empregando o corde para análise histórica de indoamericanismos
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empregando o corde para análise histórica de indoamericanismos
Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 3 • Número 9 • março 2013 Edição Especial • Homenageada PROFESSORA DOUTORA MARIA LUIZA BRAGA EMPREGANDO O CORDE PARA ANÁLISE HISTÓRICA DE INDOAMERICANISMOS LÉXICOS1 Manuela Arcos Machado (IC – UFRGS)2 [email protected] Félix Valentín Bugueño Miranda (UFRGS) [email protected] RESUMO: O Corpus Diacrónico del Español (CORDE) da Real Academia Espanhola consiste em um banco de dados que registra, através de textos, o léxico presente nos primeiros registros da língua até o ano de 1975. Ao longo de séculos, o espanhol recebeu uma considerável quantidade de palavras oriundas das línguas indígenas da América Latina. Essas contribuições, por sua vez, sofreram profundas mudanças tanto no plano do significante quanto no plano do significado. Este trabalho tem como objetivo avaliar se o Corpus histórico da Academia consegue cumprir com seu objetivo de traçar, através de seus registros, a origem e tradição de palavras, neste caso, mais especificamente, de palavras provenientes das línguas indígenas americanas. PALAVRAS-CHAVE: CORDE; Indo americanismos; Etimologia-história da palavra. 1 INTRODUÇÃO Nos estudos da linguagem, a área que se dedica à evolução do léxico de uma língua denomina-se etimologia. Pode-se dizer que o estudo etimológico se apresenta em três partes: descobrir a origem das palavras, datar quando as palavras foram incorporadas a determinada língua, e avaliar suas mudanças de forma e de significado (BUGUEÑO, 2004). Em 1994, a Real Academia Espanhola começou a desenhar o Corpus Diacrónico del Español (CORDE), um banco de dados que registra, através de textos, o léxico presente desde primeiros registros da língua até o ano de 1975. Segundo a própria Academia (CORDE, http://www.rae.es), o corpus possui, entre outros, o objetivo de 1 Trabalho apresentado em forma de comunicação no II Congresso de Iniciação Científica e Pós Graduação da Unisinos, realizado de 3 a 5 de setembro de 2012. 2 Aluna de graduação do curso de Licenciatura em Letras (Português-Espanhol e respectivas Literaturas) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), orientada pelo Prof. Dr. Félix Bugueño Miranda (UFRGS). 193 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 3 • Número 9 • março 2013 Edição Especial • Homenageada PROFESSORA DOUTORA MARIA LUIZA BRAGA servir como base para o estudo histórico da língua espanhola através do conhecimento da origem e da evolução histórica do conjunto total de termos que a constituem. Para compreender a história do léxico de língua espanhola, é chave conhecer a sua evolução a partir do século XVI, momento em que a língua toma sua fisionomia própria (BUGUEÑO, 2000). Para tanto, somam-se aos estudos conceitos gerais sobre etimologia (BUGUEÑO, 1995), (BUGUEÑO, 2004) e empréstimos linguísticos (ZIMMERMANN, 1994), no âmbito do contato e contribuição entre línguas. O presente estudo analisará o corpus diacrônico da Real Academia Espanhola, a fim de constatar se o mesmo permite a articulação apropriada das informações necessárias à etimologia de forma a compreender historicamente o léxico da língua, tomando como objeto de estudo palavras do espanhol de origem indígena. 2 PRINCÍPIOS BÁSICOS DA INVESTIGAÇÃO ETIMOLÓGICA. Para o estudo etimológico das palavras, consideram-se duas doutrinas de estudo: a etimologia-origem e a etimologia-história da palavra (cf. BUGUEÑO, 1995 p.84). A etimologia-origem contempla unicamente o plano do significante, e ocupa-se em descobrir o étimo da palavra em estudo, ou seja, o seu significante na língua de origem (BUGUEÑO, 2004). O verbete abaixo representa a primeira. higo. (Del lat. fícus) DRAE (2001, s.v.). Para o DRAE (2001), no caso de higo, o seu étimo é fícus, do latim. Já a etimologia-história da palavra, mais completa, ocupa-se tanto do plano do significado quanto do significante, como demonstra o exemplo. 