FEMPAR - FUNDAÇÃO ESCOLA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO

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FEMPAR - FUNDAÇÃO ESCOLA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO
FEMPAR - FUNDAÇÃO ESCOLA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO PARANÁ
DOUTRINAS, IDEOLOGIAS E TEORIAS DA PENA
“A BUSCA POR UM DIREITO PENAL MÍNIMO”
CURITIBA
2008
SILVIO PEREIRA DA MATA
DOUTRINAS, IDEOLOGIAS E TEORIAS DA PENA
“A BUSCA POR UM DIREITO PENAL MÍNIMO”
Monografia apresentada como requisito
parcial para a obtenção do grau de
Especialista em Ministério Público – Estado
Democrático de Direito, na área de
concentração em Direito Penal, Fundação
Escola do Ministério Público do Paraná –
FEMPAR, Faculdades Integradas do Brasil UniBrasil.
Orientador: Sylvio Lourenço da Silveira Filho
CURITIBA
2008
ii
TERMO DE APROVAÇÃO
SILVIO PEREIRA DA MATA
DOUTRINAS, IDEOLOGIAS E TEORIAS DA PENA
“A BUSCA POR UM DIREITO PENAL MÍNIMO”
Monografia aprovada como requisito parcial para obtenção do grau de Especialista no
curso de Pós-graduação em Ministério Público – Estado Democrático de Direito,
Fundação Escola do Ministério Público do Paraná – FEMPAR, Faculdades Integradas do
Brasil – UniBrasil, examinada pelo Professor Orientador Sylvio Lourenço da Silveira
Filho.
________________________________________________________________
PROF. SYLVIO LOURENÇO DA SILVEIRA FILHO
ORIENTADOR
Curitiba, 12 de janeiro de 2009.
iii
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus por ter estado a meu
lado em todos os momentos da minha vida.
Aos meus pais, Manoel e Maria, a quem
tudo devo e sei que jamais conseguirei
retribuir na mesma proporção.
A minha esposa Rosane, que com amor,
compreensão e estímulo, aceitou a minha
ausência, para que assim, eu pudesse me
dedicar em mais esta empreitada do Direito.
Agradeço em especial, ao professor e
orientador Sylvio Lourenço da Silveira Filho,
que mesmo não tendo sido meu professor,
disponibilizou seu tempo e seus elevados
conhecimentos na orientação deste trabalho.
iv
“O cárcere deve ser a última das soluções:
quanto maior tempo for a prisão, mais insolvente
para a vida extra murus se tornará o apenado.”
Louk Hulsman.
“Do rio que tudo arrasta se diz que é
violento. Mas ninguém diz como são violentas as
margens que o reprimem.”
Bertold Brecht.
“A melhor reforma do direito penal não
consiste em sua substituição por um direito penal
melhor, mas sua substituição por uma coisa melhor
que o direito penal.”
G. Radbruch.
v
SUMÁRIO
TERMO DE PROVAÇÃO......................................................................................
AGRADECIMENTOS.............................................................................................
EPÍGRAFE...............................................................................................................
RESUMO..................................................................................................................
1. INTRODUÇÃO....................................................................................................
2. FORMAÇÃO DO ESTADO................................................................................
2.1 Teoria organicista.................................................................................................
2.2 Teoria Contratualista............................................................................................
3. O PODER PUNITIVO DO ESTADO.................................................................
3.1 Evolução histórica do ‘poder punitivo’ estatal.....................................................
4. TEORIAS DA PENA............................................................................................
4.1. Teorias Jurídicas: discurso oficial.......................................................................
4.1.1. Teorias Absolutas: pena como retribuição.......................................................
4.1.2. Teorias Relativas: pena como prevenção..........................................................
4.1.2.1. Da prevenção geral........................................................................................
4.1.2.2. Da prevenção especial...................................................................................
4.1.3. Teorias Mistas, Unificadoras ou Combinatórias..............................................
4.2. Teorias Críticas: discurso criminológico.............................................................
4.2.1. Teoria negativa/agnóstica da pena....................................................................
4.2.2. Teoria da retribuição equivalente.....................................................................
5. TEORIAS E MOVIMENTOS DA POLITICA CRIMINAL MODERNA.....
5.1. O neo-retribucionismo e o movimento da “lei e ordem”.....................................
5.2. Direito penal do inimigo......................................................................................
5.2.1. Críticas ao direito penal do inimigo..................................................................
5.3. O Estado de tolerância zero.................................................................................
5.4. O abolicionismo radical.......................................................................................
5.5. O Direito Penal mínimo.......................................................................................
5.5.1. Princípio da intervenção mínima......................................................................
5.5.2. Objetivos do Direito Penal mínimo..................................................................
5.5.2.1. Descriminalização..........................................................................................
5.5.2.2. Descarcerização.............................................................................................
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS...............................................................................
REFERÊNCIAS........................................................................................................
vi
iii
iv
v
vii
01
03
05
07
11
13
21
21
25
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30
33
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73
75
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84
RESUMO
Já esta consolidado na doutrina e na jurisprudência de nosso país, que o Direito
Penal como meio utilizado para garantir o poder punitivo estatal deve ser usado apenas e
tão-somente quando este for a ‘ultima ratio’. Acontece que tal pensamento não esta sendo
observado, haja vista, que a população ao se deparar com o aumento constante da
criminalidade, vem clamando por penas mais severas e inflexíveis. E o legislador pátrio,
na ânsia de dar uma resposta rápida aos anseios da população, ou de livrar-se do
problema, sem ao menos pensar nas conseqüências dessa inflação legislativa, faz do
Direito Penal a ‘panacéia para todos os males’. Isso demonstra que o Brasil ainda guarda
resquícios do modelo autoritarista da ‘lei e ordem’, que muito se fez presente no regime
militar, e que fazia da pena uma forma de vingança estatal para com aqueles que
infringissem suas regras. Tudo isso, nos faz crer que a pena tem apenas e tão somente o
condão de conferir ao apenado, o caráter retributivo do mal por ele causado,
inviabilizando assim, o alcance de uma finalidade maior que é a sua reintegração na
sociedade. Contudo, a política criminal moderna nos tem demonstrado que o uso
excessivo de leis penais, e seu agravamento, tal qual a aplicação irrestrita das penas de
prisão, em nada contribuem para a redução da criminalidade, pois o caos em que o
sistema prisional brasileiro vive, é a prova concreta de que o cárcere não ressocializa, ao
contrario dissocializa, haja vista que o convívio de pessoas, com os mais variados níveis
de periculosidade faz com que a cada dia formem-se novos bacharéis do crime.
vii
1. INTRODUÇÃO
Mesmo com a existência e a proliferação de diversos modelos de política
criminal em todo mundo, pode-se verificar que o Brasil ainda guarda resquícios
do modelo autoritarista da ‘Lei e ordem’ que muito se fez presente no regime
militar e que fazia da pena uma forma de vingança estatal para com aqueles que
infringiam suas regras.
Portanto, através de um estudo bibliográfico, a presente monografia
buscará, de certa forma, discorrer sobre alguns modelos de política criminal
existentes, bem como quais os métodos a serem empregadas pelo Estado para
garantir que as sanções penais por ele impostas, venham a cumprir a real
finalidade da pena que é a reintegração do indivíduo na sociedade.
Sendo assim, o trabalho se iniciará com a apresentação das teorias
‘Organicista’ e ‘Contratualista’. Tais teorias tentam demonstrar as formas de
convivência dos indivíduos na sociedade e, as diretrizes da formação,
funcionamento e existência do Estado.
Num segundo momento, será feito um levantamento histórico a respeito
do ‘Poder punitivo do Estado’, que vai desde os tempos primitivos, até os dias
atuais, no qual tem-se observado uma sensível diminuição da intervenção do
Estado, bem como, dos meios punitivos e repressivos por ele empregados no
combate aos desajustes sociais, apesar de ainda termos alguns movimentos que
pregam uma maior aplicação do ‘poder punitivo’ estatal.
No segundo capítulo, será feito um breve relato a respeito das teorias da
pena, na visão de alguns exímios doutrinadores. Todavia, o estudo será
direcionado da seguinte maneira: Primeiramente, serão estudadas as Teorias
Jurídicas do discurso oficial, dentre as quais podemos relacionar as teorias
absolutas (pena como retribuição); teorias relativas (pena como prevenção geral e
especial) e teorias mistas ou unificadoras. Em um segundo momento serão
analisadas as teorias críticas do chamado discurso criminológico, que vão desde a
teoria norte americana do etiquetamento social (labelling approach), passando
pela criminologia critica de Alessandro BARATTA, até chegar na proposta
2
defendida por Eugenio Raúl ZAFFARONI de uma teoria negativa/agnóstica da
pena e, por conseguinte, será apresentada a teoria da pena como retribuição
equivalente do crime, defendida pelo professor Juarez CIRINO DOS SANTOS,
no
qual
sintetizará
estudos
feitos
por
autores
como
PASUKANIS,
RUSCHE/KIRCHHEIMER e MELOSSI/PAVARINI.
Posteriormente, o terceiro capítulo será utilizado para demonstrar as
principais teorias e modelos de política criminal que foram surgindo ao longo dos
tempos, e ver-se-á que existem teorias que pregam um maior controle e uma
maior aplicabilidade do sistema punitivo do Estado, dentre os quais fazem parte o
neo-retribucionismo, o direito penal do inimigo e o Estado de tolerância zero,
bem como, há aquelas que pregam a eliminação total ou pelo menos parcial do
sistema penal, dentre os quais o movimento conhecido como abolicionismo
radical e o Direito Penal mínimo são os protagonistas.
Por fim, esta pesquisa tentará demonstrar os objetivos do direito penal
mínimo, bem como, que somente através de uma intervenção estatal mínima,
regrada por penas alternativas é que se poderá chegar a real reintegração dos
apenados, haja vista, que a crise do sistema prisional brasileiro já demonstrou
que o cárcere não melhora ninguém e muito menos garante que o egresso será
novamente reintegrado no convívio da sociedade após de ter cumprido a sua
pena.
3
2. FORMAÇÃO DO ESTADO
A vida em sociedade, durante toda a história da humanidade trouxe
diversos benefícios ao homem. Todavia, deve-se destacar que em determinados
momentos e lugares diversos, propiciou também a criação de uma série de
limitações que acabaram por afetar seriamente a liberdade humana.1 Mesmo
assim, o homem desde os tempos primitivos até os dias atuais, sempre tendeu a
criação e ao desenvolvimento de formas de vida e de organização societária que
por sua vez resultaram na formação de um ente superior chamado Estado.2
Pode-se destacar que o conceito de Estado (a polis dos gregos ou a civitas
e a res publica dos romanos)3 remonta as antigas cidades-estado que teriam
surgido em razão da evolução natural (paulatina) das sociedades humanas
primitivas. 4
A quem diga que o Estado traduz uma forma perfeita e complexa de
organização (política e social), juridicamente voltada para o controle e bem estar
da sociedade. Ou seja, o Estado pode ser compreendido como um órgão
responsável pela manutenção da ordem pública, do bem estar, do consenso e da
justiça social. 5
Todavia, o emprego moderno do termo Estado vem sendo utilizado desde
a célebre frase de Nicolau MAQUIAVEL em sua obra ‘O Príncipe’, no qual
descreve: “Todos os Estados, todos os domínios que têm tido ou têm império
sobre os homens são Estados, e são repúblicas ou principados.” 6
Sendo assim, pode-se dizer que inicialmente, as atitudes humanas eram
voltadas apenas para o domínio da natureza, e no princípio o que prevalecia era a
vontade do mais forte sobre o mais fraco. Porém, o desenvolvimento do homem
precisou estender-se a um novo plano, o da convivência social, pois as
1
DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. 27ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p.
9.
2
WOLKMER, Antonio Carlos. Ideologia, Estado e Direito. 2ª ed. rev., e ampl. São Paulo: RT, 1995. p.
61.
3
BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 12ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 65.
4
BERLOFFA, Ricardo Ribas da Costa. Introdução ao curso de teoria geral do Estado e ciências
políticas. Campinas: Bookseller, 2004. p. 69.
5
WOLKMER, Antonio Carlos. Op. cit., p. 62.
6
BERLOFFA, Op. cit., p.66.
4
necessidades humanas, sempre crescentes, exigiam cada vez mais que houvessem
relacionamentos com outros indivíduos sob a forma de cooperação, garantindo
assim a sobrevivência da espécie humana.7
Daí restou que os indivíduos, por vontade própria, uniram-se mediante um
contrato do qual os fez sair de um ‘status naturalis’, para um ‘status civilis’, e
dessa mudança deu-se início a vida em sociedade.8
Usando as palavras de Orlando SECCO:
A vida social, assim entendida como sendo os seres humanos dispostos em estado
gregário, passou a exigir normas a serem obedecidas por todos, normas comuns
especialmente criadas e a serem seguidas por vontade própria, ou mesmo
involuntariamente, por cada membro componente da coletividade. Daí resultam então
diversos procedimentos, amoldando cada indivíduo ao interesse do grupo, aparando as
arestas da personalidade, do temperamento, do modo de agir de cada um em proveito de
todos (...)9
Reconhece-se que para a determinação e existência de uma sociedade, foi
necessária a criação de uma nova e superior unidade, um ente soberano, dotado
de personalidade jurídica, capaz de fazer com que os interesses da coletividade se
sobressaíssem a eventuais interesses individuais. A este ente dotado de existência
superior, deu-se o nome de Estado.10
Sendo assim, com o intuito de justificar a existência do convívio dos
indivíduos em sociedade, alguns autores desenvolveram teorias que tentam
explicar a origem e manutenção do Estado. Dessa forma temos tanto os adeptos
da Teoria Organicista ou ‘Orgânica’, que vislumbra a idéia de uma sociedade
natural, advinda da própria natureza humana11, quanto aqueles que sustentam que
a sociedade surgiu de um ato de escolha dos indivíduos, também conhecida de
Teoria Contratualista ou do ‘Contrato Social’.12
7
SECCO, Orlando de Almeida. Introdução ao estudo do Direito. 7ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Juris,
2001. p. 10-11.
8
WOLKMER, Antonio Carlos. Op. cit., p. 63.
9
SECCO, Op. cit., p. 11.
10
BERLOFFA, Op. cit., p.33.
11
DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. 24ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p.
9.
12
BERLOFFA, Op. cit., p. 34.
5
Portanto, o estudo dessas duas teorias, demonstrará as formas de
convivência dos indivíduos na sociedade, bem como, as diretrizes da formação,
funcionamento e existência do Estado.
2.1. TEORIA ORGANICISTA
A teoria organicista por muito tempo dominou o pensamento filosófico da
antiguidade13, pois os organicistas procedem do tronco milenar da filosofia
grega14, e grandes filósofos daquela época (século IV a.C.), dentre eles podemos
destacar Aristóteles, consideravam o Estado como sendo uma “comunidade
perfeita, formada pela pluralidade de grupos comuns, comunidade que, de certo
modo, logrou o fim de inteira suficiência e surgiu mercê da vida, e, mercê da
vida, em seu conjunto se mantém.”15 Aristóteles ainda afirmava que o homem é
naturalmente um ser sociável16, e que a natureza o fez um “ser político”, que não
pode viver fora da Sociedade17 e, que somente um indivíduo de natureza
desprezível ou superior aos demais homens, tentaria viver no completo
isolamento.18
Nesse sentido, Paulo BONAVIDES ao citar Del VECCHIO descreve o
organicismo como sendo: “Reunião de várias partes, que preenchem funções
distintas e que, por sua ação combinada, concorrem para manter a vida do todo.”
E ainda, destaca que uma sociedade fundada nos moldes do organicismo se dá
13
Com base nos ensinamentos de ZAFFARONI e PIERANGELI, podemos verificar que o organicismo
social surgiu amparado de “finas e elaboradas teorias filosóficas e nutriu-se dos mais profundos
pensadores idealistas de seu tempo.” (ZAFFARONI, Eugênio Raúl; PIERANGELI, José Henrique.
Manual de direito penal brasileiro: Parte Geral. vol. I, 7ª ed. rev., atual. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2008. p. 246.)
14
BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 12ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 58.
15
BONAVIDES, Paulo. Teoria do Estado. 3ª ed. rev. e ampl. São Paulo: Malheiros, 1995. p. 26. Apud
Aristóteles. Política. Livro I, Capitulo 2.
16
Nesse sentido, DALLARI descreve que Cícero em sua época (século I a.C.), por influência de
Aristóteles afirmava que a causa primeira dos homens se agregarem a outros homens, é mais em relação
ao instinto de sociabilidade neles inato, do que uma possível debilidade, haja vista, que a espécie humana
mesmo tendo bens em abundância, não nasceu para o isolamento, muito menos para uma vida sem rumo,
e por isso procura apoio em seus semelhantes. (DALLARI, Op. cit., p. 10)
17
BONAVIDES, Paulo. Ciência Política... p. 58.
18
DALLARI, Op. cit., p. 10
6
em razão de um “conjunto de relações mediante as quais vários indivíduos vivem
e atuam solidariamente em ordem a formar uma entidade nova e superior.”19
No mesmo sentido, Dalmo DALLARI ao citar RANELLETTI, nos ensina
que somente com a convivência e cooperação dos seus semelhantes, é que o
homem pode alcançar os meios necessários para satisfazer as suas necessidades.
Ou seja, somente através dos conhecimentos e das experiências dos demais seres
humanos, é que o homem pode desenvolver e aperfeiçoar todo o seu potencial
técnico, intelectual e moral, e conseqüentemente garantiu a sua existência.20
Acredita-se, portanto, que na teoria organicista os indivíduos que fazem
parte de uma determinada sociedade, a exemplo dos órgãos que fazem parte do
corpo humano, têm uma função específica a qual devem realizar com presteza e
eficácia, para o bem do todo. Sendo assim, tal qual a falha de um dos órgãos,
pode vir a trazer conseqüências maléficas para todo o organismo, o indivíduo que
não cumpre com as funções a ele designadas, poderá trazer conseqüências
desastrosas para toda a sociedade.21
Miguel REALE assim descreve em seus ensinamentos:
O que dá ao organicismo visos de verdade é exatamente o fato de pôr em evidência o
caráter especialíssimo da unidade social, pois a sociedade não constitui um ser
substancialmente diverso de seus elementos componentes, que mantêm sempre
inatingível a própria individualidade, mas representa uma realidade que se não confunde
com as partes que as compõem; daí a teoria que, acertadamente, vê na sociedade uma
‘unidade de ordem’ e não uma ‘unidade substancial’.22
O objetivo social, ou seja, o fim pelo qual a sociedade foi criada deve estar
acima dos objetivos particulares das pessoas que a integram. E é através da
concepção de organismo, que consiste a idéia de que os indivíduos agem em
função do Estado, e não este em função daqueles, pois a sociedade é produto da
associação natural e da cooperação mútua dos indivíduos que a compõem.23
Com base nos ensinamentos de ZAFFARONI, pode-se dizer que a forma
de controle penal exercido pelo Estado nas sociedades primitivas era feito da
19
BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 12ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 57-58.
DALLARI, Op. cit., 11. Apud. Oreste Ranelletti, Intituzioni di Diritto Pubblico, Parte Geral, p. 3.
21
BERLOFFA, Op. cit., p. 39.
22
REALE, Miguel. Teoria do Direto e do Estado. São Paulo: Saraiva, 1984. p. 51.
23
DALLARI, Op. cit., 12.
20
7
seguinte forma: “o velho organicismo (positivista) acreditava que solucionava as
“células infecciosas” e as eliminava (em lugar de “penas”, impunha “medidas
eliminatórias”: morte, afastamento) ou neutralizava-as com medidas de
“reeducação”, enquanto que o “novo organicismo” não se preocupa por
selecionar todas as “células infecciosas” - nem o pretende - mas somente as que
lhe convenham (“infecciosas” ou não) para convencer o organismo de que tudo
está em ordem: o “velho organicismo” pretendia operar sobre o “organicismo
social” fisicamente; já o “novo” deseja fazê-lo pela insinuação (ou astúcia).” 24
Por fim, com o desenvolver da sociedade, novas teorias a respeito do
controle estatal começaram a ser discutidas, e o modelo social ‘natural’ de
organismo (organicista), foi sendo substituído pelo modelo ‘artificial’ do contrato
(contratualista)25, que será estudado a seguir.
2.2. TEORIA CONTRATUALISTA
Contrapondo-se aos adeptos da teoria organicista, na qual pregava que a
sociedade é fruto da cooperação e associação natural dos indivíduos, temos a
teoria contratualista, a qual define que a sociedade é apenas e tão somente um
contrato hipotético, ou seja, um acordo de vontades, firmado pelos homens,
quando estes resolveram ceder parte da sua liberdade, para um ente soberano
(Estado), afim de que este viesse a garantir a paz e a defesa comuns.26
E é na obra de Thomas HOBBES, mais precisamente no ‘Leviatã’,
publicado em 1651, que o contratualismo é claramente proposto. Para HOBBES,
antes da formação do Estado, o homem vivia em um ‘estado de natureza’, no
qual sua liberdade era ilimitada. Ao gozar dessa liberdade, o homem era movido
exclusivamente por suas paixões, sendo na maioria das vezes individualista e
agressivo. Ou seja, ao agir dessa maneira, o homem era uma ameaça constante
24
ZAFFARONI, Eugênio Raúl. Em busca das penas perdidas: a perda da legitimidade do sistema penal.
Tradução: Vânia Romano Pedrosa, Amir Lopes da Conceição. Rio de Janeiro: Revan, 1991. p. 211.
25
ZAFFARONI, Eugênio Raúl, et al. Direito Penal Brasileiro – Teoria Geral do Direito Penal. vol. I., 2ª
ed. Rio de Janeiro: Revan, 2003. p. 518.
26
DALLARI, Op. cit., 12.
8
aos outros homens, pois este cuidava apenas da sua própria conservação, sem se
preocupar com os demais, o que o fazia viver em constante estado de guerra.27
Nesse ideário, Isaac SABBÁ ao citar a obra ‘A paz perpétua’ de KANT,
assim descreve: “O estado de paz entre os homens que vivem juntos não é um
status naturalis, o qual é antes um estado de guerra, isto é, um estado em que,
embora não exista sempre uma explosão das hostilidades, há sempre, no entanto,
uma ameaça constante.”28
Ainda nessa mesma concepção, Isaac SABBÁ citando trecho da obra de
BECCARIA, descreve que os homens: “Cansados de só viver no meio de
temores e de encontrar inimigos por toda parte, fatigados de uma liberdade que a
incerteza de conservá-la tornava inútil, sacrificaram uma parte dela para gozar do
resto com mais segurança.”29
Desta forma, deu-se início à vida em sociedade, pois, os homens cansados
de viver nesse constante estado de guerra, gozando de uma liberdade, cujo ‘status
naturalis’ colocava em risco outros direitos, resolveram por bem firmar um
pacto, no qual passaram a chamar de ‘contrato social’.
Na visão de HOBBES, o pacto firmava os dizeres de um homem aos
demais homens: “Cedo e transfiro meu direito de governar a mim mesmo a este
homem, ou a esta assembléia de homens, com a condição de que transfiras a ele
teu direito, autorizando de maneira semelhante todas as suas ações.”30
Já Jean-Jacques ROUSSEAU, considerado um dos mentores do
contratualismo, especialmente pela publicação do livro ‘O Contrato Social’ em
1762, e cujos pensamentos exerceram influência direta e imediata sobre a
Revolução Francesa, e após esta, nos diversos movimentos tendentes a defender
os direitos da pessoa humana, apoiava-se nos seguintes termos: “Suponho os
homens terem chegado a um ponto em que os obstáculos que atentam à sua
27
DALLARI, Op. cit., 12-13. Apud. HOBBES, Thomas. Leviatã, Parte I, Cap. XVIII.
GUIMARÃES, Isaac Sabbá. Dogmática penal e poder punitivo – novos rumos e redefinições. 2 ed.
Curitiba: Juruá, 2001. p. 21. Apud. KANT. “A paz perpétua”, In A paz perpétua e outros opúsculos, trad.
Arthur Morão, Textos Filosóficos, Edições 70, p. 145.
29
GUIMARÃES, Op. cit., p. 22. Apud. BECCARIA. Dos delitos e das penas. São Paulo: Atena, 1956,
p.32.
30
HOBBES, Thomas. Leviatã: Ou matéria, forma e poder de um estado eclesiástico e civil. São Paulo:
Martin Claret, 2005. p. 130-131.
28
9
conservação no estado natural excedem, pela sua resistência, as forças que cada
indivíduo pode empregar para manter-se nesse estado. Então este estado
primitivo não pode subsistir, e o gênero humano pereceria se não mudasse de
modo de ser.”31
Neste contexto, ROUSSEAU admite que a adesão ao contrato social fez
com que: “Cada um, enfim, dando-se a todos, a ninguém se dá, e como em todo o
sócio adquiro o mesmo direito, que sobre mim lhe cedi, ganho o equivalente de
tudo quanto perco e mais forças para conservar o que tenho.”32 Observando
ademais que: “Cada um de nós põe em comum sua pessoa e todo o seu poder sob
a suprema direção da vontade geral, e recebemos enquanto corpo cada membro
como parte indivisível do todo.”33
Nesse sentido, de acordo o proferido por Ricardo MARQUES DIP, o
Estado, como soberano de todas as leis dos homens, encaminhou-se a seus
súditos dizendo:
Vós, Homens – assim vos designo com agá maiúsculo -, cujos ancestrais, em estado de
natureza, viviam acaso felizes – esses bons selvagens de que falou nosso mestre
Rousseau -, ou acaso em guerra permanente – como preferia nosso mestre Hobbes -;
Vós, cujos antepassados celebraram um pacto de associação, entregando à comunidade,
por si e por seus sucessores, todos seus direitos; a Vós prometo que, detendo em minhas
mãos a soberania, cuja origem está no povo – sois como deuses (ouviram-se aplausos):
o poder vem de vós -, somente punirei de acordo com a fé que temos na Constituição –
a cujo nome devemos dobrar os joelhos - e de conformidade com as leis que,
formalmente regulares, se ajustarem aos interesses do Estado, que são iguais
forçosamente aos vossos, pois que represento a vontade geral”. Após um breve silêncio,
prossegue: “Prometo-vos, em resumo, que só vos punirei de acordo com a minha
vontade que exercito por e na forma da lei. Peço-vos que tenhais fé em todas essas
afirmações, mas, em todo caso, eu sou o garante de vossa liberdade abstrata, e, pois,
como ensinou nosso mestre Kant, sois livres para pensar o que quiserdes, contanto que
obedeçais. Meu nome é Lei. 34
Conclui-se, que uma vez firmado o ‘contrato social’, todos os homens
unidos passaram a integrar uma só pessoa chamada Estado. O titular dessa pessoa
é denominado ‘soberano’, e todos aqueles que o cercam são chamados de
31
DALLARI, Op. cit., p. 17-18.
