SUMÁRIO - Prof. Saulo Almeida

Transcrição

SUMÁRIO - Prof. Saulo Almeida
Capa: Renato Xavier
Projeto Gráfico: Casa de Jdeias
Produção Gráfica: Adalmir Caparrás Fagá
2" Edição Revista- 2005 - Ia Reimpressão - 2010
Título Original: Lettre sur l'humanisme
Tradução: Rubens Eduardo Frias
SUMÁRIO
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Heidegger, Martin, 1889 - 1976
Carta sobre o humanismo / Martin Heidegger. - 2 ed. rev.
Tradução de Rubens Eduardo Frias.
São Paulo: Centauro - 2005
Título original: Lettre sur l'humanisme.
ISBN 978-85-88208-64-3
Bibliografia
1. Filosofia alemã 2. Humanismo
CDD-193
05-7532
Índices
I. Título
para
catálogo
C' b re
"o
O
"H umarusmo
.
"
.7
sistemático:
1. Filosofia alemã 193
e 2010
CENTAURO EDITORA
Travessa Roberto Santa Rosa, 30 - 02804-0 I O - São Paulo - SP
Te!. Ii - 3976-2399 - Te!'lFax 11- 3975-2203
E-mail: [email protected]
www.centauroeditora.com.br
.arta a Jean Beaufret (Paris)
87
ilossario Português-Alemão
91
SOBRE O "HUMANISMO"
CARTA A JEAN BEAUFRET (Paris)
STAMOS AINDA LONGE DE PENSAR, COM SUFI-
ciente radicalidade, a essência do agir. Conhecemos
.
.
l'P
o
\.
agir apenas como o produzir de um efeito. A sua realidade efetiva segundo a utilidade que oferece. ~as a es-
T:; e ~
sência do agir é o consuma!. Consumar significa des- C/'t.o ro.JL
dobrar alguma coisa até à plenitude de sua essência; o, (teIGMO
levá-la à plenitude, producere.
ser consumado,
Por isso, apenas pode
em sentido próprio, aqui o que já é.
O-que todavia "é", antes de tudo, ~ o ser. O pensar
consuma a relação do ser com a essência do homem.
O pensar não produz nem efetua esta relação. Ele apenas a oferece ao ser, como aquilo que a ele próprio foi
Clarfa sobre o qumanismo
~
confiado pelo ser. Esta oferta consiste no fato de, no
s mos capazes de pressentir o que se esconde neste
pensar, o ser ter acesso à linguagem. ~ linguagem é a \'
I rocesso. A libertação da
casa do ser. Nesta habitação do ser mora o homem.
Gramática e a abertura de um es aço essencialI!!~§
Os pensaaores
1/ a manifestação
e os poetas são os guar as desta ha-
bitação. A guarda que exercem é o ato de con~nar
~uagem
CIo ser, na me i a em que a levam à
\
I"
-
' ..g1!,êg!..mdos ~~a
_--_.~
o
o riginal está reservado .S,.omQJf!.tefa_ºillJL2.....2~r_. e
..
..
o poetiza . O pensar não é apenas l'engagement
r
cl'action em favor e através do ente, no sentido do
exerce como
o mais sirlg~12..e,
iminência de vir a ser. A história do ser sustenta e
um efeito, ou por s~r aplic;do, que o pensar se trans-
efetivamente
real da situacão
presente.
,
. ....
forma em ação. O pensar age enquanto
ao me~m;-tt.rr112~:_O~_~~_elevado .l2orgue interessa à
relação do ser com_o l-:!.'2...D.:lep;1.
Toda a eficácia, porém,
~-se
--
O
é
~ pensar
...~ ..
l'engagement através e em favor da verdade ~r.
~
-------.
"""",-.-"",,
."."._ ..•..
A sua história nunca é completa, ela sempre está na
e nela a conservam. Não é por ele irradiar
pensar. Este agir é provavelmente
dans
no ser e espraia-se sobre o ente. O pensar,
""""'"
determina cada conclition et' situation
Para primeiro aprendermos
..•..
humaine.
a experimentar,
na
sua pureza, a cita essência do pensar, o que significa,
pelo contrário, deixa-se requisitar pelo ser para dizer a
ao mesmo tempo, realizá-Ia, devemos libertar-nos da in-
verdade do ser. O pensar consuma este deixar. Pensar
terpretação técnica do pensar, cujos primórdios recuam
é L'engagement
até Platão e Aristóteles. O próprio pensar é tido, ali,
par L'Être. Ignoro se do ponto de vis-
ta lingüístico é possível dizer ambas as coisas ("par"
como 'tEXU'11, o processo da reflexão no serviço do fazer
e "pour"),
c'est
e do operar. A reflexão, já aqui, é vista desde o ponto
L'engagement de l'Être. Aqui, a palavra para o genitivo
de vista da rrpaçtç e rroil1mç. Por isso, o pensamento,
"de 1' ... " visa expressar que o genitivo é, ao mesmo
tomado em si, não é "prático" . A caracterização do pen-
tempo, genitivus
Mas nisto não
sar como Oecopic e a determinação do conhecer como
se deve esquecer que "sujeito e objeto" são expressões
postura "teórica" já ocorrem no seio da interpretação
inadequadas
muito
"técnica" do pensar. É uma tentativa de reação, visando
na forma da
salvar também o pensar, dando-lhe ainda uma autono-
"Lógica" e "Gramática" ocidentais. Mesmo hoje, mal
mia em face do agir e do operar. Desde então, a "Filo-
8
9
numa só expressão, a saber: penser,
subjectivus
e objectivus.
da Metafísica que se apoderou,
cedo, da interpretação
da linguagem,
roartin
<rar{a sobre o humanismo
sofia" está constantemente
na contingência
a sua existência em face das "Ciências".
com as ciências, o rigor do pensar não consiste só na
de justificar
exatidão artificial, isto é, técnico-teórica dos conceitos.
Ela crê que
O rigor do pensar repousa no fato de o dizer permane-
isto se realizaria da maneira mais segura, elevando-se
cer, de modo puro, no elemento do ser, deixando
ela mesma à condição de uma ciência. Este empenho,
porém, é o abandono
~
perar o simples das múltiplas dimensões.
da essência do pensar. A Filo-
formulações
se não for ciência. O não ser ciência é con-
~
~
Você pergunta: Comment
como o elemento do pensar. A "Ló-
medida que lhe é inadequada.
rtIIILmanisme"?
que começa com a
melha-se a um procedimento
Um tal julgamento
, I VIII'
~,J
de viver em terra seca. Já há muito tempo, demasiad
tempo, o pensar está fora do seu elemento.
i~
vel chamar de "irracionalismo"
ír
mais facilmente elucidadas numa conversa dir ta. N
nestas condições,
só com muita
culdade o pensar poderá conservar a pluridirn
lidade do âmbito que lhe é pr
no,
1
1111
\ IIIIf
Esta questão nasce da intencão de con-
"""
~~~.
1/11. c-,
se isto ~~
ainda,
I.
li!
si lI)II
[\1'1\ 'I
nhl'ir .sta necessidade.
I I
I I'
novos. E sempre se está
, I"11
I
~t1 a,"
(',
Também
os nomes
"F"
~lSLca" apenas surgem quan-
11111!lI Ir 1\1\I'io h ga ao fim. Na sua gloriosa
11 fi
ti
tI
I
11
p' 11111'111))
li 111 tais titulos. Nem mesmo
111I111111V:IIIl
:10 pensar.
Este termina
11111111111,
( ) ('ll'llH'nIO "aquilo
ao
a partir do,
11 11 I 1111'11dI'
p '115:11'. O elemento
' :1l'1'11111
Ijll
111111111
1'11111':
() pudn. I2lrassum o
( (.'/..A.I ( '~ /;
10
A
I s "-ismos". Mas o mercado da opinião
i\
111I1 I 1 li' mstanternente
'I
As questões levantadas na sua carta poderiam
Mas, sobretudo,
se s au mot
a palavra "Humanismo". Pergunto~me
111
o ato de reconduzir
papel, o pensar sacrifica facilmente a sua mobili a
/J
C C<...o'GO
1 1111111 pr v cam? Não há dúvida de que há muito
pensar ao seu elemento?
~
redonner
1H'II'Ssári . Ou será que não se manifesta,
.\
Será pos
'"
<h
,li 11111110
suficiente, a desgraça que expressões desta
que procura avaliar a na-
tureza e as faculdades do peixe, sobre a sua capacidade
s~
I
asse-
~
Por hoje, gostaria
of.-a.A
CO~
Sofistica e Platão. Julga-se o pensar de acordo com uma
~,
lingüísticas cuidadosas.
ti sta fará também uma luz sobre as outr~as.
de cientificidade. Na interpretação técnica do pensar, o
gica" é a sanção desta interpretação
Mas, por ou-
I escolher apenas uma das suas questões. A análise
siderado uma deficiência que é identificada com a falta
ser é abandonado
im-
tro lado, a forma escrita oferece a salutar coerção para
sofia é perseguida pelo temor de perder em prestígio e
importância
}Ceiaegger
I
II
;.
((
(d,)
I
I (
«(
(f (
I'
r: (
(t-
D
I
I
!t..-'II
~arta
sobre o qumanismo
pensar e o conduz, assim, para a sua essência. Dito de
sem dúvida, pensados,
maneira simples, o pensar é o pensar do ser. O g niti-
da "Metafísica", distinguindo-se
vo tem duplo significado. O pensar é do ser na m dida
significa, a partir de uma determinada
interpretação
em que o pensar, apropriado
do ser - a metafísica - actus e potentia,
distinção que
e manifestado
p t
r,
sob o império da "Lógica" e
da "atualidade";
pertence ao ser. O pensar é, ao mesmo temp , p nsar
é identificada
do ser, na medida em que o pensar,
falo de "força tranqüila do possível", não me refiro ao
ser, escuta o ser. Escutando
pertenc
I
d
nd ,
possibile de uma possibilitas
ss n-
à potentia
o ser e a ele pert n
o ser é aquilo que ele é, conforme
sua origem
com a de existentia
enquanto
e essentia.
isto
Quando
apenas representada,
nem
essentia de um actus da existentia;
cial. O pensar é - isto, quer dizer: o ser encarr g u-
refiro-me ao próprio ser que, pelo seu querer, impera
se, dócil ao destino e por ele dispensado,
ncia
com seu poder sobre o pensar e, desta maneira, sobre
uma
a essência do homem, ou seja, sobre a sua relacão com
da
uma " coisa
."
d o pensar. Encarregar-se dee uma
u d
"pessoa"
qu rer sig-
significa: amá-Ias, querê-tas. Est
nifica, quando pensado mais originariam
nt : d m da
essência. Tal querer é a essência própria d
qual não é apenas capaz de produzir
o ser. Poder algo significa, aqui: guardá-lo na sua essência, conservá-Ío no seu elemento.
Quando
poder, o
isto ou aquilo,
o pensar chega ao fim, na medida em
que sai do seu elemento,
compensa
esta perda valori-
mas é capaz de deixar que algo desdobre o seu ser em
zando-se como 't-EXv'll, como instrumento
sua proveniência,
e, por este motivo, como atividade acadêmica
isto significa que é capaz de fazer-ser.
de formação
e aca-
O poder do querer é a graça pela qual alguma coisa é
bando como atividade cultural. A Filosofia vai trans-
propriamente
formar-se em uma técnica de explicação pelas causas
capaz de ser. Este poder é propriamente
o possível; aquele possível cuja essência repousa
no
últimas. Não se pensa mais; ocupamo-nos
de "Filoso-
É a partir deste querer que o ser é capaz de
fia". Na concorrência
destas ocupações elas então exi-
pensar. Aquele possibilita este. O ser como o que pode
b m-se publicamente
como "ismos", procurando
e quer é o "possível". O ser como o elemento é a "força
s rbrepujar
tranqüila"
t' 'usual. Ele res.ide, e ist~ particularmente
querer.
de poder que quer dizer, isto é, do possí-
vel. Os nossos termos "possível" e "possibilidade"
são,
III
12
a outra. O domínio
I rnos, na singular
uma
destas ex ressões não
nos tem os
1i
al~~U~Z~i;I~,J
'larfa sobre o qumanismo
assim chamada "existência privada" não é, entretanto,
ao ser. Esta relação permanece oculta sob o domínio
ainda o ser-homem essencial e livre. Ela simplesmente
da subjetividade que se apresenta como a opinião pú-
crispa-se numa negação do que é público. Ele man-
blica. Se, todavia, a verdade do ser se tornou digna
tém o chantão dele dependente e alimenta-se apenas
de ser pensada pelo pensar, deve também a reflexão
do recuo diante do que é público. Ele atesta, assim,
sobre a essência da linguagem alcançar um outro nível.
contra sua própria vontade, a sua subjugação à opinião
Ela não pode continuar sendo apenas simples filosofia
.
pública. Ela mesma, porém , é a instauracão e dominação metafisicamente condicionadas - porque se origi-
da linguagem. É somente por isso que "Ser e Tempo"
nando do domínio da subjetividade - da abertura do
da linguagem e toca a simples questão: em que modo
ente, na incondicional objetivação de tudo. Por isso, a
do ser, afinal, a linguagem, enquan,to linguagem, é em
.
.
(§ 34) contém uma indicação para a dimensão essencial
linguagem põe-se ao servico da meditacão das vias de
cada situação? O esvaziamento da linguagem que gras-
comunicação, nas quais se espraia a objetivacão, como
sa, em toda a parte e rapidamente, não corrói apenas a
o acesso uniforme de tudo para todos, com ~de~.
responsabilidade
de qualquer limite. Deste modo, a linguagem cai sob a
palavra. Ela provém de uma ameaça à essência do ho-
ditadura da opinião pública. Esta decide previamente o
mem. Um simples uso cultivado da linguagem não de-
que é compreensível e o que de~e ser d;;prezado
incompreensível.
monstra, ainda, que conseguimos escapar a este perigo
com
i
Aquilo que se diz, em Ser e Tempo (1927) § § 27
estética e moral em qualquer uso da
essencial. Um certo requinte no estilo poderia hoje, ao
contrário, até significar que ainda não vemos o perigo,
e 35, sobre o "a gente" não quer fornecer, de maneira
nem somos capazes de o ver, porque ainda não ousa-
alguma, apenas uma contribuição incideni:al para a So-
mos nunca enfrentar o seu olhar. A decomposição da
ciologia. T ampouco o "a gente" significa apenas a figura
linguagem, atualm!12!.etão fa.1as!ae isto bastante tarde,
oposta, compreendida de modo ético-existencialista, ao
;;'ão é ~ntudo,
ser-em-si-mesmo da pessoa. O que foi dito contém, ao
fato de que a linguagem, sob o domínio da metafísi~a
contrário, indicação, pensada a partir da questão da
moderna da subjetividade, se extravia quase irresistivel--------------------------.
mente do seu elemento. A linguagem recusa-nos ainda
verdade do ser, para o pertencer originário da palavra
14
~~--------------
a razão,
~~'""----'-----
~--_--..
