TELECOMUNICAÇÕES - Grupo de Estudo Estratégia

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TELECOMUNICAÇÕES - Grupo de Estudo Estratégia
TELECOMUNICAÇÕES: A EXPANSÃO DA TELEFONICA NOS PAÍSES DA
AMÉRICA LATINA
Luis Alberto Noriega Vera1
Adalberto Américo Fischmann2
RESUMO
Nas últimas décadas um dos setores que exerceram uma forte influência nas economias dos
países desenvolvidos e em desenvolvimento tem sido o das telecomunicações. Alguns desses
países têm investido maciçamente em pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias para
o setor.
Um dos operadores que tem demonstrado um forte interesse no mercado internacional e, mais
especificamente no latino-americano, é o grupo espanhol liderado pela Telefónica de España,
Por intermédio da Telefônica Internacional, a Telefonica visa a sua expansão no mercado
latino-americano criando valor agregado com a oferta de serviços integrados (voz, vídeo e
dados; comunicações móveis e multimídia), fortalecendo a sua imagem corporativa e
aproveitando sua estrutura de negócios (incluído o desenvolvimento de novas tecnologias).
A partir de um estudo exploratório procurou-se analisar as vantagens e/ou desvantagens da
privatização do setor de telecomunicações em alguns países operados pela Telefonica no que
se relaciona ao nível de serviços atingido com esse processo.
1
Introdução
A Telefonica, principal operador e primeiro grupo privado no setor de telecomunicações da
Espanha vem conquistando um expressivo espaço no mercado latino-americano desse setor. A
aquisição da empresa brasileira Telesp (telefonia fixa) e a concessão da telefonia celular das
regiões leste e sudeste do país é uma das últimas adjudicações. Essa organização já se
encontrava no Brasil desde 1996, participando da gestão da Companhia Riograndense de
Telecomunicações – CRT com 85,12% do capital com direito a voto, compromisso esse
mantido após o leilão de ações que ela adquiriu em julho de 1998.
Afora o Brasil, a Telefonica está presente nos seguintes países e regiões:
• norte da Argentina – incluindo a região norte da capital Buenos Aires, a outra parte é
controlada pela France Telecom;
• Chile – 91% do mercado de telefonia local;
• Peru – controle da telefonia local nacional e internacional;
• Porto Rico – comunicações de longa distância;
• Venezuela – telefonia local, nacional e internacional;
• El Salvador – recente aquisição, foco na América Central;
• Portugal – desenvolvimento de sistemas;
• Estados Unidos – transmissão de dados.
1
2
Mestre em Administração – FEA/USP e doutorando da Escola Politécnica – USP([email protected])
Professor Titular FEA/USP ([email protected])
Telefonica participa no mercado latino-americano por intermédio da Telefônica Internacional.
As operações do conglomerado incluem a telefonia mídia, móvel e intercontinental
(Telefónica – consulta internet, 1998).
Algumas da estratégias dessa organização visam a expansão de sua participação no mercado
de telecomunicações – criando valor agregado a partir dos seus serviços – o ordenamento dos
múltiplos negócios que ela possui e a ampliação da presença geográfica dos mesmos. Um
exemplo disso é o atual nome Telefonica, uma tentativa de padronizar o logotipo da
organização ao idioma falado nos mercados onde ela atua e, dessa forma, o cliente reconhecela quer ele esteja em São Paulo ou em Caracas. Além da estratégia de fortalecimento de sua
imagem corporativa, a estratégia de expansão inclui a oferta de serviços integrados de valor
agregado (voz, vídeo e dados; comunicações móveis e multimídia). Ela também procura as
parcerias internacionais visando aumentar a sua participação em mercados emergentes e o
desenvolvimento de sistemas.
A Telefonica está conseguindo aliados importantes para essa expansão. Apesar de polêmicos,
os governos e seus programas de privatização, conseguiram que ambas as partes – a própria
Telefonica e os países onde ela passou a operar – obtivessem os benefícios, recursos e as
oportunidades de negócios necessários a este tipo de operações. Contudo, algumas questões
são levantadas a partir desse novo panorama nos serviços de telecomunicações. Por um lado,
quais seriam as conseqüências da privatização desses serviços? De outro, qual a influência de
sua expansão sobre o nível de qualidade do serviço e no consumidor final?