ROUSSEAU, Jean-Jacques. O Contrato Social. São Paulo: Martin Claret, 2004. p. 32.
33
ROUSSEAU, Op. cit., p. 32.
34
MARQUES DIP, Ricardo Henry. Princípio da legalidade penal: realidade ou mito (uma perspectiva
jusnaturalista). In Justiça Penal 7: críticas e sugestões: justiça criminal moderna / coordenador Jaques de
Camargo Penteado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 82-83.
32
10
‘súditos’. Ou seja, no momento da formação desse pacto social, os indivíduos
livres concederam a este ente estatal o poder legítimo do uso da força, e é este
poder que mantém os homens dentro dos limites consentidos e, os obriga por
temor a uma sanção, a cumprir com os seus compromissos e a observar as leis
previamente estabelecidas35. A propósito, é exatamente nesse uso legítimo da
força que é fundada a essência do Estado para HOBBES: “Uma grande multidão
institui a uma pessoa, mediante pactos recíprocos uns com os outros, para em
nome de cada um como autora, poder usar a força e os recursos de todos, da
maneira que considerar conveniente, para assegurar a paz e a defesa comum.”36
De tal sorte, o Estado firmado a partir da noção de ‘pacto social’, só deve
privar seus cidadãos (súditos) do exercício de seus direitos, quando estes
violarem de forma intencional ou por negligência, qualquer das cláusulas do
‘contrato social’. Quando isso acontecer, ao Estado será garantido o uso legitimo
da força e o poder de punir, todo aquele que infringir as suas leis.
Nesse sentido descreve Cesare BONESSANA, Marquês de Beccaria:
Desse modo, somente a necessidade obriga os homens a ceder uma parcela de sua
liberdade; disso advém que cada qual apenas concorda em pôr no depósito comum a
menor porção possível dela, quer dizer, exatamente o que era necessário para empenhar
os outros em mantê-lo na posse do restante. A reunião de todas essas pequenas parcelas
de liberdade constitui o fundamento do direito de punir. Todo exercício do poder que
deste fundamento se afastar constitui abuso e não justiça; é um poder de fato e não de
direito; constitui usurpação e jamais um poder legítimo. 37
Seguindo, ainda, as lições de Salo de Carvalho38, pode-se verificar que o
modelo penalógico de BECCARIA:
Sustenta que somente a necessidade de ruptura com o antigo estado de coisas
constrangeu os homens a se sujeitarem às penas e, mesmo assim, a cada um somente
seria exigível ceder ao depósito comum (Estado) a menor porção possível do bem
jurídico liberdade. A intervenção penal representa uma necessidade, uma (pré) condição
de vida em sociedade.
35
DALLARI, Op. cit., 14.
HOBBES, Op. cit., p. 131.
37
BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. tradução: Torrieri Guimarães. São Paulo: Martin Claret,
2006. p 19.
38
CARVALHO, Salo de. Pena e garantias. 3ª ed., rev. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 122.
36
11
Portanto, a soma de todas as parcelas de liberdade que foram cedidas para
satisfazer o interesse da coletividade formou o poder político do Estado, poder
político este caracterizado pela seção de liberdades individuais daqueles que o
compõem, tornando-o um ente capaz de garantir a ‘paz social’.
Simultaneamente, os indivíduos ao cederem parte de sua liberdade ao
Estado atribuíram a este ente estatal o monopólio do uso legítimo da força e o
poder de punir. Convém, no entanto asseverar que o uso dessa força só é
permitido àquele indivíduo que não cumprir com seu papel social, ou melhor,
com as regras previamente pactuadas.
3. O PODER PUNITIVO DO ESTADO
Conforme já fora dito anteriormente, o poder de punir teve origem no
poder-dever do Estado em garantir que nas relações humanas, reina-se a paz
social e o interesse da coletividade. Para isso foram criadas regras comuns de
convivência e a conseqüente punição daqueles que viessem a infringir tais regras.
A punição tinha o intuito exclusivo de castigar o infrator e vingar o mal por ele
praticado.
HOBBES, em seus ensinamentos pregava que somente através de uma
certa autoridade seria possível frear os impulsos violentos, egoístas e insaciáveis
do homem no seu estado de natureza, e para isso, era preciso que fosse criada
uma organização política capaz de dar segurança e bem estar a toda a sociedade.39
Então, somente com o advento da criação do Estado, e de sua imposição
como fenômeno unitário e singular que deve ser obedecido afim de que seja
garantida a ‘paz social’, é que seus súditos passaram a submeter-se a este, não
apenas de forma voluntária, mas também pelo dever natural de curvar-se ao
poder legítimo e soberano deste Estado.40
Sobre este aspecto, o professor DALLA-ROSA ao citar a obra de
DREIFUSS, descreve que o poder político do Estado faz dele o único agente
39
WOLKMER, Op. cit., p. 63.
DALLA-ROSA, Luiz Virgilio. O direito como garantia: pressupostos de uma teoria constitucional. p.
54-55.
40
12
capaz de deter o monopólio do uso da força e também o torna uma “empresa
institucional de caráter político, onde o aparelho administrativo leva avante, em
certa medida e com êxito, a pretensão do monopólio da legítima coerção física,
com vistas ao cumprimento das leis.”41
Também nos dizeres do mestre italiano Norberto BOBBIO:
O que caracteriza o poder político é a exclusividade do uso da força em relação á
totalidade dos grupos que atuam num determinado contexto social, exclusividade que é
o resultado de um processo que se desenvolve em toda sociedade organizada, no sentido
da monopolização da posse e uso dos meios com que se pode exercer a coação física.
Este processo de monopolização acompanha pari passu o processo de incriminação e
punição de todos os atos de violência que não sejam executados por pessoas autorizadas
pelos detentores e beneficiários de tal monopólio. 42 [grifo do autor]
Pelos fundamentos anteriormente relatados, verifica-se que o Estado
detém com exclusividade o monopólio do uso da força, e dessa forma faz valer as
regras de conduta por ele estipuladas. Tais regras agem sobre os indivíduos de
forma a condicioná-los e a modelá-los, objetivando com que cada um deles seja
parte de um todo social.
De acordo com essa concepção, Alípio FILHO afirma que:
A socialização do indivíduo humano funciona como um condicionamento. O indivíduo
submetido ao aprendizado da cultura instituída é levado a considerar a sua sociedade (e
seu modo de vida) como único modelo de vida social, ou mesmo expressão natural da
vida em comum. A sociedade, embora mascarando o fato, obtém isso por meio da
imposição de normas de conduta e pela difusão de crenças segundo as quais a própria
realidade imposta é vista como necessária, inevitável e imutável, como parte da
natureza das coisas. Essa é a maneira pela qual o indivíduo passa a aceitar sua sociedade
tal como é (ou se apresenta), sem colocá-la em questão. Os costumes, as normas e as
crenças têm o poder de condicionar o modo dos indivíduos verem o mundo, determinar
suas apreciações morais e os diferentes comportamentos sociais.43
41
DALLA-ROSA, Op. cit., p. 58.
BOBBIO, Norberto. Dicionário de política. vol. 2, 10ª ed. Brasília: UnB, 1997. p. 956.
43
FILHO, Alipio de Souza. Medos, mitos e castigos: notas sobre a pena de morte. p. 19.
42
13
Verifica-se, nas ciências humanas, que tudo que faz do indivíduo um ‘ser
social’ é produto do aprendizado que este tem ao longo de sua vida em sociedade
e na cultura.44
Nos dizeres de HOEBEL citado por FILHO, cultura é:
(...) a soma total, integrada, das características de comportamento aprendido que são
manifestadas e compartilhadas pelos membros de uma sociedade. (...) é integralmente o
resultado de invenção social, e pode ser considerada como herança social, pois é
transmitida por ensinamento a cada geração. (...) sua continuidade é garantida pela
punição dos membros da sociedade que se recusam a seguir os padrões de
comportamento que lhes são determinados pela Cultura.45
Pois bem, de acordo com o que foi estudado até o momento, constata-se
que a necessidade fez com que os homens cedessem parte de sua liberdade, e a
soma de todas as parcelas de liberdade cedidas, deram ao Estado, como único e
exclusivo administrador, o poder soberano do monopólio do uso da força e do
poder de punir.
3.1. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO PODER PUNITIVO ESTATAL
A história do Direito Penal nos mostra que este ramo do direito, por
diversos períodos da civilização foi um tanto quanto repressivo, se comparado
com a maioria dos ordenamentos juridíco-penais hoje vigentes.46
Na antiguidade, a pena imposta aos infratores da lei, geralmente, não
guardava proporção entre a pena aplicada e a conduta praticada pelo agente
delitivo, pois tais penas eram severas, cruéis e intimidativas.47
Ao estudarmos a evolução do homem, podemos constatar que desde a préhistória, há relatos da sua convivência em sociedade, mesmo sendo este
agrupamento formado apenas por membros da mesma família.48 Também,
44
FILHO, Op. cit., p. 21.
FILHO, Op. cit., p. 20. Apud. HOEBEL, Adamson. “A natureza da cultura”, in SHAPIRO, Harry L.
(org.). Homem, cultura e sociedade. p. 219-20.
46
BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de Direito Penal: Parte Geral. vol. I, 7 ed. rev. e atual. São
Paulo: Saraiva, 2002. p. 21.
47
FILHO, Op. cit., p. 96.
48
SILVA, César Dario Mariano da. Manual de direito penal – Parte geral, arts. 1º a 120. vol. 1, 2 ed.
rev., ampl. e atual. São Paulo: Edipro, 2002. p. 21.
45
14
observa-se que as condutas humanas eram pautadas por normas sociais
apropriadas ao momento em que estavam vivendo.49
Em rápida análise, partindo das sociedades primitivas, verifica-se que
nessas sociedades não havia um sistema normativo que regia a vida em
sociedade, nem concepções científicas centradas em princípios racionais, mas
sim um ambiente de religião e magia, o qual envolvia os grupos sociais
existentes, fazendo com que estes interpretassem os fatos de maneira
metafórica.50
Para estes grupos, os fenômenos naturais maléficos (seca, enchentes,
pestes, erupções vulcânicas) eram considerados como castigos divinos (“totem”)
por atos que teriam desagradado os deuses, e somente com a punição do infrator
era possível desagravar a divindade ofendida. Portanto, as penas aplicadas eram
cruéis, severas e desumanas, podendo chegar até mesmo ao sacrifício da vida do
transgressor.51
Nesse sentido, Alípio FILHO afirma que os castigos e as penas capitais
nas sociedades tribais ocorriam da seguinte forma: “O delito é um ato que ofende
a consciência coletiva e, por efeito oposto, gera na sociedade uma maior coesão.
A reação coletiva da sociedade implica a pena para o transgressor. Quase sempre,
a sanção penal vem cominada com o recurso ritual ás forças sobrenaturais, o que
põe em relevo o significado das crenças míticas para a manutenção da Ordem
social.”52
Posteriormente, os povos primitivos passaram a adotar como forma de
punição a ‘vingança privada’, que nada mais era que uma reação natural e
instintiva, na qual as penas adotadas guardavam certo teor de vingança pessoal, e
a reação contra um ato delituoso era feito pela própria vítima, pelos parentes, ou
por um determinado grupo social, sem que houvesse a intervenção de estranhos.
49
ZANOM, Artemio. Introdução à ciência do Direito Penal. 2 ed. rev., atual. e ampl. Florianópolis: Ed.
OAB/SC, 2000. p. 101.
50
FERREIRA, Ivete Senise. Visão do Direito Penal Moderno. In Justiça Penal 7: críticas e sugestões:
justiça criminal moderna / coordenador Jaques de Camargo Penteado. São Paulo: RT, 2000. p. 434-435.
51
MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal – Parte Geral. 21º ed. São Paulo: Atlas, 2004. p.
35.
52
FILHO, Op. cit., p. 91.
15
O revide muitas vezes atingia não apenas o autor do delito, mas também seus
familiares ou até mesmo o grupo social a que pertencesse.53
Sobre a vingança privada, Ivete FERREIRA citando João GONZAGA
esclarece: “a vingança é muitas vezes um imperativo sagrado imposto pela moral
primitiva: a opinião pública, diz ele, constrange a vítima e os seus a reagirem
porque sentem que a impunidade do ofensor representa uma ameaça para o
equilíbrio e a paz, bem como para a integração social.”54
No momento em que grupos adversos começaram a conviver em um
mesmo território, unidos por vínculos sangüíneos, a vida em sociedade se
modificou e surgiram dois novos gêneros de sanções: a ‘perda da paz’ e a
‘vingança de sangue’.55
Se o ato delituoso fosse cometido por um membro do próprio grupo, a
sanção imposta era o banimento (perda da paz), que consistia na sua expulsão do
clã, ficando este a mercê das forças hostis da natureza e de grupos rivais, que se o
encontrassem, certamente o matariam. Já, se a violação fosse feita por um
indivíduo que não pertencesse ao grupo, a sanção seria a ‘vingança de sangue’,
que nada mais era que uma guerra sangrenta entre os grupos.56
Com o advento da evolução social, surge a ‘lei de talião’, registrada no
Código de Hamurabi, (Babilônia - 1680 a.C.), adotada pela legislação hebraica
(Êxodo) e pela Lei das XII Tábuas, (romanos), que consagrava a disciplina do
“sangue por sangue, olho por olho e dente por dente”, pois suas penas eram
avassaladoras, degradantes e públicas, e na maioria das vezes o condenado
pagava com a própria vida.57
O mesmo aconteceu no período das sociedades feudais, mas nesta fase o
Estado mostrava-se um pouco mais organizado e reconhecia-se a autoridade de
um ente soberano a quem era repassado o ‘poder de punir’ em nome dos demais
súditos. Este absolutismo monárquico era beneficiado por leis imperfeitas e
53
MIRABETE, Op. cit., p. 35-36.
FERREIRA, Op.cit., p. 438. Apud. GONZAGA, João Bernardino. O direito penal dos povos primitivos.
Revista da Faculdade de Direito da USP, n. 68 (2), p. 191-192.
55
FERREIRA, Op.cit., p. 438.
56
BITENCOURT, Op. cit., p. 21-22.
57
BITENCOURT, Op. cit., p.22. Apud. FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de Direito Penal. Rio de
Janeiro: Forense, 1985, vol. 1, p. 26.
54
16
imprecisas, no qual predominava o arbítrio judicial do soberano, pois a justiça
penal por ele adotada era parcial, injusta e perversa. Naquela época, a tortura, a
pena de morte e o suplício do condenado eram utilizados como espetáculos
públicos, exprimindo assim, a força simbólica do castigo exemplar. O emprego
do suplício foi utilizado de forma abundante nos séculos que fizeram parte da
chamada Idade Média, como forma de espetáculo ritual. A exibição do suplício,
servia como meio de demonstrar a vitória da lei e do poder do Estado, mas o
caráter simbólico do ritual de encenação do suplício tinha o intuito de servir
como exemplo para os demais membros da sociedade.58
Neste sentido, ensina FOUCAULT:
O suplício faz parte de um ritual. É um elemento na liturgia punitiva, e que obedece a
duas exigências. Em relação a vítima, ele deve ser marcante; destina-se, ou pela cicatriz
que deixa no corpo, ou pela ostentação de que se acompanha, a tornar infame aquele
que é sua vítima; (...) a memória dos homens, em todo caso, guardará a lembrança da
exposição, da roda, da tortura ou do sofrimento devidamente constatados. E pelo lado
da Justiça que impõe, o suplício deve ser ostentoso, deve ser constatado por todos, um
pouco como triunfo. 59 [grifo do autor]
Michel FOUCAULT ainda descreve que a população repudiava o caráter
de espetáculo e a maneira com que as penas eram aplicadas, mas participavam
por medo de serem castigadas: “...assim, não havia aceitação pública, pelo caráter
de espetáculo da execução das penas, sendo que as pessoas eram estimuladas e
compelidas a seguir o cortejo até o sacrifício, e o preso era obrigado a proclamar
sua culpa, atestar seu crime e a justiça de sua condenação.”60
No período do Tribunal da Inquisição (Igreja Católica de Roma), esse
modelo de punição se fez prevalecer de forma ainda mais cruel, pois deu a
oportunidade da igreja massacrar aqueles que ela entendesse ser hereges. No
período que vai do fim do século XIV até meados do século XVIII, a tortura
pública e a pena de morte foram praticadas de forma intensa na Europa,
58
FILHO, Op. cit., p. 96.
FOUCALT, Michel. Vigiar e punir: história da violência nas prisões. Petrópolis: Vozes, 1977. p. 35.
60
FOULCAULT, Op. cit., p. 35. Apud. DOTTI, René Ariel. Bases e alternativas para o sistema de penas,
p. 34.
59
17
legitimados pela ideologia da caça aos pagãos, bruxas e demais indivíduos que
fossem contra as convicções da Igreja.61
Naquela época, a Igreja proclamava que a punição tinha um caráter de
castigo espiritual, pois acreditava que através dela poderia se acalmar a ira divina
e consequentemente, purificar a alma do infrator. Mas o que se via realmente era
um intenso teor vingativo, pois aos acusados eram impostas penas severas, e em
sua grande maioria estas penas eram capitais. Assim, castigos como a forca,
fogueira, açoites, guilhotina, amputação de membros e empalação, eram exibidos
á população como um mero espetáculo, que tinha um cunho de intimidar a todo
aquele que fosse contrário às concepções da Igreja.62
Portanto, chega-se a conclusão que as penas aplicadas na antiguidade,
eram usadas não como meio de se fazer justiça, mas como forma de vingança
(retribuição do mal pelo mal), pois tinham a finalidade única e exclusiva de
impor castigos e sacrifícios desumanos ao condenado. É desse período que
decorre as chamadas teorias absolutistas da pena (retribucionistas), mas iremos
tratá-las de forma mais esmiuçada no subitem referente às teorias da pena.
No decorrer do Iluminismo63, precisamente no fim do século XVIII
(Século das Luzes), deu-se início ao que os estudiosos chamam de ‘período
humanitário’, no qual importantes ícones iluministas como: ROUSSEAU,
MONTESQUIEU, e outros criaram uma nova ideologia64, um movimento de
idéias que fundava-se na razão e na humanidade e buscava a reforma das leis.65
Porém foi em 1764 o filósofo Cesare BONESSANA, Marquês de Beccaria
(1738-1774), influenciado pelos princípios de ROUSSEAU, MONTESQUIEU,
LOCKE e VOLTAIRE publicou em Milão a importante obra “Dei Delitti e delle
Pene” (Dos Delitos e das Penas), que tornou-se um marco na luta contra o
61
FILHO, Op. cit., p. 96-97.
FILHO, Op. cit., p. 98.
63
O Iluminismo, considerado como o “século da luzes” foi o movimento que deu ao século XVIII, a
segurança e a confiança na razão, pois visava a substituição da razão da autoridade pela autoridade da
razão para dirigir a vida em sociedade. O significado da palavra Iluminismo, vem da palavra alemã
‘Aufklarung’ que significa iluminação, aclaração, esclarecimento. (LOPES, Mauricio Antonio Ribeiro.
Princípios Políticos do Direito Penal – Série princípios fundamentais do direito penal moderno; vol. 3; 2ª
ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 43).
64
MIRABETE, Op. cit., p. 38.
65
BITENCOURT, Op. cit., p. 31.
62
18
desumano sistema penal até então vigente, pois posicionava-se de forma
contraria a pena de morte e as penas cruéis, levando em conta que as penas
deveriam ser moderadas e proporcionais aos delitos praticados.66 Nesse sentido,
BECCARIA finaliza sua obra dizendo que: “Para não ser um ato de violência
contra o cidadão, a pena deve ser, de modo essencial, pública, pronta, necessária,
a menor das penas aplicáveis nas circunstancias dadas, proporcionada ao delito e
determinada pela lei.”67
Destacou-se ainda, que o autor acima referido pregava a necessidade de
serem criadas leis mais claras, simples e de fácil compreensão e que viessem a
favorecer não só uma pequena minoria, mas todos os cidadãos, e que as penas
deveriam ser utilizadas como profilaxia social, não só para intimidar os cidadãos,
mas também, que buscassem recuperar o delinqüente.68
Aníbal BRUNO ao analisar o pensamento de BECCARIA assim assevera:
O que pretendeu Beccaria não foi certamente fazer obra de ciência, mas de humanidade
e justiça, e, assim, ela resultou num gesto eloqüente de revolta contra a iniqüidade, que
teve, na época, o poder de sedução suficiente para conquistar a consciência universal.
(...) falou claro diante dos poderosos, em um tempo de absolutismo, de soberania de
origem divina, de confusão das normas penais com religião, moral, superstições,
ousando construir um Direito Penal sobre bases humanas, traçar fronteiras à autoridade
do príncipe e limitar a pena à necessidade da segurança social. Defendeu, assim, o
homem contra a tirania, e com isso encerrou um período de nefanda (perversa) memória
na história do Direito Penal.69
Ainda no período humanitário, John HOWARD (xerife de Bedford e
posteriormente alcaide desse condado) iniciou um movimento de reforma das
prisões (corrente penitenciarista), pois não aceitava as condições lamentáveis em
que se encontravam as prisões inglesas. Por isso, HOWARD insistia na
necessidade de se construir estabelecimentos carcerários adequados ao
cumprimento da pena privativa de liberdade, destacando sempre que estes locais
deveriam proporcionar aos apenados condições dignas de higiene, alimentação e
66
BITENCOURT, Op. cit., p. 32-33.
BECCARIA, Op. cit., p.107.
68
MIRABETE, Op. cit., p. 39.
69
BRUNO, Aníbal. Direito Penal. Tomo I. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1967. p. 82-83.
67
19
saúde.70 Foi através de John HOWARD que se iniciou a luta pela humanização
das prisões e a ressocialização dos condenados.71
Outro ícone do período humanitário a ser lembrado foi o inglês Jeremias
BENTHAM72 que com sua obra ‘Teoria da Penas e das Recompensas’ publicada
em 1818, descreveu que a pena era necessária à prevenção geral do delito e a
ressocialização do agente delitivo. Porém, a sanção a ser imposta ao agente
delitivo não deverá exceder o limite do necessário para alcançar o fim
pretendido. Ou seja, para os teóricos do período humanitário, a pena era um mal
necessário, que se justificava por sua utilidade, haja vista que previne que o
criminoso cometa novos crimes que poderão causar danos a sociedade.73
Pode-se dizer então, que o movimento humanitário pregava, sobretudo, o
respeito a dignidade humana e, visava a proteção da liberdade individual do
apenado frente ao arbítrio do poder do Estado, bem como buscava abolir para
sempre a pena de morte e de tortura fundando-se em um sentimento de piedade e
compaixão para com aqueles que fossem submetidos ao regime penal e
carcerário então vigentes.74
Ao findar-se o período humanitário, sob a influência do pensamento
positivista (século XIX), o homem delinqüente e a explicação causal do delito,
passaram a ser objeto de estudos daqueles que pretendiam descobrir a origem e o
porquê do crime, deu-se então início ao período criminológico.75
Nesse período criminológico do Direito Penal destaca-se os estudos do
médico italiano César LOMBROSO, que em 1875 publicou o livro ‘L’Uomo
Delinquente’ (O Homem Delinqüente). Com seus estudos, LOMBROSO criou a
Antropologia Criminal e, inserido nessa ciência criou também a figura do
criminoso nato76, haja vista que para este autor o estudo do crime parte de um
70
BITENCOURT, Op. cit., p. 36.
SILVA, C. D. M. Op. cit., p. 25.
72
Outra obra de Jeremias Bentham foi o “panótico”, obra esta que descrevia como deveria ser a
arquitetura de uma prisão, e seus respectivos sistemas de segurança. (SILVA, César Dario Mariano da.
Manual de direito penal... p. 25).
73
SILVA, C. D. M. Op. cit., p. 26.
74
CANTO, Dilton Ávila. Regime inicial de cumprimento da pena reclusiva ao reincidente. Disponível
em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1099> Acesso em 23 de janeiro de 2008.
75
SILVA, C. D. M. Op. cit., p. 27.
76
MIRABETE, Op. cit., p. 40.
71
20
fenômeno biológico, ligado essencialmente ao agente que o praticou. Sob esse
enfoque, César Dario da SILVA descreve que na concepção de LOMBROSO, “o
homem já nasceria predestinado ao crime e teria características físicas e
morfológicas específicas, como assimetria craniana, fronte fugidia, orelhas de
abano, cabelos abundantes e barba escassa, dentição anormal olhos defeituosos,
tatuagens, irregularidades nos dedos e nos mamilos, etc.”77
Dentre os autores que discordam da teoria de LAMBROSO pode-se
destacar Enrique FERRI considerado o criador da ‘Sociologia Criminal’(1880) e
Rafael GAROFALO, autor do livro ‘Criminologia’ (1885). FERRI ao estudar o
crime sob um aspecto sociológico concluiu que o homem só é criminoso porque
ele convive em sociedade. Sendo assim, a responsabilidade seria social e haveria
a possibilidade de ressocialização do agente delitivo. Já GARAFALO,
considerado o iniciador da fase jurídica do positivismo, sustentava que o homem
tem dois sentimentos básicos: a piedade e a probidade (justiça), e que o crime é a
violação desses sentimentos.78
De acordo com os ensinamentos de César SILVA, os principais
fundadores da Escola Positiva são seguramente LOMBROSO, FERRI e
GARAFALO e, suas teorias contribuíram para o desenvolvimento científico do
Direito Penal, dentre os quais podemos citar:
a) o estudo cientifico do direito com o implemento de novas experiências com o
criminoso; b) o nascimento da criminologia, que passou a estudar o criminoso e o crime
por ele praticado; c) a preocupação com a vítima, que daria impulso para o
aparecimento da vitimologia; d) o estudo cientifico da aplicação das penas fazendo
surgir a idéia das medidas de segurança, suspensão condicional da pena e livramento
condicional.79
A história mais recente nos mostra que na grande maioria dos
ordenamentos jurídicos vigentes, a exemplo do ordenamento brasileiro, o Direito
Penal tornou-se um importante instrumento de manutenção da ordem social, e
não apenas e tão somente, um meio pelo qual Estado concebe o ‘monopólio do
77
SILVA, C. D. M. Op. cit., p. 28.
MIRABETE, Op. cit., p. 39- 40.
79
SILVA, C. D. M. Op. cit., p. 29.
78
21
uso da força e o direito-dever de punir’, haja vista, que tais legislações estão
baseadas na valorização da pessoa humana, ainda que apenas formalmente.
4. TEORIAS DA PENA
4.1. TEORIAS JURÍDICAS DA PENA: DISCURSO OFICIAL
Antes de iniciarmos o estudo das teorias da pena, se faz necessário à
distinção entre o ‘conceito’ de pena e a sua ‘função’ propriamente dita.