194 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 3 • Número 9 • março 2013 Edição Especial • Homenageada PROFESSORA DOUTORA MARIA LUIZA BRAGA emuntorio glándulas de los sobacos, ingles y de detrás de las orejas. Lat. tardío emunctorium receptáculo en que se deposita el esperma de los candelabros. Prim. doc: 1391 – 1419; 1591. Bugueño (1993, s.v.) Quanto ao significante do exemplo acima, tem-se a informação de que emuntorio provém de emunctorium, do latim. Já para o significado, tem-se a relação entre o significado de emuntorio (forma hispânica), com o significado em latim de emunctorium (forma origem). A forma origem dá nome ao pequeno recipiente de candelabros em que se depositava a cera derretida das velas. Já a forma hispânica, dá nome a glândulas do corpo humano, que são responsáveis por gerar e logo secretar substâncias. Portanto a relação entre os significados é que ambos nomeiam depósitos de secreções. Assim se estabelece a principal diferença entre ambas as concepções: enquanto uma detém-se no significante da língua de origem (étimo), a outra estabelece, também, a relação dos significados entre étimo e forma derivada. 3 METODOLOGIA DA ETIMOLOGIA–HISTÓRIA DA PALAVRA. A etimologia–história da palavra consiste em três diferentes tipos de informações necessárias para um estudo etimológico eficiente e completo (Wiegand (1989, apud BUGUEÑO (2004, p.177)). A primeira informação trata da data da primeira documentação da palavra. A segunda, estuda o étimo da palavra e seu significado. A terceira, por fim, ocupa-se das datas das primeiras documentações dos possíveis derivados e possíveis novos significados da palavra em questão. Essas três informações, quando contempladas, conferem ao estudo etimológico um comentário crítico válido (c.f. BUGUEÑO, 2004, p.177). 195 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 3 • Número 9 • março 2013 Edição Especial • Homenageada PROFESSORA DOUTORA MARIA LUIZA BRAGA 4 A REAL ACADEMIA ESPANHOLA E O CORPUS DIACRÔNICO DO ESPANHOL (CORDE) Ao longo de anos, a Real Academia Espanhola vem sendo a principal instituição que orienta as questões linguísticas do espanhol. Sendo assim, a Academia criou dois corpora para registrar a forma em que palavras da língua são usadas, os seus significados e os seus contextos de uso. São eles o Corpus de Referência do Espanhol Atual (CREA) e o Corpus Diacrônico do Espanhol (CORDE). O primeiro registra o léxico do espanhol fazendo um recorte cronológico desde o ano de 1975 até a atualidade. Já o segundo, registra o léxico que abarca desde os primórdios da língua até o ano de 1974. O CORDE começou a ser desenhado em 1994, e atualmente consta com mais de 250 milhões de registros. Ao apresentá-lo em sua página on-line, a própria Academia confere ao corpus determinadas funções. Dentre elas, a de utilizá-lo sistematicamente para: 1) documentar palavras e qualificá-las como antiquadas ou em desuso; 2) para saber a origem de alguns termos e sua tradição na língua; 3) para registrar as primeiras aparições das palavras, e 4) para servir como material básico para a confecção do seu Nuevo Diccionário Histórico3. Ainda, a Academia afirma que o CORDE deve servir como material obrigatório para qualquer estudo diacrônico da língua espanhola. 4.1 Funcionamento do CORDE A versão do Corpus Diacrónico del Español (CORDE) é on-line. Ao acessar o endereço http://corpus.rae.es/cordenet.html o sistema do corpus será aberto, com lacunas para que o usuário preencha com a palavra a ser pesquisada. São disponibilizados filtros opcionais à pesquisa (autor, obra, cronologia, temática, meio de publicação e local de publicação), como demonstra a imagem abaixo. 