brasil

Transcrição

brasil
Tapa portugués CI 7-1-4_Maquetación 1 15/03/12 11:09 Página 1
E UROPA
Barrar a guerra social
e os cortes de verbas!
Contra o pagamento da dívida!
A dívida pública e a moeda única são instrumentos da ver‐
dadeira guerra social que a troika e os governos fazem con‐
tra os trabalhadores. São instrumento de colonização dos
países mais débiles, em favor da banca privada e dos países
mais fortes, especialmente Alemanha.
Grécia, Portugal, Irlanda, Espanha, Itália vivem hoje sob
uma situação similar à Argentina em finais dos anos 90. Os
trabalhadores sofrem um retrocesso histórico no seus ní‐
veis de vida e conquistas.
Contra a catástrofe social e o saqueio dos países mais
débiles, a saída para os trabalhadores é deixar de
pagar a dívida; romper com a “UE de capital” e com
o pacto do euro, estatizar sem indemnização o sis‐
tema financeiro, no caminho da construção de
governos dos trabalhadores em cada país e
uma Europa dos trabalhadores ye dos
povos, os Estados Unidos Socialistas de
Europa.
O caminho é a luta em cada país e em
toda Europa.
Publicação da LIT-QI (Liga Internacional dos Trabalhadores - Quarta Internacional)
ISSN 2179-118X
07
TERCEIRA ÉPOCA
MARÇO - 2012 - ANO 3
Em defesa do socialismo
e a construção de uma
direção revolucionária internacional
MUNDO
SÍRIA
BRASIL
A economia
mundial desacelera 2
Começou
a guerra civil 9
Pinheirinho e a luta
pela moradia popular 14
Contratapas CI7 portugués_Maquetación 1 15/03/12 12:30 Página 1
SUMÁRIO
1
APRESENTAÇÃO
Apresentamos o sétimo número
da revista Correio Internacional.
9
2
MULHERES TRABALHADORAS E MARXISMO
ATUALIDADE
MUNDO ÁRABE
O processo de luta popular contra
o regime ditatorial de Bashar al Assad
se transformou em uma guerra civil
cada vez mais violenta e polarizada.
BRASIL
apresenta…
14
PORTUGAL
A violenta desocupação do Pinheirinho
mostra a luta pela moradia popular contra
a especulação imobiliária da burguesia.
Um debate sobre a opressão
A economia mundial desacelerou
em finais de 2011 e os organismos
imperialistas temem a possibilidade
de una nova recessão.
Carmen Carrasco e Mercedes Petit
19
A corrente Ruptura-FER saiu do Bloco de Esquerda
e fundou um novo partido: o MAS.
CAMPANHA “30 ANOS DA LIT-QI”
24
Conheça as atividades e publicações que se realizarão ao longo
de todo o ano de 2012. Como parte dessa campanha, nessa
edição apresentamos:
26
34
História da
corrente
morenista
A defesa
da moral
revolucionária.
EUA
Itália
Paraguai
Portugal
Pela construção de
uma internacional
revolucionária
VIDA DOS PARTIDOS
NESSA EDIÇÃO
Argentina
Brasil
36
Síria
Europa
46
• Ato do PSTU argentino en homenagem
a Nahuel Moreno
• PdAC de Itália
• PT do Paraguai
A
Editora Sundermann acaba de lançar a edição em português do
livro Mulheres Trabalhadoras e Marxismo. Este livro, por um
lado, faz uma interpretação marxista sobre a questão da mulher
e, por outro, leva adiante uma série de polêmicas sobre este
tema, no interior do movimento trotskista: a diferença entre opressão e
exploração; a família no capitalismo; o caráter das reivindicações femininas; as formas de organização do movimento de mulheres; os movimentos
feministas e a construção do partido revolucionário...
Este livro, escrito no ano de 1979, contou com a
colaboração do dirigente trotskista Nahuel Moreno. Porém recém foi publicado pela primeira
vez, em 2009, em espanhol. Porque foi publicado um livro de polêmicas, 30 anos depois?
Porque essas polêmicas são, em essência, as
mesmas que se desenvolvem na atualidade.
Recomendamos a leitura deste trabalho a
todos aqueles que, como Lenin, consideram
que “A revolução socialista é impossível sem
a participação massiva das mulheres”.
* 1 Presentación CI 7 (P)_Maquetación 1 21/03/12 10:27 Página 1
CORREIO INTERNACIONAL N.° 7
Apresentação
Correio Internacional
é uma publicação de Editora Lorca S.A.
Rua Paulo Dias 53 - CEP: 04109-060,
Aclimação, São Paulo, SP, Brasil
Impressão
Proyeto IP Grafis
Rua Dom Bosco, 70 - CEP: 03105-020,
Mooca, São Paulo, SP, Brasil
Editor Responsável
Alejandro Iturbe
Projeto gráfico
Victor Bud
Diagramação
Natalia Estrada
Tradução e revisão
Cynthia Rezende
Flávio Bandeira
Marcos Margarido
Mariana Caetano
Nívia Leão
Raquel Polla
Rodrigo Ricupero
Ruy Magalhães
Suely Corvacho
Thaís Moreira
ISSN 2179-118X
A Brigada Simón Bolívar formou-se em 1979
por iniciativa da Fração Bolchevique
e do PST colombiano para combater, junto
com a FSLN, a ditadura
de Anastasio Somoza na Nicarágua.
E
ste novo número da revista
Correio Internacional é o primeiro que publicamos no ano
em que a Liga Internacional dos Trabalhadores – Quarta Internacional
(LIT-QI) comemora os 30 anos de sua
fundação, realizada em Bogotá – Colômbia, em janeiro de 1982. Por isso,
tem um caráter especial e dedicamos
a capa e a metade de seu conteúdo
para recordar esta data, a trajetória da
corrente morenista e, também, a considerar sua realidade atual e de algumas de suas seções.
Em primeiro lugar, apresentamos a
campanha que a LIT-QI desenvolverá
(na realidade já está em curso) ao
longo de todo o ano com atos, palestras e conferências em diversos países, e toda uma série de publicações,
um kit de dois livros dedicados à conferência de 1982 e ao Congresso de
1985. Também uma seção permanente na página na web que irá abordando, seguindo a cronologia de fatos
históricos, como a Revolução Boliviana (1952), a Revolução dos Cravos
em Portugal (1974), a Guerra das Malvinas (1982) etc., as posições e a participação da corrente morenista nestes
eventos.
Em segundo lugar, publicamos
uma breve história de nossa corrente
e da LIT-QI, desde seus inícios em
1944, na Argentina, localizando-a
como uma “fio de continuidade” da
larga batalha de Marx, Engels, Lenin,
Trotsky e outros para elaborar um
programa socialista revolucionário e
forjar uma direção capaz de levá-lo
adiante.
O artigo sobre a reconstrução da IV
Internacional analisa os principais
eixos desse programa e da concepção
organizativa-política de partido e de
internacional que tomamos de Lenin,
buscando especialmente um diálogo e
um debate com as novas gerações de
lutadores que, em diversas regiões do
mundo, protagonizam os processos
atuais e buscam uma referência para
essa luta.
Na parte dedicada à atualidade,
analisamos o “freio” que vive a economia mundial, como isso se enquadra na crise econômica internacional
aberta em 2007 e se combina com os
processos políticos e da luta de classes, especialmente na Europa e nos
EUA. Na sequência, o artigo sobre a
guerra civil na Síria, ponto mais alto
hoje do processo revolucionário em
curso no Norte da África e Oriente
Médio, aborda novamente a polêmica
com os setores castro-chavistas e
trotskistas que lhe negam o caráter revolucionário, apresentando-o basicamente como uma “conspiração” do
imperialismo. Outro artigo está dedicado à ocupação urbana do Pinheirinho no Brasil, cuja violenta
desocupação impactou todo o mundo
e gerou uma ampla campanha de solidariedade. Nele, se aborda este fato
no marco de um tema programático e
político de grande vigência: a luta pela
moradia popular contra a especulação
imobiliária da burguesia.
Finalmente, este número contém
material dedicado à trajetória e a atualidade de três partidos da LIT-QI: o
PdaC da Itália, o PT do Paraguai e, especialmente, a nova seção portuguesa
(o MAS) que está sendo fundada a
partir da saída da corrente
Ruptura/FER do Bloco de Esquerda.
O EDITOR
1
* 2-8 sit. econ. mundial (P)_Maquetación 1 20/03/12 12:40 Página 2
ATUALIDADE
O imperialismo teme uma nova recessão
A economia mundial desacelera
ALEJANDRO ITURBE
TODOS OS ORGANISMOS INTERNACIONAIS do imperialismo coincidem no diagnóstico
de uma redução do crescimento da economia mundial desde o terceiro trimestre de 2011
e preveem que este retrocesso se acentuará em 2012, abrindo a hipótese de que
é possível o início de nova recessão moderada.
Segundo o último relatório anual da
OCDE (Organização para a
Cooperação e o Desenvolvimento Econômico): “A recuperação
econômica
mundial está perdendo
força, deixando a
zona do euro em uma
leve recessão e os Estados Unidos em
risco de seguir o mesmo caminho”.
Esta previsão é compartilhada
pelo Banco Mundial (“O
mundo pode entrar numa recessão tão ou até mais grave que
a de 2008-2009”), pelo Fundo
Monetário Internacional e pela
UNCTAD1, ainda que com variações
sobre as cifras.
A situação afetará, pelo menos, 2012 e
2013. A perspectiva assinalada pela
OCDE é que em 2012 ocorra um crescimento global ao redor de 3% (em 2011
foi de 3,8%). O BM reduz o prognóstico
a 2,5%. Isto é, as cifras de conjunto não
Entre a crise das dívidas, a crise bancária e as lutas populares, a situação do euro é
cada vez mais crítica
2
CORREIO INTERNACIONAL
* 2-8 sit. econ. mundial (P)_Maquetación 1 15/03/12 15:02 Página 3
ATUALIDADE
são “catastróficas”, mas também não são
“boas” e, ao mesmo tempo, definem
uma dinâmica perigosa para o imperialismo.
Situações diversas
Ao mesmo tempo, expressam-se situações diferentes segundo os países e regiões. De conjunto, as principais
potências imperialistas estão abaixo da
média mundial. Mas, enquanto a UE e a
zona do euro já estão “oficialmente” em
recessão (estima-se que cresçam 0,2%
em 2012), a economia dos EUA consegue
escapar da recessão, no contexto da continuidade de um “crescimento anêmico”
(calcula-se 2% para 2012).
As economias mais dinâmicas no cenário
mundial continuam sendo a chinesa
(9,2% em 2011) e a indiana (7,8%), arrastando atrás de si alguns países latinoamericanos. Mas o “setor emergente”
também começa a expressar a desaceleração mundial e vários países já dão sinais de redução do crescimento,
especialmente na América Latina (o que
é chamado de “aterrisagem suave”).
Esta combinação define um estancamento do conjunto da economia mundial. E abre-se a possibilidade futura de
entrar em uma nova recessão, se os fatores políticos e econômicos se agravarem.
Entre estes, o Banco Mundial indica dois
elementos que poderiam agravar e acelerar a situação. Por um lado, está mais
difícil para os países em desenvolvimento (com a China à frente) continuar
compensando parcialmente, como um
“motor secundário”, a recessão ou o estancamento nos países imperialistas. Por
outro, a capacidade dos governos imperialistas de intervir no processo (através
dos megapacotes de ajuda) é muito
menor que há três anos.
Estas perspectivas são formuladas sob a
hipótese de que 2012 seja um “ano tranquilo”. Porém, o relatório da OCDE alerta
que um “acontecimento negativo significativo” na zona do euro possa ter consequências “devastadoras” para a
economia mundial, deixando o conjunto
dos países ricos em recessão, incluindose os Estados Unidos e o Japão, e arrastaria mais profundamente aos demais.
Alguns elementos centrais
Para entender melhor a conjuntura, é necessário detalhar alguns elementos centrais de análise. Em primeiro lugar, a
profunda inter-relação entre os diferentes
países e regiões na dinâmica econômica,
MARÇO DE 2012
Os trabalhadores gregos seguem lutando
duramente contra os ferozes planos
de ajuste
particularmente, sobre o que suceder na
Europa. Ainda mais se ocorrer “um
acontecimento negativo significativo” na
zona do euro. Por exemplo, além de sua
própria crise política, é evidente que um
dos elementos centrais que impedem
uma maior recuperação da economia
norte-americana é a situação europeia.
Junto aos fatores políticos também incide o volume de comércio entre ambas
as regiões e o grande peso dos investimentos produtivos e financeiros norteamericanos na Europa. A instabilidade
europeia é, sem dúvidas, um fator central que mina a “confiança investidora”
da burguesia norte-americana em seu
próprio país e no mundo.
Relacionado com o anterior, deve-se destacar a profunda inter-relação e alimentação mútua entre a crise econômica e
os processos e crises políticas, sejam
estas originadas (ou influenciadas) pela
luta de classes ou por atritos inter-burgueses. No caso dos EUA, é incontestável a influência que a crise do governo
de Obama e o enfraquecimento do regime, a partir dos confrontos com o Congresso, exercem sobre a recuperação
econômica. No caso europeu, como resultado da crise econômica, das lutas e
dos choques interburgueses, quatro governos extremamente debilitados renun-
ciaram na Espanha, Portugal, Itália e
Grécia, o que acentua o clima de instabilidade política geral do continente.
Entre os fatores políticos que “minam”
a confiança investidora devemos assinalar um outro de grande importância: o
processo revolucionário em curso no
norte da África e no Oriente Médio, pela
instabilidade política gerada em uma
zona crucial do mundo e pelas próprias
consequências sobre um elemento central da economia, como o preço do petróleo.
Em segundo lugar, fica cada vez mais
evidente que o domínio e o controle dos
estados imperialistas (e de superestruturas internacionais como a UE) pertencem à burguesia financeira, cuja
preocupação central é “salvar” os bancos e o sistema financeiro, a qualquer
custo. Algo que analisaremos com
maior profundidade ao nos referirmos à
Europa, onde os recentes governos da
Grécia e da Itália foram montados diretamente pelo capital financeiro, fazendo
“estremecer” todo o regime democrático
burguês.
Em terceiro lugar, está o fato de que a
burguesia imperialista norte-americana
mantém e reforça a hegemonia do sistema financeiro mundial, enquanto a
europeia retrocede no contexto de crises
bem mais profundas. Isto se expressa,
por um lado, no peso cada vez maior do
FMI nas “soluções” à crise europeia.
Por outro, como um reflexo político
desta realidade, três homens que hoje
jogam papéis centrais em países ou instituições europeias (Mario Draghi, presidente do Banco Central Europeu;
Mario Monti, atual premiê italiano, e
Lucas Papademos, premiê grego) tiveram altíssimos cargos na área financeira
do banco Goldman Sachs na Europa.
Em resumo, estamos em uma situação
geral de estancamento, com a Europa
numa situação bem mais difícil, que
pode se agravar rapidamente se os fatos
se precipitarem.
Outro ponto de interrogação (pouco
analisado nos relatórios dos organismos
internacionais) é quanto tempo e em
que medida a economia chinesa poderá
manter seu crescimento baseado em pacotes estatais e crédito barato, à medida
que os investimentos estrangeiros e as
exportações diminuírem, por um lado,
e a inflação e os aumentos salariais que
as greves estão conquistando corroerem
seus baixíssimos custos comparativos,
por outro.
3
* 2-8 sit. econ. mundial (P)_Maquetación 1 15/03/12 15:02 Página 4
ATUALIDADE
Europa para baixo
A Europa continua sendo o elo mais
fraco do polo imperialista. A UE e a zona
do euro já foram declaradas em recessão,
de forma bem clara desde o terceiro trimestre de 2011. A situação, no entanto,
apresenta desigualdades em cada país. A
Alemanha cresceu 3% no ano passado,
a Espanha mal superou 0% e a Grécia e
Portugal tiveram valores negativos. Mas
a própria economia alemã está em retrocesso (estima-se 0% no 4º trimestre de
2011). Para 2012, a OCDE estima um
avanço global de 0,3%. Com prognósticos bem mais sombrios do FMI para a
Espanha (-1,7%) e Itália (-2,2%).
Na Europa, estaria ocorrendo a hipótese
da “dupla imersão”, figurada como um
W, com um período fortemente recessivo
em 2008-2009, uma recuperação muito
frágil em 2010-2011 (que já começou a
desacelerar no último trimestre de 2011)
e uma nova recessão em 2012-2013, por
enquanto de caráter “moderado”.
Algumas das contradições que nasceram
com a UE e a zona do euro (principalmente a moeda comum sem unificação
dos países, a profunda desigualdade de
desenvolvimento e produtividade de
seus membros, a necessidade de atacar
as conquistas operárias e sociais), no
marco da crise mundial, chegam agora a
um limite quase insuportável.
Aqui queremos analisar a combinação de
duas crises: a das dívidas dos países
(que já abordamos num artigo da revista
Correio Internacional nº 6) e a crise do
sistema bancário e financeiro continental.
A crise das dívidas soberanas
A crise da “dívida soberana” começou
em países menores (Grécia, Irlanda, Portugal), mas agora já afeta países mais importantes (Espanha e Itália). Um “círculo
vicioso” instalou-se nestes países: impossibilidade ou grande dificuldade de
pagamento-ajuste-refinanciamento-crescimento e encarecimento da dívida-nova
crise de pagamento, agora em uma situação muito pior. A Grécia é o grande
exemplo (o porta-voz parlamentar do
partido de Ângela Merkel declarou numa
entrevista que a “Grécia nunca será
capaz de pagar suas dívidas”). Portugal
e Irlanda vão no mesmo caminho e a
ameaça estende-se a países como a Itália
e Espanha, 3ª e 4ª economias da zona
do euro, que somam 30% de seu PIB.
A crise expande-se em várias direções e
também afeta os países mais fortes,
4
Nesta crise das dívidas soberanas existe
o risco de um efeito dominó. Se um país
- por exemplo, a Grécia - declarasse moratória, isto poderia arrastar outros países, sem possibilidades de resposta do
FEEF, ameaçando a própria existência da
zona do euro. É isto que explica que, inclusive com a corda no pescoço e aceitando que a apertem cada vez mais, o
governo grego consiga o perdão de parte
da dívida e uma redução da taxa de juros
no “refinanciamento” em curso. Apesar
disso, várias qualificadoras de risco opinam que não poderá a pagar sua dívida.
Os planos de ajuste
Ângela Merkel consegue impor a vontade alemã
na EU e na eurozona
como o recente rebaixamento da qualificação da dívida francesa que, pela primeira vez em décadas, perdeu a nota
máxima (AAA) por parte da qualificadora S&P, no quadro de uma queda geral
de qualificações de quase todos os países.
Não se trata de um problema menor.
Além de provocar um desgosto a Sarkozy, em plena luta por sua reeleição,
causa o encarecimento da taxa de juros
paga pelo país para seu financiamento
público, e uma diferença maior em relação à taxa paga pela Alemanha (1,84%
anual). A França passará de uma taxa de
2,59% a 3,56%. A Espanha paga 5,58%;
Itália, 6,39%; Irlanda, 8,22%; Portugal,
11,27% e a Grécia, a bagatela de
32,36%. A S&P também rebaixou a qualificação do FEEF (Fundo Europeu de
Resgate) porque, com um total de créditos de 440 bilhões de euros, já tem perto
da metade comprometida com a Grécia,
Portugal e Irlanda. Isto é, teria grandes
dificuldades de resposta a situações mais
difíceis na Espanha ou, ainda mais, na
Itália.
O premier italiano Mario Monti parece
perguntar-se: haverá alguma saída?
O refinanciamento dos países que já chegaram à beira do não pagamento (Grécia, Portugal, Irlanda) ou dos que estão
perto do abismo (Itália e Espanha) exige
planos de ajuste cada vez mais ferozes.
O novo governo espanhol de Rajoy
acaba de cortar 40 bilhões de euros do
orçamento estatal em um único golpe.
Isto traz como consequências, por um
lado, uma tendência ao aumento dos
processos de luta e resistência, e também um profundo desgaste dos governos
que os aplicam. Por outro, os governos
e parlamentos dos PIIGS2 têm aceitado
cláusulas que impõem uma profunda
perda de soberania (similares às aceitas
pelos países latino-americanos). No caso
espanhol, deu-se um caráter de prioridade constitucional ao pagamento da dívida pública.
A crise e os planos de ajuste pioram
cada vez mais a situação dos trabalhadores. O índice de desemprego na zona
do euro atingiu 10,3% em outubro passado e 9,8% no conjunto da UE. Segundo os dados da Eurostat, naquele
mês havia quase 23,6 milhões de desempregados na UE (16,3 milhões na zona
do euro). O maior índice deu-se no Estado espanhol (22,8%, contra 22,5% em
setembro e um aumento de 2,3% no último ano), seguido da Grécia (18,3% em
agosto passado, com um aumento de
5,4% em um ano). Os países com taxas
mais baixas são a Áustria (4,1%), Luxemburgo (4,7%) e Holanda (4,8%). Seguramente os dados finais de 2011 serão
piores.
A crise das dívidas bancárias
A situação das dívidas públicas alimenta
outra profunda crise: a do sistema bancário continental, baseado, em grande
parte, nos títulos destas dívidas (uma
parte dos quais já é qualificada como “tíCORREIO INTERNACIONAL
* 2-8 sit. econ. mundial (P)_Maquetación 1 15/03/12 15:02 Página 5
ATUALIDADE
tulos lixo”). No final do ano passado, a
qualificadora Moody’s alertou sobre o
risco de “múltiplos calotes” bancários na
Europa e anunciou que rebaixaria a
“qualificação de risco” de 87 bancos de
15 países da UE, considerados “asfixiados” e com necessidade de “respiração
artificial”.
São 17 bancos da Itália, 20 da Espanha,
9 da Áustria, 7 da França, 6 da Holanda,
5 da Noruega, 4 da Suécia, 3 da Bélgica,
3 da Finlândia, 3 de Luxemburgo, 2 de
Chipre, 2 da Eslovênia, 2 de Portugal, 2
da Suíça e 1 da Polônia. Entre eles, incluem-se vários dos principais bancos do
continente: BNP Paribas S.A. e Société
Générale S.A. (França); o UniCredit SpA
(o maior da Itália), Santander e BBVA
(Espanha) e suíços como o Credit Suisse
AG e o UBS AG.
Os bancos europeus olham-se com desconfiança uns aos outros e interromperam os empréstimos interbancários,
essenciais para o funcionamento do sistema creditício. Atualmente, só se financiam fundos interbancários por um dia
no mercado. Neste contexto, um calote
da dívida de algum país arrastaria como
parte do “efeito dominó”, grande parte
do sistema financeiro europeu.
Alguns analistas consideram que a crise
bancária é mais grave que a das dívidas
públicas porque é bem mais profunda e
estrutural. As dívidas públicas são derivadas, em grande parte, da “ajuda” aos
bancos. Assim, são postas no centro da
questão pela mídia e pelos governos para
justificar os planos de ajuste (ver o economista Christopher Ramaux, em Le
Monde, 4/12/2011).
A verdade é que, embora dizendo que
são “seus” estados e “sua” UE, a principal preocupação dos governos e das autoridades europeias é “salvar” e “ajudar”
os bancos acima dos próprios estados: a
Comissão Europeia informou que, entre
outubro de 2008 e dezembro de 2010, o
sistema bancário recebeu em ajudas públicas a quantidade de €1,6 trilhão, equivalente a 13% do PIB da UE. A esta
cifra, cabe agregar €489 bilhões emprestados pelo BCE a 523 bancos europeus
em dezembro passado.
Os bancos, principais responsáveis pela
atual crise e os mais duros em exigir
ajustes pelos “países”, não só se “salvam”, mas também aproveitam a crise
para continuar especulando e fazer gigantescos negócios: recebem esse dinheiro a 1% de juros e o emprestam aos
países a 5% ou 6%.
MARÇO DE 2012
Apesar desse grande negócio, a especulação financeira transforma-o num “poço
sem fundo”: no próximo ano serão necessários pelo menos €300 bilhões adicionais. Somado à situação das dívidas
públicas, isto significa que 2012 começa
com vencimentos de dívidas que deverão
ser cobertas com €600 bilhões. Isto num
contexto cada vez mais recessivo.
Por isso, a combinação de ambas as crises mantém e aumenta as dificuldades
de sobrevivência do euro e sua zona de
aplicação, com o consequente risco de
seu desaparecimento. Ou, pelo menos,
uma mudança qualitativa de suas condições atuais.
Que fazer com a zona do euro?
O desaparecimento da zona do euro (ou
sua redução) representaria um grande
golpe a uma obra de 50 anos da burguesia imperialista europeia. Também teria
um grande impacto sobre a crise econômica e financeira mundial. Por isso, em
geral, o imperialismo trata de defendê-la.
A OCDE e demais organismos dão dois
prognósticos alternativos, um deles definido por um “acontecimento negativo
significativo” na zona do euro com consequências “devastadoras” para o
mundo. Paul Krugman compartilha esta
visão e define o possível desaparecimento do euro como uma “catástrofe”.
Esta gravíssima situação começa a dividir as burguesias imperialistas europeias
(e também a norte-americana) sobre o
caminho a seguir. A posição majoritária,
por enquanto, é tentar salvar a zona do
euro com sua atual conformação. Mas
outros setores burgueses e economistas
falam claramente de reduzi-la (saída dos
países mais débeis) e, inclusive da formação de uma “zona” só com os países
mais “saudáveis” (Alemanha, França,
Holanda, Bélgica, Luxemburgo, Áustria
e Finlândia).