Francisco Vani BENFICA citando Heleno FRAGOSO, define a pena
como sendo a perda de um bem jurídico imposta ao autor de um delito, ou seja,
um castigo aplicado ao agente delitivo, em decorrência do seu comportamento
antijurídico.80 De acordo com os ensinamentos de Sebastian SOLER, “a pena é
uma sanção aflitiva imposta pelo Estado, através da ação penal, ao autor de uma
infração (penal), como retribuição de seu ato ilícito, consistente na diminuição de
um bem jurídico e cujo fim é evitar novos delitos.”81
Por sua vez, Fernando CAPEZ82 conceitua a pena como:
Sanção penal de caráter aflitivo, imposta pelo Estado, em execução de uma sentença, ao
culpado pela prática de uma infração penal, consistente na restrição ou privação de um
bem jurídico, cuja finalidade é aplicar a retribuição punitiva ao delinqüente, promover a
sua reeducação social e prevenir novas transgressões pela intimidação dirigida a
coletividade.
São diversas as discussões em torno das funções da pena, pois embora esta
tenha um caráter aflitivo, sua real finalidade é a prevenção (geral e especial). Na
prevenção geral, a pena é dirigida a todos os indivíduos da sociedade, pois
procura impedir que estes venham a praticar delitos. Na prevenção especial, a
pena é dirigida ao autor da infração penal, e tem o intuito de tirá-lo do convívio
80
BEMFICA, Francisco Vani. Programa de direito penal: Parte geral. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p.
198.
81
MIRABETE, Op. cit., p. 246. Apud. SOLER, Sebastian. Derecho penal argentino. vol. II. Buenos
Aires: Tipografia Editora Argentina. 1970. p. 342.
82
CAPEZ, Op. cit., p. 332.
22
com a sociedade, impedindo-o de delinqüir e procurando corrigi-lo, para que este
não mais viole as leis.83
Nesse contexto, o Código Penal brasileiro, com a reforma de 1984, passou
a adotar uma natureza mista, isto é, retributiva e preventiva, pois através de seu
art. 59, caput, informa que as penas devem ser necessárias e suficientes à
‘reprovação’ e ‘prevenção’ dos crimes. Nesse caso, de acordo com a legislação
penal brasileira, a pena deverá reprovar o mal produzido pela conduta delitiva do
agente, bem como prevenir que novas infrações penais aconteçam.84
Como já fora dito anteriormente, o Estado é o detentor do ‘poder
punitivo’, e por essa razão, é dele a responsabilidade da aplicação da lei penal.
Sendo assim, na ciência do Direito Penal, a maioria dos doutrinadores
acredita que a pena justifica-se por sua necessidade85, pois trata-se de uma
conseqüência jurídica, uma resposta estatal imposta a todo aquele que praticou
um delito.86
BITENCOURT citando GIMBERNAT ORDEIG descreve que a pena
nada mais é do que um recurso básico, pelo qual o Estado se ocupa, quando
alguém infringe determinada norma jurídica. Ao contar com esse recurso, o
Estado tenta garantir a convivência pacífica entre os membros da sociedade.87
Destarte, que esse direito-dever do Estado em punir todo aquele que descumpre
as suas regras, não é ilimitado88, devendo ser utilizado somente em casos de
‘ultima ratio’.89
83
BEMFICA, Op. cit., p. 199.
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte geral. 4ª ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Impetus,
2004. p. 536-537..
85
BITENCOURT, Op. cit., p. 65.
86
SILVA, Op. cit., p. 158.
87
BITENCOURT, Op. cit., p. 65. Apud. Gimbernat Ordeig. Tiene um futuro la dogmática de la
culpabilidad ? p. 115.
88
NORONHA, Edgar de Magalhães. Curso de Direito Processual Penal. 26ª ed. atualizada. por
Adalberto José Q.T. de Camargo Aranha. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 3.
89
Ver natureza subsidiária do Direito Penal. In GRECO, Rogério. Direito Penal do equilíbrio: uma visão
minimalista do Direito Penal. Rio de Janeiro: Impetus, 2005. p. 83.
84
23
Segundo Damásio de JESUS90, Francisco Vani BENFICA91 e César
SILVA92, devem existir nas penas algumas características básicas, quais sejam:
legalidade, proporcionalidade, personalidade e inderrogabilidade.
O princípio da legalidade penal está disposto no art. 5º, XXXIX da
Constituição Federal e no art. 1º do Código Penal brasileiro. Estes dispositivos
legais descrevem que não haverá crime sem uma lei anterior que o defina, e
somente poderá ser aplicada uma pena se houver uma prévia cominação legal
(nulla poena sine lege).93 Para Francisco de Assis TOLEDO, “O princípio da
legalidade, segundo o qual nenhum fato pode ser considerado crime e nenhuma
pena criminal pode ser aplicada, sem que antes desse mesmo fato tenham sido
instituídos por lei o tipo delitivo e a pena respectiva, constitui uma real limitação
ao poder estatal de interferir na esfera das liberdades individuais.”94 Ainda que
um ato praticado seja danoso e imoral para a sociedade, a este não poderá ser
aplicado nenhuma sanção, se não houver uma lei anterior que o preveja como
crime.
A característica da proporcionalidade define que a cada delito praticado
pelo criminoso deverá ser imposta uma sanção proporcional ao mal por ele
causado.95
BECCARIA, assim se manifestou acerca da proporcionalidade das penas:
O interesse geral não é apenas que se cometam poucos crimes, mas ainda que os crimes
mais prejudiciais à sociedade sejam os menos comuns. Os meios de que se utiliza a
legislação para impedir os crimes devem, portanto, ser mais fortes à proporção que o
crime é mais contrário ao bem jurídico e pode tornar-se mais freqüente. Deve portanto,
haver uma proporção entre os crimes e as penas. (...) Bastará, pois, que o legislador
sábio estabeleça divisões principais na distribuição das penas proporcionadas aos crimes
e que, principalmente, não aplique os menores castigos aos maiores delitos. 96
90
JESUS, Damásio Evangelista de. Direito Penal: Parte geral. vol. I, 25ª ed., rev. e atual. São Paulo:
Saraiva, 2002. p. 520.
91
BEMFICA, Op. cit., p. 199.
92
SILVA, Op. cit., p. 158-159.
93
SILVA, Op. cit., p. 158.
94
TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de Direito Penal. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2001.
p.21.
95
SILVA, Op. cit., p. 159.
96
BECCARIA, Op. cit., p. 68-70.
24
Pois bem, para que a pena seja proporcional ao mal causado pelo agente
delitivo, o magistrado deverá seguir os ditames do art.5º da Constituição Federal
e do art. 59 do Código penal brasileiro, que delimitam as circunstâncias judiciais
a serem observadas no momento da fixação da sanção penal. Há que se ressaltar,
diversos julgados acerca do tema em nossos tribunais.97
Destarte, que dessa característica decorre que a pena não poderá ser
aplicada com excesso, muito menos poderá ser demasiadamente branda, mas
para ser proporcional ao mal causado, a sanção penal deverá ser aplicada de
forma apropriada, confiável e justa, buscando sempre promover a tutela
jurisdicional buscada pela sociedade e também reprimir a prática de novos
delitos.98
Nesse contexto, merecem destaque os ensinamentos de BATISTA,
ZAFFARONI, ALAGIA e SLOKAR:
Já que é impossível demonstrar a racionalidade da pena, as agências jurídicas devem,
pelo menos, demonstrar que o custo em direitos da suspensão do conflito mantém uma
proporcionalidade mínima com o grau da lesão que tenha provocado. Temos aí o
princípio da proporcionalidade mínima da pena com a magnitude da lesão. Com esse
princípio não se legitima a pena com retribuição, pois continua sendo uma intervenção
seletiva do poder que se limita a suspender o conflito sem resolvê-lo e, por conseguinte,
conserva intacta sua irracionalidade. Simplesmente se afirma que o direito penal deve
escolher entre irracionalidades, deixando passar as de menor conteúdo; o que ele não
pode é admitir que a essa natureza irracional do exercício do poder punitivo se agregue
um dado de máxima irracionalidade, por meio do qual sejam afetados bens jurídicos de
uma pessoa em desproporção grosseira com a lesão que ela causou.99 [grifos do autor]
Também, a pena deve ser personalíssima, ou seja, deve afetar apenas o
autor do delito. A Constituição Federal (art. 5º, inciso XLV, primeira parte)
determina que “nenhuma pena passará da pessoa do condenado...” Por esta
razão, a imposição de uma pena não poderá estender-se a terceiros que não
tenham contribuído para com o delito.100
97
TACRSP: “A eficácia da pena aplicada esta diretamente ligada ao princípio da proporcionalidade, a fim
de assegurar a individualização, pois quanto mais o Juiz se aproximar das condições que envolvem o fato,
da pessoa do acusado, possibilitando aplicação da sanção mais adequada, tanto mais terá contribuído para
a eficácia da punição” (RJDTACRIM 29/152).
98
GRECO, Rogério. Direito Penal do Equilíbrio: Uma visão minimalista do Direito Penal. Rio de
Janeiro: Impetus, 2005. p. 109-110.
99
ZAFFARONI, et al p.230-231.
100
BEMFICA, Op. cit., p. 199.
25
Por fim, descreve-se que a pena deverá ser inderrogável, ou seja, deverá
haver certeza na sua aplicação e no seu cumprimento. Cesare BECCARIA ao
discorrer sobre o assunto assevera:
O rigor do suplício não é o que previne os delitos com maior segurança, porém a certeza
da punição, o zelo vigilante do juiz e essa severidade inalterável que só é uma virtude
no magistrado quando as leis são brandas. A perspectiva de um castigo moderado,
porém inflexível, provocará sempre uma impressão mais forte do que o vago temor de
um suplício horrendo, em relação ao qual aparece alguma esperança de impunidade. 101
Nesse caso, pode-se dizer que no momento em que o agente delitivo
comete uma infração penal, o Estado tem o dever de impor-lhe uma sanção.
Porém, haverá situações em que a pena poderá ser abrandada, como nos casos de
extinção da punibilidade, perdão judicial, etc.
Ante ao exposto, verifica-se que conceitualmente, a pena seria um
‘castigo’ imposto ao agente delitivo. Todavia, isso não quer dizer que a pena tem
apenas e tão somente uma função retributiva102, pois, de acordo com o que foi
proposto nesse capítulo, verifica-se que existem diversas teorias que tentam
justificar a finalidade das penas. Sinteticamente falando, podemos dividi-las em
teorias absolutas ou retributivas, teorias relativas ou preventivas (prevenção geral
e prevenção especial) e as teorias mistas, também conhecidas por ecléticas ou
unificadoras103. Dito isto, passaremos ao exame e as críticas a cada uma dessas
teorias.
4.1.1. TEORIAS ABSOLUTAS: PENA COMO RETRIBUIÇÃO
As teorias absolutas tiveram origem a partir da idéia do Talião104 (olho por
olho, dente por dente), pois partem da concepção de igualdade da reprimenda em
relação ao mal causado pelo crime. Ou seja, na reprovação do crime existe um
caráter retributivo, onde a pena nada mais é que um mal justo utilizado para punir
101
BECCARIA, Op. cit., p. 64.
BITENCOURT, Op. cit., p. 66
103
JUNQUEIRA, Gustavo Octaviano Diniz. Direto Penal: Coleção elementos do direito. São Paulo:
Siciliano Jurídico, 2003. p. 103.
104
JUNQUEIRA, Op. cit., p. 103
102
26
um mal injusto praticado pelo agente delitivo (punitur quia peccatum est).105
Assim, segundo o entendimento do professor italiano Luigi FERRAJOLI, “são
teorias absolutas todas aquelas doutrinas que concebem a pena como fim em si
própria, ou seja, como “castigo”, “reação”, “reparação” ou, ainda, “retribuição”
do crime, justificada por seu, intrínseco valor axiológico, vale dizer, não por
meio, e tampouco um custo, mas, sim, um dever ser metajurídico que possui em
si seu próprio fundamento.”106
Ademais, de acordo com os precisos ensinamentos de ROXIN107:
A teoria da retribuição não encontra o sentido da pena na perspectiva de algum fim
socialmente útil, senão em que mediante a imposição de um mal merecidamente se
retribui, equilibra e espia a culpabilidade do autor do fato pelo cometido. Se fala aqui de
uma teoria ‘absoluta’ porque para ela o fim da pena é independente, ‘desvinculado’ de
seu efeito social. A concepção da pena como retribuição compensatória realmente já é
conhecida desde a antiguidade e permanece viva na consciência dos profanos com uma
certa naturalidade: a pena deve ser justa e isso pressupõe que se corresponda em sua
duração e intensidade com a gravidade do delito, que o compense. Detrás da teoria da
retribuição se encontra o velho princípio do Talião.
Entre os defensores da teoria absolutista ou retribucionista da pena estão
dois dos maiores pensadores do idealismo alemão: Immanuel KANT, cujas idéias
acerca do referido tema estão demonstradas na obra ‘A metafísica dos costumes’,
e Friedrich HEGEL, que também trata do assunto exposto em seus ‘Princípios da
Filosofia do Direito.’108 Todavia, há uma diferença significativa entre ambos os
enunciados, haja vista, que enquanto em KANT a fundamentação tem um caráter
ético, em HEGEL a fundamentação é de cunho jurídico.109 Para estes dois
autores, a pena nada mais é que uma conseqüência justa e necessária, que tem
como fim punir um delito praticado, entendida segundo KANT, como sendo uma
necessidade ética, onde a pena é um imperativo categórico exigido pela razão e
105
TASSE, Adel El. Teoria da pena: pena privativa de liberdade e medidas complementares – um estudo
crítico à luz do estado democrático de direito. 1ª ed., 2ª tir. Curitiba: Juruá, 2004. p. 66.
106
FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2006. p.236.
107
ROXIN, Claus. Derecho Penal: Parte General – Fundamentos. La estructura de la Teoria del Delito.
Tomo I. Traducción de la 2ª edición alemana y notas por Diego-Manuel Luzón Pena; Miguel Diaz y
Garcia Conlledo; Javier de Vicente Remesal. Madri: Thomson Civitas, 2003., p. 81-82.
108
BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. São Paulo: RT,
1993. p. 102.
109
BITENCOURT, Manual de Direito Penal... p. 69.
27
pela justiça e, de acordo com HEGEL, como uma necessidade lógica, que se
funda na negação do crime e afirmação da pena.110
Em resumo, tanto KANT quanto HEGEL atribuem um conteúdo talional à
pena. Para KANT, o delinqüente deve ser penalizado pela simples prática de um
delito, ou seja, pela simples infringência da lei penal, sem que para isto seja
necessário verificar qualquer consideração sobre a utilidade da pena aplicada ao
agente delitivo, ou aos demais membros da sociedade. Nesse caso, KANT
acredita que a pena nada mais é do que uma retribuição moral, derivada da
infringência da lei penal, ante a prática de um delito.
111
Pode-se dizer que de
acordo com os ensinamentos de KANT, somente através da pena se pode realizar
a justiça, e restabelecer a ordem jurídica quebrada.112
Nesse ideário, BITENCOURT descreve o famoso exemplo que KANT
elaborou para descrever a sua crença no império da justiça:
Se uma sociedade civil chegasse a dissolver-se, com o consentimento geral de todos os
membros, como por exemplo, os habitantes de uma ilha decidissem abandoná-la e
dispersar-se, o último assassino mantido na prisão deveria ser executado antes da
dissolução, a fim de que cada um sofresse a pena de seu crime, e que o homicídio não
recaísse sobre o povo que deixasse de impor esse castigo, pois poderia ser considerado
cúmplice desta violação pura da justiça.113
Já a tese de HEGEL, pode ser resumida em sua célebre frase: “a pena é a
negação da negação do Direito.” Ou seja, HEGEL estabeleceu um método
dialético que fazia da pena, a reafirmação do direito ofendido, pois, se o delito é
a negação do direito, e, por sua vez este fere o ordenamento jurídico, a pena nada
mais é que a negação do crime, e, como a negação da negação resulta na
afirmação, a pena nada mais é que a reafirmação do direito.114
Segundo Salo de CARVALHO, para HEGEL a pena: “será justificada
pela necessidade de recompor o direito com uma violência correspondente àquela
perpetrada contra o ordenamento jurídico. O delito, percebido como lesão à
110
ALBERGARIA, Jason. Das penas e da execução penal. Belo Horizonte: Del Rey, 1996. p. 20-21.
BITENCOURT, Manual de Direito Penal... p. 73.
112
BITENCOURT, Falência da pena de prisão... p.105 e 107.
113
BITENCOURT, Falência da pena de prisão... p.105.
114
BITENCOURT, Falência da pena de prisão... p. 106-107.
111
28
ordem jurídica, deveria neutralizado através de uma força correspondente.”115
Outrossim, para HEGEL a pena não tem o condão de fazer justiça, mas
sim esta justificada ante a necessidade de se restaurar a ordem jurídica violada
(vontade geral), que foi quebrada pela vontade do delinqüente. Portanto, para
HEGEL, a pena é a lesão imposta ao agente delitivo, que tem o intuito de
compensar o delito praticado e recuperar o equilíbrio jurídico violado116.
Nesse sentido, Paulo QUEIROZ nos ensina que: “a pena para Hegel
apresenta-se, em conclusão, como condição lógica inerente à existência mesma
do direito, que não pode permanecer sendo direito senão pela negação da vontade
particular do delinqüente, representada pelo delito, pela vontade geral (da
sociedade) representada pela lei.”117
Além de KANT e HEGEL, existem outros defensores da teoria absoluta
da pena, dentre eles podemos destacar de maneira exemplificativa: CARRARA,
MEZGER e WELZEL118.
Sendo assim, de acordo com as teorias absolutistas, todo o sentido da pena
esta centrado na retribuição (poena absoluta ab effectu)119, tal qual era na idéia do
talião, pois a culpa do autor do delito deverá ser reparada com a imposição de um
castigo, que é a pena120.
Dito isto, pode-se dizer que a teoria da retribuição deve ser repudiada, haja
vista que, nessa concepção, não interessa se a pena aplicada vai gerar algum
115
CARVALHO, Op. cit., p. 120.
BITENCOURT, Manual de Direito Penal... p. 72.
117
QUEIROZ, Paulo. Funções do Direito Penal. Legitimação Versus Deslegitimação Do Sistema Penal.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 23.
118
BITENCOURT, Manual de Direito Penal... p. 74. - A concepção de Carrara aproxima-se por demais
da tese de Hegel, pois descreve que “o fim primário da pena é o restabelecimento da ordem externa da
sociedade”. Carrara ainda descreve que afim de que sejam evitadas novas ofensas por parte do criminoso,
é preciso que a pena imposta seja capaz de “reparar este dano com o restabelecimento da ordem, que se
vê alterada pela desordem do delito” (Apud. CARRARA, Francesco. Programa de Direito Criminal, vol.
I, trad. Ortega Torres, Bogotá: Temis, 1971. p. 615). Segundo Mezger a pena é “a irrogação de um mal
que se adapta à gravidade do fato cometido contra a ordem jurídica. É portanto, retribuição e,
necessariamente, a privação de bens jurídicos”. (Apud. MEZGER, Edmund. Tratado de Derecho Penal.
trad. José Arturo Rodriguez Muñoz. Madrid: Revista de Derecho Privado, 1935.) Para Welzel, “a pena
aparece presidida pelo postulado da retribuição justa, isto é, que cada um sofra o que os seus atos
valem”. (Apud. WELZEL, Hans. Derecho Penal alemán. trad. Juan Bustos Ramirez e Sergio Yáñez
Perez. Santiago: Ed. Jurídica de Chile, 1970. p.326.)
119
ALBERGARIA, Op. cit., p. 21.
120
BITENCOURT, Manual de Direito Penal... p. 68.
116
29
benefício, como a pacificação social ou a redução da violência, mas apenas que
esta pena venha a compensar o mal praticado121.
Também, não é verdade que somente com a retribuição de um mal (pena)
poderá se fazer justiça. A pena é um dos meios, mas não é o único, como afirma
Paulo QUEIROZ:
Também a idéia de retribuição pressupõe a necessidade mesma da pena, pois
fundamenta algo que já é dado, previamente, como existente e válido. Não responde à
indagação sobre quais os pressupostos que devem orientar a punição de uma conduta,
nada diz sobre qual deva ser seu conteúdo, e nada refere sobre quais ações passíveis de
repressão, ou, ainda, sobre a melhor forma de enfrentá-las, supondo-a simplesmente
como imperiosa e inevitável. Logo, tal teoria de modo algum explica porque se deva
impor a pena a alguém, ao invés de, por exemplo, perdoá-lo ou simplesmente censurá-lo
ou porque não se optar por um outro instrumento de controle social que não a pena, bem
como sobre qual a pena aplicável em cada caso.122
Ora, uma pena meramente retributiva, esgota a sua finalidade apenas no
sofrimento que é imposto ao agente delitivo, como compensação do mal por ele
praticado, não visa qualquer tipo de socialização ou ressocialização desse
indivíduo e muito menos restaura a paz social afetada pelo crime.123
Portanto, uma pena baseada apenas na teoria da retribuição de nada serve
para conter a criminalidade, nem tampouco, se preocupa com aqueles que de
alguma forma infringiram a lei, pois uma vez jogados ao cárcere, sairão piores do
que entraram, e conseqüentemente voltarão a delinqüir.
4.1.2. TEORIAS RELATIVAS: PENA COMO PREVENÇÃO
Embora a pena tenha um caráter aflitivo, podemos verificar alguns
aspectos que nos mostram a passagem de uma finalidade meramente retributiva,
para uma preventiva.124 Nas teorias relativas, a pena não visa apenas retribuir o
crime praticado pelo delinqüente, mas sim prevenir que este venha a cometê-los
novamente. Sendo assim, nas teorias preventivas o castigo imposto ao agente
121
JUNQUEIRA, Op. cit., p.103.
QUEIROZ, Op. cit., p. 27.
123
DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito Penal Português: Parte Geral II - As conseqüências jurídicas do
crime. Lisboa: Editorial Notícias, 1993. p. 95-96.
124
BEMFICA, Op. cit., p. 199.
122
30
delitivo não se funda em buscar a justiça, e sim, se dá em função de tentar inibir,
tanto quanto possível, a prática de novos delitos.125 De acordo com FERRAJOLI,
são teorias ‘relativas’, “todas as doutrinas utilitaristas, que consideram e
justificam a pena enquanto meio para a realização do fim utilitário da prevenção
de futuros delitos.”126 [grifo do autor]
Nas teorias relativas, o fim da pena divide-se em duas direções: teoria da
prevenção geral e teoria da prevenção especial (individual). Foi Hans- Heinrich
JESCHECK quem desenvolveu o critério da dupla eficácia preventiva da pena,
ao proclamar que a prevenção geral aspira a prevenir os crimes em toda
sociedade, e a prevenção especial ou individual é direcionada especificamente ao
criminoso. O período que o delinqüente fica cumprindo a pena serve para afastálo da sociedade, evitando assim, que este venha a praticar novos delitos, e
também que o mesmo seja readaptado (ressocializado) para voltar ao convívio da
sociedade.127
A seguir, as duas formas de prevenção serão analisadas separadamente.
4.1.2.1 DA PREVENÇÃO GERAL
Na prevenção geral, a pena é dirigida a todos os destinatários da norma
penal, e tem o cunho de tentar impedir que membros da sociedade venham a
praticar crimes, violando assim a norma penal.128 Entre os defensores dessa teoria
destacam-se: BECCARIA, BENTHAM, FEUERBACH e SCHOPENHAUER.
Mas foi Ludwig FEUERBACH o formulador da “teoria da coação psicológica”.
Esta teoria sustentava que através da ameaça de uma pena (coação psicológica), o
Direto Penal conseguiria dar cabo do problema da criminalidade.129
Nessa concepção, a partir do momento que o Direito Penal avisa aos
destinatários da norma, quais são as infrações penais a serem por ele combatidas,
125
BITENCOURT, Manual de Direito Penal... p. 75.
FERRAJOLI, Op. cit., p. 204.
127
ALBERGARIA, Op. cit., p. 20.
128
BEMFICA, Op. cit., p. 199.
129
BITENCOURT, Manual de Direito Penal... p. 76.
126
31
e as respectivas sanções a serem aplicadas, caso estas sejam praticadas, a ameaça
de uma pena passa efetivamente a exercer uma coerção psicológica na mente dos
cidadãos, para que estes através do uso de sua razão, não pratiquem crimes. Ou
seja, a pena através de uma coação psicológica produz no individuo uma espécie
de motivação para que este venha a se abster de praticar delitos, substituindo
assim, o poder da coação física (poder sobre o corpo), pelo poder da coação
sobre o psique (poder sobre a alma).130
Nesse sentido, Jorge de Figueiredo DIAS ensina que,
O denominador comum das doutrinas da prevenção geral radica, como se sabe, na
concepção da pena como instrumento político-criminal destinado a atuar
(psiquicamente) sobre a generalidade dos membros da comunidade, afastando-os da
prática de crimes através da ameaça penal estatuída pela lei, da realidade da aplicação
judicial das penas e da efetividade da sua execução. 131
Em similar posicionamento acerca do tema, Damásio de JESUS descreve
que: “Na prevenção geral o fim intimidativo da pena dirige-se a todos os
destinatários da norma penal, visando impedir que os membros da sociedade
pratiquem crimes.”132
Outrossim, pode-se estudar a teoria da prevenção geral sob dois aspectos
distintos: prevenção geral positiva e prevenção geral negativa.
A prevenção geral positiva ou de ‘integração’ é vista pela maioria da
doutrina como instrumento utilizado pelo Estado para informar e reafirmar a
sociedade em geral, a necessidade de respeito e fidelidade as suas normas.133
Juarez CIRINO ao citar os ensinamentos de Günther JAKOBS, descreve que “a
aplicação/execução concreta da pena criminal cumpriria a função de estabilizar
as expectativas normativas da comunidade.”134 E ainda, para JAKOBS “a missão
da pena é a conservação da norma como modelo de orientação para os contatos
130
BITENCOURT, Manual de Direito Penal... p. 76-77.
DIAS, Jorge de Figueiredo. Questões fundamentais do Direito Penal revisitadas. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 1999. p. 98-99.
132
JESUS, Op. cit., 519.
133
JUNQUEIRA, Op. cit., p.104.
134
SANTOS, Juarez Cirino dos. Novas hipóteses de criminalização. Disponível em: <http://www.cirino.
com.br/artigos/jcs/novas_hipoteses_criminalizacao.pdf>. Acesso em 20 de agosto de 2008.
131
32
sociais. O conteúdo de uma pena é uma réplica que tem lugar a custo do infrator,
frente ao questionamento da norma.”135
Concretamente, considera Figueiredo DIAS que pela prevenção geral
positiva ou de integração, a pena pode ser concebida:
Como forma de que o Estado se serve para manter e reforçar a confiança da
comunidade na validade e na força de vigência das suas normas de tutela de bens
jurídicos e, assim, no ordenamento jurídico-penal; como instrumento por excelência
destinado a revelar perante a comunidade a inquebrantabilidade da ordem jurídica,
apesar de todas as violações que tenham tido lugar.136
Já na prevenção geral negativa ou prevenção por ‘intimidação’, aplica-se a
pena ao agente delitivo, na tentativa de inibir que outros membros da sociedade
venham a delinqüir.
