Volume 9 – Número 1 - Revista Ciência e Conhecimento

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Volume 9 – Número 1 - Revista Ciência e Conhecimento
Revista Ciência e
Conhecimento
ISSN: 2177-3483
REVISTA CIÊNCIA E CONHECIMENTO
Volume 9 – Número 1 – Ano 2015
Periódico Oficial da Universidade Luterana do Brasil – ULBRA/São Jerônimo – RS – Brasil
Revista oficial da Universidade Luterana do Brasil – ULBRA – Campus São Jerônimo
ISSN: 2177-3483 – Volume 9 – Número 1 – 2015
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Rodrigo Baptista Moreira
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Lidiane R. Alli Feldmann
Álvaro Werlang
Lívia Lucina Ferreira Albanus
Bianca Rocha Gutterres
Maria de Fátima Dias Ávila
Carlos Mário Dal’Col Zeve
Maria Francisca L. Johson
Carolina Moraes Migliavacca
Mariana Secorun Inácio
Christiane Martinatti Maia
Marisa Beatriz L. M. Sanchez
Clarissa Lopes Trojack
Marjane Bernardy Souza
Claudeth Conceição de Oliveira
Claudia Lisete de Oliveira Groenvald Maurício Amaro Lopes
Olindo Barcelos da Silva
Cleber Fernando Homem
Osvaldo Donizete Siqueira
Daniel Carlos Garlipp
Pablo Rodrigo Alflen
Dorval Antônio Ferreira Dias
Paulo Henrique D. Machado
Élvia Elena Silveira Vianna
Rosa Maria da Cruz Braga
Ernani Soares Barbosa
Rosa Quitéria C. de Novaes
Evandro Agiz Heberle
Roséli Azzi Nascimento
Fernanda Ferreira Alves Pelegrini
Rossano André Dal-Farra
Franz Josef F.F. da Silva
Rudimar Serpa de Abreu
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Campus São Jerônimo – RS - Brasil
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Revista oficial da Universidade Luterana do Brasil – ULBRA – Campus São Jerônimo
ISSN: 2177-3483 – Volume 9 – Número 1 – 2015
Editorial
A Revista Ciência e Conhecimento é o periódico oficial da Universidade
Luterana do Brasil - ULBRA/São Jerônimo. A revista publica trabalhos nos
seguintes formatos: artigos originais, artigos de revisão, trabalhos de conclusão de
curso de graduação e pós-graduação, trabalhos acadêmicos e comentários, nas
diversas áreas do conhecimento. É um periódico que publica, resultados de pesquisas
que contribuam para o desenvolvimento humano e social nas seguintes áreas:
atenção à saúde e bem-estar; desenvolvimento humano; metodologias e estratégias
de ensino aprendizagens; gestão pública e institucional; gestão de conhecimento;
tecnologia e produção; meio ambiente e sustentabilidade e desenvolvimento urbano
e rural.
Todo o conteúdo da revista está disponível em português no site
www.cienciaeconhecimento.com.br, de livre acesso. A revista possui circulação
regular desde 2007, sua versão eletrônica e impressa em língua portuguesa tem
periodicidade quadrimestral. Neste número, apresentamos 7 artigos (5 originais e 2
de revisão) nas diversas áreas do conhecimento.
Rodrigo Baptista Moreira
Editor da Revista Ciência e Conhecimento
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação – CIP
C569 Ciência e conhecimento / Universidade Luterana do Brasil. - Vol. 1, n. 1
(2007)-. - São Jerônimo: ULBRA São Jerônimo, 2007-.
v. ; 30 cm.
Disponível em: http://www.cienciaeconhecimento.com.br
Semestral.
ISSN 2177-3483
1. Produção técnico-científica periódicos. 2. Pesquisa científica.
I. Universidade Luterana do Brasil.
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Revista oficial da Universidade Luterana do Brasil – ULBRA – Campus São Jerônimo
ISSN: 2177-3483 – Volume 9 – Número 1 – 2015
ÍNDICE
Artigos originais
EQUOTERAPIA NO TRATAMENTO DO TRANSTORNO DO ESPECTRO
AUTISTA: A PERCEPÇÃO DOS TÉCNICOS (Páginas 5 – 23)
Marjane Bernardy Souza e Priscilla de L. N. da Silva
MÍDIAS SOCIAIS COMO FERRAMENTAS DE ESTRATÉGIAS DE MARKETING
(Páginas 24 - 41)
Marco Miller Trainini e Jéssica da Silva Torres
O PROGRAMA ACELERA BRASIL E OS MÉTODOS DE LEITURA: REFLEXÕES
SOBRE UM ESTUDO DE CASO EM BREJO DO CRUZ/PB (Páginas 42 – 53)
Demóstenes Dantas Vieira e Joana Lúcio Maia
A DIMENSÃO DA POLITECNIA E A PRÁTICA DOCENTE NO ÂMBITO DO
ENSINO MÉDIO POLITÉCNICO DA ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO MÉDIO
CAIC MADEZATTI – SÃO LEOPOLDO/RS (Páginas 54 – 68)
Cléber Fernando Homem
CRESCIMENTO SOMÁTICO E ÍNDICE DE MASSA CORPORAL EM
ESCOLARES DOS 10 AOS 15 ANOS DE IDADE. ANÁLISE DOS RESULTADOS
PROVENIENTES DE DESENHOS TRANSVERSAIS, LONGITUDINAIS E
LONGITUDINAIS MISTOS (Páginas 69 – 83)
Daniel Carlos Garlipp, Rodrigo Baptista Moreira, Anelise Reis Gaya e Adroaldo C. A. Gaya
Artigos de revisão
DA NECESSIDADE DE PSICOEDUCAÇÃO EM PREVENÇÃO ÀS DROGAS NO
ÂMBITO ESCOLAR (Páginas 84 – 98)
Erica I. D. Andrade e Élide Ávilla Kesller
BASES
EPISTEMOLÓGICAS
DA
CRIAÇÃO
DO
CONHECIMENTO
ORGANIZACIONAL: UMA ANÁLISE A PARTIR DA TEORIA DE NONAKA E
TAKEUCHI (Páginas 99 – 118).
Ana Claudia Donner de Abreu, Angela Regina Heinzen Amin Helou e Greicy Kelli Spanhol
Lenzi
Artigo Original
EQUOTERAPIA NO TRATAMENTO DO
AUTISTA: A PERCEPÇÃO DOS TÉCNICOS
Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483
TRANSTORNO
DO
ESPECTRO
Marjane Bernardy Souza¹ e Priscilla de L. N. da Silva²
RESUMO - O Transtorno do Espectro Autista tem como característica
diagnóstica o comprometimento severo e invasivo em três áreas do
desenvolvimento: habilidades de interação social, habilidades de comunicação e
presença de comportamentos estereotipados. A Equoterapia é um método
terapêutico que utiliza o cavalo dentro de uma abordagem interdisciplinar, nas
áreas de saúde, educação e equitação, que busca auxiliar no desenvolvimento
biopsicossocial de pessoas com necessidades especiais. Esta pesquisa tratou de
investigar o desenvolvimento de uma criança de 10 anos, com o diagnóstico de
Transtorno do Espectro Autista, que está em tratamento há quatro anos, tendo
como objetivo identificar os aspectos motores, sociais, psicológicos e de
linguagem, trata-se de um estudo qualitativo tendo como referencial teóricometodológico. Foi utilizado para o tratamento dos dados a análise de conteúdo
de Bardin (2011), que é uma técnica de investigação que tem por finalidade a
descrição objetiva, sistemática e quantitativa do conteúdo manifesto da
comunicação. Participaram do estudo uma equipe multidisciplinar, composta
por psicóloga, terapeuta ocupacional, fonoaudióloga e fisioterapeuta. Para obter
as informações necessárias, foi realizada uma entrevista semiestruturada,
contendo cinco questões abertas, sendo aplicada individualmente, em ambiente
reservado, garantindo, assim, o sigilo e o conforto das participantes, tendo
duração média de uma hora e foram gravadas e transcritas para análise. De
acordo com os dados obtidos foi possível evidenciar, na percepção desses
técnicos, que a Equoterapia foi um método fundamental e eficaz para a
reabilitação dessa criança, sendo uma prática que proporcionou bem-estar e
qualidade de vida, contribuindo para melhorar a coordenação motora, o
equilíbrio, a afetividade e os relacionamentos sociais, assim como a autonomia
e a autoestima.
Revista
Ciência e Conhecimento
Volume 9 – Nº1 – 2015.
1 – Universidade Luterana do
Brasil – ULBRA/São Jerônimo.
Professora do Curso de
Psicologia. São Jerônimo, RS,
Brasil.
2 – Universidade Luterana do
Brasil – ULBRA/São Jerônimo.
Acadêmica do Curso de
Psicologia. São Jerônimo, RS,
Brasil.
Palavras-chave: Transtorno do Espectro Autista. Equoterapia. Tratamento.
ABSTRACT - The Autism Spectrum Disorder as a diagnostic feature is the
severe and pervasive impairment in three areas of development: social
interaction skills, communication skills and presence of stereotyped behaviors.
The Hippotherapy is a therapeutic method that uses the horse within an
interdisciplinary approach in the areas of health, education and riding that seeks
to assist the biopsychosocial development of people with special needs. The
present paper is a qualitative study with theoretical and methodological
framework was used for the processing of data content analysis, which is a
research technique that aims at the objective, systematic and quantitative
description of the manifest content of communication. The study comprised a
multidisciplinary team composed of a psychologist, occupational therapist,
speech therapist and physiotherapist. To obtain the necessary information, one
semi-structured interview, with five open-ended questions, being applied
individually, in private atmosphere, thus ensuring the confidentiality and
comfort of participants, average duration of one hour and were recorded and
transcribed for analysis was performed. According to the data obtained, it may
prove, in the perception of these coaches, that hippotherapy is a fundamental
and effective method for the rehabilitation of people with the spectrum being a
practice that provides wellness and quality of life, helping to improve
coordination motor, balance, affective and social relationships, as well as
autonomy and self-esteem.
.
Keywords: Autism Spectrum Disorder. Hippotherapy. Treatment.
Dados para correspondência
Marjane Bernardy Souza;
Rua: Gaspar Silveira Martins, nº
2533.
CEP: 96825-002
E-mail:
[email protected]
Recebido em: 09/12/2014.
Revisado em: 10/01/2015.
Aceito em: 20/02/2015.
Área: Atenção à saúde e bem
estar.
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INTRODUÇÃO
O Transtorno do Espectro Autista (TEA) ocorre antes dos três anos de idade, onde os
pais podem perceber a falta de reciprocidade diante de estímulos, na maioria dos casos, os
bebês com o TEA não procuram pela mãe, não reagem a atos de carinho, como por exemplo,
abraços. O diagnóstico do TEA é feito por uma equipe multidisciplinar, onde o paciente é
observado em diferentes situações, para obter um diagnóstico preciso. Após ser diagnosticado
o TEA, a família da criança deve recorrer a tratamentos específicos, que irão auxiliar a criança
e sua rede de apoio, buscando possibilidades para melhorar a qualidade de vida,
proporcionando bem-estar e para que a criança tenha a oportunidade de desenvolver os
aspectos motores, sensoriais e de comunicação. Sendo assim, um desafio para os pais,
familiares e educadores, é estabelecer um elo positivo que proporcione aprendizagem para a
criança, por isso é fundamental utilizar uma abordagem adequada e eficiente para que o
indivíduo se desenvolva, de acordo com a sua realidade, mesmo que de forma lenta
(FONSECA, 2014).
Existem muitas formas de tratamento para o TEA, a Equoterapia é uma técnica que está
cada vez mais sendo utilizada como recurso terapêutico para o tratamento do TEA (BUENO,
MONTEIRO, 2011). O modelo terapêutico da Equoterapia envolve uma equipe
interdisciplinar, composta por profissionais de áreas de saúde e equitação como:
fisioterapeutas, psicólogos, equitadores, médicos, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais
entre outros, que durante a efetiva realização de um programa de atendimento equoterápico,
são partes contribuintes para a aplicação eficaz do método.
Assim, o presente estudo tem como objetivo analisar o tratamento de Equoterapia no
desenvolvimento de uma criança (10 anos) com o Transtorno do Espectro Autista nos
aspectos cognitivos, emocionais, psicomotores, sociais e de comunicação, através de
entrevistas realizadas com os profissionais da equipe técnica, composta por: psicóloga,
terapeuta ocupacional, fonoaudióloga e fisioterapeuta.
1.1 O Transtorno do Espectro Autista
O termo autismo surgiu em 1911, de acordo com Santana (2013), quando Bleuler
psiquiatra austríaco, utilizou o termo para referir-se a uma alteração comum à esquizofrenia,
sendo o isolamento da realidade externa, o termo autismo teria o significado de estar fechado
em si mesmo. O mesmo autor faz referência que em 1942, Leo Kanner psiquiatra americano,
descreveu por meio de um artigo, a realidade de algumas crianças consideradas especiais,
tendo como tema o autismo sob o nome de “distúrbios autísticos de contato afetivo”. O
SOUZA e SILVA. Equoterapia no tratamento do transtorno do espectro autista.
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psiquiatra estudou minuciosamente onze pacientes esquizofrênicos, onde observou o
transtorno autista como característica marcante em seus pacientes, na época destacou que as
crianças autistas nasciam assim, considerando o fato de que a síndrome era precoce. No
momento em que observou o comportamento dos pais dessas crianças, passou a mudar os
seus conceitos relacionados à síndrome, considerando o contato afetivo frio entre elas,
denominado como “mãe geladeira”, referindo-se a frieza das mães, promovendo em seus
filhos hostilidade inconsciente a qual seria direcionado para situações de relacionamento
social. Asperger em 1944, também teve sua participação para a divulgação do autismo, tendo
semelhanças às hipóteses de Kanner, com algumas diferenças. Asperger na Alemanha
apresentou histórias clínicas de quatro crianças e as nomeou como “psicopatia autista”,
caracterizando o comportamento autista como, falta de empatia, pouca habilidade para fazer
amigos, comunicação não verbal pobre e linguagem repetitiva, inabilidade motora e má
coordenação (UNTOIGLICH, 2013).
Os conceitos acima denotam um comportamento clássico do transtorno autista, sendo a
falta de habilidades sociais e a reciprocidade as principais características, causando
dificuldades de aprendizagem e na interação social. A criança fica aprisionada a rituais e
sintomas, evitando emoções criando um mundo particular, onde a comunicação é um desafio
que compromete o desenvolvimento saudável (ANDRADE, TEODORO, 2012).
Porém, a tese de que as mães poderiam influenciar no aparecimento do transtorno, foi
deixado de lado, no momento em que as tecnologias de estudo foram sendo aprimorados. Na
atualidade, o autismo passou a ser considerado uma desordem de origem neurobiológica,
sendo classificado pelo CID - 10 (Classificação Internacional de Doenças, 1993), como um
Transtorno Global do Desenvolvimento. Caracterizado por diversos fatores, sendo eles: um
desenvolvimento anormal ou alterado, manifestado antes de três anos, uma perturbação
característica do funcionamento em cada dos três domínios, sendo as interações sociais, a
comunicação, o comportamento focalizado e repetitivo, ainda ressalta que o transtorno
acompanha outras manifestações inespecíficas, como por exemplo, fobias, perturbações de
sono ou da alimentação crises de birra ou agressividade (FERNANDES et al., 2012).
Em muitos casos, o TEA, pode ser percebido antes dos três anos de idade, é importante
ressaltar que o diagnóstico do TEA é obtido através de observação clínica e pela história
referida pelos pais ou responsáveis, sendo feito sempre por uma equipe multidisciplinar. Para
obter um diagnóstico preciso, é ainda fundamental que a criança seja observada de forma
física, psicológica e neurologicamente, sendo necessário realizar entrevistas com os pais para
SOUZA e SILVA. Equoterapia no tratamento do transtorno do espectro autista.
Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015.
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uma maior compreensão sobre o caso, além de exames complementares para doenças
genéticas e hereditárias (SANTANA, 2013).
Segundo o DSM-V, Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (2014),
os fatores prognósticos do transtorno autista são a presença ou ausência de deficiência
intelectual e comprometimento da linguagem associados, bem como outros problemas de
saúde mental, existindo fatores de risco inespecíficos, como idade parental avançada, baixo
peso ao nascer ou exposição fetal a ácido valproico (antiepiléptico), podendo assim
contribuir para o risco do Transtorno do Espectro Autista. A genética e a fisiologia, também
são fatores relevantes, existem estimativas de herdabilidade para o transtorno, variando de
37% até mais ou menos 90%, com base nas taxas de concordância entre gêmeos. Nos dias
atuais, 15% dos casos podem estar associados à mutação genética, no entanto, mesmo
quando um transtorno do espectro autista estiver relacionado a uma mutação genética
conhecida, pode não haver penetrância completa.
O diagnóstico do autismo sofreu modificações em sua classificação a partir do DSM-V
(2014), a principal alteração foi à eliminação das categorias Autismo, Síndrome de Asperger,
Transtorno Desintegrativo e Transtorno Global do Desenvolvimento sem outra
especificação, passou a existir apenas uma denominação, sendo “Transtornos do Espectro
Autista” (TEA), os critérios diagnósticos se referem aos déficits relacionados à
comunicação, a emoção, relacionamento social, motricidade, contato visual e linguagem, no
qual o processo de desenvolvimento infantil está significativamente comprometido com
relação à interação social e comunicação, assim como pelo repertório restrito de interesses e
atividades.
Ainda de acordo com informações retiradas do DSM-V (2014), a prevalência do TEA,
alcançou 1% na população dos Estados Unidos e em outros países, com estimativas similares
em amostras de crianças e adultos, porém ainda não está claro se taxas mais altas refletem
expansão dos critérios diagnósticos do DSM-IV incluindo casos subliminares, diferenças na
metodologia dos estudos ou aumento na frequência do transtorno.
Embora ainda não haja uma etiologia comprovada, que explique os reais motivos para
o autismo, muitos estudiosos tentam explorar o assunto para compreender melhor as suas
causas, e muitas já foram citadas, sendo as principais, os fatores psicológicos, disfunções
cerebrais, alterações de neurotransmissores e fatores ambientais (LINHARES, 2012).
SOUZA e SILVA. Equoterapia no tratamento do transtorno do espectro autista.
Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015.
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1.2 Formas de tratamento
O tratamento do TEA envolve diversas intervenções psicológicas e educacionais, como
orientação familiar, desenvolvimento da linguagem e socialização. O tratamento é sempre
feito por uma equipe multidisciplinar que está habilitada para desenvolver um programa de
intervenção orientado, com o objetivo de satisfazer as necessidades particulares de cada
indivíduo. Os profissionais envolvidos no tratamento são: psiquiatras, psicólogos,
fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais, fisioterapeutas e educadores físicos (FERRARI,
2009).
São utilizados diferentes métodos e procedimentos de intervenção com a intenção de
reverter, em parte, as alterações dos quadros dos TEA, buscando proporcionar uma melhor
qualidade de vida para os indivíduos diagnosticados dentro desse espectro, a análise do
comportamento tem papel primordial no desenvolvimento de tecnologia comportamental
eficiente na intervenção sobre esses distúrbios (MARINHO, MERKLE, 2009).
Segundo informações obtidas no site “Associação de amigos do Autista – (AMA,
2008)”, existem tratamentos específicos para o Transtorno do Espectro Autista, são eles:
TEACCHR que é um programa estruturado que combina diferentes materiais visuais para
organizar o ambiente físico através de rotinas e sistemas de trabalho, de forma a tornar o
ambiente mais compreensível, esse método visa à independência e o aprendizado. O PECSR
sendo um método de comunicação alternativa através de troca de figuras é uma ferramenta
valiosa tanto na vida das pessoas com autismo que não desenvolvem a linguagem falada,
quanto na vida daquelas que apresentam dificuldades ou limitações na fala. O ABA, ou seja,
Análise Comportamental Aplicada, que se embasa na aplicação dos princípios fundamentais
da teoria do aprendizado, baseado no condicionamento operante e reforçadores para
incrementar
comportamentos
socialmente
significativos,
reduzir
comportamentos
indesejáveis e desenvolver habilidades. Há várias técnicas e estratégias de ensino e
tratamento comportamentais associados à Análise do Comportamento Aplicado que tem se
mostrado útil no contexto da intervenção incluindo: (a) tentativas discretas, (b) análise de
tarefas, (d) ensino incidental, (e) análise funcional, e o uso de medicações, que é indicado
quando existe alguma comorbidade neurológica e/ou psiquiátrica e quando os sintomas
interferem no cotidiano.
É importante ressaltar que até o momento não existe uma medicação específica para o
tratamento de autismo, e a Equoterapia é um recurso terapêutico que também pode ser usado
como forma de tratamento do TEA. É importante destacar que não existe tratamento padrão
SOUZA e SILVA. Equoterapia no tratamento do transtorno do espectro autista.
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que possa ser utilizado, dessa forma, cada paciente deve ter acompanhamento individual, de
acordo com suas necessidades e deficiências (LINHARES, 2012).
1.3 Definição de Equoterapia
A Equoterapia, segundo os autores Silva e Aguiar (2008), é um método terapêutico
educacional que utiliza o cavalo dentro de uma abordagem interdisciplinar, nas áreas de
saúde, educação e equitação, buscando o desenvolvimento biopsicossocial de pessoas
portadoras de deficiências e/ou com necessidades especiais.
A palavra “Equoterapia” foi criada pela ANDE-BRASIL, sendo fundada a Associação
Nacional de Equoterapia (ANDE BRASIL, 2010), instituição de cunho societário civil, de
caráter filantrópico, terapêutico, educativo, cultural, desportivo e assistencial, não visando
lucros, atuando em todo o país, sediada na cidade de Brasília no Distrito Federal no dia 10 de
maio de 1989. No ano seguinte em 1990, com a disponibilidade de infraestrutura básica,
proporcionando condições de realizar atendimento e com uma equipe interdisciplinar de
profissionais nas áreas da saúde, educação e equitação, foi realizado a 1.ª sessão de
Equoterapia com pacientes na sede da ANDE BRASIL, com apoio da equipe de profissionais
da saúde do Hospital Sarah Kubitschek, referência no Brasil no tratamento do aparelho
locomotor, tornando possível a execução prática do método terapêutico em vigência na
Europa, de onde foi reproduzido. Em seguida oficializou-se o 1.º Encontro Nacional de
Equoterapia com a participação de órgãos do Governo Federal, instituições universitárias e
especial participação da Associação Nacional Italiana de Reabilitação Equestre- ANIRE –
ITÁLIA. Já em 1997, o Conselho Federal de Medicina por meio do parecer n.º 06/97 de 09 de
abril de 1997 deu por reconhecido a Equoterapia como método de reabilitação
(ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE EQUOTERAPIA, 2006).
A palavra Equoterapia está registrada no Instituto Nacional da Propriedade Industrial INPI, do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, com o Certificado de
Registro de Marca n.º 819392529, de 26 de julho de 1999, o reconhecimento da Equoterapia
como método terapêutico e educacional, iniciou a partir do momento em que o Conselho
Federal de Medicina - CFM, em Sessão Plenária de 09 de abril de 1997, aprovou no Parecer
06/97, que: A Equoterapia é reconhecida como método a ser incorporado ao arsenal de
métodos e técnicas direcionadas aos programas de reabilitação de pessoas com necessidades
especiais (CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, 1997).
O tratamento com a utilização do cavalo precisa estar fundamentado e amparado em
pesquisa científica, sendo comprovado com estudos e sendo reconhecido como modelo
SOUZA e SILVA. Equoterapia no tratamento do transtorno do espectro autista.
Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015.
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sistemático de reabilitação, precisando produzir resultados eficazes. Na área da saúde, estas
respostas são presenciadas nos aspectos, físico-motores, e psicológicos e sociais, o que
culminou com a manifestação do órgão oficial que zela pela saúde e bem-estar da sociedade,
o Conselho Federal de Medicina (1997), quando publica o parecer favorável ao
reconhecimento do método de reabilitação.
Os benefícios que decorrem do método Equoterápico são evidenciados e comprovados
nas áreas da saúde, educação e equitação, dessa forma, foi criada uma associação que
representasse e englobasse todos os conceitos de reabilitação e educação com o uso do cavalo
como agente promotor (ANDE-BRASIL, 2010).
1.4 Equoterapia e o Psicólogo
Para Cittério (1991), a prática da Equoterapia objetiva benefícios físicos, psíquicos,
educacionais e sociais de pessoas com deficiências físicas ou mentais e/ou com necessidades
especiais, sendo, deficiências físicas ou mentais que podem ser causadas por lesões
neuromotoras de origem encefálica ou medular, patologias ortopédicas congênitas que
geralmente
são
adquiridas
por
acidentes
diversos,
disfunções
sensório-motoras,
comportamentais, de aprendizagem.
Os recursos terapêuticos que utilizam o cavalo são considerados um conjunto de
técnicas reeducativas, que auxiliam no desenvolvimento dos aspectos sensoriais, motores,
cognitivos e comportamentais, caracterizando como uma atividade lúdico-desportiva
(NASCIMENTO, 2006).
A Equoterapia é uma atividade que exige a presença de uma equipe multidisciplinar,
sendo composta por profissionais da área da psicologia, fonoaudiologia, terapia ocupacional
e fisioterapia (NEWTON, 2011). A função do psicólogo durante a atividade da Equoterapia,
conforme Bueno e Monteiro (2011) é possibilitar ao paciente um cenário simbólico, para que
inicie o vínculo junto ao cavalo, buscando familiarizar o praticante ao ambiente, para que
seja possível desenvolver as atividades terapêuticas, criando desta forma o setting
terapêutico. No primeiro momento um exercício de alongamento, com conversa, onde
psicólogo estimula o vínculo entre ambos. Desta forma, o psicólogo desenvolve um papel de
extrema importância, acompanhando os praticantes e seus familiares, orientando-os, através
de jogos, brincadeiras, sempre de forma lúdica.
É importante destacar que cabe ao psicólogo conhecer todos os profissionais que
estarão trabalhando juntos de forma interdisciplinar, como o cavalo, o praticante, e todo o
material empregado nas técnicas e exercícios utilizados na equoterapia. De acordo com
SOUZA e SILVA. Equoterapia no tratamento do transtorno do espectro autista.
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Barbosa e Munster (2013) o psicólogo ajuda na desenvoltura da equipe, para haver harmonia
entre todos e obter um ótimo resultado no trabalho, portanto a interação de toda a equipe
permite que cada um entenda a abordagem de seu colega, possibilitando assim um trabalho
dinâmico.
1.5 Equoterapia como tratamento do Transtorno do Espectro Autista.
De acordo com Marinho (2009), a equoterapia no tratamento do TEA inicia após ser
feito um diagnóstico preciso e o encaminhamento ocorre quando o médico considera
necessário. Após o paciente passar por uma avaliação com profissionais multidisciplinares
como: psicólogo, fonoaudiólogo, fisioterapeuta, terapeuta ocupacional e equitador, a equipe
multidisciplinar é essencial, pois é ela que garante a escolha correta do cavalo, bem como do
programa específico para cada praticante.
Para realizar o processo terapêutico Ferrari (2009), ressalta que é importante a equipe
técnica, ter conhecimento aprofundado sobre os sintomas e as limitações do paciente,
levando em consideração também o contexto social em que o indivíduo está inserido,
proporcionando benefícios para o paciente, assim como a sua família.
É importante lembrar que os principais sintomas do TEA, estão relacionados aos
déficits na reciprocidade sócio emocional, nos comportamentos comunicativos, dificuldade
para se adequar a contextos sociais, padrão restritivo e repetitivo de comportamento,
movimentos motores estereotipados (ex.: alinhar brinquedos, estereotipias motores simples),
rotinas de rituais de comportamento verbal ou não verbal (sofrimento extremo diante de
grandes ou pequenas mudanças), interesse fixo e anormal a determinados objetos, hiper ou
hiporreatividade a estímulos sensoriais (DSM-V, 2014).
Dessa forma atividades lúdicas e recreativas podem contribuir de forma positiva no
tratamento do transtorno, principalmente quando são realizadas ao ar livre, sendo a
equoterapia a atividade proposta que é desenvolvida dessa forma. A prática da Equoterapia é
desenvolvida ao ar livre, uma característica positiva e diferenciada é que o paciente fica
ligado à natureza, proporcionando a execução de exercícios psicomotores, de recuperação e
integração, completando as terapias tradicionais em clínicas e consultórios (SILVA, 2006).
Nascimento (2006) ressalta que a atividade terapêutica da Equoterapia inicia no
instante em que o indivíduo entra em contato com o animal, no primeiro momento o cavalo
passa a representar um problema, exigindo que o praticante aprenda a lidar, aprendendo
também a maneira correta de montar ou descobrindo meios para fazer com que o animal
SOUZA e SILVA. Equoterapia no tratamento do transtorno do espectro autista.
Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015.
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aceite seus comandos, essa relação contribui para o desenvolvimento da sua autoconfiança,
afetividade e autonomia, trabalhando também os limites.
Dessa forma é importante ressaltar, que as terapias utilizando cavalos podem ser
consideradas como um conjunto de técnicas que agem para superar danos sensoriais, motores,
cognitivos e comportamentais, através de uma atividade lúdico-desportiva que tem como
meio o cavalo (CITTÉRIO, 1991). Sendo assim é importante que a criança com o transtorno
tenha a possibilidade de ser observada e diagnosticada por uma equipe multidisciplinar, com o
objetivo de ser programada a melhor forma de tratamento, de acordo com a necessidade e
realidade da criança.
2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Foi realizada uma pesquisa com metodologia qualitativa, possibilitando interpretar
como o indivíduo percebe o mundo que o cerca. A pesquisa qualitativa, permite compreender
o sujeito da pesquisa, focando seu papel específico e suas relações sociais, dentro do contexto
ao qual faz parte (BARDIN, 2011).
Participaram do estudo uma equipe multidisciplinar, composta por: psicóloga,
terapeuta ocupacional, fonoaudióloga e fisioterapeuta. Todos profissionais habilitados para
trabalhar com a técnica da Equoterapia, profissionais da área da saúde, que trabalham com
uma criança com Transtorno do Espectro Autista.
A presente pesquisa foi avaliada e aprovada pelo plenário do Comitê de Ética em
Pesquisa com Seres Humanos e Animais da Universidade Luterana do Brasil, campos
Canoas, nº 771.199 em 28/08/2014. A coleta de dados foi realizada no período outubro de
2014, em lugares alternados de acordo com a escolha dos participantes, mediante
agendamento prévio de data e horário. Inicialmente, foi prestado esclarecimento sobre a
pesquisa e após o aceite, foi solicitado que lessem e assinassem o Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido, foi concordado a autorização para a gravação da entrevista. Foi
realizada uma entrevista semiestruturada, contento cinco questões abertas, essa entrevista foi
realizada individualmente, em ambiente reservado, garantindo, assim, o sigilo e o conforto
das participantes. Elas tinham duração média de uma hora e foram gravadas e transcritas
para análise.
Para a análise dos dados foi utilizada a metodologia de Análise de Conteúdo proposta
por Bardin (2011), que é uma expressão comumente usada para representar o tratamento dos
dados de uma pesquisa qualitativa, dados estes obtidos através da entrevista semiestruturada.
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A análise de conteúdo, segundo Bardin (2011), é um conjunto de técnicas de análise das
comunicações, visando obter de forma sistemática o conteúdo das mensagens. Este método de
análise divide-se em cinco etapas.
A pré-análise é a fase de organização, que consistiu na escolha dos documentos a serem
analisados e na retomada dos objetivos iniciais da pesquisa. A primeira atividade foi o contato
com os documentos e o conhecimento do texto, surgindo hipóteses ou questões norteadoras, o
que Bardin (2011) chama de leitura flutuante. Após, escolheu-se índices, que surgiram destas
questões norteadoras e das hipóteses, que foram organizados em indicadores. A exploração do
material consistiu numa operação classificatória, que visou alcançar o núcleo de compreensão
do texto. Buscou-se encontrar categorias que são expressões ou palavras significativas em
função das quais o conteúdo de uma fala foi organizado e descrito. Na fase seguinte, de
acordo com Bardin (2011), buscou-se transformar as unidades significativas em categorias,
conforme critérios de semelhança dos conteúdos. Assim, pôde-se sintetizar os dados obtidos
nas entrevistas. Em seguida, foi realizada a apresentação dos resultados em categorias, a partir
da análise do material das entrevistas. Foram criadas nesta pesquisa cinco categorias. Esta
etapa será apresentada no capítulo a seguir. Na última fase, a interpretação, os resultados
brutos foram tratados de maneira a serem significativos e válidos, a partir de operações que
permitiram salientar as informações obtidas. Em seguida, voltou-se aos referenciais teóricos
que deram embasamento e perspectivas significativas ao estudo. A relação entre os dados
obtidos e a fundamentação teórica, conforme Bardin (2011) deu sentido à interpretação, que
será apresentada logo após na apresentação e discussão dos resultados.
3. APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
A seguir serão apresentados e discutidos os resultados obtidos através das entrevistas
realizadas. Os temas foram divididos em quatro diferentes categorias, sendo elas: a) o cavalo
como agente provedor de mudanças no desenvolvimento da criança autista, b) movimentos
motores adquiridos durante o processo terapêutico, c) afetividade e socialização como
mudanças positivas durante o tratamento e d) bem-estar, alegria e a qualidade de vida após o
tratamento.
As entrevistas semiestruturadas foram aplicadas em quatro profissionais responsáveis
pelo tratamento de uma criança autista, sendo eles: 1) psicóloga; 2) terapeuta ocupacional, 3)
fonoaudióloga e 4) fisioterapeuta, todos atuam na Equoterapia há seis anos, tendo feito curso
especializado para poder atuar na área, estando em tratamento com a criança autista há
quatro anos. É importante ressaltar que a realização da atividade prática de equoterapia
SOUZA e SILVA. Equoterapia no tratamento do transtorno do espectro autista.
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possibilita trabalhar a criança de forma individual ou grupal, onde o acompanhamento
interdisciplinar é fundamental prevendo as adaptações e estabelecendo assim um programa
para atender as necessidades específicas de cada praticante (SILVA, AGUIAR, 2008). Sendo
assim, a equipe multidisciplinar é fundamental para o sucesso no tratamento equoterápico,
podendo criar programas com o objetivo de contribuir no desenvolvimento da criança.
A criança em questão trata-se de uma menina de 10 anos com o diagnóstico de
Transtorno do Espectro Autista, que está em tratamento há quatro anos, a atividade é
realizada em uma instituição onde existe a estrutura adequada para a realização da terapia,
contendo picadeiro, cavalos disponíveis, equitadores e uma equipe multidisciplinar
habilitada para realizar a atividade.
A categoria (a) está relacionada à importância do cavalo durante todo o processo
terapêutico da atividade, sendo uma questão extremamente importante que apareceu nas
quatro entrevistas realizadas, onde os técnicos ressaltaram que o animal é primordial na
atividade equoterápica, sendo o protagonista, e a equipe entra como complemento ao
tratamento. De acordo com as entrevistas feitas, podemos identificar que o significado da
equoterapia, vai além dos conceitos estabelecidos nos livros, segundo os técnicos a
equoterapia, é uma intervenção que está fundamentada principalmente na atuação do cavalo,
a psicóloga ressalta a importância do cavalo durante o processo do tratamento cita:“a
equoterapia é uma relação afetiva com o cavalo, que em minha opinião é um ser de muita
afetividade, e o terapeuta é um coadjuvante, dessa terapia ele vai tá ali, digamos ele vai
estar ali orquestrando, direcionando essa relação e através do feeling da experiência
profissional do psicólogo no caso, desenvolvendo a pessoa que está praticando,
desenvolvendo aspectos necessários, como segurança, expressão, autoestima, e o afeto as
emoções, mais ou menos isso.” De acordo com Vogel e Lyra (2007) as interações com o
cavalo, incluindo os primeiros contatos, o ato de montar e o manuseio final, contribuem no
desenvolvimento de novas formas de socialização, autoconfiança e autoestima, a
fonoaudióloga, também ressalta a importância do animal no tratamento terapêutico da
equoterapia dizendo:“a equoterapia é tratamento terapêutico que vem em auxílio, e com a
ajuda do animal, o cavalo, é um trabalho em equipe, mas não só da equipe multidisciplinar,
mas o animal é o centro, é o principal, é o tratamento terapêutico que auxilia no
desenvolvimento da criança num todo, biopsicossocial.” É importante compreender como os
técnicos percebem a equoterapia, e como eles se relacionam entre si, pois as atividades
acontecem em equipe, porém cada um possui uma responsabilidade específica, onde todas as
partes se complementam, com o intuito de beneficiar o paciente, promovendo as mudanças
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de acordo com as necessidades do paciente. De acordo com as entrevistas, o cavalo é o
protagonista e a equipe é coadjuvante durante a atividade.
O terapeuta ocupacional fala sobre o sentimento e das mudanças da paciente em
relação ao cavalo, citando com: “o cavalo foi o agente de mudanças no comportamento da
paciente, ela iniciou com o comportamento de fuga e com o desenvolvimento das sessões ela
foi se vinculando ao cavalo, e a demonstração é a felicidade, alegria por está ali com
cavalo, tocando fazendo carinho manifestando e fazendo alguns sons”. Esse vínculo está
relacionado ao que os autores Vogel e Lyra, (2007) referem diante da interação com o
cavalo, incluindo os primeiros contatos, o ato de montar e o manuseio final, desenvolvem
novas formas de socialização, autoconfiança e autoestima.
A autonomia é um aspecto muito relevante durante o processo do tratamento, que pode
ser observado como um resultado positivo, assim como relata a fonoaudióloga:“...ela está
mais independente, consegue soltar, antes ela saia correndo da gente, hoje em dia, ela fica
esperando o horário dela, ela deixa colocar o capacete, bem tranquila, pega a nossa mão
vem, antes parecia que as pernas dela ficavam frouxas, caindo, agora ela caminha, sabe,
põe o pé ali, ela própria se ajuda, ela já tem uma organização, antes tínhamos que fazer
força, ela da beijo no cavalo sem medo”, que segundo Mendes (s/d), sugere que a atividade
terapêutica da Equoterapia começa no instante em que o aluno entra em contato com o
animal, onde o praticante aprende a lidar com a presença do cavalo, aprendendo também a
maneira correta de montar, essa relação contribui para o desenvolvimento da sua
autoconfiança, afetividade e autonomia.
Ainda sobre a relação afetuosa com o cavalo durante o processo terapêutico, a
psicóloga fala sobre os pontos positivos:“...são vários pontos positivos, mas um dos
principais é a confiança, é uma relação de confiança mutua tanto do praticante com o
animal, quanto do animal com o praticante também, e o cavalo se comunica com o olhar,
pelos gestos, pelos movimentos, o praticante pode estar entrando nesse universo do animal,
começa a desenvolver outra dimensão de percepção, eu acho que o cavalo tem uma
sensibilidade muito grande, inclusive espiritual, é uma vivência, é firme, é grande, sensível e
puro, o brilho do olhar faz entrar em outra dimensão”. Sendo uma das maiores dificuldades
do TEA, o fato de receber e demonstrar afeto às pessoas, que segundo Fonseca (2014), em
alguns casos é possível perceber nos primeiros anos de vida do bebê. O fato de eles não
olharem diretamente para os pais, geralmente se entretêm sozinhos, são repetitivos e não
interagem com os outros, tendo dificuldades em se relacionar com a própria mãe,
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característica que se intensifica ao longo dos anos, prejudicando a vida social, assim como o
processo de aprendizagem.
Percebe-se que ao iniciar o tratamento equoterápico, a criança inicia em um mundo
novo e diferente, cheio de possibilidades, onde muitos ganhos são adquiridos, sendo a
relação afetiva um dos principais, ultrapassando barreiras e modificando de forma positiva
sua rotina.
A categoria (b), diz respeito a movimentos motores, fatores que tiveram mudanças
significativas durante o tratamento, tendo a flexibilidade e o equilíbrio como ganhos
positivos, a psicóloga fala a respeito com a seguinte frase:“...eu acredito que o contato físico
e corporal, dela estar tocando no cavalo, sentada, abraçando e desenvolvendo mais
flexibilidade, também porque ela tinha muita rigidez e foi desenvolvendo mais flexibilidade
na montaria, foi tendo um pouco mais de leveza”. Para Brilinger (2005), os movimentos
proporcionados pelo andadura do cavalo são capazes de despertar no corpo do praticante
uma grande quantidade de estímulos sensoriais e neuromusculares que interferem
diretamente na aquisição de habilidades motoras. A fonoaudióloga diz que: “...hoje em dia,
ela quer ir, quer subir, quando o cavalo para ela quer continuar, o equilíbrio dela mudou,
antes ela caia, tinha muitas quedas, não parava, hoje em dia fica esperando a vez dela,
deixa colocar o capacete, coloca o pezinho e sobe no cavalo”. Segundo Freire et al. (2007),
a equoterapia sendo organizada com técnicas adequadas e por equipe capacitada proporciona
melhoras nos aspectos motores relacionados ao equilíbrio. É possível identificar, dessa
forma, que as mudanças ocorridas no processo terapêutico, durante as sessões de
equoterapia, são percebidas também no cotidiano da criança, sendo esse um dos principais
objetivos da prática. Para Ferrari (2009), o cavalo é constituído por mais de 200 ossos
diferentes, o que significa que em movimento este conjunto de ossos desencadeia uma gama
de estímulos insubstituíveis por qualquer outro recurso mecânico, o cavalo realiza um
movimento tridimensional: para frente e trás, para cima e baixo, para esquerda e direita,
contribuindo na coordenação motora, alinhamento postural, autoestima, atenção,
concentração, estimulação sensório-motora, noção espacial e esquema corporal. A
fisioterapeuta relata que também percebeu grandes modificações nesse aspecto: “...percebo
grandes melhoras na coordenação motora, no equilíbrio, sinto que ela mais calma e focada
e feliz na atividade, muito diferente de quando começou”.
As mudanças citadas pelos técnicos são percebidas também pelos familiares, que
acompanham assiduamente as atividades, o terapeuta ocupacional diz que: “...hoje em dia
ela chega acompanhada pela mãe, de mãos dadas, espera a vez dela, a própria mãe se diz
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contente, que consegue ir sozinha com a menina a alguns lugares, sem que ela fique
agressiva ou caindo no chão, antes tinha que sair sempre com a companhia de uma terceira
pessoa para segurá-la”.
Ainda sobre as questões motoras, a fonoaudióloga relata que: “...durante o percurso
ela é muito atenta aos barulhos da rua, tudo chama a atenção dela, sendo bem sensível aos
sons, principalmente de carros e caminhões, porém ela consegue se manter em cima do
cavalo e continuar o percurso, coisa que no início do tratamento não acontecia, quando ela
escutava um som desses queria sair, queria virar, e era bem dificultoso para continuar a
atividade”. De acordo com o DSM-V (2014) um dos aspectos do diagnóstico do TEA, é a
hiper ou hiporreatividade a estímulos sensoriais ou interesse incomum por aspectos
sensoriais do ambiente, o que se percebe nessa criança, é o fato de ela estar conseguindo
lidar com essa questão, que foi modificada durante o processo do tratamento, sem deixar
comprometer a atividade equoterápica. Newton (2011) realizou um estudo em que relatou
que a prática de equoterapia é capaz de desenvolver aspectos como a sensibilidade física e
psíquica, pois exige a constante percepção e reação frente a diversos estímulos, o que resulta
em harmonia e equilíbrio físico e psíquico.
A percepção do outro, a imitação, a vivência social, mímica, linguagem falada, sorriso
como resposta, postura corporal ou gestos para iniciar ou modular a interação social,
vinculação com objetos inusitados, percepção em relação ao mundo externo, são algumas
características que segundo Silva e Aguiar (2008), podem ser observadas durante as
atividades da equoterapia. É importante lembrar que nem todos os praticantes reagem da
mesma forma, a criança que está sendo analisada, teve ganhos notáveis em muitos aspectos,
sendo a flexibilidade e o equilíbrio alguns deles, dessa forma é importante ressaltar a
importância da preparação da equipe técnica, assim como a colaboração da família, afim de
alcançar os objetivos propostos pela atividade.
A categoria (c) trata dos aspectos de afetividade e socialização, sendo características de
maior dificuldade do transtorno, e que ao entrevistar a equipe técnica foi possível detectar
que existem ganhos obtidos através do tratamento. Segundo o DSM-V (2014) a afetividade e
a socialização são critérios diagnósticos, sendo especificados como déficits na reciprocidade
social e emocional, assim como dificuldade em estabelecer uma conversa normal e lidar com
emoções e demonstrações de afeto. A psicóloga refere que: “...com o desenvolvimento das
sessões, ela foi se vinculando ao cavalo, tocando, fazendo carinho, manifestando alguns
sons. Vejo que ela começou o tratamento muito distante, com muita resistência, agora ela
está mais aberta, tendo contato com o terapeuta, mais proximidade com a equipe”. De
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acordo com Barbosa e Munster (2013), a equoterapia pode ampliar socialização da criança,
dando condições para que ela possa desenvolver simultaneamente outras habilidades que
estão internamente relacionadas com desenvolvimento do praticante. Entende-se que todo o
processo terapêutico tem um tempo de adaptação, por isso é válido destacar a fala da
psicóloga: “...o processo de adaptação durou em torno de dois meses...” e diz ainda: “...a
confiança é mutua, entre praticante e animal, o praticante acaba entrando no universo do
animal”. A fonoaudióloga faz referência a essas mudanças: “... ela pega o terapeuta pela
mão e quer começar logo”, outra frase marcante dita pela terapeuta ocupacional: “...me
olha, me aceita, me da à mão”, essas frases significam que a criança estabeleceu vínculo
afetivo, não apenas com o cavalo, mas com a equipe técnica também, o que possibilita uma
comunicação eficaz entre paciente/equipe, não só na atividade terapêutica, mais sim na vida
cotidiana da paciente. A fonoaudióloga relata sentir diferença na comunicação da menina
durante a atividade: “...noto que ela tem mais uma comunicação visual com a gente, não
assim olho a olho, mas agente nota que, até o último atendimento dela, ela deu tchau para
nós, já estava com outro paciente, e a mãe saiu depois com ela, gritei tchau e ela abanou
para o nada, mas ela fez o gesto, ela levantou, ela não olhou para nós, mas ela sabia que
era tchau”.
Do ponto de vista psicológico segundo Bueno e Monteiro (2011), a equoterapia
contribui nos aspectos da autoestima, autoconfiança, assim como sensação de bem-estar,
proporciona condições para desenvolver afetividade (vínculo), desenvolvimento psicomotor,
aquisição da autonomia. Há, também o estímulo da linguagem e da área sensorial e
perceptiva, aspectos que possibilitam resultados positivos na vida social da criança. A
psicóloga diz que: “...ela foi demonstrando felicidade, alegria por estar com o cavalo,
tocando fazendo carinho manifestando alguns sons”, o fato de a criança estar adquirindo
habilidades para lidar com as suas limitações, estão relacionadas ao vínculo construído
durante o processo terapêutico, assim como a felicidade que demonstra ao estar praticando a
atividade, que antes era um grande desafio, hoje faz parte da rotina de sua vida, o terapeuta
ocupacional fala com entusiasmo sobre os progressos da paciente: “...é uma satisfação ver o
desenvolvimento dela, o neurologista que vê ela uma vez por mês, nota a diferença, ele disse
que ela melhorou 100%, a gente sabe que ela ainda vai progredir cada vez mais”.
Muitos estudos constataram melhora dos praticantes de equoterapia segundo Ribeiro
(2011), que relaciona a interação social, o equilíbrio estático e dinâmico, além da melhora
nos aspectos comportamentais e emocionais nos praticantes da atividade. A fonoaudióloga
relata sobre o progresso da paciente:“...ela entrou em 2010, tem 10 anos, 4 anos de
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tratamento, a afetividade e socialização foram as principais mudanças, o nosso vínculo é
muito positivo, e a socialização pelo que a mãe comenta, ela está conseguindo sair só a mãe
e ela, antes tinha que levar alguém junto uma em cada mão, a mãe diz que agora está
conseguindo sair sozinha com ela, porque ela se jogava no chão, às vezes ela ainda dispara,
mas não como antes, ela aceita os colegas, ela sempre é a primeira a fazer a atividade, mas
ela vê as outras crianças, não empurra os outros, ela só teve evoluções”.
A categoria (d) representa o fato da felicidade da criança em estar em contato com o
animal, com a natureza e com todos que participam da atividade, sendo esse um ganho
essencial e de extrema importância em qualquer tratamento. Independente da situação do
sujeito, as autoras Bueno e Monteiro (2011), consideram os movimentos tridimensionais do
cavalo, assim como a relação que se estabelece com o mesmo sendo grandes precursores dos
benefícios que a equipe atinge no decorrer dos atendimentos, considerando também a relação
homem-cavalo e a vivência dos profissionais no processo terapêutico, onde todos esses
fatores completam o setting terapêutico, e os resultados que serão proporcionados ao
praticante.
Dessa forma entende-se que a atividade equoterapia proporciona resultados positivos,
sendo um conjunto de fatores que auxiliam, não apenas nos aspectos de desenvolvimento da
criança, mas também modifica a rotina, contribuindo para a qualidade de vida e bem estar da
criança e consequentemente da sua rede de apoio. O contato com o animal e com a natureza
representa um novo mundo, onde a criança encontra desafios e oportunidades de estabelecer
novos relacionamentos, aprendendo a lidar com as suas limitações, esses fatores são
fundamentais, e estão diretamente relacionados aos diversos ganhos citados anteriormente,
assim como o bem estar, e a alegria em praticar a atividade. A fisioterapeuta relata: “...ela
sorri quando está em cima do cavalo”, a psicóloga em vários momentos ressalta a alegria da
paciente: “... o que mais me chamou a atenção foi à alegria, a sensação de liberdade, de
expressão como se ela pudesse está se manifestando de outra forma, expressando para outra
forma de chamar a atenção dela, trazer ela para aqui e agora, naquele momento ela poder
estar ali. ”As características do cavalo apontadas, explicam o fato de curiosidade da criança
em relação ao animal, sendo visto no primeiro momento como algo assustador e no decorrer
do tratamento percebe-se a fascinação que desperta no imaginário infantil.
Por fim, é importante ressaltar o desempenho da equipe técnica que ao trabalhar em,
proporciona mudanças significativas no desenvolvimento da criança, percebe-se que o
cavalo e o local onde são feitas às atividades são fatores primordiais para o sucesso do
tratamento, além das mudanças no desenvolvimento motor, social e afetivo, destaca-se a
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sensação de bem estar, a alegria ao cavalgar, fatores que estão relacionados ao vínculo criado
com o animal assim como a equipe, dessa forma é possível associar uma modificação na
vida cotidiana da paciente, adquirindo uma melhor qualidade de vida.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
De acordo com os relatos dos técnicos (psicóloga, terapeuta ocupacional,
fonoaudióloga e fisioterapeuta) foi possível obter informações relevantes sobre o TEA,
compreendendo como funciona a atividade da equoterapia, que está de acordo com o
referencial teórico. Fica claro como a equoterapia se estabeleceu no Brasil, e como ela pode
ser utilizada de forma profissional e válida, tendo o cavalo como o principal motivo para as
mudanças ocasionadas durante e após o tratamento.
É importante ressaltar que a disponibilidade da equipe técnica foi fundamental para a
realização dessa pesquisa, equipe essa que reconhece e administra de forma consciente o
papel e a função de cada um, valorizando assim o trabalho em grupo, considerando como
fundamental o papel do animal durante à pratica. É possível perceber a responsabilidade dos
profissionais que atuam nessa área, que de forma multidisciplinar identificam as reais
necessidades de cada paciente e organizam as intervenções apropriadas para cada praticante.
Considerando as limitações e dificuldades do Transtorno do Espectro Autista, tais
como interação social, déficits nos aspectos psicológicos, afetivo, psicomotor, social e de
comunicação, entre outros, foi possível observar que a atividade de equoterápica foi um
método fundamental e eficaz para o desenvolvimento da menina proporcionando bem-estar e
qualidade de vida, contribuindo também para melhorar a coordenação motora, o equilíbrio, a
afetividade e os relacionamentos sociais, assim como a autonomia e a autoestima.
É valido citar a importância de realizações de pesquisas como essas, para que cada vez
mais posam contribuir para a descoberta de novas possibilidades referentes ao transtorno do
espectro autista, assim como o conhecimento de novas opções de tratamento.
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Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015.
Artigo Original
Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483
MÍDIAS SOCIAIS COMO FERRAMENTAS DE ESTRATÉGIAS DE MARKETING
Marco Miller Trainini1 e Jéssica da Silva Torres1
RESUMO - O presente artigo aborda assuntos pertinentes ao uso das
Mídias Sociais como ferramentas de estratégias de Marketing Digital,
através da pesquisa bibliográfica que se desenvolve em conjunto ao
estudo do Marketing de relacionamento com objetivo de identificar
quais são as ferramentas da Internet utilizadas para desenvolver
estratégias voltadas para o mundo em constante globalização e avanços
tecnológicos, que cada vez mais, são eficazes para o desenvolvimento de
competitividade a fim de atingir o máximo de pessoas possíveis. O
estudo procurou como objetivo geral investigar a importância do
Marketing Digital e das novas mídias, a fim de expor os benefícios e
malefícios a respeito da utilização das mesmas, como canal de
comunicação nas organizações. A pesquisa quanto aos fins é do tipo
descritivo e exploratório, pois irá descrever as estratégias de marketing
que são utilizadas sem um planejamento estratégico, utilizando-se um
levantamento bibliográfico e análises de exemplos que facilite a
compreensão.
Palavras-chave: Marketing digital. Marketing de relacionamento.
Mídias sociais.
ABSTRACT – This article discusses matters pertaining to the use of
Social Media as Digital Marketing strategies tools, through literature
that develops together to relationship marketing study in order to
identify what are the Internet tools used to develop focused strategies to
the world of constant globalization and technological advances,
increasingly, are effective for the development of competitiveness in
order to achieve the maximum possible people. The study sought is to
investigate the importance of digital marketing and new media, to
expose the benefits and harms regarding the use of the same, as a
communication channel in organizations. Research on ends is
descriptive and exploratory, it will describe the marketing strategies that
are used without a strategic plan, using a literature review and analysis
of examples to facilitate understanding.
Keywords: Digital marketing. Relationship marketing. Social media.
Revista
Ciência e Conhecimento
Volume 9 – Nº1 – 2015.
1 – Universidade Luterana do
Brasil – ULBRA/São Jerônimo.
Curso de Administração. São
Jerônimo, RS, Brasil.
Dados para correspondência
Marco Miller Trainini;
Rua: Barreto Leite, nº 381.
São Jerônimo/RS/Brasil
CEP: 96700-000
E-mail:
[email protected]
Recebido em: 28/09/2014.
Revisado em: 28/11/2014.
Aceito em: 10/03/2014.
Área:
Gestão do conhecimento.
24
Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483
INTRODUÇÃO
As tecnologias cada vez estão mais integradas, com o desenvolvimento empresarial
e a globalização, e as organizações estão se adaptando neste mundo tecnológico, fazendo
com que o seu planejamento de marketing se inclua nesta tendência, para poder competir
no mercado e buscar cada vez mais a atenção dos clientes, tendo um alto poder de
transmitir e receber informações em um ambiente tão disperso.
Devido à globalização, as organizações estão identificando ferramentas virtuais de
acordo com o uso da Internet através de compras, pesquisas e principalmente a comunicação,
várias empresas buscam lançar novas informações com o objetivo de atingir cada vez mais
pessoas.
As novas e grandes tecnologias instigam a curiosidade e faz com que aumente o
consumo virtual, pois muitas informações estão sendo lançadas, trocadas, debatidas na rede,
podendo ser acessada, visualizada por qualquer usuário, fazendo com que aumente o nível de
competitividade para o gerador de conteúdo, resultando a utilização virtual cada vez mais
efetiva e positiva para a marca.
O Marketing Digital tem como foco além da fidelização de cliente, a personalização ao
cliente, com muitas possibilidades de fortalecer a marca da empresa e reestruturar o
planejamento e posicionamento perante o mercado. E-marketing pode avaliar e quantificar
o impacto da ferramenta, buscando informações quanto ao retorno imediato e
principalmente o relacionamento da empresa com o cliente.
De acordo com este avanço na tecnologia, com as mudanças e adaptações, os clientes
podem estar conectados em qualquer lugar e momento, e através desta oportunidade, esta
pesquisa desenvolve a seguinte questão: quais as estratégias que as empresas podem utilizar
para captar clientes com o Marketing digital?
O objetivo desta pesquisa é identificar quais são as ferramentas do Marketing digital
utilizadas para desenvolver estratégias para captar clientes, que cada vez mais, são eficazes
para o desenvolvimento de competitividade a fim de atingir o máximo de pessoas possíveis.
A pesquisa será do tipo descritivo e exploratório, pois irá descrever as estratégias de
marketing que podem ser utilizadas nas organizações, utilizando-se um levantamento
bibliográfico e analises de exemplos que facilite a compreensão.
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2. Referencial teórico
2.1 Marketing digital
O conceito de Marketing é muito mais amplo que o Marketing digital, que segundo
Fascioni (2007) podemos definir Marketing Digital como uma maneira de fazer Marketing
através de ações de comunicação que as empresas utilizam com recursos digitais, podendo ser
utilizados e representados via internet.
Kotler (2000) afirma que as empresas terão mais chance de sucesso as que escolherem
seu mercado-alvo e se prepararem para programas de marketing customizados. Afirmando
então que é importante conhecermos o perfil do consumidor online. É essencial conhecer o
contexto do marketing digital, para depois planejar ações que façam a empresa crescer.
O marketing digital é uma das vantagens dos negócios online, onde se pode personalizar
o contato com os consumidores virtuais, observar seu comportamento e medir o seu grau de
engajamento.
Torres (2009) diz que quando falamos de marketing digital e internet, estamos falando
de pessoas, suas histórias e desejos, estamos falando sobre relacionamentos e necessidades a
serem atendidas.
Assim, o marketing vem em busca da necessidade pelo o qual todos desejam ou
necessitam qualquer produto ou serviço.
Torres (2009) afirma também que um modelo simples mostra quatro comportamentos
do consumidor online, que permite analisar com mais profundidade e clareza as atividades
realizadas na Internet, entendendo as motivações no uso de cada uma das tecnologias
existentes, são eles: a) Relacionamento; b) Informação; c) Comunicação e d) Diversão.
Conforme o autor citado, essa visão é baseada no comportamento do consumidor, que
nos permite analisar e definir estratégias de marketing digital, muito mais adequadas a cada
um dos ambientes e situações presentes na Internet.
Vaz (2010) define da seguinte forma;
[...] a época atual é do relacionamento. A palavra de ordem é personalizar a
comunicação, os produtos, os serviços e criar um laço emocional com consumidores
de modo que estes escolham sua empresa pelo coração, não pelo produto ou preço
[...]
O quadro 1, adaptado de Torres (2009) mostra a relação entre as estratégias de
marketing digital, as estratégias do modelo de marketing digital e suas aplicações
operacionais. É necessário entender que a Internet viabiliza o uso de mais uma estratégia que
é o monitoramento de resultados, importante no mundo empresarial e difícil programar no
marketing tradicional.
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Quadro 1. O Marketing e a Internet.
Estratégia de Marketing
Estratégia de Marketing
Digital
Ações Táticas e
Operacionais
Tecnologias e
plataformas
empregadas atualmente
Comunicação corporativa
Relações Públicas
Marketing de Conteúdo
Geração de Conteúdo
Marketing de busca
Blogs SEO/SEM
Marketing de
Relacionamento
Marketing nas mídias
sociais
Ações em rede sociais.
Ações com blogueiros
Orkut, Twitter, Facebook,
Youtube, Linkedin etc.
Marketing direto
E-mail Marketing
Newsletter Promoções
Lançamentos
E-mail SMS
Publicidade e propaganda
de Marketing de
Guerrilha
Marketing Viral
Postagem de vídeos,
animações e músicas
Publicação de widgets
Redes Sociais You tube
Widgets virais
Publicidade e propaganda
Branding
Publicidade on-line
Banners Podcast e vídeo
cast Widgets Jogos online
Sites e blogs Mídias
Sociais Google Adwords
Pesquisa de Mercado
Branding
Pesquisa on-line
Bancas e Clipping
Monitoramento de marca
Monitoramento de mídias
Google Redes Sociais
Clipping
Fonte: Adaptado de TORRES (2009, p. 69).
Chleba (1999) separa as grandes forçar do marketing digital em interatividade,
personalização, globalização, integração, aproximação, convergência e democratização da
informação. Para ele cada uma delas oferece uma nova dimensão à comunicação, às vendas e
ao relacionamento com o mercado.
São elas:
 A interatividade é uma exigência crescente dos clientes, e deve ser compreendida como
a possibilidade bidirecional de transferência de dados, como a forma em que o usuário
interage por meio de troca de dados e do fácil acesso as informações do que deseja.
 A personalização é uma força que o marketing digital deve usar de forma a atender
especificamente cada pessoa, utilizando da segmentação e das informações. A empresa
pode direcionar o conteúdo do jeito que o usuário deseja, adequando os serviços,
produtos e anúncios individualmente.
 A integração e a utilização de um único sistema que reduz os custos e integram
informações, esta é uma tendência muito forte que faz com que a empresa centralize
suas operações neste único sistema.
 Aproximação se enquadra nas tecnologias multimídias, que permite a divulgação de
produtos e serviços com um enorme volume informativo, fazendo com que esta
aproximação realize a venda e que ela seja direta e sem intermediários, como ocorre nos
sites.
 Convergência na representação digital das imagens, sons e vídeos.
 Democratização da informação na quantidade de informações disponíveis, nunca foi tão
vasta e tão barata, tanto em sites informativos, quanto nos sites comparativos.
Essas forças do marketing digital posicional a mídia como um inovador e poderoso
recurso dotado de características únicas e indispensáveis para empresas que desejam
estabelecer uma comunicação instantânea e direta com seu alvo.
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Torres (2009) relata que essas estratégias são interdependentes e subdividem-se em:
 Marketing de conteúdo: é o conteúdo dentro de um site, e a primeira e mais importante
forma de comunicação com o consumidor conectado.
 Marketing nas mídias sociais: são sites construídos para interação social e
compartilhamento de informações, ou seja, opiniões de pessoas falando de diversas
coisas, inclusive dos serviços prestados.
 Marketing viral: que é a comunicação individual entre um internauta e outro, o chamado
“boca a boca”.
 E-mail marketing: uma forma de comunicação pessoal e empresarial, onde são enviadas
mensagens em massa, para destinatários específicos, de maneira estratégica.
 Publicidade online: geralmente são banners com anúncios publicitários, que com o
tempo ganharam animação, interação, som, vídeo e muitos outros recursos.
 Pesquisa online: é uma forma de conhecer o público-alvo, seu comportamento e suas
opiniões, para planejar suas estratégias e ações de marketing.
 Monitoramento: que é uma ação estratégica que integra os resultados de todas as outras
ações estratégicas, táticas e operacionais, permitindo verificar os resultados e agir para
correção de rumos ou melhoria das ações.
Dessa forma, nota-se que o marketing digital deve ser encarado como um conjunto de
sete ações estratégicas, cada uma criando ações táticas e operacionais, que de forma
coordenada e interdependente, gera sinergia e resultados, de acordo com a dinâmica utilizada
pelas empresas.
2.2 Marketing de relacionamento
O Marketing de Relacionamento é um processo de desenvolvimento, de liderança, de
fidelidade ao consumidor e de rápida aceitação dos novos produtos e serviços no mercado. A
criação de relações sólidas e duradouras é uma tarefa árdua, de difícil manutenção, mas
acredita-se que, em um mundo onde o cliente tem tantas opções, mesmo em segmentos
limitados, uma relação pessoal é uma das formas de manter a fidelidade do cliente. Hoje as
empresas devem estudar o mercado e principalmente, seu público-alvo, para poder atender, da
melhor forma, suas necessidades, pois o consumidor é a alma do negócio. Segundo Las Casas
(1987):
O mais importante era a conquista e a manutenção de negócios em longo
prazo, mantendo relações permanentes com o cliente, por isso uma valorização
maior do consumidor. O cliente passou a dominar o cenário da comercialização
como um dos caminhos para a obtenção de melhores resultados. Estava determinado
o conceito de marketing, em que o consumidor passava a ser considerado o rei.
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O Marketing de Relacionamento tem como pressuposto o conceito de valorização, que é
o algo a mais do que produto ou serviço, ou seja, aquilo que não se toca e não se vê. Isso
remete às práticas do atendimento diferenciado e qualificado. Trabalhar com os desejos,
ansiedades do cliente, facilitando a memorização de sua marca, e deixar o cliente à vontade
para que se possam compreender suas necessidades. Para McKenna (1993):
Com o desenvolvimento da tecnologia e o aumento da competição, algumas
empresas mudaram sua abordagem e começaram a voltar para o cliente. Essas
empresas expressaram uma nova disposição em modificar seu produto de modo a
atender às exigências dos clientes – praticando a escola de marketing do diga que
cor prefere.
Com efeito, com tantas empresas oferecendo produtos, a fidelização do cliente seria
uma tarefa muito dispendiosa caso se utilizasse os métodos convencionais. Ou seja, aumentar
o pessoal de vendas ou aumentar o pessoal de marketing. Uma prática mais fácil seria o
treinamento do pessoal, que em uma pequena margem já melhoraria as condições reais de
interação da empresa e o cliente, na qual o cliente falando de suas necessidades,
indiretamente, estaria colaborando para o lançamento de novos produtos.
