Finanças Públicas

Transcrição

Finanças Públicas
FUNDAÇÃO INSTITUTO DE PESQUISAS ECONÔMICAS
Nº 407 Agosto / 2014
análise de conjuntura
p.3
Finanças Públicas
V
M
S
Setor Externo
V
M
W
A
C
G
P
M
G
S
H
p.24
VivianGarridoMoreiratececonsideraçõessobreainterpretaçãoque
Solow(1956)fezdotrabalhoseminaldeHarrod(1939)sobreteoriado
crescimentoeconômico.
p.28
JuliaPassabomAraújopropõeummodeloteóricoqueanalisaadecisão
deempreenderdoindivíduo,contribuindonaliteraturaaoincluiraesfera
informaldaeconomia.
p.37
EdnaldoMorenoGóisSobrinhoanalisaaproduçãoagrícolaedebiodiesel
noBrasil,comênfasenaregiãoCentro-Oeste.
p.47 JoãoHenriqueChaerDibNettoapresentaalinhadepesquisaemEconomia
A Economia da Felicidade
J
WilsonAparecidoCostadeAmorimfazumare lexãosobreasgreves
recentesnosetordetransportecoletivourbanonoBrasil,apartirda
atuaçãodossindicatosdetrabalhadores.
A
O Crescimento e os Impactos da Produção de
Soja no Centro- Oeste: Biodiesel e Produção
de Alimentos – Parte I
E
p.14
M
Escolha Ocupacional, Restrição de Crédito e
Informalidade
J
VeraMartinsdaSilvarevêatrajetóriarecentedosetorexternobrasileiro
ecomentaasperspectivasparaoBalançodePagamentosdoPaís.
A
O Transiente Entre Harrod e Solow e o
Questionável Rumo Tomado pela Teoria do
Crescimento Econômico
V
p.8
S
As Greves Recentes nos Transportes Coletivos
Urbanos: Um Modelo “Perde-Perde” de
Relações de Trabalho
VeraMartinsdaSilvacomentaosresultados iscaisdogovernofederal
noanode2014,comfoconasdi iculdadesparaaobtençãodesuperávit
primário.
C
D N
As ideias e opiniões expostas nos artigos são de responsabilidade
exclusiva dos autores, não refletindo a opinião da Fipe
daFelicidade,seusdesa ioseconométricos,oparadoxodeEasterlineos
principaisdesdobramentoscontemporâneos.
Indicadores Catho-Fipe
Os indicadores Catho-Fipe, desenvolvidos pela Fipe em parceria com a Catho, oferecem uma visão mais aprofundada e imediata do mercado de trabalho e da economia brasileira. As informações disponíveis em tempo
real no banco de dados da Catho e em outras fontes públicas da Internet permitem agilidade na extração e
cálculo dos números. Desta forma, é possível acompanhar a situação imediata do mercado de trabalho, sem
a necessidade de se esperar um ou dois meses para a divulgação dos dados oficiais. Todos os indicadores são
divulgados no último dia útil de cada mês, com informações sobre o próprio mês.
O primeiro indicador é uma estimativa para a taxa de desemprego calculada pelo IBGE, a Taxa de Desemprego Antecipada. A Fipe calcula também um índice que acompanha a relação entre novas vagas e novos currículos cadastrados na Internet, o Índice Catho-Fipe de Vagas por Candidato (IVC). Este indicador é mais amplo
do que a taxa de desemprego, porque traz informações sobre os dois lados do mercado: a oferta e a demanda por trabalho. Além desses dois indicadores, o Índice de Salários Ofertados permite o acompanhamento
dos salários oferecidos pelas empresas que estão em busca de novos profissionais.
Maiores Informações:
É:(11)3767-1764
œ:catho ipe@ ipe.org.br
INFORMAÇÕES FIPE É UMA PUBLICAÇÃO MENSAL DE CONJUNTURA ECONÔMICA DA FUNDAÇÃO INSTITUTO DE PESQUISAS ECONÔMICAS
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MariaHelena
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agosto de 2014
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Carmo
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Chahad
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Cacciamali
MariaHelena
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SimãoDaviSilber
–
ISSN1678 6335
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Produção Editorial
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SandraVilasBoas
Preparação de
Originais e Revisão
AlinaGasparellode žhttp://www. ipe.
Araujo
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3
análise de conjuntura
Finanças Públicas: Resultado Primário Ladeira Abaixo
V
A s contas públicas apresentaramresultadonegativoemjunho,
acompanhandoadesaceleração
daeconomiabrasileira.Estadesaceleraçãotemimpactonegativo
naarrecadaçãotributária.Além
disso, há aexpansão de gastos
nessaépocapré-eleitoral,dado
queumasériededespesasjáforam
realizadas para evitar osconstrangimentoslegaisreferentesà
realizaçãodegastosduranteos
mesesdecampanhaeleitoralem
si.Oresultadoprimário,queexclui
receitasedespesas inanceiras,
icounegativonosmesesdemaio
ejunhode2014:-R$10,5bilhões
emmaioe-R$1,9biemjunho.No
acumuladodosemestre,oresultadofoipositivo,comumsuperávit
deR$17,2bi.Esteresultadofoisigni icativamenteinferioraoapresentadonoprimeirosemestrede
2013,quandoosuperávitprimário
alcançouR$34,5bi.Ouseja,houve
quedaexpressivanomontanteacumuladodoprimeirosemestredo
anoemrelaçãoaomesmoperíodo
doanoanterior-umaquedadeR$
17,3bi,valorimportantedoponto
devistadascontaspúblicas.
M
S
(*)
dosdasestatais,usodoFundoSoberanoeatrasosnospagamentos
defornecedores.A“criatividade”
provavelmenteseráredobrada.
Ofatoéqueaobtençãodesuperávitprimário iscalcomouminsJánoanopassado,comumresulta- trumentodeajustetemperdidoa
doprimárioquerepresentacerca relevâncianostemposrecentes.
dodobrodoobtidonesteano,o OGrá ico1mostraaevoluçãodo
governocentraltevederecorrera superávitprimárioedoresultado
receitasextraordináriasparaatin- nominaldogovernoconsolidado,
girametadoprimárioparaoano, incluindoUnião,Estados e Muoquelevouacríticasgeneralizadas nicípios,emtermosacumulados
quantoaousoeabusodemedidas em12mesescomopercentagem
ditascriativasparadriblarameta doPIB,desdejaneirode2007,ou
assumida.Esteano,asituaçãoé seja,antesdacrise inanceirainbemmaiscrítica,poisogoverno ternacional.Antesdessacrise,que
centralesperaobtercercadeR$ ocorreu apartirde outubro de
27bilhõesdereceitasextraordiná- 2008,oresultadoprimárioestava
rias,entreasquaisdestaca-seum emtornode3,5%.Comacriseea
novoProgramadeRecuperação fortedesaceleraçãoeconômica,cai
Fiscal–REFIS,cujaexpectativade até1%,eentrenovembrode2009
aportedereceitaédeR$18bi.A ejulhode2011háumarecuperareceitaextrapodevirtambémde çãodesseresultado,quenessemês
outorgasdeconcessões,dividen- retomaseuvalorpré-crise.Apartir
agosto de 2014
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análise de conjuntura
demeadosde2011,atendência
temsidoareduçãosistemáticado
resultado primário do governo
comoumtodo.Observe-sequeo
resultadonominal,queincluireceitasedespesas inanceiras,segue
amesmatendênciadoprimário,
apesardeterhavidoreduçãoda
diferençaentreonominaleoprimário,de7%emjaneirode2007
para5%emjunhode2014.Istoindicaquemesmocomumprimário
menor,oresultadonominalestá
relativamente sobcontrole, em
tornode3,6%doPIB.Esseresultadodecorredagestãodadívida
pública,especialmentedafederal,
que temconseguido alongaros
prazosemodi icaroseuper il,
comoaumentodaparticipaçãode
títulospre ixados,oquedámaior
estabilidadeaessadívida.
mentaramemR$47bilhões,ao
passoqueasreceitasaumentaram
emR$25bilhões.Então,apesarda
continuidadedoaumentodaarrecadação−tambémconhecidocomo
“ajustepelareceita”−,mesmoem
umcontextodebaixocrescimento
econômico,oquedefatopreponderoufoiumaumentoespetacular
dasdespesas.Oobjetivodesuperávitprimário icouemsegundo
plano,demodoaserbuscadono
inaldoanocombaseemreceitas
extraordinárias.Omomentoatual
re leteespecialmenteocicloeleitoral,pois,conformejádito,háno
segundosemestreumasériede
restriçõeslegaisquantoarepasses
eoutrasdespesas.1Então,vários
gastosforamantecipadosparafugir
aessasrestrições.Nessalinha,diversasdespesaspúblicasserãocontidasnosegundosemestredoano,o
Odeclíniodoresultadoprimáriodo quetambémajudaránaobtençãodo
governocentralnoprimeirosemes- resultado inal.
trede2014ocorreuprincipalmente
emfunçãodomaiorcrescimento Umaboanotícianocontextodas
dasdespesasprimárias,queau- contaspúblicasvemdaPrevidên-
ciaSocial:apesardareduçãoda
geraçãodepostosdetrabalhoformaisnesteano,osnovosvínculos
eaexpansãodarendadotrabalho
permitiramaquedadeR$4bilhõesdodé icitdaPrevidência,que
atingiuR$23bilhõesentrejaneiro
ejunhode2014contraR$27bi
noprimeirosemestrede2013.A
Previdênciateveumaumentode
receitasigni icativa,deR$15bilhões,nacomparaçãodosdoisprimeirossemestresdosanosde2013
e2014,sendopraticamentetodo
esseaumentodecorrentedaárea
urbana,apesardeosetorrural
tambémtertidobomdesempenho.
Emmédia,ocrescimentorealda
arrecadação previdenciária aumentou5%,oqueé,semdúvida,
umótimoresultadoconsiderando
a desaceleração econômica. Do
ladodadespesaprevidenciária,
houvecrescimentodeR$11,6bilhões,apenasumcrescimentoreal
ligeiramentepositivo.
Gráfico 1 - Resultados Primário e Nominal - Acumulado em 12 Meses em Relação ao PIB (%) - Jan/2007 a Jun/2014
Fonte:Bacen.
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análise de conjuntura
Osuperávitprimáriodeclinanteno
primeirosemestrede2014deveu-seespecialmenteaoaumentode
gastos.AsdespesasdoTesouroNacionalaumentaramR$34bilhões,
sendoqueasdespesascompessoal
e enc argos tiveram apenas um
aumentoemlinhacomain lação
(deR$6bilhões),eoaumentomais
signi icativo icoucomDespesas
deCusteioeCapital(crescimento
deR$28bilhões).Entreessasdespesas,destacam-se:1)aumentode
R$6bilhõesdasdespesasdoPlano
deAceleraçãodoCrescimento–
PAC;2)compensaçõesdeR$4,7
bilhõespagasàPrevidênciapelas
desoneraçõessobreafolhadepa2
gamentos; 3)R$4bilhõesparaa
ContadeDesenvolvimentoEnergético–CDE,re letindoosproblemas
dosetorelétricoeinexistenteno
anoanterior;4)aumentodeR$1,7
dasdespesasdoFundodeAmparo
aoTrabalhador–FAT,devidoaoaumentodovalordoseguro-desempregoe5)aumentodasdespesas
discricionárias,deR$6,3bilhões
doMinistériodaSaúde,R$2,9bilhõesdoMinistériodaEducação
eR$1,2doMinistériodaDefesa.
Noâmbitodastransferênciasintergovernamentais,destaca-seo
aumentode:1)R$1,8bilhõespara
EstadoseMunicípiosdecorrente
decompensaçãoporreduçãonas
receitasestaduaisdoICMSrelativo
àisençãodotributonaexportação
eutilizaçãodecréditodebensde
capitalincorporadoaoprocesso
produtivo(antigaleiKandir);2)R$
1,6bidetransferênciasaoFundeb
–FundodeManutençãoeDesenvolvimentodaEducaçãoBásicae
deValorizaçãodosPro issionaisda
Educação;e3)R$1,5bilhõesem
auxílio inanceiroaosMunicípios.
EssesrepassesaEstadoseMunicípiossãoapontado icebergde
umaenormecentralização iscalda
arrecadaçãopelaUnião,queacaba
sendosistematicamentepressionadapelosníveissubnacionaisde
governoalhestransferirrecursos,
poisefetivamentesãoelesosresponsáveispelaofertadeprogramasdeeducação,saúdeesegurançapúblicas.Nocomplexosistema
federativobrasileiro,prevalece
aindaacentralizaçãoderecursos
eseurepasseporcritériosquestionáveisdopontodevistatécnico,
temasparaumasempreesperada
reformatributária.
aarrecadação icoupraticamente
constante.Dentrodesseitemvale
notaroaumentodeR$4,2bidevidoaoImpostodeRendanaFonte
doTrabalho, re letindooainda
dinâmico mercadodetrabalho,
eR$2,8bideImpostodeRenda
RetidonaFontedeRendimentos
deCapital.OImpostosobreProdutosIndustrializados(IPI)também
aumentouemR$2,1bilhõesem
funçãodarecomposiçãodasalíquotasdoIPIsobreautomóveise
linhabranca,assimcomopelaarrecadaçãodoIPIsobreimportados.
AsContribuiçõesSociais,segunda
grandefontedereceitadaUnião,
representaramR$ 171bilhões,
comdestaqueparaoaumentoda
arrecadaçãodoPIS/Co insemR$
4bidevidoàalteraçãodabasede
cálculosobreaimportação. 3Um
itemdedestaquenaarrecadação
federaldizrespeitoaosdividendos,
quetiveramumacréscimodeR$
2,8bilhões.Dessetotal,54%foram
pagospelaPetrobrasàUnião,mostrandoqueentreasestataisessa
é aque mais contribuiu para o
Dopontodevistadareceita da resultadoprimáriodoprimeiroseUnião,valedestacarqueaprin- mestre.Acompanhiaencontra-se
cipalfontedereceitadaUnião, tambémnamaiorevidênciamidiáosImpostos,representouR$215 ticaemtornodousodasempresas
bilhõesnoacumuladodejaneiroa estataiscomoinstrumento iscale
junhode2014,e,emtermosreais, decontroledain lação.
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análise de conjuntura
Tabela 1 – Resultado Primário do Governo Central - Jan/Jun 2013-Jan/Jun2014 – R$ Milhões
Discriminação
1. RECEITA TOTAL
Receitas do Tesouro Nacional
Receita Bruta
Impostos
Contribuições
Demais
d/q Cessão Onerosa Exploração Petróleo
(-) Restituições
(-) Incentivos Fiscais
Receitas da Previdência Social
Receitas da Previdência Social - Urbano
Receitas da Previdência Social - Rural
Receitas do Banco Central
2. TRANSFERÊNCIAS A ESTADOS E MUNICÍPIOS
Transferências Constitucionais (IPI, IR e outras)
Lei Complementar 87/ Lei Complementar 115
Transferências da Cide - Combustíveis
Demais Transferências
3. RECEITA LÍQUIDA TOTAL (1-2)
4. DESPESA TOTAL
Despesas do Tesouro Nacional
Pessoal e Encargos Sociais
Custeio e Capital
Despesa do FAT
Abono e Seguro Desemprego
Demais Despesas do FAT
Subsídios e Subvenções Econômicas
Operações Oficiais de Crédito e Reordenamento de Passivos
Despesas com Subvenções aos Fundos Regionais
Benefícios Assistenciais (LOAS e RMV)
Auxílio à CDE
Outras Despesas de Custeio e Capital
Outras Despesas de Custeio
Outras Despesas de Capital
Transferência do Tesouro ao Banco Central
Benefícios Previdenciários
Benefícios Previdenciários - Urbano
Benefícios Previdenciários - Rural
Despesas do Banco Central
5. FUNDO SOBERANO DO BRASIL - FSB 8/
6. RESULTADO PRIMÁRIO GOVERNO CENTRAL (3 - 4 + 5)
Tesouro Nacional
Previdência Social (RGPS)
Previdência Social (RGPS) - Urbano
Previdência Social (RGPS) - Rural
Banco Central
Fonte:sitedoTesouroNacional,acessoem05/08/2014.
agosto de 2014
jan-jun 2013
jan-jun 2024
561.111,3
419.830,5
428.003,1
202.024,1
164.676,7
61.302,3
0,0
-8.121,0
-51,6
139.710,9
136.784,7
2.926,2
1.569,8
98.085,9
74.987,5
975,0
57,3
22.066,0
463.025,4
428.469,6
259.845,9
96.317,7
162.310,4
17.333,8
17.095,5
238,3
6.219,7
3.938,8
2.281,0
16.832,6
0,0
121.924,3
88.757,5
33.166,8
1.217,8
166.740,8
128.940,0
37.800,8
1.883,0
0,0
34.555,8
61.898,8
-27.029,9
7.844,7
-34.874,6
601.716,9
444.870,2
450.995,7
215.126,9
171.071,7
64.797,0
0,0
-6.119,2
-6,3
155.158,9
151.874,8
3.284,0
1.687,8
110.515,2
82.182,8
2.762,5
116,1
25.453,8
491.201,7
473.963,7
294.138,0
102.455,1
190.302,5
18.998,5
18.806,3
192,3
4.965,9
2.618,7
2.347,2
18.451,3
4.101,8
143.785,0
103.422,5
40.362,4
1.380,4
178.323,5
138.114,1
40.209,4
1.502,2
0,0
17.237,9
40.217,0
-23.164,6
13.760,7
-36.925,4
-313,1
185,6
7
análise de conjuntura
1 Umaimportantefontederestriçõesagastospúblicosnoúltimo
períododegovernoestáprevistanaLeideResponsabilidadeFiscal
(LC101/2000).
2 Note-seque asmodi icaçõesdorecolhimento à Previdência para
váriossegmentosdaeconomiasujeitosanovasregrasdecontribuição
nãodevemsobrecarregarascontasdaPrevidênciaSocial,demodo
quedevemsercobertaspeloTesouro(Lei12.546/2011ePortaria
RF/MF/INSS/MPSN.2/2013).
3 Lei12.865/2012.
(*)EconomistaedoutoraemEconomiapeloIPE-USP.
(E-mail:[email protected]).
agosto de 2014
8
análise de conjuntura
Setor Externo: O Pessimismo ao Redor
V
Comopessimismogeneralizado
quetemseabatidosobreaeconomiabrasileira,destaca-seodesempenhosofríveldenossosetor
externo.Mas,comotudoemeconomia,esteaspectoécomplexoemereceumaanálisemaisdetalhada.O
resultadodosetorexternomedido
pelosaldodeTransaçõesCorrentes−quere leteastransaçõesde
benseserviçosentreresidentese
nãoresidentesdoPaís−temapresentadoumatrajetóriadeclinante
desde janeiro de 2007,período
pré-criseeconômicainternacional,
comomostraoGrá ico1.
