Entendendo a incontinência

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Entendendo a incontinência
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Entendendo a
incontinência, em todas
as fases da vida
Segundo especialistas, a
incontinência provoca um
impacto psicológico enorme, as
pessoas passam a ter medo de
sair, manter uma vida social
ativa e principalmente manter
relações sexuais.
Por Luciana H. Mussi
M
uitos ainda acreditam que o envelhecimento, de modo geral, está
associado à ocorrência de incontinência urinária e fecal. Porém, esta
não
é,
necessariamente,
uma
consequência
natural
do
envelhecimento, como muitos ainda acreditam. Mudar esse cenário tornou-se
um desafio para os profissionais da saúde e considerando o acelerado
envelhecimento da população mundial, o entendimento de alguns conceitos
que envolvem a incontinência é fundamental, em todas as fases da vida.
Velhice
Wyman e colaboradores (2000) definem a velhice a partir do conjunto das
condições biológicas, sociais, econômicas, cognitivas, funcionais e
cronológicas. Biologicamente, o envelhecimento se inicia no momento em que
se nasce, e não aos 60 anos; socialmente, a velhice varia de acordo com o
momento histórico e cultural; intelectualmente, diz-se que alguém esta
envelhecendo quando suas faculdades cognitivas começam a falhar,
apresentando problemas de memória, atenção, orientação e concentração;
economicamente, a pessoa entra na velhice quando se aposenta, deixando de
ser produtiva para a sociedade; funcionalmente quando o individuo perde a sua
independência e precisa de ajuda para desempenhar suas atividades básicas
de vida diária; e finalmente cronologicamente, a pessoa é idosa quando faz 60
ou 65 anos.
Envelhecimento
Segundo Rigo e Teixeira (2005), o envelhecimento é um processo que afeta
todos os indivíduos de forma lenta e gradativa, provocando alterações
biológicas e socioambientais. A intensidade dessas modificações inerentes ao
processo de senescência varia de indivíduo para indivíduo.
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Já Herzog e Fultz (1990) afirmam que o processo de envelhecimento e suas
consequências naturais, as alterações biomorfológicas, são preocupações da
humanidade desde o inicio da civilização. Naturalmente os seres vivos são
regidos por um determinismo biológico: todos nascem, crescem, amadurecem,
envelhecem, declinam e morrem. As alterações inerentes ao envelhecimento
dependem de cada individuo, da programação genética de sua espécie e de
fatores ambientais (habitat, modos de vida, e de agressões que tenham sofrido
no decorrer de suas existências).
O envelhecimento não começa subitamente aos 60 anos,
mas consiste no acumulo e interações de processos
sociais, médicos e de comportamento durante a vida
toda. Entre as patologias as incontinências, fecal e
urinaria, são as que mais afetam a população idosa.
Por se tratar de um tema delicado e pouco explorado, realizamos uma
pesquisa na mídia buscando, através do olhar de especialistas da área da
saúde, entender a dinâmica das patologias, suas respectivas causas e
sintomas, além de um diagnóstico preciso com tratamentos adequados,
prevendo, inclusive alternativas para os casos mais graves.
Tudo, sem perder de vista o impacto emocional relacionado aos
“constrangimentos sociais” que afetam diretamente a qualidade de vida e,
muitas vezes, isolam e acabam por deprimir as pessoas. Alternativas existem,
são possíveis e estão acessíveis a todos que desejam uma vida plena, como
veremos a seguir.
Incontinência fecal
Em entrevista concedida ao Dr. Drauzio Varella, a Dra. Angelita H. Gama,
médica, professora de Coloproctologia da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo e profissional do corpo clínico do Hospital Osvaldo
Cruz (São Paulo/SP), explica:
Incontinência fecal, isto é, a incapacidade de controlar a eliminação das fezes,
é um assunto delicado sobre o qual os portadores do distúrbio não costumam
conversar nem mesmo com os médicos. O constrangimento é tanto que o
problema evolui e vai comprometendo cada vez mais a qualidade de vida
desses pacientes que acabam sem coragem de sair de casa.
Para entender melhor como funciona o controle da evacuação é preciso
conhecer a anatomia da pelve. Na parte de trás da pelve óssea, ou bacia como
popularmente é chamada, situa-se o osso sacro formado pela fusão de cinco
vértebras do finalzinho da coluna, e pelo cóccix, o ossinho pontudo que pode
ser visto na “imagem 1”.
A parte inferior da cavidade pélvica é constituída pelo períneo onde se situam
os órgãos genitais e o canal anal. A musculatura do períneo dá suporte ao
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ânus, a porção final do aparelho digestivo. O canal anal tem um esfíncter
interno e outro externo e é enervado pelo nervo pudendo, que é fundamental
para o funcionamento de toda a musculatura da base do períneo e pelo
controle dos esfíncteres. Qualquer alteração anatômica nessa região pode ser
responsável pela incontinência fecal.
Causa
Drauzio: Quais são as causas da incontinência fecal, problema que
compromete tanto a qualidade de vida das pessoas?
Angelita H. Gama: A causa pode ser congênita. Crianças que nascem com o
ânus imperfurado e são submetidas à operação de abaixamento do intestino,
com frequência se tornam incontinentes na idade adulta. Acredito, porém, que
o interesse maior seja dar destaque à incontinência adquirida do adulto.
