EDUCAÇÃO MULTI/BILÍNGUE E ENSINO DE LÍNGUAS* BAZARIM

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EDUCAÇÃO MULTI/BILÍNGUE E ENSINO DE LÍNGUAS* BAZARIM
REVISTA CIENT€FICA ELETR•NICA DE CI‚NCIAS SOCIAIS APLICADAS DA EDUVALE
Publicaƒ„o cient…fica da Faculdade de Ci†ncias Sociais Aplicadas do Vale de S„o Lourenƒo - Jaciara/MT
Ano V, N‡mero 07, novembro de 2012 – Periodicidade Semestral – ISSN 1806-6283
EDUCAÇÃO MULTI/BILÍNGUE E ENSINO DE LÍNGUAS*
BAZARIM, Milene1
VILELA, Maria Cristiana da Silva2
OLIVEIRA, Braz da Silva3
RESUMO: O objetivo deste trabalho ‰ (re)discutir os conceitos de educaƒ„o multi/bil…ngue e seus
impactos no processo de ensino-aprendizagem de l…nguas. Primeiramente, revisamos os conceitos de
l…ngua, de contexto bidialetal, bil…ngue e multil…ngue. Posteriormente, apresentamos e discutimos
alguns modelos utilizados na educaƒ„o bil…ngue e seus poss…veis impactos no processo de ensinoaprendizagem de l…nguas. Embasam essa discuss„o estudos feitos no Šmbito dos Estudos Culturais
(HALL, 2006; SILVA, 2005) e da Lingu…stica Aplicada (CAVALCANTI, 1999; CESAR; CAVALCANTI,
2007; MAHER, 2007).
PALAVRAS-CHAVE: educaƒ„o bil…ngue; bilinguismo; educaƒ„o multil…ngue; ensino de l…nguas.
INTRODUÇÃO
É regra entrar em uma sala de aula multicultural/multilíngue.
(CAVALCANTI, 1999)
Os estudos sobre contextos bil…ngues e bidialetais no Brasil s„o recentes.
Segundo Cavalcanti (1999, p.385), no final de 1990, eles n„o tinham completado
uma d‰cada. Quase dez anos se passaram ap‹s essa constataƒ„o de Cavalcanti
(1999) e, apesar de um significativo crescimento, ainda hΠmuito que ser feito na
Œrea, principalmente, pensando nos impactos que os resultados das pesquisam
podem ter (tiveram) no processo de ensino-aprendizagem de l…nguas.
*
Este trabalho colabora com as pesquisas desenvolvidas no Šmbito do Projeto TemŒtico “PrŒticas de
escrita e de reflexŽes sobre a escrita em diferentes m…dias”, sob a coordenaƒ„o da Prof• Dra. In†s
Signorini.
1
Licenciada em Letras pela Universidade Federal do ParanΠ(UFPR). Especialista em Metodologia do
Ensino de L…ngua Portuguesa pela Universidade Braz Cubas. Mestre em Lingu…stica Aplicada pelo
Instituto de Estudos da Linguagem (IEL) da UNICAMP. Doutoranda em Lingu…stica Aplicada pelo IELUNICAMP. JŒ atuou como professora de L…ngua Portuguesa no Ensino Fundamental e M‰dio.
Atualmente, ‰ docente na Faculdade de Ci†ncias Sociais Aplicadas do Vale do S„o Lourenƒo –
EDUVALE. E-mail: [email protected].
2
Mestre em Educaƒ„o pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). Especialista em Psicologia
da Educaƒ„o pela UFMT e em M‰todos e Estrat‰gias do Ensino de L…ngua Estrangeira pela
Faculdade S„o Lu…s. Licenciada em Letras e em Pedagogia. Atualmente, ‰ professora da rede
municipal de ensino de Rondon‹polis-MT e docente na Faculdade de Ci†ncias Sociais Aplicadas do
Vale do S„o Lourenƒo – EDUVALE. E-mail: [email protected].
3
Possui graduaƒ„o em Ci†ncias Econ‘micas pela Universidade Cat‹lica Dom Bosco.
