Arquivos - Grupo de Estudo da Insulino
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Manual sobre INSULINO-RESISTÊNCIA 2.ª Edição Realizado pelo: GEIR – Grupo de Estudo da Insulino-Resistência da Sociedade Portuguesa de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo Manual sobre INSULINO-RESISTÊNCIA 2.ª Edição Realizado pelo: GEIR – Grupo de Estudo da Insulino-Resistência da Sociedade Portuguesa de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo Ficha Técnica Título MANUAL SOBRE INSULINO-RESISTÊNCIA 1.ª Edição: Março 2002 2.ª Edição: Janeiro 2006 Editora Helena Cardoso Autores da 2.ª Edição Ana Paula Santos, Claudia Freitas, Elisabete Rodrigues, Helena Cardoso, Helena Fonseca, Isabel Palma, Isabel Silva, João Luís Pereira, José Silva Nunes, Luís Raposo, Manuela Carvalheiro, M.ª Helena Ramos, M.ª João Oliveira, Mariana Monteiro, Martim Martins, Paula Freitas, Rute Cerqueira, Sandra Paiva, Sequeira Duarte, Sónia Cunha Cruz, Themudo Barata. Coordenador do Grupo de Estudos da Insulino-Resistência (GEIR) da Sociedade Portuguesa de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo Luís Raposo Patrocínio Merck, s.a. Design e Paginação Isabel Monteiro Impressão Multitema – Soluções de Impressão, S.A. Tiragem 7 000 Exemplares Índice 5 Prefácio 7 Introdução 9 11 15 Luís Medina Manuela Carvalheiro Insulino-resistência: o que é? Manuela Carvalheiro Sensibilidade à insulina: como medir Luís Raposo Síndrome de insulino-resistência, s. metabólica: definições Sandra Paiva Etiopatogenia 23 29 33 39 44 51 55 Etiopatogenia da insulino-resistência / hiperinsulinismo Martim Martins Insulino-resistência e inflamação subclínica José Silva Nunes Insulino-resistência e estilo de vida Helena Cardoso Causas genéticas Mariana Pereira Monteiro Síndrome metabólica e adolescência Helena Fonseca Insulino-resistência e iatrogenia Claudia Freitas Insulino-resistência e infecção por VIH Paula Freitas Insulino-resistência e co-morbilidades 63 67 71 77 81 85 91 93 Insulino-resistência e obesidade Helena Cardoso Insulino-resistência e alterações do metabolismo glicídico J. Sequeira Duarte Insulino-resistência e hipertensão arterial José Silva Nunes Insulino-resistência e dislipidemia Isabel Palma Doença do fígado gordo não alcoólico (NAFLD) Rute Cerqueira e Luís Raposo Insulino-resistência e síndrome do ovário poliquistico Elisabete Rodrigues Insulino-resistência e neoplasias Ana Paula Santos Insulino-resistência e apneia do sono Helena Cardoso Prevenção e tratamento 101 Insulino-resistência e actividade física 126 J. L. Themudo Barata M.ª João Oliveira Síndrome metabólica: estratégias de prevenção Elisabete Rodrigues Síndrome metabólica: terapêutica farmacológica M.ª Helena Ramos Síndrome metabólica numa consulta de medicina geral e familiar Sónia Cunha Cruz e João Luís Pereira Empoderamento do doente Isabel Silva 133 Conclusões 141 Índice bibliográfico Anexos 109 Insulino-resistência e alimentação 112 115 121 156 Helena Cardoso Prefácio 5 PREFÁCIO O Grupo de Estudos de Insulino-resistência (GEIR) da SPEDM decidiu, e bem, proceder a uma revisão do seu Manual. O tema da insulino-resistência, de todos conhecido como um dos mais importantes nos últimos anos, merece que se lhe dedique a maior atenção e que se faça a mais vasta e completa difusão de conhecimento. Pela falta de tempo que todos temos no nosso dia a dia de trabalho é sempre oportuna a concentração de informação num pequeno manual de bolso que permita a consulta em qualquer lugar e a qualquer hora. Felicito o GEIR pela obra executada, pelo empenho com que trabalham e pela dedicação aos princípios que devem nortear a nossa Sociedade. Estamos conscientes de que o GEIR é um dos grupos de estudo mais dinâmicos da SPEDM, o que é digno de relevo. José Luis Medina Presidente da Sociedade Portuguesa de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo Introdução 7 INTRODUÇÃO Manuela Carvalheiro Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo; Hospital da Universidade de Coimbra No momento actual, o conceito de insulino-resistência ou diminuição da sensibilidade à insulina a nível dos tecidos alvo (músculo, fígado, tecido adiposo e rim) é da maior importância para a compreensão de um conjunto de entidades clínicas, que partilham entre si idêntica base etiopatogénica. De entre elas, teremos de referir as “epidemias” de doenças não transmissíveis que ensombram o nosso século como a obesidade, a síndroma metabólica, a prédiabetes e a diabetes tipo 2, com o corolário de dismetabolismos que originam e cuja história natural termina na doença cardio-vascular, causa primeira de morte nos países ditos desenvolvidos. Dois aspectos destas “epidemias” são de grande preocupação na actualidade. Por um lado o envolvimento das crianças e adolescentes e por outro o seu crescimento exponencial nos países do continente asiático densamente povoados, devido à ocidentalização rápida com perda dos estilos de vida tradicionais. A possibilidade de se poder quantificar o grau de resistência à insulina, pelo uso de técnicas específicas, o conhecimento mais aprofundado dos seus mecanismos indutores quer a nível molecular quer bioquímico, e consequentemente à cascata de eventos patológicos a que pode dar origem, veio aguçar a curiosidade científica, na perspectiva do diagnóstico, da prevenção e do tratamento. É imperioso ter presente a relação directa entre o estilo de vida ocidental (sedentarismo e alimentação hipercalórica e rica em alimentos de alta densidade) e o aumento da resistência à insulina o que desde logo implica o reforço da vertente dita comportamental, não farmacológica, na sua prevenção e tratamento. A indústria farmacêutica não tem ficado alheia a esta modernidade e hoje temos ao alcance um armamentário terapêutico num crescente contínuo que é preciso saber quando e como utilizar. Todos estes e outros aspectos relacionados com a resistência à insulina, e os avanços científicos dos últimos anos, leva a que o Grupo de Estudo da Insulinoresistência (GEIR), da SPEDM, considere premente escrever de novo, uma pequena monografia actualizada de carácter educativo e informativo. Os textos nela reunidos foram da responsabilidade dos diversos membros do grupo, entusiasticamente coordenados pela Prof. Doutora Helena Cardoso. 8 Manual sobre Insulino-resistência Insulino-resistência: o que é? Insulino-resistência é um estado patológico comum, no qual as células alvo têm uma resposta insuficiente aos níveis normais de insulina circulante O conceito engloba toda a acção biológica da insulina: crescimento e desenvolvimento, metabolismo glicídico, lipídico e proteico, função endotelial e expressão genética. Mecanismos moleculares indutores de insulino-resistência: 1. mutações ou modificações de post-translação do receptor à insulina (RI), ou das suas moléculas efectoras. 2. defeitos na ligação da insulina a nível do IR ou a nível do pós-receptor. 3. ↓ da actividade da cinase a nível do RI, com eventuais mutações do gene do RI. 4. ↑ da expressão do TNF-α, translocação dos GLUT4, e eventuais mutações das moléculas PPARγ. Na base destes processos celulares alterados há sempre uma componente genética e ambiental, nomeadamente através da acção dos ácidos gordos livres. A resistência à insulina, com carácter transitório ou definitivo é uma alteração fisiopatológica de base nas seguintes situações: Fisiológicas: puberdade, gravidez, menopausa… Patológicas: obesidade, DM tipo 2, dislipidemia, HTA, s. metabólica, PCOS… Insulino-resistência: o que é? 9 INSULINO-RESISTÊNCIA: O QUE É? Manuela Carvalheiro Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo; Hospital da Universidade de Coimbra O conceito de insulino-resistência ou mais exactamente diminuição da sensibilidade à insulina (sinónimo de insulino-resistência), foi introduzido por Himsworth e Kerr em 1939, para definir a relação entre uma deficiente resposta glicémica à insulina exógena, encontrada num grupo de pessoas obesas com diabetes. O avanço tecnológico (destaca-se a capacidade de medir a insulina pelas técnicas RIA na década de 60) permitiu rapidamente esclarecer deste conceito. Primeiro, foi demonstrado que a obesidade induzia um aumento da resistência à insulina, que por sua vez aumentava o stresse secretor da célula β pancreática, conducente à sua insuficiência e posterior exaustão. Posteriormente tornou-se evidente que o hiperinsulinismo, estimado em valor absoluto, poderia estar presente independentemente do habitus corporal e ser um marcador de um estádio pré-diabético. O desenvolvimento científico permitiu um grande avanço em termos conceptuais, ao demonstrar que a resistência à insulina, definida como uma resposta biológica diminuída à insulina, quer endógena quer exógena, não se confinava ao metabolismo dos hidratos de carbono. De facto estende-se a toda e qualquer acção biológica da insulina, o que deve incluir o crescimento e desenvolvimento, o metabolismo glicídico, lipídico e proteico, a função vascular endotelial e a expressão genética. O avanço nos conhecimentos da biologia molecular e celular, revelou-se extremamente proveitoso na compreensão dos mecanismos indutores de insulinoresistência. A insulina circulante atinge rapidamente os tecidos alvos onde interage com o seu receptor, (uma tirosina cinase (Tyr) transmembranária), largamente expresso a nível tecidular. A redução da acção da insulina parece resultar de mutações ou modificações de post-translação do receptor à insulina (IR) em si mesmo, ou das suas moléculas efectoras. A insulino-resistência pode ser devida a defeitos na ligação da insulina a nível do IR ou a nível do pós-receptor. Foram ainda encon- 10 Manual sobre Insulino-resistência trados outros tipos de defeitos relacionados com a redução da actividade da cinase a nível do IR, com ocorrência ou não de mutações do gene do IR. Outras alterações a nível celular têm vindo a ser demonstradas, embora os seus efeitos interajam directamente na cascata metabólica desencadeada pela ligação da insulina ao IR. Referimo-nos ao aumento da expressão do TNF-α, à translocação dos GLUT4 de que resulta redução da actividade destes transportadores de glicose e a polimorfismos das moléculas PPARγ. Na base de todos estes processos celulares alterados há sempre uma componente genética e ambiental, mediada através da acção dos ácidos gordos livres. Tendo em conta estes conhecimentos, podemos redefinir insulino-resistência como um estado patológico comum, no qual as células alvo (por diminuição do “insulin signaling” isto é da passagem do sinal), têm uma resposta insuficiente aos níveis normais de insulina circulante. A noção de que a insulino-resistência é um estado patológico comum capaz de induzir aumento de morbilidade e mortalidade, é da maior relevância. São hoje conhecidas diversas situações fisiológicas, (puberdade, gravidez, menopausa etc.) e patológicas em crianças e adultos (obesidade, pré-diabetes, diabetes tipo 2, dislipidemia, hipertensão arterial, síndroma metabólica, doença cardio-vascular, síndroma do ovário poliquístico (PCOS), esteatohepatite não alcoólica (NASH), oncogénese (mama e colo-rectal) e infecções crónicas etc.), em que a resistência à insulina, com carácter transitório ou definitivo é a alteração fisiopatológica de base. Acresce ainda, que o estado de insulino-resistência, pode preceder por vezes em anos o eclodir das situações de morbilidade. Concluindo, poderemos afirmar, que o conhecimento quanto à natureza da insulino-resistência, nomeadamente o seu impacto na saúde e na doença, as suas bases bioquímicas e as formas da sua avaliação, permitem compreender e implementar um conjunto de medidas de ordem preventiva (onde se destaca o aumento da actividade física e uma alimentação equilibrada) e terapêutica, que privilegie e combata esta alteração fisiopatológica. Sensibilidade à insulina: como medir 11 SENSIBILIDADE À INSULINA: COMO MEDIR Luís Raposo Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo; Hospital Egas Moniz A resistência à insulina é um fenómeno de reconhecida importância na patogénese da diabetes mellitus tipo 2, estando ainda associada a diversas entidades patológicas de que se destaca a obesidade, a hipertensão arterial e outros factores de risco vascular. A avaliação da sensibilidade à insulina reveste-se assim, de grande interesse na prática clínica. De um ponto de vista genérico, podemos considerar duas metodologias para a medição da sensibilidade à insulina: na sequência de uma intervenção dinâmica (por exemplo a injecção ou perfusão de glicose e/ou insulina) ou em condições basais. As técnicas de maior rigor utilizadas para a determinação da sensibilidade à insulina recorrem a uma intervenção dinâmica e são de execução complexa e não apropriadas à prática e investigação clínicas; destacam-se o clamp euglicémico hiperinsulinémico1 e o teste de tolerância à glicose iv (TTGIV) com a análise do modelo mínimo – “minimal model analysis”2. O clamp euglicémico hiperinsulinémico é a técnica de referência na avaliação da sensibilidade à insulina (SI). Consiste na infusão contínua de insulina com o objectivo de induzir uma hiperinsulinémia; durante o exame a glicémia é fixada (“clampada”) dentro de valores normais, à custa de uma infusão variável de glicose, que acaba por atingir uma fase estacionária (“steady-state”). O cálculo de SI é feito com base nas necessidades de glicose e nos níveis de insulinémia em condições de “steady-state”. O teste de tolerância à glicose iv com colheitas frequentes (para doseamentos de glicose e insulina) apresenta uma grande correlação com a técnica anterior. O cálculo de SI é efectuado de acordo com a análise do modelo mínimo, que utiliza os resultados dos vários doseamentos de glicémia e insulinémia efectuados no decurso do teste. 12 Manual sobre Insulino-resistência Em condições basais fisiológicas (após um jejum nocturno) os níveis sanguíneos da insulina (I0) e da glicose (G0) podem ser correlacionados e permitem o cálculo de um índice da sensibilidade (ou resistência) à insulina. Destacam-se a razão glicose / insulina3, o índice de resistência à insulina do HOMA (homeostasis model assessment)4-5, o índice de resistência à insulina FIRI (fasting insulin resistance index)6, o índice de sensibilidade à insulina QUICKI (quantitative insulin sensitivity check index)7-8. Estes índices são de simples determinação, têm uma boa correlação com as técnicas mais fiáveis de medição da sensibilidade à insulina e são reprodutíveis; poderão ser por isso adequados para uma utilização alargada em estudos de investigação clínica. Os índices referidos têm porém algumas limitações: não podem ser aplicados em indivíduos com defeitos da secreção de insulina (como é o caso da diabetes mellitus); fornecem alguma informação indirecta sobre a retroalimentação entre o fígado e as células beta mas muito pouca sobre o efeito da insulina nos tecidos periféricos (nomeadamente no tecido adiposo e músculo); de referir ainda, que nestas equações é apenas considerado um valor de insulinémia, pelo que os resultados dependem da precisão da sua medição. Tendo em atenção as limitações dos índices de sensibilidade à insulina, o valor da insulinémia em jejum poderá ser usado, em sua substituição como mero indicador da sensibilidade à insulina, desde que exista um estudo populacional que suporte especificamente a população em que é aplicado. Sensibilidade à insulina: como medir 13 Sensibilidade à insulina: como medir De um ponto de vista genérico podemos considerar 2 metodologias para a medição da sensibilidade à insulina: na sequência de uma intervenção dinâmica ou em condições basais. As técnicas de maior rigor utilizadas para a determinação da sensibilidade à insulina recorrem a uma intervenção dinâmica e são de execução complexa e não apropriadas à prática e investigação clínicas; destacam-se o “clamp” euglicémico hiperinsulinémico e o teste de tolerância à glicose IV (TTGIV) com a análise do modelo mínimo. Em condições basais (após um jejum nocturno) os níveis sanguíneos da insulina (I0) e da glicose (G0) podem ser correlacionados e permitem o cálculo de um índice da sensibilidade (ou resistência) à insulina; destacam-se a razão glicose / insulina, os índices de resistência à insulina do HOMA (“homeostasis model assessment”) e FIRI (“fasting insulin resistance index”) e o índice de sensibilidade à insulina QUICKI (“quantitative insulin sensitivity check index”). O valor da insulinémia em jejum poderá também ser usado como um mero indicador da sensibilidade à insulina desde que exista um estudo populacional que suporte especificamente a população em que é avaliado. Razão G/I = G0 (mg/dl) / I0 (µU/ml) ⇒ razão <6 sugere RI HOMA-RI = [I0 (µU/ml) x G0 (mmol/l)] / 22.5 ⇒ valores médios: 2.06±0.14 FIRI = [I0 (µU/ml) x G0 (mmol/l)] / 25.0 QUICKI = 1 / [log I0 (µU/ml) + log G0 (mg/dl)] ⇒ valores médios: 0.382±0.007 14 Manual sobre Insulino-resistência Cálculo dos diversos índices de sensibilidade (resistência) à insulina: A razão glicose / insulina é dada por: Razão G / I = G0 (mg/dL) / I0 (µU/ml) (uma razão < 6 sugere resistência à insulina)3 O índice de resistência à insulina determinado por HOMA é definido pela equação: HOMA-RI = I0 (µUI/ml) / [ 22.5 × e – Ln Go (mmol/l) ] ou HOMA-RI = [ I0 (µUI/ml) × G0 (mmol/l) ] / 22.5 (valores médios: 2.06 ± 0.14)5 O índice de resistência à insulina FIRI é definido por: FIRI = [ I0 (µUI/ml) × G0 (mmol/l) ] / 25.0 (valor médio teórico de 1)6 O índice de sensibilidade à insulina denominado por QUICKI é definido por: QUICKI = 1 / [ log I0 (µU/ml) + log G0 (mg/dL) ] (valores médios: 0.382 ± 0.007)7 Síndrome de insulino-resistência, síndrome metabólica: definições 15 SÍNDROME DE INSULINO-RESISTÊNCIA, SÍNDROME METABÓLICA: DEFINIÇÕES Sandra Paiva Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo; Hospital da Universidade de Coimbra A constatação da coexistência frequente de hipertensão arterial, alterações da homeostase da glicose, obesidade e dislipidemia em determinados grupos populacionais ou no indivíduo, levou à descrição de uma síndrome clínica que as associa e agrupa. Assim, em 1988, G. Reaven propõe a designação de síndrome X, que engloba alterações da tolerância à glicose, aumento das VLDL, diminuição das HDL e hipertensão arterial. Propõe também serem a insulino-resistência e o consequente hiperinsulinismo os responsáveis fisiopatológicos desta associação, que determina um risco cardiovascular acrescido. No entanto, a descrição inicial não incluiu a obesidade, posteriormente referida com base na evidência de que a acumulação de tecido adiposo intra-abdominal é fundamental para o aparecimento das alterações metabólicas descritas. Em 1995, em artigo de revisão, Reaven propõe integrarem a síndrome X a elevação do PAI-1 (inibidor do activador do plasminogénio) bem como a hiperuricémia. A importância desta síndrome torna-se cada vez mais conhecida, tomando designações múltiplas na literatura: síndrome de insulino-resistência, síndrome plurimetabólica e quarteto mortal. As componentes que a definem variam também nas diversas publicações, o que acentua a confusão terminológica. Alguns autores sugerem que as alterações hemorreológicas (alterações da homeostase e da reactividade vascular) e elevação dos níveis séricos de leptina estão frequentemente presentes nesta entidade. O relatório da Organização Mundial de Saúde de 1999 propõe a designação de síndrome metabólica (argumentando não estar a obesidade central incluída na definição original de Reaven), definida como: intolerância à glicose (diminuição da tolerância ou diabetes mellitus) e/ou insulino-resistência (definida como captação da glicose inferior ao quartil mais 16 Manual sobre Insulino-resistência baixo para a população estudada em clamp euglicémico) associadas a dois ou mais das seguintes componentes: hipertensão arterial ≥ 140/90 mmHg) hipertrigliceridemia (≥ 150 mg/dL) e/ou diminuição do colesterol-HDL (< 35 mg/dL nos homens e < 39 mg/dL nas mulheres) obesidade central (relação cintura / anca > 0,9 nos homens e > 0,85 nas mulheres) e/ou IMC > 30 Kg m2 microalbuminúria ≥ 20 µg/min ou relação albumina / creatinina ≥ 30 mg/g componentes da síndrome foram descritas mas não são necessárias para o diagnóstico Esta definição impõe a realização de clamp euglicémico hiperinsulinémico, só realizado em centros especializados, facto que lhe fez merecer algumas críticas. Neste contexto, o EGIR (European Group for the Study of Insulin Resistance) defende a utilização de uma definição com critérios mais simples e aplicáveis na prática clínica, sugerindo a seguinte definição (aplicável apenas a indivíduos não diabéticos dada a dificuldade em determinar a resistência à insulina nos últimos): insulino-resistência ou hiperinsulinémia de jejum e dois dos seguintes critérios: hiperglicemia (>110 mg/dL mas < 126 mg/dL) hipertensão arterial ≥ 140/90 mmHg dislipidémia (triglicéridos > 180 mg/dL ou colesterol-HDL < 40 mg/dL) obesidade central (cintura ≥ 94 cm nos homens e ≥ 80 cm nas mulheres). Em 2001 o Adult Treatment Panel III do National Cholesterol Education Program (ATP III) define a síndrome metabólica como o conjunto de três ou mais dos seguintes factores de risco, não sendo necessária a demonstração de insulinoresistência per se: cintura >102 cm no homem e > 88 cm na mulher Síndrome de insulino-resistência, síndrome metabólica: definições 17 TG ≥ 150 mg/dL C-HDL < 40 mg/dL no homem e < 50 mg/d na mulher tensão arterial ≥ 130/85 mm Hg glicémia em jejum ≥ 110 mg/dL. Em 2003 a ACE / AACE publica um consenso em que defende o termo de síndrome de insulino-resistência em detrimento de síndrome metabólica, dado esta ser pouco precisa. Salientam que a insulino-resistência não é uma doença per se, mas antes uma alteração que predispõe ao aparecimento de várias anomalias, que tendem a agrupar-se e que identificam indivíduos com risco aumentado de diabetes tipo 2 e doença cardiovascular. E consideram serem factores de risco: diagnóstico de doença cardiovascular (DCV), hipertensão, síndroma do ovário poliquístico, acantose nigricante ou NAFLD história familiar de diabetes tipo 2, hipertensão arterial ou DCV diabetes gestacional prévia ou anomalia da tolerância da glicose etnia não caucasiana sedentarismo IMC > 25 Kg m2 (ou cintura > 102 cm nos homens, > 88 cm nas mulheres) idade > 40 anos. Se num indivíduo de risco, ou seja com qualquer das alterações supracitadas, 2 dos seguintes parâmetros forem atingidos, poder-se-á afirmar que tem a síndrome de insulino-resistência: TG > 150 mg/dL C-HDL < 40 mg/dL nos homens e < 50 mg/dL nas mulheres tensão arterial > 130/85 mmH glicémia de jejum 110-125 mg/dL ou ás 2 h na PTGO 140-199 mg/dL. 18 Manual sobre Insulino-resistência Em 2005 a International Diabetes Federation (IDF) elabora um consenso com vista a uma definição universal, de simples diagnóstico. Este consenso define a síndrome metabólica centrada na obesidade do segmento superior: Obesidade central (definida como cintura ≥ 94 cm no homem e ≥ 80 cm na mulher, nos de origem europeia, sendo os valores diferentes para as várias etnias) e dois dos seguintes parâmetros: TG > 150 mg/dL (ou terapêutica para hipertrigliceridémia) C-HDL < 40 mg/dL nos homens e < 50 mg/dL nas mulheres (ou terapêutica para esta anomalia) tensão arterial sistólica ≥ 130 ou diastólica ≥ 85 mmH ou terapêutica para HTA previamente diagnosticada. glicémia de jejum ≥ 100 mg/dL ou DM previamente diagnosticada. Posteriormente o Adult Treatment Panel III do National Cholesterol Education Program (ATP III) revê a sua definição, actualizando-a, e propondo os seguintes critérios: Diagnóstico quando 3 ou mais dos seguintes elementos estão presentes: perímetro da cintura: sexo masculino ≥ 102 cm (90/80 em asio-americanos) sexo feminino ≥ 88 cm TG ≥ 150 mg/dL ou em tratamento HDL sexo masculino < 40 mg/dL ou em tratamento sexo feminino < 50 mg/dL ou em tratamento tensão arterial sistólica ≥ 130 ou diastólica ≥ 85 mmHg ou em tratamento Síndrome de insulino-resistência, síndrome metabólica: definições 19 glicemia plasmática jejum ≥ 100 mg/dL ou em tratamento A síndrome metabólica é uma entidade cuja definição está longe de ser consensual. Este facto reflecte o incompleto conhecimento da sua fisiopatologia, apesar da intensa investigação nesta área. Para o clínico, a escolha de qualquer definição pode ser válida, desde que seja reconhecida e devidamente tratados os seus componentes. No entanto, as duas últimas são de simples aplicabilidade e mais actuais, pelo que as destacamos para a prática clínica corrente, pese embora a polémica que neste momento envolve estas definições. 20 Manual sobre Insulino-resistência Síndrome de IR, síndrome metabólica: definições Definição da IDF 2005 Obesidade central (definida como cintura ≥ 94 cm no homem e ≥ 80 cm na mulher, de origem europeia, sendo os valores diferentes para as várias etnias) e dois dos seguintes parâmetros: TG > 150 mg/dL (ou terapêutica para hipertrigliceridémia) C-HDL < 40 mg/dL nos homens e < 50 mg/dL nas mulheres (ou terapêutica para esta alteração) tensão arterial sistólica ≥ 130 ou diastólica ≥ 85 mmH ou terapêutica para HTA diagnosticada previamente glicémia de jejum ≥ 100 mg/dL ou DM previamente diagnosticada. Definição do ATP-III 2005 Diagnóstico quando 3 ou mais estão presentes: perímetro da cintura: sexo masculino ≥ 102 cm (90/80 em asio-americanos) sexo feminino ≥ 88 cm TG ≥ 150 mg/dL ou em tratamento HDL sexo masculino < 40 mg/dL ou em tratamento sexo feminino < 50 mg/dL ou em tratamento tensão arterial sistólica ≥ 130 ou diastólica ≥ 85 mmHg ou em tratamento glicemia plasmática jejum ≥ 100 mg/dL ou em tratamento Etiopatogenia Manual sobre Insulino-resistência Insulino-resistência – etiopatogenia FACTORES GENÉTICOS e.g. património genético FACTORES AMBIENCIAIS e.g. factores intra-uterinos, sedentarismo, dieta inadequada, obesidade central, hipertensão arterial HIPERINSULINISMO – INSULINO-RESISTÊNCIA Efeito biológico 22 Insulina α α β β TK IRS-1 IRS-2 IRS-3 TK IRS-4 MAK IP3K Músculo, Tecido Adiposo, Fígado – Receptor e Pós-receptor Hiperglicemia e Hiperlipidemia em jejum e pós-prandial SÍNDROME X – Diabetes, Hiperlipidemia, Hiperuricemia, Hipertensão arterial, Doença aterosclerótica Etiopatogenia da insulino-resistência / hiperinsulinismo 23 ETIOPATOGENIA DA INSULINO-RESISTÊNCIA / HIPERINSULINISMO Martim Martins Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo; Hospital Curry Cabral A insulino-resistência define-se como uma situação com uma resposta biológica insuficiente à insulina endógena ou exógena. Para manter a homeostase da glicemia é então necessário o desenvolvimento de um hiperinsulinismo mantido, o que requer a capacidade adaptativa e de reserva da célula β; quando esta falha, em geral ao fim de algumas décadas, surge então a hiperglicémia e a Diabetes Mellitus1-3. Idealmente a resistência à insulina deveria ser avaliada pelas técnicas de clampagem euglicemica, descritas por Fronzo, em que se mede a infusão de glicose necessária para manter a euglicemia perante uma infusão constante de insulina; naturalmente que a quantidade de glicose administrada nestas condições (M) traduz a quantidade de glicose que foi utilizada pelo organismo em condições de estimulação pela insulina4. Mais recentemente foi proposto um outro método, o modelo mínimo de Bergman, em que a sensibilidade à insulina (Si) é estimada pela análise matemática dos níveis da glicemia e insulinemia durante uma prova de tolerância à glicose oral modificada pela administração de insulina ou tolbutamida5. Nenhuma destas técnicas é acessível na prática clínica diária, em que a insulino-resistência pode ser avaliada simplesmente pela relação glicose e insulina em jejum ou em condições pósprandiais, ou ainda pela simples determinação da insulinemia em jejum excluídos os doentes diabéticos a cumprirem terapêutica com insulina6. Embora com diferentes sensibilidades, todos estes métodos têm excelente correlações entre si, mas na prática não existe um índice e um limite consensual de definição da insulino-resistência, até pela variabilidade técnica subjacente e pela continuidade da distribuição da sensibilidade à insulina na população, que não permite a discriminação absoluta entre o normal e o patológico. Sob o ponto de vista metabólico, a insulino-resistência evidencia-se nas células hepáticas, musculares e adiposas. O músculo e o tecido adiposo são os principais órgãos responsáveis pela utilização periférica da glicose em condições pósprandiais; assim a diminuição da produção dos transportadores de glicose 24 Manual sobre Insulino-resistência GLUT-4, responsáveis pela captação de glicose e defeitos de actividade da glicogénio sintetase muscular, contribuem para hiperglicemia pós-prandial. O fígado é o principal responsável pela produção de glicose em condições de jejum; assim a insuficiente inibição da glicogenólise e gliconeogénse hepática, aparentemente em relação com alterações da glicocinase hepática, contribuem para a hiperglicemia de jejum1,2. Desta forma no modelo patogénico da diabetes mellitus tipo 2 actualmente aceite podem considerar-se várias fases sucessivas: factores genéticos – obesidade central – insulino-resistência e hiperinsulinismo – tolerância diminuída à glicose oral com hiperglicemia pós-prandial – hipereglicemia em jejum – e finalmente diabetes mellitus tipo 27,8. No entanto é claro que os efeitos da insulina se verificam a múltiplos níveis – efeitos no metabolismo dos hidratos de carbono, dos lípidos, das proteínas, no endotélio vascular, na hemostase, no crescimento e diferenciação, além de efeitos centrais – e que essa insulino-resistência está igualmente presente a estes níveis, embora não necessariamente com igual gravidade. Assim verifica-se também resistência aos efeitos de insulina no tecido adiposo – diminuição da captação dos ácidos gordos livres e diminuição da inibição da lipólise, sendo que o aumento dos níveis circulantes dos ácidos gordos que ocorre nessas circunstâncias, inibe a utilização periférica da glicose e aumenta a gliconeogénese hepática contribuindo para a hiperglicémia e para a insulino-resistência; além disso os ácidos gordos livres em circulação e não apenas a glicose em circulação inibem a secreção de insulina pela célula β, dificultando a compensação pancreática (lipo- e glicotroxicidade). Este defeito a nível do tecido adiposo, pode de facto ser primordial até porque se verifica para concentrações de insulina, muito inferiores às que são necessárias para estimular a utilização periférica da glicose1-2. O receptor de insulina é constituído por quatro subunidades; 2 subunidades α, extracelulares e duas subunidades β, transmembrana, formando dois pares αβ. A insulina liga-se à subunidade α, e estimula a auto-fosforilação de três resíduos de tirosina da subunidade β adjacente, o que resulta numa estimulação marcada da actividade da ATP-ase incluída nessa subunidade β. Pelo contrário a fosforilação dos resíduos de serina e treonina da subunidade β, que ocorre noutras circunstâncias, resulta numa inibição da actividade da referida ATP-ase. A esti- Etiopatogenia da insulino-resistência / hiperinsulinismo 25 mulação da actividade desta ATP-ase resulta na activação de diversos mensageiros intracelulares de natureza proteica, genericamente designados de substratos do receptor de insulina (IRS) que incluem o IRS-1, IRS-2, IRS-3, a Gab-1 e o PP62dok; de facto essa activação ocorre em virtude da fosforilação dos resíduos de tirosina destas proteínas. Estas proteínas activadas, activam por sua vez múltiplas outras proteínas intracelulares, nomeadamente as fosfatidilinositol-3-cinases (PI3Ks) numa cascata amplificadora que afecta o metabolismo intracelular das proteínas, hidratos de carbono e lípidos, além de resultar em importantes efeitos sobre o crescimento celular9. Os mecanismos da insulino-resistência não são completamente conhecidos. Na maior parte dos casos não parece haver alterações relevantes na ligação da insulina à subunidade α, pelo que os defeitos, devem ocorrer nos fenómenos subsequentes da acção da insulina, ou seja na autofosforilação dos resíduos de tirosina da subunidade β, resultantes da ligação da insulina à subunidade α, ou nos fenómenos celulares pós-receptor. Por outro lado esses eventuais defeitos deverão explicar a associação conhecida da insulino-resistência com outras situações como a agregação familiar, diabetes gestacional, baixo peso ao nascer, inactividade física, tipo de dieta nomeadamente quanto ao valor calórico e teor relativo de gorduras saturadas e obesidade central. Embora os mecanismos exactos da insulino-resistência não sejam conhecidos e possam até ser variáveis, tem sido possível isolar vários factores. A sua importância pode ser aditiva se considerarmos que a sensibilidade à insulina representa um contínuo em que a insulino-resistência, é apenas porção extrema da curva definida de forma convencional. Assim o hiperinsulinismo de qualquer causa determina insulino-resistência desde logo por fenómenos de regulação homóloga negativa dos receptores de insulina (“receptor down-regulation”) e também por fenómenos pós-receptor – dessensibilização. A este respeito poderão ser relevantes os dados relativos à hiperactividade parassimpática pelo menos relativa, que ocorre na resistência à leptina que caracteriza a obesidade humana, na medida em que esse é um factor conhecido da secreção de insulina. 