pontifícia universidade católica de são paulo
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO – PUC-SP FACULDADE DE FILOSOFIA, COMUNICAÇÃO, LETRAS E ARTE COMUNICAÇÃO EM MULTIMEIOS TÍTULO DO PROJETO HQ no Cinema: os recursos sonoros AUTOR DO PROJETO Profa. Dra. Elisabete Alfeld Rodrigues AUTOR DO RELATÓRIO: IGNÁCIO SEITI LIMA ITO SÃO PAULO 2012 NOTA PRÉVIA Relatório científico de Pesquisa de Iniciação Científica aprovada pelo Conselho de Ensino e Pesquisa da PUC-SP, subsidiado pelo PIBIC-CEPE e desenvolvido no período de março de 2011 a fevereiro de 2012. 6.00.00.00-7 – CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS 6.09.00.00-8 - COMUNICAÇÃO HQ no cinema: os recursos sonoros Profª. Dra. Elizabete Alfeld – ORIENTADORA Faculdade de Filosofia, Comunicação, Letras e Artes – Pontifícia Universidade Católica – São Paulo Ignácio Seiti Lima Ito - ORIENTANDO Comunicação em Multimeios - PUCSP A sonorização é um elemento importante para a narrativa, tanto na realização audiovisual como nas histórias em quadrinhos. No cinema, é composta por música, ruídos e diálogos dos personagens. Na HQ a sonorixação é produzida por meio das onomatopeias presentes nos balões de diálogo e nas formas diversas que sugerem ruído. A pesquisa desenvolvida buscou caracterizar a dimensão sonora na adaptação cinematográfica da HQ Sin City, do escritor e desenhista Frank Miller, no que diz respeito às onomatopeias e a maneira como é interpretada pelo diretor de cinema Robert Rodriguez em sua adaptação da HQ Sin City. A metodologia da pesquisa, consistiu no levantamento de informações acerca de autores de textos fundamentais da linguagem cinematográfica e dos quadrinhos, a fim de fundamentar a investigação com todos os elementos necessários para realizar a análise da passagem do sonoro, presente no quadrinho, para a sua representação cinematográfica. A análise de Sin City principiou com a realização da decupagem detalhada de todos os planos correspondentes a cada onomatopeia adaptada para o formato audiovisual. Cada onomatopeia recebeu uma análise fonética e perceptiva segundo a proposta de Schafer (1991), através de referencias paisagísticas, arquitetônicas e sonoras, em comparação a sua adaptação audiovisual. A montagem sonora, a narrativa musical, a influência das imagens na representação sonora consistiram na estratégia utilizada para representar as onomatopeias destacadas. PIBIC-CEPE Palavras-chave: Onomatopeia, sonorização; Adaptação, HQ. SUMÁRIO Introdução................................................................................................................... 5 Metodologia ................................................................................................................ 5 Síntese do relatório parcial ......................................................................................... 5 A sonoridade na HQ e no cinema............................................................................... 7 Desenvolvimento das análises ................................................................................. 10 DECUPAGEM DAS ONOMATOPEIAS EM Sin City “O assassino amarelo”............ 20 DECUPAGEM DAS ONOMATOPEIAS EM Sin City “A cidade do pecado” ............. 37 DECUPAGEM DAS ONOMATOPEIAS EM Sin City 'A Grande Matança' ................ 73 Conclusões ............................................................................................................... 86 Referências Bibliográficas ........................................................................................ 87 5 Introdução A proposta da pesquisa de Iniciação Científica denominada “HQ e o cinema: os recursos sonoros”, buscou discutir que a adaptação dos quadrinhos para o formato audiovisual requer uma interpretação/transposição das onomatopeias em sons baseados em sonoplastia e outros recursos sonoros para essa linguagem, utilizando-se do fato de que, de acordo com Will Eisner (2001, p.122) “nos quadrinhos, a imagem torna-se um enunciado preciso que permite pouca ou nenhuma interpretação adicional. Quando palavra e imagem se ‘misturam’, as palavras formam um amálgama com a imagem e já não servem para descrever, mas para fornecer som, diálogo e textos de ligação.” O objetivo central da pesquisa foi investigar a forma como a adaptação cinematográfica da HQ foi realizada em relação às onomatopeias e o que representam enquanto índice de ruídos, fenômenos da natureza, interjeições e outros significados que foram descobertos. Metodologia As análises empreendidas nesta pesquisa lançaram mão de conhecimentos acerca das linguagens relativas às áreas de interesse da pesquisa, ou seja, o universo das HQs, do cinema e da sonorização,. O ponto de partida foi a análise dos quadrinhos devido a importância dos elementos gráfico e visual. O enfoque especial recaiu no aspecto da linguagem sonora, já que é aspecto destacado por Eisner (2001), Cirne (1973), Schafer (1992) e Moya (1977). Síntese do relatório parcial Sin City apresentou-se como um objeto de investigação riquíssimo em exemplos de onomatopeias adaptadas por Robert Rodriguez para o cinema a partir da HQ de Frank Miller. No relatório parcial a proposta foi selecionar textos de teóricos sobre a linguagem dos quadrinhos para destacar os aspectos conceituais sobre a linguagem e a narrativa sequencial. O segundo aspecto estudado referiu-se à linguagem 6 cinematográfica. Percebeu-se o uso da câmera como elemento preponderante para a criação da narrativa, ou seja, cada enquadramento, ângulo, movimento e plano tem o poder de dar a linguagem uma dimensão diferente de modo a imprimir uma percepção diferente também de acordo com a escolha do diretor. A terceira e última etapa da pesquisa valeu-se da leitura de quadrinhos para obtenção de conhecimento acerca do universo das HQs. 7 A sonoridade na HQ e no cinema As análises realizadas consideram a onomatopeia e o quadrinho como uma forma de leitura diferente das outras expressões presentes no cinema e na literatura, segundo Will Eisner (1989, p.8) “A configuração geral da HQ apresenta uma sobreposição de palavra e imagem, e, assim, é preciso que o leitor exerça as suas habilidades interpretativas visuais e verbais. As regências da arte (por exemplo, perspectiva, simetria e pincelada), da literatura (por exemplo, gramática, enredo e sintaxe) superpõem-se mutuamente. A leitura da HQ é um ato de percepção estética e de esforço intelectual.” A imagem do quadrinho torna-se um enunciado preciso que permite pouca ou nenhuma interpretação adicional, no que diz respeito à fisionomia dos personagens e aos elementos de cenário, timing, etc. Quando palavra e imagem se “misturam”, as palavras formam um amálgama com a imagem e já não servem para descrever, mas para fornecer som, diálogo e textos de ligação. As ações nos quadrinhos possuem uma série de ruídos que são expressos através das onomatopeias. Os quadrinhos tem praticamente a mesma idade do cinema, “em 5 de maio de 1895, um domingo, no jornal World, de Nova Iorque, surgiu o primeiro personagem fixo semanal, dando margem ao aparecimento das histórias em quadrinhos” 1, quando no começo do século XX surgiram as primeiras manifestações na busca de novos meios de comunicação e expressão gráfica e visual. Paralelamente a essa manifestação, o cinema, o fenômeno da sucessão dos frames, produzia um efeito de movimento, isto é, um frame somado a outro produz um terceiro elemento que gera a ilusão da imagem em movimento. Em se tratando de sonoridade o cinema nunca foi "totalmente" mudo. Só não tinha o som da fala. Som, sempre teve. É quase que instintivo, natural, do homem associar o som às imagens e vice-versa. Por definição, as onomatopeias são um fenômeno de criação de nomes, ou fazer nomes, no sentido de afigurar um nome ou afigurar um termo. É uma figura de 1 MOYA, Álvaro de. O menino amarelo. In. História da história em quadrinhos. São Paulo. Ed. Brasiliense, 1987. 8 linguagem na qual se reproduz um som, com um fonema ou uma palavra. Os ruídos, gritos, canto de animais, sons da natureza, barulho de máquinas, o timbre da voz humana fazem parte do universo das onomatopeias. A HQ Sin City entra na dimensão da presente pesquisa como o objeto de investigação por possuir a matéria prima do estudo, as onomatopeias, em abundância. O segundo aspecto da investigação é o ponto que discute a questão da adaptação, sobretudo, dessas onomatopeias e a interpretação sonora delas realizada. As sonoridades produzidas refletem uma escolha, consciente ou não, por parte dos diretores de Sin City que na produção e pós-produção naturalmente trabalharam esta dimensão da realização de modo a deixá-la coerente com a atmosfera e características do ambiente, contexto da história, da cena, do plano, do personagem, etc. Considerando também as diversas possibilidades técnicas da reprodução sonora considera-se o aspecto do aparato a ser empregado e os equipamentos utilizados de acordo com as características apresentadas e tendo em vista a impossibilidade de se obter uma ficha técnica detalhada a respeito de equipamentos de áudio a análise partirá sempre do produto e não da matéria prima, isto é, dos equipamentos utilizados. É de se considerar que Sin City possui uma narrativa e proposta bastante familiar à graphic novel de Frank Miller, todavia é evidente que todo o esforço de Robert Rodriguez e Frank Miller em aproximar a adaptação ao máximo com o quadrinho é no fundo apenas uma tentativa de de aproximar filme e HQ, de acordo com uma proposta, senão uma condição, do quadrinista em realizar um filme que respeitasse a sua criação original. Todavia, apesar de as HQs de Sin City serem uma espécie de storyboard para a adaptação, os quadros de cada plano definem apenas um perímetro da ação, em relação ao tempo, a duração de todo o plano. O quadrinho comunica tempo em essência. No filme, toda a duração, todo o tempo da cena é filmado, é expresso em imagens, em planos, tomando o direcionamento que a interpretação dos diretores imprime. Esse tempo gravado passa pelo crivo da interpretação pessoal, essa interpretação é influenciada pela plataforma cinematográfica. É considerável o fato de que a graphic novel dá ao leitor o direito de criar a sua própria história lançando mão de sua imaginação para compor os gestos e a atmosfera cénica. 9 Apesar de não haver um compromisso, em relação ao mercado, de se obter um resultado “fiel” à HQ, segundo o que afirma Ismail Xavier (2003, p.56), quando na verdade “há uma atenção especial voltada para os deslocamentos inevitáveis que ocorrem na cultura, passando-se a privilegiar a ideia do diálogo para pensar a criação das obras, adaptações ou não”, a proposta dos realizadores de Sin City é manter uma relação de proximidade com a novela gráfica de Sin City nos aspectos da narrativa, diálogos, enredo, apesar da adaptação que foi feita para amarrar as quatro principais histórias do filme, excetuando-se “The costumer is always right”. No entanto não é a “fidelidade” o alvo da questão das onomatopeias e a sua transposição para a plataforma fílmica, mas sim a forma como essa onomatopeia foi transposta para a interface audiovisual. As maneiras como essa representação sonora expressa o universo sonoro e as dimensões da fotografia, do clima da história e outros fatores, são alguns dos pontos a serem analisados e considerados. A simples mudança na linguagem, neste caso a linguagem gráfica em face da linguagem sonora (física), já evidencia uma mudança essencial. 10 Desenvolvimento das análises O projeto de pesquisa contou com diversas etapas cujo desenvolvimento sempre se deu pelo resultado de buscas anteriores e distintas, mas que sempre seguiram a proposta inicial e em busca de um objeto comum, fazer uma análise detalhada e perceptiva da adaptação da história em quadrinho, no que diz respeito à dimensão sonora representada pelas onomatopeias, para o cinema. A pesquisa seguiu etapas bem definidas iniciando-se pelo levantamento das primeiras informações a respeito da técnica dos quadrinhos e do cinema, sempre visando a construção de critérios para a análise da própria adaptação, fundamento para as afirmações, ferramentas para a reflexão e discussão, com a finalidade de chegar a algumas conclusões, sobre a construção da narrativa através dos ruídos como interpretação das onomatopeias. A contextualização do objeto da pesquisa que é a graphic novel de Frank Miller e a adaptação de Robert Rodriguez, no que tange à interpretação das onomatopeias na adaptação cinematográfica em forma de ruídos, é um elemento de introdução à temática abordada, a fim de situar o leitor, pois o fundamento da pesquisa se dá nas próprias análises e conclusões decorridas delas. O filme de Robert Rodriguez realizou a adapatação de quatro histórias da série de Frank Miller. “The Costumer is Always Right” (O Cliente sempre tem Razão), “That Yellow Bastard” (Assassino amarelo), “Sin City, The Hard Goodbye” A Cidade do pecado, e “The Big Fat Kill”. As quatro histórias acontecem paralelamente na mesma cidade e pequenos elementos ligam-nas. Sin City não possui um personagem fixo, a grande personagem da história de Frank Miller é a própria cidade, na qual impera a corrupção, a violência, a psicopatia de alguns e a resistência de outros. Com a proposta da pesquisa em foco, desenvolveu-se leituras fundamentais dos textos de base para mergulhar em uma análise direta, profunda, meticulosa e que pudesse compreender na análise, no mínimo, todas as onomatopeias que tiveram a sua equivalência sonora na adaptação cinematográfica de Sin City. A primeira solução para se chegar a uma análise sistematizada do objeto foi realizar uma decupagem de todos os planos do filme, nos quais os fenômenos sonoros tiveram uma correspondência no formato original, a HQ. Antes de tudo a leitura das histórias de Sin City que foram adaptadas por Robert Rodriguez foi fundamental, 11 para verificar o quanto a proposta da adaptação buscou representar a graphic novel de Frank Miller, interpretado no suporte fílmico, segundo a concepção do próprio Frank Miller, que figura no posto de co-diretor da obra. A constatação feita foi a de que a realização fílmica, apesar de as histórias da HQ sofrerem alguns cortes de elementos desnecessários, ou seja, que não alteram o curso da narrativa, utilizou a própria HQ como o storyboard do filme. Algumas adaptações foram realizadas, mas podemos constatar essa afirmação através das próprias imagens da análise. Após a realização das decupagens iniciou-se um levantamento quantitativo a fim de apurar o emprego dado a cada onomatopeia, por exemplo: BLAM para tiros de pistola, BRAK para tiros de metralhadora, etc. Em seguida apurou-se a reincidência de cada uma delas, trabalho que se apresentou exaustivo mas que, posteriormente, trouxe à pesquisa uma possibilidade antes não mensurada, depois de realizadas as análises das onomatopeias que não se repetiriam, foram elencadas todas as onomatopeias reincidentes no final para realizar as análises, talvez com uma abordagem diferente das outras realizadas. A escolha deta estratégia rendeu uma nova possibilidade. Descrevendo em poucas palavras, foi possível realizar o método comparativo entre elas, além de, antes da análise de cada onomatopeia, destacar os aspectos fonéticos da pronúncia onomatopaica, com o seu lugar de articulação, dos ruídos sonoros emulados por meio de cada elemento verbal, com o modo como cada dígrafo e sílaba foram articulados, e com a análise perceptiva, (ou qualitativa, no sentido de reduzir a distância entre indicador e indicado, entre teoria e dados, contexto e ação) que se pautou de um referencial obtido pela própria experiência de músico deste bolsista pesquisador e pelas análises e critérios propostos por Schafer 2. No início das análises sonoras a base interpretativa das onomatopeias, tal como a forma de descrição das situações apresentadas e das impressões obtidas, foi mais direta, análoga, com o uso de exemplos metafóricos e alusivos As onomatopeias, apesar de as histórias em quadrinhos analisadas terem sido traduzidas para o idioma português nos diálogos, foram avaliadas com a pronúncia do idioma inglês, pois a interpretação dos diretores se deu na sua língua nativa, o 2 SCHAFER, R. Murray. O ouvido pensante. São Paulo: Fundação Editora da Unesp, 1991. 12 inglês, tanto do quadrinho quanto do país de origem da realização fílmica e em se tratando de ruído, a onomatopeia é diretamente afetada na sua fonética quando alterada a sua pronúncia, consequentemente as propriedades sonoras mudam. A investigação encontra aqui nesse parâmetro a primeira problematização, pois uma possível contestação pode ser pelo argumento de que a onomatopeia é gráfica e não trabalha diretamente com sons, no sentido físico da emissão de ondas sonoras e, além disso o leitor de modo algum faz comparações fonéticas. O segundo problema se deu na dúvida em saber se a tradução do idioma inglês para o português afetou a onomatopeia de alguma forma, isto é, se a onomatopeia também foi traduzida. O primeiro problema é amplamente respondido por Álvaro de Moya 3, começando pela definição etimológica do termo que diz: “Vem do grego Onomatopeia (ação de imitar uma palavra por imitação do som – ou criação de palavras).” Inúmeros teóricos definem a onomatopeia como uma formação linguística que imita um determinado som natural. O lingüista e filólogo dinamarquês Krystoffer Nyrop, define as onomatopeias como “palavras imitativas, isto é, palavras que pretendem imitar, através dos fonemas de que se compõem.” (Moya 1977). O segundo problema é respondido através do próprio exemplo a seguir, de que as onomatopeias das três histórias adaptadas, de Sin City, não sofreram nenhuma mudança e permaneceram como no original, legitimando a análise com a pronúncia do inglês. 