Castelo da Pré História ao Início do Século XX

Transcrição

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André Dell’Orto Casagrande
Maria Helena Mion Barbiero
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Castelo - Da Pré-História ao início do Século XX
Pesquisa e idealização:
André Dell”Orto Casagrande e Maria Helena Mion Barbieiro
Fotos:
Alex Stúdio, Castelo - ES
Revisão:
1ª Edição: Sônia Frezza Peisino Corrêa
2ª Edição: Jorgina de Vargas Barbosa
Editoração e projeto gráfico:
Gráfica Impresso - (28) 3542-0721
Departamento de Criação
Maykon Zanetti Pereira
Impressão:
Gráfica Impresso - (28) 3542-0721
Capa:
Gráfica Impresso - (28) 3542-0721
Departamento de Criação
Maykon Zanetti Pereira
sobre fotos de arquivo.
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SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO...................................................................................... 9
PREFÁCIO.................................................................................................11
I - OS PRIMEIROS HABITANTES DE NOSSA TERRA.............................13
1.1 - Pré-história em Castelo.......................................................13
II - O CONTEXTO EUROPEU À ÉPOCA DAS GRANDES DESCOBERTAS........................................................................................................... 17
III - DISCUTINDO O INÍCIO DO POVOAMENTO EM CASTELO............. 19
IV - OS GRUPOS HUMANOS QUE FIZERAM A NOSSA HISTÓRIA....... 25
4.1 - Por que os índios brigavam?.............................................. 25
4.2 - Os Jesuítas......................................................................... 29
4.2.1 - Os Jesuítas no ES............................................. 33
4.3 - Os Mineradores.................................................................. 37
V - A EXPLORAÇÃO DO OURO EM CASTELO....................................... 40
5.1- A Mineração em si............................................................... 40
5.1.1 - Primeira Fase: Séc. XVII................................... 41
5.1.2 - Segunda Fase: Séc XVIII.................................. 43
5.1.3 - Terceira Fase: Séc. XIX..................................... 54
5.2 - As Consequências da Proibição da Mineração no Espírito
Santo e em Castelo.................................................................... 57
VI - ORIGEM DO NOME CASTELO......................................................... 59
VII - O CAFÉ NO BRASIL.......................................................................... 62
7.1 - Breve Comentário............................................................... 62
VIII - O CAFÉ NO ESPÍRITO SATO.......................................................... 64
8.1 - Breve Comentário............................................................... 64
IX - A EXPLORAÇÃO DA CAFÉ EM CASTELO........................................ 67
9.1 - Introdução........................................................................... 67
9.2 - Primeira Fase da Produção do Café em Castelo............... 68
9.2.1 - As Grandes Fazendas: migração interna.......... 68
9.2.2 - O Aldeamento Imperial Afonsino....................... 70
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9.2.3 - As Grandes Fazendas de Café – a concentração
do poder nas fazendas................................................ 73
9.2.3.1 - A Posse da Terra.............................. 74
9.2.3.2 - As Fazendas.................................... 75
9.2.4 - O Sistema de Plantation.................................... 83
9.2.5 - Os Escravos...................................................... 84
9.2.6 - A Decadência das Grandes Fazendas.............. 87
9.3 - Segunda Fase da Produção do Café em Castelo.............. 88
9.3.1 - Os Imigrantes: motivos da vinda....................... 88
9.3.2 - núcleo Colonial Castelo..................................... 92
9.3.3 - A Luta dos Imigrantes contra os Fazendeiros... 93
9.3.4 - O Caminho dos Imigrantes até Castelo............ 95
9.3.5 - As Condições de Transporte............................. 97
9.3.6 - A Segunda Leva de Imigrantes........................ 103
X - AS BASES DO MUNICÍPIO DE CASTELO........................................ 108
10.1 - Considerações Gerais ................................................... 108
10.2 - A Crise da Mão de Obra.................................................. 109
10.3 - O Processo de Urbanização – Conceito ........................ 110
10.4 - O Início do Processo de Urbanização de Castelo........... 112
10.5 - A Estrada de Ferro Caravelas......................................... 119
XI - A FAZENDA DO CENTRO................................................................ 121
11.1 - Final do Século XIX e início do Século XX..................... 121
11.2 - A Compra da Fazenda pelos Agostinianos ..................... 122
XII - A IMPORTÂNCIA DA IMIGRAÇÃO.................................................. 129
XIII - A URBANIZAÇÃO 40 ANOS DEPOIS............................................. 135
XIV - BIBLIOGRAFIAS............................................................................ 142
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APRESENTAÇÃO
Dez anos se passaram do lançamento da 1ª edição e muita coisa
aconteceu neste período: o mundo mudou, o Brasil mudou, nosso Município também mudou. Temos a impressão de que o mundo anda mais rápido,
todos têm pressa, a velocidade e a rapidez com que as coisas acontecem
são uma das principais características destes tempos.
A História é uma ciência que busca nos proporcionar uma clara,
completa e profunda compreensão do presente. Sendo assim, esperamos
poder ajudar, com nosso trabalho, aos que buscam respostas às grandes
questões do nosso dia a dia.
Optamos, em nosso segundo trabalho, por uma edição ampliada e
revisada e não uma obra nova, isolada. Nosso objetivo foi reunir, em um só
livro, todas as informações históricas que apuramos e as conclusões a que
chegamos a respeito da História de Castelo.
A parte que revisamos, da edição anterior, está relacionada à discussão do início do povoamento. Anexamos documentos transcritos do Livro
Tombo de Itapemirim, que fala sobre as Missões Jesuíticas dos Montes
do Castello, a partir de 1625. Com isso, buscamos fundamentar, dar lastro
documental, à nossa teoria sobre o início do povoamento de nossa região.
O que acrescentamos à segunda edição foi o início da urbanização,
e suas implicações, pois até então todo o cenário que permeava a História
de Castelo era o rural. Buscamos identificar o início dessa nova realidade
para os castelenses do final do século XIX. Como surgiu o núcleo urbano
que nós conhecemos hoje? E estas e outras perguntas que buscaremos
responder na parte que acrescentamos.
Como afirmamos no início, muita coisa mudou em 10 anos, até a
nossa maneira de compreendermos algumas coisas. Então, convidamos
você, que já leu o nosso livro, a relê-lo, agora revisado e ampliado. Com
certeza, você também tem algumas concepções diferentes das que tinha
há 10 anos atrás. Você, que ainda não leu, terá a oportunidade de fazê-lo
agora e conhecer um pouco sobre nossas origens.
Desejamos a todos uma boa leitura.
Os autores
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PREFÁCIO
Ao Receber a “boneca” do livro de André Dell’Orto Casagrande e
Maria Helena Mion Barbiero, sobre a história de Castelo, com o pedido de
fazer o prefácio, desanimei. Apesar de conhecer a inteligência de André
e de Maria Helena, pensei que iria enfrentar mais uma História contando
onde o Imperador fez xixi, onde o cavalo do marquês empacou ou a rua
onde a duquesa quebrou o salto do sapato. Para minha surpresa – agradável surpresa – enfrento um livro diferente e novo, bem pesquisado e bem
escrito, em estilo simples e moderno, uma agradável surpresa – repito –
brotada e florescente na cidade de Castelo.
O pior é que eu não sei fazer prefácio, sei, e muito pelas pontas,
fazer uns poemas, uns romances e trechos da História da minha cidade,
Campos dos Goytacazes, mas prefácio a coisa muda.
Pois bem, os dois jovens historiadores começam pelo começo,
como se diz, trazendo a História da bela cidade de Castelo, no Espírito
Santo, mostrando como os europeus chegaram ao Brasil, como alcançaram o interior capixaba, como descobriram florestas, rios, bichos, soldados,
riquezas minerais, montanhas ouriças e colonizadores terríveis, que escravizaram índios e mataram de fome e chicote os escravos negros. Tudo isso
contaram os dois moços, num estilo simples e bonito, enxuto, de tal forma
que se chega ao final do livro rapidamente e com pena, querendo ler mais
sobre Castelo.
Osório Peixoto Silva
André e Maria Helena amadureceram. Aprofundaram seu trabalho e realizaram o desejo de todo pesquisador: descobriram um fato novo.
Esse fato, a chegada da linha férrea à região e seu consequente desenvolvimento, veio modificar a visão sobre a urbanização da cidade de Castelo.
Os dois não se acomodaram ao consenso existente e foram além
e mais fundo. Provaram ser a instalação da linha férrea a responsável pela
formação do novo núcleo urbano.
Essa constatação já vale todo o esforço do livro. Mas, eles não se
contentaram e fizeram mais.
O livro nos mostra toda a evolução da região e nos faz compreender os porquês de Castelo ser hoje uma cidade organizada, desenvolvida e
ciente de seus valores e suas possibilidades.
Graça Maria Moreira
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I – O PRIMEIROS HABITANTES DE NOSSA TERRA
1.1 – Pré-história em Castelo
De acordo com as pesquisas arqueológicas mais recentes, já sabemos que o mais antigo homem da América viveu em solo brasileiro há
cerca de 60 mil anos, nas cavernas, onde hoje se encontra o Parque Nacional da Capivara, no Piauí, administrado por órgãos como o Ibama e a
Fundham (Fundação do Homem Americano). Foi possível a comprovação
de sua idade através do carbono 14.
Haviam encontrado no sul do continente inúmeros artefatos de pedra, de ossos, pedaços de cristais de quartzo e de conchas, que datavam
de mais de 8.000 mil anos a.C. em várias regiões como Minas Gerais e no
Piauí.
Quanto mais a pesquisa se intensificava, mais remoto no tempo os
achados surgem.
No Espírito Santo, as pesquisas arqueológicas são liberadas pelo
Museu Histórico Nacional e pela Universidade Federal do Espírito Santo e
muito já se conseguiu detectzar sobre a presença de grupos pré-históricos
como os mais antigos, que datam de 7,5 mil anos atrás, na região de Gironda, através de artefatos e fósseis encontrados ao longo do Rio Fruteiras
em Cachoeiro de Itapemirim.
O ambiente em que esses homens pré-históricos viviam era bastante hostil, clima frio, vegetação rasteira, era o Período Terciário, 35 milhões
a 7 mil anos a.C., tinham que disputar com animais gigantes que também
buscavam sua sobrevivência, como as preguiças que chegavam até a 6
metros.
Se compararmos ao primitivo, vemos uma desproporção muito
grande. Esses grupos humanos aqui encontrados apresentavam a altura
entre 1,65 e 1,70 metros, crânio arredondado e pouco pelo no corpo, andava nu e vivia da caça, da pesca e da coleta de frutos, raízes, o que lhe dava
a condição de nômade. Viviam em grupos de mais ou menos 60 pessoas,
não havia propriedade privada, sendo uma sociedade igualitária. Usavam
como instrumento de trabalho a pedra lascada e depois polida, além de
osso que também ajudava na manutenção da sua sobrevivência. Eram hábeis caçadores e não desenvolviam nenhuma cultura a não ser a língua em
comum, provavelmente de origem asiática.
E é essas mesmas características e condições que viveram vários
grupos pré-históricos no sul do Espírito Santo.
Aqui encontramos 2 formações geológicas, o complexo cristalino
terciário que forma o Forno Grande e toda a Serra Geral Brasileira e na
região de Castelo e Cachoeiro aparece a formação de afloramento calcário
onde se encontram várias grutas que serviam de habitações pré-históricas
a grupos que aqui viveram.
Grande parte dessa história, em Castelo, tem como ponto de refe-
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rência as pesquisas científicas arqueológicas do professor Celso Perota,
uma das maiores autoridades em cultura indígena, que vêm desde muitos
anos num trabalho incansável de busca por fósseis e vestígios de passagem desses grupos humanos no Espírito Santo e em especial, em Castelo.
O professor Celso Perota esteve em Castelo, em 1969 e com suas
observações e pesquisas, encontrouna Gruta do Limoeiro indícios da presença desses grupos. Ali começou os primeiros trabalhos pela descoberta
de vestígios e fósseis. Em 1979 foram feitas escavações arqueológicas na
área da entrada da gruta sendo recolhidos uma série de elementos arqueológicos, como, pontas de flechas, colares e a mais ou menos 60 a 80 cm do
solo, oito sepultamentos em posição fletida, tradição indígena comum nos
sepultamentos, posição fetal, o indivíduo enterrado era colocado na mesma posição que o feto no ventre da mãe. Outra característica interessante
e bastante peculiar dos índios da gruta do Limoeiro é a utilização de ocre
vermelho sobre o cadáver.
Através da radiometria obtida pelo carbono 14, comprovou-se que
se tratava de fósseis de 4,5 mil anos a.C.. Esses fósseis têm traços idênticos aos encontrados em Gironda, de 7,5 mil anos a.C.. Encontra-se na entrada da gruta também, pedras que apresentam áreas polidas, utilizadas ao
longo do tempo pelos habitantes do local para alisamento de instrumentos
utilizados por esses grupos, como machados, pontas de flechas e lanças.
Esses mesmos grupos que habitavam boa parte do sul do Estado,
há milênios, são os que antecedem geneticamente os índios puris-coroados que se encontravam notadamente no Vale do Itapemirim e na região
montanhosa dos municípios de Castelo, Conceição de Castelo, Muniz Freire, Iúna, Alegre, Guaçuí e toda a Serra do Caparaó.
Além da Gruta do Limoeiro, o professor Celso Perota também desenvolveu escavações na Comunidade de Estrela do Norte, em Castelo,
uma região de vales com abundância no passado de peixes e animais para
caça, local de uma antiga aldeia de puris-coroados que datam de mais ou
menos 1200, 300 anos antes da chegada dos portugueses ao Brasil.
Neste vale encontrou-se e ainda é possível encontrar cacos de cerâmica, que era a tecnologia básica desses povos, utilizadas para guardar
alimentos e água, recipientes dos mais diversos tipos. Quando houve a
construção da Igreja local é que veio à tona toda essa riqueza arqueológicas, que além de restos de cerâmica, também, colares de dentes de
animais, como o de onça, troféu do caçador que havia abatido aquela onça,
como também algumas pontas de flechas danificadas pelo uso, outras não,
encontravam-se ainda intactas.
Outro local de pesquisas arqueológicas em Castelo, que também
serviu da habitação de tribos puri-coroado, a mais de 1.000 anos atrás, foi
no Vale da Sombra da Tarde, nome bastante sugestivo, dado em função
da presença de uma grande pedra que se torna obstáculo à luz do sol,
no vale, a partir das duas horas da tarde. Próximo à pedra, na encosta da
montanha, os puris-coroados fizeram os enterramentos de seus mortos.
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Como na Gruta do Limoeiro, neste vale também, os cadáveres eram
enterrados na posição fletida, sendo que nestes foram encontrados junto
ao corpo destes indivíduos, alguns pertences como machado de pedra polida, conchas que serviriam para a alimentação do morto, principalmente
os estropoqueiros, uma lesma terrestre bastante apreciada pelos nativos.
Os puris-coroados foram os habitantes que os padres jesuítas encontraram em suas incursões no interior da Capitania do Espírito Santo e
que os aldearam em missões tanto com fins religiosos quanto, posteriormente para o trabalho de mineração.
Todos esses achados arqueológicos se encontram em local apropriado que em Castelo se organize um espaço adequado para que eles
possam voltar e serem utilizados para o estudo e o turismo na região.
Gruta do Limoeiro - Castelo - ES
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Mapa da Topografia da Gruta do Limoeiro.
Detalhamento dos Salões Internos da Gruta.
Confeccionado pela extinta ENCATUR em novembro de 1978.
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II – CONTEXTO EUROPEU À ÉPOCA DAS
GRANDES DESOBERTAS
Para se entender a presença dos europeus na América, dos portugueses, mais especificamente, no Brasil, é necessário entender o ambiente
em que os europeus viviam na época das grades navegações.
Os séculos XIV e XV foram marcados por profundas crises, principalmente econômicas, o que levará os europeus à necessidade de encontrar caminhos para a superação de seus problemas. Encontrar novas terras
de onde pudessem extrair metais preciosos, tão necessários ao mercantilismo que vigorava na época para o fortalecimento político e econômico
das recém-criadas monarquias europeias, era uma forma de se resolver a
situação vigente, além de ser também a saída para fugir da concorrência
e do protecionismo que muito dificultavam o comércio entre países europeus. Todos queriam suas balanças comerciais favoráveis. Por isso, evitar
a saída de matéria-prima e a exportação de produtos já manufaturados era
o lema da época.
Como então resolver este impasse? Obviamente impondo o Pacto
Colonial e o monopólio comercial. Assim, a colônia seria responsável pela
complementação da economia da metrópole. Mas o que produzir nessas
colônias? Matéria-prima, produtos tropicais, mercadorias de alto valor econômico no mercado europeu?
E foi nesse ambiente que partiram as caravelas portuguesas em
1500, compondo a maior frota jamais vista na época. O objetivo dessa
expedição não era somente confirmar a existência de novas terras, mas
também tomar posse das mesmas que já haviam sido determinadas a Portugal pelo Tratado de Tordesilhas, em 1494, porém, um projeto para ser
desenvolvido somente após a descoberta do caminho para as Índias Orientais, o que ocorreu em 1498 com Vasco da Gama. Agora bastava a Portugal
somente vir tomar posse de sua terra.
Chegar ao Brasil não significou colonizá-lo. Ser uma colônia era
obedecer a objetivos bem definidos: ser uma fonte geradora de lucros e ser
uma fonte de complementos à economia da metrópole. E o tínhamos nesse momento para suprir esses objetivos? Nada, pois pau-brasil era muito
pouco, tanto que foi arrendado a Fernando de Noronha.
O monopólio do comércio com as Índias Orientais era um negócio
muito mais rentável, e desviar nesse momento não seria inteligente.
E assim ficamos: Brasil a ver portugueses que iam e vinham carregando caravelas e mais caravelas da madeira tintória. E lá se foram basicamente trinta anos da nossa história, período conhecido como Pré-Colonial.
Na terceira década do século XVI, Portugal sentiu necessidade de
vir colonizar sua terrinha. No aspecto político, para garantir sua posse sobre a terra, e no aspecto econômico, as Índias já não representavam o que
já haviam representado um dia para os portugueses. Mas, surge aí um im-
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passe, pois colonizar requer que a colônia seja fonte de lucros, o que levou
então os portugueses a introduzirem aqui um produto alheio à nossa terra
até então: a cana-de-açúcar, produto valiosíssimo no comércio europeu. O
sistema de Plantation (monocultura, latifúndio, mão-de-obra escrava) seria
implantado para maximizar os lucros. Isso tudo para ser comercializado no
mercado europeu, gerando muitas divisas aos portugueses.
O Espírito Santo viveu de perto essa história com a montagem de
vários engenhos, claro que não tão rentáveis quando os de Pernambuco,
“menina dos olhos de Portugal”, nessa época.
No século XVI, habitado pelas tribos puris-coroados, Castelo, que é
o objetivo de nossa pesquisa, ficou alheio ao que acontecia no litoral.
“De fato, a colonização por meio da agricultura
tropical, como a inauguraram pioneiramente
os portugueses, aparece como a solução através da qual se tornou possível valorizar economicamente as terras descobertas, e dessa
forma garantir-lhes a posse (pelo povoamento).”
NOVAIS, F. O Brasil nos Quadros do Antigo Sistema Colonial. In.: MOTTA, I. O., 1969, p.48.
Mas nosso Castelo entra em cena no século XVII, quando os padres
jesuítas aqui estiveram e fundaram as missões. Mas, por que não no litoral
como as outras; Reritiba, por exemplo?
É para esta e para tantas outras perguntas que começaremos a
traçar algumas respostas, remontando assim a história de nossa cidade.
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III- DISCUTINDO O INÍCIO DO POVOAMENTO EM CASTELO
O nome de Castelo está associado a poder, luxo e riqueza, e foi
justamente em busca da riqueza mineral que se iniciou o povoamento da
região do Castelo. Foi a sede do ouro, que movia toda a Europa Mercantilista, que fez surgir o povoamento de Montes Castello, no início do século
XVII, por volta de 1625. Nunca é demais lembrar a importância do ouro do
período do Mercantilismo, pois era a partir dele que se media a riqueza das
nações. Sendo assim, todo o processo de colonização tinha como objetivo
principal a obtenção de ouro e prata para o enriquecimento das metrópoles.
E foi justamente a partir deste necessidade que Castelo surge no cenário
do mundo colonial.
Partindo da premissa de que a busca pelo metal precioso levou à
formação do povoamento de Castelo, cabe-nos então esclarecer o início
desse processo de exploração. As poucas pessoas que se preocuparam
com esse assunto não são unânimes em determinar o início dos trabalhos
de garimpagem no rio Castelo e em seus afluentes. Sintetizemos, pois, as
duas versões existentes a respeito deste assunto: a de Alberto Lamego,
endossada por Tristão de Alencar Araripe, e a do Major Gomes Neto, que
se ocuparam do início dos trabalhos nas minas do Castello.
Segundo Tristão de Alencar Araripe, um dos pioneiros pesquisadores da história de Castelo, Pedro Bueno Cacunda partiu de Taubaté em
1705 em busca de ouro no interior de Minas Gerais, provavelmente em
Ouro Preto e Mariana. Daí vai para os sertões de Cataguases, onde fica
sabendo da existência de ouro mais próximo da costa. De posse dessa
informação, ele desce e o rio Doce e chega ao interior do Espírito Santo,
onde se encontra com Domingos Luiz Cabral que afirma existir cascalho
de ouro abundante no rio Manhuaçu. Encorajado por essas notícias, Pedro
Bueno Cacunda se desloca para a região das serras do Castello, onde
encontra ouro nos ribeirões, iniciando assim o povoamento no lugar. Dessa
forma, Araripe acreditava que o início dos trabalhos de mineração e o consequente povoamento de Castelo tiveram início no século XVIII, ou seja, a
partir de 1705.
Em sua obra “A Terra Goytacá”, o renomado pesquisador da história
de Campos, Alberto Lamego, afirma que:
“Nada mais precisamos adiantar para provar
que Pedro Bueno Cacunda foi o descobridor
das minas do Castello e fundador dos primeiros arraiais ali formados com os habitantes de
Minas e Bahia”.
LAMEGO, Alberto. “A Terra Goytacá”. Livro 2, p.302.
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Nesta mesma obra, o escritor campista rechaça de forma contundente a hipótese de Gomes Neto, professor do Aldeamento Imperial Afonsino de 1848 a 1852, a respeito do início do povoamento das minas do
Castello. E para nos mostrar que os trabalhos de mineração e povoamento
das minas do Castello foram mesmo iniciadas por Bueno Cacunda, Lamego cita os roteiros de viagem e requerimento enviados à Coroa por Cacunda, e que também foram apreciados pelo Conselho Ultra-Marino. Lamego
baseia-se também nas cartas dos Governadores da Bahia, Ouvidor Geral
do Rio de Janeiro e Espírito Santo, da Câmara de São Salvador, além das
informações da Casa da Moeda e, por último, nos decretos expedidos sobre o assunto.
Gomes Neto não compartilha da hipótese defendida por Lamego e
Araripe, e afirma que os trabalhos de mineração e povoamento da região
das minas do Castello são bem anteriores à chegada de Pedro Bueno Cacunda. Segundo Gomes Neto, os referidos trabalhos foram iniciados pelos
jesuítas ainda no século XVI. Tal historiador afirma que:
“O descobrimento de ouro na região de Castelo foi pouco posterior a 1551, data em que
os jesuítas se estabeleceram na região de
Reritiba, hoje Anchieta. Foram esses missionários, auxiliados pelos fiéis e pelos índios,
que lavraram com intensidade e quase clandestinamente as minas da Barra do Castelo,
do Caxixe, do Ribeirão e do Arraial Velho, até
que os índios Aimorés, desavendo-se com os
padres e colonos, obrigaram-nos a se retirar
do seu território.”
Tirado de um artigo: “A Colonização do Município
de Castelo” de Tristão de Alencar Araripe, Revista
Cultural – UFES, Vitória, 1(2); 32-47, 1979.
Outra hipótese que se encontra no Dicionário Geográfico do Espírito
Santo é a de que os trabalhos de mineração iniciaram em 1723, em um
afluente norte do rio Itapemirim, chamado Castelo. Mas, vários documentos constatam a presença de Pedro Bueno Cacunda bem ates disso na
região das minas do Castello.
Essa polêmica histórica entre Lamego e Araripe contra Gomes Neto
sobre o início do trabalho de mineração e povoamento das minas do Castelo e a provável mineração realizada pelos jesuítas (Inacianos) tem como
pano de fundo o julgamento histórico do papel desempenhado pelos jesuítas no Espírito Santo. Gomes Neto busca criticar esse trabalho afirmando que eles se desviaram de sua função de catequizar os indígenas para
enriquecer, explorando ouro e trabalho escravo dos índios. Por outro lado,
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Lamego e Araripe buscam enaltecer este mesmo trabalho, afirmando que
os jesuítas nunca exploraram ouro nas minas do Castelo, e ao contrário, foi
através das mãos destes pioneiros (os jesuítas), principalmente Anchieta,
que os gentios e a capitania do Espírito Santo tiveram contato com a luz
da civilização.
Não acreditamos em trabalhos neutros, ou seja, quando alguém se
propõe a escrever alguma coisa, fatalmente estará inclinado à defesa ou à
condenação de uma ideia. Não queremos aqui ressuscitar a polêmica entre
os prós e os contras jesuítas, mas sim, escrever a história do munícipio de
Castelo. A respeito do trabalho dos jesuítas no Espírito Santo, veja algumas
palavras do Padre Anchieta, contidas no livro “O Povo Brasileiro” do antropólogo Darci Ribeiro, onde o jesuíta louva o que considera heroicos feitos
do bravo Governador Mem de Sá, frente aos índios.
“Quem poderá contar os gestos heroicos do
chefe à frente dos soldados, na imensa mata:
cento e sessenta as aldeias incendiadas, mil
casas arruinadas pela chama devoradora, assolado os campos, com suas riquezas, passado tudo ao fio da espada.”
RIBEIRO, Darci. “O Povo Brasileiro”, p.50.
Como vivos, os jesuítas pareciam estar imbuídos de um espírito militar para realizarem seus trabalhos aqui nos trópicos. Desta forma, ficamos
à vontade, sem correr o risco de manchar a história dos jesuítas no Espírito
Santo, para elaborar a hipótese que mais se aproxima da verdade (já que
a falta de documentos dificilmente nos possibilitará a construção de uma
verdade sólida e inquestionável) a respeito do início dos trabalhos e povoamento das minas do Castelo.
Iniciamos nossa definição negando a afirmação de Tristão de Alencar Araripe, pois não foi Pedro Bueno Cacunda o pioneiro no povoamento
da região das minas de Castelo. Quem iniciou este povoamento foram os
jesuítas, que em 1625 construíram uma igreja dedicada à Nossa Senhora
do Amparo, na localidade denominada Montes Castello. Esta igreja, em
1710, foi elevada à categoria de Paróquia. Neste período, o Vale do Itapemirim, que posteriormente se tornou o pólo de concentração populacional
do Sul do Estado, ainda não tinha uma paróquia. A Igreja dos Montes Castello foi construída posteriormente a de Orobó, dedicada à Nossa Senhora
do Bom Sucesso, que é de 1580, e a de Muribeca, que é de 1581 e dedicada à Nossa Senhora das Neves. É importante lembrar que ambas foram
construídas por Anchieta.
Todas essas informações constam no livro Tombo de Itapemirim,
que se encontra na Matriz Nossa Senhora do Amparo. Por falta de documento, Araripe se equivocou ao afirmar que o início do povoamento foi
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com Pedro Bueno Cacunda, pois quando este aqui chegou, os jesuítas
provavelmente ainda se encontravam estabelecidos. Já Alberto Lamego
faz menção em seu livro, sem citar data, de uma população cristã distribuídas em quatro arraiais na região do Castelo, mas posteriormente, nesta
mesma obra, afirma que foi Pedro Bueno o primeiro a explorar as minas do
Castelo e também a formar os primeiros povoados. Desta forma, ele cai no
erro assim como Araripe, já que as missões jesuíticas dos Montes do Castello, em 1625, contavam com cerca de 3.000 habitantes, uma população
considerável para a época.
Reprodução de partes do Livro Tombo de Itapemirim que se refere às Missões dos
Montes do Castello em 1625.
Descartamos, através de documentos a que tivemos acesso, apresentados acima, a hipótese de povoação da região do Castelo defendida
por Alberto Lamego e Tristão de Alencar Araripe. Agora partiremos para a
questão mais polêmica, que diz respeito ao início dos trabalhos de mineração.
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Gomes Neto defende a ideia de que o descobrimento e a consequente exploração do ouro, realizados pelos jesuítas, foi pouco posterior a
1551, e até a presente data, não temos documento para provar tal afirmação, e dificilmente teremos, o que nos faz buscar a proximidade da verdade
histórica através de indícios.
A busca pelo ouro foi o motor de todo o início da colonização europeias. Sendo assim, é bem provável que aqui chegando, os jesuítas procurassem informações com os índios a respeito da existência do cobiçado
e precioso metal. E este, por não darem o mesmo valor a tal metal, provavelmente, os conduziram até ele. Ou será que foi uma simples coincidência
os jesuítas terem fundado uma importante missão, com cerca de 3.000
indígenas bem na região das minas do Castelo, sem saber da existência
do ouro que havia ali? Temos duas hipóteses para acreditar: a primeira é a
coincidência das aldeias da missão serem justamente no local de existência posterior de ouro. A segunda é a de que os jesuítas realmente exploraram o ouro na região das minas de Castelo. Fica aqui, então, um desafio
para futuras pesquisas sobre o tema.
São fortes os indícios de que realmente os jesuítas exploraram o
precioso metal por aqui. Podemos enumerar alguns motivos para justificar
tal afirmação. Antes da presença do europeu, os índios eram os senhores
de toda região; eles tinham um profundo conhecimento da mesma, amparados em milhares de anos de sua história. Esse conhecimento se estendia
aos minerais e aos locais de sua existência. Sendo os jesuítas possuidores
de uma relação mais próxima com os índios, as chances deles em relação
aos Bandeirantes Paulistas de descobrirem ouro em Castelo foram muito
maiores. Outro fator que contribui para fortalecer os indícios de que realmente os jesuítas exploraram ouro aqui, foram os motivos que trouxeram
Pedro Bueno Cacunda até a região das minas do Castelo. Alberto Lamego
fala sobre uma conversa de Bueno com Domingos Luiz Cabral que motivou o Bandeirante Paulista, pois se tratava de existência de ouro no rio
Mayguassú (hoje Manhuaçu). Motivado por Cabral, Pedro Bueno iniciou
uma viagem que termina nas serras do Castelo. Essas informações são
um tanto quanto vagas, o que abre espaço para os indícios de que Pedro
Bueno já sabia da existência das minas. Se já circulava a notícia a ponto
dos Bandeirantes ficarem sabendo, é porque já existia mineração. Logo,
esta era executada pelos jesuítas, ou a mando dos mesmos, visto que
eram eles que controlavam a região.
Se houve mineração por parte dos jesuítas, esta, com certeza, foi de
caráter clandestino, pois não era esse o motivo oficial da presença deles no
novo mundo. Os jesuítas atravessaram o Atlântico para salvar, catequizar
almas para o Senhor Jesus Cristo através da conversão dos infiéis indígenas, e não para garimpar riquezas mundanas. O provável desvio de função
dos jesuítas foi clandestino, logo se torna uma tarefa inútil buscar documentos que provem tal ação. Outra razão da clandestinidade era evitar
uma corrida nas regiões das minas, motivada pela cobiça dos aventureiros.
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O poder dos jesuítas neste período era muito grande, podendo a Ordem
ser considerada um Estado dentro do próprio Estado. E, com tanto poder,
os Inacianos não iriam querer entregar nem ao Estado, nem a aventureiros,
as riquezas que porventura descobrissem.
Em 1734, Pedro Bueno envia uma carta ao Rei pedindo auxílio em
seus trabalhos de mineração no Castelo. O Rei atende ao pedido ordenando que o Vice-Rei, Conde de Sabugosa, o ajudasse. Mas este, a pedido
dos jesuítas, não cumpriu as ordens reais, frustrando assim, as aspirações
do Bandeirante Paulista. Esta intervenção pode claramente ser interpretada como uma vingança dos jesuítas por terem perdido o domínio sobre as
minas do Castelo.
Não é possível darmos definições totalmente precisas a respeito
do assunto, mas mesmo assim, buscaremos sintetizar o que defendemos.
Existem provas documentais (Livro Tombo da Paróquia de Itapemirim) de
que o início do povoamento na região das serras do Castelo foi o começo
do século XVII. Este povoamento pode ter sido iniciado antes, já que em
1625, as Missões de Montes Castello já contavam, inclusive com igreja.
Existem fortes indícios de que os trabalhos de mineração tenham iniciado
ao mesmo tempo do povoamento. Devido às fortes evidências, passaremos a considerar, de agora em diante, que realmente houve exploração de
ouro por parte dos jesuítas na região das minas do Castelo.
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IV – OS GRUPOS HUMANOS QUE FIZERAM
A NOSSA HISTÓRIA
4.1 – Por que os índios brigavam?
A exploração do ouro nas serras do Castelo nunca foi uma atividade
pacífica e tranquila. Inúmeras lutas foram travadas entre europeus e índios,
onde os últimos quase sempre levaram vantagem. Esta afirmação torna
a história de Castelo um tanto quanto atípica, pois o que aconteceu em
grande parte do Brasil foi justamente o contrário, ou seja, os índios foram
amplamente dominados pelos portugueses, tiveram sua cultura destruídas, além de terem sido usados como escravos por eles. É bem verdade
que esta supremacia foi efêmera, pois não tardou a extinção dos puris-coroados em nossa região. Contudo, não podemos deixar de registrar as
históricas vitórias dos puris-coroados contra invasores de suas terras que
buscavam delas tão somente a exploração das riquezas. Não foram poucas as vezes que os exploradores de ouro tiveram que voltar para o litoral
devido ao ataque dos índios. Porém, o mais contundente se deu em 1765
quando os habitantes fugiram com todos os paramentos da Igreja de Nossa
Senhora do Amparo. O sino, a pia e a própria imagem de Nossa Senhora
que foram levados durante a fuga, acreditamos que se encontram, ainda
hoje, na paróquia de Itapemirim.
Ao dedicarmos uma parte de nossos estudos ao índio na história de
Castelo, enfrentamos uma certa dificuldades, pois tudo que encontramos
sobre o tema é a versão do vitorioso, do conquistador, mas faremos o possível para resgatar a imagem do índio na história de Castelo de forma mais
justa. Nossa história não começa quando os primeiros jesuítas aqui chegaram para fundaram suas missões nas serras do Castelo, mas sim milhares
de anos antes, quando os primeiros índios por aqui começaram a circular e
a viver livremente. Desta forma é muito mais que natural e compreensível a
ação agressiva dos índios contra os portugueses, pois estavam a defender
milhares de anos de histórias vividas nesta região.
É bem provável que os brancos tenham chegado às minas do Castelo trazidos pelos próprios índios, pois os milhares de anos aqui vividos lhes
proporcionaram um inigualável conhecimento da região, sabendo inclusive
onde se encontrava o ouro, o que não podiam imaginar os aborígenos,
e o que desencadearia a presença do branco em seu meio, ameaçando
inclusive a sua própria sobrevivência, ameaça essa que se confirmou posteriormente. Mais do que uma batalha por pequenos pedaços de terra, ou
pequenos desentendimentos entre índios e europeus por motivos fúteis, a
luta entre ambos representava a disputa entre dois mundos completamente
opostos que não poderiam coexistir fraternalmente, pois um sucumbiria, e
outro resistiria. Sendo assim, prevaleceu o europeu, e consequentemente
o indígena sucumbiu. É justamente nestes dois mundos antagônicos que
iremos mergulhar a partir de agora.
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O que os índios achavam dos brancos? O que os brancos achavam
dos índios? É em busca destas respostas que nos remeteremos aos opostos mundos que fazem parte da história de Castelo. Não dispomos de muito
material específico sobre o assunto, então nos basearemos em fontes mais
genéricas, mas estaremos nos esforçando para que partindo do geral, possamos atingir o específico. Mergulhemos no universo do índio:
“Para os índios que ali estavam nus na praia,
o mundo era um luxo de se viver, tão rico de
aves, de peixes, de raízes, de frutas, de fibras,
de sementes, que podia dar a alegria de caçar,
de pescar, de plantar e colher a quanta gente
aqui viesse ter na sua concepção sábia e singela, a vida era dádiva de deuses bons, que
lhes doaram esplêndidos corpos, bons de andar, de correr, de nadar, de dançar, de lutar...
bocas magníficas de degustar comidas doces
e amargo, salgados e azedos, tirando de cada
qual o gozo que podia dar. E, sobretudo, sexos opostos e complementares, feitos para a
alegria e o amor”.
RIBEIRO, Darci. “O Povo Brasileiro”, os.44/45.
Ninguém melhor do que Darci Ribeiro para falar a respeito do índio
brasileiro, a quem dedicou boa parte de sua vida. Através desta pequena
visão extraída da obra acima citada, podemos ter a exata dimensão de
como vivia e pensava o índio. Apesar da abordagem ser dirigida ao índio
da costa, podemos entendê-la aos índios do sertão. Não se trata aqui de
santificar a imagem do índio, mas apenas a verdade histórica e estabelecer
um tratamento, mesmo que tardio, mas justo aos aborígenes.