Especializaƒ„o em Metodologia do Ensino Superior pela Universidade de CuiabŒ. Mestrado em
Desenvolvimento Local pela Universidade Cat‹lica Dom Bosco. Atualmente, docente na Faculdade
de Ci†ncias Sociais Aplicadas do Vale do S„o Lourenƒo – EDUVALE. E-mail:
[email protected].
1
REVISTA CIENT€FICA ELETR•NICA DE CI‚NCIAS SOCIAIS APLICADAS DA EDUVALE
Publicaƒ„o cient…fica da Faculdade de Ci†ncias Sociais Aplicadas do Vale de S„o Lourenƒo - Jaciara/MT
Ano V, N‡mero 07, novembro de 2012 – Periodicidade Semestral – ISSN 1806-6283
Desde jΠassumimos que neste artigo, um breve ensaio, estabelecemos uma
relaƒ„o entre os estudos sobre educaƒ„o bil…ngue e o ensino, conforme propŽe o
t…tulo. Como a escola ‰ o espaƒo privilegiado para o que se chama de educaƒ„o
formal, cabe-nos, desde jŒ, defini-la como um espaƒo sociolinguisticamente
complexo. Dessa forma, como diz o texto em ep…grafe, ao entrar em uma sala de
aula, em qualquer lugar deste pa…s, o professor, de qualquer disciplina,
provavelmente vai se deparar com um contexto multicultural e multil…ngue.
Nossas reflexŽes aqui est„o divididas em quatro partes. Ap‹s esta breve
introduƒ„o, fazemos uma revis„o de alguns conceitos te‹ricos importantes n„o s‹
para os estudos da Œrea, mas para estabelecermos a relaƒ„o com o ensino. A
seguir, discutimos alguns modelos utilizados na educaƒ„o bil…ngue e seus impactos
no processo de ensino-aprendizagem. Por fim, apresentamos, nas consideraƒŽes
finais, a hip‹tese de que o ensino de l…nguas baseado na diversidade de g†nero
textual-discursivo4 seja uma possibilidade de emerg†ncia de um contexto multil…ngue
na sala de aula.
ASPECTOS TEÓRICO-CONCEITUAIS
Quando se trata de distinguir entre categorias conceptuais nebulosas
como “l•ngua” e“dialeto” atƒ os linguistas se abstƒm de
estabelecer diferen„a (RAJAGOPALAN, 1998)
A primeira consideraƒ„o te‹rico-conceitual que pode ser feita diz respeito ’
pr‹pria concepƒ„o de l…ngua que orienta as pesquisas nessa Œrea de estudos.
Segundo C‰sar; Cavalcanti (2007, p. 47, 61), o conceito de l…ngua como
caleidoscópio ‰ o mais adequado ’s necessidades e dilemas que s„o enfrentados
na pesquisa e no trabalho pedag‹gico com a linguagem.
4
Apesar saber das implicaƒŽes te‹ricas que est„o envolvidas no uso da express„o “g†nero textual”
e/ou “g†nero discursivo”, preferimos utilizar aqui o termo “g†nero textual-discursivo” n„o como uma
forma de neutralizar essa tens„o te‹rica, mas sim para sinalizar que, n„o se adere aqui a uma vis„o
engessada e normativista de g†nero. Sabemos que os g†neros s„o apenas relativamente estŒveis
(BAKHTIN, 1954, p.277). No entanto, sabemos tamb‰m que, devido ’ necessidade de partir daquilo
que ‰ facilmente observŒvel, quase sempre, ao analisar os diversos g†neros, ‰ poss…vel que se fique
apenas na sua estrutura composicional e nas marcas lingu…sticas, aspectos estritamente textuais, que
atestam determinado estilo e autoria, em detrimento dos aspectos discursivos que tamb‰m interferem
na textualizaƒ„o tais como esfera de circulaƒ„o e funƒ„o.
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O caleidosc‹pio, sendo feito por diversos pedaƒos, cores, formas e
combinaƒŽes, ‰ um jogo de (im)possibilidades fortuitas e, ao mesmo tempo,
acondicionadas pelo contexto e pelos elementos, um jogo que se explica
sempre fugazmente no exato momento em que o objeto ‰ colocado na mira
do olho e a m„o o movimenta; depois, um instante depois, jŒ ‰ outra coisa.