O trabalho visa a elaboração de um estudo exploratório dos principais indicadores do setor
telecomunicações em alguns mercados latino-americanos em que a Telefonica está operando,
identificando as vantagens e/ou desvantagens do processo de privatização e a sua influência
no nível de serviços de telefonia.
2
As organizações globais e a sua participação nos processos de privatização
Nos últimos anos, alguns indicadores têm sido usados para explicar as mudanças sociais,
políticas, econômicas e tecnológicas na maior parte dos países, tanto desenvolvidos como em
desenvolvimento. Alguns desses indicadores relacionam-se com a redefinição do poder
exercido pelo capital e a influência deste nas relações de trabalho, na distribuição da riqueza e
nas relações entre países e/ou grupos econômicos – algo amplamente discutido por Marx na
sua celebre obra O Capital.
Pode ser observado que as regras estabelecidas para mediar essas relações hoje são mais
“abertas”, ou pelo menos pretendem ser. Ao longo dos anos, as relações de poder tem sido
discutidas por diversos pensadores que tentaram explicar as formas e instrumentos de poder
existentes (Machiavel,1991; Foucault, 1984; Galbraith, 1984; entre outros)
A evolução das relações do poder tem permeado diferentes mudanças no contexto mundial.
Por exemplo, alguns autores consideram que o processo de globalização é mais um exemplo
do exercício de poder do capital por parte dos seus detentores. Segundo Theophilo (1998), o
processo de globalização atingiu um estágio abrangente, em que as relações econômicas se
antepõe às questões ideológicas. As dimensões dos problemas econômico-financeiros, sociais,
científicos, tecnológicos, culturais, entre outros, ultrapassaram os antigos limites das
fronteiras. Como conseqüência desse fenômeno abrangente, novos regulamentos e
procedimentos deverão ser adotados.
No atual contexto, as pessoas e as organizações – públicas e privadas, em âmbito nacional e
internacional – precisam adaptar-se a essas mudanças. As organizações globais estão cientes
do alto índice de obsolescência tecnológica e do valor agregado a ser gerado a partir dos seus
processos produtivos – tanto de produtos como de serviços (Hoogvelt, 1997).
A necessidade de definir estratégias é importante para essas organizações. Para elas a visão do
futuro é fundamental para planejar ações que permitam conquistar mercados além-fronteiras.
Diante dessa perspectiva, os ensinamentos básicos da administração e planejamento
estratégicos são sempre lembrados e instrumentos de gestão são desenvolvidos para ajudar na
tomada de decisões (Porter, 1996). Assim, a influência das mudanças tecnológicas, das
necessidades dos compradores e das políticas governamentais são elementos que criam
condições para a diferenciação de algumas organizações e, dessa forma, elas poderem tornarse competitivas a partir de uma estratégia global (Porter, 1993).
Mais especificamente em relação ao setor de telecomunicações, Hawkins (1995) acredita que
o impulso em direção a uma economia globalizada está estreitamente relacionada ao aumento
da disponibilidade de informações dos bens e serviços e ao desenvolvimento e difusão de
tecnologias para o processamento e distribuição dessas informações. Contudo, o setor está
composto de economias classificadas em três categorias:
• economias dominantes com um grau de desenvolvimento tecnológico das informações e
comunicações expressivo – como no caso dos países dos G7: EUA, Canadá, Inglaterra,
França, Alemanha, Itália e Japão;
• economias que conseguiram implementar programas de Pesquisa e Desenvolvimento de
novas tecnologias em áreas específicas;
• economias que dependem das operações de importação para poder atingir um certo grau de
desenvolvimento.
Esse grau de desenvolvimento é requisito fundamental para conseguir se encaixar dentro da
denominada era da informação, na qual tanto países desenvolvidos como em desenvolvimento
estão interessados em participar. Alguns processos de mudança organizacional foram
utilizados para atender às exigências do contexto global, dentre os quais destacam-se os
processos de reengenharia, terceirização, privatização, entre outros.
