reduzindo os danos: novas formas de pensar o consumo

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reduzindo os danos: novas formas de pensar o consumo
 REDUZINDO OS DANOS: NOVAS FORMAS DE PENSAR O
CONSUMO
JULIANI KARSTEN ALVES
Universidade Federal de Santa Maria
[email protected]
MATHEUS GIACOMINI PALMA
UFPEL
[email protected]
REDUZINDO OS DANOS: NOVAS FORMAS DE
PENSAR O CONSUMO
Resumo:
Há uma eminente preocupação com o futuro do planeta Terra, desde 1987 é abordada a
necessidade da adesão aos modelos de desenvolvimento sustentáveis. Consumimos mais bens
e serviços do que todas as gerações anteriores reunidas, esquecendo-nos que o modelo de
consumo que praticamos não é sustentável e não será capaz de possibilitar que futuras gerações
supram suas necessidades. Apesar de o enfoque do desenvolvimento sustentável ser mais
relacionado ao mundo empresarial, a adesão às práticas sustentáveis deve ser assentida, com a
igual importância, tanto pelas organizações como pelos indivíduos. O presente trabalho tem
como objetivo sugerir uma outra forma de consumir: o consumo colaborativo através da
reutilização contribuindo com a redução de danos para o planeta. Para isso, através da pesquisa
bibliográfica são fundamentados referenciais que abarcam o conceito de subjetividade e que
denunciam o mal-estar na sociedade atual, como também de consumo colaborativo e
reutilização como uma alternativa de consumir menos agressiva para o meio ambiente.
Constata-se que, apesar de o consumo ser um dos grandes instrumentos de bem-estar atual, é
necessário aprender a consumir os bens e serviços de uma maneira diferente da praticada
atualmente, não basta que consumamos menos lixo doméstico ou destinemos à reciclagem, mas
sim modifiquemos nossa relação com o que consumimos de novo proveniente do processo
industrial.
- Palavras-chave: Redistribuição; Consumo colaborativo; Subjetividade.
REDUCING THE DAMAGE: NEW WAYS
OF THINKING CONSUMPTION
Abstract:
There is an imminent concern for the future of planet Earth since 1987 is discussed the need for
adherence to sustainable models of development. Consume more goods and services than all
previous generations combined, forgetting that the consumption model that practice is not
sustainable and not be able to enable future generations Supram your needs. Although the focus
of sustainable development to be more related to the business world, adherence to sustainable
practices must be assented, with equal importance, both by organizations and by individuals.
This paper aims to suggest another way to consume: collaborative consumption through reuse
contributing to the reduction of damage to the planet. For this, through literature references that
cover the concept of subjectivity and denouncing the malaise in contemporary society, as well
as collaborative consumption and reuse as an alternative to consume less aggressive to the
environment are based. It appears that, although the consumption is one of the great instruments
of current well-being, you must learn to consume the goods and a different way of services
currently practiced, is not enough we consume less destinemos household waste or recycling,
but yes we change our relationship to what we consume again from the industrial process.
- Key Words: Redistribution; Collaborative consumption; Subjectivity.
1 INTRODUÇÃO
Há uma eminente preocupação com o futuro do planeta Terra, desde 1987 é abordada a
necessidade da adesão aos modelos de desenvolvimento sustentáveis. Porém o enfoque dado
nessa área é evidentemente voltado ao mundo empresarial, esquecendo-se que a adesão às
práticas sustentáveis também deve abranger os indivíduos, esses que além de consumidores de
produtos e serviços, são os escolhedores da destinação dada ao que sobra após a realização do
consumo.
Vivemos em uma sociedade individualista que nos estimula a viver além dos nossos
recursos, tanto financeiros quanto ecológicos, consumindo mais bens e serviços do que todas
as gerações anteriores reunidas e em décadas cerca de um terço dos recursos naturais do planeta.
Certamente o modelo de consumo que praticamos não é sustentável, uma vez que apesar de
suprir nossas necessidades e vontades, não comportará que futuras gerações também supram as
suas.
