Tontura

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Tontura
Neurologia
Semiologia - GESEP
Qual é a fisiologia do sistema vestibular?
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TONTURA
Dr. Carlos R. Caron
Objetivos
1. Saber o significado de tontura para o paciente.
2. Qual é a fisiopatología da vertigem.
3. Quais os principais tipos de vertigem.
4. Como distinguir uma vertigem central de uma
periférica.
O que pode significar tontura para o
paciente?
1. Vertigem é a ilusão de que o paciente ou o
ambiente está se movendo.
2. Síncope é a sensação de perda ou perda
efetiva da consciência)
3. Desequilíbrio é a sensação de instabilidade
ou ataxia.
4. L i p o t í m i a s i n t o m a s a u t o n ô m i c o s
semelhantes ao da síncope, porém sem
perda de consciência.
O labirinto consiste de três canais
semicirculares (dispostos em ângulos de 90º), o
sáculo e o utrículo. Os canais semicirculares
estão dispostos entre si de forma perpendicular,
sendo responsáveis por registrar acelerações
angulares em todos os eixos do espaço.
Indicam a velocidade de rotação. É a inércia da
endolinfa que faz abaulamento da cúpula,
dentro da ampola, estimulando os estereocílios
e os cinocílios. As máculas possuem os seus
cílios situados no sáculo e no utrículo, os quais
penetram em uma membrana gelatinosa, rica
em cristais pesados de calcita
(otocônias). As funções das máculas
são, portanto, sinalizar movimentos lineares e
desvios da cabeça em relação ao eixo vertical.
Os neurônios bipolares do gânglio vestibular
transmitem o estímulo para os núcleos
vestibulares e daí para os núcleos da
musculatura ocular, cerebelo, motoneurônios
da musculatura esquelética e para o giro póscentral.
Quais elementos podem auxiliar o
esclarecimento etiológico da tontura?
1. Existe sensação de movimento ou de
rotação em relação a você ao em relação ao
ambiente? (resposta positiva = vertigem).
2. A sensação é a de que você vai “desligar”,
“apagar”? (resposta positiva = síncope).
3. Existe sensação de instabilidade em seus
pés? Existe sensação de que você não tem
certeza onde a sua mão ou o seu corpo
está? (resposta positiva = desequilíbrio).
4. Perguntar se o paciente pode desencadear a
tontura e como (ao virar a cabeça =
vertigem posicional benigna ou síncope por
insuficiência vértebro basilar; ao se
levantar = hipotensão ortostática ou
vertigem posicional benigna; ao se virar
enquanto está andando = desequilíbrio).
O que é vertigem?
É a ilusão de movimento, em relação à sí ou ao
ambiente. Aproximadamente metade dos
pacientes com tontura apresenta vertigem. O
primeiro problema que deve ser questionado
nestes pacientes é se a vertigem é central
(tronco cerebral, em 1/5 dos pacientes) ou
periférica (estruturas labirínticas e nervo
vestibular). Considere ainda condições
sistêmicas que podem causar vertigem (drogas,
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infecções sistêmicas, doenças endócrinas,
vasculites, entre outras).
Como diferenciar um nistágmo central de
um periférico?
Quais questões que auxiliam no diagnóstico
da vertigem periférica?
Nistágmo
Periférico
Direção
Horizontal
Qualquer direção
rotatório
Nunca puramente Pode ser
vertical
puramente
vertical
1. Qual a frequência dos sintomas?
2. Os sintomas são desencadeados por
barulho (Fenômeno de Tulio)?
3. Os sintomas são desencadeados por
estresse?
4. Existe algo que piore ou melhore os
sintomas?
5. Existe algum lado para o qual existe
tendência de queda? (o paciente tende a
cair para o lado do canal labiríntico com
menor atividade).
6. Os sintomas são severos, moderados ou
leves? Existe náusea ou vômitos? (lesões
periféricas apresentam vertigem mais
severa).
7. Existe a sensação de inclinação ou de
movimento linear? (sugere lesão de
otolitos).
8. Existe diminuição de acuidade auditiva,
tinitus ou pressão intrauricular? (pode
sugerir doença de Ménière).
9. Existe história de otite?
10. Existe exposição a drogas ototóxicas
(aminoglicosídeos, AAS, altas doses de
diurético de alça)?
Quais questões que auxiliam no diagnóstico
de vertigem central?
1. Existe diplopia?
2. Existe perda de sensibilidade em face ou
extremidades?
3. Existe fraqueza em braços ou pernas?
4. Existe dificuldade para deglutir?
5. Existe dificuldade para falar?
6. Existe confusão ou perda de consciência?
7. Existe incoordenação de braços ou pernas?
Fase rápida
Afasta-se do lado
da lesão
Fixação visual Suprime o
nistágmo
Localização
Labirinto ou
nervo vestibular
Central
Aproxima-se do
lado da lesão
Não suprime o
nistágmo
Tronco cerebral
ou cerebelo
Quais são as principais causas de vertigem
periférica?