,..
~
mas já uma conse üência do
-
-------
--
15
-
.
<larIa sobre o ijumanismo
a sua essência: isto é, que ela é a casa da verdade do
ser. A linguagem abandona-se,
ao contrário,
real, no sistema de atuação de
causa e efeito. Abordamos
mem? Para onde se dirige "o cuidado", senão no sentido
de reconduzir o homem nova!?ente p~ra a sua essência? .. ..:::;.--
e filosofamos
com expli-
----------~-ue o homem
(homo) se torne humano (b-.Jimgnusl Deste modo então,
-----_.
co~tudo, a humanitas permanece no coracão de um tal
A elas também
pertence o
pensar; pois humanismo
Que outra coisa significa isto, a não ser
o ente como o efetivamente
real, tanto quando calculamos e agimos, como quando
procedemos
o homem
para este apelo, um empenho e urna solicitude pelo ho-
sobre.o.enre. Este próprio ente aparece
como o efetivamente
neste apelo ao homem,
não se esconde nesta tentativa de preparar
ao nosso
puro quZrer e à nossa atividade, como um instrumev.to
de dominação
Não reside, no entanto,
cientificamente
-
r-
cações e fundamentações.
garantir
que algo seja inexplicável.
ções pensamos
Com tais afirma-
estar diante do mistério.
Como
se já
estivesse estabelecido que a verdade do ser se pudesse
fundamentar,
q~u:e=-=o:....:h:.::o:.::m=e.:.:m~s;.e::.:ja=-:.:h::u:.:m~a::.n:.:o::.....:e:....n:.:;:::ã.:::o_d:::.e
~no, isto é, situado fora da sua essência., Entretanto, em
ue consiste a humanidade
de qualquer modo, sobre causas e razões
explicativas, ou, o que dá no mesmo, sobre a impossi-
do hom~m? Ela repousa Q.a
sua essên.,cia...
Mas de onde e como se determina
a essência do
homem? Marx exige que o "homem humano"
bilidade da sua apreensão.
nhecido e reconhecido.
Caso o homem encontre, alguma vez, o caminho
para a proximidade
é isto: meditar e cuidar para
O homem
do ser, então deve antes aprender
a existir no inefável. Terá que reconhecer,
igual, tanto a sedução pela opinião pública, quanto
Ele encontra-o na "sociedade".
"social" é para ele o homem
"natural".
na "sociedade" que a "natureza" do homem,
de maneira
a
seja co-
totalidade das "suas necessidades
reprodução,
naturais"
subsistência
É
isto é, a
(ali me nta-
impotência do que é privado. Antes de falar, o homem
.ão, vestuário,
deve novamente escutar, primeiro, o apelo do ser, sob o
.qüitativarnente
risco de, dócil a este apelo, pouco ou raramente algo que
10 homem, a humanitas do homo, desde o ponto de
restar a dizer. Somente assim será devolvida à palavra o
vista da sua distinção da Deitas. Ele é, sob o ponto de
valor da sua essência e o homem será agraciado com a
vista da história da salvação, ~omem como "filho de
\l.volução da casa para habitar na verdade do ser.
Deus", que, em Cristo, escuta e \esponde
é
assegurada. O cristão vê a humanidade
17
ao apelo do
~~hílvoÚ'LI/~j - kJlJ(
116
econômica)
<larra sobre o humanismo
Pai. O homem não é deste mundo, na medida em que
ra, o assim chamado barbarismo da Escolástica gótica
o "mundo", pensado teórica e platonicamente, é apenas
-Ia Idade Média. Do humanismo,
uma passagem provisória para o Além.
mente, faz sem re parte um studium humanitatis; este
Somente na época da república romana, huma-
,--------
entendo histórica-
,
-- - _.
estudo
maneira, à~Antigiiidade,
- recorre, de uma certa
-----_.---,..-
nitas foi, pela primeira vez, expressamente pensada e
tornando-se assim, em cada caso, também~~~~ci-
visada sob este nome. O homo humanus contrapõe-se
mente da-gr~d.d~~ Isto
ao homo barbarus. O homo humanus é, aqui, o roma-
século XVIII, aqui entre nós sustentado por Winckel-
no que eleva e enobrece a virtus romana através da
mann, Goethe e Schiller. Holderlin, ao contrário,
"incorporação" da l1atÚEta herdada dos Gregos. Estes
faz parte do "humanismo" e isto pelo fato de pensar o
Gregos são os Gregos do helenismo cuja cultura era
destino da essência do homem mas radicalmente do
ensinada nas escolas filosóficas. Ela refere-se a eruditio
que este "humanismo" é capaz.
et institutio in bonas artes. A l1atÚEla assim entendida
é traduzida por humanitas. A romanidade propriamen-
Se,
porém, por humanismo
se entende, de modo
~
--.......
~_.
.
geral, o empenho para que o homem se torne livre para
te dita do homo romanus consiste nesta tal humanitas.
a sua huma~iaade,
Em Roma, encontramos
dade..:.então o humanis;o-distin@~-~t;,
é ~vidente
~~--
o primeiro humanismo.
Ele
no humanismo
-----------
..-.-
para nela encon~
do
não
--=.;~-,
a s~~_digniem cada casç,
permanece, por isso, na sua essência, um fenômeno
s~gundõaConcepção
especificamente romano, que emana do encontro da
do~m.
romanidade com a cultura do helenismo. Assim, a cha-
as vias para a sua realização. O humanismo
mada Renascença dos séculos XIV e XV, na Itália, é
não carece de retorno à Antigüidade, como também
uma renascentia romanitatis. Como o que importa é a
não o humanismo
romanitas, trata-se da humanitas e, por isso, da rratÚEta
em Existencialismo. Neste sentido amplo, em questão,
grega. Mas a grecidade é sempre vista na sua forma
também o Cristianismo é um humanismo,
tardia, sendo esta mesma vista de maneira romana.
em que, segundo a sua doutrina, tudo se ordena à sal-
Também
vação da alma (salus aeterna) do homem, aparecendo
o homo romanus do Renascimento
está em
oposição ao homo barbarus. Todavia, o inumano é, age-
18
da "liberdade" e da "natureza"
Distinguem-se, então, do mesmo modo,
I
de Marx
que Sartre concebe, quando
a história da humanidade
fala
na medida
na moldura da história da
19
"'<:---~
crarfa sobre o qumanismo
salvação. Por mais que se distingam
humanismos
estas espécies de
segundo as suas metas e fundamentos,
I .vantando-se no próprio seio da Metafísica a questão:
a
[ue é Metafísica? De início, questões acerca do "ser" e
maneira e os meios de cada realização, e a forma da sua
s bre a verdade do "ser" podem ser apresentadas
doutrina,
questões "metafísicas".
todas elas coincidem nisto: que a hum~itas
do homo humanus é determinada
a p~tir do ponto de
r
O primeiro
humanismo,
r--.....
~
vista de uma inter retacão fixa da natureza, da história
~
'----.
:>o,
do mundo e do fundamento
----=------
~--
tipos do humanismo
,
do mundo, isto é, do pon-
to de vista do ente na sua totalidade.
(
Todo o humanismo
metafísica. Toda a determinação
de uma tal
da essência do homem
que já pressupõe a interpretação do ente, sem a questão
da verdade do ser, e o faz sabendo
ou não sabendo ,
é Metafísica. Por isso, mostra-se, e isto no tocante ao
modo como é determinada
a essência do homem , o
elemento mais próprio de toda a Metafísica, no fato de
ser "humanística".
manismo
De acordo com isto, qualquer
permanece
humanidade
metafísico. Na determinação
do homem,
o humanismo
huda
não só deixa
de questionar
a relação do ser com o ser humano,
mas
o humanismo
tolhe mesmo esta questão, pelo fato de,
por causa de sua origem metafísica, não a conhecer
II
nem a compreender.
natureza particular
E vice-versn,
a necessidade
pres~n~
..
"
como o'b'"
via a essencia
mais universal
---_._..-..,,-do homem.. O homem é tomado como
animal rationale, Esta determinacão não é apenas a
se funda ou numa Metafísica
ou ele mesmo se postula como fundamento
e todos os
g~e, desde ~p~ão até~
-te ~d
têm .surgi o, pressupõem
>
o romano,
como
I
tradu cão
latina da expressão grega S<POU Â,óyou EXOU,
.
I mas uma interpretação
iessencial
do homem
ci6nada
metafísica. Esta determinação
não é falsa. Mas ela é condi-
pela Metafísica, cuja origem essencial
apêrlãSãs
seus limites s~ tOE~ar~ml contudo,
Temp-;,dignos
questionado
de serem 9uestio~_s.
foi, primeiro,
ao consumo
em S~r e,
O digno de ser
confiado ao pensar como
aquilo que ele deve pensar,
atirado
e nã-;;.
mas de maneira
de uma dissolvente
alguma
compulsão
de dúvida.
A Metafísica representa realmente o ente em seu
ser e pensa assim o ser do ente. Mas ela não pensa a
diferença de ambos (Vide "Sobre a Essência do Funda-
e a
mento", 1929, pág. 8; "Kant e o Problema da Metafísi-
da questão da verdade do ser, es~
ca", 1929, pág. 225, e ainda, "Ser e Tempo", 1927, pág.
. quecida na Metafísica e através dela, só pode vir à luz
20
--
230). A Metafísica não levanta a questão da verdade do
21
<larIa sobre o qumanismo
ser-ele-mesmo. Por isso ela também jamais questiona o
pr ceder-se assim, pode situar-se, desta maneira, o ho-
modo como a essência do homem pertence à verdade
mem, no interior do ente, como um ente entre outros.
do ser. Esta questão até agora não foi levantada pela
enuncia-
Metafísica. Esta questão é inacessível para a Metafísica
dos certos sobre o homem. É preciso, porém, ter bem
enquanto Metafísica. O ser ainda está à espera de que
.lararnente
ele mesmo se torne digno de ser pensado pelo homem.
relegado definitivamente
Seja qua
or a maneira de determinar a ratio do animal
animalitas; é o que acontecerá, mesmo que não seja
e a razão do ser vivo, tendo em mira a determinação
equiparado ao animal e se lhe atribuírmos uma dife-
essencial do homem, quer como "faculdade dos princí-
rença específica. Pensa-se, em princípio, sempre o homo
pios", quer como "faculdade das categorias" ou de outra
animalis, mesmo que anima seja posta como animus
maneira, em toda parte e sempre a essência da razão
sive mens e mesmo que estes, mais tarde, sejam postos
funda-se no fato de que, para toda a percepção do ente
como sujeito, como pessoa, como espírito. Uma tal po-
no seu ser, o ser-em-si-mesmo já se iluminou e acontece
sicão é o modo próprio da Metafisica. Mas com isto a
----~--------~--~~-----
historicamente na sua verdade.
presente que o homem permanece assim
para o âmbito essencial da
essência do homem é minimizada e não é pensada na
Do mesmo modo com animal, ç<po'Ujá se propôs
sua origem. Esta origem essencial permanecerá sempre
uma interpretação da "vida" que repousa necessaria-
a origem essencial para a humanidade historial. ~;:
mente sobre uma interpretação do ente como çoolÍ e
tafísica pensa o homem a partir da animalitas, ela não
<{mole;'em meio à qual se manifesta o ser vivo. Além
pensa em
disto, e antes de mais, resta, enfim, perguntar se a essência do homem como tal, originalmente
- e com
isto decidindo previamente tudo - realmente se funda
I
om isto se poderá afirmar, constantemente,
~
.
ireçao
a sua
umanitas.
;
A metafísica fecha-se à simples noção essencia~~
de que o homem somente desdobra o seu ser n
sua-~--'
essência, enquanto recebe o apelo do s~r. Somente na
já "tem" ele enco~trado
na dimensão da animalitas. Estamos nós no caminho
i~timidade dest;;~~l~
certo para a essência do homem quando distinguimos
aquilo em que mora a sua essência. Somente deste
\I
sempre
o homem, e enquanto o distinguimos como ser vivo,
morar "possui" ele "linguagem" como a habitação que
entre outros, da planta, do animal e de Deus? Pode
preserva o ex-stático para a sua essência. O estar pos-
22
23
,
'larta sobre o humanismo
tado na clareira do ser é o que eu chamo a ex-sistência
:rn nal, deixar tombar tudo de volta na vivência da vida,
do homem. Este modo de ser só é próprio do homem.
n lmoestando-se ainda, com ilusória segurança, que o
A ex-sistência assim entendida não é apenas o funda-
pensar destrói, pelos seus conceitos rígidos, o fluxo
mento da possibilidade da razão, ratio, mas é aquilo
Ia vida e que o pensar do ser deforma a existência.
em que a essência do homem conserva a origem de
fato de a Filosofia e a química fisiológica poderem
sua determinação.
examinar
A ex-sistência somente se pode dizer da essência
r
O
homem como organismo, sob o ponto de
vista dãsCiências
a
atureza, não é
nesteeIem~t~
rova_de Que
-~
no d e "ser;". pois, apenas o h ornem, ao menos tanto
"orgânico", isto é, de que no corpo ex- ~
_ •... . - - -- ~
..., .••.. - plicado cientificamente resida a essência do ho~I11..._
quanto sabemos, nos limites da nossa experiência, está
Isto vale tampouco como a opiciã;-de
iniciado no destino da ex-sistência. É por isso que a
atômica, esteja encerrada a essência da natureza. Pois,
ex-sistência nunca poderá ser pensada como uma ma-
poderia mesmo acontecer que a natureza escondesse
neira específica de ser entre outras espécies de seres
precisamente a sua essência, naquela face que oferece
vivos; isto naturalmente supondo que o homem foi as-
ao domínio técnico do homem. Como a essência do
sim disposto, o que deve pensar a essência do seu ser
homem não consiste em ser um organismo animal,
e não apenas elaborar relatórios sobre a natureza e a
assim também não se pode eliminar e compensar esta
história da sua constituição e das suas atividades. Desta
insuficiente determinação da essência do homem, ins-
maneira, funda-se na essência da ex-sistência também
trumentando-o com uma alma imortal ou com as facul-
aquilo que atribuímos ao homem, mediante a compa-
dades racionais, ou com o caráter de pessoa. Em cada
ração com o "animal". O cor o do homem é algo de-
caso, passa-se por alto a essência, e isto em ~
essencialmente diferente de um organismo animal. O
mesmo prqjeto metafisiço.
do homem, isto é, somente a partir do modo huma-
~
___
--
.-----
que, na energia
~
.-
d'rro do biologismo não está supera-o quan o se j~-nta
~quilo que o homem é, o que na linguagem tra-
ao elemento corporal do homem a alma e à alma o
dicional da Metafísica se chama a "essência" do ho-
espírito e ao espírito o aspecto existencial, pregando
mem, reside na sua ex-sistência. Mas a ex-sistência, as-
ainda alto como até agora o apreço pelo espírito, para,
sim pensada, não é idêntica ao conceito tradicional do
24
.25
~'
crarta sobre o qumanismo
existentia,
que significa realidade efetiva, na diferença
(~v rdade que ainda fica aberta a questão se através do
com a essentia enquanto possibilidade. Em Ser e Tempo
tVI'ITIO
(pág. 42), encontra-se a frase grifada: "A essência do
'I 'nas à primeira vista, como realidade efetiva, já é
ser-aí reside na sua existência".
