José Rodrigo de Moraes - Instituto de Estudos em Saúde Coletiva

Transcrição

José Rodrigo de Moraes - Instituto de Estudos em Saúde Coletiva
i
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
INSTITUTO DE ESTUDOS DE SAÚDE COLETIVA
ESTADO DE SAÚDE AUTORREFERIDO DE ADULTOS NO BRASIL E A
ÁREA DE LOCALIZAÇÃO DO DOMICÍLIO SEGUNDO A PNAD 2008:
AVALIAÇÃO DO EFEITO DO PLANO AMOSTRAL E USO DE MODELO LOGÍSTICO
ORDINAL VIA ABORDAGENS AGREGADA E DESAGREGADA
José Rodrigo de Moraes
RIO DE JANEIRO
2012
ii
José Rodrigo de Moraes
ESTADO DE SAÚDE AUTORREFERIDO DE ADULTOS NO BRASIL E A
ÁREA DE LOCALIZAÇÃO DO DOMICÍLIO SEGUNDO A PNAD 2008:
AVALIAÇÃO DO EFEITO DO PLANO AMOSTRAL E USO DE MODELO LOGÍSTICO
ORDINAL VIA ABORDAGENS AGREGADA E DESAGREGADA
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em
Saúde Coletiva, do Instituto de Estudos em Saúde
Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro,
como requisito parcial para obtenção do título de Doutor
em Saúde Coletiva na linha de pesquisa
“Desenvolvimento
de
Métodos
Estatísticos,
Epidemiológicos e Computacionais em Saúde”.
Orientador: Ronir Raggio Luiz
RIO DE JANEIRO
2012
iii
José Rodrigo de Moraes
ESTADO DE SAÚDE AUTORREFERIDO DE ADULTOS NO BRASIL E A
ÁREA DE LOCALIZAÇÃO DO DOMICÍLIO SEGUNDO A PNAD 2008:
AVALIAÇÃO DO EFEITO DO PLANO AMOSTRAL E USO DE MODELO LOGÍSTICO
ORDINAL VIA ABORDAGENS AGREGADA E DESAGREGADA
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva, do Instituto de Estudos
em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial para
obtenção do título de Doutor em Saúde Coletiva na linha de pesquisa “Desenvolvimento de
Métodos Estatísticos, Epidemiológicos e Computacionais em Saúde”.
Banca avaliadora:
Prof. Dr Ronir Raggio Luiz (IESC/UFRJ) – Orientador
Prof. Dr Alexandre dos Santos Brito (IESC/UFRJ)
Prof. Dr Guilherme Loureiro Werneck (ENSP/FIOCRUZ)
Prof. Dr Antonio Carlos Monteiro Ponce de Leon (IMS/UERJ)
Prof. Dr Christovam Barcellos (FIOCRUZ)
RIO DE JANEIRO
2012
iv
M827
Moraes, José Rodrigo de.
Estado de saúde autorreferido de adultos no Brasil e a área
de localização do domicílio segundo a PNAD 2008: avaliação
do efeito do plano amostral e uso de modelo logístico ordinal
via abordagens agregada e desagregada/ José Rodrigo de
Moraes. – Rio de Janeiro: UFRJ/ Instituto de Estudos em
Saúde Coletiva, 2012.
166 f.; 30cm.
Orientador: Ronir Raggio Luiz .
Tese (Doutorado) - UFRJ/Instituto de Estudos em
Saúde Coletiva, 2012.
Inclui Bibliografia
1. Avaliação em saúde. 2. Distribuição espacial da
população. 3. Regressão logística . 4. Estatística. 5.
Bioestatística. 6. Análise multinível. I. Luiz, Ronir Raggio. II.
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Estudos
em Saúde Coletiva. III. Título.
CDD 570.15195
v
Em primeiro lugar dedico esta tese a Deus
por permitir que eu completasse mais essa
importante etapa da minha vida; em segundo
lugar aos meus pais Vera Lúcia e José
Roberto e ao meu irmão José Roberto Júnior
por me apoiarem em todos os momentos na
realização de mais esse grande sonho: “Ser
doutor e assim poder conseguir maior êxito
nas minhas atividades profissionais de ensino
e pesquisa”.
vi
Agradecimentos
Especialmente ao meu orientador Ronir Raggio Luiz, a quem tenho um grande respeito
e admiração, não somente pelo incentivo a produção acadêmica, pela indicação para ser
avaliador de artigos científicos e por seu vasto conhecimento em estatística e epidemiologia,
mas principalmente pela forma como conduziu o seu trabalho de orientação durante todo esse
tempo. Sua pontualidade, paciência, atenção, além da confiança depositada em mim, foram
com certeza qualidades fundamentais para a conclusão desta tese.
Ao Professor Ponce de Leon, agradeço por ter atendido o meu pedido para assistir as
suas aulas de bioestatística no IMS/UERJ sem me conhecer pessoal ou profissionalmente, e
sobretudo por ter me comunicado sobre o início do doutorado no IESC e desse modo
possibilitado que eu me inscrevesse no processo seletivo ainda em 2009.
A todas as pessoas que me incentivaram nesta longa caminhada, em especial a minha
namorada Renata Lacerda e aos meus grandes amigos Milton Ferreira e Jorcely Franco pela
grande ajuda, atenção e paciência em muitos momentos. Aos meus amigos de turma, em
especial Patrícia Guimarães, Fátima Paula, Jéssica Pronestino e Raphael Mendonça, por
todas as sugestões e críticas que me fizeram refletir e crescer como pesquisador.
Aos professores que sempre me espelhei Inês Costa (ENCE/IBGE) e Frederico
Cavalcanti (ENCE/IBGE) por terem me estimulado para a carreira acadêmica.
A todos os meus amigos do Departamento de Estatística da Universidade Federal
Fluminense, em especial Luz Amanda, Dirley Santos e Licínio Esmeraldo, por me
incentivarem durante todo esse período de realização da tese.
A todos os meus alunos da Universidade Federal Fluminense, em especial os da
graduação de Estatística, Farmácia e Economia, agradeço por continuarem me mostrando por
meio de palavras ou por simples gestos que tenho condições de fazê-los compreender as
técnicas estatísticas, motivando-me ainda mais a me empenhar na carreira acadêmica.
Ao Instituto de Estudos em Saúde Coletiva (IESC/UFRJ), por ter-me acolhido com
todo carinho durante todo o período de estudo e pesquisa e por ter me possibilitado conhecer e
valorizar ainda mais a área de Saúde Coletiva, além de ter me possibilitado construir laços de
amizade e parcerias com diferentes profissionais da área de saúde.
A Coordenadora Geral da Escola Nacional de Ciências Estatísticas (ENCE), Denise
Britz, por ter me permitido usar o programa SAS nos momentos em que precisei.
vii
SUMÁRIO
Lista de Tabelas....................................................................................................... viii
Lista de Quadros...................................................................................................... x
Lista de Figuras....................................................................................................... xi
Lista de Siglas......................................................................................................... xii
1. Introdução........................................................................................................ 01
2. Saúde Urbana.................................................................................................. 05
2.1. Saúde e urbanização................................................................................... 05
2.2. Saúde e os lugares...................................................................................... 07
2.2.1. Modelos conceituais em Saúde......................................................... 13
2.2.2. Definição de urbano e rural.............................................................. 16
2.2.3. Indicadores de saúde........................................................................ 19
2.2.3.1. Morbidade autorreferida........................................................ 20
2.2.3.2. Mobilidade física autorreferida.............................................. 21
2.2.3.3. Autoavaliação de saúde......................................................... 22
3. Objetivos.......................................................................................................... 24
3.1. Objetivo geral............................................................................................ 24
3.2. Objetivos específicos................................................................................. 24
4. Material e Métodos......................................................................................... 26
4.1. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD...................... 26
4.1.1. Plano amostral da PNAD.................................................................. 27
4.1.1.1. Informações do plano amostral............................................. 29
4.1.1.2. Estrutura hierárquica dos dados............................................. 31
4.2. Modelagem Estatística............................................................................. 35
4.2.1. Autoavaliação do estado global de saúde do indivíduo.................... 35
4.2.2. Variáveis explicativas do modelo..................................................... 38
4.2.3. Modelo logístico ordinal................................................................... 48
4.2.4. Modelo logístico ordinal multinível.................................................. 49
5. Resultados......................................................................................................... 55
5.1. Artigo 1....................................................................................................... 55
5.2. Artigo 2....................................................................................................... 81
5.3. Artigo 3....................................................................................................... 101
5.4. Artigo 4....................................................................................................... 124
6. Considerações finais........................................................................................ 150
Apêndice................................................................................................................. 156
Referências bibliográficas..................................................................................... 161
Anexos
viii
Lista de Tabelas
Artigo 1:
Tabela 1: Associações de variáveis demográficas, socioeconômicas, comportamentais e de
saúde com o estado de saúde autorreferido – Brasil................................................................ 67
Tabela 2: Modelos logísticos ordinais (multivariados) explicativos do estado de saúde
autorreferido de adultos - Brasil...............................................................................................69
Tabela 3: Medidas de razão de chance para as variáveis de interação ................................... 71
Artigo 2:
Tabela 1: Modelo logístico ordinal ajustado por MPV considerando todas as informações do
plano amostral...........................................................................................................................92
Tabela 2: Modelos logísticos ordinais ajustados por MV considerando apenas os pesos
amostrais, e por MV desconsiderando os pesos amostrais e as informações estruturais do
plano amostral ..........................................................................................................................95
Artigo 3:
Tabela 1: Ajuste de modelos logísticos univariados para estabelecimento da associação entre
área censitária (urbano vs rural) e a chance acumulada de uma melhor autoavaliação de saúde
.................................................................................................................................................112
Tabela 2: Ajuste de modelos logísticos multivariados para estabelecimento da associação
entre área censitária (urbano vs rural) e a chance acumulada de uma melhor autoavaliação de
saúde, controlando por um conjunto de variáveis demográficas, socioeconômicas,
comportamentais e de saúde...................................................................................................115
Artigo 4:
Tabela 1: Distribuição de adultos segundo o desfecho de autoavaliação de saúde, a área de
localização do domicílio e as variáveis de controle (categóricas) usadas na análise multinível
– Municípios populosos..........................................................................................................134
Tabela 2: Associação entre pesos amostrais e o desfecho de autoavaliação de saúde de adultos
nos municípios considerados (análise multinível) .................................................................136
Tabela 3: Resultados do teste de comparabilidade entre o modelo nulo de 4 níveis (adulto,
domicílio, setor e município) com outros quatro modelos nulos com menos níveis de
hierarquia ...............................................................................................................................137
Tabela 4: Estimativas para os modelo logísticos ordinais de interceptos aleatórios de 4 níveis
para o desfecho de autoavaliação de saúde de adultos............................................................138
Tabela 5: Análise multinível da autoavaliação de saúde de adultos: estimativas para o modelo
logístico ordinal de interceptos aleatórios de 4 níveis considerando efeitos
principais................................................................................................................................ 141
ix
Lista de Tabelas
(continuação)
Apêndice:
Tabela 1: Ajustes dos modelos logísticos ordinais univariados (MCP e MCPP) para
estabelecimento da associação entre área censitária (urbano vs rural) e a chance acumulada de
uma melhor autoavaliação de saúde........................................................................................156
Tabela 2: Ajustes dos modelos logísticos ordinais multivariados (MCP e MCPP) para
estabelecimento da associação entre área censitária (urbano vs rural) e a chance acumulada de
uma melhor autoavaliação de saúde........................................................................................158
x
Lista de Quadros
Quadro 1: Listagem do conjunto inicial de variáveis explicativas consideradas no ajuste dos
modelos logísticos (abordagens agregada e desagregada) explicativos do estado global de
saúde autorreferido do indivíduo..............................................................................................47
Artigo 3:
Quadro 1: Comparações efetuadas no modelo de regressão logística ordinal (modelo de
chances proporcionais)...........................................................................................................109
xi
Lista de Figuras
Figura 1: Modelo Conceitual para Saúde Urbana................................................................... 13
Figura 2: Outro Modelo Conceitual para Saúde Urbana..........................................................14
Figura 3: Estrutura do plano amostral da PNAD..................................................................... 29
Figura 4: Relação entre uma variável latente e uma variável categórica de 3 níveis.............. 37
Figura 5: Níveis de hierarquia das variáveis de controle....................................................... 39
Artigo 1:
Figura 1: Distribuição de adultos segundo o estado de saúde autorreferido.
Brasil........................................................................................................................................ 66
Apêndice:
Figura 1: Probabilidade acumulada do adulto autorreferir melhor estado de saúde por área
censitária segundo os modelos de chances proporcionais (MCP) e os modelos de chances
proporcionais parciais (MCPP)...............................................................................................160
xii
Lista de siglas
AR – Municípios autorrepresentativos
MB – Modelo (logístico) binário
MCP – Modelo de chances proporcionais
MCPP – Modelo de chances proporcionais parciais
MPV – Método de Máxima Pseudo-Verossimilhança
MV – Método de Máxima Verossimilhança
NAR – Municípios não autorrepresentativos
OMS – Organização Mundial de Saúde
OPAS – Organização Pan-Americana de Saúde
OR – Razão de chances
PNAD – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
PSF – Programa da Saúde da Família
UPA – Unidade primária de amostragem
USA – Unidade secundária de amostragem
UTA – Unidade terciária de amostragem
xiii
RESUMO
Usando os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2008,
com modelos logísticos ordinais (modelos de chances proporcionais), o presente estudo pode
ser dividido em quatro partes (artigos). Na parte 1 avaliou a associação entre a área de
localização do domicílio (urbana e rural) e o estado de saúde autorreferido da população
adulta brasileira, controlando para um conjunto de fatores individuais e do ambiente
intradomiciliar e extradomiciliar. Na parte 2 avaliou o impacto nas medidas de razões de
chance e nas medidas de precisão das estimativas dos parâmetros quando não se consideram
alguns ou todos os aspectos do plano amostral ao ajustar um modelo logístico ordinal para
estabelecer a associação entre o estado de saúde autorreferido de adultos e um conjunto de
fatores individuais e ambientais. Na parte 3 comparou a associação entre a situação censitária
(urbana vs rural) e o desfecho de autoavaliação de saúde de adultos no Brasil considerando os
casos em que este desfecho é expresso em escala ordinal (três e cinco categorias) e binária. Na
parte 4, ajustando para características do ambiente intradomiciliar (domicílio) e
extradomiciliar (setor) e para características individuais (adulto) teve como objetivo avaliar,
por meio de modelo de regressão logística ordinal multinível, o efeito da área de localização
do domicílio (urbana e rural) na autoavaliação de saúde de adultos residentes em cidades
populosas. Quanto aos resultados, observou-se na parte 1 que ao controlar por fatores
individuais e ambientais, a associação entre a área de localização do domicílio e o estado de
saúde autorreferido dos adultos se modifica (passando de OR=1,51 para OR=0,96) e perde a
sua significância estatística (p-valor=0,208). Na parte 2, observou-se que quando não se
considera os três aspectos (estratificação, conglomeração e pesos amostrais distintos)
simultaneamente, ocorrem alterações nas magnitudes das medidas de razões de chance do
adulto autorreferir melhor estado de saúde associadas à maioria dos fatores, além de grande
subestimação dos erros padrões. Na parte 3, para as diferentes escalas de autoavaliação de
saúde verificaram-se semelhanças no sentido, magnitude e significância estatística da
associação entre a situação censitária e a chance (acumulada) de melhor autoavaliação de
saúde tanto na análise bruta quanto na análise multivariada. Com relação à parte 4, na análise
bruta os resultados mostraram que a área urbana, em comparação a área rural, está associada a
melhores níveis de autoavaliação de saúde de adultos, mas na análise ajustada não se
evidenciou uma diferença estatisticamente significante nos níveis de autoavaliação de saúde
entre áreas urbana e rural de municípios populosos.
Palavras-chave: Estado de saúde autorreferido, área de localização do domicílio, modelo de
regressão logística ordinal, efeito do plano amostral, escala binária, escala ordinal, modelo
regressão logística ordinal multinível.
xiv
ABSTRACT
Using data from the National Household Sampling Survey (PNAD) 2008, with ordinal
logistic models (proportional odds models), the present study can be divided into four parts
(papers). In part 1 assessed the association between the area where the homes of a Brazilian
adult population were located (urban or rural) and these individuals’ self-reported state of
health, while controlling for a set of individual and environmental factors within and outside
of households. In part 2 assessed the impact on odds ratio and accuracy measurements of the
parameters estimates when some or all the features of the sampling plan are not taken into
account in fitting ordinal logistic models to establish associations between adults’ selfreported health status and various individual and environmental factors. In part 3 compared
the association between census tract location (urban vs rural) and the outcome of self-assessed
health among adults in Brazil, considering cases in which this outcome is expressed on an
ordinal scale (three and five categories) and on a binary scale. In part 4 evaluated the effect of
household location (urban or rural) on self-assessed health among adults living in large cities,
by means of a multilevel ordinal logistic regression model, with adjustments for
environmental characteristics inside homes (household) and outside homes (census tract) and
for characteristics of the individuals (adult). Regarding the results, in part 1 the results
indicated that after controlling for individual and environmental factors, the association
between the area of home location and individuals’ self-reported state of health became
modified (going from OR = 1.51 to OR = 0.96) and lost its statistical significance (p-value =
0.208). In part 2, it was seen that when the three features (stratification, clustering and
different sampling weights) were not simultaneously taken into account, there were changes
to the magnitudes of the odds ratio measurements, such that adults self-reported a better state
of health in relation to most of the factors, along with major underestimation of standard
errors. In part 3, for the different self-assessed health scales, similarities in the direction,
magnitude and statistical significance of the association between census tract location and the
accumulated chance of better self-assessed health, both in crude analysis and in multivariate
analysis, were observed. With respect to part 4, in the crude analysis, the results showed that,
in comparison with rural areas, urban areas were associated with better self-assessed health
levels among adults, but in the adjusted analysis did not show any statistically significant
difference in self-assessed health levels between the urban and rural areas of large-population
municipalities.
Key words: Self-reported state of health, area of home location, ordinal logistic regression
model, effect of sampling plan, binary scale, ordinal scale, multilevel ordinal logistic
regression model.
1
1. Introdução
Na segunda metade do século XX, o Brasil experimentou uma das mais aceleradas
transições urbanas da história mundial, transformando-se de um país rural e agrícola em um
país urbano e metropolitano (MARTINE e MCGRANAHAN, 2010). Esse rápido processo de
urbanização, aliado à intensificação da industrialização após a Segunda Guerra Mundial,
provocou a migração de grandes contingentes populacionais de áreas rurais para os centros
urbanos na busca de melhores condições de vida, o que conduziu a modificações na ocupação
do espaço urbano (NOGUEIRA, 2008).
Em grande parte do século XX, a saúde da população urbana não teve a devida
atenção de políticos e planejadores, não atuando nos fatores determinantes da saúde urbana
que poderiam ser evitados ou modificados com a realização de um planejamento urbano
adequado (SANTANA, 2006). Devido à dificuldade de planejamento do crescimento urbano e
às grandes desigualdades socioeconômicas ainda existentes no Brasil, o espaço urbano tem se
caracterizado por altos níveis de pobreza, crescimento de favelas e aumento da degradação
ambiental (MARTINE e MCGRANAHAN, 2010).
No século XXI, a urbanização e o crescimento urbano acentuado são ainda
considerados fenômenos que mais afetam as condições socioeconômicas e ambientais nos
países em desenvolvimento, e com isso a saúde e a qualidade de vida das populações.
Com o novo paradigma do processo saúde-doença baseado na promoção e prevenção,
cujo resultado esperado é a melhoria da qualidade de vida e bem-estar da população, tem
surgido nas últimas décadas, no campo da Saúde Pública, estudos que levam também em
conta os atributos (características) do espaço urbano (lugar) para explicar as diferenças de
saúde da população urbana. A saúde é entendida como resultado da influência de fatores
individuais (características dos indivíduos, tais como sexo, idade, escolaridade, etc.) e fatores
composicionais (características do lugar obtidas a partir da agregação das características dos
2
indivíduos que compõem esse lugar) e contextuais (características do ambiente físico e social
do lugar) (PROIETTI et al., 2008).
Ainda é baixo o número de estudos que visam encontrar associações entre
determinantes individuais e contextuais do lugar de moradia e a saúde individual, usando
como desfecho do modelo a autoavaliação do estado de saúde levantado em inquéritos
populacionais (SANTOS et al., 2007). Além disso, uma grande parte desses estudos
dicotomizam este indicador. Nesta tese, a partir dos dados da Pesquisa Nacional por Amostra
de Domicílios (PNAD) realizada em 2008, utilizou-se como desfecho a autoavaliação do
estado global de saúde, mantendo a natureza ordinal deste indicador; a área de localização do
domicílio (urbana e rural) como variável de interesse e um conjunto de dezoito variáveis de
controle relacionadas às características dos indivíduos (adultos) e dos ambientes
intradomiciliar e extradomiciliar. A PNAD é um estudo secional realizado anualmente pelo
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de abrangência nacional, que utiliza um
plano amostral complexo, que envolve estratificação, conglomeração e probabilidades
desiguais de seleção das unidades.
De modo geral, nesta tese avaliou-se a existência de associação entre a área de
localização do domicílio (urbana e rural) e o desfecho de autoavaliação de saúde para dois
recortes populacionais: 1) adultos brasileiros que informaram seu próprio estado de saúde e
2) adultos brasileiros que informaram seu próprio estado de saúde residentes em municípios
populosos, que englobam os municípios situados nas regiões metropolitanas e os municípios
grandes em tamanho populacional. O primeiro recorte populacional foi utilizado nos artigos 1,
2 e 3, enquanto que o segundo recorte foi considerado no artigo 4.
Na modelagem estatística foram consideradas basicamente duas abordagens de
análise: a agregada (artigos 1, 2 e 3) e a desagregada (artigo 4). Na abordagem agregada,
utilizou-se o modelo de regressão logística ordinal, em especial o modelo de chances
3
proporcionais (MCP) que foi ajustado incorporando e não incorporando as informações do
plano amostral da pesquisa. Mas ainda na abordagem agregada, foram realizadas algumas
análises que incluíram o modelo de chances proporcionais parciais (MCPP) e o modelo de
regressão logística binária. Com relação à abordagem desagregada, ajustou-se o modelo de
regressão logística ordinal multinível, também considerando o modelo de chances
proporcionais.
Em termos gerais, pode-se dizer que a abordagem desagregada traz uma complexidade
maior na análise estatística, pois além da consideração da estrutura hierárquica dos dados, é
preciso incorporar ainda os pesos amostrais e a estrutura do plano amostral adotado na seleção
da amostra (PESSOA e SILVA, 1998). A análise multinível (abordagem desagregada de
análise) é considerada mais adequada no estudo das características do(s) local(is) de moradia
(unidade de contexto) na autoavaliação do estado global de saúde dos indivíduos
(SANTANA, 2006), por permitir estudar tanto as variações entre indivíduos quanto entre
grupos, além de permitir a estimação do efeito de cada um desses níveis sobre a autoavaliação
de saúde (SANTOS et al., 2007).
Esta tese foi estruturada em seis capítulos, sendo esta introdução o Capítulo 1. No
Capítulo 2 são apresentados aspectos relacionados à temática Saúde Urbana, que inclui uma
descrição sobre a relação entre saúde e urbanização, a importância do lugar na análise das
diferenças de saúde, a mudança de paradigma do processo saúde-doença, os modelos
conceituais em Saúde Urbana, e por fim, são apresentados alguns indicadores de saúde de
natureza subjetiva levantados periodicamente nas PNADs, além da definição de urbano-rural
utilizada pelo IBGE, bem como uma breve discussão sobre tal definição. No Capítulo 3 são
descritos os objetivos gerais e específicos. No Capítulo 4 é apresentada a descrição do plano
amostral da PNAD 2008, incluindo aspectos relacionados à estrutura do plano amostral e à
estrutura hierárquica dos dados, e a descrição das variáveis (desfecho e variáveis explicativas)
4
que serão usadas nos ajustes dos modelos tanto na abordagem agregada quanto na abordagem
desagregada de análise (análise multinível). No Capítulo 5 são apresentados os resultados na
forma de artigos (artigos 1, 2, 3 e 4), além de resultados suplementares apresentados no
Apêndice. No Capítulo 6 são feitas as considerações finais. Complementam esta tese as
referências bibliográficas.
5
2. Saúde Urbana
A saúde urbana pode se entendida como um ramo da saúde pública que “estuda os
fatores de riscos das cidades, seus efeitos sobre a saúde e as relações sociais urbanas
(CAIAFFA et al., 2008)”. A saúde está associada às condições de vida das pessoas e de suas
interações com o meio ambiente e não apenas às suas características biológicas ou genéticas
(COHEN, 2004). Segundo a OMS, o processo de urbanização é considerado o maior desafio
para a saúde pública, estando associado à ocorrência de grandes iniqüidades intra-urbanas.
A temática “Saúde Urbana” vem ganhando mais atenção na agenda política com a
criação de movimentos sociais, que visam realizar ações de melhoria das condições de vida e
saúde da população urbana e, portanto, de incremento na qualidade de vida (SEID e
ZANNON, 2004). Entre eles pode-se citar o Movimento de Cidades Saudáveis surgido em
1986 na Europa
2.1. Saúde e urbanização
Com a aceleração do processo de industrialização, ocorreu uma rápida urbanização
brasileira, com a ampliação no ritmo do crescimento e no número de cidades
(BERNARDELLI, 2006). Esses fenômenos promoveram fortes impactos no campo brasileiro,
isto é, com a modernização da agricultura iniciado principalmente após 1970 no Brasil, houve
aumento da concentração fundiária e a expulsão de expressivo contingente de trabalhadores,
intensificando a migração de grandes contingentes populacionais de áreas rurais para áreas
urbanas (êxodo rural) (MARTINE e MCGRANAHAN, 2010; MONTE-MÓR, 2006;
BERNARDELLI, 2006).
6
Segundo MARTINE e MCGRANAHAN (2010), a não adoção de atitudes proativas
em relação à rápida urbanização no Brasil facilita o aparecimento de problemas, como por
exemplo, a propagação da pobreza habitacional e da degradação ambiental. Esses problemas,
por sua vez, dificultam o aproveitamento do potencial da urbanização precoce no sentido de
melhorar o desenvolvimento social e econômico do país e os níveis de saúde da população.
Segundo CAMELLO et al. (2009) mais de um bilhão dos habitantes do mundo vivem
em habitação em condições inadequadas e sem acesso a serviços básicos, embora todo
indivíduo tenha direito a uma vida saudável em consonância com a natureza. Além disso,
estes autores chamam atenção para o fato que doenças como cólera, dengue, esquistossomose
e leptospirose provenientes da falta ou inadequação de saneamento, sobretudo em áreas
pobres, têm agravado a situação epidemiológica no Brasil.
Se por um lado a urbanização pode trazer oportunidades positivas, por outro lado
também pode trazer efeitos negativos relacionados à falta de organização social, precárias
condições urbanas de moradia e de trabalho, de oportunidades, e de capacidade de
desenvolver políticas para ações que, por sua vez, tendem a ampliar os efeitos adversos sobre
a saúde da população (CAIAFFA et al., 2008). De acordo com MARTINE e
MCGRANAHAN (2010), a urbanização se bem orientada com uma governança mais efetiva
pode ajudar na redução da pobreza, na estabilização do crescimento urbano e na geração de
um futuro ambiental mais seguro. Mas se deixada a mercê das forças de mercado e da
especulação imobiliária, a urbanização aumentará a pobreza, a favelização e a degradação
ambiental, sobretudo em lugares com maiores desigualdades políticas e sociais.
VLAHOV et al., em 2005, já apontavam a ocorrência de uma aceleração no ritmo da
urbanização em todo o mundo nas próximas décadas, especialmente na América Latina, Ásia
e África, e a maioria da população passará a viver em cidades nos próximos anos. Este
fenômeno pode agravar os problemas sociais e ambientes existentes nas cidades brasileiras no
7
século XXI, com conseqüências para a saúde das populações, sobretudo das populações mais
pobres, que não tem as suas necessidades atendidas devido à incapacidade dos políticos e
planejadores para prever e reagir frente à magnitude, velocidade e importância do crescimento
urbano (MARTINE e MCGRANAHAN 2010). COSTA (1986) em seu artigo intitulado
“consumo coletivo e a questão urbana: notas para discussão” já salientava a necessidade e
importância no Brasil de “políticas sociais voltadas para a provisão dos meios de consumo
coletivo essenciais, que devido à sua ausência e/ou precariedade nas áreas urbanas
contribuem, juntamente com os baixos salários, para agravar a pobreza nas cidades
(COSTA, 1986:167).
2.2. Saúde e os lugares
O espaço é considerado como um dos principais elementos na análise de dados
epidemiológicos, sendo compreendido, separado do tempo e das pessoas, como o lugar
geográfico que predispõe a ocorrência de doenças (CZERESNIA e RIBEIRO, 2000). Os
lugares são constituídos por espaço físico e por tudo o que envolve e o que ele contém, por
pessoas e por suas atividades, por ambientes físicos e sociais. Embora parte das diferenças nos
níveis de saúde possa ser devida a fatores individuais, é possível que indivíduos com os
mesmos fatores de risco tenham experiências de saúde diferentes, dependendo do lugar em
que vivem (NOGUEIRA, 2008).
No modelo biomédico vigente desde o século XVI até os séculos XVIII e XIX era
dado mais atenção à doença do que a saúde, e, portanto o foco estava na cura e não na
promoção da saúde ou prevenção da doença, configurando assim uma visão reducionista de
que saúde é simplesmente ausência de doença (NOGUEIRA, 2008). Em outras palavras,
segundo este modelo, a explicação do processo saúde-doença se restringe a seus aspectos
8
anatômicos, bioquímicos e fisiológicos, não considerando assim aspectos funcionais, sociais e
culturais (COSTA, 2006). Em 1946, a OMS passou a definir a saúde de forma mais
abrangente, como um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas
ausência de doença. Ainda assim, tal definição de saúde recebeu críticas devido à não
explicitação dos possíveis fatores responsáveis pela produção do “completo estado de bemestar” (AKERMAN, 2008).
Embora considerada mais abrangente, mas vaga e imensurável na época, a definição
da OMS, surgida na década de 40, tornou-se amplamente aceita devido ao desenvolvimento
de novas técnicas para mensuração de conceitos como bem-estar (VERMELHO et al., 2009).
Entretanto, somente na década de 70 houve uma mudança de paradigma do conceito de saúde,
pautada na promoção de saúde. Em setembro de 1978 foi organizada pela Organização
Mundial de Saúde (OMS) e o Fundo das Nações Unidas para a Infância1 (UNICEF) a
1ª Conferência Internacional sobre Cuidados Primários de Saúde, na cidade de Alma-Ata, no
Cazaquistão. Esta conferência, cujo tema era “Saúde Para Todos no Ano 2000”, deu origem a
elaboração da Declaração de Alma-Ata, que é um documento que reafirmou o significado de
saúde – estado de completo bem-estar físico, mental e social e não apenas ausência de doença
– como um direito humano fundamental e como uma das mais importantes metas mundiais
para a melhoria social (GIOVANELLA, 2008).
Conforme a Declaração de Alma-Ata, deveriam ser estimuladas ações de redução das
desigualdades sociais em todos os países (os desenvolvidos e em desenvolvimento) para que a
meta de saúde universal fosse alcançada. Para isso, essa declaração defende a importância de
1
O Fundo das Nações Unidas para a Infância (em inglês United Nations Children's Fund - UNICEF) é uma
agência das Nações Unidas que visa promover a defesa dos direitos das crianças, atender às suas necessidades
básicas e contribuir para o seu pleno desenvolvimento.
9
investimentos em atenção primária para uma promoção de saúde mais abrangente, por meio
de medidas de prevenção2 e educação em saúde3.
De acordo com BUSS (2000), a Declaração de Alma-Ata representou um importante
reforço para os defensores da estratégia da promoção da saúde, que culminou com a
realização, em novembro de 1986, da 1ª Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde
em Ottawa, no Canadá, organizada pela OMS, Ministério da Saúde e Bem Estar do Canadá e
Associação Canadense de Saúde Pública. Desta conferência, cujo tema era “Promoção da
Saúde nos Países Industrializados”, resultou a Carta de Ottawa, considerada como marco
fundamental na história da Saúde Pública. A Carta de Ottawa define a promoção da saúde
como o processo de capacitação da comunidade para atuar na melhoria de sua qualidade de
vida e de sua própria saúde, incluindo uma maior participação no controle deste processo
(BUSS, 2000).
A Carta de Ottawa reconhece a existência de múltiplos determinantes da saúde, ao
destacar como pré-requisitos fundamentais para a saúde, a paz, a habitação, a alimentação, a
educação, a renda, um ecossistema estável, e conservação dos recursos naturais e a equidade.
Além disso, reforça a questão da intersetorialidade, ao reconhecer que a promoção da saúde é
uma atividade intersetorial, ou seja, depende de uma ação conjunta de outros setores (social,
econômico, etc.) e não exclusivamente do setor saúde (BECKER, 2001). Segundo a Carta de
Ottawa, a saúde é entendida como o maior recurso para o desenvolvimento socioeconômico e
pessoal, sendo a qualidade de vida apontada como fator primordial para a manutenção e
aumento da saúde da população (WESTPHAL, 2000; NOGUEIRA, 2008).
Com a Carta de Ottawa, houve uma ampliação da concepção de promoção da saúde,
incorporando a importância e o impacto das dimensões socioeconômicas, políticas e culturais
2
Prevenção primária é o conjunto de ações que visam evitar a doença na população, removendo os fatores
causais, ou seja, visam a diminuição da incidência da doença.
3
A educação em saúde pode ser definida como qualquer combinação planejada de aprendizado que predispõe,
capacita ou reforça o comportamento voluntário, levando à saúde do indivíduo, do grupo ou da comunidade.
10
sobre as condições de saúde (FERRAZ, 1994 apud BECKER, 2001) dos indivíduos,
superando assim o modelo biomédico, focado na doença como fenômeno individual e na
assistência médica curativa realizada nos estabelecimentos de saúde como foco essencial de
intervenção (BUSS, 2000).
De acordo com BUSS (2000), a Carta de Ottawa considera cinco campos principais
de ação para a promoção de saúde: 1) elaboração e implementação de políticas públicas
saudáveis, que compreendem, sobretudo, ações voltadas para prover equidade em saúde e
uma distribuição mais eqüitativa da renda e políticas sociais; 2) criação de ambientes
favoráveis à saúde, através da proteção do meio ambiente e da conservação dos recursos
naturais, do monitoramento do impacto das mudanças no meio ambiente sobre a saúde, ou
mesmo da conquista de ambientes que contribuam para a saúde, como o lar, trabalho, escola e
a própria cidade; 3) reforço da ação das comunidades, que através do incremento de seu
poder técnico e político, contribuem para a definição de prioridades, na tomada de decisões e
na especificação e implementação de estratégias que visam melhores níveis de saúde;
4) desenvolvimento das habilidades pessoais, por meio da divulgação de informações sobre a
educação para a saúde em diferentes lugares (casa, escola, trabalho, etc.) e 5) reorientação
dos serviços de saúde, no sentido da nova concepção da promoção da saúde, além de serviços
assistenciais.
Segundo CAMELLO et al. (2009), além de ações de prevenção e assistência,
considera-se extremamente importante atuar sobre os fatores determinantes da saúde, entre os
quais destacam as condições ambientais como um dos mais importantes. AZEREDO et
al. (2007) corroboram dizendo que o conhecimento das condições do meio pertinente à saúde,
como saneamento e moradia, é de suma importância para a promoção da qualidade de vida
dos indivíduos, famílias e comunidades.
11
A promoção da saúde, cujos princípios estão expressos na Carta de Ottawa, constitui
um dos principais objetivos da OMS e da OPAS, sendo a habitação considerada um espaço de
construção da saúde e consolidação do seu desenvolvimento. Segundo COHEN et al. (2004),
como a família tem seu assento na habitação, pode-se considerar a habitação como espaço
principal e como veículo da construção e desenvolvimento da saúde da família e da
comunidade. AZEREDO et al. (2007) ressaltam que a inclusão da família como foco da
atenção básica em saúde ultrapassa o cuidado individualizado focado somente na doença,
contextualizando a saúde produzida num espaço físico, social e relacional, resgatando assim,
as múltiplas dimensões do processo saúde-doença.
Como prioridade da política de saúde do Brasil e da OPAS, valoriza-se a iniciativa da
Habitação Saudável, como instrumento para otimização dos resultados do Programa Saúde da
Família (COHEN et al., 2004) criado pelo Ministério de Saúde em 1994. O conceito de
habitação saudável, que tem como preocupação central a melhoria da qualidade de vida,
está relacionado com o território geográfico e social onde a habitação se
assenta, os materiais usados para sua construção, a segurança e
qualidade dos elementos combinados, o processo construtivo, a
composição espacial, a qualidade dos acabamentos, o contexto global
do entorno (comunicações, energia, vizinhança) e a educação em saúde
ambiental de seus moradores sobre estilos e condições de vida saudável
(COHEN et al., 2004:809).