26 Manual sobre Insulino-resistência Por outro lado diversas alterações metabólicas poderão contribuir para a insulino-resistência. O simples aumento dos ácidos gordos livres em circulação como ocorre na obesidade tende a provocar insulino-resistência simplesmente por competição dos substractos – ciclo de Randle e aumento da gliconeogénese – ciclo de Cori. Também alterações enzimáticas eventualmente de base genética por exemplo ao nível da glicogénio sintetase são susceptíveis de contribuir para a insulino-resistência reduzindo a utilização metabólica de glicose em resposta à administração da insulina. Finalmente o defeito da insulino-resistência é em grande parte reversível, podendo depender de eventuais inibidores endógenos, nomeadamente a proteína cinase C que fosforila os resíduos de serina e treonina que inibem a ATP-ase do receptor, ou diversas hormonas e factores nalguns casos de identificação recente e com origem no tecido adiposo que podem ter os mesmos efeitos; factor de necrose tumoral α, resistina e leptina. De facto outras alterações do tecido adiposo, por exemplo ao nível dos PPARs, ou dos receptores adrenérgicos β3, poderão justificar a insulino-resistência a nível deste tecido. Convém ter presente que se os efeitos da insulina são em termos quantitativos mais importantes no músculo esquelético – principal órgão responsável pela utilização de glicose – a inibição da lipólise e a captação dos ácidos gordos são os primeiros efeitos da administração de doses progressivamente crescentes da insulina, e que o aumento dos ácidos gordos, resultante da insulino-resistência ao nível do tecido adiposo pode ser um acontecimento precoce, criando um ciclo vicioso que agrava o defeito1-3. De uma forma mais geral insulino-resistência e/ou o hiperinsulinismo podem ocorrer em diversas fases do desenvolvimento e em diversas situações patológicas: 1) puberdade, gravidez e idade avançada; 2) sedentarismo; 3) plano alimentar inadequado; 3) obesidade, sobretudo a obesidade abdominal visceral; 4) Diabetes Mellitus tipo 2; 5) endocrinopatias com excesso de hormona de crescimento (acromegalia), glicocorticóides (síndrome de Cushing), catecolaminas (feocromocitoma), insulina (insulinoma), glicagina (glucagunoma), hormonas tiroideias (hipertiroidismo) ou androgéneos (síndrome dos ovários poliquísticos). 6) Insuficiência hepática e insuficiência renal; 7) Hipertensão Arterial; 8) Aterosclerose; 9) síndromes genéticas de insulino-resistência extrema como o Leprecaunismo ou a síndrome de Rabson-Mendenhall, em algumas situações de Etiopatogenia da insulino-resistência / hiperinsulinismo 27 lipodistrofia, a ataxia de Friedreich, a distrofia miotónica e a síndrome de Alstrom; 10) autoanticorpos adquiridos contra o receptor de insulina muitas vezes no contexto de outras doenças autoimunes, incluindo as conectivites ou associado a uma forma de ataxia com telangiectasias; 11) autoanticorpos adquiridos contra a insulina associados ou não à administração de insulina; 12) alguns fármacos como os corticoesteróides, os progestagénios, agentes β-adrenérgicos, diuréticos do tipo das tiazidas, ciclosporina e alguns anti-virais do tipo dos inibidores das proteases1-3. O problema é que ainda antes do aparecimento da diabetes com a sua fisiopatologia própria, esta situação de insulino-resistência e hiperinsulinismo é em si mesma patogénica constituindo a vulgarmente designada Síndrome X, vulgarizada por Reaven. As suas principais manifestações que se deduzem facilmente são: 1) hiperglicemia – quando o hiperinsulinismo já não é capaz de compensar adequadamente a insulino-resistência; 2) aumento dos ácidos gordos livres em circulação – provavelmente uma alteração mais precoce do que a anterior – o que associado ao aumento dos níveis circulantes da insulina resulta num aumento da produção hepática dos triglicéridos e da secreção das VLDL com simultânea redução dos níveis das HDLc (por transferência do colesterol das HDL para as VLDL) e aumento das LDL pequenas e densas; 3) hiperuricemia – porque a insulina diminui a excreção renal do ácido úrico; 4) hipertensão arterial por retenção renal de sódio e estimulação da actividade do sistema nervoso vegetativo simpático; 5) aumento das concentrações do inibidor do activador do plasminogénio tecidual (PAI-1) e eventualmente do fibrinogénio; 6) eventuais alterações da hemóstase e da reactividade vascular secundárias aos efeitos da insulina sobre o endotélio vascular e sobre os elementos figurados da corrente circulatória; 7) hiperhomocisteinémia1-3. Outras manifestações comuns da insulino-resistência-hiperinsulinismo são: a) acantose nigricans; b) hiperandrogenismo com eventuais manifestações do tipo da oligoamenorreia, hirsutismo e acne chegando à síndrome dos ovários poliquísticos; c) características acromegalóides ou gigantismo; d) hipertensão arterial; e) dislipidémia; f) doença aterosclerótica e naturalmente g) diabetes mellitus; h) eventuais episódios só aparentemente paradoxais de hipoglicémia sobretudo no período pós-prandial1-3. 28 Manual sobre Insulino-resistência Insulino-resistência e inflamação subclínica DADOS CONHECIDOS À aterogénese está subjacente um processo de inflamação subclínica crónica. Qualquer processo inflamatório crónico tende a reduzir a sensibilidade à insulina. A síndrome metabólica está associada a aumento dos marcadores inflamatórios subclínicos. Doentes não diabéticos que apresentam níveis elevados desses marcadores têm maior probabilidade de vir a desenvolver diabetes tipo 2 no futuro. ILAÇÕES A inflamação subclínica poderia ser interpretada como o vector de ligação entre a insulino-resistência e aumento do risco cardiovascular. O processo inflamatório associado à insulino-resistência poderá ter implicações directas na evolução para a diabetes tipo 2. IMPLICAÇÕES CLÍNICAS 1. Utilização dos marcadores de inflamação subclínica para avaliação do risco cardiovascular inerente à síndrome metabólica; 2. utilização dos marcadores inflamatórios como predictivos de evolução para a diabetes, em doentes com síndrome metabólica. Insulino-resistência e inflamação subclínica 29 INSULINO-RESISTÊNCIA E INFLAMAÇÃO SUBCLÍNICA José Silva Nunes Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo; Hospital de Curry Cabral A insulino-resistência tem vindo a ser considerada como um factor independente de risco cardiovascular. A partir da hipótese do solo comum, considera-se que a inflamação subclínica seria o ponto de partida comum à etiopatogenia da insulino-resistência e diabetes tipo 2, por um lado, e ao desenrolar dos vários passos da aterogénese, por outro. Tal explicaria o risco cardiovascular aumentado presente nas situações que cursam com insulino-resistência; segundo aquela hipótese não seria a insulino-resistência, per se, o factor de risco cardiovascular, mas ambas as condições (insulino-resistência e doença cardiovascular) seriam as faces visíveis de um mesmo processo – a inflamação subclínica. O tecido adiposo constitui um importante órgão endócrino, responsável pela secreção de inúmeras substâncias interagindo, entre outros, com o metabolismo glucídico e lipídico e condicionando a sensibilidade do indivíduo à acção da insulina. Dentro do conjunto de substâncias secretadas pelo adipócito (adipocinas), destacam-se algumas citocinas inflamatórias como a interleucina 6 (IL-6), a interleucina 1 beta (IL-1β) e o factor de necrose tumoral alfa (TNF-α). Estas citocinas têm uma acção pró-inflamatória e, actuando a nível hepático, induzem a libertação de proteínas de fase aguda, como a proteína C reactiva (PCR) e o fibrinogénio. Estes produtos, além de serem marcadores clínicos de um processo inflamatório em curso, têm um papel activo na perpetuação desse mesmo fenómeno. Além das citocinas inflamatórias, o adipócito também secreta produtos com acção anti-inflamatória como a adiponectina e algumas interleucinas (interleucina 10, interleucina 4,…). O adipócito tem assim um papel activo na regulação da inflamação subclínica, para além de intervir no grau de sensibilidade à insulina de cada indivíduo. O TNF-α e a IL-6 são consideradas as principais citocinas pró-inflamatórias. O TNF-α, produzido pelos adipócitos, macrófagos e linfócitos, possui várias acções: 30 Manual sobre Insulino-resistência anti-tumoral, pró-coagulante, anorexígeno e pirogénico. A IL-6, produzida pelos adipócitos, fibroblastos, células endoteliais e miócitos, estimula a produção de anticorpos pelos plasmócitos e a síntese de proteínas de fase aguda pelos hepatócitos. Estas citocinas têm uma acção autócrina, parácrina e endócrina, sendo que a sua acção autócrina e parácrina predomina sobre o seu efeito endócrino. Contudo, em caso de hipersecreção (como acontece na obesidade) este efeito endócrino é muito mais relevante. Verifica-se uma estreita correlação entre níveis de IL-6 e grau de insulino-resistência. Em parte, tal pode ser explicado pelo facto de cerca de 30% da IL-6 ser secretada pelo tecido adiposo. Quando em níveis elevados, a IL-6 induz hipersecreção hepática de proteínas de fase aguda. A inibição do TNF-α resulta em melhoria da sensibilidade à insulina e aumento da captação periférica da glicose. A insulino-resistência induzida pelo TNF-α pode ocorrer, directamente, através do bloqueio das vias de transmissão do sinal de insulina, inibindo a actividade tirosino-cinase do receptor de insulina. O TNF-α bloqueia, igualmente, a captação de glicose através da regulação negativa da expressão do gene do transportador de glicose GLUT-4. Relativamente à adiponectina, esta constitui uma hormona proteica codificada pelo gene APM1 que se localiza numa região próxima a locus de susceptibilidade associados à síndrome metabólica, à doença coronária e à diabetes tipo 2 (3q27). Recentemente, foram identificados alguns polimorfismos do gene da adiponectina que parecem condicionar o grau de sensibilidade à insulina de cada indivíduo. A adiponectina tem uma acção insulino-sensibilizadora através de, pelo menos, dois mecanismos: estimulação da oxidação dos ácidos gordos a nível muscular e hepático e facilitação directa da tirosino-fosforilação a nível do receptor de insulina. Contrariamente à maior parte das outras hormonas e substâncias secretadas pelo adipócito, estão relatados níveis circulantes de adiponectina em ordem inversamente proporcional à quantidade de massa gorda de cada indivíduo. Têm vindo a ser relatados níveis baixos de adiponectinemia em condições patológicas associadas a um aumento da insulino-resistência e a ser sugeridas pro- Insulino-resistência e inflamação subclínica 31 priedades anti-aterogénicas para a adiponectina, com inibição de vários passos da aterogénese. A aterosclerose é cada vez mais, consensualmente, aceite como uma doença caracterizada por uma inflamação crónica de baixo grau, sendo a PCR de alta sensibilidade um bom marcador bioquímico dessa actividade inflamatória. Actualmente, os marcadores de inflamação subclínica têm vindo a ser encarados como bons índices de predição do risco cardiovascular. Tal valor predictivo parece, inclusive, ser igual (ou superior) aos factores de risco cardiovascular clássicos. Relativamente à síndrome metabólica, tem vindo a ser demonstrada a existência de uma maior actividade inflamatória subclínica nos doentes portadores da síndrome. Além dessa diferença, foi demonstrado que os níveis de PCR de alta sensibilidade, como marcador de inflamação subclínica por excelência, é tanto mais elevado quanto maior o número de parâmetros da síndrome metabólica que estão presentes. Tal como em relação ao valor predictivo da doença cardiovascular, tem vindo a ser demonstrado que os marcadores de inflamação subclínica têm valor predictivo em relação ao desenvolvimento futuro de diabetes tipo 2. O processo inflamatório associado à insulino-resistência poderia ter implicações directas na evolução para a diabetes. Vários estudos epidemiológicos têm vindo a apontar no sentido dos marcadores inflamatórios poderem constituir marcadores predictivos para o desenvolvimento de diabetes tipo 2. Embora, em alguns desses estudos, se pudesse argumentar que parte da associação com o risco de diabetes fosse secundário à obesidade, surgiram outros que confirmam a existência, de forma independente, dessa associação (particularmente entre risco de evolução para diabetes e níveis de PCR de alta sensibilidade). Assim, estariam presentes níveis elevados desses marcadores inflamatórios numa fase muito precoce da história natural da diabetes tipo 2. A sua determinação, particularmente da IL-6 e, sobretudo, da PCR de alta sensibilidade, nessa fase forneceria indicação quanto à probabilidade de vir, futuramente, a desenvolver diabetes. 32 Manual sobre Insulino-resistência Assim, no doente com síndrome metabólica, os marcadores de inflamação subclínica poderão ter duas principais aplicações: – Avaliação do risco cardiovascular inerente à síndrome, – Identificação de indivíduos (não diabéticos) com maior risco de evolução para a diabetes tipo 2. Partindo do princípio de que a inflamação subclínica pode estar implicada directamente na génese de insulino-resistência, quais as medidas comprovadamente capazes de levar a redução do processo inflamatório e, secundariamente, aumentar a sensibilidade à insulina? A perda de peso, à custa da redução da massa de adipócitos secretores de adipocinas pró-inflamatórias; O aumento da actividade física, independentemente da redução de peso; Uma dieta rica em alimentos com elevado poder anti-inflamatório poderá induzir uma redução da actividade inflamatória subclínica (pelo contrário, uma ingesta abundante favorece aumento dos níveis de algumas citocinas pró-inflamatórias, particularmente da IL-6); Vários grupos farmacológicos têm-se mostrado capazes de atenuar o processo inflamatório subclínico: os salicilatos, a metformina, as tiazolidinedionas, as estatinas, os inibidores da enzima de conversão da angiotensina e os antagonistas dos receptores da angiotensina II. Insulino-resistência e estilo de vida 33 INSULINO-RESISTÊNCIA E ESTILO DE VIDA Helena Cardoso Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo; Hospital Geral de Santo António, Porto. Para além dos factores genéticos também os factores ambientais estão envolvidos na ocorrência da resistência à insulina, tolerância alterada à glicose, diabetes tipo 2 e restantes elementos da síndrome metabólica, como o demonstra a natureza epidémica da obesidade e da diabetes tipo 2 a nível mundial1. A dimensão do problema em Portugal é igualmente preocupante. Segundo um estudo patrocinado pela Sociedade Portuguesa para o Estudo da Obesidade 49,6% da população portuguesa tem excesso de peso e 14,4% tem obesidade2. A prevalência do excesso de peso e da obesidade em crianças é ainda mais preocupante uma vez que os números obtidos num estudo efectuado já neste século em crianças entre os 7 e 9 anos de idade revelam uma prevalência de excesso de peso de 20,3%, de obesidade de 11,3%, o que dá uma prevalência de excesso de peso e obesidade de 31,5%3 e nos coloca em segundo lugar entre os países Europeus, logo a seguir à Itália onde a prevalência de excesso de peso e obesidade é de 36%, segundo os dados da IOTF4. Estes resultados são concordantes com os de Lissau e colaboradores5 publicados em 2004 sobre obesidade na adolescência, num estudo que incluiu Europa, Israel e Estados Unidos, tendo sido encontradas prevalências mais elevadas de excesso de peso nos USA, Irlanda, Grécia e Portugal. Também nas crianças o problema se tem vindo a agravar de de 1970 para 1992 e de 1992 para 20023. A nossa geração é provavelmente uma das mais sedentárias na história do mundo e seria de espantar que com estas alterações do estilo de vida não houvesse repercussões na prevalência das doenças a que nós chamamos doenças da civilização. É interessante a correlação encontrada entre a sensibilidade à insulina e o número de passos médios diários6. De salientar que Portugal é o pais da União Europeia com mais alta percentagem de adultos com estilo de vida sedentário, 87,8%, segundo um estudo efectuado por Varo et al7. O aumento da prevalência da obesidade, da resistência à insulina e da diabetes tipo 2 associado à mudança de uma alimentação rica em grãos, frutos e vege- 34 Manual sobre Insulino-resistência tais para uma alimentação de grande densidade energética rica em gorduras e hidratos de carbono e à alteração dos padrões de actividade física, com a mudança para um estilo de vida sedentário, fisicamente inactivo, tem sido observado em diferentes populações. Demonstrou-se em animais a rápida indução de resistência à leptina e à insulina provocadas pelo excesso de nutrientes, com colapso de todo o sistema da leptina e da sua capacidade de inibição do apetite, num processo sugestivo de facilitação do armazenamento de nutrientes sob a forma de reservas lipídicas8. Estes mecanismos estarão particularmente bem desenvolvidos nos indivíduos e animais predispostos ao ganho de peso e à diabetes em consistência com a hipótese do genótipo poupador9 e chamam a atenção para a importância da prevenção versus tratamento pela sua maior eficácia. Também a demonstração de um risco aumentado de diabetes tipo 2 associado ao tabagismo materno durante a gravidez e ao tabagismo em jovem vem reforçar a importância da mudança do estilo de vida em várias vertentes10. A constatação em estudos epidemiológicos que a nutrição fetal pode afectar de modo permanente as características fisiológicas do novo individuo e influenciar o risco de diabetes, doença cardiovascular e cancro, o que é descrito com o nome de programação fetal, de que é exemplo a regulação epigénica, reforça a importância das alterações do estilo de vida para as gerações actuais e futuras, responsabilizando-nos pelas nossas atitudes11. Na Europa de hoje, seis dos sete factores de risco mais importantes para a morte prematura (tensão arterial, colesterol, IMC, inadequada ingestão de frutos e vegetais, inactividade física e consumo excessivo de álcool) relacionam-se com o modo como comemos, bebemos e nos movemos. Uma dieta equilibrada e actividade física regular, assim como a abstenção tabágica, são importantes factores na promoção e manutenção de boa saúde12. Assim, nós médicos devemos ter sempre presente a dualidade do nosso papel: a nível da micro e da macro-intervenção. Insulino-resistência e estilo de vida 35 A nível da micro-intervenção actuando a nível individual, pensando sempre que é mais fácil prevenir que tratar e uma vez que a resistência à insulina surge antes do aparecimento dos restantes elementos da síndrome metabólica, torna-se importante identificar essas pessoas uma vez que a nossa intervenção terá maior eficácia. Deve-se suspeitar de insulino resistência perante a existência de antecedentes familiares de diabetes mellitus tipo 2, história pessoal de diabetes gestacional, tolerância alterada à glicose ou síndrome de ovário poliquístico e obesidade, principalmente obesidade central. Nestes indivíduos as alterações do estilo de vida com aumento da actividade física diária, aumento da ingestão de fibras e a obtenção de um peso saudável são atitudes prioritárias devendo ser bem explicadas as implicações de atingir este objectivo em relação à história natural da doença. De salientar a importância da intervenção a nível familiar, tentando captar toda a família para uma mudança de estilo de vida e aumentando as probabilidades de sucesso com o doente. Na edição anterior deste manual dizíamos: é urgente que em cada país as autoridades de saúde lancem campanhas para promover mudanças do estilo de vida e dos hábitos nutricionais, campanhas estas que para serem eficazes terão de ser acompanhadas de intervenções a nível da política dos transportes, da educação, das obras públicas, com acções concertadas visando combater o sedentarismo – e estas acções se bem publicitadas serão bem recebidas pela população – só com este tipo de intervenção conseguiremos impedir o aumento galopante das doenças da civilização, da obesidade da diabetes das doenças cardiovasculares. Dizíamos ainda: torna-se urgente criar organismos estatais de promoção da saúde e controlo e prevenção das doenças crónicas. Há urgência em desenvolver planos globais e nacionais para prevenção da obesidade, diabetes mellitus tipo 2 e toda a síndrome metabólica. Nesta edição podemos dizer que verificamos com satisfação e esperança o lançamento no dia 15 de Março de 2005 pelo Comissário Europeu para a Saúde e Protecção do Consumidor, Markos Kyprianou, da Plataforma Europeia de Acção na – Dieta, Actividade Física e Saúde (12) e cuja criação faz parte de uma estratégia global para a nutrição e actividade física desenvolvida pela Comissão na sequência de vários meses de discussão com representantes dos retalhistas, produtores e processadores de comida, industria de cafeteria, anunciantes, consumidores e organizações não governamentais ligadas à saúde, profissões médicas e presidências 36 Manual sobre Insulino-resistência Insulino-resistência e estilo de vida O aumento da prevalência da IR e da S. Plurimetabólica associa-se à: 1. mudança de uma alimentação rica em grãos, frutos e vegetais para uma alimentação de grande densidade energética rica em gorduras e hidratos de carbono. 2. alteração dos padrões de actividade física com a mudança para um estilo de vida sedentário, fisicamente inactivo. PAPEL DO MÉDICO Micro-intervenção – a nível do doente Prevenção: Suspeitar de IR perante antecedentes familiares de diabetes mellitus tipo 2, história pessoal de diabetes gestacional, tolerância alterada à glicose, síndrome de ovário poliquístico e obesidade, principalmente visceral. Nestes doentes as alterações do estilo de vida com aumento da actividade física diária, aumento da ingestão de fibras e a obtenção de um peso saudável são atitudes prioritárias. Tratamento: Menos eficaz. Tratar, não lesar. Intervenção familiar: Mais eficaz, conjuga prevenção e tratamento. Macro-intervenção – intervenção social Campanhas para promover mudanças do estilo de vida e dos hábitos nutricionais. Criação de organismos estatais de promoção da saúde e controlo e prevenção das doenças crónicas Desenvolvimento de planos globais e nacionais para prevenção da obesidade, diabetes mellitus tipo 2 e toda a síndrome metabólica. Insulino-resistência e estilo de vida 37 europeias actuais, com o objectivo de conseguir compromissos para acções destinadas a travar a epidemia da obesidade. Todos concordaram que promover dietas mais saudáveis e mais actividade física entre os Europeus é a chave para lidar com o problema. A obesidade está a aumentar rapidamente e a expansão da «cintura Europeia» traz com ela consequências devastadoras para a saúde pública e custos económicos tremendos, diz Markos Kyprianou. Os políticos despertaram para a dimensão do problema. A nível Nacional o Programa Nacional de Saúde e nomeadamente o Programa de Luta contra a Obesidade, o Programa de Controlo da Diabetes, o Programa de Prevenção e Controlo das Doenças Cardio-Vasculares e o Programa de Intervenção Integrada sobre Determinantes da Saúde Relacionados com os Estilos de Vida, denotam a mesma preocupação. Esperemos que o conjugar de esforços entre os parceiros sociais leve às macrointervenções tão necessárias e pelas quais nós médicos há tanto tempo lutamos. Recentemente a DECO organizou um simpósio intitulado «Obesidade Infantil – Uma Nova Epidemia», onde foram elaboradas e difundidas 12 medidas para combate à obesidade infantil e que se seguem: 1. Desenvolver acções articuladas (campanhas informativas, sessões de esclarecimento, brochuras, conteúdos on-line, kits pedagógicos) que promovam junto da população uma alimentação mais saudável e estilos de vida mais activos para combate à obesidade infantil; 2. Os programas escolares devem aperfeiçoar a abordagem alimentação / saúde numa perspectiva prática. 3. Deve ser definido o perfil nutricional dos alimentos e bebidas disponíveis nos bares e cantinas da escola que não devem promover e/ou vender alimentos hipercalóricos. 4. No ambiente escolar, deve ser limitada a presença de máquinas de venda, podendo estar presentes quando disponibilizem apenas determinados alimentos dentro do perfil nutricional definido. 38 Manual sobre Insulino-resistência 5. Os alunos devem ser envolvidos na escolha das ementas das cantinas escolares, de forma a melhorar a sua aceitação em relação às ementas oferecidas. 6. No ambiente escolar, todas as escolas deverão disponibilizar bebedouros públicos gratuitos que devem ser mantidos em boas condições. 7. No ambiente escolar, os espaços de recreio e desporto devem estar sempre abertos (mesmo em períodos não lectivos, férias e fins de semana), com a existência de materiais diversificados e com o apoio e supervisão de professores / monitores / auxiliares de acção educativa. 8. A publicidade dirigida às crianças, durante o espaço da programação televisiva não pode promover produtos alimentares ricos em açúcar, gordura e sal. 9. A indústria alimentar e a restauração devem ser obrigadas a reduzir os níveis de gordura, sal e açúcar, presentes nos produtos alimentares e refeições destinadas a crianças. 10. Promover uma política educativa que estimule a participação de crianças e jovens em actividades desportivas e de ar livre. 11. A cidade deve prever a existência de espaços de jogo em áreas residenciais novas ou reabilitadas. 12. Na cidade devem existir zonas pedestres, ruas fechadas ao trânsito e ciclovias comunitárias para todos os residentes; Causas genéticas 39 CAUSAS GENÉTICAS Mariana Pereira Monteiro Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar – Porto Numerosos estudos epidemiológicos demonstraram que existe uma agregação étnica e familiar da síndrome metabólica, sugerindo a existência de factores de susceptibilidade genética a condicionar os efeitos do ambiente no aparecimento das manifestações da insulino-resistência. No sentido de identificar os genes responsáveis pela resistência à insulina, os primeiros estudos genéticos desenvolvidos tiveram por base os conhecimentos actuais da estrutura e funcionamento do receptor da insulina na membrana celular e da respectiva cascata de sinalização após o receptor, desde a ligação da insulina até à activação do transporte da glicose para o interior das células. O receptor da insulina é uma proteína tetramérica constituída por duas cadeias alfa extra-celulares e por duas cadeias beta constituídas por uma porção transmembranar e uma porção intracelular, sendo esta última a iniciadora da cascata de transdução do sinal pós-receptor pois possui actividade tirosina-cinase intrínseca. A insulina ao ligar-se à subunidade alfa do receptor estimula a autofosforilação da porção intracelular da subunidade beta, que por sua vez induz a fosforilação de resíduos de tirosina de segundos mensageiros – os Substratos do Receptor da Insulina (IRS), que actuam como intermediários entre o receptor de insulina e outras moléculas intracelulares, activando-as. Inicia-se então uma cascata de fosforilações com activação de proteínas citoplasmáticas, como a fosfatidilinositol 3-cinase (PI 3-cinase), que permitem a translocação de transportadores da glicose insulino-dependente 4 (GLUT-4) do citoplasma para a membrana celular e consequentemente a entrada de glicose para a célula. Os genes do receptor da insulina, IRS-1, IRS-2, PI 3-cinase e GLUT-4 que regulam a cascata de sinalização da insulina, são genes que, se mutados, podem estar potencialmente envolvidos na etiopatogenia da insulino-resistência. Estudos em animais transgénicos demonstraram que mutações inactivadoras dos genes do receptor da insulina, IRS-1 e IRS-2 causam resistência à insulina com um fénotipo por vezes idêntico ao que ocorre na espécie humana. 