Os índios não entendiam por que os brancos estavam afoitos e se
prendiam tanto com fazimentos para acumular e guardar, pois para os índios o prazeroso não era juntar para si, mas sim realizar o intercâmbio, a
troca, a permuta.
A visão do branco sobre o índio está descrita na grande maioria
dos livros de história que tratam deste período. Para o branco, o índio era
preguiçoso, pois trabalhava como ele e não tinha preocupação em acumular; era também um herege, pois adorava a vários deuses e não apenas
ao seu, que era verdadeiro; era promíscuo, pois andava nu e tinha várias
mulheres.
“Os recém-chegados eram gente prática, experimentada, sofrida, cientes de suas culpas
oriundas do pecado de Adão, predisposto à
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virtude com clara noção dos horrores do pecado e da perdição eterna”.
RIBEIRO, Darci. “O Povo Brasileiro”, p.45.
Os homens que aqui chegaram vindo da Europa, e também os bandeirantes e aventureiros que exploravam ouro nas minas do Castelo, tinham como objetivo principal o enriquecimento rápido; algumas tinham o
objetivo de voltar, no caso dos portugueses, para a Europa onde poderiam
viver confortavelmente o resto de suas vidas.
Dois mundos, que além de diferentes eram opostos, só poderiam
gerar o que aconteceu: conflitos sangrentos. No caso específico das minas
de Castelo, os índios tiveram muito mais sorte do que os do litoral, pois
esses foram logo massacrados ou catequizados, (um ou outro para eles
fazia pouca diferença, já que a catequese do branco europeu os limitava
no que tinham de melhor que era uma alma livre, feliz e pura de culpa e de
pecados). Já os nossos índios obtiveram alguns êxitos iniciais na defesa
de sua existência. Isso graças ao conhecimento de como viver e combater
nas selvas, e também ao pouco número e despreparo dos bandeirantes e
aventureiros do ouro. Quando lutavam e expulsavam os brancos das serras do ouro para o litoral, os índios não estavam atrapalhando o progresso
da região, mas sim tratando de manter vivo seu mundo (coisa que seria
impossível com a presença dos exploradores do ouro) e sua própria sobrevivência. Caso os índios não tivessem apenas obtido pequenas vitórias,
mas sim a vitória total, que seria a imposição aos exploradores da época
do seu tipo de vida, hoje, provavelmente, teríamos um mundo mais fraterno
socialmente e, com certeza, mais autêntico.
Não queremos emitir juízo de valor quanto a verdadeira intenção
dos jesuítas na catequese dos índios brasileiros, mas não podemos negar
seu efeito devastador sobre os mesmos, que lhes tirava a identidade, a
beleza e os enchiam de pecado e de culpa. Os jesuítas estavam imbuídos
do espírito semelhante ao dos cruzados europeus que partiam rumo à terra
santa, no século XI, para combater e converter o inimigo infiel.
As perspectivas dos índios eram mesmo sombrias, pois se escapassem das missões teriam grandes chances de serem escravizados pelos
homens brancos, fossem eles capitães do mato, bandeirantes ou donos do
engenho. Se para os jesuítas, os índios deviam ser catequizados e evangelizados, mesmo que à força para viverem como operários nas missões,
para os desbravadores, eles não passavam de mulas de cargas, e eram
mais semelhantes a bicho do que a gente. Em carta endereçada a El Rei,
datada de 15 de julho de 1694, Domingos Jorge Velho diz que “em vão
trabalha quem os quer fazer anjos, antes de os fazer homens”.
Este impasse sobre o que fazer com o índio ante os jesuítas e os
homens responsáveis pelo “progresso” da colônia gerou muitas brigas mediante a esta trágica situação dos índios em quase toda a colônia. Po-
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demos afirmar que os índios das serras do Castelo foram extremamente
valentes e corajosos, pois por várias vezes, conseguiram expulsar tanto os
jesuítas, como os mineradores de ouro.
Podemos concluir finalmente que não se tratavam de bons ou ruins,
de trabalhadores ou preguiçosos, de selvagens ou civilizados, de cristãos
ou hereges, mas sim de dois mundos opostos que se enfrentavam, cada
qual com seus valores e estilos de vida diferentes, onde acabou prevalecendo o europeu. Foi uma batalha desigual, pois os europeus estavam em
estágio de desenvolvimento, diferente dos índios em vários aspectos, inclusive no de guerrear; sem falar na guerra bacteriológica, onde uma simples
gripe matava toda uma aldeia. Isto explica então as lutas em que cada um
defendia seus interesses: os brancos, a busca por riqueza e glória através
do ouro; os índios, a continuação da vida em harmonia com a natureza e
consigo mesmo, além de uma sociedade muito mais justa, por ser bem
menos estratificada.
Agora podemos responder a pergunta título “Por que os índios brigavam?”. A luta era pela sobrevivência, que por sinal, não aconteceu. O
massacre dos índios foi imprescindível para o surgimento do mundo tal
como ele é hoje. A destruição de sua forma harmônica de vida, não só nas
minas do Castelo, mas em todo continente americano, foi um pré-requisito
ao parto da sociedade castelense, espírito-santense, brasileira, enfim, no
capitalismo mercantil.
Para sabermos com maiores informações sobre os índios que habitavam este região, hoje município de Castelo, seria necessário e importante dar continuidade às pesquisas arqueológicas e antropológicas, o que
com certeza, elucidaria muito sobre a vida dos nosso primeiros habitantes.
Não sendo isso possível a curto e médio prazo, neste livro não teremos
essas detalhadas informações. Mas, quem sabe outras pessoas tenham
oportunidade para realizarem as pesquisas de forma mais aprofundada
para conhecermos um pouco mais sobre nossa história. Certamente seremos nós quem ganhará com isso.
Buscamos, então, retratar aqui as únicas informações que temos
sobre nossos índios, transcritas do livro Tombo de Itapemirim. Lembramos
que esta era a visão dos jesuítas que aqui chegaram para a catequese dos
nativos.
As missões de Montes Castello foram muito perseguidas pelos “bugres botocudos, assim chamados por causa de seus adereços, madeiras
enfiadas nos lábios e orelhas”. (Livro Tombo)
Por mais que os jesuítas tentaram, não conseguiram a mansidão
destes nativos, que por várias vezes se revoltaram contra a presença de
brancos na região, que viram obrigados a fugir para o litoral.
“Os índios habitavam uma grade gruta de vários compartimentos espaçosos onde colocavam os cadáveres untados por tal tinta que os
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tornavam ressequidos os esqueletos e também uma fonte cujas águas novas se conseguiam as curas.
Quando um bugre adoecia, aplicava-se todas
os remédios, e, mesmo assim, a doença permanecia, era conduzido à fonte onde o pajé
era consultado, e todo um ritual de cura acontecia. Se o pajé tiver bom agouro, o doente
era lavado com a água da fonte, mas, se o
agouro não era favorável ao mesmo ou se por
ocasião do conduzido enfermo aparecesse no
caminho o “anhangá” – espírito mal que adoecia à noite – e o “manhagiguará” - espírito mal
que andava de dia nas grunhas, o enfermo era
sem piedade atirado e abandonado à beira da
fonte e ali perecia”.
Livro Tombo: Itapemirim
4.2 – Os Jesuítas
O Brasil é um país onde a religião da maioria da população é a Católica Apostólica Romana. Como explicar, não só o catolicismo, mas o fervor
religioso que move o povo brasileiro espalhado pelo país afora? Afinal, antes dos portugueses, nossa extensa terra era habitada pelos nativos, que
eram adeptos de uma religião que nada se assemelha à dos europeus; sua
cultura era totalmente diferente daquela que havia chagado à sua terra. O
que aconteceu então? Como nos tornamos cristãos?
A explicação fica simples se analisada no contexto da chagada dos
europeus ao Novo Mundo e dos portugueses ao Brasil.
A Igreja Católica absoluta desde o período medieval, Senhora das
Almas e do poderes políticos e econômicos, não se encontrará nesta mesma posição no período em que as Grandes Navegações acontecem no
final da Idade Média. Agora, os interesses e as necessidades são outras. A
expansão marítima vai acontecer atendendo a uma conciliação de interesses dos mais diferentes grupos: burguesia, nobreza, Estado e Igreja.
A presença da Igreja, desde que por aqui chegaram os primeiros
portugueses, ainda na Esquadra de Pedro Álvares Cabral, quando o escrivão Pero Vaz de Caminha escreve ao rei sugerindo que:
“O melhor fruto que nela (a nossa terra) se
pode fazer me parece que será salvar esta
gente e esta deve ser a principal semente que
Vossa Alteza em ela deve lançar”
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Aqui entra em cena a Cia de Jesus, idealizada e criada por Inácio de
Loyola em 1537. A Ordem seguia um estilo de vida semelhante ao existente
no exército, eram chamados, inclusive, de “Soldados de Cristo”.
“A Companhia de Jesus era uma força vigilante, equiparada com uma couraça “celestial” e
asas “espirituais” para a conquista das Almas
perdidas para o protestantismo e para a conquista das Almas perdidas para o paganismo.
A Companhia, categórica na obediência que
devia ser geral ao Papa, foi a força internacional da Igreja e desenvolveu uma ação preponderante na extensão do domínio católico, na
instrução da mocidade católica e em atrair a
atenção e a devoção dos reis e nobres, tão ativa no campo de batalha europeu da fé católica
como na Missões do Norte da África, da Ásia
e da América”.
GREEN, Ano: 201
Os jesuítas vieram para difundir a fé católica. Num momento em que
a Reforma Protestante trouxe a cisão da Igreja no Continente Europeu, era
preciso resgatar a importância de outrora, para isso a Igreja criou a Contra-Reforma Católica. Segundo o professor Celso Perota, os jesuítas vieram
para fundar um República Jesuítica.
Sem dúvida, os jesuítas tiveram uma participação muito ativa na
história dos países europeus à época da Contra-Reforma Católica em que
a Igreja buscava, a qualquer custo, evitar a expansão do movimento reformista protestante que arrebatou da Igreja Católica muito mais que fiéis,
arrebatou poder e importância política, e paralelamente, poder econômico.
A presença dos jesuítas no Brasil atendeu, portanto, às necessidades da Santa Sé, que na Europa, em função dos prejuízos religiosos, políticos e econômicos que a Reforma Protestante acarretara no Continente, via
necessária a vinda para a Terra recém-descoberta. E a Igreja precisava não
só deter a expansão da Reforma, mas também se reestruturar. As novas
terras poderiam suprir estas necessidades.
Vir para o Brasil, dentro do contexto da Contra-Reforma, seria a
saída para impedir que os efeitos arrasadores da Reforma chegassem às
Terras recém-descobertas, para aumentar o número de fiéis católicos e
para a reorganização político-econômica.
Os jesuítas estiveram presentes desde o início da colonização. Sua
chegada aqui data do ano de 1549, ano de fundação do 1º Governo Geral
do Brasil, a cargo de Tomé de Souza, fundando missões e desenvolvendo
o seu trabalho de catequese, ao que avaliamos, acarretou um processo de
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aculturação profunda nos grupos nativos que aqui viviam. A catequese se
incumbiu de formar novos católicos. O Deus que conta é o dos europeus, o
caminho da Santidade só é conhecido por eles, colonizadores desse mundo bárbaro.
Nas missões, o empenho não era somente com a educação dos
nativos. Sua organização era bastante original. Os padres iam entrando
nas aldeias procurando respeitar a organização tribal e, pouco a pouco,
introduzindo os princípios religiosos e os interesses econômicos.
O excedente de produção, que crescia com o estímulo dos sacerdotes e em função de seus interesses, era apropriado pelas Ordens religiosas, que muitas vezes, realizavam com o “mundo civilizado” um lucrativo
comércio.
A ideologia, contudo, já havia sido incorporada à formação social
do Brasil. Assim como a Igreja precisava dos jesuítas aqui, o Estado também os queria, uma vez que com seu trabalho junto aos nativos, havia
uma facilitação da penetração portuguesa na nova terra na formação do
Império Colonizador. Para este propósito, os jesuítas foram essenciais, sua
importância foi de serem peças-chaves no contexto da expansão marítima
e da colonização do Brasil. Seu poder de influência junto ao poder político
foi tão grade, que era a eles que recorriam muitas autoridades coloniais,
quando havia necessidade, e não ao Governador Geral, e muito menos, ao
Rei em Portugal.
Desde muito cedo, houve o contato dos padres também com os
bandeirantes, em expedições que levaram ao interior do território, a possibilidade de metais preciosos. Mas, para que os jesuítas os acompanhavam? Atendiam, na realidade aos interesses dos dois grupos: - dos bandeirantes, que viam na presença dos padres em suas expedições uma forma
dos nativos aceitarem a aproximação “dessas gentes”, o que não necessariamente contribuiu para facilitar o encontro do metal por parte dos nativos,
que não o valorizaram. Se o resultado não foi logo positivo, com certeza,
estas expedições muito contribuíram para o conhecimento das terras do
interior, da fauna, da flora, permitindo a formação de novas expedições
por aqueles caminhos; - como os dos jesuítas, que buscavam almas para
serem catequizados e viam nessas buscas dos metais uma maneira de
gente branca vir para o Brasil, que sabemos, no início da colonização era
muito escassa. Essa vinda acarretaria a facilitação da cristianização junto
aos nativos.
É claro que também havia possibilidade de encontrar metais. No
livro de Serafim Leite, sobre a História da Cia de Jesus no Brasil, o autor
afirma que os padres tinham o único interesse de achar almas e em algumas citações até coloca que eles não iam às expedições com o objetivo de
explorarem metais preciosos, sendo, porém, tentados a isso.
Parece-nos muita coincidência que em Castelo, no séc. XVII, tenha
havido a presença dos padres fundando missões, onde exatamente se explorou ouro mais tarde, no início do sec. XVIII.
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Fica aqui também uma dúvida a respeito de sua montagem mais
para o interior, nas Serras do Castelo, quando aqui no Espírito Santo observarmos que as missões foram montadas no litoral, como as de Reritiba,
Orobó, Muribeca, conforme nos mostra o mapa a baixo.
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4.2.1 – Os Jesuítas no Espírito Santo
Os primeiros padres jesuítas (Padre Afonso Brás e o irmão Simão
Gonçalves) chegaram ao Espírito Santo em 1551 e já começaram a construção do Colégio Santiago, hoje Palácio Anchieta, sede do Governo do
Estado.
Os objetivos aqui eram os mesmos da Cia de Jesus no Brasil: através da catequese do índio e da educação aos filhos dos colonos, aumentar
o número de fiéis católicos devido às perdas em função da Reforma Protestante, objetivo primordial. Sendo assim, os padres iam ao interior do território capixaba e de lá traziam os grupos indígenas paras as missões como
as de Goarapari, Reritigba, Reis Magos, Aldeia Nova, Caobá. Serafim Leite
escreveu na história da Cia. De Jesus no Brasil:
“algumas vezes, iam os padres em pessoa ao
sertão buscar os índios ou os parentes dos
que já viviam no ES, e iam a mais de cem léguas por caminhos ásperos...”, assim “(...) as
aldeias do Es formaram-se quase sempre a
seguir a alguma entrada ao sertão.”
LEITE, Serafim Teixeira. “História da Companhia
de Jesus no Brasil”. Lisboa, 1938 – Tômo VI – Cap.
I, II, III
É certo que além das obras de catequese, os padres desenvolveram também atividades de organização e de produção econômica, como
nas aldeias de Itapoca, provavelmente em Cariacica, especializada na produção de farinha e de produção de gado. A de Araçatiba, em Viana, onde
havia a produção de cana-de-açúcar; a de Carapina, que se destinava à
produção de legumes.
Nas aldeias jesuíticas, além da produção religiosa e econômica,
havia também a arquitetônica, com construções de várias igrejas e residências, como a de Nossa Senhora de Assunção, em Anchieta; a de Nossa
Senhora da Conceição, em Guarapari; a de Nossa Senhora da Ajuda, em
Araçatiba – Viana; Igreja de São Riago em Vitória.
Algumas dessas construções ainda resistem ao tempo, como a Igreja de Nossa Senhora das Neves, em Presidente Kennedy, construída em
1650, com a ajuda dos índios botocudos, e também a Igreja de Nossa Senhora da Conceição, construída no séc. XVI pelo poder de José de Anchieta, com a ajuda dos índios tupis-guaranis, utilizando como material: pedras,
blocos de recife, óleo de baleia e argamassa de cal e mariscos. Em Guarapari, encontra-se a Igreja de Nossa Senhora da Consolação, construída por
Anchieta. Sua fachada é revestida de conchas que remodelam as paredes.
Em Viana, a Igreja de Nossa Senhora da Ajuda, datada em 1570. Em Carapina, a Igreja de São João de Carapina. E, em Nova Almeida, na Serra,
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Igreja e residência Reis Magos, erguida entre 1569 e 1589.
Em vários pontos do nosso litoral, em algumas cidades e construções, é notória a importância dos jesuítas em nosso Estado.
No livro “Tombo de Itapemirim” (Comarca Eclesiástica de Itapemirim), encontramos a descrição precisa das missões organizadas pelos jesuítas em Castelo, na pag. 03 do referido livro, registrou-se com minúcias
a presença dos padres em nosso município.
A construção de uma Igreja dedicada à Nossa Senhora do Amparo,
em novembro de 1625, nos Montes do Castello, sugere-se, inclusive, que
eles chegaram aqui antes desta data, mas não temos documentos para
comprovar o ano exato de sua chegada.
Os jesuítas construíram aqui em nossa região a chamada “Missões
de Montes Castello”, que compreendia cinco missões:
1. Montes do Castello. (sede) – “Ignora-se sua posição por não
haver vestígio dela; ficava, porém, muito próxima à do Caxixe.
2. Caxixe ou Caxixa – à margem do rio Caxixe – um dos afluentes
do Castello.
3. Ribeirão – Á margem do Ribeirão – um dos afluentes do Castello.
4. Barra do rio Castelo – à foz do rio Castello – afluente do Itapemirim.
5. Salgado – À margem do Ribeirão – Salgado afluente do rio
Itapemirim.”
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4.3 – Os Mineradores
Em nosso trabalho buscamos a veracidade e a autenticidade da
história de Castelo, ou seja, queremos analisá-la dos mais diversos ângulos possível. Sendo, assim, procuremos a seguir, traçar o perfil do homem
branco, seja ele europeu, ou mesmo brasileiro, que aqui se encontrava no
início da mineração nas serras do Castelo. Trataremos inicialmente dos
europeus, mais precisamente dos portugueses, e posteriormente, de seus
descendentes nascidos aqui, a quem Darci Ribeiro chama de “brasilíndios”.
O povoamento, propriamente dito, da Capitania do Espírito Santo
aconteceu na primeira metade do séc. XVI em 23/05/1535, com a criação
das Capitanias Hereditárias e consequente vinda de religiosos ( os jesuítas) e povoadores, que em sua maioria, eram degredados.
Como sabemos, os registros mais antigos da presença de europeus
na região que compreende Castelo hoje, são de 1625, quando se fundaram três missões jesuíticas. Tais missões eram formadas basicamente por
Missionários Inacianos oriundos da Europa, índios, e também por uma população de colonos. Mas, num primeiro momento, trataremos do europeu.
Ao se lançar no mar bravio e ainda pouco conhecido, sujeito a todos
os riscos e problemas, o aventureiro europeu tinha um claro objetivo: o enriquecimento através do descobrimento de metais preciosos. O português
vinha de uma sociedade estratificada, que já havia rompido com o mundo
feudal europeu e se constituído em Estado Nacional. Toda essa estratificação, tipicamente europeia, contrastava drasticamente com o modo de vida
tribal dos trópicos. As ações dos portugueses haviam sido previamente planejadas, e o seu centro de decisão estava milhares de quilômetros de distância, mais precisamente em Lisboa; tal situação dava-lhes uma grande
autonomia no Novo Mundo.
Os pilares básicos que sustentavam a ação dos portugueses no
Novo Mundo foram o Estado Nacional Mercantilista, com seu poder bélico
em busca de lucro, e a Guerra-Santa, promovida pela Igreja contra o índio
infiel. Os europeus se outorgaram a missão de expandir a cristandade,
missão essa que não era apenas dos missionários jesuítas, mas de todos
que atravessavam o Atlântico rumo ao Novo Mundo. Desta forma se legitimava as mais bizarras atitudes dos portugueses aqui, pois tudo era com o
propósito de conseguir mais almas para o Senhor.
O outro pilar era de caráter mais econômico e racial do que o Estado Nacional. Neste período, a Igreja concentrava em suas mãos o poder
espiritual e também o temporal. Desta forma, seu poderio pairava acima
dos Estados Nacionais Mercantilista. Tanto Portugal, como a Espanha, a
mesmo a França, eram submissos ao poder temporal do Vaticano. Uma
questão que incomodava Portugal, e consequentemente seus aventureiros
que aqui estiveram, era a disputa por colônias entre Estados Nacionais
Europeus, que viviam em eterno conflito na busca por riquezas que as
colônias pudessem oferecer. Rechaçar, as por eles consideradas invasões
dos estrangeiros, era também uma das funções dos aventureiros.
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Os portugueses que atravessaram o Atlântico e chegaram até aqui
também estavam eufóricos e orgulhos com os avanços tecnológicos da
sociedade europeia, como o barco à vela, a bússola, o leme fixo e o astrolábio. Essas invenções representavam a tecnologia de ponta da época, e
estava a serviço do mercantilismo, e foi através delas que eles conseguiram cruzar o Atlântico.
De forma bastante sucinta, este era o universo destes corajosos
aventureiros e gananciosos europeus que abandonaram a certeza de sua
terra natal para se lançarem rumo ao desconhecido através do mar, alimentando um febril sonho de riqueza. Mas nem só de homens provenientes do
Velho Continente foi que se empreendeu a extração de ouro em nossas
terras, pois os aqui nascidos tiveram uma participação direta, e são eles
nossos objetos de estudo a seguir.
Dentro da divisão de trabalho da época, a pior parte, com certeza,
cabia aos “brasilíndios” – ou mestiços. É provável que se tenha usado também a mão-de-obra indígena. Quando delimitamos o início da mineração
em Castelo, afirmamos ser provável que os jesuítas exploraram ouro aqui
a partir de 1625 utilizando-se da mão-de-obra indígena.
Uma das características mais marcantes da colonização de exploração, como foi o nosso caso, é a não presença de mulheres dentre os exploradores. Tal característica foi fundamental no processo de formação do
povo brasileiro. Na ausência de mulheres portuguesas, os homens brancos
buscavam a satisfação de seus desejos sexuais com as índias, e destas
relações surgiam os “brasilíndios” ou mestiços. Para muitos pesquisadores
foi aí o início da formação do povo brasileiro. Os frutos destas inusitadas
relações sofriam uma dupla rejeição de brancos e índios, forçando assim
a criação de uma identidade nova e inédita. Os portugueses não os reconheciam como os filhos legítimos, aptos a dar continuidade à tradição ocidental europeia, que tanto primava pela filosofia e conhecimentos nos mais
distintos campos, sejam eles da Física, da Matemática, da Astronomia ou
de outros. Esses filhos ilegítimos não eram dignos de serem considerados
europeus, já que seu ventre materno era impuro e selvagem.
Por outro lado, os índios também não os reconheciam como sendo
membros de suas tribos, pois dentro da tradição indígena, a mulher ocupa
um papel coadjuvante na reprodução, atuando como simples depositária
de esperma. Para eles, o filho ou a filha é resultado da ação do pai. Assim
sendo, os mestiços ou “brasilíndios” eram considerados estranhos. Enquanto dois mundos distintos e opostos se digladiavam para sobreviverem,
um novo povo nascia, fruto da rejeição que sofria dos dois lados, e teve
que criar, a duras penas, sua própria identidade. Essa inusitada situação
chegou a despertar a preocupação dos jesuítas, que para tentar impedir a
“promiscuidade” dos homens brancos com as índias, mandaram uma carta
ao rei de Portugal solicitando o envio de mulheres brancas à colônia, mas
tal pedido não obteve êxito.
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Castelo teve pioneirismo na interiorização, foi um processo único
em termos de fixação de população do Estado. Nossa minas presenciaram
tal processo. Quanto à existência das primeiras missões jesuíticas, elas se
formavam de índios (índias), jesuítas e colonos, que foram os ingredientes
necessários para a formação inicial do povo brasileiro. Com a chegada
das Bandeiras, já no século XVIII, por volta de 1705, com Pedro Bueno
Cacunda, esse processo se acelerou devido ao aumento do contingente
populacional, e também graças à origem das Bandeiras, que eram de São
Paulo. Os Portugueses de Capitania de São Vicente foram os pioneiros na
gestação dos “brasilíndios” ou mestiços devido à pobreza e ao isolamento
de sua capitania, pois não havendo outra fonte de recurso econômico, eles
recorreram às Bandeiras, que tinham como propósito, além da busca de
metais preciosos, o aprisionamento, a escravidão e a comercialização dos
indígenas. A presença dos “brasilíndios” era fundamental nessas campanhas, pois devido a sua robustez e busca de autoafirmação, eles se tornaram o motor da conquista do interior do Brasil, participando ativamente das
atividades de mineração e captura de índios. É importante destacar que
a língua falada por índios, jesuítas, colonos europeus e “brasilíndios” era
o tupi-guarani, que foi o meio de comunicação usado em toa colônia até
meado do século XVIII.
De forma sintética, e não incluindo os índios que já circulavam nesta
região há milhares de anos, podemos afirmar que os primeiros habitantes
de Castelo foram os jesuítas provenientes da Europa, de onde traziam um
rígido de moral e valores. E, através deste código, queriam julgar e condenar os índios, para aí sim catequizá-los a ferro e a fogo, e transformá-los
em cristãos. Havia também poucos portugueses sonhadores que buscavam riqueza e glória na colônia para desfrutar na metrópole, mas a maioria
da população era formada por “brasilíndios” ou mestiços, que sofriam uma
dupla rejeição por parte dos brancos e índios, e que a partir da estranheza
que causavam em ambos, criaram sua própria identidade. E foram justamente eles que efetuaram diretamente a lida com a mineração do ouro.
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V- A EXPLORAÇÃO DO OURO EM CASTELO
5.1 – A Mineração em si
Nesta parte do livro trataremos da mineração propriamente dita e
de seus desdobramentos em nosso município. O ouro descoberto em Castelo é, em sua maioria, o de aluvião, que se encontra nos leitos dos rios
misturados em suas areias. Ele é arrecadado em pequenos fragmentos
das rochas pela força das águas dos rios, é a medida que vai descendo
o leito, transforma-se em pequenos grãos, que posteriormente viram pó.
Este pó fica cada vez mais fino, na proporção da distância de seus veeiros
iniciais. Os veeiros auríferos encontram-se disseminados nos granitos que
constituem os maciços da Pedra Azul e Forno Grande. Portanto, nos rios
que nascem nesta região pode se encontrar ouro.
As inúmeras cachoeiras que existem, principalmente no rio Caxixe,
além de proporcionarem um exuberante espetáculo da natureza, facilitaram o trabalho de garimpagem do precioso metal. Apesar de poucas, existem algumas planícies onde o rio corre manso e aparentemente inofensivo,
e é justamente nesses locais de água tranquilas que o ouro (em pequenos
grãos ou pó), fica depositado no fundo do rio. Na localidade chamada Caxixe, hoje Fazenda Povoação, existe uma destas pequenas planícies, onde
segundo Gomes Neto, foi o primeiro local de extração de ouro em Castelo.
Em 1625 esta planície foi palco de uma das quatros missões jesuíticas em
nosso cidade. Outro local com características geográficas semelhantes, é
onde se localiza hoje a Fazenda do Centro; nos dois lugares o leito do rio
foi alterado para facilitar o trabalho de garimpagem do ouro, na época da
exploração.
Para proporcionar uma melhor compreensão do leitor, e até mesmo
balizar estudos posteriores, decidimos dividir a mineração de Castelo em
três fase ou períodos.
A primeira é a mais polêmica: segundo o Major Gomes Neto, teve
início logo após a fundação de Rerigtiba (hoje Anchieta) 1565; ele ainda
afirma que esta missão tinha por objetivo, além da catequese dos índios,
proteger dos invasores as minas do Castelo. Apesar de um tanto quanto
pertinente, não temos provas documentais a respeito da versão de Gomes
Neto. Os documentos que encontramos falam a respeito da existência de
missões jesuíticas aqui somente 100 anos depois, a partir de 1625.
A segunda fase ou período inicia-se em 1705, com a chegada do
Bandeirante Pedro Bueno Cacunda. Ao que tudo indica, esta foi a fase
mais próspera e que contou com a presença de um maior número de pessoas; finalizou-se com a expulsão dos exploradores efetuada pelos índios.
A terceira fase é a mais recente, e compreende a retomada dos
trabalhos de mineração já no século XIX, no fim do período colonial e início
do imperial. Os trabalhos foram reativados após um longo período de abandono, quando os botocudos reinaram soberanos.
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Dedicaremos nosso trabalho a seguir à primeira fase da mineração
tomando como base os escritos de Gomes Neto, pois apesar de seus relatos não terem respaldos documentais, algumas de suas afirmações estão
de acordo com nossas fontes.
5.1.1 – Primeira Fase – séc XVII
Segundo Gomes Neto, logo após a fundação de Rerigtiba (1565),
os missionários jesuítas subiram o rio Benevente à procura de ouro e de
selvagens. Com a ajuda de índios catequizados, eles chegaram às minas
do Castelo. Efetuada a descoberta, iniciaram um processo de fortificação
e defesa das minas para evitar a presença dos farejadores de ouro, principalmente dos paulistas.
Ainda segundo Gomes Neto, os jesuítas fundaram pequenos arraiais para protegerem as minas contra os invasores; o primeiro a ser criado foi o Batatal, próximo às minas; depois o do Caxixe e o do Ribeirão do
Meio. Eles permitiram também que o moradores destes povoados faiscassem ouro, para depois venderem aos próprios padres. Desta forma, os
jesuítas transformaram os ingênuos habitantes e defensores de suas minas, pois em caso de invasão, os habitantes rechaçariam o inimigo. Tendo
proteção em todas as barras dos rios que poderiam das acesso às minas,
os jesuítas podiam exercer com tranquilidade sua clandestina função de
mineradores. O ouro, resultado do trabalho da mineração dos jesuítas, ia
diretamente para a sede da Ordem dos Inacianos na Europa.
De fato, as missões citadas por Gomes Neto existiram, para tanto
existem provas documentais. A divergência acontece com elação à data,
pois o que ele afirma ter sido realizado no século XVI, por volta de 1565, o
documento descreve que foi no século posterior, ou seja, 1625. Tal divergência só pode ser esclarecida comum minucioso trabalho arqueológico
nos locais onde teriam sido construídas as missões ou povoados. O que
não podemos negar é que nesta primeira fase, direta ou indiretamente, os
jesuítas exploraram ouro de forma clandestina, ou foi pura coincidência o
fato de os bandeirante “descobrirem” ouro posteriormente nos locais onde
existiam as missões jesuíticas?
Segundo o Livro Tombo de Itapemirim, as cinco aldeias que compunham as Missões de Montes Castello, estavam assim distribuídas: a primeira era a dos Montes Castello, e sua exata localização é desconhecida,
pois não existem vestígios aparentes de suas ruínas. Sabe-se, portanto,
que ficava próxima à do Caxixe. A outra aldeia era a do Caxixa ou Caxixe,
que se localizava próximo à margem do rio Caxixe, um dos afluentes do
Castelo, e sua localização é onde se encontra a Fazenda Povoação. A terceira é a do Ribeirão, localizada próximo à margem do Ribeirão, também
um dos afluentes do Castelo. Essa região é conhecida hoje como Planície da Prata, e compreende as localidade de Monte-Pio, Flores e Prata. A
quarta aldeia é a da Barra do Rio Castelo, que se localizava na foz do rio
Castelo, onde e hoje a localidade de Duas Barras. A quinta e última aldeia
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era a de Salgado, que ficava às margens do ribeirão do mesmo nome, que
era afluente do rio Itapemirim.
A localização da Missões de Montes Castello no mapa, não são
precisas, uma vez que, para tal afirmação serão necessárias pesquisas arqueológicas. As Missões de Barra do Rio Castello e Salgado não constam
no mapa por estarem fora dos limites do atual município.
Nesta primeira fase foi construída pelos jesuítas a Igreja de Nossa
Senhora do Amparo, em 1625. Esta igreja foi elevada à categoria de Matriz, pois a região das minas do Castello foi transformada em Freguesia
sob a proteção de Nossa Senhora do Amparo. Este fato ocorreu em 12 de
novembro de 1710. Não se sabe com exatidão a localização da centenária Paróquia, seguramente uma das mais antigas do Sul do Estado, nem
mesmo como era seu interior e seus aspectos externos. Tais revelações
só poderão ser feitas a partir de um trabalho arqueológico de escavação.
Este trabalho é de grande importância para a elucidação de muitas interrogações sobre a história, não só do município de Castelo, mas também do
Estado do Espírito Santo e do próprio Brasil.
A Missão de Montes Castello, erguida em novembro de 1625, contava com 3.000 índios distribuídos nas cincos aldeias já citadas que compunham a missão. Os documentos se limitam à descrição da experiência da
missão, bem como as aldeias a eles pertencentes. Em nenhum momento
é vinculado o tipo de atividade econômica realizado, e nem se menciona
a existência do poderoso metal no fundo dos rios. Com certeza, a explo-
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ração do ouro foi realizada de maneira clandestina pelos jesuítas, por três
motivos. O primeiro é o fato da mineração não constar no rol de atividades
previstas aos jesuítas no Novo Mundo, e ainda mais, quem procurava ouro
era para se enriquecer, e o enriquecimento não era uma meta a ser seguida por aqueles que outrora haviam dedicado suas vidas à construção
do Reino Celeste, e não às coisas passageiras e materiais deste mundo
transitório. O segundo motivo que fazia com que os Inacianos agissem na
clandestinidade era do de burlar as leis coloniais que previam uma grande
carga tributária sobre a atividade de mineração. Certamente, se a extração
não fosse de maneira clandestina, parte do resultado do trabalho pertenceria à Coroa Portuguesa. O terceiro motivo era o de evitar a invasão das
Minas, principalmente por Bandeirantes, que como já sabemos, perambulavam pelos sertões à procura de índios e metais preciosos. Inclusive, esse
foi um dos motivos, segundo Gomes Neto, da criação dos povoamentos
margeando o rio Castelo visando proteger as Minas. Os jesuítas evitaram
a presença dos Bandeirantes por alguns anos e até décadas, mas não
conseguiram ocultar por mais tempo seu achado, já que no início do século
XVIII, por volta de 1705, Pedro Bueno Cacunda “descobre” o que tanto os
jesuítas buscavam esconder. A partir daí, entramos na Segunda fase da
mineração em Castelo.
5.1.2 – Segunda Fase – séc. XVIII
A segunda fase começa com a presença dos bandeirantes, no nosso caso, Pedro Bueno Cacunda. Esta fase apresenta uma subdivisão:
A - Pedro Bueno explorou ouro na região, de 1705, como temos registros
aqui de sua presença e vai até 1734, quando desanimado e sem recursos
abandonou as minas.
B - Após 1734, quem assumiu a mineração em nossa região foram os jesuítas, que por aqui ficaram até 1759, ano de sua expulsão não só do Brasil,
mas também de Portugal por decreto do Marquês de Pombal. Esta fase foi
monopolizada pelos padres, e parte da riqueza ia para os cofres da Coroa
ou da Companhia de Jesus.
C - Com a saída dos jesuítas, mineração continuou sendo prática entre
os mineradores que aqui ficaram, porém, foram expulsos por duas vezes
pelos índios. A primeira em 1754 e a definitiva em 1771.
A Segunda fase inicia-se com a chegada de Pedro Bueno Cacunda,
o mais importante bandeirante que andou por nossas terras. Em 1705, ele
inicia sua perseguição em busca de ouro pelo interior do Brasil, e chegando à Capitania do Espírito Santo, adquire alguns terrenos e constrói
casas para servirem de base às futuras explorações. Neste período ele
teve contato com o Governador do Rio de Janeiro, Fernando Mathias de
Mascarenhas, que o encorajou em sua missão, afirmando que ele prestava
um grande serviço à Coroa. Outro que encorajou Pedro Bueno foi Domingos Luiz Cabral, que também era explorador de ouro e esteve analisando
as vertentes do rio “Mayguassú” – Manhuaçu (afluente do rio Doce e que
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divide o Espírito Santo de Minas Gerais), e, além disso, o orientou em como
chegar às minas do Castelo.
Ao chegar às Minas do Castelo, Bueno se deparou com os jesuítas, que já exerciam a clandestina atividade da mineração. Porém, não
encontramos relatos a respeito do encontro, mesmo porque, a grande
maioria dos historiadores acreditava na errada hipótese do pioneirismo de
Cacunda. O que sabemos é que os jesuítas eram os senhores da região, e
se julgavam extremamente bem protegidos para exercerem sua atividade
clandestina. Para isso, é bem provável que dispunham de meios (armas
ou não) para repelir os invasores. Por outro lado, os bandeirantes, caçadores profissionais de gente e riquezas, vinham dispostos a tudo para atingir
seus objetivos. Coragem, valentia e espírito de luta eram características
que não faltavam aos bandeirantes que viajavam pelos sertões em grupos
de 20 a 30 pessoas entre índios, chefes das expedições e seus filhos. O
resultado deste provável confronto em que grupos distintos tinham o ouro
como mesmo objetivo é desconhecido. E não são poucas as chances de
ter havido conflito.