O conceito de ambiente e entorno saudável, por sua vez,
incorpora a necessidade de ter equipamentos urbanos básicos com
saneamento, espaços físicos limpos e estruturalmente adequados e redes
de apoio para se conseguir hábitos psicossociais sãos e seguros, isentos
de violência (abuso físico, verbal e emocional). A idéia de
municípios/cidades saudáveis só é possível se houver uma política de
habitação saudável (COHEN et al., 2004:809).
A influência dos lugares na saúde das pessoas residentes deste lugar tem sido objeto de
estudos epidemiológicos que consideram o paradigma do ambiente como determinante da
saúde. Considerando as propriedades do lugar, entendido como a cidade e seu entorno, e a
12
função do ambiente físico e social (contexto) na saúde das pessoas, é possível entender a
cidade (espaço urbano) como fator de exposição, ou melhor, como fator que influência a
saúde da população de forma positiva ou negativa (CAIAFFA et al., 2008).
NOGUEIRA (2008) chama atenção para o fato que o espaço urbano não é uniforme, e,
portanto, não proporciona a toda a sua população oportunidades iguais de acesso aos serviços,
de ter uma vida saudável e de promoção de saúde. CAMELLO et al. (2009) apesar de
reconhecerem os avanços conquistados pelo Programa (ou Estratégia) da Saúde da Família no
que se refere às ações de assistência e aos cuidados médicos, ressaltam a necessidade de
ampliação das ações do programa para a questão do meio-ambiente, mais especificamente
para os cuidados com a água, lixo e saneamento, apontando para isso a necessidade de
formação específica para as equipes.
COSTA (1986) já salientava que grande parte dos problemas urbanos deve-se aos
obstáculos à “socialização dos meios de consumo co1etivo”, tornando particularmente graves
em uma sociedade na qual as áreas urbanas são caracterizadas pela pobreza generalizada, pela
retenção de terrenos com fins especulativos e pela inexistência de um planejamento urbano
efetivo. Este autor também coloca a habitação no lócus desse consumo coletivo, entendendo a
habitação como uma moradia bem localizada em relação aos lugares das atividades diárias de
seus moradores e que possui todos os serviços urbanos essenciais, tais como saneamento, de
educação e de lazer, de transporte, etc.
Do exposto apreende-se que as diferenças nos níveis de saúde parecem depender de
quem é a pessoa e do lugar onde ela reside, ressaltando a importância de se considerar
variáveis contextuais que capturam as características do lugar onde os indivíduos residem,
além de características próprias desses indivíduos.
13
2.2.1. Modelos Conceituais em Saúde Urbana
A análise da Saúde Urbana é baseada em um modelo conceitual que tem como
característica uma rede interligada de determinantes, tendo como fundamento a proposta de
que os ambientes físico e social definem o contexto urbano e são representados por fatores
proximais e distais que atuam em diferentes níveis (CAIAFFA et al., 2008).
O modelo conceitual de Saúde Urbana (Figura 1) apresentado por CAIAFFA et al.
(2008) mostra que a saúde da população urbana é uma função das influências de três níveis:
1) mundiais e nacionais; 2) municipais; 3) condições urbanas de moradia e trabalho, sendo
estes últimos considerados como fatores primariamente modificáveis.
Figura 1: Modelo Conceitual para Saúde Urbana
Fonte: Caiaffa et al. (2008).
14
Um outro modelo conceitual de Saúde Urbana (Figura 2) é apresentado por
NOGUEIRA (2008). Este modelo também pode ser dividido em três níveis, sendo o primeiro
deles constituído por fatores individuais (sexo, idade e fatores genéticos, por exemplo) e de
grupo (comportamentos e estilos de vida), sensíveis ao processo de planejamento urbano; o
segundo nível formado por influências comunitárias e condições estruturais locais
(organização social e oportunidades sociais); e por fim o terceiro nível formado por fatores
ambientais mais gerais que também sofrem influências do processo de planejamento urbano.
Figura 2: Modelo Conceitual para Saúde Urbana
Fonte: Adaptado de Nogueira (2008).
Este modelo reforça a idéia de que atributos físicos e sociais (contexto) do lugar onde
se vive (local de moradia), também denominado de unidade de contexto (cidade, bairro,
vizinhança, domicílio), podem afetar a saúde dos indivíduos, e que a saúde, também pode
estar associada a atributos dos indivíduos aninhados no local de moradia assim como o
15
agregado das características destes indivíduos (composição), para além de suas características
puramente individuais (PROIETTI et al., 2008). Os atributos físicos e sociais do local de
moradia (ou unidade de contexto), que pode ser uma unidade geográfica administrativa,
embora dependente dos indivíduos, são tipicamente externos a eles e potencialmente
modificáveis (PROIETTI et al., 2008).
Os atributos físicos do lugar de moradia (ambiente físico) representam aspectos
compartilhados por todos os residentes de um lugar, como clima, qualidade da água, solo e ar,
nível de ruído e estética do lugar. Já os atributos sociais do lugar de moradia (ambiente
social), por sua vez, representam um conjunto de fatores relacionados à organização social do
lugar/comunidade e à disponibilidade e oferta de oportunidades sociais e recursos necessários
à vida cotidiana, tais como: Coesão e capital social, Habitação, Trabalho, Transporte e
acessibilidade, Segurança e Disponibilidade de alimentos (NOGUEIRA, 2008). De modo
geral, o ambiente social inclui a vizinhança onde se vive e as regras (procedimentos ou
políticas) criadas para organização da vida dos moradores (SANTOS et al., 2007).
No campo da saúde pública, mais especificamente em Epidemiologia Social, há
especial interesse na dimensão social da saúde, onde a saúde, sob a visão neomaterial da vida
contemporânea, é compreendida como resultante “de diferentes experiências e exposições,
determinadas pelas condições materiais, às quais se juntam, sistematicamente, baixos
investimentos nos fatores que promovam a satisfação das necessidades humanas
(NOGUEIRA, 2008:57)”. Sendo assim, é de interesse atuar em fatores mais proximais tal
como, as “condições de habitação e trabalho” que caracterizam o cotidiano das pessoas que
moram em áreas urbanas e que através de sua modificação é possível alcançar melhores
condições de saúde (CAIAFFA et al., 2008).
Segundo o modelo apresentado, observa-se que comportamentos e estilos de vida,
como por exemplo, tabagismo, atividades físicas e hábitos alimentares, também possuem sua
16
parcela de influência na saúde individual, podendo gerar aumento no nível de mortalidade e
morbidade das populações, além de gerar uma menor qualidade de vida, sobretudo quando se
leva em consideração determinados grupos e/ou lugares.
Com relação ao primeiro nível do modelo conceitual de Saúde Urbana, proposto por
Nogueira (2008), no que se refere a “comportamentos e estilos de vida”, o Programa da Saúde
da Família (PSF), por meio de visitas domiciliares, representa uma importante função de
contribuição para mudança de comportamento de risco e, assim para a promoção da qualidade
de vida dos moradores e de suas famílias (AZEREDO et al., 2007). O PSF se baseia na
educação em saúde, em termos de prevenção de doenças e promoção da saúde, e tem como
objetivo a reorganização da atenção básica sendo implantado prioritariamente em áreas de
risco em populações excluídas do consumo de serviços. Portanto, para a seleção dos
municípios beneficiados pelo PSF são utilizados critérios de natureza socioeconômica além de
critérios de natureza epidemiológica (ASSIS et al., 2010).
A análise da influência de um conjunto desses fatores na saúde da população da área
urbana, seja na comparação ou não com a área rural, é um processo complexo “não só por
causa da multiplicidade de fatores envolvidos e pelas inter-relações existentes entre eles
(NOGUEIRA, 2008: 69)”, mas também pelas limitações provenientes do tipo de desenho de
estudo epidemiológico adotado, independentemente dos cuidados tomados na realização do
estudo a fim de minimizar possíveis vieses de seleção e informação.
2.2.2. Definição de urbano e rural
No Brasil, assim como em outros países latino-americanos (El Salvador, Equador,
Guatemala e República Dominicana), a definição de urbano e rural segue um conceito
político-administrativo baseado em leis municipais. Tomando por base a legislação vigente
17
por ocasião da realização do Censo Demográfico 2000, as áreas urbanas abrangem todas as
áreas situadas dentro dos limites das cidades (sedes municipais), das vilas (sedes distritais) ou
das áreas urbanas isoladas, enquanto que a área rural abrange todas as áreas situadas fora
desses limites (IBGE, 2010).
Contrapondo a conceituação político-administrativa utilizada pelo IBGE, diferentes
critérios são sugeridos para a definição dos limites entre urbano e rural, entre os quais se pode
destacar aqueles que se baseiam: 1) no tamanho da população, onde o rural é entendido como
dispersão e o urbano como aglomeração; 2) na densidade demográfica, onde o urbano e o
rural são definidos em função da quantidade de habitantes por quilômetros quadrados e 3) na
ocupação econômica da população, onde o urbano e rural são definidos pela natureza das
atividades econômicas (ENDLICH, 2006).
VEIGA (2002) defende a adoção da densidade demográfica como novo padrão de
classificação dos limites entre urbano e rural, por ser um indicador de fácil operacionalização
e compreensão, e por refletir a visão de que áreas rurais são sempre menos densamente
povoadas que as urbanas. Baseando-se neste indicador demográfico (com um parâmetro
superior a 150 hab./km2 para classificação de localidades urbanas), a taxa de urbanização no
Brasil em 2000 deveria ser bem menor do que a divulgada pelo IBGE (ou seja, deveria ser de
57% ao invés de 81%) (VEIGA, 2002).
Segundo SILVA et al. (2002), com o surgimento do “novo rural” há uma extrapolação
das atividades agropecuárias e agroindustriais que caracterizaram o campo brasileiro, com a
diversificação de atividades agrícolas e não agrícolas. Há o aparecimento de novas atividades
(de serviços, comércio e indústria) desenvolvidas no campo que fazem com que o espaço rural
não possa mais ser classificado como estritamente agrário. Como cada vez menos a população
do campo trabalha na agricultura e se inserem em várias atividades terciárias,
ABRAMOVAY (2000) propõe que a ruralidade não esteja vinculada a qualquer setor
18
econômico,
discordando
do
terceiro
critério.
Assim
como
VEIGA
(2002),
ABROMOVAY (2000) sugere que o rural assim como o urbano seja entendido como uma
questão territorial, defendendo a consideração dos dois primeiros critérios (tamanho da
população e densidade demográfica) na definição de seus limites.
De acordo com BERNARDELLI (2006), o conceito utilizado na definição de áreas
urbanas e rurais no Brasil tem recebido críticas por basear exclusivamente em questões
territoriais e por gerar dificuldades em comparações internacionais. Essa autora evidencia que
os critérios usados para o processo emancipatório dos municípios no passado e ainda presente
hoje estão muitas vezes vinculados a interesses políticos e tributários, servindo para
beneficiamento de alguns grupos e partidos, bem como para atingir suas demandas. Além
disso, destaca ainda que municípios sem receitas próprias podem ser emancipados,
acarretando dificuldades administrativas e não beneficiamento da população residente nestes
municípios.
Além da abordagem dicotômica de urbano e rural defendida por VEIGA (2002) e
ABROMOVAY (2000) usando critérios demográficos e da adotada oficialmente pelo IBGE
por meio de critério político-demográfico, há uma outra abordagem para definição de urbano
e rural, onde o rural é entendido como um continuum do urbano. A abordagem do continnum
rural-urbano admite uma maior relação entre cidade e campo através de diferenças de grau e
não de contraste. Na abordagem do continnum há duas visões possíveis: uma que considera o
fim do rural, enquanto a outra ao contrário reafirma a existência do rural (WANDERLY,
2001).
A primeira visão está centrada no urbano em detrimento do rural, sendo o urbano
considerado fonte de progresso e o rural de atraso, onde a realidade rural estaria sujeita ao
desaparecimento com a expansão do sistema urbano (WANDERLY, 2001). Essa visão de fim
do rural se baseia na idéia de que o espaço rural se urbaniza devido à industrialização da
19
agricultura (“urbanização do campo”), sobretudo com o aparecimento de novas atividades não
agrícolas no campo. Entretanto, há críticas quanto essa visão por não poder ser aplicada de
forma generalizada para todos os países. No caso do Brasil, poderia ser aplicada apenas para
aquelas áreas rurais localizadas próximas dos grandes centros metropolitanos (GIRARD,
2008).
A segunda visão, na abordagem do continnum rural-urbano, considera a aproximação
entre o urbano e rural, e que mesmo com a expansão do urbano e aproximação de
semelhanças entre estes dois espaços as peculiaridades do rural não desaparecem. Essa visão
de aproximação entre urbano e rural contrapôs a idéia de urbanização do campo (1ª visão),
onde os avanços sociais e econômicos, alcançados primeiramente nas cidades chegam ao
campo constituindo mais uma de suas características, sem comprometer as suas
particularidades (WANDERLY, 2001). Nesse sentido, tanto o rural influencia o urbano
quanto o urbano influencia o rural, e portanto o rural não se urbaniza, mas se transforma
(SOBARZO, 2006).
Tendo em vista a falta de consenso da definição urbano-rural e da falta de uma
definição oficial mais criteriosa e de fácil operacionalização do que é cidade no Brasil, optouse por utilizar nesta tese a definição estritamente político-administrativa adotada pelo IBGE
em suas pesquisas até os dias atuais.
2.2.3. Indicadores de saúde
A disponibilidade de indicadores de saúde válidos e confiáveis é fundamental para
avaliar as condições de saúde no âmbito individual ou populacional e para a formulação de
ações na área de saúde. No campo da saúde pública, a procura por medidas do estado de saúde
de indivíduos é antiga, sendo as medidas de mortalidade consideradas até o início dos anos
20
1960 os únicos indicadores de saúde que apresentavam boas propriedades. Durante os últimos
50 anos, com a melhor compreensão do conceito de saúde, outros indicadores de saúde que
não a mortalidade foram desenvolvidos, como por exemplo: a morbidade, a incapacidade
funcional, a avaliação do bem-estar e da satisfação com o próprio estado de saúde de saúde e
da qualidade de vida.
Nas últimas décadas, diferentes inquéritos populacionais, entre eles podem-se citar a
Pesquisa sobre Padrões de Vida – PPV 1996-1997 e as Pesquisas Nacionais por Amostra de
Domicílios - PNADs 1998, 2003 e 2008, têm levantado indicadores subjetivos de saúde, que
incluem indicadores de morbidade autorreferida, mobilidade física autorreferida e/ou
autoavaliação do estado de saúde.
2.2.3.1. Morbidade autorreferida
Devido aos altos custos de realização de inquéritos populacionais com medidas
objetivas de saúde, tem-se utilizado medidas de morbidade autorreferida, ou seja, medidas
baseadas no relato do diagnóstico médico de existência ou não de determinadas doenças
(BRASIL, 2004). PINHEIRO et al (2002) acrescentam que é comum a adoção de indicadores
de morbidade referida em inquéritos de saúde de base populacional, pois a coleta de
informação diagnóstica é mais difícil, apresenta maior custo e requer uma padronização
rigorosa.
A morbidade autorreferida das doenças crônicas é uma medida aproximada dos
resultados obtidos através de exames clínicos, entretanto, estudos de prevalência de doenças
crônicas revelam boa concordância entre os seus achados e os registros médicos ou exames
clínicos, sobretudo para doenças cardiovasculares e diabetes (THEME-FILHA et al., 2008).
21
A presença de doenças crônicas depende do acesso ao diagnóstico médico, e não
apenas baseada na percepção do indivíduo. Sendo assim, o uso de indicadores de morbidade
autorreferida tem como limitação a influência do acesso e uso de serviços médicos, podendo
estar refletindo a distribuição do acesso ao serviço na população, e não a distribuição real da
doença em questão (BRASIL, 2004). Estudos têm mostrado que os indicadores de morbidade
referida sofrem influência de características sociodemográficas (sexo, idade, escolaridade), e
devem ser levadas em consideração nas análises. No que se refere ao sexo, há índicos de que
homens são menos propensos a reportar problemas de saúde do que as mulheres
(VERBRUGGE e WINGARD, 1987 apud PINHEIRO et al., 2002).
Na PNAD 2008, a caracterização da morbidade autorreferida foi feita por meio da
autoavaliação do indivíduo em relação à presença ou não de doze doenças crônicas4
selecionadas: 1) doença de coluna ou costas; 2) artrite ou reumatismo; 3) câncer;
4) diabetes; 5) bronquite ou asma; 6) hipertensão; 7) doença do coração; 8) doença renal
crônica; 9) depressão; 10) tuberculose; 11) tendinite ou tenossinovite e 12) cirrose.
2.2.3.2. Mobilidade física autorreferida
A mudança de foco da mortalidade para morbidade tem levado a realização de estudos
que visam compreender a distribuição, os determinantes e as conseqüências da perda da
capacidade funcional, sobretudo de populações idosas (PARAHYBA e VERAS, 2008). A
incapacidade funcional é definida como inabilidade ou dificuldade, devido a uma deficiência,
para realizar atividades que fazem parte do cotidiano das pessoas e que são indispensáveis
para uma vida independente na sociedade (ALVES et al., 2007).
4
Foram pesquisadas doenças crônicas, através do relato da pessoa sobre o diagnostico realizado por médico ou
profissional de saúde que consultou. Definiu-se como doença crônica aquela que acompanhava a pessoa por um
longo período de tempo, podendo ter fases agudas, momentos de piora ou melhora sensível.
22
De acordo com PARAHYBA e SIMÕES (2010), medidas de mobilidade física
elaboradas a partir das questões do questionário da PNAD representam uma boa proxy de
incapacidade funcional. Além disso, estes autores acrescentam que medidas de mobilidade
física são valiosas no estudo da relação do status funcional com características demográficas,
condições crônicas e comportamentos relacionados à saúde.
As questões disponíveis nos suplementos de saúde das PNADs 1998, 2003 e 2008
levantam informações sobre “mobilidade física dos moradores de 14 anos ou mais de idade”,
cuja avaliação se baseia no grau de dificuldade para realizar determinadas atividades do
cotidiano medido através de 4 categorias ordenáveis: “não tem dificuldade”, “tem pequena
dificuldade”, “tem grande dificuldade”, “não consegue”. No caso da PNAD 2008, oito
quesitos podem ser utilizados para a avaliação do grau de dificuldade das seguintes
atividades: 1) alimentar-se, tomar banho ou ir ao banheiro; 2) correr, levantar objetos
pesados, praticar esportes ou realizar trabalhos pesados; 3) empurrar mesa ou realizar
consertos domésticos; 4) subir ladeira ou escada; 5) abaixar-se, ajoelhar-se ou curvar-se; 6)
andar mais do que um quilômetro; 7) andar cerca de 100 metros; 8) fazer compras de
alimentos, roupas e medicamentos, sem ajuda.
Embora seja no grupo dos idosos onde ainda se verifique maiores prevalências de
incapacidade funcional, há destaque de que o elevado grau de morbidade da população idosa é
originado ainda na fase adulta, o que prejudica a qualidade de vida dos idosos e sobrecarrega
os serviços de saúde (COSTA, 2006).
2.2.3.3. Autoavaliação de saúde
A autoavaliação de saúde é um indicador obtido no nível individual que tem sido
amplamente utilizada em várias pesquisas que visam estabelecer o estado de saúde do
23
indivíduo, por ser de fácil mensuração e por permitir comparações internacionais (THEMEFILHA et al., 2008). Apesar de sua natureza subjetiva, a autoavaliação do estado de saúde
global do indivíduo tem sido apontada na literatura como “um poderoso indicador com alta
validade preditiva para mortalidade, independentemente de fatores de riscos médicos,
comportamentais ou psicossociais” (IDLER e BENYAMINI, 1997:183), sendo, também,
considerado um importante indicador de necessidade em saúde, por refletir uma escala de
bem-estar geral dos indivíduos (NERI e SOARES, 2002). Vários estudos têm demonstrado
também que a autopercepção de saúde é uma medida que apresenta boa confiabilidade
(CAMARGO et al., 2009; MARTIKAINEN et al., 1999; BAILIS et al., 2003).
A principal vantagem deste indicador é a sua forte associação com estado real de
saúde dos indivíduos, indicando que a autopercepção da saúde pode ser utilizada como uma
proxy das condições objetivas de saúde (CARMAGOS et al., 2009). Além disso,
NOGUEIRA (2008) chama a atenção para o fato que a subjetividade não é uma limitação e
sim um ponto forte deste indicador, tendo em vista que o processo saúde-doença é um
processo contínuo, relativo e subjetivo, cuja percepção, cognição e interpretação variam no
tempo e no espaço, em função de fatores individuais e contextuais.
Embora o indicador de autoavaliação do estado de saúde seja obtido por meio de uma
única pergunta, os indivíduos, ao avaliarem seu estado de saúde, não se baseiam apenas na
simples presença ou não de uma doença (NERI e SOARES, 2002), mas procuram ponderar a
sua resposta às múltiplas dimensões de saúde (THEME-FILHA et al., 2008). Nesse sentido,
está a falta de clareza do que está se medindo, pois os determinantes do estado de saúde são
múltiplos, englobando aspectos físicos, cognitivos, emocionais, culturais e socioeconômicos
(VIACAVA, 2002). Entretanto existem estudos que obtiveram 80% de concordância entre
autoavaliação do estado de saúde e avaliação clínica da presença ou ausência de condição
crônica (VIACAVA, 2002).
24
3. Objetivos
3.1. Objetivo geral
O objetivo geral desta tese é estudar a associação entre a área de localização do
domicílio (urbana e rural) e a autoavaliação do estado global de saúde da população adulta
brasileira (20 anos ou mais), controlando para um conjunto de fatores demográficos,
socioeconômicos, comportamentais e de saúde que retratam características individuais e dos
ambientes
intradomiciliar
e
extradomiciliar,
considerando
os
principais
aspectos
metodológicos da PNAD 2008.
3.2. Objetivos específicos
■
Descrever a associação entre a área de localização do domicílio e a
autoavaliação de saúde de adultos no Brasil usando modelo de regressão
logística ordinal (modelo de chances proporcionais) incorporando todas as
informações do plano amostral (abordagem agregada – abordagem baseada
no plano amostral).
■
Usando a abordagem agregada de análise, avaliar o efeito de ignorar o plano
amostral da pesquisa sobre as estimativas das medidas de razão de chance do
modelo de regressão logística ordinal (modelo de chances proporcionais) e dos
erros padrão associados às estimativas pontuais dos parâmetros desse modelo;
■
Usando abordagem agregada de análise, avaliar o efeito da escala (binária e
ordinal) do desfecho de autoavaliação de saúde de adultos no Brasil: 1) no
25
sentido, magnitude e significância da associação entre a área censitária e a
chance (acumulada) de melhor autoavaliação de saúde; 2) na seleção dos
modelos; 3) nas medidas de qualidade dos modelos selecionados.
■
Descrever a associação entre a área de localização do domicílio e a
autoavaliação de saúde de adultos brasileiros residentes em municípios
populosos (os situados nas regiões metropolitanas e os grandes em tamanho
populacional) usando modelo de regressão logística ordinal multinível (modelo
de chances proporcionais) considerando as informações do plano amostral
(abordagem desagregada – abordagem baseada no modelo).
■
Comparar a associação entre a situação censitária (urbana e rural) e o desfecho
de autoavaliação de saúde (escala ordinal de três categorias) de adultos no
Brasil usando o modelo de chances proporcionais e o modelo de chances
proporcionais parciais numa abordagem agregada de análise.
26
4. Material e Métodos
4.1. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD)
A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) realizada em 2008 trata-se
de um estudo seccional de abrangência nacional, realizado pelo Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), que coletou informações de uma amostra probabilística de
aproximadamente 150.591 domicílios e 391.868 pessoas, no período de 28 de setembro de
2007 a 27 de setembro de 2008 (IBGE, 2010).
A PNAD é uma pesquisa, de periodicidade anual, implantada no Brasil a partir de
1967, com o objetivo de produzir informações básicas para análise do desenvolvimento
socioeconômico do País. Entre as informações de caráter permanente, estão incluídas as
características demográficas, de educação, habitação, trabalho e renda; e as de caráter variável
se referem às informações complementares através das quais se tem como objetivo aprofundar
os temas permanentes ou investigar tópicos específicos, tais como: trabalho infantil (PNADs
2001 e 2006); saúde (PNADs 1998, 2003 e 2008); segurança alimentar (PNADs 2004 e
2009); acesso à internet e posse de telefone móvel celular para uso pessoal (PNADs 2005 e
2008); educação (PNADs 2004, 2006 e 2007); acesso a transferências de renda de
programas sociais (PNADs 2004 e 2006) e vitimização e acesso à justiça (PNAD 2009).
O suplemento da PNAD 2008, intitulado “Um Panorama da Saúde no Brasil – Acesso
e utilização dos serviços, condições de saúde e fatores de risco e proteção à saúde 2008”,
englobou características de saúde da população brasileira devido ao convênio firmado entre o
IBGE e o Ministério da Saúde, que compreendem basicamente as necessidades de saúde dos
indivíduos (autoavaliação do estado de saúde, restrição de atividades habituais por motivo de
saúde, morbidade autorreferida e limitação na realização de atividades físicas) e o acesso e
27
utilização de serviços de saúde (consulta ao médico, cobertura por plano de saúde, cobertura
pelo Programa Saúde da Família - PSF, etc.).
4.1.1. Plano amostral da PNAD
A pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios como mencionado levantou em 2008
informações sobre uma amostra unidades domiciliares, distribuídas por todas as Unidades da
Federação. A amostra da PNAD foi planejada para produzir estimativas representativas para o
Brasil, Grandes Regiões, Unidades da Federação e nove Regiões Metropolitanas (Belém,
Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba e Porto
Alegre).
A PNAD é uma pesquisa por amostragem probabilística que utiliza uma amostra
selecionada usando um plano amostral complexo (Figura 3) que considera conglomeração das
unidades em um, dois ou três estágios de seleção, além de estratificação das unidades
(municípios) definida separadamente por unidade da federação (SOUZA e SILVA, 2003). Em
cada unidade da federação, os municípios primeiramente foram classificados em dois grupos:
em municípios autorrepresentativos (AR) e em municípios não autorrepresentativos (NAR).
O grupo de municípios AR era constituído pelos municípios situados nas regiões
metropolitanas e pelos municípios grandes em termos populacionais não situados em regiões
metropolitanas ou pertencentes as unidades da federação sem região metropolitana. Os
municípios AR foram incluídos na amostra com certeza e, portanto, cada município AR é
considerado como um estrato, e não como unidade de seleção. O grupo de municípios NAR é
constituído pelos demais municípios então existentes, que passaram por um processo de
estratificação, e em cada estrato formado, foram selecionados com reposição e com
probabilidade proporcional à população residente obtida no Censo Demográfico 2000.
28
Desse modo, para os municípios autorrepresentativos, o plano amostral da PNAD é
estratificado por município (estrato) e conglomerado em dois estágios, onde os setores
censitários são as unidades primárias de amostragem (UPA) e os domicílios são as unidades
secundárias de amostragem (USA).
Para os municípios não autorrepresentativos, o plano amostral é estratificado (estratos
formados por conjuntos de municípios NAR por tamanho e proximidade geográfica) e
conglomerado em três estágios de seleção, onde os municípios NAR são as unidades
primárias de amostragem (UPA), os setores as unidades secundárias de amostragem (USA) e
os domicílios as unidades terciárias de amostragem (UTA).
Em cada um dos municípios da amostra, os setores censitários foram selecionados
com reposição e com probabilidade proporcional ao tamanho, sendo utilizada como medida
de tamanho, neste caso, o número de unidades domiciliares existentes por ocasião do Censo
Demográfico 2000. Em seguida, em cada um dos setores censitários da amostra foi realizada
uma operação de listagem rápida de todas as unidades residenciais e não residenciais
existentes na área com o objetivo de obter um cadastro básico atualizado de unidades
domiciliares. A partir do cadastro básico construído após a operação de listagem rápida, as
unidades domiciliares foram selecionadas com eqüiprobabilidade para investigação das
características habitacionais e de todos os seus moradores.
Além desta atualização, visando monitorar o crescimento dos municípios pertencentes
à amostra, criou-se um cadastro complementar constituído pelas unidades domiciliares
existentes em conjuntos habitacionais com mais de trinta unidades residenciais, que tenham
sido construídos após a realização do Censo Demográfico 2000. Para o universo de “Novas
Construções” o plano amostral da PNAD é estratificado (por município) e conglomerado em
um único estágio de seleção, onde os domicílios são as unidades primárias de amostragem.
29
Unidade da Federação
Estrato=Município AR
Estrato=Grupo de
municípios NAR
Universo de novas
construções:
Estrato=município
Unidade Primária de
Amostragem
(UPA) = Setor
Unidade Primária de
Amostragem
(UPA) = Município NAR
Unidade Primária de
Amostragem
(UPA) = Domicílio
Unidade Secundária de
Amostragem
(USA)=Domicílio
Unidade Secundária de
Amostragem
(USA) = Setor
Unidade Terciária de
Amostragem
(UTA) = Domicílio
Figura 3: Estrutura do plano amostral da PNAD
Para a seleção dos municípios e setores censitários da PNAD 2008 foram utilizadas a
mesma divisão territorial e malha setorial vigentes em 1º de agosto de 2000 usadas para
realização do Censo Demográfico 2000 (IBGE, 2010). É importante mencionar ainda que no
levantamento das informações do suplemento de saúde foi adotado o mesmo plano amostral
descrito anteriormente sem qualquer adaptação.
4.1.2. Informações do plano amostral
A inferência estatística clássica pressupõe que os dados amostrais são realizações de
variáveis aleatórias independentes e identicamente distribuídas. Este pressuposto só é
adequado para dados amostrais obtidos utilizando um plano aleatório simples com reposição.
Entretanto, muitas pesquisas amostrais do IBGE e de outros institutos de pesquisa, utilizam
planos amostrais complexos que combinam estratificação, conglomeração e probabilidades
30
desiguais de seleção. No que se refere às informações estruturais do plano amostral, a
estratificação, que consiste na divisão da população em subgrupos (estratos) mais
homogêneos, é utilizada visando à redução da variância dos estimadores dos parâmetros de
interesse, enquanto a conglomeração, apesar de geralmente aumentar a variância dos
estimadores, é adotada por motivos operacionais ligados ao processo de amostragem.
A análise estatística dos dados provenientes de pesquisas amostrais complexas “só se
torna possível se forem incluídas no arquivo de dados variáveis que informem a estrutura do
plano amostral, identificando ao menos o estrato, a UPA e o peso de cada unidade da
amostra” (PESSOA e SILVA,1998:156), uma vez que as estimativas pontuais dos parâmetros
de interesse são influenciadas por pesos distintos das observações e as estimativas de
variância são influenciadas pela conglomeração, estratificação e pesos amostrais
(SZWARCWALD et al., 2008; PESSOA et al., 2002; PESSOA e SILVA, 1998). Além da
obtenção de estimativas pontuais corretas, há também uma grande preocupação com o cálculo
correto de estimativas de variância, pois são medidas quantitativas utilizadas na avaliação da
precisão/qualidade das estimativas pontuais, sendo necessárias no cálculo de intervalos de
confianças e na realização de testes de hipóteses para os parâmetros de modelos estatísticos.
Conforme ressaltado por ASPAROUHOV (2005) se os conglomerados e os estratos não
forem levados em consideração na análise dos dados espera-se uma subestimação e
sobrestimação dos erros padrões, respectivamente.
Atualmente os bancos de dados das pesquisas realizadas pelo IBGE contem indicação
explícita dos pesos amostrais associados aos domicílios e indivíduos da amostra e das
informações estruturais do plano de amostral adotado, bastando apenas que informemos tais
informações na análise estatística, com fins descritivos ou analíticos, utilizando pacotes
estatísticos adequados.
31
4.1.3. Estrutura hierárquica dos dados
Dados provenientes de pesquisas amostrais complexas apresentam uma estrutura
hierárquica que é caracterizada “quando as unidades elementares de análise estão grupadas
em unidades maiores, que por sua vez também podem ou não pertencer a uma estrutura de
grupos, numa hierarquia bem definida (PESSOA e SILVA, 1998:139)”. Dados de pesquisas
de avaliação educacional em geral apresentam uma estrutura hierárquica, onde os alunos estão
agrupados em turmas, que, por sua vez, estão agrupadas em escolas. Este é um exemplo de
estrutura hierárquica de 3 níveis, onde os alunos são as unidades de 1º nível, as turmas são as
unidades de 2º nível e as escolas as unidades de 3º nível. Alternativamente pode se referir aos
alunos como unidades elementares, e as turmas e escolas como unidades de grupos.
Da mesma forma, em pesquisas por amostragem domiciliar, os indivíduos representam
unidades elementares de análise que estão naturalmente agrupados em domicílios, e os
domicílios por sua vez agrupados em setores censitários já configurando assim a existência de
uma estrutura populacional hierárquica bem definida. Um outro exemplo de dados com
estrutura hierárquica é o caso de dados provenientes de pesquisas longitudinais, onde
repetidas observações (unidades de 1º nível ou unidades elementares) são agrupadas dentro
dos indivíduos ou sujeitos (unidades de 2º nível ou unidade de grupo). Desse modo, em
pesquisas longitudinais os indivíduos são as unidades de grupo, enquanto que em pesquisas
amostrais complexas, os indivíduos são as unidades elementares, que estão agrupados em
unidades maiores (domicílios, setores ou municípios; turmas ou escolas; hospitais; etc.).
Embora as unidades elementares possam ser independentes para grupos distintos,
apresentam características semelhantes num mesmo grupo, configurando a existência de
dependência das observações dentro de um mesmo grupo. No exemplo do sistema
educacional, de acordo com MAIA et al.(2003), embora alunos pertencentes às escolas
32
diferentes, cada uma das quais com as suas respectivas particularidades (em termos de infraestrutura física, didática do professor, material didático utilizado, nível socioeconômico da
escola) possam apresentar desempenhos distintos, é de esperar que os alunos de uma mesma
escola sejam relativamente homogêneos, por exemplo, quanto ao desempenho escolar (ou
seja, as observações de seu desempenho escolar não são independentes, apresentando alguma
correlação entre alunos de uma mesma escola).
Visando contornar a estrutura de dependência das observações levantadas, alguns
analistas procuram concentrar a análise dos dados dessas pesquisas apenas em unidades de
nível micro (unidades elementares) ou apenas em alguma unidade do nível macro (unidade de
grupo) (MAIA et al., 2003).
A análise centrada no nível macro ocorre quando, em pesquisas com estrutura
hierárquica, os dados referentes às unidades elementares são agrupados para o nível de grupo
(escola), ignorando a variação entre unidades elementares (alunos). Já a análise centrada no
nível micro ocorre quando a análise dos dados é efetuada apenas no nível de unidades
elementares (nível individual), como comumente se verifica em estudos que utilizam modelos
de regressão tradicionais que não levam em conta os efeitos de variação das unidades de
grupo (escolas).
Ambas as análise ignoram a estrutura hierárquica dos dados. No caso da primeira
(análise centrada no nível macro) as relações observadas no nível de grupo podem não ser
válidas para o nível de unidades elementares. Desse modo, não se pode fazer inferências para
o nível individual a partir dos achados encontrados no nível de grupo, sob pena de ocorrer
viés ecológico (ou falácia ecológica).
No caso do segundo tipo de análise (análise centrada no nível micro), ignora-se a
variação no nível de grupo na explicação do fenômeno em estudo, ao utilizar os modelos de
regressão tradicionais, assumindo que o valor de uma determinada variável de grupo é
33
considerado o mesmo para todas as unidades elementares pertencentes a uma mesma unidade
de grupo. Embora isso seja uma limitação deste tipo de análise (nível micro), talvez o mais
grave esteja no uso de modelos de regressão tradicionais, uma vez que sua utilização
pressupõe que as observações amostrais são independentes entre si. A falta de independência
pode ser encarada como um problema decorrente do plano amostral adotado (como por
exemplo, o caso de um plano amostral complexo) e ignorar este fato pode levar a uma
subestimação dos erros padrões dos estimadores dos parâmetros do modelo. Entretanto, o
problema de ausência de independência das observações amostrais pode ser resolvido através
do ajuste de modelos estatísticos por meio de métodos de estimação adequados, como por
exemplo o método de Máxima Pseudo-Verossimilhança (MPV), que permite incorporar no
processo de ajuste as informações (características) do plano amostral da pesquisa –
abordagem baseada no plano amostral5 – produzindo estimativas corretas de erros padrões,
além de estimativas não viciadas para os parâmetros de modelos estatísticos. Ou seja, este
procedimento reconheceria a existência da estrutura de correlação dos dados, mas não
possibilitaria estudar os efeitos de variação entre grupos.