Entretanto,aBalançaComercial
temtidoumresultadopositivona
amplamaioriadosmesesdesse
período,salvoemalgunsmesesatípicos,especialmenteemjaneirode
2013ede2014,comaocorrência
dealgumasoperaçõesespeciais.O
Grá ico2ilustraodesempenhodas
principaiscontasdeTransações
Correntesdesde2007.Éevidente
que,apesardasoscilaçõesmensais,
apiorasistemáticadeseuresultadovemdocrescimentodosaldo
negativodeServiçoseRendas.O
Grá ico3reforçaestaanáliseao
permitiravisualizaçãodeexportaçõeseimportaçõesdebens,tam-
bémdesdejaneirode2007:depois
deumperíodoinicialdealguma
turbulência,apartirdemeados
de2010houvecertaestabilidadetantodeexportaçõescomode
importaçõesemtornodeUS$20
bilhões.Obviamente,essaéuma
leiturapossívelere letediversidadedeimpactossobreascontas
de comércioem termosdetaxa
decâmbio,condiçõesdecrédito,
acordoscomerciaiseperformance
dosprincipaisparceiroscomerciais.Então,seafamosainvasão
dosimportadosocorreu,tambémé
verdadequeasexportaçõesforam
ampliadas,demodoqueoPaístem
setornadomaisabertoaocomércioexterior.Demaneirageral,isso
ébené icoparaaeconomiacomo
umtodo,apesardehaversegmentosprodutivosperdedores,entre
osquaisváriosdelesindustriais.
Noentanto, omaisrazoável do
pontodevistadapolíticaeconômicaseriaaadoçãodeaçõesde
ampliaçãodacompetitividadesistêmicadaeconomiaenãomedidas
paraseufechamentoaocomércio
exterior.Issoincluiumconjunto
demedidasdenaturezamicroeconômicasparamelhoraroambientedenegócios,comoreduçãoda
burocracia,melhoramentosnain-
agosto de 2014
M
S
(*)
fraestrutura ísicaeinstitucional,
comotambémmacroeconômicas,o
quepodeincluirmudançasnosregimes iscal,monetárioecambial.
Ouseja,alémdapolíticacambial,
hámuitasopçõesdemelhoriasa
seremfeitas.
Seporumladoosresultadosem
TransaçõesCorrentestêmsedeterioradoemfunçãodascontasde
ServiçoseRendas,poroutro,odesempenhodoBalançodePagamentoscomoumtodotemsidopositivo
namaioriadosmesesemanálise
devidoàentradaderecursosexternospelaContadeCapitaleFinanceira.Normalmente,maisênfaseé
dadaaoingressodeInvestimento
DiretoLíquido,e,defato,esterepresentouemmédia85%dosrecursosqueentrarampelaContade
CapitaleFinanceiraentrejaneirode
2007ejunhode2014.Noentanto,
hátambémosInvestimentosem
CarteiraeDemaisInvestimentos,e
todoselessofremmuitaoscilação
nosmontantesmensais,comose
vêpeloGrá ico4,queapresentaa
evoluçãodaContaFinanceiradesde
2007.Excetono inalde2008,logo
apósacriseinternacional,quandoo
ingressoderecursos inanceirosexternoscaiprofundamente,oquese
9
análise de conjuntura
vênosmomentosposterioreséaentradaderecursos,mudandoapenas
acomposição,algumasvezescom
predomíniodecomprasdeaçõesou
títuloseempréstimos.Essasinformaçõesre letemaboapercepção
dosinvestidoresestrangeirossobre
aeconomiabrasileira–naverdade,
umavisãobemmaisotimistaquea
dosempresáriosnacionais.ATabela
1mostraoresultadoacumuladodo
primeirosemestrede2013e2014.
Nesseperíodo,asTransaçõesCorrentesestãorelativamenteestáveis
enquantoaContaFinanceiraaumentouseuresultadopositivoem
US$2bilhões,mascommudançana
composição,comreduçãodoInvestimentoDiretodeUS$10bilhões
eaumentodeUS$15bilhõesem
InvestimentoemCarteira.Houve
umasaídadeUS$1,9bilhõesem
OutrosInvestimentos.
ativosjáexistentesouempréstimosintercompanhias,queeventualmentepoderãoserutilizados
parainvestimentoprodutivo.Portanto,muitomaisdoqueinvestimento,essesrecursosrepresentam
movimentações inanceiras,muito
sujeitosàsvolatilidadesdosmercados inanceiroseaosdiferenciais
dejurosecâmbio.E,destaforma,
sensíveisàsmudançasdapolítica
monetáriaamericana,quejáestá
sealterandolentamente,demaneiraareduzirparceladarentabilidadedasaplicaçõesnomercado
brasileiro.
ses,hátambémoproblemadacrise
daprincipalparceiradecomércio
naAméricaLatina,aArgentina.E,
paralelamente,aconsolidaçãodos
BRICS pode permitir aumentos
dos luxosdecomércioe inanças,
especialmentecomapossibilidadedeoBrasilpassarasuprira
demandadeprodutospelaRússia,
emdecorrência desançõesimpostasporalgunsdeseusantigos
parceiroscomerciaispelocon lito
naUcrânia.OGrá ico5apresenta
oresultadodoBPdesdejaneirode
2007eoimpactodacrisedo inal
de2008.Nesteperíodohouveoretornoderecursosqueestavamno
Comoresultado inaldesseconjunBrasileanormalizaçãodomodelo.
todefatoresqueafetamascontas
Alémdisso,houveafase inal,a
externas,nota-se queomodelo
temfuncionadoatéagora,masestá partirde2013,quandopassaram
sujeitoàsmudançasdo cenário aocorrerresultadosdeBPnegatiinternacional,especialmentepela vos.Estesresultadosnãochegam
1
retomadadaseconomiasdesen- asergravesjáqueháasreservas Note-setambémque,apesardo volvidas,oquepoderáimplicar quepodemdarcontadeeventuais
nome‘InvestimentoEstrangeiro aumentodasexportaçõesbrasilei- problemas.Noentanto,talsituaDireto’,osrecursosapuradosnesta ras,mastambémreduçãodosin- çãocomeçaapreocupareadiciona
contanãonecessariamentesig- gressosderecursos inanceirosao maisumelementonaatualondade
ni icaminvestimentonosentido Brasil.Mas,comooresultado inal pessimismonacional.Apesardisso,
macro,deampliaçãodacapacidade doBalançodePagamentos(BP) oresultadosemestraldoBPfoipodeprodução.Podematéteressa éasíntesedeinúmerosfatores,a sitivoesuperioraodoanode2013,
destinação,maspodemrepresen- únicacoisacertaéamudança.Isso comaumentodeUS$6bilhõesnas
tartambémapenasacomprade porquesehápaísessaindodecri- reservas.
agosto de 2014
10
análise de conjuntura
Gráfico 1 – Transações Correntes - US$ Milhões
Fonte:Bacen-Jan2007-Jun2014.
Gráfico 2 – Principais Componentes das Transações Correntes – US$ Milhões - Jan 2007 - Jun 2014
Fonte:Bacen.
agosto de 2014
11
análise de conjuntura
Gráfico 3 – Exportações e Importações de Bens - US$ Milhões - Jan 2007 - Jun 2014
Fonte:Bacen.
Gráfico 4 – Conta Financeira - US$ Milhões - Jan 2007 - Jun 2014
Fonte:Bacen.
agosto de 2014
12
análise de conjuntura
Gráfico 5 – Resultado do Balanço de Pagamentos - US$ Milhões - Jan 2007- Jun 2014
Fonte:Bacen.
Tabela 1 - Balanço de Pagamentos - US$ Milhões
jan/jun 2013
jan/jun 2014
-43.228
-43.312
Balança comercial (FOB)
-3.073
-2.490
Exportação de bens
114.424
110.531
Importação de bens
-117.497
-113.021
-41.697
-41.529
50.839
52.717
655
334
50.183
52.383
Investimento Direto
37.202
26.670
Investimento em Carteira
12.410
27.354
Derivativos (líquido)
119
302
Outros Investimentos
453
-1.943
ERROS E OMISSÕES
-1.334
2.620
RESULTADO DO BALANÇO
6.277
12.024
HAVERES DA AUTORIDADE MONETÁRIA (-=aumento)
-6.277
-12.024
TRANSAÇÕES CORRENTES
Serviços e Rendas
CONTA CAPITAL E FINANCEIRA
Conta Capital
Conta Financeira
Fonte:SitedoBancoCentraldoBrasil,acessoem11/08/2014.
agosto de 2014
13
análise de conjuntura
1 Emjulho,asreservasemdivisasconversíveiseramdeUS$377bilhões.
(*)EconomistaedoutoraemEconomiapeloIPE-USP.
(E-mail:[email protected]).
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14
temas de economia aplicada
As Greves Recentes nos Transportes Coletivos Urbanos: Um
Modelo “Perde-Perde” de Relações de Trabalho
W
Durante muitos anos,quando a
negociaçãocoletiva nosetorde
transportescoletivosurbanosdas
grandescidadesbrasileirasresultavaemgreveereajustessalariais,
disparavaquaseautomaticamente
oaumentodastarifasporparte
dasempresas.Naquelestempos
deindexaçãoein laçãoelevada,a
correiadetransmissãodoreajuste
salarialemdireçãoàtarifafuncionavademaneiranatural.Apressão
dasgreveseraexercidasobreas
empresas,queentãorepassavam
aquestãoaopoderpúblico.Emseguida,oaumentodopreçodaspassagenseraautorizadoeentãose
incorporavaaocálculodain lação.
cas.Alémdisso,especialmenteno
setordetransportespúblicos,há
ofatonovodosurgimentodopassageiro,oudegruposqueorepresentamcomoatoresimportantes
nade iniçãodastarifas.Comisso,
orecursoàcorreiadetransmissão
doreajustesalarialemdireçãoà
tarifatorna-seaindamaisdi ícil.
Dopontodevistadanegociação
coletivadosetor,evidencia-seum
contextoinstitucionalbemmais
complexoparaestadimensãodas
relaçõesdetrabalho.
A
C
A
(*)
deesgotar o assunto,nositens
seguintes,aintençãoéanalisaro
contextodoscon litostrabalhistas
maisrecentes,ascaracterísticas
dosprocessosdeencaminhamento
desoluçãodosmesmoselevantar
pontosparare lexãosobreofuturodasnegociaçõescoletivasneste
setor.
1 Introdução
Estudosarespeitodasgrevesno
BrasildemonstramqueelasseconOobjetivodesteartigoélevan- solidaramcomopartedocenário
tarelementosparaumadiscus- trabalhistabrasileiro.Dentrode
sãosobreasgreves destesetor umaperspectivadetempomais
−odetransportecoletivourba- ampla,Noronha(2009)identi ica
Atualmente,oambienteeconômico no−dandomaiorfocoaosfatos doisgrandesciclosgrevistasno
émenostoleranteàindexaçãoau- relacionadosàsorganizaçõesdos Brasilentreo inaldadécadade
tomáticadepreçosetarifaspúbli- trabalhadores. Sem pretensão 1970emeadosdadécadade2000.
agosto de 2014
15
temas de economia aplicada
Oprimeirociclodegrevesteriase
iniciadojuntamentecomoressurgimentodossindicatoscomoatoressociaisimportantesnasegunda
metadedosanos1970.Oregistro
dasgrevesteriasidocrescentee
acompanhou a transição brasileiradoregimeautoritáriopara
aconsolidaçãodemocráticaaté
1998.Osegundociclocomeçaem
1998evaiatémeadosde2000e
émarcadopeloqueNoronhaquali icacomoodenormalizaçãodas
greves,ouseja,algodocotidiano
dasrelaçõesdetrabalho.Dentro
doprimeirocicloestãoperíodos
economicamentecríticoscomoa
crisedadívidaexternanoinício
dosanos1980,ospacoteseconômicosanti-in lacionáriosde1986,
1987,1989,1990eoiníciodaesta-
bilizaçãoapartirdoPlanoReal,em
1994.Nosegundoperíodo,houve
acrisecambialde1998/1999,além
dobaixocrescimentoeconômico
entreosanosde2001e2003.Para
Noronha,estaperiodizaçãore lete
asetapasdoamadurecimentoda
sociedadebrasileiranotratamento
doscon litossociaisenãoseprendeexatamenteaosfatoseconômicosexperimentadospeloPaís.
desdeosanos1980.Entreestas
categoriasincluem-semetalúrgicosnoEstadodeSãoPaulo,outras
categoriasdaindústriaemgeral,
bancáriosefuncionáriospúblicos.
Alémdisso,jánametadedadécada
de2000,énaindústriae,secundariamente,nosserviçosqueocorremasgrevesmaisexpressivas.
OsdadosdoDepartamentoIntersindicaldeEstatísticaeEstudos
Boito,GalvãoeMarcelino(2009) Socioeconômicos(DIEESE)paraas
tambémobservamalgumasper- grevesbrasileirasmostramainda
manênciasnaocorrênciadegreves que,comalgumaoscilaçãoaolongo
noBrasildosanos2000.Napri- dosanos,ovolumedegrevestem
meiradelas,osregistrosdegre- sidocrescentede2004emdiante.
vesseguirammaisfrequentesnos Nota-seaindaque,namaiorparte
setoressindicaisquetradicional- dosanos,asgrevesdosetorpúblimentejárealizavammaisgreves co(serviçopúblicoeempresasesemcomparaçãoaoutrascategorias tatais)têmsidoasmaisfrequentes.
Tabela 1
Anos
Greves
Setor Público
Setor Privado
Total
Nº
%
Nº
%
Nº
%
2004
188
62,3
114
37,7
302
100
2005
164
54,8
135
45,2
299
100
2006
169
52,8
151
47,2
320
100
2007
167
52,8
149
47,2
316
100
2008
187
45,5
224
54,5
411
100
2009
252
48,6
266
51,4
518
100
2010
240
57,7
176
42,3
416
100
2011
327
59,0
227
41,0
511
100
2012
409
47,0
461
53,0
870
100
Fonte(SAG,DIEESE).Elaboraçãodoautor.
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16
temas de economia aplicada
Aindanão háumlevantamento
conclusivo,masosdadospreliminaresdoDIEESEsinalizamum
for te crescimento daatividade
grevistaem2013e2014.Adicionalmente,épossívelindicarum
crescentenúmerodegrevesem
setoressituadosmaispróximosda
basedomercadodetrabalho,como
motoristas de ônibus urbanos,
construçãocivilelimpezaurbana.
Asgrevesnestessetorestêmalgumascaracterísticasrelativamente
comuns.Váriasdelassãoselvagens,ouseja,semorganizaçãoou
controledosindicatodacategoria.
Emvárioscasos,asgrevessãodecididaserealizadasemoposição,
oumesmoàreveliadasdecisões
das diretorias sindicais. Outro
aspectocomumdestasgrevesé
agrandedi iculdadecomquea
buscapelasoluçãodestescon litos
étentadanoâmbitoinstitucional.
Destaforma,emcontrapontoàs
tendênciasidenti icadasporBoito,
GalvãoeMarcelino(2009)eNoronha(2009)paraosprimeirosanos
2000,épossívela irmarquehouve
expansãodaatividadegrevistaem
setoresnosquaiselasantesnão
eramtãocomuns.Alémdisso,as
grevesnestessetores,dadosseus
efeitossobreapopulaçãoeadi iculdadedeencaminhamentoem
termosdesolução,aindanãopassarampelachamadanormalização
nostermosdeNoronha.
Nosanosmaisrecenteseprincipalmenteem2014,asgrevesneste
setoradquiriramvisibilidadeetensãoporocorreremàsvésperasdo
iníciodaCopadeMundo,comoem
SãoPaulonocasodosmotoristas
deônibusedostrabalhadoresdo
Metrô,eemoutrascapitais.Além
disso,emaisimportante,estasgrevesafetamocotidianodemilhões
depessoasnasgrandes regiões
metropolitanasdoPaís.
cienteparaque,alémdarotineira
imprecisãodasinformações,surja
aindaadúvidaquantoàobjetividadee/ou idedignidadedoconteúdo
informado.
Dequalquermaneira,paraaOIT–
OrganizaçãoInternacionaldoTrabalho,agreveéumaparalisação
temporáriadotrabalhorealizada
porumoumaisgruposdetraba2 Uma Rápida Observação Con- lhadorescomoobjetivoderefor1
ceitual e Metodológica Sobre çarsuasreivindicações. Apartir
desteconceito,encontram-seos
as Greves
elementosbásicosdasgreves:uma
Antes da análisepropriamente açãocoletivavoltadaaocon lito,
dita,cabeumaressalvametodoló- objetivosprede inidos,porém,com
gica.Comofenômenosocialeeco- desdobramentos imprev isíveis
nômico,asgrevestêmumarápida (CATTANI,1997).
visualizaçãonoimagináriodas
pessoas,sendofácilaconstatação Nesteartigo,adelimitaçãodascadesuapresençaoumesmodeseus racterísticasdasgrevesvaiseresefeitos.Entretanto,dentrodaárea tringirapoucosaspectos(número
dosestudostrabalhistas,oregis- aproximadodeenvolvidos,reivintro,caracterizaçãoeanálisedas dicaçãoprincipal,posicionamento
grevesincluem-seentreastarefas dacategoriaemrelaçãoàdireção
demaiordi iculdademetodológica sindical,resultadoseposiçãoda
(SILVER,2005).Taisdi iculdades JustiçadoTrabalho).
serevelamemaspectosconceituaisarespeitodadelimitaçãodas
grevesemseuporte,motivação,
duração,consequênciase,naconluênciadestespontos,tambémna
captaçãodainformaçãosobreas
greves.