40 Manual sobre Insulino-resistência No homem, as mutações inactivadoras de genes que codificam os diferentes elementos da cascata de sinalização do receptor da insulina são pouco frequentes, tendo sido encontradas em indivíduos com síndromes de insulino-resistência grave e por vezes incompatíveis com a vida. Até à data existem mais de 70 mutações do receptor da insulina conhecidas, que podem causar diminuição do número de receptores, da afinidade para a insulina ou da actividade da tirosina cinase, e que se podem manifestar por três síndromes diferentes: o leprechaunismo, a síndrome de Rabson-Mendenhall e a síndrome de Donahue. O leprechaunismo é caracterizado por atraso de crescimento intra-uterino, fácies dismórfico dito de duende e hipoglicemia em jejum, sendo frequentemente fatal no primeiro ano de vida. A síndrome de RabsonMendenhall caracteriza-se por atraso de crescimento, abdómen protuberante e anomalias dos dentes e unhas. A síndrome de Donahue apresenta crescimento e desenvolvimento normais, mas com manifestações severas de insulino-resistência associadas a hiperandrogenismo no sexo feminino. O gene do PI 3-cinase quando inactivado manifesta-se por uma forma da síndrome de insulino-resistência designada de pseudo-acromegálica, por apresentar um fenótipo sugestivo de acromegalia. No humano, as mutações do gene do IRS-1 e IRS-2, não se associam a um fenótipo concordante com os dados obtidos em animais de laboratório e ocorrem com igual frequência em indivíduos com insulino-resistência e em indivíduos normais. No entanto, a maioria destes casos de insulino-resistência têm uma etiologia poligénica não sendo possível explicar o fenótipo por um defeito genético único. Esta pode envolver fenómenos de epistasia em que a mutação ou polimorfismo de um único gene não causa qualquer alteração do fenótipo mas a conjugação de defeitos se manifesta por resistência à insulina, como por exemplo, a combinação de polimorfismos do IRS-1 e do receptor da insulina. Mas nem só as alterações da cascata de sinalização da insulina são responsáveis por síndromes de insulino-resistência, esta também ocorre quando existem defeitos nos órgãos-alvo da insulina que condicionam uma diminuição da sua acção de forma independente da cascata de sinalização da insulina. Causas genéticas 41 O tecido adiposo, dado ser quantitativamente o maior local de acção da insulina, é um importante determinante da sensibilidade à insulina. Defeitos genéticos que resultam numa escassez total ou parcial de tecido adiposo condicionam resistência à acção da insulina por mecanismos moleculares ainda mal caracterizados mas possivelmente por condicionarem uma deficiente remoção dos ácidos gordos plasmáticos. Dos quais são exemplos: a síndrome lipoatrófica de Berardinelli-Seip – uma forma de lipoatrofía generalizada congénita devida à mutação do gene da seipina, e a síndrome de Koberling-Dunnigan – uma forma parcial de lipoatrofia que poupa a face, devida à mutação do gene das lamininas nucleares A/C – ambas com resistência à insulina associada. Por outro lado, devido ao facto de a espécie humana ao longo de milhares de anos se ter debatido com situações de escassez nutricional às quais teve de se adaptar desenvolvendo mecanismos de defesa favorecedores do armazenamento energético em detrimento do gasto de energia é de esperar que tenham sido seleccionados genes “poupadores” que assegurassem um eficiente armazenamento de reservas para fazer face aos períodos de jejum prolongado. O gene P PAR-γ (Peroxisome Proliferator Activated Receptor-gamma) considerado até ao momento o principal gene “poupador”, expressa-se em vários tecidos existindo em várias isoformas, sendo a isoforma γ2 a predominante no tecido adiposo. Este gene codifica um receptor nuclear que é activado por ácidos gordos e estimula a transcrição de genes insulino-sensíveis responsáveis pela diferenciação dos adipócitos, metabolismo glucídico e lipídico, tais como os genes: da lipoproteína lipase, da proteína transportadora dos ácidos gordos, da sintetase dos ácidos gordos e do GLUT 4 – que promovem o armazenamento de triglicerideos no adipócito e consequentemente diminuem a acumulação de ácidos gordos no fígado e no músculo e facilitam o transporte da glicose mediado pela insulina para estes mesmos órgãos. O seu efeito sensibilizador à insulina resulta de mecanismos directos: ao aumentar o transporte de ácidos gordos e glicose para o adipócito e indirectos diminuindo a lipotoxicidade e facilitando o transporte da glicose para os outros tecidos insulino-sensíveis como o fígado e o músculo. As mutações do gene PPAR γ2 quando ocorrem podem resultar em perda ou ganho de função. As mutações do gene PPAR γ2 com perda de função do recep- 42 Manual sobre Insulino-resistência tor originam uma síndrome de lipodistrofia parcial com perda selectiva de massa adiposa na região femoroglutea e resistência à insulina. Enquanto que as mutações do gene PPAR γ2 com ganho de função do receptor causam obesidade e resistência à insulina, mas em menor grau do que seria de esperar para o seu grau de obesidade. As mutações do gene PPAR γ2 são raras, no entanto, existem numerosos polimorfismos do gene que ocorrem com maior frequência em algumas populações e podem estar associados a maior ou menor prevalência da resistência à insulina nessa população, do qual é exemplo o polimorfismo Pro12Ala que ocorre em 15% da população finlandesa e se associa a um índice de massa corporal baixo e sensibilidade à insulina aumentada. A actividade do PPAR γ2 correlaciona-se com o grau de resistência à insulina segundo uma curva em U, condicionando resistência à insulina tanto em situações de hipo como hiperactivação do receptor. Do ponto de vista evolutivo a activação do PPAR γ favoreceu a sobrevivência da espécie em períodos de carência alimentar ao facilitar a acumulação de reservas. Nas últimas décadas, com as modificações que têm sido observadas no ambiente, nomeadamente, o acesso fácil a alimentos de alta densidade calórica associado a estilos de vida com pouca actividade física, condicionaram um aumento dos níveis de ácidos gordos circulantes e a activação constante do PPAR γ2 que explica em parte o aumento da prevalência do excesso ponderal e da obesidade, da resistência à insulina e consequentemente da síndrome metabólica. Pode concluir-se que embora seja inquestionável a existência de um substrato genético para a insulino-resistência, as causas monogenéticas são extremamente raras sendo pouco provável a sua contribuição para o risco de insulino-resistência na população geral, a maioria dos casos de são de etiologia poligénica e mal caracterizados, pelo que ainda não é possível afirmar quais os genes implicados nesta entidade patológica. Nos últimos anos foram identificados múltiplos genes candidatos para etiopatogenia da síndrome de insulino-resistência, no entanto, existem ainda muitas questões por responder que se elucidadas poderão permitir no futuro o desenvolvimento abordagens terapêuticas mais dirigidas à etiologia da doença. Causas genéticas Insulino-resistência: causas genéticas Estudos epidemiológicos sugerem a influência de factores genéticos na susceptibilidade para a insulino-resistência (IR). Os estudos genéticos em curso procuram identificar quais os genes que podem condicionar IR. Os principais alvos de estudo têm sido, não somente, os genes envolvidos na cadeia de sinalização da insulina, tais como: 1. Receptor da insulina 2. IRS-1 e IRS–2 3. PI3-cinase 4. GLUT 4 Mas também, os genes que quando mutados condicionam defeitos nos orgãos alvo da insulina, sendo exemplo os que cursam com sindromes lipoatróficos generalizados ou parciais, tais como: 1. Seipina 2. Laminina nuclear A/C 3. Gene PPAR γ2 As causas monogenéticas de IR são raras, sendo a maioria dos casos de carácter poligénico. Embora pareça existir um substrato genético para a IR, não existem, até ao momento dados definitivos que nos permitam afirmar quais os genes implicados nesta entidade patológica. 43 44 Manual sobre Insulino-resistência SÍNDROME METABÓLICA E ADOLESCÊNCIA Helena Fonseca Unidade de Medicina do Adolescente, Clínica Universitária de Pediatria Hospital de Santa Maria A prevalência de obesidade tem também vindo a aumentar consideravelmente no grupo etário da adolescência1 e as suas complicações médicas são cada vez mais reconhecidas. Por exemplo, a prevalência da diabetes tipo 2 aumentou dramaticamente entre os adolescentes nos passados 20 anos. Vários estudos sugerem que uma percentagem substancial de crianças e adolescentes obesos poderão sofrer de síndroma metabólica porque muitos têm presente uma associação de pelo menos três dos factores que caracterizam a síndrome. Muitos adolescentes obesos têm também níveis elevados de insulina indicando um aumento da resistência à insulina. A presença num adolescente de pressão arterial elevada, anomalias no metabolismo da glucose, alteração na concentração dos lipidos plasmáticos e obesidade abdominal tem sido descrito como Síndrome de insulino-resistência ou Síndrome metabólica. Até há alguns anos atrás não se ouvia sequer falar desta entidade na criança. No entanto, actualmente, esta constelação de alterações metabólicas e hemodinâmicas é cada vez mais frequentemente encontrada na criança e no adolescente fruto da crescente prevalência de obesidade na idade pediátrica, com tendência para aumentar fruto do aumento da obesidade. Considera-se obesidade um Índice de Massa Corporal (IMC) superior ao P95 para a idade e sexo, segundo as tabelas de Tim Cole2 (Anexos 1A. e 1B.). Sabemos que a obesidade aumenta o risco de hipertensão, alteração do perfil lipidico, hiperinsulinemia e diminuição da tolerância à glucose. Por outro lado, está provado que o controlo do IMC no adolescente obeso, reduz a hiperinsulinemia, diminui a pressão arterial e melhora o perfil lipídico3,4. Estudamos a insulino-resistência numa população de adolescentes obesos, entre os 12 e os 18 anos, seguidos na Consulta de Obesidade do Serviço de Pediatria do Hospital de Santa Maria. Este estudo consistiu num estudo retrospectivo transversal, com avaliação de história familiar de diabetes, glicémia e Síndrome Metabólica e adolescência 45 insulinémia em jejum e cálculo de índices de sensibilidade / resistência à insulina: razão glicémia / insulinémia em jejum, índice de resistência à insulina determinado por HOMA (HOMA RI) e QUICKI. Dos 154 processos que possuíam valores de glicémia e insulinémia em jejum numa mesma data, 77/154 (50%) tinham uma razão glicémia em jejum / insulinémia em jejum menor que 6; 77/154 (50%) tinham um HOMA RI superior a 2,59; 121/154 (78,6%) tinham um QUICKI menor que 0,357. Este estudo permitiu demonstrar como uma parte importante da população acima dos 12 anos seguida em consulta de Obesidade, tem índices de sensibilidade / resistência à insulina que demonstram resistência a esta hormona. Sabendo-se que 77,3% destes adolescentes têm história familiar de diabetes, que a insulino-resistência precede o aparecimento de morbilidade e que tanto o primeiro como o segundo factores, assim como a obesidade em si mesma, são importantes factores de risco cardiovascular, torna-se fundamental instituir medidas de prevenção primária e secundária o mais eficazes possível. Os vários autores são unânimes em considerar que as guidelines para o tratamento da obesidade deveriam recomendar a identificação dos adolescentes com complicações médicas da sua obesidade. No entanto, ao contrário do que acontece no adulto, não há uma definição de consenso para a síndroma metabólica em idade pediátrica. Utilizando critérios análogos aos do National Cholesterol Education Program (NCEP / ATP III), S. Cook et al.5 definiram a Síndrome Metabólica na Adolescência como a associação de pelo menos três dos seguintes factores: 1. Pressão arterial (mm Hg) elevada ≥ P90 para a idade e sexo (Anexos 3A. e 3B.). 2. Colesterol HDL diminuído ≤ 40 mg/dl (P 10 para a idade e sexo) (Anexo 2B.). 3. Trigliceridos elevados ≥ 110 mg/dl (P 90 para a idade e sexo) (Anexo 2D.). 4. Glicemia em jejum elevada ≥ 110 mg/dl (= 6.1 mmol/L). 5. Obesidade abdominal (diâmetro da cintura em cm) ≥ P90. 46 Manual sobre Insulino-resistência Síndrome metabólica e adolescência Ao contrário do que acontece no adulto ainda não existe uma definição de consenso para o síndrome metabólica em idade pediátrica. No entanto, utilizando critérios análogos aos do National Cholesterol Education Program (NCEP / ATP III) foi possível definir o síndrome metabólica na Adolescência como a associação de pelo menos três dos cinco seguintes factores: Trigliceridos elevados (mg/dl) ≥ 110 HDL – C diminuído (mg/dl) ≤ 40 Obesidade abdominal (diâmetro da cintura em cm) ≥ P90 Glicemia em jejum elevada ≥ 110 Pressão arterial elevada (mm Hg) ≥ P90 Como a obesidade tem aumentado entre os adolescentes, as suas complicações médicas são cada vez mais comuns e mais frequentemente reconhecidas. Vários estudos sugerem que uma percentagem substancial de adolescentes obesos poderá sofrer de síndrome metabólica. Muitos adolescentes obesos têm também níveis elevados de insulina indicando um aumento da resistência à insulina. A identificação atempada de parâmetros alterados tais como: Trigliceridos elevados, HDL – C diminuído e Pressão Arterial elevada, poderá ajudar a desenhar intervenções que melhorem a saúde cardiovascular futura destes adolescentes. Síndrome metabólica e adolescência 47 Neste estudo, o primeiro que determinou a prevalência e distribuição da síndrome metabólica numa amostra representativa nacional dos adolescentes americanos, foi utilizada a definição de síndrome metabólica do National Cholesterol Education Program (Adult Treatment Panel III) adaptada à idade. A amostra foi constituída por 2430 adolescentes de ambos os sexos, com idades entre os 12 e os 19 anos e que participaram no Third National Health and Nutrition Examination Survey (19881994). A prevalência da síndrome encontrada no grupo etário em estudo foi de 4.2%: 6.1% do sexo masculino e 2.1% do sexo feminino. Tinham a síndrome 28.7% dos adolescentes obesos (IMC > P95 para a idade e sexo) contra 6.8% dos adolescentes com excesso de peso (IMC entre o P85 e o P95 para a idade e sexo). Já para B. Falkner et al.6, a definição de síndrome metabólica na adolescência é ligeiramente diferente, consistindo na associação de pelo menos três dos seguintes critérios: 1. Trigliceridos em jejum ≥ 1.1 mmol/L (100 mg/dL). 2. Colesterol HDL < 1.3 mmol/L (50 mg/dL) (para os adolescentes do sexo masculino entre os 15 e os 19 anos: < 1.2 mmol/L (45 mg/dL). 3. Glicemia em jejum ≥ 6.1 mmol/L (110 mg/dL). 4. Circunferência da cintura > P75 para a idade e sexo. 5. Pressão arterial sistólica > P90 para a idade, sexo e altura. Esta definição, utilizando valores mais restritivos de lipidos e do perímetro abdominal, fez com que fosse encontrada uma prevalência superior de síndrome metabólica (~ 9.2%). Para o perímetro da cintura (que deve ser medido a meia distancia entre duas linhas imaginárias, uma paralela ao chão passando pela extremidade inferior da grelha costal e outra passando pelo bordo superior da crista ilíaca), estes autores utilizaram percentis extrapolados do adulto do sexo masculino7. A maior limitação com que nos defrontamos para a definição de síndrome metabólica na adolescência é, efectivamente, a inexistência de valores de referência para o perímetro da cintura em crianças e adolescentes. Para ultrapassar esta limitação, no estudo efectuado por S. Cook e colaboradores5, foram analisados 48 Manual sobre Insulino-resistência todos os adolescentes da amostra que tinham registo do perímetro da cintura, e desenhadas as correspondentes curvas de percentis. Foram classificados como tendo obesidade abdominal os adolescentes com um perímetro de cintura superior ou igual ao P90 para a idade e sexo. A pressão arterial sistólica e/ou diastólica elevada foi definida como um valor igual ou superior ao P90 para a idade, sexo e altura8. (Anexos 3A. e 3B.) Uma diminuição da pressão arterial média para valores inferiores ao percentil 90 para a idade, sexo e percentil de altura será o objectivo a atingir. Os primeiros passos no tratamento de adolescentes com hipertensão moderada, na ausência de doença renal ou diabetes tipo 1, são medidas não farmacológicas de controlo de peso, através da obtenção de mudanças no estilo de vida, tanto a nível da dieta como da actividade física. Do mesmo modo, a intervenção terapêutica primária no tratamento da elevação dos trigliceridos e do colesterol HDL baixo reside no controlo da obesidade através da dieta e exercício físico. Está demonstrado que mesmo pequenas reduções no peso podem melhorar significativamente o perfil lipidico3. Na idade pediátrica só está recomendado o início de terapêutica farmacológica se a idade for superior a 10 anos, e o LDL colesterol for superior a 190 µg/dl (ou acima de 160 se houver associação com outros dois factores de risco)9. A acantose nigricans, que se descreve como um espessamento da pele tipo veludo com pigmentação aumentada, em torno do pescoço e axilas e é encontrado com frequência em raparigas e mulheres jovens obesas, está associada com diminuição da tolerância à glucose e hiperandrogenismo. Às crianças obesas assim como às crianças com acantose nigricans (com ou sem obesidade) dever-se-ia determinar o peptido C, a HbA1C e o perfil lipídico em jejum. Os que tivessem valores alterados de algum destes parâmetros deveriam ser alvo de uma avaliação adicional que incluísse o teste de tolerância oral à glucose. No adulto já se demonstrou que as intervenções não farmacológicas para conseguir redução do peso e aumentar a actividade física podem melhorar a tole- Síndrome metabólica e adolescência 49 rância à glucose e diminuir a progressão para diabetes10. No adolescente não está indicado utilizar agentes que aumentem a sensibilidade à insulina como a Metformina, a menos que se esteja a verificar uma deterioração progressiva da tolerância à glucose. Independentemente de não haver consenso em relação aos critérios a adoptar para a definição de Síndrome Metabólica, o importante a realçar é o facto de esta constelação de alterações metabólicas na população de adolescentes obesos ser sete vezes mais frequente do que na população adolescente em geral, com consequentes implicações importantes tanto em termos de saúde pública como em termos da intervenção clínica direccionada para este grupo de risco tão elevado. Porque a síndrome metabólica aumenta significativamente o risco de diabetes tipo 2 e de doença arterial coronária prematura no adulto, os adolescentes em que se identifique um perfil de factores de risco, tais como trigliceridos elevados, colesterol HDL diminuído e pressão arterial elevada, devem constituir um subgrupo a ser alvo de intervenções desenhadas com o objectivo de obter uma mudança de estilo de vida, com consequente melhoria da sua saúde cardiovascular futura. Consultar anexos nas páginas 156 a 163 deste Manual. 50 Manual sobre Insulino-resistência Insulino-resistência e iatrogenia 1. CORTICOSTERÓIDES (++) 2. PROGESTATIVOS 3. ESTROGÉNIOS E ANDROGÉNIOS 4. HORMONA DE CRESCIMENTO 6. ÁCIDO NICOTÍNICO 5. INSULINA 6. ANTI-HIPERTENSORES Hidralazina Diuréticos Beta-bloqueantes 7. INIBIDORES DA PROTEASE RETROVIRAL 8. INTERFERON 9. ANTI-PSICÓTICOS ATÍPICOS Clozapina Olanzapina Actuando directamente ao nível do receptor da insulina1,3,5 Diminuindo a utilização de glicose ou aumentando a sua produção1,2,4,6,7,8,9 Aumentando a captação1 ou a mobilização de lípidos do tecido adiposo visceral4,6 Aumentando os níveis de hormonas de contra-regulação (glucagon1 ou hormona de crescimento2) São passíveis de induzir fenómenos de insulino-resistência, que num terreno susceptível, se traduzirão em repercussões metabólicas mais ou menos importantes. Insulino-resistência e iatrogenia 51 INSULINO-RESISTÊNCIA E IATROGENIA Cláudia Freitas Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo; Hospital Geral de Santo António. Na prática clínica, são utilizados vários fármacos que podem induzir fenómenos de resistência à insulina, com implicações metabólicas mais ou menos importantes para o doente. Os corticosteróides são os mais frequentemente implicados. Podem ter acção directa diminuindo o número de receptores de insulina e estimulando a produção de glicose hepática por gluconeogénese, ou actuar indirectamente aumentando a actividade da lipoproteíno-lipase com o consequente aumento da captação de lípidos pelo tecido adiposo visceral. No contexto de diminuição da acção da insulina, a mobilização de lípidos está deficiente, pelo que o resultado é a acumulação de gordura visceral. Por outro lado, os corticosteróides aumentam a secreção de glucagon, hormona hiperglicemiante por excelência, que naturalmente agrava o quadro de hiperinsulinémia e resistência à insulina. Os progestativos aumentam a secreção de hormona de crescimento, mas o maior contributo para a insulino-resistência advém do seu efeito glicocorticóide. O papel dos estrogénios e androgénios não é tão claro. Apesar de alguns dados serem contraditórios, pensa-se que os estrogénios não induzam insulinoresistência clinicamente significativa. Relativamente aos androgénios, é bem conhecida a sua capacidade de reduzir a acção da insulina in vivo, diminuindo a ligação da insulina ao seu receptor e induzindo defeitos pós-receptor em mulheres com hiperandrogenismo. Todavia, tanto os estrogénios como os androgénios utilizados como forma terapêutica em mulheres e homens com hipogonadismo e insulino-resistência, demonstraram que facilitavam a mobilização de lípidos e diminuíam a acumulação de gordura visceral, pelo que contribuíam para uma melhoria da síndrome. De uma forma semelhante, apesar do efeito benéfico sobre a insulino-resistência que o tratamento com hormona de crescimento tem na deficiência do adulto, um estudo recente demonstrou que a Diabetes tipo 2 era seis vezes mais fre- 52 Manual sobre Insulino-resistência quente nas crianças com deficiência tratadas. Sabe-se que o seu efeito anti-insulínico faz-se sentir não só na utilização periférica e hepática de glicose, como no aumento da lipólise e libertação de ácidos gordos livres, contribuindo para o quadro de insulino-resistência, também conhecida na acromegalia. Se a alteração tem por base uma predisposição da criança não está esclarecido. O ácido nicotínico também possui um efeito paradoxal. Trata-se do único fármaco que diminui directamente os níveis de ácidos gordos não esterificados, através da diminuição da lipólise. O seu efeito imediato traduz-se assim no aumento da sensibilidade à insulina. No entanto, no tratamento prolongado, por vezes assiste-se ao efeito inverso, pensa-se que por um mecanismo de rebound do efeito anti-lipolítico. Alguns anti-hipertensores, como os diuréticos, beta-bloqueantes selectivos e não selectivos e hiralazina, são passíveis de induzir resistência à insulina, intolerância à glicose e dislipidemia. Utilizados em menor escala, mas com repercussões não menos importantes, encontram-se os inibidores da protease retroviral usados no tratamento da infecção HIV, que diminuem de uma forma significativa a actividade do transportador de glicose GLUT4 e que com grande probabilidade serão a causa da lipodistrofia, dislipidemia, intolerância à glicose e Diabetes encontradas nestes doentes. O interferon também demonstrou ser capaz de induzir resistência à insulina nos tecidos periféricos e esplâncnicos em doentes com hepatite crónica activa. Os anti-psicóticos têm vindo a ser alvo de atenção crescente, particularmente a clozapina e olanzapina. Para além do antagonismo aos efeitos da serotonina e dopamina, com diminuição dos limites da saciedade e consequente aumento da ingestão alimentar e obesidade, estes anti-psicóticos parecem ter um efeito directo sobre os transportadores de glicose periféricos (GLUT 1) e centrais (GLUT 3). O aumento do risco cardiovascular dos doentes esquizofrénicos tratados com estes fármacos tem questionado a opção terapêutica face aos anti-psicóticos convencionais. O efeito parece ser independente da dose, mas reversível após suspensão terapêutica. Insulino-resistência e iatrogenia 53 A própria insulina regula o seu receptor por um mecanismo de “feed-back” negativo, pelo que a hiperinsulinémia endógena ou exógena, é um potente antagonista da sua acção. Concluindo, numerosos fármacos são capazes de induzir fenómenos de insulinoresistência mais ou menos acentuados, que num terreno susceptível, se traduzirão em repercussões metabólicas mais ou menos importantes. Cabe ao clínico conhecê-los e pesquisá-los, sempre que a instituição terapêutica tenha sido prioritária. 54 Manual sobre Insulino-resistência Insulino-resistência e infecção por VIH IR DA SÍNDROME DE LIPODISTROFIA DA INFECÇÃO POR VIH Alterações do metabolismo e redistribuição da gordura: Terapêutica anti-retrovírica: Inibidores da protease ↑ Gordura visceral Nucleosídeos inibidores da ↓ Gordura subcutânea transcriptase reversa AGL Factores relacionados com o doente: (⇒ Dislipidemia) Hormonas INSULINO RESISTÊNCIA (↓leptina, ↑resistina, ↓ adiponectina) Genética Ambiente Dieta Citocinas (↑TNF-α) Factores relacionados com a doença (Infecção VIH) ↓Tolerância à glicose ou diabetes; Dislipidemia; Alterações da fibrinólise e coagulação (↑PAI-1, ↑tPA) Síndrome Metabólica ⇒ ↑ Risco Doença Cardiovascular Insulino-resistência e infecção por VIH 55 INSULINO-RESISTÊNCIA E INFECÇÃO POR VIH Paula Freitas Serviço de Endocrinologia, Faculdade de Medicina do Porto, Hospital de São João, Porto. Síndrome de lipodistrofia A síndrome de lipodistrofia caracteriza-se por redistribuição da gordura, com acumulação abdomino-visceral e perda subcutânea na face e nas extremidades e pode afectar a maioria dos indivíduos infectados por VIH que são tratados com terapêutica anti-retrovírica combinada. Devido ao desenvolvimento de novos fármacos, como os nucleosídeos inibidores da transcriptase reversa, os nãonucleosídeos e os nucleotídeos e os inibidores da protease (IP), a sobrevida dos doentes com infecção VIH aumentou significativamente. Desde finais de 1996, a estratégia do tratamento anti-retrovírico mudou da associação de 2 para 3 fármacos, a denominada terapêutica anti-retrovírica altamente activa (HAART). A HAART é tão eficaz que a incidência das infecções oportunistas associadas ao VIH diminuiu drasticamente. Esta síndrome está associada a insulino-resistência significativa. De modo que, apesar da melhoria do prognóstico dos doentes infectados com VIH e tratados com HAART, a insulino-resistência e a hiperinsulinemia podem aumentar o risco de mortalidade cardiovascular destes doentes. Para além das alterações cosméticas da síndrome de lipodistrofia, verificou-se mais tarde a existência de alterações metabólico-endócrinas: 1. Metabolismo glicídico (diminuição da tolerância à glicose ou diabetes) 2. Metabolismo lipídico (aumento triglicerídeos, colesterol total e C-LDL e diminuição C-HDL) 3. Alterações da fibrinólise e da coagulação (↑ PAI-1, ↑ tPA) 4. Alterações endócrinas (↓leptina, ↑resistina, ↓adiponectina) As alterações no metabolismo da glicose resultam de diminuição da sensibilidade à insulina e esta conjuntamente com hiperlipidemia e as alterações da fibrinólise e da coagulação são factores de risco para doença coronária. O conjunto destes factores (síndrome metabólica) aumenta exponencialmente este risco. 