De acordo com Michel FOUCAULT, o povo era o principal personagem
para a realização das cerimônias dos suplícios, pois: “Um suplício que tivesse
sido conhecido, mas cujo desenrolar houvesse sido secreto, não teria sentido.
Procurava-se dar o exemplo não só suscitando a consciência de que a menor
infração corria sério risco de punição; mas provocando um efeito de terror pelo
espetáculo do poder tripudiando sobre o culpado (...) As pessoas não só têm que
saber, mas também ver com seus próprios olhos. Porque é necessário que tenham
medo; mas também porque devem ser testemunhas e garantias da punição, e
porque até certo ponto devem tomar parte dela.”137
Segundo Winfried HASSEMER, na prevenção geral negativa ou por
intimidação: “existe a esperança de que os concidadãos com inclinações para a
prática de crimes possam ser persuadidos, através da resposta sancionatória à
violação do Direito alheio, previamente anunciada, a comportarem-se em
conformidade com o Direito; esperança, enfim, de que o Direito Penal ofereça
sua contribuição para o aprimoramento da sociedade.”138
135
Assim esta disposto no texto original: “La misión de la pena es el mantenimiento de la norma como
modelo de orientación para los contactos sociales. Contenido de la pena es una replica que tiene lugar a
costa del infractor, frente al cuestionamiento de la norma” (JAKOBS GÜNTHER . “ Derecho Penal, Parte
Genaral, Fundamentos y Teoría de la Imputación”. Editorial Marcial Pons Madrid 1995 p.14.)
136
DIAS, Questões fundamentais... p.99.
137
FOUCALT, Michel. Op. cit., p. 49.
138
GRECO, Curso de Direito Penal... p. 538.
33
Conclui-se, que a prevenção geral negativa é vislumbrada como forma de
intimidação dos demais membros da sociedade, usando o apenado como
exemplo. E na prevenção geral positiva pune-se o agente que praticou o ato
delitivo, para reforçar que estas normas estão em plena vigência e que por isso
devem ser obedecidas.
4.1.2.2. DA PREVENÇÃO ESPECIAL
BITENCOURT, ao citar Hans-Heinrich JESCHECK descreve que vários
são defensores de uma postura preventivo-especial da pena. Na França, destacase a teoria da ‘Nova Defesa Social’, de MARC ANCEL; na Alemanha, a teoria
da prevenção especial foi introduzida por VON LISZT; e por fim, na Espanha, a
representante da teoria da prevenção especial foi a Escola Correcionalista, de
inspiração Krausista.139
Pode-se dizer que na prevenção especial, a pena é direcionada ao autor do
delito, fazendo que este seja retirado do convívio da sociedade, ou apenas seja
advertido para que não mais volte a violar a norma penal.140
Nesta seara, Francisco MUÑOZ CONDE descreve que:
Lãs teorias de la prevención especial ven el fin de la pena en apartar al delincuente de la
comisión de futuros delitos, bien a través de su corrección y educación, bien a través de
su asseguramiento. Su principal representante fue Franz von List, quien consideró al
delincuente como el objeto central del derecho penal y a la pena como uma institución
que se dirige a su corrección o asseguramiento.141
De acordo com o jurista Nicanor PASSOS, a prevenção especial é o meio
pelo qual se é usado para retirar o agente delitivo do convívio social, pois o fato
deste ter cometido um delito, por si só já demonstra a sua periculosidade e,
consequentemente a necessidade de uma ‘reeducação’ ou ‘readaptação’, para só
então voltar a conviver em sociedade.142
139
BITENCOURT, Manual de Direito Penal... p. 80.
BITENCOURT, Manual de Direito Penal... p. 79.
141
MUÑOZ CONDE, Francisco. Introducción al Derecho Penal - Colección: Maestros del Derecho
Penal, nº 3. Argentina/Buenos Aires: IbdeF, 2003. p. 72.
142
PASSOS, Nicanor Sena. Prisões. Revista Jurídica Consulex. Brasília: Editora Consulex, ano I, nº 7,
jul. 1997.
140
34
Sendo assim, pode-se dizer que a teoria da prevenção especial não visa a
intimidação de toda a sociedade, muito menos busca a retribuição do mal
causado pelo agente delitivo. Sua pretensão é em prol daquele indivíduo que já
praticou o delito, pois tenta evitar que este volte a delinqüir.143 Segundo Luigi
FERRAJOLI, a teoria da prevenção especial segue tendências, dentre as quais, as
‘teleológicas da diferenciação da pena’, pois, por mais variadas que sejam suas
matrizes ideológicas, suas orientações são voltadas não tanto em relação aos
fatos, ou ao crime em si, mas em relação a seus autores (agentes delitivos),
diferenciados pelas suas características pessoais, antes mesmo de serem
verificadas as suas infrações penais.144
Sérgio SHECAIRA e Alceu CORRÊA JUNIOR acreditam que a
prevenção especial:
Pode representar uma idéia absolutista, arbitrária, ao querer impor uma verdade única,
uma determinada escala de valores e prescindir da divergência, tão cara às modernas
democracias. Suas qualidades, por outro lado, são inescondíveis. Esta teoria tem um
caráter humanista, pois põe um acento no indivíduo, considerando suas particularidades,
permitindo uma melhor individualização do remédio penal. Além disso, sua atuação
específica permite o aperfeiçoamento do trabalho de reinserção social. 145
A seu turno, também, pode-se estudar a teoria da prevenção especial, sob
dois aspectos distintos, quais sejam: prevenção especial positiva e prevenção
especial negativa.
Pela prevenção especial positiva, busca-se a ressocialização do criminoso,
mediante a sua correção. Ou seja, nessa concepção a pena é direcionada ao
tratamento do próprio criminoso, com o fim de incidir sobre a sua personalidade,
e evitar a sua reincidência.146 Verifica-se, nesse contexto o caráter ressocializador
da pena, fazendo com que o criminoso venha a meditar sobre o crime que
cometeu, ponderando sobre as conseqüências, inibindo-o assim de cometer novos
143
BITENCOURT, Manual de Direito Penal... p. 81.
FERRAJOLI, Op. cit., p. 214.
145
SCHECAIRA, Sérgio Salomão; CORRÊA JUNIOR, Alceu. Pena e Constituição. São Paulo: Ed. RT,
1995. p. 100.
146
NERY, Déa Carla Pereira. Teorias da pena e sua finalidade no direito penal brasileiro. Disponível
em: <http://www.uj.com.br/publicacoes/doutrinas/default.asp?action=doutrina&iddoutrina=2146> acesso
em 20 de fevereiro de 2008.
144
35
delitos.147 Segundo Claus ROXIN, pela prevenção especial, “a missão da pena
consiste unicamente em fazer com que o autor desista de cometer futuros
delitos.”148 Ou seja, a finalidade preventivo-especial da pena se traduz na
‘prevenção da reincidência’.149
Por sua vez, pela prevenção especial negativa ou de ‘inocuização’, ocorre
a neutralização daquele que praticou o ato delitivo, através da sua segregação ao
cárcere. A retirada do agente delitivo do convívio com a sociedade, o impede de
cometer novos delitos. Deve-se, ressaltar, que essa neutralização do agente
delitivo ocorre somente nos casos em que a ele for aplicada uma pena privativa
de liberdade.150
De acordo com BATISTA, ZAFFARONI, ALAGIA e SLOKAR:
Para a prevenção especial negativa, a criminalização também visa a pessoa
criminalizada, não para melhorá-la, mas para neutralizar os efeitos de sua inferioridade,
à custa de um mal para a pessoa, que ao mesmo tempo é um bem para o corpo social.
Em geral, ela não se enuncia como função manifesta exclusiva, mas sim em
combinação com a anterior: quando as ideologias re fracassan ou são descartadas,
apela-se para neutralização e eliminação. 151
Figueiredo DIAS ensina que a prevenção especial negativa logra alcançar
um efeito de pura defesa social através da separação ou segregação do
delinqüente, pois só assim se pode atingir a necessária neutralização da sua
periculosidade social.152 Ou seja, a prevenção especial negativa visa neutralizar
uma possível reincidência, daquele que já praticou anteriormente uma infração
penal, através de sua ‘inocuização’ ou ‘intimidação’.153
Conclui-se, portanto, que a prevenção especial negativa pretende afastar o
autor de futuros delitos, do corpo social (demais membros da sociedade),
147
GRECO, Curso de Direito Penal... p. 538.
ROXIN, Op. cit., p.85.
149
DIAS, Questões fundamentais... p.103.
150
GRECO, Curso de Direito Penal... p. 538.
151
ZAFFARONI, et al. Direito Penal Brasileiro... p. 127.
152
DIAS, Questões fundamentais... 103.
153
NERY, Déa Carla Pereira. Teorias da pena e sua finalidade no direito penal brasileiro. Disponível
em: <http://www.uj.com.br/publicacoes/doutrinas/default.asp?action=doutrina&iddoutrina=2146> acesso
em 20 de fevereiro de 2008.
148
36
mediante a reclusão, intimidação, neutralização e eliminação desses indivíduos
infratores.
4.1.3. TEORIAS MISTAS, UNIFICADORAS OU COMBINATÓRIAS
MERKEL, no início do século, foi o primeiro doutrinador a trabalhar na
Alemanha com a idéia de uma teoria mista, e desde então, sua concepção tornouse quase que dominante entre as legislações.154 Inclusive, o atual Código Penal
brasileiro, após a reforma de 1984, em seu art 59, caput, passou a atribuir a pena
um caráter misto (reprovar e prevenir), pois define a pena como sendo de
natureza retributiva e preventiva.155
As teorias unificadoras ou mistas, também chamadas por ZAFFARONI de
combinatórias156, tentam mesclar em um único conceito, preceitos das teorias da
retribuição e da prevenção157, objetivando assim, superar as deficiências
individuais de cada teoria, através da fusão das funções da pena criminal no
tocante a retribuição, prevenção geral e prevenção especial.158
Nesse contexto, o professor Adel El TASSE ao citar Francisco MUÑOZ
CONDE descreve que as teorias unificadoras, baseadas na fusão das correntes
absolutas com as correntes relativas, afirmam que, “por detrás destas,
aparentemente inconciliáveis posições se defende na atualidade uma postura
intermediária que objetiva conciliar os extremos, tendo a idéia de retribuição
como base, porém lhe acrescendo também o complemento dos fins preventivos,
tanto gerais como especiais”
154
159
, observando ainda que “as teorias unificadoras
BITENCOURT, Manual de Direito Penal... p. 82.
CÓDIGO PENAL. Assim dispõe o Art. 59, caput, do referido diploma legal: “O juiz, atendendo à
culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, os motivos, às circunstancias
e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja
necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime: I – as penas aplicáveis dentre as
cominadas; II – a quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos; III - o regime inicial de
cumprimento da pena privativa de liberdade; IV – a substituição da pena privativa de liberdade aplicada,
por outra espécie de pena, se cabível”.
156
ZAFFARONI, et al. Direito Penal Brasileiro... p. 140.
157
BITENCOURT, Manual de Direito Penal... p. 82.
158
CIRINO DOS SANTOS, Juarez. Direito Penal: Parte Geral. 2ª ed. Curitiba: ICPC; Lúmen Júris, 2007.
p. 463-464.
159
TASSE, Op. cit., p. 73. Apud. MUÑOZ CONDE, Francisco. Introducción al Derecho Penal Colección: Maestros del Derecho Penal, nº 3. Argentina/Buenos Aires: IbdeF, 2003. p. 72.
155
37
aparecem na história do direito penal como uma solução para a luta das escolas,
que dividiu os penalistas em dois grupos inconciliáveis: os partidários da
retribuição e os partidários da prevenção, geral e especial”
160
. Nesse caso, a
“sanção penal deve objetivar, simultaneamente, retribuir e prevenir a infração –
punitur quia peccatum ut ne peccetur (pune-se porque pecou e para que não
peque)”. 161
Juarez CIRINO, por sua vez, descreve que a fusão das teorias isoladas da
pena resultaria na ‘retribuição’ do injusto praticado, em razão da compensação
ou expiação da culpabilidade, na ‘prevenção especial positiva’ em face da
correção do agente delitivo pela ação pedagógica da execução penal, além de
‘prevenção especial negativa’ pela neutralização do agente delitivo, em prol da
segurança social e, por fim, na ‘prevenção geral negativa’ em razão da ameaça
penal frente a criminosos potencias, bem como na ‘prevenção geral positiva’ que
reafirma para a sociedade em geral, a necessidade de respeito, fidelidade e
confiança na ordem jurídica vigente. 162
Todavia, Santiago MIR PUIG, ao discorrer sobre as teorias unificadoras,
conclui que através da fusão das teorias da retribuição, da prevenção geral e da
prevenção especial, chegar-se-á apenas a aspectos distintos de um mesmo
fenômeno complexo que é a pena.163
Nessa mesma linha de raciocínio, BITENCOURT164, citando Emilio de
TOLEDO y UBIETO descreve que as teorias unificadoras aplicam severas
críticas sobre as teorias monistas (teorias absolutas e teorias relativas), haja vista,
que a “unidimensionalidade, em um ou outro sentido, mostra-se formalista e
incapaz de abranger a complexidade dos fenômenos sociais que interessam ao
160
TASSE, Op. cit., p. 73. Apud. MUÑOZ CONDE, Op. cit., p. 73.
TASSE, Op. cit., p. 73.
162
CIRINO DOS SANTOS, Juarez. Direito Penal...p. 464.
163
BITENCOURT, Manual de Direito Penal... p. 82. Apud. MIR PUIG, Santiago. Derecho Penal – Parte
General. Barcelona: PPU, 1998. p. 46.
164
BITENCOURT descreve que, “as teorias unificadoras aceitam a retribuição e o princípio da
culpabilidade como critérios limitadores da intervenção da pena como sanção jurídico-penal. A pena não
pode, pois, ir além da responsabilidade decorrente do fato praticado.” (BITENCOURT, Cezar Roberto.
Manual de Direito Penal… p. 83).
161
38
Direito Penal, com conseqüências graves para a segurança e os direitos
fundamentais do Homem.”165
Francisco Vani BENFICA, descreve que mesmo a pena tendo um caráter
aflitivo (retribuição), a sua real finalidade é a prevenção, ou seja, a pena é o meio
pelo qual se busca obter benefícios tanto para o condenado, quanto para a
coletividade.166
Ainda sobre a teoria unificadora, Claus ROXIN descreve que:
A aplicação da pena serve para a proteção subsidiária e preventiva, tanto geral, como
individual, de bens jurídicos e prestações estatais, através de um processo que
salvaguarda a autonomia da personalidade. Pode ver que assim se conserva o princípio
da prevenção geral, reduzindo às exigências de Estado de Direito e completado com os
componentes de prevenção especial da sentença.167
Sendo assim, podemos verificar que nas teorias unificadoras ou mistas, a
pena tem como função a retribuição do mal praticado pelo agente delitivo.
Contudo, a prevenção apresenta-se como função principal, até porque, o Direito
Penal é a ciência que tem como objetivo fundamental, garantir que os indivíduos
vivam em paz e harmonia na sociedade.
4.2. TEORIAS CRÍTICAS: DISCURSO CRIMINOLÓGICO
O discurso criminológico a que se pretende abordar nesse trabalho não é o
regrado na criminologia positivista de LOMBROSO, GAROFFALO e FERRI,
que baseava-se em características biológicas, psicológicas e ambientais
(criminalidade patológica) para diferenciar os indivíduos “normais” dos sujeitos
“criminosos”, mas sim em uma criminologia crítica, que ao mudar de paradigma,
deixa de estudar as causas da criminalidade para então se ater aos processos de
criminalização de determinados indivíduos na sociedade168.
165
BITENCOURT, Manual de Direito Penal... p. 82-83. Apud. TOLEDO Y UBIETO, Emilio Octavio de.
Sobre el concepto de Derecho Penal. Madri: Universidade Complutense, 1981. p. 217.
166
BEMFICA, Op. cit., p. 199.
167
ALBERGARIA, Op. cit., p. 27. Apud. ROXIN, Claus. Iniciacción al derecho penal de hoy.
Universidad de Sevilha, 1981, p.33.
168
BARATTA, Alessandro. Criminologia crítica e crítica do direito penal: introdução à sociologia do
direito penal. Rio de Janeiro: Revan, 1997. p. 29.
39
Os processos de criminalização ou como definem a grande maioria dos
doutrinadores da atualidade de Criminologia Interacionista ou da Reação Social,
nada mais são do que processos de etiquetamento social, ligados intimamente a
criminologia fenomenológica americana do “Labelling Approach”, que teve
como precursores TANNEMBAUM, SUTHERLAND, CICOUREL, ERIKSON,
KITSUSE e BECKER.169
De acordo com estudos feitos pela professora Elena LARRAURI em seu
livro ‘Criminoloía y Derecho: La herencia de la criminologia crítica’, podemos
destacar que:
“Los representantes del labelling approach buscarán apoyo em outra corriente
sociológica que em la década de los sesenta estaba (re) emergindo com fuerza como era el
interaccionismo simbólico. Éste, desarrolhado por la Escuela de Chicago, perdió su
preeminência em la década de los cuarenta y cincuenta debido al ímpetu de las teorías
estructural-funcionalistas elaboradas por la Escuela de Harvard (Downes-Rock, 1988: 166-167),
pero resurge em la criminología de la mano de los teóricos del etiquetamiento.” 170
Sendo assim, podemos verificar que para os teóricos do labelling
approach o crime é apenas um subproduto do controle social, e por isso
defendem que esta não é uma teoria da criminalidade de sim da criminalização,
haja vista que estes, convertem determinados indivíduos de classes subalternas
em delinqüentes, não porque eles tenham realizado uma conduta delitiva, mas
apenas e tão somente porque determinadas instituições sociais, através de um
processo seletivo e discriminatório os etiquetaram como tal.171
Maria DUARTE ao citar Howard BECKER como um dos grandes
expoentes da teoria do labelling approach, descreve que este formulou “a teoria
segundo a qual o crime não é uma qualidade do ato, mas um ato qualificado
como criminoso por agências de controle social. O delinqüente é o indivíduo no
169
DUARTE, Maria Carolina de Almeida. Política criminal, criminologia e vitimologia: caminhos para
um direito penal humanista. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1236, 19 nov. 2006. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9150>. Acesso em: 19 outubro de 2008.
170
LARRAURI, Elena. Criminología y Derecho: La herencia de la criminologia crítica. 2ª edición.
Madri: Siglo Veintiuno de España editores, 1992. p. 25.
171
MOLINA, Antonio Garcia-Pablos de. Criminologia. Tradução: Luiz Flávio Gomes, 4ª ed. rev., atual. e
ampl. – São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 374.
40
qual a etiqueta foi aplicada com sucesso; o comportamento delinqüente é uma
conseqüência da aplicação de regras e sanções pelos outros.”172
Para CIRINO DOS SANTOS173, a partir do labeling approach houve uma
revolução científica da teoria criminológica, haja vista que ao estudar a
criminalidade como fenômeno social produzido por normas e valores, esta
passou a definir o comportamento criminoso como “uma qualidade atribuída por
agências de controle social mediante aplicação de regras e sanções, enquanto
criminoso seria o sujeito ao qual se aplica com sucesso o rótulo de criminoso.”
Já para Alessandro BARATTA174, considerado o pai da criminologia
crítica, o sistema de justiça criminal não existe para combater o crime, como
afirmam os teóricos da criminologia tradicional, mas apenas e tão somente para
garantir um modelo de sistema social, voltado para a criminalização de um
determinado número de condutas e a estigmatização de um determinado grupo de
indivíduos na sociedade.
Michael Löwy175 nos ensina que um dos pilares fundamentais dos
processos de etiquetamento social é o preconceito. Segundo este autor, estudos
da Criminologia Interacionista revelam que o preconceito imbuído nas mentes
humanas é fonte dos estigmas e de estereótipos que transformam os indivíduos
das classes sociais subalternas (moradores de favelas; desempregados; mendigos;
prostitutas; etc...) em seres diferentes que precisam ser isolados e controlados.
Como exemplo desse tipo de estigmatização social podemos citar a obra de Loïc
WACQUANT176, intitulada ‘Punir os pobres: uma nova gestão da miséria nos
Estados Unidos’, que trata da forma como o gueto e a prisão nos Estados Unidos
da América, são instituições que muito se assemelham, pois, ambas são locais de
confinamento forçado. O gueto por ser uma forma de ‘prisão social’. Já a prisão
172
DUARTE, Maria Carolina de Almeida. Política criminal, criminologia e vitimologia: caminhos para
um direito penal humanista. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1236, 19 nov. 2006. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9150>. Acesso em: 19 outubro de 2008.
173
CIRINO DOS SANTOS, Juarez. Novas hipóteses de criminalização. Disponível em:
<http://www.cirino.com.br/artigos/jcs/novas_hipoteses_ criminalizacao.pdf>. Acesso em 20 de agosto de
2008.
174
BARATTA, Alessandro. Criminologia crítica... p. 161.
175
LÖWY, Michael. Ideologias e Ciências Sociais: elementos para uma análise marxista. 10ª ed. São
Paulo: Cortez, 1995, p. 43.
176
WACQUANT, Loïc. Punir os pobres: uma nova gestão da miséria nos Estados Unidos. Rio de
Janeiro: Freitas Bastos, 2001, p. 100.
41
propriamente dita nada mais é que um ‘gueto judiciário’. Ambas tem o intuito de
confinar uma população estigmatizada (rotulada) neutralizando assim a ameaça
material ou simbólica que venham a produzir perante a sociedade sobre a qual
foram destituídas.
Todavia, CIRINO DOS SANTOS ao citar BARATTA afirma que o
movimento do labeling approach (teoria da linguagem), foi condição necessária,
mas não suficiente para a formulação da Criminologia crítica, haja vista que:
“condição necessária porque mostra o comportamento criminoso como conseqüência da
aplicação de regras e sanções pelo sistema penal – e não como qualidade da ação, segundo a
etiologia positivista; mas condição insuficiente, porque incapaz de indicar os mecanismos de
distribuição social da criminalidade, identificáveis pela inserção do processo de criminalização
no contexto das instituições fundamentais das sociedades modernas – relação capital/trabalho
assalariado – suscetível de mostrar que o poder de definir crimes e de atribuir a qualidade de
criminoso corresponde às desigualdades sociais em propriedade e poder das sociedades
contemporâneas.”177 (grifos no original)
Sendo assim, as bases da formação da Criminologia crítica, tanto na
Europa, quanto na América Latina, se deu através da integração de processos
subjetivos de construção social da criminalidade, estudados pelo modelo do
labeling approach, com uma teoria marxista, definida por processos objetivos
estruturais e ideológicos da relação capital/trabalho assalariado178.
De fato, com bem define CIRINO DOS SANTOS, a tese fundamental da
Criminologia crítica é reconhecer que o “sistema penal constituído pela lei,
policia, justiça e prisão – é o aparelho repressivo do moderno Estado capitalista,
garantidor de relações sociais desiguais de produção/distribuição material,
responsáveis pela violência estrutural da marginalização, do desemprego, dos
baixos salários, da falta de moradia, do ensino precário, da mortalidade precoce,
do menor abandonado etc.”179
177
CIRINO DOS SANTOS, Juarez. Novas hipóteses de criminalização. Disponível em:
<http://www.cirino.com.br/artigos/jcs/novas_hipoteses_ criminalizacao.pdf>. Acesso em 20 de agosto de
2008.
178
CIRINO DOS SANTOS, Juarez. A criminologia crítica e a reforma da legislação penal. Disponível
em: <http://www.cirino.com.br/artigos/jcs/criminologia_critica_reforma_legis_ penal.pdf>. Acesso em
julho de 2008.
179 179
CIRINO DOS SANTOS, Juarez. A criminologia crítica e a reforma da legislação penal.
Disponível em: <http://www.cirino.com.br/artigos/jcs/criminologia_critica_reforma_legis_ penal.pdf>.
Acesso em julho de 2008.
42
Segundo Alessandro BARATTA180, o Direito Penal tende a privilegiar os
interesses das classes dominantes e dirige os processos de criminalização para os
atos desviantes típicos dos indivíduos das classes subalternas, haja vista que:
As maiores chances de ser selecionado para fazer parte da “população criminosa”
aparecem, de fato, concentradas nos níveis mais baixos da escala social (subproletariado e
grupos marginais). A posição precária no mercado de trabalho (desocupação, subocupação, falta
de qualificação profissional) e defeitos de socialização familiar e escolar, que são características
dos indivíduos pertencentes aos níveis mais baixos, e que na criminologia positivista e em boa
parte da criminologia liberal contemporânea são indicados como as causas da criminalidade,
revelam ser, antes, conotações sobre a base das quais o status de criminoso é atribuído.
Após estudarmos as funções da pena, pelo viés do discurso defendido
pela Criminologia crítica, tomaremos agora o seguinte curso. Primeiramente, será
apreciada a proposta defendida por Eugenio Raúl ZAFFARONI181 de uma teoria
negativa/agnóstica da pena. Por conseguinte, será apresentada a teoria da pena
como retribuição equivalente do crime, defendida pelo professor Juarez CIRINO
DOS SANTOS182, no qual sintetiza estudos feitos por autores como
PASUKANIS, RUSCHE/KIRCHHEIMER e MELOSSI/PAVARINI.
4.2.1. TEORIA NEGATIVA/AGNÓSTICA DA PENA
A teoria negativa/agnóstica da pena, de acordo com os ensinamentos de
Juarez CIRINO DOS SANTOS ao citar ZAFFARONI, é fundada na
contraposição entre o Estado de Polícia e o Estado de Direito, e estes coexistem
de forma recíproca no Estado moderno, da seguinte forma:
“a) o modelo ideal de estado de policia se caracteriza pelo exercício de poder vertical e
autoritário e pela distribuição de justiça substancialista de grupos ou classes sociais, expressiva
de direitos meta-humanos paternalistas, que suprime os conflitos humanos mediante as funções
manifestas positivas da retribuição e de prevenção da pena criminal, conforme a vontade
hegemônica do grupo ou classe social no poder; b) o modelo ideal de estado de direito se
caracteriza pelo exercício de poder horizontal/democrático e pela distribuição de justiça
procedimental da maioria, expressiva de direitos humanos fraternos, que resolve os conflitos
humanos conforme regras democráticas estabelecidas, com redução ou limitação do poder
punitivo do estado de polícia.” 183 [grifos do autor]
180
BARATTA, Alessandro. Criminologia crítica... p. 165.
ZAFFARONI, et al. Direito Penal Brasileiro... p. 97-113.
182
CIRINO DOS SANTOS, Juarez. Direito Penal... p. 470-476.