Na história recente de alguns países observa-se que a privatização foi uma das opções
adotadas para se desfazer daquilo que os administradores públicos não conseguiam
administrar, uma vez que a burocracia mal interpretada apresentou-se incapaz de acompanhar
a dinâmica dos processos de mudança que ocorriam no dia-a-dia.
No caso do Brasil a experiência de países como a Inglaterra em relação às privatizações
coincidiu com o que em 1979 caracterizou-se como o primeiro movimento de
desburocratização, com a criação do Programa Nacional de Desburocratização. Segundo
Amaral, o objetivo do programa foi alcançar o que hoje em termos de serviços públicos é
indicado como uma pré-condição: a melhoria do atendimento aos usuários (Amaral, 1996).
No processo de privatização, os principais atores são: o Estado, que dita as regras para que o
processo seja levado de modo a não transgredir a própria constituição, as operadoras
interessadas, que possuem considerável capacidade para reerguer as empresas privatizáveis e,
ainda, a sociedade, desorientada sobre o processo.
O irônico deste novo processo de privatização é que está sendo transferido à iniciativa privada
aquilo que foi estatizado em décadas passadas, pois, naquela época, não se procurou
identificar um agente controlador capaz e imune aos interesses políticos sempre existentes
nesse contexto (Johnson, 1996). Hoje em dia a privatização é necessária, porque esse processo
acompanha o da globalização – esses processos possuem a mesma geratriz, representada pela
nova ordem interna onde o tamanho do Estado deveria ser diminuído e a sua atuação nas
relações econômicas limitada (Theophilo, 1998).
O comprometimento do governo é garantir a dotação de uma infra-estrutura de
telecomunicações adequada para seus cidadãos atingirem um nível de qualidade de vida
aceitável. Para isto, o processo de privatização e/ou concessão desses serviços também tem de
assegurar que as partes interessadas (Estado, operadores e consumidores) satisfaçam seus
objetivos particulares, o que implica na existência de um sistema de controle e supervisão.
(que no caso do Brasil estaria representado pela Agencia Nacional de Telecomunicações –
ANATEL).
3.
Tendências no setor de telecomunicações
Como comentado, a reorganização operacional e comercial de vários setores econômicos no
mundo influenciou o setor de telecomunicações. A deficitária infra-estrutura existente nesse
setor foi determinante na decisão de alguns governos de países em desenvolvimento de aceitar
a necessidade de estimular suas economias através de sua privatização (O’Neill, 1991).
As previsões feitas no início da década de 90 demonstravam uma forte animosidade em torno
ao setor. Mais recentemente algumas previsões das operações do mercado global de
telecomunicações estimaram um crescimento em torno de US$ 1 trilhão para o ano 2000
comparativamente aos US$ 700 bilhões de receitas anuais obtidas no ano de 1997 (Raphael,
1998). No panorama previsto para o ano 2000 os países europeus e os Estados Unidos da
América partilhariam 50% do mercado enquanto a América Latina dobraria a sua participação
(id. ibid.). Outras previsões do efeito da globalização no mercado das telecomunicações são
apresentados no quadro 1
3.1
Países centrais e periféricos no setor de telecomunicações
Segundo Barnett e Salisbury, a partir do avanço tecnológico existente no setor foi criada uma
rede na qual países como os Estados Unidos e alguns países da Europa encontram-se em
posição hegemônica. Essa classificação adotada pelos autores baseia-se na forte correlação
existente entre a posição dos países na rede – central ou periférica – e o PIB per capita gerado
em cada um deles (Barnett & Salisbury, 1996). Para eles, o advento da globalização das
telecomunicações, tornou essa rede mais centralizada e integrada. Essa centralização e
integração também é observada no aumento do fluxo de informações entre os países centrais,
principalmente nos Estados Unidos da América (id. ibid.)
Nas duas últimas décadas aqueles países denominados periféricos tiveram uma participação
dinâmica no processo de integração à rede de comunicações mundiais. Essa participação tem
sido influenciada por diversos acontecimentos. Assim, por exemplo, os acontecimentos
políticos e econômicos dos países do Leste Europeu desviaram a atenção dos países centrais
dos mercados latino-americanos – a proximidade territorial e a semelhança de línguas da
região teve um peso considerável nas decisões de investimento dos países centrais.
