Fundação do Seja Hundé

Transcrição

Fundação do Seja Hundé
1
TERREIRO DO VENTURA: UMA HISTÓRIA DE RESISTÊNCIA E PODER DO
POVO DE SANTO NA CACHOEIRA DE 1920
VENTURA'S TERREIRO: A HISTORY OF RESISTANCE AND PEOPLE
POWER THE HOLY OF 1920 CACHOEIRA
Fábio dos Santos Teles 1
RESUMO
O presente artigo, focado em Cachoeira de 1920, busca analisar a experiência
singular vivenciada pelo Terreiro do Ventura em um contexto histórico de
violentas perseguições por parte do Estado, que utilizava as incursões policiais
para reprimir e inibir as práticas mágico-religiosas de cura das religiões de
matrizes africanas. No período em estudo estava em vigor o Código Penal de
1890, que por meio dos artigos 157 e 158, criminalizava essas práticas médicoreligiosas. Na contramão dessa realidade, a pesquisa busca apreender os
fatores históricos que possibilitam a esse terreiro escapar dessa política
persecutória, bem como o discurso dos segmentos letrados que consideravam
essas práticas culturais, entraves ao projeto político de progresso e civilização
proposto naquela época.
Palavras-chaves: Terreiro do Ventura. Cachoeira. Cultura. Religião.
ABSTRACT
This article, focused on the Cachoeira 1920, seeks to analyze the singular
experience lived by the Ventura Terreiro which context it portrayed the violent
persecutions by the state who used the police incursions to repress and to
inhibit the magico-religious practices of healing of African religions. During the
period studied was in effect the Criminal Code 1890, which by Articles 157 and
158 criminalized these medical-religious practices. Opposed to this reality, the
research sought to identify the historical factors that made possible the this
terreiro to escape this political persecution, and the segment the scholars who
considered these practices cultural barriers to the political project of progress
and civilization at that time.
Keywords: Ventura Terreiro. City of Cachoeira. Culture. Religion.
1 INTRODUÇÃO
1
Graduado em licenciatura e bacharelado em História pela Universidade Católica do Salvador.
e–mail: [email protected]
2
O presente artigo busca, na Cachoeira de 1920, apreender os fatores
históricos que possibilitaram o Terreiro do Ventura não ter sofrido incursões
policiais bem sucedidas. Além de analisar também as subsequentes
articulações políticas forjadas pelo povo de santo do Terreiro do Ventura,
quando vigorava o Código Penal de 1890. De acordo com os artigos 157 e 158
deste Código Penal, foi instituída juridicamente a repressão aos terreiros de
candomblé,
por
utilizarem
as
práticas
médicas-religiosas
tradicionais,
criminalizando-as como exercício ilegal da medicina, acusando-as de
curandeirismo e charlatanismo.
Cachoeira, uma cidade construída às margens do rio Paraguaçu, no
Recôncavo baiano foi um importantíssimo entreposto comercial. Neste sentido,
convém registrar que a origem desta cidade remete ao processo de
colonização portuguesa, iniciado em meados do século XVI.
A ocupação deste território ocorreu sob a égide de inúmeros conflitos entre
os povos originários e os colonizadores, resultando no genocídio dessas
populações. Ao fixarem-se nesta região do Recôncavo baiano, os portugueses
instituíram a economia de cana-de-açúcar, devido à presença do solo de
massapé. Este tipo de solo era mais adequado para a implantação desta
cultura, a qual favoreceu o estabelecimento de prósperos engenhos
açucareiros.
Sendo assim, para dinamizar a economia os colonizadores utilizaram em
larga escala o trabalho compulsório dos povos originários e, posteriormente,
dos povos africanos, os quais deram suporte à colonização. Convém frisar
ainda que o progresso dessa região ocorreu, porque o rio facilitava o
escoamento da produção. Este gradativo crescimento possibilitou a criação da
então Vila de Nossa Senhora do Rosário do Porto da Cachoeira.
Durante o século XVIII, Cachoeira assistiu um intenso crescimento da cultura
do tabaco que se estabeleceu na área fumageira da Vila e proximidades
circunvizinhas, propiciando um rentável comércio na Costa da Mina. Por isso,
ampliou-se o fluxo de cativos e, por conseguinte, uma enorme prosperidade
econômica naquela região do Recôncavo. Segundo Walter Fraga Filho (2006),
o Recôncavo baiano não se concentrou apenas na economia açucareira, mas
também na multiplicidade das culturas agrícolas, como o fumo, a mandioca, o
milho e outros gêneros agrícolas, os quais serviram para abastecer Salvador e
3
os outros centros urbanos. Foi nas primeiras décadas do século XIX que se
implantou a navegação a vapor, a qual consolidou a cidade como entreposto
comercial.
Mais
tarde,
Cachoeira,
devido
o
envolvimento
nas
lutas
emancipatórias na Bahia, foi elevada a categoria de cidade.
Trazer à tona a história da economia desta cidade é relevante para
evidenciar a presença de trabalhadores africanos e seus descendentes que na
condição de cativos foram fundamentais para a riqueza e a dinâmica da cidade.
Isto é, na condição de sujeitos históricos,embora submetidos à ordem da
escravidão, criaram com base na cultura africana de origem, uma nova religião:
a afro-brasileira.Vale frisar ainda que tal forma forma de religião possibilitou
trilhar um caminho de resistência e liberdade por meio da construção de
espaços de autonomia, a exemplo do Terreiro do Ventura.
O recorte temporal limita-se à década de 1920 por este ser um período
marcado por uma intensa política persecutória contra as práticas culturais de
tratamento do corpo e da saúde física e espiritual que caracterizavam os
terreiros localizados no Brasil e,em particular, na cidade de Cachoeira.Daí
emergiu uma indagação ao longo da pesquisa: por que o Terreiro do Ventura
escapou das incursões policiais?
Da questão acima decorreu três objetivos: descortinar as relações políticas
que o terreiro estabelecia com os segmentos sociais da cidade, compreender o
porquê da presença de maçons no terreiro, bem como apreender as
estratégias de resistência engendradas pelo povo de santo do Ventura.
Assim, a escolha do tema resultou da necessidade de se compreender como
os segmentos letrados de Cachoeira buscavam incutir no imaginário social a
suposta idéia de que as religiões de matriz africana representavam um enorme
problema ao “projeto civilizador”. Por este motivo, este artigo também contribui
para desconstruir certos estereótipos desenvolvidos historicamente para
desqualificar as culturas africanas. Além de contribui para uma reflexão acerca
da negação da alteridade que é um desafio a ser enfrentado pela sociedade
como um todo.
Quanto à metodologia, optou-se pelo emprego da tradição de oralidade,
buscando na pesquisa resultante do diálogo com os depoentes, recuperar a
memória dessa história de resistência. Neste sentido, foram analisados os fatos
à luz da História Social, uma corrente historiográfica que não apreende tão
4
somente as condições materiais como uma única via na compreensão do
acontecer histórico, mas contempla, principalmente, a experiência dos sujeitos
sociais.
De acordo com Khoury,Peixoto e Vieira (1995), a História Social tem como
premissa a explicação global dos fatos humanos acima de qualquer
compartimentação. Ou seja, não é um estudo paralelo do social, do cultural, do
econômico, do político, mas sim um estudo que leve em consideração todas
essas dimensões. Neste caso, centra o eixo de tal explicação nos mecanismos
que garantem a dominação e exploração de uns homens sobre os outros e que
se traduzem nas relações econômicas, políticas, sociais, culturais, nas
tradições, nos sistemas de valores, nas ideias e formas institucionais.
