômeno que sofre influência sócio-cultural e que se constitui no decorrer da história. Desse modo, temos o príncipio de que o ensino de gramática do português quando pautado no conhecimento de sua formação histórica e com reflexão do seu papel na sistematização das normas consideradas padrão ou nãopadrão/populares pode elucidar e dar sentido à maioria das regras incompreensíveis da língua portuguesa, dispensando os exercícios mecanicistas e a memorização. Para tanto, dentre o referencial teórico, temos Britto (1997), Deline (In: Fiorin, 2007), Marcuschi (2003), Silva (1997). EDUCAÇÃO LÍNGUÍSTICA: O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA NO PROJETO ESCREVENDO O FUTURO Paula Barreto Silva – PPGCEL/UESB Ester Maria de Figueiredo Souza – PPGCEL/UESB Este trabalho integra a pesquisa Políticas de Ensino de Língua Portuguesa no Ensino Médio em desenvolvimento no Mestrado em Letras: Cultura, Educação e Linguagens, cujo foco é o programa Escrevendo o Futuro, uma das ações do Ministério da Educação no Brasil. O programa em foco, atualmente denominado Olimpíada de Língua Portuguesa (OLP), é analisado com base no seu manual com o intuito de extrair e indiciar as concepções de ensino de língua para todo o território nacional. Como programa, a OLP promove, em todo o país, concursos bienais de textos produzidos por alunos da rede pública e consiste numa proposta para o ensino da produção de gêneros textuais por meio de sequencias didáticas especificas para cada ano escolar. A homogeneidade da orientação do manual pode ser um elemento que indicia concepções hegemônicas para espelhar o padrão de ensino de língua nacional. A partir dessa hipótese, a pesquisa os critérios de avaliação para os gêneros da esfera escolar descritos nos Cadernos e o reconhecimento da organização discursiva do gênero, como gênero privilegiado para a apropriação da estrutura e da discursividade da língua. Resultados parciais do estudo desse estudo apontam que as práticas didáticas espelham diretrizes curriculares modalizadas em concepções de ensino de língua e que a educação linguística formal não deve se restringir ao ensino de uma única norma linguística, mas priorizar o aprendizado das “normas de comportamento linguístico” que regem a vida dos diferentes grupos sociais. AS ATITUDES SOCIOLINGUÍSTICAS DE PROFESSORES INDÍGENAS TAPUIAS. Frederiko Luz Silva – UFG O presente trabalho é parte do projeto de pesquisa Ensino e Aprendizagem de Língua Portuguesa, em uma perspectiva sócio-histórico-cultural, e foi feito na perspectiva da Sociolinguística Educacional, sob a orientação da pesquisa etnográfica. Trata-se de estudo de caso com professores inseridos em um contexto de diversidade invisibilizada, onde grupos dominantes tentam apagar traços socioculturais de grupos minoritários. São professores da escola Indígena do Carretão, localizada no município de Rubiataba/GO, terra onde vive o povo indígena da etnia Tapuia. Objetivamos com a pesquisa mensurar quais as atitudes sociolinguísticas desses professores em relação às variedades do português realizadas no contexto escolar. Notamos uma atitude geral de 626 627 promoção da variedade do português falado na terra indígena como a língua desse povo, o Português Tapuia. Hipotetizamos que esta atitude tem relação direta com a crença de que um povo para ser considerado indígena deve ter uma língua indígena, tal hipótese nos levou a distinguir, no trabalho, atitude de crença. Essa situação nos fez perceber a construção de uma comunidade de participação que tem sido instaurada através da escola por meio dos professores. A comunidade de participação que está sendo implantada tem como objetivo maior, solidificar a identidade do povo em questão, como povo indígena. Observamos que a escola tornou-se o lugar de trabalho para a comunidade de participação do povo Tapuia. São professores indígenas que por meio de suas atitudes sociolinguísticas estão liderando um movimento que busca resgatar os traços socioculturais desse povo de constituição tão particular, e encontraram na língua a principal possibilidade de terem sua identidade indígena bem marcada e assim terem os seus direitos respeitados e garantidos. Esses são resultados parciais de pesquisa em andamento que investiga a formação e a atitude sociolinguística de professores de Português da Educação Básica. O LIVRO DIDÁTICO DE HISTÓRIA E A QUESTÃO ETNICORRACIAL: APONTAMENTOS PARA REFLEXÃO Vanda Lucia Praxedes – NERA/FAE-UEMG Santuza Amorim – NERA/FAE-UEMG Neste texto, apresentam-se análises de livros didáticos, relativas à pesquisa em andamento, “Língua e Literatura: relações raciais, diversidade sociocultural e interculturalidade em países de língua portuguesa”, desenvolvida por pesquisadores integrantes do NERA (Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Relações Raciais e Ações Afirmativas) e do CEALE (Centro de Alfabetização Leitura e Escrita), ligados ao Curso de Especialização Lato Sensu da FAE/UFMG – LASEB -, para professores de Rede Municipal de Belo Horizonte, da área de “História da África e Culturas AfroBrasileiras: uma introdução à lei 10.639/03”. As análises já realizadas sobre materiais didáticos que circulam nas escolas brasileiras (Rosemberg, 2003; Silva, 1995) revelaram uma característica marcante desse material, ou seja, sua omissão em revelar e representar a diversidade etnicorracial, tal qual acontece no contexto da sociedade brasileira: os alunos se defrontam cotidianamente com materiais impregnados de elementos, tanto do ponto de vista imagético, como de conteúdo, que reforçam e acirram comportamentos próximos da discriminação e do preconceito racial. Pode-se dizer que tal fenômeno ainda se orienta e é decorrente da existência da falsa democracia racial (MUNANGA, 1999), que impera fortemente no ideário político e religioso da nação. Historicamente, as relações raciais no Brasil sempre foram perpassadas pela ideologia do branqueamento, o que fez com que os grupos afrodescendentes fossem impedidos de se perceberem e de se reconhecerem como negros, apropriando-se de seus traços físicos e culturais. A falta de expressão e construção de uma identidade própria resulta (MUNANGA, 1999), de uma expropriação, dominação e conversão de suas características e marcas identitárias “em símbolos nacionais pelas elites dirigentes”. Em suma, há uma negação de suas raízes e da tradição africana, como referência para a constituição da identidade e, em muitos casos, uma condução a associar-se a grupo de pessoas brancas, em que não se observa oposição aos estereótipos e estigmas veiculados e seus efeitos sobre os mesmos. Tal constatação e a implantação do PNLD - Programa Nacional do Livro Didático - fizeram com que esse material começasse a ser analisado de maneira mais crítica e com base em alguns critérios, visto que, conforme as orientações desse programa, estariam desautorizadas de circular nas escolas obras em que os preconceitos de classe, gênero, etnia e outros estivessem presentes. Considerando o exposto, não resta dúvida de que a atenção destinada a esse material se prende a sua importância como instrumento que pode impedir a alienação dos sujeitos que dependem dele para se informar e educar. Embora presente e definidor de currículos escolares, no que diz respeito à 627 628 história do continente africano e de seu povo, esta se faz ausente. Encontra-se uma abordagem que trata de reforçar o que circula na mídia em relação a esse continente, isto é, uma imagem reduzida e quase sempre associada à situação de miséria, doenças, atraso e subdesenvolvimento, contribuindo, dessa maneira para acirrar preconceitos, discriminação e desigualdades sociais que advêm dessas situações. Serão analisados livros didáticos de Português e de História, aprovados pelo PNLD, tendo como pano de fundo a análise da questão etnicorracial. O objetivo dessa análise é observar como determinados livros, aprovados para distribuição nas escolas públicas do país, abordam os aspectos concernentes às questões etnicorraciais e em que medida procuram incorporar as recomendações da Lei 10.639/03, das Diretrizes e do PNLD, no sentido de romper com estereótipos e o racismo detectados nas pesquisas. Para essa análise, utilizaremos as ilustrações e o modo como o texto e as atividades propostas no livro tratam os aspectos etnicorraciais. A ASCENSÃO DA LÍNGUA PORTUGUESA ENTRE OS MAKU- DÂW: UMA ANÁLISE SOCIOLINGUÍSTICA DA INTER-RELAÇÃO LÍNGUA ÉTNICA, NHEENGATU E PORTUGUÊS COM ENFOQUE NAS PRÁTICAS DE ENSINO BILÍNGUE Silvana Andrade Martins – UEA Valteir Martins – UEA Este estudo apresenta uma análise sociolinguística da situação de multilinguísmo dos Dâw, nos últimos 50 anos. Evidencia-se a ascensão da língua portuguesa, ao lado da preservação da língua étnica, e do desaparecimento da língua de contato interétnico, o Nheengatu. Os Dâw constituem um povo minoritário, que convive em uma das áreas mais multilíngues do mundo, que é a região do Alto Rio Negro, onde se localiza o município de São Gabriel da Cachoeira. Nesse perímetro municipal, são faladas 22 línguas indígenas, de quatro troncos linguísticos: Tupi-Guarani, Tukano Oriental, Maku e Arawak, além da língua portuguesa, sendo que três delas são cooficiais: Tukano (da família Tukano), Nheengatu (tupi-guarani) e Baniwa (Arawak). Essa relação entre as línguas é balizada por relações sociais interétnicas. Nesse contexto sociolinguístico, o Dâw, juntamente com as demais línguas dos povos Maku, ocupa a base da pirâmide de prestígio linguístico e sociocultural. Além da língua materna, eles falam Nheengatu e português, em diferentes graus de proficiência, que variam dependendo da faixa etária, gênero, escolaridade e intensidade de contatos interétnicos. Contudo, constata-se que a inter-relação dessas línguas no quadro de multilinguismo dos Dâw tem se reconfigurado nos últimos 50 anos. Está sendo redesenhada por mudanças socioculturais, resultadas da trajetória de contato dos Dâw com indígenas e não-indígenas, alavancadas sobretudo pelo ensino da língua portuguesa na escola bilíngue da comunidade indígena. Os Dâw estão deixando de ser trilíngues e tornando-se bilíngues em português, eliminando o uso do Nheengatu, no contato interétnico. Por contra, há uma ascensão da língua portuguesa. Verifica-se que o português está em vias de suplantar o uso do Nheengatu como língua de contato intertribal. Também, gradativamente, a língua nacional deixa de ser falada somente em situações de contato com os não-Dâw e passa a ser empregada em algumas situações formais de enunciação que ocorrem no contexto tribal, como na escola e em cerimônias religiosas. Observa-se que os Dâw, nessas interlocuções, alternam suas falas entre língua nativa e o português aleatoriamente, ou ainda inserem frases inteiras do português no discurso Dâw. Também se evidencia um aumento de empréstimos do português que são integrados à língua indígena sem serem adaptados ao sistema fonológico e morfológico nativo, o que implica variações e possíveis mudanças nesse sistema linguístico. Verifica-se que embora seja Dâw a primeira língua aprendida pelas crianças, a proficiência em português aumenta entre a população abaixo de 35 anos, sobretudo entre os escolarizados, que já preferem estudar o português que Dâw, na escola. No entanto, registram-se algumas iniciativas do professor de Dâw para motivar os alunos no estudo da língua étnica. Portanto, diante dessa situação sociolinguística vivenciada pelos Dâw, analisam-se os fatores 628 629 socioculturais que estão contribuindo para reformatar o perfil linguístico dos Dâw e verificam-se como essas mudanças estão operando na formação de sua identidade étnica, tendo como enfoque uma análise das práticas de ensino da língua portuguesa e de Dâw, no contexto da escola bilíngue desta etnia. POLÍTICAS SOCIOLINGÚISTICAS PARA O FORTALECIMENTO DA DIVERSIDADE, DA PESQUISA E DO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS INDÍGENAS DE PERNAMBUCO Cinthya Torres Melo – UFPE/NEI/CAA Este trabalho apresenta perspectivas sociolinguísticas para o fortalecimento da pesquisa linguística e do ensino de língua portuguesa (LP) nas escolas indígenas junto aos 6 eixos temáticos da Educação Indígena de Pernambuco (Terra, Identidade, História, Organização, Interculturalidade e Bilinguísmo ) que corroboram para o reconhecimento e o respeito da diversidade. Nesta perspectiva, o ensino de LP nas escolas indígenas possui particularidades que necessitam ser discutidas nos cursos de graduação em letras. A proposta metodológica aqui é de caráter qualitativo e as bases teóricas tomam por referência o Projeto Pedagógico do Curso de Licenciatura Intercultural Indígena da UFPE/CAA, as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Escolar Indígena, as avaliações dos estudantes indígenas e a experiência como docente no Curso Intercultural e na Coordenação Pedagógica. Entende-se, assim, que há especificidades no ensino de LP, nas escolas indígenas, que precisam ser incluídas no currículo de graduação em letras e nas pesquisas científicas da área. BILINGUISMO INDÍGENA: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA (LÍNGUA ESTRANGEIRA OU SEGUNDA LÍNGUA?) NAS ESCOLAS DAS ALDEIAS APINAYÉ SÃO JOSÉ E MARIAZINHA Severina Alves de Almeida – SISSI/UnB Nessa comunicação apresentamos os resultados de uma pesquisa com os Apinayé, indígenas falantes da língua Apinayé, pertencente ao Tronco Linguístico Macro Jê e à Família Linguística Jê, residentes no norte do estado do Tocantins na região do Bico do Papagaio. Os objetivos foram estudar o Bilinguismo no contexto indígena e investigar como se dá o ensino da língua portuguesa nas escolas Mãtyk e Tekator das aldeias São José e Mariazinha. Igualmente, buscamos identificar como os professores entendem a incidência da língua portuguesa, se como língua estrangeira (LE) ou segunda língua, considerando a situação de contato, sendo que a língua Apinayé (L1) é a língua falada pelas comunidades nas relações intragrupo e o português (L2) nas interações intergrupo, isto é, com os não indígenas. Além disso, pesquisamos a situação sociolinguística dos indígenas, com o intuito de identificar a facilidade linguística em relação às línguas Apinayé e Portuguesa. A pesquisa, de teor interdisciplinar, agregou aspectos qualitativos e quantitativos, tendo como base os estudos de Günther (2006) e Vasconcelos (2009). O estudo se apresentou também como uma etnografia participante a partir das teorias de Ezpeleta & Rockwell (1989); Erickson (1984) e Beaud & Weber (2007). Os dados foram gerados qualitativa e quantitativamente e coletados a partir de observações, entrevistas e questionários. O corpus investigado é composto de entrevistas realizadas com lideranças, professores e estudantes Apinayé, diários e notas de campo. Para análise dos conceitos de Bilinguismo: Grosjean (1999); Hamers & Blanc (2000); Butler & Hakuta (2004). Para Educação Indígena e Intercultural Cabral (1987); Lopes da Silva (2000; 2001); Maher (1994; 2005; 2006); Grupioni (2001; 2003; 2006); sobre os Apinayé, Nimuendaju (1983); Da Matta (1976); Albuquerque (1999; 2007) e Almeida (2011). Acerca das línguas indígenas, Rodrigues (1988; 2002; 629 630 2011) e Cabral (2002; 2009; 2010; 2011); sobre diversidade linguística e o ensino de português, Matos (2004) e Maher (2010). O estudo revelou que os Apinayé são Bilíngues (Apinayé/Português), e que apesar do uso e função da Língua Portuguesa ter atingido diferentes domínios sociais das aldeias, eles estão conseguindo preservar traços de sua identidade cultural e linguística. Todavia, identificamos um “Deslocamento Sociolinguístico”, fenômeno recorrente quando, em situação de Bilinguismo, a língua dominante, paulatinamente, ocupa os domínios da língua indígena. Tal ocorrência foi constatada quando os Apinayé afirmaram usar a língua portuguesa durante os eventos culturais e no âmbito familiar. Embora na aldeia São José a porcentagem de pessoas que fazem uso das duas Línguas nas cerimônias da Tribo (10%) sejam menor do que se constata na Mariazinha (27%), é importante salientar que este é um domínio social onde a penetração de outra língua, que não a materna, é motivo de apreensão, pois põe em cheque a identidade linguística da comunidade. No tocante ao ensino da língua portuguesa, as aulas são ministradas por professores não indígenas e os professores indígenas, assim como as lideranças e estudantes, veem a língua portuguesa como uma língua estrangeira. No que tange ao papel da escola e sua relação com o Bilinguismo, ficou claro que esse importante domínio social das aldeias favorece dois tipos de Bilinguismo. O primeiro é um “Bilinguismo Aditivo”, praticado nos anos iniciais do Ensino Fundamental, por meio de um material de apoio pedagógico Bilíngue, onde a Língua Materna é valorizada e serve como preparo para a criança ter um primeiro contato com a Língua Portuguesa nas formas oral e escrita. O segundo é um “Bilinguismo Subtrativo”, evidenciado pelas práticas pedagógicas dos professores nos anos finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio, que usam material didático exclusivamente na Língua Portuguesa. RELAÇÕES ENTRE LÍNGUA OFICIAL E LÍNGUA MATERNA NA ESCOLA: COMO SE ENSINA E SE APRENDE EM PORTUGUÊS NUMA ESCOLA RURAL AFRICANA, EM CABINDA/ANGOLA Silvestre Filipe Gomes – FAE/UFMG Angola é um país com uma diversidade linguística: mais de uma dezena de línguas autóctones compõe o mosaico sociolinguístico do país. O português surge como a língua oficial e veicular, considerado pela maioria da população como língua segunda e estranha, entretanto, necessária para o exercício do poder e da cidadania plena. Este artigo é fruto de um estudo que procurou compreender como decorre o processo de ensino e aprendizagem da língua portuguesa numa aldeia cujas crianças falam, desde o seio familiar, uma língua local (Ifiote) diferente à da escola (o Português), numa escola primária localizada numa aldeia da província de Cabinda/Angola. O estudo foi desenvolvido com base nos seguintes objetivos: geral – Investigar o processo metodológico de e de aprendizagem numa escola rural africana, onde a principal língua de comunicação é o Ifiote; objetivos específicos: 1) descrever o perfil cultural e linguístico dos alunos e do(a) professor(a); 2) analisar a interação, criada na sala de aula e no recinto escolar, entre o Português e o Ifiote; 3) Analisar os materiais didáticos na sala de aula para o ensino e aprendizagem. A pesquisa, de abordagem etnográfica, foi realizada numa aldeia afastada da zona urbana, tendo como a característica principal o uso frequente da língua Ifiote, falada na província de Cabinda, com os alunos duma turma, a eleger, da 1ª classe. Para a aquisição dos dados, levar-se-á a cabo uma observação participativa, assistindo às aulas, todos dias lectivos, na turma da 1ª classe (1ª ano); foram dirigidas algumas entrevistas semiestruturadas, combinadas com entrevistas profundas ao(à) professor(a) daquela classe; também foram acompanhados certos eventos marcantes da vida da aldeia, como cultos religiosos e sessões de resolução de problemas que diziam respeito à vida do povo. Com a devida autorização, tanto as aulas como alguns eventos da comunidade foram filmados e anotados num diário de campo. 630 631 SIMPÓSIO 59 REUNIÃO DA ASSOCIAÇÃO INTERNACIONAL DE LINGUÍSTICA DO PORTUGUÊS A Associação Internacional de Linguística do Português (AILP), sediada em Macau até 2013, propõe um grupo de discussão para aprofundar reflexões sobre “a presença da língua portuguesa na Ásia”, focando a pesquisa, o ensino e a difusão. Nesse momento de pós/neo-colonialismos, superdiversidade e (pós)multiculturalismo, o Português vai assumindo diferentes papéis no dinamismo econômico, sociolinguístico, cultural, educacional e histórico no contexto da Ásia e na relação da Ásia com o mundo que fala Português. Esperamos receber colaborações que situem a língua nesse contexto, levando em consideração a diversidade entre sujeitos, povos e governos que, inevitavelmente, estão e estarão em contato e que, por isso, precisam interagir no plano político, sociocultural, educacional e acadêmico. COORDENAÇÃO Roberval Teixeira e Silva Universidade de Macau / AILP [email protected] Ana Nunes Universidade de Macau / AILP [email protected] Mário Pinharanda Nunes Universidade de Macau / AILP [email protected] 631 632 SIMPÓSIO 60 O POEMA NARRATIVO E O CONTO NO ENSINO MÉDIO: ANÁLISE, PRODUÇÃO E APROXIMAÇÃO ENTRE PAÍSES DE LÍNGUA PORTUGUESA A história oficial do Brasil nasce em estreita relação com Portugal e com vários países africanos. A literatura transfigurou, por intermédio de vários gêneros, essa experiência de gradativa transformação dos “países colonizados e colonizador” em “países de língua portuguesa”. Essa experiência histórica de transformação pode e deve ser transmitida às novas gerações, especialmente na escola, por intermédio de análise e produção de textos literários. Ainda que leitura e produção de texto componham partes integrantes de uma mesma habilidade, e leitores vorazes apresentem, frequentemente, facilidade de expor suas ideias e emoções por intermédio do texto escrito; no entanto, em se tratando de textos literários, constatamos uma situação paradoxal. O aluno de Ensino Básico entra em contato com a Literatura – clássica ou popular –muito antes de ingressar na escola; amplia seu repertório, nos bancos escolares, com leitura e análise de diversos gêneros; porém tudo isso não reverte em produções de qualidade. No Brasil, estudos recentes têm apontado como uma das razões os manuais didáticos, que usam geralmente adaptações de composições clássicas ou fragmentos de obras consagradas. Essa seleção não permite muitas vezes que o aluno, mesmo ao chegar ao curso médio, domine bem o gênero analisado, tampouco aprenda como elaborar um texto com início, meio e fim coerentes. Portanto, defendemos a adoção de textos literários integrais, em sala de aula, oriundos de países diversos, análise com vistas à produção, e incorporação de ensaios de autores consagrados. Para orientar a prática cotidiana, recorremos a Dolz, Noverraz e Schnewly, certos de que suas experiências podem ser de muita ajuda ao professor. Outros estudos críticos que permitam diálogos teóricos e/ou pedagógicos relevantes poderão ser acolhidos também. Todos com o objetivo de revelar facetas novas tanto para a esfera da recepção quanto para a da produção do leitor adolescente de obras de literatura de língua portuguesa. COORDENAÇÃO Raul de Souza Püschel Instituto Federal de Educação de São Paulo [email protected] Suely Corvacho Instituto Federal de Educação de São Paulo [email protected] 632 633 “NAVIO NEGREIRO”: COMO ESTUDAR SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS DE UM POEMA NARRATIVO Raul de Souza Püschel – IFSP Neste trabalho, metodologicamente com base nas concepções de Dolz, Noverraz e Schnewly (2004) de oferecer um caminho para que seja assimilado certo gênero textual, será estudado “Navio negreiro”, de Castro Alves, como um exemplo de poesia narrativa a ser investigado. Esta investigação está decomposta em uma apresentação da situação, uma produção inicial, seis módulos e uma produção final. Na apresentação da situação, o aluno é colocado em contato com tal gênero textual e é levado a inferir o que é um poema narrativo, a partir de sua experiência prévia e não sistemática de contato com tal texto. A produção inicial, tanto uma de natureza oral quanto outra de natureza escrita, acontecerá em torno de 13 de maio para que haja articulação entre a proposta de poesia narrativa e a questão da discriminação racial do negro no Brasil. No módulo 1, é feito um primeiro contato com “Navio negreiro”, criam-se contextos favoráveis para que sejam apresentadas informações sobre o Romantismo e o autor, além disso são explicadas referências e termos mais complexos. No 2, há primeiramente o comentário dos alunos acerca da obra e depois uma análise mais detida do docente. No módulo 3, os discentes são exortados a ler estudiosos, formando desta maneira uma espécie de fortuna crítica do texto do poeta dos escravos. No 4, aspectos extraliterários, em conexão ou não com o literário, serão trabalhados pelo docente e por seus alunos, para ilustrar, entre outros casos, o emprego da vírgula de caráter expressivo e da sinonímia, tanto no poema de Castro Alves quanto na produção inicial dos alunos. Também outras questões de natureza linguística que surgirem serão aqui exploradas. No 5, serão levados em conta aspectos da teoria literária, como a versificação e a intertextualidade, entre outras, que servirem aqui como elementos de iluminação também, não só da obra do poeta baiano quanto da dos alunos. No módulo 6, o gênero poema narrativo é colocado em confronto com gêneros textuais fronteiriços (oração, hino, por exemplo) e também é aprofundada a discussão sobre as marcas e tipicidades do que vem a ser um poema narrativo. Durante a produção final, será proposto um leque de situações que auxiliam o educando a criar o seu poema narrativo, almejando a que domine plenamente esta espécie de produção. Às propostas levadas pelo professor serão agregadas aquelas que os alunos apresentem e sejam pertinentes para a produção textual. Observa-se, então, que o trabalho ora apresentado dará espaço, em cada módulo, para que necessidades reais dos alunos, que tenham aparecido nas interações em sala de aula, sejam contempladas e reorientem tais propostas. POR QUE LER OS CLÁSSICOS? Darcilia Marindir P. Simões – UERJ/CNPq/SELEPROT Eleone Ferraz de Assis – UEG/FAPERJ/SELEPROT Para que um sujeito desenvolva seu vocabulário, não pode ficar restrito ao seu grupo imediato. É preciso transitar por grupos diferentes com vista a adquirir novas experiências e, por conseguinte, aumentar seu vocabulário. O conhecimento linguístico de um falante ultrapassa o inventário de signos com os quais se expressa cotidianamente (vocabulário ativo). No repertório de um falante, também há em latência um vocabulário passivo que é constituído dos signos que ele absorve da fala de outrem (rádio, televisão, cinema, conversas etc.). No entanto, se o falante não entrar em contato com falas distintas da sua, sua experiência de vida, que é traduzida pela língua, esta restará reduzida, mínima. Logo, é preciso fazer algo no sentido de promover o enriquecimento verbal dos estudantes. Em consequência, ampliarão seu universo de experiência e expandirão seu repertório (idioleto produtivo – o que resulta da prática linguageira do sujeito; e idioleto receptivo – que é proveniente da linguagem absorvida de outros falantes). Por isso, é tão relevante o estudo da língua a partir da leitura e compreensão de textos. 