Quadro 1: Indicadores do mercado global de telecomunicações
Custos
Indicador
Descrição
• ligações internacionais: menos de US$ 1 por três minutos de conversação;
• custo menor através da Internet;
• novas tecnologias (fibra ótica, transmissões digitais, entre outros),
•
Privatização
Alianças
•
•
•
•
•
•
•
•
•
Internet e outras tecnologias •
Organização
•
•
possibilitando a diminuição de preços;
acordos internacionais para redução de custos entre alguns dos membros da
Organização Mundial do Comércio;
qualidade e amplitude da banda – principais parâmetros na precificação.
abertura sigilosa dos mercados;
ingresso de novas empresas nos mercados monopolísticos;
abertura e privatização de empresas nos EUA, Europa, Ásia.
condicionadas ao crescimento dos mercados de redes de informação (criação,
movimentação e uso da informação)
definição e construção do core competence;
priorização de oportunidades internacionais;
consolidação de estrutura de negócios global;
investimento na capacitação de pessoal
200 milhões de computadores e terminais conectados à Internet em 2001 (30
milhões em 1998);
eletrodomésticos adaptados às novas TI’s;
despesas com P&D – procurando melhorar a tecnologia.
Fonte: Raphael, 1998 e Serrano et al., 1991
No entanto, assim como no leste europeu, os países latino-americanos tiveram oportunidade
de demonstrar seu potencial com a abertura dos seus mercados à indústria internacional –
global. Esses países também abriram a possibilidade de ingresso de organizações globais em
setores estratégicos de suas economias, como no caso da energia (energia elétrica, petróleo)
das comunicações, entre outros.
3.2
O promissor mercado latino-americano
Os países latino-americanos centralizaram a atenção dos demais países devido a algumas
mudanças que foram acontecendo a partir do final da década dos anos 80. Algumas dessas
mudanças estão relacionadas com as privatizações acontecidas no Chile, Argentina, Brasil e
México – consideradas algumas das mais fortes economias da região – e nas demais
economias que se encontravam em situação de descrédito internacional como conseqüência
das crises políticas pelas que atravessaram – como no caso do Panamá e Peru (Shirley, 1994).
As projeções feitas sobre o futuro dos mercados de telecomunicações apontaram o Brasil
como o mais promissor dos mercados da América Latina, principalmente, pela sua extensão
territorial e por ser uma das mais fortes economias da região (Nota de imprensa da Telefônica,
1998). Este aspecto teve um peso significativo na decisão de investimento das organizações
que pleitearam a concessão das “teles” brasileiras (doze ao todo). Diante dessa possibilidade
foi aberta uma brecha para a conquista do mercado regional do cone sul.
O mercado latino-americano está sendo disputado por várias organizações da Europa e dos
Estados Unidos e o Canada. A espanhola Telefonica tem investido fortemente em vários
países da região, afora o Brasil, ela tem investimentos na Argentina, no Chile, Peru,
Venezuela, entre outros. A partir das concessões obtidas pela Telefonica nesses países, ela
encontra-se um pouco à frente dos outros fortes investidores europeus e norte-americanos,
devido à capacidade de utilização da sua própria estrutura no tráfego internacional de voz e
dados. Nesse sentido a rede regional de fibra ótica instalada em parceria com a MCI
WorldCom no Pacífico Sul representa para essa organização a obtenção de economias de
escala na utilização de uma única estrutura para o serviço de vários países.
Na telefonia fixa, além da Telefonica encontram-se no mercado latino-americano a France
Telecom, a Telecom Itália e a Portugal Telecom (que tem uma parceria com a Telefonica para
o desenvolvimento de novas tecnologias). Na telefonia celular, a líder é a norte-americana
BellSouth seguida pelas concorrentes Millicom International Cellular (MIC) do Luxemburgo
e a canadense Telesystem International Wireless (TIW).