O artigo está dividido em quatro partes. Na primeira, esboça-se o tecido
social da cidade de Cachoeira, evidenciando as disparidades étnico-raciais e
sociais naquele contexto. Na segunda, pormenoriza-se o discurso médicohigienista cristalizado para desqualificar e, sobretudo, criminalizar por meio do
Estado, as manifestações culturais e religiosas de origem africana. Na terceira,
apresenta-se as versões acerca da criação do Terreiro do Ventura e a sua
importância histórica para a cidade de Cachoeira. Por fim, na quarta parte
evidencia-se as articulações políticas elaboradas pelo povo de santo, para
suplantar os duros ataques contra o candomblé.
2 UMA HISTÓRIA DE LUTA DO POVO DE SANTO DO TERREIRO DO
VENTURA
2.1 O TECIDO SOCIAL DA CIDADE DE CACHOEIRA E O DISCURSO
MÉDICO-HIGIENISTA
Cachoeira, na década de 1920, não sofreu transformações profundas em
sua ordem social e nas subsequentes relações de poder no contexto da
República. A cidade, portanto, ainda apresentava um quadro deplorável de
disparidade étnico-racial e social. Embora a Constituição republicana vigente
naquele período tenha igualado negros e brancos juridicamente, pondo fim a
ordem da escravidão, as formas de distinção social e de exclusão foram
5
ressignificadas neste novo contexto histórico. Sendo assim, o resultado de
séculos de escravidão que o negro foi privado da liberdade e submetido à
coação no século XIX, no bojo da crise do escravismo, veio acompanhado da
incorporação por determinados segmentos da sociedade das teorias racialistas
em voga na Europa.Assim conforme Bacelar (1997, p.260):
[...] Cachoeira, sociedade comercial por excelência, possuía ainda
embrionariamente uma ordem econômica de classes, baseada em
relações sociais abertas e de mercado, porém, dado a ausência de
transformações substanciais no pós-Abolição, o que vingava mesmo
era uma ordem tradicional, pautada no status, demarcada
especialmente pela “cor” e origem familiar. Nela, imperava mais a
“atribuição” que a “aquisição” ou “desempenho”, baseando-se
primordialmente nos contatos primários e nas relações pessoais. Daí
emanavam os grupos de prestígio, remanescentes da ordem
escravista: de uma lado, “brancos”ou ricos e, de outro, pretos ou
pobres.
No Brasil, as teorias racialistas que fundamentam os novos projetos políticos
de progresso e de civilização vão se sedimentando a partir da segunda metade
do século XIX. Daí resultou a construção ideológica de forjar um modelo racial
como justificativa para desqualificar e inferiorizar, em particular, a população
negra. Assim, de acordo com Swarchz (1993, p. 65):
[ ...] “Naturalizar as diferenças” significou nesse momento, o
estabelecimento de correlações rígidas entre características físicas e
morais.Em meio a esse projeto grandioso, que pretendia retirar a
diversidade humana do reino incerto da cultura para localizá-la na
moradia segura da ciência determinista do século XIX, pouco espaço
sobrava para o arbítrio do indivíduo. Da biologia surgiam os grandes
modelos e a partir das leis da natureza é que se classificavam as
diversidades. Certamente essa não era a única versão que explicava,
naquele momento, as sociedades em seu comportamento. É possível
dizer, no entanto, que os modelos deterministas raciais foram
bastante populares, em especial no Brasil. Aqui se fez um uso
inusitado da teoria original, na medida em que a interpretação
darwinista social se combinou com a perspectiva evolucionista e
monogenista. O modelo racial servia para explicar as diferenças e
hierarquias, mas, feitos rearranjos teóricos, não impedia pensar na
viabilidade de uma nação mestiça.
Em depoimento, com riqueza detalhes, sobre a penetração das ideias de
civilidade nas respectivas cidades brasileiras; o que culminou no ataque
implacável às manifestações de cunho africano, como também a exclusão da
população negra. O historiador Luis Cláudio Nascimento informou em
depoimento:
A gente se sabe que é um período que se chama Belle Époque, né
que vai de 1904 é a data histórica por determinação policial e por
determinação mesmo do governo do Estado de proibir qualquer tipo
manifestação de cunho africano na Bahia. Isso foi um processo que
aconteceu no Brasil, né, principalmente, no Rio de Janeiro, Recife,
Salvador. Aqui na Bahia que eram locais onde a manifestação de
cunho africano era muito intensa, né. E aqui em Salvador o
documento que a gente encontra que mostra essa determinação de
6
proibição de qualquer tipo de manifestação de cunho africano não só
o candomblé, mas a capoeira, os afoxés qualquer coisa que tivesse
alguma relação com a África fosse terminantemente proibida e
combatida com rigor. Então esse rigor seria prisão de manifestantes,
invasão de terreiros de candomblé, apreensão de equipamentos,
enfim, né. E também o afastamento da mulher, principalmente, a
mulher ganhadeira, né de mercar, de transitar nas áreas urbanas
centrais da cidade. Então, Salvador, Rio de Janeiro, Recife sofreram
intensamente esse tipo de perseguição. Então o projeto, era um
projeto de, como é que diz, embraquecimento dos espaços públicos.
Esse processo de embraquecimento se dava a partir de uma
profilaxia dessas áreas urbanas. Essa profilaxia era afastar mesmo
essa inserção dessas mulheres e também de meninos, dos
capoeiras, do negro, né, fazendo com que eles fossem para a
periferia.
O “projeto civilizador” tinha como princípio enquadrar a sociedade dentro dos
padrões que consideravam uma autêntica civilização e tendo como modelo as
sociedades da Europa Ocidental. Assim conforme salienta Leite (1996, p. 11):
Se o projeto higienizador, inicialmente, direcionou suas vistas para os
problemas relacionados à estrutura e infraestrutura urbanas e para
qualidade das habitações, não tardou em se preocupar com hábitos
da população, assumindo uma dimensão social. Ele implicou em
“ações simultâneas em três planos: o do espaço público, o do privado
e o do modo de vida”. Buscou normatizar as habitações, passou a
invadir a vida familiar e procurou “estruturar comportamentos
individuais e coletivos”. Havia o objetivo de se controlar o modo de
vida das classes populares, que com seus “péssimos” (conforme
definiam as elites) costumes contribuíam para insalubridade da
cidade.
De acordo com Leite (1996), os projetos políticos defendidos na época
voltaram-se para uma profunda crítica à insalubridade dos espaços públicos e,
por consequência, atribuíram a ocorrência de uma série de doenças aos
segmentos populares. Por essa ótica dominante, espaço insalubre e o
comportamento popular confundiram-se assim:
De projeto espacial, a higienização transfigurava-se em projeto social:
a higienização do comportamento dos pobres e trabalhadores. Isto
porque se formulara uma intricada associação entre “pobreza-saúdeimoralidade” ou, ainda, “pobreza-saúde-promiscuidade-subversão”. E
ainda mais, tentava-se impedir, a todo modo, a medicância, os cultos
místicos ou religiosos que não fosse católicos e as diversas formas
de manifestações lúdicas populares (LEITE, 1996, p. 12).