56 Manual sobre Insulino-resistência Alterações da Tolerância à Glicose As causas de insulino-resistência na infecção por VIH são provavelmente multifactoriais. Os mecanismos de insulino-resistência nesta população podem relacionar-se com a diminuição no transporte de glicose causado por efeito directo de certos agentes anti-retrovíricos, como os IP, ou com o efeito de grandes alterações da distribuição da gordura, nomeadamente a perda de gordura subcutânea e aumento de gordura visceral. Vários estudos demonstraram a existência de hiperinsulinemia nos doentes infectados com VIH. A maioria dos indivíduos com infecção VIH têm glicemia normal mas alguns com lipodistrofia têm diminuição da tolerância à glicose ou diabetes. Nos doentes com infecção por VIH e com insulino-resistência existe aumento da secreção de insulina, diminuição da extracção hepática de insulina, diminuição da sensibilidade das células β, e aumento da produção hepática de glicose. As alterações na distribuição de gordura podem ser graves nos doentes VIHpositivos, e podem contribuir de forma independente para a hiperlipidemia e insulino-resistência. Os mecanismos de redistribuição da gordura e alteração da regulação do adipócito não são totalmente conhecidos, mas podem resultar de efeitos directos do vírus VIH, das medicações anti-retrovíricas ou de uma interacção entre o vírus VIH, citoquinas e estas terapêuticas específicas. Não há dados que confirmem uma infecção directa dos adipócitos pelo vírus VIH. Citoquinas como o factor necrose tumoral – α (TNF-α) podem promover lipólise e insulino-resistência através de acção sistémica ou efeitos parácrinos locais. Por outro lado, os IP podem inibir a diferenciação dos adipócitos através dos seus efeitos na regulação da proteína 1 de ligação do elemento regulador dos esteróides (SREBP-1) enquanto que os nucleosídeos inibidores da transcriptase reversa (NRTIs) podem afectar a função mitocondrial e o metabolismo dos adipócitos através dos seus efeitos no DNA polimerase γ. Nos doentes infectados por VIH existe um aumento dos níveis de AGL, devido ao aumento da lipólise e à redistribuição de gordura, o que influencia directamente a insulino-resistência. O aumento de AGL contribui para a insulino-resistência por diminuir a entrada de glicose no músculo. Insulino-resistência e infecção por VIH 57 O mecanismo pelo qual a redistribuição da gordura parece ser um determinante importante da insulino-resistência em doentes infectados por VIH com síndrome de lipodistrofia não é totalmente conhecido. Uma possibilidade é o TNF-α e os seus receptores, nomeadamente, o receptor solúvel do tipo 2 do TNF, contribuírem para a insulino-resistência na lipodistrofia por VIH. Em doentes com insulinoresistência observa-se um aumento da produção de TNF-α no tecido adiposo. Papel da Desregulação Imune Existe também uma ligação entre factores imunes ou inflamatórios e redistribuição de gordura. Doentes tratados com HAART têm elevado número de linfócitos CD8+ contendo TNF-α. O TNF tem múltiplos efeitos no tecido adiposo, nomeadamente inibição da diferenciação dos adipócitos, inibição da esterificação dos triglicerídeos e sua deposição nos adipócitos, e promoção da lipólise. Patogénese da Redistribuição da gordura Estudos moleculares mostraram que os IP estão associados a menores níveis de SREBP-1, PPAR γ, e c/EBP α – factores que normalmente promovem a diferenciação do adipócito e a uma localização celular persistente de SREBP-1 com uma falta de translocação normal para o interior do núcleo. A incubação com IP também diminui os efeitos da insulina na cinase MAP e cinase P13, factores intracelulares que promovem o transporte de glicose e promove a apoptose, principalmente o indinavir. A rosiglitazona (agonista dos PPARγ) reverte esses efeitos inibitórios permitindo o aumento da diferenciação, diminuição da insulino-resistência e diminuição da apoptose. O aumento das concentrações séricas de lactato também pode estar associado com a insulino-resistência e são superiores nos doentes com lipodistrofia. Em resumo, vários factores promovem a insulinoresistência, nomeadamente efeito directo dos fármacos na translocação do GLUT 4, e outros efeitos na função celular como a actividade hexocinase e promovem também alterações na secreção pancreática de insulina e produção hepática de glicose. Baseado em estudos de homologia sequencial, Carr propôs que os IP podem ligar-se à proteína de ligação do ácido retinóico citoplasmático de tipo 1 (CRABP1) e à proteína relacionada com o receptor da lipoproteína (LRP). A ligação dos IP ao CRABP1 parece diminuir a activação do receptor retinóide X e a 58 Manual sobre Insulino-resistência dimerização com o “peroxisome proliferator-activated receptor”γ (PPARγ), o que causa diminuição da captação dos quilomicra e depuração dos triglicerídeos pelo complexo lipoproteína lipase-LRP endotelial. Tratamento da insulino-resistência na síndrome de lipodistrofia VIH Uma questão inicial nos doentes com lipodistrofia por VIH é saber até que ponto um regime sem IP poderá melhorar a insulino-resistência. No entanto, as alterações metabólicas devem ser compensadas tendo em conta os efeitos benéficos conhecidos dos vários regimes anti-víricos na função imune e na sobrevivência global. São necessários mais estudos para determinar a segurança e eficácia das estratégias de substituição de anti-virícos. Modificações dietéticas (baixo conteúdo em gordura e elevado em fibras), aumento de exercício e correcção do excesso de peso caso exista ou tratamento específico devem ser estratégias iniciais em doentes com lipodistrofia por VIH. Os agentes insulino-sensibilizadores parecem melhorar a insulino-resistência e reduzir o risco de DCV nesta população. A metformina é particularmente apropriada para doentes com obesidade andróide significativa, dislipidemia e aumento do IMC, já que o uso da metformina melhora o equilíbrio glicémico, reduz a insulino-resistência, a obesidade visceral, o peso, os triglicerídeos, as LDL, a tensão arterial diastólica, tPA e PAI-1; o que sugere que os agentes insulino-sensibilizadores podem melhorar o perfil de risco global cardiovascular em doentes VIH-infectados com redistribuição de gordura. Estes benefícios foram demonstrados em doentes sem diabetes, com infecção por VIH a efectuar terapêutica anti-retrovírica mas com diminuição da tolerância à glicose e/ou hiperinsulinemia (insulina em jejum> 15 µIU/mL) e/ou aumento da razão perímetro da cintura / perímetro da anca e/ou evidência de redistribuição da gordura. O desenvolvimento de acidose láctica é raro, mas é um potencial efeito secundário grave da metformina, particularmente em doentes com disfunção renal. Em doses baixas a metformina em doentes infectados por VIH não aumenta o risco de acidose láctica, mesmo naqueles que usam nucleosídeos inibidores da transcriptase reversa, os quais estão eles próprios associados de per si a acidose láctica. A metformina, apesar de ser um potente insulino-sensibiliza- Insulino-resistência e infecção por VIH 59 dor, não aumentou a adipogénese periférica, possivelmente porque actua primariamente na redução da insulino-resistência hepática. Pelo contrário, as tiazolidinedionas (rosiglitazona, pioglitazona), estão associadas a aumento de peso, promovem a adipogénese subcutânea primariamente através da sua acção nos PPARγ. Apesar das tiazolidinedionas terem efeitos tanto na insulino-resistência hepática como periférica, o efeito dominante é melhorar a captação periférica de glicose. As tiazolidinedionas também reduzem os níveis plasmáticos de triglicerídeos e podem aumentar as HDL, diminuir o PAI-1 e melhorar a função endotelial. Os agentes hipolipemiantes (fibratos e estatinas) estão recomendados em indivíduos infectados por VIH com hiperlipidemia. São preferidas as estatinas que não partilham vias de metabolismo similares com os IP (citocromo P450 3A4), no entanto a melhor forma de melhorar o perfil lipídico é a descontinuação da terapia com IP. Hormona de crescimento tem um efeito bidireccional na insulino-resistência, ou seja, um agravamento precoce e uma melhoria tardia. Existe um aumento na produção hepática de glicose e insulino-resistência hepática ao fim de um mês de tratamento mas que é reversível ao sexto mês. A IR periférica também melhora ao 6.º mês. Esta terapêutica está associada a perda de gordura, especialmente gordura visceral, diminuição do colesterol total, LDL e triglicerídeos e aumento das HDL. O tratamento com GHRH (“Growth hormone releasing hormone”) pode ser uma opção viável para reverter as anomalias da composição corporal existentes na lipodistrofia VIH. Apesar desta redistribuição da gordura reflectir um perfil cardiovascular mais saudável, os níveis de insulina, glicose, colesterol e triglicerídeos podem permanecer estáveis. Outras potenciais terapêuticas associadas à diminuição da IR são a administração de IGF-I, leptina e adiponectina. Conclusões A insulino-resistência associada à infecção VIH é comum e multifactorial, parecendo que alguns IP têm um efeito promotor directo. A redistribuição da gordura, também comum, parece ser igualmente multifactorial, com os agentes antiretrovíricos contribuindo apenas para uma parte do problema. Insulino-resistência e co-morbilidades 62 Manual sobre Insulino-resistência Insulino-resistência e obesidade A associação de obesidade visceral com resistência à insulina, hipertrigliceridemia, aumento da apolipoproteína B, aumento das LDL pequenas e densas e diminuição do colesterol HDL confere um alto risco de doença cardiaca isquémica. Hiperinsulinemia TRÍADA ATEROGÉNICA Aumento das partículas LDL pequenas e densas Aumento da apolipoproteína B Associa-se a risco aumentado de doença coronária mesmo na ausência dos factores de risco clássicos como diabetes tipo 2, hipercolesterolemia e hipertensão. NA PRÁTICA: A associação da hipertrigliceridemia com o aumento do perímetro da cintura é um fenótipo identificador de obesidade / excesso de peso de alto risco. O perímetro da cintura deverá ser usado como um parâmetro vital a medir em todos os doentes pela sua capacidade de identificar a obesidade visceral e de monitorizar a sua modificação no tempo. Insulino-resistência e obesidade 63 INSULINO-RESISTÊNCIA E OBESIDADE Helena Cardoso Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo; Hospital Geral de Santo António A associação entre obesidade e resistência à insulina parece corresponder a uma relação de causa-efeito. Um dado a favor é o facto de, quer nos modelos de experimentação animal, quer no Homem, o aumento de peso diminuir a sensibilidade à insulina e a perda de peso aumentá-la, com repercussões também a nível da tolerância à glicose1. O mecanismo subjacente a esta relação é porém discutível. Os ácidos gordos livres parecem constituir uma importante ligação entre obesidade, resistência à insulina e diabetes mellitus. Os ácidos gordos elevados provocam resistência à insulina a nível hepático e periférico2. Os mecanismos possíveis para esta relação entre a resistência à insulina e o nível plasmático de ácidos gordos livres são a inibição da fosforilação e do transporte da glicose e a diminuição da actividade da sintase do glicogénio muscular. Os ácidos gordos livres também estimulam a secreção de insulina nos indivíduos não diabéticos, compensando assim a resistência periférica à insulina que eles próprios medeiam. Outros autores propõem como explicação para a hiperinsulinemia uma redução da captação de insulina pelo fígado em resultado da sua exposição a níveis elevados de ácidos gordos livres. Boden defendeu que nos indivíduos predispostos geneticamente à diabetes tipo 2 os ácidos gordos livres seriam incapazes de promover esse aumento da secreção de insulina capaz de compensar o aumento da resistência à insulina, o que resultaria em hiperglicemia3. Vários autores demonstraram uma associação entre as reservas aumentadas de triglicerídeos intramusculares e a diminuição da sensibilidade muscular à insulina medida pela determinação da síntase de glicogénio estimulada pela insulina, e os índices de resistência à insulina determinados pelo clamp euglicémico. O Quebec Cardiovascular Study demonstrou a associação da obesidade visceral com a hiperinsulinemia, a resistência à insulina, a hipertrigliceridemia, o aumento da concentração da apolipoproteína B, o aumento da proporção das LDL pequenas e densas e a diminuição das concentrações do colesterol HDL. Das variáveis estudadas foi a apolipoproteína B a que se correlacionou mais for- 64 Manual sobre Insulino-resistência temente com a doença cardíaca isquémica (4). Perante a frequente observação de níveis de colesterol total muito próximos do normal em doentes com obesidade visceral e história de doença cardíaca isquémica, Després descreve uma tríada aterogénica, de que fazem parte a hiperinsulinemia, o aumento das partículas LDL pequenas e densas e o aumento da apolipoproteína B, tríada essa associada a risco aumentado de doença coronária mesmo na ausência dos factores de risco clássicos como a diabetes tipo 2, a hipercolesterolemia e a hipertensão5. A associação da hipertrigliceridemia ao aumento do perímetro da cintura será um fenótipo identificador dessa tríada aterogénica e da obesidade / excesso de peso de alto risco. É de salientar a importância da resistência à insulina como factor de risco cardiovascular chamando a atenção para os diferentes fenótipos que a síndrome metabólica pode apresentar. O perímetro da cintura deve ser usado como um parâmetro vital a medir em todos os doentes pela sua capacidade de identificar a obesidade visceral e de monitorizar a sua modificação no tempo. Várias explicações têm sido sugeridas para a maior associação entre obesidade central e S. metabólica. Uma explicação é que o tecido adiposo visceral seja mais insulino-resistente do que o tecido adiposo subcutâneo. No entanto, Abate e colaboradores6 observaram, no homem, um maior papel do tecido abdominal subcutâneo na resistência à insulina ligada à obesidade, tendo o tecido adiposo intraperitoneal e retroperitoneal um menor papel. Já Dowling e colaboradores7 verificaram que nas mulheres brancas com obesidade central quer os adipócitos abdominais quer os gluteais respondiam menos aos efeitos estimuladores da insulina na captação da glicose e eram menos sensíveis aos efeitos antilipolíticos da insulina, confirmando a associação da obesidade central com a resistência à insulina e a dislipidemia. Portanto a resistência aos efeitos antilipolíticos da insulina ao nível do tecido adiposo pode aumentar a lipólise sistémica, desempenhando um papel no desenvolvimento ou manutenção da resistência periférica à insulina associada à obesidade central. Outra explicação é que os produtos libertados pelo tecido adiposo visceral, ácidos gordos livres e seus metabolitos e as citocinas como o TNF-α entram na circulação portal, banham o fígado desenca- Insulino-resistência e obesidade 65 deando várias repostas que agravam a S. metabólica. Activarão componentes da via inflamatória como o factor nuclear kappa-B (NFKappaB) e inibirão a sinalização da insulina. A resistência à insulina associa-se ainda a níveis diminuídos de adiponectina. Reaven e colaboradores demonstraram na mulher pós-menopáusica que embora a RI isolada esteja associada a algumas alterações metabólicas, é a associação de obesidade visceral e RI que se acompanha de maiores alterações metabólicas, inclusive diabetes em 43% da população estudada. O «Insulin Resistance Atherosclerosis Study» demonstrou que a medida da cintura é um forte predictor do declínio da SI nos normoponderais não diabéticos, pelo que deve ser usada juntamente com o IMC na identificação de indivíduos com alto risco de diabetes ou da S.da IR8. A visão prevalente é pois que a acumulação de gordura visceral promova a diminuição da sensibilidade à insulina. Contudo esta visão tem sido posta em causa pela sugestão de que poderá ser a insulino-resistência a levar à acumulação de gordura visceral e/ou que a IR e a acumulação de gordura visceral possam ambas ser resultado de um defeito a montante, tal como a acumulação de gordura noutros locais, por exemplo no tecido adiposo subcutâneo abdominal, principal contribuidor para os níveis plasmáticos de ácidos gordos livres9. Outro factor importante a considerar é a susceptibilidade genética. A influência genética na sensibilidade à insulina e na composição corporal está bem determinada10. Como podemos explicar que nem todas as pessoas com excesso de peso e obesidade desenvolvam a S. Metabólica? Presumivelmente alguma pessoas, mas não todas, têm susceptibilidade genética ao desenvolvimento da S. metabólica na presença de obesidade11. A variação considerável dos padrões da S. Metabólica entre indivíduos e entre populações sugere que a variabilidade genética seja a responsável por essa variação. Alguma populações, como os Asiáticos do Sul, exibem uma alta prevalência de S. Metabólica mesmo na presença de obesidade leve, o que sugere uma alta susceptibilidade genética. A susceptibilidade genética interactuará fortemente com a obesidade na definição de padrões particulares de S. Metabólica, pelo que a patogénese da S. Metabólica não será completamente compreendida até a natureza da variação genética ser identificada. 66 Manual sobre Insulino-resistência Baranova e colaboradores12 identificaram 1208 genes com expressão significativamente diferente no tecido adiposo visceral de obesos mórbidos e não obesos incluindo genes relacionados com o metabolismo lipidico e glicidico, transporte de membrana e promotores do ciclo celular. Estes dados são um primeiro passo na clarificação da patogénese molecular da obesidade. Porém, a observação de uma ausência de correlação de história familiar de diabetes com IR e acumulação de gordura em populações rurais, magras e com maior actividade física do IRA Family Study, ao contrário do que se passava nas populações urbanas, mais obesas e mais sedentárias, sugere que a actividade fisica desde idades jovens pode impedir a manifestação de um quadro genético, o que vem reforçar o papel do estilo de vida e a importância de não se considerar a S. Metabólica como uma fatalidade genética. Insulino-resistência e alterações do metabolismo glicídico 67 INSULINO-RESISTÊNCIA E ALTERAÇÕES DO METABOLISMO GLICÍDICO J. Sequeira Duarte Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo do Hospital Egas Moniz. Em determinadas situações clínicas, a resistência à insulina (IR) é muito provável e avaliar com rigor a sua presença não muda a atitude a seguir para a contrariar1,2. Esperar-se-ia encontrar resistência à insulina por exemplo, em pessoas obesas com hipertrigliceridemia e níveis baixos do colesterol das lipoproteínas de alta densidade (HDL) (a prevalência de IR em cada uma destas situações pode chegar aos 80%)3,4. Também se encontram elevadas prevalências de IR (cerca de 60%) em doentes com hiperuricémia ou com hipertensão arterial. É frequente, mas está apenas presente em cerca de 20% pessoas obesas com normoglicemia4. Em tais pessoas, as taxas de secreção da insulina no estado basal e depois das refeições são frequentemente mais do dobro do que as das pessoas magras (i.e. controlos)5. As concentrações da insulina são geralmente elevadas na fase inicial da diabetes tipo 2, mas porque há um defeito na função da célula beta pancreática, os níveis não são suficientemente altos para compensar essa resistência à insulina5,6. Quando a diabetes progride, as concentrações da insulina circulante começam a diminuir, resultando numa hiperglicemia progressivamente mais grave. Este facto é agravado pela redução progressiva do índice de sensibilidade à insulina à medida que a hiperglicemia se agrava passando de valores superiores a 3 nos indivíduos normoponderais não diabéticos para valores inferiores a 1 U/ml)-1 min-1 nos diabéticos com glicemias de jejum superiores a 210 mg/dl. É conhecido que a resistência à insulina se agrava com a obesidade e que níveis crescentes de glicemia marcam mesmo a diabetes relativamente suave4. Numa população que foi estudada com o objectivo de compreender melhor as relações entre a insulina e a gordura corporal na progressão de metabolismo normal para um quadro clínico de diabetes tipo 2, encontrou-se uma curva em forma de U invertido quando as concentrações da insulina são relacionadas com a glicemia num conjunto de pessoas com quadros que vão da alteração da tolerância à glicose até à diabetes avançada, um teste que tem sido denominado como a curva de Starling do pâncreas7. Os dados eram esperados e são similares aos relatados por muitos outros investigadores8. A percentagem de gordura corporal aumenta progressivamente dos 28% nos indivíduos normais 68 Manual sobre Insulino-resistência Insulino-resistência e metabolismo glicídico Figura 1 Fígado - + Cérebro GLICOSE Eritrocitos + + Amino-ácidos Intestino + - Ácidos gordos + Músculo Tecido Adiposo Principais sistemas que regulam a glicemia. - efeito regulador da insulina + efeito inibidor da insulina (reforçado em situações de insulinopénia) - Insulino-resistência e alterações do metabolismo glicídico 69 para os 41% nos diabéticos com glicemia de jejum superiores a 210mg/dl, com valores que variam de forma directa com os níveis de glicemia. A figura 1 descreve as acções metabólicas da insulina na utilização da energia pelos principais órgãos e ilustra alguns efeitos periféricos estimulantes (positivos) e inibidores (negativos) da insulina em órgãos específicos, mostrando que os níveis da glicose do sangue estão regulados pelo balanço entre a produção hepática e o aporte alimentar por um lado e a utilização periférica, por outro. O músculo é o órgão insulino-dependente principal para a utilização da glicose; explica aproximadamente 95% da captação da glicose mediada pela insulina10. No estado de jejum, o uso da glicose pelo organismo humano é 2.0 a 2.5 mg/kg do peso por minuto, ou aproximadamente 10 g/hr num adulto que pese 70 quilos11. Porque o fígado é o local fundamental para o armazenamento e liberação da glicose, a produção hepática da glicose tem um ritmo mantido. As células do cérebro e do sangue têm uma necessidade obrigatória de utilizar glicose, independente da insulina e usam a maioria da produção hepática de glicose em jejum no estado de repouso. Por outro lado, a natureza constante desta necessidade significa que o uso da glicose pelas células do cérebro e do sangue, não muda o balanço total entre a captação da glicose e a sua utilização e consequentemente não tem efeitos substanciais nos níveis da glicose do plasma. Pelo contrário, o músculo necessita de glicose em quantidades variáveis, dependendo do nível de actividade e da concentração da insulina. Podemos assim concluir que a determinante principal dos níveis circulantes da glicose é o balanço entre os processos insulino-dependentes da produção hepática da glicose e a utilização da glicose pelos músculos. Este balanço é como vimos, muito influenciado pela sensibilidade à insulina. 70 Manual sobre Insulino-resistência Insulino-resistência e hipertensão arterial MECANISMOS ETIOPATOGÉNICOS 1. Hiperactividade adrenérgica 2. Efeito anti-natriurético: a. aumento da reabsorção de sódio b. níveis aumentados de aldosterona c. redução da secreção de péptido natriurético auricular 3. Hiperactividade do eixo hipotálamo-hiófise-supra-renal 4. Hipersensibilidade ao sal ingerido 5. Redução na síntese de prostaglandinas vasodilatadoras 6. Vasoconstrição (aumento do cálcio intracelular): a. estimulação da bomba Na+/H+ b. inibição da actividade da Na+-K+-ATPase c. inibição da actividade da Ca2+-ATPase 7. Aumento da resistência vascular periférica a. disfunção endotelial b. acção de vários factores tróficos a nível dos vasos sanguíneos IMPLICAÇÕES TERAPÊUTICAS 1. Implementação das medidas básicas de terapêutica tendentes a reduzir o estado de insulino-resistência e redução do consumo de sal 2. Abolir medicação anti-hipertensora que aumente a insulino-resistência Insulino-resistência e hipertensão arterial 71 INSULINO-RESISTÊNCIA E HIPERTENSÃO ARTERIAL José Silva Nunes Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo; Hospital de Curry Cabral A HTA essencial (HTAe) constitui um dos componentes da síndrome metabólica (SM). Estima-se que cerca de 50% dos doentes hipertensos apresentem aumento da resistência à insulina. Em relação à obesidade, o aumento de cada 1 Kg de peso corporal associa-se a um aumento de 0.15 mmHg na pressão arterial diastólica. O efeito da obesidade sobre os níveis tensionais parece ser mediado, pelo menos em parte, através da insulino-resistência (IR) que lhe está associada. A HTAe foi uma das patologias, inicialmente, incorporadas na primeira definição de SM por Reaven, em 1988. A primeira associação entre hiperinsulinismo e HTAe foi descrita na revista “Lancet”, em 1966; vários estudos posteriores demonstraram a associação presente entre os níveis de insulina, não só com os níveis tensionais, mas também com outros factores de risco cardiovascular. Contudo, só nos anos 80, Ferrannini demonstrou um aumento do grau de IR, em doentes hipertensos. Na prova de tolerância à glicose oral (PTGO), verificou que os doentes hipertensos apresentavam níveis significativamente mais elevados de glicemia e de insulinemia. Recorrendo à técnica padrão de avaliação do grau de IR (clamp euglicémico hiperinsulinémico), demonstrou que os doentes hipertensos apresentavam uma redução média de 37% da sensibilidade à insulina, comparativamente aos controlos. Mais tarde, foi demonstrado que a cada redução de 10 unidades no valor da sensibilidade à insulina (valor M, na técnica de clamp) verificava-se um aumento de 1.7 mmHg na pressão arterial sistólica e de 2.3 mmHg na diastólica. Apesar da associação comprovada entre IR e HTAe, esta última é uma condição multifactorial. Nem todos os doentes com HTAe se apresentam com IR, nem todos os doentes com IR têm HTAe. A questão é saber se a IR, em indivíduos geneticamente predispostos, induz o desenvolvimento de HTAe ou se IR e HTAe são o resultado de um factor etiopatogénico comum que induza as duas condições, eventualmente, com desfasamento temporal. Assim, nos últimos anos várias vezes se tem colocado a seguinte questão: “Estará a IR activamente implicada na génese de HTAe?”. 72 Manual sobre Insulino-resistência Demonstrou-se que filhos, normotensos, de doentes com HTAe apresentam já uma redução significativa na sensibilidade à insulina, redução esta semelhante à verificada em filhos, normoglicémicos, de doentes com diabetes tipo 2. Estes dados comprovam o papel da hereditariedade na transmissão do estado de IR e favorecem a teoria de que este estado precede o aparecimento da HTAe. Por outro lado, vários autores têm vindo a demonstrar que o grau de IR em indivíduos não hipertensos concede um valor predictivo sobre o desenvolvimento futuro de HTAe. Além do papel da IR sobre o desenvolvimento de HTAe, aquela também está associada a um padrão “não-dipper”. Este padrão de variação circadiana dos níveis tensionais está associado a um pior prognóstico, em termos de eventos cardiovasculares. Em indivíduos com IR, e geneticamente predispostos, vários mecanismos são sugeridos como tendo um papel etiopatogénico no desenvolvimento da HTAe: a) hiperactividade adrenérgica; b) acção anti-natriurética por: aumento da reabsorção de sódio, a nível do tubo contornado proximal; níveis aumentados de aldosterona (secundários à hiperactividade adrenérgica e, possivelmente, devido ao efeito dos níveis aumentados de amilina a nível do sistema renina-angiotensina-aldosterona); redução da secreção de péptido natriurético auricular; c) hiperactividade do eixo hipotálamo-hipófise-supra-renal; d) hipersensibilidade ao sal ingerido na dieta; e) redução na síntese de prostaglandinas vasodilatadoras; f) vasoconstrição secundária ao aumento do cálcio intracelular por: estimulação da bomba Na+/H+; inibição da actividade da Na+-K+-ATPase; inibição da actividade da Cálcio-ATPase. Insulino-resistência e hipertensão arterial 73 Contudo, embora estes mecanismos possam explicar a elevação transitória dos níveis tensionais, não são os responsáveis pela manutenção crónica daqueles. A HTAe mantida deve-se, possivelmente, ao aumento da resistência vascular periférica (RVP) induzida pela acção trófica de vários factores e pela disfunção endotelial. A insulina, bem como vários outros factores de crescimento, actua a nível da parede vascular, resultando na hipertrofia desta e aumento da relação parede / lúmen. Por outro lado, a disfunção endotelial com comprometimento da secreção de substâncias vasodilatadoras, como o óxido nítrico, e aumento na secreção de factores vasoconstritores, como a endotelina, perpetua uma RVP aumentada e subsequente aumento dos níveis tensionais. O aumento dos ácidos gordos livres (AGL) circulantes parece ser um dos factores intervenientes na disfunção endotelial associada à IR. Ainda relacionado com a perturbação da função endotelial, e consequente incapacidade vasodilatadora, parece estar envolvida a dimetil-arginina assimétrica (ADMA – asymmetric dimethylarginine). A ADMA é um inibidor endógeno da sintetase do óxido nítrico e correlaciona-se, directamente, com o grau de IR. A favor do papel da IR na etiopatogenia da HTAe encontram-se, ainda, os estudos que demonstram que certos agentes insulino-sensibilizadores, como as tiazolidinedionas, têm a capacidade de reduzir os níveis de pressão arterial. Um dos mecanismos, pelos quais intervêm na redução dos níveis tensionais, foi demonstrado ser pela inibição da proliferação de células musculares lisas induzida pela insulina. Os mecanismos etiopatogénicos aventados para explicar a associação entre IR e HTAe partem, contudo, da teoria da IR selectiva ou diferenciada, i.e., parte dos mecanismos resultam de um aumento da resistência à insulina e a outra parte resulta da acção do hiperinsulinismo compensatório em sistemas que mantém uma normal sensibilidade à insulina. Exemplo da manutenção de uma normal sensibilidade à insulina parece ser o sistema nervoso simpático (SNS). Assim, o hiperinsulinismo compensatório (da resistência à acção de insulina em outros sistemas) traduzir-se-ia, no SNS, em hiperactividade. Tal tem sido demonstrado, nomeadamente, através do doseamento da excreção urinária de noradrenalina. Nestes estudos, a redução aguda da insulinemia resultou na redução, proporcional, dos níveis tensionais e dos níveis plasmáticos de noradrenalina. 74 Manual sobre Insulino-resistência A HTAe é um dos factores, manifestamente, associados a disfunção a nível do endotélio, situação associada a aterogenecidade. A ligação das células mononucleares circulantes (CMNC) ao endotélio constitui o primeiro passo da aterogénese; foi demonstrado que as CMNC de indivíduos com HTAe apresentavam uma maior adesividade ao endotélio do que aquelas de indivíduos normotensos. Contudo, o grau de adesividade apresentava uma maior correlação com o grau de IR do que com os níveis de pressão arterial, quer em indivíduos hipertensos, quer nos normotensos. Mais, os níveis plasmáticos das moléculas envolvidas no processo de adesidade celular, como a ICAM-1 (inter-cellular adhesion molecule-1) e a VCAM-1 (vascular cellular adhesion molecule-1), apresentam uma correlação directa com o grau de IR. Assim, os indivíduos com HTAe e IR teriam as condições mais propícias para a iniciação, promoção e aceleração do processo aterogénico. A hipoadiponectinemia tem sido outro dos factores que tem vindo a estar implicado na génese da HTAe associada ao SM (os níveis tensionais encontram-se inversamente associados à concentração de adiponectina, independentemente do grau de IR). Considerando-se a SM como um estado de inflamação subclínica, também a HTAe está associada a aumento dos marcadores inflamatórios. Contudo, mais do que estar associada à inflamação subclínica parece que a HTAe constitui, por si só, um factor indutor / perpetuador do processo inflamatório, através do factor de crescimento endotelial vascular (VEGF – vascular endothelial growth factor). Admitindo que a HTAe é induzida pela IR, é óbvio que a melhoria do estado de IR, conduz a uma melhoria da HTAe. A adopção de medidas básicas de terapêutica, como a dieta e o exercício físico, conduzem, por si só, à redução dos níveis tensionais e da insulinémia, em doentes com grau significativo de IR. Além destas medidas, a introdução de terapêutica com biguanidas ou tiazolidinedionas conduz a uma adicional melhoria da sensibilidade à insulina e, assim, favorece a redução dos níveis tensionais. Se, nestes indivíduos, a introdução das medidas básicas de terapêutica para combater a IR e a HTAe (dieta, exercício físico e restrição salina), junto com a terapêutica específica para redução da IR, não são suficientes para normalizar os níveis de pressão arterial, há que recorrer à terapêutica com agentes hipotensores. Insulino-resistência e hipertensão arterial 75 Se um dos principais elos de ligação entre a IR e a HTAe parece residir na disfunção endotelial. Uma terapêutica hipotensora que melhorasse, também, a função do endotélio pareceria ter um duplo efeito benéfico; tal objectivo parece ser conseguido com os agentes que actuam no eixo renina-angiotensina-aldosterona, i.e.,inibidores da enzima de conversão da angiotensina e antagonistas dos receptores da angiotensina II. 76 Manual sobre Insulino-resistência Insulino-resistência e dislipidemia Hiperinsulinemia, obesidade central… ↓ da actividade da enzima lipoproteína lípase ↑ apoproteína C-III ↑ enzima transportadora de ésteres de colesterol e da lípase hepática ↑ produção hepática e ↓ do catabolismo de lipoproteínas de muito baixa densidade ↑ níveis plasmáticos de triglicerídeos ↓ lipoproteínas de alta densidade Alt. na composição das lipoproteínas de baixa densidade (LDL pequenas e densas) Insulino-resistência e dislipidemia 77 INSULINO-RESISTÊNCIA E DISLIPIDEMIA Isabel Palma Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo, Hospital Geral de Santo António – Porto A insulino-resistência não é por si só uma doença, mas uma anomalia fisiológica que aumenta a probabilidade do desenvolvimento de algumas alterações como, dislipidemia, intolerância à glicose, disfunção endotelial, aumento dos factores procoagulantes, entre outras (tabela 1). O facto destas anomalias ocorrerem com maior frequência nos indivíduos insulino-resistentes, faz com que estes tenham um risco aumentado de desenvolverem algumas síndromes clínicas como é o caso da diabetes mellitus tipo 2, da doença cardiovascular, da hipertensão arterial, da obesidade visceral, do ovário poliquístico, da esteatose hepática de etiologia não alcoólica, de algumas neoplasias e da apneia do sono. Os componentes majores da dislipidemia que ocorrem na insulino-resistência são: 1. aumento dos níveis plasmáticos de triglicerídeos (TG) 2. diminuição do diâmetro das partículas LDL (LDL pequenas e densas) 3. diminuição das lipoproteínas de alta densidade (HDL) 4. acumulação pós-prandeal de partículas ricas em triglicerídeos O aumento dos TG corresponde ao aumento de lipoproteínas contendo apoproteína B (apo B), a qual está presente nos precursores metabólicos das LDL, isto é, nas lipoproteínas de muito baixa densidade (VLDL), lipoproteínas de densidade intermédia (IDL) e obviamente nas partículas LDL. No seu conjunto estas lipoproteínas contendo apoB, constituem a fracção designada por colesterol não – HDL. No perfil lipídico aterogénico, há habitualmente um aumento no número de lipoproteínas contendo apoB, ainda que os níveis de LDL não estejam elevados. Permanece por esclarecer completamente a regulação da secreção hepática de lipoproteínas. Sabe-se contudo que a hiperinsulinemia e a obesidade central, que tipicamente acompanham a insulino-resistência, contribuem para a excessiva produção hepática de VLDL. 78 Manual sobre Insulino-resistência As VLDL são lipoproteínas constituídas por um núcleo lipídico (80-95% de TG e 2-7% de colesterol) rodeado por fosfolipídeos, colesterol livre e apoproteínas (apos B 100, CI, Cll, Clll, e apo E). Algumas das alterações metabólicas da insulino-resistência que levam à excessiva produção de partículas VLDL são: 1. aumento dos níveis plasmáticos de ácidos gordos livres e glicose, que regulam a produção de VLDL a nível hepático (aumento da produção de VLDL). 