Todos os setores que formam uma empresa são importantes e contribuem no processo
de relacionamento e fidelização. Os funcionários internos precisam ter consciência da
importância de prestar um atendimento diferenciado ao cliente, criando-se um valor adicional,
aumentando, assim, suas possibilidades de fidelização.
Para obter um bom trabalho de equipe e incrementar a fidelidade dos clientes
é preciso derrubar as barreiras que separam os diferentes departamentos da empresa.
Todos devem estar empenhados em prestar um serviço de excelência que supere as
expectativas mais elevadas (SOUKI, 2000).
Enfim, é importante que a empresa acompanhe todas as necessidades do cliente para
obter dele a satisfação total.
2.3 Mídias sociais
Ao se utilizar o marketing digital, podemos encontrar inúmeras ferramentas grátis que
ajudam a promover a organização, como as redes sociais, onde as maiores do Brasil hoje
são Facebook, You tube e Twitter, além de outras como Google+, Blogs, Orkut, que está
foi encerrada e foi uma das maiores redes sociais, Askfm, Badoo, Instagram, etc. Além
das redes sociais, as empresas podem utilizar websites, que foram os primórdios do marketing
digital. A maior dúvida é saber distinguir o que cada rede social oferece e os recursos e a
abrangência da atuação na internet.
Uma rede social é composta por pessoas ou organizações, conectadas por vários tipos de
relações, que partilham de objetivos e valores em comuns, característica fundamental na
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definição das redes, possibilitando relacionamentos não hierárquicos e horizontais entre os
usuários.
2.3.1 Facebook
Facebook é uma rede social que foi criada em fevereiro de 2004, em Harvard, nos EUA
por Mark Zuckerberg e três amigos. Em dezembro do mesmo ano, a rede já alcançara a marca
de um milhão de usuários. Ele foi à rede social mais visitada do mundo, no ano de 2010,
superando a Google, líder absoluta de acessos até então. O Facebook atinge nos dias de hoje
vários usuários espalhados por todos os continentes, podendo também encontrar várias
empresas, escolas entre outros que utilizam essa ferramenta para divulgar os acontecimentos,
além de estarem sintonizados com os desejos e expectativas de seus clientes, sendo uma
ferramenta comum nível de recursos incríveis, como fotos, textos, vídeos e também
integrando o Youtube, Skype, Twitter, etc.
Uma das grandes vantagens do uso do Facebook é que ele tem como característica a
centralização de informações, o que permite ao usuário navegar em busca de diversos
assuntos sem sair da sua página na rede. O Facebook, atualmente, pode ser acessado pelo
celular, diminuindo a distância entre a rede e o usuário, que pode tê-la em suas mãos.
Para pessoa física existe o Perfil no Facebook e para pessoa jurídica, que é a empresa
possui uma página, mais conhecido como Fanpage.
As vantagens para as empresas na Fanpage são:
 São indexadas pelos mecanismos de busca (Google, Bing...), o que aumenta o tráfego
na página, e consequentemente no seu site;
 Visualmente se torna muito atrativo para o usuário, que em seu momento de lazer entra
na página de empresas, buscando indicações de produtos e serviços;
 É possível criar campanhas de publicidade direcionadas para a página, dentro do
Facebook;
 Não possui limitação de fãs (perfis estabelecem limites de amigos);
 Sua empresa estará dentro dos termos de uso do Facebook;
 A rede que mais cresce no mundo é a tendência que seus usuários passem a fazer
compras através dela.
Nas redes, quem dita às regras é o consumidor e não o anunciante. A página de um
usuário é repleta de informações relevantes, onde encontramos a localidade da pessoa,
interesses e, em muitos casos, o consumidor diz com suas próprias palavras seu desejo, pela
atualização de status. A partir destas informações conseguimos conhecer melhor o público
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alvo, podendo gerar o conteúdo que ele deseja receber no seu feed de atualizações, horários
mais propícios para se fazer as postagens e o tipo de publicações que serão feitas (fotos,
enquetes, links externos, ações promocionais que incentivem o usuário a interagir e
compartilhar o conteúdo, e até a própria marca). Também é possível anunciar dentro da rede
social, utilizando o Facebook Ads, que impulsiona o post e pode filtrar o público que deseja
mostrar.
Como qualquer outra mídia social, o sucesso da Fanpage depende do engajamento dos
usuários perante a marca ou empresa. Isso depende de um bom planejamento nas redes e na
web como um todo, realizado com muita competência.
2.3.2 Twitter
O Twitter é um serviço online de micro blogging, sendo que o usuário deve responder a
simples pergunta “O que está acontecendo” (What’s happening?) em no máximo 140
caracteres, assim ele pode expor opinião, debater, comentar e fazer publicidade. É uma rede
de informações em tempo real (TWITTER, 2011).
Como cita Vaz (2008);
[...] o Twitter é um ambiente moderno, inovador, rápido, ágil, jovem,
informal. Esse deve ser o espaço em que seus consumidores se sintam mais
próximos de sua marca ou de você, tenham vontade de interagir, tenham a sensação
de serem seus amigos e, por serem seus amigos, terem até um sinal positivo desta
rede social [...]
Está ferramenta é de grande prioridade para uma empresa que deseja ter um e-marketing
audacioso em relação aos seus clientes, o exemplo é que se acabou de lançar o produto, as
pessoas que seguem o usuário da empresa não precisarão entrar no site organizacional ou em
sites de pesquisas, ao abrir o Twitter já haverá a informação que tal produto foi lançado.
Diferente de outras redes sociais, no Twitter não é necessário que haja correspondência
mútua entre usuários para que aconteça uma interação. É possível seguir alguém que não siga
o seu perfil e vice-versa. Isso torna o Twitter uma poderosa mídia social de rádio difusão.
Não há diferença técnica entre perfis de pessoas e de empresas. A dinâmica é a mesma
para todos. Ao seguir um perfil, você automaticamente começa a receber em sua “timeline”
os tweets desse usuário.
A sigla RT é a abreviação de Retweet. Quando um usuário dá RT em um tweet de
outro usuário, ele replica o conteúdo dele para seus próprios seguidores. O Retweet pode ser
dado clicando no botão "Retweet", ao passar o cursor do mouse por um tweet. Outra opção é
copiar a mensagem a ser retweetada e postar em seu perfil colocando a sigla RT e o
@usuário à frente do tweet.
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O símbolo “#” é utilizado na rede social para identificar e agrupar em uma busca
palavras-chave e assuntos importantes. Ao clicar em uma palavra com “#”, você é
direcionado automaticamente a uma página que exibe todos os tweets que utilizaram a
mesma palavra. Assim é possível acompanhar o que milhares de usuários da rede estão
falando sobre um determinado assunto e, assim, disseminar conteúdo segmentado também.
2.3.3 YouTube
O YouTube, é um site pertencente a Google, que é basicamente um compartilhador de
vídeos, onde o usuário pode fazer o upload (enviar para o servidor) do vídeo e permitir que o
mundo inteiro o assista, comentem, deem notas, compartilhe seu vídeo exibindo-o em outras
páginas Web, enviar para amigos, etc.
É o mais popular site devido à possibilidade de hospedar qualquer vídeo, exceto
materiais protegidos por copyright. Trata-se de início da produção de conteúdo colaborativo,
ou simplesmente uma forma de fazer Consumer Generated Media – GCM, pois este
consumidor saturado está com o poder em suas mãos, com seus aparelhos mentais ligados a
propaganda, que Gracioso (2002) conceitua assim:
Propaganda é a mensagem divulgada em veículos de grande penetração (TV,
rádio, revistas, jornais, etc.) e patrocinada (paga) por um anunciante, que tem por
fim criar ou reforçar imagens ou preferências na mente do consumir, predispondo-o
favoravelmente em relação ao produto, serviço ou instituição patrocinadora.
O Youtube utiliza um compartilhamento de recursos audiovisuais muito aderidos por
empresas de música e cinema, além disso, é uma ferramenta que disponibiliza a qualquer
empresa divulgar de forma mais lúdica e criativa seus produtos e serviços, também muito
aderida por jovens, com o intuito de se auto promover mediante a rede, hoje em dia, é muito
comuns os canais de pessoas físicas ou empresas, onde relatam sobre diversos acontecimentos
e publicam seus respectivos vídeos, se gerar um forte impacto na rede, as organizações podem
perceber o quão o mercado está sendo necessitado, podendo criar um e-marketing ao nicho
desejado.
1.3.4 Website
Atualmente o website é a ferramenta mais usada na rede, pois as empresas utilizam
como forma de comunicação entre clientes e fornecedores, disponibilizando do endereço da
organização até toda a sua variedade de produtos e serviços. É uma ferramenta que
inicialmente tem um custo baixo ao serem criados, com o aperfeiçoamento poderá gerar
despesas em inovação e comodidade aos clientes, como as suas atualizações e seus
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certificados de segurança, que consomem uma renda financeira das empresas para serem
atualizadas frequentemente.
Segundo Monteiro (2007), o link patrocinado é um modelo de propaganda onde a
anunciante paga pelo clique no anúncio, e não pela exposição do mesmo.
Este tipo de anúncio é também chamado de campanha por palavra chave ou PPC (payper-click), pois o anúncio é mostrado através de alguma palavra chave.
O Adwords é um programa de publicidade do GOOGLE, onde os anúncios são
exibidos em forma de links. Esses anúncios são exibidos nas pesquisas do site e nos sites que
utilizam o adsense, um serviço de publicidade onde os donos de sites se inscrevem no
serviço e disponibilizam os resultados em suas páginas, gerando lucro baseado na quantidade
de cliques ou visualizações dos anúncios.
De acordo com Vaz (2008), dos formatos de publicidade oferecidos pelo Google no
Adwords, o mais comum é o em forma de texto, seguido pelos anúncios gráficos e os de
animação. Outros formatos oferecidos também são anúncios em vídeos, anúncios de
empresas locais e em celulares.
Através das informações do site do Adwords Google (2008), os links patrocinados
funcionam porque o seu alcance é segmentado, pois a sua exibição será somente quando
houver pesquisas relacionadas à sua palavra-chave cadastrada, possuindo maior controle,
pois pode ser exibido de diversos formatos, inclusive por área geográfica e idiomas; e valor
mensurável, pois não há compromisso de tempo ou requisito de gasto mínimo, com a opção
de custo por clique, só é cobrado quando recebe um clique, isso significa que todo o seu
orçamento é usado para clientes potenciais.
De acordo com O’Brien (2010) os sites e serviços de rede Internet/Intranet, por
exemplo, possibilitam um processo de marketing interativo, no qual os clientes podem tornarse parceiros na criação, comercialização, na compra e na melhoria de produtos e serviços.
Os websites também podem absorver as informações dos clientes e fornecedores, como
um banco de dados, a fim de utilizar as necessidades e desejos dos mesmos e facilitar a
comunicação entre eles, o que é de grande importância em um mercado totalmente
competitivo.
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Figura 1. Representação do Adwords.
Fonte: http://adwords.google.com.
2.3.5 Blog
Os blogs, ou weblogs, são exemplos de espaço virtual que possibilitam a ação em
comunidades com outros usuários, com uma interface relativamente fácil de ser aplicada,
normalmente gratuita, onde os usuários se expressam, criam grupos que partilham interesses
em comum, trocam informações e dão opiniões sobre produtos e filmes e etc.
A força dos blogs está na possibilidade de que seus atores utilizem essa
ferramenta para se beneficiar ou comprometer uma corporação, o que pode
representar oportunidades e ameaças para a empresa. Entretanto é possível utilizar
um blog para atualizar os empregados sobre os negócios da empresa, alertar os
clientes sobre os novos serviços (ou problemas) e também para ajudar nos esforços
para a recuperação de falhas permitindo que os clientes e empregados se
comuniquem durante possíveis emergências (ROSA, 2007).
O blog tem um formato mais informal, dando à empresa uma “face humana”, ou seja, a
empresa perde aquela imagem de “intocável” oferecendo oportunidade de interação com seus
clientes. Um blog bem escrito e com constantes atualizações aproxima os clientes da empresa,
além de passar credibilidade.
O baixo custo de manutenção é mais uma vantagem de se usar essa ferramenta.
Podendo ainda obter excelentes resultados com campanhas de marketing. A comunicação
direta é mais um facilitador. É possível falar especificamente da empresa, de seus produtos,
seus funcionários, eventos realizados. Ou seja, inserir o cliente naquele contexto.
Uma das formas de manter o relacionamento é manter o blog atualizado sempre, dar
dicas, antecipar lançamentos e oferecer serviços da empresa, incluindo links para o site. O
blog também é um excelente lugar para oferecer produtos e promoções. Apenas deve-se tomar
cuidado para não exagerar e acabar prejudicando a proposta da empresa.
Com o blog, a empresa também pode atualizar o site disponibilizando conteúdo de
qualidade, aumentando a quantidade de acessos e consequentemente o SEO – Search Engine
Optimization.
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2.3.6 Google+
É uma rede social lançada em 2011 pelo Google. Agrega diversos serviços do próprio
Google e proporciona uma nova dinâmica entre usuários com os Círculos e Hangouts. Já
possui mais de 250 milhões de usuários e é tido como a proposta do Google para concorrer
com o Facebook.
Possui o botão +1 é semelhante ao botão "Curtir" do Facebook, mas para utilizá-lo,
basta ter um perfil no Google. Ele permite recomendar páginas publicamente na web e
compartilhar com seus círculos, caso você tenha perfil no Google+.
Possui os “Círculos” que é a função de organizar os seguidores nas categorias
desejados, como por exemplo, “Amigos Pessoais”, “Colegas de Trabalho”, “Empresas”.
Dessa forma, é possível segmentar o conteúdo que você compartilha.
Para as empresas é importante classificar os novos seguidores de sua página, segundo o
seu perfil, idade, sexo, localização, etc. Assim, suas postagens podem ser exclusivas para
certos círculos e aumentam a chance de interação. Para adicionar seus seguidores nos círculos,
é preciso classificá-lo de forma exata e de forma manual (não tem como o seguidor se
encaixar em um círculo, é você quem decide), sendo algo trabalhoso, mas que pode gerar
bons resultados no futuro. Vale lembrar que você pode adicionar um mesmo usuário em mais
de um círculo.
Como opção de bate papo possui o Hangouts, que é a opção para realizar uma
videoconferência gratuita com os seus usuários. Você cria o Hangout, define quais círculos
vão ter acesso e depois é enviado um convite aos participantes perguntando se eles querem ou
não assistir. Outra opção são os Hangouts On Air, que permite que você faça uma transmissão
ao vivo para um número indeterminado de pessoas em todo o mundo. Depois de terminado o
Hangout On Air, o vídeo é colocado automaticamente em sua conta verificada do YouTube.
O Google+ já disponibilizou o selo de verificação de conta, entretanto, ainda não está
liberado para as empresas. Por enquanto, o Google mesmo verifica a veracidade da conta,
dando preferência para páginas de figuras públicas, celebridades e pessoas que forem
adicionados ao grande número de círculos. Após um longo tempo sem essa permissão, as
páginas já podem ser administradas por até 50 pessoas. Basta o criador adicionar os e-mails
nas configurações da página.
É uma forte ferramenta para empresas que querem gerar discussões e debates com
formadores de opinião.
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Figura 2. Google +
Fonte: https://plus.google.com/.
2.3.7 Instagram
Instagram é um aplicativo móvel (Android, iOS) de edição e de compartilhamento de
imagens e de vídeos, com as seguintes funcionalidades sociais:
 Criação de um perfil público.
 Inscrição nas contas de usuários.
 Tags (palavras-chave ou "marcadores") adicionados às fotos/vídeos, geolocalização,
 Interações com os conteúdos compartilhados (curtir, comentar).
 Conexão com outros aplicativos (Facebook, Twitter).
O aplicativo é propriedade do Facebook e também declinada em versão web.
O Instagram para ajudar a segmentação deve-se usar as hashtags (#) certas no conteúdo
e colocar a foto no sistema de busca do canal. O mais importante é usar hashtags pertinentes
ao que está sendo postado. A empresa pode criar hashtags próprias para o seu negócio,
começando com o nome da empresa. Assim, todas as fotos relacionadas diretamente à
empresa podem ser encontradas na busca através do nome criado. Além disso, se alguém
ainda não souber que a organização tem um perfil oficial da sua marca no Instagram, ficará
sabendo se buscar por hashtags ligadas ao nome da empresa.
Os consumidores se interessam sobre como seu negócio funciona “por dentro”. Este
APP serve também para divulgar benefícios do produto ou serviço através de fotos dele sendo
feito, fotos dos locais físicos da sua empresa, fotos de seus funcionários, etc.
A utilização desta ferramenta é para saber além do que o Instagram mostra. Com
o Statigram tem como, por exemplo, o número total de likes que as fotos do perfil possuem e
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quem são as pessoas que mais se engajam com o perfil da empresa. Além disso, a rede é uma
febre mundial.
Figura 3. Instagram para empresas.
Fonte: marketingsemgravata.com.br – julho/2014.
2.4 Monitoramento de redes sociais
No marketing digital, o monitoramento das redes sociais desempenha uma função
primordial em qualquer campanha. O monitoramento das redes sociais não se aplica
exclusivamente a marcas de produtos e serviços. No marketing político, por exemplo, o
monitoramento das mídias sociais é essencial para sentir a tendência do eleitorado.
Não se imagina uma ação de marketing nas mídias sociais sem que haja uma estratégia de
monitoramento eficiente da mensagem e sua repercussão junto ao público presente nas mídias
sociais.
É através do monitoramento das redes sociais que podemos identificar quais são os
melhores caminhos para ser seguido por um produto ou serviço ou então, ter uma percepção
exata do conceito da marca junto ao público-alvo.
Outra função desse processo de monitoramento de mídias sociais é identificar
tendências do mercado através do mapeamento dos assuntos que usuários com o perfil mais
afinado com a marca ou produto estão comentando nas diversas redes sociais.
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Frequentemente, esse tipo de monitoramento nos traz insights para novas campanhas ou ações
táticas, além de funcionarem como parâmetro para uma sintonia fina das campanhas em vigor.
O estabelecimento de uma estratégia de monitoramento de redes sociais pode trazer uma
série de benefícios para a empresa como, por exemplo, a compreensão do comportamento do
público através da observação do que lhe agrada ou não, além é claro, do entendimento da
percepção da marca junto ao público que faz uso dessas mídias.
Atualmente, existem inúmeras ferramentas, pagas e gratuitas, que podem ajudar no
monitoramento de uma marca ou tópico nas redes sociais online.
Ferramentas gratuitas podem citar algumas como:
 Social Mention: Pesquisa menções em várias redes sociais, possibilitando filtrar as mais
interessantes. A ferramenta disponibiliza um resultado completo, com top users, top
keywords e top hashtags.WhosTalking: A interface é agradável e a pesquisa, fácil de ser
realizada, pois fazem uma busca simples e linca as menções com os comentários
diretamente nas redes em que foram postadas;
 Topsy: Interface semelhante ao Google, monitora também o Google+, o que faz toda a
diferença, pois ainda são poucas as ferramentas que monitoram essa plataforma;
 Tweet Deck: é um dos mais populares, tendo sido comprado pelo Twitter no ano passado.
Por meio dele, a empresa pode seguir as menções em diferentes contas dessa rede social e
também do Facebook;
 Addictomatic ou o HootSuite: Disponibilizam serviço parecido, observando outras fontes,
como o Foursquare, Linkedin e Google+, entre outras ferramentas.
Para análises mais aprofundadas, que incluam métricas com volume de menções,
associações de palavras, mensagens replicadas, alcançadas, mensagens, engajamento, usuários
mais influentes que interagem ou recomendam a marca, é recomendada a utilização de
ferramentas mais sofisticadas, e pagas, que além de oferecer mensurações, podem garantir a
coleta e o armazenamento de um número ilimitado de mensagens. Podemos citar algumas:
 Scup e o Livebuzz: permitem boas análises da influência que a empresa tem na rede,
observando o número de compartilhamentos e comentários. Scup é uma plataforma
desenvolvida pela DirectLabs onde é possível monitorar tecnologias como o Twitter,
comunidades do orkut, blogs, portais de notícias, Flickr, Youtube e Yahoo Respostas. A
ferramenta também permite a publicação de conteúdo, classificar as conversas, adicionar
tags e gera gráficos precisos das atividades nas redes sociais;
 Radian6: A ferramenta monitora desde comentários em fotos até grupos do Facebook e
conversas no twitter, também fornece relatórios detalhados de análises e gráficos;

ScoutLabs: Poderoso aplicativo baseado na Web que monitora mídias sociais e encontra
sinais de ruído e ajuda sua equipe a criar produtos melhores e criar relacionamentos mais
fortes com os clientes;
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 Alterian: SM2 é uma solução de monitoramento e análise de mídias sociais concebida
para profissionais de marketing e RP. A plataforma ajuda a rastrear conversas e
classificar o sentimento sobre sua marca, entre outras ferramentas.
Na verdade, as próprias redes sociais disponibilizam ferramentas de busca que permitem
a observação e captação de comentários em tempo real, como por exemplo o Facebook, onde
na Fan Page onde conseguimos medir o retorno de cada postagem e muitas outras funções,
como mostra a figura 04.
Figura 4. Página do Facebook da empresa X com informações
gerenciais.
Fonte: www.facebook.com.br
Considerações finais
O presente artigo buscou demonstrar através de uma revisão de bibliográfica a
importância no Marketing digital, finalidades e importância para as organizações que desejam
estar sempre atualizados.
Pesquisas apontam que os brasileiros passam cerca de 8 horas mensais conectados às
redes sociais, sendo que destas o Facebook se destaca, ocupando o primeiro lugar no ranking
de acessos. O consumidor de hoje procura mais do que nunca em uma marca, além da
qualidade, a segurança de estar fazendo um bom negócio. E para isso, ter um dos melhores
produtos já não é mais o suficiente, é preciso de algo mais, é preciso fazer com que o
consumidor se sinta inserido no contexto da empresa, que faça parte dela.
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A empresa que falar de forma sincera com os seus clientes pode conquistar sua
confiança, consegue estabelecer vínculos fieis e duradouros, mas para que isso seja realizado
de forma concisa, antes de tudo, a empresa precisa conhecer quem é o seu cliente de fato, e é
aí que se encaixam as redes sociais.
As redes sociais são as maiores fontes de informação da atualidade. Um banco de dados
de números astronômicos que, se aplicados a um planejamento estratégico e modelados da
forma correta, poderá ser o mapa da mina para a empresa que as utilizarem.
As redes sociais abrem espaço para a avaliação dos clientes. Hoje o consumidor prefere
ir a página da empresa no facebook do que ligar no SAC. Isso porque os serviços por telefone
geralmente são demorados e nunca, ou quase nunca, resolvem o problema, enquanto na
internet o que está em jogo é a reputação da empresa diante de milhares de outros clientes – e
possíveis novos clientes, o que pressiona para que o consumidor seja ouvido e tenha seu
problema solucionado.
Além da importância de estar presente nas redes sociais para monitorar os comentários
que surgem sobre seu produto, as empresas conectadas transmitem melhor imagem para os
consumidores contemporâneos, pois demonstram atitude de preocupação com a opinião de
seus clientes, podendo inicial utilizar ferramentas gratuitas conforme citadas anteriormente,
para conseguir medir e identificar, além de melhorias futuras, o perfil do consumidor e do
público que a empresa pode atingir.
Por meio das mídias sociais sua empresa pode divulgar novos produtos, disseminar
promoções, acompanhar sua imagem na internet, ficar atento às tendências de mercado,
identificar o que seus clientes procuram fidelizar seus consumidores, atingir e envolver
diretamente seu público-alvo.
Ao inserir a sua empresa nas redes sociais, é importante delegar a função de
gerenciamento das mesmas a um profissional de comunicação qualificado. O criador de
conteúdo precisa compreender a linguagem da empresa, o perfil do público-alvo, além de
conseguir desenvolver postagens interessantes. É preciso desenvolver uma identidade gráfica
da marca e manter-se fiel ao segmento e perfil da empresa fora do mundo virtual. Além disso,
é indispensável manter os perfis da empresa atualizados e com conteúdo atraente, para que
além de um SAC, a página da empresa se torne uma fonte de conhecimento e entretenimento
para o consumidor.
Atualmente, as pessoas buscam engajamento com as empresas que simpatizam, não
adianta apenas criar uma conta nas redes sociais, é preciso ter conhecimento e um bom plano
estratégico para compreender e atingir seu “target” e também criar relacionamento e mantê-lo,
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pois, se mostra uma ótima ferramenta de fidelização de clientes onde faz com que o cliente
siga a empresa de acordo com o conteúdo que a mesa lhe oferece. Mais do que a presença
empresarial ser essencial nas redes sociais, ela precisa ser útil para os usuários. Suas páginas
nas redes de relacionamento precisam passar conteúdo único e relevante para que sua empresa
faça diferença no dia a dia dos consumidores.
REFERÊNCIAS
CHLEBA, Márcio. Marketing Digital: novas tecnologias e novos modelos de negócios. São
Paulo: Futura,1999.
GRACIOSO, Francisco. Propaganda: engorda e faz crescer a pequena empresa. São Paulo:
Altas, 2002.
KOTLER, Philip; ARMSTRONG, Gary. Princípios de Marketing. 9.ed. São Paulo: Pearson
Prentice Hall, 2003.
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milênio. 10ª Ed. São Paulo: Prentice Hall, 2000.
LAS CASAS, Alexandre Luzzi. Marketing: conceitos, exercícios, casos. São Paulo: Atlas,
1987.
McKENNA, R. Marketing de relacionamento. 20 ed. São Paulo: Campus, 1997.
MONTEIRO, Ricardo Vaz. Google Adwords - A Arte da Guerra: A Batalha dos Links
Patrocinados. 2. ed. Atualizada e revisada. São Paulo: Brasport, 2007.
O’BRIEN, James A. Sistemas de Informação e as decisões gerenciais na era da Internet. 3.ed.
SãoPaulo: Saraiva, 2010.
SOUKI, Omar. Paixão por marketing: o fantástico diferencial dos gênios. Belo Horizonte:
Souki House, 2000.
TORRES, Claudio. A Bíblia do marketing digital: tudo o que você queria saber sobre
marketing e publicidade na internet e não tinha a quem perguntar. 1ª Ed. São Paulo: Novatec,
2009.
VAZ, Conrado Adolpho. Google Marketing: O Guia Definitivo de Marketing Digital. 2 ed.
São Paulo: Novatec, 2008.
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Artigo Original
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O PROGRAMA ACELERA BRASIL E OS MÉTODOS DE LEITURA: REFLEXÕES
SOBRE UM ESTUDO DE CASO EM BREJO DO CRUZ/PB
Demóstenes Dantas Vieira1 e Joana Lúcio Maia2
RESUMO - Visto que a leitura apresenta-se como instrumento
sociocomunicativo indispensável à inserção totalitária dos educandos na
sociedade e que, a mesma é a base inicial para a construção de inúmeras formas
de conhecimento, este trabalho, descritivo e explicativo, visa descrever as
análises de um estudo de caso realizado na Escola Municipal Josué Alves de
Azevedo, localizada no município de Brejo do Cruz – PB. Nele, propõe-se a
análise das práticas de leitura realizadas na referida escola, mais
especificamente, no Programa Acelera Brasil. Nessa perspectiva, adota-se como
fonte teórica os estudos de Kleiman (2004), Aguiar e Bordine (1993), Kato
(2004), Koch (2004), Nóbrega e Pinheiro (2006), os Parâmetros Curriculares
Nacionais (2001) e outros teóricos julgados essenciais ao desenvolvimento
dessa pesquisa. Quanto aos métodos de leitura utilizados em sala de aula,
percebe-se a necessidade de reflexão sobre a visão tradicional da leitura, que
muitas vezes, acontece em detrimento de uma prática direcionada às
necessidades humanas sócio comunicativas. Tendo em vista a reflexão realizada
mediante a análise do instrumento de coleta de dados (o questionário) pôde-se
perceber que o professor do referido programa analisado adota uma postura
bastante consciente quanto à leitura numa perspectiva social e, principalmente,
como momento de prazer.
Revista
Ciência e Conhecimento
Volume 9 – Nº1 – 2015.
1 – Universidade do Estado do
Rio Grande do Norte - UERN
2 – Faculdades Integradas de
Patos - FIP
Palavras-chave: Práticas de leitura. Estudo de caso. Programa Acelera Brasil.
ABSTRACT - Since reading is presented as an instrument essential to the
socio-communicative integration of students in the totalitarian society and that
it is the initial basis for the construction of numerous forms of knowledge, this
study, descriptive and explanatory, but to describe the analysis of a field study
conducted at the Municipal School Josué Alves de Azevedo, located in the
swamp of Brejo do Cruz- PB. In it, it is proposed to examine the practices of
reading held at the school, more specifically, the program Speeds Brazil. From
this perspective, is adopted as a source of theoretical studies Kleiman (2004),
Aguiar e Bordine (1993), Kato (2004), Koch (2004), Nóbrega e Pinheiro (2006)
the National Curriculum Parameters (2001) and others deemed essential to the
development of this research. Regarding methods of reading used in the
classroom, we see the need for reflection on the formalist view of lelitura,
which often happens at the expense of a practice directed to human needs
socio-communicative. In view of the discussion conducted by analysis of the
data collection instrument (the questionnaire) could be perceived that the
teacher of that program analysis adopts a rather conscious about reading in a
social perspective, and especially as a moment of pleasure.
Keywords: Practice reading. Field study. Program Accelerate Brazil.
Dados para correspondência
Demóstenes Dantas Vieira;
Rua: Jaen Menescal, nº 25.
CEP: 59604-200
E-mail:
[email protected]
Recebido em: 23/01/2015.
Revisado em: 28/03/2015.
Aceito em: 02/05/2015.
Área:
Metodologias e estratégias de
ensino aprendizagens.
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INTRODUÇÃO
É notório que em diversos casos a leitura tem sido tratada como mais um ato de
formalismo, tanto tratada pelos educandos como pela instituição escolar. Ela, entretanto,
continua sendo instrumento essencial para o desenvolvimento dos indivíduos inseridos no
processo de ensino-aprendizagem, pois ela perpassa todas as áreas do conhecimento.
A escola enquanto instituição social é responsável, em parte, pela formação e inserção
social dos educandos, porém é possível perceber que em diversas situações a leitura não é
percebida como elemento fundamental a essa integração dos indivíduos na comunidade. Para
isso é de fundamental importância que a escola e, principalmente, os professores, possam ver
na leitura um poderoso instrumento para a efetivação da cidadania e desenvolvimento dos
aspectos sensíveis indispensáveis à vida social. É nisto que consiste a importância da leitura e,
principalmente, do texto literário; na formação ética, moral, afetiva, crítica e comunicativa.
Entretanto, vale ressaltar que para isso acontecer, a escola deve repensar o espaço, as
concepções e os métodos dados à leitura, pois, enquanto o ato de ler for considerado como
“mais um” momento obrigação e, às vezes, até mesmo de castigo, esse objetivo não vai
concretizar-se.
Torna-se então fundamental questionar “como desenvolver e incentivar a leitura de
forma prazerosa e significativa?”. Desse problema surge à necessidade de realização deste
trabalho, pois, sabe-se da necessidade da leitura como eixo gerador em todas as áreas do
conhecimento. À vista disso, este trabalho, compreendido como estudo de caso, foi
desenvolvido em 2014 na Escola Municipal de E. F. Josué Alves de Azevedo, situada na
cidade de Brejo do Cruz-PB e utilizou-se como instrumento de coleta de dados um
questionário semi-estruturado (aplicado ao professor). Ressaltamos que a nossa pesquisa teve
como foco o Programa Acelera Brasil, adotado pela escola. Sobre o aporte teórico, ressaltamse os estudos de Kleiman (2004), Aguiar e Bordine (1993), Kato (2004), Koch (2004),
Nóbrega e Pinheiro (2006), os Parâmetros Curriculares Nacionais (2001) e outros teóricos
julgados essenciais ao desenvolvimento dessa pesquisa.
Vale ainda ressaltar as contribuições da referida pesquisa no meio acadêmico no
tocante que visa proporcionar a investigação e reflexão sobre os aspectos que permeiam a
leitura na instituição escolar. Buscando entender qual a atribuição dada à leitura pela escola e
refletir sobre as concepções e métodos adotados pela instituição escolar ao trabalhar a leitura.
Nessa perspectiva, objetiva-se contribuir para a reflexão e construção da leitura como um
momento privilegiado de ensino e prazer.
VIEIRA e MAIA. O programa acelera Brasil e os métodos de leitura.