Deoutraparte,paraviabilizara
análisedasgrevesemseusentido
maisgeral,recorremosaosconceitosdecontexto,estrutura(quem
negociaoucon litacomquem),
processo(comoagreveesuatentativadesoluçãoforamencaminhaAcaptaçãodasinformaçõesdas das)econteúdo(razõesdagreve).
grevespodeserfeitatantopela Taisconceitosencontramfundaviadaimprensaquantonaalimen- mentaçãono enfoque sistêmico
taçãodiretapelosenvolvidos.Em dasrelaçõesdetrabalho(DUNLOP,
qualquerdassituações,asgreves 1972eHORN;COTANDA;PICHLER,
sãoumfenômenocomplexoosu i- 2011).
agosto de 2014
17
temas de economia aplicada
3 Uma Análise de Greves Recentes nos Transportes Coletivos
Urbanos
Noâmbitoempresarial,orelatoé
dedi iculdadesnaconstituiçãode
frotascomveículosmaisnovose
depressãodopoderpúblicocom
Nestetrechoserãoabordadoso multasemesmodescredenciamencontextodasgreves,aestruturae tosdeempresaspordescumpriprocessodasnegociaçõescoletivas mentodoscontratosdelicitação.A
egrevesdosetor.Paratanto,serão demoranaconstruçãoeextensão
apresentadosinformaçõesedados delinhasdemetrôenadisponibidealgumasgrevesimportantes lizaçãodeoutrasopçõesdetransdesde2010.
portedemassadequalidadesão
tambémdadosdoproblema.
nifestaçõesderua,peloseuporte,
intensidadeeoutrascaracterísticas,podemserincluídasnagrande
ondademobilizaçõessociaisexperimentadasrecentementenosmais
diversospaísesdomundo(CASTELLS,2013).Umdadoinconteste,
porém, é que o seu estopim na
cidadedeSãoPaulofoiexatamente
oanúnciodaelevaçãodopreçoda
passagem.
3 . 1 O C o nt e x t o d a s N e g o ci a ções do Setor de Transportes Coletivos Urbanos − Algumas Observações
Comestasmanifestações,osurgimentodopassageirocomopersonagem importantena de iniçãodopreçodapassagemfoiuma
novidadeaindanãodigeridano
âmbitoinstitucional.Grupospolíticospoucoconhecidosdaopinião
pública(ALONSO,2013;CASTELLS,
2013),mascomfortesentidode
objetivotornaram-seinterlocutoresnaquestãodotransporte
reivindicandocontençãotarifária
emelhorianaqualidadedoserviço.
Ouseja,doisobjetivosaparentementeinconciliáveis,cujoatendimentosópodeserviabilizadoa
partirdedecisõesresultantesde
muitanegociaçãonoâmbitodas
políticaspúblicas.
Dentrodeumfocomaisestreito,é
nestecenárioqueestáoambiente de trabalho dos condutores.
Osônibusestãolotados,andam
Umaanáliseaprofundadadotrans- lentamenteporruascompisode
portecoletivourbanonoBrasilnão rolamentoemcondiçõesruinsnas
caberianestetrabalho.Entretanto, quaisadisputaporespaçocom
deformageral,épossívela irmar vans,táxis,motoboys,alémdos
queosproblemasesoluçõesdo automóveisparticularesérenhida.
transportecoletivonoBrasilestão
entranhadosàprópriaevoluçãoda Em fenômeno mais recente, os
questãourbanaemseusdiversos ônibusurbanospassaramtambém
desdobramentos,comoocupação aserobjetodedemonstraçãode
deterritórios,mobilidadeurbana, descontentamentooumesmode
segurançapúblicaetc.Nestesenti- forçadesetoresnãoclaramente
do,astransformaçõespelasquais mapeadosdasociedade,comincênascidadesbrasileiraspassaram diosoudepredaçõesnasgaragens
nasúltimasdécadasgeraramcon- oumesmonasruas.Desteponto
diçõesdentrodasquais,comraras devista,osetorestáemconexão
exceçõesoquesenotaéadi icul- comaprópriaquestãodasegudadegeralnamobilidadeurbana rançapública.Destaforma,parece
e,dentrodela,abaixaqualidade claroqueostrabalhadoresdosetor
dotransportecoletivo(VASCON- estãoquasesempreex postos a
CELLOS; CARVALHO;PEREIR A, todatensãoquetemcaracterizado
2011).Ocrescimentoeconômico avidadascidadesbrasileiras.
recenteeapersistenteopçãopelo
transporteindividualnasociedade Osprotestosqueseespalharam
brasileiratornaramotráfegoainda portodooPaísemjunhode2013
maisintensonosgrandesaglome- esuasconsequênciastambémse
radosurbanos.
integraramaestequadro.Asma-
Ade iniçãodatarifapelopoder
públicoédependentedoorçamentomunicipalouestadual,jáqueé
comumaconcessãodesubsídios
parabarateamentodaspassagens.
Aviabilizaçãodesubsídiossempre
foiobjetodecálculoscomplexos,
masqueagoratornaram-sealvoda
exigênciademaiortransparência.
Qualquerelevaçãodecustoparaas
empresaspassouaterseurepasse
agosto de 2014
18
temas de economia aplicada
paraasplanilhasdecustosdasempresasconcessionáriasobservado
commaioratençãopelosatores
sociais.Empoucaspalavras,astarifasdetransportecoletivourbano
tornaram-se um assunto ainda
maisacentuadamentepúblico,e
poristo,político.
categoriasdabasedomercadode
trabalhoparaareivindicaçãode
seuspisos.Nosetordetransportes,
opisomédiodostrabalhadoresdos
transportesnãoéumaexceção(R$
900,01em2013).(DIEESE,2014).
regional)doMinistériodoTrabalhoeEmprego.
Noquadroaseguir,encontram-se
informaçõesrelativasadezgreves
deônibusemcapitaisougrandes
cidadesbrasileiras.Umdadoque
Empoucaspalavras,háumam- chamaaatençãoinicialmenteé
bientefavorávelàmobilizaçãodos queamaiorpartedasgrevesse
No c aso das manifest ações de trabalhadorestantonosentido originouemquestõessalariaisou
junhode2013,anegociaçãoem maisgeraldomercadodetrabalho vinculadasaitensdaremuneração.
tornodastarifasenvolveusimul- emtermosdeelevaçãodaremune- Taisgrevesmostram-senaclassitaneamenteoExecutivoFederal raçãoquantonoqueserefereàs icaçãodoDIEESEcomoproposi−preocupadocomimpactosin la- di íceiscondiçõesdetrabalhoda tivas.Nistoosetorseassemelha
cionáriosdaelevaçãodatarifa−, categoriadosmotoristasdeônibus aoconjuntodascategoriasquereoEstadualeoMunicipal-preo- urbanos.
alizaramgrevesnosúltimosanos
cupadosemcompatibilizarcustos
(DIEESE,2014).
crescentesdemanutençãoeinvestimentosnossistemasdetranspor- 3.2 Uma Análise Destas Greves
Outroaspectoimportanteéqueas
temetropolitanos.Evidentemente,
grevesnestesetornormalmente
ade iniçãodossaláriosdosetore Ascategoriasdetrabalhadores
sãodecurtaduração,restringindodeseusreajustesestáimbricadaa relacionadasaostransportesurbanoscoletivosnoBrasiltêm,em -seaumoudoisdiasdeparaliestecenário.
grandenúmero,suadata-baseno saçãoeraramenteextrapolando
esteperíodo.Taisdadostambém
Outroelementoimportanteaser mêsdemaiodecadaano.Acada
consideradoéocomportamento ano,asnegociaçõesestendem-se sealinhamaoobservadoparao
doprópriomercadodetrabalho. entreosmesesdeabrilejunho conjuntodascategorias,postoque
Osfenômenosmaisvisíveiscomo eresultamnosacordoscoletivos emtornode60%dasgrevesdura
quedaexpressivadataxadede- queregulamacontrataçãodotra- entreumecincodias(SAG–DIEEsempregoeelevaçãodorendimen- balhonestesetor.Normalmente, SE).Entretanto,nocasoespecí ico
todotrabalhoespecialmenteentre deumladodamesaencontra-seo dostransportescoletivosurbanos,
ossaláriosmaisbaixosincluema sindicatolocaldetrabalhadorese asgreves têmmaior exposição
categoriaentreasquaisasreivin- dooutroosindicatopatronaldas públicadevidoaseusimpactosno
dicaçõesporelevaçãotornam-se empresasdeônibus.Eventualmen- cotidianodascidades;istoéum
maisfortes.Aexpressivaelevação te,opoderexecutivo–aprefeitura elemento crítico paratorná-las
realdosalário mínimo−111% –étambémchamadoainterferir fenômenossimultaneamentemais
nosúltimos16anos–(MENEZES, noandamentodasrodadas,sendo curtosetensoscomparativamente
2014)certamentevemexercendo tambémfrequenteapresençada aoqueocorreemoutrascategotambémopapeldereferênciadas instâncialocal(superintendência rias.
agosto de 2014
19
temas de economia aplicada
Quadro 1 – Greves Selecionadas – Transportes Coletivos Urbanos no Brasil – Alguns Dados
Sindicato de Transporte Coletivo
Urbano
Período/
participantes
Principais Reivindicações/
Resultado
Características
Transp. Coletivo Urbano – Rio
de Janeiro
12/4/10
3200
Reajuste salarial, vale- alimentação, horas
extras.
Reivindicações rejeitadas.
Justiça decreta greve como abusiva.
Transp. Rodoviários – Rio de
Janeiro
20/5/10
400
Vale-refeição.
Sem informação sobre resultado
Grevistas fazem piquete na garagem
e expulsam dirigentes do sindicato da
categoria
Transp. Coletivo Urbano –
Goiânia
26/4/10
nc
Justiça decreta greve como abusiva
Sindicato não reconhecido pelo Sindicato
oficial e também não reconhecido pelo
Sindicato patronal.
Transp. Coletivo Urbano –
Campinas/SP
13/12/11
588
Horas extras.
Reivindicações atendidas
Grupo de trabalhadores articulam-se
independentemente do Sindicato oficial e
realiza greve. Tentativas de mediação do
Ministério Público e Polícia Militar
Transp. Coletivo Urbano - Recife
03/07/12
Nc
Reajuste salarial
Justiça decreta greve abusiva.
Atendimento parcial das reivindicações.
Trabalhadores em discordância com
Sindicato oficial (que optou por acatar
proposta salarial patronal) deflagram greve.
Reajuste salarial, vale- alimentação, jornada.
Reivindicações parcialmente atendidas.
Trabalhadores em discordância com
Sindicato oficial (que optou por acatar
proposta salarial patronal) deflagram greve.
Reuniões com vereadores, prefeito,
Ministério Público e empresa de transporte.
Assistência médica.
Reivindicações parcialmente atendidas
Sindicato negocia com a empresa. Chegase a um acordo para o fim da greve.
Grupo de trabalhadores não aceita acordo
assinado pelo sindicato e é ameaçado de
demissão.
5 e 06/3/13
200
Reajuste salarial e manutenção de condições
vigentes.
Justiça declara greve abusiva.
Reivindicações rejeitadas.
Greve se estende às diversas empresas.
Sindicato declara que não apoia a greve. Há
reuniões entre comissão de trabalhadores
e o Sindicato (que não se reúne com
empresas).
20 a 22/05/14
nc
Reajuste salarial
Justiça declara greve abusiva e estipula multa
aos sindicatos (trabalhadores e patronal).
Reivindicações rejeitadas
Transp. Coletivo Urbano – Bauru
-SP
Transp. Coletivo Urbano –
Empresa VB Tranp. E Turismo
Campinas
Transp. Coletivo Urbano - Mogi
das Cruzes
Transp. Coletivo Urbano – SP
(1)
Transp. Coletivo Urbano – RJ (1)
21 a 27/6/13
180
08 e 09/08/13
550
08/05/14
300
Reajuste salarial.
Reivindicações rejeitadas
Greve chamada por grupo de oposição
Grupo dissidente de trabalhadores não
aceita acordo assinado pela diretoria do
sindicato. Sindicato não apoia a greve.
Superintendente Regional do Trabalho do
MTE atua como mediador.
Grupo de trabalhadores não aceita acordo
assinado pelo sindicato e paralisa o trabalho
Fonte:SAG–DIEESE.(1)http://g1.globo.com.
Quantoàmaiortensãonasgrevesdestesetor,um
elementoadicionalpodeserencontradonaestrutura
dasnegociaçõesemtornodasgreves.Aestruturadas
negociaçõesdizrespeitoàidenti icaçãodosatores
querepresentamaspartes.Damesmaforma,emuma
greve,quandoháintençãodeencaminharasuasolu-
ção,éfundamentalveri icarquemestáexercendoa
representaçãodaspartes.
AobservaçãodoQuadro1revelaqueentreasgreves
descritasháumasituaçãoqueserepete:agreveou
seusdesdobramentosacontecempraticamenteàre-
agosto de 2014
20
temas de economia aplicada
veliadasdecisõesdasdiretoriasdossindicatos.Em
algumassituações,agreveocorreporiniciativade
trabalhadoresquechegammesmoarechaçaraaproximaçãoemediaçãodosindicato.Emoutrassituações,
agreveéchamadaportrabalhadoresque icaramdescontentescomostermosdoacordoassinadopeladiretoriacomoladopatronal.Nestescasosapresentados,
sejaporforçadegruposdacategoria,deoposição,ou
mesmodedissidênciasdasdireções,aocorrênciadas
grevesapontaquearepresentatividadedasdireções
estáemxeque.
pontoéadi iculdadedeidenti icaçãodo(s)líder(es)
domovimentoedaíatéaidenti icaçãotambémdo
interlocutornecessárioànegociaçãodo imdagreve.
Dadi iculdadedeidenti icaçãodosinterlocutores,
decorretambémadi iculdadedede iniçãomaisclara
dasreivindicaçõesquemotivamagreve.Emoutro
momento,aindaquesesaibaqueméaliderançaea
pautadereivindicaçãodostrabalhadoresassociada
aosmotivosdagreve,aprópriaorganizaçãodasreuniõesdenegociaçãoparasaídadocon litotorna-sealgo
inde inido.
Osdesdobramentosdosprocessosdegrevequetêm AgrevedecondutoresqueocorreunacidadedeSão
seuinícioemsituaçõescomoestassãotodosnadi- Pauloem insdemaiopassadoéumexemploclaro
reçãodetornarmaisdi ícilsuasolução.Oprimeiro desteconjuntodedi iculdades.
Quadro 2 – Greve dos Condutores na Cidade de São Paulo (Maio/2014)
Data
Principais fatos do processo da greve
19/5
Assembleia realizada na sede do Sindicato aprova acordo com propostas da empresa
20/5
Motoristas dissidentes discordam da forma de convocação da greve e questionam acordo assinado. Paralisação inicia-se no centro da capital
21/5
O superintendente regional do Trabalho, Luiz Antônio Medeiros, atua como intermediador entre dissidentes e empresários para encerrar a
greve. Sindicato patronal recusa negociar com dissidentes. Dissidentes e sindicalistas negociam entre si e concordam em pedir intermediação
do prefeito de São Paulo junto aos empresários. A greve é encerrada.
25/5
Fatos adicionais
Prefeito aguarda decisão da Justiça do Trabalho sobre a greve.
O acordo entre sindicalistas e grevistas foi fechado por volta das 18h20. Pouco tempo depois, às 18h40, o prefeito Fernando Haddad
concedia entrevista na sede da Prefeitura. Ele não foi questionado sobre a reunião, mas o secretário municipal de Transportes, Jilmar Tatto,
afirmou que não havia previsão de o encontro acontecer.
Em nota, a prefeitura afirmou que não foi notificada da reunião e que a agenda estava fechada. Na quinta, Haddad disse que aguardava a
decisão da Justiça sobre a validade da greve.
Justiça do Trabalho define a greve como abusiva e multa o Sindicato dos Trabalhadores e o Sindicato das Empresas (R$ 100 mil cada).
Durante as primeiras horas da greve, diante da paralisação crescente dos ônibus, a não identificação de interlocutores da greve levou
o superintendente regional do trabalho até as garagens das empresas mais afetadas pelo movimento. A identificação da liderança do
movimento ocorreu apenas ao longo dos dias seguintes ao início do movimento.
Elaboraçãodoautor.Fonte:http//g1.globo.com.
DoexpostonoQuadro2,percebe-seumaestruturade
negociaçãoemque,alémdosinterlocutoreshabituais–sindicatodetrabalhadoresesindicatopatronal
–estãotambémtrabalhadoresdissidentes,aPrefeitura,OMinistériodoTrabalhoeEmprego(na igura
agosto de 2014
doseusuperintendente)eaJustiçadoTrabalho.Com
estamultiplicidadedeatoresenvolvidosecompouca
clarezadereivindicaçõesemotivo,torna-senaturala
grandedi iculdadedeencaminhamentodesoluções
temas de economia aplicada
consistentesparaasgrevesesuas
decorrentesnegociações.
Emtermosderesultados,osmovimentosanalisadosinvariavelmentedesenham-secomoummodelo
“perde-perde”emqueodesgaste
detodasaspartesseacumulaenquantoagrevenãoencontrasua
solução.Ostrabalhadoresperdem,
poisnãosesentemrepresentados
nasdecisõesdasdireçõessindicais
ouingressamnasgrevessemrespaldodestas.Perdemasempresas
porcontadofaturamentoperdido
eeventuaisprejuízos materiais
trazidosporônibusdepredados
pelacategoriaouporparcelasmais
extremadasdapopulação.Perdeo
poderexecutivomunicipaleestadualporseroendereçoderecebimentodasqueixasdapopulação
pelainterrupçãodaofertadeum
serviçoessenciale,fundamentalmente,perdeapopulaçãoporrazõesóbvias.
