Inovação do Valor: Rompendo com os alicerces na gestão

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Inovação do Valor: Rompendo com os alicerces na gestão
Inovação do Valor: Rompendo com os alicerces na gestão estratégica
Por Marcelo Fernandes, Consultor Symnetics
Boa parte daquilo que vem a ser considerado novo, assim é, pelo questionamento que trazem as premissas
vigentes em dado momento nos diversos campos do conhecimento humano. Se as novas premissas são
corretas, ou mais próximas da realidade que buscam representar, tanto mais consistentes serão os resultados
por elas almejados. Consideramos como parte vital na evolução deste processo, que muitas das premissas
anteriores não serão mais válidas, sendo necessária a modificação de seus preceitos, conduzindo então a
novas reflexões que tragam entendimento sobre novos elementos que antes passavam despercebidos. Assim
procedendo, novos aspectos que representarão profundas modificações na forma como pensamos, agimos e
percebemos a realidade acabarão por emergir.
A Inovação do Valor (Value Innovation), que tanto tem chamado atenção de executivos a partir do
lançamento do livro “Estratégia do Oceano Azul – Como criar novos mercados e tornar a concorrência
irrelevante” (Campus, 2005), possui interessantes aspectos que rompe com a ortodoxia reinante no
pensamento empresarial, mais profundamente do que a maioria dos críticos tem percebido em suas análises.
Inovação do Valor, diferentemente de tentar desenvolver vantagem competitiva e de empreender esforços
para superar a concorrência, busca criar mudanças nos atributos de valor oferecidos aos clientes, inseridos
como características nos produtos e serviços que passam a ser valorizadas pelos clientes independente de
como o setor tradicionalmente vinha evoluindo.
Tendo como ponto de partida àquilo que o cliente valoriza, o inovador do valor oferece um valor novo e
diferente do praticado pelo seu setor. Os exemplos mais citados são o Cirque du Soleil, Southwest Airlines,
Hotéis Formule 1, Callaway Golf, entre muitos outros, que criaram espaços novos no mercado por
empreender um tipo de inovação que não visava buscar confrontação com a concorrência, pois acabava por
tornar seus produtos e serviços obsoletos rapidamente a partir de uma nova fronteira mercadológica
delineada pela soma do conjunto de valores inovadores.
Para entendermos a diferença entre os aspectos relativos à teoria de Porter, que busca a estratégia como
forma da organização fazer frente à competição, e que, hoje, é o modelo mais aceito pelos executivos, seja
consciente ou inconscientemente, em contraste com a que sustenta a Inovação do Valor é necessário ter em
mente os conceitos de eficiência estática e eficiência dinâmica que irá relacionar estratégia e valor.
No esquema de Porter, o objetivo é a organização buscar “apropriar” o máximo possível de valor (daí a
expressão agregar valor) frente à concorrência ao mesmo tempo em que se tenta evitar que a concorrência
faça o mesmo. Com isso ao se traçar a estratégia, entendemos o ambiente concorrencial como forças que
vem trabalhar contra ou a favor, cabendo a organização gerir todas as variáveis em benefício próprio.
Esta tem sido a orientação primordial quando da formulação da estratégia. É daí, também, que decorre a
simplificação do conceito de gestão, já que, o gerenciamento a partir desta conotação consiste em fazer mais
com menos, o que leva as organizações a perceberem seus clientes, fornecedores e concorrentes, em posição
contrária aos seus interesses, na medida em que os mesmos também tenderiam a lutar por seu quinhão de
valor.
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O total de valor auferido pela empresa num mercado em expansão, nesta perspectiva, cresceria de forma
contínua, levando a conclusão de que a organização poderia vir a crescer frente a uma maior participação
sua neste bolo, a partir do quão eficientemente se gerenciasse a “escolha” de atividades estratégicas que
viessem a trazer valor.
Diferentemente, a eficiência dinâmica, que vai além da exploração das opções econômicas disponíveis, vem
das inovações, por estas possibilitarem a criação de novas alternativas juntamente com a criação de novos e
inovadores valores. Esta permite a criação de riqueza sustentada face à sustentabilidade dos saltos de
produtividade e valor conferidos a todas as partes (clientes, fornecedores e empresa).