P insado com suficiente exatidão o ser da pedra ou
Aqui não se trata de
uma contraposição de existentia e essentia, porque, de
111
"exístentíu",
em suas interpretações,
diferentes
smo a vida como ser da flora e da fauna. Em todo
maneira alguma, ainda estão em questão estas duas
'ns , os seres vivos são como são, sem que, a partir do
determinações
, 'LI
metafísicas do ser, nem se fale então da
sua relação. A frase contém, ainda muito menos, uma
ser como tal, estejam postados na verdade do ser,
Ifl.l(udando numa tal postura o desdobramento
afirmação geral sobre a existência (dasein), na medida
ial do seu ser. Provavelmente,
essen-
causa-nos a máxima
em que esta designação surgiu, no século XVIII, para
dificuldade, entre todos os entes que são, pensar o
a palavra "objeto" deveria expressar o conceito metafí-
li
sico de realidade efetiva do real. Ao contrário, a frase
r .ntesco mais próximo, estando, contudo,
diz: O homem desdobra-se assim no seu ser (west) que
Indo, ao mesmo tempo, separado por um abismo da
ele é o "aí", isto é, a clareira do ser. Este "ser" do aí, e
nossa essência ex-sistente. Em comparação
somente ele, possui o traço fundamental
da ex-sistên-
n s parecer que a essên~ia do divino nos é mais próxi-
cia, isto é, significa o traço fundamental
da in-sistên-
ma, como o elemento estranho do ser vivo; próxima,
cia ex-sratíca na verdade do ser. A essência ex-srática
quero dizer, numa distância essencial, que, enquanto
r vivo, porque, por um lado possui conosco o papor outro
~--------~----,--pode até
do homem reside na sua ex-sistência, que permanece
listância, contudo, é mais familiar para a nossa essên-
distinta da existentia
.ia ex-sistente que o abissal parentesco corporal com
compreendida
pensada metafisicamente.
Esta é
pela Filosofia Medieval como actuali-
o animal, quase inesgotável para o nosso pensamento.
tas. Kant representa a existentia como a realidade efe-
Tais considerações
tiva no sentido da objetividade da experiência. Hegel
determinação corrente e, por isso, sempre provisória e
determina
apressada, do homem como animal rationale.
a existentia
como a idéia que se sabe a si
lançam uma estranha luz sobre a
Porque
-
-'-
mesma, a idéia da subjetividade absoluta. Nietzsche
as plantas e os animais estão mergulhados,
concebe a existentia como o eterno retorno do mesmo.
.no seio de seu ambiente próprio, mas nunca estão in-
'--~"""-
---_
cada qual
•....
~----------------------------------
26
27
crarta sobre o qumanismo
c---é mundo
-,""'"
__-por isso, falta-Ihes a lingu;g~m. E n~
seridos livremente na clareira do ser - e só esta clareira
11
11
-,
porque lhes falta a linguagem estão eles s~sos
sem
mundo no seu ambiente. Mas nesta palavra "ambiente"
concentra-se toda a dimensão enigmática do ser vivo.
Na sua essência, a linguagem não é nem exteriorização
de um organismo nem expressão de um ser vivo. Por
-nt ,quer perguntemos pelo que é o homem, quer
tllIlII
111 I f \ 1I temos quem é o homem. Pois no quem? e no
no, e talvez nem mesmo a partir do seu valor de significação. Linguagem é advento iluminador-velador
-
~
do
r--
~a,
IIII
'I" da
11"1
)
com a existentia.
~
-
Ex-sistência si nifica sob o
<:
ontc: de
ncia" não se determina, nem a partir do esse essen-
I IIC,
I
nt
\ I \'
I
da idéia. E~istência
nomeia a-º,e.terminacão da uilo
o homem é no destino da verdade. Existentia
per-
manece o nome para a efetivação daquilo que uma coisa é, enquanto se manifesta na sua idéia. A frase:
nta o ser-aí, enquanto toma sob o seu
é real ou não, mas responde à questão da "essência" d'o
levantar esta questão inadequa-'
28
id d
11
CUl
a o
11
enquanto clareira do ser. Mas o ser-aí mesmo é
Ilquanto "[ogado''. Desdobra o seu ser no lance do ser
lispensa o destino e a ele torna dócil.
A suprema confusão seria, se se quisesse explicar
1\\1'
1\
[ra e sobre a essência ex-sistente do homem, como se
Ii IHSC uma transposição secularizada de um pensamento
r-xpresso pela teologia cristã sobre Deus (Deus est suum
I'.~$ '),
para aplicá-Ío ao homem; a ex-sistência não é nem
\ 111)':t
realização efetiva de uma essência, nem causa e
110
homem ex-siste", não responde à pergunta se o homem
homem. Costumamos
em a partir do esse existentíae, mas a partir do eleex-státíco do ser-aí. Como ex-sistente, o homem
(existence) quer, ao contrário, dizer actuaUt'as,
realidade efetiva, em oposição com a pura possibilid~de
"Wesen" entre aspas. Isto significa que agora a
II
,,-,-~,----------..;.::.
Existentia
~
11ldllvl",:t
=--...,
vista do seu conteúdo, estar exposto na verdade do ser.
e--
que possui caráter objetivo. Com cautela se escre-
I1 111
ao conteúdo, nem quanto ~a,
ex-sistência ontológico-historial, e não menos
por isso, na frase citada em Ser e Tempo (pág. 42) a
I
pensada extaticamente, não coin-
c~uanto
possui caráter de objeto. Mas o elemento pesso-
ti íulha e obstrui, ao mesmo tempo, o desdobramento
111
próprio ser.
temos em vista algo que possui caráter de pessoa
1111 \lU
isso, ela também não pode ser pensada em harmonia
com a sua essência, nem a partir do seu valor de sig-
Jú
111111
por si mesma o que é essencial (EssentíeHe). Se se compr cende o projeto nomeado em Ser e Tempo como um
I ór que representa, então ele será como que a produII
ll
29
<rarfa sobre o humanismo
ção da subjetividade
:\ que, desde Platão, diz: a essentia precede a
e não se dá como a "compreensão
mundo"; unicamente
a relação ex-stática
II
pode ser pensada, a saber, como
com a clareira do ser. A tarefa de
repetir e acompanhar,
de maneira adequada e suficien-
te, este outro pensar que abandona
a subjetividade
foi,
meira Parte, Tempo e Ser (Víde Ser e Tempo, pág. 39). É
aqui que tudo se torna confuso. A seção problemática
foi retida, porque o dizer suficiente desta reviravolta fracassou e não teve sucesso com o auxílio da linguagem
da Metafísica. A conferência intitulada
da verdade, pensada e pronunciada
Sobre a essência
em 1930, mas ape-
nas impressa em 1943, oferece uma certa perspectiva
sobre o pensamento
da reviravolta de Ser e Tempo para
Tempo e Ser. Esta reviravolta não é uma modificação do
ponto de vista de Ser e Tempo; mas nesta reviravolta o
pensar ousado alcança a região dimensional
qual Ser e Tempo foram compreendidos
compreendidos
esquecimento
a partir da
e, na verdade,
a partir da experiência fundamental
do
do ser.
Sartre, pelo contrário, exprime assim o princípio
do existencialismo:
a existência precede a essência. Ele
toma, ao dizer isto, existentia e essentia na acepção da
30
\,'
II
I\.
,1
1111
Mas a inver-
lima frase metafisica permanece uma frase meta~
m esta frase, permanece ele com a Metafisica,
I-
cimento da verdade do ser. Pois, ainda que a
I' \ h ofia determine a relação de essentia e existentia, no
Illil\
sem dúvida, dificultada pelo fato de, na publicação de
Ser e Tempo, eu haver retido a Terceira Seção da Pri-
artre inverte esta proposição.
11'111 1ft.
do ser", no âmbito da "analítica existencial" do "ser-no-
das controvérsias da ldade Média ou no senti-
I, Leibniz; de outro modo, antes de tudo isto, resta
I1II
II )Iltudo,
perguntar,
a partir de que destino do ser esta
11 ,I ínção no ser de esse essentiae e esse existentiae chega
1'1'
I\I
pensada.
Permanece
desafiando
itivo por que o questionamento
o pensamento
o
deste destino do ser
n linca foi levantado e por que esta questão não podia
" 'r pensada. Ou é esta situação da distinção da essentia
, existentia um sinal do esquecimento
do ser? Podemos
, njeturar que este destino não reside numa simples
omissão do pensar humano
e muito menos numa me-
nor capacidade do pensamento
dos primórdios
do Oci-
dente. A distinção entre essentia (quididade) e existentia
(atualidade) perpassa o destino da história ocidental e
da história determinada pela Europa.
A frase principal de Sartre sobre a precedência da
existência sobre a essentia justifica, entretanto,
"Existencialismo"
como um título adequado
o termo
para esta
filosofia. Mas a frase capital do "Existencialismo"
31
não
<larfa sobre o qumanismo
tem o mínimo
de comum com aquela frase em Ser e
Tempo; sem levar em consideração
nem se podia ainda pronunciar
que em Ser e Tempo
um juízo sobre a rela-
ção de essentia e existentia pois trata-se, ali, de preparar
algo precursor.
Pelo que dissemos, isto ainda se apre-
senta de um modo bastante desajeitado. Talvez o que
ainda resta para dizer possa, eventualmente,
transfor-
mar-se num estímulo para levar a essência do homem a
I
hlsr rialmente,
111
I' ", ru
'I'
I
I ,
I
11 ,
",I"
111
1
de .ououx,
a tradição encobridora
ue nomeia a presença do que se apresenta
na maioria 'das vezes, através ele uma enigrnáti-
nmbígüídade, visa à própria coisa que se apresenta.
I
p'5
I
armos o nome metafisico
, utilizada em Ser e Tempo,
nruição fenomenológica"
-nt
"substância",
nesta
de acordo com a
aí realizada, já se tinha em
(pág. 25) então a proposição
"A 'substância'
do
o modo como o homem
se
atentar, com o pensar, para a dimensão da verdade do
1IIIm m é a ex-sistência'':
ser que o perpassa com o seu domínio.
1Ip" 'senta em sua própria essência ao ser é a ex-stática
Todavia, tarn-
bérn isto só poderia acontecer a favor da dignidade do
In-sistência
ser e em benefício do ser-aí, que o homem, ex-sistindo,
Iiu manísticas do homem como animal rationale, como
sustenta, e não por causa do homem, para que através
", ssoa", como ser espiritual-anírnico-corporal,
da sua obra se afirmem a civilização e a cultura.
Para que nós, contemporâneos,
gir, entretanto,
a dimensão
na verdade elo homem,
as interpretações
não são
I, laradas falsas nem são rejeitadas. Ao contrário, o
possamos
atin-
da verdade do ser a fim
único pensamento
que se quer impor é o de que as
mais altas determinacões
humanísticas
da essência do
de poder rnedíra-ln, deveremos, primeiro, tornar desde
homem ainda não experimentam
já bem claro como o ser se dirige ao homem e como
mente dita do homem.
o requisita. Tal experiência essencial nos será dada se
Ser e Tempo,
compreendermos
ção não significa que um tal pensar se oriente para o
que o homem
Digamo~lo, primeiro,
é enquanto
ex-sisre.
na linguagem da tradicão
.
, onde
Neste sentido,
é contra o humanismo.
lado oposto do humano - defendendo
isto quer dizer: a existência do homem é a sua substân-
desumanidade
cia. Por isso, aparece repetidas vezes a frase em Ser e
Pensa-se contra o humanismo
Tempo: "A 'substância
a humanitas
do homem' é a existência" (págs.