Nesteponto,éimportanteretomar
ocontextodentrodoqualasgreves
destesetorocorrem.Nãoédi ícil
paraapopulaçãoperceberasatribuladascondiçõesdoambientede
trabalhodosmotoristasecobradoresdeônibus.Porextensão,oapoio
dapopulaçãoaestestrabalhadores
esuasreivindicaçõestambémnão
seriaimprovável.Ocorreque,na
verdade,háumadesconexãodos
sindicatosdosetorcomaleitura
dohumordapopulação.Destamaneira,umacondiçãoindispensável
paraosucessodegrevesemum
serviçopúblicocomoodosônibus
21
deveriaserexatamenteoapoioda Paulo,RiodeJaneiro,RecifeeGoiâopiniãopública.
niaeoutrascidadesdeportegrandeemédio,oQuadronãodeixade
Parececlaroquearepresentação serumareferênciasobreaforma
sindicalformaldostrabalhadores comoade iniçãodacontratação
dosetorestápressionadatanto coletivadotrabalhovemsendo
pelasuaconjunturacomopeloseu tratadanaárea.
contexto.Alémdisso,estasdireçõesnãodãosinaissobrecomo Pelasrazõesapontadas,épossível
lidarcomanovaecomplexasitua- a irmarqueachamadanormalizaçãoinstitucional.Mesmonoâmbito çãodasgrevesnostermosproposmaisrestritodomeiosindical,a tosporNoronhaaindaestálonge
percepçãoéqueossindicatosdes- deacontecernosetordetransportascategoriasestãorelativamente tescoletivosurbanosnoBrasil.
afastados dos grupos políticos
maisorganizadosqueseencon4 Considerações Finais
tramnascentraissindicais.Ohistóricodedisputaseleitoraisnos
sindicatosdosetorcomrecursoà Nesteartigo,procuramosapresentaralgunselementosparare lexão
violênciaéumsinaldisso.
emtornodasgrevesocorridasnos
Deoutraparte,oprópriopoderpú- anosrecentesnosetordetransblicodemonstrafaltadeagilidade portescoletivosurbanostomando
oumesmodiscernimentoemlidar comoreferênciaprincipalaatucomasgrevesdosetor.Emúlti- açãodossindicatosdetrabalhamainstância,comoemSãoPaulo, dores.Taisgrevesencontram-se
aguarda-seoposicionamentoda dentrodocontextogeraldasocieJustiçadoTrabalho.Esta,porsua dadebrasileiradeáreasurbanas
vez,invariavelmenteemitiráuma emcrescimentoeplenasdeproblesentençacomcaráterdisuasório mascomofaltadeplanejamentona
oumesmopunitivo.Nestecaso, ocupaçãodosolo,sistemasdetrásãoimpostasmultasseverasaos fegoscongestionados,entreoutros
sindicatoscujostrabalhadoresrea- fatores.Somadoaisto,registra-se
lizaramagreve.OQuadro1possui aindaum ambiente trabalhista
bastanteaquecidoemquebaixas
muitosexemplosnestesentido.
taxasdedesemprego,umgrande
Nãoépossívela irmarqueoque númerodeacordoscoletivoscom
constanoQuadro1sejadireta- aumentosreaisemdiversascatementerepresentativodasituação gorias,encorajaramarealizaçãode
danegociaçãocoletivadatotalida- maismovimentosgrevistas.
denosetordetransportescoletivosurbanos.Porém,porrelacionar Nosetordetransportescoletivos,
sindicatosdecapitaiscomoSão asmanifestaçõesdejunhode2013
agosto de 2014
22
temas de economia aplicada
tiveramatarifadeônibuscomo
seuestopimetornaramoambienteinstitucionalquetratadesuas
questõesmaiscomplexoedelicado.Assuasnegociaçõescoletivas
naturalmenteintegraram-seaesse
quadro.
lativo–validadordoorçamento
público–nestasdiscussões.Com
taiselementos,torna-sepossível
buscarapoionapopulaçãoàsua
causa,pois,a inal,seostrabalhadorestiveremmelhorremuneração
e condições maisfavoráveis de
trabalhoapossibilidadedemelhoApósjunhode2013,opreçoda rianoserviçoaumenta.Nãosendo
passagem(seu inanciamento,sub- assim,aversãoprevalecentedas
sídio,regulaçãoetc)nasgrandes greveséqueelasseapresentam
cidades v irou aber tamente um contraasempresas,mas,também,
assuntodepolíticaedebatepúbli- eprincipalmente,contraapopulacos.Anecessidadedecontrolara ção.
elevaçãodocustodevida,apressãopormelhoriasmínimasnofun- Deoutraparte,noâmbitomais
cionamentodetodoosistemade restritodomeiosindical,parece
transportecoletivo,adiminuição haverumaquestãoderepresendatolerânciadapopulaçãoàmá tatividadeaserresolvidaemdiqualidadedoserviçooferecidosão versossindicatosdacategoria.De
variáveispresentesnosetor.Como outraforma,decisõestomadaspor
desdobramento,contrataçãoco- diretoriasemesmoassembleiasde
letivadaáreasedesenvolvecomo trabalhadorescontinuarãoaser
umanegociaçãonaqualsedeman- confrontadasportrabalhadoresda
da mais clareza daslimitações própriacategoria.Seapressãoda
impostaspeloorçamentopúblico própriacategorianãoprovocamuaprovadonolegislativomunicipal dançasdeposturadosdirigentes
nestesentido,aoquetudoindica,
e/ouestadual.
arealidadeinstitucionaldoentorA partirdosdados observados, nodosetorestápressionandopor
nemosmunicípios,nemasempre- isto.
sas,nemossindicatosdetrabalhadorestêmdemonstradoexperiên- DopontodevistadoPoderExeciaparalidarcomistodeforma cutivo (prefeituras e Estados),
evidencia-seanecessidadedeanmadura.
tecipaçãoeplanejamentoemreDopontodevistadossindicatos, laçãoàspossibilidadesdegreve
torna-senecessárioaprendersobre nosetor. Portodosos aspectos
oudaratençãoàmaneiracomoas apresentados,ocustoeconômico,
tarifasoudotaçõesorçamentárias socialemesmopolíticodeuma
sãodecididase,apartirdaí,com- únicamanhãoudiadegreveem
preenderopapeldoPoderLegis- qualquergrandecidadecompensa
agosto de 2014
arealizaçãodeesforçosparatrazerascondiçõesdecontrataçãodo
trabalhonosetoremquestãopara
dentrodeumambienteinstitucionalmaisarticuladoepreparado
parasoluçõesnegociadasdeforma
multipartite.Opoderpúblicotem
aresponsabilidadesobreosetor
edeveriacriarespaçosparaisto.
Apenasgerircontratose iscalizar
empresaséinsu iciente.
Em síntese, est as greves estão
mostrandoaoportunidadedeas
negociaçõescoletivasamadurecerempeloesclarecimentodasregrasdojogodoserviçopúblicode
transportescoletivos.Estesserviçossãoessenciais,contratadosmediantelicitação,seu inanciamento
écondicionadoporlimitaçõesorçamentáriascujasde iniçõessão
maiscomplexasquenosmercados
privados.
Há,portanto,anecessidadedeinstitucionalizaçãodasnegociações
coletivasdostransportescoletivos
urbanos,conectandoasmesasde
negociaçãocomosoutrosespaços
públicosemqueagestãoe inanciamentodosetorsãodecididos.
Encararasnegociaçõescoletivas
dosetornosmoldestradicionais
dasrelaçõesentrecapitaletrabalhoseriaumerro.Istodi icilmente
resultariaemacordosemqueao
mesmotempoganhassemostrabalhadoresdosetor,asempresas
e,fundamentalmente,tambémo
cidadão.
23
temas de economia aplicada
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(*) Professor Doutor da FEA-USP.
(E-mail: [email protected]).
agosto de 2014
24
temas de economia aplicada
O Transiente Entre Harrod e Solow e o Questionável Rumo Tomado pela Teoria do Crescimento Econômico
V
QuandoRoyHarrodpublicaem
1939oseu“EnsaioemTeoriaDinâmica”,provavelmentenãopoderia
imaginarqueestarialançandoelementosparaumdosmaisimportantesembatesteórico-ideológicos
daciênciaeconômicadoséculoXX.
Entretanto,arepercussãoqueteve
oseutrabalho,tantorelativamente
aovolumedeusoecitaçõesquanto
àextensãodascríticas(positivas
ounegativas)quelheforamsubsequentes,podenãoserfrutoapenas
das carac terísticas própriasdo
mesmo. Investigar sobre o que
estavalatentenopensamentoeconômicodominanteàépocapode
explicarmaisdoquepareceuma
meracuriosidadehistórica.Este
pequenoensaiosugereque,muito
longedeumsupostore inamento
crítico,ainvestidadeSolowsobre
Harrod,provavelmente,constituiu
umdesviocrucialnocursohistóricodasteoriasdocrescimentoeconômicoquesedelineariamapartir
daquelemomento.
clássicosdosséculosXVIIIeXIX
passavamhistoricamenteporeste
assunto.OqueexistiunoséculoXX
foramre inamentosoujunçõesde
ideiasqueconstituíramosmodernosmodelosdecrescimentoeconômicoeparaosquaisconcorreram
alguns elementosimportantes,
comoasmudançassociaisetecnológicasocorridascomaSegunda
Guerra Mundial,a repercussão
inquestionávelda“TeoriaGeral”de
JohnMaynardKeynesetambémo
desenvolvimentodaeconometria.
Parcialmenteenvolvidonestaatmosfera,Harroddesenvolveum
trabalhodentroda perspectiva
keynesiana,discorrendosobre lutuaçõesdonívelde ativ idade e
sobredinâmicadoscicloscomo
objetivodeexplicaravariaçãoda
rendapercapitaatravésdotempo,
eascausasdesuainstabilidade.A
percepçãodoempresáriosobreos
grausdeutilizaçãodacapacidade
instalada,presenteemseuartigo,
podeserlidacomomanifestação
deumanimalspirit,apesardeseu
Oprocessodecrescimentoeco- caráteraindabastantemecanicisnômico e a compreensão sobre ta,emarcaapreocupaçãocomas
seusdeterminantes,internosou expectativasempresariais.Uma
externosaoprocessocíclico,não versãorudimentar(ein lexível)de
é,enquantotema,umanovidade expectativasadaptativasdetermidoséculoXX.Dealgumaformaas nandoapossibilidadededepressão
preocupações dos economistas sãoapenasalgunsdoselementos
agosto de 2014
G
M
(*)
tipicamentekeynesianosdomodelodeHarrod.
ConformenoslembraDeane(1980,
p.253)apreocupaçãodeHarrod
pareceser,emparte,aconstrução
deummodelofuncionalàexecução
depolíticaseconômicas,mostrandopormeiodevariáveisrelativamentesimples,taiscomoataxade
poupançaearazãocapital-produto,umafórmulaútilàperseguição
demetasdedemandacapazes
desintonizaraeconomiacomsua
t axade crescimentogarantida,
aquelasobreaqualmanter-se-ia
osistemaeconômiconuma trajetóriasustentáveleequilibrada
decrescimento.Dopontodevista
prático,essepodetersidoomaior
interessedoartigodeHarrod,de
modoqueaprópriamanipulação
daspolíticaspoderiateropoderde
afastarounãoaeconomiado“ io
danavalha”.Dopontodevistateórico,entretanto,concebiaeleuma
outrasintonização,entreataxade
crescimentoanterioreataxanaturaldecrescimento,queporsuavez
eradadapelataxadecrescimento
da população e pelo progresso
técnico.Concebiam-seentão,três
taxasdecrescimentodiferentes,
que,teóricaeidealmente,deveriamconvergirnolongoprazopara
25
temas de economia aplicada
aconstituiçãodeumatrajetória
equilibradadecrescimentoede
acordocomopotencialmáximoda
economia:ataxaefetiva,ataxagarantidaeataxanatural.Nãoobstanteisso,adiscussão(possivelmente)maisfamosadomodelode
Harrod−oquepareceatésurpreendentenaquelecontextohistórico
−,constituisigni icativodesviode
percursoemrelaçãoàssuasideias
fundamentaisepropostascentrais.
LideradaporRobertSolow,emum
artigode1956,taldiscussãoabdicaclaramenteoaspectopráticodo
trabalhodeHarrod,relacionando
dimensãodademandaagregada
eseusimpactosnatrajetóriade
crescimentoeconômico,evolta-se,
exclusivamente,paraoaspectoteóricodeumcrescimentodelongo
prazoequilibradoentreastaxas
garantidaenatural.Umaênfase
quenãoaparecenacontribuição
originaldeHarrode,aliás,estava
longedeconstituirumapreocupaçãocentraldaqueletrabalho.
Somenteanosmaistarde,noseu
discursodoNobel,Solowreconhecenão tercompreendidoclaramenteaseparaçãodastrêstaxas
à época, segundo nos lembram
BoianovskyeHoover(2009,p.6)
eHagemann(2009,p.83)e,tampouco,apresençadeduaspossibilidadesdistintasdeconvergência,
entreastaxasefetivaeagarantida
eentreagarantidaeanatural(ea
efetiva).Focandoadiscussãonesta
últimaeespecí icapossibilidadede
convergência,esemmaioresjustiicativas,Solowlançaopilardesua
“críticafundamental”aHarrod,no
arcabouçodeumateoriadeclaradamenteneoclássica,voltadapara
ohorizonteteóricodolongoprazo
edacompreensãodatendência,
nãodosciclosnemdadinâmica
dosmesmos.Esteconjuntodeelementosdirecionaascontribuições
originaisdeHarrodaumaseara
diametralmenteoposta,tantoem
termosde iliaçãodentrodahistóriadopensamentoeconômico,
quantoemtermosdamotivação
políticaesuascompatíveisestratégias de açãodecurtoelongo
prazos.Apesarde,nasuaorigem,
tambémestar iliadoaumaorientaçãokeynesiana,Solow,aolevara
discussãoparaumoutrolado,relativamentepoucoexploradopela
teorianeoclássicaàépoca,podeter
tidomotivaçõesquerespondiam
maisaos,então,imperativosdo
desenvolvimentodeumavertente
daciênciaeconômica.
Longedeesgotaroassunto,gostaria deapontaralguns pontos
quepodemcontribuirparaesta
ideiadeumrumo“desejado”para
ospassosdopensamentoeconômicoàépoca.OartigodeSolow
sintetizoueuniuvárioselementos
valiososàteorianeoclássica,inclusiveoriundosdecomportamentos
microeconômicos(comoasubstitubilidadedosfatoresdeprodução)
nummodeloagregadodedescrição
deumatrajetóriamacroeconômica,quecontinhaoutroselementos
neoclássicos(comoaigualaçãode
poupançapotencialeinvestimento
nobojodopleno-emprego).Dado
o avançoquev inha sendofeito
pelateorianeoclássica,nasesferas
isoladasdamicroedamacroeconomia,haviaumtácitoclamorda
comunidadeacadêmicaporalgum
modelobemestruturadodecrescimentoeconômicoquecorrespondesseaosesforçosde“fechar”
umaboateorianestetópico.Em
outraspalavras,dereuniralógica
comportamentalmicroeconômica
comasprescriçõeseresultados
macroeconômicos,tornandotambémolongoprazoumresultado
coerente,nuncaconcorrente,com
ocurtoprazo.Amotivaçãodepreencherestalacunateóricapodeter
sidoo iocondutordosesforços
deSolownamedidaemque,até
osdiasdehoje,énotávelaorientaçãodo mainstreamembuscar
compatibilidadeentreocomportamentomicroeomacroeconômico
etambémentreocurtoeolongo
prazos,emcomplexosmodelosde
equilíbriogeralintertemporaleaté
intergeracional.
Mas,alémdisso,Solowpareciaser
onomeidealparaimplementar
estapesquisa,dadoquehaviarazoávelcompatibilidadeentreseu
próprioprojetodepesquisaeas
categoriasteóricas(edepensamento)quevinhamsendodesenvolvidas;Solowhaviaestudadoas
nuancesdefunçõesdeprodução
einvestimentocapitalistas(por
exemplo,comoalunoecolaborador
deLeontieff )ev inha buscando
entenderocomportamentodoprodutonolongoprazo,oqueainda
eraincompletonatradiçãoneo-
agosto de 2014
26
temas de economia aplicada
clássica.Nestecontexto,eramuito
compreensívelqueseinteressasse
eque izesseumaleituradoartigo
deHarrodapartirdapercepçãode
umproblemapráticonafunçãode
produção.Naquelemeadodeséculo,aleituradeSolowpodetersido
bastantesatisfatóriaparaoavanço
deumapartedaciênciaeconômica.
Mas como icaclaroemHoover
(2008),asintenções de Harrod
pareciambemdiferentesdaquelaspercebidasporSolow,principalmentenoquetangeàfunção
investimento.Comonãoháfundamentaçãoteóricaqueescape,em
algummomento,acríticassobre
suafactibilidadeempírica,ofato
deainstabilidadefundamentaldo
modelodeHarrodnãoencontrar
qualquercorrespondentenaobservaçãoderealidade,nemantecedenteshistóricos,podetersido
odetonadornecessárioparaabrir
oespaçoprivilegiadoquebuscava
ateorianeoclássica.Erainevitável
apontaralgumainterpretaçãodo
artigode1939deHarrodpormeio
defalhasdeconcepçãodashipótesesoudomodelo.
Se,noestágioemqueseencontravaapesquisa,aleituradeSolow
sobreo modelo deHarrodfoi a
melhorpossívelouse,comopensa
Hoover(2008),Harrodteriasido
malcompreendido, cer tamente
serialevianojulgar,jáquesãomuitasaspeculiaridadesqueenvolvem
estesestudoseavanços.Ofato,
porém,équecadaintérpretepõe
suaênfaseemaspectosparticularesquepretendeinterpretar.Efoi
assimqueSolowacabourealmente
mudandoaquestãodeHarrod,retirandoasênfasesdademanda,da
dinâmicaedosciclosparacolocá-lasnafunçãodeprodução,nosteadystateenatendênciadelongo
prazo.Poroutrolado,seaintenção
deSoloweraexplicarcommaior
plausibilidadeoprocessodecrescimentoeconômico,porqueteria
seesforçadonadireçãodoartigo
de1956,se,numaproduçãoquase
conjunta,em1957,demonstrouque
o“resíduo”tecnológicoeraresponsávelpor7/8docrescimento,restandoapenas1/8aserexplicado
pelomecanismoconvencionalde
substituiçãodefatoresnomodelo
de1956?Emoutraspalavras,seria
relevante,mesmoquesejaverdadeira,acríticadeSolowaHarrod
paraexplicarocrescimentoeconômico?Ouparecemaisprovávelque
amaiorfunçãodoartigode1956
seriaapenasafastaratrajetóriade
“ iodenavalha”daexplicaçãodos
ciclos?Seestaúltimaversãodos
acontecimentosforverdadeira, ica
maiscon iávelahipótesedeque
Solowquismudarotomeoritmo
dodebateacadêmicoparaaperspectivadelongoprazoneoclássica
esintonizá-la,oupelomenosnão
torná-laantagônica,comascondiçõesdeinvestimentodecurto
prazo.
percebidoporHoover(2008),que
arigidezdocoe icientetécnicode
capitalnuncafoipermanenteem
seumodelo,masqueseusvaloresalteram-seaolongodotempo.
Entretanto,Domar,quedeforma
independenteelaborouummodelo
nosmesmos moldes de Harrod,
admitecomoadequadaainterpretaçãodeSolow,reconhecendoum
“problema”nafunçãodeprodução
comcoe icientes ixos,queteria
sidosabiamentesanadaporSolow
(HAGEMANN,2009,p.81).Oque
ica, porém, sem resposta pelo
reconhecimentodeDomarépara
ondeforamasdemaispreocupações,prescriçõesefundamentosde
umalinhadepesquisakeynesiana,
abordadas num modelo comas
característicasdomodeloHarrod-Domar,anosdepoisreconhecido
conjugadamente.Epor que não
repensarafunçãoinvestimento,
seestafossemesmoarealfonte
dascríticas,numalinhadepesquisakeynesiana.Nãoque,apartir
dessasdivergênciasdeorientação
teórica, sepossa a irmarque o
rumodopensamentoeconômico
foimelhoroupiordoqueteriasido
semo“desvio”deSolow.Todavia,
icadi ícilnegaraexistênciadeste
desvio,creditandoàevoluçãodas
ideiaseconômicasumatrilhade
diretacontinuidadecronológica.