Outro capítulo (este documentado) entre bandeirantes e jesuítas na
luta pelo ouro das Minas de Castelo, deu-se no âmbito da influência de
que ambos dispunham nos altos escalões da coroa. Diante das dificuldades proporcionadas pelos índios, irregularidade do terreno e densidade da
mata, Pedro Bueno escreve ao rei em 1734, pedindo ajuda para a continuação de sua empreitada mineradora.
Os pedidos de Bueno eram para serem retirados 60 índios das aldeias de Rerigtiba, dos Reis Magos e de Santo Antônio da Vila de São
Salvador, esta última comandada pelos religiosos de Santo Antônio, e as
demais pelos Inacianos. Seriam retirados 20 índios de cada aldeia, e os
mesmos prestariam serviço ao bandeirante po3 anos. Após este período,
retornariam às suas aldeias (os sobreviventes, é claro), onde seriam trocados por outros 20, e assim sucessivamente. Ele ainda pedia ferramentas
e arma própria para a utilização dos índios, além de pólvora e chumbo.
Por último, Cacunda incluía em seu pedido 80 homens sob as ordens das
Capitanias do Espírito Santo e Paraíba do Sul.
Os pedidos do bandeirante foram bem recebidos pela Coroa, através do Conselho Ultramarino. Tanto é verdade, que em 26 de dezembro
de 1735, foi expedida a ordem ao Provedor da Fazenda da Bahia para
que Pedro Bueno fosse atendido em seus pedidos. O Conde de Sabugosa, segundo a ordem Real, ficou encarregado de arregimentar junto aos
jesuítas, os índios pedidos por Cacunda. Aí entra a influência dos padres
da Companhia de Jesus, que aliados ao poder de convencimento que lhes
era característico, convenceram o então Conde de Sabugosa a desistir de
cumprir a ordem. Sendo assim, o referido conde indefere o pedido e lança
na mesma petição um despacho que diz:
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“A S. Majestade darei conta porque não cumpro a portaria”
LAMEGO, Alberto. “A Terra Goytacá”. Livro II, p.279
Desiludido, Pedro Bueno Cacunda retira-se para o rio Doce, região
onde existiam muitos índios que mataram escravos do bandeirante, impossibilitando o mesmo de exercer a atividade de mineração.
A disputa entre os padres jesuítas e os bandeirantes não foi a única característica deste período que convencionamos chamar de Segunda
Fase da Mineração das Minas de Castelo. Outra característica foi a ciência,
por parte da Coroa Portuguesa, da existência de ouro no interior da Capitania do Espírito Santo.
Um importante bandeirante que passou rapidamente pela Minas do
Castelo e pelo interior da Capitania do Espírito Santo até o Cabo de São
Tomé foi Manuel Francisco dos Santos Soledade. Este português permaneceu, a partir de 1704, por seis anos no interior do Brasil. Com suas bandeiras à procura de ouro, neste espaço de tempo, percorreu três mil léguas.
Ao retornar a Lisboa foi condecorado pelo rei com o Hábito de Cristo, e nomeado em 18 de dezembro de 1730, como Superintendente da conquista
das minas do Brasil.
A Coroa Portuguesa teve uma política confusa com relação a exploração e à descoberta de ouro na Capitania do Espírito Santo. Os portugueses temiam os piratas, já que as minas se localizavam próximo da costa,
facilitando assim a ação de contrabando das demais nações europeias.
Outra preocupação era o desguarnecimento da costa, no caso de uma
corrida de seus habitantes rumo ao interior em busca de ouro. A primeira
proibição para a descoberta e exploração do ouro em nossa Capitania foi
feita em 10 de novembro de 1710, pelo Governador Capitão Geral do Estado do Brasil, D. Lourenço de Almada. A ordem proibia ainda a construção
de qualquer estrada para as Minas Gerais, pois era intenção da Coroa
transformar a Capitania do Espírito Santo em uma grande cerca verde e
desabitada, para proteger dos piratas estrangeiros, as Minas Gerais da
Coroa Portuguesa. Esta tática deixou profundas consequências negativas
no futuro desenvolvimento do Estado do Espírito Santo.
A pena prevista para quem desrespeitasse a proibição era o degredo dos infratores para Angola. Mesmo assim, as explorações não pararam
e eram incentivadas pelo Intendente Geral do Rio de Janeiro. Este fato
descontentava o governo da Bahia, pois as minas não eram adjacentes ao
governo do Rio de Janeiro, e sim ao da Bahia. Apesar da insatisfação dos
baianos, o ouro de Castelo ia mesmo para o Rio de Janeiro, mais precisamente para a Casa da Moeda: de 1º de agosto de 1751 até 14 de julho
de 1759, deram entrada na referida casa 246 marcos, duas onças e uma
oitava de 18 grãos, provenientes das Minas do Castelo. Esta parte é a de
um período restrito, e a que foi quintada, pois acreditamos que boa parte foi
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extraída clandestinamente, graças às dificuldades de controle por parte da
Coroa. O ouro quintado na Casa da Moeda proveniente de Castelo, neste
período, equivale a aproximadamente 58 quilos. Anterior a esta data, mais
precisamente a 1732, o Capital-Mor da Capitania do Espírito Santo, Silvestre Cirne da Veiga, mandou que se quintasse o ouro das Minas do Castelo,
no entanto, não se tem registro a respeito de tal atividade.
Após 125 anos da presença dos jesuítas nas Minas do Castelo e
de exploração de ouro na região, o Ouvidor-Mor do Espírito Santo nomeia
Domingos Corrêa da Silveira, em 1750, como Capitão de todo o distrito das
Minas de Castelo. Mas tal ato contou com o repúdio do governo baiano.
A função a ser desempenhada pelo ocupante do cargo recém-criado era
de pôr fim às constantes desavenças e brigas entre bandeirantes e índios
que viviam e trabalhavam nas minas. Os confrontos entre brancos e índios
eram comuns e não terminaram com a criação do posto de Capitão das
Minas de Castelo.
Foi durante o período B da 2ª fase da mineração que ocorreu a expulsão dos jesuítas do Brasil, e consequentemente de Castelo, resultado
da política pombalina. Os padres jesuítas tiveram que sair às pressas da
colônia, acontecimento que gerou algumas lendas que até hoje circulam
entre habitantes de Castelo, mais precisamente, nas regiões onde ficavam
as minas. As lendas consistem basicamente na existência de tesouros de
ouro escondidos pelo interior do município, além da existência e mapas
para localizá-los. Assim, ligado o fato dos jesuítas terem explorado ouro
de forma clandestina, ao fato de terem sido expulsos repentinamente do
Brasil, fica a pergunta: o que foi feito com o ouro? Basta adicionarmos um
pouco de imaginação para darmos certo crédito à lenda, porém, não é este
o nosso objetivo no momento. Deixemos que os modernos caçadores de
tesouros se preocupem com isso.
A harmonia nunca foi uma característica presente no relacionamento entre índios e garimpeiros. E foi justamente um enfrentamento entre eles
que culminou com a fuga dos brancos para o litoral, deixando os garimpos
das serras do Castelo abandonados. Por se tratar de um fato marcante,
resolvemos utilizá-lo como o marco final da Segunda Fase da mineração.
Sabemos que eram dois mundos que não tinham a mínima chance de coexistirem harmonicamente, por isso, buscaremos relatar o resultado desta
impossibilidade, que foi o confronto final entre eles. Aliás, umas das características dos combates, além da aterrorizadora violência, era a banalidade
devido à frequência com que eles aconteciam.
A vida seguia sua normalidade, quando inesperadamente, um grupo
de índios dava o alarme em forma de gritos. Os habitantes do Arraial se
agrupavam no centro, e armados com trabucos e chuços enfrentavam os
nativos, que disparavam suas flechas mortíferas por todos os lados. Os
índios pareciam ser invisíveis, pois se camuflavam muito bem no terreno
devido ao seu grande conhecimento do local. Ao fim da batalha, os corpos,
dos até então inimigos, se misturavam pelo chão, e o fogo ainda resistia
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em pequenos focos, após devorar algumas choças onde habitavam os garimpeiros. A data exata da saída (ou fuga) dos mineradores das Minas do
Castelo rumo ao litoral não é precisa. Antônio Marins afirma em sua obra,
“Minha Terra e Meu Município”, que tal fato aconteceu entre 1779 e 1780;
Tristão de Alencar Araripe diz que o mesmo fato ocorreu, aproximadamente, em 1771.
Existe uma lenda a respeito dos motivos que levaram os índios a
lutarem até conseguiram a expulsão dos mineradores. Ela conta que tudo
ocorreu porque os garimpeiros cortaram uma ponte de cipó sobre o rio Caxixe. Por essa ponte os índios atravessavam. Com a derrubada da ponte,
os mineradores pensavam em se ver livres dos índios, mas ocorreu o contrário, pois estes tomaram o ato como ofensa e intensificaram os ataques.
Assim, não restou aos mineradores outra alternativa senão a fuga. Após
o ataque, alguns mineradores tentaram resistir, ficando nas minas com o
apoio de incursões vindas das Capitanias da Paraíba do Sul e de Minas
Gerais, mas em 1771, segundo Tristão de Alencar Araripe, foram expulsos
e perseguidos pelos botocudos até a Vila de Itapemirim. Botocudos e Puris
passaram a reinar soberanos na rica região onde outrora, garimpeiros e
jesuítas se digladiavam em busca do rico metal. As lutas cada vez mais
constates entre índios e garimpeiros, a falta de recursos econômicos para
investimento na mineração e a falta de apoio efetivo (a não ser da Capitania do Rio de Janeiro, que não foi suficiente) da Coroa para a exploração
foram os motivos do declínio das minas das serras do Castelo.
Esta fase foi, sem dúvida, a
mais próspera história das Minas do
Castelo, sendo assim importantes falarmos um pouco mais sobre fatos que
aconteceram e que, de certa forma,
marcaram o período.
Os jesuítas já haviam construído uma igreja em 1625, mas Pedro
Bueno também se deu ao trabalho de
mandar construir uma na aldeia do Caxixe em homenagem a Nossa Senhora
da Conceição.
A nova igreja passou a ser a
Matriz da Freguesia em substituição a
dos jesuítas. Esta mudança acarretou
também a alteração do nome da Freguesia, que passou a se chamar Freguesia de Nossa Senhora da Conceição das Minas do Castelo, em 1754.
Pia Batismal da Paróquia Nossa
Senhora do Amparo - Itapemirim - ES
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Nesta época, existia um fluxo considerável de fiéis na região, visto
que foi necessária a construção de duas igrejas próximas. Em 1765, muitos
destes habitantes emigraram
para o Porto do Caxangá, no
Sítio Itapemirim, e o motivo da
saída, como sabemos, eram
os confrontos com os índios.
Temerosos em relação
ao futuro, esses habitantes
não só emigraram, como levaram consigo as imagens
e paramentos das igrejas. O
responsável pelo translado foi
o pároco Amaro da Silva CarSinos da Paróquia Nossa Senhora do
neiro. Foi levada a imagem de
Amparo - Itapemirim - ES
Nossa Senhora do Amparo, a
de São Benedito, os sinos e a pia batismal.
Inicialmente, eles foram colocados em um oratório ereto, na casa
de Domingos de Souza Bueno Camargo. Posteriormente, foi edificada uma
igreja no local denominado Bello, hoje, Itapemirim, de propriedade de Baltazar Caetano Carneiro, só para amparar a imagem.
Em março de 1769, esta igreja foi declarada paroquia da Nova Freguesia de Nossa Senhora do Amparo do Itapemirim, atual Paróquia de
Nossa Senhora do Amparo.
Além das imagens que se tornaram peregrinas, neste período, existia
também em Castelo, uma irmandade
consagrada a São Benedito. Este tipo
de instituição era característica comum
nas regiões auríferas. O Jornal “A Gazeta de Itapemirim” de 11 de março de
1883, traz a seguinte notícia a respeito
da irmandade de São Benedito:
“A esse tempo já ali havia imagens no templo, entre essas, a de São
Benedito, que mais tarde teve criada a
sua irmandade, inaugurada em 1756,
no dia 26 de dezembro, em que se inscreveram 73 irmãos devotos, pretos e
brancos, livres e escravos, entre eles
Cláudio Dias de Queiroz, preto forro,
natural de Campos, que veio morar e
Imagem de Nossa Senhora do
Amparo, que se encontra no altar da
Paróquia - Itapemirim - ES
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ser sepultado nesta vila em 1792”. Ainda sobre a irmandade, podemos afirmar que foi aprovada pelo Bispo do Rio de Janeiro, Francisco Antônio do
Desterro, em 1764.
Os irmãos pagavam as suas joias com ouro em pó. Do seu patrimônio constava a existência de terrenos, joias, ouro em pó, uma pequenas
casa de telha e animais. Mas, todo esse patrimônio se perdeu no tempo
devido às constantes batalhas com os índios. A imagem de São Benedito
tinha um resplendor de prata com o sinal do rei, mas devido as seguidas
reformas pelas quais passou, tal sinal se perdeu. O referido selo também
tinha assinatura do Bispo do Rio de Janeiro, que fez o reconhecimento
oficial da irmandade. No período em que funcionou a irmandade, o vigário
das minas era o Reverendo Antônio Ramos de Macedo. O fato curioso a
respeito da irmandade á a convivência, a que tudo indica, igualitária entre
brancos e negros, escravos e livres, dentro da mesma instituição (MARINS,
Antônio. Minha Terra e meu Município. RJ. 1920.)
As vias de comunicação da época, na segunda fase da mineração
em Castelo, eram os rios. Por eles se chegavam às minas e se escoava
a produção. Mesmo quando não davam condições de navegabilidade, seriam como ponto de referência, já que os aventureiros seguiam margeando
os rios em suas expedições rumo ao interior. Dois foram os rios que deram
acesso às nossa minas. Um deles foi o Benevente, que tem sua foz em
Anchieta, na antiga Rerigtiba. Muito provavelmente, este foi o caminho utilizado pelos jesuítas exiliados pelos índios, pois a nascente deste rios fica
próximo à região das minas. Após subirem margeando o rio, os jesuítas
andavam um pouco mais, e através da orientação dos nativos, chegaram
ao local onde edificaram suas missões e exploraram ouro.
O outro rio é o Itapemirim, que tem o Rio Castelo como seu afluente, e deságua em Marataízes. Vejamos o que diz um relatório da época, a
respeito de tal rio:
“Da Barra até as minas do Castelo, se gastam
oito dias em canoas carregadas e em canoas
escoteiras este rio para o sul e vai seguindo
para o Castelo, chegando ao lugar da Fruteira
se divide o rio da Fruteira para o norte, e se vai
seguindo o Castelo e chegando a Manga Larga divide-se já como pouca água até chegar
ao Porto da Piedade, que é o porto das minas
do Castelo, daí para cima não há mais navegação, por haver algumas cachoeiras, sempre
vai seguindo do Castelo para cima, as cabeceiras dele se gastam doze dias”.
OLIVEIRA, José Teixeira Leite de História do Estado do Espírito Santo, pág. 225.
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Este relato a respeito do Rio Itapemirim e do Rio Castelo, de sua foz
à nascente, dá-nos a dimensão das dificuldades encontradas pelos exploradores de ouro para chegaram aos locais de trabalho, que neste período
levavam oito dias pelas águas do rio. Os rios Itapemirim, Castelo e Benevente foram usados basicamente para se chegar às minas e para escoar
a produção, mas o rio onde se encontrava o ouro era o Rio Caxixe e o do
Ribeirão. É de se destacar a imensa importância que o rio exerce neste
período específico da história castelense, pois era dele que se retirava e
por ele que se transportava toda a riqueza.
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Cabe-nos ainda algumas informações sobre o Rio Caxixe, que teve
este nome em homenagem ao último dos vigários da Freguesia de Santana
das minas do Castelo, na segunda metade do séc. XVIII, o Padre André
de Souza Leite, que também era conhecido como Padre Doutor ou Padre
Caxixe. O referido padre era de Campos e detentor de muitos bens. Ele
costumava vir à região para negociar ouro em pó com os mineradores.
Apesar de padre, ele também era um rico negociante e profundo conhecedor do mineral mais cobiçado da terra, e daí é que vem o outro apelido, de
Padre Doutor. A presença de pessoas endinheiradas, como o Padre Caxixe
e o Major Antônio da Silva Povoas, foi muito importante para a dinamização
da exploração do ouro nesta segunda fase da mineração em Castelo, pois
sem o investimento necessário, não se aumentaria a produção aurífera.
Padre Caxixe não foi o único morador de Campos que se interessou
pelas riquezas das minas do Castelo. A cobiça foi tanta que se projetou
a construção de uma estrada ligando as minas a então capitania. Os oficiais da Câmara da Vila de São Salvador enviaram, em 1757, um pedido
à Coroa para se abrir uma estrada daquela Vila até as minas do Castelo.
Pediram também a criação de um posto de intendente de ouro na mesma
Vila de São Salvador. E, buscando conseguir a liberação para a construção
da estrada (neste período só podia construir qualquer tipo de estrada com a
autorização da Coroa), os habitante de São Salvador argumentavam que a
mesma lhes proporcionaria uma grande economia de tempo, pois levaram
quinze dias no transporte do ouro das minas até a Casa da Moeda, no Rio
de Janeiro; e segundo eles, com a nova estrada, o percurso até a Casa da
Moeda gastaria somente três dias.
Além dos problemas causados pela precariedade dos transportes
e pela geografia local, outro aspecto que dificultava o escoamento da produção era a burocracia, que exigia que o ouro passasse para o Rio de
Janeiro. Depois de qintada a parte devida, o ouro era enviado a Portugal.
O ouro retirado das minas descia pelo Rio Itapemirim em canoas,
mas até a foz eram doze cachoeiras, e em cada um delas a canoa tinha
que ser descarregada e tirada do rio com as mãos, causando assim muitos
transtornos e dificuldades aos navegantes. Mas, o rio não era o único problema, pois o ouro de Castelo tinha que pegar guia em Vitória, para depois
ser levado para quintar na Casa da Moeda do Rio de Janeiro. O caminho
até Vitória era deserto e perigoso, tendo o viajante que atravessar nove rios
até chegar ao destino. De posse da guia, o viajante retornava pelo mesmo
difícil caminho, passando posteriormente pela Vila de São Salvador até
chegar ao Rio de Janeiro. Com a nova estrada, o ouro sairia diretamente
das minas do Castelo para a Vila de São Salvador (hoje cidade de Campos)
e seguiria viagem para o Rio.
No período colonial, Portugal usava a política de impedir, a qualquer
preço, o desenvolvimento e a comunicação interna entre as províncias.
Esta postura política era um meio de impedir um desenvolvimento interno
que os portugueses temiam que chagassem à independência. Uma forma
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de impedir o desenvolvimento era uma rigorosa fiscalização na construção
de estradas, no interior da colônia. O pedido feito pelos habitantes da Vila
de São Salvador, em 1757, para a construção da estrada, passou por toda
a burocracia colonial, e foi finalmente apreciada pelo conselho ultramarino,
que deu parecer favorável à construção, com apenas um voto contra, do
Dr. Alexandre Metello de Souza Menezes. A resolução real para a construção da estrada foi dada em 27 de novembro de 1761 juntamente com
uma carta topográfica da região, onde constatava, além de outras coisas, a
existência de seis aldeias indígenas, as quais o rei mandava civilizá-la. Só
em 20 de abril de 1763, ou seja, seis anos após o envio da primeira carta,
o Governador do Rio recebe a ordem real para a construção da estrada.
Mas, nesta época, as minas já estavam decadentes, o que desmotivou por
completo, a construção da tão sonhada estrada.
Por trás da construção da estrada, havia uma disputa entre a Capitania do Espírito Santo e a Vila de São Salvador pelo ouro de Castelo. Geograficamente, Castelo pertencia, à Capitania do Espírito Santo, o que nos
faz acreditar que o ouro deveria passar primeiro por Vitória, mas por razões
práticas e econômicas, seria mais vantajoso para os exploradores e para
a Vila de São Salvador, a construção da estrada. Neste caso, quem sairia
perdendo seria o Espírito Santo. Em resumo, eram esses os caminhos para
se chegarem às minas: o Rio Benevente e o Itapemirim. Pela estrada projetada e não realizada pelos moradores da Vila de São Salvador não trafegou
outra coisa a não ser os sonhos de seus idealizadores.
Para encerrar o relato sobre este período da história de Castelo,
gostaríamos de enfatizar, além do dia-a-dia dos habitantes, os aspectos
gerais das minas. Nenhum minerador pretendia viver eternamente por
aqui, o que buscavam era somente enriquecer e desfrutar do local em lugares que oferecessem melhores condições, sendo assim, o arraial tinha
características rudimentares e de caráter provisório. A população crescia
misturando os hábitos dos negros, dos índios e dos portugueses na pequena clareira aberta, em meio à mata virgem. O poder da lei e da autoridade estava distante, a ponto de prevalecer dentro do arraial, apenas
a autoridade dos padres, quando esta ainda prevalecia. As casas eram
construídas de forma a deixar um grande espaço no meio, que era utilizado
comunitariamente como praça. As características das construções era um
tanto quanto semelhantes às dos índios. Era utilizada a própria madeira
da região, que servia de parede, e as cascas e folhas serviam de teto. As
casas eram construídas mantendo uma certa distância, pois em caso de
incêndio provocado pelos índios, não se destruiria toda a vila. O arraial
tinha um aspecto sombrio devido à qualidade e ordenação das habitações,
e também graças às árvores não derrubadas, que se espalhavam secas
por toda parte. Esse aspecto sombrio dava lugar ao exótico, quando aos
domingos, a Bandeira Portuguesa tremulava em mastros fixados na porta
das casas dos chefes do garimpo.
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O amanhecer trazia consigo uma considerável leva de cavadores
de ouro para o início das atividades, que só terminavam quando o sol se
punha. Esses cavadores eram homens rudes, barbas por fazer, que ao
regressarem à Vila, enchiam-lhe de vida, pelo fato da mesma passar o dia
vazia, à espera dos sonhadores habitantes. Assim era a vida nos Arraiais
de Castelo, distante de tudo, do poder real e eclesial, mas extremamente
próxima do sonho do enriquecimento, e por mais que a dura realidade lhe
parecesse pesadelo, o sonho resistia.
O mapa abaixo, copiado por Bueno Dias Fernandes, com algumas
modificações da “Geografia e História do Espírito Santo” de Miguel A. Kill,
mostra as minas do Castelo e sua proximidade com a região de Ouro Preto,
Mariana em Minas Gerais.
O fim da Segunda Fase da Mineração em Castelo foi consequência
da derrota dos mineradores para o mundo tribal e comunitário dos índios.
Os fatores que levaram os índios à vitória inicial foram um melhor conhecimento do terreno, que lhes possibilitava melhor locomoção durante as
batalhas, e também melhor condição de adaptação e sobrevivência na selva. Por parte dos mineradores, a derrota foi resultado não só das melhores
condições dos índios, mas também da falta de recursos econômicos, que
tornava tanto a mineração como a defesa das minas com características
totalmente arcaicas, e no caso específico da mineração, inviável economicamente. As difíceis condições de transporte também contribuíram para
o fracasso da mineração. Por último, podemos apontar não só a falta de
apoio da Coroa, mas também a proibição das atividades de mineração em
Castelo. A política confusa em relação a Minas do Castelo, que ora proibia
e ora legalizava a exploração, fazia parte da estratégia portuguesa para o
Brasil. Seguindo a mesma estratégia, o Espírito Santo serviu de proteção,
uma autêntica cerca verde, para preservar as ricas minas de Minas Gerais.
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Por volta de 1785, não existia mais nada da antiga Freguesia de
Nossa Senhora da Conceição das Minas do Castelo. Casas, igrejas, vila,
fazenda, tudo fora destruído pelos botocudos que voltaram a ser senhores
soberanos de toda região, como outrora. Mas no século posterior, as atividades de mineração voltaram a serem efetuadas em nossa região; esta
retomada dos trabalhos foi por nós designada como a “A Terceira Fase da
Mineração”, que é justamente a que nosdedicaremos a partir de agora.
5.1.3 – Terceira Fase – Séc XIX
A terceira fase inicia-se com o que havia faltando na segunda, o
apoio da Coroa Portuguesa, pois agora o Espírito Santo já havia cumprido
sua função de proteger as ricas minas de Ouro Preto e de Diamantina. Com
a decadência da mineração em Minas Gerais, não fazia mais sentido manter o Espírito Santo isolado e despovoado para proteger o que não mais
existia. E foi justamente por isso, que em 4 de dezembro de 1816, através
de Carta Régia, D. João VI ordenou ao então governador da capitania do
Espírito Santo, Francisco Alberto Rubim, que dividisse os terrenos das antigas minas do Castelo e que desse reinício às explorações de ouro.
Esta fase teve uma duração bastante curta, de 1816 a 1830. Neste
período houve exploração contínua, contando, inclusive, com a presença
de mineradores ingleses e alemães. As explorações não terminaram por
inteiro em 1830, mas houve uma considerável diminuição, acabando por se
tornar uma atividade esporádica, que chega até os nossos dias. Há registro
de remessa de ouro de Castelo, enviada pela província do Espírito Santo
ao Governador Imperial, nos anos de 1820, 1824 e 1847. Este envio foi a
título de amostragem e foi efetuado pelo Coronel Julião Fernandes Leão.
A presença real é uma característica que difere a terceira fase das
duas anteriores. O que se conseguia com a força física, na terceira fase
passou a se conseguir com o uso de uma outra força – a política. Foi assim
que no dia 1º de outubro 1822 no linear de nossa “Independência”, o Tenente-Coronel de Milícias, Ignácio Pereira Duarte Carneiro, recebeu, através do ministro do império, a autorização para lavrar as minas de Sant’Ana
do Castelo. O Tenente-Coronel genro de Joaquim Marcellino da Silva Lima,
o famoso e poderoso Barão de Itapemirim, que comandava com pulso forte
toda a política do sul do Espírito Santo. O grade poder político conseguido
através do poder econômico, da troca de favores e de assistencialismo
às véspera das eleições, comum na política do sul do Estado, tem raízes
profundas na nossa história. Vem do início do império a tradição de usar
coisa pública, como um bem privado em benefício de determinado grupo
de amigos ou parentes. Tornam-se cada vez mais comuns em nosso dia-a-dia, casos iguais ao do Barão de Itapemirim, que conseguiu concessão
das minas do Castelo para o seu genro. O fato desta tradição vir de longa
data, não deve ser motivo de desânimo, mas sim de força e impulso para
que lutemos contra estes problemas que aumentam cada vez mais a distância entre ricos e pobres.
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Livre do julgo de servir cerca verde para proteger as minas de ouro
de Minas Gerias, inicia-se a tentativa de dinamizar economicamente o Espírito Santo. Um passo importante neste sentido foi a criação da estrada
do Rubim, que ligava Vitória às jazidas auríferas de Minas Gerais. Esta
estrada tem um percurso semelhante ao da BR 262, e leva este nome por
ter sido construída entre 14 de setembro de 1814 e 30 de agosto de 1816,
período em que Francisco Alberto Rubim era governador do Espírito Santo.
O encarregado da construção foi o Tenente-Coronel Ignácio Pereira Duarte
Carneiro, o mesmo que tinha a concessão de explorar as minas do Castelo.
A estrada nova do Rubim, ou também estrada de São Pedro de
Alcântara (os dois referiam-se a mesma estrada), tinha início na baía de
Vitória, no porto de Itacibá e passava na fazenda Borba, hoje Viana. A referida fazenda pertencia a mesma pessoa responsável pela construção da
estrada, o Tenente Coronel Inácio Pereira Duarte Carneiro. Através desta
afirmação, percebe-se mais uma vez, a velha mania de usar coisa pública
em benefício particular. Da fazenda Borba, a estrada ia até a divisa do
Estado do Espírito Santo com Minas Gerais, no rio Pardo onde existia um
quartel com o marco divisório. A estrada terminava em Mariana, e em seu
percurso foram criados quartéis onde moravam colonos vindos de outra
possessão portuguesa, os Açores. A presença dos moradores nos quartéis
era para proteger a estrada e os viajantes dos ataques dos índios. Além
de conservar a estrada, os colonos cultivavam lavouras. A distância que
separava os quartéis era de três quilômetros.
A estrada de Rubim deu um certo impulso na mineração em Castelo,
pois ela passava relativamente próximo às minas, mais precisamente onde
hoje é Conceição do Castelo, facilitando assim o escoamento de ouro para
Vitória. Passavam por ela também tropa com variados produtos que eram
transportados para Vitória provenientes das Minas Gerais. Mas, devido ao
pouco fluxo de pessoas, cargas e bois, a estrada foi sendo gradativamente
abandonada, assim como seus quartéis de manutenção e proteção.
Foi também no terceiro período da mineração em Castelo, mais precisamente em 1820, que o então governador do Espírito Santo, Baltazar de
Souza Botelho Vasconcelos, enviou ao rei um pedido de regulamentação
dos trabalhos das minas e também de proteção dos índios, que a esta
altura não ofereciam muita resistência à presença do branco em seu antigo território. E foi justamente atendendo a este pedido, em 1º de agosto
de 1829, que o governo imperial criou, para efeito de lei, o Aldeamento
Imperial Afonsino, que ficou, como não poderia deixar de ser, a cargo de
Joaquim Marcelino da Silva Lima, o Barão de Itapemirim.
O Barão de Itapemirim só executou a missão a qual o governo imperial lhe havia ordenado, em 1845. Após uma viagem à região das Minas
Gerais, o Barão passou pelas Minas do Castello, e encantado com a beleza da região. Decidiu enfim criar o aldeamento para os índios Puris, que
ficava localizado à margem do rio Castelo. O responsável direto por sua
fundação, designado pelo Barão, foi o engenheiro Frederico Willmer, que
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foi sucedido pelo Frei Daniel de Napoli. Mas tarde, os índios abandonaram
o aldeamento, que estava sobre comando do Frei Bento de Gênova. Deste
momento em diante, o local foi se transformando em vila, que contava em
sua maioria, com a presença de brancos. Na segunda metade do séc. XIX,
uma lei provincial eleva o antigo Aldeamento à categoria de freguesia com
a invocação de Nossa Senhora da Conceição do Castelo, atualmente denominada apenas Conceição do Castelo.
Mais uma vez, as minas de ouro do Castelo são pauta do dia, no Império do Brasil. Em 17 de dezembro de 1824, o então imperador D. Pedro I
ordena, através de decreto, a divisão das ricas terras das minas do Castelo, já que o genro do Barão de Itapemirim, Inácio Pereira Duarte Carneiro,
não havia feito uso da concessão que lhe autorizava a mineração da área.
Economicamente, Portugal e Brasil era extremamente dependentes da Inglaterra, no início do século XIX, e esta dependência foi sentida e refletida
aqui nas minas do Castelo. Em 1824, os representantes de uma companhia inglesa, Georges CreyressBaumer e Eduard J. Bridges, estiveram visitando as minas. Os responsáveis pelas minas receberam ordens claras
do Imperador para facilitar e auxiliar os estrangeiros em suas “pesquisas”,
colocando à disposição dos mesmos todas as riquezas das minas do Castelo. Esta atitude é uma clara demonstração de submissão aos interesses
estrangeiros; submissão da qual ainda não estamos livres nos dias de hoje.
O local que hoje conhecemos como Fazenda do Centro, também foi
palco de mineração, como afirmamos anteriormente, graças às suas planícies em que o metal se assentava no fundo do rio, que era até desviado
para facilitar o trabalho de cata do ouro. Mais do que lugar de mineração,
a Fazendo do Centro foi o local onde se iniciou a mudança da base econômica do futuro município de Castelo. Desiludidos com o ouro, que se
tornava cada vez mais escasso, os moradores da Fazenda do Centro iam
se dedicando gradativamente à agricultura. O Major Antônio Vieira Machado da Cunha foi um dos primeiros donos da fazenda a empreender outras
atividades econômicas, que não fosse a mineração. A atividade econômica
que suplantou a mineração, inicialmente na Fazenda do Centro, e posteriormente no município, foi a extração de madeira para a transformação
das matas em lavouras de café e pasto para gado.
A região, hoje Fazendo do Centro, havia sido abandonada pelo major Povoas, “o velho”, provavelmente, desiludido com a escassez do ouro.
Foi aí que o Major Antônio Vieira Machado da Cunha tomou posse do local, dando-lhe a denominação que ainda hoje pendura. O Major Vieira da
Cunha chegou a Castelo em 1845 e faleceu em 23 de julho de 1868, deixando como herdeiro da fazenda, um de seus genros, o português Manoel
Fernandes Moura.
O tal português era comerciante de fumo, café, toucinho e queijos
na Rua da Candelária, no Rio de Janeiro; por ser amigo de Vieira da Cunha
veio a se casar com sua filha, vindo a falecer em uma viagem de Portugal
para o Rio de Janeiro. Este fenômeno de mudança do ciclo econômico, do
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ouro para o café, não foi exclusivo da Fazenda do Centro, ocorreu também
em outras áreas de mineração, como na Fazenda da Prata, Limoeiro e
Caxixe.
5.2 – As Consequências da Proibição da Mineração no Espírito Santo
e em Castelo
Com o aumento da fama e da riqueza das “Gerais”, Portugal temia
que invasores estrangeiros fossem atraídos por elas e pelas Minas do Castelo, e assim pudessem conquistar a cidade de Vitória e subir o rio Itapemirim, chegar ao Castelo e depois às “Gerais”. Por esta razão, e também
para impedir que o ouro fosse contrabandeado pelo litoral da Capitania do
Espírito Santo, Portugal não só as explorações das Minas do Castelo e a
descoberta de outras, mas também que a Capitania mantivesse ou abrisse
quaisquer comunicações com as Gerais. A desobediência dessa ordem seria punida com o confisco dos bens e o degredo para a África.
O 1º Ato de Proibição data de 10/11/1710. A alegação da Coroa para
a proibição se devia à proximidade da Costa, da falta de proteção contra
piratas, do pouco povoamento que nesta época ainda se encontrava no
Espírito Santo, aliados à mata tropical fechada. Nossa Capitania pouco
se desenvolveu economicamente, apesar dos vários engenhos de açúcar
aqui montados. Vários fatores contribuíram para nosso insucesso: ataque
constantes dos índios, poucos recursos financeiros dos colonos que aqui
se instalaram, a distância do mercado europeu e, com certeza, uma população em qualidade e quantidade bem inferior à da menina dos olhos
da Coroa Portuguesa nesta época, que era Pernambuco. Portanto, nossa
colonização foi litorânea e escassa, o que vai gerar, no início do século
XVIII, quando há as primeiras descobertas de ouro em nosso interior, desconfianças por parte de Portugal em permitir que o escoamento do ouro
das “Gerais” passasse pelos portos capixabas (Vitória).
Não basta a Portugal encontrar as minas de ouro no Brasil, mas
também assegurar seu controle e fiscalização rigorosa sobre elas. Afinal,
nesta época, Portugal se debatia numa economia decadente, e ainda mais,
com o açúcar brasileiro em baixa no mercado europeu, o ouro então seria
a solução para todos os males. Portugal não se permitiria o risco de ver
o ouro passando por uma região de tão poucos fortes militares, poucos
habitantes, que não ofereceria o mínimo de condições de segurança para
passagem do mesmo.
A decisão da proibição foi, portanto, algo bem pensado, bem avaliado para não haver possibilidade de erro. Como não havia garantia de proteção das jazidas, foram proibidas construções de estradas ou navegação
fluvial em direção ao interior.
As proibições impediram que, com a febre da procura do ouro e
pedras preciosas e com a abertura de caminhos para o sertão ou para as
“Gerais”, mais rapidamente tivesse sido desbravado e se expandido o território do Espírito Santo. As minas “Gerais” tornaram-se território proibido
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aos capixabas. A capitania funcionou como uma verdadeira Barreira Verde
ao desvio do ouro, foi a fortaleza e a proteção das “Gerais”.
Não é difícil avaliar os prejuízos de tal medida adotada e imposta
aos capixabas. Com certeza, o Espírito Santo perdeu muito, pois pela Carta de Doação de 1534, de Vasco Fernandes Coutinho todo o território que
compreende as áreas de exploração do ouro, na região das minas, pertencia à Capitania do Espírito Sato, o que ficou confinado a praticamente 1/5
do que verdadeiramente lhe pertencia. Mas, perdeu também em desenvolvimento, 300 anos de esquecimento, de fechamento ao progresso. Quem
levou a melhor foi o Rio de Janeiro, que se desenvolveu em função do ouro
que passou a circular por seus portos, em direção à Europa, vindo inclusive
a tornar-se a capital da colônia em 1763.
A capitania do Espírito Santo virou uma cortina intransponível para
se atingir o ouro.
As proibições no Espírito Santo provocaram, então, aprofundamento da decadência da capitania, relegando a ela um abandono e um atraso
correspondente a 3 séculos, só vindo a modificar esta situação com a produção cafeeira. A nossa pobreza serviu à riqueza e ao desenvolvimento
das outras regiões próximas às minas.
Com relação a Castelo, a política da proibição modificou-se em vários momentos, de proibidas e consentidas e até autorizadas pelas autoridades do governo.
Mesmos assim, quem saiu ganhando com essa exploração do ouro
em Castelo, não foi Castelo, que com certeza não viu o metal servir ao seu
desenvolvimento e ao seu crescimento, pois não se tem, sequer, registros
oculares da sua presença aqui, como no caso das “Gerais”.