Em nosso tempo há uma emergência que muitas vezes é esquecida, porém não por um
nível baixo de importância ou aplicabilidade, mas arriscando uma resposta, pela falta de
interesse ou insight de poucos e muitos respectivamente. Quando falamos interesse estamos
ligando aos grandes produtores, as grandes empresas que não demonstram estar interessadas no
uso inapropriado, contínuo e excessivo dos recursos de nosso planeta. Já por outro lado, o
insight, ou também em outras palavras, uma tomada de consciência das pessoas que consomem
os mais diversos produtos, também marcados pelo excesso, que além de reforçar a produção
em massa, produzem uma quantidade enorme de lixo e não percebendo que suas ações são
ativas e de grande importância na relação com o planeta.
Nosso trabalho é atravessado por dois problemas que são encontrados na
contemporaneidade, o vazio existencial que gera o ato de repetição em forma de consumação
capitalística e também a produção que tem como finalidade saciar essa eterna repetição. Temos
como objetivo não demonstrar uma solução para esse vazio existencial, mas sugerir uma outra
forma de consumir, que age como uma redução de danos para o planeta, especificamente o
consumo colaborativo visando a reutilização. Frente a isso são fundamentados referenciais que
abarquem o conceito de subjetividade e que denunciam o mal-estar na sociedade atual, como
também, a reutilização como uma forma de consumir menos agressiva para o meio ambiente.
2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
2.1 Forma de entender a subjetividade.
Para compreender a subjetividade nesse trabalho foi usado referenciais específicos da
filosofia e psicologia, especificamente a filosofia da diferença e psicanálise. No começo do
livro Mil Platôs (1995), os autores relatam o que escrevem e ao colocar seus nomes é por pura
formalidade, pois já não eram somente estes que haviam composto o livro. O que os autores
evidenciam é a multiplicidade de um sujeito, ou seja, todas as ações do mesmo não partem de
atitudes isoladas e exclusivamente intrínsecas, mas de um conjunto de outros dispositivos que
o compõe em sua multiplicidade, em suma, delegam a parte política dos sujeitos.
Mais à frente retomares a esse ponto, quando trataremos do mal-estar da repetição em
forma de consumação, sendo que agora vamos apresentar como fundamentamos a
subjetividade. A fundamentação sobre a subjetividade se dá em dois pontos, mas estes não são
dialeticamente separados, mas se constroem simultaneamente, por meios extrapessoais e
infrapsíquicos (GUATTARI, ROLNIK, 1986). Para os autores, o processo de construção da
subjetividade não se limita somente em meios individuais ou grupais, mas como dito por meios
extrapessoais, sendo estes na relação com diversos sistemas, sendo sociais, maquínicos,
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econômicos, tecnológicos, midiáticos e também os infrapsíquicos, como sistemas de percepção,
de sensibilidades, de afeto, desejo, entre outros.
Devemos ressaltar, que por mais que haja uma separação, os autores o fazem
didaticamente, pois não há como retirar a esfera política de ambas. Para esse trabalho, nos
interessa ressaltar nesse momento os mecanismos extrapessoais, que se dão como dispositivos.
Dispositivo é um conceito muito usados nas obras de Foucault, porém sem uma definição
específica sobre o mesmo. Para clarificar esse conceito, fazemos o uso do livro de Deleuze
(1990) que em nossa visão satisfaz nosso problema.
Para compreender o conceito de dispositivo, Deleuze (1990) o compara com um novelo
de lã, um emaranhado de linhas heterogêneas. Essas linhas heterogêneas são a metáfora para
exemplificar as diferentes formas de subjetividade que o sujeito pode consumir presentes no
social. Essas linhas objetivamente, podem ser consideradas como a instituição da família, da
educação, da mídia, da psicanálise, da ciência, religião entre outras que produzem a
subjetividade do sujeito.
Vale ressaltar quando nos referimos a subjetividade, não estamos falando de ideologia,
ou seja, reduzindo a um simples, modo de pensar. Quando se fala em subjetividade abarcamos
todos os modos de ser, viver, sentir e habitar o presente que nos rodeia (GUATTARI, ROLNIK,
1986). Assim nossa porção fechada de subjetividade é denominada de território, como um lugar
que habitamos, porém sempre na presença de uma linha nova, no momento em que a
consumimos, nosso território não é o mesmo, fazendo o movimento de abrir-se ao novo, para
depois fechar-se com a nova linha consumida. Linguisticamente essas três etapas são chamadas
de territorialização (subjetividade fechada), desterritorialização (subjetividade aberta e
consumindo) e por fim, a reterritorialização (que consiste em seu fechamento).
