Diário de Notícias: SONS DN MAIS, 15 Nov. 03 A trilogia de

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Diário de Notícias: SONS DN MAIS, 15 Nov. 03 A trilogia de
Diário de Notícias: SONS DN MAIS, 15 Nov. 03
A trilogia de Cremona
Sonus Faber Stradivari (versão resumida em Português)
Há séculos que os especialistas tentam encontrar uma explicação
científica para o milagre acústico que são os instrumentos de cordas
produzidos nos séc. XVII/XVIII pelos grandes mestres artesãos de
Cremona: Guarneri, Amati e Stradivari, sendo hoje os violinos
criados por este último os mais procurados pelos coleccionadores e
músicos de todo o mundo atingindo preços astronómicos.
Franco Serblin, um antigo dentista de Vicenza, na região de Verona, convertido à religião
audiófila, por convicção profunda e não por motivos comerciais, fundou a Sonus Faber,
uma empresa que se dedica à construção de colunas de som com base nestas técnicas
ancestrais, nomeadamente a escolha e tratamento prévio das madeiras, a fórmula secreta
dos vernizes e o formato das caixas acústicas.
As Sonus Faber são conhecidas internacionalmente pelo design clássico (que se afasta do
tradicional paralelepípedo caixotal), pelos materiais utilizados (onde sobressai a madeira
natural e o cabedal) e, fundamentalmente, pela sua musicalidade intrínseca e ilusão de
projecção holográfica do som. Tal com na lenda do Triângulo das Bermudas, o triângulo
historicocultural Cremona-Verona-Veneza parece influenciar à «nascença» todos os
modelos gerados na fábrica de Arcugnano. As Sonus Faber são assim obras de arte,
esculturas acústicas, que reflectem não só a personalidade do seu criador como o
ambiente cultural privilegiado em que vive.
As Sonus Faber têm os seus cultores, que lhes gabam incondicionalmente as qualidades,
e os seus detractores, que lhes criticam o «classicismo» das formas, o «tempêro» tonal e
as alegadas colorações eufónicas, mas ninguém lhes pode ficar indiferente. E tal como os
instrumentos que as inspiram têm sido copiadas por muitos sem sucesso. É possível
«clonar» um corpo, mas a musicalidade é algo de tão intangível e irrepetível como a alma.
Em 1993, Franco Serblin lançou o seu projecto mais ambicioso, a trilogia Homage, um
tributo aos três grandes mestres de Cremona que se iniciou com a «Guarneri», a primeira
coluna de som do mundo com caixa acústica em forma de alaúde para controlar as
ressonâncias internas, cujo processo de construção segue à risca as técnicas ancestrais
dos artesãos de Cremona: a madeira de cerejeira e faia é cortada, moldada sob vapor e
colocada em estágio numa estufa durante seis meses antes de ser utilizada na construção
das caixas, cujo acabamento final consiste em 16 demãos de uma fórmula secreta de
verniz vegetal encontrada no espólio documental do Museu de Cremona! Franco
descobriu que bastava utilizar um verniz sintético industrial para destruir as qualidades
acústicas da coluna de som, mesmo mantendo todas as outras especificações
inalteráveis. E só ele tem o exclusivo da fórmula deste verniz...
Cinco anos depois surgia a «Amati», uma versão revista e aumentada da «Guarneri». Em
2003, chegou finalmente a vez de António Stradivari aluno dilecto de Nicola Amati.
A Sonus Faber «Stradivari» é «il capolavoro», a obra máxima de Franco Serblin, um
projecto que amadureceu durante dez anos, tal o respeito e veneração que sente pelo
mestre dos mestres, tendo sido recentemente apresentado em Itália, numa cerimónia
restrita, que contou com a presença de «Sons» e dos críticos Ken Kessler e Martin
Colloms da revista Hifi News.
SONUS FABER STRADIVARI
A «Stradivari» é a primeira coluna de três vias projectada por Franco Serblin, que
abandona assim também os filtros suaves de primeira ordem em favor de um
complexo filtro de pendente múltipla.
A forma elíptica da caixa acústica foi inspirada pela junção no espaço de duas
«Amati» abraçadas rosto com rosto num beijo apaixonado. Os altifalantes foram
colocados numa linha vertical numa das faces mais largas, geométrica (o suporte
inclina a coluna para trás) e electricamente em fase de forma a obter um fonte
acústica pontual, isto é, como se o som irradiasse a partir de um ponto único no
espaço, garantindo a desejada coerência temporal e integridade tímbrica. As
dimensões do painel frontal (baffle) foram calculadas de forma a que funcione na
prática como um «infinite baffle» virtual, com a face polida em arco ligeiro para
evitar o efeito de difracção. O resultado final é visual e acusticamente perfeito.
Todos os altifalantes têm as suas câmaras de ressonância independentes. O
«tweeter» é idêntico ao utilizado na Krell LAT, um «cúpula de seda» de diafragma de
dupla onda, com um faseador (inspirado na ondulação concêntrica de um lago
calmo onde se tenha deixado cair um seixo) que integra harmonicamente a radiação
do diafragma com o painel reflector de madeira polida. A radiação traseira é
absorvida por um labirinto acústico moldado em madeira natural.
A «Stradivari» exibe orgulhosamente um duplo-woofer de 260 mm ultra linear e ultra
dinâmico ligados em paralelo, fabricados numa liga leve de alumínio e magnésio.
Para eliminar as colorações características do metal, os cones são banhados num
composto de borracha.
O segredo da «Stradivari» reside, contudo, nos registos-médios, reproduzidos por
um altifalante fabricado por métodos artesanais na Dinamarca, que cobre todo o
espectro de frequências entre os 300-4000Hz, que corresponde grosso modo aos
registos da voz humana, evitando-se os tradicionais «hiatos» na zona em que o
ouvido é mais sensível. O sistema acústico altifalante-caixa de ressonância foi
concebido como o de um violino, sendo que a peça principal é também a mais
insignificante: a «Anima», a pequena peça de madeira que liga o tampo ao fundo, a
«alma» sem a qual o violino, tal como nós, está morto para a música.
A «Stradivari» tem a pose de uma Quad 989 e soa como uma electrostática: a
mesma leveza, transparência e aparente «ausência» de caixa. Mas, ao contrário
desta, pode agarrar-nos pelos colarinhos e varrer o chão connosco, quando se puxa
pelo controlo de volume: têm o ataque, poder e tensão de uma coluna dinâmica sem
perder a compostura e dimensionalidade de um dipolo, não o sendo.
Antonio Stradivari, lá no assento etéreo onde se partiu, deve estar orgulhoso deste
«capolavoro» do seu discípulo Franco Serblin: a «Stradivari» tem a beleza, a
raridade (já há lista de espera) e a musicalidade dos violinos a que deu o nome. E,
hélas, o preço... (cerca de €30.000, preço ainda não definitivamente estabelecido).

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