Existem causas traumáticas como acidentes de trânsito, operações de períneo
e determinadas fissurectomias que, às vezes, exigem a secção dos músculos
do esfíncter para a cura da fístula. Algumas cirurgias para tratamento de câncer
que obrigam a retirada parcial ou completa do reto também geram
incontinência.
Outro fator importante a considerar é o envelhecimento que provoca diminuição
das células da musculatura do períneo, denervação e fechamento insuficiente
do canal anal. Nos adultos, numa faixa etária em que as pessoas ainda estão
em atividade laboriosa, a incontinência fecal predomina nas mulheres.
Predomina nas mulheres principalmente por causa do parto.
Drauzio: Qual o prejuízo que o parto determina?
Angelita H. Gama: O trabalho de parto determina a tração, o estiramento do
nervo pudendo, que sofre uma degeneração parcial. Quando a mulher atinge
os 40, 50 anos, o problema é agravado pela perda da enervação que ocorre
com a idade e aparecem os sintomas da incontinência. Outra causa importante
nas mulheres é a constipação intestinal.
A força necessária para conseguir evacuar acaba gerando o estiramento do
nervo e acentua a denervação natural da idade. Portanto, esses dois fatores,
trauma de parto e prisão de ventre, aumentam a incidência de incontinência
fecal nas mulheres na fase adulta. Acima dos 70, 80 anos, porém, o problema
se manifesta igualmente em homens e mulheres, porque a denervação ocorre
de forma semelhante nos dois sexos.
Drauzio: Em que proporção a incontinência fecal acomete mais as mulheres na
idade adulta do que os homens?
Angelita H. Gama: Eu diria que, em cada dez pessoas incontinentes na idade
adulta, oito são mulheres e duas são homens. Na idade mais avançada, repito,
os dois sexos se equiparam.
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Sintomas
Drauzio – Nos casos em que a instalação da incontinência é gradativa, quais
são os primeiros sinais que aparecem?
Angelita H. Gama: As pessoas começam a perceber que não seguram mais os
gases intestinais. Vão tossir, perdem gases; têm flatulência, perdem gases.
Progressivamente esse sintoma piora, o ânus vai ficando mais flácido, mais
frouxo, e elas não contêm mais a diarreia, as fezes líquidas. Quando o quadro
se agrava, deixam de reter também as fezes sólidas. Por causa disso,
precisam usar um protetor nas vestes e, às vezes, deixam de sair de casa, de
trabalhar e de viajar, porque têm medo de não chegar a tempo ao banheiro.
Como se pode imaginar, isso compromete profundamente a qualidade de vida
e provoca um trauma psicológico muito grande, o que é uma pena porque há
maneiras cirúrgicas e não cirúrgicas de tratar a incontinência. As pessoas
precisam saber que podem procurar auxílio para resolver esse problema
recorrendo a um médico especialista.
Drauzio: Sua experiência mostra que as pessoas demoram para procurar um
médico quando estão incontinentes?
Angelita H. Gama: Demoram muito. Às vezes, as pessoas vão ao consultório
por outros motivos que não a incontinência, mas durante a manobra do exame
percebe-se a presença de fezes no ânus ou a perda de gases. Minucioso
interrogatório clínico feito a seguir revela que a doença já estava instalada há
algum tempo. Muitos pacientes, porém, nos procuram assim que manifestam
um grau menor de incontinência.
Reflexo na qualidade de vida
Drauzio: Qual o impacto psicológico que a incontinência fecal provoca?
Angelita H. Gama: É enorme. Pessoas casadas têm medo até de manter
relações sexuais porque perdem gases, perdem fezes líquidas. Às vezes,
abandonam os exercícios físicos pelo mesmo motivo e precisam usar protetor
nas roupas permanentemente. A sensação de desconforto é enorme. Além
disso, a incontinência torna as pessoas mal cheirosas, situação que piora nos
idosos que, em geral, acumulam os dois tipos de incontinência, a fecal e a
urinária.
Diagnóstico
Drauzio: Como você encaminha uma pessoa que chega ao
consultório com queixa de incontinência fecal?
Angelita H. Gama: A conversa com o cliente, o
interrogatório clínico é muito importante no encaminhamento do caso, porque
há pessoas que têm incontinência em virtude de alterações no tipo de
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evacuação. Muitas tomam laxantes e evacuam fezes líquidas sempre. Ora,
fezes líquidas são difíceis de conter, mesmo considerando que a musculatura
do ânus é mais eficiente do que a da mão. Fechando a mão, não conseguimos
conter líquidos e muito menos gases. O ânus consegue porque possui
musculatura diferenciada. O esfíncter interno está permanentemente contraído
e o externo permanentemente com certo grau de relaxamento. Se a pessoa
quer conter a evacuação, reforça a contração de repouso também do esfíncter
externo.
No entanto, é o esfíncter interno que segura mesmo as fezes e
os gases. Um grande anatomista já o comparou a um gorila
numa jaula. Está sempre atento. Como estávamos dizendo,
fezes líquidas são difíceis de conter especialmente se a pessoa
já apresenta certo grau de laceamento da musculatura anal. Às
vezes, porém, para o problema ser controlado, basta modificar
a consistência fecal, fazendo-a passar de líquida para sólida.
Drauzio: Além da anamnese, algum exame ajuda no diagnóstico?
Angelita H. Gama: O exame proctológico é de grande importância para o
diagnóstico e o tratamento que pode ser cirúrgico ou não cirúrgico. Por meio do
toque retal se percebe a flacidez do ânus e o retossigmoidoscópio (aparelho
em forma de tubo dotado de lentes que permitem visualizar a parte interna das
porções mais baixas do intestino) possibilita a avaliação das condições gerais
da região. Se a incontinência for mais acentuada, são necessários exames
mais especializados como a eletromanometria, que mede as pressões do
esfíncter, e a miografia.