Nesse sentido, o dito projeto de modernização das cidades brasileiras trazia,
em sua lógica, a incorporação de valores eurocêntricos, que perpassavam não
só pela mudança dos aspectos físicos dos centros urbanos, como também o
aspecto comportamental da população. Em outras palavras, modernizar
significava, na verdade, expurgar qualquer sinal que considerasse atraso para
7
a sociedade, como: o projeto arquitetônico, as manifestações religiosas que
não fossem católicas e os divertimentos das camadas populares.
2.2 AS VERSÕES ACERCA DA CRIAÇÃO DO TERREIRO DO VENTURA
O Zoogodô Bogum Seja Hundé, conhecido popularmente como Terreiro do
Ventura, é palco de controvérsias que disputam a memória de sua criação a
partir de várias versões, tanto dos intelectuais quanto dos seus seguidores
religiosos. Estas controvérsias evidenciam uma ausência de consenso em
relação à sua origem.
Trazer à tona essas várias representações é um dos pontos fundamentais
da presente pesquisa, pois possibilita a reflexão acerca da temporalidade da
memória, em especial, por tratar-se de uma tradição de oralidade. É bem
plausível que a tradição oral sofra alterações ao longo tempo, mas nem por
isso diminui o significado e o sentido da importância do Terreiro do Ventura
para seus adeptos e, por extensão, para a cidade de Cachoeira.
A equede Romilda da Silva Machado 2 esclarece em seu depoimento, que as
informações acerca da criação do Seja Hundé foram transmitidas por meio de
familiares, de geração em geração. Completa que em suas poucas lembranças
ainda mantém a memória desse acontecimento. Vale enfatizar que na sua
versão, fruto da tradição oral, contém informações que sintonizam com a
apresentada por Parés (2009). Assim relata a equede Romilda da Silva
Machado:
Mas é uma pergunta que você está me fazendo de como surgiu que
eu só sei malmente a história. Uma casa com quase duzentos anos e
eu com 58 anos e eu não vou saber como diretamente como foi que
surgiu, porque a eu sei a história, porque tenho parente antigo que
era de lá, minha avó, mãe do meu pai [...] meu tio que era ogã, o ogã
velho, porque era o ogã de Maria Gorensi, que é a fundadora de lá da
Roça.
Quer dizer que a história que sei contar foi quase a história contada
por ele, porque não foi do meu tempo, porque eu tô com 35 anos –
vou fazer agora no dia 29 – de confirmada. Quer dizer que eu vou
saber uma história que aconteceu a cento tantos anos quase
duzentos, porque eu me confirmei tô com 35 anos – vou fazer no dia
29. E meu tio era de Agorensi, que era o ogã mais velho e sempre
2
Romilda da Silva Machado, nasceu em 21 de março de 1955, na cidade de Cachoeira, com
58 anos de idade. Foi confirmada Ekede de Sogbo, em 29 de abril de 1975, por sua mãe de
santo Gaiaku Agesì no Terreiro do Ventura. Entrevista concedida, no dia 09 de abril de 2013. 60
minutos.
8
contava lá em casa para minha mãe.E, no momento, a gente
pequena começava a ouvir e quando meu tio morreu, eu não tava
confirmada ainda não era suspensa.Eu só confirmei depois que meu
tio morreu.[...] A Roça do Ventura, porque o Ventura era o marido
dela, que era dono da terra, era em segredo e não era ogã da casa.
Ele era ogã do Zé de Brechior, o jeje de cima, que unificou e ficou um
só.
Em relação à fundação do Terreiro do Ventura, o antropólogo Parés (2009,
p. 182-183) apresenta a seguinte versão:
[...] A Roça de Cima era vizinha, isto é, limitava com a antiga fazenda
Ventura, onde atualmente está localizado o candomblé Seja Hundé
que, como veremos, surgiu do candomblé da Roça de Cima. Num
registro de terras, datado de 18 de março de 1860, menciona-se a
Fazenda Ventura, assim chamada por ser propriedade de Luis
Ventura Esteves, morador na freguesia de São Sebastião. Na
descrição dos limites das terras, menciona-se, entre outros, o trecho
que ia de “um pé de cajueiro grande”, no caminho do Engenho do
Rosário, até “um pé de jaqueira do sítio de Vicente Ferreira”,
descendo de lá até o rio Caquende. Esse “pé de jaqueira” é muito
provavelmente a jaqueira da Roça de Cima, que marca ainda hoje,
marca o limite com a Fazenda Ventura.
Encontrei ainda um outro registro de propriedade, datado de 8 de
junho de 1896, mas que vem oficializar uma escritura particular
passada em 5 de agosto de 1882, pelo qual José Maria Belchior
comprou por 200 mil réis uma fazenda denominada Sítio do Charema
– Charene ou Cherema – de José Gonsalo Martins de Oliveira e sua
mulher Amália de Oliveira. A localização do Sítio Charene, vizinho da
“portaria de Ventura”, indica, sem dúvida, tratar-se da Roça de Cima.
.[...] Nesse sentido, ogã Boboso afirma que, além de Dandagojí
(Azonsu), também Ogum era “dono do terreiro”, talvez por ser Ogum
o “dono da cabeça” de Ludovina Pessoa. Embora não haja evidência
conclusiva, essas informações sugerem uma liderança religiosa
compartilhada entre tio Xarene e Ludovina Pessoa. Aliás, a tradição
oral sustenta que tio Xarene foi marido de Ludovina Pessoa, o que
poderia ser uma distorção da memória oral para expressar essa
colaboração
religiosa.
Independentemente
desse
possível
relacionamento sentimental, como já vimos, a co-responsabilidade de
um homem e uma mulher na liderança de um templo de vodum é
prática comum no Benin e também em vários terreiros baianos do
século XIX.
Quanto à fundação do Seja Hundé, Nascimento (2007) apresenta a seguinte
versão:
[ ... ] sobre a fundação do Seja Hundé, ele me respondeu que “Desde quando havia Obitedô aqui na Cachoeira, onde existia aquela
jaqueira ... Eu não conheci; conheci quando era já lá embaixo ...”
Perguntei-lhe em seguida o que era Obitedô, e ele respondeu: “-Você
não conhece? Ali embaixo do túnel, na ponte.Era ali embaixo, mais
acima, onde tinha as cajás. Hoje só tem bambus ... Ali viviam as altas
personalidades: Zé de Brechó, Salacó, Quixareme”. Quando Boboso
diz, referindo-se ao Bitedô, “ali naquela jaqueira”, “conheci lá em
baixo”, ele faz referência deslocada da Roça de Cima, que ele não
conheceu, e da Roça de Ventura (lá embaixo), que ele conhece. Já
ali embaixo. “No túnel”, etc., ele finalmente localiza o Bitedô. Infere-se
daí que Boboso confunde, mas pretende dizer que Bitedô e o sítio
Chareme foram lugares onde Zé de Brechó manteve um terreiro de
candomblé, sendo o Bitedô em um tempo anterior a 1860 e o sítio
9
Chareme após essa data e com a associação de Ludovina Pessoa.
Com efeito, interpretando e transcriando essa narrativa, a minha
versão sobre a formação do Seja Hundé é a de que ele é oriundo do
culto realizado até a primeira metade do século XIX nas terras do
Bitedô que, como já fiz referência, pertenciam ao pai de Zé de
Brechó. E, que com a construção de um túnel e um viaduto ferroviário
nesse lugar, concluído em 1870, esse culto foi desfeito e reaberto por
volta de 1880 em terras compradas por Zé de Brechó e José Gonsalo
Martins de Oliveira, entre a Faleira e a vizinhança do engenho
Rosário, no limite da cidade de Cachoeira com a zona rural do
Iguape, dando origem a Roça de Cima (NASCIMENTO, 2007, p. 9093).