Do exposto, conclui-se que para dados com estrutura hierárquica seria mais adequado
utilizar uma análise multinível, considerada de extrema importância na análise de dados
epidemiológicos. Segundo DIEZ-ROUX (1998) a análise multinível, também chamada de
hierárquica ou contextual, envolve a incorporação de variáveis no nível macro (variáveis
contextuais ou ecológicas) dentro de equações no nível micro adequadas para estudos que
consideram indivíduos como unidades de análise. Desse modo, os modelos multiníveis6
permitem medir o efeito de variáveis individuais e contextuais sobre os desfechos estudados e
explicar as relações existentes entre elas, e ainda possuem a vantagem de controlar
5
Abordagem baseada no plano amostral é comumente aplicada para dados de pesquisas com planos amostrais
complexos, que consideram estratos e conglomerados, além de probabilidades desiguais de seleção (ou
alternativamente, pesos amostrais distintos).
6
São também chamados de modelos hierárquicos, modelos de efeitos mistos ou modelos de efeitos aleatórios.
34
confundimento (pelo menos os fatores conhecidos) e de avaliar a existência de interação entre
as variáveis nos diferentes níveis.
Com relação a sua especificação, o modelo multinível se diferencia de um modelo
tradicional por apresentar, além de uma parte fixa, uma parte aleatória. Assim, no modelo
tradicional tanto o intercepto quanto o coeficiente de inclinação são efeitos fixos, enquanto
que no modelo multinível o intercepto, assim como o coeficiente de inclinação se desejado,
podem ser considerados efeitos aleatórios. Os interceptos aleatórios indicam a
heterogeneidade entre os grupos no desfecho, enquanto os coeficientes aleatórios indicam a
heterogeneidade na relação entre o desfecho e as variáveis explicativas (RABE-HESKETH et
al., 2004). Do exposto, é importante salientar que se faz uso de modelos multiníveis, quando
os dados apresentam alguma estrutura de correlação e quando se tem interesse em que o efeito
de uma determinada variável sobre o desfecho estudado varie aleatoriamente entre os grupos
considerados.
Os modelos multiníveis também são chamados de modelos de efeitos mistos, quando
ambos os efeitos (fixos e aleatórios) são considerados na análise (SKRONDAL e RABEHESKETH, 2003). A parte fixa consiste na estimação e realização de testes de hipóteses dos
efeitos fixos, enquanto a parte aleatória consiste estimação dos efeitos aleatórios e das
componentes de variância (PERRI e IEMMA, 1999).
Sabe-se que a análise hierárquica (ou multinível) leva em consideração a dependência
das observações entre os membros de um mesmo grupo, medido pelo coeficiente de
correlação intra-classe, a qual representa a homogeneidade em um mesmo grupo e, ao mesmo
tempo, a heterogeneidade entre grupos distintos (KREFT e LEEUW, 1998). Quanto maior
essa dependência maior a necessidade de uso de uma análise hierárquica.
O coeficiente de correlação intraclasse é um número compreendido no intervalo [0,1].
Um alto valor deste coeficiente indica que a maior parte da variação total é proveniente das
35
diferenças existentes entre os grupos (logo as unidades pertencentes a estes grupos são muito
similares), enquanto um baixo valor deste coeficiente indica, por outro lado, que a maior parte
da variação total é decorrente das diferenças entre as unidades pertencentes ao mesmo grupo
(grande variação intra-grupo).
4.2. Modelagem Estatística
4.2.1. Autoavaliação do estado global de saúde do indivíduo
Na PNAD 2008 a autoavaliação do estado global de saúde do indivíduo foi levantada
por meio do quesito “estado de saúde segundo o próprio ponto de vista da pessoa, ou, no caso
de criança pequena do ponto de vista do responsável”, com as seguintes alternativas de
resposta: muito bom, bom, regular, ruim e muito ruim (IBGE, 2010). Entretanto, nesta tese
foram consideradas apenas as pessoas que informaram seu próprio estado global de saúde, por
entender que informações prestadas por terceiros (outras pessoas moradoras do domicílio, ou
ainda outras pessoas não moradoras do domicílio) aumentaria a chance de ocorrer viés de
informação ou classificação do desfecho de saúde utilizado nesta tese.
Nesta tese foram ajustados modelos logísticos ordinais (modelo de chances
proporcionais) usando o software SPSS for Windows, versão 17.0, considerando como
desfecho Y o indicador de autoavaliação do estado de saúde usando a escala original ordinal
de cinco categorias (C=5) e a seguinte escala ordinal de três categorias (C=3): 1) muito
ruim/ruim, 2) regular, 3) bom/muito bom. O modelo de chances proporcionais é representado
pela equação abaixo:
 P(Y ≤ c / x1 , x 2 ,K , x p ) 
Logit[ P(Y ≤ c / x1 , x 2 ,K , x p )] = ln 
 = γ c − ( β 1 x1 + β 2 x 2 + K + β p x p )
 P(Y > c / x1 , x 2 ,K , x p ) 
c =1,2,...,C-1
36
onde:
Logit[ P (Y ≤ c / x1 , x 2 ,K , x p )] é o logaritmo da razão entre a probabilidade acumulada
P (Y ≤ c / x1 , x 2 ,K , x p ) e seu complementar P (Y > c / x1 , x 2 ,K , x p ) .
γ c é o ponto de corte para as c=1,2,...,C-1 categorias do desfecho de autoavaliação de saúde.
x1, x2,...,xp são as variáveis explicativas do modelo.
β1, β2,..., βp são os efeitos das variáveis explicativas. Os parâmetros não dependem de c, pois
o modelo de chances proporcionais assume que os efeitos β`s das variáveis explicativas sobre
o desfecho de autoavaliação de saúde independe da categoria c.
Embora a natureza ordinal do desfecho obrigue a modelagem em termos das
probabilidades acumuladas, o modelo de chances proporcionais é derivado da suposição de
existência de uma variável latente Y*, não observável, contínua, que varia no intervalo
]-∞, +∞[ e que gera os valores do desfecho observado Y. Neste caso, existem pontos de corte
(cuja quantidade depende do número de categorias da variável ordinal observada) que
separam os indivíduos em diferentes categorias. A resposta de um determinado indivíduo é
determinada em função do intervalo em que sua resposta não observada pertencerá. Assim,
um indivíduo está na categoria c (Y=c) quando Y* excede o ponto de corte γC-1, mas não
excede o ponto de corte γC. De modo geral, assume-se uma série de pontos de corte γ0, γ1,
...,γC-1, γC, onde C é o número de categorias da variável observada e γ0=-∞, e γC = +∞.
Para a escala ordinal de C categorias, a autoavaliação do estado global de saúde Y está
relacionada com uma variável latente Y * da seguinte forma geral como mostrado abaixo:
Y = c se γ c −1 < Y ∗ ≤ γ c , ∀ c = 1, 2, ..., C
37
No caso particular de C=3 categorias de autoavaliação de saúde, esta relação pode ser
representada do seguinte modo:
*
1 → muito ruim ou ruim se − ∞ < Y ≤ γ 1

Y = 2 →
regular
se γ 1 < Y * ≤ γ 2
3 → muito bom ou bom se γ < Y * < +∞
2

Neste caso, existem dois pontos de corte γ1, e γ2 estritamente crescentes (γ1 < γ2). A
Figura 4 abaixo mostra a divisão da reta real pelos pontos de corte em três intervalos,
ilustrando a relação entre uma variável latente e uma variável categórica de três níveis.
-∞
γ1
γ2
+∞
Y∗
muito ruim/ruim
regular
muito bom/bom
Y
Figura 4: Relação entre uma variável latente e uma variável categórica de 3 níveis
Um outro modelo logístico ordinal (WILLIAMS, 2006) considerado na tese (apêndice)
foi o modelo de chances proporcionais parciais (MCPP) que tem uma parametrização
equivalente à equação do modelo de chances proporcionais, mas nem todos os efeitos β`s são
iguais para todas as categorias c=1,2,..., C-1 de autoavaliação de saúde, sendo denotados
genericamente por: β1c, β2c,..., βpc. Este modelo, representado abaixo, foi ajustado usando o
comando gologit2 do software STATA 10.0, incluindo a opção “autofit”. Com esta opção,
através de uma série de testes de Wald para cada variável, avalia se os efeitos diferem através
das equações, isto é, se a variável encontra a suposição de homogeneidade das inclinações
(WILLIAMS, 2006). Se o teste de Wald não for estatisticamente significante para algumas
variáveis, os efeitos dessas variáveis são contraídos através das equações.
38
 P (Y ≤ c / x1 , x2 ,K , x p ) 
Logit[ P (Y ≤ c / x1 , x2 ,K , x p )] = ln 
 = γ c − ( β1c x1 + β 2c x2 + K + β pc x p )
 P (Y > c / x1 , x2 ,K , x p ) 
c =1,2,...,C-1
onde:
Logit[ P (Y ≤ c / x1 , x 2 ,K , x p )] é o logaritmo da razão entre a probabilidade acumulada
P (Y ≤ c / x1 , x 2 ,K , x p ) e seu complementar P (Y > c / x1 , x 2 ,K , x p ) .
γ c é o ponto de corte para as c=1,2,...,C-1 categorias do desfecho de autoavaliação de saúde.
x1, x2,...,xp são as variáveis explicativas do modelo.
β1c, β2c,..., βpc são os efeitos das variáveis explicativas referentes à categoria c do desfecho de
autoavaliação de saúde.
Nas análises de regressão ordinal (C=3 ou C=5) considerou a suposição de distribuição
logística para a variável latente, ao invés da suposição de distribuição normal (RAMAN e
HEDEKER, 2005). Segundo SNIJDERS e BOSKER (1999) a diferença entre o uso de uma
ou outra distribuição é pequena e a escolha entre elas deve-se apenas a uma questão de
conveniência.
4.2.2. Variáveis explicativas do modelo
Na análise da associação entre a área de localização do domicílio e o desfecho de
autoavaliação do estado geral de saúde do indivíduo, foi levado em consideração um conjunto
de dezoito variáveis demográficas, socioeconômicas, comportamentais e de saúde que
retratam características individuais e do ambiente intradomiciliar (domicílio) e extradomiciliar
(setor) (Figura 5). As características individuais são compostas pelas variáveis: 1) sexo,
2) faixa etária, 3) cor/raça, 4) escolaridade, 5) situação de ocupação, 6) atividade física,
39
7) fumo, 8) morbidade autorreferida, 9) mobilidade física autorreferida, 10) posse de plano
de saúde, 11) consulta ao médico nos últimos doze meses e 12) região de residência. As
características do ambiente intradomiciliar, por sua vez, são compostas pelas variáveis:
13) domicílio cadastrado no Programa de Saúde da Família (PSF), 14) qualidade de
moradia, 15) posse de bens básicos no domicílio, 16) condição de ocupação do domicílio,
17) renda domiciliar mensal per capita. E como característica do ambiente extradomiciliar foi
utilizada a variável 18) proporção de domicílios considerados adequados no setor
(vizinhança) quanto aos serviços sociais básicos (água, esgoto, lixo e luz), as densidades
habitacionais e aos padrões construtivos das moradias (material usado nas paredes e
telhado).
Níveis de hierarquia
das variáveis de
controle
1º nível = Adulto
2º nível = Domicílio
Sexo, faixa etária, Cor/raça, Escolaridade, Situação de
ocupação,
Atividade
física,
Fumo,
Morbidade
autorreferida, Mobilidade física, Plano de saúde, Consulta
ao médico, Região de residência (tratada como variável no
nível individual).
Qualidade de Moradia, Posse de bens básicos, Condição
de ocupação, Renda mensal per capita, Cadastramento no
PSF.
3º nível = Setor7
Proporção de domicílios considerados adequados quanto à
qualidade da moradia.
Figura 5: Níveis de hierarquia das variáveis de controle
7
Área de listagem
40
As variáveis individuais se referem basicamente a características demográficas,
socioeconômicas, comportamentais e de saúde, enquanto que as variáveis ecológicas
englobam características do ambiente intradomiciliar (domicílio) e extradomiciliar (setor).
Em relação às características demográficas, foram consideradas no modelo as
variáveis sexo e idade. As variáveis sexo e idade são utilizadas em vários estudos
epidemiológicos tendo em vista as possíveis diferenças em termos de saúde entre os grupos de
sexo e idade. A existência de tais diferenças pode requerer medidas de controle específicas.
Além do sexo e idade, foram consideradas outras características demográficas, como a
raça/cor e as grandes regiões brasileiras (região de residência). A raça é considerada uma
categoria sociocultural utilizada como um marcador de risco para discriminação social.
Segundo VOLOCHKO e VIDAL (2010), no Brasil, os negros são um grupo social vulnerável
que possuem mais desvantagens do que os brancos, como menor nível educacional, menor
renda, maior desemprego, moradias com maior nível de inadequação, além de maior
dificuldade de acesso a bens sociais, inclusive serviços de saúde. Além disso, práticas sociais
discriminatórias veladas ou abertas afetam a autoestima e, muitas vezes, causam
vulnerabilidade pessoal cognitiva e/ou comportamental, levando os negros à depressão e a
comportamentos reacionais como abuso de drogas (VOLOCHKO e VIDAL, 2010). A
variável grandes regiões brasileiras foi incluída na modelagem estatística, pois os níveis de
saúde dos indivíduos podem ser dependentes do nível de desenvolvimento regional.
Quanto às características comportamentais, que se referem aos hábitos e atividades
realizadas pelo indivíduo, foram considerados informações sobre a realização de exercício
físico e o uso de drogas permitidas (fumo/tabaco). Conforme LIMA-COSTA et al (2003),
exercícios físicos são considerados benéficos para a saúde individual, independente da idade,
estando relacionado à redução da morbidade e mortalidade por doença coronariana, controle
da pressão arterial, da glicemia e do colesterol e adequação do peso corporal. Com relação ao
41
fumo do tabaco (tabagismo), é considerado atualmente o principal e mais disseminado
poluente presente no meio interior (que prejudica a qualidade do ar interior) com efeitos
negativos para a saúde tanto de fumadores quanto de não-fumadores (CALHEIROS, 2006).
Adicionalmente, vale ressaltar que o tabagismo, além de potencializar o aparecimento de
carcinomas (ação carcinogênica), aumenta o risco de mortalidade por doenças
cardiovasculares e cerebrovasculares e doenças respiratórias crônicas (RODRIGUES et al.,
2008), não existindo um nível seguro para a exposição (CALHEIROS, 2006).
Em relação às características de saúde foram utilizadas informações sobre morbidade
autorreferida, mobilidade física autorreferida, consulta ao médico, além da posse de plano
de saúde, onde esta última variável permite distinguir os indivíduos que dependem
exclusivamente dos serviços públicos de saúde daqueles que dispõem de outras opções de
acesso a serviços de saúde. O plano de saúde é considerado indicativo do grau de capacidade
do consumo de saúde no Brasil (SAWYER et al., 2002), ou melhor, é usado como indicador
do acesso a serviços de saúde, cujo acesso pode ser entendido como a capacidade do
indivíduo obter, quando necessitar, cuidado de saúde, de maneira fácil e conveniente
(ACURCIO e GUIMARÃES, 1996).
A variável consulta ao médico (“procurou algum lugar, serviço ou profissional de
saúde para atendimento relacionado à própria saúde”) é considerada um indicador de
utilização aos serviços de saúde importante na explicação da saúde dos indivíduos
(VIACAVA, 2002).
A morbidade autorreferida, foi levantada na PNAD por meio da seguinte pergunta:
“Algum médico ou profissional de saúde já disse que o Sr(a) tem ...?”, com duas alternativas
de repostas possíveis (sim ou não). Foi investigada a presença de 12 doenças crônicas: doença
de coluna ou costas; artrite ou reumatismo; câncer; diabetes; bronquite ou asma;
hipertensão; doença do coração; doença renal crônica; depressão; tuberculose; tendinite ou
42
tenossinovite e cirrose. A variável “morbidade autorreferida”, foi construída a partir das
respostas obtidas dessa pergunta para cada doença, resultando numa única medida de
morbidade autorreferida que informa se o indivíduo não possui nenhuma destas 12 doenças
crônicas ou se possui pelo menos uma destas doenças.
As características de mobilidade física dos moradores, por sua vez, foi levantada na
PNAD por meio da seguinte pergunta “Normalmente por problema de saúde, você tem
dificuldade para ....?” Foi levantado informações sobre o grau de dificuldade (não consegue,
tem grande dificuldade, tem pequena dificuldade, não tem dificuldade) na realização de oito
atividades: 1) alimentar-se, tomar banho ou ir ao banheiro; 2) correr, levantar objetos
pesados, praticar esportes ou realizar trabalhos pesados; 3) empurrar mesa ou realizar
consertos domésticos; 4) subir ladeira ou escada; 5) abaixar-se, ajoelhar-se ou curvar-se;
6) andar mais do que um quilômetro; 7) andar cerca de 100 metros; 8) fazer compras de
alimentos, roupas e medicamentos, sem ajuda. A partir da combinação das respostas dessas
oito perguntas obteve-se a variável “mobilidade física autorreferida”, com quatro níveis:
muita limitação, limitação, pouca limitação e sem limitação. Os indivíduos são classificados
como tendo muita limitação quando não conseguem ou têm grande dificuldade para realizar
as atividades básicas de alimentação e higiene, ou não conseguem realizar pelo menos uma
das demais atividades. Como tendo limitação quando os indivíduos têm pequena ou nenhuma
dificuldade nas atividades de alimentação e higiene, mas possui grande dificuldade em pelo
menos uma das outras atividades. Como tendo pouca limitação, os indivíduos que não têm
pequena ou nenhuma dificuldade, mas têm pequena dificuldade em pelo menos uma das
outras atividades. E foram classificados como sem limitação, os indivíduos que não
apresentaram nenhuma dificuldade em todas as atividades.
Quanto às características socioeconômicas individuais, foram considerados os anos de
estudo e a situação na ocupação. A importância da consideração dos anos de estudo na
43
análise das diferenças dos níveis de saúde é traduzida pelo fato de que indivíduos com
maiores níveis de escolaridade, tendem a apresentar comportamentos mais saudáveis
(NOGUEIRA, 2008). Além disso, indivíduos mais escolarizados tendem a apresentar maior
capacidade de identificar problema de doença e de necessidade, de procura e utilização de
serviços de saúde (NOGUEIRA, 2008; ANDRADE e MAIA, 2009). Destaca-se ainda que
indivíduos mais escolarizados tendam a apresentar melhor percepção dos efeitos do
tratamento sobre a saúde e um maior conhecimento das diferentes especialidades médicas
(NERI e SOARES, 2002).
A situação de ocupação do indivíduo é uma outra importante variável socioeconômica,
uma vez que o desemprego gera instabilidade emocional e situações de stress com efeitos
negativos para a saúde (NOGUEIRA, 2008; POCHMANN, 1999). Por outro lado, a ocupação
é considerada como um dos principais meios de acesso à renda e aos serviços sociais básicos
(POCHMANN, 1999).
As variáveis ecológicas do ambiente intradomiciliar se referem à qualidade da
moradia, que será avaliada segundo dois indicadores: indicador de adequação da habitação e
indicador das condições de conforto ou padrões de consumo.
O indicador de adequação da habitação, utilizado como proxy das condições de
moradia da população, foi construído através da combinação ou agrupamento de sete
variáveis8 dicotômicas pertencentes a três dimensões distintas: I) a qualidade da infraestrutura física (construção) do domicílio, II) a disponibilidade de serviços sociais básicos
(água, luz, esgoto, lixo) e a III) densidade domiciliar. A primeira dimensão “qualidade da
infra-estrura física do domicílio” é composta por duas variáveis: 1) material predominante
nas paredes do domicílio: adequado (alvenaria ou madeira aparelhada) e inadequado (taipa
não revestida, madeira aproveitada, palha, outro material); 2) material predominante no
8
Tais variáveis foram criadas obedecendo os critérios definidos em IBGE (1999).
44
telhado do domicílio: adequado (telha, laje de concreto, madeira aparelhada e zinco) e
inadequado
(madeira
aproveitada,
palha,
outro
material).
A
segunda
dimensão
“disponibilidade de serviços sociais básicos”, por sua vez, é composta por quatro variáveis:
1) procedência da água utilizada no domicílio: adequado (rede geral de distribuição) e
inadequado (poço ou nascente, ou outra proveniência; e ainda banheiro sem água canalizada);
2) forma de escoadouro do banheiro ou sanitário do domicílio: adequado (rede coletora de
esgoto ou pluvial ou fossa séptica ligada ou não ligada á rede coletora de esgoto ou pluvial/
banheiro ou sanitário de uso exclusivo dos moradores do domicílio) e inadequado (fossa
rudimentar, vala, direto para o rio, lago ou mar, outra forma de escoadouro/ banheiro de uso
comum para mais de um domicílio; e ainda domicílios sem banheiro ou sanitário); 3) destino
do lixo domiciliar: adequado (coleta direta ou indireta) e inadequado (queimado ou enterrado
na propriedade, jogado em terreno baldio ou logradouro, jogado em rio, lago ou mar, ou outro
destino); 4) forma de iluminação do domicílio: adequado (elétrica) e inadequado (óleo,
querosene ou gás de botijão, ou outra forma de iluminação). Já a terceira e última dimensão
“densidade domiciliar” é representada por uma única variável, taxa de moradores por
cômodo: adequado (até dois moradores por cômodo habitável – exclui-se banheiro e cozinha)
e inadequado (mais de dois moradores por cômodo habitável).
Conforme o agrupamento efetuado, o indicador de adequação da habitação resultante é
uma variável binária, onde os domicílios são considerados adequados se foram classificados
como adequado em todas as variáveis das três dimensões consideradas (qualidade da
construção, disponibilidade de infra-estrutura de serviços sociais e densidade habitacional) e
são considerados inadequados se forem classificados como inadequado em pelo menos uma
das variáveis de alguma dimensão.
O indicador das condições de conforto ou padrões de consumo construído através da
combinação de variáveis sobre a posse de bens ou equipamentos domésticos. Na PNAD 2008,
45
são levantados um conjunto de bens de consumo, dos quais o fogão, geladeira, televisão e
rádio são considerados bens básicos (IBGE, 1999). O indicador resultante também é uma
variável binária, onde os domicílios são considerados adequados se possuírem todos os bens
de consumo básicos e são considerados inadequados se não possuírem pelo um dos bens um
dos bens básicos.
NOGUEIRA (2008) ressalta a importância dos indicadores de qualidade de moradia
no que se refere a sua influência na saúde, destacando que as características de
habitação/moradia podem influenciar a saúde direta (proteção/segurança/conforto) e
indiretamente, devido às situações de stress e ansiedade geradas pela precariedade das
habitações. Ressalta ainda que os indicadores habitacionais representem indicadores de
privação real e não potencial, ou seja, indicam se o indivíduo ou a família estão efetivamente
privados.
Com relação ao ambiente intradomiciliar também foi utilizada a característica
socioeconômica renda domiciliar per capita. A importância deste indicador na análise das
diferenças de estado de saúde também é ressaltada por NOGUEIRA (2008) quando menciona
que “o rendimento, condicionando os indivíduos nas suas opções quotidianas – impondo ou
não, limitações à quantidade e a qualidade de bens possíveis de adquirir, e restringindo, ou
não, a mobilidade e a vida social – afeta a saúde física e mental (NOGUEIRA, 2008:42)”.
Para avaliação da exposição a uma situação de insegurança na posse, considerou-se a
condição de ocupação do domicílio, sendo classificada em quatro categorias: próprio,
alugado, cedido, ou outra condição. A categoria “outra condição” contempla aqueles
indivíduos que ocuparam o domicílio por invasão, e, portanto residem em imóvel que não tem
garantia de permanência. Segundo ALVES (2010), essa falta de garantia pode ser jurídica, no
caso de posse precária de imóveis de terceiros (irregularidade fundiária), ou mesmo “de fato”,
nos casos em que a pessoa tem direitos sobre o imóvel, mas também sofre ameaças ou
46
despejos (por exemplo, pessoas que possuem processos judiciais pendentes em relação ao
imóvel, como titulares de ação de herança, usucapião, etc.). O indicador “condição de
ocupação do domicílio” tem sido usado como proxy de capital social (NOGUEIRA, 2008),
ressaltando que aspectos já mencionados como a falta de proteção, segurança, situações de
stress e ansiedade da população tem impactos negativos para a saúde individual.
A variável “PSF”, disponível na PNAD 2008 e também considerada na modelagem
estatística, indica se o domicílio foi cadastrado ou não no Programa Saúde da Família (PSF),
designado atualmente de Estratégia Saúde da Família (ESF) que tem como propósito garantir
a universalização do acesso aos serviços de saúde. Desse modo, tal variável informa se a
família reside em área de atuação do programa que, como já mencionado, tem como objetivo
a promoção da saúde e a prevenção de doenças, e com isso melhoria da qualidade de vida dos
indivíduos.
Com relação às características do ambiente extradomiciliar são utilizadas duas
variáveis ecológicas que retratam a qualidade do ambiente extradomiciliar definida pelo
percentual de domicílios considerados adequados9 em relação aos serviços sociais básicos
(água, esgoto, lixo e luz), as densidades habitacionais e aos padrões construtivos das
moradias. Além disso, considerou a área de localização do domicílio como uma outra
variável do ambiente extradomiciliar, que pode ser classificada em urbana ou rural, tomando
por base a legislação vigente por ocasião da realização do Censo Demográfico 2000.
O Quadro 1 resume todas as variáveis explicativas (com suas respectivas categorias)
consideradas nos ajustes dos modelos logísticos tanto na abordagem agregada quanto na
abordagem desagregada de análise.
9
Percentual construído com base no indicador dicotômico de adequação da habitação (qualidade da moradia)
47
Quadro 1: Listagem do conjunto inicial de variáveis explicativas consideradas no ajuste dos
modelos logísticos (abordagens agregada e desagregada) explicativos do estado global de
saúde autorreferido do indivíduo.
Variáveis explicativas
Categorias
Características demográficas, socioeconômicas, comportamentais e de saúde
(variáveis individuais)
Sexo
Masculino; feminino
Faixa etária
De 20 a 29 anos, de 30 a 39 anos, de 40 a 49
anos, de 50 a 59 anos, 60 anos ou mais
Cor/raça
Branca, não branca (preta, amarela, parda
ou indígena)
Escolaridade
Sem declaração, sem instrução ou menos de
1 ano, 1 a 7 anos, 8 a 14 anos, 15 anos ou
mais
Situação de ocupação
Ocupado, não ocupado
Atividade física
Sem declaração, pratica, não pratica
Fumo
Sem declaração, fumante, ex-fumante,
nunca fumou
Morbidade autorreferida de 12 doenças crônicas
Pelo menos 1 doença crônica, nenhuma
doença crônica
Mobilidade física autorreferida
Muita limitação, limitação, pouca limitação,
sem limitação
Posse de plano de saúde
Sim; não
Consulta médica nos últimos 12 meses
Sim, não
Região de residência (Grandes Regiões Brasileiras)
Norte, Nordeste, Sudeste, Sul, Centro-Oeste
Ambiente intradomiciliar (variáveis domiciliares)
Qualidade da moradia
Adequada (todos os indicadores adequados),
não adequado (pelo menos um indicador
inadequado)
Posse de bens básicos (geladeira, fogão, televisão e
Possui todos os bens básicos, não possui
rádio) no domicílio
pelo menos um bem básico
Condição de ocupação do domicílio
Próprio, alugado, cedido, outra condição
Renda domiciliar mensal per capita
Sem declaração, sem renda ou até 1 s.m,
mais de 1 a 5 s.m, mais de 5 s.m
Domicílio cadastrado no PSF
Sim, não
Ambiente extradomiciliar (variáveis do setor)
Área de localização do domicílio (área censitária)
Urbana; rural
Proporção de domicílios considerados adequados
quanto a qualidade da moradia (qualidade da
construção, disponibilidade de infra-estrutura de
serviços e densidade domiciliar)*.
*Variável numérica
48
4.2.3. Modelo logístico ordinal
Modelo logístico ordinal é um modelo linear generalizado pertencente à classe dos
modelos de regressão de efeitos fixos, onde o desfecho é policotômico ordinal, e as variáveis
explicativas numéricas ou categóricas.
Modelos de efeitos fixos assumem que todas as observações são independentes, não
sendo apropriadas para análise de dados provenientes de pesquisas que apresentam algum tipo
de estrutura de correlação, seja através de pesquisas longitudinais ou que fazem uso de
conglomeração. Assim, no caso de pesquisas amostrais complexas, que violam a suposição de
independência das observações, uma alternativa adequada seria utilizar a abordagem
agregada (PESSOA e SILVA,1998) no ajuste de modelos estatísticos, que se baseia na
incorporação do plano amostral da pesquisa, informando os pesos amostrais e aspectos
ligados à estrutura do plano, tais como estratos e unidades de conglomeração. É importante
mencionar ainda que esta abordagem agregada de análise, também denominada de
abordagem baseada no plano amostral, corresponde segundo THOMAS e HECK (2001) à
modelagem em um único nível de análise (ou seja, no nível individual) e pode ser realizada
através de procedimentos ou módulos específicos para análise de dados amostrais complexos
de pacotes estatísticos como, por exemplo: STATA, SAS e SPSS.
Considerando a abordagem agregada de análise (artigos 1, 2 e 3), o modelo logístico
ordinal (modelo de chances proporcionais) pode ser representado pela equação abaixo:
Y * = β1 x1 + β 2 x 2 + K + β p x p + ε
, onde:
Y * é a autoavaliação do estado de saúde adulto;
x1, x2,...,xp são as variáveis explicativas.
β1, β2,...,βp são os parâmetros desconhecidos (efeitos fixos) a serem estimados.
ε é o erro do modelo com distribuição logística de média 0 e variância π2/3.
49
Com relação à ponderação dos dados amostrais da pesquisa, foram utilizados na
abordagem agregada pesos relativos, ao invés de pesos brutos, para a estimação das
estimativas pontuais dos parâmetros (coeficientes) do modelo e de suas medidas de precisão,
definidos pela razão entre os referidos pesos brutos e sua média aritmética simples, com o
objetivo de preservar o efetivo tamanho da amostra (LEE, 1989; THOMAS e HECK, 2001;
WEI e PARSONS, 2009). Embora tanto o uso de pesos brutos quanto de pesos relativos
levem as mesmas estimativas pontuais dos parâmetros do modelo, tal ajuste/correção nos
pesos amostrais é importante, tendo em vista que a maioria dos pacotes estatísticos trata a
soma dos pesos brutos (tamanho da população) como se fosse o tamanho efetivo da amostra,
acarretando uma grande subestimação dos erros padrões e levando a decisões equivocadas
baseadas na realização de testes estatísticos de hipóteses (THOMAS e HECK, 2001).
Uma outra forma de se ajustar modelos estatísticos com base em dados de pesquisas
amostrais complexas é através do uso da abordagem desagregada (PESSOA e SILVA,1998),
isto é, através de modelos multiníveis, como o descrito na seção 4.2.4.
4.2.4. Modelo logístico ordinal multinível
Modelos logísticos ordinais multiníveis pertencem à classe dos Modelos Lineares
Generalizados Mistos (MLGM) que, por sua vez, podem ser considerados como uma extensão
dos Modelos Lineares Generalizados (MLG) tradicionais, e basicamente diferem destes pela
incorporação de efeitos aleatórios no preditor linear.
Portanto, na análise multinível, efeitos aleatórios do(s) grupo(s) podem ser
adicionados no modelo para considerar a estrutura de dependência (ou correlação) dos dados.
O modelo resultante é um modelo misto que inclui tanto efeitos fixos usuais quanto efeitos
aleatórios para as variáveis explicativas. Além disso, na análise multinível, para cada
50
indivíduo, o valor do desfecho estudado é decomposto em duas componentes, sendo uma
componente individual ou intra-grupo, e a outra componente inter-grupo. A decomposição das
variáveis de uma amostra de dados em partes (componentes) é usada para estimar a matriz de
variância-covariância dentro dos grupos (ou seja, dos desvios individuais em relação às
médias dos grupos) e a matriz de variância-covariância entre grupos (ou seja, dos grupos de
médias desagregadas) (THOMAS e HECK, 2001).
A análise multinível é considerada uma abordagem desagregada de análise,
denominada alternativamente de abordagem baseada no modelo analítico (THOMAS e
HECK, 2001), que permite incorporar explicitamente no ajuste do modelo a estrutura
hierárquica dos dados (adulto, domicílio, setor, etc.). Entretanto, para a análise de dados da
PNAD 2008 é preciso incorporar ainda aspectos do plano amostral efetivamente adotado na
seleção da amostra (isto é, estratos, unidade primárias de amostragem e pesos amostrais).
THOMAS e HECK (2001) chamam atenção para o fato de que os modelos multiníveis lidam
naturalmente com a conglomeração dos dados, mas precisam de “ajustes estatísticos” para
acomodar outras características de amostragem, como os pesos de amostragem.
Nesta tese (artigo 4) utilizou-se à abordagem desagregada para adultos residentes em
municípios populosos (os chamados municípios autorrepresentativos) que informaram seu
próprio estado de saúde. Nestes municípios, o plano amostral é estratificado e conglomerado
em dois estágios de seleção, onde os municípios são os estratos, e os setores e domicílios são
as unidades primárias e secundárias de amostragem, respectivamente. Desse modo, a fim de
considerar todas essas informações estruturais do plano amostral da PNAD 2008, ajustou-se
um modelo logístico ordinal multinível com quatro níveis hierárquicos, onde os adultos são as
unidades de 1º nível, os domicílios (habitações) são as unidades de 2º nível, os setores
(vizinhanças) as unidades de 3º nível. Os municípios autorrepresentativos foram considerados
no modelo como unidades de 4º nível.
51
Um modelo multinível (modelo de chances proporcionais) de quatro níveis de
hierarquia pode ser representado genericamente pela seguinte equação adaptada de
SKRONDAL e RABE-HESKETH (2003):
Y
*
ijkh
=
M1 −1
∑β
x m ijk
1
m1 = 0
142
4 43
4
m1
M 2 −1
∑θ
+
⋅z
m2 =0
1442443
parte
fixa
(2)
m2 jkh
( 2)
m2ijkh
+
M 3 −1
∑θ
⋅ z (m3)ijkh
3
m3 = 0
1
442443
parte aleatória
de 2 ºnível
( 3)
m3kh
parte aleatória
de 3ºnível
+
M 4 −1
∑θ
⋅ z (m4)ijk + ε ijkh
4
m4 = 0
1
44244
3
( 4)
m4 h
parte aleatória
de 4º nível
que pode ser escrita de forma alternativa usando alguma notação matricial:
*
`
( 2 )` ( 2 )
( 3 )` ( 3 )
( 4 )` ( 4 )
Yijkh
= x ijkh
β + z ijkh
θ jkh + z ijkh
θ kh + z ijkh
θ h + ε ijkh ;
i=1,2,..., njkh ;
j=1,2,..., nkh
;
k=1,2,....,nh;
h=1,2,....,n
onde:
*
Y ijkh
é o estado de saúde autorreferido (variável latente) do i-ésimo indivíduo que reside no j-
ésimo domicílio do k-ésimo setor pertencente ao h-ésimo município autorrepresentativo;
[
]
x ijk = x 0ijk , x1ijk , K , x M1 −1ijk é o vetor de variáveis explicativas;
ββββ
[
= β 0 , β1 ,K, β M1 −1
]
`
é o vetor de efeitos fixos;
[
]
`
é o vetor de efeitos aleatórios de 2º nível (domicílio);
[
]
`
é o vetor de variáveis explicativas com efeitos aleatórios de 2º
2)
)
θ (jkh
= θ 0( 2jkh
, θ1( 2jkh) ,K, θ M( 22) −1 jkh
( 2)
)
2)
z ijkh
= z 0( 2ijkh
, z1(ijkh
,K, z M( 22) −1ijkh
nível (domicílio). A coluna de 1`s é usualmente incluída no caso de intercepto aleatório para o
2º nível);
[
θ kh(3) = θ0(3kh) , θ1(kh3) ,K, θ M( 32) −1kh
]
[
`
é o vetor de efeitos aleatórios de 3º nível (setor);
]
( 3)
)
3)
z ijkh
= z 0(3ijkh
, z1(ijkh
,K, z M(33) −1ijkh ` é o vetor de variáveis explicativas com efeitos aleatórios de 3º
nível (setor).
[
θ h( 4) = θ 0( 4h) , θ1(h4) ,K, θ M( 44) −1h
autorrepresentativo);
]
`
é o vetor de efeitos aleatórios de 4º nível (município
52
[
]
( 4)
)
4)
z ijkh
= z 0( 4ijkh
, z1(ijkh
,K, z M( 44) −1ijkh ` é o vetor de variáveis explicativas com efeitos aleatórios de 4º
nível (município autorrepresentativo).