Drauzio: Como se realiza a miografia?
Angelita H. Gama: O nome completo desse exame é Medida do Tempo de
Latência do Nervo Pudendo. É um exame importante e muito simples. Consiste
em fazer um toque com um instrumento que se liga ao eletromiógrafo.
A “imagem 2” mostra o aparelho medindo o tempo de contração muscular na
área enervada pelo nervo pudendo. Quando esse tempo é maior, significa que
o músculo está denervado e funcionando mal. Exames especializados como a
manometria, o tempo de latência do pudendo e o ultrassom intra-anal, que
mostra se o esfíncter está integro ou com lesão, são indispensáveis para
seleção e adequação do procedimento cirúrgico.
Tratamento
Drauzio: Você disse que o tratamento da incontinência
fecal pode ser cirúrgico ou clínico. Em que consiste o
tratamento clínico?
Angelita H. Gama: O tratamento clínico consiste em
corrigir o tipo de evacuação, o que se consegue com dieta e medicamentos.
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Vamos prescrever constipantes, se a pessoa tiver
diarreia, e substâncias que aumentam o bolo fecal se as
fezes forem endurecidas e exigirem muita força para
evacuar. Além disso, o indivíduo aprende que pode
recorrer a certas estratégias quando vai viajar ou sair de
casa por mais tempo, como usar supositórios
evacuadores ou fazer pequenas lavagens intestinais para esvaziar o reto. Isso
evita o inconveniente da perda de fezes, o que acontece muitas vezes sem que
ele perceba, pois, além do relaxamento dos músculos, a sensibilidade anal fica
comprometida. Felizmente, existem pomadas com substâncias que melhoram a
sensibilidade e facilitam a contração do ânus.
Outras medidas conservadoras que facilitam o tratamento não cirúrgico da
incontinência fecal são o uso de alguns medicamentos antidepressivos e o
sistema de biofeedback, indicado para pessoas que não conseguem contrair a
musculatura da região anal (o que é definido pelo exame de
eletromanoterapia). O biofeedeback é um autotreinamento que
ajuda o paciente a descobrir o nível de contração necessário para
fechar o ânus. Em três ou quatro sessões, ele aprende como
utilizar a musculatura que existe, mas não sabe usar.
Drauzio: Como se explica que as pessoas não saibam utilizar um
mecanismo tão natural?
Angelita H. Gama: Vamos imaginar, por exemplo, uma pessoa que seja
operada das hemorroidas, cirurgia em que o esfíncter é preservado, mas o
paciente passa por um período de desconforto em que sente dor, toma
laxantes e, às vezes, fica com medo de contrair o ânus. A incontinência de que
se queixa não tem outra causa senão o fato de não estar usando a musculatura
por temor ou ansiedade. Aliás, a ansiedade é causa de uma série de doenças,
entre elas os distúrbios da defecação.
Drauzio: O que acontece com as pessoas que por ansiedade contraem
excessiva e involuntariamente a musculatura?
Angelita H. Gama: Essa contração constante, que pode ser diagnosticada pelo
exame de eletromanometria, vai gerando dificuldade para evacuação e pode
chegar ao que chamamos de contração paradoxal do músculo que sustenta o
períneo (músculo elevador do ânus).
Drauzio: Qual a conduta quando o defeito é mais grave, por exemplo, quando
houve mesmo a ruptura dos músculos responsáveis pela continência do ânus?
Angelita H. Gama: Na “imagem 3”, o pontilhado indica o músculo que está por
baixo da pele, o esfíncter do ânus, e que houve uma ruptura que pode ser vista
melhor na “imagem 4”.
É claro que, quando existe esse afastamento, o ânus fica frouxo e sem a
possibilidade de segurar as fezes. Corrigir esse problema é um procedimento
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razoavelmente simples. Sob anestesia, o cirurgião faz uma incisão na pele,
identifica a extensibilidade do músculo que não fecha mais o ânus, aproxima as
duas pontas, costura uma na outra, “imagem 5” e a pessoa passa a evacuar
bem de novo. No entanto, esse procedimento só pode ser feito quando o
afastamento não é muito grande. Nas pessoas mais idosas, às vezes, a
denervação é mais extensa como revelam os exames de eletromanometria e
miografia. Nesses casos, somos obrigados a utilizar a transposição de outros
músculos. Existe uma técnica antiga de operação que fizemos muito no
Hospital das Clínicas e consiste na transposição de um músculo da coxa para o
ânus, que passa a funcionar com esse novo músculo.
Drauzio: Como é feita essa cirurgia?
Angelita H. Gama: Descolamos o músculo da coxa que se insere no joelho e
que não faz falta para a movimentação da perna. É um músculo longo, com um
pedículo vascular próximo à espinha ilíaca, na bacia. Em seguida, dissecamos
todo o músculo, fazemos um túnel entre a coxa e o ânus, passamos por ele o
músculo com o qual circundamos o reto.
Drauzio: Como costuma ser o resultado dessa cirurgia?
Angelita H. Gama: Não é perfeito, mas é melhor do que nada. É um
procedimento de exceção. Hoje dispomos de outros artifícios que a população
precisa conhecer para o tratamento de casos graves de incontinência fecal.