Por exemplo, George Soros afirmou que
tudo o que se fizer para salvar a atual
zona do euro, como as “ajudas” aos países mais endividados, são inúteis. Que o
melhor seria envolver os países mais
saudáveis num “cordão sanitário” e,
dali, iniciar a recuperação.
Um setor importante da burguesia alemã
expressa uma conclusão similar. O presidente da federação de exportadores
(BGA), Anton Börner afirmou: “Não se
deve superestimar o euro, o que a Alemanha precisa é do mercado livre, não
da moeda única, podemos viver sem o
euro. Recomendo que Grécia e Portugal
saiam voluntariamente do euro”.
Duas saídas ruins
O debate é muito concreto. O problema
é que, nas atuais condições, nenhuma
das alternativas é boa. Defender a zona
do euro atual implica, por um lado, em
avançar na centralização e no controle
bancário e financeiro muito mais impositivo por parte do BCE e das autoridades europeias. Isto não significa aliviar
o torniquete sobre os países mais debilitados, mas “apertá-lo” ainda mais, com
planos de ajuste bem mais duros, avanços sobre sua soberania e governados
desde os escritórios de Bruxelas, em direção a regimes que “perfuram” cada
vez mais a democracia burguesa. A nomeação de Monti e Papademos e a mo-
A plataforma “Há que parar lhes os pés” propõem uma maior radicalidade na luta
contra os planos de ajuste e contra a reforma trabalhista do governo Rajoy
5
* 2-8 sit. econ. mundial (P)_Maquetación 1 15/03/12 15:02 Página 6
ATUALIDADE
acima de Frankfurt. Este centro atua
como plataforma de investimentos para
a China (desde Hong Kong, através do
HSBC) e para a Índia (por exemplo, a
Jindal, a maior empresa mineiro-siderúrgica do mundo tem capital anglo-indiano). O governo de Cameron estava a
favor da “disciplina” e da “austeridade”
fiscal, mas totalmente contra votar impostos europeus que afetassem as operações financeiras.
O concreto é que seu voto contrário faz
com que qualquer legislação sobre este
tipo de impostos só possa ser votada
agora individualmente por cada país (ou
como “acordos bilaterais”) e não como
uma “legislação europeia” de cumprimento obrigatório para os membros da
UE.
Obama se recupera nas pesquisas para as
próximas eleições presidenciais, ajudado
por uma pequena baixa no desemprego
dificação da constituição espanhola vão
nessa direção.
Por outro lado, manter a zona do euro e
cortar (ou atenuar) o “círculo vicioso”
da crise das dívidas requereria “compartilhar”, de alguma forma, o custo da
crise. Mas aqui todo mundo “tira o
corpo”. Merkel recusou a proposta de
Sarkozy de criação dos “bônus europeus”, porque isso aumentaria o custo
de financiamento ao estado alemão.
Ademais, faz um ano que não se aprova
o aumento do FEEF a um trilhão de
euros. Por sua vez, os bancos, grandes
responsáveis pela crise, mas afundados
em seu “próprio inferno”, só aceitaram
o perdão da dívida grega sob a condição
de que o BCE compre esses bônus e os
compense.
O confronto com a Grã-Bretanha
Outras alternativas de financiamento,
como a criação de impostos europeus e,
dentro deles, uma taxação das transações financeiras propostas na recente cúpula europeia também criam crise e
confrontos: a Grã-Bretanha votou na
contramão, o que provocou uma grande
irritação em Merkel e Sarkozy.
A posição do governo de Cameron é explicada pelo fato da Grã-Bretanha ser
parte da UE, mas com um elemento de
diferenciação. Com um PIB um pouco
menor que o da França, representa um
polo específico dentro da UE, com uma
economia altamente financeirizada: Londres é hoje o segundo centro financeiro
mundial, só perdendo para Nova York e
6
A “zona de ferro”
Por sua vez, o projeto de reduzir a zona
do euro, deixando os países débeis saírem, abre o risco do efeito dominó. Também gera um forte debate: uma coisa é
deixar fora a Grécia, Portugal e Irlanda
(que somam apenas 6% do PIB da zona)
e outra, a Itália e a Espanha, que acumulam 30%. A burguesia imperialista europeia assemelha-se a um jogador de
xadrez com uma posição na qual não há
jogada boa: qualquer uma que fizer recebe xeque. Então, trata-se de eleger a
“menos ruim”.
As burguesias imperialistas só terão uma
“saída boa” se conseguirem infligir a
suas classes trabalhadoras uma derrota
de grande magnitude. Isto lhes permitiria
aumentar em termos qualitativos os níveis de exploração e de extração de maisvalia para aumentar a taxa de lucro,
O premier britânico, David Cameron, se opõe
a criar impostos europeus sobre as operações
financeiras
alimentar a voracidade financeira e gerar
uma nova onda expansiva. Ao mesmo
tempo, esse triunfo lhes daria a “tranquilidade política” da qual agora carecem.
Os efeitos da própria crise e os planos de
ajuste, evidentemente, têm aumentado
os níveis de exploração e a taxa de lucro.
Mas este aumento não parece ser, por
hora, suficiente. No entanto, o fundamental é que, no contexto da profunda
crise econômica e financeira, o movimento operário, embora não consiga
impor sua própria saída, resiste e enfraquece com sua luta, governos e regimes
e transforma a situação em um grande
atoleiro. À medida que nenhuma das
duas classes em luta imponha sua saída
de fundo, a perspectiva é que a situação
atual se arraste, num movimento em espiral, com tendência a se agravar. Inclusive, pode se produzir um “evento
negativo significativo” de consequências
catastróficas, que a OCDE tanto teme.
No marco desta contradição, a “linha
Merkel” continua sendo aplicada: manter a zona do euro, mas “espremendo”
os países mais débeis e com problemas
até ao extremo.
EUA esquivam-se da recessão
Em 2011, a economia norte-americana
escapou da recessão, mas com um crescimento pequeno (1,7%), menor que o
de 2010. A OCDE prevê uma continuidade deste “crescimento suave” para
2012 (2%); outros prognósticos estimam
2,5%. A mídia ressaltou, no final de
2011, dois dados positivos: o aumento do
consumo privado e a redução do índice
de desemprego (caiu a 8,3% em dezembro de 2011, 1,5% menor que um ano
atrás).
É similar ao prognóstico de Nouriel Roubini, em 2010, antecipando um “período
prolongado de crescimento anêmico”.
Isto se refletiria não no “W” europeu,
mas na figura de um planalto, isto é,
uma situação de crescimento, mas sem
grandes possibilidades de aceleração.
Os incentivos governamentais que empurraram a frágil recuperação estão se
reduzindo (em função da votação no
Congresso sobre o teto da dívida pública) e, segundo dados do BEA (Bureau
of Economics Affairs), o investimento
privado não se recupera significativamente. O consumo privado (representa
70% do PIB) não tem grandes possibilidades de crescer de modo sustentado, à
medida que não há uma grande criação
de novos empregos, e os que se criam
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são de salários mais baixos que os eliminados e, desde 2007, a capacidade da população em financiar seu consumo com
crédito foi reduzida.
O desemprego baixou no último ano.
Mas, além dos questionamentos à sua
metodologia de cálculo (elimina-se as
pessoas que deixaram de buscar emprego), estima-se que esta redução tenha
limites próximos, se não houver renovação dos estímulos de contratação pelo legislativo, porque se chocaria com o
chamado “desemprego estrutural”. Em
qualquer caso, os analistas estimam que
fossem necessários pelo menos cinco
anos deste ritmo de crescimento para
voltar aos níveis de desemprego prévios
à crise (5,6% em 2007).
Sobe a produtividade
e a taxa de lucros
Neste marco, a produtividade (um indicador que combina níveis de exploração
com a incorporação de tecnologia) continuou crescendo de modo sustentado
nos últimos anos, incluídos os da crise.
Teve um crescimento anual de 3% nos
anos 90; 3,5-4% entre 2000 e 2005 e
manteve uma média de 2,5% desde
então.
Como assinala Daniel Romero (“Com
quantas crises se faz uma revolução?”,
http://litci.org/pt/mundo), este aumento da produtividade se deve fundamentalmente ao maior nível de
exploração e não à incorporação de tecnologia ou de capital fixo. Por exemplo,
em 2009, o investimento em capital fixo
caiu 2,7%. O aumento da produtividade
foi resultado da intensificação do ritmo
de trabalho dos que conservaram seus
empregos, no contexto de um salto importante do desemprego.
Este aumento dos níveis de exploração
resulta no crescimento sustentado da
taxa de lucros, depois de chegar ao
menor nível (inícios de 2009). Como se
vê no gráfico anexo, no final de 2010 já
havia uma recuperação a um nível similar a 2007, quando estourou a crise.
Segundo um estudo do Economic Policy
Institute (EPI), o lucro das empresas
cresceu de US$ 1,5 trilhão no quarto trimestre de 2007 (momento do início da
crise) a quase US$ 1,6 trilhão no primeiro trimestre de 2010 (pico da recuperação). Um aumento de 5,7%. No
mesmo período, perderam-se 8,2 milhões de empregos, perto de 5% da força
de trabalho. Nestes anos, o rendimento
do trabalho aumentou 11%.
MARÇO DE 2012
Evolução da taxa de lucro nos Estados Unidos e Europa
Estados Unidos
(escala da esquerda)
Europa
(escala da direita)
Fonte: Eurostat e BEA – Tomado de Husson, Michel, Una Crisis sin fondo,
Revista Herramienta 48, Outubro 2011.
(Nota: os valores do gráfico têm como referência uma taxa de lucro histórica.
Em trabalhos anteriores, o valor da taxa de lucro nos EUA, em 1999, foi estimado
em 7%).
Por que a recuperação
não dá um salto?
Se a crise permitiu que a exploração e a
produtividade aumentassem e, com isso,
que a taxa de lucro tivesse uma recuperação aos níveis de 2007: por que não
começou nos EUA uma recuperação
muito maior dos investimentos para iniciar uma “fase ascendente” mais sustentada? A resposta requer a combinação de
vários elementos.
Por um lado, a crise política causou um
grande impacto, analisado no artigo
Nada de tranquilidade (Correio Internacional nº 6). A derrota do projeto Bush
foi seguida pela impossibilidade para
Obama de reverter seus aspectos mais
profundos e de impedir o desgaste de
seu governo. Frente a este desgaste, os
republicanos, ao mesmo tempo em que
lhe “ataram as mãos”, em um processo
de eleição primária “sangrenta”, não parecem ainda capazes de gerar uma alternativa séria para a burguesia, apesar do
atual deslocamento do Tea Party3.
Esse braço de ferro travou simultaneamente ambos competidores e, através da
lei orçamentária votada no ano passado,
diminuiu ou eliminou incentivos ao consumo e à recuperação (incluindo a redução do orçamento militar). Tudo isso
aumentou a “desconfiança investidora”
da burguesia.
Isto é, estariam dadas as “condições objetivas” para uma recuperação, mas não
as condições políticas. Esta posição foi
enunciada por Mohamed O-Erian (principal executivo de PIMCo, um dos maiores fundos de investimento dos EUA) em
várias entrevistas ao canal financeiro
Bloomberg, onde criticou duramente o
governo e os republicanos pela forma
com que manejaram a “crise da dívida”.
Alguns elementos desta crise política parecem estar começando a mudar. As últimas pesquisas mostram que Obama
está se recuperando eleitoralmente e poderia derrotar Mitt Romney nas eleições
presidenciais. Esta recuperação apoia-se
seguramente no “crescimento anêmico”
e também na leve redução do desemprego. E, também, em medidas de claro
verniz eleitoral como o refinanciamento
de hipotecas a um pequeno setor de devedores para que não percam suas casas.
Para ajudá-lo, a primária republicana
está muito à direita. Romney tem dito
frases como “gosto de demitir” ou “os
mais pobres não me preocupam”.
É muito provável também que haja cada
vez mais setores da burguesia norteamericana que prefiram um “Obama conhecido” para enfrentar a situação atual
do que “um Romney a se conhecer”.
De qualquer forma, mesmo que a “crise
política” esteja começando a se fechar,
ao longo de todo ano de 2012 haverá um
efeito “delay”4 devido ao processo eleitoral. No caso de um triunfo de Obama,
será necessário verificar a força política
de seu segundo mandato e quanta “confiança investidora” vai gerar na burgue7
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sia. Por outro lado, ao longo de várias
décadas, e agravada pela crise, foi-se desenvolvendo nos EUA uma deterioração
social cada vez maior, que se expressa
nos 45 milhões de pobres e no surgimento de movimentos de protesto, o que
não ocorria há décadas, como o Occupy.
Um processo mais estrutural
O segundo aspecto a analisar é se a burguesia norte-americana (ou pelo menos
setores importantes) está mudando sua
política de levar os maiores investimentos industriais à China e à Índia e voltar
a investir nos EUA. Isto é, se a divisão
internacional do trabalho definida desde
os anos 90 estaria começando a mudar
ou se esta se mantém no essencial.
Num artigo da Correio Internacional nº
6, apresenta-se dados de várias empresas que estão instalando ou expandindo
fábricas nos EUA em detrimento de seus
investimentos na China (Caterpillar,
NCR, Wham-Ou Inc., BCG). Um executivo da BCG, Michael Zinser, destacou o
avanço da exploração: “Trabalhadores e
sindicatos estão mais receptivos a aceitar
concessões para trazer os empregos de
volta aos EUA”.
Em seu discurso do Estado da União de
2012, Obama reivindicou (além do “salvamento” da GM) que a histórica empresa de fechaduras Master Lock tinha
deixado de fabricar na Malásia e na
China e reabriu sua fábrica em Milwaukee, com alguns milhares de trabalhadores. Isto é, começaria a se produzir um
equilíbrio entre o aumento da produtividade mais a redução salarial nos EUA e
o aumento de salários e a inflação na
China, que justificaria a volta dos investimentos industriais ao país.
Deve-se seguir estudando este tema. Mas
achamos que ainda se trata de casos isolados e não de uma tendência geral, que
reverta o processo que se deu a partir de
90. A burguesia norte-americana continua em compasso de espera em relação
aos investimentos industriais no país.
Como um elemento que expressa esta
realidade, as medidas monetárias de
Obama para diminuir o déficit da balança comercial não conseguiram grande
efeito. O déficit comercial acumulado em
2011 superará amplamente os US$ 500
bilhões. Pouco mais de 60% dessa cifra
corresponde à balança comercial com a
China.
As apostas no capital financeiro
Em vários trabalhos, mostramos que os
bancos centrais dos países imperialistas
e outros fizeram planos de resgate e jogaram nos mercados financeiros e bancos uma cifra global equivalente a US$
24 trilhões. Estima-se que pouco mais de
50% do valor correspondeu aos EUA.
Graças a esses fundos, salvaram-se da falência à que estavam quase condenados
em 2008, recuperaram o valor de seu capital corroído pelo fim da “bolha” especulativa e ganharam novo fôlego para
manter sua especulação. “O mercado financeiro ganhou oxigênio novo e, em
2010, o volume de ativos financeiros já
era US$ 10 trilhões maior do que em
2007, ano anterior à crise” (Instituto
McKinsey, Relevação do Mercado Global
de Capitais, agosto de 2011). Em pouco
mais de dois anos, o mercado financeiro
recuperou as perdas de uma das maiores
crises da história e, inclusive superou-as.
Mas isso não faz mais que reabrir uma
das causas que esteve na origem da crise
(a hipertrofia do sistema): a relação
entre o capital financeiro e o PIB chega
a 356% no mundo e a 462% nos EUA.
Assim se realimentam velhas bolhas especulativas e se criam novas. Com isso,
volta a entrar em cena o fenômeno que
chamamos “superincremento” da composição do capital, analisado em vários
artigos da revista Marxismo Vivo. Isto
corrói o impacto favorável que a recuperação do aumento da mais-valia possa
ter conseguido pela via da maior exploração.
Volta assim a se colocar também a necessidade de que o aumento da exploração se mantenha, com ataques cada vez
mais ferozes aos trabalhadores, por diferentes meios. Mas estes respondem com
sua luta, como vemos no norte de
África, no Oriente Médio e na Europa. O
que reafirma, uma vez mais, que a definição final da dinâmica da atual crise se
dará, como sempre, no terreno da luta
de classes.
1
UNTACT – Conferência das Nações Unidas
Sobre Comércio e Desenvolvimento.
2
PIIGS – Sigla para Portugal, Irlanda, Itália,
Grécia e Espanha, setor mais frágil da zona
do euro.
3
Tea Party – Movimento da ultradireita norteamericana, surgiu em 2009, como oposição às medidas de Obama e em apoio ao
Partido Republicano.
4
Efeito “delay” – instrumento musical que
provoca um efeito de eco, de reverberação.
O movimento Occupy Wall Street, e outros
semelhantes no resto do país, mostraram
o crescente descontentamento popular com
o aumento da desigualdade social nos
Estados Unidos, expresso em seu lema:
“Somos os 99%”.
8
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Síria
A Guerra Civil marca os passos
da Revolução
RONALD LEÓN
É UM FATO. A luta
de classes na Síria,
como parte de um
impresionante processo
revolucionário que
sacudiu a região que vai
do Norte da África ao
Oriente Médio, chegou
ao seu pico máximo:
a guerra civil.
N
esse mês de março completa-se
o primeiro aniversário do início
do levante popular contra a ditadura de Bashar Al Assad, que detém o
poder de maneira totalitária há 12 anos,
no marco de um regime que se arrasta
por quatro décadas. Desde então, a luta
do povo sírio por liberdades democráticas e melhorias no padrão de vida se espalhou em graus diferentes por todo o
país.
Durante todos esses meses, as manifestações populares foram brutalmente
reprimidas. Até fevereiro de 2012, a ONU
contabilizou 7500 vítimas fatais. Já as organizações da oposição sírias, entre elas
a DDHH, contabilizaram muito mais.
Revolução e contrarrevolução medem
forças pelas ruas tendo como linguagem
fuzis e canhões. Assistimos a um verdadeiro banho de sangue.
MARÇO DE 2012
Surgimento e Desenvolvimento
do Exército da Síria Livre (ESL)
A crescente força das mobilizações populares e o impulso que as vitórias em
outros países da região (como a do povo
líbio contra o sanguinário Kadafi) davam
ao processo revolucionário de conjunto
geraram por um lado o armamento de
um setor da população e por outro lado
uma crise profunda e um número considerável de deserções no exército regular
sírio. Dessa maneira, surgiu no final de
2011 o Exército da Síria Livre (ESL), composto por civis que tomaram as armas e
soldados desertores.
Em suas primeiras batalhas, o ESL atacava alguns pontos políticos (como a
sede do partido Baath) além de postos
policiais e militares. Nesse processo, a
força do ESL foi aumentando, acompanhando a radicalização dos protestos po-
pulares, constituindo-se em uma força
combatente de peso importante.
Lutando contra um exército regular
que continua mantendo sua superioridade material, o ESL utiliza-se de táticas
militares de guerrilha. Assim, um dos
chefes militares do exército rebelde, coronel Riad Al–Assad, informou que o
ESL conta com mais de 40.000 combatentes e que as “operações realizadas pelo
ESL são caracterizadas por ataques rápidos conta as posições pró–Assad, seguidas de retiradas táticas para zonas mais
seguras”. (France Presse).
O curso da Guerra Civil acelera
a crise do exército de Assad
A crise do exército regular sírio é mais
lenta se compararmos com a que ocorreu
com o exército de Kadafi, mas é incessante e não se dá apenas pelos ataques
ao movimento de massas, mas por signi9
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ficativas contradições internas que ocorrem no país.
O exército do ditador Assad é composto pela minoria alauita, segmento ao
qual pertence sua família. Estima-se que
80% dos altos oficiais pertencem a esse
setor. Contudo, este exército elitizado
começa a dar sinais de cansaço depois
de alguns meses de ações ininterruptas.
O exército regular de Assad está munido
de tanques e artilharia pesada em áreas
urbanas, levando à destruição de muitos
locais, exacerbando os protestos e o uso
de armas de fogo pelo povo.
A questão é que Assad tem um
enorme problema na composição da
maioria de suas forças armadas. Embora
seja numerosa, a esmagadora maioria
dos 300.000 efetivos são recrutas sunitas, aos quais, por se duvidar de sua fidelidade, não é costume atribuir tarefas
de repressão nas missões. Não é casual
que a maioria das deserções venha dessas forças. Portanto, na hora de reprimir,
quem geralmente atua é a Guarda Republicana, que conta com cerca de 10.000
efetivos, assim como a Quarta Divisão
Mecanizada, que em suas fileiras conta
com outros 20.000 efetivos. Ambas as
forças estão formadas em sua maioria
por alauitas e são dirigidas pelo nefasto
Maher Al Assad, irmão mais novo do
presidente.
Do ponto de vista militar, a situação
de Assad é complicada. Existe lutas em
cidades como Homs, Hama, Idlib, Deraa
e até no berço da família Assad, a costeira cidade de Latakia. O levante popular se espalhou em que pese que alguns
focos rebeldes tenham sido esmagados,
estão superando Assad. Apesar de sua
superioridade em número e armamentos, o exército do regime até agora não
consegue deter o levante popular armado: enquanto uma cidade é destruída, os soldados de Maher Al Assad
devem abandoná-la e correr para assaltar outras e outras. E assim, os rebeldes
ressurgem... Isso tem ocorrido sucessivamente.
Um exemplo disso foi o que ocorreu
na cidade de Homs, que foi submetida
durante quatro semanas a intensos
bombardeios e dois dias ferozes de combates casa a casa. O bairro de Baba Amr,
foco da resistência, foi o mais atingido,
pois teve à sua frente uma superioridade
numérica e um poder de fogo infinitamente superior, mas em suas ruas resistiam várias milícias apoiadas pela
maioria da população.
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O regime sírio continuou utilizando o
mesmo método em Homs com o qual,
há exatamente 30 anos, esmagou uma
rebelião islâmica em Hama. Naquela
ocasião, Hafez El Assad, pai do atual ditador, bombardeou a cidade por um mês
para depois lançar sobre ela um assalto
terrestre implacável. Hama foi arrasada.
Nunca se soube o número real de mortos
que oscila entre 14 e 40 mil.
A milícia de Homs finalmente anunciou um recuo tático. No entanto, Assad
filho não obteve em Homs o mesmo
êxito que seu pai em Hama. A resistência armada do povo sírio não foi esmagada em Homs, como quer comemorar
o regime assassino de Assad. O ditador
utilizou nesta operação cerca de 7.000
soldados de elite e dezenas de tanques,
incluindo mísseis de longo alcance usados sob bombardeio incessante. Mesmo
com todas essas forças, o regime não
conseguiu esmagar a resistência popular.
Pelo contrário, o presidente teve que
reconhecer em declarações para a televisão Al Jazeera que suas forças “também
sofreram numerosas baixas nos combates”, pelas mãos do ESL.
Dessa forma, enquanto Homs continua em chamas, os combates se transferiram para outras cidades rebeldes como
Hama e Idlib, onde já começaram os
bombardeios.
A guerra civil se espalhou a tal ponto
que também houve confrontos em regiões de conflitos antigos como nas Colinas de Golã, território conquistado e
anexado por Israel. (conforme o jornal
Clarín da Argentina)
É claro que a vitória rebelde não está
definida. No entanto, pelos elementos
que analisamos podemos afirmar que a
guerra civil se intensifica e a resistência
popular armada se estende. Nir Rosen,
um jornalista norte-americano que passou algumas semanas na Síria comentou
sua experiência para a rede Al Jazeera
“Bashar, pare de matar”.
destacando como os comitês locais e as
milícias armadas das cidades ou províncias estão se unindo e criando estruturas
maiores.
De todas as organizações, disse Rosen,
a mais importante é justamente o Conselho Revolucionário de Homs, que se
tornou um “estado dentro de outro estado”. Este Conselho assumiu tarefas de
segurança, saúde, alimentação de mais
de 16.000 famílias e ainda organiza a
luta social e armada contra a ditadura.
Outro dado importante apontado por
Rosen tem a ver com a composição do
ESL, que está formado majoritariamente
por civis armados, por pessoas comuns
que tomaram as armas, muito mais do
que os soldados que abandonaram o
exército regular sírio. Rosen confirma
que as deserções existem e aumentam.
Afirma ainda que começaram muito depois do início da resistência popular armada, que obtinha armas no mercado
paralelo e que começou pela necessidade de proteger as manifestações da repressão.
As manobras da
“abertura democrática”
Quanto mais o regime se desespera,
mais reprime. Assad agarra-se ao poder,
recusa-se a negociar sua saída, endurece
a repressão e declara ao mundo que continuará usando “mão de ferro” e que “se
manterá firme para enfrentar seus inimigos” que, segundo suas próprias denúncias,
seria
uma
“conspiração
estrangeira”.
No entanto, tenta um movimento paralelo tímido para legitimar seu regime e
manter a base social que ainda o apoia.
Em fevereiro desse ano, ao mesmo
tempo em que bombardeou Homs, realizou um referendo constitucional para
legitimar uma suposta “abertura democrática”. No entanto, de acordo com o
texto dessas reformas, Assad mantém
poderes determinantes, incluindo a possibilidade de escolher o primeiro-ministro, rechaçar leis contra a maioria do
“parlamento” e, acima de tudo, poderia
ser mantido “constitucionalmente” no
poder, pelo menos, até 2028.
Apesar desta manobra, o regime continua em uma situação muito delicada,
tanto política quanto militar. Cercado
pelas mobilizações populares e pela ação
armada do ESL, deve enfrentar outra
dura realidade: o imperialismo, ao qual
tem sido tão fiel até agora, cada vez mais
se distancia.