183
CIRINO DOS SANTOS, Juarez. Direito Penal... Op. cit., p. 466-467 Apud ZAFFARONI, et al.
Direito Penal Brasileiro... p. 93-100.
181
43
Sendo assim, pode-se dizer que o Estado de Polícia é regido pelas decisões
dos governantes, ou seja, um grupo ou classe hegemônica decide sobre o que é
certo e possível e, as regras estabelecidas tornam-se lei. Já o Estado de Direito
deve ser fraterno, pois tudo que é certo e possível é decidido pela vontade da
maioria, respeitando-se ainda os direitos das minorias, mas ambos devem
submeter-se as regras anteriormente estabelecidas184.
Nesse contexto, ainda descrevem ZAFFARONI e Nilo BATISTA sobre o
Estado de Polícia e o Estado de Direito:
Para o primeiro modelo, submissão à lei é sinônimo de obediência ao governo; para o
segundo, significa acatamento a regras anteriormente estabelecidas. O primeiro pressupõe que a
consciência do que bom pertence à classe hegemônica e, por conseguinte, tende a uma justiça
substancialista; o segundo pressupõe que pertence a todo ser humano por igual e, portanto,
tende a uma justiça procedimental. A tendência substancialista do primeiro o faz pender para
um direito transpersonalista (a serviço de algo meta-humano: divindade, casta, classe, estado,
mercado, etc.); o procedimentalismo do segundo, para um direito personalista (para os
humanos). O primeiro é paternalista: considera que deve castigar e ensinar seus súditos e,
inclusive, tutelá-los ante as suas próprias ações autolesivas. O segundo deve respeitar todos os
seres humanos por igual, porque todos têm uma consciência que lhes permite conhecer o bom e
o possível, e, quando articular decisões de conflitos, deverá fazê-lo de modo a afetar o menos
possível a existência de cada um, conforme seu próprio conhecimento: o estado de direito deve
ser fraterno185.
Partindo-se de um viés científico, pode-se afirmar que a teoria
negativa/agnóstica refuta as teorias jurídicas positivas da pena criminal. Isso se
dá, em razão de no processo de desenvolvimento da teoria negativa/agnóstica,
seus autores terem se afastado das teorias positivistas, por acharem que estas
eram falsas ou não-generalizáveis e, passaram então a reconhecer funções
ocultas/latentes, que limitam a atuação do estado de policia. 186
Nesse sentido, assim descrevem ZAFFARONI e Nilo BATSITA:
(...) apelando para uma teoria negativa ou agnóstica da pena: deve-se ensaiar uma
construção que surja do fracasso de todas as teorias positivas (por serem falsas ou não
generalizáveis) em torno de funções manifestas. Adotando-se uma teoria negativa, é possível
delimitar o horizonte do direito penal sem que seu recorte provoque a legitimação dos elementos
do estado de polícia próprios do poder punitivo que lhe toca limitar. A questão é como obter um
conceito de pena sem apelar para as suas funções manifestas. A este respeito não é tampouco
viável a tentativa de fazê-lo através de suas funções latentes, porque estas são múltiplas e nós
não as conhecemos em sua totalidade (...)187
184
ZAFFARONI, et al. Direito Penal Brasileiro... p. 93.
ZAFFARONI, et al. Direito Penal Brasileiro... p. 93/94.
186
ZAFFARONI, et al. Direito Penal Brasileiro... p. 98.
187
ZAFFARONI, et al. Direito Penal Brasileiro... p. 98.
185
44
Analisando a teoria negativa/agnóstica da pena do ponto de vista políticocriminal, podemos dizer que esta tem como objetivo aumentar a segurança
jurídica para um maior número de indivíduos na sociedade, mediante aumento do
estado de direito e a conseqüente redução do estado de polícia. Nesse sentido, se
faz necessário enaltecer o brilhantismo dos mestres Eugenio Raúl ZAFFARONI
e Nilo BATISTA, haja vista que a teoria negativa/agnóstica da pena criminal, é
considerada uma teoria crítica, humanista e democrática do Direito Penal, capaz
de influenciar projetos de política criminal, assim como no tocante a prática
jurídico-penal no Brasil e em toda a América Latina. Afinal, desenvolver uma
teoria que rejeita como falsas as teorias justificadoras (manisfestas ou declaradas)
da pena criminal e, ao recuperarem um conceito de TOBIAS BARRETO para
definir a pena criminal como “ato de poder político” correspondente ao
“fundamento jurídico da guerra” significa uma ruptura radical e definitiva com o
discurso da lei e ordem tanto pregado pelos Estados. 188
Com isso, finda-se o estudo da teoria agnóstica da pena para darmos
início a análise da teoria da retribuição equivalente.
4.2.2. TEORIA DA RETRIBUIÇÃO EQUIVALENTE
O discurso da teoria materialista/dialética da pena criminal inaugurada
por PASUKANIS em sua obra “A teoria geral do direito e o marxismo (1924)”
189
e desenvolvida por Juarez CIRINO DOS SANTOS
tem por objetivo
demonstrar a natureza real ou latente da retribuição penal nas sociedades
contemporâneas. A criminologia materialista/dialética traz em seu bojo uma
explicação política a cerca da retribuição equivalente, como fenômeno sócioestrutural típico das sociedades capitalistas, que se fundam basicamente na
relação de exploração entre capital e trabalho assalariado190.
188
CIRINO DOS SANTOS, Juarez. Direito Penal... p. 467-468.
A partir dessa obra, PASUKANIS inicia a tradição do pensamento crítico em teoría jurídica e
criminológica, onde passa a inserir contribuições fundamentais da teoría marxista sobre crime e controle
social. (PASUKANIS, Eugeny Bronislavovic. A teoría geral do direito e o marxismo. Tradução de
Soveral Martins Coimbra: Perpectiva Jurídica, 1972. p. 202.)
190
ZAFFARONI, et al. Direito Penal Brasileiro... p. 94/95.
189
45
Com base na teoria da retribuição equivalente, podemos dizer que as
relações econômicas no capitalismo se estruturam da seguinte forma: o salário
pago ao operário é a retribuição equivalente ao trabalho prestado na produção de
bens e serviços; o preço recebido corresponde ás mercadorias vendidas ou
serviços prestados, etc. No campo jurídico, podemos dizer que há retribuição
equivalente no âmbito da responsabilidade civil, quando em face de um dano
causado ocorre uma indenização civil. Já no campo penal “a retribuição
equivalente é instituída sob a forma de pena privativa de liberdade, como valor
de troca do crime medido pelo tempo de liberdade suprimida.”191
Nesse sentido, assim nos ensina PASUKANIS:
A pena proporcionada à culpabilidade representa fundamentalmente, a mesma forma
que a reparação proporcionada do dano. É a expressão aritimética que sobretudo caracteriza o
rigor da sentença (...) A privação de liberdade por um tempo determinado através da sentença do
tribunal é forma específica pela qual o direito penal moderno, isto é, burguês-capitalista, realiza
o princípio da retribuição equivalente. Esta forma está inconscientemente, mas profundamente,
ligada à representação do homem abstracto e do trabalho humano abstracto mensurável pelo
tempo. Não foi por acaso que esta forma de pena foi introduzida e foi considerada como natural
precisamente no século XIX, ou seja, numa época em que a burguesia pôde desenvolver e
afirmar todas as suas características. As prisões e os calabouços também existiram na
Antiguidade e na Idade Média ao lado de outros meios de violência física. Porém, os indivíduos
estavam geralmente detidos aí até à sua morte ou até que pudessem pagar o resgate. 192
Numa mesma linha de raciocínio, CIRINO DOS SANTOS cita a obra
‘Punição e estrutura social’(1939) de Georg RUSCHE e Otto KIRCHHEIMER,
onde estes dois autores da Escola de Frankfurt formulam a tese de que a
“produção tende a descobrir punições que correspondem às suas relações
produtivas”, demonstrando assim a relação mercado de trabalho/sistema de
punição: onde o trabalhador inserido no mercado de trabalho é controlado pelo
regime organizacional da fábrica e o trabalhador desempregado é controlado pelo
regime da prisão. 193
Já Dario MELOSSI e Massimo PAVARINI em sua obra ‘Cárcere e
fábrica’ (1977) definem a relação cárcere/fábrica como a pedra fundamental do
capitalismo, haja vista que as relações de trabalho nas fábricas dependiam da
191
CIRINO DOS SANTOS, Juarez. Direito Penal... p. 473.
PASUKANIS, Eugeny Bronislavovic. A teoría geral do direito e o marxismo. Tradução de Soveral
Martins Coimbra: Perpectiva Jurídica, 1972. p. 202.
193
CIRINO DOS SANTOS, Juarez. Direito Penal... p. 471-472.
192
46
disciplina e do rigor do sistema penal, sendo este a principal instituição de
controle do capitalismo, pois mantinha e reproduzia as relações sociais de
dominação/exploração das classes assalariadas. 194
Pode-se dizer que na sociedade capitalista, a pena é usada como moeda de
troca, ou seja, a pena imposta ao agente delitivo nada mais é do que a retribuição
equivalente ao crime praticado. Sendo assim, a pena equiparada a um valor de
troca, acaba por realizar o princípio jurídico da igualdade formal, haja vista que
fazendo do cárcere uma fábrica de proletários, pois oculta a submissão ao regime
carcerário, como aparelho produtor e disciplinador de indivíduos dóceis e úteis.
Todavia, o salário como retribuição equivalente do trabalho, em um mundo
capitalista, que prega a falácia da igualdade jurídica no momento da pactuação do
contrato de trabalho, “oculta a desigualdade real do processo de produção, em
que a expropriação de mais-valia significa retribuição desigual e a subordinação
do trabalhador ao capitalista significa dependência real, determinada pela coação
das necessidades econômicas, que configuram o cárcere do operário.”195
Nesse sentido assim nos ensina PASUKANIS: “Numa palavra, as relações
entre o Estado e o delinqüente situam-se inteiramente no quadro de um leal
negócio comercial.” Por isso, é muito importante para o agente delitivo, que seja
respeitado o principio da legalidade, pois: “Ele deve saber qual o quantum de
liberdade que deverá pagar em conseqüência do contrato concluído perante o
Tribunal. Ele deve conhecer antecipadamente as condições com base nas quais
deverá ser preso.” 196
Todavia, Juarez CIRINO DOS SANTOS amplia a relação pena
criminal/mercadoria na sociedade capitalista, também para a dimensão do valor
de uso, tendo em vista que este valor de uso da pena criminal consistiria nas
funções preventivas (especial e geral) medido pelo tempo de liberdade suprimida
do apenado, em razão de:
194
MELOSSI, Dario; PAVARINI, Massimo. Cárcere e fabrica: As origens do sistema penitenciário
(séculos XVI – XIX) Rio de Janeiro: Revan, 2006. p. 211-217.
195
CIRINO DOS SANTOS, Juarez. Direito Penal... p. 474-475.
196
PASUKANIS, Eugeny Bronislavovic. A teoría geral do direito e o marxismo. Tradução de Soveral
Martins Coimbra: Perpectiva Jurídica, 1972. p. 205-206.
47
a) a prevenção especial negativa de neutralização do condenado e a prevenção especial
positiva de correção do condenado, vinculam a retribuição equivalente da pena criminal às
funções reais/latentes de disciplina da classe trabalhadora; b) a prevenção geral negativa de
intimidação de criminosos potenciais e prevenção geral positiva de integração/prevenção da
pena criminal, como afirmação da validade da norma, na linha de JOKOBS, ou como afirmação
dos valores comunitários, na linha de ROXIN, vinculam a retribuição equivalente da pena
criminal à funções reais/latentes de preservação da ordem social fundada na relação
capital/trabalho assalariado das sociedades contemporâneas.
Sendo assim, através da teoria da retribuição equivalente, podemos
verificar a universalidade da pena privativa de liberdade, pelo simples fato de que
esta teoria usa o tempo como moeda de troca do crime, e assim, consegue
abranger todos os indivíduos da sociedade, independentemente de qual classe
social eles pertençam.
5. TEORIAS E MOVIMENTOS DA POLÍTICA CRIMINAL MODERNA
As constantes reformas legislativas em matéria penal demonstram que o
Direito Penal não é alheio aos fenômenos e reformas sociais. Tais reformas são
impostas por motivos de conveniência e ordem prática, fazendo surgir novas
teorias e movimentos de Política Criminal, que podem pregar desde uma maior
rigidez no sistema penal vigente, até a sua completa extinção197.
Atualmente, com o fracasso do discurso jurídico-penal surgiram várias
tendências penais e movimentos de política criminal, que preconizam diferentes
metas para a solução do problema da criminalidade, dentre as quais podemos
destacar: o ‘neo-retribucionismo’, o ‘movimento da Lei e ordem (‘law and
order’), o ‘direito penal do inimigo’, a ‘política de “tolerância zero’, o
‘abolicionismo radical’ e o ‘direito penal mínimo’, que serão tratados a seguir198.
197
PIRES, Ariosvaldo de Campos; SALES, Sheila Jorge Selim de. Alguns Movimentos político-criminais
da atualidade. In IBCCRIM, ano 11. nº 42, janeiro-março. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p.
295-296.
198
BIANCHINI, Alice. Os grandes movimentos de Política criminal na atualidade: movimento de lei e
ordem, minimalismo penal e abolicionismo. Disponível em: <http://www.uvb.com.br/main/posgraduacao/
CienciasCriminais/AulasImpressas/PC_Aula_02.pdf>. Acesso em 29 de março de 2008.
48
5.1. O NEO-RETRIBUCIONISMO E O MOVIMENTO DA “LEI E ORDEM”
O neo-retribucionismo é o sistema de Política Criminal que tem como
pilar fundamental a ideologia do movimento ‘Lei e ordem’ (Law and Order)199.
Este movimento surgiu em razão do combate ao aumento da criminalidade
ocorrido nos Estados Unidos da América, principalmente em razão dos
constantes conflitos raciais que ocorreram nos grandes guetos norte-americanos
na década de setenta.
200
Tal movimento (não se pode falar em uma doutrina
estável) de cunho altamente repressivo recomenda que para conter, ou até mesmo
diminuir a criminalidade, é preciso que sejam produzidas um maior número de
tipificações penais. 201
Nesse contexto, são os ensinamentos de Ariosvaldo PIRES e Sheila
SALES, que assim aduzem: “O movimento Law and Order defende o
enrijecimento do sistema penal, por meio do rigor da reação penal: cominação de
penas severas, aumento daquelas já previstas, endurecimento do regime de
execução da pena, ampliação das hipóteses de prisão processual, redução dos
poderes discricionais do juiz para a individualização da pena etc.”202 [sic] [grifo
do autor]
Ou seja, o neo-retribucionismo tem como objetivo principal, a utilização
do sistema penal de maneira cada vez mais intensa (endurecimento do sistema
penal), promovendo assim a criminalização, a punição, a penalização e a
prisão203. Pode-se dizer que para os adeptos do neo-retribucionismo, o fator
‘Justiça’ não é questionado, muito menos a sua adequação, pois as normas devem
ser respeitadas, independentemente da coerência social e da proporcionalidade
aplicada204.
199
O movimento da ‘law and order’ surgiu nos Estados Unidos e na Inglaterra (década de 70/80), como
estratégia política para as campanhas eleitorais de Ronald Reagan e Margareth Tatcher. Seus maiores
representantes foram Van den Haag, Freda Adler e Edward Benfild. (PIRES, Op. cit., p. 298-299)
200
SILVEIRA FILHO, Sylvio Lourenço da. Neoliberalismo, mídia e movimento da lei e da ordem: rumo
ao estado de polícia. In ABPCP – Ciências Penais. ano 2. nº 2 janeiro-junho. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2005. p. 257.
201
PIRES, Op. cit., p. 298-299.
202
PIRES, Op. cit., p. 299.
203
MELO, Yure Gasgarin Soares de. As novas perspectivas do direito penal brasileiro. Rio de Janeiro:
América Jurídica, 2003. p. 21.
204
MELO, Op. cit., p. 21.
49
No Brasil podemos constatar o aparecimento de adeptos deste sistema,
pois existem aqueles que de forma utópica acreditam que o encarceramento tem a
finalidade primordial de retribuir o mal causado pelo criminoso, fazendo com
que este seja ressocializado e, que após cumprir sua pena, tal indivíduo voltará a
viver em sociedade, sem praticar novos delitos.
E seguindo o raciocínio impróprio e inconseqüente dos teóricos da ‘lei e
ordem’, a atual sociedade brasileira (na sua grande maioria), por viver assustada
com o aumento da criminalidade clama de maneira irracional por essa ‘Justiça’
sem freios, pois acredita que um Direito Penal realmente eficaz deve ser regido
por penas rápidas e inflexíveis.
Tais medidas fazem surgir o que os estudiosos no assunto chamam de
‘inchaço legislativo’, que nada mais é do que uma medida irracional e descabida
dos legisladores brasileiros, que agem de maneira precipitada ao tentar satisfazer
os clamores da sociedade, tentando inibir e diminuir a criminalidade através da
simples edição de leis ou aumento das penas a serem aplicadas aos delinqüentes,
criando assim um ‘direito penal simbólico’205.
Todavia, este direito penal simbólico não esta surtindo o efeito esperado,
haja vista que a criminalidade no Brasil vem aumentando drasticamente a cada
dia, fazendo com que o Direito Penal caia no descrédito206. Um exemplo a ser
dado é a Lei dos crimes Hediondos (Lei 8.072/90), que desde a sua entrada em
vigor não reduziu a incidência dos crimes nelas contidos, o que é pior, contribuiu
apenas para a superlotação do sistema carcerário brasileiro207.
Desse modo, Sylvio da SILVEIRA FILHO, ao citar Aury LOPES JR, nos
ensina que com a criação da Lei dos Crimes Hediondos deu-se início a uma
política criminal do terror, visto que: “o Brasil já foi contaminado por esse
modelo repressivista há mais de 10 anos, quando a famigerada Lei dos Crimes
Hediondos (Lei 8072/90), seguida de outras na mesma linha, marcou a entrada
do sistema penal brasileiro na era da escuridão, na ideologia do repressivismo
205
VOLPE FILHO, Carlos Alberto. Quanto mais comportamentos tipificados penalmente, menor o indice
de criminalidade? Jus Navigandi. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=6792>
Acesso em 24 de março de 2008.
206
VOLPE FILHO, Op. cit.,
207
VOLPE FILHO, Op. cit.,
50
saneador. A idéia de que a repressão total vai sanar o problema é totalmente
ideológica e mistificadora.” 208
Nesse contexto, Roberto Carvalho VELOSO, afirma que: “...está
comprovado estatisticamente que a Lei dos Crimes Hediondos não diminuiu o número
de delitos, (...) Ao contrário, tudo indica que uma das causas para as constantes
rebeliões seja a desesperança dos condenados que não têm direito à progressão do
regime prisional, obrigados que são a cumprir pena em regime integralmente
fechado.”209
Alberto Silva FRANCO, com bastante propriedade assim descreveu
acerca da Lei dos Crimes Hediondos:
“Na linha desse entendimento, o legislador constituinte, sob o impacto dos meios de
comunicação de massa, dramatizou a realidade, esquecido de que a violência é cíclica e
de que, enquanto o mundo for mundo, sempre haverá, a sacudi-lo, ondas maiores e
menores, de violência. Assim, em nome do movimento da "Lei e da Ordem", além de
criar uma categoria nova de delitos (os crimes hediondos), equiparou-a a outras espécies
criminosas (tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e terrorismo),
eliminou garantia processual de alta valia (fiança), vedou causas extintivas de
punibilidade expressivas (anistia e graça) e, afinal, atribuiu ao legislador ordinário a
incumbência de formular tipos e cominar penas, numa luta contra o crime, sem
descanso, mas fadada ao insucesso, por seu irracionalismo, passionalidade e
unilateralidade.”210
Ora, não é a falta de leis, muito menos o agravamento ou a aplicação
irrestrita das penas de prisão, que farão com que a criminalidade diminua em
nosso país211, ao contrário, somente através de políticas públicas voltadas a
redução das desigualdades sociais que aqui imperam por mais de 500 anos é que
poderemos almejar um dia resolver este problema.
Mas, enquanto esse dia não chega não se pode fazer do Direito Penal um
instrumento de vingança ou muito menos torná-lo a panacéia para todos os males
da sociedade.
208
SILVEIRA FILHO, Neoliberalismo, mídia e movimento da lei e da ordem... Op. cit., p. 261-262.
VELOSO, Roberto Carvalho. A crise do sistema penitenciário: fator de introdução, no Brasil, do
modelo consensual de Justiça Penal. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4088>
Acesso em 22 de fevereiro de 2008.
210
FRANCO, Alberto Silva. Crimes hediondos. 2. ed. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 1992. p. 34.
211
VELOSO, Roberto Carvalho. A crise do sistema penitenciário: fator de introdução, no Brasil, do
modelo consensual de Justiça Penal. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4088>
Acesso em 22 de fevereiro de 2008.
209
51
5.2. DIREITO PENAL DO INIMIGO
No sistema conhecido como direito ‘Direito Penal do Inimigo’, Gunter
JAKOBS, um dos mais brilhantes discípulos de WELZEL, mantém a posição de
que o Direito Penal tem como função essencial a proteção da norma e somente de
forma indireta deve tutelar os bens jurídicos fundamentais212. Já Eduardo
CRESPO citando CANCIO MELIA descreve que: “O ‘Direito Penal do Inimigo’
se caracteriza, entre outras coisas, por um amplo adiantamento da punibilidade,
pela adoção de uma perspectiva fundamentalmente prospectiva, por um
incremento notável das penas e por um relaxamento ou supressão de
determinadas garantias individuais.”213
Na concepção de Gunter JAKOBS existem dois tipos de Direito Penal, um
para os cidadãos comuns (Direito Penal do cidadão), que agem de acordo com o
disposto na norma, e outro para os inimigos da sociedade (Direito Penal do
inimigo), que nada mais são que indivíduos que se afastaram do direito, e não
mais se mantém fieis ao ordenamento jurídico, pois vivem em constante
desacordo com os ditames do Estado214. Pode-se dizer então, que as regras
atinentes ao Direito Penal do cidadão serão utilizadas quando o autor do fato
delitivo, apesar de ter infringido a norma, oferecer garantias de que se portará
como um cidadão e se manterá fiel ao ordenamento jurídico. Já o Direito Penal
do inimigo deverá ser aplicado quando certos indivíduos ao se incorporarem a
determinadas organizações criminosas, não mais oferecerem garantias de que se
portarão conforme o ordenamento jurídico, pois se distanciaram do Direito de
forma duradoura e não apenas de forma incidental215.
Sendo assim, JAKOBS descreve que: “Quem por princípio se conduz de
um modo desviado não oferece garantia de um comportamento pessoal. Por isso
212
JAKOBS, Günter; CANCIO MELIA, Manuel. Direito Penal do Inimigo: noções e críticas. Org. e
Trad.: André Luis Callegari e Nereu José Giacomolli. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005. p. 22.
213
CRESPO, Eduardo Demetrio. Do “Direito Penal Liberal” ao “Direito Penal do Inimigo”. In Revista
da ABPCP – Ciências Penais. Ano I - nº 1, de julho-dezembro de 2004. p. 11.
214
JAKOBS, Günter; CANCIO MELIA, Manuel. Direito Penal do Inimigo... p. 37.
215
GRACIA MARTÍN, Luis. O horizonte do finalismo e o direito penal do inimigo. Tradução: Luiz
Regis Prado e Érika Mendes de Carvalho. São Paulo: RT, 2007. p. 82.
52
não pode ser tratado como cidadão, mas deve ser combatido como inimigo.”216
Para JAKOBS os principais inimigos são: os criminosos econômicos; os autores
de crimes sexuais; os terroristas e os traficantes de substâncias tóxicas ou
entorpecentes, os traficantes de pessoas e de órgãos etc.217 Ou seja, em geral os
inimigos serão todos aqueles indivíduos que vinculados as uma organização
estruturada, se opõem ao Direito e, desenvolvem suas atividades com
habitualidade e profissionalismo, atividades estas que são típicas do chamado
crime organizado. 218
A esses indivíduos vinculados a organizações criminosas, que se afastam
do ordenamento jurídico de maneira constante e duradoura, o Direito Penal do
inimigo não os considera mais como ‘pessoas’ e sim como ‘inimigos de guerra’,
que devem ser combatidos, sem as garantias processuais do Estado de Direito,
haja vista que sem o status de cidadão ou condição de pessoa, tais indivíduos
serão considerados inimigos, não merecendo assim que o ordenamento jurídico
defenda seus interesses219.
Nesse sentido, assim nos ensina Luis GRACIA MARTÍN:
“A condição de inimigo significa privação e negação da condição de pessoa e sua
consideração como não-pessoa. O Direito Penal “comum” ou do cidadão, porém dirige-se às
pessoas. No Direito Penal do inimigo, por isso, não podem operar os princípios e as regras do
Direito Penal das pessoas, e os inimigos, isto é, as não-pessoas, não podem invocá-los nem
exigir sua observância a seu favor. Nesse sentido, tem razão Cancio quando vê esse Direito
Penal do inimigo como um Direito Penal do autor.” 220
E ainda GRACIA MARTÍN citando Gunter JAKOBS assim descreve:
“A privação e a negação da condição de pessoa a determinados indivíduos, declarados
como inimigos, constituem, pois, o paradigma e o centro de gravidade em torno do qual é
construído o Direito Penal do inimigo como um ordenamento punitivo diferente, excepcional e
autônomo com relação ao Direito Penal comum, da normalidade ou do cidadão. “Os inimigos”
– afirma sem rodeios Jakobs – “são atualmente não-pessoas (Unpersonen)”.” 221
216
JAKOBS, Günter; CANCIO MELIA, Manuel. Direito Penal do Inimigo... p. 49.
GOMES, Luiz Flavio. Direito Penal do inimigo (ou inimigos do Direito Penal) Disponível em:
<http://www.revistajuridicaunicoc.com.br/midia/arquivos/ArquivoID_47.pdf> Acesso em 24 de março de
2008.
218
GRACIA MARTÍN, Op.cit., p. 83.
219
GRACIA MARTÍN, Op.cit., p. 98-99.
220
GRACIA MARTÍN, Op.cit., p. 132. Apud CANCIO, Derecho Penal del Enemigo?, p. 100s.
221
GRACIA MARTÍN, Op.cit., p. 133. Apud JAKOBS, In Eser/Hassemer/Burkhardt, p. 53.
217
53
Pode-se dizer que para JAKOBS, o Direito Penal do inimigo, é um direito
penal excepcional, que contraria todos os direitos e garantias fundamentais do
indivíduo reconhecidas pela maioria das constituições e pelas declarações
internacionais de direitos humanos, haja vista que o inimigo, por não ingressar no
estado de cidadania, não pode ser considerado como pessoa (sujeito de direito) e,
por conseguinte, não é beneficiário de tais garantias e direitos. O inimigo, não
pode ser considerado como sujeito processual, sendo assim, não dispõe dos
direitos processuais, o que acarreta inclusive que este não venha a ter direito de
se comunicar com advogado constituído222.