Esfíncter artificial e neuroestimulação
Drauzio: Quais são os métodos para os casos graves de incontinência fecal?
Angelita H. Gama: Para casos muito graves de incontinência, quando a
denervação e a rutura são grandes, podemos dispor do esfíncter artificial que
funciona como se fosse um tubo comunicante. É uma peça feita com material
plástico que circunda o ânus, um balão colocado pelo abdômen em cima do
púbis e uma bomba que se fixa nos grandes lábios ou no escroto. A pessoa
aperta o botão que existe na bomba, o líquido se movimenta e o ânus abre ou
fecha.
Drauzio: Funciona bem esse esfíncter artificial?
Angelita H. Gama: Funciona melhor que os demais artifícios de que
dispúnhamos até agora. A pessoa não fica perfeita, porque perfeição em
matéria de continência anal ou urinária, só Deus quando a gente nasce. A
única dificuldade é o custo. Um aparelho desses custa dez mil dólares. Nos só
conseguimos levar essa técnica para o HC com o apoio da Fapesp (bendita
Fapesp!) que doou um número razoável de esfíncteres. Eles foram colocados
especialmente em jovens com incontinência secundária e que tinham
alterações congênitas. Os resultados foram animadores, pois muitos jovens,
que eram totalmente incontinentes, até se casaram depois da colocação dos
esfíncteres. Além do esfíncter artificial, podemos contar também com a
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neuroestimulação sacral que pode beneficiar um número significativo de
doentes.
Drauzio: Como é feita a neuroestimulação sacral?
Angelita H. Gama: Colocamos uma agulha na terceira vértebra sacral e
fazemos um teste, porque existe ali um mecanismo reflexo integrado
desencadeado por nervos que saem do forame sacral e comandam a
musculatura esfincteriana. Se houver contração dessa musculatura,
implantamos um marca-passo que vai permanentemente estimular esses
nervos. São pequenos choques elétricos que a pessoa recebe sem sentir o
menor incômodo, sem sentir dor alguma, e que contraem a musculatura.
Drauzio: Esses tratamentos para a incontinência fecal são aplicados com
frequência?
Angelita H. Gama: Tanto o esfíncter artificial quanto a neuroestimulação são
tratamentos de exceção para as formas mais graves de incontinência, para
aquelas em que o procedimento de reparo muscular não dá resultado. Hoje, há
médicos que desconhecem a existência de tratamentos cirúrgicos para
incontinência fecal e a população jamais ouviu falar sobre eles. Tenho muitos
anos de profissão e esta é a primeira vez que, na mídia, alguém me convida
para abordar esse tema de tamanha importância social e tão cercado de
preconceitos.
Drauzio: O que a correção da incontinência fecal muda na vida das pessoas?
Angelita H. Gama: Muda muito. Os pacientes levam outra vida. Levam uma
vida digna, porque a incontinência os aproxima dos animais.
Costumo dizer que a diferença entre o homem e o animal está
no fato de que o homem evacua na hora que quiser e é capaz
de segurar as fezes. O animal não tem controle definido. A
incapacidade de segurar as fezes faz com que o ser humano se
sinta rebaixado emocionalmente. Por isso, o tratamento clínico
ou cirúrgico é fundamental e as pessoas com esse problema não devem resistir
para procurar o médico.
Incontinência urinária
Para falar sobre Incontinência urinária, Dr. Drauzio Varella
entrevista o Dr. Fabio Baracat, médico urologista da Divisão
de Urologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de
Medicina da Universidade de São Paulo e profissional do
corpo clínico do Hospital Osvaldo Cruz (São Paulo/SP).
Fazem parte do aparelho urinário os rins, que filtram o sangue e eliminam suas
impurezas para que possa ser reconduzido à circulação, e as vias urinárias,
isto é, o ureter, a bexiga e a uretra. É na bexiga que a urina proveniente dos
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rins através dos ureteres é armazenada. Quando a capacidade desse
reservatório se esgota, ela é eliminada pela uretra.
Como se pode ver na “imagem 01”, as vias urinárias são estruturas muito
próximas de outros órgãos que se localizam na cavidade abdominal. Nos
homens, a próstata envolve a uretra. Nas mulheres, a bexiga fica muito perto
do útero, órgão com o formato de uma pera, e a uretra desemboca pouco
acima da vagina. Por isso, existe uma relação muito importante e direta entre a
bexiga e os órgãos do aparelho reprodutor feminino.
Controlar a eliminação da urina pressupõe um ato voluntário comandado pelo
sistema nervoso central. Comprometimento da musculatura dos esfíncteres ou
do assoalho pélvico, gravidez, tumores malignos ou benignos e outras doenças
que comprimam a bexiga podem interferir no controle da micção e provocar
incontinência urinária, um distúrbio mais frequente nas mulheres do que nos
homens. De 15% a 30% das mulheres acima dos 60 anos perdem urina
involuntariamente, quando riem tossem ou espirram, o que atrapalha muito a
vida dessas pessoas.
Prevalência
Drauzio: Por que a incontinência urinária é mais frequente nas mulheres?
Fabio Baracat: Incontinência urinária é uma doença mais frequente no sexo
feminino e acomete tanto as mulheres na quinta ou sexta década de vida,
quanto mulheres jovens. Atribui-se essa prevalência ao fato de a mulher
apresentar, além da uretra, duas falhas naturais na musculatura do assoalho
pélvico — o hiato vaginal e o hiato retal –, diferentemente dos homens que
apresentam apenas o orifício retal. Isso faz com que a dinâmica da pelve
feminina seja mais delicada e os aparelhos esfincterianos bastante diferentes
nos dois sexos.