3 MOYA, Álvaro de. Onomatopeia nas histórias em quadrinhos. In. SHAZAM!. São Paulo, ed. Perspectiva. 1977. 13 Exemplo das onomatopeias em Sin City, no português e no original. Imagens extraídas das HQs “O assassino amarelo” e “That yellow bastard” O modelo de análise de Schafer (1991) seguiu descrições paisagísticas, arquitetônicas, geométricas e relativas a sentimentos e experiências humanas. Tal tipo de análise se faz necessária por ser também o tipo de cognição realizada pelo leitor dos quadrinhos ao ver uma onomatopeia presente em alguma situação, fazendo relações hipermidiáticas e talvez até mesmo inserindo trilhas sonoras. Uma das linhas que a interpretação dos ruídos segue é a de descrever e emular os sons através de outros instrumentos, musicais ou não, proposta por Schafer (1991: 36) e através da qual se pôde ter base suficiente de possibilidades de caminhos a se seguir para uma linha de interpretação pautada em um raciocínio lógico, mas que 14 não exclui a imaginação e a criatividade. A proposta da análise mais pautada na experiência do pesquisador enquanto ouvinte torna-se relativizada pela variedade de possibilidades que acaba admitindo. Apesar de ser inegável esta, Schafer (1992) se pauta em critérios bem definidos de interpretação da dimensão sonora que deseja expressar, mas que ao mesmo tempo são submetidos a sua própria experiência com os sons, imagens, uma vez que estas também intervém na dimensão sonora, e intenções da narrativa que Rodriguez deseja representar. A pesquisa pautada nos critérios citados, de Schafer, necessita do apoio técnico e dogmático de uma análise fonética. Que por ele fora dispensada, uma vez que não serviu aos propósitos de sua demanda.Realizou-se uma busca pelas ferramentas que propiciassem a leitura das onomatopeias de modo mais ortodoxo. Identificou-se a escassez e a dificuldade de encontrar publicações que pudessem elucidar e embasar as análises por este novo viés. O texto de Thaïs Cistófaro Silva 4 (1999) tem por escopo subsidiar a organização e descrição do sistema sonoro das línguas naturais. Há ênfase na caracterização das variedades do português brasileiro, no entanto, considerou-se esse detalhe indiferente para o fato de que as onomatopeias foram interpretadas pela pronúncia do idioma inglês. Thaïs apresenta a descrição das partes do sistema fonético, tais como: palato, alvéolos, lábios, dentes, etc. A anatomia da cavidade oral auxilia a descrição do modo de articulação, que pode ser; oclusivo, africado, fricativo, nasal e entre outros, ou lugar de articulação, bilabial, lábildental, alveolar, palatal, glotal, etc. Verificou-se que as maneiras de articulação revelam uma característica da onomatopeia que é de, através da própria articulação, promover a experiência sonora da representação sonora que ela propõe. Eisner (2001), afirma que, quando se examina uma obra em quadrinhos como um todo, a disposição dos seus elementos específicos assume a característica de uma linguagem, além de que a leitura da revista em quadrinhos é um ato de percepção estética e esforço intelectual, isto é, as onomatopeias lidas como imagem e são 4 SILVA, Thaïs Cristófaro. Fonética. In Fonética e fonologia do português : roteiro de estudos e guia de exercícios. 9. Ed. – São Paulo: Contexto, 2007. P. 32. 15 interpretadas semanticamente. Ao ler o quadrinho o indivíduo realiza uma pronúncia interna de cada fonema, a pronúncia do fonema produz uma impressão sonora, cada consoante produz uma gama de ruídos, as vogais melodizam a pronúncia e as vogais unidas às consoantes modificam o timbre das mesmas. O que define a sonoridade das onomatopeias é o modo de articulação dos dígrafos, de modo que o indivíduo associa as onomatopeias ao evento representado e realiza um processo de julgamento, no sentido de avaliar se a onomatopeia representa eficazmente a ideia sonora da situação correspondente. Passando por esse crivo a onomatopeia transmite a ideia sonora de modo convincente ou não. Seus ruídos, seus timbres e forma, devem possuir verossimilhança com a situação de um evento real. As onomatopeias podem ser convencionais, além de poderem ser padronizadas pelo próprio autor. Frank Miller faz uso seriado de várias onomatopeias, BLAM, para disparos de arma, BRAK, para disparo de metralhadora, sem alterar a finalidade, mas em diversas situações a onomatopeia serviu a mais de uma situação, por exemplo SNAP, em “Assassino amarelo”, é uma onomatopeia que representa a idéia sonora de um estilete, porém hora a onomatopeia expressa o som do estilete sendo acionado, hora expressa o som de uma pessoa sendo esfaqueada, além de que em “A cidade do pecado (The hard goodbye)” SNAP representa o ruído de um pescoço se quebrando e Marv algemando a Kevin. 16 Exemplo extraído da HQ “Assassino Amarelo”, Hartigan esfaqueia um soldado pelas costas. Exemplo extraído de “A Cidade do Pecado”, Marv algema Kevin. A onomatopeia é inserida no quadro de modo que o leitor faça uma leitura geral do quadrinho, considerando todo o plano de forma geral como uma arte a ser apreciada, independente do conteúdo. Will Eisner afirma que “quando se examina uma obra de quadrinhos, a disposição dos seus elementos específicos assume a característica de uma linguagem” 5. Um dos elementos marcantes de Sin City é a narração em primeira pessoa que caminha paralelamente aos acontecimentos, em voice over, em que os protagonistas descrevem sensações, pensamentos e questões-chave das tramas, essa característica da HQ de Miller foi mantida na adaptação de Rodriguez em uma tradução intersemiótica, ou seja aquilo que por meio do som é expresso com o mesmo ideal na plataforma gráfica, no caso, a imaginação da voz do protagonista pensando coisas pela sua própria descrição. Por outro lado, a adaptação de Sin City teve a trilha sonora como um elemento presente quase que em toda a adaptação e de um modo diferenciado, a música de Robert 5 EISNER, Will. Os quadrinhos como uma forma de leitura. In. Quadrinhos e arte sequencial; Will Eisner; Ed. Martins Fontes; São Paulo, 2001. pg 62 17 Rodriguez foi composta para texturizar a atmosfera de todo o filme e de modo que interagisse com todas as sequências, como um elemento narrativo. Orquestrações preparadas para planos e sequências foram observadas inúmeras vezes, sons de sintetizadores que harmonizavam a iminência de um disparo ou colisão de automóvel foram documentados em cada análise em que esse aspecto se apresentou conveniente à representação sonora da onomatopeia, pois nesses casos as texturas sonoras “artificiais”, no sentido de que foram produzidos para o evento em questão, estabeleceram um contraponto com o ruído, de modo a formar uma unidade sonora com o correspondente à onomatopeia. As imagens do quadrinho contribuem para a representação sonora, até mesmo a determinam, funcionando como um elemento complementar à onomatopeia e vice versa. Da mesma maneira verificou-se a expressiva influência das imagens na emissão sonora da adaptação de Robert Rodriguez. No desenvolvimento das análises das onomatopeias de Sin City alguns exemplos apresentaram essa característica em sua narrativa. Planos em que as imagens contribuíram para a impressão sonora de modo determinante. Essa característica é indicada com ênfase nas análises, dos exemplos em que, de diferentes modos, se manifestou. Um dos elementos importantes verificados, para a análise e que foi um ponto de base para a discussão que nasce a respeito da questão da adaptação cinematográfica, dos quadrinhos especificamente, é o conceito de timing postulado por Eisner (2001). O quadrinho representa o exato momento, do plano no caso da adaptação, que permite que toda a ação pode ser compreendida na interdependência de tempo, espaço e som. Apesar de não existir um debate, em termos de mercado, a respeito do acréscimo de novos planos (que modifiquem um posicionamento de câmera, eixo, ou de elementos do cenário), este aspecto é de interessante efeito neste caso, pois trata a narrativa com detalhes que influenciam diretamente na dimensão sonora, pois o disparo de um tiro em alguns casos deve ser representado do ponto de vista de quem dispara e daquele que é atingido. Arlindo Machado descreve esse fenômeno como linearização do fenômeno icônico 6, em que um mesmo evento não pode ser representado através de um mesmo plano. 6 MACHADO, Arlindo. A linearização da história. In. Pré-cinemas e Pós-cinemas. Campinas, SP: Papirus, 1997. COLOCAR A PAGINA 18 Marv arremessa um galão de combustível com um pano em chamas contra a casa de Kevin. O mesmo estrondo claramente se repete em cada plano. Extraído do filme Sin City “The Hard Goodbye” A explosão retratada no cinema. Extraído da HQ Sin City “The Hard Goodbye” A explosão retratada na história em quadrinhos. 19 20 DECUPAGEM DAS ONOMATOPEIAS EM Sin City “O assassino amarelo” ● Tempo 06:56 Det. John Hartigan dá um soco em Det. Bob / (HQ) KRAK ● Tempo 08:20 Hartigan dá um golpe na cabeça de Shlubb com um cano de metal / KONK A sonoridade gerada pelo impacto do cano de metal, em posse de Hartigan, é semelhante ao choque de um metal em outro, de modo que o barulho produzido dá a impressão de que se trata de um material muito pesado se chocando com outro. Onomatopaicamente falando a letra K produz um ruído bastante representativo na transmissão de um conceito sonoro a ser produzido no leitor ● Tempo 08:26 Hartigan sempre uma dor forte no peito e geme / (HQ) gemido: NGAAA NGAAA propõe uma compressão no peito, que se canaliza pela boca por causa da dificuldade de se pronunciar a consoante N em decorrência de haver a letra G logo em seguida. Como algo que impeça o fluxo de ar a sair para as cordas vocais do leitor, dessa maneira a dor sentida por Hartigan ganha a sua devida dramaticidade, dando a este seu problema uma relevância que será atestada futuramente no todo do enredo. ● Tempo 09:36 Hartigan arromba a porta. Hartigan geme com o esforço. / (HQ) porta: CRASHH - gemido: HUFF Hartigan arromba a porta do cativeiro de Nancy com o mesmo enquadramento de perfil, da cintura para cima, quando entra no recinto. No filme a sonoridade de CRASHH é um estrondo com som dos fragmentos da porta caindo pelo chão. ● Tempo 10:00 Hartigan efetua dois disparos / (HQ) BOOM ● Tempo 10:02 Roark Jr atira em Hartigan / (HQ) BLAM ● Tempo 10:40 Hartigan atira na orelha de Roark Jr / (HQ) BOOM ● Tempo 10:52 Roark Jr atira em Hartigan / (HQ) BLAM ● Tempo 10:57 Hartigan atira no antebraço de Roark Jr, decepando-o / (HQ) BOOM ● Tempo 11:01 Hartigan atira no órgão genital de Roark Jr / (HQ) BOOM ● Tempo 12:18-21 Bob atira várias vezes em Hartigan / (HQ ) BLAM (Este trecho ficou bem diferente da HQ, mas o contexto da ação é o mesmo, isto é, 21 depois de ter atirado três vezes e Hartigan não cair no chão, Bob termina o serviço quando Hartigan ameaça pegar uma arma reserva.) ● Tempo 01:30:37 - 01:31:37 Hartigan é torturado com socos no rosto / (HQ) KRAK ● Tempo 01:33:42 Roark Jr/Assassino “Amarelo” dá um soco em Hartigan / (HQ) CHOK Amarelo desfere um soco em Hartigan. Pensando sonoplasticamente, no sentido do processo de produção do som para a situação em questão, a sonoridade assemelha-se a um golpe de taco de beisebol numa chapa de metal. Talvez um papel sendo amassado simultaneamente possa ter sido gravado para fazer referência aos ossos de Hartigan sendo esmagados pelo golpe. A onomatopeia CHOK traz consigo o som molhado contido no ‘X’ de CHO talvez como uma analogia ao vento sendo cortado pela mão fechada de Amarelo em direção ao rosto de Hartigan e a letra K como um ponto culminante da colisão com o próprio. ● Tempo 01:40:42 Hartigan está no carro com Nancy, Amarelo está perseguindo os dois, quando então ele atira e atinge o vidro do carro de Nancy / (HQ) SPAK SPAK tem os elementos ideais para a sonoridade de um vidro sendo atingido pela bala de um revólver. A letra P somada à letra A traduzem verbalmente, com eficiência, um som característico para um vidro sendo atingido por um artefato de metal. No filme, o som deste mesmo ‘PA’ descrito na onomatopéia, o que nada mais é do que a possibilidade de reprodução via oral, é somado ao som do disparo da arma – que está no carro de Amarelo que persegue Hartigan e Nancy – e os estilhaços do vidro que cintilam ao final. ● Tempo 01:40:46 O carro de Nancy esbarra no canteiro da pista e um projéctil pega de raspão na lataria do carro / (HQ) : Projéctil: SPUKK - Esbarro: KUMP O plano está invertido, a cerca, que beira o canteiro lateral da estrada, está do lado oposto, no longa-metragem. Isto por causa do ângulo em que a ação vem sendo acompanhada pela câmera, talvez a mudança alteraria o seu eixo deslocando o interlocutor para outro ângulo e causando confusão. No plano o carro de Nancy esbarra num cercado que estoura e se arrebenta. A onomatopéia KUMP, tanto na HQ quanto na adaptação, está sob o seu objeto de origem: o pequeno poste do cercado no qual o carro de Nancy colide. Levando em consideração a situação 22 apresentada e pensando nos elementos da onomatopéia em si, as letras de KUMP segundo Schafer 7 possuem sons contínuos e descontínuos que podem ser prolongados pela voz. Não há uma descrição para a letra ‘K’ na biografia do alfabeto de Schafer, além de ele dizer que é uma letra que possui um som abrupto e descontínuo. A letra ‘U’ é segundo a descrição de Schafer vogal escura, preguiçosa, corpulenta. “Pode ter, também, uma qualidade reverberante ou subterrânea”.(Schafer 1991 pg 219). No filme a onomatopeia SPUKK não consta no plano. ● Tempo 01:41:26 Hartigan mira com cuidado e atira em Amarelo, atingindo-o no pescoço / (HQ) Tiro: BOOM - a bala quebra o vidro e atinge o pescoço de Amarelo: CASH ● Tempo 01:43:05 Amarelo aparece no carro do lado de fora e tosse / (HQ) CAFF ● Tempo 01:45:06 A cortina do boxe do chuveiro se abre / (HQ) CLAK CLAK ● Tempo 01:45:07 Amarelo dá dois socos em Hartigan / (HQ) KRAK KRAK ● Tempo 01:47:23 Amarelo empurra a mesinha na qual Hartigan está apoiado e Hartigan engasga com a corda / (HQ) engasgo: GLAKK De modo funcional, a pronúncia de GLAKK demanda, na letra G, a pronúncia de GA, antes do L, forçando um fechamento da garganta com a abertura da boca, tendo em seguida a necessidade de, em virtude de a letra L forçar o posicionamento da língua no céu da boca, com a boca aberta, chocando-se com a parte da boca que fica debaixo da língua. Em seguida a pronúncia do A, já boquiaberto e encerrando abruptamente com o K (que tem o som de QUI) que novamente força o fechamento da garganta com a língua. Este movimento, mais do que a referência verbal da palavra em si, parece ser muito mais mecânico do que gráfico. ● Tempo 01:47:57 Hartigan se balança na forca e atinge o vidro da janela com os pés / (HQ) CASHH ● Tempo 01:48:45 Hartigan dá um soco em Shlubb / (HQ) KUNK (a cena está modificada) 7 SCHAFER, R Murray. Quando as palavras cantam. In O ouvido pensante. São Paulo: Fundação Editora da Unesp, 1991. Pg216. 23 ● Tempo 01:49:18 Hartigan aciona um estilete no caminho para a fazenda / (HQ) SNAP! ● Tempo 01:50:05 Hartigan, a pé, tosse com dores no peito / (HQ) KHAFF ● Tempo 01:50:23 Hartigan aciona o canivete e espeta-o no pescoço de uma sentinela / (HQ) canivete: SNAP - pescoço: SHAKK ● Tempo 01:50:33 Hartigan espeta o canivete em outra sentinela / (HQ) SHAKK ● Tempo 01:50:48-53 Amarelo chicoteia Nancy várias vezes / (HQ) CRACK CRACK possui a sonoridade abrupta contida na consoante k e para o som de chicote a própria palavra chicote indica alguns elementos que descrevem a sonoridade de um som de chicoteio. No entanto, a subjetividade do som produzido e da gama de possibilidades para descrever a sonoridade na linguagem da onomatopéia, não exclui a escolha feita por Frank Miller (autor e desenhista da HQ, além de co-diretor do longa metragem) na onomatopéia CRACK, que produz um som mais truncado (fricativo) pela presença da letra R e o kick de CK no final. ● Tempo 01:51:54 Hartigan leva um tiro no braço direito / (HQ) SHPUKK ● Tempo 01:52:15 Hartigan atira nos dois policiais que se aproximam / (HQ) BRAK – BOOM BRAK sugere um disparo de uma arma do tipo metralhadora, que emite mais de um projétil, devido a sílaba BRA ter uma articulação um pouco mais longa e ritmada – como uma sequência de fusas (rítmica). Este tipo de sonoridade não é encontrada neste plano da ação. Os responsáveis pela trilha sonora neste caso claramente adaptaram a sonoridade de modo conveniente ao plano. Tanto na HQ quanto na adaptação audiovisual, Hartigan empunha duas armas, visivelmente diferentes uma da outra. Como há duas onomatopéias no quadrinho (BRAK e BOOM) e no filme Hartigan dá um tiro com cada arma (no total de dois tiros), cada tiro atinge um dos dois soldados. ● Tempo 01:52:16 Os dois policiais são atingidos pelas balas de Hartigan ao mesmo tempo em que gemem / (HQ) balas atingindo: SPUKK-SPUKK gemidos: GAKK – AAWK Os lugares de articulação de ‘GA’ é a parte posterior da língua (parte da língua próxima à garganta), no articulador ativo, e o véu palatino ou palato mole (parte do céu da boca próxima à garganta), no articulador passivo. A maneira de articulação desses dígrafos (GAKK e AAWK) é oclusiva. A vogal ‘A’ determina mais do que a 24 possibilidade de pronunciação da onomatopeia, indica articulação da boca, ou seja, trata-se de interjeições. ● Tempo 01:52:52 Hartigan tenta levantar a arma em direção a Amarelo, mas não consegue e a arma cai / (HQ) arma caindo: KUNK ● Tempo 01:53:23 Hartigan pega seu estilete e crava no estomago de Amarelo / (HQ) SNAP ● Tempo 01:56:26 Hartigan se suicida / (HQ) BOOM. Onomatopéia elencadas por ordem de incidência “Segundo a teoria de Schafer (1992 pg216) as palavras são um bracelete de encantamentos vocais. E contam ao ouvinte atento uma complicada história da vida.” BOOM (onomatopéia disparo de arma) Onomatopeia que caracteriza disparos de arma. Acontece em sete situações no filme. BOOM possui, na tabela fonética consonantal, uma pronúncia oclusiva bilabial vozeada. O articulador ativo é o lábio inferior e o articulador passivo é o lábio superior. A vogal ‘O’, no inglês, possui a pronúncia da vogal ‘u’ e os articuladores produzem uma passagem de ar semelhante à articulação fricativa, na qual os articuladores geram uma fricção quando ocorre a passagem de ar. A aproximação dos articuladores, no entanto não chega a causar obstrução completa e sim parcial. Acontece o anasalamento no final da pronúncia da onomatopeia. A onomatopeia tem uma característica estilística em sua tipografia. Em determinados momentos ela também faz referência à força do som. Esta propriedade sonora é sempre referenciada no emprego desta onomatopeia e de outras que representam a ideia sonora de explosões e outros fenômenos cuja marca tenha ligação direta com a ideia de algo muito ruidoso. • Tempo 10:00 Hartigan efetua dois disparos / (HQ) BOOM A sonoridade dos disparos possui características bastante análogas à onomatopeia BOOM, as frequências de grave tem uma grande relação com a pronúncia anasalada e a abrupticidade da bilabial ‘BO’ representa o estrondo do disparo. ● Tempo 10:40 Hartigan atira na orelha de Roark Jr / (HQ) BOOM 25 No filme, o plano conta com uma trilha sonora de suspense em crescendo que conduz ao ponto clímax em que Hartigan atira em Roark Jr arrancando sua orelha. No quadrinho, a onomatopeia está inserida na ação e a tipografia estilizada se propõe também como um elemento da cena que expressa a força do disparo. 