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VI – ORIGEM DO NOME CASTELO
Muitos se perguntam sobre a origem do nome de nosso município:
Castelo. A melhor e mais correta maneira de darmos uma resposta a esta
indagação é recorrendo à história. Mas, não buscamos uma verdade pronta e única que não aceite questionamento. O que faremos aqui é relatar as
versões que encontrarmos a respeito do tema, e a partir daí acolheremos,
ou mesmo criaremos, a mais plausível e próxima da verdade histórica.
Recorreremos ao dicionário para buscar o significado da palavra
Castelo.
“Castelo: casa senhorial fortificada, residência senhorial ou real, fortaleza medieval, parte
mais elevada do convés do navio”.
ROCHA, Ruth. Mini dicionários – p. 127.
O nome Castelo não é de origem indígena, logo foi dado o referido
nome às minas por um europeu, provavelmente um português. Vamos tentar fazer uma breve análise do imaginário do europeu desta época e identificar o significado da palavra Castelo para ele. Castelo é uma palavra ligada essencialmente ao mundo medieval, que a Europa acabava de sair no
período em que aqui chegaram. Dava ideia de um lugar grande, fortificado
e protegido com poço, pontes móveis, torres e não necessariamente com
muito luxo. O nome Castelo está associado também a poder e riqueza, pois
era a residência do rei, símbolo de riqueza, mais basicamente de poder.
Alguma coisa na região das minas fez os primeiros habitantes lembrarem
de um castelo e batizarem a região com o mesmo nome. As denominações
encontradas foram: Montes do Castello, Nossa Senhora da Conceição das
Minas do Castelo, Serras do Castelo e Castelo. Nós nos dedicaremos a
partir de agora, às versões que encontramos a respeito do nome. Sabemos
que elas estão diretamente ligadas às diferentes hipóteses de chegada
dos primeiros habitantes de nossa região. Tristão de Alencar dá a seguinte
versão para a origem do nome:
“Diz a lenda que um explorador, vindo da costa, deparou a serrania com alta muralha, enquadrada, nos dois flancos por dois altos picos
(Pontões), como legítimos torreões. Teve a impressão de um castelo com muralhas a meias
e torres ou bastões. Daí a ideia de solar ou
fortificação medieval – o castelo”.
ARARIPE, Tristão de Alencar. “O Ciclo do Ouro em
Castelo”. Pág. 32. Ver. Cut UFES – Vitória, 1974.
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Esta versão parte do pressuposto de que os primeiros habitantes
que aqui estiverem chegaram pelo rio
Itapemirim, segundo Tristão de Alencar Araripe, como mostra o mapa ao
lado.
A outra versão a que tivemos
contato, foi a do major Joaquim José
Gomes da Silva Neto, em seu trabalho “Histórias das mais importantes
minas de ouro do Estado do Espírito
Santo”.
Basicamente. Esta segunda versão diz que os jesuítas foram os que
primeiro chegaram, e também denominaram Monte do Castello a nossa
região. Gomes Neto diz que nos lugares onde se encontrou ouro, ou seja,
Povoação e Fazenda do Centro, não se verifica na cadeia de montanha
que os rodeia, nenhuma semelhança que faça lembrar um castelo, logo,
segundo ele, não foi dali, onde os homens escavavam e mudavam o curso
do rio, que surgiu a inspiração para o nome.
Para o major, esta inspiração
surgiu quando os jesuítas partiram
de Rerigtiba, (hoje Anchieta) através
do rio Benevente (conforme o segundo mapa), embrenharam-se na
mata e aqui chegaram. Segundo ele,
foi em uma serra onde nasce o rio
Jucu, que fica no antigo caminho que
ligava as minas ao mar, que surgiu
a inspiração para os padres jesuítas.
Perto desta serra, nasce também o
rio Caxixe. Esta serra destacava-se
das serras adjacentes por sua imponência e altura. Tal serra observada do
sítio, perto do Arraial Velho, que pertenceu ao major Vieira, tinha as seguintes características: muito elevada, com um corte no flanco a prumo como
uma espécie de parapeito, entre dois pontões a picos perto um do outro,
sendo que um era mais grosso do que o outro na base. Ainda deste sítio
se avistava, à direita, as serras de Guarapari e, à esquerda, os montes do
Benevente. Esta formação rochosa refletindo a luz do sol nascendo proporcionou aos jesuítas a imagem de um castelo, onde o corte vertical da serra
era a muralha e os dois pontões as torres. Desta forma estava justificada,
segundo ele, a origem do nome Castelo.
O documento mais antigo a que tivemos acesso a respeito da nossa
história é datado de 1625, e nele já figurava o nome Castello. Sendo assim,
concluímos que foram os jesuítas que nos batizaram, pois sendo eles os
primeiros habitantes europeus do lugar que, já em 1625 tinha este nome,
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ou seja, antes da chegada dos Bandeirantes, não temos dúvidas sobre os
autores do nome, pois eram eles os únicos habitantes europeus de nossa
região. Outro fato que não podemos negar é que a inspiração para o batismo veio dos aspectos geográficos, ou seja, da cadeia de montanhas ou de
uma específica que nos rodeia.
A versão de Gomes Neto com relação ao autor do nome Castelo é
mais precisa, pois ele enfatiza que foram os jesuítas. Já Araripe menciona
apenas que o autor foi um determinado viajante, sem dar detalhes sobre
ele mesmo porque Araripe não comunga da versão sobre o pioneirismo dos
jesuítas na exploração do ouro em nossa região. Sendo assim, no que diz
respeito ao criador do nome Castelo, Gomes Neto tem razão. Com relação
ao local que serviu de inspiração para este nome também encontramos divergências; Araripe diz que foi próximo ao rio Castelo, na região conhecida
hoje como Pontões. Já Gomes Neto diz que o lugar, apesar de distante,
está ligado ao rio Caxixe.
Também neste aspecto a verão de Gomes Neto leva vantagem sobre a de Araripe, pois em torno do rio Caxixe se concentrava um fluxo maior
de pessoas, nada mais natural, pois foi nele que se descobriu o ouro. Isso
não significa dizer que os primeiros habitantes desconhecessem o rio Castelo e consequentemente o local que supostamente serviu de inspiração
para o nome. Mas as possibilidade do local ser o citado por Gomes Neto
são maiores, pois além do rio Caxixe está mais ligado à mineração, o ponto
descrito por ele fica mais próximo ao caminho percorrido pelos jesuítas.
Trabalhar com essa possibilidades é um tanto quanto difícil, pois
além das documentações serem escassas, estamos lidando com algo extremamente subjetivo, já que nos referimos aos prováveis locais que remeteram à imaginação de nossos antepassados ao mundo medieval. A
imaginação, como sabemos, não segue nenhuma tipo de regra estabelecida e não tem modelo fixo, ela é condicionada a cada tipo específico de
indivíduo. Como mais um fator a dificultar a precisão deste conceito, temos
o fato de que a imaginação é necessariamente movida pela emoção, que
por sua vez, está diretamente condicionada a um infindável número de
acontecimentos não só do presente, mas também do passado.
Desafiados pelo intrigante e fascinante mundo da imaginação, optamos por não criarmos nossa versão a respeito da origem do nome, mesmo
porque ela não passaria de uma nova imaginação, e o que é pior, revestida
de um caráter imposto.
Pelo exposto, tudo nos leva a crer que o nome Castelo foi dado
pelos padres jesuítas, e a fonte de inspiração foram as montanhas da região. Mas não podemos afirmar, quais, ou qual montanha fez os padres
lembrarem da imagem de um castelo, pois ela pode ter sido encontrada no
caminho até chegarem aqui, ou mesmo na região das minas. Para finalizar,
é bom registrar que a primeira visão que os jesuítas tiveram de nosso futuro
município foi de cima para baixo, ou seja, eles chegaram pelo alto, margeando o Benevente até atingirem a nascente do rio Caxixe, e daí desceram
para a região onde se encontrava o ouro.
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VII – O CAFÉ NO BRASIL
7.1 – Breve Comentário
O café foi introduzido no Brasil no início do séc. XVIII, vindo da Guiana Francesa, pelas mãos do Sargento-mor Francisco Melo Palheta, entrando pelo Pará. Neste período, a importância do café foi pequena, pois era
um produto para consumo doméstico. O produto só ganhava contornos de
produção visando o mercado externo no séc. XIX, principalmente a partir
de 1830, com o Brasil já independente.
É importante ressaltar que o Brasil passou por problemas econômicos seríssimos com a Balança Comercial constantemente deficitária, em
função da ausência de um produto que viesse levantar nossa economia.
Foram crises como a do açúcar em queda constante no mercado europeu
desde fins do séc. XVII e a do ouro em processo de esgotamento desde o
final do séc. XVIII. Fazia-se, então, urgente achar um novo produto que pudesse reerguer nossa economia, e é dentro desse contexto que começa a
se vislumbrar a comercialização, em primeiro momento em pequena escala, mas que caminhando o séc. XIX a fora, se torna o pilar de sustentação
da economia brasileira. Cada vez mais, os mercados americanos e europeus se expandiam. Tanto assim, que em meados, já deste século, a pauta
de exportação registrava 60% das nossas exportações que se baseavam
na comercialização do café.
É importante ressaltar que a empresa cafeeira foi estruturada no
mesmo modelo da empresa açucareira, isto é, no Sistema Plantation, monocultura, mão-de-obra escrava e os grandes latifundiários. Começando as
produção em larga escala no Rio de Janeiro, depois avançava para o oeste
paulista (produção espetacular), para Minas Gerais e para o Espírito Santo.
No Rio de Janeiro, o café se espalhou pela Floresta da Tijuca, Angra
dos Reis, Parati, Vale do Paraíba e outras cidades em grande zonas cafeeiras. Mas é em São Paulo que o café encontrou o seu habitat mais propício. Solo fértil, terra roxa, chuvas regulares e temperaturas adequadas, em
regiões como Ubatuba, Guaraguatatuba, São Sebastião, Campinas, Jundiaí, Limeira, Itu, Sorocaba, Ribeirão Preto, onde atingiram produtividade
máxima, é o que vai tornar São Paulo o mais importante centro econômico
do país.
O café foi responsável por grandes transformações sociais, políticas
e econômicas no Brasil, alterando profundamente sua estrutura. As cidades cresceram, alterou-se a vida social nos grande centros urbanos com
construções e hotéis, jardins públicos, teatros, cafés, ricos salões de baile,
bondes puxados a burros, iluminação das ruas com famosos lampiões a
gás, bancos, ferrovias e companhias de navegação.
O café reintegrou a economia brasileira aos mercados internacionais, contribuiu decisivamente para as mudanças das relações assalariadas de produção e possibilitou o acúmulo de capital, que disponível, foi
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sendo aplicado em sua própria expansão e em alguns setores urbanos
a indústria, a inversão de nossa Balança Comercial que fecha o séc. XIX
apresentado superávit. Realmente, o café tornou-se o “produto rei” de nossa economia.
TABELA DE EXPORTAÇÕES DE CAFÉ DO BRASIL
PORCENTAGENS SOBRE O VALOR DA EXPORTAÇÃO
Produtos
1821/30
1831/40
1841/50
1851/60
1861/70
1871/80
1881/90
Café
18,4
43,8
41,4
48,8
45,5
56,6
61,5
Açúcar
30,1
24,0
26,7
21,2
12,3
11,8
9,9
Couros e
peles
13,6
7,9
8,5
7,2
6,0
5,6
3,2
Borracha
-
-
-
2,3
3,1
5,5
8,0
Algodão
20,6
10,8
7,5
6,2
18,3
9,5
4,2
Fumo
-
-
1,8
2,6
3,0
3,4
2,7
Cacau
-
-
1,0
1,0
0,9
1,2
1,6
Fonte: CANABRAVA, Alice. “A Grande Lavoura”. In. Sérgio Buarque de Holanda
(dir.). “História Geral da Civilização Brasileira”. São Paulo, Difel.
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VIII – O CAFÉ NO ES
8.1 – Breve Comentário
O Espírito Santo, desde a sua colonização, com Vasco Fernandes
Coutinho, desenvolveu uma economia baseada na agricultura, em especial
a da cana e de outros produtos utilizados na subsistência da população.
Apesar das várias buscas pelo metal, a capitania se mantinha com a agricultura.
Até meados do séc. XIX, era o açúcar, apesar da pouca produção,
o produto que sustentava a economia capixaba. O ouro, apesar das tentativas, era encontrado em pequena escala, e foi ofuscado pelo ouro em grandes quantidades nas Minas Gerias, o que contribuirá para praticamente o
fechamento de nossa capitania, mediante a possibilidade do contrabando
passando por aqui, região pouco povoada, de poucas defesas, na chamada “Barreira Verde”. Isso contribuiu muito para que o nosso desenvolvimento não acontecesse em função do ouro, muito pelo contrário, nos legará um
atraso de 300 anos. Assim sendo, nossa capitania vivia à mingua, pouco
povoada, sem algo que lhe desse novos ânimo para seu crescimento econômico.
É dentro deste contexto de necessidade de recuperação da capitania, que em 1800 assume o governador Silva Pontes (Antônio Pires da
Silva Pontes), e toma de imediato algumas providências para que se alcançasse tal objetivo. Uma delas, e importantíssima, foi a assinatura dos Autos
de 1800, ficando definitivamente demarcados os limites entre Minas Gerias
e a capitania do Espírito Santo, o que vai preservar o nosso território, já
que os mineiros se expandiam em direção ao mar. A assinatura deste Ato
vai também contribuir para o incentivo à comunicação entre as duas regiões, favorecendo o transporte pelo até então fechado Rio Doce, levando
o povoamento e colonização daquela região, contando com a presença da
mão-de-obra mineira, já que o ouro encontrava-se em decadência.
Apesar de todos os esforços, a capitania ainda carecia de uma nova
dinâmica na economia. Era preciso que se encontrassem caminhos que
levassem ao nosso real crescimento econômico. Mas o que tínhamos para
isso? Terras pouco povoadas, mata quase que recobrindo nossa extensão
territorial, terras virgens, devolutas, portanto, a nossa saída seria pela via
agrícola, devido as nossas possibilidades naturais. Paralelo a isso, o Vale
do Paraíba, em grande escala, vinha produzindo um produto, que apesar
de ter entrado no Brasil no início do século XVIII, só no século seguinte,
séc. XIX, começava a ter expressão na economia do país, seguido por Minas Gerias e São Paulo. Os cariocas começaram a expandir sua produção,
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fazendo das terras sul capixabas quase que uma extensão de suas terras,
seguidos pelos mineiros e depois pelos paulistas.
Existem indícios de que o café já era produzido em pequenas escalas em nossa capitania em 1811, porém era um produto de pouca expressão. Primeiro vinha o açúcar, que a partir de 1826 é superado pela farinha,
exportada em larga escala, vinda da região de São Mateus.
O café encontrou aqui, apesar de nosso território não apresentar
as condições adequadas para o seu plantio, como no oeste paulista, outros elementos que foram fundamentais para sua produção, como as terras
virgens para serem desbravadas e o estímulo do mercado externo, onde o
preço e a procura pelo produto aumentavam ano após ano; o menrs custo
de implantação do produto se comparado ao da cana, o que contribuiu para
que os lavradores capixabas abandonassem a sua produção, substituindo-a pela do café, surgindo assim “uma verdadeira febre de plantar café”
(BITTENCOURT, Gabriel. Notícias do ES – editora Cátedra – pág. 48).
O período que se segue é de grandes possibilidades para a nossa
província (denominação dada às antigas capitanias, a partir da Independência 07.09.1822) e para seus moradores. Em 1815, no Governo de Francisco Alberto Rubim, exportamos nossas primeiras arrobas de café. Em
1852, o café já era o produto de maior valor dentro de nossas exportações,
levando nossa balança a apresentar seus primeiros saldos positivos.
Começando pelas regiões do sul: Mimoso do Sul, Cachoeiro de Itapemirim, Apiacá, Itarana, Muqui, Castelo, e indo em direção ao norte, o
café foi trazendo grandes transformações para nossa província.
O que antes era uma Província pobre, isolada e sem o menor atrativo para a vinda de forasteiros, como observa Saint-Hilaire, agora não é
mais uma realidade, pois grandes contingentes de imigrantes internos e
europeus vieram se estabelecer em território capixaba, aumentando consideravelmente nosso número de habitantes, que me 1824 era de 35.000
e passou, em 1900 a 209.783. o desenvolvimento do setor de transportes,
tanto rodoviário quanto fluvial (ponto fluvial de Cachoeiro de Itapemirim),
incrementa a desobstrução de rios, a construção e a ampliação do Porto de
Vitória, que passa a receber a presença constante de navios europeus, e
da rede ferroviária, que chega à nossa Província já no final do Império, que
de Cachoeiro de Itapemirim ligava-se às regiões do interior, como Castelo
e Alegre, além da criação de inúmeras benfeitorias, como o Correio Geral
(1884), a iluminação a gás, o telégrafo elétrico, enfim, ares de crescimento
e desenvolvimento.
No sul do Espírito Santo prevalecera a grande propriedade com
mão-de-obra escrava, e que vai entrar em franca decadência a partir de
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1888, com a assinatura da Lei Áurea, tornando o trabalho nessas regiões
mais ou menos desorganizado.
Exportação dos principais produtos pelos portos do Espírito Santo
Porto de Vitória
Norte
Porto de São Mateus
Sul
Porto de Itapemirim
%
%
%
Produtos
1873/74
1883/84
1885/86
1873/74
1883/84
1885/86
1873/74
1883/84
1885/86
Café
37,6
30,7
29,3
4,3
6,1
5,2
58,1
63,2
65,86
Açúcar
13,3
60,3
35,4
20,3
-
2,4
66,4
39,7
62,2
Farinha
0,4
6,3
2,4
99,6
92,5
97,5
-
1,1
0,1
Milho
96,4
99,4
4,6
1,8
0,3
49,8
1,8
0,3
45,8
Madeira
0,1
0,1
74,8
0,6
0,2
0,4
99,3
99,7
24,8
Fonte: A Gazeta
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IX – A EXPLORAÇÃO DO CAFÉ EM CASTELO
9.1 – Introdução
Tendo como principal referencial a questão econômica, e encerrando o ciclo do ouro como principal produto da economia castelense temos
agora o café, que passa a ser o carro chefe de nossa economia.
Buscando levar o leitor a uma melhor compreensão a respeito do
tema, optamos por dividir em fases o estudo da exploração do café em
Castelo. Esta divisão é de caráter estritamente didático, e tem como objetivo proporcionar uma melhor análise sobre o tema, pois quando os fatos
aconteceram, não se adotava tal divisão. Elegemos como marco divisório
da produção cafeeira em Castelo a alteração no tipo de mão-de-obra.
A primeira fase tem como característica principais a utilização da
mão-de-obra escrava, a grande quantidade de terra das fazendas, a produção para exportação, a dificuldade para o transporte da produção e a
grande concentração de poder nas mãos dos fazendeiros. Esta fase tem
início na primeira metade do século XIX, quando os fazendeiros de regiões
produtoras de café buscavam novas terras para dar continuidade às suas
atividades econômicas.
Antigos núcleos de mineração deram lugar a grandes fazendas de
café, que por precisarem de muita quantidade de terras, foram expandindo
mata a dentro, explorando as antigas fronteiras do período da mineração.
Consideramos como fim desta fase a abolição da escravidão, pois ocorre
aí uma ruptura na questão de mão-de-obra.
A segunda fase inicia-se com uma pseudo liberdade para os antigos escravos e pelo sonho de construção de uma nova vida por parte
dos imigrantes italianos, longe da fome e penúria que viviam em seu país
de origem. A presença de um grande número de imigrantes italianos nas
lavouras de nossa terra, no lugar dos escravos é o que mais diferencia a
segunda fase da primeira.
Contrariando a tendência nacional, que era o aumento da concentração de terras nas mãos de poucos fazendeiros, em Castelo ocorre justamente o contrário, ou seja, a pulverização da propriedade da terra. Esta
característica da região na questão da propriedade também não existia na
fase anterior. As demais características da primeira fase não sofrem muitas
mudanças na segunda.
Feita essa pequena exposição inicial, podemos nos ater, de agora
em diante, às questões que envolveriam a produção do café propriamente
dita. Buscaremos nos aprofundar, de forma rápida, nos temas que foram
aqui citados, e também abordar outros que julgamos de grande importância
para a compreensão da história de nosso município. Segundo a cronologia,
abordaremos a primeira fase.
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9.2 – Primeira Fase da Produção do Café em Castelo
9.2.1 – As Grandes Fazendas: migração interna.
Como relatamos na parte que trata da mineração, a região onde
hoje é Castelo, ficou um determinado período praticamente desabitada.
Este período vai doo fim do séc. XVIII, por volta de 1785, até a retomada
dos trabalhos de mineração no início do século XIX. Veja o que diz o “Livro
Tombo de Itapemirim”, a respeito deste período:
“Foi assim extinta a Paróquia de N. S. do Amparo dos Montes ou de N. S. Conceição das
Minas do Castelo, na qual não existiam em
1785, nem aldeias, nem casas, nem igrejas,
nem fazendas, nem sítios, porque os Botocudos, senhores da localidade, tudo destruíram,
restando apenas vestígios da Aldeia do Caxixe na atual Fazenda Povoação, pertencente a
Francisco Vieira D’Almeida Ramos”.
Após este período que relatamos, tem-se a retomada dos trabalhos
de mineração, já no séc. XIX. Mas onde entra o café nesta história? O café
estava sendo produzido em larga escala neste período, no Vale do Rio Paraíba. Pois bem, tendo os mineradores se desiludindo com a cata do ouro,
e observando que a terra de nossa região era bem fértil e virgem, muitos
deles, provavelmente, resolveram mudar de atividades. O grande impulso
à cultura do café na região do Castelo se dá com a chegada dos ricos e
capitalizados fazendeiros oriundos da região do Vale do Rio Paraíba e também de Minas Gerais. Os poucos recursos utilizados na recuperação do
solo e o tipo de agricultura que se praticava exigiam, cada vez mais, novas
áreas para plantação do café. E foi graças a esta necessidade que a região
onde hoje é Castelo se inseriu no cenário estadual e nacional da produção
cafeeira. O mesmo ocorria no Vale do Paraíba Fluminense, onde esse processo se agravou de tal forma, que veio afetar não somente pequenos e
médios lavradores, mas até mesmo os grandes proprietários. A Baronesa
do Pati escrevia, em 1862, a respeito de suas imensas propriedade herdadas do Barão do Pati dos Alferes:
“A absoluta falta de terra para novas plantações de café não me permitiu estender os cafezais.”
ALMADA, Vilma Paraíso. “Escravismo e Transição”.
Editora Graal, 1ª edição – 1984. P.76
Os antigos locais que seduziam os aventureiros pelo brilho do pre-
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cioso metal passaram a atrair fazendeiros de café em busca de terras virgens e férteis para exercerem suas atividades. As primeiras expedições
que se dirigiram para a região do Alto Itapemirim, (região onde se encontra
Castelo hoje) em busca de terras férteis e propícias à agricultura, e não
mais para a mineração, aconteceram em 1822.
Os relatos desta expedição foram feitos por Francisco Lobato e Antônio Marins em 1898. Segundo o referido relato, ela era composta por
setenta e duas pessoas, na maioria, índios mansos e escravos libertos.
Havia também algumas brancos, e entre eles o capitão-mor Manoel José
Esteves de Lima, de origem portuguesa, residente em Mariana, que liderava a expedição. O ponto de partida foi a fazenda São Francisco da Anta
em Minas Gerais, e após vencer todas os obstáculos naturais, a expedição
chega ao Alto Itapemirim.
Após a avaliação da área, o Major retorna a Mariana, mas para proteger as terras das quais acabava de se apoderar, deixa algumas pessoas
de sua confiança nos sítios. Os responsáveis que aqui ficaram tinham à
sua disposição escravos e índios para desempenhar a missão de proteger
a área e também desbravar as matas. Mas, ao retornar em 1827, o Major
encontra a maioria dos sítios abandonados. Os únicos que estavam habitados eram o de Alegre, Veado e Flores, este último, provavelmente, fica
situado dentro dos atuais limites do município de Castelo.
Esta expedição, a que tudo indica, não teve nenhum resultado prático para a história de Castelo, ou seja, a partir dela não se construiu nenhuma fazenda de café. As primeiras fazendas de café das quais temos
notícias em Castelo foram construídas por volta de 1845, e seus primeiros
empreendedores foram os irmãos Vieira Machado da Cunha, provenientes
da Província do Rio de Janeiro.
Essa gente vinha munida de grande estrutura para realizar a atividade cafeeira, que contava basicamente com dinheiro e escravos. Esses pioneiros vinham para morar na região, e não apenas para explorá-la
abandonando-a em seguida. Esta característica fez com que se desenvolvessem aqui uma atividade econômica constante e duradora que chega até
os nossos dias. Entre os primeiros povoadores estavam o Major da Guarda
Nacional, Antônio Vieira Machado da Cunha, (Fazenda do Centro) e seus
irmãos, Joaquim Vieira Machado da Cunha (Fazenda da Prata), Honório
Vieira Machado da Cunha (Fazenda Fim do Mundo), Manoel Vieira Machado da Cunha (Fazenda São Manoel). Ainda faziam parte da família as
irmãs, Lina Vieira Machado da Cunha, casada com José Vieira Machado da
Cunha (Fazenda Povoação) e Francisca Vieira Machado da Cunha, casada
com João Pinheiro de Souza (Fazenda Ante-Portão).
É importante lembrar que além dos Vieira Machado da Cunha, esta
importante fase da história de Castelo foi composta por fazendeiros de Minas Gerias, que através da estrada do Rubim, também migraram para cá
pelos mesmos motivos dos fluminenses: em busca de terras férteis e virgens.
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Por muitos anos a comunicação entre as então capitanias do Espírito Santo e de Minas Gerais foi proibida por motivos que já abordamos neste
livro. Esta longa prejudicial proibição para a vida econômica do Espírito
Santo fez nascer a crença de que o incremento econômico da Província
estava vinculada à construção de estradas ligando o Espírito Santo a Minas Gerias. Este sonho se tornou realidade no início do século XIX com a
conclusão da Estrada do Rubim, que leva este nome em homenagem ao
Governador da Província, no término de sua construção, Francisco Alberto
Rubim.
Em termos econômicos, a tão sonhada estrada não teve o resultado
esperado. E, apesar de passar nos limites de onde depois veio a se tornar o
Município de Castelo, ela não foi a principal via de acesso para os imigrantes fazendeiros, que em sua maioria, era proveniente do Rio de Janeiro.
Nesta primeira metade do século XIX, existia em Castelo um considerável
número de habitantes nativos (os índios), e parte deles se encontrava no
Aldeamento Imperial Afonsino, e é justamente sobre o mesmo que dedicaremos as próximas linhas.
9.2.2 – O Aldeamento Imperial Afonsino
O enfrentamento entre brancos e índios foi uma das principais características do período da mineração, e de certa forma, chega até ao café,
mas com proporções menores, já que os nativos se encontravam bastante
debilitados, e nem de perto, lembravam o poder de luta que tinham na época do ouro. A historiadora Gilda Rocha, que se dedicou ao tema, afirma que
o Aldeamento pouco se diferenciava de um acampamento de escravos,
pois os índios eram caçados como feras para terem o “direito” de morarem
no local.
O responsável não só pelo Aldeamento Imperial Afonsino, mas por
todos os índios alocados na Província, era o Barão de Itapemirim, que por
diversas vezes assumiu o posto de Presidente da Província. Seus relatórios
sobre o Aldeamento são extremamente apaixonados. Mas o que levaria um
homem tão influente, poderoso e certamente ocupado, a se preocupar com
a sorte dos índios? O fato é que nesta época os índios eram usados como
soldados de milícia na construção de estradas, além de mão-de-obra barata na agricultura. Outra grande utilidade dos índios para os fazendeiros
era na perseguição aos escravos rebeldes e fugitivos, como ocorrera na
importante Insurreição de Queimados (na Serra, no Espírito Santo) no ano
de 1849. Sendo assim, os Aldeamentos funcionavam como estoques de
mão-de-obra indígena para servir ao branco.
Longe de ser um defensor da causa indígena, o Barão de Itapemirim estava preocupado com o bom andamento do Aldeamento Imperial
Afonsino para garantir a mão-de-obra gratuita para os mais diversos tipos
de empreitadas. Veremos agora uma breve história sobre o Aldeamento.
Foi o Governador Balthazar de Souza Botelho e Vasconcelos que
teve a primeira iniciativa de criar um aldeamento para os índios Puris, no
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sul do Espírito Santo. Ele baixou uma Portaria em 09 de outubro de 1821
determinando a criação do mesmo. O ato do Governador não sensibilizou
o Governo Geral, e a ideias da criação do aldeamento não se materializou.
Em 1831, outra tentativa frustrada de criação de aldeamento partiu do Presidente da Província do Espírito Santo.
A ideia da construção do aldeamento passa a ser uma realidade em
1845, quando o Presidente da Província, Herculano Ferreira Pena, recebe
a autorização para construí-lo. Junto com a ordem de construção, vem o
nome do futuro aldeamento que se chamara “Imperial Afonsino” em homenagem ao Príncipe Imperial Dom Afonso, que havia nascido em 23 de fevereiro de 1845. Como afirmamos anteriormente, o responsável por todos
os índios aldeados no Espírito Santo era o senhor Joaquim Marcelino da
Silva, o futuro Barão de Itapemirim, que por sua vez, indicou o engenheiro
Frederico Willmer como responsável direto pela construção.
O engenheiro responsável não só coordenou a construção do aldeamento, mas também foi o responsável por ele até setembro de 1847 quando chega o Frei Daniel de Napoli. Com a chegada do sacerdote da Ordem
dos Capuchinhos, o engenheiro, até então responsável pela administração
do aldeamento, transfere-se para a Colônia de Santa Isabel. O sacerdote
Capuchinho é o primeiro religioso a administrar o aldeamento. Sua vinda se
deu graças a pedidos do Governo Provincial.
Frei Daniel presidiu o aldeamento por dois anos, e neste período
coordenou a construção de cabanas para os índios e iniciou a capela. No
local eram criados gados e porcos, além de dois lotes de besta e a ferramenta necessária ao seu manuseio. Os índios fabricavam telhas, e além
de cultivarem as roças, outros ainda se especializaram em trabalhos fabris,
como serrador, carpinteiro e pedreiro. As índias aprendiam a lavar e a fiar
com algodão produzido no próprio aldeamento.
A Lei nº 6, de 26 de julho de 1847, cria uma Escola de Letras tendo
como professor o senhor Joaquim José Gomes da Silva Neto, que assume
as atividades em 23 de março de 1848. Ao que tudo indica, o aldeamento
conta uma certa organização neste período. Não se trata aqui de fazer uma
apologia ao sistema de aldeamento, pois como afirmamos anteriormente,
seu principal objetivo era a escravização dos índios. Parece-nos que neste
período o aldeamento gozava de um certo progresso, isto através da ótica
dos brancos, o que para os índios significava exatamente o contrário, ou
seja, a perda de sua identidade.
Existia uma divergência entre os missionários e os representantes
do Governo em relação aos índios. Os primeiros buscavam a conversão e
a catequização dos nativos. Já os homens que representavam o Governo
e que eram considerados os grande empreendedores da época, queriam
mesmo era escraviza-los para construir o progresso. Revoltado com a escravização dos índios, e após um desentendimento com o Barão de Itapemirim, Frei Daniel abandona o aldeamento. No dia 27 de maior de 1849 o
Capuchinho dá entrada no hospício do Rio de Janeiro. Após deixar o ma-
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nicômio, vai para São José de Leonissa, e em 1855, transfere-se para Sergipe. No ano de 1869, volta para sua terra natal e morre no ano seguinte.
Os homens de negócios da época, os empreendedores, vencem
a queda de braço com os religiosos, e de 1849 a 1855, o aldeamento fica
sem nenhum missionário. Mas os religiosos eram imprescindíveis ao bom
andamento do aldeamento, já que eles tinham um melhor relacionamento com os nativos. Sem a presença dos religiosos, os índios podiam ser
escravizados, mas o número dos que permaneciam nos aldeamentos era
cada vez menor devido aos maus tratos e aos desgastantes trabalhos.
No período em que o aldeamento ficou sem missionários, a escola
foi extinta em 1852, e o professor foi para São Miguel, no distrito de Mangaraí, exercer sua atividade. Nesta fase também, muitos índios voltaram
para a mata, e as roças e atividade outrora desempenhadas por eles foram
paralisadas. Apesar das divergências com relação ao tratamento dispensado aos índios pelos religiosos, o governo local estava convencido de que
sem padre o aldeamento não teria futuro. Por isso mesmo, foram vários os
pedidos do Governo Provincial para que o aldeamento voltasse a ter um
religioso à sua frente.
Os pedidos do Governo Provincial eram remetidos ao Ministério da
Justiça do Império, que encaminhava os mesmos ao Comissário Geral dos
Capuchinhos, Frei Fabiano de Scandiano. Neste período de seis anos, o
aldeamento teve vários diretores leigos, sendo esta série interrompida com
a chegada do Frei Bento de Gênova.
Apesar dos insistentes pedidos ao Governo Provincial, não foi através do Comissário Geral que Frei Bento se deslocou para o aldeamento. A
iniciativa partiu do próprio padre, que enviou uma carta a Frei Fabiano de
Scandiano (Comissário Geral) pedindo ao mesmo que o nomeasse responsável pela aldeamento, em janeiro de 1856. Frei Bento já se encontrava no
local à espera da nomeação, que ocorreu no dia 07 de janeiro do mesmo
ano. No dia 29 de fevereiro, o então Presidente da Província, Barão de
Itapemirim, nomeara Frei Bento de Gênova como Diretor do Aldeamento.
O tempo que Frei Bento ficou à frente do aldeamento foi curto, pois
em meados de 1857, o Barão de Itapemirim, Presidente da Província, demitiu-o do cargo. Os motivos da demissão foram os mesmos que levaram
Frei Daniel a abandonar os índios. No curto período em que esteve à frente
do aldeamento, Frei Bento iniciou a construção de alojamentos para os índios, casa para o diretor, além de uma capela e um cemitério. Para alcançar
o que ele escarava como desenvolvimento econômico, mandou construir
também um moinho, uma olaria e um paiol para guardar os mantimentos.
Novamente o aldeamento retorna para as mãos de administradores
leigos, que por não terem a capacidade dos religiosos para se relacionarem
com os nativos, acabavam por espantá-los. Em 22 de dezembro de 1858,
existiam apenas 28 índios no aldeamento. Em 1861, o número era ainda
menor, não passava de 18 índios, distribuídos em 04 arruinadas casas. A
antiga casa do diretor e a capela estavam abandonadas.
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Em 1867, o Aldeamento deixa de ter uma certa autonomia e é anexado ao distrito de Rio Pardo, que pertencia ao atual Município de Viana.
Em 1867, o aldeamento é anexado ao Município de Cachoeiro, e em 15
de novembro de 1871, passa a ser considerado como Freguesia de Nossa
Senhora da Conceição do Aldeamento Imperial Afonsino, hoje município
de Conceição do Castelo. As terras foram sendo ocupadas por invasores,
e os poucos índios que restavam, buscavam sua sobrevivência cada vez
mais mata adentro.
Na primeira metade do século XIX, era essa a realidade dos habitantes de nosso futuro município. De um lado, os fazendeiros aventureiros
de Mariana – Minas Gerais, na pessoa do Major José Esteves de Lima, que
junto com alguns seguidores percorreu nossa região em busca de terra fértil para a prática da agricultura. Posteriormente, vieram os fazendeiros do
Vale do Paraíba com escravos e dinheiro, e aqui se apossaram de grandes
quantidades de terras para cultivar café. E por fim, os índios que viviam
dispersos nas matas ou no Aldeamento Imperial Afonsino, que oscilava entre a administração violenta dos leigos e dos religiosos que os enchiam de
pecados e negavam-lhes o direito à liberdade de serem índios.
Mas o contingente populacional de maior importância neste período
era, sem dúvida, os escravos, pois seu trabalho sustentava toda a sociedade da época. Todo tipo de trabalho ficava a cargo dos escravos. Compreendendo a importância do trabalho escravo para a história do nosso
município, dedicaremos uma parte do nosso Livro ao tema da escravidão
em Castelo e no sul do Estado.
Nesta fase da história ainda não tínhamos uma urbanização forte,
isto implica dizer que a sociedade não girava em torno da cidade, e sim das
fazendas. Eram nelas que se concentrava o poder das decisões econômicas. Elas funcionavam como organismos autônomos, e é justamente sobre
elas que falaremos a partir de agora.
9.2.3 – As grandes Fazendas de Café – a concentração do poder nas
fazendas
As fazendas de Castelo eram realmente grandes, a média de tamanho era o dobro das demais fazendas da região sudeste, e atingia 2.807
hectares. Dentro de suas terras, os fazendeiros detinham um poder quase
que ilimitado, eram senhores da vida e da morte não só de seus escravos e
empregados, mas também dos membros de suas próprias famílias.
A grande concentração de poder nas mãos dos fazendeiros era um
fenômeno nacional, e não apenas local. A própria estrutura da sociedade
dava suporte a este poderio, que em Castelo, por condições que iremos
abordar, era ainda maior.
As condições que garantiam maior poder aos fazendeiros eram o
tamanho das fazendas e a quase inexistência de meios de transporte e de
comunicação com os demais municípios e entre as próprias fazendas. O
isolamento comprometia a influência externa dos fazendeiros em relação
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a outros locais e até mesmo à Província. Mas, com certeza, fortalecia seu
poder interno, já que o isolamento dava-lhes a certeza da não intromissão
de nenhun tipo de outra autoridade em seus domínios.