Todas as partes ganham, pelo valor gerado e pela disseminação do mesmo que subsidia a criação de riqueza.
Esta é uma das explicações de por que o Brasil teria dificuldade na promoção do desenvolvimento
econômico, já que procura a sustentação em torno da exploração das opções econômicas disponíveis
levando, pela dinâmica dos mercados mundiais, a uma valorização cada vez menor de seus produtos.
A primeira visão irá considerar os problemas de gestão como trade-offs, que terá a solução a partir de um
processo negociado entre aquilo que é valorizado pelo gestor e aquilo que é factível. O mesmo se daria pela
perspectiva do cliente, pois este irá considerar no momento da compra a questão do quanto esta disposto a
abrir mão de algo que valoriza para obter algo que valoriza ainda mais, num processo de priorização.
De acordo com o trecho abaixo, extraído de Porter:
“O lema da estratégia competitiva é ser diferente. Significa escolher, de forma deliberada, um conjunto diferente de atividades
para proporcionar um mix único de valor a um público específico. Estratégia é criar uma posição exclusiva, envolvendo um
diferente conjunto de atividades...”.
Tal argumento não procede. Escolher de forma deliberada um conjunto diferente de atividades, tendo em
mente um processo que se guiará por um conjunto de valores e objetivos dados a priori, não levará a
inovação do valor, irá levar a um aperfeiçoamento na proposição de valor, em face dos mesmos valores
considerados.
A inovação do valor tem por objetivo a redefinição do problema de um setor, pela redefinição da
proposição de valor que uma empresa entrega a um cliente. Considera que este setor vem partilhando de
valores comumente aceitos ao longo de seu desenvolvimento e que influencia diretamente as decisões de
compra dos compradores no presente. Alguma coisa que expresse valor, só é assim, por ter sido testada ao
longo do tempo e expressa critérios de escolha, em detrimento de outros, que não funcionaram tão bem no
passado.
É por isto que os autores trouxeram uma mudança radical em torno da problemática do Valor,
diferenciando a Criação do Valor de Inovação do Valor, já que “Inovar Valor” leva a modificação na natureza
do valor permitindo a substituição da proposição de valor anterior, e a criação, faz com que o produto ou
serviço lançado tragam novas características que tragam novos valores embutidos, mas este não tem a força
de substituir o anterior quando do seu lançamento no mercado.
A propósito, a tradução Inovação do Valor adere melhor às intenções dos autores W. Chan Kim e
Mauborgne, pois se entende que toda inovação é de Valor, já que foi aceita pelo mercado, do contrário,
chamar-mos-ia de invenção, algo que não teve aceitação pelos consumidores, apresentando apenas
características de funcionalidade que não tem valor econômico.
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Ter em mente estes conceitos fica possível entender por que a Inovação do Valor torna a concorrência
irrelevante, pois ela modifica a base de sustentação pelas quais as organizações se mantinham ao longo do
tempo. Normalmente a inovação do valor irá trazer mudanças no modelo pelo qual a organização pensa sua
atuação. Como a proposição de valor, leva a alterações na cadeia de causa e efeito que impulsionam as ações,
acaba por redirecionar, a partir da criação de novos atributos, a avaliação por parte do cliente daquilo que ele
reconhece como sendo uma característica de valor, tornando, portanto incongruente a maneira como as
organizações fazem análise competitiva. A Inovação do Valor “desconstrói” a percepção do ambiente
competitivo, invertendo a lógica de competição a seu favor.
Ou seja, as duas fontes de vantagem competitiva sustentável segundo Porter, que seriam operar com custos
baixos ou buscar diferenciação, traduz um rigidez de pensamento que irá se desenvolver sobre escolhas
estratégicas. A diferença entre esta concepção e a Inovação do Valor estaria no desenvolvimento de um
processo mais aberto a criação.
No primeiro busca-se solucionar problemas, a partir de “análise das suas circunstâncias”, no outro a
inovação não se serviria de categorias prévias, mas
buscariam redefinir as soluções entregues aos clientes pela modificação nos critérios utilizados que
conduzem a decisão de compra. A ênfase está no processo que leva a uma transformação na forma como a
organização pensa sua atuação.