Os efeitos aleatórios de cada nível são, por suposição, normalmente distribuídos
θ m( 2) jkh ~ N (0,σ (22 ) ), θ m( 3)kh ~ N (0,σ (23) ) e θ m( 4 )h ~ N (0, σ (24 ) ) , além de independentes através dos
3
2
4
níveis.
εijkh são os erros do modelo com distribuição logística de média 0 e variância π2/3.
No caso de um modelo multinível de quatro níveis apenas com interceptos aleatórios,
no qual se adiciona ao preditor linear efeitos aleatórios para as unidades de 2º nível
(domicílio), 3º nível (setor) e 4º nível (município AR) tem-se a seguinte representação abaixo
)
)
)
=1; M3=1 e z 0(3ijkh
=1; M4=1 e z 0( 4ijkh
=1).
(M2=1 e z 0( 2ijkh
`
)
Yijk* = x ijk
β + θ 0( 2jkh
+ θ 0( 3kh) + θ 0( 4h) + ε ijk
i=1,2,..., njkh ;
j=1,2,..., nkh
;
;
k=1,2,....,nh; h=1,2,....,n
onde:
*
Y ijkh
é o estado de saúde autorreferido (variável latente) do i-ésimo indivíduo que reside no j-
ésimo domicílio do k-ésimo setor pertencente ao h-ésimo município autorrepresentativo;
xijkh é o vetor de variáveis explicativas;
β é o vetor de efeitos fixos;
θ 0( 2jkh) é o efeito aleatório do j-ésimo domicílio do k-ésimo setor pertencente ao h-ésimo
município autorrepresentativo (efeito da unidade de 2º nível, ou seja, do domicílio);
)
θ 0( 2jkh
~ N (0, σ (22 ) )
53
θ 0( 3kh)
é o efeito aleatório do k-ésimo setor pertencente ao h-ésimo município
(
autorrepresentativo (efeito da unidade de 3º nível, ou seja, do setor); θ 0(3kh) ~ N 0, σ (23)
)
θ 0( 4h) é o efeito aleatório do h-ésimo município autorrepresentativo (efeito da unidade de 4º
(
nível, ou seja, do município autorrepresentativo); θ 0( 4h) ~ N 0, σ (24 )
)
εijk são os erros do modelo com distribuição logística de média 0 e variância π2/3.
Destarte, na análise multinível são utilizadas três unidades de contexto, o “domicílio”,
o “setor” e o “município AR”. Para os domicílios e setores foi considerado um conjunto de
características que retratam o ambiente intradomiciliar e extradomiciliar, respectivamente.
Quanto ao “município” foi considerada na análise multinível por representar o estrato no
plano amostral da PNAD 2008. Segundo o IBGE, o domicilio é definido como “o local de
moradia estruturalmente separado e independente, constituído por um ou mais cômodos”. A
separação refere-se à delimitação do local de moradia por paredes, muros, cercas, e por um
teto, tornando possível o isolamento de seus moradores, que arcam com parte ou todas as suas
despesas de alimentação ou moradia. A independência, por sua vez, refere-se à possibilidade
de acesso direto ao local de moradia, ou seja, possibilita a entrada e saída dos moradores sem
a necessidade de se passar pelo local de moradia de outros moradores.
Para fins de análise foram considerados apenas os domicílios particulares permanentes
(DPP) que são aqueles domicílios (casa, apartamento ou cômodo) destinados exclusivamente
à moradia de uma pessoa ou de um grupo de pessoas cujo relacionamento fosse ditado por
laços de parentesco, dependência doméstica ou, ainda, normas de convivência.
Devido a não disponibilidade da identificação dos códigos dos setores censitários para
garantir o sigilo ou confidencialidade das informações prestadas pelos respondentes, utilizouse como unidade de contexto a “área de listagem” (referida simplesmente como setor nesta
54
tese) disponível no banco de dados da PNAD, que podem ser os próprios setores censitários
ou subdivisões dos setores censitários, ou ainda áreas de novas construções nos casos em que
o crescimento de domicílios foi muito espalhado. Embora concebida para fins de controle do
processo de amostragem, sabe-se que os domicílios pertencentes a uma certa área de listagem
mantêm uma certa proximidade geográfica.
55
5. Resultados
5.1. ARTIGO 1
Associação entre o estado de saúde autorreferido de adultos e a
área de localização do domicílio: uma análise de regressão
logística ordinal usando a PNAD 2008♦
♦
Artigo publicado na Revista Ciência & Saúde Coletiva e ligeiramente modificado na tese.
56
Resumo
O ambiente urbano influencia a saúde e os comportamentos humanos, sendo necessário um
melhor entendimento dos determinantes da saúde das populações que vivem nas cidades. A
partir dos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2008, usando
modelos logísticos ordinais incorporando o plano amostral, o presente artigo avalia a
associação entre a área de localização do domicílio (urbana e rural) e o estado de saúde
autorreferido da população adulta brasileira, controlando para um conjunto de fatores
individuais e do ambiente intradomiciliar e extradomiciliar. Os resultados indicam que ao
controlar por fatores individuais e ambientais, a associação entre a área de localização do
domicílio e o estado de saúde autorreferido dos adultos se modifica (passando de OR=1,51
para OR=0,96) e perde a sua significância estatística (p-valor=0,208). Entretanto, foram
observadas interações estatisticamente significantes entre a área de localização do domicílio e
as seguintes variáveis: sexo, cor/raça, morbidade autorreferida, posse de bens básicos e
percentual de domicílios adequados quanto a qualidade de moradia.
Palavras-chave: Estado de saúde autorreferido, área de localização do domicílio, modelo de
regressão logística ordinal.
57
Abstract:
The urban environment influences human health and behavior, and better understanding of the
health determinants of populations living in cities is needed. Using data from the National
Household Sampling Survey (PNAD) 2008, with ordinal logistic models incorporating the
sampling plan, the present study assessed the association between the area where the homes of
a Brazilian adult population were located (urban or rural) and these individuals’ self-reported
state of health, while controlling for a set of individual and environmental factors within and
outside of households. The results indicated that after controlling for individual and
environmental factors, the association between the area of home location and individuals’
self-reported state of health became modified (going from OR = 1.51 to OR = 0.96) and lost
its statistical significance (p-value = 0.208). However, statistically significant interactions
were observed between the area of home location and the following variables: sex, color/race,
self-reported morbidity, possession of basic goods and percentage of households with
adequate housing quality.
Key words: self-reported state of health, area of home location, ordinal logistic regression
model.
58
5.1.1. INTRODUÇÃO
O ambiente urbano influencia a saúde e os comportamentos humanos, apontando para
a necessidade de melhor entendimento dos determinantes da saúde das populações que vivem
nas cidades1. No Brasil, houve um aumento na taxa de urbanização, passando de 81,2% em
2000 para 83,8% em 2008, que em termos absolutos significa mais de 159 milhões de pessoas
vivendo nas cidades em 20082.
Com relação aos múltiplos efeitos da urbanização na saúde da população ainda há
divergências entre estudos. Alguns estudos sobre a relação entre o processo de urbanização e
a saúde da população apontam como fatores que proporcionam uma melhor saúde dos
indivíduos em áreas urbanas, comparativamente a áreas rurais, um maior nível de renda,
educação e informação, que lhes proporcionam um melhor acesso a uma alimentação de
qualidade3,4 e um maior acesso de serviços de saúde5. Por outro lado, outros estudos apontam
que o processo de urbanização, sobretudo quando não planejado, pode trazer uma série de
riscos a saúde da população como resultado de residências impróprias, aglomeração humana,
poluição ambiental, água para consumo insuficiente ou contaminada, instalações sanitárias
inadequadas, esgoto não-tratado, estresses associados com pobreza e desemprego6,7.
Segundo Caiaffa et al.1, independente do efeito positivo ou negativo da vida nas
cidades contemporâneas (meio urbano), o conceito de saúde deve incorporar o cotidiano dos
indivíduos vivendo nas cidades, não ignorando as relações de interdependência que existem
entre o indivíduo e o meio físico, social e político onde ele vive e se insere. “Os resultados em
saúde parecem, pois depender de quem se é e do lugar onde se vive”4. Apreende-se, portanto
que o estudo dos determinantes de saúde não pode se limitar a fatores individuais, devendo
ser considerados também fatores ambientais para explicar as diferenças nos níveis de saúde de
populações humanas. A importância da consideração de indicadores relativos à qualidade das
59
moradias está no fato deles representarem conceitos de privação real, ou seja, indicam que os
indivíduos estão efetivamente privados4.
Do ponto de vista da prevenção das doenças e da promoção da qualidade de vida e das
condições de saúde no país é fundamental identificar fatores, sobretudo os passíveis de
intervenção (modificáveis), que influenciam os níveis de saúde de populações humanas, com
objetivo de reduzir as iniqüidades em saúde. Entretanto, o estabelecimento desta relação não é
simples, “não só por causa da multiplicidade de fatores envolvidos e pelas inter-relações
existentes entre eles (...)”4, mas, sobretudo pelas limitações provenientes do tipo de desenho
de estudo epidemiológico adotado e da disponibilidade e qualidade das informações nos
níveis geográficos requeridos.
Na análise das diferenças nos níveis de saúde de populações humanas considerando
variáveis individuais e contextuais, têm sido frequentemente utilizados, como proxy das
avaliações objetivas de saúde individual, indicadores de autopercepção do estado global de
saúde, por ser de fácil mensuração, confiável e válido8,9,10, além de permitir comparações
internacionais11. .
Vários autores utilizam o indicador de autopercepação do estado de saúde em seus
estudos12,13,14,4, entretanto diferem quanto à forma de tratar o indicador. Por exemplo, Dachs e
Santos13, com base nos dados da PNAD 2003, usaram modelos de regressão logística binária
para relacionar a autopercepção do estado de saúde dicotomizada em ruim/muito ruim ou não
com um conjunto de determinantes individuais. Já Nogueira4 usando modelos de regressão
logística ordinal relacionou a autopercepção do estado de saúde com um conjunto de
determinantes individuais e contextuais na Área Metropolitana de Lisboa.
No presente artigo são analisadas as diferenças no estado de saúde autorreferido dos
adultos usando dados mais recentes da PNAD utilizada por Dachs e Santos13 e o mesmo tipo
de modelo adotado por Nogueira4, mas incorporando as informações do plano amostral.
60
Considerando a população adulta residente em domicílios particulares permanentes que
informou o seu próprio estado de saúde, este artigo tem como objetivo avaliar a associação
entre a área de localização do domicílio (urbana e rural) e o estado de saúde autorreferido,
controlando para um conjunto de variáveis demográficas, socioeconômicas, comportamentais
e de saúde que retratam características individuais e do ambiente intradomiciliar e
extradomiciliar.
61
5.1.2. MATERIAL E MÉTODOS
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) é uma pesquisa de
abrangência nacional, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),
que coletou informações de uma amostra probabilística de 150.591 domicílios e 391.868
pessoas. Tem como finalidade produzir informações básicas para o estudo do
desenvolvimento socioeconômico do País. Sua amostra foi planejada para obter estimativas
representativas para o Brasil, Grandes Regiões, Unidades da Federação e nove Regiões
Metropolitanas (Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São
Paulo, Curitiba e Porto Alegre). Com relação ao desenho amostral, a PNAD é um estudo
seccional que combina estratificação, conglomeração em dois ou três estágios, com
probabilidades desiguais de seleção que resultam em pesos amostrais distintos para os
elementos da amostra. Maiores informações sobre o planejamento amostral podem ser obtidos
em Silva et al.15 e IBGE2.
População de estudo
A população-alvo deste estudo compreende os indivíduos adultos (20 anos ou mais de
idade) residentes em domicílios particulares permanentes que informaram o seu próprio
estado de saúde, o que corresponde a uma seleção de 162.213 registros na amostra da PNAD.
Foram consideradas na análise apenas as pessoas que informaram seu próprio estado global de
saúde, por entender que informações prestadas por terceiros (outras pessoas moradoras do
domicílio, ou ainda outras pessoas não moradoras do domicílio) aumentaria a chance de
62
ocorrer viés de informação ou classificação do desfecho de saúde utilizado neste trabalho. Do
total de adultos residentes em domicílios particulares permanentes, 37,2% tiveram seu estado
de saúde informado por terceiros.
Variáveis de estudo
A partir das cinco alternativas de resposta do quesito de autopercepção do estado
global de saúde obteve-se um desfecho ordinal com três níveis: muito bom/bom, regular,
ruim/muito ruim.
A área de localização do domicílio classificada em urbana ou rural de acordo com a
legislação vigente na ocasião do Censo Demográfico 2000 é a variável de exposição principal,
cuja associação com o estado de saúde autorreferido se deseja avaliar em nível nacional. A
área urbana foi definida como agregação de três categorias da variável original “situação
censitária” disponível no banco de dados da PNAD 2008: 1) Cidade ou vila, área urbanizada;
2) Cidade ou vila, área não-urbanizada; e 3) Área urbana isolada. A área rural, por sua vez,
foi definida como junção de cinco categorias da variável situação censitária: 1) Aglomerado
rural de extensão urbana; 2) Aglomerado rural, isolado, povoado; 3) Aglomerado rural,
isolado, núcleo; 4) Aglomerado rural, isolado, outros aglomerados; e 5) Zona rural exclusive
aglomerado rural.
Como variáveis de controle foi utilizado um conjunto de dezoito variáveis
demográficas, socioeconômicas, comportamentais e de saúde que retratam características
individuais e do ambiente intradomiciliar e extradomiciliar: sexo, faixa etária, cor/raça,
escolaridade, situação de ocupação, atividade física, fumo, morbidade autorreferida,
mobilidade física, posse de plano de saúde, consulta médica nos últimos 12 meses, domicílio
cadastrado no Programa de Saúde da Família (PSF), qualidade de moradia, posse de bens
63
básicos no domicílio, condição de ocupação do domicílio, renda domiciliar mensal per
capita, região de residência e proporção de domicílios considerados adequados no setor
(vizinhança) quanto aos serviços sociais básicos (água, esgoto, lixo e luz), as densidades
habitacionais e aos padrões construtivos das moradias (material usado nas paredes e
telhado). As variáveis de controle que foram obtidas através da agregação de variáveis
disponíveis no banco de dados da PNAD 2008 são descritas abaixo.
A variável “qualidade de moradia” representa uma característica do ambiente
intradomiciliar, construída através da combinação de sete variáveis binárias que indicam
adequação ou inadequação de três dimensões distintas (qualidade da construção, infraestrutura de serviços sociais e densidade domiciliar) de acordo com os critérios definidos na
publicação da Pesquisa sobre Padrões de Vida 1996-199716. As categorias da variável
“qualidade da moradia” são: adequado - para os domicílios considerados adequados em todos
os indicadores das três dimensões e inadequado - para os domicílios considerados
inadequados em pelo menos um dos indicadores de alguma das dimensões. A partir da
variável “qualidade de moradia”, foi obtida uma outra variável que retrata uma característica
do ambiente extradomiciliar, através do cálculo do percentual de domicílios existentes no
setor considerados adequados quanto à qualidade da construção, à infra-estrutura de serviços
sociais (água, esgoto, lixo e luz) e à densidade habitacional.
A “posse de bens básicos no domicílio” é uma outra variável do ambiente
intradomiciliar, com duas categorias que informam se no domicílio existem todos os quatro
bens básicos (fogão, geladeira, televisão e rádio) ou se não existe pelo menos um desses bens.
A variável “mobilidade física” foi construída a partir do agrupamento das respostas
(não consegue, tem grande dificuldade, tem pequena dificuldade ou não tem dificuldade) de
oito quesitos de mobilidade física levantados na PNAD 2008, resultando em quatro níveis que
retratam os diferentes estados de mobilidade física dos indivíduos ou diferentes graus de
64
limitação na realização de determinadas atividades básicas do cotidiano: muita limitação,
limitação, pouca limitação e sem limitação. Os indivíduos são classificados como tendo muita
limitação quando não conseguem ou têm grande dificuldade para realizar as atividades
básicas de alimentação e higiene, ou não conseguem realizar pelo menos uma das demais
atividades. Como tendo limitação quando os indivíduos têm pequena ou nenhuma dificuldade
nas atividades de alimentação e higiene, mas possui grande dificuldade em pelo menos uma
das outras atividades. Como tendo pouca limitação, os indivíduos que não têm pequena ou
nenhuma dificuldade, mas têm pequena dificuldade em pelo menos uma das outras atividades.
Finalmente, foram classificados como sem limitação, os indivíduos que não apresentaram
nenhuma dificuldade em todas as atividades.
A variável “morbidade autorreferida” foi construída a partir das respostas (sim ou não)
de doze quesitos que investigam a presença de doze doenças crônicas. As categorias da
variável “morbidade autorreferida” informam se o indivíduo não possui nenhuma destas 12
doenças crônicas ou se possui pelo menos uma destas doenças.
Análise Estatística
Utilizando o software SPSS for Windows, versão 17.0 (SPSS Inc., Chicago, Estados
Unidos), foram ajustados modelos logísticos ordinais para o estado de saúde autorreferido,
considerando os pesos amostrais e as informações estruturais do plano amostral (estratos e
unidades primárias de amostragem) da PNAD 2008. Nos ajustes foram usados pesos
amostrais corrigidos definidos pela razão entre os pesos naturais do desenho e a sua média
aritmética, para manter o uso do tamanho de amostra na realização das inferências
realizadas17. Neste artigo foi utilizado o modelo logístico ordinal, também chamado de
modelo de chances proporcionais, cuja forma funcional está representada em Abreu et al18,
65
pois é o mais utilizado por investigadores sociais na área de saúde e está implementado na
maioria dos pacotes estatísticos que possuem rotinas para a análise de dados amostrais
complexos (SPSS, STATA, SAS, etc.), como os dados da PNAD.
Além dos efeitos principais das dezoito variáveis de controle, também foram testados
os efeitos de interação das variáveis selecionadas com a área de localização do domicílio.
66
5.1.3. RESULTADOS
Quase 70% da população adulta brasileira avaliou o seu estado global de saúde como
bom ou muito bom. Apenas 5,6% dos adultos avaliaram o seu estado de saúde como ruim ou
muito ruim, enquanto os demais (26,0%) reportaram um estado de saúde regular (Figura 1).
Figura 1: Distribuição de adultos segundo o estado de saúde autorreferido - Brasil
Percentual de adultos
100%
80%
68,4%
60%
40%
26,0%
20%
5,6%
0%
Ruim ou muito ruim
Regular
Bom ou muito bom
Estado de saúde autorreferido
A Tabela 1 apresenta os resultados dos modelos logísticos ordinais univariados
relacionando todas as variáveis consideradas com a autopercepção do estado de saúde dos
adultos, além de suas distribuições de freqüências simples e conjuntas (com a autopercepção
do estado de saúde).
67
Tabela 1: Associações de variáveis demográficas, socioeconômicas, comportamentais e de
saúde com o estado de saúde autorreferido – Brasil.
Distribuição percentual de adultos
segundo o estado de saúde autorreferido
Variáveis
Área de localização do domicílio
Urbano
Rural
Região de residência
Norte
Nordeste
Sudeste
Sul
Centro-oeste
Sexo
Masculino
Feminino
Faixa etária
20 a 29 anos
30 a 39 anos
40 a 49 anos
50 a 59 anos
60 anos ou +
Cor/raça
Branca
Não branca
Escolaridade
Sem instrução ou menos de 1 ano
1 a 7 anos
8 a 14 anos
15 anos ou +
Sem declaração
Renda domiciliar mensal per capita
Sem renda ou até 1 salário mínimo
Mais de 1 a 5 salários mínimos
Mais de 5 salários mínimos
Sem declaração
Situação de ocupação
Ocupada
Não ocupada
Atividade física
Pratica
Não pratica
Sem declaração
Fumo
Fumante
Ex-fumante
Nunca fumou
Sem declaração
Morbidade autorreferida
Pelo menos uma doença crônica
Nenhuma doença crônica
Ruim ou
muito
ruim
Regular
83,3
16,7
5,3
7,3
7,4
27,7
42,0
15,4
Modelos logísticos ordinais
univariados
Bom ou
muito
bom
Total
24,7
32,3
70,0
60,4
100
100
1,51
1
[1,43; 1,59]
-
<0,001
-
28,8
30,6
22,8
25,0
25,7
64,9
62,4
72,5
69,3
69,3
100
100
100
100
100
0,82
0,73
1,16
0,99
-
[0,75; 0,89]
[0,69 0,77]
[1,09; 1,23]
[0,92; 1,06]
-
<0,001
<0,001
<0,001
0,701
7,4
6,3
7,0
4,7
5,7
4,9
38,4
61,6
5,3
5,9
23,2
27,7
71,5
66,4
100
100
1,26
1
[1,23; 1,29]
-
<0,001
-
22,3
22,1
20,6
16,0
18,9
1,4
2,4
5,0
8,6
12,6
13,0
18,6
26,5
34,7
41,9
85,6
79,0
68,5
56,7
45,5
100
100
100
100
100
7,26
4,59
2,64
1,58
1
[6,93; 7,60]
[4,41; 4,79]
[2,54; 2,74]
[1,51; 1,64]
-
<0,001
<0,001
<0,001
<0,001
-
49,0
51,0
4,9
6,3
23,2
28,7
71,9
65,0
100
100
1,38
1
[1,34; 1,42]
-
<0,001
-
13,0
36,2
42,1
8,5
0,2
14,9
7,4
2,3
1,2
5,0
40,0
33,8
17,9
10,8
25,5
45,1
58,8
79,8
88,0
69,5
100
100
100
100
100
0,11
0,20
0,54
1
0,31
[0,10; 0,11]
[0,18; 0,21]
[0,51; 0,58]
[0,23; 0,42]
<0,001
<0,001
<0,001
<0,001
51,0
40,7
5,4
2,8
7,4
4,1
1,5
4,8
30,3
22,5
12,4
23,6
62,3
73,4
86,1
71,6
100
100
100
100
0,26
0,44
1
0,40
[0,24; 0,28]
[0,41; 0,48]
[0,36; 0,45]
<0,001
<0,001
<0,001
62,2
37,8
3,5
9,2
22,1
32,3
74,4
58,5
100
100
2,12
1
[2,06; 2,17]
-
<0,001
-
25,2
72,3
2,5
2,0
5,7
40,8
17,5
28,4
41
80,5
65,9
18,2
100
100
100
2,15
1
0,09
[2,08; 2,23]
[0,09; 0,10]
<0,001
<0,001
15,4
16,7
50,9
17,0
7,2
8,9
4,1
5,7
28,0
33,8
22,9
25,8
64,8
57,3
73,0
68,5
100
100
100
100
0,67
0,49
1
0,79
[0,64; 0,69]
[0,48; 0,51]
[0,77; 0,82]
<0,001
<0,001
<0,001
46,5
53,5
10,9
1,1
41,7
12,3
47,4
86,6
100
100
0,14
[0,13; 0,14]
-
<0,001
-
Distribuição
percentual
de adultos
Razão de
chance
1
IC 95%
p-valor*
-
68
Mobilidade física
Muita limitação
Limitação
Pouca limitação
Sem limitação
Posse de plano de saúde
Sim
Não
Consulta médica
Sim
Não
PSF
Sim
Não
Condição de ocupação do domicílio
Próprio
Alugado
Cedido
Outra
Posse de bens básicos
Tem todos os quatro bens básicos
Não tem pelo menos um bem básico
Qualidade da moradia
Adequado
Não adequado
8,1
12,9
15,6
63,4
29,0
16,0
4,3
0,9
48,2
53,2
39,9
14,1
22,8
30,8
55,8
85,0
100
100
100
100
0,04
0,08
0,23
1
[0,03; 0,04]
[0,07; 0,08]
[0,22; 0,24]
-
<0,001
<0,001
<0,001
-
27,2
72,8
3,0
6,6
19,0
28,6
78,0
64,8
100
100
1,94
1
[1,87; 2,01]
-
<0,001
-
73,9
26,1
6,9
2,0
29,3
16,7
63,8
81,3
100
100
0,40
1
[0,39; 0,41]
-
<0,001
-
49,4
50,6
6,6
4,7
29,5
22,5
63,9
72,8
100
100
0,66
1
[0,64; 0,69]
-
<0,001
-
76,1
15,4
8,0
0,5
6,1
3,6
5,1
8,0
27,2
20,2
25,7
28,6
66,7
76,2
69,2
63,4
100
100
100
100
1,17
1,88
1,32
1
[0,97; 1,41]
[1,55; 2,28]
[1,09; 1,60]
-
<0,001
0,005
-
82,6
17,4
4,9
9,0
24,9
30,8
70,2
60,2
100
100
1,59
1
[1,53; 1,65]
-
<0,001
-
54,1
45,9
4,8
6,6
23,4
29,1
71,8
64,3
100
100
1,41
1
[1,36; 1,46]
[1,90; 2,11]
<0,001
-
% domicílios adequados
2,00
0,098
<0,001
*Teste Wald
Dos adultos que informaram seu próprio estado de saúde, 83,3% deles residem em
domicílios localizados na área urbana. Com relação à distribuição da autopercepção do estado
de saúde segundo as categorias das variáveis consideradas, pode-se destacar também que a
proporção de adultos com estado de saúde autorreferido bom ou muito bom é maior entre os
residentes na área urbana (70,0%), na região Sudeste (72,5%), em domicílios com os quatro
bens básicos (70,2%) e adequados com relação à densidade e à infra-estrutura física e de
serviços sociais (71,8%). Pode-se destacar ainda que esta proporção também é maior entre
indivíduos que nunca fumaram (73,0%), que praticaram atividade física (80,5%), sem
nenhuma doença crônica (86,6%), com plano de saúde (78,0%) e que não consultaram médico
nos últimos 12 meses (81,3%) (Tabela 1).
Analisando os resultados dos modelos logísticos ordinais univariados (Tabela 1),
observa-se que todas as características demográficas, socioeconômicas, comportamentais e de
69
saúde (individuais ou dos ambientes intra e extradomiciliar) estão estatisticamente
relacionadas com a chance do adulto autorreferir um melhor estado de saúde ao nível de
significância de 5%. Na análise univariada (análise bruta) observou-se que a chance do adulto
apresentar um melhor estado de saúde autorreferido na área urbana é 51% maior que na área
rural (OR= 1,51; IC 95%= [1,43; 1,59]).
Tabela 2: Modelos logísticos ordinais (multivariados) explicativos do estado de saúde
autorreferido de adultos - Brasil.
Variáveis
Área de localização do domicílio
Urbano
Rural
Região de residência
Norte
Nordeste
Sudeste
Sul
Centro-oeste
Sexo
Masculino
Feminino
Faixa etária
20 a 29 anos
30 a 39 anos
40 a 49 anos
50 a 59 anos
60 anos ou +
Cor/raça
Branca
Não branca
Escolaridade
Sem instrução ou menos de 1 ano
1 a 7 anos
8 a 14 anos
15 anos ou +
Sem declaração
Renda domiciliar mensal per capita
Sem renda ou até 1 salário mínimo
Mais de 1 a 5 salários mínimos
Mais de 5 salários mínimos
Sem declaração
Situação de ocupação
Ocupada
Não ocupada
Modelo multivariado 1:
inclui os efeitos principais
significativos
Razão de
chance
IC 95%
0,96
1
[0,90; 1,02]
-
0,75
0,78
1,10
0,99
1
Modelo multivariado 2:
inclui os efeitos principais e de
interação significativos
Razão de
chance
IC 95%
0,208
-
0,93
1
[0,83; 1,05]
-
0,226
-
[0,68; 0,83]
[0,74; 0,84]
[1,04; 1,17]
[0,91; 1,07]
-
<0,001
<0,001
0,002
0,722
-
0,75
0,78
1,10
0,99
1
[0,68; 0,83]
[0,73; 0,83]
[1,03; 1,17]
[0,92; 1,07]
-
<0,001
<0,001
0,003
0,819
-
0,85
1
[0,83; 0,88]
-
<0,001
-
0,96
1
[0,90; 1,02]
-
0,187
-
1,41
1,19
0,96
0,83
1
[1,33; 1,49]
[1,14; 1,25]
[0,92; 1,00]
[0,80; 0,87]
-
<0,001
<0,001
0,067
<0,001
-
1,42
1,20
0,96
0,84
1
[1,34; 1,50]
[1,14; 1,26]
[0,92; 1,01]
[0,80; 0,87]
-
<0,001
<0,001
0,101
<0,001
-
1,16
1
[1,12; 1,20]
<0,001
1,02
1
[0,95; 1,10]
0,618
-
0,46
0,47
0,69
[0,42; 0,50]
[0,44; 0,51]
[0,65; 0,74]
[0,33; 0,64]
0,46
0,48
0,70
1
0,47
[0,42; 0,50]
[0,45; 0,52]
[0,65; 0,75]
0,46
<0,001
<0,001
<0,001
<0,001
[0,34; 0,65]
<0,001
<0,001
<0,001
<0,001
0,53
0,71
1
0,69
[0,49; 0,58]
[0,65; 0,77]
[0,61; 0,78]
<0,001
<0,001
0,001
0,53
0,71
1
0,69
[0,49; 0,58]
[0,65; 0,77]
[0,61; 0,78]
<0,001
<0,001
<0,001
1,19
1
[1,15;1,23]
-
<0,001
-
1,19
1
[1,15;1,23]
-
<0,001
-
p-valor*
p-valor*
70
Atividade física
Pratica
1,36
Não pratica
1
Sem declaração
0,50
Fumo
Fumante
0,86
Ex-fumante
0,88
Nunca fumou
1
Sem declaração
0,95
Morbidade autorreferida
Pelo menos uma doença crônica
0,29
Nenhuma doença crônica
1
Mobilidade física
Muita limitação
0,13
Limitação
0,18
Pouca limitação
0,42
Sem limitação
1
Posse de plano de saúde
Sim
1,32
Não
1
Consulta médica
Sim
0,55
Não
1
Posse de bens básicos
Tem todos os quatro bens básicos
1,14
Não tem pelo menos um bem básico
1
1,36
% domicílios adequados
Área*Sexo
Urbana * Masculino
Área*Cor/raça
Urbana * Branca
Área*Morbidade autorreferida
Urbana * Pelo menos uma doença
Área*Posse de bens básicos
Urbana * Todos os bens
Área*%domicílios adequados
Urbana * %domicílios adequados
*Teste Wald
Nota: Excluídas as variáveis condição de ocupação do
multivariado.
[1,31;1,41]
[0,46;0,55]
<0,001
<0,001
1,36
1
0,50
[1,31;1,41]
[0,46;0,56]
<0,001
<0,001
[0,82;0,89]
[0,85;0,91]
[0,92;0,99]
<0,001
<0,001
0,012
0,86
0,88
1
0,95
[0,82;0,89]
[0,85;0,91]
[0,91;0,99]
<0,001
<0,001
0,009
[0,28;0,30]
-
<0,001
-
0,33
1
[0,31;0,36]
-
<0,001
-
[0,12;0,14]
[0,17;0,19]
[0,40;0,43]
-
<0,001
<0,001
<0,001
-
0,13
0,18
0,42
1
[0,12;0,14]
[0,17;0,19]
[0,40;0,43]
-
<0,001
<0,001
<0,001
-
[1,26;1,37]
-
<0,001
-
1,31
1
[1,26;1,37]
-
<0,001
-
[0,53;0,57]
-
<0,001
-
0,55
1
[0,53;0,58]
-
<0,001
-
[1,10;1,19]
[1,26;1,46]
<0,001
<0,001
1,02
1
0,98
[0,95;1,10]
[0,78;1,23]
0,540
0,864
0,86
[0,81;0,92]
<0,001
1,17
[1,08;1,27]
<0,001
0,83
[0,76;0,90]
<0,001
1,17
[1,08;1,28]
<0,001
1,40
[1,11;1,77]
0,005
domicílio, qualidade da moradia e PSF no ajuste do modelo
A Tabela 2 apresenta os resultados do ajuste dos modelos ordinais multivariados para
avaliar a associação entre a “área de localização do domicílio” e a “autopercepção do estado
de saúde” dos adultos, controlando simultaneamente pelas variáveis ambientais e individuais
previamente apresentadas, fixando o nível de significância em 5%.
Considerando primeiramente todos os efeitos principais das variáveis no ajuste do
modelo explicativo do estado de saúde autorreferido dos indivíduos, apenas as variáveis
71
“condição de ocupação do domicílio”, “qualidade da moradia” e “PSF” foram excluídas do
modelo por não apresentarem efeito estatisticamente significante ao nível de 5%. Portanto,
baseado no modelo multivariado 1, observa-se que, ao controlar pelas demais variáveis
ambientais e individuais, a associação entre a área de localização do domicílio e o estado de
saúde autorreferido dos adultos se modifica (passando de OR=1,51 para OR=0,96) e perde a
sua significância estatística (p-valor=0,208).
Ao incluir todos os efeitos de interação das variáveis selecionadas no modelo
multivariado 1 com a área de localização do domicílio, observou-se existência de interação
para as seguintes variáveis: sexo, cor/raça, morbidade autorreferida, posse de bens básicos e
o percentual de unidades adequadas, no setor de localização do domicílio (vizinhança),
quanto à densidade, a infra-estrutura física e de serviços sociais (Tabela 2).
Devido à existência de interações no modelo multivariado 2 algumas medidas de
associação não estão explicitadas na tabela 2 e precisaram ser calculadas. A tabela 3 apresenta
as medidas de razão de chance para as variáveis de interação.
Tabela 3: Medidas de razão de chance para as variáveis de interação
Variáveis
Sexo
Masculino
Feminino
Cor/raça
Branca
Não branca
Morbidade autorreferida
Pelo menos uma doença crônica
Nenhuma doença crônica
Posse de bens básicos
Tem todos os quatro bens básicos
Não tem pelo menos um bem básico
% domicílios adequados quanto a qualidade da moradia
Área de localização do
domicílio
Urbana
Rural
0,77
0,93
0,96
1
1,11
0,93
1,02
1
0,25
0,93
0,33
1
1,11
0,93
1,28
1,02
1
0,98
Os homens na área urbana (OR=0,93*0,96*0,86=0,77) apresentam níveis de saúde
menores que as mulheres na área urbana (OR=0,93*1*1=0,93), ou mesmo, que os homens na
72
área rural (OR=1*0,96*1=0,96), indicando que em áreas urbanas o adulto do sexo masculino
tem piores níveis de saúde. Já os brancos apresentam níveis de saúde maiores do que os não
brancos, mas na área urbana (OR=0,93*1,02*1,17=1,11) estes níveis são ligeiramente
maiores que na área rural (OR=1*1,02*1=1,02).
Os adultos que residem em domicílios que possuem todos os bens básicos têm níveis
de saúde maiores do que aqueles que residem em domicílios sem pelo menos um dos bens
básicos. Entretanto, é na área urbana que os níveis de saúde dos adultos residentes em
domicílios com todos os bens são ligeiramente maiores (urbana: OR=0,93*1,02*1,17=1,11 e
rural: OR=1*1,02*1=1,02). Com relação aos adultos com pelo menos uma doença crônica,
observam-se menores níveis de saúde na área urbana (OR=0,93*0,33*0,83=0,25) do que na
área rural (OR=1*0,33*1=0,33).
Embora a variável qualidade da moradia (ambiente intradomiciliar) não tenha
apresentado significância estatística no ajuste do modelo multivariado, o percentual de
unidades adequadas quanto à qualidade da moradia no setor de localização do domicílio
(ambiente extradomiciliar) está fortemente associado com uma autopercepção positiva do
estado de saúde na área urbana (OR=0,93*0,98*1,40=1,28). Na área rural, este efeito não foi
significativo.
Entre os resultados do modelo multivariado 2 cabe destacar ainda que as variáveis
“faixa-etária”, “escolaridade”, “renda domiciliar mensal per capita” e “mobilidade física”
mantêm os gradientes com a chance de autopercepção do estado de saúde de adultos , mas não
as magnitudes dos efeitos (Tabela 2), quando comparados com os resultados dos modelos
univariados (Tabela 1).
73
5.1.4. DISCUSSÃO
Para a análise das diferenças no estado de saúde autorreferido dos indivíduos, os
estudos eram mais frequentemente conduzidos no campo da epidemiologia sob a ótica
reducionista levando em conta características individuais, em detrimento de características do
ambiente19; não predominando, portanto a chamada visão neomaterial20,4. O presente trabalho
considera um indicador de autopercepção de saúde como proxy da avaliações objetivas de
saúde8, e os resultados evidenciam a existência de associação entre este indicador e fatores do
ambiente intradomiciliar e extradomiciliar, além de fatores individuais. Apesar de sua
natureza subjetiva, o estado de saúde autorreferido tem sido apontado na literatura como um
preditor de alta validade da mortalidade, independentemente de fatores de riscos médicos,
comportamentais ou psicossociais21. Além de sua validade, vários estudos têm demonstrado
que a autopercepção de saúde é uma medida que apresenta boa confiabilidade8,9,10. Além
disso, segundo Nogueira4 a subjetividade não é uma limitação e sim um ponto forte deste
indicador, tendo em vista que o processo saúde-doença é um processo contínuo, relativo e
subjetivo, cuja percepção, cognição e interpretação variam no tempo e no espaço, em função
de fatores individuais e contextuais.