26 Hartigan atira na orelha de Roark Jr (Imagem extraída da HQ “O assassino amarelo). ● Tempo 10:57 Hartigan atira no antebraço de Roark Jr, decepando-o / (HQ) BOOM Pensando no aspecto referente ao timbre e numa analogia para uma situação sonoplástica, poderíamos pensar no estrondo de uma porta de metal sofrendo a pancada de um ponta pé e, adicionado a isso, um som semelhante ao fio de uma espada representando o braço de Roark Junior sendo atingido. Quando se analisa o ruído do plano um ruído é nitidamente somado ao disparo de Hartigan. ● Tempo 11:01 Hartigan atira no órgão genital de Roark Jr / (HQ) BOOM Neste caso trata-se da mesma sonoridade do exemplo anterior do plano em que Hartigan atira no antebraço de Roark Jr, porém sem o som adicional (semelhante ao fio de uma espada) e este aspecto deve ser considerado pela importância na narrativa sonora da realização, tal como na distinção dos eventos apresentados. 27 ● Tempo 01:41:26 Hartigan mira com cuidado e atira em Amarelo, atingindo-o no pescoço / (HQ) Tiro: BOOM O objeto sonoro deste plano vai afunilando em direção a um pianíssimo, ao mesmo tempo em que um zoom penetrante vai enquadrando o rosto de Hartigan, que narra em voz over, de modo que apenas o ruído do pneu atropelando o solo cheio de neve pode ser ouvido. Quando Hartigan tem seu rosto enquadrado ao fundo e o cano do revolver fica em primeiro plano, então ele dispara o tiro em direção a Amarelo. O plano foi modificado em relação ao posicionamento da câmera. ● Tempo 01:52:15 Hartigan atira nos dois policiais que se aproximam / (HQ) BRAK – BOOM Hartigan se vira e dispara dois tiros, um em cada soldado. Hartigan está utilizando uma arma a mais, conseguida no combate que acabara de ter, a segunda arma é a nova arma, logo, BOOM corresponde ao primeiro disparo, já que Hartigan atira primeiro com a sua antiga arma. Este exemplo demonstra a preocupação de Frank Miller em utilizar a mesma fonte sonora para o mesmo objeto, isto é, BOOM é a onomatopeia utilizada para representar a ideia sonora do disparo da arma de Hartigan. ● Tempo 01:56:26 Hartigan se suicida / (HQ) BOOM. Mais uma vez a sonoridade é exaltada como protagonista na narrativa da cena em questão. A onomatopeia BOOM toma toda a página no suicídio de Hartigan, de modo a dar o desfecho de uma forma antológica, dividida em duas partes BO – OM, a onomatopeia também, dessa forma expressa a força do ruído pelo tamanho da fonte empregado. BLAM (onomatopéia disparo de arma) A onomatopeia BLAM caracteriza o disparo de uma arma. No âmbito da fonética da onomatopeia, o lugar de articulação da consoante ‘b’ é bilabial, onde o articulador ativo é o lábio inferior e o articulador passivo o lábio superior e a maneira de articulação é oclusiva, onde os articuladores produzem uma obstrução completa da passagem da corrente de ar através da boca. Em seguida emenda-se a consoante ‘L’, cujo lugar de pronúncia é conhecido como alveolar, pois o articulador ativo é o 28 ápice ou a lâmina da língua e como passivos os alvéolos (parte rajada do céu da boca). No final ‘AM’ a onomatopeia é concluída com uma articulação anasalada. ● Tempo 10:02 Roark Jr atira em Hartigan / (HQ) BLAM Roark Jr dispara contra Hartigan, atingindo um seu braço esquerdo. O posicionamento da câmera é invertido, Hartigan, tanto na HQ quanto no filme, é atingido no braço e também geme nos dois formatos. O tema musical orquestrado e bastante exasperado, com notas tocadas de modo lírico e sob uma harmonia tensa, dá o chão da ação com naipes de metal que causam a impressão de suspense. ● Tempo 10:52 Roark Jr atira em Hartigan / (HQ) BLAM Em comparação não é difícil chegar à conclusão de que os ruídos produzidos pelo disparo da arma de Roark são idênticos, indicando que se trata da mesma fonte sonora. O que restaria saber, para definir a questão de que os sons vieram a ser pensados de modo a criar uma identidade para cada objeto, é se o ruído é artificial ou não. Como na produção de Rodriguez não existe uma fonte que permita identificar tal condição, pelo menos nesse caso, a análise prática assume o critério de avaliação para este quesito. O disparo de Roark gera um segundo som, todos num mesmo espectro, acrescentado de um delay que o leva a se repetir sutilmente. Este efeito contribui para representar a ideia de ar livre, visto que o delay funciona muito bem como uma espécie de eco. ● Tempo 12:18-21 Bob atira várias vezes em Hartigan / (HQ ) BLAM (Este trecho ficou bem diferente da HQ, mas o contexto da ação é o mesmo, isto é, depois de ter atirado três vezes e Hartigan não cair no chão, Bob termina o serviço quando Hartigan ameaça pegar uma arma reserva.) O primeiro aspecto a se destacar é a característica gráfica da onomatopeia. Neste exemplo, apesar de a cena ter sofrido adaptações quanto a número de planos, posicionamentos de câmera e outros mais sutis, como a diferença física dos personagens (algo que segundo o que afirma Ismail Xavier 8 não possui relevância do ponto de vista da narrativa), a onomatopeia indica força do ruído do disparo da 8 XAVIER, Ismail. Do texto ao filme: a trama, a cena e a construção do olhar no cinema. In Literatura, cinema e televisão/Tânia Pelegrini...[et al]. São Paulo: ed. Senac São Paulo: Instituto Itaú Cultural, 2003. Pg62. 29 arma e organiza o espaço gráfico na HQ com um tamanho grande e de fonte estilizada. KRAK (onomatopéia de soco) Representa a idéia sonora de soco. Foneticamente KRAK possui o intrincamento da oclusiva ‘K’ somada a consoante velar ‘R’, em que o articulador ativo é a parte posterior da língua (próxima à garganta) e em seguida emenda o fricamento em que a lâmina da língua funciona como articulador ativo sob os alvéolos não chegando a encostar (região rajada do céu da boca) e a vogal ‘A’, com a pronúncia da vogal ‘e’ proporcionando a abertura da mandíbula, seguindo com a oclusiva ‘K’. Seu efeito sonoro faz referência a ossos se quebrando, como em um esmagamento ou pancada muito forte. ● Tempo 06:56 Det. John Hartigan dá um soco em Det. Bob / (HQ) KRAK Na adaptação de Rodriguez o golpe desferido por Hartigan é representada em um plano americano em que é possível visualizar os personagens de lado, diferentemente do quadrinho em que os dois personagens são retratados no plano numa posição que os enquadra de cima, uma espécie de Plongée. A sonoridade é seca e tem a mesma sonoridade da cena em que Hartigan é (tempo 01:30:37). Os ruídos de socos são produzidos através dos sintetizadores. ● Tempo 01:30:37 - 01:31:37 Hartigan é torturado com socos no rosto / (HQ) KRAK Pela comparação com o ruído do plano em que Hartigan desfere o golpe em Det. Bob é possível identificar a representação do golpe por sintetizadores. Três golpes são desferidos contra Hartigan e a onomatopeia KRAK representa os três. ● Tempo 01:45:07 Amarelo dá dois socos em Hartigan / (HQ) KRAK KRAK No filme, os dois golpes são desferidos em Hartigan da maneira como foi retratada na HQ de Frank Miller. O plano é enquadrado com um close do rosto de Hartigan. A linguagem imagética é parte da representação sonora, pois ilustra o golpe com a onomatopeia disposta sobre a ação com um aspecto quebradiço. SPUK (projéctil atingindo objeto) A consoante fricativa ‘S’ é pronunciada independentemente antes da oclusiva bilabial ‘P’, os articuladores não chegam a causar obstrução completa e sim parcial 30 do ápice da língua (região da ponta da língua) com os alvéolos, produz uma ideia sonora de vento sendo cortado pela velocidade do objeto, implodindo em ‘P’. A vogal ‘U’ força uma pronúncia fechada (ou alta) posterior da consoante ‘P’ antes de finalizar na oclusiva velar ‘K’. • Tempo 01:51:54 Hartigan leva um tiro no braço direito / (HQ) SHPUKK Amarelo ameaça Nancy e a música começa a soar com trompetes ornamentados, enquanto Amarelo sai do plano médio para o primeiro plano. Enquanto a música continua a crescer; no plano seguinte, Hartigan corre num plano médio e seu braço explode com um tiro recebido pelas costas. O plano se dá em uma espécie de câmera lenta e o ruído do tiro é reverberado, de modo que o efeito da câmera lenta tem certa correspondência sonora. • Tempo 01:52:16 Os dois policiais são atingidos pelas balas de Hartigan ao mesmo tempo em que gemem / (HQ) balas atinjindo: SPUKK-SPUKK gemidos: GAKK – AAWK Hartigan atira nos dois soldados e, no plano seguinte, os soldados recebem os tiros. Essa montagem deixa evidente o fato de que a narrativa requer uma exclusividade de informações de modo que o interlocutor possa compreender plenamente apenas aquilo que se pretender narrar, afim de que não haja um desvio de atenção ou uma interpretação ambígua da cena. CASH (vidro sendo atingido) Presença da oclusiva velar desvozeada ‘C’ (igual a K) com a vogal ‘A’ aberta (ou baixa) anterior e a fricativa dental alveopalatal desvozeada SH (chi), Schafer descreve a sua sonoridade como ruído branco, espectro total de frequências de sons aleatórios. O tilintar de cacos de vidro ao chão tem as características da sonoridade representada por ‘SH’, sua abrupticidade inicial faz referência ao vidro sendo atingido pela força de um objeto em ‘CA’. ● Tempo 01:41:26 Hartigan mira com cuidado e atira em Amarelo, atingindo-o no pescoço / (HQ) Tiro: BOOM - a bala quebra o vidro e atinge o pescoço de Amarelo: CASH Um silêncio total precede o disparo de Hartigan contra Amarelo. No plano seguinte ao disparo, que tem Hartigan mirando contra Amarelo em primeiríssimo plano, Amarelo é atingido e o disparo quando atinge o vidro do carro, produz um ruído de 31 projétil esbarrando. A onomatopeia possui a oclusiva velar desvozeada ‘CA’ aberta e ‘SH’ representa a ideia dos estilhaços gerados pelo disparo. ● Tempo 01:47:57 Hartigan se balança na forca e atinge o vidro da janela com os pés / (HQ) CASHH Hartigan quebra o vidro da janela. O ruído é simples e claro e é muito provável que o ruído seja do próprio vidro da janela quebrado. CAFF (som de tosse) A onomatopeia Oclusiva velar desvozeada ‘C’ (igual a K) com a vogal ‘A’ aberta (ou baixa) anterior e a fricativa labiodental desvozeada ‘F’. Em ‘F’ a repetição aumenta a força da tosse, dando a sensação de tensão do pulmão ou asfixia. ● Tempo 01:43:05 Amarelo aparece no carro do lado de fora e tosse / (HQ) CAFF A tosse de Amarelo chega a ser tão baixa que se assemelha a um pequeno engasgo. Essa foi a solução encontrada por Rodriguez a fim de realizar o quadro da HQ de modo mais fiel possível. 32 ● Tempo 01:50:05 Hartigan, a pé, tosse com dores no peito / (HQ) KHAFF O som diegético de Hartigan, no sentido dos ruídos que o personagem percebe, fica em segundo plano à sua voz que narra os fatos e a música que junto à voz narrativa de Hartigan predominam no objeto sonoro. Desse modo, a tosse de Hartigan é 33 percebida, mas bem baixa, tendo o apoio de sua imagem a tossir em um plano médio. SNAP (som de estilete) A consoante fricativa alveolar desvozeada ‘S’ corta o vento com a velocidade do movimento, ou representa a ideia de um objeto deslizando sob outro, além da ideia de corte representada nesta história. A consoante nasal alveolar ‘N’ é dental, as nasais são consoantes idênticas às oclusivas diferenciando-se apenas quanto ao abaixamento do véu palatino para as nasais (ex. má, nua, banho). Unida à vogal ‘A’ tem sua pronúncia aberta e encerra-se com a oclusiva bilabial desvozeada ‘P’. Esta representação sonora possui características fonéticas bastante distintas, pois possui diversos modos de articulação, produzindo assim uma gama de ruídos variados. Por associação SNAP é uma onomatopeia que necessita do auxílio da imagem para que o interlocutor faça a relação, diferentemente de BLAM, por exemplo. ● Tempo 01:49:18 Hartigan aciona um estilete no caminho para a fazenda / (HQ) SNAP! Nesta história Frank Miller padroniza a onomatopeia SNAP para a situação do uso do canivete, ou estilete, diferentemente do uso feito em “A Cidade do Pecado” onde o emprego da onomatopeia se dá no click das algemas de Marv (Tempo 37:25) e no pescoço do soldado de Roark se quebrando (Tempo 40:27). Neste exemplo Hartigan aciona o estilete. O ruído é natural do próprio instrumento. ● Tempo 01:50:23 Hartigan aciona o canivete e espeta-o no pescoço de uma sentinela / (HQ) canivete: SNAP - pescoço: SHAKK Uma série de ruídos pode ser percebida na ação. Hartigan agarra o soldado, abre o estilete e esfaqueia-o. O ruído contido no fonema da consoante sibilante ‘S’ é o único percebido no momento em que o policial aciona o instrumento. ● Tempo 01:53:23 Hartigan pega seu estilete e crava no estomago de Amarelo / (HQ) SNAP Ressalto novamente o ruído da consoante fricativa alveolar “sibilante” ‘S’ no ato de acionar o canivete de Hartigan. SHAKK (Canivete entrando no corpo) A fricativa dental alveopalatal desvozeada SH (chi), somada à vogal ‘A’ produz a sensação de algo muito molhado. A oclusiva velar desvozeada ‘K’ é descrita como explosão subterrânea das cordas vocais. A onomatopeia também sugere o corte, já que a consoante ‘S’ sugere o deslize do dedo sobre a mesa, ou corte de um objeto 34 por uma lâmina de metal. A vogal ‘A’, aberta (baixa) anterior, também desempenha papel fundamental na expressão do efeito de corte requerido nesta situação, um exemplo disso é a onomatopeia CHIKK (presente em A Cidade do Pecado), que representa a ideia sonora de isqueiro, ou o ato de engatilhar uma arma. A única diferença fonética em relação a SHAKK é a vogal ‘I’, que é fechada (alta) anterior. • Tempo 01:50:23 Hartigan aciona o canivete e espeta-o no pescoço de uma sentinela / (HQ) canivete: SNAP - pescoço: SHAKK O canivete entra no pescoço do soldado. O golpe de Hartigan tem o ruído de um golpe muito rápido que corta o ar e possui uma sonoridade fricativa e que lembra a pronúncia da consoante ‘F’ junto à vogal ‘U’, por exemplo. • Tempo 01:50:33 Hartigan espeta o canivete em outra sentinela / (HQ) SHAKK O ruído soa como se fosse um golpe seco (como um soco) em um pedaço de carne grande. Essa descrição é apenas uma das possibilidades e em análise, o ruído produzido é o próprio movimento dos atores, cuja sonoridade não habita de modo determinante na dimensão da sonoplastia. KUNK ‘K’ é oclusiva velar desvozeada, uniforme em quase todos os dialetos. Numa análise mais antiga, mais para o começo da decupagem das análises observei a referência que o caráter abrupto contido na consoante K faz ao contato de um metal com o outro. A sonoridade gerada pelo impacto do cano de metal, em posse de Hartigan, é semelhante ao choque de um metal em outro, de modo que o barulho produzido dá a impressão de que se trata de um material muito pesado se chocando com outro. Onomatopaicamente falando a letra K produz um ruído bastante representativo na transmissão de um conceito sonoro a ser produzido no leitor. A mudança de vogal, neste caso a vogal ‘U’ fechada (ou alta) posterior, não altera a característica sonora mesma de KONK. ● Tempo 01:48:45 Hartigan dá um soco em Shlubb / (HQ) KUNK (a cena está modificada) O golpe de Hartigan contra Shlubb está sobre uma atmosfera sonora completamente silenciosa e é nitidamente produzido por sintetizadores. O ruído é produzido 35 (foneticamente) por uma consoante oclusiva bilabial e a onomatopeia KUNK foge dessas características fonéticas, pensando no ponto de vista da adaptação. ● Tempo 01:52:52 Hartigan tenta levantar a arma em direção a Amarelo, mas não consegue e a arma cai / (HQ) arma caindo: KUNK A arma de Hartigan cai no chão. O chassi de metal da arma produz um ruido característico da consoante ‘K’. O tipo de material influencia na interpretação do leitor. 