Drauzio: O que são aparelhos esfincterianos?
Fabio Baracat: São estruturas musculares que produzem a contração da uretra
masculina e feminina para evitar a perda urinária, principalmente perdas
urinárias por esforço.
Drauzio: Crianças pequenas não exercem controle nenhum sobre a bexiga.
Com que idade começam a controlar a micção?
Fabio Baracat: Crianças começam a controlar a eliminação da urina por volta
dos 18 meses, mas isso depende do amadurecimento do sistema nervoso de
cada uma. Casos de incontinência urinária depois dessa fase devem ser
melhor estudados.
O distúrbio mais comum na infância é a enurese noturna, que se caracteriza
por controle inadequado da micção e perda de urina principalmente durante a
noite. Esse tipo de incontinência pode ser bem avaliado com o levantamento da
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história do paciente. O médico pede que a mãe elabore um diário miccional da
criança, onde deve anotar como é a perda urinária, a que
horas ocorre e se existe algum episódio estressante que a
provoque.
Para complementar o diagnóstico, existe o exame de
urodinâmica, que mostra a função do trato urinário inferior
não só de crianças, mas também de homens e de mulheres.
Controle da micção
Drauzio: Que mecanismos possibilitam controlar a eliminação da urina de
acordo com nossa vontade?
Fabio Baracat: A eliminação da urina é controlada pelo sistema nervoso
autônomo, que se divide em simpático e parassimpático. O simpático é
responsável pela continência esfincteriana, ou seja, ele faz com que os
esfíncteres se contraiam. Já o parassimpático promove a contração da bexiga,
quando queremos esvaziá-la.
Drauzio: Na verdade, esses movimentos para prender e soltar a urina são
realizados pela musculatura. São os músculos que contraem ou relaxam para
reter ou eliminar a urina.
Fabio Baracat: A micção correta acontece quando simultaneamente o músculo
detrusor contrai e o esfíncter relaxa para que o fluxo urinário seja livre. Um
comprometimento nesse mecanismo pode resultar na disfunção miccional e
transformar-se num problema importante na vida das pessoas.
Causas
Drauzio: Mulheres apresentam mais incontinência urinária do que os homens.
São muitas as que se queixam de pequenas perdas de urina quando tossem
ou dão risada. Por que elas são mais suscetíveis a esse tipo de problema?
Fabio Baracat: A incontinência urinária feminina é um problema bastante grave.
Só para dar uma ideia, nos Estados Unidos, o custo do tratamento da
incontinência em mulheres é 15 bilhões de dólares, praticamente o mesmo
valor do orçamento da saúde no Brasil.
A fragilidade do assoalho pélvico feminino explica por que essa doença atinge
mais as mulheres. A musculatura que dá sustentação aos órgãos pélvicos é
bastante mais frágil nelas e o aparelho esfincteriano, mais delgado, “imagem
2”.
Além disso, o músculo estriado, que forma um pequeno anel em volta da
uretra, é mais fino e adelgaçado nas mulheres e mais espesso e forte nos
homens, “imagem 03”. Consequentemente, as perdas urinárias nos homens
adultos estão mais relacionadas a procedimentos cirúrgicos que envolvem a
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retirada da próstata e o comprometimento da enervação do esfíncter
masculino.
Drauzio: Quando a próstata cresce, o fato de estar colada ao músculo do
esfíncter prejudica a função desse músculo?
Fabio Baracat: Não. Quando benigna, a hipertrofia prostática, ou seja, o
aumento do volume da próstata, pode comprimir a uretra e dificultar o
esvaziamento da bexiga. No entanto, tumores malignos podem exigir a retirada
dessa glândula. Quando se localizam na região periférica, por onde passam os
nervos que enervam o esfíncter masculino, o procedimento cirúrgico ou a
irradiação podem lesar esses nervos e, consequentemente, causar danos ao
aparelho esfincteriano masculino e incontinência urinária.
Drauzio: A incontinência urinaria é mais comum nas mulheres porque os
músculos do assoalho que sustentam a pelve e o músculo que fecha a uretra
são mais fracos. Existem outras causas?
Fabio Baracat: Não podemos deixar de mencionar o aumento do volume
abdominal como causa da incontinência urinária, que é mais pronunciada nas
mulheres porque elas ficam grávidas. No entanto, não é só isso. Pessoas
obesas, fumantes com tosse crônica e pneumopatas também podem
desenvolver incontinência urinária.
Drauzio: O que caracteriza a incontinência nos pneumopatas?
Fabio Baracat: Em geral, os pneumopatas apresentam quadros pulmonares
obstrutivos que geram muita pressão abdominal. Isso pode provocar perdas
urinárias, quando o paciente tosse ou faz um esforço respiratório.
Drauzio: Como se explica a relação entre gravidez e incontinência urinária?
Fabio Baracat: Esse é um tema muito controverso na literatura. Em 2001, no
Congresso da Sociedade Internacional de Incontinência, em Paris, a Dra. Linda
Cardoso apresentou um trabalho, mostrando claramente que a gravidez, assim
como a paridade e a multiparidade, aumentam a incidência de incontinência
urinária nas mulheres. No entanto, não ficou definido se o parto normal provoca
mais incontinência do que a cesariana.