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2. O TEXTO E O CONTEXTO DOS MÉTODOS DE LEITURA
Numa sociedade extremamente letrada o ato de ler e escrever são de fundamental
importância ao convívio social. Pode-se inferir que leitura e a escrita pode ser agente de
inclusão e exclusão social, pois as mesmas podem proporcionar o acesso aos mais variados
ambientes e situações comunicativas, enquanto aquele que não possui o conhecimento de “ler
e escrever” acaba sendo excluído de inúmeras situações de interação sócio comunicativa e
também de diversas oportunidades de inserção no mercado de trabalho. Consciente dessa
realidade torna-se de suma importância refletir sobre a função social da escola, que se
apresenta como segundo mais poderoso aparelho ideológico na vida dos educandos,
principalmente das crianças.
Pode-se inferir que a função da instituição escolar é extremamente social, visto que
almeja proporcionar a construção das competências sociais, afetivas, éticas, morais,
cognitivas, físicas, estéticas, etc., para inserção dos indivíduos na sociedade. Prais (1996, p.
58) atribui” como função social e política da escola, não só de transformação, socialização e
crítica da herança cultural acumulada, mas também a produção de um novo saber a fim de
preparar o indivíduo para a vida da totalidade social”. A escola deve proporcionar a crítica à
herança cultural da humanidade, como também possibilitar a inserção do indivíduo na
comunidade, de forma que o mesmo adentre nela detentor das habilidades necessárias à vida
em totalidade, criticamente e, acima de tudo, como ser humano capaz de integrar-se sócio
afetivamente à sociedade.
Para a concretização desses objetivos o educador deve reconhecer-se como parte desse
processo de integração e transformação social. Apesar das inúmeras barreiras enfrentadas pela
educação, não se pode desanimar. Freire (1996) já afirmava que a escola sozinha não
transforma a sociedade, sem ela tampouco pode haver transformação. Sozinha a educação não
pode mudar o mundo, entretanto vale ressaltar que ela é um dos instrumentos, e porque não
dizer o mais poderoso instrumento, para que essa mudança possa existir. A transformação
“macro” só pode acontecer a partir da “micro”. Talvez a formação de um indivíduo seja
apenas a demonstração do micro poder da educação, mas é através de todos esses indivíduos
sócio historicizados que o “macro poder” passa a existir. É nisso que consiste a magnitude da
educação. A possibilidade de o individual transformar. E é nisto que consiste o poder da
leitura: na contribuição para formação sócio histórica dos educandos. Formado criticamente o
indivíduo poderá exercer um papel concreto na sociedade e contribuir para sua transformação.
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Quanto à função social da escola? Os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino
Fundamental elenca os seguintes objetivos:
Posicionar-se de maneira crítica, responsável, e construtiva nas diferentes situações
sócias, utilizando o diálogo como forma de mediar conflitos e de tomar decisões
coletivas;
Desenvolver o conhecimento de si mesmo e o sentimento de confiança em suas
capacidades afetiva, física, cognitiva, ética, estética, de inter-relação pessoal e de
inserção social, para agir com perseverança na busca de conhecimento e no
exercício da cidadania; (BRASIL, 2001, p.8-9).
Como é possível perceber os Parâmetros Curriculares Nacionais estabelece como
objetivo da educação para o Ensino Fundamental a formação da autonomia dos indivíduos, de
modo que inseridos na comunidade os mesmos possam se posicionar criticamente ante as
realidades sociais, utilizando as competências desenvolvidas para resolução de conflitos e
exercício pleno da cidadania.
Faz-se então necessário refletir sobre quais instrumentos podem ser utilizados para
atender tal objetivo. Pode-se então inferir que a leitura é um dos mais importantes
instrumentos para sua realização. Quanto a isso, os Parâmetros Curriculares Nacionais para o
Ensino Fundamental suscita suas contribuições e orientam que se deve
Compreender os textos orais e escritos com os quais se defrontam em diferentes
situações de participação social, interpretando-os corretamente e inferindo as
intenções de quem os produz;
Valorizar a leitura como fonte de informação, via de acesso aos mundos criados
pela literatura e possibilidade de fruição estética, sendo capazes de recorrer aos
materiais escritos em função dos mais diversos objetivos (BRASIL, 2001, p. 4142).
Através da leitura o professor proporciona aos educandos possibilidades de
posicionamento diante da sociedade em que vivem. Ler é muito mais que decodificar,
entretanto é essa concepção que se apresenta mais forte no presente sistema de ensino, a
leitura como decodificação. Essa concepção equivocada faz com que muitas crianças se
tornem leitores passivos, capazes apenas de decodificar o texto, ou seja, de juntar os signos
linguísticos e formar palavras e frases, essa concepção tende a torná-los leitores que não
interagem, que não interpretam, que não se posicionam em relação ao texto. Nessa
perspectiva realizam apenas a atividade decodificativa, mas não entendem o que lêem. Quanto
a essa concepção Kleiman (2004, p. 20) faz as seguintes considerações:
Essa concepção dar lugar a leituras dispensáveis, uma vez que em nada modificam a
visão de mundo do aluno. A atividade compõe-se de uma série de automatismos de
identificação e pareamento das palavras do texto com as palavras idênticas numa
pergunta ou comentário. Isto é, para responder a uma pergunta sobre alguma
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informação do texto o leitor só precisa o passar do olho pelo texto a procura de
trechos que repetem o material já decodificado da pergunta.
Formar leitores é formar alguém capaz de entender o que lê e, além disso, é
proporcionar o desenvolvimento linguístico de modo que os educandos possam se posicionar
quanto ao que está escrito. Entender o texto e inferir do texto. A leitura é um elemento de
fundamental importância tanto no processo educacional como no cotidiano das pessoas,
através dela o alunado começa a visualizar realidades diferentes do mundo no qual está
inserido, permitindo liberdade de pensamento e expressão, tornando-os mais críticos e
criativos.
Segundo Mary Kato (1995), a leitura ainda favorece a interdisciplinaridade entre
diversos tipos de conhecimento. Quando um aluno consegue fazer essa associação entre os
conteúdos, tem mais facilidade de entendimento de sua própria realidade e compreensão dos
assuntos expostos.
É notório que a leitura favorece o desenvolvimento cognitivo do ser humano, permite
que o indivíduo construa suas próprias ideias e automaticamente, seu senso crítico a sua
sociedade. Assim, antes de tudo vale enfatizar que a leitura tem uma importante função social,
pois em uma sociedade letrada ela é fundamental ao desenvolvimento das atividades políticosociais. Kock (2004, p.159) enfatiza que “ao professor cabe a tarefa de despertar no educando
uma atitude crítica diante da realidade em que se encontra inserido, preparando-o para ler o
mundo: a princípio o ‘seu mundo’, mas, paulatinamente, todos os mundos possíveis”. O texto
é portador de muitos mundos, a leitura é a ponte para a inserção nesses mundos de
informação, amor, magia, entretenimento, etc. Assim, o educador deve proporcionar a leitura
da sociedade na qual o educando está inserido e, também promover a reflexão sobre tantas
outras sociedades através das quais os indivíduo pode adquirir conhecimento. Pode-se então
coligir que é função da instituição escolar proporcionar o contato do aluno com toda a
diversidade textual produzida pelo homem, desde os gêneros textuais de caráter social (carta,
bilhete, receita, ata, abaixo-assinado, etc.) até a literatura, portadora de inúmeras
possibilidades de prazer. Entretanto, em muitos casos, acontece o contrário, a leitura é vista
apenas como mais um momento de obrigação.
Torna-se então evidente a necessidade de reflexão sobre a prática de leitura e
motivação para que o aluno conceba a leitura como um momento privilegiado de prazer e
aprendizagem. Para isso, é necessário que o professor seja mediador na construção afetiva
pelo ato de ler, de forma que o mesmo seja também um leitor ativo para que assim possa
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transmitir paixão pela leitura e, que seus alunos possam ver nele um espelho de um verdadeiro
leitor.
Segundo Foucambert (1994, p. 37), “a escola deve ajudar a criança a tornar-se leitor
dos textos que circulam no social e não limitá-la à leitura de um texto pedagógico, destinado
apenas a ensiná-lo a ler”. Consciente disso vale ressaltar as múltiplas atitudes, que aqui, jugase pertinente à prática de leitura na instituição escolar. Dentre os conceitos atribuídos ao ato
de ler “a leitura instrumental e informativa” apresenta-se bastante relevante, pois é notório a
necessidade crítica e cidadã de compreensão da diversidade de gêneros informativos da
sociedade. O professor, enquanto facilitador da inserção social do indivíduo deve
proporcionar o contato e reflexão da diversidade textual em circulação, tais como receitas,
bulas de remédio, catálogos, enciclopédias, placas, notícias, reportagens, artigos, classificados
de jornais, regras de jogos, etc. Assim, tende a formar leitores ativos e participativos na
sociedade.
A abordagem dada a leitura, aqui, abrange, portanto, desde capacidades necessárias ao
processo de alfabetização até aquelas que habilitam os alunos à participação ativa nas práticas
sociais letradas, ou seja, aquelas que contribuem para o seu letramento. Soares (1998, p. 21)
afirma que “dentre outras habilidades/capacidade, a leitura inclui as de fazer previsões
significados combinando conhecimentos prévio e informação textual, de refletir sobre o
significado do que foi lido e tirar conclusões sobre o assunto enfocado”. Inserir-se nas práticas
sociais próprias à cultura escrita implica comportamentos procedimentos e destrezas tipos de
quem vive no mundo da leitura. Isto é movimentar-se numa biblioteca, frequentar livrarias,
estar atento aos escritos urbanos e aos materiais escritos que circulam na escola. Implica
também adquirir, quando se fizer necessário e quando aparecem novos usos para a leitura na
sociedade, outras formas de ler.
Utilizando-se de metodologias apropriadas que promovam o estímulo e o desejo pelos
livros mostrando-lhes os benefícios que dela resultam, os educandos poderão então perceber,
nos momentos de leitura, um momento de prazer e reflexão, visto que a mesma poderá
proporcionar-lhes uma viagem inesquecível a tantos mundos que a leitura e, principalmente, a
literatura, pode oferecer. É por isso que a literatura é tão importante, tanto para o aluno quanto
para o professor, porque os aproxima do outro, de mundos, de viagens, de sonhos. Da
angústia do ser humano e de suas esperanças. De sua revolta com os problemas sociais e da
necessidade de transformação. A literatura faz que cada um sinta-se parte de um todo, que é a
vida em sociedade, pois o poder da leitura e da literatura consiste na expressão do estado do
espírito humano no decorrer do tempo e do espaço. Nesse sentido,
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Ler é identificar-se com o apaixonado ou com o místico. É ser um pouco
clandestino, é abolir o mundo exterior, deportar-se para uma ficção, abrir o parêntese
do imaginário. Ler é muitas vezes trancar-se (no sentido próprio e figurado). É
manter uma ligação através do tato, do olhar, até mesmo do ouvido (as palavras
ressoam). As pessoas lêem com seus corpos. Ler também é sair transformado de
uma experiência de vida, é esperar alguma coisa. É um sinal de vida, um apelo, uma
ocasião de amar sem ter a certeza de que se vai amar. (BELLEUGER apud
KLEIMAN, 2004, p.15).
Vale ressaltar que a escola, todos os seus profissionais, deve refletir sobre qual o lugar
que a referida instituição tem dado a leitura nas aulas, eventos, etc. O professor deve
questionar-se quanto ao objetivo que o mesmo tem adotado para trabalhar a leitura com seus
alunos e, principalmente, perceber-se ou construir-se enquanto leitor, para que dessa forma
possa transmitir um pouco da necessidade e do prazer proporcionado pela leitura. A formação
de leitores exige, antes demais nada, professores leitores.
3. OS MÉTODOS DE LEITURA E O PROGRAMA “ACELERA BRASIL”
Dar-se o nome de “Programa de Aceleração” ou “Acelera Brasil” o programa
desenvolvido pelo Instituto Ayrton Senna em parceria com o Governo Federal cujo objetivo é
acelerar o desenvolvimento da aprendizagem de alunos fora da faixa-etária estipulada para as
séries iniciais do ensino fundamental (1º ao 4º ano). Objetiva-se, aqui, descrever e analisar as
atividades de leitura desenvolvidas pelo professor do referido programa da Escola Municipal
Josué Alves de Azevedo, situada na cidade de Brejo do Cruz/PB. Inicialmente foi proposto
um questionário semi-estruturado de 8 questões que foi aplicado com sucesso. Nele o
professor foi questionado quanto à sua formação, conceitos, métodos e outras questões
relacionadas à leitura, objetivando compreender o texto e o contexto da leitura na escola e,
mais especificamente, na sala de aula.
Antes de adentrar na análise propriamente dita vale ressaltar que a turma analisada é
composta por alunos de 9 a 14 anos, de uma população composta de alunos extremamente
carentes e de alunos advindos da zona rural (os mesmos compõem uma turma de 3º e 4º anos).
Diante disso, vale ressaltar o que, aqui, é considerado um grave problema de aprendizagem,
que seria a indisciplina, segundo o próprio professor, “causada pela diferença de idade dos
alunos”. Isso, segundo o professor, dificulta o relacionamento pessoal dos educandos e até
mesmo os momentos de interação e socialização da aprendizagem. A primeira pergunta
realizada no questionário foi direcionada a formação do professor. O professor é Graduado
em Pedagogia e é Especialista em Supervisão e Orientação Educacional.
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Visando entender a concepção de leitura do professor, realizou-se a seguinte pergunta:
“Na sua opinião o que é leitura?”. O mesmo respondeu que “A leitura é uma compreensão do
mundo, é através dela que podemos desenvolver nosso pensamento crítico e construir a nossa
própria opinião, tendo em vista que a mesma pode contribuir contundentemente na formação
moral e afetivo-social do ser humano”. Pode-se inferir que a leitura para o professor está
relacionada a dois fatores: o desenvolvimento da criticidade e da humanidade, isso é notório
quando o mesmo afirma que a leitura objetiva “desenvolver nosso pensamento crítico” e a
“formação moral e afetivo-social do ser humano”. Confrontando esse conceito com os
Parâmetros Curriculares Nacionais perceber-se uma íntima ligação, visto que o Brasil (2001,
p.8-9) atribui ao Ensino Fundamental o desenvolvimento das competências críticas e afetivas,
de modo, que o aluno possa “posicionar-se de maneira crítica”, “mediar conflitos”, e,
desenvolver as capacidades “afetiva, física, cognitiva, ética, estética, de inter-relação pessoal
e inserção social”. Como é possível o conceito dado pelo professor está em conformidade
com os Parâmetros Curriculares Nacionais. A terceira pergunta foi direcionada aos métodos
de leitura, foi pedido que o professor marcasse os métodos de leitura utilizados em sua aula. O
professor marcou os seguintes:







Leitura silenciosa (realizada pelo aluno).
Leitura oral (realizada pelo alunado).
Leitura oral (realizada pelo professor).
Roda de leitura.
Momento literário (de gêneros literários – contos, crônicas, romances, etc.)
Leitura dos textos produzidos pelo alunado.
Leitura de textos informativos (artigos, notícias, reportagens, etc.).
Dos métodos de leitura propostos o único não utilizado pelo professor é promover o
acesso à biblioteca, isso se deve ao fato de que a referida escola não possui biblioteca,
enquanto ambiente físico, apesar de ter um bom acervo de livros de literatura infantil. Ainda
na mesma questão o professor respondeu que se utilizava da “biblioteca itinerante” que
segundo o mesmo, é um pequeno acervo de livros de literatura infantil que são levados à sala
de aula diariamente para a leitura tanto do professor quanto dos alunos.
O professor respondeu ainda que se utiliza de uma estratégia denominada por ele de
“adotar um livro”. Esse seria um método de estimulo à leitura de modo que os alunos
deveriam adotar um livro para sua leitura. Outro método julgado, aqui, de grande significado
é uma prática de leitura chamada pelo professor de “venda do livro”. Esse possui um caráter
bastante motivador. Nele o professor levaria diariamente um livro para casa e faria a leitura,
no outro dia ele faria a propaganda desse livro. Falaria de sua narrativa, dos personagens, um
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pouco do enredo, os porquês do livro ser bom, e tentaria, (claro de maneira simbólica vender
o livro lido as crianças) para que os mesmos pudessem ler. Esse método é bastante
interessante, tendo em vista que através dele o prazer da leitura torna-se algo muito próximo
do dia-a-dia das crianças, assim, pode-se inferir que o referido professor se torna espelho de
leitor ativo, que se encanta com o texto, que se apaixona por ele, que viaja e mergulha no
mundo fantástico da leitura. Sobre isso Belleuger apud Kleiman (2004, p.15) já afirmava que
ler é “identificar-se com o apaixonado ou com o místico”. É ser “clandestino”, é “deportar-se
para uma ficção, abrir o parêntese do imaginário”. Nessa perspectiva o professor apresenta-se
ao aluno como um exemplo de um experienciador dos mundos e dos sentimentos
proporcionados pela leitura.
A quarta questão proposta foi direcionada aos objetivos adotados pelo professor
quanto aos métodos de leitura. O mesmo atribui os seguintes objetivos à leitura na sala de
aula:





Desenvolver atividades de ortografia.
Desenvolver atividades de gramática.
Desenvolver as habilidades de compreensão textual.
Desenvolver atividades sobre o vocabulário do texto.
Desenvolver os aspectos sensíveis e humanos do aluno.
O referido professor marcou todos os objetivos propostos. Entretanto vale refletir
sobre alguns. Bem, sabe-se que o objetivo primordial da leitura na instituição escolar é
desenvolver as competências sócio comunicativas da escrita e fala, além, proporcionar através
da arte da palavra (a literatura) o desenvolvimento dos aspectos sensíveis indispensáveis a
vida social. Dos objetivos acima se pode inferir que dois se apresentam nessa perspectiva:
desenvolver as habilidades de compreensão textual; desenvolver os aspectos sensíveis e
humanos do aluno. Porém, vale ressaltar que a leitura pode servir para os outros objetivos
propostos desde que esses sejam encarados como primordiais. Vale ainda ressaltar que a
leitura enquanto prática de aumento de vocabulário e prática das regras gramaticais pode
proporcionar a construção de um leitor passivo, por isso, é necessário que o educador
compreenda o real significado da leitura: como prática sócio comunicativa, cognitiva, critica,
afetiva, moral, etc. Entretanto, aqui, não se julga tais métodos como desprezíveis, desde que
os mesmos não sejam tidos como essenciais e, que esses mesmos métodos, sejam vistos como
práticas secundárias, posteriores as atividades de compreensão e deleite da leitura. Sobre isso
os PCNs (2001, p. 41-42) afirmam que a leitura no ensino fundamental justifica-se
prioritariamente pela necessidade de compreensão dos “textos orais e escritos” com os quais
os educandos “se defrontam em diferentes situações de participação social, interpretando-os
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corretamente e inferindo as intenções de quem os produz” além de proporcionar a valorização
da leitura através do “acesso aos mundos criados pela literatura”.
Foi realizada ainda a seguinte pergunta: Qual(is) tipo(s) de texto você trabalha nas
aulas de leitura? Foram adquiridas as seguintes respostas:












Os textos do livro didático.
Fábulas.
Livros paradidáticos.
Memórias.
Crônicas.
Contos de fadas.
Contos
Romances
Literatura infantil no geral
Noticias
Cartas
Receitas
Os únicos textos não trabalhados pelo professor foram músicas e bulas. Diante disso,
pode-se inferir que o professor compreende a leitura como prática social, visto que o mesmo
tem trabalhado uma diversidade textual bastante coerente e, até, elogiável. Se a leitura e a
escrita são práticas sociais, é de fundamental importância que assim seja considerada pela
instituição escolar, que assume como função proporcionar a reflexão aos mais diversos
gêneros textuais que circulam na sociedade.
As últimas perguntas foram direcionadas ao cotidiano do professor enquanto leitor.
Foi perguntado “Qual a intensidade que você costuma indicar livros para seus alunos?” O
professor respondeu que indica livros “muito” frequentemente. Foi ainda perguntado: “Você é
conhecedor (leitor) da literatura infantil?” O professor respondeu que “sim”. E, por último
pediu-se que o professor indicasse alguns livros de literatura infantil. O mesmo indicou as
seguintes obras:





A princesa sapo – A. Sônia.
(Re) fabulando – Elias José.
O homem que espalhou o deserto – Ignácio de Loyola.
A magia do amor – A. Sônia.
Estamos em paz – Gian Calvi.
Como é possível perceber as práticas de leitura do referido professor apresentam-se
bastante significativas. Conhecedor da literatura infantil e integrante do processo de
desenvolvimento da leitura enquanto prática social e momento de prazer, o professor
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demonstra-se bastante consciente de que a postura de leitor, de fato, proporciona a intimidade
e aproximação do aluno com a leitura visto que para se construir leitores ativos é necessário
que o educador, antes de mais nada, seja também um leitor.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante das considerações realizadas pode-se inferir que na realidade investigada o
professor demonstra-se bastante consciente de seu papel enquanto agente formador de
leitores, não apenas numa perspectiva formal e decodificativa, mas, principalmente, numa
visão holística desse processo enquanto uma prática comunicativa social indispensável à
inserção do indivíduo na sociedade.
Quanto aos tipos de texto, ressalta-se a heterogeneidade atribuída pelo professor as
suas aulas, isso reflete em um ato consciente do texto enquanto um produto social, com
características e funções específicas. Sobre as práticas de leitura propriamente ditas, vale
ressaltar a atitude do professor em promover a exaltação do ato de ler, “a venda do livro”, a
frequente indicação da literatura, o uso da biblioteca itinerante, parecem ser atitudes que
somadas à paixão do professor pelo ato de ler podem contribuir de maneira ímpar para a
formação dos educandos.
Pode-se, portanto, concluir que a referida instituição e o Programa Acelera Brasil
adotam uma postura bastante coerente no que compete às concepções e métodos de leitura
como um ato sócio comunicativo, cognitivo e, acima de tudo, como uma prática que não deve
ser desassociada das atividades do dia a dia.
REFERÊNCIAS
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1996.
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Artigo Original
Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483
A DIMENSÃO DA POLITECNIA E A PRÁTICA DOCENTE NO ÂMBITO DO
ENSINO MÉDIO POLITÉCNICO DA ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO MÉDIO
CAIC MADEZATTI – SÃO LEOPOLDO/RS
Cléber Fernando Homem1,2
RESUMO - Este artigo busca apresentar um estudo de caso da apropriação
pelos docentes da Escola Estadual de Ensino Médio CAIC Madezatti, de São
Leopoldo, sobre os conceitos fundamentais da proposta de ensino médio
politécnico, à luz das proposições da Secretaria Estadual de Educação (SEDUC
RS), órgão do governo estadual responsável pela elaboração e implantação
desta proposta de ensino. Através da aplicação de um questionário individual ao
conjunto dos docentes da escola e, também, à coordenação do ensino médio da
SEDUC RS, pode-se identificar o quão alinhado estão as estratégias e práticas
docentes daquele grupo de professores em relação aos princípios orientadores
definidos pelo Estado na proposta pedagógica para o ensino médio politécnico e
educação profissional integrada ao ensino médio. Os resultados advêm da
análise qualitativa das respostas obtidas junto aos docentes e sua comparação
com as respostas obtidas junto à SEDUC RS. As análises foram referenciadas
nos princípios orientadores do ensino politécnico: relação parte-totalidade,
reconhecimento de saberes, teoria e prática, interdisciplinaridade, avaliação
emancipatória e pesquisa. Os resultados indicam que a interdisciplinaridade,
enquanto prática, e a pesquisa, como princípio fundamental para apropriação de
saberes estabelecidos e base para a construção de novos saberes, ainda se
constitui em maior obstáculo a concretização do ensino médio politécnico.
Palavras-chave: Ensino médio politécnico. Politecnia. Prática docente.
ABSTRACT - This article aims to present a case study on the appropriation by
the teachers of a state school in São Leopoldo and the main concepts of the
Polytechnic School according to the State Education Department. By applying
an individual questionnaire to all school teachers and also to the coordination of
the State Education Department, it is possible to identify just how aligned are
the strategies and teaching practices of that teachers group with the rules set by
the state in the pedagogical proposal for Polytechnic School and professional
education integrated to high school . The results are from qualitative review of
the comparison of the answers obtained from the teachers and the responses
obtained from the State Education Department. Analyses were referred to the
principles of polytechnic education: the relationship between part and whole,
recognition of knowledge, theory and practice, interdisciplinarity, emancipatory
evaluation and research. The results show that interdisciplinarity, as a practice,
and research, as a key principle to frame established knowledge and a base to
build new knowledge, still are the major obstacle to the polytechnic education
implementation.
Keywords: High school. Polytechnic. Teaching practice.
Revista
Ciência e Conhecimento
Volume 9 – Nº1 – 2015.
1 – Universidade Luterana do
Brasil – ULBRA/São Jerônimo,
RS, Brasil.
2 – Universidade Federal do Rio
Grande do Sul – UFRGS, RS,
Brasil.
Dados para correspondência
Cléber Fernando Homem
Rua: Emilio Becker, nº 26.
CEP: 93042-370
E-mail:
[email protected]
Recebido em: 23/01/2015.
Revisado em: 10/03/2015.
Aceito em: 20/04/2015.
Área:
Metodologias e estratégias de
ensino e aprendizagens.
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INTRODUÇÃO
A proposta de ensino médio politécnico surge no âmbito do Plano de Governo para o
Rio Grande do Sul no período 2011-2014 como alternativa para reestruturação do ensino
médio praticado nas escolas públicas estaduais. Amparado na Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (LDB), nº 9.394/96, e na Resolução Nº 4, de 13 de julho de 2010, sobre
Diretrizes Curriculares para a Educação Básica emitida pelo Conselho Nacional de Educação
(CNE), a Proposta Pedagógica para o Ensino Médio Politécnico e Educação Profissional
Integrada ao Ensino Médio consiste:
Numa proposta para a educação do século XXI, a qual tem a
responsabilidade de ofertar à juventude e ao mundo um novo paradigma, uma
mudança estrutural que coloque o Ensino Médio para além da mera continuidade do
Ensino Fundamental, instituindo-o efetivamente como etapa final da educação
básica. Um Ensino Médio que contemple a qualificação, a articulação com o mundo
do trabalho e práticas produtivas, com responsabilidade e sustentabilidade e com
qualidade cidadã (SEDUC RS, 2011).
Basicamente, a proposta constitui-se no entendimento de que a politecnia resulta da
articulação das diferentes áreas do conhecimento e suas tecnologias com os assim designados
eixos estruturantes: cultura, ciência, tecnologia e trabalho enquanto princípio educativo. Ou
seja, num contexto produtivo em que o modelo de produção taylorista/fordista perde espaço
para novas formas de organização produtiva e, logo, a escola baseada no modelo
iluminista/positivista mostra-se ineficiente para formar profissionais capazes de atuar nestas
novas dinâmicas produtivas, a concepção de uma escola politécnica ganha força diante da
possibilidade de atender as necessidades de intelectualização da técnica. Segundo Saviani
(1989, p. 17), a noção de politecnia diz respeito ao domínio dos fundamentos científicos das
diferentes técnicas que caracterizam o processo de trabalho produtivo moderno.
Sendo assim, a politecnia surge como alternativa à dualidade em que o ensino médio
estava envolto a partir do Decreto nº 2.208/1997, que promoveu a separação entre o ensino
médio e a educação profissional. Revogado, é verdade, pelo Decreto nº 5.154/2004 que,
juntamente com a Lei nº 11.741/2008 normatiza a articulação da Educação Profissional com o
Ensino Médio, nas formas integrada, concomitante e subsequente. No entanto, mesmo o novo
arcabouço legal constituído sobre uma nova percepção do papel a ser cumprido pelo ensino
médio, não contempla a educação tecnológica ou politécnica, mas contém princípios
orientadores que acabam por fornecer os pilares de fundamentação necessários à consolidação
da politecnia como uma alternativa concreta.
No entanto, muitos são os desafios para a consolidação do Ensino Médio Politécnico.
A criação dos chamados Seminários Integrados, por exemplo, cuja intencionalidade consiste
na promoção da articulação entre os dois blocos que integram o currículo, a “formação geral”
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(núcleo comum) e a “parte diversificada” (humana – tecnológica – politécnica), tem sido
objeto de muita discussão. Talvez porque sejam estes seminários o lócus onde se espera que
ocorra a materialização da interdisciplinaridade pretendida. É nos seminários integrados que
se objetiva dar significado à interlocução entre as diferentes áreas de conhecimento e suas
transversalidades, oportunizando aos aprendizes tanto a apropriação dos conhecimentos
quanto a geração de novos saberes que contribuam no processo de construção da cidadania e
na inserção destes no mundo do trabalho.
Portanto, entender a proposta de criação do ensino médio politécnico como um
processo em construção sugere a necessária avaliação não só do seu objetivo final, entendido
aqui como a produção sistematizada pelo conjunto da escola no âmbito dos seminários
integrados, como também das atividades fundamentais que podem conduzir a efetiva
consolidação da proposta no médio ou longo prazo. Para isso, mais que analisar os discursos,
muitas vezes permeados por fatores exógenos à proposta, mas nem por isso irrelevantes, como
a questão dos baixos salários e problemas de infraestrutura das escolas, buscou-se investigar o
quanto as práticas docentes estão alinhadas com a intencionalidade da proposta.
2. MARCO REFERENCIAL
Os princípios orientadores do ensino médio politécnico constituem a base de
sustentação da proposta elaborada pela SEDUC e organizam os processos de ensino e
aprendizagem. Ou seja, esses princípios possibilitam ação à intenção. Instrumentalizam os
diferentes atores para o desempenhar de suas atividades de maneira articulada e coordenada.
Tendo como referencial Gramsci (1966;1981), a SEDUC RS propõe que o conhecimento deve
ser elaborado a partir da realidade vivida, a partir do senso comum, como conhecimento
científico no âmbito da escola e deve retornar como bom senso à sociedade. Com isso,
entende-se que o ensino politécnico não só contribui para que os diferentes atores
compreendam os processos de construção do conhecimento como, ao mesmo tempo, atende
as necessidades de grupos sociais marginalizados na medida em que permite que a construção
deste conhecimento se dê no sentido da realidade dos educandos até o conhecimento
cientificamente produzido.
São princípios orientadores do ensino politécnico: relação parte-totalidade,
reconhecimento de saberes, teoria e prática, interdisciplinaridade, avaliação emancipatória e
pesquisa.
Relação parte-totalidade refere-se ao desafio de compreender fatos e realidades amplas
e complexas, a partir da escolha de conteúdos curriculares. Dito de outra forma, consiste no
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reconhecimento da insuficiência da proposta disciplinar para a solução de problemas
concretos, demandando abordagens sistêmicas na perspectiva da multi,
inter e
transdisciplinaridades ressignificarem os conteúdos e relacioná-los com as condições
existenciais.
Reconhecimento de saberes compreende a colocação da práxis pedagógica no espaço
mais permanente da sociedade: no espaço das lutas sociais pela emancipação do ser humano.
Consiste no reconhecimento de que a realidade é um constructo das práticas sociais e que, por
esta razão, o ponto de partida para o conhecimento cientifico é o saber popular. No entanto, é
preciso reconhecer também que a compreensão da realidade demanda a superação do senso
comum e o entendimento de que o conhecimento científico produzido e sistematizado
também deve avançar na direção do saber popular. Neste contexto, faz-se necessário
reconhecer e compreender as diferenças sociais, políticas e culturais de cada população,
definindo estratégias diferenciadas de apresentação dos conteúdos a partir da introdução de
aspectos da realidade dos alunos na abordagem em sala de aula.
A relação entre teoria e prática deve ser entendida como a organização planejada,
sistemática e metodológica de uma intervenção humana na realidade. Ou seja, consiste na
indissociabilidade entre o saber e o fazer. O saber, isoladamente, constitui-se em mera
representação abstrata e sem sentido. Por outro lado, o fazer pelo fazer torna-se um processo
mecânico, desprovido de reflexão e meramente automatizado e alienante. Promover a relação
entre teoria e prática significa produzir aplicabilidade para os saberes nos problemas
concretos da vida e da sociedade.
A abordagem interdisciplinar possibilita o estudo de temáticas transversalizadas,
permitindo a integração das diferentes áreas do conhecimento e destas com os problemas
concretos das sociedades. A compartimentação do saber, organizado em disciplinas, constituise em solução elaborada com o propósito de facilitar a aprendizagem, no entanto, acaba por
descaracterizar o todo, de maneira a comprometer sua aplicabilidade em situações concretas
da existência humana.
No que se refere aos processos de avaliação, desenvolver a consciência crítica em
relação ao desempenho de cada sujeito frente às diferentes situações de aprendizagem e, ao
mesmo tempo, propor alternativas para superar eventuais problemas e entraves, constitui-se
em desafio a ser perseguido na perspectiva de implementar um processo de avaliação
emancipatório. Nesta direção, ideias como a avaliação processual, que toma por referência o
desenvolvimento do aluno em relação a ele próprio, bem como a utilização de diferentes
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métodos avaliativos, representam a possibilidade de colocar o aluno, e não a prova, no centro
do processo de avaliação.