Este processo poderia ser considerado uma nova invasão da América por renovados países
colonizadores. Desta vez o processo se dá pelos operadores de telefonia globais que buscam
ganhar espaço em mercados latino-americanos que apresentem índices de acesso e densidade
de telefones menores, comparativamente aos apresentados pelos seus países de origem. Ainda
espera-se a privatização da telefonia da Guatemala, Equador e Colômbia, entre outros países
que ainda não definiram seus processos de privatização.
Também importante para as empresas de telecomunicações latino-americanas é a proximidade
dos compromissos assumidos pelos países membros da Organização Mundial do Comércio
(OMC) que na Rodada do Uruguai assinaram um acordo – General Agreement of Tariffs and
Services, GATS – que visa a internacionalização dos serviços, incluído o de telefonia. O
acordo possibilita a existência de elementos fiscalizadores quanto ao acesso a mercados, como
o latino-americano, entre outros aspectos. Contudo, também evidencia-se que, a partir do
longo processo de negociações que antecedeu a assinatura do acordo de telecomunicações do
GATS, o capital privado é um dos fatores dinamizadores do setor. Os investimentos
realizados através desse capital nos países em desenvolvimento têm demonstrado a sua
capacidade para a modernização da infra-estrutura existente – sempre que existam regras de
jogo justas e estáveis.
Betta e Levenberg apresentam um dado adicional importante relacionado com o impulso das
telecomunicações nos países latino-americanos. Segundo esses autores, a partir da
liberalização e privatização, assim como da experiência adquirida pelos operadores latinoamericanos, está acontecendo um crescimento da participação desses operadores no mercado
internacional, e particularmente na própria região latino-americana (Betta & Levenberg,
1995). Os operadores de maior destaque são a Entel do Chile (tem participação nos Estados
Unidos através da AmericaTel Corp., na Colômbia, México e Argentina), a Companhia de
Telefones do Chile – CTC (com participações na Companhia Celular da Colômbia –
COCELCO), a IMPSAT da Argentina (possui subsidiárias na Venezuela e o Equador) e a
IUSACEL do México (com participação no mercado equatoriano de telefonia celular).
4
Os serviços de telecomunicações em alguns dos países servidos pela Telefonica
4.1
Brasil
Até antes da privatização do sistema Telebras os mercados do Rio de Janeiro e São Paulo – os
dois mais importantes mercados de telefonia no Brasil – registravam uma fila de espera de
instalação de linhas telefônicas composta de usuários favorecidos. No caso de São Paulo, a
fila de espera para os dois planos de expansão era composta de usuários da telefonia fixa com
planos já quitados e por aqueles potenciais usuários que tinham feito inscrição e esperavam
ser convocados. Especificamente em São Paulo a fila de espera dos telefones pagos era de 489
mil telefones (Telefónica – consulta internet, 1999). Por outro lado, a instalação de linhas
telefônicas em São Paulo era de, em média, 50 mil linhas por mês.
Após cerca de 7 meses do início das operações, a atual situação vivida pela Telefonica não é
animadora. Acredita-se que tal situação não pode ser comparada às demais experiências dessa
organização nos mercados onde ela já está operando. Em primeiro lugar, a agência de
proteção ao consumidor (Procon) recebe diariamente reclamações de usuários descontentes
com a operação dos seus aparelhos – dentre as queixas levantadas as mais comuns são: a falta
de sinal, a cobrança indevida, a instalação da aparelhagem sem a habilitação respectiva, entre
outras. O número de queixas é tão elevado que a Telefonica não consegue atender a todas elas
e está utilizando os meios de comunicação para pedir a compreensão do público usuário. Para
agregar mais um problema aos vários que ela enfrenta, está sendo aberta uma Comissão de
Inquérito Parlamentar – CPI para apurar alguns aspectos do processo de privatização e, ainda,
foi estabelecida uma multa de, aproximadamente, US$ 1,7 milhões como conseqüência das
ocorrências que foram encaminhadas ao poder judicial.