Para enriquecer estas histórias controversas, o ogã Marcelino Gomes de
Jesus 3, através do seu depoimento informa outra versão:
O pessoal do Ventura. Tinha um grupo de pessoas da Roça do
Ventura que veio pro Brasil livre, não veio como escravo. Quem
instituiu a Roça do Ventura não veio pro Brasil como escravo. Vieram
livres eram negociantes bastardo inclusive da família da Casa Estrela,
que toda pertencia a Roça do Ventura, tinha senhoras. Eu conheci. Aí
eu conheci duas: Tutuzinha e Santinha. Elas eram mulheres de 80
anos. Quando era criancinha com 5 anos já frequentava .Era
mulheres de 70 anos elas morreram com quase 100 anos de idade a
Tutuzinha deve ter já quase 100 anos quando faleceu e nem saia de
casa. Dona Santinha, mas era ligada a Roça do Ventura. Tinha uma
cozinha na Casa Estrela. Era uma indústria de doces o dia inteiro.
Que todas as vendedoras de doces de Cachoeira, a maioria delas
pegava a venda na Casa Estrela, que eles tinham dinheiro. Então
qualquer mulher de santo chegava lá, enchia o tabuleiro de todo tipo
de iguaria, de cocada, bolachinha de goma, pé-de-moleque e que não
tinha fritava acarajé, mas dava para elas comprarem feijão e
compravam feijão na mão dela. Era uma fábrica artesanal. Todo esse
povo pertencia a Roça do Ventura só que esse povo não veio como
escravo.
O Zoogodô Bogum Malê Seja Hundé é, sem dúvida, um terreiro de grande
importância histórica para os seus adeptos e, por extensão, para a cidade de
Cachoeira. Atualmente, o Seja Hundé está a quatro quilômetros da área central
da cidade. Assim conforme Nascimento (2010, p. 135):
O Zoogodô Bogum Malê Seja Hundé está localizado no lmite da
cidade com a Iguape, a zona açucareira de Cachoeira, distante dela a
4 quilômetros. Essa localidade é conhecida como Lagoa Encantada,
antes denominada lagoa Faleira, no limite da extensa rua Benjamim
Constant, antes denominada ladeira que sobe para Belém, estrada
dos carmelitas e ladeira da cadeia.
Trata-se, portanto, de um terreiro tradicional jeje-mahi fundado por africanos
oriundos da área gbe ( região do antigo Daomé, atual República do Benin) que
vieram para o Brasil livres e que souberam como ninguém proteger e manter
3
Marcelino Gomes de Jesus nasceu em 02 de junho de 1949, na cidade de Cachoeira. Ogã
que foi iniciado no Rumpame Ayono Runtó Logi, terreiro de nação jeje-mahi, fundado por
Gaiaku Luisa. Entrevista concedida, concedida no dia 09 de abril de 2013. 30 minutos
10
viva a sua ancestralidade. Por isso, propõe-se a partir de relatos orais, trazer á
tona informações preciosas acerca da influência do terreiro na construção das
representações em torno da cidade. Assim conforme Chartier (1990, p.17):
As representações do mundo social assim, construídas, embora
aspirem à universalidade de um diagnóstico fundado na razão são
sempre determinadas por interesses de grupos que as forjam. Daí
para cada caso, o necessário relacionamento dos discursos
proferidos com a posição de quem os utiliza. As percepções do social
não são de forma alguma discursos neutros: produzem estratégias e
práticas( sociais,escolares políticas) que tendem a impor uma
autoridade à custa de outros,por elas menosprezados, a legitimar um
projeto reformador ou a justificar, para os próprios indivíduos, as suas
escolhas e condutas.
O depoimento da já falecida Gaiaku Luisa concedido ao psicólogo Marcos
Carvalho denota que o Seja Hundé atraia um número acentuado de pessoas
de Cachoeira que não ia somente apreciar as suas festas, mas também
recorriam às práticas médico-religiosas de cura e tratamento da saúde física e
espiritual existente nos terreiros de candomblé.
[...] No Ventura havia muita vodunsì e só o pessoal da casa lotava o
candomblé.Elas estavam sempre descalças, porque só quem podia
usar chinelo era a mãe -de -santo, uma Deré antiga, uma
Equede.Usavam camisa com o pano -da -costa amarrado, sem bata.
Vinham para o Zandró com seus cabelos presos e algumas usavam
tranças, mas nenhuma com pano na cabeça. Se a Vodunsì fosse de
santo homem e repartisse o cabelo, era multada, teria que pagar uma
galinha para quem fosse de santo mulher. Só quem podia repartir o
cabelo, ao meio ou de lado, eram as Vodunsì de santo mulher. Se
esta penteasse para trás sem repartir, era multada e teria que pagar
um galo a quem fosse santo homem. Quando o povo de Cachoeira
via aquelas mulheres negras subindo a para a Roça de Ventura,
perguntava: “O que vai ter lá no Ventura?” Elas respondiam: “É o
Boitá”. O povo com medo falava: “Então, não vou lá não!” Eles tinham
pavor de ir ao Gboitá, porque havia a conversa de que, se caísse no
Gboitá, não levantava. Lembro uma vez, no Gboitá, papai mandou
fazer uma carreira de bambu verde de um lado e do outro, fazendo
uma espécie de túnel. Ia de Soròkê até Aziri-Tobosì.[..] A luz da roça
era de carboneto e,quando acendia, parecia que era fosforescente,
iluminando bem mesmo. [...] Antes de começar o Zandró, costumavase rezar o ofício, mas depois deixei de fazer. Quando acabava a reza,
a tia sentada em seu banquinho, com seu cacetinho na mão, dizia:
“Vamos, vamos... Que eu quero colocar meu Valuvava no chão!!!”
Alia se comia “de mão” e, quando acabava, não podia lavar a mão,
passava pelo corpo pedindo proteção ao Vodum. Se estava com
alguma dor no corpo, passava a mão suja da comida de santo sobre
o local, pedindo para ficar bom (CARVALHO, 2006, p. 83-84).