Harrod,elepróprio,nãoacatouo
desenvolvimentodeSolowcomo
umasoluçãoparaoseu“problema” Referências
da instabilidade namedida em
quecomenta,conformeaparece BOIANOVSKY,M.;HOOVER,K.D.TheneoemHagemann(2009)eétambém
classical growth model and twentieth-
agosto de 2014
27
temas de economia aplicada
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(E-mail:[email protected]).
agosto de 2014
28
temas de economia aplicada
Escolha Ocupacional, Restrição de Crédito e Informalidade
J
1 Introdução
Umagrandeliteraturainvestigaa
importânciadefricçõesnomercado inanceirosobreaescolhapelo
empreendedorismo.Emparticular,
diversos autores sugerem uma
relaçãopositivaentreariqueza
deumindivíduoesuacapacidade
deiniciarumnegóciopróprio.A
presençaderestriçõesdecrédito
limitaaquantiaótimainvestidaem
umempreendimentoeatémesmo
excluiindivíduosdestaatividade,
gerando,assim,umaimportante
fontedemáalocaçãoderecursos
naeconomia.
Imperfeiçõesnomercadodecréditofazemcomqueariquezapessoal
setorneumfatorpreponderante
sobre a escolhadeinvestimentodospotenciaisempresários.A
decisãodeempreendernãomais
dependeunicamentedotalento
intrínsecoparaestaocupação,mas
tambémdacapacidadedoindivíduodeseauto inanciarouobter
empréstimosnomontantedesejado.Buera(2008),Blanch lowere
Oswald(1998)eEvanseJovanovic
(1989)apresentamevidênciasempíricasdequepartedas irmasnos
EstadosUnidosestárestritaacrédito.PaulsoneTownsend(2004)
realizamumestudodeconclusões
semelhantesparaaTailândia.Gasperini(2010)eAssunçãoeAlves
(2007)ofazemparaoBrasil.
P
A
(*)
retoentreoníveldeformalização
daeconomiaesuaprodutividade,
gerandooutradimensãodemáalocaçãoderecursos.Inclui-se,também,apossibilidadedetributação
Opresenteartigopartedaelabo- sobreossalárioserendimentos
raçãodeummodeloemlinhacom dasempresasformais,outramaEvanseJovanovic(1989).Osauto- neiradedistorceramargemdecirespropõemummecanismopara sóriadosindivíduos.Por im,uma
adecisão estática do indiv íduo condiçãodeequilíbriogeraléimentretrabalharouempreender.O
postasobreomercadodetrabalho.
mercadodecréditoestáorganizadosegundoumparâmetroque Apartirdeumadotaçãoinicialhelimitaaquantiadisponívelpara terogêneadetalentoempresarial
empréstimoporumaproporçãoda
eriqueza,indivíduosdecidempela
riquezapessoaldoagente.Habiliatividadequegeraramaiorrenda
dadeempresarialedisponibilidade
líquida.Elespodemoptarportradecréditointeragemnasescolhas
balharou empreenderno setor
ocupacionais.Comoconsequênformalouinformal,podendoou
ciadireta,indivíduosmaisricos
nãoestarrestritosacréditonessas
possuemmaisacessoacréditoe
ocupações.Oobjetivoéanalisar
podem empreender emescalas
comoas escolhasocupacionais
maise icientes.
afetame iciência,níveldeformaAcontribuiçãopropostaéincluir lizaçãoedistribuiçãoderendana
acoexistênciadeempreendedores economiacomoumtodo.Omodelo
atuandonaesferainformaldaeco- modi icadofoicalibradodeformaa
nomia.1Essesnãopagamimpostos, reproduziralgumascaracterísticas
mastambémnãopossuemacesso daeconomiabrasileira.Diversas
aomercadodecrédito,estando simulaçõesnosparâmetrosdecrérestritosàprópriariquezacomo ditoealíquotasdostributosforam
meiode inanciamento.Aopermi- realizadascomointuitodeavaliar
tirqueatecnologiainformalseja osefeitos inaisemecanismosde
potencialmenteinferioràoperada interaçãodasdiversasdistorções
formalmente,cria-seumcanaldi- domodelo.
agosto de 2014
temas de economia aplicada
2 Modelo
Aeconomiaserácompostaporindivíduosheterogêneosemduascaracterísticas:talentoempresarial
Î [0, +¥[ e dotação de riqueza zÎ [0, +¥[ .Não
existecorrelaçãoentreasduasdimensõeseosagentespossueminformaçãoperfeitasobretodosospares
daeconomia.Alémdisso,todospossuemumaunidade
dedotaçãodetrabalho,aqualéofertadademaneira
inelástica.
Apenas irmasqueoperamnaesferaformaldaeconomiapossuemacessoaomercadodecrédito.Acadaperíododetempo,umindivíduopodetomaremprestado
nomáximoummúltiplo ( - 1) desuariquezapessoal
z.Oparâmetrol pertenceaointervalo [1, +¥[ erepresentaumamedidadograuderestriçãodomercado
decrédito,ouseja,quantomaioroseuvalor,maiscréditopoderásertomadoemaisfrouxaseráarestrição
sobreomutuário.
Aescolhaocupacionalérealizadaanalisando-seunicamentearendalíquidageradaemcadaatividade.No
mercadodetrabalho,oindivíduorecebeumsaláriode
mercadow,queindependedoseutalentoempresarial.
Esseéobtidopormeiodeumacondiçãodeequilíbrio
geralentreaofertademãodeobraesuademanda
porpartedosempreendedoresformaiseinformais.A
rendalíquidanomercadodetrabalhoserádadapela
somadosalárioapósaincidênciadeumtributocom
alíquotatnedorendimentodoalugueldariquezapes2
soalparaalguma irmaàtaxadejurosdemercador, ouseja: Yn = 1 - n w + rz .
Noempreendedorismoformal,oganholíquidoédado
3
pelaprodução descontadaporumimpostodealíquotatkedispêndiosnosmercadosdetrabalhoede
capital: Y f = 1 - k (k f l 1f - ) - wl f + r ( z - k f ) . As
quantidadesdeinsumok felfderivamdamaximização
darenda,sujeitaàrestriçãodecrédito, k f £ z .Caso
arestriçãonãosejaativa,oagenteéditoempreendedorformalirrestrito.
29
Afunçãodeproduçãonosetorinformalédistintana
participaçãodocapitalnarenda,b,e,apesardeosetor
nãopagarimpostos,umparâmetro £ 1 tornaesta
ocupaçãomenosprodutiva.Arendalíquidaédada
por: Yi =
(ki li1- ) - wli + r ( z - ki ).Lembrandoque,
pornãopossuiracessoaomercadodecrédito,aescolhaótimadecapitalestásujeitaa ki £ z .
Aetapaqueprecedetodaaanálisedocomportamentodoindivíduocomoempreendedorouassalariado
éaprópriaescolhaocupacionalentreastrêsopções
disponíveisnomodelo.Apartirdeumadotaçãoinicial
intrínsecadeprodutividadeeeriquezaz,cadaagente
teráquedecidirentretrabalharouserumempreendedor,formalouinformal.Alémdisso,deve-seasseguraroequilíbrionomercadodetrabalho.Osalário
wseajustadeformaatornaroexcessodedemanda
pormãodeobranulo.Paraumdadovetordeparâmetros [ , z , k , f , , , , , , r ] cadaagentetoma
asuadecisão.Pode-secaracterizarcompletamentea
escolhaocupacionaldosindivíduosnoespaçotalento
empresarial-riqueza.
3 Calibragem
Parapossibilitaroestudoarespeitodosmecanismos
deatuaçãodaspolíticascreditíciase iscaissobreo
equilíbriodomodelo,faz-senecessárioespeci icar
valoresaosparâmetrosdaeconomia.DeformasemelhanteaCagettieDeNardi(2006),dividem-seos
parâmetrosemdoisgrupos:noprimeiroestãoaqueles
inferíveisnosdadosouparaosquaishajaalgumconsensonaliteratura.Sãoesses: [ n , k , , , , , , r ]
.ATabela1apresentaosvalorespropostoseum
comentáriooujustificativaparaaescolhadesses;
ooutrogruposeráestimadodentrodoescopodo
modelo,deformaaaproximarosresultadosobtidos
poresseomáximopossíveldedeterminadasestatísticasbrasileiras.Naúltimacategoriaseenquadramosparâmetrosreferentesàdistribuiçãode
habilidadeeriqueza.
agosto de 2014
30
temas de economia aplicada
Tabela 1 - Calibragem dos Parâmetros Básicos
Nãoexistenenhumapesquisasobreadistribuição
doestoquederiquezadosdomicíliosbrasileiros.
Paracontornaressefato,seguindoCagettieDeNardi
(2006),optou-sepelaespeci icaçãodeumadistribuiçãoLog-normal.Essapossuiaspectosinteressantes,
comoumaconcentraçãodeindivíduosnacaudainferior,eéamplamenteutilizadanaliteratura(STI-
GLITZ,1967eBENABOU,2000,porexemplo).Além
disso,aLog-normalpossuiumarelaçãodiretacomo
coe icientededesigualdadedeGini,quesódepende
dodesviopadrãodadistribuição.Paraadistribuição
detalentoempresarial,optou-seporumadistribuição
uniforme.
Tabela 2 – Ajuste do Modelo
Omodeloseaproximadeformasatisfatóriadascaracterísticasbrasileiraspropostas,comopodeservisto
naTabela2.Foramsimulados100.000indivíduosna
economia.Calibrandoosdemaisparâmetrosbásicose
ajustandoosalárioparasempreequilibraromercado
detrabalho,obtêm-seasescolhasocupacionaisecom-
agosto de 2014
pletaalocaçãodosrecursos.A iguraaseguirmostraa
distribuiçãodosindivíduosnoplanoriqueza-habilidade.Elesestãodispostossegundosuasdecisõescomo
trabalhadoreseempreendedores,podendoatuarno
setorformalouinformal,comousemrestriçãode
crédito.
temas de economia aplicada
31
Figura 1 – Escolha Ocupacional na Presença de Restrição de Crédito e Tributos
na.Commaiscréditodisponível,maisagentesoptam
peloempreendedorismo,atéopontoemqueosalário
Umavezcalibradaaeconomia,parte-separaoutro passaaresponderpositivamenteaaumentosdecréobjetivo:simularpolíticasdecréditoe iscais.Osex- dito.Amargemintensivapassa,então,aseramais
perimentosforamrealizadosalterandoosparâmetros importante.Aumentosnostributossobreempreendeindividualmente,mantendoosdemaisconstantes doresformaisetrabalhadoresafetampositivamenteo
eajustandoosalárioparaequilibraromercadode saláriodeequilíbrio.
trabalho.Foramrealizadassimulaçõesem [ n , k , ]
.Sãoinvestigadososefeitossobree iciência,nívelde
4.1 Eficiência e Formalização
formalizaçãoedesigualdadenadistribuiçãoderenda.4
Busca-seentenderdemaneiraisoladacomoatuacada
umdosmecanismosdomodelo,dadaapresençadas Umpassopreliminaràssimulaçõeséade iniçãodo
conceitodee iciência.Optou-sepelaseguinteabordaoutrasdistorções.
gem:oefeitodasdistorçõesseráavaliadoemtermos
Acadasimulaçãodecréditoou iscal,umnovosalá- davariaçãodarendaagregadafrenteacadamudança
riodeequilíbrioéatingido.Oúnicoefeitonãotrivial nosparâmetros.Ointuitoéavaliaradistânciada
ocorrenassimulaçõeseml,háumanãomonotoni- rendatotalgeradanaeconomiaemrelaçãoaocenáriocidadenosalário.Omecanismoéoseguinte:com -basecalibrado.Optou-sepelaabordagemdoPIBsob
baixadisponibilidadecrédito,indivíduosoptampelo aóticadarenda.Arendadosetorformalédadapelos
empreendedorismoinformal.Aumentoseml,aprin- rendimentosdostrabalhadoreseempreendedores
cípio,incentivamaformalizaçãoe,comoestesetoré formais.Arendainformalcompreendeosganhosdos
menosintensivoemtrabalho,háumaquedainicial empreendedoresqueatuamnestesetor.Éimportante
nademandapormãodeobraeosaláriodeequilíbrio notarqueasituaçãoinicialjáéporsisóine iciente,
diminui.Oefeitosobreamargemextensivapredomi- comopodeservistonaTabela3.
4 Simulações
agosto de 2014
32
temas de economia aplicada
Tabela 3 - Mensuração do Impacto das Distorções Iniciais Sobre a Renda
Usandocomobasedecomparaçãoocenárioidealdeausênciade
restriçãodecréditoetributos,a
calibração do modelogerauma
perdade30%narenda.Analisandoapresençaindividualdecada
tipodedistorção,conclui-sequea
restriçãodecréditogeraamaior
perdadee iciência.Naausênciade
tributos,aperdaderendaquandol=2édeaproximadamente
14%,enquantooimpostosobre
trabalhadoreseempreendedores
formaisgeramquedasnarendaem
0,2%e2,6%,respectivamente.Na
ausênciadeempréstimos,casoem
quel=1,esemaincidênciadetributos,aperdaéde20%.Ainclusão
dealíquotastornaestadistorção
daordemde45%.
háumganhode0,9pontospercentuaisemrelaçãoaocenáriode
ausênciadestetributo,dadosos
5
demaisparâmetroscalibrados. Aexplicaçãoparaamenorperda
dee iciêncianomodelocalibrado
comimpostossobreotrabalhador
écomosesegue:osetorinformal
operacomumatecnologiamenos
produtivaepolíticasquedesincentivamestaatividadebene iciama
alocaçãoderecursosnaeconomia.
Aumentosnaalíquotasobreotrabalhogeramumônusmaiorsobre
osetorinformal,jáqueesseémais
intensivoemmãodeobra.Agentes
migramdessesetoredotrabalho
assalariadoparaoempreendedorismoformal.NestanovaocupaNota-se,noentanto,queosefeitos çãoatingemganhossuperiores,
nãosãodiretamentecumulativos. aumentandoarendaagregadada
Os mecanismos do modelo são economia.Nestesentido,doponto
maiscomplexosdoqueisso.Esta devistadae iciência,pode-sedizer
a irmaçãotambémécorroborada queainclusãodeumadistorção
peloefeitonãotrivialresultanteda ajudaaminimizaroefeitodeouadiçãodoimpostosobreostraba- tras.Esteparâmetro,porém,terá
lhadores.Quando n = 0 perde-se umimpactodistintosobreadesi30,9%darendaecom n = 17, 6% gualdadederendanaeconomia,
agosto de 2014
evidenciandoumtrade-offentre
e iciênciaeequidade.
4.2 Simulações de Políticas de
Crédito
Mudançasnoparâmetroderestriçãodecréditopodemserentendidascomoalteraçõesnapercepção
doscredoresemrelaçãoaoproblemadecomprometimentolimitado.
Parasimpli icaraanálise,pode-se
pensardiretamenteemmudanças
naquantidadederecursosdisponíveisparaospotenciaisempreendedores(formais)naeconomia.
Aumentosemlrepresentamum
afrouxamentodarestrição,com
maiscréditodisponívelparainvestimento.OGrá ico1apresenta
osefeitosdemudançasnesteparâmetrosobrearenda.Noeixo
horizontalsão apresentadosos
valoressimuladosparaarestrição
de crédito,enquanto o vertical
apresentaasvariaçõesnarenda
formal,informaletotal.Acomparaçãoésemprefeitacomrelaçãoao
cenáriocalibrado,porissotodasas
curvascruzamozeroeml = 2.
temas de economia aplicada
33
Gráfico 1 - Variação na Renda para Diferentes Graus de Restrição de Crédito
Napresençadetotalrestriçãode
crédito, arenda dosetorinformal aumenta emcercade94%.
Deformaanáloga,aumentosdo
créditodisponívelincentivama
migração paraoempreendedorismoformal.Casoaquantiapara
empréstimosaumentepara,por
exemplo,3,5vezesariquezados
agentes, arenda total expande
11,3%,sendo20,6%decrescimen-
todaformalequedade30,9%da laçãoaocenário-basecalibrado.O
Grá ico2ilustraasvariaçõesobinformal.
servadasnasrendasdossetores.
Oimpactosedámajoritariamente
4.3 Simulações de Políticas Fisnamargemextensiva.Háalteracais
çõesnamargemintensiva,massua
magnitudeéinsigni icanteperto
Omodeloémaissensívelavaria- doefeitototal.Aumentosnestadisçõesemtk .Umaquedade2pontos torçãoocasionamquedadarenda
percentuais nesseparâmetro é totalnaeconomia,apesardepossu icienteparadiminuirarenda suíremumefeitopositivosobreos
informalemquase80%,comre- saláriosearrecadaçãodogoverno.
Gráfico 2 – Variação na Renda para Diferentes Alíquotas tk
agosto de 2014
34
temas de economia aplicada
Adecisãopelotrabalhoassalariado
émaisinelásticaperantemudançasemsuaalíquota.Tornarnulo
oimpostosobreostrabalhadores
reduzarendatotalem1,2%eaumentaainformalem5,0%.Oefeito
épequenoeestárelacionadoao
fatodequealgunsindivíduosse
tornamtrabalhadoresporserem
poucohabilidosos,nuncasetornandosu icientementerentáveis
comoempresários.Éinteressante
notaroefeitonãotrivialsobrea
e iciênciadaeconomia.Aumentos
nessetributoafetampositivamentearendaagregada.Esteaspecto
podeservistonoGrá ico3.Como
osetorinformalémaisintensivo
emtrabalho,aumentosnoimposto
sobreessefatordesincentivama
informalidade.Trata-sedeuma
maneiraindiretadesecombatera
economiasubterrânea.
Gráfico 3 - Variação na Renda para Diferentes Alíquotas tk
Éinteressantenotarque,aocontráriodasoutrassimulações,os
efeitosentreasmargensintensiva
eextensivaocorrememdireções
opostas,sendooúltimopreponderante.Umaumentonaalíquota
incentivaindivíduosamigrarem
paraoempreendedorismoformal
daeconomia,registrandoganhos
deprodutonanovaocupação(margemextensiva).Porém,osempreendedoresquepermanecemnas
ocupaçõesanterioresincorremem
ummaiorcustodeproduçãodevidoaoaumentodosalárioesofrem
umaperdanarendaauferida(margemintensiva).