633 634 Como se tem a pesquisa e o ensino como balizas de produção, busca-se, com a investigação da iconicidade lexical em contos de Eça de Queiroz, produzir modelo de análise que não só discuta e classifique o vocabulário dos textos-córpus, mas também estimule a leitura dos clássicos, uma vez que a riqueza lexical dos textos eleitos transborda da instrução linguística para outras áreas de interesse como a literatura, a história, a política, a religião etc. Nossa hipótese: a leitura dos clássicos pode deflagrar o desenvolvimento do repertório e do cabedal cultural dos estudantes. Por meio da leitura orientada é possível desenvolver a competência discursivo-textual dos alunos. Nesta comunicação, mostraremos que mapeamento lexical é uma estratégia de análise que busca operar com marcas sensíveis (sonoras, no texto oral; gráficas, no texto escrito). Essa preocupação se deve à necessidade de orientação da leitura, em especial no que tange à apuração das isotopias plausíveis para interpretação de um texto. Pela iconicidade (SIMÕES, 2009), busca-se no texto pistas que orientem a produção de sentido, a identificação das isotopias possíveis para a interpretação. Em meio ao material léxico, podemos levantar palavras-chave que se repetem na superfície textual e que se vão enlaçando, fazendo com que algumas funcionem como nós — as âncoras textuais —, que representam as encruzilhadas onde as isotopias (ou recortes temáticos) se encontram e se sobrepõem em um mesmo signo. Para Simões (2008), iconicidade é uma qualidade com potencial semântico-discursivo emergente da estruturação textual o qual conduz o leitor durante a leitura. Essa mostra se faz mais significativa no texto clássico que, por princípio, abriga mais de uma isotopia, por ser polissêmico por essência. “SINHÁ”, MÚSICA DE CHICO BUARQUE E JOÃO BOSCO, E AS SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS Suely Corvacho – IFSP Dentre os vários tipos de poemas narrativos, a música conquista mais facilmente o jovem aluno do Ensino Médio do que outras expressões. Nesta comunicação, tratamos como a música de Chico Buarque e João Bosco,”Sinhá”, pode ser apresentada no primeiro momento da sequência didática proposta por Dolz, Noverraz e Schnewly, ou seja, a fase na qual é exposto um problema de comunicação e os conteúdos a ele relacionados, neste caso a elaboração de uma música para um Festival interno sobre a contribuição africana para formação da identidade nacional. “Sinhá” começa in media res com a fala de um escravo procurando convencer o senhor de engenho de que não deve ser penalizado. Acusado de ter visto Sinhá banhar-se no açude, o escravo mostra a injustiça do ato, contrastando sua inocência à crueldade dos castigos que o aguardam: ser levado ao tronco, ficar aleijado, talhar o corpo, furar os olhos. No final do poema, a voz do escravo é substituída pelo eu-lírico, que se apresenta como poeta e descendente das duas linhagens: do cruel senhor de engenho e do escravo. Essa revelação, contida numa arquitetura da história dentro da história, obriga a releitura de todo o poema, abrindo espaço para uma série de reflexões, inclusive dos traços da contemporaneidade na Literatura. O poema que em seu corpo se autodenomina “conto de um cantor” enseja o trabalho em diversas direções: a reflexão sobre a escolha e complexidade do gênero literário e musical; a sequência narrativa; a construção poética com os jogos aliterantes e paronomásicos, como em "o conto de um cantor", o jogo entre radical e derivada (nome/renome), entre outros; as escolhas de construções morfossintáticas marcadas pelo estrado sociocultural de seu falante, como em “Para que que vosmincê”; e recuperação da polêmica histórica em torno da relação do senhor de engenho e os escravos no Brasil. 634 635 DE REPENTE, SURGIU UMA CRIATURA...: UMA EXPERIÊNCIA COM O GÊNERO DE TEXTO NARRATIVA DE HORROR NO OITAVO ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL Chislene Moreira Cardoso – UERR Ana Maria Mattos Guimarães – UNISINOS O Interacionismo Sociodiscursivo, doravante ISD, apresenta a idéia de que a apropriação dos gêneros textuais é fundamental no processo de inserção do indivíduo em uma prática social, ou seja, o domínio dos gêneros é necessário para que o usuário de uma língua participe, de forma ativa, na comunidade verbal na qual esteja inserido. O gênero de texto é trabalhado no processo de aquisição da língua materna por meio de uma sequência didática (SCHNEUWLY e DOLZ, 2004). O objetivo geral desta pesquisa foi propor a aplicação de uma sequência didática por meio do gênero textual narrativa de horror em uma turma do oitavo ano do ensino fundamental de uma escola particular e uma escola pública. Utilizou-se a pesquisa qualitativa a fim de interpretar os dados. Realizou-se também a pesquisa exploratória, com o propósito de famialiarizar o pesquisador com o seu objeto de estudo. Além disso, utilizou-se a pesquisa bibliográfica, para proporcionar uma base teórica, e a pesquisa de campo para coletar os dados para posterior análise. Os dados foram coletados por meio de questionários e das produções textuais iniciais e finais aplicadas aos alunos durante o desenvolvimento dos módulos da sequência didática por meio do gênero textual narrativa de horror nas duas turmas de oitavo ano de uma escola particular e uma escola pública. A comparação entre as produções iniciais e finais mostrou um avanço qualitativo de aspectos considerados essenciais ao gênero em questão: conteúdo temático, seqüência narrativa, personagens e narrador. Os resultados da análise das produções dos alunos revelam transformações importantes em suas capacidades de linguagem. A maioria dos alunos viu-se capaz de mobilizar o conteúdo temático compatível com o gênero e de organizá-lo de maneira adequada, em função das diferentes fases de uma seqüência narrativa, encadeando as ações das personagens no quadro do horror, elemento essencial para o gênero desenvolvido. É evidente que a aplicação da sequência didática em um curto espaço de tempo não é suficiente para que os alunos apreendam toda a riquezade um gênero complexo. O trabalho com a seqüência didática deve ser contínuo. Assim, por exemplo, seria extremamente importante continuar, nas turmas aqui enfocadas, o trabalho com outros gêneros de texto. 635 636 SIMPÓSIO 61 GÊNEROS DA ORDEM DO NARRAR E DO RELATAR – A QUESTÃO DO ENSINO A proposta deste simpósio representa, inicialmente, a busca de espaço para um diálogo produtivo de pesquisadores das universidades federais de Uberlândia, de Goiás, de Mato Grosso, dos institutos Federal de São Paulo e Politécnico de Santarém, além dos pesquisadores da Universidade de São Paulo sobre os gêneros de discurso da ordem do narrar e do relatar e as formas de abordagem didática desses gêneros, que, conforme Schneuwly (1994), do ponto de vista da construção dos discursos e da construção da linguagem pela criança, os gêneros do discurso constituem “megainstrumentos” de ensino e, como tais, considerados como uma unidade organizadora de currículos e de progressões no ensino fundamental. A despeito de o projeto ter nascido, no bojo do Projeto A LÍNGUA PORTUGUESA NO MUNDO, como afiliado ao I Simpósio Mundial de Estudos de Língua Portuguesa e como uma proposta emanada da vontade manifesta desses grupos listados, o simpósio configurar-se-á como um espaço de recepção de todos os interessados em expor suas pesquisas sobre o tema ou simplesmente participar na condição de ouvinte das discussões. Aceitarse-ão trabalhos descritivos que convirjam para os propósitos iniciais deste simpósio. Uma agenda de trabalhos, no entanto, foi imaginada para os dias de encontros: o momento do status quo do projeto, o reforço dos pressupostos teóricos assumidos pelas equipes e os resultados de pesquisas desenvolvidas. Desse modo, uma tarefa inicial prevê o relato pelos coordenadores regionais do andamento do projeto, se possível já resumindo os resultados porventura alcançados. É esperado que as equipes regionais sinalizem as tarefas previstas para o ano seguinte. Outro tópico relevante da agenda diz respeito à apresentação das linhas mestras primariamente apresentadas em Uberlândia, as quais foram sendo refinadas com o andamento dos trabalhos. Assim, é esperado que se encontre durante as discussões o método que consolidará os resultados de ambas as vertentes priorizadas desde o início da pesquisa. Espera-se ainda que os pesquisadores participantes possam relatar, sobretudo, as agruras e dificuldades enfrentadas ao lidar com o gênero discursivo escolhido para descrição, em especial na associação dos aspectos discursivo-pragmáticos com os gramaticais. Em suma, trata-se de um espaço para que pesquisadores brasileiros e internacionais reflitam sobre formas e métodos de descrição do objeto referido com vistas a identificar o caminho para se elaborar a transposição didática. COORDENAÇÃO Maura Alves de Freitas Universidade Federal de Uberlândia [email protected] Eliana Dias Universidade Federal de Uberlândia [email protected] 636 637 PRÁTICAS DE LEITURA E PRODUÇÃO DE GÊNEROS: A ORDEM DO NARRAR E DO RELATAR Maura Alves de Freitas Rocha – UFU Este Grupo Temático tem como objetivo discutir práticas escolares de leitura e produção de gêneros do relatar e do narrar, a partir da proposta teórica do interacionismo sociodiscursivo (BRONCKART, 1999, 2004, 2005), aliada à proposta de Schneuwly e Dolz (1999), com o intuito de discutir questões como: qual a finalidade de se fazer a distinção entre gêneros do relatar e do narrar?; que textos propor para o ensino da leitura e da escrita?; como sistematizar tais gêneros nas séries do ensino fundamental e ensino médio? Será adotada a proposta de Agrupamento de gêneros de Dolz e Schneuwly (2004) e, para responder as questões acima, adotaremos como ponto de partida a ideia de que as sequências discursivas (narrativas, descritivas, argumentativas, explicativas e dialogais) concorrem para compor tipos linguísticos variados, conforme Adam (1993). Ressalte-se ainda que Schneuwly e Dolz (1999) consideram que, “quanto mais precisa a definição das dimensões ensináveis de um gênero, mais ela facilitará a apropriação deste como instrumento e possibilitará o desenvolvimento de capacidades de linguagem diversas que a ele estão associadas” (id, p. 15). Nesta perspectiva, procuraremos desenvolver uma proposta de trabalho com os gêneros do narrar e do relatar que contemplem as sequências didáticas, na linha de Bronckar (1999), que considera que um texto organiza-se de acordo com uma arquitetura interna, o “folhado textual”, que se organiza em 3 camadas superpostas, mas interativas: a infraestrutura do texto, os mecanismos de textualização e os mecanismos enunciativos, em suma: os mecanismos que constituirão os objetos de aprendizagem de alunos. ENSINO DOS GÊNEROS DISCURSIVOS NA ESCOLA: SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS DO PORTAL DO PROFESSOR Eliana Dias – ILEEL/UFU Na última década, a grande mudança ocorrida nas aulas de Língua Portuguesa (LP) foi a chegada dos gêneros discursivos. Uma das causas dessa mudança se relaciona ao constante uso das Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) que redimensionaram as práticas de letramento e, por conseguinte, o trabalho com os gêneros discursivos. Porém, o que está ocorrendo na atualidade é uma pequena confusão dos professores no modo de ensinar e trabalhar com esses gêneros. A presente comunicação foca a questão do ensino dos gêneros discursivos e apresenta uma análise de aulas com propostas de sequências didáticas sobre gêneros do narrar e do relatar publicadas no portal do professor. As sequências didáticas são um conjunto de atividades ligadas entre si, planejadas para ensinar um conteúdo, etapa por etapa e devem envolver atividades de aprendizagem e avaliação. Entende-se que não é qualquer sequência didática que favorece o desenvolvimento da autonomia entre os estudantes, indispensável à formação para a cidadania. Aquelas, por exemplo, que enfatizam a recepção de conteúdos e sua reprodução mecânica não dá aos educandos a possibilidade de autoria na produção de conhecimentos. Acredita-se que a problematização da realidade, o levantamento de hipóteses, a análise e interpretação de dados na escola devem ser ações estimuladas entre os estudantes. Conclui-se que muitas sugestões de aulas de LP publicadas no Portal do professor adotam uma postura tradicional e equivocada, o que pode ser comprovado nas análises feitas das propostas do referido Portal. 637 638 O ESTILO NO ROMANCE MACUNAÍMA: ASPECTOS DA ORDEM DO NARRAR Fernanda Mussalim – UFU Bakhtin, em Os gêneros do discurso, afirma que os diversos campos da atividade humana estão ligados ao uso da linguagem e que o emprego da língua efetua-se em forma de enunciados concretos e únicos, proferidos pelos integrantes desse ou daquele campo da atividade humana. O enunciado – ato singular, irrepetível, concretamente situado que emerge de uma atitude ativamente responsiva, isto é, de uma atitude valorativa em relação a um determinado estado-de-coisas – reflete as condições específicas e as finalidades do campo que lhe possibilitou o surgimento, não somente por seu conteúdo temático, mas também pelo estilo da linguagem (seleção de recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais da língua) e por sua construção composicional. Em outras palavras, há um vínculo orgânico entre o enunciado e as condições específicas e finalidades dos campos de atividade humana, de modo que cada campo elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, denominados de gêneros do discurso. Neste simpósio, que aborda questões relacionadas aos gêneros de discurso e à ordem do narrar, irei tratar da manifestação do estilo (uma das instâncias constitutivas dos gêneros de discurso) em um gênero literário constituído predominantemente por sequências textuais narrativas. Mais especificamente, tratarei da manifestação de traços estilísticos em sequências narrativas do romance Macunaíma: o herói sem nenhum caráter de Mário de Andrade, considerando a relação entre a inscrição, o posicionamento do escritor no campo literário brasileiro do início do século XX e a constituição do estilo. Inicialmente, tratarei do conceito de “campo” de três perspectivas teóricas – da de Mikhail Bakhtin, de Pierre Bourdieu e de Dominique Maingueneau; em seguida, farei considerações sobre a relação entre o posicionamento do escritor no campo literário e a constituição do estilo. Posteriormente, apresentarei, em linhas gerais, o projeto estético dos primeiros modernistas brasileiros e, por fim, procederei à análise de um trecho narrativo do romance Macunaíma. GÊNEROS DA ORDEM DO NARRAR E DO RELATAR: UMA ANÁLISE DOS TRABALHOS PUBLICADOS NOS CADERNOS DE RESUMO E ANAIS DO I E II SIELP Maria Aparecida Resende Ottoni – UFU A proposta desta comunicação está vinculada ao projeto de pesquisa interinstitucional “O Ensino da Língua Portuguesa no Brasil e em Portugal: bases epistemológicas, objetivos e conteúdos”, o qual integra um projeto maior “O ensino de língua portuguesa no mundo”, que congrega pesquisadores do Brasil e de Portugal. Fruto desse projeto interinstitucional, já foram realizados, dentre outras atividades, o I e II Simpósio Internacional de Ensino de Língua Portuguesa (SIELP), o qual reuniu investigadores de várias partes do mundo interessados no ensino de Língua Portuguesa como língua materna e como língua estrangeira. Considerando que os trabalhos apresentados nesses dois eventos refletem muito do que se tem produzido acerca do ensino de Língua Portuguesa e considerando ainda um dos focos atuais do projeto – os gêneros da ordem do narrar e do relatar -, objetivo apresentar resultados parciais de uma pesquisa sobre o que tem sido produzido sobre esses gêneros, as bases teóricas e resultados dessas produções. Para isso, tomo como material de análise os textos que compõem os cadernos de resumos e anais do I e do II SIELP. Tendo em vista a proposta de agrupamento de gêneros de Dolz & Schneuwly (1996) e a proposta dos PCN (BRASIL, 1997, 1998, 1999) de se tomar os gêneros de discurso como objeto de ensino, algumas questões norteiam a investigação, tais como: a) quais gêneros de cada agrupamento estão incluídos em trabalhos submetidos aos dois eventos?; b) qual é o objetivo e a base teórica desses estudos?; c) o gênero é tomado como objeto de ensino e sua abordagem leva em conta suas especificidades?; d) quais os resultados, limitações e potencialidades dessas pesquisas? Na análise, foi possível observar um número muito reduzido de produções sobre os gêneros das ordens do narrar e do relatar e de 638 639 referência a essas ordens. Da primeira ordem, há trabalhos relativos aos gêneros conto, fábula e lenda e, da segunda ordem, aos gêneros notícia, reportagem e crônica. Contudo, a maioria deles não focaliza o gênero em si e suas especificidades e não joga luz a como os gêneros podem ser tomados como objetos de ensino. O GÊNERO “CONTO” NO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA Jorge França de Farias Jr. – UFRPE Este trabalho pretende abordar o gênero “conto” e sua importância para o incentivo à leitura e produção textual, em aulas de língua portuguesa. No geral, “o conto é, pois, uma narrativa unívoca, univalente: constitui uma unidade dramática, uma célula dramática, visto gravitar ao redor de um só conflito, um só drama, uma só ação.” (Moisés, 2012). Tudo no conto tende à objetividade: os diálogos das personagens, a linguagem utilizada e o número de sucessos. Traços que contribuem na utilização desse tipo de texto na sala de aula, prendendo a atenção do aluno e viabilizando a leitura e produção escrita no espaço de tempo escolar. Num primeiro momento de execução para a realização do trabalho, aqui, proposto, fez-se indispensável um levantamento programático das atividades fundamentadas no conteúdo visto nas aulas de língua portuguesa. Também foi imprescindível observar a metodologia utilizada pelo professor dentro da sala de aula em questão, pois é em harmonia com o método desse profissional que se baseou a forma como a pesquisa se desenvolveu. Para o desenvolvimento deste trabalho foram utilizados, preferencialmente, contos de autores modernos e contemporâneos, produzidos no século XX e XXI. Além da leitura dos contos em si, os alunos também participaram dos seguintes objetivos específicos da pesquisa: i) acesso às elucidações que tratam do conto enquanto gênero, com as suas características, a maneira como é organizado e os seus objetivos, a fim de melhor situá-los no ambiente do texto e alcançar uma mais profunda interpretação do que foi lido; e, ii) participação em oficinas que possibilitaram à produção de contos, onde eles puderam retratar acontecimentos corriqueiros, dando-lhes a oportunidade de desenvolver uma produção literária que foi partilhada em sala de aula. Por fim, espera-se que as atividades aplicadas tenham servido para demonstrar que o ambiente escolar é imprescindível para o incentivo à leitura. GÊNERO CRÔNICA: UM OLHAR ENUNCIATIVO SOB AS NARRATIVAS ESCOLARES Selma Zago da Silva Borges – UFU Ao considerar a língua em uso, este estudo parte da posição benvenistiana de que: “ [...] antes de servir para comunicar; a língua serve para viver” (BENVENISTE, p.222, [1966] 2006). Buscamos compreender as noções de enunciação – que vai além de uma suposta ideia propagada à teoria de Benveniste: a de configurá-la a um quadro teórico meramente comunicacionista – e de subjetividade na língua e na linguagem, a partir da análise de narrativas escolares. O material de análise constituir-se-á de crônicas, cujos textos foram selecionados à categoria de finalistas e, em consequência, integram uma coleção referente à Olimpíada Brasileira de Língua Portuguesa – Escrevendo o Futuro, ano 2012, terceira edição. Tal olimpíada é uma realização do Ministério da Educação e de algumas parcerias e tem o foco no ensino de língua, a fim de colaborar para a melhoria do ensino da leitura e da escrita, com a participação de alunos matriculados na rede pública. A olimpíada adota o tema “O lugar onde vivo”. Assim, para escrever os textos, conforme o regulamento proposto, cabe ao aluno, além de atender ao gênero textual, discriminado de acordo com as categorias eleitas (poema, memórias literárias, crônica, artigo de opinião), resgatar histórias, estreitar os vínculos com a comunidade e aprofundar o conhecimento com a realidade. Sendo assim, em se tratando deste estudo, para a realização da análise, far-se-á o contraponto dos textos com a 639 640 proposta discursivizada em um livro didático sobre o ensino do gênero crônica. Hipotetizamos que, apesar de o aluno atender a diferentes demandas sócio-institucionais – professor; comissões julgadoras (escolar, municipal, estadual e regional) – para a produção textual, poderá ocorrer um deslize do aluno em relação aos limites da produção desse gênero, conforme assevera o protótipo endereçado ao gênero, e as discursividades no livro didático. De nossa perspectiva teórica, esse deslize se configura como um indício da assunção do aluno a uma enunciação subjetiva que, de certo modo, resulta de seu manejo da língua, e manejar a língua em um ato de escrita é produzir o diferente. 