A ekede Romilda Machado Rocha, a partir de suas lembranças, revelou que
Cachoeira tinha um enorme contingente de africanos que se instalaram lá em
virtude do porto que propiciava esse trânsito de pessoas. Além disso, a mesma
cita três africanos pertecentes a Roça do Ventura tais como: Lodovina Pessoa,
11
e dois irmãos um chamado Zé de Brechó e Salacó que fizeram fortuna na
cidade e foram responsáveis pela construção da fama de Terra de
macumbeiros, o que pode ser confirmado no depoimento a seguir:
[...] porque essa africana que era Lodovina Pessoa era uma africana
legítima que veio..., porque a única ponte de entrada que tinha dos
africanos era por Cachoeira. O que não tinha saída em lugar
nenhum. Quando eles vinham no navio negreiro... A única saída que
tinha era por Cachoeira por causa do porto, porque ninguém saia por
Muritiba. O rio passa em Muritiba? Ninguém saia por Cruz das Almas,
ninguém saia por Santo Amaro, ninguém saia por nada. A saída que
tinha... Quem vinha todo os pontos os africanos era aqui em
Cachoeira. Ele vinha de Cachoeira saltava aqui no navio. Que tinha o
navio Paraguaçu e o São João das Botas ele saltava aqui. E se
instalava aqui pelas recuadas, os lugares recanteados. Como o
Bitedô que era a ponte do Batedor. Que nego chama a ponte do
Batedor, mas é o Bitedô que é a casa de uma nação que abriu em
Cachoeira africana.Quer dizer, no momento, que ela se instalaram aí
botou essa fama aqui em Cachoeira de “Terra de Macumbeiros”,
porque os africanos se instalaram aqui e a distração era fazer
macumba. E,principalmente, o pior feiticeiro que tinha,macumbeiro
que tinha foi o que ganhou fama aqui em Cachoeira. Foi o Zé de
Brechior e Salacó era de uma família africana mesmo. [...] Era uma
pessoa que fez fortuna aqui em Cachoeira. [...] chama de Zé de
Brechó, porque fala na Língua Portuguesa, mas é Brechior que era
africano e o Salacó. O Salacó foi porque ele nasceu umbilicado. Todo
mundo que nascia dentro da África que era chamado Salacó, porque
nasceu no saco umbilical. Aí ele era forte!
[...] É, por isso, que Cachoeira ficou com essa fama. Que ele olhasse
assim para você. E você fizesse alguma coisa de errado que não
gostasse. Ele só dizia duas palavras e você já estava enfeitiçado.
Esse povo todo é nosso! É, por isso, que criou essa fama em
Cachoeira.
Marcos Carvalho (2006), em sua obra, cita o depoimento de um vizinho que
morava próximo ao casarão, que ficava em cima do Bar Sete Portas, antiga
residência de Zé de Brechó, sobre a rivalidade com seu irmão Sálákò. O
vizinho que não se identificou contou que:
Zé de Brechó e seu irmão Sàlàkó eram muito respeitados aqui em
Cachoeira. Eu era pequeno e ouvia essa história: uma dia Sàlàkó
estava na janela daqueles casarões antigos da rua da Matriz, quando
passou uma branca gorda e começou a rir dele, achando-o um negro
engraçado. Ele ficou revoltado, falou umas palavras e a branca danou
a rir e não parava mais. Ela ria que chegava a urinar e obrar. Ria de
manhã á noite e resolveram, então, levá-la para Zé de Brechó dar um
jeito nisso. Somente ele poderia desfazer a bruxaria feita pelo irmão.
E assim foi feito, pois, quando chegaram em Zé de Brechó, ele falou
umas palavras e a branca parou de rir. Ele não fez isso pela branca
não! Fez pelo prazer de desfazer o feitiço do inimigo-irmão
(CARVALHO, 2006, p. 29-30).
2.3 AS ARTICULAÇÕES POLÍTICAS ELABORADAS PELO POVO DE SANTO
12
Sem dúvida, o negro, ao longo de sua história, soube criar poderosas
estratégias de resistência frente a tentativa de cerceamento de sua liberdade.
O revisionismo historiográfico já evidencia que a ordem escravista que vigorou,
no Brasil, sempre foi posta em xeque. Isso implica dizer que o edifício da
escravidão de certo modo, foi abalado por revoltas escravas. Tudo isso,
sugere, evidentemente, que houve uma forte tensão entre cativos e senhores
naquela época. É sabido, portanto, que o sistema escravocrata não se
reproduziu baseado, exclusivamente, no método coercitivo, ou seja, nem
sempre o açoite serviu como instrumento para disciplinar os escravos. Reis
(2005, p. 32) salienta que:
O combate à autonomia e indisciplina escrava, no trabalho e fora
dele, se fez através de uma combinação da violência com
negociação, do chicote com a recompensa. Os escravos também não
enfrentaram os senhores somente através da força individual ou
coletiva. As revoltas, a formação de quilombos e sua defesa, a
violência pessoal, conviveram com estratégias ou tecnologias
pacíficas de resistência.
Pode-se dizer, então, que a trajetória de resistência do povo negro marcou
profundamente a sociedade brasileira a qual vivia sob a égide da instituição da
escravidão. Isso revela que tal povo aproveitou perfeitamente os instantes de
vulnerabilidade do sistema para burlar essa repressão. João Reis (2005), em
seu livro - Negociação e Conflito: a resistência negra no Brasil escravista enfatiza que tanto os escravos, quanto as autoridades escravistas souberam
usar o jogo da barganha política no sentido de garantir o êxito nas suas
batalhas diárias.
O ogã Marcelino Gomes, em seu depoimento, denota com riqueza de
detalhes que o povo negro no contexto do escravismo soube burlar a repressão
dos seus senhores, mantendo-se viva as suas tradições religiosas. Além de
apresentar algumas especificidades comuns nas respectivas nações: Ketu,
Angola e Jeje.
O povo de ketu era povos nômade. É um povo que eles na África
veneravam um só orixá que um caçador Oxossi. Quer dizer o
caçador! Então, um povo que viveu nômade... mas o povo da área da
Nigéria, povos da área devia ter qualquer outro lugar da África
nômade é nômade. E quando se juntava esse grupo de nômade esse
grupo venerava a Oxossi que era o caçador. Então, esse povo de
ketu que invadiu várias vezes o Daomé que botou os jejes pra fora
várias vezes, os daomeanos pra fora, porque você lutar, por exemplo,
um trabalhador braçal contra um médico, um professor claro que ele
leva vantagem, né? Então, os povos nômades eram povos muito
fisicamente muito mais resistente do que os doutores, os agricultores
13
que trabalhavam mais lentamente. Então, geralmente o Ketu venceu
várias guerras. E aqui, no Brasil, a grande diferença do Ketu pra
outras nações é como ele venerava um só orixá. Aqui você teve
centenas de etnias, mas pequeníssimos grupos, porque a primeira
coisa que o senhor de engenho fazia era separar as etnias, trocar
com outros fazendeiros de longe, de outros estados. Bahia,
Pernambuco com Bahia, Rio de Janeiro com Maranhão, porque você
não queria tem uma tribo na sua fazenda, porque aí era perigoso pra
os senhores de engenho. Então, eles fazia essa troca, vendia...
Então, ficava de cada etnia pouquíssima gente. Então pra você
manter suas tradições era difícil. Que é que o povo de Ketu fez já
acostumado no pique de nômade. Eu considero o maior trabalho
político, social, religioso no Brasil a nível de África que fez foi o povo
de Ketu, porque o povo de ketu reuniu todo aqueles pequenos
religiosos que não tinha condições de se manter sozinho e criou
terreiros dentro do quilombo. Cada quilombo era um terreiro na
própria senzala. [...] Então, o samba já que não posso dançar, as
danças de candomblé tem o samba, mas dentro da senzala você
tinha vários orixás assentados. A gente venera a divindade suprema
do universo representado pela água, rocha, luz e vento. [...] Já o povo
de Angola já veio de lá da África com o panteão mais ou menos
organizado e fez esse trabalho também, mas só que bem menor que
o Ketu. Já excelentíssimo Jeje veio com o panteão organizado,
fechado não se abriu e continua fechado até hoje, por isso, o jeje tá
indo embora se acabando. O Jeje é uma nação muito fechada,
porque a gente é iniciado sobre juramento de morte de não revelar os
segredos.