O capitalismo se enquadra no conceito de dispositivo, pois produz nos sujeitos modos
que de viver que não são ontológicos, ou seja, inatos ao ser. Não podemos negar que há
vantagens neste modo econômico, porém também não negligenciamos que há uma produção
de doença da mesma forma. Há também a necessidade de ressaltar que este trabalho não quer
propor outro modo econômico, mas repetidamente já dito, demonstrar outras maneiras de
habitar este modo. Com essa breve contextualização, adentraremos então ao mal-estar gerado e
seu objeto.
2.2 O nosso mal-estar
Há uma diferença entre singularidade e individualidade (GUATTARI, ROLNIK, 1986).
Quando falamos em individualidade de acordo com o referencial proposto, nos referimos aos
sujeitos com sua subjetividade produzida em massa. Produção em massa é o problema central
em nosso trabalho, pois denota dois prejuízos: 1) a produção em massa de produtos, que fazem
o uso excessivo de matéria-prima da natureza; e 2) a produção em massa da subjetividade dos
sujeitos. O capitalismo produz sua doença contemporânea, a massificação de modos de pensar
e viver, e por isso a necessidade de tratar da singularidade, isto é, a capacidade dos sujeitos
escaparem dos modos de produção da subjetividade em massa, desta esteira de produção, para
assim conseguirem sintetizar o que lhe é posto e criar seu próprio modo de habitar o mundo,
um modo não massificado.
Birman (2005, 2012) ressalta o modo que vivemos na atualidade, isto é, imersos num
vazio gerador de mal estar. O capitalismo como já dito, fator incisivo para a massificação dos
modos de pensar e agir, ao ser imposto sem uma crítica pelo sujeito, gera uma negatividade,
uma falta de sentido nas ações contemporâneas. Estas ações, de produção e consumo não são
pensadas a longo prazo ou em relação ao bem-comum, causando danos aos próprios sujeitos,
como também nas gerações póstumas. Citando fielmente o autor: “Age-se frequentemente sem
que se pense naquilo a que se visa a ação, de forma que os indivíduos nem sempre sabem dizer
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o que os leva a agir” (BIRMAN, 2012, p. 82).
Em uma leitura psicanalítica sobre o problema, Birman (2012) caracteriza a compulsão
pelo consumo de novos produtos a todo momento. Por essa leitura, o autor se posiciona que
essa compulsão toma a forma de um ato repetitivo, que nunca se esgota, uma necessidade de
preencher um vazio que está em intrinsicamente nos sujeitos, que sempre muda de objeto,
fazendo com que os sujeitos necessitem de um produto hoje, amanhã outro, outro e outro. Estes
outros, além de não saciar, produzem o mal estar no bem comum, isto é, nosso planeta, pelo
acúmulo de um consumo.
Essa necessidade de consumo pode ser muito bem vista nos grandes dispositivos
gerados pela mídia, onde se cria a necessidade de consumir. Qualquer produto que é oferecido,
antes de surgir nas prateleiras há um grande investimento por trás, que faz criar o desejo da falta
nos sujeitos, que os fazem sentir a necessidade de os comprar. Guattari (2012) propõe que contra
essa força, necessita de uma força maior ainda que parte dos sujeitos que re-signifiquem os
modos de habitar esse capitalismo. Assim há a emergência do sujeito produzir novos modos de
agir com as três grandes esferas, a da subjetividade, a do social e com a natureza.
A proposta que expomos nesse trabalho também não demonstra uma solução ao nosso
vazio, porém uma nova forma de se relacionar com as três grandes esferas. O pensamento
permeado pela sustentabilidade será fundamentado, para tentar demonstrar esta nova forma de
relação, onde há ganhos principalmente com a natureza, porém que agrega outros territórios
com o social e a subjetividade.