Independentemente da área de localização do domicílio, observou-se que os
indivíduos mais escolarizados apresentam melhores níveis de estado global de saúde, assim
como os indivíduos residentes em domicílios com maiores rendimentos per capita. As
associações das variáveis escolaridade e rendimento per capita com a autopercepção de saúde
(dicotomizada) também foram identificadas por Dachs e Santos13 e Kassouf22. A importância
da última variável na explicação das diferenças no estado de saúde autorreferido deve-se ao
fato do “rendimento, condicionando os indivíduos nas suas opções quotidianas – impondo ou
74
não, limitações à quantidade e à qualidade de bens possíveis de adquirir, e restringindo, ou
não, a mobilidade e a vida social – afeta a saúde física e mental”4.
A ocupação, considerada como um dos principais meios de acesso à renda e aos
serviços sociais básicos22, também está fortemente associada a melhores níveis de saúde. A
exclusão do indivíduo do mercado de trabalho, além de gerar privação material, pode levá-lo
a restrição de direitos, de segurança socioeconômica e de auto-estima23.
Considerando a região Centro-Oeste como referência, observa-se que a região Sudeste
é a região brasileira que concentra indivíduos que reportam melhores níveis de saúde. Os
indivíduos das regiões Norte e Nordeste reportaram piores estados de saúde do que os da
região Centro-oeste. Já a região Sul não apresentou efeito estatisticamente significante.
Kassouf22 também observou que, além da Região Sul, indivíduos da região Sudeste
apresentam um melhor estado de saúde do que os da região Nordeste, seguido da região
Norte.
Independente da área ser urbana ou rural, observou-se o efeito prejudicial do fumo na
saúde dos indivíduos, indicando que tanto os fumantes quanto os ex-fumantes avaliam piores
estados de saúde, comparativamente aos indivíduos que nunca fumaram. Por outro lado,
observa-se o efeito benéfico da prática de atividade física no estado geral de saúde, como
também verificado no estudo de Höfelmann e Blank14.
Indivíduos mais velhos reportaram piores níveis de estado de saúde, assim como os
indivíduos que reportaram maior grau de dificuldade na realização de determinadas atividades
do cotidiano. A mobilidade física prejudicada, definida como estado no qual a pessoa sofre
uma limitação no movimento físico independente e voluntário do corpo ou de uma ou mais
extremidades24, é um dos problemas que mais compromete a saúde das pessoas, sendo os
idosos considerados o grupo mais suscetível a desenvolvê-la, uma vez que durante o processo
de envelhecimento os idosos sofrem modificações importantes na capacidade motora25.
75
Quanto à consulta médica, observou-se também, independentemente da área de
localização do domicílio, uma relação negativa com a autoavaliação do estado de saúde,
indicando que adultos que consultaram médico nos últimos doze meses avaliam um pior
estado de saúde do que aqueles que não consultaram médico neste período. Tal resultado
parece estar condizente com a conclusão obtida por Kassouf22 de que indivíduos com
melhores níveis de saúde parecem reduzir a procura por atendimento à saúde.
Ainda em relação às características de saúde, conclui-se que indivíduos que possuem
plano de saúde, médico ou odontológico, particular, de empresa ou órgão público apresentam
melhores níveis de estado de saúde do que os indivíduos sem plano de saúde. Esse resultado
parece estar relacionado ao fato de que indivíduos portadores de plano de saúde possuem um
maior acesso e utilização a serviços de saúde22.
Com relação à modelagem estatística, é importante ressaltar que foram considerados os
pesos amostrais e as informações estruturais do plano amostral da PNAD 2008. Quando se
ignora estas informações, a análise efetuada a partir de dados de amostras complexas pode
produzir resultados incorretos tanto para as estimativas pontuais como para as medidas de
precisão e p-valores, que, por sua vez, pode comprometer o ajuste de modelos e a interpretação
dos resultados obtidos15,17, 26,27.
Um outro aspecto que merece destaque é a utilização do modelo logístico ordinal18,28, que
considerou a natureza policotômica ordinal do desfecho de saúde utilizado, sem dicotomizá-lo.
Além disso, considerou fatores individuais e ambientais (intradomiciliar e extradomiciliar) para
explicar as diferenças nos níveis de autopercepção de saúde, embora não se tenha considerado a
estrutura hierárquica dos dados, por meio de modelagem multinível29. Através da análise
multinível seria incorporado explicitamente os múltiplos níveis de informação (indivíduo,
domicílio, setor) no modelo, possibilitando explicar a contribuição de cada nível na variação do
desfecho estudado. Entretanto, isso introduziria uma complexidade ainda maior na análise devido
76
à necessidade de se incorporar ainda os diferentes aspectos do plano amostral da PNAD (estratos,
unidades primárias de amostragem e pesos amostrais)26.
No que se refere à qualidade do ajuste do modelo multivariado 2 (Tabela 2), observase que 42,0% da variação dos níveis de estado de saúde autorreferido (variável latente) é
explicada pelo modelo ajustado. Além do valor moderado para a medida de qualidade do
ajuste (pseudo R2 de Nagelkerke), observa-se também que o modelo prediz, com diferentes
graus de acurácia, os três níveis de estado de saúde considerados, sendo que a porcentagem de
previsões corretas é de 90,1% para o nível “bom/muito bom”; 50,3% para o nível “regular” e
de 6,6% para o nível “ruim/muito ruim”. Em termos globais, o modelo selecionado classifica
corretamente 75,1% dos adultos.
Uma das limitações deste estudo pode estar na própria definição políticoadministrativa de urbano-rural baseada em leis municipais como é no caso do Brasil30.
Segundo Endlich31 a falta de uma definição oficial mais criteriosa do que é cidade no Brasil
provoca grandes discussões a respeito de como distinguir os limites entre urbano e rural. Há
críticas quando a definição desses limites baseada apenas no conceito político-administrativo
utilizado pelo IBGE, não considerando assim outros critérios31,32. Devido a complexidade
relacionada ao tema, que vários critérios são apontados na literatura para definição de cidade,
entre os quais pode-se destacar o tamanho geográfico, densidade, aspectos formológicos,
atividades econômicas e modo de vida. Segundo Bernardelli32 os critérios usados para o
processo emancipatório dos municípios no passado e ainda presente hoje estão muitas vezes
meramente associados a interesses políticos e tributários, servindo para beneficiamento de
alguns grupos e partidos, bem como para atingir suas demandas. Esta autora acrescenta ainda
que muitas vezes municípios sem receitas próprias são emancipados, acarretando dificuldades
administrativas e não beneficiamento da população residente neste municípios.
77
Outra limitação deste estudo se refere à impossibilidade de se considerar outras variáveis
importantes, tais como variáveis de natureza nutricional33 e de poluição atmosférica34, por não
fazerem parte do escopo do suplemento da saúde da PNAD 2008.
Conclui-se que a área urbana parece influenciar negativamente o estado de saúde
autorreferido, uma vez que nestas áreas adultos com determinadas características (sexo
masculino; raça não branca; portador de pelo menos uma doença crônica; residente em
domicílios sem pelo menos um dos bens básicos; e residente em setores com menores
percentuais de domicílios adequados quanto à qualidade da moradia) reportam piores níveis
de estado de saúde.
78
5.1.5. AGRADECIMENTOS
Este artigo foi parcialmente financiado com recursos da FAPERJ – Nº dos processos:
E-26/100.682/2007 e E-26/101.506/2010.
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metodológicas e teóricas para cidade de São Paulo. In: Encontro da Associação
Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ambiente e Sociedade; 2004; São Paulo.
p.1-20.
81
5.2. ARTIGO 2
Efeito do plano amostral em modelo de regressão logística
ordinal: uma análise do estado de saúde autorreferido de adultos
no Brasil usando a PNAD 2008♦
♦
Artigo publicado nos Cadernos de Saúde Pública (CSP)
82
Resumo
Estudos que consideram variáveis individuais e ambientais para explicar as diferenças
no estado de saúde autorreferido de indivíduos vêm paulatinamente crescendo, mas ainda são
escassos. Por razões de tempo e custo, muitas pesquisas utilizam planos amostrais complexos
que envolvem aspectos (estratificação, conglomeração e pesos amostrais distintos) que
quando ignorados podem influenciar as medidas de razões de chance e as medidas de precisão
das estimativas dos parâmetros de modelos estatísticos. Usando a Pesquisa Nacional por
Amostra de Domicílios 2008, este artigo avalia o impacto nessas medidas quando não se
consideram alguns ou todos aspectos ao ajustar um modelo logístico ordinal para estabelecer a
associação entre o estado de saúde autorreferido de adultos e um conjunto de fatores
individuais e ambientais. Observou-se que quando não se considera os três aspectos
simultaneamente, ocorrem alterações nas magnitudes das medidas de razões de chance do
adulto autorreferir melhor estado de saúde associadas à maioria dos fatores, além de grande
subestimação dos erros padrões.
Palavras-chave: Estado de saúde autorreferido, modelo logístico ordinal, efeito do plano
amostral.
83
Abstract
The numbers of studies that take into consideration individual and environmental
variables to explain differences in individuals’ self-reported health status have gradually been
increasing, but such studies are still scarce. For time and cost reasons, many studies use
complex sampling plans involving features (stratification, clustering and different sampling
weights) that, when ignored, may influence odds ratio and accuracy measurements on
parameter estimates in statistical models. Using the National Household Sampling Survey
(PNAD) 2008, this paper assesses the impact on these measurements when some or all of
these features are not taken into account in fitting ordinal logistic models to establish
associations between adults’ self-reported health status and various individual and
environmental factors. It was seen that when these three features were not simultaneously
taken into account, there were changes to the magnitudes of the odds ratio measurements,
such that adults self-reported a better state of health in relation to most of the factors, along
with major underestimation of standard errors.
Key words: Self-reported health status, ordinal logistic model, effect of sampling plan.
84
5.2.1. INTRODUÇÃO
A inferência estatística clássica pressupõe que os dados amostrais sejam obtidos
usando amostragem aleatória simples com reposição, sendo considerados realizações de
variáveis aleatórias independentes e identicamente distribuídas. Entretanto, a maioria dos
inquéritos nacionais que levantam informações de saúde como, por exemplo, a Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD 2008 e a Pesquisa Nacional de Saúde do
Escolar – PNSE 2009 realizadas pelo Instituto Brasileiro de Estatística (IBGE) assim como a
Pesquisa Mundial de Saúde – PMS 2003 realizada pela Organização Pan-Americana de Saúde
(OPS), utilizam planos de amostragem complexa. A PNAD, por exemplo, apresenta todas as
características de um plano amostral complexo, como estratificação, conglomeração e
probabilidades desiguais de seleção, além de ajustes dos pesos amostrais para calibração com
totais conhecidos da população1. Os pesos ajustados (ou calibrados) correspondem ao produto
dos pesos naturais do desenho (inversos das probabilidades de seleção em cada estágio) e um
fator de ajuste calculado pela razão entre os totais populacionais estimados e conhecidos (ou
projetados).
A análise estatística de dados de inquéritos amostrais complexos pode ser realizada
tanto com fins descritivos ou analíticos usando diferentes pacotes estatísticos (SAS,
SUDAAN, STATA, R etc.), cuja escolha depende basicamente se o pacote opera num
ambiente computacional familiar ao analista e se contêm as técnicas estatísticas necessárias
para executar a análise de interesse1. Cabe ressaltar ainda que para efetuar a análise de dados
provenientes de inquéritos amostrais complexos é preciso incorporar as informações do plano
amostral da pesquisa, informando os pesos das unidades da amostra e as informações
estruturais da pesquisa, identificando o estrato e pelo menos as unidades primárias de
amostragem. Segundo Pessoa e Silva1 e Szwarcwald2 as estimativas pontuais são
85
influenciadas por pesos distintos associados às unidades da amostra, enquanto as estimativas
de variância são influenciadas pela estratificação, conglomeração e pesos amostrais.
Segundo Caiaffa et al.3, o conceito de saúde deve considerar o cotidiano dos
indivíduos vivendo nas cidades e as relações de interdependência que existem entre o
indivíduo e o meio físico e social onde ele vive. Estudos que consideram variáveis individuais
e contextuais do local de moradia para explicar as diferenças no estado de saúde autorreferido
de indivíduos vêm paulatinamente crescendo no Brasil, mas ainda são escassos4.
Apesar do estado de saúde autorreferido, frequentemente levantado em diferentes
pesquisas amostrais, ser um indicador de natureza subjetiva é considerado uma proxy das
avaliações objetivas de saúde5 e um preditor de alta validade e sensibilidade da morbidade e
mortalidade6,7. Embora seja um indicador policotômico ordinal, em muitas análises o estado
de saúde autorreferido é geralmente dicotomizado8,9,10,11. Além disso, há estudos que ainda
não explicitam ou não consideram o uso de todas as informações do desenho amostral
(estrato, UPA e pesos amostrais) no ajuste do modelo estatístico adotado11,12.
Usando os dados da PNAD13,14 2008 este artigo tem como objetivo fazer uma análise
comparativa entre as medidas de associação (Odds Ratio - OR), os erros padrão associados as
estimativas pontuais dos parâmetros do modelo e a significância estatística dessas estimativas
obtidas a partir do ajuste de um modelo logístico ordinal, cujo propósito é estabelecer
associação entre a autoavaliação do estado de saúde de adultos no Brasil e a área de
localização dos domicílios em que residem (urbana e rural), sob três formas de ajuste: 1) pelo
método de Máxima Pseudo-Verossimilhança (MPV) considerando os pesos amostrais e as
informações estruturais do plano amostral: essa forma de ajuste se refere a uma situação
adequada de modelagem na qual o pesquisador reconhece os aspectos de complexidade do
plano amostral da PNAD, como estratificação, conglomeração e probabilidades desiguais de
seleção e os incorpora no ajuste do modelo 2) pelo método de Máxima Verossimilhança (MV)
86
considerando os pesos amostrais e desconsiderando as informações estruturais do plano
amostral: essa forma de ajuste representa uma situação inadequada de modelagem na qual o
pesquisador ignora ou negligência que a amostra é complexa, levando em conta apenas as
ponderações associadas as unidades da amostra da PNAD; e 3) pelo método de Máxima
Verossimilhança (MV) desconsiderando os pesos amostrais e as informações estruturais do
plano amostral: essa forma de ajuste também indica uma situação inadequada de modelagem
na qual o pesquisador pressupõe que a amostra da PNAD é uma amostra aleatória simples
com reposição, situação na qual não existiria estratificação e conglomeração das unidades e os
pesos seriam considerados constantes, e portanto desnecessários.
5.2.2. MATERIAL E MÉTODOS
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) é um inquérito amostral de
abrangência nacional, realizado pelo IBGE, que em 2008 coletou informações de uma
amostra probabilística de 150.591 domicílios e 391.868 pessoas. A partir da amostra da
PNAD é possível obter estimativas representativas para o Brasil, Grandes Regiões, Unidades
da Federação e nove Regiões Metropolitanas (Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo
Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba e Porto Alegre). Embora a PNAD tenha como
finalidade básica produzir informações para o estudo do desenvolvimento socioeconômico do
País, a PNAD 2008 através de seu suplemento levantou ainda uma série de características de
saúde sobre a população brasileira que compreendem: a autoavaliação do estado global de
saúde, a morbidade autorreferida, a mobilidade física autorreferida e a necessidade de
cuidados médicos e utilização de serviços.
87
No que se refere ao seu planejamento amostral, a PNAD é um estudo seccional (ou
transversal) que utiliza um plano amostral complexo13,14 que envolve estratificação,
conglomeração, com probabilidades desiguais de seleção que resultam em pesos amostrais
distintos para as unidades amostrais.
População de estudo
A população de estudo trata-se de um domínio de estimação composto por adultos de
20 anos ou mais de idade que residem em domicílios particulares permanentes (DPP),
correspondendo à 162.213 registros na amostra da PNAD. Foram consideradas na análise
apenas os indivíduos que informaram seu próprio estado global de saúde, por entender que
informações prestadas por terceiros (outras pessoas moradoras do domicílio, ou ainda outras
pessoas não moradoras do domicílio) aumentaria a chance de ocorrer viés de informação ou
classificação do desfecho de saúde utilizado neste artigo. Do total de adultos residentes em
DPP, 37,2% tiveram seu estado de saúde informado por terceiros.
Modelagem Estatística
Modelos de regressão ordinal15,16 são utilizados quando o desfecho do modelo é
policotômico ordinal e as variáveis explicativas numéricas ou categóricas. Neste artigo, foi
ajustado um modelo de regressão logística ordinal, utilizando como desfecho do modelo a
autoavaliação do estado de saúde com três níveis: muito bom/bom, regular, ruim/muito ruim.
A autoavaliação de saúde é um indicador obtido no nível individual que tem sido
amplamente utilizada em pesquisas que visam estabelecer o estado de saúde do indivíduo, por
ser de fácil mensuração e por permitir comparações internacionais17. A principal vantagem
deste indicador é a sua forte associação com o estado real de saúde dos indivíduos, indicando
que a autoavaliação da saúde pode ser utilizada como uma proxy das avaliações objetivas de
88
saúde5. Além disso, a subjetividade não é uma limitação e sim um ponto forte deste indicador,
tendo em vista que o processo saúde-doença é um processo contínuo, relativo e subjetivo, cuja
percepção, cognição e interpretação variam no tempo e no espaço, em função de fatores
individuais e contextuais18.
Com o objetivo de estabelecer a associação entre a área de localização do domicílio
(urbana e rural) e o desfecho de autoavaliação do estado geral de saúde do indivíduo, utilizou
como controle um conjunto de dezoito variáveis demográficas, socioeconômicas,
comportamentais e de saúde que retratam características individuais e do ambiente
intradomiciliar (domicílio) e extradomiciliar (setor): 1) sexo, 2) faixa etária, 3) cor/raça, 4)
escolaridade, 5) situação de ocupação, 6) atividade física, 7) fumo, 8) morbidade
autorreferida, 9) mobilidade física, 10) posse de plano de saúde, 11) consulta médica nos
últimos doze meses, 12) domicílio cadastrado no Programa de Saúde da Família (PSF),
13) qualidade de moradia, 14) posse de bens básicos no domicílio, 15) condição de ocupação
do domicílio, 16) renda domiciliar mensal per capita, 17) região de residência e
18) proporção de domicílios considerados adequados no setor (vizinhança) quanto aos
serviços sociais básicos (água, esgoto, lixo e luz), às densidades habitacionais e aos padrões
construtivos das moradias (material usado nas paredes e telhado).
No ajuste do modelo de regressão logística ordinal incorporando o plano amostral da
pesquisa, foi utilizado o método de MPV descrito em Pessoa e Silva1 através do módulo
Complex Samples do pacote estatístico SPSS for Windows, versão 17.0. No ajuste do modelo
multivariado foram testados (teste de Wald) primeiramente todos os efeitos principais das
variáveis explicativas (18 variáveis de controle e área de localização do domicílio), a partir do
qual se excluiu aquelas variáveis de controle que não apresentavam efeito estatisticamente
significativo. Num segundo momento, foram adicionados e testados separadamente os efeitos
de interação (duplas) entre cada uma das variáveis de controle selecionadas e a área de
89
localização do domicílio (variável de interesse). Num terceiro momento, foi ajustado um
modelo incluindo simultaneamente além da área de localização do domicílio, as variáveis de
controle selecionadas e as variáveis de interação que apresentaram efeitos significativos.
A representação geral do modelo selecionado pelo método de MPV se encontra na
equação abaixo:
logit [P(Yk ≤ m )] = τ m - (αa + βb + γc + δd +ϖ e + ξ f + φg + ηh +ψ i + λ j + φl + ς o + π p + ρ q + ϑr + θ X k +
+ ( αγ )ac + ( αϖ )ae + ( αφ )al + ( απ )ar + (αθ )a X k )
m=1,..., M-1 e k = 1,2, ..., nabcdefghijlopqr , onde:
Yk é a autoavaliação do estado de saúde do k-ésimo adulto com M=3 categorias. A
autoavaliação do estado de saúde (desfecho observado) do k-ésimo indivíduo associa-se com
a variável latente não observável contínua ( Yk* ) da seguinte forma, como mostrado abaixo:
Yk* < γ 1
1 → (muito ruim ou ruim) se

Yk = 2 →
(regular )
se γ 1 ≤ Yk* < γ 2
3 → (muito bom ou bom) se Y * ≥ γ
k
2

Os valores γ1, e γ2, denominados pontos de corte, são estritamente crescentes, isto é, γ1
< γ2. Estes pontos de corte permitem que as probabilidades do desfecho em cada classe
difiram entre si.
αa
é o efeito principal do a-ésimo nível do fator área de localização do domicílo; a=1,2
βb
é efeito principal do b-ésimo nível do fator região de residência; b=1,2,3,4,5
γc
é efeito principal do c-ésimo nível do fator sexo; c=1,2
δd
é efeito principal do d-ésimo nível do fator faixa etária ; d=1,2,3,4,5
ϖe
é efeito principal do e-ésimo nível do fator cor/raça; e=1,2
ξf
é efeito principal do f-ésimo nível do fator escolaridade; f=1,2,3,4,5
90
ϕg
é efeito principal do g-ésimo nível do fator renda domiciliar mensal per capita; g=1,2,3,4
ηh
é efeito principal do h-ésimo nível do fator situação de ocupação; h=1,2
ψi
é efeito principal do i-ésimo nível do fator atividade física ; i=1,2,3
λj
é efeito principal do j-ésimo nível do fator fumo; j=1,2,3,4
φl
é efeito principal do l-ésimo nível do fator morbidade autorreferida ; l=1,2
ςo
é efeito principal do o-ésimo nível do fator mobilidade física autorreferida; o=1,2,3,4
πp
é efeito principal do p-ésimo nível do fator posse de plano de saúde; p=1,2
ρq
é efeito principal do q-ésimo nível do fator consulta ao médico; q=1,2
ϑr
é efeito principal do r-ésimo nível do fator posse de bens básicos; r=1,2
θ
é o quanto varia o logito ao aumentar em uma unidade o percentual de domicílios adequados
quanto a qualidade da moradia no setor.
Xk
é o percentual de domicílios adequados quanto a qualidade da moradia no setor em que
reside o k-ésimo indivíduo.
(αγ )ac
é o efeito de interação entre o a-ésimo nível do fator área de localização do domicílio e o
c-ésimo nível do fator sexo.
(αϖ )ae é o efeito de interação entre o a-ésimo nível do fator área de localização do domicílio e o
e-ésimo nível do fator cor/raça.
(αφ )al é o efeito de interação entre o a-ésimo nível do fator área de localização do domicílio e o
l-ésimo nível do fator morbidade autorreferida.
(αϑ )ar é o efeito de interação entre o a-ésimo nível do fator área de localização do domicílio e o
r-ésimo nível do fator posse de bens básicos.
(αθ )a é o efeito de interação referente a variável percentual de domicílios adequados quanto a
qualidade da moradia no setor e devido ao a-ésimo nível do fator área de localização do domicílio.
91
5.2.3. RESULTADOS
Ao ajustar o modelo logístico ordinal considerando apenas os efeitos principais das
variáveis explicativas, observou-se que as variáveis condição de ocupação do domicílio,
qualidade da moradia e PSF não apresentaram efeito estatisticamente significativo.
Ao adicionar separadamente no modelo as interações entre cada uma das variáveis de
controle selecionadas (15 variáveis) e a área de localização do domicílio (variável de
interesse), observou-se que seis interações apresentaram efeito estatisticamente significativo:
área*sexo, área*cor, área*morbidade autorreferida, área*plano de saúde, área*posse de
bens básicos e área*percentual de domicílios adequados quanto à qualidade da moradia. Em
seguida, foi ajustado um modelo incluindo além da área de localização do domicílio, as
quinze variáveis de controle e as seis variáveis de interação mencionadas, mas a partir desse
ajuste observou-se que a interação entre a área de localização do domicílio e o plano de saúde
deixou de apresentar efeito significativo, sendo excluído do modelo.
Os resultados do ajuste do modelo (modelo selecionado) pelo método de MPV
considerando todas as informações do plano amostral são apresentados na tabela 1.
92
Tabela 1: Modelo logístico ordinal ajustado por MPV considerando todas as informações do
plano amostral.
Características (variáveis)
Modelo 1 ajustado por MPV considerando os pesos
amostrais e as informações estruturais do plano amostral
ORMPV
EPMPV
p-valor
0,93
1
0,059
-
0,226
-
0,75
0,78
1,10
0,99
1
0,051
0,032
0,032
0,039
-
< 0,001
< 0,001
0,003
0,819
-
0,96
1
0,033
-
0,187
-
1,42
1,20
0,029
0,024
< 0,001
< 0,001
0,96
0,84
1
0,023
0,022
-
0,101
< 0,001
-
Cor/raça
Branca
Não branca
1,02
1
0,039
-
0,618
-
Escolaridade
Sem instrução ou menos de 1 ano
1 a 7 anos
0,46
0,48
0,042
0,037
< 0,001
< 0,001
0,70
1
0,47
0,036
0,167
< 0,001
< 0,001
Renda domiciliar mensal per capita
Sem renda ou até 1 salário mínimo
0,53
0,046
< 0,001
Mais de 1 a 5 salários mínimos
Mais de 5 salários mínimos
Sem declaração
0,71
1
0,69
0,044
0,064
< 0,001
< 0,001
Situação de ocupação
Ocupada
Não ocupada
1,19
1
0,017
-
< 0,001
-
Atividade física
Pratica
Não pratica
Sem declaração
1,36
1
0,50
0,019
0,050
< 0,001
< 0,001
0,86
0,88
1
0,95
0,021
0,019
0,020
< 0,001
< 0,001
0,009
0,33
1
0,037
-
< 0,001
-
Área de localização do domicílio
Urbano
Rural
Região de residência
Norte
Nordeste
Sudeste
Sul
Centro-oeste
Sexo
Masculino
Feminino
Faixa etária
20 a 29 anos
30 a 39 anos
40 a 49 anos
50 a 59 anos
60 anos ou +
8 a 14 anos
15 anos ou +
Sem declaração
Fumo
Fumante
Ex-fumante
Nunca fumou
Sem declaração
Morbidade autorreferida
Pelo menos uma doença crônica
Nenhuma doença crônica
93
Mobilidade física autorreferida
Muita limitação
Limitação
Pouca limitação
Sem limitação
Posse de plano de saúde
Sim
0,13
0,031
< 0,001
0,18
0,42
1
0,023
0,021
-
< 0,001
< 0,001
-
1,31
0,021
< 0,001
Não
Consulta médica
Sim
Não
1
-
-
0,55
1
0,020
-
< 0,001
-
Posse de bens básicos
Tem todos os quatro bens básicos
1,02
0,039
0,540
1
-
% domicílios adequados
0,98
0,116
0,864
Área*Sexo
Urbana * Masculino
0,86
0,035
< 0,001
1,17
0,042
< 0,001
0,83
0,041
< 0,001
1,17
0,044
< 0,001
1,40
0,119
0,005
Não tem pelo menos um bem básico
Área*Cor/raça
Urbana * Branca
Área*Morbidade autorreferida
Urbana * Pelo menos uma doença
Área*Posse de bens básicos
Urbana * Todos os bens
Área*%domicílios adequados
Urbana * %domicílios adequados
-
Nota: Modelo 1: γ1=-5,961 e γ2=-3,152
Ao comparar os resultados do modelo de regressão logística ordinal ajustado pelo
método de MPV considerando todas as informações do plano amostral (Tabela 1) com os
resultados do ajuste deste mesmo modelo pelo método de MV considerando as pesos
amostrais e ignorando as informações estruturais do plano amostral (estrato e UPA), observase (Tabela 2) que as medidas de razão de chance não sofrem qualquer alteração, uma vez que
as estimativas pontuais dos parâmetros do modelo (efeitos principais e de interação) são
influenciadas apenas pelos pesos amostrais. Entretanto, ao desconsiderar as informações
estruturais do ajuste todas as estimativas dos erros padrão dos estimadores dos parâmetros do
modelo ficam subestimadas, dando uma falsa idéia de que as estimativas pontuais obtidas são
mais precisas do que na realidade elas são, resultando em p-valores menores.
Ao observar, por exemplo, a interação entre as variáveis “área de localização do
domicílio” e “sexo”, conclui-se que tanto no ajuste do modelo por MPV quanto por MV2,
94
mulheres residentes em DPP localizados na área rural possuem uma chance 7,5%
(1/OR=1/(0,93*1*1)=1/0,93=1,075) maior de reportarem melhores estados de saúde do que
mulheres residentes em DPP na área urbana. Todavia, no modelo ajustado por MV2, essa
associação é considerada estatisticamente significante ao nível de 10%, enquanto que no
modelo ajustado por MPV tal associação não apresenta significância estatística.
Ao ajustar o modelo (modelo 3) de regressão logística ordinal pelo método de MV3
desconsiderando os pesos amostrais e as informações estruturais do plano amostral (estrato e
UPA) (Tabela 2), observa-se, para quase todos os fatores, que as medidas de razão de chance
sofrem alterações. Embora de modo geral o sentido das associações se mantenham, a
magnitude dessas associações é de extrema importância, inclusive na análise das interações
entre as variáveis. Além disso, é possível observar que os erros padrão dos estimadores dos
parâmetros do modelo ficam bem subestimados. Ainda considerando, para fins de
exemplificação, a interação entre as variáveis “área de localização do domicílio” e “sexo”,
observa-se que quando o modelo é ajustado por MV3, mulheres que moram em DPP
localizados na área rural têm 12,4% (1/OR=1/(0,89*1*1)=1/0,89=1,124) de chance de
reportarem melhores estados de saúde, comparativamente às mulheres residentes em DPP na
área urbana. Tal associação é mais forte, além de ser estatisticamente significante ao nível de
1% (OR=1,124; p-valor=0,002), do que a associação encontrada ao ajustar o modelo por
MPV (OR=1,075; p-valor=0,226).
Quando se ajusta o modelo por MV3, apesar das estimativas pontuais dos efeitos
principais e de interação sofram aparentemente pequenas modificações, as medidas de
associação calculadas para efetuar a análise das interações entre determinados níveis de
variáveis podem ser bem distintas. Por exemplo, no modelo ajustado por MPV, adultos
brancos que residem em DPP localizados na área urbana possuem uma chance 11,0%
(OR=0,93*1,02*1,17=1,110) maior de autorreferirem melhores níveis de saúde do que
95
adultos não brancos residentes em DPP na área rural. Enquanto, que no modelo ajustado por
MV3, a medida de razão de chance obtida na comparação desses mesmos grupos é de apenas
5,7% (OR=0,89*0,99*1,20=1,057).
Tabela 2: Modelos logísticos ordinais ajustados por MV considerando apenas os pesos
amostrais, e por MV desconsiderando os pesos amostrais e as informações estruturais do
plano amostral.
Características (variáveis)
Modelo 2 ajustado por MV
considerando apenas os
pesos amostrais
EPMV2
*ORMV2
Área de localização do domicílio
Urbano
Rural
Região de residência
Norte
Nordeste
Sudeste
Sul
Centro-oeste
Sexo
Masculino
Feminino
Faixa etária
20 a 29 anos
30 a 39 anos
40 a 49 anos
50 a 59 anos
60 anos ou +
Cor/raça
Branca
Não branca
Escolaridade
Sem instrução ou menos de 1 ano
1 a 7 anos
8 a 14 anos
15 anos ou +
Sem declaração
Renda domiciliar mensal per capita
S/ renda ou até 1 salário mínimo
Mais de 1 a 5 salários mínimos
Mais de 5 salários mínimos
Sem declaração
Situação de ocupação
Ocupada
Não ocupada
EPMPV
EPMV2 p-valor
Modelo 3 ajustado
desconsiderando os
pesos amostrais e as
informações estruturais
do plano amostral
OR MPV
EPMPV
OR MV3
EPMV3
ORMV3 EPMV3 p-valor
0,93
1
0,039
-
0,065
-
1,51
-
0,89
1
0,038
-
0,002
-
1,04
-
1,55
-
0,75
0,78
1,10
0,99
1
0,032
0,026
0,026
0,029
-
< 0,001
< 0,001
< 0,001
0,761
-
1,59
1,23
1,23
1,34
-
0,78
0,80
1,12
1,06
1
0,026
0,022
0,023
0,026
-
< 0,001
< 0,001
< 0,001
0,020
-
0,96
0,98
0,98
0,93
-
1,96
1,45
1,39
1,50
-
0,96
1
0,029
-
0,135
-
1,14
-
0,94
1
0,029
-
0,048
-
1,02
-
1,14
-
1,42
1,20
0,96
0,84
1
0,025
0,023
0,02
0,019
-
< 0,001
< 0,001
0,069
< 0,001
-
1,16
1,04
1,15
1,16
-
1,40
1,19
0,97
0,84
1
0,025
0,022
0,021
0,02
-
< 0,001
< 0,001
0,135
< 0,001
-
1,01
1,01
0,99
1
-
1,19
1,09
1,10
1,10
-
1,02
1
0,03
-
0,518
-
1,30
-
0,99
1
0,03
-
0,836
-
1,03
-
1,30
-
0,46
0,48
0,70
1
0,47
0,037
0,034
0,033
0,154
< 0,001
< 0,001
< 0,001
< 0,001
1,14
1,09
1,09
1,08
0,45
0,47
0,68
1
0,50
0,037
0,034
0,032
0,147
< 0,001
< 0,001
< 0,001
< 0,001
1,02
1,02
1,03
0,94
1,14
1,09
1,13
1,14
0,53
0,71
1
0,69
0,04
0,039
0,053
< 0,001
< 0,001
< 0,001
1,15
1,13
1,21
0,54
0,71
1
0,68
0,04
0,038
0,053
< 0,001
< 0,001
< 0,001
0,98
1
1,01
1,15
1,16
1,21
1,19
1
0,014
-
< 0,001
-
1,21
-
1,17
1
0,014
-
< 0,001
-
1,02
-
1,21
-
96
Atividade física
Pratica
Não pratica
Sem declaração
Fumo
Fumante
Ex-fumante
Nunca fumou
Sem declaração
Morbidade autorreferida
Pelo menos uma doença crônica
Nenhuma doença crônica
Mobilidade física
Muita limitação
Limitação
Pouca limitação
Sem limitação
Posse de plano de saúde
Sim
Não
Consulta ao médico
Sim
Não
Posse de bens básicos
Tem todos os quatro bens básicos
Não tem ao menos um bem básico
% domicílios adequados
Área*Sexo
Urbana * Masculino
Área*Cor/raça
Urbana * Branca
Área*Morbidade autorreferida
Urbana * Pelo menos uma doença
Área*Posse de bens básicos
Urbana * Todos os bens
Área*%domicílios adequados
Urbana * %domicílios adequados
1,36
1
0,50
0,017
0,037
< 0,001
< 0,001
1,12
1,35
1,36
1
0,52
0,016
0,037
< 0,001
< 0,001
1
0,96
1,19
1,35
0,86
0,88
1
0,95
0,018
0,017
0,018
< 0,001
< 0,001
0,004
1,17
1,12
1,11
0,85
0,87
1
0,95
0,018
0,017
0,018
< 0,001
< 0,001
0,008
1,01
1,01
1
1,17
1,12
1,11
0,33
1
0,029
-
< 0,001
-
1,28
-
0,33
1
0,03
-
< 0,001
-
1
-
1,23
-
0,13
0,18
0,42
1
0,025
0,018
0,017
-
< 0,001
< 0,001
< 0,001
-
1,24
1,28
1,24
-
0,14
0,19
0,42
1
0,025
0,018
0,017
-
< 0,001
< 0,001
< 0,001
-
0,93
0,95
1
-
1,24
1,28
1,24
-
1,31
1
0,017
-
< 0,001
-
1,24
-
1,33
1
0,018
-
< 0,001
-
0,98
-
1,17
-
0,55
1
0,017
-
< 0,001
-
1,18
-
0,56
1
0,016
-
< 0,001
-
0,98
-
1,25
-
1,02
1
0,98
0,03
0,081
0,431
0,806
1,30
1,43
1,02
1
0,96
0,03
0,085
0,416
0,639
1
1,02
1,30
1,36
0,86
0,032
< 0,001
1,09
0,89
0,032
0,001
0,97
1,09
1,17
0,033
< 0,001
1,27
1,20
0,033
< 0,001
0,98
1,27
0,83
0,032
< 0,001
1,28
0,86
0,032
< 0,001
0,97
1,28
1,17
0,035
< 0,001
1,26
1,18
0,035
< 0,001
0,99
1,26
1,40
0,084
< 0,001
1,42
1,38
0,087
< 0,001
1,01
1,37
Nota: * As razões de chances são iguais as obtidas no ajuste do modelo 1 por MPV.