640 641 SIMPÓSIO 62 REUNIÃO DE TRABALHO DO PROJETO “HISTÓRIA DO PORTUGUÊS BRASILEIRO” - (PHPB) – “O ADJETIVO” A entidade surgiu na Universidade de São Paulo (USP), em 1995, inicialmente como Projeto de História do Português Paulista (PHPP), objetivando identificar o percurso histórico do português paulista, que representa o primeiro momento de inserção da língua portuguesa no Brasil (São Vicente, 1532), e que, atualmente, tem como foco a história do português brasileiro. O PHPB congrega mais de 200 pesquisadores, divididos em 13 coordenações regionais, que, por sua vez, são divididos em subgrupos, de acordo com a temática de investigação. No âmbito do Simpósio 62 do IV SIMELP, estará reunida parte do subgrupo que estuda o Adjetivo, inserida no capítulo sobre a “Mudança sintática sob a perspectiva funcionalista”, cujos trabalhos compõem o Vol. III Tomo 2 – Editores: Ataliba T. de Castilho (USP) e Célia Regina dos Santos Lopes (UFRJ). A reunião consiste na discussão da primeira versão do capítulo “O Adjetivo”, que tem como autores José Romerito Silva (UFRN), Maria Célia Lima-Hernandes (USP), Mariângela Rios de Oliveira (UFF), Nilza Barroso Dias (UFF), Vânia Cristina Casseb-Galvão (UFG) e seus auxiliares de pesquisa. COORDENAÇÃO Maria Célia Lima-Hernandes Universidade de SãoPaulo [email protected] 641 642 SIMPÓSIO 63 PORTUGUÊS L2 PARA FINS ESPECÍFICOS – DA TEORIA À PRÁTICA Na presente era da globalização, o mercado linguístico dita cada vez mais as regras da representatividade mundial de determinados idiomas – como é o caso de português. Por outro lado, os mercados que solicitam essas línguas, diversificam-se e especificam de forma crescente e pertinente os domínios para os quais as necessitam. Nesse sentido, temos observado o incremento significativo da procura de aprendizagem de línguas para fins específicos – tanto a nível da aprendizagem de língua estrangeira como de língua segunda e mesmo materna. O presente simpósio pretende discutir questões relacionadas com conteúdos e materiais didácticos, orientações programáticas e metodológicas à luz de abordagens de ensino das línguas que possam responder de uma forma mais ou menos eficaz às necessidades de qualquer àrea de especialidade, como sejam a aprendizagem de língua através dos conteúdos e também através de tarefas. A discussão que este simpósio pretende desenvolver poderá centrar-se: (i) na descrição e (ou) avaliação de progamas, materiais, estratégias de ensino de língua para fins específicos; (ii) modelos de avaliação; (iii) o papel das novas tecnologias no ensino do português para fins específicos; (iv) o papel da linguística de corpus no âmbito do ensino de português para fins específicos; (v) modelos e formatos de avaliação de necessidades; (vi) modelos de formação de professores de língua para fins específicos; (vii) desenvolvimento de capacidades; (viii) análise e descrição de linguagem técnica na perspectiva da linguística aplicada ao ensino do português para fins específicos; (ix) análise do discurso técnico. COORDENAÇÃO Custódio Martins Universidade de Macau [email protected] Mário Pinharanda Nunes Universidade de Macau [email protected] 642 643 LÍNGUA E NEGÓCIOS: PORTUGUÊS PARA FINS ESPECÍFICOS Natália M. Tosatti – UFMG Augusto da Silva Costa – UFMG O Português como LE/L2 tem ganhado espaço no cenário mundial. Atentos a essa crescente demanda, o mercado editorial tem lançado livros voltados para o ensino de PLE/L2, hoje são várias as obras que estão à disposição de aprendizes e docentes. Porém, há ainda uma lacuna nesse mercado. São poucos os recursos didáticos que se dedicam ao ensino de Português para Fins Específicos. Como professores da área e atendendo a uma demanda de profissionais estrangeiros que precisam aprender o português no contexto de negócios, muitas vezes, temos a necessidade de criar um material que atenda a esse público. Neste trabalho, apresentaremos uma proposta de atividade que tem como foco o estudante que precisa dominar o português no meio corporativo. Partindo do princípio de que aprender uma língua é também aprender comportamento e cultura, procuramos na elaboração desse material integrar esses três aspectos, considerando também o desenvolvimento do aprendiz nas habilidades de compreensão e produção oral e escrita, nesse contexto em que ele atua. COLOCAÇÕES TERMINOLÓGICAS E ENSINO DA LÍNGUA MÉDICA Teresa Lino – CLUNL Yocelyn Correia – CLUNL Madalena Contente – CLUNL Propomo-nos apresentar o fenómeno linguístico das colocações terminológicas na língua especialidade da Medicina. O estudo das colocações não são apenas importantes para o trabalho do terminólogo e do tradutor, são igualmente de uma enorme relevância no ensino-aprendizagem de uma língua para fins específicos, muito em especial numa óptica de língua estrangeira. Este tipo de combinatórias, em discurso especializado, não tem uma correspondência directa de uma para outra língua; tal facto pode dificultar a transmissão do conhecimento e da comunicação especializada. As colocações colocam grandes desafios quer a nível linguístico quer ao nível da passagem de um para outro sistema conceptual. Todavia, a análise linguística destas unidades contribui para uma identificação e descrição mais precisa dos diferentes tipos de colocações. A nossa investigação tem como ponto de partida um corpus textual especializado do domínio da Medicina constituído com critérios rigorosos. Os softwares de tratamento semi-automático permitem-nos a obtenção de dados quantitativos, a extracção de termos e de coocorrentes, a elaboração de concordâncias e de contextos. Partindo dos coocorrentes frequentes, tentaremos identificar colocações terminológicas e efectuar uma sistemática com o objectivo do ensino-aprendizagem da língua médica para fins específicos. ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA NA MODALIDADE ESCRITA COMO SEGUNDA LÍNGUA PARA SURDOS: UM ESTUDO ENUNCIATIVO-DISCURSIVO Sebastiana Almeida Souza – UFMT/MeEL Simone de Jesus Padilha – UFMT/MeEL Este estudo pretende discutir o processo de ensino de segunda língua para surdos, promovendo estratégias que permitam a aquisição e desenvolvimento da Língua de Sinais, como primeira língua e, paralelamente, da Língua Portuguesa em sua modalidade escrita. Consideramos, no contexto da Educação Inclusiva, as possíveis lacunas intervenientes no processo de aquisição de L2 para surdos, 643 644 decorrentes da apropriação de um sistema de escrita que envolve a representação de uma língua oralizada. Especificamente, no que concerne ao processo de ensino-aprendizagem, percebe-se, através da convivência com os alunos, desde a educação infantil até o final do processo de escolarização, problemas coesivos na produção textual, o que tem ocasionado no professor dificuldades na efetivação de uma metodologia na perspectiva da educação bilíngue, por isso acreditamos ser imprescindível que o professor de Língua Portuguesa conheça com profundidade a Língua de Sinais, bem como a estruturação de sinais e tradução para que possa ofertar um ensino de qualidade. Isso nos traz algumas reflexões acerca da linguagem escrita do aluno surdo, no que se refere às questões linguístico-discursivas da língua portuguesa, bem como de que forma o surdo articula o seu texto, já que o mesmo interage no plano visual-gestual, mas precisa integrar-se no mundo da linguagem escrita. Desse modo, buscaremos oportunizar o apontamento dos aspectos coesivos em textos de alunos surdos, observando como são construídas as relações de sentido por intermédio da escrita. Para tanto, buscaremos nos ancorar teoricamente nos conceitos bakhtinianos de dialogismo, interação, alteridade e exotopia, entre outros, e também nos basearemos na teoria sócio-histórica da aprendizagem de Vygotsky. Essa investigação está inserida no Projeto de Pesquisa “Relendo Bakhtin: contribuições do Círculo de Bakhtin para uma análise dialógica de discursos produzidos em diferentes esferas da atividade humana”, desenvolvida pelo Grupo de pesquisa RELENDO BAKHTIN (REBAK), do Programa de Pós-graduação em Estudos de Linguagem, da Universidade Federal de Mato Grosso. PROPOSIÇÃO DE UM PROGRAMA DE ATIVIDADES DE LEITURA E ESCRITA REFERENTES À SEÇÃO DE INTRODUÇÃO DO RESUMO EXPANDIDO PARA APRENDIZES DO ENSINO MÉDIO NUMA ABORDAGEM DE GÊNERO SOCIORRETÓRICA Rita Rodrigues de Souza – IFG/UNESP/SJRP Com a inserção de discentes do Ensino Médio Integrado no Programa de Bolsa de Iniciação Científica para o Ensino Médio – PIBIC-EM –, oferecido pela Rede Federal de Educação em parceria com o CNPq, surge uma nova demanda para os docentes que atuam na Rede: a orientação de pesquisa científica e outras demandas decorrentes dessa orientação, como, por exemplo, a escrita de textos acadêmicos. Em função disso, neste trabalho, objetivamos mostrar e discutir um possível programa de atividades leitura e escrita que visem à conscientização dos aprendizes em relação aos elementos retóricos presentes na seção de introdução do resumo expandido, caracterizando o ensino-aprendizagem de língua portuguesa com um fim específico no contexto de ensino de língua materna, resumidamente, com a finalidade de desenvolvimento da habilidade de compreensão e escrita de texto acadêmico. A escolha desse tipo de resumo se justifica porque em muitos Seminários de Iniciação Científica, de apresentação dos resultados de projetos de pesquisa de PIBIC-EM, solicita-se que o discente produza um resumo expandido para apresentação em forma de pôster e/ou comunicação oral. A produção textual da introdução, subsidiada pelo aporte teórico do estudo de gênero numa abordagem sociorretórica, pode contribuir com os jovens pesquisadores de IC-EM para a construção de conhecimentos significativos em relação à prática social de elaboração de Resumo Expandido, e salvo adaptações a escrita do Relatório de Pesquisa. A escolha da introdução se deu, primeiramente, pelo fato de que há fundamentação teórica consistente em relação à análise de gênero sociorretórica, tendo como expoente fundador o linguista Swales (1990) e o estudioso Bhatia (1993). E há estudos substantivos no Brasil sobre a introdução, como por exemplo, Aranha (1996, 2004) e Zinani e Santos (2007) que podem subsidiar a proposta em questão em questão. Além da importância da aprendizagem desse gênero como um dos fatores principais de condução ao êxito de determinado propósito. No atinente à abordagem sociorretórica, verifica-se que tem como objetivo a análise de gêneros textuais, tomando-os como ações sociais de modo que eles materializem uma classe de eventos; compartilhem propósitos comunicativos; possuam traços 644 645 específicos prototípicos; apresentem lógica inata; e determinem usos linguísticos específicos de acordo com a comunidade discursiva a qual estão relacionados (PEREIRA; RODRIGUES, 2009). As atividades de conscientização retórica, que serão propostas, visam a proporcionar ao discente momento para que ele possa refletir e atuar por meio da linguagem e perceber os movimentos linguísticos e discursivos (SWALES, 1990) que podem ser selecionados para a construção do texto, no caso, a introdução. Para alcançar tal fim, o programa de atividades contemplará desde a identificação dos passos e movimentos retóricos conforme propõe Swales (1990) à organização retórica de introduções de modo reflexivo contemplando a leitura e a escrita. Enfim, este trabalho pretende contribuir com as discussões deste simpósio no que se propõe no item (i) a descrição e (ou) avaliação de programas, materiais, estratégias de ensino de língua para fins específicos. Por isso, as considerações acerca da leitura e produção de texto acadêmico, presentes neste trabalho, considerarão o conceito de gênero como ação social de acordo com Miller (1984, 1994), Bhatia (1993) Swales e Feak (2001), Swales (2004,[1990]2006), Bazerman (2006), e também, considerações sobre análise textos discutidas em Antunes (2010). ENSINO DO PORTUGUÊS PARA FINS ESPECÍFICOS EM DIREITO – ANÁLISE DE NECESSIDADES Mário Pinharanda Nunes – UMAC Desde a década de 80 do sec. XX, aproximadamente, e em consequência da afirmacão do Português como língua internacional, determinados contextos de procura da aprendizagem de PLE começaram a exigir que os profissionais desta área passassem a elaborar programas e abordagens próprias, ainda que partindo da maior parte dos casos com base na já vasta experiência de inglês no domínio do ensino de inglês para fins específicos (EIFE), que teve o seu início nos anos 70 (Marquesi, 2007). Foi ainda na década de 80, que na reflexão acerca do ensino de inglês se começou a defender a importância do EIFE constituir uma abordagem própria – a par das existentes para o ensino de daquele idioma para fins gerais (EIFG) (Hutchinson & Waters, 1987). Nesse sentido, o campo de EIFE, e de outras línguas, passou de uma fase em que se ocupou primordialmente com questões ligadas aos aspetos linguísticos da língua para uma em que se coloca maior ênfase no desenvolvimento de capacidades comunicativas, e em que o processo de ensino/aprendizagem está centrada nas necessidades específicas que levam o aprendente a querer atingir um determinado domínio da língua. A análise das necessidades do conhecimento e uso da língua em aquisição tornase um elemento central na elaboração de programas e de materiais dos cursos deenino de línguas para fins específicos (Yin et. al 2011). Em Macau, o EPFE da área jurídica remonta a meados da década de 1990 quando é criada uma licenciatura em Direito em Língua chinesa na Universidade de Macau, com o objetivo de formar jurístas locais bilingues (em chinês e português) para a Região Adminsitrativa Especial de Macau que seria fundada a 20 de Dezembro de 1999. A referida licenciatura inclui entre os componentes no seu currículo o EPFE. Com já cerca de 16 anos de existência, o EPFE na Licenciatura de Direito em chinês da Universidade de Macau evoluiu de uma fase em que era ensinado a partir de programas e conteúdos muito próximos dos das abordagens empregues para o EPFG, para uma fase mais recente em que tem vindo a ser feita uma refexão e experimentação por parte de alguns docentes envolvidos nesta cadeira no sentido de aproximar o processo de ensino/aprendizagem do português das reais necessidades dos seus alunos. O presente trabalho procura apurar a avaliação que os aprendentes de PFE na Licenciatura em Direito em língua chinesa fazem da sua aprendizagem desta língua, face às suas necessidades e desejos, enquanto alunos de português, e às falhas que o EPLE evidencia, na opinião dos mesmos. Os dados foram recolhidos por meio de um inquérito e de depoimentos em forma de entrevistas junto a ex-alunos (atuais juristas em exercício) de diferentes anos de formatura e a atuais alunos, i.e. ainda em formação. A natureza diacrónica da constituição do corpus de dados permitiu estabelecer 645 646 comparações entre as opiniões dos aprendentes dos respetivos modelos de ensino ao longo da existência desta Licenciatura. A presente pesquisa insere-se numa avaliação mais alargada do EPFE na Licenciatura em Direito na Universidade de Macau. O DOMÍNIO DA LINGUAGEM JURÍDICA – CRENÇAS E ATITUDES Custódio Martins – UMAC O campo de investigação da Linguística Aplicada (LA), influenciado pelas correntes de investigação em contextos de língua estrangeira, de língua segunda e também de contextos bilingues, tem vindo a caracterizar-se nas últimas décadas por um grande eclectismo em termos metodológicos e teóricos (Dörnyei, 2009:241-242). Compreender o papel das diferenças individuais, como sejam a motivação ou as atitudes, pode fornecer dados importantes para a definição e caracterização dos processos de aprendizagem de uma língua, mas também para o seu desenvolvimento. O domínio da linguagem jurídica pode colocar alguns desafios tanto a falantes nativos como a falantes de língua segunda ou a falantes bilingues, não só pela sua especificidade em termos lexicais, através do frequente recurso a cultismos, por exemplo, mas também em termos sintácticosemânticos. O tratamento científico do ensino/aprendizagem para fins específicos para o português não está substancialmente desenvolvido. Nessa medida, o presente trabalho investiga o papel que tanto crenças como atitudes podem ter no processo conducente à apropriação e domínio da linguagem jurídica, independentemente da área de sub-especialização, por falantes nativos de português, falantes bilingues (português/chinês; português/crioulos de base lexical portuguesa) e falantes de português como segunda língua que frequentam a Licenciatura em Direito em Língua Portuguesa na Universidade de Macau. Através de entrevistas e de um questionário aberto pretendemos identificar e caracterizar a função das crenças e atitudes (e outras eventuais variáveis sociolinguísticas) de cada grupo de falantes relativamente ao seu posicionamento face ao processo de apropriação e domínio da linguagem jurídica, sabendo que, para tal, o domínio mais ou menos sólido das várias componentes da gramática é imprescindível. 646 647 SIMPÓSIO 64 RELAÇÕES ENTRE O SUJEITO E A LÍNGUA: OS MÚLTIPLOS SENTIDOS O objetivo desse grupo é apresentar trabalhos que investigam como ocorre, por meio da relação entre palavra e sentido,a formação de leitores. Fundamentamos nossa pesquisa nas teorias de sentido da língua, indo da semântica ao discurso. Consideramos significativo criar relações entre o campo teórico desenvolvido nos espaços acadêmicos e as práticas escolares e não escolares que se referem ao processo de ler como construção de sentidos a partir da materialidade da língua em realização textual. Outras categorias de estudos da linguagem, como signo, enunciado, formação discursiva, interação, gênero, discurso e interdiscurso contribuirão para a analisar epistemologicamente essas práticas de leitura pesquisadas. A metodologia será operacionalizada por esses dois fundamentos: os dados (corpus) das práticas de leitura; a análise e a interpretação dos dados pelos fundamentos acima referidos. Esperamos como resultados a reflexão sobre as práticas de leitura e propostas de leitura que qualifiquem a relação do sujeito com a palavra da sua língua. COORDENAÇÃO Agostinho Potenciano de Souza Universidade Federal de Goiás [email protected] Luana Alves Luterman Universidade Estadual de Goiás [email protected] 647 648 PROJETO GOIÁS: PEDAGOGIA DE PROJETOS E LITERATURA GOIANA NA FORMAÇÃO DE LEITORES Heliandro Rosa de Jesus – PG/UFG Uma das questões que mais me incomoda como professor da rede pública estadual de Goiás é a falta de conhecimento, por parte dos alunos, das questões históricas, geográficas, artísticas e culturais do nosso estado. Como professor de Língua Portuguesa sempre me incomodou, também, a falta de obras de literatura goiana no currículo escolar já que essa literatura tem uma produção bastante interessante e está bem mais próxima da realidade dos nossos alunos do que a literatura clássica nacional. Com isso, decidi desenvolver um projeto de trabalho intitulado Projeto Goiás, desenvolvido com os alunos de uma turma de terceiro ano do Ensino Médio de uma escola pública estadual da periferia de Goiânia, no qual busquei o incentivo à leitura utilizando a leitura de contos, poesias e crônicas de autores goianos, tais como os já considerados clássicos como Cora Coralina, Bernardo Elis e José J. Veiga e outros mais atuais, como Miguel Jorge, Lêda Selma, José Mendonça Teles e Brasigóis Felício. Busquei também, com o projeto relacionar questões culturais do nosso estado com as leituras feitas, seguindo assim as ideias de Hernández (2000) que defende que devemos abandonar os modelos tradicionalistas de educação, pois estes estão abalizados pela velha racionalidade que se baseia em uma visão simplista e memorista que não tem nenhuma relação com a sociedade moderna na qual nos inserimos. Esse mesmo autor defende, ainda, que temos que buscar uma nova racionalidade, o que significa transformar radicalmente a maneira de pensar herdada do passado, seu memorismo normativo, sua reprodução simples e substituir tudo isso pela cooperação, pelo sentido de responsabilidade, pela capacidade de relacionar umas coisas e fenômenos com outros e assim descobrir em todo momento o que é novo. No entanto o que percebemos é que essa mudança de postura no ensino e aprendizagem ainda é algo longe do ideal, pois, observamos com Antunes (2003) que a pesar das propostas inovadoras da linguística histórica, da sociolinguística e da análise do discurso as aulas de português, em grande parte, continuam seguindo propostas pedagógicas nas quais as regras gramaticais continuam ocupando o centro das aulas e são trabalhadas de forma descontextualizadas em frases soltas e longe do seu significado real. Além disso, esta mesma autora, referindo-se à leitura e à produção de texto, nos indica que, mesmo com a aparição da proposta de se trabalhar os diversos gêneros textuais buscando a relação com o seu uso real e contextualizado, continua-se a trabalhar a leitura e, consequentemente, a literatura, como simples pretexto para o ensino das estruturas gramaticais e tudo isso com pouca reflexão por parte dos alunos e professores sobre o que está sendo feito e estudado (ANTUNES, 2003). Nesse sentido, este trabalho tem por objetivo relatar os resultados de uma pesquisa desenvolvida em sala de aula sobre a relação entre a formação de leitores e a pedagogia de projetos, proposta educativa que busca novas formas de ensinar dirigidas à realidade dos alunos, fazendo com que estes aprendam de forma autônoma e sejam sujeitos da sua própria aprendizagem. MEMÓRIA DISCURSIVA SOBRE LEITURA NO ENSINO MÉDIO Mary Rodrigues Vale Guimarães – GEDIS/UFG-CAC-PMEL Grenissa Bonvino Stafuzza – GEDIS/UFG-CAC-PMEL O presente estudo orienta-se nos pressupostos da Análise do Discurso Francesa (ADF) traz como tema a análise da memória discursiva (Pêcheux, 1999) sobre a prática de leitura de alunos cursando o ensino médio em uma escola estadual da cidade de Campo Alegre de Goiás-GO. Pêcheux e Fuchs (1993) observam que a memória discursiva faz com que toda formação discursiva faça circular formulações já enunciadas. Nesse sentido, a memória discursiva sobre a leitura no ensino médio diz respeito, em um primeiro momento, à recorrência de enunciados nos dizeres dos alunos, sujeitos da pesquisa, que enunciam a historicidade desse processo. Logo, é a memória discursiva quem separa e 648 649 elege, a partir dos enunciados dos alunos, os elementos de uma determinada historicidade do processo da leitura, ou seja, aquilo que deve ser excluído e o que pode emergir e ser realizado num outro contexto, produzindo, assim, determinados efeitos de sentidos. A construção do corpus da pesquisa deu-se em campo quando, em contato com os alunos, sujeitos da pesquisa, propomos o trabalho aos alunos a partir do livro didático adotado pela escola Português-Linguagens, de Willian Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães (2005), que traz no capítulo 10 “Procedimentos de leitura”, uma atividade com o título “Ler é só começar?”