2. aumento dos níveis de TG no fígado, que inibem a degradação de apo B, a qual tem como papel principal transportar lipídeos para fora do fígado. 3. diminuição dos níveis de lipoproteína lípase (LPL). Esta enzima é sintetizada no tecido adiposo e muscular e actua na lipólise das lipoproteínas ricas em TG. A sua diminuição leva a diminuição da “clearance” destas partículas. 4. aumento da síntese de apo CIII (componente apoproteico major das VLDL). Esta apoproteína interfere com a acção da LPL, diminuindo-a e interfere com a captação dos remanescentes VLDL por intermédio dos receptores hepáticos das LDL. Como resultado final temos aumento de lipoproteínas ricas em TG. Níveis normais de LDL, geralmente resultam de um equilíbrio no metabolismo das lipoproteínas não-HDL; este processo é mediado por enzimas, cofactores e receptores lipoproteicos. As enzimas chave são a LPL, a lípase hepática (LH) e a lecitina colesterol acil transférase (LCAT); os cofactores são a CETP (proteína transportadora de ésteres de colesterol), a proteína transportadora de fosfolipídeos (PLTP), e os receptores que incluem os receptores hepáticos LDL. Normalmente as VLDL na presença de LPL, CETP e PLTP transformam-se em IDL. Por sua vez a LH parece ser a enzima chave na conversão de IDL em LDL (Fig.1). As partículas LDL são constituídas por 40 a 50% de colesterol (70% do qual está esterificado), 5 a 15% de TG e 20 a 25% de fosfolipídeos. A apoproteína característica, quase exclusiva, é a apo B100. As LDL são caracterizadas por heterogenicidade na densidade, tamanho e composição. Vários estudos têm demonstrado que doentes com insulino-resistência têm caracteristicamente partículas LDL pequenas e densas (tipo B), as quais estão Insulino-resistência e dislipidemia 79 depletadas de ésteres de colesterol e enriquecidas de apo B. A associação de insulino-resistência e diâmetro de partículas LDL não se relaciona directamente com os níveis de insulinemia mas com alterações do metabolismo lipídico. Os mecanismos envolvidos na formação das LDL pequenas e densas são: 1. troca de ésteres de colesterol das LDL por TG das VLDL. Produção de partículas LDL ricas em TG que podem sofrer lipólise transformando-se em partículas pequenas e densas. 2. alteração no metabolismo das VLDL, levando à produção de partículas LDL depletadas de colesterol. As HDL são lipoproteínas constituídas por 5-10% de TG, 15-25% de colesterol, 20-30% de fosfolipídeos e por uma variedade de apoproteínas (apo AI, II, IV, Apo CI, II, III, e Apo E). Apesar dos mecanismos que regulam o metabolismo das HDL não serem completamente conhecidos, a diminuição do potencial aterogénico levada a cabo por estas lipoproteínas é incontestável. Os mecanismos que na insulino-resistência podem levar à diminuição das HDL são: 1. alteração da lipólise de partículas VLDL, que impede o transporte de apoproteínas e fosfolipídeos das lipoproteínas ricas em TG para as HDL. 2. troca de ésteres de colesterol das HDL por TG das VLDL. 3. aumento da actividade da lípase hepática (aumento da “clearance” das HDL). 4. alteração na função hepática com diminuição da produção de apo A1 e/ou diminuição da secreção hepática de partículas HDL nascentes. Uma maneira simples de quantificar a aterogenicidade do perfil lipídico é determinar os níveis de colesterol não-HDL. Este valor é obtido pela diferença entre o colesterol total e o colesterol HDL. O colesterol não – HDL contém todo o colesterol das partículas VLDL, IDL e LDL, e correlaciona-se bem com o valor da apo B plasmática total. 80 Manual sobre Insulino-resistência A dislipidemia característica da insulino-resistência (aumento TG, diminuição HDL, LDL tipo B), precede muitas vezes a completa manifestação clínica da síndrome metabólica. Tabela 1. Anomalias associadas à insulino-resistência e hiperinsulinemia compensadora Dislipidemia Intolerância à glicose Disfunção endotelial Alterações hemodinâmicas Aumento dos marcadores de inflamação Alterações do metabolismo do ácido úrico Aumento dos factores procoagulantes Aumento da secreção de testosterona (ovário) Alterações respiratórias do sono Indivíduos saudáveis LPL HL VLDL IDL CETP / PLTP LDL CETP/PLTP Dislipidemia aterogénica IDLG VLDLG VLDLP LDLG IDLP LDLP Fig. 1 – Base metabólica da dislipidemia aterogénica. Representação esquemática da interconversão de VLDL a LDL, em indivíduos saudáveis e indivíduos com insulinoresistência. Partículas de VLDL, IDL, e LDL de tamanho normal, são produzidas como resultado da acção de LPL, LH e CETP e PLTP na presença de receptores LDL normais. Lipoproteínas pequenas resultam de um desequilíbrio na acção destas enzimas e cofactores, e são preponderantes na dislipidemia aterogénica. Um grande número de lipoproteínas pequenas pode resultar da produção excessiva de VLDL pelo fígado, ou de diminuição da “clearence” pelos receptores hepáticos de lipoproteinas. Doença do fígado gordo não alcoólico (NAFLD) 81 DOENÇA DO FÍGADO GORDO NÃO ALCOÓLICO (NAFLD) Rute Cerqueira e Luís Raposo Serviço de Gastrenterologia, Hospital S. Sebastião; Hospital Egas Moniz. A doença do fígado gordo não-alcoólico (NAFLD) é uma doença que se caracteriza pela presença de achados histológicos característicos de doença hepática alcoólica (esteatose com ou sem inflamação e fibrose) em doentes abstinentes ou não consumidores de quantidades significativas de álcool. Clinicamente, a NAFLD é um diagnóstico de exclusão que deve ser considerado num doente com consumo de álcool inferior a 20g/dia e serologia negativa para doenças congénitas e adquiridas do fígado. O achado de esteatose nos estudos de imagem apoia o diagnóstico que deve ser definitivamente estabelecido e estadeado através da biópsia hepática. Em termos histológicos caracteriza-se pela presença de esteatose macrovesicular e engloba 2 tipos de lesões: 1. esteatose (ausência de inflamação e/ou fibrose) – NAFLD 2. esteatohepatite (presença de inflamação e/ou fibrose) – NASH Considerada durante muito tempo uma entidade benigna, na última década vários estudos evidenciaram o risco de progressão da NAFLD para cirrose, passando pelo estádio intermédio de NASH, e o seu potencial de desenvolvimento de carcinoma hepatocelular1-3. Uma questão de maior importância é se o processo de carcinogénese hepático resulta da cirrose subjacente ou é favorecida pela esteatose por si só. Alguns dados experimentais apoiam esta hipótese, nomeadamente a tendência da carcinogénese devido à resistência à insulina e ao stress oxidativo3. Em termos fisiopatológicos, é universalmente aceite a teoria dos «two-hit»4 1. resistência à insulina / hiperinsulinemia a insulino-resistência ao nível do músculo e do tecido adiposo aumenta a lipólise periférica que conduz a maior quantidade dos ácidos gordos livres disponíveis para captação e oxidação hepáticas resultando no acréscimo de sínte- 82 Manual sobre Insulino-resistência se hepática de triglicerídeos. Se a capacidade hepática de síntese e secreção das VLDL é ultrapassada, o excesso é armazenado no hepatócito sob a forma de vacúolos de gordura (esteatose); 2. stress oxidativo intra-hepático secundário à disfunção mitocondrial e à produção de radicais livres intrahepáticos que agravam as lesões através da peroxidação lipídica das membranas intracelulares. Este fenómeno é promotor de inflamação e fibrose que são achados histológicos característicos da esteatohepatite. Apenas recentemente foi reconhecida como doença hepática crónica sendo uma causa frequente de alteração da bioquímica hepática em adultos com obesidade1,2 e com diabetes5, ambas associadas a resistência à insulina, e em adultos com dislipidemia. Porém, há evidência crescente que a NAFLD, incluindo formas mais agressivas, pode existir com bioquímica hepática normal6. O conteúdo hepático de gordura correlaciona-se significativamente com as concentrações séricas de insulina e triglicerídeos7 mas parece ser independente do IMC e da gordura visceral e cutânea5. Em conclusão, a obesidade é um factor de risco de NAFLD promovendo a esteatose através das alterações metabólicas que lhe estão associadas – insulino-resistência / hiperinsulinemia. Existe actualmente ampla evidência clínica de que a NAFLD está associada a resistência à insulina e dislipidemia traduzindo a expressão hepática da síndrome metabólica, razão pela qual alguns autores defendem que a NAFLD não deve ser considerada uma doença primária hepática mas uma entidade clínica que deve integrar a síndrome de insulino-resistência7. As medidas terapêuticas visam a sensibilização à insulina, podendo ser não farmacológicas (controlo do peso e aumento da actividade física) e farmacológicas. Os fármacos mais promissores são a metformina e as glitazonas. Estudos recentes 8-9 mostraram que a metformina e a pioglitazona podem normalizar a bioquímica hepática e melhorar a histologia. Doença do fígado gordo não alcoólico (NAFLD) 83 O fármaco mais utilizado é a metformina. Está em curso um grande estudo controlado metformina versus placebo. A quantificação dos depósitos hepáticos de gordura, a bioquímica hepática e o padrão histológico são parâmetros relevantes de monitorização terapêutica. A quantificação da esteatose pode ser feita por diversos métodos, de que se destaca como técnica de referência a medição directa por biópsia hepática, que tem a vantagem adicional da caracterização histológica; a sua utilização é limitada pelos riscos associados. As técnicas não invasivas como a ecografia, a tomografia axial computadorizada (TAC), a ressonância magnética nuclear (RMN) e a espectroscopia de protões por RMN podem ser usadas como alternativa à biópsia hepática na estimativa dos depósitos hepáticos de gordura, sendo a espectroscopia de protões por RMN a mais específica10. Em conclusão, a NAFLD é uma entidade relevante do ponto de vista clínico, que se associa à insulino-resistência e a diversas alterações metabólicas podendo, por isso, ser integrada na síndrome de insulino-resistência. Fica por esclarecer em definitivo o papel do fígado gordo na resistência hepática à insulina; a acumulação de gordura no fígado será um factor determinante de resistência à insulina ou apenas um fenómeno secundário? 84 Manual sobre Insulino-resistência Insulino-resistência e síndrome do ovário poliquístico A incidência de SOP é aproximadamente de 1 em 12 mulheres em idade fértil. Associa-se a alterações da reprodução (infertilidade) a curto-prazo e a disfunção metabólica a longo prazo (risco de diabetes tipo 2 e doença vascular). Incidência de sintomas em mulheres com SOP: irregularidades menstruais (70%), obesidade (50%), hirsutismo (70%), alopecia androgénica (10%) e acne (30%). Nova definição de SOP (consenso de Roterdão) – 2 dos 3 critérios seguintes. Presença de ovários poliquísticos ne ecografia pélvica Oligo / anovulação Evidência clínica e/ou bioquímica de hiperandrogenismo Está frequentemente associado a obesidade e a síndrome metabólica. É essencial a avaliação do perfil lipídico e glicídico em mulheres obesas com SOP. Insulino-resistência e síndrome do ovário poliquístico 85 INSULINO-RESISTÊNCIA E SÍNDROME DO OVÁRIO POLIQUÍSTICO Elisabete Rodrigues Hospital São João – Porto A síndrome do ovário poliquístico (SOP) é a patologia endócrina mais comum em mulheres jovens, afectando cerca de 4 a 12% das mulheres em idade fértil. Apesar de ser uma entidade heterogénea as suas características fundamentais são o hiperandrogenismo e as irregularidades menstruais. Desde a sua descrição em 1953 por Stein e Leventhal, muito se tem esclarecido acerca da sua fisiopatologia, desde a contribuição de factores genéticos e neuro-endócrinos até à melhor compreensão da relação entre obesidade, insulino resistência (IR) e SOP. O reconhecer da importância da IR na etiopatogénese desta síndrome foi crucial na mudança do modo como estas mulheres passaram a ser encaradas: não somente portadoras de problemas cosméticos e de infertilidade mas de potenciais alterações metabólicas que implicam risco acrescido de diabetes tipo 2 e de eventos cardiovasculares. Constituem portanto um importante grupo em termos de risco cardiovascular onde não pode ser desperdiçada a oportunidade de se exercer uma medicina preventiva. Critérios diagnósticos A definição da síndrome tem evoluído ao longo dos anos, tendo sido recentemente proposto pela Sociedade Europeia de Reprodução Humana e Embriologia e pela Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva um novo consenso acerca da definição do SOP. De acordo com este, pode afirmar-se o diagnóstico na presença de 2 dos 3 critérios seguintes: 1) oligo anovulação; 2) evidência clínica ou bioquímica de hiperandrogenismo; 3) presença de ovários poliquísticos. Permanece como sendo um diagnóstico de exclusão, pelo que devem ser excluídas doenças com fenótipo que mimetizem o SOP, tais como hiperplasia supra-renal congénita, tumores produtores de androgénios e S. Cushing. Ovários poliquísticos – Os critérios ecográficos de ovários poliquísticos também evoluíram, sendo actualmente definidos (consenso de Roterdão) pela presença de 12 ou mais folículos em cada ovário com dimensões entre 2 e 9 mm e/ou 86 Manual sobre Insulino-resistência volume ovárico aumentado (> 10 ml). A distribuição dos folículos e o aumento da ecogenicidade do estroma foram eliminados como critérios de diagnóstico. Deve preferir-se a ecografia por via transvaginal e caso seja detectado um folículo dominante (> 10 mm) ou corpo lúteo, o exame deverá ser repetido. As mulheres que apenas apresentem morfologia de ovário poliquístico na ecografia, mas sem irregularidades menstruais nem hiperandrogenismo associados não são consideradas como tendo SOP. Irregularidades menstruais – As irregularidades menstruais iniciam-se tipicamente no período peripubertário, podendo mesmo ocorrer atraso da idade da menarca, e poderão traduzir-se por oligomenorreia ou amenorreia. Além de irregularidades menstruais os ciclos são geralmente anovulatórios, causando portanto infertilidade. Hiperandrogenismo – A maioria das mulheres com SOP tem evidência clínica e bioquímica de hiperandrogenismo. 1. Hiperandrogenismo clínico: As principais manifestações clínicas são hirsutismo, acne e alopecia androgénica (tipo masculino). Só muito raramente surgem sinais de virilização, como hipertrofia do clitóris e modificação da voz (mais grave), pelo que a sua presença implica o despiste de tumores produtores de androgénios. 2. Hiperandrogenismo bioquímico: A testosterona livre é o androgénio que mais frequentemente está elevado e é o teste mais sensível para estabelecer hiperandrogenismo. Tal deve-se ao facto dos níveis aumentados de insulina (frequente no SOP) e dos androgénios actuarem a nível hepático diminuindo a produção de SHBG (sex hormone binding globulin). Nas mulheres obesas com SOP os níveis de SHBG estão igualmente diminuídos (efeito da obesidade per si), o que origina aumento da testosterona livre. Outros androgénios, como a testosterona total, androstenediona e DHEAS também podem estar aumentados. Outros achados bioquímicos frequentes mas nem sempre presentes são aumento da LH ou razão LH / FSH aumentada (avaliada na fase folicular precoce). Insulino-resistência e síndrome do ovário poliquístico 87 Insulino-resistência Apesar da IR não fazer parte dos critérios diagnósticos do SOP a sua importância na patogénese da síndrome não pode ser negada (fig.1). A associação entre hiperinsulinemia e SOP foi descrita pela primeira vez em 1980 por Burghen, que encontrou uma correlação positiva entre insulina, androstenediona e testosterona em mulheres com SOP. O hiperandrogenismo correlaciona-se positivamente com a IR em mulheres com SOP, tenham ou não excesso de peso. Sabemos que a obesidade e a obesidade abdominal são comuns nas mulheres com SOP (10 a 50% têm IMC> 25Kg/m2), o que agrava as características da IR, interactuando de forma sinergística com o grau de IR presente nas mulheres magras. Nestas foram descritos defeitos pós-receptor na acção da insulina semelhantes aos encontrados na obesidade e diabetes tipo 2. Dunaif e col. verificaram existir em 50% dos fibroblastos retirados de mulheres com SOP diminuição da autofosforilação do receptor da insulina, resultante do aumento da fosforilação da serina. Esta fosforilação da serina está associada à diminuição da autofosforilação da tirosina do receptor da insulina e constitui o mecanismo provável da IR induzida pelo TNF-α. Uma vez que a fosforilação da serina da P450c17 (enzima reguladora principal da biossíntese de androgénios) aumenta a actividade enzimática levando a maior síntese de androgénios é possível que um único defeito (fosforilação da serina) possa originar quer IR quer hiperandrogenismo num subgrupo de mulheres com SOP. Calcula-se que 20 a 40% das mulheres com SOP têm tolerância à glicose diminuída, número este que é cerca de 7 vezes maior que em mulheres da mesma idade e com o mesmo peso. Igualmente a prevalência de diabetes tipo 2 está aumentada nesta população (15% versus 2,3% nas mulheres normais). As mulheres magras com SOP têm menor prevalência de alterações da tolerância à glicose que as obesas com SOP, mas mesmo as magras com SOP têm maior prevalência que a população controlo da mesma idade e peso. De acordo com o consenso de Roterdão não são necessários testes clínicos de IR para fazer o diagnóstico de SOP nem para seleccionar o tratamento. Todavia nas mulheres obesas com SOP deve ser rastreada a síndrome metabólica, incluindo a utilização de prova de tolerância à glicose oral (PTGO) para excluir intolerância à glicose. 88 Manual sobre Insulino-resistência Ainda segundo este consenso em mulheres não obesas com SOP serão necessários mais estudos para determinar a utilidade destes testes, embora possam ser considerados se existirem outros factores de risco de IR, tais como história familiar de diabetes. Insulino-resistência Obesidade central Manifestações endócrinas Manifestações metabólicas ↑ Insulina Fígado ↓SHBG Ovário Suprarrenal Diminuição Hipertensão Dislipidemia da tolerância arterial à glicose ↑ Androgénios Apresentação clínica Irregularidades menstruais Sequelas a longo-prazo Hirsutismo Doença cardiovascular Fig.1 – Papel da insulino resistência nas manifestações da síndrome do ovário poliquistico. Quadro 1 – Insulina e potenciais mecanismos pelos quais pode aumentar a secreção e acção dos androgénios Aumento da síntese de androgénios no ovário Aumento da síntese de androgénios a nível supra-renal Diminuição da síntese de SHBG (sex hormone binding globulin) ⇒ aumento de testosterona livre Diminuição da síntese de IGFBP-1 ⇒ aumenta disponibilidade de IGF-1 Aumento da secreção de LH? Insulino-resistência e síndrome do ovário poliquístico Quadro 2 – Critérios de diagnóstico de Síndrome do Ovário Poliquístico 1990 – Critérios NIH (ambos são necessários) 1. Anovulação crónica e infertilidade. 2. Sinais clínicos e/ou bioquímicos de hiperandrogenismo e exclusão de outras etiologias 2003 – Critérios revistos (Consenso de Roterdão) – 2 dos 3 seguintes 1. Oligo ou anovulação 2. Sinais clínicos e/ou bioquímicos de hiperandrogenismo 3. Ovários poliquísticos e exclusão de outras etiologias (hiperplasia supra renal congénita, tumores produtores de androgénios, S. Cushing) Quadro 3 – Características clínicas da síndrome do ovário poliquístico Oligomenorreia / amenorreia Hirsutismo Obesidade Acne Infertilidade Acantose nigricans Alopecia androgénica 89 90 Manual sobre Insulino-resistência Insulino-resistência e neoplasias A associação entre obesidade e cancro é conhecida desde os anos 40. Os mecanismos fisipatológicos responsáveis por esta associação só começaram a ser esclarecidos a partir dos anos 90. As neoplasias mais frequentemente relacionadas com a obesidade e a resistência à insulina são os tumores hormonodependentes e cancros do tubo digestivo. A “hipótese insulínica” permite estabelecer uma relação entre a obesidade visceral, a aterosclerose e o cancro. De acordo com esta teoria, a estimulação da proliferação celular deve-se ao efeito mitogénico da insulina e factores de crescimento pertencentes ao sistema IGF. Este modelo permite explicar a intervenção de uma alimentação rica em vegetais e fruta e com baixo valor calórico associada à actividade física na prevenção e melhoria do prognóstico de determinados cancros. Insulino-resistência e neoplasias 91 INSULINO-RESISTÊNCIA E NEOPLASIAS Ana Paula Santos Instituto Português de Oncologia – Porto A associação entre obesidade e cancro tornou-se evidente no final da década de 40 através da análise das estatísticas de mortalidade das companhias de seguros. Desde essa altura, múltiplos estudos epidemiológicos e experimentais têm vindo a confirmar o aumento de incidência de determinados cancros nos indivíduos obesos, nomeadamente os tumores hormonodependentes e neoplasias digestivas, como o cancro da próstata no homem, da mama, do colo e do útero na mulher e do fígado, pâncreas, cólon e recto, vesícula e rim em ambos os sexos. A obesidade e o excesso ponderal são responsáveis por uma em cada sete mortes por cancro no sexo masculino e uma em cada cinco no sexo feminino, sendo a maior causa evitável de neoplasia nos indivíduos não fumadores. Uma redução do excesso de peso e da obesidade em 50% evitaria 36 000 casos de cancro por ano na Europa. Esta relação é ainda mais estreita na obesidade visceral. Estudos recentes têm vindo a demonstrar que, associada a outras co-morbilidades como a doença cardiovascular, a diabetes tipo 2, a HTA essencial, a síndrome do ovário poliquístico, a doença hepática não alcoólica e a síndrome obstrutiva da apneia do sono, a síndrome de insulino-resistência aumenta o risco para determinadas neoplasias. Com efeito, os indivíduos com cancro colorectal, da mama e da próstata apresentam níveis elevados de insulina e a presença da síndrome metabólica parece conferir maior risco para cancro da próstata e mama. Com efeito, num estudo caso-controlo envolvendo 43 doentes com cancro da mama recém-diagnosticado, a síndrome metabólica (classificação NCEP / ATPIII) aumentava quatro vezes o risco para aquela neoplasia. Além disso, as mulheres com cancro da mama apresentavam níveis significativamente mais elevados de insulina e peptídeo C e eram mais insulinorresistentes quando comparadas com um grupo controlo. Outros dados favorecem esta associação: as principais causas de morte das mulheres com SOP são a diabetes tipo 2, a doença cardiovascular e o cancro da mama; a esteatohepatite não alcoólica tende actualmente a ser a principal causa de carcinoma hepatocelular, ultrapassando a cirrose alcoólica. 92 Manual sobre Insulino-resistência A fisiopatologia da associação entre insulino-resistência e cancro começa ser clarificada, envolvendo mecanismos complexos relacionados com o excesso de insulina circulante. A “hipótese insulínica” estabelece uma ligação entre o estilo de vida ocidental, o risco de aterosclerose e o risco de cancro. O mecanismo fisiopatológico pelo qual o hiperinsulinismo levaria à estimulação da proliferação das células e à transformação neoplásica, relaciona-se essencialmente com a estimulação do sistema IGF. No caso dos tumores hormonodependentes, relaciona-se também com os níveis elevados de androgénios e estrogénios livres devidos, por um lado, a uma maior actividade da enzima aromatase e por outro lado a uma diminuição da produção hepática de SHBG, a proteína de transporte das hormonas sexuais. No modelo mais bem estudado, o da neoplasia da mama, a IGF1 e a insulina actuam sinergicamente com os estrogénios livres nas células epiteliais mamarias como factores de estimulação da proliferação celular levando ao aparecimento da neoplasia. Outro exemplo da influência do sistema IGF na patogénese da neoplasia é o cancro do cólon. O sedentarismo e a dieta do tipo ocidental são, tal como para a síndrome metabólica, factores de risco para cancro do cólon. Verifica-se existir uma associação entre os níveis de GH e de IGF1 e o aumento da proliferação do epitélio cólico. As células neoplásicas do cólon produzem IGF1 de um modo autócrino e parácrino, possuindo receptores para IGF1. Na acromegalia, uma doença caracterizada pelo aumento de GH e IGF1 e resistência à insulina, o risco de cancro do cólon está aumentado. A hipótese insulínica explica não só a associação entre obesidade visceral e cancro, como a importância de uma alimentação rica em vegetais e fruta e do exercício físico na prevenção de determinados cancros e mesmo da influência da perda de peso no prognóstico dos doentes com neoplasia já estabelecida. Do mesmo modo, está demonstrada experimentalmente a acção de fármacos insulinossensibilizadores como a metformina e os agonistas dos receptores PPAR-γ e das estatinas na diminuição da proliferação celular das células neoplásicas. Insulino-resistência e apneia do sono 93 INSULINO-RESISTÊNCIA E APNEIA DO SONO Helena Cardoso Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo, Hospital Geral de Santo António O sono é um estado complexo que ocupa um terço da vida humana. Podendo parecer um estado passivo, é porém um processo muito activo e dinâmico. Um eventual colapso parcial ou completo das vias aéreas durante o sono leva à ocorrência de hipopneias ou apneias que ocorrendo de um modo repetitivo definem a síndrome de apneia obstrutiva do sono (SAOS). O índice de apneia / hipopneia (I. A/H), que corresponde ao número de apneias e hipopneias por hora de sono, é geralmente usado para definir a doença. A apneia de sono durante muito tempo foi tratada como uma anomalia das vias respiratórias mais do que como uma doença sistémica. No entanto a forte associação entre SAOS e obesidade e entre SAOS e complicações cardio-vasculares veio pôr em causa essa posição. Para além do sexo (masculino), a obesidade é o maior factor de risco para a apneia do sono. No entanto os mecanismos pelos quais a obesidade causa apneia de sono não estão completamente esclarecidos, havendo muitas hipóteses em aberto. Os estudos iniciais centravam-se nos mecanismos pelos quais o excesso de gordura comprometia a mecânica pulmonar e a permeabilidade das vias aéreas. O mais óbvio e de acordo com essa visão mecânica será que a deposição de gordura na região cervical leve a um colapso mais fácil das vias aéreas o que associado à diminuição fisiológica do tono muscular durante o sono, agrava o aumento da resistência das vias aéreas ao fluxo do ar. Também a deposição de gordura no tórax e abdómen poderá resultar em redução do volume pulmonar. Estudos recentes sugerem que a diminuição do volume pulmonar facilita o colapso das vias aéreas. Algumas formas de obesidade assumem pois um papel mais importante na patogénese da SAOS. Quer a deposição de gordura na região cervical, quer o excesso de tecido adiposo subcutâneo no tronco e abdómen, quer o tecido adiposo visceral são melhores preditores de SAOS do que a obesidade em geral. Mas outros possíveis mecanismos relacionam a obesidade com a apneia de sono. Uma hipótese será pelas hormonas produzidas no tecido adiposo. Por 94 Manual sobre Insulino-resistência exemplo, a leptina, para além da sua acção no controlo do peso, pode ter acções importantes, nomeadamente a nível do estímulo ventilatório. Os ratinhos deficientes em leptina hipoventilam e têm uma resposta diminuída à hipercapnia, tendo-se demonstrado que a administração de leptina corrige estas anomalias independentemente da variação do peso corporal. E assim, através dos seus efeitos no estímulo ventilador, os níveis elevados de leptina (ou o estado subjacente de resistência à leptina) podem desempenhar um papel patogénico no aparecimento da apneia de sono. Mas também é possível que a apneia do sono possa ter um papel causal no desenvolvimento ou agravamento da obesidade. Estudos epidemiológicos implicam a redução do sono como um factor de risco para o desenvolvimento de obesidade. Também os dados da literatura que implicam a apneia do sono na patogénese da tolerância alterada à glicose são cada vez em maior número. A hipóxia intermitente e a fragmentação do sono características da SAOS podem desencadear uma cascata de fenómenos, nomeadamente a activação do sistema nervoso autónomo, alterações neuroendócrinas e libertação de mediadores pró-inflamatórios potentes, tais como o TNF-α e IL-6, actores conhecidos pelo papel importante que desempenham na síndrome da RI. A recente explosão de investigação nesta área e que inclui estudos de fisiologia em animais e humanos, estudo em roedores geneticamente alterados e estudos epidemiológicos em larga escala, revolucionaram a aproximação à apneia do sono que passou do domínio do fisiologista respiratório para a necessidade de uma aproximação multidisciplinar. A investigação da patofisiologia da apneia do sono requer agora a colaboração activa de investigadores com especialização em genética, fisiologia cardiorespiratória, endocrinologia, entre muitos outros. Os dados de estudos clínicos e epidemiológicos que mostram associações fortes da apneia do sono com componentes da síndrome de insulino-resistência (diabetes mellitus, obesidade visceral, hiperlipidemia e hipertensão arterial) denotam a complexidade da sua patofisiologia e expressão. A demonstração de que a SAOS pode aumentar a tensão arterial sistémica é dada por estudos populacionais como o Wisconsin Sleep Cohort Study e o Sleep Insulino-resistência e apneia do sono 95 Heart Health Study. O aumento da tensão arterial foi demonstrado, quer durante o sono quer durante o estado de vigília, independentemente da idade, sexo e índice de massa corporal. Os valores tensionais quer sistólicos quer diastólicos apresentam uma relação linear directa com o índice de apneia / hipopneia e a percentagem de tempo de sono em dessaturação. Quando nós comparámos indivíduos obesos com e sem SAOS verificámos que embora não houvesse diferença significativa no que dizia respeito a idade, peso, altura e índice da massa corporal, os doentes com SAOS apresentavam uma maior resistência à insulina, determinada pelo método do modelo mínimo. A diferença da SI entre os grupos foi significativa, o grupo com SAOS apresentando um valor de SI médio de 0,78 (x10-4.min-1.