Drauzio: O pessoal que discute as vantagens e desvantagens do parto normal
e da cesariana confunde a gente. Você ouve argumentos a
favor do parto normal e pensa que o melhor é dar à luz desse
jeito. Depois, ouve os que defendem a cesariana e acha que
eles têm razão em alguns aspectos, pelo menos. Embora não
esteja cientificamente demonstrado, os defensores da
cesariana dizem que mulheres submetidas ao parto normal
estariam mais sujeitas a desenvolver incontinência urinária por causa do
esforço provocado pela passagem da criança pelo canal no momento da
expulsão.
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Fabio Baracat: Realmente, isso não está demonstrado. No entanto, já se sabe
que, na gestação, não só o aumento do volume abdominal, mas também a
presença da cabeça fetal insinuada na pelve podem causar isquemia que leva
a danos neurológicos e da musculatura periuretral do esfíncter feminino.
Tipos e sintomas
Drauzio: Quais são os sintomas iniciais da incontinência urinária?
Fabio Baracat: Numa classificação um pouco simplista, existem três tipos de
incontinência urinária. O que mais acomete as mulheres chama-se
incontinência urinária de esforço e o sintoma inicial é a perda urinária que
ocorre durante aumento da pressão abdominal, quando a pessoa tosse,
penteia o cabelo, movimenta-se, faz exercício físico.
O segundo tipo mais frequente é a incontinência urinária de urgência, mais
grave do que a de esforço. É a incontinência que as mulheres apresentam
quando, em meio às atividades diárias, abrem uma torneira, por exemplo, e
sentem uma vontade súbita e urgente de ir ao banheiro, mas não conseguem
chegar ao sanitário a tempo de evitar a perda de urina.
O terceiro é a incontinência mista que associa a incontinência de esforço à
incontinência de urgência. Nesse caso também o principal sintoma é a perda
urinária pela uretra sem possibilidade de controle.
Drauzio: O que explica essa diferença? Por que uma mulher perde urina
quando faz esforço e a outra tem essa premência?
Fabio Baracat: A incontinência urinária de esforço é uma doença mecânica
provocada pela falência da musculatura esfincteriana uretral. Já a de urgência
ocorre porque a bexiga se contrai fora de hora e independentemente da
vontade da mulher.
Atualmente, a incontinência urinária de urgência é uma doença muito discutida
e pesquisada tanto pela classe médica quanto pelos laboratórios farmacêuticos
interessados em entender o que chamam de bexiga hiperativa, ou seja, a
bexiga que se contrai sem que a pessoa sinta vontade de fazer xixi ou consiga
controlar essa vontade.
Drauzio: A bexiga hiperativa também é mais frequente nas mulheres do que
nos homens?
Fabio Baracat: Também é mais frequente nas mulheres, especialmente nas
mulheres mais velhas.
Drauzio: Como as pessoas convivem com essa perda urinária? Elas costumam
procurar logo o médico assim que o distúrbio aparece?
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Fabio Baracat: Um estudo demonstrou que só 5% dos médicos fazem
perguntas sobre incontinência urinária nas consultas. Parece que, na cultura
latina, considera-se normal a mulher perder urina. A mãe perdia, a irmã perde.
Mulheres anglo-saxãs, porém, questionam muito o fato, principalmente porque
exercem atividades econômicas e sociais que correspondem a 50% da força de
trabalho local. Portanto, não podem ficar privadas do convívio social e
procuram o médico mais depressa.
Diagnóstico
Drauzio: Quando uma mulher procura você dizendo
involuntariamente um pouco de urina, como você orienta o caso?
que
perde
Fabio Baracat: A primeira coisa é levantar a história dessa paciente. É preciso
conversar bastante com ela para tentar caracterizar se a perda urina é por
esforço ou por urgência. Existem métodos para facilitar o diagnóstico. Um deles
é o diário miccional, no qual ela deve registrar, durante três dias consecutivos,
como foi a perda urinária. Se a urina escapou, por exemplo, quando fez
exercícios, ou em repouso, ou seja, quando estava dormindo em casa. Essas
duas situações são bastante diferentes para identificação e tratamento da
enfermidade.
Outro recurso de diagnóstico é o exame urodinâmico, que permite determinar a
ocorrência de contrações vesicais involuntárias (sem que a bexiga esteja muito
cheia, surge o desejo premente de urinar), assim como a perda urinária quando
a paciente faz esforço. Nesse exame, a saída de urina pelo meato-uretal é
monitorizada por computação.
Fazer o diagnóstico de incontinência urinária por esforço ou por atividade
exagerada da bexiga é muito importante para o tratamento da doença.
Tratamento
Drauzio: Qual é o tratamento indicado para a incontinência urinária por
esforço?
Fabio Baracat: O tratamento da incontinência urinária por esforço é
basicamente cirúrgico, embora exercícios fisioterápicos para reforçar a
musculatura do assoalho pélvico também ajudem.
Drauzio: A cirurgia é complicada?
Fabio Baracat: Na década de 1950, essas cirurgias eram tidas como muito
complicadas; hoje, não mais. Durante algum tempo, indicou-se a perineoplastia
para a correção da incontinência por esforço, mas somente 30% das doentes
se beneficiavam com esse procedimento.
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A partir dos anos 1990, no Brasil, mas muito antes disso em outros países,
passou-se a utilizar uma técnica chamada suporte suburetral em que se coloca
um anteparo na uretra feminina para restabelecer os ligamentos e evitar a
perda de urina. Não são cirurgias complexas e 90% das pacientes com
incontinência por esforço ficam livres do problema.