. A partir do trabalho com essa atividade, propomos dois temas para que os alunos pudessem desenvolver suas produções textuais: i) Como foi o início de sua experiência de leitura e ii) Como se sentiu a partir do momento em que passou a ter autonomia para ler o que quisesse. As produções textuais, produtos dessa atividade de redação escolar constituiuse, portanto, no corpus de pesquisa, uma vez que levantamos questões sobre o sujeitoleitor que enuncia, observando em sua produção como enuncia a memória discursiva. Pretendemos refletir inicialmente como emerge os dizeres provenientes de uma memória discursiva sobre o processo de leitura, observando de que modo os alunos constituem-se leitores e quais sentidos sobre a prática de leitura (o papel da escola, dos amigos, da família etc.) podem emergir de suas produções, pontuando, assim, as memórias de leitura na formação do sujeito-leitor. PRÁTICAS DE LEITURA RELACIONANDO LÍNGUA, TEXTO E DISCURSO Agostinho Potenciano de Souza – UFG/FL Luana Alves Luterman – UEG/UnU Para contribuir na formação para a leitura, incluímos estudos teóricos básicos, na formação de professores de Língua Portuguesa, a respeito do processo de leitura e o exercício deles em práticas de leitura conduzidas com alunos de ensino básico. O ato de ler coloca em jogo as intenções de sentido de três lugares: o autor, o texto, o leitor (ECO: 1986). No embate dessas forças, que ora determinam limites, ora abrem-se para a liberdade interpretativa, gradativamente, o leitor levanta hipóteses de sentidos, relacionando língua, texto e discurso – categorias que sustentam a atividade de consciência do ato de ler. Nessa interação complexa, entra em cena a formação do leitor ativo nos processos de interpretação e compreensão dos enunciados, para os quais confluem as questões sócio-históricas, a formação discursiva, a questão da subjetividade e do interdiscurso (ORLANDI: 1998). O modo de realizar essa pesquisa inicia-se com a formação de um grupo de estagiários de Licenciatura em Língua Portuguesa que estuda as bases teóricas da leitura, seja em relação às condições de sua produção no meio social, seja no embate entre leitor e texto. A seguir, o grupo de licenciandos assume um projeto de leitura em alguma série do ensino fundamental ou médio, executando com eles práticas de leitura em gêneros diversos, colhendo dados que indicam as dificuldades, as hipóteses de leitura, a utilização das bases teóricas, os avanços nas competências em relação a essa atividade. O grupo acompanha a ação com discussões críticas a respeito da metodologia que está conduzindo, retomando o campo teórico e repensando a prática vivenciada com seus alunos. O resultado é o amadurecimento do futuro professor como leitor e a confiança na relação entre o campo teórico e as práticas produtivas de leitura. Como efeito consequente, constatamos a melhora das condições de formação de adolescentes e jovens leitores, que aprendem a relacionar a palavra da sua língua e a construção de sentidos num processo de leitura como construção de sentidos. 649 650 PRÁTICAS DE LEITURA E ESCRITA DE ALUNOS DO 9º ANO DE UMA ESCOLA PÚBLICA: UM TRABALHO COM CRÔNICAS Rosangela do Nascimento Costa – UFG O presente trabalho busca analisar as práticas de leitura e escrita de alunos do 9º ano de uma escola pública. A pesquisa aborda noções de gêneros discursivos, texto, textualidade, práticas de leitura e escrita. O objetivo principal da pesquisa é verificar como os alunos reagem à leitura do gênero crônica, baseado nos conhecimentos prévios dos mesmos, para posteriormente trabalhar o gênero com todas as suas especificidades. O trabalho em sala se baseou nas orientações dos PCNs sobre o trabalho com os gêneros textuais/discursivos. Analisar-se-á também a escrita dos educandos após algumas aulas desenvolvidas pela pesquisadora, nas quais serão desenvolvidas atividades relacionadas ao referido tema. Foram necessárias 10 aulas em uma mesma sala objetivando o entrosamento com os alunos e também para que o trabalho obtivesse melhor êxito. O trabalho se baseia em pressupostos teóricos ancorados em Bakhtin, Chartier, Manguel, Koch, Costa Val, Marcuschi, dentre outros que se julgar necessário. O corpus a ser analisado consta das crônicas lidas em sala e dos textos produzidos pelos alunos. A pesquisa é de campo com participação e intervenção da pesquisadora, que a partir do trabalho em sala e da produção dos alunos, buscou verificar como se processa a constituição do sujeito por meio da leitura e da escrita. Outro fator importante também analisado foi a maneira como os estudantes fazem uso da escrita e como inferem em textos lidos e excertos de apoio à produção textual. Nesse sentido, após todo um trabalho desenvolvido foram propostas algumas produções do gênero com textos de apoio e tema já previsto. Dessa forma, a pesquisa se justifica pelo fato de tanto leitura quanto escrita estarem presentes em toda a vida escolar dos discentes e ser fator fundamental para que o mesmo obtenha sucesso na vida acadêmica e social. POR UMA VIDA MELHOR: DA PRODUÇÃO DE SENTIDO À FORMAÇÃO DE LEITORES Bruna Gracieli de Souza – UFMS Compartilhando o pensamento de Mikhail Bakthin que considera a leitura um processo abrangente e complexo de compreensão e intelecção do mundo que parte de uma característica fundamental e singular ao homem: a sua capacidade simbólica de interagir com o outro pela expressão da palavra; e admitindo que desde o nascimento, o homem utiliza a linguagem para ler o mundo e que, como leitores em potencial, busca-se contato com diversas formas de leitura, o presente trabalho, visa a apresentar resultados parciais do projeto de pesquisa em desenvolvimento no Programa de PósGraduação Mestrado em Estudos de Linguagens, cuja abordagem trata da discussão instituída acerca de algumas afirmações feitas quando o livro didático Por uma Vida Melhor foi distribuído pelo MEC aos estudantes da EJA – Educação de Jovens e Adultos. Propomos a análise de quatro textos sincréticos divulgados, em 2011, na revista semanal de maior circulação no país, a VEJA. Considerando-se a semiótica como uma teoria da significação, cuja preocupação, segundo o linguista lituano Algirdas Julien Greimas, a princípio, será explicitar, de maneira conceitual, as condições da apreensão e da produção do sentido, sob a forma de um percurso gerativo, que vai do mais simples e abstrato ao mais complexo e concreto; pretendemos interpretar os componentes sintáticos e semânticos empregados no discurso e os efeitos de sentido fabricados pelos mecanismos escolhidos, com o propósito de examinar se as escolhas realizadas com o intuito de garantir o efeito de veracidade às críticas, corroboram para a divulgação de um suposto ponto de vista da própria Revista VEJA acerca do fragmento de um dos textos correspondentes ao ensino de Língua Portuguesa, publicado no livro didático Por uma Vida Melhor. Dessa forma, as reflexões apresentadas pretendem, ainda, mostrar até que ponto a utilização de diferentes formas de 650 651 linguagem colaboram com a formação do leitor, estimulando o pensamento crítico, o desenvolvimento dos sentidos e da capacidade cognitiva que compõem sua bagagem cultural. DISCURSIVIDADE A PARTIR DA POLÊMICA DO LIVRO DIDÁTICO “POR UMA VIDA MELHOR”: UM PROJETO DE LEITURA Dinaura Batista – UFMT/MeEL Este trabalho tem como mote a recente polêmica, iniciada em maio de 2011, acerca do livro didático “Por uma Vida Melhor”, distribuído pelo MEC para turmas de Educação de Jovens e Adultos em todo o Brasil. Vários artigos circularam na mídia sobre o tema, e diferentes visões sobre a questão da língua e sobre o ensino-aprendizado da língua materna foram tratadas. A leitura desses textos ainda revelou um diálogo bastante intenso, em que, na visão bakhtiniana, um texto “respondia ao outro”, um texto era “contrarresposta” do outro, numa cadeia dialógica ininterrupta. Atraídos pelo ocorrido, surgiu a ideia de um projeto de leitura que tomasse tal material como base, enfocando a discursividade nessas práticas sociais da escrita, tendo ainda o inflamado conteúdo como tema. Assim, esta pesquisa será de cunho documental e bibliográfico, e propositiva, gerando dados por meio de análise de textos que circularam à época, e propondo, a partir daí, um projeto de leitura para Capacitação de Professora de Língua Materna, com objetivos específicos: 1) foco na discursividade; 2) discussão sobre concepções de língua/linguagem e as questões do ensino da língua materna em nosso país. As questões de pesquisa para as quais buscamos respostas a partir da investigação são: 1) como os textos que circularam na mídia, a respeito do livro referido didático, dialogam entre si? 2) como estruturar um projeto de leitura com base na teoria sócio-histórica bakhtiniana, visando à discursividade? Este trabalho está inserido no projeto de pesquisa “Relendo Bakhtin: contribuições do Círculo de Bakhtin para uma análise dialógica de discursos produzidos em diferentes esferas da atividade humana”, desenvolvida pelo Grupo de Pesquisa RELENDO BAKHTIN (REBAK), do PPGEL/MeEL/UFMT. QUARENTA PROJETOS BRASILIENSES NO APODERAMENTO DA CIDADANIA, POR MEIO DO FOMENTO À LEITURA Dinorá Couto Cançado – BBDN/UFMG O tema leitura, de grande relevância na busca pela qualidade em educação e cultura, é foco deste estudo que relata resultados colhidos em pesquisa que buscou respostas para a maneira como as ações acontecem em projetos de fomento à leitura, no Distrito Federal (DF). Trata-se de projetos desenvolvidos em escolas, bibliotecas e os de iniciativas da sociedade civil. Em todas essas iniciativas, tanto os que estão à frente dos projetos, bem como os participantes que usufruem das atividades, são beneficiários e vivenciam aspectos de cidadania, presentes neles. Há muito de ousadia e criatividade na prática de dinamização, voltada para a literatura no DF. São muitos projetos que têm como objetivo fomentar o hábito de ler. A máxima a ser considerada ao enfocar esse tema é a de que o indivíduo que lê e que desenvolve sua criticidade é um cidadão participativo, está à frente de outros, torna-se mais bem informado e mais sábio no que se refere a seus direitos e deveres. Portanto, é aquele que caminha em busca da cidadania plena. A percepção da necessidade de se fazer pesquisa sobre o tema deu lugar à concretude da ação, resultando em uma monografia intitulada Leitura, Cidadania e Transformação Social, conclusão de curso de especialização, parte do Programa de Conselheiros Nacionais, na UFMG. Pela diversidade das ações e muitas sem reconhecimento, surgiu a necessidade da criação de Fórum para congraçamento das pessoas e conhecimento dos projetos, com o nome: Fórum “Brasília, capital das leituras”, que se tornou um encontro especial de celebração entre atores sociais multiplicadores de leituras, responsáveis por 40 651 652 ações já mapeadas no DF. A pesquisa citada refere-se a três edições do Fórum e tem como foco: quais projetos foram divulgados; o desempenho dos mesmos; o perfil dos executores e dos participantes; o acolhimento aos projetos; os resultados de cada Fórum; o alcance das ações desenvolvidas e a verdade sobre o apoderamento do hábito de ler. A pretensão de saber sobre os resultados colhidos nos projetos pesquisados, com base na aplicabilidade deles, ocasionou a elaboração e aplicação de questionário com perguntas voltadas à busca por respostas embasadoras sobre estes Projetos serem, ou não, instrumentos que permitem, efetivamente, que os beneficiários sejam levados à aquisição da consciência de que lendo são mais capazes de fazer análises das situações, de serem mais justos, críticos e donos do seu próprio destino. Nem as bibliotecas públicas, nem as escolares estão aparelhadas, suficientemente, para atender a todas as necessidades dos cidadãos no DF. Por isso, as iniciativas que democratizam o livro e a leitura revestem-se de importância, destacando-se, umas sete, na Biblioteca Braille Dorina Nowill. As questões propostas mostram isso, comprovando que a cidadania é vivenciada e que a leitura é uma ação que está presente na vida dos entrevistados. As principais descobertas nos projetos, dos mais simples aos mais abrangentes são: igualdade de oportunidades para todos, inclusão social, solidariedade, criticidade e compreensão leitora, democratização do livro e leitura, ludicidade, inclusão cultural, parceria entre estado e sociedade civil. O caminho percorrido, até aqui, por todos esses projetos sociais evidencia que serão colhidos frutos que disseminarão sementes e beneficiarão mais e mais envolvidos. Também é latente a certeza que há muito mais a ser feito. Depende de cada um que se empenha e que só faz a diferença por ter se apoderado da leitura e da consciência de que é cidadão todo indivíduo que sabe ser responsável por si e pelo próximo. LEITURA E ESCRITA DE RIBEIRINHOS DA AMAZÔNIA ACREANA Nagila Maria Silva Oliveira – UFAC Elisabete Carvalho de Melo – UFAC Historicamente, os discursos sobre a região amazônica têm sido embasados por teorias etnocêntricas e nacionalistas. Nos últimos anos, pesquisadores da região se debruçam sobre tais discursos, na tentativa de mudá-los, e inserir as experiências cotidianas que até então foram/são silenciadas, pela historiografia oficial. Pensando nessa realidade e na necessidade de dar vozes, com eco, às culturas amazônica-acreanas, há tempos, marcadas por estereótipos que remetem a uma inferioridade civilizatória, apresentamos como proposta de pesquisa para o Mestrado em Letras: Linguagem e Identidade, da Universidade Federal do Acre, um estudo sobre a escrita de ribeirinhos do Rio Juruá, da cidade de Cruzeiro do Sul-AC, com o intuito de contribuir com a história da leitura e escrita acreana, a partir de representações de práticas leitoras daquelas comunidades. A pesquisa encontra-se em andamento e, nesta comunicação, apresentaremos uma pequena amostra dos dados coletados e alguns apontamentos referentes ao uso da leitura e escrita pelos ribeirinhos do Rio Juruá. O objeto de estudo será, portanto, textos produzidos por esses sujeitos e veiculados através do rádio - chamado por eles por telégrafos orais. Apresentaremos, ainda, algumas reflexões sobre o uso da escrita e de outros aspectos da cultura daqueles sujeitos, que, por viverem geograficamente isolados e privados da energia elétrica, na maioria das vezes, quando se encontram nos centros urbanos, para manter contato com familiares das colocações ribeirinhas, têm na escrita desse “telégrafos”, seu único meio de comunicação. Serão utilizados os estudos de Bakhtin (1992) sobre linguagem e gêneros textuais; Bagno (2007), Marcuschi (2001) e Ong (2011), sobre fala, oralidade e escrita. Nessa perspectiva, objetivamos apresentar elementos teóricos que evidenciem a apropriação/realização da escrita por esses ribeirinhos, bem como o uso social atribuído à leitura e escrita, por essas comunidades, na tentativa de valorizar a escrita popular e compreender como esta se dá no contexto de quem vive na floresta amazônica acriana. 652 653 O ENSINO DE LÍNGUA ESCRITA NOS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS E A FORMAÇÃO DE LEITORES Alcicléia Souza Valente – UFAC Elisabete Carvalho de Melo – UFAC Nos últimos anos, os debates sobre práticas de leitura têm se intensificado, visando à compreensão das atuais necessidades de formação de leitores, consideradas as transformações sociais decorrentes da consolidação de uma sociedade letrada. Esta comunicação apresenta uma análise dos Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa - PCN, dando ênfase, principalmente, às práticas pedagógicas de professores dos anos iniciais do Ensino Fundamental, no que diz respeito à proposta curricular do ensino de língua escrita, bem como os subsídios teóricos e metodológicos para este segmento em que se trabalha a aquisição da alfabetização e desenvolvimento da leitura e escrita. Neste sentido, subentendemos que os PCN de Língua Portuguesa são uma referência para a transformação de objetivos, conteúdos e didática do ensino da língua materna, diferente de uma coleção de regras, as quais os professores devem ou não cumprir. De acordo com as indicações dos PCN de Língua Portuguesa, a linguagem verbal, atividade discursiva que é, tem como resultado a produção de textos orais e escritos. Para conduzir o aluno ao domínio da linguagem escrita, o professor deve atuar como o mediador entre a criança e o seu objeto de conhecimento, orientando-a na leitura e escrita de diferentes tipos de textos em variados gêneros discursivos. Nessa perspectiva, o documento norteador do ensino de Língua Portuguesa tem como objetivo orientar o professor a executar seu trabalho, partilhando dos objetivos educacionais de fazer com que as crianças dominem os conhecimentos escolares sobre a língua materna. Nesse sentido, a presente comunicação visa apresentar dados de uma pesquisa em andamento, do Mestrado em Letras, Linguagem e Identidade da Universidade Federal do Acre, que tem como objetivo, analisar os Parâmetros Curriculares de Língua Portuguesa na abordagem sóciointeracionista proposta por Kleiman, no que se refere à formação de leitores na perspectiva do letramento. A análise realizada considera os últimos estudos de Kleiman (1996; 2005) sobre alfabetização e letramento e formação de professores, bem como os estudos sobre concepções e práticas de alfabetização e letramento de Soares (1999) e Tfouni (1992; 1994; 1995; 2010) que tem fomentado discussões sobre os termos alfabetização e letramento, escrita e leitura, apreendidos na formação inicial e continuada de professores. A contribuição desta análise consiste em uma possibilidade de compreender os impactos dos PCNs para a formação de professores leitores, consequentemente alunos leitores. O LETRAMENTO DE ADULTOS SOB A PERSPECTIVA DA ABORDAGEM MULTIMODAL DA MÍDIA E SUAS INFLUÊNCIAS Elda Alves Oliveira Ivo – UnB Nos usos da linguagem no contexto social e escolar surgem novas exigências e habilidades para lidar com as múltiplas linguagens, nos diferentes grupos sociais. Nesse contexto, são investigadas novas perspectivas para o texto, sob a ótica da Análise de Discurso Crítica (ADC), do Letramento e da Multimodalidade, pois nenhum entendimento efetivo dos efeitos sociais do texto é possível se não analisarmos como são esses efeitos quando as pessoas falam ou escrevem. Aqui são analisados os textos produzidos pelos alunos no contexto de letramento na empresa e a relação com os diferentes textos divulgados pela mídia acerca da empresa e sua atividade ligada à exploração de minério. É importante destacar que a permanência da empresa na cidade é motivo de grande polêmica tanto na comunidade local quanto fora dela, devido a questões referentes ao impacto ambiental e constantes acusações de poluição dos recursos naturais da cidade e da região. Os funcionários/alunos estão sempre envolvidos em polêmicas sobre as atividades das empresas em 653 654 que trabalham e são questionados, às vezes de forma veemente, por parte da população em geral, sobre os riscos alegados acerca do impacto destas atividades para o meio ambiente e sobre a repercussão do assunto na mídia. O objetivo do presente trabalho é estudar, com base em reportagens publicadas na mídia, em relação às atividades da empresa, se tal abordagem influencia a produção textual do aluno e se contribui para a construção crítica do discurso deste aluno, sob o marco teórico do Letramento em Street (1984, 1995 e 2001), Barton (1994), Barton, Hamilton & Ivanic (1994, 2000), Heath (1983), Vieira (2003); Kleiman (2003) e outros, da Análise de Discurso Crítica em Fairclough (1989, 1992, 2001, 2003, 2006), Chouliaraki e Fairclough (1999) e da Multimodalidade em Kress e van Leeuwen (1996, 2001). Busca-se refletir sobre as contribuições de uma abordagem multimodal e no repensar acerca do modelo de Letramento e das práticas habituais da produção textual, dos significados utilizados para estabelecer e sustentar as relações de interação e a contribuição desse arcabouço teórico para o entendimento do letramento. A base metodológica escolhida é a abordagem qualitativa em Denzin (2009), Flick (2004) e Bauer e Gaskell (2003), pois o surgimento e a diversificação dos contextos e das perspectivas sociais exigem uma nova postura crítica, conceitual e metodológica para lidar com os assuntos de pesquisa, pela sua própria natureza científica. Diante do corpus analisado verifica-se que o campo teórico do Letramento, da ADC e da Multimodalidade têm muito a contribuir, pois língua(gem) e imagem não desempenham o mesmo papel e esta já se encarrega de certas funções anteriormente desempenhadas pela linguagem. As duas modalidades não estão meramente co-existindo, há uma forte interação e, no presente trabalho, já são evidentes os efeitos reais sobre a linguagem na modalidade escrita. Há muito para refletir e para discutir acerca do entrelaçamento do Letramento, da Multimodalidade e da ADC diante da relevância temática, pois são ferramentas capazes de potencializar os sujeitos para essa leitura do mundo em todas as formas de representação, em qualquer contexto e para que o discurso seja considerado para além dessa estrutura social. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS DA ESTRUTURA SAUSSURIANA NO DISCURSO PSICANALÍTICO LACANIANO: LINGUAGEM E PSICANÁLISE Rita de Cássia Gemino da Silva – FAMA Com a chegada do século XXI, podemos perceber uma convergência mais ampla entre as ciências e a procura de novos paradigmas que possam dar conta de um postulado científico mais complexo e, consequentemente, mais investigativo, a fim de desmistificar os padrões científicos do passado. Hoje, situar um estudo tendo como arcabouço a ciência e somente a ciência, de que é objeto o tema pretendido, nos faz desviar de um objetivo mais amplo, exigido pela nova metodologia de ensino, a inter-relação entre as ideias centrais que formam o discurso humano. Sendo assim, procurou-se caracterizar como a Linguística, enquanto ciência revela meandros para a formação de novas teorias, inclusive aquelas que abarcam o comportamento do pensamento humano, como a Psicanálise. Desta maneira, este estudo tem como principal objetivo referendar a importância da Teoria do Signo, do linguista Ferdinand de Saussure, na sistematização do discurso psicanalítico de Jacques Lacan. Expondo uma linha de tempo sobre a formação da Linguística, o texto caminha por entre as questões colocadas por Protágoras, Platão e Aristóteles, chegando ao que hoje conhecemos como a ciência da linguagem. Estabelecendo um contraponto com a Psicanálise de Freud e os preceitos de Jacques Lacan, foi elaborado um esquema axiomático no qual são demonstradas as inter-relações dos dois psicanalistas e a formação do pensamento lacaniano centrado no arcabouço teórico de Saussure. Fazendo uma interpretação da Teoria do Espelho, de Lacan, é referendada a imbricação da Linguagem e seus signos com as Teorias Linguísticas da Psicanálise. O estudo poderia abranger não somente a Psicanálise de Lacan, como também outras ciências, que, no final do século XX, se debruçaram sobre a Linguística. Mas a escolha de Jacques Lacan vem 654 655 acompanhar uma série de intenções, entre elas ressaltar a estrutura da linguagem e sua interligação com a estrutura do pensamento e a utilização das ideias saussurianas na formação de Lacan, que resgata os pacientes, discernindo o problema existente utilizando a linguagem do signo. Entre tantas contribuições de Lacan, talvez a maior tenha sido, tanto para psicanálise como para toda ciência humana, o duplo movimento de um retorno às descobertas originárias de Freud e de um recurso às ciências da linguagem, que permitem articular a ciência do inconsciente. Nas descobertas recentes da antropologia estrutural e da linguística é que a teoria lacaniana se fundamenta, deixando também contribuições para as mesmas. O que Lacan vai destacar na teoria psicanalítica é a importância do dizer e do calar numa dialética em que a verdade fica além do discurso infinitamente travado entre poltrona e divã, da relação significativa da linguagem, colhendo os efeitos do significante. Na realidade, Lacan propõe fecundar a psicanálise com a análise estrutural saussuriana dos signos, retornando os textos originais de Freud, numa releitura, na qual imbricam duas ciências e seus respectivos objetos de estudo, com suas diferenciadas metodologias; nesse caso a Psicanálise e a Linguística. LEITURA, GÊNERO, RETEXTUALIZAÇÃO E PRODUÇÃO TEXTUAL NO ENSINO MÉDIO: AS CONTRIBUIÇÕES DE (TEXTOS ANTIGOS) PEDAGOGIA RETÓRICA NA FORMAÇÃO DE LEITORES E ESCRITORES COMPETENTES. Veralúcia Cogo – UFMG O presente trabalho é parte de uma investigação que apresenta e retoma aspectos centrais de (textos antigos) da Pedagogia Retórica, tendo como foco principal a ‘ensinagem’ da leitura e a produção textual no processo aprendizagem de alunos, em especial, do Ensino Médio. Esta pesquisa foi realizada em duas etapas. A primeira aconteceu em sala de aula (Metodologia da Língua Portuguesa) com alunos do Ensino Médio profissionalizante do Curso Normal, que estavam formando para trabalharem nas séries iniciais do Ensino Infantil. Foi realizado um mapeamento das práticas de ‘letramento’ desenvolvidas nessas turmas, focalizando aulas de leitura (em vários gêneros) e produção textual. Na segunda etapa, analisou-se o discurso produzido nestas práticas à luz da teoria bakhtiniana. Todavia, o objetivo maior foi extrair dos (textos antigos) Pedagogia Retórica princípios norteadores para a formação de leitores e escritores competentes. Sobre o corpus teórico foram considerados os trabalhos que discutem estratégias de leitura e produção textual em sala de aula: Koch (2006), Silva (1993) e muitos outros, da pedagogia Retórica: D’Angelo (1980), Fiandra (2002), Mosca (2001), Reboul (2004), Amarante (2007), até mesmo do mais contemporâneo Perelman, e, ainda autores que investigam sobre gêneros, produção textual e retextualização: Marcusch (2000/2007) e Costa Val (2004) dentre outros. Os resultados da pesquisa reafirmam a importância de investir na formação de professores para atuarem na formação de leitores e escritores desde as séries iniciais. HISTÓRIA DO ENSINO DO PORTUGUÊS: MATERIAIS DIDÁTICOS E PEDAGÓGICOS DE LÍNGUA PORTUGUESA E A DIFUSÃO DO PENSAMENTO CIENTÍFICO MODERNO DE 1900 A 1930 Márcia Regina Takeuchi – PUC-SP Este trabalho deriva de uma parte de minha pesquisa de doutorado, que se dedica a estudar as origens da constituição da disciplina de ciências na escola estadual paulista. Antes do surgimento mesmo da ciência como disciplina escolar, os conteúdos atinentes ao campo que hoje entendemos como sendo de ciências vinham permeando as outras disciplinas em formação ou já constituídas – entre elas a língua portuguesa, ou “língua pátria”. Contrariamente a história, geografia, educação 655 656 moral e civismo, religião, que no final do século XIX figuravam com conteúdos próprios, com práticas prescritas e materiais didáticos dedicados ao ensino, os conteúdos hoje chamados de “ciências” freqüentavam campos de outras disciplinas, dando legitimidade e reforçando a noção de modernidade científica e de escola moderna. Veiculados dessa maneira, esses conhecimentos ajudaram a compor os saberes escolares que se atomizavam, num processo analisado, entre outros, por André Chervel e Bruno Belhoste e caracterizado como a crise das humanidades e a disciplinarização dos campos de conhecimento, a passagem do ensino das humanidades clássicas para o ensino científico. É de se notar, por exemplo, que entre as práticas docentes prescritas para o ensino da leitura, há uma recorrente preocupação de se inserirem temas relacionados à higiene e à saúde ou a plantas e animais úteis ou nocivos aos interesses humanos. Para este trabalho, usarei como fonte de pesquisa Anuários do Ensino do Estado de São Paulo, revistas pedagógicas e livros de leitura. UM OLHAR DISCURSIVO PARA A POLISSEMIA NA LINGUAGEM REFORMULADA Hélder Sousa Santos – UFU Sob a óptica da Análise de discurso de linha francesa (AD), nosso trabalho re-examina o tópico da polissemia na/da linguagem reformulada. Polissemia que, em nosso caso específico, é resultante da tarefa de, em concurso de vestibular, alunos vestibulandos “formularem” paráfrases de enunciados de um texto motivador (TM) — consoante injunção a eles requerida — em redações escritas para avaliação da instância vestibular. No tocante a essas paráfrases, cabe ressaltar que, em vista de nossa análise construída para elas no mestrado, há incidências subjetivas afetando a avaliação que corretores de redação de vestibular ali realizaram. Esses corretores, a fim de localizar gestos de paráfrases de enunciados do TM na redação do vestibulando, tendem a olhar (apenas) para os “mesmos” sentidos que os tocam em correções de redação que efetivam. Isso, certamente, se dá porque mecanismos constitutivos do próprio imaginário de objetividade do processo seletivo do vestibular, por exemplo, os comandos de correção de redações e as exigências impostas ao candidato à vaga à universidade durante momento de realização desse exame, não contam com critérios pré-estabelecidos para, também, avaliar sentidos da ordem do diferente na escrita do vestibulando. No entanto, esse modo de avaliar a paráfrase no vestibular não funciona assim em sua conjeturada objetividade. Ocorrem ali (em sua forma de avaliação) discrepâncias de sentidos, posto que aquilo que um corretor de redação localiza como sendo uma produção parafrástica para enunciados do TM, outro corretor, diferentemente, nada disso garante, localizando, nesse segundo caso, o sentido diferente — o contrário, com certeza, acontece! Sendo assim, o sentido reconhecido como "discrepante" (a polissemia) na avaliação de paráfrases escritas para o vestibular representa para nós uma “porta de entrada” para perscrutarmos fatos linguísticos implicados aos processos de constituição da linguagem que é (re)feita a partir de gestos de (re)formulação do dizer do outro; fatos esses que, em sua maioria, relacionam-se à noção cunhada pela AD francesa de “memória discursiva”. A QUESTÃO DA ARQUITETÔNICA NO PROJETO ENUNCIATIVO DA DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA NO SÉCULO XIX Urbano Cavalcante Filho – USP Nesta exposição, propomo-nos a apresentar nossa proposta de investigação constante do projeto de doutoramento no Programa de Pós-Graduação em Filologia e Língua Portuguesa da USP. Nosso trabalho se volta ao estudo da questão da arquitetônica da Divulgação Científica (DC) na segunda metade do século XIX. Objetivamos analisar a arquitetônica da DC, materializada no projeto 656 657 enunciativo-discursivo das Conferências Populares da Glória do Rio de Janeiro. Tais conferências, corpus deste trabalho, representa uma das mais significativas atividades de divulgação dos saberes científicos da história brasileira, cuja meta era divulgar um conhecimento científico entre a camada letrada da cidade do Rio de Janeiro. Apoiados nas reflexões advindas da teoria dialógica da linguagem do Círculo de Bakhtin, e considerando o fato de que, para o Círculo, o enunciado é encarado como produto da interação verbal, determinado tanto por uma situação material concreta como pelo contexto mais amplo que constitui o conjunto das condições de vida de uma dada comunidade linguística numa dimensão histórica, social e cultural, discutiremos e analisaremos as relações dialógicas interdiscursivas e interativas e as estratégias e mecanismos discursivos presentes no projeto enunciativo-ideológico no discurso da esfera da DC. Sob a luz da teoria do Círculo, pretendemos mobilizar os conceitos de esfera, gênero discursivo, dialogismo, enunciado, sujeito e autoria, todos eles perpassados pela dimensão do ato ético/responsivo do divulgador nessa esfera de atividade (DC), pois é nessa conjectura dialógica que o sujeito age ético-axiologicamente no processo interacional, na realidade histórico-social. Destacamos a importância da contribuição do Círculo para este trabalho, pelo fato de, ao pensarmos a respeito da natureza da enunciação e dos gêneros do discurso, observamos como as condições de produção condicionam e são condicionadas pelos aspectos enunciativos, a partir do pressuposto bakhtiniano de que a classificação das formas de enunciação apoiam-se na classificação das formas de comunicação verbal, determinadas pelas relações de produção e pela estrutura sociopolítica. AVENIDA BRASIL: FENÔMENO TELEVISIVO, FENÔMENO NAS REDES SOCIAIS NO BRASIL E EM PORTUGAL Tiago de Souza Lima Gomes – Universidade do Minho - Portugal Renata Kelly Arruda – UNICAMP Esse trabalho propõe uma reflexão acerca das diversas manifestações via web, mais precisamente nas redes sociais Twitter e Facebook, oriundas da exibição da telenovela intitulada Avenida Brasil no Brasil e em Portugal no ano de 2012. Produzida e exibida pela Rede Globo, emissora de maior audiência no Brasil, a novela estreou em 26 de março de 2012 no horário de 21hs, horário nobre da emissora, e desenrolou-se em 179 episódios tendo seu último capítulo exibido no dia 19 de outubro de 2012. Em Portugal, a telenovela teve sua estréia em 24 de setembro de 2012 através do canal Sociedade Independente de Informação (SIC) e até o presente momento, encontra-se em exibição no horário de 23hs. Alcançando bons números de audiência e superando os números da telenovela antecessora, Avenida Brasil ainda foi responsável por inúmeras manifestações nas redes sociais, durante o período de sua exibição. Seus bordões viraram moda, o desenrolar da trama foi comentado em tempo real, diariamente por milhões de telespectadores nas redes sociais, cenas marcantes se transformavam em GIF animado em questões de minutos e um trecho da música tema se tornou uma espécie de grito de guerra das redes sociais. Nesse trabalho abordaremos como as emoções causadas, o envolvimento gerado pelo enredo, as trocas de informações e opiniões através da Internet foram, um autêntico fenômeno de relação entre duas mídias, e gerou consequências que certamente poderão refletir não somente no processo de criação deste gênero televisivo, mas na forma como algumas classes sociais encaram este produto de mídia. Refletiremos o produto cultural telenovela, sua história de sucesso no cenário televisivo brasileiro e todo o preconceito sofrido pelo gênero. Diante de uma sociedade que sabidamente enxerga a telenovela como produto menor, alienante e produto para classes menos abastadas, deparar-se com uma produção que conseguiu ao longo dos meses, agregar consumidores de vários níveis socioeconômicos e que, em seus perfis de redes de relacionamento se assumiram como telespectadores, configurar-se como o prenuncio de um novo arranjo para as relações entre mídias. O sucesso da novela pode ser medido e acompanhado em tempo real, aprovações e desaprovações foram e são expostas e discutidas pelos telespectadores ainda durante a exibição do capítulo. No caso dessa investigação, também 657 658 apresentaremos os fatores que entendemos como primordiais ao sucesso alcançado pela telenovela na televisão e nas redes sociais, as impressões de seus telespectadores quanto a seus diferenciais com relação a outros folhetins e os jargões, imagens e discussões que movimentaram e movimentam as redes durante sua exibição no Brasil e atualmente em Portugal. HUMOR E SEMÂNTICA NAS RELAÇÕES DE ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA: UMA ANÁLISE LINGUÍSTICA DA PROGRAMAÇÃO DE ENTRETENIMENTO DA TELEVISÃO BRASILEIRA Everaldo dos Santos Almeida – FAMA Análise do discurso humorístico televisivo brasileiro, implicâncias e relações linguístico-históricoculturais dos falantes em decorrência da concepção sociológica da linguagem a partir dos bordões veiculados pela programação de entretenimento. Estudo cultural e semiótico do humor na televisão capaz de atingir e influenciar a configuração da Língua Portuguesa a partir da ressemantização da linguagem tendo os bordões como instrumento de uso. Relação dialógica entre a linguagem humorística televisiva (o outro) e o sujeito (telespectador) na (re)construção dos sentidos linguísticos a partir da interação verbal, por meio da qual surgem novas formas de dizer e de significar, tendo a língua como produto midiático. A televisão passa a negociar a linguagem, fazendo-o com que o resultado seja mais que uma palavra. Objetiva mapear descritivamente como os novos bordões se inscrevem e influenciam a fala de adolescentes e jovens adultos. A investigação é ancorada na Teoria da Recepção de Stuart Hall e seu postulado sobre texto e significação, na interação verbal de Mikhail Bakhtin, em Michel Pêcheux e seus estudos do campo da língua e da sociedade apreendida pela história e ideologia, em William Labov e sua reflexão sobre os processos sociais nas estruturas linguísticas, em Melvin DeFleur e Sandra Ball-Rokeach e sua contribuição acerca da influência das comunicações sobre os indivíduos, a sociedade e a cultura, e na Teoria dos atos de fala de Austin e Searle. Pesquisa qualitativa não intervencionista baseada em dois eixos intitulados Seleção, escolha dos bordões, e Análise de Conteúdo, categorias simbólicas dos bordões e suas relações com a sociedade, cultura e a linguagem. Os signos culturais são dotados de sentidos, tornando-se parte da unidade da consciência verbal e coletivamente constituída, sendo a linguagem a representante dos aspectos transformacionais da sociedade. Propõe uma nova abordagem acerca do entendimento dos estudos da linguagem e suas metodologias de ensino em contextos pós-modernos. MOVIMENTAÇÕES URBANAS: LEITURAS E LEITORES DO JORNAL SUPER NOTÍCIA Renata Kelly de Arruda – Unicamp Lilian Lopes Martin da Silva – Unicamp Um cenário peculiar nos é apresentado junto a movimentação diária das ruas de Belo Horizonte/MG: a convivência entre pressa matutina, congestionamentos, buzinas e leitura, atividade essa comumente imaginada como ação que requer isolamento, silêncio e concentração, a leitura integra o cenário matutino e coletivo da cidade. Esse panorama nos instiga a questionar discursos já implícitos, como o de que “brasileiro lê pouco” ou a supervalorização de alguns determinados “tipos” de leitura em detrimento de outros. Quem seriam esses leitores? Onde eles estão? Quais são seus hábitos? Quais são os usos dados a essa leitura? Localizar esse leitor, identificar as formas de recepção e detectar as possíveis interações existentes a partir da leitura do jornal Super Notícia são os principais objetivos dessa pesquisa. Nos baseamos na crença de que os modos de existência atuais e suas práticas cotidianas também são geradoras de saberes uma vez que se relacionam com 658 659 vivências, interações sociais, escrita, fala, leitura e formas de se pensar o mundo. Nossa metodologia se embasará em observação não participante dos leitores do jornal pelas ruas da cidade, registro fotográfico e entrevista estruturada com uma amostra de sujeitos leitores a ser definida pós observação. Desejamos conhecer as formas de obtenção do impresso pelos sujeitos; suas maneiras de ler; motivações para leitura; as apropriações que fazem desse material; como o tornam parte integrante do seu dia a dia; as sociabilidades que vivenciam e que foram por ele produzidas; os percursos de leitura realizados e outros aspectos ligados ao pólo da recepção deste impresso. Uma exploração do jornal, em sua textualidade e materialidade, tendo em vista a identificação das estratégias dos produtores de notícias e reportagens, como aquelas dos editores, para através delas buscar responder a essas questões, nos coloca na direção de levantar representações do leitor pressuposto (inscrito nessas estratégias) que estão a guiar autores e editores. No caso dessa investigação, nossa opção por uma aproximação dos leitores de ‘carne e osso’, que, interagem com o Super Noticia e, de fato e concretamente o manipulam e significam, praticando a leitura. Não são sujeitos abstratos, mas situados, no espaço e tempo; na vida urbana; do ponto de vista econômico e social; mas sobretudo do ponto de vista cultural e pertencentes a uma dada comunidade de leitores, que partilha protocolos de leitura, que se explicam na comunidade a que pertencem. POSSIBILIDADES DE LEITURA DA VELHICE NO LONGA-METRAGEM “AS BICICLETAS DE BELLEVILLE” Flávia Motta de Paula Galvão – PPGEL/UFU/CAPES O presente trabalho faz parte de uma pesquisa que está sendo desenvolvida com o objetivo de problematizar e analisar a representação de idoso em dois longas-metragens, a saber: As Bicicletas de Belleville (2003) e Up Altas Aventuras (2009). Importante destacar que essa pesquisa está vinculada à participação no Grupo de Pesquisa e Estudos em Linguagem e Subjetividade (GELS), alocado no Instituto de Letras e Linguística, da Universidade Federal de Uberlândia (ILEEL/UFU). Nessa pesquisa, propomo-nos a realizar uma análise discursiva que permita compreender e explicitar as relações de sentidos predominantes na constituição das representações de idoso nos longas-metragens, o que configura, para nosso trabalho, a produção de uma análise sobre uma questão social específica calcada no estudo da linguagem. Para esta apresentação, centramo-nos na análise do filme As Bicicletas de Belleville, a partir de pressupostos teóricos da Análise de Discurso (AD) de linha francesa, mais especificamente, nos estudos de Michel Pêcheux (1969; 1975; 1983). A Análise de Discurso possibilita ao pesquisador, na condução da pesquisa nesse campo teórico e metodológico, construir uma visão articulada do objeto investigado e sua relação com os aspectos socioculturais, políticos e econômicos. Nesse sentido, buscamos analisar de que modo a velhice é significada no filme e os efeitos de sentido que dela podem circular socialmente, na produção de efeitos-leitores. Parece-nos que, no filme As bicicletas de Belleville, a velhice é significada de modo a produzir certo movimento na representação de idoso, alçando-a ao inusitado, ao cômico. Esse parece ser o aspecto que permite ao idoso ocupar o lugar de personagem protagonista e heroína no referido filme. O alçamento ao cômico funciona porque subjaz a ele um estereótipo de idoso cujo aspecto marcante é a fragilidade e a debilidade de sua potencialidade física, o que pode promover o riso. O idoso também é, em certo sentido, o índice de uma crítica direcionada ao valor que, aparentemente, os norte-americanos teriam da velhice. 659 660 CONCEITOS E PROPOSTAS DE IMANOL ARRIAGA EM UMA PRÁTICA DOCENTE E DISCENTE BRASILEIRA Sérgio Roberto Vaz Ferreira – FaE/UFMG Celia Abicalil Belmiro – FaE/UFMG Maria Lúcia Castanheira – FaE/UFMG O presente trabalho expõe a investigação em curso sobre o uso da linguagem verbal na leitura de imagens de obras de arte por alunos do ensino fundamental, seus referentes culturais e locais a partir das concepções do educador basco Imanol Aguirre Arriaga. Discute-se a leitura de imagens como uma forma de evidenciação e inserção da criança no mundo da cultura, de apoderamento da cultura e de desenvolvimento da linguagem. A prática proposta pelo autor tem o objetivo de proporcionar o reconhecimento pelo próprio aluno das referências do seu contexto em sua fala e no olhar que ele lança sobre a imagem. Com isto, pretende-se que as obras de arte sejam capazes de entranhar-se em cada biografia, integrando-se sua experiência vital, contribuindo para a criação de “si mesmo”. Para Arriaga a reciprocidade entre narrativa das experiências artísticas e formação do sujeito em Arte parte da alegação de que o ensino-aprendizagem como instrumento de análise da realidade constitui uma ferramenta muito útil em um primeiro momento da formação estética. No entanto, seu interesse e alcance resultam muito limitados se permanecem no âmbito formal, unicamente como objeto artístico, e não avançam da metáfora da linguagem artística à narrativa – entendida por Arriaga como interpretação oral da obra a partir das experiências pessoais com o que o próprio sujeito possa definir como arte. É prerrogativa o trabalho de leitura de obras artísticas através das narrativas da experiência estética com as obras, seu estudo e contextualização e a produção plástica (desenho) pelos alunos envolvidos. Nesse processo de estudo da imagem, segundo Arriaga, são prioritárias as dimensões representativa e comunicacional (linguística), às que podemos acrescentar outras, como a lúdica, a estética e a cognitiva. Como procedimento metodológico de pesquisa, são propostas oficinas de ensino-aprendizagem em Arte como um momento que integre questões referentes à criação ou à produção artística do educando, ao mesmo tempo em que são abordadas a interpretação da produção artística geral e a experiência estética, como define Arriaga. Essas oficinas se constituem de um grupo de quatorze alunos de turmas de 2º ciclo do Ensino Fundamental (entre 8 e 9 anos) e um aluno graduando e duração de 1 hora e 40 minutos, uma vez por semana e durante 8 semanas, no horário da aula de artes das crianças. É importante que esses alunos pertençam à comunidade que abriga a escola e que representem o contexto da comunidade, simulando, assim, um ambiente profícuo para a intervenção e análise dos materiais. As atividades têm seu planejamento baseado nas proposições de Arriaga, buscando traduzi-las em uma prática que envolva os elementos constitutivos de sua teoria. O material de apoio se constitui por um conjunto de obras de arte, seja através de slides, seja de peças originais. Os instrumentos utilizados para o registro constam da produção plástica das crianças e dos documentos audiovisuais das atividades. Finalmente, deve-se ressaltar que a presença do aluno graduando como condutor das oficinas sob acompanhamento e orientação do pesquisador. A opção por trabalhar com um graduando do 5º ou 6º período do curso de graduação em Educação Artística da Escola Guignard – UEMG - se justifica pelo fato de estar em estágio curricular, momento em que ele se confronta com seu campo de trabalho. Também se justifica pela familiaridade do pesquisador que propõe esta investigação com o currículo da graduação, como professor da Escola Guignard e formador de professores para o ensino de Arte. Esta apresentação propõe realizar um recorte dos eventos nas oficinas e analisar aspectos da interação entre os participantes de um grupo de alunos e o professor estagiário, considerando o discurso em uso, a produção narrativa e plástica dos alunos. 