3 http://www.rae.es/rae/gestores/gespub000019.nsf/voTodosporId/B4E26FC2520104D8C125716400455C 06?OpenDocument&i=1 196 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 3 • Número 9 • março 2013 Edição Especial • Homenageada PROFESSORA DOUTORA MARIA LUIZA BRAGA (Figura 1) Ao pesquisar uma palavra, sem atender às lacunas opcionais, a Academia oferece o número total de ocorrências da palavra e em quantos registros está presente (Figura 2). (Figura 2) Para fins de exemplo do funcionamento do corpus, pesquisou-se a palavra sábana. 197 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 3 • Número 9 • março 2013 Edição Especial • Homenageada PROFESSORA DOUTORA MARIA LUIZA BRAGA sábana. (Del lat. sabăna, pl. n. de sabănum). 1. f. Cada una de las dos piezas de lienzo, algodón, u otro tejido, de tamaño suficiente para cubrir la cama y colocar el cuerpo entre ambas. 2. f. sabanilla (de altar). 3. f. Manto que usaban los hebreos y otros pueblos de Oriente. DRAE (2001, s.v.). Ao recuperar as ocorrências, abre-se uma lista com os alinhamentos da palavra, isto é, com os fragmentos dos registros em que ela aparece e sua respectiva data de publicação. Também é oferecido na pesquisa o número de telas que os documentos ocupam no sistema, no caso do exemplo abaixo, 33 páginas de registros com uma média de 25 alinhamentos por página (Figura 3). (Figura 3) 198 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 3 • Número 9 • março 2013 Edição Especial • Homenageada PROFESSORA DOUTORA MARIA LUIZA BRAGA Ao modificar o filtro da pesquisa para “ano” 4, é possível organizar as ocorrências de forma cronologicamente crescente. A fim de obter uma pesquisa mais organizada, é possível filtrar as ocorrências apenas por seus documentos, e de forma resumida (figura 4). O resultado será uma tabela que agrupa de forma cronologicamente crescente os documentos onde a palavra está presente. (Figura 4) Portanto, tais procedimentos possibilitam uma pesquisa mais organizada no que diz respeito à cronologia, uma vez que os alinhamentos se agrupam em documentos, e estes, por sua vez, se organizam pela sua cronologia. (figura 5). O resultado vem em forma de tabela, onde também constam outras informações como o número de ocorrências da palavra em cada documento, e também a classificação de autor e tema. 4 Filtro disponível através do caminho clasificación>año>recuperar, como ilustra a figura 4. 199 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 3 • Número 9 • março 2013 Edição Especial • Homenageada PROFESSORA DOUTORA MARIA LUIZA BRAGA (Figura 5) A última observação a ser feita sobre o funcionamento do corpus histórico é sobre a opção “estatística” oferecida pelo corpus no início da pesquisa (figura 2). A estatística da palavra pesquisada se apresenta com a seguinte tabela: (Figura 6) Constituem a estatística três critérios de informação: ano, país e temática. Os três tipos de informações organizam-se de forma decrescente no que diz respeito às ocorrências da palavra. Na primeira coluna, a primeira linha consta como 1966, ano em que a palavra sábana apresenta maior número de registros no corpus. Já a segunda coluna corresponde a um critério diatópico e informa o país que possui mais ocorrências da palavra.5 Por fim, a terceira e última coluna trata dos gêneros em que a palavra se insere, e em quais deles há maior número de ocorrências. Considerando a descrição feita à estática do corpus, é possível observar que os critérios utilizados são apenas 5 No entanto, é necessário observar que a Real Academia Espanhola divide os documentos do CORDE em 50% para aqueles oriundos da Espanha, e os outros 50% para os da América Espanhola. Assim, na grande maioria das vezes a maior quantidade de ocorrências de uma palavra, segundo o corpus, será localizada na Espanha. 