36 37 DECUPAGEM DAS ONOMATOPEIAS EM Sin City “A cidade do pecado” Análise das onomatopeias dos quadrinhos em relação ao filme ● Tempo 15:21 Marv estoura a porta sobre os policiais / (Quadrinho) onomatopéia da porta estourando com o golpe de Marv: SKREKK, KOK No filme o estrondo da porta se arrombando possui uma sonoridade de algo semelhante a um choque de um bastão com algo semelhante a um capô de automóvel e em seguida um vaso de barro cheio de areia sendo arremessado contra o chão com alguns pedaços de pau caindo no chão para representar os pedaços da porta esmigalhada (provavelmente constituída de um isopor fragmentado e colado com uma cola fina que facilita o seu quebramento), além de alguns ruídos adicionais, como o sax executando uma melodia tensa ao fundo de toda a ação, acompanhado por um contrabaixo sombrio, pois executa um acompanhamento harmônico constante e semitonado, ritmicamente constante e que ilustra toda uma atmosfera sombria na ação. Essa maneira de se interpretar a sonoridade tem como referencial o texto de Schaffer (1991 pg:36) denominado Música Descritiva em que os sons da natureza são descritos e emulados através de outros instrumentos, musicais ou não. Essa ideia é um verdadeiro exercício de percepção e discernimento dos sons. Marv destrói a porta do apartamento com uma força inacreditável. Visualmente o efeito da porta se quebrando é bastante importante para ilustrar a intenção do plano. Marv é um cara durão. Portanto, é de se considerar que Marv está ainda sendo apresentado ao interlocutor, nos minutos iniciais, então o emprego da cena de modo mais brutal e rude possível é importantíssimo para que o estilo e as características gerais do personagem sejam definidos. A reflexão, os conceitos e os recursos sobre o cinema também auxiliam a investigação da expressão sonora da realização audiovisual, tal como também da HQ. ● Tempo 15:23 Marv dá uma cotovelada no soldado, que é arremessado longe / (Quadrinho) onomatopéia da cotovelada: KUDD ● Tempo 15:24 Marv se joga pelo vão da escadaria do hotel, um soldado atira / (Quadrinho) onomatopéia do tiro: POOM OBS: Todos os tiros single da ação, no quadrinho são produzidos com a onomatopéia POOM, sons de metralhadora com a onomatopéia BREKKK. Tiros acertando a parede: SPAK 38 ● Tempo 15:32 Marv se arremessa pela janela quebrando o vidro com seu corpo / (Quadrinho) onomatopéia do vidro se quebrando: KASHH ● Tempo 15:38 Marv cai sobre os sacos de lixo / (Quadrinho) Marv caindo sobre os sacos: WUMP ● Tempo 15:41 Sirene da polícia se aproximando / (Quadrinho) Som da sirene: EEEEEEEEEEEEEEEEEE Na realização de Robert Rodriguez a sonoridade da sirene possui uma tonalidade de reverb (espécie de eco) e uma segunda sirene com uma sonoridade mais grave e que sobe de frequência com uma força maior, no sentido próprio da palavra, isto é, do volume; dando a impressão de maior proximidade, auxiliando a sonoridade ambiente da sirene original. Da mesma forma a trilha sonora, presente praticamente em todo o filme, tem uma dinâmica de continuidade ao início da cena (cerca de 15:21), quando Marv percebia a presença da força policial que o cercava e a narrativa era acompanhada por um sax executando uma melodia tensa ao fundo de toda a ação, acompanhado por um contrabaixo igualmente sombrio. A onomatopeia EEEEEEEEEEE surge em dois quadros da história gráfica de Frank Miller e o primeiro ponto a se destacar é o gráfico, obviamente, o da composição do quadro. No primeiro plano, está Marv caído no chão sobre os sacos de lixo e a onomatopeia EEEEEEEEEE está em perspectiva no canto esquerdo superior, dando a ideia de profundidade, aludindo ao fato de que há um ruído, contínuo, pois a onomatopeia lança mão de apenas uma letra, e crescente, pois a vogal cresce gradativamente, trabalhando a ideia de volume e proximidade. Além disso, contribui para um equilíbrio na composição do quadro. A parede com tijolos auxilia o traçado da perspectiva formado pela onomatopeia. No segundo quadro a onomatopeia é uniforme (não muda de tamanho) e acompanha o trajeto do automóvel em direção a Marv. A pronúncia de ‘E’ será considerada pela forma como é pronunciada no inglês, pois, apesar de o quadrinho ter sido traduzido para o idioma português e, obviamente, ter como interlocutor o nativo de língua portuguesa, a interpretação feita para a plataforma audiovisual foi feita na concepção do idioma inglês. Então, é de se concluir que as onomatopeias, traduzidas para o português ou não, estão sendo consideradas como inglesas no que diz respeito às regras fonéticas e as análises mais técnicas desta ciência estão sofrendo as devidas adaptações, isto é, por exemplo, a vogal ‘E’ é analisada como ‘i’ em seu lugar e modo de articulação. ‘E’ (pensada como o som da vogal ‘i’) tem uma pronúncia fechada (ou alta). A 39 onomatopeia tem a oscilação de volume (característica marcante da sirene) sugerida pelo aumento do tamanho da fonte, então, a onomatopeia lança mão, de modo determinante, do elemento gráfico, para se complementar na dimensão sonora. Esse é um grande exemplo da força visual da onomatopeia. ● Tempo 15:44 Marv pula com os dois pés sobre a cabeça dos policiais pelo vidro da viatura, quebrando-o / (Quadrinho) som do vidro se estilhaçando na colisão com os pés de Marv: SKAK ● Tempo 15:45 Viatura colide com a parede / (Quadrinho) colisão: SSKEEEEEWHUMPP A colisão da viatura tem uma sonoridade bastante característica de um automóvel em tal situação. A batida do automóvel é abrupta e tremeliques de vidro se estilhaçando podem ser ouvidos. O plano tem uma cama harmônica sombria dando a atmosfera do ambiente e da situação no seu objeto sonoro. A onomatopeia SSKEEEEEWHUMPP possui um modo fricativo na inicial ‘SS’ que emenda com a oclusiva K, onde os articuladores produzem uma obstrução completa da passagem da corrente de ar através da boca, vindo em seguida a vogal fechada E (que tem a pronúncia da vogal ‘i’ em português). A idéia de sonoridade sugerida pela repetição da vogal ‘E’ é a de movimento, neste caso compreende-se uma derrapagem que antecede o choque com a parede que acontece na oclusiva ‘P’ da onomatopeia. Como o lugar de articulação de WHUM [uãm] é palatal, isto é o articulador ativo é a parte média da língua e o articulador passivo é a parte final do palato duro (por exemplo: banha, palha) presume-se que este é o final da derrapagem. ● Tempo 15:48 Marv desfere um soco no soldado quebrando um vídro / (Quadrinho) vidro SKAK. Soldado 1 leva soco: Aaa / Soldado 2 leva soco: GAAA ● Tempo 16:48 Lucille Engatilha o revolver / (Quadrinho) CHICKK Este plano foi filmado com as mesmas características da HQ de Frank Miller, a personagem Lucille retira de uma gaveta o revolver e engatilha-o com uma pose sensual. Neste caso, Frank Miller se valeu do recurso imagético para enfatizar a onomatopeia, o plano todo, isto é, a pose de Lucille, seu olhar e a iluminação. No filme o mesmo acontece e o recurso da trilha sonora é também empregado, um contrabaixo em volume tênue introduz a cena, num clima de suspense. 40 ● Tempo 17:16 Marv abre a tampa do remédio / (Quadrinho) POK A onomatopeia no quadrinho está numa composição diferente da adaptação de Rodriguez. No quadrinho Marv agradece o remédio e diz: “você é o máximo” (thanks, you’re the best) já estourando a tampinha do remédio. Na adaptação Marv agradece num close up de seu rosto e depois, num plano detalhe em sua mão, abre a tampa do remédio. A onomatopeia POK tem foneticamente a mesma sonoridade da tampinha do frasco se abrindo. O ruído emitido no filme é ambiente, não foi editado posteriormente. Rodriguez pode ter utilizado um microfone direcional (BOOM) para captar o som emitido na sua melhor dimensão, a fim de se ter a melhor representação para o seu plano detalhe. ● Tempo 18:58 Marv, após entrar pelo beco, dá de encontro com uma porta que é socada por dentro (Um homem está batendo em outro) / (Quadrinho) WHUMP 41 ● Tempo 19:00 O homem atira o outro para fora do estabelecimento / (Quadrinho) PUNT PUNT sugere um ponta pé no traseiro do homem espancado, a onomatopeia traz a ideia de ponta pé e a articulação é oclusiva fechada. No filme o ponta pé acontece, mas a sonoridade emitida não corresponde ao ponta pé e sim a um ruído produzido pelo esbarramento do corpo do homem espancado na porta. ● Tempo 19:09 Marv é insultado e crava seus dedos nos olhos do homem / (Quadrinhos) KRNCH A onomatopeia KRNCH propõe uma ideia sonora de esmagamento, como uma mastigação de um alimento. Claramente o ruído do plano é editado em sonoplastia, de modo que quando Marv é insultado pelo “brucutu” ouve-se o ruído duas vezes. Nesta cena a edição sonora atua fortemente. Quando o homem cai na mesa sons de copos caindo podem ser ouvidos, todavia não há copos na mesa. Isto posto, ressalto o objeto sonoro e a sua independência das imagens quando a sonoridade proposta é de um objeto ou fenômeno conhecido. A onomatopeia KRNCH não possui vogais e isso é um aspecto interessante a se considerar. Schafer afirma que as consoantes são o esqueleto das palavras, elas determinam o ritmo (Schafer 1992 pg224). O ruído no senso comum significa barulho, som ou poluição sonora. A cacofonia desta onomatopeia se dá exatamente pela ausência de de vogais. As articulações oclusiva ‘K’ e ‘CH’ com som de ‘ti’, fricativa em ‘R’ e nasal em ‘N’ estão presentes. ● Tempo 20:44 Marv é levado para um beco por matadores, onde os domina e usa o braço do adversário para atingir o outro / (Quadrinho) BLAM ● Tempo 21:10 Marv dá um soco no matador com a arma / (HQ) WHUKK Marv desfere um gancho no queixo do matador e o primeiro aspecto que pode ser observado do ponto de vista da adaptação é o da imagem. O posicionamento da câmera é diferente do ponto de vista da HQ. Entretanto a direção do filme observou o movimento do golpe do personagem da maneira como ele se deu na HQ. No filme a sonoridade desse golpe é forte e ruidosa, seu ruído tem uma cama sonora, uma harmonia sem movimento e com uma dinâmica, aumentando e diminuindo o volume, como se fosse uma bolha dentro da água, algo próximo à ideia de dilatação e contração. 42 A pronúncia de WHUKK começa com a pronúncia fechada (ou alta) de WHU, com a sonoridade da vogal ‘u’ e em seguida a oclusiva K, que é oclusiva e é pronunciada como ‘qui’ nesse caso. • Tempo 21:42 Marv executa o matador com um tiro na cabeça / (HQ) BLAM ● Tempo 22:03 Marv coloca a cabeça de Tommy na privada / (HQ) FLSHH Mais uma onomatopeia sem a presença de vogais, trabalha com a ideia de água em movimento e sugere o som sibilante com a consoante ‘S’. A maneira de articulação fricativa revela uma característica da onomatopeia que é de, através da própria articulação, promover a experiência sonora da representação sonora que ela propõe. O modo fricativo está na consoante ‘F’, os articuladores se aproximam produzindo fricção quando ocorre a passagem central da corrente de ar. Em relação à letra ‘L’ nada mais pertinente para esta situação do que a descrição de Schafer (1992 pg217) para esta consoante cujo lugar de articulação ativa, denominado pelas leis fonéticas do idioma português como alveolar, é o ápice ou a lâmina da língua e como articulador passivo temos o alvéolo, parte rajada do céu da boca próxima ao dente. O ruído da água produzido também é ambiente. A trilha sonora faz a cama atmosférica, o som de bongo com o saxofone podem ser ouvidos com nitidez. ● Tempo 22:20 Marv acelera com o carro arrastando a cabeça de Tommy pela rua / (HQ) IÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁ! O plano da adaptação ficou bem próximo da HQ e possui praticamente todos os elementos do quadro original. A interjeição não confere no filme. O homem, no filme, já parece estar morto e o único ruído percebido é o do atrito do rosto com o chão em movimento. 43 ● Tempo 23:10 Marv revela ao padre que sabe de toda a armação engatilha sua arma / (HQ) engatilho da arma: CHKCHAKK 44 Aqui, na onomatopeia, há um espectro total de frequências aleatórias, pois a representação das oclusivas mescladas com a consoante neutra ‘H’ (duas vezes), que segundo Schafer possui uma ideia inicial de ar, especialmente efetivo em árabe, onde é pronunciado com uma explosão no peito, e a vogal ‘A’ que facilita a pronúncia; alternam e dão a ideia sonora de ruído no ato de engatilhar a arma de Marv. A presença das oclusivas é o elemento que dá a característica do ato de engatilhar, como o atrito de um metal com o outro. ● Tempo 23:40 Marv é insultado e dá três tiros no Padre / (HQ) BLAM ● Tempo 24:03 Marv sai da igreja e, quando está prestes a entrar no mercedes do Padre, ouve o carro da irmã de Goldie, Wendy, vindo a toda velocidade derrapando os pneus / (HQ) som derrapagem: SKREEEEEEE (duas vezes) ● Tempo 24:06 Marv engatilha sua arma para atirar em Wendy (somente o som. a imagem é de Wendy dirigindo) / (HQ) CHKK ● Tempo 24:12 Marv reconhece o rosto de Goldie (Wendy, irmã gêmea) e é arremessado longe pelo carro / (HQ) som da colisão: WHUMPP, som de Marv gemendo: GHAA Goldie (Wendy) derrapa com o carro mais duas vezes, além de atingí-lo e efetuar dois disparos, tudo na mesma sequência. As onomatopéias se repetem. Derrapagens: SKREEEEEEE / Tiros: BLAM / Colisões contra Marv: WHUMPP ● Tempo 25:00 Marv vai até a fazenda onde o Padre diz estar o assassino de Goldie (North Cross com a Lennox) e é recepcionado por um cão feroz. Marv ouve o ganir do cão / (HQ) RRRRRRRRRRRRRRR ● O cão late / (HQ) ROWF Destacar neste trecho a função preponderante do K na sonoridade dos golpes no combat entre Kevin e Marv. ● Tempo 25:20 Marv é atacado pelo cão e desfere dois golpes no cão / (HQ) WHUKKK, KUNK Mais uma vez o ruído dos dois golpes foi produzido através de um sintetizador. Obviamente, trata-se de uma cena realizada na montagem, basta observar o bote do animal e, principalmente na qualidade do som dos dois golpes desferidos por Marv, uma das características é que o timbre é evidentemente artificial. A consoante oclusiva ‘K’ está presente e a sua pronúncia é oral e fechada. ● Tempo 25:49 Marv leva o primeiro golpe de Kevin / (HQ) WHUNGG 45 O golpe de Kevin sobre Marv é sutilmente precedido por um ruído que forma uma sonoridade fricativa semelhante ao som da consoante ‘s’, como uma espécie de lance de ar que é impulsionado pelo movimento de Kevin. Em análise à onomatopeia, este ruído pode ter a sua correspondência em ‘WHUN’ que é uma composição silábica de articulação alta e fechada. O trauma do golpe fica todo concentrado na consoante ‘G’ que é oclusiva e tem o seu lugar de articulação denominado como velar, pois o articulador ativo é a parte posterior da língua e o articulador passivo é o véu palatino, ou o palato mole (parte superior do céu da boca próxima às amigdalas). ● Tempo 25:50 Marv cai no chão / (HQ) BLAMKRAK A onomatopeia BLAMKRAK sugere o golpe uma série de ruídos distintos e que não se referem a um único evento. Na HQ de Frank Miller, BLAM é claramente uma onomatopeia de disparo de arma, primeiramente pelo fato de possuir diversas outras incidências em Sin City, criando assim uma base referencial quase imutável, e em segundo lugar por ter no próprio quadro do plano na HQ, a arma sendo disparada acidentalmente na mão de Marv. A onomatopeia KRAK segue emendada à BLAM e representa, por sua vez, o choque do corpo de Marv com uma cerca (coisa que não acontece na adaptação de Frank Miller). Isto posto, e até aqui, podemos concluir que a adaptação não segue o evento a fio, ou seja, da maneira como Miller o representou em sua graphic novel, pois Rodriguez eliminou a cerca, na qual Marv se choca, no quadrinho, e sua arma não é disparada, sendo posteriormente arrancada de sua mão com uma patada de Kevin. A adaptação sofreu algumas mudanças em relação à HQ. Na minha interpretação o plano referente a onomatopeia BLAMKRAK vem depois do próximo plano (na HQ) que tem a onomatopeia THUKKK como referencial sonoro (tratar da reorganização dos eventos como uma forma de concatenar a narrativa). O segundo ponto em que se verifica uma modificação expressiva (levando em conta a questão da fidelidade) é o enquadramento do plano cujo posicionamento da câmera se encontra por de trás de Marv. ● Tempo 25:51 Kevin acerta um chute cruzado no pescoço de Marvin / (HQ) THUKKK Muda-se o enquadramento do plano na ação fílmica, mas o motivo é o mesmo. Kevin desfere um high kick (chute alto) cruzado na face esquerda de Marv. 46 O lugar de articulação na pronúncia de THU é conhecido como Alveolar 9 onde o articulador ativo é o ápice ou a lâmina da língua (região da ponta da língua) e como articulador passivo os Alvéolos (região rajada do céu da boca). Os articuladores produzem a obstrução completa da passagem da corrente de ar através da boca, liberando o ar subitamente, característica da maneira oclusiva, também contida em KKK [qu’i]. Essas características já foram evidenciadas em diversas situações de golpe. Como a questão da onomatopeia é fundamentalmente sonora, apesar de a influência da imagem ser algo bastante importante, a mudança do posicionamento da câmera na adaptação não modificou o motivo original do plano, influenciando em muito pouco na análise em questão. Na realização de Rodriguez o objeto sonoro conta com uma orquestração composta especialmente para a cena. Um som de tambor incorporado ao ruído dá corpo ao golpe, aumentando significativamente a dramaticidade do golpe e enfim do combate. A vulnerabilidade de Marv é também enfatizada, elevando a ação a um alto nível de suspense. 9 SILVA, Thaïs Cristófaro. Fonética. In Fonética e fonologia do português : roteiro de estudos e guia de exercícios. 9. Ed. – São Paulo: Contexto, 2007. P. 32. 