parentalidade - Editora Champagnat
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parentalidade - Editora Champagnat
Planejamento da PARENTALIDADE no contexto da bioética Busca de uma nova abordagem para pesquisa Mário Antonio Sanches • Juares Celso Krum • Miguel Fernando Rigoni Edésia de Sousa Sato • Renato Barbosa dos Santos Planejamento da PARENTALIDADE no contexto da bioética Busca de uma nova abordagem para pesquisa Mário Antonio Sanches Juares Celso Krum Miguel Fernando Rigoni Edésia de Sousa Sato Renato Barbosa dos Santos Curitiba 2015 © 2015, Mário Antonio Sanches e outros 2015, PUCPRess Este livro, na totalidade ou em parte, não pode ser reproduzido por qualquer meio sem autorização expressa por escrito do Editor. Conselho Editorial Alceu Souza, Eduardo Biacchi Gomes, Elisangela, Ferretti Manffra, Elizabeth Carvalho Veiga, Lorete Maria da Silva Kotze, Lúcia Teresinha Peixe Maziero, Mônica Panis Kaseker, Ruy Inacio Neiva de Carvalho, Sergio Rogério Azevedo Junqueira Editora Universitária Champagnat Direção: Ana Maria de Barros Editora-chefe: Rosane de Mello Santo Nicola Editor de arte: Felipe Machado de Souza Projeto gráfico: Janete Bomy Yun Capa e diagramação: Guilherme Fontana Simões Preparação de texto e revisão de normas: Debora Carvalho Capella Avaliadores consultivos: Prof. Dr. Francisco Javier de La Torre Díaz – U.P. Comillas/Madrid Prof. Dr. Luiz Dietrich – PPGT/UCPR Prof. Dr. Marcio Luiz Fernandes – PPGT/UCPR Prof. Dr. Mário Antonio Sanches – PPGT/UCPR Prof. Dr. Waldir Souza – PPGT/UCPR Prof.ª Dr.ª Clélia Peretti – PPGT/UCPR Prof.ª Dr.ª Maria Del Carmen Massé Garcia – U.P. Comillas/Madrid Prof.ª Dr.ª Solena Ziemer Kuzma – Curso de Medicina – PUCPR Editora Universitária Champagnat Rua Imaculada Conceição, 1155 - Prédio da Administração - 6º andar Câmpus Curitiba - CEP 80215-901 - Curitiba-PR Tel. (41) 3271-1701 [email protected] | www.editorachampagnat.pucpr.br P712 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética : busca de uma nova abordagem para pesquisa / Mário Antonio Sanches... [et al.]. – Curitiba : PUCPRess, 2015. 301 p. ; 21 cm. Vários autores. Inclui referências. ISBN 978-85-68324-11-0 1. Bioética. 2. Análise fatorial. 3. Planejamento familiar. I. Sanches, Mario Antonio. II. Título. CDD 174.9574 Lista de gráficos Gráfico 1 - Instituição em que atua 117 Gráfico 2 - Áreas de formação acadêmica: graduação 117 Gráfico 3 - Áreas de formação acadêmica: pós-graduação 118 Gráfico 4 - Descritor 1 - Identificação de gênero 121 Gráfico 5 - Descritor 2 - Número de filhos consanguíneos/adotivos/por reprodução assistida/gravidezes múltiplas 122 Gráfico 6 - Descritor 3 - Religião: pertença/ grau de participação 124 Gráfico 7 - Descritor 4 - Estado civil na gravidez do primeiro/último filho 125 Gráfico 8 - Descritor 5 - Escolaridade na gravidez do primeiro/último filho 126 Gráfico 9 - Descritor 6 - Idade em que a pessoa teve o primeiro/último filho 127 Gráfico 10 - Descritor 7 - Identificação da renda familiar na gravidez do primeiro/último filho 129 Gráfico 11 - Descritor 8 - Identificação da situação de emprego na gravidez do primeiro/ último filho 130 Gráfico 12 - Descritor 9 - A gravidez do primeiro/último filho fora planejada – houve clara decisão de ter o filho antes de engravidar 131 Gráfico 13 - Descritor 10 - Os riscos relacionados com a maternidade foram avaliados antes da gravidez do primeiro/ último filho 134 Gráfico 14 - Descritor 11 - As condições para cuidar dos filhos foram avaliadas antes da gravidez do primeiro/último filho 136 Gráfico 15 - Descritor 12 - O anúncio da gravidez se deu num clima de aceitação e alegria na gravidez do primeiro/último filho 137 Gráfico 16 - Descritor 13 - O(a) parceiro(a) acolheu a criança na gravidez do primeiro/último filho 143 Gráfico 17 - Descritor 14 - O cuidado do primeiro/ último filho se tornou preocupação 144 Gráfico 18 - Descritor 15 - A possibilidade de um aborto fora descartada na gravidez do primeiro/ último filho 146 Gráfico 19 - Descritor 16 - A gravidez do primeiro/último filho foi mal acolhida, mas hoje o(a) parceiro(a) acolhe a criança muito bem 147 Gráfico 20 - Descritor 17 - A gravidez do primeiro/último filho foi bem recebida, mas o(a) parceiro(a) não se preocupa mais com a criança 149 Gráfico 21 - Descritor 18 - Ocorrência de aborto no núcleo familiar 150 Gráfico 22 - Descritor 19 - A decisão de engravidar do primeiro/último filho foi compartilhada pelo(a) parceiro(a) 152 Gráfico 23 - Descritor 20 - Ocorrência de ajuda profissional para conseguir engravidar do primeiro/ último filho 153 Gráfico 24 - Descritor 21 - Com quem a pessoa morava quando soube da gravidez do primeiro/ último filho 154 Gráfico 25 - Descritor 22 - Um dos parceiros não queria o primeiro/último filho por já ter filho de outro relacionamento 157 Gráfico 26 - Descritor 23 - A pessoa assumiu a gravidez do primeiro/último filho sozinha 158 Gráfico 27 - Descritor 24 - Apoio da família do(a) respondente à gravidez do primeiro/ último filho 159 Gráfico 28 - Descritor 25 - Influência da atividade profissional da mulher na decisão de engravidar mais tarde (adiar a primeira gravidez) 161 Gráfico 29 - Descritor 26 - Influências de terceiros (familiares, religiosos, profissionais de saúde) na decisão de ter filhos 162 Gráfico 30 - Descritor 27 - Participação da pessoa na tomada de decisão na hora de conflito (aborto, doenças, doar o filho) 167 Gráfico 31 - Descritor 28 - Cuidado pessoal com os filhos: acompanhamento na escola/responsabilidade financeira/tempo investido com os filhos/ acompanhamento religioso 168 Gráfico 32 - Descritor 29 - Decisão de a mulher engravidar relacionada com sua idade (evitar gravidez de risco) 169 Gráfico 33 - Descritor 30 - Uso de contraceptivo antes da gravidez do primeiro/último filho 172 Gráfico 34 - Descritor 31 - Ocorrência de separação do casal devido às dificuldades para ter filho 174 Gráfico 35 - Descritor 32 - Decisão de não ter filho em virtude da possibilidade de ter um filho doente 176 Gráfico 36 - Descritor 33 - Realização pessoal/ alegria em ter o filho 177 Gráfico 37 - Descritor 34 - Vínculo afetivo materno/ paterno do entrevistado Gráfico 38 - Descritor 35 - Onde recebeu informações sobre sexualidade: família/escola/ comunidade religiosa Gráfico 39 - Descritor 36 - Prática sexual influenciada/ adiada por possibilidade de engravidar Gráfico 40 - Descritor 37 - Prática sexual influenciada/ adiada por possibilidade de adquirir doença Gráfico 41 - Descritor 38 - Idade de início de sua atividade sexual Gráfico 42 - Descritor 39 - Motivações para praticar o ato sexual (realização pessoal/pertença ao grupo/afirmação da identidade) Gráfico 43 - Descritor 40 - Ocorrência de abusos sexuais de criança na família Gráfico 44 - Descritor 41 - Influência da religião na escolha ou não de método contraceptivo Gráfico 45 - Descritor 42 - Para o entrevistado, a sexualidade está vinculada aos seguintes pontos: naturalidade/ espiritualidade/promiscuidade Gráfico 46 - Descritor 43 - Os filhos são compreendidos como sinais da bênção de Deus Gráfico 47 - Descritor 44 - Identificar se o uso de preservativos induz à promiscuidade Gráfico 48 - Descritor 45 - Filho como projeto do casamento ou relacionamento Gráfico 49 - Descritor 46 - Ausência de um dos pais na vida do primeiro/último filho Gráfico 50 - Descritor 47 - Participação da mulher em algum serviço de saúde tido como de planejamento familiar na gravidez do primeiro/último filho 178 180 181 184 185 189 192 193 195 196 197 198 199 200 Gráfico 51 - Descritor 48 - Participação da mulher em serviço pré-natal na gravidez do primeiro/ último filho Gráfico 52 - Descritor 49 - Gravidez do primeiro/último filho com o objetivo de melhorar o relacionamento com o parceiro Gráfico 53 - Descritor 50 - Gravidez do primeiro/ último filho com o objetivo de melhorar a situação social ou econômica Gráfico 54 - Descritor 51 - Separação do casal devido às dificuldades em cuidar do filho Gráfico 55 - Descritor 52 - Incentivo de acesso aos serviços de saúde pela família/escola/ comunidade religiosa Gráfico 56 - Descritor 53 - Ocorrência de violência contra a criança Gráfico 57 - Descritor 54 - Filho considerado um peso/ uma sobrecarga Gráfico 58 - Descritor 55 - Morte na família relacionada ao parto Gráfico 59 - Descritor 56 - Morte de criança (antes dos 5 anos) na família Gráfico 60 - Descritor 57 - Dificuldade de a mulher adquirir um emprego por ter filhos Gráfico 61 - Descritor 58 - Identificação de quem exerce a chefia da família 201 202 203 204 206 207 208 209 211 212 213 LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Descritor 1 - Identificação de gênero Tabela 2 - Descritor 2 - A - Número de filhos Tabela 3 - Descritor 3 - Religião Tabela 4 - Descritor 4 - Participação religiosa Tabela 5 - Descritor 5 - Estado civil na gravidez do primeiro filho Tabela 6 - Descritor 6 - Estado civil na gravidez do último filho Tabela 7 - Descritor 7 - Escolaridade na gravidez do primeiro filho Tabela 8 - Descritor 8 - Escolaridade na gravidez do último filho Tabela 9 - Descritor 9 - Com que idade você iniciou um relacionamento sexual Tabela 10 - Descritor 10 - Idade em que você teve a primeira gravidez/ou engravidou alguém pela primeira vez Tabela 11 - Descritor 11 - Sua situação na gravidez do primeiro filho Tabela 12 - Descritor 12 - Sua situação na gravidez do último filho Tabela 13 - Descritor 13 - Com quem você morava quando soube da gravidez do primeiro filho? 219 219 221 222 223 223 225 225 227 228 230 230 232 Tabela 14 - Descritor 14 - Com quem você morava quando soube da gravidez do último filho? 232 Tabela 15 - Descritor 15 - A influência mais significativa na decisão de ter filhos foi 234 Tabela 16 - Descritor 15 - A influência mais significativa na decisão de ter filhos foi 235 Tabela 17 - Descritor 17 - Quem exerce a chefia da família em sua casa 237 Tabela 18 - Descritor 18 - Houve planejamento na gravidez de seu primeiro filho 238 Tabela 19 - Descritor 19 - Houve planejamento na gravidez de seu último filho 238 Tabela 20 - Descritor 20 - Os riscos relacionados à maternidade/paternidade foram avaliados antes da gravidez do primeiro filho 239 Tabela 21 - Descritor 21 - Os riscos relacionados à maternidade/paternidade foram avaliados antes da gravidez do último filho 240 Tabela 22 - Descritor 22 - As condições (econômicas...) para cuidar do bebê foram avaliadas antes da gravidez do primeiro filho 242 Tabela 23 - Descritor 23 - As condições (econômicas...) para cuidar do bebê foram avaliadas antes da gravidez do último filho 242 Tabela 24 - Descritor 24 - O anúncio da gravidez de seu primeiro filho se deu num clima de alegria 244 Tabela 25 - Descritor 25 - O anúncio da gravidez do teu último filho se deu num clima de alegria 244 Tabela 26 - Descritor 26 - Chegou-se a desejar, em algum momento, o aborto do primeiro filho 246 Tabela 27 - Descritor 26 - Chegou-se a desejar, em algum momento, o aborto do primeiro filho 246 Tabela 28 - Descritor 28 - A gravidez do primeiro filho foi um projeto de casal. Decisão dos dois Tabela 29 - Descritor 29 - A gravidez do último filho foi um projeto de casal. Decisão dos dois Tabela 30 - Descritor 30 - A família ajudou na decisão de aceitar a gravidez do primeiro filho Tabela 31 - Descritor 31 - A família ajudou na decisão de aceitar a gravidez do último filho Tabela 32 - Descritor 32 - A atividade profissional da mulher influenciou na decisão de engravidar mais tarde Tabela 33 - Descritor 33 - A possibilidade de adquirir doença alterou sua prática sexual Tabela 34 - Descritor 34 - A religião lhe influenciou na escolha do método contraceptivo Tabela 35 - Descritor 35 - Você compreende os filhos como sinais da bênção de Deus Tabela 36 - Descritor 36 - O uso de preservativos lhe incentivou a ter relacionamento sexual com outra pessoa, além do parceiro Tabela 37 - Descritor 37 - Para você, qual a relação entre casamento e ter filhos? Tabela 38 - Descritor 38 - Você teve o acesso desejado ao serviço pré-natal na gravidez do primeiro filho Tabela 39 - Descritor 39 - Você teve o acesso desejado ao serviço pré-natal na gravidez do último filho Tabela 40 - Descritor 40 - A gravidez do primeiro filho ocorreu para melhorar o relacionamento do casal Tabela 41 - Descritor 41 - A gravidez do último filho ocorreu para melhorar o relacionamento do casal 247 248 249 249 251 252 253 254 255 256 256 257 258 259 Tabela 42 - Descritor 42 - A gravidez do primeiro filho ocorreu para melhorar a situação econômica Tabela 43 - Descritor 43 - A gravidez do último filho ocorreu para melhorar a situação econômica Tabela 44 - Descritor 44 - Ocorreu alguma dificuldade para conseguir emprego por ter filho Tabela 45 - Descritor 45 - Você participou de algum serviço de planejamento familiar antes de engravidar? Tabela 46 - Descritor 46 - Um dos parceiros não queria filho por já ter filho de outro relacionamento? Tabela 47 - Descritor 47 - Você já assumiu um filho(a) sozinho(a) Tabela 48 - Descritor 48 - Se a resposta da pergunta 47 for sim Tabela 49 - Descritor 49 - Você já se separou em virtude das dificuldades em ter filho? Tabela 50 - Descritor 50 - Você já decidiu não ter filho em virtude da possibilidade de ter um filho doente? Tabela 51 - Descritor 51 - Se a resposta da pergunta 50 for sim: Motivo: Tabela 52 - Descritor 49 - Você já se separou em virtude das dificuldades em ter filho? Tabela 53 - Descritor 53 - Houve ocorrência de morte de criança (antes de 5 anos) na família? 260 260 261 263 263 264 265 266 267 267 268 269 Sumário PREFÁCIO 19 APRESENTAÇÃO 23 INTRODUÇÃO 25 PARTE I Fatores que Impactam no Planejamento da Parentalidade 31 1 Parentalidade e modelos de família 1.1 Alterações no modelo de ser pai e ser mãe 1.2 Alterações no modelo de família 1.3 As famílias monoparentais 1.4 As famílias em segunda união 1.5 As famílias mosaico 33 34 44 49 51 52 2 Parentalidade e sexualidade 2.1 Sexualidade e reprodução 2.2 Tendências brasileiras na prática da sexualidade 2.3 Sexualidade integrada 55 56 59 61 3 Parentalidade e questões sociais 3.1 Saúde da mulher e gênero 3.2 Educação e cuidados em saúde 63 64 66 3.3 Parentalidade e violência 3.4 Contracepção e aborto 4 Parentalidade e religião 4.1 Parentalidade no Ocidente: religião ou cultura? 4.2 Abraão, o pai 4.3 Judaísmo e parentalidade 4.4 Cristianismo e parentalidade 4.5 Islamismo e parentalidade 69 73 77 78 80 84 87 94 PARTE 2 Relatório de Validação de Instrumento de Pesquisa 99 5 Contexto do projeto de pesquisa 5.1 Aspectos históricos, processos e atores da pesquisa 5.2 Contexto temático do projeto 5.3 Objetivos 5.4 Etapas da pesquisa realizada 101 6 Relatório da técnica de grupo nominal 113 7 Resultado da técnica de grupo nominal: definição dos descritores 7.1 Descritores de identificação 7.2 Descritores sobre projeto de parentalidade 7.3 Descritores que indicam modelo de família 7.4 Descritores relacionados com a visão de sexualidade 7.5 Descritores relacionados com religião 102 105 107 108 119 120 130 150 170 192 7.6 Descritores relacionados com questão social 198 8 Projeto piloto 8.1 Aplicação do instrumento da pesquisa 8.2 Resultados do projeto piloto 215 215 217 CONSIDERAÇÕES FINAIS REFERÊNCIAS APÊNDICE A - Instrumento de pesquisa validado APÊNDICE B - Quadro sinótico da pesquisa realizada SOBRE OS AUTORES 271 275 285 294 299 Prefácio Durante os meses de março a junho de 2011, a Cátedra de Bioética da Universidade Pontifícia Comillas de Madrid foi honrada com a presença de Dr. Mario Antônio Sanches. O objetivo fundamental de sua estadia em solo espanhol foi a pesquisa e o estudo aprofundado de um tema que, desde seu início até os dias atuais, tem preocupado nossa instituição: avaliação ética dos processos reprodutivos, desde a reprodução assistida até o planejamento familiar. O livro que temos o prazer de apresentar é o resultado de pesquisas, estudos e projetos que surgiram nos últimos três anos e que tivemos a oportunidade de ajudar a avaliar e aprimorar com nossa visita à Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), em 2013. Nele, os autores e o grupo de pesquisa envolvido realizaram ampla abordagem das questões envolvidas no projeto de parentalidade dos casais, propondo novas pistas para reflexão. Temas como sexualidade, modelos de família, questões sociais e religião são desenvolvidos considerando-se a compreensão interdisciplinar inerente à reprodução humana. Com base na complexa Planejamento da parentalidade no contexto da bioética realidade parental atual, os autores propõem um novo instrumento de pesquisa capaz de mapear o perfil de planejamento familiar nas populações a serem estudadas. Desse modo, este estudo se situa no âmbito da bioética, que como disciplina surgida exatamente para avaliar o impacto do avanço científico, particularmente no âmbito das biociências, sobre a vida humana, tem desenvolvido reflexões interessantes a respeito da reprodução. A bioética não endossa uma única posição sobre temas polêmicos, por causa do necessário respeito à diversidade cultural e religiosa, mas promove o debate e a análise crítica das posturas assumidas. Não há dúvida de que o profissional de saúde, corretamente orientado pelo princípio da beneficência, busca o bem-estar do casal ao lhe assistir, amparar e instrumentar no sentido de viabilizar o desejo e a decisão de ter filho. O planejamento familiar é mais um serviço de saúde, que pode promover vida, realização humana e superação de limites biológicos. Certamente o casal tem autonomia para tomar as decisões que envolvem os diferentes aspectos de todo o processo de busca ou não de serviços de planejamento familiar. Não podemos promover uma ditadura da tecnologia que pressiona os casais a buscarem necessariamente as soluções que envolvem maior tecnologia reprodutiva ou de contracepção, nem pressionar os casais a optarem por soluções que eles não desejam nem se sintam em condições de assumir. Os casais precisam ser informados, científica, 20 Prefácio técnica e eticamente, para que a decisão a ser tomada seja a mais consciente possível. A fim de que tais orientações sejam efetivas e reflitam a realidade dos casais, é necessário o conhecimento dessa realidade, elemento que a proposta de pesquisa apresentada no livro poderá viabilizar. Todos que se aproximam das conquistas realizadas nesse campo ficam maravilhados com a insistência e a persistência de inúmeros pesquisadores, com a dedicação dos profissionais, com a garra e a firmeza dos casais que buscam tais serviços e, por fim, com o encanto dos resultados, como o nascimento de bebês longamente esperados e profundamente desejados por pais e mães. Neste momento, uma boa reflexão cristã nos diz que o ser humano cumpre de fato seu papel de cocriador, missão recebida do Criador: continuar a obra da criação e levá-la à plenitude. Essa visão positiva e otimista dos recursos de saúde aplicados à reprodução humana não pode esconder ou acobertar os problemas e dificuldades existentes. Não cabe à bioética barrar o avanço da pesquisa, mas é necessário indicar caminhos para que tais serviços de saúde sejam realizados dentro dos padrões éticos aceitáveis pelas pessoas envolvidas e por toda a sociedade. Este livro, portanto, aponta para o desvendar dessa realidade nas comunidades específicas a serem pesquisadas; os resultados a serem gerados podem interessar aos casais e a todos que estudam, propõem políticas ou prestam serviços na área de planejamento familiar. 21 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Resta-nos apenas agradecer por participarmos deste projeto e por termos sido convidados a dar nossa singela contribuição. Javier de La Torre Díaz1 Carmen Massé García2 1 Doutor em direito pela Universidade Complutense de Madri, licenciado em Direito, Teologia e Filosofia. Diretor da Cátedra de Bioética e do Master de Bioética da Universidade Pontifícia Comillas, Madri. 2 Doutora em Teologia pela Universidade Pontifícia Comillas, mestre em Bioética e licenciada em medicina e teologia. Secretária da Cátedra de Bioética da Universidade Pontifícia Comilllas, Madri. 22 Apresentação Este livro é o resultado de um projeto de pesquisa que contou com o apoio da Fundação Araucária, Paraná e CNPq, assumido com afinco pelos autores, com rica contribuição dos colaboradores e dos avaliadores, com especial participação dos pesquisadores da Cátedra de Bioética da Universidade Pontifícia Comilllas (Madri, Espanha). Pela natureza própria do projeto — que buscou validar um instrumento —, este livro é o primeiro resultado da pesquisa e, principalmente, um marco referencial para as pesquisas que se seguirão na aplicação do instrumento validado. Ele apresenta uma síntese teórica de quatro dissertações de mestrado, a metodologia do projeto, com ênfase no uso da técnica de grupo nominal e projeto piloto e, por fim, o instrumento validado. Como marco referencial na área de Planejamento Familiar, este trabalho apresenta ferramentas para a pesquisa de campo que, neste momento, junho de 2014, já estão sendo aplicadas por mestrandos em várias localidades do Paraná, contando também com o apoio da Fundação Araucária. Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Este trabalho se situa no contexto da bioética, com a consciência dos desafios da pesquisa interdisciplinar, buscando atender às exigências práticas e teóricas dessa nova realidade, conforme o documento da Área Interdisciplinar da CAPES, na qual a Pós-Graduação em Bioética se situa e é avaliada: “Entende-se por Interdisciplinaridade a convergência de duas ou mais áreas do conhecimento, não pertencentes à mesma classe, que contribua para o avanço das fronteiras da ciência e tecnologia, transfira métodos de uma área para outra, gerando novos conhecimentos ou disciplinas...”. Por isso, o trabalho reflete a busca de sistematização e revisão teórica próprias das humanidades e a construção de instrumento de pesquisa criteriosamente validado pelas áreas de saúde. É nesse diálogo entre humanidades e saúde que este trabalho se compreende; no campo da bioética, funciona como uma “ponte” que possa facilitar o intercâmbio de conhecimentos e as práticas de uma área a outra. 24 Introdução A possibilidade de pensar e planejar a própria reprodução humana surgiu no século XX e, na evolução dessa temática, houve alterações nos termos utilizados. A expressão paternidade responsável foi primeiramente adotada englobando também os cuidados maternos — logo se percebeu seu viés ideológico patriarcal. Alguns autores optaram por conjugalidade responsável, que não foi muito aceito, pois parecia não expressar toda a complexidade das relações em questão. Em nosso trabalho, adotamos o termo parentalidade, usado pela primeira vez em 1961, por Paul-Claude Recamier, psiquiatra e psicanalista francês; a partir da década de 1980, passou a ser usado também no Brasil (FÉRES-CARNEIRO; MAGALHÃES, 2011, p. 117). Parentalidade nos parece mais apropriado para expressar os conceitos expressos em paternidade e maternidade. Assim, falamos de parentalidade responsável, e neste estudo insistiremos no uso da expressão projeto de parentalidade. É importante explicitar que quando discutimos planejamento da parentalidade, ou projeto de parentalidade, Planejamento da parentalidade no contexto da bioética situamo-nos no contexto do que usualmente se define como planejamento familiar. No entanto, gostaríamos de ressaltar que há uma diferença de ênfase e foco. De modo geral, quando se fala sobre planejamento familiar, enfatiza-se a instituição familiar, e o foco de ação de quem planeja é o acesso ou não aos métodos de contracepção. Se o planejamento familiar acontece a partir de governantes, facilmente ele se torna sinônimo de controle de natalidade, e o objetivo consiste no controle populacional. A expressão projeto de parentalidade, por sua vez, se distancia do controle de natalidade e não insiste na instituição família, nem nos métodos de concepção e contracepção, mas enfatiza a condição de ser pai e ser mãe. Pensar a parentalidade é pensar a acolhida, o afeto e o cuidado dos filhos, ou seja, a ênfase não está no método utilizado, mas no desejo de ter filhos e em seu bem-estar. Uma sociedade plural deseja que cada criança possa de fato ser acolhida e cuidada, independentemente das definições de famílias e suas configurações. Com isso, não desprezamos a família, mas assumimos que ela se justifica à medida que se torna espaço de acolhida, afeto e cuidado com seus membros e com os filhos em particular. Desse modo, o exercício da parentalidade responsável torna-se elemento constitutivo da família, pois a parentalidade nasce da família ou a constrói. Há, atualmente, uma clara consciência da necessidade do planejamento familiar, no entanto a visão de parentalidade responsável e seus desdobramentos na qualidade de acolhimento e vida de filhos planejados (ou não) é ainda pequena. Parentalidade pode ser ainda um tema muito sensível, pois diz respeito ao modo como as pessoas vivem suas 26 Introdução vidas e como os contextos sociais e comunitários representam essa realidade. Por isso, defendemos que, no âmbito da reprodução humana, o projeto de ser pai ou mãe (projeto de parentalidade) precisa ser situado nos contextos de projeto de vida das pessoas envolvidas. No contexto de uma sociedade secular, os projetos de parentalidade podem ter diferentes conteúdos e métodos, mas necessariamente demonstram um padrão ético diferenciado, pois exigem uma tomada de consciência dos processos que envolvem a reprodução humana, o que significa a superação do “ter filhos sem pensar no assunto”. Assim, independentemente de seu conteúdo, estamos propondo que há um grande avanço para a sociedade quando as pessoas passam a explicitar a parentalidade como projeto, uma vez que a transmissão da vida requer uma decisão pessoal e responsável e porque “cada menino ou menina tem o indiscutível direito de ser desejado antes de ser concebido” (BEÑERAF, 2006, p. 58). No estudo da reprodução humana em bioética, um dos maiores conflitos surge quando nos deparamos com a situação de pessoas com filhos ou mulheres grávidas sem terem um “projeto de parentalidade” explícito ou implícito. Os dados indicam que cerca de 30% dos partos são abortados — esse talvez seja o resultado mais dramático para as mães e as crianças de uma gravidez sem projeto. Mas, certamente, o aborto não é a única consequência, e a gravidez é o centro de situações com fortes implicações para a mãe, as crianças, as famílias e os serviços de saúde. Consideramos que há projeto de parentalidade: a) quando a gravidez é planejada cuidadosamente; b) quando se avaliam também as questões de riscos relacionados à maternidade; c) quando a decisão de 27 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética ter filhos é compartilhada pelos parceiros; d) quando as condições para cuidar dos filhos é avaliada; e) quando o anúncio de uma gravidez se dá num clima de aceitação e alegria; f) quando o parceiro acolhe a criança; g) quando o cuidado dos filhos é preocupação constante; h) quando a possibilidade de um aborto deliberado não é sequer considerado; i) quando a criança cresce sem violência. Quando nos aproximamos do estudo das causas de presença ou ausência de projeto de parentalidade, deparamo-nos com a falta de instrumentos adequados para uma análise ampla destas relações, por causa da complexidade das questões envolvidas. Estudos realizados no âmbito da Teologia focam prioritariamente a defesa da vida e da dignidade da criança e, no âmbito da Saúde, a defesa da vida e da dignidade da mulher. Um estudo no âmbito da Bioética nos desafia a uma visão mais ampla que possa desvendar a realidade a partir de perspectivas que permitam contemplar os dois focos da questão: a dignidade da mãe e da criança. Com base nessas considerações, o Grupo de Pesquisa Teologia e Bioética planeja realizar uma pesquisa qualitativa, em diferentes contextos do Brasil. Portanto, este estudo é apresentado em duas partes: a primeira faz uma revisão teórica de alguns temas que impactam a elaboração ou não de projetos de parentalidade, enquanto a segunda explicita o caminho metodológico percorrido pelos pesquisadores para elaborar e validar o instrumento de pesquisa. 28 PARTE 1 FATORES QUE INFLUENCIAM A PARENTALIDADE 1 Parentalidade e modelos de família3 Na investigação sobre a existência ou não de um projeto de parentalidade, uma das maiores probabilidades de encontrar as respostas seria num núcleo familiar que, no Brasil, atinge um percentual de 87,7% das cerca de 57 milhões de unidades domésticas, de acordo com o Censo Demográfico do IBGE de 2010. Com base na pesquisa bibliográfica, pretende-se identificar se há impacto dos modelos de família no acolhimento da gravidez, a relação desses modelos com a capacidade de se assumir um projeto de parentalidade, a relação dos diferentes arranjos familiares com o fato de a criança ter sido assumida por ambos os parceiros, a relação entre as configurações familiares e a avaliação das condições para o cuidado dos 3 Uma abordagem mais completa da temática se encontra em: KRUM, J. C. O impacto dos modelos de família sobre o projeto de parentalidade. 2013. 128 f. Dissertação (Mestrado em Teologia) – Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, 2013. Planejamento da parentalidade no contexto da bioética filhos. Busca-se verificar, ainda, se a decisão sobre a parentalidade é compartilhada pelo casal ou deixada apenas sob a responsabilidade da mulher, e se a parentalidade é pensada usualmente no contexto familiar. Apresentamos a seguir, duas perspectivas: as alterações no modelo de ser pai e ser mãe e as alterações no modelo de família. 1.1 Alterações no modelo de ser pai e ser mãe Ser pai e ser mãe é um processo em que mulheres e homens se dispõem a viver a parentalidade. Para que isso seja possível, deve haver uma relação de troca mútua envolvendo os pais e deles com a criança e o mundo. Ser pai e ser mãe não é decorrência apenas do instinto, mas é uma altíssima vocação. Exige atitude coerente, pois como afirma Teperman (2011, p. 159), comentando a perspectiva de Lacan: “o nascimento de um filho não determina automaticamente a constituição das funções parentais, estas requerem um processo delicado de reordenamento simbólico”. É preciso um envolvimento pleno, com clareza e comprometimento, pois “as funções parentais não estão determinadas pelos aspectos biológicos daqueles que constituem as figuras parentais” (TEPERMAN, 2011, p. 159). A sociedade espera, portanto, que as pessoas exerçam uma parentalidade responsável. 34 Parentalidade e modelos de família 1.1.1Parentalidade responsável Na linguagem usual, os termos maternidade e paternidade significam, respectivamente, qualidade ou condição de mãe e de pai e que aqui se denomina parentalidade. Já a palavra responsável traz o significado daquele (ou daquela) que responde pelos próprios atos ou pelos de outrem, ou ainda que responde legal ou moralmente pela vida, pelo bem-estar de alguém. A condição de ser mãe ou pai, e não apenas genitora ou genitor, implica que a concepção de um filho esteja inscrita no desejo, que ele se concretize numa gestação ou adoção, cujo produto seja reconhecido como filho e, a partir de então, seja alvo do amor e do cuidado para sempre. Quanto às condições físicas, econômicas, psicológicas e sociais, vive-se a parentalidade responsável com a decisão equilibrada e generosa de se ter uma família numerosa ou, por motivos justos, e, considerando a lei moral, evitar temporariamente, ou por tempo indeterminado, um novo nascimento, ou ainda uma família mais reduzida, com um ou dois filhos apenas. Na Igreja Católica, a Constituição Pastoral Gaudium et Spes (cf. n. 50 e 51) destaca que a prática responsável da parentalidade implica que os cônjuges reconheçam plenamente os próprios deveres para com Deus, para consigo mesmos, para com a família e para com a sociedade, numa justa hierarquia de valores. Na missão de transmitir a vida, eles não têm liberdade para fazer tudo por vontade própria, como se pudessem definir com absoluta autonomia os meios honestos a percorrer. Mas devem, sim, conciliar seu proceder com o propósito 35 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética criador de Deus, expresso na própria natureza do matrimônio e de seus atos e manifestado pelo ensino da Igreja. 1.1.2As mudanças acontecem Alguns elementos geoculturais fazem parte da estrutura dos sistemas familiares e podem ajudar a entender as alterações e adaptações que acontecem, principalmente quando são usados momentos e contextos de épocas diferentes. Menezes e Castro (2009, p. 29) afirmam que: “no protoindustrialismo, o patriarcalismo é fortalecido, a despeito dos índices em contrário”. E que situações como a do pai possuir filhos fora do casamento e, em contrapartida, posições indicadoras de que a mulher decide ser mãe ou não oferecem uma amostragem de como os arranjos novos entre gênero e gerações serão tecidos no século XX (MENEZES; CASTRO, 2009, p. 29). Therborn destaca que, na Europa, duas fontes foram consideradas os desafios ideológicos ao patriarcado. “A primeira delas, o radicalismo protestante, cuja primeira grande manifestação foi o tratado de John Stuart Mill sobre A Sujeição das Mulheres, [...]” (THERBORN, 2006, p. 45). O entendimento de Mill era de que um dos principais óbices para o desenvolvimento humano seria a subordinação de gênero, e que a maneira de pensar e agir seria fortalecida com a igualdade de gênero, além da melhoria nas condições gerais de associação entre homens e mulheres. A segunda foi 36 Parentalidade e modelos de família o socialismo ateu, que nos anos 30 e 40 do século XIX tinham uma orientação feminista. Contudo, foi August Bebe quem estabeleceu a primeira conexão importante entre o movimento trabalhista socialista e a causa das mulheres (THERBORN, 2006, p. 45). Pode-se dizer que uma das mudanças observadas foi em relação à mulher, que passou a ter, senão de fato, pelo menos de direito um aumento de poder, no século XIX com reflexos nos próximos séculos. Ou seja, há um avanço, uma caminhada que se fez em relação a essa situação, mas que precisa ainda ir além, enfrentando as resistências e os resquícios de poder e de falta de visão por parte de alguns setores da sociedade. Esse empoderamento das mulheres também influiu nos papéis tradicionais do pai e da mãe. Com o passar do tempo, a maneira como o casal vive se modifica, deixando de lado os modelos presentes nos séculos XIX e XX. É cada vez menos frequente encontrar aquela família constituída por um pai que trabalha — portanto, o “provedor” — e uma mãe que fica em casa — a “rainha do lar”, cuidando do marido e dos filhos, que poderia ser chamada de “cuidadora”, algo que foi norma no século XIX, conforme destaca Therborn (2006, p. 43): “O homem de família provedor, administrador de sua propriedade, tornou-se a norma do século XIX. É bem verdade que ele era burguês, mas não era ancien regime, nem de uma religião estranha ou de alguma etnia exótica”. Ele era muito apoiado tanto pela lei religiosa quanto pela opinião pública. E se a lei religiosa apoiava esse procedimento naquele contexto, nos séculos XX e XXI a Igreja também percebe o que acontece nessa área do relacionamento e da 37 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética composição familiar. O Documento de Aparecida (CONSELHO EPISCOPAL LATINO-AMERICANO, 2007, n. 49) destaca: “as mudanças culturais modificaram os papéis tradicionais de homens e mulheres, que procuram desenvolver novas atitudes e estilos de suas respectivas identidades, [...], na família e na sociedade, às vezes por vias equivocadas”. Em outras palavras, aquele modelo de ser pai e de ser mãe, apesar das dificuldades começa a mudar, influenciado pelo meio cultural e pela busca de igualdade cada vez mais forte. Isso resultou em alguns novos modelos para essas duas figuras dentro da família, visto que ela também passou a ter novos arranjos, completamente diversos e impensáveis em outros tempos. “Desde a década de 1960 multiplicam-se consideravelmente as investigações acerca das relações familiares, nem sempre considerando a família constituída de pai, mãe e filhos” (PORRECA, 2012, p. 23). O que se observa não são substituições completas no jeito de ser das famílias, como se fossem à base de troca: “Este modelo por aquele outro!”