200 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 3 • Número 9 • março 2013 Edição Especial • Homenageada PROFESSORA DOUTORA MARIA LUIZA BRAGA numéricos, e que por vezes não são de fato eficientes para traçar um estudo diacrônico da língua. A análise que se fará a seguir utiliza as ferramentas do corpus diacrônico, a fim de traçar um estudo etimológico de palavras oriundas do contato do espanhol com línguas indígenas. Como observação final, se avaliará se o corpus funciona como ferramenta eficiente para tal tipo de estudo diacrônico. 5 AS LÍNGUAS INDÍGENAS EM CONTATO COM O ESPANHOL DO SÉCULO XVI. A vinda dos espanhóis à América com o objetivo de conquistar e cristianizar as terras do novo continente confrontou-se com a grande diversidade de línguas indígenas então existentes. No processo de colonização, essa diversidade tornou-se um obstáculo. Para superá-lo, os monges espanhóis adotaram línguas gerais (c.f Moreno de Alba, 1993, p.34), de forma a aprendê-las e difundi-las entre os próprios nativos. No México, a língua adotada foi o náhuatl, que teve maior difusão com os espanhóis se comparada ao alcance que teve no auge do Império Asteca. O mesmo processo se deu na região sul do continente, com o Quéchua, que inclusive tomou o lugar do Aimará na região andina (Chile, Peru, Bolívia e Argentina). Ainda, como línguas gerais estiveram na Colômbia o chibcha, e no Paraguai, Brasil e região do Rio da Prata o tupi-guarani. A língua trazida pelos conquistadores é um espanhol consolidado enquanto língua nacional, que durante o século XVI, sofreu modificações que lhe conferiram uma fisionomia própria (BUGUEÑO, 2000). Tais modificações se devem em especial a três fatores: o final do processo de Reconquista com a tomada de Granada e a retirada dos muçulmanos; a influência do Renascimento, que ressuscita a tradição clássica, inclusive no plano lexical das novas ciências, e por fim, a descoberta do continente americano (c.f 201 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 3 • Número 9 • março 2013 Edição Especial • Homenageada PROFESSORA DOUTORA MARIA LUIZA BRAGA Bugueño, 2000, p.85-86). Dessa forma, a língua espanhola estabelece suas principais fontes de contribuição lexical: o árabe, o latim, e as línguas indígenas6. 4.1 Contribuição das línguas indígenas para o espanhol Segundo Zimmermann (1994, p.8), no campo da linguística hispânica há uma espécie de polêmica quando o assunto é o grau de influência que as línguas ameríndias exercem sobre o espanhol. Entretanto, é importante ressaltar que a contribuição de línguas ameríndias ao espanhol se dá no nível léxico (c.f Moreno de Alba, 1993, p.56), uma vez que o léxico constitui o plano da estrutura linguística mais propensa a modificações e, logo, contribuições. É possível compreender essa contribuição lexical através de Lüdke (2003), que descreve o espanhol do século XVI em três variedades de arquitetura da língua: as terciárias, as secundárias e as contatais. A variedade terciária existe em forma de registros escritos, entre eles registros da linguagem literária. Até meados do século XVI, a distância entre a variedade terciária elaborada na América e a literatura elaborada por autores na Península, se expressava através das diferenças léxicas (Lüdke, 2003, p.2133), uma vez que os registros oriundos da América eram escritos para leitores peninsulares. A variedade secundária não é documentada. Trata-se dos dialetos da América que derivavam dos dialetos peninsulares. Esses dialetos não estão documentados, pois correspondem às variedades de uso diário que permitiam o intercambio lingüístico imediato entre os espanhóis e os indígenas. Por fim, as variedades contatais tratam do contato “forçado” entre as línguas. Esse contato ocorria com aqueles que falavam a língua do outro enquanto durava a convivência ao vivo entre espanhóis e indígenas. Por exemplo, as mulheres indígenas dos espanhóis e os caciques devem ter aprendido a língua da península, bem como os franciscanos aprenderam as línguas da América ao ensinar espanhol para crianças 6 O espanhol recebe influências também do grego, e posteriormente de outras línguas como o italiano e francês. 