Como já foi mencionado, a resistência negra perpassou a história do Brasil
escravista. Durante as primeiras décadas do século XX, as comunidades afroreligiosas também reagiram às incursões policiais contra seus espaços
sagrados através de formas sutis de resistência que, de certo modo,
mostraram-se eficazes na política de proteção das suas tradições religiosas.
Braga (1995, p. 32) afirma que:
As investidas da Igreja e da sociedade dominante não foram capazes
de reduzir os anseios de liberdade religiosa da comunidade negra na
Bahia. Ao contrário cristalizou-se entre o povo-de-santo um profundo
sentimento religioso capaz de superar, nos dias atuais, as
adversidades oriundas das intransigências de segmentos da
sociedade que relutam em aceitar a identidade cultural diferenciada
da população negra no Brasil.
Convém elucidar os fatores responsáveis pela não perseguição do Terreiro
do Ventura, no contexto de uma intensa política persecutória, que tentou a
todo
custo
banir
a
herança
cultural
negro-brasileira
da
cidade
de
Cachoeira.Essa elucidação dos fatos ancorou-se nos depoimentos orais, que
serão respectivamente apresentados.
O ogã Marcelino, através de suas lembranças, contou que A Roça do
Ventura era muito bem frequentada por grandes autoridades políticas, e que
teve uma tentativa frustrada de invasão da polícia neste espaço sagrado.
14
A Roça do Ventura tinha um relacionamento muito grande com
deputados etc,etc,etc. Tem uma história verbal que uma vez, uma
festa, uma obrigação no Ventura exatamente a obrigação que a gente
no Jeje faz São joão. No mês de junho que o mês que chove muito é
inverno aqui. E a polícia tentou atacar a Roça do Ventura, porque não
era a grande festa. A grande festa era janeiro! Aí você tinha políticos
lá dentro de altíssimo nível minha mãe de santo... foi criada lá dentro
o pejigã da Roça era pai carnal da minha mãe de santo.E ela sempre
diz: era cada cavalo mais belo do que o outro muito bem arriado,
durante todo mês de janeiro de políticos que ia para Roça do Ventura.
Minha mãe de santo teria 103 se tivesse viva, ela foi criada de 11 a
12 anos tava criada na Roça do Ventura. O pai dela quando foi
confirmado pejigã, ela tinha 7 anos. Então, ela viu todo esse povo
entrar e sair da Roça do Ventura. Agora volto a história do mês de
junho. O mês de junho que ia muito menos gente que a festa menor.
Era uma festa bem menor e de pouca freqüência. Tempo frio a Roça
até perto, mas na época era muito longe pra se chegar lá. Então,
tinha menos quase político nenhum a polícia resolveu atacar a Roça
e aí conta-se que quando chegaram no assentamento o jeje
chamado de Aizan. Os cavalos escorregaram, os policiais caíram do
cavalo e se batia na lama, se batia na lama. Aí mandaram chamar
dona Maria, humbono Maria Gorensi, e lá ela mandou que os ogãs
viessem e vai vê o que está acontecendo. E que foram lá pegaram
eles levaram para o Caquende deram banho emprestaram roupas
que saíram labriados de lama. [...] Essa é uma história que eles
contam aqui que eu ouvia de várias pessoas velhas conta.Mas a
Roça do Ventura não era tão atacada, porque a Roça do Ventura
tinha peso político lá dentro.
A ekede Romilda Machado também informou que, durante as festas do
terreiro, tinha segmentos da sociedade cachoeirana que freqüentava o terreiro
como, por exemplo, os grandes comerciantes e, sobretudo, os membros da
Maçonaria.
Quando teve uma festa de uma ekede que ia dá uma obrigação. E
essa ekede era cheia de dinheiro e ia botar luz de motor. Aí a
Cachoeira encheu! Que a Roça do Ventura apesar de ser uma casa
de origem africana, todos esses comerciantes de Cachoeira quase
todos freqüentava a Roça. [...] Todos os comerciantes ricos,
principalmente, maçons. Quando tinha festa lá na Roça aquelas
cadeiras toda da frente era tudo de maçom.E o maçom gostava da
Roça, porque diz a Roça do Ventura tem um quê da Maçonaria,
porque a Maçonaria tem um segredo que não é divulgado pra
ninguém e aquele que divulga algo que sai recebe uma pena.
Leomar Borges 4 relatou, em sua entrevista, que a Maçonaria não proíbe que
seus membros tenha vínculo com determinadas denominações religiosas haja
vista que a mesma é uma filosofia.
A Maçonaria não é uma religião. Ela é uma associação de homens
que, ao longo da história, sempre trabalhou pelos processos de
desenvolvimento do ser humano, seja a parte intelectual, seja a parte
4
Leomar Borges dos Santos, natural de Salvador, 43 anos, membro da Irmandade Rosário
dos Pretos.Entrevista concedida, no dia 07 de maio de 2013. 20 minutos.
15
filosófica, seja a parte, né espiritualista. E, por isso, que ela não
cerceia que diferentes membros de diversas religiões participe do seu
seio. O que não pode é não acreditar em Deus, não acreditar na
imortalidade da alma. Então, a Maçonaria tem nos seus quadros
membros de todas as religiões que você possa imaginar católicos,
evangélicos, candomblecistas, islâmicos, judaicos. Então, como ela
atua hoje no mundo todo, então, em cada continente, em cada região,
em cada local que ela atua e que existe tem em seus quadros
membros das diversas religiões. O que não pode ter na Maçonaria
são ateus. Então, você tem maçons católicos, você tem maçons que
são iniciados no candomblé, você tem espíritas. Então, ele tem essa
capacidade de está em todas as classes sociais, desde a motorista
de ônibus, a desembargador, a presidente, a procurador geral a
pessoas simples e atua em diversas áreas. Qual é o tripé da
Maçonaria? Família, Pátria e Deus. Então, são os três pilares da
Maçonaria Deus, Pátria e Família. Então, o maçom ele tem que ser
aquele que cuida da família, que respeita a família, que respeita seus
filhos, que respeita sua esposa que respeita essa célula mater. A
Pátria, ou seja, respeitando tudo aquilo que é direito, que é legal, que
é legítimo, que está dentro das ordem constitucionais, respeitando as
leis e exortando o desenvolvimento do seu país.[...] E Deus em
primeira coisa, né! Que para nós arquiteto do universo. Então, a
Maçonaria ela institucionalmente, ou seja, enquanto instituição ela
tem mais de 300 anos, mas dentro da construção da humanidade ela
perpassa todo o processo de construção da própria humanidade,
porque ela é uma filosofia. [...] Tanto que nós maçons dizemos que a
Maçonaria é o espaço de levantar templos a virtude e cavar
masmorras ao vício!
O historiador Luis Cláudio Nascimento informou, no depoimento a seguir,
que a Loja Maçônica Caridade e Segredo de Cachoeira teve uma importância
bem significativa no processo abolicionista e,mais tarde, o seu quadro foi
ocupado por figuras negras inclusive do Ventura.