Vertigem Posicional Paroxística Benigna
(VPPB)
É a causa mais comum de vertigem no paciente
adulto, sendo de característica eminentemente
episódica. É mais comum após a quarta década
e em paciente com história de trauma de crânio
recente. As otocônias (cristais de carbonato de
cálcio) normalmente se encontram aderidas na
membrana do utrículo. Em decorrência de
trauma, infecção ou degeneração, são
deslocadas e agrupadas na endolinfa do braço
longo do canal semicircular posterior.
Mudanças na posição da cabeça fazem com
que as otocônias livres gravitem
longitudinalmente através do canal, causando
um efeito semelhante ao de um pistão, que
traciona a região cupular, causando nistágmo e
vertigem.
A vertigem é sempre desencadeada por
mudanças de posição da cabeça (rolar na cama
para uma posição lateral, inclinar-se para frente
e olhar para cima). Não existe queixa de tinitus
ou diminuição de acuidade auditiva. Não
ocorre nistágmo espontaneamente, sendo o
mesmo desencadeado por mudanças de
posição, tal como na manobra de Dix-Hallpike.
Quando elicitado, o nistágmo possui
caracteristicamente a sua fase rápida
direcionada para cima, realizando uma torção
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em direção ao ouvido afetado (isto é, no
sentido contrário aos ponteiros do relógio
quando o ouvido direito está afetado e no
sentido dos ponteiros do relógio quando o
ouvido esquerdo está afetado). O quadro é
geralmente autolimitado, durando 2 semanas,
mas pode persistir por meses ou anos. A
recorrência ocorre em 20% dos casos.
Achados do nistágmo posicional elicitado
pela manobra de Dix-Hallpike:
Periférico
(VPPB)
Central
Latência
3-20 Segundos
Duração
Menos de 1
Mais de 1
minuto
minuto
(geralmente
somente alguns
segundos)
Fatigabilidade
Acentuada (pode Inexistente
estar ausente na
repitição
imediata)
Vertigem subjetiva Acentuada
Direção do
nistágmo
Imediata
Mínimo ou
ausente
Torção para
Muda conforme
cima em direção a posição da
ao ouvido lesado cabeça
VPPB = vertigem posicional paroxística benigna
Manobra de Dix-Hallpike, vista na figura
abaixo, visando analisar as características do
nistágmo, sendo especialmente útil em relação
a VPPB:
1. Paciente sentado na maca (pernas esticadas
sobre a mesma).
2. Deitar o paciente rapidamente e deixar a
sua cabeça pendente para fora da cabeceira
da maca 30º, inclinada 45o para a esquerda
e manter nesta posição por 30 segundos
(considera-se neste caso que o ouvido
esquerdo é o que está lesado, sendo
portanto aquele que inicialmente ficará
para baixo).
3. Anotar todas as características do nistágmo
desencadeado e as sensações do paciente
durante este intervalo de tempo.
4. As contraindicações para esta manobra são:
Artrose severa de coluna cervical, estenose
carotídea importante, doença cardíaca
instável.
Vertigem Pós-traumática:
Vertigem é comum após traumatismos
crânioencefálicos, podendo ter instalação
imediata ou de início tardio.
Vertigem Pós-traumática Imediata: A causa é
provavelmente o deslocamento das otocônias a
partir da mácula, lesão do labirinto
membranoso, hemorragia na endolinfa ou no
VIII par e fratura do osso labiríntico (causando
formação de fístula perilinfática). Ocorre
nistágmo espontâneo, cujo componente rápido
se afasta do ouvido lesado. A queixa de náusea
e vômitos é comum. Procurar sempre por
sangramento no canal auditivo externo, pelo
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sinal de Battle (equimose na região da
mastóide) e por paralisia do nervo facial.
Vertigem Pós-traumática de início tardio:
Ocorre dias ou semanas após o trauma,
apresentando-se como VPPB.
Fístula Perilinfática:
Pode ser sequela de traumatismo craniano ou
de barotrauma.
Apresenta-se com episódios de vertigem e
perda auditiva, precipitada ou exacerbada pela
manobra de Vasalva (ex: tossir).
A maioria dos casos melhora espontaneamente.
Labirintite Viral Aguda e Neuronite
Vestibular:
Mais comum entre a 3º e 5º décadas. O quadro
clínico se caracteriza por vertigem de
moderada a severa, com instalação súbita,
acompanhada de náusea e vômitos, com piora
quando da mudança da posição da cabeça. Os
sintomas podem ser incapacitantes,
principalmente nos primeiros dias. Ocorre
tendência de queda para o lado lesado com
nistágmo horizonto-rotatório para o lado são.