No caleidosc‹pio, formam-se desenhos complexos a partir de movimentos,
de combinaƒŽes. [Essa] Parece uma imagem feliz para descolar as
concepƒŽes de l…ngua das concepƒŽes de naƒ„o e territ‹rio estabilizadas
politicamente e de n…veis hierŒrquicos, num caso e num outro, totalidades
que se mant†m como “grande narrativa”, justamente por conta de um
arcabouƒo te‹rico anacr‘nico. (C“SAR; CAVALCANTI, 2007, p. 61)
Para acompanhar esse dinamismo do conceito de l…ngua(gem), os termos
“contextos bil…ngues”, “bilinguismo”, “bidialetalismo” e “educaƒ„o bil…ngue” tamb‰m
precisam ser constantemente revistos e atualizados. Isso deve ocorrer, porque,
segundo Cavalcanti (1999, p. 388), contextos bil…ngues s„o complexos5.
Um contexto bil…ngue, portanto, ‰ aquele em que s„o contempladas duas ou
mais l…nguas. JŒ um contexto bidialetal ‰ aquele em que hŒ o uso de diversas
variedades de uma mesma l…ngua, diferenciadas n„o s‹ por questŽes lingu…sticas
propriamente ditas, mas, principalmente, por razŽes socioecon‘micas relacionadas
ao prest…gio de quem fala a(s) variedade(s).
Todo contexto bil…ngue ‰ complexo, porque n„o convivem apenas duas ou
mais l…nguas, mas diversas variedades dessas l…nguas.
Assim, todo contexto
bil…ngue ‰ tamb‰m bidialetal, mas nem todo contexto bidialetal ‰ bil…ngue. O que se
tem, portanto, s„o contextos multilíngues (multiculturais) e n„o somente bil…ngues
e/ou bidialetais. (CAVALCANTI, 1999, p.388).
Maher (2007), numa tentativa de tornar tais conceitos mais dinŠmicos e
condizentes com a realidade encontrada em vŒrias comunidades pesquisadas,
afirma ‰ importante frisar que existem vŒrios tipos de sujeitos bil…ngues (logo de
bilinguismo) porque o bilinguismo ‰ um fen‘meno multidimensional. Somente uma
definiƒ„o suficientemente ampla poderia, segundo a autora, abarcar todos os tipos
existentes.
Dizer que o bilinguismo é uma condição humana muito comum que se
refere à capacidade de um determinado sujeito fazer uso de mais de uma
língua e/ou variedades dessas línguas de forma específica e contextual seja, no
5
Neste trabalho, o termo complexo assume o mesmo sentido proposto por Morin (2002, p. 16) “o que
estŒ tecido em conjunto”. Para Morin (2002, p. 72), enfrentar a complexidade do real significa
perceber as ligaƒŽes, interaƒŽes e implicaƒŽes m‡tuas de fen‘menos multidimensionais e de
realidades que s„o simultaneamente solidŒrias e conflitantes.
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momento, a melhor definiƒ„o justamente por ser a mais abrangente.
(MAHER,
2007, p.79).
No que diz respeito ao cenŒrio sociolingu…stico brasileiro, persiste o mito do
pa…s monol…ngue: qualquer brasileiro parece capaz de afirmar veementemente “no
Brasil, fala-se uma l…ngua6, a L…ngua Portuguesa”.
Segundo Cavalcanti (1999), a perpetuaƒ„o de tal mito ‰ eficaz, pois se
invisibilizam as minorias7 – as naƒŽes ind…genas, as comunidades de imigrantes e
migrantes – e, por extens„o, as maiorias tratadas como minorais, tais como as
in‡meras
comunidades
falantes
de
variedades
desprestigiadas
da
L…ngua
Portuguesa.
Os contextos bil…ngues e bidialetais a que se refere o mito acima, al‰m de
terem em comum o fato de se referirem apenas a modalidade oral da(s) l…ngua(s),
s„o constantemente invisibilizados tendo em vista o fato de que est„o presentes em
comunidades “minoritŒrias” ou tratadas como tais.
Nesse caso, o que se leva em conta para definir um grupo como minoria n„o
‰ a quantidade de falantes, mas sim o prest…gio (ou falta de) que ‰ atribu…da a sua
variedade lingu…stica e/ou da sua l…ngua. HŒ, portanto, um apagamento da exist†ncia
das variedades e/ou das l…nguas dessas comunidades e, por conseguinte, das
pr‹prias comunidades.