4.2
Chile
No Chile, existem serviços múltiplos providos por várias empresas. A mais importante é a
CTC que possui 95% das linhas existentes, controla a maior companhia de telefonia celular,
possui a segunda maior subsidiária de ligações de longa distância e controla os serviços de TV
a cabo. A CTC é controlada pela Telefónica de España. As outras empresas que operam no
setor são a Entel, a Telex Chile a VTR e a Bell South – a italiana STET e a Samsung possuem
19,5% e 12,5% respectivamente da Entel e a South Bell 45% da VTR (Bitran & Serra, 1998).
A regulamentação do setor de telecomunicações no país começou a ser discutida no final da
década de 70, sendo esta a base do complexo sistema de telecomunicações existente nesse
país (O’Neill, 1991). Apesar do desempenho apresentado pelo setor (ver quadro 2), as tarifas
por minuto da telefonia local não tem diminuído após a privatização (Ch$2,825 em 1989 e
Ch$3,814 em 1996), devido a alguns problemas relacionados com a existência de uma
assimetria das informações dos agentes que participaram na determinação dessas tarifas.
Desde 1994 não existem barreiras para a livre competição nos serviços de longa distância – o
usuário escolhe seu provedor internacional. Dessa forma a Telefonica não tem mais o
monopólio desses serviços ao ter redistribuídos os 20% em ações que ela mantinha na Entel.
A desregulamentação dos serviços de longa distância possibilitou sensível diminuição de
tarifas.
Quadro 2: Evolução do setor no Chile
Critério
Densidade linhas/por 100 hab.
Número de linhas
Tráfego internacional
1987
0,74
581.000
21M de minutos
1996
2,35
2.100.000
175M de minutos
M: milhões
Fonte: Adaptado de Bitran & Serra, 1998
Entretanto, segundo o observado por Bitran e Serra (1998), o mercado chileno de
telecomunicações está forçando as empresas prestadoras à integração verticalizada dos seus
serviços para acessar diretamente seus clientes. Dessa forma, a competição que inicialmente
existia somente para os serviços de longa distância está estendendo-se aos serviços locais
através das subsidiárias. A telefonia chilena mantém políticas anti-trust, no entanto, a CTC –
controlada pela Telefónica de España – tem feito alianças para adequar suas operações às
restrições existentes. Ela tem conseguido uma das mais importantes fusões da telefonia celular
com a VTR, apesar da multa imposta pelo serviço conjunto entre CTC e CTC Celular.
4.3
Peru
No Peru, o mercado dos serviços de telecomunicações tem um único provedor, Telefónica del
Perú – 29% do capital é de propriedade do governo peruano e 35% dos restantes 71%
pertencem à Telefónica de España – este processo foi realizado no início de 1994 com a
privatização e posterior fusão dos únicos operadores de chamadas locais e internacionais
Compañia Peruano de Teléfonos – CPT e Entel-Peru respectivamente.
Uma característica das operações da Telefonica é a importação dos equipamentos utilizados
na sua própria rede de provedores. Entretanto, segundo estimativas da Câmara Americana de
Comércio, este setor é um dos que mais investimentos receberam – 44 % do total de
investimentos, sendo o setor de mineração o segundo com 20%. O investimento estrangeiro
no setor foi de 37,4% de um total de US$5.351 bilhões até 1995 (Commercial Service, 1996).
A regulamentação do setor é exercida pelo Ministério dos Transportes, Comunicações,
Habitação e Construção, encarregado das concessões e licenças do setor. Outro órgão que tem
uma acentuada participação no controle desse setor é o Organismo Supervisor de Inversão
Privada nas Telecomunicações – OSIPTEL, que visa, entre outros, a integração dos
investimentos em telecomunicações com as normas de concessão de serviços públicos.
A Telefonica exerce o monopólio dos serviços de chamadas locais e internacionais e aluga
circuitos para uso de provedores estrangeiros. Afora isso, pelo contrato de concessão a
empresa comprometeu-se a desenvolver uma infra-estrutura de telecomunicações estimada em
US$1.5 bilhões (em adição aos US$ 2 bilhões pagos pela concessão) após 5 anos de
concessão. Também como parte dos benefícios do monopólio foi impedida a entrada dos
serviços call back.