Drauzio: Como é feito o tratamento para incontinência urinária por
hiperatividade da bexiga?
Fabio Baracat: O tratamento da incontinência urinária de urgência é
farmacológico e fisioterápico. O farmacológico pressupõe o uso de várias
drogas que contêm substâncias anticolinérgicas que evitam a contração
vesical. São comprimidos diários, que infelizmente devem ser tomados quase
que pela a vida inteira para melhora da sintomatologia e apresentam alguns
efeitos colaterais, como boca seca, obstipação, rubor facial.
Drauzio: Qual é a eficácia dessas drogas?
Fabio Baracat: Quando a incontinência é muito grave, essas drogas ajudam,
pelo menos, a melhorar um pouco a qualidade de vida. Atualmente, fala-se na
aplicação de botox intravesical, a fim de paralisar a contração da musculatura e
evitar a perda urinária nos casos mais graves.
Drauzio: Qual o papel da fisioterapia nos casos de bexiga hiperativa?
Fabio Baracat: A fisioterapia procura aumentar a força de contração da
musculatura do assoalho pélvico e, por um mecanismo de feedback, ou seja,
de retroalimentação, faz com que a bexiga hiperativa contraia menos. Já está
provado que pacientes com assoalho pélvico fortalecido têm diminuição da
contração vesical involuntária.
Incontinência nos idosos
Drauzio: Quais as medidas indicadas para as pessoas com incontinência
urinária que não pode ser corrigida?
Fabio Baracat: É importante avaliar os fatores que podem levar à incontinência
urinária. Por exemplo, uso de diuréticos, ingestão hídrica, situações de
demência e delírios e problemas de locomoção. Muitas vezes, o paciente idoso
passa o dia no andar térreo da casa, onde não há banheiro. Como demora
para subir as escadas que levam ao pavimento superior, pode perder urina
durante o percurso. Como o problema é mais social do que físico nesses
casos, o uso do uripem pode ser uma saída.
Drauzio: Você poderia explicar como é o uripem?
Fabio Baracat: O uripem é parecido com o preservativo masculino, que
desemboca numa sonda ligada à uma bolsa externa ao organismo para a
coleta da urina.
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Drauzio: Em que situações ele deve ser indicado?
Fabio Baracat: O uso do uripem é válido em algumas situações. Entretanto,
deve-se sempre pesquisar a causa da incontinência para saber se ela é
passível de tratamento ou não, porque o uso crônico do uripem apresenta
algumas desvantagens.
Drauzio: O fraldão que muitos idosos usam é um método eficaz nos casos de
incontinência urinária?
Fabio Baracat: O fraldão é o método mais aceito no mundo para controle da
incontinência urinária geriátrica. O problema é o alto custo que representa,
porque a pessoa precisa trocá-lo várias vezes por dia.
Drauzio: Há outros inconvenientes?
Fabio Baracat: Os maiores inconvenientes são o odor e as dermatites na região
perineal masculina e feminina.
Perguntas enviadas por e-mail
Patrícia Faccioli – São Caetano do Sul? SP: A incontinência urinária pode ter
causas psicológicas?
Fabio Baracat: Pode ocorrer agravo da incontinência de urgência em situações
de desbalanço emocional. No entanto, o problema físico deve ser sempre
investigado e é muito mais importante do que o componente psicológico.
Miguel Bonadini Junior – São José dos Pinhais/PR: O uso do uripem é
aconselhável para os idosos?
Fabio Baracat: O uso do uripem é válido para os idosos com incontinência
urinária em algumas situações. No entanto, é preciso investigar a causa da
incontinência e estar atento porque seu uso crônico pode acarretar lesões e
perda da pele peniana.
Sonia Maria Nogueira – Fortaleza? CE: Exercícios fisioterápicos realmente
resolvem o problema ou simplesmente ajudam a sustentar a bexiga?
Fabio Bacarat: Os exercícios ajudam, mas somente 12% das pacientes que
fazem fisioterapia pélvica ficam livres da perda urinária. Por isso, são usados
como método complementar no tratamento da doença.
Lucia Mendes de Oliveira – São Paulo/SP: Como prevenir a incontinência
urinária?
Fabio Baracat: A prevenção da incontinência urinária de esforço é assunto
bastante controverso. De qualquer forma, evitar a obesidade a todo o custo e o
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sedentarismo, praticar exercícios fisioterápicos para fortalecer o assoalho
pélvico (algumas academias de ginástica já possuem programas com esse
objetivo) e controlar o peso durante a gestação (obstetras aconselham que, no
período pré-natal, as gestantes aumentem não mais do que 12kg, 13kg) são
algumas medidas que podem ser eficazes, embora ainda falte embasamento
científico para estabelecer se realmente funcionam.
Outros olhares...continentes”
Várias matérias do Jornal Folha de São Paulo também divulgam pesquisas,
programas e tratamentos inovadores no tratamento da incontinência:
“Incontinência urinária em idosos” - Estudo realizado pelo médico José
Tadeu Nunes Tamanini e colaboradores, sob a coordenação da OMS
(Organização Mundial da Saúde), mostra que a incontinência urinária (perda
espontânea de urina) é um sintoma altamente frequente na população idosa de
São Paulo, com maior incidência em mulheres.
A pesquisa em questão foi realizada com 2.143 pessoas idosas, 26,2% eram
do sexo feminino e 11,8%, masculino, e publicada na revista “Cadernos de
Saúde Pública” em 2009.