[...] Os fundadores da Loja Maçônica Caridade e Segredo foram os
mesmos fundadores da Sociedade Abolicionista 25 de junho. Essa
Sociedade era formada por políticos brancos que tinha escravos, mas
que eram figuras liberais, eles estavam interessados no processo
abolicionista, porque eles viam o progresso do país a partir da
extinção do elemento servil como eles falavam. Você não vai
desenvolver o país, você não vai criar uma política de igualdade
empresarial, econômica se você ainda mantém a escravidão. Os
únicos interessados em manter a escravidão era aqueles grandes
proprietários de escravos viviam da mão-de-obra escrava e senhores
de engenho que eram donos de grandes planteis. Mas esses
comerciantes talvez então eles se tornaram abolicionistas e dentro
desse processo eles faziam ruídos. [...] E aí dentro dessa Maçonaria
começou a se infiltrar pessoas negras que tinha acesso a essa como
Zé de Brechó, como esse Salacó, e outras figuras, Trampolino Bastos
não sei se era maçom, tinha Cincinato Franca que e por aí vai! E
quando eles fundaram a Sociedade Monte Pio dos Artistas. [...] De
modo que quando passou o processo abolicionista esses africanos,
essas figuras negras começaram a tomar conta da Maçonaria. [...]
Então, começou a ser invadida por esses afro-descendentes Zé de
Brechó era marceneiro, o irmão dele era carpinteiro, o outro tipógrafo.
[...] Eram aqueles ligados ao candomblé do Ventura, então, por isso,
que eu te falei.Eu não sei se a Maçonaria, no Brasil, teve essa função
afro-religiosa. Mas em Cachoeira aqueles que sustentam a Maçonaria
16
no período abolicionista e depois abolicionista foram esse povo,
esses intelectuais negros, a palavra é essa. Esses intelectuais negros
pensaram a abolição, que estruturam a Irmandade Boa da Morte, que
estruturam o candomblé, que foram estruturando uma identidade
africana aqui.
Ainda em depoimento, Nascimento informou que os membros do Ventura
tinham fortes ligações com certos segmentos sociais de Cachoeira; além de
ter em seu edifício
conventual, integrantes com grande poder aquisitivo,
evidenciando alguns fatores para não perseguição deste terreiro.
Então, Zé de Brechó era muito rico,tá o pai dele também era muito
rico, além de rico ele era capitão da Guarda Nacional que é um título
honorífico de grande valor social. Ele foi por duas vezes conselheiro
municipal que era um cargo que correspondia a vereador. Ele foi por
duas vezes foi suplente, ele era maçom e foi um dos fundadores de
uma Sociedade classista chamada Sociedade Monte Pio dos Artistas
Cachoeiranos fundada em 1874 e que, na verdade, era uma
sociedade abolicionista e que juntava uma porção de de negros. Esse
Belchior Rodrigues Moura esse Zé de Brechó, ele morreu em 1902.
[...] A Igreja Matriz da cidade como todas as igrejas matrizes só era
velado pessoas da alta sociedade local. Então, ele foi velado dentro
da Igreja Matriz da cidade pra o enterro dele vieram pessoas de
Salvador doutor não sei quem. doutor não sei quem ... Pessoas de
alta relevância social. E, além disso, houve um impacto social dentro
da cidade. [...] Os amigos dele o padre da cidade era comendador era
não sei quem... era não sei quem... Ele foi presidente da Irmandade
dos Nagôs que é a única Irmandade para sepultamento exclusivo de
africano, no Brasil, ainda em funcionamento que é aqui em
Cachoeira. [...] Uma das fundadoras da Boa Morte foi a mãe de Zé de
Brechó chamada Maria Morta. Então, esses fatores foram aqueles
que determinaram a não perseguição. Então, houve como até hoje na
memória oral fala que o Ventura a polícia não pode ir para o Ventura,
porque o Ventura tinha “costa larga.” [...] Por exemplo, o pejigã do
Ventura era guarda costa do maior político de Cachoeira de 1920 a
1930 que era Chamado Ubaldino de Assis foi deputado no Rio de
Janeiro era de Cachoeira. Foi prefeito várias vezes. O tempo do
coronelismo, o principal coronel da região de Cachoeira.
Luis Cláudio também enfatizou em sua fala, que o Seja Hundé soube utilizar
muitíssimo bem as estratégias de resistência, no sentido de proteger o terreiro
de possíveis ataques da polícia em voga na época, na cidade de Cachoeira.
[...] seu Bobosa foi um dos principais interlocutores do meu trabalho
ele me falava que tinha um lugar chamado de Galinheiro ali no
Bitedô. [...] Ali naquela localidade só passava quem tinha negócio. Eu
coloquei textualmente como seu Bobosa me falou só passava quem
tinha negócio. Só tinha negócio como? Porque lá tinha africanos
fardados e usando lança, espada porrete que não deixava ninguém
passar. [...] Então, houve uma relação extremamente africana no
sentido de proteger a integridade do terreiro. Ela foi sempre protegida
neste sentido que era uma rua habitada por africanos. [...] Isso
impossibilitou o acesso de policiais descer de cavalo ou a pé lá. [...] E
o Ventura nunca fez nenhum tipo no rio Paraguaçu, eles se
preservavam não se tem história do Ventura fazer presente no rio,
porque era um candomblé diferenciado onde a nata da sociedade
local participava. Então, era feito convites especiais, então, o prefeito
da cidade ia, o deputado, o coronel da cidade ia, o grande
17
comerciante ia. E lá tinha uma sala que até hoje tem essa sala como
a grande mesa onde eles eram servidos diferentes daqueles outros
que comia na mão, na palha. [...] iam pra comer a ôlha como se fala a
melhor parte com pratos e talheres muito bem montados, muito bem
limpinhos, com vinhos, com bebidas, com águas. [...] Isso eram
formas de resistência chamadas surdas.
Sendo assim, percebe-se que nos respectivos depoimentos acerca do Seja
Hundé as articulações políticas foram decisivas no sentido de proteger o
terreiro. Isso denota que o povo de santo soube com muita sutileza transpor as
perseguições as suas práticas médico-religiosas tradicionais de matriz africana.
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A teia intricada em torno dos fatores históricos que corroboraram para que o
Terreiro do Ventura não sofresse muitas incursões policiais na década de 1920
foi desfeita, à medida que houve um diálogo com as fontes. Evidentemente,
que não foi uma tarefa nada fácil elucidar os fatos, mas por outro lado, tornouse gratificante no transcorrer da pesquisa montar o “quebra-cabeça” desta
história.
As cidades brasileiras, assim como Cachoeira, estavam fortemente
influenciadas pelo projeto civilizador que tentava a todo custo cercear qualquer
manifestação que não estivesse inserida dentro do modelo europeu. Tudo isto,
provocou uma onda de ataques às práticas médico-religiosas tradicionais de
matriz africana nesta região do Recôncavo baiano.
Constatou-se ainda que apesar de Cachoeira estar envolta nesta atmosfera
de perseguição as manifestações culturais e religiosas de cunho africano
houve determinados terreiros de candomblé que conseguiram escapar das
incursões policiais em voga naquela época. O exemplo do Seja Hundé é,
certamente, um caso emblemático de exceção, no que se refere a esta
perseguição.
Isso implica dizer que este terreiro, por ter uma “blindagem
política”, dificultava possíveis ataques ao seu espaço sagrado.
O Ventura, como é chamado popularmente, como já foi dito, tinha uma
peculiaridade, ou seja, o seu edifício conventual era composto por uma elite
negra
emergente,
com
trânsito
facilitado
nos
estratos
sociais
de
Cachoeira.Somando-se a isso, existia segmentos sociais que participavam
ativamente das festas do terreiro, como por exemplo, figuras da política local,
18
maçons e grandes comerciantes. Isto implica uma manutenção de alianças
políticas entre o Ventura e a nata da sociedade cachoeirana.