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ATUALIDADE
A política do imperialismo
Há alguns meses o imperialismo
(norte-americano e europeu) e as burguesias árabes, que no começo o apoiaram com tudo, começaram a se
distanciar de Assad. Primeiro fizeram-lhe
advertências, pressionando no sentido de
buscar uma saída negociada. Depois,
aplicaram sanções econômicas. Subindo
o tom, ainda que no terreno diplomático,
a Liga Árabe, que é um dócil instrumento
da política das potencias imperialistas e
que durante meses tentou negociar de
todas as formas com Assad, resolveu suspendê-lo como país membro.
Nos primeiros dias de fevereiro, a Liga
Árabe apresentou uma proposta de resolução para o Conselho de Segurança da
ONU onde se condenava a repressão e se
colocava como condição sine qua non
para resolver a crise a saída de Assad e a
conformação de um “governo de unidade
nacional”. Essa resolução foi vetada pela
Rússia e China, motivo pelo qual foram
duramente denunciados pelos demais líderes mundiais como “cúmplices” dos
crimes de Assad.
Depois houve uma declaração do Conselho dos Direitos Humanos da ONU que
condenava a “sistemática violação” dos
direitos dos civis na Síria. Rússia, China
e Cuba, que apoiam a permanência de
Assad votaram contra essa resolução.
O imperialismo, vendo que tal situação
se agrava cada vez mais, entende que um
apoio aberto a Assad tornou-se complicado demais. Por isso o denuncia, aplica
sanções econômicas e tenta cercá-lo internacionalmente, pressionando para que
mude a tática na forma de enfrentar a revolução popular ou diretamente renuncie, enquanto a situação permitir.
Mas por que o imperialismo norteamericano, europeu e as burguesias árabes agora emitem declarações contra
Assad?
Os motivos estão bem longe de um suposto e repentino sentimento humanitário para com o povo sírio, que está sendo
massacrado, ou de uma real defesa das
liberdades democráticas nesse país.
Essas potências são as mesmas que sempre sustentaram a dinastia Assad, que
por sua vez sempre foi fiel na entrega do
petróleo, na aplicação da receita do neoliberalismo do FMI e em garantir a segurança das fronteiras de Israel.
O que está por trás dessa retórica “humanitária” é a necessidade vital que o
imperialismo tem de derrotar o processo
revolucionário na Síria e em toda a reMARÇO DE 2012
O povo sírio se mobiliza massivamente contra a ditadura de Assad.
gião, que se agudiza com a permanência de Assad no poder. O ditador sírio,
atualmente, transformou-se em um elemento de desestabilização. O imperialismo, além de hipócrita, é pragmático.
Sabe distinguir muito bem o tático do
estratégico e, nesse sentido, manter ou
não um lacaio, para eles, é um assunto
meramente tático.
Por outro lado, está claro que agora
não está disposto a impulsionar nenhum tipo de intervenção armada
como fez na Líbia. Para o imperialismo
norte-americano, que enfrenta um momento eleitoral e que carrega derrotas
como no Iraque e no Afeganistão, qualquer ação militar seria muito difícil.
Para o imperialismo europeu, mergulhado em crises, não é menos complicado. Além disso, a saída armada seria
um grande risco em um país onde
existe um exército melhor preparado e
cuja localização geopolítica é explosiva.
A Síria possui fronteiras com o Líbano
e com o Mar Mediterrâneo a oeste; Israel a sudoeste; Jordânia ao sul; Iraque
a leste e Turquia ao norte. Uma intervenção armada poderia ter desenlaces
inesperados e poderia incendiar todo o
Oriente Médio. Obviamente que do
ponto de vista político e militar, Síria
não é Líbia.
Nesse momento, o imperialismo
aponta para o desgaste econômico e diplomático. Poderíamos dizer que
aposta numa saída como a que ocorreu
no Iêmen, transferindo o poder ao vicepresidente, concedendo algumas reformas democráticas, mas salvando o
essencial do regime. A intervenção armada não é o mais provável, uma medida que, se acreditassem ser oportuna,
já teria sido aplicada há algum tempo,
sem se importar com o veto da Rússia e
da China na ONU.
Pelos mesmos motivos, embora declarem que Assad deve sair, os imperialistas ficam furiosos quando o CNS e o ESL
lhes exigem armas e assessores militares
para combatê-lo. Hillary Clinton, diante
desse pedido indagou: “Se fizermos isso,
a quem estaríamos armando?”. O imperialismo não confia nos rebeldes.
O castro–chavismo continua
apoiando os ditadores assassinos
O concreto é que a Assad restam poucos aliados no cenário internacional. Podemos contar nos dedos das mãos, pois
são China, Irã, Cuba, Venezuela e Nicarágua.
Hugo Chávez emitiu um comunicado
onde “expressa seu mais firme apoio” ao
governo sírio e “reconhece o grande esforço realizado pelo presidente Bashar
Al–Assad para facilitar uma solução política para a complexa solução que o
país atravessa” (APF, 12/1/12)
Chávez acusa o povo sírio, assim
como as massas da região, de cometer
“atos terroristas”. Tudo com o conhecido
argumento de um “assédio imperialista”
e que um suposto líder anti-imperialista
estaria sendo desestabilizado “por forças estrangeiras”, segundo expressa seu
comunicado oficial.
A posição da ditadura castrista é igual
e lamentável, ainda que surpreendente.
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ATUALIDADE
No Granma digital pode-se ler elogios
ao suposto “processo de reformas” que
Assad estaria impulsionando com o referendo que comentamos. Diz que o
bombardeio oficial a Homs é contra
“grupos armados” financiados por estrangeiros que estariam atacando essa
cidade (www.granma.cu). Frente a esse
massacre, os representantes diplomáticos do governo cubano expressaram que
a saída deve ser “pacífica” e, nesse sentido, destacam as tentativas de Kofi
Anan como mediador (www.cubadebate.cu).
O apoio a esses ditadores, além de repugnante, reforça a posição do imperialismo, pois favorece sua política de
aparecerem como os “defensores da democracia e dos direitos humanos”. Tudo
isso sem falar da solidariedade de Castro
e Chávez com os tiranos do mundo
árabe, debilitando a solidariedade que a
justa luta do povo sírio, ou de outros
povos, necessitam com tanta urgência.
O problema dos problemas
Na Síria, como na Líbia e nos demais
países da região, a contradição central
está entre as heróicas lutas das massas
e suas direções burguesas e pró–imperialistas. No caso sírio, nesse último sentido, temos o Conselho Nacional Sírio
(CNS) que surgiu nos últimos meses. O
CNS apresenta-se como um governo alternativo e está composto pela Irmandade Muçulmana, por liberais, pelas
diversas facções curdas e, aparentemente, pelos Comitês de Coordenação
Locais.
O CNS apoia as ações armadas do
ESL, mas ao mesmo tempo clama por
uma intervenção imperialista exigindo
uma ação rápida por parte da “comunidade internacional” para proteger os
civis “mediante os meios necessários”
(France Presse).
De todos esses organismos, o espaço
mais progressista parece ser os Comitês
de Coordenação Locais, compostos por
moradores das comunidades, jovens de
distintas cidades e bairros, com a tarefa
de articular as manifestações em várias
zonas.
Nós da LIT-QI, sustentamos que o problema dos problemas, tanto na Síria
como no resto dos países da região que
estão sendo sacudidos pelo processo revolucionário é a questão da direção revolucionária. Nesse sentido, alertamos
o povo sírio e os lutadores e lutadoras
12
mais conscientes da resistência a confiar somente em suas próprias forças
revolucionárias e não alimentar nenhum tipo de expectativa, nem no imperialismo, nem nas correntes políticas
burguesas, sejam laicas ou islâmicas.
Aos trabalhadores e jovens que se organizam em comitês por zonas, que
pegam em armas e se articulam, dizemo-lhes que se trata de um processo
de vida ou de morte e que, no calor da
luta contra o regime de Assad, que seja
o povo e a classe trabalhadora síria que
se auto-organizem e se autodeterminem na hora de definir os destinos de
sua luta.
Dirigentes como os atuais, tanto do
CNS como do ESL, podem estar momentaneamente no mesmo campo militar que o povo pobre contra Assad,
mas por seu caráter de classe acabarão, cedo ou tarde, traindo as reais aspirações populares não somente
econômicas, mas também as que existem no terreno das liberdades democráticas.
A única saída para uma vitória estratégica é construir uma direção revolucionária e internacionalista que tome
as rédeas do processo.
Todo o apoio à luta do povo sírio
pela queda do regime assassino
de Assad!
É preciso unificar as mobilizações
em todo o país e intensificar a luta armada até a queda do regime. É o momento de aprofundar a divisão das
forças armadas do regime e que as
massas estendam sua organização na
forma de conselhos populares com
funcionamento democrático que, por
sua vez, organizem as milícias armadas, cujas ações devem estar submetidas ao interesse geral da luta.
Nesse sentido, a LIT-QI rechaça categoricamente, e chamamos para que se
rechace qualquer tipo de intervenção
imperialista na Síria. É o povo sírio, e
somente o povo sírio, quem deve decidir seus destinos. Não se pode esperar
nada de bom das potências imperialistas e nem de seus fantoches, que têm
como único objetivo o saque e a exploração de nossos povos.
Fazemos um chamado a todo movimento social e às organizações políticas que se reivindicam de esquerda ou
defensora dos direitos humanos a se
solidarizarem com a luta do povo sírio.
A partir de nossas organizações devemos exigir uma ruptura imediata de
todos os governos com o assassino
Assad. Isso inclui, é claro, os governos
liderados por Chávez e pelos Castros,
fieis defensores do regime. E ao governo
Dilma no Brasil que, ainda que de
forma mais discreta, também expressou
apoio político a Assad.
Não somente isso, devemos exigir de
todos os governos o imediato envio de
armamento bélico e assessores militares
para lutar no campo militar do ESL.
Para fazer essa exigência, nos dirigimos
especialmente ao povo líbio, egípcio, tunisiano e a todos os demais povos da região.
A luta é pela queda imediata de
Assad e pela instauração de um governo
das classes exploradas da Síria.
Somente um governo operário e popular pode convocar e garantir a realização de uma Assembleia Constituinte
Livre, democrática e soberana para conquistar todas as liberdades democráticas e libertar o país do imperialismo.
Somente um governo operário e popular poderá encarar um verdadeiro combate contra o estado nazi-sionista de
Israel, enclave político-militar do imperialismo na região, começando pela recuperação do território correspondente
às Colinas de Golã, roubado pelos sionistas desde 1967.
Esse governo, estabelecido pelas organizações e milícias populares, deve
processar e castigar todos os crimes de
Assad e sua camarilha ditatorial; confiscar suas fortunas e colocá-las sob o controle e a serviço do povo faminto;
anular todos os contratos petroleiros e
outros pactos realizados por Assad que
amarram o país ao imperialismo; nacionalizar imediatamente o petróleo e
todas as riquezas do país sob a administração do povo e a serviço de efetuar
um plano de emergência que atenda as
urgentes necessidades do povo trabalhador sírio, avançando para uma Federação de Repúblicas Socialistas Árabes.
CORREIO INTERNACIONAL
* 9-13 Siria (P)_Maquetación 1 20/03/12 20:16 Página 13
ATUALIDADE
O castro-chavismo não declarado do PTS-FT
O
PTS-FT parece não estar aprendendo
nada com os processos revolucionários no norte da África e no Oriente
Médio.
Na Síria começaram a esboçar a mesma
linha que tiveram na Líbia. Naquele caso,
o fato de que as massas se armaram e derrotaram violentamente um ditador sanguinário e pró–imperialista como Kadafi, a
ponto de linchá-lo diante dos olhos do
mundo, não representou nenhum triunfo
das massas para o PTS–FT. Ao contrário,
para eles, quem triunfou foi o imperialismo, que conseguiu instalar um “governo ainda mais pró-imperialista que o
de Kadafi”.
As heróicas ações das massas, para esses
estudiosos da teoria revolucionária, não
têm nada a ver com uma revolução, pois
entre o povo não se encontravam lutadores, mas muito pelo contrário, “tropas terrestres” centralizadas pela OTAN e
dirigentes burgueses do Conselho Nacional de Transição (CNT).
Como é possível constatar, essa posição
chega por outro caminho e adornada com
terminologia trotskista à mesma conclusão do castro-chavismo:
Na Líbia não houve revolução, mas contrarrevolução (triunfou o imperialismo);
A luta das massas líbias é o que existe de
mais reacionário (seriam mercenários ou
tropas terrestres a mando do imperialismo);
Kadafi, como mínimo era o mal menor,
pois em seu lugar o imperialismo instalou
um governo ainda mais pró–imperialista.
No entanto, apesar de ter a mesma caracterização, o PTS–FT não se anima em
dizer que os marxistas revolucionários deveriam estar, no mínimo, no mesmo
campo militar de Kadafi e, agora, ao lado
do CNT, que pretende desarmar as “tropas terrestres” da OTAN.
A questão é que para o PTS–FT, as ações
das massas valem pouco ou nada. Para
eles, o que vemos no norte da África e no
Oriente Médio não são revoluções, mas
apenas um “ciclo de rebeliões”1. Na Síria
não existe uma guerra civil, mas somente
uma “escalada de protestos e enfrentamentos”.
Quando definem a situação da luta de
classes na Síria, em nenhum momento
essa organização entra na impressionante
luta que as massas travam. O único que
conta para eles são as linhas políticas do
MARÇO DE 2012
imperialismo: “Na Síria se entrelaçam a
estratégia imperialista para derrotar a rebelião árabe e a ofensiva para reafirmar
seu domínio no Oriente Médio”. E as
massas? Por acaso não estão lutando,
ainda que de forma inconsciente, contra
essa estratégia imperialista?
Embora não expressam apoio explícito
ao regime de Assad e dizem que as massas não devem ter nenhum interesse em
preservar o seu regime, se apressam em
dizer que Assad “não é um agente direto
do imperialismo como foi o egípcio Mubarak, nem um ‘convertido’ às alianças
com o Ocidente como Kadafi. Assad,
como nos informa o PTS-FT, nao é um
“agente direto” do imperialismo. É o
mesmo que sustenta o castro-chavismo.
O que é então? Um líder anti-imperialista
ou um nacionalista burguês que comanda um país independente?
Fazendo um esforço camuflado para atenuar ou embelezar o regime de Assad,
como fazem os castro-chavistas, continuam dizendo que com esse ditador no
poder “subsistem atritos importantes com
o Ocidente como sua aliança com Irã, o
apoio ao Hezbollah e a exigência a Israel
para que se devolvam as Colinas de
Golã”. Dizem, ainda, que se ocorresse
uma intervenção militar do imperialismo
o objetivo seria instaurar um “regime
mais funcional” aos seus interesses.
Novamente aparece, desta vez para o
caso sírio, a idéia do mal menor a partir
da possibilidade de um regime “mais
funcional” ou um governo “mais pró–imperialista”, como foi o caso de Kadafi.
Por outro lado, em seu afã em depreciar
as ações das massas, o PTS-FT transfere
o caráter contrarrevolucionário do CNS
para as ações das massas. Dizem: “A
maior contradição política do levante é
que ao não desenvolver uma dinâmica re-
volucionária independente, o movimento
fica subordinado ao CNS e ao seu programa
pró-imperialista como um fator de pressão
pela “mudança de regime” subordinado aos
EUA e à UE (...)”.
No caso da Síria, nem esperaram uma intervenção militar para anexar a luta das
massas ao campo da contrarrevolução.
Essa foi a mesma lógica de raciocínio com
a qual acusaram as massas líbias de serem
“tropas terrestres” subordinadas ao imperialismo e ao CNT.
O PTS–FT declara que a estratégia deve ser
“impor por via revolucionária a derrubada
de Assad e instaurar um poder operário e
popular”. Concordamos plenamente nesse
ponto. O problema é que confundem desejo com realidade, como se acostumaram
a fazer esses idealistas que se dizem dominadores do método de análise marxista.
Um marxista revolucionário parte dos fatos
da realidade, não de seus desejos. Por isso,
em lugar de negar todo o processo pela inexistência de uma vanguarda da classe operária e uma direção revolucionária, nós
marxistas devemos ter uma política, no
campo da revolução, para superar essas
graves limitações; uma política que parta
das contradições do processo, identificando
e tentando desenvolver ao máximo os elementos progressivos do processo revolucionário.
Mas essa tarefa se torna impossível para
uma corrente que não sabe identificar de
conjunto onde está a revolução e onde está
a contrarrevolução em todo o processo político que sacode o Norte da África e o
Oriente Médio.
1
Molina, Eduardo: El imperialismo quiere imponer un “nuevo régimen” favorable a sus intereses. Publicado em 3/2 no site da Fração
Trotskista. Todas as citações são desse artigo.
13
* 14-18 Pinheirinho (P)_Maquetación 1 21/03/12 10:41 Página 14
ATUALIDADE
Brasil
O Pinheirinho:
a luta
por moradia
e a barbárie
do capital
BERNARDO CERDEIRA
A
s brutais imagens correram o
mundo: mulheres carregando
seus filhos, fugindo de tropas policiais que atiravam balas de borracha e
bombas de gás, tendo ao fundo pobres
casas de alvenaria ardendo em chamas.
Moradores expulsos com violência, feridos e presos, alguns desaparecidos, famílias amontoadas em ginásios e
escolas, “abrigos” que se pareciam mais
a campos de concentração sem alimentação adequada e condições sanitárias
dignas. Em poucos dias máquinas derrubaram 1.600 casas que abrigavam cerca
de 9.000 pessoas e as transformam em
destroços. Os poucos pertences dessas
famílias foram destruídos sem contemplação.
Esta é o retrato da desocupação do
bairro Pinheirinho, na cidade de São
José dos Campos, a cerca de 100 km de
São Paulo, Brasil, por uma força de dois
mil soldados da Polícia Militar estadual.
Um verdadeiro cenário de guerra.
A brutal repressão provocou mobilizações de protesto em São José dos Campos e em diversas cidades do Brasil e do
mundo. A agressão do governo do Es14
A violenta desocupação do Pinheirinho causou um grande impacto no Brasil
e em vários países. É preciso entender o que está por trás deste episódio e qual
é o caráter da luta por moradia no Brasil e em todo mundo.
tado de São Paulo, dirigido pelo PSDB1,
a famílias pobres que apenas lutavam
para ter um lugar digno onde morar mereceu o repúdio de organizações de Direitos Humanos e do movimento social
no Brasil e em todo o mundo; motivou
Audiências Públicas no Senado brasileiro e na Assembleia Legislativa de São
Paulo e levou juristas democráticos a
apresentarem o caso à Corte Interamericana de Direitos Humanos e ao Tribunal
Penal Internacional.
Não há dúvida: trata-se de mais um
capítulo da guerra social da burguesia
brasileira contra os trabalhadores e os
pobres. A campanha em defesa das famílias desalojadas, a solidariedade efetiva a elas e o apoio à sua luta por
moradia continua, mesmo depois da desocupação.
Mas é preciso também entender o que
está por trás de todo esse episódio. Qual
é o contexto internacional e nacional? A
repressão ao Pinheirinho é parte de um
“giro” fascista do governo do PSDB em
São Paulo? Que papel cumpriu o governo
Dilma neste episódio? Qual o caráter da
luta por moradia no Brasil e no mundo?
Governo, Juízes, Polícia Militar
e um megaespeculador:
uma conspiração mafiosa
A barbárie do Pinheirinho mostra
bem o verdadeiro caráter da democracia
burguesa em que vivemos: uma ditadura do capital que não hesita em usar
todo tipo de mentiras, atropelos da própria lei burguesa e violência para conseguir seus desígnios, em especial
quando estão envolvidos enormes lucros.
O Pinheirinho era um verdadeiro
bairro, situado em um terreno de um
milhão e trezentos mil metros quadrados, ocupado desde 2004 por pelas famílias que se organizavam no MUST
(Movimento Urbano dos Sem-Teto) e na
Associação dos Moradores.
A juíza Márcia Loureiro, da 6° Vara
Cível de São José dos Campos, determinou a “reintegração de posse” do terreno à empresa Selecta, que seria a
dona do terreno, e a expulsão dos moradores. Como se trata de uma empresa
em falência, a reintegração seria feita
em nome de sua massa falida para pagamento de dívidas.
CORREIO INTERNACIONAL
* 14-18 Pinheirinho (P)_Maquetación 1 21/03/12 10:41 Página 15
ATUALIDADE
Depois da desocupação, a juíza “confessou” em entrevista à imprensa que a
“operação” estava sendo preparada há
quatro meses com o Governo Alckmin,
a Polícia Militar, a Prefeitura de São José
dos Campos e o Tribunal de Justiça do
Estado de São Paulo. Ou seja, havia um
conluio de forças com a firme decisão de
expulsar os moradores a qualquer custo.
Para isso, não hesitaram em utilizar
primeiro todo tipo de subterfúgios jurídicos. A juíza resgatou uma liminar que
já havia sido indeferida pela Justiça e
deu a reintegração de posse. O Tribunal
de Justiça de São Paulo ratificou sua decisão e ignorou deliberadamente a
ordem de um juiz federal que suspendia
a ação de desocupação quando esta já
estava em curso. Finalmente, o governo
Alckmin, que comanda a Polícia Militar
de São Paulo executou a ação armada.
Não é difícil concluir que tamanha
operação política, judicial e militar por
parte do Estado, preparada durante tantos meses, não tem origem na determinação de uma juíza de uma cidade do
interior. A explicação é simples: segundo
os próprios advogados dos proprietários
o terreno poderia valer até R$ 200 milhões (cerca de 70 milhões de dólares).
Utilizado para um empreendimento imobiliário, poderia valer três ou quatro
vezes mais.
MARÇO DE 2012
É fácil ver, então, quem ganha com a
desocupação. Em primeiro lugar, o Sr.
Naji Nahas, o dono do terreno e um megaespeculador criminoso que chegou a
quebrar a Bolsa do Rio de Janeiro com
operações a descoberto. Mas não é preciso muito esforço para entender que a
Prefeitura, o Governo do Estado e logicamente o PSDB partido que dirige os
dois Executivos, tem interesses diretos e
tudo a lucrar com este negócio.
A especulação imobiliária
e a Copa do Mundo de 2014
A especulação imobiliária em São
José dos Campos não é um fato isolado.
Acontece em todo o país. A crise econômica mundial provocou uma grande disponibilidade de capitais nos países
imperialistas que estão sendo direcionados para investimentos nos países ditos
“emergentes”. No Brasil, em especial,
dois eventos foram pensados para receber esses capitais: a Copa do Mundo de
2014 e, em menor medida, as Olimpíadas de 2016 no Rio de Janeiro,
Segundo dados do relatório Brasil Sustentável – Impactos Socioeconômicos da
Copa do Mundo de 20142, o Brasil receberá cerca de três milhões de visitantes
adicionais e o evento produzirá uma receita extra de cerca de R$ 6 bilhões às
empresas brasileiras. Ao mesmo tempo,
receberá R$ 14,5 bilhões de investimentos nas 12 cidades-sede do Mundial, inclusive uma imensa quantia do Estado
para a construção de estádios, reforma
de aeroportos, melhoria do transporte
urbano e obras de infraestrutura em
geral. Tudo isso deve impactar os PIB’s
municipais em R$ 7,18 bilhões.
No total, estima-se que o impacto do
Mundial na economia brasileira gire em
torno de R$ 143 bilhões. Evidentemente,
todas as grandes empresas nacionais e
multinacionais com interesse no Brasil
estão se preparando para auferir grandes
lucros. E a inversão de capitais em torno
destes eventos é um dos motivos do
enorme aumento dos preços dos imóveis
urbanos. Na cidade de São Paulo, a valorização dos imóveis nos últimos três
anos foi de 90%, segundo o índice de
preços FIPE ZAP.
A situação da moradia no Brasil
A especulação imobiliária agrava o
problema estrutural da moradia no Brasil, que é um dos mais agudos para os
setores mais pobres da classe operária e
dos trabalhadores rurais. Segundo dados
do IBGE3 do censo de 2010, o Brasil tinha
naquele ano 11,4 milhões de pessoas
Mulheres do Pinheirinho com seus filhos
tentam afastar-se da "zona de guerra"
criada pela PM de São Paulo.
15
* 14-18 Pinheirinho (P)_Maquetación 1 21/03/12 10:41 Página 16
ATUALIDADE
(6% da população do país) vivendo em
favelas, palafitas ou outros assentamentos irregulares, num total de 6.329 assentamentos em 323 cidades. Isso sem falar
dos que não possuem moradia alguma,
vivendo nas ruas dos grandes centros urbanos e que não são “contabilizados”
pelo censo…
O censo mostra que 88% das moradias
em favelas estavam concentradas em regiões com mais de 1 milhão de habitantes. Na Região Metropolitana de São
Paulo, maior aglomeração urbana do
país, 2,16 milhões (18, 9%) de moradores viviam em favelas. Em Belém, mais
da metade da população (53,9%) morava em assentamentos irregulares. No
Rio de Janeiro, era 22% e em São Paulo
11% da população.
No entanto, levando em conta todas as
demais habitações precárias (cortiços em
velhos edifícios ou casas, várias famílias
que se amontoam na mesma casa e habitações rurais extremamente precárias)
calcula-se que o déficit habitacional do
país (segundo o PNAD de 2008) chegue
a 5,5 milhões de habitações, ou seja,
mais de 30 milhões de pessoas não tem
moradia digna.