2.3 Sustentabilidade
O termo sustentabilidade remete à característica de um processo ou sistema que
possibilita sua existência por determinado tempo ou por tempo indeterminado. Até os anos
1980, esse termo era utilizado com maior frequência por profissionais da área ambiental, porém
em 1987 o termo foi apresentado ao mundo através dos resultados publicados no relatório Our
Common Future pela Comissão Mundial de Meio Ambiente e Desenvolvimento, ou Comissão
Brundtland, surgindo um novo olhar acerca do desenvolvimento sustentável, definindo esse
como o processo realizado que supra a necessidade atual sem que haja comprometimento da
capacidade de que gerações futuras também supram as suas. Indo de encontro a isso, o termo
sustentabilidade tem sido utilizado atualmente para exprimir ambições de continuidade,
durabilidade ou perenidade, remetendo ao futuro da espécie humana, tratando-se assim de um
conceito associado a novos valores com sentido essencial a responsabilidade pelas condições
de vida das futuras gerações. (PEREIRA, 2008)
O desenvolvimento sustentável empresarial está baseado internacionalmente na relação
entre três dimensões: econômica, ambiental e social. (VELLANI, 2011) O triple bottle line,
criado pelo inglês John Elkington e traduzido ao português como "linha dos três pilares", é
baseado na relação dessas dimensões para afirmar que a sustentabilidade deve envolver pessoas,
o planeta e o lucro. John defende assim que as organizações não devem avaliar seu sucesso
somente através do desempenho financeiro, mas também avaliar também o impacto sobre a
economia mais ampla, sobre o meio ambiente e sobre a sociedade em que está inserida.
Conforme ilustra a figura 1, a organização somente seria sustentável no momento que obtivesse
sucesso em relação as três dimensões constantes nesses pilares. (PEREIRA, 2008)
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Figura 1 – O tríplice resultado
Fonte: PEREIRA, 2008, p.78
A ideia expressa no triple bottle line foi fortalecedora do movimento empresarial pela
sustentabilidade desde a década de 1990, porém da forma que é posto em prática atualmente
privilegia a visão dos negócios para sustentabilidade colocando a dimensão econômicofinanceira como norte para as outras dimensões e legitimando somente algumas iniciativas
questionáveis em relação ao tema. A ISO 26000, norma mundial de responsabilidade social,
nos lembra que o objetivo do desenvolvimento sustentável não está focado em uma organização
específica, como é praticado atualmente, mas em atingir um estado de sustentabilidade para o
planeta. A GEO-5, documento elaborado pela ONU para a Conferência das Nações Unidas
sobre Desenvolvimento Sustentável realizada 2012, relata sobre as mudanças ambientais
observadas no sistema Terra chamando atenção quando informando que apesar de muitas
medidas de mitigação, o escopo e a velocidade dessas mudanças não diminuíram nos últimos
cinco anos. A conscientização pelo desenvolvimento sustentável, assunto abordado desde 1987
como citado anteriormente, vem ganhando progressiva relevância no ambiente dos negócios
porém sem que sejam tomadas ações coletivas que resultem em reais mudanças positivas.