. Não. Entendemos sempre como alterações, termo que remete à ideia de que algo do modelo anterior permanece, junto com os novos elementos das novas configurações. Houve uma retração do patriarcado e avanços aconteceram nas relações entre os membros da família. Essas novas formas de atuação de pais e de mães se dão, às vezes, sem muitos percalços, e em outras com algum sofrimento, principalmente em relação ao homem, que se sente bastante inseguro quando precisa exercer tarefas domésticas às quais não estava acostumado. 38 Parentalidade e modelos de família 1.1.3O pai exercendo as tarefas domésticas A participação da mulher no mundo do trabalho é cada vez mais intensa e relevante, situação que obriga o homem a compartilhar a responsabilidade de cuidar dos filhos com mais frequência de alguma forma. “A mulher conquistou um novo espaço na sociedade, tem nova autocompreensão, assumiu novos papéis. Essa nova posição da mulher traz consequências diretas para o relacionamento com seu cônjuge” (BLANK, 2006, p. 34). Isso quando a perda do emprego, por exemplo, não leva os papéis a se inverterem, fazendo com que o homem permaneça em casa enquanto a mulher trabalha. “A vida do casal e da família, que por definição é relacional e dialética, é profundamente influenciada pelos fatores que a cercam. Eis por que [sic] o Concílio a situa primeiro em seu meio sociológico” (BLANK, 2006, p. 60). Verifica-se, porém, que mesmo numa situação externa que pede uma mudança nos padrões de comportamento e na divisão de tarefas mais justa, nem sempre isso acontece, ou, às vezes, acontece de forma muito lenta. Uma das justificativas é que os homens continuam sendo criados por mulheres que entendem e ensinam que o papel masculino não tem um envolvimento com tarefas domésticas. E mesmo as jovens que se casam, na maioria das vezes, também de uma forma geral, são pouco familiarizadas com os papéis femininos até então vividos. Nessa condição de buscar ajustamento de sua estrutura, o que se observa é que para determinadas classes sociais, está se tornando bastante comum considerar os custos 39 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética de uma enfermeira ou uma babá no orçamento do recém-nascido, não somente para facilitar que a mãe continue trabalhando, mas também, e principalmente, como uma forma de justificar por que as mães não querem abdicar da vida que tinham antes de dar à luz. Essa ausência da mãe nas atividades do lar junto aos filhos, em vista de sua presença no local de trabalho ou de estudo, faz com que alguém tenha que substituí-la, pelo menos por um período, quando o pai também estiver trabalhando. Esse é um dos motivos para os casais levarem em conta o planejamento da parentalidade. A exemplo do que aconteceu ao longo da história, por motivos diversos — por exemplo, depois da chegada dos portugueses ao Brasil em 1500, surgiu o costume de as mães ricas não amamentarem seus filhos, fazendo com que amas de leite as substituíssem —, também nesse novo contexto de mudanças faz-se necessária a presença dos substitutos da mãe. 1.1.4Os pais ou as mães responsáveis pela família Nos meios economicamente menos favorecidos, os substitutos dos pais podem ser os avós — mais especificamente a avó do recém-nascido —, uma tia ou a irmã da gestante, a creche etc. Isso faz com que também o pai se sinta autorizado a manter sua vida normal, de certa forma parecida com aquela que tinha antes do filho nascer. Essa é uma alteração importante no papel da mãe, com a consequente mudança no papel do pai. Algo que não seria sequer cogitado em tempos não muito distantes no século XX, haja vista o 40 Parentalidade e modelos de família enraizamento das atitudes patriarcais e suas consequências naqueles tempos, cujos reflexos se fazem sentir ainda hoje em nosso meio. Não resta dúvida de que os bebês de hoje precisam se acostumar mais cedo com a ausência física dos pais. Uma das causas é a rotina de trabalho cada vez mais exigente. Por outro lado, isso não impede que o pai substitua a mãe em determinadas tarefas e, portanto, seja visto como um prolongamento dela. Os papéis masculino e feminino tornaram-se menos delimitados e isso pode trazer consequências de relacionamento para a criança, da mesma forma que já traz para a manutenção do casamento. Portanto, essas atitudes, assim como suas consequências, merecem ser consideradas. Blank (2006, p. 25) destaca: “João Carlos Petrini, teólogo e especialista em questões matrimoniais e familiares, em seu livro Pós-modernidade e família, mostra-se preocupado com essa problemática”. O teólogo reflete a partir de uma indagação sobre a moral vigente na sociedade atual, considerando-a movida por uma razão instrumental, utilitarista, o que a impede de atender às necessidades complexas dos seres humanos. E prossegue: “para construir uma sociedade que supere a visão restritiva de uma moral utilitarista e que respeite o ser humano em todas as suas dimensões, a modernidade tem de se reconciliar com o ‘senso religioso’” (BLANK, 2006, p. 25). Para ele, senso religioso é um “conjunto de exigências elementares de justiça, de verdade, de felicidade, que constituem o núcleo mais originário do homem e que emerge existencialmente como desejo” (BLANK, 2006, p. 26). 41 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Os substitutos são ainda necessários quando acontece uma situação mais difícil e perturbadora, que é das separações e do divórcio introduzindo mudanças no relacionamento entre pais e filhos, no ser pai e ser mãe. De acordo com o Censo Demográfico do IBGE, de 2000 a 2010, aumentou o número de famílias cuja responsável era a mulher (de 22,2% para 37,3%), inclusive em presença de cônjuge (de 19,5% para 46,4%), mas diminuiu de 77,8% para 62,7% os casos de famílias com o homem como responsável. Também houve queda no percentual de homens responsáveis em domicílios com presença de cônjuge — de 95,3% para 92,2%. Os motivos podem ser creditados a uma mudança de valores relativos ao papel da mulher na sociedade e a fatores como o ingresso maciço no mercado de trabalho e o aumento da escolaridade em nível superior, combinados com a redução da fecundidade. Essa situação não é nova; ela já existia num percentual menor em 2000, e em 2010 teve um aumento considerável de 15,1% no caso da mulher como responsável e um decréscimo na mesma proporção para o homem. O aumento da configuração familiar monoparental feminina, aquela formada por mães com ou sem parentes, foi mais uma mudança importante, tendo passado de 15,3% em 2000 para 16,2% em 2010. Já o modelo monoparental masculino, formado por homens com ou sem parentes, também sofreu uma pequena alteração, passando de 1,9% em 2000 para 2,4% em 2010. Merece destaque também a diferença entre a área rural e a área urbana, visto que nas áreas rurais, observa-se um 42 Parentalidade e modelos de família porcentual consideravelmente inferior de famílias monoparentais femininas: 9,1% contra 17,4% nas áreas urbanas. Há, também, lares em que a presença é duplicada, ou seja, há duas mães ou dois pais das crianças. Mesmo numa situação adversa em que não é possível ser pai e mãe biológicos, alguns dos casais homoafetivos sentem uma profunda necessidade de serem pai ou mãe, de exercerem a paternidade ou a maternidade. O Censo 2010 investigou algumas características das uniões entre cônjuges do mesmo sexo. Em relação ao nível educacional, 25,8% das pessoas envolvidas em uniões com cônjuges do mesmo sexo declararam possuir superior completo. Em termos de opção religiosa, houve predominância de pessoas católicas (47,4%), seguidas por pessoas sem religião (20,4%). O estado civil preponderante foi o de solteiros (81,6%), e 99,6% viviam em união consensual. Mais da metade dessas uniões se encontrava na região Sudeste (52,6%). Contudo, não aparece o porcentual dessas uniões com filhos. Uma das justificativas possíveis é a dificuldade de adoção ou a utilização de fertilização in vitro. Independentemente e apesar dessas características, o fato é que as famílias formadas por casais homoafetivos existem, e com tendência a se ampliar. Há quem defenda que é melhor que a criança desamparada seja educada por casais homoafetivos do que permaneça o resto da vida sem ninguém para lhes dedicar atenção, carinho, educação, assistência. Por outro lado, há uma corrente que insiste na ideia de que a adoção seja feita sempre por algum casal “tradicional”, aquele formado por cônjuges de sexos opostos e complementares. 43 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética 1.2 Alterações no modelo de família A seguir, uma visão da família, não apenas no sentido de ser pai e mãe, mas também no contexto das alterações dos modelos de família, com seus diferentes arranjos familiares, começando com os conceitos, pois não existe apenas um. 1.2.1Resgatando os conceitos Para que a investigação sobre os modelos de família tenha êxito, faz-se necessário um entendimento sobre o que significa o termo família. Para Danda Prado (1985, p. 7), a palavra FAMÍLIA [sic], no sentido popular e nos dicionários, significa pessoas aparentadas que vivem em geral na mesma casa, particularmente o pai, a mãe e os filhos. Ou ainda, pessoas de mesmo sangue, ascendência, linhagem, estirpe ou admitidos por adoção. De acordo com a definição das Organizações das Nações Unidas (ONU), uma família é formada, no mínimo, por duas pessoas, e seus membros devem estar relacionados por meio de relações de consanguinidade (parentesco), adoção ou casamento (ALVES; CAVENAGHI, 2012). Ao longo da história, o termo vem se modificando e, atualmente, conforme definição encontrada no dicionário Ferreira (2004, p. 396), três são os conceitos, a saber: “1. Pessoas aparentadas, que vivem, em geral, na mesma casa, particularmente o pai, a mãe e os filhos; 2. Pessoas do mesmo 44 Parentalidade e modelos de família sangue; 3. Origem, ascendência”. Já para Houaiss (2001), a família é um: grupo de pessoas vivendo sob o mesmo teto (esp. o pai, a mãe e os filhos); grupo de pessoas que têm uma ancestralidade comum ou que provêm de um mesmo tronco; pessoas ligadas entre si pelo casamento e pela filiação ou, excepcionalmente, pela adoção. A Constituição Federal Brasileira de 1988 representou uma inovação na forma de se entender uma configuração familiar, compreendendo: não necessariamente como resultado de um casamento formal, mas como fruto de uma “união estável”, entre um homem e uma mulher, como entidade familiar protegida pelo Estado, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento (art. 226, § 3º). A Carta Magna também menciona a possibilidade de a família ser constituída por qualquer um dos pais e seus descendentes (art. 226, § 4º), reafirma a igualdade entre o homem e a mulher na sociedade conjugal (art. 226, § 5º) e estabelece o tratamento igualitário dos filhos, sem qualquer designação discriminatória. Angela Ales Bello (2007, p. 98) caracteriza a “família como uma particular forma associativa”. A autora apresenta três maneiras de associação humana. Na primeira, os seres humanos são uma integração de corpo, psique e espírito, contudo, essa situação pode ser prejudicada quando eles se submetem aos impulsos desordenados e também quando só prevalecem seus interesses pessoais para fins egoístas. A segunda maneira de organização humana é a sociedade, ordenada por meio de normas (direitos e deveres) que 45 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética a regem. Porém, não é o interesse de todos que prevalece; o que conta são os interesses de grupos em que não existem vínculos pessoais (ALES BELLO, 2007, p. 83). Já a terceira maneira de associação humana, possivelmente caracterizada como família, é a comunidade. Nela as ligações pessoais são de grande importância para o grupo, cada membro é parte integrante e insubstituível da comunidade. No seio comunitário, a vida humana tem seu valor preservado pelo fato de a pessoa humana estar integrada na mesma comunidade de forma total. Eis alguns exemplos de comunidade: a família (para Ales Bello, esta ocupa o primeiro lugar de grupo comunitário), a comunidade religiosa, a comunidade eclesial etc. Ainda para a autora, a família é o modelo completo de comunidade, pois nela existe a forma mais completa de ligação humana (física, afetiva, emocional e a vida em comum) (ALES BELLO, 2007, p. 98-99). Verifica-se, assim, que há três formas de constituição de família: formada pelo casamento, seja ele civil ou religioso com efeitos civis; família formada pela união estável, e a família formada por qualquer dos pais e seus descendentes. Destaca-se que a instituição do casamento permanece sendo o meio básico de consolidar uma união familiar. Ele não foi suprimido pelo reconhecimento constitucional da união estável, visto que a própria Constituição Federal de 1988 prevê a facilitação de sua conversão em casamento. 46 Parentalidade e modelos de família 1.2.2Além da família nuclear O modelo de família considerado “ideal”, ainda transmitido e predominante em nossa cultura, é a família nuclear, mas é evidente que essa não é a única forma de organização familiar existente nos dias de hoje. Teperman (2011, p. 157) adverte que a configuração da família nuclear jamais teria sido sinônimo de “normalidade”, apesar da idealização e da sensação de segurança que ela traz, pois “não existe uma forma de organização familiar ideal que poderia garantir as condições necessárias para a constituição do sujeito”. As famílias no contexto atual têm se configurado de formas diversas e houve alterações significativas na família nuclear, o que provoca profundos questionamentos à sua hegemonia. Como afirma Rios (1999, p. 545), “A recente história da família foi escrita segundo uma visão evolucionista, tendo como hipótese a seguinte: a família moderna é o resultado da ‘família extensa e complexa’”. Ao que ele mesmo questiona, argumentando que isso seria uma tese falha, pois “a família nuclear domina a partir da Idade Média em grande parte da Europa”, e simultaneamente coexistem “modelos familiares que apresentam formas diferentes de organização e distribuição da autoridade”. Além disso, há visões diferenciadas em relação a esse modelo de família, como é o caso, por exemplo, da afirmação de Gaiarsa (1992, p. 8), considerando família, o pai, a mãe e alguns filhos convivendo, na mesma casa, durante quinze a trinta anos; significa, a mais, certa atmosfera social constituída 47 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética por um número muito grande de frases e caras, todas na linha do ‘A família é a célula da sociedade’, frases como: ‘Mãe só existe uma’, O pai deve ser respeitado’, ‘Os filhos são crianças – isto é, ingênuos, bobos e ignorantes’, ‘Uma esposa deve...’, Um marido deve...’, ‘Os filhos devem...’, etc. Embora essa visão de família seja particular e peculiar, ela pode ser considerada uma forma de questionamento, para aprofundar a reflexão ou explorar como acontecem os relacionamentos familiares independente do modelo em que se vive. Para Vidal (2010, p. 144), neste início do século XXI, do sentido claro do termo família, “passou-se para a expressão mais difusa de convivência familiar. Além do mais, ao referir-se à instituição familiar como convivência familiar tende a utilizar-se o plural: fala-se de formas de convivência familiar” (VIDAL, 2010, p. 144). Há quem proponha um conceito de lar e “outros utilizam o conceito de núcleo familiar, isto é, a realidade formada tanto por um casal (com ou sem filhos) como por um pai ou uma mãe com filhos solteiros. 1.2.3Uma nova realidade familiar O Censo Demográfico do IBGE de 2010 trouxe informações interessantes sobre a família. Houve algumas alterações, como a redução do arranjo majoritário formado por casais (núcleo duplo) com filhos, que, em números aproximados, representava dois terços (66%) dos domicílios, em 1980 e, em 2010, caiu para algo próximo de 50%. Isso é resultado 48 Parentalidade e modelos de família do menor número de filhos e da maior expectativa de vida, fazendo com que os pais vivam mais tempo na fase do ‘ninho vazio’. No Brasil, o casamento é praticamente um evento universal, considerando-se todos os tipos de matrimônio. Em 1980, 65% dos casamentos eram realizados no civil e no religioso, 14% somente no civil, 14% apenas no religioso e 7% eram uniões consensuais. Em 2010, o casamento no civil e no religioso teve uma queda para 43%, só no civil houve um aumento de três pontos porcentuais, ficando em 17%, apenas no religioso caiu para 3% e as uniões consensuais subiram 30 pontos porcentuais, indo para 37%. Outra alteração foi com relação aos casais sem filhos. Essa mudança, de acordo com o IBGE, aponta que houve um aumento significativo nos casais sem filhos e sem outros parentes, que passou de 12% em 1980 para 15% em 2010. Mais uma alteração apontada pelo IBGE foi referente às pessoas morando sozinhas, com um acréscimo porcentual bastante próximo entre homens e mulheres. O número de mulheres morando sozinhas passou de 2,8% em 1980 para 6,2% em 2010 e o número de homens morando sozinhos, de 3% em 1980 para 6,5% em 2010. O número de famílias compostas e extensas (casais, filhos, parentes e agregados) teve uma redução de 4,8% em 1980 para 2,2% em 2010. 1.3 As famílias monoparentais Quando se fala em monoparentalidade, deve-se entender não apenas um único modelo, mas famílias 49 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética monoparentais, cuja análise não pode se dar considerando-a um universo próprio ou um grupo homogêneo. Foi na metade dos anos 1970 que surgiu na França a expressão famílias monoparentais, para designar as unidades domésticas em que as pessoas vivem sem cônjuge, com um ou vários filhos com menos de 25 anos e solteiros. No Brasil, Barroso e Bruschini (1981, p. 40) destacam que, embora já houvesse no país um contingente expressivo de famílias chefiadas por mulheres, foi a partir dos anos 1970 que elas passaram a ter visibilidade e conquistaram um lugar entre as pesquisas sociológicas. A Carta Magna brasileira de 1988, em seu artigo 226, § 4º reza que “entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes”. Com isso, passa não só a reconhecer a existência das famílias monoparentais, mas também a conferir-lhes a especial proteção do Estado. Porém, esse modelo de família não possui definição integral, estruturação e limites por meio de legislação infraconstitucional. Essa configuração familiar é admitida como legítima pelo Direito Constitucional, sem contudo existir para o Direito Social e, muito menos, para o Direito Civil. O reconhecimento e a definição da família monoparental como família natural também estão no dispositivo 25, da Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990: “entende-se por família natural a comunidade formada pelos pais ou qualquer deles e seus descendentes”. Eduardo de Oliveira Leite (2003, p. 22) entende que “uma família é monoparental quando a pessoa considerada (homem ou mulher) encontra-se sem cônjuge, ou companheiro, e vive com uma ou várias crianças”. 50 Parentalidade e modelos de família A expressão famílias monoparentais é bastante ampla, pois pretende atingir as situações novas e as antigas ao mesmo tempo. As primeiras, resultantes das rupturas voluntárias de casamentos e uniões, e as demais, motivadas por falecimentos, abandono de um dos cônjuges, nascimentos extramatrimoniais. Nas últimas décadas, tem crescido, nessas famílias — segundo o Censo Demográfico de 2010, correspondem a 8,1 milhões de famílias —, o número de mães que também são o “pai” e chefe de família, saem de casa bem cedo para trabalhar e se afastam da vida cotidiana de seus filhos, retornando para casa à noite. 1.4 As famílias em segunda união Dentre as novas configurações familiares, a das famílias em segunda união é uma das mais presentes no meio familiar. E tem tido avanço à medida que os anos passam. “A família, tanto no plano da sociabilidade quanto no plano normativo, deparou-se com alterações significativas, influenciadas por processos de mudanças sociais geradas na sociedade e no interior da vida doméstica” (PORRECA, 2012, p. 49). Uma dessas alterações é a família em segunda união, como evidencia Porreca (2012, p. 114-115): “dentre as ‘novas’ configurações familiares, evidencia-se a segunda união, que é composta de casais em que um ou ambos os parceiros se separaram dos primeiros cônjuges e casaram-se novamente, no civil ou não”. E pode acontecer que, em alguns casos, um ou ambos já tenham filhos da união anterior, e filhos também da nova união. 51 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Isso traz consequências, que podem ser ruins ou não, dependendo da recepção dos envolvidos, e com a busca de uma nova união, mostrando que a família vai se adaptando e descobrindo novas formas de ser: “Um exemplo atual e concreto da realidade da permanência e vitalidade da família está na situação da separação/divórcio, que é considerada transitória e não é significativa para que as pessoas não se casem novamente” (PORRECA, 2012, p. 112). Isso porque os envolvidos consideram que a relação não deu certo por causa de determinado parceiro ou parceira, e não exatamente pelo casamento de uma forma geral. Sendo assim, na maioria das vezes voltam a se casar e a recomendar o casamento a outras pessoas. Antes, os descasados e novamente casados pela lei civil eram discriminados, chamados de bígamos, infames, pecadores públicos, indignos de sepultura eclesiástica e acusados de concubinato. Hoje, esse tipo de situação familiar já é visto de uma maneira mais aceitável e sem tantas críticas e discriminações. É importante destacar uma condição específica dos casais em segunda união: as famílias-mosaico. 1.5 As famílias mosaico Mesmo sendo parte da configuração de família reconstituída em segunda união, dedicamos um item específico a essa modalidade, pois ela é de fato uma situação interessante. Engloba casais em segunda união, ambos vindo de relacionamentos anteriores, cada um com filhos e, em alguns casos, tendo outros filhos a partir do novo e atual relacionamento. 52 Parentalidade e modelos de família Atualmente, cresce a quantidade de famílias em que tanto o marido como a esposa trazem para a nova união os filhos de casamentos anteriores, vindo a se juntar com novos filhos que surgem do novo relacionamento. Agrupam-se filhos, enteados, irmãos, madrasta, padrasto, ex-esposo, ex-esposa e diversos avós. Dessa forma, nem todos os membros da família mosaico são parentes entre si, mas todos têm um grau de parentesco com a prole resultante da união do casal reconstituído. A família-mosaico é apenas mais um tipo de arranjo familiar possível, em uma sociedade cada vez mais marcada pela pluralidade e por dinâmicas inovadoras, que vão além do modelo padrão. Considerando, pois, as famílias em segunda união e, neste caso, as famílias-mosaico, não existem dados que possam afirmar se há ou não um projeto de parentalidade nesse contexto. Pode-se deduzir, em alguns casos, que no último enlace os parceiros decidem ter, pelo menos, mais um filho, que seria o fruto de seu relacionamento, independente dos filhos advindos dos relacionamentos anteriores. 53 2 Parentalidade e sexualidade4 Inicialmente, diga-se que tanto contextualizar historicamente quanto conceituar sexualidade no ocidente não é tarefa fácil, já que se trata, de certo modo, de uma abstração de algo humano. Para alguns é preciso compreender que a “a sexualidade é uma manifestação ontológica da condição humana, isto é, a sexualidade faz parte da própria constituição intrínseca do que seja o ser humano” (NUNES; SILVA, 2000, p. 2). Por outro lado ela é historicamente situada como afirma Figueiró (2006, p. 17): “a sexualidade é uma dimensão humana que vai além de sua determinação biológica, pois é, também, culturalmente determinada”. Desse modo, a sexualidade humana pode ser entendida, num primeiro momento, como o conjunto dos fenômenos 4 Uma abordagem mais completa da temática se encontra em: RIGONI, M. F. O impacto da visão de sexualidade sobre o planejamento da parentalidade. 2013. 143 f. Dissertação (Mestrado em Teologia) – Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, 2013. Planejamento da parentalidade no contexto da bioética da vida sexual de cada indivíduo. Ela possui significativas ligações com inúmeros conceitos, tanto frontais e diretos quanto reflexos e oblíquos, tais como: corpo, saúde, emoções, amor, família, planejamento familiar, escola, educação sexual, transcendência (religiões) e vida feliz etc. Ciente, portanto, da complexidade da questão, abordaremos apenas as questões da sexualidade que tenham relações com a reprodução humana. 2.1 Sexualidade e reprodução A relação entre sexualidade e reprodução humana tem sido questionada nos últimos tempos. Alguns defendem uma radical separação entre essas duas realidades humanas enquanto outros insistem num vínculo indispensável e necessário entre elas. Diante disso, gostaríamos de apresentar alguns questionamentos sobre esse assunto tão delicado: precisamos insistir no vínculo entre sexualidade e reprodução o tempo todo? Não são legítimas as relações sexuais que ocorrem à parte e fora da dimensão procriativa? Abordar a questão da reprodução humana à parte da sexualidade não significaria, por outro ângulo, deixar de lado um dos principais pontos para sua devida avaliação? Perder de vista totalmente o vínculo entre sexualidade e reprodução humana não pode ser muito arriscado e danoso? Não é a sexualidade o pano de fundo no qual se dá a parentalidade responsável? Sexualidade e reprodução não são dimensões correlacionadas do amor humano? A sexualidade, na reflexão atual, assume amplas dimensões. Algumas bastante desvinculadas da questão da 56 Parentalidade e sexualidade reprodução, de modo que sexualidade e reprodução não estão necessariamente vinculadas (VALDIVIA, 2007, p. 90). A sexualidade assume outras perspectivas além de sua dimensão procriativa e, com a reprodução assistida, a procriação nem sempre está vinculada ao ato sexual. A separação dessas realidades humanas constitui, de fato, um dos principais desencadeadores de situações complexas que exigem uma avaliação ética adequada no contexto do planejamento familiar, com fortes implicações sociais, psíquicas, jurídicas e religiosas. Enfim, temos visto estudiosos da sexualidade alegarem que ela pode ser compreendida e analisada em nossos dias deixando a questão da reprodução em segundo lugar. Entendemos que, para um estudo que foca a questão da sexualidade, tal realidade possa ser cabível nessa dimensão, pois as relações sexuais — na maioria das vezes — situam-se fora da dimensão procriativa. No entanto, defendemos a posição de que, se a compreensão da sexualidade pode ser feita sem sua dimensão reprodutiva, o contrário não ocorre, pois uma adequada compreensão da reprodução humana não se dá sem seu vínculo com a sexualidade. E, num texto cujo objetivo é avaliar o planejamento familiar, e a reprodução é o tema central, essa discussão se torna necessária. Ou seja, se em algum contexto é possível e aconselhável abordar a sexualidade separadamente, na dimensão do planejamento familiar, sexualidade e reprodução precisam ser estudadas em suas inter-relações. Podemos não querer tornar o vínculo entre sexualidade e reprodução excessivamente rígido, mas não podemos simplesmente ignorar essa relação e discutir reprodução humana totalmente ao largo da sexualidade. 57 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética No contexto de bioética secular, insistir no vínculo entre sexualidade e reprodução o tempo todo pode ser inútil, desnecessário e improdutivo, por mais relevante que seja no âmbito religioso. Por outro lado, perder de vista totalmente o vínculo entre sexualidade e reprodução humana pode ser muito arriscado e danoso, pois ele permanece o pano de fundo em que se dá a parentalidade responsável, eis que a sexualidade e a reprodução são dimensões correlacionadas do amor humano ou, como disse Anjos (1996, p. 136), “de repente esquecemos que o berço da reprodução humana é o amor”. Parece-nos, portanto, que a antropologia da sexualidade aponta para a função de gerar novas vidas, visto que a sexualidade se integra também a outros níveis, como o amor, a afetividade, o carinho e o cuidado parental. O filósofo Giovanni Reale (2002, p. 7) destaca que os “males do homem contemporâneo estão em livros, revistas, periódicos e jornais”, mas acredita “que poucas vezes se chega ao verdadeiro núcleo dos problemas”. Desvincular a reprodução humana da sexualidade pode implicar no fortalecimento da tese que apregoa o niilismo do amor, sob o comando de Nietzsche, eis que para “remediar o esquecimento niilista do amor, o homem de hoje recorre ao sexo” (REALE, 2002, p. 150). Ato contínuo, sentencia: “O que mais impressiona não é a redução do amor à dimensão do eros físico, mas a perda do senso de medida”. O imbróglio da transformação do sexo em mercadoria, numa escalada de progressão geométrica, pode conduzir ao “homicídio do Eros” (REALE, 2002, p. 151). Enfim, um “Eros” que pode ficar refém de padrões econômicos e financeiros, implicando na prevalência de uma sexualidade comercial, sendo 58 Parentalidade e sexualidade plausível ter em linha de pensamento a necessidade de libertar “eros da prisão na dimensão do físico” (REALE, 2002, p. 151), nos seguintes termos: “Para não cair nos excessos opostos de um permissivismo que é fim em si mesmo ou de um puritanismo exclusivamente reativo, seria preciso reencontrar entre os aspectos de Eros a luz do inteligível”. 2.2 Tendências brasileiras na prática da sexualidade Na busca de elementos para falar sobre a ética do brasileiro, realizou-se uma pesquisa de opinião denominada Pesquisa Social Brasileira (PESB), no período de 18 de julho a 5 de outubro de 2002, com 2.363 entrevistas (ALMEIDA, 2007, p. 19). A sexualidade fez parte da amostra e pode ser visualizada inicialmente no seguinte trecho: Sabe-se que, no Brasil, a virgindade das meninas, por exemplo, era um valor importante até, certamente, os anos 1970. Hoje, acontece o inverso. A adolescente virgem tende a ser estigmatizada pelas colegas. Modificou-se, de maneira muito veloz, um core value da sociedade brasileira. Em outra perspectiva, Almeida (2007, p. 152) constata também que não há homogeneidade no pensamento brasileiro a respeito de sexualidade, pois “na verdade, vários abismos separam os brasileiros quanto a valores relacionados 59 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética ao sexo: idade, escolaridade, religião e religiosidade, só para citar alguns”. Por outro lado, a pesquisa nacional do Datafolha (FOLHA, 2007, p. 3), que visitou 211 municípios brasileiros e totalizou 2.093 entrevistados com idade a partir de 16 anos, aponta, dentre diversos aspectos, para o fato de que existe mais tolerância na sexualidade e menos no aborto, que a família é a instituição mais valorizada e que a fidelidade é a qualidade mais desejada no parceiro. O tema do aborto apresentou aumento na taxa de rejeição, sendo a questão comentada por especialistas: Confrontados com a pergunta de que atitude tomariam caso uma filha adolescente engravidasse, 82% responderam que forneceriam apoio para que ela tivesse o filho em qualquer situação. Mas quando a pergunta troca de gênero e se refere a um filho que engravidasse uma garota, o índice dos que apoiariam o nascimento em qualquer situação cai para 71% (FOLHA, 2007, p. 24, 26). Já o Censo Demográfico 2010 (IBGE), na categoria Nupcialidade, Fecundidade e Migração, atestou que do montante das 83.223.618 mulheres brasileiras com 10 anos ou mais de idade, 51.621.903 delas tiveram filhos. Das 71.691.617 mulheres que têm domicílio urbano, tem-se que 44.272.263 tiveram filhos nas cidades e, na área rural, 7.349.640 das 11.532.001 mulheres tiveram filhos. Em relação ao número de filhos, os dados do último Censo Brasileiro registram que 51.621.903 mulheres tiveram 161.060.386 filhos, sendo que 154.101.639 nasceram vivos e 6.958.748 nasceram mortos. 60 Parentalidade e sexualidade Somente na área urbana foram 131.214.409 filhos, sendo 125.654.207 nascidos vivos e 5.560.202 nascidos mortos. Quanto aos nascimentos da área rural, foram contabilizados 29.845.977, divididos entre 28.447.431 que nasceram vivos e 1.398.546 nascidos mortos. Vidal (2002, p. 245), refletindo sobre a questão ética da sexualidade, destaca o seguinte: Um dos bens mais destacados do casamento é a possibilidade de originar uma família. A maioria dos casais integram na relação interpessoal de amor heterossexual o desejo eficaz de culminar a conjugalidade no exercício da maternidade/paternidade. O amor conjugal tem um dinamismo interno que o faz progredir rumo à constituição de uma comunidade mais ampla de pessoas (não só cônjuges, mas também pais e filhos). Parece razoável inferir-se que existe relevância social e ética significativa na busca de identificação da presença ou ausência do projeto de parentalidade, por exemplo, nessas 51.621.903 mulheres brasileiras que tiveram 161.060.386 filhos, a fim de que a instituição e ou a autoridade competente tenha subsídios para discernir quanto às formas adequadas de intervenções sociais em níveis primário, secundário e terciário. 2.3 Sexualidade integrada Na busca da compreensão da sexualidade humana, aponta-se para as diferenças em relação à sexualidade 61 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética animal, atribuindo-as à “não programação” e à possível “dissociação do prazer e função biológica” (SNOEK, 1982, p. 53). Sem dúvida, a sexualidade humana não obedece às leis impulsivas da natureza simplesmente, pois a vontade e a opção humana influenciam, e não está a serviço somente da função biológica, pois também o prazer alcançado na entrega total e amorosa entre homem e mulher é legítimo. No entanto, é necessário um aprofundamento no sentido da sexualidade humana e, para isso, busca-se ajuda de quem evidencia mais claramente esse assunto do ponto de vista da reflexão teológica (KOSNIK, 1982). Uma das questões levantadas hodiernamente refere-se à definição da sexualidade. Em tempos passados, considerava-se a sexualidade humana uma experiência própria somente de pessoas casadas. Hoje, no entanto, entendemos sexualidade como uma maneira de ser no mundo e de relacionar-se com ele, como pessoa masculina e feminina — definição que amplia o sentido da sexualidade para além do meramente genital e generativo. Outra questão levantada é a da personalidade, isto é, enquanto princípio de integração dos vários fins da sexualidade. A sexualidade é um fator que impregna e constitui a estrutura da existência humana, isto é, somos corpo. O corpo da pessoa humana precisa de outro para concretizar a capacidade de partilhar a subjetividade, que se corporifica ou num corpo masculino ou feminino, derivando daí uma experiência diferente do mundo. Na realidade, existe uma atmosfera sexual onde e quando quer que dois seres humanos se encontram. 62 3 Parentalidade e questões sociais5 Estudar a relação entre as questões sociais e a parentalidade implica, por um lado, analisar o acesso à saúde e à informação, relacionadas a fatores econômicos, educacionais, culturais, dentre outros e, por outro, compreender o quanto a vivência da parentalidade tem impacto nessas mesmas questões. Para Beñeraf, muitas chagas sociais estão relacionadas à parentalidade, pois “um filho desejado, ou muito desejado, desejará sua própria vida e também a dos outros que o rodeiam. Um filho não desejado não desejará sua vida e muito menos a alheia, ali abundam os suicídios-homicídios” (BEÑERAF, 2006, p. 55). Desse modo, a abordagem da parentalidade não se restringe ao modo como se planeja a família; inclui o estudo das consequências sociais 5 Uma abordagem mais completa da temática se encontra em: SATO, E. de S. Questões socioeconômicas: o impacto sobre o planejamento da parentalidade. 2014. 