A avaliação emancipatória, enquanto prática que oportuniza decisões democráticas e a
participação cidadã dos educandos e educadores na intermediação e superação de conflitos e
na convivência com o contraditório, constitui-se em eixo fundamental do processo de
aprendizagem. Além de ter origem na realidade, sinaliza não só os progressos do educando
como também indica as melhorias necessárias ao processo, logo, permite a revisão das
práticas da escola.
Por fim, a pesquisa enquanto processo pedagogicamente estruturado, uma vez
absorvido e praticado pela escola de ensino médio, possibilita a efetiva apropriação da
realidade e projeta possibilidades de intervenção nesta realidade. Ou seja, possibilita o
aprendizado a partir das realidades das diferentes comunidades e, dessa forma, a intervenção
destas comunidades em suas realidades próprias.
Propõe-se, assim, uma escola de ensino médio que atue como uma
comunidade de aprendizagem. Nela, os jovens desenvolverão uma cultura para o
trabalho e demais práticas sociais por meio do protagonismo em atividades
transformadoras. Explorarão interesses vocacionais ou opções profissionais,
perspectivas de vida e de organização social, exercendo sua autonomia e aprendendo
a ser autônomo, ao formular e ensaiar a concretização de projetos de vida e de
sociedade (UNESCO, 2011, p. 9).
A pesquisa, neste contexto, constitui-se na mola propulsora para a apropriação do
conhecimento já produzido e para produção de novos saberes. A análise das diferentes
realidades, à luz do conhecimento científico já sistematizado, não apenas dá significado aos
saberes como possibilita a intervenção nas realidades a serem transformadas.
Os princípios orientadores da proposta de ensino médio politécnico atuam como elo
entre os conhecimentos formais, ou eixos profissionalizantes (arte, educação física, língua
portuguesa, língua materna, línguas estrangeiras, matemática, biologia, física, química,
filosofia, geografia, história, sociologia, ensino religioso) e os conhecimentos sociais, ou
eixos
pedagógicos
(práticas
sociais,
realidade,
eixos
temáticos
transversais).
A
operacionalização desta interface se dá no âmbito dos denominados Seminários Integrados.
Na sua essência, o SI proporciona a articulação e o diálogo entre as áreas de
conhecimentos (conhecimentos dos componentes curriculares formais,
historicamente construídos) e os conhecimentos sociais (práticas sociais-realidade).
A materialização dos princípios orientadores (pesquisa, reconhecimento dos saberes,
relação teoria-prática, relação parte-totalidade, interdisciplinaridade e avaliação
emancipatória) por meio do enfoque crítico e investigativo, possibilita a construção
do conhecimento-aprendizagem, que viabiliza a intervenção para transformar a
realidade. A estratégia de resolução de problemas recorre metodologicamente à
pesquisa, para a identificação da situação a ser resolvida. Para tanto, emprega
procedimentos de observação, de levantamento de hipóteses, de testagem e de
aplicação da opção selecionada. Esse processo utiliza os conteúdos curriculares
como meio de construção dos processos mentais, que se concretizam com a
HOMEM. A dimensão da politecnia e a prática docente no âmbito do ensino médio.
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construção dos conceitos fundantes, que levam a novas aprendizagens. Na
sequência, para cada construção de conhecimento efetivada, um novo problema
surge para ser solucionado, constituindo-se assim uma rede de conhecimentos que
caracteriza a própria aprendizagem – um movimento espiral de crescente ampliação.
O SI propõe-se a desconstituir dois grandes entraves de concepção que têm
inviabilizado as tentativas de mudanças nos currículos escolares: a) a hegemonia de
algumas disciplinas em relação a outras, caracterizada especialmente pela
distribuição desequilibrada da carga horária do tempo escolar; b) a fragmentação do
conhecimento pela consagração de disciplinas e conteúdos como fim em si mesmos.
(Reestruturação do Ensino Médio: pressupostos teóricos e desafios da prática, 2013, p 197).
3. METODOLOGIA
Conforme anunciado, este é um estudo de caso sobre a apropriação pelos docentes da
Escola Estadual de Ensino Médio CAIC Madezatti de São Leopoldo sobre os conceitos
fundamentais da proposta de ensino médio politécnico, à luz das proposições da Secretaria
Estadual de Educação (SEDUC RS). Segundo Stake (1994, apud Andre, 2013), o estudo de
caso não se constitui em um método específico de pesquisa, nem em uma escolha
metodológica, é sim uma forma particular de estudo e de escolha do objeto a ser estudado.
Para Gomes (2008), o estudo de caso constitui-se em uma investigação empírica e um
método abrangente, com base em uma lógica do planejamento, coleta e análise de dados,
aplicável tanto em estudos de caso único quanto múltiplos, utilizando-se de abordagens de
pesquisa tanto qualitativas quanto quantitativas. O estudo de caso é utilizado para investigar
novos conceitos e também para investigar a aplicação de elementos teóricos.
Desta forma, buscou-se com este estudo verificar, a partir dos dados coletados, a
dimensão prática da atuação docente e não as suas percepções e entendimentos em relação à
proposta da SEDUC RS. Ou seja, não se buscou afrontar eventuais divergências. Assim,
pretende-se evidenciar sinergias e distorções que possam indicar o grau de compatibilidade
entre o fazer docente e o caminho pretendido com a implantação do ensino médio politécnico.
Os dados foram obtidos através de um questionário contendo vinte e quatro afirmações
relacionadas às práticas docentes, formuladas ao longo da observação das manifestações de
docentes em reuniões pedagógicas. Para cada uma destas afirmações os entrevistados
poderiam indicar com que intensidade as praticavam: nunca (zero), raramente (um),
frequentemente (dois) ou sempre (três).
O questionário ainda dispunha de outras seis afirmações diretamente relacionadas com
os princípios organizadores da proposta de ensino politécnico (uma para cada princípio). Para
estas afirmações os docentes poderiam assinalar se as praticavam frequentemente (dois),
eventualmente (um) ou nunca (zero).
As mesmas afirmações foram submetidas, na forma de um segundo questionário
estruturado, à análise da Coordenação do Núcleo do Ensino Médio da SEDUC. Para as
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primeiras vinte e quatro afirmações, além de assinalar se aquelas práticas docentes eram
desejáveis ou indesejáveis no âmbito do ensino politécnico, os representantes da SEDUC
poderiam indicar a intensidade com que cada uma daquelas práticas se relacionavam com os
seis princípios organizadores do ensino politécnico.
Por fim, os representantes da SEDUC indicaram a intensidade desejada para cada uma
das práticas docentes relacionadas nas seis últimas afirmações do questionário. Essas,
diretamente relacionadas aos princípios organizadores do ensino politécnico.
O primeiro grupo de questões submetidas à análise tanto da SEDUC quanto dos
docentes, buscou caracterizar situações da prática docente relatadas pelos próprios professores
quando da realização de reuniões pedagógicas e/ou momentos de formação. Compuseram esta
primeira parte do questionário as seguintes afirmações:
1. Foco minha atuação no programa do componente curricular.
2. Incorporo problemáticas da realidade dos alunos, inclusive os que não se relacionam diretamente com o
conteúdo das minhas matérias, nas atividades em sala de aula.
3. Planejo minhas aulas em conjunto com os demais professores das outras áreas.
4. Faço da aula um momento profícuo para a apropriação dos conteúdos, evitando discussões sobre temas
diversos que geram dispersões e queda do rendimento.
5. Procuro inovar nas aulas com temas atuais que transcendam a matéria que leciono.
6. Planejo sempre minhas aulas com base no diagnóstico da turma pois, cada turma é única.
7. Entendo que a integração dos conteúdos dos diferentes componentes curriculares é o resultado da
construção individual do conhecimento pelo aluno.
8. Adoto um critério único e geral para embasar minhas aulas, exemplos e métodos de significação dos
conteúdos, que se adapte a todas as turmas, primando pelo tratamento igualitário.
9. Compreendo a construção do conhecimento como um processo coletivo, permanente e inacabado.
10. Exijo dos alunos o domínio do conteúdo, que é o que realmente importa para o acesso a universidade.
11. Agrego poucos elementos novos às minhas aulas na medida em que a leciono estes conteúdos já há muito
tempo.
12. Julgo mais importante a formação integral do sujeito na hora da avaliação, em detrimento ao conteúdo do
componente curricular.
13. Restrinjo o espaço dado à pesquisa enquanto processo de aprendizagem sob pena de não cumprir o
programa do componente curricular em função da falta de tempo para repassar todo o conteúdo.
14. Considero a avaliação um processo de classificação que, dentre outras funções, seleciona aqueles que
efetivamente poderão desempenhar com qualidade suas futuras profissões.
15. Julgo que a apropriação do conteúdo é mais um processo mental do que formativo. O verdadeiro objetivo
da escola é orientar o aluno a identificar e interpretar problemas e, principalmente, buscar respostas.
16. Entendo a prova apenas como uma das muitas formas de avaliar, que nem sempre é a mais justa e eficaz.
17. Acredito que a escola tem o poder de transformar a realidade sócio-político-cultural dos alunos.
18. Utilizo dos problemas concretos trazidos pelos alunos para, a partir destas questões que lhes são
quotidianas, desafiá-los a buscarem soluções com base na discussão das teorias consagradas, sua
reconfiguração e, até mesmo, em novas proposições.
19. Reconheço os limites da escola em promover a cidadania e, por esta razão, me concentro em dar boas
aulas que ajudem os alunos a conseguirem uma boa colocação profissional no futuro.
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20. Vejo as atividades praticas como uma forma eficaz de demonstrar aos alunos a aplicabilidade e a eficácia
das teorias.
21. Discordo da afirmação de que a escola educa. Quem educa é a família, a escola apenas ensina os
conteúdos.
22. Entendo que a relação entre teoria e pratica consiste em interface necessária para produção de
conhecimento, sem o qual a escola não atingirá seu propósito.
23. Acredito na capacidade transformadora da escola em potencializar os projetos de vida de cada aluno,
formando consciência sobre seus direitos e deveres e alterando sua condição pessoal, de suas famílias e de
suas comunidades.
24. Apresento aos alunos os clássicos e as teorias consagradas, papel fundamental da escola e
“conhecimento” indispensável para as futuras atividades que desempenharão, sejam quais forem.
A segunda parte do questionário, composta por seis questões diretamente relacionadas
aos princípios organizadores do ensino politécnico, foi constituída das seguintes afirmações:
1. Utilizo os seminários integrados como fato mobilizador das minhas aulas, buscando convergir teoria e
prática através da aplicabilidade dos conteúdos nos problemas de pesquisa propostos pelos alunos
(Relação Teoria e Prática).
2. Pratico a avaliação processual tendo como referência o desenvolvimento do aluno em relação a ele
próprio, de maneira integrada e utilizando diferentes métodos avaliativos (Avaliação Emancipatória)
3. Proponho atividades voltadas à resolução de problemas, organizando os conteúdos de forma a oferecer
aos alunos instrumental teórico adequado para o desenvolvimento de suas pesquisas (Pesquisa).
4. Planejo minhas aulas em conjunto com os demais professores, de maneira a contemplar aspectos que
extrapolam os limites do conteúdo de meu componente curricular e que subsidiem as pesquisas realizadas
pelos alunos (Interdisciplinaridade).
5. Proponho atividades que denotem a insuficiência da proposta disciplinar para a solução de problemas
concretos, exigindo dos alunos uma abordagem sistêmica para resolução de seus problemas de pesquisa,
bem como em relação à sua condição existencial (Relação Parte-Totalidade).
6. Defino estratégias diferenciadas de apresentação dos conteúdos para cada turma, considerando suas
características, de forma a introduzir aspectos da realidade dos alunos na abordagem em sala de aula
(Reconhecimento de Saberes).
A única diferença na formulação das afirmações para submissão à SEDUC, em relação
ao questionário submetido aos professores, diz respeito ao sujeito empregado na construção
da oração. Se para os professores utilizou-se o “eu” (ex: “Eu” defino estratégias para...), para
a SEDUC se utilizou o “ele”, no caso, o professor (ex: Espera-se que “ele” defina estratégias
para...).
4. RESULTADOS E DISCUSSÕES
A análise dos resultados baseou-se na comparação das respostas obtidas junto ao
conjunto dos professores em relação às respostas obtidas junto à SEDUC. Essas últimas,
utilizadas como padrão referencial ou meta. Para tanto, foram aplicados princípios estatísticos
como média, desvio padrão e moda para quantificar e descrever os diferentes comportamentos
verificados.
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Caracterização dos Respondentes
Pela Seduc, dois profissionais do Núcleo do Ensino Médio responderam
conjuntamente ao questionário.
Quadro 1. Caracterização do grupo de professores respondentes.
Tipo
Gênero
Idade
Nível de formação
Vínculo de contratação
Tempo de atuação como
professor da rede pública
estadual
Nº de Escolas em que cumpre
seu contrato com o Estado
Carga horária contratual atual
com o CAIC
(1) Formação por área do
conhecimento
Caracterização
Masculino
QTD
12
Feminino
16
De 30 a 40 anos
15
Mais de 40 anos
13
Ensino Médio
1
Graduação
21
Especialização
6
Concursado
15
Contrato Emergencial
13
Até 3 anos de atuação na rede estadual
Mais de 3 até 10 anos de atuação na rede
estadual
Mais de 10 anos de atuação na rede
estadual
7
13
Cumpre seu contrato só no CAIC
24
Cumpre seu contrato em duas escolas
Cumpre seu contrato em três ou mais
escolas
3
Até 10 horas no CAIC
1
De 11 a 20 horas no CAIC
7
De 21 a 30 horas no CAIC
6
Mais de 31 horas no CAIC
Formação em Linguagens e suas
tecnologias
Formação em Matemática e suas
tecnologias
Formação em Ciências humanas e suas
tecnologias
Formação em Ciências da Natureza e suas
tecnologias
14
8
1
13
4
8
4
Formação em Seminário Integrado
1
(1) A soma das quantidades supera o número de respondentes porque alguns
docentes indicaram formação em mais de uma área do conhecimento.
Na escola CAIC Madezatti, vinte e oito professores, de um total de trinta e um que
atuam no ensino médio politécnico responderam ao questionário. A caracterização deste
grupo de professores está descrita no Quadro 1.
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Primeira parte do Questionário
Os técnicos da SEDUC definiram que seis das vinte e quatro afirmações consistiam
em características indesejáveis para o modelo de ensino politécnico. Ao estabelecer o grau de
intensidade destas afirmações em relação a cada um dos princípios organizadores, atribuíram
peso zero. Ou seja, consideraram que por ser uma prática ou percepção indesejada dos
professores, nenhuma relação ou contribuição estas podem trazer ao ensino politécnico.
Para as dezoito afirmações restantes, consideradas como desejáveis para o modelo de
ensino politécnico, foram atribuídas intensidade relacional mediana (peso dois) para quatro
afirmações e forte (peso três) para as demais quatorze.
O resultado obtido com a tabulação dos dados coletados junto aos professores está
expresso nos gráficos que seguem.
A partir do Gráfico 1, é possível identificar que valores e práticas consideradas
inadequadas para o sucesso da proposta de ensino politécnico ainda são majoritariamente
praticados pela maioria dos docentes. Em particular, cabe destacar as respostas obtidas com
relação à dimensão dos conteúdos e sua importância, bem como aquelas que dizem respeito
ao critério utilizado para organizar aulas de mesmo conteúdo para turmas diferentes. Outro
fator a se considerar é a medida de dispersão das respostas coletadas para este grupo de
questões, cujo coeficiente de variação oscilou entre 57% e 103%.
Gráfico 1. Características Indesejáveis: Comparação Docentes X SEDUC.
No que se refere às características desejáveis com contribuição mediana para o sucesso
do ensino politécnico, verifica-se que os docentes hegemonicamente estão alinhados com as
proposições da SEDUC. O que é possível de se constatar na análise do gráfico 2, onde denta-
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se que a tanto a média quanto a moda das respostas dos docentes atingiram valores idênticos,
ou muito próximos, daqueles assinalados pela SEDUC.
Gráfico 2. Características Desejáveis de Contribuição Mediana: Comparação Docentes
X SEDUC.
Com relação às características desejáveis de forte contribuição para o sucesso do
ensino politécnico, constata-se que em apenas cinco das quatorze afirmações existe um
posicionamento hegemônico dos docentes alinhado com a visão da SEDUC.
Tomando-se o gráfico 3, verifica-se que a questão mais crítica se refere ao
planejamento das aulas de forma integrada pelos docentes das diferentes áreas do
conhecimento. Neste caso, os docentes indicaram que raramente praticam o planejamento
integrado (ou conjunto), enquanto a SEDUC sugere que esta seria uma prática com forte
contribuição para o sucesso do ensino politécnico.
Com relação ao coeficiente de variação encontrado para este conjunto de questões,
este variou entre 21% e 75%.
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Gráfico 3. Características Desejáveis de Contribuição Forte: Comparação Docentes X
SEDUC.
Segunda parte do Questionário
Para as seis questões que compõem esta parte do questionário, a SEDUC indicou que
as práticas contidas nestas afirmações devem ser realizadas com frequência pelos docentes do
ensino politécnico.
No entanto, tomando como referência as respostas obtidas junto aos docentes, verificase que as questões referentes à relação teoria x prática, relação parte e totalidade e, sobretudo,
interdisciplinaridade, são praticadas eventualmente pela maior parte dos docentes. Destaca-se
que o tema da interdisciplinaridade foi o que apresentou maior dispersão e maior coeficiente
de variação (55%).
O comportamento das respostas obtidas para este grupo de questões está expresso no
gráfico 4.
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Gráfico 4. Prática Docente e Princípios Orientadores do Politécnico: Comparação Docentes
X SEDUC.
CONCLUSÕES
A partir do cruzamento dos dados e análise dos resultados obtidos com a aplicação dos
questionários, buscou-se compreender como os professores daquela escola praticam, ou não,
os princípios norteadores do ensino politécnico. Isso comparativamente ao que a SEDUC
entende como prática ideal.
No que se refere às respostas obtidas junto à SEDUC, os técnicos adotaram o critério
da indissociabilidade entre os princípios organizadores e a suposta contribuição igualitária
destes para com o sucesso da proposta de ensino politécnico. Para cada uma das afirmações,
atribuíram o mesmo grau de importância para todos os princípios. Ou seja, se a afirmação foi
julgada desejável e importante, ela foi considerada igualmente importante para todos os
princípios. Se a afirmação foi julgada desejável e pouco importante, segue a mesma lógica
anterior. E por fim, se a afirmação foi julgada indesejável, ela foi considerada sem
importância em relação a todos os princípios.
Com relação aos docentes, as respostas obtidas sugerem que os mesmos demonstram
clareza com relação ao papel da escola enquanto lócus de transformação social e de
construção da cidadania. Isto fica evidenciado quando se analisa as respostas obtidas sobre o
processo de avaliação e sobre a necessidade de promover a ressignificação dos conteúdos, na
perspectiva de sua aplicação na realidade dos alunos.
Ainda em relação aos docentes, analisando as respostas às afirmações que tratam da
dialética entre teoria e prática, pesquisa, interdisciplinaridade, como valores de emancipação
dos educandos, verifica-se que foram estes os pontos mais díspares, se comparados ao que a
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SEDUC indicou como ideal. Neste sentido, é recorrente o debate sobre a necessária revisão da
organização curricular como forma de promover a integração entre os docentes e das
diferentes disciplinas, nos diferentes fóruns docentes de discussão constituídos na escola.
Sobre este prisma, Freire (1965) afirma que a educação deve possibilitar aos
educandos construírem-se sujeitos de seu agir e de sua própria história, sendo a dialogicidade
a ação de permitir que alunos ajam e reflitam sobre a ação pedagógica. Essa, segundo Freire, é
a essência da educação libertadora. Para isso, características como colaboração, união,
organização e síntese cultural, são imprescindíveis para que essa educação libertadora se
concretize.
Freire (1998), afirma que não basta só conhecer o mundo, é preciso transformá-lo.
Para isso, ainda segundo Freire (1997), a teoria sem a prática vira “verbalismo”, assim como a
prática sem teoria, vira ativismo. No entanto, quando se une a prática com a teoria tem-se a
práxis, a ação criadora e modificadora da realidade.
Buscando uma melhor compreensão da realidade vivida pelo grupo de docentes
pesquisados, faz-se relevante destacar algumas características peculiares daquele grupo e da
realidade escolar por eles vivenciada:
a.
Apenas 25%, ou sete professores, atuam nos seminários integrados. Respondendo
diretamente por trinta e uma turmas de ensino médio politécnico.
b.
Apenas um respondente declarou ter “formação” para atuar nos seminários integrados.
c.
Seis professores, ou 27% do total, tem pós-graduação lato sensu e nenhum stricto sensu.
d.
Vinte professores, ou 71% do total, cumprem mais de 20 horas na escola. Destes,
quatorze, ou 50% do total, cumprem mais 30 horas na escola.
e.
Apenas um professor cumpre menos de 10 horas na escola.
f.
Vinte e quatro professores, ou 84% do total, cumprem integralmente seu contrato de
trabalho com o Estado apenas naquela escola.
Por fim, em relação à efetiva compreensão e apropriação da proposta de ensino médio
politécnico pelos docentes da Escola CAIC Madezatti, é importante ressaltar o esforço e o
protagonismo daquela comunidade escolar para produzir os melhores resultados possíveis. A
busca permanente pela qualificação docente, as reuniões sistemáticas de alinhamento e
planejamento, a qualificação da infraestrutura da escola tem, em grande medida, contribuído
para o rápido progresso e consolidação de um modus operandi próprio da escola, mas que
sinaliza um avanço na direção da concepção original da proposta.
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REFERÊNCIAS
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AZEVEDO, Jose Clovis de; REIS, Jonas Tarcísio (org.). Reestruturação do Ensino Médio:
pressupostos teóricos e desafios da prática. São Paulo: Fundação Santillana, 2013.
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et d'education de base au Brésil. In: FREIRE, Paulo. L'Education, praxis de liberté, 1965.
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Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=DA0eLEwNmAs>.
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para o Ensino Médio Politécnico e Educação Profissional Integrada ao Ensino Médio (20112014). Porto Alegre: Seduc, 2011.
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Executivo. Brasília, Debates ED, n.1, maio 2011.
__________. Parâmetros Curriculares Nacionais Ensino Médio. Brasília: Ministério da
Educação. 2000.
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Artigo Original
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CRESCIMENTO SOMÁTICO E ÍNDICE DE MASSA CORPORAL EM ESCOLARES
DOS 10 AOS 15 ANOS DE IDADE. ANÁLISE DOS RESULTADOS PROVENIENTES
DE DESENHOS TRANSVERSAIS, LONGITUDINAIS E LONGITUDINAIS MISTOS
Daniel Carlos Garlipp1, Rodrigo B. Moreira2, Anelise R. Gaya3 e Adroaldo Gaya3
RESUMO - O objetivo deste estudo é descrever as diferenças nas médias da
estatura, massa corporal e índice de massa corporal em dados provenientes de
desenhos transversais, longitudinal e longitudinal misto, com o intuito de alertar
sobre os possíveis equívocos quanto a comparações de resultados provenientes
de diferentes desenhos de pesquisa. A amostra coletada de forma transversal
provém dos dados analisados nos anos de 2003 e 2008. Os dados de 2003
contam com 370 alunos (157 do sexo masculino e 213 do sexo masculino) e os
dados de 2008 contam com 299 alunos (151 do sexo masculino e 148 do sexo
feminino) com idades entre 10 e 15 anos de idade. A amostra coletada de forma
longitudinal foi formada por 71 alunos, dos dois sexos, seguidos dos 10 aos 15
anos de idades, entre os anos de 2003 e 2008. Já a amostra coletada de forma
longitudinal mista foi elaborada a partir de 4 coortes da seguinte forma: Coorte
1 = dez, onze e doze anos, Coorte 2- onze, doze e treze anos, Coorte 3- doze,
treze e quatorze anos, Coorte 4 – treze, quatorze e quinze anos de idade. Para a
análise do crescimento somático utilizou-se as medidas da estatura e da massa
corporal. O índice de massa corporal foi obtido através da divisão da massa
corporal em quilogramas pela estatura em metros ao quadrado. Os resultados
foram apresentados na forma de tabelas e gráficos. Como principal resultado
identificou-se que não existe um padrão entre as diferenças dos desenhos de
pesquisa analisados. Conclui-se, portanto que não é aconselhável comparações
de resultados provenientes dos diferentes desenhos de pesquisa.
Palavras-chave: Crescimento somático. IMC. Escolares.
ABSTRACT - The aim of this study is to describe the differences in average
height, weight and body mass index on data from cross designs, longitudinal
and mixed longitudinal design, in order to warn of possible misunderstandings
as to compare results from different designs search. A sample collected in a
cross design derived from the data analyzed in the years 2003 and 2008. The
2003 data have 370 students (157 males and 213 males) and 2008 data have
299 students (151 males and 148 females) aged between 10 and 15 years of
age. A sample collected from a longitudinal design consisted of 71 students of
both sexes, followed by 10 to 15 years of age, between the years 2003 and
2008. Since the sample collected from a mixed longitudinal design was drawn
from four cohorts as follows: Cohort 1 = ten, eleven and twelve years, Cohort 2
- eleven, twelve and thirteen years, Cohort 3 - twelve, thirteen and fourteen
years, Cohort 4 - thirteen, fourteen and fifteen years old. For the analysis of
somatic growth, we used measures of height and weight. The body mass index
was obtained by dividing the body weight in kilograms by height in meters
squared. The results were presented in tables and graphs. The main result we
identified that there is a difference between the standard of research designs
analyzed. It is therefore not advisable to compare results from different
research designs.
Keywords: Somatic growth. BMI. School.
Revista
Ciência e Conhecimento
Volume 9 – Nº1 – 2015.
1 – Universidade Luterana do
Brasil – ULBRA/Canoas, RS,
Brasil.
2 – Universidade Luterana do
Brasil – ULBRA/São Jerônimo,
RS, Brasil.
3 – Universidade Federal do Rio
Grande do Sul – UFRGS, RS,
Brasil.
Dados para correspondência
Daniel Carlos Garlipp
Rua: Quintino Bocaiuva, nº 345,
apt.02, Bairro Moinho de
Ventos, Porto Alegre.
CEP: 90440-051
E-mail:
[email protected]
Recebido em: 23/02/2015.
Revisado em: 16/03/2015.
Aceito em: 28/04/2015.
Área:
Atenção à saúde e bem-estar.
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INTRODUÇÃO
O crescimento somático e suas relações vêm sendo estudado ao longo do tempo
através da utilização de desenhos transversais (CHEN et al., 2002; CDC, 2005; GARLIPP et
al., 2005, PRISTA et al., 2005; MALHOTRA et al., 2006; CONDE E MONTEIRO, 2006;
JIANG et al., 2006; TRETYAK, 2007; DINIZ et al., 2008; BERGMANN et al., 2009;
KHADILKAR et al., 2009), longitudinais (DEHEEGER et al., 2002; AMIRHAKIMI, 2003;
LEE et al., 2004; ECKHARDT et al., 2005; CSUKÁS et al., 2006; CRIMMINS et al., 2007;
LI et al., 2007; VIGNEROVÁ et al., 2007; GARLIPP et al, 2009) e longitudinais mistos (DAI
et al.,2002; BHALLA, 2003; VIRANI, 2005; MATTHEWS et al., 2006; FREITAS et al.,
2007). Em muitos casos, faz-se a comparação de resultados que utilizaram um tipo de
desenho com resultados de estudos que utilizaram outro tipo de desenho de pesquisa. Essas
comparações muitas vezes se fundamentam no fato do crescimento somático possuir forte
influência de fatores genéticos (cerca de 60% para a estatura e 40% para a massa corporal),
apresentar certo padrão de desenvolvimento, além de ser canalizado, ou seja, tende a seguir
canais específicos em tabelas de crescimento (MALINA e BOUCHARD, 2002).
Entretanto, crescer é bem mais complexo do que a simples adição de valores estaturais
ao longo da idade, do nascimento ao estado adulto (MAIA e LOPES, 2006). Crescer é fruto
de uma grande variação que está associada às diferenças na maturação biológica, efeitos
genéticos e ambientais, extremamente complexa de se ilustrar gráfica ou numericamente.
Nesse sentido, há muito tempo o crescimento tem sido usado como um espelho da sociedade
(Tanner, 1986). Para Lee e Ginkel (2004), dados acerca do crescimento somático são uma das
maiores preciosidades informativas para se lidar com necessidades físicas das crianças, na
medida em que constitui um dos parâmetros indicadores da qualidade de vida de um país.
Historicamente, profissionais da área da saúde tem utilizado a estatura e a massa
corporal como medidas para avaliar as alterações no crescimento. Essas medidas
antropométricas, avaliadas de forma individualizada, podem ser usadas para obter
informações sobre o comprometimento da saúde ou bem-estar nutricional. Já, quando
avaliadas a nível populacional, podem ser usadas para obter informações sobre o estado
nutricional de um país, de uma região, comunidade ou grupo socioeconômico.
Dessa forma, muitos estudos populacionais foram realizados em diversos países com o
intuito de propor normas de avaliação para o crescimento somático e IMC (HAMIL et al.,
1979; FREEMAN et al.,1995; CACCIARI et al., 2002; ADAK et al., 2002; KHADILKAR et
al., 2009; BERGMANN et al., 2009) e índice de massa corporal (MUST et al., 1991; COLE et
al., 2000; SHANG et al., 2005; JIANG et al., 2006; INOKUSHI et al., 2006; KHADILKAR et
GARLIPP et al. Crescimento somático e IMC em escolares dos 10 aos 15 anos de idade.
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al., 2009). Essas investigações por motivos lógicos como custo e tempo, provém de dados
analisados transversalmente, sendo que, em muitos casos, são utilizados como fator de
comparação, mesmo que o estudo a ser comparado contenha informações que utilizem outro
tipo de desenho de pesquisa.
Frente a isso, o presente estudo tem como objetivo descrever as diferenças nas médias
da estatura, massa corporal e índice de massa corporal em dados provenientes de desenhos
transversais, longitudinal e longitudinal misto, com o intuito de alertar sobre os possíveis
equívocos quanto a comparações de resultados provenientes de diferentes desenhos de
pesquisa.
2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Este estudo faz parte de uma série de trabalhos que estão sendo desenvolvido pelo
Projeto Esporte Brasil (PROESP-Br), sendo que o protocolo de estudo foi aprovado pelo
Comitê de Ética da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. A amostra é considerada por
conveniência, e formada por duas amostras coletadas de forma transversal, uma amostra
coletada de forma longitudinal e uma amostra coletada de forma longitudinal mista. Todos os
dados provêm do Instituto Estadual de Educação Vasconcelos Jardim do município de
General Câmara – RS. Importante salientar que os dados não se repetem nos diferentes
estudos, ou seja, nenhum indivíduo que esteja em um tipo de amostra compõe outro tipo de
amostra.
As amostras que compõe os desenhos transversais foram avaliadas nos anos de 2003 e
2008 e estão descritas na tabela abaixo:
Tabela 1. Distribuição da amostra separada por ano de avaliação, idade e sexo.
Idades
Ano de
Sexo
avaliação
10
11
12
13
14
15
2003
35
19
25
32
28
18
Masculino
2008
10
16
25
34
32
34
2003
45
28
37
35
43
25
Feminino
2008
12
22
15
26
25
48
Total
157
151
213
148
A amostra que compõe o desenho longitudinal foi formada por 71 alunos (30 do sexo
masculino e 41 do sexo feminino) seguidos dos 10 aos 15 anos de idades, entre os anos de
2003 e 2008.
Já a amostra que compõe o desenho longitudinal misto foi elaborada a partir de 4
coortes da seguinte forma: Coorte 1 = dez, onze e doze anos, Coorte 2- onze, doze e treze
GARLIPP et al. Crescimento somático e IMC em escolares dos 10 aos 15 anos de idade.
Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015.
71
Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483
anos, Coorte 3- doze, treze e quatorze anos, Coorte 4 – treze, quatorze e quinze anos de idade,
e distribuídos conforme a tabela 2 e composta conforme a figura 1:
Tabela 2. Distribuição da amostra nas diferentes coortes nos dois sexos.