Assim, o ‡nico bilinguismo que n„o ‰ apagado e ‰ considerado como algo
positivo ‰ o chamado bilinguismo de elite. O bilinguismo de elite ‰ um bilinguismo
de escolha, relacionado ’ aprendizagem de l…nguas de prest…gio tanto internacional
quanto nacionalmente. Ele n„o ‰ “compuls‹rio” (MAHER, 2007, p.68) e ‰ restrito a
uma determinada camada economicamente privilegiada da sociedade brasileira, que
‰ capaz de pagar para ter acesso a uma segunda l…ngua de prest…gio.
6
Para uma melhor discuss„o a respeito do preconceito linguistico, sugerimos a consulta a Bagno
(2003).
7
Nesse caso, n„o se pensa minoria, exclusivamente, em termos quantitativos, mas ao prest…gio que ‰
atribu…do a cultura (e a l…ngua) dos grupos tratados como minoritŒrios (CAVALCANTI, 1999).
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OS MODELOS DE EDUCAÇÃO BILÍNGUE E SEUS IMPACTOS NO PROCESSO
DE ENSINO-APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS
A escola brasileira nunca foi homogênea.
(MAHER, 2007)
Se as l…nguas, as culturas e os falantes n„o s„o homog†neos, por que o seria
a escola?
Essa homogeneidade da escola ‰ t„o mitol‹gica quanto a da l…ngua
‡nica,
falante
do
ideal,
do
letramento
como
meio
de
ascens„o
social.
Evidentemente, antes da popularizaƒ„o da escola, era muito mais fŒcil ignorar e por
que n„o dizer, sufocar, a diversidade presente nas salas de aula. No entanto, a partir
da abertura da escola “’s massas” passou a ser dif…cil n„o notar “o diferente”.
HŒ, no entanto, diversas formas de encarar “o diferente” na escola: ou ele ‰
simplesmente ignorado ou ‰ estigmatizado como manda a tradiƒ„o. Quando os
chamados “alunos de inclus„o” – os “diferentes”: surdos, os imigrantes, os ind…genas
etc. –
s„o colocados em salas de aula convencionais e recebendo o mesmo
tratamento que os outros alunos, a diferenƒa ‰ apagada e, neste caso, apagar a
diferenƒa tamb‰m significa excluir de uma forma talvez at‰ mais perniciosa, pois
essa exclus„o ‰ escamoteada por um discurso do politicamente correto.
Um aluno bil…ngue ao ser colocado em uma sala “monol…ngue”, por exemplo,
n„o terŒ como interagir com os demais em sua l…ngua materna, a qual, certamente
serŒ deixada de lado. A outra forma de encarar o diferente na escola ‰ “tratŒ-lo”
como uma doenƒa, um déficit que precisa ser superado atrav‰s dos cuidados de
profissionais espec…ficos.
Maher (2007, p.68) destaca que, enquanto para a maioria dos alunos das
escolas brasileiras, o bilinguismo ‰ facultativo, para os alunos ind…genas, surdos e de
comunidades de imigrantes, ele ‰ compuls‹rio, ou seja, imposto por lei.
O mesmo poderia ser dito em relaƒ„o ’s comunidades bidialetais, tais como
as urbanas “compostas por populaƒŽes de origem rural que vivem na cidade e que
falam
alguma
variedade
estigmatizada
de
portugu†s.
Essas
comunidades
constituem o que venho denominando ‘as maiorias tratadas como minorias’”
(CAVALCANTI, 1999, p.393).
Pensando no contexto educacional, isso ‰ particularmente grave, pois,
segundo Maher (2007, p. 68), sem, de fato, compreendermos “o diferente” em sua
complexidade, n„o conseguiremos criar “provimentos para acomodŒ-lo, acolh†-lo de
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forma respeitosa na escola”. Com isso, quando muito, n„o se irŒ al‰m do
reconhecimento da sua exist†ncia e da tolerŠncia de sua presenƒa.
Em seu artigo, Maher (2007), apresenta tr†s modelos utilizados na educaƒ„o
bil…ngue: o assimilacionista de submers„o; o assimilacionista de transiƒ„o; e o de
enriquecimento lingu…stico.