137 f. Dissertação (Mestrado em Teologia) – Pontifícia Universidade Católica do Paraná, 2014. Planejamento da parentalidade no contexto da bioética desse planejamento, desde o estudo das relações familiares até a violência social e política. Abre-se, assim, uma análise complexa de dupla via: há impactos sociais no planejamento da parentalidade, o modo como se vive a parentalidade é muito influenciado pelas questões sociais. A dificuldade de acesso à educação formal, por exemplo, causa menor acesso à saúde, e vice-versa. A violência sofrida pela mulher diminui sua capacidade de pensar a parentalidade e a parentalidade assumida sem o necessário cuidado e planejamento gera aumento da violência doméstica. 3.1 Saúde da mulher e gênero Abordar a questão da parentalidade em nosso sistema de saúde exige pensar a saúde da mulher e sua relação com a questão de gênero. A perspectiva de gênero é uma exigência de nossos dias e, embora não seja aceita por muitos, ela revela situações de desigualdade antes camufladas. Tal perspectiva nasce do fato de que, em diversas sociedades, encontramos a definição do ser homem e do ser mulher colocada de maneira diversa. Algumas sociedades trazem uma definição rígida dos papéis, enquanto outras defendem uma flexibilidade nos papéis de ambos. O estudo de gênero aponta a imposição de papéis rígidos como ideologia, principalmente vinculada à ideologia da superioridade masculina. Assim, identificam-se os mecanismos de determinação dos papéis sexuais por meio do discurso competente do poder (CARRASCO, 2008, p. 132). Visto que, em muitas sociedades, a responsabilidade sobre ter filhos 64 Parentalidade e questões sociais e planejá-los está intrinsecamente vinculada ao papel social da mulher, a perspectiva de gênero torna-se indispensável ao estudo da parentalidade. A hierarquia social pode ser, portanto, naturalizada a partir da definição das relações de poder, e dessa forma, a questão de gênero é definida como domínio do masculino sobre o feminino, de modo que a violência de gênero, embora diga respeito às relações que envolvem homens e mulheres, “incide principalmente sobre as pessoas do sexo feminino e constitui uma questão de saúde pública” (MINAYO, 2010, p. 95). Estudos realizados confirmam que a violência de gênero representa grave problema de saúde para a mulher. Além disso, não é apenas uma anomalia na realidade brasileira. Em outros países, as mulheres não apenas sofrem igual sorte, mas passam por situações ainda mais graves. Essa tomada de consciência avança em ritmo mais lento do que o desejado, como afirma Minayo (2010, p. 53): “o reconhecimento do problema da violência pela área da saúde no Brasil vem se fazendo de forma fragmentada, lenta, intermitente, mas progressiva”. Uma ação política organizada poderá, mesmo que aos poucos, inserir a mulher no campo dos direitos econômicos e da saúde. Essa tem sido a linha de ação: a participação do movimento de mulheres brasileiras, na introdução da violência de gênero na pauta do setor saúde no Brasil, teve uma expressão fundamental na Construção do Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher (PAISM) promulgado em 1983 (MINAYO, 2010, p. 54). 65 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética O acesso à saúde da mulher está relacionado à defesa de sua dignidade, e a negação a esse acesso faz parte de um amplo cenário de desigualdades sociais e econômicas. Essa negação fere a dignidade da mulher e superá-la é tarefa de todos, pois o “compromisso ético de garantir uma assistência adequada e atenta às especificidades de nossa população materno-infantil é um imperativo para todas as categorias profissionais de saúde” (TELES; BORGES, 2005, p. 78). 3.2 Educação e cuidados em saúde Constituem fatores de exclusão as questões étnicas, educacionais e de gênero. A pouca atenção dada à tão importante questão social e humana tem nos levado a transformar em desigualdades o que é apenas uma diferença. Segundo Martins (2006, p. 2474), “os dados evidenciam que as mulheres negras vivem em piores condições de vida e saúde. Vários autores afirmam que as mulheres negras têm os piores níveis de renda e escolaridade no Brasil”. A educação, ou a falta dela, é responsável direta pelo sofrimento, pela dor e pela morte de muitas mulheres no Brasil. Toma-se consciência de que a saúde é resultado de múltiplos fatores, dentre eles o acesso à educação com qualidade. A questão da saúde relaciona-se à disponibilidade de serviços de saúde, mas está também intrinsecamente ligada à capacidade de autocuidado da população. Aqui se evidencia a relação entre saúde e educação e, para nosso estudo, a relação entre escolaridade e saúde materno-infantil (TREVISAN et al., 2002, p. 297). 66 Parentalidade e questões sociais O nível de instrução, portanto, é muito relevante na emancipação da mulher, necessária para que ela possa ser parte ativa e consciente do planejamento e dos cuidados necessários para a vivência da parentalidade. Trevisan et al. (2002, p. 298) apontam para a falta de escolaridade e atividades educativas. A constatação de que a baixa escolaridade estava significativamente associada à falta de qualidade da assistência pré-natal é relevante, principalmente considerando-se a baixa escolaridade das mulheres estudadas e a falta de desenvolvimento de atividades educativas por parte das equipes de saúde responsáveis pela atenção pré-natal. Aqui nos deparamos com essa cadeia de questões inter-relacionadas. A negligência no pré-natal não está apenas relacionada à morbidade e à mortalidade maternas, mas também à mortalidade infantil. Crescem o índice de aborto e a violência contra a família e a vida, situações cuja origem está nas deficiências das políticas públicas e no baixo nível de formação e informação das mulheres. O fato é que nos parece que tudo está muito ligado: o nível de escolaridade feminina está diretamente atrelado à qualidade de vida das mulheres e, consequentemente, de suas famílias. Desse modo, para a mulher, a luta por emancipação passa pela luta por sua saúde, ou seja, a luta para a superação da mortalidade e da morbidade maternas está inserida na luta pela emancipação da mulher. Reiteramos que, embora a educação como um todo seja o caminho para as mudanças efetivas, para o planejamento 67 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética familiar é necessário especificamente o avanço na educação sexual e na tomada de consciência dos chamados direitos sexuais e reprodutivos. São variados os métodos e ainda escassas as orientações. Sem a cultura do planejamento familiar, resta evitar a gravidez, muitas vezes até sem acompanhamento clínico, sem orientação de profissional de saúde. A combinação de práticas contraditórias de contracepção, assim como o uso indiscriminado de contraceptivos, são agentes silenciosos que, quando se manifestam, já é em forma de doenças graves. Por isso, o planejamento familiar deve ser realizado com informação e conhecimento, a fim de escolher o momento pertinente para a concepção ou não. A decisão para escolha do método contraceptivo deve ser avaliada pelo casal e pelo profissional de saúde, o que demonstra maturidade e responsabilidade, devendo-se levar em consideração a idade, o nível socioeconômico, a paridade, o contexto social e o religioso, o que melhora a qualidade de informações sobre saúde reproduzida (CURITIBA, 2006). A ineficiência e mesmo a ausência de políticas públicas de qualidade aparecem nas mutilações, nas situações de morbidade materna e nos óbitos prematuros e causados por doenças evitáveis passíveis de prevenção, mas que são negligenciados. O planejamento familiar tem um impacto positivo sobre o bem-estar de uma família, especialmente na vida das mulheres e das crianças. Pode reduzir gravidez de risco e a mortalidade materna. 68 Parentalidade e questões sociais 3.3 Parentalidade e violência Outra questão social relacionada ao planejamento familiar é a violência, especialmente a chamada violência doméstica, que vitimiza principalmente crianças, mulheres e idosos. “Em um mundo predominantemente povoado por gravidezes se desejadas, por filhos se desejados, por partos não traumáticos, por acolhimento pós-natais não traumáticos, senão acolhimentos cordiais, obteremos o alto grau de paz política e social a que todos aspiramos” (BEÑERAF, 2006, p. 58). De modo geral, um filho desejado e planejado com responsabilidade tem maior possibilidade de ser acolhido com alegria, criado com respeito e sem violência. Estudos apontam que o âmbito familiar é o lócus privilegiado da violência contra a criança e “assume formas variadas, isto é, através de violência física, violência sexual, violência psicológica, abandono intencional e negligência, ou seja, por um conjunto de atos violentos denominados ‘maus-tratos’” (DESLANDES, 1994, p. 178). Por se tratar de uma realidade familiar, há, todavia, uma relação de cumplicidade entre os adultos agressores, entre os que maltratam e os que acobertam ou ajudam a acobertar. A renda e o grande número de filhos — elemento diretamente relacionado com planejamento familiar — são fatores agravantes dessa violência: as condições econômicas das famílias atendidas neste serviço apontam que a maioria absoluta (sempre acima de 70,0%) percebe uma renda familiar variando entre ‘menos de um salário mínimo (SM)’ a ‘três salários mínimos’. Dessas famílias investigadas, cerca de 80,0% têm 69 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética dois ou mais filhos, agravando a situação de pobreza constatada (DESLANDES, 1994, p. 179). No âmbito de um estudo sobre planejamento da parentalidade, enfatizaremos a questão da violência contra a mulher, especificamente nos aspectos relacionados com a concepção, a gestação e a parto. A violência contra a mulher apresenta-se como expressão cultural, tendo por consequência máxima a morbimortalidade materna. Porém, antes de chegar à fase mais aguda, acontecem variadas formas de discriminação, preconceitos e opressões específicas e têm sua origem e sua razão no fato de ser mulher. Os dados sobre a morte materna no mundo são, sob todos os aspectos, assustadores. a cada minuto morre no mundo uma mulher em virtude de complicações da gravidez e do parto. Ao fim de um ano, todas essas mortes somam 529 mil, a maioria das quais ocorre em países em desenvolvimento e poderia ser evitada. Para cada mulher que morre, outras trinta sofrem sequelas ou problemas crônicos de saúde (MARTINS, 2006, p. 2473). Chamam a atenção não somente os números, por si só assustadores, mas a forma silenciosa como ocorrem essas mortes. Novamente, a situação socioeconômica e a escolaridade aparecem como fatores que agravam os índices relacionados à mortalidade materna, como vemos no trabalho de Martins (2006, p. 2474): 70 Parentalidade e questões sociais é consenso que a mulheres acometidas pela morte materna são as de menor renda e escolaridade. O Comitê Estadual de Prevenção da Mortalidade Materna do Paraná (CEPMM-PR) referiu, em 1997, que 52,5% dos óbitos maternos ocorreram em mulheres com renda de 1 a 4 salários mínimos, 86,8% em mulheres com escolaridade de 1 a 4 anos e maior risco no grupo entre 35 a 39 anos. Outros estudos confirmam que as mulheres mais pobres também apresentam em geral maior número de filhos e menor acesso à assistência. Também em âmbito mundial os estudos reconhecem que os dados sobre mortalidade materna são incertos e impactados por muitos fatores (MARSTON; CLELAND, 2004, p. 8), mas os dados apresentados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) indicam que o número de mortes por aborto inseguro permanece perto de 13% de toda mortalidade materna. Estima-se que 21.6 milhões de abortos inseguros ocorreram no mundo em 2008. A média de aborto inseguro permanece inalterada: perto de 14 abortos inseguros por cada 1.000 mulheres com idade entre 15 e 44 anos. “Possivelmente o número de abortos inseguros continuará a aumentar ao menos que sejam implantando e fortalecidos medidas para aborto seguro, contracepção e suporte para empoderamento da mulher (incluindo liberdade de decidir se e quando ter um filho)” (WORLD HEALTH ORGANIZATION WHO, 2011, p. 1), 2011, p. 1). Do ponto de vista de saúde — estritamente biológica, que mais pesa no sistema de saúde —, o aborto inseguro é mais cruel, porém não podemos perder de vista que todo 71 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética aborto induzido (safe ou unsafe) é problemático. Essa ponderação não se reflete nos documentos da OMS, os quais aparentemente apresentam a solução do problema apenas com a implementação do aborto seguro. Desse modo, a preocupação com o aborto se mistura com a preocupação com o aborto, que ocorre em condições inseguras. Relatórios mais recentes apresentam números maiores. Em cada ano, no mundo todo, aproximadamente 210 milhões de mulheres engravidam e mais de 135 milhões dão à luz bebês vivos. As outras 75 milhões de gravidezes terminam em interrupção do parto, por aborto espontâneo ou induzido. Estima-se que em 2003 aproximadamente 42 milhões de gravidezes foram terminadas voluntariamente: 22 milhões com segurança e 20 sem segurança (WHO, 2011, p. 2). A OMS define aborto inseguro (unsafe) como um procedimento para dar fim a uma gravidez não desejada realizado por pessoas com falta de habilidades ou em ambiente que não apresenta um mínimo padrão médico, ou ambos, e estabelece uma relação forte entre aborto inseguro e mortalidade materna (WHO, 2011, p. 2). A mortalidade materna é apresentada como a mais grave consequência do aborto inseguro. Os dados estatísticos são complexos, mas mostram que a mortalidade materna acontece de modo específico em diferentes partes do mundo, mais na África do que na América Latina, e muito menos na Europa. Desse modo, uma gravidez na África tem 35 vezes 72 Parentalidade e questões sociais mais probabilidade de matar uma mulher do que na Europa (MARSTON; CLELAND, 2004, p. 7). O fato da mortalidade materna nos países ricos ser tão baixa implica que a maioria das mortes maternas nos países pobres podem ser evitadas, não apenas pelo aumento da riqueza mas principalmente pela melhoria dos serviços pré-natal e de parto (MARSTON; CLELAND, 2004, p. 7). Mortalidade materna está claramente relacionada à idade das mulheres quando estatística simples são examinadas: ela é relativamente alta em idade materna jovem, é mais baixa na idade de 20 a 29 anos e aumenta à medida que a idade materna aumenta, formando uma curva do tipo J. Outros fatores são o número de partos e o espaçamento entre os partos (MARSTON; CLELAND, 2004, p. 9). A relação entre contracepção e mortalidade materna é óbvia, pois diminuindo a taxa de gravidez diminui também a taxa de mortalidade materna. Quando a gravidez é desejada, planejada, tende a ocorrer num contexto de maiores condições de cuidados pré-natais, de parto e pós-parto. 3.4 Contracepção e aborto Gravidezes não planejadas constituem uma séria responsabilidade de saúde pública, pois se percebe claramente uma relação entre aborto e contracepção, sendo que em alguns momentos a contracepção diminui o aborto, conforme indicam estudos da Organização Mundial da Saúde: “Um aumento no uso de contraceptivos e o uso de métodos efetivos 73 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética diminuem a taxa de aborto” (WHO, 2011, p. 10), visto que “gravidezes não intencionais e abortos induzidos podem ser prevenidos ao se expandir e melhorar os serviços de planejamento e escolha familiar” (WHO, 2011, p. 10). Em outros momentos, percebe-se que a falha na contracepção leva ao aborto. Berer (2009, p. 1) aponta que, enquanto a fertilidade declinou para quase metade dos países em desenvolvimento desde os anos de 1960, a motivação para controlar e espaçar os nascimentos cresceu mais rápido do que as taxas de uso de contraceptivos, pois as pessoas que decidem que querem menos crianças utilizam-se de uma combinação de métodos contraceptivos modernos e/ ou tradicionais e aborto. A extensão e a efetividade do uso contraceptivo possuem influência nas taxas de aborto, mas todos os métodos podem falhar, a despeito do bom uso e do uso consistente. Essa relação entre aborto e contracepção foi percebida em países asiáticos onde as taxas de aborto foram influenciadas por políticas populacionais nacionais. Na China, após a introdução da política de um filho entrar em vigor, houve um grande aumento no número de abortos. Também no Vietnã, a contracepção influencia as taxas de aborto pela política de dois filhos, o desejo de famílias menores e serviços contraceptivos inadequados (BERER, 2009, p. 1). Mesmo em países onde a prevalência contraceptiva é muito alta, ainda existem gravidezes não planejadas e abortos. A Holanda tem um programa amplo de educação sexual, bons contraceptivos e serviços de contracepção de emergência: apenas 6% do primeiro nascimento não são planejados e a taxa de aborto é uma das mais baixas do mundo 74 Parentalidade e questões sociais (6 por 1.000 em 1994, comparando 26 por 1.000 nos Estados Unidos), mas o aborto continua uma parte necessária do controle de fertilidade (BERER, 2009, p. 1). A relação entre aborto e contracepção é clara, visto que “[...] apenas o uso de contraceptivos é incapaz de suprir as demandas crescentes de regulação da fertilidade, principalmente nos estágios iniciais da transição de fertilidade. Por volta de 1962 este padrão foi observado em Santiago, Chile” (WHO, 2011, p. 10). Assim, a utilização de métodos contraceptivos menos eficazes significa maior taxa de aborto, como mostrado no trecho do documento: Gravidezes acidentais são mais comuns nos utilizadores dos méttodos tradicionais; substituindo métodos tradicionais por métodos mais modernos é possível reduzir as falhas contraceptivas em 40%. Também, onde métodos de planejamento familiares menos eficazes são comumente utilizados, gravidezes não planejadas, e consequentemente abortos, são mais prováveis de acontecer (WHO, 2011, p. 11). É importante destacar que a contribuição da contracepção para reduzir a mortalidade e a morbidade materna é universalmente conhecida (MARSTON; CLELAND, 2004, p. 5) e estima-se que “de quatro abortos inseguros três poderiam ser eliminados se a necessidade de planejamento familiar fosse totalmente entendida” (WHO, 2011, p. 10). A reflexão sobre o aborto não pode se apresentar como a única e determinante na defesa da vida, no entanto, é uma reflexão necessária, em virtude do contexto sociocultural em 75 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética que vivemos. O aborto tem sido a causa de grandes transtornos para a sociedade, principalmente para as mulheres em condições sociais fragilizadas e desfavoráveis, deixando-as em estado de maior vulnerabilidade. O aborto não pode ser simplesmente incluído no campo das liberdades civis de fazê-lo ou não. As polêmicas e os dados existentes sobre o aborto no Brasil o tornam um problema ainda mais grave, já que temos apenas estimativas que, muitas vezes, nos dão números assustadores. Entretanto, ao mesmo tempo que nos causam espanto, também denunciam a distância das políticas públicas de saúde da realidade da vida, de modo especial a vida das mulheres, e entre elas, a das mulheres economicamente pobres: “uma das estimativas de aborto induzido mais citadas para o Brasil — 1,4 milhão de abortos induzidos ao ano teve como base informações de profissionais de saúde e registros hospitalares” (OLINTO; MOREIRA FILHO, 2004, p. 331). É um número expressivo, ainda mais quando sabemos que são estimativas, fruto de dados parciais, o que nos induz a pensar que o número pode ser ainda maior tendo passado dez anos. O aborto tem sido abordado por nós como um “pacote de dor” para todos os envolvidos, e certamente o planejamento familiar poderá atuar em suas causas. Melhor acesso a planejamento familiar significa menor incidência de gravidezes indesejadas. 76 4 Parentalidade e religião6 Dentro do grande projeto de pesquisa sobre o Projeto de Parentalidade existe uma perspectiva que, a nosso ver, é também significativa. Trata-se da perspectiva religiosa e sua influência no planejamento da parentalidade. Como a temática é muito ampla, vamos nos ater mais às influências das religiões marcadas pela Tradição Bíblica. Para tanto, o fio condutor da pesquisa proposta será, em primeiro lugar, a Bíblia, tanto no Novo quanto no Antigo Testamento. É de extrema importância compreender que não se trata de um trabalho de exegese, mas da busca de respostas às questões aqui propostas a partir da revelação divina, onde Deus se manifesta ao ser humano, como afirma a Constituição Dogmática Dei Verbum (DV, n. 167). Outro texto sagrado a ser estudado com o mesmo reconhecimento dos limites desta pesquisa é o Corão, fonte da fé Islâmica, por esta 6 Uma abordagem mais completa da temática se encontra em: SANTOS, R. B. dos. Impacto da tradição bíblica no planejamento da parentalidade. 2013. 122 f. Dissertação (Mestrado em Teologia) – Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, 2013. Planejamento da parentalidade no contexto da bioética fazer parte das chamadas religiões do Livro (BORAU, 2008): o Judaísmo, o Cristianismo e o Islamismo, colocados nessa ordem em virtude da sequência histórica do surgimento de cada uma. Tanto para o Cristianismo como para o Islamismo, a Tanakh, texto sagrado do Judaísmo (BORAU, 2008, p. 23), reconhecida pelos cristãos como Antigo Testamento, é que dá as bases da fé monoteísta seguida por essas três grandes religiões a serem estudadas aqui, com o intuito de verificar, nelas, sua influência no planejamento da parentalidade. 4.1 Parentalidade no Ocidente: religião ou cultura? Quando estudamos a parentalidade no Ocidente, deparamo-nos constantemente com a influência das religiões. Surge, então, a questão a respeito da cultura e da religião, no sentido de poder perceber como se relacionam nesse contexto. Primeiramente, faz-se necessário o reconhecimento do conceito de cultura, para possibilitar a distinção de suas peculiaridades, respeitando, assim, os limites entre cultura e religião. Para Franz Boas (2010, p. 113), a cultura revela a totalidade das relações dos indivíduos de um determinado grupo. Entretanto, para se falar de religião, é preciso perceber que há algo diferente entre relações culturais e relações religiosas. Nas relações culturais, os objetos podem ser vistos e conhecidos em sua materialidade, além dos aspectos subjetivos que os envolvem. Na relação religiosa, o fundamento é a fé que se manifesta na crença, como afirma 78 Parentalidade e religião Sanches (2010, p. 155): “a crença é um elemento básico da realidade cognitiva humana”. Certamente, podemos afirmar que cada uma das grandes religiões surgiu num determinado contexto sócio-histórico-cultural. Sendo assim, é fundamental perceber que é a partir da cultura que se formam os conceitos religiosos, para que se reconheçam os efeitos dessa relação na maneira como um povo que comunga da mesma fé enfrenta os desafios de seu contexto. Como afirma Tillich (1988, p. 160), “cada religião é em si mesma um fenômeno cultural”. Entretanto, é interessante perceber o quanto esse fenômeno abrange as culturas humanas, e, segundo Hefner (2000, p. 91), “cultura é onde a religião acontece; religião está localizada dentro da cultura”. Mas, é importante perceber que a cultura também é marcada pela religião, pois, sabe-se que o ser humano, desde seu aparecimento no palco da história, manifesta o desenvolvimento de uma atividade religiosa, e que segundo Rampazzo (1996, p. 52), “todas as tribos e todas as populações de qualquer nível cultural, cultivaram alguma forma de religião”, e que “todas as culturas são profundamente marcadas pela religião”. Por outro lado, segundo Geertz (1989, p. 124-125), a afirmação de que todas as sociedades e todos os homens são religiosos não tem confirmação científica, por não existir um estudo antropológico a respeito desse tema, especificamente elaborado. Contudo, Mondin (1983, p. 219) discorda dessa opinião, pois afirma que a religião é uma manifestação tipicamente humana. Cada cultura vive sua religião e nela o ser humano se projeta rumo a uma busca que deverá culminar no encontro 79 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética entre sua materialidade e sua transcendência. Nesse processo há toda uma gama de valores que colaboram na construção de normas éticas que conduzem um povo e isso é diretamente influenciado pela religião, que sendo um “sistema organizado de símbolos, ligados à tradição, contribui para que os indivíduos concretos adotem sua atitude religiosa pessoal” (RAMPAZZO, 1996, p. 52). A existência do ser humano é profundamente marcada pela religião, mesmo que de forma negativa. Entretanto, quando bem situada ela possibilita uma existência mais plena e comprometida com toda a criação. Como afirma Rampazzo (1996, p. 54): “A religião faz parte do ser do homem: sem ela, o homem fica mutilado da dimensão fundamental da própria existência”. Percebe-se então que, inserido em uma cultura, o sujeito pode viver sua transcendência. Quanto a isso, Geertz (1989, p. 104) afirma que pela religião a razão encontra razões para compreender de maneira mais humana seu sentido existencial. 4.2 Abraão, o pai Quando se fala das três religiões monoteístas, ou Religiões Abraâmicas (BORAU, 2008, p. 10) — Judaísmo, Cristianismo e Islamismo —, fala-se dos descendentes de Abraão que afirmam sua descendência como parte de sua confissão de fé. Para os judeus, ele é seu pai na fé, para os cristãos e muçulmanos, é considerado o pai dos que creem (BORAU, 2008, p. 14). Ao buscar os textos sagrados, observamos em seu contexto que a fertilidade é uma bênção divina. Por exemplo, no 80 Parentalidade e religião caso de Abraão (Gn 21), um bem supremo e inigualável. Abraão não se preocupava tanto com outras coisas quanto com a promessa por uma descendência vigorosa e incontável. Um filho legítimo, nascido da união entre o esposo e a esposa, apesar da possibilidade de uma escrava gerar filhos para o casal, é o sinal legítimo da bênção de Deus e certeza da continuidade da família e da permanência dos bens conquistados na família. Para Abraão, não há razão em receber muitas bênçãos de Deus e não ter um herdeiro legítimo (Gn 15). O filho desejado por Abraão é o único digno de desfrutar do resultado do esforço de toda uma vida. Esse filho é querido e amado muito tempo antes de ser efetivamente gerado. Potencialmente, ele já existia na vida de Abraão e Sara, fazendo parte de seus mais remotos planos. Uma casa de família repleta de filhos é sinal da bênção de Deus que eterniza na descendência o amor do casal que os gera, ama e educa. Tal é a importância dada à descendência na história de Abraão, que toma os capítulos 15, 16, 17,18, 21 e 22 do livro do Gênese. Na história de Abraão, percebe-se nitidamente a herança da cultura anterior ao que se pode chamar de mundo bíblico. Tanto no que se refere à própria cultura suméria e babilônica, quanto ao contexto em que ele se insere quando migra para o ocidente do Crescente Fértil, onde se depara com novos povos e culturas. O relato bíblico mostra Abraão como um homem que viveu sua fé segundo seu contexto histórico e foi ao longo de sua vida que ele percebeu a presença de Deus e passou a se relacionar de maneira cada vez mais próxima com Ele. Ansioso por ter um filho para dar sequência à sua família, 81 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Abraão oferece ao Senhor um sacrifício que se transforma em aliança (Gn 15,18). Contudo, a aliança firmada aparentemente não foi suficiente para que Abraão esperasse no Senhor. Sendo originário da Mesopotâmia, Abraão seguia as leis locais como qualquer cidadão de sua terra e de sua época, as quais previam soluções para problemas de seu contexto, dentre eles, a impossibilidade de gerar filhos. Para os mesopotâmicos, um filho era uma propriedade muito valiosa, pois podia gerar lucros a seu pai, além de pagar com seu trabalho os custos de sua criação; o pai recebia os salários referentes ao trabalho do filho que fora alugado a outra pessoa, e podia penhorá-lo ou vendê-lo para dar conta de uma dívida (HAMURABI, 2005, p. 28). Diante dessa realidade, Sarai (mais tarde, Sara), esposa de Abraão, preocupada com a situação de seu esposo, lança mão de uma intervenção terrena na busca da solução da sua infertilidade7: “sua mulher Sarai tomou Agar, a egípcia, sua serva, e deu-a como mulher a seu marido, Abrão. Este possuiu Agar, que ficou grávida” (Gn 16,3-4). Olhando para o texto bíblico que descreve a vida de Abraão, faz-se necessário buscar a legislação vigente no período em que o texto se situa. Trata-se do Código do Rei Hamurabi (1728-1686) (CHARPENTIER, 1980, p. 25), que regulava as ações da sociedade na Babilônia. Esse código foi 7 “Segundo o direito mesopotâmico, uma esposa estéril podia dar a seu marido uma serva como mulher e reconhecer como seus os filhos nascidos dessa união”. Nota de rodapé da Bíblia de Jerusalém, p. 53. 82 Parentalidade e religião colocado em praça pública para que todos pudessem conhecê-lo e cumpri-lo (HAMURABI, 2005, p. 9). O relato bíblico diz que Sarai não hesita em fazer uso desse direito conferido pela lei, pois o filho nascido dessa relação seria reconhecido como seu. O plano de Sarai tem êxito, e Agar, a escrava, engravida. Contudo, o texto mostra que, ao se perceber grávida, Agar começa a tratar Sarai com desprezo (Gn 16,4), o que imediatamente desencadeia uma reação de sua senhora, que exige de Abrão uma atitude. Com a autorização de seu esposo, “Sarai a maltratou de tal modo que ela fugiu de sua presença” (Gn 16,6). Contudo, Agar retorna e permanece por um tempo na condição que lhe é imposta e, depois, acaba sendo expulsa com seu filho Ismael, a pedido de Sara (Gn 21). Os capítulos 17 e 18 do Gênese, contam a respeito da gravidez de Sarai, que passa a se chamar Sara, assim como Abrão passa a se chamar Abraão, pois se tornará “pai de uma multidão de nações” (Gn 17,5). Esse relato desencadeia o que se pode perceber como a primeira crise de Abraão como pai não só no nome, mas efetivamente. O capítulo 22 do Gênesis traz o relato do sacrifício de Isaac, que tem sido utilizado para confirmar a fé de Abraão e sua obediência incondicional a Deus, de maneira que sua fidelidade possa ser compreendida “no sentido mais forte do termo” (BRIEND, 1980, p. 38). O centro dessa reflexão se dá no sentido de mostrar Abraão como temente a Deus de maneira incondicional, “capaz de sacrificar até mesmo o futuro da promessa e que abandona o seu primogênito nas mãos de Deus” (BRIEND, 1980, p. 38), e “se entrega totalmente a Deus quanto ao futuro desta promessa 83 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética feita no capítulo 15” (COLLIN, 1988, p. 42), quanto à herança a ser recebida pelo filho de seu sangue (Gn 15,4). Contudo, a manifestação de fé de Abraão se destaca em Gn 22,8 (COLLIN, 1988, p. 42), quando responde a Isaac que lhe pergunta sobre onde estaria o cordeiro para o holocausto (Gn 22,6-7), diz: “É Deus quem proverá o cordeiro para o holocausto, meu filho”. Tal afirmação de Abraão manifesta claramente um rompimento com a cultura local no que diz respeito ao sacrifício de crianças. O que Abraão oferece em sacrifício não é seu filho, mas um cordeiro, mostrando que a fé do patriarca rompe com os sacrifícios infanticidas de sua época. O Deus de Abraão quer o ser humano vivo, e não a sua morte. Esse relato mostra uma mudança de uma prática religiosa que ocorreu perto do ano 700, quando Israel rompe com os sacrifícios de crianças praticados no mundo urbano monárquico. 