117, 212 e 314). Mas a substância é, pensada ontoló.
a dignidade
propria-
o pensar,
em
Mas esta oposio inumano
- ou degrade a dignidade
ea
do homem.
porque ele não instaura
do homem numa posição suficientemente
alta. É claro que a sublimidade
32
da essência do homem
33
---
--
--
--
------------------
crarfa sobre o humcnísmo
não repousa no fato de ele ser a substância do ente
próximo. E, contudo, a proximidade permanece, para o
como seu "sujeito", para, na qualidade de potentado do
homem, a mais distante. O homem atérn-se primeiro e
ser, deixar diluir-se na tão decantada "objetividade", a
para sempre apenas ao ente. Quando, porém, o pensar
entidade do ente.
r 'I resenta o ente enquanto ente, refere-se, certamente,
Pelo contrário, o homem é "atirado" pelo próprio
ser na verdade do ser, para que, ex-sistindo, desta ma-
110
ser; todavia, pensa, constantemente,
apenas o ente
como tal e precisamente não e jamais o ser como tal. A
neira, guarde a verdade do ser para que na luz do ser o
11
ente se manifeste como o ente que efetivamente é. Se e
Â
como o ente aparece, se e como o Deus e os deuses, a
(illaciosaexpressão: a pergunta acerca do ser. A Filosofia
história e a natureza penetram na clareira do ser, como
s gue, como em Descartes e Kant, também ali onde ela
se apresentam
e ausentam, não decide o homem. O
se torna "crítica", constantemente na esteira da represen-
advento do ente repousa no destino do ser. Para o ho-
(ação metafisica. Ela pensa, partindo do ente e para ele
mem, porém, permanece a questão de saber se ele acha
s dirigindo, na passagem pela mediação de um olhar
a conveniência adequada àsua essência, que correspon-
1
ara o ser. Pois na luz do ser está situado cada ponto de
de a este destino, pois, de acordo com ele, o homem é o
1
artida do ente e cada retorno a ele.
pastor do ser. É somente nesta direção que Ser e Tempo
pensa quando é experimentada
a existência ex-srática
como "o cuidado" (§ 44a, págs. 226 e segs.).
luestão do ser" permanece sempre a questão do ente.
questão do ser não é ainda aquilo que designa esta
A Metafísica, porém, somente conhece a clareira
\0 ser ou desde o olhar que nos lança aquilo que se
apresenta no "aspecto" tOEU ou criticamente, como o
Mas o ser - o que é o ser? Ser é o que é mesmo.
objeto da perspectiva de representação categorial por
Experimentar isto e dizê-lo é a aprendizagem pela qual
parte da subjetividade. Isto significa: a verdade do ser
deve passar o pensar futuro - não é Deus nem um fun-
como a clareira em si mesma permanece oculta para
damento do mundo. O ser é mais longínquo que qual.
a Metafísica. Este ocultar, porém, não é uma lacuna
quer ente e está mais próximo do homem que qualquer
da Metafísica, mas o tesouro da riqueza a ela mesma
ente, seja este uma rocha, um animal, uma obra de arte,
recusado e ao mesmo tempo apresentado.
uma máquina, seja um anjo de Deus. O ser é o mais
em si, porém, é o ser. Somente ela garante, no seio do
34
35
A clareira
crarfa sobre? o humanismo
destino ontológico da Metafísica, a perspectiva a partir
da qual as coisas que se apresentam
afetam o homem
que lhes vem ao encontro: desta maneira, o próprio ho-
,I,\ da
I
atrai a visão para si e a ela se entrega quando o perceber
se transforma
no propor-diante-de-si,
cogitans como subjectum
Supondo
simploriamente:
na perceptio da res
da certitudo.
que em si nos seja dado questionar
como se comporta,
tão
então, o ser em
relação à ex-sistência? O ser é a relação, na medida em
que retém, junto a si, a ex-sistência na sua essência
existencial, isto é, ex-stática e a recolhe junto a si, como
o lugar da verdade do ser, no seio do ente. Pelo fato de
Ili \1\1)
to o homem o sustenta ex-staticamente,
isto é, assume
com cuidado, ele desconhece primeiro o mais próximo
e atem-se ao que vem depois deste. Ele pensa até que
isto é o mais próximo. Contudo,
mais próximo que o
próximo e, ao mesmo tempo, mais remoto que o mais
longínquo
para o pensamento
corrente, é esta proximi-
ularizado, mas nomeia uma relação essencial do hoIII In
m o ser, no seio do ser referenciado à essência
"
,,, \ he mem. Portanto, as expressões preparatonas
11
au-
I 1111
idade" e "inautenticidade",
usadas como prelúdio,
I I li 1
significam uma distinção
moral-existencial,
\I
nem
mtr pológica", mas a relação "ex-stática" do ser huma-
m a verdade do ser que é a primeira a ter que ser
I \I \
li -nsada porque até agora oculta para a Filosofia. Mas
relação é como é não em razão da ex-sistência, mas
(i\
I 'S
ência da ex-sistência é existencial-ex-staticamente
a
IHI rtir da essência da verdade do ser.
A única coisa que o pensar que, pela primeira vez,
pr
ura expressar-se em Ser e Tempo gostaria de alcan-
\I\\'
'
algo simples. Como talo ser permanece misterio-
nrnente como a singela proximidade de um imperador
[u não se impõe à força. Esta proximidade
• 'LI
desdobra o
ser como a própria linguagem. Mas a linguagem não
~,npenas linguagem, no sentido em que a concebemos,
quando
muito, como a unidade de fonema (grafema),
m lodia e ritmo e significação (sentido). Pensamos fo-
dade a verdade do ser.
O esquecimento
sob o
de vista da "filosofia moral" e ao mesmo tempo
o homem como ex-sistente vir a postar-se nesta relação
que é a forma como o próprio ser se destina, enquan-
em Ser e Tempo. A palavra
u : ' refere a uma queda do homem, entendida
1\
mem pode apenas perceber o seu 8tydu na percepção
uosiu, (Aristóteles, Met. 8, 10); somente a perspectiva
"decaída" nomeada
da verdade do ser, em favor da
agressão do ente impensado
36
na sua essência, é o sen-
I)
'ma e grafema como o corpo da palavra, melodia e rir-
mo como a alma e o que possui significação adequada,
37
<larIa sobre o humanismo
II I (I,
a linguagem a partir da correspondência à essência do
d dobra o seu ser no elemento dimensional que é a
homem, na medida em que esta é representada como
animal rationale, isto é, como a unidade do corpo-alma,
I" ('Iprj(l maneira de o ser ser.
pensar é atento a estas simples relações. Para
espírito. Todavia, assim como na humanitas do homo
I
animalis, a ex-sistência permanece oculta e, através dela,
, I Il\
a relação da verdade do ser com o homem assim en-
111
cobre a interpretação metafísico-animal da linguagem a
1111' ainda importa uma expressão como tal - deixa
sua essência ontológica historicaL De acordo com ela,
I,· I rocura ele a palavra adequada no seio da língua-
I
tradicional da Metatlsica e da Gramática, que vem
I nge. É problemático se um tal pensar - supondo
n Ia denominar-se humanismo. Certamente que não,
a linguagem é a casa do ser manifestada e apropriada
\ nquanto o humanismo
pelo ser e por ele disposta.
que não, se for Existencialismo e defender a frase que
Por isso, trata-se de pensar a essência da linguagem a partir da correspondência
correspondência,
ao ser enquanto
ou seja, como habitacão da essência
já é metafísico. Certamente
'artre exprime: Précisément nous sommes sur um plan ou
iL y a seulement des hommes (L'Existencialisme est um Humanisme, pág. 36). Em vez disso, pensando a partir de
Ser e Tempo, deveria dizer-se. Précisément nous sommes
do homem.
O homem, porém, não é apenas um ser vivo,
sur um plan ou il y a principalment L'Être. Mas de onde
pois, ao lado de outras faculdades, também possui a
vem o que é le plan? L'Être et le plan são o mesmo. Em
linguagem. Ao contrário, a linguagem é a casa do ser;
Ser e Tempo, vem dito intencionalmente e com cuidado
nela morando, o homem ex-siste enquanto pertence à
(pág. 212): il y a l'Être: "dá-se". O il y a traduz o lidá,
verdade do ser, protegendo-a.
se" de modo impreciso. Pois o "se" que aqui "dá" é o
Assim, o que importa na determinação da huma-
próprio ser. O "dá", contudo, nomeia aquilo que dá,
nidade do homem enquanto ex-sistência é que o ho-
a essência do ser que garante a sua verdade. O dar-se
mem não é o essencial, mas o ser enquanto dimensão
davia, não é o conhecido elemento espaciaL Ao con-
claramente, com ele mesmo, é o próprio ser.
lido li
Emprega-se, ao mesmo tempo, o a-se para, proll
visoriamente, evitar a expressão: 110 ser é ; pois comu-
38
39
do elemento ex-stático da ex-sistência. A dimensão, to'
--------
tudo o que é espacial e todo o espaço de tempo
como o espírito da linguagem. Pensamos comumente
--
--
-
-
-------
mente diz-se "é" das coisas que são. Estas nós as 'desig-
I \I[n
namos .de ente.Ma~ .oser justamente não "é 'o 'ente".
I
Se "é" vem dito sem maíorexplícitação
I! '11S~, penetrando na verdade do ser" é, enquanto pen-
do ser então o
história se' manifesta na linguagem pela palavra
h), [ ensadores
ser é representado com demasiada facilidade como um
1\1',
essenciais. É por isso que o pensar que
historial. Não existe um pensar "sistemático" e, ao
"ente", ao modo do 'ente conhecido, que opera como
IlId ), para ilustração, uma história das opiniões passa-
causa, e é operado como efeito. Contudo,
já Parmêni-
ilns. Mas também não existe, como pensa Heger, uma
des afirma nos primórdios do pensamento: E'tcrt 'Dyáp
ist mática que fosse capaz de fazer da lei de seu pensar
E'lu<Xt É o saber, o "sei". Nesta palavra esconde-se o
lima
mistério originário para todo o pensar. Talvez o "é" só
t
possa ser dito, de maneira adequada, apenas do ser,
radicalmente, a história do ser à qual o pensar, como
de maneira tal .que todo ente jamais propriamente
"é".
memorial desta história, pertence, acontecendo através
Mas como o pensamento ainda deve atingir a dimensão
Ia posterior recordação da história, no sentido do que
em que dirá o ser na sua verdade, em vez de explicá-lo
teve lugar no passado. A história não acontece primeiro
como um ente a partir do ente, deve ficar aberta para a
como evento. E este não é um simples passar; O evento
solicitude do pensar a questão se, e como o ser é.
da história desdobra-se em ser como o destino da ver-
O EO'n'D yáp Etuoa de Parmênides permanece
lei da história e que pudesse sobressair ao mesmo
mpo, a esta, no sistema, Existe, se pensarmos mais
dade do ser" a partir dele (Vide Conferência
sobre o Hino
ainda hoje impensado. Por aí se pode medir como se
de Hotclerlin "Como um dia de festa. ..", 1941, pág. 31).
dá o progresso da Filosofia. Ela não progride de for-
Ao destino chega o ser, na medida em que ele, o ser, se
ma alguma se respeitar a sua essência. Ela marca passo
dá. Mas isto significa, quando pensado em conformi-
para pensar sempre o mesmo. O progredir, a saber, afas-
dade ao destino: ele dá-se e recusa-se simultaneamen-
tar-se deste lugar, é um erro que segue o pensar como a
te. Entretanto,
sombra que ele mesmo projeta. Porque o ser está ainda
como desenvolvimento, do, "espírito", não é destituída
impensado, diz-se também, em Ser e Tempo, do ser: "dá-
de verdade. Ela, porém, também. não é, em parte certa
se". Sobre este il y a não se pode especular sem mais e
e em parte falsa. Ela é tão verdadeira como é verdadei-ra
sem apoio. Este "dá-se" impera como o destino do ser,
a Mietafísica que, pela primeira: vez, em Hegel, traz à
40
411
a determinação hegeliana de história,
<rarfa sobre o humanismo
linguagem a sua essência pensada de modo absoluto
no sistema. A Metafísica absoluta faz parte - com suas
inversões, através de Marx e Nietzsche - da história da
verdade do ser. O que dela provém não se deixa atingir
nem afastar por refutações. Somente se deixa assumir
na medida em que se recolhe sua verdade, mais radicalmente no ser mesmo, retirando-a da esfera de uma
opinião apenas humana. Néscia é toda a refutação no
campo do pensar essencial. A disputa entre pensadores
é a "disputa amorosa" da mesma questão. Ela auxilia-os
alternadamente a penetrar na simples participação no
mesmo, a partir do qual eles encontram a docilidade
no destino do ser.
Supondo que o homem, no futuro, seja capaz de
pensar a verdade do ser, então ele pensará a partir da
ex-sistência. Ex-sistindo está ele postado no destino do
ser. A ex-sistência do homem é, enquanto ex-sistência
historial, mas não é um primeiro lugar e apenas pelo
fato de, no decurso do tempo, muitas coisas acontecerem com o homem e as coisas humanas. Pelo fato de se
tratar de pensar a ex-sistência do ser-aí, por isso o pensar, em Ser e Tempo, está tão fundamente interessado
em que seja experimentada a historicidade do ser-aí.
Não se diz, porém, em Ser e Tempo (pág. 212),
onde se fala do "dá-se". "Somente enquanto é ser-aí,
42
,li
I'
q \I
\ 1\ I
III
ser"? Sem dúvida. Isto significa: somente ense manifesta a clareira do ser este se transmite
homem. Mas o fato de aí, a clareira enquanto a
,d,lde do próprio ser, acontecer e manifestar-se, é a
I
1l'o.tinaçãodo próprio ser. Este é o destino da clareira
tIIHlicionalda existentia e no sentido moderno como a
II
i1\idadeefetiva do ego cogito, é aquele ente através do
qual o ser é primeiramente criado. A frase não afirma
que o ser é um produto do homem. Na Introdução a
S'r e Tempo (pág. 38) está escrita de maneira simples e
-lara e até em grifo: "Ser é transcendente como tal". As-
sim como a abertura da proximidade espacial ultrapassa qualquer coisa próxima ou distante, quando vista
a partir desta, assim o ser é fundamentalmente
mais
amplo que todo o ente, porque é a própria clareira.
Neste caso, ainda se pensa de acordo com o ponto de
partida inicialmente inevitável, situado na Metafísica
ainda dominante,
o ser a partir do ente. Somente a
partir de tal perspectiva o ser se mostra num ultrapassar e como este mesmo.
A determinação introdutória "Ser é o transcendente como tal" reúne, numa simples frase, a maneira
como até agora a essência do ser se manifesta ao homem. Esta determinação retrospectiva da essência do
ser permanece incontornável para o ponto de partida
43
(l.arfa sobre o humanismo
antecipador
da questão .da verdade do ser. Longe dele
está a presunção de querer começar tudo desde o início
e declarar falsa toda a filosofia anterior. Para um pensar
que procura pensar a verdade do ser, a única questão
que permanece é se a determinação
plesmente transcendente
do ser como o sim-
já nomeia a simples essência
da verdade do ser. Por isso, também se diz na página
230 que somente a partir do 11 sentido" , isto é, a partir
da verdade do ser, se pode compreender
como o s.er
é. O ser manifesta-se ao homem no projeto ex-stático,
mas este projeto não instaura o ser.
E, além disto, o projeto é essencialmente
projeto
jogado. Aquele
o homem,
um
que joga no projetar
mas o próprio
ser que destina
não é
o homem
para a ex-sistência do ser-aí como sua essência.
destino
Este
acontece como a clareira do ser, forma sob
a qual o destino é. Ela garante a proximidade
na clareira do "aí", mora o ho-
Nesta proximidade,
mem como o ex-sistente,
de experimentar
ao ser.
sem que já hoje seja capaz
propriamente
este morar e assumi-lo.
imíd a de IIde ser, modo como o "aí" do ser-aí é
A proxrrm
pensado - na conferência sobre a elegia de Hõlderlin
I' 11\ ir
I
Ia
experiência
do esquecimento
I' 11 I
1'[\
11 I I
'om acento patriótico,
t
I
I ,
Ir
110
li'
é pensada aqui numa acepção mais .originária,
nem nacionalista,
mas de
I ) com a história do ser. Mas a essência da pátria
mesmo tempo, nomeada com a intenção de pen-
n apatridade
\t'l\'in
do ser. Esta
do homem
moderno
a partir da his-
do ser. O último a experimentar
esta apatridade
I li Nietzsche. Ele não foi capaz de encontrar,
no seio
\Ia Metafísica, outra saída que não fosse a inversão da
M tafísica. Mas isto é a consumação
T davia, Holderlin
HO",
preocupa-se,
da perplexidade,
ao compor
para que os seus "contemporâneos"
o lugar do seu desdobramento
o "R etor-
reencontrem
essencial. Isto ele não o
procura, de maneira alguma, no egoísmo de seu povo.