É importante observar que não estamos falando de casas típicas da classe
operária (simples, mas em bairros com
um mínimo de estrutura), que constituem a ampla maioria das moradias do
país. Aqui, estamos nos referindo às que
não reúnem condições mínimas. Se falarmos do déficit habitacional em geral,
um levantamento do próprio governo
feito em 2005 situava esta cifra em oito
milhões de moradias.
16
Depois da desocupação, a prefeitura de São
José dos Campos demoliu as mil e seiscentas
casas que os habitantes do Pinheirinho
tinham construído.
Concentração de capital,
especulação imobiliária
e o problema da moradia
no sistema capitalista
O grave problema da moradia no Brasil
não é um privilégio deste país nem da
nossa época. É um dos problemas estruturais do capitalismo decorrente da expropriação dos camponeses de suas
terras, de sua expulsão para as cidades
onde passam a compor um exército de
reserva industrial e do sistema geral da
exploração da força de trabalho dos operários.
Friedrich Engels, em seu trabalho
“Contribuição ao problema da Habitação”,4 caracterizava muito bem o problema da moradia como inerente ao
sistema capitalista e assinalava, 140 anos
atrás, suas principais tendências:
“Aquilo que hoje se entende por falta
de habitação é o agravamento particular
que as más condições de habitação dos
operários sofreram devido à repentina
afluência da população às grandes cidades; é o aumento colossal dos aluguéis,
uma concentração ainda maior dos inquilinos em cada casa e, para alguns, a
impossibilidade de em geral encontrar
um alojamento. E esta falta de habitação
só dá tanto que falar porque não se limita à classe operária, mas também atingiu a pequena burguesia.”
Engels já apontava, naquela época, a
tendência à especulação imobiliária nos
terrenos mais valorizados das áreas nobres centrais e à expulsão dos trabalhadores e pobres para as regiões de
periferia:
“A expansão das grandes cidades modernas dá um valor artificial, extremamente aumentado, ao solo em certas
áreas, particularmente nas de localização central; os edifícios nelas construídos, em vez de aumentarem esse valor,
fazem-no antes descer, pois já não correspondem às condições alteradas; são demolidos e substituídos por outros. Isto
acontece antes de tudo com habitações
operárias localizadas no centro, cujos
aluguéis nunca ou então só com extrema
lentidão ultrapassam certo máximo,
mesmo que as casas estejam superpovoadas em extremo. Elas são demolidas e
em seu lugar constroem-se lojas, armazéns, edifícios públicos.”
Engels considerava Haussman, o prefeito de Paris que comandou a reforma
da capital francesa durante o governo de
Luís Bonaparte no século XIX, derrubando bairros operários inteiros e
abrindo largas avenidas e bulevares, a
máxima expressão da política burguesa
de expulsão dos trabalhadores das áreas
mais valorizadas. Segundo suas palavras:
“Por intermédio de Haussmann, o bonapartismo explorou da forma mais colossal esta tendência em Paris, para
burla e enriquecimento privado; mas o
espírito de Haussmann passeou também
por Londres, Manchester, Liverpool, e em
Berlim e Viena ele parece sentir-se igualmente em casa. O resultado é que os operários vão sendo empurrados do centro
das cidades para os arredores, que as habitações operárias e as habitações pequenas em geral se vão tornando raras e
caras e muitas vezes é mesmo impossível
encontrá-las, pois nestas condições a indústria da construção, à qual as habitações mais caras oferecem um campo de
especulação muito melhor, só excepcionalmente construirá habitações operárias.”
A política de moradia do PT
e do governo Dilma
O PT, partido da presidente Dilma
Roussef, denunciou a ação do governo
Alckmin no Pinheirinho. Dilma chegou
a caracterizá-la (é verdade que em uma
reunião fechada no Fórum Social Mundial) como uma “barbárie”. Mas, o governo nacional nunca se propôs
seriamente a expropriar o terreno nem a
CORREIO INTERNACIONAL
* 14-18 Pinheirinho (P)_Maquetación 1 21/03/12 10:41 Página 17
ATUALIDADE
impedir a desocupação, sob a desculpa
de que o “pacto federativo” o impedia de
atuar no Estado de São Paulo, algo que
é evidentemente falso.
O verdadeiro motivo da omissão criminosa do governo Dilma é a sua política
de habitação. O governo lançou um
plano nacional de construção de dois milhões de moradias populares chamado
Minha Casa, Minha Vida que prevê a
construção de casas de até R$ 170 mil
que seriam compradas pelos trabalhadores, com financiamento estatal em até 30
anos.
Quais são os problemas deste plano?
Em primeiro lugar, o óbvio: o governo
evita ao máximo regularizar terrenos
ocupados, como por exemplo, dar títulos
de propriedade aos que tem imóveis em
favelas e urbanizar estes bairros. Ao contrário: obriga os trabalhadores a se endividarem por 30 anos para comprar suas
casas.
Em segundo lugar, o objetivo do plano
é favorecer um setor da burguesia da
construção civil, que recebe capitais do
estado com uma taxa de juros muito
baixa para construir casas populares. O
principal banco público, a Caixa Econômica Federal, paga as empresas pela
construção das casas e os trabalhadores
contraem a dívida com o banco. As construtoras têm, assim, uma excelente margem de lucro assegurada pelo
financiamento estatal a juros subsidiados.
Em terceiro lugar, o governo financia a
construção utilizando recursos de um
fundo constituído com uma parte do salário dos trabalhadores. Este fundo é o
chamado FGTS (Fundo de Garantia por
Tempo de Serviço), que é administrado
pela própria Caixa e reúne um enorme
capital de 50 bilhões de reais (aproximadamente, 30 bilhões de dólares).
O FGTS foi criado na época da ditadura militar, e é formado pela contribuição obrigatória de 8% do salário de
todos os trabalhadores contratados por
empresas privadas e estatais, exceto os
funcionários da Administração Pública.
Formalmente, a contribuição é feita pelas
empresas, mas, evidentemente, estas a
consideram como parte do capital destinado ao pagamento dos salários.
As contribuições dos trabalhadores são
depositadas em uma conta individual em
seu nome e só podem ser sacadas em
caso de demissão sem justa causa, doenças graves ou para utilização na compra
de casa para moradia.
MARÇO DE 2012
O problema é que o FGTS remunera as
contas dos trabalhadores com juros
anuais de 3%, ou seja, juros negativos
já que a inflação no Brasil em 2011 foi de
6,5%. A taxa Selic (taxa de juros do
Banco Central utilizada pelo governo
para pagar pelos títulos que emite) está
em 11, 25%. Esta diferença é utilizada
para subsidiar a indústria da construção
e financiar o próprio governo.
A conclusão óbvia é que a política do
governo Dilma e do PT não tem como
objetivo resolver o problema da falta ou
da precariedade de moradia, mas sim
transformar a construção de casas populares em um grande negócio capitalista
que gere uma massa de mais-valia e
enormes lucros para setores da burguesia brasileira, principalmente o da indústria da construção civil.
Essa política não só não chega perto
de resolver o problema da habitação
(constroem-se dois milhões de casas
para um déficit habitacional de oito milhões), como obedece às imperiosas determinações do capital, principalmente
nas grandes concentrações urbanas,
onde os trabalhadores são removidos dos
terrenos mais valorizados e deslocados
para conjuntos habitacionais na periferia, às vezes a 30 ou 40 km do centro.
Moradia: um direito democrático
Depois de mais de dois séculos, e pelo
menos em teoria, o sistema capitalista e
a democracia burguesa reconhecem o direito à moradia como um dos direitos sociais fundamentais do ser humano,
definido em todas as cartas da ONU
desde a Declaração dos Direitos do
Homem de 1948.
No entanto, os governos e Estados
burgueses, inclusive os de regime democrático, a forma mais “moderna” da ditadura do capital, pisoteiam e violentam
todos os dias não só o direito à moradia,
mas todos estes direitos democráticos
básicos.
No Brasil, não é diferente. A Constituição estabelece claramente em seu artigo 6º: “São direitos sociais a educação,
a saúde, a alimentação, o trabalho, a
moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade
e à infância, a assistência aos desamparados...”
Mas não só isso, a mesma Constituição brasileira em seu Capítulo I, ao definir os “Direitos e deveres Individuais e
coletivos”, afirma que “é garantido o direito de propriedade”, também deixa
claro que “a propriedade atenderá a sua
função social;”.
No entanto, como podem comprovar
os moradores do Pinheirinho e milhares
de trabalhadores de todo o Brasil, o direito do capital amparado na violência
e no terror está acima de tudo. Não há
direitos individuais ou coletivos para o
povo que valham alguma coisa diante
da força do capital. Neste contexto,
diante do sofrimento de milhares de famílias desalojadas, falar em “direito à
moradia” e “função social da propriedade” soa como um escárnio.
Solidariedade mundial com o Pinheirinho.
Na foto, ato na frente da embaixada brasileira
em Berlim, cuja faixa diz, em alemão:
“Somos todos Pinheirinho”.
17
* 14-18 Pinheirinho (P)_Maquetación 1 21/03/12 10:41 Página 18
ATUALIDADE
A posição e a atuação do PSTU
É amplamente conhecido que o PSTU
(Partido Socialista dos Trabalhadores
Unificado) esteve desde a ocupação, há
oito anos, ao lado dos moradores do Pinheirinho. Dirigentes do Sindicato dos
Metalúrgicos de São José dos Campos e
militantes do PSTU, como o Marrom,
ajudaram a organizar e liderar o movimento. Um dos advogados do Pinheirinho, Antonio Donizete Ferreira, o
Toninho, é ao mesmo tempo presidente
do PSTU da cidade.
Essa presença motivou ataques e manifestações de ódio da burguesia ao
PSTU, inclusive daquela que hipocritamente criticava a violência do governo e
da PM, mas a justificava. Um dos casos
mais grotescos foi o do jornal Folha de
São Paulo.
Em editorial publicado no dia 26 de janeiro intitulado ‘Operação Pinheirinho’,
abusando do cinismo, o jornal culpa o
PSTU pela violência cometida contra os
moradores. Segundo o jornal “à frente da
ocupação - uma favela com cerca de
6.000 pessoas – encontravam-se militantes esquerdistas vinculados a organizações sindicais e ao Partido Socialista dos
Trabalhadores Unificado, o PSTU”. E
conclui: “não há dúvidas de que esses líderes desejavam o confronto. Não interessam ao PSTU soluções reais para as
carências habitacionais dos pobres”.
O colunista Elio Gaspari enveredou
pelo mesmo caminho. No artigo “Pinheirinho a estratégia da tensão”, denuncia
a suposta “intransigência” do movimento dos moradores do Pinheirinho em
negociar a compra do terreno com os
proprietários.
Um editorial do jornal O Estado de S.
Paulo, também acusa o PSTU de forma
semelhante. Segundo o jornal, o PSTU
“que prega a substituição do Estado capitalista pelo “ marxismo revolucionário”
(sic) apostaria no confronto com a polícia como forma de obter vantagem política.
Esses ataques obedecem a duas lógicas perversas. A primeira afirma que a
violência é provocada pelos que se
opõem ou, pior ainda, pelos que resistem aos desmandos da burguesia, às arbitrariedades da sua Justiça corrupta, à
violência das suas forças repressivas. Os
pobres, trabalhadores e oprimidos são os
culpados pela violência porque lutam
para não serem desalojados, para defenderem suas famílias, para não perderem
todos os seus pertences. Segundo essa
lógica burguesa a única forma de evitar
a fúria e o terror da repressão é submeter-se e aceitar em silêncio todo tipo de
desmando.
A segunda lógica perversa é a que
aponta os que estão incondicionalmente
ao lado dos trabalhadores e oprimidos,
aqueles que os defendem até o fim,
como intransigentes e fomentadores da
resistência e, portanto, da violência.
Esta lógica é que leva os mais importantes órgãos da imprensa escrita brasileira a atacarem o PSTU. Porque nosso
partido, com muito orgulho, esteve e
está intransigentemente, em palavras e
ações, ao lado dos moradores do Pinheirinho, desenvolvendo hoje uma campanha de solidariedade nacional e
internacional.
Moradores do Pinheirinho tentam salvar
alguns de seus pertences.
Do outro lado, os órgãos da grande imprensa, de forma vergonhosa para jornalistas como Gaspari que, em algum
momento, já se consideraram democratas, posicionaram-se claramente ao lado
de Naji Nahas, da especulação imobiliária, dos juízes suspeitos, da PM e do governador Alckmin. A trincheira entre as
classes não poderia ser mais nítida.
A posição do PSTU é muito clara:
como marxistas revolucionários (como
diz o Estadão) não temos nenhuma ilusão de que seja possível resolver o problema da moradia dos trabalhadores e
pobres dentro do sistema capitalista. Engels mais uma vez dá uma definição precisa para o programa dos socialistas:
“Para pôr fim a esta falta de habitação,
há apenas um meio: eliminar a exploração e opressão da classe trabalhadora
pela classe dominante.”.
Mas, esta visão estratégica não pode
diluir as necessidades imediatas e concretas. O PSTU apóia as ocupações e os
movimentos de trabalhadores e pobres
que lutam por moradia. Defendemos a
expropriação de terrenos e imóveis urbanos vazios, a legalização de terrenos
ocupados e a urbanização de favelas e
assentamentos irregulares. Este programa tem uma explicação simples: a
classe operária e os setores populares
estão obrigados a batalhar todos os dias
por sua sobrevivência física, lutando por
salário, emprego, saúde, educação e também por um lugar onde morar. E a luta
cotidiana pela sobrevivência é, por sua
vez, a melhor escola sobre a exploração
capitalista e a necessidade de pôr fim ao
seu sistema, ou seja, a melhor escola
para o socialismo.
1
Partido da Social Democracia Brasileira,
que, apesar do nome, é um partido de direita, responsável por aplicar uma política
neoliberal e de privatizações durante os oito
anos de governo do presidente Fernando
Henrique Cardoso, um dos seus principais líderes. Governa o Estado de São Paulo há 17
anos.
2
Produzido pela agência Ernst & Young Terços em parceria com a Fundação Getúlio Vargas, citado em artigo de Marcos Nicolas,
Diretor Executivo da Ernst & Young – Estado
de São Paulo,
3
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, órgão oficial do Estado brasileiro.
4
Site do MIA (Marxists Internet Archive)
http://marxists.org/portugues/marx/1873/h
abita/index.htm
18
CORREIO INTERNACIONAL
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ATUALIDADE
Portugal
Por que rompemos
com o Bloco de Esqueda?
CRISTINA PORTELLA
O
Bloco de Esquerda (BE) surgiu
em Portugal em 1999, a partir da
convergência de três partidos de
esquerda, a UDP (ex-maoísta), o PSR
(trotskista, ligado ao Secretariado
Unificado da IV Internacional) e a
Política XXI (dissidência do Partido
Comunista Português).
O Ruptura/FER ingressou no BE nesse
mesmo ano, com a caracterização,
posteriormente confirmada pelo seu
sucesso militante e eleitoral, de que a
nova organização ocuparia um espaço à
esquerda do PCP, a sofrer o desgaste
provocado pela derrubada dos regimes
do Leste Europeu e da ex-URSS e por
uma política desajustada à nova
conjuntura aberta por esses eventos.
Registe-se que o BE surgiu num
momento aparentemente desfavorável à
criação de um novo partido de esquerda.
Portugal vivia, então, um período de
crescimento económico, com uma das
menores taxas de desemprego da Europa
e a euforia dos recursos provenientes dos
Fundos Europeus. Como assinala o seu
manifesto fundador, “Começar de novo”,
“1998 foi o ano em que Portugal se
anestesiou com a ilusão de ter chegado
finalmente ao ‘pelotão da frente’”. Mas a
desilusão não tardaria muito, com a crise
a empurrar o PIB português de 5%
positivos em 1998 para -0.9% em 2003.
A evolução do BE acompanhou, pela
positiva, essa performance: em dados
eleitorais, passou de 2 deputados (2,44%
dos votos) em 1999 para 8 (6,35%) em
2005.
O fato é que o seu projeto político,
expresso no “Começar de novo”, batia
certo com o momento das grandes
manifestações anti-globalização, dos
MARÇO DE 2012
Fóruns Sociais, do discurso da cidadania
e da defesa das chamadas “causas
fraturantes”, como a despenalização do
aborto, os direitos LGBT e a legalização
das drogas leves. Em seu manifesto
fundador havia a denúncia da
globalização e do “capitalismo de
casino”, com a financeirização da
economia, a concentração de capitais e
deslocalização de empresas, a gerar
desemprego e precariedade. Mas no seu
discurso, em sintonia com os
preconceitos anti-marxistas daquele
período, não havia espaço para o
conceito de classe social, nem para uma
crítica mais radical ao capitalismo e ao
projeto europeu. Esta última limitação
programática, apoiada no chamado
“europeísmo de esquerda”, transformouse numa das primeira polémicas públicas
com a corrente Ruptura/FER.
Do “europeísmo de esquerda”
à Refundação Comunista
Nos debates internos que antecederam
a III Convenção do BE, realizada em
Maio de 2003, o Ruptura/FER criticava o
texto “Para uma refundação democrática
da União Europeia”, aprovado pela Mesa
Nacional. “Mais uma vez, o documento
parece esquecer que a Europa, apesar de
subsidiária dos EUA, também é uma
potência imperialista, que explora os
trabalhadores e as nações
da Ásia, África e América Latina.
Portanto – e aí está mais um aspeto
fundamental – não basta exigir o
aprofundamento da democracia na União
Europeia, ou a sua refundação
democrática. Mas a construção de uma
União Europeia Socialista” (jornal
Ruptura nº 57/maio de 2003).
Esta polémica sobre a Europa
aprofundar-se-ia nos anos seguintes, com
a discussão sobre a adesão do BE ao
Partido da Esquerda Europeia (PEE). Na
IV Convenção do BE, em 2005, os
delegados do Ruptura/FER propuseram
que o BE não ingressasse no PEE como
membro pleno, como propunha a sua
direção, pelo facto deste partido ser
presidido pela Refundação Comunista, de
Itália. Naquele ano, a Refundação
preparava-se para integrar uma coligação
eleitoral chefiada por Romano Prodi, exprimeiro-ministro italiano e ex-presidente
da Comissão Europeia. Desta forma, o
projeto da Refundação era integrar um
governo burguês. Um governo, saber-seia depois, que manteria as tropas italianas
no Afeganistão e no Líbano e a base da
NATO em Vicenza, sempre com a
aprovação dos deputados e senadores da
Refundação Comunista. Mesmo assim, a
direção do BE nunca questionou a sua
permanência no PEE.
Mas as divergências do Ruptura/FER
com a direção do BE não se limitaram,
nesses primeiros anos de construção
partidária, à questão europeia. Já em
2001, essa corrente defendeu a
apresentação de um candidato próprio às
eleições presidenciais daquele ano contra
setores que propunham o apoio do BE à
reeleição de Jorge Sampaio, do Partido
Socialista (PS). Outra das batalhas do
Ruptura/FER no interior do BE era a
defesa de um partido centrado na classe
trabalhadora e na sua luta, construindo
alternativas sindicais e de base à
hegemonia da CGTP/PCP. Para isso, era
preciso, internamente, organizar os
militantes em núcleos de empresa, por
setor profissional, nas escolas e
19
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ATUALIDADE
universidades e entre a juventude, com
destaque aos trabalhadores precários.
Iniciativas que apontavam nessa direção,
como a Marcha pelo Emprego, em 2006,
e os encontros do trabalho e dos jovens,
contaram com a forte participação dos
militantes
bloquistas
afetos
ao
Ruptura/FER. Isso antes desses encontros
serem esvaziados pela direção do BE,
com o impedimento, no caso dos
encontros do trabalho, de votarem
orientações políticas para o setor ou
elegerem uma coordenadora para o
trabalho sindical, tarefas que passaram a
ser exclusivas da direção nacional.
2007, o ano da viragem
Esse ano começou
de forma
promissora para a esquerda e os
trabalhadores, em especial as mulheres,
com a histórica vitória do “Sim” no
referendo sobre a legalização do aborto
em Portugal. Mas a condução da
campanha pelo “Sim” também foi um
motivo de divergências no seio do BE. Os
aderentes do Ruptura/FER e muitos
independentes apontavam para a
necessidade de o BE demarcar-se do PS
durante a campanha, pois caracterizava,
e bem, que esse partido, há dois anos no
poder e a aplicar uma política de ataques
ferozes aos serviços públicos e aos
trabalhadores, aproveitar-se-ia dessa
iniciativa para “branquear” o seu
governo. Foi isso que aconteceu, e o BE
acabou por ser cúmplice dessa política,
não só por não se ter demarcado do PS
em suas reivindicações (reclamando, por
exemplo, que a interrupção da gravidez
fosse assegurada pelo Serviço Nacional
de Saúde), como também por ter
integrado movimentos de cidadãos, junto
com dirigentes do PS, sem qualquer cariz
de classe.
Essa aproximação ao PS através da
campanha pelo “Sim” é assinalada pela
Moção C, “Todos na luta, em todas as
lutas”, apresentada na V Convenção do
BE, de junho de 2007, por independentes
e integrantes do Ruptura/FER. Nela era
central a denúncia do governo do
primeiro-ministro
socialista
José
Sócrates:“Podemos hoje dizer com
clareza que o PS governa à direita e para
a direita e o capital, levando a cabo
muitas das políticas neoliberais que os
anteriores governos de Durão Barroso e
Santana Lopes não conseguiram
concretizar”. E era também clara a
proposta sobre a relação que o BE deveria
ter com esse governo: “O Bloco fará
20
oposição frontal ao governo PS, enquanto
responsável pelos mais recentes ataques
aos trabalhadores e à qualidade de vida
da população”. Além de combater o
governo PS, o BE não deveria, de acordo
com a Moção C, participar ou dar apoio
parlamentar a governos “com as mesmas
políticas da direita: privatizações,
destruição do setor público, ataques a
direitos e conquistas dos trabalhadores e
apoio ou participação militar em guerras
e ocupações de Estados soberanos”.
Por outro lado, a responsabilidade pela
manutenção do governo PS, largamente
contestado pelas lutas sociais, como a
manif que reuniu 100 mil pessoas em
outubro de 2006, e pela derrota em duas
eleições consecutivas, autárquicas e
presidenciais, não poderia ser atribuída
exclusivamente à correlação de forças: “É
preciso dizer que a principal força do
governo reside na política da CGTP, que
atrelada ao PCP vai contendo as
mobilizações e adiando a união (e
radicalização)
do
conjunto
dos
trabalhadores no sentido de derrotar as
políticas do governo”. No âmbito da
política mais geral, a ausência de uma
alternativa à esquerda ao governo
Sócrates era, igualmente, um elemento
importante para a sua
relativa
estabilidade. Nesse sentido, o centro da
Moção C era o apelo à construção da
unidade de ação contra o governo PS para
combater as suas medidas contra o povo
e apresentar uma alternativa de governo
que travasse a sua recondução: “O Bloco
de Esquerda faz um apelo público ao PCP,
à CGTP, a todos os socialistas que se
opõem às políticas neoliberais do governo
e a todos os ativistas independentes para
a criação de uma plataforma comum de
ação em torno de algumas reivindicações
centrais”.
Em coerência com a política proposta
de unidade da esquerda, a Moção C fazia
uma leitura crítica da orientação aprovada
pelo BE para as eleições presidenciais do
ano anterior. Nessas eleições, o BE
apresentou a candidatura do seu
coordenador, Francisco Louçã, mas foi o
candidato Manuel Alegre, que apesar de
pertencer ao PS não era o candidato desse
partido, que galvanizou a contestação ao
governo Sócrates e obteve mais de 1
milhão de votos (20%) e a segunda
posição, atrás apenas do vencedor, o
candidato da direita, Cavaco Silva. O
candidato do PS, Mário Soares, registou
uma tremenda derrota, cativando apenas
14% do eleitorado. “Nestas eleições toda
a esquerda defendeu como objetivo
prioritário a derrota do candidato da
direita. Todos defenderam uma ‘teoria’
semelhante: cada ‘partido’ de esquerda
devia apresentar o seu candidato dado
que esta seria a única forma de diminuir
a abstenção. Apoiámos a candidatura de
Francisco Louçã desde o primeiro
momento, mas consideramos que, à
esquerda, Bloco e PCP se preocuparam
mais em resguardar e fixar eleitorado do
que se empenharam numa candidatura
de unidade, alargada aos socialistas de
esquerda, para derrotar efetivamente
Cavaco”, concluía a Moção C.
O Acordo de Lisboa e a participação
num governo PS
Na mesma V Convenção, a maioria do
BE comprometeu-se a não fazer acordos
com o PS. Na sua moção de orientação,
“A esquerda socialista como alternativa
ao governo Sócrates”, este compromisso
estava assente: “Na campanha eleitoral
que deu a maioria absoluta a Sócrates, o
Bloco apresentou um programa de
governo que constituiu o seu
compromisso com os eleitores, e que
formulava uma alternativa clara ao PS,
demonstrando que as respostas aos
problemas exigem uma governação
comprometida com prioridades sociais.
Mantemos
esse
rumo
e
esse
compromisso
de
propostas
de
alternativa.” Mas esse rumo não foi
mantido, como ficou evidente com o
Acordo de Lisboa.