4.3 Judaísmo e parentalidade Em 722 a.C., o reino do Norte cai diante do Império assírio e, em 587, Nabucodonosor destrói o primeiro templo de Jerusalém, exilando a população local na Babilônia até que, em 530 a.C., Ciro, imperador persa, toma a Mesopotâmia e favorece a volta do povo exilado a Jerusalém e colabora com a reconstrução do Templo (BORAU, 2008, p. 32). É no exílio que esse povo começa a se referir a seu Deus como único que existe. Com “o Israel pós-exílico, começa a história do Judaísmo” (TASSIN, 1988, p. 7). É a partir do exílio que a identidade judaica se define por meio da reação que ocorre por parte dos profetas e dos sacerdotes do exílio, que 84 Parentalidade e religião perceberam a urgência de viver agora com fé no Deus único e obediência à Lei. Afinal, a derrota para Babilônia tinha um sentido muito mais profundo do que uma mera disputa territorial. Com o exílio, há uma releitura da história por parte dos exilados, e seu retorno se dá em face da experiência dos 49 anos do exílio entre 587 e 538 a.C. (SAULNIER; ROLLAND, 1983, p. 44). O Judaísmo nasce de uma experiência purificadora, na qual tudo que fazia parte de sua identidade antes do exílio ganha novo significado. As próprias consequências da aceitação de Deus por parte de Israel sempre foram confusas, pois “nunca as compreendia plenamente” (MCKENZIE, 1971, p. 134). Não que isso sirva de justificativa para o que aconteceu na história desse povo, mas essa crise colaborou para uma busca no sentido de reconhecer-se como povo de Deus, de maneira muito mais comprometida. Por outro lado, o exílio significou, também, uma diáspora (TASSIN, 1988, p. 14). Além disso, o judeu contrasta do antigo Israel de muitas maneiras, pois após o exílio teve mudanças profundas em seu modo de existir. A geografia e o regime político não serão mais os mesmos, e cede sua importância ao “arcabouço religioso que lentamente vai se instalando” (TASSIN, 1988, p. 69). Enquanto geograficamente o território judaico se reduz consideravelmente, é na diáspora que sua extensão ganha volume. É a centralidade da Torá que manifesta a identidade do Judaísmo que se levanta do exílio, apesar de não haver uniformidade na interpretação da lei. Contudo, o Templo de Jerusalém mantém sua centralidade na devoção judaica e continua sendo o lugar onde o povo se encontra com Deus. A família na época patriarcal era numerosa, e trazia consigo preocupações diferentes, pois sua realidade era 85 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética outra. Eram pastores nômades ou camponeses que necessitavam de um maior número de pessoas. Como não faziam parte da população de uma cidade, não tinham exército que os protegesse. Por isso, uma grande família significava também proteção aos seus membros. Em Gn 14,14, o relato mostra que Abraão reuniu 318 homens de sua família para resgatar seu sobrinho “Ló das mãos dos reis invasores” (ALEXANDER, 1987, p. 278). Além da importância conferida à quantidade de filhos, pois quanto maior “mais forte e rica será a família” (RAMOS, 1999, p. 26), os filhos representam uma prolongação dos pais (Tb 9,6; Eclo 30,4-6), que, como é possível verificar em boa parte do Antigo Testamento, não acreditavam em vida após a morte (RAMOS, 1999, p. 27). Em outras palavras, os filhos proporcionam a manutenção da vida de uma família. Não somente no sentido biológico, mas também no sentido em que levam à frente as tradições familiares com seus valores e suas peculiaridades. É um bem que projeta a família para o futuro, trazendo consigo as raízes que fundamentaram sua existência. Por outro lado, a perda de um filho era uma chaga incurável. Contudo, havia também a ideia de controle da natalidade. Segundo Angus Mclaren (1997, p. 68), “os rabinos judeus recomendavam igualmente a política de ‘malhar dentro e joeirar fora’ enquanto uma mulher amamentasse”. Com relação ao aborto, atualmente, só é permitido no caso de risco de morte para a mulher (SCHERER, 2005, p. 109). Assim, diante dos fatos apresentados pela literatura pesquisada a respeito do pensamento judaico no que se refere ao planejamento da parentalidade, conclui-se que ter filhos 86 Parentalidade e religião é extremamente importante. Constituir família, gerar e educar os filhos são fatos que em si revelam para a família judaica uma manifestação clara da presença e da benção divina em sua vida, e confirmam a aliança de Iahweh com seu povo. 4.4 Cristianismo e parentalidade O cristianismo nasce “no seio do judaísmo” (WEBER, 1970, p. 206) e traz consigo toda a herança de onde nasceu. Abraão é seu patriarca, o que se pode observar na genealogia de Jesus, iniciada na pessoa de Abraão, apresentada em Mateus 1,1-17. Isso reflete na formação do pensamento cristão, que não se desliga de suas raízes, afirmadas por Paulo em Gálatas 3,16: “Ora, as promessas foram asseguradas a Abraão e à sua descendência. Não diz: ‘e aos descendentes’, como referindo-se a muitos, mas como a um só: e à tua descendência, que é Cristo”. Para Paulo, Cristo é “O” descendente de Abraão, e isso está claro para os cristãos que se situam existencialmente na perspectiva da fé, desde os textos mais antigos da Sagrada Escritura. Ou seja, para o cristianismo que nasce no seio do judaísmo, tanto o Antigo quanto o Novo Testamento são fontes que revelam a inspiração divina a partir da realidade dos patriarcas que são, a exemplo dos judeus, seus patriarcas. Cabe aqui a clareza da adequada interpretação entre o Jesus histórico e o Jesus mostrado a partir da fé de seus seguidores. Para uma visão baseada na fé, ele é o Filho de Deus (Mc 1,1.15,39b), o Messias (Mt 5-7), o Senhor (Lc 7,13.19), o 87 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Salvador (Lc 2,11; At 5,31; 13, 23), o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo (Jo 1,29). A atividade de Jesus pode ser situada a partir dos relatos evangélicos. Nos evangelhos de Lucas e Mateus (Lc 1,5; Mt 2), sua atuação pública se dá a partir de seus 30 anos de idade aproximadamente (Lc 3,23), ocorreu durante poucos anos e em uma área restrita de sua região, mais precisamente na região da Palestina de população judia, principalmente na Galileia. Em seu contexto, Jesus seguiu naturalmente as tradições a que estava ligado. Sua vida era de um pobre trabalhador com poucos recursos e muitas dificuldades. A partir do momento em que assume sua atividade de pregador do reino de Deus, abandona sua atividade profissional e segue seu caminho até o fim. Jesus prega “um mundo novo mais justo e fraterno, no qual Deus pudesse reinar como Pai de todos” (PAGOLA, 2011, p. 51), ou seja, o reino de Deus é onde Ele pode reinar como Pai de todos, e se pode é pela aceitação e pelo envolvimento da humanidade nesse reino, onde ninguém é coadjuvante, mas todos protagonizam sua materialização no contexto humano. Para Jesus, Deus, que é Pai, quer estar muito próximo da humanidade e de toda sua criação, manifestando seu amor e seu cuidado com todos. Isso se revela por meio das atitudes do próprio Jesus, que se aproxima de todos os excluídos em seu tempo, em virtude, principalmente, do rigor da Lei. Essa percepção deu ao cristianismo seu caráter universal, concretizado pela atividade missionária da Igreja nascente, principalmente por Paulo. No segundo século, já se percebe um alcance da missão cristã a todos os povos 88 Parentalidade e religião do espaço mediterrâneo. Irineu de Lião menciona em seus escritos a existência de igrejas na Espanha, no Egito, entre os celtas, no leste, na Líbia e nas províncias germânicas (LENZENWEGER et al., 2006, p. 15). No que se refere à parentalidade, a história de Jesus contada pelos evangelhos de Mateus e Lucas, encontram-se relatos que vão diretamente ao centro da discussão a respeito da dignidade da vida desde a vida intrauterina. No evangelho de Lucas, ocorre a narrativa do anúncio do nascimento de João Batista (1,5-25): “ficará pleno do Espírito Santo ainda no seio de sua mãe (1,15). Em seguida, ocorre o relato da anunciação do nascimento de Jesus (1,2638) por obra do Espírito Santo, e em Lc 1,39-41, está a visitação de Maria a Isabel. Esse encontro, marcado por forte emoção, revela que, quando Maria chega, “a criança lhe estremeceu no ventre e Isabel ficou repleta do Espírito Santo” (Lc 1,41). No evangelho de Mateus, não se encontram tantos detalhes, a não ser com respeito ao cuidado de José em repudiar Maria secretamente, pois a denúncia por adultério e fornicação resultaria na pena de lapidação, ou seja, Maria seria apedrejada até a morte (Dt 22,22-29). Contudo, José é alertado durante um sonho para que não temesse receber Maria como sua esposa, pois a criança havia sido gerada pelo Espírito Santo (Mt 1,20). Em todos os relatos citados, observa-se o cuidado para expressar o valor da vida dessas crianças já no útero de suas mães de maneira muito especial. O desenvolvimento cultural que ocorreu no cristianismo desde sua origem até a atualidade trouxe opiniões e debates que se estenderam durante longos períodos. Com 89 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética respeito à parentalidade, surgiram dentro da história cristã diversos pontos de vista. As influências externas que permearam o contexto histórico-cultural do cristianismo nascente, contribuíram para formular um pensamento ético que serviu de referência para o modo de ser naquele contexto. A opção pelo celibato que Paulo expressa em 1 Cor 7,1b: “É bom ao homem não tocar em mulher” é um exemplo claro da influência grega no pensamento cristão, que teve seu início num mundo helenizado. Isso é uma novidade marcante num mundo ainda judeu, pois para os judeus um homem que não se casava não era bem visto por seu povo. Entretanto, isso se justifica pelo contexto de perseguição e martírio que os primeiros cristãos viviam. A herança grega que mais influenciou o cristianismo foi o estoicismo. O ideal estoico é conduzido pela apatia, de modo que se deve romper relações diretas com o tempo e com o mundo, sendo que só assim seria possível ser feliz. É fundamental no estoicismo mudar os desejos e não se preocupar com a ordem do mundo, pois se deve ter fé na providência divina. É essencial que se viva segundo a natureza (CHÂTELET, 1973, p. 178), conduzindo a ação humana segundo suas tendências naturais (CHÂTELET, 1973, p. 19). O pensamento estoico afirma que o ser humano deve viver sua plenitude buscando a naturalidade, ou seja, sua realização está naquilo que naturalmente se manifesta em sua humanidade. Há, contudo, um processo dialético no que diz respeito ao conceito de parentalidade do cristianismo nascente. Como reflexo da influência cultural contemporânea, começam a surgir manifestações daqueles que são considerados os pais da Igreja, a partir da cultura que os cercava, e revelavam ter 90 Parentalidade e religião mais clareza a respeito dos problemas da procriação do que seus contemporâneos pagãos. Sua forma de pensar essa questão, de certa forma e não intencionalmente, acabou legitimando o uso de meios por parte das mulheres no sentido de controlar os partos (MCLAREN, 1997, p. 86). Clemente de Alexandria (150-215) acusava de blasfêmia aqueles que por sua continência iam contra a vontade do Criador e pregavam a rejeição ao casamento e à geração dos filhos. Apesar de sua simpatia com o casamento, pois por ele se podia produzir filhos, afirmava que um casamento casto era o ideal; verifica-se com clareza nessa afirmação a influência estoica (MCLAREN, 1997, p. 91). Para Orígenes (185-255), o casamento era tão pecaminoso a ponto de considerar que os casais não podiam rezar em sua cama, por ser o lugar de seu pecado (MCLAREN, 1997, p. 90). Uma das figuras mais marcantes do pensamento cristão é Aurélio Agostinho, mais conhecido como Santo Agostinho, que criou um paradigma de fortíssima influência no pensamento cristão por muito tempo, afirmando que o casamento tem seu valor na progenitura, na fidelidade e na continência. Não há nenhuma menção ao amor entre os esposos, pois “o ‘amor’ era considerado pelos cristãos desse contexto histórico, como o tinha sido pelos pagãos, uma paixão subversiva e destrutiva e, por conseguinte, perigosa no casamento” (MCLAREN, 1997, p. 92). Apesar de seu respeito pelo casamento, diante dos riscos que se corria ao se tornar escravo da lascívia, Agostinho considerava mais adequado o celibato, pois para ele o mal não estava na copulação, mas no prazer que a acompanhava, e com isso, mais tarde as relações sexuais prazerosas foram consideradas pecado venial e 91 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética o próprio crescei e multiplicai foi interpretado no sentido da razão e não da procriação (MCLAREN, 1997, p. 92-93). Tertuliano (155-220) questionava a vontade de gerar filhos por causa dos riscos que ofereciam à fé. Para Cesário (503-543), Bispo de Arles, a maior parte dos filhos quando se tornam adultos, desejam a morte dos pais (MCLAREN, 1997, p. 94). Apesar de tudo isso, os cristãos faziam peregrinações em que recorriam aos santos para vencer a esterilidade (MCLAREN, 1997, p. 98). Todas essas perspectivas foram, ao longo dos séculos, sofrendo as influências culturais de cada época. Entretanto, no século XIX, na linha das igrejas protestantes, a intervenção era cautelosa no que se referia a assuntos familiares; preferencialmente, discussões a respeito das questões sexuais eram evitadas. As esposas protestantes defendiam a maternidade e preocupavam-se com os métodos masculinos de contracepção, pois nesse contexto eram associados à prostituição. Além disso, o celibato já havia sido questionado por Lutero em seu tratado De Votis Monasticis M. Lutrei Judicium, publicado em fevereiro de 1522 (VALENÇA, 1974, p. 97). A Igreja Católica, já no século XX, manifesta-se de maneira contundente a respeito do controle de natalidade, com um documento polêmico e questionado até por alguns bispos. Trata-se da Encíclica Humanae Vitae, de Sua Santidade o Papa Paulo VI, sobre a regulação da natalidade. O tema da regulação da natalidade já vinha preocupando o Magistério da Igreja havia algum tempo. Em virtude disso, o Papa João XXIII criou uma comissão pontifícia para o 92 Parentalidade e religião estudo da população, da família e da natalidade, confirmada pelo Papa Paulo VI, que, durante seu discurso aos cardeais em 23 de junho de 1964, manifestou seu interesse em reservar para si as decisões a respeito da regulação da natalidade. Quanto ao conteúdo da Humanae vitae (1968), podemos destacar que ela inicia afirmando o que é o verdadeiro significado das duas realidades do matrimônio, ou seja, o amor conjugal e a paternidade responsável. Aponta que o amor conjugal tem como características: ser plenamente humano, fiel e exclusivo, total e fecundo. Quanto à paternidade, insiste que deve seguir a vontade de Deus, expressa na natureza dos atos conjugais que têm sentido unitivo e procriador, deduzindo a partir disso que “todo ato matrimonial deve permanecer aberto à transmissão da vida” (MORA, 1999, p. 500). A influência do pensamento cristão no que diz respeito ao planejamento da parentalidade é inquestionável. Na atualidade, o debate cristão com as propostas e perspectivas propostas pela contemporaneidade não flui com facilidade, e não se espera que de fato haja um consenso, pois esse debate entre fé, ciência e as tendências contemporâneas — que têm relativizado o valor e a dignidade da vida desde o momento de sua concepção — mostra-se longe de encontrar uma solução que possa valorizar a diversidade das perspectivas, sem correr o risco de relativizar o valor da vida, que para o cristianismo é inquestionável, conforme as palavras do próprio Cristo em João 10,10. 93 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética 4.5 Islamismo e parentalidade O islamismo, depois do judaísmo e do cristianismo, “é a terceira das grandes religiões reveladas” (SAMUEL, 1997, p. 236). Contudo, ele se posiciona de forma a abrogar as perspectivas judaica e cristã, com a intenção de aperfeiçoá-las com a justificativa da necessidade do retorno à religião autêntica que, segundo o pensamento islâmico, foi distorcida pelo judaísmo e pelo cristianismo. Contudo, apesar da existência de pontos comuns entre essas três religiões, paira uma atmosfera de distanciamento irreversível, em virtude das visões teológicas excludentes de cada uma delas. Entretanto, na atualidade, por meio do macroecumenismo, há uma grande possibilidade de “um diálogo dinâmico e fecundo” (SAMUEL, 1997, p. 236). O islamismo nasce na aridez do deserto, trazendo consigo as marcas desse contexto. O fundador do islamismo foi Maomé, ou Mohamed, que em árabe significa “muito louvado [...], nasceu no dia 9 do mês de Rabi-Awal, que corresponde ao dia 20 de abril do ano 571 d.C.” (BORAU, 2008, p. 102). Descendente da tribo dos Haxemitas, poderosos mercadores na região de Meca e em outros lugares. Perdeu seu pai antes de nascer e sua mãe faleceu quando ele tinha cerca de 7 anos. Contudo, logo após seu nascimento, sua mãe o entregara a Halima, uma ama de leite beduína. Após a morte de sua mãe, Maomé ficou sob a custódia de seu tio Abú Talib, que o tratou como um filho. Mais tarde, durante suas atividades profissionais, conheceu Cadija, viúva e rica que se apaixonou por Maomé e se casou com ele. Nessa época, na cidade de Meca, a Kaaba era um centro religioso que guardava as representações das divindades 94 Parentalidade e religião coraixitas que totalizavam um número de 360, sendo “uma para cada dia do ano, e a famosa pedra negra” (BORAU, 2008, p. 103). Sabe-se que, por volta de 600 d.C., durante várias viagens, Maomé pôde conhecer as religiões judaica e cristã, das quais traz as influências que o ajudam a moldar o que seria mais tarde o islamismo que hoje conhecemos. O livro sagrado do islamismo é o Corão, que, segundo Maomé, lhe foi ditado por Deus por meio do arcanjo Gabriel, nele “encontram-se as revelações que Alá fez ao profeta Maomé e que foram compiladas pelos seus seguidores” (BORAU, 2008, p. 111). O termo islã por si só já traduz o modo de ser dos islâmicos, pois significa submissão, o que se revela por uma de suas fórmulas, que afirma: “Inch Allah! , Mektub!”, traduzido como “é a vontade de Deus, isto é, é o destino, contra o qual nada se pode fazer” (SAMUEL, 1997, p. 237). Para Scherer (2005, p. 15), islã significa entrega, reconciliação, e tem proximidade com o termo Salam, que significa paz, totalidade, como no hebraico shalom. A condição da família no islã difere do judaísmo e do cristianismo, apesar de anteriormente existir a poligamia em Israel e no cristianismo nascente. No islã, um homem pode possuir “quatro esposas legítimas” (BORAU, 2008, p. 122). A condição da mulher no islamismo, como no judaísmo e no cristianismo nascente, é de inferioridade diante do homem. Exemplo disso é que, se uma mulher for testemunhar em juízo, seu testemunho só terá metade do valor do testemunho de um homem (SAMUEL, 1997, p. 261). O islamismo atribui à vida um valor inestimável, sendo o seu núcleo fundamental a família, “o primeiro meio de sociabilidade do ser humano, o local onde ele aprende 95 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética as primeiras normas, que o seguirão para o resto da vida” (KHALIL; NASSER FILHO, 2003, p. 73). No Corão, a Súratu AlMái’Dah (A Sura da Mesa Provida) ayát (versículo) 32 mostra com clareza que um inocente jamais poderá ser morto. Por isso o aborto não é permitido, a menos “que a mãe esteja em perigo, ou que a gravidez seja resultado de um estupro” (SCHERER, 2005, p. 110). Fica claro que, quanto à dignidade o embrião não é diferente de ninguém que já tenha nascido, pois se trata de uma vida e, por isso, deve ser defendida, a menos que incorra em risco de vida à sua mãe, pois a vida é um dos direitos “inalienáveis da criança no Islão” (sic) (ABDALATI, 1989, p. 185). Como afirma Abdalati (1989, p. 185), “uma das ações mais louváveis no Islão (sic) é o cuidado para com as crianças”. Lembrando que essa dignidade é dada às crianças pelo Islã, independentemente de seu período de vida. Parece naturalmente claro para os islâmicos que a vida humana não pode ser relativizada em nenhum momento de sua existência. É notável a importância dada no Corão à reprodução humana. São várias Suras que revelam a importância da vida desde o momento da fecundação, bem como de seu desenvolvimento. A vida humana é tratada desde sua fecundação não como obra do acaso, mas como obra divina. É o que se pode perceber na Sura do Espedaçar-se: “Ó ser humano! O que te ilude quanto a teu senhor, O Generoso, que te criou e te formou e te endireitou? Na forma que Ele quis, Ele te compôs” (82:6-8). E ainda: “Enquanto, com efeito, Ele vos criou por estágios?” (71:14). Como também em 16:4: “Ele criou o ser humano de uma gota seminal”. O útero materno é 96 Parentalidade e religião considerado pelo Corão como um lugar especial: “Em seguida, fizemo-lo gota seminal, em lugar estável, seguro” (23:13). Ou seja, a vida é incontestavelmente um dom divino para o islamismo. O ser humano, criatura divina, colabora com Deus no processo criativo, mas a vida do ser gerado não pertence ao ser humano, e sim ao Criador. A adoção é algo muito bem visto pelo islamismo, sendo considerada “uma maravilha, uma atitude nobre e preferível dentro do Islam” (KHALIL; NASSER FILHO, 2003, p. 92). Contudo, a inseminação artificial só é possível se for feita com a utilização do esperma do próprio esposo (KHALIL; NASSER FILHO, 2003, p. 93). Quanto ao celibato, este é visto negativamente pelo islamismo: “é visto como uma condição malévola, carregada de efeitos nocivos” (AYYATULLAH, 2008, p. 19), que critica a visão moralista de outras confissões religiosas a respeito da sexualidade. É explícita a naturalidade com que o islamismo trata a questão da parentalidade. A criança deve ser protegida e amada desde sua concepção, não havendo espaço para qualquer relativização da vida, que, sendo dom divino, deve ser respeitada e protegida. A sexualidade vista de maneira positiva, assim como o matrimônio, são os meios proporcionados pelo Criador para favorecer um bom nascimento e, consequentemente, uma vida digna. 97 PARTE 2 RELATÓRIO DE VALIDAÇÃO DE INSTRUMENTO DE PESQUISA 5 Contexto do projeto de pesquisa Neste capítulo situaremos o projeto, indicaremos seus objetivos, suas etapas e o cronograma, mas antes é preciso discorrer um pouco sobre sua história e os momentos vividos pelos membros do projeto. É necessário destacar que o título do projeto inicial (Elaboração e validação de instrumento para avaliar o planejamento da parentalidade no contexto da teologia) indica que a pesquisa se deu no “âmbito da teologia”, por ser a área do programa de pós-graduação de origem do pesquisador e dos mestrandos envolvidos no projeto. No entanto, a pesquisa é claramente interdisciplinar, ou seja, o processo ocorre na perspectiva de uma teologia pública ou, mais claramente, no contexto de uma teologia em diálogo com as outras áreas do conhecimento, principalmente as áreas de saúde. Por isso reiteramos constantemente que o projeto se dá no “âmbito da bioética” e passa a envolver alunos de pós-graduação tanto da área de teologia como da bioética. Tal perspectiva é possível principalmente porque o coordenador do projeto Planejamento da parentalidade no contexto da bioética é docente do Programa de Pós-Graduação de Teologia e do Programa de Pós-Graduação em Bioética da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Vinculado a ambos os programas, o coordenador é líder do Grupo de Pesquisa CNPq Teologia e Bioética, credenciado pela PUCPR e registrado no CNPq em 2002. O que será apresentado neste relatório é o processo metodológico que culminou na validação do instrumento de pesquisa Planejamento da parentalidade no contexto da bioética, excluindo toda fundamentação teórica e o debate ao redor da temática abordada. 5.1 Aspectos históricos, processos e atores da pesquisa Nesta seção serão descritos o desenvolvimento do projeto, seus desdobramentos e o envolvimento de alunos de graduação e pós-graduação. O projeto teve início no primeiro semestre de 2011, durante o período em que o coordenador do projeto fez seu estágio de pós-doutorado em Bioética na Pontifícia Universidade de Comillas (Madri, Espanha), onde abordou o estudo da reprodução humana no contexto da bioética, chegando a propor alguns tipos de projetos de parentalidade. Em 2011, dois mestrandos do Programa de PósGraduação em Teologia aderiram ao projeto. Desse modo, Miguel Fernando Rigoni (psicólogo) passou a pesquisar a relação entre sexualidade e parentalidade, e Juares Celso 102 Contexto do projeto de pesquisa Krum (teólogo) se dedicou a estudar a relação entre modelos de família e parentalidade. Também em 2011, o Projeto Parentalidade acolheu três alunos de Iniciação Científica, que investigaram a temática do aborto em diversos contextos: Alexandre Felício de Campos (aluno de Medicina) fez levantamento da problemática do aborto nos documentos de órgãos de saúde, Castorina Honorato Vidal Casagrande estudou o aborto na pastoral familiar em Curitiba, e Eva Maria Duarte Gomes (ambas alunas de Teologia) abordou a temática do aborto na Pastoral da Criança. Em 2012, no primeiro semestre, dois novos mestrandos aderiram ao Projeto Parentalidade: Edésia de Souza Sato (assistente social), que focou no estudo da relação entre parentalidade e as questões sociais, e Renato Barbosa dos Santos (teólogo), que abordou a relação entre parentalidade e religião. No primeiro semestre de 2012, os quatro mestrandos cursaram a disciplina Leitura Supervisionada, do Mestrado de Teologia, com temas específicos relacionados a parentalidade. Nesse período, os membros do projeto fizeram a revisão teórica, continuada em encontros de estudos semanais ao longo de todo o ano de 2012. No segundo semestre de 2012, o coordenador do projeto foi contemplado com uma Bolsa Produtividade da Fundação Araucária. Nesse mesmo semestre, o Projeto Parentalidade acolheu mais três alunos de Iniciação Científica, os quais se envolveram no estudo das mesmas temáticas abordadas pelos mestrandos: Luiz Felipe da Silva (aluno de Teologia), estudando sexualidade e família, Cecília Francisca dos Santos (aluna de Teologia), estudando o planejamento familiar e questões sociais, e Kelly Fabíola de 103 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Jesus (aluna de Filosofia), abordando o estudo dos modelos de família. Somando todos os integrantes, o grupo elaborou 58 descritores. A partir deste momento o Projeto contou com a colaboração de Solena Ziemer Kuzma, doutora em Saúde coletiva com tese de doutorado em validação de instrumento de pesquisa na área de odontologia. Com os descritores definidos, o projeto foi submetido ao Comitê de Ética da PUCPR e recebeu aprovação em novembro de 2012. Após essa etapa, deu-se andamento à Técnica de Grupo Nominal, cujo processo será explicado adiante. Os resultados da técnica foram analisados conjuntamente pelos membros do projeto e, com base nessa análise, foram validados os descritores para a fase seguinte do projeto — alguns foram retirados, e outros, modificados. Esse processo de validação de cada descritor se tornou parte importante da elaboração das dissertações dos quatro mestrandos membros do Projeto Parentalidade, e a qualificação se deu em maio de 2013, com a participação de dois avaliadores internacionais, além dos docentes avaliadores locais. A partir das qualificações, cada mestrando deu continuidade a seu trabalho, com revisões e adequações dos textos conforme solicitação das bancas examinadoras. Todo o processo de qualificação e a defesa das dissertações também se tornaram momentos privilegiados de validação dos descritores. A maioria fora validada, mas alguns foram novamente modificados ou retirados. Assim, dos 58 descritores inicialmente propostos, 36 foram validados e se tornaram a base da elaboração do instrumento de pesquisa para o projeto piloto. A elaboração do instrumento se 104 Contexto do projeto de pesquisa deu em partes distintas, ora solicitando dados de identificação, ora apresentando as questões para serem avaliadas por escalas numéricas (de zero a quatro), ora apresentando as questões para respostas sim ou não. Tendo em vista que muitos descritores se referiam a uma dupla realidade — primeiro e último filho — os 36 descritores serviram como base para o instrumento com 52 questões. Dessa maneira, chegou-se ao instrumento de pesquisa aplicado em projeto piloto. No projeto piloto, participaram 149 pessoas. Serão apresentados a seguir os resultados do projeto piloto com ênfase para as sugestões de alteração do instrumento de pesquisa. Assim, chegou-se ao instrumento validado que denominamos de Planejamento da parentalidade no contexto da Bioética (anexo), que passa a ser usado nos projetos que se seguirão. 5.2 Contexto temático do projeto No estudo da reprodução humana em bioética, um dos maiores conflitos surge quando nos deparamos com a situação de pessoas com filhos ou mulheres grávidas sem terem um “projeto de parentalidade” explícito ou implícito. Os dados indicam que cerca de 30% dos partos são abortados — esse talvez seja o resultado mais dramático para as mães e as crianças de uma gravidez sem projeto. Mas, certamente, o aborto não é a única consequência, e a gravidez é o centro de situações com fortes implicações para a mãe, as crianças, as famílias e os serviços de saúde. Consideramos que há projeto de parentalidade: a) quando a gravidez é planejada cuidadosamente; b) quando se avaliam também as questões de 105 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética riscos relacionados à maternidade; c) quando a decisão de ter filhos é compartilhada pelos parceiros; d) quando as condições para cuidar dos filhos é avaliada; e) quando o anúncio de uma gravidez se dá num clima de aceitação e alegria; f) quando o parceiro acolhe a criança; g) quando o cuidado dos filhos é preocupação constante; h) quando a possibilidade de um aborto deliberado não é sequer considerado; i) quando a criança cresce sem violência. Quando nos aproximamos do estudo das causas de presença ou ausência de projeto de parentalidade, deparamo-nos com a falta de instrumentos adequados para uma análise ampla destas relações, por causa da complexidade das questões envolvidas. Estudos realizados no âmbito da Teologia focam prioritariamente a defesa da vida e da dignidade da criança e, no âmbito da Saúde, a defesa da vida e da dignidade da mulher. Um estudo no âmbito da Bioética nos desafia a uma visão mais ampla que possa desvendar a realidade a partir de perspectivas que permitam contemplar os dois focos da questão: a dignidade da mãe e da criança. Com base nessas considerações, o Grupo de Pesquisa Teologia e Bioética planeja realizar uma pesquisa qualitativa, em diferentes contextos do Brasil. O pressuposto para que uma pesquisa desse tipo tenha sucesso e seja relevante é a existência de um instrumento de pesquisa adequado, bem elaborado. Por isso, a proposta deste projeto foi elaborar e validar um instrumento que possa ser aplicado em diferentes contextos e permita uma visão mais ampla das questões que envolvem o planejamento da parentalidade. O instrumento visa identificar as causas da ausência ou da presença de projeto de parentalidade em pessoas que 106 Contexto do projeto de pesquisa já tiveram filhos. As causas podem apontar para fatores diversos, por isso o projeto buscará investigar a questão relacionando-a com quatro itens: a) sexualidade; b) modelos de família; c) questões sociais; d) religião, denominados neste projeto de fatores analisados, para os quais foram elaborados descritores específicos, além de descritores de identificação e de parentalidade. Estamos cientes de que validar esse instrumento é uma tarefa complexa, por isso cada descritor precisou ser precedido de uma ampla fundamentação e, depois, ser testado, devidamente validado por especialistas de diferentes áreas e aplicado — como projeto piloto — em determinadas populações. No item específico de metodologia, explicar-se-á todas as etapas percorridas. 5.3 Objetivos Objetivo geral: elaborar e validar um instrumento que permita uma ampla análise das causas de presença ou ausência de projeto de parentalidade em pessoas que já tiveram filhos, ou seja, construir um instrumento que permita identificar o impacto dos fatores analisados sobre o projeto de parentalidade. Objetivos específicos: -- identificar os impactos dos fatores analisados sobre o acolhimento da gravidez; -- relacionar os fatores analisados a indícios de existência de aborto no núcleo familiar; 107 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética -- relacionar os fatores analisados à capacidade de se assumir um projeto de parentalidade pós-fato; -- relacionar os fatores analisados ao fato de a tomada de decisão ser compartilhada ou não; -- relacionar os fatores analisados ao fato de a criança ter sido assumida por ambos os cônjuges; -- relacionar os fatores analisados à avaliação das condições para cuidar ou não dos filhos. 5.4 Etapas da pesquisa realizada Do ponto de vista organizacional, o projeto aconteceu em duas etapas: da elaboração do projeto à técnica de grupo nominal; e da aplicação do instrumento no projeto piloto à apresentação final dos resultados. Na primeira etapa, o projeto foi composto de quatro subprojetos, cada um sob responsabilidade de um aluno do Programa de Pós-Graduação em Teologia da PUCPR: Projeto de parentalidade e sexualidade (mestrando Miguel Fernando Rigoni, ingresso no PPGT em março de 2011); Projeto de parentalidade e modelos de família (mestrando Juares Celso Krum, ingresso no PPGT em agosto de 2011); Projeto de parentalidade e questões sociais (mestranda Edésia de Souza Sato, ingressa no PPGT em março de 2012); Projeto de parentalidade e religião (mestrando Renato Barbosa dos Santos, ingresso no PPGT em março de 2012). De 2011 a 2013, seis planos de trabalho PIBIC também estavam relacionados ao projeto. 108 Contexto do projeto de pesquisa Primeira etapa: da elaboração do projeto à técnica de grupo nominal -- Abordagem teórica do tema: uma revisão de dados da literatura relacionada à pesquisa. Em virtude do caráter complexo do tema estudado, a revisão teórica se dá em diversas áreas: teologia, bioética, saúde, psicologia, sociologia, dentre outras. A abordagem teórica será aprofundada no item sobre revisão teórica. -- Elaboração do instrumento da pesquisa: proposição dos descritores feita a partir da revisão teórica. -Aprovação do Projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa. A submissão do projeto ao CEP da PUCPR ocorreu após a aprovação no Programa de PósGraduação em Teologia8. -- Técnica do Grupo Nominal: técnica de pensamento divergente/convergente para a produção individual e silenciosa de ideias, para a discussão e o esclarecimento em grupo, bem como para a priorização das ideias por meio de votação independente. Consiste 8 O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da PUCPR no dia 7 de novembro de 2012 (CAAE: 02850212.1.0000.0020). Os pesquisadores assumem o compromisso com as questões relacionadas com a ética em pesquisa no Brasil, como a aplicação do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido antes do envolvimento de qualquer sujeito de pesquisa. 109 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética em reunir um grupo de especialistas em um assunto na busca de opiniões consolidadas, priorizando o acordo com criatividade e síntese, numa atitude geradora de ideias (JONES; HUNTER, 1995, p. 376s). O modo como essa técnica ocorreu ainda será explicitado neste relatório. -- Qualificação e defesa das dissertações de mestrado do Programa de Pós-graduação em Teologia: a) Projeto de parentalidade e sexualidade – Miguel Fernando Rigoni (mestrado concluído em julho de 2013); b) Projeto de parentalidade e modelos de família – Juares Celso Krum (mestrado concluído em junho de 2013); c) Projeto de parentalidade e questões sociais – Edésia de Souza Sato (mestrado concluído em fevereiro de 2014); d) Projeto de parentalidade e religião – Renato Barbosa dos Santos (mestrado concluído em julho de 2013). Segunda etapa: da aplicação do instrumento no projeto piloto à apresentação final dos resultados -- Definição do instrumento de pesquisa: foi definido como resultado de todas as etapas anteriores do projeto: revisão teórica, técnica do grupo nominal e críticas feitas ao longo do processo de qualificação e defesa dos projetos dos quatro mestrandos envolvidos. -- Aplicação dos instrumentos em projeto piloto: projeto piloto aconteceu em quatro comunidades de 110 Contexto do projeto de pesquisa diferentes regiões do Paraná: Vila Sabará (Curitiba), Bocaiúva do Sul, Campo Mourão e Pinhais. -- Análise dos dados quantitativos: software SPSS, criado pela IBM, já disponível nos sistemas de pesquisa da PUCPR, utilizado para análise de dados (estatística). -- Validação estatística: análise realizada por meio do Coeficiente Alpha de Crombach. 111 6 Relatório da técnica de grupo nominal O projeto previa ter a participação de ao menos 12 especialistas na Técnica de Grupo Nominal que atendiam aos critérios definidos no projeto aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa, pessoas de áreas diferentes e de áreas relacionadas com o tema estudado. Após a aprovação pelo CEP/ PUCPR, 20 pessoas foram inicialmente contatadas e convidadas a participar da pesquisa. Depois do contato feito por e-mail e uma explicação sobre a técnica que seria composta de duas etapas (uma não presencial e outra presencial), um membro da equipe de pesquisa manteve contato pessoal com cada especialista, para explicar os objetivos e a metodologia da pesquisa. Aqueles que concordaram em participar da pesquisa preencheram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e receberam os descritores para avaliarem. Os descritores foram apresentados no seguinte formato: Planejamento da parentalidade no contexto da bioética A adesão à pesquisa foi muito boa: dezesseis especialistas concordaram em participar da pesquisa e 15 cumpriram ambas as etapas da técnica. Na primeira (não presencial), os participantes fizeram a avaliação dos 58 descritores apresentados. Os descritores avaliados foram recolhidos e analisados por meio do programa SPSS, cujos resultados serão apresentados a seguir. Já a segunda etapa da técnica de grupo nominal9 foi realizada com a presença dos participantes e dos membros da pesquisa. Nela, foram reapresentados brevemente os objetivos da pesquisa, seguidos de uma apresentação sistemática do resultado da avaliação de cada descritor na etapa não presencial. Após a projeção de cada descritor, abriu-se a discussão, com grande interesse e envolvimento dos presentes. Nota-se que o contexto interdisciplinar propiciou manifestação de opiniões em alguns momentos bastante discordantes, mas sempre num clima de complementaridade e cordialidade. A segunda etapa foi gravada, como previa o TCLE, e os aspectos relevantes desse debate foram transcritos e serão utilizados ao longo da pesquisa, principalmente na exposição da avaliação dos descritores. As opiniões dos especialistas foram avaliadas e os pontos divergentes foram destacados para o debate, sem enfatizar, nesse momento, o perfil de cada um. Além disso, há o compromisso em manter o sigilo, preservando a identidade do autor das falas usadas neste trabalho; por esse motivo, optamos por identificar as falas que serão usadas na pesquisa apenas com a sigla (GE), 9 O momento presencial ocorreu 1º de dezembro de 2012, nas dependências da PUCPR, Câmpus Curitiba. 114 Relatório da técnica de grupo nominal indicando que é uma fala que surge do grupo de especialistas, sem referências aos sujeitos específicos. No decorrer da pesquisa, os pesquisadores participaram ativamente do debate, explicitando os objetivos e manifestando as razões que levaram à formulação dos descritores tais como estão. Por isso, no debate também aparecem transcrições de falas dos pesquisadores que serão identificados apenas como GP (grupo de pesquisadores). Após a apresentação e a discussão de todos os descritores, os especialistas fizeram, individualmente, uma reavaliação dos descritores em relação à sua posição inicial, manifestando novamente sua opinião e atribuindo notas. A partir dessa segunda avaliação, os descritores foram reorganizados — isso será apresentado no capítulo 3. O perfil dos 15 especialistas que participaram das duas etapas da técnica de grupo nominal se configura a partir das seguintes variáveis: sexo; instituição onde atua; primeira graduação; área de pós-graduação; maior titulação; e área de atuação. Quanto ao sexo, cerca de 60% dos especialistas era do sexo feminino, e 40%, masculino. Com relação à instituição (Gráfico 1), pelo fato de a pesquisa ser realizada no Programa de Pós-Graduação em Teologia da PUCPR, cuidou-se para que a maioria dos participantes não fosse originária dessa mesma universidade, o que resultou numa participação de diferentes instituições de Curitiba: Faculdades Pequeno Príncipe (FPP), Universidade Tuiuti do Paraná, Universidade Federal do Paraná (UFPR), Centro de Planejamento Natural da Família (CENPLAFAM), Província Marista do Brasil CentroSul (PMBCS), Pastoral Familiar da Arquidiocese de Curitiba. 