47 Kevin acerta um chute cruzado em Marv Extraído do Filme Sin City “The Hard Goodbye” e da HQ Sin City “A cidade do pecado” ● Tempo 25:52 Kevin com as unhas da mão joga no chão a arma de Marv / (HQ) THKK Kevin golpeia com as mãos a mão de Marv, que empunha sua arma, arrancado-a. O golpe é semelhante a uma patada de um grande felino ou urso. As garras de Kevin são enfatizadas como uma propriedade bélica do assassino. A sonoridade fantasmagórica harmoniza o objeto sonoro que é o ruído produzido pelo golpe de Kevin sob as mãos de Marv. A primeira característica que se pode constatar na onomatopeia THKK, é que ela não possui nenhuma vogal. Isto sugere uma gama de ruídos muito maior e esta análise é feita pela busca de uma pronúncia fonética que represente melhor a ideia sonora que se deseja expressar. O resultado desta avaliação passa obrigatoriamente pelo crivo da comparação com o objeto sonoro produzido no filme e este, inevitavelmente passa a ser o referencial final de 48 toda análise, visto que a ausência de vogais quase impossibilita a pronuncia da onomatopeia. THKK possui as consoantes oclusivas ‘T’ e ‘K’ que tem dois pontos de articulação diferentes e proporciona uma variação de ruídos complementares à situação. ‘H’ soa quase neutra, mas sua presença acrescenta frequências de grave na pronúncia da consoante ‘T’ eliminando quase toda a sua estridência. Kevin com as unhas da mão joga no chão a arma de Marv Extraído do Filme Sin City “The Hard Goodbye” e da HQ Sin City “A cidade do pecado” ● Tempo 26:10 Kevin golpeia Marv com uma marreta, apagando-o / (HQ) KUDD ● Tempo 27:35 Na cela Lucille relata a Marv a atrocidade que Kevin cometeu com ela e grita dizendo “Ele me fez olhar!” (destaco este ponto pois o seu grito é expressado graficamente com a onomatopeia “ELE ME FEZ OLHAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAARR”, de modo que enquanto sua voz ressoa no ambiente, Kevin aparece ouvindo 49 seu grito de desespero e um tema emenda o grito de modo muito interessante. Sua voz cresce de modo gutural tendo um reverb adicionado e com um leve delay que permite um eco bem sutil no momento em que quando já está em fase inicial de propagação o ruído do grito de Lucille tem acrescentado a trilha sonora do tema principal de Sin City. Esta referência ao tema principal do filme pode fazer uma série de referências e uma delas com certeza tem a ver com o carater sombrio e violento de Sin City, a cidade do pecado, da perversão, da obra de uma mente vil, uma mente reptiliana. ● Tempo 28:40 Marv manda Lucille se calar, pois ouve o ronco do motor de um carro se aproximando / (HQ) HONK Em Schafer (1992 pg217) o ‘H’ remete à exalação de ar e é pronunciado, no árabe, como uma explosão de ar no peito. Tanto na interpretação inglesa quanto da portuguesa ‘H’ possui a sonoridade de ‘R’, ficando como uma espécie de RONK e a idéia de ‘H’ como uma explosão no peito de Schafer pensada nessa concepção faz uma referência direta à ideia de ronco, onomatopaicamente falando (Referência, expressão: “o ronco do motor”). Não há a necessidade de se ater nesta análise, visto que o ruído é produzido pelo próprio objeto, no caso o próprio carro. ● Tempo 29:02 o Helicóptero da Polícia se aproxima da fazenda / (HQ) barulho da hélice do helicóptero: RAKKA A mesma ideia de motor é proposta aqui. Como em HONK, é importante o referencial de Schafer que trata a sonoridade como uma espécie de fluxo de ar, tendo suas frequências alteradas pelo lugar ou o modo de articulação, a referência é direta à ideia de algo que corta o ar, de modo repetitivo. A repetição das onomatopeias no quadrinho em vários quadros é que caracteriza o movimento das hélices e a oclusividade de KKA (com a vogal ‘a‘) corresponde ao som da hélice. ● Tempo 29:12 Marv pega a arma no chão e a engatilha / (HQ) CHIKK ● Tempo 29:26 Lucille golpeia Marv evitando que ele atire nos policiais / (HQ) KUDD ● Tempo 29:44 Lucille é fuzilada pelos policiais / (HQ) BREKK ● Tempo 29:56 Marv crava o machado no corpo do soldado / (HQ) CHUKK Marv crava o machado no traseiro do soldado como um bárbaro em um campo de batalha. A onomatopeia CHUKK possui uma fonética que representa muito bem a ideia do golpe apresentado por Frank Miller. No filme o golpe possui uma sonoridade de vento sendo cortado pela lâmina quase que simultaneamente. 50 Mais uma vez a HQ recebe uma adaptação fílmica que foge das características da imagem original. ● Tempo 32:10 Wendy (Goldie’s sister) atira em Marv (BLAM) e o tiro pega de raspão em sua cabeça / (HQ) KUKK Três sons distintos são identificados no plano em que Marv leva o tiro de raspão de Goldie. O som do disparo, o som do projéctil raspando na cabeça de Marv e junto a isso o gemido de Marv. A sonoridade do projéctil raspando na cabeça de Marv possui um som contínuo, como um reverberamento em consequência do raspão. KUKK possui a consoante oclusiva que tem uma pronúncia seca, talvez referenciando a idéia de “cuca” (coloquialmente relativo a cabeça). A presença da vogal ‘u’, que é uma vogal de pronúncia fechada (ou alta) posterior, segundo o alfabeto internacional de fonética, é uma oclusiva velar desvozeada. ● Tempo 32:31 no cativeiro, Marv é interrogado e espancado por Wendy que bate em sua cabeça diversas vezes com o revolver / (HQ) KRAKK / Marv geme: WAGG! Wendy dá o golpe em Marv dizendo “bastard” (desgraçado) e Marv geme. A referência de KRAKK, como já citado antes remete ao quebramento de ossos ou algo sendo esmagado. Segundo Schafer (1992 pg218) a consoante ‘R’ sugere recorrência ou ritmo e o inglês constrói uma obra-prima de feiura, raspando sobre ele as cordas vocais. ● Tempo 36:41 Marv desenrola o arame com as luvas especiais / (HQ) KEEK A sonoridade da vogal ‘e’ sendo interpretada com a pronúncia inglesa fica com a fonética da vogal ‘i’. A pronúncia fonética de ‘i’ é fechada anterior. Propõe o ruído do atrito de metais, deixando clara a noção do material que está sendo manipulado por Marv, o arame cortante. No filme o plano do quadrinho é transposto de modo muito semelhante à HQ. 51 Marv desenrola o arame com as luvas especiais Extraído do Filme Sin City “The Hard Goodbye” e da HQ Sin City “A cidade do pecado” 52 ● Tempo 36:51 Marv ascende um pano (HQ barulho de isqueiro: CHIKK) na boca de uma garrafa e atira contra a janela da casa de Kevin / (HQ) vidro quebrando KASHHH ● Tempo 36:53 O coquetel molotov explode na casa de Kevin / (HQ) som da explosão: POOM ● Tempo 36:59 Marv atira contra Kevin (HQ: BLAM), que desvia dos tiros. Os tiros acertam paredes e objetos / (HQ) som dos tiros acertando paredes e objetos: SPAK, SPUKK Considerarei a onomatopeia SPUKK como tendo o mesmo valor fonético de SPAK. Poder-se-ia considerar também que a vogal ‘u’ propõe uma diferença do objeto atingido pelo projéctil, por causa da maneira de articulação diferente que modifica o timbre. ● Tempo 37:09 Kevin dá um chute voador no casado de Marv, que está pendurado numa árvore como um disfarce / (HQ) som do chute acertando o casaco: REPP A sonoridade fricativa de RE representa em análise o ar sendo cortado pelo corpo de Kevin. Os articuladores se aproximam produzindo fricção quando ocorre a passagem central da corrente de ar. A consoante ‘P’ é abrupta e representa a idéia de um choque com a perna de Kevin. ● Tempo 37:15 Kevin corta com suas unhas grandes o ante-braço de Marv / (HQ) THKK No filme o golpe propõe a pronúncia lenta da onomatopeia, como uma espécie de separação silábica entre TH e KK. Os dois dígrafos tratam são representações gráficas de consoantes oclusivas. Sua sonoridade é bastante forte e remete a um tipo de ruído mais relacionado a um golpe traumático do que um “fricativo” corte. Porém pensando na idéia de corte, dificilmente se consegue conceber a abrupticidade das duas consoantes empregadas, ou mesmo de um objeto operando uma fricção na carne do braço de Marv produzindo o corte. ● Tempo 37:16 Kevin acerta um chute frontal em Marv / (HQ) PUNT A onomatopeia PUNT é uma representação cuja articulação oclusiva e de fácil pronuncia, referencia o ato de chutar, de dar o ponta pé. A sonoridade do golpe de Kevin contra Marv é nitidamente produzida através de sintetizador. Facilmente se percebe a presença de um plugin de efeito sob o ruído. Um pequeno reverb suaviza o ruído no final. Outro aspecto do objeto sonoro é a trilha sonora, mais uma vez 53 sombria e que harmoniza os ruídos traumáticos dos golpes. Em análise com a interpretação de Rodriguez um julgamento ficaria com pouca legitimidade, pois a representação imagética é diferente e na HQ de Frank Miller o combate entre Marv e Kevin é composto sem quadros, apenas com os dois corpos no plano, e também sem o próprio cenário. 54 Combate entre Marv e Kevin composto sem quadros Extraído da HQ Sin City “A cidade do pecado” ● Tempo 37:18 Kevin pula sobre a cabeça de Marv / (HQ) WHUG 55 Neste movimento o ruído, no filme, é de um objeto se quebrando com o golpe traumático de outro, algo como KRAK. Em WHUG a pronúncia das consoantes ‘W’ e ‘H’ são praticamente imperceptíveis, ficando em evidência apenas a vogal ‘u’ fechada (ou alta) posterior e a oclusiva ‘G’ abrupta no final, mas não com tanta força quanto K, Q ou C. ● Tempo 37:23 Kevin chuta a cara de Marv / (HQ) CHUD CHUD possui uma maneira fricativa de articulação, pois os articuladores não chegam a causar obstrução completa e sim parcial. ‘D’ é a consoante responsável pela oclusão abrupta e que pode ser relacionada ao trauma do golpe em si. O golpe no filme de Robert Rodriguez, que também foi produzido por sintetizadores. É um composto de ruídos, um primeiro que é uma espécie de corte do vento, como se o golpe fora desferido com extrema velocidade e outro emendado neste, sendo o próprio trauma, que é seco e tem o mesmo KRAK de algo se quebrando. ● Tempo 37:25 Kevin dá um soco em Marv, Marv esquiva e prende Kevin em suas algemas / (HQ) soco: CHUK, algema: SNAP ● Tempo 37:55 Wendy tenta matar Kevin, Marv dá-lhe um tapa, desacordandoa / (HQ) FAPP O ruído produzido é bastante agudo e abrupto, algo semelhante a um chicote estalando. A maneira de articulação da sílaba FA é fricativa, onde os articuladores poduzem fricção quando ocorre a passagem central da corrente de ar. Faz a referência da palma da mão de Marv cortando o vento antes de chegar ao rosto de Wendy. A consoante oclusiva ‘P’ é o ápice do movimento, quando há o trauma do tapa de Marv no rosto de Wendy. ● Tempo 38:47 O cão que Kevin usava para devorar os restos de seres humanos aproximasse dele rugindo para devorá-lo / (HQ) GRRRRRRRRRR ● Tempo 38:49 O cão mastiga a carne da perna amputada de Kevin / (HQ) CHOMP (A grande matança 01:21:58) ● Tempo 40:27 Marv ataca a sentinela da portaria da Fortaleza de Roark, e quebra o pescoço do soldado / (HQ) barulho do pescoço se quebrando: SNAP ● Tempo 43:43 Enquanto Marv assassina Cardeal Roark soldado entram em seu recinto pegando-o em flagrante e começam a atirar com as metralhadoras / (HQ) BREKK 56 Onomatopéia elencadas por ordem de incidência Lembrete: não deixar de considerar nas análises o fato de que os sons do filme são originais, tal como as onomatopéias, isto é são pensadas com uma fonética inglesa/americana. Portanto a leitura vocal de cada onomatopéia deve ser feita considerando a pronúncia do idioma Inglês. Segundo a teoria de Schafer (1992 pg216) as palavras são um bracelete de encantamentos vocais. E contam ao ouvinte atento uma complicada história da vida. KUDD (golpe) O golpe é representado pela onomatopeia KUDD. Oclusiva velar desvozeada em ‘K’ que com a presença da vogal ‘U’ fechada (ou alta) posterior, torna-se pronunciável e sugere o impacto principal do golpe. ‘D’ é oclusiva alveolar vozeada e da noção de complemento ao ruído. ● Tempo 15:23 Marv dá uma cotovelada no soldado, que é arremessado longe / (Quadrinho) onomatopéia da cotovelada: KUDD Marv estoura a porta, um soldado o ataca e Marv o golpeia com o braço esquerdo na HQ. No filme Marv o ataca pelo lado direito. A sequência tem como prelúdio uma percussão semelhante ao ruído de uma locomotiva e seu bate estaca nos trilhos. O estouro da porta eclode o tema sombrio da orquestra, uma espécie de sax barítono que entoa uma melodia semitonada, que é a introdução do tema principal da trilha sonora e que harmoniza a onomatopeia KUDD. ● Tempo 26:10 Kevin golpeia Marv com uma marreta, apagando-o / (HQ) KUDD. Mais uma vez o golpe é precedido por um ruído de suspense, semelhante ao som noturno com o chiado de grilos que vai aumentando até o ponto máximo que é o golpe. A imagem escurece totalmente aludindo ao desmaio de Marv e junto a isso um silêncio total. A interferência do objeto sonoro na narrativa é determinante nesse exemplo. ● Tempo 29:26 Lucille golpeia Marv evitando que ele atire nos policiais / (HQ) KUDD Marv resolve abrir fogo contra os policiais. A trilha sonora é plano de fundo da chegada do helicóptero dos policiais corruptos que querem executar Marv. O contrabaixo soa com ataques de colcheias enquanto uma flauta executa uma 57 melodia outside (melodia fora do tom). Lucille golpeia Marv, o saxofone entra em cena, com o seu timbre feminino e sensual. O ruído do golpe é um ruído semelhante a uma pedra pesada sendo golpeada contra uma bolsa de terra molhada, dando o efeito de esmagamento. POOM (som de tiro) A pronúncia da consoante oclusiva bilabial ‘P’ vai de meia fechada (ou média alta) para fechada (alta), pela presença da vogal ‘O’ e pela proximidade com a vogal ‘U’ na pronúncia inglesa. A onomatopeia POOM encerra-se de modo nasal com a pronúncia da vogal ‘O’ com os lábios completamente fechados. ● Tempo 15:24 Marv se joga pelo vão da escadaria do hotel, um soldado atira / (Quadrinho) onomatopéia do tiro: POOM OBS: Todos os tiros single (simples/um único tiro) da ação, no quadrinho são produzidos com a onomatopéia POOM, sons de metralhadora com a onomatopéia BREKKK. Tiros acertando a parede: SPAK Não é possível visualizar o soldado no plano atirando contra Marv (como na HQ), apenas se ouve o ruído do disparo. O disparo é padrão, isto é, o ruído é produzido artificialmente, está presente conforme a onomatopeia indica no momento em que Marv se lança no vão da escadaria. ● Tempo 36:53 O coquetel molotov explode na casa de Kevin / (HQ) som da explosão: POOM A explosão POOM é composta por duas explosões, mas que na verdade são “a mesma” sendo na verdade um recurso empregado por Robert Rodriguez chamado de “linearização do signo icônico e a construção de uma sequência diegética pelo desmembramento dos elementos da ação em fragmentos simples e unívocos, os planos” por Arlindo Machado 10 é uma composição de ruídos, estilhaços, um som fricativo velar de labaredas de fogo, madeiras se quebrando e u KASHH (corpo contra o vidro) A presença da oclusiva velar desvozeada ‘K’ com a vogal ‘A’ aberta (ou baixa) anterior e a fricativa dental fricativa alveopalatal desvozeada SH (chi), faz concluir que tilintar de cacos de vidro ao chão tem as características da sonoridade representada por ‘SH’, sua abrupticidade inicial faz referência ao vidro sendo 10 MACHADO, Arlindo. “A linearização da história”. In: Pré-cinemas & pós-cinemas. Campinas, SP: Papirus, 1997. – (Coleção Campo Imagético). 58 atingido pela força de um objeto em ‘CA’. Schafer descreve a sua sonoridade como ruído branco, espectro total de frequências de sons aleatórios. ● Tempo 15:32 Marv se arremessa pela janela quebrando o vidro com seu corpo / (Quadrinho) onomatopéia do vidro se quebrando: KASHH A consoante ‘S’ é preponderante na construção fonética do ruído para esta situação. O dígrafo ‘SH’ e descrito como um ruído branco. E analisado como um espectro total de sons aleatórios (Schafer 1992 : 219), representa o tilintar dos cacos de vidro. ‘K’ representa o impacto do corpo de Marv se chocando com o vidro da janela. Há uma elevação de volume no ruído dos fragmentos de vidro a cair. O vidro se quebrando é representado em dois planos no filme, no primeiro plano a câmera está posicionada de modo semelhante à HQ, no segundo a câmera se desloca um pouco para a esquerda, a fim de enquadrar melhor o personagem. 