Em plenas férias de verão e há
escassos dois meses da V Convenção, os
militantes do BE ficaram a saber pela
imprensa que o seu partido havia
firmado um acordo com o presidente da
Câmara de Lisboa, do PS, pelo qual o
vereador independente eleito pelo BE
passaria a integrar o governo. A notícia
do acordo caiu como uma bomba dentro
do BE, deixando revoltados inclusive
militantes das correntes que dirigiam o
partido. “Com este acordo, o Bloco
cedeu ao PS e não se afirma como
alternativa socialista ao governo de
Sócrates. Este acordo com António
Costa, que foi o número dois do
governo, representa indiretamente um
apoio ao governo do PS”, reagiu Gil
Garcia, do Ruptura/FER, no jornal
Público. Em sentido contrário, o
coordenador do BE, Francisco Louçã,
tentava desesperadamente justificar o
acordo em nome de uma política unitária
e a considerar os que não se reviam nele
CORREIO INTERNACIONAL
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ATUALIDADE
como sectários (“O sectarismo, um
fantasma que assombra a esquerda.
Argumentos sobre a política unitária na
estratégia socialista”, revista Combate,
Verão de 2007).
Em novembro de 2008, depois de uma
atuação desastrosa em que o BE apoiava
e ou justificava todas as iniciativas do
presidente do PS na Câmara de Lisboa, e
com o desgaste que isso trouxe para o
partido, a sua direção resolve romper
com o vereador independente que
participava do governo, imputando-lhe
toda a responsabilidade pelo mau
resultado da iniciativa. Em nenhum
momento reconheceu o seu erro e sequer
fez um balanço autocrítico daquela
política. Não o fez porque, como
veremos, não se tratava de um erro, mas
de uma política consciente de alianças
com o PS.
A “prodigiosa fantasia”
tornou-se realidade
Uma das passagens mais reveladoras
sobre a forma de fazer política da direção
do BE deu-se na sua VI Convenção, em
fevereiro de 2009, quando um dos seus
principais dirigentes, Luís Fazenda,
qualificou de “prodigiosa fantasia” a
acusação feita pela Moção C, composta
por bloquistas do Ruptura/FER e
independentes, de que o partido preparava-se para apoiar o mesmo candidato
do governo PS, Manuel Alegre. “Na
anterior convenção prometeram que não
haveria um acordo com o PS, e houve o
Acordo de Lisboa. O Manuel Alegre pode
ser o próximo candidato presidencial
apoiado por Sócrates e pelo BE”, previu
Gil Garcia. Foi exatamente isso que
aconteceu, apesar das negativas categóricas da direção do BE. Ao contrário da
sua primeira candidatura presidencial,
quando correu por fora do PS e do
governo Sócrates, nas eleições presidenciais de janeiro de 2011 Manuel Alegre
era o candidato oficial do PS, apoiado
pelo primeiro-ministro José Sócrates,
chefe de um governo que aplicava duros
planos de austeridade acordados com a
União Europeia e o FMI.
O apoio do BE a Manuel Alegre – e,
indiretamente, ao próprio governo PS –
abriu uma crise sem precedentes no
interior do partido e provocou o divórcio
entre este e uma parcela do seu potencial
eleitorado. O resultado ficou à vista
quando, nas eleições legislativas de junho
de 2011, o BE passou dos 9,82% dos
votos e 16 deputados, obtidos em 2009,
MARÇO DE 2012
para 5,17% e 8 deputados. O grande
contingente de jovens e trabalhadores
que tinham visto no BE uma nova forma
de fazer política, com mais radicalidade
e frontalidade, mais democracia e sem os
vícios parlamentares dos demais
partidos, desiludira-se. Internamente, a
capitulação do BE ao PS e a derrota
eleitoral potenciaram as críticas feitas a
um projeto que se desviara do seu
modelo original.
O BE era já um partido eleitoral e com
um grande défice de democracia interna;
que baseava a sua intervenção política
nos funcionários e não nos militantes;
que impedia a maior corrente de
oposição interna à esquerda, o
Ruptura/FER, de concorrer em lugares
elegíveis nos processos eleitorais; que se
recusava a construir oposições sindicais
para alargar o movimento sindical à base
e disputar a hegemonia das direções
burocráticas vinculadas à CGTP/PCP;
que se recusava a chamar a unidade da
esquerda para acabar com o rotativismo
da direita e do PS no poder, mas que não
se negava a participar de governos com
o PS ou apoiar candidatos comuns. Era,
enfim, um partido que se adaptava cada
vez mais ao regime e deixava órfãos
milhares de jovens e trabalhadores, como
os 300 mil que encheram as ruas do país
a 12 de março de 2011, na manifestação
da “Geração à rasca”, para protestar
contra o desemprego e a precariedade
laboral, o parlamento e os políticos.
Após o desastre eleitoral de junho, já
com a “troika” (delegação formada por
representantes da União Europeia, do
Banco Central Europeu e FMI) instalada
em Portugal e a direita a mandar no país,
o Ruptura/FER pediu a antecipação da
convenção do BE para que fosse aberto
um amplo debate no partido sobre que
políticas adotar para enfrentar a nova
situação. A direção do BE recusou. A
explicação para essa recusa é simples: ela
tem medo de fazer um balanço sério do
passado recente porque não quer mudar
de política. Prefere continuar a fazer
alianças com o PS e encenar uma
oposição sem consequências na medida
em que se nega a chamar a unidade da
esquerda para derrotar o rotativismo da
direita/PS no poder; prefere que o país
continue a pagar a dívida externa, e por
isso não defende a suspensão do
pagamento da dívida, mas sim a sua
reestruturação; prefere construir um partido centrado no parlamento e não no
mundo do trabalho e nas lutas da juventude; prefere, enfim, colecionar
deputados especialistas em fazer
denúncias bem fundamentadas e propostas para deixar tudo como está.
É por tudo isso que o Ruptura/FER
rompeu com o Bloco de Esquerda e está
a criar o MAS, Movimento de Alternativa
Socialista, um novo partido para construir, nas lutas, um novo 25 de Abril.
Coluna de Ruptura/FER na manifestação de 24 de novembro de 2011.
21
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ATUALIDADE
Portugal
Nasce uma alternativa
para os trabalhadores
e a juventude
FLOR NEVES
N
o dia 10 de março, tem lugar em
Lisboa a fundação da nova secção da LIT em Portugal – o Movimento de Alternativa Socialista (MAS).
Este é um partido que nasce no calor dos
combates que juventude e trabalhadores
portugueses travam hoje contra a crise
económica e suas dramáticas consequências.
Uma situação social marcada
pela crise e a austeridade
O MAS nasce a meio da pior crise económica mundial desde 1929, hoje com
epicentro na Europa. As consequências
desta crise para a vida da maioria da população em Portugal são dramáticas.
Entre elas, o aumento brutal do desemprego (hoje nos 14,8%) tanto para os
mais jovens como para quem, na casa do
45 anos ou mais, é considerado demasiado velho para trabalhar e novo demais
para a reforma. Com o desemprego vem
também o aumento da fome e do número de pessoas obrigadas a viver na
rua. Ao desemprego somam-se os salários pouco acima do salário mínimo nacional, hoje responsáveis pela emigração
de milhares de portugueses em busca da
sobrevivência, incluindo cada vez mais
jovens com cursos superiores. A crise
significa também uma maior precarização laboral da juventude portuguesa, generalizando os contratos quinzenais ou
semanais ou mesmo a inexistência de
contrato de trabalho e sua substituição
por recibos verdes. Conquistas do movimento operário como as férias pagas, o
22
13º e 14º mês, o direito à licença de maternidade e a baixa médica por doença
são para cada vez mais trabalhadores
uma miragem de um tempo distante.
Os trabalhadores e a juventude
começam a reagir
Frente a este ataque brutal, os trabalhadores e a juventude começam a demonstrar
nas
ruas
o
seu
descontentamento contra o beco sem
saída a que têm vindo a ser levados, primeiro pelo governo de Sócrates (PS) e
agora pelo de Passos Coelho (PSD-CDS).
Expressão desse descontentamento
foram as grandes manifestações da Geração à Rasca, do movimento 15 de Outubro e da Greve Geral de 2011, mas
também, mais recentemente, o desenvolvimento de lutas importantes nas empresas, como foram os casos do setor dos
transportes (CP e TAP) e da Cerâmica de
Valadares. Nas empresas ou nas ruas, o
que está em causa é o combate aos ataques que nos querem impor, aumentando os casos de iniciativas dos
trabalhadores e jovens à margem das direções políticas e sindicais tradicionais.
A esquerda tradicional
não passa a prova
Apesar da importância das lutas em
curso, ainda estamos longe de uma resposta do movimento sindical e popular
à altura da brutalidade do ataque que
troika e governo estão a levar a cabo.
Além do medo do desemprego, há um
sentimento geral de ausência de uma
saída alternativa. Para esse sentimento
muito contribui a política da esquerda
tradicional.
O Partido Comunista continua a dirigir
de forma burocrática a principal central
sindical do país – a CGTP, procurando
controlar a revolta que vai explodindo e
impedir que saia da sua alçada. Por ser
o partido mais enraizado no movimento
sindical, poderia cumprir um papel central no combate à troika e à austeridade.
No entanto, o PCP privilegia a conciliação de classes e não uma saída independente dos trabalhadores para a crise.
Atua para sustentar o regime e não para
o combater.
O Bloco de Esquerda, que surgiu como
uma esperança para os que à esquerda
não se reviam nem no PS nem no PCP,
deixa hoje claro não ser alternativa. De
facto, não só privilegia sistematicamente
alianças com o PS, como foi o caso do
apoio à candidatura presidencial de Manuel Alegre (PS) quando este era também apoiado pelo Governo Sócrates
(também PS), como também não é alternativa ao PCP, recusando-se a construir
uma alternativa democrática e combativa no movimento sindical e tendo a
mesma política de conciliação com os
patrões e o governo, como demonstraram na luta dos professores em 2008.
Além disso, apesar de se autodenominar
anticapitalista, o BE sempre teve seu centro virado para a atuação parlamentar e
dececionou, por isso, muitos dos que
nele viam uma esperança de alternativa
para as lutas de trabalhadores e jovens.
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ATUALIDADE
A dívida, a austeridade
e a necessidade de uma
alternativa socialista
Em nome do pagamento da dívida, o
país está a ser sugado, as vidas de milhares de trabalhadores e reformados destruídas e o futuro de várias gerações de
jovens hipotecado. Frente a este ataque
brutal contra a maioria da população portuguesa, PCP e BE são partidos acomodados ao atual estado de coisas,
defendendo apenas a renegociação das
condições de pagamento da dívida, o que
na prática significa aceitar a austeridade
imposta ao povo português, aceitar o discurso do governo de que precisamos
fazer sacrifícios para cumprir os compromissos do país e, em última instância,
aceitar o roubo que banqueiros, grandes
patrões e a União Europeia estão a fazer
ao povo português. A este discurso, é preciso opor uma alternativa socialista que
defenda a suspensão imediata do pagamento da dívida para acabar com a austeridade,
que
defenda
que
os
compromissos que temos de cumprir são
para com os trabalhadores e não para
com os banqueiros que roubaram e roubam o país e agora nos passam a fatura
em austeridade eterna e que defenda a
necessidade de um novo 25 de Abril para
parar a troika e o governo.
O período que vivemos é de grandes
mudanças, grandes convulsões e grandes
combates. Assim o mostram as lutas em
Portugal, mas também na Grécia, em Espanha e as revoluções no norte de África
e Médio Oriente. Os partidos atuais não
respondem às novas batalhas que trabalhadores e juventude começam a travar.
O MAS propõe-se a ser um instrumento
político-partidário ao serviço da luta por
um novo 25 de Abril para impor uma
saída para a crise ao serviço dos trabalhadores e não dos banqueiros.
Um partido novo, mas com história
Sendo uma expressão dos ventos de
luta que correm o mundo, o MAS é também o produto de uma corrente com uma
tradição de quatro décadas em Portugal.
A nossa história começou em 1972,
com a formação de grupos de estudantes
contra a ditadura de Salazar nas escolas
secundárias de Lisboa. Estes grupos editavam boletins nos liceus contra a guerra
colonial em África, mas também batalhavam por reivindicações específicas dos
estudantes, o que os diferenciava tanto
dos maoístas como da maioria dos trotkistas da época.
MARÇO DE 2012
A 25 de abril de 1974 cai a ditadura e
inicia-se uma profunda revolução no
país. Os ativistas destes grupos estudantis rapidamente se incorporaram ao processo
revolucionário
aberto,
às
manifestações populares e espontâneas
que se formavam um pouco por todo
lado.
A ligação à Internacional
e a constituição como partido
É no calor da revolução portuguesa,
durante o ano de 1974, que estes grupos
de estudantes entram em contacto com a
Tendência Leninista Trotskista da IV Internacional, do qual faziam parte o PST
argentino, liderado por Nahuel Moreno,
e o SWP dos EUA. A identificação com
várias opiniões e críticas desta tendência
à maioria da IV Internacional levou-os a
integrarem-se nessa mesma corrente, que
posteriormente daria origem à Liga Internacional dos Trabalhadores (LIT).
É neste contexto que, ainda em 1974,
se constitui a ASJ – Aliança Socialista da
Juventude, rapidamente transformada
numa organização muito importante nos
liceus de Lisboa, que editava a nível nacional o Combate Socialista. Em Fevereiro
de 1975, funda-se então o PRT – Partido
Revolucionário dos Trabalhadores, que
ganhará peso não só no ensino secundário, mas posteriormente também em setores como os metalúrgicos de Aveiro e
os cantoneiros de Lisboa.
Depois do retrocesso dos anos 80, com
o desaparecimento da maioria das organizações da esquerda revolucionária, nos
anos 90, a corrente que vinha do PRT
construiu o Ruptura. Este movimento de
estudantes permitiu ligar um novo setor
de jovens ativistas combativos, que despertavam para a política na luta contra as
propinas com a experiência da esquerda
revolucionária que vivera o 25 de Abril.
Em 1999, integrámos o Bloco de Esquerda, onde batalhámos por um partido
verdadeiramente anticapitalista e socialista que tivesse como centro as lutas e a
organização de alternativas democráticas
e combativas nos locais de trabalho e
não uma política centrada no parlamento. Batalhámos contra a política sistemática de aproximação ao PS e recusa
de aliança com o PCP nas lutas contra as
medidas de austeridade e no combate ao
governo.
Quando a situação social e política
mais necessitava de uma alternativa socialista que pusesse o dedo na ferida, o
BE continuou a insistir na mesma polí-
tica de colagem ao PS e de sustentação
do atual regime.
Desafios e responsabilidades
O MAS nasce com presença nacional
em várias cidades do país (ex. Lisboa,
Amadora, Coimbra, Braga) e localizado
em setores importantes como professores, bancários, trabalhadores precários
dos call-center, estudantes do ensino superior e secundário, entre outros setores
precarizados. Apesar de ser ainda pequeno, o MAS começa a ser um pólo de
atração para um setor de vanguarda de
ativistas que buscam uma saída para a
situação atual.
Frente ao discurso do governo da direita de que não há alternativa à crise e
à austeridade, de uma esquerda tradicional que, como vimos, não está disposta
a levar até ao final a luta contra a troika,
os governos e seus planos de miséria
para a maioria da população e face a
banqueiros e patrões que com seus partidos e organizações (UE, FMI, NATO,
ONU) coordenam a melhor forma de
manter o seu poder, os trabalhadores e
jovens, seja através de lutas nas empresas ou de movimentos e plataformas
como o 15 de Outubro, começam a buscar uma resposta.
A história ensina-nos que para os trabalhadores serem vitoriosos é fundamental a existência de uma direcção
revolucionária. A experiência do 25 de
Abril, em que nem PS nem PCP queriam
realmente levar a revolução até ao fim,
levando à derrota da revolução, é a expressão dessa necessidade. Temos por
isso a responsabilidade de, ao calor das
lutas atuais e por vir, ir construindo e forjando um partido que esteja ao serviço
de um novo 25 de Abril para derrotar a
troika e a austeridade e impor uma saída
para a crise ao serviço dos trabalhadores.
Porque sabemos que não existe saída
revolucionária nos marcos nacionais,
temos também a responsabilidade de
construir essa ferramenta de luta que é o
partido, não apenas a nível nacional,
mas também internacional. Por isso, o
MAS nasce como parte integrante da LIT.
Num momento em que em vários países
da Europa, trabalhadores e juventude
saem à rua, temos o desafio de, junto
com camaradas do estado Espanhol, de
Itália e de outros países, construir fortes
laços de solidariedade entre as lutas dos
povos na Europa e, nesse marco, fortalecer a LIT como uma alternativa revolucionária.
23
* 24-25 Campaña LIT (P)_Maquetación 1 15/03/12 14:59 Página 24
LIT-QI - 30 ANOS
CAMPANHA
AO COMPLETAR 30 ANOS DE SUA FUNDAÇÃO,
a LIT lança uma grande campanha
que se desenvolverá ao longo de todo
o ano de 2012 e que inclui diversos atos,
publicações e também uma
seção especial permanente de sua página na web.
C
om esta campanha, queremos reivindicar a trajetória
de
nossa
organização e da corrente morenista, iniciada em 1944, na Argentina. Porém, não fazemos
com critério nostálgico ou histórico. Essa trajetória, suas batalhas teóricas e políticas, suas
experiências militantes, seus
erros e debilidades, nos deixam
profundas lições para aplicar
hoje e poder nos apresentar orgulhosos com toda essa bagagem e nossas propostas ante
milhares de novos e velhos ativistas e lutadores.
O ato principal da campanha,
se realizará na última semana de
outubro em Buenos Aires, Argentina, lugar onde, em 1944, nasceu
a corrente morenista e onde a LITQI conseguiu sua maior influência.
Além da presença, é claro, do
PSTU Argentino, participarão do
ato convidados que foram parte da
conferência de fundação, a direção
da LIT e delegações internacionais
do Brasil, Chile, Paraguai, Uruguai etc.
Ainda que sem data exata, também
estão planejados outros atos no Brasil,
Colômbia, Costa Rica e Europa. No velho
continente, se integra como parte da
campanha a festa de lançamento do
novo partido português, o MAS, que se
realizará na data de saída desta edição
da Correio Internacional.
Além disso, está sendo preparado um kit de livros. O primeiro
deles tratará sobre a própria conferência de fundação em 1982, em
Bogotá, seus documentos e resoluções, a transcrição de várias intervenções (inclusas as de Nahuel
Moreno).
O segundo, abordará o I Congresso da LIT-QI, realizado em Buenos Aires, em 1985. Nesse material,
se recolhem depoimentos de dirigentes de vários países que aportam de
diferentes ângulos sobre a sua relação
com a LIT-QI. A ideia é incluir
também alguns dirigentes que
não estão na LIT-QI hoje.
Na página da web
Publicações
Em primeiro lugar, dedicamos parte
importante deste número da Correio Internacional a esta campanha, desenvolvendo artigos sobre sua história, sua
defesa da moral revolucionária e sobre
sua proposta programática para a reconstrução da IV Internacional.
Desde fevereiro passado, a página da LIT-QI (www.litci.org), lançou na internet uma nova seção
especial para comemorar os 30 anos
de existência da LIT-QI, em três idiomas: português, espanhol e inglês.
Esta página especial estará online durante todo o ano de 2012 e trará documentos históricos sobre a fundação da
LIT-QI e de suas seções, seu desenvolvimento e as principais polêmicas que
foram travadas internamente ou com as
demais correntes da esquerda mundial,
em particular, com as correntes trotskistas. Mostraremos, também, vídeos e galerias de fotos, além de notícias sobre os
eventos promovidos pelas seções da LITQI durante o ano.
Esperamos que vocês acessem nossa páginal especial, no
24
CORREIO INTERNACIONAL
* 24-25 Campaña LIT (P)_Maquetación 1 15/03/12 14:59 Página 25
LIT-QI - 30 ANOS
“30 ANOS DA LIT”
A página terá seu conteúdo completado ao longo do ano, conforme a sucessão de atividades das seções e a
cronologia dos vários acontecimentos
históricos tratados.
Os primeiros materiais, sobre o tema
“Fundação” já podem ser vistos, como
uma breve história da LIT-QI, documentos como o pronunciamento de Moreno
na conferência de fundação e um vídeo
onde Eduardo Barragán, dirigente do
PSTU argentino e membro do CEI da LITQI, conta como se fundou nossa Internacional.
No mês de março, se mostra como foi
construída a seção portuguesa da LIT-QI,
em pleno turbilhão da Revolução dos
Cravos, em 1974, aproveitando a grande
festa que o MAS fará para divulgar a
saída do Bloco de Esquerda e sua atuação como um novo partido independente.
Em abril, a revolução boliviana de 1952
completará 60 anos e será uma oportunidade de reviver as grandes polêmicas
que surgiram na IV Internacional, em relação àquela revolução, um ano antes de
sua divisão.
Abordaremos, também, temas como a
Moral Revolucionária, a opressão da mulher, imperialismo e nacionalismo burguês, frente popular, entre outros; e
mostraremos como se construíram as seções da LIT no Brasil, na Argentina, na
Colômbia, Espanha, América Central,
etc.
Esperamos, assim, colaborar com a
formação das novas gerações de militantes trostkistas e ativistas do movimento
operário e popular, neste momento crucial no qual, mais do que nunca, uma direção revolucionária mundial é tão
necessária. Por isso, adotamos a consigna: “Pelo socialismo e pela Internacio-
nal Revolucionária”, como lema de campanha e bandeira de sua comemoração.
endereço: http://litci.org/especial/index.php/espanol
MARÇO DE 2012
25
* 47-48 Vida de LIT-QI (P)_Maquetación 1 15/03/12 15:29 Página 47
VIDA DA LIT-QI
A LIT-QI na Itália
O Partido da Alternativa Comunista
FABIANA STAFANONI
Tradução: Rodrigo Ricupero
O
PdAC nasceu em janeiro de
2007, depois de uma fase de
constituição iniciada em abril de
2006, quando algumas centenas de dirigentes e ativistas saíram do Refundação
Comunista. Em abril de 2006, de fato, a
coalizão de centro esquerda (guiada pelo
Prodi) venceu as eleições e o Refundação
entrou no governo, sustentando políticas
racistas, belicistas e anti-operárias. O
apoio do Refundação Comunista às políticas burguesas determinou uma desagregação daquele partido, com várias
cisões e uma queda eleitoral (de 9%
para 1%).
A decisão de aderir a LIT-QI
O PdAC nasceu pela necessidade de
construir uma oposição comunista aos
governos burgueses. Os ativistas que
participaram da fase de constituição,
convencidos de que um partido de classe
se constrói em escala internacional, tiveram contato com várias organizações internacionais que se reivindicam do
trotskismo. O congresso de fundação do
PdAC decidiu pela adesão à Liga Internacional dos Trabalhadores, avaliando
que a LIT é hoje a principal organização
trotskista internacional, seja pela difusão
seja pelo potencial de crescimento. Na
Europa, ainda na limitação das forças, é
a única força revolucionária presente em
diversos países. O recente X congresso
da LIT nos demonstrou que nós não estávamos errados na escolha: o debate
entre as seções, velhas e novas, de trajetórias diversas, demonstrou que a LIT é
uma organização baseada no centralismo democrático, coerentemente marxista e presente na realidade das lutas.
Se alguns dirigentes deixaram o partido por oportunismo sindical, ao
mesmo tempo entraram no partido muitos quadros jovens, sobretudo ativistas
das lutas estudantis e dos imigrantes.
Nestes anos o PdAC aprofundou a sua
intervenção sindical, promovendo uma
batalha em favor da construção de uma
grande central sindical de classe na Itália. As três confederações conciliadoras
Cgil, Cisl e Uil, que em termos de filiados
controlam a maioria dos trabalhadores,
são cada vez mais subordinadas ao patronato italiano. A esquerda, o sindicalismo combativo sofre de uma grande
fragmentação com muitas pequenas organizações.
A nossa intervenção sindical se desenvolve seja na Cgil (em particular entre os
metalúrgicos da Fiom-Cgil) seja, sobretudo, no sindicalismo combativo. Hoje,
depois da expulsão de Fabiana Stefanoni
– a autora deste texto – do sindicato stalinista Usb, a nossa intervenção se concentrou sobretudo no sindicato de base
Cub (Confederação Unitária de Base).
Do ponto de vista da propaganda, os
meios que utiliza o partido é um jornal
bimestral, Progetto Comunista, e uma revista teórica semestral, Trotskismo hoje.
No trabalho de agitação, intervimos em
todas as principais lutas que se desenvolvem no país. Graças em particular ao
desenvolvimento das lutas estudantis
(que na Itália atingiram momentos de
grande radicalidade: em dezembro de
2010 milhares de estudantes atacaram o
Senado), o PdAC viu nos últimos dois
anos a adesão de muitos jovens: por
isto, desenvolvemos uma intervenção
como Juventude de Alternativa Comunista.
As nossas tarefas
na fase que se abre
Hoje a Europa é o centro da crise
mundial. A Itália vive uma condição
econômica semelhante àquela da Grécia: o governo Monti, sob mandato da
troika, está massacrando a classe trabalhadora. Não apenas não colocou em
discussão as medidas de Berlusconi,
como em dezembro um pacote econômico de trinta bilhões que piorou drasticamente as condições de vida das
massas populares. Ora o governo deseja, juntamente com a burocracia sindical da Cgil, Cisl e Uil, desmantelar até
o artigo 18, isto é, a tutela que impede
as demissões discriminatórias [entre outras, de dirigentes sindicais, grevistas
etc. ndt] na grande indústria. Mas é previsível que a próxima fase será caracterizada, também na Itália, por uma
explosão do conflito social em larga escala. O PdAC, juntamente com as outras
seções européias da LIT, se prepara para
o crescimento das lutas na Europa.