É por isso, que Gunter JAKOBS descreve que tal criminalidade
caracteriza o poder constituído de um inimigo da sociedade, e que por assim ser,
deve ser tratado de maneira peculiar, pois não é titular de garantias e direitos
individuais223.
Nesse ideário, Cornelius PRITTWITZ224, assim assevera:
“Direito penal do inimigo é um direito penal por meio do qual o Estado confronta não
os seus cidadãos, mas seus inimigos (...) Primeiramente, tomando-se a lei
concretamente – o código penal e a legislação processual penal, o que se vê é que, onde
se trata da punição de inimigos, se pune antes e de forma mais rígida; do ponto de vista
do direito material, a liberdade do cidadão de agir (parcialmente) de pensar é
restringida; ao mesmo tempo, subtraem-se direitos processuais do inimigo.”
Enfim, contra o inimigo não se justifica um procedimento penal legal, no
qual garanta o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa, mais
apenas e tão somente, um procedimento de guerra, de intolerância, no qual tudo
222
JAKOBS, Günter; CANCIO MELIA, Manuel. Direito Penal do Inimigo, noções e críticas. Org. e
Trad.: André Luis Callegari e Nereu José Giacomolli. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005. p. 40.
223
Com base em sua interpretação de HOBBES, o doutrinador PÉREZ DEL VALLE citado por GRACIA
MARTÍN assim descreve que: “a diminuição das garantias processuais é uma conseqüência necessária da
própria configuração do Direito Penal do inimigo” haja vista que “na realidade, o processo penal frente os
inimigos não tem como fim a imposição de uma pena (punishment), mas a vingança (revenge), de tal
modo que seria discutível que, para a vingança no estado de guerra fossem necessárias garantias.”
(PÉREZ DEL VALLE, Sobre los Orígenes del “Derecho Penal del enemigo”, CPC nº 75, 2001). Apud
GRACIA MARTÍN, Op.cit., p. 89-90.
224
PRITTWITZ, Cornelius. O Direito Penal entre Direito Penal do Risco e Direito Penal do Inimigo:
tendências atuais em Direito Penal e Política Criminal. In IBCCRIM, ano 13. nº 47, setembro-outubro.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 41-42.
54
se pode contra aquele que for declarado inimigo, podendo chegar até mesmo a
coação física225.
Nesse ideário, Luis GRACIA MARTÍN ao citar PÉREZ DEL VALLE
descreve que uma característica relevante do Direito Penal do inimigo é a
diminuição ou até mesmo a total exclusão de garantias processuais, haja vista que
para os inimigos o processo não tem como finalidade a imposição de uma pena,
mas apenas e tão somente uma vingança, “e seria contraditório que para uma
vingança em estado de guerra fossem exigidas garantias226.
Pois bem, ao serem analisados os conceitos e ditames de JAKOBS a
respeito do Direito Penal do inimigo, verifica-se que após os traumas deixados
pelos atentados de 11 de setembro de 2001 em Nova York (USA), que deixaram
cerca de 3000 mortos227 e aos recentes ataques terroristas ao sistema de
transportes urbanos de Londres em 2005, que fizeram pelo menos 50 mortos,228
nos fazem acreditar que este modelo de Política Criminal será ainda mais
difundido nos EUA e na Europa, pois deixaram o mundo em estado de alerta e
mostraram que os atos terroristas visam somente estabelecer um estado de
guerra, criando um pânico social, com o intuito de fazer valer suas ideologias,
chantageando os países através de agressões aos seus cidadãos, e que por isso
precisam ser combatidos como inimigos, pois são fonte de perigo para toda
sociedade229.
Por fim, pode-se dizer que o chamado Direito Penal do inimigo, nada mais
é que uma vertente penalística que pretende despojar da categoria de cidadãos,
determinados grupos de pessoas que na sua concepção são considerados como
fontes de perigo constante (inimigos de guerra) e, assim sendo, devem ser
225
GOMES, Luiz Flávio. Críticas à tese do direito penal do inimigo. Mundo Legal. Disponível em:
<http://www.mundolegal.com.br/?FuseAction=Artigo_Detalhar&did=15528> Acesso em 25 de março de
2008.
226
GRACIA MARTÍN, Op.cit., p. 119.
227
Wikipédia, a enciclopédia livre. Ataques de 11 de Setembro de 2001. Disponível em:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Ataques_de_11_de_Setembro> Acesso em 21 de março de 2008.
228
Folha OnLine. Terrorismo ainda ameaça transporte britânico, diz relatório. Disponível em:
<http://www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u90035.shtml> Acesso em: 21 de marco de 2008.
229
ROSA, Fábio Bittencourt da. Da vingança de sangue ao direito penal do inimigo. Disponível em:
<http://www.derechopenalonline.com/index.php?id=15,67,0,0,1,0>. Acesso em: 21 de marco de 2008.
55
neutralizados e retirados do convívio social a todo custo230, haja vista, que na
guerra contra os infratores do ‘Estado Democrático de Direito’ (indivíduos que
relutam em fazer parte de uma constituição cidadã), tudo é válido, inclusive a
supressão de direitos, pois ao inimigo não se deve dar privilégios e muito menos
garantias que são concernentes apenas aos cidadãos231 integrados aos ditames do
Estado232.
5.2.1. CRÍTICAS AO DIREITO PENAL DO INIMIGO
Há também, aqueles que combatem tal concepção, pois descrevem que o
Direito Penal do inimigo, não segue um processo democrático (é claramente
inconstitucional, pois só pode haver medidas excepcionais em tempos anormais,
como o Estado de defesa e o Estado de Sítio), e sim, um procedimento de guerra
(de intolerância, de vale tudo contra o inimigo), que não obedece às regras de um
‘Estado Democrático de Direito’, pois é fruto apenas de um Direito Penal
simbólico, que tenta acalmar os ânimos da população, através de uma
antecipação
de
tutela
penal
(exagerada
e
desmedida)
e
de
uma
desproporcionalidade das penas e medidas adotadas pelos legisladores e
operadores do direito, suprimindo assim, garantias penais e processuais233.
Dentre os estudiosos do direito penal que criticam este modelo de Política
Criminal temos o professor Luiz Flávio GOMES, que descreve que o Direito
Penal do inimigo tende a ser um direito autoritário, pois ao se punir a
periculosidade de um indivíduo considerado ‘inimigo’, não é observado a
proporcionalidade do delito praticado em relação aos danos por ele causados.
230
CRESPO, Op.cit., p.10-11.
Luiz Flavio Gomes descreve que para os adeptos do direito penal do inimigo o cidadão “é quem,
mesmo depois do crime, oferece garantias de que se conduzirá como pessoa que atua com fidelidade ao
Direito. Inimigo é quem não oferece essa garantia”. (GOMES, Luiz Flavio. Direito Penal do inimigo (ou
inimigos do Direito Penal) Disponível em: <http://www.revistajuridicaunicoc.com.br/midia/arquivos/
Arquivo ID_47.pdf> Acesso em 24 de março de 2008.
232
GOMES, Luiz Flavio. Direito Penal do inimigo (ou inimigos do Direito Penal) Disponível em:
<http://www.revistajuridicaunicoc.com.br/midia/arquivos/ ArquivoID_47.pdf> Acesso em 24 de março
de 2008.
233
GOMES, Luiz Flavio. Críticas à tese do direito penal do inimigo. Mundo Legal. Disponível em:
<http://www.mundolegal.com.br/?FuseAction=Artigo_Detalhar&did=15528> Acesso em 25 de março de
2008.
231
56
Ainda, segundo GOMES o Direito Penal do inimigo não passa de um exemplo
grotesco e retrógrado de Direito Penal de autor, no qual se pune o sujeito pelo o
que ele ‘é’, ao invés de puni-lo pelo o que ele efetivamente ‘fez’,
consubstanciado no direito penal do fato234.
Há que se falar também, das críticas ferrenhas proferidas pelo professor
alemão Cornelius PRITTWITZ, sobre a tese de um Direito Penal do inimigo no
9º Seminário Internacional do IBCCRIM, onde este declarou que: “O direito
penal como um todo está infectado pelo direito penal do inimigo (...). Deixo de
lado o fato que, de acordo com minha convicção, o conceito de “não-pessoa” não
pode mais ser usado após 1945. Mas também a idéia em si de tratar determinados
contraventores como inimigos é inaceitável do ponto de vista normativo”.
235
PRITTWITZ declara ainda que os danos que a teoria de JAKOBS trouxe para o
Direito Penal são visíveis, pois agora, muitos regimes autoritários estarão
balizados e legitimados (teoricamente) a adotar um Processo Penal e um Direito
Penal totalmente contrários ao Estado Democrático de Direito, haja vista que já
há quem fale “sobre a possibilidade de eventualmente empregar até mesmo a
tortura, em determinados casos excepcionais”. 236
Já Bernd SCHÜNEMANN citado por GRACIA MARTÍN declara que a
legitimação de um conceito doutrinário de Direito Penal do inimigo,
“possibilitaria a legitimação do restabelecimento de um Estado totalitário de uma
brutalidade e primitivismo dignos da época do Antigo Testamento”. 237
Por fim, ainda em relação ás críticas que se fazem ao ‘Direito Penal do
inimigo’, MUÑOZ CONDE indaga que não lhe parece que os terroristas,
narcotraficantes, ou membros de associações mafiosas, se sintam ameaçados por
este tipo de direito penal especial sem garantias, ou por nenhum outro tipo de
Direito Penal. O que lhe deixa claro, é que o Direito Penal do inimigo representa
234
GOMES, Luiz Flavio. Críticas à tese do direito penal do inimigo. Mundo Legal. Disponível em:
<http://www.mundolegal.com.br/?FuseAction=Artigo_Detalhar&did=15528> Acesso em 25 de março de
2008.
235
PRITTWITZ, Cornelius. O Direito Penal entre Direito Penal do Risco e Direito Penal do Inimigo:
tendências atuais em Direito Penal e Política Criminal. In IBCCRIM, ano 13. nº 47, setembro-outubro.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 43.
236
PRITTWITZ, Op.cit., p. 43.
237
GRACIA MARTÍN, Op.cit., p. 141. Apud SCHÜNEMANN, Bernd. Debate em torno da conferência:
“La Idea de la normatización em la Dogmática jurídico penal”, do Prof. Jakobs.
57
ou pode a vir representar uma ameaça para os princípios e garantias
fundamentais do Estado Democrático de Direito238.
Sendo assim, mesmo que o Direito Penal do inimigo seja proclamado por
indivíduos que tentam impor a todo custo, um Direito Penal simbólico, que em
nada contribui para uma efetiva segurança da sociedade, aceitá-lo, seria um
retrocesso de décadas de evolução do Direito Penal. Hoje, o que se deve pregar, é
por um Direito Penal consubstanciado cada vez mais na premissa de um Direito
Penal mínimo, que deve ser usado somente em caso de ‘ultima ratio’, ou seja,
somente deverá ser acionado quando todas as possibilidades de controle
extrapenais estiverem esgotadas, reservando o seu âmbito de atuação somente
para um núcleo de direitos fundamentais que precisem da sua tutela239.
5.3. O ESTADO DE TOLERÂNCIA ZERO
Em 1982, estudiosos da Política Criminal norte americana como o
psicólogo criminologista George KELLING e o cientista político James Q.
WILSON publicaram um estudo cujo título era ‘The Police and Neiborghood
Safety’ (A Polícia e a Segurança da Comunidade), no qual estabelecia uma
relação de causalidade entre a desordem e a criminalidade. Tais autores criaram a
teoria das janelas quebradas (broken windows theory) usando como exemplo a
imagem de janelas quebradas para demonstrar como a desordem e a
criminalidade andam juntas e, podem, aos poucos, infiltrar-se em uma
comunidade, fazendo com que esta entre em decadência e consequentemente
venha a perder em qualidade de vida240. Sustentavam estes autores que se a janela
de uma residência, escritório ou fábrica fosse quebrada e, não fosse consertada
imediatamente, certamente as demais janelas que ficaram intactas seriam
238
MUÑOZ CONDE, Francisco. Las reformas de la parte especial del derecho penal español en el 2003:
de
la
"tolerancia
cero"
al
"derecho
penal
del
enemigo”.
Disponível
em:
<http://www.iustel.com/v2/revistas/detalle_revista.asp?id=8&id_noticia=403856&d=1>. Acesso em 29
de março de 2008.
239
BONHO, Luciana Tramontin. Noções introdutórias sobre o direito penal do inimigo. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8439>. Acesso em 29 de março de 2008.
240
RUBIN, Daniel Sperb. Janelas quebradas, tolerância zero e criminalidade. Jus Navigand. Disponível
em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3730&p=2>. Acesso em 29 de março de 2008.
58
quebradas. Em poucos anos ou até mesmo meses todos que por ali passassem
chegariam a conclusão que naquele local, não havia ninguém responsável em
manter a paz e a ordem, e a decadência do local estaria iniciada, fazendo com que
as pessoas de bem mudassem para outras localidades, deixando o bairro a mercê
de pessoas desocupadas, desordeiras, e até mesmo com tendências criminosas241.
Nesse sentido, WILSON e KELLING proclamavam que a criminalidade é
resultado da falta de combate aos pequenos delitos e a desordem, pois o Estado
deixa de combater a delinqüência de baixa intensidade, para priorizar o combate
a criminalidade violenta242.
Em estudo publicado na Revista Horizontes Antropológicos em Dezembro
de 2002, WENDEL e CURTIS, assim postularam: “A política de “tolerância
zero” tem raízes na “teoria das janelas quebradas” de WILSON e KELLING, a
qual argumenta que tolerância e desordem são a semente para a ocorrência de
crimes mais sérios, assim como uma janela quebrada dá a impressão de abandono
e indiferença e leva à quebra de outras.”243
Segundo os ensinamentos de Loïc Wacquant, a teoria das janelas
quebradas “postula que a repressão imediata e severa de menores infrações e
desentendimentos em via pública abarca o desencadeamento dos grandes
atentados criminais, (r) estabelecendo um clima sadio de ordem – em outras
palavras, que prender ladrões de ovos permite frear, ou mesmo simplesmente
parar, os potenciais matadores de bois, pela reafirmação da norma e dramatização
do respeito a lei.” 244
241
RUBIN, Daniel Sperb. Janelas quebradas, tolerância zero e criminalidade. Jus Navigand. Disponível
em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3730&p=2>. Acesso em 29 de março de 2008.
242
RUBIN, Daniel Sperb. Janelas quebradas, tolerância zero e criminalidade. Jus Navigand. Disponível
em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3730&p=2>. Acesso em 29 de março de 2008.
243
WENDEL, Travis; CURTIS, Ric. Tolerância zero: a má interpretação dos resultados. Horizontes
Antropológicos, Dec. 2002, vol. 8, nº 18, p. 267-278. ISSN 0104-7183. Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-71832002000200012&script=sci_arttext&tlng=pt> Acesso
em 29 de março de 2008.
244
ROSA, Alexandre Morais da; SILVEIRA FILHO, Sylvio Lourenço da. Para um Processo Penal
Democrático: Crítica à Metástase do Sistema de Controle Social. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p.
34. Apud. WACQUANT, Loïc. Sobre a “janela quebrada” e alguns outros contos sobre segurança
vindos da América. In: Revista brasileira de ciências criminais. IBCCRIM, n 46, p. 244.
59
Lucas GILARDONE ao citar Loïc WACQUANT assim descreve:
“Esto es precisamente lo que ocorre com lãs políticas de tolerancia cero, que
pressuponem que el combate frontal y sin contemplaciones contra expressiones “desviantes”
menores, y contra delitos de poca monta y contravenciones, culminará em algún momento com
la erradicación de lãs expressiones mas violentas y socialmente dañinas. Em síntesis, la
intolerância y la agressividade hacia pequeños infractores logrará evitar crímenes mayores.” 245
Sendo assim, pode-se verificar que a ‘teoria das janelas quebradas’ ou
‘broken windows theory’ proclamava que pequenos delitos ou manifestações de
desordem (como vadiagem, jogar lixo nas ruas, beber em público, catar papel,
prostituição etc.) que não fossem repreendidos imediatamente, poderiam levar a
grandes delitos, e consequentemente a uma criminalidade violenta 246.
Por esse motivo, que a partir da teoria das janelas quebradas, nasceu no
início dos anos 90, mais precisamente em Nova York (EUA), a idéia do chamado
Estado de ‘tolerância zero’, quando o então Prefeito Rudolph GIULLIANI, no
exercício do seu mandato, impôs uma política de segurança pública ambiciosa e
agressiva, buscando reduzir a criminalidade na capital americana247.
O resultado da aplicação da ‘teoria das janelas quebradas’ pelo
Departamento de Polícia de Nova Iorque, deu azo ao que os americanos
batizaram de “operação tolerância zero”, e fez com que os índices de
criminalidade daquela cidade caíssem pela primeira vez em 30 anos248. Há quem
diga, que tal sucesso foi devido à tática policial de realizar busca e perseguições
aos inconvenientes sociais, retirando das ruas centrais de Nova York, “o
subproletariado que vive do mercado informal” dentre os quais podemos destacar
os mendigos, prostitutas, gigolôs, bêbados, flanelinhas, traficantes, bem como,
todo o tipo de desocupado249.
245
GILARDONE, Lucas. El retorno a la inquisición: Las políticas de tolerancia cero em el paradigma
neoliberal. Córdoba: Universidad de Córdoba, 2003. p. 230. Apud. WACQUANT, Loïc. Las cárceles de
la miseria. Editorial Manantial, Buenos Aires, 2000.
246
MIRANDA COUTINHO, Jacinto Nelson de; CARVALHO, Edward. Teoria das janelas quebradas: e
se a pedra vem de dentro? In . Revista de Estudos Criminais. !TEC, n 11. p. 24.
247
RUBIN, Daniel Sperb. Janelas quebradas, tolerância zero e criminalidade. Jus Navigand. Disponível
em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3730&p=2>. Acesso em 29 de março de 2008.
248
RUBIN, Daniel Sperb. Janelas quebradas, tolerância zero e criminalidade. Jus Navigand. Disponível
em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3730&p=2>. Acesso em 29 de março de 2008.
249
REALE JÚNIOR, Miguel. Insegurança e tolerância zero. In. Revista de Estudos Criminais. !TEC, nº 9.
p. 68.
60
Também há aqueles que dizem que ao ser colocado um maior número de
policiais para trabalhar nas ruas centrais e nos subúrbios, fez com que houvesse
uma relação de confiança e cooperação mútua entre a polícia e os cidadãos, e tal
parceria ajudou na prevenção da criminalidade250.
Todavia, há estudos que comprovam que as políticas de tolerância zero,
implantadas em Nova York e em outras cidades americanas, diminuíram a
criminalidade momentaneamente, pois, ao longo do tempo, ficou constatado que
esta vertente não conseguiu baixar, de forma significativa, o número de infrações
penais, nem ao menos de infrações menores. O que ocorreu na verdade foi um
aumento impressionante do efetivo policial e, por conseguinte, um aumento das
atividades judiciais, que por sua vez, deram causa a milhares de processos de
condenação, que resultaram em um aumento significativo da população
carcerária, já que grande parte desses delinqüentes foram condenados a pena de
prisão251.
Outra crítica que se faz, é que com o aumento do número de policiais,
houve também um aumento no número de reclamações de pessoas vítimas de
excessos e abusos por parte desses “detentores da lei”, haja vista, que em muitos
casos, a polícia atuou de forma desproporcional, inclusive em situações onde o
suposto infrator não oferecia nenhum perigo252.
Outrossim, como conseqüência dessa política repressiva253, houve um
aumento da população carcerária norte-americana nos últimos 10 anos254, e a
250
RUBIN, Daniel Sperb. Janelas quebradas, tolerância zero e criminalidade. Jus Navigand. Disponível
em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3730&p=2>. Acesso em 29 de março de 2008.
251
MUÑOZ CONDE, Francisco. Las reformas de la parte especial del derecho penal español em el
2003: de la “tolerancia cero” al “derecho penal del enemigo”. Disponível em:
<http://www.iustel.com/v2/revistas/detalle_revista.asp?id=8&id_noticia=403856&d=1>. Acesso em 29
de março de 2008.
252
Por exemplo, pode-se citar o ‘caso Diallo’, ocorrido em janeiro de 1999 na cidade de Nova York, onde
uma patrulha composta por quatro policiais da unidade de “luta contra os delitos de rua”, ao seguirem em
perseguição de um suposto agressor sexual, acabaram efetuando 41 disparos, dentre os quais 19 atingiram
mortalmente um jovem imigrante guineano de 22 anos, que se encontrava parado em frente a um edifício,
e nada tinha a haver com o caso. (MUÑOZ CONDE, Francisco. Op. cit.,)
253
Nessa perspectiva ressalta Jacinto COUTINHO que: “A política de Tolerância Zero, símbolo maior da
Broken Windons, é marcada pelo excesso do soberano e desumanidade das penas; um funcionalismo
bipolar, um tudo ou nada; culpado ou inocente; um sistema binário, muito a gosto de uma pósmodernidade reducionista e maniqueísta.” (MIRANDA COUTINHO, Jacinto Nelson de. Op. cit., p. 26.)
254
Em 10 (dez) anos o número de reclusos nos Estados Unidos triplicou, pois, de setecentos e quarenta
mil reclusos passou para quase dois milhões. Outro dado alarmante é que a cota de reclusos por cada
100.000 habitantes em 1997 nos Estados Unidos era de 646, seis vezes superior à média da União
61
grande maioria desses detentos é composta por indivíduos pertencentes a parcela
mais carente da sociedade (desempregados, principalmente negros e latinos).
Certamente, nenhuma sociedade jamais admitirá que milhares de desempregados
venham a roubar impunemente. Porém, o que fazer com estes indivíduos, se as
precárias condições de vida em que vivem (sobrevida) os levam a delinqüir? É
correto apostar em uma vertente dogmática que faz da “criminalização da
pobreza” seu estandarte para um direito penal repressivo? Ora, o problema do
desemprego, não será solucionado com o aumento da repressão penal, muito
menos com a construção de milhares de novos presídios, mas apenas e tãosomente, com uma política social e econômica, que vise uma melhor
redistribuição de renda, e a consecução de obras sociais voltadas as populações
mais carentes255.
Nesse sentido, Jacinto COUTINHO tece as seguintes críticas a teoria das
janelas quebradas:
“A Broken Windowns Theory, assim, não prega a reforma do “desordeiro”, mas tão-só
sua exclusão. Julga-o não somente por dar a ele um antecedente criminal, tampouco por
condená-lo, mas por tornar o indivíduo alguém que precisa ser controlado, removido e
observado. A categoria do “desordeiro” permite a Tolerância Zero, e esta o abuso do Estado e a
barbárie do Soberano. A desordem do Estado, enfim, garante a ordem. A violência policial é
necessária; um meio para um fim maior.” 256
Ao traçar um paralelo da teoria das janelas quebradas implantada nos
Estados Unidos, com a realidade brasileira, Jacinto COUTINHO ainda elabora a
seguinte crítica:
“Os bêbados, os catadores de papel, os flanelinhas, entre outros, são as verdadeiras
ameaças, os “projetos de Fernandinho Beira-Mar” com os quais se deve dar cabo agora, antes
que virem coisa pior. Acaba-se com eles e se acaba com os estupros, com os roubos, com os
homicídios. O perigo de tal afirmação – não fosse a ingenuidade – é evidente, na medida em que
transforma o guri da esquina (que está lá em vez de estar na escola, maldito!) em um maníaco
do parque; o mendigo que dorme sob a marquise (porque quer, obviamente!) em uma ameaça
para a sociedade (quem não dorme melhor quando não vê um mendigo em tais condições?!). Os
pedintes, então, enojam, assustam, enchem todos de medo: fazem com que saia das ruas e se
Européia, que ultrapassa apenas a casa dos 100. Por exemplo, a média espanhola é de 113. (fontes:
Bureau of Justice Statistics, Prison and Jail Inmate ad Mid-Year 1988, Washington 1999; Council of
Europe Annual Statistics, Strassbourg 1997. Apud. MUÑOZ CONDE, Francisco. Op. cit.,)
255
MUÑOZ CONDE, Francisco. Las reformas de la parte especial del derecho penal español em el
2003: de la “tolerancia cero” al “derecho penal del enemigo”. Disponível em:
<http://www.iustel.com/v2/revistas/detalle_revista.asp?id=8&id_noticia=403856&d=1>. Acesso em 29
de março de 2008.
256
MIRANDA COUTINHO, Jacinto Nelson de. Op. cit., p. 27.
62
fique trancado em casa. E o medo, como que numa osmose criminosa, é percebido pelos
ladrões-desordeiros, que passam a roubar; um círculo vicioso do apocalipse da desordem:
desordem gera medo, medo gera crime, crime gera desordem. É o reino, por evidente, da
manipulação das premissas. É a filosofia Caco Antibes aplicada ao Direito!” 257
Portanto, constata-se que o Estado de tolerância zero, nasceu com o intuito
de ser um importante movimento de Política Criminal na luta contra a
criminalidade, mas o que se vê na prática, é que essa vertente dogmática tem sido
apenas um meio ainda mais cruel de segregação humana, pois age de maneira
agressiva e desproporcional, apenas com a parcela mais carente da população,
tornando-os ainda mais excluídos da sociedade.
5.4. O ABOLICIONISMO RADICAL
Não é de hoje que se sabe que o encarceramento de indivíduos, visando à
prevenção de novos delitos e a ressocialização258 destes delinqüentes, desde os
tempos mais longínquos, até os dias atuais, não obteve êxito.
Em um primeiro contato com o vocábulo “abolicionismo” pode-se
constatar que tal proposta tende a buscar não somente a supressão dos delitos,
penas e do sistema carcerário, mas sim, a total extinção do sistema penal,
substituindo-o por sistemas alternativos de solução de conflitos259.
Ora, jamais ficou constatado que alguém que foi encarcerado, após ter
cumprido a sua pena e ser posto em liberdade, saiu melhor do que quando era
livre, o que prova que o cárcere não corrige a falha cometida pelo detento, nem o
redime para um retorno à vida em sociedade, e muito menos melhora o seu
caráter, pois o isolamento social é um fator irreversível na vida de um indivíduo.
Ou seja, a prisão para os teóricos do abolicionismo radical é inútil, pois além de
257
MIRANDA COUTINHO, Jacinto Nelson de. Op. cit., p. 27.
Há mais de um século que os reformadores do sistema penal vêm constatando que a prisão fracassou,
quanto ao seu objetivo de reeducar e reintegrar o apenado que passou determinado tempo cumprindo
pena. O que estes estudiosos percebem, é que o Estado não se interessa pela ressocialização desses
indivíduos e somente exercita “uma política de condenação ágil e intensa, que difunde a crença no
trancafiar e jogar as chaves fora.” (PASSETTI, Edson. Curso livre de abolicionismo penal. Rio de
Janeiro: Revan, 2004. p. 27-29.
