Presença de insulina em plantas
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Presença de insulina em plantas
A A PRESENÇA DE INSULINA EM PLANTAS José Xavier Filho Universidade Estadual do Norte Fluminense Mesa Redonda Sobre Proteínas PRESENÇA DE INSULINA EM PLANTAS Insulina foi descoberta em 1921 por um grupo de pesquisadores canadenses em conexão com o tratamento do diabetes (1). Logo a substância foi considerada de uma importância muito grande pelos benefícios que sua administração trouxe para a melhoria das condições de vida dos portadores dessa doença. Insulina, isolada a princípio de pâncreas de cães, tomou esse nome devido ao fato de estar presente nas ilhotas de Langerhans deste órgão. Ela foi classificada como um hormônio peptídico associado ao metabolismo de carboidratos, especialmente com a metabolização de glicose. Frederick Grant Banting e John James Richard Macleod receberam o Prêmio Nobel de Fisiologia e Medicina em 1923 por sua descoberta. Logo depois mostrou-se que o hormônio era uma proteína de cerca de 6 kDa (2). Uma substância (protéica) de massa molecular dessa ordem pode ser chamada de proteína? Até hoje se discute se insulina é uma proteína ou um polipeptídeo. Abaixo estão mensagens recentes trocadas em um site de discussão: -----Original Message----From: [email protected] [mailto:[email protected]]On Behalf Of [email protected] Sent: Thursday, May 10, 2001 7:39 AM To: [email protected] Subject: small proteins Hello, today we came across a question not realy linked to science: what is the minimal size for a protein? Or put in another way: what is the smallest protein known? We found a definition in a chemistry textbook which says from 100 aminoacids on oligopeptides should be named "proteins". This seems to be rather simple. The smallest one which came to my mind is cobratoxin with 71 aa. Any suggestions? Thomas ------------- Original Message -------------"E. S" <[email protected]> wrote: To:Bernhard Rupp <[email protected]> From:"E. S" <[email protected]> Date:Fri, 11 May 2001 09:16:03 +0530 CC:[email protected], [email protected] Subject:Re: small proteins Insulin has 51 aa. Many plant seed proteins are even smaller. We probably need a "modern" definition for what constitutes a protein, in the light of what we know about them today. I would like to suggest a definition like the following, for a debate: a protein is any peptide against which one can raise antibodies? This definition implicitly assumes the presence of a stable fold/motif as well. Any better suggestions? E. Subramanian O peptídeo/proteína insulina foi uma das primeiras proteínas a serem cristalizadas, em 1926 por J. J. Abel (3). Foi a primeira proteína a ser seqüenciada, em 1955, por F. Sanger que, por isso, recebeu o Prêmio Nobel de Química de 1958 (4). A associação de insulina ao pâncreas, mais especificamente às ilhotas de Langerhans, sugeria que ela fosse uma molécula presente exclusivamente em animais e, mesmo assim, em vertebrados. No entanto, mesmo no início da década de ´20, pesquisadores envolvidos na descoberta de insulina em pâncreas sugeriram a presença desta proteína/hormônio ou alguma molécula relacionada em plantas (5,6). Um desses pesquisadores, J. B. Collip, chegou a criar um novo nome para a molécula derivada de plantas: glucocinina. A razão para isso foi que ele não aceitava que o nome dado a uma molécula, que fazia referência ao tecido animal do qual havia sido extraída, fosse também usado para uma molécula originada de plantas. A utilização de extratos de partes de plantas (folhas, frutos, raízes, etc.) para o tratamento do diabetes é conhecida desde tempos imemoriais. Entretanto, as razões para sua utilização não são claras. Em alguns poucos casos sugere-se que moléculas pequenas, como salacinol, metformina e outras sejam os responsáveis pelos efeitos. Estes se traduzem em uma diminuição dos níveis de glicose no sangue dos doentes (e também em indivíduos sadios) (7, 8, 9). A partir de 1974 Khanna e colaboradores sugeriram que os frutos e sementes de melãode-São Caetano contêm uma proteína