115 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Uma das características da técnica de grupo nominal é a realização de uma avaliação dos descritores na perspectiva interdisciplinar, por isso a escolha dos especialistas foi pautada também a partir desse fator. Buscou-se, assim, reunir pessoas com uma diversidade de formação acadêmica dentro da área das Ciências Humanas e Sociais, mais afins com a temática estudada. Os especialistas reunidos atuam nas seguintes áreas (Gráfico 2): O perfil dos especialistas quanto às áreas de pós-graduação apresentou o seguinte quadro, disposto no Gráfico 3. O nível de estudos dos especialistas apresentou o seguinte quadro: 60% doutores, 13,3% mestres, 26,7% especialistas. Como 60% dos especialistas convidados são doutores, isso revelou também que sua principal atividade profissional é a docência (46,7%). À parte dos especialistas que foram convidados por terem doutorado em áreas de interesse para a pesquisa, os outros foram convidados por terem suas atividades profissionais vinculadas ao atendimento de famílias (33,3%), seja em consultórios e clínicas ou em atividades voluntárias, como na pastoral familiar (20%). 116 Relatório da técnica de grupo nominal Gráfico 1 - Instituição em que atua Fonte: Dados da pesquisa. Gráfico 2 - Áreas de formação acadêmica: graduação Fonte: Dados da pesquisa. 117 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Gráfico 3 - Áreas de formação acadêmica: pós-graduação Fonte: Dados da pesquisa. 118 7 Resultado da técnica de grupo nominal: definição dos descritores Dos 58 descritores avaliados pelos especialistas, oito se relacionam à identificação dos sujeitos de pesquisa, e dez indicam uma parte central da pesquisa, ou seja, apontam para a questão da existência ou não de projetos de parentalidade. Os demais descritores indicam fatores analisados que, como hipótese deste projeto, têm forte impacto na parentalidade: modelos de família (11 descritores); visão de sexualidade (11); religião (5) e as questões sociais (13). Para a avaliação dos descritores, utilizou-se a técnica do grupo nominal, já descrita neste relatório. A avaliação se deu em duas etapas distintas: etapa não presencial e etapa presencial. Após a realização das avaliações dos grupos presencial e não presencial, os resultados foram comparados cuidadosamente, tendo por base os seguintes critérios: manutenção do descritor sem alteração; manutenção do Planejamento da parentalidade no contexto da bioética descritor com alterações; exclusão do descritor das próximas etapas da pesquisa. Pelo fato de, na etapa presencial, os especialistas terem mais explicações sobre os objetivos da pesquisa e trocarem informações com os outros participantes, a metodologia adotada nos leva a concluir que a avaliação da etapa presencial foi mais consciente. Desse modo uma melhor avaliação dessa etapa servirá para definir a permanência, a alteração ou a exclusão de um descritor das etapas seguintes, que objetivam validar o instrumento de pesquisa sobre parentalidade. 7.1Descritores de identificação Os primeiros 8 descritores visam identificar os sujeitos da pesquisa e poderão estar relacionados com outros grupos de descritores. É interessante observar que, nesse grupo de descritores, todos foram mais bem avaliados na etapa presencial do que na etapa não presencial. Sendo assim, essa avaliação indicou a manutenção de todos os descritores de identificação. O primeiro descritor que identifica o gênero dos sujeitos da pesquisa passa de uma indicação de 80% como indispensável na etapa não presencial para 93% na etapa presencial, e a nota máxima passa de 60% para 93%. O debate realizado sobre esse descritor na etapa presencial apontou para um cuidado especial para a questão de gênero. De acordo com os participantes, atualmente deve-se ter o cuidado de não reduzir as respostas a apenas duas alternativas, como tradicionalmente acontece: masculino e feminino. O Gráfico 4 120 Resultado da técnica de grupo nominal indica as variações dos outros elementos de opinião e das demais notas. Gráfico 4 - Descritor 1 – Identificação de gênero Fonte: Dados da pesquisa. O descritor 2 busca identificar um dado extremamente relevante para a questão da parentalidade: o número de filhos. Atentos à problemática da realidade familiar atual, 121 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética esse descritor indaga também se os filhos são consanguíneos, adotivos ou frutos de reprodução assistida. O Gráfico 5 revela uma melhor avaliação do descritor na etapa presencial em relação à etapa não presencial. Gráfico 5 - Descritor 2 - Número de filhos: consanguíneos/adotivos/ por reprodução assistida/gravidezes múltiplas Fonte: Dados da pesquisa. 122 Resultado da técnica de grupo nominal O descritor 3 indaga sobre a religião dos sujeitos da pesquisa, elemento que permite um mapeamento das futuras realidades a serem pesquisadas no tocante a esse aspecto, considerado pelo projeto como um dos fatores de impacto na parentalidade. É interessante observar que a avaliação desse descritor sofreu considerável alteração de uma etapa para a outra: na etapa não presencial, 53% dos especialistas indica o descritor como indispensável, passando para 80% na etapa presencial; coerentemente, também na atribuição de notas, as alterações passaram de 40% para 80% de uma etapa para a outra. Tendo em vista a realidade brasileira, é interessante incluir nesse descritor sobre religião também a investigação sobre o grau de participação religiosa, pois pretende-se avaliar se o impacto da religião na parentalidade pode variar, não apenas pela adesão a uma determinada religião, mas também pelo grau de envolvimento religioso. O Gráfico 6 demonstra o resultado das avaliações. Com o próximo descritor, inicia-se uma abordagem importante para a validação do instrumento da pesquisa, investigar duplamente a situação apontada por alguns descritores: em relação ao primeiro filho e em relação último filho. Evidentemente, as situações das pessoas mudam ao longo da vida e as condições de projeto de parentalidade podem variar muito de um filho para outro. Mudanças em algumas situações são mais claramente identificadas, como o estado civil, a escolaridade, as condições econômicas etc. Em virtude da dificuldade de se investigar as condições do projeto de parentalidade para cada filho, optou-se por mapear as condições do planejamento da parentalidade no primeiro e no último filho, caso a pessoa entrevistada tenha mais de um filho. 123 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Gráfico 6 - Descritor 3 - Religião: pertença/grau de participação Fonte: Dados da pesquisa. O descritor 4 não foi muito bem avaliado pelos especialistas na etapa não presencial — apenas um terço indicou que o descritor é indispensável. Na etapa presencial, houve uma considerável melhora na avaliação do descritor: 47% dos especialistas indicaram o descritor como indispensável, e 40% atribuíram a nota 6 para o descritor. Em razão dessa mudança da avaliação e também porque o descritor claramente possibilita identificar diferentes modelos de família e 124 Resultado da técnica de grupo nominal possíveis alterações nesses modelos, os pesquisadores optaram pela manutenção do descritor. O Gráfico 7 nos permite ver as alterações nas avaliações e o fato de que em nenhum momento o descritor recebeu uma avaliação ótima da metade dos especialistas. Por causa dessas dificuldades, os pesquisadores se manterão atentos e abertos à possibilidade de alteração ou exclusão desse descritor nas etapas que seguem a validação do instrumento, principalmente na aplicação do projeto piloto. Gráfico 7- Descritor 4 - Estado civil na gravidez do primeiro/ último filho Fonte: Dados da pesquisa. 125 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética O descritor 5, que aponta para a escolaridade das pessoas nas situações de gravidezes, também não foi muito bem avaliado. Aparentemente, as avaliações não foram coerentes na relação entre manifestar a opinião e expressar a nota, pois apenas 47% dos especialistas indica o descritor como indispensável (em ambos os momentos de avaliação), ao passo que 60% atribuiu a nota 6, nota máxima para o descritor (Gráfico 8). Isso nos leva a manter o descritor neste momento da pesquisa. De qualquer modo, estabelecer a relação entre projeto de parentalidade e escolaridade pode ser muito interessante. Gráfico 8- Descritor 5 - Escolaridade na gravidez do primeiro/último filho Fonte: Dados da pesquisa. 126 Resultado da técnica de grupo nominal O descritor 6 pretende relacionar o projeto de parentalidade com a idade das pessoas. Percebe-se claramente uma melhor avaliação do descritor na etapa presencial, principalmente ao atribuir a nota: 80% dos especialistas atribuíram a nota 6. Também é notável a alteração de 13% para zero no quesito considerar o descritor dispensável. O Gráfico 9 indica as outras alterações. Gráfico 9- Descritor 6 - Idade em que a pessoa teve o primeiro/ último filho Fonte: Dados da pesquisa. 127 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética O descritor 7, que busca identificar a renda familiar e sua relação com o projeto de parentalidade, sofreu uma grande alteração nas diferentes etapas da avaliação. É interessante perceber que a dinâmica ocorrida na etapa presencial mudou drasticamente a opinião dos especialistas em relação a esse descritor, de modo que a porcentagem que considera o descritor indispensável passou de 20% na etapa não presencial, para 73% na etapa presencial. A dinâmica da técnica aponta claramente para a manutenção do descritor. Observe, no Gráfico 10, que também houve consideráveis alterações nas atribuições de notas. Na defesa da dissertação, esse descritor foi excluído porque notou-se que seria difícil as pessoas lembrarem de sua renda no período da gravidez. O descritor 8 demonstrou apontar para uma realidade complexa que precisa ser mais bem compreendida. Alguns especialistas manifestaram dúvida se o descritor era relevante, visto que mapear a situação de emprego das pessoas remete a uma grande diversidade de possibilidades. Após o debate, os pesquisadores optaram por manter o descritor com alteração e, ao invés de indagar sobre a situação de emprego, passa-se a investigar a questão de ocupação, por ser, a princípio, mais simples e poder ser reduzida a quatro categorias: empregado, desempregado, autônomo e do lar. De qualquer modo, o Gráfico 11 demonstra uma pequena melhora na avaliação desse descritor na etapa presencial. 128 Resultado da técnica de grupo nominal Gráfico 10 - Descritor 7 - Identificação da renda familiar na gravidez do primeiro/último filho Fonte: Dados da pesquisa. 129 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Gráfico 11- Descritor 8 - Identificação da situação de emprego na gravidez do primeiro/último filho Fonte: Dados da pesquisa. 7.2Descritores sobre projeto de parentalidade Passamos agora a outro conjunto de descritores que aponta para o centro do instrumento de pesquisa que pretende identificar os tipos de projeto de parentalidade ou sua ausência. 130 Resultado da técnica de grupo nominal Os descritores 9, 10 e 11 foram construídos com a intenção de identificar se há “projeto de parentalidade explícito” em relação ao primeiro e ao último filho. O descritor 9 pretende medir se houve planejamento da gravidez claramente, e a avaliação desse descritor demonstra que os especialistas concordam fortemente (80% deles) que se trata de um descritor necessário (Gráfico 12). Gráfico 12 - Descritor 9 - A gravidez do primeiro/último filho fora planejada – houve clara decisão de ter o filho antes de engravidar Fonte: Dados da pesquisa. 131 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética O descritor 10 busca analisar se houve avaliação de riscos relacionados com a maternidade. Compreende-se que, se uma pessoa ou um casal avalia as situações de riscos da gravidez, é porque o planejamento da parentalidade está sendo explicitado. No entanto, esse descritor gerou bastante debate e se revelou um ponto polêmico. Um dos especialistas assim se expressa: “a gente, quando viu esses descritores, viu assim: riscos relacionados com a maternidade. Que riscos? O risco econômico, o risco emocional, o risco da relação entre o casal, quer dizer, ou o risco da própria gestação” (GE). Iniciou-se um debate sobre a necessidade de alterar o descritor a fim de possibilitar a identificação dos diversos riscos que impactam o planejamento da parentalidade. A participação dos pesquisadores se deu visando explicitar que a pesquisa seria muito ampliada e, talvez, perdesse seu foco tentando identificar os riscos inerentes à questão. Assim aparecem as justificativas dos pesquisadores: porque a ideia é um pouco essa de que se em algum momento alguém decidiu planejar ou adiar uma gravidez, por causa do risco materno, é um sinal que nós chamaríamos de ótimo planejamento familiar (GP). Nós não queremos levantar quais são os riscos... Essa pesquisa é menor. Não temos chance, com esse descritor, de mapear quais os problemas. Nós temos nesse descritor a preocupação simples: se você chegou a adiar, ou a ter ou não ter filhos por causa dos riscos, é porque houve planejamento familiar (GP). 132 Resultado da técnica de grupo nominal No entanto, a questão abriu-se para outro tema quando um especialista indica: não, eu acho que poderia colocar os riscos, mas só os indícios, porque dependendo dos riscos você vai ter um projeto de parentalidade. Quer dizer, um projeto você pode até ter, mas pode adiar. Se o pai, por exemplo, é portador de HIVAIDS, vai ter um adiamento, porque, se ele quer ter um filho, vai ter que fazer todo um tratamento e aí vai ter, sim, um adiamento de projeto de parentalidade. Tem muitos casos hoje nesse âmbito. Não é um caso só, são muitos (GE). Com essa fala, apontou-se para o fato de que o descritor indicava apenas os riscos da maternidade, e o questionamento surge: “há o risco da maternidade. E o da paternidade?” (GE). Outro indaga: “seria necessário ver os riscos da paternidade? Seria necessário um outro descritor?” (GE). Desse modo, o debate passou a indicar a necessidade de alterar o descritor incluindo a questão da paternidade. Houve consenso quanto ao fato de que abrir para investigar os tipos de riscos seria inadequado para uma pesquisa que pretende apenas estudar o planejamento da parentalidade. Assim, a sugestão da alteração do descritor surgiu: “talvez a gente fizesse o descritor assim: ‘itens relacionados com a maternidade/ paternidade’. Acho que aí você abre para as duas frentes, mas sem entrar em quais riscos” (GE). É curioso que, mesmo depois de muito debate, esse descritor permaneceu quase que totalmente inalterado nas duas avaliações a que foi submetido. O descritor foi mantido 133 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética com a alteração indicada, mas percebe-se que poderá ser excluído nas etapas seguintes da pesquisa (Gráfico 13). Gráfico 13 - Descritor 10 - Os riscos relacionados com a maternidade foram avaliados antes da gravidez do primeiro/último filho Fonte: Dados da pesquisa. O descritor 11 alerta para vários aspectos, dentre eles, sociais, econômicos e humanos, que deveriam estar presentes 134 Resultado da técnica de grupo nominal num planejamento da parentalidade, voltados para avaliar as condições de pessoas ou casais de cuidar do filho após seu nascimento. A reflexão teórica aponta para o fato de que a parentalidade responsável implica — além da decisão da pessoa ou do casal — o bem-estar dos filhos, e a sociedade atual já não vê com bons olhos aqueles que colocam filhos no mundo sem avaliar as condições de educá-los bem. É interessante observar que esse descritor não foi muito bem avaliado pelos especialistas na etapa não presencial, mas, após o debate e melhor compreensão do projeto, o descritor passou a receber avaliação melhor, de modo que o índice alcançado na etapa presencial chegou a 73%, com indicação de que o descritor é indispensável e 67% com atribuição da nota máxima. Em virtude desse processo de mudança na avaliação de uma etapa para a outra, o descritor permanece claramente sem alteração. As alterações de avaliação de uma etapa para outra podem ser mais bem compreendidas no Gráfico 14. Se os descritores 9, 10 e 11 foram construídos com a intenção de identificar se há projeto de parentalidade explícito em relação ao primeiro e último filho, os descritores seguintes (12, 13 e 14) foram pensados para identificar se há o que chamamos de projeto de parentalidade implícito, ou seja, uma resposta positiva a esses descritores indicaria que ter filhos é parte dos projetos de vida das pessoas envolvidas. Em nossa avaliação, de todos os pesquisadores envolvidos no projeto, o descritor 12 é sintomático e nos permite um primeiro diagnóstico da existência ou não de planejamento da parentalidade: o modo como se dá e é recebido o anúncio da gravidez. Compreendemos que se a notícia da 135 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética gravidez é recebida e anunciada como uma boa notícia, indica que a parentalidade já era parte dos projetos de vida das pessoas envolvidas. Gráfico 14- Descritor 11 - As condições para cuidar dos filhos foram avaliadas antes da gravidez do primeiro/último filho Fonte: Dados da pesquisa. 136 Resultado da técnica de grupo nominal Gráfico 15 - Descritor 12 - O anúncio da gravidez se deu num clima de aceitação e alegria na gravidez do primeiro/último filho Fonte: Dados da pesquisa. 137 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética No entanto, na etapa presencial da técnica de grupo nominal, a questão se apresentou problemática e ocorreu um debate a respeito. Primeiramente, os pesquisadores provocaram os especialistas, manifestando o descontentamento com a avaliação recebida na etapa não presencial: as nossas expectativas se frustram quando a gente vê a resposta indispensável (27%). Se alguém falasse assim: “estou grávida!”, que beleza, que joia. Então um ótimo sintoma... (GP). Então, se a pessoa é mais feliz ou menos feliz no anúncio, é um sintoma para nós que o filho foi bem acolhido ou, “bah, tchê” — vamos ter que lidar com isso! (GP). Os especialistas se dividiram em relação a esse descritor. Um grupo o considerava dispensável e apresentavam alguns argumentos. A maior reação dos especialistas se deu indicando que o descritor pode indicar algo difícil de mapear, por se tratar de alegria, algo subjetivo, que não representa uma tomada de decisão consciente de planejamento da parentalidade: [...] eu coloquei aqui como dispensável, porque eu entendi assim, que essa questão já está entrando no aspecto mais subjetivo. E sobre o aspecto subjetivo, é preciso fazer uma análise de levantamento quantitativo; se é uma coisa qualitativa, você abre um leque, aí já é outra interpretação. Tem que ter cuidado com onde vocês vão colocar esses dados. De que forma isso vai ser levantado. Porque “alegria”, “felicidade”, isso é outro componente. Já está entrando com o aspecto subjetivo (GE). 138 Resultado da técnica de grupo nominal Alguns especialistas reconhecem que a alegria pode ser expressa, mas não indica realmente que haverá um compromisso da pessoa ou do casal com a criança que vai nascer: E há também aquelas pessoas que vão ao estúdio de fotografia e fazem aquela foto, fazem aquele carnaval, vão à internet. Mas é uma encenação de um momento que, da verdade, não tem nem muito. Então eu acho que a falsa alegria fere um pouco a lividez do sentido (GE). Outros especialistas, com base em suas experiências no acompanhamento de famílias, observam que esse descritor é realmente um diagnóstico da qualidade de gestação que a pessoa terá. No atendimento a gente vê quando vem o casal — hoje mais jovem — fazer uma ecografia e, se diagnostica uma gravidez, baixa um ar de tristeza e até de revolta, essa gravidez está condenada (GE). Por tudo isso, defende-se que a palavra alegria precisa ser mantida, pois o aspecto subjetivo pode contribuir muito para a percepção da existência ou não do planejamento familiar. Exatamente. Eu acho que é importante manter a palavra subjetiva “alegria” porque nas questões anteriores existem dados muito objetivos e que se pode fazer esse cruzamento entre o emotivo/intuitivo com aquilo que na prática acontece. Aí eu acho que tem um dado bem interessante para ser cruzado. Justamente por isso a palavra “alegria” 139 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética deveria permanecer, porque isso lá na prática de fato acontece. O primeiro impacto é emotivo e depois... lá na prática, é salário-família, é emprego, a questão de risco da mãe, do pai, tem todas as questões com as quais a gente vai ver se a alegria permanece (GE). Os pesquisadores argumentaram que o fato de se identificar que o anúncio da gravidez se dera num clima de alegria apenas indica que há abertura à gravidez, sem querer definir já, só por esse descritor, como suficiente para qualificar que tipo de planejamento da parentalidade existe. A questão depois vai entrar numa escala — de muita alegria até zero alegria. [...] se o cara colocou ali muita alegria, foi muito feliz nesse momento, nós vamos concluir que há planejamento de parentalidade. Não significa que há um planejamento explícito, vai ter que ver os outros elementos para dizer se foi explícito. Mas ele já vai dizer que houve planejamento. [...] esse seria um sintoma de que há planejamento (GP). Debateu-se também se aceitação não seria menos subjetiva do que alegria, conforme apontou um especialista: “Talvez o clima de ‘aceitação’ seja interessante. A alegria talvez já deixe um pouco a desejar. A aceitação é similar a este fim” (GE). Isso, no entanto, não foi acatado unanimemente: “E se a gente for tomar pela questão da subjetividade, a ‘aceitação’ também é, porque eu posso aceitar e acolher ou eu posso me resignar e, assim, aceitar numa condição...” (GE). Desse modo, 140 Resultado da técnica de grupo nominal levantou-se a possibilidade de deixar o termo aceitação e excluir alegria — não houve reação contrária. Eu acho que tem que deixar os dois (termos), sim, porque há um sinal de que essa criança foi planejada ou não. Eu me lembro da minha gravidez. Então eu penso assim: é um sintoma, como você está colocando, um sinal de que isso foi planejado. Se não há alegria, e com vida, ou você aceita mais resignadamente e não tem o que fazer, então é um dado bastante representativo se foi ou não foi planejada. Então se a ideia é justamente pesquisar isso, então, me parece que está correto indagar... (GE). Esse descritor parece ter suscitado um debate mais amplo, inerente à toda discussão do planejamento familiar e o modo como a sociedade avalia e lida com isso. Alguns pontuam o fato de que a parentalidade pode significar coisas muito diferentes nos diversos contextos sociais. A gente trabalha com grupo em favelas, adolescentes em situação social, a coisa que mais falam é no filho, ficou com meu filho, a alegria do meu filho, e a gente sabe que eles não estão muito com o filho, e onde é que estão? Aquilo é uma mercadoria: filho (GE). Essa questão é relevante e remete para a necessidade de se aprofundar a noção de parentalidade nos diversos contextos. Certamente, esse é um dos limites desta pesquisa, pois os descritores não foram pensados para avaliar as diversas noções de parentalidade, apenas identificar se há ou não planejamento. 141 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Um dos elementos fundamentais deste trabalho é a não pretensão de identificar o conteúdo do planejamento da parentalidade, por mais relevante que isso possa ser. A pesquisa que se pretende fazer situa-se no contexto da bioética e, por isso, tentou-se buscar alguns elementos fundamentais que sejam razoáveis e com ampla possibilidade de diálogo numa sociedade pluralista. Concretamente, estamos dizendo que, independentemente do que significa planejamento da parentalidade nos diversos contextos e em diversos grupos sociais, há na sociedade brasileira um consenso de que ele é importante. Por isso, identificar se filhos nascem planejadamente é relevante para qualquer que seja o grupo social, religioso ou cultural em questão. Apesar da avaliação negativa que esse descritor recebeu em ambas as etapas das avaliações, decidimos por sua manutenção para a próxima etapa do processo de validação, a saber, o projeto piloto. Talvez tenhamos que retirá-lo, mas por hora ele será mantido com alteração, por ser compreendido como um descritor sintomático da ausência ou da presença de projeto de parentalidade. O descritor 13, que busca identificar se o parceiro acolheu a criança na gravidez pode ser compreendido como um desdobrar do descritor anterior, pois o anúncio da gravidez pode se dar num clima de alegria para um parceiro e de tristeza para o outro. Para os pesquisadores, o acolhimento da criança pelo(a) parceiro(a) é também sintoma de planejamento da parentalidade, ao menos implicitamente. O descritor também não recebe uma avaliação muito boa dos especialistas, como se vê no Gráfico 16. 142 Resultado da técnica de grupo nominal Gráfico 16- Descritor 13 - O(a) parceiro(a) acolheu a criança na gravidez do primeiro/último filho Fonte: Dados da pesquisa. O descritor 14, que indaga se o cuidado do filho se torna preocupação constante, foi visto pelos especialistas como um descritor relacionado à parentalidade ao longo da vida da criança, mas irrelevante para indicar se houve planejamento da parentalidade. 143 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética A avaliação bastante negativa que esse descritor recebeu em ambas as etapas da técnica de grupo nominal indicou claramente que ele também deve ser retirado das próximas etapas da validação do instrumento, o que de fato será feito. Menos de 20% dos especialistas consideraram o descritor indispensável, como se vê no Gráfico 17. Gráfico 17- Descritor 14 - O cuidado do primeiro/último filho se tornou preocupação Fonte: Dados da pesquisa. 144 Resultado da técnica de grupo nominal Os descritores seguintes (15 a 18) são pensados para identificar se há o que definimos como planejamento da parentalidade pós-fato, ou seja, identificar as situações em que não há planejamento da parentalidade, mas as pessoas envolvidas abrem-se para a parentalidade após ocorrer uma gravidez. O descritor 15 investiga se o aborto chegou a ser considerado durante a gravidez. Por mais difícil que seja colher essa informação, compreendemos que ela é relevante, pois, independentemente da avaliação moral sobre o aborto, ele aponta, no mínimo, para uma ausência de planejamento familiar, pois usualmente não se abortaria um filho planejado. Na etapa presencial, houve questionamentos de alguns especialistas sobre o assunto. “Quando se fala em aborto aí, vocês tinham a intenção clara de falar de aborto provocado?” (GE). Evidentemente, apenas o aborto provocado tem alguma relação com a presença ou ausência de planejamento familiar. Por isso, é importante distinguir o moral do natural. Somente o aborto provocado implica avaliação moral, pois é resultado de planejamento e decisão humana. O aborto espontâneo, não provocado, pode levar a pessoa a questionamentos existenciais por ser colocada em situação de vulnerabilidade humana, frente à fragilidade própria da condição humana, mas não pode, a rigor, levantar questionamento moral. Um dos especialistas aponta, corretamente a nosso ver, que esse descritor aponta se “o aborto foi cogitado. Não se está querendo dizer que a pessoa fez o aborto, apenas se foi uma opção” (GE). Outro descritor vai buscar identificar se houve ou não aborto no núcleo familiar. Fica claro que pensar em aborto tem relação com o planejamento familiar, e, na ótica de um especialista, com um planejamento familiar 145 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética responsável. “É importante, porque a pessoa pode ter desistido, mas chegou a pensar! [...] Havia um indicativo de que não havia nenhuma vontade! [...] Aí indica um índice de planejamento responsável” (GE). O Gráfico 18 mostra as avaliações que esse descritor recebe. Houve uma melhor avaliação na etapa presencial, pois, principalmente na nota máxima nota-se uma considerável diferença: passou de 27% para 47% de uma etapa para outra. Gráfico 18- Descritor 15 - A possibilidade de um aborto fora descartada na gravidez do primeiro/último filho Fonte: Dados da pesquisa. 146 Resultado da técnica de grupo nominal O descritor 16 foi muito mal avaliado pelos especialistas em ambas as etapas da técnica de grupo nominal, portanto será retirado das próximas etapas de avaliação. A justificativa apresentada pelos especialistas é que esse descritor não aponta exatamente para o planejamento da parentalidade, mas para o exercício da parentalidade ao longo da vida do filho. Observa-se que apenas 27% dos especialistas consideraram esse descritor indispensável. Os demais índices estão no Gráfico 19. Gráfico 19- Descritor 16 - A gravidez do primeiro/último filho foi mal acolhida, mas hoje o(a) parceiro(a) acolhe a criança muito bem Fonte: Dados da pesquisa. 147 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética O descritor 17 também foi muito questionado pelos especialistas, pois eles compreendem que o descritor aponta também para as relações de parentalidade, e não para o planejamento da parentalidade. Esse descritor indaga se o parceiro mantém o cuidado e a preocupação com o filho. Houve amplo debate sobre o assunto, o qual basicamente apontou para a dificuldade de se avaliar ou identificar um projeto de parentalidade pós-fato. Embora o descritor tenha obtido melhor avaliação depois da etapa presencial, passando de 13% para 53%, ele foi excluído por não indicar projeto de parentalidade (Gráfico 20). O descritor 18 voltava a indagar sobre o aborto. Compreendemos que indagar sobre o aborto no contexto do planejamento da parentalidade é relevante, no entanto, os especialistas apontam para a dificuldade de se fazer isso. Visto que já havia um descritor (n. 15) que abordava a questão, vários especialistas recomendavam não retornar a essa questão delicada. Por fim, o descritor recebeu de fato uma avaliação muito fraca, com apenas 27% dos especialistas considerando-o indispensável; portanto, foi retirado do instrumento para as etapas seguintes da avaliação (Gráfico 21). Este conjunto de descritores — do 9 ao 18 — aponta para o centro do instrumento de pesquisa, que pretende identificar os tipos de projeto de parentalidade ou sua ausência. No projeto piloto, acontecerá a validação estatística que poderá definir uma escala para medir e identificar os diversos tipos de projeto de parentalidade. 148 Resultado da técnica de grupo nominal Gráfico 20- Descritor 17 - A gravidez do primeiro/último filho foi bem recebida, mas o(a) parceiro(a) não se preocupa mais com a criança Fonte: Dados da pesquisa. 149 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Gráfico 21- Descritor 18 - Ocorrência de aborto no núcleo familiar Fonte: Dados da pesquisa. 7.3Descritores que indicam modelo de família Os próximos 11 descritores (19 a 29) visam identificar os modelos de família. Desse total, apenas dois descritores 150 Resultado da técnica de grupo nominal suscitaram observações relevantes, em especial na etapa presencial, justificando sua exclusão. Nas duas etapas do grupo nominal, o descritor 19 apresentou um resultado bastante próximo, com o aumento percentual do item indispensável, que passou de 60% na primeira etapa para 80% na segunda. Como consequência, a indicação de necessário passou de 33% na primeira etapa para 20% na segunda. Por sua vez, dispensável passou a ser nulo na segunda etapa. As notas 6 e 5 foram exatamente iguais nas duas etapas, indicando 60% para a nota 6 e 27% para a nota 5 também em ambas as etapas, com um acréscimo de 6% na segunda etapa em relação à primeira (nota 4). Os resultados expostos no Gráfico 22 ratificam a importância de se fazer a pesquisa sobre o compartilhamento dos parceiros quando decidem o momento da gravidez. Portanto, esse descritor foi considerado indispensável. O descritor 20, que indica a ajuda profissional para que a gravidez tenha acontecido, aparentemente apresentou resultados não coerentes entre a expressão da opinião dos especialistas e a aplicação da nota. Na primeira etapa, apesar de somente 20% dos especialistas tê-lo considerado indispensável, 27% desses especialistas atribuíram a nota máxima. Na segunda etapa, houve uma equiparação entre indispensável e nota 6, com 20%. Esse descritor, considerado necessário, recebeu 73% na primeira etapa e as notas foram diversificadas: 33% nota 5; 27% nota 4 e 13% nota 3. Na segunda etapa, houve uma melhora entre a relação da opinião como necessário e notas, sendo atribuído 80% para 151 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética necessário e as notas: 5 com 60%, 4 com 13% e 3 com 7% (Gráfico 23). Com essa avaliação, o descritor foi excluído. Gráfico 22- Descritor 19 - A decisão de engravidar do primeiro/ último filho foi compartilhada pelo(a) parceiro(a) Fonte: Dados da pesquisa. 152 Resultado da técnica de grupo nominal Gráfico 23- Descritor 20 - Ocorrência de ajuda profissional para conseguir engravidar do primeiro/último filho Fonte: Dados da pesquisa. O descritor 21 visa indicar o modelo de família a partir da identificação de com quem a pessoa morava quando engravidou. Durante os debates e as análises dos especialistas na etapa presencial, um dos pesquisadores assim se expressa: 153 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética nós entendemos assim: se eu moro com meu pai, está me indicando um modelo de família; se eu moro com meu parceiro, está indicando um outro modelo de família. Porque a gente entendeu que se pega o modelo de família por essa pergunta. Onde você morava quando engravidou? Morava numa república de estudantes. É outra situação (GP). Gráfico 24- Descritor 21 - Com quem a pessoa morava quando soube da gravidez do primeiro/último filho Fonte: Dados da pesquisa. 154 Resultado da técnica de grupo nominal Com relação ao resultado, houve uma alteração importante relativa à etapa não presencial: 24% para indispensável e 20% de nota 6. Esses percentuais passam para 33%, tanto para indispensável como para a nota 6 na etapa presencial. Já o item necessário, na primeira etapa, resultou em 56%, apresentou 33% de nota 5 e 40% de nota 4. Na segunda etapa, esse item passa para 67%, a nota 5 para 53% e a nota 4 para 7%. O que chamou a atenção foi que o descritor estava sendo considerado dispensável por 20% na primeira etapa e passou a zero na segunda (Gráfico 24). Apesar das pequenas incongruências, optou-se pela permanência desse descritor. O descritor 22 na etapa não presencial não apresentou resultado satisfatório, pois apenas 40% dos especialistas consideraram o quesito indispensável e 47% atribuiu a nota 6. Nas discussões para aprofundamento na etapa presencial, um dos especialistas expressa um fato que acontece em nossos dias: na nossa cultura, o que mais aparece é na segunda união o homem exigir um filho para consolidar e legitimar a relação. E, às vezes, há casos absurdos em que ela disse que tinha feito laqueadura e escondeu isso dele e foi fazer exame para ver se tinha permeabilidade tubária e queria que no laudo não constasse isso porque ela prometeu a ele que lhe daria um filho. Isso é muito complicado, mas o que a gente mais vê é a exigência do homem ter um filho para legitimar uma união (GE). A partir dessa situação, um dos pesquisadores questiona sobre a necessidade de se elaborar outro descritor: “seria necessário outro descritor para pegar esse inverso. Seria: 155 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética o que os parceiros decidem com isso? A gravidez ocorreu para satisfazer os parceiros” (GP). Porém, houve consenso de que não seria necessário elaborar outro descritor e os novos resultados da etapa presencial comprovam essa posição, pois o item passa a ser considerado indispensável por 53% dos especialistas e 47% o consideram necessário, tal qual na primeira etapa e as notas ficam concentradas em 6 por 67% dos especialistas e 5 com 33%, o que na primeira etapa estava mais diluído, com 47% na nota 6, 27% na nota 5, 20% na nota 4 e 7% na nota 1 (Gráfico 25). Esses resultados indicam claramente a importância da permanência do descritor para a identificação do modelo de família. O descritor 23 apresenta resultados coerentes nas duas etapas. No momento não presencial, os especialistas atribuem 73% para o quesito indispensável, enquanto 40% deles atribuem as notas 6 e 5, e 20% a nota 4. Esses percentuais passam para 80% como indispensável, 73% nota 6 e 27% nota 5 na etapa presencial (Gráfico 26). Esses resultados nos levam à manutenção desse descritor, o que é reforçado por não ter havido, na etapa presencial, nenhum comentário adicional ou levantamento de questões. O descritor 24, a exemplo do descritor 21, dá uma indicação direta sobre o modelo de família. Os resultados da etapa não presencial deixam uma sensação de incoerência ao apresentar que 40% e 47% dos especialistas apontam o descritor como indispensável e necessário e 33% e 47% para as notas 6 e 5, respectivamente. Mesmo sem comentários a respeito do descritor, o esclarecimento dos demais descritores analisados até o 156 Resultado da técnica de grupo nominal momento fez com que os especialistas alterassem os resultados: de 53% como indispensável e 47% como necessário, a nota 6 passa a ser de 53% e a nota 5 de 40% (Gráfico 27). Houve, portanto, maior proximidade dos valores percentuais entre as notas e as opiniões. Isso indica que esse descritor é mantido da forma como está. Gráfico 25- Descritor 22 - Um dos parceiros não queria o primeiro/ último filho por já ter filho de outro relacionamento Fonte: Dados da pesquisa. 