As grandes fazendas se formaram em áreas desabitadas, salvo por
alguns índios, daí o motivo da imensa quantidade de terras. O tamanho,
aliado ao isolamento, fazia com que elas se tornassem praticamente auto-suficientes. Quase tudo de que se necessitava era produzido na própria
fazenda.
As fazendas eram o astro-rei, e em torno delas girava tudo que existia: mascates, escravos, padres, professores, médicos, políticos, etc. Os
fazendeiros eram os donos da verdade. A lei existia para legitimar seus
atos, pois a posse da terra, o único meio de produção de época, garantia-lhes direitos e poder ilimitado.
9.2.3.1 – A Posse da Terra
Quem detinha o poder de propriedade sobre a terra neste período
era, automaticamente, a pessoas mais poderosa da sociedade. Veremos
agora como se processava o direito de propriedade da terra, direito esse
que era de uma ínfima parcela da sociedade.
O que predominava em nossa região eram as terras devolutas
(abandonadas). O Estado tinha o poder de vendê-las aos interessados.
Mas a venda de terra pelo Estado a particulares no sul do Espírito Santo, mais precisamente em Cachoeiro de Itapemirim, que incluía Castelo,
só teve início depois de 1860. A chegada dos primeiros fazendeiros em
Castelo é anterior a esta data, e isto nos faz acreditar que os primeiros proprietários de terra tiveram apenas o trabalho de ocupar e cultivar a mesma
sem comprá-la.
Depois de produtivas é que as fazendas eram legalizadas. As leis
que tratavam sobre a questão das terras beneficiavam a formação da
grande propriedade, pois a terra era uma mercadoria, e como tal, deveria pertencer a quem dispunha de recurso para adquiri-la. O avanço das
grandes fazendas se dava em detrimento dos pequenos proprietários, que
sem recurso para investir na produção e temerosos quanto às possíveis
dívidas para com o Estado, referentes à legalização de suas terras, acabavam cedendo à pressão dos grandes fazendeiros e vendendo para eles
suas propriedades.
Com a venda de terras devolutas, o Estado arrecadava recursos,
por isso mesmo ele incentivava as transações que tinham como objetivo
também trazer mais fazendeiros para nossa região. Como principal estratégia para atrair proprietários, o Governo usava os baixos preços das terras,
que eram os menores da Região Sudeste. De 1863 a 1871, ele baixou o
preço médio da braça quadrada de terra de 1 réis e 3/10 para 6/10 de réis.
Os fazendeiros chegavam, ocupavam a quantidade de terras que
lhes convinham, colocavam seus escravos para trabalhar, e só depois de
anos produzindo, eles regularizavam a situação de suas terras com o Es-
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tado, a preços irrisórios. Os pequenos fazendeiros, que porventura estivessem utilizando-se de terras devolutas entre as grande fazendas que
interessassem aos grandes proprietários, não tinham chances de permanecerem ali, pois sofriam todo tipo de pressão para vendê-las aos poderosos fazendeiros.
Analisamos, de forma genérica, como um pequeno grupo de grandes fazendeiros controlavam a região que veio a se tornar o nosso Município. Vimos também, de forma geral, como se constituiu uma sociedade de
poucos privilégios e extremamente excludentes. Agora iremos nos ater às
questões mais específica dos fazendeiros mais importantes.
9.2.3.2 – As Fazendas
A primeira fazenda que iremos abordar é a Fim do Mundo, que conserva este nome até hoje. O proprietário era o Sr. Honório Vieira Machado, um dos irmãos Vieira Machado da Cunha, que foram os pioneiros na
implantação das grandes fazendas escravocratas em nosso município. O
fazendeiro que era casado com Clara Ramos do Prado Amaral faleceu no
dia 19 de junho de 1864, deixando os seguintes herdeiros: Pedro (14 anos),
Ana (13 anos), Zulmira (11 anos), Engracia (10 anos), Vantuil (9 anos), Izabel (8 anos), Honorio (6 anos), Adelina (4 anos), Amassilia (2 anos), Júlia
(1 ano) e Honório (2º).
A fazenda Fim do Mundo era extremamente grande e possuía quatro sesmarias (uma sesmaria possuía em média 6.500 m² de terras), seus
limites eram às margens do Rio Castelo, ao sul, com Francisco Alves Carneiro, e ao norte, com Lourenço Bernardo de Souza, que era filho do Barão
de Guandu, dono da fazenda Santa Helena. Do lado de cima, o limite eram
as terras de Manoel Vieira Machado, da fazenda São Manoel.
O produto cultivado para o mercado era o café. Quando o proprietário da fazenda morreu ela possuía um total de 99 mil pés de café. Também
faziam parte da fazenda uma casa de centro, uma casa de sobrado, um
armazém para guardar café, uma casa de engenho de cana, um paiol para
guardar milho, uma senzala de telhas e um chiqueiro.
Entre os bens móveis da fazenda constavam camas, cadeiras, sofás, objetos de uso doméstico, joias, piano, relógio de parede, lampião a
querosene e ferro de engomar. O valor dos bens móveis existentes na fazenda, em 1865 era de 14.004.450 mil réis.
Para ajudar na produção do café, existiam também na fazenda 8
bois, 10 garrotes, 7 vacas com crias, bestas e 6 animais de selas, além
de uma balança de 60kg e várias enxadas. Mas, a principal ferramenta de
trabalho do fazendeiro, eram os escravos, que desempenhavam todo tipo
de trabalho, desde as mais simples atividades domésticas, até o árduo
trabalho nas lavouras cafeeiras. O Sr. Honório Vieira Machado possuía 58
escravos, sendo que 32 eram homens, 14 mulheres e 12 crianças.
Outra fazenda deste período, e também do mesmo proprietário da
anterior, era a de São Cristóvão, que se localizava onde hoje existe uma
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comunidade com o mesmo nome. Seus limites eram a leste, com a Fazenda da Prata, pertencente a Joaquim Vieira Machado da Cunha (irmão de
Honório Vieira Machado); a oeste, com terceiros pertencentes ao Major
Antônio Vieira da Cunha (irmão de Honório Vieira Machado).
A fazenda São Cristóvão possuía 3 sesmarias, uma casa que funcionava como sede e um rancho coberto de telhas. Ela também produzia
café só que em menor quantidade do que a do Fim do Mundo, pois possuía
apenas 8 mil pés de café, além de 6 alqueires de capoeirão.
A Fazenda do Centro foi uma das mais importantes de nosso município, pois além de ter sido fundamental no período das grandes fazendas
que estamos estudando, também foi palco do período anterior, o da mineração, e também teve participação imprescindível no período que analisaremos posteriormente, o da agricultura familiar com os imigrantes italianos.
Na época da mineração, a referida fazenda pertencia ao velho Povoas, um minerador e que com o fim das atividades de mineração na região, acabou abandonando a fazenda. Por volta de 1845, o Major Antônio
Vieira Machado da Cunha, um dos pioneiros na produção de café em Castelo, funda a Fazenda do Centro. O Major era casado com Maria Leopoldina, com quem teve apenas uma filha, Ana.
A filha do Major casou-se com o português Manoel Fernandes de
Moura, que era comerciante na rua da Candelária no Rio de Janeiro. O Sr.
Moura, como era conhecido, herdou a fazenda com a morte do Major. Com
a morte do Sr. Moura, durante uma viagem da Europa para o Rio, a fazenda passou por algumas pessoas e acabou sendo comprada pelos padres
Agostinianos, mas essa transação já faz parte da segunda fase do café em
Castelo, que discutiremos mais adiante.
No período das grande fazendas, a do Centro foi a mais importante,
não só do que veio a se tornar o município de Castelo, mas de toda a região
do sul do Espírito Santo. Ela possuía, em 1870, 161 escravos e 242 mil pés
de café. Seu patrimônio total, incluindo pés de café, terras, instalações e
equipamentos, residência, pertences e animais atingia 245,303 mil réis.
Entre as benfeitorias
existentes na maior fazenda da região sul estavam:
Engenho de Pilão, Engenho
de Serra, Torno, Engenho
de Mandioca, Engenho de
Pilar Arroz, Engenho de
Cana, Enfermaria com varandas, Olarias, Telheiros,
Moinho, Curral, Lavador de
Café, além de 39 senzalas,
algumas com assoalhos.
Casarão da Fazenda do Centro - Atual - Castelo - ES
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Estes objetos enumerados eram utilizados para o trabalho, mas existiam
ainda os que eram para o lazer dos proprietários, como por exemplo, piano
de cauda, casa de vivenda assombrada, mobílias de jacarandá, joias e
objetos de ouro e prata.
A Fazenda do Centro limitava-se ao norte, com as vertentes dos rios
Jucu e Tapera e terras devolutas; ao sul, com as fazendas Criméia e São
Cristóvão, além de terras devolutas, que por sua vez, faziam limites com o
núcleo colonial Rio Novo, e também com as vertentes dos rios Prata, Fruteira, Rio Novo e Beneventes.
A leste, as terras da Fazenda do Centro limitavam-se com as vertentes dos rios Jucu, Beneventes e São Cristóvão, e também com terras
devolutas. A oeste, os limites eram as fazendas Criméia, São Manoel, Povoação, Bella Aurora e Pindobas, além do sítio Santa Izabel.
Casarão da Fazenda do Centro - Início do Século XX - Castelo - ES
Temos ainda a Fazenda da Povoação, que assim como a do Centro,
também presenciou as duas importantes fases da história econômicas do
nosso município, a mineração, a produção de café nas grandes fazendas
escravocratas e a agricultura familiar com o imigrantes italianos. A Fazenda Povoação ficava na região onde é hoje a comunidade de Limoeiro e
pertencia a José Vieira Machado, natural de São João Del Rei, que era
casado com Lina Ludgaria Vieira Souza, irmã de Antônio Vieira Machado
da Cunha, da Fazenda do Centro.
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José Vieira Machado era Capitão reformado da Guarda Nacional
e Cavaleiro da Imperial Ordem de Cristo. O inventário de seus bens foi
feito em 1871, após sua morte. Além da viúva Lina, deixou como herdeiros: filhos, genros e noras. Rachel (30 anos), casada com Francisco Vieira
de Almeida Ramos, Rita (28 anos), casada com José Nunes de Almeida
Ramos, Januária (27 anos), casada com Gabriel Ferreira Pena, Conrado
Vieira Machado (25 anos), Teodozia (22 anos), casada com o Major Antônio Rodrigues da Cunha, Cezar Vieira Machado, (19 anos) solteiro, Maria
Lina (24 anos), solteira, Isabel (17 anos), casada com Bernardo de Almeida
Ramos e Josephina (13 anos), solteira.
O fazendeiro da Povoação tinha 9 filhos ao todo, e antes de morrer,
deixou um testamento o qual iremos citar seus pontos mais importantes.
No testamento, ele diz ser uma pessoas muito católica e temente a Deus,
além de ser fiel à esposa e aos preceitos da religião. Os testamenteiros
são: Conrado Vieira Machado (filho), Francisco de Almeida Ramos (genro),
Rachel (filha), Gabriel Ferreira Pena (genro) e Jenuária (filha).
José Vieira Machado, em seu testamento, deixou 500 mil réis de
esmola para a igreja que seria construída em Cachoeiro e 100 mil réis para
os pobres. Deixou também, para um tal Felício Carolina, o sítio de Santa
Justa, no Córrego do Remanso. Libertou os escravos pardos: Henrique,
filho de Josephia, e Fernando, filho de Micaela, que ganharam 10 alqueires
de terras no Remanso, além de ter libertado também os escravos crioulos:
Anastácio e sua mulher Carolina.
Aos filhos: Rachel, Rita, Januária, Theodosia, Conrado e Isabel, que
eram emancipados, deixou por doação 7 contos e duzentos réis a cada um.
A filha solteira recebeu igual valor, porém, em bens.
A Fazenda Povoação possuía um total de terras de três sesmaria e
meia. Os limites eram a cabeceira do ribeirão, denominada povoação, bem
como todas as suas vertentes; do lado de baixo, com a Fazenda denominada Centro, na Cachoeira do Veado. A fazenda possuía 161.000 pés de
café, além de 5.000 pés de mandioca. Toda essa plantação, assim como
todo os outros tipos de trabalho, eram realizados por 56 escravos, sendo
22 homens, 20 mulheres e 14 crianças.
A Fazenda contava também com um rebanho de 14 bois, 10 novilhas, 7 vacas, 1 touro, 1 jumento, 13 bestas e 8 burros. Como bens de
raiz, ou seja, imóveis, a fazenda possuía 1 casa de vivenda, 1 engenho de
pilões, 1 paiol de telhas, 1 prensa de moer mandioca, 1 casa de senzala,
1 casa de estrebaria, 1 casa e 1 paiol no sítio de Água Limpa, 1 serraria e
seus pertences, 1 casa de tropa, 1 olaria e forno de telhas.
A Fazenda Povoação era famosa pelo seu luxo e pelas festas que
promovia. Dentre os objetos de uso doméstico podemos citar alguns, como
os castiçais e os talhares de prata, os aparelhos de chá e jantar de louça,
o relógio de ouro, e outro de parede de caixa e também um piano. A casa
também possuía cômodas de vinhático, jacarandá, mesas para refeição,
guarda-louça e várias cadeiras.
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Os objetos para o trabalho doméstico eram uma máquina de costura, várias facas de cabo de marfim, panelões de ferro, tachos e bacias de
cobre.
Encontramos também a Fazenda Santa Helena que ainda conserva
o mesmo nome. Ela fica situada atualmente no município de Conceição do
Castelo, que se desmembrou do nosso, mas optamos por incluí-la neste
estudo por acreditarmos que a mesma teve uma contribuição importante
na história de Castelo.
A Fazenda Santa Helena pertencia ao Sr. João Bernardo de Souza,
tenente-coronel da Guarda Nacional, que também detinha o título de Barão
do Guandu. A dita Fazenda era composta por outras fazendas, como a de
Santa Tereza, São Quirino, Nogueira, Ribeirão e Santa Maria, somando um
total de 17.246.453 m².
Na lista de inventário de bens existentes na fazenda constam: paiol
para milho, engenho para beneficiar café movido à água, lavadouro de
café, tulha para café, moinho de fubá, engenho de serra, serva para engordar porco, galinheiro e cerca de duzentos mil (200.000) pés de café. O
rebanho da fazenda possuía 70 cabeças de gado, 4 animais de montaria e
18 bois de canga (usados para transporte).
A casa da sede da Fazenda ainda se encontra de pé, servindo de
morada aos herdeiros do barão. Pelo seu tamanho e suntuosidade podemos imaginar o que de fato foi a fazenda no passado. As janelas da casa
são no estilo francês, com muitos vidros; os móveis são austríacos; o teto é
forrado com madeiras trabalhadas; a varanda e a fachada são cobertas por
telhas colonial-francesa. A todas essas características, soma-se o fato dela
estar localizada em um lugar alto, proporcionando, através de suas janelas
e varandas, um belíssimo visual da região.
Dos herdeiros de João Bernardes de Souza, o Barão de Gandú, o
que ficou com a sede, com o casarão foi Marcelino Bernardes de Souza,
fruto de uma relação extra conjugal com uma escrava. Marcelino Bernardes de Souza morava com a família do pai, e segundo os seus descendentes, atuais moradores, era o preferido do Barão. É este filho, bastardo, que
comprou dos irmãos, que não tinham interesse na fazenda, parte dela, a
sede e alegou aos seus.
O que muito nos entristece é o péssimo estado em que se encontra
o casarão, não só pelo que representou em produtividade, mas também
pelo destino incomum que teve.
Também da família Vieira Machado, instalou-se em Castelo o tenente Joaquim Vieira Machado da Cunha, irmão de Antônio e Honório Vieira
Machado da Cunha. Joaquim fundou a Fazenda da Prata, nome que persiste até hoje, próximo ao ribeirão de mesmo nome, que era afluente do
Ribeirão do Meio. A fazenda fazia divisa com a Fazenda São Cristóvão,
de seu irmão Honório, e com a Fazenda do Centro, de seu irmão, Antônio.
Joaquim Vieira Machado da Cunha era casado com Ana Cunha e
teve os seguintes filhos: Maurício, Joaquim, Joaquina, Belizário, Lourenço,
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José, Francisco, Lafayete e Maria. A Fazenda tinha como administrador
José da Rosa Machado, que posteriormente foi proprietário da Fazenda
Boa Vista.
Infelizmente não encontramos dados mais específicos sobre a Fazenda da Prata em livros de cartório, mas o pouco que encontramos nos
dá cota de que era grande, assim como as demais fazendas da região. Não
são poucas as histórias que ouvimos contar a respeito da forma como eram
tratados os escravos e as escravas desta fazenda, rendendo ao local o
apelido de Fazenda do Suplício. Grande parte das histórias contadas sobre
os escravos não tem comprovação histórica.
Antigo Casarão da Fazenda da Prata - Arquivo de Família - Castelo - ES
Casarão da Fazenda da Prata - Arquivo de Família - Castelo - ES
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A única construção do período que ainda está de pé é o cemitério com jazigo do fazendeiro e sua
esposa.
A Fazenda São Manoel também pertencia a um dos irmãos, Vieira
Machado da Cunha, Manoel Vieira Machado da Cunha, e se localizava próximo ao Vale do Córrego de Boa Esperança, prologando-se até as matas,
às margens do rio Castelo. Segundo as poucas informações que conseguimos obter sobre a mesma, ela possuía muitos escravos, casa e instalações
majestosas.
Manoel Vieira Machado da Cunha era casado com Ana Rosa do
Prado, filha de uma família de Duas Barras. O casal teve os seguintes
filhos: Lindalva, Escolástica, Minerva, Mizael, Manoel, Alfeu, Pedro, Eliza,
Ana e Maria. A dita Fazenda mantém o mesmo nome até os dias de hoje.
Próximo à Fazenda São Manoel, foi fundada a Fazenda Ante-Portão, de propriedade de João Pinheiro de Souza, casado com Francisca
Vieira Machado de Souza, irmã dos Vieira Machado da Cunha. Ainda segundo informações, esta Fazenda não tinha a mesma riqueza e opulência
das outras regiões.
O casal proprietário da Fazenda Ante-Portão teve os seguintes filhos: João Carlos, Adelaide, casada com Manoel Davel; Elisa, casada com
Alfredo Magalhães; Leonor, casada com Antônio da Silva Pinheiro; Carlos,
casado com Lindalva; Antenor, casado com Adelaide; Maria e Rosa, solteiras; e Virgínia, casada com Camilo Homem de Azevedo (de Pindobas).
Por último, temos a fazenda de Gabriel Vieira Machado, que apesar
do mesmo sobrenome, não era irmão dos demais. As fazendas de Gabriel chamavam-se Universo e Conquista. Vejamos alguns dados sobres
as mesmas.
Gabriel instalou-se em Castelo na mesma época dos demais fazendeiros, e veio a falecer em 23/06/1871, deixando viúva a senhora Isabel de
Sales Vieira e órfãos os filhos: Francisco de Sales Vieira Machado (9 anos),
Isabel de Sales Vieira (8 anos), Bernardo de Sales Vieira Machado (7 anos)
e Lídia de Sales Vieira (3 anos).
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As Fazendas Universo e Conquista tinha 40 mil pés de café e contavam com 19 escravos, sendo 9 mulheres e 10 homens. Para trabalhar
na produção, Gabriel Vieira Machado também contava com um rebanho
de 2 bois, 3 vacas, 1 touro, 3 garrotes, 2 bestas, 2 cavalos, 6 porcos, um
cachaço e 16 capados magros.
Em termos de ferramentas, as fazendas contavam com 9 foices, 2
machados, ferramentas de ferrar, 1 serrote grande, 1 serrote de gurpião,
ferramentas de carpinteiro, 1 carro de boi em mau estado, 1 corrente para
puxar madeira e 3 cangas de boi. Possuíam também uma casa de moradia,
paiol, tulha, senzala, moinho, engenho de cana, casa para fornos, galinheiros, chiqueiro, cobertura para forno e dois pastos cercados.
Com relação aos bens de utilidades domésticas, podemos dizer que
não era tão suntuosas, tomando como referência as demais fazendas. Elas
possuíam apenas 1 relógio de parede, uma abotoadeira de ouro, 1 cama, i
oratório, 1 espingarda, 1 espada, mesas, bancos, tachos e bacias de cobre,
além de um forno de torrar.
As terras da Conquista, que não conseguimos encontrar o tamanho, foram avaliadas, após a morte de Gabriel em 4.800.000 réis, e as da
Fazenda Universo, que também não encontramos o tamanho, foram avaliadas em 5.000.000 réis. As duas somavam um total de 9.800.000 réis. Só
para o leitor ter uma ideia, a Fazenda Povoação com três e meia sesmarias
foi avaliada em 16.750.000 réis.
Para situar cronologicamente o leitor, é importante lembrar que o início da construção das grades fazendas foi a partir de 1840, e o seu período
de prosperidade se estendeu até 1888, ano da abolição dos escravos. Não
é demais lembrar aqui, que estas datas têm como principal função situar
historicamente o leitor, e não criar datas estanques, com grandes rupturas.
Apesar das grandes extensões de terras e do poder sobre os que
nelas habitavam, os fazendeiros não se permitiam muito luxo, ou seja, não
gastavam seu capital com aquilo que não estava diretamente ligado à produção cafeeira. Esta foi a conclusão a que chegou Vilma Paraíso Almada em sua obra “Escravismo e Transição”. Durante suas pesquisas, ela
chegou aos seguintes números com relação aos bens dos fazendeiros: na
Fazenda Fim do Mundo, 82,3% dos bens do fazendeiro eram em escravos
e terras, e na Fazenda do Centro esse número era de 81,5%.
Após enumerarmos as características mais gerais, e também as
mais específicas sobre as fazendas, iremos analisar seu tipo de produção,
pois a estrutura e a organização das fazendas, que concentravam toda organização social da época, estavam voltadas para produção, transporte e
comercialização do café. Como nosso enfoque sobre a história de Castelo
parte do econômico, não poderíamos deixar de analisar como estava organizado o Sistema de Plantation em nossa região.
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9.2.4 – O Sistema Plantation
O Sistema Plantation era usado nas colônias, e através dele, a metrópole buscava se enriquecer. Nesta época, a partir de 1840, o Brasil já
não era mais colônia de Portugal, mas infelizmente nossa independência
política não teve reflexos na economia, que permaneceu com a mesma estrutura do período colonial. Sendo assim, o Plantation imperou em Castelo,
mesmo com o Brasil já independente. A principal característica do Plantation era a utilização da mão-de-obra dos escravos, pois todo e qualquer
tipo de trabalho era feito por eles. Outra característica eram as grandes
extensões de terras para que pudesse ser cultivado um só produto, que
teria como endereço o mercado exterior.
Já que o destino da produção era o mercado externo, vejamos como
se processava o seu escoamento, pois sabemos que foi a partir de 1840
que se formaram nossas primeiras fazendas de café. Foi também neste
período que surgiram as primeiras casas comerciais localizadas na altura
do rio (parte não navegável em função das grande quantidade de pedras)
que formaram a Vila de São Pedro das Cachoeiras do Itapemirim atual
município de Cachoeiro de Itapemirim.
Não encontramos nada que falasse diretamente de como se transportava a produção cafeeira das fazendas da região de Castelo, mas não
é difícil refazer o trajeto, já que dispomos de informações que nos podem
auxiliar nesta tarefa. No período do ouro, o transporte era feito através do
Rio Castelo, passando pelo Rio Itapemirim e daí se dirigindo a Vitória ou
ao Rio.
O café, por ser um produto mais volumoso do que o ouro, apresentou mais dificuldades para ser transportado. A primeira dificuldade por qual
passou foi não poder utilizar o Rio Castelo como meio de transporte, pois
o volume da água deste rio não era suficiente. Sendo assim, a produção
seguia até a Vila de São Pedro das Cachoeiras de Itapemirim no lombo
de animais e em carros de boi. Esta versão se confirma à medida que
encontramos nos diversos inventários de bens das fazendas pesquisadas
um número razoável de animais de cargas, bem como as cangas, juntas
e carros de boi.na Vila, o café era colonizado e daí seguia em pequenos
barcos até o porto de Itapemirim. A Vila de São Pedro das Cachoeiras do
Itapemirim servia como entreposto comercial de toda a região, pois lá se
concentrava um considerável número de comerciantes oriundos de Portugal e do Rio de Janeiro, que estabelecidos no Largo de São Pedro, negociavam fazendas, roupas feitas, armarinhos, ferragens, calçados, louças,
sal entre outras coisas.
O comércio varejista esbarrava em um grande obstáculo, que era
a auto suficiência das fazendas que produziam praticamente tudo que era
necessário para viver naquela época. O que realmente impulsionava a Vila
era a comercialização e o transporte do café. Sua localização também era
de importância fundamental, já que a mesma ficava no centro de uma grande região produtora de café, e ainda contava com um rio que dava condi-
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ções de escoar o produto até o Porto de Itapemirim.
A ligação fluvial não era a única da Vila com o Porto de Itapemirim,
existia também a terrestre, que inclusive era amais rápida, gastando a metade do tempo que a fluvial. Apesar de rápido, o transporte terrestre em
precárias estradas e em lombos de animais ficava impraticável no período
de chuvas, e a quantidade transportada por terra era muito inferior à transportada através do rio.
Foi em busca de rapidez e eficiência para o transporte fluvial, que o
Capitão Deslandes inaugurou, em 03 de abril de 1876, a linha de vapores
para cargas e passageiros, substituindo as antigas e lentas embarcações
anterior que se deslocavam ao sabor dos ventos e da força de seus condutores. As ferrovias, tão comuns nas regiões produtoras de café de São
Paulo e do Rio de Janeiro, só foram implantadas em nossa região a partir
de 1891, período em que as grande fazendas já haviam iniciado seu processo de desintegração.
De forma geral, os meios de transporte eram muito precários no período inicial das grandes fazendas, onde somente burros e bestas de cargas conseguiam chegar a todo Espírito Santo. Existia somente a estrada
geral que cortava a Província de norte a sul pelo litoral, com entroncamento
para as vilas do interior, o caminho do Itapemirim às minas do Castelo, com
12 léguas, a estrada da Baía do Espírito Santo a Viana, em antigas e abandonadas estradas que ligavam as remotas fazendas jesuítas.
9.2.5 – Os Escravos
Dedicaremos uma parte deste trabalho ao estudo sobre a escravidão nas fazendas de Castelo. Todo o sistema de produção, transporte
e comercialização até aqui descrito, só foi possível graças à utilização da
mão-de-obra escrava. Eram o suor, o sangue e a própria vida dos escravos
que movimentavam toda essa cadeia de produção.
Se existe uma etnia que deve se orgulhar de ter trabalhando pelo
progresso e desenvolvimento de nosso município em sua fase inicial, com
certeza, é a negra, pois foi através de seu trabalho, e em detrimento de sua
liberdade e de todos os demais direitos inerentes ao seu humano, que se
construíram as grandes fazendas que acabaram por dar origem à Vila, e
posteriormente ao Município de Castelo. Desde as primeiras derrubadas,
com apenas foices e machados para se plantar o café, passando-se pela
plantação, cultivo, colheita e transporte do produto, nas construções das
casas, em sua manutenção, e também na abertura das estradas, estava a
mão-de-obra escrava.
O aumento da produção no sul da província se deu a partir de 1850,
em função da produção do café.
Na freguesia de São Pedro do Cachoeiro, que incluía as terras do
Castelo, em 1872, metade da população era de escravos, todos de migração interna, já que o tráfico de escravos direto da África foi proibido em
1850.
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A escravidão se torna algo inexplicável e inaceitável aos nossos
olhos hoje, mas enquanto vigorou foi plenamente aceita e desfrutada pela
maioria da população livre. O escravo era considerado um objeto qualquer,
uma ferramenta de trabalho. Os escravos eram comprados e vendidos, ou
seja, comercializados como animais ou fazendas. Enquanto propriedade
de seu senhor, o escravo existia para servir ao mesmo. Seus sentimentos,
sonhos e aspirações não eram levados em conta, e sua vida estava nas
mãos do seu senhor, que podia comercializá-lo, trocá-lo, enfim, fazer o
melhor que lhe fosse favorável.
Existia todo um aparato ideológico para que o absurdo da escravidão fosse não só aceito, mas considerado como necessário e indispensável ao progresso não só de nossa região, mas de todo o país. Este aparato
atuava em duas frentes, uma direcionada à população livre, e outra ao
próprio escravo. Esta ideologia consistia basicamente na superioridade do
senhor e na submissão dos escravos.
Não era a cor da pele que justificava a escravidão, pois outras raças, como o índio, também já haviam sido escravizadas no Brasil e provavelmente em Castelo. Sendo assim, o que justificava a escravidão era a suposta inferioridade que era incutida na cabeça dos escravos e propagada
por toda sociedade. Muitas vezes os escravos acabavam por refletir o que
a sociedade pensava sobre eles, e incorporavam a equivocada inferioridade. E assim surge o preconceito racial no Brasil e em nossa região, pois à
medida que o próprio escravo assume a suposta inferioridade, a sociedade
livre, em geral, acredita na mesma.
Desta forma, o preconceito racial surge na necessidade de se justificar o injustificável: a escravidão. Apesar desta macabra origem, ainda
hoje encontramos pessoas que defendem a superioridade da raça branca,
fazendo eco às antigas ideologias escravistas. É claro que só a ideologia
não funcionava, e mesmo com grande esforço da Igreja e da sociedade
da época, aconteciam rebeliões e fugas de escravos, entrando em cena
o aparato repressivo do Estado com suas milícias e também a segurança
privada dos fazendeiros com jagunços e feitores.
Basicamente era essa a rotina dos escravos nas fazendas de café
de castelo. Às 5 horas já estavam todos de pé e prontos para tomar o café,
que era um pedaço de broa de milho regado a café. Antes de se dirigirem
ao trabalho nas lavouras eram obrigados a rezar. Nesta oração matinal
difundia-se, com certeza, a superioridade da raça branca e a necessidade
da submissão negra através do trabalho, para que aquelas pobres almas
obtivessem o paraíso após a morte. Terminada a oração, os negros se dirigiam à lavoura, onde às 9 horas, recebiam o almoço em grandes gamelas
comunitárias.
Às doze horas era a vez do café com batata assada, banana, angu
e café para não engasgar. Às 16 horas, mais uma refeição, que servia
como jantar, pois os escravos só retornavam às suas senzalas ao anoitecer, quando recebiam a última refeição do dia, que era broa de milho com
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café, ou às vezes, para variar, angu com melado de cana. No período de
frio, eles recebiam um pouco de aguardente para esquentar, e os fumantes
uma quantidade de fumo. Às 20 horas se recolhiam para dormir, mas não
sem antes fazer as orações e terem aulas de catecismo, para que não esquecessem de sua inferioridade e necessidade de submissão para agradar
a Deus.
A organização econômica de Castelo, em cima da mão-de-obra escrava e monocultura para exportação, inicia-se quando o sistema escravista começa a se desestruturar em vários lugares do Brasil, a partir de 1850,
por pressões internas e externas, mais pelas últimas do que pelas primeiras. Desta forma, o período em que foi utilizada a mão-de-obra escrava em
nossa região foi curta, em comparação a outras regiões. Buscaremos percorrer os caminhos trilhados pelos negros de nossa região até a liberdade.
As relações sociais de trabalho em uma sociedade escravista não
são nem um pouco tranquilas. Eram comuns os confrontos entre escravos
fugitivos e a polícia. Tais confrontos geravam pânico na sociedade da época. Os quilombos, que para os negros representavam a liberdade, para
a população não escrava eram motivo de preocupação. A única maneira de um escravo fugitivo sobreviver era ir para os quilombos, pois em
grupos eles desenvolviam os mecanismos de sobrevivência, que muitas
vezes infringiam às leis da época. Na ânsia de sobrevivência, e ao mesmo
tempo de vingança, os negros rebeldes promoviam assaltos, assassinatos
e sequestros que aterrorizavam as pessoas. Em uma sociedade onde o
simples fato de ser livre é uma infração às leis vigentes, fica difícil de se
estabelecer um juízo de valor.
Entre os abolicionistas de nossa região percebia-se uma forte tendência conservadora dos que acreditavam em uma liberdade lenta e gradual, condenando a liberdade por fugas dos escravos. Para esses senhores,o
meio de conseguir a liberdade era através das associações abolicionistas,
onde se angariavam fundos com a finalidade de comprar, junto aos donos
dos escravos, as alforrias dos mesmos. Uma grande incoerência, que explorava as raias do absurdo, pairava sobre o movimento abolicionista, pois
os mesmos que defendiam a liberdade, condenavam as fugas dos negos
e os quilombos.
Desta forma esses abolicionistas negavam aos negros o direito de
serem sujeitos de sua própria história. Indiferentes à ação dos abolicionistas, os negros tinham seus próprios meios de lutar contra a escravidão,
sendo os principais as fugas, os suicídios, os abortos, os assassinatos de
feitores e de senhores, o desperdício e a lentidão na execução dos serviços. Não foram os anúncios publicados em jornais da época, que ofereciam recompensa a quem desse o paradeiro de escravos fujões. Este fato
nos leva a crer que o número de escravos fugitivos na região das grande
fazendas de Castelo foi muito grande. Parece-nos muito sugestivo, inclusive, em nosso município ter uma localidade denominada Quilombo. Ora,
o que era o quilombo senão o reduto desses escravos que sonhavam com
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a liberdade? Provavelmente, só teremos comprovação desses fatos com
escavações arqueológicas na região. Mas, tudo leva-nos a crer que no passado de escravidão em Castelo, onde hoje é “Quilombo”, tenha sido uma
comunidade de escravos fugitivos das grandes fazendas de café.
Robson Luís Machado Martins, em seu livro “Os Caminhos da Liberdade”, onde enfoca a questão da escravidão na província do Espírito
Santo de 1884 a 1888, afirma que foram dois os motivos que levaram os
negros de nossa região à liberdade. O primeiro foi a concessão, por parte
dos fazendeiros, de um grande número de cartas de alforria, às vésperas
da abolição. E, o segundo motivo foram os próprios negros, que atentos a
tudo que se passava ao seu redor e percebendo a fragilidade da estrutura
escravista em sua fase final, promoviam fugas e distúrbios para atingirem
a liberdade.
Com concessão de cartas de alforria em massa, os fazendeiros buscavam conquistar a simpatia e a gratidão dos escravos, para que os mesmos continuassem em suas fazendas depois da abolição, que aconteceria
em questão de dias. E, em 13 de maio de 1888, a tão sonhada liberdade
chegou. As comemorações se espalharam por todos os lados, e muitos
temiam que o acontecimento fosse desencadear o caos e o fim das atividades produtivas. Enfim, que havia construído toda a riqueza que existia
em nossa região com o esforço de seu trabalho, é colocado em liberdade,
mas sem um mínimo de direito de desfrutar de toda riqueza que construíra.
9.2.6 – A Decadência das Grandes Fazendas
a abolição da escravidão representou o fim de uma era em nossa
região. As grandes fazendas produtores de café não resistiram ao duro golpe da abolição da escravidão e iniciaram um processo de decadência, que
no caso especifico da região de Castelo, constituiu na divisão da terra, formando pequenas propriedades. O problema da falta de mão-de-obra não
foi o único responsável pelo fim da era das grande fazendas em Castelo,
a ele se juntaram outros, que acabaram de compor um cenário totalmente
desfavorável à existência das mesmas. Entre esses problemas secundários, podemos enumerar alguns como, a dificuldade de transporte devido à
precariedade das estradas, a baixa produção da região sul, em termos de
Brasil, o grande número de terras hipotecadas no Banco do Brasil, e também o pouco investimento em máquinas de beneficiamento da produção.
Estes fatores eram consequências da baixa produtividade e lucratividade
de nossas fazendas, quando comparadas às do Rio e de São Paulo.
A abolição da escravidão era algo esperado e inevitável, mas mesmo assim nossos fazendeiros não se prepararam para a transição da mão-de-obra escrava para a assalariada, mesmo porque eles não estavam capitalizados o suficiente para tanto. Diante da natural aversão dos antigos
escravos ao trabalho rural, a solução para o problema da mão-de-obra foi
a vinda dos imigrantes europeus, no caso específico de Castelo, em sua
grande maioria, os italianos.
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Na tentativa de resistir a uma situação adversa, e mediante ao processo agonizante por qual passavam suas propriedade devido à carência
de mão-de-obra, os fazendeiros buscam formar com os imigrantes recém-chegados ao velho mundo, contratos de parcerias. Tais contratos não
surtiam efeito por motivos óbvios, já que era grande o número de terras
devolutas, e o Estado as vendia por preços convidativos ou simplesmente
as cedia nos Núcleos coloniais, como o do Rio Novo. Desta forma, os que
atravessaram o Atlântico sonhado com uma nova vida, não se sujeitaram
ao trabalho de parceria por muito tempo, visto que com um pouco de sacrifício podiam adquirir sua própria terra. A forma de lidar com a mão-de-obra que os fazendeiros estavam acostumados, com certeza, acelerou o
processo de independência dos imigrantes, pois por pior que fosse a vida
que levavam na Itália, ela não era igual ao tratamento recebido pelos escravos nas lavouras e senzalas, e que por força do hábito, os fazendeiros
dispensavam aos imigrantes.