(FIALHO, 2013)
É necessário, além do reconhecimento da necessidade de mudanças no modelo atual de
exploração de recursos naturais, no direcionamento de investimentos, na orientação do
desenvolvimento tecnológico e nos valores institucionais, buscando a sintonia com as
necessidades atuais e das gerações futuras, que também o consumo responsável, um dos fatores
determinantes para que o desenvolvimento sustentável seja atingido, seja praticado. (PEREIRA,
2008)
Dessa forma, deveria ser adotada uma ética por parte da sociedade consumidora para
que houvesse a promoção da sustentabilidade:
- a vivência de um constante exercício de descobrir, respeitar, valorizar e saber cuidar
do “outro”;
- a adoção de um estilo de vida que promova a maximização dos impactos positivos e
a minimização dos negativos frente à saúde da biodiversidade e dos ecossistemas e à
promoção da dignidade, da justiça e do bem-estar social;
- a promoção de valores e atividades econômicas que mantenham os padrões de
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consumo dentro do limite das possibilidades ecológicas a que todos possam, de modo
razoável, aspirar;
- o aprofundamento do conhecimento sobre o ciclo natural do planeta e do universo,
de forma a entender-se parte integrante desse sistema;
- a conscientização de que eu sou peça fundamental para a mudança e que isso envolve
um contínuo aprimoramento da qualidade dos meus pensamentos, atitudes e serviços
na construção de um mundo mais justo, viável e vivível. (FIALHO, 2013, p. 133)
2.4 Consumo Colaborativo
Fazemos parte de uma sociedade individualista que há mais de 50 anos nos estimula a
viver além dos nossos recursos, tanto financeiros quanto ecológicos, consumindo mais bens e
serviços do que todas as gerações anteriores reunidas. Fazemos parte de um mecanismo de
consumo e descarte cada vez mais acelerado que, desde 1980, consumiu um terço dos recursos
naturais do planeta. É nesse cenário que o consumo colaborativo surge como alternativa
sustentável. (BOTSMAN; ROGERS, 2011)
O consumo colaborativo se torna uma alternativa capaz de combinar a coletividade com
o individual e mudar a maneira de consumo atual. Essa forma de consumo foi primeiramente
definida por Algar (2007) como sendo "uma prática de partilha, empréstimos comerciais,
aluguel e trocas, transposta para o século XXI", surgindo como forma de adaptação ao contexto
capitalista que vivemos atualmente que esquece que somos dependentes dos recursos finitos da
Terra. Esse conceito é melhor explorado por Botsman e Rogers, principais autores acerca do
tema, que o definem como sendo uma alternativa de satisfazer as necessidades e anseios do
homem moderno através de uma prática mais sustentável e que seja capaz de reduzir os
prejuízos causados para e pela sociedade como um todo. (SALES, 2013)
Esse movimento ganhou ascensão a partir da crise de 2008:
Quando a grande recessão chegou em 2008, alguns especialistas e economistas
anunciaram o fim do consumismo, enquanto alguns sugeriram que os consumidores
precisavam ser estimulados a comprar novamente. De qualquer maneira, eles
supuseram que o modelo tradicional de consumismo, aquele em que compramos
produtos, os utilizamos, os jogamos fora e depois compramos mais, continuaria
existindo, ainda que em menor escala. Embora a solução “gastar mais, consumir mais”
funcione no curto prazo, ela não é nem sustentável nem saudável (BOTSMAN;
ROGERS, 2011, p. XVIII)
Se tornando uma maneira com a qual as pessoas podem ter acesso ao que precisam de forma
menos predatória, mais ecológica e economicamente sustentável. Como é fundamentado no
compartilhamento de produtos e serviços e nas trocas, o consumo colaborativo causa um menor
impacto ambiental com o reaproveitamento e a reciclagem de objetos ociosos, aliado a isso
ainda, a satisfação dos desejos individuais com o interesse coletivo, incluindo uma maior
preservação do meio ambiente. (SALES, 2013)
Abrangendo participantes de todos os cantos do mundo, o consumo colaborativo
permitiu que esses percebessem os benefícios de acesso a produtos e serviços em detrimento da
propriedade, economizassem dinheiro, espaço e tempo, fizessem novos amigos e se tornassemse cidadãos ativos novamente. São vários os exemplos de consumo colaborativo no mundo que
expressam a ascensão explosiva ao mercado colaborativo: o compartilhamento de bicicletas é
a forma de transporte que cresce mais rapidamente no mundo, com a expectativa de que a
quantidade de programas aumentaria em 200% em 2010; o Freecycle, um cadastro mundial que
faz circular itens gratuitos para reutilização ou reciclagem com mais de 5,7 milhões de membros
em mais de 85 países; o Bartecard, a maior rede mundial de escambo entre empresas em 2009,
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onde foram negociadas cerca de 2 bilhões e que teve um aumento de 20% em relação a 2008;
e o thredUP, um intercâmbio de roupas infantis, no qual aproximadamente 12 mil itens foram
negociados nos oito primeiros dias de funcionamento em abril de 2010. Sendo que esses
ocorrem em três sistemas: os sistemas de serviços de produtos, os mercados de redistribuição e
os estilos de vida colaborativos, que juntos reinventam o que consumimos e como consumimos.