660 661 EFEITOS CAUSAIS DOS TEXTOS PUBLICITÁRIOS ECOLÓGICOS Neiva Maria Machado Soares – UnB/UEA Este estudo, amparado na teoria de Norman Fairclough (2003, 2006), via Análise do Discurso Crítica (ADC), sustenta que os textos, como elementos dos eventos sociais têm efeitos causais, isto é, produzem mudanças que podem ser no conhecimento, nas crenças, nas atitudes ou nos valores, resultando em efeitos em longo prazo. Para o autor, a exposição prolongada a propagandas pode moldar a identidade de pessoas como consumidoras. Os textos também podem iniciar guerras, contribuir com mudanças na educação, mudar relações industriais e muito mais. Seus efeitos incluem mudanças no mundo material, como nos modelos urbanos, ou na arquitetura e no design de tipos específicos de prédios. Em síntese, textos podem ter efeitos causais e mudar as pessoas (crenças, atitudes e etc), as ações, as relações sociais e o mundo material (FAIRCLOUGH, 2003, p.8). Quanto a esses efeitos causais, o linguista explica que não é uma simples causalidade mecânica, ou seja, não ocorrem mudanças automáticas no comportamento ou no conhecimento de uma pessoa pelo simples acesso à informação em um texto. Pensando sob esta ótica, tomando como objeto de análise propagandas de produtos considerados ecológicos, investigo como essa publicidade, por um lado, pode auxiliar em construir um novo tipo de consumidor que possua uma atitude mais sustentável; por outro, pode ser utilizada pelas empresas para criar uma imagem de que suas práticas são adequadas às questões sustentáveis. A análise tem revelado que as práticas empresariais de produção e de consumo adotam atitudes mais verdes, mas que o espírito do capitalismo suplanta o ecológico. Logo as corporações abraçam o discurso verde/ sustentável, inclusive nas formas multimodais que concretizam o evento discursivo, porém muito ainda necessita ser feito para que o discurso sustentável deixe de se constituir em apenas uma nova retórica. É comum percebermos hoje que a maioria das empresas afirma que é sustentável. Logo, isso está visível no seu discurso, mudando o estilo de como a informação é disponibilizada. Porém, também, pode ser perceptível quando “força” a inserção desse discurso, apenas para cumprir exigências, sem se preocupar com fatores sociais e ambientais que de fato congregam o todo do discurso realmente sustentável. UMA EXPERIÊNCIA DE LEITURA E ESCRITA SUBSIDIADA PELAS OFICINAS DA OLIMPÍADA DE LÍNGUA PORTUGUESA EDIÇÃO 2012 Núbia Régia de Almeida – UFT/PG/SEDUCTO Tânia Maria de Oliveira Rosa – UFT/PG/SEDUCTO Com a primeira edição realizada em 2008 e 2009 a Olímpiada de Língua Portuguesa “Escrevendo o Futuro” é fruto de uma parceria entre o Ministério da Educação, a Fundação Itaú Social e o Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec). A Olimpíada objetiva buscar a melhoria da qualidade do ensino e da aprendizagem de leitura e escrita dos alunos da rede pública brasileira. Para isso, desenvolve ações de formação de professores no intuito de ampliar o conhecimento teórico do docente em relação aos gêneros textuais contemplados no projeto e fornecer subsidio e apoio à comissão julgadora quanto aos critérios de avaliação de textos. A olimpíada ocorre em duas etapas. Nos anos pares são realizadas as ações de formação de professores e alunos; o concurso e a premiação. Nos anos ímpares os parceiros oportunizam aos docentes participarem de atividades complementares presencial e a distância visando aprimorar sua formação, fazem análise e publicação dos textos semifinalistas e das boas práticas dos professores. O presente artigo tem como objetivo mostrar o resultado de uma pesquisa sobre a contribuição da Olimpíada de Língua Portuguesa, edição 2012, na prática de leitura e produção escrita desenvolvida com os alunos do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental na Escola Estadual José Alves de Assis em Araguaína, Tocantins. Estudos mostram que o trabalho de leitura e produção escrita na escola é um 661 662 tema que vem sendo discutido pelos professores com embasamento em teóricos a fim de compreender quais as dificuldades que limitam o desenvolvimento das habilidades de leitura e escrita escolar. Haja vista que compreender um texto é, em certa medida, produzir um outro texto em resposta ao texto lido (ROJO e JURADO). A pesquisa tratase de um estudo de caso documental com base em análise comparativa das práticas pedagógicas de leitura e escrita de uma professora de Língua Portuguesa participante da edição 2012. Para obtenção dos resultados foram analisados os registros das etapas da Olimpíada: sequências didáticas (planos de aula), depoimentos da docente, memorial das oficinas realizadas; produção preliminar dos textos dos alunos conforme proposta do programa em comparação a produção final das redações. Verificou-se por meio da pesquisa que a participação da professora na formação continuada disponibilizada no portal escrevendo.cenpec.org.br contribuiu no aprimoramento das metodologias e práticas pedagógicas para desenvolver a leitura e o processo de escrita dos estudantes; maior qualidade dos textos produzidos pelos educandos. Possibilitou também fazer um diagnóstico das condições de leitura e escrita desenvolvidas na escola antes da participação dos docentes e discentes na Olimpíada de Língua Portuguesa assim como das metodologias diversificadas utilizadas no processo para motivar os alunos à desenvolver as habil dades de leitura e escrita. 662 663 SIMPÓSIO 65 INVESTIGAÇÕES SOBRE LEITURA: DIÁLOGOS EM CIRCULAÇÃO NA RODA DOS PESQUISADORES DA ALB O debate sobre o ato de ler e sobre práticas de leitura tem atravessado pesquisas e intervenções de diversos atores sociais em vários âmbitos no Brasil, entre eles: professores pesquisadores da Educação Básica, professores universitários, pesquisadores, bibliotecários, pessoas atuando em ONGs e diferentes instituições em vários estados do país. A Roda dos Pesquisadores da Associação de Leitura do Brasil é um espaço virtual que agrega esses grupos, oportunizando a interação à distância entre essas investigações e ações sobre leitura espalhadas por todo o país, de modo que as especificidades de cada atuação ou estudo possam ser postas em diálogo entre si. Este simpósio tem o intuito de problematizar e de aproximar reflexões em torno da leitura que têm sido foco de debates entre os pesquisadores participantes da Roda de Pesquisadores da ALB. São vários os enfoques e as discussões sobre o ato de ler que têm permeado esse espaço virtual, entre eles: levantamentos sobre os rumos das pesquisas em leitura no Brasil; investigações sobre memórias e histórias de leituras; reflexões a partir de experiências de práticas de ensino da leitura presentes nas pesquisas acadêmicas e nas ações escolares e não-escolares; relações entre a leitura e a biblioteca; contrastes e confluências entre a leitura em voz alta e a leitura silenciosa; relações entre o ato da leitura e diversas manifestações artísticas. No simpósio “Investigações sobre Leitura: diálogos em circulação na Roda dos Pesquisadores da ALB”,pretende-se reforçar esse espaço coletivo de interlocução de forma a fazer girar os saberes na produção de sentidos sobre o ato de ler. COORDENAÇÃO Eliana Kefalás Oliveira Universidade Federal de Alagoas/ALB [email protected] Norma Sandra de A. Ferreira Universidade Estadual de Campinas/ALB [email protected] 663 664 UMA PASTA COM MANUSCRITOS DE JOÃO KOPKE Norma Sandra de Almeida Ferreira – UNICAMP João Köpke (1852-1926), bacharel em Direito, dedicou grande parte de sua vida ao magistério, quer como professor, diretor de institutos educacionais criados por ele, conferencista, ou como autor de cartilhas e livros de leitura para as escolas. Sua participação intelectual no campo da educação, no final do século XIX e início do XX, tem merecido um conjunto de estudos (Carvalho, 1998; Mortatti, 2000; Panizzolo, 2006; Santos, 2013, entre outros). A maioria das pesquisas sobre João Köpke tem se voltado para sua produção impressa, publicada, em grande parte, pela livraria e editora Francisco Alves (Série Rangel Pestana). Os trabalhos sobre esses livros pouco se interessaram para tomá-la pelo uso estético-literário da linguagem em que ela foi produzida, pouco se interessaram em compreender esse gênero literatura didática não pelo que diz (conteúdo moralista, patriótico, religioso etc.), mas também pelo modo como ele se configura do ponto de vista estilístico, composicional, e, em sua materialidade. Priorizam uma análise dos conteúdos formativos ligados ao contexto da Nova República, dos métodos de alfabetização, do processo analítico na aquisição da leitura. Neste artigo, apresentamos um material, provavelmente não publicado, que faz parte do acervo pessoal da família Köpke e cedido ao grupo de pesquisa ALLE/FE/Unicamp, do qual faço parte. Trata-se de uma Pasta, cujo interior traz quatro documentos manuscritos, em letra cursiva ou datilografados: Versos para pequeninos; O pássaro dourado; O casamento de Panurgo; Evangelina. O material é composto de poemas, narrativas, uma peça de teatro, acompanhadas de ilustrações e imagens recortadas e coladas, além de várias anotações e revisões a lápis nas laterais dos textos. É objetivo deste texto, descrever esse material, focando principalmente, no poema Evangelina, tradução de João Köpke e inspirado no épico de Henry Longfellow. Também indagar sobre suas condições de produção através das pistas deixadas sobre a representação que a obra possa ter no cenário entre séculos, sobre leitores previstos para esse material e ainda sobre estratégias de escrita de seu autor. Com este trabalho pretendemos apresentar uma imagem de Köpke como um escritor que modula a linguagem buscando procedimentos para uma melhor compreensão do texto pelo seu leitor e para aquilo que pretende dizer. A PRESENÇA DO CORPO EM EXPERIÊNCIAS DE LEITURA LITERÁRIA Eliana Kefalás Oliveira – UFAL/ALB O presente trabalho tem o propósito de refletir sobre a formação do leitor literário a partir de experiências de leitura em movimento e em voz alta desenvolvidas juntamente com um grupo de professores de escolas públicas e privadas do estado de Alagoas. Procura-se pensar de que forma a leitura pode ser experienciada sensorialmente, levando-se em conta a escuta do corpo no ato da leitura, priorizando o contato com o texto literário (FREDERICO, OSAKABE, 2004; BRASIL, 2006), em contraste com uma concepção informativa do ensino de literatura (RANGEL, 2005; PINHEIRO, 2006). Compreende-se, nessa perspectiva, o ato de ler como um ato performático (ZUMTHOR, 2000), no qual o leitor, quando atravessado pelo texto literário, abre-se para o que esse texto pode provocar e reverberar nele, de forma que a materialidade das palavras e seus jogos de sentido possam ser percebidos não somente analiticamente, mas também sensorialmente pelo leitor. A escuta do corpo, a percepção da presença corporal (VIANNA, 2005; MILLER, 2007) no momento da leitura podem, de certa forma, abrir a experiência da leitura para uma dimensão performática, o que permite que o texto, ao ser lido, possa ser também dançado, seja em movimentos e mobilizações internas ao leitor, seja em vocalizações poéticas (ZUMTHOR, 2005), ou ainda em movimentos do corpo que se deixam levar pelo que o texto suscita naquele que lê. Esse desafio de experienciar a leitura levando em conta a escuta do corpo tem sido enfrentado por professoras e professores da rede pública de ensino em Alagoas através do curso de extensão 664 665 "Leitura e expressão corporal", no qual se tem refletido coletivamente sobre possibilidades e entraves no trabalho com o texto literário na formação do leitor. Diante da experimentação da leitura em voz alta e em performance, algumas questões se tornam presentes: o que se passa quando se escuta o corpo na leitura literária? O que faz com que um mesmo texto seja recebido e performatizado de formas distintas por diferentes leitores ou por um mesmo leitor em diferentes momentos de experimentação do texto? A leitura em voz alta e em movimento pode ser uma via para a compreensão analítica do texto? Que possíveis relações se estabelecem entre literatura e artes corporais no ato da leitura performática? ASSOCIAÇÃO DE LEITURA DO BRASIL (ALB): MEMÓRIAS Lilian Lopes Martin da Silva – UNICAMP Luciane Moreira de Oliveira – PUCCAMP A ALB (Associação de Leitura do Brasil) nasceu no início dos anos 80, no interior da luta pela redemocratização do país. Desde então vem significando no cenário nacional um importante instrumento de garantia do direito à palavra de segmentos sociais e civis, especialmente no que diz respeito aos esforços do país na conquista da escrita para toda a população. Além disso, movimenta, desde sua fundação, a reflexão sobre a leitura, em vários de seus aspectos. Ao longo de seus 30 anos (completados nesse ano de 2012 cujo início de celebração ocorreu durante o 18.º COLE, em julho) acumulou um considerável conjunto de documentos escritos, iconográficos, fílmicos que registram seu cotidiano administrativo, de pesquisa, realização de eventos, publicações, relações com instituições e outras entidades, etc. Esse acúmulo pode ser dividido em grupos ou fundos vários, que venham a ter suas fontes reunidas, organizadas e disponibilizadas para pesquisa, vez que em sua materialidade e discurso, esses materiais expressam visões, relevâncias, pontos de vista, olhares, possibilidades, etc. e podem ser tomados como 'fontes primárias' para a construção de uma memória da leitura no país. Desse universo fazem parte os materiais referentes aos Congressos de Leitura do Brasil, surgidos ainda em 1978 (4 anos antes da fundação da entidade) e atualmente em sua 18ª edição. Esta pesquisa volta-se à construção de um arquivo (físico e digital) relativo aos materiais produzidos no âmbito dos Congressos de Leitura do Brasil desde a sua origem em 1978. Oferece-se como campo de uma experiência prática, em que se articulam ações concretas de construção de acervo documental da entidade e reflexão sobre a importância, significado e alcance dessa ação na contemporaneidade. Inserese no contexto das iniciativas que buscam afirmar a importância da constituição de arquivos para a construção de memórias; apóiam-se na necessidade de afirmação do caráter público e não elitizado que viabiliza o acesso às fontes; se pauta na atual revitalização dos estudos de memória. Ao longo de sua existência, os congressos geraram uma miríade de materiais que foram se acumulando de forma dispersa na sede da ALB e, muitas vezes, se misturando aos materiais gerados pela entidade como um todo. Esse conjunto contém: projetos de evento; solicitações para financiamento; orçamentos; correspondências; relatórios técnicos; fotos, fitas em áudio, fitas em VHS, DVDs folhetos de divulgação, programas acadêmicos, culturais, cartazes, materiais de identificação dos congressistas e dos organizadores, camisetas, etc. Este material se encontra guardado, acumulado. Nossa tentativa nesse momento não é descrever tais documentos, nem proceder a um meticuloso inventário histórico, conforme orientações técnicas e rigorosas da pesquisa arquivística ou histórica. Pensamos que, uma vez localizados, reunidos, separados do restante do material da entidade, relacionados e catalogados, eles poderão ser utilizados para outras investigações, sendo trabalhados na direção de sua descrição para composição de um arquivo, como também em sua leitura, interpretação e organização de novas publicações da própria entidade. Essa apresentação narra em maiores detalhes esse conjunto de ações, bem como apresenta o pensamento que as sustenta e como um primeiro resultado, a descrição dos conteúdos existentes nos registros sonoros referentes aos três primeiros Congressos de Leitura do Brasil (1978, 1979 e 1981). 665 666 A LEITURA NA ESCOLA PÚBLICA: PERCEPÇÕES DISCENTES Maria Helena da Rocha Besnosik – UEFS Rita de Cássia Brêda Mascarenhas Lima – UEFS Heloisa Barretto Borges – UEFS Este trabalho é parte da pesquisa “Leitores da escola pública: um estudo de caso no Colégio Estadual de Feira de Santana”, iniciada em 2008, com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB) e foi concluída em junho de 2012. Esta pesquisa está vinculada ao Núcleo de Leitura Multimeios da Universidade Estadual de Feira de Santana que desde 1992, vem realizando trabalhos de pesquisa e extensão, tendo os Círculos de Leitura como sua metodologia basilar. A investigação surgiu da necessidade de fortalecimento e sistematização das histórias de leitura dos leitores considerados comuns e, consequentemente, com pouca visibilidade nas pesquisas oficiais. O objetivo principal foi traçar o perfil do leitor da escola pública envolvendo professores e estudantes. A escolha do campo da pesquisa deu-se pelo envolvimento dos pesquisadores do Núcleo com a referida escola a partir de outro projeto de intervenção, intitulado “Tecendo Leituras (2006) com foco na formação do leitor em parceria com a Secretaria de Educação do Estado da Bahia. No processo de coleta de dados, foram realizados Círculos de Leitura, entrevistas com professoras e estudantes, questionários e grupo focal. Apresentamos neste texto resultados dessa pesquisa focalizando os grupos focais realizados com os estudantes. A utilização desse instrumento de coleta possibilitou a construção de uma riqueza de material, pois os estudantes falaram de forma muito espontânea do lugar da leitura nas suas vidas, das suas preferências, dos modos de ler e da diversidade de leituras. A análise dos dados coletados nos grupos aponta uma relação dos jovens com a leitura marcadamente influenciada pela família ou pela escola, demonstrando que cada leitor constrói a sua história como sujeito historicamente situado. A leitura neste estudo é concebida como prática sociocultural que acontece dentro e fora da escola, conforme postula Chartier (1999, 2001, 2004). À medida que aprofundávamos a análise, observávamos que vários perfis de leitores se delineavam tomando como referência as necessidades e escolhas profissionais e/ou pessoais. CÍRCULOS DE LEITURA EM ESPAÇOS NÃO-FORMAIS: TECENDO CIDADANIA NOS ENCONTROS COM AS LEITURAS LITERÁRIAS Rita de Cassia Brêda Mascarenhas Lima – UEFS Carla Luzia Carneiro Borges – UEFS Sonia Moreira Coutinho – UEFS O projeto de pesquisa e extensão “Círculos de Leitura: uma tecnologia para além do espaço escolar”, é um projeto apoiado pela FAPESB, fruto de uma ação pioneira de fomento à articulação pesquisa e extensão. O Núcleo de Leitura Multimeios da Universidade Estadual de Feira de Santana, ao qual este projeto está vinculado, vem desenvolvendo desde a sua fundação, que data de 1992, a metodologia dos Círculos de Leitura como uma tecnologia que pode contribuir para a formação de leitores e para o exercício crítico dos sujeitos envolvidos. Os Círculos de Leitura enquadram-se na modalidade de um procedimento simples, de baixo custo, que pode ser reaplicado em diversos grupos e que causam um impacto pessoal e social, à medida que amplia o acesso à leitura, seja do sujeito alfabetizado ou não, nos diversos espaços e eventos de letramento. O objetivo geral deste projeto é implantar, como tecnologia social, os círculos de leitura em quatro comunidades rurais e na sede do município de Antônio Cardoso-BA, com mulheres beneficiárias do leite do Programa Bolsa Família do Governo Federal. Além disso, visa-se conhecer suas histórias e práticas cotidianas de leitura e compreender seus modos de vida na perspectiva do efetivo exercício da cidadania, por meio da construção coletiva de estratégias de enfrentamento das demandas 666 667 educacionais e sociais. O projeto originou-se do desejo de conhecer e ressignificar as práticas de leitura vinculadas às tradições orais, antes tão utilizadas nas comunidades rurais e, atualmente, em declínio. A vivência das práticas de leitura com textos literários em espaços não-formais, mais especificamente, com mulheres da zona rural, advém da compreensão que “todos lemos a nós e ao mundo à nossa volta para vislumbrar o que somos e onde estamos” como afirma Manguel (1997, p.20). Desse modo, partilhar leituras e formar leitores no sentido pleno do termo, ou seja, alguém que faz da leitura uma possibilidade de desvelamento da realidade e de si mesmo, é um desejo e uma meta do projeto. Portanto, pretendemos como impacto acadêmico a implantação dos Círculos de Leitura como Tecnologias sociais, bem como consolidar a articulação pesquisa/extensão e como impacto social, pretende-se a reinserção dessas mulheres nas práticas socioculturais de leitura e o reconhecimento da sua autonomia na perspectiva da emancipação do sujeito. Por meio das leituras literárias muitas histórias de vida, práticas cotidianas e vivências socioculturais são compartilhadas e refletidas, assim, novos horizontes e possíveis intervenções começam a ser vislumbradas a partir do reconhecimento do seu lugar social. O processo de rememoração das suas práticas de leitura cotidianas e a ampliação do acervo literário por meio dos círculos de leitura objetivam o empoderamento e a análise crítica das mulheres sobre suas condições de vida e de cidadania. Considerando que o presente projeto encontra-se em andamento, é possível afirmar o quanto tem sido significativa a prática da leitura compartilhada e o envolvimento das mulheres na análise e reflexão do texto lido pelo leitor guia, assim como do clima de confiança que já conseguimos estabelecer entre as mulheres e as pesquisadoras. ENCONTROS E DESENCONTROS ENTRE PAIS E SEUS FILHOS EM DOIS LIVROS FRANCESES DE LITERATURA INFANTIL Adriana Pastorello Buim Arena – UFU Dagoberto Buim Arena – UNESP O trabalho analisa dois livros franceses destinados, aparentemente por seu formato físico, a crianças, mas, pelo tema é destinado a pais. As obras efendem o ponto de vista de que, nos anos correntes, os gestos culturais criados para ler literatura infantil devem fazer parte da cultura de relações entre adultos e crianças. Ensinar a ler literatura infantil e ler com e para as crianças pelos livros a elas destinados é um ato que as insere em um mundo humano estendido ao mundo da cultura e da palavra do Outro. Antes de analisar os livros, o trabalho refaz um breve percurso sobre o conceito de infância com Ariès e Leontiev, destaca o papel do outro bakhtiniano na constituição do sujeito e aponta a relevância dos apontamentos vigostkianos sobre o envolvimento da criança por um universo cultural expandido. Como ensinar seus pais a gostar de livros para crianças, de Alain Serres e Bruno Heitz e O que é um bom livro? de Emmanuel Parmentier, são duas obras provocativas. O primeiro traz o pressuposto de que os pais devem aprender a ler os livros que compram para os filhos, ou que os filhos tomam por empréstimo das bibliotecas escolares, das públicas ou da biblioteca do melhor amigo. No segundo, o personagem principal, com uma pergunta – o que seria um bom livro para presentear o pai - percorre o caminho entre sua casa e a livraria, lançando a pergunta em direção a adultos, de seu pequeno mundo, ou de fora dele, na mais direta exposição do dialogismo bakhtiniano em que o Outro, adulto, se sente acuado dentro de seu limitado universo cultural com a questão perturbadora: “o que é um bom livro?” Os dois livros, ao mesmo tempo em que cumprem sua função literária, também apresentam a discussão que os estudiosos da infância e da literatura infantil a si mesmo se põem: qual seria a melhor maneira de proporcionar o encontro da criança com a leitura? Que escolhas fazer no grande mercado de literatura em crescimento? Em vez de artigos acadêmicos, os dois livros parecem indicar as respostas possíveis, mas inconclusas, em cuja origem está a própria natureza inacabada da formação e da cultura humanas. 