Dedicaremos as próximas linhas à segunda fase da produção de
café em Castelo, contando agora com um fator novo, a presença do imigrante italiano, que veio se juntar aos que aqui, durante séculos, construíram a história do que veio a se tornar o município de Castelo. Buscaremos
abordar os principais aspectos deste período, cem como os desdobramentos dos acontecimentos que influenciam diretamente o nosso presente.
9.3 – Segunda Fase da Produção do Café em Castelo
9.3.1 – Os Imigrantes: motivos da vinda
Explicar o grande afluxo de pessoas no processo de migração requer conhecer as causa que as levaram a tal atitude e as causas que levaram um país estranho a recebê-las. Com certeza, a natureza sócio-político-econômica de tais países é a resposta para tal indagação. A conjuntura
da maneira como se processa a saída e a entrada dessas pessoas, suas
decepções, suas mágoas, suas necessidades, seus sonhos, suas ilusões,
tudo se mistura nessas situações.
Algo de muito forte estava acontecendo em alguns países europeus
para que populações estivessem abandonando suas pátricas, em especial
na Alemanha e na Itália, esta última de maneira muito particular, pois apesar dos alemães terem vindo primeiro, os italianos os superaram em quantidade. Houve várias migrações ao longo do tempo, sendo estimuladas
para o Brasil, forçadas, como a dos africanos, na condição de escravos,
ou livres, como as dos açorianos, suíços, alemães, italianos, pomeranos
e outros. O próprio governo português as incentivava como incremento à
nossa colonização. Vários sistemas foram criados para tal objetivo, porém
com muitos erros e fracassos.
Mas a migração ocorrida no final do séc. XIX superou as que já
haviam acontecidos.
Por que a Itália e a Alemanha? O que estava ocorrendo nestes paí-
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ses? O que motivou as pessoas a abandonarem o que tinham, rumo a uma
pátria estranha?
A resposta está na unificação tardia que se processou nesses países. Passaram ao longo do tempo, divididos, com interesses particulares
e externos para que assim continuassem. Mas os rumos da história na
Europa acabariam por levar esses povos de mesma cultura, ao objetivo de
se constituírem em nações autônomas. E, as ideias nacionalistas e liberais
vão, e muito, contribuir para isso.
Tão logo a unificação ocorre, ocorre também a implantação do capitalismo que impulsiona o aumento considerável da produção, sem a menor
necessidade da mão-de-obra. É esta sobra de população pobre e sem trabalho que leva à imigração.
O ato de migrar sempre esteve presente em toda história da humanidade, desde os tempos mais remotos até os dias de hoje. O imigrante
busca com seu ato um lugar melhor para viver. E, alimentados por esse
sonho, milhares de imigrantes italianos atravessaram o oceano e vieram
para o Espírito Santo construir uma nova vida.
Analisaremos o fenômeno de imigração italiana sobre dois aspectos, pois acreditamos que um fenômeno de tal magnitude, não se processa
com um motivo isolado. A imigração só se tornou realidade pela conjunção
de alguns fatores: de um lado, nossa pátria carente de mão-de-obra com a
eminente e inevitável abolição dos escravos, e do outro lado do Atlântico,
mais precisamente na Itália, um número crescente de pessoas que não
eram absorvidas pela industrialização italiana.
O que faltava aqui, sobrava lá. Desta forma, a imigração era útil
para os dois países, sendo inclusive um ato estatal. Para o governo brasileiro era a possibilidade de incrementar a produção agrícola e povoar
as regiões desabitadas. Para a Itália era uma das maneiras de manter o
controle social, já que com a imigração diminuía-se o número de habitantes
mais miseráveis, e consequentemente abrandava as pressões sociais por
mudanças.
Vejamos agora, de forma separada, as duas questões. Primeiro, o
crônico problema da falta de mão-de-obra em nossa região, e posteriormente, o excedente populacional não absorvido pela industrialização na
Itália. Se “para um pé torto sempre existe um sapato errado”, para o vazio
populacional do sul do Espírito Santo, existia o excedente populacional da
Itália.
Como afirmamos anteriormente, o Espírito Santo funcionou durante
um longo período como barreira de proteção às minas de ouro das Gerais.
Desta forma, ser desabitado era uma necessidade. Mas, passado o período do ouro em Minas, nossa Estado perde essa função, iniciando-se assim
uma tentativa estatal de povoar o Espírito Santo. O café era a principal
atividade econômica, mas carecia de um grande número de mão-de-obra
escrava, que estava cada vez mais escassa. Em 1850, em pleno início da
produção de café em Castelo, é lançada a Lei Eusébio de Queirós, que
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proíbe a importação da escravos.
Com o advento de tal Lei, resta aos fazendeiros locais a compra de
escravos somente de dentro do Brasil, de outras regiões outrora ricas e
prósperas. A partir de 1850, ocorre uma elevação do preço dos escravos,
graças à diminuição de seu número. Assim, os problemas de mão-de-obra
nascem junto com a própria cultura cafeeira castelense. À medida que o
capitalismo avançava, ficava evidente sua incompatibilidade com a escravidão, e a necessidade do trabalho livre era cada vez mais visível.
Se o capitalismo necessitava de trabalhadores livres para criar um
mercado interno de consumo, por que não libertar os escravos, para que
eles fossem os consumidores? Não é nossa intenção dar respostas a questões tão abrangentes, mas acreditamos que os séculos de escravidão e
suas terríveis consequências seriam um grande empecilho para que o negro fosse transformado subitamente em um livre consumidor, e de fato isso
não ocorreu. A abolição não foi acompanhada pela integração do negro à
sociedade e ao mercado de trabalho, devido ao fato de que permanecer
nas fazendas, para os negros, era a continuidade da condição de escravos,
já que mesmo com a libertação, era assim que os fazendeiros os enxergavam.
A opção encontrada para o crônico problema de mão-de-obra foi
incentivar a vinda de trabalhadores europeus, e neste período, os países
que tinham uma conjuntura interna que favorecia a emigração eram a Itália
e a Alemanha. E é justamente essa conjuntura que iremos analisar.
A Itália e a Alemanha foram os últimos países europeus a se unificarem, e essa demora na solução dos problemas políticos trouxe implicações
econômicas. Faremos um breve relado sobre a Itália no fim do século XIX,
período em que se iniciou a imigração.
A Unificação da Itália ocorreu em 20 de setembro de 1870, portanto,
a Itália, dentro do conceito de Estado Moderno, é um país mais novo que
o Brasil. No período em que antecedeu a imigração, a Itália estava dividida
em 7 reinos independentes.
O sul, onde predominavam as invasões estrangeiras de muçulmanos, alemães, franceses e espanhóis, era cobiçado devido a sua posição
estratégica na rota comercial do Mediterrâneo. As seguidas invasões eram
importantes fatores que dificultavam a unificação.
A região central era dominada pela Igreja, que temerosa com uma
possível unificação que lhe confiscasse a autonomia, agia de forma a impedir a unificação. Os papas buscavam enfraquecer qualquer tipo de Aliança
entre as regiões italianas, desta forma buscavam nunca ter que se submeter a um governo leigo central.
A região mais próspera era o norte, que por estar localizada mais ao
centro do continente europeu, fez valer sua vocação comercial. As cidades
de Gênova e Veneza, que desde as cruzadas, já estavam inseridas na rota
comercial da Europa, eram independentes economicamente, o suficiente
para se manterem livres das invasões estrangeiras.
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O avanço do capitalismo exigia a formação de Estados nacionais
com livre circulação de dinheiro, pessoas e mercadorias, e as diferenças
internas e o poder da Igreja acabaram por se render a essa exigência.
Coube ao Reino de Piemonte, localizado ao norte da Itália, a tarefa da
unificação, que se estendeu por 20 longos anos de duras batalhas, até que
em 20 de setembro de 1870, Vittório Emmanuel II de Roma, proclama o
Reino da Itália.
As bases para a formação do Estado italiano foram burguesas, e
por isso, o grosso da população era ignorada. As massas não figuravam
nem mesmo no conceito do povo, que para a recém-unificada Itália eram
somente os burgueses, os funcionários, os comerciantes e os advogados.
Apesar de terem participado de vários levantes no processo de unificação,
os pobres da Itália não se beneficiaram da mesma. A burguesia italiana
lutava contra a Áustria e osBoursbons, mas o restante da população, além
de se libertar destes, queria se livrar também dos patrões, e exigia terras e
liberdade. A unificação italiana, portanto, atendeu apenas aos burgueses.
Para os não-beneficiados pelo processo de unificação (os pobres)
restou a possibilidade de construir seus sonhos na América, pois a pátria
pela qual lutaram para unificar e arrancar das mãos dos estrangeiros, agora os estava expulsando. A Itália recém-unificada continuou sendo um pais
de poucos. A unificação não rompeu as rígidas estruturas sociais excludentes, e foram justamente os excluídos no processo de criação do país que
engrossaram as filas de embarques nos portos, rumo a um novo mundo,
rumo a uma nova vida.
Quando do início da vinda dos imigrantes, a Itália possuía 30 milhões de habitantes, sendo que desse total, 21 milhões viviam no campo.
Em uma pesquisa agrária ordenada pelo Parlamento italiano concluiu-se
que os italianos, em sua maioria, levavam uma vida difícil, onde faltava
de tudo: do alimento até o tratamento médico. A miséria era tanta, que na
tentativa de conseguir algum dinheiro, difundiu-se entre eles o costume de
vender as crianças. A malária matava 40.000 pessoas por ano, e a cólera,
entre 1884 e 1887, matou 55.000, sendo que esses altos índices atingiam
com mais frequência as crianças.
A Itália era um país excepcionalmente agrícola, e de uma agricultura
extremamente rudimentar. As práticas era as mesmas usadas no período
do Império Romano. Em um país extremamente populoso, com uma miséria crescente, a possibilidade de emigrar para um lugar com terras abundantes e virgens era um sonho. O medo do desconhecido e da possível
falta de estrutura da nova terra era insignificante diante dos fantasmas da
fome e da miséria.
A busca da terra, e através dela, da dignidade social, foi o motivo da
vinda dos imigrantes para o Brasil, e mais especificadamente para nossa
região do sul do Espírito Santo. Mais de 100 anos se passaram, e ainda
hoje, pessoas lutam por seu pedaço de terra e pela dignidade que ele possa lhes proporcionar.
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A imigração ajudou a preencher o vazio demográfico do Espírito
Santo ao mesmo tempo em que aliviou a pressão interna na Itália. Além
disso, proporcionou uma nova realidade para os imigrantes, que preferiam
enfrentar todas as dificuldades que passavam a continuar vivendo sem nenhum tipo de perspectiva e na mais absoluta miséria no velho continente.
9.3.2 – Núcleo Colonial Castelo
Apesar do nome, o referido núcleo colonial não tem nenhuma relação direta com nosso município, nem tão pouco ficava nos limites de onde
hoje é o município de Castelo. Mas a abordagem de sua História se faz necessária, pois foi um dos pioneiros no acolhimento aos imigrantes no sul do
Estado, e de lá, muitos imigrantes, posteriormente, se dirigiram a Castelo.
Antes de entrarmos direto na questão dos primeiros núcleos coloniais, é necessário dedicarmos algumas linhas à viagem dos imigrantes.
Atraídos pelas propagandas que lhes garantiam terras e condições de produção, muitos italianos se lançaram em cansativas viagens até o Espíritos
Santo. As primeiras viagens chegavam a durar 4 semanas, quando os navios eram movidos à vela e também a vapor. A partir de 1880, os navios
movidos à hélice diminuíam essas viagens, que passavam a durar entre
10 a 15 dias.
Durante as viagens, os homens jogavam baralho, e as mulheres
faziam tricô. Os alojamentos eram comunitários, chegando a ter 10 leitos
por quarto. As refeições iam piorando à medida que a viagem avançava.
As ondas sacudiam o barco e provocavam enjôo nos passageiros. As condições de higiene não eram das melhores, e os sanitários eram poucos.
Torna-se inevitável uma comparação com a viagem que os negros faziam
até chegarem a América, pois por piores que fossem as condições que os
imigrantes tinham, não chegavam nem aos pés, em termos de dificuldades,
das dos negros. As condições das viagens dos negros eram tão terríveis
e desumanas que mais da metade deles morriam durante o percurso até
chegarem à América.
Estabelecidas as condições das viagens, podemos nos ater à questão dos núcleos coloniais propriamente ditos. Os primeiros núcleos coloniais do Espírito Santo foram as colônias de Santa Izabel, Santa Leopoldina e Rio Novo, sendo esta última a que nos interessa. A colônia de Rio
Novo foi fundada em 1854, e segundo seu estatuto, chamava-se Associação Colonial do Rio Novo, mas seu sócio majoritário e fundador, Caetano
Dias da Silva, controlava toda a colônia. O major português e ex-traficante
de escravos, que com o fim da atividade que praticava, resolveu mudar de
ramo e investir nos imigrantes.
A Colônia Rio Novo difere-se das demais por se tratar de um investimento inicial privado, enquanto que as outras eram de caráter estatal.
Enquanto os imigrantes tinham a posse total da terra nas colônias
de Santa Izabel e Santa Leopoldina, na de Rio Novo a posse era parcial,
ficando o imigrante ligado e dependente do grupo empresarial controlado
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pelo antigo traficante de escravo, Major Caetano Dias da Silva. Os lotes
que os imigrantes recebiam eram em tamanho bastante reduzido, e muitas
vezes em lugares pantanosos ou pedregosos. Em 1871, no dia 7 de outubro o governo indeniza os antigos proprietários, e a colônia Rio Novo passa
para as mãos do Estado sobre o comando do engenheiro Carlos Kraus.
Os primeiros imigrantes que lá chegaram foram os chineses. Os
italianos só chegaram em 1875, oriundos da Região do Trento. Em 1880, a
Colônia Rio Novo é emancipada, e os imigrante italianos que continuavam
chegando, passaram a ocupar o recém-criado Núcleo Colonial Castelo.
Estas experiências com o trabalho dos imigrantes nos núcleos coloniais
funcionaram concomitantemente com o trabalho escravo, que era responsável pela maior parte da produção. Com o fim da escravidão em 1888,
abriram-se vários postos de trabalho para os imigrantes, que passaram a
ter como opção de trabalho, além dos núcleos coloniais, as antigas fazendas escravocratas.
O núcleo Colonial Castelo foi criado em 6 de março de 1880, às
margens do rio Benevente, ao norte da Colônia Rio Novo, e era dirigido por
Joaquim Adolpho Pinto Pacca, antigo diretor da Colônia Rio Novo. Logo
em 1881, no dia 28 de maio, a Colônia Castelo foi emancipada. Neste mesmo ano ela contava com 1.079 habitantes, que cultivavam 150.000 pés de
café. A população, em 1888, já era de 2.388 habitantes, e estava dividida
em seis seções: Cachoeirinha, Alexandrina, Carolina, Maravilha e Iracema.
O Núcleo Colonial Castelo se transformou na Vila de Alfredo Chaves, e posteriormente, em um município de mesmo nome. O conhecimento
da história da Colônia Rio Novo e do Núcleo Castelo é de grande importância para a compreensão da história dos imigrantes italianos em Castelo,
pois muitos destes imigrantes partiram desses locais, após da Abolição da
Escravidão, para trabalhar nas fazendas de nosso município.
Nos núcleos coloniais, os imigrantes recebiam gratuitamente um
pedaço de terra, que mesmo a duras penas, lhe garantiam a sobrevivência
e até mesmo o acúmulo de capital. Mas por outro lado, existia a necessidade dos fazendeiros de substituir a mão-de-obra escrava, e eles viam no
imigrante a salvação para seus problemas. Os recém-chegados imigrantes
estavam em um dilema: sucumbir aos interesses dos fazendeiros e trabalhar nas grandes fazendas, ou conquistar sua liberdade e independência
financeira trabalhando em sua própria propriedade?
Veremos agora quem ganhou essa queda de braço: os imigrantes
ou os fazendeiros.
9.3.3 – A Luta dos Imigrantes Contra os Fazendeiros
Os imigrantes que chegavam ao Espírito Santo tinham duas opções: dirigirem-se aos núcleos coloniais, Castelo e Colônia Rio Novo, ou
irem substituir o trabalho dos escravos nas fazendas de café já estruturadas. A grande maioria das famílias optou pelos núcleos coloniais: outras,
no entanto, vieram diretamente para as fazendas de Castelo, subindo pelo
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rio Itapemirim, até chegarem ao destino.
Os fazendeiros de nossa região estavam acostumados a lidar com
escravos, e para com esses tinham um tratamento semelhante ao dispensado aos animais, e esta realidade não mudaria de maneira rápida. Sendo
assim, os imigrantes que se dirigissem às fazendas não teriam tratamento
muito diferente ao dispensado aos escravos. Na verdade, os fazendeiros
de nossa região não se prepararam para o fim da escravidão, e perderam o
bonde da história, ou seja, não se adaptaram à nova realidade, onde teriam
que remunerar o que antes era de graça.
A ideia da substituição do trabalho pelos imigrantes europeus não
era bem aceita pelos fazendeiros, que achavam que os europeus, por serem provenientes de onde eles consideravam uma civilização mais avançada, não se adaptaram ao regime de trabalho duro. Os fazendeiros preferiam os chineses e africanos, por considerarem os mesmos de raça inferior.
Além disso, queriam que o Estado importasse os trabalhadores, construíssem casa de detenção e um forte aparelho de justiça para controlar os
futuros trabalhadores. Todos os gastos do Estado neste processo seriam
reembolsados pelos fazendeiros, que por sua vez, descontariam os valores
dos imigrantes (africanos e chineses). Se esta proposta fosse aceita, os
imigrantes trabalhariam, no mínimo, 5 anos de graça para pagarem seus
patrões. Na prática, era a continuação da escravidão.
Com o fim da escravidão e a rejeição, por parte do Estado, da proposta de imigração feita pelos fazendeiros, os mesmos não tiveram outra
opção senão aceitar os italianos que aqui já se encontravam para substituir os escravos. Mas era uma relação que já havia nascido fadada ao
fracasso por motivos óbvios, pois os dois lados envolvidos na questão não
iriam atender às expectativas uns dos outros; nem os fazendeiros ficariam
satisfeitos com o trabalho dos imigrantes (pois estavam acostumados com
o trabalho escravo), nem os imigrantes se satisfariam com o tratamento
dispensado pelos fazendeiros.
A imensa maioria dos imigrantes preferiu o óbvio, que era trabalhar
nas terras doadas pelo governo, e muitos dos que preferiam o trabalho
nas fazendas se arrependeram posteriormente e se transferiram para os
núcleos coloniais. A queda da braço entre fazendeiros e imigrantes foi vencida pelos imigrantes por uma série de razões. Umas dessas razões foi a
fragilidade econômica e política por parte dos fazendeiros que não tiveram
seu projeto de importação de mão-de-obra aceito pelo governo. Um fator
que contribuiu a favor dos imigrantes foi em relação às condições dadas a
eles nos núcleos coloniais, que se não eram melhores, eram, sem dúvida,
mais atraentes que as dos trabalhos nas antigas fazendas escravocratas, e
até mesmo que na antiga terra natal.
Mas os fazendeiros não perderam a batalha sem luta. Uma das poucas tentativas no sentido de se adaptarem ao problema da falta de mão-de-obra foi a criação da colônia Rio Novo, em 1854. Com essa colônia de
iniciativa privada buscava-se atrair imigrantes, em especial chineses, que
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posteriormente, devido às propositais más condições de sobrevivência nos
pequenos lotes recebidos, substituíram os escravos nas lavouras. Essa
tentativa não obteve êxito, e poucos chineses se deslocaram para a colônia
Rio Novo. A referida colônia sé teve um incremento populacional com a
chegada dos italianos em 1875, mas aí já estava sob controle do Estado, e
as condições eram outras, bem melhores.
Com a derrota dos fazendeiros devido ao mau planejamento e a
dificuldade de se adaptarem ao novo tipo de mão-de-obra, as antigas e
grandes fazendas de café foram se desmembrando entre os herdeiros, que
cada vez mais enfraquecidos, acabavam por vendê-las aos pedaços (lotes)
aos italianos. As grandes fazendas vão gradativamente se transformando
em um mosaico de pequenas propriedades, quase sempre nas mãos dos
descendentes dos italianos.
Trabalhando por conta própria, os italianos conseguiram com muito
esforço se capitalizar, e à medida que a família crescia, iam adquirindo
mais terras. É essa trajetória que veremos agora.
9.3.4 – O Caminho dos Imigrantes até Castelo
Tudo era novidade para os italianos na nova terra: o clima, a geografia da região, as diferentes raças (índios e negros), a floresta tropical, os
animais, enfim, tudo era diferente. Os imigrantes sofreram mudanças em
todos os sentidos: no econômico, pois agora eram donos de sua própria
terra; no social, já que teriam que aprender a conviver com raças totalmente diferentes, oriundas das mais distantes partes do mundo; no geográfico
devido às grandes distâncias a percorrer para chegar aos centros urbanos,
e naturalmente, no psicológico, diante de tantas novidades.
Com tantas mudanças, como seria o dia-a-dia dos imigrantes nos
núcleos coloniais? O Império brasileiro oferecia ao imigrante, além de terras, a passagem e a ajuda em dinheiro até a primeira colheita. Além de
trabalharem em sua terra, os imigrantes eram recrutados e remunerados
para a abertura de estradas e outros serviços. Nos núcleos coloniais, principalmente o Castelo, ainda criavam gado em pequenas quantidades, que
servia para o consumo da família e para o abastecimento de um insipiente
mercado local.
Cm muita dificuldade, pois não contavam com ferramentas apropriadas, os imigrantes derrubavam as matas e iniciaram a formação de suas
lavouras, principalmente do café. Mas a fertilidade das terras recebidas no
núcleo colonial Castelo não era das melhores, ela era denominada pelos
imigrantes de “La terra magra”. A lavoura de café leva algum tempo para
produzir, e ,na época, a demora chegava a cinco dias, e neste período, os
italianos trabalhavam nas grandes fazendas de café da região em substituição aos escravos, fazendo assim uma jornada dupla de trabalho.
E é através dessa dupla jornada que tiveram contato com as férteis
terras das fazendas de Castelo, onde também já haviam alguns compatriotas trabalhando como meeiros para os fazendeiros. Mesmo sendo tem-
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porário, o trabalho dos imigrantes deu uma sobrevida aos antigos fazendeiros escravocratas, mas não por muito tempo, pois logo que os italianos
juntavam algum dinheiro, fosse ele no trabalho de meeiro ou nos núcleos
coloniais, eles abandonavam o trabalho nas fazendas para adquirir sua
propriedade.
A intenção dos italianos ao deixarem sua terra natal era a de serem proprietários, esta meta foi alcançada, em parte, pelos que se dirigiam
aos núcleos coloniais. A realização só não foi total porque a terra sonhada
deveria ser fértil, o que não era o caso do núcleo colonial Castelo. Após
receberem o dinheiro da venda das primeiras colheitas, muitos dos imigrantes do núcleo colonial Castelo, passaram a adquirir propriedade e a se
transferirem para a região do futuro município de Castelo.
O movimento interno de imigrantes em direção a Castelo foi favorecido por alguns fatores como, a fertilidade do solo e os baixos preços das
terras devido à carência de mão-de-obra. Os descendentes dos grandes
fazendeiros pioneiros no cultivo de café em Castelo vendiam suas propriedades aos italianos e se transferiam para as cidades maiores, ou até
mesmo para o próprio centro do Distrito de Castelo, para se dedicarem a
outras atividades. Como exemplo, a família Vieira Machado da Cunha, que
parte da mesma se dirigiu à sede do distrito de Castelo, e os outros para
o Rio de Janeiro; a família Bernardes de Souza, proprietários da Fazenda
Santa Helena, que se dirigiram a Cachoeiro de Itapemirim. Os fazendeiros,
ao contrário dos italianos, não estavam acostumados a trabalhar na lavoura propriamente dita, e não se sujeitariam a tanto, devido a sua formação.
Esta situação fez com que eles se afastassem cada vez mais das fazendas
a partir da abolição da escravidão, deixando as mesmas nas mãos de administradores, ou as vendendo aos imigrantes.
O Núcleo Colonial Castelo era formado por 6 seções, como já afirmamos anteriormente. Os imigrantes que se dirigiram para Castelo era
basicamente das seções de Matilde e Carolina. Castelo não foi o único
lugar que os imigrantes escolheram para se reinstalar. De lá, partiram para
vários locais ao sul do Estado, um deles foi o núcleo de São Pedro de Venda Nova. O referido núcleo, atual município de Venda Nova do Imigrante,
ficava no local onde fora criado o Aldeamento Imperial Afonsino, que com
a expulsão dos índios, transformou nas fazendas Pindobas, Providência,
Lavrinha, Tapera e Bananeiras. Com o fim da escravidão e a dificuldade
de mão-de-obra todas estavam praticamente abandonadas, o que facilitou
sua compra pelos imigrantes.
No início deste capítulo, afirmamos que os imigrantes tinham dois
caminhos a seguir, o dos núcleos coloniais, ou o das grandes fazendas de
café, para substituir o trabalho escravo. Pois bem, mesmo trilhando caminhos diferentes, vários desses se encontraram em Castelo. Os imigrantes
nos núcleos coloniais pouco férteis e com a família aumentando, assim
que conseguiam acumular dinheiro, compravam pedaços de fazendas, no
que veio a se tornar o município de Castelo. Os que optaram pelo trabalho
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nas fazendas ao furor inicial dos fazendeiros, acostumados a lidar com escravos, também conseguiram comprar seus pedaços de terras por aqui. O
dito furor inicial dos fazendeiros foi se abrandando com o tempo devido ao
agravamento da falta de mão-de-obra.
Os meeiros, como eram chamados os italianos que substituíam os escravos nas lavouras de café de Castelo, trabalhavam para os fazendeiros, e
em troca, recebiam a metade de tudo
que produziam. Com os altos preços
do café, não demorou muito para que
eles acumulassem dinheiro suficiente
para se tornarem proprietários, dividindo cada vez mais as antigas fazendas
escravocratas. Nos locais onde outrora
predominava o trabalho escravo que
consumiam o sangue, o suor e a própria
vida dos negros, passava a reinar o trabalho livre e alegre, que reunia toda a faNotícia do Jornal “O Cachoeirano”
mília italiana cada vez mais numerosa.
relatando a chegada dos primeiros
Mas esta não era a única evolução em
imigrantes a Castelo
relação ao período escravocrata, aos
Fonte: Arquivo Público Estadual
meios de transportes para escoamento
de uma produção cada vez maior, também evoluíram.
9.3.5 – As Condições de Transporte
Com a chegada dos imigrantes a Castelo e o incremento na produção, ocorreu também uma melhora nas condições de transporte. Os meios
utilizados no período da escravidão ainda persistirem: as tropas e o fluvial.
Mas o que trouxe uma sensível evolução no transporte foi a chegada da
ferrovia a nosso município.
O rio Castelo nunca serviu como meio de escoamento da produção
de café, apenas o Itapemirim, por um certo período, cumpriu esta função.
Desta forma, este tipo de transporte não esteve ligado a nosso município. Tanto no período de escravidão, como dos imigrantes, a produção era
transportada nos lombos dos animais. Eram as tropas que carregavam
toda a riqueza da época, tanto a que descia a serra rumo a Cachoeiro e
posteriormente ao Porto de Itapemirim, como as que faziam o caminho
inverso até chegar às humildes casas dos imigrantes para lhes garantir a
sobrevivência.
O que difere este tipo de transporte do tempo da escravidão para
o dos imigrantes é o surgimento da figura heroica do tropeiro. Dentro do
modelo escravocrata não havia espaço para o surgimento de heróis, já que
o caráter determinado trazia o surgimento de outros tipo de figuras, como a
do capataz. No período escravocrata, os que trabalhavam as tropas eram
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considerados por seus donos, como os próprios animais que carreavam a
carga; já no período dos imigrantes, as pessoas que desempenhavam o
mesmo tipo de função eram consideradas heroínas. Esta comparação nos
dá a exata dimensão de como o mesmo tipo de transporte assume características totalmente diferentes, ao sabor do tipo de trabalho que a envolve.
Vários são os fatores que dão ao tropeiro a imagem de herói. Dentre
eles podemos destacar o fato de serem elas, as tropas, o único meio de
transporte existente; outro fator é que eram os tropeiros que traziam as
novidades; e a própria ideia de viagem, para uma época de muitas dificuldades, já trazia em si uma forte dose de heroísmo. Os tropeiros não eram
apenas o único meio de transporte, mas também um dos únicos meios de
comunicação entre os colonos isolados no interior com o mundo.
As tropas eram formadas por lotes de burros ou mulas. Cada um era
composto por dez animais, que ficavam presos entre si e seguiam o animal
madrinha, que carregava o sino para que o barulho do mesmo orientasse
os demais animais a segui-lo. A figura do tropeiro era muito próximo à do
negociador, chegando por vezes a confundir-se, já que o transporte tinha
sempre o mesmo objetivo, a venda, o que acabava levando o tropeiro a se
tornar também um bom negociador.
Por uma pesquisa realizada pela aluna Polliana Careta Campanha,
podemos conhecer o panorama da vida levada pelos tropeiros. Relatamos
a seguir, alguns tropeiros entrevistados, bem como uma relação dos tropeiros do município de Castelo, retirada dos arquivos da “Societá Italiana de
Castelo”.
Nome: Laurindo Camporez
Família: Camporez
Quantos anos foi tropeiro?
R: mais ou menos 25 anos.
Onde morava?
R: Limoeiro.
Quantos lotes de burro você tinha?
R: 2 lotes.
Como era a vida de tropeiro?
R: Era muito difícil, era obrigado com sol ou chuva trabalhar.
Você gostava de trabalhar com tropas?
R: Sim, gostava de andar a cavalo.
Quantas sacas de café você acostumava puxar durante o dia?
R: Mais ou menos 40 sacos por dia para entregar no comércio.
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Nome: Onório Dal-Cin
Família: Dal-Cin
Quantos anos foi tropeiro?
R: Mais ou menos 16 anos.
Onde morava?
R: Córrego da Prata – Fazenda Boa Sorte.
Quantos lotes de burro você tinha?
R: 1 lote.
Como era a vida de tropeiro?
R: Boa, na época não achei difícil, hoje eu acho que era.
Você gostava de trabalhar com tropas?
R: Não, Era obrigado para ganhar dinheiro e sair com a mercadoria.
Quantas sacas de café você acostumava puxar durante o dia?
R: Mais ou menos 30 a 60 sacos por dia.
Nome: João Cola
Família: Cola
Quantos anos foi tropeiro?
R: Mais ou menos 30 anos.
Onde morava?
R: Pindobas.
Quantos lotes de burro você tinha?
R: 2 lotes.
Como era a vida de tropeiro?
R: Dura. Não existia asfalto, era trilho, quando chovia, gastavam 3 horas
de Pindobas a Castelo.
Você gostava de trabalhar com tropas?
R: Gostava. Era uma vida sacrificada, ficavam com as roupas seis dias,
dormiam no couro com chuva.
Quantas sacas de café você acostumava puxar durante o dia?
R: Mais ou menos 48 sacos.
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TROPEIROS HOMENAGEADOS PELA SOCIETÁ ITALIANA NO
II ENCONTRO DA COLÔNIA ITALIANA EM CASTELO
Alcino Camporez
Alério Tomos
Alfredo Barbosa
Ângelo Revieiri
Antônio Catabriga
Antônio Estevão
Antônio Frade
Antônio Moreira
Antônio Reis
Antônio Rosa Rodrigues
Antônio Salvador
Antônio Zanúncio
Aristides Viano
Álvaro Cotta
Aristides Marassati
Argel Duarte
Avelino Perim
BelarminoFazolo
Bernardo Junior
Carlos Cararo
Clóvis Mesquita
Comar Airis
Custódio Prudente
Daley Fazolo
EzídioCamporez
Francisco Cardoso
Francisco Dorigo
Geraldo Andrião
Hermínio Davel
Íris Careta
Íris Fim
João Alves de Oliveira
João Angelino Comarela
João Cola
João Francischetto
João Perim
João Vieira
Joaquim Padovane
José Antônio Vitorazzi
Lacy Gomes
Laurindo Camporez
Laurindo Lovato
Leonildo Guizarde
Luis Fim
Newton Mesquita
Olívio Machado
Orlando Revieiri
Otacílio Francischetto
Otávio Perim
Ovídio Salvador
Pedro Cararo
Pedro Colodetti
Pedro Fazolo
Rafael Machado
Revenos Cota
Sebastião de Paula
Sólon Lopes
Valdemir Brambila
Valdir Calegari
Veilde Valentim Campanha
Venâncio Passamani
Vicente Perim
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Arquivo da Società Italiana di Castello
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Mas a grande novidade da época em nossa Vila era, sem dúvida, os
trilhos que traziam a Maria Fumaça, apesar de que os trilhos não dispensavam os trabalhos dos tropeiros, pois o trem só chegava até a sede da então
Vila de Castelo, e até lá, era no lombo dos animais que chegava o café.
Eram dois motivos principais para a construção de estrada de ferro
no Espírito Santo: um dos motivos era a tão sonhada ligação com Minas
Gerais, e o outro era o escoamento da produção de café da região sul do
Estado, para o mar, e daí para o mundo. Depois de vários projetos de construção que nunca se materializaram, em 1886, iniciavam-se as obras da
construção da Estrada de Ferro Caravelas, a primeira do Estado que ligava Cachoeiro-Alegre-Castelo. O concessionário era o Capitão Deslandes,
mas a obra foi executada com a administração do Visconde de Matosinhos,
cessionário do Capitão Deslandes.
A linha tronco ligava Cachoeiro a Alegre e tinha 49,5 km. Em Duas
Barras foi construída uma ponte com 77 metros de extensão para que os
trilhos pudessem chegar a Castelo. Ao todo, a ferroviatinha 77 km, sendo o
engenheiro responsável pela obra, o alemão Hermann Schindler, que era
auxiliado por outros engenheiros brasileiros. Os primeiros trilhos do Espírito Santo partiram de Antuérpia no navio da Companhia de Navegação
Caravelas, de propriedade do mesmo dono da ferrovia, Visconde de Matosinhos. Já em terras brasileiras, no porto da Barra, o material é embarcado
na prancha de nome Tarcília, que leva o mesmo ao porto João Marques,
em Cachoeiro, onde se inicia a construção da ferrovia.
Fonte: Jornal “O Cachoeirano” Arquivo Público Estadual
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Em 17 de setembro de 1887, os castelenses, assustados, presenciaram a chegada da barulhenta e fumegante máquina que deslizava pelos
trilhos, e que daí em diante substituiria, em grande parte, o trabalho das
tropas no transporte de café até Cachoeiro. Este fato marcou a história do
futuro município de Castelo, pois se tratava da chegada da modernidade.
Eram os castelenses tendo contato com um dos meios de transportes mais
modernos e eficientes da época. A viagem inaugural contou com a presença do proprietário Visconde de Matosinhos, do presidente da província
Antônio Leite Ribeiro, do chefe de polícia e de muitas outras autoridades. A
imprensa da capital da província deu ampla cobertura ao evento e esteve
presente ao ato.
Castelo, Cachoeiro e Alegre foram os primeiros lugares da então
província do Espírito Santo a terem contato com a ferrovia. Este fato, por si
só, dá-nos uma dimensão da importância econômica de nosso futuro município. Pelos antigos trilhos da Estrada de Ferro Caravelas, por muito tempo,
passou toda a vida econômica de Castelo, além dos sonhos e aspirações
de seus habitantes. No início do séc. XX Castelo recebeu uma nova leva
de imigrantes, que vão residir na antiga Fazenda do Centro, é este o tema
que abordaremos agora.
Foto: Trem de Ferro em Castelo - Arquivo Società Italiana di Castello
9.3.6 – A Segunda Leva de Imigrantes
A vinda desta segunda leva de imigrantes foi resultado da compra
e da posterior venda, em pequenos lotes, da Fazenda do Centro pelos padres Agostinianos que se encontravam no Espírito Santo, na Imperial Colônia de Rio Novo, a partir de 1899. É comum ouvir pessoas se referirem a
este ato como sendo a primeira reforma agrária do Brasil, mas tal afirmativa
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não condiz com a realidade. Não precisamos analisar o âmbito nacional,
basta o estadual para comprovar o que afirmamos.
O Núcleo Colonial Castelo e a colônia Rio Novo foram criados ainda
no séc. XIX, e neles os imigrantes recebiam gratuitamente seu pedaço de
terra, ao passo que na fazenda, os colonos compravam sua terra. Desta
forma, a venda de pequenos lotes da Fazenda do Centro aos colonos não
pode ser considerada como reforma agrária, e mesmo que assim fosse
considerada, não seria a pioneira, pois já havia acontecido uma distribuição
de terras a imigrantes italianos em nosso Estado, no século anterior.
Esta análise não diminui em nada o grande ato dos agostinianos,
que bons resultados trouxeram para o nosso município. No dia 20 de julho de 1909, uma comissão formada por Antônio e João Bernabé, Francisco Salvador, José Caliman, José Bernabé e o padre responsável por ela,
Manoel Simon, estiveram na Fazenda do Centro. O objetivo da visita era
conhecer a propriedade e também as condições para adquiri-la, já que a
fazenda se encontrava parcialmente abandonada.
Em um trabalho de pesquisa realizado pelo Frei Sérgio Peres de
Paula, em abril de 1995, sobre os Agostinianos na Região de Castelo, encontramos informações importantes para entendermos os motivos que levaram tal Ordem Religiosa a adquirir a Fazenda do Centro.