(BOTSMAN; ROGERS, 2011)
O consumo colaborativo é considerado uma tendência global, que vem acendendo cada
vez mais especialmente nos Estados Unidos e na Europa. No Brasil, ainda que como uma
iniciativa tímida, cada vez mais se tem o surgimento de novos negócios nesse mercado.
(SALES, 2013) Podemos citar como exemplos de empreendimentos colaborativos no mercado
brasileiro que estão obtendo sucesso o ZazCar, uma empresa de aluguel de carros em São Paulo
que funciona nos moldes do Zipcar american, CaronaBrasil, um site de compartilhamento de
carros em pares, o Xcambo, site de troca de produtos entre pessoas, e o Trocandolivros, site de
troca de livros entre pessoas. (BOTSMAN; ROGERS, 2011)
2.5 A redistribuição
Incluso no sistema proposto pelo consumo colaborativo, está a redistribuição: forma de
movimentar bens que antes estavam em desuso, impedindo o desperdício de bens que ainda
podem ser utilizados. Esse seria o quinto “R” – reduzir, reciclar, reutilizar, reformar e
redistribuir – e é considerado uma forma sustentável de comércio, contrariando o
relacionamento tradicional entre produtor, varejista e consumidor, e interrompendo as doutrinas
de “comprar mais” e de “comprar um novo”. O mercado de redistribuição, tanto através das
trocas livres ou mercadorias em troca de dinheiro, além de estimular a reutilização e a revenda
de itens antigos, invés jogá-los fora, reduz expressivamente o desperdício e os recursos que
acompanham uma nova produção. (BOTSMAN; ROGERS, 2011)
Em décadas passadas apesar do surgimento de programas de reciclagem e da
perseverança de bazares realizados em garagens e quintais, o ato de vender, trocar ou dar de
presente mercadorias usadas ou possuídas anteriormente não é algo natural para a maioria das
pessoas. Porém essas trocas se tornaram muito eficiente no mundo online que estimula o
compartilhamento. (BOTSMAN; ROGERS, 2011)
Podemos mencionar no mercado de redistribuição brasileiro iniciativas como o
aplicativo Dois Camelos, que permite que os usuários realizem trocas conforme suas
necessidades, promovendo o consumo consciente e aproximando pessoas identificadas por uma
causa, e o site DescolaAi, que permite que pessoas compartilhem objetos que estão em desuso
de forma segura, aumentando a vida útil do bem e evitando que adquiram um novo. (SALES,
2013)
3 METODOLOGIA
Pesquisa pode ser definida como “o processo formal e sistêmico de desenvolvimento do
método científico, que tem como objetivo descobrir respostas para problemas mediante o
emprego de procedimentos científicos”. (GIL, 1999, p.42) A pesquisa apresentada no presente
trabalho é de natureza qualitativa, caracterizando-se em relação ao seu objetivo como descritiva
por visar analisar e interpretar os fenômenos sem que os pesquisadores tenham influência sobre
esses. (GIL,2008)
O procedimento técnico adotado para a realização dessa é a pesquisa bibliográfica,
devido a essa possibilitar a explicação de um problema a partir de referenciais publicados em
documentos, tanto na forma de livros ou artigos de periódicos. (CERVO;BERVIAN, 2002)
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4 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS
Para elucidar os nossos resultados, trazemos o conceito de redução de dando como
ampliação de vida. (LANCETTI, 2014) O leitor familiarizado com o pensador citado, pode
questionar-se o porquê de um conceito de saúde pública em relação às drogas pode contribuir
com a sustentabilidade aqui proposta. Na verdade, pegamos o conceito emprestado pois
pensamos que o propomos em nosso referencial funciona como uma redução de danos em nosso
planeta.
A redistribuição não extingue o mal-estar presente nos sujeitos, da mesma forma que
não extingue a direção que esse vazio toma, ou seja, o consumo em excesso. O redistribuir
garante que o alvo do consumo seja algo que já foi produzido, assim não necessitando para que
haja o consumo uma nova produção. Dessa forma, através dos mercados de redistribuição os
bens continuam circulando, maximizando o seu uso e ampliando a longevidade. Ao mesmo
tempo há a redução do desperdício e emissões de carbono que acompanham uma nova
produção.