A intervenção do PdAC
nas lutas e a propaganda
De 2007 até hoje o desenvolvimento
do PdAC não foi linear, mas, como sempre na história dos partidos comunistas,
por saltos e rupturas.
MARÇO DE 2012
47
* 47-48 Vida de LIT-QI (P)_Maquetación 1 15/03/12 15:29 Página 48
VIDA DA LIT-QI
O PT de Paraguay
Uma história de luta
junto ao
povo trabalhador
E
m 19 de março de 1989, um mês
após a queda da ditadura comandada pelo general Alfredo Stroessner (1954-1989), cerca de 130
trabalhadores da cidade e do campo
deram nascimento ao Partido dos Trabalhadores (PT).
Três dias depois, em 22 de março, o PT
converteu-se no primeiro partido de esquerda reconhecido legalmente, em mais
de meio século de história política.
Desta maneira, apresentava-se publicamente o trabalho que, há cinco anos,
esses companheiros e companheiras vinham desenvolvendo desde a clandestina
Organização Socialista Revolucionária
(OSR).
A OSR adotou como princípios a luta
pelo socialismo revolucionário, o antiimperialismo e o internacionalismo proletário. Foi assim que seus fundadores
solicitaram em 1987 o ingresso da organização à Liga Internacional dos Trabalhadores – Quarta Internacional (LIT-QI),
como seção oficial no Paraguai, contribuindo desde então, com sua militância
quotidiana, à construção de um Partido
Mundial da Revolução Socialista.
O partido constrói-se nas lutas
A queda de Stroessner produziu um
ascenso, talvez sem precedentes na história do país, da organização e das lutas
da classe trabalhadora e dos setores populares, que estavam acorrentados por
décadas de perseguição, prisões, torturas
e mortes provocadas pela ditadura de
Stroessner. Produziu-se uma explosão
sem controle de lutas, greves e ocupações em massa no campo.
Militantes do PT tiveram participação
direta em muitas dessas lutas, convencidos de que o partido se constrói nelas.
48
Na década de 90 produziram-se ocupações de terra em massa; dezenas delas estavam encabeçadas por militantes do
partido. Nesse marco conquistaram-se milhares de hectares para o campesinato
pobre, sob a bandeira da luta por uma reforma agrária radical.
As e os militantes do partido foram
parte da construção das mais importantes
organizações camponesas, como a Coordenação Nacional de Agricultores do Paraguai (CONAPA), organização que deu
nascimento posteriormente à Federação
Nacional Camponesa (FNC), a Mesa de
Organizações Camponesas (MCNOC) e a
Central Nacional de Organizações Camponesas, Indígenas e Populares (CNOCIP).
Nucleados no Agrupamento Independente de Trabalhadores (AIT), seus militantes intervieram no movimento sindical
ingressando em 1985 no Movimento Intersindical de Trabalhadores, organização
que, depois da queda da ditadura em
1989, converteu-se na Central Unitária
dos Trabalhadores (CUT).
É parte da história e do orgulho do Partido dos Trabalhadores sua participação
nas grandes lutas que o povo trabalhador
empreendeu, em sua luta pela democracia
que se iniciou contra a ditadura, no março
paraguaio de 1999, nas lutas anti-imperialistas contra as privatizações, a Lei Antiterrorista e a criminalização das lutas
sociais.
Alternativa classista e socialista
nas eleições
O PT participou de eleições, entendendo a importância de apresentar uma
alternativa política que se contraponha
aos partidos dos patrões e latifundiários
lacaios do imperialismo.
Em 1993, conformou a frente eleitoral
Unidade dos Trabalhadores e do Povo
(UTP), em aliança com outras organizações de esquerda, que apresentou a candidatura à Presidência da República do
camarada Coco Arce.
Nas eleições gerais de 2003 foi parte de
outra aliança, a Esquerda Unida (IU), que
apresentou a candidatura do dirigente
camponês e do PT, Tomás Zayas.
Em 2008, apesar de buscar alianças,
pela primeira vez o Partido dos Trabalhadores apresenta-se sozinho nas eleições,
devido a que as demais organizações de
esquerda apoiaram a candidatura de conciliação de classes de Lugo/PLRA. O PT
apresentou uma chapa completa, encabeçada pela candidatura à Presidência da
República do camarada Julio López.
O PT hoje
Temos o orgulho de permanecer fiéis ao
classismo, à estratégia de construir o socialismo com os métodos revolucionários
e de não ter capitulado ao governo de
Frente Popular de Lugo/PLRA. Não é um
fato qualquer, pois quase toda a esquerda
vinculou-se desde o início e fez parte orgânica do governo de Frente Popular.
Com a bandeira da independência de
classe ao alto, leva essa palavra de ordem
à classe trabalhadora paraguaia. Assim,
seus militantes têm dedicado seus esforços, nos últimos anos, na construção de
um espaço para que a reorganização do
movimento sindical avance.
Com camaradas do PT à frente, em 20
de novembro de 2010 fundou-se a Confederação da Classe Trabalhadora (CCT),
uma organização classista, independente,
democrática e de luta a serviço da defesa
dos direitos e interesses da classe trabalhadora, do campesinato e dos demais setores populares de nosso país.
CORREIO INTERNACIONAL
* 34-35 Moral revolucionaria (P)_Maquetación 1 15/03/12 14:13 Página 34
LIT-QI - 30 ANOS
A defesa da moral revolucionária
ALICIA SAGRA
Q
uando nosso IX Congresso Mundial votou e tornou público um
documento sobre “moral revolucionária”, muitos companheiros, agradavelmente surpreendidos, disseram-nos
que nunca tinham visto algo assim. Não
é a primeira vez que damos uma importância central a esse tema. Inclusive, a
fundação da LIT-QI esteve estreitamente
vinculada à sua defesa. O que, sim, é verdadeiro, é o fato de ser a primeira vez
que um congresso mundial considera necessário votar um documento sobre
moral.
A questão moral
e a fundação da LIT-CI
Quando estávamos no processo de ruptura da CIQI1, o principal dirigente da
seção peruana do setor proveniente do ex
CORCI, Ricardo Napurí, que havia manifestado diferenças políticas e metodológicas, foi acusado de “ladrão” por
Lambert. Moreno não hesitou e, seguindo a política de Trotsky da década de
1930, propôs chamar um Tribunal Moral
Internacional que determinasse a verdade ou a falsidade das acusações.
Em 11 de janeiro de 1982, realizou-se
uma reunião em Bogotá, da qual participaram os partidos da ex FB e dois dirigentes que provinham do lambertismo:
Alberto Franceschi, da Venezuela e Ricardo Napurí, do Peru. No primeiro
ponto dessa reunião, ratificou-se o Tribunal e lançou-se uma grande campanha
em torno dele. No segundo ponto, resolveu-se fundar uma nova Internacional,
aprovando-se os estatutos e as Teses Fundacionais da LIT-QI.
Posteriormente, o Tribunal, constituído
por personalidades da esquerda internacional e do movimento sindical, deliberou a favor da honra revolucionária de
Ricardo Napurí.
Atuamos da mesma maneira na Bolívia, nos anos 90, frente aos ataques morais de Guillermo Lora contra um dos
principais dirigentes de seu partido, Juan
Pablo Bacherer, que havia manifestado
diferenças políticas com ele. Este Tribunal foi integrado, entre outros, por Zé
34
Maria de Almeida, dirigente metalúrgico
e membro da direção do PSTU brasileiro,
e por Esteban Volkov Bronstein, neto de
Trotsky. Como no caso anterior, o Tribunal constatou a falsidade das acusações
morais.
O que é a moral revolucionária?
Em 1920, Lênin afirmava: “Em que sentido negamos a moral? Negamo-la no sentido que a pregou a burguesia,
deduzindo-a de mandamentos divinos
(...) o clero, os latifundiários e a burguesia falavam em nome de Deus para defender seus interesses de exploradores (…)
quando nos falam de moral, dizemos:
para um comunista, toda moral reside
nesta disciplina solidária e unida, e nesta
luta consciente das massas contra os exploradores. Não acreditamos em uma
moral eterna, denunciamos a mentira de
todos os contos sobre moral. A moral
serve para que a sociedade humana se
eleve a uma maior altura, para que se
desembarace da exploração”.2
Em 1938, Trotsky, manifesta: “A Quarta
Internacional despreza os magos, charlatães e professores de moral. Em uma sociedade baseada na exploração, a moral
suprema é a da revolução socialista. Bons
são os métodos que elevam a consciência
de classe dos operários, a confiança em
suas forças e seu espírito de sacrifício na
luta. Inadmissíveis são os métodos que
inspiram o medo e a docilidade dos oprimidos contra os opressores, que afogam o
espírito de rebeldia e de protesto, ou que
substituem a vontade das massas pela
dos chefes, a persuasão pela coação e a
análise da realidade pela demagogia e falsificação. Tenho aqui por que a social democracia, que tem prostituído o marxismo
tanto quanto o stalinismo, antíteses do
bolchevismo, são os inimigos mortais da
revolução proletária e da moral da
mesma.”
Em 1969, Moreno, preso no Peru, escreve um texto no qual mostra como na
época imperialista, a burguesia abandona
a moral de sua época de ascensão, funcional à acumulação capitalista e baseada
na “ economia, a sobriedade, a obediência
servil dos filhos e da mulher ao chefe da
família” (…) “a família patriarcal burguesa da etapa da ascensão desaparece,
se rompe, para dar lugar às relações entre
os sexos e os membros da família anárquica, crítica, na qual o elemento fundamental é a transformação de cada
individuo em desfrutador do mundo e do
outro sexo (…)”.3
E propõe que essa “amoralidade” da
burguesia se combina com a moral existente nos setores marginalizados da sociedade, a moral lúmpen, dando origem
a correntes como o existencialismo ou o
espontaneísmo: “O espontaneísmo moral
é a tentativa de setores juvenis de gozar
como indivíduos da sociedade neocapitalista, ou seja, da sociedade de consumo,
sem ajustar-se aos fetiches e reflexos condicionados dessa mesma sociedade”.
“Nós acreditamos justamente no contrário, que nossa moral não é a da opção
como os existencialistas, nem para o gozo
como os espontaneístas, mas a da necessidade da revolução”.4
Moreno, que enfrentava a influência
negativa da moral espontaneísta dentro
do partido, deu tanta importância a essa
discussão que, estando na prisão, priorizou-a acima dos debates políticos que estavam propostos. Com essa visão,
construiu uma corrente que manteve
uma moral revolucionária da qual nos orgulhamos, e cujo maior expoente foi a
solidez moral e ideológica que permitiu
que os mais de 200 presos, fuzilados e
desaparecidos do PST argentino, suportassem a tortura da “Triple A”5 e da ditadura, pondo a segurança do resto dos
companheiros acima de sua própria vida.
O vendaval oportunista
e a moral do “vale tudo”
Trotsky teve que enfrentar a degradação moral provocada por Stalin, o método da amálgama, a monstruosa
perseguição política e moral contra a geração que, junto a Lênin, encabeçou a revolução e a construção do Estado
Soviético. Com os fraudulentos Processos
de Moscou e os campos de concentração,
Stalin acabou com a vida de grande
CORREIO INTERNACIONAL
* 34-35 Moral revolucionaria (P)_Maquetación 1 21/03/12 11:10 Página 35
LIT-QI - 30 ANOS
quantidade desses revolucionários e, em
1940, completou sua tarefa com o assassinato de Trotsky. Ele ganhou a batalha.
Mas Trotsky com sua grande campanha
contra a “escola stalinista de falsificações” nos deixou toda uma concepção e
uma metodologia que nos armaram para
enfrentar o stalinismo e todas as correntes que tomaram um rumo semelhante.
Moreno teve que enfrentar a destruição moral que o stalinismo impunha à
classe operária e as posições espontaneístas que surgiam como reação a essa degradação e à decadência da moral
burguesa.
Nós estamos enfrentando um novo período degenerativo. Como dissemos no
documento do IX Congresso: “A decadência do capitalismo em sua fase senil
levou a tal grau o saque e a destruição da
natureza que chega ao ponto de justificar
qualquer ataque aos mínimos direitos individuais para garantir seus lucros. Isto
gera uma decadência moral do imperialismo no terreno das relações humanas.
(…) É o “vale tudo” da sobrevivência em
um mundo decadente (…). Esta situação
teve sua refração no interior do Movimento Operário e da esquerda, devido
àquilo que chamamos o “vendaval oportunista””.
Já antes, produto da marginalidade, setores trotskistas se contaminaram com a
moral stalinista. Um exemplo foram os
casos, já citados, das amálgamas e calúnias utilizadas por Lambert e Lora. Mas
com o “vendaval oportunista” tudo se
potencializou: ex-guerrilheiros presidem
governos burgueses, reprimem as lutas.
Organizações que se reivindicam trotskistas vivem do estado, administram planos sociais, aplicam o “clientelismo
político”, utilizam a difamação como
moeda corrente, atacam fisicamente e
roubam arquivos e locais de outras organizações trotskistas. O parlamentarismo
e os aparatos sindicais corrompem aqueles que foram dirigentes revolucionários.
A questão da moral revolucionária
na reconstrução da LIT-QI e da IV
O que expomos antes mostra a necessidade de batalhar em defesa da moral
revolucionária. Mas não explica por que
nosso IX Congresso Mundial viu a necessidade de votar um documento sobre o
tema. Essa necessidade se impôs quando, ao ver importantes casos sobre índole moral em nossas fileiras,
percebemos que também nós tínhamos
sido contaminados. Como dissemos
MARÇO DE 2012
Pintura de Dorothy Eisner que representa a Trotsky declarando ante o Tribunal Moral
conhecido como Comissão Dewey.
nesse documento: “Era lógico que, se a
LIT, no marco do vendaval oportunista
que se abateu sobre a esquerda, sofreu
uma destruição no terreno teórico, programático e organizativo, isto deveria afetar também o terreno moral”.
Nossa tradição nos permitiu enfrentar
o problema por meio da educação da militância e encarando com rigor cada problema moral que se apresentasse.
Atuamos sem temor em perder militantes e inclusive seções, porque somos
conscientes de que estamos defendendo
não um principio filosófico abstrato, mas
a moral defendida por Lênin, Trotsky,
Moreno, “a moral que serve para que a
sociedade humana se eleve a maior altura, para que se desembarace da exploração”.
Por que tornamos público este combate interno? Para fortalecê-lo. Encontramo-nos
com
dirigentes
que,
reivindicando-se trotskistas e morenistas,
defendem a “lei da selva” para justificar
roubos de locais, de arquivos… E nos
dizem que estamos no “túnel do tempo”,
quando nos opomos a essas ações em
nome da moral defendida por nossos
mestres. Nós, assim como eles, sofremos
as pressões da sociedade em decomposição e não estamos livres de problemas.
A diferença é que reconhecemos esses
problemas e não os escondemos debaixo
do tapete, ao contrário, os tornamos públicos para combatê-los com mais força.
Aspiramos a que as organizações e dirigentes que se aproximam de nós politicamente, se somem a este combate.
Porque estamos convencidos de que a reconstrução da Quarta só pode dar-se em
meio a uma feroz batalha para recuperar
a moral revolucionária. Batalhando até a
morte, no movimento e no partido, contra o método das amálgamas, das calúnias; do roubo, das mentiras, dos
ataques físicos e da deslealdade entre revolucionários; do machismo, do racismo,
da xenofobia, da homofobia; porque
tudo isso vai contra a moral revolucionária, isto é, contra a revolução.
1
CIQI – Comitê Internacional – Quarta Internacional, formado pela FB (Fração Bolchevique) e pelo CORQI, organização de Lambert
em 1980, como parte da estratégia de reconstrução da IV Internacional. Aliança que foi
rompida diante da capitulação de Lambert à
Frente Popular e sua negativa em discutir a
sua política de expulsar aqueles que questionaram sua política.
2
Discurso de Lênin na I sessão do III Congresso das Juventudes Comunistas (2 de outubro de 1920).
3
Moreno, Nahuel, Moral Bolche ou Moral
Espontaneísta, Caderno de Formação 8, Abril
de 1987, p. 18.
4
Idem. p. 44.5 “Triple A” - Aliança Anticomunista Argentina.
35
* 36-45 Reconstrucción IV (P)_Maquetación 1 21/03/12 10:35 Página 36
LIT-QI - 30 ANOS
Pela reconstrução de uma
Internacional revolucionária
ALEJANDRO ITURBE
AS REVOLUÇÕES EM CURSO no Norte de África e no Oriente Médio voltaram a demonstrar
que as massas são capazes de lutar com enorme combatividade e heroísmo para mudar
a realidade. Mas também mostram que, sem uma direção revolucionária, essas lutas
têm limites no seu desenvolvimento e que o imperialismo, as burguesias nacionais
e seus agentes no seio do movimento de massas manobram na “beira do precipício”
e conseguem sobreviver.
P
or isso, para a LIT-QI, a resolução
da crise da direção revolucionária internacional é “a mãe de
todas as tarefas” que propomos aos ativistas e lutadores de todo o mundo.
Ainda mais quando a crise econômica
mundial revela com toda a crueza o autêntico e horrível rosto do capitalismo
imperialista, contrário a esse mundo de
“felicidade e abundância para todos”
que nos querem vender. Ou quando a
repressão às revoluções, lutas e resistências expressa com clareza que o capitalismo não está disposto a fazer qualquer
concessão às massas.
Expressamos esta tarefa na bandeira
Pela Reconstrução da IV Internacional.
Desde sua fundação, a LIT–QI põe seu
crescimento a serviço dessa tarefa central. Seus próprios estatutos contêm
essa proposta e o conteúdo dado por
essa tarefa:
A LIT-QI tem como objetivo fundamental superar a crise da direção do movimento operário mundial e construir a
Quarta Internacional com influência de
massas. Apenas assim, resolvendo a
crise de direção do proletariado, a permanente mobilização dos trabalhadores
e explorados do mundo contra o imperialismo e a burguesia poderá culminar
com a vitória final da revolução socialista internacional e com a implantação
da ditadura revolucionária do proletariado.
36
No entanto, quando fazemos estas
propostas, surgem numerosos questionamentos sobre o conteúdo programático e
sua concepção organizativa, tanto por
parte da maioria da esquerda como de
importantes setores de ativistas mais recentemente incorporados à luta.
Lenin discursa em uma manifestação
em Petrogrado, em 1917
Por quê IV Internacional?
Alguns setores revolucionários – em
geral de origem e tradição distintos ao
trotskismo – coincidem na necessidade
de construir uma Internacional, mas nos
questionam o porquê da IV Internacional, se esta nunca dirigiu uma revolução
nem teve peso de massas e, atualmente,
depois de sua crise em 1953, a IV estar
dividida em numerosas correntes internacionais e grupos nacionais com pro-
CORREIO INTERNACIONAL
* 36-45 Reconstrucción IV (P)_Maquetación 1 21/03/12 10:35 Página 37
LIT-QI - 30 ANOS
postas políticas e organizativas tão diferentes. Não deveríamos chamar para
construir uma nova organização (“a V”)?
Ou “reconstruir a III”, cujo modelo
(entre 1919 e 1923) é reivindicado?
A questão do número pode parecer
apenas um problema de forma, mas contém um profundo significado político.
Cada Internacional foi fundada como
resposta a profundas necessidades da
luta de classes, em sua época. Seu número as identifica com a época e as tarefas históricas que enfrentaram.
A I Internacional (1864 – 1876) respondeu a uma primeira maturação do
movimento operário mundial. Respondia
à necessidade objetiva do proletariado de
se agrupar numa internacional operária
unificada para lutar de modo mais organizado, consciente e independente da
burguesia. Desapareceu como consequência de uma grande derrota histórica:
a da Comuna de Paris e as profundas batalhas políticas e metodológicas entre os
marxistas e os anarquistas, seguidores de
Bakunin.
A II Internacional (fundada em 1889)
foi a organização dos grandes partidos
operários socialistas e marxistas que ganharam peso de massas. Nela, o proletariado fez sua aprendizagem política e
sindical. Morre como organização revolucionária com a traição de seus dirigentes, em 1914, quando cada partido nos
países imperialistas apoia sua respectiva
burguesia nacional na Primeira Guerra
Mundial. Mesmo depois da Guerra, continuou existindo. Seus partidos eram
agora organizações que integravam e
apoiavam governos capitalistas.
A III Internacional (1919 – 1943) nasceu como resultado da reação a essa traição. Sua fundação já era impulsionada
por Lênin desde 1916. Ao mesmo tempo,
havia a necessidade de construir organizações de tipo novo: os partidos bolcheviques ou leninistas, capazes de atuar na
época imperialista e de dirigir o proletariado até à revolução socialista, como
ocorreu na Rússia em 1917, quando, pela
primeira vez na História, o proletariado
tomou o poder e construiu um Estado
operário. Este grande triunfo alentou sua
fundação e crescimento.
Entre 1919 e 1923 deu-se a primeira e
até agora mais forte tentativa de construir uma verdadeira direção revolucionária internacional com peso de massas:
um partido mundial da revolução socialista. Foi uma grande conquista dos trabalhadores de todo o mundo e, por isso,
MARÇO DE 2012
reivindicamos tanto sua concepção organizativa como as elaborações programáticas de seus primeiros quatro congressos.
A burocratização da III
Por profundas razões (como a derrota
da revolução alemã de 1919 e o isolamento resultante na URSS e o altíssimo
custo da guerra civil), o stalinismo pôde
burocratizar e degenerar o partido bolchevique russo e o Estado operário soviético
e, consequentemente, a III, a qual foi
transformada num instrumento da política exterior da burocracia. Como resultado dessas políticas, a III acabou sendo
responsável por grandes derrotas como a
da Revolução Chinesa de 1923 – 1925 e,
fundamentalmente, cúmplice por não tentar combater o triunfo do nazismo e sua
ascensão ao poder na Alemanha, em
1933.
Entre o início aberto do processo de burocratização, em 1923, e o triunfo do nazismo, Trotsky se recusou a romper com
a III e lutou tenazmente para defender
essa grande conquista e resgatá-la do
avanço do stalinismo e da burocratização
da URSS e da III. Sua fração política tinha
o nome de Oposição de Esquerda e os
trotskistas se autodenominavam de “bolcheviques–leninistas”.
Apenas depois do triunfo do nazismo
em 1933 – pela política da III e do PC alemão ante esse acontecimento – chegou à
conclusão de que a III e os PCs estavam
mortos como organização revolucionária
e agora se encontravam no campo da contrarrevolução. Nesse momento, decide
chamar à construção de uma nova Internacional para defender e manter o legado
da III.
La III Internacional teve influência
de massas. Na foto, ato do Partido
Comunista Alemão
Em 1943, a pedido do presidente
norte-americano Roosevelt, Stalin, para
mostrar sua lealdade à “coexistência pacífica” com o imperialismo, dissolve “oficialmente” a III. Da mesma forma que
sua construção tinha sido um grande
triunfo, sua degeneração, e sua posterior
dissolução, foram uma grande derrota do
movimento operário mundial.
A IV é a continuidade da III
Trotsky funda a IV como uma continuação da III. Fá-lo para defender a herança programática e as concepções
organizativas do marxismo e do leninismo que a burocracia stalinista estava
destruindo. Além do mais, apresentavase como a “herdeira” dessa tradição contra uma horrível caricatura da mesma.
A esta tarefa vigente, Trotsky agregava
uma nova: lutar por uma revolução política na URSS para que a classe trabalhadora derrotasse a burocracia e
recuperasse o poder que lhe havia sido
usurpado e contra sua nefasta influência
no movimento operário internacional,
através da construção de uma internacional revolucionária. Nesse combate contra o stalinismo, a IV se propunha a
educar milhares de novos quadros no
mesmo objetivo estratégico da III: dirigir
a classe trabalhadora no processo da revolução socialista mundial.
Noutro artigo desta revista, analisa-se
a história da IV, sua crise, as razões da
crise e os debates e correntes que se
deram em seu seio. Aqui queremos,
ainda que sejamos repetitivos, tirar uma
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conclusão da primeira parte deste artigo:
manter a proposta de reconstruir a IV
não significa um empenho formal por
um número, mas afirmar que as bases de
sua fundação (a necessidade de construir
uma direção internacional, segundo o
modelo leninista de organização, que
possa conduzir a classe trabalhadora à
uma revolução socialista internacional
triunfante que derrote e acabe com o imperialismo e implante a ditadura revolucionária do proletariado em todo o
mundo) é hoje mais vigente do que
nunca.
Essa não é uma tarefa “só de trotskistas”, mas de todos os lutadores que querem acabar com o capitalismo
imperialista. Mais ainda quando muitas
organizações de esquerda propõem “humanizar o capitalismo” (ou seja, “mudar
as coisas” no marco do próprio capitalismo) ou surgem como falsas alternativas, como o Socialismo do Século XXI
impulsionado por direções burguesas
como Chávez. Recentemente, Chávez
propôs formar uma “V Internacional” integrada, entre outros, pela burocracia do
PC chinês, o PT brasileiro, o PSOE espanhol, etc. Para bom entendedor, meia-palavra basta.
Continua vigente a proposta da
revolução socialista internacional?
Outras posições e questionamentos criticam o conjunto do modelo político–organizativo da IV e da III. São expressos
por ativistas das novas gerações que saíram para a luta depois da queda do Muro
de Berlim (1989) e da queda da URSS
(1990). Incluem uma gama muito ampla
de posições e, em muitos casos, então
imbuídos do balanço resultante da restauração capitalista no Leste por parte da
maioria da esquerda e as conclusões políticas com que agora se orienta.