Já no início se justifica o porquê da aquisição, com a seguinte citação:
“A Fazenda do Centro, adquirida para ajudar
os imigrantes a se assentaram em terras mais
férteis e como ‘possível’ refúgio para abrigar
estudantes espanhóis Agostinianos Recoletos, devido a tensões políticos na Península
Ibérica, constituiu-se não apenas em empreendimento social de grande envergadura
como também tornou-se um Centro de irradiação do Evangelho”.
PAULA, Frei Sérgio Peres de. “Os Agostinianos
Recoletos na Região de Castelo” – 1995
É importante observar também que s diferenças entre o nativo e o
colono imigrante eram muito grandes, em especial no quesito religião. O
imigrante preocupava-se em manter suas crenças, sua fé ao catecismo, a
Igreja, a missa, o casamento no religioso, coisas que para o nativo eram
um tanto quanto indiferentes. E essas diferenças vão se acentuando cada
vez mais com o crescimento do número de imigrantes no Espírito Santo. A
partir do início do séc. XX percebem-se algumas mudanças no povo capixaba, como por exemplo, o interesse crescente da população pela religião.
Percebe-se a força dos costumes e das tradições dos imigrantes, uma vez
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que somavam mais de 50% da população do Estado.
A preocupação dos imigrantes em religião era tão grande, que houve manifestações de desagrado por parte dos mesmo, exigindo nas fazendas: capela, oratório, presença de padres e das condições a eles impostas,
tais como, o esgotamento das terras, a diminuição constante das colheitas.
“Insistentemente, os colonos pediam aos seus
pastores ajuda e uma solução para os problemas que eles estavam enfrentando, (...) os
religiosos procuravam ao menos direcioná-los para regiões e pontos do Estado, onde os
colonos pudessem viver reunidos e mantendo
seus costumes e sua piedade.”
(Crônica de La Província de Santo Tomás de Villanueva, Segunda década, p. 257, 655).
O que os Agostinianos poderiam fazer, em especial Frei Manuel Simón para atender a tais súplicas? Procurar por locais, onde os colonos italianos pudessem se instalar em novos terrenos mais ao interior, com terras
mais férteis, sem perder seus hábitos e fé.
“A aquisição das terras que se encontravam
à venda seria uma obra de grande benfeitoria
não só para a Província, mas principalmente para os colonos. Crendo nisto, Fr. Manuel
Simón, tendo conseguido a autorização para
adquirir a fazenda e dividi-la para os colonos,
empreendeu logo seu projeto.
(id ibid)
Dentro desta proposta de aquisição de terras, os Agostinianos começam a procurar por elas, chegando assim à Fazenda do Centro. Os
antigos donos haviam a colocado à venda pelo preço de 100 contos de
réis. Para tal quantia, ficava inviável a compra, a não ser que arrumassem
sócios para tal empreendimento. Assim, a sociedade foi feita entre a ordem
dos Agostinianos, Fr. Manuel SimónFr. Máximo Tabuenco, com o Sr. Maximino Alves, espanhol, e o Sr. José Mariano Sobrinho, brasileiro. No dia 20
de julho de 1909, os sócios foram visitar a propriedade. O acordo entre eles
era adquirir a fazenda para dividi-la em lotes de 10 alqueires, que deveriam
ser vendidos por 100 mil réis, com prazo de 10 anos para pagá-los sem
juros, sendo que o pagamento se iniciaria a partir de 5 anos. 58 famílias de
colonos que já residiam no local teriam a preferência.
A compra da terra e a passagem da Escritura deveriam acontecer
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em 21 de novembro de 1909, porém o Sr. Maximino Alves se retirou do
negócio, o que levou à compra de apenas 1.542 alqueires. Não demorou
muito para que o sonho da compra da fazenda se tornasse realidade. Em
24 de novembro de 1909, padre ManoelSimón e seu sócio José Mariano
adquiriram, em cartório, 1.216 alqueires de Antônio Fernandes Moura e
mais 326 alqueires de Joaquim Fernandes Moura, o total de terras adquiridas foi de 1.542 alqueires, além de maquinários, casas de benfeitorias
existentes. O restante das terras foi adquirido até 07 de maio de 1910,
mediante empréstimo.
Fr. Manuel Simón sofreu muito para pagar os empréstimos feitos
para adquirir o restante das terras. Também o sócio, Sr. José Mariano Sobrinho, não cumpriu seus compromissos, não havendo outra alternativa,
senão desfazer a sociedade, o que ocorreu em 27 de dezembro de 1912.
Como já afirmamos, a intenção de padre Simón, que representava
a ordem dos Agostinianos, era dividir toda a terra em lotes de 10 alqueires
e vende-los em condições favoráveis aos descendentes de italianos que
viviam na região do Núcleo Colonial Castelo. Neste período, o núcleo já
se chamava Alfredo Chaves, e pertencia a Anchieta, onde ele era pároco.
Mas, na lista dos compradores dos lotes da fazenda, nãos constam apenas
pequenos lavradores descendentes de italianos dispostos a trabalharem
diretamente na terra. Entre os compradores estão, até mesmo, parentes
dos antigos donos da fazenda, como o senhor Manoel Moura Júnior, também os Vivacqua e irmãos que já estavam estabelecidos em Castelo, que,
com certeza, não iriam lavrar diretamente a terra. Os Agostinianos não venderam toda a propriedade, reservaram a parte central para suas atividades
religiosas e uma considerável quantidade de terra para garantir a subsistência da ordem em Castelo.
Mas a grande singularidade nesta transação foi, sem dúvida, a cessão de terras aos imigrantes ou aos descendentes, com boas condições
de pagamento, pois a terra só começava a ser paga depois das primeiras
colheitas. Este ato dos padres agostinianos gerou a vinda de uma nova
leva de italianos e seus descendentes provenientes de Alfredo Chaves, que
atraídos pela fertilidade da terra e pelas boas condições de pagamento,
radicaram-se em terras castelenses.
A venda desses lotes veio ratificar a tendência do predomínio de
pequena propriedade, no embrionário do futuro município de Castelo com a
vinda dos imigrantes. Não podemos afirmar com exatidão, mas o loteamento da Fazenda do Centro atraiu para cá mais de cinquenta famílias provenientes da pouco fértil região de Alfredo Chaves. Este número de pessoas
representou um grande incremento não só populacional para a região, mas
econômico, social, religioso e político.
A Fazenda do Centro sempre mereceu lugar de destaque na história
de Castelo. Serviu de passagem para os índios nômades que andavam por
nossa região, foi palco da mineração, depois se transformou em uma das
maiores fazendas escravocratas do Espírito Santo e, finalmente, teve suas
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terras divididas entre os imigrantes italianos e seus descendentes.
Na fase dos italianos, o incremento, em todos os sentidos, foi tão
notável que se chegou a cogitar a extensão da estrada de ferro de Castelo
até a fazenda. O projeto de construção não ficou no papel, chegou a ser
iniciado com a construção do que seria a Estação Ferroviária (o prédio
ainda continua de pé na fazenda), mas na crise no preço do café frustrou
sua continuação.
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X - As Bases do Município de Castelo
10.1 - Considerações Gerais
De uma forma bastante sucinta, podemos dizer que a história de
Castelo teve início ainda com os índios que vagavam livremente por nosso território. A chegada dos europeus às nossa terras, em busca do ouro,
gerou um confronto entre esses seres de dois mundos completamente diferentes. Apesar da heroica resistência inicial e de algumas vitórias, os índios
acabaram sucumbindo ao poderio dos brancos. Nos séculos XVII, XVIII e
XIX, apesar de alguns intervalos e abandono na região, o que movimentava
a economia era a exploração do ouro de aluvião nas águas do rio Caxixe.
O ouro foi substituído pelo café como produto principal da economia, na segunda metade do séc. XIX, com a chegada dos fazendeiros provenientes da região norte do Rio de Janeiro. Os Vieira Machado da Cunha
tomaram posse das terras devolutas que hoje compõem nosso município
e colocaram os escravos para produzirem café. E, por aproximadamente
cinquenta anos, Castelo viveu a experiência do plantation, com a utilização
da mão-de-obra escrava e produzindo café para o mercado externo em
grandes extensões de terra.
O eminente fim da escravidão gerou uma grande crise de falta de
mão-de-obra, pois Castelo, assim como toda a província do Espírito Santo, era carente de habitantes. Éramos um grande vazio demográfico. Para
preencher este grande vazio, optou-se pela vinda dos italianos que sofriam
em seu país com um problema inverso – o excesso de mão-de-obra e a
falta de terra.
Tanta terra sobrando acabou por enfraquecer os fazendeiros da região, e com a concessão de terras aos imigrantes, feita pelo governo, o
processo de decadência dos grandes fazendeiros se acelerou em Castelo.
O fim da escravidão desencadeou uma grande crise de mão-de-obra que deixou os fazendeiros sem opção para tocar a produção. Esta
realidade que abaixava o preço da terra, associada a uma boa quantidade
(para a época) de imigrantes italianos, que gradativamente se capitalizava,
seja como pequenos proprietários nos núcleos coloniais, ou mesmo como
meeiros dos fazendeiros em Castelo, foi o fator que contribuiu para que
nosso município se tornasse de um pontentado de poucos donos, em um
mosaico de pequenas propriedades, e naturalmente, de muitos proprietários.
Apesar de principal, esse foi o único motivo que levou Castelo a se
dividir em pequenas propriedades. A natural divisão entre os herdeiros dos
fazendeiros também teve sua parcela de contribuição para a atual realidade econômica. O exemplo da Fazenda do Centro, apesar de não ser como
alguns pretensiosamente afirmam, a primeira reforma agrária no Brasil, foi
imprescindível para a formação econômica atual de Castelo. A chegada
da nova leva de imigrantes e de seus descendentes para a fazenda, par-
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cialmente dividida, trouxe energia nova, além de ratificar a tendência de
Castelo pela pequena propriedade agrícola.
Abordaremos a partir de agora a transição das fazendas para a
sede e o processo de urbanização que ocorreu em função das mudanças
sociais e econômicas e que diretamente contribuíram para o desenvolvimento de Castelo.
Analisaremos a história de Castelo até a década de 40, assinalando
a passagem de Vila para Distrito e posteriormente desligado de Cachoeiro
de Itapemirim, o município de Castelo.
10.2 - A Crise da Mão de Obra
O fim da escravidão agravou ainda mais um antigo problema na
região de Castelo. Esse problema nasceu junto com as primeiras fazendas
escravocratas, estamos falando da falta de mão de obra.
Abordamos anteriormente este crônico problema, já que quando
elas, as fazendas começavam a funcionar, por volta de 1845, o tráfico de
escravos direto da África já havia sido suspenso. Desta forma os escravos
daqui eram comprados principalmente das lavouras da cana-de-açúcar do
nordeste do Brasil, o chamado tráfico interno.
Com a proibição do trabalho escravo, esse flagelo que tanto manchou nossa história, os fazendeiros tiveram que buscar soluções para continuar produzindo. Os imigrantes europeus e mesmo trabalhadores livres
de outras regiões do país eram as principais soluções a vista.
Os fazendeiros da região buscaram resolver seus problemas de forma coletiva, pois tinham a plena certeza de que juntos, em algum tipo de
organização, teriam melhores perspectivas de sucesso do que de maneira
isolada, e foi dentro deste espírito corporativo que em 15 de dezembro de
1888, foi criado o Clube da Lavoura do Castello. Seu estatuto foi publicado
no jornal de circulação semanal, “O Cachoeiro”, no dia 13 de janeiro de
1889.
A diretoria do Clube da Lavoura de Castello era composta por, Conrado Vieira Machado (Presidente), Manoel José de Souza Braga (Vice-Presidente), Josino Vieira Machado (1º Secretário), Carlos Augusto de
Assumpção de Silva (2º Secretário) e Agostinho Ferreira dos Santos (Tesoureiro).
Os principais objetivos do referido clube, segundo seu estatuto,
eram: auxiliar as medidas de utilidades para a lavoura; promover junto às
autoridades civis e eclesiásticas providência para o desenvolvimento local
da agricultura; promover a vinda de imigrantes, moralizados e laboriosos;
fundar escola de letras diversas e noturnas; auxiliar a polícia local na manutenção da ordem e da paz.
A julgar pelos objetivos estatutários, podemos afirmar que o clube
estava imbuído do propósito de desenvolver a atividade principal de seus
sócios, a agricultura. É bem verdade que este desenvolvimento acabaria
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por acarretar melhoras nos demais setores da sociedade, principalmente
porque o trabalho não era mais escravo.
O trabalho escravo era estéril, ou seja, não gerava salários para os
trabalhadores, sendo assim não promovia uma circulação maior de dinheiro em todas as camadas da população, inviabilizando o avanço e o incremento do comércio e das demais atividades econômicas. Já com o trabalho
livre e assalariado o dinheiro passou a circular nas mãos de mais pessoas,
dando condições para um maior desenvolvimento econômico da região.
Mas, voltando a questão do clube e seus objetivos estatutários, uma
coisa nos chamou a atenção, que era a preocupação com a segurança,
que está caracterizada em um dos objetivos do clube que era auxílio do
mesmo à polícia local para a manutenção da ordem e da paz.
Esta preocupação dos fazendeiros nos faz supor que o clima que
precebeu a abolição da escravidão, foi um tanto quanto conturbado, já que
consta na lista de objetivos do Clube da Lavoura, o auxílio à polícia para
manter a ordem. Fica claro também quem é que dava as ordens neste
período, pois esse auxílio muito provavelmente poderia ser usado como
forma de influência, que facilmente poderia ser usado em benefício dos
poderosos fazendeiros.
O fato é que o clube cumpriu, não se sabe se a contento, com seu
objetivo de trazer imigrantes para substituir os negros na lida da lavoura.
Só que a vinda dos imigrantes, associados a outros fatores, desencadeou
um processo de pulverização das propriedades rurais, que acabou por eliminar a grande propriedade rural na região de Castelo.
A crise da falta de mão deobra, potencializada com o fim da escravidão, e a vinda da estrada de ferro, somente até onde veio, a chamada
Praça da Estação, são os principais motivos para o surgimento do início do
processo de urbanização em Castelo. O local de seu início foi justamente o
fim da linha do trem no que veio a se chamar de estação.
10.3 - Processo de Urbanização – Conceito
As cidades, tais como as conhecemos hoje, são fruto do capitalismo. O mundo feudal era rural, mas com a ascensão do capitalismo as cidades passaram a roubar a cena, e foram tendo cada vez mais importância.
A história de Castelo não está desconectada da história da humanidade, muito pelo contrário, ela faz parte deste grande cenário chamado
história da humanidade. Sendo assim, antes de entrarmos nas particularidades do processo de urbanização de Castelo, é importante fazer algumas
considerações gerais a respeito de como se deu os processos de urbanização no decorrer da história.
É importante fazermos aqui uma definição a respeito de feudalismo, mercantilismo e capitalismo, pois afirmamos anteriormente que as
cidades são fruto do capitalismo, então é pertinente falarmos sobre ele e
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sobre o modo de produção que o antecede, o feudalismo.
Karl Marx, na sua obra Miséria da Filosofia, afirma que: “as relações sociais estão (...) ligadas às forças produtivas. Ao adquirir novas
forças produtivas, os homens mudam seu modo de produção, a maneira de
ganhar a vida, mudam todas as suas relações sociais (...)”.
Esta afirmação torna ainda mais imperativo, a explanação sobre
os tipos de produção, porque a humanidade passou, (feudalismo, capitalismo). Para entendermos as transformações por que passou a história de
Castelo, faremos as definições clássicas sobre cada período e as respectivas comparações com a história de Castelo, dentro da medida do possível.
O feudalismo tinha na servidão a sua forma de produção, o servo
não era escravo. Em troca dos serviços do servo o senhor feudal lhe garantia segurança, proteção e o direito de usar parte da terra.
A base da economia no período feudal era a troca. Era pouca a
circulação da moeda, pois os feudos eram auto-suficientes. O que não produzia era trocado entre eles.
No período feudal, os reis continuaram a existir, mas seu poder
era quase simbólico e não ia além de seu feudo. Os proprietários das terras, os senhores feudais, eram soberanos em seus domínios.
De forma bastante sintética, podemos afirmar que as principais
características do feudalismo eram a não existência de um poder central,
existindo em seu lugar o poder dos senhores feudais. A circulação de moeda era pequena e o que prevalecia era a troca de mercadoria. O mundo
feudal foi necessariamente agrícola e rural.
Outro modo de produção importante e que sua análise será útil
para compreendermos a história de Castelo, é o capitalismo, que no seu
início precisou da tutela do Rei/Estado para seu desenvolvimento, através
da prática do mercantilismo.
No mercantilismo, fase inicial do capitalismo, o Estado, através da
figura do rei e em alguns casos de representantes da burguesia, passou
a exercer um controle sobre os cidadãos, o poder que estava descentralizado no feudalismo, passa a ser centralizado no mercantilismo. É quando
surgem os Estados Nacionais na Europa.
O comércio torna-se a atividade mais importante neste período, deixando a agricultura em segundo plano. É neste período que acontece nas
grandes navegações, a inclusão de novos mercados com a América, África
e Ásia, incrementando de vez o comércio.
As moedas passaram a circular com grande intensidade e a descoberta de ouro e prata nas colônias intensificarem ainda mais o mercantilismo.
O capitalismo que é definido por Karl Marx, como o modo de produção onde o capital é o principal meio de produção. Para Marx, o capital
assume várias formas: De dinheiro, de crédito com objetivo de comprar a
força de trabalho e os materiais necessários à produção.
No capitalismo, tudo é mercadoria, inclusive a força de trabalho, a
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mão de obra. No capitalismo, quem não tem os meios de produção (terra,
máquinas, fábricas) vende sua força de trabalho em troca de salário para
os proprietários dos meios de produção, os capitalistas.
Quando o homem, não proprietário dos meios de produção, sem
outra opção, passa a vender sua força de trabalho aos capitalistas, é o
capitalismo. Essa divisão social do trabalho separa os homens entre a burguesia (donos dos meios de produção) e o proletariado (os que trocam seu
trabalho por um salário e não são donos do que produzem).
Esses conceitos clássicos de modo de produção (feudalismo e capitalismo) foram elaborados a partir da história e realidade da Europa e
nem sempre ocorreu aqui, no Brasil, da mesma forma que lá no Velho
Continente.
Nem mesmo na Europa os modos de produção se sucederam de
forma contínua e linear. A história é permeada por idas e vindas, por avanços e retrocessos, ou como alguns historiadores gostam de chamar, de
permanências e rupturas. Isso significa dizer que no final do feudalismo,
podemos encontrar características do capitalismo. Portanto, essas definições servem para nos guiar nas interpretações do passado.
Retornando ao nosso assunto principal, a história de Castelo, mais
precisamente o início do processo de urbanização, podemos afirmar que
estávamos vivendo o fim de um período exclusivamente rural, para entrarmos em um novo, que trazia consigo, características, que são cada vez
mais marcantes com o desenvolvimento do comércio e de um efêmero núcleo populacional.
O fim da escravidão foi de fundamental importância, para a mudança de um modo de vida essencialmente agrário para um também urbano.
Nesse contexto, então, o fim da escravidão representou uma ruptura, desestruturou todo o modo de produção vigente, baseado na força de trabalho escravo.
Com o fim da escravidão começaram a surgir meeiros, colonos e
posteriormente os pequenos proprietários, quase todos imigrantes que iam
incrementando o comércio local.
Feitas essas considerações gerais, podemos nos ater de agora em
diante às questões específicas do processo de urbanização de Castelo.
10.4 - Início do Processo de Urbanização de Castelo
Toda a história de Castelo até o fim do século XIX se desenrolava
em cenários totalmente agrícolas. A urbanização era um fenômeno totalmente desconhecido por essas bandas.
As grandes fazendas eram núcleos totalmente fechados e auto-suficientes. Dentro deles se encontrava tudo que se necessitava para a
sobrevivência naquela época.
É bem verdade que nem tudo se produzia nos núcleos, muitas coisas chegavam de fora através dos caixeiros viajantes. O que é importante
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demonstrar ao leitor, para que ele possa ter a exata compreensão deste período, é que as fazendas não viviam em função de um núcleo urbano, como
ocorre hoje, mesmo porque não existia um muito próximo. O mais perto
era o de Cachoeiro, que ficava a uma distância considerável para a época.
Podia-se até então viver uma vida inteira sem ter a necessidade de
ir à cidade.
Como e quando esse mundo começou a se desintegrar, abrindo
espaço para o surgimento de um núcleo urbano em Castelo? Esse fenômeno está diretamente ligado à questão econômica. Para ser mais preciso,
um dos fatores que desencadeou o início da urbanização em Castelo foi o
transporte.
Outro fator que contribui para o início da formação do núcleo urbano
de Castelo foi a abolição da escravidão que agravou o problema da falta
de mão de obra. Sem gente suficiente para trabalhar nas lavouras de café,
ocorre um enfraquecimento das atividades rurais. Este problema enfrentado pelos fazendeiros, também é considerado um dos fatores que contribuíram favoravelmente para o surgimento do núcleo urbano de Castelo.
Onde hoje é o perímetro urbano de Castelo era antes da chegada
da estrada de ferro, uma simples planície, pertencente a uma das grandes
fazendas de Castelo, a Fazenda do Centro. Mas a chegada dos trilhos,
iniciou um processo de urbanização contínuo, irreversível que chega até
nossos dias.
Comungamos da teoria que a economia é um fator determinante na
organização da sociedade e que através dela as demais coisas se organizam no dia-a-dia e na história. E o processo de urbanização de Castelo
não foge essa regra, isso implica dizer que ele teve seu início impulsionado
por fatores econômicos específicos que foram o transporte da produção
de mercadoria aqui produzida e também as que chegavam oriundas das
várias partes do Brasil, até do mundo e também a crise de falta de mão de
obra que enfraqueceu o meio rural.
Tínhamos a Fazenda do Centro, como núcleo mais completo entre
as grandes fazendas. É bem provável que, se os trilhos da Estrada de Ferro Caravelas tivessem chegado até a sede da fazenda, como previsto, teria
sido lá o local onde se estabeleceria a urbanização de Castelo.
Como os trilhos não subiram a serra, o processo desceu da Fazenda do Centro e se instalou nas proximidades da estação, onde é hoje a
Praça Três Irmãos. Ali foi plantada a semente que germinou e deu origem
ao núcleo urbano de Castelo.
E foi assim, embalado pelo som da maria fumaça (o símbolo do progresso da época) que o fazendeiro Manoel Fernandes Moura transferiu sua
casa de comércio da Fazenda do Centro para as proximidades da estação.
Este ato marcou o início de nossa urbanização e desencadeou um processo que gradativamente foi transferindo toda a estrutura das fazendas, até
então autônomas e auto-suficientes, para o cada vez mais crescente centro
urbano que se formava em torno da estação.
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Dada a importância desta transferência para a história de Castelo,
iremos reproduzir na íntegra o anúncio feito no jornal de publicação semanal da época “O Cachoeirano”, de 30 de outubro de 1887, que circulava na
região:
Reprodução do jornal O CACHOEIRANO de 30 de outubro de 1887 - propaganda da CASA
MOURA. Fonte: Acervo: Arquivo Público do Estado do Espírito Santo
Consideramos este anúncio a “certidão de nascimento” do núcleo
urbano de Castelo. A chegada dos trilhos teve um significado muito importante para a região, a ponto do maior fazendeiro e comerciante não hesitar
em transferir sua casa comercial para junto da estação.
E esta transferência foi rápida, pois a inauguração da estrada de ferro foi em 17 de setembro de 1887 e já no dia 21 de outubro do mesmo ano,
Manoel Fernandes Moura anunciava que sua casa comercial funcionava
no mesmo endereço. Estar próximo da estação significa uma comodidade
muito grande do ponto de vista comercial, pois ele teria mais facilidade
para embarcar os produtos da região, principalmente o café, através da
construção de um depósito na estação e também no caso dos produtos que
chegavam de todas as partes do mundo, trazidos pelo trem. Sua localização era privilegiada. Isso sem falar no fluxo de pessoas que cada vez mais
passava a usar o trem como meio de transporte.
O contato com a maria fumaça trouxe mudanças profundas para a
vida por aqui a principal delas, como destacamos foi o desencadeamento
do processo de urbanização de Castelo, pois pela primeira vez se forma
um núcleo de povoamento, não mais em função da extração mineral, como
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ocorreu na fase que convencionamos chamar de período da mineração,
ou mesmo em torno de atividades agrícolas, como ocorreu no período das
grandes fazendas.
Desta vez a formação deste novo núcleo populacional se dá em
torno de atividades com características mais ligadas à cidade, como o comércio e o transporte de mercadorias, as que eram produzidas e as que
eram consumidas na região. Isso não significa dizer que todas as tradições
e atividades rurais foram paralisadas, muito pelo contrário, até hoje a base
da nossa economia é a agricultura.
O que diferencia este novo núcleo populacional é o seu cerne, o
motivo de sua origem até então inédito em Castelo. Enquanto os núcleos
populacionais das fazendas eram fechados em, com pouco ou nenhum
contato com o mundo exterior, com o único objetivo de garantir a sobrevivência de seus habitantes o que surgia no entorno da estação do Castelo,
estava em sintonia com o que existia de mais moderno em termos de transportes terrestre da época, que era o trem.
O fluxo de mercadorias, ideias e pessoas passou a ser muito mais
intenso no novo povoado. Enquanto que os demais povoados da região
viviam fechados em seus pequenos mundos, o que se formava na estação,
estava de portas e janelas abertas para o mundo através da estrada de
ferro. Mas essa mudança foi lenta e gradual. Muitos fazendeiros não se
adaptaram rapidamente às mudanças.
Um exemplo claro da dificuldade da nova adaptação é à polêmica
gerada em torno da construção de uma ponte e também dos preços a serem pagos para o embarque do café na estação.
Apesar da existência da estrada de ferro, muitos produtores preferiam continuar transportando sua produção através das tropas. Os motivos
alegados eram os altos preços do frete e a não existência de uma ponte
para se transpor o rio Castelo e chegar à estação. Diziam os fazendeiros
que a estrada de ferro foi construída sem pernas, pois não existia acesso à
estação pela falta de uma ponte.
O local onde deveria ser construída a ponte pertencia a Manoel Fernandes Moura, desta forma a sua construção ficaria sob sua responsabilidade. O termos dos demais fazendeiros era que após a construção, ele
cobrasse uma taxa para sua utilização. O fato da não utilização da estrada
de ferro pelos produtores de Castelo chamou a atenção dos proprietários
da concessão da estrada.
Através do jornal “O Cachoeirano”, que chegava todas às terças-feiras, à Estação do Castelo, os concessionários da estrada exigiam dos
produtores os motivos pela não utilização de seus serviços. Através do
mesmo veículo de comunicação os produtores justificavam os motivos de
continuarem a utilizar as tropas para o transporte. Os motivos basicamente
eram a não existência da ponte e os preços do frete, que os produtores
julgavam que deveria cair pela metade. A nota respondendo os motivos da
não utilização foi assinalada pelos seguintes produtores: Francisco Antô-
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nio Moraes e filhos, Pedro Vieira da Cunha, Maurício Vieira Machado da
Cunha, Luiz Homem de Azevedo, Conrado V. Machado, Carlos Pinheiro
de Souza, Francisco Vieira de Almeida Ramos, Bernardo Vieira Machado, José Nunes de Almeida Ramos, Januário Vieira Pena, Cesário Vieira
Machado, Francisco de Sales Vieira Machado, Pedro Francisco Moreira,
Bernardo de Almeida Ramos, José Alves de Souza Coutinho, Wantuil Vieira da Cunha, Antônio da Silva Pinheiro, Agostinho Ayres da Silva, Antônio
Gomes Ferreira, Honório Vieira Machado, Carlos Silva, João Bernardo de
Souza Júnior, Peregrino Gomes Vieira e companhia, Pedro Vieira Machado
da Cunha, Adolpho Vieira da Cunha e Honório Vieira Machado da Cunha.
Para buscar solucionar o impasse gerado pela insatisfação dos produtores, o alto escalão da empresa da estrada de ferro se deslocou até
Castelo para se reunir com os produtores locais e saber pessoalmente os
motivos da insatisfação e discutir as prováveis soluções.
Representando a concessionária da estrada, estiveram presentes à
reunião: Visconde S. Salvador de Mattozinhos, presidente, Antônio Gonçalves, sócio da Casa Comercial Moura e Cia, João Layola, da imprensa local
e Rodolpho Henrique Baptista, chefe de tráfego da estação.
Nesta reunião com os produtores locais ficou acertado que a construção da ponte sobre o rio Castelo, ligando a fazenda até a estação, ficaria
mesmo a cargo de Manoel Fernandes Moura, mas que devido aos altos
custos, a companhia proprietária da estrada de ferro arcaria com metade
das despesas. Desta forma, o acesso à ponte seria livre a todos os produtores e cidadãos da região.
Já com relação às tarifas cobradas, o presidente da companhia dizia não depender dele, mas que faria o máximo possível para solucionar
também esse problema.
Esta reunião é uma prova de como que gradativamente a população ia se acostumando com a nova realidade que se apresentava: A modernização no transporte e o surgimento de um núcleo urbano. Um fato
importante decidido nesta reunião e que serviu para ajudar a consolidar
o processo de urbanização, foi a construção da ponte sobre o rio Castelo.
A obra foi fundamental para a urbanização. Sua localização provável era perto da atual “ponte da cadeia”, em frente onde hoje funciona a
Delegacia de Polícia. Com a ponte ligando as duas margens do rio Castelo,
teve aumentada a área disponível para a expansão do núcleo urbano.
A relação de Manoel Fernandes Moura, dono da Fazenda do Centro
e da primeira casa comercial de Castelo, com os demais fazendeiros não
era as mais amistosas. Acompanhando os jornais da época encontramos
uma sequência de cartas de leitores e mesmo matérias jornalísticas que
demonstram conflitos de interesses entre as partes.
O primeiro impasse foi a questão da ponte, como citamos anteriormente. Mas eles não pararam por aí, tiveram outros. Os problemas se agravavam quando em 16 de janeiro de 1889 o senhor Antônio da Rosa Carvalho Machado inaugurou a segunda casa comercial do povoado, também na
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Praça da Estação, com 12 metros de frente.
A inauguração contou com a presença da banda de música da Estrela do Norte, do vigário da freguesia, do gerente da casa comercial, Sr.
José Xavier de Lima e de aproximadamente duzentas pessoas que eram
convidados em geral. Passada a festa tiveram início os problemas.
O Sr. Manoel Fernandes Moura mandou instalar esteios na margem
esquerda da estação, dificultando o acesso do concorrente e seus fregueses à Estação. O Sr. Moura também usou de outros artifícios para impedir
que seu concorrente chegasse à estação, não só a de Castelo, como também a de Santo André, atual Aracuí, como a construção de casas e valas,
todas com intenção de dificultar a passagem.
As atitudes de Manoel Fernandes Moura lhe renderam uma multa
por não cumprir as determinações da Câmara da Vila, de impedir o acesso
dos moradores à estrada de ferro e às estações.
Estes problemas fizeram com que o vigário Manoel Leite de S. Mello
retornasse a Castelo. Desta vez não apenas para benzer a casa comercial
do Sr. Antônio Rosa Carvalho Machado, mas também o caminho que ligava
a casa comercial à estação que estava sendo bloqueado pelo Moura. Na
ocasião, o vigário fez um discurso conciliatório, pregando a necessidade da
paz e da harmonia entre todos os moradores.
Apesar dos problemas, o processo de urbanização ia se consolidando aos poucos. Uma prova disto é o surgimento de novas casas comerciais. O próprio Moura abriu uma filial perto da ponte ainda em 1888.
No dia 27 de agosto de 1889, Carlos Pinheiro de Souza e Rocha
Júnior também criaram uma sociedade comercial com o nome de “Antônio
da Rocha Júnior”.
Também no ano de 1889, mas no mês de fevereiro, Carlos Pinheiro
de Souza e Carlos Augusto Assumpção Silva fundaram a “Sociedade Silva
e Pinheiro” que vendia fazendas, roupas feitas, chapéu, sal, molhados, louças, ferragens e armarinhos.
Esta casa comercial não se localizava nos arredores da Praça da
Estação do Castelo, mas sim na Fazenda São Quirino e com uma filial
no Aldeamento Imperial Afonsino (atual cidade de Conceição do Castelo).
Mas com certeza, sua existência contribuiu para a consolidação do nosso
processo de urbanização, já que eles tinham a necessidade de usar a Estação do Castelo para receber suas mercadorias,contribuindo assim para
um maior fluxo de mercadorias e pessoas em nossa estação.
Como podemos observar, tomando como base estes primeiros investimentos comerciais, o surgimento do comércio foi obra dos antigos
fazendeiros escravocratas, que viram na atividade comercial uma nova
modalidade de investimento e de retorno. Desta forma, o comércio passou
gradativamente a ocupar espaço na vida de alguns fazendeiros, que se
dedicarem as duas atividades: a agrícola, produzindo café e a comercial
que se desenvolvia às margens da Estação.
Os anos finais que antecederam a Proclamação da República do
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Brasil, em 15 de novembro de 1889 foram marcados por uma agitação
no meio político. A ideia da República para substituir a Monarquia do Rei
crescia a cada dia e Castelo não ficou imune ao crescimento desta ideia.
No jornal republicano “O Cachoeirano” de 18 de setembro de 1888
é anunciada a criação do Partido Republicano no Castelo. Na ocasião foi
publicado o Manifesto Republicano, assinado por grande parte dos fazendeiros e por alguns comerciantes do então nascente núcleo urbano da Estação do Castelo.
Paralelo à nova ideia da vida urbana gestava-se entre alguns habitantes outras novidades que era a substituição da monarquia pela república. O sonho da república virou realidade, mas acontecimentos políticos
nesse período não mobilizaram a massa da população, que ficava indiferente ao que passava no meio político. Sua preocupação principal era a
sobrevivência.
Outro núcleo também surgiu ao longo da estrada de ferro. Trata-se
do Distrito Policial de Santo André, hoje Aracuí, criado em 26 de setembro
de 1887. Seu limite era ao norte com base no Caxixe, ao sul e oeste o
Ribeirão de Boa Esperança e Santa Rosa e a leste com o rio Castelo até
sua foz.
Para este distrito foram nomeadas as seguintes autoridades: Camilo
Homem de Azevedo, Manoel Lopes de Souza, Antônio Cândido Neves dos
Santos e Nicolau Santiago Louzada, para os cargos de 1º, 2º e 3º suplentes. Este fato só veio reforçar a importância fundamental da estrada de
ferro para a formação dos núcleos urbanos.
A criação do Distrito Policial de Santo André (26/09/1887) é anterior
a transferência da Casa do Comércio Moura e Cia da Fazenda do Centro
para a Estação do Castelo (30/10/1887), fato considerado por nós como
marco inicial da urbanização de Castelo.
Mesmo surgindo depois o fato do núcleo populacional da Estação
do Castelo estar mais próximo geograficamente das grandes fazendas, foi
determinante para ele se tornar maior e mais importante que o Distrito de
Santo André. O núcleo populacional que se formou no entorno da Praça da
Estação que deu origem a atual sede do município só foi transformado em
distrito em 1891.
Uma amostra de que o processo de urbanização estava de fato se
consolidando eram os frequentes anúncios que o Sr. João da Cunha Coutinho fazia no formal “Cachoeirano”, de vendas e arrendamentos de terrenos e casas comerciais nas proximidades da ponte do Machado, como era
conhecida a ponte que existia nas proximidades de onde é hoje a ponte da
cadeia.
A importância da estrada de ferro para o desenvolvimento da região
de Castelo, é indiscutível. Podemos afirmar sem nenhum medo de errar
que o surgimento e o desenvolvimento do núcleo urbano que é Castelo, se
deu basicamente por conta da estrada de ferro.
É bem verdade que esse não foi o único fator impulsionador do sur-
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gimento do que veio a se chamar cidade de Castelo. Aliás, nenhum grande
acontecimento histórico pode ser explicado por um único fator. Eles sempre
são resultados da soma de vários fatores. Mas o mais importante para nós
nesse momento, para proporcionarmos ao leitor uma boa compreensão de
nossa história, é a estrada de ferro. Por isso, dedicaremos um capítulo de
nosso livro a ela, a Estrada de Ferro Caravelas.
10.5 - A Estrada de Ferro Caravelas
A Estrada de Ferro Caravelas, que ligava Cachoeiro a Alegre, com
entroncamento para Castelo, foi a primeira a ser construída no Espírito
Santo. O fato de nossa região ser a pioneira nesta modalidade de transporte dá a dimensão da nossa importância econômica no final do século XIX.
Quinze anos. Foi o tempo necessário para a Estrada de Ferro Caravelas sair do papel e virar realidade. Seu projeto de construção foi apresentado à Assembleia Provincial por Basílio Daemom em 31 de outubro de
1872 e sua inauguração foi em 16 de setembro de 1887.
O projeto inicial previa que a estrada fosse até o Limoeiro, onde
se localizavam as grandes fazendas produtoras de café. Mas a parte que
ligava a estação do Castelo à Fazenda do Centro e ao Limoeiro não se
concretizou, ficando como ponto final da linha a Praça da Estação. Este
inclusive foi o principal motivo para que o início da urbanização se desse
no entorno da praça.
Mas mesmo depois da inauguração os esforços para o prolongamento da estrada até o Limoeiro continuaram. Tanto é verdade que o jornal
semanário “O Cachoeirano” publicou no dia 27 de julho de 1888 a notícia
de que a Assembleia Provincial iria discutir mais uma vez a questão da
estrada de ferro até Limoeiro.