202 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 3 • Número 9 • março 2013 Edição Especial • Homenageada PROFESSORA DOUTORA MARIA LUIZA BRAGA indígenas (idem, p.2135). Portanto, parte da fisionomia léxica da língua espanhola se deve às variedades terciária e contatais. 6 ANÁLISE Ao fazer um estudo diacrônico do léxico da língua espanhola, é imprescindível o estudo do contato entre o espanhol e as línguas ameríndias. Portanto, para fins de análise, se utilizará um corpus de indo americanismos léxicos oriundos da língua Náhuatl, responsável por importantes contribuições para o espanhol. Compõem o corpus analisado 17 empréstimos. Para efeitos de exemplo, neste trabalho serão analisados dois empréstimos: chamaco e chicle. Suas respectivas mudanças serão traçadas com base à doutrina da etimologia-história da palavra, já comentada, que exige três informações: 1) Data da primeira documentação da palavra; 2) o étimo da palavra e seu significado, e 3) Data dos possíveis novos significados assim como dos possíveis derivados. Para tanto, foram utilizados dois dicionários: o Diccionario de la Real Academia Española (DRAE, 2001), e o Diccionario del Español de América (Mo, 1996). Também o Corpus Diacrónico del Español (CORDE) a fim de observar o comportamento dessas palavras ao longo do tempo. Dessa forma, procura-se: 1) observar as mudanças entre étimo e forma hispânica no plano do significante, através das informações oferecidas pelos dicionários, 2) observar as mudanças entre étimo e forma hispânica no plano do significado, e 3) traçar cronologicamente as mudanças nos planos do significante e significado através das cronologias oferecidas pelo CORDE. As tabelas abaixo ilustram a análise. 203 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 3 • Número 9 • março 2013 Edição Especial • Homenageada PROFESSORA DOUTORA MARIA LUIZA BRAGA (Tabela 1) Na análise da palavra chamaco, pôde-se observar claramente a mudança entre significante do étimo e significante da forma hispânica a partir do étimo oferecido pelo dicionário de americanismos (Mo,1996). O mesmo ocorre no plano do significado. O étimo chamahua significa o “início do amadurecimento do milho”. A forma hispânica chamaco siginifica “menino, rapaz”, ou seja, fase da vida em que o indivíduo masculino começa a amadurecer. Portanto, analisando significado de étimo e de forma hispânica, é possível visualizar a evolução do significado. Entretanto, ao tentar traçar a história dessas evoluções o CORDE não oferece registros satisfatórios. Primeiramente, o étimo não aparece registrado, e a forma hispânica aparece registrada apenas a partir de 1916, momento muito posterior ao contato entre as línguas indígenas e o espanhol ibérico. Embora seja possível observar empiricamente as mudanças nos planos do significante e significado a partir das informações oferecidas pelos dicionários, traçar tais mudanças através do tempo por meio dos registros do corpus histórico da Academia, não é completamente possível. 204 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 3 • Número 9 • março 2013 Edição Especial • Homenageada PROFESSORA DOUTORA MARIA LUIZA BRAGA (Tabela 2) A mesma situação ocorre com a palavra chicle. Segundo o DRAE (2001), o étimo de chicle é tzcilti, do Náhuatl. Tanto no plano do significante quanto no plano do significado é possível estabelecer as mudanças de étimo para forma hispânica. Ao longo da utilização do empréstimo tziclti, estabeleceram-se as mudanças de escrita e pronúncia (plano do significante) demonstradas na tabela acima. Já o significado manteve-se para o que atualmente chama-se de chicle “goma de mascar aromatizada”. Entretanto, ao procurar traçar essas mudanças cronologicamente, o CORDE não oferece informações suficientes. Embora o étimo tziclti apareça registrado no corpus, a cronologia de registros oferecida não possui valia para traçar o comportamento do étimo ao longo de sua utilização por falantes da língua espanhola, uma vez que a primeira documentação oferecida é de 1576 e a segunda, de 1963. Há, portanto, um vazio de 387 anos entre os registros, o que impossibilita visualizar em que momento e circunstância a forma hispânica chicle é incorporada à língua espanhola. 