No primeiro, modelo assimilacionista de submersão, prega-se a inclus„o
do aluno bil…ngue em uma sala de aula monol…ngue; n„o tendo com quem interagir
em sua l…ngua materna (LM), o aluno serŒ forƒado a abandonŒ-la e aprender a
L…ngua Portuguesa.
No segundo, modelo assimilacionista de transição, a l…ngua de instruƒ„o
nas s‰ries iniciais ‰ a l…ngua materna do aluno. Esse, no entanto, ‰ um modelo
subtrativo, pois assim que a crianƒa ‰ alfabetizada em sua LM e passa a entender o
funcionamento da escrita, o portugu†s ‰ inserido aos poucos, at‰ que a LM do aluno
seja exclu…da do curr…culo.
Por fim, o modelo de enriquecimento linguístico o qual, ao nosso ver, ‰ o
menos coercitivo e o mais idealizado. Esse modelo insiste na importŠncia de que a
LM do aluno seja a l…ngua de instruƒ„o ao longo de todo o processo de
escolarizaƒ„o e, al‰m disso, que seja promovido um bilinguismo aditivo, i.e., a
L…ngua Portuguesa deve ser adicionada ao repert‹rio comunicativo do aluno sem,
contudo, deixar de se investir no aumento da compet†ncia do educando tamb‰m na
sua LM.
Evidentemente, nas nossas escolas ainda ‰ mais comum o primeiro modelo,
ainda mais subtrativo que o segundo. Algumas pesquisas mostram tentativas de
implantaƒ„o do segundo modelo, o que jŒ seria um avanƒo. Mas o modelo de
enriquecimento ainda parece uma realidade distante. Ou seja, a escola(rizaƒ„o) das
minorias ‰ uma relaƒ„o de desigual de forƒas e de poder.
Somente ‰ visto
positivamente o bilinguismo e o bidialetalismo quando se trata de l…nguas,
variedades e, por conseguinte, falantes de prest…gio socioecon‘mico.
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ALGUMAS CONSIDERAÇÕES FINAIS E PROVISÓRIAS
Tudo que é sólido se desmancha no ar.
(Marx)
Nos estudos sobre os contextos bil…ngues, conforme tentamos mostrar, uma
das maiores preocupaƒŽes dos pesquisadores tem sido mobilizar teorias capazes de
explicar, de elucidar, de visibilizar contextos t„o complexos.
Nessa Œrea de estudos, inspirada nos Estudos Culturais e na Lingu…stica
Aplicada, seguindo o paradigma das ci†ncias na p‹s-modernidade8, n„o hŒ lugar
para certezas, o que fica claro jŒ no t…tulo do artigo de Maher (2007) “Do casulo ao
movimento: a suspensão das certezas na educaƒ„o bil…ngue e intercultural” [grifo
nosso]. E esse ‰ justamente o grande desafio da p‹s-modernidade: o fim das
certezas, muitas perguntas, apenas possibilidades de respostas.
A respeito da educaƒ„o bil…ngue, uma Œrea em franca expans„o, vŒrios s„o
os questionamentos, mas um nos chamou a atenƒ„o: “O que significa eleger o
portugu†s prestigiado, sem maiores consideraƒŽes, como a l…ngua de dom…nio da
escola, com o argumento de que o dom…nio dessa l…ngua, por si s‹, representa
emancipaƒ„o, inserƒ„o dos atores que est„o socialmente marginalizados” (CESAR;
CAVALCANTI, 2007, p.51)? Pensemos o contrŒrio: o que significa não dar acesso,
atrav‰s da escola, a esse chamado “portugu†s prestigiado” aos atores que est„o
socialmente marginalizados, sem maiores consideraƒŽes sobre os impactos que isso
traria a sua emancipaƒ„o?
Pedindo licenƒa para utilizar um jarg„o, consideramo-nos no direito de
acreditar, mesmo que provisoriamente, que n„o se deva pecar nem pelo excesso
nem pela falta. Mesmo n„o sabendo como tornŒ-lo de fato viŒvel e parte do
cotidiano das escolas, defendemos o modelo de enriquecimento lingu…stico.