O povo de santo do já referido terreiro soube como ninguém utilizar os
instantes de vulnerabilidade do sistema no sentido de proteger as suas
tradições afro-religiosas. Os adeptos do Ventura naquela época também
criaram estratégias sutis de resistência que propiciaram manter viva a chama
dos seus cultos afro-brasileiros.
Através desta pesquisa foi possível entender o poder do povo de santo que,
ao longo da sua trajetória, sempre reagiu aos ataques implacáveis dos setores
sociais da época que através do aparato ideológico e coercitivo do Estado
tentaram inibir e reprimir as manifestações culturais e religiosas de cunho
africano. Apesar disso, o povo de santo conseguiu neutralizar tais ações do
Estado,o que possibilitou manter o contato com as suas divindades.Por fim,tal
pesquisa servirá de reflexão para que a sociedade compreenda os
mecanismos político-ideológicos construídos historicamente para justificar e
legitimar a repressão as práticas culturais e religiosas de matriz.
REFERÊNCIA
BACELAR, Jéferson. Mario Gusmão (1920-1996) – O santo guerreiro contra
o dragão da maldade. Centro de Estudos Afro-Orientais- FFCH/ UFBA, 1997,
p.19-20.
BRAGA, Júlio Santana. A Cadeira de Ogã e Outros Ensaios. Rio de Janeiro:
Pallas, 1999.
________________ . Na gamela do feitiço: resistência nos candomblés da
Bahia. Salvador: EDUFBA,1995.
BERKENBROCK, Volney J. A experiência dos orixás: um estudo sobre a
experiência religiosa no candomblé. Petrópolis, RJ: Vozes, 1997.
CHARTIER, Roger. A História Cultural: Entre práticas e representações.
Tradução Maria Manuela Galhardo. 2. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,1990.
CARNEIRO, Edison. Candomblés da Bahia. 9. ed. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 2002.
CARVALHO, Marcos. Gaiaku Luisa e a trajetória do Jeje-Mahi na Bahia. Rio
de Janeiro: Pallas, 2006.
19
FRAGA FILHO, Walter. Encruzilhadas da liberdade: histórias de escravos e
libertos na Bahia (1870- 1930). Unicamp, 2006
KHOURY,Yara Maria Aun; PEIXOTO, Maria do Rosário da Cunha; VIEIRA,
Maria do Pilar de Araújo. A pesquisa em História. 4. ed. São Paulo: Ática,
1995.
LEITE, Rinaldo C. Nascimento. E a Bahia civiliza-se ... Ideias de civilização e
cenas de anticivilidade em um contexto de modernização urbana, Salvador
1912-1916. Dissertação (Mestrado em História) – Faculdade de Filosofia e
Ciências Humanas, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 1996.
LIMA, Vivaldo da Costa. A família de santo nos candomblés Jeje-nagôs da
Bahia: um estudo de relações intragrupais. Salvador: Corrupio, 2003.
LUIZ, Madel Teresinha. Medicina e ordem política brasileira: políticas e
instituições de saúde (1850-1930). Rio de Janeiro: Graal, 1982.
NASCIMENTO, Luis Cláudio Dias do. Bitedô: onde moram os nagôs: redes
de sociabilidade africanas na formação do candomblé jêje-nagô no recôncavo
baiano. Rio de Janeiro: CEAP, 2010.
NASCIMENTO, Luis Cláudio Dias do. “Terra de macumbeiros” rede de
sociabilidades africanas na formação do candomblé jeje-nagô em
Cachoeira e São Felix- Bahia. (Dissertação de Mestrado do programa de pósgraduação em estudos étnicos e africanos centro de estudos afro-orientais).
Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal da Bahia,
2007.
NASCIMENTO, Vilma Maria do. Sagrado/profano no trato do corpo e na
saúde na metrópole negra: Salvador nos anos 1950-1970. Tese (doutorado
em História) São Paulo: PUC/SP, 2007.
PARÉS, Luis Nicolau. A formação do candomblé: histórias e ritual da nação
Jeje na Bahia. Campinas: Unicamp, 2006.
REIS, João José e Eduardo Silva. Negociação e conflito: resistência negra
no Brasil escravista. São Paulo: Companhia das Letras: 2005.
SANTOS, Jadson Luis dos. Cachoeira III Séculos de História e Tradição.
Salvador: EGBA, 2010.
SCHWARTZ, Stuart B. Segredos internos: engenhos e escravos na
sociedade colonial. São Paulo: Companhia das Letras, 1988.
SCHWARCZ, Lilia Moritz. O espetáculo das raças: cientistas, instituições e
questão racial no Brasil (1870- 1930). São Paulo: Companhia das Letras, 1993.
THOMPSON, Edward Palmer. Costumes em comum: estudos sobre a cultura
popular tradicional. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.
20
GLOSSÁRIO
Assentamento: objeto ou elementos da natureza ( pedra, árvore,etc) cuja substância e
configuração abrigam a força dinâmica de uma divindade.
Azonsú: vodum do jeje-mahi que corresponde obaluaiyê nagô.
Aizan: vodum jeje ligado a terra.
Aziri Tobosi: vodum feminino das águas corresponde à yemanjá dos nagôs.
Bitedô: lugar onde mora os nagôs.
Deré: corresponde a mãe-pequena.
Ekede: responsável por cuidar da vodunzì,assim que o vodum se manifesta.
Gaiaku: é uma sacerdotisa consagrada a divindades presentes no panteão nagô, porém
cultuadas na nação jeje como, por exemplo, Ogum, Oyá-Iansã, Nanã e Oxum.
Humbono: primeira pessoa iniciada na Casa.
Gboitá: obrigação jeje que ocorre no mês de janeiro onde existe uma procissão de
vodum vestidos com roupas brancas ao redor das árvores sagradas.
Ja: nome que eles dão a cobra de ferro utilizada no assentamento do vodun Bésen
Jeje: o termo jeje quer dizer estrangeiro em yorubá,era povos do antigo reino do
Daomé, atual Benim trazidos para o Brasil no século XIX.
Pejigã: responsável pelos sacrifícios votivos do jeje-mahi.
Sòròkê: é uma qualidade do Ogum assentado do lado direito da entrada dos terreiros de
candomblé jeje-mahi.
Sogbo: vodum jeje dos raios e trovões correspondente ao Xangô dos nagôs.
Undé: em fon significa aqui neste lugar.
Valuvavá: palavra que inicia a primeira cantiga do zandró.
Vodum: divindade do jeje que corresponde ao orixá em nagô.
Vodunsí: filho ou filha de santo que incorpora o vodum em transe.
Zandró: é a obrigação que abre o ciclo de toques no barracão e feito na noite de sábado,
tendo início a partir das 22 ou 23 horas e termina por volta das 2 ou 3 horas da manhã. É
a chamada ou invocação dos voduns, feito com rezas,cantos e toques percussivos com a
finalidade de anunciar aos voduns as oferendas de animais a serem realizadas no dia
seguinte.
Zoogodô Bogum Malê Seja Hundé: Zo (fogo) Zoogodô corruptela de Zoonodo, que
é uma divindade jeje representada em uma árvore; Bogum Malê: cofre onde eram
guardados o dinheiro e as jóias dos malês; Seja: corruptela de Sèn que em fon significa
adorar; Undé: em fon significa aqui neste lugar.