µU-1.ml-1) versus 1,88 no grupo sem SAOS (p=0,037). Comparação dos dois grupos de obesos com e sem síndrome de apneia obstrutiva do sono (SAOS). Parâmetros n Idade (anos) Peso (Kg) Cintura (cm) Anca (cm) Cintura / Anca SI(x10-4.min-1.mU-1.ml-1) SG (min-1) Obesos com SAOS Obesos sem SAOS média ± SEM média ± SEM 6 45,1 ± 2,2 127,3 ± 12,4 132,1 ± 8,3 139,2 ± 4,7 0,95 ± 0,03 0,78 ± 0,2* 0,015 ± 0,002 6 41,8 ± 3,2 129,2 ± 12,7 126,4 ± 8,8 136,5 ± 5,7 0,93 ± 0,05 1,88 ± 0,9* 0,017 ± 0,003 t Valor de P 0,858 -0,110 0,466 0,362 0,326 -2,492 -0,491 0,411 0,950 0,651 0,725 0,752 0,037 0,635 In Contribuição para o estudo da sensibilidade à Insulina na Obesidade e na Síndrome Metabólica. Porto, Helena Cardoso, 1999. Vgontzas e colaboradores determinaram a distribuição de gordura corporal por TAC em doentes obesos com apneia de sono e em controlos obesos sem apneia de sono. Os doentes com apneia de sono apresentavam maior quantidade de gordura visceral a nível de L1, L3, L4, e L5 (P<0.05). A gordura visceral correlacionava-se de modo significativo com os índices de SAOS, nomeadamente com o índice de apneia / hipopneia e com a saturação mínima de O2. Estes dados são consistentes com outros relatos de que a acumulação de gordura visceral é um importante factor de risco para a SAOS nos obesos. No mesmo estudo, quer os níveis de glicemia de jejum, quer os níveis de insulinemia plasmática eram significativa- 96 Manual sobre Insulino-resistência mente mais elevados nos apneicos do que nos controlos obesos, assim como os níveis de TNFα e IL6. Já anteriormente tinha sido descrito um aumento significativo do TNFα e da IL6 em doentes com apneia do sono comparados com normais. A correlação da insulino resistência com a SAOS independentemente da obesidade viria a ser confirmada em dois estudos, com amostras maiores, de Ip e Punjabi e também foi descrita em normoponderais com SAOS e em doentes com formas mais leves de SAOS pelos mesmos autores. Embora estudos anteriores, realizados em indivíduos apneicos mas sem outras co-morbilidades e em apneicos magros e pouco sintomáticos, tenham sugerido que a relação entre apneia do sono e resistência à insulina reflectia os efeitos da obesidade, a avaliação global revela que há evidência consistente a favor de uma associação independente entre as alterações respiratórias do sono e a insulino-resistência. Outros dados que apoiam a teoria de que a apneia de sono e a excessiva sonolência diurna possam ser manifestações da síndrome da IR, são os seguintes: O aumento da prevalência da SAOS em doenças em que a resistência à insulina é a anomalia patofisiológica primária: As mulheres com Síndrome de Ovário Poliquístico (SOPQ) têm uma probabilidade 30 vezes superior de terem alterações respiratórias do sono e excessiva sonolência diurna. Nas mulheres com SOPQ a resistência à insulina é não só um melhor preditor de apneia do sono do que a idade, o IMC e os níveis de testosterona, como é o mais forte preditor do SAOS neste grupo. As mulheres pós-menopáusicas apresentam um aumento da prevalência da apneia do sono (valores mais próximos, embora ainda inferiores aos do sexo masculino) ao contrário das mulheres pré-menopausicas e pósmenopausicas sob terapêutica hormonal de substituição em que a prevalência é baixa. Na diabetes tipo 2 há um aumento da prevalência de SAOS e de alterações respiratórias do sono. A maioria dos estudos do efeito do nCPAP (ventilação não invasiva por pressão contínua, nasal) na IR não consegue demonstrar melhoria da insulino-resistên- Insulino-resistência e apneia do sono 97 cia o que pode traduzir não adesão ao tratamento ou então resultar do facto da insulino-resistência estar envolvida na patogénese da SAOS. No entanto a demonstração do efeito do nCPAP na diminuição da actividade simpática aumentada e na diminuição da hipercortisolemia provavelmente resultará da diminuição do stress da hipóxia intermitente e da fragmentação do sono. Vgontzas propõe a seguinte explicação: a obesidade visceral e insulino-resistência, determinada por factores genéticos / constitucionais e ambientais, leva ao agravamento progressivo das manifestações da síndrome metabólica e da apneia do sono. Por sua vez a apneia do sono pode levar ao agravamento da obesidade visceral e da S. metabólica pelo stress e causando elevações hormonais nocturnas, por exemplo aumento do cortisol e insulina, para além da cascata de fenómenos já descritos, que promovem a adiposidade visceral, anomalias metabólicas e complicações cardio-vasculares. Os trabalhos de Patel e colaboradores nomeadamente o «Cleveland Family Study», a primeira avaliação, generalizada a todo o genoma, de ligação génica de fenótipos SAOS chamam a atenção para a possível sobreposição genética entre a SAOS e a obesidade, revelando que quer no coorte caucasiano quer no afroamericano a hereditariedade para o I. A/H, como medida de SAOS, é de 33% e a hereditariedade para o IMC, como medida da obesidade, é superior a 50%. Após controlar para o IMC manteve-se hereditariedade significativa para a SAOS, indicando que a susceptibilidade genética para a SAOS não é completamente definida pelo peso. Análises de um maior subgrupo revelaram que as medidas da obesidade, como o IMC e a leptina, explicavam 50% a 55% dos determinantes genéticos do I. A/H, os restantes 50% sendo independentes da obesidade. De salientar a importância dos genes que influenciam o controlo ventilatório e a anatomia das vias aéreas, assim como dos genes com efeitos pleiotrópicos, influenciando quer a expressão da obesidade quer a da apneia do sono. Outro aspecto estudado é a importância da interacção genes-ambiente. Como exemplo, a hipóxia suprime a transcrição do gene do PPAR gama, pelo que a importância de um leve defeito na função do PPAR gama pode ser ampliada em circunstâncias de exposição recorrente à hipóxia, como é o caso da SAOS. De modo semelhante os efeitos das proteínas desacopuladoras UCP1 e UCP2, dois genes associados à obesidade por estarem envolvidos na termogénese, podem 98 Manual sobre Insulino-resistência ser influenciados pela apneia do sono. Trabalhos de investigação animal demonstram que a privação do sono leva a um aumento da expressão destas proteínas, sugerindo que a disrupção do sono provocada pela SAOS possa influenciar a expressão destes genes. A possibilidade dos polimorfismos genéticos afectarem a susceptibilidade que uma doença confere para outra, poderá levar a uma maior compreensão da associação resistência à insulina / obesidade e SAOS. A compreensão da interacção complexa entre sono, sonolência, alterações respiratórias do sono, inflamação, insulino-resistência e obesidade poderá levar a tratamentos das alterações respiratórias do sono e da sonolência diurna mais eficazes e melhor tolerados e desse modo diminuir as complicações cardio-vasculares nestas populações. O tratamento com aparelhos não invasivos de ventilação por pressão positiva (nCPAP ou BiPAP), nem sempre é bem tolerado e a adesão ao tratamento pode revelar-se difícil de conseguir. O controlo do peso e a adopção de hábitos alimentares e de sono saudáveis e de actividade física regular com o objectivo de melhorar a sensibilidade à insulina, devem ser viva e persistentemente recomendados aos indivíduos que sofram de alterações respiratórias do sono e de sonolência diurna, com o objectivo de um tratamento holístico. Os médicos devem estar alertados para a possibilidade da coexistência de outras manifestações da síndrome da RI e/ou para a possibilidade do seu aparecimento em doentes com alterações respiratórias do sono e sensibilizados de que o tratamento das causas subjacentes se revelará mais eficaz quer para o tratamento quer para a prevenção das outras manifestações da síndrome de insulino-resistência. A compreensão pelo doente de todo este processo fisiopatológico é extremamente importante pois só assim conseguiremos adesão a toda uma mudança do estilo de vida a realizar num ambiente físico e social tão desfavorável como é o actual. A transmissão desta informação enquadra-se no conceito de dar poder ao doente para ele saber como e porquê deve adoptar determinados padrões de vida e assim poder gerir melhor a sua doença. Prevenção e tratamento 100 Manual sobre Insulino-resistência Insulino-resistência e actividade física Fundamental e Insubstituível: Muito eficaz, barata e com mais vantagens para a saúde e eventuais complicações associadas. 2 mecanismos: 1. Estimula a passagem de glucose para os músculos (activos); 2. Reduz a massa gorda, sobretudo abdominal, a qual é fundamental no aparecimento de IR. Quanta e qual actividade física: Programada: Diária ou quase e pode-se fraccionar se necessário. 45 a 60 minutos de AF ligeira contínua (marcha normal, voleibol recreativo). 30 a 40 minutos de AF moderada (marcha rápida). 15 a 20 minutos se um pouco mais intensa (marcha atlética, corrida lenta tipo jogging). A marcha rápida é a rainha das actividades Kcal consumidas = Peso em Kg X Distância em Km X 0,8 Objectivo 2.000 Kcal por semana. Associar (não substituir) musculação 2 a 3/semana: óptimo! E manter toda a AF espontânea possível. Andar a pé para fugir ao trânsito, optar pelas escadas. Ter passatempos activos. SIGLAS USADAS: AF – Actividade Física; IR – Insulino-Resistência; SI – Sensibilidade à Insulina; PTGO – Prova de tolerância à glucose oral; IGT – Alteração da PTGO (Impaired Glucose Tolerance); SM – Síndrome Metabólica; VAT – Tecido adiposo abdominal peri-visceral. Insulino-resistência e actividade física 101 INSULINO-RESISTÊNCIA E ACTIVIDADE FÍSICA J. L. Themudo Barata Faculdade de Medicina da Universidade da Beira Interior; Serviço de Nutrição e Actividade Física do Centro Hospitalar Cova da Beira; Responsável Médico do Programa PESO da Faculdade de Motricidade Humana de Lisboa. Este capítulo tem como objectivo abordar os efeitos da AF sobre a IR, não se tratando, portanto, de um manual de AF para o doente diabético, com todas as adaptações e restrições que há que fazer, decorrentes desta doença e da sua terapêutica. As normas orientadoras em relação à AF nestas situações podem ser encontradas em literatura nacional[Barata 1997] e internacional[ACSM 2005]. Abordam-se sucessivamente quatro pontos relacionados: I. A AF é fundamental na prevenção da IR (e portanto da diabetes tipo 2). II. Indicação sumária dos mecanismos através dos quais a AF melhora a SI. III. Breve alusão aos efeitos da AF na Síndroma Metabólica (Síndroma de IR). IV. Esquemas concretos de AF adequada a estes pacientes. I. A AF é fundamental na prevenção da IR (e portanto da diabetes tipo 2) São muitas as evidências epidemiológicas da importância da AF regular, integrada no estilo de vida, na prevenção primária da diabetes. Esta evidência provém de mega-estudos de grandes dimensões e de elevado rigor metodológico, como sejam o Estudo das Enfermeiras (Nurses Health Study), que envolveu mais de 80.000 mulheres, e o Physicians Health Study. Do estudo de Malmo decorreu um algoritmo, segundo o qual, por cada aumento de dispêndio energético semanal de 500 Kcal com AF resultaria uma redução, já controlada para a idade, de 6% no risco de diabetes tipo 2. Outros estudos de grande rigor logístico, do fim da década de 90 e do início deste século, provaram a importância da AF regular, aliada a uma alimentação saudável, na prevenção da diabetes de tipo 2 em populações de risco aumentado para ela, nomeadamente o estudo de Da Quing, o DPS e o DPP. Nestes estudos provou-se a importância duma intervenção mista, alimentar e de AF, pelo que não foi fácil individualizar o papel da AF. Posteriormente verificou-se que qualquer delas previne a IR de modo independente[Duncan 2003]. 102 Manual sobre Insulino-resistência II. Mecanismos directos e indirectos, através dos quais a AF melhora a sensibilidade à insulina Consideram-se efeitos directos da AF na SI, aqueles que se devem aos efeitos do exercício na captação muscular da glucose e outros nutrientes, cuja entrada no músculo é habitualmente facilitada pela insulina. Como efeitos indirectos são considerados aqueles que resultam das acções da AF na massa adiposa abdominal. Efeitos directos – A AF é determinante na sensibilidade do músculo esquelético à insulina. Indivíduos treinados, obesos ou normoponderais, têm insulinémias menores que os seus semelhantes sedentários, por duas razões: porque a AF regular aumenta a capacidade do músculo captar a glucose circulante e porque diminui a gordura intramuscular, a qual se sabe estar associada à IR. Na realidade, indivíduos activos têm menos triglicéridos e outros lípidos intramusculares. O aumento da capacidade do músculo oxidar gordura em resposta ao treino aeróbio[McArdle 2004], é dos principais mecanismos pelos quais a AF promove a melhoria da SI no músculo[Goodpaster 2003]. Em relação ao primeiro mecanismo, sabe-se que quer a insulina, quer a AF promovem a activação dos GLUT-4, os maiores transportadores transmembranários de glucose, embora ainda não se saiba ao certo se a acção de uma e da outra sobre os GLUT-4 depende dos mesmos mecanismos intracelulares. Dado que têm efeitos aditivos na captação de glucose, admite-se que os seus mecanismos sejam diferentes[Cortright 1997, Youngreen]. Esta acção da AF tanto ocorre em indivíduos saudáveis como em diabéticos. Os efeitos indirectos da AF na SI devem-se sobretudo à redução da gordura intra-abdominal. Sabe-se que existe uma relação quase linear entre VAT (tecido adiposo peri-visceral ou abdominal profundo) e SI e conhecem-se os mecanismos subjacentes a esta associação. A diminuição do VAT acarreta a consequente diminuição de adipoquinas geradoras de IR por ela produzidas (TNF-α, Resistina e PAI-1) e o aumento de adipoquinas insulino-sensibilizantes como a adiponectina. Portanto estes efeitos indirectos são mais marcados quando há obesidade e pré-obesidade. Num indivíduo obeso (ou pré-obeso), os efeitos insulino-sensibilizantes indirectos da AF predominam sobre os directos. Mas independentemente da sinergia com a alimentação, a melhoria da SI é dos efei- Insulino-resistência e actividade física 103 tos mais marcados e mais importantes da AF, independente dos benefícios originados pela modificação alimentar[Cox 2004]. III. AF e outros constituintes da Síndroma Metabólica (SM) A IR é a alteração fisiopatológica de partida da SM, também designada por Síndrome de Resistência à Insulina. Não sendo a SM o tema deste manual e deste capítulo, deve ser mencionado que também a este nível temos acções directas e indirectas da AF: – acções directas nos vários constituintes da síndrome, como é conhecido para a disfunção endotelial, para o perfil lipídico, para a HTA, para os factores de risco trombogéneos e hemorreológicos, etc.; – acções indirectas em todos estes factores, via melhoria da SI. Também aqui interferem quer a redução da gordura abdominal, quer a condição física por si própria. Foi demonstrado que a mortalidade cardiovascular em indivíduos com SM mas boa condição física aeróbia é menor que em indivíduos sem SM mas com má condição física aeróbia[Blair 1996]. Em 2004 o mesmo grupo mostrou, numa amostra de grandes dimensões, que a prevalência de SM é inversamente proporcional à aptidão aeróbia e que, dentro dos últimos tercis de capacidade aeróbia, é também inversamente proporcional à condição muscular[Jurca 2004] . No entanto, apesar de a aptidão aeróbia só por si parecer ser protectora de SM, ela sobretudo reflecte uma composição menos desfavorável, o que será o principal motivo porque os indivíduos com melhor condição física terão menor prevalência de SM[Barata 2005]. IV. Quanta e qual AF: indicações práticas Os princípios da AF em termos de SI são os mesmos da promoção da saúde em geral. Na ausência de excesso de peso, os consensos actuais[Pate 1995] referem que os mínimos necessários para originar grandes benefícios para a saúde podem ser obtidos por pequenas doses de AF diária (ou pelo menos 5 dias por semana), como 45 minutos de AF ligeira (voleibol recreativo, marcha lenta, etc.), 30 minutos de AF moderada (marcha rápida), ou 20 minutos de AF um pouco mais intensa (corrida lenta ou marcha atlética). Daqui se deduz que a intensidade e a duração da AF necessárias são inversamente proporcionais. 104 Manual sobre Insulino-resistência Quando existe necessidade concomitante de reduzir a massa gorda, estas prescrições são claramente insuficientes, havendo a necessidade de 80 a 90 minutos diários de AF ligeira ou de 60 minutos de AF moderada[Saris 2003]. Para emagrecer, a AF e o plano alimentar devem em conjunto proporcionar um défice energético diário de 500 a 1000 Kcal, de modo a ter perdas ponderais semanais de 0,5 a 1 Kg, limites que são adequados para a maioria dos casos. A AF total tanto poderá ser contínua como fraccionada ao longo do dia, sendo o objectivo que atinja pelo menos 2000 Kcal semanais repartidas nos vários dias, no mínimo de cinco, idealmente 2.500 kcal. Não se pode dizer que seja pedir muito, nomeadamente em termos de tempo investido, atendendo ao que está em jogo!!! A marcha tem várias vantagens: é acessível a todos e não tem riscos importantes. Com marcha consegue-se fazer trabalho ligeiro, moderado ou intenso, conforme se pretenda. É fácil calcular o dispêndio calórico da marcha com a equação seguinte: Kcal = Peso do indivíduo em Kg x distância em Km x 0,8. No caso da corrida contínua (aeróbia) desaparece o coeficiente 0,8, ficando apenas 1Kcal/Km/Kg. Por exemplo, um indivíduo de 90 Kg ao fim de 5 Km terá gasto em média 90 x 5 x 0,8 = 360 Kcal. Equivalentes calóricos para outras formas de AF podem ser preditos por equações similares ou por diversas tabelas como a seguinte, que mostra consumos calóricos de períodos de 10 minutos de marcha na horizontal. Tabela 1 – Consumos calóricos de períodos de 10 minutos de marcha horizontal Peso em Kg 70 75 80 85 90 Andar Lento 29 31 33 35 38 Andar Moderado 41 44 47 50 53 Andar Acelerado 47 50 53 57 60 Andar Terreno Irregular 70 75 80 85 90 Para quem usa podómetros, cada vez mais em voga, o objectivo do adulto são 10.000 passos por dia (para a criança e jovens o objectivo é superior). Uma hora de marcha à velocidade normal são em média 6000 passos, pelo que os 10.000 passos comportariam não só os 80 a 90 minutos de marcha lenta acima referidos, como os que pertencem à AF mínima da vida diária. Insulino-resistência e actividade física 105 Os exercícios de força, em termos ideais, devem ser associados pelo menos 2 vezes por semana. As vantagens desta prática para a saúde em geral são consensuais[ACSM 2005]. No entanto, em termos especificamente de IR ainda não é absolutamente clara a sua necessidade, mas os seus benefícios sobre a globalidade do indivíduo, justificam a sua inclusão, se for viável, sempre como complemento e não como actividade de base e privilegiando os grandes grupos musculares. A AF tanto pode ser contínua como fraccionada e tanto pode ser espontânea (informal) como organizada (formal) – A prática de AF programada (programa de marcha, ida ao ginásio, etc.) não dispensa um estilo de vida activo durante o dia, (actividades profissionais, lúdicas e familiares da vida diária, tais como deslocar-se a pé no e/ou para o trabalho, passear os animais, bricolage, passatempos familiares activos, etc.), havendo uma relação inversa entre as necessidades de cada uma destas formas de AF, conforme a importância da outra. A quantidade de AF é mais importante que a sua intensidade, mas esta também importa, secundariamente. Hábitos de marcha à velocidade normal, já melhoram ao fim de pouco tempo a SI, mesmo sem redução de peso nem do perímetro da cintura, sublinhando a importância da AF só por si, ainda que ligeira[Hu 1999, Duncan 2003]. Contudo, apesar da quantidade de AF ser o factor mais determinante, actividades mais vigorosas parecem trazer benefícios extra, quer na saúde em geral, quer na IR em particular.[McAuley 2002] 106 Manual sobre Insulino-resistência Insulino-resistência e alimentação 1. N.º refeições: fraccionar – 3 principais + 3 ou 4 snacks; repartir ingestão de hidratos de carbono. 2. Aporte calórico: de acordo com IMC e actividade física; restrição calórica → ↑ sensibilidade insulina. 3. Composição: Hidratos carbono: 50-60% valor calórico total +++polissacáridos (HC complexos) e frutose e lactose associados a polissacáridos → << variações glicemia. Atenção índice glicémico? Lípidos: até 30% valor calórico total – saturadas < 10% poliinsaturados ≤ 10% monoinsaturados ≥ 10% (Ags omega 3 usar como suplemento apenas quando não se consegue controlar os triglicerideos). Os hidratos de carbono e a gordura monoinsaturada devem constituir 60-70% do aporte energético (tendo em conta o valor calórico da dieta). Proteínas: 15-20% valor calórico total; atenção ao aporte simultaneo de gordura animal (colesterol). Álcool: uso ponderado e criterioso. Micronutrientes: vitaminas – geralmente não é necessário suplementar anti-oxidantes – vantagem da sua suplementação por rotina permanece em estudo. Insulino-resistência e alimentação 107 INSULINO-RESISTÊNCIA E ALIMENTAÇÃO M.ª João Oliveira Unidade de Endocrinologia; Hospital Pedro Hispano. Nos últimos 30 anos verificou-se uma mudança acentuada nos hábitos alimentares da população portuguesa quer no que diz respeito a valores quantitativos – consumo calórico – quer qualitativos. Portugal (juntamente com a Grécia) é actualmente o país europeu com maior consumo calórico médio diário por pessoa. É ainda de salientar nestes anos, o consumo crescente de proteínas e gorduras animais em contraste com o acentuado decréscimo no consumo do azeite. Paralelamente quase 30% da população portuguesa apresenta um IMC superior a 27 Kg/m2. A alimentação é um elemento crucial no campo da prevenção e tratamento do S. de Insulino-resistência (e de todos os seus componentes, individualmente). Idealmente esta prevenção e a “educação alimentar” deveriam iniciar-se nos primeiros anos de vida pois, mais tarde, a prescrição de um plano alimentar pode implicar uma alteração radical de hábitos já enraizados. A obesidade nas crianças e adolescentes está a tornar-se um problema de saúde pública no nosso país. O sucesso a longo termo das chamadas “dietas” é baixo atendendo a que a aderência vai diminuindo com o passar do tempo e é assim essencial “individualizar” e “negociar” em lugar de prescrever. Ou seja, na elaboração de um plano alimentar nunca devem ser esquecidas as preferências alimentares pessoais, certos factores culturais, sociais, educacionais e económicos. Por vezes revela-se suficiente alterar o tipo de alimentação como, por exemplo, conseguir uma redução do consumo de gorduras. Os objectivos da intervenção nutricional no S. de Insulino-resistência poderão consistir em: Reduzir o aporte calórico em caso de excesso de peso ou obesidade, contribuindo para a redução da insulino-resistência; Fraccionar a ingestão alimentar ao longo do dia de forma a proporcionar uma maior saciedade e reduzir as oscilações glicémicas no doente diabético; 108 Manual sobre Insulino-resistência Reduzir a ingestão de gorduras (nomeadamente de ácidos gordos saturados e trans-insaturados) e aumentar o consumo de hidratos de carbono complexos (ricos em fibras solúveis, com baixo índice glicémico) reduzindo assim os níveis de glicemia, insulinemia e de lipídeos plasmáticos e o risco de doença cardio-vascular; Reduzir o consumo de sódio melhorando o controlo da HTA; Na prática: 1. Número de refeições: A alimentação deve ser fraccionada ao longo do dia, evitando longos períodos de jejum alternados com refeições abundantes e densamente calóricas. Geralmente, e dependendo das necessidades energéticas e da actividade do indivíduo, recomendam-se 3 refeições principais e 3 ou 4 snacks. É imprescindível repartir a ingestão dos hidratos de carbono por estas refeições. 2. Aporte calórico: A ingestão calórica deverá ser individualizada de acordo com a actividade física e com o índice de massa corporal (IMC). Apesar de ser rara a utilização de dietas de muito baixo valor calórico (menores que 1000 Kcal/dia) sabe-se que a restrição calórica melhora a sensibilidade à insulina (e o controlo da diabetes – efeito este independente da perda de peso?) e reduz o nível de ácidos gordos livres circulantes. 3. Composição alimentar: De uma forma simples e elementar a ingestão calórica diária divide-se em: Hidratos de carbono – 50-60% do valor calórico total; Lípidos – até 30% do valor calórico total, dos quais os saturados devem ser < 10%, os polinsaturados ≤ 10% e os monoinsaturados pelo menos 10%; Os Hidratos de carbono e os lipidos monoinsaturados devem representar cerca de 60-70% da ingestão calórica diária. Contudo, o perfil metabólico do doente e a necessidade de perda de peso devem ser considerados quando se calcula a % em gorduras monoinsaturadas num esquema alimentar. Proteínas – 15-20% do valor calórico total. Insulino-resistência e alimentação 109 Hidratos de carbono Ultimamente, saber o tipo e a quantidade de hidratos de carbono que devem constituir uma dieta tornou-se mais controverso. Segundo algumas entidades a quantidade é mais importante que o tipo de hidratos de carbono na determinação do efeito glicémico duma refeição. Contudo, os hidratos de carbono ricos em fibras (como grãos, cereais integrais, legumes, leguminosas, frutos e vegetais) que pela sua digestão mais lenta conduzem a menores variações da glicemia, produzem um efeito maior de saciedade e concorrem para a diminuição do colesterol LDL. Há vários factores que podem influenciar a resposta do perfil glicémico à refeição ingerida: a quantidade em hidratos de carbono, o tipo de açúcar (glicose, frutose, sacarose ou lactose), a natureza do amido (amilose, amilopectina, amido insolúvel), a forma de cozinhar e processar os alimentos (como o grau de gelatinização do amido, o tamanho das partículas) e os outros componentes da refeição (quantidade de gordura e outras substancias como fitatos, gordura-amido, proteína-amido). A glicemia pré-prandeal, a intolerância à glicose e uma segunda refeição são outros factores que podem afectar a resposta glicémica. Na elaboração dum plano alimentar com vista à prevenção ou tratamento da síndrome de insulino-resistência parecia importante atender-se ao índice glicémico dos alimentos – alimentos com baixo índice glicémico e ricos em fibra estão associados ao aumento do colesterol HDL, aumento da sensibilidade à insulina e redução do risco de aparecimento da diabetes tipo 2. Fica, no entanto, por demonstrar a importância do índice glicémico no perfil metabólico a longo prazo. É actualmente de consenso que alimentos contendo hidratos de carbono provenientes de cereais, vegetais, fruta e leite pobre em gordura devem ser incluídos numa alimentação saudável. Proteínas As proteínas da dieta são necessárias para a manutenção da massa magra. Contudo, as proteínas estão continuamente a ser sintetizadas e degradadas e os amino-ácidos resultantes podem ser reciclados (embora de forma incompleta) o 110 Manual sobre Insulino-resistência que origina que o valor e a ingestão proteica diárias são geralmente superiores ao mínimo necessário. A ingestão recomendada é de 0.8 – 1.0 gr de proteína / Kg peso / dia o que representa 56 gr. de proteína/dia num homem de 70 kg ou 11% da energia calórica total numa dieta de 2000 Kcal/dia. Nas crianças e jovens em crescimento e nos idosos o aporte diário eleva-se para 1.0 – 1.25 gr/Kg peso. Em caso de insuficiência renal recomenda-se uma restrição proteica (0.6 – 0.8 gr /kg/dia) que poderá retardar a progressão da doença. A ingestão de proteínas de origem animal terá de ter em conta a possibilidade de aporte simultâneo de gordura animal, nomeadamente de colesterol (com propriedades aterogénicas). Por outro lado, no diabético, a ingestão proteica isolada não conduz a aumento da glicemia plasmática e beneficia a insulino-secreção se conjunta com hidratos de carbono. O efeito a longo prazo das dietas ricas em proteínas e pobres em hidratos de carbono, que produzem uma perda rápida de peso, permanece desconhecido. Não é certo que a perda de peso se mantenha e há o risco de aumentar o colesterol LDL e as doenças cardiovasculares. Lípidos A restrição da gordura da dieta resulta em perda de peso e restringir as gorduras saturadas (essencialmente gorduras sólidas de origem animal muito ricas em colesterol) para menos de 10% do valor calórico total tem um efeito benéfico no nível de lipidos e na sensibilidade à insulina. Se há aumento do colesterol LDL as gorduras saturadas e trans-insaturadas devem ser limitados a menos de 7% do aporte energético (e a ingestão de colesterol inferior a 200mg/dia). No entanto, dietas pobres em gordura saturada (≤ 10%) e ricas em carbohidratos parecem não só reduzir o colesterol HDL mas também aumentar os triglicerideos, a glicemia pós prandeal e a insulinemia, quando comparadas com dietas isocalóricas ricas em gorduras monoinsaturadas. Insulino-resistência e alimentação 111 Um estudo realizado em indivíduos saudáveis mostrou que uma dieta rica em gordura monoinsaturada melhora a sensibilidade à insulina quando comparada a uma com predomínio de gorduras insaturadas. Contudo, este efeito benéfico desaparece se a ingestão total de lipidos excede 38% do valor calórico total diário. É menos evidente como a percentagem das gorduras poliinsaturadas (essencialmente óleos de origem vegetal) duma dieta pode afectar os níveis plasmáticos de lipidos e glicose, contudo é de consenso que esta não ultrapasse 10% do valor calórico total. Logo, as gorduras monoinsaturadas (azeite, óleo de amendoim) devem representar pelo menos 10% do valor calórico da dieta. Os ácidos gordos omega 3 são o principal constituinte dos óleos de peixe de água fria. Reduzem os triglicerídeos e parecem diminuir a trombogenicidade e melhorar a actividade plaquetária, contudo elevam o colesterol LDL e não têm efeito no controlo glicémico. Devem ser utilizados como suplemento apenas naqueles casos em que não se consegue controlar os triglicerídeos. Álcool Poucas vezes e em pequenas quantidades ou nunca? Sabe-se que a ingestão regular em pequenas quantidades de álcool eleva o colesterol HDL e a secreção de insulina estimulada pela glicose, e reduz a gluconeogenese hepática reduzindo a insulino-resistência. Contudo, o álcool é responsável pela elevação dos triglicerideos, implica um maior consumo calórico e um maior risco de hipoglicemias principalmente no diabético insulinotratado. O seu uso deve ser ponderado e criterioso. Micronutrientes – vitaminas e anti-oxidantes Não há necessidade de suplementação vitaminica desde que a dieta seja variada e equilibrada e o seu uso restringe-se a casos específicos de défice ou outros como grávidas, lactantes, lactentes e pessoas em dietas hipocalóricas com ingestão de menos de 1200 Kcal/dia. Os anti-oxidantes como a vitamina E e C e os carotenoides neutralizam os radicais livres prevenindo processos oxidativos de lesão celular como os existentes na aterogenese. A vantagem da sua suplementação por rotina permanece em estudo. 