Pensamos que um ensino que tenha o g†nero textual-discursivo como objeto de
ensino seja algo a ser considerado, pois, na perspectiva bakhtiniana (BAKHTIN,
8
A p‹s-modernidade, ou modernidade tardia, ‰ um momento em que hŒ uma verdadeira turbul†ncia
cultural, provocada pelo conv…vio, e conflito, de tend†ncias hegem‘nicas, padronizadoras, por um
lado; e movimentos de afirmaƒ„o da identidade cultural das minorias, por outro (HALL, 2006;
BAZARIM, 2011). Com isso, as teorias cient…ficas passam a ser consideradas “maneiras diversas de
tentar articular diversos aspectos de um processo global e de explicitar uma vis„o de conjunto.”
(SANTOS FILHO; GAMBOA, 1995, p. 88). Nesse sentido, para as ci†ncias que se inserem no
paradigma p‹s-moderno, n„o existe uma relaƒ„o representacional, especular e mim‰tica entre teoria
e realidade, ou seja, a teoria n„o ‰ “uma representaƒ„o, uma imagem, um reflexo, um signo de uma
realidade que cronologicamente, ontologicamente, a precede.” (SILVA, 2005, p. 11)
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1929; 1954) os g†neros s„o h…bridos, instŒveis e dinŠmicos e, dado seu carŒter
ideol‹gico, indexam as menores variaƒŽes da sociedade.
Assim, acreditamos que o uso de diversos g†neros textual-discursivos na sala
de aula pressupŽe a presenƒa de diversos estilos, autorias, esferas de circulaƒ„o,
funƒ„o e, com isso, de diversos registros lingu…sticos, oportunizando a criaƒ„o de um
contexto verdadeiramente multil…ngue nas aulas de l…nguas.
REFERÊNCIAS
BAGNO, M. Preconceito linguístico: o que é, como se faz. 25.ed. S„o Paulo:
EdiƒŽes Loyola, 2003.
BAKHTIN, M. (VOLOCHINOV) [1929]. Marxismo e filosofia da linguagem. 11.ed.
S„o Paulo Hucitec: 2004.
BAKHTIN, M. [1954] Os g†neros do discurso. In: ______. Est‰tica da criaƒ„o verbal.
2.ed. S„o Paulo: Martins Fontes, 1997.
BAZARIM, M. As concepƒŽes de curr…culo da ediƒ„o especial da proposta curricular
do
Estado
de
S„o
Paulo.
Revista
Científica
Eletrônica
de
Ciências Sociais Aplicadas da EDUVALE, Ano IV, N‡mero 06, novembro de 2011.
Dispon…vel em: < http://www.eduvalesl.edu.br/site/revista/>.
CAVALCANTI, M.C. Estudos sobre educaƒ„o bil…ngue e escolarizaƒ„o em contextos
de minorias lingu…sticas no Brasil. D.E.L.T.A., vol. 15, n.– especial, 1999, p.385-417.
CESAR, A.L.; CAVALCANTI, M.C. Do singular para o multifacetado: o conceito de
l…ngua como caleidosc‹pio. IN: CAVALCANTI, M.C.; BORTONI-RICARDO, S.M.
Transculturalidade, linguagem e educação. Campinas-SP: Mercado de Letras,
2007. p.45-66.
HALL, S. A identidade cultural na pós-modernidade.11.ed. Rio de Janeiro: DP&A,
2006.
MAHER, T.M. Do casulo ao movimento: a suspens„o das certezas na educaƒ„o
bil…ngue e intercultural. IN: CAVALCANTI, M.C.; BORTONI-RICARDO, S.M.
Transculturalidade, linguagem e educação. Campinas-SP: Mercado de Letras,
2007. p. 66-94.
MORIN, E. Educação e Complexidade: os sete saberes e outros ensaios. S„o
Paulo, Cortez, 2002.
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Ano V, N‡mero 07, novembro de 2012 – Periodicidade Semestral – ISSN 1806-6283
SANTOS FILHO; GAMBOA. Pesquisa educacional: quantidade-qualidade. S„o
Paulo, Cortez, 1995.
SILVA, T.T. da. Documentos de identidade – uma introduƒ„o ’s teorias do curr…culo.
2.ed. Belo Horizonte-MG: Aut†ntica, 2005.
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