Ele o vê, ao contrário, a partir da condição de eles fazerem parte do Ocidente.
Mas Ocidente não é pensado
regional e geograficamente,
opõe ao oriental, também
enquanto
o ocidental
se
não é pensado como a Eu-
ropa, mas na perspectiva da história universal a partir
da proximidade
com a origem, Nós praticamente
da não comecamos
a pensar as misteriosas
ain-
relações
11
"Retorno" (1943) a partir de Ser e Tempo - éa partir da
com o Oriente,
Holderlin
que assomaram
(Vide "O Jster" e "A Peregrinação",
e.segs.). O "alemão
ll
poesia do Poeta que-esta proximidade
do ser é percebi-
da numa linguagem mais radical e nomeada
a "pátria"
à palavra na poesia de
não é proclamado
9
3 estrofe
ao mundo para
que este se restabeleça no modo de ser alemão, mas
45
<larfa sobre o humcnismo
é dito para os alemães, para que eles, em verdadeiro
universalismo,
mundo
se tornem participantes da história do
(Sobre a poesia de Hõlderlin,
Tübinger Gedenkschrift,
"Lembrança".
1943, pág. 322). A pátria
deste habitar historial é a proximidade do ser.
É nesta proximidade que se realiza - caso isto um
dia aconteça - a decisão se e como o Deus e os deuses
IlIdl evitar de ter o ser na representação, também o ser
I
I Ii 'ado apenas como o "mais geral" e, portanto, o
pll
.ngloba o ente ou como criação do ente infinito, ou
I I\d(\, como produção de um sujeito finito. Ao mesmo
11111\
,"o ser", desde a Antiguidade, situa-se em lugar
"1111
nte", e vice-versa, este em lugar daquele; ambos
IIIIlssados numa estranha e não refletida confusão.
O ser enquanto destino que destina verdade per-
se recusam e a noite permanece, se e como amanhece
o dia sagrado, se e como, no surgimento do sagrado,
pode recomeçar uma manifestação de Deus e dos deuses. O sagrado, porém, que é apenas o espaço essencial
para a deidade -, o qual, por sua vez, apenas garante
uma dimensão para os deuses e o Deus -, manifesta-se
somente, então, em seu brilho, quando antes e após a
longa preparação, o próprio ser se iluminou e foi experimentando em sua verdade. Só assim começa, a partir
do ser, a superação da apatridade, na qual erram perdidos, não apenas os homens, mas também a essência
\\ll I oesia, sem que ainda se torne manifesto como a
história do ser. O pensamento de caráter universal de
"Le b
'"
\ \()lderlin, que se expressa no poema
m rança, e
I or isso mais essencialmente radical e, por isso, mais
tecipador que o puro cosmopolitismo
ill
de Goethe.
Pela mesma razão, a relação de Holderlin com a grecilade é essencialmente diferente que não o humanismo.
Por isso, os jovens alemães que sabiam de Holderlin,
I ensaram e viveram bem outra coisa em face da morte,
do que aquilo que a opinião pública apresentava como
do homem.
A apatridade que assim deve ser pensada reside
no abandono
I\)l\ncce oculto. Mas o destino do mundo anuncia-se
antológico do ente. Ela é o sinal do es-
quecimento do ser. Em conseqüência dela, a verdade
do ser permanece impensada. O esquecimento do ser
manifesta-se indiretamente no fato de o homem sempre considerar e trabalhar só o ente. E como nisto não
sendo a opinião alemã.
A apatricidade torna-se um destino do mundo.
É por isto que se torna necessário pensar este destino
sob o ponto de vista ontológico-historial. O que Marx,
a partir de Hegel, reconheceu, num sentido essencial e
significativo, como alienação do homem, alcança, com
47
46
-----
---------------~-=-=-==-----~----------~~
Garfa sobre o humanismo'
III
suas raizes, até a apatricidade do homem: moderno.
11,,11\
Esta alienação é provocada e isto, a partir do destino
do ser, na forma de Metafísica, é por ela consolidada
1I
e ao mesmo tempo por ela mesma encoberta, como
homem experimentado como subjetividade.
I lli
In
1\ \
n j 'obre esta, não há dúvida, muito se-escre-
1
Il
outro tipo de historiografia. M-asporque nem Husserl,
I j I I,
nem, quanto eu saiba até agora, Sartre reconhecem
I
a gente se liberte das representações
ingênuas sobre
o materialismo e das refutações mesquinhas
tendem
que pre-
atingi-lo. A essência do materialismo
não
consiste na afirmação de que tudo apenas é matéria;
ela consiste, ao contrário,
numa determinação
me,
tafísica, segundo a qual' todo o ente aparece corno a
matéria de um trabalho. A essência moderna e a me,
tafísica do trabalho foram antecipadas no pensamento da Fenomenología
dó Espírito,
de Hegel, como o
processo que a si mesmo se instaura, da produção. in-
48-
I
mas ela origina,se ontológico.historicalmen,
I I"
I
o ente manifesto. Enquanto uma forma da
I ,a técnica funda-se na história da Metafísica.
I
U
ma fase privilegiada da história do ser e a
Ia qual, até agora, podemos ter uma visão de
\111 11\
necessário que
\:lI , apenas com seu nome, até à 'tE:X'Ull dos
\\l\'l1i)[
111111
Existencialismo atingem aquela dimensão, no seio da
Mas, para isto, é naturalmente
da verdade do ser,
LI \X'Ull como um modo de àÂ.1l8EÚElV, isto é,
que a dimensão essencial do elemento da História re-
tivo com o marxismo.
esconde,se na essência
I I no esquecimento. A técnica não remonta,
I
ria, a visão marxista da História é superior a qualquer
qual é, em primeiro lugar, possível um diálogo produ,
materialismo
antológico-historial
Ii ri
a alienação, atingir uma dimensão, essencial da histó-
nem o
:\0
I ( uco se pensa. A técnica é, em sua essência,
apatricidade. Pelo fato de Marx, enquanto experimenta
side no ser, por isso, nem a Fenomenologia,
Ia, isto é, da ohj.eti'tidadedo efetivamente
1\11:1
1 1111 \I ri to .
I r mais diversas que sejam as pOSlçoes qtle se
111111:\1
em face das doutrinas do comunismo e da sua
IlIl\d:ll1l_entação,é certo, sob o ponto de vista-ontológi,
I1 I
historial, que nele se exprime uma experiência ele,
tar daquilo que é atual na história universal. Quem
•
11
11
'..:1' 11
orno
11 nna o "comunlsmo. apenas como partido
ou- c
1111'1
"vlHã
do mundo" não pensa com suficiente, amplitude
11:1 mesma maneira como aqueTes que, na expressão
"1\ IlIcricanismol1,
apenas visam, e ainda com acento pee
[orativo, um particular estilo de vida.
49
o: perigo
para,
.0
<larfa sobre o qumanismo
I
qual é impelido, cada vez mais nitidamente, o que até
r' onduzir às suas origens, nem se deixa experimen-
agora era a Europa, consiste provavelmente no fato de,
lar, de modo suficiente, através de um pensamento que
antes de tudo, o seu pensar - um dia a sua grandeza
não radicaliza a mediação. Expulso da verdade do ser,
- decair e ficar para trás, na marcha essencial do desti-
o homem gira, por toda parte, em torno de si mesmo,
no mundial que inicia; este, contudo, permanece deter-
'( mo animai rationaie.
A essência do homem, no entanto, consiste em
minado pelo caráter europeu nos traços essenciais de
Metafísica alguma, seja ela
le ser mais do que simples homem, na medida em que
idealista, seja materialista, seja cristã, pode, segundo a
.ste é representado como o ser vivo racional. "Mais"
sua essência, e de maneira alguma apenas nos esforços
I
despendidos em desenvolver-se, alcançar ainda o des-
se a definição tradicional do homem tivesse que per-
tino, isto é, atingir e reunir, através do pensar, o que
manecer a determinação fundamental
agora é do ser num sentido pleno.
perimentar
uma origem fundamental.
ão deve ser entendido aqui em sentido aditivo, como
para então ex-
apenas um alargamento, através de um
Em face da essencial apatricidade do homem,
acréscimo do elemento existencial. O "mais" significa:
mostra-se ao pensamento, fiel à dimensão ontológico-
mais originário e por isso mais radical em sua essên-
historial, o destino futuro do homem, no fato de ele
cia. Aqui, porém, mostra-se o elemento enigmático: o
achar o caminho para a verdade do ser, pondo-se a ca-
homem é, na condição-de-ser-jogado. Isto quer dizer: o
minho deste encontro. Cada nacionalismo é, do ponto
homem é, como a réplica ex-sistente do ser, mais que
de vista metafísico, um antropologismo e, como tal, um
o animai rationaie, na proporção em que precisamente
subjetivismo. O nacionalismo não pode ser superado
é menos na relação com o homem que se compreende
pelo simples intemacionalismo,
a partir da subjetividade. O homem não é o senhor
mas apenas ampliado
e erigido em sistema. Tanto o nacionalismo não é con-
do ente. O homem é o pastor do ser. Neste "menos"
duzido à humanitas, e sobres sumido, como não o é o
o homem nada perde, mas ganha, por quanto atinge a
individualismo, através do coletivismo a-histórico. Este
verdade do ser. Ele ganha a essencial pobreza do pas-
I"
a subjetividade do homem na totalidade. Ele realiza
tor, cuja dignidade reside no fato de ter sido chamado
incondicional auto-afirmação. Esta não se deixa
pelo próprio ser, para guardar a sua verdade. Este apelo
,I .'lIa
50
51
crarta sobre o qumanismo
vem como o lance no qual se origina a condição de serjogado do ser-aí.
o homem
morar ex-stárico na proximidade do ser. Ela é vigilân-
é, em sua essência ontoló-
cia, isto é, o cuidado pelo saber. Pelo fato de neste
gico-historial, o ente cujo ser como ex-sistência consiste
pensar dever ser pensado algo simples, parece ele tão
no fato de morar na vizinhança do ser. O homem é o
Iifícil ao tipo de representação que nos foi transmitido
vizinho do ser.
, mo Filosofia. Mas a dificuldade não consiste num
Mas - o senhor já há muito deverá ter querido
perder-se em profundas considerações de caráter parti-
objetar-me - não pensa justamente um tal pensar a hu-
ular e em formar conceitos complicados, mas oculta-
manitas do homo humanus? Não pensa ele esta humani-
se no recuar que faz penetrar e pensar num questionar
tas num sentido tão decisivo, como Metafísica alguma
em busca de experiência, e que abandona as opiniões
a pensou e jamais a poderá pensar? Não é isto um
correntes da Filosofia.
Éo
Opina-se, por toda parte, que a tentativa de Ser
a humanidade do homem des-
e Tempo findou num beco sem saída. Deixemos esta
de a proximidade do ser. Mas é, ao mesmo tempo, o
opinião entregue a si mesma. Para além de Ser e Tem-
humanismo
1)0, o pensar que procura .dar alguns passos no tratado
"humanismo" no sentido supremo? Certamente.
humanismoquepensa
no qual está em jogo, não o homem, mas
a essência hi-storial do homem, na sua origem desde a
que temeste
verdade do ser. Não depende, porém, desta circunstân-
çar. Entretanto, talvez este pensar se tenha aproximado
cia, então, no mesmo tempo, de maneira absoluta, a
um pouco mais do miolo de sua questão. Todavia,en-
ex-sistência do homem? De fato, assim é.
quanto a Filosofia apenas se ocupar em obstruir cons-
título, ainda hoje não conseguiu avan-
Em Sere Tempo (pág; 38) afirma-se que todo o
tantemente a possibilidade de penetrar na questão do
Filosofia "repercute na existência".
pensar..a saber,a verdade do ser, ela está certamente
Mas a existência não é aqui a realidade efetiva do ego
livre do perigo de um dia romper-se na dureza da sua
cegue. Ela .tarnbém não é apenas a realidade efetiva dos
questão .. Por esta razão .o "filosofar" sobre o fracasso
sujeitos que agem juntos e .uns para os outros e assim
está separado, por um abismo, de um pensar quereal-
chegam .a si mesmos. "Ex-sistêncía" é, numa diferença
mente fracassa . .Se um dia o homem tivesse -a sorte de
fundamentalccmoqualquer
realizar um tal pensar, não aconteceria uma desgraça. A
question:amentoda
:52
existentiae "existence", o
(lar{a
sobre o qumanismo
questão. Na penúltima página de Ser e Tempo (pág.
ele, pelo contrário, seria concedido o dom que poderia
11
advir ao pensamento por parte do ser.
'I i7), estão
Mas também isto é importante: o objeto do pen-
IIH;n
as frases seguintes: "A disputa na interpre-
do ser (isto, portanto, não significa do ente, e
samento não é atingido por um conversar à toa sobre
I '11) bérn
a "verdade do ser" e sobre a "história do ser". Tudo
\ 111, I)orque ainda nem sequer foi desencadeada. E, afinal,
depende do fato de a verdade do ser atingir a língua-
I
gem e de o pensar conseguir esta linguagem. Talvez a
\[escncadear da disputa já necessita de uma prepara'
linguagem então exija muito menos a expressão precipitada do que o devido silêncio. Contudo,
nós, contemporâneos,
qual de
quereria pretender que as suas
não do ser do homem) não pode ser decidi,
Ia não se deixa introduzir improvisadamente,
• 10.
É só para isto que a presente investigação está a
rnminho''.
IlpÓS
mas o
Estas frases continuam válidas ainda hoje,
muitos decênios. Continuemos nós, também nos
tentativas de pensar estivessem familiarizadas na senda
tempos vindouros, como viajantes no caminho para a
do silêncio? Quando muito, o nosso pensar poderia
vizinhança do ser. A questão por vós levantada ajuda a
talvez apontar para a verdade do ser como o que deve
clarear o caminho.
ser pensado. Assim, mais que de outra maneira, ele
estaria livre do simples pressentimento
O senhor pergunta: Comment redonner uns sens au
e do opinar e
mor "Humanisme"? "De que maneira dar novamente à
seria entregue à tarefa da escritura, que se tornou rara.
palavra humanismo um sentido"? A sua pergunta não
As coisas que têm alguma consistência ainda chegam
pressupõe apenas que o senhor quer conservar a pala,
a tempo, por mais tarde que seja, mesmo que não se
vra "humanismo"; ela contém também a confissão de
destinem para a eternidade.
que esta palavra perdeu o seu sentido.