O impacto que a redistribuição pode propiciar é expresso por William McDonough,
coautor do livro Cradle to Cradle, ao calcular que um produto isoladamente contém apenas 5%
da matéria-prima usada para produzí-lo. Dessa forma, na produção de um novo produto já há
um desperdício de 95% de matéria-prima que poderia ser poupado através da prática da
reutilização.
Além disso, o ambiental Paul Hawken estimou que para cada 45 quilos de produto
fabricado, 1.450 quilos de resíduos sejam produzidos, uma razão de 32 para 1.5. Portanto, se
há a redistribuição de um sofá velho para outra pessoa, além de estar mantendo
aproximadamente 45 quilos fora de um lixão, também estaria-se economizando 1.450 quilos de
resíduos que teriam sido usados para a produção de um sofá novo.
E apesar de termos o pensamento de que destinando à reciclagem nosso papel, nossas
garrafas e nossos plásticos já estamos sendo sustentáveis, a Agência de Proteção Ambiental dos
EUA estimou que 98% de todo o lixo seja industrial e apenas 2% seja lixo doméstico.
Comprovando assim, que por mais que destinemos corretamente o nosso lixo doméstico, a
melhor maneira de ajudar a evitar o desperdício é adquirindo menos coisas novas e reutilizando
e redistribuindo o que já possuímos.
A produção e o consumo como são vistos na atualidade são territórios compartilhados
pela grande parte, fazendo parte dos modos de viver de cada um. Voltando ao aspecto da
subjetividade e das três ecologias fundamentas no referencial teórico, entende-se que a ligação
entre sustentabilidade e estes produz um desterritório, isto é, outro modo de encarar o consumo.
Como trazidos nos dados anteriormente, cria-se uma relação positiva com a esfera da natureza
havendo a menor produção de lixo e desperdício de recursos.
Somado a isto, indiretamente, têm-se outras formas de relacionar com o subjetivo e o
social, pois mesmo o vazio não se eliminando, esse novo modo de consumir traz benefícios
também ao social. Além da questão econômica envolvida ao adquirir bens por valor inferior
ao pago para adquirir um bem novo, há a interação entre pessoas que se interessam pela mesma
causa, criando vínculos de amizade e reforçando seu espírito cidadão.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho mostra-se de extrema importância vista a emergência desse modo
de pensar em prol do bem comum. Ainda que o consumo seja um dos grandes instrumentos de
bem-estar atual, é necessário aprender a consumir os bens e serviços de uma maneira diferente
da praticada atualmente. Não basta que consumamos menos lixo doméstico ou destinemos à
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reciclagem, é necessário que hajam mudanças em relação ao que consumimos de novo
proveniente do processo industrial.
O consumo colaborativo, não somente através da redistribuição, é uma tendência
mundial que deve ser incentivada pois demonstra-se como uma alternativa através da qual as
pessoas podem ter acesso ao que precisam de forma menos predatória, mais ecológica e
economicamente sustentável.
Por fim, é válido ressaltar que caso não haja modificação nossos hábitos de consumo,
não haverão recursos que supram as necessidades de gerações futuras e assim, ocorrerá um
detrimento da vida.
REFERÊNCIAS
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GUATTARI, G. As três ecologias. São Paulo: Papirus, 2012.
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GUATTARI, F., ROLNIK, S. Micropolítica: cartografias do desejo. Rio de Janeiro: Vozes,
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LANCETTI, A. Clínica Peripatética. São Paulo: Hucitec, 2014.
PEREIRA, A. Sustentabilidade, responsabilidade social e meio ambiente. 1 ed. São Paulo:
Saraiva, 2008.
SALES, G.P. Consumo Colaborativo: Da posse ao acesso. [trabalho de conclusão de curso]
Salvador: Universidade Federal da Bahia, Faculdade de Economia, 2013.
VELLANI, C. Contabilidade e responsabilidade social: integrando desempenho econômico,
social e ecológico. São Paulo: Atlas, 2011.
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