Existe nistágmo espontâneo, ao contrário da
VPPB., sendo que o componente rápido do
nistágmo se afasta do lado da lesão, quando o
paciente olha para o lado oposto ao da lesão, e
desaparece quando o paciente olha para o lado
da lesão. Geralmente o quadro melhora dentro
de seis semanas. Lembrar que em caso de
labirintite ocorre hipoacusia do lado
comprometido.
Ve r t i g e m c a u s a d a p o r d r o g a s
vestibulotóxicas:
Ototoxicidade pode ocorrer por uso de
aminoglicosídeos (gentamicina e
estreptomicina), salicilatos, ácido etacrínico e
furosemida ocorrendo destruição das células
ciliadas da cóclea e do labirinto. Como o
labirinto é mais sensível do que a cóclea à ação
da gentamicina, pode ocorrer distúrbio de
equilíbrio sem perda auditiva. Em decorrência
da ação bilateral das drogas tóxicas, o paciente
raramente refere vertigem franca, ocorrendo
muito mais instabilidade postural e intolerância
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aos movimentos. Os danos ototóxicos são
irreversíveis e sem tratamento.
Doença de Méniére:
Ocorre por hidropisia endolinfática. Sempre
deve ser considerado naqueles casos de
vertigem periférica de início súbito. Os ataques
são recorrentes e auto limitados (duram entre
minutos a horas). Ocorre tinitus, sensação de
plenitude auricular (como se houvesse água
dentro do ouvido) e hipoacusia no lado
comprometido.
Sd. de Ramsay-Hunt:
É uma infecção pelo vírus herpes-zoster do
nervo vestibulocloclear e facial, ocorrendo
hipoacusia do lado comprometido e tendência
de queda para o lado lesado com nistágmo
horizonto-rotatório para o lado são. Apresenta
paralisia facial periférica do lado lesado e
vesículas no conduto auditivo externo.
Quais são as causas de vertigem central?
Enxaqueca:
É a mais frequente causa de vertigem central,
sendo diagnosticada em aproximadamente 20%
dos casos de vertigem Pode ocorrer em
pacientes com ou sem cefaléia. Geralmente
existe história familiar para enxaqueca.
Tumor de Ângulo Pontocerebelar:
O tumor mais comum nesta localização é o
neurinoma acústico. A clínica consiste
inicialmente na compressão do componente
auditivo do VIII par (perda auditiva
sensorioneural) evoluindo posteriormente com
a compressão das estruturas subjacentes (V e
VII pares cranianos). A maioria dos pacientes
se queixa inicialmente de instabilidade
postural, associada à perda auditiva unilateral e
tinitus, sempre havendo piora progressiva do
quadro.
Doença Arterial Vertebrobasilar:
Geralmente por doença isquêmica, secundária
a lesão de uma dessas artérias:
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Artéria Cerebelar Anteroinferior (AICA) =
Irriga a porção lateral do cerebelo e a porção
dorsolateral da ponte e o labirinto (pela artéria
labiríntica).
Artéria Cerebelar Póstero-inferior (PICA) =
Irriga a porção póstero-inferior do cerebelo e a
porção lateral da transição bulbopontina =
acarreta Sd. de Wallemberg.
Síndrome Medular Lateral (Síndrome de
Wallemberg):
Ocorre por oclusão da artéria vertebral ou da
artéria cerebelar póstero inferior. Acomete a
medula oblonga dorsolateral, com lesão dos
núcleos vestibulares.
Ocorrem vertigem, náusea, vômitos, soluços
intratáveis, dor facial ipsilateral, diplopia,
disfagia e disfonia. Ipsilateralmente à lesão
ocorre Sd. Horner + hipoestesia para dor e
temperatura em hemiface + ataxia (ocorre
lateropulsão para o lado da lesão) + paresia do
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glossofaríngeo e do vago. Contralateral à lesão
encontramos Hipoestesia para dor e
temperatura. O nistágmo espontâneo se faz
para o lado oposto ao da lesão.
Bibliografia:
MUTARELLI, E. G. Propedêutica neurológica
- do sintoma ao diagnóstico. São Paulo:
Sarvier, 2000.
PATTEN, J. Diagnóstico diferencial em
neurologia. 2º edição. Rio de Janeiro: Revinter,
2000.
NITRINI, R.; BACHESCHI, L. A. A
neurologia que todo médico deve saber. 2º
edição. São Paulo: Atheneu, 2003.
CAMPBELL, W. W. DeJong - O exame
neurológico. Rio de Janeiro: GuanabaraKoogan, 2007.