Se o âmbito da verdade do ser é um beco sem
saída ou o livre espaço em que a liberdade reserva a
Ela perdeu o sentido pela convicção de que a
ssência do humanismo
é de caráter metafísico e isto
sua essência, isto poderá decidir e julgar todo aquele
significa, agora, que a Metafísica não só coloca a ques-
que tentou, por seu próprio esforço, trilhar o caminho
tão
indicado, ou, o que ainda é melhor, abrir um cami-
que a Metafísica persiste no esquecimento do ser. Mas
nho melhor, o que significa uma vida mais adequada
o pensar que conduz a esta compreensão do caráter
54
55
da verdade do ser, mas a obstrui, na medida em
<rarfa sobre o humanismo-
problemático da essência do humanismo levou-nos, ao
mesmo tempo, a pensar a' essência do homem
hama humanus, em sua dimensão mais essencial, resulta
a um
sentido historial que é mais antigo, que é o seu mais antigo- sentido, 'sob o ponto de vista historiográfico.
, IIhumarusmo.
' '. 11 1:rosse como ta.1 sem senti do e-um
pa 1avra
ll
aponta, na pala-
111111
ser apreendida de maneira radical. Este sentido é o que
possui a palavra "humanisrno" como palavra. Dar-lhe
novamente um sentido somente pode significar: determinar de novo o sentido da palavra. Isto exige, de um
lado, que a essência do homem seja experimentada
mais originariamente; de outro lado, que se mostre em
que medida esta essência é, a seu modo, bem-disposta.
A essência do homem reside. na ex-sistência. É esta exsistência que essencialmente importa, o que significa
que ela recebe a sua importância do próprio ser, na
medida em que o ser apropria o homem enquanto ele
é
O'
ex-sistente, para a vigilância da verdade do ser; in-
serindo-o na própria verdade do ser. "Humanismo" sig-
56
ira, pensamos um "humanismo" de natureza sin-
I '111 li r. A palavra
I
\ 1111
dá como .resultado uma expressão que
ll
IIlucus a nan lucenda
•
Será que se deve chamar a este "humanismo" que
11111\ contra todo o humanismo
IIH'SmO
111'1
rete .do inumano,
nrompanhar
IHI
conhecido, mas que ao
tempo, de maneira alguma, se arvora em inainda de "humanismo'?
q1 'nas para talvez, participando
vra, para. a humanitas, a essência do homem. O' "ismo"
aponta para o fato de que a essência do homem deveria
ia do homem é essencial em conseqüência disto,
importa o homem simplesmente como tal. Desta
I I \1
Este
devolver do sentido não deve ser entendido como se a
simples flactus vacis. O' IIhumanum
11
mais
radicalmente. No que diz respeito a esta humanitas do
a possibilidade de devolver a palavra humanismo
1 '(l, agora, caso nos dedicamos a manter a palavra: a
II
E isto
no uso da expressão,
as correntes dominantes
que se afogam
subjetivismo metafísico e que estão afundadas no
s uecimento do ser? Ou será tarefa do pensamento
t
I
ntar, através de uma aberta oposição contra o "huma-
nismo", um novo impulso que poderia suscitar uma
III
nção para a humanitas do hama humanus e sua fun-
damentação? Pois deste modo - caso o momento da
história universal atual já não a provocasse por si mes1110 -
poder-se-ia despertar uma reflexão que pensasse,
não apenas sobre o homem, mas sobre a "natureza" do
homem, não apenas sobre a natureza, mas ainda mais
originariamente
sobre a dimensão na qual a essência
10 homem, determinada a partir do próprio ser, se
(. ma familiar. Não seria melhor suportarmos
57
antes,
<larfa
sobre o ltumcnísmo
por mais algum tempo ainda, os inevitáveis mal-ent
11
didos, deixando-os desgastarem-se lentamente; mal-
11
tendidos aos quais o caminho do pensamento está
l'orquc se diz que o ser do homem consiste em
I 1111
I
posto até agora no elemento de Ser e Tempo. Estas falsa.
interpretações são naturalmente interpretações do qui
I IIIII
111'
to:
,I
pensa saber já antes da leitura. Todos eles revelam a
11111111
quem afirma a mundaneidade do ser-homem
I val r ao que é de baixo, negando o que é do além
mesma estrutura e o mesmo fundamento.
iando a toda "transcendência"?
Porque se aponta uma palavra de Nietzsche sobre
Porque se fala contra o "humanismo",
teme-s
uma defesa do inumano e uma glorificacão da barbárí
brutal. Pois o que há de "mais lógico" do que ficar, para
I
"morte de Deus" declara-se que tal comportamento
ção da desumanidade?
'1"1 experimentar a "morte de Deus" é um sem-Deus?
Porque, em tudo isto, em toda a parte, se fala conIIII
Porque se fala contra a "Lógica", pensa-se que se
para intro-
duzir, em seu lugar, a arbitrariedade dos impulsos e
é
mo. Pois o que é "mais lógico" do que isto: aquele
III
apenas com a afirma-
exige a renúncia ao rigor do pensamento,
ser meramente mundano, reduzindo-se assim
111I Ilna ao positivismo. Pois, o que é mais lógico do
se leu, ou de opiniões de outros que leram e do que s
aquele que nega o humanismo,
mu ndo", imagina-se que o homem foi degrada-
aquilo que para a humanidade vale como elevado
ngrado, tal filosofia ensina um "nihilisrno" irrespon-
v 1 e destruidor. Pois o que é "mais lógico" do que
10:
quem nega, em toda a parte, o ente verdadeiro,
sentimentos e assim proclamar como verdadeiro o "ir-
roloca-se do lado do não-ente e, com isto, proclama que
racionalismo". Pois, o que é "mais lógico" do que isto:
() simples nada é o sentido da realidade efetiva?
aquele que fala contra o lógico defende o alógico?
Porque se fala contra os "valores" a gente escan-
O que se passa aqui? Ouve-se falar de "humanis1110",
"lógica", "valores", "mundo" e "Deus". Ouve-se
daliza-se em face de uma filosofia que pretensamente
{alar de uma oposição contra tudo isto. O que foi no-
ousa abandonar ao desprezo os supremos bens da hu-
meado conhecer-se e toma-se como o positivo. Aquilo
manidade. Pois o que é "mais lógico" do que isto? Um
[ue, no ouvir dizer, fala, de um modo não pensado
pensamento que rejeita os valores deverá proclamar
tudo sem valor?
com rigor, contra o que acima nomeado, toma-se ime-
58
59
diatamente como sendo a sua negação e, esta, como o
crarfa sobre o liumcnismc
"negativo", no sentido do destrutivo.
Em Ser e Tempo
fala-se até, em alguma parte expressamente,
da "destrui-
I I 111
I -se a recusa de submeter a uma reflexão o que,
pr conceito,
1"11
se julga "positivo", juntamente
com
Pensa-se com o auxílio da Lógica
nc e oposição, díade esta em que se pensa estar a
e a razão, tantas vezes invocadas, que o que não é po-
om o constante apelo ao elemento lógico susci-
ção fenomenológica".
sitivo é negativo, e que assim se pratica o desprezo da
111
• i1
III!I( ,
razão e merece, por isso, ser marcado como deprava-
aparência de um empenho
justamente,
se renunciou
no pensar, quando,
ao pensar.
estas observações deve ter resultado um pouco
ção. Está-se tão saturado de "Lógica" que se contabiliza
tis
laro que a oposição ao "humanismo"
como elemento oposto condenável tudo que se opuser
11\
à serni-sonolência
I li,
d ' maneira alguma, a defesa do inumano,
I 1111
rns pers pectivas.
do simples opinar. Rejeita-se tudo o
que não permanece truncado junto ao conhecimento
idolatrado positivo, na fossa previamente
e
no nada e assim completa o nihilismo.
Deixa-se, atra-
mas abre
A "Lógica" entende o pensar como a representação
preparada da
pura negação, que a tudo nega e que, por isso, termina
não impli-
,111 .nte em seu ser, pensar que apresenta o representar
generalidade
1111
do conceito. Mas o que acontece com
vés deste caminho lógico, afundar tudo num nihilisrno
1\ 111
ditação sobre o próprio ser, isto é, com o pensar
que se inventou com o auxílio da Lógica.
1111 '
pensa a verdade do ser? Somente este pensar atinge
Mas será que efetivamente
pensar apresenta
o "contra", que um
diante do que comumente
na, aponta necessariamente
se imagi-
para a pura negação e para
o negativo? Isto acontece só então e neste caso, sem
, cs ência originária do Àóyoç que, em Platão e Aris11')1
.les, os fundadores
da "Lógica", já foi entulhada
perdida. Pensar contra a "Lógica" não significa quebrar
lnn ,as em defesa do ilógico, mas significa apenas: melitar sobre o Àóyoç e a sua essência nos primórdios
dúvida, de modo inevitável e definitivo - isto é, sem
uma livre visão de qualquer outra coisa - quando já de
p nsamento:
antemão
I nração de um tal refletir. Que sentido possuem
se coloca o elemento opinativo
sitivo", decidindo,
como "o po-
a partir deste, absoluta e ao mesmo
tempo negativamente,
quer possível oposição
sobre o âmbito de toda e quala ele. Num tal procedimento
60
e
significa empenhar-se,
primeiro,
do
na prepara
nós todos os sistemas da Lógica, por mais amplos que
s cjam, quando
ti
se subtraem, e mesmo sem o saber, já
antemão, da tarefa de primeiro questionar,
61
mesmo
<rarfa sobre o humanismo
que seja apenas isto, a essência do Àóyoç. Quisésse-
"1 us" como "o valor supremo", isto significa uma
mos devolver na mesma moeda, com objeções, o que
\Il'gradação da essência de Deus. O pensar através de
certamente é improdutivo, então, com maior razão, se
:\1 res é, aqui e em qualquer outra situação, a maior
poderia dizer: o irracionalismo como renúncia a tatio,
Ill:t fêmia que se pode pensar em face do ser. Pensar
impera o desconhecido e o indiscutido, quando se de-
(outra os valores não significa, portanto, propagar que
fende aquela "Lógica" que pensa poder esquivar-se de
(I
uma modificação sobre o Àóyoç e sobre a essência da
mas isto significa: levar para diante do pensar a clarei-
ratia que nele se fundamenta.
rn da verdade do ser contra a subjetivação
O pensar contra "os valores" não afirma que
I'
nte é destituído de valor e que é sem importância;
do ente em
i mples objeto.
Chamar a atenção para o "ser-no-mundo" como
tudo aquilo que se declara como "valores" - a "cultura", a "arte", a "ciência", a "dignidade do homem",
() traço fundamental
"mundo" e "Deus" - seja sem valor. Ao contrário,
não significa afirmar que o homem é apenas um ser
importa, finalmente, reconhecer que, justamente pela
"mundano", no sentido cristão; portanto, um ser afas-
caracterização de algo como "valor", se rouba a digni-
Indo
dade daquilo que é assim valorizado. Isto quer dizer:
da humanitas do hama humanus
de Deus e, até, desligado da "transcendência".
om esta palavra pensa-se o que mais claramente foi
ao avaliar algo como valor, aquilo que foi valoriza-
lenominado
do é apenas admitido como objeto de avaliação pelo
inte supra-sensível.
homem. Mas aquilo que é algo que em seu ser não
no sentido da causa primeira de todos os entes. Deus
se esgota sua objetividade e, quando
, pensado como esta causa primeira. "Mundo", toda-
a objetividade
por transcendente.
O transcendente
é o
Este vale como o ente supremo
tem o caráter de valor. Todo o valorizar, mesmo onde
via, na expressão "ser-no-mundo",
é um valorizar positivamente, é uma subjetivação. O
maneira alguma, o ente terreno, em oposição ao ce-
valorizar não deixa o ente ser, mas todo o valorizar
leste, nem mesmo o "mundano" em oposição ao "espi-
deixa apenas valer o ente como objeto de seu operar.
ritual". "Mundo, naquela expressão, não significa, de
O esdrúxulo empenho em demonstrar
modo algum, um ente e nenhum âmbito do ente, mas
a objetividade
não significa, de
dos valores não sabe o que faz. Quando se proclama
a abertura do ser. O homem é e é homem, enquanto
62
63
·{l'arla sobro o q.umanismo
é o ex-sistente. :Bleestá postado, num processo
trapassagem,
o próprio
na abertura do ser, que é o modo
11'011: l'I1 ,
como um .lance, no "cuidado" de si. Frojetado
maneira,
o homem
está postado "na abertura
Mundo éa clareira do ser na qual o homem
I1
d .. I
I"
penetro\!
nomeia a essência da ex-sistên ia,
/1111
ex-sistência, "mundo" é, justamente, de certa maneira,
o outro lado no seio da e para a ex-sistência. O homem
do lado de cá do mundo com
um " sujeno," pense-se este como "eu" ou como "nós".
"
NU:1ca é também primeiramente e apenas sujeito, que,
na verdade, sempre se refere, ao mesmo tempo, a objetos, de tal maneira que a sua essência consistiria na
relação sujeito-objeto.
Ao contrário, o homem
primei-
ro é, em sua essência, ex-sistente na abertura
do ser
mundo também não contém uma decisão sobre a hipótese se o homem é, no sentido teológico-metafísico,
ser deste mundo ou do outro.
um
u "não-ser", como, tampouco,
ou impossibilidade
apressado,
sobre a pos-
de deuses. Por isso não é
mas já falso no modo de proceder,
que a interpretação
da essência do homem,
a
Ia relação desta essência com a verdade do ser,
ísrno. A esta classificação arbitrária falta, ademais,
r lidado na leitura. Não há preocupação com o fato
I.,
I sde 1929, estar escrito, no texto, Sobre a essência
,lu fundamento
(pág. 28, nota 1), o seguinte: "Através da
\I
.rpretação ontológica do ser-aí como ser-no-mundo,
111
se decidiu nada, nem positiva nem negativamente,
obre um possível ser-para-Deus. Mas só pela clarifica(;G. da transcendência
se alcança um adequado conceito
do ser-aí, que, levado em consideração,
permite, então,
/)erguntar qual é, sob o ponto de vista ontológico, o estado da relacão do ser-aí com Deus". Se também se inter-
,
cuja abertura ilumina o "entre" em cujo seio pode "ser"
uma "relação" de sujeito e objeto.