59 Extraído da HQ Sin City “A cidade do pecado” e do Filme Sin City “The Hard Goodbye” 60 ● Tempo 36:51 Marv ascende um pano (HQ barulho de isqueiro: CHIKK) na boca de uma garrafa e atira contra a janela da casa de Kevin / (HQ) vidro quebrando KASHHH O galão de combustível quebranta o vidro da janela da casa de Kevin e o resultado sonoro é o de correspondência a ‘K’ quando o galão se choca com o vidro e de correspondência a ‘SH’ nos detritos de vidro que caem. SKAK (som de vidro se quebrando) A consoante fricativa alveolar desvozeada ‘S’ corta o vento com a velocidade do movimento, ou representa a ideia de um objeto deslizando sob outro. ‘K’ é a oclusiva velar desvozeada e faz clara referência à palavra caco na sua composição com a vogal ‘A’ (aberta, ou baixa, anterior). ● Tempo 15:44 Marv pula com os dois pés sobre a cabeça dos policiais pelo vidro da viatura, quebrando-o / (Quadrinho) som do vidro se estilhaçando na colisão com os pés de Marv: SKAK SKAK possui uma idéia sonora que não corresponde ao ruído deste exemplo, depois de analisar a onomatopeia KASHH é possível perceber duas características sonoras em SKAK, a consoante ‘S’ antecede o impacto da oclusiva ‘K’, ou seja, antecede o impacto dos pés de Marv com o vidro. ‘KAK’ é abrupta, porém o ruído característico dos estilhaços não está presente. SKAK é abrupta, mas omite o espectro de frequências de sons aleatórios que os estilhaços do vidro emitem. ● Tempo 15:48 Marv desfere um soco no soldado quebrando um vídro / (Quadrinho) vidro SKAK. Soldado 1 leva soco: Aaa / Soldado 2 leva soco: GAAA Marv desfere um golpe em cada soldado e o ruído correspondente à onomatopeia SKAK parece confuso na HQ, pois no filme refere-se à viseira do capacete do soldado. O vidro da viseira se estilhaça e o gemido do soldado se mistura ao som do material se quebrando. A harmonia de um string de teclado molda o objeto sonoro. GAAA (som de gemido) ‘G’ é oclusiva velar vozeada e tem a sua origem na articulação da parte posterior da língua (próxima da garganta) e o véu palatino, ou palato mole (região do céu da boca próxima da garganta). A pronúncia desta onomatopeia sugere 61 claramente uma noção de engasgo, pela região onde os articuladores processam a passagem do ar. A vogal ‘A’ aberta (ou baixa) anterior, facilita a passagem de ar pela abertura da boca que provoca. Ar este que é interrompido na articulação da consoante oclusiva. ● Tempo 15:48 Marv desfere um soco no soldado quebrando um vídro / (Quadrinho) vidro SKAK. Soldado 1 leva soco: Aaa / Soldado 2 leva soco: GAAA O homem leva um golpe de Marv e produz um gemido. A voz deste homem exprime um estímulo externo e forçado e é conhecido como interjeição. Trata-se de um comportamento humano que dispensa uma estrutura linguística mais elaborada para expressá-lo. ● Tempo 24:10 Marv reconhece o rosto de Goldie (Wendy, irmã gêmea) e é arremessado longe pelo carro / (HQ) som da colisão: WHUMPP, som de Marv gemendo: GHAA (neste caso h é neutro) Marv é atingido fortemente pelo carro de Wendy, a qual ele pensa ser Goldie. O carro o atinge a uma grande velocidade. A trilha sonora é fundamental nesta sequência e é interessante perceber a sua dinâmica até Marv percebe que não é um ataque de um inimigo comum, ele conclui ser Goldie a mulher atrás do volante. Uma orquestração acompanha a entrada do carro de Wendy na rua onde Marv se posiciona para entrar em seu carro, a câmera dá um close em Marv, passando de um plano médio a um primeiro plano, nesse momento o tema cessa e um ruído constante e crescendo harmoniza a situação de atonicidade de Marv que, no plano seguinte, é violentamente atingido pelo carro, gemendo pela ocasião da colisão. WHUMP (porta sendo socada) A onomatopeia sugere um efeito vertiginoso e psicodélico e que só pode ser associado a idéia de colisão pela presença da abrupta consoante ‘P’. WHUM com excessão da consoante nasal ‘M’ é foneticamente entendida como se fosse uma única letra, ‘U’ ou o ‘L’ do sal e do salto. É definida pela fonologia como Lateral alveolar vozeada velarizada em seu segmento consonantal. ● Tempo 18:58 Marv, após entrar pelo beco, dá de encontro com uma porta que é socada por dentro (Um homem está batendo em outro) / (Quadrinho) WHUMP A onomatopeia representa a idéia de que a porta está sendo golpeada por dentro. Na HQ, Marv é representado num plano geral do ambiente e a onomatopeia 62 WHUMP está sobre a porta indicando visualmente esta sendo golpeada. A presença da onomatopeia está representada de modo singular, como se houvesse sido golpeada apenas uma vez, porém na continuidade da história (na HQ), outra onomatopeia WHUMP se faz presente e a interpretação que se pode fazer é de uma sequência de golpes. A prova de que Robert Rodriguez e Frank Miller fizeram essa escolha interpretativa está no fato de no filme, a sequência estar exatamente colocada dessa forma. Rodriguez lança mão do recurso imagético para representar a sequência. Marv é enquadrado de costas num plano médio e ao fundo de sua imagem é possível ver o homem agredindo o outro de modo covarde. ● Tempo 24:10 Marv reconhece o rosto de Goldie (Wendy, irmã gêmea) e é arremessado longe pelo carro / (HQ) som da colisão: WHUMPP, som de Marv gemendo: GHAA Goldie (Wendy) derrapa com o carro mais duas vez, além de atingí-lo mais duas vezes e efetuar dois disparos, tudo na mesma sequência. As onomatopéias se repetem. Derrapagens: SKREEEEEEE / Tiros: BLAM / Colisões contra Marv: WHUMPP Wendy lança o carro contra Marv, o para choque bate em suas canelas jogando-o longe o ruído produzido pelo choque é semelhante ao som de latas se batendo umas nas outras. A onomatopeia WHUMPP além de representar uma idéia sonora, tem uma influência visual no movimento vertiginoso do corpo de Marv sendo arremessado para cima. A consoante oclusiva bilabial desvozeada ‘P’ representa a colisão do carro com o corpo do personagem. ● Tempo 15:38 Marv cai sobre os sacos de lixo / (Quadrinho) Marv caindo sobre os sacos: WUMP A onomatopeia representa também a idéia de queda, no sentido de que o corpo está no ar, o fonema possui um efeito de vertiginosidade na pronúncia de WUM, eclodindo em ‘P’. Marv cai no monte de entulho e uma série de ruídos podem ser ouvidos. BLAM (onomatopeia disparo de arma) A onomatopeia BLAM caracteriza o disparo de uma arma. No âmbito da fonética da onomatopeia, o lugar de articulação da consoante ‘b’ é bilabial, onde o articulador ativo é o lábio inferior e o articulador passivo o lábio superior e a maneira 63 de articulação é oclusiva, onde os articuladores produzem uma obstrução completa da passagem da corrente de ar através da boca. Em seguida emenda-se a consoante ‘L’, cujo lugar de pronúncia é conhecido como alveolar, pois o articulador ativo é o ápice ou a lâmina da língua e como passivos os alvéolos (parte rajada do céu da boca). No final ‘AM’ a onomatopeia é concluída com uma articulação anasalada. ● Tempo 20:44 Marv é levado para um beco por matadores, onde os domina e usa o braço do adversário para atingir o outro / (HQ) BLAM A montagem nesta sequência exerce um papel fundamental na narrativa e o ponto mais importante na adaptação é o plano em que Marv é enquadrado de costas, neste ponto ele dispara contra o homem. O ponto em que Marv dispara contra o homem está retratado de modo diferente na HQ. O ruído do disparo é acompanhado por uma trilha sonora cuja harmonia é realizada por sintetizadores e plugins de efeitos sonoros que privilegiam o reverb de modo que todo o objeto sonoro, inclusive os gemidos e o próprio disparo possuam índices de reverb. Neste exemplo, tudo o que acontece num mesmo quadro da HQ é representado através de vários planos no filme e com um posicionamento dos personagens diferente. Extraído do Filme Sin City “The Hard Goodbye” e da HQ Sin City “A cidade do pecado” • Tempo 21:42 Marv executa o matador com um tiro na cabeça / (HQ) BLAM No filme a imagem do momento do disparo é omitida, escurecendo completamente o plano e enfatizando apenas o ruído do disparo, sem imagem 64 alguma. Este plano faz uma referência ao próprio fim da vida do homem assassinado por Marv, o momento do disparo em que tudo fica escuro é o momento em que ele deixa de viver. Rodriguez encontrou essa forma de narrativa imagética, a fim de atenuar um evento que poderia exceder as expectativas no nível da violência se fosse representado do mesmo modo que na HQ. ● Tempo 23:40 Marv é insultado e dá três tiros no Padre / (HQ) BLAM A onomatopeia recebe um emprego predominante na sequência. Cada tiro disparado é inserido dentro da própria onomatopeia enfatizando o ruído de cada disparo, num estilo muito criativo da obra de Frank Miller. O primeiro disparo traz um plano detalhe da mão de Marv disparando a pistola e os seguintes dizeres “vale a pena morrer por ela” tudo ao mesmo tempo (no filme Marv declama os dizeres enquanto o ruído do disparo soa). O segundo disparo traz a imagem do padre levando um tiro e sua cabeça sendo atravessada pelo projéctil da arma de Marv num plano médio (Frank Miller interpreta o padre na adaptação cinematográfica), os dizeres “Vale a pena matar por ela” aparecem em um balão centralizado, enquanto no filme, Marv narra. No terceiro, A cruz da igreja é representada em um plano médio num contra plongée. Os três ruídos de disparos são emitidos num silêncio total. Cada tiro possui uma tonalidade de reverb bastante grande afim de que cada um perdure até a implosão do próximo, a sequência resulta em uma narrativa pausada e que pauta a paixão e o ódio de Marv. O plano médio da cruz é emblemático pois inicia uma nova etapa na busca de Marv pelo responsável pela morte de Goldie. ● Tempo 24:10 Goldie (Wendy) derrapa com o carro mais duas vez, além de atingí-lo e efetuar dois disparos, tudo na mesma sequência. As onomatopéias se repetem. Derrapagens: SKREEEEEEE / Tiros: BLAM / Colisões contra Marv: WHUMPP Frank Miller emprega três vezes a onomatopeia. Wendy efetua quatro tiros. Significa dizer que a sugestão de Miller é de “alguns” tiros. Na HQ Wendy para duas vezes para atirar (três vezes). No filme isso acontece apenas uma vez. O ruído do disparo parece ser originado da própria arma utilizada nas filmagens. ● Tempo 32:10 Wendy (Goldie’s sister) atira em Marv (BLAM) e o tiro pega de raspão em sua cabeça / (HQ) KUKK 65 No filme Wendy atira em Marv e o ruído referente a onomatopeia BLAM surge no plano em que ela é enquadrada num plano médio. O plano seguinte é identico à HQ, porém no filme o ruído é do corpo de Marv sendo atingido e não mais do disparo. Este é um exemplo de que na realização audiovisual é muito interessante para a narrativa de uma situação de tiro a representação de um plano, em que a dispara, com o ruído do disparo, e um plano com a pessoa que recebe o tiro sendo atingida e de preferência com o ruído do tiro atingindo a mesma. Extraído e da HQ Sin City “A cidade do pecado” SKREEEEEEE (derrapagem de automóvel) ‘S’ é fricativa dental, onde o articulador ativo é o ápice ou a lâmina da língua (região da ponta da língua) e como articuladores passivos os dentes incisivos superiores. ‘K’ é a oclusiva velar desvozeada que é pronunciada simultaneamente à ‘R’ classificada como Tepe alveolar voazeado. O ruído das três consoantes iniciais só pode ser pronunciado pela presença da vogal ‘E’ que é meia-fechada (ou média alta) anterior. Também pode ser cantada já que a sugestão é de que literalmente os pneus cantem. A análise fonética desta onomatopeia expõe a intenção do autor da HQ através de uma representação ideal do som de uma derrapagem de automóvel. • Tempo 24:03 Marv sai da igreja e, quando está prestes a entrar no mercedes do Padre, ouve o carro da irmã de Goldie, Wendy, vindo a toda velocidade derrapando os pneus / (HQ) som derrapagem: SKREEEEEEE (duas vezes) As duas derrapagens são representadas na adaptação fílmica e dão o prelúdio para a investida de Wendy contra Marv. No filme, o tema da trilha sonora conta com uma voz feminina que canta quase que liricamente (sem uma ordem, ou padrão). O primeiro ruído é mais baixo do que o segundo, de modo que este 66 representa um objeto sonoro que explicita (ainda que o rosto de Marv esteja no plano) a proximidade do automóvel. • (24:12) Goldie (Wendy) derrapa com o carro mais duas vezes, além de atingílo mais duas vezes e efetuar dois disparos, tudo na mesma sequência. As onomatopéias se repetem. Derrapagens: SKREEEEEEE / Tiros: BLAM / Colisões contra Marv: WHUMPP Neste trecho da sequência, o ruído das derrapagens do carro de Wendy fica em segundo plano, sendo a força do ruído fraca, predominando a trilha sonora com vozes angelicais reverberadas sob uma música sombria orquestrada. CHIKK A fricativa dental alveopalatal desvozeada CH (cuja pronúncia é ‘ti’), somada à vogal ‘I’ produz a idéia sonora de engatilho, ou o ato de ascender o isqueiro. A oclusiva velar desvozeada ‘K’ é descrita como explosão subterrânea das cordas vocais (Schafer 1992 pg 216). A frequência produzida por essa consoante é muito alta. Uma das maneiras de se deduzir isso é que as notas muito graves não podem ser percebidas, o fato é que as notas agudas, ou altas, possuem um maior comprimento de onda (maior frequência). ● Tempo 24:06 Marv engatilha sua arma para atirar em Wendy (somente o som. A imagem é de Wendy dirigindo) / (HQ) CHKK Sutilmente é possível perceber o ruído da arma de Marv sendo engatilhada. Predominam a voz feminina entoando uma melodia sombria e angelical em uníssono e o carro de Wendy derrapando. ● Tempo 29:12 Marv pega a arma no chão e a engatilha / (HQ) CHIKK Na HQ, tal como no filme, o plano detalhe dá ênfase ao ato de pegar a arma no chão e engatilhar de Marv. O ruído é claro e tem o respaldo da imagem. A presença da sílaba fricativa CHI (de pronúncia ti) e da oclusiva ‘K’ representam a idéia de engatilho de modo claro e objetivo, pelos seus ruídos característicos. ● Tempo 36:51 Marv ascende um pano (HQ barulho de isqueiro: CHIKK) na boca de uma garrafa e atira contra a janela da casa de Kevin / (HQ) vidro quebrando KASHHH CHIKK está inserida no momento em que Marv está para executar o seu plano de matar a Kevin. Marv ascende o isqueiro e põe fogo ao pano embebido no 67 combustível. A atmosfera de iminência de um grande conflito é bastante desenvolvida pelo objeto sonoro de uma trilha em stand by de uma condução orquestral constante e que fica em segundo plano ao som do ambiente, no qual Marv ascende o isqueiro e narra a possível situação de Kevin dentro da casa. ROWF (latido de cão) ‘R’ é velar em seu lugar de articulação e articulada de maneira fricativa, assim como ‘F’, as duas consoantes propõe o fluxo de ar de modo gutural, algo bastante conveniente ao latido de um cão de grande porte. ● Tempo 25:00 Marv vai até a fazenda onde o Padre diz estar o assassino de Goldie (North Cross com a Lennox) e é recepcionado por um cão feroz. Marv ouve o ganir do cão / (HQ) RRRRRRRRRRRRRRR Marv ouve o ganir do cão de Kevin, cuja respiração se mistura com a sua no objeto sonoro. Sua voz é sussurrante e expressa o silêncio de um lugar sombrio. ● O cão late / (HQ) ROWF O latido do cão é gutural e a consoante velar ‘R’ unida a vogal meia-fechada (ou média-alta) posterior ‘O’ faz analogia ao modo de articulação do cão cuja estrutura mandibular não permite combinações fonéticas muito complexas. No filme, o latido do cão soa com uma frequência que permite perceber que trata-se de um ruído aplicado artificialmente, dada a má qualidade sonora do ruído, que soa abafado e com um índice de volume que destoa do restante sonoro paralelo. ● Tempo 38:47 O cão que Kevin usava para devorar os restos de seres humanos aproxima-se dele rugindo para devorá-lo / (HQ) GRRRRRRRRRR Uma única nota em uníssono harmoniza o ganido do cão. Como se o ruído do animal fosse o grande interprete da melodia tenebrosa que dá o clima da situação de violência que decorre. A câmera se aproxima do rosto de Kevin que, de modo reptiliano, aprecia o seu fim. SNAP (barulho de pescoço sendo quebrado) A consoante fricativa alveolar desvozeada ‘S’ corta o vento com a velocidade do movimento, ou representa a ideia de um objeto deslizando sob outro, além da idéia de corte representada nesta história. A consoante nasal alveolar ‘N’ é dental, as nasais são consoantes idênticas às oclusivas diferenciando-se apenas quanto ao 68 abaixamento do véu palatino para as nasais (ex. má, nua, banho). Unida à vogal ‘A’ tem sua pronúncia aberta e encerra-se com a oclusiva bilabial desvozeada ‘P’. Esta representação sonora possui características fonéticas bastante distintas, pois possui diversos modos de articulação, produzindo assim uma gama de ruídos variados. Por associação SNAP é uma onomatopeia que necessita do auxílio da imagem para que o interlocutor faça a relação, diferentemente de BLAM, por exemplo. ● Tempo 37:25 Kevin dá um soco em Marv, Marv esquiva e prende Kevin em suas algemas / (HQ) soco: CHUK, algema: SNAP A onomatopeia SNAP é utilizada em situações distintas e que em quase nenhum aspecto representa a idéia que deseja representar. A situação proposta oferece uma gama de ruídos metálicos e em análise fonética, talvez os elementos que mais enfraquecem o espectro sonoro seriam a vogal ‘A’, que é responsável pelo modo de abertura da mandíbula e, principalmente a consoante ‘P’, que é bilabial e descaracteriza o som fricativo e velar de um objeto de metal que clica, ou encerra com a consoante ‘T’ fechada, como em SNIKT (de Wolwerine quando abre suas garras). ● Tempo 40:27 Marv ataca a sentinela da portaria da Fortaleza de Roark, e quebra o pescoço do soldado / (HQ) barulho do pescoço se quebrando: SNAP O ruído emitido pelo golpe traumático de Marv sob a sentinela de Roark possui um ruído bastante complexo, pois o próprio ato de quebrar o pescoço possui elementos sonoros presentes em KRAK, por exemplo, de uma espinha dorsal se quebrando e o corpo do soldado se espatifando, dada a violência encontrada na sequência. A onomatopeia tem papel imagético na HQ de Frank Miller, ela se funde aos movimentos dos personagens, entre um plano e outro. BREKK (ruído de metralhadora) BREK, igualmente a BRAK, sugere um disparo de uma arma do tipo metralhadora, que emite mais de um projétil, devido a sílaba BRE (sendo a consoante ‘B’ oclusiva labial vozeada, ‘R’ vibrante alveolar e ‘E’ meia-fechada, ou média alta, anterior) ter uma articulação um pouco mais longa e ritmada – como uma sequência de fusas (rítmica). A consoante oclusiva velar vozeada ‘K’ conclui a 69 fonética da onomatopeia de modo seco mas levemente fricado, tendo o lugar de articulação conhecido como velar. ● Tempo 15:24 Marv se joga pelo vão da escadaria do hotel, um soldado atira / (Quadrinho) onomatopéia do tiro: POOM OBS: Todos os tiros single da ação, no quadrinho são produzidos com a onomatopéia POOM, sons de metralhadora com a onomatopéia BREKKK. Tiros acertando a parede: SPAK Uma saraivada de tiros cai sobre o vão da escadaria do hotel em que Marv está. É interessante notar que o som do trombone contínuo está em primeiro plano e ao fundo cai o céu em forma de chumbo sobre a cabeça de Marv. ● Tempo 29:44 Lucille é fuzilada pelos policiais / (HQ) BREKK Lucille é metralhada a queima roupa sem a piedade do policial de elite. A metralhadora demanda muitos tiros de uma mesma vez e a seu ruído é forte e violento, mas contínuo e simétrico. A onomatopeia BREKK propõe essa repetição através da maneira de articulação em Tepe da sílaba BRE, em que o articulador ativo toca rapidamente o articulador passivo ocorrendo uma rápida obstrução da passagem da corrente de ar através da boca. A oclusiva velar desvozeada ‘K’ é um elemento abrupto que dá força à representação sonora do evento. ● Tempo 43:43 Enquanto Marv assassina Cardeal Roark, soldados entram em seu recinto pegando-o em flagrante e começam a atirar com as metralhadoras / (HQ) BREKK O ruído produzido pelas metralhadoras nessa situação é diferente do exemplo em que Lucille é fuzilada pelos policiais de elite (Tempo 29:44). Diferentemente, as metralhadoras produzem um ruído mais caótico, pois neste caso há a presença de três metralhadoras, diferentemente do outro exemplo, e a sonoridade é confusa, mas não menos ritmada e simétrica. É possível também perceber o ruído de cápsulas caindo ao chão. SPAK (tiros atingindo objetos e paredes) A consoante fricativa ‘S’ é pronunciada independentemente antes da oclusiva bilabial ‘P’, os articuladores não chegam a causar obstrução completa e sim parcial do ápice da língua (região da ponta da língua) com os alvéolos, produz uma idéia sonora de vento sendo cortado pela velocidade do objeto, implodindo em ‘P’. A vogal ‘A’ força uma pronúncia aberta (ou baixa) anterior da consoante ‘P’ antes de finalizar na oclusiva velar ‘K’. 