Coorte
Sexo Masculino
Sexo Feminino
1) 10 – 12 anos
40
39
2) 11 – 13 anos
51
49
3) 12 – 14 anos
44
48
4) 13 – 15 anos
39
41
Total
174
177
1ª coorte: 10 a 12 anos
10
11
12
2ª coorte: 11 a 13 anos
11
12
3ª coorte: 12 a 14 anos
12
4ª coorte: 13 a 15 anos
Figura 1. Composição do desenho longitudinal misto
13
13
13
14
14
Total
79
100
92
80
351
15
Para a coleta das informações seguiu-se os seguintes caminhos: (a) no ano de 2003,
após consentimento do órgão diretivo da escola, foram apresentados em reunião para pais,
alunos e professores, os objetivos da aplicação dos testes e medidas analisados; (b) após
consentimento dos pais iniciou-se a coleta de dados; (c) no mês de março de 2003 foi
realizada a primeira coleta de dados e anualmente, em todos os meses de março, até o ano de
2008, se repetiu a coleta das medidas em todas as crianças e jovens matriculados desde os
sextos anos do ensino fundamental até o terceiro ano do ensino médio. Todos os dados foram
coletados pelo mesmo professor de Educação Física e equipamentos.
Para a análise do crescimento somático utilizou-se as medidas da estatura e da massa
corporal. A estatura foi medida em cm entre o vértex e plano de referência do solo por
intermédio de um estadiômetro com resolução de 0,1 cm. A massa corporal foi medida em kg
através de uma balança digital com 0,1 kg de precisão com os escolares vestindo o mínimo
possível de roupas. O índice de massa corporal foi obtido através da divisão da massa
corporal em quilogramas pela estatura em metros ao quadrado [IMC = massa corporal
(kg)/estatura (m2)].
Os dados foram apresentados em forma de tabelas pelos valores médios, desviopadrão, mínimo e máximo, e de forma gráfica através de curvas da distância. Para tanto,
primeiramente foram analisados os gráficos boxplot para identificação e possível eliminação
de possíveis outliers severos. Todas as análises foram realizadas no pacote estatístico SPSS
for Windows versão 18.0.
GARLIPP et al. Crescimento somático e IMC em escolares dos 10 aos 15 anos de idade.
Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015.
72
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Cabe salientar que nenhuma medida político-econômica foi realizada no município
durante os anos de investigação, ou qualquer fato tenha ocorrido que sabidamente pudesse
interferir nos resultados analisados.
3. RESULTADOS
Os resultados das três variáveis analisadas serão apresentados na forma de tabelas
contendo os valores médios, desvio-padrão, além dos valores mínimos e máximos e gráficos
para cada idade e sexo investigados.
Tabela 3. Valores descritivos da estatura corporal (cm) em cada idade e sexo para os três
desenhos de análise (transversal, longitudinal e longitudinal misto).
Sexo
Idades
10
11
Masculino
12
13
14
15
10
Feminino
11
12
13
Tipo de estudo
Média
DP
Mínimo
Máximo
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
144,37
140,06
144,77
141,93
147,26
148,89
149,10
147,03
150,04
151,04
155,05
153,71
158,64
161,41
161,30
159,79
164,10
165,12
166,74
165,58
173,14
170,08
170,96
169,53
144,04
141,20
143,93
141,74
146,92
149,33
148,93
147,85
152,28
154,72
154,20
152,26
156,46
155,49
156,94
156,55
7,33
5,59
7,04
5,82
7,56
9,30
7,32
6,68
8,29
6,35
8,23
8,33
9,26
7,90
8,72
8,86
9,71
8,56
8,76
8,42
7,53
9,25
8,67
8,31
7,62
8,66
7,86
8,36
6,95
5,82
7,64
8,49
8,78
4,58
6,82
7,21
5,89
7,60
6,44
6,90
129,10
130,50
130,10
129,40
133,00
139,60
133,90
133,00
135,00
136,60
139,60
135,00
145,00
141,80
146,60
140,00
146,80
143,00
152,00
145,20
154,60
151,00
153,00
154,60
129,30
129,20
129,30
125,60
133,00
138,00
132,00
130,00
134,00
144,00
139,00
137,00
141,30
140,80
143,80
140,80
159,00
146,40
159,00
158,20
159,40
169,80
165,90
163,40
174,80
160,00
173,40
174,80
181,80
177,10
182,40
180,10
182,20
177,40
183,60
187,10
183,00
185,80
185,80
188,80
160,00
158,00
160,00
173,00
162,60
159,20
163,00
177,40
174,60
161,80
167,60
174,60
166,00
167,00
169,00
176,60
GARLIPP et al. Crescimento somático e IMC em escolares dos 10 aos 15 anos de idade.
Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015.
73
Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483
Tabela 3. Valores descritivos da estatura corporal (cm) em cada idade e sexo para os três
desenhos de análise (transversal, longitudinal e longitudinal misto).
Continuação
Sexo
Idades
Feminino
14
15
Tipo de estudo
Média
DP
Mínimo
Máximo
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
158,28
158,61
158,79
158,87
161,57
160,40
160,41
160,64
6,07
6,92
6,54
6,20
7,35
6,21
6,39
6,40
143,10
148,00
144,40
145,80
147,40
147,00
147,00
146,00
171,40
178,40
172,00
177,40
178,90
172,40
172,40
178,80
Sexo Masculino
Sexo Feminino
Figura 1. Distribuição dos valores médios de estatura, nos dois sexos, dos dados coletados de
forma transversal em 2003 e 2008, longitudinal e longitudinal misto em escolares dos 10 aos 15
anos de idade.
Tabela 4. Valores descritivos da massa corporal (kg) em cada idade e sexo para os três
desenhos de análise (transversal, longitudinal e longitudinal misto).
Sexo
Idades
10
Masculino
11
12
13
Tipo de estudo
Média
DP
Mínimo
Máximo
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
38,71
35,47
38,62
38,82
42,56
43,28
41,97
42,97
39,27
46,15
45,48
46,31
52,27
56,49
51,77
52,31
8,46
6,83
8,54
10,13
10,42
10,59
8,61
10,64
7,89
10,16
8,45
12,04
12,97
13,20
10,11
13,47
27,30
27,80
27,30
26,50
28,60
31,30
30,30
28,10
26,70
32,50
33,50
26,70
31,20
36,60
38,10
28,10
65,30
45,00
65,30
72,70
60,40
69,50
68,10
69,50
58,60
70,00
69,00
99,50
74,50
83,00
71,00
107,00
GARLIPP et al. Crescimento somático e IMC em escolares dos 10 aos 15 anos de idade.
Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015.
74
Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483
Tabela 4. Valores descritivos da massa corporal (kg) em cada idade e sexo para os três
desenhos de análise (transversal, longitudinal e longitudinal misto).
Continuação
14
15
10
11
Feminino
12
13
14
15
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Sexo Masculino
54,87
56,90
56,74
54,38
60,60
60,90
61,94
60,53
37,10
36,10
36,30
37,31
39,22
44,91
40,15
41,02
43,33
48,84
45,62
43,97
48,10
51,27
49,08
47,92
50,68
49,75
52,09
49,76
52,01
54,71
54,98
51,88
15,98
11,61
10,20
11,31
8,16
10,57
10,24
11,75
8,92
6,50
8,15
10,10
9,26
10,22
8,88
10,69
9,98
9,14
9,78
9,17
7,54
9,54
9,03
9,38
8,27
9,76
9,23
8,89
6,22
9,57
9,66
7,88
35,30
36,90
42,30
31,80
46,40
44,00
45,90
36,30
23,90
26,10
23,90
21,10
27,30
28,70
24,70
22,00
25,60
36,30
29,50
25,60
32,70
36,60
35,00
28,20
28,50
35,50
39,00
29,00
42,50
38,60
42,20
30,50
89,50
83,20
80,00
83,90
79,00
83,90
83,90
89,70
61,90
47,20
54,00
82,00
71,90
76,90
57,80
85,00
67,40
67,90
65,40
77,20
65,00
77,60
71,30
82,50
71,50
71,80
74,00
89,50
66,20
77,90
77,90
70,30
Sexo Feminino
Figura 2. Distribuição dos valores médios da massa corporal, nos dois sexos, dos dados coletados de
forma transversal em 2003 e 2008, longitudinal e longitudinal misto em escolares dos 10 aos 15 anos
de idade.
GARLIPP et al. Crescimento somático e IMC em escolares dos 10 aos 15 anos de idade.
Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015.
75
Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483
Pode-se identificar na tabela 4 e figura 2 que os valores médios de massa corporal, de
uma forma geral, são crescentes ao longo das idades em ambos os sexos, nos três tipos de
desenhos de pesquisa. Ao ser analisadas as maiores diferenças da massa corporal entre os
diferentes tipos de desenhos de pesquisa, pode-se identificar, no sexo masculino que esta se
deu aos 12 anos entre o desenho transversal de 2003 em relação ao estudo longitudinal misto
(7,04kg). Já no sexo feminino, a maior diferença ocorreu aos 12 anos de idade entre os dois
desenhos transversais (5,68kg). Quanto às menores diferenças, essas variaram entre 0,03 e
0,30 kg no sexo masculino e entre 0,01 e 0,87 kg no sexo feminino.
Tabela 5. Valores descritivos do índice de massa corporal (kg/m2) em cada idade e sexo
para os três desenhos de análise (transversal, longitudinal e longitudinal misto).
Sexo
Idades
10
11
Masculino
12
13
14
15
10
Feminino
11
12
13
Tipo de estudo
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Média
18,44
18,00
18,31
19,07
19,45
19,45
18,80
19,69
17,57
20,17
18,84
19,36
20,53
21,46
19,80
20,26
20,04
20,06
20,32
19,70
20,16
20,96
21,12
20,93
17,70
18,18
17,35
18,36
18,02
20,07
17,92
18,58
18,52
20,36
19,03
18,87
19,58
21,11
19,83
19,45
DP
3,10
2,85
3,26
3,86
3,65
3,52
3,29
3,82
2,54
4,15
2,71
3,56
3,66
3,63
3,08
3,88
4,01
2,19
2,82
3,16
1,86
2,69
2,75
2,99
3,09
3,61
2,69
3,52
3,17
4,23
2,77
3,63
3,17
3,46
3,09
3,19
2,40
3,06
2,78
3,00
GARLIPP et al. Crescimento somático e IMC em escolares dos 10 aos 15 anos de idade.
Mínimo
14,31
13,41
14,31
13,41
15,02
15,65
15,20
13,98
14,16
16,11
15,12
14,16
14,05
16,89
16,02
14,19
14,38
16,14
16,51
15,08
17,22
17,08
17,08
15,19
12,37
15,47
12,37
11,96
14,74
14,44
13,16
12,78
13,44
14,73
13,65
12,57
14,53
16,85
14,87
12,55
Máximo
28,94
22,80
28,94
30,59
26,63
28,56
29,48
31,35
24,33
32,39
27,64
32,56
26,48
28,91
27,21
32,99
29,77
26,61
27,68
32,10
24,93
28,31
28,31
29,31
27,08
25,52
23,84
27,40
27,19
34,18
23,45
30,36
27,23
27,20
26,57
28,51
24,83
29,42
27,07
31,75
Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015.
76
Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483
Tabela 5. Valores descritivos do índice de massa corporal (kg/m2) em cada idade e sexo
para os três desenhos de análise (transversal, longitudinal e longitudinal misto).
Continuação
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
Transversal 2003
Transversal 2008
Longitudinal
Longitudinal misto
14
15
20,20
19,71
20,57
19,65
20,00
21,20
21,28
20,06
3,02
3,28
2,88
2,94
2,79
3,08
2,95
2,57
Sexo masculino
12,80
14,33
15,47
12,89
16,59
15,15
16,61
12,83
29,68
26,44
27,72
33,28
26,63
28,51
28,51
27,43
Sexo feminino
Pode-se identificar, na tabela 5 e figura 3, que os valores médios do índice de massa
corporal, de uma forma geral, são crescentes ao longo das idades em ambos os sexos, nos três
tipos de desenhos de pesquisa. Ao ser analisadas as maiores diferenças do IMC entre os
diferentes tipos de desenhos de pesquisa, pode-se identificar, no sexo masculino que esta se
deu aos 12 anos entre os dois desenhos transversais (2,60 kg/m2). Já no sexo feminino, a
maior diferença ocorreu aos 11 anos de idade entre o desenho transversal de 2008 e o desenho
longitudinal (2,14 kg/m2). Quanto às menores diferenças, essas variaram entre 0,00 e 0,52
kg/m2 no sexo masculino e entre 0,05 e 0,17 kg/m2 no sexo feminino.
4. DISCUSSÃO
A partir dos resultados pode-se identificar que não existe um padrão entre as
diferenças dos desenhos de pesquisa analisados. Ou seja, quanto à estatura, as maiores
diferenças ocorreram entre o desenho transversal de 2003 e o longitudinal no sexo masculino
e entre os dois desenhos transversais no sexo feminino. Já na massa corporal as maiores
diferenças ficaram entre o desenho transversal de 2003 e o desenho longitudinal misto no
sexo masculino e entre os dois desenhos transversais no sexo feminino. E no índice de massa
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corporal as maiores diferenças ocorreram entre os dois desenhos transversais no sexo
masculino e entre o desenho transversal de 2008 e o longitudinal misto no sexo feminino.
Essas diferenças podem ser explicadas pelo fato de que cada desenho utilizado
(transversal, longitudinal e longitudinal misto) tem as suas peculiaridades. Para Malina e
Bouchard (2002), o desenho transversal é um retrato de uma população, ou parte dela, em um
determinado momento. Esse desenho pode determinar a presença ou a ausência da exposição
e desfecho em cada indivíduo estudado em certo momento (GORDIS, 2004), sendo que a sua
grande vantagem é a capacidade de inferência dos resultados observados para uma população
definida no tempo e no espaço, o que muitas vezes não é possível em estudos que utilizam
outros desenhos de pesquisa (KLEIN e BOCH, 2002). Já, o desenho longitudinal conforme
Singer, Nobre e Rocha (2009), constitue um caso especial dos estudos denominados como
medidas-repetidas. Esse tipo de desenho de pesquisa fornece maior precisão nas estimativas
de mudanças temporais do que os estudos transversais do mesmo tamanho, devido à
eliminação da variabilidade interindividual nas comparações realizadas (COOK e WARE,
1983). As principais vantagens do desenho longitudinal voltadas ao estudo do crescimento
físico e desempenho motor são que, além de fornecer informações quanto ao estágio atual de
um determinado atributo, também pode trazer valiosas informações referentes às mudanças
nos índices e progressos que ocorrem ao longo do tempo (MALINA, BOUCHARD e BAROR, 2004). Por outro lado, o desenho longitudinal misto pode ser utilizado para cumprir em
simultâneo as promessas principais dos dois outros tipos de estudos. Ou seja, permite analisar
o desenvolvimento de crianças e adolescentes, principalmente quanto à transição da infância
para adolescência, e até a fase adulta, em um espaço de tempo consideravelmente mais curto,
o que permite que esse desenho seja conhecido também como um modelo de estudos
acelerados (KEMPER, 1988; TWISK e KEMPER, 1995; KEMPER et al., 1997; VAN
MECHELEN e MELLEMBERGH, 1997; MAIA e LOPES, 2003).
Frente aos resultados, surpreendeu o fato de, em uma determinada idade e sexo, as
maiores diferenças ocorrerem entre o estudo longitudinal e o longitudinal misto. Isso ocorreu
para o sexo masculino na estatura (2,07cm) e IMC (0,89 kg/m2) aos 11 anos, aos 15 anos para
a massa corporal (1,41kg) e aos 14 anos para o IMC (0,62 kg/m 2). Já no sexo feminino, as
maiores diferenças entre o estudo longitudinal e longitudinal misto ocorreram na massa
corporal (3,10kg) aos 15 anos e no IMC aos 10 (1,01 kg/m2) e 14 (0,92 kg/m2) anos de idade.
Essas diferenças não eram esperadas tendo em vista que o desenho longitudinal misto por ser
uma combinação do desenho longitudinal com o transversal tem por finalidade descrever e
interpretar a verdadeira mudança, bem como aspectos preditivos das diferenças entre os
GARLIPP et al. Crescimento somático e IMC em escolares dos 10 aos 15 anos de idade.
Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015.
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sujeitos (MAIA e LOPES, 2003). Ou seja, esse método é considerado o meio do caminho
entre os estudos transversais e os longitudinais, do qual se esperava resultados semelhantes ao
que foi identificado no desenho longitudinal. Entretanto, se forem observados o
comportamento dos valores médios nos três desenhos de pesquisa, identifica-se que as curvas
representantes do desenho longitudinal e do desenho longitudinal misto são as mais
semelhantes, enquanto que as curvas representantes dos desenhos transversais (2003 e 2008)
são as que apresentam maiores oscilações.
As oscilações identificadas podem ter ocorrido devido a uma maior variabilidade
interindividual presentes nos estudos transversais. Como citado anteriormente, os estudos
longitudinais eliminam a variabilidade interindividual (COOK e WARE, 1983), desta forma o
valor do desvio-padrão no desenho longitudinal deveria apresentar menores valores quando
comparado com os demais desenhos de pesquisa, entretanto, isso não ficou muito evidente no
presente estudo. Quanto à estatura, em nenhum momento o desvio-padrão do estudo
longitudinal apresentou menor valor em relação aos estudos transversais e longitudinal misto.
Na massa corporal, menor valor de desvio-padrão foi identificado aos 11 anos nos dois sexos
e aos 13 e 14 anos no sexo masculino. No IMC, o valor do desvio-padrão do estudo
longitudinal foi menor do que nos outros estudos aos 11 e 13 anos do sexo masculino e aos
10, 11, 12 e 14 anos no sexo feminino.
Outro fato que chama a atenção nos resultados do presente estudo é a grande variação
apresentada pelas três variáveis analisadas entre os desenhos transversais de 2003 e 2008. Ou
seja, ao descrever essa população com um intervalo de 5 anos de diferença, é possível
verificar um aumento nas médias de estatura (4,37cm no sexo masculino e 2,63cm no sexo
feminino), massa corporal (5,66kg no sexo masculino e 4,94kg no sexo feminino) e IMC
(1,05kg/m2 no sexo masculino e 1,46kg/m2 no sexo feminino). Todavia, essas diferenças não
são possíveis de ser observadas nos outros dois tipos de desenhos (longitudinal e longitudinal
misto). Esses resultados reforçam as características de cada desenho de pesquisa, onde
conforme Matton et al. (2007), desenhos longitudinais são fundamentais quando se pretende
responder a perguntas em relação à consistência das características individuais no decurso do
tempo, ou sobre os efeitos, em longo prazo, de alguma experiência; enquanto que os desenhos
transversais, como já citado anteriormente, apresentam um retrato de uma população, ou parte
dela, num determinado momento (MALINA e BOUCHARD, 2002).
Ainda é possível identificar que as maiores diferenças se concentraram entre os 10 e os
12 anos de idade. Pode-se sugerir que essas diferenças tenham ocorrido devido às intensas
mudanças das características somáticas ocorridas nesse período etário conhecido como salto
GARLIPP et al. Crescimento somático e IMC em escolares dos 10 aos 15 anos de idade.
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Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483
pubertário (BERGMANN et al, 2007). Para Siervogel et al. (2003) a informação da
ocorrência ou não do salto pubertário auxilia na avaliação do estado nutricional e
conseqüentemente na avaliação das modificações antropométricas e da composição corporal.
CONCLUSÕES
No presente estudo não foi identificado um padrão de desenvolvimento das curvas
médias de estatura, massa corporal e IMC entre os três tipos de desenhos de pesquisa.
Todavia, foi identificada uma semelhança no desenvolvimento das curvas, nas três variáveis
analisadas, nos dois sexos, entre os desenhos de pesquisa longitudinal e longitudinal misto.
Ainda observaram-se aumentos médios nas médias de estatura, massa corporal e IMC entre os
anos de 2003 e 2008, quando analisadas as curvas provenientes dos desenhos transversais.
Frente ao exposto, sugere-se que a utilização de um ou outro desenho de pesquisa para
a investigação das alterações nas variáveis somáticas ao longo do tempo, seja acompanhada
de um profundo entendimento das limitações e vantagens de cada modelo. Ainda, não se
aconselha comparações de resultados provenientes dos diferentes desenhos de pesquisa.
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Artigo Revisão
Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483
DA NECESSIDADE DE PSICOEDUCAÇÃO EM PREVENÇÃO ÀS DROGAS NO
ÂMBITO ESCOLAR
Erica I. D. Andrade1,2 e Élide Ávilla Kessler1,2
RESUMO - O uso de substâncias psicoativas há muito tempo vem
ocupando os espaços de vulnerabilidade que ocorrem diante das
mudanças na vida do homem. Algumas pesquisas indicam um aumento
do uso de drogas entre o público adolescente, e apontam a questão
grupal como um dos fatores de risco para o consumo inicial. Percebendo
a importância de psicoeducar esses adolescentes sobre os riscos do uso
de drogas, elaboramos um cronograma de atividades, baseado em
conceitos da teoria cognitivo-comportamental breve. A intenção é que
ele possa ser utilizado em escolas, promovendo o vínculo e orientando
sobre os danos causados pelo uso de drogas, a partir do uso de uma
linguagem que aproxime e facilite a discussão.
Palavras-chave: Dependência de drogas. Comorbidades psiquiátricas.
Adolescentes e drogas.
Revista
Ciência e Conhecimento
Volume 9 – Nº1 – 2015.
1 – Escola Estadual Dolores
Alcaraz Caldas – ESAE. Porto
Alegre, RS, Brasil.
2 – Universidade Luterana do
Brasil – ULBRA/São Jerônimo.
Curso de Psicologia. São
Jerônimo, RS, Brasil.
ABSTRACT - The use of psychoactive substances has long been
occupying the spaces of vulnerability in the face of changes that occur
in human life. Some research indicates an increase in drug use among
the teen audience and highlighting the issue as a group of risk factors for
early consumption. Realizing the importance of psychoeducate these
teenagers about the risks of drug use, we developed a schedule of
activities, based on concepts of brief cognitive- behavioral theory. The
intention is that it can be used in schools, promoting the bond and
directing the damage caused by drug use, from using a language that
approaches and facilitate the discussion.
Keywords: Drug dependence. Psychiatric comorbidities. Teens and
drugs.
Dados para correspondência
Erica I. D. Andrade
Rua: Coronel Corte Real, nº 620.
CEP: 90630080
Bairro: Petrópolis. Compl.: 202
Cidade: Porto Alegre/RS/Brasil
E-mail:
[email protected]
Recebido em: 09/02/2015.
Revisado em: 26/03/2015.
Aceito em: 20/04/2015.
Área:
Atenção à saúde e bem-estar.
84
Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483
INTRODUÇÃO
Este estudo está embasado em um trabalho de psicoeducação desenvolvido em uma
escola pública, situada em uma região carbonífera do Estado do Rio Grande do Sul, onde a
direção escolar solicitou ajuda da equipe de psicologia da ULBRA São Jerônimo para auxiliar
no assunto relativo à prevenção de drogas junto aos adolescentes do ensino médio.
Para tanto, demos início a uma pesquisa qualitativa (GIL, 2002), com a finalidade de
aprofundar os conhecimentos sobre a adolescência e, por ser um momento de mudanças na
vida do indivíduo onde é difícil seguir as orientações provenientes da família ou de terceiros.
As drogas, presentes na história do ser humano há muito tempo, podem ocupar esse
espaço de vulnerabilidade, que ocorre em algumas mudanças e trazer grandes prejuízos ao
desenvolvimento dos jovens (MARQUES e CRUZ, 2000; RAMOS e PENSO, 2013).
A relevância verificada no tema nos levou à elaboração deste estudo, permitindo-nos
realizar uma pesquisa bibliográfica mais aprofundada (GIL, 2002) com relação ao uso e não
uso de substâncias psicoativas (SPA), bem como, ao uso com finalidade de permitir a
desinibição e entrada do adolescente em grupos.
A escolha da adolescencia, como objeto de aplicação da presente pesquisa, se deu em
razão de ser uma etapa de fortes mudanças no desenvolvimento do ser humano
(ZANELATTO e LARANJEIRA, 2013). Nela, o adolescente está deixando o ensino
fundamental (visto por ele como lugar de crianças/infantil), para ingressar no ensino médio
(mais juvenil). Também, é a etapa em que começa a perceber mais fortemente as mudanças
corporais, onde ocorrem os namoros, obtém o primeiro emprego, ingressa em novos grupos e
o surge o medo da proximidade do futuro e de assumir as responsabilidades que começam a
aparecer em suas vidas (KESSLER, 2005).
2. USO DE SUBSTÂNCIAS PSICOATIVAS NA ADOLESCÊNCIA
Até o ano passado, o DSM-IV-TR™ (2002) incluía, nos transtornos de substâncias,
desde drogas de abuso até efeitos colaterais de medicamentos e exposição a toxinas. No
entanto, o novo e atual DSM V (2014, p. 481) modificou essa definição, passando a
considerá-los como “transtornos relacionados a substâncias e transtornos aditivos”, contando
com 10 substâncias descritas no manual. De acordo com o novo manual, “todas as drogas que
são consumidas em excesso têm em comum a ativação direta do sistema de recompensa do
cérebro [...]” (DSM V, p. 481).
Assim sendo, a dependência química pode ser entendida como a necessidade crescente
do uso da substância, incluindo a tolerância e a abstinência, ou um padrão compulsivo de uso;
ANDRADE e KESSLER. Da necessidade de psicoeducação em prevenção às drogas.
Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015.
85
Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483
ou seja, não há controle quanto ao uso, pelo período mínimo de um ano. A tal quadro deve ser
acrescentado algum tipo de prejuízo ou, então, problemas psicossociais e ambientais, como
problemas familiares, profissionais, educacionais, entre outros.
As pesquisas apontam um aumento no número de adolescentes envolvidos com álcool e
outras drogas, e a questão grupal como fator de risco para o início do uso (RAMOS e PENSO,
2013). Ainda, temos a afirmação, feita pela doutrina, no sentido de que o uso de drogas
psicoativas está associado a um maior número de comorbidades psiquiátricas (HESS et al.,
2012; SILVA et al., 2009; DIEHL, et al., 2010). Assim, podem ocorrer alucinações auditivas
e visuais, delírios persecutórios semelhantes aos quadros psicóticos dos transtornos de humor
bipolar e esquizofrenia.
Dito de outro modo, as drogas psicoativas podem ocultar os sintomas de algum outro
problema, pois muitos indivíduos apresentam comportamentos característicos a alguns
transtornos. Não raro, vemos que pessoas em uso constante de drogas elevam as chances de
surgimento de outras doenças e podem apresentar comportamentos de risco em decorrência de
alucinações e delírios, os quais podem ser explicados também pelo uso (intoxicação) da droga
ou pelo advento de alguma outra comorbidade – como no caso da esquizofrenia – sendo,
comumente, internados por apresentarem quadro de surto psicótico.
Em razão disso, é necessário que, ao se fazer o processo de avaliação, tenha-se maior
cuidado para não considerar um sintoma ou reclamação como algo isolado e não
correlacionado. Logo, deve-se avaliar, de forma integrada, o consumo de substâncias e os
transtornos psiquiátricos que podem estar associados (CORDEIRO e DIEHL, 2011; COSTA
e VALÉRIO, 2008).
Feita essa observação, é possível dizer que os transtornos mentais podem ser
diagnosticados antes do uso/abuso de uma substância ou ser encontrados de modo simultâneo
quando da identificação de um quadro de dependência química, ou, ainda, ser decorrentes da
utilização de substâncias psicoativas.
Segundo Cordeiro e Diehl (2011, p. 107-108), as comorbidades podem ter origem em
diversos fatores. Um deles diz respeito à “origem genética”, como nos casos em que mulheres
grávidas usam substâncias psicoativas; ou, os transtornos podem ser independentes, mas se
retroalimentarem, como no caso do uso de álcool, que gera ansiedade e leva a mais uso de
álcool. Ainda, segundo os autores citados, o sofrimento causado por um distúrbio mental pode
levar o indivíduo a fazer uso de substâncias psicoativas com a finalidade de diminuir esse
desconforto, como pessoas em “quadros depressivos podem relatar diminuição do desanimo,
de baixa autoestima e de insônia quando consomem bebidas alcoólicas”. Por fim, temos o
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inverso, ou seja, o uso de substância psicoativa como fator desencadeante para uma outra
doença, como depressão ou sintomas psicóticos, comuns em diversos transtornos
(CORDEIRO e DIEHL, 2011, p. 107-108).
As pesquisas nos mostram que existe um grande número de transtornos mentais
associados à dependência química (COSTA e VALÉRIO, 2008; SILVA, et al., 2009;
PORTUGAL et al., 2010; SWENDSEN et al., 2010; CORDEIRO e DIEHL, 2011;). As mais
comuns dizem respeito aos transtornos depressivos e de personalidade (CHAMPMAM e
CELLUCCI, 2007; PORTUGAL et al., 2010; CABALLO 2011; LIANG et al., 2011; HESS et
al., 2012), fobia social (PAIVA et al., 2008), esquizofrenia (CORDEIRO e DIEHL, 2011),
transtornos do espectro bipolar e alimentar (ELBREDER et al., 2008), transtornos de déficit
de atenção e hiperatividade e transtorno de conduta (BIEDERMAN et al., 2006; COSTA e
VALÉRIO 2008; OHLMEIER et al., 2008).
A esquizofrenia, segundo o DSM V (2014, p.100), “envolve uma gama de disfunções
cognitivas, comportamentais e emocionais”, síntomas que estão “associados a um
funcionamento profissional ou social prejudicado”. Os itens que compõem o quadro da
esquizofrenia “costumam surgir no final da adolescência” (DSM-V, 2014, p. 102) e podem
ser desencadeados pelo abuso de substâncias.
O transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, que é outro quadro que aparece com
frequência em usuários de drogas, leva a um baixo rendimento escolar e, por consequência, a
uma piora na qualidade de aprendizagem do adolescente. Os adolescentes podem apresentar
comportamentos hiperativos, desatentos, impulsivos, agressividade, dificuldade de realizar
tarefas que exijam desempenho neurocognitivo mais elevado, assim como, problemas sociais
e falta de motivação (DIEHL et al., 2010).
O indivíduo com quadro de comorbidade psiquiátrica frequentemente apresenta
comportamento mais agressivo, geralmente, decorrente de transtornos de conduta ou
antissocial que fazem parte do diagnóstico (ANDRADE et al., 2004), bem como, um maior
número de recaídas e comportamento parassuicida ou tentativas de suicídio exitosas (HESS et
al., 2012; (ARCOVERDE e SOARES, 2012). Por outro lado, o paciente que exibe um quadro
de transtorno mental grave associado – como no caso dos transtornos do espectro “bipolar e
na esquizofrenia”, e fizer uso de qualquer quantidade de droga psicoativa – pode ter uma
piora do quadro atual e do prognóstico do transtorno (CORDEIRO e DIEL, 2011, p. 107).
Comumente, adolescentes e adultos usuários de substâncias psicoativas não se
submetem a avaliações e exames clínicos frequentes, tornando difícil e tardio o diagnóstico de
uma comorbidade (SILVA et al., 2009). Portanto, além das condições médicas gerais do
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indivíduo, é de suma importância que seja feito um bom levantamento de quando começou o
uso, o tempo de dependência, a quantidade e os tipos de substâncias que a pessoa usa/usou, e
quais prejuízos cognitivos e comportamentais podem ser identificados.
De posse dessas informações, será possível identificar com segurança se existe alguma
comorbidade associada e, posteriormente, traçar um prognóstico e desenvolver um plano de
tratamento que o paciente consiga aderir (VALÉRIO, 2008 e HESS et al., 2012).
2.1 Psicoeducação
Baseando-nos na piora dos quadros onde estão associados transtorno de uso de
substâncias e outro transtorno psiquiátrico, sustentamos ser a psicoeducação um dos caminhos
para que se possa orientar o adolescente sobre os riscos e danos e, ainda, tentar engajá-lo na
busca de tratamento.
Dentro da psicologia, a teoria cognitivo-comportamental (BECK, 2007) faz uso da
psicoeducação como um importante instrumento de engajamento do sujeito no processo
psicoterápico e medicamentoso, muitas vezes, utilizando-se de algumas técnicas, como o
questionamento socrático, checagem de evidências, entre outras, para fazer com que a pessoa
compreenda as informações que estão sendo fornecidas. Baseando-se em um “modelo médico
biopsicossocial”, a teoria cognitivo-comportamental (psicoeducação) fornece ao indivíduo
“conhecimentos teóricos e práticos sobre o seu problema”, e objetiva “familiarizar o paciente
ao modelo cognitivo e ao funcionamento do tratamento aditivo” (FREIRE, 2011, p. 393).
De acordo com essa teoria, os indivíduos com transtornos psiquiátricos têm
pensamentos disfuncionais, distorcem situações reais e têm pouca ou nenhuma flexibilidade
cognitiva, o que leva a emoções negativas e desadaptação à realidade, e a uma percepção de
que todas as pessoas não os compreendem e querem prejudicá-los (COSTA e VALÉRIO,
2008). Em razão disso, a teoria cognitivo-comportamental objetiva auxiliar esses indivíduos a
aprenderem novas formas comportamentais mais flexíveis para lidarem com as situações do
ambiente (COSTA e VALÉRIO, 2008).