A frase: a essência do homem reside no ser-no-
S
11111
J
jamais é primeiramente
I
111\
iluminada, desde a qual desde
bra o seu ser o "ex" da ex-sistência. Pensada a partir da
1\ I
111111\1'
I
com vista à dimensão
<lU
1I11.llId
do
a partir da condição de ser projetado de sua essén Ia,
O "ser-no-mundo"
II
existencial da essência do
ainda nada está decidido sobre a "existência de
111' 111,
ser é; este projetou a essência do
a determinação
I \ 1111
orn
pretar, corno de costume, também esta observação, de
maneira mesquinha,
irá explicar-se: esta filosofia não se
decide nem a favor nem contra a existência de Deus.
Ela permanece
presa à indiferença.
E um tal indiferen-
tismo, contudo, torna-se vítima do nihilismo.
Ora, ensina a observação que aduzimos,
ferentismo? Porque grifamos então determinadas
64
65
o indipala-
<rarta sobre o humanismo
vras isoladas e não qualquer uma? Pois, foi apenas para
Todavia, com esta indicação não se quer decidir,
insinuar que o pensar que pensa desde a questão da
de maneira alguma, pelo teísmo, o pensar que, anteci-
verdade do ser, pensa mais radical e originariamente
pando, aponta para a verdade do ser como o que deve
do que a Metafísica é capaz de questionar.
ser pensado. Ele não pode ser teísta, nem ateísta. Isto,
Somente a partir da verdade do ser se deixa pensar
porém, não levado por uma atitude de indiferença, mas
a essência do sagrado. E somente a partir da essência
por respeito aos limites, postos ao pensar enquanto
do sagrado deve ser pensada a essência da divindade.
pensar, e isto através daquilo que se lhe dá a pensar
E, finalmente, somente na luz da essência da divindade
pela verdade do ser. Na medida em que o pensar se
pode ser pensado e dito o que deve nomear a palavra
contenta com a sua tarefa, dá ele, no momento
de "Deus": ou será que não devemos ser capazes de,
presente destino mundial, ao homem, uma orientação
primeiro, entender e escutar com cuidado estas pala-
para a dimensão originária de sua morada historial.
vras, se nós, homens, isto é, como seres ex-sistentes,
Como dizer desta forma a verdade do ser, o pensar
quisermos ter acesso a uma experiência de uma relação
entregou-se àquilo que é mais essencial do que todos os
de Deus para com o homem? Pois, como poderia o
valores e do que qualquer ente. O pensar não supera
homem da atual história mundial mesmo apenas ques-
a Metafísica, mas ainda mais a exacerba, ultrapassa e
tionar, com seriedade e rigor, se o Deus se aproxima
a sobressume em qualquer lugar, mas enquanto recua
ou se subtrai, se o homem omite pensar primeiro para
para a proximidade do mais próximo. A descida é bem
dentro da dimensão, na qual aquela questão unicarnen-
mais difícil e perigosa, particularmente ali, onde o ho-
te pode ser desencadeada? Esta dimensão, porém, é a
mem se perdeu na subjetividade. A descida conduz à
dimensão do sagrado, que mesmo como dimensão já
pobreza da ex-sistência do homo humanus. Na ex-sistên-
permanece fechada, caso não se clarear a abertura do
cia é abandonado o âmbito do homo animaUs da Meta-
ser para, em sua clareira, estar próximo do homem.
física. O império deste âmbito é a razão indireta e de
Talvez o elemento mais marcante desta idade do mun-
conseqüências que recuam longe, para a obliteração
do consista no rígido fechamento para a dimensão da
a arbitrariedade daquilo que se pode caracterizar como
graça. Talvez seja esta a única desgraça.
biolo rismo
) )
tarn
m
ara aquil
do
e
que se conhece pela
<rada
sobre o humcnisrno
expressão pragmatismo.
Pensar a verdade do ser signido homo
sa, somente pode ser levado a uma estabilidade segura,
ao serviço da verdade
através de um recolhimento e ordenação do seu plane-
fica, ao mesmo tempo: pensar a humanitas
humanus.
Importa a humanitas
do ser , mas sem o humanismo no sentido metafísico.
Se, porém, a humanitas
técnica, entregue aos meios de comunicação de mas-
está tão essencialmente
jar e agir como um todo, correspondente à técnica.
Quem poderia deixar de perceber a indigência
no campo visual do pensar do ser, não deve então a
nesta situação? Não seria conveniente poupar e garan-
"Ontologia" ser completada por uma "Ética"? Não seria
tir os laços estabelecidos, ainda que somente consigam
então seu empenho, que exprime em sua frase, muito
manter a unidade do ser humano precariamente e ape-
especial: "Ce que je cherche à faire, depuis longtemps
nas na situação de hoje? Sem dúvida. Mas já desobri-
déjà, c'est préciser le rapport de l'ontologie avec une éthi-
ga esta indigência o pensar de considerar aquilo que
que possible"?
principalmente
deve ser pensado e que permanece,
Logo após a publicação de Ser e Tempo, perguntou-
enquanto ser; mais que todo ente, garantia e verdade?
me um jovem amigo: "Quando escreverá o senhor uma
Será que o pensar pode ainda continuar a esquivar-se
ética"? Lá, onde a essência do homem é pensada tão
de pensar o ser, quando este se manteve escondido em
essencialmente, a saber, unicamente a partir da ques-
longo esquecimento e, ao mesmo tempo, se anuncia,
tão da verdade do ser, mas onde, contudo, o homem
neste momento da história universal, através da como-
não foi elevado para o centro do ente, deve realmente
ção de todos os entes?
despertar a aspiração por uma orientação a partir da ex-
Antes de procurarmos determinar mais exatamen-
ou de
te as relações entre a "Ontologia" e a "Ética", devemos
acordo com o destino. A aspiração por uma Ética urge,
perguntar o que são a própria "Ontologia" e a própria
com tanto mais pressa por uma realização, quanto mais
"Ética". Impõe-se considerar se aquilo que é nomeado
a perplexidade manifesta do homem e, não menos, a
nestas duas expressões ainda permanece adequado e
oculta, se exacerbam para além de toda a medida. Deve
próximo para aquilo que foi entregue ao pensar como
dedicar-se todo o cuidado à possibilidade de criar uma
tarefa, que como pensar deve, antes de tudo, pensar a
Ética de caráter obrigatório, uma vez que o homem da
verdade do ser.
sistência para o ser, deve viver convenientemente
68
69
(larfa sobre o qumanismo
Caso tanto a "Ontologia"
como a "Ética", junto
costuma traduzir-se.
"o caráter próprio
do homem
com todo o pensar por disciplinas, se tomassem cadu-
o seu demônio".
cas, adquirindo
dcrna e não de modo grego. HSoç significa morada,
assim, o nosso pensar mais disciplina,
Essa tradução pensa de maneira
é
mo-
qual será então a situação da questão da relação das
lugar da habitação.
duas disciplinas mencionadas
onde o homem habita. O aberto de sua morada torna
com a Filosofia?
A "Ética" aparece junto com a "Lógica" e a "Física",
A palavra nomeia o âmbito aberto
manifesto aquilo que vem ao encontro
pela primeira vez, na Escola de Platão. As disciplinas
homem e assim, aproximando-se,
surgem na época que permite a transformação
I roximidade.
do pen-
da essência do
demora-se
em sua
A morada do homem contém e conser-
sar em "Filosofia", a Filosofia em Êm<J't'!Íull (Ciência) e
va o advento daquilo a que o homem pertence em sua
a Ciência mesma em um assunto de escola e de ativida-
issência. Isto é, segundo
de escolar. Na passagem por esta Filosofia assim enten-
ôcdurov. o Deus. A sentença diz: o homem habita.na
dida, surge a Ciência e passa o pensar. Os pensadores
medida em que é homem,
antes desta época não conhecem
Com esta sentença
nem uma "Lógica",
a palavra de Heráclito,
na proximidade
de Heráclito
concorda
o
de Deus.
uma his-
nem uma "Ética" e nem uma "Física". E, contudo, o seu
tória que Aristóteles
pensar não é nem ilógico nem imoral. A yúmç era, po-
17). É a seguinte: HpáXÀEt'tOÇ ÀÊ)'Ct'tat 1tpÕç 'touç
rém, pensada por eles numa profundidade
çÉvouç
e amplitude
U1tEt:V 'toúç
relata (de parto animo A 5.645 a
~ouÀoj.lÉvouç
EV'tUXEÍv aú'tro
que toda a "Física" posterior nunca mais foi capaz de
oi E1tEtÕ'!Ínpootóvre;
alcançar. As tragédias de Sófocles ocultam - permita-me
'tCOt1tvCO E<J't1l<Jav, EXÊÀEUEy<xp aU'toúç
uma tal comparação - em seu dizer, o 1ÍSoç, de modo
Sappuv'taç
mais originário, que as preleções de Aristóteles sobre a
eiôov aú'tov SEpÓj.lEVOV1tpàç
Etvat yàp Xat Ev'tauSa
eíotévot
SEQUç.
"Narra-se de Heráclito uma palavra que teria dito aos
"Ética". Uma sentença de Heráclito, que consiste ape-
forasteiros que queriam chegar até ele. Aproximando-se,
nas em três palavras, diz algo tão simples que dela brota
viram-no como se aquecia junto ao fomo. Detiveram-se
e chega à luz, de maneira imediata, a essência do 1ÍSoç.
surpresos; isto, sobretudo, porque Heráclíto ainda os en-
A sentença de Heráclito é a seguinte (Fragmento
119): i]Soç
<xvSpo:ytco õaíj.loov.
70
De maneira
geral
corajou - a eles que hesitavam - convidando-os a entrar,
com as palavras: Pois também aqui estão presentes deuses ... ".
71
'larfa sobre o qumanismo
Esta narrativa fala por si; destaquemos, contudo,
alguns aspectos.
Ii
Interessante. Os curiosos perdem logo, pois, com
I \"
O grupo de visitantes está frustrado e desconsertado na curiosidade que os levou a dirigir-se ao pen-
visão frustrante,
a vontade de se aproximarem
mnis. Que farão ali? Este fato, comum e sem encanto,
Il' alguém
estar com frio e estar perto do forno, qual-
morada. O grupo cria ter que encontrar o pensador,
'1\1 'r um pode revivê-lo, em qualquer tempo, em casa.
Pura que procurar então um pensador? Os visitantes
em circunstâncias
que, ao contrário do simples viver
IIpresentam-se para se afastar. Heráclito lê essa curio-
comuns, deveria mostrar, em tudo, os
I lade frustrada em seus rostos. Sabe que para uma
traços do excepcional e do raro e, por isso, do emo-
multidão já basta a falta de uma sensação esperada,
cionante. O grupo traz a esperança de, com sua visita,
pn ra fazer com que os recém-chegados imediatamente
encontrar
voltassem para trás. Por isso, indundc-lhe
sador; o desconserto é provocado pelo aspecto da sua
dos homens
junto do pensador coisas que, ao menos
coragem.
por um certo tempo, sejam motivo de conversa. Os
Ele mesmo os convida a entrarem, contudo, dizendo:
estranhos que querem visitar o pensador esperam vê- .
'lvat Àáp Xat Ev'tau8a
10 talvez justamente no momento em que ele, mergu-
\ 'tão aqui presentes".
8múÇ, os deuses também
Esta palavra situa a morada ~8oç do pensador e
lhado em profundas meditações, pensa. Os visitantes
querem "viver" isto, não para serem atingidos pelo
H
pensar, mas simplesmente
visitantes imediatamente ou se alguma vez entenderam
para poderem dizer que
u agir, numa outra luz. A história não conta se os
viram e ouviram alguém, do qual, igualmente, apenas
esta palavra, vendo então tudo numa outra luz. Mas se
se diz que é um pensador.
esta história foi contada e transmitida até nós, contem-
Em vez disso, os curiosos encontram
Heráclíto
porâneos, isto reside no fato de que aquilo que relata
junto ao forno. É um lugar banal e bastante comum.
provém da atmosfera deste pensador e a caracteriza:
Sem dúvida, nele se coze o pão. Ele está aí apenas
Xat Ev'tau8a, "também aqui", junto ao forno, neste
para se aquecer. Assim revela ele, neste lugar, sem
lugar corriqueiro, onde cada coisa e cada circunstância,
dúvida, comum, toda a indigência de sua vida. A vista
cada agir e cada pensar s~o costumeiros e banais, isto
de um pensador
é, familiares, "pois, também aqui", no âmbito do fa-
passando frio oferece muito pouco
72
73
<rarfa
sobre o qumanismo
miliar eiveí 8EOÚÇ,a coisa é de tal modo "que deuses
estão presentes".
H80ç àv8pw1tffi ôcdurov diz o próprio Heráclíto.
:1
verdade do ser, desconhecendo,
assim, que existe um
I ensar que é mais rigoroso que o penar conceitual.
O
I ensar que procura antecipar-se, pelo pensar, na verda-
"A habitação (familiar) é para o homem a abertura para
le do ser, só consegue, na indigência de seu primeiro
a presentificação
sforço, transformar
do Deus (o in-soliro)",
Se, portanto,
de acordo com a significacão funda-
mensão absolutamente
em linguagem pouca coisa de didiferente. Esta ainda se falsifica
mental da palavra ~8oç, o nome Ética diz que medita a
a si mesma, na medida em que não tem sucesso em
habitação do homem, então aquele pensar que pensa a
reter a essencial ajuda do ver fenomenológico
verdade do ser como o elemento primordial
do, deixa de lado, porque sem sentido e inadequada,
enquanto
do homem
alguém que ex-siste, já é em si a Ética originá-
a preocupação
e, contu-
em ser "Ciência" e "Pesquisa". Todavia,
ria. Mas este pensar não é apenas então Ética, porque
para tornar conhecida e compreensível
é Ontologia.
pensar, no seio da filosofia estabelecida, só foi possível,
Pois a Ontologia pensa sempre apenas o
esta tentativa do
ente (oy) em seu ser. Enquanto não tiver sido pensada,
primeiro, falar desde o horizonte do estabelecido
contudo, a verdade do ser, toda a Ontologia permanece
correndo às expressões que lhe eram familiares.
sem o fundamento.
É esta a razão por que o pensamen-
Entretanto,
aprendi a ver que justamente
e re-
estas ex-
to que, com Ser e Tempo, procurava antecipar o pensar
pressões tinham que levar direta e inevitavelmente
para dentro da verdade do ser, se caracterizava a si mes-
a errância. Pois, as expressões e a linguagem conceitual
mo como Ontologia Fundamental. Esta tende a penetrar
nelas integradas não foram repensadas,
no fundamento
a partir da coisa propriamente
essencial do qual provém o pensamen-
pelos leitores,
dita que tinha que ser
to da verdade do ser. Já pelo ponto de partida do outro
pensada; ao contrário, a coisa propriamente
questionar,
presentada
se afasta este pensar, da "Ontologia" da Me-
taíísica (daquela de Kanr). A "Ontologia", porém, quer
seja ela transcendental
ou pré-crítica, está submetida
à
dita foi re-
a partir das expressões que foram mantidas
com suas significações correntes.