157 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Gráfico 26- Descritor 23 - A pessoa assumiu a gravidez do primeiro/último filho sozinha Fonte: Dados da pesquisa. 158 Resultado da técnica de grupo nominal Gráfico 27- Descritor 24 - Apoio da família do(a) respondente à gravidez do primeiro/último filho Fonte: Dados da pesquisa. 159 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética O descritor 25 traz resultados interessantes e curiosos tanto para a opinião como para as notas. Nesse caso, houve os dados coincidiram em ambas as etapas. Veja-se que, na primeira etapa, o quesito indispensável está com 53%, o quesito necessário com 40% e o dispensável com 7%. As notas da primeira etapa replicam esses percentuais para as notas 6, 5 e 4 respectivamente. Na segunda etapa, houve um incremento percentual no quesito indispensável, que passou a ser considerado por 87% dos especialistas, e o necessário caiu para 13%, enquanto as notas 6 e 5 também passaram a ter esses percentuais, respectivamente (Gráfico 28). Visto que não houve qualquer comentário a respeito e dado o incremento que se observa, esse descritor será mantido. Ao iniciar a análise do descritor número 26, um dos especialistas levanta a questão: “Isso é um apontamento que eu estou fazendo, mas é inevitável pensar como a pergunta será feita” (GE). Ao que um dos pesquisadores esclarece: “Esta vai ser feita exatamente assim: família, líderes religiosos e profissionais da saúde. Vamos investigar essas três áreas” (GP). Um dos especialistas chega a comentar sobre a pressão vinda de terceiros, citando: “Porque alguns dizem: ‘vocês ainda não têm filhos?’” (GE). O resultado da primeira etapa traz alguma preocupação, pois apenas 27% dos especialistas optaram pelo quesito indispensável, 53% pelo necessário e 20% pelo dispensável. Também as notas na primeira etapa diluíram-se: 27% para a nota 6, 40% para a nota 5, 20% para a nota 4 e 7% para as notas 3 e 1 (Gráfico 29). A etapa presencial trouxe um resultado melhor, com o quesito indispensável chegando aos 53% dos especialistas, 160 Resultado da técnica de grupo nominal o necessário em 47%, e as notas se concentraram em 6, com 67%, e 5, com 33%. A melhora dos percentuais nessa segunda etapa indica a permanência do descritor. Gráfico 28- Descritor 25 - Influência da atividade profissional da mulher na decisão de engravidar mais tarde (adiar a primeira gravidez) Fonte: Dados da pesquisa. 161 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Gráfico 29 - Descritor 26 - Influências de terceiros (familiares, religiosos, profissionais de saúde) na decisão de ter filhos Fonte: Dados da pesquisa. O descritor 27 é questionado quanto à forma como está elaborado. Tanto que um dos especialistas indaga: “Quem é essa pessoa aí? Fiquei em dúvida” (GE). O esclarecimento foi apresentado por um dos pesquisadores: É a própria pessoa que está respondendo. O entrevistado. Eu participei por minha decisão. Como é que eu estou 162 Resultado da técnica de grupo nominal presente nesse momento de conflito? Sou eu que assumo isso ou é o outro? Não, esse assunto quem decide em casa é a minha mulher (GP). Outra questão foi com relação ao tipo de conflito, visto que os exemplos foram apenas três: aborto, doenças e doação do filho. Novamente, um dos especialistas observa: Pois é, mas, vai ser colocado isso como exemplo para a pessoa? Para dar um direcionamento. Porque, por exemplo, pode ter um conflito de separação, morte, ou outro tipo. Então não sei se não teria que olhar isso aqui como na questão anterior. Se você vai perguntar sobre três coisas, tem que olhar para isso (GE). E outro especialista complementa: “Eu acho que a questão da separação é mais presente. Mais frequente” (GE). Diante das controvérsias e, com os resultados da etapa presencial ainda mais desfavoráveis e até certo ponto confusos, tanto no que diz respeito à opinião quanto às notas — que, inclusive, atingiu 13% para a nota zero —, optou-se pela exclusão desse descritor (Gráfico 30). O descritor 28 também teve a forma de sua elaboração questionada. Um dos especialistas inquire: “Mas essa pergunta aqui entra no depois?” (GE). Um dos pesquisadores diz: “Aqui nós estamos querendo investigar que modelo de família ele tem. Se é o homem que faz, se é a mulher que faz, é mais nesse sentido. Captar o modelo de família. Será que essa pergunta ajuda a captar o modelo de família?” (GP). Outro 163 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética especialista afirma: “Eu acho que não” (GE). E um terceiro especialista opina: Uma família patriarcal. Vamos pensar num modelo. Família patriarcal, em que o homem não se envolve com a mulher e com os filhos. Ele só se liga na questão financeira e é ela que define tudo. Tem família hoje que a mulher define tudo (GE). As dúvidas continuam sendo levantadas com a participação de um quarto especialista: “Quem é o responsável? Isso aqui talvez tenha um indicativo. Do jeito que ela está, se parece muito com essa — todos os cuidados com o primeiro/ último filho. Se for com um foco mais...” (GE). Complementada por mais um especialista: “Essa daí não é a pergunta. É só o indicador para fazer a pergunta” (GE). Um dos pesquisadores procura esclarecer mais uma vez: Mas esse indicador seria para captar esse aspecto. Se alguém perguntar se é algo que está respondendo, se é de muito a zero, e ele responder: “Ah, eu tenho zero de participação, tenho zero de participação nisso, e só a mulher tem participação” (GP). A dúvida persiste e o foco passa a ser o modelo de família. A a ideia é mapear que modelo de família nós temos e depois ver se nesse modelo existe mais planejamento ou 164 Resultado da técnica de grupo nominal menos planejamento. Usar esses dados. A gente quer, com essa pergunta, ver qual modelo de família as pessoas estão vivenciando. Aí você pode concluir que nessa família tem mais planejamento, na outra, menos (GP). A polêmica continua, com a indagação: “Deixe só eu entender esse ponto. Esse instrumento é para pesquisar. Vamos entrevistar as famílias e entender qual é o modelo de família do grupo que entrevistamos” (GE). Um pesquisador tenta situar melhor o tema: Não, veja bem, nós estamos querendo saber se há planejamento de parentalidade. Quer dizer, se há planejamento familiar ou não. Mas daí agora, nós estamos vendo se o modelo de família propicia ou não o planejamento. Então nós também queremos saber que modelo de família as pessoas têm para relacionar isso com se há planejamento ou não nesse ou naquele modelo. [...] A gente vai mapear os entrevistados (GP). Ao que é feita a réplica: Tem-se em mente um modelo de família muito idealizado. É isso que eu tenho medo. Você tem uma mãe que trabalha fora e ela pode ter mais culpa para responder do que propriamente dar a informação, não é? Tem gente que está feliz com o tempo que dá aos filhos! (GE) Mais uma vez, a participação de um especialista, que complementa com a seguinte visão: 165 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Mas eu insisto assim, se você tem um apontamento para fazer na escola, a responsabilidade financeira, todos esses critérios, o sujeito deve estar apontado porque ele configura a família. Aí eu pergunto: quem faz tal coisa nesse núcleo aí? Tem que cuidar dos dados cruzados. Tudo isso para definir um modelo de família (GE). As dúvidas persistem e, ao observarmos o Gráfico 31, pode-se ter uma ideia desse descritor. A opinião de indispensável — que, na etapa não presencial, quase atingiu 50% —, após a intensa participação de todos na etapa presencial, caiu dos 47% para 33%. A nota 6, apresentada com 53% na primeira etapa, caiu 20 pontos percentuais, ficando nos 33% na segunda etapa. Diante da polêmica, das controvérsias, da dificuldade em se estabelecer um parâmetro claro até mesmo para os especialistas, há um indicativo muito forte de que para os entrevistados poderia ser ainda mais complexo. Portanto, esse descritor foi excluído. O descritor 29, mesmo não tendo comentários na etapa presencial, reflete o nível de entendimento a que se chegou com o aprofundamento da análise dos descritores anteriores, com o que está presente no Gráfico 32. Na primeira etapa, o quesito indispensável contava com 47% e passou para 80% na etapa presencial. De forma semelhante, a nota 6 — que na primeira etapa teve como resultado 47% —, na segunda etapa, chegou aos 73%. São dados bastante coerentes que justificariam a manutenção desse descritor, porém na defesa o descritor foi excluído por sugestão da banca. 166 Resultado da técnica de grupo nominal Gráfico 30- Descritor 27 - Participação da pessoa na tomada de decisão na hora de conflito (aborto, doenças, doar o filho) Fonte: Dados da pesquisa. 167 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Gráfico 31- Descritor 28 - Cuidado pessoal com os filhos: acompanhamento na escola/responsabilidade financeira/tempo investido com os filhos/ acompanhamento religioso Fonte: Dados da pesquisa. 168 Resultado da técnica de grupo nominal Gráfico 32- Descritor 29 - Decisão de a mulher engravidar relacionada com sua idade (evitar gravidez de risco) Fonte: Dados da pesquisa. 169 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética O resultado, especialmente da etapa presencial, fez com que o descritor 27 “Participação da pessoa na tomada de decisão na hora de conflito (aborto, doenças, doar o filho)” e o descritor 28 “Cuidado pessoal com os filhos: acompanhamento na escola/responsabilidade financeira/tempo investido com os filhos/acompanhamento religioso” fossem excluídos, pelas causas descritas anteriormente. Restaram, portanto, nove descritores que indicam modelo de família para serem utilizados no projeto piloto: os descritores de identificação, aqueles que indicam parentalidade e os que indicam modelo de família, bem como os demais descritores que foram trabalhados por outros três alunos mestrandos, conforme já descrito. 7.4Descritores relacionados com a visão de sexualidade Os descritores de números 30 a 40 visam identificar a existência ou não de impacto da sexualidade na parentalidade. Desses 11 descritores, tendo em conta as observações significativas do grupo de especialistas (GE) na etapa presencial, cinco foram excluídos: os descritores 33 (realização pessoal/alegria em ter o filho), 36 (prática sexual influenciada/adiada por possibilidade de engravidar), 38 (idade de início de sua atividade sexual), 39 (motivações para praticar o ato sexual — realização pessoal/pertença ao grupo/afirmação da identidade) e 40 (ocorrência de abusos sexuais de criança na família). 170 Resultado da técnica de grupo nominal Entretanto, nos debates ocorridos com os examinadores durante a Banca de Qualificação, percebeu-se que o descritor número 38 (idade de início de sua atividade sexual) deveria avançar para a próxima fase, pois foi considerado pertinente ao projeto de parentalidade. Permaneceram ativos, portanto, sete descritores: 30, 31, 32, 34, 35, 37 e 38. A seguir, faz-se a análise dos conteúdos dos 11 descritores, à esquerda, e suas respectivas notas, à direita, considerando-se as duas etapas de participação do grupo de especialistas (GE) na técnica do Grupo Nominal, ou seja, primeiramente na edição não presencial e, posteriormente, no encontro presencial, este, realizado na PUCPR no dia 1º de dezembro de 2012. O descritor 30 obteve, na Etapa 1 (não presencial), o percentual de 53% para a opção necessário e, também, outros 47% para indispensável. A alternativa dispensável permaneceu zerada. Já na rodada presencial (Etapa 2), a adesão dos especialistas elevou a alternativa indispensável para o patamar de 87%, em detrimento dos anteriores 47%. Ademais, o entendimento dos outros 13% de especialistas foram classificados como necessários. As notas lançadas para avaliar o descritor corroboram com a moldura fática do julgamento de conteúdo, bem como de sua pertinência ao objeto da pesquisa, eis que a nota máxima (6) foi assinalada por 60% dos especialistas, contra os 53% da primeira etapa. A nota 5 foi a opção dos outros 40%, que antes fora marcada por 27%, acrescida da nota 4 por mais 20%. As demais notas (3, 2, 1 e zero) não foram apontadas em nenhuma das duas etapas da técnica metodológica utilizada. 171 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Nota-se que não foi lançado numeral algum na cota do dispensável em nenhuma das edições desse trabalho, bem como sequer houve algum comentário, seja por parte dos pesquisadores ou dos especialistas, que justificaria de forma inequívoca a permanência do referido descritor. No entanto, na qualificação da dissertação, o descritor foi excluído (Gráfico 33). Gráfico 33- Descritor 30 - Uso de contraceptivo antes da gravidez do primeiro/último filho Fonte: Dados da pesquisa. 172 Resultado da técnica de grupo nominal O descritor 31 chegou a ser questionado pelo grupo de especialistas (GE) quanto ao vocábulo dificuldades nos seguintes termos: “Que tipo de dificuldades? Podem ser econômicas”. O esclarecimento prestado pelo grupo de pesquisadores (GP) foi no seguinte rumo: “Não, aí é no sentido de engravidar mesmo. Não conseguir engravidar. Dificuldade para ter filho. Não consegue engravidar? E se separa? Isso ocorre? Gostaria de saber. É, gostaria de saber como, quando e o percentual disso”. Na Etapa 1, 33% do GE assinalou indispensável, 53% necessário e 13% dispensável. Já na Etapa 2, desapareceu o crédito da cota dispensável e aumentaram significativamente as marcações máxima e intermediária (para 60% e 40%, respectivamente, indispensável e necessário), fechando a questão. Esse descritor foi bem avaliado na Etapa 2, pois 47% do GE atribuiu-lhe nota 6 (antes 40%), somado à nota 5, com 40% de preferência (antes 27%) e acrescido da nota 4, com 7% de assinalamento. O restante coube ao registro mínimo de nota 3. Nada obstante o descritor não ter atingido unanimidade por parte do grupo de especialistas, sua pertinência foi considerada adequada pelos especialistas e devidamente justificada sua presença na investigação da parentalidade (Gráfico 34). 173 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Gráfico 34- Descritor 31 - Ocorrência de separação do casal devido às dificuldades para ter filho Fonte: Dados da pesquisa. O descritor 32 não recebeu do GE nenhum registro de dispensável, em nenhuma das etapas. Também não teve assinalamentos de notas 2, 1 ou zero. A ponderação do GE ficou por conta da observação no sentido de que “esse problema fica sério quando o primeiro filho vem com problema”. O GP explicou: 174 Resultado da técnica de grupo nominal se fosse acusado pelo segundo filho, poderia ser mais relevante. Teria que colocar na hora de ter o segundo filho, porque o primeiro é difícil de se avaliar. Como é que se vai saber? Entre o primeiro e o segundo, você tem dificuldade. Qual seria o mais relevante? Na Etapa 2, o grau de importância ficou em 67% para a opção necessário (antes 80%) e 33% para a alternativa indispensável (antes 20%). Quanto às notas, tem-se que 47% dos especialistas atribuíram valor 6 em ambas as etapas, 40% nota 5 (antes 33%), 7% nota 4 (antes 20%) e, o restante, nota 3. Nesse contexto, o descritor 32 foi considerado adequado e, por via de consequência, mantido (Gráfico 35). Já o descritor 33 foi excluído, entendendo-se seu descabimento quando considerados os demais descritores já analisados e justificados (Gráfico 36). O descritor 34 ganhou na primeira etapa conceitos de indispensável (40%), necessário (47%) e dispensável (13%). As notas dessa etapa ficaram divididas em 6, 5 e 4 — respectivamente, 40%, 40% e 20%. A Etapa 2 não registrou a ocorrência da opção dispensável. A opção necessário foi elevada para 67% pelo GE (antes 47%) e a alternativa indispensável ficou com 33% da preferência dos especialistas. Nessa etapa derradeira, a nota 6 subiu para 53% (antes 40%), a nota 5 ficou em 33% e, por fim, a nota 4, com o percentual remanescente. Dessa forma, o descritor foi considerado inapto a permanecer nos moldes que norteiam a pesquisa sobre planejamento da parentalidade (Gráfico 37). 175 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Gráfico 35 - Descritor 32 - Decisão de não ter filho em virtude da possibilidade de ter um filho doente Fonte: Dados da pesquisa. 176 Resultado da técnica de grupo nominal Gráfico 36- Descritor 33 - Realização pessoal/ alegria em ter o filho Fonte: Dados da pesquisa. 177 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Gráfico 37 - Descritor 34 - Vínculo afetivo materno/paterno do entrevistado Fonte: Dados da pesquisa. O descritor 35, apresentado no Gráfico 38, obteve adesão do GE nas três alternativas possíveis durante a primeira etapa, assim divididos: dispensável 7%, necessário 60% e indispensável 33%. Embora predomine a categoria necessário, ressalta-se que, se ela for somada à opção indispensável, o descritor totaliza 93% de conveniência e viabilidade de utilização na pesquisa. 178 Resultado da técnica de grupo nominal A atribuição de notas nessa etapa inicial ficou entre 6 (60%), 5 (20%), 4 (13) e zero (7%). Assim, na contabilização das três maiores notas, também se chega ao montante de 93% das escolhas por parte dos especialistas. Durante os embates com os especialistas, o grupo de pesquisadores esclareceu o objetivo em relação ao descritor analisado: “vamos também pegar os três pontos só, não vamos abrir muito: família, escola ou comunidade?”, para evitar desvios de rota na pesquisa. A Etapa 2 expurgou a cota anterior da opção indispensável e fixou a escolha entre necessário (53%), e indispensável (47%). As notas foram distribuídas entre 6 (33%), 5 (47%), 4 (13%) e, finalmente, 3 (7%), fechando a grade avaliativa. Com efeito, o descritor 35 também passou no teste e está apto a ser regularmente utilizado nos objetivos propostos na de pesquisa (Gráfico 38). O descritor 36 também foi excluído, entendendo-se seu descabimento quando considerados os demais descritores já analisados e justificados (Gráfico 39). O descritor 37 trouxe na primeira etapa tanto a avaliação de conteúdo quanto as notas aplicadas de forma consistentes, recomendando desde o início a manutenção desse descritor. Na Etapa 1, a verificação do conteúdo e da pertinência com o objeto da pesquisa ficou entre as demarcações necessário (53%) e indispensável (47%), fechando a preferência de integrantes do grupo de especialistas. Quanto às notas, nessa etapa, 40% atribuíram valor 6, e outros 40%, nota 5. Os outros 20% ficaram divididos entre a nota 4 (13%) e a nota 3 (7%). Portanto, as notas 2, 1 e zero não foram assinaladas. 179 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Gráfico 38 - Descritor 35 - Onde recebeu informações sobre sexualidade: família/escola/comunidade religiosa Fonte: Dados da pesquisa. 180 Resultado da técnica de grupo nominal Gráfico 39- Descritor 36 - Prática sexual influenciada/adiada por possibilidade de engravidar Fonte: Dados da pesquisa. 181 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Os embates na Etapa 2 foram reduzidos no grupo de especialistas. Entretanto, houve manifestação no sentido de que o descritor seria “tão dispensável” (GE), ao que os pares se pronunciaram em tom de defesa da maioria para argumentar que se “você trabalhar com pessoas com HIV-AIDS, você vai ver que isso é um risco. É um grupo de risco, né. Então, isso existe sim” (GE), bem como a constatação de que todas “as DSTs podem interromper” (GE). A posição minoritária, entretanto, continuou na exposição de seus argumentos, nos seguintes termos: O que apresenta essa novidade, de como eu posso evitar, né... Ele tem HIV, mas o parceiro que tem HIV não deixa de ter relação sexual hoje em dia. Eu acho que entram mais as doenças sexualmente transmissíveis, mas, que às vezes, é tão difícil de identificar o parceiro que tenha para poder ter o cuidado. O cuidado é o tempo inteiro. Não é o cuidado porque eu não conheço o outro. Tem que ser um cuidado permanente. A educação em saúde não pode ser um cuidado esporádico. Por isso que na hora eu pensei, mas... Os demais especialistas ainda sustentaram que se trata de “um dado importante para a saúde pública, descobrir que as pessoas não deixam de transar mesmo sabendo que podem pegar uma doença” (GE). Já o grupo de pesquisadores observou que “se a resposta for totalmente negativa, não influencia em nada” (GP). Na Etapa 2, o descritor 37 teve aumentado o percentual do conceito indispensável para 53% (antes 47%) e, por consequência, ocorreu uma diminuição na opção necessário, 182 Resultado da técnica de grupo nominal que ficou em 47% (antes 53%). A discussão, portanto, caminhou no sentido de firmar ainda mais a necessidade de se manter o descritor na pesquisa de parentalidade. A mesma linha de raciocínio pode ser visualizada na alteração das notas, eis que o valor máximo de 6 subiu para 47% (antes 40%), permanecendo o mesmo percentual de preferência das notas 5 e 4, isto é, respectivamente, 40% e 13% em ambas as etapas. Contudo, desaparece a cota da nota 3. Tem-se, assim, plenamente justificada a consistência do descritor 37, por se tratar de uma realidade presente e próxima do tema investigado nessa pesquisa (Gráfico 40). O descritor 38, disposto no Gráfico 41, inicialmente foi excluído, entendendo-se seu descabimento pelo grupo de especialistas (GE), quando considerados os demais descritores já analisados e justificados. Em síntese, o descritor 38 apresentou uma rejeição de 53% por parte do GE na primeira etapa, sendo que 40% dos especialistas classificaram a proposição como necessário e 13% optaram por dispensável. A opção indispensável recebeu, em ambas as etapas, a adesão de 47% do GE. Na Etapa 2, a opção dispensável baixou a rejeição de 13% para 7% e, consequentemente, elevou-se a opção necessário de 40% para 47%. As notas atribuídas na Etapa 1 somaram 60% da preferência do GE entre os conceitos 5 (33%), 4 (13%), 1 (7%) e zero (7%), e apenas 40% lançou a nota máxima. Na Etapa 2, a nota 6 caiu de 40% para 33%. Já a nota 5 aumentou o percentual de 33% para 47%. Também ocorreu a redução da nota 4: de 13% para 7%. As notas 3 e 1 dividiram o saldo. Mas os examinadores da Banca de Qualificação chamaram a atenção para o fato de que o descritor tem conexão 183 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética direta com o projeto de parentalidade e, portanto, deveria avançar para a fase seguinte da pesquisa, o que foi acatado pelo grupo de pesquisadores (GP). Gráfico 40 - Descritor 37 - Prática sexual influenciada/adiada por possibilidade de adquirir doença Fonte: Dados da pesquisa. 184 Resultado da técnica de grupo nominal Gráfico 41 - Descritor 38 - Idade de início de sua atividade sexual Fonte: Dados da pesquisa. O Gráfico 42 apresenta o descritor 39, que dividiu significativamente a opinião do grupo de especialistas (GE) nas duas rodadas de análise do tema. Na Etapa 1, apenas 27% do GE entendeu que o descritor seria indispensável. Outros 40% 185 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética admitiram-no como necessário e, por fim, 33% consideraram o quesito dispensável. O caminho das notas também refletiu a manifestação da opinião sobre os conteúdos, porque somente 13% atribuíram a nota máxima. Já a nota 5 obteve a preferência de 33%, enquanto a nota 4 foi assinalada por 27%. Apareceram, ainda, as notas 3 e 1, ambas com o mesmo índice percentual restante. Durante os embates acadêmicos, a questão foi exposta pelo grupo de especialistas (GE) dentro dos seguintes parâmetros: Essa pra mim seria? Motivações pra praticar? A relação direta entre uma coisa e outra, eu digo tem, mas assim... Eu demorei pra entender. É (necessário) uma pergunta muito limpa pra chegar a planejamento. Me causou um certo, sei lá... Tanta pergunta talvez mais importante pra se fazer quando se refere à parentalidade. É uma percepção bem pessoal [mas eu concordo com você]. Tipo motivações. Tanta motivação que possa ter na vida, que possa influenciar uma coisa e outra. É... Não rolou. O grupo de pesquisadores (GP) apontou: “Ninguém defende o 39. Então, de repente, seja até questionável o descritor”. Ato contínuo, surge nova manifestação indicando mudança de opinião, a saber: “Eu tinha colocado que era importante, né. Agora, escutando ele, fico pensando que parece dispensável” (GE). O especialista que deu início à questão volta a insistir: “é uma pergunta muito primária ao meu ver, assim, muito primeira” (GE). 186 Resultado da técnica de grupo nominal Outra intervenção ocorreu (GE), agora ponderando a possibilidade de se manter o descritor, senão vejamos: Mas veja: a gente não está tentando levantar dados desse projeto de parentalidade, sob a ótica da questão da sexualidade? Como eu vivo isso? Então, assim: qual significado o ato sexual, a sexualidade, tem pra mim? Ah, pra mim, é a realização da minha vida. Pra mim, é porque eu quero estar bem no meu grupo; eu posso estar com meus pares. Ou então: eu quero ser, aquela coisa assim, de firmação da identidade: sou uma mulher desejada; sou um homem viril, né. Então, acho que isso pode ter alguma coisa interessante. A resposta do especialista foi de que pode ter alguma coisa interessante, eu não duvido. A questão que a coisa interessante até o objeto de estudo eu achei muito distante. Foi isso (GE). Outros especialistas acrescentaram: “Não leva, necessariamente, à parentalidade e, também, indica a associação direta, né, entre sexo e gravidez. Sexo e reprodução” (GE). Ocorreu uma nova intervenção do grupo de pesquisadores (GP): “É, ele não faz essa vinculação. Mas eu acho que o objetivo é acatar um pouco do que a Márcia está colocando: que visão a pessoa tem da sexualidade? Motivações?”. Por fim, o GE ainda trouxe a seguinte ponderação: Anos atrás, uma socióloga francesa apresentou aqui um trabalho, uma pesquisa feita no Nordeste sobre as adolescentes grávidas. Então, para a sociedade, eram umas garotas sem vergonha. E, no fundo, a pesquisa mostrou 187 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética que, com uma gestação, elas seriam notadas, que existem, enquanto mulher. Então, a motivação delas pra terem uma criança era uma ação de presença na sociedade. [intervenção breve: caberia uma pergunta direta sobre a motivação pra se ter um filho]. Sem vergonha era a sociedade que as excluía. Em resumo, na Etapa 2 foi notória a sinalização de exclusão desse descritor, visto que a opção dispensável foi apontada por 67% dos especialistas, que, se acrescido de outros 27%, advindos da categoria necessário, somam 94% e, portanto, apenas um percentual mínimo o considerou indispensável. As notas atribuídas também desvelam um caminho de obscuridade para a manutenção desse descritor. A nota 6 teve 20% de adesão (antes 13%) e a nota 5 ficou com 53% das preferências (antes 33%). Já a nota 4 ficou com 7% (antes 27%), a nota 1 apareceu com 7% (antes 13%) e, por fim, a nota zero registrou 13% (antes zero). Diante do que se apresentou nas duas etapas de participação do grupo de especialistas (GE) e, ainda, após as reflexões feitas pelo grupo de pesquisadores (GP), restou firmado o entendimento sobre o descabimento da manutenção do descritor 39, também considerados de forma sistêmica os demais descritores já analisados e justificados. O descritor 40 recebeu, durante a Etapa 1, o maior percentual na opção necessário, com 53% das preferências dos especialistas. Outros 20% se posicionaram na categoria indispensável e, finalmente, 27% escolheram a categoria dispensável. Nessa etapa inicial, apenas a nota zero não foi escolhida. A nota 6 foi alcançada por 27% das escolhas do grupo 188 Resultado da técnica de grupo nominal de especialistas (GE), a nota 5 ficou com 33% das preferências, as notas 4, 3 e 2 com 7% cada uma, e o percentual restante, com a nota 1. Gráfico 42- Descritor 39 - Motivações para praticar o ato sexual (realização pessoal/pertença ao grupo/afirmação da identidade) Fonte: Dados da pesquisa. 189 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Na Etapa 2, foi possível perceber tanto certo temor por parte do grupo de especialistas quanto a sinalização do tamanho do desafio em relação ao tema contido no descritor. A primeira questão a respeito do tema surgiu como forma de indagação: como vai fazer esta pergunta? “É um ponto muito ‘delicado’ e quem passou por isso acaba não falando. Essa é muito mais puxada” (GE). O fato de que a pesquisa não poderia deixar a temática de lado foi apresentado nos seguintes termos: A pesquisa não pode se eximir de fazer esse apontamento, porque, sei lá, eu acho que você não pode perguntar se você foi abusado ou você tem alguém na sua família que foi. Mas se você sabe de casos ou conhece pessoas, não faz diretamente. Porque o que acontece é que os dados sobre abuso sexuais de crianças são os mais difíceis de se obter, inclusive registros inclusive desses casos nas estatísticas aí, né. [...] É uma informação num momento importante da gente, inclusive, cumprir o papel social de levantar isso, porque a sociedade esconde. A família esconde. E não dá mais para esconder o que as crianças têm passado. (GE) Outro especialista ponderou o seguinte: “também tenho dificuldade de fazer uma conexão com o objetivo da pesquisa” (GE). O grupo de especialistas também observou que se a família, se a pessoa tem um olhar sobre isso, ela tem 190 Resultado da técnica de grupo nominal um cuidado em sua organização familiar. Ressaltou, ainda, a existência de um dado patológico nesses casos. Por fim, o grupo de pesquisadores concluiu: “Vamos ver como a gente faz. Depois a equipe ‘quebra a cabeça’. O assunto foi levantado. A relevância, entende?” (GP). Quanto ao conteúdo do descritor, na Etapa 2, tivemos mantido o percentual para a opção indispensável (20%). A alternativa necessário ficou com 33% (antes 53%), e a categoria dispensável subiu nas preferências dos especialistas para 47% (antes 27%). Nesta etapa, comparativamente com a etapa anterior, a nota teve um decréscimo, eis que ficou no patamar de 20% (antes 27%), enquanto a nota 5 permaneceu no mesmo índice percentual da etapa inicial (33%). Também a nota 4 aumentou, permanecendo em 20% (antes 7%). Já a nota 3 permaneceu no percentual de 7%, enquanto a nota 2 não foi assinalada pelos especialistas. Entretanto, a nota 1 recebeu assinalamento de 7% dos experts, bem como a nota zero, anteriormente não anotada, que agora ficou com 13% da preferência. O descritor 40, diante do que se apresentou nas duas Etapas de participação do grupo de especialistas (GE) e, ainda, após os questionamentos analisados pelo grupo de pesquisadores (GP), foi considerado inviável, igualmente considerados sistemicamente os demais descritores já analisados e justificados (Gráfico 43). 191 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Gráfico 43- Descritor 40 - Ocorrência de abusos sexuais de criança na família Fonte: Dados da pesquisa. 7.5Descritores relacionados com religião Os próximos cinco descritores (n. 41 a 45) visam identificar o impacto da tradição bíblica no planejamento de parentalidade. 192 Resultado da técnica de grupo nominal O Gráfico 44 mostra que, para o descritor 41, foi possível observar uma evolução no conceito, visto que na primeira avaliação o descritor foi considerado indispensável por 67% dos especialistas, e na segunda avaliação a porcentagem subiu para 80%. Consequentemente, há uma queda na avaliação: na primeira etapa, mostrava 27% considerando necessário, o que caiu para 13%. Contudo, o valor de dispensável não se modificou. Gráfico 44- Descritor 41 - Influência da religião na escolha ou não de método contraceptivo Fonte: Dados da pesquisa. 193 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética O descritor 42 gerou debate entre os especialistas, que questionaram a possibilidade de a sexualidade estar vinculada à promiscuidade. Segundo eles, o conceito de promiscuidade pode ser muito relativo, proporcionando um aumento significativo na categoria necessário, que superou muito a categoria indispensável. Entretanto, quanto a notas atribuídas ao descritor, não houve mudanças, como pode ser observado no Gráfico 45. Sendo assim, o descritor foi excluído. O Gráfico 46 mostra que o descritor 43 teve uma evolução tanto no valor indispensável como no necessário, porém, com uma superação do necessário sobre o indispensável após a segunda avaliação dos especialistas. Quanto à nota, houve um aumento de porcentagem na nota 5. Aparentemente, é óbvia para os especialistas a clareza desse descritor sobre a influência da religião na maneira como os filhos são recebidos na vida do entrevistado. O descritor 44 mostrou uma queda considerável em sua avaliação, pois, na discussão do Gráfico 47, o tema da promiscuidade foi relativizado pelos especialistas. Perceber a atitude das pessoas poderá dar bases para uma melhor análise dessa questão diante dos problemas que a atualidade revela nas mais diversas perspectivas que esse tema pode oferecer. Considerado importante pela banca de qualificação, o descritor será mantido com alterações. O Gráfico 48 mostra que a evolução no descritor 45, no critério indispensável e no necessário, é bastante significativa. Observa-se também um grande aumento na nota 6 e na nota 4. Reconhecer se o filho é um projeto do casamento ou relacionamento, que num primeiro momento não teve tão 194 Resultado da técnica de grupo nominal boa avaliação, mostrou-se, após a segunda avaliação, uma questão muito relevante para a pesquisa. Gráfico 45- Descritor 42 - Para o entrevistado, a sexualidade está vinculada aos seguintes pontos: naturalidade/ espiritualidade/promiscuidade Fonte: Dados da pesquisa. 195 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Gráfico 46- Descritor 43 - Os filhos são compreendidos como sinais da bênção de Deus Fonte: Dados da pesquisa. 196 Resultado da técnica de grupo nominal Gráfico 47- Descritor 44 - Identificar se o uso de preservativos induz à promiscuidade Fonte: Dados da pesquisa. 197 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Gráfico 48- Descritor 45 - Filho como projeto do casamento ou relacionamento Fonte: Dados da pesquisa. 