Oefeitodeequilíbriogeraldas
variaçõesnotributosobreostrabalhadores podeser de grande
valiaquandoseanalisaae icácia
depolíticaspúblicas.Sobaóticada
e iciência,aumentarotributopode
serconsideradobené icoparaa
economia.Esteefeito,porém,será
acompanhado de uma piora na
distribuiçãoderenda,comoserá
vistomaisadiante.Nocasodesse
tributoháumtrade-offclaroentre
e iciênciaeequidade.Alémdisso,
oimpostotambémajudaacombaterainformalidade,tornandoa
análisedepolíticas,emcertonível,
subjetivaaoobjetivojulgadocomo
primordial.E iciênciaeformali-
agosto de 2014
zaçãosãobene iciadasàcustade
umapiordistribuiçãoderenda.
4.4 Desigualdade de Renda
Comoumamedidadedesigualdade
pode-secalcularocoe icientede
Giniparaadistribuiçãoderenda
geradanessaeconomia.Ariqueza
afetaasescolhasocupacionais,e
cadaparâmetropossuiráumimpactodiferentesobreadispersão
nosganhoslíquidosemcadaatividade.Nesteponto,cabearessalva
dequeoíndicedeGiniéumamedidareduzidaparaadesigualdade.
Umamesmaestatísticapodeser
35
temas de economia aplicada
condizívelcomdiversasdistribuições.
O presente artigo parte de um
modeloestáticodeescolhaocupacional,comopropostoporEvanse
Oefeitomenosintuitivo,aprin- Jovanovic(1989).Propõe-seenricípio,éobservadocompolíticas queceromodelobásicocomoutras
decrédito.Parabaixosvaloresde dimensõesrelevantes:coexistência
créditodisponível,aumentoseml deempreendedoresformaiseinpioramadesigualdade.Apóscerto formais,alíquotassobreempresas
formaiseassalariadoseumaconnível,observa-seumamelhorana
diçãodeequilíbriogeralsobreo
distribuiçãoderenda.Esteefeito
mercadodetrabalho.
estádiretamente relacionado à
evoluçãonãomonotônicadossa- Omodelofoicalibradodeacordo
lários.Enquantoisso,alterações comaliteraturavigenteedeforma
nasalíquotasdeimpostospossuem areproduziralgumascaracterístiefeitosemdireçõesopostassobre casdaeconomianacional.Oobjetiadistribuiçãodarenda.Aumentos vo inalerasimularmudançasnos
naalíquotasobreempreendedores parâmetrosdecréditoetributos.
formaisdiminuemadesigualdade, Almejou-seentenderosmecanisenquantoummovimentocontrário mosdeatuaçãoeseusefeitossobre
ocorrecomoimpostosobreostra- e iciência,níveldeformalizaçãoe
distribuiçãoderendanaeconomia.
balhadores.
Algumasconclusõespuderamser
obtidasatravésdeexercíciosde
simulaçãonosparâmetros.AinApresençaderestriçõesdecrédi- troduçãodasdistorçõesgerauma
to,suapersistênciaeefeitossobre perdaderendanaordemde30%
agregadoseconômicosconstituem naeconomia,quandocomparada
aspectosdocumentadosporuma aomodelosemrestriçãodecrédito
grandeliteratura.Aatividadeem- etributos.Omaiorefeitoadvém
preendedoratipicamentenecessita darestriçãodecrédito.Comoo
deinvestimentosemcapital,que setorinformalémaisintensivoem
mãodeobraemenosprodutivo,
podemser inanciadosatravésde
aumentosnasalíquotassobreos
recursosprópriosouempréstimos.
trabalhadorescombatemainforApresençaderestriçõesdecrédito
malidade,bemcomoaumentamo
exclui indivíduostalentososdo
totalproduzido.Porém,issoocorre
empreendedorismoefazcomque àcustadeumapioranocoe iciente
algunsempresáriosnãoconsigam deGiniparaarenda.
investiremescalaótima,gerando,
assim,importantesdistorçõesna Arestriçãodecréditopossuiuma
alocaçãoderecursosdaeconomia. relaçãonãomonotônicacomosa-
5 Conclusão
láriodeequilíbrio,oquesetraduz
diretamentesobreadesigualdade
derenda.Por im,omodeloémais
sensívelamudançasnasalíquotas
sobreosempreendedoresformais.
Tantoe iciênciaquantoformalizaçãosãoseveramenteafetadaspor
mudançasnessetributo.Conclui-sequeasdimensõesadicionadas
aomodelodeEvanseJovanovic
(1989)trazemmecanismosinteressanteseenriquecemaanálise
depolíticaspúblicas.
Referências
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Restrições de crédito e decisões intrafamiliares.RevistaBrasileiradeEconomia,
v.71,p.201-229,2007.
BENABOU, Roland. Unequal societies: incomedistributionandthesocialcontract.
American Economic Review, v. 90, p.96129,2000.
BLANCHFLOWER,David;OSWALD,Andrew
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ofLaborEconomics,v.16,p.26-60,1998.
BUERA,FranciscoJ.Persistencyofpoverty,
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CAGETTI,Marco;DENARDI,Mariacristina.
Entrepreneurship,frictions, and wealth.
JournalofPoliticalEconomy.v.114,n.5,
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EVANS,David;JOVANOVIC,Boyan.Anestimatedmodelofentrepreneurshipchoice
under liquidity constraints. Journal of
PoliticalEconomy,v.97,n.4,p.808-827,
1989.
GASPERINI, Bruno Otta. Crédito e empreendedorismo: confrontando eventos
agregadosemicrodados.Dissertaçãoapresentadacomorequisitoparaaobtenção
do título de Mestre em Economia pela
UniversidadedeSãoPaulo.P.1-61,2010.
agosto de 2014
36
temas de economia aplicada
PAULSON,AnnaL.;TOWNSEND,RobertM.Entrepreneurshipand
inancialconstraintsinThailand.JournalofCorporateFinance,v.
10,p.229-262,2004.
2 Onde r é ataxadejurosbrutademercado,ouseja, r = (1 + taxa de juros).
SCHNEIDER,Friedrich.Shadoweconomiesaroundtheworld:what
dowereallyknow?EuropeanJournalofPoliticalEconomy,v.21,
n.3,p.598-642,2005.
4 A arrecadaçãodogoverno neste modelo ésempre crescente para
aumentosdasalíquotas.Dessemodo,optou-sepornãoincluiresta
análisenotrabalho.
STIGLITZ, Joseph E. Distribution of income and wealth among
individuals. CowlesFoundation for Research inEconomics,Yale
University.1967.
5 Ainteraçãoderestriçãodecréditoetributosdistanciaaeconomiade
seu irstbest,tornandoaanálisedequalquerpolíticapúblicasujeita,
impreterivelmente,aumaavaliaçãodentrodocontextodeummodelo
calibrado.
1 Altacargatributáriaeumsetorinformalexpressivosãocaracterísticascomunsemdiversospaíses,especialmentenaquelesem
desenvolvimento.Schneider(2005)estimaque,entre1999e2000,a
informalidadecorrespondiaa41%doPIBdestespaíses,contra18%
paraosmembrosdaOCDE.ParaoBrasil,omontanteestimadofoide
39,8%doprodutointernonoperíodo.
agosto de 2014
3 Oparâmetrodespanofcontrolg<1fazcomqueotalentoempresarial
possuarendimentosmarginaisdecrescentes.
(*)MestreemEconomia,IPE-USP.
(E-mail:[email protected]).
37
temas de economia aplicada
O Crescimento e os Impactos da Produção de Soja no CentroOeste: Biodiesel e Produção de Alimentos – Parte I1
E
1 Introdução
M
G
S
(*)
doatendênciadeestabilidadedos
preçosprojetadapeloInternationalFoodPolicyResearchInstitute
(IFPRI,2002),sendoumahipóteseapontadaparatalreversãode
tendênciaaexpansãodaáreade
biocombustíveis.Porém,hávárias
causas,estruturaiseconjunturais,
queafetamopreçoeaprodução
dosalimentos(SENAUER,2008;
PINGALI;R ANEY;WIEBE,2008;
FoodandAgricultureOrganization
oftheUnitedNations-FAO,2008),
comoaexpansãodademandanos
paísesdaÁsiaeperturbaçõesclimáticasqueafetaramaofertade
certosprodutosagrícolasnaépoca,
como, por exemplo, aprodução
detrigo naAustráliapelaseca,
aproduçãodearroznoVietnam
(SENAUER,2008)easuspensão
dasexportaçõesdetrigopelaArgentina.
biocombustíveis,comoacontração
daofertademilhopeloseuusona
produçãodeetanol,assimcomo
uminíciodedesviodeáreadetrigo
para aprodução de milho.Com
isto,osestoquesdemilhoetrigo
diminuemeospreçosseelevam
(SAMPAIO,2010).Osmodelostambémmostrampossíveisreduções
nasexportaçõesnorte-americanas
paraomilho,asojaeotrigo.Runge
eSenauer(2007),porexemplo,criticamosefeitosperversossobrea
segurançaalimentardomundodo
programaamericanodeprodução
deetanol:
Hápoucostrabalhosqueanalisam
Váriostrabalhosbemelaborados essaquestãoparaoBrasil;porém,
sobreessespossíveisimpac tos existeumaliteraturasobreoutros
foramrealizados,comoodeSe- produtosparaosEstadosUnidos
nauer (2008), que report a que eparaaUniãoEuropeia.Vários
entre2005ejaneirode2008,o estudosutilizandodiversosmopreçodotrigoaumentou143%,o delos,hipóteseseperspectivas
domilho,105%,odoarroz,154%, foramfeitosparaosEUA,quedeodoaçúcar,118%,eodassemen- tectaramapresençadecon litos
tesoleaginosas,197%,contrarian- entreaproduçãodealimentosede
poramarrarospreçosdacomidae
Estetrabalhoapresentaumaanálisedoprocessodeexpansãoda
sojanaregiãoCentro-Oeste,no
períodode2005a2009,paraaveriguarosefeitosdecorrentesda
obrigatoriedade damist ura do
óleodiesel-biodieselemterritório
nacionalsobreaproduçãoagrícola,
eprincipalmentesobreaproduçãodealimentosdaditaregião.
Nessaprimeiraparte,analisar-se-áomercadodesojabrasileiroe,
principalmente,doCentro-Oestee
aproduçãoagrícoladessaregião
ediscutir-se-áaproduçãodobiodiesel,asuaevoluçãoeaspolíticas
governamentaisvoltadasparao
setor.Asegundapartenapróxima
ediçãoirá apresentaromodelo
shift-shareutilizadoparaanalisara
produçãoagrícoladoCentro-Oeste
noperíodode2005a2009eosresultadosdessetrabalho.
Aopressionaraofertamundialde
safrascomestíveis,aaltanaproduçãodeetanolsetraduziráem
preçosmaiselevadostantoparaos
alimentosindustrializadosquanto
paraosbásicos,emtodoomundo.
Osbiocombustíveisterminaram
osdopetróleodeumamaneiraque
podeperturbar,profundamente,o
relacionamentoentreprodutores
econsumidoresdealimentos,e
entreasnações,nospróximosanos,
oqueacarretaimplicaçõespotencialmentedevastadorastantopara
apobrezanomundoquantoparaa
segurançaalimentar.
agosto de 2014
38
temas de economia aplicada
AexpansãodaproduçãodebiocombustíveisnosEstadosUnidos
sedácomexpansãodaprodução
edaáreaplantadacommilhoe
oleaginosas,mascomcontração
daproduçãodecana-de-açúcar,
deoutrosgrãoseoutrosprodutos
agrícolas. Jána UniãoEuropeia
predominaaexpansãodeoleaginosas,umavezqueéprivilegiado
obiodieselemrelaçãoaoetanol,
havendocontraçãodaproduçãoe
daáreacomcana-de-açúcar,outros
grãoseoutrosprodutosagrícolas
(SAMPAIO,2010).
Agropecuária(EMBRAPA)con irmaisso,estimandohaver,em2006,
cercade90milhõesdehectares
disponíveisparaexpansãodaagriculturanoBrasil,quepossuium
territóriototalde852milhõesde
hectares.Alémdisso,hámaisde30
milhõesdehectaresocupadoscom
pastagensextensivassubaproveitadasquepoderãoserliberados
nospróximosanosparaexercício
deoutrasatividadesagrícolassem
prejuízoàsproduçõesdecarnee
leite,fatojáconstatadoparaoEstadodeSãoPaulo(STRAPASSON;
JOB,2006).Oprogressotecnológiconaproduçãoagropecuária,
reconhecidonacadeiadasojaeda
cana-de-açúcarnoCentro-Sul,contribuiparaareduçãodospreços
dosalimentos,fazendocomqueo
efeitodaproduçãodebicombustíveissobreessespreços,adepender
doritmodecrescimentodoetanol
edobiodiesel,sejaapenasaausênciaouumamenorreduçãodesses
preços.Portanto,ahipótesedeque
aexpansãodosbiocombustíveis
con litacomaproduçãodealimentosecolaboracomaelevaçãodos
preçosdesseséaceitável,porém
necessitademaiorveri icação.
obrigatória passou, em julho desse
ano, para o B4,veri icando-seos
fatoresquecontribuíramparao
aumentodaprodução:avariação
dorendimento, daárea colhida
(queédivididaemutilizaçãode
novasáreasedeáreasdeoutras
culturasqueasojasubstituiu)eda
localizaçãogeográ ica.
2 O PNPB e a Produção de Biodiesel
AsprimeiraspesquisassobrebiodieselnoBrasilsurgiramnaUniversidade do Ceará,no inalda
Há,noentanto,umadiferençafundécadade70.Aindaassim,aindamentalentreosdoismaiores
troduçãodefatodobiodieselna
produtoresdebicombustíveis:enagendadaspolíticasenergéticas
quantoosEUAusamomilhoparaa
doPaíssóocorreunadécadade90
produçãodeetanol,oBrasilutiliza
einíciodade2000.Umdosmarcos
acana-de-açúcar.Emrelaçãoao
foioProgramaBrasileirodeBioBrasil,agrandeexpansãodaprocombustíveis(Probiodiesel),em
duçãodeetanolnoPaísocorreao
2002,coordenadopeloMinistério
ladodaexpansãodaproduçãoda
daCiênciaedaTecnologia(MCT).
sojasemocorrermaiorcontração
Nessaépoca,osargumentosparaa
naproduçãodealimentos,segunimplementaçãodoprogramaeram:
doPingali,RaneyeWiebe(2008).
adiminuiçãodadependênciados
Müeller(2003)eBrandão,Rezende
derivadosdopetróleo;acriação
eMarques(2006)argumentamque
denovosmercadosparaasoleaasojaseexpandiusobreasáreas
ginosas,emparticularparaasoja;
depastagemsemtrazercontração
ocrescimentodademandaglobal
naproduçãodealimentos.
Objetiva-seassimavaliarseaex- porcombustíveisalternativose
O Brasil possui grandes vanta- pansãodasoja,incentivadapelo renováveis;eareduçãodasemisgenscomparativasnaproduçãode biodiesel,nãorepresentouuma sõesdegáscarbônico(FLEXORet
biocombustíveis.Morceli(2006) ameaçaàsoutrasculturasdare- al.,2011).Issoocorreudiantedo
defendequeoPaíspossuiprivi- gião.Paraisso,otrabalhopropõe- aumentodaspreocupaçõescomo
légiosnaturais,podendocontri- -seamostraramagnitudedessa meioambiente,doefeitoestufae
buircomareduçãodapoluição expansãoentre2005,quando pas- dadependênciadoscombustíveis
mundial,forneceretanoleainda sou a ser autorizada a mistura B2 (2% fósseis,comoalertadoesgotamenobterexcelenteslucroscomisso. de biodiesel e 98% de diesel mineral), todasreservasdepetróleoouo
AEmpresaBrasileiradePesquisa até o ano de 2009, quando a mistura encarecimentodasuaexploração,
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39
temas de economia aplicada
inviabilizando-o.Obiodieseléa
alternativamaisaceitadecombustívelrenováveldevidoaofatode
suaspropriedadesseremsimilares
àdopróprioóleodiesel(YUSTE;
DORADO,2006).
programa com três fundamentosprincipais:ainclusãosocial
atravésdaagriculturafamiliar,
a sustentabilidade ambient al e
a viabilidadeeconômica. Desse
modo,nasceem2004oPrograma
Nacional de Produção e Uso de
Em 2003,re letindoasmudan- Biodiesel(PNPB),que,paraincençasdepreocupaçãoemtornodo tivaraconsolidaçãodomercadode
novocombustível,surgeumnovo biodieseleassegurarqueasmetas
doprogramafossemalcançadas
semgerarproblemasdedesabastecimento,estabeleceuosleilões
públicospromovidospelaAgência
NacionaldePetróleo,GásNaturale
Biocombustíveis(ANP),atribuindo
àPetrobrasopapeldeúnicocompradoresendoresponsávelpelas
misturasdeóleodiesel-biodiesel
estipuladasemlei.
Figura 1 - Biodiesel - Localização das Unidades Produtoras de Biodiesel
Fonte:BoletimMensaldosCombustíveisRenováveis,março2011(MinistériodeMinaseEnergia-MME).
Em2011,existiam67plantasprodutorasdebiodiesel
autorizadaspelaANPparaoperaçãonoPaís,correspondendoaumacapacidadetotalautorizadade
17.315,95m³/dia.Dessasplantas,61possuemautorizaçãoparacomercializaçãodobiodieselproduzido,
correspondendoa17.015,25m³/diadecapacidade
autorizadaparacomercialização.Háaindanovenovas
plantasdebiodieselautorizadasparaconstruçãoe
dezplantasdebiodieselautorizadasparaampliação
decapacidade.Coma inalizaçãodasobraseposteriorAutorizaçãoparaOperação,acapacidadetotal
autorizadapoderáseraumentadaem4.567,79m³/dia
(ANP,2011).Das67plantasprodutorasdebiodiesel,
2
31estãolocalizadasnaregiãoCentro-Oeste, ouseja,
46%,edas19autorizadasparaconstruçãoouampliação,oitoestãonoCentro-Oeste, 3implicandoem42%
dasnovasplantas(Figura1).