205 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 3 • Número 9 • março 2013 Edição Especial • Homenageada PROFESSORA DOUTORA MARIA LUIZA BRAGA 7 CORDE E CREA O objetivo do CORDE consiste em registrar o léxico desde sua aparição até o ano de 1974, enquanto o CREA registra o léxico a partir de 1975 até a atualidade. Considerando que ambos os corpora tem a finalidade de traçar a história do léxico da língua, nos casos observados anteriormente não foi possível utilizá-los como ferramentas que se complementam, uma vez que o corpus histórico nem sempre ofereceu informações suficientes. Entretanto, o sucesso nessa complementação pode ser exemplificado através da palavra guanaco, de origem indo americana, com a qual foi possível traçar sua diacronia e sincronia através dos corpora. Guanaco 1. m. Mamífero rumiante de unos trece decímetros de altura hasta la cruz, y poco más de longitud desde el pecho hasta el extremo de la grupa. 2. m. Am. Persona tonta, simple. DRAE, 2001. A tabela abaixo demonstra como CORDE e CREA se complementam para traçar a história desse vocábulo. (Tabela 3) O CORDE registra a aparição da palavra na língua, em 1534, e também sua evolução, uma vez que ela aparece registrada em todos os séculos, até 1974 (em função do corte cronológico do corpus histórico). O CREA, por sua vez, também registra a 206 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 3 • Número 9 • março 2013 Edição Especial • Homenageada PROFESSORA DOUTORA MARIA LUIZA BRAGA palavra satisfatoriamente: há registros em todas as décadas desde 1975. Uma vez que a palavra guanaco não caiu em desuso (não possui nenhuma marcação cronológica no DRAE (2001)), os corpora registram e, por conseguinte, permitem traçar a sua história na língua. 8 CONSIDERAÇÕES FINAIS Compreender o contato entre as línguas indígenas e o espanhol constitui parte essencial de um estudo histórico da língua espanhola. Embora a premissa básica do CORDE seja traçar a história do léxico do espanhol, através da análise feita ao vocabulário do espanhol de origem ameríndia, concluiu-se que a utilidade do corpus é parcial para satisfazer as informações necessárias ao estudo da etimologia-história da palavra, uma vez que as informações oferecidas pelo corpus na maioria das vezes não se integram. Quanto ao funcionamento do corpus, não foi possível encontrar uma real utilidade para todos os mecanismos oferecidos, considerando que algumas informações não se baseiam em critérios lingüísticos e sim numéricos. Isso pode ser visto através de como o corpus foi compilado em termos diatópicos (50% para América e 50% para toda a Espanha), o que impossibilita refletir uma realidade léxica fiel da língua espanhola. Por fim, foi possível constatar que, muitas vezes, os corpora diacrônico e sincrônico da Real Academia Espanhola não permitem um trabalho concomitante para traçar o comportamento do léxico ao longo de sua existência. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS KLAUS ZIMMERMANN, Aspectos teóricos y metodológicos de la investigación sobre el contacto de lenguas en Hispanoamérica, págs. 9-34. GRIJELMO, Alex. Defensa apasionada del idioma español. Madrid: Punto de Lectura, noviembre de 2001. 399 p. 207 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 3 • Número 9 • março 2013 Edição Especial • Homenageada PROFESSORA DOUTORA MARIA LUIZA BRAGA LÜDKE, Jens. Actas del XI Congreso Internacional de la Asociación de Lingüística y Filología de la América Latina. Las Palmas de Gran Canaria: Librería Nogal, 1996. LÜDKE, Jens. 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