que apresenta propriedades químicas e biológicas semelhantes às de insulinas animais. O grupo patenteou o processo de obtenção dessa “proteína p” e colocou o produto à venda como eficaz no tratamento do diabetes (10, 11, 12, 13). Este produto tem, aparentemente, estrutura assemelhada às insulinas animais (13). Em seguida em 1987, Collier et al. comunicaram o isolamento de proteínas de espinafre, centeio e Lemna gibba com massas moleculares, propriedades cromatográficas, identidade imunológica e atividade biológica idênticas às apresentadas por insulinas de vertebrados. Nenhuma informação estrutural foi apresentada para essas proteínas (14). Recentemente nós descobrimos, inteiramente por acaso (“serendipity”), que uma proteína isolada do tegumento das sementes de feijão-de-porco (Canavalia ensiformis) tem a mesma massa molecular e seqüência de amino ácidos que insulina bovina. Encontramos também, associado a essa proteína, um fragmento de uma outra proteína com 15 resíduos de amino ácidos que apresentou homologia de seqüência com um receptor de insulina humana (15). Estes resultados nos levaram a estabelecer uma linha de pesquisa a fim de desenvolver trabalhos que nos levassem a responder às perguntas principais que foram postas para nós: A proteína insulina está presente em plantas ? qual é sua função ? A partir de então, temos acumulado uma considerável soma de resultados sugerindo fortemente que uma molécula de proteína/polipeptídeo, com as características de insulina de vertebrados (mamíferos), está presente tanto em plantas como em fungos e cianobactérias (16): Resultados recentes do Laboratório, nem todos já submetidos para publicação, sugerem que insulina de plantas localiza-se em órgãos/tecidos envolvidos em processos de transporte/metabolização de carboidratos, principalmente de glicose. Assim é que detectamos ou verificamos os efeitos de insulina (ou antígenos) em • • • • Tegumentos de sementes (Oliveira AEA) Folhas verdes (Azevedo C/Belarmindo Silva L/Oliveira V) Raízes jovens (Azevedo C/Belarmindo Silva L/Oliveira V) Fruto (legume) imaturo (Venâncio et al., submetido) (17) • • Sementes germinantes (Oliveira et al., submetido) (18) Células em suspensão (de fumo) (Belarmindo Silva L) Tendo em vista todos os resultados obtidos no Laboratório, talvez seja lícito especular que insulina é uma proteína/hormônio necessário à metabolização de glicose e que foi conservado durante a evolução dos seres vivos. Desde que a presença de insulina (peptídeo/proteína) em plantas ficou clara para nós e foi aceita no nosso Laboratório passamos a ter de lidar com o problema da aceitação da descoberta. A princípio, a notícia do isolamento de uma insulina de plantas caiu como uma bomba na imprensa diária, seja a de Campos (A Cidade, Folha da Manhã, Gazeta Mercantil), de Fortaleza (O Povo e o Diário do Nordeste) ou nacional (Folha de São Paulo). A reação positiva foi muito fácil de entender pois, tratando-se de insulina, uma substância de grande valor no tratamento do diabetes, os resultados foram tomados como indicativos de boa perspectivas para sua produção e comercialização a, talvez, baixos custos. Veículos de divulgação científica (Diabetes Clínica e Biotecnologia) também foram simpáticos à idéia que tentávamos divulgar, além do aspecto óbvio envolvido. Isto é, a idéia de que plantas também utilizam rotas de sinalização dependentes do hormônio insulina. A comunidade que envolve diabéticos e clínicos de certa faixa também teve uma reação positiva haja vista o número de mensagens e cartas recebidas e os contactos diretos mantidos com a equipe. A aceitação por parte da comunidade científica foi e tem sido uma dificuldade. Nossos resultados não têm sido aceitos internacionalmente, seja pela comunidade de bioquímicos de um modo geral, seja pela de cientistas de plantas, mais especificamente. Esta não aceitação é traduzida pela rejeição de manuscritos pelas mais variadas revistas internacionais (Science, Nature, Proceedings of the National Academy of Science, European Journal of Biochemistry, Plant Science, Plant