70 ● Tempo 15:24 Marv se joga pelo vão da escadaria do hotel, um soldado atira / (Quadrinho) onomatopéia do tiro: POOM OBS: Todos os tiros single da ação, no quadrinho são produzidos com a onomatopéia POOM, sons de metralhadora com a onomatopéia BREKKK. Tiros acertando a parede: SPAK O ruído dos tiros atingindo a parede e os objetos do ambiente se misturam aos sons dos tiros e trilha sonora. A onomatopeia representa uma série de tiros que pegam na parede, segundo a interpretação de Robert Rodriguez. ● Tempo 36:59 Marv atira contra Kevin (HQ: BLAM), que desvia dos tiros. Os tiros acertam paredes e objetos / (HQ) som dos tiros acertando paredes e objetos: SPAK, SPUKK. Marv atira contra Kevin e este se esquiva contra os disparos que acertam o chão e objetos próximos. É interessante perceber o recurso narrativo conhecido como linearização do signo icônico (Machado 1997 pg102), no momento em que Marv atira contra Kevin, vemos Marv atirando em um plano e, no plano seguinte, os tiros acertando o chão próximo a Kevin. 71 Extraído do Filme Sin City “The Hard Goodbye” e da HQ Sin City “A cidade do pecado” 72 73 DECUPAGEM DAS ONOMATOPEIAS EM Sin City 'A Grande Matança' (OBS. As onomatopeias não encerram o som/ruído em sua totalidade, apenas dão a idéia sonora do objeto/fenômeno/ação em curso. Toda a análise acaba passando pelo crivo da interpretação, seja ela sumária quando fundamentada nas propriedades e rudimentos do objeto, no caso o som, ou não) Incidências: ● Tempo 51:03 Jackie Boy bate em Shellie. Shellie colide no suporte de facas / (HQ) Jackie Boy bate: KRAK / Shellie colidindo no suporte: WHUDO Jackie Boy dá um tapa seco e forte no rosto de Shellie. No plano em que Shellie está sentada, seu rosto está ensanguentado, visivelmente machucado, demonstrando a violência do golpe desferido por Jackie Boy. Na HQ, KRAK evoca uma sonoridade chocante, abrupta e estridente, causando uma impressão de ardência ao se produzi-la com a boca. KRAK não chega a ser uma forma hiperbólica da sonoridade da situação apresentada, chegando a ser uma onomatopeia que aproxima em muito a idéia do som real produzido no filme. Na situação do plano seguinte, expressa pela onomatopeia WHUDO, a base de análise é a cena do filme, como na maioria dos outros planos, pois possui uma captação ambiente dos sons e ruídos. Shellie esbarra com o braço direito no faqueiro, batendo com os cotovelos na mesa, produzindo uma sonoridade semelhante a um pequeno estrondo. A onomatopeia WHUDO possui um som contínuo e sem nenhuma implosão de consoante na pronúncia inicial, exceto em DO, que mesmo assim não possui efeito oclusivo para a situação. Pensei na letra W com o som de U. Se pensada, no entanto, com o som do V, a onomatopeia ganha um pouco mais de força, porém ainda mantém o fluxo de ar na sua articulação e sem a implosão necessária para o choque do braço com o faqueiro e o tilintar dos objetos caindo. ● Tempo 53:10 Dwight afoga Jack Boy na privada, Jack Boy adormece e volta retirando a cabeça de dentro da privada / (HQ) tirando a cabeça da privada: GLAGG Jackie Boy ressuscita do afogamento e se levanta tirando a sua cabeça da privada, quase afogado, seus cabelos compridos estão encharcados de água de privada e são responsáveis pelo ruído característico da água como em um SPLASH, a referência fonética que se faz nessa onomatopeia restringe-se apenas ao S, o fonema de mais alta frequência (8000 – 9000 c.p.s.), diferentemente de GLAGG, que provavelmente tem uma relação com uma espécie de engasgo, tendo uma sonoridade oclusiva, pois na sua pronúncia o ar expirado é bloqueado por um obstáculo vocal, que interrompe momentaneamente a sua corrente, e que acaba “explodindo” quando aberto. Jackie Boy se distrai no volante e provoca um acidente (no quadrinho) a onomatopeia da colisão que provoca o capotamento do carro transeunte é KUNK/ No filme há apenas uma quase colisão, mas que é evitada por 74 Jackie Boy, que chama a atenção da viatura de polícia, passando esta a persegui-lo. Não considerarei a onomatopeia por se tratar de uma cena adaptada de modo “não fiel” ao quadrinho, ou seja, posicionamento de câmera e outros elementos estão modificados. No quadrinho, as prostitutas da cidade velha empunham suas armas ao som de CHIKK e CHAKK / No filme 56:29 não há o som correspondente (as prostitutas apenas empunham suas armas) ● Tempo 59:13 uma das prostitutas da cidade velha (Basin City) fecham um portão / (HQ) KANK A consoante K possui todas as propriedades sonoras da situação. Seu som abrupto produzido tem uma característica que, timbristicamente, remete ao próprio metal em atrito com outro objeto. A estridência produzida deixa claro o movimento do portão quando fechado. ● Tempo 01:00:18 Miho atira uma estrela que arranca a mão de Jackie Boy / (HQ) CHUNK ● Tempo 01: 00: 31 Miho encrava suas espadas nas cabeças de três comparças de Jackie Boy / (HQ) SHAK ● Tempo 01:00:40 Miho Arranca a cabeça de um comparsa de Jackie Boy e ela cai no chão / (HQ) KONK A onomatopeia KONK é empregada também em “O assassino amarelo”, quando Hartigan dá um golpe na cabeça de Shlubb com um cano de metal. Neste caso a onomatopeia representa o som de uma pancada, provocada por uma barra de metal. Em “The big fat kill” (A grande matança) KONK representa uma cabeça decepada caindo no chão. A interpretação do leitor passa pela análise dos objetos, a análise da verossimilhança na cena ou circunstância. Uma cabeça humana é composta, basicamente por carne e osso. Fazendo a relação da sonoridade produzida pelo objeto [a cabeça] chocando-se com o chão, fica difícil associar a onomatopeia com o evento. A verossimilhança fica um pouco enfraquecida com a onomatopeia KONK, mas não eliminada, pois sua sonoridade dá a idéia de colisão, pancada, porém com um ruído mais metálico. No filme, a cabeça do comparsa de Jackie Boy bate no chão violentamente, parece ter sido arremessada com força. Para descrever o som desta situação, o ruído produzido é como em uma batida com a mão aberta no capô de um carro. Essa sonoridade possui uma oclusividade característica da letra P, relacionada, em seu modo de articulação, com uma pronúncia bilabial ou labiodental. ● Tempo 01:01:18 Jackie Boy escorrega e cai sentado na estrela de Miho, enquanto escorrega Jackie Boy esbraveja / (HQ) esbravejo: IAA! Na cena do filme, a interjeição de Jackie Boy é algo próximo de UOOH. A transcrição dos sons para a forma gráfica/onomatopaica fica nesta situação bastante simplificada, pois segundo o que afirma Shaffer (1992 :224), as vogais possuem todas as propriedades sonoras que as tornam perfeitamente audíveis, pois as vogais são o pico sonoro de uma sílaba, elas articulam a melodia de um som enquanto que as consoantes articulam o ritmo.Segundo Schaffer,(1992 :217) o “I é a vogal mais aguda. Magra, brilhante, som apertado, deixando a menor abertura na boca.” A vogal A, pelo contrário, é a única vogal que pode ser pronunciada quando a boca está totalmente aberta. ● Tempo 01:01:18 Jackie Boy senta na estrela de Miho / (HQ) CHUNK ● Tempo 01:01:45 Miho bloqueia o cano do revolver de Jackie Boy / (HQ) THUNK 75 ● Tempo 01:01:51 Miho bloqueia o cano do revolver de Jackie Boy, que atira / (HQ) BLAM ● Tempo 01:01:52 o tiro de Jackie Boy sai pela culatra e entra em sua testa / (HQ) KUNK Jackie Boy rejeita o conselho de Dwigth, que o admoesta quanto à sua arma estar com o cano obstruído, e dispara contra ele. O tiro de Jackie Boy sai pela culatra e entra em sua testa. O ‘K’ encontra emprego em várias situações de Sin City. Inevitavelmente a sonoridade do ‘K’ surge de várias combinações silábicas ou pronunciações fonéticas como, por exemplo, o ‘C’ pronunciado em corpo, o ‘qu’ em queijo, o ‘X’ em inglês ou francês, o ‘Q’ em francês etc. É conhecida como Oclusiva Velar Surda, pois seu modo de articulação é oclusiva, seu ponto de articulação é velar, é surda em relação ao papel das pregas vocais e é oral em relação ao papel das cavidades bucal e nasal. ● Tempo 01:05:35 Dwight toma a arma de Gail e lhe dá um tapa / (HQ) tapa: SMACK SMACK é classicamente uma onomatopeia empregada em beijo na boca. As onomatopeias também possuem uma força gráfica muito grande. Nesta situação Dwight dá um tapa com a parte externa da palma direita, num cruzado para fora. É interessante notar o timing (Eisner 2001) da situação na HQ. Gail está no ato do tapa, com seu semblante fechado, ainda assimilando a dor. Dwight está com a expressão aberta e inquieta com o braço arremessado e aberto contra o ar, visto que já desferiu o golpe. SMACK figura entre a face de Gail e Dwight ilustrando a sonoridade sibilante e molhada do S, como se cortasse o vento no movimento inicial do golpe e a consoante nasal, que tem o som formado pelo encontro dos lábios através da obstrução do ar, seguida de oclusão, do som abrupto de ‘K’ somado a ‘i’ em CK (SMACK). Esse timing do plano permite a visualização de toda a cena e a elaboração imaginativa da mise en scenè. O aspecto gráfico possui uma qualidade significativa no quadro; suas letras tortas e desproporcionais falam muito e até mesmo dão uma idéia de amplitude do som, pensando neste aspecto do design de modo mais subjetivo. Na realização de Robert Rodriguez, o ruído produzido deixa bem forte a idéia fonética do ‘S’ e uma articulação de língua com o dente característica da letra ‘T’ Pensando de modo mais subjetivo e confiando na percepção sonora, o ruído é abrupto, molhado, em ‘S’, e seco, com a idéia sonora de ‘T’. A trilha sonora neste trecho é bastante importante para compor a paisagem sonora, ouve-se um naipe de violinos produzindo uma melodia quase em uníssono, mas com intervalos bastante chocantes, algo como uma segunda menor, como um período de suspense ou movimento da trama. ● Tempo 01:07:01 Miho começa a decepar os cadaveres / (HQ) SHAKK ● Tempo 01:11:04 Dwight pisa no freio do carro / (HQ) PUNCH Poderíamos dizer que o ruído é o som indesejável (Schaffer 1992 pg68) se estivéssemos estudando-o pelo âmbito da apreciação musical, sem ter a difícil tarefa de se definir o que é música ou não. No entanto, quando se trata de onomatopeias o ruído mais escabroso, na dimensão física sonora, pode significar uma maravilhosa sonoridade de um tal evento. Começando assim, pelo dígrafo (agrupamento de duas letras com apenas um fonema) CH e sua sonoridade de chiado em sua própria pronúncia quando adcionada uma vogal qualquer. Em relação ao papel das cordas vocais, o fonema de CH nesta onomatopeia é surdo, pois as cordas vocais não 76 vibram. Também é possível dizer que é um fonema palatal, pois sua pronúncia é formada pelo encontro do dorso da língua contra o céu da boca. PUNCH possui um explosivo produzido pelas iniciais PUN, um som explosivo produzido pelos lábios. A sonoridade de P é oclusiva e dá a sensação de pisão, na situação em questão, hiperbolizando a imagem, que é bastante ilustrativa na HQ. O pé de Dwight é destacado e a onomatopeia PUNCH é um elemento visual bastante forte.No filme não há tanta ênfase ao ato de freiar, visto que Rodriguez conta com uma gama maior de possibilidades e prefere focar em Jack Boy sendo empurrado pela força centrífuga a arremessar a sua cabeça contra o painel do carro. ● Tempo 01:11:05 Jackie Boy bate com a testa no painel do carro / (HQ) CHUNKK A onomatopeia CHUNKK, tendo ela o fonema tiank, pensando na pronúncia inglesa do dígrado CH, ou o fonema próprio da língua portuguesa, articulando o CH como o X, dá uma impressão de carne sendo esmagada por uma estaca de metal, como mostra a cena. A análise da sonoridade que o impacto produz traz mais o ruído do painel sofrendo a pancada. Jackie Boy está morto, Dwight sofre de uma leve esquizofrenia ao trocar palavras com o defunto de Jackie Boy, no entanto, quando Jackie Boy bate sua testa no painel, ele geme junto da batida. A sonoridade dessa batida possui uma característica de amassamento curta e estridente. ● Tempo 01:12:07 Dwight leva um tiro / (HQ) BLAM ● Tempo 01:14:40 Dwight levanta-se e atira / (HQ) BLAM - metralhadora: BREKK A sonoridade fricativa de BRE busca emular a repetição dos tiros, acompanhada da oclusiva K com sua abrupta e truncada sonoridade. A onomatopeia representa muito bem a idéia de sequencialidade dos tiros da metralhadora. O som das metralhadoras de Sin City provavelmente foi produzido por sintetizadores (um sintetizador é um instrumento musical projetado para produzir sons gerados artificialmente), é possível perceber um ruído regular na emissão de cada tiro. Essa afirmação, é claro, elimina a possibilidade de se ter usado uma arma de verdade (ou de festim) na gravação do ruído e das cenas, visto que o filme foi gravado em estúdio e todo o cenário, tal como as composições de luz (explosões, fogos do cano das metralhadoras etc) foram produzidos digitalmente. Em relação à cena, este plano foi construído com um alto nível de semelhança em relação à HQ. É possível perceber na construção do posicionamento dos personagens, em relação à HQ, é que a sequência da ação é respeitada quanto ao posicionamento dos personagens, o movimento de Dwight quando se lança para a parte de trás do carro, o homem recém atingido jogado no chão. ● Tempo 01:17:57 O carro de Dwight choca-se de frente com o carro da polícia / (HQ) CRASH A onomatopeia CRASH possui a articulação oclusiva somada a uma vibrante simples, ou tepe (O articulador ativo toca rapidamente o articulador passivo ocorrendo uma rápida obstrução da passagem da corrente de através da boca.) em CRA e uma articulação fricativa em SH, ou seja, os articuladores se aproximam 77 produzindo fricção quando ocorre a passagem central da corrente de ar. Schaffer (1992 pg219) descreve a sonoridade de SH (correspondente ao som de CH) como ruído branco. Espectro total de frequências de sons aleatórios 11. A representação sonora no momento do abalo entre os dois automóveis tem propriedades bastante análogas à expressão onomatopaica CRASH. O impacto é, assim como a oclusiva formação CRA, semelhante a dois objetos se chocando fortemente e em seguida, semelhante a fricção de SH, formando um fluxo de ar, misturado com estilhaços e gases vazando. Em relação ao objeto sonoro, isto é toda a gama de sons e ruídos possíveis de se perceber numa dada situação, a cena é influenciada por inúmeras intervenções sonoras. O choque dos automóveis é precedido por trombones orquestrados e com pausas. Bongos e congas produzem uma célula ritmica acelerada sob a harmonia produzida por um sintetizador que faz um crescente até o momento da colisão dos automóveis. Um som de buzina é produzido em meio a uma série de ruídos distintos de estilhaços, buzina e derrapagens de pneus. Quando a colisão ocorre todos os sons param, ficando apenas o ruído do ‘SH’ (na representação onomatopaica, que é oral, fricativo, pós alveolar e surdo segundo as características fonéticas) cujo ruído semelhante a um gás vasando. ● Tempo 01:18:12 Homem atira com a meralhadora, para dar cobertura / (HQ) BRAKA Como na onomatopeia BREKK, a sonoridade fricativa de BRA busca emular a repetição de tiros, acompanhada da oclusiva K com sua abrupta e truncada sonoridade, porém mais atenuada com a presença da vogal ‘A’. A onomatopeia representa a repetição de disparos, mas a vogal ‘A’ dá uma impressão de interrupção rápida como uma pequena rajada de disparos. No entanto, o que se vê no plano do audiovisual é uma verdadeira saraivada de disparos efetuados pelo atirador, utilizando duas pistolas-metralhadoras compactas modelo UZI, ou semelhante. A cena é adaptada. Rodriguez e Miller exploraram os planos do quadrinho através de enquadramentos e posicionamentos de câmera diferentes. Toda a sequência do atirador em pé atirando em Miho, Miho saltando e atirando sua flecha contra o atirador (decepando parte de sua cabeça) está numa única página 11 SEQUENCIAL, Quadrinhos e arte; Will Eisner; Ed. Martins Fontes; São Paulo, 2001; pgs 154. 