O pensar que questiona a verdade do ser e nisto
crítica, não porque ela pense o ser do ente e force assim
determina
o ser para dentro do conceito, mas porque não conhece
e em direção a ele, não é nem ética nem ontologia.
74
------------------
para
o lugar essencial do homem, a partir do ser
75
E,
(Iarfa sobre o humanismo
contudo, a sua pergunta, pensada mais originariamen-
de acordo com o destino, a essência do homem para
te, retém um sentido e um peso fundamentais.
morar na verdade do ser. Este morar é a essência do
Pois, deve se perguntar: se o pensar, pensando
"Ser-no-mundo" (Ser e Tempo, pág. 54). A indicação
a verdade do ser, determina a essência da humanitas
- e,
para o "ser-em " como o " morar," que lãa aparece, nao
como ex-sistência a partir do fato de pertencer ao ser,
um simples jogo etimológico. A indicação que aparece
permanece então este pensar apenas um representar
na conferência de 1936, sobre a palavra de Holder-
teórico do ser e do homem, ou é possível retirar, ao
lin, "Cheio de méritos, todavia poeticamente habita o
mesmo tempo, de um tal conhecimento,
homem nesta terra", não é um enfeite de um pensar
indicações
para a vida ativa?
que foge da Ciência, salvando-se na Poesia. O discurso
A resposta é: este pensamento não é nem teórico
sobre a casa do ser não é uma transposição da imagem
nem prático. É antes, desta distinção, que ele acontece
da "casa" para o ser; ao contrário, um dia seremos mais
e se realiza. Este pensar é, na medida em que é, a lem-
capazes de pensar o que é "casa" e "habitar" a partir da
brança do ser e nada além disso. Pertencendo ao ser,
essência do ser adequadamente pensada.
porque por ele jogado na guarda de sua verdade e para
ela requisitado,
Sem embargo, o pensar jamais cria a casa do ser.
ele pensa o ser. Um tal pensar não
O pensar conduz a ex-sistência historial, isto é, a huma-
chega a um resultado: não produz efeito. Ele satisfaz a
nitas do homo humanus, para o âmbito onde nasce o
sua essência, enquanto é. Mas ele é, na medida em que
que é salutar.
diz a sua propriamente
dita. À questão propriamente
Com o salutar - o bom -, particularmente,
se
dita do pensar pertence apenas uma saga (Sage), aquela
manifesta, na clareira do ser, o mal. A essência do mal
que é adequada ao que constitui a essência da questão.
não consiste na simples maldade do agir humano, mas
A sua constrigência é essencialmente mais alta que a
reside na ruindade do ódio. Ambos, o bom e o ódio,
vaidade das ciências, porque é mais livre, pois ela deixa
somente podem desdobrar o seu ser, no seio do ser, na
que o ser - seja.
medida em que o próprio ser é o que está em conflito.
O pensar trabalha na edificação da casa do ser;
Nisto se esconde a origem essencial do nadificar. Aqui-
é como tal casa que a juntura do ser dispõe, sempre
lo que nadifica ilumina-se como o que possui caráter
76
77
<laria sobre o qumanismo
saber e do amor. Nesta vontade ainda se oculta o ser
apoio para todo o comportamento
como a vontade de poder. Todavia, o motivo pelo qual
10 ser. "Apoio" (Halt) significa na língua alemã a "pro-
a negatividade da subjetividade absoluta que é "dialétí-
teção (Hut). O ser é a proteção que guarda o homem
ca" e porque através da dialética o nadificar , com efeito ,
chega a manifestar-se, mas ao mesmo tempo vela-se na
em sua essência ex-sistente, de tal maneira, para a sua
verdade, que ela instala a ex-sistência na linguagem. É
essência, não pode ser aqui discutido.
por isso que a linguagem é particularmente
O nadificar no ser é a essência daquilo que eu
nomeio o nada. Por isso, porque pensa o ser, o pensar
pensa o nada.
É somente o ser que garante ao salutar (salvo)
o nascimento
ao ódio.
com honra, o impulso para a desgraça
ser e a habitação do ser humano.
a casa do
Somente porque a
linguagem é a habitação da essência do homem,
dem as humanidades
po-
historiais e os homens não estar
em casa na sua linguagem, de maneira tal que ela se
torna para eles um obstáculo das suas maquinações.
Quais as relações que mantém, entretanto, o pen-
Somente na medida em que o homem, ex-sistindo
sar do ser com o comportamento
teórico e prático? Isto
na verdade do ser, a este pertence, pode vir do próprio
ultrapassa toda a consideração porque se preocupa com
ser a adjudicação daquelas ordens que se devem tomar
a luz na qual pode residir e mover-se um ver da teoria.
lei e regra para o homem. Adjudicar significa em grego
O pensar atenta para a clareira do ser, enquanto depo-
não é apenas lei, mas, mais origina-
sita o seu dizer do ser na linguagem como habitação
riamente, a adjudicação oculta na destinação do ser.
da ex-sistência. Deste modo, o pensar é um agir. Mas
Só esta é capaz de dispor o homem no seio do ser. Só
é um agir que, ao mesmo tempo, supera toda a práxis.
tal disposição é capaz de sustentar e vincular. De outra
O pensar perpassa a operar e a produzir, não pela gran-
maneira toda a lei permanece apenas no artifício da ra-
deza dos seus resultados nem pelas conseqüências
zão humana. Mais importante que qualquer fixacão de
sua atuacão , mas através do mínimo do seu consumar
regras é o homem encontrar o caminho para morar na
destituído de sucesso.
VEJ.lE1V.
O võuoç
verdade do ser. É somente esta habitação que garante a
experiência do que pode ser sustentado e dar apoio. O
80
-----
presenteia a verdade
-
--
--~~------------
da
.
Pois o pensar traz à linguagem, em seu dizer, apenas a palavra impronunciadado
81
ser.
~arfa
sobre o qumanismo
A expressão "trazer à linguagem", aqui usada,
sob o nome "Filosofia", na forma do inabitual que é
deve ser tomada agora bem literalmente. O ser chega,
apenas acessível aos iniciados. Representamo-nos,
iluminado-se, à linguagem. Ele está constantemente
mesmo tempo, o pensar, à maneira do conhecimento
caminho para ela. Isto que está constantemente
a
em ad-
científico e seus empreendimentos
ao
de pesquisa. Me-
vento, o pensar ex-sistente, por sua vez, traz, em seu
dimos o agir na produção impressionante
dizer, à linguagem. Esta é assim elevada para a clareira
sucesso da práxis. Mas o agir do pensar não é nem
do ser. Somente assim é a linguagem daquela maneira
teórico nem prático, nem é a imbricação dos dois mo-
misteriosa e que, contudo, constantemente,
dos de comportamento.
nos per-
passa com o seu imperar. Portanto, enquanto
a lin-
e cheia de
Pelo seu modo simples de ser, o pensar do ser
guagem levada plenamente à sua essência é historial,
torna-se para nós irreconhecível. Se, contudo, nos tor-
o ser é guardado na lembrança. A ex-sistência habita,
namos amigos do não costumeiro do simples, então as-
pensando,
a casa do ser. Em tudo isto, as coisas per-
salta-nos imediatamente uma outra preocupação. Surge
manecem como se nada tivesse acontecido através do
a suspeita de que este pensamento do ser se torna víti-
dizer pensante.
ma da arbitrariedade; pois, não pode encontrar apoio
Todavia, há pouco mostrou-se um exemplo para
este invisível agir do pensar. Pois, enquanto pensamos
de maneira apropriada,
a expressão "trazer à lingua-
no ente. Onde busca o pensar a sua medida? Qual a
lei do seu agir?
É aqui que se deve escutar a terceira pergunta da
gem" que foi destinada à linguagem, apenas isto e nada
sua carta: comment
mais, enquanto conservamos isto que pensamos como
porte toute recherche sans faire de la philosophie une sim-
o que no futuro deve ser constantemente
ples aventuriere?
pensado, na
sauver l'élement d'aventure
que com-
Só de passagem vamos nomear agora
atenção de nosso dizer, trouxemos à linguagem algo
a Poesia. Ela confronta-se com as mesmas questões e
essencial do próprio ser.
da mesma maneira, como o pensar. Mas ainda sempre
O estranho, neste pensamento do ser, é a sua sim-
vale a pouco meditada palavra de Aristóteles em sua
plicidade, pois ela nos mantém dele afastados. Pois,
Poética que o poematizar é mais verdadeiro do que o
procuramos o pensar que tem seu prestigio universal
investigar o ente.
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83
<rarfa sobre o humanismo
Mas o pensar não é apenas une aventure, enquanto procurar e perguntar para além, para o desconheci-
mora o homem".
O poeta denomina-a "O mais perigo-
so dos bens".
do. O pensar é, em sua essência, enquanto pensar do
A boa disposição do dizer do ser enquanto des-
ser, por este requisitado. O pensar está referido ao ser
tino da verdade é a primeira lei do pensar, e não as
como o que está referido ao advento (l'avenant).
O pen-
regras da Lógica que apenas se tornam regras a partir
pensar no advento do ser está ligado ao
Ia lei do ser. Atentar para o bem disposto do dizer pen-
sar enquanto
ser como advento. O ser já se destinou ao pensamento.
sante não inclui apenas que meditemos cada vez o que
O ser é como o destino do pensar. O destino, porém,
se deve dizer do ser e como isto deve ser dito. Aquele
é em si historial. A sua história já chegou à linguagem,
tríplice elemento a que acenou uma carta anterior é
no dizer dos pensadores.
determinado em seu comum-pertencer a partir da lei da
A única tarefa do pensar é trazer à linguagem,
docilidade do pensar ontológico-historial ao destino: o
sempre novamente, este advento do ser que permane-
rigor da meditação, o cuidado do dizer, a parcimônia
ce e em seu permanecer espera pelo homem. Por isso,
da palavra.
os pensadores
essenciais dizem sempre o mesmo. Isto,
Já é tempo de nos desacostumarmos
de superva-
porém, não quer dizer: o igual. Não há dúvida que
lorizar a Filosofia e de, por isso, lhe vir com exigências.
eles só o dizem a quem se empenha em meditar sobre
Na presente indigência do mundo, é necessário menos
eles. Na medida em que o pensar, rememorando
Filosofia, mas mais desvelo do pensar; menos literatu-
torialmente,
his-
presta atenção ao destino do ser, ele já
se vinculou ao bem disposto que é adequado ao des-
ra, e mais cultivo da letra.
O pensamento
futuro não é mais Filosofia, por-
tino. E, contudo, permanece o elemento aventureiro ,
a saber, como um constante risco do pensar. De que
que pensa mais originariamente do que a "Metafísica",
modo este simples, certamente não em si, mas para
pode mais, como exigia Hegel, deixar de lado o nome
o homem,
do "amor pela sabedoria" e nem ter-se tornado a própria
não deveria permanecer
Continuemos
pensando
bre a linguagem,
o mais perigoso?
na palavra de Holderlin
no fragmento
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so-
liMas em choupanas
nome que diz o mesmo. O pensar futuro também não
sabedoria na forma do saber absoluto. O pensar está
na decida para a pobreza da sua essência precursora. O
85
<rarfa sobre o ltumanismo
pensar recolhe a linguagem para junto do simples dizer. A linguagem é assim a linguagem do ser, como as
nuvens são as nuvens do céu. Com seu dizer, o pensar
abre sulcos invisíveis na linguagem. Eles são mais invisíveis do que os sulcos que o camponês, a passo lento,
CARTA A JEAN BEAUFRET (Paris)
abre pelo campo.
FRIBURGO,
23
DE NOVEMBRO
DE
1945.
Caro Sr. Beaufret,
A sua amável carta, que me foi transmitida
há
alguns dias pelo Sr. Palmer, deu-me uma grande satisfação. Conheço o seu nome há apenas algumas semanas, através dos excelentes artigos sobre" o existencialismo", publicados em Conj1uences. Infelizmente, até
agora, não obtive os nºs 2 e 5 da revista, mas desde
o primeiro artigo (nº 2) que se me tomou evidente o
elevado conceito que o senhor tem da Filosofia. Há ainda aqui domínios ocultos que só o futuro esclarecerá.
Mas tal não se conseguirá, salvo se o rigor do pensar a
86
<rada
sobre o qumanismo
atenção vigilante do dizer e da economia das palavras
não acharem um crédito bem diferente daquele de que
gozam agora. O senhor mesmo vê que um abismo separa aqui o meu pensar da filosofia de Jaspers, sem fa-
indicação essencial acerca das possibilidades
de um
er instruído pelo outro, no seio de um pensamento
produtivo, dentro de um intercâmbio mútuo.
"Da-sein" é uma palavra-chave do meu pensar, por
lar já da outra questão que anima o meu pensar e que,
isso ela é causa de graves erros de interpretação. 'Da-
de maneira curiosa, tem sido até agora absolutamente
sein" não significa para mim exatamente "eis-me", mas,
desconhecido.
Estimo deveras Jaspers como pessoa e
se é que me posso exprimir num francês sem dúvida
como escritor, a sua influência na juventude universitá-
impossível: ser-a-aí e o-lá significa exatamente AÀrt8EUX,
ria é considerável. Mas a aproximação, quase tornada
desvelamento-abertura.
por
Mas o que precede não passa de uma informação
excelência que circula na nossa Filosofia. Este equívoco
breve. O pensar fecundo requer, mais do que a escritura
atinge o cúmulo quando se pretende ver na minha filo-
e a leitura, a ()\yyouma da conservação e deste trabalho
sofia um "nihilísmo", na minha filosofia que não se in-
que é, já ensinamento recebido, já ensinamento dado.
clássica, "[aspers e Heidegger" é o mal-entendido
terroga somente, como toda a filosofia anterior, sobre o
MARTIN HEIDEGGER
ser do ente, mas sobre a verdade do ser. Pelo contrário ,
a essência do nihilismo tem como característica o ser
incapaz de pensar o nihil. Pressinto, tanto quanto pude
dar-me conta após algumas semanas, no pensamento
dos jovens filósofos da Franca, um élan extraordinário
que mostra bem que se prepara uma revolucão neste
domínio.
O que o senhor afirma da tradução de Da-sein por
"realidade humana" é deveras justo. Excelente ainda
a anotação: "Mas se o alemão tem os seus recursos,
o francês tem os seus limites": aqui oculta-se uma
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