667 668 FEIRA DO LIVRO: UMA AÇÃO INTERINSTITUCIONAL A FAVOR DA FORMAÇÃO DA COMUNIDADE LEITORA Eliana Carlota Mota Marques Lima – SEDUC Geisa Silva de Oliveira Nobre – DIREC Rosana Fernandes Falcão – SEDUC Para atender às atuais demandas sociais, a sociedade contemporânea, traz consigo o desafio de promover transformações nos seus diversos setores. No setor educacional, ao repensar a função social e política da escola, torna-se imprescindível inserir o aluno nas diversas linguagens. A leitura permite acesso aos conhecimentos acumulados pela comunidade, uma herança cultural que, por razões econômicas e sociais, é negada a uma expressiva maioria de brasileiros. Ultrapassando os muros da escola foi criado o Projeto Feira do Livro – Festival Literário e Cultural de Feira de Santana, uma ação de incentivo a formação da comunidade leitora, fruto de esforços conjuntos empreendidos por vários órgãos e instituições desse município (Universidade Estadual de Feira de Santana – UEFS; Arquidiocese de Feira de Santana; Secretaria Municipal da Educação de Feira de Santana; Secretaria Estadual de Educação através da DIREC 02 e Serviço Social do Comércio SESC). Transcendendo o universo escolar a Feira do Livro de Feira de Santana vem se constituindo em uma ação sociocultural participativa, que visa potencializar a formação do leitor de todas as idades, alargando fronteiras, fertilizando o encontro para além das palavras e mobilizando a comunidade feirense para a importância da leitura como elemento facilitador da compreensão do mundo e da participação de cada ser na construção coletiva da cidadania. Este evento se ancora na compreensão de que o conhecimento construído pelo povo em seu universo cultural se traduz em diferentes leituras de mundo, logo, o aprendizado da leitura se dá via processo ininterrupto de interação, no qual o individual e o coletivo se complementam no cenário social, marcado por diversidades econômicas, sociais e culturais, ultrapassando o tempo e o espaço e abrangendo as diferentes linguagens. Linguagens que se expressam através da exposição, venda e distribuição de livros e periódicos, cordel, poesia, contação de histórias, teatro, filmes, dentre outras. O presente trabalho pretende socializar as ações de fomento à formação de leitores de todas as idades, bem como publicizar o seu processo de criação e execução coletiva nas cinco edições da Feira de Livros, bem como os resultados alcançados, visto que percebe-se mudanças significativas da 1ª para a 5ª quanto ao número de títulos comercializados e ao fluxo de pessoas, o que demonstra a ampliação do evento e a grande contribuição deste para a instauração de práticas de leitura na comunidade, na busca constante por uma sociedade comprometida com a inclusão social. FLEURY E O DISCURSO SOBRE O ENSINO DE LEITURA NAS ESCOLAS PÚBLICAS, ENTRE 1922 A 1936 Ilsa do Carmo Vieira Goulart – UNICAMP Este trabalho tem por objetivo apresentar alguns dos resultados obtidos na pesquisa de doutorado, ainda em andamento, a partir dos estudos desenvolvidos sobre uma série graduada de livros de leitura, Meninice, de autoria do Professor sorocabano Luiz Gonzaga de Camargo Fleury (18911969). Neste texto pretende-se compreender qual concepção a respeito do ensino da leitura estaria abalizada nos discursos de Fleury, publicados em diferentes periódicos, entre o período de 1922 a 1936. Para tanto, os estudos apoiam-se na perspectiva da História Cultural, que proporciona à pesquisa um direcionamento do olhar investigativo para representações de leitura presente nos objetos selecionados para a análise: os artigos publicados pelo autor na Revista Nacional (1922), Revista Educação (1928, 1930, 1936) e no Jornal O Estado de São Paulo (1929). O conceito de representação, que se torna uma ideia determinante da nova história cultural, permite vincular as posições e as relações sociais com a maneira como os indivíduos ou grupos se percebem, 668 669 mutuamente, e percebem aquilo que os envolvem. Chartier (2009) mostra que as representações não ocupam um status entre ser, ou não, imagens verdadeiras ou falsas de uma realidade externa, mas possuem uma força própria que conduz à crença de uma realidade externa a partir daquilo que acredita que é. A representação pode ser vista como uma produção que rompe com a sociedade e se incorpora no indivíduo. Neste sentido, esta pesquisa parte da premissa de que os textos podem trazer marcas na estruturação da linguagem de um discurso escrito, de representações de leitura, que aparecem voltados para a formação dos professores em relação ao ensino da leitura e da escrita. A preocupação do Prof. Fleury com educação manifesta-se em vários de seus escritos, a partir de uma inquietação com as questões metodológicas que envolviam o ensino, direcionadas para a utilização de um método que auxiliasse de modo mais eficaz o desenvolvimento da leitura nas escolas públicas paulistas. Em 1922, ao escrever o artigo O ensino da leitura (methodo analytico), publicado na Revista Nacional, na secção “Educação e Instrucção”, Fleury além de esclarecer o que significava o méthodo analytico, ele também apresentou modos de aplicação do método analítico no ensino da leitura, denominada leitura analytica, a partir de uso de textos e seus respectivos procedimentos. A questão metodológica é retomado por Fleury, no artigo publicado em 1928, intitulado As denominações “methodo analytico” e “methodo synthetico” em Pedagogia, na Revista Educação, em que o autor procura esclarecer as constantes dúvidas e confusões de nomenclaturas dos posicionamentos metodológicos utilizados pelos professores. Ao escrever Sobre o ensino da leitura, publicado em 1930, pela Revista Educação, Fleury comentou que sua experiência de dezenove anos atuando como professor, diretor de grupo escolar e como inspetor de ensino, proporcionou-lhe algumas aprendizagens e observações, uma delas consistia na ideia de que uso do método analítico pelo professor, proporcionava uma alfabetização mais rápida e segura. Anos mais tarde, no artigo Suggestões para aulas de leitura, publicado em 1936, pela Revista Educação, Fleury traria para seu discurso o problema que muitos professores enfrentavam em relação à linguagem escrita presente nos livros de leitura. Com isso o discurso de Fleury, a respeito do ensino da leitura, parecia refletir sobre as influências da nova proposta teórica metodológica do movimento da Escola Ativa, que foi ganhando um espaço de discussão entre os educadores da época. O movimento de aulas mais participativas defendia que a atividade pedagógica deveria ser motivada por uma finalidade e por um desejo de sentido, ou seja, todo o conteúdo a ser ensinado precisaria partir de um interesse, ou responder a uma necessidade da criança. A partir de uso de textos e seus respectivos procedimentos. A questão metodológica é retomado por Fleury, no artigo publicado em 1928, intitulado As denominações “methodo analytico” e “methodo synthetico” em Pedagogia, na Revista Educação, em que o autor procura esclarecer as constantes dúvidas e confusões de nomenclaturas dos posicionamentos metodológicos utilizados pelos professores. Ao escrever Sobre o ensino da leitura, publicado em 1930, pela Revista Educação, Fleury comentou que sua experiência de dezenove anos atuando como professor, diretor de grupo escolar e como inspetor de ensino, proporcionou-lhe algumas aprendizagens e observações, uma delas consistia na ideia de que uso do método analítico pelo professor, proporcionava uma alfabetização mais rápida e segura. Anos mais tarde, no artigo Suggestões para aulas de leitura, publicado em 1936, pela Revista Educação, Fleury traria para seu discurso o problema que muitos professores enfrentavam em relação à linguagem escrita presente nos livros de leitura. Com isso o discurso de Fleury, a respeito do ensino da leitura, parecia refletir sobre as influências da nova proposta teórica metodológica do movimento da Escola Ativa, que foi ganhando um espaço de discussão entre os educadores da época. O movimento de aulas mais participativas defendia que a atividade pedagógica deveria ser motivada por uma finalidade e por um desejo de sentido, ou seja, todo o conteúdo a ser ensinado precisaria partir de um interesse, ou responder a uma necessidade da criança. 669 670 O ENSINO DA LEITURA EM UMA PERSPECTIVA BAKHTINIANA: ELABORAÇÕES ACERCA DO PAPEL DO PROFESSOR NA FORMAÇÃO DO LEITOR AUTÔNOMO Cláudia Beatriz de Castro Nascimento Ometto – UNIMEP Rita de Cássia Cristofoleti – UNICAMP Este artigo tematiza as mediações de uma professora formadora no processo de formação do leitor na disciplina Fundamentos Teórico-metodológicos de Língua Portuguesa de um curso de Pedagogia noturno, em uma instituição privada, localizada no interior do estado de São Paulo. O curso atendia, predominantemente, estudantes locais, mulheres em sua maioria absoluta, que trabalhavam o dia todo em atividades ligadas ao setor de prestação de serviços e eram estimuladas a prosseguir os estudos por razões diversas, entre as quais, a possibilidade de mudança de profissão. Em contatos iniciais constatou-se que essas estudantes chegaram ao ensino superior arcando com os custos de sua formação, dividindo-se entre a jornada diária de oito horas de trabalho e o curso noturno. Dotadas de recursos materiais e culturais variáveis, sendo algumas oriundas de famílias pouco letradas, encontravam-se algumas (poucas) que já atuavam como professoras. Nas relações de ensino vividas com elas, encontramo-nos em situações nas quais as alunas pareciam compreender de modo limitado aquilo que liam, visto que ao fazer referências a livros, a notícias e comentários lidos em jornal, indiciavam-nos que liam pouco, o que era confirmado em suas réplicas aos nossos comentários. Muitas delas reconheciam a televisão como sua principal fonte de informações, contavam que não estavam habituadas a ler livros e que se desencorajavam diante de textos longos e difíceis que compunham o material do curso, penalizando sua participação nas aulas e a compreensão que elaboravam daquilo que lhes estava sendo proposto. Tendo em vista que grande parte das alunas pretendia assumir a docência no Ensino Fundamental a preocupação recaiu sobre o fato de que quando se tornassem professoras, essas alunas, pouco afeitas à leitura, futuramente seriam as mediadoras na formação dos jovens leitores das séries iniciais. Essas preocupações levaram-nos a indagar acerca de como aproximá-las da leitura, uma vez que as relações que os sujeitos estabelecem com o ato de ler, em diferentes situações, porque são constitutivas, repercutem nas práticas que poderão assumir. Posto isto, dentre diversas atividades desenvolvidas durante um semestre letivo, tais como 1. atividades orais de interlocução acerca da elaboração do conceito de letramento a partir da leitura de um texto literário; 2. uma atividade em grupo sobre a qual foi discutido, ainda oralmente – tendo em vista um trabalho escrito –, o conceito de letramento a partir de um texto teórico-didático; 3. a produção de um texto individual focalizando o conceito de letramento a partir do cotejamento entre os textos teórico-didáticos e os textos literários lidos e 4. a realização da leitura por lexias, mediada pelo professor, escolhemos, como recorte para este artigo, tecer uma reflexão acerca do papel da leitura por lexias no desenvolvimento da autonomia leitora pelos alunos. Assumimos como referencial teórico a perspectiva enunciativo-discursiva de Bakhtin, por compreender que essa abordagem possibilita a compreensão da interação verbal instaurada pela leitura, em suas condições concretas de produção. Para tal, as aulas foram audiogravadas e transcritas bem como foram realizadas anotações em diário de campo. A aproximação do universo dos estudos da linguagem para a compreensão da singularidade das experiências nas condições históricas comuns da existência definiu o modo de olhar para as relações dos sujeitos com a leitura, neste sentido, metodologicamente, trabalhamos com a análise das interlocuções produzidas na sala de aula a partir da leitura e nas situações de leitura buscando indicadores dos sentidos em circulação durante o processo. Os dados evidenciam a dimensão intersubjetiva do processo de leitura vivido pelas alunas. Destacamos a tese de que aprender a cotejar textos possibilita a formação do leitor autônomo, que vai se constituindo pela mediação, transformando-o ao longo de experiências compartilhadas nas práticas culturais em que se inserem. 670 671 CRIAÇÃO E FABRICAÇÃO DE LIVROS DE LITERATURA INFANTIL: UM OLHAR PARA O LIVRO ILUSTRADO Andréa Rodrigues Dalcin – UNICAMP Este trabalho tem como propósito conhecer o processo de criação e produção de livros de literatura infantil, pela visão do autor e ilustrador Odilon Moraes. O corpus é constituído por três obras publicadas pela Editora Cosac Naify, escritas e ilustradas pelo referido autor: “A Princesinha Medrosa” (2ª edição, 2008), “Pedro e Lua” (2004) e “O Presente” (2010). A pesquisa se volta para as singularidades dos modos de criação e produção, a partir da análise das representações e concepções de criança, leitor, literatura e arte que concebem um determinado jogo circunscrito no polo da produção, por este autor e esta editora. Para tanto, levantamos as seguintes interrogações: no caso da literatura infantil, como as representações do leitor infantil são sugeridas no momento da criação das obras pelos autores? Como é o jogo, no polo da produção, quando pensamos neste autor e nesta editora? Quais relações podem ser estabelecidas entre o leitor e o livro ilustrado? Essas relações são pensadas no processo de criação e produção do livro? Para buscarmos respostas, tomamos como fontes documentais entrevistas com o autor, com Isabel Lopes Coelho, editora do catálogo de literatura infantojuvenil da Cosac Naify, e com Maria Carolina Sampaio de Araújo, designer. Nessa direção, o trabalho tem seu procedimento metodológico ancorado nas entrevistas realizadas, nas análises dos livros selecionados e em buscas realizadas em bancos de pesquisa sobre teses e dissertações a respeito do tema “literatura infantil”. Contribuições teóricas advindas da História Cultural (Chartier, 1990 e 2001) nos mostram que ao tomarmos os sujeitos envolvidos nesses processos como fontes e objetos de nossa investigação adentramos no campo das representações próprias de um tempo ou de um espaço. Ao pensarmos com a liberdade (sempre condicionada) de cada sujeito, Certeau (2007) nos oferece contribuições sobre os modos de pesquisar, bem como um aprofundamento nas discussões acerca das estratégias de quem detém o poder (a editora). Em Ginzburg (1989, 2006), teremos contribuições para o estudo de um caso particular (um autor, uma editora), que pode ser representativo de um determinado tempo histórico. Com Norbert Elias (2001), teremos contribuições trazidas pela Sociologia ao estudarmos não um autor e uma editora em particular, mas a função deste autor e desta editora não na ação de fabricar um livro, mas na constituição de uma rede ou um jogo no qual eles estão inscritos. Já Scott e Nikolajeva (2011), Hunt (2010) e Linden (2011) trazem contribuições ao panorama atual da literatura infantil. Arroyo (1988), Coelho (2010), Lajolo e Zilberman (2007) situam esta pesquisa no tempo e espaço, a partir de um panorama histórico. PARA LER COM PRAZER? A RECEPÇÃO DO PROJETO “CONTRIBUIÇÕES PARA A LEITURA LITERÁRIA DE EDUCADORES DOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL” Carlanne Santos Carneiro – FAE/ UFMG Esta proposta de trabalho objetiva avaliar a recepção do Projeto “Contribuições para a leitura literária de educadores dos anos iniciais do ensino fundamental”, por parte dos professores da rede municipal de Belo Horizonte e região metropolitana, com o intuito de verificar a contribuição do Projeto na sua formação como sujeitos-leitores literários. Este Projeto vem sendo desenvolvido desde 2007 por uma equipe de professores e alunos de Pós- Graduação que atuam no campo da formação de leitores, sob Coordenação da Profa. Graça Paulino, na FAE-UFMG, e destaca-se por buscar promover uma leitura para esses educadores desvinculada de seus afazeres profissionais, mesmo reconhecendo o quanto eles podem ser importantes como mediadores de leitura para seus alunos. O grupo que desenvolve o Projeto parte da concepção de que, no Brasil, apesar de existirem muitas políticas públicas de distribuição de livros (como o PNLD e o PNBE), não se verifica uma 671 672 política de fomento da formação de professores leitores de literatura. Somado a isso, de acordo com BATISTA (1998), PAULINO (2010) e SILVA (2009), tem-se, de forma geral, um baixo índice de leitura literária quando se trata de professores, os quais realizam leituras na maioria das vezes relacionadas ao âmbito escolar, ou seja, não possuem o hábito de ler por prazer ou por crescimento individual. Assim, se eles não têm acesso a textos literários de qualidade, lendo apenas literatura infanto-juvenil e outros tipos de leitura para fins profissionais e não para a sua própria vida cultural, não têm facilidade de se apresentarem como modelos de leitores para seus alunos, o que constitui um dos agravantes do baixo nível de motivação para a inserção destes no mundo da escrita, seja ela literária ou não. Tendo em vista os aspectos mencionados, o Projeto “Contribuições para a leitura literária de educadores dos nos iniciais do Ensino Fundamental” reapresenta alguns textos clássicos de autores de literatura brasileira. A partir de um site de domínio público que o Governo Federal abriu aos cidadãos para que estes possam capturar livremente textos da literatura brasileira, cujos autores faleceram há mais de 70 anos, a equipe faz uma busca, escolhe e reapresenta alguns desses textos. O grupo produz livros de pequeno tamanho, pouco extensos, acessíveis do ponto de vista da linguagem e da temática. As versões dos livros publicadas em épocas passadas passam a compor publicações novas, as quais são distribuídas gratuitamente aos educadores de crianças, oferecendo a eles mais uma possibilidade de acesso a obras de qualidade literária. Portanto, o trabalho em andamento pretende averiguar, primeiramente, se o objetivo do Projeto está sendo alcançado, ou seja, se tem contribuído para a formação literária do professor. Para isso, algumas perguntas precisam der feitas, como: os livros têm sido lidos? Se não, por quê? O que tem sido mais valorizado nos livros (as partes escritas pela equipe ou os textos literários)? As estratégias editorias utilizadas nos livros são relevantes? Houve diferença de recepção do livro de poesia com relação aos outros, de contos? Qual? Qual foi o livro preferido? O professor que recebeu o livro passou a ler mais após esta experiência? O gosto pela leitura literária passou por alguma transformação após a leitura destes livros? Neste sentido, será feita uma investigação, por meio de questionários e entrevistas, a fim de verificar como tem sido a recepção dos volumes publicados, uma vez que se torna necessária a avaliação do Projeto, para que a ação sociocultural e educativa proporcionada por ele tenha um caráter de continuidade, até que, ao final dos trabalhos, possa ser assegurada a validade da produção desenvolvida junto à comunidade. LITERATURA INFANTIL NA “REVISTA DE ENSINO” DA ASSOCIAÇÃO BENEFICENTE DO PROFESSORADO PÚBLICO DE SÃO PAULO (ABRIL DE 1902 A FEVEREIRO DE 1904) Maria das Dores Soares Maziero – UNICAMP Este estudo está ligado a pesquisa de Doutorado, em andamento, sobre a “Biblioteca Infantil Melhoramentos”, coleção para a infância idealizada pelo educador paulista Prof. Arnaldo de Oliveira Barreto, e que foi publicada a partir de 1915 pela Weiszflog Irmãos – estabelecimento gráfico que se tornaria, posteriormente, a Editora Melhoramentos. Antes disso, porém, o professor Arnaldo Barreto já havia construído uma sólida carreira como professor, inspetor de ensino e autor de obras didáticas, tendo sido no período de abril de 1902 a fevereiro de 1904, o primeiro Redatorchefe da Revista de Ensino, órgão de defesa dos interesses do professorado paulista. Dentre as seções fixas mantidas pelo periódico, havia uma denominada “Literatura Infantil”, a qual publicava textos em prosa e em verso, escritos por nomes posteriormente reconhecidos como pertencentes ao universo desse tipo de literatura - caso de Zalina Rolim, mas também por autores de livros e cartilhas escolares, como Romão Puiggari, Theodoro de Moraes e pelo próprio Arnaldo Barreto, entre outros, além de hinos escolares e textos traduzidos. O objetivo do presente artigo é fazer um levantamento de todos os textos e autores que foram publicados na seção “Literatura Infantil” da Revista de Ensino durante o período em que Arnaldo Barreto foi seu Redator-chefe, procurando situar esta produção no contexto maior de publicações de obras para a infância brasileira, contexto 672 673 este mapeado por diferentes obras e estudos sobre literatura infantil no Brasil. A fonte para o presente estudo são onze exemplares da Revista de Ensino publicados durante o período recortado, os quais fazem parte de acervo constituído para a pesquisa de doutorado. Espera-se, com tal análise, lançar luz sobre o conceito de literatura infantil assumido pela Revista de Ensino - e por extensão por setores envolvidos com as questões de ensino que mobilizavam professores, inspetores e dirigentes de ensino, lembrando que a Revista de Ensino, até 1904, foi publicada pela Typographia do “Diário Official”. Não se pode perder de vista, também, o fato de que este periódico tinha entre seus objetivos a instrumentalização dos professores para o trabalho docente, o que remeteria a um uso prescritivo e utilitário dos textos publicados em todas as seções, inclusive aqueles classificados como “Literatura Infantil”. Para os estudos e análises ligados à história da literatura para crianças no Brasil será utilizado o arcabouço teórico trazido por autores que se dedicaram a este campo, especialmente L. Arroyo, M. Lajolo e R. Zilberman. Para orientar as questões relacionadas à Revista da Educação e à leitura na perspectiva da história da educação, o estudo recorrerá a autores como M. R. L. Mortatti e D. B. Catani (2003), entre outros. JOSÉ JORGE LETRIA: UM CONTADOR DE HISTÓRIAS Iris Filomena Mendes de Oliveira – UNICAMP Esta comunicação pretende apresentar um estudo sobre a obra “Avô, conta outra vez”, (2010) escrito por José Jorge Letria e ilustrado por André Letria - pai e filho, ambos portugueses e autores desta obra que celebra a amorosa e deliciosa relação familiar existente entre duas gerações distantes no tempo, mas selada pela ternura da infância. A temática da criança sendo embalada e acalentada por histórias também está presente em outras obras, em conjunto como “Versos para os pais lerem aos filhos em noite de luar” (2010) e “Versos de fazer ó-ó” (1999). Os diversos trabalhos em parceria entre pai e filho evidenciam uma expressiva articulação entre o texto escrito e as ilustrações, com a criação de uma obra singular e harmoniosa em toda sua materialidade. Este tipo de produção vem recebendo diversas premiações e indicações, tanto no Brasil quanto em Portugal, é designado neste país como álbum ilustrado e será apresentado nesta comunicação. A escolha desta obra deve-se ao fato de este escritor ser atualmente um dos mais premiados de Portugal; e também por José Letria e André Letria configurarem-se entre os escritores e ilustradores portugueses com maior quantidade de obras à venda no Brasil, segundo levantamento realizado, em dissertação de mestrado na FE/Unicamp, por Oliveira (2013) sobre a presença de obras de escritores e ilustradores portugueses no mercado livreiro brasileiro. A obra em questão foi selecionada pelo Plano Nacional de Leitura de seu país de origem e, no Brasil, foi premiada pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil na categoria “Literatura em Língua Portuguesa” (2011). Também foi selecionada para o programa Minha Biblioteca 2011/SP, no Kit de literatura de Belo Horizonte/ MG e pela Secretaria Municipal de Educação SME/ RJ. Neste estudo, algumas das contribuições teóricas a respeito do álbum ilustrado são oriundas dos trabalhos de Rodrigues (2009), Maia (2002), Ramos (2005), Silva (2003, 2005). As reflexões acerca do trabalho literário e poético das obras de José Jorge Letria são de Pires (2004), Silva (2003), Nogueira (2012), entre outros. 