Modelo 2: γ1=-5,961 e γ2=-3,152 e Modelo 3: γ1=-5,971 e γ2=-3,158
97
5.2.4. DISCUSSÃO
Os resultados encontrados neste artigo indicam o grande impacto de não se considerar
simultaneamente as três informações do plano amostral (peso, estrato e UPA) da PNAD ao
ajustar um modelo de regressão logística ordinal para estabelecer a associação entre a área de
localização do domicílio (urbana, rural) e o estado de saúde autorreferido de adultos no Brasil,
considerando um conjunto de variáveis individuais e contextuais. Este impacto é traduzido
por alterações nas magnitudes das medidas de razões de chance (odds ratio) associadas à
quase totalidade dos fatores considerados e na grande subestimação das medidas de precisão
(erros padrão dos estimadores dos parâmetros do modelo).
Neste artigo também se verificou que mesmo ajustando o modelo por MV informando
as ponderações referentes aos adultos da amostra (modelo 2), sem contudo considerar as
informações estruturais do plano amostral da PNAD, a subestimação dos erros padrão
continua expressiva apesar das medidas de associações (odds ratio) estarem corretas, isto é,
serem equivalentes as obtidas ao ajustar o modelo pelo método de MPV.
Outros estudos foram realizados com o intuito de avaliar o impacto do plano amostral
no ajuste de diferentes modelos estatísticos usando dados de pesquisas amostrais complexas,
entre eles pode-se citar o trabalho de Leite19 em que foi ajustado um modelo multinomial
logístico usando os dados da PNAD 1999 e o de Pessoa e Silva1 que ajustaram um modelo
logístico binário com os dados da PNAD 1990. O presente artigo também identificou a
necessidade de consideração do planejamento amostral na análise de dados com fins
analíticos, mas no contexto de ajuste de um modelo de regressão logística ordinal usando os
dados da PNAD 2008. As diferenças observadas nas magnitudes das razões de chance
(modelo 3) quanto nos erros padrão dos estimadores (modelos 2 e 3) revelam a importância de
se considerar todas as informações do plano amostral (pesos amostrais e informações
98
estruturais) na análise de dados epidemiológicos. Caso contrário, pode comprometer a análise
de confundimento e de interação entre as variáveis de extrema importância no campo da
Epidemiologia, que por sua vez pode comprometer as conclusões do estudo.
Este estudo apresenta limitação com relação ao processo de calibração dos pesos.
Embora o processo de calibração adicione uma nova fonte de incerteza nas estimativas, neste
artigo foram consideradas apenas duas fontes de incerteza: o modelo de superpopulação e o
plano amostral adotado para a seleção da amostra da PNAD. No presente artigo foi utilizado o
método de Máxima Pseudo-Verossimilhança (MPV), que se baseia na modelagem de
superpopulação, para o ajuste de modelo estatístico que leva em conta estratificação,
conglomeração e pesos calibrados que são os pesos gravados no banco de dados da PNAD.
Segundo Silva et al14 este método proporciona estimativas consistentes para a amostra
completa da PNAD ou mesmo no caso de domínios de estudo com tamanhos amostrais
suficientemente grandes.
Devido à estrutura hierárquica bem definida dos dados da PNAD, onde os indivíduos
estão agrupados em unidades domiciliares, que por sua vez estão grupadas em setores
censitários, poderia ser realizado um estudo futuro usando modelo multinível20 (ou
hierárquico) visando a avaliar, por exemplo, o impacto de se ignorar tal estrutura nas
estimativas pontuais (ou medidas de razões de chance) dos parâmetros do modelo e de suas
medidas de precisão. Entretanto, cabe mencionar a maior dificuldade envolvida no ajuste
desse tipo de modelo usando grandes bases de dados oriundos de amostragem complexa como
a PNAD, devido a necessidade de incorporação não só das informações típicas do desenho
amostral da pesquisa (estrato, UPA e peso amostral), mas também da estrutura hierárquica dos
dados21.
99
5.2.5. AGRADECIMENTOS
Este artigo foi parcialmente financiado com recursos da FAPERJ – Nº dos processos:
E-26/100.682/2007 e E-26/101.506/2010.
5.2.6. BIBLIOGRAFIA
1. Pessoa DGC e Silva PL. Análise de dados amostrais complexos. São Paulo: ABE,
1998.
2. Szwarcwald, CL e Damacena GN. Amostras complexas em inquéritos populacionais:
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3. Caiaffa WT, Ferreira FR, Ferreira AD, Oliveira CDL, Camargos VP, Proietti FA.
Saúde urbana: “a cidade e uma estranha senhora, que hoje sorri e amanhã te devora”.
Cienc. Saude Colet 2008;13(6): 1785-1786.
4. SANTOS, S. M. et al. Associação entre fatores contextuais e auto-avaliação de saúde:
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5. Camargos MCS, Rodrigues RN, Machado CJ. Expectativa de vida saudável para
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9. Hofelmann DA, Blank N. Auto-avaliação de saúde entre trabalhadores de uma
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10. Peres et al., Auto-avaliação da saúde em adultos no Sul do Brasil. Rev Saúde Pública
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12. Romero M., D. E e Sousa Jr., PRB. Determinantes da auto-avaliação da saúde entre
adultos e idosos: Uma perspectiva de gênero da inter-relação com as doenças crônicas
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100
Nacional de Estudos Populacionais – ABEP, realizado em Caxambú, MG – Brasil, de
20- 24 de Setembro de 2004.
13. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pesquisa Nacional por Amostra
de Domicílios 2008 – Notas Metodológicas: pesquisa básica, pesquisa especial de
tabagismo e pesquisas suplementares de saúde e acesso à internet e posse de telefone
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14. Silva PLDN, Pessoa DGC, Lila MF. Análise Estatística de Dados da PNAD:
Incorporando a Estrutura do Plano Amostral. Ciência e Saúde Coletiva 2002; 7(4),
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15. Abreu MNS; Siqueira AL e Caiaffa WT. Regressão logística ordinal em estudos
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16. Marôco J. Análise Estatística com o PASW Statistics (ex-SPSS). Pêro Pinheiro:
ReportNumber, 2010.
17. Theme Filha MM; Szwarcwald CL e Souza Junior PRB.. Medidas de morbidade
referida e inter-relações com dimensões de saúde. Rev. Saúde Pública, São Paulo, v.
42, n. 1, Feb. 2008.
18. Nogueira H. Os Lugares e a Saúde. Coimbra; 2008.
19. Leite PGPG. Análise da situação ocupacional de crianças e adolescentes nas regiões
Sudeste e Nordeste do Brasil utilizando informações da PNAD 1999. Escola Nacional
de Ciências Estatísticas, dissertação de mestrado em Estudos Populacionais e
Pesquisas Sociais. Rio de Janeiro, 2001.
20. Diez-roux AV. Bringing context back into epidemiology: Variables and fallacies in
multilevel Analysis. American Journal of Public Health 1998; 88 (2):216.
21. Thomas SL e Hech RH. Analysis of large-scale secondary data in higher education
research: Potential Perils Associated with Complex Sampling Designs. Research in
Higher Education, Vol. 42, No. 5, 2001.
101
5.3. ARTIGO 3
Autoavaliação de saúde e sua relação com a situação censitária:
uma análise do efeito do uso das escalas ordinal e binária, segundo
os dados da PNAD 2008
102
Resumo
A realização de estudos que fazem uso de indicadores de natureza subjetiva para a
mensuração da saúde, frequentemente levantados em pesquisas de base populacional, vem
crescendo no Brasil, em especial a autoavaliação de saúde global do indivíduo. Apesar de ser
originalmente obtida em escala ordinal, a autoavaliação de saúde é frequentemente reduzida a
um indicador dicotômico e em diferentes estudos essa redução é feita sem maiores
justificativas podendo acarretar perda de informação e decréscimo de poder estatístico. Além
disso, a escolha arbitrária do ponto de corte para dicotomizar a autoavaliação de saúde pode
influenciar diretamente os resultados das medidas de associação.
Este artigo compara a associação entre a situação censitária (urbana vs rural) e o
desfecho de autoavaliação de saúde de adultos no Brasil considerando os casos em que este
desfecho é expresso em escala ordinal (três e cinco categorias) e binária usando os dados da
PNAD 2008. Para as diferentes escalas de autoavaliação de saúde verificaram-se semelhanças
no sentido, magnitude e significância estatística da associação entre a área censitária e a
chance (acumulada) de melhor autoavaliação de saúde tanto na análise bruta quanto na análise
multivariada. Apesar da escala não influenciar nesta associação, observou-se na análise
multivariada que a diferença de escala influencia na seleção do modelo, isto é, três variáveis
de controle (condição de ocupação do domicílio, qualidade da moradia e PSF) foram
excluídas do modelo logístico ordinal usando uma escala de autoavaliação de saúde com três
ou cinco categorias, enquanto que apenas as duas primeiras foram excluídas do modelo
logístico binário. Todavia, essa diferença pode ser devida ao não atendimento da hipótese de
homogeneidade das inclinações para algumas das variáveis de controle em especial para
variável PSF. Nesse sentido, o modelo de chances proporcionais parciais pode ser uma
alternativa de modelo logístico ordinal mais adequada que o modelo de chances proporcionais
e que o modelo logístico binário.
Palavras-chave: Autoavaliação de saúde, situação censitária, escala binária, escala ordinal,
modelo de chances proporcionais, modelo logístico binário.
103
Abstract
Studies using indicators of subjective nature for measuring health, which is often done
in population-based surveys, are being increasingly conducted in Brazil, especially with
regard to individuals’ overall self-assessed health. Although originally obtained on an ordinal
scale, self-assessed health is frequently reduced to a dichotomous indicator. In many studies,
this reduction is done without much justification and may lead to loss of information and
decreased statistical power. Moreover, the arbitrary choice of cutoff point for dichotomizing
self-assessed health may directly influence the association measurement results.
This paper compares the association between census tract location (urban vs rural) and
the outcome of self-assessed health among adults in Brazil, considering cases in which this
outcome is expressed on an ordinal scale (three and five categories) and on a binary scale,
using the PNAD 2008 data. For the different self-assessed health scales, similarities in the
direction, magnitude and statistical significance of the association between census tract
location and the accumulated chance of better self-assessed health, both in crude analysis and
in multivariate analysis, were observed. Although the scale used did not influence this
association, multivariate analysis showed that scale differences influenced model selection,
such that whereas three control variables (household occupation condition, housing quality
and family healthcare program) were excluded from the ordinal logistic model using a selfassessed health scale with three or five categories, only the first two were excluded from the
binary logistic model. Nonetheless, this difference might have been due to non-fulfillment of
the hypothesis of slope homogeneity, for some of the control variables and especially for the
family healthcare program. Hence, the partial proportional odds model may form an
alternative ordinal logistic model that is more appropriate than either the proportional odds
model or the binary logistic model.
Key words: Self-assessment of health, census tract, binary scale, ordinal scale, proportional
odds model, binary logistic model.
104
5.3.1. INTRODUÇÃO
No campo da saúde urbana, são estudados os múltiplos efeitos da urbanização na
saúde da população1. Neste contexto ao mesmo tempo em que levanta a necessidade de se
considerar múltiplos determinantes para a explicação do processo saúde-doença, traz o duplo
desafio de como mensurar os efeitos desses determinantes e também a saúde individual em
grandes inquéritos populacionais.
A realização de estudos que fazem uso de indicadores de natureza subjetiva para a
mensuração da saúde, frequentemente levantados em pesquisas de base populacional, vem
crescendo, em especial a autoavaliação de saúde global do indivíduo2. Este crescimento devese ao fato deste indicador ser uma proxy das avaliações objetivas de saúde3 e apresentar alta
validade preditiva da morbidade e mortalidade4. A autoavaliação de saúde é apontada como
um melhor indicador para a predição de mortalidade quando comparada a outros indicadores
objetivos de saúde individual, por representar a avaliação do estado de saúde global realizada
pelo próprio indivíduo ponderada pelas diferentes dimensões da saúde (biológica, psicológica
e social). Embora a autoavaliação da saúde possa sofrer influência da idade e cultura5, Anson
et al6 reconhecem a importância da autoavaliação da saúde e chamam a atenção para a
necessidade dos profissionais de saúde levarem em consideração tal indicador no momento da
avaliação médica e da definição dos planos de tratamento.
A autoavaliação de saúde vem sendo investigada de diversas formas, usando questões
simples. Segundo Eriksson et al.7, as avaliações usando uma única questão podem ser
classificadas em três categorias principais: não comparativa (pergunta aos respondentes se
eles classificariam a saúde como excelente, boa, regular, ruim ou muito ruim); idade
comparativa (pergunta aos respondentes se eles classificariam a saúde como melhor, igual ou
105
pior em comparação a outra pessoa da mesma idade); e tempo-comparativa (os respondentes
são questionados sobre como avaliam a saúde comparativamente a um dado tempo passado).
Apesar de ser originalmente obtida em escala ordinal, a autoavaliação de saúde é
frequentemente reduzida a um indicador dicotômico e em diferentes estudos essa redução é
feita sem maiores justificativas3,8-12. Além do uso da escala binária representar perda de
informação e decréscimo de poder estatístico13,14, deve-se levar em consideração a situação
em que as categorias de “autoavaliação global de saúde” representam uma classificação
arbitrária de um fenômeno potencialmente contínuo, mas que por dificuldade ou
impossibilidade não foi medido em escala intervalar e sim em escala ordinal14. Nesta situação
existem modelos estatísticos mais apropriados que o modelo logístico binário, como o modelo
logístico ordinal (modelo de chances proporcionais), que consideram não só a natureza
ordinal da autoavaliação de saúde, mas também associa esse desfecho a uma variável latente
contínua e não observável15.
Um outro ponto que merece destaque é a escolha arbitrária do ponto de corte para
dicotomizar a autoavaliação de saúde, que influencia diretamente os resultados das medidas
de associação16. Normalmente a dicotomização da autoavaliação de saúde se dá através da
transferência da categoria “regular” para a saúde não boa3,11,17.
O presente artigo tem como objetivo comparar os resultados da associação entre a
situação censitária (urbana vs rural) e o indicador autoavaliação de saúde de adultos no Brasil
considerando os casos em que este indicador é expresso em escala ordinal e binária usando os
dados da PNAD 2008. Nesta comparação, buscou-se avaliar principalmente: 1) o sentido, a
magnitude e a significância da associação entre a área censitária e a chance (acumulada) de
melhor autoavaliação de saúde; 2) a influência da escala na seleção dos modelos e 3) a
qualidade dos modelos selecionados.
106
5.3.2. MATERIAL E MÉTODOS
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios e População de estudo
Neste artigo foi utilizada a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD),
inquérito amostral realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que
selecionou no ano de 2008 uma amostra de 150.091 domicílios e 391.868 indivíduos. Este
inquérito utiliza um plano amostral complexo, que considera estratificação das unidades
amostrais, conglomeração (seleção da amostra em vários estágios) e probabilidades desiguais
de seleção18,19.
No Suplemento de Saúde da PNAD realizada em 2008, a autopercepção de saúde é
avaliada através de uma única pergunta (avaliação não comparativa) dirigida a todos os
moradores do domicílio, formulada da seguinte forma: “De um modo geral, como considera o
seu próprio estado de saúde ?”, contendo originalmente cinco alternativas de respostas
possíveis: muito ruim, ruim, regular, bom, muito bom.
A população alvo deste estudo é composta por adultos brasileiros de 20 anos ou mais
de idade residentes em domicílios particulares permanentes que informaram o seu próprio
estado de saúde, totalizando 162.213 adultos na amostra (registros).
Desfecho, variável de interesse e variáveis de controle
O desfecho é o indicador autoavaliação do estado global de saúde individual,
considerado neste estudo de duas formas: de forma policotômica com uma escala ordinal
original de cinco níveis: “muito ruim”, “ruim”, “regular”, “bom” e “muito bom” e de três
níveis: “muito ruim/ ruim”, “regular” e “bom/muito bom”; e de forma dicotômica, dando
origem a seguinte escala binária: “regular/ruim/muito ruim” e “bom/muito bom”.
107
A situação censitária considerada como variável de interesse foi classificada em
urbana e rural, segundo a definição político-administrativa usada pelo IBGE, baseada em leis
municipais.
Para estabelecer a associação entre a situação censitária (urbana e rural) e a
autoavaliação do estado global de saúde do adulto, utilizou-se como controle variáveis de
natureza demográfica, socioeconômica, comportamental e de saúde, listadas a seguir: 1) sexo,
2) faixa etária, 3) cor/raça, 4) escolaridade, 5) situação de ocupação, 6) atividade física, 7)
fumo, 8) morbidade autorreferida, 9) mobilidade física, 10) posse de plano de saúde, 11)
consulta médica nos últimos doze meses, 12) domicílio cadastrado no Programa de Saúde da
Família (PSF), 13) qualidade de moradia, 14) posse de bens básicos no domicílio,
15) condição de ocupação do domicílio, 16) renda domiciliar mensal per capita, 17) região
de residência e 18) proporção de domicílios adequados quanto a qualidade da moradia, isto
é, a proporção de domicílios adequados no setor (vizinhança) com relação aos serviços
sociais básicos (água, esgoto, lixo e luz), às densidades habitacionais e aos padrões
construtivos das moradias (material usado nas paredes e telhado). Em Moraes et al20, pode
ser obtida uma maior descrição sobre algumas dessas variáveis.
Análise estatística
As análises foram realizadas através do programa estatístico SPSS 17. Quando a
autoavaliação de saúde foi expressa em escala binária utilizou-se o modelo de regressão
logística binária21 e quando este indicador foi expresso em escala ordinal ajustou-se o modelo
de regressão logística ordinal (modelo de chances proporcionais14,21,22). A seguir são revistos
os modelos usados neste artigo para as diferentes escalas de autoavaliação de saúde com o
objetivo de comparar seus efeitos nas medidas de associação.
108
Modelo binário
Considerando o desfecho de autoavaliação de saúde Y em escala binária (onde o valor
Y=1 representa o “estado de saúde regular/ruim/muito ruim” e o valor Y=2 representa o
“estado de saúde bom/muito bom”) o modelo de regressão logística binária pode ser definido
por:
 P (Y = 2 / x1 , x 2 ,..., x p ) 
Logit[ P (Y = 2 / x1 , x 2 ,..., x p )] = ln 
 = β 0 + β 1 x1 + β 2 x 2 + K + β p x p ,
 P (Y = 1 / x1 , x 2 ,..., x p ) 
onde:
Logit[ P (Y = 2 / x 1 , x 2 ,..., x p )] é o logaritmo da razão entre a probabilidade de autorreferir um
estado de saúde bom/muito bom P (Y = 2 / x1 , x 2 ,..., x p ) e a probabilidade complementar de
autorreferir um estado de saúde regular/ruim/muito ruim P (Y = 1 / x1 , x 2 ,..., x p ) , ou seja, é a
chance (em escala logarítmica) da autoavaliação de saúde assumir a categoria
“bom/muito bom”, relativamente a categoria “regular/ruim/muito ruim”.
x1, x2,...,xp são as variáveis explicativas.
β0, β1,...,βp são os efeitos das variáveis explicativas.
Modelo ordinal
No caso do desfecho de autoavaliação de saúde Y ser expresso em escala ordinal com
K categorias (K=3 ou K=5) correspondentes aos valores ordenados de forma crescente Y=1,
Y=2, ..., Y=K utilizou-se neste artigo o modelo de regressão logística ordinal (modelo de
chances proporcionais10) que permite incorporar a ordem natural da autoavaliação de saúde
10
Essa equação é modelada pela maior parte dos softwares estatísticos (SPSS, STATA, STATISTICA, etc.)
109
como demonstrado no Quadro 1. A equação do modelo de chances proporcionais é
apresentada abaixo:
Quadro 1: Comparações efetuadas no modelo de regressão logística ordinal (modelo de
chances proporcionais).
Autoavaliação de saúde em escala ordinal
(Comparações)
k=1: Muito ruim
k=2: Ruim
k=3: Regular
k=4: Bom
k=5: Muito bom
K=5 categorias
1
1,2
1,2,3
1,2,3,4
K=3 categorias
k=1: Muito ruim / ruim
1
k=2: Regular
1,2
k=3: Bom / muito bom
vs
vs
vs
vs
-
2,3,4,5
3,4,5
4,5
5
vs
vs
-
2,3
3
 P (Y ≤ k / x1 , x2 ,K , x p ) 
Logit[ P (Y ≤ k / x1 , x2 ,K , x p )] = ln 
 = α k − ( β1 x1 + β 2 x2 + K + β p x p )
 P (Y > k / x1 , x2 ,K , x p ) 
k =1,2,...,K-1
onde:
Logit[ P (Y ≤ k / x1 , x2 ,K , x p )] é o logaritmo da razão entre a probabilidade acumulada
P (Y ≤ k / x1 , x2 ,K , x p ) e seu complementar P (Y > k / x1 , x2 ,K , x p ) , ou melhor, é a chance
(em escala logarítmica) da autoavaliação de saúde assumir categorias de menor ordem (pior
estado de saúde autorreferido), comparativamente às categorias de maior ordem (melhor
estado de saúde autorreferido).
α k é o ponto de corte para as k=1,2,...,K-1 categorias do desfecho de autoavaliação de saúde.
x1, x2,...,xp são as variáveis explicativas do modelo.
110
β1, β2,..., βp são os efeitos das variáveis explicativas. Os parâmetros não dependem de k, pois
o modelo de chances proporcionais assume que os efeitos β`s das variáveis explicativas sobre
o desfecho de autoavaliação de saúde independe da categoria k.
Assim como no modelo logístico binário, no modelo de regressão logística ordinal
(modelo de chances proporcionais) pode-se obter uma medida de razão de chance ( OR *k ) do
adulto autorreferir um estado de saúde menor ou igual a k, para as categorias k=1,2,.... K-1 da
autoavaliação de saúde. Comparando a chance de um adulto autorreferir um estado de saúde
menor ou igual a k (Y ≤ k ) para x1=a (sendo a=1 no caso de ter o atributo) com aquela para
x1=b (sendo b=0 no caso de não ter o atributo), obtêm-se a seguinte medida de razão de
chance (odds ratio):
OR *k =
OR =
*
k
P (Y ≤ k / x1 = a, x 2 ,K , x p ) / P (Y > k / x1 = a, x 2 ,K , x p )
P (Y ≤ k / x1 = b, x 2 ,K , x p ) / P(Y > k / x1 = b, x 2 ,K , x p )
e
e
α
α
− ( β 1 ⋅a +
β 2 x2
+ K +β p
xp )
− ( β 1 ⋅b +
k
β 2 x2
+ K +β p
xp )
k
=e
−( a −b)⋅β 1
=e
−(1−0)⋅β 1
,
∀ k=1,2,..., K-1
=e
−β1
∀ k=1,2,..., K-1
Por outro lado, ao invés de OR *k , pode ser preferível interpretar a razão de chance
OR *k* de um adulto autorreferir um estado de saúde maior do que k (Y > k ) para x1=a (sendo
a=1 no caso de ter o atributo) com aquela para x1=b (sendo b=0 no caso de não ter o atributo).
Neste caso após algumas operações matemáticas pode-se calcular a razão de chance OR *k* a
partir de OR *k :
111
OR *k* =
P (Y > k / x1 = a, x 2 ,K , x p ) / P (Y ≤ k / x1 = a, x 2 ,K , x p )
P (Y > k / x1 = b, x 2 ,K , x p ) / P (Y ≤ k / x1 = b, x 2 ,K , x p )
=
1
β
=e 1
*
OR k
∀ k=1,2,..., K-1
Embora a natureza ordinal do desfecho obrigue a modelagem em termos das
probabilidades acumuladas, o desfecho de autoavaliação de saúde Y pode ser interpretado
como operacionalização de uma variável contínua não medida Y* (variável latente)21,
resultando na especificação do seguinte modelo estrutural:
Y * = β 1 x1 + β 2 x 2 + K + β p x p + ε
, onde:
x1, x2,...,xp são as variáveis explicativas.
β1, β2,...,βp são os efeitos das variáveis explicativas.
ε é o erro do modelo com distribuição logística de média 0 e variância π2/3.
Os modelos logísticos ordinais e binário foram ajustados considerando o método de
Máxima Pseudo-Verossimilhança (MPV), que é um método de estimação que permite
incorporar o plano amostral complexo adotado na PNAD 2008, em especial os estratos, as
unidades primárias de amostragem e os pesos amostrais.
Nos ajustes dos modelos logísticos binário e ordinal para a autoavaliação de saúde
foram fornecidas as medidas de razão de chance, os erros padrões dos estimadores dos
parâmetros e os p-valores do teste. A comparação e seleção dos modelos usando as três
escalas (binária, ordinal de 3 categorias e ordinal de 5 categorias) se basearam em critérios
estatísticos, como medida de qualidade global do ajuste (pseudo R2 de Nagelkerke)21,
capacidade preditiva do modelo e no nível de significância do teste de Wald fixado em 1%
devido ao grande tamanho da amostra. Adicionalmente, para as variáveis de controle
selecionadas comparou as medidas de razão de chance estimadas no modelo logístico binário
para cada nível das variáveis com as respectivas medidas obtidas através dos modelos
logísticos ordinais.
112
5.3.3. RESULTADOS
A Tabela 1 apresenta os ajustes dos modelos logísticos univariados considerando o
indicador autoavaliação de saúde expresso tanto em escala binária quanto em escala ordinal.
Independentemente da escala utilizada, observou-se uma associação estatisticamente
significante e positiva entre a situação censitária (urbano vs rural) e a chance acumulada de
melhor autoavaliação de saúde.
Além da presença de significância estatística, as três escalas usadas para a
autoavaliação de saúde levam a medidas de razão de chance próximas. Quando se usa o
modelo binário (MB), observa-se que na área urbana a chance do adulto reportar um estado
de saúde bom/muito bom é 53% (OR=1,53; p-valor<0,001) maior do que na área rural. Para
os modelos de chances proporcionais (MCP), verifica-se que a chance acumulada do adulto
reportar melhor estado de saúde é 55% (OR**=1,55; p-valor<0,001) maior na área urbana
quando se usa a autoavaliação de saúde com cinco categorias. E esta chance é 51%
(OR**=1,51; p-valor<0,001) maior na área urbana quando se usa a autoavaliação de saúde
com três categorias.
Tabela 1: Ajuste de modelos logísticos univariados para estabelecimento da associação entre
área censitária (urbano vs rural) e a chance acumulada de uma melhor autoavaliação de saúde.
MCP: Autoavaliação de saúde
em escala ordinal de 5
categorias
MCP: Autoavaliação de saúde
em escala ordinal de 3
categorias
MB: Autoavaliação de saúde em
escala binária
(Y>k), k=1,2,3,4
(Y>k), k=1,2
(Y>1)=(Y=2)
Variável
principal
Área censitária
Urbano
Rural
Razão de
chance
(OR**)
Erro
Padrão
p-valor
Razão de
chance
(OR**)
Erro
Padrão
p-valor
Razão de
chance
(OR)
Erro
Padrão
p-valor
1,55
1
0,026
-
< 0,001
-
1,51
1
0,026
-
< 0,001
-
1,53
1
0,026
-
< 0,001
-
113
A Tabela 2 fornece os ajustes dos modelos logísticos ordinais multivariados. A
primeira observação foi que o uso da escala influencia na seleção do modelo. Usando a escala
ordinal com três ou cinco categorias, excluíram-se três variáveis (condição de ocupação do
domicílio, qualidade da moradia e PSF) dos modelos de chances proporcionais, enquanto que
usando a escala binária apenas as duas primeiras foram excluídas do modelo logístico binário.
Ao controlar por variáveis demográficas, socioeconômicas, comportamentais e de
saúde (Tabela 2), verificou-se também que a associação entre a situação censitária e a chance
do adulto autorreferir melhor estado de saúde deixa de ser estatisticamente significante tanto
no caso em que o desfecho de autoavaliação de saúde é usado em escala ordinal com cinco
categorias (MCP: OR**=0,95; p-valor=0,129) ou três categorias (MCP: OR**=0,96; pvalor=0,208) quanto no caso em que é usado em escala binária (OR=0,98; p-valor=0,549).
Em todos os três modelos multivariados, além da perda de significância estatística da
associação entre a situação censitária e os níveis de autoavaliação de saúde, observa-se a
proximidade das medidas de razão de chance obtidas para as diferentes escalas de
autopercepção de saúde.
Na análise multivariada observou-se ainda que as estimativas de razão de chance para
a variável “situação censitária” nos três modelos selecionados são praticamente as mesmas
estimativas obtidas para esta variável nos modelos completos usando a escala de cinco
categorias (MCP: OR**=0,96; p-valor=0,184), de três categorias (MCP: OR**=0,97; pvalor=0,291) ou mesmo de duas categorias (MB: OR=0,98; p-valor=0,681), indicando que as
variáveis excluídas não são fatores de confundimento da relação entre situação censitária e os
níveis de autoavaliação de saúde.
Além disso, nos modelos multivariados (Tabela 2) o sentido das associações se
mantém, inclusive continua existindo gradiente no sentido esperado para variáveis de controle
faixa etária, renda domiciliar per capita e mobilidade física. Já a escolaridade deixa de
114
apresentar gradiente com a autopercepção da saúde somente no modelo binário. Com relação
à magnitude das associações encontradas para as variáveis de controle, observou-se que
91,6% (29/32) das medidas de razão de chance no modelo binário (desconsiderando da
contagem a medida referente à variável PSF) são próximas das respectivas medidas estimadas
no modelo ordinal usando a escala de três categorias, com uma diferença máxima relativa de
aproximadamente 5%. Mantendo a mesma diferença máxima relativa, observa-se que este
percentual reduz para 53,1% (17/32) quando se compara com as medidas de razão de chance
do modelo de chances proporcionais usando a escala de cinco categorias.
Com relação à qualidade do ajuste dos modelos multivariados (Tabela 2), verificou-se
que a porcentagem global de adultos classificados corretamente é de 79,7% para o modelo
binário e de 75,0% para o modelo de chances proporcionais usando a escala de três
categorias, indicando que estes modelos apresentam uma capacidade preditiva razoável. Em
contrapartida, quando se usa a autoavaliação de saúde em escala ordinal com as cinco
categorias, o modelo de chances proporcionais apresentou uma capacidade preditiva inferior
aos demais (57,8% de previsões corretas). Na análise por categoria de autoavaliação de saúde,
observou-se que o modelo binário classifica corretamente 88,8% dos adultos que reportaram
um estado de saúde “bom/muito bom” (sensibilidade do modelo) e 60,1% para os adultos que
reportaram um estado de saúde “regular/ruim/muito ruim” (especificidade do modelo). O
modelo de chances proporcionais usando a escala com três categorias, por sua vez, classifica
corretamente 90,1% dos adultos para o estado de saúde “bom/muito bom”, 50,3% para o
estado de saúde “regular” e 6,3% para o estado de saúde “ruim/muito ruim”. E quando se usa
a escala original de cinco categorias, apenas quatro delas são previstas pelo modelo de
chances proporcionais, ou melhor, este modelo classifica corretamente: 15,6% para a
categoria “muito bom”, 82,3% para a categoria “bom”; 52,0% para a categoria “regular”;
1,2% para a categoria “ruim” e 0% para a categoria “muito ruim”.
115
Tanto o modelo binário quanto o modelo de chances proporcionais quando se usa a
autoavaliação de saúde com uma escala de três categorias são obtidas medidas de qualidade
do ajuste (pesudo R2 de Nagelkerke) moderadas e próximas (0,43 para o modelo binário e
0,42 para o modelo de chances proporcionais). O modelo de chances proporcionais usando a
escala original de cinco categorias apresentou uma medida de qualidade do ajuste
ligeiramente menor (igual a 0,40).
Tabela 2: Ajuste de modelos logísticos multivariados para estabelecimento da associação
entre área censitária (urbano vs rural) e a chance acumulada de uma melhor autoavaliação de
saúde, controlando por um conjunto de variáveis demográficas, socioeconômicas,
comportamentais e de saúde.
MCP: Autoavaliação de saúde
em escala ordinal de 5
categorias
(Y>k), k=1,2,3,4
Variáveis
Área censitária
Urbano
Rural
Região de residência
Norte
Nordeste
Sudeste
Sul
Centro-oeste
Sexo
Masculino
Feminino
Faixa etária
20 a 29 anos
30 a 39 anos
40 a 49 anos
50 a 59 anos
60 anos ou +
Cor/raça
Branca
Não branca
Escolaridade
Sem instrução ou menos de 1 ano
1 a 7 anos
8 a 14 anos
15 anos ou +
Sem declaração
MCP: Autoavaliação de saúde
em escala ordinal de 3
categorias
MB: Autoavaliação de saúde
em escala binária
(Y>k), k=1,2
(Y>1)=(Y=2)
p-valor
Razão de
chance
(OR)
Erro
Padrão
p-valor
0,033
-
0,208
-
0,98
1
0,036
-
0,549
-
0,75
0,78
1,10
0,99
1
0,052
0,033
0,032
0,039
-
<0,001
<0,001
0,002
0,722
-
0,75
0,79
1,13
1,03
1
0,058
0,034
0,033
0,040
-
<0,001
<0,001
<0,001
0,502
-
<0,001
-
0,85
1
0,015
-
<0,001
-
0,87
1
0,016
-
<0,001
-
0,024
0,022
0,021
0,021
<0,001
<0,001
0,362
<0,001
1,41
1,19
0,96
0,83
1
0,029
0,024
0,023
0,022
-
<0,001
<0,001
0,067
<0,001
-
1,49
1,26
1,00
0,86
1
0,031
0,026
0,025
0,025
-
<0,001
<0,001
0,982
<0,001
-
1,13
1
0,015
-
<0,001
1,16
1
0,017
-
<0,001
1,18
1
0,018
-
<0,001
-
0,49
0,51
0,71
1
0,54
0,033
0,027
0,024
0,135
<0,001
<0,001
<0,001
<0,001
0,46
0,47
0,69
1
0,46
0,042
0,037
0,036
0,166
<0,001
<0,001
<0,001
<0,001
0,49
0,47
0,69
1
0,47
0,043
0,037
0,036
0,178
<0,001
<0,001
<0,001
<0,001
p-valor
Razão de
chance
(OR**)
Erro
Padrão
0,031
-
0,129
-
0,96
1
0,72
0,79
1,11
0,98
1
0,041
0,033
0,029
0,033
-
<0,001
<0,001
<0,001
0,447
-
0,91
1
0,013
-
1,35
1,16
0,98
0,85
Razão de
chance
(OR**)
Erro
Padrão
0,95
1
116
Renda domiciliar mensal per capita
Sem renda ou até 1 salário mínimo
Mais de 1 a 5 salários mínimos
Mais de 5 salários mínimos
Sem declaração
Situação de ocupação
Ocupada
Não ocupada
Atividade física
Pratica
Não pratica
Sem declaração
Fumo
Fumante
Ex-fumante
Nunca fumou
Sem declaração
Morbidade autorreferida
Pelo menos uma doença crônica
Nenhuma doença crônica
Mobilidade física
Muita limitação
Limitação
Pouca limitação
Sem limitação
Posse de plano de saúde
Sim
Não
Consulta médica
Sim
Não
Posse de bens básicos
Tem todos os quatro bens básicos
Não tem pelo menos um bem básico
% domicílios adequados quanto à
qualidade da moradia
PSF
Domicílio cadastrado no PSF
Domicílio não cadastrado no PSF
0,52
0,68
1
0,69
0,033
0,031
0,049
<0,001
<0,001
<0,001
0,53
0,71
1
0,69
0,046
0,044
0,064
<0,001
<0,001
0,001
0,54
0,72
1
0,71
0,046
0,044
0,066
<0,001
<0,001
<0,001
1,15
1
0,014
-
<0,001
-
1,19
1
0,017
-
<0,001
-
1,16
1
0,018
-
<0,001
-
1,44
1
0,48
0,015
0,051
<0,001
<0,001
1,36
1
0,50
0,019
0,050
<0,001
<0,001
1,34
1
0,71
0,020
0,059
<0,001
<0,001
0,91
0,93
1
0,99
0,017
0,016
0,015
<0,001
<0,001
0,500
0,86
0,88
1
0,95
0,021
0,019
0,020
<0,001
<0,001
0,012
0,88
0,88
1
0,96
0,022
0,020
0,021
<0,001
<0,001
0,032
0,33
1
0,016
-
<0,001
-
0,29
1
0,018
-
<0,001
-
0,29
1
0,018
-
<0,001
-
0,13
0,19
0,44
1
0,031
0,022
0,019
-
<0,001
<0,001
<0,001
-
0,13
0,18
0,42
1
0,031
0,023
0,021
-
<0,001
<0,001
<0,001
-
0,15
0,19
0,40
1
0,032
0,025
0,022
-
<0,001
<0,001
<0,001
-
1,26
1
0,017
-
<0,001
-
1,32
1
0,021
-
<0,001
-
1,32
1
0,022
-
<0,001
-
0,62
1
0,015
-
<0,001
-
0,55
1
0,020
-
<0,001
-
0,56
1
0,020
-
<0,001
-
1,15
1
0,018
-
<0,001
-
1,14
1
0,020
-
<0,001
-
1,09
1
0,022
-
<0,001
-
1,27
0,035
<0,001
1,36
0,037
<0,001
1,38
0,040
<0,001
-
-
-
-
-
-
0,94
1
0,021
-
0,002
-
Nota: MCP(5 categorias): α1=-7,534; α2=-5,705; α3=-2,942; α4=0,204 /MCP(3 categorias): α1=-5,968; α2=-3,159 / MB: β0= 3,116
117
5.3.4. DISCUSSÃO
O presente artigo procurou avaliar o efeito do uso de escala utilizada para
autoavaliação de saúde (desfecho) na seleção dos modelos (modelo logístico binário e modelo
logístico ordinal de chances proporcionais) e no sentido, magnitude e significância da
associação encontrada entre a situação censitária e a chance acumulada do adulto autorreferir
melhor estado de saúde, considerando duas situações: a análise bruta e a análise multivariada
usando um conjunto de variáveis de controle que retratam características individuais e do
ambiente intradomiciliar e extradomiciliar.