A discussão se dava em torno da viabilidade econômica de sua
construção e também do compromisso ou não da Província, na construção
da mesma. A estrada não chegou a ser construída, mas o prédio que serviria de estação na Fazenda do Centro foi erguido e se encontra até hoje lá,
à espera dos trilhos que nunca chegaram.
A companhia responsável pela estrada de ferro, Companhia de Navegação e Estrada de Ferro Espírito Santo – Caravelas, possuía três locomotivas. Baldwin de 27 toneladas, um carro de primeira classe, dois de segunda, dois mistos, dois de correios e bagagens, dezoito vagões fechados
e seis abertos. Uma era exclusiva para o transporte de animais e seis de
lastro. A estrada era de bitola larga.
A primeira viagem de trem em solo espírito-santense foi para a Estação de Pombal, em Alegre. O trem partiu às dez horas da manhã e retornou
a Cachoeiro às 16 horas. Só no dia seguinte é que o trem chegou à estação
do Castelo.
No dia 17 de setembro de 1887, às sete horas da manhã a locomotiva com seus 40 vagões partem com destino à estação do Castelo. A
viagem da estação de Cachoeiro que se localizava onde é hoje o gabinete
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do prefeito de Cachoeiro de Itapemirim, durou 4 horas até a estação do
Castelo, onde é hoje a Praça Três Irmãos.
Aqui chegando, as autoridades políticas, eclesiásticas, os responsáveis pela estrada e os demais passageiros da viagem inaugural foram
recebidos pela banda de música do fazendeiro, proprietário da Fazenda do
Centro, Manoel Fernandes Moura, e pela população livre da época (nunca
é demais lembrarmos que neste período ainda vivíamos em um regime escravocrata), que se deslocou das fazendas para ver a máquina que andava
pelos trilhos, com uma rapidez estonteante para a época e que carregava
sozinho, o equivalente a várias juntas de boi.
Podemos considerar a chegada dos trilhos a Castelo como um dos
fatos mais importantes ocorridos na história do município. Foi um marco
divisório em nossa história e que só vem reforçar a importância econômica
das fazendas da região, que com o suor, sangue, a própria vida dos escravos que eram privados do seu bem maior, a liberdade, produziam café o
suficiente para inserir nossa região entre as mais importantes províncias
do Espírito Santo.
A construção da estrada de ferro e montagem dos vagões e locomotivas ficaramsob responsabilidade do engenheiro Pedro Schere e também,
os empreiteiros Figueiredo e Praxedes. As publicações da época não fizeram menção, mas nós, por uma questão de senso de justiça e de reconhecimento e valorização, podemos afirmar que os escravos tiveram participação na construção. E mais do que isso, que foram fundamentais, pois nesta
época nada em termos de trabalho era realizado sem a presença da mão
de obra escrava. Portanto, a base da origem do que hoje consideramos o
início de nosso progresso, foi também construída em cima da destruição de
um período importante de uma raça, a raça negra. O sangue e o suor dos
negros foram o principal combustível da construção do nosso progresso.
Os materiais para a construção da estrada de ferro foram importados da Antuérpia, Bélgica e chegaram ao porto de Cachoeiro que se
chamava João Marques e se localizava onde é hoje o Centro Operário e
de Proteção Mútua, trazidos pelo vapor da Companhia de Navegação do
Visconde de Matozinho, que fazia regularmente o trajeto da foz do rio Itapemirim ao porto de Cachoeiro, transportando passageiros e mercadorias.
Acreditamos ter contribuído com essas análises para a elucidação
de como se deu o início do processo de urbanização de Castelo. Contudo é
importante também analisarmos dentro desse mesmo propósito, a respeito
da Fazenda do Centro.
Muito já falamos sobre ela, mas agora faremos uma abordagem em
um momento diferente, onde ela não é mais o centro das atividades políticas econômicas e sociais.
Procuraremos retratar como a Fazenda do Centro e através dela,
todo o meio rural reagiu ao fenômeno da urbanização. Esta análise é fundamental, pois Castelo iniciou a construção de um núcleo urbano, mas
jamais deixou de depender economicamente da agricultura.
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XI - Fazenda do Centro
11.1 - Final do Século XIX e Início do Século XX
A história da Fazenda do Centro, por vezes se confunde com a própria história de Castelo, ainda mais em se tratando dos períodos mais remotos. Como fenômeno da urbanização ela vai gradativamente ficando em
um plano mais secundário, perdendo importância para o núcleo urbano que
se formava no entorno da estação.
Neste capítulo estaremos abordando a fazenda em um período específico, o da morte de seu proprietário Manoel Fernandes Moura, em 1898
até a compra pela ordem agostiniana, em 1909.
O Sr. Moura faleceu durante uma viagem para a Europa, deixando
como herdeiros Ansa Izabel Vieira Moura. Aí ocorre um fato no mínimo
curioso. A herdeira que residia no Rio de Janeiro, antiga Capital Federal,
na Rua Senador Furtado, nº 12, não foi localizada e muito menos se preocupou em tomar posse de seus bens.
O cartório de Cachoeiro de Itapemirim enviou correspondência à
herdeira, afirmando que ela tinha 8 dias pra comparecer à sede do município, no referido cartório para assinar o termo de inventário, descrever os
bens para serem avaliados e pagos os impostos devidos. O não comparecimento no prazo descrito implicaria na indicação de novo inventariante, ou
seja, outro herdeiro.
Contam os registros, que foram 4 os herdeiros, sendo eles: Antônio
Fernandes Moura, Joaquim Fernandes Moura, José Vieira Ferraz e José
Fernandes Moura que residia em Portugal.
Como sabemos a falta de mão de obra era um problema crônico
para os fazendeiros neste período e se agravou com o fim da escravidão.
A tentativa da vinda dos imigrantes italianos era uma das únicas opções e
assim também foi feito na Fazenda do Centro.
Ainda no período em que estava sobre a administração de Manoel
Fernandes Moura chegaram ao fazendeiro os primeiros imigrantes, mas
ainda não em número suficiente já que eles preferiam ficar nos núcleos
coloniais onde recebiam terra do governo.
Do fim da escravidão até a compra de parte da fazenda pelos agostinianos foram aproximadamente 20 anos; esse período foi marcado pelo
abandono e pela perda de importância econômica da Fazenda. A morte de
seu proprietário e sua divisão entre os herdeiros não alterou o quadro de
decadência e abandono. Esse quadro onde a Fazenda ficava sobre administração de feitores, principalmente após a morte de Manoel F. Moura, só
começou a mudar quando parte da Fazenda foi comprada pelos Agostinianos.
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11.2 - A Compra da Fazenda pelos Agostinianos
O ato de compra da Fazenda foi antes de tudo uma transação comercial, com todo os contornos e características inerentes a mesma, como
lucro, hipotecas, financiamento, divida, etc... mais a frente nos ateremos
aos números dos negócios. Agora, nos dedicaremos aos desdobramentos
desta negociação que mudou a estrutura fundiária de Castelo, introduzindo
de vez a pequena propriedade no município.
Em 1909 o Padre Manoel Simón de San José, ficou sabendo o interesse dos então proprietários da Fazenda do Centro em vendê-la. Ao
tomar conhecimento da notícia, Frei Manoel veio a Castelo para conhecer
a Fazenda.
Como se tratava de um grande negócio, ele buscou alguns parceiros. A intenção era comprar a Fazenda e repassá-la aos imigrantes italianos e seus descendentes que residiam nos núcleos coloniais Alfredo Chaves, onde a terra não era boa e não havia lugar para todos.
Os sócios escolhidos foram Maximiliano Alves e José Mariano Sobrinho, sendo que o primeiro se dedicaria a criação de gado e o segundo a
explorar o comércio. Essa busca por sócio é mais uma prova da intenção
dos compradorespara obter ganho econômico com a transação. O agrimensor HermanBello também entraria de sócio e sua participação provavelmente seria prestando serviço de medição das terras, já que esse serviço custava quase um terço do preço estimado da Fazenda.
Mas a sociedade não durou muito tempo, logo em seu início antes
mesmo de começar as negociações com os proprietários, o Sr. Maximiliano
Alves abandonou a sociedade sem apresentar motivo aparente. Os outros
sócios se dirigiram a Cachoeiro do Itapemirim para negociar com os demais
da Fazenda.
Segundo consta nos registros do 1º Cartório de Imóveis de Cachoeiro de Itapemirim, Frei Manoel Simon de San José e seu sócio José Mariano Sobrinho adquiriram dos herdeiros, o total de 15421/2alqueires, sendo
10171/2 na Fazenda do Centro, 199 alqueires na Fazenda Criméia e mais
outros 326 alqueires.
Como forma de viabilizar a compra, os sócios resolveram hipotecar
a Fazenda junto ao banco.
O quadro a seguir, mostra passo a passo, em ordem cronológica
como se processou toda a transação de compra da Fazenda do Centro
pelos Agostinianos.
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PAULA, Sérgio Peres de.
Fazenda do Centro: Imigração e Colonização Italiana no Sul do Espírito Santo
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Estava selada assim a transação de compra e venda que mudou a
história de Castelo. Este fato demonstrou toda a visão de negócio, coragem
e idealismo de uma importante figura da história de Castelo, estamos falando do Padre Frei Manoel Simón.
Ele nasceu na Espanha, no ano de 1862, em 21 de maio de 1899
atravessou o Atlântico e veio trabalhar no Espirito Santo, onde foi o primeiro
Padre Agostiniano. Em 14 de julho do mesmo ano foi nomeado Pároco em
Anchieta. A paróquia era bastante extensa e abrangia todo o litoral sul e
também o município de Alfredo Chaves, onde estava localizado o núcleo
colonial Castelo.
Frei Manoel faleceu em 1936, em Ribeirão Preto no interior de São
Paulo, no dia 19 de Julho. Durante o processo de compra da Fazenda que
durou cerca de um ano, Frei Manoel temeu que fosse destituído de sua
função de sacerdote administrador da paróquia de Guarapari, pelo Bispo
Diocesano, sob a alegação de que ele estava abandonando as questões
religiosas e se dedicando somente à Fazenda.
Para além das questões religiosas o fato é que Frei Manoel era homem de grande visão. Pois além de ter feito um grande negócio do ponto
de vista econômico, resolveu o problema dos imigrantes e descendentes
que viviam sem terra, ou em algum lugar de pouca qualidade e o que é
mais importante, impulsionou o processo de pulverização da propriedade
rural em Castelo, que dura até hoje.
Dedicaremos agora a análise das famílias que foram instaladas
através da compra, nas terras da Fazenda do Centro.
Para facilitar a compreensão do leitor, dividiremos a comercialização das terras da Fazenda do Centro efetuada por Frei Manoel Simón em
duas etapas. A primeira foi feita aos colonos imigrantes e seus descendentes, algumas famílias das quais já se encontravam na região e outras que
vieram junto com o Frei Manoel, de Alfredo Chaves. Vemos então dois tipos
de negociação, a que assentou os colonos de pequeno porte e a outra de
maior porte.
Nessa primeira fase, também encontramos registros de pagamentos referentes a compra de terras na Fazenda, cujos valores nos fazem
acreditar que o volume de terras compradas era bem superiores aos pequenos lotes vendidos aos colonos.
Nas negociações de maiores valores, encontramos os registros de
pagamento de:
01 – Denativos Domingos – 3.500 $000 (3 contos e quinhentos mil réis) –
25/05/1910;
02 – Denativos Domingos – 100 $000 (cem mil réis) – 30/06/1910;
03 – Manoel Moura Júnior – 1000 $000 (um conto de réis) – 17/08/1910;
04 – GiuseppinaVentorim – 500 $000 (quinhentos mil réis) – 15/10/1910;
05 – Vivácqua e Irmãos – 10.000 $000 (dez contos réis) – 01/02/1911;
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A relação que se segue refere-se aos lotes de pequeno porte, seus
proprietários e sua localização.
Na localidade de Corumbá:
Libardi Antônio Carlo – 05 lotes
Giovanni Bernabé – 01 lote
AmábileMazzioli – 01 lote
Pedro Campo – 02 lotes
FioravanteVenturim – 02 lotes
Augusto Lachine – 02 lotes
NicoliAntonio – 01 lote
CeruttiGiusseppe – 01 lote
Ângelo Vettorazi – 02 lotes
DazziGiusseppe – 01 lote
Rubim Pietro – 02 lotes
Facco Antônio – 01 lote
Alexandre Scandian – 01 lote
Giusseppe – 01 lote
Rubim Pietro Delazare – 01 lote
Venturim Ricardo – 03 lotes
Baldo Giusseppe – 06 lotes
Na localidade do Caxixe
Vettorace Carlo e Irmãos – 07 lotes
GulielmoBarrani – 01 lote
Salvador Giovanni – 01 lote
Salvador Francisco – 01 lote
D”Martin e Filhos – 04 lotes
Altoé Antônio e Filhos – 04 lotes
CalimanGiácomo – 01 lote
Caliman Pietro – 01 lote
Francischetto Alexandre – 01 lote
Fasolo Augusto – 01 lote
Cremasco Ângelo – 01 lote
Tossi Segundo – 02 lotes
Altoé José e Filhos – 03 lotes
Tossi Cirilo – 01 lote
Filhos de Cesconetti – 03 lotes
Camata Teodoro – 07 lotes
Brunoro Giovanni – 03 lotes
Monsueto – 07 lotes
Nicoli Caetano – 01 lote
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Na localidade de São Luís
Bernabé Calixto e Irmãos – 04 lotes
Na localidade de Córrego da Telha
Salvador Francisco – 01 lote
Andreia Colodetti – 01 lote
Zoppe Ludovico – 01 lote
Nico Césare – 01 lote
Nicoli Caetano – 01 lote
Andreon Luigi – 02 lotes
José Ribeiro d’Aquino – 01 lote
Na localidade de Vae e Vem
Caliman Michel – 04 lotes
CalimanGiusseppe – 02 lotes
SpadettoFilippo – 01 lote
Lubiana Luciano – 01 lote
AltoéTiciano e Filhos – 02 lotes
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O mapa da página anterior, serve para visualizar a divisão da Fazenda em lotes que foram vendidos aos imigrantes e seus descendentes e
diz respeito a 1ª fase.
Optamos por colocar o mapa completo da Fazenda feito pelo agrimensor Herman Bello. Ao todo, as negociações de pequeno porte, somam
50 famílias em 6 localidades num total de 115 lotes.
Entre a 1ª e a 2ª fase da venda das terras da Fazenda, em 1912,
aconteceu a dissolução da sociedade entre Frei Manoel Simón e José Mariano Sobrinho, ficando a cargo de Frei Manuel Simón, toda a responsabilidade hipotecária da terra, assim como também de pagar todas as dívidas
coube à Fazenda e inclusive a que coube a Joaquim Vieira Moura.
Em contrapartida, José Mariano Sobrinho e sua esposa Dona Leopoldina Maria Amiga ficaram com 620 alqueires de terra em matas. O restante das terras continuou propriedade dos Agostinianos e dos imigrantes
que foram adquirindo lotes da Fazenda.
Na 2ª fase da comercialização das terras da Fazenda, já devidamente registrada em cartório, ocorreu a partir de 1932.
A 1ª transação foi em 06/07/1932, onde vendeu a AchildoLubiana,
EtoreLubiana, AttilioLubiana, Adelino Lubiana, Pedro Lubiana e Emilio Lubiana, 3 alqueires de terrenos em capoeiras, próximo ao córrego da povoação.
A 2ª transação se deu em 27/03/1933, quando vendeu para João,
Agostinho, Ricardo, Luís e Virgílio, da Família Altoé, 20 alqueires de terrenos em matas, no lugar denominado Alto Caxixe.
Em 03/09/1934, Frei Manoel Simón vendeu a Carlos Sasso, 30 alqueires de terrenos em mata, no lugar denominado Rancho.
Em 13/04/1936, as terras foram comercializadas com João Sassoprimeiro, meio alqueire em mata, no lugar denominado Corumbá.
Em 08/05/1936, Frei Manuel vendeu a Augusto Fasollo, 3 alqueires
em mata que confrontava com a propriedade de Francisco Piassi.
Em 15/02/1937, vendeu para João Jusson, Fernando Jusson, Ângelo Jusson e Brás Jusson 17 alqueires de terreno, que confrontavam com a
Cia Territorial Castelo, com Augusto Fasolo e Segundo Tosi.
Em 15/02/1937, vendeu a João Berleze 13 alqueires e meio de
terrenos que confrontavam com GiocindoLourencini, Egydio, Arthur Casagrande e também com a sociedade de colonização e instrução.
Em 12/03/1937, Frei Manuel vendeu a Andrea Tedesco, 23 alqueires de terras em mata, situados no Alto Caxixe, que confrontavam com os
irmãos Jusson, AntonioJusson, Francisco Piassi e irmãos Tosi.
No mesmo dia, por se tratar de menos de 5 alqueires de terras em
mata negociou também com Domingos e Angélica Grassi, que foi representado por seu pai Virgílio Grassi, na localidade de Alto Caxixe, que confrontava com Raphael Zardo.
Consta no registro do cartório, ainda, vendeu em 04/05/1937, a Atílio Rigo, 6 alqueires de terreno em mata, no Alto Caxixe, confrontando com
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irmãos Tosi, Raphael Zardo, Andrea Tedesco e Antônio Jusson.
Esses foram os registros encontrados em cartório (Cachoeiro de
Itapemirim), que convencionamos chamar de 2ª fase das vendas das terras
da Fazenda do Centro. Ao todo foram 12 transações de venda efetuadas
por Frei Manuel Simón, na década de 30 do século XX, totalizando 137
alqueires de terras.
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XII - A IMPORTÂNCIA DA IMIGRAÇÃO
Não podemos falar da história de Castelo, sem acrescentar a ela
a presença marcante dos imigrantes que aqui chegaram e fincaram suas
raízes, colaborando de forma direta na construção não só econômica, mas
principalmente cultural. Castelo foi escolhido para abrigar vários grupos de
imigrantes europeus, mas sem sombra de dúvida, coube ao grupo italiano
a maior quantidade.
Muito já se pesquisou sobre o tema e muito ainda está para ser pesquisado, mas uma coisa é fato: nossa construção está intimamente ligada
à presença dos italianos em nossa região.
Abordaremos aqui brevemente, o quanto esta presença foi e é importante.
A imigração europeia em nossa região foi acontecendo desde os
primórdios de nossa história, começando pelos portugueses e espanhóis
que aqui chegaram com a missão de arrebanhar almas para a cristandade. O foco era através das Missões Jesuíticas, educar o gentio, o nativo à
religião Cristã Católica que tanto sofria na Europa os efeitos devastadores da Reforma Protestante. Listaremos aqui, algumas famílias de portugueses e descendentes que ajudaram na ocupação e desenvolvimento de
Castelo: Souza Wernek, Magalhães, Pinheiro de Souza, Moreira Matos,
Maximiniano, Almeida, Ramos, Ferreira dos Santos, Machado, Lopes da
Rocha, Oliveira da Costa, Oliveira Pinto, Oliveira de Souza, Souza Pinto,
Oliveira Leite, Arruda, Gonçalves Leite, Vargas e Silva, Vargas Neto, Pereira de Vargas, Vargas Ferreira, Vargas Fontes, Nunes, Vargas Fernandes,
Alves Machado, Gomes, Vieira da Cunha, Vieira Dável, Azevedo, Pinheiro,
Vieira Machado, Rocha, Grilo, Cardozo, Silvestre, Dias, Soares, Moreira,
Vargas Côrrea, Fernandes D’Ávila, Escobar, Mota, Lopes Xavier, Souza
Flor, Bicas, Homem de Azevedo, Coutinho, Moura, Durães, Guimarães,
Brandão, Pereria Souto, Cunha, Penna, Barboza,Merçon, Lemes Ferreira,
Nolasco, Pinto de Assis, Serpa, Sales, Vieira de Melo, Paiva, Araripe, Cruz,
Marques, Pinto Coelho, Carvalho, Crisóstono, Senna, Rodrigues, Lacerda, Castro, Ayres, Mendes, Ferreira dos Santos, Leitão, Martins, Nogueira,
Vidigal, Rabelo, Gomes Gonçalves, Conrado, Pimenta, Lamas, Teixeira,
Manço, Barcellos, Carneiro, Trugilo, Almança, Ribeiro, Lima, Alves Dias,
Máximo, Dutra da Rosa e Veloso.
E o que dizer da imigração forçada a que se submeteram os africanos, convertidos em escravos, desprovidos de tudo e aos milhares, sangraram em nossas terras, para que nelas pudessem se desenvolver uma economia que fosse lucrativa, rentável, não importando o custo de vidas para
que o objetivo fosse alcançado. Os africanos chegaram em grandes levas,
principalmente para o trabalho na produção de nossos cafezais. Vieram
para nossa região no momento em que a cafeicultura carioca se ressentia
de terras, necessitando expandir a produção cafeeira, fomos acrescidos à
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produção do café, com os cafeicultores que já possuíam a estrutura para a
produção: tropas para transporte, capital para a produção e a tão importante e fundamental mão de obra. O que tínhamos a oferecer? Terras, muitas
terras devolutas, matas virgens, terras férteis para que aqui se pudesse
produzir o tão valioso café. E foi assim que surgiram nossas fazendas cafeicultoras e escravocratas, nos mesmos moldes das cariocas, já que fomos uma extensão delas.
A presença dos Sírio-Libaneses já ocorre em nosso processo de
urbanização. Ainda não temos dados específicos, mas sabemos que em
torno de 1902 e 1903, já existem registros da presença deste grupo de
imigrantes no sul do Espírito Santo, Alegre e Cachoeiro de Itapemirim, mas
podem até ter chegado antes ainda. Nossa formação econômica, além da
agricultura, com certeza a que sustentava nossa economia, cada vez mais
viu o migrar do comércio das fazendas para a Estação da Estrada de Ferro
e neste contexto de economia também agora comercial, viu a chegada de
novos grupos de imigrantes, relacionados especialmente a esse novo ramo
de nossa economia. O café propiciou o crescimento do mercado interno
e a impulsionado pelas estradas de ferro, estes imigrantes viram aí uma
grande possibilidade econômica. As várias guerras internas que sempre
estiveram presentes na história dos povos do Oriente Médio e infelizmente ainda estão, foram os fatores motivadores prováveis da imigração dos
sírios-libaneses para nossa região, em especial a 1ª Grande Guerra mundial de 1914, que trouxe para cá um enorme contingente de imigrantes,
fugindo da fome que assolava a região dos invasores turcos. Detentores de
um grande conhecimento, algum recurso financeiro e faro comercial, criaram aqui vários empreendimentos econômicos, como armarinhos, secos e
molhados, loja de tecidos e armazéns, que foram fundamentais para nossa
consolidação econômica, que nos trariam condições para futuramente nos
desligarmos de Cachoeiro de Itapemirim, de quem éramos distrito. E caminharmos com nossas próprias pernas.
Tivemos também a presença de outros grupos europeus, mas em
muito menor quantidade, como os alemães e austríacos.
A imigração do italiano é um capítulo à parte pela quantidade que
migrou para nossa região. O motivo desta imigração já foi discutida neste
livro, cabe então aqui apenas uma lembrança, do quanto foi difícil ter que
abandonar a própria Pátria, porque ela não mais oferecia a condição mínima de sobrevivência para seu povo. E essa condição fica explícita nos
versos de uma canção de um imigrante da Toscana, mas que bem pode ser
utilizada para todos os que da Itália saíram, quando ele diz:
“Itália bela, mostra-te gentil e os filhos teus não a abandonarão
senão eles vão para o Brasil e não se lembrarão mais de voltar. Ainda
aqui haveria trabalho sem ter que emigrar para a América. O século
presente está nos deixando e o novecentos se aproxima. Eles têm a
fome pintada na cara e para saciá-los não existe a medicina. A cada
momento escutamos dizer: eu vou prá lá onde tem a colheita do café.”
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Como esses versos deixam evidentea motivação para o imigrante italiano: a fome provocada pela falta de trabalho, o desespero de não
encontrar na própria nação a mínima esperança de um presente-futuro diferente daquele que havia sido traçado para o povo pobre, camponês e
trabalhador da Itália. A unificação do país era necessária e urgente, mas o
saldo de uma Itália Grande, Unida e Industrializada foi muito negativo, para
aqueles que não faziam parte desta nova realidade traçada pelo governo.
“Que coisa entendeis por uma nação, Senhor Ministro?
é a massa dos infelizes?
Plantamos e ceifamos o trigo, mas nunca provamos pão branco.
Cultivamos a videira, mas não bebemos o vinho.
Criamos animais, mas não comemos a carne.
Apesar disso, vós nos aconselhais a não abandonarmos a nossa pátria?
Mas é uma pátria a terra em que não se consegue viver do próprio
trabalho?”
(resposta de um italiano a um Ministro de Estado de seu país, a propósito das razões que estavam ditando a emigração em massa)
Diante da condição do nada, a que o povo lá estava submetido, o
Brasil era a única esperança. A propaganda da falta de braços para nossa
lavoura de café, se encaixava perfeitamente na necessidade exata da falta
de trabalho para aqueles que se encontravam na miséria.
A pressão externa exercida principalmente pelos ingleses e a pressão interna daqueles que viam a necessidade de acabar aqui com a escravidão, culminaria com as leis abolicionistas, em especial a de 1850, que
acabou com o tráfico.Momentaneamente não trouxe sérios abalos à nossa produção do café, pois passou a haver o tráfico interno, mas ao longo
do processo da abolição, ficava muito claro a asfixia a que as fazendas
escravocratas estariam vivendo diante da certeza de que de a lei que definitivamente acabaria com a escravidão, era uma questão de tempo. O
tempo chegou quando em 13 de Maio de 1888, a princesa Isabel assinou
a Lei Áurea. Antes mesmo da lei assinada, já há alguns anos, começaram
a chegar os primeiros italianos no Brasil, no Espírito Santo, em 1874 e em
Castelo, em 1884, quando aqui chegou o primeiro grupo, que consta de
104 imigrantes direcionados para as fazendas de Castelo.
Os nossos primeiros imigrantes italianos aqui chegados não vieram
propriamente pra cá. Vieram de Alfredo Chaves e de outros lugares. Alguns sobrenomes das famílias atualmente:
Agostini
Dorieto
Pagios
Aledi
Espadetos
Pagoto
Altoé
Espadette
Pasteis
Andeão
Facini
Pasti
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Antoniazzi
Faço
Pedregulho
Arcobele
Falqueto
Perin
Avance
Fardin
Persici
Baldo
Feijoli
Piuccin
Barbieri
Feitanin
Provatti
Barnaldi
Feriani
Puziol
Belisario
Ferrão
Ragazzi
Benicá
Filete
Rigo
Bertolin
Finholato
Rinhao
Bissoli
Fornacieri
Sansao
Botazzin
Francesquetti
Santolin
Brambilla
Furlan
Sardi
Brioschi
Furlanete
Scabele
Bruneto
Fuze
Scalferes
Buzatto
Gazzola
Sonas
Calagari
Giaretta
Sossai
Caliman
Guarnieri
Stelzer
Camata
Gurssan
Tedesco
Campanha
Jareta
Tessinari
Campo Dal´Orto
Jubini
Toneli
Campores
Laquin
Tozzi
Careta
Lavatti
Ulian
Cavazzani
Libardi
Valani
Cesauin
Lorenzoni
Venturin
Cesconette
Lubiana
Vicentini
Cipian
Magnago
Vince
Coco
Maragonhas
Vitorazzi
Cola
Marcelan
Vivacqua
Colodetti
Mareto
Volpini
Cumarelli
Mauro
Zachi
Dadalto
Mazioli
Zambon
Dalcin
Mignoni
Zandonadi
Dalvi
Minete
Zaneli
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Delbarba
Negri
Zardes
Delarmelina
Niceli
Zucoloto
Derive
Nicote
Zucon
Quando o imigrante chegava a Vitória, ficava hospedado próximo ao
porto em um lugar, tipo um albergue, por alguns dias, até sua distribuição
para o interior. Essa distribuição se dava de acordo com o interesse do
imigrante, que poderia requerer ser um colonizador, um meeiro ou como
diarista. São reunidos em grupos de acordo com o interesse e levados próximo ao local para onde poderiam ser destinados:Benevente e Itapemirim
no Sul, Santa Cruz, Rio Doce e São Mateus no norte.
Os diaristas encontraram trabalho com facilidade como, os meeiros,
são apresentados aos fazendeiros que requereram a Comissão Distrital. Já
os imigrantes que requeriam um lote de terreno para colonizar, tinham que
aguardar, até que pudessem obter o terreno mediante a compra do mesmo.
Em Castelo, tivemos o predomínio num primeiro momento dos meeiros e somente com o passar do tempo, o imigrante pode adquirir seu lote
de terra.
Possuir um pedaço de chão para plantar e tirar dele o próprio sustento, era a mais profunda aspiração dos camponeses vênetos. Feita a
derrubada no meio da floresta, o colono tinha seis meses para construir
sua casa e iniciar as plantações. Só começava a pagar a terra, depois de
dois anos.
Em pesquisa recente realizada junto aos alunos, de 12 a 18 anos,
das escolas públicas municipais, estaduais e privadas do Município de
Castelo, ficou evidente o quanto foram duros os primeiros anos. As dificuldades encontradas pelos imigrantes assim que chegavam em nossa região, eram as mais diversas: nem todas as terras eram de boa qualidade,
matas fechadas, falta de alimentos, isolamento quase que total, falta de
estradas ou caminhos, ausência de tropas para abastecimento de produtos
de necessidade básica, preços do café que já se apresentava em baixa,
sintomas de uma crise que se aproximava.
Praticamente todos os relatos contam o quanto foi difícil, começar
literalmente do zero, abrindo caminho na mata fechada, correndo todo tipo
de perigo, desde as doenças tropicais, que os imigrantes não tinham conhecimento, até as mordidas de cobras que acabavam se tornando um
calvário, pela falta de médicos, de medicamentos e acesso a eles.
A pesquisa mostrou também, que conhecer suas origens, tradições
e a história da família é muito relevante, de acordo com os entrevistados,
pela própria manutenção da memória, fundamental para que as futuras
gerações tenham fontes de pesquisa e conhecimento do passado, como
uma referência para sua identidade enquanto cidadão.
Castelo prosperava, mas nossas estradas eram péssimas e descui-
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dadas e não havia nas duas primeiras décadas escolas. Os colonos dessa
região eram, em boa maioria, alfabetizados e alguns com curso ginasial.
Suplicaram escolas e assistência religiosa. A professora pública foi nomeada em 1924. Os pais alfabetizavam os filhos nas horas de lazer, em idioma
italiano, quando não no próprio harmonioso dialeto vêneto. As mulheres
instruíam os filhos na doutrina católica.
Diante do exposto é inegável a grande contribuição dos vários grupos de imigrantes que em nossas terras chegaram e se fixaram e o quanto
contribuíram para sermos hoje o que somos: Castelenses.
Foto típica de Família Italiana - Arquivo Società Italiana di Castello
Foto de Família Italiana e ao fundo Casarão com arquitetura típica.
Arquivo Società Italiana di Castello.
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XIII - URBANIZAÇÃO 40 ANOS DEPOIS
No ano de nossa
emancipação política, em
1928, Castelo possuía vários estabelecimentos comerciais como: Vivacqua,
Irmãos & Cia; o bar pertencente a José Castro que
depois passou para o Senhor José Franscischetto;
venda de verduras do Senhor José Teixeira; barbearia do Alberto Vieira dos
Santos;maxabomba de Antônio de Oliveira; pequeno Festa de Emancipação do Município de Castelo - Hotel
Mangueira em 7 de janeiro de 1929.
comércio de fumo, bebidas,
Arquivo Società Italiana di Castello
fósforo, sal e mantimentos
de propriedade de Cecília Leocádia; fábrica de aguardente, do senhor Pery
Aranha; Mussi, Filhos & Cia; também um fábrica de bebidas de propriedade
de Miranda & Irmãos; Restaurante do Senhor Angelino Scarpi; Domingos
Ceotto& Companhia; Antônio Madeira que era comprador e exportador de
madeira;J.Vargas& Cia que possuía uma venda de bebidas, louças, vidro,
fósforos, querosene e inflamáveis; o Hotel Mangueira, de propriedade do
Senhor Liberato Shmarts e armazén do Senhor Domingos Perim.
Nesta época as cidades
eram administradas por Interventores Estaduais, que deveriam seguir a mesma linha de
administração do Estado e do
Governo Federal. Tudo era analisado, autorizado ou não por
ele. Qualquer aterro, derrubada
de parede, construção de parede, abertura de nova porta ou janela, pintura, tudo deveria ser li“América Cine”
berado
pelo Interventor. No início
Propriedade do Senhor Antero Castro Rodrigues
de 1929, foram feitos vários peArquivo Società Italiana di Castello
didos de licença para a abertura
de casas comerciais e prestação de serviços, porém quase todos pediam
no final deste mesmo ano o fim da licença para o funcionamento de seus
respectivos estabelecimentos. Era a grande crise de 1929, que começou
nos Estados Unidos e se arrastou por vários países e trazendo profundas
mudanças, como ocorreu em vários estados do Brasil, atingindo inclusive
a cidade de Castelo.
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A crise deu novos rumos à política, à economia e à educação. E é
dentro deste contexto de mudanças, que nesta época, no ano de 1937, o
capitão João PunaroBley, no governo do Espírito Santo, inaugurou a Escola João Bley.
O processo de urbanização apesar de irreversível foi lento. Para
mostrar isso, vamos relatar o número de casas por ruas em Castelo nos
anos de 1932 e 1933. Essa relação foi tirada do livro de registro de impostos e taxas da Prefeitura que se encontra no arquivo Municipal.
QUADRO DE RUAS
RUA
CASAS 1932
CASAS 1933
Atual Veriador Anisio Novais
31
43
CAXIXE
NITERÓI
22
24
VA.ESPIRITO SANTO
31
34
MOURA
18
19
DOMINGOS MARTINS
12
16
MARIA ORTIZ
12
19
Atual av. Ministro Araripe
43
59
FREI MANOEL
3
4
VIERA DA CUNHA
29
34
AV.JOÃO PESSOA
TIERES VELOZO
10
15
BERNADINO MONTEIRO
5
5
AFONSO CLAUDIO
6
6
NESTOR GOMES
9
11
CRUZ MAIA
3
5
VITÓRIA
7
10
MUNIZ FREIRE
8
9
AV. 24 DE OUTUBRO
25
28
ANTÔNIO MACHADO
2
5
PRAÇA VIVAQUA
1
1
1
4
PRAÇA RUI BARBOSA
Praça três irmãos
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DISTRITO DE SANTO
ANDRÉ
61
80
POUSO ALTO
1
1
PRAÇA CASTELO
0
2
Ponte do Caxixe - Década de 30 - Arquivo Società Italiana di Castello
Rua no centro da Cidade de Castelo - 1935 - Ao fundo, a esquerda, à Escola Nestor
Gomes e à direita, 2ª Igreja Matriz Católica. Arquivo Società Italiana di Castello.
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Av. Getúlio Vargas - 1930 - Arquivo Società Italiana di Castello.
Av. Getúlio Vargas, tendo à frente a Ponte Nova - 1932
Arquivo Società Italiana di Castello.
Av. Getúlio Vargas - vista dos casarões, Hotel Mangueira e a bomba de
gasolina manual - 1935 - Arquivo Società Italiana di Castello.
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O número de estabelecimento que pagava impostos em Castelo em
1938 por setor, estão no quadro abaixo. Através deles podemos ter a dimensão do trânsito, do comércio local neste período, alguns anos depois
da emancipação em 25 de dezembro de 1928.
QUADRO DE N° DE ESTABELECIMENTO
SETOR
QUANTIDADE
HOTEL
5
INFLÁMAVEL
10
PENSÃO
3
FÁBRICA DE AGUARDENTE
5
BOMBA DE GASOLINA
1
BEBIDAS DE FUMO
44
SANTO ANDRÉ
BEBIDAS DE FUMO
9
FABRICA DE AGUARDENTE
2
FÁRMACIA
1
INFLÁMAVEL
1
Dando continuidade ao objetivo de dimensionar esse período especifico de nossa história, a década de
trinta, do século XX, descrevemos a
seguir as profissões que encontramos
no livro de registro da prefeitura. Eram
elas;açougueiro, madeireiro, tintureiro,
padeiro, comerciante (donos de bar,
pensão, hotel, farmácia, livraria, posto
de gasolina), sapateiro, barbeiro, médico, ferreiro, agrimensor, advogado, fotográfo e alfaiate.
Muitas destas profissões ainda
existem até hoje, outras já deixaram de
existir ou foram substituídas por outras.
Este é o cenário de Castelo 40
anos após o início do processo de urbanização.
Ferraria de propriedade do
Senhor José Alledi
Arquivo Società Italiana di Castello.
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As fotos a seguir nos dão a dimensão de como ocorreu este processo de urbanização em Castelo.
Cadeia Pública no Arraial de Castelo
1910
Arquivo Società Italiana di Castello
Ponte Nova e ao fundo
Cadeia Pública Municipal - 1930
Arquivo Società Italiana di Castello
Cidade de Castelo em 1929.
Arquivo Società Italiana di Castello.
Cidade de Castelo em 1930.
Arquivo Società Italiana di Castello
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Cidade de Castelo em 1933. Arquivo Società Italiana di Castello.
Cidade de Castelo em 1935. Arquivo Società Italiana di Castello.
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Considerações sobre a transição do trabalho escravo ao trabalho livre na economia cafeeira no ES.
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