673 674 AS TECITURAS DA FORMAÇÃO LEITORA DO PROFESSOR: A EXPERIÊNCIA DO GRUPO DE ESTUDO E VIVÊNCIA SOBRE FORMAÇÃO LEITORA DA EDUCAÇÃO MUNICIPAL DE FEIRA DE SANTANA Rosana Fernandes Falcão – SEDUC Eliana Carlota Mota Marques Lima – SEDUC Estamos vivendo em uma sociedade que exige cada vez mais respostas inovadoras a complexidade da contemporaneidade. Na definição da educação que atenda às demandas do século XXI, marcado pela inovação tecnológica e social, a formação de leitores proficientes torna-se imprescindível por carregar consigo uma força transformadora necessária para a construção de uma sociedade comprometida com a superação das diferenças sociais. A escola atribui-se a função de desenvolver a cultura do escrito, ou seja, investir na formação dos seus alunos de forma que esses sejam membros plenos da comunidade leitora e escritora. Trata-se, portanto de uma tarefa difícil que exige a promoção de reestruturações na cultura, na prática pedagógica e nas políticas vivenciadas em escolas, de modo que estas lancem mão da leitura e da escrita enquanto instrumentos poderosos na interpretação e transformação do mundo em que vivem. Concebendo a leitura enquanto prática social e cultural e não apenas como uma atividade cognitiva, o que não pode ser assegurado apenas em formações pontuais, foi criado, em 2012, o Grupo de Estudo e Vivência em Formação Leitora, com o objetivo de implementar um trabalho de leitura na rede pública municipal que favoreça a formação de leitores proficientes. São 20 professores de escolas do ensino fundamental da Educação Municipal de Feira de Santana que reúnem-se mensalmente para pesquisar, estudar e trocar experiências sobre a formação pessoal e as práticas de leitura desenvolvidas na escola, bem como promover eventos de leitura envolvendo as escolas da rede. O presente artigo pretende socializar a trajetória do Grupo de Estudo e Vivência em Formação Leitora, durante o ano de 2012, e da proposta de implementação das ações deste grupo, em 2013, na expectativa de desenvolver um processo de escolarização da leitura comprometido com o desafio de promover mudanças na sociedade, incorporando práticas pedagógicas democráticas, realizando um trabalho de leitura direcionado ao desenvolvimento do pensamento crítico, da autonomia do homem. SELEÇÕES DO READER’S DIGEST : “IDENTIDADES LEITORAS” EM REVISTA Sandra Monteiro Lemos – PPGEdu/UFRGS/CNPq Muito se tem discutido, teorizado e falado sobre “leitura”, seus benefícios, seus objetos, suas propostas, seus usos, ou mesmo sobre a quantidade, variedade e qualidade da leitura. Entretanto, outras tantas abordagens sobre tal temática são possíveis de serem feitas, como por exemplo, investigar artefatos culturais – em especial as revistas, e sua relação com a leitura que os leitores fazem dela. A partir do referencial teórico dos Estudos Culturais, articulados aos estudos sobre leitura, é que se propõe este trabalho, recorte de uma pesquisa mais ampla, que se utiliza da entrevista de doze leitores da revista de origem editorial norte-americana Seleções do Reader’s Digest, como objeto empírico. Tais leitores foram selecionados por se considerarem em algum período da sua vida leitores assíduos da referida publicação. O estudo investiga a leitura enquanto experiência cotidiana, compreendendo experiência cotidiana de leitura como aquela que se efetua com regularidade, estando imersa nas suas várias dimensões e implicada no social, no cultural, no político e no econômico. Os dados coletados através da transcrição das entrevistas dessa pesquisa possibilitaram sua circunscrição em histórias pessoais, que ajustadas à sua dimensão singular são reconhecidas como histórias de leitura (CHARTIER, 1999). A análise de tais dados permitiu mapear algumas das relações que podem ser feitas entre comportamentos, situações, ambientes e materiais de leitura que envolveram seu processo de formação como sujeito leitor, permitindo categorizar algumas das identidades leitoras, que puderam assim ser nomeadas: leitor iniciado, 674 675 leitor “apaixonado”, leitor que transforma seu horizonte, leitor encantado e crítico, leitor “pouco leitor” e leitor feliz. Tais categorias auxiliaram a problematizar as questões de hábito de leitura, modelos de leitor e sobre o ensino da leitura. As análises conduziram a entendimentos sobre o deslocadamento de certas práticas de leitura para outra dimensão. Agora, não mais, a do universo da “alta cultura” como nos estudos de Fraisse et alii (1997), mas sim para o universo da cultura de massa que adentrou nas dimensões do social. Através das análises desse estudo e a abertura que este propõe a outras discussões, evidencia-se que a mulher leitora passa a ter uma presença predominante em muitos dos cenários possíveis de serem compostos, seja no lar, no trabalho, na maternidade, dentre outros tantos. Pois é ela quem assume o topo na lista dos leitores que leem com maior frequencia. Outro deslocamento pode estar representado nos materiais que podem estar compondo as bibliotecas familiares. Nos cenários apresentados pelos depoentes, possuir uma biblioteca, mesmo que seja com revistas encadernadas, parece aliar-se a boas práticas de leitura com hábitos diários, que buscam sempre entendimento e atualização. Tais aspectos podem ser tomados como tradutores de algumas das possíveis materialidades de representação de leitura na contemporaneidade. DOCÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR: MEMÓRIAS DE LEITURA E SUAS REVERBERAÇÕES NAS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS Filomena Elaine P. Assolini – FFCLRP-USP Apresentamos um recorte de uma ampla pesquisa que investigou as relações que docentes do ensino superior, das áreas de licenciatura em Pedagogia e Letras, estabeleceram com a leitura, durante o curso de graduação. Buscamos compreender as ressonâncias e ecos dessas relações para as suas práticas pedagógicas escolares. Nosso referencial teórico-metodológico é constituído pela Análise de Discurso de matriz francesa (pecheuxtiana), pelas contribuições de Chartier e seus seguidores, bem como por estudos das Ciências da Educação, particularmente os que se detém na formação profissional docente. Nosso corpus foi constituído por entrevistas orais, realizadas com oitenta e três professores de nove diferentes universidades públicas brasileiras, sendo três estaduais e seis federais. Essas universidades estão distribuídas em sete diferentes estados da federação. Através de um roteiro de perguntas abertas, buscamos acionar a memória discursiva desses sujeitos-professores concernente às suas relações com a leitura. Além disso, de um total de oitenta e três professores entrevistados coletamos cinqüenta e quatro depoimentos escritos, a respeito de seus fazeres pedagógicos, nos cursos de licenciatura. Observações de aulas ministradas por dez docentes, oriundos de universidades do estado de São Paulo-Brasil compõem também o nosso corpus. A partir desse “amplo espaço discursivo” (Maingueneau, 1997), constituído pelas entrevistas, depoimentos e observações de aulas realizamos alguns recortes, entendidos aqui a partir da perspectiva discursiva, ou seja, com fragmentos correlacionados de linguagem e situação (Orlandi, 1987). Selecionamos para análise algumas “sequências discursivas de referência”, S. D. R ( Courtine, 1981). Os resultados das análises discursivas mostram que: 1º) Sujeitos-professores cujas relações com a leitura durante a graduação foram marcadas por vínculos e sentimentos positivos com essa prática cultural empenham-se em oferecer condições favoráveis de produção para que os estudantes pelos quais são responsáveis possam também vivenciar situações agradáveis, prazerosas e produtivas, no processo de ensino-aprendizagem; 2º) Sujeitos-professores cujas relações negativas com a leitura puderam ser ressignificadas no curso de graduação proporcionam condições de produção instigantes para os alunos, incitando-os também à leitura de textos literários, além dos de natureza científico-acadêmica; 3º) Sujeitosprofessores cujas memórias discursivas de leitura são constituídas por vestígios que evocam sentidos, emoções e sentimentos negativos tendem a desenvolver uma prática pedagógica escolar na qual predomina o processo parafrástico de linguagem, o que não contribui para que o sujeito-estudante ocupe a posição de intérpretehistoricizado, condição essencial para a instauração da função-autor. Entendemos que os cursos de 675 676 formação inicial, particularmente os de licenciatura, responsáveis pela formação de professores, devem se preocupar em lhes oferecer espaços discursivos nos quais possam expressar a sua subjetividade e “falar de si” (Foucault, 1969), o que pode contribuir para que os futuros profissionais da educação possam “saber de si mesmo”, fator imprescindível para uma docência responsável. Nessa perspectiva, nossos trabalhos com os ateliês e oficinas de leitura, nos quais o futuro educador encontra oportunidades para vivenciar experiências com diferentes gêneros discursivos e, também, com os discursos lúdico e polêmico tem-se mostrado alternativas exequíveis para a sua constituição como sujeito-educador, capaz de ler e de interpretar para além das evidências,inclusive a si mesmo. REPRESENTAÇÃO PICTÓRICA DA MULHER LEITORA Simone Cléa dos Santos Miyoshi – SME-Santo André O recorte abarca a representação visual de leitores no Brasil entre o final do século XIX e o início do XX, em especial voltado à representação pictórica da mulher leitora. Para essa apresentação focaremos as obras de pintores brasileiros como José Ferraz de Almeida Júnior, Oscar Pereira da Silva e Henrique Bernardelli e outros. Embora alguns pesquisadores as tenham estudado na literatura de ficção, em especial nos romances brasileiros, este trabalho propõe ampliar o entendimento de um imaginário que inclua a representação visual, nomeadamente na pintura. É possível perceber através da representação pictórica da mulher leitora uma idealização, ao mesmo tempo em que os preceitos artísticos demandavam uma representação realista (ou naturalista) do mundo. Nesse sentido, quais seriam as diferenças e equivalências entre a figuração da mulher leitora e a mulher “real” naquela época? Quais seriam as relações entre a representação pictórica da mulher leitora e as práticas da mulher “real” com relação à leitura e, de forma mais ampla, com a educação? Por fim, esta comunicação visa compartilhar pesquisa em estágio inicial acerca das representações e imagens de leitores, tendo como disciplinas de abordagem, sobretudo, a história da educação, a história cultural e a história da arte, bem como questões envolvendo gênero e diversidade etária. No intuito de ampliar o nosso conhecimento sobre o papel dessas imagens em relação à história da educação, buscando em particular entender os lugares da mulher nessa relação e como as práticas de leitura poderiam interferir na sua constituição enquanto sujeito. MOVIMENTAÇÕES URBANAS: LEITURAS E LEITORES DO JORNAL SUPER NOTÍCIA Renata Kelly de Arruda – UNICAMP Lilian Lopes Martin da Silva – UNICAMP Um cenário peculiar nos é apresentado junto a movimentação diária das ruas de Belo Horizonte/MG: a convivência entre pressa matutina, congestionamentos, buzinas e leitura, atividade essa comumente imaginada como ação que requer isolamento, silêncio e concentração, a leitura integra o cenário matutino e coletivo da cidade. Esse panorama nos instiga a questionar discursos já implícitos, como o de que “brasileiro lê pouco” ou a supervalorização de alguns determinados “tipos” de leitura em detrimento de outros. Quem seriam esses leitores? Onde eles estão? Quais são seus hábitos? Quais são os usos dados a essa leitura? Localizar esse leitor, identificar as formas de recepção e detectar as possíveis interações existentes a partir da leitura do jornal Super Notícia são os principais objetivos dessa pesquisa. Nos baseamos na crença de que os modos de existência atuais e suas práticas cotidianas também são geradoras de saberes uma vez que se relacionam com vivências, interações sociais, escrita, fala, leitura e formas de se pensar o mundo. 676 677 Nossa metodologia se embasará em observação não participante dos leitores do jornal pelas ruas da cidade, registro fotográfico e entrevista estruturada com uma amostra de sujeitos leitores a ser definida pós observação. Desejamos conhecer as formas de obtenção do impresso pelos sujeitos; suas maneiras de ler; motivações para leitura; as apropriações que fazem desse material; como o tornam parte integrante do seu dia a dia; as sociabilidades que vivenciam e que foram por ele produzidas; os percursos de leitura realizados e outros aspectos ligados ao pólo da recepção deste impresso. Uma exploração do jornal, em sua textualidade e materialidade, tendo em vista a identificação das estratégias dos produtores de notícias e reportagens, como aquelas dos editores, para através delas buscar responder a essas questões, nos coloca na direção de levantar representações do leitor pressuposto (inscrito nessas estratégias) que estão a guiar autores e editores. No caso dessa investigação, nossa opção por uma aproximação dos leitores de ‘carne e osso’, que, interagem com o Super Noticia e, de fato e concretamente o manipulam e significam, praticando a leitura. Não são sujeitos abstratos, mas situados, no espaço e tempo; na vida urbana; do ponto de vista econômico e social; mas sobretudo do ponto de vista cultural e pertencentes a uma dada comunidade de leitores, que partilha protocolos de leitura, que se explicam na comunidade a que pertencem. REFLEXÕES SOBRE A VERBO-VISUALIDADE EM UMA COLEÇÃO DIDÁTICA DE LÍNGUA PORTUGUESA DO ENSINO FUNDAMENTAL Elizangela Patrícia Moreira da Costa – LAEL/PUC/SP O presente trabalho insere-se no âmbito da Linguística Aplicada e objetiva apresentar e discutir resultados parciais da nossa pesquisa, em andamento, em nível de doutorado. Para tanto, observouse a inserção de gêneros verbo-visuais e o trabalho desenvolvido no processo de ensinoaprendizagem dos conceitos/conteúdos articulados para os anos a que se destinam da coleção Para viver juntos: português (Edições SM) indicada pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) 2011, para o triênio 2011 a 2013 e selecionada a partir da escolha de professores de Língua Portuguesa de das escolas públicas de Cuiabá-MT. Para análise dos dados recorremos aos principais conceitos do Círculo de Bakhtin, tais como Gêneros de discurso, compreensão ativa e relações dialógicas, e nas contribuições teóricas sobre a verbo-visualidade de Beth Brait (2009; 2012). Da perspectiva metodológica, trata-se de uma pesquisa de análise documental, de abordagem qualitativa e dialógica. Neste recorte, tratamos dos dados quantitativos referentes à inserção de diferentes gêneros discursivos verbo-visuais nos volumes destinados aos últimos anos do Ensino Fundamental (6º ao 9º anos) e a sua abordagem didática em um dos volumes da coleção supracitada. Os resultados parciais dessa amostra apontaram para uma escassez de gêneros verbovisuais, especialmente, nas seções de leitura e sua abordagem revelou o enfoque na materialidade verbal em detrimento da materialidade visual. Pretende-se que os resultados parciais da pesquisa provoquem reflexões acerca do lugar da verbo-visualidade em livros didáticos de Língua Portuguesa e da necessidade de um ensino-aprendizagem de leitura que leve em consideração a verbo-visualidade como um traço constitutivo da linguagem e, portanto, como dimensões indissolúveis nos processos de leitura. LEITURAS, BRICOLAGENS E CONSTRUÇÃO DE SENTIDOS: A CAMINHADA INTERPRETATIVA DO LEITOR PARA A PRODUÇÃO DE TEXTOS. Mariana Bortolazzo – UNICAMP Por meio da análise de produções escritas de crianças em fases de alfabetização em resposta a uma questão de avaliação, buscamos, neste artigo, compreender os elementos – textuais, discursivos, 677 678 interpretativos – que os alunos mobilizam para compor seus textos, realizar seu projeto de escrita e se fazer compreender em uma situação de avaliação. Mais precisamente, os textos analisados partiram de uma proposta de produção escrita no gênero carta opinativa em uma avaliação institucional da cidade de Campinas-SP. Recorremos a uma compreensão enunciativa da linguagem (BAKHTIN, 2010) que nos auxilia a compreender os textos dos alunos como forma de trabalho sempre ativo com a linguagem, seja na forma escrita ou oral, que oferece condições para construções de sentidos individuais e configurados por cada campo da atividade humana e pelas determinadas condições de produção. Assim, recorremos a Geraldi (1997) que sugere que a “caminhada interpretativa do leitor”, seja refeita pelos professores e pesquisadores que se empenham em compreender a produção de textos de escolares. Dessa forma, tentamos identificar os indícios (GINZBURG, 2001) que revelem a atividade de escritura como “resposta” (BAKHTIN, 2010) às leituras realizadas, às experiências e práticas compartilhadas. As análises sugerem um empenho dos alunos para recolher de seu repertório, as leituras, as lembranças, o significativo e fazem recortes para o processo de “bricolagem” durante a “usinagem” do texto (CERTEAU, 2012). Em outras palavras, entendemos que as crianças, ainda que apresentem algumas dificuldades no trabalho com a linguagem escrita, utilizam aquilo que já foi vivenciado, lido, aprendido e compartilhado em diferentes momentos e espaços juntamente com sua capacidade inventiva e criativa para produzir textos em uma resposta de questão de avaliação. Essas práticas de leitura e escrita, sempre novas e inventivas – porque únicas e singulares – se identificadas e valorizadas, podem oferecer aos professores e pesquisadores, elementos que possibilitem uma compreensão mais sensível e significativa do processo de aprendizagem das crianças do ensino fundamental. Neste artigo, buscaremos apontar exemplos dessa atividade dinâmica entre leitura e escrita que contribuem para a construção de sentidos nas produções textuais de crianças em fases de alfabetização. EXPERIÊNCIAS DE LEITURA DE CRIANÇAS EM DIFERENTES CONTEXTOS Andrea Del Larovere – UFG/CAC /PPGEDUC Selma Martines Peres – UFG/CAC /PPGEDUC Ao pensar na temática leitura, geralmente, associa-se à instituição escolar o seu papel formador. Sem dúvida alguma esta tem função central nesta formação, principalmente quando tomamos a sistemática da aquisição da habilidade de decodificação do código escrito e, atualmente, a concepção de letramento numa sociedade letrada. Contudo, outros contextos que não o escolar podem formar e/ou contribuir com a formação do leitor, principalmente se tomarmos como referência fatores como desejo e necessidade, que podem potencializar o leitor a buscar diferentes materiais de leitura em contextos e suportes variados. (MARTINS, 2003). Nesse sentido, as experiências de leitura do sujeito podem ocorrer em diferentes instâncias e com intensidades distintas, segundo as relações sócio-históricoculturais estabelecidas entre leitor e mundo. O texto desta comunicação apresenta resultados parciais de uma pesquisa que parte da inquietação em conhecer as experiências leitoras de quatro crianças, que cursam o quinto ano do ensino fundamental de uma escola da rede municipal de ensino da cidade de Catalão - GO, tanto em contexto escolar, quanto extraescolar. O objetivo da investigação é conhecer e analisar as experiências de leitura narradas por essas crianças. Assim, para investigar as experiências da leitura, eixo principal desta pesquisa, nos apoiamos na metodologia do estudo de caso do tipo etnográfico, que como nos lembra André (2005), esse tipo de estudo tem o foco de interesse na descrição da cultura, abrangendo práticas, hábitos, linguagens, significados, crenças e valores, de um processo educativo. O aporte teórico baseia-se nos conceitos de experiência, a partir de Larrosa, Dewey e Benjamin, e de leitura a partir das obras de Chartier, Paulo Freire, Magda Soares, Marisa Lajolo, Fischer, Márcia Abreu, Batista e Galvão, Bresson, Kleiman, Yunes, entre outros. Adentrar esse campo conceitual não é tarefa fácil. Estes campos são, por sua constituição, complexos e de difícil 678 679 definição. Nesse sentido, neste texto traçamos alguns discussões acerca da leitura, enquanto experiência, e sua interlocução com a formação de leitores nos diferentes contextos. Observa-se assim, que tratar da experiência de leitura pressupõe a inter-relação vivenciada pelo sujeito a partir de suas referências individuais, sociais ou históricas. LEITURA INTERATIVA EM SALA DE AULA – DISCUTINDO POSSIBILIDADES E LIMITES Rosa Maria Hessel Silveira – UFRGS Letícia Fonseca Richthofen de Freitas – UFPEL O trabalho articula-se a uma pesquisa em andamento, com apoio CNPq, intitulada “Literatura infantil: um estudo sobre leituras de obras selecionadas com leitores de anos iniciais”, cujo objetivo maior é o de analisar a recepção, por grupos de alunos de anos iniciais de escola pública do Rio Grande do Sul, de um conjunto de obras de gêneros e temas diversos, escolhidas da listagem do PNBE-2012 para anos iniciais do ensino fundamental, examinando eventuais diferenças de receptividade, interesse e obstáculos de leitura. A partir da realização de sequências de encontros com sete títulos diferentes do acervo, em turmas de escolas também diversas, a análise das sessões filmadas, dos trabalhos produzidos e das anotações de diário do campo dos pesquisadores propiciou o levantamento de alguns tópicos a serem discutidos e analisados, em confronto com outras pesquisas do campo da leitura e da literatura infantil. Como tópicos de interesse para discussão, situamos: 1. as possibilidades de enriquecimento da leitura compartilhada, quando feita de forma interativa em sala de aula, desde que com uma mediação adequada pelo/a professor/a; 2. a importância de uma leitura multissemiótica de livros de literatura infantil, considerando a importância da imagem em tais obras e a possibilidade de o professor ser um mediador que leve o aluno a desenvolver sua competência em apreciar e aprofundar as relações entre texto e imagem; 3. a importância de se propiciar uma articulação entre o universo ficcional construído pelo livro com as experiências pessoais, culturais e sociais das crianças, e 4. a possibilidade e a fecundidade de instrumentalizar o pequeno aluno para atentar e manipular elementos do objeto livro: autor, ilustrador, tradutor, contracapa, edição e outros elementos paratextuais (biografias, dedicatórias) etc., não com um intuito formal, conteudístico, mas como veículos de informações que podem enriquecer a própria leitura do texto principal. Tais tópicos não são apresentados como conclusões acabadas, mas como itens a serem discutidos, numa dimensão de aperfeiçoamento de práticas que propiciem uma leitura mais significativa de obras de literatura por crianças de escolas públicas, às quais são distribuídos acervos com tais livros. Alguns limites e dificuldades a eles associados também serão colocados na Roda, como questões de manutenção de interesse e organização do espaço de sala de aula, (im)possibilidade de exemplares de um mesmo título para todos os alunos e necessidade de um planejamento detalhado (incluindo a análise prévia do texto imagético) para a realização de tais sessões. 679