78 dividida em dois quadros e um quadro menor ao meio com Miho saltando. De modo que toda a informação contida na HQ possa, aos olhos dos diretores, ter sido possível apenas com a quantidades de planos usada no filme. Voltando à questão do objeto sonoro o tema harmônico permanece no plano de fundo de toda a ação, sempre com uma dinâmica crescendo e em interação com os fenômenos do primeiro plano, ou seja, aqueles sons do ambiente que são mais verossímeis do que os sons de trilha sonora e de atmosferas. ● Tempo 01:18:27 Granada explode contra Miho / (HQ) POOM ● Tempo 01:18:35 Dwight atira contra homem, que entra no bueiro / (HQ) BLAM ● Tempo 01:19:05 Homem aciona uma bombs contra Dwight / (HQ) POOM ● Tempo 01:19:56 Miho atravessa Homem bomba com sua espada / (HQ) SHAKK ● Tempo 01:21:58 Gail ataca o pescoço de Beck / (HQ) CHOMP (a cidade do pecado 38:49) ● Tempo 01:22:06 Manute dá um golpe em Gail, atirando-a longe / (HQ) FAPP O golpe de Manute em Gail é precedido por um “crescendo” de um harmônico produzido por um sintetizador que culmina no golpe. O sentido para o qual Gail é arremessada é diferente ao do quadrinho, além de que Manute segura Becky pelo colarinho na HQ. FAPP possui uma articulação fricatica em FA, é possível se imaginar o braço de Manute cortando o vento em direção ao rosto de Gail. A letra P é oclusiva, seu som é abrupto e representa o momento do golpe. Em análise trata-se de uma onomatopeia perfeita para a situação. No filme, o crescendo de trompas, em intervalos dissonantes de segundas menores é uma parte importante da linguagem sonora para a expressão de todo o sentimento de ódio e impetuosidade de Manute. O fato de Gail literalmente decolar dá mais ênfase ainda no plano e atribui-se essa ênfase para este golpe à escolha do diretor. ● Tempo 01:22:26 Miho atira uma flecha no homem de Manute / (HQ) THUNK ● Tempo 01:23:08 Miho atira uma flecha novamente atingindo a cabeça do homem / (HQ) barulho do arco: KTANGG - vidro sendo atravessado pela flecha: SPAKK - flecha entrando no corpo do homem: THUNK SPAKK está contida em “O assassino amarelo” KTANGG, sendo pronunciada em português como katângui tem a oclusiva ‘K’, que possui no articulador ativo a parte superior da língua (que seria a região da língua mais próxima da epíglote) e o articulador passivo no véu palatino (região do céu da 79 boca próxima da epíglote). “TAN” possui um lugar de articulação conhecido como Dental 12, em que o articulador ativo é ou o ápice (ponta) ou a lâmina (parte posterior) da língua, isto é, tem a mesma articulação encontrada em data, lata e nada. Quanto ao modo ou maneira de articulação trata-se de uma oclusiva, então neste caso KTANGG é uma onomatopeia de uma articulação que contém uma oclusiva seguida de outra em “KTAN” (o estrondo da representação sonora no filme é bastante ruidoso possuindo tremeliques da corda do arco em movimento de amplitude.) e o som nasal da consoante ‘N’, que seria uma obstrução completa da passagem de ar pela boca. A conclusão da onomatopeia com a pronuncia da consoante ‘G’ que é conhecida tecnicamente como uma articulação secundária, tratando-se de uma palatalização que consiste no levantamento da língua em direção a parte posterior do palato duro, ou seja, a língua direciona-se para uma posição anterior (mais para a frente da cavidade bucal), tratando-se também de uma consoante de pronuncia oclusiva/abrupta. Toda essa consideração a respeito da onomatopeia é uma análise que busca aproximar a interpretação deste ideal sonoro realizado no filme. Como já dito o disparo da flecha efetuado por Miho no filme possui uma sonoridade bastante cheia de informações e ruídos e KTANGG busca expressar todos eles em seu todo. As vogais sempre tem a sua contribuição nas onomatopeias, a única onomatopeia encontrada aqui é ‘A’, Schaffer afirma que elas são grandes responsáveis pelo timbre do som, ele diz que existem faixas de frequência que dão às vogais a sua coloração timbrística, essas são conhecidas como formantes 13. ● Tempo 01:24:38 Dwight aperta o botão que irá detonar a bomba na cabeça de Jackie Boy / (HQ) CHIKK A sonoridade de ‘T’ contida em CHI como ‘ti’ é oclusiva e representa muito bem a sonoridade do botão sendo apertado por Dwight. O close up no exato momento em que Dwight aperta o botão, no plano, é um recurso poderoso quanto a enfatizar a importância do fato, afinal várias pessoas estão em volta da cabeça e serão gravemente atingidas pelos estilhaços. Os olhos arregalados de Manute em plano close up também são uma ênfase da situação gerada pela armação de Dwight e Gail. Em análise conclui-se a força imagética na construção do plano na ação, tanto 12 SILVA, Thaïs Cristófaro. Fonética. In Fonética e fonologia do português : roteiro de estudos e guia de exercícios. 9. Ed. – São Paulo: Contexto, 2007. P. 32. 13 SCHAFFER, R. Murray. Quando as palavras cantam. In O ouvido pensante. São Paulo: Unesp, 1992. P. 224 80 na HQ, quanto no filme o mais importante é que isto tudo para enfatizar o click do botão explosivo. A adaptação da cena sofre algumas modificações e claramente elas se deram pela necessidade de se reforçar o apelo dramático da situação e do momento da história que se encaminha para seu ápice. ● Tempo 01:24:38 Bomba explode / (HQ) POOM Onomatopeia elencadas por ordem de incidência Segundo a teoria de Schafer (1992) as palavras são um bracelete de encantamentos vocais. E contam ao ouvinte atento uma complicada história da vida. CHUNK (Estrela de Miho) O lugar de articulação da onomatopeia tem duas partes, que podem ser divididas por CHUN – K. ‘CHUN’ possui uma articulação conhecida como alveopalatal (ou pós-alveolares) onde o articulador ativo é a parte anterior da língua (região central) e o passivo a parte medial do palato duro (região conhecida como céu da boca), o seu modo de articulação é fricativo. ‘K’ é a oclusiva velar desvozeada e sua fonética sugere juntamente a CHUN, o ruído que representa a idéia da arma de Miho cravando no corpo, ou seja, é um complemento. • Tempo 01:00:18 Miho atira uma estrela que arranca a mão de Jackie Boy / (HQ) CHUNK Jack Boy engatilha a sua arma e ordena a Becky que entre em seu carro. A trilha sonora é de suspense e uma melodia crescendo precede o ataque de Miho. Miho atira um artefato cortante contra o antebraço de Jack Boy e seu braço é amputado. A sequência é cheia de informações sonoras, o som ambiente, a trilha sonora e os ruídos adicionais correspondentes à onomatopeia. CHUNK corresponde ao ruído do momento exato em que o artefato corta o antebraço do policial. Uma série de ruídos narra o ato de atirar de Miho, desde o momento em que ela lança o objeto até o momento em que a mão cai segurando a arma no chão e o ruído do sangue de Jack Boy começa a figurar no objeto sonoro sem representação imagética. A trilha sonora ganha peso após o ataque e a partir daí, Miho começa a chacina. • Tempo 01:01:18 Jackie Boy senta na estrela de Miho / (HQ) CHUNK Jack Boy descuida-se e escorrega, caindo sentado sobre a estrela de Miho que está fincada no chão. O plano é representado de modo diferente da HQ, mas não altera 81 em nada a narrativa. Três planos narram a queda de Jack Boy. A trilha sonora faz um crescendo de um efeito que uniformiza os instrumentos da trilha sonora e de modo abrupto silencia, abrindo espaço para o ruído correspondente à onomatopeia. O ruído da onomatopeia é semelhante a um ruído produzido por uma lâmina, como uma faca sendo amolada. SHAKK (Corte de espada de Miho) A fricativa dental alveopalatal desvozeada SH (chi), somada à vogal ‘A’ produz a sensação de algo muito molhado. A oclusiva velar desvozeada ‘K’ é descrita como explosão subterrânea das cordas vocais. A onomatopeia também sugere o corte, já que a consoante ‘S’ sugere o deslize do dedo sobre a mesa, ou corte de um objeto por uma lâmina de metal. A vogal ‘A’, aberta (baixa) anterior, também desempenha papel fundamental na expressão do efeito de corte requerido nesta situação, um exemplo disso é a onomatopeia CHIKK (presente em A Cidade do Pecado), que representa a idéia sonora de isqueiro, ou o ato de engatilhar uma arma. A única diferença fonética em relação a SHAKK é a vogal ‘I’, que é fechada (alta) anterior. • Tempo 01: 00: 31 Miho encrava suas espadas nas cabeças de três comparças de Jackie Boy / (HQ) SHAK O ataque de Miho conta com a trilha sonora que tem uma característica de suspense e adorna toda a ação é enriquecida com a orquestração de um tema de suspense. Os ruídos dos golpes são fortes e foneticamente falando as altas frequências contidas em ‘S’ e ‘K’ predominam em toda a sequência. • Tempo 01:07:01 Miho começa a decepar os cadaveres / (HQ) SHAKK Miho decepa os membros dos corpos dos homens de Jack Boy e, enquanto ela o faz, os planos mostram os rostos de Dwight e Gail enquanto o objeto sonoro narra Miho cortando os pedaços dos corpos. Os ruídos são fortes e os personagens que aparecem demonstram estar atentos àquilo que o som narra. • Tempo 01:19:56 Miho atravessa Homem bomba com sua espada / (HQ) SHAKK A sequência é toda modificada em relação à HQ, o eixo, a ângulação, o ruído soa com o auxílio da trilha sonora, como em quase todo o filme, como se fosse uma grande ópera. A escolha de Rodriguez por um plano diferente pode ter se dado por vários fatores, condições de cenário, preferência estética, disposição dos personagens no quadro, etc. 82 Extraído do Filme Sin City “The Big Fat Kill” e da HQ Sin City “A Grande Matança” 83 THUNK (som de flecha de Miho) ‘T’ e oclusiva alveolar desvozeada, tem uma pronúncia fechada (ou alta) posterior, pela presença da vogal ‘U’ e representa a vibração de uma flecha quando cravada numa espécie de tábula. A oclusiva velar desvozeada ‘K’ complementa a idéia do ruído de vibração sugerido, como se a onomatopeia fosse um único ruído de vibração. ● Tempo 01:01:45 Miho bloqueia o cano do revolver de Jackie Boy / (HQ) THUNK Os bongos soam dando dinâmica à ação. Jackie Boy descuida-se e um naipe de violoncelos, quase que como uma anacruse (introdução que antecede o primeiro compasso de uma peça musical), precede Miho disparando o objeto contra o cano do revolver de Jackie Boy. A impressão sonora de THUNK tem muito mais verossimilhança com flechas do que com o objeto deste exemplo, que no filme fora utilizado como material de metal e cujo ruído faz referência a esse material. ● Tempo 01:22:26 Miho atira uma flecha no homem de Manute / (HQ) THUNK Sons de trovão adornam o objeto sonoro e a flecha atravessa um dos homens de Manute que, como se não tivesse sentido dor alguma, exclama uma interjeição (Hey). Em análise, o ruído é foneticamente análogo a um ruído fricativo, algo como FLASH, possui uma alta variação de ruídos que soam juntos e de modo organizado. ● Tempo 01:22:08 Miho atira uma flecha novamente atingindo a cabeça do homem / (HQ) barulho do arco: KTANGG - vidro sendo atravessado pela flecha: SPAKK - flecha entrando no corpo do homem: THUNK Miho lança uma nova flecha contra o homem de Manute e atinge-o na cabeça, o ruído produzido pela investida de Miho tem um efeito de um objeto cortando o ar e, em seguida, algo semelhante a FLASH, como no plano anterior em que Miho acerta a primeira flecha no corpo do homem. BLAM (som de tiro) A onomatopeia BLAM caracteriza o disparo de uma arma. No âmbito da fonética da onomatopeia, o lugar de articulação da consoante ‘b’ é bilabial, onde o articulador ativo é o lábio inferior e o articulador passivo o lábio superior e a maneira de articulação é oclusiva, onde os articuladores produzem uma obstrução completa da passagem da corrente de ar através da boca. Em seguida emenda-se a consoante ‘L’, cujo lugar de pronúncia é conhecido como alveolar, pois o articulador ativo é o ápice ou a lâmina da língua e como passivos os alvéolos (parte rajada do céu da boca). No final ‘AM’ a onomatopeia é concluída com uma articulação anasalada. ● Tempo 01:01:51 Miho bloqueia o cano do revolver de Jackie Boy, que atira / (HQ) BLAM Jack Boy dispara contra Dwight com o cano de sua pistola obstruído por um pequeno cilindro de metal atirado por Miho. A onomatopeia BLAM ocorre também em “O assassino amarelo” nas situações em que o anti-herói Det. Hartigan é atacado por seus inimigos. Nesta situação, o ruído do disparo é abafado e um ruído paralelo, que representa a culatra da pistola descarrilhando contra a sua face, 84 ressoa junto ao som do disparo que, diferentemente dos outros exemplos da mesma onomatopeia, cuja adaptação possui uma sonoridade mais aguda e ruidosa, possui um ruído mais reprimido e grave e o ruído adicional assemelha-se à um objeto de metal sofrendo uma fricção em outro objeto do mesmo material, analogizando o atrito da culatra no corpo da pistola. Robert Rodriguez preservou o mesmo posicionamento da câmera no plano em relação à HQ. Extraído do Filme Sin City “The Big Fat Kill” e da HQ Sin City “A Grande Matança” ● Tempo 01:12:07 Dwight leva um tiro / (HQ) BLAM Na adaptação de Rodriguez o projetil corta o vendo produzindo o efeito de velocidade e efusão. A arma utilizada pelo atirador de elite é uma espécie de espingarda. Conclui-se que Frank Miller não se preocupa em distinguir a identidade das sonoridades de cada onomatopeia, empregando o recurso da maneira mais conveniente para a sua composição narrativa. ● Tempo 01:18:35 Dwight atira contra homem, que entra no bueiro / (HQ) BLAM Neste exemplo temos a onomatopeia representando a idéia de não só um disparo, mas, como vemos na adaptação de Rodriguez (valendo ressaltar que fora co-dirigida com Frank Miller) uma situação em que Dwight desfere mais de um tiro (três tiros). 85 Extraído da HQ Sin City “A Grande Matança” POOM (Explosão de bomba) A pronúncia da consoante oclusiva bilabial ‘P’ vai de meia fechada (ou média alta) para fechada (alta), pela presença da vogal ‘O’ e pela proximidade com a vogal ‘U’ na pronúncia inglesa. A onomatopeia POOM encerra-se de modo nasal com a pronúncia da vogal ‘o’ com os lábios completamente fechados. ● Tempo 01:18:27 Granada explode contra Miho / (HQ) POOM A trilha sonora cessa e uma harmonia de timbres bem agudos, no estilo Hitchcock, dá o prelúdio para a explosão, que lança Miho longe. No filme a bomba explode contra Miho e a lança longe. Os ruídos produzidos são muito interessantes. A explosão do artefato gera uma sonoridade que foneticamente pode ser interpretada como uma oclusiva bilabial desvozeada, um ruído de gás vazando e alguns assovios, característicos dos fogos de artifícios, cantam junto ao som de gás vazando. ● Tempo 01:19:05 Homem aciona uma bombs contra Dwight / (HQ) POOM É interessante perceber neste exemplo o quanto o uso de sons que anúnciam um evento é comum. no plano anterior a explosão podemos ouvir um pequeno ruído que claramente faz referencia à atitude do homem bomba, de detonar a bomba instalada para matar Dwight. ● Tempo 01:24:38 Bomba explode / (HQ) POOM Violinos executam uma frase que termina no momento em que Dwight resolve detonar a bomba. Tudo fica em silêncio. 86 Conclusões A análise realizada sobre a sonorização das onomatopeias passou por várias etapas de evolução dos estudos realizados, motivados pela proposta inicial da investigação da adaptação cinematográfica realizada sobre o universo das onomatopeias, sobretudo na obra de Frank Miller, a HQ Sin City. A primeira conclusão a ser apontada, é a de que as onomatopeias são experiências sonoras que o leitor realiza no ato de leitura. Etimologicamente são definidas como “ação de imitar uma palavra por imitação de um som. Do grego onomatopiia” Moya (1977). As onomatopeias descrevem ou sugerem acusticamente o objeto ou a ação que significam. Isso legitima a análise fonética baseada nos modos e lugares de articulação que definem a qualidade dos ruídos, como uma imitação dos sons. Na HQ de Frank Miller, houve uma preocupação em preservar a mesma fonte sonora para um mesmo objeto em situações distantes. Em O Assassino Amarelo, (tempo 01:52:15) Hartigan atira em dois policiais que se aproximam. A onomatopeia empregada é BOOM para todos os disparos de Hartigan. Roark Jr dispara contra Hartigan, atingindo um seu braço esquerdo (tempo 10:02). Roark Jr atira novamente em Hartigan (tempo 10:52), em ambas as situações a onomatopeia empregada é BLAM. Por toda a trama acontecem repetições que dão identidade ao ruído de cada elemento no objeto sonoro. Conclui-se a sonoridade de um mesmo evento pode ser repetida quando a narrativa do fato exigir que este seja representado por um ponto de vista diferente. Arlindo Machado (1997) situa essa técnica num contexto de evolução da narrativa, pela necessidade de detalhar os fatos mais importantes, conhecida como linearização do signo icônico, pois o que caracterizava o primeiro cinema era o fato de tudo ser colocado de forma simultânea dentro do quadro de modo que a clareza da narrativa fosse prejudicada, negligenciando as informações mais importantes. No exemplo em que Marv (Tempo 37:00) arremessa um galão de combustível contra a casa de Kevin a mesma explosão se repete, afim de que pudesse ser vista tanto do alto quanto de perto; no quadrinho apenas a imagem do alto é retratada. No segundo exemplo Marv é levado para um beco por matadores, onde os domina e usa o braço do adversário para atingir o outro, ao mesmo tempo em que, na HQ, crava a cabeça do segundo matador na parede. No filme (tempo 20:44) todos esses eventos foram 87 divididos cada um em um plano independente. Algumas onomatopeias não correspondem à ideia sonora que buscam representar e necessitam do complemento da imagem, tanto do quadrinho, quanto do plano no cinema, para que a relação possa ser feita. A partir da proposta da pesquisa, conclui-se também com isso que algumas onomatopeias são inadequadas em relação ao som/ruído que desejam imitar, não cabe a avaliação do ponto de vista da adaptação, uma vez que em alguns desses casos a própria onomatopeia não representa com eficiência a ideia sonora que deseja representar. Um exemplo que soou inadequado na análise fonética em quase todas as situações em que foi empregado é a onomatopeia SNAP, presente em Assassino Amarelo (como som de estilete) e em A cidade do Pecado - The Hard Goodbye – (como barulho de pescoço sendo quebrado). A ausência de vogais na onomatopeia aumenta a sensação de ruído, pela dificuldade de pronunciação que é causada. Segundo Schafer (1992 pg 224) são a alma das palavras, e as consoantes, seu esqueleto. Em Sin City, a adaptação sofreu adaptações (como em 25:50 em que Marv cai no chão/ onomatopeia: BLAMKRAK) os eventos foram reorganizados, uma forma, encontrada pelo diretor Robert Rodriguez, de concatenar a narrativa. Para a dinâmica da narrativa, é preponderante a interferência da trilha sonora (no que diz respeito ao som produzido por sintetizadores, ou seja, que não são música necessariamente) na emissão de alguns ruídos. Em The Hard Goodbye (tempo 26:10) Kevin golpeia Marv com uma marreta, apagando-o. A interferência do objeto sonoro na narrativa é determinante. 88 Referências Bibliográficas AUMONT, Jacques. A estética do filme. Campinas: Papirus, 1995. CIRNE, Moacy. A linguagem dos quadrinhos. Petrópolis: Vozes, 1973. ____________. Quadrinhos, sedução e paixão. Petrópolis: Vozes, 2000. ECO, Umberto. A linguagem da estória em quadrinhos. In Apocalípticos e Integrados. São Paulo: Perspectiva, 1976, pg. 144-179. ____________. O mito do superman. In Apocalípticos e Integrados. 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