Porém,estudospreliminaresdeviabilidade inanceira
mostravamqueobiodieselteriaumpreçonabomba
superioraodoóleodiesel(FERRES,2003).Barroset
al.(2009)tambémmostraramque,considerandoas
basesdoperíodo2003/2006eocâmbiodeR$1,80,
ocusto inanceirodobiodieselseriadeR$2.159,00/
ton,enquantoodieselimportadoentrariaporR$
1.563,00/ton,fazendocomqueosubsídionecessário
paraviabilizarobiodieselfossedomontantedeR$
596,00/tonnoCentro-Oeste,tambémobservando-se
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temas de economia aplicada
queopreçointernodobiodieselsemanteveestável
noperíodo.Dinardi,SalumeMiranda(2010)ainda
concluemque,parapreçosdeóleosvegetaisacima
deR$1.501,00/ton,aproduçãodebiodieselsetorna
inviável;logo,opreçodoóleodesojadegomadode
R$1.901,00/tonoinviabilizariaparaaproduçãode
biodiesel,sendoentãonecessáriossubsídiosdogoverno,jáexistindoincentivos iscais,parasealcançaras
metasdeprodução.
Entrejaneiroejulhode2008,amisturaobrigatória
debiodieselpuro(B100)aoóleodieselfoide2%;
entrejulhode2008ejunhode2009foide3%;eentre
julhoedezembrode2009foide4%.Osrespectivos
aumentosdaproduçãodebiodieselemcadaintervaloemrelaçãoaomesmoperíododoanoanteriorno
Centro-Oesteforam:289,17%,100,17%e25,7%(ANP,
2011).Osaumentosforamexpressivos,porém,sucessivamentedecrescentes.Ogovernoaindaantecipou
oaumentode4%para5%dopercentualobrigatório
damisturaem2010,conformearesoluçãonº6/2009
doConselhoNacionaldePolíticaEnergética(CNPE),
quandoestavaprevistopara2013,eaproduçãofoide
1,02bilhõesdelitrosdebiodieselem2010,aumento
de59,1%emrelaçãoaoanoanterior,elevandoassim
ataxacomessaantecipação.SepermaneceroB5,a
ofertaseguradocombustívelestarágarantidapelacapacidadeprodutivaatualaté2019(MENDES;COSTA,
2010).Essesaumentossósãofeitosàbasedemuito
estímuloesubsídiosdogoverno,comomostradopelos
desembolsosdoBancoNacionaldoDesenvolvimento
(BNDES,2010,Grá ico1).
Gráfico 1 - Desembolso do BNDES ao Biodiesel (Valores Nominais)
Fonte:BancoNacionaldoDesenvolvimento(BNDES,2010).ElaboraçãodoInstitutodePesquisaEconômicaAplicada(IPEA).
agosto de 2014
temas de economia aplicada
Aocontráriodoqueestavaprevistooriginalmente
noprograma,osbene ícios iscaisdoPNPBatingem
maisosprodutoreseEstadosquenãoeramopúblico-alvodoprograma,especi icamenteossojicultoresdo
Centro-OesteedoSul,devidoàimportânciadasoja
comoprincipalmatéria-primaepelofatodeamaior
partedesuaproduçãoseconcentrarnessasregiões,
malograndoassimosanseiossociaisdoprograma
(FLEXORetal.,2011).
3 Produção Agrícola e de Biodiesel no Centro-Oeste
AregiãoCentro-Oesteéamaiorprodutoradesojado
País,tendoproduzidoquase31,6milhõesdetoneladas
em2009(46%daproduçãonacionaldoano),comuma
41
áreaplantadanomesmoanodemaisde10,5milhões
dehectares(45%daáreaplantadadesojadoPaís),e
aproximadamente10,8milhõesdehectaresnoano
de2010,mantendoonívelde45%daáreaestimada
paraoPaís(CompanhiaNacionaldeAbastecimento
-CONAB,2011).NaFigura2,observam-seáreasde
concentraçãodaproduçãodesojanoCentro-Oeste,
especialmentenoMatoGrosso,que,em2007,tinhaos
cincomunicípiosdemaiorproduçãoeondetambém
concentram-seasusinasprodutorasdebiodiesel.A
grandemaioriadosmunicípiosnaregiãoapresenta
algumaproduçãodogrão.Jáemrelaçãoaobiodiesel,
aregiãoproduziu640.077,296m³em2009−39,8%
daproduçãonacional.Comparando2009e2010,oaumentofoide59,1%,atingindo42,5%daproduçãonacional,com1.018.302,608m³deB100,biodieselpuro.
Figura 2 – Distribuição Espacial da Produção de Soja por Município no Centro-Oeste em 2007
Fonte:ProduçãoAgrícolaMunicipal(PAM,IBGE),BancoSIDRAemapasdegeociênciadoIBGE.Elaboraçãodoautor.
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temas de economia aplicada
Oóleodesojaéaprincipalmatéria-primautilizadano
Paísparaaproduçãodebiodiesel,respondendopor
83,76%daproduçãodebiodiesel(Figura3).Opotencialdeproduçãodeóleodasoleaginosasvariabastante:entre150litros/hadomilhoaté5.900litros/hado
dendê(LaboratóriodeDesenvolvimentodeTecnologiasLimpas-LADETEL,2005).Mesmoapresentando
ummenorteordeóleo(de18%a20%dasoja)em
comparaçãocomasoutrasalternativas(mamona,
dendê,girassol,pinhãomanso,crambe,macaúba,
canola,linhaça,gergelim,entreoutras,queapresentamumteorde30%até50%),alémdessasteremum
maiorapelosocialeisençãodeimpostos,agrande
utilizaçãodasojadecorredacadeiaprodutivadessa
sermaisbemestruturada,tantoantesquantodepois
dafazenda;possuirumatecnologiadeproduçãobem
de inidaemoderna,aproveitando-sedeeconomiasde
escala;oferecerrápidoretornodoinvestimento,tendo
umciclode4a5meses;proporcionarumagamade
produtosesubprodutos,diversi icandoaspossibilidadesdoprodutor,comoafarinhadesoja,farelodesoja
pararaçãoanimal,lecitinadesoja,leiteeóleodesoja,
entreváriosoutrosusosalimentícioseindustriais,
alémdobiodiesel;asojapodeserarmazenadapor
longosperíodos,aguardandoamelhoroportunidade
paracomercialização;éumprodutofácildevender,
poissãopoucososprodutoresmundiais(EUA,Brasil,
Argentina,China,ÍndiaeParaguai),pouquíssimosos
exportadores(EUA,Brasil,ArgentinaeParaguai),mas
muitooscompradores(todosospaíses),resultando
emmaiorgarantiadecomercialização.Assim,Sachs
(2009)jáalertavaque,semumapolíticaexplícitade
apoioaosagricultoresfamiliares,aevoluçãodaproduçãodebicombustíveisirianovamenteconcentrar
terraseriqueza,gerandoummodelodecrescimento
concentradoreexcludente.
Gráfico 2 - Principais Matérias-Primas Utilizadas para Produção de Biodiesel em 2009
Fonte:BoletimMensaldeBiodiesel,Dezembro/2009(ANP).
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43
temas de economia aplicada
Mesmo sendo a inclusão social
umdosdestacadosobjetivosdo
PNPB,Biondi, MonteiroeGlass
(2010)destacamque,infelizmente,
oobjetivodoPNPBdediversi icarasfontesdematérias-primas
paraaproduçãodebiodieselteria
avançadopouco.Oprogramanão
obtevesucessoemsuasmetassociais,mantendoosagricultores
familiaresàmargemdaspolíticas
públicas(FLEXORetal.,2011;BUAINAIN,2008;BUAINAIN;GARCIA,
2008).
madamente55,4milhõesdetoneladasem2010(+5,81%emrelação
a2009),sendosódesojaaproximadamente33,7milhõesdetoneladas
paraaregião(+6,75%emrelação
a2009,segundoaCONAB,2011).
Orebanhobovinodaregiãofoide
maisde70,65milhõesdecabeças
em2009,34,42%doefetivonacional,sendoacriaçãoextensiva
evisando,principalmente,ogado
paraocorte(IBGE,2011).Jáomeio
ambienteéformado,aonortee
oeste,pelaFlorestaAmazônica,
peloCerradonamaiorparteepelo
Noperíodode2005-2009,outra ComplexodoPantanalnosudoeste.
preocupaçãoestánapossibilida- SegundooMinistériodoMeioAmdedeaexpansãodasojatersido biente(MMA),48,2%daáreado
motivadapelosincentivosgover- Cerradojáfoidesmatada.
namentais,comooPNPBde2004,
epelomercadodobiodiesel,emde- SegundoBrandão,RezendeeMartrimentodeumasojavoltadapara ques (2006), que analisaram o
insalimentícios,alémdapossível crescimentodaagriculturabrasisubstituiçãodeoutrasculturas leiraapósamudançadapolítica
daregiãopelasoja.Asprincipais cambialdejaneirode1999,houve
culturasdaregião,alémdasoja, um aumento de 22,8% da área
sãoomilho,oarroz,amandioca,o plantadacomgrãos,aolongode
amendoim,ocafé,otrigo,acana- trêsanosagrícolas(2001/2002,
-de-açúcar,ofeijãoeoalgodão, 2002/2003e2003/2004).A irsendoaestimativadaprodução mam,ainda,queestaexpansão
totaldegrãosdaregiãodeaproxi- daáreasedeusobretudonasoja,
que cresceu, somente naqueles
trêsanos,66,1%naregiãoCentro-Oeste,estimuladapelamudança
napolíticaeconômicaeporuma
fasedealtadospreçosinternacionaisapartirde2002,quereforçou
oestímulocambial.
N o e n t a n t o , p a r a o p e r í o d o
2005/2009,aexpansãodaárea
plantadadesojanoCentro-Oeste
desaceleroupara-8,9%,enquanto
aquantidadeproduzidaaumentou
apenas1,12%,registrando-seque
ospreçosinternacionaisdasoja
cederamem2004esóvoltarama
subirexpressivamenteem2007,
caindonovamenteemseguidacom
acrisemundial,conformeoGráico3.
Assim,mesmocomossubsídiose
incentivosdogoverno,obiodiesel
parecenãotercontribuídoparaestimularaexpansãodasoja,levando
no imaodecréscimodaáreaplantadaeaumpequenocrescimento
daproduçãoentre2005e2009.Ou,
poroutrolado,podeteratenuadoa
quedadoprópriomercadodesoja,
constituídoporgrão,fareloeóleo.
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temas de economia aplicada
Gráfico 3 – Evolução dos Preços da Soja e do Biodiesel
*De lacionadospeloIPA-DIProdutoAgrícola(FGV-RJ),ano-base2005.
**De lacionadopeloPPI(USDepartmentofLabor:BureauofLaborStatistics),ano-base2005.
Fonte:BolsadeChicago,Corretoras,JornalValorEconômicoeANP.Elaboraçãodoautor.
Alémdisso,autilizaçãodepastagensdegradadasparaaexpansão
dafronteiraagrícolaéoutrofator
afavordahipótesedequeorisco
docon litoentreaproduçãode
biodieseledealimentosémínimo.Brandão,RezendeeMarques
(2006)defendemaconversãode
pastagensnaexpansãodasoja:
gem),jáocorreu,emummomento
arrendamentodaterraporparte
anterior.Apropósito,valeapena
dosojicultor,oquetemavantagem
informarqueaáreadepastagem
deeximi-lodanecessidadedeimo-
plantadanoCentro-Oestepredo-
bilizaçãodecapitalnaaquisição
minaamplamentesobreaárea
deterra.Alémdisso,opecuarista
depastagemnatural.Bastanotar
que,segundoosCensosAgropecu-
normalmentenãopossuiasmáquinasagrícolasnecessáriaspara
ários,aáreadepastagemplantada
realizarelemesmoarenovaçãodas
aumentou,entre1970e1995/96,
pastagens.
[...]aocontráriodasáreasvirgens,
áreasocupadascompastagens
sãomuitomaisviáveisdeserem
convertidasemáreacomsojae,no
de7para50milhõesdehectares;
próprioperíodoemquesedáessa
conversão,iniciar-seaprodução
desoja.Arazãoparaistoéqueboa
partedoprocessodeproduçãode
terraapropriadaparaoplantiode
Emcomparação,aáreacomlavoura
soja(como,porexemplo,acala-
[...]Sabe-sesermuitofrequenteo
agosto de 2014
enquantoisto,aáreadepastagem
nativacaiude46para23milhões
dehectares,nessemesmoperíodo.
eradeapenas7milhõesdehectares
em1995/96.Adisponibilidadede
pastagensparaseremconvertidas
emlavourasé,assim,quasein inita.
EssahipótesetambémfoidefendidaporMüeller(2003),emsua
análisedoprocessodeexpansão
dasojanoCentro-Oeste,durante
a década de 1990.Eleconcluiu
que,paradesestimularodesmatamentodenovasáreasdemata
virgem,énecessárioqueosistema
detransporte,primordialparaa
expansãodafronteiraagrícolada
45
temas de economia aplicada
soja,sejaaprimoradonasáreas
já assentadas do Cerrado,onde
existemconsideráveispastagens
jálimpasdavegetação,masque
estãodegradadasesubutilizadas,
passíveisderecuperaçãocomo
sistema de integração lavoura-pecuária,conhecidocomosistema
ILP,evitandoqueosinvestimentos
detransportesnãoacabemincentivandoaaberturadenovasáreas
navegetação.
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1 Trabalhodesenvolvidosobaorientaçãodo
Prof.Dr.YonydeSáBarretoSampaio,professortitulardoPIMESdoDepartamentode
EconomiadaUFPE(DECON/UFPE),aquem
oautoragradecetodaaajuda,colaboraçãoe
sugestões;agradecetambémoapoio inanceirodoCNPq.Qualquererroremanescente
éderesponsabilidadedoautor.
2 Dessas,21estão no MatoGrosso, trêsno
MatoGrossodoSuleseteemGoiás.
3 CinconoMatoGrosso,umanoMatoGrosso
doSuleduasemGoiás.
(*)GraduadoemCiênciasEconômicaspela
UFPE,mestrandoemTeoriaEconômica
noIPE/FEA/USP,integrantedo
NEREUS/USPebolsistadaFIPE.
(E-mail:[email protected]).
47
temas de economia aplicada
A Economia da Felicidade
J
1 Um Breve Panorama Histórico
Felic idade sempre foi tema de
grandeinteresse ilosó ico.Aristóteles,emÉticaaNicômaco,discute
afelicidade(nogrego,eudaimonia)
comoprincípiocentralqueguiaos
sereshumanosemtodasassuas
motivações.Parao ilósofo,aeudaimonia signi ica mais doque
prazer,sentimentoousatisfação
dedesejos.Abrangeaexcelência
moralespecí icaànaturezahumana,tornandoaquestãodecomo
serfelizequivalenteàquestãode
comoviverbem,nosentidoético
dotermo. Correntes ilosó icas
helenistastambémsepropuseram
aárduatarefadeidenti icarquais
aspectosda vida determinama
felicidade.OsEstoicos,porexemplo,acreditavamqueaorigemda
felicidadeestánavidadeacordo
comanaturezahumanadarazão.A
realizaçãodeumcarátervirtuoso,
queemnadadependedecircunstânciasmateriais,seriaachave
paraaresoluçãodoproblemada
vida.OsEpicuristas,porsuavez,
entendiamqueoinstintoprimário
dequalquerservivoébuscarprazeres.Portanto,umavidaplenamentefelizseriaaquemaximizasseprazereminimizassedor ísica
oupsicológica(STEPHENS,2007).
Extrapolandosuasorigens ilosóicas,adiscussãosobrefelicidade
tambémestevepresentenoprelúdiodaeconomiacomociência.
AdamSmith,emTeoriadosSentimentosMoraisidenti icaafelicidadecomofrutode“compostura
etranquilidadedeespírito”provenientesdeumavidavirtuosa.O
autorécéticonoquedizrespeito
àexistênciadeumarelaçãoentre
acumulaçãoderiquezasefelicidadeindividual,distinguindoos ins
“desejados”dos“desejáveis”.Smith
enfatizaque,apesardeariqueza
serum im“desejado”porgrande
partedahumanidade,issoestaria
longedeseroidealnoquetangeao
aspectomoral–o“desejável”seria
abuscaincessantepelasabedoria
eavirtude.
A par tirdo im doséculoXIX o
bem-estar(utilidade)foiincorporadocomovariávelprincipaldeinteressedoseconomistas.Em1779,
outilitaristaJeremyBenthampostulaseuaxiomafundamental,inluenciandoconsideravelmenteas
diretrizesdateoriaeconômicasubsequente:“éamaiorfelicidadedo
maiornúmerodepessoasquedeve
seramedidadocertoedoerrado”.
Seguindoalógicabenthamiana,
JohnStuartMill(1891)observa
que“asaçõesestãocertasàmedida
H
C
D N
(*)
quetendemapromoverafelicidade
eerradasàmedidaquetendema
produziroreversodafelicidade”.
2 Felicidade Pode Ser Medida?
Apesardaprofundadiscussãoteóricaveri icadadesdeentão,alguns
fatoresdi icultaramoestabelecimentodosmétodosquantitativos
destaabordagem.Comooquehoje
sedenominaeconomiadafelicidadetemcomocentrodeinteresse
umavariávelsubjetiva, o arcabouçoteóricodamicroeconomia
baseadanaspreferênciasreveladas
nãopôdesercompletamenteaproveitado.Portanto,foinecessárioo
desenvolvimentodetécnicasque
quanti icassemobem-estarsubjetivoindividual.
Comesseobjetivoebaseadosna
vastaexperiênciadospsicólogos,
economistasperceberamqueuma
boaformadeacessarobem-estar
deumapessoaé,simplesmente,
perguntandoaela.Assimsendo,
grandepartedosestudosnaáreaé
centradaemquestõescomo:“Considerandotodososaspectos,você
classi icariasuavidacomo:muito
feliz,bastantefeliz,nãomuitofeliz
ounadafeliz?”.Hátambémapossibilidade de pedirpara queos
entrevistadosseposicionemna
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48
temas de economia aplicada
“escaladesatisfaçãocomavida”
–escalaquevaide0a10,sendo
0destinadoàpiorvidapossívele
10àmelhor.Ambososmétodos
abrangemomesmoconceitode
bem-estar:osubjetivo.
Éimportanteressaltarqueessa
análisenãodevetercomoobjetivo
de inir“utilidade”deumaforma
empíricaúnicaeexata.Adiscussão
sobreoqueébem-estar,asdiferentesformasdemedi-lo,suasrelaçõescomeventosdecurtoelongo
prazopermanecememaberto.Sua
caracterizaçãocomoum imque
deveporsisóserperseguidopelas
sociedadestambéméquestionável.
Dequalquerforma,comonotam
Blanch lowereOswald(2004),a
compreensãodobem-estarsubjetivoedeseusdeterminantespode
ser muito útil aos economistas
paradiversos ins,queserãoexpostosadiante.