Na “Revista da Escola de Enfermagem da USP” deste ano, as professoras
Vanessa Abreu da Silva, Kátia Lacerda de Souza e Maria José D'Elboux
destacam a importância da atenção médica para a incontinência urinária, pelos
seus impactos negativos na vida emocional, social e econômica do idoso.
As autoras analisaram queixas de pacientes de um ambulatório de geriatria. A
perturbação foi considerada pela maioria dos pacientes como muito grave. Em
festas e reuniões, surge o receio de perder urina e exalar odores.
Os médicos urologistas podem ajudar não só a tratar a incontinência urinária,
mas a orientar para prevenir ou amenizar esse desconforto.
É necessário que as autoridades médicas passem a se preocupar com esse
transtorno. O aumento da população idosa brasileira (prevista para 17,6
milhões em 2025) poderá criar mais um problema de saúde pública.
“Incontinência urinária é tratada sem cirurgia em hospital” - Um programa
inédito do Hospital do Servidor Público Estadual, que envolve ginecologista,
urologista, proctologista e fisioterapeuta, tem tratado mulheres incontinentes
apenas com exercícios para fortalecer a musculatura do períneo.
O princípio é o mesmo da musculação. São vários exercícios que trabalham os
músculos internos da vagina ou do ânus. Envolvem o uso de pesinhos de
diferentes cargas e eletroestimulação para ativar os mecanismos
neuromusculares, explica a ginecologista Raquel Figueiredo.
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Estudos apontam que 60% dos casos de incontinência urinária com indicação
cirúrgica poderiam ser tratados com exercícios.
Mas, como qualquer outra musculatura do corpo, os exercícios para o períneo
só funcionam se houver disciplina e persistência. A fisioterapeuta Priscila
Midori alerta: “É para o resto da vida”.
Muitas mulheres mal orientadas pensam que não há nada a fazer. Margareth
Fernandes, proctologista, diz: “Só um terço busca ajuda”.
Se a incontinência urinária se associa à fecal, o que ocorre em 16% dos casos,
o constrangimento aumenta: “Se a gente não pergunta, ela tem vergonha de
contar”.
“EUA aprovam uso de botox para casos de incontinência urinária” - A
Administração de Alimentos e Medicamentos dos Estados Unidos (FDA, na
sigla em inglês) aprovou em agosto/2011o uso do botox para tratar
incontinência urinária de pessoas com quadro neurológico grave, como a
esclerose múltipla, e que sofram de hiperatividade na bexiga.
As contrações incontroladas da bexiga em pacientes que sofrem transtornos
neurológicos fazem com que eles sejam incapazes de controlar a urina. O
tratamento padrão inclui medicação para relaxar a bexiga e cateteres para
esvaziá-la regularmente, disse o órgão em comunicado.
George Benson, subdiretor da Divisão de Reprodução e Produtos Urológicos
explica: “A incontinência urinária associada a certos danos neurológicos é difícil
de conduzir, e o botox é uma outra opção de tratamento para estes pacientes”.
A injeção do botox é realizada mediante uma citoscopia, procedimento que
requer anestesia geral e que permite ao médico visualizar o interior da bexiga.
A duração efetiva da terapia é de aproximadamente nove meses, segundo a
FDA.
Dois estudos clínicos com 691 pacientes que sofriam incontinência urinária,
resultado de algum dano na medula espinhal ou por esclerose múltipla,
mostraram estatisticamente reduções significativas na frequência das
incontinências pelo grupo que tinha aplicado o botox, em comparação com o
que tinha sido tratado com placebo.
Os efeitos secundários mais comuns no tratamento com botox foram infecção
urinária e retenção urinária, que tem que ser tratada mediante cateter.
Além de ser usado para melhorar a aparência das rugas faciais, o uso do botox
também foi aprovado para o tratamento de dor de cabeça crônica, em certos
casos de rigidez muscular, para sudoração nas axilas e para tratar pacientes
que sofram contração ocular ou tenham os olhos não alinhados.
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Concluindo...
A incontinência provoca alterações emocionais e físicas, tornando-se
estressante e fragilizando dia a dia os pacientes, além de gerar alta morbidade
por afetar o nível psicológico, ocupacional, doméstico, físico e sexual. Como o
profissional de saúde convive com tantas questões complexas que se interrelacionam e se ramificam continuamente?
A resposta também pertence ao campo da complexidade, varia de profissional
para profissional, implicado culturalmente e historicamente na delicada tarefa
de cuidar, curar e enfrentar as vicissitudes da vida. Por exemplo, o contato
direto com seres humanos coloca o profissional de saúde diante de sua própria
vida, saúde ou doença, dos próprios conflitos e frustrações. Estes profissionais
submetem-se, em suas atividades, a tensões provenientes de várias fontes:
contato frequente com a dor e o sofrimento e com pacientes terminais, receio
de cometer erros, relações com pacientes difíceis. Sendo assim, cuidar de
quem cuida é tarefa que nos leva a refletir sobre nossas próprias condições,
além do delicado universo emocional do outro.
Referências
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idosa. Disponível em
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Data de recebimento: 10/07/2012; Data de aceite: 17/08/2012
__________________________________
Luciana Helena Mussi - Engenheira, Psicóloga e Mestre em Gerontologia pela
PUC/SP. Doutoranda em Psicologia Social PUC/SP. Colaboradora do Portal do
Envelhecimento. E-mail: [email protected]
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