Fundamentalmente, essas críticas se
baseiam em dois raciocínios: o primeiro
expressa que o que esteve errado na experiência do chamado “socialismo real”
foi a própria concepção de como se deveria desenvolver o processo revolucionário (o centro era a tomada do poder
pela classe trabalhadora, a destruição do
estado burguês e a construção de novos
Estados operários) e a proposta política
organizativa de “partidos centralizados
de combate” para dirigir esses processos.
Afirma-se que nessa concepção leninista
de partido, logo transportada a um Estado “ditatorial”, já estava a raiz do problema: falta de liberdades e de
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democracia que culminaria inevitavelmente na burocratização e o fracasso da
experiência, por estar “afastada” das
massas.
O centro da luta contra as injustiças e
os males atuais, especialmente padecidos pela juventude, passaria então pelo
“aprofundar” ou “radicalizar a democracia”. O fio condutor seria: “somos a
maioria e se nos mobilizarmos e lutarmos de modo consequente, podemos
impor à minoria nossas reivindicações e
assim dirigir o curso da sociedade”. Através desde “aprofundar da democracia”
viriam as mudanças políticas e sócioeconômicas. Ainda que nem todas as
propostas desse tipo sejam “pacifistas”,
retomam, de certa forma, a base conceitual expressa por Mahatma Gandhi, líder
da luta pela independência da Índia: a
força e a continuidade da mobilização
das massas e a justeza moral de suas reivindicações acabariam por garantir a vitória.
No terreno político-organizativo, tentase construir redes e coordenações dos diferentes setores para a luta e de realizar
grandes assembleias de massas nas
quais seriam definidas tanto o curso da
luta como o programa a ser adotado.
Mas elas, corretas e necessárias, se unem
na recusa de toda forma de organização
e direção permanentes e centralizadas,
que já trariam o “germe” da burocratização.
Queremos expressar que compartilhamos plenamente de dois aspectos da
visão de milhares de jovens. Primeiro, a
reivindicação das grandes ações autônomas das massas como método de luta
que possa mudar a História. Isto quer
Nosso programa se opõe a dar apoio
a governos burgueses, ainda que estes
se digam de “esquerda”, como o de
Hugo Chávez
dizer que as revoluções são feitas pelas
massas mobilizadas. Segundo aspecto: a
reivindicação da necessidade da mais
ampla democracia no interior dos processos de mobilização e luta como uma
ferramenta imprescindível para que
esses processos se desenvolvam e triunfem. Ou seja, estamos contra a concepção burocrática de que as revoluções são
feitas pelas “ordens” de comandantes,
secretários-gerais ou presidentes “esclarecidos” como Stalin, Fidel Castro ou
Chávez.
Contra quem lutamos?
Acreditamos que o ponto de partida do
debate é a pergunta: contra quem lutamos? Ou quem é o culpado pela crise
econômica, o desemprego, a baixa salarial, o aumento da exploração, a pobreza
e a miséria, por um lado, e pelo fato de
todos os regimes políticos atuais serem
ditaduras ou “sistemas democráticos”
vazios de conteúdo, com uma minoria
que sempre acaba dirigindo, através de
governos de diferentes partidos, os destinos da sociedade. Para nós, a resposta
é clara: é o sistema capitalista imperialista.
Este sistema é, em primeiro lugar, uma
formação sócio-econômica baseada na
propriedade privada dos meios de produção (as fábricas e a terra) e de troca (os
bancos) nas mãos de uma classe: a burguesia. Nela, podemos distinguir algumas centenas de empresas (as
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“multinacionais”) e bancos imperialistas
muito concentrados (os verdadeiros
donos do mundo) e burguesias nacionais
associadas ou dependentes dela. A partir
desse domínio econômico da sociedade,
a burguesia (especialmente a imperialista) dita as “regras do jogo” econômico
e social do mundo e dos países. O motor
do sistema capitalista imperialista é a
busca de lucro pelas empresas e não a
satisfação das necessidades das pessoas.
Uma busca de lucro que se faz cada vez
mais voraz, à medida que o sistema se
torna cada vez mais especulativo e parasitário, e que se vê agravada e se expressa com toda a violência na atual crise
econômica internacional.
Para satisfazer essa voracidade por
lucro, o capitalismo não só não pode garantir melhorias do nível de vida das
massas (como o fez, por exemplo, no século XIX), como, para continuar funcionando, deve atacá-lo e piorá-lo
constantemente. Os exemplos atuais sobram. Para milhares de milhões de habitantes do mundo a realidade é a fome –
que, por exemplo, fez explodir a “revolta
dos famintos” de 2008, em Moçambique
– nos países mais pobres. Mas também
se expressa nos países mais ricos, como
mostra a realidade da Grécia e Portugal,
O capitalismo imperialista atua como
um sistema internacional unificado.
Um exemplo disto é o FMI
MARÇO DE 2012
ou o fato de que, nos EUA (o país mais
poderoso do mundo), já existam aproximadamente 45 milhões de pobres.
Não haverá solução para os problemas
dos trabalhadores e das massas enquanto subsistir o sistema capitalista-imperialista. Pelo contrário, para salvar os
banqueiros e especuladores, tudo continuará a piorar: cada vez haverá menos
comida, emprego, salários, saúde e educação pública e casas para todos. Uma
realidade que continuará enquanto não
terminarmos com este sistema e o substituirmos por outro sistema sócio-econômico em que a produção e os
investimentos, através de uma economia
planificada pelo Estado, estejam ao serviço da satisfação das necessidades das
massas e não para manter o lucro de um
punhado de empresas e bancos. Para
isso é necessário expropriar as fábricas e
bancos aos capitalistas.
Mas para defender sua propriedade, a
burguesia conta com os Estados ao seu
serviço e a luta pela expropriação deve
passar, inevitavelmente, pela luta para
tirar o poder desse Estado. Para nós, o
processo de luta que leva da realidade
atual do capitalismo a esse objetivo é a
revolução socialista.
Os limites da “democracia
em geral”
Nas lutas do Norte de África, Oriente
Médio, Europa e EUA, tem um peso
muito importante a batalha pelas liberdades democráticas, contra as ditaduras
ou contra as “democracias dos ricos”.
Vimos que muitos ativistas opinam que
esta “ampliação da democracia” seria o
caminho para alcançar as mudanças sociais.
A luta pelas liberdades democráticas é
imprescindível, especialmente quando se
dirige contra os regimes ditatoriais ou
bonapartistas que eliminam totalmente
ou restringem essas liberdades. Compartilhamo-nas e a impulsionamos plenamente. Acreditamos que essas liberdades
democráticas são imprescindíveis para
que os trabalhadores e os jovens possam
se organizar e lutar melhor. Por isso, é
totalmente correto lutar por elas e defendê-las quando são conseguidas e
ameaçadas.
No entanto, é um erro considerar que
é suficiente “ampliar a democracia” para
conseguir as mudanças sociais e terminar com os males que o capitalismo cria.
Na realidade, é equivocado falar de “democracia em geral”.
O que hoje vemos no mundo são “democracias burguesas”, sistemas políticos
ao serviço da burguesia. Porque ela domina a sociedade numa via de mão
dupla: são os donos de empresas e bancos que controlam os Estados e os põem
ao seu serviço.
Numa verdadeira democracia, as massas trabalhadoras que deveriam controlar
a economia e as ações de Estado, para
que esses respondessem à satisfação de
suas necessidades mais urgente e não às
dos capitalistas e seus lucros. Mas não é
assim: qualquer que seja a opinião política das massas, aqueles que dominam a
economia e ditam as “regras do jogo” são
as grandes empresas e os bancos. E o Estado, através de governos de diversos partidos (ainda que se apresentem como
“ideologicamente diferentes”), responde
a essas necessidades. Nesta realidade, os
indignados espanhóis falam, com ironia,
do “PPSOE”...1
Assim, mudam os partidos no governo,
mas continuam as mesmas políticas.
Quem votou, por exemplo, nas gigantescas ajudas estatais do BCE ou/e da Reserva Federal2 aos especuladores
financeiros de bilhões de dólares e euros?
Quem votou nos duríssimos planos de
austeridade? Quem votou que, na Grécia
ou Itália, governem homens que foram
altos executivos do banco norte-americano Goldman Sachs? A burguesia monta
uma série de instituições e legislações ao
seu serviço e diz às massas que são “sacrossantas”. Mas se a “incomodam”, “reformam-nas” sem problema. E se por
causa de um agravamento da luta de classes a coisa se torna mais complicada,
aparecem os verdadeiros “pilares” do Estado burguês: as Forças Armadas e de repressão. Presente está o exemplo da
repressão contra os jovens e trabalhadores
árabes, os indignados europeus, o movimento Occupy nos EUA, as mobilizações
contra a austeridade na Grécia, o desalojamento do Pinheirinho no Brasil, etc. É
neste sentido que Engels expressava que
até a maior democracia burguesa continua
sendo uma “ditadura do capital”.
Ou seja, por um lado a burguesia não
mais garante direitos democráticos de
“conteúdo” aos trabalhadores e aos jovens, como emprego, salário digno, saúde
e educação pública, gratuita e de qualidade. Esta democracia é cada vez mais
uma forma vazia de conteúdo, cada vez
menos “democrática”. Sob o domínio do
capitalismo, nunca poderá haver verdadeira democracia para as massas.
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Como conseguir uma
“verdadeira democracia”?
Para consegui-la é necessário cortar
pela raiz o controle sócio-econômico que
a burguesia tem da sociedade, o que implica expropriar suas fábricas e bancos.
Mas a burguesia nunca deixará que isto
ocorra de “boa vontade”, nem pela “justiça” das reivindicações populares. Irá
defender-se com unhas e dentes.
Primeiro, com “suas” instituições,
“sua” legislação e uma repressão moderada às lutas. Mas se o processo se torna
mais agudo e ameaça profundamente
seu domínio, apelará a todas as reservas
do “seu” Estado: as Forças Armadas e de
repressão e, inclusive, os bandos armados “extra-oficiais” e os golpes de Estado.
Neste sentido, a luta pelas mudanças
sócio-econômicas de fundo deve passar,
imprescindivelmente, pela luta pelo
poder de Estado entre a burguesia de um
40
lado e os trabalhadores e as massas no
outro. Uma luta na qual se decide quem
tem a força para impor ao outro sua vontade.
Por isso o programa revolucionário socialista da III e da IV põe como centro da
luta o objetivo da tomada do poder, a
instalação de um governo da classe trabalhadora e do povo, a destruição do Estado burguês e o início da construção de
um Estado de novo tipo, sobre bases sociais radicalmente diferentes às do capitalismo imperialista. No programa, esse
governo é chamado de “ditadura do proletariado”.
Nesse ponto surge um dos questionamentos mais fortes das novas vanguardas de lutadores: não existe uma
contradição insanável entre essa “ditadura” e a “ampliação da democracia”?
Para entender essa contradição deve-se
entender que, diferentemente do que
acontece hoje, trata-se de uma ditadura
da maioria contra a minoria privilegiada:
são as “duzentas famílias” que dominam
a economia norte-americana, os Botín na
Espanha, os Agnelli na Itália, etc.
Ao mesmo tempo, a diferença entre a
falsificação stalinista, onde as decisões
eram tomadas pelos secretários-gerais e
comitês centrais, e a proposta da IV é
que esse governo baseia-se em organismos democráticos dos trabalhadores e
das massas, como os sovietes (conselhos) de trabalhadores e camponeses dos
primeiros anos da URSS. Neles, as massas elegiam seus deputados e davamlhes mandatos tendo em conta o que
pretendiam e podiam revogá-los a qualquer momento. Esses deputados votavam as leis e ações do governo e também
ajudavam a aplicá-las.
Trotsky e a IV Internacional em um detalhe
de um mural na Cidade do México
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Em ambos os sentidos, para as massas,
era uma ditadura muito mais democrática que a das chamadas “democracias”
atuais.
A contradição ditadura-democracia
É importante entender também que
nenhuma mudança revolucionária profunda foi levada a cabo sem repressão
sobre as velhas classes e setores dominantes que perdem seus privilégios.
Assim ocorreu também com o domínio
burguês e as atuais democracias burguesas. Elas não existiriam sem a Revolução
Francesa de 1789 e o “terror” dos jacobinos contra a monarquia e a nobreza,
ou sem a feroz Guerra da Independência
contra a Inglaterra que os “Pais Fundadores” dos EUA encabeçaram, a partir de
1776. Nesse sentido, devemos dizer que
uma “verdadeira democracia” nascerá,
sim, de uma ditadura, mas – e como assinalamos – a de uma ampla maioria
sobre uma minoria.
Outro fator que torna imprescindível a
ditadura do proletariado é que, caso o
poder em um ou vários países seja tomado, mas o imperialismo conserve o
domínio das nações principais, haverá
inevitavelmente ataques e guerras contra
o nascente Estado operário.
Assim o demonstra a invasão à URSS
de 16 exércitos estrangeiros em 1918 ou
as guerras da Coreia e Vietnã. Nesse aspecto, a ditadura é imprescindível para
defender o novo Estado destes ataques.
O caráter internacional da luta
Se a luta contra o capitalismo imperialista começa ao nível de cada país só poderá triunfar totalmente a nível
internacional, porque este sistema tem
esse caráter e seus principais polos são
os países imperialistas mais fortes como
EUA, Japão, Alemanha, etc. A revolução
socialista só se poderá considerar terminada quando tiver vencido nesses países.
Precisamente, o fator central que levou
ao fracasso da experiência do chamado
“socialismo real” foi uma tentativa da
burocracia estalinista de desenvolver o
“socialismo nacional” na URSS e em outros países (em geral, débeis economicamente). Para defender seus privilégios, a
burocracia abandonava a luta internacional contra o imperialismo e a substituía
pela “coexistência pacífica” com ele.
Nos países onde surgiram Estados operários, alcançaram-se grandes avanços e
conquistas, mas o capitalismo imperialista manteve o domínio das principais
MARÇO DE 2012
potências de muito maior desenvolvimento econômico. Com isso, manteve o
domínio da produção e dos mercados
mundiais e pôde estrangular até derrubar esses “socialismos nacionais”.
Ao mesmo tempo, se as revoluções
triunfantes em um ou alguns países não
se estenderem a nível internacional e
não se toma o poder nos países centrais,
estes utilizarão todo seu poderio econômico-militar para tentar derrotar militarmente o processo.
Estes são os dois elementos estratégicos que explicam porque a revolução socialista deve ser internacional e por que,
então, precisamos de uma organização
internacional de luta revolucionária para
levá-la adiante.
A democracia operária
Vimos que nossa proposta de funcionamento do novo Estado se baseia na
mais profunda democracia para os trabalhadores e as massas. Para diferenciála
da
“democracia
burguesa”
chamamo-la de “democracia operária” e
é um ponto central de nosso programa.
A luta pela democracia operária não é
algo que fique limitada ao futuro Estado.
Pelo contrário: é profundamente válida
e imprescindível hoje através da luta
contra as burocracias sindicais cúmplices e colaboradoras do capitalismo. É
necessário destronar estes dirigentes
vendidos para que novas direções sejam
formadas nas organizações das massas.
Também defendemos sua plena aplicação e defesa em novos organismos de
luta que se vão construindo no processo.
Reunião dos Sovietes (conselho)
dos deputados operários na Rússia, 1917
Consideramos que a revolução socialista e a luta que conduz até ela só
podem se desenvolver até o final caso
estejam baseadas num processo de mobilização permanente das massas, através de sua autodeterminação e
organização democrática.
Ao mesmo tempo afirmamos que
esses elementos (a mobilização permanente e autodeterminada das massas, a
democracia operária em seus organismos e o controle sobre os dirigentes com
o direito de revogabilidade) são os únicos e verdadeiros caminhos para combater e impedir a burocratização desses
dirigentes e desses organismos. Por isso,
o stalinismo e todas as burocracias os
destroem e o trotskismo luta incansavelmente pela sua defesa.
O partido democraticamente
centralizado
O caráter que adquire a luta pelo
poder contra o Estado burguês – um
aparato centralizado e com muitos recursos – marca as limitações que, nessa
luta, têm as redes e coordenações. Estas
formas de organização mostraram capacidade de convocar e realizar importantes mobilizações de resistência no marco
de uma unidade de ação de diversos grupos sociais, especialmente no marco de
lutas pelas liberdades democráticas ou
contra os planos de austeridade. Mas
quando se trata de avançar no embate
decisivo sobre o Estado burguês não é
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LIT-QI - 30 ANOS
A “centralidade”
da classe trabalhadora
O capitalismo criou grandes concentrações de operários e trabalhadores que,
com sua luta, podem paralisá-lo. Na foto, operários da construção na Argentina,
em assembleia durante uma greve
efetiva, já que inevitavelmente tende a
se dispersar pelas contradições de objetivos dos diferentes elementos da rede.
Pelo seu próprio caráter, a luta pelo
poder deve ser necessariamente centralizada e disciplinada. Caso contrário, os
diversos setores que participam podem
ser derrotados separadamente. Na história moderna se apresentaram duas alternativas de como esta luta centralizada e
disciplinada pode ser dirigida com possibilidades de triunfo. Uma é o “partidoexército” presente, por exemplo, nos processos revolucionários da China, Cuba,
Vietnã, etc. Aqui, a disciplina é garantida
através de uma estrutura vertical-militar
onde o que se faz, ou não, é definido
pelos “comandantes”. Mas essa disciplina militar imprescindível se aplica
sem mudanças no terreno político: não
se toleram as diferenças internas e, em
muitos casos, elas se extinguem com assassinatos, como foi o caso da comandante
Ana
María,
do
FMLN
salvadorenho, em 1983. Opomo-nos
completamente a esta metodologia. A
outra alternativa – a que nós propomos
– é o partido leninista (ou de combate),
como o da Revolução Russa de 1917, que
funciona com a metodologia do “centralismo democrático”. Isto significa, por
um lado, que na sua ação na luta de classes (por exemplo, ante uma greve ou
42
uma mobilização) o partido atua de
modo centralizado e disciplinado, conduzido por sua direção. O que quer
dizer, com a posição votada por maioria
em seus organismos. Esta centralização
e disciplina na ação na luta de classes
são ainda mais necessárias nos momentos mais agudos, como a luta pelo
poder.
Mas tem profundas diferenças com o
partido-exército que se expressa no chamado “polo democrático” do partido leninista. A primeira é que a adesão a essa
centralização e disciplina sempre é voluntária e só se obriga a aceitá-la aqueles que coincidem com seu programa e
metodologia. A segunda é que existem
instâncias centrais nas quais seus membros debatem tudo o que diz respeito à
vida do partido. Especialmente nos congressos, onde os delegados eleitos pela
base votam a direção, o programa e a
linha política que logo a direção eleita
levará por diante.
Dessa forma, o centralismo democrático se mostrou capaz de ter a disciplina
férrea necessária para a luta pelo poder
e, por sua vez, de realizar uma “elaboração coletiva” do programa, fazer uma
seleção dos melhores dirigentes e “impulsionar” as mudanças das complexas
situações da luta de classes e dos estados de ânimo das massas.
Os programas da III e da IV postulam
claramente o papel central e dirigente da
classe trabalhadora no processo de luta
pela revolução socialista (é o “sujeito social” dessa revolução).
Esse aspecto também é questionado
por quem assinala que hoje a classe trabalhadora tem um peso social muito
menor que na época de Lenine e
Trotsky; que uma parte se “aburguesou”
por certas conquistas sociais e hoje atua
de modo “conservador”. Por outro lado,
teriam surgido outros setores sociais,
como o campesinato pobre, as massas
plebeias urbanas, a juventude estudantil, os “precarizados” (um setor diferenciado e mais explorado da classe
trabalhadora), etc., que são mais combativos. Por isso, já não deveríamos falar
de “classe trabalhadora”, mas de
“povo”, “cidadãos” ou outros termos.
A definição marxista de que a classe
trabalhadora é o “sujeito social” principal da luta contra o capitalismo surgiu
como resultado de uma análise científica
e não de um dogma ou uma fé religiosa
e irracional. A classe operária ou trabalhadora é a que produz e move economicamente a sociedade. Em especial os
trabalhadores industriais e dos principais
serviços, como energia, transporte, comunicações e bancos. Assim sendo: sua
luta tem a capacidade de paralisar diretamente o “coração” e outros “órgãos vitais” da sociedade capitalista. Ao mesmo
tempo, o próprio capitalismo concentrou
a classe trabalhadora em grandes núcleos, aos quais chamamos os “batalhões pesados” da luta.
Ainda que tenha havido algumas mudanças na estrutura produtiva, acreditamos que essa análise continua,
essencialmente, vigente: a classe trabalhadora continua no centro do funcionamento da sociedade capitalista. Ao
mesmo tempo, se em algumas épocas do
século XX e em alguns países houve setores dos trabalhadores que tiveram alguns privilégios (a “aristocracia
operária”), atualmente a classe trabalhadora é atacada em toda a linha pela burguesia e volta a ocupar um lugar na
primeira fila da luta, como demonstrado
pelos processos do Egito ou da Europa.
Outros setores sociais oprimidos
(como o campesinato pobre ou as massas plebeias urbanas), pelas suas próprias características sociais, podem ser
mais explosivos em suas lutas, mas tamCORREIO INTERNACIONAL
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LIT-QI - 30 ANOS
bém são muito menos constantes e contundentes. A juventude, por seu lado,
traz sempre combatividade e radicalização, entretanto, tratando-se de um setor
não estrutural, não pode, por si mesma,
atacar os “centros vitais” do capitalismo.
É imprescindível que os jovens dos
movimentos alternativos de luta compreendam que sem a classe trabalhadora
é praticamente impossível tomar o poder
e derrubar o capitalismo e, mais ainda,
começar uma construção de transição ao
socialismo. Nesse sentido, não devem
confundir a classe trabalhadora com os
aparatos sindicais burocráticos, conservadores e inimigos da mobilização. Por
isso é indispensável que essa juventude
utilize sua radicalização e combatividade
não para “se separar” dos trabalhadores
(ou se dissolver em sua “cidadania”),
mas para ser a faísca que ajude a classe
trabalhadora a entrar de modo pleno e
autodeterminado na luta.
Por outro lado, afirmar esta centralidade não é dizer que a classe trabalhadora é o único sujeito da luta contra o
capitalismo. Pelo contrário, os programas da III e da IV reconhecem claramente que existem outros setores sociais
duramente atacados pelo capitalismo
que também lutam com força.
MARÇO DE 2012
Assim se expressa a importância e a
necessidade de disputar esses setores à
influência do capitalismo. Portanto, a
proposta é a construção de uma “aliança
das classes oprimidas”, encabeçada e estruturada pela classe trabalhadora para
lutar contra o capitalismo.
A independência de classe
Profundamente relacionado com o anterior, existe outro ponto central em
nosso programa: a necessidade de que a
classe trabalhadora mantenha sua total
independência política de classe da burguesia. Isto significa que a classe trabalhadora deve se organizar politicamente
de modo independente de qualquer variante burguesa, ainda que se disfarce de
“esquerda” e que isso se expresse a
todos os níveis, incluindo o eleitoral.
Isso é especialmente importante
quando a burguesia “disfarça” seus governos, através das chamadas “frentes
populares” (governos conjuntos de partidos burgueses e operários reformistas
como é o caso do governo do PT no Bra-
sil) ou dos governos burgueses “populistas de esquerda” (como é o caso de
Chávez na Venezuela). São manobras do
capitalismo para sobreviver e becos sem
saída para a classe trabalhadora.
Opomo-nos totalmente a qualquer
apoio a estes governos e a participar
neles. Pelo contrário, estamos em oposição a todos eles e lutamos para que a
classe trabalhadora não deposite nenhuma confiança e preserve sua completa independência política.
Esta é uma verdadeira “prova de fogo”
para as correntes que se reivindicam revolucionárias porque, na sua grande
maioria, capitularam a estes governos.
Quem chamamos?
Quando chamamos à reconstrução da
IV entendemos que é uma tarefa não só
para os trotskistas, mas para todos os revolucionários. Mais ainda, acreditamos
que atualmente a maioria das organizações que se reivindicam trotskistas não
estão dispostas, em forma ou conteúdo,
a tomar esta tarefa.
Os processos revolucionários do Norte da África e Oriente Médio mostraram
que as grandes lutas de massas são capazes de “mudar a história”.
Na foto, a famosa Praça Tahrir do Cairo
43
* 36-45 Reconstrucción IV (P)_Maquetación 1 21/03/12 10:36 Página 44
LIT-QI - 30 ANOS
A burguesia conta com aparatos especiais para reprimir a luta das massas
e defender sua propriedade e seus lucros. Na foto, a polícia espanhola
reprime um “indignado” em Barcelona
Não há forma de reconstruir a IV
senão à volta de um programa revolucionário, cujos eixos centrais esclarecemos
brevemente neste artigo. Mas muitas organizações, como o chamado Secretariado Unificado (SU), abandonaram há
tempos o programa e os princípios da IV
(por exemplo, a luta pelo poder dos trabalhadores ou a construção de partidos
revolucionários) e cruzaram a fronteira
de classe até à colaboração e a capitulação à burguesia, como o apoio que
deram aos governos de Lula no Brasil e
Prodi na Itália.
Tampouco significa reagrupar as organizações sectárias que confundem seus
desejos com a realidade e se contentam
a recitar o programa trotskista, mas são
incapazes de encontrar (nem sequer a
procurar...) com esse programa, o caminho até às massas. Já Trotsky havia prevenido sobre a impossibilidade de
construir algo juntamente com os sectários. Inclusive, quando estas seitas conseguem algum crescimento – ao mesmo
tempo em que mantêm seu caráter burocrático, aparatista e autoproclamatório
(“somos a IV”) – começam a mostrar
também uma veia oportunista. Foi o caso
do chamado “lambertismo” e também,
atualmente, da Fração Trotskista, encabeçada pelo PTS da Argentina.