259
PIRES, Ariosvaldo de Campos; SALES, Sheila Jorge Selim de. Alguns Movimentos político-criminais
da atualidade. In IBCCRIM, ano 11. nº 42, janeiro-março. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p.
303).
258
63
despersonalizar o indivíduo, não o ressocializa, e faz com que este se torne ainda
mais afastado da sociedade260.
Por esta razão, existem doutrinadores261 que defendem a teoria do
‘abolicionismo radical’, sustentando que é necessário que se haja uma eliminação
total do direito penal, haja vista, que este sistema de intervenção humana, traz
mais efeitos maléficos do que benéficos. Para os adeptos do abolicionismo, a
pena de prisão deveria ser extinta e, em seu lugar deveriam ser adotados os
modelos informais de soluções de conflitos, dentre os quais podemos citar a
reparação civil, a arbitragem, os acordos, entre outros262.
Partindo dos ensinamentos de Salo de CARVALHO podemos verificar
que o abolicionismo seria uma “teoria sensibilizadora” que reúne autores que:
“Partilhando do modelo sociológico crítico das décadas de 60 e 70, comungam
propostas
político-criminais
estruturadas
na
premissa
da
radical
contração/substituição do sistema penal por outras instâncias resolutivas dos
conflitos sociais.” 263
A grande contribuição que esta ideologia traz a pauta seria no tocante a
humanização por ela defendida, haja vista que o ‘poder punitivo’ estatal
encontrasse falido e não é capaz de ressocializar o delinqüente, possibilitando-lhe
um cumprimento de pena de acordo com a dignidade e os direitos fundamentais
da pessoa humana.
Pode-se dizer que Louk HULSMAN264 é um dos mais significantes
defensores da ideologia abolicionista. Tanto o é, que em sua obra: “Das penas
260
MELO, Op. cit., p. 9 e 22.
Existem variantes no pensamento abolicionista, haja vista, que seus autores não compartilham em pé
de igualdade com seus métodos e pressupostos filosóficos, para a consecução de seus objetivos. O ponto
em comum do pensamento abolicionista é a extinção do sistema penal, pela sua total ineficácia na solução
dos conflitos sociais. Dentre estes autores pode-se citar a preferência fenomenológica de Louk Hulsman,
a marxista de Thomas Mathiesen, a estruturalista de Michel Foucault e, por fim, a fenomenológicohistoricista de Nils Christie. (ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Em busca das penas perdidas: a perda da
legitimidade do sistema penal. Tradução: Vânia Romano Pedrosa, Amir Lopes da Conceição. Rio de
Janeiro: Revan, 1991. p. 98.)
262
MELO, Op. cit., p. 21.
263
CARVALHO, Salo de. Considerações sobre as incongruências da Justiça Penal Consensual: Retórica
Garantista, Prática Abolicionista. In Diálogos sobre a Justiça Dialogal. CARVALHO, Salo de;
WUNDERLICH, Alexandre (orgs.). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002. p. 263-264.
264
De acordo com o pensamento de Louk Hulsman, o sistema penal é um problema em si mesmo e, em
face da sua inutilidade em resolver conflitos, é preferível que seja extinto. (ZAFFARONI, Eugenio Raúl.
Em busca das penas perdidas... p. 98.). E ainda nesse sentido, afirma Hulsman que o sistema penal “se
261
64
perdidas”, ele descreve que: “O desaparecimento do sistema penal abrirá, num
convívio mais sadio e dinâmico, os caminhos de uma nova justiça, uma vez que,
segundo D’urso, daria lugar aos ajustes espontâneos realizados pela própria
comunidade.”265
Nesse sentido, de acordo com Winfried HASSEMER e Francisco
MUÑOZ CONDE, citados por Alice BIANCHINI, o movimento em prol do
abolicionismo penal funda-se no seguinte pressuposto:
“Se o Direito penal é arbitrário, não castiga igualmente todas as infrações delitivas,
independentemente do status de seus autores, e quase sempre recai sobre a parte mais
débil e os extratos economicamente mais desfavorecidos, provavelmente o melhor que
se pode fazer é acabar de vez por todas com este sistema de reação social frente à
criminalidade, que tanto sofrimento acarreta sem produzir qualquer benefício.”266
Portanto, pode-se concluir que o abolicionismo radical é uma ideologia
não-intervencionista, totalmente contrária ao neo-retribucionismo, pois fomenta a
desinstitucionalização e descentralização, ao tentar afastar do Estado a
incumbência de solucionar os conflitos existentes, passando tal ônus para a
sociedade267.
Mas o desaparecimento do sistema penal no Brasil é criticado por diversos
doutrinadores, dentre os quais, pode-se citar Luiz Flávio D’URSO, que assim
descreve: “A eliminação do sistema penal representa algo de inimaginável para o
Brasil, embora possa até ser admitida em tese para alguns países do mundo. O
nosso sistema penal não é bom, todavia, sua eliminação traria um verdadeiro
caos que representaria anarquia global de todas as relações humanas.”268
Todavia, há aqueles que se opõem as críticas ferrenhas feitas ao modelo
abolicionista penal, dentre eles podemos destacar Salo de CARVALHO que se
manifesta no seguinte sentido:
trata de uno de los raros condicionamentos sociales que podrían desaparecer sin suscitar problemas
particulares, porque las organizaciones que componen este sistema no dependen en absoluto de él.”
(PIRES, Ariosvaldo de Campos; SALES, Sheila Jorge Selim de. Op. cit., p. 304).
265
MELO, Op. cit., p. 22.
266
BIANCHINI, Alice. Os grandes movimentos de Política criminal na atualidade: movimento de lei e
ordem, minimalismo penal e abolicionismo. Apud. HASSEMER, Winfried; MUÑOZ CONDE, Francisco.
“Introducción a la Criminología y al derecho penal”. Valencia: Tirant lo Bianch, 2001, p.361. Disponível
em: <http://www.uvb.com.br/main/posgraduacao/CienciasCriminais/AulasImpressas/PC_Aula_02.pdf>.
Acesso em 29 de março de 2008.
267
MELO, Op. cit., p. 32.
268
MELO, Op. cit., p. 22. Apud. D’urso, Luiz Flávio Borges. In Consulex.
65
“É mister ressaltar, desde já, que negamos terminantemente as críticas demonizadoras
do modelo político-criminal abolicionismo. Entendemos que as várias matizes do abolicionismo
a) são extremamente úteis e importantes para a avaliação fenomenológica da (in)eficácia do
sistema penal; b) seus fundamentos teórico-doutrinários, ancorados no paradigma da reação
social, são irreversíveis, do ponto de vista acadêmico, na ciência criminológica; e c) algumas de
suas propostas, fundamentalmente aquelas que dizem respeito à abolição da pena privativa de
liberdade cumprida em regime carcerário fechado, aos processos de descriminalização e à
negativa da ideologia do tratamento são viáveis como projeto político-criminal” 269
Também nessa linha de raciocínio, o ilustre doutrinador Alessandro
BARATTA entendia que o modelo teórico abolicionista seria um:
“(...) modelo de política criminal alternativa que utiliza, como idéia reguladora ou
‘utopia concreta’, a superação do direito penal.” Pois, “nas teorias radicais de política criminal,
como são as teorias abolicionistas, o critério funciona no sentido de avaliar as reformas como se
estas tivessem a capacidade de superar o sistema penal tradicional, e que dita superação fosse
efetivamente possível.” 270
Em seqüencia Salo de CARVALHO271 complementa o pensamento de
BARATTA dizendo: “Percebemos, assim, o abolicionismo na perspectiva de
ALESSANDRO BARATTA, ou seja, como uma utopia orientadora de extrema
importância heurística. Não há mudança sem utopia e, no momento em que o
homem renuncia à utopia, acaba por renunciar à sua própria condição humana.”
Por fim, seguindo nessa linha abolicionista do sistema penal, em prol de
uma política criminal alternativa, Alessandro BARATTA encontrou em uma
expressão de G. RADBRUCH o seguinte ensinamento: “a melhor reforma do
direito penal não consiste em sua substituição por um direito penal melhor, mas
sua substituição por uma coisa melhor que o direito penal.” 272
Assim, devemos destacar que as propostas abolicionistas devem ser vistas
de maneira reservada, principalmente em se tratando da atual realidade nos países
do ‘terceiro mundo’, pois o total desaparecimento do direito penal poderia trazer
efeitos desastrosos e de difícil reparação, podendo dar azo ao aparecimento de
outros instrumentos informais de controle social, que possivelmente seriam
269
CARVALHO, Salo de. Considerações... Op. cit., p. 273.
BARATTA, Alessandro. Criminologia crítica... p. 222.
271
CARVALHO, Salo de. Considerações... Op. cit., p. 274.
272
BARATTA, Alessandro. Criminologia crítica... p. 222.
270
66
regrados por uma maior arbitrariedade, e conseqüentemente fariam que houvesse
uma maior supressão de direitos e garantias dos indivíduos273.
5.5. O DIREITO PENAL MÍNIMO
De acordo com os ideais iluministas, se o Estado é produto da razão,
jamais poderá ser considerada legítima a sanção penal que se findar, única e
exclusivamente no sentimento de vingança. É com base nesse pensamento, que
podemos afirmar que o Direito Penal, deve ser a ‘ultima ratio’, devendo ser
chamado a intervir somente quando os demais ramos do direito se mostrarem
incapazes, inaptos ou insuficientes para a tutela do bem jurídico infringido274.
Nesse contexto, assim descreve Raúl CERVINI: “...o Direito Penal
somente deve ser empregado para a proteção dos bens jurídicos em forma
subsidiária, como ultima ratio, reservando-se para aqueles casos em que seja o
único meio de evitar um mal maior.”275 [grifo meu]
Já dizia BECCARIA na conclusão de sua obra ‘Dos delitos e das penas’:
“Para que cada pena não seja uma violência de um ou de muitos contra um
cidadão privado, deve ser essencialmente pública, rápida, necessária, a mínima
das possíveis em dadas circunstâncias, proporcionada aos crimes, ditada pelas
leis.”276 [grifo meu]
No mesmo sentido, assim são os dizeres do mestre ZAFFARONI:
“A teoria do direito penal mínimo (ou minimalismo penal) expôs um conceito de pena
de nítida inspiração liberal, no que constitui um dos mais elaborados esforços
contemporâneos para proporcionar tal conceito a partir da referida inspiração. Segundo
esse conceito, a intervenção penal caberia somente em conflitos muitos graves, que
comprometessem interesses gerais, e naqueles em que, sem tal intervenção, surgiria o
risco de uma vingança privada ilimitada.”277
273
MELO, Op. cit., p. 32.
BITENCOURT, Cezar Roberto. Op. cit., p. 11.
275
CERVINI, Raúl. Os processos de descriminalização. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995. p. 192.
276
BECCARIA, Op. cit., p.143.
277
ZAFFARONI, et al. Teoria Geral do Direito Penal... p. 129.
274
67
Portanto, o Direito Penal mínimo é uma espécie de Política Criminal
voltada a conter ao máximo o poder punitivo estatal, utilizando-se primeiramente
de meios jurídicos de controle que não o penal, bem como outras formas de
aplicação de pena que não apenas e tão somente a privativa de liberdade278.
Porém, o Brasil vive um momento de conflito entre duas ideologias
penais. De um lado o movimento do ‘law and order’ (lei e ordem), que acredita
que o Direito Penal ao utilizar-se da sanção penal poderá acabar com a
criminalidade. De outro, a ideologia da intervenção mínima do Estado, originário
do iluminismo, conforme anteriormente relatado.
Assim sendo, pode-se verificar que legisladores penalistas ao se deixarem
levar pela ‘emoção’ acabaram por aderir a ideologia repressiva da ‘Lei e ordem’,
fazendo com que houvesse um aumento desenfreado no número de tipificações
penais, e conseqüentemente um maior incentivo a criminalização, a penalização e
a carcerização. Mas, mesmo com essa ‘inflação legislativa’ o movimento da ‘Lei
e ordem’ não foi capaz de reduzir a criminalidade, e tão pouco prevenir os
delitos279. Por essa razão, que o pensamento doutrinário acerca de um Direito
Penal mínimo vem ganhando terreno a cada dia, pois acredita-se que esse seja o
modelo de política criminal que mais se identifica com a atual realidade penal
brasileira280.
Segundo os ditames de Luiz Flávio D’URSO: “Esse é o grande desafio do
mundo moderno, reduzir ao máximo a aplicação da pena privativa de liberdade,
somente reservando a prisão para aqueles realmente perigosos ou que não
possam permanecer em liberdade.”281
Nesse sentido, o legislador pátrio assim descreveu na exposição de
motivos da Lei 7.209 de 1984:
“Uma política criminal orientada no sentido de proteger a sociedade terá de restringir a
pena de liberdade aos casos de reconhecida necessidade, como meio eficaz de impedir a
ação criminógena cada vez maior do cárcere. Esta filosofia importa obviamente na
busca de sanções outra para os delinqüentes sem periculosidade ou menos graves. Não
278
MELO, Op. cit., p. 30.
MELO, Op. cit., p. 33.
280
MELO, Op. cit., p. 32.
281
D’URSO, Luiz Flávio Borges. Privatizações de Presídios. In Consulex. Ano III – nº 31, de 31 de julho
de 1999.
279
68
se trata de combater ou condenar a pena privativa de liberdade como resposta penal
básica ao delito. Assim, como no Brasil, a pena de prisão se encontra no âmago dos
sistemas penais de todo o mundo. O que por ora se discute é a sua limitação aos casos
de reconhecida necessidade.”282
De acordo com as considerações acima relatadas, pode-se concluir que
atualmente no Brasil vem crescendo de maneira ainda tímida, uma corrente
ideológica que tem como objetivo firmar a idéia de que a intervenção estatal só
deve acontecer quando for estritamente necessária. Ou seja, devem-se reduzir os
mecanismos punitivos do Estado ao ‘mínimo necessário’, dando ensejo à
formação do chamado Direito Penal mínimo.
5.5.1. PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO MÍNIMA
O princípio da intervenção mínima283 por ser originário do Iluminismo284 e
trazer consigo ideais de defesa aos bens e garantias fundamentais do cidadão, não
poderia ter posição diferente daquela que visa conter o ‘ius puniend’ do Estado,
pois deve tentar extinguir a arbitrariedade estatal, enquanto solucionador e
apaziguador dos conflitos sociais285. Sendo assim, pode-se afirmar que o princípio
da intervenção mínima surgiu para se contrapor ao absolutismo, pois, “aparece
como uma orientação político-criminal restritiva do jus puniend.”286 Constata-se
ainda, que o princípio da intervenção mínima foi positivado primeiramente na
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789), mais precisamente em
seu art. 8º, que assim proclamava: “A lei só deve estabelecer penas estrita e
evidentemente necessárias, (...)” No Brasil, o princípio em análise, embora não
tenha sido previsto de maneira explicita, foi recepcionado pela Constituição
282
MARTINS, Jorge Henrique S. Penas alternativas: comentários a nova lei 9714/98. Exposição de
motivos da nova parte geral do código penal, p. 33.
283
O princípio da intervenção mínima se faz presente desde a Declaração dos Direitos do Homem e dos
Cidadãos de 1789, trazendo em seu art. 8º, a seguinte descrição: “A lei não deve estabelecer mais do que
penas estrita e evidentemente necessárias, e ninguém pode ser castigado a não ser em virtude de uma lei
estabelecida e promulgada anteriormente ao delito, e legalmente aplicada.” (DDHC)
284
De acordo com a ideologia do iluminismo, o Estado é produto da razão. Sendo assim, no ideário
iluminista, não há nenhuma legitimação possível que justifique a sanção penal pelo simples sentimento de
vingança. (JUNQUEIRA, Gustavo Octaviano Diniz. Direto Penal: Coleção elementos do direito. São
Paulo: Siciliano Jurídico, 2003. p. 25).
285
MELO, Op. cit., p. 25 e 31.
286
LOPES, Mauricio Antonio Ribeiro. Princípios Políticos do Direito Penal – (Série princípios
fundamentais do direito penal moderno) vol. 3, 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 92.
69
Federal através da cláusula geral disposta no art. 5º, § 2º, que assim dispõe: “Os
direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes
do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em
que a República Federativa do Brasil seja parte.”287 Isso se dá, em decorrência
desses
tratados
conterem
normas
de
direitos
fundamentais
que
são
automaticamente incorporados ao rol do art. 5º da Constituição Federal através
da teoria da recepção288.
Portanto, na luta contra o crime, o princípio da intervenção mínima,
propõe que o direito penal seja utilizado de forma restrita289, devendo a sanção
criminal ser reservada apenas para aqueles casos em que se constituir meio
necessário para a proteção de um bem jurídico relevante.
Nesse sentido, Rogério GRECO citando Francisco MUÑOZ CONDE
descreve de forma ímpar, o caráter limitador do princípio da intervenção mínima
frente ao poder punitivo estatal: “O poder punitivo do Estado deve estar regido e
limitado pelo princípio da intervenção mínima. Com isto, quero dizer que o
Direito Penal somente deve intervir nos casos de ataques muito graves aos bens
jurídicos mais importantes. As perturbações mais leves do ordenamento jurídico
são objetos de outros ramos do Direito.”290
Conforme descrevem ZAFFARONI e PIERANGELI, o poder punitivo
estatal traz consigo um certo teor de violência, e sua intervenção na maioria das
vezes se apresenta de forma irracional, a tal ponto de acrescentar ainda mais
violência à aquela em que sociedade é submetida. Estes doutrinadores descrevem
ainda, que na América Latina o princípio da intervenção mínima vem sendo
desrespeitado de maneira mais acentuada, haja vista, que nas Américas são
constantes as agressões aos Direitos Humanos, o que afeta o desenvolvimento
desses países, e consequentemente culmina em um aumento desenfreado da
criminalidade291.
287
DOTTI, Curso de direito penal: Parte geral. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 67-68.
SIQUEIRA, Flávio Augusto Maretti. A Insignificância no Direito Penal Moderno. Disponível em:
<http://www.praetorium.com.br/index.php?section=artigos&id=9> Acesso em: 02 de abril de 2008.
289
DOTTI, Curso de direito penal... p. 67.
290
GRECO, Direito Penal do equilíbrio... p. 52.
291
ZAFFARONI, Eugênio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro. 3ª
ed. rev., atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p.80-81.
288
70
Esta crise do Direito Penal esta relacionada em partes com a utilização
desenfreada de normas incriminadoras, que muitas vezes acabam invadindo
outras esferas do direito em que o ilícito pode ser meramente civil, administrativo
ou tributário292. O arbítrio daqueles que fazem as leis é certamente uma das
causas da desordem do sistema punitivo estatal, haja vista, que o Estado esta
visando apenas a sua pretensão punitiva, sem ao menos se preocupar com
critérios de humanidade ou proporcionalidade, impondo penas severas, até
quando não é necessário293. São muitos os doutrinadores que advertem sobre o
esvaziamento da força intimidadora da pena, frente a criação excessiva e sem
critérios de tipos penais incriminadores. Francesco CARNELUTTI fala em uma
inflação legislativa, ao sustentar que “seus efeitos são análogos aos da inflação
monetária, pois desvalorizam as leis, e no concernente às leis penais aviltam a
sua eficácia preventiva.”294 Carlos Enrico PALIERO, em sua obra analisa o
fenômeno da hipertrofia do Direito Penal295, dizendo que há um crescimento
“patológico da legislação penal”. Para Luiz Flávio GOMES, “o sistema
tradicional, claramente paleorrepressivo, ao infringir a ‘Lei do Estado”, o infrator
contrai uma dívida com ele e deve pagá-lo a todo custo; e a única resposta estatal
prevista para o pagamento desta dívida é a ‘pena’, principalmente a de prisão.”296
Atualmente, nossos legisladores estão sendo levados a editarem ‘leis de
ocasião’, que nada mais são que leis editadas para responder a determinadas
situações excepcionais que estejam causando agitação na opinião pública, como
por exemplo, nos casos de homicídios qualificados e seqüestros. É nesse
momento que se percebe a função simbólica do Direito Penal, que é voltado
292
SIQUEIRA, Flávio Augusto Maretti. A Insignificância no Direito Penal Moderno. Disponível em:
<http://www.praetorium.com.br/index.php?section=artigos&id=9> Acesso em: 02 de abril de 2008.
293
MELO, Op. cit., p. 26.
294
LUISI, Luiz. Um discurso sedicioso: a minimização do Direito Penal. In Discursos Sediciosos, ano 1,
n. 2. Instituto Carioca de Criminologia. Rio de Janeiro: ICC, 1996. p. 37. Apud. FRANCESCO,
Carnelutti. La crisi della legge. In “Discorsi intorno al diritto”. p. 178.
295
Em um artigo descoberto em 1898, Reinhart Frank usou pela primeira vez a expressão ‘hipertrofia
penal’ salientando que “o uso da pena tem sido abusivo, e por isso perdeu parte do seu crédito, e,
portanto, sua força intimidadora, já que o corpo social deixa de reagir do mesmo modo que o organismo
humano não reage mais a um remédio administrado abusivamente.” (LUISI, Luiz. Um discurso sedicioso:
a minimização do Direito Penal. In Discursos Sediciosos, ano 1, n. 2. Instituto Carioca de Criminologia.
Rio de Janeiro: ICC, 1996. p. 37. Apud. Reinhart Frank. Dir Uberspannung Der Stattlichen Strafgewalt.
In Zstw (Revista para a Ciência geral do direito penal), 1899, p. 733.
296
MELO, Op. cit., p. 26. Apud. GOMES, Luiz Flávio. Suspensão condicional do processo penal. São
Paulo: RT, 1997.
71
apenas e tão-somente para a criação de resultados imaginários, que ficam a
margem da consecução efetiva de resultados concretos. Esse aspecto tem se
tornado bastante preocupante, pois, nesse momento tem predominado a adoção
de uma política criminal radical (hard control), tendente a criação de novos tipos
penais, ao endurecimento das penas já existentes e ao corte de direitos e garantias
fundamentais. Como exemplo dessa tendência, podemos citar a Lei dos Crimes
Hediondos297.
Entretanto, é por esse motivo que Damásio de JESUS defende a
priorização do princípio da intervenção mínima, haja vista, que este princípio
procura “restringir ou impedir o arbítrio do legislador, no sentido de evitar a
definição desnecessária de crimes e a imposição de penas injustas, desumanas ou
cruéis, a criação de tipos delituosos deve obedecer à imprescindibilidade, só
devendo intervir o Estado, por intermédio do Direito Penal, quando os outros
ramos do Direito não conseguirem prevenir a conduta ilícita.”298
Por tudo isso, é que o sistema penal deve ter seu uso restringido ao
máximo, devendo ser esgotados todos os meios extra-penais de controle social,
antes de se recorrer ao direito penal299. Assim, quando outras formas de sanção ou
outros métodos de controle social (medidas civis ou administrativas) forem
suficientes para o restabelecimento da ordem jurídica violada, estas é que
deverão ser adotadas e não as criminais300.
Nesse sentido, assim descreve o insigne doutrinador Nelson Hungria:
“Somente quando a sanção civil se apresenta ineficaz para a reintegração da ordem
jurídica é que surge a necessidade da enérgica sanção penal. O legislador não obedece a
outra orientação. As sanções penais são o ultimo recurso para conjurar a antinomia entre
a vontade individual e a vontade normativa do Estado. Se um fato ilícito, hostil a um
interesse individual ou coletivo, pode ser convenientemente reprimido com sanções
civis, não há motivo para reação penal.”301
Sendo assim, conclui-se que o princípio da intervenção mínima tem como
função basilar, a aplicação da pena privativa de liberdade somente em situações
297
MELO, Op. cit., p. 27-28.
JESUS, Op. cit., p. 10.
299
BITENCOURT, Op. cit., p. 11.
300
BITENCOURT, Op. cit., p. 11.
301
DOTTI, Curso de direito penal... p. 67. Apud. HUNGRIA, Nelson. Comentários ao Código Penal.
vol. VII. Rio de Janeiro: Forense, 1978. p. 178.
298
72
extremas, nas quais os fins buscados pelo poder punitivo estatal não podem ser
alcançados com medidas alternativas à prisão.
5.5.2. OBJETIVOS DO DIREITO PENAL MÍNIMO
Não é de hoje, que o Direito Penal brasileiro guarda resquícios do
movimento repressivo da ‘Lei e Ordem’, e certamente essa ideologia contribuiu
para que em nosso país fosse cada vez mais difundida a criminalização, a
punição, a penalização, e a carcerização302.
Gabriel CHALITA ao prefaciar a obra de Tailson Pires COSTA adverte:
“Não é de hoje que se discute a reeducação humana. Não é de hoje que se discute a
prisão, sua eficiência, sua evolução. Não é de hoje que se discute violência,
criminalidade. Eis uma temática que há muito perturba a sociedade. Eis um desafio que
ainda hoje não se equacionou. É o grande dilema do direito penal! Criminaliza?
Despenalizar? Humanizar? Qual a melhor alternativa para se construir um sistema
perfeito de reeducação daqueles que tiveram a infelicidade de infringir o sistema penal
ou o sistema jurídico?”303
Atualmente, vários são os defensores de uma política criminal voltada
para um Direito Penal mínimo, cujo lema é “mínima intervenção, com máximas
garantias”. Mas para que isso ocorra de maneira eficaz, é preciso que os três
Poderes do Estado estejam sintonizados nessa empreitada. O Executivo deve
buscar uma política de prevenção do crime, e não apenas de repressão, como é
feito atualmente. O Judiciário deve propagar que a função do Direito Penal é a de
resguardar os bens jurídicos de forma subsidiária, devendo este ser acionado
somente em casos de ‘ultima ratio’, ou seja, somente quando os outros ramos do
direito não forem suficientes ou se mostrarem inaptos ao efetivo controle social.
Também, ao Poder Judiciário caberá assegurar que os demais princípios
fundamentais do Direito Penal mínimo304, anteriormente estudados, sejam
302
MELO, Op. cit., p. 33.
COSTA, Tailson Pires. Penas alternativas: reeducação adequada ou estímulo a impunidade? São
Paulo: Max Limonad, 1999. p. 9.
304
Os princípios fundamentais do Direito Penal mínimo estudados nesse trabalho foram: princípio da
legalidade, princípio da reserva legal, princípio da humanidade, princípio da culpabilidade, princípio da
proporcionalidade, princípio da fragmentariedade, princípio da subsidiariedade, princípio da adequação
social, princípio da insignificância e princípio da intervenção mínima.
