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• A “Fraude Carrossel” no IVA Por Ricardo Carvalho Com a
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A “Fraude Carrossel” no IVA
Por Ricardo Carvalho
Com a publicação do Decreto-Lei n.º 394-B/84, de 26 de Dezembro, procedeu-
se a uma importante reforma do sistema da tributação indirecta, consubstanciada na
entrada em vigor do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) em 1 de Janeiro de
1986.
No preâmbulo do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA), além
de se referir a “exigência” da adopção deste imposto em função da adesão de Portugal
à Comunidade Económica Europeia (CEE), também se aponta as claras vantagens do
IVA face às limitações inerentes ao anterior Imposto de Transacções (IT), que entre
outros aspectos se traduziam no aumento da evasão e fraudes fiscais.
Se é certo que o IVA, envolvendo uma técnica muito mais perfeita que a do IT,
veio assegurar uma maior neutralidade na tributação e constituir um sistema com
maiores potencialidades de obtenção de receitas para o erário público, também é certo
que não eliminou a evasão e a fraude fiscal.
A fuga e fraude fiscais são hoje um fenómeno de contornos cada vez mais
sofisticados, sendo comuns os casos de facturas falsas, de não entrega dos
montantes liquidados a terceiros ou da “fraude carrossel” do IVA.
A fraude em matéria de IVA, e mais particularmente a "fraude carrossel", tornouse um assunto particularmente preocupante para os Estados-Membros, conduzindo
inclusivamente à criação de um grupo ad-hoc no Conselho Europeu. Não existem
dados quantitativos fiáveis em relação à "fraude carrossel" na União Europeia, embora
seja seguro que os montantes desviados do IVA são consideráveis.
Para além do seu impacto orçamental, a fraude em matéria de IVA cria
distorções da concorrência que favorecem os operadores desonestos.
Em termos gerais, a “fraude carrossel” implica a existência de várias empresas
que, supostamente, realizam transacções entre si, onde uma delas por praticar
transmissões intracomunitárias de bens, não liquida IVA, nos termos do RITI (Regime
do IVA nas Transacções Intracomunitárias). No entanto, deduz o IVA suportado nas
supostas aquisições de bens, o que origina assim, ilegitimamente, uma permanente
situação de crédito de imposto perante o Estado.
Temos assim que o elemento fundamental da "fraude carrossel" é o
aproveitamento da associação de operações em que o IVA é cobrado pelo fornecedor
ao seu cliente (geralmente no âmbito de operações dentro de um Estado-Membro) e
de operações sem cobrança do IVA entre os contratantes (geralmente no âmbito de
operações intracomunitárias). Esta associação, que é inerente ao regime actual,
permite a um sujeito passivo a aquisição de bens sem pré-financiamento do IVA e a
facturação em seguida do IVA ao abrigo de uma entrega interna destes bens. Sucede
que tal sujeito passivo desaparece e não paga esse IVA à administração fiscal,
enquanto que o comprador dos bens exerce o seu direito à dedução. Ou seja, não só
não se paga como se tenta recuperar impostos que nunca foram pagos, através de
reembolsos.
No quadro abaixo podemos observar o mecanismo destas operações:
“FRAUDE CARROSSEL” VOLTA A VOLTA
1
Empresa 1 no Estado-Membro A
Vende bens para Empresa 2 no Estado-Membro B
Não cobra IVA, por estar a vender a
outro Estado-Membro.
2
Empresa 2 no Estado-Membro B
Vende produtos a “empresas tampão” no seu país, com
Liquida IVA, mas não o entrega ao
IVA
Estado e “desaparece”.
Como não paga o IVA, pode vender
produtos mais baratos.
3
Empresas tampão no Estado-Membro B
Compram à empresa 2 e vendem à empresa 3,
Estas empresas cumprem todos os
liquidando e deduzindo IVA
requisitos legais, e servem apenas
para criar “ruído” e dificultar a
investigação por parte do Fisco na
ligação entre as empresas 2 e 3.
4
4.1
4.2
Empresa 3 no Estado-Membro B (duas hipóteses)
Vende aos consumidores no seu país, liquidando e
Quem fica a perder é o erário
deduzindo IVA
público do Estado-Membro B que
Volta a vender à empresa 1, não cobrando IVA, e
não recebe o IVA liquidado pela
solicita o reembolso/dedução do IVA que lhe foi
Empresa 2, mas tem de
liquidado pelas empresas tampão
reembolsar/deduzir o IVA relativo à
empresa 3.
Fonte: Semanário Económico
A nível interno continuam a ser dados passos no combate à fraude fiscal. O
último Orçamento de Estado (Lei n.º 55-B/2004, de 30 de Dezembro) veio introduzir
alterações relevantes em matéria de IVA, mormente no tocante à “fraude carrossel”.
Assim, verificou-se o aditamento dos n.ºs 4 e 5 ao art.º 72.º do Código do IVA,
alargando-se a responsabilidade solidária pelo pagamento do IVA, aplicável ao
adquirente, para os casos de operações simuladas. Por outro lado, foi aditado ao
mesmo Código o art.º 72.º-A, determinando-se que nas transmissões de bens ou
prestações de serviços realizadas ou declaradas com a intenção de não entregar nos
cofres do Estado o imposto correspondente, passam igualmente a ser responsáveis
solidários pelo pagamento do imposto qualquer sujeito passivo abrangido pela alínea
a) do n.º 1 do art.º 2.º do CIVA que, em face das circunstâncias do negócio, tenha ou
deva ter conhecimento dessas circunstâncias.
Conforme o n.º 3 do art.º 72.º-A do CIVA “presume-se que o sujeito passivo tem
conhecimento de que o imposto relativo às transmissões de bens ou prestações dos
serviços (…) não foi ou não venha a ser integralmente entregue nos cofres do Estado,
sempre que o preço por ele devido pelos bens ou serviços em causa seja inferior ao
preço mais baixo que seria razoável pagar em situação de livre concorrência ou seja
inferior ao preço relativo a esses bens ou serviços em fases anteriores de circuito
económico.”.
De acordo com o despacho n.º 14 839/2005 (2ª Série) do Senhor Ministro das
Finanças, publicado no Diário da Republica (2ª Série), de 7 de Julho de 2005, a
responsabilidade solidária pelo pagamento do IVA a que se refere o artigo 72.º-A do
CIVA é aplicável nas transmissões em que estejam em causa os seguintes bens:
a) Computadores e qualquer outro equipamento, incluindo componentes,
acessórios e software, fabricados ou adaptados para uso em conexão
com computadores ou sistemas de computadores;
b) Telefones e qualquer outro equipamento, incluindo componentes e
acessórios, fabricados ou adaptados para uso em conexão com telefones
ou telecomunicações;
c) Veículos automóveis;
d) Desperdícios e sucatas.
Note-se, pois, que, a exemplo do que acontece em outros Estados-Membros,
esta medida de responsabilidade solidária é de aplicação, numa primeira fase, apenas
às transmissões de bens, nos quais a prática da fraude no IVA é reconhecida como
um problema significativo.

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