Physiology, Physiologia Plantarum, etc). Após reiteradas submissões (5 em um caso e 4 em outros dois) os dois manuscritos já publicados o foram pelas revistas Protein and Peptide Letters e Brazilian Journal of Medical and Biological Research (19). • Gene A percepção de que a presença de insulina em plantas represente um importante fato científico que levaria à mudança do paradigma que reza que os vegetais não utilizam esse hormônio em processos de metabolização de glicose, como em animais, tem nos trazido dificuldades na publicação de resultados, como já dito acima. Isso nos tem levado a um esforço para caracterizar a informação genética correspondente a essa proteína/polipeptídeo e certamente inscrita no genoma das plantas. Essa caracterização seria necessária a uma aceitação pacífica de, pelo menos, a existência do sistema GENE>PROTEÍNA. Esperamos, dentro em breve, ter a resposta para esta questão que transformaria a insulina de plantas de UMA PROTEÍNA À PROCURA DE UM GENE a uma proteína com paternidade definida. Referências 01. Banting FG, Best CH (1922). The internal secretion of the pancreas. Journal of Laboratory and Clinical Medicine, 7: 465-480. 02. Harfenist EJ, Craig LC (1952). The molecular weight of insulin. Journal of American Chemistry Society, 74: 3087-3089. 03. Abel JJ (1926). Crystalline insulin. Proceedings of National Academy of Sciences, 12: 132-136. 04. Sanger F (1959). Chemistry of insulin. Science, 129: 1340-1344. 05. Collip JB (1923). Glucokinin. A new hormone present in plant tissue. Preliminary paper. The Journal of Biological Chemistry, 56: 513-543. 06. Best CH (1924). Recent work on insulin. Endocrynology, 8: 617-629. 07. Gray AM, Flatt PR (1997). Nature's own pharmacy: The diabetes perspective. Proceedings of Nutritional Society, 56: 507-517. 08. Oliveira AEA, Azevedo CR, Venâncio TM, Machado OLT e Xavier-Filho J (2000). Presença de insulina em plantas: Função biológica e possível validação de sua utilização no tratamento do diabetes. Diabetes Clínica, 4: 283-290 (2000) 09. Oliveira AEA, Azevedo CR, Venâncio TM, Silva LB, Cruz MAL, Machado OLT, da Cunha M, Santos VO, Cavalcante CP, Uchoa AF, Fernandes KVS, Gomes VM, Astolfi Filho S, Xavier-Filho J(2001). Insulina de Plantas. Biotecnologia, 19/III: 3641. 10. Khanna P, Nag TN, Jain SC, Mohan S (1974). Extraction of insulin from a plant source. 3rd International Congress on Plant Tissue & Cell Cultures, 21-26th July, Leicester, UK. 11. Khanna P, Nag TN, Chandrajaia S, Mohan SV (1976). Process for isolation of insulin from plant source. United States Patent, 3: 945-988. 12. Khanna P, Jain SC, Panagariya A, Dixit VP (1981). Hypoglycemic activity of Polypeptide-P from a plant source. Journal of Natural Products, 44: 648-655. 13. Gourdin. http://www.gourdin.com/ 14. Collier E, Watkinson A, Cleland CF, Roth J (1987). Partial purification and characterization of an insulin-like material from spinach and Lemna gibba G3. The Journal of Biological Chemistry, 262: 6238-6247. 15. Oliveira AEA, Machado OLT, Gomes VM, Xavier-Neto J, Pereira AC, Vieira JGH, Fernandes KVS, Xavier-Filho J (1999). Jack bean seed coat contains a protein with complete sequence homology to bovine insulin. Protein and Peptide Letters, 6: 1521. 16. Silva LB, Santos SSS, Azevedo CR, Cruz MAL, Venâncio TM, Cavalcante CP, Uchôa AF, Astolfi-Filho S, Oliveira AEA, Fernandes KVS, Xavier-Filho J (2002). The leaves of green plants as well as a cyanobacterium, red alga, and fungi contain insulin-like antigens. Brazilian Journal of Medical and Biological Research, 35: 297-303. 17. Oliveira AEA, Ribeiro ES, Da Cunha M., Gomes VM, Fernandes KVS, XavierFilho J. Insulin accelerates Canavalia ensiformis seeds germination and development. Submetido. 18. Venâncio TM, Oliveira AEA, Silva LB, Machado OLT, Fernandes KVS, XavierFilho J. A 5.6 kDa protein with sequence homology to bovine insulin is found in the legume Vigna unguiculata (Cowpea). Submetido.19. Xavier Filho J (2002). Aceites e Rejeições ou Como Chegamos Às Vicilinas E Às Insulinas. http://www.jxavierfilho.hpg.ig.com.br/index.htm