303
73
observados de maneira efetiva. Por fim, o Legislativo deve evitar a
criminalização de novas condutas e o aumento das penas já existentes, bem
como, deverá promover os processos de descriminalização, despenalização,
descarcerização e desinstitucionalização, haja vista, que tais processos atingem o
âmago do sistema penal brasileiro305.
Portanto, se na busca de uma política criminal voltada ao direito penal
mínimo, os três Poderes promoverem uma “deflação penal”, certamente, isto
poderá
transformar
o
aspecto
quantitativo
da
lei em qualitativo,
e
consequentemente, a justiça criminal se tornará mais humanizada306.
5.5.2.1. DESCRIMINALIZAÇÃO
Os processos de descriminalização307 é um dos mais importantes
movimentos de política criminal na atualidade, pois preconiza que “o direito
penal só pode intervir onde se verifiquem lesões insuportáveis das condições
comunitárias essenciais de livre desenvolvimento e realização da personalidade
de cada homem.”308 René DOTTI ensina que “em sentido mais freqüente,
descriminalizar significa abandonar a incriminação de certos fatos ou fazer com
que uma infração perca o seu caráter criminal.”309 Na lição de Heleno
FRAGOSO, citado por Alice BIANCHINI, “uma política criminal moderna
orienta-se no sentido da descriminalização e da desjudicialização, ou seja, no
sentido de contrair ao máximo o sistema punitivo o Estado, dele retirando todas
305
GOMES, Luiz Flávio. Direito de apelar em liberdade; conforme a Constituição Federal e a
Convenção Americana sobre Direitos Humanos: doutrina e jurisprudência. 2 ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1996. p. 98-106.
306
MELO, Op. cit., p. 33-34.
307
De acordo com Marc Ancel, o termo descriminalização foi divulgado pela primeira vez em 1949, em
uma obra de Shedon Gluck. Porém, o próprio autor esclarece que desde 736 uma lei inglesa já trazia este
conceito de forma intrínseca, ao proibir que houvessem perseguições aos acusados de cometer bruxaria.
(DOTTI, René Ariel. Reforma penal brasileira. Rio de Janeiro: Forense, 1988. p.24.)
308
DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito Penal Português: Parte Geral II - As conseqüências jurídicas do
crime. Lisboa: Editorial Notícias, 1993. p. 65.
309
DOTTI, René Ariel. Reforma penal brasileira. Rio de Janeiro: Forense, 1988. p.24.
74
as condutas anti-sociais que podem ser reprimidas e controladas sem o emprego
de sanções criminais.”310
Nessa mesma linha de raciocínio, é a visão de Figueiredo DIAS, pois este
ensina que mesmo quando um ato delituoso violar um bem jurídico, deve-se
tentar acionar outros meios que não os penais, pois estes só devem ser utilizados
em ‘ultima’ ou ‘extrema ratio’311.
Sendo assim, enquanto os adeptos da despenalização buscam soluções
alternativas (penas alternativas), frente ao ‘ius puniend’ estatal, sem valorar o
caráter ilícito das condutas delituosas, a corrente que segue em prol da
descriminalização pede pela exclusão do âmbito penal, de toda e qualquer
conduta que for de pequeno potencial ofensivo. Isto é, toda conduta delituosa que
não merecer ou não necessitar de pena, devera ser descriminalizada, ou seja,
devera ser retirada do âmbito de atuação do direito penal, transformando-a em
ilícito administrativo ou civil, ou simplesmente perder o caráter de ilícito312.
De acordo com os ensinamentos de Raúl CERVINI, a descriminalização é
o meio pelo qual se retira do âmbito do Direito Penal determinadas condutas que
não são graves, e que por isso deixam de ser sancionadas penalmente313.
Já o Comitê do Conselho Europeu (1987) descreve que “se entende por
descriminalização os processos pelos quais a competência do sistema penal para
aplicar sanções como uma reação diante de certas formas de conduta é anulada a
respeito dessa conduta específica.”314
René DOTTI ao citar Louk HULSMAN descreve que entre os diversos
comportamentos que podem ser descriminalizados, destacam-se os relativos às
“normas morais (blasfêmia, infrações sexuais e aborto); às normas sociais
(vagabundagem, mendicidade, abandono da família e toxicomania) e às novas
310
BIANCHINI, Alice. Os grandes movimentos de Política criminal na atualidade: movimento de lei e
ordem,
minimalismo
penal
e
abolicionismo.
Disponível
em:
<http://www.uvb.com.br/main/posgraduacao/Ciencias Criminais/AulasImpressas/PCAula02.pdf>. Acesso
em 29 de março de 2008.
311
DIAS, Questões fundamentais... p. 66.
312
GOMES, Luiz Flávio; BIANCHINI, Alice. O Direito Penal na era da globalização – prisionização
(Hipertrofia irracional do Direito Pena). In Série as Ciências Criminais no Século XXI - vol.10. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 65.
313
CERVINI, Op. cit., p. 72.
314
CERVINI, Op. cit., p. 72.
75
normas ditadas pelas sociedades industrializadas. Por outro lado, pequenas
infrações contra o patrimônio (furtos menores) também podem ser excluídas da
competência do sistema penal.”315
Hoje no Brasil a mais de mil tipos penais. Uma verdadeira hipertrofia
legislativa. Muitas condutas que já deixaram de ser consideradas crimes por uma
expressiva parcela da população, continuam fazendo parte do nosso sistema
penal, apenas por pressões de grupos religiosos ou políticos316. É preciso que
nossos legisladores promovam um amplo programa de descriminalização, em
prol de uma intervenção mínima do Estado. É chegada a hora de se fazer uma
reestruturação completa do Direito Penal brasileiro, pois a maioria da infrações
penais de pequeno potencial ofensivo, já poderiam estar sendo tratadas como
ilícito administrativo ou civil, ou até quem sabe, deixarem de ser consideradas
crimes317.
5.5.2.2. DESCARCERIZAÇÃO
A pena de privativa de liberdade é a intervenção mais violenta que o
direito penal pode impor ao indivíduo que cometeu um ato ilícito. Para Yure de
MELO, sua aplicação é imperfeita, haja vista, que “não repara a situação jurídica
ou fática anterior, não iguala o valor dos bens jurídicos em confronto e impõe um
novo sacrifício social”, ainda mais, não consegue alcançar o seu objetivo
principal, que é a ressocialização do apenado. Por isso, é que se deve buscar a
solução dos conflitos sociais, primeiro no âmbito administrativo e civil, e
somente em ultimo caso, deve-se recorrer a esta modalidade de sanção318.
A descarcerização é o processo pelo qual se atribui outro tipo de
penalidade aos crimes considerados de baixo potencial ofensivo319. Por esta razão
que os defensores de um direito penal mínimo defendem a descarcerização como
315
DOTTI, Reforma penal brasileira... p. 26.
DOTTI, Reforma penal brasileira... p. 26.
317
GOMES, Luiz Flávio; BIANCHINI, Alice. Op. cit., p. 70.
318
MELO, Op. cit., p. 37.
319
SANTOS JÚNIOR, Rosivaldo Toscano dos. As Duas Faces da Política Criminal Contemporânea.
Disponível em: <http://www.jfrn.gov.br/docs/doutrina33.doc>. Acesso em 02 de abril de 2008.
316
76
um meio pelo qual se possa conter o ‘ius puniend’ do Estado, não de maneira
total e irrestrita, mas, apenas para aqueles casos em que medidas alternativas se
mostrem suficientes para solucionar os conflitos penais320.
Na visão de Maurício Ribeiro LOPES, citado por Yure de MELO:
“Ainda que determinada conduta sujeite o seu autor à intervenção do ius puniend do
Estado na generalidade dos casos, cabe o princípio da intervenção mínima identificar,
também, genericamente, hipóteses em que, apesar da amoldação da conduta à norma,
existe circunstância que desaconselha sua aplicação, pois se assim não o fizesse, a
intervenção não seria mínima.”321
Deu-se, que durante os debates da “1ª Conferência sobre Alternativas à
Pena de Prisão”, organizada pela socióloga Julita LEMGRUBER, em outubro de
1994, no Estado do Rio de Janeiro, a inglesa Vivien STERN, Secretária Geral da
“Penal Reform Internacional” (PRI), descreveu textualmente que:
“Devemos aceitar a evidência acumulada em todo o mundo de que a prisão não cura
criminosos. Há, de fato, evidências em demasia que apontam, justamente, para o
contrário: a prisão torna as pessoas piores. Pode torná-las piores porque reforça suas
tendências para a violência e criminalidade, e pode torná-las piores porque se
deterioram de tal forma que, ao sair da prisão, o retorno ao crime é, freqüentemente, a
única alternativa para conseguirem algum dinheiro.”322
De fato, o sistema carcerário, principalmente o brasileiro há muito tempo
não vem cumprindo com a sua função primordial, que é a ressocialização dos
apenados, haja vista, que na maioria dos presídios e cadeias públicas, a
superlotação de presos em celas sem as mínimas condições de higiene, em que
presos dormem uns por cima dos outros, “vegetando numa promiscuidade sem
qualquer objetivo de reabilitação,”323 contribui ainda mais para a degradação
desses indivíduos. A prisão, além de apenas retirar o criminoso do convívio
social, deveria buscar a regeneração desse indivíduo, através de processos
320
MELO, Op. cit., p. 35.
MELO, Op. cit., p. 35. Apud. LOPES, Mauricio Antônio Ribeiro. Princípios Políticos do Direito
Penal – (Série princípios fundamentais do direito penal moderno) vol. 3, 2ª ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1999.
322
MORAES FILHO, Antonio Evaristo de. Rumos atuais do Direito Penal - Descriminalização,
Despenalização
e
novos
tipos.
Disponível
em:
<http://www2.uerj.br/~direito/publicacoes/publicacoes/evaristo_moraes/em_7.html> Acesso em 29 de
março de 2008.
323
NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Comentários à lei de execução penal. São Paulo: Saraiva, 1994. p. 55.
321
77
educativos, que fossem centrados primordialmente na profissionalização e no
desenvolvimento social. Pois hoje o que se vê, é que o fator ressocializador do
sistema penitenciário brasileiro não passa de utopia, pois ao adentrar pelos
portões do cárcere, o apenado se depara com um mundo de terror, violência e
opressão, no qual os mais fortes impõem suas regras, e os mais fracos
obedecem324, pois se não o fizerem, podem acabar pagando com a própria vida325.
Na cadeia não se vive se sobrevive. E há quem diga que lá é o verdadeiro
inferno em vida, ou como bem diz René DOTTI, as cadeias desse país mais
parecem a ante-sala do inferno.
Em face da crise em que vive o sistema penitenciário brasileiro, é preciso
que se evite ao máximo o encarceramento, porque nesse momento, o poder
punitivo estatal tornou-se falho, haja vista, que ele trata com descaso a vida
humana sob sua tutela, pois priva o delinqüente do convívio social, trancando-o
em verdadeiras masmorras medievais, mas esquece que tem o dever de reeducálo e ressocializá-lo, para que um dia volte a conviver com a sociedade326.
De acordo com o Comitê do Conselho da Europa, a descarcerização inclui
todas as possíveis formas de atenuação da sanção penal, bem como medidas
alternativas à prisão, dentre as quais são citadas: limitação de fim de semana,
prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, multa reparatória,
indenização à vítima, semidetenção, interdição temporária de direitos, prisão
domiciliar, inabilitação, diminuição de salário, e todas as demais medidas
alternativas e reeducativas dos sistemas penais327.
O Código Penal português, em seu art. 71, dá ao magistrado, em caso
deste poder optar entre uma pena privativa de liberdade ou uma pena alternativa,
o direito de preferência pela medida alternativa, desde que esta, seja suficiente
324
Nesse sentido, Manoel Pedro Pimentel descreve que: “Na verdade, o que a prisão fechada faz é
socializar o condenado para viver adequadamente em seu mundo restrito, enquanto estiver preso e
submetido às suas regras informais, que se sobrepõem, nesse mundo peculiar, às próprias regras ditadas
pela Administração.” (PIMENTEL, Manoel Pedro. O drama da pena de prisão, In Reforma penal
(diversos autores), Saraiva, 1985, p.55.)
325
MELO, Op. cit., p. 38.
326
COSTA, Op. cit., p. 32.
327
CERVINI, Op. cit., p. 75-76. Apud. Informe del Comite Europeu sobre problemas de la criminalidad,
1980.
78
para promover a ressocialização do delinqüente, bem como, satisfaça as
exigências de prevenção e reprovação do ato delitivo328.
Essa idéia de reduzir a intervenção estatal, aplicando métodos de
descarcerização para os casos de atos lesivos de menor potencial ofensivo, já
vinha brotando a algum tempo em nosso ordenamento jurídico329, e ficou
concretizada com a implantação dos Juizados Especiais Criminais, positivados
pela Lei 9.099/95330. Com o advento da criação dos Juizados Especiais Criminais,
nasce um novo sistema de justiça penal em nosso país, sistema este, que a muito
vinha sendo aclamado pelos defensores do Direito Penal mínimo, e que se tornou
a pedra fundamental para os processos de descarcerização331.
Os processos de descarcerização que a Lei dos Juizados Especiais
Criminais propõe, são baseadas no princípio da intervenção mínima, e por isso,
abrangem medidas que afastam a incidência de uma sanção penal. Portanto, ao
buscar a conciliação entre as partes, promovendo a descarcerização, os Juizados
Especiais Criminais fundam-se nos seguintes institutos: a) da composição civil
(art. 74, parágrafo único), b) da transação penal (art. 76), c) da representação nos
delitos de lesões corporais leves e lesões culposas (Arts. 88 e 91), e d) da
suspensão condicional do processo (art. 89)332.
A composição civil é realizada entre a vítima e o autor do fato delituoso, e
pode ser conduzida por juiz togado ou conciliador. Com a composição civil, o
legislador criou a possibilidade de se resolverem ao mesmo tempo, questões que
dizem respeito às jurisdições civil e penal, que podem compreender danos
materiais e, ou danos morais decorrentes de atos ilícitos. O limite do acordo fica
a critério das partes, mas uma vez homologado, é irrecorrível e tem eficácia de
título executivo a ser interposto no juízo civil. Outrossim, o acordo também
328
ALBERGARIA, Op. cit., p. 47.
Inspirados na nova ideologia de um Direito Penal mínimo e na necessidade urgente de desafogar o
sistema judiciário, através de medidas mais rápidas, eficazes e que proporcionassem uma maior economia
processual, os constituintes de 1988 estabeleceram no art. 98, inciso I da Constituição Federal brasileira
os Juizados Especiais Criminais.
330
MELO, Op. cit., p. 30.
331
MELO, Op. cit., p. 57.
332
MELO, Op. cit., p. 36.
329
79
extingue a punibilidade de delitos de ação pública de natureza condicionada ou
privada333.
A transação penal ancora-se na idéia de um acordo de vontades entre o
titular da ação penal e o autor do delito. O representante do Ministério Público ao
verificar que estão atendidas as condições legais exigidas para a consecução da
transação penal, proporá ao autor do ato delituoso, uma pena restritiva de direitos
ou multa, que uma vez aceita gerará uma sentença homologatória de transação
penal, prevista no art. 76 da Lei dos Juizados Especiais Criminais334.
Sendo assim, de acordo com os ensinamentos de Edison Miguel da
SILVA JR. a transação penal pode ser considerada como uma alternativa ao
processo penal e a seus efeitos, pois, busca a solução dos conflitos penais, através
do consenso entre as partes envolvidas, sem que estes tenham que ingressar no
sistema penal intimatório e conflitivo335.
Com maestria SILVA JR ao citar Rogério SCHIETTI assim descreve:
“Intui-se, portanto, que ambos os protagonistas dessa transação penal buscam, com o
certo de vontades, evitar o processo. O Ministério Público abdica da persecução penal,
obviando a formulação de denúncia e toda a atividade processual que decorreria do
exercício do ius acusationis; o Autuado também evita o processo... preferindo sujeitarse a uma pena que, em sendo cumprida, permitirá a extinção da punibilidade.”336 [sic]
Ao aceitar a proposta do membro do ‘parquet’, o autor da infração penal
não reconhece a culpa, mas ao cumpri-la, verá extinta a sua punibilidade337.
Outrossim, de acordo com o art. 76, § 4º da Lei 9.099/95, a transação penal não
gerará reincidência, mas será registrada apenas para impossibilitar que o
individuo que dela se beneficiou, faça uso desse instituto por um prazo de 5
(cinco) anos.
É importante trazer à baila, que a sentença homologatória da transação
penal tem natureza condenatória e gera coisa julgada material e formal, por isso,
se o autor do fato delituoso descumprir o acordo firmado na sentença de
333
MELO, Op. cit., p. 58-59.
MELO, Op. cit., p. 36.
335
SILVA JR, Edison Miguel da. Eixo Ideológico da Lei 9.099/95: Direito Penal Mínimo. Disponível
em: <http://www.mp.rs.gov.br/criminal/doutrina/id68.htm>. Acesso em 02 de abril de 2008.
336
SILVA JR, Edison Miguel da. Op. cit., Apud. SCHIETI, Rogério. (Revista do TRF - 1ª Região, vol.8,
nº 2, p.30).
337
MELO, Op. cit., p. 60.
334
80
homologação, contra ele não poderá ser instaurado nova ação penal338. Nos casos
em que o descumprimento do pactuado na homologação for referente a quantia
em dinheiro (pena de multa), o que poderá ocorrer, é a inscrição da pena não
paga em dívida ativa da União, que deverá ser cobrada através de um processo de
execução, pois tratasse de um título executivo judicial, abrangido pela legislação
processual civil339.
A suspensão condicional do processo é uma espécie de transação
processual que pode ser aplicada a todos os tipos de infrações penais, cuja pena
mínima cominada seja igual ou inferior a 1(ano)340, abrangidas ou não pelo
Código Penal, desde que o acusado esteja de acordo com os requisitos dispostos
no art. 89, ‘caput’, da Lei 9.099/95341. É um importante instituto de
despenalização utilizado pela Justiça Criminal de nosso país, haja vista, propicia
ao titular da ação (Ministério público), ao oferecer a denúncia, propor a
suspensão do processo, sem buscar a condenação do acusado, e este, sem entrar
no mérito da sua culpabilidade, submete-se a certas condições, por um tempo
determinado, que ao seu término extinguirá a sua punibilidade. Ao permitir que o
titular da ação proponha a suspensão do processo, o instituto da suspensão
condicional do processo atenuou o princípio da indisponibilidade da ação
pública, ora muito rígida342.
338
ALENCAR, Rosmar Antonni Rodrigues Cavalcanti de. Natureza jurídica da transação penal e efeitos
decorrentes. Revista do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte, v. 7, p. 115-132, 2005. .
339
Nesse sentido, assim dispõe o seguinte julgado: “CRIMINAL. HC. NULIDADE. LEI 9.099/95.
DESCUMPRIMENTO DE ACORDO FIRMADO E HOMOLOGADO EM TRANSAÇÃO PENAL.
OFERECIMENTO DE DENÚNCIA. IMPOSSIBILIDADE. SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA. COISA
JULGADA MATERIAL E FORMAL. EXECUÇÃO DA MULTA PELAS VIAS PRÓPRIAS.
RECURSO PROVIDO. I - A sentença homologatória da transação penal, prevista no art. 76 da Lei nº
9.099/95, tem natureza condenatória e gera eficácia de coisa julgada material e formal, obstando a
instauração de ação penal contra o autor do fato, se descumprido o acordo homologado. II - No caso de
descumprimento da pena de multa, conjuga-se o art. 85 da Lei nº 9.099/95 e o 51 do CP, com a nova
redação dada pela Lei nº 9.286/96, com a inscrição da pena não paga em dívida ativa da União para ser
executada. III - Ordem concedida para determinar o trancamento da ação penal.” (HC 33487/SP, rel. Min.
Gilson Dipp, DJ 01.07.2004). Ainda nesse sentido: (HC 11111, Quinta Turma, Min. rel. Jorge
Scartezzini, DJ: 18/12/2000).
340
MELO, Op. cit., p. 60.
341
O texto legal contido no artigo 89, caput, da Lei 9.099/95, assim descreve: “Nos crimes em que a pena
mínima cominada for igual ou inferior a um ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao
oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos desde que o acusado
não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos
que autorizariam a suspensão condicional da pena (art. 77 do Código Penal).”
342
MELO, Op. cit., p. 60.
81
Por fim, com base nos arts. 88 e 91 da Lei dos Juizados Especiais
Criminais343, para que haja prosseguimento das ações penais relativas a delitos de
lesões corporais leves e lesões culposas, o exercício da ação penal pelo
representante do Ministério Público deverá estar condicionado a prévia
representação do ofendido ou de seu representante legal344. Ou seja, caso o
ofendido ou seu representante legal renuncie expressamente em audiência, o seu
direito de representação contra lesões corporais leves e lesões culposas, o
magistrado declarará em seguida, extinta a punibilidade do autor do delito345.
É por isso, que com base no que fora anteriormente relatado, hoje em dia a
descarcerização346 é o meio pelo qual o Estado busca solucionar os conflitos
ocorridos na sociedade aplicando meios alternativos contra as condutas
desviadas, sem ter que valorar o caráter ilícito dessas condutas347.
Nesse sentido, Luiz Flávio GOMES defende a necessidade de se promover
a descarcerização, proclamando que “diante da falência da ideologia do
tratamento ressocializador e das prisões, do elevadíssimo custo operacional do
sistema penal e da existência de leis penais desconexas a descarcerização se torna
necessária.”348
Portanto, ante ao exposto, sempre que houver a prática de uma infração de
menor potencial ofensivo, deve-se buscar a descarcerização, aplicando-se
medidas alternativas, que venham a divergir da pena privativa de liberdade349.
343
Os arts. 88 e 91 da Lei dos Juizados Especiais Criminais dispõem que: Art. 88 - “Além das hipóteses
do Código Penal e da legislação especial, dependerá de representação a ação penal relativa aos crimes de
lesões corporais leves e lesões culposas.” Art. 91 – “Nos casos em que esta Lei passe a exigir
representação para a propositura da ação penal pública, o ofendido ou seu representante legal será
intimado para oferecê-la no prazo de 30 (trinta dias), sob pena de decadência.”
344
MELO, Op. cit., p. 33-37.
345
MELO, Op. cit., p. 59.
346
Sobre a descarcerização Yure de Melo ao citar Luiz Flávio Gomes, descreve que: “só é considerada
legítima a criminalização de um fato se a mesma constitui meio necessário para a proteção de um
determinado bem jurídico.” (MELO, Op. cit., p. 35. Apud. GOMES, Luiz Flávio. Suspensão condicional
do processo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997).
347
MELO, Op. cit., p. 35.
348
MELO, Op. cit., p. 40. Apud. GOMES, Luiz Flávio. Suspensão condicional do processo penal. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.
349
MELO, Op. cit., p. 39.
82
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ora, por tudo que foi exposto é fácil concluir que uma vez ocorrida a
violação a uma norma penal, não basta apenas e tão somente, ‘punir, encarcerar e
vigiar’ o agente que praticou o ato delituoso, muito menos não se pode aceitar o
modelos de política criminal como o autoritarista da ‘Lei e Ordem’ que muito foi
utilizado no regime militar, e que pregava um enrijecimento do sistema penal,
por meio do rigor da reação penal; ou ainda o da ‘Tolerância zero’ que nada mais
é que um meio ainda mais cruel de segregação humana, pois age de maneira
agressiva e desproporcional, apenas com a parcela mais carente da população; ou
até mesmo o modelo de ‘Direito penal do inimigo’, que não considera
determinados indivíduos como ‘pessoas’ e sim como ‘inimigos de guerra’, que
devem ser combatidos, sem as garantias processuais do Estado de Direito, haja
vista que tal aceitação acarretaria em um retrocesso histórico.
Então, deve-se reconhecer que a pena privativa de liberdade, enquanto
objeto de reeducação e ressocialização de apenados a muito tempo se tornou
ineficaz, ou melhor dizendo, nunca o foi, haja vista que o projeto prisional do
Estado se tornou um fracasso, ante as péssimas condições de vida em que vivem
os presos em todo o mundo, mas principalmente em nosso país.
Por isso, que a pena privativa de liberdade deve ficar restrita somente aos
casos de violações extremamente graves, ou seja, somente naqueles casos em
que penas e medidas alternativas não puderem ser aplicadas, pois, não será
através da implantação de modelos autoritários como o da ‘Tolerância zero’, do
‘Direito Penal do inimigo’ ou
da ‘ Lei e Ordem’ que farão diminuir a
criminalidade em nosso país.
Não é possível admitir que em razão de uma mídia persuasiva, que
acredita e faz acreditar que o Direito Penal é o remédio para todos os males,
venhamos a aceitar que a edição de leis imediatistas (como é o caso da ‘Lei dos
crimes Hediondos’, lei esta que surgiu em razão do assassinato de uma atriz
global - caso Daniela Perez, e basicamente fez com que alguns crimes tivessem
penas mais severas ou talvez uma lei que venha a reduzir a imputabilidade
83
penal, e mais uma vez podemos citar a repercussão que teve na mídia o caso do
menino João Helio), possam dar resultados efetivos em relação ao controle da
criminalidade.
Portanto, o Estado ao fazer uso do seu ‘ius puniend’, deve fazê-lo da
forma mais branda possível, racionalizando o poder punitivo estatal e tornando o
Direito Penal, um sistema de garantias que não apenas e tão-somente, sirva como
instrumento de vingança pública, mas sim, que garanta a dignidade e o direito de
liberdade de seus cidadãos. Visando assim, medidas que garantam que o agente
delitivo venha a pagar por seus crimes de maneira não tão rígida, mais sim, de
forma que seja proporcional a sua culpa, pode-se concluir que dentre todos os
movimentos de política criminal existentes, o que mais se enquadra na realidade
brasileira e tem como objetivo primordial garantir uma maior proteção aos
direitos fundamentais e a dignidade da pessoa humana é o ‘Direito Penal
mínimo’.
Nesse caso, pode-se dizer que a finalidade do Direito Penal mínimo é a de
evitar que o Direito Penal seja aplicado como a panacéia para todos os males,
deixando assim, seqüelas que jamais serão apagadas. Como exemplo disso,
podemos citar o que ocorre com os egressos do sistema penal, que mesmo depois
de terem cumprido a sua pena, continuam vivendo sobre o olhar reprovador da
sociedade, ficando eternamente rotulados como marginais.
Esta pesquisa tentou demonstrar que a intervenção estatal só deve
acontecer quando for estritamente necessária, ou seja, quando esta for a ‘ultima
ratio’ e que é preciso que se reduzam os mecanismos punitivos do Estado, dando
assim, condições para a formação do chamado ‘Direito Penal mínimo’.
Assim, constata-se que o Direito Penal mínimo está intimamente ligado a
idéia de um exercício racional e limitado do poder do Estado, e que de certa
forma esta condicionado a obedecer de forma ilimitada as garantias e direitos
fundamentais do cidadão, historicamente constitucionalizados em nossa
Constituição Federal.
84
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