Ojulgamento individualbaseadoexclusivamentenamétricada
satisfaçãocomavidapossuilimitaçõesóbviase,porisso,háuma
sériededesa iosmetodológicos
(FREY;STUTZER,2002).Asrespostaspodemestarcorrelacionadascomtraçosdepersonalidade
nãoobservados.Asvicissitudesdo
humorfrenteaoseventoscotidianossãoprováveisfontesdeviés.
Épossívelquesurjamproblemas
naagregaçãodasrespostas,jáque
geralmenteosindivíduosutilizam
pontosdereferênciadistintosao
declararobem-estarsubjetivo.Na
comparaçãointernacional,diferen-
çasculturaisnainterpretaçãodo
signi icadodapalavra“felicidade”
podemtornarasrespostasincomparáveis.Por im,comoexempli icamDeatoneStone(2013),acorrelaçãodeumamedidadebem-estar
subjetivoeumadeterminadavariávelnãopode,concomitantemente,
validaroindicadoremostraras
implicaçõesdebem-estar.Ouseja,
éumequívocoa irmarqueasmétricassubjetivasdefelicidadesão
válidasporseremcorrelacionadas
comemprego,rendaesaúdee,simultaneamente,tambémavaliar
asconsequênciasdoemprego,da
rendaedasaúdetendocomobase
omesmoindicador.
Com o passar do tempo, novas
técnicasdemapeamentocerebral
(eletroencefalogramas)possibilitaramestudoscomoodeSuttone
Davidson(1997),quemostramque
osdadosdefelicidadeestãopositivamentecorrelacionadoscom
medidasdaatividadepré-frontal
docérebro(regiãodoencéfaloassociadaaosníveisdebem-estar).
Noquedizrespeitoaospossíveis
problemasdeagregaçãodasrespostas,Graham(2005)destacaque
cross-sectionsentrediferentespaísesaolongodotempoapresentam
notáveiseconsistentespadrões
nosdeterminantesdafelicidade.
Por im,notocanteàsdi iculdadesdetradução,Inkeles(1960)e
Sendoassim,inúmerostestesde Cantril(1965)apresentamsólidos
validaçãoexternaforamdesen- indíciosdequeafelicidade,compavolvidospelapsicologiae,mais rativamenteadiferentesconceitos
recentemente,pelaneurociência
relacionadosaestadosemocionais,
paraveri icararobustezdosdados
podesermuitobemtraduzidade
defelicidade.Atualmenteháfortes
umidiomaparaoutro.
evidênciasdequeesseéumbom
meiodeacessarobem-estarsubjetivo.Porexemplo,asrespostasàs 3 Desafios Econométricos
questõesdesatisfaçãoestãocorrelacionadascomreaçõesorgânicas Mesmocomtodooavançometodoquepodemserentendidascomo lógiconasúltimasdécadasnoque
evidênciasdefelicidadegenuína. dizrespeitoàvalidaçãoexterna
Ekman,DavidsoneFriesen(1990) dasmétricasdebem-estarsubmostramqueindivíduosque se jetivo,umcertoceticismoainda
dizemmuitofelizestendemasor- pairasobreessetipodeanálise
rirmais.Shedler,MaymaneManis nocenárioacadêmico,sobretudo
(1993)destacamevidênciasdeque entrealgunseconomistas.Éneoutrosfatores ísicos,comoapres- cessárioreconhecerqueháoutros
sãoarterialeataxadebatimentos importantesdesa iosempíricos
cardíacosemrespostaaoestresse, (principalmenteeconométricos)
sãonegativamentecorrelacionados paraosquaisaindanãohásolução
comobem-estarsubjetivo.
consolidada.
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49
temas de economia aplicada
Umadasprimeirascríticasque
surgeméque,dadaacaracterísticaordinaldavariáveldependente, estimações usuaisbaseadas
na média (Mínimos Quadrados
Ordinários,porexemplo)seriam
fontesdeconclusõesequivocadas
(STEVENS,1946).Sendoassim,é
importantedestacarquemodelos
ordenadosdevariáveldependente
discreta–ProbiteLogitordenados,
porexemplo–têmsidoamplamenteutilizadospelaliteraturapara
estimaçãodas “happinessequations”–como icaramconhecidas
asequaçõesmicroeconômicaspara
modelaro bem-estarsubjetivo.
Osresultados,emtermosdesigni icânciaedireçãodasvariáveis,
quasenuncasealteram.
emdoisestágios.Qualqueranálise
intertemporalnestaliteratura,por
suavez,develidarcomaseguintedi iculdade:épossívelqueos
dadosdesatisfaçãocomavidanão
apresentemnenhumatendênciaao
longodotempoemalgunspaíses
simplesmenteporqueaspessoas
ancoramsuasavaliaçõessubjetivasdeacordocomseusníveisde
aspiração,quesãomutáveiscom
dotempo.Dessaforma,ganhosde
bem-estar seriamanulados(ou
fortementeatenuados)poraspiraçõescrescentes.Emtermosde
estimação,hápoucacoisapassível
deserfeitacasoissosejaverdade.
Noentanto,porquealgunspaíses
apresentariambem-estarsubjetivo
médiocrescenteaolongodotempo
eoutrosnão?Asaspiraçõesseriam
Adireçãodecausa-efeitotambém mais voláteisemdeterminados
podeserquestionada.Porexem- contextos?ComonotamBlanch loplo:aspessoassãomaisfelizespor wereOswald(2004),aintrigante
teremmaisrendaouelasganham faltadeumatendênciaascendente
maisporseremmaisfelizesquea nosdadosdefelicidadeemalguns
médiae,consequentemente,serem paísesdeveserconfrontadapelos
maisprodutivas?Aspessoascasa- economistas.Podeserqueimpordassãomaissatisfeitascomavida tantesnuancesdosdeterminantes
ouéobem-estarquefazcomque dafelicidadeestejamsendoignoosindivíduosestejammaisabertos radasquandoassocia-seinequiarelacionamentosmaisestreitos, vocamenteaumento darenda a
aumentandoaprobabilidadedese aumentodobem-estar.
casarem?
OutroimportanteproblemaempíNesseaspecto,aestimaçãopor ricoéabaixadisponibilidadede
variáveisinstrumentaissoluciona- basesdedadosqueacompanhem
riaoproblemadopossívelviésde os mesmosindivíduos aolongo
simultaneidade.Todavia,aindanão dotempo.Sóhádadosempainel
foramencontradosinstrumentos paraalgunspaísesespecí icos(por
convincentesparaasvariáveisex- exemplo,oGermanSocio-Economic
plicativaspotencialmenteendóge- Panel),demodoqueasestimações
nas,oqueinviabilizaaestimação empainelsãoaexceção,quando
deveriamseraregra.Controlarpor
efeitos- ixosindividuaiséfundamentalparaqueaestimaçãoseja
robustaàin luênciadecaracterísticaspessoaisnãoobserváveis.
4 Debates Iniciais: o Paradoxo de
Easterlin
Justamentedevidoàsdi iculdadesmetodológicasdetalhadasnas
subseções anteriores, apenas a
partirdoiníciodadécadade1970
aeconomiadafelicidadefoiincorporadanodebateacadêmicocomo
promissoraabordagemdebem-estarsubjetivo.Emumseminal
artigo,oeconomistaedemógrafo
RichardEasterlin(1974)postula
trêsquestõesfundamentaispara
a discussão econômica: em um
determinadopaís,aspessoasricas
sãomaisfelizesqueaspobres?Os
paísescommaiorrendapercapita
possuem,emmédia,oshabitantes
maisfelizes?Alémdisso,oaumentodariquezanacionalpormeio
docrescimentoeconômicoelevao
bem-estarsubjetivoindividual?
A respost a à primeira questão
segueosensocomumepostula
que,defato,dentrodeumpaísas
pessoas maisricas são aquelas
queemmédiaapresentammaioresníveisdebem-estarsubjetivo.
Emtodasas19naçõesdaamostraheterogêneadeEasterlinhá
umpadrãonotávelquerelaciona
positivamenterendaefelicidade.
Estepareceseromaiorpontode
convergênciadaliteraturasubse-
agosto de 2014
50
temas de economia aplicada
quente.StevensoneWolfers(2013)
expandemaamostradeEasterlin
paramaisde100paísesenãoencontramumexemplosequeronde
osmaispobresreportamníveis
maisaltos de felicidade. Frank
(2005)observaque“quandoanalisamosa felicidademédia versusarendamédiaparagruposde
pessoasemumdadopaísemum
determinadoinstantedotempo[...]
aspessoasricassãodefatomuito
maisfelizesqueaspobres”.GardnereOswald(2001),analisando
ganhadoresdealtasquantiasem
loteriasnaInglaterra,concluem
queaproximadamenteummilhão
delibrasseriaummontantesu icienteparamoverumindivíduoda
baseparaotopoempesquisasde
bem-estarsubjetivo.
te,oautornãoencontranenhum
indíciodequeocrescimentoeconômicoveri icadonosprimeiros25
anosdopós-guerranosEUAtenha
sido fonte substancial debem-estarsubjetivo.
trinsecamentefalaciosa.Seguindo
amesmalinhaderaciocínio,Lane
(2000)defendequeaverdadeira
fontedebem-estarestánoaprimoramentodasrelaçõespessoais
efamiliares,nosensodeautorrealizaçãoenodesenvolvimentode
As ev idências estatisticamente novashabilidadesnotrabalho.
signi icantesnaanáliseintrapaís
justapostasàfaltadeindíciosnos Apesardaenormein luência,otradadoscross-countryedesériede balhodeEasterlin(1974)não icou
tempoderamorigemao“Paradoxo isentodecríticasposteriores.A
deEasterlin”.Umadasprincipais aplicaçãodemétodosquantitativos
interpretaçõesparaoparadoxoé maisconsistenteseainclusãode
baseadanoargumentodospsicó- outrospaísesemdesenvolvimento
logosBrickmaneCampbell(1971). naamostrageraramresultados
Osautorescunharamaexpressão diamet ralmenteopostos (VEE“esteirahedonista”(hedonictrea- NHOVEN,1991eSACKS;STEVENdmill)paracaracterizarahipótese SON;WOLFERS,2010).Stevenson
deque os ganhos derendasão eWolfers(2013)confrontamde
acompanhados por novasaspi- formabastanterobustaoestudo
raçõesemrelaçãoao consumo. deEasterlin,usandoduasbases
Todavia,osresultadostornam-se Sendoassim,obem-estargerado extremamenteabrangentes(Gallup
surpreendentesquandoatentamos porumpadrãomaterialmaisele- WorldPolleWorldValuesSurvey)e
àsesferasinternacionaleinter- vadoseriaanuladoporexpectati- mostrandoumaforteepersistente
temporal.Easterlin(1974)aponta vascrescentesfrenteaosbensde relaçãoentrerendaebem-estar
quenãohádiferençasigni icativa consumo.
subjetivonaanáliseentrepaíses.
entreasnaçõesnoquedizrespeito
Comoobservamosautores,éproàfelicidademédiadoscidadãos. Outrapossívelexplicaçãoparao vávelqueafaltadeevidênciasque
Contraintuitivamente,talrelação ParadoxodeEasterlinpode ser relacionamrobustamentePIBefeindependedoPIBpercapita.Ou encontradaemScitovsky(1976).O licidadetenhasidomalinterpretaseja,paísesqueapresentamPIBper autorargumentaconsistentemen- dacomoumaprovadainexistência
capitamaisaltonãosãonecessa- tequemuitos(talvezamaioria) detalrelação.
riamenteaquelesquesedeclaram dosprazeresdavidanãosãopremaisfelizes.Aanáliseintertempo- ci icados,nãoestãoàvendae,con- Comoexemplodisso,aFigura1a
raldeEasterlin,porsuavez,sere- sequentemente,nãopassampelo seguirmostraarelaçãoentrefelicisumiuaosEstadosUnidosdevidoà mercado.Dessa forma,alógica dadeePIBpercapitaparatodosos
indisponibilidadededadoscon iá- econômicaqueassociadiretamen- paísesparticipantesdawavemais
veis.Mesmoassim,admiravelmen- terendaesatisfaçãopessoaléin- recentedaWVS(2005-2008):
agosto de 2014
temas de economia aplicada
51
Figura 1 - Relação Entre PIB Per Capita e Felicidade
NaFigura1 estão evidenciadosalgunsaspec tos
importantes.Emprimeirolugar, icaclaroqueuma
relaçãologarítmicaentrePIBpercapitaefelicidade
possuimaiorpoderexplicativodoqueumarelação
puramentelinear.Esseéumefeitonatural,jáquea
variáveldefelicidadeestálimitadanointervalode1
a4.Adivisãoda iguraemsubconjuntosrelacionando
níveldefelicidadeerenda,conformeaTabela1,evidenciaoutrosfatores:
Tabela 1 - Relação Entre PIB Per Capita e Felicidade
Felicidade baixa
Felicidade alta*
PIB/capita baixo
15 países
20 países
PIB/capita alto**
4 países
16 países
*Acimadamédiamundial
**AcimadeUS$20.000
Naamostrahá35paísescomPIBpercapitaabaixode
20.000dólaresanuais.Desses,20apresentamfelicidadeacimadamédiamundial.Portanto,talvezaquestãomaisimportanteseja:porquedentreospaíses
debaixarendaháumadivisãoquasequeigualitária
entrefelicidadealtaefelicidadebaixa?Quaisaspectos
diferenciamessasnações?
OparadoxodeEasterlinestabelecequenãohánenhumadiferençasigni icativaentrepaísesdealtaebaixa
rendanoquedizrespeitoaobem-estarsubjetivo.
Aqui,noentanto,háfracosuporteaoparadoxo.De
fato,nemtodosospaísesdealtarendaestãoacima
damédianoníveldefelicidade.Porém,hádeseconsiderarque,naamostra,aprobabilidadedeumpaís
terbaixafelicidadedadoqueédealtarenda(20%)
ésigni icativamentemenordoqueaprobabilidade
deumpaísterbaixafelicidadedadoqueédebaixa
renda(42,8%).Ouseja,apesardealtarendanãoga-
agosto de 2014
52
temas de economia aplicada
rantirbem-estarsubjetivoacima
da média, pelo menos aumenta
consideravelmenteaprobabilidade
distoocorrer.Dos19paísesdealta
rendaapenasquatropossuemfelicidadeabaixodamédiamundial–
todoselescommenosdeumdesvio
padrãoemrelaçãoàmédia.
sempregados.Arendarelativaé,
porsisó,importanteparaobem-estarindividual.Por im,háindíciosdequeafelicidadeassume
formatodeUemrelaçãoàidade,
tendocomopontodemínimoos40
anos.Todosessesresultadosforam
replicadosporinúmerosautorese
hápoucadivergência.
políticaseconômicas.A inal,para
queestassejam ótimas, devem
considerartantooscustospecuniáriosquantoosnãopecuniáriosdo
desemprego.
O bem-estar subjetivo também
podeserin luenciadoporoutros
aspectossocioculturais.Inglehart
etal.(2008),porexemplo,inves5 Desdobramentos Contemporâ- Alémdisso,estaliteraturatambém
tigamdeumaperspectivaglobal
neos
temcontribuídoparaadiscussão comoademocratização,associada
damacroeconomiacontemporâ- àcrescentetolerânciasocialeao
MesmoconsiderandoVeenhoven nea.DiTella,MaccullocheOswald
desenvolvimentoeconômico,ala(1991),StevensoneWolfers(2013) (2001),porexemplo,mostramque
vancouosíndicesdefelicidadea
eaFigura1acima,queenfraque- movimentos macroeconômicos
partirdadécadade1980em45
cemaexistênciadoparadoxoren- têmconsideráveisefeitosnobempaíses.Osautoresargumentam
da-felicidade, acontribuiçãode -estarsubjetivomédiodasnações.
queosentimentodeliberdadede
Easterlinfoibastantesigni icativa Taxadein laçãoePIBpercapita
escolhaéumcomponenteimportambémporimpulsionaraanálise sãovariáveisfortementecorrelatantedobem-estarsubjetivoindidebem-estarbaseadaemmétricas cionadascomasatisfaçãocoma
vidualedestacamqueosregimes
subjetivas.
vidaem12paíseseuropeusenos comunistasforamextremamente
EUA.Esteargumentoenriqueceo prejudiciaisnesteaspecto.
Nasúltimastrêsdécadas,arelação debateentreoskeynesianoseos
entreasvariáveiseconômicastra- economistasderealbusinesscycle
dicionaiseobem-estarsubjetivo aoevidenciarquerecessõesenvol- 6 Conclusão
temsidoobjetodeextensodebate vemoutrasperdasconsideráveis
acadêmicoemuitosedeveàsnão queexcedemosajustesdesejáveis Aquestãosobreosdeterminantes
dobem-estaréfundamentalpara
triviaisconclusõesdeEasterlin. achoquesdeprodutividade.
aeconomia,etemsidoexplorada
Desdeentão,tem-sebuscadoidenti icarosdeterminantesmacroe Outroimportanteresultadoéo desdeoiníciodoseudesenvolvimicroeconômicos dasatisfação querelacionadesempregoebem- mento como ciência. Dada essa
com av ida ealgunsresultados -estar indiv idual. Por exemplo, importância,éinegávelqueformas
estãobemconsolidadosnalitera- WinkelmanneWinkelmann(1995) deanálisealternativasaoarcaboutura.
eCorbieMenezes-Filho(2006) çodas “preferênciasreveladas”
apontamqueoscustosdodesem- podemserúteisparaacompreBlanch lowereOswald(2004)sin- pregovãoalémdadiminuiçãoda ensãodosmaisdiversosprobletetizamosprincipaisresultados renda.Emgeral,surgemoutros mas.Sendoassim,outrostiposde
dashappinessequations:afelici- efeitosnegativosindividuaiseso- abordagens,alémdeaproximara
dadeémaiorentreasmulheres, ciaiscomo,porexemplo,adepres- ciênciaeconômicadeoutrasáreas
pessoascasadas,religiosas,mais são,reduçãodaautoestimaeperda doconhecimento(psicologia,neueducadasedealtarenda.Menor destatus.Esteresultadopossui rologia, iloso ia,dentreoutras)
entreosdivorciados,viúvosede- grandesimplicaçõesemtermosde tambémtêmpermitidoexplorar
agosto de 2014
53
temas de economia aplicada
nuancesdobem-estaratéentão BRICKMAN, P.; CAMPBELL, D. T. Hedonic
relativismandplanningthegoodsociety.
desconhecidas.
Mesmoconsiderandoadi iculdade
implícitaemmensuraralgotão
pessoaleinde inidocomoafelicidadeouasatisfaçãocomavida,
hojeexistemdiversasevidências
dequeaEconomiadaFelicidade
temcontribuídosigni icativamente
paraodebatemicroemacroeconômicocontemporâneo.Diversas
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(E-mail:[email protected])

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