Alguns estudos já avaliaram o impacto da dicotomização do desfecho de autoavaliação
de saúde (com escala original de quatro categorias) considerando poucas variáveis
explicativas na modelagem estatística e uma amostra bem menor do que a utilizada neste
artigo16,22. Manor et al22 compararam o ajuste do modelo de regressão logística binária
(ruim/regular e boa/excelente) com os ajustes de alguns modelos estatísticos (inclusive o
modelo de chances proporcionais) que incorporam a natureza ordinal da autoavaliação de
saúde, e encontraram semelhanças em termos de magnitude, significância dos efeitos
principais, tipo de associação e efeitos de interação ao estabelecer associação entre algumas
variáveis socioeconômicas e a autoavaliação de saúde.
Assim como o estudo de Manor et al22, no presente artigo observou-se semelhanças no
sentido, magnitude e significância estatística da associação entre a situação censitária (usando
a área rural como categoria de referência) e a chance acumulada de melhor autoavaliação de
saúde de adultos no Brasil tanto na análise bruta quanto na análise multivariada. Em outras
palavras, a proximidade entre as medidas de razão de chance obtidas quando se usa
autoavaliação de saúde em escala binária e em escala ordinal (com três ou cinco categorias)
indica que o uso da escala não influencia a associação entre situação censitária e os níveis de
118
autoavaliação de saúde de adultos. Entretanto, na análise multivariada, o uso da escala
influenciou na seleção do modelo, isto é, fazendo uso da escala ordinal de três ou cinco
categorias, excluíram-se três variáveis (condição de ocupação do domicílio, qualidade da
moradia e PSF), enquanto que para a escala binária apenas as duas primeiras foram excluídas
do modelo.
O presente estudo se limitou em avaliar o efeito da escala nas estimativas dos
parâmetros do modelo, não avaliando assim a influência do ponto de corte, cuja escolha
também pode influenciar diretamente os resultados das medidas de associação. Finnas et al16
dicotomizaram a autoavaliação de saúde de duas formas diferentes (autoavaliação não boa
como muito ruim e ruim, e depois como muito ruim, ruim ou regular) e concluíram que a
escolha do ponto de corte tem implicações nos efeitos de determinantes de saúde. Mostraram
que quando a categoria intermediária do desfecho (regular) é combinada com as categorias de
boa saúde autorreferida (“boa” e “muito boa”), os efeitos das covariáveis (nível educacional e
estado civil) são altamente dependentes da idade, e quando agrupada com as categorias
“ruim” e “muito ruim” (saúde não boa) verificaram que os efeitos dessas covariáveis sobre a
autoavaliação de saúde são menos acentuados entre as categorias de idade.
Para fins de avaliação do impacto da dicotomização nas medidas de razão de chance
optou-se neste artigo por dicotomizar a autoavaliação de saúde em “muito ruim/ruim/regular”
e “bom/muito bom”, pois essa escala é usada na maioria dos estudos sobretudo naqueles que
usam os dados das PNADs. Embora a categoria regular seja normalmente transferida para a
saúde não boa, há estudos em que a categoria regular foi transferida para o lado da saúde boa,
entre eles pode-se citar os de Pagotto et al23 e Barros et al10. No primeiro estudo os autores
dicotomizaram a autoavaliação de saúde em boa (muito bom, bom e regular) e ruim (fraco e
péssimo), enquanto que no segundo dicotomizaram a autoavaliação de saúde em ruim versus
demais categorias (excelente, bom, regular).
119
Neste artigo considerou-se o modelo de chances proporcionais por ser o modelo
ordinal mais popular, parcimonioso e interpretável24,25, além de estar implementado nos
principais pacotes estatísticos inclusive para análise de dados amostrais complexos (SPSS,
STATA, SAS, etc.). Mas observou-se que o modelo de chances proporcionais ajustado para a
autoavaliação de saúde de cinco categorias apresentou uma capacidade preditiva bem inferior
aos demais modelos (MB e MCP com escala de três categorias). Sendo assim, é preferível
usar uma escala ordinal com três categorias para obtenção de um modelo de chances
proporcionais com melhor poder discriminatório. Outras funções de ligação também foram
avaliadas para o modelo de chances proporcionais (escala de três categorias), mas verificouse que foi o modelo logístico ordinal que apresentou medidas de qualidade do ajuste (pseudo
R2 de Nagelkerke=0,42 e taxa de classificações corretas=75,0%) iguais ou ligeiramente
superiores aos modelos ajustados para as outras funções de ligação, como log-log
complementar (R2N = 0,40 e taxa= 74,8%), log-log negativo (R2N =0,41 e taxa= 74,9%) e
probit (R2N=0,42 e taxa= 74,9%). Para as três funções de ligação, as variáveis condição de
ocupação do domicílio, qualidade da moradia e domicílio cadastrado no PSF continuaram
não apresentando efeito estatisticamente significante, e ao excluí-las a associação entre a
situação censitária e a autoavaliação de saúde continuou apresentando sinal negativo e
ausência de significância estatística assim como no modelo ordinal com função de ligação
logística.
Uma outra limitação se refere ao fato do teste geral de homogeneidade das inclinações
ter sido significativo. Entretanto, segundo Scott et al25, há críticas quanto a adequação desse
teste por ser muito sensível a grandes amostras como a utilizada neste artigo. Entretanto,
aplicou-se o teste de homogeneidade por variável usando o STATA 10 (teste de Wald
individual), e constatou-se que no modelo de chances proporcionais parciais26 (modelo
multivariado) o efeito da área censitária (variável de interesse) sobre a chance acumulada de o
120
adulto apresentar melhor estado de saúde é homogêneo para as diferentes categorias da
autoavaliação de saúde (escala ordinal de três categorias) e aproximadamente igual ao obtido
no modelo de chances proporcionais, além de não ser estatisticamente significante.
Uma diferença em relação ao estudo de Manor et al.22 está no tipo de desenho de
estudo. Embora o presente estudo seja de natureza transversal, considera-se o plano amostral
complexo da PNAD 2008 no ajuste dos modelos logísticos univariados e multivariados para o
desfecho de autoavaliação de saúde (binária e ordinal), pois quando ignorado pode levar a
resultados incorretos tanto para as estimativas pontuais dos parâmetros do modelo quanto para
os erros padrões associados às estimativas pontuais, comprometendo a qualidade do ajuste de
modelos e as conclusões do estudo18,19. Além da incorporação do planejamento da amostra
nos ajustes dos modelos estatísticos, considerou-se também o mesmo método de estimação
dos parâmetros (método de máxima pseudo-verossimilhança - MPV) a fim de manter a
comparabilidade dos resultados. Em Moraes et al27, podem ser obtidas maiores informações
sobre o impacto do plano amostral sobre as medidas de razão de chance e erros padrões em
modelo de regressão logística ordinal (modelo de chances proporcionais).
Apesar da variável de interesse “área censitária” ter efeito parecido e não significativo
para diferentes escalas de autoavaliação de saúde em todos os modelos logísticos
multivariados, o presente artigo trouxe evidências de que a diferença de escala do desfecho
(ordinal vs binária) influencia na seleção do modelo. Todavia, essa diferença pode ser devida
ao não atendimento da hipótese de homogeneidade das inclinações para algumas das variáveis
de controle usadas na modelagem, em especial a variável “Programa da Saúde da Família”.
Recomenda-se assim o emprego do modelo de chances proporcionais parciais ao invés do
modelo de chances proporcionais ou do modelo logístico binário.
Um outro aspecto que deve ser ressaltado na modelagem é o viés de especificação do
modelo estrutural que pode levar a estimativas tendenciosas para os efeitos das variáveis28.
121
Segundo Greeland28, a verdadeira relação estrutural entre as variáveis quase nunca é
conhecida em estudos epidemiológicos devendo esperar algum grau de erro de especificação
do modelo, sobretudo na ausência de amostragem aleatória. Com relação a este aspecto, no
presente artigo considerou-se dados obtidos por meio de amostragem complexa cujas
características foram incorporadas na modelagem estatística. Adicionalmente, para o ajuste do
modelo considerou-se um método de estimação robusto (MPV) que fornece portanto
estimativas robustas para os parâmetros mesmo nas situações em que o modelo estrutural não
fornece uma boa descrição para a distribuição da variável de estudo29.
Apesar do modelo de regressão logística binária não considerar toda a informação
disponível do desfecho de saúde considerado, postula-se que o uso mais freqüente da escala
binária parece depender não de problemas inerentes aos dados, mas da preferência do
pesquisador, em virtude de, muitas vezes, haver maior familiaridade com o modelo logístico
binário em investigações na área de saúde.
122
5.3.5. BIBLIOGRAFIA
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124
5.4. ARTIGO 4
Área de localização do domicílio e autoavaliação de saúde de
adultos brasileiros residentes em cidades populosas: uma análise
multinível usando os dados da PNAD 2008
125
Resumo
No Brasil a urbanização agravou a pobreza e a exclusão social e contribuiu para
manutenção das desigualdades de renda e para proliferação de moradias precárias. Esses
problemas tendem a ampliar os efeitos adversos sobre a saúde, sobretudo em lugares onde não
há uma atitude proativa em relação às necessidades da população.
Este artigo ajustando para características do ambiente intradomiciliar (domicílio) e
extradomiciliar (setor) e para características individuais (adulto) teve como objetivo avaliar,
por meio de modelo de regressão logística ordinal multinível, o efeito da área de localização
do domicílio (urbana e rural) na autoavaliação de saúde de adultos residentes em cidades
populosas.
Na análise bruta os resultados mostraram que a área urbana (em comparação a área
rural) está associada a melhores níveis de autoavaliação de saúde de adultos. Embora na
análise ajustada não tenha se evidenciado uma diferença estatisticamente significante nos
níveis de autoavaliação de saúde entre áreas urbana e rural dos municípios populosos, as
relações encontradas no presente estudo nos remetem as conseqüências da urbanização sobre
a saúde da população apontadas por diferentes autores. Desse modo, o estudo mostrou o efeito
das condições de vida no ambiente intra e extradomiciliar (qualidade da moradia, posse de
bens básicos, renda domiciliar per capita e percentual de domicílios no setor quanto a
qualidade de moradia) na variação dos níveis de autoavaliação de saúde de adultos, além da
existência de efeito de características individuais, que inclui as sociodemográficas, as de
saúde e as relativas a comportamentos e estilos de vida.
Palavras-chave: Autoavaliação de saúde, área de localização do domicílio, modelo regressão
logística ordinal multinível.
126
Abstract
In Brazil, urbanization has worsened poverty and social exclusion, and has contributed
towards maintenance of income inequalities and proliferation of poor-quality housing. These
problems have tended to amplify adverse effects on health, especially in places where there is
no proactive attitude towards the population’s needs.
The aim of this study was to evaluate the effect of household location (urban or rural)
on self-assessed health among adults living in large cities, by means of a multilevel ordinal
logistic regression model, with adjustments for environmental characteristics inside homes
(household) and outside homes (census tract) and for characteristics of the individuals (adult).
In the crude analysis, the results showed that, in comparison with rural areas, urban
areas were associated with better self-assessed health levels among adults. Although the
adjusted analysis did not show any statistically significant difference in self-assessed health
levels between the urban and rural areas of the large-population municipalities, the
relationships found in the present study portrayed the consequences of urbanization on the
population’s health that have been demonstrated by several authors. Thus, this study showed
the effect of living conditions in environments inside and outside homes (housing quality,
possession of basic goods, per capita household income and percentages of households in the
census tract according to housing quality), on self-assessed health levels among adults, which
include sociodemographic, health-related, behavioral and lifestyle effects.
Key words: Self-assessed health, household location, multilevel ordinal logistic regression
model.
127
5.4.1. INTRODUÇÃO
A urbanização é ainda considerado o fenômeno de maior influência nas condições
socioeconômicas e ambientais nos países em desenvolvimento1. As diferentes regiões e
estados do país apresentam uma urbanização desigual e contrastes na distribuição da
população em áreas urbanas e rurais2. Segundo Nakamura3, o crescimento populacional
acentuado, sobretudo nas grandes metrópoles, agravado pela migração, sem a devida
adequação das condições de infra-estrutura básica, delimita o espaço urbano em áreas
socioeconômicas e ambientais diferenciadas. Geib4 reforça dizendo que a urbanização
agravou a pobreza e a exclusão social e contribuiu para manutenção das desigualdades de
renda e para proliferação de moradias precárias, impedindo o desenvolvimento do conceito de
habitação saudável11.
Embora a urbanização possa trazer oportunidades positivas para a população, há uma
maior preocupação com os efeitos negativos da urbanização sobre a saúde. Isso pode ser
devido ao reconhecimento da urbanização brasileira ser marcada por profundas
transformações espaciais e sociais, que são caracterizadas por um conjunto de fatores, entre os
quais estão: o desemprego, as precárias condições urbanas de moradia e trabalho, as
condições inadequadas de infra-estrutura básica e a violência3,5. Esses problemas tendem a
ampliar os efeitos adversos sobre a saúde, sobretudo na ausência de uma atitude proativa em
relação às necessidades da população1.
Com o novo paradigma do processo saúde-doença baseado na promoção e prevenção,
tem surgido nas últimas décadas, no campo da Saúde Pública, estudos que levam também em
conta os atributos (características) do espaço urbano (lugar) para explicar as diferenças de
saúde da população urbana. Entretanto, ainda é baixo o número de estudos que visam
11
Conceito de habitação saudável inclui agentes promotores da saúde e do bem-estar e controla ou previne
fatores de risco no ambiente intra e extradomiciliar
128
encontrar associações entre determinantes individuais e contextuais do local de moradia e a
autoavaliação do estado de saúde6.
O presente artigo tem como objetivo estabelecer a associação entre a área de
localização do domicílio (urbana e rural) e a autoavaliação global de saúde de adultos em
cidades populosas (municípios das regiões metropolitanas ou municípios grandes em tamanho
populacional) usando análise multinível. Nesta associação utilizou-se como variáveis de
controle um conjunto de características individuais e do ambiente intra e extradomiciliar.
5.4.2. MATERIAL E MÉTODOS
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) é um inquérito amostral
complexo de abrangência nacional, realizado pelo IBGE, que coletou no ano de 2008
informações de uma amostra probabilística de 150.591 domicílios e 391.868 pessoas7.
A amostra da PNAD foi planejada para obter estimativas representativas para o Brasil,
Grandes Regiões, Unidades da Federação e nove Regiões Metropolitanas (Belém, Fortaleza,
Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba e Porto Alegre). Com
relação ao seu planejamento amostral, a PNAD é um estudo seccional que utiliza um plano
amostral complexo que considera estratificação, probabilidades desiguais de seleção e
conglomeração das unidades em dois ou três estágios de seleção dependendo do estrato ser de
municípios autorrepresentativos (AR) ou não autorrepresentativos (NAR), respectivamente
(Silva et al., 2002). Para os municípios autorrepresentativos situados nas regiões
metropolitanas o plano amostral da PNAD é estratificado por município (estrato) e
129
conglomerado em dois estágios, onde os setores censitários são as unidades primárias de
amostragem (UPA) e os domicílios são as unidades secundárias de amostragem (USA).
Com relação aos municípios não são situados em regiões metropolitanas ou
pertencentes as unidades da federação sem região metropolitana, é possível classifica-los
também em municípios autorrepresentativos (AR) para os grandes em termos populacionais, e
os restantes em municípios não autorrepresentativos (NAR). Para esses municípios
autorrepresentativos, o plano amostral também é estratificado e conglomerado em dois
estágios de seleção exatamente igual ao adotado para os municípios situados nas regiões
metropolitanas, ou seja, cada município AR é o estrato, enquanto os setores e os domicílios
são as unidades primárias e secundárias de amostragem, respectivamente. Para os municípios
não autorrepresentativos, o plano amostral é estratificado (estratos formados por conjuntos de
municípios NAR por tamanho e proximidade geográfica) e conglomerado em três estágios de
seleção, onde os municípios NAR são as unidades primárias de amostragem (UPA), os setores
as unidades secundárias de amostragem (USA) e os domicílios as unidades terciárias de
amostragem (UTA)8.
População de estudo
A população de estudo é formada por adultos brasileiros (20 anos ou mais) que
informaram o seu próprio estado global de saúde, residentes em domicílios particulares
permanentes (DPP) localizados em municípios populosos. Na amostra dessa pesquisa, dos
162.213 adultos (registros) brasileiros em DPP que informaram seu próprio estado de saúde,
92.745 deles residem em municípios populosos, isto é, em municípios autorrepresentativos AR (os grandes em tamanho populacional e os situados nas regiões metropolitanas), enquanto
os adultos restantes são residentes em municípios não autorrepresentativos - NAR.
130
A opção pela escolha desse recorte populacional (municípios grandes em tamanho
populacional e municípios situados em regiões metropolitanas) deveu-se principalmente a
dificuldade envolvida no ajuste desse tipo de modelo usando amostras complexas como a da
PNAD, devido à necessidade de incorporação não só das informações típicas do plano
amostral (estratificação, conglomeração e pesos amostrais), mas também da estrutura
hierárquica dos dados (PESSOA e SILVA, 1998). No caso de se considerar na análise
multinível (abordagem desagregada) a amostra completa de adultos (mesmo recorte
populacional do artigo 1) não bastaria incluir as variáveis identificadores dos grupos de
interesse “domicílio” e “setor”, além da variável “estrato”, pois a consideração da estrutura de
grupo entre “domicílio” e “setor” não acomodaria toda a estrutura do plano amostral da
PNAD. Tal análise seria mais complexa pelo fato dos níveis de hierarquia das variáveis de
interesse não coincidirem com os múltiplos estágios de seleção utilizados no plano amostral
da PNAD para os diferentes estratos como mostrado na Figura 3 da seção 4.1.1. Por exemplo,
no caso de se considerar os estratos dos municípios NAR, seria preciso incorporar mais um
outro nível de hierarquia representando as UPAs nesses estratos, tornando a análise menos
trivial. Entretanto, a consideração da amostra de adultos residentes em municípios AR fez
com que os níveis de hierarquia das variáveis coincidissem com a estrutura de conglomeração
da pesquisa adotada nesses municípios AR simplificando a análise multinível. Com relação à
estratificação, no ajuste do modelo usando o programa GLLAMM considerou o estrato
(município AR) como efeito aleatório de nível mais alto9.
Embora as informações estruturais do plano amostral da PNAD tenham sido
consideradas, não foi incluída na análise multinível os pesos associados aos adultos da
amostra, pois mesmo com a redução do âmbito de inferência para municípios AR, é requerido
um modelo multinível com um elevado número de níveis de hierarquia (quatro) para
contemplar todas as características estruturais da amostra em municípios AR. Na literatura de
131
análise multinível diferentes métodos de escala são apresentados, particularmente no caso de
dois níveis hierárquicos, para considerar os pesos de amostragem no ajuste de modelos
multiníveis, mas não há nenhum resultado teórico10, nem consenso11 sobre o melhor método
de construção de peso. Além disso, com a inclusão dos pesos amostrais elevaria ainda mais o
tempo de processamento para ajuste desse modelo multinível usando o comando GLLAMM
do STATA 10. Tal dificuldade foi devida não só a grande quantidade de níveis de hierarquia,
mas também devida à quantidade de variáveis usadas na modelagem, aliada ao grande número
de registros do banco de dados e a limitação da capacidade de processamento de
computadores padrões.
Diante desse contexto, efetuou-se uma análise para avaliar se os pesos amostrais são
de fato informativos, isto é, se eles estão correlacionados com o desfecho de autoavaliação de
saúde12,13. Verificou-se a ausência de relação entre os pesos de amostragem e o desfecho de
estudo condicionada a presença das demais variáveis do desenho amostral (estrato e
conglomerados) consideradas na análise multinível como níveis hierárquicos, concluindo que
os pesos amostrais são não informativos, justificando a sua exclusão. Segundo Asparouhov et
al.10, a inclusão de pesos não informativos na análise pode gerar uma perda substancial de
eficiência. Carle12 acrescenta que, embora os pesos levem a estimativas populacionais mais
representativas, a exclusão de pesos não informativos da análise não vicia as decisões
inferenciais.
Análise de regressão logística ordinal multinível
Neste artigo foi ajustado usando o software STATA 10 o modelo de regressão
logística ordinal multinível14 com quatro níveis de hierarquia, onde os adultos são as unidades
de 1º nível, os domicílios (habitações) são as unidades de 2º nível, os setores (vizinhança) as
unidades de 3º nível e os municípios as unidades de 4ª nível. A estrutura hierárquica dos
132
dados corresponde as características do plano amostral da PNAD para os municípios AR
(municípios populosos) considerados neste artigo, com exceção dos pesos amostrais da
pesquisa.
Para avaliar a necessidade de ajustar um modelo multinível de quatro níveis foi
aplicado também testes de comparabilidade de modelos encaixados (teste Qui-quadrado de
razão de verossimilhança), resultante da comparação das funções de verossimilhança de um
modelo nulo (modelo sem variáveis explicativas) de 4 níveis (adulto, domicílio, setor,
município) com outros modelos: 1) o modelo nulo de 3 níveis (adulto, domicílio, setor); 2) o
modelo nulo de 2 níveis (adulto, domicílio); 3) modelo nulo de 3 níveis (adulto, setor,
município); 4) modelo nulo de 3 níveis (adulto, domicílio, município). Para cada um dos
modelos foram calculadas medidas de qualidade do ajuste (critério de informação de Akaike AIC).
O desfecho do modelo é a autoavaliação de saúde considerando a seguinte escala
ordinal com três categorias: 1) ruim/muito ruim, 2) regular, 3) muito bom/bom. Além da área
de localização do domicílio (variável de interesse), foi considerado na estrutura linear do
modelo, um conjunto de dezoito variáveis de controle (demográficas, socioeconômicas,
comportamentais e de saúde) que retratam características individuais e do ambiente
intradomiciliar (domicílio) e extradomiciliar (setor).
As características do adulto (unidade de 1º nível) são compostas por doze variáveis:
sexo, faixa etária, cor/raça, escolaridade, situação de ocupação, atividade física, fumo,
morbidade autorreferida, mobilidade física, posse de plano de saúde, consulta ao médico nos
últimos doze meses e região de residência. As características do domicílio (unidade de 2º
nível), por sua vez, são compostas por cinco variáveis: domicílio cadastrado no Programa de
Saúde da Família (PSF), qualidade de moradia, posse de bens básicos no domicílio, condição
de ocupação do domicílio, renda domiciliar mensal per capita. Por último, como
133
característica do setor (unidade de 3º nível) foi utilizada a proporção de domicílios
considerados adequados no setor (vizinhança) quanto a qualidade da moradia, isto é, quanto
aos serviços sociais básicos (água, esgoto, lixo e luz), as densidades habitacionais e aos
padrões construtivos das moradias (material usado nas paredes e telhado). Quanto ao nível
municipal, não foi incluída nenhuma variável além da identificação dos municípios a fim de
incorporar a estratificação da amostra. Em Moraes et al.15, pode ser obtida uma maior
descrição sobre a construção de algumas dessas variáveis usadas numa abordagem agregada
de análise.
134
5.4.3. RESULTADOS
A Tabela 1 apresenta a distribuição percentual dos adultos segundo os níveis de
autoavaliação de saúde, a área de localização do domicílio e cada uma das variáveis de
controle (categóricas) usadas na análise multinível.
Tabela 1: Distribuição de adultos segundo o desfecho de autoavaliação de saúde, a área de
localização do domicílio e as variáveis de controle (categóricas) usadas na análise multinível
– Municípios populosos.
Variáveis
Autoavaliação de saúde
Ruim ou muito ruim
Regular
Bom ou muito bom
Área de localização do domicílio
Urbano
Rural
Região de residência
Norte
Nordeste
Sudeste
Sul
Centro-oeste
Sexo
Masculino
Feminino
Faixa etária
20 a 29 anos
30 a 39 anos
40 a 49 anos
50 a 59 anos
60 anos ou +
Cor/raça
Branca
Não branca
Escolaridade
Sem instrução ou menos de 1 ano
1 a 7 anos
8 a 14 anos
15 anos ou +
Sem declaração
Renda domiciliar mensal per capita
Sem renda ou até 1 salário mínimo
Mais de 1 a 5 salários mínimos
Distribuição de
adultos (%)
4,6
23,1
72,3
96,3
3,7
6,6
19,9
51,7
13,6
8,2
37,3
62,7
21,8
22,6
21,2
16,4
18,0
51,5
48,5
7,3
30,3
50,5
11,8
0,2
40,8
47,2
135
Mais de 5 salários mínimos
Sem declaração
Situação de ocupação
Ocupada
Não ocupada
Atividade física
Pratica
Não pratica
Sem declaração
Fumo
Fumante
Ex-fumante
Nunca fumou
Sem declaração
Morbidade autorreferida
Pelo menos uma doença crônica
Nenhuma doença crônica
Mobilidade física
Muita limitação
Limitação
Pouca limitação
Sem limitação
Posse de plano de saúde
Sim
Não
Consulta médica
Sim
Não
PSF
Sim
Não
Condição de ocupação do domicílio
Próprio
Alugado
Cedido
Outra
Posse de bens básicos
Tem todos os quatro bens básicos
Não tem pelo menos um bem básico
Qualidade da moradia
Adequado
Não adequado
Nota: estimativas ponderadas
8,2
3,8
60,2
39,8
28,5
69,2
2,2
14,0
16,3
52,4
17,2
46,3
53,7
6,9
11,9
15,6
65,6
37,0
63,0
76,3
23,7
33,9
66,1
75,2
18,2
5,9
0,6
89,5
10,5
66,3
33,7
Dos adultos residentes em cidades populosas, 96,3% residem em domicílios
localizados na área urbana e a maioria (72,3%) deles reportam um estado de saúde bom/muito
bom, enquanto 23,1% reportam estado de saúde regular e 4,6% estado de saúde ruim/muito
ruim. Com relação à distribuição das variáveis de controle, pode-se destacar que o percentual
136
de adultos é maior na região Sudeste (51,7%), em domicílios com os quatro bens básicos
(89,5%) e adequados quanto a qualidade da moradia (66,3%). Observou-se ainda que nestes
municípios há maior predominância de adultos que nunca fumaram (52,4%), que praticam
atividade física (28,5%), sem nenhuma doença crônica (53,7%), não portador de plano de
saúde (63,0%), sem limitação física (65,6%), que consultaram médico nos últimos 12 meses
(76,3%), e que não moram em domicílios cadastrados no PSF (66,1%) (Tabela 1).
A Tabela 2 apresenta uma análise prévia de associação entre os pesos amostrais e o
desfecho de autoavaliação de saúde de adultos, por meio de modelagem multinível.
Observou-se, considerando a estrutura hierárquica dos dados (estratificação e conglomeração
das unidades), que os pesos amostrais não estão correlacionados estatisticamente com os
níveis de autoavaliação de saúde de adultos, indicando que os pesos amostrais são não
informativos, não havendo necessidade de incorporá-los na análise, no caso desse desfecho
em particular.
Tabela 2: Associação entre pesos amostrais e o desfecho de autoavaliação de saúde de
adultos nos municípios considerados (análise multinível).
Pesos amostrais de expansão
Modelo
Parte fixa
Peso amostral
Estimativa
Erro
Padrão
p-valor*
0,00004
0,00006
0,444
0,92210
0,25135
0,08350
0,04581
0,01243
0,00752
-
Parte aleatória – Estimativa da
variância dos interceptos aleatórios
2º nível - Domicílio
3º nível - Setor
4º nível - Município
A Tabela 3 apresenta os resultados dos testes de comparabilidade de modelos
encaixados (teste Qui-quadrado de razão de pseudoverossimilhanças), resultante da
comparação das funções de verossimilhança do modelo nulo de 4 níveis (adulto, domicílio,
setor, município) com os seguintes modelos: 1) o modelo nulo de 3 níveis (adulto, domicílio,
137
setor); 2) o modelo nulo de 2 níveis (adulto, domicílio); 3) modelo nulo de 3 níveis (adulto,
setor, município); 4) modelo nulo de 3 níveis (adulto, domicílio, município).
Tabela 3: Resultados do teste de comparabilidade entre o modelo nulo de 4 níveis (adulto,
domicílio, setor, município) com outros quatro modelos nulos com menos níveis de
hierarquia.
Comparações entre quatro diferentes modelos nulos
com o modelo nulo de 4 níveis (AIC= 132.256,2)
Teste 1) Modelo nulo de 3 níveis (adulto, domicílio, setor)
Teste 2) Modelo nulo de 2 níveis (adulto, domicílio)
Teste 3) Modelo nulo de 3 níveis (adulto, setor, município)
Teste 4) Modelo nulo de 3 níveis (adulto, domicílio, município)
Resultados do teste Quiquadrado de razão de
pseudoverossimilhanças
χ2
p-valor
394,81
1.456,46
678,29
696,87
<0,001
<0,001
<0,001
<0,001
AIC*
132.649,0
133.708,7
132.932,5
132.951,1
*Critério de Informação de Akaike (AIC)
Os resultados dos três testes fornecidos na Tabela 3 mostram que o modelo multinível
que considera os 4 níveis de hierarquia é o mais adequado, ou seja, conclui-se portanto que os
efeitos aleatórios do setor e município, isoladamente (testes 1 e 4) ou conjuntamente (teste 2),
contribuem significativamente para a qualidade do modelo. Com base no teste 3, se
evidenciou ainda que o efeito aleatório do domicílio é significativamente diferente de zero,
quando são mantidos os demais efeitos de grupo (setor e município) no modelo (χ2=678,29;
p-valor<0,001).
A partir do modelo nulo de 4 níveis, isto é, do modelo logístico ordinal ajustado
somente com os interceptos aleatórios nos níveis dos domicílios, setores e municípios
(Tabela 4), obteve os coeficientes de partição de variância (CPV). Através do cálculo do CPV
para os municípios (4º nível) verificou-se que aproximadamente 2,0% da variação dos níveis
do estado de saúde autorreferido é atribuída às diferenças dos municípios. O CPV para os
setores (3º nível), por sua vez, indicou que 7,4% da variação dos níveis de autoavaliação de
saúde é atribuída as diferenças dos setores (que estão dentro dos mesmos municípios). Já o
CPV para os domicílios (2º nível), foi mais elevado mostrando que aproximadamente 28% da
138
variação dos níveis de autoavaliação de saúde é devida as diferenças dos domicílios (que
estão dentro dos mesmos setores pertencentes aos mesmos municípios).
Embora a parcela de variação explicada pelas diferenças entre os municípios seja
baixa (CPV≅2,0%), a consideração do nível municipal na análise dos níveis de autoavaliação
de saúde deveu-se também ao fato dos municípios considerados (municípios grandes em
termos populacionais e os municípios das Regiões Metropolitanas) representarem os estratos
no plano amostral da PNAD.
No modelo multinível ajustado somente com a área de localização do domicílio
(Tabela 4), observou-se que a área apresenta um efeito estatisticamente significante nos níveis
de autoavaliação de saúde de adultos (OR=1,42; p-valor<0,001). A medida de razão de
chance de 1,42 indica que a chance dos adultos residentes nos municípios considerados
autorreferirem um melhor estado de saúde na área urbana é 42% maior em comparação à área
rural. Em comparação a parte aleatória do modelo nulo, pode-se observar que as estimativas
de variância dos interceptos aleatórios praticamente permaneceram inalteradas com a
introdução da área de localização do domicílio (Tabela 4).
Tabela 4: Estimativas para os modelo logísticos ordinais de interceptos aleatórios de 4 níveis
para o desfecho de autoavaliação de saúde de adultos.
Modelo com a área de localização do
domicílio
Modelo nulo
Modelo
Parte fixa
Área de localização do domicílio
Parte aleatória – Estimativa da
variância dos interceptos aleatórios
2º nível – Domicílio
3º nível – Setor
4º nível – Município
* Teste de Wald
Razão de
chance
Erro
padrão
Razão de
chance
Erro
padrão
p-valor*
-
-
1,42
0,083
<0,001
0,923
0,251
0,086
0,046
0,012
0,007
0,920
0,248
0,084
0,046
0,012
0,007
-
139
Ao ajustar o modelo multinível com a área de localização do domicílio e todas as
dezoito variáveis de controle que retratam características dos adultos (indivíduos) e do
ambiente intradomiciliar (domicílio) e extradomiciliar (setor), observou-se que apenas duas
variáveis do ambiente intradomiciliar (condição de ocupação do domicílio e PSF) não
apresentaram efeito significativo, e portanto foram excluídas da análise, resultando no modelo
fornecido na Tabela 5. Ao controlar pelas demais variáveis, a área de localização do domicílio
deixou de ter um efeito estatisticamente significante sobre os níveis de autoavaliação de saúde
de adultos (OR=0,92; p-valor=0,186).
Além disso, depois de controlar a associação entre a área e o nível de autoavaliação de
saúde (variável latente) por variáveis do indivíduo e do ambiente intra e extradomiciliar
(Tabela 5), observou-se redução das estimativas das variâncias de todos os interceptos
aleatórios do modelo, sendo que esta redução foi: de 6,3% para o nível do domicílio, de
34,3% para o nível do setor e de 35,7% para o nível do município. Esses decréscimos pode ser
devida a diferença de composição dos domicílios, setores e/ou municípios com respeito às
variáveis adicionadas no modelo.
Com relação a parte fixa do modelo ajustado com apenas os efeitos principais
(Tabela 5), observou-se que a chance de apresentar um melhor estado de saúde autorreferido é
22,0% maior para os adultos do sexo feminino (OR=1/0,82=1,22; p-valor<0,001) e menor a
medida que aumenta a faixa etária do adulto. A chance é 18% maior para os adultos de raça
branca (OR= 1,18, p-valor<0,001), 21% maior para adultos ocupados (OR=1,21; pvalor<0,001), 41% maior para os que têm plano de saúde (OR=1,41; p-valor<0,001), 85%
maior para os adultos que não consultaram médico nos últimos doze meses (OR=1/0,54=1,85;
p-valor<0,001), mais de 4 vezes maior para os adultos sem nenhuma doença crônica
(OR=1/0,23=4,3; p-valor<0,001), 44% para os que praticam atividade física (OR=1,44; pvalor=<0,001) e 25% maior para os não fumantes em comparação aos fumantes
140
(OR=1/0,80=1,25; p-valor=<0,001) e 19% maior comparativamente aos ex-fumantes
(OR=1/0,84=1,19;p-valor=<0,001).
Observa-se ainda que a chance de autorreferir melhor estado de saúde é: 6% maior
para os adultos que residem em domicílios adequados quanto a qualidade da moradia
(OR=1,06; p-valor=0,027), 28% maior para os adultos residentes em domicílios com todos os
bens básicos (OR=1,28; p-valor=<0,001). Além disso, verifica-se que chance do adulto
reportar melhor estado de saúde aumenta em 35% ao aumentar em 1 unidade o percentual de
domicílios adequados no setor quanto a qualidade da moradia (OR=1,35; p-valor<0,001).
Considerando o Centro-Oeste como categoria de referência, observou-se nas regiões
Norte (OR=0,86; p-valor=0,007) e Nordeste (OR=0,75; p-valor<0,001) menor chance do
adulto autorreferir melhor estado de saúde, enquanto nas regiões Sul (OR=1,10; pvalor=0,076) e Sudeste (OR=1,07; p-valor=0,155) maior chance, embora para as duas últimas
regiões a associação encontrada não foi estaticamente significante. Observa-se também um
aumento na chance de melhor autoavaliação de saúde para adultos à medida que aumenta a
escolaridade, e a renda domiciliar per capita; e uma redução nesta chance a medida que
aumenta o problema de mobilidade física.
141
Tabela 5: Análise multinível da autoavaliação de saúde de adultos: estimativas para o modelo
logístico ordinal de interceptos aleatórios de 4 níveis considerando efeitos principais.