Alguns anos após o processo de privatização o primeiro balanço do setor indica uma certa
eficiência operacional. A gestão pública do setor foi considerada de alta ineficiência operativa
no período prévio à privatização. Alguns desses indicadores sobre os níveis de serviço
apresentados entre 1993 e 1997, período pré e pós início das operações da Telefonica, são
apresentados no quadro 3.
Quadro 3: Evolução do serviço da Telefonica no Peru
Critério
Densidade (linhas/100hab.)
Cobertura Lima Metropolitana
Custo de uma linha
1994
2.9
17%
US$1500,00
1995
7.0
37%
US$350,00
Fonte: Adaptado de Rodrich, 1997
Cabe destacar que, apesar dos números apresentados no quadro 3, a qualidade do serviço teve
uma deterioração produto da estratégia de expansão inicial adotada pela empresa. Também
houveram demissões de trabalhadores, a empresa contava com uma folha de pagamento
aparentemente inflada. Alguns desses trabalhadores tiveram a oportunidade de criar empresas
de serviços relacionados com a Telefonica, o que gerou uma moderada oferta de trabalho.
Outros indicadores são a diminuição das tarifas de chamadas locais e internacionais e a
participação cidadã, a partir do programa de Participação Cidadã em que, aproximadamente,
260 mil peruanos converteram-se em novos acionistas da empresa – como conseqüência da
venda das ações do pacote de 71% não adquirido pela Telefonica (Rodrich, 1997).
5
Considerações finais
Alguns pontos podem ser resgatados deste primeiro esboço da situação do setor de
telecomunicações latino-americano após o início das operações da Telefonica nos países onde
ela opera.
Em primeiro lugar, um princípio fundamental para a internacionalização das operações de
grandes conglomerados tem sido a facilidade de acesso às informações de modo a facilitar a
tomada de decisão no processo de planejamento corporativo. A partir desse contexto foi
necessário que o setor de telecomunicações atendesse a essas exigências investindo
maciçamente em pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias e formando parcerias para
fortalecer o seu know how e domínio nesse setor
Em segundo lugar, o reflexo desse movimento de internacionalização também atingiu as
economias menos desenvolvidas que tiveram a oportunidade de atrair a confiança dos
investidores estrangeiros a partir da melhoria da sua infra-estrutura de telecomunicações.
Em terceiro lugar, a necessidade de melhorar o setor de telecomunicações das economias
menos desenvolvidas, somado ao interesse dos operadores internacionais de telecomunicações
de expandir sua participação global no setor, levou a uma comunhão de interesses desses
agentes, que tem como base os processos de globalização e privatização.
O caso específico da Telefonica chama a atenção por ser um dos principais operadores na
América Latina, posição reafirmada quando se adjudicou em 1998 uma boa fatia do
estratégico mercado de telecomunicações brasileiro junto com os seus parceiros Portugal
Telecom (que tem a telefonia celular de São Paulo), MCI (obteve as operações de longa
distância da Empresa Brasileira de Telecomunicações – Embratel) e Iberdrola (obteve a
concessão da Teleleste, operadora celular na área do Estado da Bahia).
O seu desempenho em cada país varia segundo o contexto e situação do setor de
telecomunicações. No Brasil, o início das operações está representando uma dura batalha
contra uma parcela da opinião pública que não via no processo de privatização desse setor
uma saída para a crise que este atravessava. Afora isso, comprova-se que este processo não
gera suficientes postos de trabalho para abrigar a massa de trabalhadores desempregados,
mesmo nas empresas prestadores de serviço.
A participação da Telefonica na América Latina, somada a possibilidade em aberto de
participar em mercados não privatizados, são parte de uma estratégia uniforme para a região.
Apesar dos problemas originados pelo ingresso de novos operadores no setor, a abertura do
mercado a novos operadores representa um novo desafio que os grandes operadores deverão
enfrentar. A competição que esse futuro panorama irá propiciar deverá influenciar na
reformulação de suas estratégias, principalmente, se considerado o fato de alguns operadores
chilenos, argentinos e mexicanos estarem utilizando os conhecimentos obtidos para entrar em
alguns segmentos não atendidos pelos grandes operadores.
6
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