A técnica da psicoeducação quer ensinar e apropriar o indivíduo da sua doença,
proporcionando a ele, desde o início do tratamento, informações sobre os efeitos e resultados
do seu diagnóstico (FIGUEIREDO, 2009). É uma técnica com uma duração determinada, que
segue um roteiro de acordo com o momento atual, e tem, como objetivo, ensinar o sujeito,
através de diversos meios (folhetos explicativos, imagens, entre outros), sobre como opera o
seu transtorno e como e porque o seu comportamento desorganizado lhe provoca angústia
(FIGUEIREDO, 2009).
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A pessoa deve entender as informações teórico-práticas da sua doença (COLOM e
VIETA, 2004, p. 48). Por isso, devemos fornecer ao indivíduo informações suficientes sobre
os sintomas daquela doença, sobre a estrutura psíquica de cada pessoa em interação com o
ambiente, e as consequências que alguns medicamentos provocam no organismo (COLOM,
VIETA, 2004). Aos poucos, a pessoa passa a compreender que, por exemplo, na dependência
química, existe a fissura e seus sinais, que são a irritação, alteração do humor, sudorese e
taquicardia. Tendo aprendido a lidar conscientemente e identificar esses sintomas, o indivíduo
pode se alertar quando está indo em direção à recaída (FREIRE, 2011). Esta informação lhe
dá a oportunidade de procurar ajuda antes que reincida no uso/abuso.
As especificidades que o sujeito adquire sobre determinado transtorno que o acomete
fazem com que ele aprenda a conhecer-se. Além disso, ajuda a fortificar a aliança com o
psicoeducador, pois o paciente não se sentirá manipulado ou enganado com o tratamento.
Logo, tem-se um tratamento embasado no empirismo colaborativo, onde há uma adesão maior
do indivíduo e, por conseguinte, resultados mais positivos.
Alguns transtornos mentais, como os depressivos ou as fases maníacas dos transtornos
de humor, interferem negativamente na capacidade e interesse em aprender (BIEDERMAN et
al., 2006), pois há uma tendência à autodestruição e uma falta de atenção involuntária
(COLOM e VIETA, 2004). Como o indivíduo não consegue entender e reter as informações,
elas parecem ser ilusórias e que não vão ajudá-lo a superar a doença. Contudo, para algumas
pessoas com comorbidades psiquiátricas associadas com a dependência química, a
psicoeducação, é uma prática aplicada e eficaz de intervenção clínica (HODGINS e PEDEN,
2008; FORMIGA et al., 2012).
Podemos ver que, para a esquizofrenia,
Un programa psicoeducativo, en el que se incluían módulos sobre
medicación, conocimiento de la enfermedad y otras actividades psicoeducativas, se
obtiene que la adherencia al tratamiento farmacológico se incremente en
aproximadamente 30%, los pacientes al estar mejor informados aumentan su
conciencia de la enfermedad y son más capaces de hacerse responsables de tomar la
medicación, su calidad de vida mejora al tener menos recaídas y/o reingresos
hospitalario (RIVERA, 2011, p.74).
É importante que a família também passe pela psicoeducação, pois é ela que, muitas
vezes, será responsável pelo tratamento, sendo necessário que sejam elucidados os mitos e
crenças populares que cercam as comorbidades e a dependência química (ALMEIDA e
MONTEIRO, 2011). É preciso que o transtorno de uso de substâncias seja entendido como
uma doença que afeta o sistema de recompensa e prazer do cérebro, e não uma falta de
motivação para melhorar ou deixar o uso, ou algo que provoca alívio da ansiedade e deixa a
pessoa mais tranquila (LARANJEIRA et al., 2000; COSTA e VALÉRIO, 2008).
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A família precisa entender como os transtornos podem estar relacionados e qual o seu
papel no tratamento. Por isso, o objetivo de psicoeducar a família reside em promover uma
mudança na forma como ela entende e age em relação ao indivíduo que apresenta um quadro
de dependência e um transtorno mental associado (LARANJEIRA et al., 2000).
2.2 Psicoeducaçã em grupo
Ainda há pouco material literário que trata da psicoeducação sob o enfoque da
dependência química e comorbidades correlatas (COSTA e VALÉRIO, 2008). Os estudos
apontam para a psicoeducação de um transtorno específico, mas a realidade das clínicas
demonstra que, dificilmente, um transtorno aparece individualizado.
O que vemos é que os grupos para dependentes de substâncias se utilizam da técnica
educativa como ferramenta de impulso ao tratamento. Todavia, é importante observar que,
quando a comorbidade – que acomete algum dos membros do grupo – for incapacitante
(como nos casos de esquizofrenia), essa pessoa não deve participar dos grupos de
dependência química, pois o comportamento psiquiátrico de um integrante pode comprometer
a comunicação e a participação significativa de todo o grupo (WASHTON e ZWEBEN,
2009). Será, desta forma, necessária a existência de grupos específicos para esses pacientes,
pois a abordagem dos temas se dá de forma mais acolhedora e pausada, sendo repetida
inúmeras vezes ao longo do tratamento, até que alguns pontos fiquem completamente
entendidos, e comecem a gerar resultado no tratamento clínico.
Ao realizar seminários de psicoeducação sobre determinado tema – que vise clarear aos
indivíduos os mitos e verdades sobre a dependência química, o psicoeducador pode se valer
de algumas estratégias para fazer com que eles consigam absorver mais informações dentro
daquele grupo. A participação dos integrantes do grupo é estimulada através de técnicas
dirigidas e semiestruturadas, que ajudam pessoa a pensar sobre o que está sendo tratado. Na
prática com adolescentes, é comum serem usados recursos educacionais alternativos, como
vídeos e sites de internet, que o estimulam a pesquisar sozinho e, com isso, auxiliar na
formação do seu conhecimento sobre aquele tema (WRIGHT et al., 2012).
No grupo de psicoeducação, procura-se, através das técnicas de registro de pensamentos
disfuncionais e automonitoramento, fazer o sujeito “reconhecer os estímulos que despertam
fissura e entender os fatores que influenciam o comportamento aditivo. Deve-se fazer um
mapeamento de situações, companhias, hábitos e lugares que estão condicionados ao uso de
SPA” (FREIRE, 2011). Uma vez identificadas as situações pelo registro dos pensamentos,
utiliza-se o automonitoramento desses estados que provocam o estresse e ansiedade.
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Durante a psicoeducação, é comum a pessoa trazer exemplos pessoais, situações
experienciadas que servem de paradigma para a futura tomada de decisões em relação a usar
ou resistir. Trabalhando estas questões levantadas, é possível “reconhecer as distorções e
evidenciar as diferenças entre os pensamentos funcionais e disfuncionais, o coordenador
trabalha a reestruturação cognitiva, promovendo o confronto com a realidade” (FREIRE,
2011, p. 394). Assim, através da reestruturação cognitiva, o “terapeuta formula hipóteses que
relacionam os pensamentos disfuncionais às crenças e testa com o sujeito a validade dessas
hipóteses de forma objetiva e sistemática” (FREIRE, 2011).
Na psicoeducação, o coordenador mostra estratégias de enfrentamento e algumas
formas de como a pessoa pode treinar as habilidades que possui no momento do craving. O
objetivo desse tipo de educação “é evitar o aumento da fissura com medidas
comportamentais” (FREIRE, 2011, p. 396).
Ao ensinar para o indivíduo que a dependência química é uma doença que necessita
tratamento, que ele necessita de pessoas para ajudá-lo e que existem técnicas que podem
auxiliá-lo a evitar o comportamento de fissura, percebe-se que ele se motiva muito mais para
o tratamento. O indivíduo entende que há formas de fazer prevenção à recaída, e que é
importante formar uma rede de apoio que possa ajudá-lo nas etapas difíceis da abstinência.
Desta forma, o indivíduo percebe que é preciso fazer um “resgate de atividades
saudáveis que promovem satisfação pessoal, convivência com pessoas que não usam drogas e
proximidade afetiva com familiares e pares” (FREIRE, 2011).
Quando falamos de rede de apoio, referimo-nos não só à família, mas também a amigos
e reuniões de usuários anônimos. Segundo Marinho et al. (2011), “a rede pode complementar
a terapia individual ou em grupo e as reuniões de AA”, sendo “criada para executar uma
tarefa simples: ajudar o terapeuta a manter a abstinência do paciente. A abordagem deve
envolver membros da família e intervenções de cuidados totalmente planejados”.
3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
3.1 Cronograma breve de psicoeducação
A terapia cognitivo-comportamental breve segue alguns itens que consideramos
importantes incorporar ao trabalho, quando da elaboração de um programa de educação sobre
drogas para adolescentes (ARAÚJO et al., 2011).
Os encontros de psicoeducação, baseados na teoria cognitivo-comportamental breve
(ANDRETTA e OLIVEIRA, 2010), devem ter, como característica principal, o “empirismo
colaborativo”, o que significa criar e fortalecer o vínculo com o grupo, reforçando-o a cada
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encontro. O programa deve ter uma estrutura que atenda ao “tempo disponível”, e “ritmar as
sessões de maneira eficaz e dar e receber feedback sobre o andamento do processo”
(WRIGHT et al., 2012, p. 20 e 21).
Como os adolescentes precisam se sentir à vontade para expressarem suas opiniões e
perguntas, pautamos a atividade psicoeducativa em grupos de discussão sobre: a) os diversos
tipos de substâncias psicoativas; b) dinâmicas sobre as drogas e suas consequências
psicológicas, sociais e orgânicas; e c) dinâmicas e vídeos sobre as drogas com pessoas
conhecidas publicamente.
Com base no que foi exposto neste trabalho, formulamos um cronograma de atividades
psicoeducativas para adolescentes com 10 encontros, sendo que os primeiros quatro estão
embasados no que nos ensina Ramos (2013) sobre os adolescentes e as drogas.
1º encontro: apresentação e integração com o grupo.
Dinâmica: promover a integração lúdica entre os adolescentes.
Procedimento: cada adolescente apresenta aquele que está à sua esquerda, e diz como ele vê
aquela pessoa.
Objetivo: promover o contrato de trabalho: presença de todos, respeito ao outro e ao local,
não usar o celular, outras regras que os adolescentes queiram colocar no papel; bem como,
explicar sobre o que trata o projeto, e de que forma será realizado.
2º encontro: substâncias psicoativas.
Dinâmica: pedir para cada adolescente escrever, individualmente em uma cabine (caixa de
papel), o nome da droga que (se for o caso) tenha usado ou use.
Objetivo: debater sobre as drogas que eles mencionaram: dúvidas, problemas relacionados,
etc.; conhecer e trabalhar a relação que os adolescentes têm com as drogas.
3º encontro: como se proteger das drogas.
Dinâmica: pedir que cada adolescente debata sobre as situações de risco que envolvem as
drogas e como podem se proteger do uso.
Objetivo: visa discutir o contexto dessas situações, e de que outra forma se pode evitar um
risco e se sentir protegido.
4º encontro: projetos para o futuro.
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Dinâmica: debate sobre aspirações e possibilidades futuras baseadas nos conteúdos que são
estudados na escola.
Objetivo: incentivar, nos adolescentes, possibilidades de realizarem seus desejos e projetos de
forma saudável.
5º encontro: levantamento das drogas e questões que serão abordadas nos demais encontros.
Dinâmica: debater em grupo, com base nas drogas mencionadas no segundo encontro, sobre
quais drogas estão mais presentes, e quais as questões gostariam que fossem abordadas nos
demais encontros através de vídeos psicoeducativos. Os vídeos usados devem conter a
legislação sobre as drogas ilícitas e depoimentos, como, por exemplo, de pessoas conhecidas
da mídia e do público jovem, especialistas da área de dependência química.
6º encontro: vídeos sobre o álcool e nicotina, efeitos psicológicos e físicos; questões sociais e
criminais;
7º encontro: vídeos sobre a maconha, efeitos psicológicos e físicos; questões sociais e
criminais;
8º encontro: vídeos sobre a cocaína, o crack e as anfetaminas, efeitos psicológicos e físicos;
questões sociais e criminais;
9º encontro: pesquisa do aproveitamento dos projetos desenvolvidos.
Dinâmica: uso da técnica de balança decisória.
Cada adolescente deverá dividir uma folha branca com um risco ao meio. De forma anônima,
em um dos lados da linha escreverá quais as vantagens no uso das drogas, ao passo que, do
outro lado da linha, escreverá quais as desvantagens no uso das drogas, tudo isso de acordo
com os pontos discutidos durante o trabalho. Após, recolhe-se as folhas e se faz uma roda
para discutir as vantagens e desvantagens levantadas pelo grupo.
A técnica da balança decisória é utilizada para avaliar as “vantagens e desvantagens que
a pessoa faz para si mesma” (BARLETTA, 2010, p. 313), em relação às informações que lhe
foram oferecidas. A “visualização estruturada das vantagens e desvantagens de usar ou não
usar” drogas “contrasta os argumentos relacionados aos fatores de exposição e de proteção do
consumo” (ZANELATTO e LARANJEIRA, 2013, p. 360). Com isso, os adolescentes podem
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avaliar, de acordo com a sua própria experiência, os benefícios ou não do uso de substâncias
psicoativas.
3.2 Metodologia
Trata-se de um projeto de qualitativa, com objetivo exploratório, seguindo
procedimentos técnicos bibliográficos e documentais (GIL, 2002), pois buscamos conhecer
mais o assunto. Para tanto, realizamos pesquisa nas bases de dados SciELO, BVS-Psi, base de
dados da Biblioteca da PUC/RS e Journal Addiction, no período de 2000 - 2014, sendo
utilizados os seguintes descritores: dependência de drogas (drug dependence); comorbidades
psiquiátricas (psychiatric comorbidities); adolescentes e drogas (teens and drugs) e transtorno
de substâncias (disorder substances).
Após essa etapa de coleta bibliográfica, pudemos formular os objetivos do trabalho que,
de forma geral, são: a) levar informação qualificada aos adolescentes e, mais especificamente,
esclarecê-los sobre os efeitos das drogas no organismo; b) mostrar ferramentas para
identificar e prevenir o uso e o consumo de substâncias psicoativas; c) instruí-los sobre
formas de dizer não ao uso de drogas, e também de cessar o uso, trabalhando e discutindo
questões sobre a influência de amigos e grupos; d) informá-los quanto aos riscos e
comorbidades associados ao uso de substâncias psicoativas; e, por fim, e) integrar essas metas
com os conteúdos acadêmicos discutidos na escola.
4. DISCUSSÃO
A literatura vem demonstrando que o uso de substâncias psicoativas que alteram o
estado de consciência faz parte da experiência humana por milênios, e que, nos últimos anos,
há aumento no consumo dessas substâncias. Partindo desta premissa, estamos nos deparando
com um novo fator, qual seja, o início cada vez mais precoce do uso dessas substâncias que
alteram os sentidos (In: SILVA, MICHELI, et al. 2006).
Pesquisas recentes apontam uma elevada prevalência, entre os adolescentes, de
substâncias como álcool, tabaco, solventes, maconha, ansiolíticos, anfetaminas e cocaína
(MONTEIRO et al., 2012). Também assinalam que os alunos do ensino médio, com faixa
etária entre 14 e 16 anos, estão entre os números mais altos de consumo de drogas
(MONTEIRO et al., 2012).
Nesta faixa etária apontada pelas pesquisas, podemos ver que há uma grande influência
dos grupos de convivência, e que a necessidade de pertencimento e entrosamento são fatores
que contribuem de forma a facilitar a entrada no mundo das drogas. A fase de grupos é
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determinada como de maior socialização e de aprendizagem das regras sociais, que, devido ao
envolvimento com as drogas, pode ficar prejudicada e trazer prejuízos sociais e judiciais ao
jovem. Ainda, quanto mais cedo se dá o início do consumo de substâncias psicoativas, mais
grave será o quadro de dependência e de danos ao organismo (SILVA et al., 2006; MOURA
et al., 2009; MONTEIRO et al., 2012;).
Além da influência do grupo, outros fatores – como amigos que usam ou toleram que o
outro use alguma substância, e um dos mais importantes, que é a presença de conflitos
familiares (SILVA et al., 2006) – são incentivadores e facilitadores do primeiro uso.
No que tange aos conflitos familiares, vemos que, quando existem desentendimentos,
existe pouco diálogo ou um diálogo empobrecido, sem espaço para perguntas e dúvidas
comuns na fase de mudanças que é a adolescência. As famílias, os educadores e profissionais
da área de dependência química têm demonstrado uma grande preocupação (SILVA et al.,
2006), mas não têm conhecimento ou recursos suficientes para trabalhar o problema de forma
efetiva.
No caso dos pais e educadores, muitas vezes, há uma “supervalorização dos perigos
oferecidos pelas drogas ilícitas e minimização dos problemas decorrentes do uso de drogas
lícitas” (SILVA et al., 2006). Ainda, algumas famílias preferem que seus filhos façam o uso
de álcool em casa, com a ilusão de que, dessa forma, terão mais controle do uso, e poderão
ensinar o filho(a) a beber de forma correta. Entretanto, estes pais esquecem que estão
cometendo um crime ao fornecerem álcool para menores, pois a legislação vigente proíbe o
fornecimento de bebidas alcoólicas a esse público. Em outras palavras, para os menores de 18
anos, o álcool é considerado uma droga ilícita, e, se um adulto lhe fornece essa droga, está
cometendo um crime (BRASIL. Lei nº 8.069/90, art. 243).
Não existe um consenso sobre qual seria a forma mais correta de abordar questões de
prevenção e tratamento para o público adolescente. No entanto, um programa de prevenção ao
uso de drogas, para ter maior eficácia, deve estar baseado em modelos que já tenham sido
usados e que tenham apresentando um bom resultado. No caso, a psicoeducação tem se
mostrado um modo simples de se trabalhar os assuntos mais delicados, fazendo com que a
própria pessoa reflita sobre questões complexas.
Por isso, entendemos que, para abordar questão das drogas junto ao público adolescente,
temos que conseguir formar um bom vínculo e, ao mesmo tempo, trabalhar as questões
complexas trazidas de forma educativa e simples, em ações concretas e que realmente
busquem resultados efetivos.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
É importante que sejam criados outros mecanismos de prevenção primária, que
busquem abranger os jovens dentro das escolas, proporcionando, naquele espaço, um
ambiente de elucidação de dúvidas sem preconceitos. Mais que isso, é preciso unir esforços
de diversas áreas, para que sejam desenvolvidos mais estudos que permitam reduzir os índices
do quadro de dependência química que assola o país atualmente.
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Artigo Revisão
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BASES
EPISTEMOLÓGICAS
DA
CRIAÇÃO
DO
CONHECIMENTO
ORGANIZACIONAL: UMA ANÁLISE A PARTIR DA TEORIA DE NONAKA E
TAKEUCHI
Ana Claudia Donner de Abreu1,2, Angela Regina Heinzen Amin Helou2 e Greicy Kelli
Spanhol Lenzi2
RESUMO - Neste trabalho apresenta-se uma reflexão das bases epistemológica
da teoria de Gestão do Conhecimento, mais especificamente sobre a criação do
conhecimento organizacional de Nonaka e Takeuchi (1997 e 2008). Este estudo
foi empreendido para possibilitar uma análise das críticas apresentadas por Von
Krogh, Ichijo, Nonaka (2001) e Behr, Nascimento (2008), que consideram que
a Gestão do Conhecimento está envolvida em uma série de questões práticas e
conceituais que podem impossibilitar a implantação com sucesso desse
paradigma. Os procedimentos adotados foram a pesquisa qualitativa,
explicativa e bibliográfica. Como resultados, ao se buscar uma relação com as
críticas feitas tem-se que: se o modelo de gestão do conhecimento que suporta a
prática da organização é fundamentado na concepção subjetiva do
conhecimento, será imprescindível a participação das pessoas na criação do
conhecimento organizacional. Nesse entendimento, se existe um momento em
que um ativo que gera riqueza para uma organização está incorporado nas
pessoas – o conhecimento – esse momento é agora. Portanto, é preciso
promover a emancipação dos homens na organização, de maneira que o seu
potencial criativo possa ser liberado para gerar a inovação que vai permitir que
a organização permanentemente se reconfigure de maneira estratégica. Por
emancipação entende-se todas as formas de gestão que se baseiam em uma
nova racionalidade, especialmente naquela denominada substantiva. Se as
organizações querem fundamentar-se em modelos de GC que tenham as
características propostas por Nonaka e Takeuchi, elas precisam entender o
potencial que essa emancipação pode significar e cultivar uma nova cultura
organizacional fundamentada nas pessoas.
Palavras-chave: Gestão do Conhecimento. Epistemologia. Criação do
Conhecimento Organizacional.
ABSTRACT - This paper presents an epistemological analysis of the creation
of the theory of organizational knowledge of Nonaka and Takeuchi (2008),
seeking to deepen the bases underlying the proposed design. This study was
undertaken to permit an analysis of the criticisms made by Von Krogh, Ichijo,
Nonaka (2001) and Behr, born (2008), believe that knowledge management is
involved in a number of practical and conceptual traps and so if makes an
awkward and not reform paradigm for organizations. For this purpose, the
procedures used were qualitative, explicative and literature. As a result, when
seeking a relationship with the criticisms we have that: if the model of
knowledge management that supports the organization's practice is based on
the subjective knowledge of design, people's participation in the creation of
organizational knowledge is essential. In this understanding, if there is a time
when an asset that generates wealth for an organization is embedded in people knowledge - that time is now. Therefore, it is necessary to promote the
emancipation of men in the organization, so that their creative potential can be
released to generate the innovation that will enable the organization to
permanently reconfigure strategically. For emancipation means all forms of
management that are based on a new rationality, especially in that substantive
called. If organizations want to be based on GC models that have the
characteristics proposed by Nonaka and Takeuchi, they need to understand the
potential that this emancipation can mean and cultivate a new organizational
culture based on people.
Keywords: Knowledge
Knowledge Creation.
Management.
Epistemology.
Organizational
Revista
Ciência e Conhecimento
Volume 9 – Nº1 – 2015.
1 – Faculdade Estácio de Sá.
SC, Brasil.
2 – Universidade Federal de
Santa Catarina. Florianópolis,
SC, Brasil.
Dados para correspondência
Ana Claudia Donner Abreu
Rua: Professor Milton Sullivan,
nº 107, bairro Carvoeira, compl.
101.
CEP: 88040-620
Cidade: Florianópolis/SC/Brasil
E-mail:
[email protected]
Recebido em: 30/04/2015.
Revisado em: 20/05/2015.
Aceito em: 30/05/2015.
Área:
Gestão do conhecimento
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INTRODUÇÃO
A passagem nos últimos duzentos anos da sociedade industrial para a sociedade do
conhecimento, mudou a maneira como as organizações gerenciam o recurso conhecimento,
onde ganhou destaque a gestão desse recurso. Nonaka e Konno (1998) colocam que esse se
tornou um tópico frequentemente discutido na literatura de gestão. Nesse sentido, Nonaka e
Takeuchi (2008) complementam que desde a década de 90 a gestão do conhecimento se
converteu em tema de pesquisa acadêmica, sendo bastante utilizada também em consultoria.
Isso ocorreu porque a “implantação coordenada da Gestão do Conhecimento (GC) cria uma
vantagem competitiva sustentável e de difícil imitação, pois está enraizada nas pessoas que
trabalham na empresa, e não em recursos físicos, que são facilmente imitáveis pelos
concorrentes” (SILVA, 2004, p. 143).
Com o intuito de obter essas vantagens a teoria se difundiu, no entanto, essa
popularidade, pode induzir a uma percepção de que a organização tem enfrentado de maneira
construtiva as barreiras à criação do conhecimento organizacional, porém para Von Krogh et
al. (2001) a gestão do conhecimento como está sendo praticada representa um paradigma
constrangedor e não reformador para as organizações, visto que se encontra envolvida em
várias armadilhas conceituais.
A primeira dessas armadilhas é a de que a gestão do conhecimento depende de
informações que são facilmente detectáveis e quantificáveis: as habilidades humanas que
impulsionam a criação de conhecimento têm mais a ver com relacionamentos e construção de
comunidades do que com banco de dados. A tecnologia e os sistemas são importantes sim,
porém insuficientes para transformar informação em conhecimento (VON KROGH et al.,
2001).
Os autores (2001) complementam que a segunda armadilha é a de que a gestão do
conhecimento se dedica à fabricação de ferramentas: embora as ferramentas possam ajudar a
organização a iniciar o processo de criação de conhecimento, elas não podem se tornar mais
importantes do que os resultados obtidos. Assim, as ferramentas devem ser criadas,
selecionadas e adaptadas ao longo do processo para atender às necessidades específicas de
micro comunidades dentro da organização. Portanto, as ferramentas são necessárias, mas
também são insuficientes para criar conhecimento organização.
Por fim, a terceira armadilha é a de que a gestão do conhecimento depende de um
executivo do conhecimento: a criação do conhecimento não pode estar sujeita às fronteiras.
Ao contrário, deve envolver diferentes disciplinas, funções e indivíduos com diversidade de
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experiências e transpor as fronteiras organizacionais, estendendo-se aos fornecedores, clientes
e até aos concorrentes (VON KROGH et al., 2001).
Nesse sentido, Fischer e Amorim (2007) colocam que as principais armadilhas são:
confundir conhecimento com informação; não diferenciar conhecimento individual de
conhecimento organizacional; tratar conhecimento como estoque; desconsiderar a interface
com os demais modelos ou sistemas de gestão da organização.
Behr e Nascimento (2008) também fazem suas críticas em relação à gestão do
conhecimento. Enfatizam que na literatura existente sobre o campo, predomina uma
concepção cartesiana de gestão com destaque à dimensão funcionalista, ou seja, às
abordagens que priorizam um conjunto de técnicas e ferramentas visando a produtividade e
eficácia das organizações. Indo mais além, os autores consideram que a conversão do
conhecimento tácito em explícito, como a técnica de gestão de conhecimento em que se
baseiam para fazer sua apreciação, nada mais é do que “um mecanismo de controle do
trabalhador, pelo que ele é pressionado, tanto pela organização, quanto pelos seus pares a
transmitir seus conhecimentos tácitos, tornando-os explícitos”, visto que o conhecimento
implícito, subjetivo, criativo ao ser articulado pode gerar ganhos significativos de
competitividade para a organização (GATTONI, 2000).
Em função dessas críticas, vai se empreender neste artigo uma análise epistemológica
da teoria de criação do conhecimento organizacional de Nonaka e Takeuchi (2008) buscandose aprofundar nas bases da Gestão do Conhecimento que fundamentam essa concepção
proposta e avançar em relação às críticas apresentadas.
2. DESENVOLVIMENTO
Uma das principais questões para a efetiva gestão do conhecimento, diz respeito a criar
o conhecimento organizacional. Von Krogh et al. (1994) propõem que a criação do
conhecimento organizacional se dá em três perspectivas: a cognitivista; a interacionista e a
autopoiética, sendo as suas principais características:
 Cognitivista: As principais atividades no desenvolvimento do conhecimento são a
identificação, a coleta e a disseminação centralizada das informações. As organizações
são abertas, pois desenvolvem o conhecimento a partir de assimilação de novas
informações. É possível a explicitação e codificação do conhecimento, sendo que este é
desenvolvido a partir de regras universais da organização, onde se deve considerar o
contexto da informação;
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 Interacionista: O conhecimento está nas conexões e o foco deve estar na análise de
fluxos dispersos de informações auto organizadas. As organizações são redes auto
organizadas que dependem de comunicação e, diferentemente da abordagem anterior,
esta abordagem não aplica regras universais. As regras são baseadas em grupos e
variam conforme o contexto; e
 Autopoiética: O conhecimento é construído socialmente por meio do processo da
interpretação e da observação. A organização do conhecimento é um sistema aberto
(para dados) e fechado (para informação e conhecimento). O conhecimento envolve
sentimentos, valores e crenças, e não é visto simplesmente como dado ou informação
que pode ser armazenado, ele não é facilmente disseminado, pois depende da
interpretação dentro de um sistema de acordo com regras individuais.
Os autores ainda trazem mais uma colaboração sobre o conhecimento organizacional:
o conceito de epistemologia corporativa, sendo esta a teoria do como e do porque as
organizações aprendem, e como estas acreditam que o conhecimento é desenvolvido. Desta
forma, Krogh et al. (1994) procuram evidenciar que o sucesso das iniciativas de gestão do
conhecimento, perpassa por existir alinhamento entre as epistemologias dos indivíduos e a
epistemologia corporativa dentro da qual estes atuam.
Embora existam diferentes teorias de criação do conhecimento organizacional, para
Escrivão e Silva (2011), dentre toda a literatura de GC a teoria mais consolidada atualmente é
a de Nonaka e Takeuchi, uma vez que ela é a mais estruturada e detalhada.
2.1 Modelo de Criação do Conhecimento Organizacional
A teoria da criação do conhecimento organizacional, é apresentada por Nonaka e
Takeuchi (2008) como uma abordagem distinta daquelas que tratam a organização como um
mecanismo de processamento de informações do ambiente externo para adaptar-se às novas
necessidades ambientais. Essa diferença na abordagem é importante, pois o conhecimento
organizacional é um ativo intangível, “que é acumulado vagarosamente ao longo do tempo e,
desta forma, está impossibilitado de ser negociado ou facilmente imitado por concorrentes,
uma vez que representa a base e os alicerces da história e da cultura da organização. Quanto
mais especificidades esse conhecimento demonstrar em relação à organização, mais ele se
tornará seu ativo estratégico” (SHINYASHIKI et al., 2003, p. 2).
Assim, a teoria da criação do conhecimento organizacional pretende ser uma
“plataforma para uma nova visão de organização como um sistema dinâmico, evolutivo,
semiautônomo de produção e de aplicação de conhecimento” (SPENDER, 1996, p.59). Para
Frota et al. (2005) assim como qualquer abordagem ao conhecimento, esta teoria tem sua
própria epistemologia, que refere a reflexão geral em torno da natureza, etapas e limites do
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conhecimento humano, ou seja, a teoria do conhecimento, mas com um foco diferente da
abordagem tradicional ocidental.
Essa teoria fundamenta-se em duas dimensões, a epistemológica e a ontológica.
 Na dimensão epistemológica, há a diferenciação entre conhecimento tácito e explícito,
sendo que eles se integram através da linguagem (símbolos, metáforas e analogias),
objetivando criar conhecimento organizacional.
 Já, a dimensão ontológica, diz respeito à criação do conhecimento individual, sendo
que este pode ser expandido para o conhecimento organizacional por meio da espiral do
conhecimento, o que acaba por gerar redes de conhecimento dentro da organização, ou
seja, está relacionada com os níveis de criação de conhecimento dentro da organização:
individual, grupal, organizacional e Inter organizacional.
A interação da dimensão epistemológica emerge a “espiral virtuosa do conhecimento
como sendo uma plataforma para transcender o conhecimento do nível ontológico individual
para o coletivo por meio da interação entre o conhecimento tácito e o explícito” (LENZI,
2014, p. 53). Assim, a dinâmica entre o conhecimento tácito e explícito acontece e é elevado
de um nível ontológico mais baixo para outro mais elevado.
Cabe ressaltar que a dimensão epistemológica desta teoria está fundamentada na
distinção feita por Polanyi (1962) entre conhecimento tácito e explícito. O conhecimento
tácito é pessoal, específico ao contexto e por isso difícil de ser comunicado, e o conhecimento
explícito é codificado, transmissível na linguagem formal, sistemática. Para Nonaka e
Takeuchi (2008), na história da epistemologia ocidental existe uma controvérsia em torno do
tipo de conhecimento que é mais verdadeiro. Enquanto os ocidentais tendem a enfatizar o
conhecimento explícito como sendo o conhecimento mais verdadeiro, os japoneses tendem a
enfatizar o conhecimento tácito.
Na visão dos autores (2008), contudo, o conhecimento tácito e o conhecimento
explícito não são entidades totalmente separadas, e sim mutuamente complementares, que
interagem e dinamizam trocas nas atividades criativas das pessoas. Nesse modelo dinâmico da
criação do conhecimento, existe o pressuposto central de que o conhecimento humano é
criado e expandido a partir da interação dos dois tipos de conhecimento. A interação,
nomeada como “conversão do conhecimento”, é concretizada a partir de um processo social
entre indivíduos onde o conhecimento tácito e o conhecimento explícito se expandem tanto
em termos de qualidade quanto de quantidade. A figura 1, apresenta o modelo de conversão
do conhecimento.
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Figura 1. Espiral do Conhecimento.
Fonte: Elaborado pelas autoras fundamentados em Nonaka e Takeuchi (1997).
A interação entre os dois tipos de conhecimento gera então a conversão de um para
outro. Para dar conta dessa dinâmica e embasar a sua teoria de criação do Conhecimento,
Nonaka e Takeuchi (1997) propõem o modelo SECI de conversão de conhecimento. O
modelo apresenta quatro modos de conversão, sendo eles: (a) socialização, (b) externalização,
(c) combinação e (d) internalização. Esses quatro modos de conversão do conhecimento,
serão apresentados a seguir.