Variáveis
Parte fixa
Área
Urbano
Rural
Região de residência
Norte
Nordeste
Sudeste
Sul
Centro-oeste
Sexo
Masculino
Feminino
Faixa etária
20 a 29 anos
30 a 39 anos
40 a 49 anos
50 a 59 anos
60 anos ou +
Cor/raça
Branca
Não branca
Escolaridade
S/ instrução ou < 1 ano
1 a 7 anos
8 a 14 anos
15 anos ou +
Sem declaração
Renda domiciliar per capita
Sem renda ou até 1 s.m
Mais de 1 a 5 s.m
Mais de 5 s.m
Sem declaração
Situação de ocupação
Ocupada
Não ocupada
Atividade física
Pratica
Não pratica
Sem declaração
Fumo
Fumante
Ex-fumante
Nunca fumou
Modelo de interceptos
aleatórios de 4 níveis, com
todos os efeitos principais das
variáveis
Modelo de interceptos aleatórios
de 4 níveis, excluindo a variável
“condição de ocupação do
domicílio”
Modelo selecionado: Modelo de
interceptos aleatórios de 4
níveis, excluindo as variáveis
“condição de ocupação do
domicílio” e “PSF”
Razão
de
chance
Erro
padrão
pvalor*
Razão de
chance
Erro
padrão
p-valor*
Razão de
chance
Erro
padrão
p-valor*
0,92
1
0,061
-
0,157
-
0,96
1
0,061
-
0,478
-
0,92
1
0,061
-
0,186
-
0,85
0,74
1,07
1,09
1
0,056
0,047
0,048
0,054
-
0,004
<0,001
0,185
0,096
-
0,86
0,91
1,05
1,09
1
0,057
0,049
0,049
0,054
-
0,007
0,044
0,358
0,133
-
0,86
0,75
1,07
1,10
1
0,055
0,047
0,047
0,053
-
0,007
<0,001
0,155
0,076
-
0,82
1
0,021
-
<0,001
-
0,82
1
0,021
-
<0,001
-
0,82
1
0,021
-
<0,001
-
1,51
1,30
1,02
0,82
1
0,039
0,036
0,033
0,032
-
<0,001
<0,001
0,660
<0,001
-
1,49
1,29
1,01
0,82
1
0,039
0,036
0,033
0,032
-
<0,001
<0,001
0,785
<0,001
-
1,49
1,29
1,01
0,82
1
0,039
0,036
0,033
0,032
-
<0,001
<0,001
0,772
<0,001
-
1,17
1
0,022
-
<0,001
-
1,19
1
0,022
-
<0,001
-
1,18
1
0,022
-
<0,001
-
0,43
0,47
0,68
1
0,41
0,056
0,047
0,044
0,224
<0,001
<0,001
<0,001
<0,001
0,42
0,46
0,68
1
0,41
0,056
0,047
0,044
0,223
<0,001
<0,001
<0,001
<0,001
0,43
0,46
0,68
1
0,41
0,056
0,047
0,044
0,224
<0,001
<0,001
<0,001
<0,001
0,51
0,68
1
0,68
0,056
0,052
0,074
<0,001
<0,001
<0,001
0,51
0,68
1
0,69
0,056
0,052
0,074
<0,001
<0,001
<0,001
0,51
0,68
1
0,68
1,21
1
0,022
-
<0,001
-
1,20
1
0,022
-
<0,001
-
1,21
1
0,056
0,052
0,074
0,022
-
<0,001
<0,001
<0,001
<0,001
-
1,44
1
0,42
0,025
0,062
<0,001
<0,001
1,44
1
0,42
0,025
0,062
<0,001
<0,001
1,44
1
0,42
0,025
0,062
<0,001
<0,001
0,80
0,84
1
0,029
0,027
-
0,80
0,84
1
0,029
0,027
-
<0,001
<0,001
-
0,80
0,84
1
0,029
0,027
-
<0,001
<0,001
-
<0,001
<0,001
-
142
Sem declaração
Morbidade autorreferida
Pelo menos 1 doença
Nenhuma doença
Mobilidade física
Muita limitação
Limitação
Pouca limitação
Sem limitação
Posse de plano de saúde
Sim
Não
Consulta médica
Sim
Não
Qualidade da moradia
Adequada
Não adequada
Posse de bens básicos
Tem todos os 4 bens
Não tem ao menos 1 bem
% domicílios adequados
PSF
Sim
Não
Cond. de ocup. domicílio
Próprio
Alugado
Cedido
Outra
Parte aleatória – Estimativa
da variância dos interceptos
aleatórios
2º nível – Domicílio
3º nível – Setor
4º nível – Município
0,96
0,027
0,106
0,96
0,027
0,101
0,96
0,027
0,091
0,23
1
0,025
-
<0,001
-
0,24
1
0,025
-
<0,001
-
0,23
1
0,025
-
<0,001
-
0,11
0,14
0,37
1
0,044
0,033
0,028
-
0,11
0,14
0,37
1
0,044
0,033
0,028
-
<0,001
<0,001
<0,001
-
0,11
0,14
0,37
1
0,044
0,033
0,028
-
<0,001
<0,001
<0,001
-
1,40
1
0,025
-
<0,001
-
1,41
1
0,025
-
<0,001
-
1,41
1
0,025
-
<0,001
-
0,54
1
0,027
-
<0,001
-
0,54
1
0,027
-
<0,001
-
0,54
1
0,027
-
<0,001
-
1,06
1
0,028
-
0,040
-
1,06
1
0,028
-
0,034
-
1,06
1
0,028
-
0,027
1,28
1
1,34
0,030
0,053
<0,001
<0,001
1,29
1
1,30
0,030
0,053
<0,001
<0,001
1,28
1
1,35
0,030
0,052
<0,001
<0,001
0,95
1
0,023
-
0,029
-
0,96
1
0,023
-
0,066
-
1,09
1,03
0,98
1
0,124
0,126
0,130
-
0,503
0,813
0,896
-
0,863
0,053
0,863
0,053
0,862
0,053
0,162
0,054
0,013
0,006
0,162
0,068
0,013
0,008
0,163
0,054
0,013
0,006
<0,001
<0,001
<0,001
-
* Teste de Wald
Nota: Excluídas as variáveis condição de ocupação do domicílio e PSF no ajuste do modelo multinível.
-
143
5.4.4. DISCUSSÃO:
Este artigo usando análise multinível buscou estabelecer as relações entre os níveis de
autoavaliação de saúde e um conjunto de fatores individuais e ambientais para uma amostra
complexa de adultos residentes em municípios populosos (municípios das regiões
metropolitanas ou municípios grandes em termos populacionais).
Como o estudo de Moraes et al.15 em que foi usado uma abordagem agregada de
análise e uma abragência maior (nacional); o presente estudo também verificou, na análise
bruta, que a área urbana (em comparação a área rural) está associada a melhores níveis de
autoavaliação de saúde dos adultos; e que após controlar para variáveis individuais (adultos) e
do ambiente intradomiciliar (domicílios) e extradomiciliar (setores), a associação entre a área
de localização do domicílio e a autoavaliação de saúde passou a não apresentar efeito
significativo. Adicionalmente, após o controle por tais variáveis, observou-se no presente
estudo que as estimativas de variância dos interceptos aleatórios do modelo sofreram
reduções, evidenciando existência de efeito composicional do lugar de moradia (município,
setor e/ou domicílio) nos níveis de autoavaliação de saúde dos adultos.
Embora na análise multivariada (ajustada) não tenha se evidenciado uma diferença
estatisticamente significante nos níveis de autoavaliação de saúde de adultos entre áreas
urbana e rural de municípios populosos, as relações encontradas no presente estudo nos
remetem as conseqüências da urbanização sobre a saúde da população apontadas por e
Nakamura3, Geib4 e Caiffa et al.5. Observa-se para estes municípios, o efeito das condições de
vida no ambiente intra e extradomiciliar (qualidade da moradia, posse de bens básicos, renda
domiciliar per capita e percentual de domicílios no setor quanto a qualidade de moradia) na
variação dos níveis de autoavaliação de saúde. Além disso, observa-se a existência de efeito
na saúde autorreferida proveniente de fatores individuais, que englobam os aspectos
144
sociodemográficos (sexo, faixa etária, região de residência, raça, escolaridade e ocupação), os
de saúde (presença de alguma doença crônica, mobilidade física, posse de plano de saúde e
consulta médica), além dos fatores relativos à “comportamentos e estilos de vida” (atividade
física e fumo).
Quando se considera apenas as cidades populosas incluindo as formadoras das regiões
metropolitanas, observou-se uma diferença com relação à análise multivariada (análise dos
efeitos principais) desenvolvida por Moraes et al.15. Num ambiente mais metropolitano a
qualidade da moradia (característica intradomiciliar) apresentou efeito estatisticamente
significante indicando que adultos residentes em moradias adequadas possuem melhores
níveis de estado de saúde autorreferido, traduzindo a importância da qualidade de moradia
como indicador de privação real que influencia a saúde do indivíduo de forma direta
(proteção/segurança/conforto) e de forma indireta (estresse e ansiedade relacionados as
inadequadas condições de habitabilidade).
Neste estudo foram considerados apenas os adultos que informaram o seu próprio
estado de saúde, excluindo-se os adultos cujo estado de saúde foi informado por outras
pessoas moradoras da unidade domiciliar ou mesmo por outras pessoas não residentes no
domicílio, pois as informações prestadas por terceiros poderia aumentar a chance de ocorrer
viés de informação sobre o estado global de saúde. A autoavaliação de saúde é um indicador
que vem sendo levantado em diferentes inquéritos populacionais na área de saúde, por várias
razões: por ser de fácil mensuração ou aplicação16; por ser uma medida confiável e
válida17,18,19, por permitir comparações internacionais20, pela sua própria natureza subjetiva21;
por sua forte associação com estado real de saúde22; por ser um preditor sensível de
morbidade e mortalidade23,24,25, por captar o bem estar físico, mental e social do indivíduo26 e
por permitir o monitoramento das condições de saúde de populações27.
145
A consideração de apenas municípios autorrepresentativos (municípios grandes em
tamanho populacional ou municípios situados nas regiões metropolitanas) foi devida, por um
lado, a complexidade de se ajustar um modelo multinível usando todas as características do
plano amostral da PNAD em nível nacional, aliado ao elevadíssimo tempo de processamento
para ajuste de modelos multiníveis com grande quantidade de variáveis explicativas, de níveis
hierárquicos e usando grandes amostras. Por outro lado, deveu-se a importância desses
municípios, em especial os das regiões metropolitanas, no processo de urbanização brasileira.
De acordo com Peres & Zimmermann28, região metropolitana pode ser definida como uma
mancha de ocupação contínua ou não diretamente polarizada por uma metrópole, onde se
realizam as maiores intensidades de fluxos e as maiores densidades de população e atividades
envolvendo municípios fortemente integrados. Estes mesmos autores apontam ainda que
municípios que integram regiões metropolitanas têm como principal característica o elevado
grau de complementaridade das funções urbanas (habitação, saúde, educação, saneamento e
meio ambiente, segurança pública, transporte, defesa civil, etc.), tendo como resultado uma
gestão compartilhada e a busca por soluções integradas visando melhoria dos serviços
públicos municipais e da qualidade de vida da população. Além disso, uma vantagem de se
considerar os referidos municípios se refere ao critério político-administrativo usado pelo
IBGE para classificação dos limites de urbano e rural, pois segundo Endlich29 as críticas
quanto a esse critério somente são relevantes no caso de se estudar pequenas cidades, uma vez
que são justamente em cidades pequenas que os limites estabelecidos entre essas duas áreas
ainda são procurados.
Devido à estrutura hierárquica dos dados da PNAD, onde os adultos estão agrupados
em unidades domiciliares, que estão grupados em setores censitários, que por sua vez, estão
agrupados em municípios; utilizou-se neste artigo o modelo de regressão logística ordinal
multinível com quatro níveis hierárquicos (1º nível: adulto, 2º nível: domicílio, 3º nível: setor,
146
4º nível: município). Este tipo modelo é o mais adequado, pois ao contrário do modelo linear
generalizado (modelo de efeitos fixos) não assume que todas as observações são
independentes, sendo portanto apropriado para análise de dados de pesquisas que apresentam
algum tipo de estrutura de correlação, como pesquisas longitudinais ou pesquisas que fazem
uso de conglomeração, como as PNADs.
A análise multinível é um dos tipos de análise de regressão que, simultaneamente, leva
em consideração múltiplos níveis de agregação, tornando corretos erros padrão, intervalos de
confiança e testes de hipóteses30,31. Além disso, neste tipo de abordagem de análise, além da
inclusão de interceptos aleatórios que representam a heterogeneidade entre os grupos no
desfecho de interesse, possibilita a consideração de coeficientes aleatórios, que representam,
por sua vez, a heterogeneidade na relação entre o desfecho e as variáveis explicativas31.
Embora as informações estruturais tenham sido consideradas, o plano amostral da
PNAD utiliza ainda probabilidades desiguais de seleção, resultando em diferentes pesos
associados aos adultos da amostra. Como bem aponta Souza & Nilza32, embora os pesos de
amostragem sejam utilizados para compensar as probabilidades desiguais das unidades
amostrais, contribuindo para redução de vícios, estimativas ponderadas tendem a ser menos
precisas, apresentando maior variância quando comparadas àquelas não ponderadas. Por este
motivo, ressalta-se a importância de se incorporar também os pesos amostrais nas análises
sempre que possível e/ou necessário.
Além do programa GLLAMM, tentou-se ajustar o mesmo modelo multinível, usando
a PROC GLIMMIX do SAS 9.1 e 9.2, mas neste caso o ajuste era interrompido
automaticamente devido à insuficiência de recursos computacionais (capacidade de memória
insuficiente para o processamento do modelo).
147
5.4.5. BIBLIOGRAFIA:
1. Martine G, Mcgranahan G. População e Cidades: subsídios para o planejamento e para
as políticas sociais. In: Baeninger, R.(org.). Campinas: Núcleo de Estudos de
População- NEPO / Unicamp; Brasília: UNFPA, 2010.
2. Giffoni M. Urbanização e a Rede de Cidades no Brasil, 2010. Disponível em:
http://fichasmarra.wordpress.com/2010/12/21/urbanizacao-e-a-rede-de-cidades-no-brasil/
3. Nakamura E. Algumas considerações antropológicas sobre o processo de urbanização
e suas conseqüências sobre a saúde mental das crianças. Infanto - Rev. Neuropsiq. da
Inf. e Adol., 4(1): 52-56, 1996
4. Geib LTC. Determinantes sociais da saúde do idoso. Ciênc. saúde coletiva. 2012,
17(1):123-133
5. Caiaffa WT, Ferreira FR, Ferreira AD, Oliveira CDL, Camargos VP, Proietti FA.
Saúde urbana: “a cidade e uma estranha senhora, que hoje sorri e amanhã te devora”.
Cienc. Saude Colet 2008; 13(6): 1785-1786.
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150
6. Considerações finais
Em termos gerais esta tese avaliou o efeito da área de localização do domicílio (área
urbana em comparação a área rural) na autoavaliação de saúde de adultos brasileiros.
Utilizou-se a autoavaliação de saúde por ser um indicador fortemente associado com estado
real de saúde dos indivíduos, sendo considerado como uma boa proxy das condições objetivas
de saúde (CARMAGOS et al., 2009). Além disso, a natureza subjetiva deste indicador de
saúde parece não constituir uma limitação quando se leva em conta que o processo saúdedoença é um processo contínuo, relativo e subjetivo, cuja percepção, cognição e interpretação
variam no tempo e no espaço, em função de características individuais e contextuais
(NOGUEIRA, 2008). Nesse sentido, sob a definição mais ampliada de saúde consolidada pela
criação da Comissão Nacional sobre os “Determinantes Sociais da Saúde” no Brasil em 2006,
se reconhece que a saúde é influenciada por características do contexto social, que geram
desigualdades nas exposições e vulnerabilidades (GEIB, 2012). Desse modo, nesta tese ao
estabelecer a associação entre a área de localização do domicílio e os níveis de autoavaliação
de saúde, foram consideradas ainda fatores individuais e fatores relacionados a
comportamentos e estilos de vida (tabagismo e sedentarismo), além de fatores contextuais do
local de moradia de grande importância para a promoção da qualidade de vida dos indivíduos,
que incluíram características do ambiente intradomiciliar (qualidade da habitação, posse de
bens básicos, rendimento domiciliar per capita, condição de ocupação do domicílio, domicílio
cadastrado no Programa da Saúde da Família) e do ambiente extradomiciliar (percentual de
domicílios adequados quanto a qualidade da moradia).
Entre as mudanças demográficas que o Brasil vem experimentando, destaca-se o
processo de urbanização brasileira como uma das mais importantes e como o fenômeno de
maior
influência
nas
condições
ambientais
e
socioeconômicas
nos
países
em
151
desenvolvimento. Entretanto, há divergências entre os estudos quanto aos múltiplos efeitos da
urbanização na saúde da população. Alguns estudos apontam como fatores que proporcionam
uma melhor saúde dos indivíduos em áreas urbanas, comparativamente a áreas rurais, um
maior nível de renda, educação e informação, que lhes promovem um melhor acesso a uma
alimentação de qualidade e um maior acesso de serviços de saúde (VLAHOV et al., 2005;
MCDADE et al., 2001). Enquanto outros estudos apontam que o processo de urbanização,
agrava a pobreza e a exclusão social e contribui para manutenção das desigualdades de renda
e para proliferação de moradias precárias, que por sua vez tendem a ampliar os efeitos
negativos sobre a saúde da população (GEIB, 2012; AZEREDO et al., 2007; MOORE et al.,
2003). Independente do efeito (positivo ou negativo) de ser viver nas cidades (espaço urbano),
o conceito de saúde deve incorporar o cotidiano dos indivíduos vivendo nas cidades, não
ignorando as relações de interdependência que existem entre o indivíduo e o ambiente físico e
social onde ele vive (CAIAFFA et al., 2008). Nesse sentido, buscou-se nesta tese avaliar
diferenças nos níveis de saúde autorreferida de adultos que vivem em áreas urbana e rural,
controlando para características individuais e ambientais. Nesta tese utilizou-se a definição
político-administrativa adotada pelo IBGE, devido à falta de consenso da definição urbanorural e da falta de uma definição oficial mais criteriosa e de fácil operacionalização do que é
cidade no Brasil.
Na avaliação da associação entre a área de localização do domicílio e os níveis de
autoavaliação de saúde foram consideradas duas diferentes abordagens de análise: a
abordagem agregada e a abordagem desagregada. Independente da abordagem adotada, entre
os diferentes modelos usados nas análises desenvolvidas nesta tese destaca-se o modelo de
chances proporcionais, por ser: o modelo de regressão logística ordinal mais utilizado na área
de saúde, que incorpora a natureza ordinal da autoavaliação de saúde; por estar implementado
na maioria dos pacotes estatísticos, inclusive para análise de dados amostrais complexos; e
152
por ser o modelo mais popular, parcimonioso e interpretável. As análises deram origem a
quatro artigos cujos objetivos e conclusões são apresentados a seguir de forma resumida, onde
o primeiro artigo foi publicado na Revista Ciência & Saúde Coletiva em 2011, o segundo
artigo aceito para publicação nos Cadernos de Saúde Pública em 2012 e os dois últimos
artigos estão em fase de submissão.
O 1º artigo intitulado “Associação entre o estado de saúde autorreferido de adultos e
a área de localização do domicílio: uma análise de regressão logística ordinal usando a
PNAD 2008” mostrou na análise bruta que a área urbana está associada a melhores níveis de
saúde autorreferida em comparação a área rural. Após o controle por variáveis individuais e
do ambiente intradomiciliar e extradomiciliar, a associação entre a área de localização do
domicílio e os níveis de autoavaliação de saúde perdeu a sua significância estatística.
Adicionalmente, ao avaliar as interações duplas com a variável de interesse, observou-se a
existência de efeito de interação estatisticamente significante entre a área e cinco variáveis de
controle: sexo, cor/raça, morbidade autorreferida, posse de bens básicos e o percentual de
domicílios adequados quanto à qualidade da moradia.
No 2º artigo intitulado “Efeito do plano amostral em modelo de regressão logística
ordinal: uma análise do estado de saúde autorreferido de adultos no Brasil usando a
PNAD 2008”, considerando as características inerentes ao plano amostral adotado nesta
pesquisa, tais como estratificação, conglomeração e pesos amostrais distintos, comparou-se
situações de análise na qual o pesquisador ignora ou negligência alguns ou todos os aspectos
do plano amostral, mostrando as suas conseqüências nas medidas de razões de chance e nos
erros padrão das estimativas dos coeficientes, no contexto de modelo de regressão logística
ordinal (modelo de chances proporcionais) ajustado pelo método de Máxima Verossimilhança
(MV). Utilizou-se como parâmetro de comparação às referidas estimativas do modelo de
regressão logística ordinal obtidas pelo método de Máxima Pseudo-Verossimilhança (MPV),
153
que representa uma situação adequada de modelagem na qual o pesquisador reconhece os
aspectos de complexidade do plano amostral da PNAD e os incorpora na análise. A partir dos
resultados obtidos, concluiu-se que quando se considera os pesos amostrais e ignora a
estratificação e a conglomeração (UPA), as medidas de razão de chance não sofrem qualquer
alteração, mas as estimativas dos erros padrão dos estimadores dos coeficientes do modelo
ficam bem subestimadas, dando uma falsa idéia de que os coeficientes estimados são mais
precisos, resultando em p-valores menores. Além disso, quando os pesos amostrais e as
informações
estruturais
do
plano
amostral
(estratificação
e
conglomeração)
são
simultaneamente ignorados observou-se para quase todos os fatores que as medidas de razão
de chance sofreram alterações e que os erros padrão dos estimadores dos coeficientes do
modelo também ficam bem subestimados, constituindo-se assim a pior situação de análise.
Nesta última situação de modelagem, apesar dos sentidos das associações permaneceram de
modo geral os mesmos, a magnitude das associações é de extrema importância na análise de
dados epidemiológicos, inclusive na análise das interações entre as variáveis.
Devido à autoavaliação de saúde ser comumente reduzida a um indicador dicotômico
por meio da transferência da categoria regular para a saúde não boa, e em diferentes estudos
essa dicotomização não apresentar maiores justificativas podendo gerar perda de informação e
eficiência, desenvolveu-se o 3º artigo intitulado “Autoavaliação de saúde e sua relação com a
situação censitária: uma análise do efeito do uso das escalas ordinal e binária, segundo os
dados da PNAD 2008”. Este artigo avaliou o efeito da escala binária e ordinal ao estabelecer
a associação entre a situação censitária (urbana e rural) e o desfecho de autoavaliação de
saúde. Nesta avaliação considerou-se a escala ordinal original da autoavaliação de saúde que
contém cinco categorias (1-muito ruim, 2-ruim, 3-regular, 4-bom, 5-muito bom), a escala
ordinal com três categorias (1-muito ruim/ruim, 2-regular, 3-bom/muito bom) e a escala
binária como adotada em muitos estudos (1-muito ruim/ruim/regular, 2-bom/muito bom),
154
sobretudo naqueles que fazem uso dos dados das PNADs. No caso da escala ordinal utilizouse o modelo de regressão logística ordinal (modelo de chances proporcionais) e no caso da
escala binária adotou-se o modelo de regressão logística binária. Os resultados mostraram, por
um lado, que o tipo de escala não influenciou no sentido, magnitude e significância estatística
da associação de interesse entre a situação censitária e a chance (acumulada) de melhor
autoavaliação de saúde nas análises bruta e multivariada. Mas, por outro lado, influenciou na
seleção do modelo. Quando se considerou a ordinalidade do desfecho de autoavaliação de
saúde por meio de modelo de chances proporcionais, verificou-se que as variáveis de controle
“condição de ocupação do domicílio”, “qualidade da moradia” e “Programa da Saúde da
Família” foram excluídas por não apresentarem efeito estatisticamente significante, enquanto
que para escala binária somente as variáveis “condição de ocupação do domicílio” e
“qualidade da moradia” foram excluídas do modelo. No entanto, tal diferença pode ser devida
à não verificação da hipótese de homogeneidade das inclinações para algumas das variáveis
de controle em particular para variável “Programa da Saúde da Família”. Nesse sentido, o
modelo de chances proporcionais parciais pode ser uma alternativa mais adequada que o
modelo de chances proporcionais e que o modelo logístico binário.
No 4º artigo intitulado “Área de localização do domicílio e autoavaliação de saúde de
adultos brasileiros residentes em cidades populosas: uma análise multinível usando os dados
da PNAD 2008”, por meio de modelo de regressão logística ordinal multinível com quatro
níveis (adulto, domicílio, setor, município AR), verificou-se que os adultos residentes em
áreas urbanas de municípios populosos também reportam melhores níveis de estado de saúde
em comparação aos adultos residentes em áreas rurais desses municípios. Na análise
multinível, ao controlar por características individuais e do ambiente intradomiciliar e
extradomiciliar também não se verificou uma diferença estatisticamente significante nos
níveis de autoavaliação de saúde entre áreas urbana e rural de municípios populosos.
155
Observou-se a influência das condições de vida (qualidade da moradia, posse de bens básicos,
renda domiciliar per capita e percentual de domicílios no setor quanto à qualidade de
moradia) nos níveis de autoavaliação de saúde de adultos, além da influência das
características individuais, que inclui aspectos demográficos, socioeconômicos, de saúde e
comportamentos e estilos de vida.
Adicionalmente foram gerados resultados suplementares (Apêndice) que comparam o
efeito da área de localização do domicílio nos níveis de autoavaliação de saúde (escala ordinal
de três categorias) de adultos que informaram seu próprio estado de saúde usando o modelo
de chances proporcionais e o modelo de chances proporcionais parciais para uma abordagem
agregada. No MCP univariado verificou-se que a chance acumulada de melhor autoavaliação
de saúde na área urbana é 51% maior que na área rural independente da categoria do
desfecho. No MCPP univariado observou-se, por sua vez, uma diferença, mas de
aproximadamente 10%, na chance acumulada de melhor autoavaliação de saúde dependendo
da categoria da autoavaliação de saúde (K=1 ou K=2). No entanto, com relação à análise
multivariada (Tabela 2 do apêndice) observou-se que o efeito da área de localização do
domicílio na saúde autorreferida é aproximadamente o mesmo e não estatisticamente
significante nos dois tipos de modelos de regressão ordinal (MCP e MCPP), mas no MCP
multivariado a variável PSF não apresentou efeito estatisticamente significante e foi excluída
da análise. Além disso, no MCPP multivariado observou-se que algumas das variáveis de
controle não atenderam o pressuposto de homogeneidade das inclinações. Todavia, as
estimativas das probabilidades acumuladas de melhor autoavaliação de saúde por área de
localização do domicílio são bem semelhantes nos dois tipos de modelo logístico ordinal
como mostrado na Figura 1 do apêndice.
156
Apêndice:
A Tabela 1 apresenta os resultados dos ajustes do modelo de chances proporcionais e
do modelo de chances proporcionais parciais univariado explicativos da autoavaliação de
saúde (escala ordinal de K=3 categorias) para a amostra de adultos residentes em municípios
das regiões metropolitanas ou em municípios grandes em termos populacionais
(autorrepresentativos).
No MCPP univariado (análise bruta), embora a associação continue positiva como no
MCP univariado ajustado usando a mesma amostra de adultos (artigos 1, 2 e 3) e a mesma
escala de autoavaliação de saúde (escala de três categorias), observou-se uma diferença (de
aproximadamente 10%) na chance acumulada de melhor autoavaliação de saúde dependendo
da categoria da autoavaliação de saúde (K=1 ou K=2). Neste modelo a chance do adulto
reportar um estado de saúde regular/bom/muito bom (relativamente a categoria ruim/muito
ruim) é 38% (OR1**=1,38; p-valor<0,001) maior na área urbana do que na área rural,
enquanto que a chance do adulto reportar um estado de saúde bom/muito bom (relativamente
a categoria regular/ruim/muito ruim) é 52% (OR2**=1,52; p-valor<0,001) maior na área
urbana.
Tabela 1: Ajustes dos modelos logísticos ordinais univariados (MCP e MCPP) para
estabelecimento da associação entre área censitária (urbano vs rural) e a chance acumulada de
uma melhor autoavaliação de saúde.
Variáveis
*MCPP:
Escala de K=3 categorias
MCP: Escala de K=3
categorias
(Y>k), k=1,2
OR**
EP
p-valor
1,51
1
0,026
-
<0,001
-
(Y>1)
(Y>2)
OR1** OR2**
(Y>1)
(Y>2)
(Y>1)
(Y>2)
EP1
EP2
p-valor1
p-valor2
0,056
0,040
<0,001
-
<0,001
Área censitária
Urbano*
Rural
1,38
1
1,52
-
157
A Tabela 2 fornece o ajuste do MCPP e do MCP multivariados. Ao controlar por
variáveis demográficas, socioeconômicas, comportamentais e de saúde, verifica-se que a
associação entre a área de localização do domicílio e a chance do adulto autorreferir melhor
estado de saúde deixa de ser estatisticamente significante (MCPP: OR**=0,97; pvalor=0,297; MCP: OR**=0,96; p-valor=0,208).
Além da área de localização do domicílio, observou-se no MCPP que uma grande
parte das variáveis de controle satisfez a hipótese de homogeneidade das inclinações ao nível
de significância de 1%, como: 1) renda domiciliar per capita (todos as faixas), 2) escolaridade
(sem declaração, sem instrução ou menos de 1 ano), 3) cor, 4) grandes regiões brasileiras
(Norte, Nordeste), 5) fumo (sem declaração, ex-fumante), 6) morbidade autorreferida, 7)
mobilidade física (pouca limitação), 8) consulta médica e 9) posse de plano de saúde. Para as
demais variáveis que não satisfizeram a hipótese de homogeneidade, verificou-se de modo
geral o mesmo sentido das associações encontradas no MCP, mas a magnitude dessas
associações foi diferente dependendo da categoria da autoavaliação de saúde ser muito
ruim/ruim (k=1) ou regular (k=2).
Quanto à qualidade do ajuste do MCPP multivariado, verificou-se que a porcentagem
global de adultos classificados corretamente é de 75,1%, indicando que este modelo também
apresenta uma capacidade preditiva razoável assim como no MCP ajustado para a mesma
amostra de adultos e usando a mesma escala de autoavaliação de saúde (escala de três
categorias).
Ao analisar o percentual de classificações corretas por categoria de autoavaliação de
saúde, observou-se ainda que o MCPP multivariado ajustado para a autoavaliação de saúde
com três categorias apresentou percentuais de classificações corretas para as categorias
“regular” (49,5%) e ‘bom/ muito bom” (89,9%) aproximadamente iguais aos obtidos com o
MCP (escala de três categorias), sendo que para a categoria “muito ruim/ruim” (13,1%) o
158
percentual de classificações corretas foi aproximadamente duas vezes maior. Além disso, o
MCPP usando a escala de três categorias apresentou uma medida de qualidade do ajuste
(pseudo R2 de Nagelkerke) moderada e igual a 0,42 assim como o MCP.
Tabela 2: Ajustes dos modelos logísticos ordinais multivariados (MCP e MCPP) para
estabelecimento da associação entre área de localização do domicílio (urbano vs rural) e a
chance acumulada de uma melhor autoavaliação de saúde.
Variáveis
*MCPP:
Escala de K=3 categorias
MCP: Escala de K=3
categorias
(Y>k), k=1,2
(Y>1)
(Y>2)
(Y>1)
(Y>2)
(Y>1)
(Y>2)
EP1
EP2
p-valor1
p-valor2
OR**
EP
p-valor
OR1** OR2**
0,96
1
0,033
-
0,208
-
0,97
1
0,032
-
0,297
-
0,75
0,78
1,10
0,99
1
0,052
0,033
0,032
0,039
-
<0,001
<0,001
0,002
0,722
-
0,75
0,79
0,039
0,026
0,044
0,036
0,046
0,041
-
<0,001
<0,001
0,736
<0,001
0,003
0,519
-
0,85
1
0,015
-
<0,001
-
0,80
0,022
<0,001
1,41
1,19
0,96
0,83
1
0,029
0,024
0,023
0,022
-
<0,001
<0,001
0,067
<0,001
-
1,05
1,01
0,84
0,77
1,16
1
0,017
-
0,46
0,47
0,69
1
0,46
Área censitária
Urbano*
Rural
Região de residência
Norte*
Nordeste*
Sudeste
Sul
Centro-oeste
0,99
0,85
1,13
1,03
1
Sexo
Masculino
Feminino
0,87
1
0,014
-
<0,001
-
Faixa etária
20 a 29 anos
30 a 39 anos
40 a 49 anos
50 a 59 anos
60 anos ou +
1,49
1,25
1,00
0,86
0,068
0,052
0,034
0,027
0,045
0,032
0,024
0,022
0,414
0,786
<0,001
<0,001
<0,001
<0,001
0,919
<0,001
1
-
-
<0,001
1,16
1
0,019
-
<0,001
0,042
0,037
0,036
0,166
<0,001
<0,001
<0,001
<0,001
0,49
1
0,47
0,020
0,029
0,017
0,049
0,024
0,078
<0,001
<0,001
<0,001
0,061
<0,001
<0,001
0,53
0,71
1
0,69
0,046
0,044
0,064
<0,001
<0,001
0,001
0,54
0,72
1
0,70
0,025
0,031
0,044
<0,001
<0,001
<0,001
1,19
1
0,017
-
<0,001
-
1,32
1,36
1
0,5
0,019
0,05
<0,001
<0,001
1,56
Cor/raça
Branca*
Não branca
Escolaridade
Sem instrução ou < 1 ano*
1 a 7 anos
8 a 14 anos
15 anos ou +
Sem declaração*
0,60
0,90
0,47
0,68
Renda domiciliar per capita
Sem renda ou até 1 s.m*
Mais de 1 a 5 s.m*
Mais de 5 s.m*
Sem declaração
Situação de ocupação
Ocupada*
Não ocupada
1,16
0,041
1
0,021
<0,001
-
<0,001
-
Atividade física
Pratica*
Não pratica
Sem declaração*
1,34
0,067
0,71
0,024
1
0,49
0,026
<0,001
0,041
<0,001
-
<0,001
<0,001
159
Fumo
Fumante
Ex-fumante*
Nunca fumou
Sem declaração
0,86
0,88
1
0,95
0,021
0,019
0,02
<0,001
<0,001
0,012
0,29
1
0,018
-
<0,001
-
0,13
0,18
0,42
1
0,031
0,023
0,021
-
<0,001
<0,001
<0,001
-
1,32
1
0,021
-
0,55
1
0,75
0,88
1
0,95
0,88
0,027
0,019
0,016
0,019
<0,001
<0,001
<0,001
0,009
0,29
1
0,009
-
<0,001
0,40
1
0,004
0,005
0,005
0,005
0,009
-
<0,001
<0,001
<0,001
<0,001
<0,001
-
<0,001
-
1,31
1
0,027
-
<0,001
0,02
-
<0,001
-
0,56
1
0,011
-
<0,001
1,14
1
1,36
0,02
0,037
<0,001
<0,001
1,34
-
-
-
1,06
Morbidade autorreferida
Pelo menos 1 doença crônica*
Nenhuma doença crônica
-
Mobilidade física
Muita limitação
Limitação
Pouca limitação*
Sem limitação
0,08
0,12
0,15
0,19
Posse de plano de saúde
Sim
Não
-
Consulta médica
Sim*
Não
-
Posse de bens básicos
Tem todos os 4 bens básicos
Não tem pelo menos 1 bem
% domicílios adequados
1,09
0,046
1
1,13
0,024
<0,001
0,053
0,018
0,020
0,052
1,39
0,060
0,94
0,032
<0,001
<0,001
PSF
Domicílio cadastrado
Domicílio não cadastrado
1
-
0,002
-
*Nos casos onde tem apenas um único valor, significa que a hipótese de homogeneidade da inclinação é satisfeita para a variável em
questão, logo: OR1**=OR2**=OR; EP1=EP2=EP e p-valor1=p-valor2=p-valor
Nota: MCP (5 categorias): α1=-7,534; α2=-5,705; α3=-2,942; α4=0,204
/ MCP (3 categorias): α1=-5,968; α2=-3,159
/ MCPP (3
categorias): α1=6,134; α2=3,149
A seguir são fornecidos os box-plots por área de localização do domicílio (urbana e
rural) para as distribuições das probabilidades acumuladas de melhor autoavaliação de saúde
estimadas a partir do MCP e do MCPP (modelos multivariados) para a escala de três
categorias (Figura 1).
160
Probabilidade acumulada de autorreferir melhor
estrado de saúde
Figura 1: Probabilidade acumulada do adulto autorreferir melhor estado de saúde por área
censitária segundo os modelos de chances proporcionais (MCP) e os modelos de chances
proporcionais parciais (MCPP)
A Figura 1 mostra que ambos os modelos multivariados (MCPP e MCP) ajustados
para autoavaliação de saúde (escala de K=3 categorias) fornecem probabilidades acumuladas
estimadas de melhor de autoavaliação de saúde bem semelhantes tanto na área urbana quanto
na área rural.
161
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