Este movimento está diretamente ligado ao processo criativo que não pode ser controlado, apenas se criam
condições para que se desenvolva.
O ponto de partida pelo qual se daria o processo de formulação da estratégia, estaria enquadrado na origem,
pelo estabelecimento de regras normativas que conduzem a escolhas estratégicas a partir de elementos de
análise. Desta forma não suscitando o processo de criação, algo que possui natureza caótica e imprevisível,
mas nem por isso não gerenciável.
Isto é muito diferente em relação ao que concebe Porter, que entende o processo da inovação como uma
construção de trás para frente, que parte da definição de objetivos estratégicos inseridos num problema
estratégico, caminhando até a concepção de alternativas (conjunto de ações) para atingir esses objetivos.
Procedendo desta maneira o “campo de visão” dos gestores estará direcionando a construção de alternativas
estratégicas a luz dos valores vigentes, pois não poderia dissociar aquilo que se faz daquilo que se valoriza.
O que nos informa que o processo de redefinir a proposição de valor entregue ao cliente é outro, muito
mais divergente, algo que irá trazer uma nova representação dos problemas ligados aos mercados.
Se esses objetivos, valores, pudessem ser reconhecidos e explicitados por pesquisas ou ferramentas de gestão,
considerados no momento de concepção de produtos e serviços, ou mesmo no delineamento da estratégia
em questão, seria possível controlar, reconhecer, sistematizar e delinear a inovação focada nos valores
pertinentes tanto para os executivos quanto para os clientes.
Claro que considerado desta forma teríamos um modelo esquemático de pensamento bastante simplificado,
pois tenta explicar a inovação, e todo o processo de desenvolvimento do pensamento estratégico a partir de
uma conjectura bastante idealizada. O processo pelo qual tomamos decisões que nos afetam diretamente
frente a um conjunto de objetivos por nós valorizados não é possível de ser explicitado ou mensurado em
sua totalidade, pois sempre haveria uma brecha entre aquilo que dizemos ser importante para nós e aquilo
que realmente acreditamos como prática possível de se obter.
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Além disso, os valores considerados importantes pelos clientes, podem ser modificados na sua própria
natureza, originando freqüentes rupturas em mercados que viam se sustentado rumo a uma pretensa
continuidade, dadas às oportunidades de ganhos extremamente acelerados quando da entrada de uma
empresa que inova o valor.
Esse processo estará associado a responder a questão de como criar uma dinâmica que permita estabelecer
elementos de criação e de novos valores para ampliar o campo de visão de executivos, permitindo com isso
desconstruir a partir da ação organizacional os limites de setores solidamente estabelecidos. Estará muito
mais ligada ao processo de criação do que o estabelecimento de processos racionalizantes, que podem ser
facilmente justificados por variáveis exógenas a empresa quando do seu insucesso.
Como exemplo, podemos citar o declínio do setor de enciclopédia que, deveu-se principalmente pela
concorrência entre setores alternativos. Neste caso pela disseminação do Computador Pessoal, que trazia
uma proposta de valor substituta ao da Enciclopédia, ou seja, os compradores passavam a decidir de
maneira inconsciente pela compra de um PC em substituição aos valores trazidos pela enciclopédia. O
Google só viria a se consolidar muitos anos mais tarde do declínio daquele setor, após a disseminação em
massa do PC.
É como se mundos impossíveis de serem relativizados, estivessem competindo por um espaço no sistema
de valores dos compradores, que também é dinâmico e sofre influências sociais e culturais.
É desta forma que devemos pensar a estratégia concebida fora das “fronteiras usuais”, algo que foi
evidenciado por Mauborgne e Chan Kim, pela grande similaridade entre produtos e serviços colocados nos
mercados ao longo do tempo advindos de estratégias competitivas, devido à consideração de que estas
estratégias, estarão, presas a um conjunto de valores considerados importantes pelos gestores dada sua
experiência dentro de práticas bem sucedidas e que conduziriam à organização numa trajetória de
continuidade.
A mudança nos pressupostos das ciências da gestão estratégica é maior do que se imagina. A mudança pelas
quais fronteiras e setores passam a serem redefinidos, também passa pela mudança nas crenças e valores de
quem pensa a atuação naquele setor.
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