2.1.1 Socialização - de Conhecimento Tácito em Conhecimento Tácito
A socialização é um processo de compartilhamento de experiências que permite a
criação do conhecimento tácito, expresso em modelos mentais e habilidades técnicas
compartilhadas. Um indivíduo pode adquirir conhecimento tácito diretamente de outros
indivíduos, sem usar a linguagem, mas sim pela observação, imitação e prática. O segredo
para a aquisição do conhecimento tácito é a experiência. Sem experiência compartilhada, é
extremamente difícil para um ser humano conhecer o processo de raciocínio de outros. A
mera transferência de informações muitas vezes fará pouco sentido se estiver desligada das
emoções associadas e dos contextos específicos nos quais as experiências compartilhadas são
embutidas (NONAKA e TAKEUCHI, 2008).
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2.1.2 Externalização: de Conhecimento Tácito em Conhecimento Explícito
A externalização é um processo de articulação do conhecimento tácito em conceitos
explícitos. Pode ser definido também como um processo de criação do conhecimento, na
medida em que o conhecimento tácito se torna explícito e passa a ser expresso na forma de
metáforas, analogias, conceitos, hipóteses ou modelos. Dentre os quatro modos de conversão
do conhecimento, a externalização é a chave para a criação do conhecimento, pois cria
conceitos novos e explícitos a partir do conhecimento tácito. Para converter o conhecimento
tácito em conhecimento explícito de forma eficiente e eficaz podem ser usadas a metáfora, a
analogia e o modelo (NONAKA e TAKEUCHI, 2008).
2.1.3 Combinação: do Conhecimento Explícito em Conhecimento Explícito
A combinação é um processo de sistematização de conceitos em um sistema de
conhecimento. Esse modo de conversão do conhecimento envolve a combinação de conjuntos
diferentes de conhecimento explícito. As pessoas trocam e combinam conhecimentos por
meio de documentos, reuniões, conversas ao telefone ou redes de comunicação
computadorizadas. A reconfiguração das informações existentes através da classificação, do
acréscimo, da combinação e da categorização do conhecimento explícito (como realizado em
bancos de dados de computadores) pode levar a novos conhecimentos. A criação do
conhecimento realizada a partir da educação e do treinamento formal nas escolas
normalmente assume esta forma (NONAKA e TAKEUCHI, 2008).
2.1.4 Internalização: de Conhecimento Explícito em Conhecimento Tácito
A internalização é o processo de incorporação do conhecimento explícito no
conhecimento tácito e está intimamente relacionada ao “aprender fazendo”. Quando são
internalizadas nas bases de conhecimento tácito dos indivíduos, sob a forma de modelos
mentais ou know-how técnico compartilhado, as experiências advindas da socialização, da
externalização e da combinação tornam-se ativas e valiosas. No entanto, para viabilizar a
criação do conhecimento organizacional, o conhecimento tácito acumulado precisa ser
socializado com os outros membros da organização, iniciando assim uma nova espiral de
criação do conhecimento (NONAKA e TAKEUCHI, 2008).
Nonaka e Takeuchi (2008) complementam que para o conhecimento explícito se
tornar tácito, é necessário a verbalização do conhecimento sob a forma de documentação,
manuais e histórias orais. A documentação ajuda os indivíduos a internalizarem suas
experiências, aumentando assim seu conhecimento tácito. Além disso, os documentos ou
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manuais facilitam a transferência do conhecimento explícito para outras pessoas, ajudando-as
a vivenciar indiretamente as experiências dos outros. Quando a maioria dos membros da
organização compartilha de tal modelo mental, o conhecimento tácito passa a fazer parte da
cultura organizacional.
2.1.5 Conteúdo do Conhecimento e a Espiral do Conhecimento
Conforme exposto anteriormente, a criação do conhecimento organizacional é uma
interação contínua e dinâmica entre o conhecimento tácito e o conhecimento explícito,
moldada pelas mudanças ocorridas entre diferentes modos de conversão de conhecimento.
Como o conteúdo do conhecimento criado por cada modo de conversão do conhecimento é
naturalmente diferente, é preciso compreender como ocorrem esses processos.
Em primeiro lugar, o modo da socialização normalmente começa com o
desenvolvimento de um “campo” de interação que facilita o compartilhamento das
experiências e modelos mentais dos membros da organização. Já, o modo de externalização é
provocado pelo diálogo ou pela reflexão coletiva, nos quais o emprego de uma metáfora ou
analogia significativa ajuda os membros da equipe a articularem o conhecimento tácito oculto
que, de outra forma, é difícil de ser comunicado. O modo de combinação é provocado pela
colocação do conhecimento recém-criado e do conhecimento já existente, proveniente de
outras experiências da organização, em uma rede, tornado-o um novo produto, serviço ou
sistema gerencial. Por fim, o aprender fazendo provoca a internacionalização.
Para Lenzi (2014, p. 54 – Grifo da Autora)
a Socialização gera o Conhecimento Compartilhado, como um campo para
compartilhar modelos mentais e habilidades técnicas. A Externalização origina o
Conhecimento Conceitual, pois evoca o diálogo e a reflexão coletiva. A
Combinação produz o Conhecimento Sistêmico, onde o novo conhecimento é
incorporado, ou mesmo alinhado a conhecimentos já existentes. Na Internalização é
criado o Conhecimento Operacional que é o aprender-fazendo.
Até aqui foi apresentada a dimensão epistemológica da criação do conhecimento
organizacional. Porém, uma organização não pode criar conhecimento sozinha. O
conhecimento tácito dos indivíduos constitui a base da criação do conhecimento
organizacional, mas a organização tem de mobilizar o conhecimento tácito criado e
acumulado no nível individual.
O conhecimento tácito mobilizado é ampliado organizacionalmente a partir dos quatro
modos de conversão do conhecimento e cristalizado em níveis ontológicos superiores (espiral
do conhecimento). Assim, a criação do conhecimento organizacional é um processo em
espiral que começa no nível individual e vai subindo e ampliando comunidades de interação
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que cruzam fronteiras entre seções, departamentos, divisões e organizações. Por isso, Nonaka
e Takeuchi (2008) também apresentam as condições que são capacitadoras para a criação do
conhecimento organizacional.
2.2 Condições capacitadoras da criação do conhecimento organizacional
A função da organização no processo de criação do conhecimento organizacional é
fornecer o contexto apropriado para facilitar as atividades em grupo e promover a criação e
acúmulo de conhecimento no nível individual, mas para isso é importante considerar os
aspectos apresentados a seguir:
2.2.1 Intenção
A espiral do conhecimento é direcionada pela intenção organizacional que é definida
como a aspiração de uma organização às suas metas. Normalmente, os esforços para alcançar
a intenção assumem a forma estratégica dentro de uma organização. A intenção
organizacional fornece o critério mais importante para julgar a veracidade de um determinado
conhecimento, bem como o valor da informação ou do conhecimento percebido ou criado. No
nível organizacional, a intenção é frequentemente expressa por padrões organizacionais ou
visões que podem servir para avaliar e justificar o conhecimento criado. Por isso, a intenção é
necessariamente carregada de valor (NONAKA e TAKEUCHI, 2008).
2.2.2 Autonomia
A segunda condição para promover a espiral do conhecimento é a autonomia. No nível
individual, todos os membros de uma organização devem agir de forma autônoma conforme
as circunstâncias. Ao permitir essa autonomia, a organização amplia a chance de introduzir
oportunidades inesperadas. A autonomia também aumenta a possibilidade de os indivíduos se
automotivarem para criar novo conhecimento. Além disso, indivíduos autônomos atuam como
parte da estrutura holográfica, na qual o todo e cada parte compartilham as mesmas
informações. Ideias originais emanam de indivíduos autônomos, difundem-se dentro da
equipe, transformando-se então em ideias organizacionais (NONAKA e TAKEUCHI, 2008).
2.2.3 Flutuação e Caos Criativo
A terceira condição organizacional para promover a espiral do conhecimento é a
flutuação e o caos criativo, que estimulam a interação entre organizações e o ambiente
externo. A flutuação é diferente da desordem total e caracterizada pela “ordem sem
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recursividade”. Trata-se de ordem cujo padrão é difícil de prever inicialmente. Se as
organizações adotam uma atitude aberta em relação aos sinais ambientais, podem explorar a
ambiguidade, a redundância ou os ruídos desses sinais para aprimorar seu próprio sistema de
conhecimento. O caos é gerado naturalmente quando a organização enfrenta uma crise real,
por exemplo, um rápido declínio de desempenho devido as mudanças nas necessidades do
mercado ou ao crescimento significativo de concorrentes. Em suma, a flutuação na
organização pode precipitar o caos criativo, que induz e fortalece o compromisso subjetivo
dos indivíduos. Na realidade operacional do dia-a-dia, os membros da organização não
enfrentam regularmente essa situação (NONAKA e TAKEUCHI, 2008).
2.2.4 Redundância
A redundância é a quarta condição que possibilita que a espiral do conhecimento
ocorra em nível organizacional. A redundância é a existência de informações que
transcendem as exigências operacionais imediatas dos membros da organização. Nas
organizações de negócios, a redundância refere-se à superposição intencional de informações
sobre atividades da empresa, responsabilidades da gerência e sobre a empresa como um todo.
Para que se crie conhecimento organizacional, é preciso que um conceito criado por um
indivíduo ou por um grupo seja compartilhado por outros indivíduos que talvez não precisem
do conceito imediatamente. O compartilhamento de informações redundantes promove o
compartilhamento de conhecimento tácito, pois os indivíduos conseguem sentir o que os
outros estão tentando expressar.
Nesse sentido, a redundância de informações acelera o processo de criação do
conhecimento. A redundância é importante sobretudo no estágio de desenvolvimento do
conceito, quando é essencial expressar imagens baseadas no conhecimento tácito. Nesse
estágio, as informações redundantes permitem que os indivíduos invadam mutuamente suas
fronteiras funcionais e ofereçam recomendações ou forneçam novas informações de diferentes
perspectivas. Em suma, a redundância de informações precipita o “aprendizado por intrusão”
na esfera de percepção de cada indivíduo (NONAKA e TAKEUCHI, 2008).
2.2.5 Variedade de Requisitos
A quinta condição que ajuda a desenvolver a espiral do conhecimento é a variedade de
requisitos. A diversidade interna de uma organização deve corresponder à variedade e à
complexidade do ambiente para permitir que ela enfrente os desafios impostos pelo ambiente.
Os membros da organização podem enfrentar muitas situações se possuírem uma variedade de
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requisitos, que pode ser aprimorada através da combinação de informações de uma forma
diferente, flexível e rápida e do acesso às informações em todos os níveis da organização.
Para maximizar a variedade, todos na organização devem ter a garantia do acesso mais rápido
à mais ampla gama de informações necessárias, percorrendo o menor número possível de
etapas (NONAKA e TAKEUCHI, 2008).
3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Quanto aos objetivos esta pesquisa é explicativa, a escolha de procedimentos
sistemáticos para a descrição e explicação dos fenômenos é qualitativa, e quanto ao processo
de coleta de dados foi bibliográfica. A abordagem qualitativa se justifica, sobretudo, por se
tratar de uma forma adequada para entender e explicar a natureza de um fenômeno social
como a teoria da criação do conhecimento organizacional. A natureza explicativa do trabalho,
está ancorada no objetivo de aprofundar o conhecimento sobre as bases epistemológicas que
fundamentam essa mesma teoria e a técnica de pesquisa utilizada - bibliográfica - permitiu
explicar o problema a partir de referências teóricas publicadas (CERVO e BERVIAN, 1996).
4. APRESENTAÇÃO DAS BASES EPISTEMOLÓGICAS QUE FUNDAMENTAM A
TEORIA DA CRIAÇÃO DO CONHECIMENTO ORGANIZACIONAL
O primeiro artigo que trata da criação do conhecimento organizacional de Nonaka é
datado de 1991 sob o título “The Knowledge-Creating Company”. Mais tarde, com a
participação de colaboradores, incluindo Takeuchi, a teoria foi ganhando corpo e sendo
desenvolvida.
Cabe ressaltar que a teoria da criação do conhecimento organizacional,
proposta por Nonaka e Takeuchi tem seus fundamentos epistemológicos nas tradições
filosóficas orientais de Nishida, e nas tradições ocidentais de Polanyi e Whitehead, que
explicam a natureza do conhecimento e a existência humana do ponto de vista de um mundo
que é dinâmico e inter-relacionado (NONAKA et al., 2011).
Ao formularem sua teoria, os autores (2008) partem de um questionamento da teoria
da organização baseada em recursos que utiliza o conhecimento de maneira mais objetiva –
para obter ganhos acima da média – e não se preocupa em entender as dinâmicas a partir das
quais a organização produz continuamente recursos por meio da interação com o meio
ambiente. Além disso, nessa visão de organização o conhecimento é tido como um dos muitos
recursos que geram receita, mas ainda há uma incompreensão do papel do conhecimento na
gestão, bem como do processo pelo qual o conhecimento é criado (NONAKA et al., 2011).
Já a visão da organização baseada em conhecimento busca superar esse limite
apresentado, e pretende ser uma “plataforma para uma nova visão de organização como um
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sistema dinâmico, evolutivo, semiautônomo de produção e de aplicação de conhecimento”
(SPENDER, 1996, p.59). Nessa visão proposta, a natureza do conhecimento como recurso de
gestão é diferente da natureza do conhecimento como recurso físico. O conhecimento é criado
nas interações entre as pessoas e o ambiente e é: (a) subjetivo, (b) relacionado a processos,
(c) estético e (d) adquirido pela prática:
a) O conhecimento é subjetivo: Essa visão de conhecimento se fundamenta na concepção
de Polanyi (1962), que se opõem a visão objetiva e analítica de que o conhecimento é
algo que o ser humano adquire ao analisar o objeto como algo que existe a parte e além
dele mesmo. Para esse autor, o ser humano adquire conhecimento por meio de sua
formação e na integração de suas experiências individuais, e faz isso de modo ativo e
subjetivo, criando o conhecimento tácito. Embora não negue a importância da visão
objetiva que ele denomina de conhecimento explícito, ele defende que o conhecimento é
acima de tudo uma questão de como o ser humano responde à realidade, e como situa
essa realidade em relação a si mesmo. Da mesma maneira, levando essa visão de
conhecimento para o contexto das organizações, a realidade não possui uma
“existência” objetiva. Ela é criada pela organização que a percebe como real. Isso
significa que as organizações diferem entre si pelos modelos que se utilizam para reagir
a uma realidade, mas também por aqueles modelos em que se baseiam para perceber a
realidade (NONAKA et al., 2011).
(b) O conhecimento é relacionado ao processo: A visão de mundo que embasa a teoria é
fundamentada na visão dos filósofos processuais, como Whitehead. Nessa filosofia o
mundo é entendido como uma teia orgânica de processos inter-relacionados ou como
uma sociedade de eventos espaço-temporais complexos. E nesse sentido, o
conhecimento deve ser entendido principalmente como um processo, que é criado e
utilizado em relação ao conhecimento de outras pessoas. O conhecimento nasce tanto da
experiência, que é um processo subjetivo de percepção, quanto da apreensão da essência
na interpretação do mundo. É importante destacar que na filosofia processual, o objeto
do conhecimento surge da interação com o mundo, e não o mundo que surge a partir do
objeto (WHITEHEAD, 1978). Assim, nessa teoria, o conhecimento é definido como “o
processo humano/social dinâmico de justificação da crença pessoas em relação à
verdade” (NONAKA e TAKEUCHI, 2008, p. 58). O conhecimento é criado pelas
pessoas a partir de suas relações umas com as outras e com o ambiente. Dessa forma, o
conhecimento é um processo no qual os pensamentos subjetivos das pessoas são
justificados pela interação social com outros e com o ambiente, para aí sim tornar-se
uma “verdade” objetiva (NONAKA et al., 2011).
c) O conhecimento é estético: historicamente a teoria das organizações tem se preocupado
em estudar questões instrumentais como eficácia e eficiência. Entretanto, os estudos de
estética - que estão relacionados com o conhecimento criado a partir de nossas
experiências sensoriais - tem se tornado mais comum nas organizações. O
conhecimento estético, é, portanto, uma forma de conhecimento que as pessoas
adquirem ativando as capacidades necessárias para garantir que o juízo estético do diadia faça parte das organizações. Ele oferece um insight e uma consciência que talvez
não se expresse em palavras, mas possibilita a organização a perceber novos caminhos.
Novas oportunidades, novos mercados, tecnologias, modelos de negócio baseiam-se em
uma visão de futuro que é reflexo dos valores, ideais e do senso estético dos membros
da organização (NONAKA et al., 2011).
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d) O conhecimento é criado por meio da prática: os teóricos da gestão têm procurado
estabelecer regras universais para analisar os recursos da organização e o ambiente em
que ela opera. Entretanto, o gerenciamento não pode ser realizado por meio de análises
baseadas nessas regras, mas sim por práticas desenvolvidas para lidar com as situações
particulares que cada organização enfrenta. Nesse sentido, o diferencial competitivo de
uma organização está na capacidade que possui de adaptação e para a prática da
mudança contínua, e não pela capacidade de estabelecer um plano analítico preciso
(NONAKA et al., 2011).
Para se compreender a gestão baseada no conhecimento, é preciso uma teoria de
organização fundamentada nessa visão de conhecimento, ao invés das teorias de gestão
convencionais que encaram a organização como uma entidade autossuficiente e indiferente, e
na qual as subjetividades humanas são desconsideradas da análise. A visão do conhecimento
como subjetivo, processual, estético e prático, indica como ele é criado para alterar a
organização e o ambiente, e indica que essa capacidade se desenvolve nas interações com o
meio (NONAKA et al., 2011).
O que define uma organização no contexto dessa visão, é sua capacidade de formar
juízos de valor em cada situação particular visando concretizar sua visão de futuro. Essa
capacidade, chamada e descrita por Aristóteles de phronesis – é entendida como a capacidade
de determinar e tomar a melhor atitude em relação a uma situação específica, servindo ao bem
comum. A phronesis considera as circunstâncias do contexto, atende às particularidades e
altera os objetivos do processo quando necessário. Está relacionada aos valores, vai além do
conhecimento científico, analítico e técnico e envolve julgamentos e decisões tomadas por um
ator social virtuoso (NONAKA et al., 2011).
Dessa forma, o conhecimento nasce da subjetividade das pessoas inseridas em um
contexto e encontra sua objetividade por meio do processo social. Surge da síntese do
pensamento e da ação dos indivíduos que interagem tanto dentro quanto fora da organização e
isso cria uma nova práxis de interação que, por sua vez, torna-se a base da geração de um
novo conhecimento por meio da espiral do conhecimento.
4.1. Reflexão das bases epistemológicas que fundamentam a teoria da criação do
conhecimento organizacional
A despeito do grande número de publicações sobre teorias de gestão do conhecimento,
poucos trabalhos têm se preocupado em fazer uma análise dessas teorias com relação às suas
bases filosóficas. Por isso, Nonaka e Peltokorpi (2006) se propõem a fazer essa análise,
utilizando como critério trabalhos que apresentam o conhecimento a partir de uma perspectiva
objetiva ou subjetiva.
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Para os autores (2006), na perspectiva objetiva que é positivista, o conhecimento é
objetivo, existe separado e independente das pessoas. Para o positivismo, existem fatos
práticos sobre o mundo que não dependem da interpretação e nem da presença do ser humano
e o mundo é constituído por relações causais entre objetos. O argumento subjacente, é de que
o verdadeiro conhecimento não é produto da experiência sensorial, mas sim de um processo
mental ideal, ou seja, existe um conhecimento a priori que não precisa ser justificado pela
experiência (NONAKA e TAKEUCHI, 1997). Por outro lado, na perspectiva subjetiva, o
conhecimento é contextual, subjetivo e relacional, ou seja, é impossível existir conhecimento
objetivo separado das subjetividades das pessoas (MERLEAU - PONTY, 1999).
As bases que fundamentam a teoria da criação do conhecimento de Nonaka e
Takeuchi (1997, 2008), se fundamentam em Polanyi, Nishida e Whitehead, que se identificam
com essa visão subjetiva da criação do conhecimento. Polanyi (1962) fundamenta sua teoria
de conhecimento na Gestalt, que indica que os indivíduos podem conhecer a totalidade de
determinado objeto a partir da interpretação que fazem de seus aspectos particulares, ainda
que não sejam capazes de isoladamente os identificar. Nesse sentido, o processo de
conhecimento humano é formado por pistas fragmentadas que são integradas em categoriais
nas quais as pessoas atribuem sentido à realidade.
O autor (1962) propõe um conceito de conhecimento fundamentado em três
pressupostos: (a) a verdadeira descoberta não pode ser explicada por um conjunto de regras e
algoritmos; (b) o conhecimento é público e social, e por isso é construído pelas pessoas; (c)
todo conhecimento é tácito ou nele fundamentado. Tácito é uma palavra de origem latina que
significa silencioso, ou seja, no sentido próprio da palavra o conhecimento tácito é algo que o
ser humano sabe mesmo não tendo capacidade para explicar.
O conhecimento tácito tem dois componentes distintos: (a) o técnico – o know-how –
conhecimento enraizado na ação e com o desempenho e (b) cognitivo – o modelo mental que encontra-se incorporado nos pessoas e age como um filtro a partir do qual eles enxergam,
agem e se comportam no mundo. É complexo, e por ser uma experiência pessoal e específica
a um contexto, é mais difícil de ser formalizado, comunicado e compartilhado. Polanyi (1962)
sustenta que o componente tácito é parte indispensável de todo e qualquer conhecimento e é a
base para o conhecimento explícito. Ou seja, a dimensão tácita do conhecimento é utilizada
para interpretar a realidade e produzir conhecimento explícito.
Nishida, tido como precursor do pensamento japonês contemporâneo e fundador da
Escola de Kyoto, é outro dos autores que influenciam Nonaka e Takeuchi. A partir da Escola
de Kyoto, Nishida se aproxima de Husserl e Heidegger e inicia um diálogo entre o
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pensamento japonês contemporâneo e a filosofia ocidental. Seus escritos, pretendem oferecer
uma contribuição oriental à tradição especulativa ocidental apoiando-se nos conceitos
budistas e confrontar e integrar instancias próprias do mundo oriental com categorias e
instituições do rigor da filosofia europeia (FLORENTINO NETO, 2008).
Para Nishida, o pensamento comum ensina que sujeito e objeto são realidades
independentes, mas isso é uma disposição errada. A reflexão emerge a posteriori em relação à
experiência, e trazendo de novo a consciência sobre si mesma e tornando-a traduzível em
palavras e comunicável, coloca entre sujeito e objeto uma separação, uma cisão. Antes da
reflexão não existem sequer um sujeito e um objeto.
A realidade é uma, ou seja, existe um princípio que a unifica. O único elemento capaz
de corresponder à realidade na sua totalidade, o elemento que pode exprimir dialeticamente os
fenômenos do mundo é a consciência. Todavia, não se trata de uma consciência intencional,
que aponta o seu objeto e o define, compreende-o. Na concepção de Nishida, a consciência
tem que ser entendida como um lugar de acolhimento, uma cavidade que deixa que os
fenômenos aconteçam e se disponham livremente. A ideia principal, é que o momento do
“fazer experiência” não precise de um sujeito – que se manifestando provocaria uma cisão,
uma distância daquilo que viria como consequência a constituir-se como um objeto – mas que
aconteça ao contrário, como um “puro ver” a realidade assim como é, fora da distinção
cartesiana entre sujeito e objeto (FLORENTINO NETO,2008).
Assim, ainda na visão de Nishida, a verdadeira direção só é percebida dentro da
realidade viva da experiência anterior à separação entre sujeito e objeto. Nesse sentido, não se
pode obter o verdadeiro conhecimento a partir do pensamento teórico, mas sim apenas a partir
da mente e do corpo do indivíduo (NONAKA e TAKEUCHI, 1997). Parece interessante que
Nishida não pretenda descrever a realidade nem como objetiva, nem como subjetiva, nem
mesmo como empiricamente objetiva. Para ele, o agir da experiência pura é a mesma e
idêntica coisa do que o que é agido; nenhum elemento pode dominar nem resumir a si o outro
(o pensamento ou a realidade, o sujeito ou o objeto), dado que a unidade posta em campo pela
experiência é infinitamente dinâmica e abrangente. O saber deve ter o significado de agir, que
é onde se encontra o sentido da auto- determinação dos fatos. Como na hermenêutica
fenomenológica de Heidegger, que considera a compreensão como um tipo de ação e,
consequentemente, a partir disso considera a existência como um fato de compreensão, podese entender que a auto compreensão vê a sua própria realidade.
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Nessa perspectiva, o fundamento da visão com relação ao conhecimento, é suportada
por três condições: (a) a unidade do homem e da natureza; (b) a unidade do corpo e da mente
e (c) a unidade do eu e do outro.
 A primeira condição: unidade do homem e da natureza - é expressada pelas
características estruturais da língua japonesa. Nela, as imagens físicas e concretas são
necessárias para a expressão, e as afirmações feitas por um falante articulam imagens
concretas e tangíveis. Assim, essas imagens que existem na mente do falante, mesmo
que em alguns casos, só na hora em que são proferidas, se tornam reais. Além disso,
essas características se associam a uma visão sobre o tempo entendido como um fluxo
contínuo – um presente permanentemente atualizado. O tempo é a aqui e agora e o
espaço não tem uma perspectiva fixa (NONAKA e TAKEUCHI, 1997).
 A segunda condição: a unidade do corpo da mente - está fundamentada na ideia de
personalidade total, onde o conhecimento significa a sabedoria adquirida a partir da
perspectiva da personalidade como um todo. Nessa expectativa, a realidade e a
existência estão na aquisição do fato a partir da experiência pura e a pessoa é o sujeito
da ação. Portanto, a incorporação da experiência pessoal direta é necessária em relação
ao conhecimento (NONAKA e TAKEUCHI, 1997).
 A terceira condição: a unidade do eu e do outro - integra as duas condições anteriores.
Desenvolve uma visão de mundo orgânica, onde o conhecimento subjetivo e
inteligência intuitiva são valorizados, e onde a realidade surge na interação física entre a
natureza e os seres humanos (NONAKA e TAKEUCHI, 1997).
Da mesma maneira que Polanyi e Nishida, outro que contribui para a formação da
base epistemológica da teoria que está sendo analisada é Whitehead. O filósofo e matemático
Whitehead, foi um dos mais destacados críticos do cientificismo e do materialismo que
caracterizam a ciência desde o século XVII. Crítico do cientificismo, o filósofo britânico
apontava que o ideal de uma ciência caracterizada pela mera busca de descrições simples dos
fenômenos observados, pretensamente desligada de qualquer pressuposto metafísico, torna a
ciência uma empresa sem qualquer importância. A ciência só pode recuperar sua importância
na medida em que esse ideal é demonstrado falso (WHITEHEAD, 1994).
Para Whitehead (1994) a natureza é aquilo que se observa pela percepção obtida a
partir dos sentidos e há três elementos envolvidos no conhecimento da realidade: o fato, os
fatores e as entidades.

O fato é a própria natureza que se apresenta à apreensão sensível;

nos fatores a apreensão sensível é capaz de diferencia elementos; e,

as entidades são o modo como os fatores de apreensão sensível estão presentes
no pensamento.
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O fato imediato para a apreensão sensível é a ocorrência da natureza em sua totalidade
complexa, entretanto, a apreensão não é capaz de compreender o fato em sua totalidade. Por
isso, em um processo de abstração, o fato é separado em fatores e concebido pelo pensamento
como entidades distintas. Isso significa que, dizer que a natureza deve ser entendida como
aquilo que se apresenta imediatamente à apreensão sensível, não implica a pressuposição de
que ela é um conjunto de elementos distintos. Aquilo que é “um mero processo da mente na
tradução da apreensão sensível em termos do conhecimento discursivo foi transmutado em
caráter fundamental da natureza” (WHITEHEAD, 1994, p.23). De forma que, as abstrações
produzidas pelo pensamento para tornar inteligível aquilo que aparece à apreensão sensível,
foram convertidas em elementos não só inerentes ao real, mas dotados de um caráter de
realidade última, imutável e diferenciada. Nesse sentido, o real se mostra através dos sentidos,
sem qualquer acréscimo da consciência.
Destarte, é preciso pensar a natureza homogeneamente, sem impor sobre ela artifícios
criados pelo pensamento para lidar com os fatores da apreensão sensível. Nesse caso, a
exterioridade da natureza em relação ao pensamento se mostra a partir da própria percepção
sensível, onde se tem a consciência de algo que “não é pensamento e que é contido em si
mesmo com relação ao pensamento” (WHITEHEAD, 1994, p.7).
Por isso, qualquer afirmativa sobre a natureza deve evitar confundir a natureza mesma
com o que o pensamento elabora sobre ela para poder comunica-la, sendo possível, apenas, o
desenvolvimento de uma filosofia da coisa percebida. A tese do autor é a de que o
conhecimento é uma instancia última. Não se pode explicar o porquê do conhecimento, só se
pode descrever o que do conhecimento. Ou seja, é possível analisar o conteúdo e as relações
internas do conhecimento, mas não explicar porque ele existe. Dessa maneira, não é possível
tratar dos instrumentos de conhecer e de como a natureza age sobre eles para produzir o
conhecimento. O que é preciso, é abordar o conteúdo do conhecimento verificando como ele
se estrutura internamente em suas mútuas relações e pôr em coerência aquilo que apreensão
sensível fornece. Negada a possibilidade de tratar o conhecimento como um produto da
mente, é preciso abordá-lo enquanto apreensão abstrata de um conteúdo que vem da
apreensão sensível.
CONCLUSÕES
Nesse trabalho se apresentou uma análise epistemológica da teoria de criação do
conhecimento organizacional de Nonaka e Takeuchi, buscando-se aprofundar nas bases que
fundamentam essa concepção proposta. Esse estudo foi empreendido para que fosse possível
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uma análise das críticas apresentadas por Von Krogh, Ichijo, Nonaka (2001) e Behr,
Nascimento (2008) sobre a gestão do conhecimento. Para esses autores, a gestão do
conhecimento está envolvida em uma série de armadilhas práticas e conceituais que a torna
um paradigma constrangedor e não reformador para as organizações, uma vez que os modelos
de GC fundamentam-se em uma concepção cartesiana e um mecanismo de controle dos seres
humanos dentro da organização.
Após a apresentação das bases epistemológicas, percebe-se que esses fundamentos
permitem algumas considerações mais gerais:
 O conhecimento é um processo humano. Não se pode reduzir a gestão do conhecimento
à tecnologia de informação ou ferramentas de mensuração. Mesmo que o termo gestão
implique em controle de processos, na gestão do conhecimento o que deve ser
promovido é a criação do conhecimento que decorre de um processo de capacitação
para o conhecimento;
 O conhecimento depende dos olhos do observador, que confere significado a um
contexto a partir de suas referências, bem como pela maneira como utiliza esse
conhecimento. As pessoas justificam a veracidade de suas crenças com base em suas
observações do mundo que dependem da sensibilidade e da experiência individual.
Dessa maneira, o conhecimento é uma construção da realidade e não algo “verdadeiro”
de maneira abstrata e universal;
 É preciso o desenvolvimento de comunidades de trabalho fundamentadas em processos
sociais de interação para que as organizações estejam capacitadas para o conhecimento;
 Da mesma maneira, levando essa visão de conhecimento para o contexto das
organizações, a realidade não possui uma “existência” objetiva. Ela é criada pela
organização que a percebe como real. Isso significa que as organizações diferem entre si
pelos modelos que se utilizam para reagir a uma realidade, mas também por aqueles
modelos em que se baseiam para perceber a realidade. O que define uma organização no
contexto dessa visão, é sua capacidade de formar juízos de valor em cada situação
particular visando concretizar sua visão de futuro.
Assim, se o modelo de gestão do conhecimento que suporta a prática da organização é
fundamentado na concepção subjetiva do conhecimento, será imprescindível a participação
das pessoas na criação do conhecimento organizacional. Nesse entendimento, se existe um
momento em que um ativo que gera riqueza para uma organização está incorporado nas
pessoas – o conhecimento – esse momento é agora. Portanto, é preciso promover a
emancipação dos homens na organização, de maneira que o seu potencial criativo possa ser
liberado para gerar a inovação que vai permitir que a organização permanentemente se
reconfigure de maneira estratégica.
Por emancipação entende-se que todas as formas de gestão que se baseiam em uma
nova racionalidade, especialmente naquela denominada substantiva. Se as organizações
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querem fundamentar-se em modelos de GC que tenham as características propostas por
Nonaka e Takeuchi, elas precisam entender o potencial que essa emancipação pode significar
e cultivar uma nova cultura organizacional fundamentada nas pessoas.
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