112 Manual sobre Insulino-resistência SÍNDROME METABÓLICA: ESTRATÉGIAS DE PREVENÇÃO Elisabete Rodrigues Serviço de Endocrinologia do Hospital S. João – Porto Num contexto internacional pode considerar-se o estado nutricional de grande parte da população dos países ocidentais como sendo bom. À medida que a situação sócio-económica foi melhorando, também a saúde e o estado nutricional melhoraram, visto que, o acesso aos alimentos tornou-se facilitado, deixando de existir problemas de saúde por défices energéticos ou nutricionais. De facto, a esperança média de vida nunca foi tão elevada como nos dias de hoje. Contudo este padrão de vida elevado nas últimas décadas também criou novos problemas. Actualmente as doenças mais prevalentes nos países industrializados são o cancro e as doenças cardiovasculares, ambas claramente relacionadas com o estilo de vida. O grande aumento, nos últimos anos, destas e doutras doenças crónicas, incluindo a síndrome metabólica, tornou imperativo o desenvolvimento de uma abordagem preventiva destas doenças, além das medidas terapêuticas. O síndrome metabólica consiste no agrupamento no mesmo indivíduo de vários factores de risco cardiovascular, nomeadamente obesidade abdominal, dislipidemia caracterizada por aumento dos triglicerídeos e diminuição do colesterol HDL e hipertensão arterial. O denominador comum a estes factores parece ser a insulino-resistência, e de facto em termos de fisiopatologia do síndrome metabólica tem sido proposto que a insulino-resistência parece ser o defeito primário. Todavia é também possível que a insulino-resistência possa ser secundária, por exemplo à obesidade abdominal. Em geral a contribuição genética para a insulino-resistência é da ordem dos 40% o que significa que os factores ambientes desempenham um papel mais importante que os factores genéticos. Poder-se-á concluir que para o desenvolvimento da insulino-resistência predominam factores ambientes e que a obesidade, particularmente a gordura intra-abdominal desempenha um papel específico. Por outras palavras, na maioria dos casos o síndrome metabólica é originado pelo estilo de vida excessivo das sociedades ocidentais, mas tende a desenvol- Síndrome metabólica: estratégias de prevenção 113 ver-se em indivíduos geneticamente susceptíveis. De facto, cada um dos componentes deste síndrome está relacionado com a dieta: obesidade (balanço entre ingestão e dispêndio energético; densidade energética); hipertensão arterial (obesidade; ingestão de sal); dislipidemia (obesidade; ingestão de gordura). Os avanços no conhecimento dos factores genéticos responsáveis pelo síndrome metabólica poderão ajudar na sua prevenção. Porém, de momento, assume crucial importância a promoção de um plano alimentar adequado, e a modificação do estilo de vida com aumento da actividade física e diminuição do sedentarismo, sem os quais não será possível evitar / tratar a obesidade, que é central no desenvolvimento deste síndrome. A abordagem em termos de prevenção deverá combinar esforços em 3 níveis diferentes: 1. Prevenção universal ou medidas de Saúde Pública (dirigida a toda a população) 2. Prevenção selectiva (dirigida a subgrupos da população com maior risco individual de desenvolver insulino-resistência) 3. Prevenção específica (dirigida a indivíduos de alto risco) Recomendações gerais para a prevenção do síndrome metabólica: Actividade física regular, de preferência diária Evitar sobrecarga ponderal, através da adaptação da ingestão calórica ao dispêndio energético; para a maioria das pessoas significa aumentar a actividade física diária e reduzir ingestão calórica. A ingestão de gordura não deve exceder 30% do valor calórico total; para a maioria das pessoas significa diminuir a ingestão de gordura e tal diminuição deve ser fundamentalmente através da redução de ácidos gordos saturados, os quais não devem ultrapassar 10% da energia ingerida. A ingestão de fibra deve aumentar para 25-30 g/dia A ingestão de açúcares refinados deve ser igual ou inferior a 10% da ingestão 114 Manual sobre Insulino-resistência calórica, especialmente em dietas hipocalóricas A ingestão de sal deve diminuir. 5-6 g/dia A ingestão de álcool deve ser moderada ou mesmo abolida Deve aumentar o consumo de hidratos de carbono complexos (pão, massa, arroz, batata) Deve consumir-se diariamente alimentos de todos os grupos da pirâmide alimentar Evitar modos de confecção com gordura (ex. fritos, molhos) A ingestão diária deve ser repartida por 3 refeições principais e 2 ou mais snacks Síndrome metabólica: terapêutica fatmacológica 115 SÍNDROME METABÓLICA: TERAPÊUTICA FARMACOLÓGICA M.ª Helena Ramos Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo, Hospital Geral de Santo António – Porto A síndrome metabólica engloba um conjunto de factores de risco cardio-vasculares que necessitam de terapêutica para tentar reduzir a morbilidade e mortalidade coronária e cardio-vascular. Devido à estreita correlação entre insulino-resistência e hiperinsulinemia, devemos utilizar como terapêutica medicamentosa fármacos que aumentem ou melhorem a acção intracelular da insulina e que reduzam a hiperglicemia. Dentro destas acções, podemos dispôr de três tipos de fármacos: – biguanidas (metformina) – inibidores da α glicosídase (acarbose) e – tiazolidinedionas (rosiglitazona e pioglitazona). Biguanidas Desta classe farmacológica, a única de que dispomos actualmente é a metformina comercializada sob as designações de: “Risidon” – cloridrato de metformina – 1gr/cp “Risidon” – cloridrato de metformina – 850 mg/cp ↔ 663 mg metformina-base “Stagid” – embonato de metformina – 700 mg/cp ↔ 280 mg metformina-base “Glucophage” – cloridrato de metformina – 500 mg/cp ↔ 390 mg de metformina – base A metformina tem vários mecanismos de acção de que se destaca a diminuição da produção hepática de glicose, redução do peso corporal e do hiperinsulinismo acompanhado de diminuição do inibidor do activador do plasminogénio (PAI – 1) e do fibrinogénio e ainda a redução dos triglicerídeos, colesterol total e LDL e aumento do colesterol HDL, o que se torna altamente benéfico no tratamento da dislipidemia que acompanha a insulino-resistência. No estudo DPP (Diabetes Prevention Program), a metformina mostrou reduzir em 31% o risco de progressão para diabetes tipo 2 em indivíduos previamente intolerantes à glicose. 116 Manual sobre Insulino-resistência A metformina está contra-indicada em casos de cetose, doença grave intercorrente, cirurgias, traumatismo grave, insuficiência hepática, renal, respiratória ou cardíaca. No caso de exames radiológicos com contraste, deve suspender-se 48 horas antes da sua realização por risco de acidose láctica. Os efeitos laterais são gastrointestinais como diarreia, náuseas, sabor metálico, má absorção de vitamina B12 e folatos em terapêuticas muito prolongadas e com deficiente aporte nutricional e muito raramente acidose láctica. Recomenda-se começar a terapêutica com uma dose baixa a seguir às principais refeições, que se pode aumentar progressivamente até à dose máxima de 2 a 2,5 g/dia. Inibidores da α glicosídase Actualmente só podemos dispôr da acarbose em doses de 50 e 100 mg/cp (“Glucobay 50” e “Glucobay 100”), embora exista o miglitol nas mesmas doses (“Diastabol 50” e “Diastabol 100”) e a voglibose. O seu mecanismo de acção permite atenuar as elevações da glicemia pós-prandial, diminuindo o estímulo pancreático e consequentemente o hiperinsulinismo. No estudo STOP – NIDDM (Study to Prevent NIDDM), a acarbose em monoterapia na dose de 300 mg/dia reduziu o risco de progressão de alteração da tolerância à glicose para diabetes tipo 2, bem como o risco cardio-vascular, o desenvolvimento de hipertensão arterial e a espessura da íntima-média carotídea nos indivíduos com alteração da tolerância à glicose. Como efeitos laterais apontam-se essencialmente os gastrointestinais como dores abdominais, meteorismo, flatulência e por vezes diarreia. Aconselha-se começar com uma dose baixa (50 mg) no início duma refeição principal que se vai aumentando semanalmente de acordo com as necessidades terapêuticas até máximo de 300mg/d. Está contra-indicada em doentes com doença inflamatória intestinal, ulceração do cólon, obstrução intestinal, hérnias abdominais, gravidez e aleitamento. Síndrome metabólica: terapêutica fatmacológica 117 Tiazolidinedionas São fármacos sensibilizadores da insulina, estando o seu mecanismo de acção relacionado com o receptor gama activado de proliferação dos peroxizomas (PPAR γ) de que são agonistas. O PPAR γ é um receptor nuclear que se expressa sobretudo no tecido adiposo e em menor grau no músculo liso, fígado e outros tecidos. Actuam formando um complexo com o receptor do retinoíde X, aumentando a transcrição de vários genes sensíveis à insulina. Este mecanismo de acção induz a utilização de glicose e ácidos gordos pelo adipócito, promovendo a lipogénese. Aumentam a glicogénese e a utilização periférica da glicose, podendo ainda reduzir a produção hepática da glicose. No tecido adiposo, reduzem a lipólise e portanto os ácidos gordos livres, diminuem a secreção do TNFα (factor de necrose tumoral) e aumentam a secreção de adiponectina. Todas estas acções contribuem para a redução da resistência à insulina. Conhecem-se vários compostos químicos deste grupo tais como a troglitazona, rosiglitazona (“Avandia”), pioglitazona (“Actos”) e outros. A troglitazona foi retirada do mercado por provocar hepatotoxicidade grave. A rosiglitazona está comercializada no nosso país com a designação de “Avandia” nas doses de 4 e 8 mg.e é metabolizada pelo CYP2C8.A pioglitazona está comercializada com a designação de «Actos» nas doses de 15 e 30mg e é metabolizada pelo citocromo P450 3 A4. Embora o risco de doença hepática seja baixo, recomenda-se vigilância analítica da função hepática de dois em dois meses durante o primeiro ano de terapêutica. Quer a rosiglitazona, quer a pioglitazona, aumentam o colesterol HDL com redução dos triglicerídeos que parece ser mais marcada para a pioglitazona. Como efeitos laterais apontam-se cefaleias, dores musculares, retenção de líquidos e aumento de peso que se deve ao aumento do tecido celular subcutâneo por estimulação da diferenciação dos pré-adipócitos em adipócitos e não por aumento do tecido adiposo visceral, havendo até redução da gordura intra-hepática, tendo-se demonstrado em trabalhos recentes que a rosiglitazona melhora a esteatose hepática não alcoólica em indivíduos não diabéticos. Devido à expansão do volume plasmático, as tiazolidinedionas estão contra-indicadas em doentes com insuficiência cardíaca. Em casos graves de insulino-resistência podem associar-se as tiazolidinedionas à metformina, com muito bons resultados. 118 Manual sobre Insulino-resistência As glitazonas actuam ainda sobre vários outros factores de risco cardio-vasculares para além da hiperinsulinemia e intolerância à glicose podendo prevenir a diabetes tipo 2, tais como dislipidemia, hipertensão arterial, microalbuminúria, hiperhomocisteínemia, PAI-1, fibrinogénio, proteína C reactiva de alta sensibilidade, sendo, pois, as tiazolidinedíonas um grupo de fármacos com amplas potencialidades na terapêutica da síndrome metabólica. Terapêutica farmacológica Fármacos Mecanismo de acção Indicações Biguanidas ↓ gliconeogénese hepática ↓ resist. perif. à insulina Obesidade e Ins. – resist. Glitazonas ↓ resist. perif. à insulina ↓ ác. gordos livres Ins. – resist. Inibidores da α glicosídase ↓ abs. hidratos de C Hiperglicemia pós-prandial Obesidade Para além do que atrás ficou dito, podemos dispôr de fármacos com acção periférica, o Orlistat (“Xenical”) e com acção central, a sibutramina (“Reductil”). O Orlistat actua localmente, inibindo as lípases gástrica e pancreática que são enzimas envolvidas na hidrólise dos triglicerídeos, o que reduz em 30% a absorção das gorduras ingeridas. Os efeitos máximos são obtidos com 120 mg três vezes por dia, devendo a toma ser omitida se houver falha de refeição. As reacções indesejáveis derivam do seu mecanismo de acção e são gastrointestinais, podendo ser particularmente incómodas se o obeso ingerir grandes quantidades de gordura: flatulência com diarreia, urgência de defecação, esteatorreia, incontinência fecal e aumento da frequência das dejecções. O Orlistat tende a diminuir a absorção das vitaminas liposolúveis (A, D, Síndrome metabólica: terapêutica fatmacológica 119 E, K) pelo que se deve prescrever um polivitamínico sobretudo em terapêuticas a longo prazo. Este deve ser tomado duas horas após a toma do Orlistat ou ao deitar. O Orlistat está contra-indicado nas síndromes de má absorção, colestase, gravidez e amamentação. Provoca também uma ligeira redução dos níveis do colesterol total e LDL, bem como a melhoria do controle glicémico (estudo Xendos) e da tensão arterial, relacionadas com a redução do peso. A Sibutramina é um fármaco inibidor da recaptação da serotonina e noradrenalina nas terminações sinápticas aumentando assim a saciedade. Não deve ser administrada a doentes com insuficiências hepática nem renal, antecedentes de doença coronária, insuficiência cardíaca congestiva, taquicardia, doença arterial oclusiva periférica, arritmias, doença cérebro-vascular, nem a hipertensos não controlados. A dose diária é de 10 mg, de manhã que poderá ser aumentada para 15 mg desde que não haja uma perda mensal de pelo menos 2 kg de peso. Recentemente está em estudo um novo fármaco de acção central, o Rimonabant, antagonista dos receptores canabinóides tipo 1, que para além de reduzir a ingestão alimentar e consequentemente o peso, diminui os triglicerídeos e o colesterol LDL, aumentando a tolerância à glicose e a sensibilidade à insulina, com aumento de produção de adiponectina pelo tecido adiposo. Dislipidemia A dislipidemia da síndrome metabólica é caracterizada essencialmente por aumento dos triglicerídeos, diminuição do colesterol HDL e LDL pequenas e densas com ou sem aumento quantitativo. Dado o alto risco cardio-vascular (CV) que esta síndrome apresenta, está indicada a terapêutica com estatinas e eventual associação com o Ezetimibe, caso não se consigam os valores de colesterol adequados com as primeiras. Como segundo objectivo terapêutico, devemos procurar normalizar os triglicerídeos e aumentar o colesterol HDL com fibratos – o fenofibrato tem menos interacções farmacológicas. Se a única necessidade terapêutica consistir no aumento do colesterol HDL, resta-nos o ácido nicotínico. Cada 1gr de ácido nicotínico aumenta em 10% o colesterol HDL. Deve iniciar-se 120 Manual sobre Insulino-resistência a terapêutica com doses baixas, lentamente, para evitar os efeitos vaso reactivos faciais do ácido nicotínico e impedir o agravamento da insulino-resistência ou mesmo a deterioração do controle glicémico. Se isso acontecer, deve iniciar-se terapêutica com antidiabéticos orais. Hipertensão arterial A escolha dos anti-hipertensores na síndrome metabólica deve obedecer aos mesmos critérios utilizados para a hipertensão arterial nos diabéticos, tanto mais que nesta síndrome também existe disfunção endotelial, pelo que os inibidores da enzima de conversão e os antagonistas da angiotensina serão fármacos de primeira escolha, seguindo-se a associação destes com hidroclorotiazida, diuréticos, bloqueadores beta cardioselectivos, bloqueadores dos canais de cálcio e outros. Os objectivos terapêuticos serão obter uma TA ≤ 130/85mmHg, o que habitualmente obriga a associação terapêutica de dois ou três fármacos. De todo o exposto se deduz que a terapêutica farmacológica da síndrome metabólica deve ser profundamente abrangente de todas as suas componentes que contribuem, cada uma delas, para o risco CV que acompanha esta grave disfunção metabólica. Síndrome metabólica numa consulta de medicina geral e familiar 121 SÍNDROME METABÓLICA Qual a dimensão do problema numa consulta de medicina geral e familiar? Sónia Cunha Cruz e João Luís Pereira Centro de Saúde de Sacavém Já há alguns anos que a Síndrome Metabólica ou Síndrome de Insulino-resistência está descrita como fortemente relacionada com a obesidade visceral, diabetes e a alto risco de morbilidade e mortalidade cardiovascular. O primeiro passo foi dado em 1939 por Himsworth e Kerr ao verificarem resposta diminuída à insulina nos diabéticos obesos. Muitos foram os estudos realizados desde então, inclusive aqui em Portugal. Júdice Halpern, investigador e professor na Faculdade de Medicina de Lisboa, publica em 1984 artigo onde designa de Síndroma Plurimetabólica às alterações metabólicas que associam dislipidémia e tolerância diminuída à glicose. Em 1988, Halpern investiga a associação do hiperinsulinismo com as dislipidémias, contemporâneo portanto de G. Reaven, autor que ficou internacionalmente conhecido naquele mesmo ano ao propor chamar-se de “Síndrome X” a associação entre as alterações da glicose, dislipidémia e hipertensão arterial. Em 1999 a OMS propõe uma definição de Síndrome Metabólica (SM) com uma aplicabilidade clínica limitada em Medicina geral e Familiar (MGF). Em 2002 o Adult Treatment Panel III (ATP III) do National Cholesterol Education Program dos EUA propõe critérios clínicos para a síndrome. Em 2004 o European Group for Study of Insulin Resistance (EGIR) define critérios de fácil aplicabilidade. Em 2004 Darwin Deen considera a SM como marcador de risco primário para as doenças cardiovasculares e como muito forte preditor de risco para a diabetes tipo 2. Na Europa, estudo belga de 2003 estima que cerca de 20% dos adultos sofrem de SM e considera tal como um problema de saúde pública. Nos Estados Unidos a situação é mais dramática: com o aumento na última década do milénio (19912000) de 61% na incidência de obesidade principalmente entre as mulheres, estima-se em estudo de 2004 que> 45% destas após a menopausa sofram de SM! Fala-se de pandemia! 122 Manual sobre Insulino-resistência E entre nós os portugueses? Qual é a dimensão deste problema na nossa consulta de MGF no Centro de Saúde? Conseguiremos com os nossos meios adequadamente prevenir, detectar, e tratar a síndrome metabólica??? Com o objectivo de perceber a prevalência da SM no âmbito da consulta de MGF, foram avaliados todos os indivíduos de 2 listas de utentes ≥ 20 anos, excepto grávidas, que procuraram seu médico de família pelos mais diversos motivos durante os 20 dias úteis de Junho/2004 (n=580). Registou-se para cada um dos indivíduos avaliados a verificação de cada um dos critérios diagnósticos da SM de acordo com o ATPIII. Síndrome Metabólica (NCEP-ATPIII, 2002) Obesidade central P. abd. a > 88 / ` > 102 cm Hiperglicemia em jejum ≥ 110 mg/dl Hipertrigliceridemia ≥ 150 mg/dl HDL reduzida a < 50 / ` < 40 mg/dl Pressão arterial elevada PAS ≥ 130 e/ou PAD ≥ 85 mm HG Nota: a associação de positividade em 3 destes critérios dá-nos o diagnóstico de Síndrome Metabólica Foram estudados 580 indivíduos com idade média de 56,4 anos. Pelo menos 3 dos 5 parâmetros dos critérios do ATPIII foram encontrados em 217 indivíduos, com uma idade média de 62,6 anos, correspondendo a uma prevalência de SM de 37% na população estudada, assim distribuídos: 16% (31) do total (192) de indivíduos da faixa etária <50 anos 48% (150) do total (315) de indivíduos da faixa etária ≥ 50<74 anos 49% (36) do total (73) de indivíduos da faixa etária ≥ 74 anos Acontece que 99 (17%) destes 580 indivíduos eram bem conhecidos: diabéticos já diagnosticados e em tratamento. Neste grupo a prevalência de SM subia a 83% (82 diabéticos), conforme esperado. Síndrome metabólica numa consulta de medicina geral e familiar 123 Estudamos então a população não diabética (n=481). Possuíam critérios para a SM 135 destes indivíduos. O que quer dizer ainda um prevalência de 28%! Se foram encontrados 37% da população geral e 28% da população não diabética com Síndrome Metabólica, isto é mesmo um problema de saúde pública! Confrontados com estes números – e chamando a atenção que o estudo incidiu apenas sobre os utentes que nos procuraram para consulta pelos mais variados motivos durante o mês de Junho de 2004 e não sobre a lista total de inscritos em si – interrogamo-nos: Como poderemos nós, médicos de MGF, objectivamente intervir para atenuar a dimensão deste problema? Ora, os utentes diabéticos são bem nossos conhecidos e já se encontram quase sempre motivados, embora da pior maneira – pois já com a doença estabelecida – e muitos deles estão convencidos e a seguir as necessárias instruções terapêuticas e a adoptar um estilo de vida mais saudável. Logo, podemos dizer que os temos em “nossas mãos”. Por outro lado, como médicos de família, a nossa preocupação vai para os tais 28% que circulam inocentes dos riscos que correm, nem um pouco preocupados com a barriguinha (assassina) que vai crescendo, a “tensão” um pouquinho mais alta e quem sabe mais o que… muitas vezes ainda a fumar um cigarrinho para descontrair! Com o objectivo de estudar mais a fundo o grupo de risco para a SM como reconhecer estes indivíduos de forma rápida, eficaz e não dispendiosa dentre a população em geral que todos os dias “entope” a nossa consulta? Estudando os dados de todos os factores, constatamos que o perímetro abdominal isolado foi o que demonstrou maior valor preditivo positivo – cerca de 70% – e a pressão arterial cerca de 59%. Curiosamente, ao cruzar os dados percebemos que 38% da população em geral e 78% dos indivíduos com SM apresentavam associação de pressão arterial e perímetro abdominal elevados. 124 Manual sobre Insulino-resistência O que significa que… APENAS COM UMA FITA MÉTRICA E UM ESFIGMOMANÓMETRO conseguiremos reconhecer cerca de 80% dos indivíduos de alto risco para SM! E são justamente estes que precisam ser melhor estudados, valendo a pena insistir e intervir através a modificação do estilo de vida e a correcção dos factores alterados! Apesar de não ser fácil… pois convencer alguém que não se sente doente a modificar seus hábitos é algo muito, muito difícil. Durante milhares de anos a estrutura biológica do Homem teve necessidade de se adaptar à escassez alimentar e ao esforço físico para conseguir nutrientes. É provável que um organismo humano, quiçá com tendência para a insulino-resistência, esteja preparado para vencer crises de fome mas não se adapte ao excesso alimentar e ao sedentarismo e ao stress próprio das grandes urbes. Pagará esse estilo de vida com a doença cardiovascular. Como intervir para modificar esse destino? Não será voltar às cavernas mas intervir na modificação harmoniosa do estilo de vida. Será necessário adaptar o modo de vida do Homem à sua estrutura biológica. Resumindo: Saber viver, promovendo a saúde e minorando os riscos. A Finlândia é nesse momento um exemplo a seguir: desde 2004 decorre um Programa Nacional de Prevenção da Diabetes tipo 2 e que prevê resultados até 2010, através a prevenção sistemática da obesidade e a promoção de uma alimentação saudável e actividade diária, utilizando os meios de comunicação social, treinos físicos, aconselhamentos gerais de estilo de vida e uma rede extensa de suporte destas actividades para a população em geral; através o controlo eficiente da pessoa em risco, avaliando, monitorizando os níveis de glicemia, investigando e tratando a doença cardiovascular, procedendo ao tratamento intensivo da obesidade, educação alimentar e educação física. Esta é a combinação ideal: macro e microintervenção! Portugal bem poderia seguir este exemplo… mas enquanto tal não acontece, sugiro que todos nós, médicos de família (pois é por nossas mãos que passam as pessoas “saudáveis” e suas famílias), passemos a utilizar juntamente Síndrome metabólica numa consulta de medicina geral e familiar 125 com o estetoscópio uma fita métrica “ao pescoço” para que assim, de forma rápida e sem custos (financeiros!) adicionais consigamos reconhecer a população de risco para a Síndrome Metabólica e assim trabalhá-la, contribuindo deste modo activamente para a prevenção e a diminuição efectiva das terríveis consequências da Doença Cardiovascular! 