Às características assinaladas, essas
organizações juntam a política de fazer
44
chamados permanentes ao “reagrupamento dos revolucionários” e às “conferências abertas” com a única intenção de
atuar deslealmente sobre organizações
trotskistas mais importantes e ganhar alguns militantes. Não os move a genuína
vontade de intervenção na luta de classes, mas uma espécie de “canibalismo
político” e deslealdade permanentes.
Qualquer tentativa de reconstruir a IV
com estes grupos significará, inevitavelmente, a paralisia provocada por intermináveis lutas internas.
Uma IV com muitos lutadores
de outras origens
Então, ao nos referirmos à reconstrução
da IV, não estamos falando de um crescimento linear das atuais organizações
da LIT. Somos conscientes de que só é
possível reconstruir a IV com a incorporação de milhares de ativistas revolucionários vindos de distintas trajetórias. A
“IV reconstruída” deverá agrupar revolucionários com origem em diversas tradições do marxismo e também
provenientes de fora dele, em base ao
acordo com um programa revolucionário. Um programa cujos traços centrais
tentamos delinear neste artigo:
• A impossibilidade do capitalismo imperialista resolver as necessidades urgentes das massas e seu ataque cada
vez maior ao seu nível de vida.
• A necessidade de uma revolução socialista internacional para mudar pela
raiz este estado de coisas.
• O papel central da classe trabalhadora
como sujeito da revolução socialista.
• O impulso e a defesa da mobilização
permanente da classe trabalhadora e
seus aliados.
• O impulso e defesa da independência
política da classe trabalhadora frente a
toda variante burguesa, especialmente
dos governos de frente popular e populistas de esquerda.
• A necessidade de lutar contra todas as
burocracias e por um regime de democracia operária em todas as organizações da classe.
• Afirmamos que a grande tarefa da
classe trabalhadora nesta etapa é a tomada do poder, a destruição do Estado
burguês e de suas Forças Armadas e
estabelecer uma ditadura revolucionária do proletariado.
• O Estado Operário Revolucionário pelo
qual lutamos deve ser baseado em
conselhos de trabalhadores, de camponeses e do povo, ter um regime da
mais ampla democracia para a classe
trabalhadora e a maioria absoluta do
povo.
• Recusamos a suposta “teoria” do “socialismo em um só país”. A revolução
socialista terá um caráter internacional
ou estará destinada a retroceder e a ser
derrotada.
• A necessidade imediata e inevitável de
construir uma organização internacional revolucionária, integrada por partidos nacionais segundo o modelo
leninista, em todos os países do
mundo, como seções desta Internacional.
• Defendemos a moral operária e revolucionária. Defendemos a máxima lealdade na relação entre organizações
que se reivindicam revolucionárias.
CORREIO INTERNACIONAL
* 36-45 Reconstrucción IV (P)_Maquetación 1 21/03/12 10:36 Página 45
LIT-QI - 30 ANOS
Nosso chamado é dirigido, com certeza, àquelas organizações revolucionárias com as quais possamos estabelecer
acordos programáticos e relações fraternais de discussão no processo de aproximação. Essencialmente, é dirigido, em
primeiro lugar, às correntes e grupos que
rompem com as grandes organizações de
massas que o stalinismo, a social-democracia e o castro-chavismo ainda dirigem
e se orientem até a esquerda para procurar uma alternativa revolucionária.
Em segundo lugar, é dirigido às novas
gerações de lutadores, como os jovens
egípcios que participam de organizações
como a do “movimento 6 de Abril”, os
ativistas dos “indignados” europeus ou
os de Occupy, nos EUA. Eles lutam ativamente contra a ditadura e as consequências do capitalismo e da crise e
procuram referências que lhes permitam
orientar-se nessa luta.
Chamamos todos eles a reconstruir a
IV Internacional porque, como dizíamos
ao início, consideramos que a construção de uma direção revolucionária internacional é a “mãe de todas as tarefas”
que propomos aos lutadores.
A LIT-QI é hoje, então, o “espaço natural”
para que os militantes e grupos revolucionários se integrem e atuem internacionalmente, debatam e intervenham nos
centros da luta de classes e tragam a necessária atualização programática que as
mudanças na situação mundial exigem.
Somos conscientes de que a LIT é
ainda uma organização pequena. Nossa
força principal está no programa revolucionário que apresentamos e na vontade
consequente de lutar por ele.
Posto isto, chamamo-los a construir a
LIT. Pomos nossa organização internacional à disposição desses militantes e
grupos para que, em torno desse programa, tomem-na como um instrumento para avançar na construção de
uma internacional revolucionária com
peso de massas.
1
PPSOE – uma junção das siglas do PP, de
direita, e do PSOE, social-democrata, os dois
partidos que se alternam no poder.
2
BCE – Banco Central Europeu; Reserva federal ou Federal Reserve, o banco central dos
EUA.
A LIT-QI ao serviço dessa tarefa
Já assinalamos que a LIT-QI está ao
serviço da reconstrução da IV. Isto significa que se põe à disposição das organizações e militantes revolucionários de
todo o mundo como uma ferramenta e
um espaço democrático para a reconstrução da IV. E que, no imediato, põe todo
seu patrimônio político e militante, sua
estrutura de seções e publicações ao serviço dessa tarefa. Desse modo, já se está
tornando um pequeno polo de reagrupamento de algumas organizações e militantes trotskistas e não-trotskistas.
No entanto, hoje não estão previstas,
em curto prazo, fusões que possam dar
origem a uma nova organização internacional. Nem tampouco existe uma organização de maior peso na qual a LIT-QI
possa entrar e se integrar. Por isso, acreditamos que, nas atuais condições, a tarefa de reconstruir a IV passa pela
construção e o crescimento da LIT-QI.
Essa conclusão não representa nenhum tipo de autoproclamação. Não
somos nem nos julgamos a IV reconstruída. Essa é uma tarefa que está por ser
feita e esperamos poder realizá-la junto
com todos os revolucionários dispostos
a encará-la. Seguramente, isso vai ter sua
expressão organizativa no futuro. Mas a
situação atual é a que descrevemos.
MARÇO DE 2012
45
* 46-Argentina a Moreno (P)_Maquetación 1 15/03/12 14:45 Página 46
VIDA DA LIT-QI
Argentina
Ato do PSTU argentino em
homenagem a Nahuel Moreno
N
o último mês de janeiro, o salão
Bolívar do Hotel Bauen, na zona
central de Buenos Aires, a capital argentina, foi cenário perfeito para
que cerca de 200 companheiros se encontrassem para prestar homenagem a
Nahuel Moreno, aos 25 anos de seu falecimento.
Assim que começou o ato, uma mistura de emoções tomou conta dos companheiros e companheiras que tinham
comparecido, enquanto se projetava um
vídeo que recordava a intervenção de
Moreno no encerramento da 2ª conferência internacional da Liga Internacional dos Trabalhadores. Exatamente no
ano em que se completa o 30º aniversário da fundação da LIT, sua maior obra
política, todos os presentes puderam observar a paixão revolucionária com a
qual ele encarava cada ação em sua vida.
Intervenções e saudações
Demián Romero, secretário geral de
ATEN Centenario da província de Neuquén, foi encarregado por abrir o ato e
apresentar os oradores que posteriormente se dirigiram a dezenas de ativistas
operários, lutadores dos movimentos social e estudantil que estiveram presentes
no recinto. Um caloroso aplauso foi ouvido em toda a sala quando se mencio-
46
nou a presença de Clara Bressano (filha
do “velho” Nahuel) e de Ricardo Napurí,
um dirigente histórico peruano, fundador
da LIT. Aconteceu o mesmo com os companheiros militantes dos partidos irmãos
do Uruguai e do Paraguai presentes, e
com a leitura das saudações provenientes
dos partidos irmãos do Chile e do secretariado internacional da LIT.
A primeira intervenção ficou aos cuidados de Eduardo Barragán, presidente da
Associação de Profissionais do Hospital
Larcade, que em nome da direção nacional do PSTU se encarregou por relembrar
brevemente os pilares fundamentais que
mantém hoje mais que nunca vigente o
programa trotskista e morenista. Este programa se resume na construção da organização internacional que Moreno
fundou há 30 anos, a LIT, como uma ferramenta essencial para avançar no caminho de reconstruir a IV internacional e
organizar a revolução socialista em nível
mundial.
Em seguida foi a vez de Luciana Danquis, dirigente da juventude do PSTU,
que se referiu a o que significa ser morenista hoje na Argentina: “É enfrentar o
governo, que agora diante da crise mundial começa a aplicar medidas contra o
povo e pede a solidariedade de nós trabalhadores para sustentar as empresas que
recebiam os subsídios.” Neste sentido, a
companheira convocou todos os presentes a se somarem ao PSTU, para colaborarem na construção da alternativa
política que os trabalhadores necessitam
para poder governar e não pagar pela
crise.
Encerramento internacionalista
O fechamento ficou sob responsabilidade do companheiro Dirceu Travesso,
“Didi”, dirigente bancário, da CSP Conlutas e membro da direção do PSTU brasileiro, que chegou especialmente do
Brasil para participar do ato. Em nome
da LIT, o companheiro refletiu com clareza a situação e as tarefas que nós revolucionários temos nos dias de hoje:
“Nossa corrente internacional é pequena
e frágil, porém não devemos ficar parados diante das enormes oportunidades
que a luta de classes nos oferece, frente à
crise mundial. O centro da tarefa é construir, juntamente com as massas que
lutam, este programa revolucionário que
nos deve permitir derrotar o capitalismo.”
No final, entre palavras de ordem e
cantos dos presentes, foi assinalado que
este ato é somente o início de uma homenagem que vai continuar durante o
ano todo, e que vai ser encerrada com
chave de ouro no mês de outubro,
quando for realizado o principal ato pelo
30º aniversário de fundação da LIT, na
Argentina, país onde o morenismo nasceu e deu seus primeiros passos. Depois
de cantar a Internacional, hino que identifica a classe trabalhadora, todos nós
presentes nos retiramos do salão com a
sensação de termos homenageado nosso
mestre da maneira que talvez ele mais tivesse gostado: cheios de força e energia
para encarar os desafios que a luta de
classes nos impõem, para poder aproveitar as oportunidades, construindo o partido e a Internacional que ele nos deixou.
CORREIO INTERNACIONAL
* 34-35 Moral revolucionaria (P)_Maquetación 1 15/03/12 14:13 Página 34
LIT-QI - 30 ANOS
A defesa da moral revolucionária
ALICIA SAGRA
Q
uando nosso IX Congresso Mundial votou e tornou público um
documento sobre “moral revolucionária”, muitos companheiros, agradavelmente surpreendidos, disseram-nos
que nunca tinham visto algo assim. Não
é a primeira vez que damos uma importância central a esse tema. Inclusive, a
fundação da LIT-QI esteve estreitamente
vinculada à sua defesa. O que, sim, é verdadeiro, é o fato de ser a primeira vez
que um congresso mundial considera necessário votar um documento sobre
moral.
A questão moral
e a fundação da LIT-CI
Quando estávamos no processo de ruptura da CIQI1, o principal dirigente da
seção peruana do setor proveniente do ex
CORCI, Ricardo Napurí, que havia manifestado diferenças políticas e metodológicas, foi acusado de “ladrão” por
Lambert. Moreno não hesitou e, seguindo a política de Trotsky da década de
1930, propôs chamar um Tribunal Moral
Internacional que determinasse a verdade ou a falsidade das acusações.
Em 11 de janeiro de 1982, realizou-se
uma reunião em Bogotá, da qual participaram os partidos da ex FB e dois dirigentes que provinham do lambertismo:
Alberto Franceschi, da Venezuela e Ricardo Napurí, do Peru. No primeiro
ponto dessa reunião, ratificou-se o Tribunal e lançou-se uma grande campanha
em torno dele. No segundo ponto, resolveu-se fundar uma nova Internacional,
aprovando-se os estatutos e as Teses Fundacionais da LIT-QI.
Posteriormente, o Tribunal, constituído
por personalidades da esquerda internacional e do movimento sindical, deliberou a favor da honra revolucionária de
Ricardo Napurí.
Atuamos da mesma maneira na Bolívia, nos anos 90, frente aos ataques morais de Guillermo Lora contra um dos
principais dirigentes de seu partido, Juan
Pablo Bacherer, que havia manifestado
diferenças políticas com ele. Este Tribunal foi integrado, entre outros, por Zé
34
Maria de Almeida, dirigente metalúrgico
e membro da direção do PSTU brasileiro,
e por Esteban Volkov Bronstein, neto de
Trotsky. Como no caso anterior, o Tribunal constatou a falsidade das acusações
morais.
O que é a moral revolucionária?
Em 1920, Lênin afirmava: “Em que sentido negamos a moral? Negamo-la no sentido que a pregou a burguesia,
deduzindo-a de mandamentos divinos
(...) o clero, os latifundiários e a burguesia falavam em nome de Deus para defender seus interesses de exploradores (…)
quando nos falam de moral, dizemos:
para um comunista, toda moral reside
nesta disciplina solidária e unida, e nesta
luta consciente das massas contra os exploradores. Não acreditamos em uma
moral eterna, denunciamos a mentira de
todos os contos sobre moral. A moral
serve para que a sociedade humana se
eleve a uma maior altura, para que se
desembarace da exploração”.2
Em 1938, Trotsky, manifesta: “A Quarta
Internacional despreza os magos, charlatães e professores de moral. Em uma sociedade baseada na exploração, a moral
suprema é a da revolução socialista. Bons
são os métodos que elevam a consciência
de classe dos operários, a confiança em
suas forças e seu espírito de sacrifício na
luta. Inadmissíveis são os métodos que
inspiram o medo e a docilidade dos oprimidos contra os opressores, que afogam o
espírito de rebeldia e de protesto, ou que
substituem a vontade das massas pela
dos chefes, a persuasão pela coação e a
análise da realidade pela demagogia e falsificação. Tenho aqui por que a social democracia, que tem prostituído o marxismo
tanto quanto o stalinismo, antíteses do
bolchevismo, são os inimigos mortais da
revolução proletária e da moral da
mesma.”
Em 1969, Moreno, preso no Peru, escreve um texto no qual mostra como na
época imperialista, a burguesia abandona
a moral de sua época de ascensão, funcional à acumulação capitalista e baseada
na “ economia, a sobriedade, a obediência
servil dos filhos e da mulher ao chefe da
família” (…) “a família patriarcal burguesa da etapa da ascensão desaparece,
se rompe, para dar lugar às relações entre
os sexos e os membros da família anárquica, crítica, na qual o elemento fundamental é a transformação de cada
individuo em desfrutador do mundo e do
outro sexo (…)”.3
E propõe que essa “amoralidade” da
burguesia se combina com a moral existente nos setores marginalizados da sociedade, a moral lúmpen, dando origem
a correntes como o existencialismo ou o
espontaneísmo: “O espontaneísmo moral
é a tentativa de setores juvenis de gozar
como indivíduos da sociedade neocapitalista, ou seja, da sociedade de consumo,
sem ajustar-se aos fetiches e reflexos condicionados dessa mesma sociedade”.
“Nós acreditamos justamente no contrário, que nossa moral não é a da opção
como os existencialistas, nem para o gozo
como os espontaneístas, mas a da necessidade da revolução”.4
Moreno, que enfrentava a influência
negativa da moral espontaneísta dentro
do partido, deu tanta importância a essa
discussão que, estando na prisão, priorizou-a acima dos debates políticos que estavam propostos. Com essa visão,
construiu uma corrente que manteve
uma moral revolucionária da qual nos orgulhamos, e cujo maior expoente foi a
solidez moral e ideológica que permitiu
que os mais de 200 presos, fuzilados e
desaparecidos do PST argentino, suportassem a tortura da “Triple A”5 e da ditadura, pondo a segurança do resto dos
companheiros acima de sua própria vida.
O vendaval oportunista
e a moral do “vale tudo”
Trotsky teve que enfrentar a degradação moral provocada por Stalin, o método da amálgama, a monstruosa
perseguição política e moral contra a geração que, junto a Lênin, encabeçou a revolução e a construção do Estado
Soviético. Com os fraudulentos Processos
de Moscou e os campos de concentração,
Stalin acabou com a vida de grande
CORREIO INTERNACIONAL
* 34-35 Moral revolucionaria (P)_Maquetación 1 21/03/12 11:10 Página 35
LIT-QI - 30 ANOS
quantidade desses revolucionários e, em
1940, completou sua tarefa com o assassinato de Trotsky. Ele ganhou a batalha.
Mas Trotsky com sua grande campanha
contra a “escola stalinista de falsificações” nos deixou toda uma concepção e
uma metodologia que nos armaram para
enfrentar o stalinismo e todas as correntes que tomaram um rumo semelhante.
Moreno teve que enfrentar a destruição moral que o stalinismo impunha à
classe operária e as posições espontaneístas que surgiam como reação a essa degradação e à decadência da moral
burguesa.
Nós estamos enfrentando um novo período degenerativo. Como dissemos no
documento do IX Congresso: “A decadência do capitalismo em sua fase senil
levou a tal grau o saque e a destruição da
natureza que chega ao ponto de justificar
qualquer ataque aos mínimos direitos individuais para garantir seus lucros. Isto
gera uma decadência moral do imperialismo no terreno das relações humanas.
(…) É o “vale tudo” da sobrevivência em
um mundo decadente (…). Esta situação
teve sua refração no interior do Movimento Operário e da esquerda, devido
àquilo que chamamos o “vendaval oportunista””.
Já antes, produto da marginalidade, setores trotskistas se contaminaram com a
moral stalinista. Um exemplo foram os
casos, já citados, das amálgamas e calúnias utilizadas por Lambert e Lora. Mas
com o “vendaval oportunista” tudo se
potencializou: ex-guerrilheiros presidem
governos burgueses, reprimem as lutas.
Organizações que se reivindicam trotskistas vivem do estado, administram planos sociais, aplicam o “clientelismo
político”, utilizam a difamação como
moeda corrente, atacam fisicamente e
roubam arquivos e locais de outras organizações trotskistas. O parlamentarismo
e os aparatos sindicais corrompem aqueles que foram dirigentes revolucionários.
A questão da moral revolucionária
na reconstrução da LIT-QI e da IV
O que expomos antes mostra a necessidade de batalhar em defesa da moral
revolucionária. Mas não explica por que
nosso IX Congresso Mundial viu a necessidade de votar um documento sobre o
tema. Essa necessidade se impôs quando, ao ver importantes casos sobre índole moral em nossas fileiras,
percebemos que também nós tínhamos
sido contaminados. Como dissemos
MARÇO DE 2012
Pintura de Dorothy Eisner que representa a Trotsky declarando ante o Tribunal Moral
conhecido como Comissão Dewey.
nesse documento: “Era lógico que, se a
LIT, no marco do vendaval oportunista
que se abateu sobre a esquerda, sofreu
uma destruição no terreno teórico, programático e organizativo, isto deveria afetar também o terreno moral”.
Nossa tradição nos permitiu enfrentar
o problema por meio da educação da militância e encarando com rigor cada problema moral que se apresentasse.
Atuamos sem temor em perder militantes e inclusive seções, porque somos
conscientes de que estamos defendendo
não um principio filosófico abstrato, mas
a moral defendida por Lênin, Trotsky,
Moreno, “a moral que serve para que a
sociedade humana se eleve a maior altura, para que se desembarace da exploração”.
Por que tornamos público este combate interno? Para fortalecê-lo. Encontramo-nos
com
dirigentes
que,
reivindicando-se trotskistas e morenistas,
defendem a “lei da selva” para justificar
roubos de locais, de arquivos… E nos
dizem que estamos no “túnel do tempo”,
quando nos opomos a essas ações em
nome da moral defendida por nossos
mestres. Nós, assim como eles, sofremos
as pressões da sociedade em decomposição e não estamos livres de problemas.
A diferença é que reconhecemos esses
problemas e não os escondemos debaixo
do tapete, ao contrário, os tornamos públicos para combatê-los com mais força.
Aspiramos a que as organizações e dirigentes que se aproximam de nós politicamente, se somem a este combate.
Porque estamos convencidos de que a reconstrução da Quarta só pode dar-se em
meio a uma feroz batalha para recuperar
a moral revolucionária. Batalhando até a
morte, no movimento e no partido, contra o método das amálgamas, das calúnias; do roubo, das mentiras, dos
ataques físicos e da deslealdade entre revolucionários; do machismo, do racismo,
da xenofobia, da homofobia; porque
tudo isso vai contra a moral revolucionária, isto é, contra a revolução.
1
CIQI – Comitê Internacional – Quarta Internacional, formado pela FB (Fração Bolchevique) e pelo CORQI, organização de Lambert
em 1980, como parte da estratégia de reconstrução da IV Internacional. Aliança que foi
rompida diante da capitulação de Lambert à
Frente Popular e sua negativa em discutir a
sua política de expulsar aqueles que questionaram sua política.
2
Discurso de Lênin na I sessão do III Congresso das Juventudes Comunistas (2 de outubro de 1920).
3
Moreno, Nahuel, Moral Bolche ou Moral
Espontaneísta, Caderno de Formação 8, Abril
de 1987, p. 18.
4
Idem. p. 44.5 “Triple A” - Aliança Anticomunista Argentina.
35
Contratapas CI7 portugués_Maquetación 1 15/03/12 12:30 Página 1
SUMÁRIO
1
APRESENTAÇÃO
Apresentamos o sétimo número
da revista Correio Internacional.
9
2
MULHERES TRABALHADORAS E MARXISMO
ATUALIDADE
MUNDO ÁRABE
O processo de luta popular contra
o regime ditatorial de Bashar al Assad
se transformou em uma guerra civil
cada vez mais violenta e polarizada.
BRASIL
apresenta…
14
PORTUGAL
A violenta desocupação do Pinheirinho
mostra a luta pela moradia popular contra
a especulação imobiliária da burguesia.
Um debate sobre a opressão
A economia mundial desacelerou
em finais de 2011 e os organismos
imperialistas temem a possibilidade
de una nova recessão.
Carmen Carrasco e Mercedes Petit
19
A corrente Ruptura-FER saiu do Bloco de Esquerda
e fundou um novo partido: o MAS.
CAMPANHA “30 ANOS DA LIT-QI”
24
Conheça as atividades e publicações que se realizarão ao longo
de todo o ano de 2012. Como parte dessa campanha, nessa
edição apresentamos:
26
34
História da
corrente
morenista
A defesa
da moral
revolucionária.
EUA
Itália
Paraguai
Portugal
Pela construção de
uma internacional
revolucionária
VIDA DOS PARTIDOS
NESSA EDIÇÃO
Argentina
Brasil
36
Síria
Europa
46
• Ato do PSTU argentino en homenagem
a Nahuel Moreno
• PdAC de Itália
• PT do Paraguai
A
Editora Sundermann acaba de lançar a edição em português do
livro Mulheres Trabalhadoras e Marxismo. Este livro, por um
lado, faz uma interpretação marxista sobre a questão da mulher
e, por outro, leva adiante uma série de polêmicas sobre este
tema, no interior do movimento trotskista: a diferença entre opressão e
exploração; a família no capitalismo; o caráter das reivindicações femininas; as formas de organização do movimento de mulheres; os movimentos
feministas e a construção do partido revolucionário...
Este livro, escrito no ano de 1979, contou com a
colaboração do dirigente trotskista Nahuel Moreno. Porém recém foi publicado pela primeira
vez, em 2009, em espanhol. Porque foi publicado um livro de polêmicas, 30 anos depois?
Porque essas polêmicas são, em essência, as
mesmas que se desenvolvem na atualidade.
Recomendamos a leitura deste trabalho a
todos aqueles que, como Lenin, consideram
que “A revolução socialista é impossível sem
a participação massiva das mulheres”.
Tapa portugués CI 7-1-4_Maquetación 1 15/03/12 11:09 Página 1
E UROPA
Barrar a guerra social
e os cortes de verbas!
Contra o pagamento da dívida!
A dívida pública e a moeda única são instrumentos da ver‐
dadeira guerra social que a troika e os governos fazem con‐
tra os trabalhadores. São instrumento de colonização dos
países mais débiles, em favor da banca privada e dos países
mais fortes, especialmente Alemanha.
Grécia, Portugal, Irlanda, Espanha, Itália vivem hoje sob
uma situação similar à Argentina em finais dos anos 90. Os
trabalhadores sofrem um retrocesso histórico no seus ní‐
veis de vida e conquistas.
Contra a catástrofe social e o saqueio dos países mais
débiles, a saída para os trabalhadores é deixar de
pagar a dívida; romper com a “UE de capital” e com
o pacto do euro, estatizar sem indemnização o sis‐
tema financeiro, no caminho da construção de
governos dos trabalhadores em cada país e
uma Europa dos trabalhadores ye dos
povos, os Estados Unidos Socialistas de
Europa.
O caminho é a luta em cada país e em
toda Europa.
Publicação da LIT-QI (Liga Internacional dos Trabalhadores - Quarta Internacional)
ISSN 2179-118X
07
TERCEIRA ÉPOCA
MARÇO - 2012 - ANO 3
Em defesa do socialismo
e a construção de uma
direção revolucionária internacional
MUNDO
SÍRIA
BRASIL
A economia
mundial desacelera 2
Começou
a guerra civil 9
Pinheirinho e a luta
pela moradia popular 14

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