7.6Descritores relacionados com questão social Passamos agora a analisar os descritores relacionados com a questão social. Quanto ao descritor 46, na avaliação não presencial, 40% dos especialistas o consideraram 198 Resultado da técnica de grupo nominal indispensável e, na etapa presencial, houve uma diminuição para 33% no mesmo índice. Em função dessa fraca avaliação, o descritor será retirado das próximas etapas da pesquisa. No Gráfico 49, podem ser visualizados os outros itens de avaliação desse descritor. Gráfico 49- Descritor 46 - Ausência de um dos pais na vida do primeiro/último filho Fonte: Dados da pesquisa. 199 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética O descritor 47 apresenta, na etapa não presencial, um percentual de 40% de que a pergunta é indispensável para o desenvolvimento da pesquisa. Porém, na etapa presencial, 73% dos especialistas o consideraram indispensável. Portanto, esse descritor melhorou na avaliação e será mantido sem alteração. No Gráfico 50, percebem-se as alterações dos outros itens de avaliação. Gráfico 50 - Descritor 47 - Participação da mulher em algum serviço de saúde tido como de planejamento familiar na gravidez do primeiro/último filho Fonte: Dados da pesquisa. 200 Resultado da técnica de grupo nominal O Gráfico 51 mostra que 60% dos avaliadores consideraram o descritor 48 indispensável na primeira etapa. Já na segunda, a avaliação foi melhor ainda: foi considerado indispensável por 80% dos especialistas. Observe no gráfico que o descritor foi melhor avaliado na segunda etapa do que na primeira nos outros itens de avaliação. Gráfico 51- Descritor 48 - Participação da mulher em serviço prénatal na gravidez do primeiro/último filho Fonte: Dados da pesquisa. 201 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética O descritor 49 (Gráfico 52) foi mantido sem alteração, pois na etapa não presencial ele recebeu uma avaliação de indispensável de apenas 20%, mas passou para 73% na etapa presencial. Essa melhora na avaliação também foi percebida nas notas 5 e 6 (100%). Diante disso, o descritor foi mantido sem alteração. Gráfico 52- Descritor 49 - Gravidez do primeiro/último filho com o objetivo de melhorar o relacionamento com o parceiro Fonte: Dados da pesquisa. 202 Resultado da técnica de grupo nominal O Gráfico 53 retrata a avaliação do descritor 50 considerado dispensável na etapa não presencial, mas na etapa presencial, 67% o considera como indispensável, com percentual de notas 5 e 6 de 100%. Desse modo, o descritor foi mantido. Gráfico 53- Descritor 50 - Gravidez do primeiro/último filho com o objetivo de melhorar a situação social ou econômica Fonte: Dados da pesquisa. 203 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética O descritor 51 (Gráfico 54) foi excluído da pesquisa, pois tanto na etapa presencial como na não presencial, 53% consideram-no necessário, com percentuais de notas 5 e 6 de 47% na etapa não presencial e de 94% na presencial. Gráfico 54- Descritor 51 - Separação do casal devido às dificuldades em cuidar do filho Fonte: Dados da pesquisa. Os especialistas afirmam ser importante mapear as questões sociais que gerariam mais consequências na ausência e na presença de um projeto de parentalidade. Questionam 204 Resultado da técnica de grupo nominal sobre as relações sociais da família, ressaltando que elas perpassam uma visão de gênero, não como a relação psicológica, mas as relações das questões sociais. Salientam, ainda, que a identificação de gênero e sexo é diferente, porque está falando de parentalidade. Quando houvesse questionamentos ao colocar sexo da pessoa, dever-se-ia colocar masculino e feminino. O Gráfico 55 apresenta que 67% consideram-no necessário, com 40% de notas 5 e 6 na etapa não presencial. Já na etapa presencial, o percentual de opinião diminui para 53%, e o percentual de notas 5 e 6 passa para 94%, apenas com a ressalva da troca da palavra acesso ou busca. Desse modo, o descritor 52 foi excluído. O fato de a ocorrência de violência contra a criança decorrer de situações familiares, socioeconômicas e drogas é uma temática importante na visão dos avaliadores, mas muito difícil de ser pesquisada. Por isso o descritor 53 teve uma fraca avaliação: na etapa não presencial, 60% o considera como necessário, com 47% de notas 5 e 6. Na etapa presencial, o percentual diminui para 53%, com percentual de notas 5 e 6 de 53% (Gráfico 56). Assim, o descritor 53 foi excluído. O descritor 54 também fora excluído após a avaliação dos especialistas, pois mesmo tendo uma avaliação razoável, 47% dos avaliadores considera o tema como indispensável e, ou, necessário, com percentual de nota 6 de apenas 27% na etapa presencial. O motivo da exclusão é a identificação de outro descritor que já aborda o mesmo tema (Gráfico 57). O questionamento sobre a ocorrência de morte na família relacionada ao parto foi muito frequente em ambas as etapas de avaliação, de modo que o descritor 55 foi excluído. Veja a avaliação no Gráfico 58. 205 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Gráfico 55- Descritor 52 - Incentivo de acesso aos serviços de saúde pela família/escola/comunidade religiosa Fonte: Dados da pesquisa. 206 Resultado da técnica de grupo nominal Gráfico 56- Descritor 53 - Ocorrência de violência contra a criança Fonte: Dados da pesquisa. 207 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Gráfico 57 - Descritor 54 - Filho considerado um peso/uma sobrecarga Fonte: Dados da pesquisa. 208 Resultado da técnica de grupo nominal Gráfico 58- Descritor 55 - Morte na família relacionada ao parto Fonte: Dados da pesquisa. 209 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética O questionamento acerca da ocorrência de morte de criança antes de 5 anos na família foi considerado, na etapa não presencial, por 80% dos avaliadores como necessário, com o percentual das notas 5 e 6 totalizando 54%. Na etapa presencial, o percentual relativo à opinião diminui um pouco, ficando em 73%, com o percentual das notas de 5 e 6 subindo para 67%. Apesar da fraca avaliação, o descritor 56 foi mantido para a próxima etapa com modificação por sugestão da banca examinadora da dissertação, sugerindo especificar melhor de que família se trata: pequena ou extensa (Gráfico 59). Destaque-se a menção feita pelos debatedores sobre a questão do emprego, enfatizando precisamente o teor do questionamento, ressaltando que, além de ter filhos, a mulher também sofre por ser casada. Há, assim, uma discriminação da sociedade e da empresa, por querer um empregado que dê lucros. Houve também uma ressalva feita pelos avaliadores no sentido de que seria necessário contemplar o casal, visto que o filho pode atrapalhar, tanto o projeto pessoal como o profissional. O questionamento sobre a dificuldade de a mulher adquirir um emprego por ter filhos foi do descritor 57, tido como necessário para 67% dos avaliadores, tanto na etapa presencial como na não presencial, com a soma do percentual de notas 6 e 5 de 73% na etapa não presencial e de 87% na presencial (Gráfico 60). O descritor 58, que apresenta o questionamento sobre quem exerce a chefia da família, foi analisado pelos debatedores. Para eles, havia problema no termo chefia. Dessa forma, os avaliadores compreenderam ser mais adequado substituí-lo por responsável. De todos os avaliadores, 210 Resultado da técnica de grupo nominal na etapa não presencial, percebe-se que 80% consideram o descritor indispensável, com a soma do percentual das notas 5 e 6 de 80%. Na etapa presencial, tanto o percentual de opinião quanto o das notas 5 e 6 aumenta para 93%, o que pode ser conferido no Gráfico 61. Gráfico 59- Descritor 56 - Morte de criança (antes dos 5 anos) na família Fonte: Dados da pesquisa. 211 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Gráfico 60- Descritor 57 - Dificuldade de a mulher adquirir um emprego por ter filhos Fonte: Dados da pesquisa. 212 Resultado da técnica de grupo nominal Gráfico 61- Descritor 58 - Identificação de quem exerce a chefia da família Fonte: Dados da pesquisa. 213 8 Projeto piloto Na sequência, apresenta-se o projeto piloto e o resultado dessa etapa, que levou à validação final do instrumento de pesquisa denominado Planejamento da parentalidade no contexto da bioética. 8.1 Aplicação do instrumento da pesquisa A escolha das localidades para aplicação do Projeto Piloto se deu em função da disponibilidade dos membros da pesquisa ou por meio da realização de missão de pesquisa de campo. Tratando-se de um projeto piloto que visa validar o instrumento, o foco não era uma necessária análise estatística da população pesquisada, mas buscar uma variedade de contextos socioeconômicos e culturais para aplicação do instrumento da pesquisa. Desse modo, as localidades onde ocorreram as pesquisas de campo foram as seguintes: -- Vila Sabará, comunidade localizada no Município de Curitiba. Lá a pesquisa envolveu entrevistas em Planejamento da parentalidade no contexto da bioética 20 residências, realizada por Cecília Francisca dos Santos, aluna de Iniciação Científica vinculada ao Projeto Parentalidade. -- Bocaiúva do Sul, município da Região Metropolitana de Curitiba. Nessa localidade, a pesquisa se deu por meio de uma missão de pesquisa, com deslocamento de seis membros da equipe de pesquisa, dentre eles três mestrandos, dois alunos de Iniciação Científica e o coordenador do projeto, para entrevistar 66 residências. Num segundo momento, o instrumento de pesquisa foi aplicado pelo coordenador a um grupo de pais de alunos que frequentam a catequese, o que somou mais 27 pessoas entrevistadas. -- Campo Mourão, cidade do interior do Paraná. Lá a pesquisa foi realizada pelo mestrando Roberto Cesar de Oliveira, que aplicou o questionário num evento de um grupo de agentes da Pastoral Familiar, com 20 questionários preenchidos. -- Pinhais, cidade da Região Metropolitana de Curitiba. Nessa localidade, a pesquisa foi aplicada durante um evento de uma Associação de Moradores do Jardim Weissópolis, e realizada pelo coordenador do projeto, com 16 questionários preenchidos. Desse modo, no total, chegou-se a 149 questionários preenchidos aplicados em quatro localidades diferentes. 216 Projeto piloto Em geral, observou-se que, quando a técnica utilizada para aplicar o questionário foi a pesquisa em residência, a receptividade dos entrevistados foi muito boa e a principal dificuldade se deu em função do tempo gasto: cerca de 20 minutos para cada questionário preenchido, além do tempo de locomoção até as residências. Nesses casos, chega-se a uma qualidade de dados recolhidos, pois o entrevistador, ao enunciar a questão, pode interagir com o participante da pesquisa e explicar alguns termos. Quando o instrumento foi aplicado em grupos, por ocasião de eventos programados, isso ocorre mais rapidamente, mas observa-se que a qualidade das respostas pode depender bastante da habilidade de os entrevistados lerem e interpretarem o instrumento. 8.2 Resultados do projeto piloto Após a pesquisa de campo os dados foram digitalizados para o SPSS - software utilizado para análise de dados – e por meio deste programa gerou-se os quadros e gráficos para análise. Os resultados do Projeto Piloto passam a ser apresentados abaixo. O primeiro resultado fora a validação da consistência interna do Instrumento de Pesquisa – análise realizada por meio do Coeficiente Alpha de Cronbach – chegando ao seguinte resultado: 217 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Quadro 1– Estatística de confiabilidade Coeficiente Alpha de Cronbach Coeficiente Alpha de Cronbach baseado em itens padronizados Número de itens 0,745 0,743 54 Fonte: Dados da pesquisa. Ao apresentar os resultados a seguir, precisamos destacar que eles não significam o mapeamento das localidades estudadas, visto que não houve análise estatística da relação entre população e amostra. Os dados podem apenas apontar para a relevância ou não dos descritores que foram validados, por isso as análises dos descritores seguem com o objetivo de identificar se as questões apresentadas no instrumento de pesquisa foram mantidas, excluídas ou alteradas na validação final. A primeira questão não sofreu alteração, pois mesmo que todos os participantes tenham indicado apenas “masculino” ou “feminino”, dado ao contexto atual de grande sensibilidade para a questão de gênero, é importante manter aberta a possibilidade de uma terceira resposta. Percebeu-se que mais de três quartos dos entrevistados eram do gênero feminino. Segue abaixo o modo como a questão fora apresentada e o quadro com as percentagens de respostas: Questão 1 - Gênero ( ) Feminino 218 ( ) Masculino ( ) Outro Projeto piloto Tabela 1- Descritor 1 - Identificação de gênero Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado Feminino 117 78,5 78,5 78,5 Masculino 32 21,5 21,5 100,0 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. Igualmente, a questão relacionada ao número de filhos se manteve inalterada. Vejamos abaixo como a questão fora colocada e os resultados. Questão 2 - Número de filhos Consanguíneos Adotivos Por Reprodução Assistida ( ) 0 ( ) 3 ( ) 0 ( ) 3 ( ) 0 ( ) 3 ( ) 1 ( ) 4 ( ) 1 ( ) 4 ( ) 1 ( ) 4 ( ) 2 ( ) ≥ 5 ( ) 2 ( ) ≥ 5 ( ) 2 ( ) ≥ 5 ( ) NR Tabela 2- Descritor 2 - A - Número de filhos (Continua) Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado zero 5 3,4 3,4 3,4 1,00 29 19,5 19,5 22,8 219 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Tabela 2- Descritor 2 - A - Número de filhos (Conclusão) Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado 2,00 45 30,2 30,2 53,0 3,00 34 22,8 22,8 75,8 4,00 19 12,8 12,8 88,6 5,00 16 10,7 10,7 99,3 NR 1 0,7 0,7 100,0 149 100,0 100,0 Total Fonte: Dados da pesquisa. No instrumento aplicado no projeto piloto, não havia uma questão indagando sobre a idade do entrevistado, pois entendia-se que o importante era indagar a respeito da idade da pessoa quando ela engravidou. No entanto, o contato com os participantes da pesquisa nos fez perceber a relevância de identificar sua idade atual, pois isso pode nos levar a perceber variações nos projetos de parentalidade em relação à idade das pessoas. Desse modo, foi inserida no instrumento final a questão: Questão nova - Idade atual do entrevistado ( ) Entre 18 e 25 anos ( ) Entre 26 e 35 anos ( ) Entre 46 e 60 ( ) Acima de 60 220 ( ) Entre 36 e 45 anos Projeto piloto A questão relacionada à religião também foi mantida, visto que não apresentou maior dificuldade nas respostas. Do mesmo modo, a questão da participação religiosa. Seguem as duas questões e seus resultados: Questão 3 - Religião ( ) Católica ( ) Evangélica ( ) Afro-brasileira ( ) Judaica ( ) Islâmica ( ) Oriental ( ) Espírita ( ) Sem religião ( ) Outra. Qual? __________________ Tabela 3- Descritor 3 - Religião Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado Católica 73 49,0 49,0 49,0 Evangélica 63 42,3 42,3 91,3 Islâmica 1 ,7 ,7 91,9 Espírita 4 2,7 2,7 94,6 Sem religião 3 2,0 2,0 96,6 Outra religião 5 3,4 3,4 100,0 149 100,0 100,0 Total Fonte: Dados da pesquisa. 221 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Questão 4 - (Se a pessoa tem religião) Na tua religião você é: ( ) Pouco participante ( ) Participante ( ) Ministro/Ministérios ( ) Agente/Obreiro ( ) Outro. Qual? ( ) NA – não se aplica Tabela 4- Descritor 4 - Participação religiosa Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado Pouco participante 55 36,9 36,9 36,9 Participante 69 46,3 46,3 83,2 Ministro / Ministérios 11 7,4 7,4 90,6 Agente / Obreiro 4 2,7 2,7 93,3 Outro. Qual? 1 0,7 0,7 94,0 NR 9 6,0 6,0 100,0 149 100,0 100,0 Total Fonte: Dados da pesquisa. A questão que indaga sobre o estado civil na gravidez foi mantida, pois ela permite mapear a diferença entre as condições da gravidez do primeiro filho e as da última gravidez. Vejamos como a questão foi apresentada e seus resultados. 222 Projeto piloto Questão 5 - Estado civil na gravidez do primeiro filho ( ) Solteiro ( ) Casado ( ) Divorciado ( ) Viúvo ( ) União Estável ( ) Separado Judicialmente Tabela 5- Descritor 5 - Estado civil na gravidez do primeiro filho Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado Solteiro 36 24,2 24,2 24,2 Casado 90 60,4 60,4 84,6 União Estável 8 5,4 5,4 89,9 Separado Judicialmente 13 8,7 8,7 98,7 NR 2 1,3 1,3 100,0 149 100,0 100,0 Total Fonte: Dados da pesquisa. Tabela 6- Descritor 6 - Estado civil na gravidez do último filho (Continua) Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado Solteiro 16 10,7 10,7 10,7 Casado 87 58,4 58,4 69,1 Divorciado 4 2,7 2,7 71,8 223 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Tabela 6- Descritor 6 - Estado civil na gravidez do último filho (Conclusão) Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado Viúvo 2 1,3 1,3 73,2 União Estável 6 4,0 4,0 77,2 Separado Judicialmente 9 6,0 6,0 83,2 Não se aplica 11 7,4 7,4 90,6 NR 14 9,4 9,4 100,0 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. A questão sobre a escolaridade no período da gravidez foi alterada para se tornar mais clara, pois o modo como as pessoas responderam, com anotação pessoal, gerou dúvidas na hora de catalogar os dados. Por exemplo, uma das entrevistadas havia indicado ter engravidado na primeira vez como menos de 15 anos, mas ao mesmo tempo indicou ter estudado por 14 anos. Por isso, seguem abaixo o modo como a pergunta foi colocada, os resultados e a questão alterada. Questão 6- Na gravidez do primeiro filho, quantos anos você tinha estudado? ________________ 224 Projeto piloto Tabela 7- Descritor 7 - Escolaridade na gravidez do primeiro filho Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado Não estudou 20 13,4 13,4 13,4 Entre 1º e 4º ano 30 20,1 20,1 33,6 Entre 5º e 8º ano 53 35,6 35,6 69,1 Estava no Ensino Médio 41 27,5 27,5 96,6 Estava na Faculdade 5 3,4 3,4 100,0 149 100,0 100,0 Total Fonte: Dados da pesquisa. Tabela 8- Descritor 8 - Escolaridade na gravidez do último filho (Continua) Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado Não estudou 16 10,7 10,7 10,7 Entre 1º e 4º ano 24 16,1 16,1 26,8 Entre 5º e 8º ano 37 24,8 24,8 51,7 Estava no Ensino Médio 34 22,8 22,8 74,5 225 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Tabela 8- Descritor 8 - Escolaridade na gravidez do último filho (Conclusão) Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado Estava na Faculdade 6 4,0 4,0 78,5 Havia concluído Curso Superior 8 5,4 5,4 83,9 Não se aplica 24 16,1 16,1 100,0 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. Essas questões foram alteradas e passam a ser apresentadas do seguinte modo: Questão alterada - Escolaridade na gravidez do primeiro/último filho: ( ) Não havia estudado ( ) Estava nas séries iniciais ( ) Havia concluído a 4ª Série ( ) Estava entre a 5ª e a 8ª série ( ) Estava no Ensino Médio ( ) Havia concluído o Ensino Médio ( ) Estava na Faculdade ( ) Já havia concluído a Faculdade As questões relacionadas à idade em que se deu o primeiro relacionamento sexual e a primeira gravidez se 226 Projeto piloto mostraram adequadas. São questões distintas, mas relacionadas, por isso apresentamos aqui lado a lado para melhor compreensão. Vejamos as questões e os resultados, bem como os gráficos comparativos que nos permitem relacionar melhor ambas as questões: Questão 7 - Com que idade você iniciou um relacionamento sexual? ( ) Menos de 15 anos ( ) Entre 15 e 18 ( ) Entre 18 e 25 ( ) Acima de 25 Tabela 9- Descritor 9 - Com que idade você iniciou um relacionamento sexual Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado Menos de 15 35 23,5 23,5 23,5 Entre 15 e 18 anos 60 40,3 40,3 63,8 Entre 18 e 25 anos 42 28,2 28,2 91,9 Acima de 25 anos 8 5,4 5,4 97,3 NR 4 2,7 2,7 100,0 149 100,0 100,0 Total Fonte: Dados da pesquisa. 227 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Questão 8 - Idade em que você teve a primeira gravidez/ou engravidou alguém pela primeira vez ( ) Menos de 15 anos ( ) Entre 15 e 18 ( ) Entre 18 e 30 ( ) Acima de 30 Tabela 10 - Descritor 10 - Idade em que você teve a primeira gravidez/ou engravidou alguém pela primeira vez Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado Menos de 15 23 15,4 15,4 15,4 Entre 15 e 18 anos 35 23,5 23,5 38,9 Entre 18 e 30 anos 80 53,7 53,7 92,6 Acima de 30 anos 11 7,4 7,4 100,0 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. Tendo em vista que essas questões são muito relevantes para o tema estudado o grupo de pesquisa decidiu aprimorar a questão apresentando um número maior de opções de idade. Assim ficam as questões com as alterações: 228 Projeto piloto Questão alterada - Com que idade você iniciou um relacionamento sexual? ( ) Menos de 15 anos ( ) Entre 15 e 18 ( ) Entre 21 e 25 ( ) Acima de 30 ( ) Entre 18 e 21 Questão alterada - Idade em que você teve a primeira gravidez/ ou engravidou alguém pela primeira vez ( ) Menos de 15 anos ( ) Entre 15 e 18 ( ) Entre 21 e 25 ( ) Acima de 30 ( ) Entre 18 e 21 As questões seguintes identificam as ocupações das pessoas nas situações em que ocorreram as gravidezes. Uma pequena alteração também foi sugerida para essas questões. Vejamos como foram apresentadas e seus resultados. Questão 9 - Sua situação na gravidez do primeiro filho ( ) Empregado(a) ( ) Desempregado(a) ( ) Autônomo(a) ( ) Do lar Questão 10- Sua situação na gravidez do último filho ( ) Empregado(a) ( ) Desempregado(a) ( ) Autônomo(a) ( ) Do lar 229 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Tabela 11 - Descritor 11 - Sua situação na gravidez do primeiro filho Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado Empregado(a) 61 40,9 40,9 40,9 Desempregado(a) 42 28,2 28,2 69,1 Autônomo(a) 14 9,4 9,4 78,5 Do lar 30 20,1 20,1 98,7 NR 2 1,3 1,3 100,0 149 100,0 100,0 Total Fonte: Dados da pesquisa. Tabela 12 - Descritor 12 - Sua situação na gravidez do último filho Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado Empregado(a) 51 34,2 34,2 34,2 Desempregado(a) 28 18,8 18,8 53,0 Autônomo(a) 9 6,0 6,0 59,1 Do lar 38 25,5 25,5 84,6 Não se aplica 22 14,8 14,8 99,3 Não respondeu 1 ,7 ,7 100,0 149 100,0 100,0 Total Fonte: Dados da pesquisa. 230 Projeto piloto Com a pequena alteração, a questão fica assim: Questão alterada - Sua situação de emprego na gravidez do primeiro filho ( ) Empregado(a) ( ) Desempregado(a) ( ) Do lar ( ) Outro ( ) Autônomo(a) As questões 13 e 14 se mostraram também relevantes para auxiliar na identificação do contexto em que ocorreu uma gravidez. Seguem as questões e as tabelas, que deixam mais claras as alterações ocorridas nos contextos de gravidezes do primeiro e do último filho: Questão 11 - Com quem você morava quando soube da gravidez do primeiro filho? ( ) Sozinha(o) ( ) Com amigos ( ) Com os pais ( ) Com o(a) parceiro(a) Questão 12 - Com quem você morava quando soube da gravidez do último filho? ( ) Sozinha(o) ( ) Com amigos ( ) Com o(a) parceiro(a) ( ) NA ( ) Com os pais 231 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Tabela 13 - Descritor 13 - Com quem você morava quando soube da gravidez do primeiro filho? Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado Sozinha(o) 5 3,4 3,4 3,4 Com os amigos 4 2,7 2,7 6,0 Com os pais 37 24,8 24,8 30,9 Com o(a) parceiro(a) 100 67,1 67,1 98,0 3 2,0 2,0 100,0 149 100,0 100,0 NR Total Fonte: Dados da pesquisa. Tabela 14 - Descritor 14 - Com quem você morava quando soube da gravidez do último filho? Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado Sozinha(o) 9 6,0 6,0 6,0 Com os pais 4 2,7 2,7 8,7 Com o(a) parceiro(a) 110 73,8 73,8 82,6 Não se aplica 26 17,4 17,4 100,0 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. 232 Projeto piloto As questões pareceram adequadas, mas percebe-se que talvez alguém esteja morando em outros ambientes além dos sugeridos, por isso a questão foi levemente alterada: Questão alterada - Com quem você morava quando soube da gravidez do primeiro filho? ( ) Sozinha(o) ( ) Com amigos ( ) Com o(a) parceiro(a) ( ) Outro ( ) Com os pais A questão 15, aplicada no projeto piloto, revelou uma alta porcentagem de não respondentes, o que levou o grupo de pesquisa a perceber que o modo como a questão estava formulada não ajudava os entrevistados a respondê-la, nem auxiliava os pesquisadores a identificar se houve pressão externa para que a gravidez ocorresse. Sendo assim, a questão foi reformulada, tornando-se mais direta. Vejamos como a questão fora apresentada e o quadro com as respostas: Questão 13 - A influência mais significativa na decisão de ter filhos foi: ( ) Do parceiro ( ) De familiares ( ) Da escola ( ) De religiosos ( ) De profissionais de saúde ( ) NA 233 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Tabela 15 - Descritor 15 - A influência mais significativa na decisão de ter filhos foi Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado Do parceiro 85 57,0 57,0 57,0 Familiares 14 9,4 9,4 66,4 Da escola 4 2,7 2,7 69,1 De religiosos 10 6,7 6,7 75,8 De profissionais de saúde 2 1,3 1,3 77,2 Outros 9 6,0 6,0 83,2 NR 25 16,8 16,8 100,0 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. Na reformulação da questão, houve um desdobramento, visto que esse elemento externo é compreendido como relevante para indicar projeto de parentalidade. Segue então o modo como a questão passa a ser formulada, transformada em duas, no instrumento validado: Questão alterada - Houve pressão externa para ter filhos: ( ) De familiares ( ) De amigos ( ) De outros ( ) Não houve pressão externa 234 ( ) Da escola Projeto piloto Questão nova - Se houve pressão externa – a importância dessa pressão foi: ( ) Nula ( ) Fraca ( ) Regular ( ) Forte ( ) Muito forte A questão 16 mostrou-se bastante relevante para relacionar o projeto de parentalidade com o modo como as pessoas têm acesso às informações sobre sexualidade. Seguem a questão e o quadro com os resultados: Questão 14 - De quem você recebeu as informações mais significativas sobre sexualidade: ( ) Dos amigos ( ) De familiares ( ) Da escola ( ) De religiosos ( ) De profissionais de saúde ( ) Outros Tabela 16 - Descritor 15 - A influência mais significativa na decisão de ter filhos foi (Continua) Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado De amigos 54 36,2 36,2 36,2 De familiares 38 25,5 25,5 61,7 Da escola 34 22,8 22,8 84,6 De religiosos 5 3,4 3,4 87,9 De profissionais de saúde 3 2,0 2,0 89,9 235 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Tabela 16 - Descritor 15 - A influência mais significativa na decisão de ter filhos foi (Conclusão) Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado Outros 4 2,7 2,7 92,6 NR 11 7,4 7,4 100,0 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. O índice de resposta “outros” e de não respondentes, somando quase 10%, levou os pesquisadores a se indagarem a respeito dos novos modos de comunicação — percebeu-se que seria relevante inserir na questão a alternativa “internet”. Desse modo, a questão será apresentada com tal alteração: Questão alterada - De quem você recebeu mais informações sobre sexualidade: ( ) Dos amigos ( ) De familiares ( ) Da escola ( ) De religiosos ( ) De profissionais de saúde ( ) Internet ( ) Outros A questão 17 pareceu-nos adequada e será mantida sem alteração. Vejamos a questão e o resultado: 236 Projeto piloto Questão 15 - Quem exerce a chefia da família em sua casa ( ) o homem ( ) a mulher ( ) o casal ( ) outro Tabela 17 - Descritor 17 - Quem exerce a chefia da família em sua casa Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado O homem 32 21,5 21,5 21,5 A mulher 36 24,2 24,2 45,6 O casal 80 53,7 53,7 99,3 NR 1 ,7 ,7 100,0 149 100,0 100,0 Total Fonte: Dados da pesquisa. O instrumento utilizado no projeto piloto apresentou um bom número de questões que pedia do respondente uma avaliação entre zero e quatro. Boa parte dessas questões foi alterada visando a uma formulação mais direta, com linguagem menos acadêmica. Vejamos como as questões 18 e 19 foram formuladas, os resultados em tabelas e as alterações: 237 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Tabela 18 - Descritor 18 - Houve planejamento na gravidez de seu primeiro filho Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado zero 71 47,7 47,7 47,7 1,00 3 2,0 2,0 49,7 2,00 7 4,7 4,7 54,4 3,00 20 13,4 13,4 67,8 4,00 44 29,5 29,5 97,3 NR 2 1,3 1,3 98,7 7,00 2 1,3 1,3 100,0 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. Questão 16 - Houve planejamento na gravidez de seu último filho ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 4 ( ) NA ( ) 3 Tabela 19 - Descritor 19 - Houve planejamento na gravidez de seu último filho (Continua) Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado zero 42 28,2 28,2 28,2 1,00 11 7,4 7,4 35,6 2,00 2 1,3 1,3 36,9 3,00 14 9,4 9,4 46,3 238 Projeto piloto Tabela 19 - Descritor 19 - Houve planejamento na gravidez de seu último filho (Conclusão) 4,00 Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado 57 38,3 38,3 84,6 100,0 NA 23 15,4 15,4 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. Questão alterada - Você planejou a gravidez do teu primeiro filho ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 Do mesmo modo, as questões 20 e 21 foram um pouco alteradas. Questão 17 - Os riscos relacionados à maternidade/paternidade foram avaliados antes da gravidez do primeiro filho ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 Tabela 20- Descritor 20 - Os riscos relacionados à maternidade/ paternidade foram avaliados antes da gravidez do primeiro filho (Continua) Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado zero 87 58,4 58,4 58,4 1,00 4 2,7 2,7 61,1 239 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Tabela 20- Descritor 20 - Os riscos relacionados à maternidade/ paternidade foram avaliados antes da gravidez do primeiro filho (Conclusão) Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado 2,00 7 4,7 4,7 65,8 3,00 12 8,1 8,1 73,8 4,00 32 21,5 21,5 95,3 NR 7 4,7 4,7 100,0 149 100,0 100,0 Total Fonte: Dados da pesquisa. Questão 19 - Os riscos relacionados à maternidade/paternidade foram avaliados antes da gravidez do último filho ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 ( ) NA Tabela 21 - Descritor 21 - Os riscos relacionados à maternidade/ paternidade foram avaliados antes da gravidez do último filho (Continua) Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado zero 66 44,3 44,3 44,3 1,00 5 3,4 3,4 47,7 2,00 6 4,0 4,0 51,7 3,00 14 9,4 9,4 61,1 4,00 36 24,2 24,2 85,2 NA 19 12,8 12,8 98,0 240 Projeto piloto Tabela 21 - Descritor 21 - Os riscos relacionados à maternidade/ paternidade foram avaliados antes da gravidez do último filho (Conclusão) NR Total Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado 3 2,0 2,0 100,0 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. Questão alterada - Você pensou nos riscos de saúde relacionados a ter filhos — antes da gravidez do primeiro filho ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 As questões 22 e 23 estão relacionadas às condições econômicas, que também passam a ser apresentadas de forma mais direta. São questões relevantes para o projeto e revelam um quadro interessante. Questão 20- As condições (econômicas...) para cuidar do bebê foram avaliadas antes da gravidez do primeiro filho ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 241 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Questão 22 - As condições (econômicas...) para cuidar do bebê foram avaliadas antes da gravidez do último filho ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 ( ) NA Tabela 22 - Descritor 22 - As condições (econômicas...) para cuidar do bebê foram avaliadas antes da gravidez do primeiro filho Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado 86 57,7 57,7 57,7 1,00 5 3,4 3,4 61,1 2,00 14 9,4 9,4 70,5 3,00 9 6,0 6,0 76,5 4,00 31 20,8 20,8 97,3 NR 2 1,3 1,3 98,7 7,00 2 1,3 1,3 100,0 Total 149 100,0 100,0 zero Fonte: Dados da pesquisa. Tabela 23- Descritor 23 - As condições (econômicas...) para cuidar do bebê foram avaliadas antes da gravidez do último filho (Continua) Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado zero 60 40,3 40,3 40,3 1,00 4 2,7 2,7 43,0 2,00 12 8,1 8,1 51,0 242 Projeto piloto Tabela 23- Descritor 23 - As condições (econômicas...) para cuidar do bebê foram avaliadas antes da gravidez do último filho (Conclusão) Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado 3,00 16 10,7 10,7 61,7 4,00 36 24,2 24,2 85,9 NA 21 14,1 14,1 100,0 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. Questão alterada - As condições econômicas para cuidar do bebê foram avaliadas antes da gravidez do primeiro filho ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 As questões 24 e 25 buscam identificar uma das questões vistas, na técnica de grupo nominal, como de grande relevância para o projeto. O modo como a pergunta foi formulada parece ter induzido o participante da pesquisa a uma resposta politicamente correta, por isso a questão será substancialmente alterada. Questão 23 - O anúncio da gravidez de seu primeiro filho se deu num clima de alegria ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 243 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Tabela 24 - Descritor 24 - O anúncio da gravidez de seu primeiro filho se deu num clima de alegria Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado zero 11 7,4 7,4 7,4 1,00 5 3,4 3,4 10,7 2,00 9 6,0 6,0 16,8 3,00 25 16,8 16,8 33,6 4,00 95 63,8 63,8 97,3 NR 4 2,7 2,7 100,0 149 100,0 100,0 Total Fonte: Dados da pesquisa. Questão 24 - O anúncio da gravidez de seu último filho se deu num clima de alegria ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 ( ) NA Tabela 25- Descritor 25 - O anúncio da gravidez do teu último filho se deu num clima de alegria (Continua) Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado zero 7 4,7 4,7 4,7 1,00 2 1,3 1,3 6,0 2,00 8 5,4 5,4 11,4 3,00 14 9,4 9,4 20,8 4,00 91 61,1 61,1 81,9 NA 27 18,1 18,1 100,0 244 Projeto piloto Tabela 25- Descritor 25 - O anúncio da gravidez do teu último filho se deu num clima de alegria (Conclusão) Total Frequência Percentual Percentual válido 149 100,0 100,0 Percentual acumulado Fonte: Dados da pesquisa. Esta é uma questão que fora substancialmente alterada, após o projeto piloto. Vejamos: Questão alterada - O anúncio da gravidez do teu primeiro filho se deu num clima: ( ) de revolta ( ) de preocupação ( ) de aceitação ( ) de alegria ( ) de surpresa As questões 26 e 27 abordam o aborto, um tema sensível, mas que pode revelar se a gravidez foi de algum modo planejada, visto que dificilmente alguém abortaria um bebê planejado. As questões se mostraram adequadas e foram mantidas sem alterações. Questão 25 - Chegou-se a desejar, em algum momento, o aborto do primeiro filho ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 245 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Tabela 26 – Descritor 26 - Chegou-se a desejar, em algum momento, o aborto do primeiro filho Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado zero 127 85,2 85,2 85,2 1,00 6 4,0 4,0 89,3 2,00 4 2,7 2,7 91,9 4,00 7 4,7 4,7 96,6 100,0 NR Total 5 3,4 3,4 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. Questão 26 - Chegou-se a desejar, em algum momento, o aborto do último filho ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 Tabela 27 - Descritor 26 - Chegou-se a desejar, em algum momento, o aborto do primeiro filho Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado zero 114 76,5 76,5 76,5 1,00 1 0,7 0,7 77,2 2,00 3 2,0 2,0 79,2 4,00 5 3,4 3,4 82,6 100,0 NA 26 17,4 17,4 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. 246 Projeto piloto As questões 28 e 29 indagam abertamente se a gravidez era projeto do casal. Essas questões permitiram uma variada gama de respostas e serão mantidas sem alterações. Questão 27- A gravidez do primeiro filho foi um projeto de casal. Decisão dos dois. ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 Tabela 28- Descritor 28 - A gravidez do primeiro filho foi um projeto de casal. Decisão dos dois Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado zero 55 36,9 36,9 36,9 1,00 2 1,3 1,3 38,3 2,00 9 6,0 6,0 44,3 3,00 9 6,0 6,0 50,3 4,00 65 43,6 43,6 94,0 NR 6 4,0 4,0 98,0 55,00 3 2,0 2,0 100,0 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. Questão 28 - A gravidez do último filho foi um projeto de casal. Decisão dos dois. ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 ( ) NA 247 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Tabela 29- Descritor 29 - A gravidez do último filho foi um projeto de casal. Decisão dos dois Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado zero 25 16,8 16,8 16,8 1,00 4 2,7 2,7 19,5 2,00 10 6,7 6,7 26,2 3,00 12 8,1 8,1 34,2 4,00 70 47,0 47,0 81,2 NA 26 17,4 17,4 98,7 NR 2 1,3 1,3 100,0 149 100,0 100,0 Total Fonte: Dados da pesquisa. As próximas questões visam identificar a ajuda da família na aceitação da gravidez, compreendidas como relevantes para um tipo de projeto de parentalidade estudado. As questões estão mantidas com pequenas alterações. Questão 29 - A família ajudou na decisão de aceitar a gravidez do primeiro filho. ( ) zero 248 ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 Projeto piloto Tabela 30- Descritor 30 - A família ajudou na decisão de aceitar a gravidez do primeiro filho zero Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado 36 24,2 24,2 24,2 1,00 6 4,0 4,0 28,2 2,00 18 12,1 12,1 40,3 3,00 18 12,1 12,1 52,3 4,00 66 44,3 44,3 96,6 NR 5 3,4 3,4 100,0 149 100,0 100,0 Total Fonte: Dados da pesquisa. Questão 30 - A família ajudou na decisão de aceitar a gravidez do último filho. ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 ( ) NA Tabela 31 - Descritor 31 - A família ajudou na decisão de aceitar a gravidez do último filho (Continua) Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado 38 25,5 25,5 25,5 1,00 3 2,0 2,0 27,5 2,00 10 6,7 6,7 34,2 zero 249 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Tabela 31 - Descritor 31 - A família ajudou na decisão de aceitar a gravidez do último filho (Conclusão) Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado 3,00 14 9,4 9,4 43,6 4,00 60 40,3 40,3 83,9 NA 24 16,1 16,1 100,0 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. Questão alterada - A família ajudou na aceitação da gravidez do primeiro filho ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 A questão 32 aponta para a relação entre atividade profissional da mulher e a gravidez. Embora o resultado dessa questão no projeto piloto possa indicar ausência de conflito, a equipe de pesquisadores compreende que, em contexto diverso ao pesquisado, o tema pode se tornar relevante. Desse modo, a questão segue sem alteração. Questão 31 - A atividade profissional da mulher influenciou na decisão de engravidar mais tarde. ( ) zero 250 ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 Projeto piloto Tabela 32- Descritor 32 - A atividade profissional da mulher influenciou na decisão de engravidar mais tarde Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado zero 116 77,9 77,9 77,9 1,00 3 2,0 2,0 79,9 2,00 5 3,4 3,4 83,2 3,00 4 2,7 2,7 85,9 4,00 7 4,7 4,7 90,6 NR 14 9,4 9,4 100,0 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. A questão 33 aborda alterações na atividade sexual devido às possibilidades de se adquirir doenças. A questão será mantida sem alteração e é interessante observar que 12,2% dos entrevistados atribuiu nota máxima à questão. Questão 32 - A possibilidade de adquirir doença alterou sua prática sexual. ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 251 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Tabela 33- Descritor 33 - A possibilidade de adquirir doença alterou sua prática sexual Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado zero 120 80,5 80,5 80,5 2,00 4 2,7 2,7 83,2 3,00 2 1,3 1,3 84,6 4,00 18 12,1 12,1 96,6 NR 5 3,4 3,4 100,0 149 100,0 100,0 Total Fonte: Dados da pesquisa. A questão 34 indaga a respeito da presença da religião no contexto de escolha do método contraceptivo. Essa questão será mantida, pois um dos destaques do projeto é identificar o impacto da religião na parentalidade. Questão 33 - A religião lhe influenciou na escolha do método contraceptivo. ( ) zero 252 ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 ( ) NR Projeto piloto Tabela 34 - Descritor 34 - A religião lhe influenciou na escolha do método contraceptivo Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado zero 118 79,2 79,2 79,2 2,00 4 2,7 2,7 81,9 3,00 11 7,4 7,4 89,3 4,00 12 8,1 8,1 97,3 NA 4 2,7 2,7 100,0 149 100,0 100,0 Total Fonte: Dados da pesquisa. A questão 35 indaga a respeito do modo como os pais veem os filhos. Pareceu-nos que a maioria deu uma resposta politicamente correta, o que fez com a equipe decidisse por alterar a questão, apresentando-a de modo mais complexo. Questão 34 - Você compreende os filhos como sinais da bênção de Deus. ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 ( ) NR 253 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Tabela 35- Descritor 35 - Você compreende os filhos como sinais da bênção de Deus zero Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado 12 8,1 8,1 8,1 3,00 6 4,0 4,0 12,1 4,00 131 87,9 87,9 100,0 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. Questão alterada - Você compreende os filhos como: ( ) peso ( ) obstáculo ( ) um privilégio ( ) benção de Deus ( ) algo natural A questão 36 também aborda um dos destaques do projeto, que é a relação entre sexualidade e parentalidade, pois isso indaga a respeito da influência dos preservativos na prática sexual. A questão não sofreu alteração. Vejamos a questão e os resultados. Questão 36 - O uso de preservativos lhe incentivou a ter relacionamento sexual com outra pessoa, além do parceiro. ( ) zero 254 ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 ( ) NR Projeto piloto Tabela 36- Descritor 36 - O uso de preservativos lhe incentivou a ter relacionamento sexual com outra pessoa, além do parceiro Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado zero 117 78,5 78,5 78,5 1,00 1 ,7 ,7 79,2 2,00 4 2,7 2,7 81,9 3,00 4 2,7 2,7 84,6 4,00 12 8,1 8,1 92,6 NR 11 7,4 7,4 100,0 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. A questão número 37 aponta para um dos tipos de projeto de parentalidade (implícito) ao indagar a respeito da relação entre casamento e ter filhos. A questão foi mantida sem alteração. Questão 37 - Para você, qual a relação entre casamento e ter filhos? ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 255 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Tabela 37 - Descritor 37 - Para você, qual a relação entre casamento e ter filhos? Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado zero 7 4,7 4,7 4,7 2,00 11 7,4 7,4 12,1 3,00 19 12,8 12,8 24,8 4,00 112 75,2 75,2 100,0 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. As questões 38 e 39 identificam o acesso aos serviços de pré-natal. Essas questões são mantidas, pois podem apontar para a disponibilidade dos serviços de saúde. Questão 38 - Você teve o acesso desejado ao serviço pré-natal na gravidez do primeiro filho. ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 Tabela 38- Descritor 38 - Você teve o acesso desejado ao serviço pré-natal na gravidez do primeiro filho (Continua) Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado zero 24 16,1 16,1 16,1 1,00 4 2,7 2,7 18,8 256 Projeto piloto Tabela 38- Descritor 38 - Você teve o acesso desejado ao serviço pré-natal na gravidez do primeiro filho (Conclusão) Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado 2,00 15 10,1 10,1 28,9 3,00 16 10,7 10,7 39,6 4,00 84 56,4 56,4 96,0 NR 4 2,7 2,7 98,7 100,0 7,00 2 1,3 1,3 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. Questão 39 - Você teve o acesso desejado ao serviço pré-natal na gravidez do último filho ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 ( ) NA Tabela 39- Descritor 39 - Você teve o acesso desejado ao serviço pré-natal na gravidez do último filho Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado zero 21 14,1 14,1 14,1 2,00 8 5,4 5,4 19,5 3,00 22 14,8 14,8 34,2 4,00 77 51,7 51,7 85,9 NA 21 14,1 14,1 100,0 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. 257 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética As questões 40 e 41 pretendem identificar motivações para a gravidez que estejam focadas em realidades sociais. Elas sofreram algumas alterações em virtude da dificuldade para sua compreensão. Questão 40 - A gravidez do primeiro filho ocorreu para melhorar o relacionamento do casal. ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 ( ) NR Tabela 40- Descritor 40 - A gravidez do primeiro filho ocorreu para melhorar o relacionamento do casal Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado zero 84 56,4 56,4 56,4 1,00 3 2,0 2,0 58,4 2,00 8 5,4 5,4 63,8 3,00 8 5,4 5,4 69,1 4,00 41 27,5 27,5 96,6 NR 5 3,4 3,4 100,0 149 100,0 100,0 Total Fonte: Dados da pesquisa. Questão 41 - A gravidez do último filho ocorreu para melhorar o relacionamento do casal ( ) zero 258 ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 ( ) NA Projeto piloto Tabela 41 - Descritor 41 - A gravidez do último filho ocorreu para melhorar o relacionamento do casal Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado zero 64 43,0 43,0 43,0 1,00 2 1,3 1,3 44,3 2,00 9 6,0 6,0 50,3 3,00 12 8,1 8,1 58,4 4,00 37 24,8 24,8 83,2 NA 23 15,4 15,4 98,7 100,0 NR Total 2 1,3 1,3 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. Questão alterada - A gravidez do primeiro filho ocorreu para segurar um relacionamento. ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 Igualmente, as questões 42 e 43 apontam para as motivações socioeconômicas da gravidez. Foram feitas alterações nas questões a fim de torná-las mais claras e diretas. Questão 42 - A gravidez do primeiro filho ocorreu para melhorar a situação econômica. ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 259 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Tabela 42 - Descritor 42 - A gravidez do primeiro filho ocorreu para melhorar a situação econômica Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado zero 84 56,4 56,4 56,4 1,00 3 2,0 2,0 58,4 2,00 8 5,4 5,4 63,8 3,00 8 5,4 5,4 69,1 4,00 41 27,5 27,5 96,6 NR 5 3,4 3,4 100,0 149 100,0 100,0 Total Fonte: Dados da pesquisa. Questão 43 - A gravidez do último filho ocorreu para melhorar a situação econômica. ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 ( ) NA Tabela 43 - Descritor 43 - A gravidez do último filho ocorreu para melhorar a situação econômica (Continua) Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado zero 104 69,8 69,8 69,8 1,00 3 2,0 2,0 71,8 2,00 4 2,7 2,7 74,5 3,00 8 5,4 5,4 79,9 4,00 8 5,4 5,4 85,2 NA 20 13,4 13,4 98,7 260 Projeto piloto Tabela 43 - Descritor 43 - A gravidez do último filho ocorreu para melhorar a situação econômica (Conclusão) Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado 100,0 NR 2 1,3 1,3 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. Questão alterada - Você engravidou do primeiro filho para alcançar uma melhor situação econômica. ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 A questão número 44 foi mantida sem alteração ou questionamentos, pois revela um aspecto importante da pesquisa. Questão 44 - Ocorreu alguma dificuldade para conseguir emprego por ter filho ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 ( ) NR Tabela 44 - Descritor 44 - Ocorreu alguma dificuldade para conseguir emprego por ter filho (Continua) zero Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado 99 66,4 66,4 66,4 261 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Tabela 44 - Descritor 44 - Ocorreu alguma dificuldade para conseguir emprego por ter filho (Conclusão) Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado 1,00 6 4,0 4,0 70,5 2,00 9 6,0 6,0 76,5 3,00 11 7,4 7,4 83,9 4,00 13 8,7 8,7 92,6 NR 11 7,4 7,4 100,0 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. As questões 45 e 46 exigiam respostas alternativas, por se referirem às situações em que uma maior gradação parece difícil. A número 45 investiga a participação em serviços de planejamento familiar. Houve dificuldade em aplicar a questão, por isso ela foi alterada. Questão 45 - Ocorreu alguma dificuldade para conseguir emprego por ter filho ( ) Sim 262 ( ) Não Projeto piloto Tabela 45 - Descritor 45 - Você participou de algum serviço de planejamento familiar antes de engravidar? Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado Sim 24 16,1 16,1 16,1 Não 118 79,2 79,2 95,3 NR 7 4,7 4,7 100,0 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. Questão alterada - Você buscou orientação antes de engravidar? ( ) Não buscou ( ) Não conseguiu ( ) Não aceitou A questão 46 foi mantida sem alteração. Questão 46 - Um dos parceiros não queria filho por já ter filho de outro relacionamento? ( ) Sim ( ) Não ( ) NA ( ) NR Tabela 46 - Descritor 46 - Um dos parceiros não queria filho por já ter filho de outro relacionamento? (Continua) Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado Sim 15 10,1 10,1 10,1 Não 114 76,5 76,5 86,6 263 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Tabela 46 - Descritor 46 - Um dos parceiros não queria filho por já ter filho de outro relacionamento? (Conclusão) Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado NA 16 10,7 10,7 97,3 NR 4 2,7 2,7 100,0 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. As questões 47 e 48 estavam relacionadas, ou seja, a 48 estava condicionada à resposta positiva da 47. Houve um pouco de dificuldade para sua compreensão, por isso elas foram alteradas de modo a se fundirem. Questão 47 - Você já assumiu um filho(a) sozinho(a)? ( ) Sim ( ) Não ( ) NR Tabela 47 - Descritor 47 - Você já assumiu um filho(a) sozinho(a) Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado Sim 37 24,8 24,8 24,8 Não 104 69,8 69,8 94,6 NR 4 2,7 2,7 97,3 7,00 4 2,7 2,7 100,0 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. 264 Projeto piloto Questão 48 - Se a resposta da pergunta 47 for sim: ( ) Por morte do parceiro(a) ( ) Por separação ( ) Por opção ( ) Por abandono da criança ( ) Por outra situação ( ) NA Tabela 48- Descritor 48 - Se a resposta da pergunta 47 for sim Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado Por morte do parceiro(a) 7 4,7 4,7 4,7 Por separação 24 16,1 16,1 20,8 Por opção 10 6,7 6,7 27,5 Por outra situação 7 4,7 4,7 32,2 NA 29 19,5 19,5 51,7 NR 72 48,3 48,3 100,0 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. Questão alterada - Você já assumiu um filho(a) sozinho(a) ( ) Nunca ( ) Por morte do parceiro(a) ( ) Por separação ( ) Por opção ( ) Por outra situação ( ) Não aceitou A questão 49 aborda um aspecto cultural muito presente: a dificuldade de um casal estéril manter o relacionamento. 265 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Em algumas culturas, isso é muito forte, portanto investigar o tema é interessante. Questão 49 - Você já se separou em virtude das dificuldades em ter filho? ( ) Sim ( ) Não ( ) NR Tabela 49 - Descritor 49 - Você já se separou em virtude das dificuldades em ter filho? Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado Sim 5 3,4 3,4 3,4 Não 136 91,3 91,3 94,6 NR 5 3,4 3,4 98,0 7,00 3 2,0 2,0 100,0 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. As questões 50 e 51 estão também inter-relacionadas, buscando mapear o impacto de se ter um docente na decisão de ter um segundo filho. Buscando clareza, a questão foi reformulada, tornando-se uma só. Questão 50 - Você já decidiu não ter filho em virtude da possibilidade de ter um filho doente? ( ) Sim 266 ( ) Não ( ) NR Projeto piloto Tabela 50- Descritor 50 - Você já decidiu não ter filho em virtude da possibilidade de ter um filho doente? Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado Sim 4 2,7 2,7 2,7 Não 133 89,3 89,3 91,9 NR 10 6,7 6,7 98,7 100,0 7,00 2 1,3 1,3 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. Questão 51 - Se a resposta da pergunta 50 for sim: Motivo ( ) Já teve um filho doente ( ) Vive com HIV/ AIDS ( ) Consanguinidade ( ) NA ( ) Enfermidades genética na família Tabela 51 - Descritor 51 - Se a resposta da pergunta 50 for sim: Motivo: (Continua) Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado Vive com HIV/AIDS 5 3,4 3,4 3,4 Enfermidades genéticas na família 9 6,0 6,0 9,4 Consanguinidade 4 2,7 2,7 12,1 NA 102 68,5 68,5 80,5 NR 29 19,5 19,5 100,0 267 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Tabela 51 - Descritor 51 - Se a resposta da pergunta 50 for sim: Motivo: (Conclusão) Total Frequência Percentual Percentual válido 149 100,0 100,0 Percentual acumulado Fonte: Dados da pesquisa. Questão alterada - Você decidiu não ter mais filho: ( ) Já teve um filho doente ( ) Vive com HIV/ AIDS ( ) Casamento consanguíneo ( ) Não se aplica ( ) Há enfermidades genéticas na família A questão 52 se mostrou problemática. Aborda um tema relevante, mas o termo família se tornou aqui bastante impreciso, de modo que os pesquisadores decidiram pela exclusão da questão. Questão excluída – 52 - Houve ocorrência de morte na família relacionada a parto por falta de acesso à saúde? ( ) Sim ( ) Não Tabela 52- Descritor 49 - Você já se separou em virtude das dificuldades em ter filho? (Continua) Sim 268 Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado 5 3,4 3,4 3,4 Projeto piloto Tabela 52- Descritor 49 - Você já se separou em virtude das (Conclusão) dificuldades em ter filho? Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado Não 136 91,3 91,3 94,6 NR 5 3,4 3,4 98,0 7,00 3 2,0 2,0 100,0 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. Também na questão 53 o termo família tornou a questão confusa. No entanto, ela foi reformulada de modo a identificar a esfera pessoal do entrevistado. Questão 52 - Houve ocorrência de morte de criança (antes de 5 anos) na família? ( ) Sim ( ) Não ( ) NR Tabela 53- Descritor 53 - Houve ocorrência de morte de criança (antes de 5 anos) na família? Sim Frequência Percentual Percentual válido Percentual acumulado 65 43,6 43,6 43,6 100,0 Não 84 56,4 56,4 Total 149 100,0 100,0 Fonte: Dados da pesquisa. 269 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética A tendência foi priorizar questões mais simples, reformuladas de modo menos acadêmico, especialmente as que suscitaram dupla interpretação. Outra alteração se deu com relação a questões que se repetiam para as situações de gravidezes dos primeiros e dos últimos filhos. Observou-se que todas as vezes que se comparavam as questões referentes a essas situações, ocorria um resultado de um índice de “não se aplica”, pois coerentemente a questão que indaga sobre o “último filho” não se aplicava às pessoas que tinham apenas um filho. Desse modo, para corrigir esse elemento que traz distorções para a análise estatística dos dados, o instrumento de pesquisa final (Anexo F) apresentará uma seção aplicada apenas às pessoas com mais de um filho, indicando: “só responde quem tem mais de um filho”. 270 CONSIDERAÇÕES FINAIS Na investigação sobre os modelos de família, percebemos que há vários dados sobre as novas configurações, um novo jeito de ser nos relacionamentos dos membros das famílias. Algumas pesquisas, além dessa, estão sendo elaboradas em outras universidades, como é o caso da Universidade Católica de Salvador, para verificar a vivência da parentalidade. Porém, não foi possível identificar a existência de um instrumento adequado, que permita uma análise mais ampla considerando as características do projeto de parentalidade no contexto do planejamento de parentalidade. O estudo das configurações familiares sobre o planejamento de parentalidade mostrou-se insuficiente para indicar a existência ou não de um projeto de parentalidade desejado e aceito, não desejado e aceito, desejado e não aceito ou não desejado e não aceito, pelas pessoas que já tiveram filhos. Mesmo havendo legislação para o planejamento familiar na própria Constituição Federal, ou que a Igreja católica procure incentivar por meio de encontros em preparação ao matrimônio — conhecido ainda em alguns locais como curso de noivos —, o planejamento familiar, admitindo o uso de Planejamento da parentalidade no contexto da bioética métodos naturais, não foi possível identificar a existência ou não do planejamento de parentalidade. Percebemos que a Igreja católica acompanha as alterações nos arranjos familiares e tem uma visão própria a respeito. Elabora suas orientações doutrinais e pastorais, sem contudo, ser ‘favorável’ a todos os tipos ou modelos de família. Aliás, em alguns casos, sequer aceita a designação de família, como é o caso do arranjo homoafetivo, que não se enquadra na lei natural, impossibilitando a geração da prole por meio de um relacionamento sexual de forma natural. Para os casais em segunda união, há uma acolhida bem maior, e a procura de uma reinserção na comunidade eclesial, quando se trata da Igreja católica no Brasil. Por se tratar de uma característica humana, a influência da religião é visceral, e qualquer discussão que se proponha a relativizar tal influência dificilmente logrará êxito. Contudo, na proposta que cada religião tem de mostrar a face de Deus, vem sempre a expectativa de salvação e libertação de todo o mal. Mas, que mal é esse que hoje enfrentamos no que diz respeito ao cuidado com a vida? E, como pode a ação divina nos livrar dele? Contudo, se pensarmos no mal como resultado das ações humanas, que é de fato o que materializa o mal, nossas preces carecem de revisão. É importante identificar o modelo tradicional, junto aos novos arranjos familiares. Pois, nem tudo o que é tradicional é ruim. E nem tudo o que é novo, é melhor, necessariamente. É imprescindível que uma autocrítica seja feita, dentro mesmo das novas famílias — que, ao que parece, vêm perdendo essa capacidade. Além disso, é necessário um 272 Parentalidade e modelos de família caminho que ajude a entender para, em seguida, melhorar o planejamento de parentalidade. Das questões sociais que impactam na parentalidade, percebemos a interação de mútuos e múltiplos fatores. O acesso à educação é necessário para o aprimoramento do planejamento familiar que, por sua vez, se for feito a partir de programas bem elaborados, pode se tornar um processo educativo relevante. A questão de gênero estará sempre presente neste debate em virtude de fatores culturais e sociais complexos: a atribuição tradicional da maternidade como mais relacionada com a mulher; a persistente violência contra a mulher; a existência de instituições e movimentos sociais que nem sempre promovem uma agenda equilibrada sobre planejamento familiar etc. Também o aborto é uma questão central na pesquisa, pois sua ocorrência retrata uma ausência de projeto de parentalidade e traz consequências indesejáveis para todos. Vimos que os projetos de parentalidade ocorrem quando os casais refletem, planejam e decidem ter ou não filhos num determinado momento, não se podendo deixar de considerar a necessidade de uma participação da sociedade como um todo, governo, igrejas, escolas, imprensa, todos num crescente incentivo ao planejamento familiar. A aplicação do instrumento de pesquisa validado pela revisão teórica e pela Técnica de Grupo Nominal possibilitou uma ampla revisão das questões apresentadas. Percebeuse que em alguns momentos os entrevistados expressavam mais o “politicamente correto” do que sua própria realidade. Isso se dá por ser o tema do planejamento familiar altamente sensível à opinião pública. Portanto, algumas questões foram readequadas de modo a tornar a questão menos direta. 273 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética No instrumento final, buscou-se uma redação menos acadêmica, mais clara, com alterações nas questões que claramente possibilitavam uma resposta confusa. Também foram alteradas aquelas que indicavam a possibilidade de uma resposta “não se aplica”, em razão das dificuldades que isso traz para a análise estatística, por meio do programa SPSS. Assim, boa parte das questões que apontava para esta indicação foi separada, colocada no final, como no caso que se indagava sobre situações relacionadas ao último filho. Apresentamos, assim, um instrumento de pesquisa validado por todo esse processo, mas a equipe de pesquisadores estará atenta às possibilidades de alterações, principalmente no primeiro projeto em que o instrumento será aplicado: Planejamento familiar no contexto intereclesial — já encaminhado ao CEP-PUCPR. Esse projeto entrevistará aproximadamente 1.000 pessoas, o que possibilitará uma ampla análise dos dados e, talvez, a construção de uma escala de projeto de parentalidade. 274 REFERÊNCIAS ABDALATI, H. O islam em foco. São Bernardo do Campo: Centro de divulgação do Islam para América Latina, 1989. ALES BELLO, A. Família e intersubjetividade. In: CARVALHO, A. M. A.; MOREIRA, L. V. C. Família, subjetividade, vínculos. São Paulo: Paulinas, 2007. ALMEIDA, C. A. A cabeça do brasileiro. Rio de Janeiro: Record, 2007. 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WORLD HEALTH ORGANIZATION — WHO. Unsafe abortion: global and regional estimates of the incidence of unsafe abortion and associated mortality in 2008. 6th ed. Geneva: World Health Organization, 2011. 283 APÊNDICE A Instrumento de pesquisa validado 1 - Gênero ( ) 1 Feminino ( ) 2 Masculino ( ) 3 Outro 2 – Idade atual do entrevistado ( ) Entre 18 e 25 ( ) Entre 26 e 35 ( ) Entre 36 e 45 ( ) Entre 46 e 60 ( ) Acima de 60 3 – Número de filhos Consanguíneos Por Reprodução Assistida Adotivos ( ) 1 ( ) 2 ( ) 1 ( ) 2 ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) ≥4 ( ) 3 ( ) ≥4 ( ) 3 ( ) ≥4 4 – Religião ( ) Católica ( ) Evangélica ( ) Afro-brasileira ( ) Judaica ( ) Islâmica ( ) Orientais ( ) Espírita ( ) Sem religião ( ) Outra. Qual? ______________ 5 – Qual é o seu grau de sua participação na religião? ( ) Pouco participante ( ) Participante ( ) Ministro / Ministérios ( ) Agente / Obreiro ( ) Outro. ( ) Não se aplica 285 6 – Qual era seu estado civil na gravidez do primeiro filho? ( ) Solteiro ( ) Casado ( ) Divorciado ( ) Viúvo ( ) União Estável ( ) Separado Judicialmente 7 – Qual era seu grau de escolaridade na gravidez do primeiro filho? ( ) Não havia estudado ( ) Estava nas séries iniciais ( ) Havia concluído a 4ª série ( ) Estava entre a 5ª e a 8ª série ( ) Estava no Ensino Médio ( ) Havia concluído o Ensino Médio ( ) Estava na Faculdade ( ) Já havia concluído a Faculdade 8 – Em que idade você iniciou um relacionamento sexual? ( ) Menos de 15 anos ( ) Entre 16 e 18 anos ( ) Entre 22 e 25 anos ( ) Acima de 26 anos ( ) Entre 19 e 21 anos 9 – Em que idade você teve a primeira gravidez / ou engravidou alguém pela primeira vez? ( ) Menos de 15 anos ( ) Entre 16 e 18 anos ( ) Entre 22 e 30 anos ( ) Acima de 31 anos ( ) Entre 19 e 21 anos 10 – Qual era a sua situação de emprego na gravidez do primeiro filho? ( ) Empregado(a) ( ) Desempregado(a) ( ) Do lar ( ) Outro 286 ( ) Autônomo(a) 11 – Com quem você morava quando soube da gravidez do primeiro filho? ( ) Sozinha ( ) Com amigos ( ) Com o(a) parceiro(a) ( ) Outro ( ) Com os pais 12 – Você sentiu pressão para ter filhos? ( ) De familiares ( ) De amigos ( ) Da escola ( ) De outros ( ) Não houve pressão externa 13 – Se houve pressão externa – a importância dessa pressão foi: ( ) Nula ( ) Fraca ( ) Forte ( ) Muito forte ( ) Regular 14 – De quem você recebe mais informações sobre sexualidade: ( ) Dos amigos ( ) De familiares ( ) Da escola ( ) De religiosos ( ) Da internet ( ) De profissionais de saúde ( ) Outros 15 – Qual foi a sua reação no anúncio da gravidez do primeiro filho? ( ) Revolta ( ) Preocupação ( ) Aceitação ( ) Alegria ( ) Surpresa 16 – Você compreende os filhos como: ( ) Peso ( ) Obstáculo ( ) Um privilégio ( ) Bênção de Deus ( ) Algo natural 287 17 – Quem exerce a chefia da família em sua casa? ( ) o homem ( ) a mulher ( ) o casal ( ) outro:_____________ RESPONDA ÀS QUESTÕES ABAIXO COM NOTAS DE ZERO A QUATRO 18 – Houve planejamento na gravidez do seu primeiro filho? ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 19 – Você pensou nos riscos de saúde relacionados a ter filhos – antes da gravidez do primeiro filho? ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 20 – Você avaliou as condições econômicas para cuidar do bebê – antes da gravidez do primeiro filho? ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 21 – Você chegou a desejar, em algum momento, o aborto do primeiro filho? ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 22 – A gravidez do primeiro filho foi um projeto do casal? Decisão dos dois? ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 23 – A sua família ajudou na aceitação da gravidez do primeiro filho? ( ) zero 288 ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 24 – A sua atividade profissional (ou de sua companheira) influenciou na decisão de engravidar mais tarde? ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 25 – A possibilidade de adquirir doença alterou a sua prática sexual? ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 26 – A religião lhe influenciou na escolha do método contraceptivo? ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 27 – O uso de preservativos lhe incentivou a ter relacionamento sexual com outra pessoa, além do parceiro? ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 28 – Para você qual a relação entre casamento e ter filhos? ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 29 – Você teve acesso a serviços/orientações sobre planejamento familiar na gravidez do primeiro filho? ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 30 – Você teve o acesso desejado ao serviço pré-natal na gravidez do primeiro filho? ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 31 – A gravidez do seu primeiro filho ocorreu para segurar um relacionamento? ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 289 32 – Você engravidou do primeiro filho para alcançar uma melhor situação econômica? ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 33 – Ocorreu alguma dificuldade de se conseguir emprego por ter filho? ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 RESPONDA SIM OU NÃO 34 - Um dos parceiros não queria filho por já ter filho de outro relacionamento? ( ) Sim ( ) Não ( ) Não se aplica 35 – Você já assumiu um filho(a) sozinho(a)? ( ) Nunca ( ) Por separação ( ) Por morte do/a parceiro/a ( ) Por outra situação ( ) Por opção 36 – Você já se separou devido às dificuldades em ter filho? ( ) Sim ( ) Não 37 – Se você decidiu não ter mais filho, qual o motivo? ( ) Opção pessoal ( ) Já teve um filho doente ( ) Vive com HIV/ AIDS ( ) Há enfermidade genética na família ( ) Casamento com consanguinidade ( ) Não se aplica 290 38 – Você já se separou devido às dificuldades em ter filho? ( ) Sim ( ) Não SÓ RESPONDE QUEM TEM MAIS DE UM FILHO (da 39 a 53) 39 – Qual seu estado civil na gravidez do último filho? ( ) Solteiro ( ) Casado ( ) Divorciado ( ) Viúvo ( ) União Estável ( ) Separado Judicialmente 40 – Qual era seu grau de escolaridade na gravidez do último filho? ( ) Não havia estudado ( ) Estava nas séries iniciais ( ) Havia concluído a 4ª série ( ) Estava entre a 5ª e 8ª série ( ) Estava no ensino médio ( ) Havia concluído o EM ( ) Estava na Faculdade ( ) Já havia concluído a Faculdade 41 – Qual era sua situação de emprego na gravidez do último filho? ( ) Empregado(a) ( ) Desempregado(a) ( ) Do lar ( ) Outro ( ) Autônomo(a) 42 – Com quem você morava quando soube da gravidez do último filho? ( ) Sozinha ( ) Com amigos ( ) Com o(a) parceiro(a) ( ) Outro ( ) Com os pais 43 – Qual foi sua reação no anúncio da gravidez do último filho? ( ) Revolta ( ) Preocupação ( ) Aceitação ( ) Alegria ( ) Surpresa 291 RESPONDA ÀS QUESTÕES ABAIXO COM NOTAS DE ZERO A QUATRO 44 – Você planejou a gravidez do seu último filho? ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 45 – Você pensou nos riscos de saúde relacionados a ter filhos – antes da gravidez do último filho? ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 46 – Você avaliou as condições econômicas para cuidar do bebê – antes da gravidez do último filho? ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 47 – Você chegou a desejar, em algum momento, o aborto do último filho? ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 48 – A gravidez do último filho foi um projeto do casal? Decisão dos dois? ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 49 – A sua família ajudou na aceitação da gravidez do último filho? ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 50 – Você teve acesso a serviços/orientações sobre planejamento familiar na gravidez do último filho? ( ) zero 292 ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 51 – Você teve o acesso desejado ao serviço pré-natal na gravidez do último filho? ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 52 – A gravidez do seu último filho ocorreu para segurar um relacionamento? ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 53 – Você engravidou do último filho para alcançar uma melhor situação econômica? ( ) zero ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 293 Orientandos / pesquisadores Edésia de Sousa Sato Juares Celso Krum Mário Antônio Sanches Miguel Fernando Rigoni Renato Barbosa dos Santos Alexandre Felício de Campos Castorina H.V. Casagrande Cecília Francisca dos Santos Eva Maria Duarte Gomes Kelly Fabiola G.de Jesus Luiz Felipe da Silva Mário Antônio Sanches Atividade realizada Revisão teórica principal Revisão de apoio Participantes da pesquisa 294 6 trabalhos de Iniciação Científica 4 dissertações de mestrado Resultados Relatórios em julho de 2012 e em julho de 2013 3 defesas até julho de 2013 (Continua) Cronograma APÊNDICE B Quadro sinótico da pesquisa realizada 295 Orientandos / pesquisadores Toda a equipe Toda a equipe Edésia de Sousa Sato Juares Celso Krum Mário Antônio Sanches Miguel Fernando Rigoni Renato Barbosa dos Santos Atividade realizada Técnica de Grupo Nominal – etapa a distância Técnica de Grupo Nominal – etapa presencial Análise dos dados da TGN 15 especialistas 17 especialistas Participantes da pesquisa Validação de 36 descritores Avaliação de 58 descritores Avaliação de 58 descritores Resultados Concluída em março de 2013 Dezembro de 2012 Novembro de 2012 (Continua) Cronograma 296 Orientandos / pesquisadores Cecília Francisca dos Santos Juares Celso Krum Kelly Fabiola G.de Jesus Luiz Felipe da Silva Mário Antônio Sanches Renato Barbosa dos Santos Juares Celso Krum Mário Antônio Sanches Renato Barbosa dos Santos Mário Antônio Sanches Juares Celso Krum Renato Barbosa dos Santos Atividade realizada Projeto Piloto Análise dos dados do PP Relatórios Finais 149 entrevistados Participantes da pesquisa Relatório elaborado em 3 partes: a) Método e contexto, b) Revisão teórica, c) projeto piloto. Definição do Instrumento da Pesquisa Aplicação do instrumento de pesquisa Resultados Concluído em setembro de 2013. Concluída em agosto de 2013 Realizada em junho de 2013 (Conclusão) Cronograma Parentalidade e modelos de família SOBRE OS AUTORES Edesia Souza Sato Assistente social, psicopedagoga e mestre em Teologia pela PUCPR, membro efetivo da Comissão de Ética CRESS. Contato: [email protected] Juares Celso Krum Diácono permanente, bacharel em Teologia e Mestre em Teologia pela PUCPR. É assessor da Pastoral Familiar do Regional Sul 2 da CNBB. Contato: [email protected] Mário Antônio Sanches Doutor em Teologia pela EST/IEPG, RS, com pós-doutorado em Bioética pela Pontifícia Universidade de Comillas (Madrid). É professor titular da PUCPR, onde coordena o Mestrado de Bioética. Contato: [email protected] Miguel Fernando Rigoni Diácono, advogado, psicólogo, jornalista, mestre em Teologia pela PUCPR, mestre em Educação pela Universidade Tuiuti. Atua como juiz do Tribunal Eclesiástico Interdiocesano e de Apelação de Curitiba e professor da PUCPR. Contato: [email protected] 299 Planejamento da parentalidade no contexto da bioética Renato Barbosa dos Santos Bacharel em Teologia e mestre em Teologia pela PUCPR. Professor de Bioética no Grupo Rhema de Educação. Contato: [email protected] 300 Parentalidade e modelos de família COLABORADORES Alunos PIBIC 2011-2012 Alexandre Felício de Campos Castorina Honorato Vidal Casagrande Eva Maria Duarte Gomes Alunos PIBIC 2012-2013 Cecília Francisca dos Santos Kelly Fabiola Galikoski de Jesus Luiz Felipe da Silva Alunos PIBIC – Junior 2012-2013 Elisa Casselato Bento, Lucas Rafael de oliveira, Alunos PIBIC 2013-2014 Kelly Fabiola Galikoski de Jesus, Edilaine Cristiana Cervi Valquíria Batista da Rocha Mestrandos Luiz Fernando de Lima Shanny Mara Neves Roberto Cesar de Oliveira Cleusa Regina Ferreira da Luz 301 ISBN 9 7 8 - 8 5 - 6 8 3 2 4 - 1 1 - 0 9 788568 324110