126 Manual sobre Insulino-resistência A ABORDAGEM DO EMPODERAMENTO NO TRATAMENTO DA INSULINO-RESISTÊNCIA Isabel Silva Universidade Fernando Pessoa A insulino-resistência é da maior importância para a compreensão de um conjunto de doenças não transmissíveis que constituem uma preocupação na actualidade, de que são exemplos a obesidade e a diabetes tipo 2. Urge ter presente a relação directa entre o estilo de vida ocidental e o aumento da resistência à insulina, pois ainda que existam importantes recursos disponíveis a nível farmacológico para o tratamento deste problema, a importância da alteração de estilos de vida e a adopção de comportamentos mais saudáveis na prevenção e tratamento da resistência à insulina é inegável. Após o diagnóstico de insulino-resistência, é exigido ao doente que se envolva totalmente no seu tratamento, assumindo responsabilidade por este e comportando-se como um agente activo. No entanto, este trata-se de um problema de saúde sem desconforto imediato, nem risco evidente e cujo tratamento pode implicar modificações de hábitos de vida bem consolidados e considerados pelo doente como gratificantes (ex. hábitos alimentares, sedentarismo), podendo, assim, o seu cumprimento ser percebido como intrusivo e inconveniente. Tratase, ainda, de um tratamento que é implementado sem supervisão directa dos comportamentos e cujas consequências imediatas da adesão aos cuidados poderão ser percebidas como sendo mais aversivas ou punitivas pelo doente do que as consequências do não cumprimento dos conselhos médicos. Apesar de ser considerado fundamental o envolvimento activo do doente no seu tratamento, à semelhança do que se verifica no domínio de outros problemas crónicos, também este tem sido abordado pelos profissionais de saúde à luz do paradigma médico tradicional, que revela continuar a dominar o sistema de cuidados de saúde. Na última década têm sido vários os investigadores e clínicos que defendem a necessidade de uma passagem para um outro paradigma contrastante, designado por “empoderamento do doente”. Este paradigma tem como aspectos fulcrais a devolução do poder ao doente e da importância atribuída a este, considerando-o como um verdadeiro parceiro na tomada de decisões relacionadas com o tratamento, o que contrasta claramente com a perspectiva que concebe Empoderamento do doente 127 o do profissional de saúde como detentor máximo de todo o conhecimento (Paterson, 2001). Esta nova abordagem implica que os profissionais de saúde reconheçam e respeitem a capacidade do doente para tomar decisões, valorizem a informação que este fornece e sejam capazes de delegar o controlo quando o doente rejeita os seus conselhos (Paterson, 2001). Só assim se poderá enquadrar uma intervenção que visa encorajar o doente a assumir uma responsabilidade partilhada no tratamento da resistência à insulina. Para que o tratamento seja eficaz, os doentes têm de se envolver activamente na gestão da doença e, para tal ser exequível, necessitam de “poder”. Estimular a percepção que o doente tem de controlo sobre a sua doença constitui, segundo a Organização Mundial de Saúde, um aspecto central para melhorar o bem-estar psicológico destes indivíduos. Neste sentido, revela-se imprescindível tomar consciência e aceitar que o doente é também responsável pelo tratamento da sua doença e que a sua responsabilidade não é negociável, no sentido de que esta não lhe pode escapar, nem a pode transferir totalmente para outra pessoa, mesmo sendo esta um profissional de saúde. Segundo esta perspectiva, quando temos por objectivo ajudar o doente a alterar o seu estilo de vida, devemos estar conscientes de que: (1) As escolhas mais importantes que afectam a sua saúde e o bem-estar são feitas pelo próprio doente e não pelos profissionais de saúde; (2) Os doentes controlam em grande medida o seu tratamento; (3) As consequências das escolhas feitas pelo doente no dia a dia em relação ao tratamento reflectem-se, em primeiro lugar e principalmente, no próprio doente. De acordo com o modelo médico tradicional, considera-se que a fonte dos problemas na adesão ao tratamento é o doente e que a solução destes passa, obviamente, por este se subjugar à perícia e autoridade do profissional de saúde, seguindo as recomendações que este faz para que altere o seu comportamento (Anderson & Funnell, 2005). Pelo contrário, o empoderamento pode ser compreendido como um processo que leva a pessoa a acreditar nas suas capacidades para agir de forma independente e eficaz (processo que contribui para melhorar a sua percepção de auto-eficácia, de competência e de auto-controlo), transformando o doente num solucionador activo dos seus problemas (Lewis, 128 Manual sobre Insulino-resistência Lewis, Daniels, & D’Andrea, 1998; Sleeter, 1991; Zimmerman, 1998). A perspectiva do empoderamento consiste em tornar as pessoas conscientes do seu próprio poder para alcançar os seus objectivos e resolver problemas, mesmo quando enfrentam oposição, assim como aumentar o controlo que estas têm sobre a sua própria saúde, melhorando-a. Todavia, não devemos esquecer que também pressupõe um processo de educação, colaboração, cooperação e reciprocidade entre as pessoas envolvidas (Hanna & Robinson, 1994; Lewis et al., 1998; Mitcheson & Cowley, 2003; Shiu et al., 2003; Zimmerman, 1998), neste caso, com os profissionais de saúde. Zimmerman (1998) encara o empoderamento como uma variável contínua, considerando que alguém pode ter mais ou menos falta dele, pelo que devemos esperar encontrar diferentes níveis ou graus, e como uma variável desenvolvimental, que pode mudar com o tempo, ainda que não necessariamente de forma linear – uma pessoa pode apresentar em dado momento um nível mais elevado de empoderamento e, num momento seguinte, revelar um nível menor. É essencial ter presente que uma condição elementar e essencial para a adopção da abordagem do empoderamento é os profissionais de saúde disporem de tempo para o doente, para que seja possível a exploração de preocupações, expectativas e emoções deste. Muitas vezes, os doentes vêem-se confrontados com a necessidade de escolherem alternativas de tratamento, sem disporem de tempo ou informação suficiente para tal. Se o indivíduo não se sente preparado e é pressionado para tomar uma decisão, provavelmente confiará no profissional de saúde para que este a tome por ele (Paterson, 2001). Paterson (2001) alerta para o facto de não ser suficiente uma mudança na linguagem utilizada na consulta para existir empoderamento do doente, sendo imprescindível, também, uma alteração das complexas relações de poder entre os profissionais de saúde e o doente. A adopção desta abordagem implica necessariamente uma mudança no papel do profissional de saúde, que, de controlador, deverá passar a alguém que tem por função ajudar, apoiar e/ou criar condições para que o doente assuma o controlo sobre a sua vida (Adolfsson, Smide, Gregeby, Fernström, & Wikblad, 2004). Empoderamento do doente 129 De acordo com Shiu et al. (2003), para formar um doente empoderado, não será suficiente o conhecimento e as competências que eram fornecidos pelos programas de educação tradicionais, sendo necessário, também, que os doentes recebam treino dirigido a competências psicossociais. Assim, a educação relativa à insulino-resistência não deverá focar somente os aspectos directamente associados à implementação do tratamento, mas ser muito mais lata, abarcando aspectos psicossociais, tais como valores, expectativas, necessidades e preferências do doente, obtenção de apoio familiar, negociação com os profissionais da equipa dos cuidados de saúde. A abordagem do empoderamento percebe a educação como uma colaboração entre iguais designados para ajudarem o doente a tomar decisões mais informadas sobre a sua o seu tratamento. O conhecimento necessário para a tomada dessas decisões informadas assenta em dois domínios globais de informação: (1) O primeiro, diz respeito a um conhecimento que podemos considerar externo – é o conhecimento acerca da insulino-resistência e do seu tratamento, isto é, a informação necessária para fazer julgamentos do tipo custos / benefícios acerca da adopção (ou não adopção) do tratamento; (2) O segundo, tem que ver com um conhecimento interno – o conhecimento acerca dos valores, crenças, necessidades e objectivos do doente, bem como das aspirações ou expectativas que este tem em relação ao tratamento da doença. Na educação orientada para este último domínio, os doentes são ajudados a examinar e clarificar os componentes emocional, espiritual e intelectual das suas vidas enquanto envolvidos numa série de decisões que devem tomar acerca do tratamento. A abordagem do empoderamento, na educação de indivíduos com problemas crónicos, visa, então, maximizar o seu conhecimento sobre o tratamento, recursos e competências para lidar com a doença, auto-avaliação e sentido de autonomia pessoal, de forma a capacitá-los para assumirem a responsabilidade pelo tratamento. Os doentes que realmente possuem o poder (doentes empoderados) são aqueles que aprenderam o suficiente acerca do seu problema de saúde e sobre si mesmos, de tal forma que podem seleccionar e alcançar os seus próprios objectivos para o tratamento na consulta com o profissional de saúde, melhorar a sua adaptação psicossocial e a sua auto-eficácia. A educação deverá, assim, envolver descoberta e desenvolvimento dos recursos do doente para 130 Manual sobre Insulino-resistência a mudança e para assumir a responsabilidade, mas também deverá ser uma fonte de apoio psicossocial para o doente, que o encoraje a alterar e manter comportamentos importantes para o seu tratamento. A probabilidade de conseguir e manter mudanças de estilo de vida é muito maior se estas forem significativas para o doente e se tiverem sido escolhidas por este livremente. Sublinham-se como aspectos importantes na consulta a adopção de uma atitude de respeito, empatia, confiança e genuinidade, assim como o profissional revelar-se alguém com quem é fácil falar, amigável, bom ouvinte, que não assume a atitude de condenar o doente e que cria um espaço para que o doente exponha aquilo que para ele é realmente importante, avaliando as suas verdadeiras necessidades. Em termos de intervenção prática, considera-se importante a compreensão da educação do doente como sendo um processo, e como tal, algo não limitado a um único momento do tempo, e como tendo como um dos seus principais objectivos motivar o doente para a adesão aos conselhos de saúde, através da adopção de uma atitude de colaboração e apoio e não de simples confrontação deste. A perspectiva do empoderamento, não constituindo panaceia para o problema da fraca adesão a tratamentos que implicam alteração de estilos de vida, poderá contribuir para um maior envolvimento do indivíduo no tratamento da insulinoresistência, bem como para melhorar o seu bem-estar. Regra geral, os doentes crónicos, nomeadamente indivíduos que apresentam resistência à insulina, ficam numa situação de total dependência face aos profissionais de saúde e revelam uma completa ausência de poder, o que se acaba por reflectir na fraca adesão ao tratamento. Urge que a acção terapêutica seja tomada tendo por base uma relação de colaboração, de facilitação e de valorização das experiências e recursos do indivíduo. Conclusões Conclusões 133 CONCLUSÕES Helena Cardoso Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo; Hospital Geral de Santo António Na primeira edição do manual dizíamos: é preciso lançar a semente… E falávamos de micro e macro-intervenção. E dizíamos também que o GEIR estava aberto a todos os colegas que connosco quisessem colaborar… Como se pode ver por este manual, aumentou o número de colegas que connosco quis colaborar. E também muita coisa mudou desde então. A nível nacional e internacional. A nível nacional o Plano Nacional de Saúde, que integra 40 programas nacionais entre os quais o Programa Nacional de Prevenção e Controlo das Doenças Cardiovasculares, o Programa Nacional de Controlo da Diabetes, o Programa Nacional de Combate à Obesidade e o Programa Nacional de Intervenção nos Determinantes da Saude Relacionados com o Estilo de Vida, mostra como o Governo e os Médicos pretendem intervir. Também o programa do IX congresso da SPEO – ObeCidade revelou como se percorrem novos e importantes caminhos. A nível internacional, Reaven, o pai da Síndrome X, escreve um artigo com o título: The metabolic syndrome: requiescat in pace. Khan, Buse, Ferrannini e Stern em nome da American Diabetes Association (ADA) e da European Association for the Study of Diabetes (EASD) escrevem um artigo de revisão com o sugestivo título: The metabolic syndrome: time for a critical appraisal. e na mesma revista Edwin Gale escreve o editorial: The myth of the metabolic syndrome. À primeira vista poderá parecer que está tudo a ser posto em causa, que os pais da síndrome a estão a renegar. De modo algum. Se não vejamos o que a análise detalhada destes artigos nos diz: A insulino-resistência não é uma doença, mas a descrição de um estado fisiológico que aumenta as probabilidades de um indivíduo desenvolver uma ou mais das anomalias descritas no quadro 1. Em resultado dessas anomalias ocorrerem com maior frequência nos indivíduos insulino-resistentes, estes têm um risco aumentado de desenvolver as síndromes clínicas descritas no quadro 2. O prin- 134 Manual sobre Insulino-resistência cipal valor do conceito de insulino-resistência é fornecer uma estrutura conceptual que permite colocar um número substancial de ocorrências biológicas, aparentemente não relacionadas, num constructo patofisiológico. O seu principal objectivo não é fornecer um diagnóstico, mas aumentar a compreensão da ocorrência dessas anomalias. Por exemplo, permite distinguir entre o papel relativo da resistência à insulina e da hiperinsulinemia compensadora na origem dessas anomalias. O facto de nem todos os tecidos partilharem o mesmo defeito na acção da insulina, explica o preço pago em resultado do aumento da secreção da insulina, aumento esse necessário para vencer a resistência à insulina localizada principalmente no músculo e tecido adiposo. E esse preço é exactamente o impacto negativo da hiperinsulinemia compensadora nos tecidos que se mantêm insulino-sensíveis como é o caso do ovário. Este conceito de sensibilidade diferencial à insulina é essencial para a compreensão das anomalias e síndromes clínicas associadas à resistência à insulina. No entanto o conceito de insulino-resistência não é desprovido de interesse clínico e explica por exemplo porque é que as mulheres com SOPQ devem ser monitorizadas quanto ao aparecimento de tolerância alterada à glicose. Pelo contrário o valor da noção de síndrome metabólica, não deve ser vista em termos patofisiológicos, mas como uma aproximação pragmática que permita obter melhores resultados clínicos. E é exactamente a utilidade clínica de classificar os indivíduos como portadores ou não da síndrome metabólica, usando os critérios da IDF ou os do ATP III, que está a ser questionada. A síndrome metabólica, como um constructo que denota associação de factores de risco, tem sido um útil paradigma, funcionando como um alerta para os clínicos, levando à procura das outras variáveis quando uma variável de risco é identificada. No entanto e segundo a American Diabetes Association (ADA) e a European Association for the Study of Diabetes (EASD), a síndrome metabólica adquiriu um significado e uma importância superior à que lhe deve ser atribuída à luz dos conhecimentos actuais. A crítica feita é que falta informação importante para que a ciência médica possa considerar útil chamar a atenção para milhões de pessoas a quem vai ser diagnosticada uma presumível doença que neste momento ainda não assenta em terreno firme. Conclusões 135 A ADA e a EASD sugerem uma série de investigações necessárias para fundamentar: – a definição da síndrome; – a importância de cada factor de risco; – o risco relativo de cada combinação de factores de risco; – o uso de limites inferiores e superiores ou o uso de variáveis continuas num sistema de avaliação multivariado, como utilizado na avaliação do risco Framingham / UKPDS. A ADA e a EASD sugerem ainda: – uma análise baseada na evidência avaliando o valor da adição de outros factores de risco cardio-vascular (como a idade, história familiar, PCR, medidas directas da insulino-resistência) à definição da síndrome; – a avaliação do risco cardiovascular com a combinação de fenótipos intermediários, por exemplo alteração da homeostasia da glicose de jejum, triglicerídeos moderadamente elevados, tensão arterial sistólica entre 120 e 140 mmHg com e sem resistência à insulina/hiperinsulinemia, etc.; – uma agenda de investigação agressiva para estudar a causa ou causas subjacentes à associação de factores de risco cardiovascular. São lançados ainda alguns alertas. O diagnóstico da síndrome metabólica em indivíduos diabéticos, pode, ao contrário do que seria de esperar, levar a que o tratamento da diabetes passe para um plano inferior ao do tratamento da síndrome metabólica, fazendo com que passos importantes do tratamento da diabetes sejam esquecidos. Também em doentes que não tenham os critérios suficientes para o diagnóstico da síndrome, por exemplo por só duas anomalias estarem presentes, a ausência da síndrome pode desviar a atenção da avaliação dos factores de risco presentes e do seu tratamento, por exemplo do tratamento de uma dislipidemia ou de uma hipertensão arterial. Daí a recomendação final da American Diabetes Association e da European 136 Manual sobre Insulino-resistência Association for the Study of Diabetes de que: 1. Adultos com qualquer factor de risco major para doença cardiovascular devem ser avaliados quanto à presença de outros factores de risco. 2. Doentes com variáveis de risco cardiovascular acima dos limites do normal devem receber aconselhamento para a modificação do estilo de vida e os com valores indicativos de doença franca devem ser tratados de acordo com os protocolos estabelecidos. 3. Deve ser evitada a rotulação com o termo síndrome metabólica, por poder criar a impressão de que a síndrome metabólica implica um risco superior ao dos seus componentes ou de que é mais grave do que outros factores de risco cardiovascular, ou de que a patofisiologia subjacente é clara. 4. Todos os factores de risco cardiovascular devem ser individual e agressivamente tratados. 5. Até estudos randomizados e controlados terem sido completados, não há tratamento apropriado para a síndrome metabólica, nem deve ser assumido que terapêutica para reduzir a resistência à insulina seja benéfica em doentes com a síndrome metabólica. Pôr questões, pôr em causa o que parecem ser verdades inquestionáveis, é sempre útil, obriga-nos e reflectir, a repensar, faz-nos avançar, ou ainda pensaríamos que o Sol anda à volta da Terra. O que foi posto em causa não foi a associação de factores de risco-cardiovascular, não foi a síndrome da insulino-resistência como estrutura conceptual, mas sim a síndrome metabólica como entidade clínica pelos inconvenientes que poderá implicar, quer levando a uma desvalorização do próprio risco e a uma diminuição da intervenção médica, quer levando a uma atribuição de riscos ainda não devidamente demonstrados. Por isso as recomendações do tratamento dos factores de risco individuais e não o tratmento da síndrome como um todo evitando assim subtratamentos ou tratamentos cuja justificação ainda não está demonstrada. Conclusões 137 Mas independentemente de haver ou não síndrome metabólica há algo que não mais será destruido – a sensibilização dos médicos para a associação de factores de risco e para a prevenção e intervenção precoce. E como diziamos na 1.ª edição – nós médicos temos a obrigação de prevenir, educar, mostrar as atitudes a tomar e as razões para o fazer. Para sermos eficazes nas nossas prescrições e levarmos a mudanças de comportamentos, temos de explicar os motivos, falar dos trabalhos que levaram a certas conclusões e daí a derterminadas prescrições. Tentar com um imenso esforço impedir os estragos que todo um estilo de vida da sociedade actual provoca é tarefa muito dura. É um trabalho árduo e inglório. Tratar as sequelas desta síndrome, os pós-enfartes, as sequelas dos acidentes vasculares cerebrais é desgastante. É a chamada micro-intervenção. Não podemos porém esquecer que só macro-inervenções poderão melhorar este estado de coisas. Devemos pois sentirmo-nos mais próximos do poder e tentar intervir no sentido de levar a medidas globais que tenham como objectivo mudar o estilo de vida actual. E assim, sempre que qualquer um de nós possa intervir, tem a obrigação moral e social de o fazer. O GEIR continua aberto a todos os colegas que connosco queiram colaborar… 138 Manual sobre Insulino-resistência Quadro 1 – Anormalidades associadas à insulino-resistência e à hiperinsulinemia compensadora Algum grau de intolerância à glicose Alteração da homeostasia da glicose de jejum Tolerância alterada à glicose Dislipidemia > Triglicerídeos < Colesterol HDL Partículas LDL pequenas e densas > Pós-prandeal de lipoproteínas ricas em triglicerídeos Disfunção endotelial > Adesão das células mononucleares > Concentração plasmática das moléculas de adesão celular > Concentração plasmática da dimetilarginina assimétrica <Vasodilatação dependente do endotélio Factores pró-coagulantes >PAI-1 >Fibrinogénio Alterações hemodinâmicas >Actividade do sistema nervoso simpático >Retenção renal de sódio Marcadores de inflamação >Proteína C-reactiva, leucócitos, etc. Metabolismo anormal do ácido úrico >Concentração de ácido úrico plasmático Aumento da secreção de testosterona pelo ovário Alterações da respiração relacionadas com o sono Quadro 2 – Síndromes clínicas associadas à insulino-resistência Diabetes mellitus tipo 2 Doença cardiovascular Hipertensão essencial Síndrome do ovário poliquístico Doença hepática não-alcoólica Certas formas de cancro Apneia do sono Índice bibliográfico Índice bibliográfico 141 ÍNDICE BIBLIOGRÁFICO INSULINO-RESISTÊNCIA. 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Anexos 156 Manual sobre Insulino-resistência ANEXO 1 IMC (kg/m2) 32 31,5 31 obesidade 30,5 P95 30 29,5 29 28,5 28 27,5 excesso de peso 27 26,5 26 25,5 P85 25 24,5 24 23,5 23 22,5 22 21,5 21 20,5 20 normal 19,5 19 18,5 18 17,5 17 16,5 16 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 Idade (anos) correspondente ao IMC 30 de adulto correspondente ao IMC 25 de adulto A. Índice de Massa Corporal em função da idade: sexo feminino (adaptado de Cole et al., Establishing a standard definition for child overweight and obesity worldwide – BMJ 2000; 320: 1240-3) Anexos IMC (kg/m2) 32 31,5 31 obesidade 30,5 P95 30 29,5 29 28,5 28 27,5 27 26,5 excesso de peso 26 25,5 P85 25 24,5 24 23,5 23 22,5 22 21,5 21 20,5 20 normal 19,5 19 18,5 18 17,5 17 16,5 16 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 Idade (anos) correspondente ao IMC 30 de adulto correspondente ao IMC 25 de adulto B. Índice de Massa Corporal em função da idade: sexo masculino (adaptado de Cole et al., Establishing a standard definition for child overweight and obesity worldwide – BMJ 2000; 320: 1240-3) 157 158 Manual sobre Insulino-resistência ANEXO 2 A. COLESTEROL TOTAL (mg/dl), níveis sericos em crianças e adolescentes Percentis 5 10 25 50 75 90 95 0–4 117 129 141 156 176 192 209 5–9 125 134 147 164 180 197 209 10 – 14 123 131 144 160 178 196 208 15 – 19 116 124 136 150 170 188 203 0–4 115 124 143 161 177 195 206 5–9 130 138 150 168 184 201 211 10 – 14 128 135 148 163 179 196 207 15 – 19 124 131 144 160 177 197 209 Idade (anos) Sexo Masculino Sexo Feminino B. HDL – COLESTEROL (mg/dl), níveis sericos em crianças e adolescentes Percentis 5 10 25 50 75 90 95 Idade (anos) Sexo Masculino 5–9 39 43 50 56 65 72 76 10 – 14 38 41 47 57 63 73 76 15 – 19 31 35 40 47 54 61 65 Sexo Feminino 5–9 37 39 48 54 63 69 75 10 – 14 38 41 46 54 60 66 72 15 – 19 36 39 44 53 63 70 76 Fonte: Blood Cholesterol Levels in Children and Adolescents. Pediatrics, vol. 89, n.º3, 1992. Anexos 159 C. LDL – COLESTEROL (mg/dl), níveis sericos em crianças e adolescentes Percentis 5 10 25 50 75 90 95 Idade (anos) Sexo Masculino 5–9 65 71 82 93 106 121 133 10 – 14 66 74 83 97 112 126 136 15 – 19 64 70 82 96 112 127 134 Sexo Feminino 5–9 70 75 91 101 118 129 144 10 – 14 70 75 83 97 113 130 140 15 – 19 61 76 80 96 114 133 141 D. TRIGLICÉRIDOS (mg/dl), níveis sericos em crianças e adolescentes Percentis 5 10 25 50 75 90 95 0–4 30 34 41 53 69 87 102 5–9 31 34 41 53 67 88 104 10 – 14 33 38 46 61 80 105 129 15 – 19 38 44 56 71 94 124 152 0–4 35 39 46 61 79 99 115 5–9 33 37 45 57 73 93 108 10 – 14 38 45 56 72 93 117 135 15 – 19 40 45 55 70 90 117 136 Idade (anos) Sexo Masculino Sexo Feminino Fonte: Blood Cholesterol Levels in Children and Adolescents. Pediatrics, vol. 89, n.º3, 1992. 160 Manual sobre Insulino-resistência ANEXO 3 A. BLOOD PRESSURE LEVELS FOR BOYS BY AGE AND HEIGHT PERCENTILE* Age BP Systolic BP (mmHg) Diastolic BP (mmHg) (year) Percentil ← Percentil of Height → ← Percentil of Height → 5th 10th 25th 50th 75th 90th 95th 5th 10th 25th 50th 75th 90th 95th 1 50th 80 81 83 85 87 89 34 35 36 37 38 39 39 90th 94 95 97 99 100 102 103 49 50 51 52 53 53 54 95th 98 99 101 103 104 106 106 54 54 55 56 57 58 58 99th 105 106 108 110 112 113 114 61 62 63 64 65 66 66 50th 84 85 87 92 39 40 41 42 43 44 44 90th 97 99 100 102 104 105 106 54 55 56 57 58 58 59 95th 101 102 104 106 108 109 110 59 59 60 61 62 63 63 99th 109 110 111 113 115 117 117 66 67 68 69 70 71 71 50th 86 95 44 44 45 46 47 48 48 90th 100 101 103 105 107 108 109 59 59 60 61 62 63 63 95th 104 105 107 109 110 112 113 63 63 64 65 66 67 67 99th 111 112 114 116 118 119 120 71 71 72 73 74 75 75 50th 88 97 47 48 49 50 51 51 52 90th 102 103 105 107 109 110 111 62 63 64 65 66 66 67 95th 106 107 109 111 112 114 115 66 67 68 69 70 71 71 99th 113 114 116 118 120 121 122 74 75 76 77 78 78 79 50th 90 98 50 51 52 53 54 55 55 90th 104 105 106 108 110 111 112 65 66 67 68 69 69 70 95th 108 109 110 112 114 115 116 69 70 71 72 73 74 74 99th 115 116 118 120 121 123 123 77 78 79 80 81 81 82 50th 91 100 53 53 54 55 56 57 57 90th 105 106 108 110 111 113 113 68 68 69 70 71 72 72 95th 109 110 112 114 115 117 117 72 72 73 74 75 76 76 99th 116 117 119 121 123 124 125 80 80 81 82 83 84 84 50th 92 100 101 55 55 56 57 58 59 59 90th 106 107 109 111 113 114 115 70 70 71 72 73 74 74 95th 110 111 113 115 117 118 119 74 74 75 76 77 78 78 99th 117 118 120 122 124 125 126 82 82 83 84 85 86 86 50th 94 100 102 102 56 57 58 59 60 60 61 90th 107 109 110 112 114 115 116 71 72 72 73 74 75 76 95th 111 112 114 116 118 119 120 75 76 77 78 79 79 80 99th 119 120 122 123 125 127 127 83 84 85 86 87 87 88 50th 95 100 102 103 104 57 58 59 60 61 61 62 90th 109 110 112 114 115 117 118 72 73 74 75 76 76 77 95th 113 114 116 118 119 121 121 76 77 78 79 80 81 81 99th 120 121 123 125 127 128 129 84 85 86 87 88 88 89 50th 97 100 102 103 105 106 58 59 60 61 61 62 63 90th 111 112 114 115 117 119 119 73 73 74 75 76 77 78 95th 115 116 117 119 121 122 123 77 78 79 80 81 81 82 99th 122 123 125 127 128 130 130 85 86 86 88 88 89 90 ↓ 2 3 4 5 6 7 8 9 10 87 89 91 92 94 95 96 98 89 91 93 94 95 97 98 88 91 93 95 96 97 99 90 93 95 96 98 99 88 92 94 96 98 99 Anexos 161 (continued) Age BP Systolic BP (mmHg) Diastolic BP (mmHg) (year) Percentil ← Percentil of Height → ← Percentil of Height → 5th 10th 25th 50th 75th 90th 95th 5th 10th 25th 50th 75th 90th 95th 11 50th 99 100 102 104 105 107 107 59 59 60 61 62 63 63 90th 113 114 115 117 119 120 121 74 74 75 76 77 78 78 95th 117 118 119 121 123 124 125 78 78 79 80 81 82 82 99th 124 125 127 129 130 132 132 86 86 87 88 89 90 90 50th 101 102 104 106 108 109 110 59 60 61 62 63 63 64 90th 115 116 118 120 121 123 123 74 75 75 76 77 78 79 95th 119 120 122 123 125 127 127 78 79 80 81 82 82 83 99th 126 127 129 131 133 134 135 86 87 88 89 90 90 91 50th 104 105 106 108 110 111 112 60 60 61 62 63 64 64 90th 117 118 120 122 124 125 126 75 75 76 77 78 79 79 95th 121 122 124 126 128 129 130 79 79 80 81 82 83 83 99th 128 130 131 133 135 136 137 87 87 88 89 90 91 91 50th 106 107 109 111 113 114 115 60 61 62 63 64 65 65 90th 120 121 123 125 126 128 128 75 76 77 78 79 79 80 95th 124 125 127 128 130 132 132 80 80 81 82 83 84 84 99th 131 132 134 136 138 139 140 87 88 89 90 91 92 92 50th 109 110 112 113 115 117 117 61 62 63 64 65 66 66 90th 122 124 125 127 129 130 131 76 77 78 79 80 80 81 95th 126 127 129 131 133 134 135 81 81 82 83 84 85 85 99th 134 135 136 138 140 142 142 88 89 90 91 92 93 93 50th 111 112 114 116 118 119 120 63 63 64 65 66 67 67 90th 125 126 128 130 131 133 134 78 78 79 80 81 82 82 95th 129 130 132 134 135 137 137 82 83 83 84 85 86 87 99th 136 137 139 141 143 144 145 90 90 91 92 93 94 94 50th 114 115 116 118 120 121 122 65 66 66 67 68 69 70 90th 127 128 130 132 134 135 136 80 80 81 82 83 84 84 95th 131 132 134 136 138 139 140 84 85 86 87 87 88 89 99th 139 140 141 143 145 146 147 92 93 93 94 95 96 97 ↓ 12 13 14 15 16 17 BP, blood pressure * The 90th percentile is 1.28 SD, 95th percentile is 1.645 SD, and the 99th percentile is 2.326 SD over the mean. For research purposes, the standard deviations in appendix table B–1 allow one to compute BP Z-scores and percentiles for boys with height percentiles given in table 3 (i.e., the 5th, 10th, 25th, 50th, 75th, 90th, and 95th percentiles). These height percentiles must be converted to height Z-scores given by (5% = -1.645; 10% = -1.28; 25% = -0.68; 50% = 0; 75% = 0.68; 90% = 1.28; 95% = 1.645) and then computed according to the methodology in steps 2–4 described in appendix B. For children with height percentiles other than these, follow steps 1–4 as described in appendix B. Fonte: 4th Report on the Diagnosis, Evaluation, and Treatment of High Blood Pressure in Children and Adolescents (National Heart, Lung and Blood Institute: May 2004). 162 Manual sobre Insulino-resistência B. BLOOD PRESSURE LEVELS FOR GIRLS BY AGE AND HEIGHT PERCENTILE* Age BP Systolic BP (mmHg) Diastolic BP (mmHg) (year) Percentil ← Percentil of Height → ← Percentil of Height → 5th 10th 25th 50th 75th 90th 95th 5th 10th 25th 50th 75th 90th 95th 1 50th 83 84 85 86 90 38 39 39 40 41 41 42 90th 97 97 98 100 101 102 103 52 53 53 54 55 55 56 95th 100 101 102 104 105 106 107 56 57 57 58 59 59 60 99th 108 108 109 111 112 113 114 64 64 65 65 66 67 67 50th 85 85 87 91 43 44 44 45 46 46 47 90th 98 99 100 101 103 104 105 57 58 58 59 60 61 61 95th 102 103 104 105 107 108 109 61 62 62 63 64 65 65 99th 109 110 111 112 114 115 116 69 69 70 70 71 72 72 50th 86 93 47 48 48 49 50 50 51 90th 100 100 102 103 104 106 106 61 62 62 63 64 64 65 95th 104 104 105 107 108 109 110 65 66 66 67 68 68 69 99th 111 111 113 114 115 116 117 73 73 74 74 75 76 76 50th 88 94 50 50 51 52 52 53 54 90th 101 102 103 104 106 107 108 64 64 65 66 67 67 68 95th 105 106 107 108 110 111 112 68 68 69 70 71 71 72 99th 112 113 114 115 117 118 119 76 76 76 77 78 79 79 50th 89 96 52 53 53 54 55 55 56 90th 103 103 105 106 107 109 109 66 67 67 68 69 69 70 95th 107 107 108 110 111 112 113 70 71 71 72 73 73 74 99th 114 114 116 117 118 120 120 78 78 79 79 80 81 81 50th 91 98 54 54 55 56 56 57 58 90th 104 105 106 108 109 110 111 68 68 69 70 70 71 72 95th 108 109 110 111 113 114 115 72 72 73 74 74 75 76 99th 115 116 117 119 120 121 122 80 80 80 81 82 83 83 50th 93 99 55 56 56 57 58 58 59 90th 106 107 108 109 111 112 113 69 70 70 71 72 72 73 95th 110 111 112 113 115 116 116 73 74 74 75 76 76 77 99th 117 118 119 120 122 123 124 81 81 82 82 83 84 84 50th 95 100 101 57 57 57 58 59 60 60 90th 108 109 110 111 113 114 114 71 71 71 72 73 74 74 95th 112 112 114 115 116 118 118 75 75 75 76 77 78 78 99th 119 120 121 122 123 125 125 82 82 83 83 84 85 86 50th 96 100 101 102 103 58 58 58 59 60 61 61 90th 110 110 112 113 114 116 116 72 72 72 73 74 75 75 95th 114 114 115 117 118 119 120 76 76 76 77 78 79 79 99th 121 121 123 124 125 127 127 83 83 84 84 85 86 87 50th 98 100 102 103 104 105 59 59 59 60 61 62 62 90th 112 112 114 115 116 118 118 73 73 73 74 75 76 76 95th 116 116 117 119 120 121 122 77 77 77 78 79 80 80 99th 123 123 125 126 127 129 129 84 84 85 86 86 87 88 ↓ 2 3 4 5 6 7 8 9 10 87 88 90 92 93 95 97 99 88 90 91 93 95 96 98 88 89 91 93 94 96 98 88 89 91 92 94 96 97 99 89 91 92 94 95 97 99 Anexos 163 (continued) Age BP Systolic BP (mmHg) Diastolic BP (mmHg) (year) Percentil ← Percentil of Height → ← Percentil of Height → ↓ 5th 10th 25th 50th 75th 90th 95th 5th 10th 25th 50th 75th 90th 95th 11 50th 100 101 102 103 105 106 107 60 60 60 61 62 63 63 90th 114 114 116 117 118 119 120 74 74 74 75 76 77 77 95th 118 118 119 121 122 123 124 78 78 78 79 80 81 81 99th 125 125 126 128 129 130 131 85 85 86 87 87 88 89 50th 102 103 104 105 107 108 109 61 61 61 62 63 64 64 90th 116 116 117 119 120 121 122 75 75 75 76 77 78 78 95th 119 120 121 123 124 125 126 79 79 79 80 81 82 82 99th 127 127 128 130 131 132 133 86 86 87 88 88 89 90 50th 104 105 106 107 109 110 110 62 62 62 63 64 65 65 90th 117 118 119 121 122 123 124 76 76 76 77 78 79 79 95th 121 122 123 124 126 127 128 80 80 80 81 82 83 83 99th 128 129 130 132 133 134 135 87 87 88 89 89 90 91 50th 106 106 107 109 110 111 112 63 63 63 64 65 66 66 90th 119 120 121 122 124 125 125 77 77 77 78 79 80 80 95th 123 123 125 126 127 129 129 81 81 81 82 83 84 84 99th 130 131 132 133 135 136 136 88 88 89 90 90 91 92 50th 107 108 109 110 111 113 113 64 64 64 65 66 67 67 90th 120 121 122 123 125 126 127 78 78 78 79 80 81 81 95th 124 125 126 127 129 130 131 82 82 82 83 84 85 85 99th 131 132 133 134 136 137 138 89 89 90 91 91 92 93 50th 108 108 110 111 112 114 114 64 64 65 66 66 67 68 90th 121 122 123 124 126 127 128 78 78 79 80 81 81 82 95th 125 126 127 128 130 131 132 82 82 83 84 85 85 86 99th 132 133 134 135 137 138 139 90 90 90 91 92 93 93 50th 108 109 110 111 113 114 115 64 65 65 66 67 67 68 90th 122 122 123 125 126 127 128 78 79 79 80 81 81 82 95th 125 126 127 129 130 131 132 82 83 83 84 85 85 86 99th 133 133 134 136 137 138 139 90 90 91 91 92 93 93 12 13 14 15 16 17 BP, blood pressure * The 90th percentile is 1.28 SD, 95th percentile is 1.645 SD, and the 99th percentile is 2.326 SD over the mean. For research purposes, the standard deviations in appendix table B–1 allow one to compute BP Z-scores and percentiles for girls with height percentiles given in table 4 (i.e., the 5th, 10th, 25th, 50th, 75th, 90th, and 95th percentiles). These height percentiles must be converted to height Z-scores given by (5% = -1.645; 10% = -1.28; 25% = -0.68; 50% = 0; 75% = 0.68; 90% = 1.28; 95% = 1.645) and then computed according to the methodology in steps 2–4 described in appendix B. For children with height percentiles other than these, follow steps 1–4 as described in appendix B. Fonte: 4th Report on the Diagnosis, Evaluation, and Treatment of High Blood Pressure in Children and Adolescents (National Heart, Lung and Blood Institute: May 2004). Um serviço: