Parte 2 PDF - João Martins Pereira

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Parte 2 PDF - João Martins Pereira
Outro indicador i m p o r t a n t e é o relativo à t a x a de c r e s c i m e n t o da
produtividade do trabalho. S e g u n d o o e c o n o m i s t a soviético N o t k i n e s t a
t a x a foi de 7,6 % no quinquénio 1951-55, de 6,3 % n o quinquénio 1956-60,
e de 4 , 8 % no de 1961-65 ( ) . V e r e m o s adiante a l g u n s e x e m p l o s s i g n i f i c a t i v o s r e l a t i v a m e n t e a e s t e ponto, m a s quereríamos desde já n o t a r
que, para além dos problemas de produtividade d i r e c t a m e n t e relacionados
com a q u e s t ã o dos incentivos, certos a s p e c t o s m u i t o i n q u i e t a n t e s revel a v a m sérias deficiências de o r g a n i z a ç ã o e p r o g r a m a ç ã o ( ) . R e f e r i m o -nos ao que N o v e considera «uma d a s principais f o n t e s de ineficiência
de t o d a a economia» ( ) e que ilustra com u m a citação do soviético
K r a s o v s k y , de 1975, a propósito dos n o v o s e m p r e e n d i m e n t o s , que dispensa
c o m e n t á r i o s : « [ R e c e n t e m e n t e ] o período de construção era duplo da
n o r m a planificada, o período de arranque 1,5 v e z e s m a i s longo. P o r sua
vez a s n o s s a s n o r m a s para períodos de construção s ã o duplas dos efectiv o s períodos de construção n o e s t r a n g e i r o ( . . . ) . O processo de investim e n t o entre n ó s arrasta-se por 8-12 anos, o que c a u s a p e s a d a s perdas
na eficiência e c o n ó m i c a das n o v a s e m p r e s a s , contribui para u m a imprev i s t a obsolescência do equipamento, dá o r i g e m à desactualização dos
p r o j e c t o s do empreendimento, deteriora f o r t e m e n t e o s indicadores técnico-económicos planificados para n o v a s capacidades de produção, impede
a rápida recuperação dos i n v e s t i m e n t o s e m capital ( . . . ) » ( ) . E s t e problema, que e s t á i n t i m a m e n t e ligado à s deficiências do s i s t e m a de abast e c i m e n t o técnico-material, v e m m u i t o de t r á s m a s persiste hoje, como
se pode concluir d e s t a citação, o que n ã o é de e s t r a n h a r n a medida e m
que e s s e s i s t e m a t a m b é m s u b s i s t i u à s reformas. A d m i t e - s e m e s m o que
se t e n h a a g r a v a d o ( ) .
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O m a u f u n c i o n a m e n t o do s i s t e m a de a b a s t e c i m e n t o técnico-material,
a s s u a s i n c o n s i s t ê n c i a s com o s planos de produção, a s c o n s t a n t e s alterações de d i r e c t i v a s ao longo do ano, f o r a m o u t r o s e l e m e n t o s s u j e i t o s a
s e v e r a s críticas. Com efeito, a s e m p r e s a s , a quem era i m p o s t o o e s t r i t o
( ) Cit. em L E W I N [1973], p. 12.
( ) N o seu relatório de 1965 ao Comité Central do Partido (que esteve na origem
da reforma soviética), assinalava o próprio Kossygin: «Em muitos casos as empresas
não têm os meios necessários à sua disposição para substituir com suficiente rapidez
os equipamentos obsoletos. Donde um decréscimo nas taxas de aumento da produtividade, na qualidade dos produtos, e um aumento nos custos de produção» (KOSSYGIN
[1965], p. 325).
("») N O V E [1977], p. 157.
( °) Id., id.
( ) Sobre este ponto v. L E W I N [1973], p. 153.
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c u m p r i m e n t o dos indicadores q u a n t i t a t i v o s do Plano, v i a m a s u a acção
m u i t o dificultada por carência de m a t e r i a i s e irregularidade n o s e u abast e c i m e n t o . I s t o conduzia a d o i s f e n ó m e n o s f r e q u e n t e m e n t e c i t a d o s na
i m p r e n s a : o f u n c i o n a m e n t o das e m p r e s a s «aos s a f a n õ e s » , com períodos
de quase paralisia e períodos de super-actividade, e o d e s e n v o l v i m e n t o de
m é t o d o s e x p e d i t i v o s de obtenção de m a t e r i a i s , à m a r g e m do s i s t e m a oficial. Q u a n t o ao primeiro ponto, «em lugar de u m d e s e n v o l v i m e n t o económ i c o c o n s t a n t e e regular, o s n o v o s e c o n o m i s t a s [no o r i g i n a l : the new
look] descobriam a e x i s t ê n c i a de a m p l a s flutuações, a l t o s e baixos, arranques e p a r a g e n s , que "sacudiam" o o r g a n i s m o e c o n ó m i c o — c o m a s fábric a s incapazes de estabelecer por si próprias u m r i t m o regular de trabalho,
d e s c a n s a n d o p a c h o r r e n t a m e n t e por a l g u m tempo, a p ó s o que e m b a l a m
f r e n e t i c a m e n t e para a m e t a do c u m p r i m e n t o do Plano» ( ) . « N e m c h i n o v
[académico s o v i é t i c o — J M P ] diz que 60 % da produção n a s fábricas
s o v i é t i c a s é realizada durante o "vendaval" da ú l t i m a década de cada
m ê s » ( ) . T a m b é m Dobb fala da «característica sMurmovshchina,
ou
"storming", n a s f a s e s f i n a i s de cada período de planificação» ( ) . O seg u n d o ponto é a p e n a s u m dos a s p e c t o s do conhecido f e n ó m e n o dos «mercados paralelos». N u m a r t i g o j u s t a m e n t e dedicado ao e x a m e dos v á r i o s
t i p o s de relações entre a g e n t e s e c o n ó m i c o s ( e m p r e s a s e s t a t a i s , e m p r e s a s
c o l e c t i v a s e a g r e g a d o s f a m i l i a r e s ) n a U R S S , refere-se e s t e c a s o específico da s e g u i n t e m a n e i r a : «Devido à f a l t a de s e g u r a n ç a n o s a b a s t e c i m e n t o s e à pressão para cumprir o s o b j e c t i v o s do Plano, a s e m p r e s a s soviét i v a s e m p r e g a m expediters
[ a g e n t e s «expeditivos» ( ) — J M P ] que
"percorrem" a e c o n o m i a e m b u s c a de f o r n e c i m e n t o s n e c e s s á r i o s e que
utilizam u m a variedade de m e i o s m o n e t á r i o s e n ã o m o n e t á r i o s (incluindo
a t r o c a de m e r c a d o r i a s ) para o s adquirir. E s t e a s p e c t o das relações inter-empresas e s t á b e m pormenorizado n a literatura geral sobre a economia
s o v i é t i c a ; t e m sido m u i t a s v e z e s descrito c o m o o lubrificante das relações
h o r i z o n t a i s [na e c o n o m i a ] que permite que a "command e c o n o m y " sovié1 2 2
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C ) Sobre este ponto v. L E W I N [1973], p. 143.
( ) Id., id. — nota 20.
( ) DOBB [1966], p. 376.
í - ) N a linguagem técnica ocidental relativa à condução de projectos, o expediting (em português deficientemente traduzido por «relançamento») é a actividade de
acompanhamento da execução das encomendas, a pressão exercida para que elas sejam
cumpridas nos prazos e condições técnicas previstos. A utilização aqui do termo expediter constitui uma extrapolação deste sentido, tratando-se obviamente de indivíduos
que não só exercem aquela função m a s a suplementam com a procura de fornecimentos não-planificados, fora portanto do sistema oficial de abastecimento.
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t i c a f u n c i o n e » ( ) . Lewin, pelo seu lado, diz o s e g u i n t e : «Como contrapartida das deficiências do s i s t e m a de a b a s t e c i m e n t o técnico-material e
d a s f a l h a s do s i s t e m a de preços, a s fábricas, f o r t e m e n t e p r e s s i o n a d a s
para cumprir o s o b j e c t i v o s planificados, m a s mal a b a s t e c i d a s de recursos
n e c e s s á r i o s , d e s e n v o l v e r a m m e i o s próprios para a t i n g i r a s "quotas". Surg i u u m a importante rede de intermediários, "desbravadores"
(tolkachi)
e "fornecedores" {snábzhentsy)
que a j u d a v a m o preocupado director de
u m a fábrica, kolkhoz
ou sovkhoz
a obter o s f o r n e c i m e n t o s n e c e s s á r i o s
que, embora oficialmente lhe t i v e s s e m sido a f e c t a d o s , n u n c a lhe c h e g a riam pelos c a n a i s oficiais ( . . . ) . A s s i m , desenvolveu-se u m a espécie de
m e r c a d o m e s m o para b e n s de capital, tolerado pelo Governo. E r a impossível eliminá-lo, e ajudava a e c o n o m i a a funcionar melhor» ( ) .
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Outra questão, de a l g u m m o d o i n v e r s a da anterior, é a da conhecida
acumulação de s t o c k s de produtos que não e n c o n t r a m comprador ( o s
invenãiãos).
N o seu relatório de 1965, K o s s y g i n refere-se a e s t e problema
da s e g u i n t e f o r m a : « N ã o raro a s n o s s a s e m p r e s a s e s t ã o produzindo b e n s
de b a i x a qualidade que o c o n s u m i d o r não quer e que, portanto, ficam
por vender. (...) [ N o e n t a n t o ] , s e g u n d o o s i s t e m a actual de a v a l i a ç ã o
de a c t i v i d a d e s das e m p r e s a s n a base do v o l u m e de produção global,
considera-se que t a i s e m p r e s a s cumpriram o Plano» ( ) . Outro a u t o r
indica que «na Polónia, o s s t o c k s a u m e n t a r a m em 1970 d u a s v e z e s m a i s
r a p i d a m e n t e que a s v e n d a s a retalho» ( ) . N a realidade, o problema dos
«invendidos» não r e s u l t a v a u n i c a m e n t e da b a i x a qualidade dos produtos.
P o d e r e m o s citar d u a s o u t r a s razões. Por u m lado, deficiências a d m i n i s t r a t i v a s : « N a f a l t a de i n s t r u ç õ e s de cima, a s e m p r e s a s não t o m a v a m a
iniciativa de suspender ou t r a n s f o r m a r a s f a b r i c a ç õ e s [ p r o d u t o s ] para
os quais a procura t i n h a baixado, ou h a v i a m e s m o cessado, v i s t o que
e s s a s fabricações c o n t i n u a v a m a c o n s t a r do indicador. E m caso de reorientação brusca do aparelho produtivo por ordem dos m i n i s t é r i o s , elas
n ã o p r o c u r a v a m a c h a r d e s t i n o para o s s e u s stocks de produtos a c a b a d o s
ou semi-acabados, v i s t o que e s t e s eram, independentemente disso, integ r a d o s no resultado. T o d o s e s s e s produtos inutilizados i a m a u m e n t a r
aquilo a que o s e c o n o m i s t a s s o v i é t i c o s c h a m a v a m pudicamente "as
reservas"» ( ° ) . Outra ainda, e talvez a m a i s i m p o r t a n t e , c a u s a de «inven1 2 8
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K A T S E N E L I N B O I G E N & L E V I N E [1976], p. 63.
L E W I N [1973], pp. 119-120.
KOSSYGIN [1965], p. 319.
CONNOR [1975], p. 115.
E G N E L L & P E I S S I K [1974], p. 47.
didos», era a derivada d i r e c t a m e n t e dos «objectivos q u a n t i t a t i v o s » f i x a d o s
à s empresas, que a s l e v a v a m a distorcer a g a m a de produção no sentido
de conseguir um m a i s fácil c u m p r i m e n t o do Plano, com i s s o produzindo
largos excedentes de produtos « f a v o r á v e i s à empresa», a o m e s m o t e m p o
que geravam a escassez dos o u t r o s : parte dos primeiros ia a u m e n t a r o
stock de invendidos.
Finalmente outro a s p e c t o global indiciador da inadequação do s i s tema à crescente complexidade da economia, e que s u s c i t o u n a t u r a l m e n t e
sérias inquietações foi a de u m a evidente incapacidade do s i s t e m a para
estimular a inovação, a criação de n o v o s produtos, o d e s e n v o l v i m e n t o
de novas tecnologias, e b e m a s s i m a m e l h o r i a de qualidade dos produtos
existentes. E n t r e outras razões (v. p. ex. a citação de K o s s y g i n n a
nota 118), o ênfase no c u m p r i m e n t o q u a n t i t a t i v o do P l a n o «virava o s
gestores contra o s novos m é t o d o s de produção m a i s eficientes, p o i s a s u a
introdução fazia "perder t e m p o " ao f l u x o corrente da produção» ( ) .
O sistema premiava, deste m o d o , a rotina, o « c o n f o r m i s m o tecnológico»,
e penalizava a experimentação de n o v o s m é t o d o s e produtos, a utilização
de novas técnicas, o s e s f o r ç o s n o s e n t i d o de u m a m e l h o r qualidade — p o i s
tudo isto perturba o f u n c i o n a m e n t o «normal» da produção n o curto
prazo.
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Vistos os grandes p a r â m e t r o s sobre o s quais incidiu o essencial das
críticas surgidas no período pós-estaliniano, o b s e r v e m o s a g o r a c o m o
estas «distorções» puderam, n a óptica dos reformadores, s e r t o d a s
reconduzidas a u m a responsabilização quase e x c l u s i v a do s i s t e m a de
«preços e incentivos» para tal s i t u a ç ã o . A s s i m , o s indicadores quantitativos que exprimiam o s o b j e c t i v o s do P l a n o e r a m considerados como
«indicadores de sucesso», e c o m a n d a v a m , c o m o já v i m o s , a acção dos
directores das empresas. Simplesmente, ao m e s m o t e m p o que s e lhes impunha que os cumprissem, e por i s s o m e s m o , dava-se-lhes — a t r a v é s da
«forma» que t o m a v a o índice — u m incentivo a a c t u a ç õ e s e decisões contrárias aos objectivos (a outros objectivos) do planificador. «Como o s
vários modos de medir o s objectivos do P l a n o podiam exercer u m efeito
de distorção é hoje u m a h i s t ó r i a c o n h e c i d a : s e e m peso, era m a i s fácil
cumprir o Plano s e o s produtos f o s s e m e m m e n o r quantidade e m a i s
pesados (ex.: pregos ou a r m a ç õ e s de c a m a ) ; s e e m comprimento,
induzia
por exemplo ao fabrico de t e c i d o s e s t r e i t o s e de padrão m u i t o s i m p l e s ;
se em valor bruto (o que era c o m u m ) encorajava a produção de b e n s
("') DOBB [1966], p. 376.
"material-intensivos" ( . . . ) , p. ex. v e s t u á r i o f e i t o com m a t e r i a i s c a r o s de
preferência a "linhas de p r o d u t o s " m e n o s onerosos, f e r r a m e n t a s f e i t a s de
a ç o s especiais, m o t o r e s ou t r a c t o r e s c o m p l e t o s em l u g a r de peças. D a í a s
dificuldades de cumprir o assortment
plan [ g a m a de produção planificada — J M P ] e a persistência da e s c a s s e z de m u i t o s b e n s » ( ) .
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A l i á s , m e s m o a o nível do t r a b a l h o individual p a g o «à peça» ( p o r t a n t o
t a m b é m u m «indicador q u a n t i t a t i v o » ) , o r e s u l t a d o é s e m e l h a n t e . N o s e u
livro (v. n o t a 1 3 2 ) , A n t o n o v cita o caso, que se tornou p a r a d i g m á t i c o ,
de t r a b a l h a d o r e s e m p r e g a d o s n a d e s c a r g a de tijolos de c a m i õ e s . S e g u n d o
ele, 30 % dos tijolos quebravam-se dada a preocupação prioritária de
d e s c a r r e g a r o m á x i m o de tijolos no m í n i m o de t e m p o . C o m e n t a N o v e :
«se a d e s c a r g a f o s s e f e i t a com m a i s cuidado, o s t r a b a l h a d o r e s "produziriam" m e n o s e receberiam m e n o r salário, o condutor do c a m i ã o faria m e n o s v i a g e n s , e e n f i m a s u a e m p r e s a realizaria m e n o s t o n . / k m » . S o b r e
o m e s m o caso, sublinha L e w i n : «Os t r a b a l h a d o r e s s a b i a m que a s u a acção
s e opunha quer a o s i n t e r e s s e s do país, quer ao s i m p l e s s e n s o comum,
m a s o f a c t o é que o trabalho lhes e r a avaliado e p a g o na base de u m
indicador q u a n t i d a d e / t e m p o » ( ) .
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Q u a n t o à relação entre a s e x i g ê n c i a s de c u m p r i m e n t o dos o b j e c t i v o s
q u a n t i t a t i v o s e o incentivo à q u a l i d a d e / i n o v a ç ã o , j á a c i m a m e n c i o n á m o s
e s t e ponto. B a s t a r á a c r e s c e n t a r que o polaco B r u s articula e s t a q u e s t ã o
com a contradição entre a planificação a prazo e a e x e c u ç ã o prioritária
dos o b j e c t i v o s dos planos de curto p r a z o : « U m dos m a i s g r a v e s d e f e i t o s
do s i s t e m a actual de planificação e g e s t ã o c o n s i s t e n a contradição flag r a n t e entre o f a c t o de que o plano central é a l o n g o prazo, enquanto que
a s e m p r e s a s t r a b a l h a m a curto prazo, s e m a m e n o r p e r s p e c t i v a ; elas pre-
( ) DOBB [1966], pp. 374-375. Dobb cita um artigo da Pravda de 19 de Outubro
de 1962: «Conhecemos muitos exemplos de empresas que, na procura de cumprir o
Plano em termos brutos, baixam a qualidade e fabricam produtos de uma variedade
[assortment]
não correspondente à s necessidades da indústria e da população». (Id.,
p. 375, nota 1). Nove, entre numerosos exemplos e citações, refere uma anedota ilustrada publicada no jornal satírico Krokodil, na qual se mostrava um gigantesco prego
pendurado numa oficina, cujo director, apontando para ele, dizia: «O Plano mensal
está cumprido!». E Nove comenta: «em toneladas, é claro» (NOVE [1977], p. 94).
O célebre projectista aeronáutico Antonov publicou em 1965 um livro em que descreve
também múltiplas destas aberrantes situações. Por exemplo o caso de uma fábrica de
lâmpadas cujo plano era fixado em termos de «potência global», e que portanto poucas
lâmpadas de baixa potência produzia. Mas se o indicador fosse alterado para «milhares
de lâmpadas», muito poucas de alta potência seriam fabricadas (v. ÍNOVE [1977],
p. 107).
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(«»)
N
o v E [1977], p. 107; L E W I N [1973], p. 148.
f e r e m m u i t a s v e z e s — devido a o s critérios de apreciação adoptados —
soluções piores, desde que dêem r e s u l t a d o s n o quadro de u m período definido de planificação. Inútil sublinhar que isto t r a v a o p r o g r e s s o técnico
n a s e m p r e s a s e x i s t e n t e s , limita a s u a capacidade de se adaptar à s modif i c a ç õ e s p r e v i s t a s de e s t r u t u r a da procura, e t c . » ( ) .
Outro ponto de assinalável importância, ainda ligado directamente
à formulação q u a n t i t a t i v a dos «indicadores de sucesso», c o n s i s t i a no
i n c i t a m e n t o à fraude informativa. N i n g u é m m e l h o r do que Dobb descreve e s t e m e c a n i s m o e a s s u a s c o n s e q u ê n c i a s : « A s autoridades de planificação t i n h a m de basear-se, no essencial, n a s i n f o r m a ç õ e s sobre n o r m a s
t é c n i c a s e capacidades de produção dadas pelas próprias direcções das
empresas. (...) Com a crescente complexidade do s i s t e m a , tornou-se
cada vez m a i s difícil a u m p e s s o a l de planificação sobreocupado efectuar
a verificação de dados fornecidos por 200 000 e m a i s e m p r e s a s . Daí que
a s e m p r e s a s p u d e s s e m , e m certa m e d i d a pelo m e n o s , e em m u i t o s c a s o s
e m l a r g a medida, influenciar os o b j e c t i v o s de produção e a s n o r m a s
atribuídas a si próprias, e b e m a s s i m a quantidade e tipo de m a t e r i a i s
e e q u i p a m e n t o que lhes seriam afectados. O ê n f a s e tradicional no cump r i m e n t o q u a n t i t a t i v o dos o b j e c t i v o s de produção criou u m a a t m o s f e r a
e m que o s g e s t o r e s e r a m f o r t e m e n t e t e n t a d o s a dar v a l o r e s inferiores
para a capacidade das s u a s e m p r e s a s para "ficar com a l g u m a reserva"
e para obter "normas" f á c e i s de cumprir. D a í o dizer-se que "um director
inteligente cumpre o s e u plano talvez e m 105 %, m a s nunca em 125 %".
Tornou-se usual, a o que parece, que a s a u t o r i d a d e s de planificação, s u s peitando que o s dados sobre n o r m a s e e s t i m a t i v a s de n e c e s s i d a d e s v i n d a s
de b a i x o e s t a r i a m sempre erradas n u m sentido f a v o r á v e l à s empresas,
p r o c e d e s s e m a u m a sobre-compensação a t r a v é s da c h a m a d a planificação
"tensa", que f r e q u e n t e m e n t e se tornou "ultra-tensa". O resultado foi não
s ó penalizar o s directores c o n s c i e n c i o s o s impondo-lhes o b j e c t i v o s impossív e i s de cumprir, m a s t a m b é m originou e s t r a n g u l a m e n t o s no s i s t e m a de
f o r n e c i m e n t o s , com a s c o n s e q u e n t e s r u p t u r a s n o s f l u x o s de produção» ( ) .
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( ) BRUS [1967], p. 255.
( ) DOBB [1966], pp. 375-376. O académico Nemchinov exprime também muito
claramente as suas preocupações quanto a esta questão: «Ocorre com frequência que
os esforços realizados pelo pessoal de um estabelecimento se vêem reduzidos a zero
pelo plano seguinte, pois este "absorve" de um golpe todos os resultados passados.
Nestas condições, os chefes de empresa são frequentemente incitados a dissimular as
suas reservas e disponibilidades a fim de que, no período seguinte, o pessoal não se
veja colocado nas condições difíceis que acarreta a não-execução de um plano excessivamente sobrecarregado» (NEMCHINOV [1964], p. 34).
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M5
P e l a n o s s a parte, c h a m a m o s a a t e n ç ã o para o que i s t o representa e m
t e r m o s de « s i s t e m a de desconfiança» generalizada, de a u t ê n t i c o j o g o
do g a t o e do r a t o entre planificadores e directores d a s e m p r e s a s , de
e f e c t i v a desarticulação institucional entre i n t e r e s s e s particulares e colect i v o s (isto se, e m primeira aproximação, a d m i t i r m o s que o s o b j e c t i v o s
do plano r e p r e s e n t a m o i n t e r e s s e c o l e c t i v o : se o n ã o p u d e r m o s admitir,
dada a f o r m a não-participada c o m o e r a m f i x a d o s , então t r a t a - s e de u m a
generalizada c o m p e t i ç ã o de i n t e r e s s e s particulares, e m que cada u m
utiliza o poder de que dispõe para o s f a z e r valer) ( ) .
1 3 e
Outro a s p e c t o que foi a l v o de f o r t e s a t a q u e s dos «reformadores»
foi a f a l t a de i n c e n t i v o s à «economia de recursos». N o s e u relatório, diz
K o s s y g i n : «O f i n a n c i a m e n t o dos i n v e s t i m e n t o s de capital é a c t u a l m e n t e
g r a t u i t o , a t r a v é s d o o r ç a m e n t o do E s t a d o . Os g e s t o r e s d a s e m p r e s a s
m o s t r a m - s e pouco i n t e r e s s a d o s q u a n t o ao c u s t o de reconstrução da e m p r e s a [reposição, renovação — J M P ] ou q u a n t o à eficiência do investim e n t o adicional, pois a s e m p r e s a s não são o b r i g a d a s a restituir a s s o m a s
p o s t a s à s u a disposição. P o r i s s o n e c e s s i t a m o s de u m s i s t e m a que induza
o s n o s s o s g e s t o r e s a s e n t i r e m - s e m a i s implicados em q u e s t õ e s c o m o :
c o m o utilizar o s f u n d o s da f o r m a m a i s eficiente, de m o d o a que a s n o v a s
i n s t a l a ç õ e s s e j a m c o n s t r u í d a s com o m í n i m o de i n v e s t i m e n t o s , arranquem
e m devido t e m p o e a s capacidades p r o j e c t a d a s s e j a m p l e n a m e n t e utiliz a d a s tão rapidamente quanto possível. (...) A c o n t e c e por v e z e s que u m a
e m p r e s a adquire e q u i p a m e n t o s de que n ã o n e c e s s i t a m e r a m e n t e com o
objectivo de g a s t a r f u n d o s que lhe e s t ã o atribuídos» ( ) . P e l a s u a parte,
Dobb exprime-se do s e g u i n t e m o d o : «A experiência m o s t r o u que, s o b
o s i s t e m a a n t e r i o r [ à s r e f o r m a s — J M P ] , h a v i a pouca e c o n o m i a de inst a l a ç õ e s e e q u i p a m e n t o s , e pouca preocupação a nível da e m p r e s a e m
conservá-los c o n v e n i e n t e m e n t e e u s á - l o s o m e l h o r possível» ( ) . S e g u n d o
ele, isto deve-se e s s e n c i a l m e n t e a o f a c t o de que o v a l o r do capital f i x o
s e n ã o encontra l i g a d o a o s c u s t o s de produção. E comenta, n a linha dos
«reformadores»: « N e s t a medida, i s t o pode s e r v i s t o c o m o u m defeito
do s i s t e m a de preços m a i s do que da centralização per si. N a realidade
a s d u a s c o i s a s s ã o dificilmente dissociáveis, já que é característico dum
s i s t e m a a l t a m e n t e centralizado o a s s e g u r a r a conformidade com o s s e u s
o b j e c t i v o s por m e i o de ordens a d m i n i s t r a t i v a s , e m l u g a r de "medidas
1 3 7
1 3 S
( ) Sobre este ponto e, em geral, sobre os métodos «informais» de actuação dos
directores, v. BERLINER [1952].
C ') KOSSYGIN [1965], pp. 326-327.
(*>») DOBB [1966], p. 376.
Ma
3
e c o n ó m i c a s " c o m o i n c i t a m e n t o v i a preços» ( ) . A i n d a quanto à (des) economia de recursos, é de acentuar a deficiente g e s t ã o de s t o c k s : «O problema da e s c a s s e z v e m a lume n u m a e c o n o m i a que se torna c a d a vez
m a i s c o m p l e x a e diversificada. Torna-se impossível deixar acumular
s t o c k s de m a t é r i a s - p r i m a s e de m a t e r i a i s que, finalmente, são improdutivos, a p e n a s para fazer frente a imprevistos, tolerando a s s i m imobilizações de capitais s o b p r e t e x t o de que, por pertencerem ao E s t a d o , a empresa n ã o l h e s suporta o s e n c a r g o s » ( ° ) .
1 3 9
14
Outra questão ainda que preocupou s e r i a m e n t e o s «reformadores»
foi a f a l t a de «incentivos m a t e r i a i s directos ( p e s s o a i s ) » que l e v a s s e m
g e s t o r e s e t r a b a l h a d o r e s a interessar-se pelos a u m e n t o s de produção e,
particularmente, de produtividade e e c o n o m i a de recursos ou, c o m o freq u e n t e m e n t e se exprimiram, que o s l e v a s s e m indirectamente a actuar de
acordo com o s o b j e c t i v o s do planificador. N o que respeita a o s primeiros,
é indiscutível que a s v a n t a g e n s m a t e r i a i s de c o n s e g u i r u m lucro sensiv e l m e n t e superior ao planificado n ã o c o m p e n s a v a m o s i n c o n v e n i e n t e s já
v i s t o s de u m «excessivo» c u m p r i m e n t o do Plano, que prenunciava u m
a u m e n t o dos o b j e c t i v o s a cumprir para o s a n o s s e g u i n t e s . Tudo aliás
levava u m director a preferir a s c o m b i n a ç õ e s p r o d u t i v a s que lhe perm i t i s s e m cumprir m a i s f a c i l m e n t e o plano ( q u a n t i t a t i v o ) do que a escolher a s c o m b i n a ç õ e s m a i s l u c r a t i v a s : e r a m a i o r o incentivo para agir no
s e n t i d o de evitar sanções do que de obter benefícios
pessoais.
N o que se refere a o s trabalhadores, o problema torna-se particularm e n t e delicado, n a m e d i d a e m que, e s t a n d o teoricamente
n o poder, se
torna difícil explicar o seu desinteresse. A i n d a a s s i m , não é difícil encontrar m ú l t i p l a s referências e t e n t a t i v a s de explicação para o facto. P a r a
além da ausência de e s t í m u l o s directos, o u t r o f a c t o r f r e q u e n t e m e n t e
mencionado, e para o qual o s «reformadores» propuseram medidas, posteriormente a d o p t a d a s com m a i s ou m e n o s rigor, era o do « e x c e s s i v o igualitarismo salarial», que desencorajaria o esforço individual e o desejo
de promoção. N o v o z h i l o v a f i r m a p e r e m p t o r i a m e n t e : « N o complexo s i s t e m a da n o s s a e c o n o m i a actual, é m u i t o difícil c o n s e g u i r o i n t e r e s s e
pessoal de cada trabalhador n o s r e s u l t a d o s do seu trabalho» ( ) . L e w i n
cita Strumilin, sobre o m e s m o a s s u n t o : «Strumilin explicou que a f a l t a
de i n t e r e s s e m o s t r a d a pelos produtores, e m particular pelos trabalhadores,
n o s r e s u l t a d o s da laboração da s u a fábrica era o resultado de que rece1 4 1
i a ) DOBB [1966], p. 377.
("») CHAMBRE [1964], p. 286.
('") NOVOZHILOV [1966], p. 380.
biam a p e n a s u m a parte insignificante dos f u n d o s de e s t í m u l o da empresa.
"É-lhes pedido que d e s e n v o l v a m u m considerável esforço adicional, e a
r e c o m p e n s a é de m e i a dúzia de patacos. D e s t e m o d o o s i n t e r e s s e s dos
t r a b a l h a d o r e s s ã o desprezados, j á que o fruto do s e u trabalho lhes e s t á
sendo confiscado pelo E s t a d o " » ( ) . Indirectamente, K o s s y g i n reconhece
a m e s m a s i t u a ç ã o : «Ê, pois, n e c e s s á r i o deixar à s e m p r e s a s u m a parte
m a i o r dos lucros que realiza, de m o d o a que p o s s a d e s e n v o l v e r a produção, a u m e n t a r a s s u a s técnicas, encorajar m a t e r i a l m e n t e o s s e u s trabalhadores e melhorar a s condições de trabalho e de vida dos trabalhadores fabris e a d m i n i s t r a t i v o s do seu quadro (...) [ H á que] tornar
o colectivo global e cada oficina e secção da e m p r e s a i n t e r e s s a d o s e m
cumprir n ã o só o s o b j e c t i v o s que l h e s s ã o f i x a d o s individualmente m a s
t a m b é m e m m e l h o r a r o s r e s u l t a d o s g l o b a i s da empresa» ( ) .
1 4 2
1 4 3
N o que se refere a o «igualitarismo», c o n v é m recordar que ele é
parte essencial da ideologia
básica do socialismo, não sendo por a c a s o
que o impulso n e s s e s e n t i d o se verifica sempre e m períodos de grande
fervor revolucionário, como foi o c a s o na U R S S durante o c o m u n i s m o de
guerra. A n o s m a i s tarde, quando s e t r a t o u de forçar a industrialização,
foi o próprio Staline a fazer aprovar u m a forte diferenciação salarial,
denunciando o « i g u a l i t a r i s m o pequeno-burguês». A partir dos a n o s 50, n a
U R S S , e n a generalidade dos p a í s e s de Leste, deu-se u m s e n s í v e l nivelam e n t o salarial, reforçado pelos benefícios s o c i a i s (o c h a m a d o «fundo
de c o n s u m o c o l e c t i v o » ) . É contra e s t e que s e l e v a n t a m os «reformadores»,
que colocam a questão e m t e r m o s de u m d e s a j u s t a m e n t o entre o s n í v e i s
salariais e a s qualificações.
D e facto, o que e s s e n c i a l m e n t e preocupa o s «reformadores» é a
eficiência
e a economia de recursos
( n e s t e caso, de m ã o - d e - o b r a ) , e reconhece-se no s i s t e m a u m desincentivo geral a o a p r o v e i t a m e n t o dos m a i s
qualificados, dos m a i s «produtivos», dos m a i s eficientes. U m a u t o r húng a r o e x p r i m e - s e com a m a i o r clareza: « A s c a r a c t e r í s t i c a s b á s i c a s do
b e m - e s t a r s o c i a l i s t a não podem ser deduzidas a partir do p u r i t a n i s m o de
s i t u a ç õ e s de e m e r g ê n c i a e m t e m p o s revolucionários, n e m do igualitarismo.
O s o c i a l i s m o contradiz o s s e u s próprios o b j e c t i v o s se proclama a pobreza
geral e fechará m e s m o o s c a m i n h o s do d e s e n v o l v i m e n t o se o t a l e n t o e
a mediocridade, a diligência e a preguiça forem i g u a l m e n t e remunera-
( ) L E W I N [1973], p. 147. A citação de Strumilin é da sua obra «Khoziaistvennyi, Raschet i Problema Tsenoobrazovaniia».
( ) KOSSYGIN [1965], pp. 324-325.
IK
M
d o s » ( ) . N a realidade, o sentimento
igualitário
t e m sido considerado
por v á r i o s a u t o r e s como u m dos principais o b s t á c u l o s l e v a n t a d o s pelos
t r a b a l h a d o r e s à introdução das reformas, de u m m o d o geral f o r t e m e n t e
diferenciadoras dos r e n d i m e n t o s e p r é m i o s ( ) .
1 4 4
1 4 5
A concluir e s t e p a n o r a m a m u i t o s u m á r i o sobre o s «princípios» e a
prática do s i s t e m a de planificação central, a p e n a s queremos r e t o m a r o
que a c i m a d i s s e m o s sobre o seu ê x i t o e m t e r m o s globais, a g o r a já sob
o u t r a luz. Com efeito, h á a g o r a que sublinhar que t a i s s u c e s s o s — a industrialização e modernização de u m país da d i m e n s ã o da U R S S , ainda por
cima polarizado durante m a i s de dez a n o s para prioridades de g u e r r a e de
reconstrução, e tendo p o s t e r i o r m e n t e de continuar a canalizar v u l t o s o s
recursos para o s e c t o r da d e f e s a — f o r a m obtidos a t r a v é s de u m s i s t e m a
e m que a desconfiança, o desinteresse pelos o b j e c t i v o s colectivos, o estímulo à fraude e a o e x p e d i e n t e eram generalizados, «um s i s t e m a de admin i s t r a ç ã o burocrático, b a s e a d o sobre a f a l s a ideia de que o s planificadores
e o s f u n c i o n á r i o s podem, por si sós, dirigir a produção social s e m fazer
u s o da iniciativa criadora dos que dirigem d i r e c t a m e n t e a produção (...)
u m s i s t e m a que, por e s t a r m a n i e t a d o e m e x c e s s o no s e u f u n c i o n a m e n t o ,
s e converte n u m freio ao p r o g r e s s o social e ao p r o g r e s s o das técnicas» ( ) ,
n a s e x p r e s s õ e s de u m d e s t a c a d o e c o n o m i s t a soviético. S e b e m que a s
r e f l e x õ e s sobre e s t e p o n t o fiquem r e s e r v a d a s para t r a t a m e n t o m a i s pormenorizado n o e n s a i o s e g u i n t e , é útil desde já a s s i n a l a r a s i m e n s a s
potencialidades de u m modelo deste tipo, se combinadas
com u m a consciência social d e s e n v o l v i d a a t r a v é s de m e c a n i s m o s de participação colect i v a n a f i x a ç ã o dos o b j e c t i v o s e n a e f e c t i v a ç ã o de t a r e f a s cujo s e n t i d o
f o s s e compreendido e a s s u m i d o por t o d o s c o m o u m imperativo
natural.
M a s é claro que aqui n o s s i t u a m o s já ao nível do s i s t e m a político, e u m a
vez m a i s n o s d e f r o n t a m o s com a impossibilidade de isolar um s i s t e m a
económico dos o u t r o s s i s t e m a s de relações que i n t e g r a m a realidade
social.
1 4 6
("') KOZMA [1976], Recensão em SZABO [1976], p. 212.
(" ) V. sobre este ponto CONNOR [1975], pp. 113-114 e 125; neste artigo é citado
um jornal húngaro, sobre uma forma de reacção negativa aos estímulos introduzidos
pelas reformas: «Os responsáveis pela repartição dos lucros há muito constataram que
o princípio "um pouco a cada um" lhes evitaria terríveis dores de cabeça. Pelo seu lado,
os beneficiários, operários e empregados, fizeram-se à ideia de que não havia entre eles
bons e maus, melhores ou piores: eu recebo um tanto, tu outro tanto (...) e não há
razão para andarmos a perguntar porque é que uns recebem menos que outros».
(" ) NEMCHINOV [1964]-1, pp. 24 e 26.
5
6
4. A terminar e s t e ensaio, e porque o que n o s ocupa é a configuração
de s i s t e m a s e c o n ó m i c o s relativamente
diferenciados (ou a s
tentativas
f e i t a s n e s s e s e n t i d o ) , deter-nos-emos u m pouco sobre o hoje correntem e n t e d e s i g n a d o por « s o c i a l i s m o de mercado», p a r a o que e x a m i n a r e m o s
o c h a m a d o «novo m e c a n i s m o económico» introduzido na H u n g r i a com a
reforma de 1968.
A n t e s disso, porém, c r e m o s útil indicar s u m a r i a m e n t e como n a s c e u
e s s e «modelo» a partir do s i s t e m a de planificação central, p o i s e s s a
g é n e s e determina, a n o s s a ver, o s próprios l i m i t e s do n o v o s i s t e m a . P o r
o u t r a s palavras, t r a t a - s e de apreciar quais a s g r a n d e s linhas da controv é r s i a teórica que se desenrolou durante o s a n o s 60 n a U R S S e n o s p a í s e s
de L e s t e , e b e m a s s i m a s m o d a l i d a d e s a d o p t a d a s p a r a e n f r e n t a r t o d o s
aqueles problemas e a n o m a l i a s d e s c r i t o s n a secção anterior.
P o d e r e m o s dizer, e m síntese, que o s p o n t o s de partida p a r a a disc u s s ã o se c e n t r a v a m e m torno de d u a s g r a n d e s q u e s t õ e s , a l i á s m u i t o
i n t e r l i g a d a s : por u m lado, a e v i d e n t e desarticulação entre u m s i s t e m a
de planificação e controlo a l t a m e n t e centralizado e o s c o m p o r t a m e n t o s
dos a g e n t e s e c o n ó m i c o s (em particular, dos directores e c o l e c t i v o s e m p r e s a r i a i s ) , com t e n d ê n c i a para u m a g r a v a m e n t o com a crescente complexidade da e c o n o m i a (problemas de informação, de a g r e g a ç ã o / d e s a g r e g a ç ã o de i n d i c a d o r e s ) ; por outro, aquilo que f r e q u e n t e m e n t e s e d e s i g n o u
por « p a s s a g e m de u m d e s e n v o l v i m e n t o e x t e n s i v o a u m d e s e n v o l v i m e n t o
intensivo», o m e s m o é dizer, a n e c e s s i d a d e de t o m a r e m consideração u m a
crescente e s c a s s e z de r e c u r s o s e a p o s t a r na produtividade, no p r o g r e s s o
técnico, etc. Juntou-se a e s t e s dois g r a n d e s t e m a s o da n e c e s s i d a d e de
acelerar a s a t i s f a ç ã o d a s n e c e s s i d a d e s de c o n s u m o das populações, ou
seja, o de atender, na própria f o r m u l a ç ã o dos o b j e c t i v o s e a f e c t a ç ã o de
m e i o s , à «procura final». P a r a além disso, é desde já conveniente assinalar que, f o s s e por necessidade m e t o d o l ó g i c a (dado o tipo de q u e s t õ e s a
t r a t a r ) , f o s s e por d e s c o m p r e s s ã o ideológica (que permitiu l e v a n t a r certos
t a b u s ) , f o s s e ainda por u m t á c i t o c o n s e n s o e m n ã o politizar a discussão,
e c e r t a m e n t e por t o d a s e s t a s razões s i m u l t a n e a m e n t e , u m dos t e r r e n o s
privilegiados do debate foi o da «aplicação das m a t e m á t i c a s à economia» ( ) 1 4 7
( ) Para além de KANTOROVICH [1959] e NOVOZHILOV [1959], já referidos,
é indispensável, para conhecer com maior profundidade as posições em confronto no
debate, a leitura dos textos de numerosos economistas soviéticos incluídos na colectânea
«Planificación dei Socialismo» [1965] onde se encontram os artigos essenciais de Liberman, Trapeznikov e Nemchinov, além de uma «mesa-redonda» entre economistas sovié14T
A b o r d a d a a q u e s t ã o e m t e r m o s e s t r i t a m e n t e e c o n ó m i c o s — e foi
apenas a e s s e nível que t o d a a d i s c u s s ã o s e processou a partir do m o m e n t o
e m que, l o g o a p ó s a m o r t e de Staline, se t e n t a r a m (e f r a c a s s a r a m ) soluções p u r a m e n t e a d m i n i s t r a t i v a s , como a criação por K h r u s h c h e v dos
«conselhos e c o n ó m i c o s regionais» (Sovnarkhose)
— , e r a inevitável que
o debate g i r a s s e quase e x c l u s i v a m e n t e e m torno do s i s t e m a de preços
e incentivos, e d a s s u a s relações com a planificação. O problema a resolver
era, n a s p a l a v r a s de Liberman n o seu f a m o s o a r t i g o de 1 9 6 2 : «Construir
u m s i s t e m a de planificação e de a v a l i a ç ã o do t r a b a l h o d a s e m p r e s a s t a l
que e l a s t e n h a m u m a u t ê n t i c o i n t e r e s s e e m cumprir a o m á x i m o o s object i v o s do Plano, e m introduzir n o v a s t é c n i c a s e produtos de m e l h o r qualidade, n u m a palavra e m m a x i m i z a r a eficiência da produção» ( ) . N ã o
é difícil a o s reformadores m o s t r a r que u m a boa parte dos v í c i o s
do s i s t e m a p r o v é m da quase c o m p l e t a separação entre o « s i s t e m a de
preços» e o « s i s t e m a de o b j e c t i v o s / i n d i c a d o r e s de sucesso». Por u m lado,
o s i s t e m a de preços n ã o é u m «condutor de informação», n ã o m o t i v a n d o
de qualquer m o d o o s directores das e m p r e s a s (a n ã o s e r n o s c a s o s e m
que o s e u «objectivo planificado» é e x p r e s s o e m «valor bruto da produç ã o » ) , e a i n d a que o f o s s e só poderia dar o r i g e m a decisões «erradas» —
dado t r a t a r - s e de u m s i s t e m a de «preços políticos» e m que, por exemplo,
a desarticulação entre preços por g r o s s o e preços ao c o n s u m i d o r era, de
u m ponto de v i s t a «económico», total, já que o que se pretendia era, n o
essencial, proporcionar ao E s t a d o a principal f o n t e de r e c e i t a s orçament a i s a t r a v é s do « i m p o s t o sobre o v o l u m e de v e n d a s » . P o r outro, e e m contrapartida, o s «indicadores de s u c e s s o » , t e n d e n c i a l m e n t e q u a n t i t a t i v o s ,
e r a m o s ú n i c o s g u i a s de decisão, e já v i m o s o t i p o de c o m p o r t a m e n t o s
a n ó m a l o s que d e t e r m i n a v a m .
1 4 S
Sendo a s s i m , e m u i t o inspirados n a s t e o r i a s de Oskar L a n g e da «planificação descentralizada», é fácil de compreender que o s reformadores
i m a g i n a s s e m , c o m o solução m a i s adequada, a conjunção
daqueles dois
s i s t e m a s : o s preços deveriam s e r calculados de tal f o r m a que, orientan-
ticos, bem como textos importantes relativos à Polónia, RDA e Checoslováquia (Ota
S i k ) ; a obra dirigida por V. Nemchinov «El uso de las matemáticas en la economia»
[1959] incluindo alguns textos fundamentais; os diversos contributos reunidos no capitulo «The great value-price controversy in the U R S S and the prospects for the use
of mathematics to improve the efficiency of soviet planning» da colectânea «The
soviet economy — a collection of Western and Soviet views» [1963]; enfim as descrições sintéticas do debate em NOVE [1977], pp. 49-59 e 174-185, e DOBB [1966],
pp. 332-336 e 377-384.
(» ) L I B E R M A N [1962], p. 309.
s
do-se por eles com o objectivo de realizar o lucro m á x i m o , o s directores
de e m p r e s a s f o s s e m indirectamente
l e v a d o s a t o m a r decisões c o n s i s t e n t e s
com o s o b j e c t i v o s do planificador e, subentende-se, com o s i n t e r e s s e s da
economia. A p o u c o s m e s e s de distância, e n c o n t r a m o s e m N e m c h i n o v e
Liberman d u a s a f i r m a ç õ e s m u i t o s e m e l h a n t e s , que e x p r i m e m e s t a persp e c t i v a : «Se s e querem e v i t a r o s choques, é preciso que s e respeite o
princípio s e g u i n t e : tudo o que é útil e v a n t a j o s o para o conjunto da econ o m i a deve sê-lo t a m b é m , de acordo c o m o s planos, p a r a a e m p r e s a
encarregada de e x e c u t a r a t a r e f a que lhe corresponde» ( ) . «O que é
v a n t a j o s o para a sociedade, r e p r e s e n t a d a pelo E s t a d o , deve s e r v a n t a j o s o
para c a d a e m p r e s a e p a r a c a d a u m d o s s e u s m e m b r o s » ( ) . E L i b e r m a n
precisa bem o s e n t i d o da palavra « v a n t a j o s o » : «Ê útil observar que não
s e t r a t a de u m a r e f o r m a dos índices, m a s de u m a reforma
das
relações
entre as empresas
e a economia
nacional.
É por i s s o e s t r a n h o que se
d i s c u t a para saber o que é m e l h o r : o valor da t r a n s f o r m a ç ã o estabelecido por u m a norma, ou o lucro? O lucro deve intervir como a medida
comum, final, da eficácia»
( ).
14í)
1 3 0
151
Ê, de facto, o velho s o n h o da t e o r i a do equilíbrio geral, s e g u n d o o
qual o c o m p o r t a m e n t o m a x i m i z a d o r do lucro por parte dos e m p r e s á r i o s
é condição para a obtenção do m á x i m o de utilidade colectiva. Ê n e s t e
ponto que i n t e r v ê m o s e c o n o m i s t a s m a t e m á t i c o s : com efeito, s e o s i s t e m a geral n ã o é o de u m m e r c a d o livre concorrencial, t r a t a - s e de s i m u l a r
m a t e m a t i c a m e n t e o s i s t e m a de preços que s e estabeleceria n e s s e m e r c a d o
livre, preços que reflectirão s i m u l t a n e a m e n t e quer a e s c a s s e z relativa de
recursos, quer a s p r e s s õ e s da procura dos consumidores. É claro que,
c o m o o planificador t e r á o b j e c t i v o s que n ã o s e r ã o e x c l u s i v a m e n t e o
da m a x i m i z a ç ã o da produção com o m í n i m o de recursos — h a v e r á que
realizar d e s p e s a s públicas, para f i n s s o c i a i s ou outros, h a v e r á que f a v o recer o c r e s c i m e n t o de c e r t o s s e c t o r e s e m d e t r i m e n t o de o u t r o s — , o
cálculo deverá permitir t e r e m c o n t a e s s e s f a c t o r e s , obtendo-se u m sist e m a «quase-óptimo», n o s e n t i d o de Baumol-Bradford. R e s t a ainda ao
E s t a d o , por v i a do controlo do crédito, u m s i s t e m a «correctivo» que impedirá a anarquia do i n v e s t i m e n t o , ainda que sacrificando parcialmente
a «pura racionalidade» económica.
Ê evidente que tal o u s a d i a n ã o podia deixar de c a u s a r u m a a c e s a
polémica, já que se i a m l e v a n t a r o s problemas da «lei do valor na economia
("») NEMCHINOV [1964]-1, 28.
( ) L I B E R M A N [1964], p. 117,
("*) Id., p. 116.
,:o
socialista», da renda e do juro, dos c o n c e i t o s de «mercadoria», e se era
forçado a pôr e m q u e s t ã o certos d o g m a s e s t a l i n i s t a s (por e x e m p l o a «lei»
da prioridade da indústria p e s a d a ) e a r e e x a m i n a r a t e o r i a do m e r c a d o
capitalista de Marx, a g o r a e m t e r m o s de «mercado socialista». Tratou-se,
de resto, de u m a d i s c u s s ã o b a s t a n t e nebulosa, j á que toda a a r g u m e n t a ç ã o
v i n h a m a s c a r a d a por t á c t i c a s o u i n t e r e s s e s n ã o - c o n f e s s a d o s . Se o s reform a d o r e s se v i a m obrigados a difíceis m a l a b a r i s m o s para conciliar a s s u a s
p r o p o s t a s com a teoria m a r x i s t a , e a citar a b u n d a n t e m e n t e M a r x e
Lenine (sobretudo o Lenine da N E P ) , o s s e u s o p o s i t o r e s e r a m obrigados
a esconder o s e u t e m o r perante a s a m e a ç a s que t a i s r e f o r m a s comport a v a m para o poder da burocracia do P a r t i d o e da a d m i n i s t r a ç ã o , e t a m bém o receio de u m imparável efeito de a r r a s t a m e n t o que t ã o radical
liberalização e c o n ó m i c a n ã o deixaria de t e r n o capítulo d a (indesejável)
liberalização política e cultural. E m a m b o s o s c a m p o s se e n c o n t r a r a m
n u m e r o s o s «matizes», desde o s m a i s m o d e r a d o s a o s m a i s radicais. P o u c o s ,
por exemplo, s u b s c r e v e r i a m a s a f i r m a ç õ e s do e c o n o m i s t a A. V i k e n t y e v ,
s e g u n d o a s quais «a planificação e a a d m i n i s t r a ç ã o soviéticas, t o m a d a s
globalmente, cumpriram com ê x i t o a s s u a s t a r e f a s , principalmente porque
a s s e n t a v a m n u m a sólida base científica. P o r t a n t o , a planificação, t o m a d a
globalmente, foi sempre óptima» ( ) . N a realidade era generalizado u m
c o n s e n s o sobre a necessidade de r e f o r m a s u r g e n t e s , e por isso m e s m o
elas se fizeram, embora ficando m u i t o a q u é m de u m «socialismo de mercado» m a t e m a t i c a m e n t e optimizado, m e s m o na H u n g r i a , onde, c o m o veremos, se fez u m a considerável ruptura com o s i s t e m a anterior.
E m que c o n s i s t i r a m , então, n a generalidade, a s r e f o r m a s e c o n ó m i c a s
n o s p a í s e s de L e s t e ? Com a c e n t u a ç ã o variável de p a í s para p a í s ( ) ,
elas compreenderam e s s e n c i a l m e n t e :
1 5 2
1 5 3
a) Alterações
nos «índices
compulsivos»
ou «indicadores
de
sucesso»
planificados
— N a U R S S o s índices b á s i c o s a d o p t a d o s de acordo com
a s p r o p o s t a s incluídas n o relatório de K o s s y g i n , f o r a m : produção
vendida, g a m a ou «nomenclatura» de produtos, f u n d o de salários, t a x a
de lucro, p a g a m e n t o s ao e r e c e i t a s do o r ç a m e n t o . P a r a além disso
Cit. in NOVE [1970], p. 353.
( ) U m a lista das reformas, sem muito pormenor, por anos e por países, encontra-se em WILCZYNSKI [1976], pp. 26-27. A s principais características das reformas
nos diversos países encontram-se num quadro incluído em B O R N S T E I N [1973], p. 76,
onde se indicam as reformas que foram posteriormente anuladas, em particular na
Checoslováquia. Para a U R S S existe informação detalhada em INOVE [1977], Quanto
à Hungria, citaremos adiante numerosas referências.
,5S
e r a m t a m b é m planificados o lucro global ( e m r u b l o s ) , o s investim e n t o s c e n t r a i s e m n o v a s capacidades, a s «tarefas b á s i c a s para a
introdução de n o v a s técnicas», o a b a s t e c i m e n t o técnico-material. M a i s
tarde, v á r i o s o u t r o s índices f o r a m sendo i n t r o d u z i d o s : índices de qualidade, t a x a de c r e s c i m e n t o da produtividade do trabalho, etc. A lista
de indicadores não é c o m u m a t o d o s o s p a í s e s : por e x e m p l o n a Checoslováquia e n a P o l ó n i a foi introduzido como índice básico o «valor
acrescentado» ( s a l á r i o s + l u c r o s ) . M a s e m t o d o s foi abandonado o produto bruto e o plano de redução de c u s t o s .
b) Introdução
gradual de «encargos
de capital» — Isto traduziu-se, de
facto, n u m a r e v i s ã o g e r a l do s i s t e m a de preços e da e s t r u t u r a orçamental. Com efeito, a s reformas, de u m m o d o geral, v i s a v a m o s preços
d a s m a t é r i a s - p r i m a s , b e n s de produção e o s preços por g r o s s o dos
b e n s de consumo, devendo o s preços ao c o n s u m i d o r m a n t e r - s e inalterados. A t e n d ê n c i a era, pois, n o s e n t i d o de que n a s r e c e i t a s orçam e n t a i s deveriam a u m e n t a r o s i m p o s t o s sobre lucros e diminuir o
i m p o s t o sobre o v o l u m e de v e n d a s . P o r outro lado, o n o v o s i s t e m a de
preços, l i g a d o a o capital quer por v i a dos « e n c a r g o s financeiros», quer
por v i a d a t a x a de lucro, deveria reduzir s u b s t a n c i a l m e n t e o n ú m e r o
de e m p r e s a s não-rendíveis e, por e s s a via, a l i g e i r a r o crescente v o l u m e
de s u b s í d i o s o r ç a m e n t a i s . A s r e f o r m a s de p r e ç o s s e g u n d o e s t e s n o v o s
m o l d e s e x i g i r i a m , como é óbvio, u m i m e n s o trabalho de «avaliação
do capital» d a s e m p r e s a s : só n a A l e m a n h a D e m o c r á t i c a «350 colectiv o s de trabalho participaram na elaboração dos n o v o s preços e foram
n e c e s s á r i o s 6000 e s p e c i a l i s t a s para recalcular o valor do capital das
empresas» ( ) . R e s t a a c r e s c e n t a r que e m a l g u n s p a í s e s (Hungria,
1 5 4
• B u l g á r i a , Checoslováquia, com «regressão» posterior n o s dois ú l t i m o s )
f o r a m introduzidos m e c a n i s m o s de flexibilidade de preços, permitindo
e m certa m e d i d a u m a adequação-preço à s v a r i a ç õ e s da procura. Volt a r e m o s ao a s s u n t o a o e s t u d a r o «modelo húngaro».
c) Maior incidência
do crédito
(reembolsável
e com juro) e menor do
Orçamento
no financiamento
dos investimentos.
D o m e s m o modo, encorajou-se m o d e r a d a m e n t e o a u t o f i n a n c i a m e n t o d a s e m p r e s a s .
d) Remodelação
profunda
do sistema
de incentivos.
N e s t e campo, foi
criado u m s i s t e m a e x t r e m a m e n t e complexo, variável de p a í s para país,
de «repartição de lucros» entre f u n d o s e m p r e s a r i a i s d e s t i n a d o s a preBRYSON [1975], p. 145. N e s t a referência encontra-se uma exposição bastante completa sobre a teoria e a prática das reformas de preços na RDA.
m i a r o s b o n s resultados da empresa. D e f o r m a geral, foram criados
t r ê s f u n d o s : fundo de e s t í m u l o m a t e r i a l (para g e s t o r e s , quadros e
t r a b a l h a d o r e s ) , fundo para aplicações sociais e f u n d o p a r a «investim e n t o descentralizado» ( a u t o - f i n a n c i a m e n t o ) . A s r e g r a s de repartição
eram, aliás, não só v a r i á v e i s de país para p a í s m a s t a m b é m entre sect o r e s e por v e z e s e m p r e s a s , e ainda s e g u n d o o nível de c u m p r i m e n t o
do plano. Q u a n t o a este ú l t i m o ponto, é i n t e r e s s a n t e n o t a r que a s norm a s de contribuição de lucros e x c e d e n t e s a o s planificados p a r a o
fundo de e s t í m u l o são m a i s d e s f a v o r á v e i s para a e m p r e s a do que n o
c a s o do lucro «normal»: com i s s o encora ja-se a p e n a s m o d e r a d a m e n t e
o sobre-cumprimento do Plano, de f o r m a a e v i t a r o s «erros» de inform a ç ã o sobre a s capacidades p r o d u t i v a s que, n o s i s t e m a anterior, c o m o
se viu, e r a m correntes.
e) Tendência
para uma maior autonomia
e simultaneamente
uma
maior,
concentração
empresarial.
J u n t a m o s e s t a s d u a s t e n d ê n c i a s , que na
prática s e traduziram por n u m e r o s a s f ó r m u l a s e experiências, porque,
de u m m o d o geral, a m a n u t e n ç ã o de u m plano central i m p e r a t i v o impôs que a atribuição de u m a m a i o r a u t o n o m i a e flexibilidade de g e s t ã o
f o s s e f e i t a não a m i l h a r e s de e m p r e s a s individualmente (com riscos
de u m a t o t a l perda de «controlo») m a s a «associações» ou «grupos»
de e m p r e s a s , criando-se u m a espécie de nível intermédio ao qual eram
concedidos certos poderes até e n t ã o do domínio dos m i n i s t é r i o s ou
e n t i d a d e s centrais. U n i õ e s industriais, o u a d m i n i s t r a t i v a s
(obyeãineniye)
na URSS, W E s (Vereinigung Volkseigener Betriebe) e
Kombinaten
n a R D A , W O G (Wielkie Organizacje Gospodarcz) ou
empresas-piloto n a Polónia, acordos de a s s o c i a ç õ e s e f u s õ e s n a Hung r i a ( ) — s ã o o u t r o s t a n t o s e x e m p l o s d e s t a tendência, que t e m sido
f r e q u e n t e m e n t e j u s t i f i c a d a por r a z õ e s de m a i s correcto t r a t a m e n t o
de u m a informação e m c o n s t a n t e multiplicação. U m a u t o r soviético
explica e s t a necessidade da s e g u i n t e f o r m a : «O n ú m e r o de l i g a ç õ e s
[ e c o n ó m i c a s ] cresce rapidamente com a e x p a n s ã o da produção e a
155
C ) Sobre este ponto v. LAVIGNE [1975], NOVE [1977] pp. 79-84 ( U R S S ) ,
pp. 303-304 ( R D A ) e pp. 304-306 (Polónia), D A R S K A [1975] (Polónia), MAZIARSKI
[1975] (Polónia). Para a Hungria especificamente daremos referências mais pormenorizadas na sequência deste ensaio. Matejko, referindo-se apenas à RDA, confirma
a tendência que acima apontámos: «Na Alemanha de Leste, p. ex., o Novo Sistema
Económico apresenta duas tendências simultâneas: uma consistindo em delegar certas
funções a escalões inferiores da hierarquia, e outra em criar empresas de maior dimensão e menos numerosas» (MATEJKO [1975], p. 98).
35
aceleração do p r o g r e s s o técnico-científico. F o i d e m o n s t r a d o que o
número de l i g a ç õ e s e c o n ó m i c a s a u m e n t a , m a n t e n d o - s e c o n s t a n t e s a s
r e s t a n t e s condições, pelo m e n o s n a razão do quadrado do f a c t o r de
a u m e n t o da produção. L o g o , u m a duplicação n a produção t o t a l corresponderia a u m a quadruplicação d a s l i g a ç õ e s e c o n ó m i c a s . [ I s t o ] conduz a u m a u m e n t o do n ú m e r o de n í v e i s a d m i n i s t r a t i v o s e da d i m e n s ã o
do aparelho de a d m i n i s t r a ç ã o - g e s t ã o ( . . . ) . A solução m a i s eficiente
é concentrar a produção, a u m e n t a r a dimensão das e m p r e s a s e reduzir
o seu número» ( ° ) . P a r a além do m a i o r ou m e n o r g r a u de a u t o n o m i a
d e s t e s «grupos», h o u v e m u i t a s e x p e r i ê n c i a s parcelares de u m a maior
liberdade de acção d a s e m p r e s a s (isto s e m n o s referirmos ao caso
h ú n g a r o , que adiante a b o r d a r e m o s ) , de que são bem c o n h e c i d a s a s
que n a U R S S se s e g u i r a m à s p r o p o s t a s de L i b e r m a n (fábricas de
confecções Bolshevichk
e Mayak, e m 1963, e m u i t a s o u t r a s n o s s e c t o r e s
t ê x t i l e do calçado, n o ano s e g u i n t e ) , e c e r t a s o u t r a s , c o n t r o v e r s a s ,
como a da fábrica de Shchekino, i g u a l m e n t e n a U R S S , e m 1 9 6 7 ( ) .
P a r a ter u m a ideia do ponto a que s e chegou, n e s t e s primeiros t e m p o s
«reformistas», no sentido de c o n s e g u i r rápidos a u m e n t o s de produtividade, b a s t a dizer que, n e s t e ú l t i m o caso, a concepção da experiência
era das m e n o s o r t o d o x a s e m m a t é r i a de «ideologia s o c i a l i s t a » : o Ministério da Indústria Química ( t r a t a v a - s e de u m g r a n d e
kombinat
químico) c o m p r o m e t i a - s e a m a n t e r o fundo de s a l á r i o s da e m p r e s a
e e s t e esforçar-se-ia por reduzir s u b s t a n c i a l m e n t e o e m p r e g o n u m
prazo de 4 anos, revertendo u m a proporção estabelecida dos salários
«economizados» e m benefício dos t r a b a l h a d o r e s não dispensados.
A experiência foi u m ê x i t o globalmente, na medida e m que foi possível
absorver o s t r a b a l h a d o r e s e x c e d e n t á r i o s e m projectos e m curso n a
m e s m a área, e foi s e g u i d a por o u t r a s e m p r e s a s ( ) , m a s não foi gene15
1 5 7
1 5 8
( J M ) Drogichinsky, cit. in NOVE [1977], p. 79.
( ) V. referências a estas experiências em LIBERMAN [1964], p. 116, NOVE
[1977], pp. 313-314 e DOBB [1966], pp. 379-381, para as primeiras; e em NOVE
[1977], p. 220 e EGNELL & PEISSIK [1974], pp. 144-148, para a segunda. Sobre esta
última existe um livro com uma descrição muito pormenorizada ( D E LAMOTTE [1973])
de que uma súmula com informação interessante é dada em TCHIMICHKIAN [1975j.
Refira-se ainda uma fonte soviética, J A L N I N E [1972] onde, para além de um conjunto de informações quantificadas sobre a experiência, se dá um panorama geral
com muito interesse sobre a problemática dos estimulantes materiais e os seus efeitos
na distribuição dos rendimentos na U R S S .
( ) Segundo J A L N I N E [1972], em 1972 estavam em curso experiências do
mesmo tipo em «121 empresas de diversos sectores, representando um total de 700 000
trabalhadores».
,5t
15S
ralizada por razões d i v e r s a s : apreensão dos trabalhadores e sindicatos, necessidade de condições f a v o r á v e i s para a s u a aplicação, e
sobretudo por representar u m a «lógica» s e n s i v e l m e n t e d i s t i n t a da
lógica global das reformas.
V i s t a s e m linhas g e r a i s a s g r a n d e s linhas de orientação das reform a s e c o n ó m i c a s é útil dedicar ainda a l g u m a s p a l a v r a s a o s s e u s r e s u l t a d o s
e m t e r m o s de modelo de « s i s t e m a económico». Começando pela conclusão
diremos que, à e x c e p ç ã o do c a s o húngaro, é p a t e n t e que a s r e f o r m a s contribuíram para m e l h o r a r m u i t a s das deficiências de f u n c i o n a m e n t o do
s i s t e m a , de que d e m o s a l g u n s exemplos, m a s não o alteraram no essencial,
nem sequer contribuíram s u b s t a n c i a l m e n t e para u m a m u d a n ç a de comp o r t a m e n t o dos directores de e m p r e s a s e t r a b a l h a d o r e s : quando m u i t o ,
dados o s n o v o s índices planificados, o s directores t i v e r a m de encontrar
n o v a s f o r m a s de c o n s e g u i r «cumprir o plano» da maneira m a i s «cómoda»,
a qual, t e n d o em conta o s próprios l i m i t e s d a s r e f o r m a s , dificilmente
coincidiria com a aspiração dos r e f o r m a d o r e s t e ó r i c o s no sentido de que,
s e m dar por isso e velando a p e n a s pelos s e u s próprios interesses, eles
deveriam e s t a r a prosseguir o s «interesses» do c o n j u n t o da economia
(o óptimo da e c o n o m i a de r e c u r s o s ) .
Quais f o r a m e n t ã o e s s e s limites, e porque n ã o s e foi m a i s l o n g e ?
Começando pela s e g u n d a questão, que é determinante, v e j a m o s brevem e n t e que a t i t u d e s face à s r e f o r m a s adoptaram o s v á r i o s «grupos sociais»,
ou «grupos de interesses». S e g u n d o o c o n s e n s o geral entre n u m e r o s o s
autores, o s principais opositores à s r e f o r m a s s i t u a r a m - s e entre a burocracia do aparelho do Partido e do E s t a d o , incluindo o s directores de
empresa, sobretudo o s m a i s v e l h o s , p r o v e n i e n t e s dos quadros do Partido,
para quem o P l a n o e r a algo de «sagrado», o seu c u m p r i m e n t o u m imperativo indiscutível e a obediência c e g a à s ordens v i n d a s «de cima» ( f o s s e m
elas a b s u r d a s ou i n c o n g r u e n t e s ) u m valor absoluto. Q u a n t o à burocracia,
compreende-se que v i s s e e m r e f o r m a s de s e n t i d o descentralizador u m a
a m e a ç a ao s e u poder, que lhe provinha j u s t a m e n t e da sua p o s i ç ã o de
controlo n o s i s t e m a . Sobre e s t e ponto, N o v e considera erróneo que, como
a l g u n s t e n d e m a fazer, s e d i g a que «o Partido» seria contra a s reformas,
o que de r e s t o t e r i a pouco sentido já que, s e a s s i m f o s s e , elas nunca se
t e r i a m realizado. « N o entanto», acrescenta, «os funcionários a t e m p o
inteiro do Partido, e s p e c i a l m e n t e a nível local m a s t a m b é m funcionários
do Comité Central, e x e r c e m poderes m u i t o consideráveis. E l e s n o m e i a m ,
demitem, a f e c t a m e r e a f e c t a m [ m e i o s e p e s s o a s ] , i n t e r f e r e m n o s a s s u n t o s
correntes, adjudicam. E l e s preferem n a t u r a l m e n t e que e s t e e s t a d o de
m
c o i s a s continue» ( ) . Q u a n t o à s e l i t e s d i r i g e n t e s do Partido, m a i s sensív e i s à s dificuldades e c o n ó m i c a s b e m c o m o a e v e n t u a i s r e p e r c u s s õ e s políticas, a s u a atitude foi variável s e g u n d o o s p a í s e s : m a i o r r e s i s t ê n c i a n a
P o l ó n i a e n a Checoslováquia (Gomulka, N o v o t n y ) , r e s i s t ê n c i a que pers i s t i u até hoje n a Roménia, e na Checoslováquia p ó s - 1 9 6 8 ; m a i s abertura
na U R S S , de início, na H u n g r i a , n a B u l g á r i a , e m e s m o n a R D A . H á que
sublinhar aqui a influência no desencadear das r e f o r m a s de u m a g e r a ç ã o
de «tecnocratas» dentro dos quadros do Partido, por v e z e s em posições
d i r i g e n t e s de alto nível — de que o caso m a i s conhecido é o próprio
Kossygin.
1 5 9
Quanto aos c a m p o n e s e s , eles ter-se-ão m a n t i d o indeferentes, até porque a s r e f o r m a s l h e s diziam r e l a t i v a m e n t e pouco respeito. Mais interess a n t e é a atitude dos t r a b a l h a d o r e s da indústria, d i r e c t a m e n t e v i s a d o s
pelas reformas. É g e r a l m e n t e a d m i t i d o que n ã o acolheram e n t u s i a s t i c a m e n t e a s r e f o r m a s : v i r a m n e l a s u m a potencial a m e a ç a à s e g u r a n ç a do
emprego, t e m e r a m a u m e n t o s de preços (recorde-se, e m particular, o s
a c o n t e c i m e n t o s que levaram à queda de Gomulka na P o l ó n i a e, m a i s
recentemente, o s que, no m e s m o país, o b r i g a r a m Gierek a u m recuo,
a m b o s o s c a s o s d i r e c t a m e n t e l i g a d o s a a u m e n t o s de p r e ç o s ) , e recearam
i g u a l m e n t e a abertura do leque salarial e m f a v o r dos quadros técnicos.
N ã o se pode, no entanto, dizer que s e t e n h a m o p o s t o f r o n t a l m e n t e à s
reformas — e n e m sequer o poderiam f a c i l m e n t e f a z e r p o i s a única
e s t r u t u r a organizada e m que s e i n t e g r a m , o s sindicatos, s e g u e e s t r i c t a m e n t e a linha do Partido.
E n f i m , poderá dizer-se que o s ú n i c o s s e c t o r e s v e r d a d e i r a m e n t e «reformadores», para além da j á referida burocracia t e c n o c r á t i c a — que foi de
f a c t o a d e c i s i v a — , t e r ã o s i d o o s m e i o s universitários, m u i t o s j o r n a l i s t a s ,
p r o f i s s õ e s liberais, e o s intelectuais, de u m a f o r m a geral. E t a m b é m foram
f r a n c a m e n t e f a v o r á v e i s à s r e f o r m a s m u i t o s directores de e m p r e s a s de
f o r m a ç ã o técnica, m a i s j o v e n s do que o s v e l h o s directores partidários
n o m e a d o s «por m é r i t o político».
P e r a n t e este panorama, é compreensível que, n a m a i o r i a dos países,
a s r e f o r m a s t e n h a m f i n a l m e n t e sido m u i t o m e n o s a m b i c i o s a s e m a i s
i n c o m p l e t a s do que o s t e ó r i c o s propunham. P a s s e m o s então b r e v e m e n t e
e m r e v i s t a o s l i m i t e s que o s próprios a u t o r e s d a s r e f o r m a s s e i m p u s e r a m ,
e que p e r m i t e m a conclusão de que o essencial do s i s t e m a se não alterou,
ainda que o s e u f u n c i o n a m e n t o t e n h a o b v i a m e n t e beneficiado. N o que s e
( ) NOVE [1977], p. 312.
,5>
s e g u e e x c l u í m o s o c a s o h ú n g a r o que, pela s u a especificidade, será t r a t a d o
e m seguida.
U m dos e l e m e n t o s n u c l e a r e s do s i s t e m a que s e m a n t e v e p r a t i c a m e n t e
s e m m o d i f i c a ç õ e s foi o c h a m a d o s i s t e m a de a b a s t e c i m e n t o t é c n i c o - m a t e rial, ou seja, a d e s i g n a ç ã o dos clientes e fornecedores p a r a cada empresa,
com q u a n t i d a d e s e preços f i x a d o s centralmente, quer para m a t é r i a s -primas e b e n s de capital, quer para o s d i v e r s o s inputs m a t e r i a i s e b e n s
fabricados. A m a n u t e n ç ã o deste s i s t e m a s i g n i f i c a claramente a conservação de u m i m e n s o poder de controlo central, de j o g o s de influência e de
pressão, dos circuitos paralelos já a n t e s mencionados, e s i g n i f i c a t a m b é m
que dificilmente s e poderá falar de u m a apreciável a u t o n o m i a de g e s t ã o
por parte das e m p r e s a s , ainda que n o quadro do Plano. Quando m u i t o ,
como t a m b é m j á v i m o s , terá h a v i d o u m a d e l e g a ç ã o ao nível das uniões,
t r u s t s o u k o m b i n a t s de certas decisões, e e m particular a s r e l a t i v a s a
n o v o s i n v e s t i m e n t o s c o n t i n u a r a m a s e r t o m a d a s centralmente, e n e m
poderia ser de outro modo, m a n t e n d o - s e o s i s t e m a centralizado de «afect a ç ã o de recursos» com base n o s b a l a n ç o s m a t e r i a i s . Mantiveram-se
i g u a l m e n t e a s dificuldades de coordenação de e m p r e e n d i m e n t o s a s e r
realizados sob a responsabilidade c o n j u n t a de v á r i o s d e p a r t a m e n t o s de
v á r i o s m i n i s t é r i o s . O que se alterou, m a i s s i g n i f i c a t i v a m e n t e n u n s p a í s e s
do que noutros, foi a f o r m a de f i n a n c i a m e n t o dos i n v e s t i m e n t o s , com
m a i o r a c e n t u a ç ã o do recurso ao crédito.
Outra q u e s t ã o v i t a l para o s r e f o r m a d o r e s m a i s e x i g e n t e s , m u i t o
ligada à anterior, diz n a t u r a l m e n t e respeito ao s i s t e m a de preços. A s ref o r m a s de preços fizeram-se n u m s e n t i d o m u i t o p r a g m á t i c o , e o s n o v o s
preços f o r a m e m boa parte «preços de s a n e a m e n t o » , no s e n t i d o e m que
libertaram o o r ç a m e n t o de u m a enorme c a r g a de «subsídios» para cobrir
prejuízos de e m p r e s a s , planificados o u não, além de que, n a s condições
anteriores, o n o v o papel e s t i m u l a n t e que se pretendeu atribuir ao lucro
n ã o teria o n e c e s s á r i o suporte — a possibilidade de obter u m lucro. N o ent a n t o , a própria b a s e empírica e m que a s s e n t a r a m o s n o v o s preços, por
e x e m p l o com t a x a s de lucro v a r i á v e i s de s e c t o r para sector, e bem a s s i m
a própria e x p e c t a t i v a q u a n t o ao c o m p o r t a m e n t o d a s e m p r e s a s f a c e a o s
n o v o s e s t í m u l o s , criou u m a a m e a ç a «insuportável» à estabilidade das
r e c e i t a s o r ç a m e n t a i s . S e g u n d o M. L a v i g n e , a l ó g i c a do n o v o s i s t e m a implicava que a s e m p r e s a s c o n s t i t u í s s e m o s s e u s f u n d o s de e s t í m u l o a partir do
lucro e s ó em seguida o o r ç a m e n t o receberia o saldo. M a s e n t ã o «o orçam e n t o do E s t a d o teria de a s s u m i r os r i s c o s da variabilidade e insuficiên-
cia de lucros» ( ° ) . D a í que se t e n h a m i m a g i n a d o m e c a n i s m o s
estabilizadores d a s r e c e i t a s o r ç a m e n t a i s ( p a g a m e n t o s a o o r ç a m e n t o f e i t o s a nível
de uniões, c o m m e c a n i s m o s p r e v i s t o s de «desdobramento» de e v e n t u a i s
prejuízos a nível d a s e m p r e s a s que d e l a s f a z e m p a r t e ; criação de «fundos
de regularização dos f u n d o s de e s t í m u l o » ; e t c ) , e com isso moderado
ou m e s m o anulado o efeito e s t i m u l a n t e d e s e j a d o : «o espírito do s i s t e m a
é c l a r o : h á que g a r a n t i r o i n t e r e s s a m e n t o m a t e r i a l da empresa, s e m que
p o s s a s e r e x c e s s i v o » ( ) . A m e s m a a u t o r a nota, aliás, que, n a ausência
de u m a u t ê n t i c o «espírito de e m p r e s a » no s e n t i d o capitalista, de que faz
parte i n t e g r a n t e a a u t o n o m i a de i n v e s t i m e n t o e a plena disposição do
lucro, a «motivação
do lucro resumir-se-á, para o director como para qualquer operário, a o desejo de a u m e n t a r o s [ s e u s ] r e n d i m e n t o s para a u m e n t a r
o c o n s u m o . M a s c o m o e s t e , por s u a vez, e s t á limitado, quer p e l a oferta,
quer pela lei (...) o i n c i t a m e n t o a o a u m e n t o d o s r e n d i m e n t o s está, ele-mesmo, limitado. ( . . . ) U m director de e m p r e s a nã.o t e m m u i t o a g a n h a r
se quiser t o m a r riscos — i n o v a r , diversificar a p r o d u ç ã o — e t e m m u i t o
a perder, m u i t o m a i s do que d i n h e i r o : a função, a p o s i ç ã o social que
implica. O lucro não é p o i s u m i n s t r u m e n t o eficaz para o l e v a r a agir
no sentido do i n t e r e s s e colectivo, além de s e r u m i n s t r u m e n t o ideologic a m e n t e c o n t e s t á v e l [ n u m s i s t e m a socialista, é claro — J M P ] » ( ) .
16
1 0 1
1 6 2
E n f i m , u m terceiro e ú l t i m o aspecto, c o m p l e m e n t a r dos dois a n t e riores, aquele que m a i s d i r e c t a m e n t e s u p o r t a o s c o m p o r t a m e n t o s «aberrantes» dos directores de e m p r e s a s . O n o v o c o n j u n t o de o b j e c t i v o s
planificados o u «indicadores de s u c e s s o » i m p o s t o s à s e m p r e s a s , ainda que
e m n ú m e r o b a s t a n t e m a i s reduzido, constitui u m apertado espartilho
— e s p a r t i l h o e s s e que, é certo, l h e s permite m o v e r - s e de f o r m a m a i s
«racional»: por e x e m p l o deixou de lhes s e r indiferente a a c u m u l a ç ã o de
«invendidos» — que o s obriga a f r e q u e n t e s a c ç õ e s s e m i - l e g a i s (ou m e s m o
ilegais) para c o n s e g u i r o c u m p r i m e n t o do P l a n o : m a n t ê m - s e o s m e r c a d o s
paralelos, classificam-se t r a b a l h a d o r e s e m c a t e g o r i a s superiores à s r e a i s
para ludibriar o controlo sobre o «fundo de salários», fazem-se a l t e r a ç õ e s
fictícias e m p r o d u t o s para obter preços m a i s altos, continua a escolher-se
(dentro de l i m i t e s m a i s e s t r e i t o s ) a g a m a de produção que p e r m i t a a t i n g i r
m a i s f a c i l m e n t e o s n o v o s indicadores, e t c , e t c D e resto, ainda que de
f o r m a geral, como s e viu, a m o t i v a ç ã o do lucro n ã o t e n h a resultado como
previsto, t a m b é m c o n v é m a s s i n a l a r que, sobretudo na f a s e inicial m a i s
("") LAVIGNE [1975], p. 44.
( ) Id., p. 46.
( ) Id., pp. 48-49.
161
,6:
«liberalizante» da reforma n a l g u n s p a í s e s ( e m particular: Polónia, H u n g r i a ) , se verificaram práticas de carácter «monopolista», e m particular
a nível de g r a n d e s e m p r e s a s ou «uniões», que i m p u s e r a m a adopção de
legislação contra «lucros ilícitos», o b t i d o s por v i a da manipulação de
preços.
N ã o é de estranhar, em conclusão, que a p a r t i r de 1971-73, conforme
o s países, s e t e n h a v i n d o a e f e c t u a r u m certo r e t r o c e s s o na aplicação das
reformas, r e a p r o x i m a n d o o s i s t e m a do modelo centralizador, ainda que
corrigidas m u i t a s a n o m a l i a s de pormenor. O f a c t o é que, perante o s prob l e m a s n o v o s decorrentes da introdução d a s m e d i d a s r e f o r m i s t a s , o
sentido geral d a s a c ç õ e s t o m a d a s foi o de efectuar correcções por v i a
a d m i n i s t r a t i v a — e i s s o é parte essencial da lógica do s i s t e m a de planificação central.
5. R e s t a enfim e x a m i n a r aquilo que hoje é corrente d e s i g n a r como
«socialismo de mercado», m o d e l o com c a r a c t e r í s t i c a s próprias que o
identificam e diferenciam claramente dos m o d e l o s «capitalista» e «de
planificação central». E m b o r a m u i t o s a u t o r e s incluam n e s t e modelo quer
o « s i s t e m a j u g o s l a v o » de a u t o g e s t ã o , quer o « s i s t e m a húngaro», e indep e n d e n t e m e n t e do i n t e r e s s e m u i t o particular que teria u m a cuidadosa
análise do primeiro, pela n o s s a parte e s c o l h e m o s e x a m i n a r a p e n a s o
s e g u n d o , por se t r a t a r de u m e x e m p l o t e o r i c a m e n t e m u i t o m a i s consist e n t e , e p r a t i c a m e n t e m u i t o m a i s «controlado» e eficiente — n o sentido
económico, c o n t r o v e r s o m a s preciso, de « e f i c i ê n c i a » — . B a s t a r i a c o n s t a t a r
que, a p ó s m a i s de 30 anos, o s i s t e m a j u g o s l a v o não c o n s e g u i u resolver
o problema d o d e s e m p r e g o e da e m i g r a ç ã o e m m a s s a , para desde logo
n o s i n t e r r o g a r m o s sobre a s v i r t u d e s de tal «socialismo».
Que especial configuração t i v e r a m e n t ã o a s r e f o r m a s h ú n g a r a s que
nos p o s s a m hoje levar a f a l a r de u m terceiro modelo de « s i s t e m a económico» (obviamente, no que s e refere a e c o n o m i a s i n d u s t r i a l i z a d a s : não
q u e r e m o s entrar no c a m p o da «antropologia e c o n ó m i c a » ) ?
A n t e s de enunciar a s c a r a c t e r í s t i c a s f u n d a m e n t a i s da reforma h ú n gara, é importante referir que a H u n g r i a foi o único país e m que se procedeu a u m a r e f o r m a «em bloco»: e m 1 de Janeiro de 1968 entrou em
f u n c i o n a m e n t o aquilo a que desde e n t ã o se p a s s o u a chamar, talvez por
inspiração da N E P de Lenine, o N o v o M e c a n i s m o E c o n ó m i c o ( N M E ) ( ) .
1 G 3
( ) U m a observação curiosa: «Na terminologia utilizada pelos economistas
húngaros o adjectivo "económico" (instrumentos ou meios económicos, reguladores
económicos, cálculo económico) corresponde na realidade aos adjectivos "monetário"
Jes
E e s t e englobava n ã o s ó a r e f o r m a do s i s t e m a de preços (que foi feita,
m a i s tarde o u m a i s cedo, t a m b é m n o s o u t r o s p a í s e s , a i n d a que n e s t e s
m u i t o m e n o s a m b i c i o s a — e x c e p t o talvez n a R D A ) , m a s u m a reforma de
t o d o o s i s t e m a «de relações das e m p r e s a s com a e c o n o m i a nacional». E s t a
e x p r e s s ã o , fomo-la buscar à c i t a ç ã o de L i b e r m a n que f i z e m o s a c i m a
(v. p. 1 6 9 ) , para a s s i n a l a r que, e x c e p t o n o c a s o h ú n g a r o (e n a Checoslov á q u i a p r é - 1 9 6 8 ) , aquilo que s e fez f o r a m , n o essencial, r e f o r m a s dos
índices, a s s o c i a d a s a u m a j u s t a m e n t o geral d o s preços por g r o s s o .
Ê t a m b é m útil desde já, ainda que à c u s t a de u m a l o n g a citação,
darmo-nos c o n t a da concepção teórica do N M E , e de como o s s e u s promot o r e s pretenderam opor u m a n o v a l ó g i c a à lógica da «planificação central».
Diz C s i k ó s - N a g y : «O s i s t e m a h ú n g a r o de controlo e c o n ó m i c o apoia-se na
hipótese
dual s e g u n d o a qual, por u m lado, n ã o pode h a v e r desenvolvim e n t o económico orientado s e m planificação g o v e r n a m e n t a l e controlo
planificado, e, por outro, n ã o é concebível u m a organização económica
racional s e m o f u n c i o n a m e n t o e a função verificadora do m e c a n i s m o do
mercado. F o i no interesse de u m c o m p o r t a m e n t o racional da e m p r e s a
que r e s t a u r á m o s a unidade dos p r o c e s s o s de produção e venda, anteriorm e n t e c o r t a d o s u m do outro, que a u m e n t á m o s a a u t o n o m i a da e m p r e s a
e colocámos a actividade da e m p r e s a na base do i n t e r e s s e n o s lucros, na
t o m a d a de riscos e na responsabilidade. A s e m p r e s a s são c r e s c e n t e m e n t e
o r i e n t a d a s por j u l g a m e n t o s de valor m e r c a n t i s [market
value
judgements]»( ).
E m a i s a d i a n t e : «A l ó g i c a da regulação planificada do mercado difere radicalmente da do m e c a n i s m o de i n s t r u ç õ e s planificadas.
Sob o mecanismo
caracterizado
por instruções
do Plano, o processo de
realização e s t á separado do processo de p r o d u ç ã o : o E s t a d o prescreve o
volume de produção e t a m b é m a s s u m e o risco de produzir; a realização
e s t á deste m o d o a s s e g u r a d a para a e m p r e s a . O que é produzido c o m o v a l o r
de uso, pode s e r contabilizado c o m o resultado da produção a preços contabilísticos, m e s m o que parte dos produtos n ã o p o s s a s e r realizada [i. e.
v e n d i d a — J M P ] , o u n ã o o p o s s a a o s preços oficiais. A s s i m , o e l e m e n t o
c o n s t a n t e para a e m p r e s a é a segurança
de realização.
Como a s condições
de m e r c a d o v a r i a m , e m regra, o E s t a d o neutraliza e s s a s v a r i a ç õ e s m u dando c o n t i n u a m e n t e o s r e g u l a d o r e s financeiros. I s t o é c o n s e g u i d o por
1<i4
ou "financeiro". Este desvio semântico parece reflectir a preocupação dos teóricos em
evitar pôr demasiado em foco as categorias mercantis» (CHEVALIER [1948]-2,
p. 37). U m a das poucas excepções a esta regra é o economista L. Faluvégi, que utiliza
correntemente a expressão «reguladores financeiros» (v. F A L U V E G I [1974] e [1976]).
( ) CSIKOS-NAGY [1970], p. 162.
,S4
m e i o de adequado p l a n e a m e n t o financeiro, colectando o s lucros originados n a s e m p r e s a s e cobrindo a s perdas por v i a orçamental. A lógica da
regulação
planificada
do mercado é precisamente
a oposta: aqui o s proc e s s o s de produção e realização são s i n t e t i z a d o s n u m processo de produção uniforme. O r i s c o das decisões e c o n ó m i c a s é dividido entre o E s t a d o
e a s e m p r e s a s de acordo com a divisão de c o m p e t ê n c i a s . S e g u e - s e que,
como regra, o s e f e i t o s de a l t e r a ç õ e s n a s condições de m e r c a d o sobre a
e m p r e s a não podem s e r neutralizados. O m e c a n i s m o de m e r c a d o t e m de
actuar como u m a s a n ç ã o [positiva ou n e g a t i v a , e m inglês check — J M P ]
da actividade da e m p r e s a » O ) . O problema situa-se f i n a l m e n t e naquela
«divisão de c o m p e t ê n c i a s » ; ou s e j a n a criação de u m s i s t e m a de relações
entre E s t a d o e e m p r e s a s que p e r m i t a a e s t a s u m a l a r g a m a r g e m de
decisão independente, por r e a c ç ã o ao mercado, tal que se verifique o verdadeiro o b j e c t i v o : «Sob condições adequadas, a m o t i v a ç ã o do lucro e s t a belece u m a h a r m o n i a entre o s i n t e r e s s e s sociais, da e m p r e s a e individuais,
mobiliza e e s t i m u l a a s e n e r g i a s da e m p r e s a e individuais n o s e n t i d o dos
i n t e r e s s e s sociais» ( ° ) . S ã o p r e c i s a m e n t e e s s a s condições adequadas
que
o N M E s e propõe estabelecer. V e j a m o s como.
05
10
P o d e r e m o s considerar como a s p e c t o s centrais da r e f o r m a h ú n g a r a
os seguintes cinco:
1) F i m do s i s t e m a de a b a s t e c i m e n t o técnico-material.
2) Liberalização d a s decisões de i n v e s t i m e n t o .
3) R e f o r m a geral do s i s t e m a de preços, com u m a importante zona de
«preços livres» e u m cálculo dos preços a d m i n i s t r a t i v o s (fixos)
s e g u n d o u m a fórmula dita «a dois canais».
4) P l a n o central a p e n a s parcialmente imperativo. N o restante, «plano-orientador» não desdobrado e m planos atribuídos à s empresas,
com regulação por «incentivos indirectos».
5) Redefinição da posição da H u n g r i a n a «divisão internacional do
trabalho», inclusive com o s p a í s e s c a p i t a l i s t a s .
E m b o r a i n t i m a m e n t e ligados, e relevando t o d o s de u m a m e s m a lógica, e x a m i n a r e m o s e s t e s p o n t o s u m por u m .
( ) CSIKÓS-NAGY [1970], pp. 164-165.
FALUVEGI [1976]), p. 20.
105
V i m o s o papel decisivo que d e s e m p e n h a v a , e continuou a desempenhar, n o s i s t e m a de planificação central, o f a m o s o Mattekhsnab
ou s i s t e m a centralizado de a p r o v i s i o n a m e n t o técnico-material, pelo qual cada
e m p r e s a s e vê d e s i g n a r o s s e u s fornecedores e clientes, com q u a n t i d a d e s
e preços f i x a d o s . Tal s i s t e m a foi s i m p l e s m e n t e abolido na H u n g r i a pela
reforma de 1 9 6 8 : u m a s p e c t o importante «da a u t o n o m i a das e m p r e s a s
decorre do f a c t o de que o princípio da a f e c t a ç ã o a u t o m á t i c a dos b e n s de
produção [e t a m b é m de destino dos produtos — J M P ] e m função d a s
n o r m a s do P l a n o foi suprimido e s u b s t i t u í d o por m e c a n i s m o s de t r o c a s
comerciais entre a s e m p r e s a s , f u n d a d a s sobre relações m e r c a n t i s directas
e, e m geral, livres. S e g u e - s e que a s e m p r e s a s s ã o livres de escolher o s
s e u s fornecedores e de vender d i r e c t a m e n t e a s u a produção à s e m p r e s a s
utilizadoras ou de a e x p o r t a r por intermédio de e m p r e s a s especializadas
no c o m é r c i o e x t e r n o ( c e r t a s e m p r e s a s e s t ã o m e s m o a u t o r i z a d a s a comerciar directamente com o exterior) » ( ) . P a r a s e t e r u m a ideia do p o n t o
a que s e pode f a l a r de abolição, b a s t a r á referir que a reforma de 1968
a p e n a s m a n t e v e a a f e c t a ç ã o central de 2 produtos ( u m dos quais a c a r n e ) ,
embora, para c e r t o s produtos ou m a t é r i a s - p r i m a s b á s i c a s , e m n ú m e r o
reduzido, se t e n h a m f i x a d o «quotas de aquisição» o u d e s i g n a d o u m fornecedor e x c l u s i v o ( ) .
1 6 7
1 6 8
N o que r e s p e i t a à s decisões de i n v e s t i m e n t o , foi intenção dos reform a d o r e s t r a n s f e r i r g r a d u a l m e n t e para a s e m p r e s a s u m a parte considerável d e s s a capacidade de decisão, que s e pode desdobrar e m pelo m e n o s
dois a s p e c t o s e s s e n c i a i s . Com efeito, decidir sobre u m i n v e s t i m e n t o implica u m a escolha quanto a o projecto
c o n c r e t o e u m a capacidade para o
financiar.
N o que respeita ao primeiro ponto, v e r e m o s de s e g u i d a que o s
planos empresariais, e e m particular o s planos de i n v e s t i m e n t o s , d e i x a r a m
de ser o r e s u l t a d o de u m a s i m p l e s d e s a g r e g a ç ã o do plano central e, n e s s a s
condições, e x c l u í d o s o s g r a n d e s projectos de «vocação» central e o s que
implicam a criação de n o v a s u n i d a d e s / e m p r e s a s , a s e m p r e s a s p a s s a r a m
a ser livres de decidir que projectos l h e s i n t e r e s s a e x e c u t a r , os quais em
princípio,
dentro da l ó g i c a do n o v o s i s t e m a , deverão s e r os que proporcionem u m a m a i o r rendibilidade. J á quanto à s e g u n d a questão, a do financiam e n t o , o s i s t e m a é n e c e s s a r i a m e n t e m a i s r e s t r i t i v o m a s , t a m b é m em
princípio, não o será f i n a l m e n t e m u i t o m a i s que n u m a e c o n o m i a de mer-
P ) CHEVALIER [1978]-2, p. 36.
( ) CSIKOS-NAGY [1976], pp. 42-44. Este artigo contém um quadro em que
se mostra como o número de produtos (ou grupos de produtos) sujeitos a regulação
central evoluiu de 1968 a 1976.
01
les
cado com u m a banca f o r t e m e n t e concentrada e u m s e c t o r público poder o s o e interveniente. D e facto, a criação de u m «fundo de d e s e n v o l v i m e n t o
da produção» a partir do lucro, a nível das e m p r e s a s , e bem a s s i m a s u a
liberdade contratual (que l h e s permite e m m u i t o s c a s o s estabelecer ou
acordar preços de venda, e, por exemplo, decidir exportar, com elevados
benefícios, n u m a s i t u a ç ã o de inflação m u n d i a l ) , dá à s e m p r e s a s u m a
importante capacidade de a u t o f i n a n c i a m e n t o . P o r outro lado, s e é certo
que o recurso — i n c e n t i v a d o p e l a s r e f o r m a s — a o crédito bancário pode
ser (e crê-se que t e m sido) u m m e i o de controlo e de orientação por parte
do E s t a d o no que t o c a à natureza d o s i n v e s t i m e n t o s a realizar, n ã o é m e n o s certo que o critério de apreciação dos pedidos de crédito, dentro da
lógica do s i s t e m a , é, ainda aqui, o da rendibilidade esperada. E n f i m , subs i s t e quase s e m p r e u m recurso m a r g i n a l a s u b v e n ç õ e s do E s t a d o que,
embora p o s s a m ser e m reduzida p e r c e n t a g e m do i n v e s t i m e n t o , n e m por
i s s o deixarão de constituir u m m e i o adicional de controlo e eventual
d i s s u a s ã o . Se s e a d m i t i s s e que, e m t o d o e s t e esquema, n ã o s u b s i s t i a m
v e s t í g i o s de p r e s s õ e s a d m i n i s t r a t i v a s ou de relações de «poder», não h á
razão para não reconhecer que ele poderia ser p e r f e i t a m e n t e conforme
com a teoria do «mercado regulado».
P a r a dar u m a ideia das p e r s p e c t i v a s iniciais da reforma, b a s t a
referir que «em 1967, o s a u t o r e s d a s r e f o r m a s a entrar e m v i g o r no ano
s e g u i n t e p e n s a v a m que a proporção dos i n v e s t i m e n t o s p r o d u t i v o s decididos e f i n a n c i a d o s c e n t r a l m e n t e cairia a cerca de 35 % e m 1976. Se se
considerasse, n ã o o v o l u m e d o s - i n v e s t i m e n t o s produtivos, m a s o número
de projectos de i n v e s t i m e n t o , eram a p e n a s 10 % das decisões que deviam
m a n t e r - s e centralizadas [dado o m a i o r v a l o r unitário dos i n v e s t i m e n t o s
centralizados — J M P ] » ( ) .
1 6 9
C h e g a m o s a g o r a ao e l e m e n t o nuclear da reforma, o u seja, o n o v o
s i s t e m a de preços. É evidente que n u m s i s t e m a e m que o critério básico
d a s decisões e c o n ó m i c a s das e m p r e s a s é o lucro, o s i s t e m a de preços
é u m e l e m e n t o determinante da «afectação de recursos», pois é e m função
deles que s ã o e f e c t u a d o s o s cálculos r e l a t i v o s à g e s t ã o e ao i n v e s t i m e n t o .
Como já v i m o s , o debate sobre o papel dos preços e o s e u «conteúdo inform a t i v o » foi j u s t a m e n t e u m dos «pontos quentes» do debate geral sobre
a s r e f o r m a s a introduzir n o s i s t e m a de planificação central. F o i nele que
s e confrontaram, e que de a l g u m m o d o se procuraram articular, o s conc e i t o s da t e o r i a m a r x i s t a do valor (valor-trabalho, preços de produção,
( ) CHEVALIER [1978]-2, p. 71, nota 38.
169
valor s o c i a l m e n t e n e c e s s á r i o ) e o s conceitos d a «teoria económica ocidental» (preços óptimos, preços m a r g i n a i s , c u s t o s de o p o r t u n i d a d e ) . 'Na realidade, adoptada a c a t e g o r i a «lucro» (ou «rendimento social líquido»)
como aferidor de eficiência e c o m p o n e n t e dos preços, a d i s c u s s ã o centrou-se sobre a q u e s t ã o s e g u i n t e : na f o r m a ç ã o dos preços, qual a base e m
que devia a s s e n t a r a d e t e r m i n a ç ã o do lucro? A f r o n t a r a m - s e sobretudo
3 t e s e s : o lucro deveria ser u m a p e r c e n t a g e m dos c u s t o s salariais (preços
da f o r m a «valor» de M a r x ) ; o lucro deveria ser proporcional aos a c t i v o s
f i x o s e circulantes («preços de produção» de M a r x ) ; o lucro deveria ser
proporcional aos c u s t o s de produção. N a prática, a s s o l u ç õ e s a d o p t a d a s
n o s d i v e r s o s p a í s e s não f o r a m c o m u n s , m a s relevaram m u i t o m a i s do
p r a g m a t i s m o do que de u m a «racionalidade» definida u m a vez por t o d a s ,
«racionalidade» e s s a que era a defendida p e l o s e c o n o m i s t a s m a t e m á t i c o s
m a i s radicais, para quem o s i s t e m a de preços que pudesse fundar decis õ e s «óptimas» n o plano da a f e c t a ç ã o de recursos só poderia r e s u l t a r de
u m a p r o g r a m a ç ã o m a t e m á t i c a — e r e s t a v a ainda o problema da articulação entre o s «preços óptimos» para e f e i t o s de cálculo e o s i s t e m a
real de preços (e s a l á r i o s ) .
N o caso h ú n g a r o adoptou-se u m s i s t e m a de preços que combinava
o s dois primeiros t i p o s a c i m a i n d i c a d o s : a o s c u s t o s de produção adicionava-se u m a « t a x a sobre o capital» ( 5 % do valor bruto do activo f i x o
e sobre o v a l o r m é d i o do activo c i r c u l a n t e ) , e u m a « t a x a sobre o s salários» (25 %, repartida e m 17 % para o fundo do s e g u r o social e 8 % de
t a x a sobre o s s a l á r i o s propriamente d i t a ) . E s t e s i s t e m a é conhecido como
« s i s t e m a de preços a dois canais» e, como v e r e m o s , p e r m i t e u m a grande
flexibilidade. D e qualquer modo, ainda n e s t e caso, «os cálculos que serv i r a m de base a e s t a s t a x a s f o r a m a p r o x i m a d o s e r u d i m e n t a r e s e m m u i t o s
aspectos» ( ° ) . M a s e s t a q u e s t ã o diz n a t u r a l m e n t e respeito ao conjunto
de preços que continuou a ser f i x a d o centralmente. D e f a c t o , a reforma
h ú n g a r a introduziu dois o u t r o s t i p o s de p r e ç o s : preços l i m i t a d o s e preços
livres. A primeira d e s t a s c a t e g o r i a s s u b s i s t i u pouco t e m p o , j á que o s
preços nela incluídos r a p i d a m e n t e se f i x a r a m no limite m á x i m o estipulado
e p a s s a r a m p r a t i c a m e n t e a funcionar como preços f i x o s . Q u a n t o a o s preç o s livres, a g a m a de p r o d u t o s abrangida foi m u i t o ampla, n o que s e refere
a o s «preços ao produtor», e m u i t o m a i s e s t r e i t a no r e s p e i t a n t e aos «preços
17
(>">) A S S E L A I N & BONCOEUR [1978], p. 152.
ao consumidor» ( ) . R e s t a dizer que, m e s m o no caso dos preços livres,
o P l a n o central f i x a o s l i m i t e s m á x i m o s do a u m e n t o m é d i o dos preços
l i v r e s : é dentro d e s t a média que, por c o n c e r t a ç ã o entre a s e m p r e s a s e o s
m i n i s t é r i o s , s e s i t u a a m a r g e m de flexibilidade.
A i n d a q u a n t o ao s i s t e m a de preços, h á que f o c a r u m a outra preocupação central dos reformadores h ú n g a r o s , que se compreende pela
importância do comércio e x t e r n o no produto nacional (aquele representa
e m m é d i a 50 % do P N B h ú n g a r o ) : a articulação do s i s t e m a de preços
interno com o s preços internacionais. A resolução do Partido Socialista
Operário H ú n g a r o de 7 de Maio de 1966, o verdadeiro ponto de partida
das reformas, e s t i p u l a v a : «O n o v o m e c a n i s m o deverá estabelecer e s t r e i t a s
relações entre o s m e r c a d o s interno e externo. E l e deve fazer com que
a u m e n t e a influência dos m e r c a d o s e x t e r n o s sobre a produção e o s cons u m o s nacionais» ( ) . E e m 1975, já sob o s e f e i t o s da crise ocidental, o
X I C o n g r e s s o a f i r m a v a : « A s a l t e r a ç õ e s duráveis de preços do m e r c a d o
mundial devem repercutir-se n a m e d i d a e c o n o m i c a m e n t e n e c e s s á r i a sobre
o s preços internos à produção de m o d o a m e l h o r a r a eficiência económica» ( ) . N a realidade, a reforma, n e s t e campo, foi r e l a t i v a m e n t e prudente, limitando-se a introduzir, para a s operações com o exterior, o s
c h a m a d o s «multiplicadores de comércio e x t e r n o » , que correspondem de
f a c t o a u m a t a x a de câmbio «desvalorizada», t e n d e n t e a f o m e n t a r a s
e x p o r t a ç õ e s . Mas, de u m m o d o geral, no t o c a n t e à s importações, a indústria m a n t e v e - s e l a r g a m e n t e protegida, suportando o E s t a d o o s diferenciais
de preços internos e e x t e r n o s , a i n d a que o m e c a n i s m o de protecção f o s s e
variável s e g u n d o os s e c t o r e s e o s bens a importar. A s i t u a ç ã o alterou-se
profundamente, como v e r e m o s , a p ó s a crise de 1973. M a s e s t e é u m
a s s u n t o de p e r m a n e n t e debate, m u i t o s e c o n o m i s t a s considerando que o
objectivo a a t i n g i r é a livre convertibilidade do / o r m í ( ) . P a r a dar u m a
1 7 1
1 7 2
1 7 3
1 7 4
("') E m 1974, 34 % do volume da produção industrial obedecia a preços fixos,
64 % tinha preços livres e subsistia 2 % com preços limitados. Inversamente, para
os preços ao consumidor, 65 % do volume de vendas tinha preço fixo e 35 % preço
livre. O objectivo inicial da reforma era atingir em 1975 uma liberalização a 50 %
dos preços ao consumidor, o que não foi atingido (CHEVALIER [1978], pp. 53 e 55).
( -) CHEVALIER [1978], p. 58.
( ) Id., id.
("*) Por ex.: «Num estado ulterior de desenvolvimento, aumentarão os esforços
para atingir a convertibilidade» (TIMÂR [1973], p. 289); «Temos de nos concentrar
no reforço dos factores que favoreçam a convertibilidade» (CSIKOS-NAGY [1970],
p. 168). Estes dois autores são: o primeiro, J. Timár, Governador do Banco Central
da Hungria; o segundo Csikós-Nagy, presidente do Gabinete húngaro das matérias e
dos preços.
17
m
ideia do ponto a que m u i t o s deles s e a p r o x i m a m das t e s e s o c i d e n t a i s sobre
o efeito «racionalizador» de u m a e c o n o m i a t o t a l m e n t e aberta ao m e r c a d o
mundial, b a s t a a s e g u i n t e c i t a ç ã o : «Contudo, para u m a e c o n o m i a aberta
como a húngara, p o d e m o s r e a l i s t i c a m e n t e l e v a n t a r a q u e s t ã o : como e v o luiria a e s t r u t u r a de inputs de u m produto, s e c t o r ou ramo, o que aconteceria à s u a rendibilidade se, e m l u g a r de preços f o r t e m e n t e autárquicos,
o s diferentes recursos f o s s e m a v a l i a d o s com base n o s p r e ç o s de u m dado
mercado e x t e r n o ? U m tal cálculo alteraria só por si a produção, a estrutura de inputs, a rendibilidade, a produtividade para u m dado a n o ? » ( ) .
E o a u t o r conclui que u m tal cálculo, a s e r e m o s s e u s e f e i t o s «reconhecidos» p e l o s g e s t o r e s económicos, «proporcionaria u m i n c e n t i v o indirecto
para a m u d a n ç a no plano material, t e c n o l ó g i c o , do input ( . . . ) , [além de
que] t a m b é m a f e c t a r i a a política de i n v e s t i m e n t o , inspirando u m a n o v a
a f e c t a ç ã o de capital f i x o e trabalho» ( ) .
1 7 5
1 , e
O quarto a s p e c t o c a r a c t e r í s t i c o das r e f o r m a s foi o n o v o papel atribuído ao P l a n o central e o d i s p o s i t i v o «indirecto» p o s t o e m prática n o
sentido de l e v a r a s e m p r e s a s , d o t a d a s de m a i o r autonomia, a não se a f a s t a r e m dos o b j e c t i v o s planificados. «A função de orientação geral do P l a n o
é não só essencial m a s e x c l u s i v a : c o m o o e n u n c i a m o s a u t o r e s h ú n g a r o s ,
o plano é o regulador
da macrostrutura
e o mercado o da
microstrutura,
o que significa que d e i x o u de h a v e r índices i m p e r a t i v o s para a empresa,
que e s t a elabora o s e u plano e m t o t a l a u t o n o m i a » ( ) . S e g u n d o outro
a u t o r : «A principal característica do s i s t e m a h ú n g a r o de planificação,
que o distingue f u n d a m e n t a l m e n t e dos que v i g o r a m n o s o u t r o s p a í s e s do
C A E M é que o s planos d a s e m p r e s a s n ã o r e s u l t a m de u m a "desintegração"
[éclatement]
do plano nacional. O plano de E s t a d o e o s planos das e m p r e s a s s ã o elaborados de f o r m a coordenada m a s a s e m p r e s a s preparam
o s s e u s planos de m o d o r e l a t i v a m e n t e a u t ó n o m o no s e n t i d o e m que não
s ã o o b r i g a d a s a t e r e m conta s e n ã o a s decisões g o v e r n a m e n t a i s que direct a m e n t e lhes dizem respeito (por ex. a realização de u m i n v e s t i m e n t o
i m p o r t a n t e ) e, n a t u r a l m e n t e , o conjunto dos r e g u l a d o r e s económicos» ( ) .
D e n o t a r que u m a das obrigações i m p o s t a s c e n t r a l m e n t e à s e m p r e s a s é
o c u m p r i m e n t o de acordos c o m e r c i a i s com o s o u t r o s p a í s e s do C A E M
( n o m e a d a m e n t e a s e x p o r t a ç õ e s para e s s e s p a í s e s ) , n o que d i r e c t a m e n t e
l h e s diga respeito.
1 7 7
1 7 8
GLATTFELDER & MÃTÊFFY [1971], p. 105.
("«) Id., p. 106.
("') LAVIGNE [1975], p. 28.
( ) CHEVALIER [1978]-2, p. 63.
II8
N e s t a s condições, é p a t e n t e a i m p o r t â n c i a conferida ao s i s t e m a
de «reguladores económicos» e de controlo das a c t i v i d a d e s das empres a s , sendo certo que «todo e s s e controlo n ã o incide sobre a e x e c u ç ã o do
plano m a s sobre o g r a u de eficiência d a s e m p r e s a s » ( ) . O dispositivo
global da r e g u l a ç ã o indirecta (para além d a f u n ç ã o selectiva, que já
referimos, da c o n c e s s ã o de m e i o s de f i n a n c i a m e n t o ) repousa no princípio
de que, s e o sistema de preços estiver adequadamente
estruturado,
a atribuição à e m p r e s a de u m a parcela considerável dos lucros que efectuar
( e m particular para e f e i t o s de prémios e de a u t o f i n a n c i a m e n t o ) incitá-la-á a fixar-se c o m o objectivo prioritário a m a x i m i z a ç ã o do lucro, l o g o
dos f u n d o s de participação e de i n v e s t i m e n t o , e, com isso, a cumprir
indirectamente
o s o b j e c t i v o s do planificador (que foi, para f e c h a r o circuito, q u e m e s t a b e l e c e u ou fixou a s r e g r a s desse m e s m o s i s t e m a de preç o s ) . O planificador pode m e s m o ir m a i s longe — e foi-o no c a s o húng a r o — e f i x a r a s n o r m a s de repartição do fundo de participação, o u de
prémios, de m o d o a e s t i m u l a r u m a «diferenciação salarial», reputada
indispensável c o m o incentivo à produtividade e ao i n t e r e s s e pelo trabalho
e pela promoção. A s s i m , n a H u n g r i a , a reforma de 1968 determinou que,
n a repartição do fundo de participação, o s d i r i g e n t e s e m p r e s a r i a i s pudess e m receber «adicionais» até u m limite de 80 % do salário-base, que o s
quadros i n t e r m é d i o s p u d e s s e m ir a t é 5 0 %, e o s t r a b a l h a d o r e s não pudess e m exceder 1 5 % (sendo que e s t e s ú l t i m o s , e m número, r e p r e s e n t a v a m
cerca de 90 % do t o t a l de e m p r e g a d o s na indústria) ( ° ) .
17S>
18
D e u m m o d o geral, o s i s t e m a de «regulação» incide sobre o s lucros
e o s s a l á r i o s e e n v o l v e t o d o u m m e c a n i s m o de repartições, de i m p o s t o s
e n o r m a s , traduzido e m n u m e r o s a s fórmulas, diferenciadas s e g u n d o o s
sectores. R e s u m i d a m e n t e , o lucro obtido pela empresa é repartido pelo
«fundo de participação» e pelo «fundo de desenvolvimento» em função
da intensidade capitalística do sector. S e g u n d o a r e f o r m a de 1968, 60 %
do fundo de d e s e n v o l v i m e n t o é e n t r e g u e ao E s t a d o , como i m p o s t o , e,
quanto ao fundo de participação, a t a x a de i m p o s t o é variável (entre 0 e
70 %) em função da relação entre o m o n t a n t e do fundo e a m a s s a salarial.
P a r a além disto, e x i s t e i g u a l m e n t e u m a regulação salarial que impõe
à s e m p r e s a s u m limite de a u m e n t o do salário-médio (4 % s e g u n d o a
( ) CHEVALIER [1978]-2, p. 69.
( ) Dada a forte reacção havida, logo em 1969 este esquema foi alterado: máximo de 25 % para todos, m a s com «prémios especiais» para os quadros superiores em
caso de lucros importantes (v. NOVE [1970], p. 346; LAVIGNE [1975], p. 48; CONNOR [1975], p. 123).
m
1S0
reforma de 1 9 6 8 ) . R e s t a a p e n a s acrescentar que o fundo de participação
s e n ã o d e s t i n a u n i c a m e n t e a «prémios» m a s t a m b é m a f i n s de ordem
s o c i a l : f i n a n c i a m e n t o de h a b i t a ç ã o , criação de lares para trabalhadores,
f o r m a ç ã o profissional, i n i c i a t i v a s culturais, desportivas, recreativas, etc.
F i n a l m e n t e , é do j o g o c o m b i n a d o de d i r e c t i v a s ou o r i e n t a ç õ e s cent r a i s (que s e procurou m i n i m i z a r ) , do controlo dos m e i o s de financiam e n t o , e do m e c a n i s m o de reguladores, j o g o e s s e que v i s a a s s e g u r a r
u m a «saudável» repartição dos f u n d o s líquidos g e r a d o s entre a s e m p r e s a s ,
o s trabalhadores e o E s t a d o — o que depende e m primeira análise da
«correcção» do s i s t e m a de preços, que n ã o deve o r i g i n a r c o m p o r t a m e n t o s
«anómalos» — , que deverá r e s u l t a r o ê x i t o d o «novo m e c a n i s m o económico».
Q u a n t o à ú l t i m a característica da reforma, r e l a t i v a à inserção da
e c o n o m i a h ú n g a r a n a «divisão internacional do trabalho», já no essencial
n o s r e f e r i m o s a ela quando d e s c r e v e m o s a s preocupações centrais no domínio dos preços, ou seja, a relação preços i n t e r n o s / p r e ç o s m u n d i a i s .
E s t ã o a s s i m definidos o s t r a ç o s f u n d a m e n t a i s do «novo m e c a n i s m o
económico» tal c o m o foi concebido pelos r e f o r m a d o r e s h ú n g a r o s e posto
e m prática a partir de 1968. Cremos t e r c o n s e g u i d o dar u m a ideia sufic i e n t e m e n t e clara q u a n t o à radical diferença de filosofia (e de «ousadia»)
entre e s t e s i s t e m a e o s i s t e m a de «planificação central» que, c o m o v i m o s ,
n ã o foi n a s u a e s s ê n c i a alterado com a s r e f o r m a s introduzidas n o s o u t r o s
p a í s e s do L e s t e europeu.
Contudo, e s t e s i s t e m a de «socialismo de mercado» c o n t a hoje m a i s
de 10 a n o s de f u n c i o n a m e n t o . E m 1971, e sobretudo e m 1975, por o c a s i ã o
do l a n ç a m e n t o do 5.° P l a n o 1976-80, foram-lhe introduzidas apreciáveis
alterações, e e x i s t e m n u m e r o s o s a r t i g o s de a u t o r e s h ú n g a r o s que a s
explicam e c o m e n t a m , p a s s a n d o e m r e v i s t a o s r e s u l t a d o s p o s i t i v o s e
n e g a t i v o s verificados n a prática ( ) . Outros especialistas, ocidentais,
m u i t o s deles f r a n c a m e n t e f a v o r á v e i s a o s princípios do n o v o s i s t e m a ,
dão-nos t e s t e m u n h o s e informações, que n o s p e r m i t e m c o m p l e t a r u m
juízo sobre a s u a evolução.
V e j a m o s e m primeiro l u g a r o balanço geral dos a s p e c t o s p o s i t i v o s
do N M E , s e g u n d o o s próprios r e s p o n s á v e i s h ú n g a r o s . «Provou-se que o
controlo central da n o s s a e c o n o m i a s o c i a l i s t a pode ser solucionado n a
1 S 1
(»') Entre outros: FALUVÉGI [1974] e [1976], BIHARI [1974], GADO [1976],
TIMAR [1973] e [1976], CSIKOS-NAGY [1970], [1973], [1974], [1975] e [1976],
RÉVÊSZ [1972] e [1974], SZIKSZAY [1976], TALLÕS [1976], SZEGÓ [1972], N Y E R S
[1976], B A L A S S A [1973].
s u a maior parte com o auxílio de m e d i d a s i n d i r e c t a s ; de f a c t o com a s
n o s s a s disponibilidades de recursos, i s t o conduz a m e l h o r e s resultados
do que o s i s t e m a baseado e m instruções detalhadas. (...) A "pesada" afect a ç ã o central de m e i o s de produção foi, n a m a i o r i a das áreas, s u b s t i t u í d a
pelo comércio. A separação rígida entre a c t i v i d a d e s p r o d u t i v a s e comercialização cessou. (...) D e s e n v o l v e r a m - s e relações de produção racionais,
quer no m e r c a d o interno quer n o s m e r c a d o s e x t e r n o s . (...) D e u m modo
geral, o princípio de que o s preços s e d e v i a m a p r o x i m a r das proporções
de valor, e que deveria ser desenvolvido u m s i s t e m a de preços flexível
que desse lugar, n u m â m b i t o bem definido e d e v i d a m e n t e controlado, ao
j o g o da o f e r t a e de procura, r e s i s t i u à experiência. (...) O s i s t e m a de
m o t i v a ç ã o pelo lucro suportou g e r a l m e n t e o t e s t e e provou ser u m poderoso e s t í m u l o ao trabalho dos d i r i g e n t e s e colectivos das e m p r e s a s .
(...) A s e m p r e s a s a p r o x i m a r a m - s e dos m e r c a d o s , puderam s e n t i r m a i s
i m e d i a t a m e n t e a s e x i g ê n c i a s , a concorrência e o nível dos m e r c a d o s
e x t e r n o s , e tudo i s s o provou s e r u m útil f a c t o r de promoção» ( ) . E m
resumo, «se m e d i r m o s o s resultados do n o v o s i s t e m a de controlo económ i c o e g e s t ã o pelos dados dos ú l t i m o s cinco anos, o balanço pode considerar-se d e f i n i t i v a m e n t e positivo» ( ) . E o m e s m o autor aponta que,
n e s t e s 5 anos, a t a x a de c r e s c i m e n t o do r e n d i m e n t o nacional a t i n g i u u m a
média anual de 6,1 %, contra a média de 5,2 % n o s s e t e a n o s anteriores.
Outro autor, referindo-se ao período de e x e c u ç ã o do P l a n o para 1971-75,
a s s i n a l a que «as t a r e f a s m a i s i m p o r t a n t e s ( f i x a d a s como objectivos) da
política de nível de vida, f o r a m concluídas com ê x i t o . O c o n s u m o pessoal
a u m e n t o u cerca de 28 % n o s ú l t i m o s 5 a n o s . O a u m e n t o q u a n t i t a t i v o foi
t a m b é m a c o m p a n h a d o por u m a considerável m e l h o r i a na qualidade.
O a p a r e c i m e n t o de n o v o s produtos, o a l a r g a m e n t o da g a m a de b e n s e
s e r v i ç o s e, e m geral, u m a proporção crescente de p r o d u t o s m o d e r n o s e
m a i s apreciados promoveu u m a adequada s a t i s f a ç ã o de procuras diferenciadas» ( ) . E n f i m , «ficará para a s f u t u r a s g e r a ç õ e s o juízo sobre o
papel dos n o v o s m é t o d o s de controlo e g e s t ã o planificados, m a s é já indiscutível que a h i s t ó r i a económica considerará a r e f o r m a do s i s t e m a de
g e s t ã o e c o n ó m i c a iniciada e m 1968 como de e x t r a o r d i n á r i a importância,
ainda que a cabal confirmação [dos s e u s m é r i t o s ] e x i j a m a i s t e m p o e
m a i s a j u s t a m e n t o s do que se h a v i a suposto» ( ) .
1 8 2
1 8 3
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1 8 5
TIMAR [1973], pp. 278-281.
( ) Id., p. 277.
( ) SZIKSZAY [1976], p. 26.
( ) PALUVÊGI [1976], p. 20.
,S3
184
IS5
E s t a ú l t i m a breve r e s e r v a introduz-nos, de imediato, n a s interrog a ç õ e s l e v a n t a d a s q u a n t o aos a s p e c t o s n e g a t i v o s s u r g i d o s com a reforma.
E é o m e s m o a u t o r que, j u s t a m e n t e , n a sequência do m e s m o t e x t o , n o s
v a i dar u m p a n o r a m a geral d e s s e lado n e g a t i v o , que adiante e x a m i n a r e m o s com m a i s pormenor. O a u t o r e x a m i n a t r ê s ordens de dificuldades
p a t e n t e a d a s n o decurso dos primeiros sete a n o s de aplicação do N M E .
A primeira diz respeito e m boa parte à própria concepção e d i s p o s i t i v o s
do m e c a n i s m o , e bem a s s i m à s u a adequação a condições que n e m sempre
corresponderam ao que inicialmente fora p r e v i s t o : « N ã o s e desenvolver a m a s condições de u m a sã competição, n e m m e s m o no caso de capacidades paralelas internas, pelo que o s s e u s s u p o s t o s e f e i t o s benéficos s e
n ã o puderam verificar (...) A concorrência do m e r c a d o internacional
não e s t i m u l a s u f i c i e n t e m e n t e a melhoria da qualidade e de tecnologia,
[entre o u t r a s c o i s a s porque] não r e g u l á m o s s u f i c i e n t e m e n t e a procura
e porque o s f e n ó m e n o s de u m a e c o n o m i a de e s c a s s e z p e r s i s t e m no n o s s o
s i s t e m a ( . . . ) . O papel orientador dos preços, depois de u m temporário
reforço, enfraqueceu cada vez m a i s . [ N ã o s ó } não se a c e n t u o u a perspect i v a de "proprietário" por parte dos trabalhadores, [ c o m o ] o s d i r i g e n t e s
d a s e m p r e s a s f o r a m incapazes de reconciliar o s i n t e r e s s e s de hoje com o s
de a m a n h ã : a v i s ã o de longo-prazo ainda não se expandiu suficientemente.
[ A l é m d i s s o ] o s r e g u l a d o r e s n ã o e s t i m u l a r a m s u f i c i e n t e m e n t e u m a eficiente e c o n o m i a de t r a b a l h o ; o s i s t e m a de regulação do salário m é d i o
induziu pelo contrário u m a e c o n o m i a do trabalho d e m a s i a d o descontrolada [loose].
Os e n c a r g o s de capital f o r a m d e m a s i a d o altos, e e m comparação com eles o s e n c a r g o s sobre o t r a b a l h o v i v o d e m a s i a d o b a i x o s ,
ainda que se d e v e s s e ter sabido prever — e a l g u n s e x p r i m i r a m e s s e conhec i m e n t o — que o t r a b a l h o se tornaria e s c a s s o na n o s s a e c o n o m i a » ( ) .
A s e g u n d a ordem de dificuldades t e m que v e r com a inércia social, ou seja,
com o s problemas de t r a n s f o r m a ç ã o da consciência social, «quer n a s empresas, quer n a s i n s t i t u i ç õ e s de controlo», t r a n s f o r m a ç ã o que «não pode
ter l u g a r de u m dia para o outro». « V e m o s a cada p a s s o que no n o s s o
p e n s a m e n t o e f r e q u e n t e m e n t e n o s próprios d i s p o s i t i v o s de regulação o
v e l h o e o n o v o e s t ã o a m b o s p r e s e n t e s . E s t ã o t ã o imbricados que nem
sempre é possível d i s t i n g u i r se se t r a t a de v e s t í g i o s do p a s s a d o se de
contradições i n t e r n a s do n o v o s i s t e m a de regulação» ( ) - E n f i m , a última
q u e s t ã o refere-se à incapacidade de a d a p t a ç ã o do s i s t e m a à s «alterações
n a s condições e x t e r n a s que e n t r e t a n t o se produziram, e não e x a c t a m e n t e
1 8 6
1 8 7
( ) FALUVÉGI [1976], p. 21.
("') Id., p. 22.
1M
como t i n h a m sido previstas» ( ) . T r a t a - s e da crise do s i s t e m a capitalista mundial, d e s e n c a d e a d a a partir de 1973. Os t e r m o s de t r o c a a g r a v a r a m - s e s u b s t a n c i a l m e n t e para a e c o n o m i a h ú n g a r a no s e u conjunto,
quer c o m o s p a í s e s c a p i t a l i s t a s quer com o s p a í s e s s o c i a l i s t a s . Ora sucede
que «acreditámos que era possível proteger a e c o n o m i a h ú n g a r a da
influência das relações de preço no m e r c a d o mundial sobre o s preços
internos. E n t ã o , a s perdas n o comércio e x t e r n o f o r a m cobertas pelo orçam e n t o , enquanto a s e m p r e s a s e a população puderam c o n t i n u a r a comprar
o s b e n s i m p o r t a d o s a o s preços a n t i g o s . (...) A m i c r o e c o n o m i a n e m sequer
se deu conta daquelas alterações» ( ) .
1 8 S
1 8 9
T e m o s a s s i m o p a n o r a m a geral dos a s p e c t o s n e g a t i v o s , ou melhor,
das deficiências no f u n c i o n a m e n t o do N M E , a que a s m e d i d a s de 1975
v i e r a m t e n t a r dar resposta. Se e x c l u i r m o s o ú l t i m o ponto focado ( o s
e f e i t o s da protecção r e l a t i v a m e n t e ao m e r c a d o m u n d i a l ) , a crítica m a i s
f r e q u e n t e m e n t e presente e m o u t r o s a r t i g o s de e s p e c i a l i s t a s h ú n g a r o s
traduz-se e m e x p r e s s õ e s como «o trabalho é b a r a t o para a s e m p r e s a s
e a t e c n o l o g i a é c a r a » ( ) ou «o trabalho é "barato", o capital é "caro"
no n o s s o p a í s » ( ) , a f i r m a ç õ e s produzidas a s e i s a n o s de distância u m a
da outra. N ã o é, pois, de estranhar, que t e n h a sido n e s t e ponto, como
v e r e m o s , que f o r a m m a i s s u b s t a n c i a i s a s m o d i f i c a ç õ e s introduzidas.
1 9 0
1 9 1
V e j a m o s então, com m a i s pormenor, quais os e f e i t o s concretos que
o s erros ou a rigidez do n o v o s i s t e m a t r o u x e r a m a lume, impondo u m a
apreciável revisão.
E m primeiro lugar, verificou-se u m sobreinvestimento,
nem sempre
concordante com o s o b j e c t i v o s do planificador. « N ã o c o n s e g u i m o s evitar
que arranquem i n v e s t i m e n t o s injustificados financiados por fundos das
empresas, n e m que o s c u s t o s adicionais que daí v ê m a resultar, devido
a "sub-planificação" [underplanning],
a u m e n t e m a t e n s ã o e x i s t e n t e [no
domínio dos recursos financeiros disponíveis — J M P ] . E m certos sectores, a s f r o n t e i r a s entre a u t o r i d a d e s e s v a í r a m - s e , não podendo a s responsabilidades s e r s a t i s f a t o r i a m e n t e definidas» ( ) . E o m e s m o autor
a c r e s c e n t a : « A o regular o s i n c e n t i v o s m a t e r i a i s , e m l u g a r de iniciar
n o v o s i n v e s t i m e n t o s , deveria s e r privilegiada a conclusão de projectos.
O n o s s o s i s t e m a actual não e s t i m u l a e s t a s u f i c i e n t e m e n t e , o que con1 9 2
( )
(»»)
C )
(">')
(«)
I!S
90
FALUVEGI [1976], p. 22.
Id., p. 23.
CZICOS-INAGY [1970], p. 162.
RÉVÊSZ [1976], p. 295.
TIMAR [1973], p. 281.
tribui para a dissipação de f u n d o s e para o c r e s c i m e n t o do s t o c k de
projectos incompletos» ( ) . U m a u t o r ocidental precisa e s t e ponto com
a l g u n s n ú m e r o s : « [ D e u - s e ] ' u m a "explosão" dos i n v e s t i m e n t o s e dos
c u s t o s de c o n s t r u ç ã o : de 1968 a 1971 o v o l u m e de i n v e s t i m e n t o s subiu
de 3 6 % , e a s u a parte n o P r o d u t o N a c i o n a l Líquido p a s s o u de 32,2 a
3 7 , 7 % , u l t r a p a s s a n d o sempre o s o b j e c t i v o s planificados» ( ) . Ê certo
que l o g o e m 1971 f o r a m t o m a d a s m e d i d a s para contrariar e s t a tendência, vindo a conseguir-se que, para o período 1970-75, a t a x a m é d i a
de c r e s c i m e n t o do i n v e s t i m e n t o se t e n h a s i t u a d o e m 6,2 % ( ) . S i m plesmente, e aqui p a s s a m o s ao s e g u n d o ponto, ainda que o «sobreinvest i m e n t o » t e n h a podido ser quantitativamente
controlado, m a n t e v e - s e
u m a grande pressão sobre o emprego:
m a i s precisamente, verificou-se
que, contrariamente a u m dos g r a n d e s o b j e c t i v o s da r e f o r m a — p a s s a r
da f a s e de d e s e n v o l v i m e n t o e x t e n s i v o à f a s e de d e s e n v o l v i m e n t o intens i v o — se processou u m f e n ó m e n o de «sobreemprego» que, n o plano
económico, viciou a «eficiência» do i n v e s t i m e n t o , a e c o n o m i a de recursos
e o s planos de a u m e n t o acelerado da produtividade. R é v é s z e x p õ e o problema com m u i t a clareza, atacando-se particularmente ao a s p e c t o da
«regulação do salário-médio», que t e m aqui u m papel e s s e n c i a l : de
acordo com o s i s t e m a v i g e n t e «concretamente, substituir por m á q u i n a s
trabalhadores com a l t o s s a l á r i o s é e x t r e m a m e n t e v a n t a j o s o [para a
empresa, para o s t r a b a l h a d o r e s não s u b s t i t u í d o s ] , enquanto a m e c a nização a f e c t a n d o t r a b a l h a d o r e s com b a i x o s s a l á r i o s é d e s v a n t a j o s a
para o s r e n d i m e n t o s dos t r a b a l h a d o r e s que s e m a n t ê m na e m p r e s a (...)
[ou s e j a ] e s t a r e g u l a ç ã o retarda a m e c a n i z a ç ã o do t r a b a l h o precisam e n t e dos t r a b a l h a d o r e s não qualificados ou semi-qualificados e prom o v e a dos m a i s bem p a g o s . I s t o é contraditório com a t a r e f a de modernizar e intensificar a t e c n o l o g i a de produção e a g a m a de produtos,
o que é u m a e x i g ê n c i a objectiva e actual na f a s e já a t i n g i d a de desenv o l v i m e n t o económico. A o m e s m o t e m p o , i s t o é t a m b é m u m a pré-condição para u m a participação m a i s e f e c t i v a na divisão internacional do
trabalho» ( ) . D e facto, c o m o v i m o s , n o s i s t e m a inicial ( 1 9 6 8 ) , a s
e m p r e s a s v i a m - s e f i x a r u m limite para o a u m e n t o do salário médio.
A partir de Janeiro de 1971, a s e m p r e s a s s ã o s u j e i t a s a u m a t a x a sala1 9 3
1 D 4
1 9 5
1 9 6
(•")
(» )
( )
p. 14.
( «)
4
195
,9
TIMÂR [1973], p. 288.
A S S E L A I N [1978], p. 154.
Sobre o 1.» ponto v. B A L A S S A [1973], p. 344; sobre o 2.», v. N Y E R S [1976],
RÊVÊSZ [1972], p. 297.
rial p r o g r e s s i v a sobre o a u m e n t o do salário médio, que é função da
relação entre e s s e a u m e n t o e o r e n d i m e n t o «per capita» n a empresa.
N u m c a s o como noutro, a s e m p r e s a s t ê m interesse, de u m m o d o geral,
e m alterar a c o m p o s i ç ã o do s e u quadro de pessoal no sentido de b a i x a r
o salário-médio, quer dispensando t r a b a l h a d o r e s com a l t o s salários,
quer admitindo trabalhadores para o s n í v e i s salariais m a i s b a i x o s .
S e g u n d o aquele autor, «pode calcular-se que, supondo lucros c o n s t a n t e s ,
s e t r a b a l h a d o r e s com u m salário duplo do valor m é d i o da e m p r e s a a
deixam, cerca de m e t a d e da e c o n o m i a f e i t a n a m a s s a salarial é liberta
para a u m e n t o s n o s s a l á r i o s dos trabalhadores que nela p e r m a n e c e m (...)
É óbvio que o colectivo da e m p r e s a e s t á i n t e r e s s a d o e m tirar partido
de t a i s oportunidades de a u m e n t o s salariais» ( ) . E s t e problema só
v e m n a t u r a l m e n t e a g r a v a r a q u e s t ã o da «escassez de trabalho» que,
s e g u n d o Timár, j á h á m u i t o f o r a prevista, dada a rigidez da oferta
e a s n e c e s s i d a d e s c r e s c e n t e s decorrentes do processo de d e s e n v o l v i m e n t o :
«A e s c a s s e z relativa de trabalho, a f o n t e b á s i c a do c r e s c i m e n t o económico, t o r n a cada vez m a i s difíceis quer i n i c i a t i v a s e c o n o m i c a m e n t e
eficientes e s o c i a l m e n t e i m p o r t a n t e s quer a utilização das capacidades
e x i s t e n t e s : a escassez
de trabalho
tornou-se
geral. E m tal situação, a s
e m p r e s a s e o u t r a s o r g a n i z a ç õ e s c o m p e t e m com crescente intensidade
por trabalhadores. I s t o , e m si, n ã o c a u s a r i a problema, se a s a c t i v i d a d e s
da e m p r e s a f o s s e m s u f i c i e n t e m e n t e r e g u l a d a s por e x i g ê n c i a s de rendibilidade e eficiência. N ã o sendo a s s i m , n o entanto, a competição por
t r a b a l h a d o r e s a u m e n t a irrealisticamente a procura e a g r a v a a escassez.
(...) [Ora] a política e c o n ó m i c a h ú n g a r a n ã o pôde adaptar-se a t e m p o
e a d e q u a d a m e n t e à s i t u a ç ã o previsível do m e r c a d o de e m p r e g o : foi
incapaz
de regular
e controlar
a procura
de trabalho
satisfatoriamente»^*).
1 9 7
S e g u n d o ele, a s empresas, j á n ã o a p e n a s pelas razões acima, m a s
c o m o «reserva interna» (na s u a própria e x p r e s s ã o ) para f u t u r a s n e c e s sidades, t e n d e m a «reter t r a b a l h a d o r e s excedentários, e t a n t o m a i s
q u a n t o m a i o r a e s c a s s e z , [quando] deveriam dispensar t r a b a l h a d o r e s
que não lhe s e r v e m o u que são supérfluos, deste m o d o a u m e n t a n d o a
oferta, o que permitiria a s a t i s f a ç ã o da procura e m a c t i v i d a d e s a ser
d e s e n v o l v i d a s » ( ) . P i o r : « D i s p o m o s de e s c a s s a informação sobre quais
o s s e c t o r e s em que e x i s t e e x c e s s o de trabalho. (...) E se a s e x i g ê n c i a s
199
("") RÊVÉSZ [1972], p. 297.
( ) TIMAR [1976], pp. 123-126.
Id., pp. 128-130.
1ÍS
de rendibilidade e a eficiência não e s t i m u l a m — o u f o r ç a m — a s emp r e s a s a revelar e eliminar e s s e e x c e s s o , e m a i s ainda, s e a intervenção
e x t e r n a — c e n t r a l ou r e g i o n a l — põe e m perigo a s s u a s r e s e r v a s cios a m e n t e g u a r d a d a s , elas não s ó t e n t a m reter t r a b a l h a d o r e s m a s t a m bém o s e s c o n d e m c u i d a d o s a m e n t e » ( ° ) . Ora, «segundo v á r i a s e s t i m a t i v a s e s t e t r a b a l h o perdido [por t r a b a l h a d o r e s s u p é r f l u o s ] a t i n g e u m a
ordem de 5-25 % do fundo de t e m p o de t r a b a l h o total. Os d i r i g e n t e s
r e s p o n s á v e i s pela g e s t ã o do e m p r e g o n a H u n g r i a calculam e s t a reserva
e m 1 0 - 1 5 % e m m é d i a nacional, por v e z e s m e s m o em 20-25 % » ( ) .
20
2 0 1
S o b r e i n v e s t i m e n t o , por u m lado, m a s t a m b é m sobreemprego, por
outro, r e s u l t a m n a t u r a l m e n t e dum i n t e l i g e n t e a p r o v e i t a m e n t o pelas
e m p r e s a s de u m s i s t e m a de i n c e n t i v o s que a isso a s incita, m a s revela
o b v i a m e n t e u m surpreendente à-vontade n a disponibilidade de fundos.
E aqui c h e g a m o s a o terceiro e f e i t o do N M E , i n t i m a m e n t e a s s o c i a d o
aos anteriores, ainda que m a i s d i r e c t a m e n t e ligado ao s i s t e m a de p r e ç o s :
deu-se u m d e s l o c a m e n t o pronunciado n a repartição do «produto social
líquido» entre a s e m p r e s a s e o E s t a d o , tendo aquelas realizado, na
e x p r e s s ã o de u m autor, lucros « a n o r m a l m e n t e elevados» e este, a o contrário, s e n t i d o u m a forte diminuição relativa das s u a s disponibilidades.
Mas, pior do que isso, c o n s t a t a - s e que, por deficiências próprias do
N M E , n a t u r a l m e n t e aproveitadas, e s s e s i m p o r t a n t e s lucros das e m p r e s a s
não s e repartiram de acordo com a «eficiência» r e l a t i v a das m e s m a s ,
m a s por f a c t o r e s c i r c u n s t a n c i a i s que v i e r a m a distorcer a s i n t e n ç õ e s
dos reformadores. O i ç a m o s a l g u n s d e p o i m e n t o s sobre e s t e ponto, n o s
quais encontraremos, e x p l í c i t a s ou implícitas, a l g u m a s das o r i g e n s dest e s lucros e x c e s s i v o s ou deficientemente r e p a r t i d o s : « E n q u a n t o certos
preços individuais c o n t ê m demasiado, e m certos c a s o s injustificado,
lucro, que deve s e r colectado pelo o r ç a m e n t o do E s t a d o , o u t r o s não
a s s e g u r a m sequer a s condições de s i m p l e s reprodução, que t ê m de ser
proporcionadas por m e i o de subsídios» ( ) ; « A s e m p r e s a s m a i s efic i e n t e s n e m s e m p r e o b t ê m u m r e n d i m e n t o proporcionado a o s s e u s
esforços, enquanto, devido ao efeito c o m b i n a d o de preços e "apoios",
e m p r e s a s m e n o s eficientes, com produções de m e n o r qualidade e m e n o s
modernas, c o n s e g u e m m a n t e r - s e l u c r a t i v a s » ( ) ; « [ d e v i d o à a l t a de
preços m u n d i a l ] o s subsídios a o s preços de i m p o r t a ç ã o p a g o s pelo orça2 0 2
2 0 3
(- )
( )
(="-)
( )
00
5M
2<n
TIMÃR [1976], p. 130.
Id., p. 129.
FALUVÉGI [1974], p. 162.
TIMÃR [1973], p. 279.
m e n t o e m 1974-75 a t i n g i r a m 4-5 v e z e s o s r e l a t i v o s a 1973. A o m e s m o
t e m p o o lucro das e m p r e s a s crescia r a p i d a m e n t e devido ao a u m e n t o
dos preços de exportação, enquanto que o correspondente a u m e n t o dos
i m p o s t o s [sobre lucros] a p e n a s c o n t r a b a l a n ç a v a parte dos s u b s í d i o s à
importação, e a diferença t i n h a de ser coberta por créditos orçamentais.
E m resultado de s u b s í d i o s à importação e lucros de exportação, a s
e m p r e s a s receberam m a i o r e s r e n d i m e n t o s do que lhes era devido e m
função da s u a real e f i c i ê n c i a » ( ) . Mas, para além do a p r o v e i t a m e n t o
de deficiências próprias do s i s t e m a de preços e do j o g o sobre o s preços
internacionais, c e r t a s i n f o r m a ç õ e s dão-nos conta de o u t r a s f o r m a s de
realização de lucros «anormais». Diz-nos, por exemplo, C s i k ó s - N a g y :
«A f i m de pôr u m limite à acumulação e s p e c u l a t i v a de aço laminado,
o Ministério d a s F i n a n ç a s decretou e m 1975 que 10 % da diferença e m
valor deveria ser p a g a sobre o e x c e s s o , e m relação ao s t o c k de 1973,
a título de e n c a r g o s s u p l e m e n t a r e s sobre a c t i v o s . P a r a a r e g u l a ç ã o dos
s t o c k s , pode revelar-se n e c e s s á r i o no futuro, n o caso de a l g u m a s empresas, fixar u m limite superior de s t o c k s (sob a f o r m a de prescrição
do n ú m e r o de dias a que d e v e m corresponder o s s t o c k s p e r m i s s í v e i s )
para a l g u m a s m a t é r i a s - p r i m a s e produtos s e m i - a c a b a d o s u s u a l m e n t e
escassos» ( ) .
204
2 0 3
A combinação, s e g u n d o m e c a n i s m o s de que n o s é fácil aperceber-nos,
da crescente a u t o n o m i a das e m p r e s a s o r i e n t a d a s por d i s p o s i t i v o s n e m
sempre c o n s i s t e n t e s com a s intenções do planificador com o a s s u m i r
pelo E s t a d o das consequências financeiras da crise c a p i t a l i s t a pós-1973,
t e v e a i n d a dois e f e i t o s importantes, u m dos quais, aliás, j á referido
a c i m a : a crescente e s c a s s e z de recursos do E s t a d o , e m comparação com
a s i t u a ç ã o f o l g a d a das e m p r e s a s (no seu c o n j u n t o ) . S o b r e e s t e ponto,
b a s t a r á a s s i n a l a r que, a p e s a r de n u m e r o s a s m e d i d a s p o n t u a i s que f o r a m
sendo a d o p t a d a s , «a parte que r e p r e s e n t a m a s t a x a s sobre o s salários
e sobre o s a c t i v o s no "rendimento social líquido" t e n d e u m e s m o a diminuir a t é 1975, e a dos lucros, pelo contrário, a aumentar» ( ) . O outro
efeito, que não deveria surpreender no quadro de u m m e c a n i s m o «liberalizador», m a s cujo sentido n ã o correspondeu à s i n t e n ç õ e s da reforma,
foi o de u m a crescente mobilidade da mão-de-obra. T i m á r s i t u a a q u e s t ã o
e m p o u c a s p a l a v r a s : «Ê e s t a opinião [a de que a s f o r m a s que t o m a a
mobilidade do trabalho d e v e m s e r v i s t a s como u m "sistema de s i n a i s "
2 0 0
( ) FALUVEGI [1976], p. 23.
p ) CSIKOSiNAGY [1976], p. 44.
( ) A S S E L A I N [1978], p. 155.
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05
M8
pelo planificador] que s e e x p r i m e e m a n á l i s e s que c o n t r a s t a m o s movim e n t o s de t r a b a l h a d o r e s "justificados" ou "necessários" com a f l u t u a ç ã o
e mobilidade "prejudicial" ou "desnecessária". E s t a c l a s s i f i c a ç ã o m o s t r a
que o problema não é que a mão-de-obra "se m o v a " m a s que a direcção
e e s t r u t u r a desse m o v i m e n t o não é a d e q u a d a : o s t r a b a l h a d o r e s e m movim e n t o não são o s que deviam, e não se dirigem para o s l u g a r e s em que
s e r i a m socialmente m a i s n e c e s s á r i o s o u onde poderiam responder m a i s
a d e q u a d a m e n t e a o s r e q u i s i t o s p o s t o s pelo t r a b a l h o [pela natureza do
trabalho — J M P ] ! » ( ) . Outro autor explica, m a i s p r ó x i m o do c o n c r e t o :
«A mão-de-obra t e m m i g r a d o de e m p r e s a s com b a i x o s lucros p a r a a s de
m a i o r e s lucros, porque o s s a l á r i o s m a i s a l t o s a t r a e m o s trabalhadores.
A r o t a ç ã o de mão-de-obra c h e g o u a o ponto de pôr e m perigo a continuidade da produção n u m certo número de fábricas. I s t o levou a u m a s i t u a ç ã o
e m que t i v e r a m de e n t r a r n a "competição salarial" m e s m o e m p r e s a s s e m
e l e v a d a produção n e m a l t o s lucros. A l é m disso, o s t r a b a l h a d o r e s n ã o
v i a m j u s t i f i c a ç ã o para que, para o m e s m o trabalho, fábricas diferentes
p a g a s s e m s a l á r i o s m u i t o a f a s t a d o s , n ã o devido a qualquer m é r i t o seu
[das e m p r e s a s , dos t r a b a l h a d o r e s — J M P ] , m a s porque u m a e m p r e s a
pôde modernizar o seu e q u i p a m e n t o com auxílio do i n v e s t i m e n t o estatal,
enquanto a o u t r a o n ã o pôde fazer, e que u m a fábrica recebe m a i o r apoio
porque o s e u produto é reputado "mais i m p o r t a n t e " que outro, e t c . » ( ) .
Isto acaba por r e s u l t a r anárquico e contraditório, quer no plano prático,
quer m e s m o n o plano dos princípios, ainda não s u f i c i n t e m e n t e «actualizados». N o plano p r á t i c o : «O afluxo de mão-de-obra para a s e m p r e s a s
de ponta faz b a i x a r a m a s s a dos prémios, m u i t o s g e s t o r e s preferindo
m a n t e r o lucro recrutando a s s a l a r i a d o s com b a i x a r e m u n e r a ç ã o e m lugar
de a u m e n t a r o s i n v e s t i m e n t o s , d e m a s i a d o penalizados fiscalmente, a seu
ver. L o g i c a m e n t e , a produtividade s o f r e u u m declínio s o b o p e s o d e s t a
mão-de-obra sub-empregada, s e não m e s m o e m d e s e m p r e g o disfarçado,
e da b a i x a de p e r s p e c t i v a s de m i r í f i c o s prémios» ( ) . N o plano dos princ í p i o s : « E s t e problema [da m o b i l i d a d e } envolve a [ s e g u i n t e ] contradição, do p o n t o de v i s t a d a s leis do t r a b a l h o : enquanto a s n o r m a s l e g a i s
e s t i m u l a m a lealdade a o empregador, a racionalidade e c o n ó m i c a e considerações h u m a n i t á r i a s f r e q u e n t e m e n t e depõem a f a v o r do d i n a m i s m o
e da mobilidade» ( ) .
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( )
(*»)
P»)
20S
FALUVÉGI [1976], pp. 25-26.
Id., id.
THEVENC-N [1978], p. 103.
BIHARI [1974], p. 244.
E n f i m , c o n v é m referir u m a s p e c t o que t e m sido m u i t o discutido, ou
seja o dos r e f l e x o s inflacionistas. M. L a v i g n e coloca a q u e s t ã o sob a forma
de u m a s i m p l e s equação. S e g u n d o ela, a introdução de m e c a n i s m o s de
m e r c a d o e m e c o n o m i a s com e s t r a n g u l a m e n t o s n a oferta, com u m a e s t r u tura oligopolística e p r o t e g i d a do m e r c a d o internacional, m a s obedecendo
a certos o b j e c t i v o s centrais, n o m e a d a m e n t e o pleno emprego, conduz à
s e g u i n t e i d e n t i d a d e : pleno e m p r e g o + r i g i d e z estrutural n a o f e r t a + f o r m a s
o l i g o p o l í s t i c a s do m e r c a d o = i n f l a ç ã o ( ) . E s t a autora considera m e s m o
que é e s t e o m a i o r risco de r e f o r m a s «liberalizantes» e m p a í s e s com a
e s t r u t u r a e c o n ó m i c a d o s p a í s e s de L e s t e (para além da questão «de princípio» que é a de que a s e m p r e s a s c r e s c e n t e m e n t e s e d e s v i e m dos object i v o s do Plano, por deficiência dos d i s p o s i t i v o s de e s t í m u l o ) . O que podemos constatar na Hungria quanto a este aspecto?
J á v i m o s ( n o t a 171 acima) que, p r e c i s a m e n t e por se ter presente e s t e s
condicionalismos, h o u v e o cuidado de m a n t e r u m controlo m u i t o m a i s
e s t r e i t o sobre o s preços ao c o n s u m i d o r do que sobre o s preços à produção.
A l é m disso, t a m b é m a s políticas de crédito, a s políticas salariais e aquilo
a que s e poderá c h a m a r a política cambial f o r a m t o d a s t r a ç a d a s n o sentido de obviar a o s e f e i t o s de ruptura traduzidos pela equação acima.
S e g u n d o N o v e , «os reformadores procederam c a u t e l o s a m e n t e , procurando c o m b a t e r o e x c e s s o de procura (por políticas de crédito e salariais
apropriadas, e por a l t e r a ç õ e s de preços) a n t e s de ser introduzida a reforma. O s coeficientes de conversão cambial f o r a m calculados (i. e. o
forint foi e f e c t i v a m e n t e desvalorizado) de m o d o a reduzir a procura de
bens importados, m a s i s t o t e v e de s e r reforçado por u m s i s t e m a de limitações q u a n t i t a t i v a s e licenciamentos, ainda que a intenção f o s s e tratar-se
a p e n a s de m e d i d a s temporárias» ( ) . Concretamente, foi possível, até
1973, conter a alta de preços ao consumidor, ainda que a t a x a de a u m e n t o
se f o s s e a c e n t u a n d o de ano para a n o : 1,3 % e m 1970, 2 % em 1971, 3 %
e m 1972 e 3,6 % e m 1973 ( ) . A partir de 1973, e s t e a u m e n t o agravou-se,
ainda que m o d e r a d a m e n t e , a t i n g i n d o e m 1976 a ordem dos 5 %, m a s isso
só foi possível à c u s t a de u m a intervenção e s t a t a l que sobrecarregou
f o r t e m e n t e o orçamento, o que não e v i t o u certos a u m e n t o s «espectacular e s » : e m Julho de 1976 a carne a u m e n t o u 25-30 %, e o m e s m o sucedeu
à s bebidas e m princípios de 1977 ( ) . N o e n t a n t o , convirá sublinhar a
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( )
(= )
( »)
( ")
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2
2
LAVIGNE [1975]-1, p. 30.
NOVE [1977], p. 293.
B A L A S S A [1973], p. 345; LAVIGNE [1975]-2.
T H E V E N O N [1978], p. 102.
enorme diferença a que ficam e s t e s v a l o r e s daqueles que n o s m e s m o s a n o s
se verificaram n o s p a í s e s ocidentais. E m todo o caso, é t a m b é m s u b s t a n cial a diferença e m relação à estabilidade que era corrente n o s p a í s e s
de e c o n o m i a planificada, e que tende a m a n t e r - s e m e s m o a p ó s a s reform a s — sendo certo que a s « t e n s õ e s inflacionistas» neles se m a n i f e s t a m
sob o u t r a s f o r m a s . C s i k ó s - N a g y c h a m a a atenção para e s t e p o n t o : «Poder-se-ia p e n s a r que no caso de restrições a d m i n i s t r a t i v a s de preços e salários, h á possibilidade de e v i t a r a espiral preços-salários, p o i s e s p i r a i s
preços-salários e s p o n t â n e a s s ã o a s s o c i a d a s a e c o n o m i a s de mercado.
Os f a c t o s , contudo, d e s m e n t e m e s t a s u p o s i ç ã o e m m u i t o s a s p e c t o s .
(...) A experiência dos p a í s e s s o c i a l i s t a s q u a n t o a s i s t e m a administrat i v o de preços e m t e m p o de paz (...) m o s t r a que, m e s m o n e s s e caso, t e m
l u g a r u m aumento escondido
de preços» ( ) . E refere v á r i a s f o r m a s que
t o m a e s t e « a u m e n t o » : abandono de produtos m a i s b a r a t o s por produtos
m a i s caros, deterioração da qualidade (a preço c o n s t a n t e ) , m e n o r variedade e e s c a s s e z de produtos. E c o m e n t a : « N a d a d i s t o é reflectido n a s
e s t a t í s t i c a s de preços, pois e s t a s não t r a b a l h a m com preços m é d i o s m a s
com preços de produtos, que s e m a n t ê m para g r u p o s de m e r c a d o r i a s ;
para além disso, a s e s t a t í s t i c a s não e n t r a m e m c o n t a com a e s c a s s e z e
são c o n s t r u í d a s na base de qualidade inalterada» ( ) . A l i á s , a l e g i s l a ç ã o
de J u n h o de 1973 contra «lucros ilícitos», refere, entre o s m é t o d o s que
«violam d i r e c t a m e n t e o s i n t e r e s s e s da sociedade e o s princípios de u m a
e c o n o m i a socialista», a l g u n s que t ê m p r e c i s a m e n t e e f e i t o s inflacionistas
deste t i p o ( ) .
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2 1 7
Pode, pois, concluir-se, o que é p e r f e i t a m e n t e lógico tendo presente
a natureza d a s r e f o r m a s introduzidas, que a u m a n o v a combinação direcção central-mercado, com reforço deste, correspondeu u m a proporção
diferente entre inflação escondida e inflação m a n i f e s t a (nos p r e ç o s ) ,
com a c e n t u a ç ã o desta. M a s poderá assinalar-se, de qualquer modo, que o
f e n ó m e n o foi m a n t i d o sob controlo, n a s s u a s d i v e r s a s c o m p o n e n t e s (incluindo a política e s o c i a l ) , e daí que certos a u m e n t o s de preços «impopulares», t e n h a m podido ser l e v a d o s a efeito s e m a s consequências verif i c a d a s na Polónia.
P a s s a d o s e m r e v i s t a o s e f e i t o s « n e g a t i v o s » , e m t e r m o s da desejada
«racionalidade económica», interessa, ainda que m u i t o brevemente, e x a minar o tipo de m e d i d a s correctivas a d o p t a d a s e m 1975. S e o f a z e m o s de
( ) CSIKOS-NAGY [1973], pp. 170-175.
( ") Id., p. 170.
(-") LAVIGNE [1975]-1, p. 21.
:is
5
f o r m a m u i t o s u c i n t a é, naturalmente, porque o n o s s o problema s e não
s i t u a ao nível das m e d i d a s pormenorizadas de «política económica», m a s
a o do «funcionamento do s i s t e m a económico». Sendo a s s i m , o que reterá
sobretudo a atenção será u m a eventual alteração s u b s t a n c i a l de
filosofia
do s i s t e m a ( d a s r e f o r m a s que a m a t e r i a l i z a m ) que porventura s e t e n h a
verificado.
Q u a i s e n t ã o a s m e d i d a s t o m a d a s f a c e à s d i s t o r ç õ e s no comportam e n t o dos a g e n t e s e c o n ó m i c o s e a o s desequilíbrios g l o b a i s acima apont a d o s ? L i s t e m o s a s principais: a) A t a x a sobre o capital p a s s o u a ser
calculada sobre o s a c t i v o s líquidos, o que corresponde, n e s s a base, a u m
a b a i x a m e n t o de 7 para 5 % ( ) ; b) A t a x a sobre o s s a l á r i o s p a s s o u de
25 a 35 %; c) A repartição dos lucros entre o fundo de d e s e n v o l v i m e n t o
e o fundo «social» (prémios, acção social) p a s s o u a ficar ao critério das
e m p r e s a s , ficando i s e n t a de i m p o s t o a parte a f e c t a d a ao primeiro;
d) F o r a m s e n s i v e l m e n t e a u m e n t a d o s o s preços de f a c t o r e s de produção
com forte componente importada, por redução dos s u b s í d i o s à i m p o r t a ç ã o
ou por a u m e n t o s directos de preços, e m particular de m a t é r i a s - p r i m a s ,
e n e r g i a e t r a n s p o r t e s ; e) F o r a m criados i m p o r t a n t e s i n c e n t i v o s de crédito e de mobilização de r e s e r v a s para p r o j e c t o s «captadores de d i v i s a s » ;
/ ) T o m a r a m - s e m e d i d a s no sentido de nivelar o s s a l á r i o s entre e m p r e s a s
e de o s diferenciar dentro das e m p r e s a s , e m função do «rendimento» do
t r a b a l h o ; g) Os g r a n d e s p r o j e c t o s f i n a n c i a d o s c e n t r a l m e n t e p a s s a m a
sê-lo de f o r m a reembolsável e por critérios que t e r ã o d i r e c t a m e n t e que
v e r com a s u a capacidade de r e e m b o l s o ; h) R e f o r ç a r a m - s e certos controlos « a d m i n i s t r a t i v o s » , n o m e a d a m e n t e sobre a mobilidade da mão-de-obra ( n ã o é permitido m u d a r de e m p r e g o m a i s de t r ê s v e z e s por a n o ) ,
na f i x a ç ã o de q u o t a s de aquisição no m e r c a d o interno e externo, n a afect a ç ã o de fornecedores e clientes para certos produtos, etc. E n t r e t a n t o ,
p r o s s e g u e m c e r t a s e x p e r i ê n c i a s l i m i t a d a s n o s e n t i d o de alterar a r e g u lação do salário médio, cujos e f e i t o s já v i m o s , para u m a r e g u l a ç ã o da
« m a s s a salarial». E assinale-se, t a m b é m , entre a s m e d i d a s t o m a d a s anteriormente a 1975, a colocação s o b «supervisão especial» das cinquenta
2 1 8
( ) Esta medida poderá parecer surpreendente, se se tiver presente o clima de
«sobreinvestimento» acima referido. Asselain explica: «A variável "custo do capital"
mantém uma importância secundária nas condições actuais da economia húngara,
dependendo a procura de investimentos pelas empresas antes de mais das possibilidades imediatas de financiamento» ( A S S E L A I N [1978], p. 159). Ora estas, como veremos, foram fortemente amputadas. Aliás, a intenção das novas medidas não é reduzir
drasticamente o investimento, m a s torná-lo «mais eficiente».
!ls
m a i o r e s e m p r e s a s e s t a t a i s , a i n d a que «isso n ã o e n v o l v a quaisquer n o r m a s
especiais, preferências particulares ou u m a posição de privilégio. D e certo,
se a observação revelar a n o m a l i a s , podem ser t o m a d a s m e d i d a s individuais, m a s sempre n o quadro do s i s t e m a geral de regulação» ( ) .
J u l g a m o s que, n o essencial, será j u s t a a conclusão de T h e v e n o n
r e l a t i v a m e n t e ao sentido
d e s t a s m e d i d a s : «O t r a ç o f u n d a m e n t a l d e s t a
reforma [de 1 9 7 5 ] é que o E s t a d o parece aplicar à letra a ideia do N o v o
Mecanismo E c o n ó m i c o , tornando-se ao m e s m o t e m p o m u i t o m a i s restrit i v o [contraignant,
no original — J M P ] face à s empresas» ( ) . N a realidade, s ó para dar u m exemplo, e n q u a n t o se dá m a i o r a u t o n o m i a à s
e m p r e s a s e se procura inseri-las m a i s p l e n a m e n t e e m relações de m e r c a d o
«reais» (por via, por exemplo, de u m a m a i o r «verdade» dos preços internacionais, do ponto de v i s t a d a s e m p r e s a s ) , por outro lado, g r a n d e parte
das m e d i d a s t o m a d a s v i s a reduzir-lhes o lucro, s e n d o objectivo c o n f e s s o
dos planificadores «fazer b a i x a r o lucro residual [i. e., o que f i c a efectiv a m e n t e à disposição da e m p r e s a — J M P ] das e m p r e s a s de 35 % por
a n o » ( ) . A p a r e n t e m e n t e , estar-se-ia a s s i m a reduzir o papel do lucro
c o m o principal incentivador e m o t i v a d o r das decisões empresariais.
A i s t o respondem o s e c o n o m i s t a s h ú n g a r o s da s e g u i n t e f o r m a : «Espera-se
que a s e m p r e s a s , d e s c o n t e n t e s com o s lucros decrescentes, t e n t e m opor-se
a isso economizando m a t e r i a i s , particularmente o s i m p o r t a d o s c u j o s
preços a u m e n t a r a m m u i t o , e t e n t a n d o s u b s t i t u i r o s m a t e r i a i s m a i s caros
v i n d o s dos p a í s e s c a p i t a l i s t a s por m a t e r i a i s m a i s b a r a t o s dos p a í s e s
s o c i a l i s t a s ou internos» ( ) . «Com u m a m a i s b a i x a t a x a de lucro, a u m e n tará a sensibilidade a o s c u s t o s , e s t i m u l a n d o a s e m p r e s a s à redução dos
c u s t o s de produção, e c o n o m i a de m a t e r i a i s , a u m e n t o da produtividade
do trabalho, m e l h o r utilização dos a c t i v o s f i x o s e circulantes. I s t o e s t á
de h a r m o n i a com o s m a i s i m p o r t a n t e s o b j e c t i v o s do 5.° Plano. Consequentemente, a h a r m o n i a entre o s i n t e r e s s e s nacional e das e m p r e s a s
melhorará» ( ) .
E m resumo, c r e m o s poder concluir que a filosofia geral do N M E
se m a n t é m , e que n ã o é por ora justificado presumir, c o m o parece fazê-lo
M. L a v i g n e , que a experiência t e m o s dias c o n t a d o s e tenderá a reaprox i m a r - s e do modelo de planificação central.
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23
TIMAR [1973], p. 296. Sobre este ponto v. LAVIGNE [1975], p. 21.
T H E V E N O N [1978], p. 103.
Id., id.
PALUVÊGI [1976], p. 25.
GADO [1976], p. 353.
D e i x a n d o a g o r a de lado o s a s p e c t o s e s t r i t a m e n t e económicos, será
de m u i t o interesse, do n o s s o ponto de vista, observar como paralelamente
t e r ã o evoluído a s f o r m a s de c o m p o r t a m e n t o social e institucional no
c o n t e x t o g e r a l das r e f o r m a s económicas.
Começando pelos a j u s t a m e n t o s institucionais, v e j a m o s a f o r m a como
F a l u v é g i aborda o problema: «A repartição das u n i d a d e s e c o n ó m i c a s por
r a m o s de acordo com o s o b j e c t i v o s f i x a d o s e m t e r m o s físicos, que foi
estabelecida durante o s i s t e m a de P l a n o aplicado por i n s t r u ç õ e s admin i s t r a t i v a s , m a n t e v e - s e n o essencial até h o j e ; naquele s i s t e m a , cada empresa t i n h a u m a t a r e f a que lhe era atribuída do e x t e r i o r e de c i m a ; a s
f u n ç õ e s produtiva, g r o s s i s t a , retalhista, de comércio e x t e r n o e de s e r v i ç o s
e s t a v a m r i g i d a m e n t e s e p a r a d a s u m a s das o u t r a s . O carácter das organizações, o conteúdo da s u a actividade alterou-se profundamente. A planificação a nível do r a m o só l e n t a m e n t e e s t á a t i n g i n d o u m n o v o s e n t i d o ;
no controlo a nível do ramo, a s o r g a n i z a ç õ e s f u n c i o n a i s e bancárias t ê m
dificuldade e m encontrar m é t o d o s a j u s t a d o s ao seu n o v o tipo de tarefas» ( ) . Timár, pelo seu lado, referindo-se ao «primeiro período» da
aplicação da reforma, r e f e r e : «A m á q u i n a [dos ó r g ã o s por r a m o ] alterou-se com a l g u m a dificuldade para o s n o v o s m é t o d o s de trabalho e isto
c a u s o u problemas. E m c e r t o s locais prevaleceram o s a n t i g o s m é t o d o s ,
enquanto n o u t r o s era o outro e x t r e m o que s e o b s e r v a v a : o m i n i s t é r i o não
interferia quando isso competia à s u a autoridade e quando era desejável
que o fizesse» ( ) . N a realidade, i s t o não parece e s t a r t o t a l m e n t e ultrapassado, m a n t e n d o - s e relações entre a s instituições e a s e m p r e s a s que
relevam, e m importante parcela, do « a n t i g o s i s t e m a » : «Se já não acontece
que u m m i n i s t é r i o t r a n s m i t a instruções e s c r i t a s a u m a empresa, e m cont r a p a r t i d a a s i n s t r u ç õ e s v e r b a i s são frequentes. A s u a frequência a l i á s
a u m e n t o u n o s ú l t i m o s anos, na m e d i d a e m que a s perturbações do mercado mundial i m p u s e r a m a j u s t a m e n t o s f e i t o s m u i t a s v e z e s por tacteio.
A o m e s m o t e m p o que r e c o n h e c e m que, e m c e r t o s casos, o s r e g u l a d o r e s
indirectos s ã o inoperantes ou insuficientes e que, por e s s e facto, a s inst r u ç õ e s a d m i n i s t r a t i v a s directas são i n e v i t á v e i s , o s planificadores húng a r o s e s t i m a m que se recorre a i n d a e x c e s s i v a m e n t e a e s s e tipo de proc e s s o s , que se t r a t a na realidade com m u i t a frequência de m a n i f e s t a ç õ e s
i n t e m p e s t i v a s de autoritarismo, e que i s s o impede de s i t u a r claramente
a s responsabilidades. [ A l é m d i s s o ] os d i r i g e n t e s das e m p r e s a s m a n t ê m - s e
b a s t a n t e dependentes dos m i n i s t é r i o s de tutela, que o s n o m e i a m , f i x a m
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2 2 5
(*") FALUVÉGI [1974], p. 169.
( ) TIMÁR [1973], p. 292.
a l
a s m o d a l i d a d e s da s u a r e m u n e r a ç ã o e p o d e m exonerá-los» ( ) . Que
e s t a q u e s t ã o da p e r s i s t ê n c i a institucional d a s « v e l h a s relações» preocupa
o s reformadores h ú n g a r o s , prova-o a a p r e s e n t a ç ã o de n u m e r o s a s prop o s t a s t e n d e n t e s a solucioná-la. A m a i s ousada, citada c o m frequência,
é a de M á r t o n Tardos, s e g u n d o a qual a s e m p r e s a s p a s s a r i a m a ser cont r o l a d a s por «uma "organização dos proprietários de a c t i v o s " ( d e s i g n a d a
por T a r d o s como a rede dos B a n c o s Comerciais e de P r o d u ç ã o ) , que seria
independente da organização da a d m i n i s t r a ç ã o do E s t a d o (e subordinada
n ã o ao C o n s e l h o de M i n i s t r o s m a s d i r e c t a m e n t e ao P a r l a m e n t o ) . A s e m p r e s a s não e s t a r i a m relacionadas com e s t a s o r g a n i z a ç õ e s e m função da
s u a filiação sectorial. O s e u papel de s u p e r v i s ã o estender-se-ia à i n v e s t i g a ç ã o do u s o efectivo dos a c t i v o s da empresa, bem c o m o a u m r e a g r u p a m e n t o parcial d e s t e s , e t a m b é m à apreciação d a actividade d o s dirig e n t e s da empresa, s u a n o m e a ç ã o e e x o n e r a ç ã o . S e g u n d o Tardos, sob t a i s
condições i n s t i t u c i o n a i s , a concorrência de u n i d a d e s e c o n ó m i c a s socialist a s m o t i v a d a s pelo lucro poder-se-ia d e s e n v o l v e r n u m m e r c a d o organizado, bem como a prossecução de u m a e c o n o m i a e f e c t i v a de f a c t o r e s de
produção, e, entre outros, de trabalho v i v o e da s u a i m p l i c a ç ã o : o s c u s t o s
salariais» ( ) . T a r d o s pretenderia, com isto, a criação de u m «quase-mercado» de trabalho, no qual o s a u m e n t o s s a l a r i a i s s ó s e r i a m decididos
s e l h e s correspondesse u m a u m e n t o de lucros (via a u m e n t o da produtiv i d a d e ) . S e g u n d o o a u t o r que a c a b a m o s de citar, «a proposta de T a r d o s
funda-se no conflito entre d i r i g e n t e s e t r a b a l h a d o r e s (Tardos considera
que, desde que tal conflito n e c e s s a r i a m e n t e e x i s t e , s ó é v a n t a j o s o que
s e j a e v i d e n c i a d o ) . [Ora] é, pelo m e n o s , duvidoso que e s t e procedimento
seja viável e compatível com a e s t r u t u r a social socialista» ( ) .
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2 2 S
P a s s e m o s , então, a o s a s p e c t o s m a i s d i r e c t a m e n t e l i g a d o s ao comp o r t a m e n t o dos a g e n t e s e c o n ó m i c o s e sociais, e sobretudo ao e x a m e da
m e d i d a em que t e r ã o sido influenciados pelas r e f o r m a s h ú n g a r a s . Ê, de
u m m o d o geral, a questão, c o n s t a n t e m e n t e referida pelos e c o n o m i s t a s ,
da consciência
social.
A p e n a s dois a n o s a p ó s o arranque d a s r e f o r m a s , e s c r e v i a Csikós- N a g y : «Tem sido f e i t o m u i t o m a i s para colocar o d e s e n v o l v i m e n t o económ i c o n u m a base equilibrada e planificada do que é, por enquanto, percebido pela consciência social. V e j a m o s o caso da oferta de bens. D u r a n t e
m a i s de d u a s décadas f o r a m t í p i c a s a s s i t u a ç õ e s periódicas de e s c a s s e z
("••') CHEVALIER [1978]-2, pp. 69-70.
( ) RÊVESZ [1974], p. 70.
(™) Id., p. 71.
2jr
de carne, m a t e r i a i s de construção, a u t o m ó v e i s ligeiros e v á r i o s outros
b e n s de consumo. O a b a s t e c i m e n t o de n u m e r o s o s b e n s de c o n s u m o era
insuficiente, o u era m e s m o nulo. Com a r e f o r m a de 1968, a o f e r t a de bens
melhorou m u i t o m a s u m a solução completa dos problemas com ela relacionados levará a l g u n s anos. [Ora] generalizou-se a opinião de que a
reforma resolveria e s t e s problemas de u m s ó golpe. N ã o c o n s e g u i m o s
tornar claro que u m a e s t r u t u r a económica centrada sobre b e n s de produção não pode ser m u d a d a de u m dia para o outro n o s e n t i d o de elevar
o c o n s u m o a o m e s m o n í v e l » ( ) . E , depois de dar outro e x e m p l o interessante, relativo à sensibilidade social à «flexibilidade» de preços, conclui
dizendo s e r e m m ú l t i p l o s o s «factores indicando que aqueles que f o r m u l a m
a política económica t ê m t a m b é m de actuar n a formação
da
consciência
social. (...) O que constitui o m a i s g r a v e dilema a e s t e respeito é s e m
dúvida a e x i s t ê n c i a de expectativas
sociais
desligadas
dos
resultados
[performance]
ou, por o u t r a s palavras, o juízo sobre a s condições de vida
independentemente do e s t a d o das f o r ç a s produtivas» ( ° ) . D o i s a n o s m a i s
tarde, é T i m á r que aborda o problema, e m t e r m o s de democracia
económica: « A reforma do controlo e g e s t ã o económica criou a s pré-condições
para a n e c e s s á r i a evolução da d e m o c r a c i a socialista, a ausência das quais
a p e n a s permitia, a n t e s [i. e. n o s i s t e m a anterior — J M P ] , a s u a referência m e r a m e n t e formal. (...) C o m o resultado da reforma, o s p r o c e s s o s
e c o n ó m i c o s t o r n a r a m - s e m a i s c o n t r o l á v e i s e m a i s i n t e l i g í v e i s pelo grande
público» ( ) . « A possibilidade de contribuição e s p o n t â n e a dos trabalhadores — quer directamente, quer a t r a v é s dos s e u s ó r g ã o s representat i v o s — para determinar e r e s o l v e r p r o b l e m a s alargou-se. A actividade
pública da população, a s u a participação n o s a s s u n t o s públicos aumentou» ( ) . N o e n t a n t o , «uma m e l h o r apreciação d a s relações de valor t a m bém traz à superfície f e n ó m e n o s s o c i a l m e n t e i n d e s e j á v e i s (aparecimento
m a i s aberto de s í m b o l o s de e s t a t u t o , e s f o r ç o s n a obtenção de benefícios,
e t c ) , m a s t a m b é m facilita o r e c o n h e c i m e n t o e o combate a o s problemas.
(...) O d e s e n v o l v i m e n t o da democracia dentro da e m p r e s a não se pode
considerar s a t i s f a t ó r i o (...) A contradição entre a direcção e s t a t a l repres e n t a n d o o s i n t e r e s s e s do proprietário e o s i n t e r e s s e s i m e d i a t o s dos trab a l h a d o r e s torna-se m a n i f e s t a s o b v á r i a s f o r m a s : o dilema entre aument a r o s lucros a n u a i s ou a longo prazo, a contradição entre conservar ou
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C- ')
( )
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CSIKÓS-NAGY [1970], p. 171.
Id., p. 172.
TIMÃR [1973], p. 299.
Id., id.
desenvolver a estrutura, a e s c o l h a entre a s e g u r a n ç a e o a s s u m i r riscos,
entre a u m e n t o s salariais e d e s e n v o l v i m e n t o , i. e., o s p a r e s representando
o p r e s e n t e e o futuro, e o s e u conflito» ( ) . M a i s r e c e n t e m e n t e ainda,
e m 1976, F a l u v é g i exprime-se de m o d o a podermos p e n s a r que se a v a n ç o u
pouco n e s t e c a m p o : «O n o v o s i s t e m a de i n c e n t i v o s financeiros n ã o
consolidou s u f i c i e n t e m e n t e a "perspectiva de proprietário"
[owner's
approach]
por parte dos trabalhadores, n ã o s e ampliaram suficientem e n t e o s direitos d e m o c r á t i c o s dos c o l e c t i v o s de produtores e, portanto,
o controlo social n ã o se pôde verificar com a amplitude desejada. Os dirig e n t e s das e m p r e s a s não f o r a m capazes de reconciliar o s i n t e r e s s e s de
hoje com o s de a m a n h ã : ainda n ã o s e expandiu s u f i c i e n t e m e n t e a perspectiva de l o n g o p r a z o » ( ) . E m a i s adiante a f i r m a : «A f i m de que se
o b t e n h a o s e f e i t o s d e s e j a d o s é n e c e s s á r i o u m a completa transformação
da
consciência,
que t a m b é m s e t e m de m a n i f e s t a r n o c o m p o r t a m e n t o económico. (...) N o v a s ordens e r e g u l a m e n t a ç õ e s n ã o d e v e m s e r a p e n a s
"aceites", m a s a s p e s s o a s t ê m de trabalhar dentro do s e u espírito, a s u a
actividade quotidiana t e m de ser p e r m e a d a p e l o s n o v o s princípios e pela
n o v a perspectiva, elas devem o u s a r avaliar por si próprias a s n o v a s oportunidades, e i s t o não a c o n t e c e de u m dia para o outro, quer n a s e m p r e s a s
quer n a s i n s t i t u i ç õ e s de controlo. (...) A t r a n s f o r m a ç ã o da consciência
social e o processo de cristalização e x p r e s s o t a m b é m n o s r e g u l a d o r e s
e s t ã o a ter l u g a r n o s n o s s o s d i a s ; t ê m de s e r intensificados e canalizados
na direcção correcta» ( ) .
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2 3 4
2 3 5
E s t a q u e s t ã o da «deficiente» consciência social m a n i f e s t a - s e s o b a s
m a i s d i v e r s a s f o r m a s e é apontada, s e g u n d o o s c a s o s e o s a u t o r e s , quer
c o m o u m «entrave» ao b o m f u n c i o n a m e n t o do s i s t e m a (logo, e m certa
medida, c o m o u m a «causa» do seu m a u f u n c i o n a m e n t o ) quer como u m a
r e s u l t a n t e de c e r t o s m e c a n i s m o s , a corrigir, do próprio s i s t e m a . E x a m i n a r e m o s a p e n a s a l g u n s a s p e c t o s m a i s concretos e m dois d o m í n i o s dist i n t o s : o s c o m p o r t a m e n t o s na e m p r e s a e o s c o m p o r t a m e n t o s e m c e r t a s
á r e a s da v i d a social.
A o nível da e m p r e s a t e r e m o s , por u m lado, o problema da participação n a s decisões e por outro o da disciplina n o trabalho. Sobre o primeiro, e para além de n u m e r o s a s referências, a l g u m a s já citadas, sobre
a difícil a d a p t a ç ã o da organização interna d a s e m p r e s a s à s n o v a s condições, que e x i g i r i a m u m a «democratização» da empresa, d i s p o m o s de
( M ) TTMAR [1973], p. 299.
( <) FAL.UVÊGI [1976], p. 21.
Id., p. 22.
a
u m t e x t o m u i t o elucidativo e recente, j u s t a m e n t e intitulado «La participation directe des travailleurs a u x décisions dans l e s u s i n e s h o n g r o i s e s »
de dois a u t o r e s h ú n g a r o s , que t ê m procedido a e s t u d o s e inquéritos direct o s sobre a m a t é r i a ( ) . Começam n a t u r a l m e n t e por pôr a s q u e s t õ e s de
princípio e a s a f i r m a ç õ e s g e n é r i c a s de o r i g e m oficial: «Trabalhadores
instruídos e a n i m a d o s de u m a consciência social, a s s e g u r a d o s do seu
e m p r e g o e disfrutando de condições de e x i s t ê n c i a em c o n s t a n t e m e l h o r i a
t ê m a possibilidade de s e i n t e r e s s a r pelo conteúdo do seu trabalho e pelo
quadro social m a i s largo e m que s e e x e r c e a s u a actividade», e, citando
a s decisões do 11.° C o n g r e s s o do P a r t i d o ( 1 9 7 5 ) , «a democracia na oficina e n o serviço faz parte i n t e g r a n t e da d e m o c r a c i a s o c i a l i s t a (...)
[ m a s ] a d e m o c r a c i a na oficina e n o serviço n ã o e s t á à altura das n o s s a s
e s p e r a n ç a s e o seu conteúdo como o s s e u s m é t o d o s t ê m de s e r m e l h o rados» ( ) . P a s s a n d o ao concreto, m e n c i o n a m o s r e s u l t a d o s de u m inquérito efectuado n a fábrica de v a g õ e s e m a t e r i a l ferroviário, e m que o s
t r a b a l h a d o r e s se p r o n u n c i a v a m sobre o s d o m í n i o s de actividade da e m presa e m que seria possível a s u a participação, directa ou indirecta, n a s
decisões. A s conclusões s ã o s i g n i f i c a t i v a s : u m a m a i o r i a de trabalhadores
j u l g a possível e s s a participação e m decisões r e l a t i v a s ao seu próprio
trabalho e à s u a própria s i t u a ç ã o na empresa, e impossível e s s a participação e m d o m í n i o s como «planificação da produção» (59 % contra 3 0 % ) ,
«adopção de m á q u i n a s e m a t e r i a i s novos» ( 6 5 % contra 2 4 % ) , «política
de p e s s o a l e planificação da mão-de-obra» ( 7 6 % contra 1 3 % ) , «recrut a m e n t o » (82 % contra 11 %) e «redução da produção e e n c e r r a m e n t o
de unidades fabris» (53 % contra 6 % ) . Os a u t o r e s c o m e n t a m do s e g u i n t e
m o d o : «A i n v e s t i g a ç ã o e a experiência quotidiana m o s t r a m que na H u n g r i a a s n e c e s s i d a d e s e a s m o t i v a ç õ e s dos t r a b a l h a d o r e s são a n t e s de
m a i s de ordem material, donde se s e g u e que a s q u e s t õ e s salariais deverão
ter u m l u g a r importante e m qualquer p r o g r a m a de participação. H á t o d a s
a s razões p a r a pensar que a s decisões a u m escalão inferior (oficina,
fábrica) e a s que t ê m consequências práticas i m e d i a t a s t o c a m m a i s de
perto o p e s s o a l que a s que são t o m a d a s a u m e s c a l ã o superior (o da
sociedade o u da e m p r e s a ) e cujos e f e i t o s ( e s t r a t é g i c o s ) só se m a n i f e s t a r ã o a l o n g o prazo. Tratando-se das primeiras, o s t r a b a l h a d o r e s podem
realmente acompanhá-las, apreender-lhes o s e n t i d o e m e s m o influenciá-las,
j á que e s t ã o l i g a d a s à s u a actividade q u o t i d i a n a ; q u a n t o à s s e g u n d a s ,
elas s i t u a m - s e a u m nível que u l t r a p a s s a o da sua informação, da sua
2 3 0
2 3 7
(=>«) HÉTHY & M A K ô [1977].
P ') Id., pp. 10-11 e nota 1 da p. 11.
3
competência, da s u a instrução e dos s e u s poderes» ( ) . Os a u t o r e s assinalam, de resto, que «a m u i t o s directores (...) a participação aparece
c o m o u m fardo suplementar, ou m e s m o c o m o u m e l e m e n t o de natureza
a conduzir a u m a f r o u x a m e n t o da disciplina e a u m a b a i x a de rendimento»,
m a s a c r e s c e n t a m , n ã o s e m u m certo cinismo, que n o s c a s o s e m que o s
directores a c e i t a r a m experiências participativas, e s t a s t i v e r a m j u s t a m e n t e o m é r i t o de «aligeirar o fardo da direcção, d e i x a n d o à s equipas
[de t r a b a l h a d o r e s ] a t a r e f a difícil de avaliar o trabalho realizado p e l o s
s e u s m e m b r o s e, com ela, a s t e n s õ e s e conflitos que lhe são inerentes» ( ) .
Referindo-se ainda à s decisões de política, que implicam a s s u m i r riscos
e a correspondente responsabilidade, o s a u t o r e s dizem que «se o exercício de t a i s atribuições é questão de rotina para o pessoal de enquad r a m e n t o e de direcção, para o s t r a b a l h a d o r e s é, pelo m e n o s por agora,
algo de n o v o e de b a s t a n t e a r r i s c a d o ; quem n ã o t e m o h á b i t o de se exprimir e m público arrisca-se a tornar-se ridículo, ou m e s m o a provocar conf l i t o s que podem prejudicá-lo ou à s u a equipa» ( ° ) , o que é u m a f o r m a
quase brutal de sublinhar o b a i x o nível de consciência política, a completa
ausência de h á b i t o s de d i s c u s s ã o colectiva, a forte hierarquização v i g e n t e
e, c o m o síntese, o r e t r a t o m e s m o da f a m o s a d i c o t o m i a « n ó s / e l e s » (dirig e n t e s / t r a b a l h a d o r e s ) que prevalece. Sobre e s t a dicotomia diremos a l g o
m a i s adiante.
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23!>
24
Os a u t o r e s concluem, de resto, com lucidez que «não é possível considerar a democracia n a oficina e no serviço como u m a q u e s t ã o estritam e n t e a d m i n i s t r a t i v a ; t e m o s de v e r nela u m problema m a i s v a s t o de
o r g a n i z a ç ã o política e s o c i a l » ( ) , e, com u m o p t i m i s m o t ã o oficial
q u a n t o contraditório, a p ó s o que d i s s e r a m sobre o «poder efectivo» dos
trabalhadores, que «o f a c t o de que o s m e i o s de produção s ã o propriedade
do E s t a d o e que o poder político e s t á n a s m ã o s dos t r a b a l h a d o r e s e do
s e u partido, facilita por certo a adopção d a s m e d i d a s que s e impõem,
m a s n ã o cria a u t o m a t i c a m e n t e a s condições n e c e s s á r i a s » ( ) .
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2 4 2
Q u a n t o à q u e s t ã o da disciplina n o trabalho, outro a u t o r e x p r i m e a
s u a preocupação, relacionando-a m a i s d i r e c t a m e n t e com a s deficiências,
já a c i m a a p o n t a d a s , do s i s t e m a de «regulação», que, como v i m o s , incita
a s e m p r e s a s a m a n t e r u m e x c e d e n t e de t r a b a l h a d o r e s r e l a t i v a m e n t e à s
í )
C-™)
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( )
( )
238
2,
2J1
212
HÊTHY & MAKO [1977], p. 13.
Id., pp. 13-14.
Id., p. 16.
Id., p. 22.
Id., p. 23.
s u a s n e c e s s i d a d e s . Diz e l e : « N e s t a s i t u a ç ã o de "precisa-se t r e m e n d a m e n t e
de t r a b a l h a d o r e s " e "se n ã o g o s t o , v o u - m e embora", o s d i r i g e n t e s de
e m p r e s a cada vez m e n o s podem t o m a r m e d i d a s e n é r g i c a s contra a ausência
ou o d e c r é s c i m o de disciplina no trabalho, e a b a i x a intensidade [de trabalho daí r e s u l t a n t e ] induz n o v o s a u m e n t o s de procura (...)
[Esta]
f r o u x a disciplina de trabalho, que pode ser atribuída, entre o u t r o s factores, à s i t u a ç ã o t e n s a do emprego, a c t u a contra a m e c a n i z a ç ã o e contra
a aplicação de s o l u ç õ e s de alto nível t e c n o l ó g i c o (...) [ P i o r a i n d a ] , com
u m baixo nível de disciplina, m e s m o u m a m e c a n i z a ç ã o racional n o u t r a s
condições pode tornar-se n u m f a c t o r de a u m e n t o de perdas e de desordem» ( ) . T a m b é m Timár, no seu t e x t o sobre política de emprego, se
refere n a t u r a l m e n t e a e s t e ponto. E , enfim, porque n a perspectiva domin a n t e t o d a s a s q u e s t õ e s se a c a b a m por traduzir n o problema dos e s t í m u l o s
m a i s adequados para obter o s resultados desejados, é i n t e r e s s a n t e citar
u m a p a s s a g e m do «compte-rendu» da conferência sobre « E s t i m u l a ç ã o
e c o n ó m i c a e social dos trabalhadores», de Março de 1974, onde se coloca
u m a dramática i n t e r r o g a ç ã o : «O reforço dos "requisitos m í n i m o s " [de
rendimento]', de "responsabilidade", etc. m e n c i o n a d o por v á r i o s particip a n t e s identificava-se com o problema g e r a l de saber s e pode h a v e r u m a
e s t i m u l a ç ã o eficiente s e m u m a certa f o r m a de coerção. A e s t e respeito,
dever-se-ia a c e n t u a r u m a dupla exigência, s e g u n d o a qual o s trabalhadores deveriam por u m lado s e n t i r a natureza h u m a n a e p r o g r e s s i s t a
do n o s s o s i s t e m a social, e, por outro, cumprir o s s e u s deveres para com
a sociedade» ( ) .
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2 4 4
Se p a s s a r m o s aos c o m p o r t a m e n t o s «fora da empresa», em v á r i o s
d o m í n i o s da vida social, p o d e m o s colocar-nos n a p e r s p e c t i v a do «desenv o l v i m e n t o de f e n ó m e n o s socialmente indesejáveis» (v. citação de Timár,
pág. 2 0 2 ) , m a s convirá i n t e r r o g a r m o - n o s sobre s e t a i s f e n ó m e n o s não
s e r ã o inerentes à lógica m e s m a do s i s t e m a que se procura aplicar, por
oposição à rigidez do s i s t e m a anterior. A s s i m , u m a u t o r assinala, n o
domínio do c o n s u m o , a s distorções c a u s a d a s no «ideal de bem-estar» por
aquilo a que c h a m a o «efeito pequeno-burguês», referindo ainda que «a
sociedade não pode, no curto prazo, proporcionar a cada u m a s condições
n e c e s s á r i a s para u m d e s e n v o l v i m e n t o diversificado da personalidade»,
para concluir que aquelas distorções «não podem s e r e l i m i n a d a s lutando
contra o s f e n ó m e n o s m a s a p e n a s pela f o r m a ç ã o planificada das condições
RÊVÊSZ [1972], pp. 300-301.
(=") BIHARI [1974], p. 246.
de v i d a e da consciência [ s o c i a l ] » ( ) . O m e s m o a u t o r sublinha, de resto,
a i m p o r t â n c i a que t ê m , n a criação d e s t a distorção do ideal de b e m - e s t a r
(ou seja, n o d e s e n v o l v i m e n t o de e x p e c t a t i v a s de u m a «sociedade de cons u m o » de t i p o o c i d e n t a l ) , o s f e n ó m e n o s de e s c a s s e z de h a b i t a ç ã o , de
t r a n s p o r t e s e de serviços, a s s o c i a d o s c o m u m a u m e n t o d o s r e n d i m e n t o s
e com aspirações que a introdução do N M E alimentou, s e m poder s a t i s fazer a curto prazo. Kornai, pelo seu lado, n u m a r t i g o j u s t a m e n t e i n t i t u lado «A medida da escassez», a p o n t a idênticas f r u s t r a ç õ e s não só naqueles sectores, m a s m e s m o a o nível de certos b e n s de consumo, sofisticando a análise e abordando a q u e s t ã o da «substituição forçada» (não
f a l t a m sapatos,
f a l t a m os sapatos
que os consumidores
desejariam).
Diz e l e : «A o f e r t a melhorou m u i t o na H u n g r i a n o s ú l t i m o s anos, no ent a n t o a e s c a s s e z de certos bens e serviços ocorre r e p e t i d a m e n t e (...)
Ou f a l t a m c o m p l e t a m e n t e n o s armazéns, ou a s u a o f e r t a é flutuante e
desigual a s u a distribuição regional (...) O c o n s u m i d o r h ú n g a r o m é d i o
tende a crer que [a s u b s t i t u i ç ã o f o r ç a d a ] é u m f e n ó m e n o característico
especificamente da e c o n o m i a do seu país. E s t á errado, contudo, pois a
s u b s t i t u i ç ã o forçada e x i s t e e m qualquer s i s t e m a económico (...) A diferença essencial e s t á n o s d o m í n i o s e m que s e verifica, na frequência, na
intensidade e n o s m e c a n i s m o s que a induzem ou eliminam» ( ) .
2 4 5
2 4 6
Ocorre e n t ã o interrogar-nos, n a e s t e i r a de Timár, se u m s i s t e m a
que incita à iniciativa e à prossecução dos i n t e r e s s e s m a t e r i a i s individuais, m a s ainda não c o n s e g u i u d o m i n a r f e n ó m e n o s de e s c a s s e z e m sect o r e s e s s e n c i a i s e, sobretudo, dá indício de u m baixo nível de «consciência
socialista», não e s t a r á a f o m e n t a r c o m p o r t a m e n t o s expeditivos, l e g a i s
ou m e s m o ilegais, que precisamente contrariam o aprofundamento d e s s a
m e s m a consciência. É certo que no jornal oficial Nepszabadsag
já se escrev e u (Julho de 1973) que «é possível v i v e r e p e n s a r como s o c i a l i s t a m e s m o
n u m a c a s a de c a m p o e m e s m o tendo u m automóvel» ( ) , m a s e s s e m e s m o
jornal já a n t e s (19 de Outubro de 1970) t a m b é m se i n t e r r o g a v a : «Muitos
e c o n o m i z a m para u m carro, u m a c a s a de campo ou u m a v i a g e m , e a l g u n s
já o c o n s e g u i r a m . "Como e com quê?", poder-se-iam p e r g u n t a r dezenas
o u m e s m o c e n t e n a s de m i l h a r de p e s s o a s que s e e s f o r ç a m por v i v e r dentro
do o r ç a m e n t o ou que t ê m problemas de a l o j a m e n t o . Como podem a l g u n s
m a n d a r construir c a s a s de c a m p o quando f a l t a m m a t e r i a i s para construir
n o v o s edifícios? A s p e s s o a s m a i s privilegiadas s ã o t a m b é m a s que m a i s
2 4 7
p ) KÓZMA [1976], p. 212.
p") KORNAI [1976]-2, pp. 321, 325 e 326.
P") Cit. em CONNOR [1975], p. 121.
4S
f a z e m para a prosperidade da c o m u n i d a d e ? A t é onde podem ir a s diferenças de rendimento e de nível de vida n u m a sociedade s o c i a l i s t a ? E o
que será dos f i l h o s ? A que levarão a s d e s i g u a l d a d e s da propriedade priv a d a quando a l g u n s h e r d a r a m riquezas e o u t r o s a p e n a s a s preocupações
da vida quotidiana?» ( ) . E não se pense que, ao referir «os m a i s privilegiados» s e e s t á n e c e s s a r i a m e n t e a apontar para a s c a m a d a s d i r i g e n t e s
do E s t a d o o u do Partido. A i n d a n o m e s m o jornal (10 de A g o s t o de 1973)
se denunciam o s «especuladores que s a b e m sempre fazer m u i t o dinheiro
s e m t r a b a l h a r : t a i s p e s s o a s preferem a c i m a de tudo o s n e g ó c i o s l i g a d o s
ao imobiliário e à revenda de condomínios [ a p a r t a m e n t o s e m propriedade
horizontal, cujo crédito é facilitado e a t r a n s a c ç ã o posterior autorizada — J M P ] ( » ( ) .
2 4 8
249
M a s m e s m o n o plano e s t r i t a m e n t e legal, v e j a m o s e m que resulta a
combinação da e s c a s s e z de s e r v i ç o s com o i n c i t a m e n t o à utilização dos
t e m p o s livres para fins l u c r a t i v o s : « N o que t o c a à c l a s s e operária, pode
hoje distinguir-se u m a c l i v a g e m cujo efeito moral t e m de s e r s e g u i d o
com atenção. E m n u m e r o s o s r a m o s o s operários t ê m a possibilidade de
completar o s e u r e n d i m e n t o por m e i o de actividade n o domínio dos serviços. E m si, tal n ã o t e m g r a v i d a d e pois cada m o e d a g a n h a resulta de
u m trabalho fornecido. (...) Sabidas a s insuficiências crónicas do s e c t o r
dos serviços, e a verdadeira n e c e s s i d a d e deste tipo de trabalho, conclui-se
i n e v i t a v e l m e n t e que h á que encorajá-lo e não travá-lo. O problema e s t á
noutro p o n t o : (...) será difícil e m breve s u b s t i t u i r a mão-de-obra n o s
r a m o s e m que o s operários não t ê m qualquer possibilidade de t e r actividades fora das e m p r e s a s . U m fundidor, u m laminador, u m operário têxtil,
u m t i p ó g r a f o n ã o podem t r a b a l h a r e m serviços privados [contrariamente
a o s operários da construção civil, da reparação de a u t o m ó v e i s , e x e m p l o s
t a m b é m c i t a d o s pelo m e s m o a u t o r — J M P ) » ( ) .
2 5 0
Cremos s e r e m s u f i c i e n t e s e s t e s exemplos, e m a i s p o d e r í a m o s citar,
de que, enquanto a aplicação do N M E , no domínio e s t r i t a m e n t e económico, e como a c i m a v i m o s , foi c u i d a d o s a m e n t e implantada e provida de
d i s p o s i t i v o s de controlo que permitiram e v i t a r u m a inflação g a l o p a n t e
(e m e l h o r e s s e r i a m os resultados, não fora a crise do s i s t e m a c a p i t a l i s t a ) ,
já no domínio da « m o t i v a ç ã o colectiva» a evidência é r e l a t i v a m e n t e desencorajadora, n ã o parecendo, a n t e s pelo contrário, que a consciência polít i c a e social s e e s t e j a desenvolvendo no sentido de u m a cada vez m a i o r
( ) Cit. em CONNOR [1975], p. 122.
(=") Id., p. 132.
( °) Id., pp. 124-125, cit. da revista Vj Iras, Fevereiro de 1973.
Í4S
M
'participação
colectiva
ou de u m e m p e n h a m e n t o crescente e m t a r e f a s de
utilidade colectiva, como tal a s s u m i d a s independentemente dos benefícios
m a t e r i a i s daí r e s u l t a n t e s . O problema é, de resto, crucial e c e r t a m e n t e
de difícil solução, j á que o N M E s e funda n u m a teoria e m que a p e n a s
se pede a cada indivíduo
ou organização
que m a x i m i z e o seu próprio
benefício, com b a s e n o s i s t e m a de preços e i n c e n t i v o s v i g e n t e . Ora tal
s i s t e m a encontra p r e c i s a m e n t e a s u a dinâmica na crescente «diferenciação
de rendimentos», que n ã o pode deixar de acentuar o s conflitos de inter e s s e s e a própria «discriminação» social. É i n t e r e s s a n t e deixar aqui
r e g i s t a d a a p o s i ç ã o de u m dirigente sindical h ú n g a r o sobre e s t a s questões, e sublinhar a s u a perspectiva de f a c t o m u i t o m a i s «sociológica»
do que «política» (citação no discurso indirecto por s e t r a t a r do relato
de u m a i n t e r v e n ç ã o s u a n u m a C o n f e r ê n c i a ) : «O orador [ T a m á s Meitner,
dirigente do Conselho N a c i o n a l dos S i n d i c a t o s ] foi de opinião de que s e
t e m de t o r n a r claro em que m e d i d a o i n t e r e s s e é u m f a c t o r objectivo
e e m que medida e onde é u m f a c t o r s u b j e c t i v o ; e m que m e d i d a a estim u l a ç ã o é s i m p l e s m e n t e u m m e i o para realizar o i n t e r e s s e o b j e c t i v o ;
o que pode ser considerado c o m o u m a s i t u a ç ã o e s t i m u l a n t e do p o n t o
de v i s t a da p e s s o a estimulada. (...) Tendo-se referido ao conflito de inter e s s e s , o orador a c e n t u o u que a t o t a l eliminação de conflitos é u m a i l u s ã o ;
a verdadeira t a r e f a é "tornar clara a relação real de interesses, tratá-la
a t r a v é s do d e s e n v o l v i m e n t o de m é t o d o s e m e c a n i s m o s de s í n t e s e de inter e s s e s , de tal m o d o que o s i n t e r e s s e s p e r s p e c t i v o s da sociedade s a i a m
reforçados". (...) O s i n t e r e s s e s m a t e r i a i s e e c o n ó m i c o s t ê m u m a real
prioridade, o s f a c t o r e s morais, c o n s c i e n t e s , idênticos a o s i n t e r e s s e s persp e c t i v o s da sociedade, t ê m u m a preferência de valor. A s q u e s t õ e s dos
i n t e r e s s e s m a t e r i a i s , da e s t i m u l a ç ã o material, o s erros e e x c e s s o s que se
verificam n a prática são indicadores da necessidade de aprofundar a
i n v e s t i g a ç ã o sobre m o t i v a ç ã o e n e c e s s i d a d e s . A s f u n ç õ e s de i n t e r e s s e s e
e s t i m u l a ç ã o n ã o s e r e s t r i n g e m ao s e u efeito n o d e s e n v o l v i m e n t o da econ o m i a — eles t ê m t a m b é m u m papel n a f o r m a ç ã o [shaping:
dar f o r m a ]
do H o m e m , c u j a s n e c e s s i d a d e s t ê m de ser r e v e l a d a s por u m v a s t o trabalho de i n v e s t i g a ç ã o » ( ) .
2 5 1
T e m o s , então, por u m lado, u m s i s t e m a e c o n ó m i c o c u j o s
fundamentos
teóricos s ã o j u s t a m e n t e a o p t i m i z a ç ã o m a t e r i a l dos c o m p o r t a m e n t o s indiv i d u a i s (conducente a u m a diferenciação crescente de r e n d i m e n t o e de
poder)
e a não-participação colectiva (pois é do s i m p l e s j o g o daqueles
(-=') B I H A R I [1974], p. 242.
c o m p o r t a m e n t o s , s u p o s t o s independentes,
que resultará o m á x i m o de utilidade colectiva),
e cuja aplicação
prática,
n a f o r m a planificada, supõe
u m corpo de d i r i g e n t e s políticos e e c o n ó m i c o s capazes de traduzir num
m e c a n i s m o ó p t i m o de preços e i n c e n t i v o s o s « i n t e r e s s e s p e r s p e c t i v o s da
s o c i e d a d e » ; e, por outro, a persistência, a nível ideológico, de u m a afirm a ç ã o «socialista» a que e s t á a s s o c i a d a u m a ideia «moral» de solidariedade, de cooperação, de i g u a l i t a r i s m o , que, n o período anterior, ainda
que utilizada sobretudo com fins de propaganda e buscando criar u m
generalizado c o n f o r m i s m o político, não deixou de penetrar n a s m a s s a s ,
t o r n a n d o difícil a s u a adaptação ao n o v o s i s t e m a e imprevisível, se não
incontrolável, a s u a r e s p o s t a a o s «incentivos» nele c o n t i d o s : quer press õ e s «igualitaristas» que anulam o próprio efeito incentivador, quer
c o m p o r t a m e n t o s e x p e d i t i v o s ou m e s m o e s p e c u l a t i v o s , «socialmente indes e j á v e i s » . W . B r u s formulou de f o r m a clara, e e m p o u c a s palavras, e s t e
dilema f u n d a m e n t a l : «O conflito entre a necessidade de m a n t e r u m leque
definido de r e n d i m e n t o s e a s t e n d ê n c i a s i g u a l i t á r i a s , e m certa m e d i d a
n a t u r a i s n o n o s s o r e g i m e [ s o c i a l i s t a ] , constitui u m a das contradições
e s s e n c i a i s do socialismo, contradição que não se poderá u l t r a p a s s a r de
um "salto"»( ).
252
U m a u t o r h ú n g a r o procura tornear a questão do s e g u i n t e m o d o :
«Sempre d e s e j á m o s que o trabalho e o s s e u s r e s u l t a d o s s e reflictam n o s
rendimentos. E s t e desejo foi s a t i s f e i t o , e hoje t e m o s c i e n t i s t a s , especial i s t a s e a r t i s t a s que g a n h a m dez v e z e s m a i s que u m a operária da confecção, o que n o s parece perfeitamente natural. P e n s o que a s p e s s o a s
compreenderam que, a g i n d o a s s i m , nós não p r o c u r a m o s depreciar o s
operários,
m a s a n t e s reforçar o poder dos t r a b a l h a d o r e s concedendo u m a
c o m p e n s a ç ã o financeira a o s que t r i u n f a m na i n v e s t i g a ç ã o , na organização
e n a modernização. A s p e s s o a s razoáveis e s t i m a m connosco que n ã o h á
n i s s o n e n h u m mal, pois que a afirmação de u m princípio f u n d a m e n t a l
do s o c i a l i s m o não pode ferir o sentido de j u s t i ç a dos trabalhadores»
[sublinhados m e u s — J M P ] ( ) . A m e d i a ç ã o é aqui feita, entre a diferenciação e o i g u a l i t a r i s m o («o sentido de j u s t i ç a dos t r a b a l h a d o r e s » ) ,
por m e i o s do princípio «a cada u m s e g u n d o o seu trabalho». M a s o m a i s
i n t e r e s s a n t e n e s t e t e x t o é a clareza com que s u r g e a f a m o s a dicotomia
«nós-eles» (aqui, m u i t o concretamente, n ó s - d i r i g e n t e s / e l e s - o p e r á r i o s )
que é a n e g a ç ã o m e s m a n ã o só da «sociedade participada» m a s , sobretudo, da a f i r m a ç ã o de u m « E s t a d o operário» ou dos «trabalhadores no
2 5 3
(= ) B R U S [1967], p. 252.
( 2 5 3 ) MINC [1976], p. 11. Citação do Del-Magyarorszag
M
de 22 de Janeiro de 1972.
poder». A l i á s , e m m u i t a s d a s c i t a ç õ e s que f i z e m o s é evidente o assumir,
pelos s e u s autores, de tal dicotomia. M u i t a s o u t r a s p o d e r í a m o s fazer,
mas limitamo-nos apenas às mais sugestivas:
«Depende da relação entre d i r i g e n t e s de alto, m é d i o e b a i x o nível
e o s trabalhadores, quando e e m que m e d i d a a população poderá compreender a s n o v a s t a r e f a s que a s e m p r e s a s e n f r e n t a m , e e n t ã o eles
[ t r a b a l h a d o r e s ] poderão apoiar o s s e u s d i r i g e n t e s organizando o seu
trabalho diário m a i s eficientemente» ( ) ; «As aspirações
suscitadas
na
sociedade
p e l a política e c o n ó m i c a a u m e n t a r a m e n o r m e m e n t e (...)
Temos
de agir, de preparar
as nossas d e c i s õ e s e responder à s e x i g ê n c i a s de trabalho operacional n u m a m b i e n t e social a l t a m e n t e crítico. (...) A política
económica t e m de se justificar a si-própria n o s p r o c e s s o s reais de vida
e tornar-se aceitável t a m b é m pela sociedade» ( ) ; « D e v e m s e r d e t e c t a d a s
a s opiniões dos operários, c a m p o n e s e s e da c l a s s e trabalhadora e m geral,
e depois discutidas, g e n e r a l i z a d a s e t o m a d a s e m c o n t a n a política económica» ( ° ) [ s u b l i n h a d o s J M P ] .
2 5 4
2 5 5
25
A s i t u a ç ã o , n e s t e a s p e c t o fundamental, parece p o i s n ã o divergir m u i t o
(e, d a d a a n a t u r e z a e a f i l o s o f i a d a reforma, poderá até apresentar-se
m a i s a g u d a ) daquela que c r u a m e n t e n o s é relatada por u m a u t o r polaco
sobre o seu próprio p a í s : « A s s i n a l a m o s a e s t e respeito u m f a c t o característico, n o m e a d a m e n t e o f u n c i o n a m e n t o , n a consciência social, de u m a
c a t e g o r i a m á g i c a , d e s i g n a d a pelo vocábulo "eles" e que e n g l o b a t o d o o
aparelho económico, desde o e s c a l ã o da b r i g a d a de trabalho a t é a o das
a u t o r i d a d e s s u p r e m a s . A c a t e g o r i a "eles" é e m p r e g a d a e m oposição à s
n o ç õ e s "eu" o u "nós". E l a traduz o s e n t i m e n t o de não t e r qualquer influência sobre a s decisões t o m a d a s . (...) A p e r s i s t ê n c i a da c a t e g o r i a "eles"
n a consciência social explica-se, primeiro que tudo, pelo f a c t o de que a
população n ã o conhece n e m o s m e c a n i s m o s r e a i s da t o m a d a de decisões,
n e m o s critérios que a ela presidem, n e m o s principais a c t o r e s que n e l a
participam. A s p e s s o a s t o m a m c o n h e c i m e n t o d e s s a s c o i s a s p e l o s r u m o r e s
públicos» ( ) .
2 5 7
T e r m i n a m o s aqui o e x a m e que n o s p r o p u s e m o s f a z e r do N o v o Mecan i s m o E c o n ó m i c o h ú n g a r o , e j u l g a m o s t e r deixado b e m p a t e n t e s a s difer e n ç a s e s s e n c i a i s d a s u a concepção r e l a t i v a m e n t e a o c h a m a d o modelo
de «planificação central». N ã o terá sido difícil reconhecer, m e s m o quando
(-=')
( )
( )
(.'")
23S
2M
TTMÃR [1973], p. 290.
CSIKOS-NAGY [1970], p. 171.
CSIKOS-NAGY [1973], p. 78.
KOZMINSKI [1972], p. 27.
não c h a m a m o s e x p l i c i t a m e n t e a a t e n ç ã o para o facto, a filosofia profund a m e n t e «Langiana» do s i s t e m a ou, e m ú l t i m a análise, u m a concepção
de «eficiência económica» m u i t o afim das t e s e s neo-clássicas e dos s e u s
pressupostos.
6. D o e x a m e , a que procedemos s u c e s s i v a m e n t e , de u m debate teórico e da prática e f e c t i v a de dois « s i s t e m a s económicos» que se reclamam,
ambos, do socialismo, que conclusões p o d e m o s e queremos tirar ( ) ?
258
U m a primeira conclusão, que terá porventura já r e s s a l t a d o com suficiente clareza da e x p o s i ç ã o feita, é a enorme diferença de «empenham e n t o político» entre o s i n t e r v e n i e n t e s no debate s o v i é t i c o dos a n o s 20,
por u m lado, e o s c o n s t r u t o r e s de s i s t e m a s reais (Staline e o s s e u s seguidores, p r i m e i r o ; o s reformadores h ú n g a r o s de h o j e ) , por outro. Com efeito,
o s t e ó r i c o s dos a n o s 20, que n a s u a m a i o r i a e r a m t a m b é m d i r i g e n t e s e
m i l i t a n t e s , procuravam, a t r a v é s da reflexão t e ó r i c a sobre a prática, n u m a
f a s e e m que ainda m u i t o e s t a v a por definir, e m que o c a m p o de manobra
quer da acção quer do p e n s a m e n t o ainda era v a s t o , equacionar o s prob l e m a s de f u n c i o n a m e n t o do « s i s t e m a económico» e m l i g a ç ã o íntima
(estrutural) com a necessidade
de m o t i v a ç ã o e a d e s ã o políticas,
sobret u d o das g r a n d e s m a s s a s c a m p o n e s a s . A questão da «aliança operário-camponesa» e da forma de a concretizar, utilizando para i s s o o s instrum e n t o s económicos, foi central, como v i m o s , naquele debate. Por exemplo,
a prioridade a dar à indústria o u à agricultura, ao Plano ou a o s m e c a n i s m o s de mercado, eram discutidas e m t e r m o s de relação a estabelecer entre
o c a m p o e a cidade — e n e s s a d i s c u s s ã o o s a r g u m e n t o s e c o n ó m i c o s e
políticos c h e g a v a m a ser de difícil destrinça. N o t e - s e , a propósito, que
u m B u k h a r i n e , a p a r e n t e m e n t e m a i s preocupado com os a s p e c t o s estritam e n t e económicos, n o m e a d a m e n t e com o d e s e n v o l v i m e n t o de relações
de m e r c a d o (liberalização da iniciativa «privada» camponesa, do comércio e x t e r n o ) , a o ponto de ser hoje considerado por a l g u n s u m a u t ê n t i c o
precursor do «socialismo de mercado», era t a m b é m quem m a i s a c e n t u a v a
( ) U m a oportunidade mais para assinalar o considerável grau de subjectividade nestas matérias: as conclusões que adiantaremos são, muito conscientemente, as
que queremos tirar, em articulação com a démarche geral deste trabalho, com a sua
lógica própria, com a inexpurgável parte de ideologia contida na nossa visão prévia
destas questões. Outros poderão tirar outras conclusões, o que não poderão é reivindicar para elas uma maior objectividade: apenas será distinta, se não oposta, a ideologia
que as suporta, e como tal terá de ser assumida.
J5S
a necessidade de conquistar o s c a m p o n e s e s para a revolução e quem
a c u s a v a o s s e u s o p o s i t o r e s de pretenderem liquidar a aliança operário-camponesa.
A q u e l e s a quem acima c h a m a m o s o s «construtores de s i s t e m a s » ,
talvez por disporem de i n d i s p u t á v e i s s i t u a ç õ e s de domínio político, ou,
por o u t r a s palavras, por partirem de s i s t e m a s políticos j á e s t r u t u r a d o s
e controlados, « m o n t a r a m » (no s e n t i d o t é c n i c o do t e r m o ) sistemas
económicos e m que a c o m p o n e n t e de participação
ou adesão política
conscientes n ã o t i n h a qualquer relevância. A articulação entre s i s t e m a político e s i s t e m a económico era (é) f e i t o ao nível das i n s t â n c i a s d i r i g e n t e s
do P a r t i d o e do E s t a d o . O cidadão-trabalhador é, e m qualquer dos c a s o s
(planificação central o u s o c i a l i s m o de m e r c a d o ) , considerado a p e n a s
c o m o u m « a g e n t e económico», servindo, no primeiro caso, u m a l ó g i c a
central de a c u m u l a ç ã o acelerada, ou comportando-se t e n d e n c i a l m e n t e
como u m « m a x i m i z a d o r de utilidade» s e m e l h a n t e ao « á t o m o económico»
do m e r c a d o livre teórico e servindo, d e s s e m o d o , u m a l ó g i c a central de
«utilização eficiente de recursos», no s e g u n d o caso. N u m e n o u t r o caso,
o s indivíduos são motivados
ou incentivados,
s e g u n d o f o r m a s concebidas
a nível central, para agir n o s e n t i d o do m e l h o r c u m p r i m e n t o dos objectiv o s f i x a d o s pelo «Centro».
E s t r a n h a r - s e - á que de a l g u m m o d o s e identifique aqui, n o s t e r m o s
que a c a b a m o s de expor, dois s i s t e m a s t ã o d i s t i n t o s como o de planificação central e o de s o c i a l i s m o de mercado, ou, com m a i o r rigor, que n ã o
se a s s i n a l e s u f i c i e n t e m e n t e a conhecida oposição entre i n c e n t i v o s morais
(políticos) e i n c e n t i v o s materiais
( e c o n ó m i c o s ) , que por v e z e s s e a s s o c i a m
a cada u m dos dois s i s t e m a s , para p r e c i s a m e n t e m a r c a r a s u a oposição.
N e s t a óptica, o que d i s s e m o s aplicar-se-ia ao s e g u n d o d e s t e s s i s t e m a s ,
m a s n ã o ao primeiro, e m que h a b i t u a l m e n t e é p o s t a e m relevo a componente política,
o v o l u n t a r i s m o com que s o b r a n c e i r a m e n t e se o l h a v a m
a s «leis económicas». Sublinhámos, a seu t e m p o , e s s e a s p e c t o , indiscutível, do s i s t e m a estaliniano, m a s de igual m o d o respondemos, antecipadam e n t e , a e s t a o b j e c ç ã o : « E s t e s i s t e m a de "estímulos m o r a i s " era, ele-próprio, i n t e i r a m e n t e dirigido "de cima", c o m o t u d o o resto. I s t o é, não
se t r a t a v a de qualquer "estrutura de participação" m a s , pelo contrário,
era o E s t a d o / P a r t i d o que procurava conseguir
o e n t u s i a s m o e a participação dos trabalhadores, apontando-lhes c a s o s exemplares
ou incutindo-lhes a ideia de u m a f e r v o r o s a "sociedade solidária" (o que releva, n o
m í n i m o , de u m a atitude c l a r a m e n t e p a t e r n a l i s t a ) — e n t u s i a s m o e participação na e x e c u ç ã o de t a r e f a s e o b j e c t i v o s que ele próprio, E s t a d o /
/ P a r t i d o , definira previamente» ( ) . D i t o por o u t r a s palavras, m a i s
p r ó x i m a s da p e r s p e c t i v a e m que a g o r a c o l o c a m o s a questão, o s i s t e m a
de e s t í m u l o s era parte exclusiva
do s i s t e m a político, e e r a por ele «aplicado» ao s i s t e m a e c o n ó m i c o : e s t e era u m s i s t e m a e c o n ó m i c o puro, que
não c o n t i n h a em si e l e m e n t o s e x t r a - e c o n ó m i c o s , e que e s t a v a simplesm e n t e s u b m e t i d o a u m conceito de «eficiência» t o t a l m e n t e d i s t i n t o do
conceito de eficiência e c o n ó m i c a da t e o r i a clássica, que o «socialismo de
mercado» r e t o m o u : no s i s t e m a de planificação central, eficiência é identificada com acumulação. A lógica que preside ao s i s t e m a é a de u m a
acumulação acelerada e e s t e objectivo entronca n a t u r a l m e n t e n o objectivo
político de «reforço ão Estado socialista» ( ° ) : e n t r o n c a m e n t o que s e faz
a o s n í v e i s superiores do E s t a d o . A m o t i v a ç ã o política é i m p o s t a ao s i s t e m a económico ( s i s t e m a puro de p r o d u ç ã o / a c u m u l a ç ã o ) de f o r a p a r a
dentro, e ela n ã o é a p e n a s p o s i t i v a ou incentivadora. 3Ê-o, n o caso das
c a m p a n h a s de «trabalho voluntário», dos «heróis do trabalho», dos operários de choque e dos « s t a k h a n o v i s t a s » , etc. — t u d o i n c e n t i v o s à produtividade, ao contributo de recursos n ã o - o n e r o s o s p a r a a a c u m u l a ç ã o planificada. M a s n ã o o é no c a s o do m e c a n i s m o r e p r e s s i v o de «trabalho obrigatório» : aqui verifica-se u m duplo e f e i t o — por u m lado u m a produção
a c u s t o s laborais de pura subsistência, m a s por outro u m «incentivo» m u i t o
forte ao c o n f o r m i s m o político. D e qualquer modo, e é i s s o que importa
para a s n o s s a s conclusões, o s i s t e m a económico, tal como foi «construído», a p e n a s c o m p o r t a v a elementos
económicos
e a p e n a s previa comportamentos
económicos.
A intervenção política e social e s t a v a
ausente
do s i s t e m a económico — como, de resto, n o s i s t e m a económico de mercado livre, que a t e o r i a concebe independentemente
do s i s t e m a político,
o que, aliás, permitiu a n u m e r o s o s r e f o r m a d o r e s dos p a í s e s de L e s t e
perfilhá-la no essencial.
2 5 9
2 0
A s e p a r a ç ã o entre o político, o económico, o social, o cultural é algo
que impede o s indivíduos de s e «totalizarem» e de «totalizarem» a socie-
( ) V. p. 154 acima.
( ) Como vimos, as reformas pós-1965 na União Soviética e nos outros países de
Leste (com exclusão da Checoslováquia até 1969 e da Hungria) vieram moderar um
pouco o objectivo de acumulação «a qualquer preço» e introduzir elementos tendentes
a induzir no sistema comportamentos de «economia de recursos» e uma maior atenção
à produção de bens de consumo e à inovação tecnológica. Isso não impede que, conforme foi assinalado, o essencial do sistema não se alterou, em particular a afectação
central de bens de produção e o ênfase no cumprimento dos objectivos planificados:
de igual modo se não alteraram (antes se «adaptaram») os comportamentos «fraudulentos» de que cada um se serve para cumprir o Plano da maneira mais cómoda.
M3
M0
dade e m que v i v e m : é u m i n s t r u m e n t o ideológico
de domínio e m t o d o s
aqueles s e c t o r e s da v i d a social. E é j u s t a m e n t e na m e d i d a e m que a realidade social é i d e o l o g i c a m e n t e c o m p a r t i m e n t a d a que s e t o r n a i m p o s s í v e l
estabelecer u m a t e o r i a científica
dos c o m p o r t a m e n t o s políticos, económ i c o s , sociológicos, etc. J á v i m o s , no 1.° ensaio, o e s t r o n d o s o divórcio
entre a «teoria económica» de raiz n e o - c l á s s i c a e o f u n c i o n a m e n t o real
do « s i s t e m a económico» n o s p a í s e s c a p i t a l i s t a s , e bem a s s i m c o n s t a t á m o s
a impossibilidade de formular u m a t e o r i a do s i s t e m a e c o n ó m i c o que n ã o
t e n h a e m conta m ú l t i p l o s e l e m e n t o s e x t r a - e c o n ó m i c o s , m u i t o s dos quais
v i o l a m f r o n t a l m e n t e o s p r e s s u p o s t o s b á s i c o s da teoria «oficial». M a i s
importante ainda, c o n v é m salientar que, e m b o r a e s s a t e o r i a «oficial»
s e j a c o r r e n t e m e n t e a s s o c i a d a à d e f e s a ideológica dos s i s t e m a s políticos
de «democracia r e p r e s e n t a t i v a » , n ã o e x i s t e de f a c t o n e n h u m a implicação
n e c e s s á r i a entre a s d u a s c o i s a s : u m s i s t e m a económico de m e r c a d o pode
c o e x i s t i r (e c o e x i s t e e m n u m e r o s o s p a í s e s ) com r e g i m e s políticos d i t a t o riais. A t é ao m o m e n t o parece n ã o e x i s t i r démarche
m a i s fecunda para
abordar e s t a articulação do que a m e t o d o l o g i a m a r x i s t a , e m que ela é
f e i t a n ã o e m t e r m o s de relação entre s i s t e m a económico e s i s t e m a político, m a s e m t e r m o s de relações de classe, que podem, e m f u n ç ã o d a s
situações
históricas
concretas,
i n t e g r a r o político e o económico s e g u n d o
e s q u e m a s diferenciados.
R e t o m a n d o a s conclusões que b u s c á v a m o s para e s t e 2.° ensaio, n ã o
será difícil a d m i t i r que, a i n d a aqui, a m e s m a c o m p a r t i m e n t a ç ã o do real
social e m d o m í n i o s e s t a n q u e s , i m p o s t a a g o r a por u m E s t a d o / P a r t i d o
todo-poderoso, s e j a i g u a l m e n t e r e s p o n s á v e l por n ã o t e r sido possível até
hoje f o r m u l a r u m a s a t i s f a t ó r i a «teoria económica do socialismo», para a
qual t a n t o s e l e m e n t o s b á s i c o s pareciam ter sido lançados pelos interv e n i e n t e s n o debate dos a n o s 20. Como j á a n t e s d i s s e m o s , aquilo que t e m
sido apresentado como «economia política do socialismo» (v. na n o t a 4
deste e n s a i o a s v á r i a s d e s i g n a ç õ e s u s a d a s para a «ciência económica do
s o c i a l i s m o » ) n ã o é m a i s do que u m conjunto de regras, n o r m a s e object i v o s a a t i n g i r por u m a e c o n o m i a c e n t r a l m e n t e planificada ou, quando
m u i t o (veja-se, por exemplo, o livro « E c o n o m i c s of Socialism», de
W i l c z y n s k i ) , u m a descrição
de como funcionam, aparentemente,
a s econ o m i a s que a d o p t a r a m o s i s t e m a de planificação central. D e resto, tivem o s o c a s i ã o de c i t a r n u m e r o s o s c o m p o r t a m e n t o s que, violando o s press u p o s t o s s u b j a c e n t e s a e s s a s «teorias», n e m por i s s o contribuem m e n o s
para que t a i s s i s t e m a s f u n c i o n e m na prática — o que é, finalmente, m u i t o
s e m e l h a n t e a o que sucede n o s s i s t e m a s c a p i t a l i s t a s reais, f a c e a o que
prescreve a teoria. N ã o e x i s t e , de facto, sequer u m a «teoria do s i s t e m a
económico de planificação central», e m u i t o m e n o s , n a t u r a l m e n t e , do
sistema
socialista,
que n ã o pode de a l g u m m o d o ser reduzido a u m s i m ples « s i s t e m a económico» — ainda que f o s s e possível conceber u m «sist e m a económico» desligado do r e s t o . A p ó s a e x p o s i ç ã o que fizemos, e s t a r e m o s e m m e l h o r e s condições para compreender a afirmação j á citada
do h ú n g a r o Madarász, s e g u n d o a qual «a e c o n o m i a política do social i s m o n ã o e x i s t e , a i n d a t e m de s e r criada» (v. p á g 119 a c i m a ) .
R e s t a p e r g u n t a r : será e s s e o c a m i n h o que e s t ã o a trilhar o s próprios
h ú n g a r o s , com o seu N o v o M e c a n i s m o E c o n ó m i c o ? A p ó s o que d i s s e m o s ,
a r e s p o s t a afigura-se i n d i s c u t i v e l m e n t e n e g a t i v a . D e f a c t o , a «teoria económica» e m que s e funda o N M E n ã o é m a i s do que a t e o r i a do equilíbrio
geral, a n o ç ã o de «eficiência» e c o n ó m i c a é a que nela s e contém, s i m p l e s m e n t e a s u a aplicação, c o n t r a r i a m e n t e ao que sucede n o s p a í s e s capit a l i s t a s ( e m que o s i s t e m a n a s c e u antes da t e o r i a ) , é f e i t a por u m «planificador», n u m a p e r s p e c t i v a teórica m u i t o p r ó x i m a da «economia do socialismo» de O. L a n g e (ou, talvez m a i s , do « r e g i m e óptimo» de T i n b e r g e n ) ,
e que g a n h o u t o d o o s e n t i d o c o m a aquisição teórica que foi o t e o r e m a
da dualidade. N ã o é por acaso que o s i s t e m a h ú n g a r o t e m m e r e c i d o u m a
particular atenção, se n ã o m e s m o s i m p a t i a , de m u i t o s e c o n o m i s t a s ocidentais, que v ê e m nele a possibilidade de s e r e m eliminadas, pela «mão
visível» dos planificadores, m u i t a s das d i v e r g ê n c i a s entre o s p r e s s u p o s t o s
da t e o r i a e a realidade, e t a m b é m de a t e n u a r o e f e i t o de c e r t o s e l e m e n t o s
que a t e o r i a n ã o engloba, como por e x e m p l o a incerteza. A dificuldade
prática de estabelecer u m r i g o r o s o s i s t e m a de preços ( c u s t o s de oportunidade dos r e c u r s o s e s c a s s o s , preços de m e r c a d o ) a t r a v é s do cálculo não
impede que a t e o r i a considere e s s a possibilidade. O que j á s u r g e m a i s
problemático, e o s dez a n o s do N M E p a r e c e m confirmá-lo, é a possibilidade de c o n s e g u i r dos « a g e n t e s económicos» o s c o m p o r t a m e n t o s m a x i m i z a d o r e s s e m o s quais a «eficiência óptima» não poderá, de acordo
com a teoria, ser atingida. N e s t e ponto, e dado o i m e n s o suporte ideológico
e x i s t e n t e n a s sociedades ocidentais, é de a d m i t i r que e s t a s se encontrem,
a p e s a r de tudo, m a i s p r ó x i m a s da teoria, e m particular n o que respeita
a o s empresários. Mas, e m contrapartida, a s decisões de consumo, que
n o s i s t e m a de m e r c a d o s e confrontam com u m a i m e n s a diversidade de
preços para o s m e s m o s produtos e t a m b é m com u m a escolha de p r o d u t o s
f o r t e m e n t e v i c i a d a pela publicidade, poderão n o s i s t e m a de s o c i a l i s m o
de m e r c a d o conformar-se m e l h o r com a teoria, j á que o s i s t e m a de preços
é m u i t o m a i s u n i f o r m e e a influência da publicidade m u i t o m e n o s c o n s -
trangedora. Mas, num e n o u t r o caso, o s princípios de «independência»
e da «transitividade» das preferências m a n t ê m - s e f o r t e m e n t e a f a s t a d o s
d a realidade, por f a c t o r e s claramente extra-económicos.
S e j a c o m o for, e é e s t e o ponto que n o s interessa, o s o c i a l i s m o de
m e r c a d o não pode fornecer qualquer t e o r i a económica do s o c i a l i s m o ,
e x a c t a m e n t e n a m e d i d a e m que o que procura f a z e r é u m a utilização
da teoria económica do capitalismo, p r o m o v i d a p a r a o efeito ao e s t a t u t o
de «teoria económica neutra». P o r isto m e s m o n ã o será e x a g e r a d o dizer
que, n o limite, o s o c i a l i s m o de m e r c a d o t a l c o m o concebido n a H u n g r i a ,
é por certo o « s i s t e m a económico» m a i s despido de qualquer articulação
política que já terá e x i s t i d o : a p e n a s s e procura c o n s e g u i r u m tal s i s t e m a
de preços e i n c e n t i v o s que o s « a g e n t e s económicos», m o t i v a d o s p e l o s s e u s
próprios i n t e r e s s e s individuais, s e c o m p o r t e m de f o r m a a que a «colectividade» cumpra o s o b j e c t i v o s centralmente
fixados por t e c n o c r a t a s «ilum i n a d o s » , m a s n ã o i m p o s t o s a cada u m c o m o imperativo. E c o n o m i c a m e n t e m u i t o m a i s «liberal» do que o s i s t e m a de planificação central,
a s u a concepção m e s m a exclui a participação política, a formulação
colectiva dos o b j e c t i v o s : n e s t e s e n t i d o o s i s t e m a é t ã o paternalista, s e
b e m que m e n o s autoritário, c o m o o s i s t e m a de planificação central.
E , c o m o seria inevitável n u m a s i t u a ç ã o de c o m p l e t a a u s ê n c i a de «motivações colectivas», o s i s t e m a a c a b a por reproduzir e m e s m o incentivar
c o m p o r t a m e n t o s o b v i a m e n t e a n t i - s o c i a l i s t a s (a c o m p e t i ç ã o material, a
valorização do dinheiro e dos b e n s de prestígio, u m a ideologia de sociedade de c o n s u m o ) e por pôr e m m a r c h a m e c a n i s m o s que g e r a l m e n t e se
a s s o c i a m a u m a e c o n o m i a de m e r c a d o (inflação, crescente dependência
e x t e r n a — de que s e espera u m a a f e c t a ç ã o m a i s «racional» d o s recursos
nacionais...).
E s t a m o s , pois, concluindo, desprovidos de u m a «teoria económica
do socialismo», o u m e s m o da «transição», tal c o m o c o n s t a t á m o s e s t a r
t a m b é m r e l a t i v a m e n t e a o capitalismo.
M a s n ã o será o c i o s o a v e r i g u a r o que de p o s i t i v o n o s t e r á deixado
e s t e e x a m e — n e c e s s a r i a m e n t e b r e v e — de dois s i s t e m a s e m funcionam e n t o prático, a m b o s reclamando-se do socialismo.
O s i s t e m a de planificação central é, certamente, o g r a n d e responsável pela persistência, m e s m o n o s p a í s e s de L e s t e m a i s p r o f u n d a m e n t e
«reformados», da f a m o s a c a t e g o r i a n ó s / e l e s n a consciência social. M a s
n ã o d e i x o u de enraizar nela, e m particular n a s g r a n d e s m a s s a s , u m
forte s e n t i m e n t o igualitário, u m s e n t i m e n t o de s e g u r a n ç a do e m p r e g o
e de «estabilidade de preços», u m a noção m u i t o m a i s a c e n t u a d a do que
n a s s o c i e d a d e s de e c o n o m i a de m e r c a d o da «utilidade física e social»
dos b e n s e serviços, independentemente do s e u «preço»: tudo «sentimentos» e « c o m p o r t a m e n t o s » inerentes a u m a sociedade socialista, ainda
que eles t e n h a m sido d e t e r m i n a d o s por u m a propaganda o b c e s s i v a e não
t e n h a m r e s u l t a d o da consciência do papel de cada um (a não ser p a s s i v o )
n o s e u d e s e n v o l v i m e n t o e n a í n t i m a l i g a ç ã o que e l e s deveriam ter com
u m a e f e c t i v a participação política na «construção» da sociedade. A l g u n s ,
de resto, t e r ã o m e s m o r e s u l t a d o e m g r a n d e parte das condições específ i c a s de carência e m que o s i s t e m a foi implantado — como o s e n t i m e n t o
de i g u a l i t a r i s m o , hoje c o m b a t i d o e m todos o s p a í s e s de Leste, por ser
contrário à produtividade e à valorização profissional individual, e j á
m e n o s «necessário» devido à m a i o r abundância relativa de b e n s de
consumo.
Q u a n t o ao s o c i a l i s m o de mercado, t r a t a - s e s e m dúvida de u m a experiência i n t e r e s s a n t e de «economia m i s t a p r o g r a m a d a » (ainda que a H u n g r i a dificilmente se p o s s a considerar u m a e c o n o m i a «mista» no s e n t i d o
de u m a combinação de propriedade e s t a t a l e privada de m e i o s de produção, m a s t ã o só m i s t a n o s e n t i d o de u m a articulação de Plano e mercado c o m o m e c a n i s m o s não exclusivos).
O problema do s o c i a l i s m o de
m e r c a d o h ú n g a r o deriva e m boa parte de ele aparecer aplicado a u m a
sociedade e m que s e s u p u n h a m «adquiridos» aqueles v a l o r e s de igualitarismo, s e g u r a n ç a de e m p r e g o e de estabilidade de r e n d i m e n t o que o sist e m a anterior produzira
e, n e s s a medida, o s i n c e n t i v o s p r o g r a m a d o s
s e r e m c o m frequência anulados ou distorcidos conduzindo a e f e i t o s contrários.
P a r a s e r m o s m a i s claros, a d m i t i m o s que u m s i s t e m a de tipo h ú n g a r o
s e j a de considerar como «progressista» e resulte p l e n a m e n t e se introduzido na sequência de u m s i s t e m a de m e r c a d o e suportado por u m a grande
participação colectiva a t o d o s o s n í v e i s — o u seja, n u m a f a s e de t r a n s i ç ã o
para u m a e c o n o m i a de planificação
central participada.
A i n d a m a i s conc r e t a m e n t e , o s i s t e m a de planificação central poderá ser, s e a s s u m i d o
colectivamente,
i s t o é, s e for u m sistema social integrando ( o que não significa planificando!)
t o d o s o s d o m í n i o s da actividade h u m a n a e com igual
intervenção e m t o d o s eles das g r a n d e s m a s s a s da população, a verdadeira
«economia do socialismo», consequente de u m a f a s e de «socialismo de
mercado» em que g r a d u a l m e n t e s e v ã o aprofundando (e não o
contrário,
como parece suceder n a H u n g r i a ) a s aquisições c o l e c t i v a s e a s relações
s o c i a i s de carácter socialista. Ê u m a e x p e r i ê n c i a que e s t á por fazer, m a s ,
a s s i m c o m o L a n g e concebeu n o s a n o s 30, m u i t o a n t e s da s u a e f e c t i v a ç ã o
prática, o s i s t e m a económico do «socialismo de mercado», nada impede
que hoje s e aprofunde, a partir das e x p e r i ê n c i a s disponíveis, o que será
o s i s t e m a social de t r a n s i ç ã o e o s i s t e m a social socialista, n u m a óptica
multidisciplinar, e m que o político t e r á de s e r u m a das d i m e n s õ e s e s s e n ciais.
N ã o parece s e r isto o que e s t á s u c e d e n d o : quer n o ocidente quer n o s
p a í s e s de L e s t e ( n o m e a d a m e n t e n a U n i ã o S o v i é t i c a ) , o s d e s e n v o l v i m e n t o s
t e ó r i c o s e m curso v ã o no s e n t i d o de u m a «teoria dos s i s t e m a s » que e s t á
n a s m ã o s de m a t e m á t i c o s , ciberneticistas, biólogos, no limite filósofos,
e nela o « s u b s i s t e m a político» aparece c o m u m a identidade própria e
n ã o lhe é dado — o que n ã o é por a c a s o — o papel intersticial que n e c e s s a r i a m e n t e lhe caberá n u m a sociedade socialista. N ã o é, de resto, e s t a
a preocupação dos t e ó r i c o s dos s i s t e m a s : para eles não e x i s t i r á e m
definitivo s o c i a l i s m o ou capitalismo, m a s a p e n a s infinitas c o m b i n a ç õ e s
de s u b s i s t e m a s n u m e s p a ç o contínuo, cada u m a constituindo u m caso
específico,
u m ponto n e s s e e s p a ç o multidimensional. A teoria será t a n t o
m a i s g e r a l (e inútil, d i r e m o s n ó s ) , q u a n t o s e verifique n ã o e x i s t i r e m
p o n t o s reais que c a i a m f o r a d e s s e e s p a ç o teórico. U m a vez m a i s , não s e
v ê s a í d a s o c i a l m e n t e operacional p a r a analisar o s problemas que põe
u m a sociedade socialista, e e m particular u m a sociedade de transição,
que n ã o s e j a u m a l a r g a m e n t o — por certo multidisciplinar — da démarche m a r x i s t a a á r e a s que para o s c l á s s i c o s m a r x i s t a s s e r i a m do domínio
da utopia, m a s que para nós s e e n c o n t r a m ao alcance do p e n s a m e n t o ,
s e aplicado a t u d o o que desde e n t ã o decorreu. O p r ó x i m o e n s a i o esboçará
u m pouco do que deveria s e r e s s e percurso teórico, que n ã o poderá aprofundar p r e c i s a m e n t e porque, a o fazê-lo, e s t a r i a a contrariar a própria
e x i g ê n c i a de interdisciplinaridade.
III — P R O J E C T O S O C I A L I S T A E C O N S C I Ê N C I A SOCIAL
1. Muitos s e r e c l a m a m do socialismo. N ã o é porém preciso m a i s do
que pôr e m confronto o s «objectos» d e s i g n a d o s p e l a s c o n h e c i d a s e x p r e s s õ e s Internacional S o c i a l i s t a e P a í s e s S o c i a l i s t a s p a r a que se evidencie
o a b i s m o de significado que s e s i t u a entre a d j e c t i v o s f o r m a l m e n t e idênt i c o s . U m a certa distinção t e m vindo a ser feita, i n v e r s a m e n t e , a g r e g a n d o
ao s u b s t a n t i v o a d j e c t i v o s q u a l i f i c a t i v o s : s o c i a l i s m o africano, s o c i a l i s m o
democrático, socialismo revolucionário, s o c i a l i s m o a u t o g e s t i o n á r i o , socialismo «realmente e x i s t e n t e » (ou s o c i a l i s m o r e a l ) , e t c , etc. A própria
d i s t i n t a n a t u r e z a de t a i s qualificativos dá bem c o n t a da s u a insuficiência
para diferenciar o o b j e c t i v o : de f a c t o porque n ã o poderá o s o c i a l i s m o
«africano» ser t a m b é m democrático ou a u t o g e s t i o n á r i o , e n ã o poderá o
s o c i a l i s m o democrático «realmente existir» ? T o d a s e s t a s e x p r e s s õ e s nunca
f o r a m definidas c o m precisão, s ã o c o n c e i t o s v a g o s , e x c e p t u a n d o talvez
a última, que se define pelo «facto c o n s u m a d o » : s o c i a l i s m o realmente
e x i s t e n t e ou s o c i a l i s m o real é m u i t o s i m p l e s m e n t e o s i s t e m a que e x i s t e
n o s p a í s e s s o c i a l i s t a s , c o m o o s próprios i d e ó l o g o s d e s s e s p a í s e s o design a m 0 ) , querendo m a r c a r bem com e s s a e x p r e s s ã o que procurar, na
prática ou n a teoria, outro socialismo, releva da p u r a h e r e s i a .
Ê claro que a realidade é bem m a i s c o m p l e x a e, tendo necessariam e n t e em c o n t a (e pela n o s s a parte tivemo-la, p o i s lhe d e d i c a m o s todo
C ) Por ex., num documento oficial húngaro, encontramos, insistentemente, expressões como: socialismo real, socialismo já realizado ou em curso de realização,
formas práticas existentes do socialismo, socialismo existente. (V. Prise de position...
[1973], pp. 2754, 2755 e 2757).
1
o s e g u n d o e n s a i o deste trabalho, e m a i s dela f a l a r e m o s adiante) a prov e i t o s a experiência daqueles p a í s e s — p r o v e i t o s a , e m a i s v a r i a d a do que
c o r r e n t e m e n t e s e s u p õ e — , mas também
muitas outras experiências e
debates sobre o a s s u n t o , r e i v i n d i c a m o s a l e g i t i m i d a d e de falar de «projecto socialista», t o m a n d o c o m o referente u m objecto (social) que realm e n t e a i n d a n ã o e x i s t e . R e c u s a d a a s s i m a «desnecessidade», e n f r e n t e m o s
o a r g u m e n t o da «utopia»: u m a sociedade n ã o se idealiza o u i m a g i n a ,
constrói-se e desenvolve-se na prática, e m função d a s c i r c u n s t â n c i a s h i s t ó r i c a s c o n c r e t a s que e m boa parte lhe d e t e r m i n a m a configuração e a s
n o r m a s . A c e i t a m o s a objecção de princípio pelo que c o n t é m de advertência q u a n t o a o s e x c e s s o s ou a o s desafios da i m a g i n a ç ã o descontrolada,
m a s r e j e i t a m o s a ideia de que p o s s a s e r comparável a s i t u a ç ã o e m que
h o j e n o s e n c o n t r a m o s e aquela e m que g a n h a r a m f o r m a a s «utopias socialistas» do século X I X . A riqueza da informação produzida pela acção
concreta de q u a n t o s , e m particular desde o princípio deste século, se
e m p e n h a r a m n a «luta pelo socialismo» em p a í s e s e condições o s m a i s
diversos não permite m a i s , a n o s s o ver, s e nela nos apoiarmos,
a construção de u t o p i a s . D i r í a m o s m e s m o que é c h e g a d o o t e m p o de u m «proj e c t o socialista», n e m utópico, n e m desnecessário. Cremos que o s elos que
f a l t a m à definição dos p a r â m e t r o s e s s e n c i a i s desse projecto e s t ã o à
m e r c ê de u m esforço intelectual não desmedido — m a s por certo e x i g e n t e
e objectivo.
N ã o d e s c o n h e c e m o s , t a m b é m , a s perplexidades e m que t ê m sido
lançados m u i t o s e s t u d i o s o s e m i l i t a n t e s políticos pelos inesperados o b s t á culos que a complexidade crescente e a aparente flexibilidade das cham a d a s «sociedades industriais» t e m vindo a colocar-lhes, quando durante
t a n t o t e m p o se a g a r r a r a m , u n s ao inevitável a p r o f u n d a m e n t o das c r i s e s
e dos conflitos de classe à m e d i d a que a industrialização a v a n ç a s s e e a
concentração s e acelerasse, até s e c h e g a r à m a n h ã g l o r i o s a e m que a s
«insuperáveis contradições» do s i s t e m a i m p o r i a m o poder proletário,
o u t r o s a u m idealismo libertário de pequenos produtores independentes
ou de c o m u n a s a u t ó n o m a s onde v i g o r a s s e u m a democracia directa e perm a n e n t e , s e m E s t a d o n e m poderes organizados. A retracção numérica
do proletariado fabril (para já não falar n o s s e u s «aliados naturais»,
o s a s s a l a r i a d o s a g r í c o l a s ) n a s s o c i e d a d e s c a p i t a l i s t a s m a i s a v a n ç a d a s não
faz m a i s do que sublinhar a n e c e s s i d a d e de reflectir s e r i a m e n t e e, se
necessário, reformular conceitos e perspectivas.
E n t r e t a n t o , a própria experiência dos p a í s e s ditos s o c i a l i s t a s terá
e x e m p l a r m e n t e dissipado a s i l u s õ e s «economicistas», inspiradas por u m a
leitura primária de Marx, s e g u n d o a s quais o s i m p l e s d e s e n v o l v i m e n t o
d a s f o r ç a s produtivas, n o quadro da s u a apropriação colectiva, seria suficiente para determinar
relações de produção s o c i a l i s t a s . Isso não sucedeu
com o s i s t e m a de planificação central e, ao que a experiência húngara,
com o s s e u s dez anos, n o s parece ensinar, t a m b é m não e s t á e m v i a s de
acontecer, pelo contrário, no s i s t e m a de «socialismo de mercado». S e g u n d o
o s s o c i ó l o g o s h ú n g a r o s da c h a m a d a E s c o l a de B u d a p e s t e e s t e s i s t e m a
e s t á produzindo u m a sociedade orientada para o lucro, u m a sociedade
de tipo «aquisitivo» ( v o l t a r e m o s m a i s adiante ao e x a m e d e s t a s p o s i ç õ e s ) .
Quais e n t ã o a s g r a n d e s q u e s t õ e s que h o j e s e l e v a n t a m à f o r m u l a ç ã o
de u m «projecto socialista», e m particular se c o n s i d e r a r m o s a s u a viabilidade e m s o c i e d a d e s industrializadas ou s e m i - i n d u s t r i a l i z a d a s ? E n u n c i e m o s a p e n a s a l g u m a s , e c o m e n t e m o - l a s s u m a r i a m e n t e , s e m que a ordem
por que a s a p r e s e n t a m o s s e j a n e c e s s a r i a m e n t e a da s u a m a i o r ou menor
prioridade.
1) Como conciliar autogestão
e planificação?
— Seja qual for a
n o s s a concepção de socialismo, e s t a s duas ideias n ã o poderão d e i x a r de
lhe e s t a r de a l g u m modo a s s o c i a d a s . Por oposição à anarquia do mercado capitalista, a necessidade de a sociedade «organizar» a produção
de f o r m a planificada de m o d o a que a utilização dos recursos s e j a orient a d a por o b j e c t i v o s c o l e c t i v o s e n ã o por o b j e c t i v o s individuais privados,
parece s e r indiscutível como ponto de princípio. E m contrapartida, a
socialização dos m e i o s de produção t a m b é m não pode ser identificada
com a s u a s i m p l e s e s t a t i z a ç ã o . P a r a além da s e p a r a ç ã o entre a s unidades
p r o d u t i v a s — que à planificação competiria eliminar — , o que s e pretende
— e j u l g a m o s por e n q u a n t o c o n t i n u a r m o s a m o v e r - n o s e m á g u a s n ã o
c o n t r o v e r s a s — é o f i m da separação dos produtores dos r e s p e c t i v o s m e i o s
de produção, o fim da relação salarial, que e x p r i m e e s s a separação e m a t e rializa a exploração. Sendo a s s i m , é óbvio que só h a v e r á real socialização
s e houver, de a l g u m modo, u m a a u t o g e s t ã o : só ela significará a posse
e f e c t i v a dos m e i o s de produção p e l o s trabalhadores. Planificação e autog e s t ã o serão, n e s t e sentido, a r e s p o s t a s o c i a l i s t a à f a m o s a «dupla separação» característica das sociedades c a p i t a l i s t a s .
A q u e s t ã o que s u r g e de imediato, e que e s t á longe de s e r u m a
q u e s t ã o académica, pois são a s práticas e x i s t e n t e s que d i r e c t a m e n t e a
colocam, é e n t ã o : c o m o conciliar u m a planificação global, necessariam e n t e centralizadora da informação e por isso m e s m o i n s t r u m e n t o de
poder sobre a sociedade, com u m a g e s t ã o descentralizada e a u t ó n o m a de
u n i d a d e s de produção e de s e r v i ç o s (para n ã o ir m a i s l o n g e ) , que de u m
m o d o geral não t e r ã o u m a v i s ã o global dos g r a n d e s i n t e r e s s e s colec-
t i v o s ( ) e cujos o b j e c t i v o s próprios podem contrariar o s estabelecidos no
Plano ? E n t r a n d o desde j á em terreno controverso, diremos que, a t é agora,
n ã o foi encontrada r e s p o s t a s a t i s f a t ó r i a para e s t e problema. T a n t o no
«socialismo» de planificação central c o m o no de m e r c a d o s ã o o s ó r g ã o s
superiores da tecno-burocracia dirigente o juiz s u p r e m o dos «interesses
colectivos», n u m c a s o determinando i m p e r a t i v a m e n t e o que d e v e m fazer
a s u n i d a d e s p r o d u t i v a s («repartindo o Plano» por e l a s ) , n o outro procurando levá-las, por m e c a n i s m o s indirectos, a a g i r de acordo c o m a v o n t a d e
do planificador. P o r oposição, no «socialismo a u t o g e s t i o n á r i o » j u g o s l a v o ,
prevalecem em larga m e d i d a o s i n t e r e s s e s dos «colectivos de trabalhadores», porventura em conflito u n s com o s outros, e s u r g e u m a «anarquia»
a n á l o g a à dos s i s t e m a s de m e r c a d o e m que problemas v i t a i s da sociedade — c o m o é n e s s e c a s o o do d e s e m p r e g o — não e n c o n t r a m solução,
pois n e n h u m a empresa, seja ela autogerida, faz disso u m objectivo prioritário.
2
H á pois, provavelmente, u m novo sentido a dar a e s t e s dois conceitos,
que p e r m i t a a s u a articulação e compatibilização, condição de u m proj e c t o socialista. E s t e projecto terá de encontrar u m a c h a v e p a r a a dicotomia, ainda não resolvida, que opõe u m a s u p o s t a identidade entre P l a n o
e centralização a outra s u p o s t a identidade entre Mercado e descentralização.
2) Como dissociar o poder do saber 1 Como conciliar poder
democrático e complexidade
tecnológica
e organizacional?
— E s t a questão adquire
u m a crescente acuidade e m a n i f e s t a - s e com cada vez m a i o r evidência à
m e d i d a que o processo de industrialização s e a c e n t u a e invade todos o s
d o m í n i o s da actividade social. T r a t a - s e de u m a s i t u a ç ã o que foi rigorosam e n t e p r e v i s t a p e l o s c l á s s i c o s do m a r x i s m o — a lógica da inevitável concentração e c o n ó m i c a é s e m dúvida u m dos p o n t o s e m que a sua análise
do m o d o de produção c a p i t a l i s t a triunfa l a r g a m e n t e da «teoria económica» neo-clássica, que pressupõe a a t o m i z a ç ã o dos a g e n t e s e c o n ó m i c o s — ,
e sobre c u j o s efeitos, o próprio Lenine, na esteira das p r e v i s õ e s por eles
formuladas, centrou u m o p t i m i s m o que o s f a c t o s c o n c r e t o s infelizmente
c o n t r a r i a r a m : «Sem os grandes
bancos o socialismo
seria
irrealizável.
Os g r a n d e s b a n c o s s ã o o "aparelho do E s t a d o " que n o s é necessário para a
(-) Mesmo admitindo, por hipótese, que as «unidades de gestão» tenham essa
visão global, muito mais difícil ainda será possuírem uma noção clara dos efeitos
macroeconómicos das decisões que terão de tomar, isto é, da articulação, na prática,
entre as acções desenvolvidas a esse nível e os «interesses colectivos» globais.
realização do socialismo, que n ó s tomamos
pronto a usar a o c a p i t a l i s m o
[...] U m ú n i c o (o m a i o r p o s s í v e l ) banco de E s t a d o , com u m r a m o e m cada
distrito, e m cada fábrica — isso já c o n s t i t u i r á nove d é c i m o s do aparelho
socialista» ( ) . M a s foi o próprio Lenine, pouco t e m p o depois, já com a
R e v o l u ç ã o e m m a r c h a , que n ã o h e s i t o u e m c l a m a r pela n e c e s s i d a d e de
e s p e c i a l i s t a s e t é c n i c o s , s e m o s q u a i s a «organização económica» corria
o risco de sossobrar. E isto p a s s a - s e n u m a sociedade p r e d o m i n a n t e m e n t e
rural, e m que o aparelho industrial e financeiro ainda era, r e l a t i v a m e n t e
à e c o n o m i a n o s e u conjunto, diminuto, embora b a s t a n t e concentrado.
A c t u a l m e n t e , a s sociedades industrializadas, o u m e s m o a p e n a s semi-industrializadas, s ã o e x t r e m a m e n t e diversificadas, d i s p õ e m de t e c n o l o g i a s
cada v e z m a i s c o m p l e x a s e s o f i s t i c a d a s , a s u a própria e s t r u t u r a é dominada por g r a n d e s o r g a n i z a ç õ e s ( n ã o a p e n a s e c o n ó m i c a s ) b u r o c r a t i z a d a s
•—no s e n t i d o W e b e r i a n o ( ) — que s ã o o s v e r d a d e i r o s c e n t r o s de poder.
T e m sido v i g o r o s a m e n t e discutido entre s o c i ó l o g o s e o u t r o s e s p e c i a l i s t a s
da «teoria d a s organizações», s e j u s t a m e n t e e s t a f o r m a de organização,
e m l u g a r de conferir u m poder cada vez m a i o r a o s especialistas, não
tenderá, pelo contrário, a diluir e s s e poder dentro da organização, distribuindo-o por m ú l t i p l o s n í v e i s e m ú l t i p l a s f u n ç õ e s ( ) .
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A evidência não parece dar razão a e s t a hipótese, m a s a n t e s f a v o recer u m a outra, s e g u n d o a qual o s factores
de decisão, internos e e x t e r n o s à organização, se t o r n a m m a i s diversificados ( a r b i t r a g e m de interess e s de g r u p o s dentro da organização, multiplicação da i n f o r m a ç ã o técnica,
económica, política, e t c , c o n s i d e r a ç õ e s e s t r a t é g i c a s sobre o s comportam e n t o s de organizações concorrentes, e t c , e t c ) , o s e s p e c i a l i s t a s de trat a m e n t o da informação adquirem por e s s e f a c t o u m papel de crescente
importância n a f o r m a ç ã o d a s decisões, m a s , e m definitivo, o verdadeiro
centro de decisão compreende u m n ú m e r o r e l a t i v a m e n t e r e s t r i t o (face
à d i m e n s ã o da organização) de indivíduos, que a g e n o quadro das direc-
( ) L E N I N E L1917].
( ) Para Marx Weber, o conceito de burocracia (conceito sociológico que, contrariamente ao uso corrente do termo, não tem nada de depreciativo) exprime uma forma
de organização hierarquizada e «racionalizada», no sentido em que funciona segundo
um sistema explícito de regras impessoais que definem funções e repartem responsabilidades, tendo como objectivo o máximo de eficiência e o mínimo de conflitos.
( ) Era a posição que, com certas nuances, defendia M. Crozier na sua grande
tese sobre o «fenómeno burocrático»: «Gostaríamos de sustentar, a concluir, que os
receios tão frequentemente manifestados face à ascensão da tecnocracia, são pouco
fundamentados. O poder do especialista, enquanto tal, tentámos mostrá-lo, diminui à
medida que o progresso se acelera». (CROZIER [1963], p. 374).
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t i v a s e prioridades definidas pelos proprietários, g r a n d e s a c c i o n i s t a s ou
s e u s directos r e p r e s e n t a n t e s . E s s e s h o m e n s , que podem ser e c o n o m i s t a s ,
engenheiros, j u r i s t a s , e t c , s ã o o s «especialistas de g e s t ã o » , e s e m eles
torna-se difícil conceber u m f u n c i o n a m e n t o e c r e s c i m e n t o r e g u l a r e s de
t a i s g r a n d e s organizações. N a s g r a n d e s a d m i n i s t r a ç õ e s e e m p r e s a s do
s e c t o r público dos p a í s e s c a p i t a l i s t a s o modelo o r g a n i z a t i v o é s e m e l h a n t e ,
o s m e s m o s h o m e n s t r a n s i t a n d o com frequência entre o s s e c t o r e s público
e privado, m u i t o s deles p a s s a n d o m e s m o m a i s t r a n s i t ó r i a o u m a i s durad o u r a m e n t e p e l a s cadeiras do poder político — o que facilita a difusão
do «modelo» (e da ideologia que lhe é s u b j a c e n t e ) a t o d a s a s e s f e r a s da
actividade social.
M u i t o s dos que defendem a s t e s e s de convergência (v. 1.° ensaio,
pp. 86-87) fundam-se no a r g u m e n t o da implicação n e c e s s á r i a entre a
industrialização e o modelo burocrático de «organização», que acabará,
s e g u n d o eles, por tornar a s «sociedades industriais» ou «pós-industriais»
f i n a l m e n t e análogas
no seu f u n c i o n a m e n t o , n a s u a estrutura, n o s s e u s
v a l o r e s d o m i n a n t e s . Mas t a m b é m m u i t o s dos que, n o s p a í s e s de Leste,
se opõem v i o l e n t a m e n t e à s t e s e s de convergência, n ã o d e i x a m de reconhecer que u m a das principais carências d e s s e s p a í s e s se s i t u a precis a m e n t e a o nível das «capacidades de g e s t ã o » , do controlo das relações
«informação-decisão-objectivos», carências cada vez m a i s evidenciadas
pela d i m e n s ã o g i g a n t e s c a das g r a n d e s o r g a n i z a ç õ e s económicas, sociais
e a d m i n i s t r a t i v a s , n u m a f a s e de p a s s a g e m do «crescimento e x t e n s i v o »
(recursos abundantes, o b j e c t i v o s «simples») ao «crescimento intensivo»
(recursos e s c a s s o s , objectivos « c o m p l e x o s » ) .
O m e s m o é dizer que, a o pretender definir-se u m «projecto socialista»
para s o c i e d a d e s industrializadas ou semi-industrializadas, u m a d a s quest õ e s f u n d a m e n t a i s que não é possível iludir é por certo, n u m primeiro
tempo, o da articulação entre o «poder democrático» e o dos detentores
do «saber» ( o s que sabem «produzir», gerir, decidir, m a s t a m b é m o s
c i e n t i s t a s , o s professores, t o d a a «elite» cultural que, c o n s c i e n t e m e n t e
ou não, reproduz a s condições do poder, e de f a c t o o exerce t a m b é m ) .
N u m s e g u n d o tempo, e s t a r á n a ordem do dia a s u b m i s s ã o clara dos
s e g u n d o s ao primeiro, a t é que, a m a i s longo prazo, a completa reformulação d a s relações s o c i a i s (a começar pelo s i s t e m a e d u c a t i v o ) v e n h a
s i m p l e s m e n t e a eliminar o problema, n ã o n o s e n t i d o — e s s e o b v i a m e n t e
u t ó p i c o — de que «todos saberão tudo», m a s n o s e n t i d o e m que a própria
e s t r u t u r a de relações s o c i a i s será tal que o s e s p e c i a l i s t a s n o s v á r i o s
d o m í n i o s {que os haverá sempre)
e s t a r ã o i n t e g r a d o s n u m s i s t e m a em
que o s m e c a n i s m o s do poder serão outros, colectivos, e e m que eles par-
ticiparão n ã o enquanto e s p e c i a l i s t a s , m a s e n q u a n t o m e m b r o s a c t i v o s da
c o m u n i d a d e : o saber n e c e s s á r i o para intervir e participar p o l i t i c a m e n t e
será de outra
natureza.
3) C o m o conciliar capacidade
criativa
(individual, de g r u p o s ) c o m
produção
de massa? — A q u i poder-se-á dizer que, n o s e n t i d o habitualm e n t e pejorativo, «produção de m a s s a » é a l g o inerente à s s o c i e d a d e s
c a p i t a l i s t a s a v a n ç a d a s o u à s que lhe s e g u e m a s p i s a d a s , m a s n ã o a u m
verdadeiro projecto socialista, e como tal a a l t e r n a t i v a (ou a «compatibilização») não s e poria. Ora sucede, por u m lado, que a s s o c i e d a d e s a
que n o s e s t a m o s a referir estão o r g a n i z a d a s e m f u n ç ã o da produção de
m a s s a : por razões e c o n ó m i c a s de rendibilização da produção ( e c o n o m i a s
de escala, produções de s é r i e ) , mas também
por razões i d e o l ó g i c a s de
uniformização de g o s t o s , c o m p o r t a m e n t o s , v a l o r e s (e n e s t e s e n t i d o
c o n v é m incluir n o conceito geral de produção de m a s s a a própria produção
de informação
e de i d e o l o g i a : a c o m u n i c a ç ã o de m a s s a , a cultura de
m a s s a , etc. — a produção do m a r c u s i a n o h o m e m u n i d i m e n s i o n a l ) . Ê, pois,
u m a s i t u a ç ã o de partida que é i m p o s s í v e l ignorar, a qual, quando m u i t o ,
será possível recusar
e, m e s m o a s s i m , importa a n a l i s a r a s f o r m a s de
t r a n s i ç ã o para u m projecto alternativo. D e qualquer modo, s e f o s s e e s t a
a ú n i c a objecção, a i n t e r r o g a ç ã o e s t a r i a m a l colocada: n ã o se t r a t a r i a
de u m «como conciliar», m a s de u m «como p a s s a r de (...) a». Mas, por
outro lado, se e n t e n d e r m o s «produção de m a s s a » n o s e n t i d o de u m a
abundância crescente, para t o d o s , de b e n s e s e r v i ç o s úteis, de u m a c e s s o
generalizado de todos a o c o n h e c i m e n t o dos m e c a n i s m o s e c o n ó m i c o s e
sociais, e p o r t a n t o à instrução, à informação, à cultura — s e a s s i m o
entendermos, não p o d e m o s n e g a r a necessidade
de equacionar, n u m projecto socialista, o s problemas de escala, de eficiência, de «produtividade»,
de técnica, que e s t ã o a s s o c i a d o s a u m a «produção de m a s s a » , n e s s e sentido novo. S ó que, ao fazê-lo, e s t a r e m o s s i m u l t a n e a m e n t e a colocar-nos
u m a q u e s t ã o adicional, u m a n o v a aparente contradição a resolver.
D e f a c t o , ao projecto s o c i a l i s t a não pode ser alheio o despertar de t o d a a
capacidade i n v e n t i v a e criativa e x i s t e n t e n a sociedade, e é indiscutível
que a s g r a n d e s o r g a n i z a ç õ e s burocratizadas que e s t ã o i n t i m a m e n t e ligadas à «produção de m a s s a » não são o caldo de cultura ideal, n e m o estim u l a n t e indicado para tal processo criativo. P e l o contrário, e m princípio
elas f u n c i o n a r ã o t a n t o m e l h o r q u a n t o cada u m cumprir com m a i o r r i g o r
e eficácia a s f u n ç õ e s que lhe e s t ã o atribuídas, s e m a v e n t u r a s i m a g i n a t i v a s .
N u m colóquio sobre « E s t i m u l a ç ã o social e económica dos trabalhadores»
realizado n a Hungria, e a que j á v á r i a s v e z e s n o s referimos ao l o n g o d o
2.° ensaio, esboçou-se u m a d i s c u s s ã o sobre e s t e ponto, que a s s i m n o s é
descrita pelo a u t o r do respectivo r e l a t o : «De acordo com v á r i o s participantes, o trabalho criativo envolve u m s e n t i d o m a i s profundo de vocação
e, em t a i s actividades, a importância da e s t i m u l a ç ã o material é menor.
Outros discordaram. S e g u n d o J á n o s T i m á r "trabalho
criativo
t e m sido
entendido n u m s e n t i d o d e m a s i a d o restrito, e u m sentido
de
vocação
atribuído a p e n a s a e s s e tipo superior de trabalho. (...) N o s e n t i d o m a i s
a m p l o — e n a realidade — qualquer tipo de trabalho, m e s m o o m a i s
simples, é de natureza criativa e, sob condições f a v o r á v e i s , u m sentido
de v o c a ç ã o pode desenvolver a alegria do trabalho ( s a t i s f a ç ã o com o trabalho) n a s m a s s a s do povo trabalhador, por m e i o de u m u s o complexo
de i n c e n t i v o s m a t e r i a i s e não materiais"» ( ) . E s t a ú l t i m a posição, que
c o n t é m u m duplo vício ideológico, é típica da «boa consciência» com que
o s d i r i g e n t e s políticos e económicos, n o Ocidente como no L e s t e , procur a m exercer o s e u poder — e Timár, já o v i m o s , é u m dos m a i s d e s t a c a d o s
t e c n o c r a t a s do «socialismo de mercado» h ú n g a r o . Com efeito, ele por um
lado confunde «alegria ou s a t i s f a ç ã o com o trabalho» — a qual pode s i m p l e s m e n t e encobrir f a l t a de sentido crítico, de noção das s e r v i d õ e s e implicações s o c i a i s da divisão do trabalho, enfim, de c o n f o r m i s m o — com
«trabalho criativo», que, pelo contrário, pressupõe u m a atitude a c t i v a
e inteligente
f a c e ao próprio trabalho. P o r outro lado, afirma s e m rebuço
que qualquer trabalho, mesmo o mais simples,
pode s e r criativo. Seria
encantador se a s s i m fosse, m a s s a b e m o s bem que o não é: j u s t a m e n t e
a parcelização levada ao e x t r e m o do m o d e r n o trabalho industrial, s e m
falar n a multiplicação d a s t a r e f a s a d m i n i s t r a t i v a s (desde a dactilografia
à perfuração m e c a n o g r á f i c a , p a s s a n d o pelo preenchimento, verificação,
arquivo dos m a i s v a r i a d o s i m p r e s s o s e d o c u m e n t o s ) , d e s e n v o l v e r a m u m a
infinidade de a c t i v i d a d e s s e m qualquer potencial criativo, perante a qual
esbarra a m a i s fértil i m a g i n a ç ã o , o m a i s forte espírito criador daquele
que a s d e s e m p e n h a , a i n d a que m o t i v a d o por u m «uso c o m p l e x o de incent i v o s m a t e r i a i s e morais». E n e m sequer a «desproletarização» que
resulta da crescente m e c a n i z a ç ã o / a u t o m a ç ã o de t a r e f a s m e l h o r a a situação n e s t e p o n t o : a permanência durante v á r i a s h o r a s por dia n u m a sala
de controlo, a t e n t o a que não acendam a l g u m a s luzes v e r m e l h a s que
d e v e m m a n t e r - s e a p a g a d a s é, sob e s t e ponto de vista, talvez ainda m e n o s
e s t i m u l a n t e que o trabalho do carregador de tijolos. E s t a evolução r e s ponde a outro tipo de p r o b l e m a s : reduz (ou elimina) o s p o s t o s de trabalho
6
( ) BIHARI [1974], p. 246.
6
f i s i c a m e n t e v i o l e n t o s ou d e s g a s t a n t e s , e tende a eliminar o s riscos de
«falha h u m a n a » n a condução d a s operações industriais, ao m e s m o t e m p o
que a u m e n t a a produtividade. T a m b é m a s e x p e r i ê n c i a s nórdicas, aparent e m e n t e «bem sucedidas», de «recomposição de t a r e f a s » n o s t r a b a l h o s
de cadeias de produção de série n ã o a l t e r a m e m n a d a a n a t u r e z a d e s s a s
m e s m a s t a r e f a s , a p e n a s dão m a i o r g r a u de liberdade a o s c o m p o n e n t e s
das e q u i p a s de t r a b a l h o n a « g e s t ã o do tempo» e t o r n a m - l h e s o trabalho
m a i s variado, o que n ã o s i g n i f i c a m a i s e s t i m u l a n t e o u c r i a t i v o ( ) .
E s t a m o s , pois, perante u m problema real, que dificilmente pode t e r
resposta a o nível do p o s t o de t r a b a l h o ou m e s m o da própria oficina.
U m projecto s o c i a l i s t a n ã o o pode ignorar, e p r o v a v e l m e n t e s ó lhe poderá
dar r e s p o s t a dando u m suporte social sólido à n o ç ã o de
criatividade.
A i n d a que m u i t o p o s s a s e r f e i t o n e s s e domínio, n ã o c r e m o s que s e p o s s a m d e p o s i t a r d e m a s i a d a s e s p e r a n ç a s n u m a «revolucionarização t e c n o lógica» que e l i m i n a s s e por inteiro o s p o s t o s de trabalho n ã o e s t i m u l a dores da criatividade individual: s ã o o s próprios h o r i z o n t e s individuais,
a b e r t o s pelo exterior, que t ê m de ser objecto de u m a «revolucionarização»,
de raiz e m i n e n t e m e n t e político-cultural.
7
4) Como conciliar qualidade de vida e industrialização?
— A o colocar
e s t a interrogação, s i t u a m o - n o s desde l o g o f o r a dos p r o j e c t o s «utópicos»
de a l g u n s e c o l o g i s t a s (de direita e de esquerda) que s o n h a m , ainda que
quase n u n c a o explicitem, com o idílico r e t o r n o a u m a a s s é p t i c a sociedade
rural — i n t e l e c t u a i s g e r a l m e n t e de raiz literária ou filosófica, que ignor a m t a n t o a dureza e a s s e r v i d õ e s do t r a b a l h o agrícola, q u a n t o o s s e u s
i n i m i g o s jurados que f a l a m da criatividade do trabalho industrial i g n o ram este. Pela n o s s a parte, e s t a m o s a admitir, c o m o o t e m o s vindo a
fazer, que o projecto s o c i a l i s t a n ã o s ó n ã o rejeita a e x i s t ê n c i a de indúst r i a s como e x i g e , p a r a p l e n a m e n t e se realizar, u m considerável desenv o l v i m e n t o industrial, ú n i c a f o r m a de a s s e g u r a r à sociedade a abundância
de b e n s m a t e r i a i s por ela considerados
ú t e i s , se n ã o m e s m o indispensáveis.
P o s t o isto, q u e r e m o s assinalar, p a r a v i n c a r com a força n e c e s s á r i a
a s dificuldades i n e r e n t e s a e s t a «conciliação», que d a m o s aqui a o s dois
(') Sobre a descrição de tarefas e os limites da criatividade numa cadeia de montagem de motociclos na Hungria, v. K E M É N Y [1978]. Neste texto encontram-se também informações com muito interesse sobre a hierarquia na empresa, a utilização das
horas extraordinárias e os seus efeitos no rendimento salarial e na qualificação, a
persistência da «obsessão do cumprimento do Plano», etc.
t e r m o s da d i c o t o m i a enunciada o seu m a i s amplo sentido. A s s i m , qualidade de vida n ã o s e referirá apenas, c o m o é frequente, à eliminação dos
e f e i t o s da poluição, m e s m o no sentido m a i s v a s t o (incl., p. ex., poluição
sonora, o u a t é « v i s u a l » ) . P a r a o projecto socialista, a qualidade de vida
t e m de s e r entendida no sentido m a r x i a n o original, de « d e s e n v o l v i m e n t o
completo do indivíduo» ( ) ou, na e x p r e s s ã o de u m a s o c i ó l o g a húngara,
da apropriação p e l o s indivíduos da riqueza social que resulta do «desenv o l v i m e n t o multilateral d a s f o r ç a s e s s e n c i a i s do g é n e r o h u m a n o » ( ) .
Trata-se, m u i t o s i m p l e s m e n t e , de u m n o v o m o d o de r e l a c i o n a m e n t o dos
indivíduos entre si e com a n a t u r e z a (nomeada, m a s não e x c l u s i v a m e n t e ,
a t r a v é s dos m e i o s de produção e dos p r o c e s s o s de t r a b a l h o ) . O que s i g nifica a realização do «indivíduo social», t a m b é m n a e x p r e s s ã o de Marx,
por u m lado, e por outro u m a relação com a natureza que n ã o pode ser
de m e r a contemplação, e m u i t o m e n o s de s u b m i s s ã o (e é e s s e o carácter
real da relação e x i s t e n t e n a tal idílica sociedade r u r a l ) , m a s de apropriação — e a decisão consciente de conservar a p a i s a g e m , de m a n t e r
protecções n a t u r a i s , de a s s e g u r a r o s equilíbrios n a t u r a i s estabelece, pelo
s i m p l e s f a c t o de s e r uma decisão política v i s a n d o o benefício da colectividade, u m a relação de poder sobre a natureza, o u de apropriação.
A u m e n t a r a qualidade de vida é, pois, n e s t a acepção global, a u m e n t a r
a capacidade de apropriação
de cada u m e de t o d o s sobre a s u a própria
v i d a e sobre a v i d a social, aprofundar o c o n h e c i m e n t o de cada u m e de
t o d o s sobre o s m e c a n i s m o s de relacionamento social, económico, cultural,
que d e t e r m i n a m o devir da comunidade, para o s dominar e, dentro dos
seus limites, exercer uma autêntica
liberdade.
8
9
Se p a s s a r m o s a o polo oposto, ao conceito amplo de «industrialização»,
e n c o n t r a m o s aí u m a necessidade do projecto socialista, c o m o j á v i m o s ,
m a s i g u a l m e n t e u m f a c t o r i m e n s a m e n t e poderoso de continuidade, isto
é, de reprodução de relações anteriores
dos h o m e n s entre si e deles com
a natureza. F o i a industrialização m o d e r n a que g e r o u o s i s t e m a salarial
e a relação de exploração inerente ao m o d o de produção capitalista.
Foi ela que parcelizou a s t a r e f a s , que aniquilou o t r a b a l h o criativo, que
«burocratizou» a sociedade — diluindo, n a aparente i m p e s s o a l i d a d e das
s u a s r e g r a s , n a hierarquização das f u n ç õ e s que desenvolveu, o conflito central entre exploradores e explorados. N e s t e sentido, a industrialização, m a i s do que u m a (entre o u t r a s ) f o r m a s de d e s e n v o l v i m e n t o
( ) MARX [1857-58J-2, p. 230.
( ) HELLER [1970], cit. em F R A N K E L & MARTIN [1973], p. 278, de «Hipótese
para uma teoria marxista do valor» (em Húngaro), de Agnes Heller.
8
9
económico, foi t a m b é m u m poderoso p r o c e s s o «modelador» de comportam e n t o s sociais, u m s i s t e m a de poder, u m destruidor da «qualidade de
vida», n ã o a p e n a s pelos s e u s e f e i t o s m a i s p a t e n t e s de poluição ou de
concentração urbana, m a s pelas contrapartidas que «estruturalmente»
propõe de afluência de bens de c o n s u m o , c o n s t i t u í d a e m objectivo m á x i m o de vida e sinal de p r e s t í g i o , se n ã o m e s m o de «libertação».
Ê n e s t a acepção global que se t o r n a p a t e n t e a oposição frontal
entre «qualidade de vida» e «industrialização», oposição m u i t o m a i s
profunda do que a que c o r r e n t e m e n t e é colocada por n u m e r o s o s ecolog i s t a s entre o s m e s m o s t e r m o s . E é por i s s o que, ao p e r s p e c t i v a r u m
projecto socialista, s e t e r á de ir ao f u n d o da q u e s t ã o e encontrar, n u m a
n o v a formulação dos t e r m o s , ou na s u a m e d i a ç ã o a t r a v é s de n o v o s conc e i t o s e de n o v a s práticas, a s o l u ç ã o da contradição e o s c a m i n h o s de
t r a n s i ç ã o para e s s a m e s m a solução.
5) Como p a s s a r da noção de rendimento
(ou de v a l o r m a t e r i a l / m o n e t á r i o ) à de fruição
de bens socialmente
úteis
(ou valor qualitativo) ?
— Quando a L e s t e se a s s i s t e a u m a indiscutível penetração dos «valores»
da c h a m a d a sociedade de c o n s u m o ocidental, de que a s u a própria imprensa f r e q u e n t e m e n t e s e f a z eco (com m a i s severidade n o s p a í s e s de
planificação central, com m a i s indulgência n u m a H u n g r i a , e m que é o
próprio modelo e c o n ó m i c o que f i n a l m e n t e s e g r e g a c o m p o r t a m e n t o s de
tipo «consumista» — m a s e m a m b o s o s c a s o s dando t e s t e m u n h o do que
«realmente e x i s t e » ) ; quando, n o s p a í s e s ocidentais, o s partidos s o c i a l i s t a s ,
implícita e m u i t a s v e z e s e x p l i c i t a m e n t e , t e n d e m a identificar « s o c i a l i s m o
democrático» a u m «socialismo de distribuição», que n ã o é m a i s do que
u m a social-democracia, o u u m neo-capitalismo, g e s t ã o i n t e l i g e n t e de u m a
e c o n o m i a capitalista que procura diluir o s conflitos s o c i a i s e a t e n u a r a s
s u a s próprias c r i s e s a t r a v é s de u m a elevada capacidade de c o n s u m o
a s s e n t e n a articulação entre a l t a s produtividades, a l t o s s a l á r i o s e publicidade intensiva, e s t a ú l t i m a c o m u m a função preponderante, não a p e n a s
económica m a s talvez sobretudo ideológica; quando nós-próprios já
a c i m a n o s referimos, a propósito do «projecto socialista», a u m a «abundância crescente», ainda que j u l g u e m o s t e r sido claros q u a n t o à natureza
d e s s a m e s m a abundância; enfim, quando n o s d e f r o n t a m o s c o m t a i s « f a c t o s
sociais», s e não com o risco de certos equívocos, c r e m o s indispensável
sublinhar a importância vital, para a identificação do «projecto socialista», d o e q u a c i o n a m e n t o preciso do problema cultural que c o n s i s t e n a
p a s s a g e m do q u a n t i t a t i v o ao qualitativo. P a r a utilizar u m a fórmula
s u f i c i e n t e m e n t e s u g e s t i v a , t r a t a - s e de encontrar a s v i a s de p a s s a g e m de
u m a s u p o s t a (ou desejada) abundância indiscriminada de bens a u m a
«abundância de vida». Ã preocupação o b c e s s i v a c e n t r a d a n a luta const a n t e por r e n d i m e n t o s m o n e t á r i o s m a i s a l t o s para comprar produtos
cada vez m a i s c a r o s (e com u m a relação m a r g i n a l q u a l i d a d e / p r e ç o fort e m e n t e decrescente) t e r á de g r a d u a l m e n t e substituir-se a valorização
do que é s o c i a l m e n t e útil, t e n h a ou n ã o u m preço m o n e t á r i o , independ e n t e m e n t e de e f e i t o s de p r e s t í g i o a l i m e n t a d o s por u m a publicidade falaciosa. N ã o q u e r e m o s c o m isto dizer que m u i t o s d e s s e s b e n s s o c i a l m e n t e
ú t e i s não s e j a m b e n s de c o n s u m o formalmente
i d ê n t i c o s a o s que h o j e
c o n h e c e m o s , e que para o s adquirir n ã o s e j a n e c e s s á r i o dispor de
dinheiro. O i m p o r t a n t e é que s e altere a atitude
d o «consumidor» face
ao produto, n o sentido de e s s e m e s m o consumidor s e tornar, acima de
tudo, u m «utilizador». A p e n a s para exemplificar, a eliminação da n e c e s sidade artificialmente f o m e n t a d a de s u b s t i t u i r b e n s duráveis periodicam e n t e ( a u t o m ó v e i s , frigoríficos, i n s t a l a ç õ e s de reprodução sonora, e t c ,
e t c ) , eliminação que i m p l i c a a c ç õ e s a o nível da produção,
onde h o j e
a «obsolescência» é como s e sabe c u i d a d o s a m e n t e programada, e alter a ç õ e s de c o m p o r t a m e n t o sociológico a o nível do consumo,
j á que faz
parte de u m certo e s t a t u t o m u d a r de carro, como m u d a r de «toilette»,
de t a n t o e m t a n t o t e m p o — tal e l i m i n a ç ã o colocaria s ó por si e m b a s e s
t o t a l m e n t e diferentes n ã o só a relação u t i l i z a d o r / p r o d u t o , m a s t a m b é m
a s relações entre o s d i v e r s o s utilizadores, a o m e s m o t e m p o que modificaria a relação s a l á r i o / p r e ç o e que tornaria t r a n s p a r e n t e s o s m e c a n i s m o s a c t u a i s de d o m i n a ç ã o da produção sobre o quotidiano de consumidores condicionados. Outro e x e m p l o possível de alteração de t o d a s e s t a s
relações poderá s e r o da utilização colectiva de certos b e n s que h o j e s ã o
p o s s u í d o s n ã o a p e n a s pela s u a utilidade i n t r í n s e c a m a s c o m o s í m b o l o s
s o c i o l ó g i c o s de «riqueza» ou de p r o p r i e d a d e / p r o s p e r i d a d e individual.
Os c a s o s m a i s e v i d e n t e s s ã o talvez o s de m á q u i n a s de l a v a r roupa utilizadas c o l e c t i v a m e n t e p e l o s m o r a d o r e s de u m m e s m o prédio, e t a m b é m
a t ã o discutida inversão t r a n s p o r t e c o l e c t i v o / t r a n s p o r t e individual.
N a realidade, o problema é m u i t o m a i s v a s t o , a l a r g a n d o - s e a t o d a s
a s e s f e r a s d a v i d a social, e n ã o a p e n a s a o s c o m p o r t a m e n t o s d e t e c t á v e i s
ao nível do m e r c a d o de b e n s de c o n s u m o . O projecto s o c i a l i s t a t e m de
ser u m projecto de «desmercantilização» de t o d a a vida social, t e m de
apontar v i a s p a r a a t r a n s f o r m a ç ã o das relações de t r o c a mercantil,
que d o m i n a m h o j e t o d a a e s t r u t u r a de c o m p o r t a m e n t o s (desde o s «económicos», a t é a o s i s t e m a educativo, à s relações entre s e x o s , à ocupação
dos t e m p o s l i v r e s ) , e m relações de cooperação. É óbvio que, a e s t e respeito, s e r ã o d e c i s i v o s o s s i s t e m a s de c o m u n i c a ç ã o e c o n f r o n t a ç ã o / c o n -
vívio, n e c e s s a r i a m e n t e desierarquizados e abertos, entre indivíduos e
grupos, n ã o condicionados pelo local de trabalho e / o u de h a b i t a ç ã o .
E s t a será u m a d a s c h a v e s p a r a a t r a n s f o r m a ç ã o do h o m e m unidimensional, t e n d e n c i a l m e n t e indiferenciado dos outros, m a s e f e c t i v a m e n t e
deles isolado, a p e n a s «comunicando» com os outros a t r a v é s da m e n s a g e m c o m u m que t o d o s recebem
(via t e l e v i s ã o , v i a imprensa, v i a public i d a d e ) , n u m h o m e m multidimensional, s i m u l t a n e a m e n t e m a i s diferenciado e dotado de vida própria, e m a i s social, pela apreensão da experiência colectiva n a s u a totalidade.
6) Como conciliar igualitarismo
e dinamismo
económico/social?
— Ê u m f a c t o indiscutível que a ideia igualitária, ou seja, a de u m a exig ê n c i a de n i v e l a m e n t o de r e n d i m e n t o s , de oportunidades, de condições
de v i d a (habitação, educação, saúde, m a s t a m b é m a c t i v i d a d e s lúdicas,
culturais, e t c ) , é inerente à ideologia s o c i a l i s t a e t e m de e n c o n t r a r resp o s t a n u m projecto socialista. M a s é t a m b é m u m f a c t o que, até
hoje,
n ã o foi e n c o n t r a d o m o t o r m a i s eficaz de d i n a m i s m o e c o n ó m i c o e social
do que, p r e c i s a m e n t e , a e x i s t ê n c i a de d e s i g u a l d a d e s de r e n d i m e n t o e
condições de vida entre o s indivíduos, que o s i n c i t a m a o trabalho e à
poupança. I s t o é verdade n o que diz respeito a o s p a í s e s c a p i t a l i s t a s ,
onde t a l d e s i g u a l d a d e faz parte da lógica própria do s i s t e m a e da s u a
ideologia, m a s t a m b é m , c o m o v i m o s , n o s p a í s e s que se r e c l a m a m do
s o c i a l i s m o s e v e i o a c o n s t a t a r a insuficiente m o t i v a ç ã o criada quer pelos
e s t í m u l o s p r o p a g a n d í s t i c o s quer pelo s i s t e m a de s a n ç õ e s político-repress i v a s da era estaliniana, pelo que u m a das c o m p o n e n t e s g e n é r i c a s das
r e f o r m a s dos a n o s 60 foi a do a c e n t o p o s t o n o papel d o s «incentivos
m a t e r i a i s » e m e s m o , com frequência explicitada, a da n e c e s s i d a d e de
u m a crescente abertura dos leques s a l a r i a i s e de u m a m a i o r diferenciação social.
P a r a n o s d a r m o s c o n t a do ponto a que a ideia i g u a l i t á r i a é e s t r u t u r a l m e n t e e s t r a n h a ao s i s t e m a de m e r c a d o e com ele radicalmente
incompatível, b a s t a r á ler u m a série de a r t i g o s publicada e m 1975 n a
Business
Week sobre o i g u a l i t a r i s m o e o « m o v i m e n t o igualitário» n o s
E . U n i d o s , de que o primeiro t e m o t í t u l o elucidativo « I g u a l i t a r i s m o :
a m e a ç a a o m e r c a d o livre» ( ) . J u l g a m o s útil fazer a l g u m a s c i t a ç õ e s
e s c l a r e c e d o r a s : « E n q u a n t o o s porta-vozes d e s t e m o v i m e n t o [ i g u a l i t á r i o ]
ainda f a l a m sobretudo e m t e r m o s de direitos, o objectivo é cada v e z m a i s
1 0
('») COBBS [1975]-1, 2 e 3.
o n i v e l a m e n t o de bens e poderes na sociedade americana. Os igualitarist a s de hoje pretendem utilizar o g o v e r n o federal para redistribuir a
riqueza e o s rendimentos, eliminar a s diferenças na educação e na
o r i g e m familiar e u l t r a p a s s a r o princípio clássico s e g u n d o o qual o que
u m h o m e m c o n s o m e t e m de e s t a r determinado pelo que produz ou pelo
que possui. P a r a a t i n g i r a uniformidade e a igualdade, eles e s t ã o preparados para sacrificar a diversidade e a liberdade individual. O movim e n t o igualitário é e s s e n c i a l m e n t e autoritário. Ê a l t a m e n t e crítico do
business
e da e c o n o m i a do laissez-faire.
Os m e i o s de n e g ó c i o s [o business], pelo s e u lado, v ê e m o i m p u l s o igualitário como u m a a m e a ç a —
n ã o e x a c t a m e n t e para o s s e u s e n c a r g o s salariais m a s para o s princípios
f u n d a m e n t a i s de u m a e c o n o m i a de mercado. E t ê m razão nisso» ( " ) .
M a i s adiante c i t a A r t h u r Okun, s e g u n d o o qual: « A o prosseguir
tal objectivo [de igualdade de condições, por oposição a igualdade de
d i r e i t o s ] , a sociedade desperdiçaria t o d a a oportunidade de u s a r recomp e n s a s m a t e r i a i s como i n c e n t i v o s à produção. E i s t o conduziria a ineficiências que seriam prejudiciais para o welfare
da maioria» ( ) .
E n f i m , oferece-nos u m a i m a g e m clássica, que n o s recorda a s referências
f e i t a s no 1.° e n s a i o aos t e ó r i c o s da «neguentropia e c o n ó m i c a » : « U m s i s t e m a c a p i t a l i s t a utiliza a s diferenças de s a l á r i o s e lucros para m a n t e r
a m á q u i n a e c o n ó m i c a e m f u n c i o n a m e n t o tal c o m o u m a m á q u i n a a
vapor utiliza diferenças de calor e p r e s s ã o para m a n t e r o volante em
m o v i m e n t o . Diferenciais de s a l á r i o s m o v e m o s t r a b a l h a d o r e s de actividades m e n o s p r o d u t i v a s para o u t r a s m a i s produtivas. D i f e r e n c i a i s de
lucros m o v e m o capital de a c t i v i d a d e s e m declínio para á r e a s e m crescimento». E acrescenta, logo a s e g u i r : «Mesmo o s s i s t e m a s s o c i a l i s t a s
e c o m u n i s t a s descobriram que o s i n c e n t i v o s salariais são o único camin h o para obter produção» ( ) . E s t a ú l t i m a citação, que poderia levantar
dúvidas se não n o s t i v é s s e m o s j á referido l a r g a m e n t e ao a s s u n t o no
2.° ensaio, leva-nos, a p e s a r disso, a referir u m a u t o r polaco que, do
m e s m o p a s s o , n o s dá a l g u m a s i n t e r e s s a n t e s i n f o r m a ç õ e s sobre o «igualitarismo» n o seu p a í s : «O que m a i s ressalta, n e s t e ponto [i. e., no que
respeita ao problema dos r e n d i m e n t o s ] , é a a c e i t a ç ã o por t o d a a população, e a n t e s de m a i s pela classe operária, dos princípios i g u a l i t á r i o s
da repartição. (...) E s t e i g u a l i t a r i s m o traduz i n c o n t e s t a v e l m e n t e t r a n s f o r m a ç õ e s s o c i a l i s t a s n a consciência da n o s s a sociedade e constitui u m
1 2
1 3
(") COBBS [1975]-1, p. 62.
( ) Id., p. 64.
(") COBBS [1975]-3, p. 87.
K
f a c t o r que facilita a aplicação, no domínio da repartição, de soluções
próprias a o s e s t á d i o s superiores de d e s e n v o l v i m e t o do s o c i a l i s m o ,
quando a pressão das n e c e s s i d a d e s m a t e r i a i s deixa pouco a pouco de
ser a p r e m i s s a f u n d a m e n t a l da actividade h u m a n a . N o entanto, n ã o
d e v e m o s esquecer t a m b é m que o i g u a l i t a r i s m o polaco c o n t e m p o r â n e o
é u m f e n ó m e n o d e m a s i a d o c o m p l e x o e ainda d e m a s i a d o pouco conhecido para s e r considerado c o m o u m e s t a d o de consciência que n ã o
n e c e s s i t a de correcção do p o n t o de v i s t a das e x i g ê n c i a s que impõe a
continuação da e x p a n s ã o económica. Parece, e m primeiro lugar, que
e s t e i g u a l i t a r i s m o t e m por o r i g e m u m a condenação m o r a l do s u c e s s o
m a t e r i a l dos indivíduos ou, m a i s e x a c t a m e n t e , dos m e i o s p e l o s quais
e s t e s u c e s s o foi obtido. S e o s r e n d i m e n t o s e l e v a d o s p r o v o c a m u m a desaprovação social é porque se t e m como certo que f o r a m adquiridos por
operações m o r a l m e n t e condenáveis. D e facto, à n o s s a sociedade f a l t a m
q u a s e c o m p l e t a m e n t e m o d e l o s de s u c e s s o m a t e r i a l que a opinião aprov a s s e . P e l o contrário, u m a m á s i t u a ç ã o m a t e r i a l é q u a s e considerada
c o m o u m a g a r a n t i a de h o n e s t i d a d e . S i t u a ç ã o que e s t á longe de s e r norm a l para u m a sociedade a i n d a incapaz de poder renunciar à aplicação
de e s t i m u l a n t e s m a t e r i a i s que i n c i t e m a trabalhar» ( ) . T a m b é m u m
s o c i ó l o g o checo, Machonin, l a m e n t a v a e m 1969 «uma ideologia igualit á r i a l a r g a m e n t e expandida, para a qual a s diferenças, n o e n t a n t o insuficientes, de e s t a t u t o social que e x i s t e m actualmente, p a r e c e m prejudiciais e inúteis» ( ) . P a r a W . Connor, «em t o d a a E u r o p a de L e s t e ,
o i g u a l i t a r i s m o e a consciência de u m a s e g u r a n ç a de e m p r e g o penetrar a m o m u n d o operário e c o n s t i t u í r a m u m obstáculo m a i o r n a v i a das
r e f o r m a s económicas» ( ) . D e resto, se recordarmos a b a s e teórica das
r e f o r m a s , que n ã o é m a i s do que a teoria e c o n ó m i c a do equilíbrio geral,
compreende-se f a c i l m e n t e como o i g u a l i t a r i s m o terá i n e v i t a v e l m e n t e
de c o n s t i t u i r u m a r e s i s t ê n c i a à s u a aplicação. E t a m b é m se compreenderá porque a c o m p o n e n t e i g u a l i t a r i s t a t e m de e s t a r p r e s e n t e n u m s i s t e m a de t r a n s i ç ã o para o s o c i a l i s m o . R e s t a contudo que s e encontre
u m «substituto» m o t i v a d o r da d i n â m i c a social e económica que terá,
ele próprio, de ser c o m p o n e n t e essencial do projecto socialista, s e m
o que a t r a n s i ç ã o para o s o c i a l i s m o poderá ser, m u i t o s i m p l e s m e n t e , a
t r a n s i ç ã o para a e s t a g n a ç ã o , o imobilismo e o d e s i n t e r e s s e , e o socia1 4
1 5
1 6
(") KOZMINSKI [1972], p. 27.
O ) Cit. em CONNOR [1975], p. 119.
(") CONNOR [1975], p. 114.
5
l i s m o a sociedade de entropia m á x i m a , o que seria n e g a r a própria
ideia de s o c i a l i s m o — sociedade empenhada, consciente e dinâmica.
7) E n f i m , porventura s í n t e s e de t o d a s a s a n t e r i o r e s q u e s t õ e s / c o n tradições, c o m o conciliar democracia
e socialismo,
liberdade
e empenhamento
colectivo ? — É com efeito e s t a , sobretudo a primeira, a f o r m a
por que, desde h á m u i t o , t ê m vindo a s e r formuladas, de m o d o condensado, a s dificuldades f u n d a m e n t a i s de u m projecto socialista. Infelizm e n t e , e m l u g a r de p r o p o s t a s e acções c o n c r e t a s n o s e n t i d o de a s superar, t e m - s e adoptado quase sempre u m n o m i n a l i s m o estéril e mistificador. A s e x p r e s s õ e s social-democracia, s o c i a l i s m o democrático, democracia s o c i a l i s t a de a l g u m m o d o p a r e c e m anunciar que o s que delas s e
r e c l a m a m s ã o portadores de u m a «solução». M a s b e m s e sabe t a m b é m
q u a n t o o p o r t u n i s m o e quanto c o n f o r m i s m o (com o s m e c a n i s m o s fundam e n t a i s do s i s t e m a capitalista) s e t e m abrigado sob e s t a s capas. T a m bém, a L e s t e , n ã o f a l t a m a s d e m o c r a c i a s populares que, ao s e r e m simult â n e a e g l o b a l m e n t e d e s i g n a d a s de p a í s e s s o c i a l i s t a s (do «socialismo
r e a l » ) , n o s propõem m o d e l o s de sociedade e m que democracia e socialismo enfim s e t e r i a m encontrado. Ora, s e j a qual for o conceito de
d e m o c r a c i a que s e adopte, desde que ele p r e v e j a u m a participação a c t i v a
dos cidadãos n a s decisões políticas
que i n t e r e s s a m à colectividade, n e m
que s e j a a p e n a s n a escolha de r e p r e s e n t a n t e s ou d i r i g e n t e s a quem ingen u a m e n t e dêem «carta branca» para conduzir o s d e s t i n o s d e s s a m e s m a
colectividade (e j á e s t a r e m o s n o limiar da d e m i s s ã o colectiva, l o g o da
não-democracia, m e s m o t o m a d a e s t a n a m a i s «generosa» a c e p ç ã o ) , ainda
a s s i m é suficiente a evidência de que n o s c h a m a d o s p a í s e s «socialistas»
não e x i s t e f o r m a aceitável
de democracia.
E m contrapartida, e n s i n a - n o s a experiência de n u m e r o s o s períodos
revolucionários desde o princípio deste século (a p o r t u g u e s a pós-25 de
Abril, entre m u i t a s o u t r a s ) a e x t r e m a vulnerabilidade dos p r o c e s s o s de
«democracia de base» o u «democracia directa», que sempre s u r g e m e
s e d e s e n v o l v e m e m t a i s c o n t e x t o s , sendo pelo m e n o s incontestável que
e m n e n h u m caso eles puderam dar o r i g e m a u m a organização social
m o d e l a d a por t a i s princípios. O que não s i g n i f i c a que t a i s experiências
n ã o t e n h a m revelado i n s u s p e i t a d a s capacidades de iniciativa e de criatividade colectivas, bem como u m potencial de solidariedade, de s e n t i d o
do «socialmente útil», de operacionalidade anti-burocrática, de auton o m i a f a c e a o s aparelhos de poder tradicionais — tudo e l e m e n t o s e s s e n c i a i s de qualquer «projecto socialista». S i m p l e s m e n t e , a luta política
decisiva
t r a v a v a - s e e n t r e t a n t o à m a r g e m d e s s a s e x p e r i ê n c i a s (quando
m u i t o servindo-se
d e l a s ) , e e r a conduzida por aparelhos partidários e m
disputa pelo «aparelho de poder de E s t a d o » , o que é compreensível pois,
c o m o já v i m o s , é a e s s e nível, e a o das g r a n d e s o r g a n i z a ç õ e s e c o n ó m i c a s
e financeiras, que e s t ã o c o n c e n t r a d o s o s poderes de d e c i s ã o e de controle sobre t o d a a sociedade.
É n a u l t r a p a s s a g e m d e s t a f a l s a a l t e r n a t i v a que se s i t u a o projecto
s o c i a l i s t a : a c o n q u i s t a do poder por u m m o v i m e n t o e x c l u s i v a m e n t e
b a s i s t a , a t o m i z a d o e desarticulado, é u m a das u t o p i a s cuja inviabilidade a experiência j á claramente d e m o n s t r o u — e m u i t o m a i s o seria
o s e u e x e r c í c i o ; por outro lado, a c o n q u i s t a do poder por u m aparelho
de profissionais, organizados, hierarquizados e disciplinados, ainda que
f e i t a em nome d a s g r a n d e s m a s s a s , r a p i d a m e n t e cede à s e x i g ê n c i a s de
u m exercício «realista» desse m e s m o poder, que, para s e «consolidar»,
n ã o se pode c o m p a d e c e r de b a s i s m o s «anarquizantes» — cai-se e n t ã o
n u m n o v o poder de E s t a d o s e m controlo democrático, exercido por u m a
v a n g u a r d a iluminada, que n ã o demora a constituir-se n u m a burocracia
omnipotente e asfixiante.
O problema f u n d a m e n t a l que o «projecto socialista» terá, pois, de
equacionar, e de cuja solução dependerá e m grande parte a de t o d a s
a s contradições anteriores, será o da e x i s t ê n c i a de u m E s t a d o que, n u m
c o n t e x t o de luta de c l a s s e s , c o n t e n h a e m si m e s m o o s m e c a n i s m o s da
s u a n e g a ç ã o a prazo enquanto aparelho r e p r e s s i v o (ou de «coesão soc i a l » ) , pela s u b s t i t u i ç ã o gradual de relações de d o m i n a ç ã o de u m a classe
ou bloco social sobre o u t r a s (outro) por relações de solidariedade e a u t o disciplina colectivas. E s t e é, reconhecemo-lo, o ponto em que p a r e c e m o s
a p r o x i m a r - n o s m a i s da utopia, e é, por i s s o m e s m o , e s t e o desafio m a i s
arriscado e t a m b é m o m a i s m o t i v a d o r que s e coloca à lucidez dos que
procuram t r a ç a r a s linhas de f o r ç a de tal projecto. V o l t a r e m o s adiante,
n e c e s s a r i a m e n t e , a e s t a q u e s t ã o , a o e x a m i n a r a l g u n s d e b a t e s o u prop o s t a s r e l e v a n t e s no que t o c a a t o d a a problemática enunciada. M a s
desde j á d i r e m o s que, t a m b é m n e s t e ponto parece indispensável rever
e precisar c o n c e i t o s : u m deles s e r á por certo o de democracia represent a t i v a , que t e m de s e r dissociado de outro, q u a s e s e m p r e t o m a d o como
s e u sinónimo, o u seja, o de d e m o c r a c i a parlamentar.
A concluir e s t a primeira parte, em que n o s l i m i t á m o s a expor,
e m t e r m o s de contradições a resolver, a s g r a n d e s c o m p o n e n t e s do proj e c t o socialista, q u e r e m o s s a l i e n t a r desde l o g o u m a s p e c t o capital, que
n o s fará a l i g a ç ã o com o s dois e n s a i o s anteriores. V i m o s , ao l o n g o da
e x p o s i ç ã o f e i t a sobre e s s a s contradições, surgirem-nos, c o n s t a n t e m e n t e
imbricados, problemas económicos, políticos, sociais, culturais, f a c t o r e s
l i g a d o s à tecnologia, à organização social, ao «modo de vida», ao quotidiano, à s relações de classes, e t c , etc. Talvez n ã o f o s s e preciso m a i s
para se apreender a t é que ponto o « s i s t e m a socialista» ( c o m o o « s i s t e m a
c a p i t a l i s t a » ) não pode s e r de n e n h u m m o d o identificado e m t e r m o s de
« s i s t e m a económico». D e facto, colocando-nos a p e n a s no plano dos s i s t e m a s económicos,
t e r e m o s dificuldade e m f u g i r à l ó g i c a da t e o r i a dos
s i s t e m a s , s e g u n d o a qual cada s i s t e m a é a p e n a s u m ponto n u m espaço
a n dimensões, definido pelos v a l o r e s dos n p a r â m e t r o s c a r a c t e r í s t i c o s
desse m e s m o espaço. S e g u n d o o s v a l o r e s c o m b i n a d o s d e s s e s p a r â m e t r o s ,
poderão apontar-se r e g i õ e s mais pronunciadamente
s o c i a l i s t a s e regiões
mais pronunciadamente
c a p i t a l i s t a s , m a s nunca d i s t i n g u i r com rigor,
como s i s t e m a s c o m l ó g i c a s r a d i c a l m e n t e o p o s t a s , o socialismo
do capitalismo.
E i s t o é a s s i m não a p e n a s porque a m b o s s ã o sistemas
globais,
e não a p e n a s económicos, m a s porque o «peso» relativo dos diversos
e l e m e n t o s caracterizadores de u m e outro s i s t e m a é distinto. E m linguag e m b e m c o n h e c i d a de a l g u n s iniciados, no c a p i t a l i s m o é e c o n ó m i c a a
i n s t â n c i a dominante, enquanto no s o c i a l i s m o é d o m i n a n t e a instância
política — ou, preferentemente, político-cultural. E m t e r m o s m a i s concretos, i s t o s i g n i f i c a que, por exemplo, o s p o n t o s que, no e s p a ç o dos
s i s t e m a s económicos, indiquem u m a preponderância q u a s e absoluta dos
m e c a n i s m o s de m e r c a d o sobre a planificação correspondem
necessariamente a s i s t e m a s «capitalistas», aqueles e m que a relação seja inversa
n ã o correspondem necessariamente
a s i s t e m a s «socialistas». S ó saindo
para fora d e s s e espaço, será possível equacionar e s t e ú l t i m o problema.
2. E m b o r a correndo o risco de decepcionar o s leitores cujo fôlego
ou a paciência l h e s p e r m i t i r a m c h e g a r a e s t e ponto, e cuja ingenuidade
o u d e s a t e n ç ã o t e r ã o levado a e s p e r a r que l h e s a p r e s e n t á s s e m o s u m a
«solução definitiva» para a s q u e s t õ e s p o s t a s , desde já s u b l i n h a m o s v i v a m e n t e que n u n c a poderia ser e s s e o n o s s o propósito, s o b p e n a de n o s
contradizermos f r o n t a l m e n t e : a f o r m u l a ç ã o do «projecto socialista» terá
s e m p r e de ser resultado de u m trabalho multidisciplinar aprofundado,
se é certo que s e t r a t a de u m projecto de sociedade global, logo de u m
s i s t e m a e m que t ê m de se encontrar c o n s i s t e n t e m e n t e articuladas a s comp o n e n t e s política, económica, social, cultural, ideológica. E é a p e n a s da
identificação da natureza
do projecto socialista e das s u a s
componentes
críticas
que se ocupa o n o s s o trabalho. P o d e r í a m o s m e s m o dá-lo por
concluído n e s t e ponto, pois j u l g a m o s a t i n g i d o e s s e objectivo. N o e n t a n t o ,
c e r t o s contributos s u r g i d o s n o s ú l t i m o s a n o s e m p a í s e s que s e r e c l a m a m
do s o c i a l i s m o parecem-nos de suficiente importância, por n a s c e r e m da
prática,
como e l e m e n t o s m o t i v a d o r e s do debate indispensável, para que
não l h e s dediquemos a l g u m a s breves linhas. Como t a m b é m n ã o n o s
e s c u s a r e m o s , a concluir, a u m i n s i g n i f i c a n t e contributo pessoal, e m term o s de h i p ó t e s e de trabalho, para e s s e m e s m o debate.
Ocupar-nos-emos, pois, de seguida, e s u c e s s i v a m e n t e , do «debate
cubano sobre a g e s t ã o socialista» dos a n o s 1963-65, da «alternativa» prop o s t a por Rudolf B a h r o e dos t r a b a l h o s da c h a m a d a e s c o l a de B u d a p e s t e .
Ê importante n o t a r desde l o g o o s c o n t e x t o s d i s t i n t o s e m que s e g e r a ram e s t a s contribuições. E n q u a n t o o debate cubano (do qual n o s ocuparem o s , no essencial, das t e s e s de Guevara) decorre n u m p a í s claramente
«subdesenvolvido», de e c o n o m i a t o t a l m e n t e d i s t o r c i d a pelo domínio imperialista (monocultura a ç u c a r e i r a ) , s u b m e t i d o a u m bloqueio económico
pelos E . U . e, sobretudo, n u m a f a s e em que a n o v a organização económica e
social e s t á por a s s i m dizer em aberto e se e x p e r i m e n t a m n a prática m o delos distintos, a s contribuições de B a h r o e dos f i l ó s o f o s e s o c i ó l o g o s
da E s c o l a de B u d a p e s t e s u r g e m , pelo contrário, c o m o reacção a s i s t e m a s
«fechados», com p r o v a s dadas, ainda que com diferenças c o n s i d e r á v e i s :
a R D A é o país e c o n o m i c a m e n t e m a i s a v a n ç a d o de t o d o s o s p a í s e s de
Leste, e t a m b é m daqueles e m que a o r t o d o x i a do s i s t e m a de planificação
central persistiu c o m m e n o s alterações, enquanto a H u n g r i a é u m p a í s
de nível «intermédio» de d e s e n v o l v i m e n t o , m u i t o aberto ao e x t e r i o r ( e m
t e r m o s de t r o c a s comerciais) e o único e m que, c o m o j á v i m o s , s e t e m
vindo a aplicar u m a «reforma económica» que contradiz f r o n t a l m e n t e
o s i s t e m a de planificação central ( ) . S a l i e n t a m o s ainda, porque isso
explica certas diferenças s u b s t a n c i a i s n a s p o s i ç õ e s dos a u t o r e s e m discuss ã o e porque e s s a f o r m a de e x p r e s s ã o é por eles f r e q u e n t e m e n t e utilizada,
que enquanto Cuba s e e n c o n t r a v a (e encontra por c e r t o ) n u m a f a s e de
d e s e n v o l v i m e n t o extensivo,
t a n t o a R D A como a H u n g r i a já p a s s a r a m
à f a s e de d e s e n v o l v i m e n t o intensivo.
Daí, por exemplo, que a Guevara s e
não p o n h a m com a m e s m a acuidade que a o s r e s t a n t e s i n t e r v e n i e n t e s
problemas como o da «estrutura de c o n s u m o s » ou m e s m o da «qualidade
do d e s e n v o l v i m e n t o » .
1 7
(") Ainda que utilizando um indicador discutível, poderemos ter uma ideia grosseira dos níveis respectivos de desenvolvimento económico através do respectivo
P N B / c a p i t a em 1978 (não esquecendo que o debate cubano decorre nos anos 1963-64):
Cuba 1090 US$, RDA 5680, Hungria 3060. Para comparação: Portugal 1820, França
8780, Reino Unido 5480 (ATLASECO [1979]).
V e j a m o s e n t ã o s u m a r i a m e n t e e m que c o n s i s t i u o «debate cubano»
e que e l e m e n t o s pode trazer à problemática que n o s o c u p a ( ) .
l s
D e s d e o primeiro t e x t o de Guevara, «Contra o b u r o c r a t i s m o » ( ) ,
ele e n u n c i a u m d o s s e u s t e m a s p r i v i l e g i a d o s : a c o n s t r u ç ã o do s o c i a l i s m o
e x i g e u m motor interno. A s u a f a l t a é, s e g u n d o ele, u m a das c a u s a s dos
g r a v e s problemas de e n t ã o e, concretamente, do «burocratismo». É patente,
para Guevara, «a falta de i n t e r e s s e do indivíduo e m p r e s t a r u m serviço
a o E s t a d o e por superar u m a s i t u a ç ã o dada. F u n d a - s e n u m a f a l t a de
consciência revolucionária ou, e m todo o caso, n o c o n f o r m i s m o frente ao
que a n d a m a l (...) [daí q u e ] , s e j a que e s t a f a l t a de m o t o r ideológico se
produza por u m a carência absoluta de convicção ou por certa dose de
desespero frente a problemas repetidos que não s e podem resolver, o indivíduo, o grupo de indivíduos, r e f u g i a m - s e no burocratismo, preenchem
papéis, s a l v a m a s u a responsabilidade e e s t a b e l e c e m a defesa e s c r i t a para
s e g u i r v e g e t a n d o ou para defender-se da irresponsabilidade de outros» ( ) .
A e x p r e s s ã o « m o t o r interno» s u r g e aliás por m a i s de u m a vez n o s t e x t o s
de Guevara, e e s t á sempre a s s o c i a d a à ideia de «consciência social» ou
«consciência revolucionária». N a realidade t r a t a - s e de u m a «vontade de
agir», ou «propensão para agir», m o t i v a d a por conhecimentos
ou convicções próprias
(ou s e j a por u m a consciência,
no e x a c t o s e n t i d o ) e n ã o por
a l a v a n c a s e x t e r i o r e s . Donde que outro dos t e m a s privilegiados de Guevara, e m torno do qual m u i t o se discutiu naquele período, t e n h a sido o
19
2 0
( ) Os textos fundamentais deste debate estão reunidos em SILVERMAN [1971],
e encontram-se mencionados na bibliografia sob os nomes dos que nele participaram:
Guevara, Rom, Codina, Cossio, Mora, Pont, Bettelheim, Mandel. U m a descrição pormenorizada do debate encontra-se em D E SANTIS [1965]. N a obra «Cuba, una revolucion en marcha», que inclui o texto de De Santis, podem ler-se alguns dos textos de
Guevara no original espanhol, e em particular o artigo «Contra el burocratismo», não
traduzido na referida antologia. V. ainda M A N D E L [1967], ALIER [1972] e
A L P H A N D E R Y [1972].
1S
( ) Não confundir com «burocracia», como sistema de organização, de que
muito se falará nos textos húngaros e no contributo de Bahro. De algum modo se pode
dizer que o burocratismo (que também existe nos países de Leste) corresponde às
«taras» de um sistema burocrático em que, inevitavelmente, competências e responsabilidades se não encontram ajustadas. E m Cuba, obviamente, dada a grande carência
de técnicos e quadros administrativos nos primeiros anos após a Revolução, essas
taras eram, por assim dizer, dominantes no sistema: isso conduzia (e nós bem conhecemos isso...) ao que Guevara chamava a «reunionite», ou então ao seu contrário, no
caso daqueles para quem qualquer problema se resolve como «na guerrilha», expeditamente. A esses chamou Guevara de «guerrilheiros administrativos».
( ) GUEVARA [1963]-1, p. 139.
19
20
dos « e s t í m u l o s m a t e r i a i s » , que s ã o i n c e n t i v o s à acção por
interesse:
«Segundo a n o s s a concepção, e s t í m u l o m a t e r i a l directo e consciência s ã o
t e r m o s contraditórios (...) [ e ] r e t a r d a m o d e s e n v o l v i m e n t o da moralidade
socialista» ( ) . A s u a utilização, que G u e v a r a n ã o exclui, teria n o e n t a n t o
que s e r c u i d a d o s a m e n t e feita, e m m o d a l i d a d e s que e v i t a s s e m u m a competição desenfreada entre trabalhadores, e c o l e c t i v a s de preferência a
individuais. Mandel, que s u b s c r e v e a s t e s e s g u e v a r i s t a s sublinha que só
deverão ser rejeitados o s i n c e n t i v o s m a t e r i a i s «que e n t r a m e m conflito
com a elevação da consciência s o c i a l i s t a dos trabalhadores, por e x e m p l o
o salário à peça, o s t a k h a n o v i s m o ; ou aqueles que e s t i m u l a m a compet i ç ã o entre e m p r e s a s contra o i n t e r e s s e da e c o n o m i a global» ( ) .
2 1
2 2
P o d e r i a supor-se que, f a c e a e s t e tipo de preocupações, G u e v a r a f o s s e
u m descentralizador, s e n ã o u m «autogestionário». M a s é j u s t a m e n t e aí
que reside a originalidade do p e n s a m e n t o g u e v a r i s t a . E m t e r m o s de g e s t ã o
da economia, ele é u m convicto centralizador, u m partidário acérrimo da
planificação central. E o s s e u s a r g u m e n t o s s ã o s i m u l t a n e a m e n t e de ordem
p r a g m á t i c a e de ordem teórica. D e ordem p r a g m á t i c a quando se fundam e n t a n a enorme e s c a s s e z de quadros t é c n i c o s e g e s t o r e s c o m p e t e n t e s ,
o que a seu v e r é u m obstáculo prático de m o n t a a u m a g e s t ã o descentralizada eficiente. D e ordem teórica quando o b s e r v a que, s e j á h a v i a a l g o
que e m Cuba, no plano das f o r ç a s produtivas, t i v e s s e a n t e s da Revolução
a t i n g i d o o nível «adequado» para s e r socializado s e m dificuldade era j u s t a m e n t e o s e c t o r das g r a n d e s e m p r e s a s i n d u s t r i a i s p e r t e n c e n t e s a o s m o n o pólios americanos, o que «permitia u m controlo centralizado sobre algum a s e m p r e s a s a partir das s e d e s centrais e m H a v a n a ou N o v a Iorque (...)
P o d e r í a m o s dizer, pois, que, enquanto t é c n i c a [de g e s t ã o ] o predecessor
do s i s t e m a o r ç a m e n t a l foi o m o n o p ó l i o imperialista tal como e x i s t i a
e m Cuba, a p ó s ter p a s s a d o p e l a s a l t e r a ç õ e s i n e r e n t e s ao l o n g o p r o c e s s o
de d e s e n v o l v i m e n t o das t é c n i c a s a d m i n i s t r a t i v a s e de controlo» ( ) . E s t e
tipo de a r g u m e n t o , que pode à primeira v i s t a parecer f i n a l m e n t e m a i s
p r a g m á t i c o que teórico, radica n a t e o r i a m a r x i s t a das contradições entre
relações de produção e d e s e n v o l v i m e n t o das f o r ç a s produtivas. Ora é
j u s t a m e n t e n o s e c t o r dos g r a n d e s m o n o p ó l i o s industriais que Guevara
v ê o único domínio e m que e s s a c o r r e s p o n d ê n c i a / c o n t r a d i ç ã o s e encont r a v a o b j e c t i v a m e n t e m a d u r a para a revolução e s e g u n d o ele não teria
sentido, do p o n t o de v i s t a da t r a n s i ç ã o socialista, ir s e g m e n t a r o que j á
2 3
(-"') G U E V A R A [1964]-1, pp. 134-135.
MANDEL, [1964], p. 89.
(*•) GUEVARA [1964]-1, pp. 129 e 132.
2Ifl
s e e n c o n t r a v a concentrado e, portanto, m a i s f a c i l m e n t e planificável. Pelo
contrário, Guevara dá u m p a s s o m a i s e considera todo o s e c t o r industrial
como «uma ú n i c a empresa» e defende que, tal c o m o sucede entre s e c t o r e s
ou oficinas de u m a empresa, o s produtos que circulam entre a s diversas
e m p r e s a s d e i x a r a m de t e r o carácter de mercadorias, e n e s s a s «transacções» (que o n ã o s ã o n a realidade, n e s s a concepção) d e i x o u de v i g o r a r
a lei do valor. É por e s t a v i a que u m a l a r g a parcela do debate s e s i t u a
( c o m o j á sucedera no debate soviético dos a n o s 20) e m torno do papel
da «lei do valor» durante a t r a n s i ç ã o para o socialismo. D e v e m o s aqui
f a z e r u m a breve p a u s a para precisar que, a o t e m p o ( 1 9 6 3 - 6 4 ) , em
Cuba, eram aplicados dois s i s t e m a s opostos de g e s t ã o : o s i s t e m a orçamental, no sector industrial, e o s i s t e m a de «cálculo económico» na agricult u r a e n o comércio externo. N o primeiro, defendido como já v i m o s por
Guevara, a s e m p r e s a s (ou consolidados,
g r u p o s de e m p r e s a s afins — E m presa Consolidade do Petróleo, E m p r e s a Consolidade da M o a g e m , e t c ) ,
e r a m f i n a n c i a d a s por dotações o r ç a m e n t a i s e o «critério de sucesso» era
o c u m p r i m e n t o do P l a n o (parcelar, pois n ã o h a v i a ainda u m a planificação g l o b a l ) . N ã o h a v i a p a g a m e n t o s entre e m p r e s a s e o s e s t í m u l o s ao
t r a b a l h o e r a m preferencialmente de natureza m o r a l : «o grande papel do
partido n a unidade de produção é o de ser o s e u m o t o r interno (...) para
que o trabalho produtivo, a capacitação, a participação n o s a s s u n t o s econ ó m i c o s da unidade s e j a m parte i n t e g r a n t e da v i d a dos operários, se v ã o
t r a n s f o r m a n d o e m h á b i t o insubstituível» ( ) . O s i s t e m a de «cálculo económico» inspirava-se n a s . concepções que ao t e m p o s e r v i a m de b a s e à
reforma económica soviética, citando o s s e u s d e f e n s o r e s com frequência
N o v o z h i l o v e Liberman. Recorde-se que se e s t á p r ó x i m o do relatório
K o s s y g i n (1965) que desencadeou o processo de reforma n a U R S S . Os
princípios b á s i c o s são o s d e : a u t o n o m i a de g e s t ã o d a s unidades produt i v a s tendo como critério prioritário de avaliação o lucro, recurso ao crédito bancário com juro para f i n s de f i n a n c i a m e n t o , relações m e r c a n t i s
(de compra e v e n d a efectivas)
entre e m p r e s a s , u s o i n t e n s i v o de incent i v o s m a t e r i a i s , e m particular de salários à peça e ao rendimento. O s grandes a r g u m e n t o s dos partidários deste s i s t e m a centram-se n a necessidade
de fazer corresponder a s relações de produção reais (portanto a s f o r m a s
de propriedade «socialista» e de g e s t ã o ) ao nível m u i t o primário de desenv o l v i m e n t o das f o r ç a s produtivas, u m a m e l h o r ( m a i s eficiente) utilização
2 4
(") Cit. em D E SANTIS [1965], p. 220. Para ver a sua inserção no texto original,
v. GUEVARA [1964]-1, p. 140.
de recursos, m e n o r burocracia e m a i o r m o t i v a ç ã o p a r a o trabalho (logo,
m a i s elevada p r o d u t i v i d a d e ) . A d i s c u s s ã o situa-se, p o i s e m p l a n o s distintos. E n q u a n t o u n s privilegiam a eficiência económica, o s o c i a l i s m o e u
quanto s i s t e m a e c o n ó m i c o (pelo m e n o s na primeira f a s e de t r a n s i ç ã o ) ,
o s o u t r o s v i s a m desde l o g o lançar a s b a s e s do s o c i a l i s m o enquanto
sistema global. Recorde-se contudo que Guevara n ã o era insensível à importância d e c i s i v a das q u e s t õ e s e c o n ó m i c a s . P o r u m lado à componente
económica de «suporte» da consciência s o c i a l : «O c o m u n i s m o é u m a m e t a
da h u m a n i d a d e que se alcança c o n s c i e n t e m e n t e ; l o g o , a educação, a liquidação das t a r a s da sociedade a n t i g a na consciência dos indivíduos, é
u m f a c t o r de s u m a importância, s e m esquecer, claro está, que sem
avanços
paralelos
na produção
não s e pode c h e g a r n u n c a a tal sociedade» ( )
[sublinhado m e u — J M P ] . N a s u a introdução ao debate cubano, Silverm a n coloca cruamente a m e s m a q u e s t ã o : «A f a l t a de controlo e c o n ó m i c o
eficaz é a f o r m a m a i s i m p o r t a n t e que m i n a o s i n c e n t i v o s m o r a i s . ( . . . )
O i m p a c t e da e s c a s s e z de b e n s sobre o s i n c e n t i v o s m o r a i s n ã o pode s e r
ignorado (...) Os i n c e n t i v o s m o r a i s t ê m de s e r reforçados a t r a v é s da elim i n a ç ã o da ansiedade q u a n t o à s a t i s f a ç ã o das n e c e s s i d a d e s b á s i c a s , e
isto faz-se elevando o s n í v e i s de v i d a » ( ) . E t a m b é m Mandel s u b l i n h a :
«Já e x p r e s s á m o s a n t e s a s razões por que c r e m o s impossível b a s e a r m o - n o s
i n t e i r a m e n t e em i n c e n t i v o s m o r a i s , n a educação socialista dos produtores.
Tal educação t e m de ser s u p o r t a d a por u m a realidade económica e social
que não neutralize l a r g a m e n t e o s s e u s efeitos» ( ) . Mas, m e s m o n o plano
da «eficiência económica», Guevara defende a s s u a s posições com a
s e g u i n t e a r g u m e n t a ç ã o : « ( . . . ) u m a a t e n ç ã o preferencial dada ao desenv o l v i m e n t o da consciência retardará a produção? E m t e r m o s comparativos, é possível que a s s i m suceda durante u m dado período, ainda que
n i n g u é m t e n h a efectuado o correspondente cálculo. N ó s s u s t e n t a m o s que
o d e s e n v o l v i m e n t o da consciência faz m a i s pelo d e s e n v o l v i m e n t o da produção n u m prazo r e l a t i v a m e n t e curto do que o s i n c e n t i v o s m a t e r i a i s .
T o m a m o s e s t a p o s i ç ã o porque o d e s e n v o l v i m e n t o da n o s s a sociedade é
g l o b a l m e n t e projectado de f o r m a a conduzir ao c o m u n i s m o . Isto p r e s s u põe que o trabalho c e s s a r á de s e r u m a penosa necessidade para s e tornar
n u m i m p e r a t i v o agradável. Tal afirmação e s t á c a r r e g a d a de s u b j e c t i v i s m o
e requer a s a n ç ã o da experiência que e s t a m o s vivendo» ( ) .
25
2 6
2 7
2 S
( )
( )
(")
(- )
M
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s
GUEVARA [1964]-1, p. 130.
SILVERMAN [1971], pp. 22 e 29.
M A N D E L [1964], p. 89.
GUEVARA [1964]-1, p. 135.
E n f i m , para completar a s t e s e s g u e v a r i s t a s n u m ponto importante,
v e j a m o s b r e v e m e n t e o problema dos critérios de i n v e s t i m e n t o . A i n d a aqui,
a p o s i ç ã o é p e r f e i t a m e n t e c o n s i s t e n t e com a perspectiva global, e é e x p o s t a
com a m a i o r clareza por Mandel: «Pode a "lei do valor" [logo a procura
da m á x i m a rendibilidade] g u i a r o i n v e s t i m e n t o s o c i a l i s t a ? I s t o seria
não só o fim de qualquer planificação real, m a s , m a i s do que isso, condenaria o s p a í s e s subdesenvolvidos (...) a permanecer indefinidamente
subdesenvolvidos. D e facto, n u m p a í s subdesenvolvido, a agricultura é
m a i s "rendível" que a indústria, a indústria ligeira m a i s "rendível" que
a pesada, a pequena indústria m a i s "rendível" que a grande indústria,
e, acima de tudo, a importação de bens industriais do mercado mundial
é m a i s rendível do que a s u a produção doméstica. P e r m i t i r - s e que o invest i m e n t o s e j a comandado pela lei do valor corresponderia de f a c t o a m a n t e r o desequilíbrio da e s t r u t u r a económica criada pelo capitalismo» ( ) .
P a r a o objectivo que nos propusemos, c r e m o s s u f i c i e n t e s a s referências que a c a b a m o s de f a z e r ao debate cubano de 1963-64, ainda que i s s o não
dispense u m a leitura cuidada pelo m e n o s dos s e u s t e x t o s capitais. A s s i n a l e m o s desde j á que, pelo que ficou e x p o s t o , se pode i m a g i n a r ter-se
t r a t a d o d u m a quase-reedição a 40 a n o s de distância do debate s o v i é t i c o
dos a n o s 20, e m que Guevara teria t o m a d o o papel de P r e o b r a j e n s k y e o s
s e u s o p o s i t o r e s o s dos bukharinianos, d e f e n s o r e s da N E P e da iniciativa
privada ( c a m p o n e s a ) . E x i s t e m e v i d e n t e s a n a l o g i a s , m a s , independentem e n t e de certas a s s i m e t r i a s na incidência dos debates e m certos a s p e c t o s
(p. ex. a q u e s t ã o dos e s t í m u l o s m a t e r i a i s / m o r a i s , central no debate
cubano, não merece u m a a t e n ç ã o específica no debate s o v i é t i c o ) , u m a
diferença é essencial, e determinante n o conteúdo m e s m o do d e b a t e :
enquanto P r e o b r a j e n s k y era, a n t e s de m a i s , u m e c o n o m i s t a ( e c o n o m i s t a
com posições «revolucionárias», é c e r t o ) , Guevara não o era, e isso reflecte-se f o r t e m e n t e no c a m p o em que procura s i t u a r a d i s c u s s ã o . N ã o esquec e m o s [v. 2.° e n s a i o ] que o « s i s t e m a » de P r e o b r a j e n s k y só pode ser assimilado à posterior opção estaliniana no plano e s t r i t a m e n t e e c o n ó m i c o :
nunca P r e o b r a j e n s k y (se e x c l u i r m o s a s u a posterior «auto-crítica»)
defendeu que o s e u s i s t e m a implicasse a colectivização forçada e a repress ã o generalizada. Isto é, o seu «sistema» p r e s s u p u n h a u m elevado g r a u
de «consciência social». Mas e s s e é u m a s p e c t o que, na sua a r g u m e n t a ç ã o ,
s ó e s p o r a d i c a m e n t e é explicitado. D e qualquer modo, a «questão cam2S)
(=») M A N D E L [1964], pp. 81-82.
m
ponesa», pano de fundo do debate soviético, e que t o r n a v a o projecto
de Preobrajensky, n a s u a globabilidade, u m a quase-impossibilidade que
ele só c o n s e g u i a «resolver» a p o s t a n d o n u m a c a d a vez m e n o s provável
revolução mundial, p r a t i c a m e n t e não transparece no debate c u b a n o : aí
foi desde logo f e i t a u m a R e f o r m a A g r á r i a «colectivista», e não u m a
«distribuição de terras», a d i m e n s ã o é t o t a l m e n t e outra (o problema
s o v i é t i c o envolvia u m a s dezenas de m i l h õ e s de c a m p o n e s e s , e m Cuba
nem u m a d e z e n a ) , e, enfim, e s t a v a ultrapassada, pelo m e n o s e m princípio,
a q u e s t ã o do «socialismo n u m s ó país». Daí que a s p r o p o s t a s de G u e v a r a
a s s u m a m u m a m u i t o m a i o r «credibilidade», e o s e u «voluntarismo» n ã o
só s e j a i n t e l e c t u a l m e n t e aceitável c o m o p o t e n c i a l m e n t e mobilizador.
Guevara introduz, de facto, n u m s i s t e m a económico a n á l o g o ao de «planificação central», u m a n o v a d i m e n s ã o que, s ó por si lhe altera radicalm e n t e a configuração e a p r á t i c a : a consciência social, a participação
colectiva — a s s e n t e s n u m a «nova educação», que n ã o pode ser confundida com
propaganda.
O « s i s t e m a » de Guevara é o de u m a «centralização provisória», e m
que t o d a s a s a l a v a n c a s políticas e culturais devem v i s a r u m a cada vez
m a i o r participação e e m p e n h a m e n t o colectivos, a t é se c h e g a r a o ponto
em que a s decisões centrais s e j a m a e x p r e s s ã o de o p ç õ e s l a r g a m e n t e disc u t i d a s e a s s u m i d a s . P a r a ele, o P a r t i d o t e r á de s e r o a g e n t e d e s t a
t r a n s f o r m a ç ã o global, e por isso não deve utilizar m e i o s que se o p o n h a m
ao que ele c h a m a o « d e s e n v o l v i m e n t o da consciência».
É altura de e x a m i n a r m o s o s contributos para e s t a m e s m a problem á t i c a dados por h o m e n s m u i t o diferentemente posicionados, a partir
da análise do f u n c i o n a m e n t o de s i s t e m a s c h a m a d o s de « s o c i a l i s m o real».
Sociólogos, filósofos, e c o n o m i s t a s , o s s e u s t e x t o s s ã o m u i t o m a i s «elaborados», e a s u a a r g u m e n t a ç ã o n ã o s e insere e m qualquer d e b a t e : n o s
r e s p e c t i v o s países, eles a c a b a r a m por ser s i m p l e s m e n t e e x c o m u n g a d o s
(presos, e x c l u í d o s dos P C s r e s p e c t i v o s a que t o d o s pertenciam, autoriz a d o s a l g u n s a a c e i t a r l u g a r e s de e n s i n o e m u n i v e r s i d a d e s ocidentais,
m a r g i n a l i z a d o s o u t r o s n o s s e u s p a í s e s e m a c t i v i d a d e s secundárias, e t c ) .
N e m por isso a r e f l e x ã o que propõem é m e n o s i n t e r e s s a n t e e s u g e s t i v a ,
até porque t o d o s se colocam n u m a perspectiva de redescoberta do m a r x i s m o e de convicta a p o s t a n u m a sociedade s o c i a l i s t a / c o m u n i s t a , isto é,
de r e c u s a radical do s i s t e m a capitalista.
C o m e ç a m o s pelo e x a m e das a n á l i s e s de Rudolf B a h r o , e c o n o m i s t a
da R D A , contidas no seu v o l u m o s o t e x t o de 1977 «A alternativa — para
u m a crítica do socialismo realmente e x i s t e n t e » ( ) . N ã o é t a r e f a fácil
e x p o r e m p o u c a s p á g i n a s a s l i n h a s m e s t r a s de u m a obra t ã o densa, tão
rica e t a m b é m n a t u r a l m e n t e t ã o controversa. Por isso e s c o l h e m o s debruçar-nos m u i t o m a i s sobre a s s u a s p r o p o s t a s e r e s p e c t i v o s f u n d a m e n t o s
do que sobre a m i n u c i o s a e implacável análise crítica da g é n e s e e func i o n a m e n t o das sociedades de «socialismo real», que constitui a s d u a s
primeiras p a r t e s do livro. R e c o r d a m o s ainda que, c o n t r a r i a m e n t e ao
c a s o de Guevara, B a h r o parte da o b s e r v a ç ã o duma sociedade industrializada, cuja capacidade produtiva é claramente suficiente para a s a t i s fação de t o d a s a s n e c e s s i d a d e s b á s i c a s da população. V e j a m o s então
a linha geral do p e n s a m e n t o de B a h r o .
3 0
P a r a Bahro, a noção central que caracteriza o projecto s o c i a l i s t a
é a de emancipação,
a m e s m a e m que Marx fundou, a partir da s u a
análise do capitalismo, a luta pelo s o c i a l i s m o : « E m lugar da a n t i g a sociedade burguesa, com a s s u a s c l a s s e s e o s s e u s a n t a g o n i s m o s de classe,
s u r g e u m a a s s o c i a ç ã o e m que o livre d e s e n v o l v i m e n t o de cada u m é a
condição do livre d e s e n v o l v i m e n t o de todos» ( ) . Ora, s e g u n d o B a h r o ,
«é m a i s do que e v i d e n t e que a s s o c i e d a d e s s o v i é t i c a s e dos p a í s e s de L e s t e
europeu, são i n c o m p a t í v e i s com o s o b j e c t i v o s f i x a d o s pelo M a r x i s m o .
O s o c i a l i s m o r e a l m e n t e e x i s t e n t e , independentemente d a s s u a s m u i t a s
realizações, é caracterizado por: permanência do t r a b a l h o assalariado,
da produção de mercadorias, do dinheiro; racionalização da d i v i s ã o tradicional do t r a b a l h o ; p e r s i s t ê n c i a de d e s i g u a l d a d e s s o c i a i s que v ã o m u i t o
para além das d e s i g u a l d a d e s de r e n d i m e n t o s m o n e t á r i o s ; e x i s t ê n c i a de
corporações oficiais para a m a n u t e n ç ã o da ordem e t u t e l a das populaç õ e s ; liquidação d a s liberdades c o n q u i s t a d a s pelas m a s s a s na era burg u e s a , e m l u g a r da preservação e realização d e s s a s liberdades (considere-se t ã o s ó a censura generalizada e a pronunciada formalidade e irrealidade de f a c t o da c h a m a d a democracia s o c i a l i s t a ) . É t a m b é m caracterizado p o r : u m corpo de funcionários, u m e x é r c i t o e polícia permanentes,
t o d o s a p e n a s r e s p o n s á v e i s perante o s r e s p e c t i v o s s u p e r i o r e s ; a duplicação
da p e s a d a m á q u i n a do E s t a d o n u m aparelho de E s t a d o e n u m aparelho
do P a r t i d o ; o seu i s o l a m e n t o dentro d a s f r o n t e i r a s n a c i o n a i s . (...) T e m o s
3 1
( °) BAHRO [1977]-1. Dada a síntese a que somos obrigados, utilizámos de preferência, para efeito de citações, um outro texto do mesmo autor (BAHRO [1977]-2),
em que ele-próprio condensou em cerca de 30 páginas o essencial das suas teses. N o entanto, sempre que se tornou necessário precisar melhor certos conceitos ou posições do
autor, recorremos ao texto do ensaio original.
( ) M A R X / E N G E L S [1848], p. 46.
3
31
o tipo de m á q u i n a do E s t a d o que M a r x e E n g e l s s e propunham e s m a g a r
pela revolução proletária, e que n ã o devia ser permitido r e e m e r g i r s o b
qualquer f o r m a ou p r e t e x t o . Isto é irrefutavelmente claro n o s s e u s próprios t e x t o s , e m particular o s r e s p e i t a n t e s à Comuna de Paris» ( ) .
3 2
Ora n a d a disto é compatível com u m a p e r s p e c t i v a de «emancipação
geral», com a criação de u m a «nova e m a i s elevada civilização, que resolva
o s problemas f u n d a m e n t a i s da h u m a n i d a d e de u m m o d o t a l que o indivíduo s e encontre ao m e s m o t e m p o m a i s s a t i s f e i t o e m a i s liberto (...) Ora
a t é agora, parece que o s c o m u n i s t a s s ó t o m a r a m o poder para continuar
a v e l h a civilização a u m r i t m o acelerado» ( ) . A d i v i s ã o social do t r a b a lho, a estrutura de n e c e s s i d a d e s , o «modo de vida», n ã o s ã o suficientem e n t e distintos, «no s e n t i d o m a i s global, cultural e n ã o e s t r i t a m e n t e político», do c a p i t a l i s m o . Ê por i s s o t a m b é m que é insuficiente o a c e n t o
posto pela oposição interna n a q u e s t ã o dos direitos h u m a n o s , oposição
e s s a que f i n a l m e n t e acaba por se fiar a p e n a s n o «apoio e socorro que
p o s s a vir do P r e s i d e n t e dos E s t a d o s U n i d o s » ( ) .
3 3
3 4
Segundo Bahro, o «socialismo realmente existente» é historicamente
u m a v i a não-capitalista de industrialização de sociedades pré-capitalistas,
particularmente adequada e m t a i s s i t u a ç õ e s para criar a s pré-condições
do socialismo, n o m e s m o s e n t i d o (ainda que com diferente ênfase, sublin h a ) que o c a p i t a l i s m o m o n o p o l i s t a t a m b é m é, n a s sociedades que s e g u i r a m a v i a capitalista, u m a pré-condição do s o c i a l i s m o . A n o t a , de r e s t o ,
que p a í s e s como a R D A ou a Checoslováquia não s ã o típicos d e s t a e v o lução, e que, como n o s outros p a í s e s de L e s t e , foi por razões políticas
decorrentes da 2 . Guerra Mundial que neles foi e x o g e n a m e n t e «introduzida» a v i a não-capitalista.
a
M a s e s t e « d e s p o t i s m o da industrialização» nunca foi «desde início,
u m s i s t e m a de real liberdade e igualdade, n e m poderia ter sido. E l e r e produz r e g u l a r m e n t e e i n e v i t a v e l m e n t e a s barreiras que bloqueiam a v i a
para u m livre d e s e n v o l v i m e n t o da subjectividade auto-consciente e da
a u t o n o m i a individual. E l e incorpora p r e c i s a m e n t e t o d a s a s c o n d i ç õ e s
e s t r u t u r a i s da subalternidade individual» ( ) . E aqui c h e g a m o s a outra
n o ç ã o b á s i c a da análise de B a h r o , «a pedra a n g u l a r da s u a concepção
alternativa». O que entende B a h r o por subalternidade?
«É a mentali3 5
( )
(»)
( )
( )
3!
3l
3S
BAHRO [1977]-2, pp. 4-5.
Id., p. 7.
Id., id.
Id., p. 10.
dade e o c o m p o r t a m e n t o da "gente s e m importância" [little
people]
dependente e alienada da totalidade» ( ) . «O conceito de subalternidade
refere-se a u m a e s t r u t u r a objectiva que produz e s t a mentalidade em
escala m a c i ç a e que, para além disso, t e m o poder de organizar interiorm e n t e [inwardly
— «no íntimo», J M P } h o m e n s livres c o m o subalternos
n u m s e n t i d o formal e tratá-los como t a l » ( ) . E m s e n t i d o restrito, a
subalternidade é a condição de t u d o o que s e insere n u m a hierarquia,
é m e s m o a s u a pedra basilar. « N o e n t a n t o , s e e s t e papel define o comp o r t a m e n t o social t o t a l dos que lhe e s t ã o s u j e i t o s , s e o seu p r o c e s s o
global de vida s e desenrola principalmente s o b o s i g n o de certas funções
parciais subordinadas a u m a totalidade incontrolável, e n t ã o e s s a subalternidade d e i x a de ser s i m p l e s m e n t e u m a propriedade da f u n ç ã o subordinada e torna-se u m a propriedade do indivíduo encarregado de a executar. E n t ã o , p a s s a a dominar o c o m p o r t a m e n t o subjectivo, trazendo cons i g o a u t o m a t i c a m e n t e a incapacidade de ser r e s p o n s á v e l por u m c o n t e x t o
m a i s geral. T o d a a sociedade de c l a s s e s , t o d a a relação de dominação,
produz subalternidade. M a s n e n h u m a o u t r a sociedade de c l a s s e s desde
o m o d o de produção a s i á t i c o subalternizou a s g r a n d e s m a s s a s dos s e u s
m e m b r o s livres n u m a f o r m a t ã o c o m p l e t a c o m o o s o c i a l i s m o realmente
e x i s t e n t e . É a subalternidade c o m o s i s t e m a e — como A n d r e a s H e g e d i i s
já estabeleceu h á a n o s — e m consequência t a m b é m u m s i s t e m a de
irresponsabilidade organizada» ( ) . P a r a B a h r o , a raiz m e s m a da subalternidade encontra-se n a «divisão tradicional do trabalho». N a divis ã o horizontal, que c o m p a r t i m e n t a o s a b e r e a s e s f e r a s de actividade,
impedindo u m a v i s ã o global dos problemas, m a s sobretudo «na divisão
vertical do trabalho por f u n ç õ e s requerendo n í v e i s diversos de capacidade
e conhecimento, de acordo com n í v e i s d i v e r s o s de educação, e, igualm e n t e importante, por u m a pirâmide hierárquica de poderes de g e s t ã o » ( ) .
D e t o d a s e s t a s considerações conclui B a h r o que é condição indiscutível para a e m e r g ê n c i a de u m a n o v a ordem social que r e t o m e o s
o b j e c t i v o s e m a n c i p a t ó r i o s de M a r x «uma revolução cultural contra o
domínio da divisão tradicional do trabalho e do E s t a d o » ( ) . M a s se, n a s
sociedades de s o c i a l i s m o realmente e x i s t e n t e (e t a m b é m n a s de capitalismo m o n o p o l i s t a , ainda que de f o r m a n ã o t ã o rígida) t e m o s por u m
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3
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BAHRO [1977]-2, p. 10.
Id., p. 11.
Id., id.
Id., p. 12.
Id., p. 11.
lado u m aparelho burocrático de poder, por outro m a s s a s subalternizadas,
onde ir b u s c a r o «motor» da t r a n s i ç ã o para a n o v a s o c i e d a d e ? B a h r o
introduz aqui u m n o v o conceito-chave na s u a a n á l i s e : o excedente
de
consciência.
«O e x c e d e n t e de consciência é o potencial decisivo para a
m u d a n ç a social. D e que s e t r a t a ? É u m a capacidade de e n e r g i a psíquica
que já não é absorvida pelas n e c e s s i d a d e s imediatas
e p e l o s p e r i g o s da
e x i s t ê n c i a h u m a n a , e que pode a s s i m e n t r e g a r - s e a preocupações m a i s
a f a s t a d a s » ( ) . « [ E s t e ] potencial psíquico, u m a vez liberto [ n a s socied a d e s industriais — J M P ] d a luta absorvente p e l o s m e i o s de existência,
poderá repartir-se de m o d o c o m p l e m e n t a r e m d u a s f o r m a s diametralm e n t e o p o s t a s d o interesse p o s t o na sociedade. (...) P o r u m lado o s inter e s s e s de compensação
s ã o a inevitável reacção ao f a c t o de que a sociedade l i m i t a e bloqueia d e m a s i a d o cedo a e x p a n s ã o
[épanouissement],
o d e s e n v o l v i m e n t o e a afirmação de i n ú m e r a s p e s s o a s . A s n e c e s s i d a d e s
c o r r e s p o n d e n t e s s ã o s a c i a d a s por s a t i s f a ç õ e s de substituição» ( ) . B a h r o
inclui aqui a p o s s e e o c o n s u m o do m á x i m o de o b j e c t o s e s e r v i ç o s e, n o
limite, a própria «sede de poder». « P o r outro lado, pelo contrário, o s
i n t e r e s s e s de emancipação
v o l t a m - s e para o crescimento, a definição e a
realização da personalidade e m t o d o s o s d o m í n i o s da vida h u m a n a » .
S e g u n d o B a h r o , o aparelho d o poder n o s p a í s e s do s o c i a l i s m o real t e n t a
j u s t a m e n t e , «em parte dispersar o e x c e d e n t e de consciência não dispendida [ n a s a c t i v i d a d e s p r o d u t i v a s vitais], por a c t i v i d a d e s não-produtivas,
e m parte paralisá-lo pelo terror, m a s a c i m a de t u d o desviá-lo para s a t i s f a ç õ e s de substituição» ( ) . A a c e i t a r m o s e s t a análise diríamos que, n a s
sociedades capitalistas avançadas, predominam largamente os primeiros
e terceiros t i p o s de actuação, s e b e m que, g u a r d a d a s a s devidas proporções, já se t e n h a falado com a l g u m a propriedade do «terror publicitário»
( s e m falar das p r á t i c a s r e p r e s s i v a s conhecidas, que relevam d e s t a m e s m a
m o t i v a ç ã o ) . D e p a s s a g e m , a n t e c i p a m o s desde j á u m a certa convergência
entre e s t a perspectiva de B a h r o e certos e s t u d o s h ú n g a r o s sobre a utiliz a ç ã o dos t e m p o s livres, a que adiante n o s referiremos.
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4 3
É n e s t a óptica que B a h r o afirma que «a totalidade da v i d a mental
da sociedade é o c a m p o de b a t a l h a da revolução cultural f u t u r a — e e s s a
v i d a m e n t a l não se m o v e contra a e x i s t ê n c i a material, m a s p r e c i s a m e n t e
a t r a v é s do p r o c e s s o de reprodução e dos s e u s objectivos, sendo o s e u
(") BAHRO [1977]-1, p. 240.
( ) Id., p. 255.
(«) BAHRO [1977] -2, p. 17.
,:
CONSCIÊNCIA
(Compreendendo
o conjunto d a s
sociais
EXCEDENTE
SOCIAL
qualificações
e técnicas )
QUALIFICAÇÃO
DE
ABSORVIDA
CONSCIÊNCIA
Fonte:
BAHRO [1977]-!
centro de g r a v i d a d e a informação e decisão» í ) . P a r a apreendermos plen a m e n t e o sentido d e s s a totalidade,
t e r e m o s a g o r a de completar a construção de B a h r o em torno do conceito de consciência social. De facto,
até aqui s ó f a l á m o s do «excedente de consciência», h á que v e r a q u e s t ã o
da «consciência absorvida», o s e u complemento.
Se ao primeiro caberá
ser o «motor» ou o p o n t o de partida de u m a t r a n s f o r m a ç ã o radical, a
4 4
(") BAHRO [1977]-2, p. 18.
s e g u n d a t e r á i g u a l m e n t e de s e r «revolucionada», pois o s o c i a l i s m o p r e s s u p õ e u m a n o v a «consciência social total», e m que s e t o r n a r ã o predomin a n t e s o s i n t e r e s s e s de e m a n c i p a ç ã o . D i z B a h r o : «Aquilo a que c h a m o
consciência absorvida é o dispêndio de e n e r g i a psicosocial que é g a s t a
por u m lado na hierarquia d a s f u n ç õ e s de g e s t ã o [ s o c i a l ] , por outro lado
n a s a c t i v i d a d e s de r o t i n a do processo de reprodução. (...) [Mais precisamente]', 1) o c o n h e c i m e n t o burocrático organizado para o c o m a n d o
sobre o processo de trabalho e sobre o processo da vida e m geral, o qual
se e x p r i m e politicamente pelos i n t e r e s s e s do aparelho, pelo exercício
a r r o g a n t e do poder; e 2) o trabalho abstracto, alienado, na produção,
s e r v i ç o s e g e s t ã o , que s e e x p r i m e em reacções e m o d o s de c o m p o r t a m e n t o
subalternos, e m baixo r e n d i m e n t o e subserviência, e m f a l t a de i n t e r e s s e
e indiferença pelos a s s u n t o s públicos» ( ) . A articulação d e s t e s quatro
e l e m e n t o s da consciência social faz-se a s s i m , s e g u n d o B a h r o , de acordo
com u m e s q u e m a g r á f i c o elucidativo (v. p á g i n a a n t e r i o r ) !
4 5
T e m o s a s s i m s u m a r i a m e n t e a p r e s e n t a d o o e s q u e m a conceptual básico
de Rudolf B a h r o : o projecto s o c i a l i s t a / c o m u n i s t a s ó pode ser, n a s socied a d e s industriais, o de u m a revolução
cultural que realize a
emancipação
d o s h o m e n s da s u a condição de subalternidade.
O lugar natural d e s s a luta
é a consciência
social, e o s s e u s p r o t a g o n i s t a s serão, por u m lado, o s
interesses
de emancipação
que de f o r m a crescente se m a n i f e s t a m e m
indivíduos e e x t r a c t o s v a r i a d o s p r o v e n i e n t e s de diferentes c l a s s e s sociais,
e por outro o s aparelhos e e s t r u t u r a s de p o d e r / s a b e r que a c t u a m no sentido de reproduzir a subalternidade.
N ã o n o s d e t e r e m o s aqui sobre a f o r m a pela qual B a h r o i m a g i n a
possível o d e s e n v o l v i m e n t o d e s s a revolução cultural n o s p a í s e s do socialismo realmente e x i s t e n t e . O que para n ó s i n t e r e s s a é o s i s t e m a - o b j e c t o ,
e a natureza
da transição, que o terá de v i s a r e conter e m embrião e e m
d e s e n v o l v i m e n t o . A s f o r m a s c o n c r e t a s da t r a n s i ç ã o s e r ã o o b v i a m e n t e
f u n ç ã o do «estado inicial», e p o r t a n t o variarão de sociedade para sociedade. I m p o r t a quando m u i t o referir que u m s i s t e m a de democracia polít i c a de tipo ocidental é, n a s u a concepção, como s e compreende, u m ponto
de partida m a i s f a v o r á v e l do que u m s i s t e m a do tipo e x i s t e n t e n o s P a í s e s
de L e s t e , por permitir u m a l u t a ideológico-cultural aberta, s e b e m que,
c o m o i g u a l m e n t e s e compreende, a i n e x i s t ê n c i a n o s ú l t i m o s de propriedade privada dos m e i o s de produção, e bem a s s i m a organização econó-
(") BAHRO [1977]-2, p. 16. Recordamos aqui a citação de Guevara em que
ele próprio se interrogava sobre essa mesma falta de interesse e indiferença.
m i c a que daí decorre, s e j a m , e m contrapartida, f a c t o r e s f o r t e m e n t e posit i v o s para a t r a n s i ç ã o . A l i á s B a h r o , e n i s s o é criticado por a l g u n s h ú n g a r o s , não concebe tal revolução cultural s e m u m a organização que ele
e x p l i c i t a m e n t e filia no conceito g r a m s c i a n o de «intelectual colectivo» e
que denomina de L i g a dos C o m u n i s t a s ( ) : u m partido «novo», construído
à i m a g e m e s e m e l h a n ç a da «nova sociedade», onde se c o n g r e g a r ã o t o d o s
o s « i n t e r e s s e s emancipadores» da «velha sociedade».
4 6
V e j a m o s , agora, brevemente, a l g u n s a s p e c t o s e l u c i d a t i v o s da «alternativa», i s t o é, do s i s t e m a «alternativo» proposto por B a h r o . Começa
por ser elucidativo que n o s seja difícil expor e s s a alternativa nos t e r m o s
c o m p a r t i m e n t a d o s característicos dos «programas» políticos h a b i t u a i s .
D e facto, é tal a interligação estrutural entre t o d o s o s domínios de
acção, que t o d a s a s a c ç õ e s serão s i m u l t a n e a m e n t e económicas, políticas,
culturais, etc.
B a h r o c o m e ç a por c o n s t a t a r que, a m a n t e r - s e a actual «evolução perm a n e n t e d a s e x p e c t a t i v a s » , u m a e c o n o m i a que, impulsionada pelos «prog r e s s o s » t é c n i c o s e científicos, cria m a i s «necessidades» do que a s que
satisfaz, «a sociedade será sempre demasiado
pobre para o c o m u n i s m o .
E dentro de 100 a n o s poderá continuar a objectar-se a o s c o m u n i s t a s que
pretendem generalizar a pobreza» ( ) . Ora, «as condições da liberdade
n ã o podem s e r m e d i d a s e m dólares ou rublos por cabeça. O que falta a o s
h o m e n s dos p a í s e s desenvolvidos, não são n o v a s n e c e s s i d a d e s , m a s a
4 7
( ) « [ U m a liga de comunistas] teria de ser: 1) Não um partido da classe operária no velho — e demasiado restrito — sentido, m a s uma combinação de todas aquelas
pessoas, provenientes de todos os estractos e grupos da sociedade, cuja consciência é
dominada por necessidades e interesses emancipatórios; 2) Não um partido de massas
do tipo em que uma auto-designada elite dirigente de intelectuais autoritários manipulam os chamados "membros", mas uma união de indivíduos de pensamento afim,
i. e., interessados em resolver os mesmos problemas, e todos considerados como igualmente competentes; 3) Não uma corporação sectária dos "que sabem mais", isolada
da sociedade, m a s uma comunidade revolucionária aberta para a sociedade e a que se
poderão juntar todos os que se esforcem na mesma direcção; 4) Não uma organização
supra-estatal que guia e controla o aparelho efectivo do Estado e da administração
do exterior e por cima, m a s o inspirador ideal de uma actividade integrada de todos
os grupos na base, o que dá às pessoas [ou "ao povo": people] a capacidade de controlar todos os processos de tomada de decisão de dentro; 5) Não um exército obediente que toma decisões burocráticas sobre a manutenção e a extensão do status quo,
m a s o que Gramsci chamou um intelectual colectivo, criando e exercendo um consenso
maioritário para a mudança, em comunicação democrática com todos os interesses na
sociedade» (BAHRO [1977]-2, p. 25).
(") BAHRO [1977]-1, p. 249.
4S
possibilidade de s e realizarem pela actividade individual: prazer da acção,
prazer da comunicação, v i d a concreta n o s e n t i d o m a i s largo» ( ) . I s t o
quer dizer, por exemplo, que «o c r e s c i m e n t o da produção e o da produtividade, que hoje s ó m u i t o r a r a m e n t e s ã o p o s t o s e m questão, perderão
na prática a s u a auréola de i n e l u t á v e i s n e c e s s i d a d e s económicas. O que
n ã o s i g n i f i c a de r e s t o que h a j a que f a z e r do "crescimento zero" u m a
r e g r a absoluta, m a s que o critério de quantidade s e j a ele-próprio a f a s t a d o
do primeiro plano» ( ) .
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4 9
A q u i l o a que B a h r o c h a m a o p r o g r a m a m á x i m o da revolução cultural, e que define o s contornos f u n d a m e n t a i s do s i s t e m a , compreende, pois,
entre outros p o n t o s : «a e x p a n s ã o da personalidade c o m o objectivo da
produção», o que e x i g e u m a completa «remodelação da planificação e da
o r g a n i z a ç ã o e m t o d o s o s d o m í n i o s da e c o n o m i a e da ciência»; «unidade
dos p r o c e s s o s de trabalho e de formação» (unidade da produção e da
apropriação da c u l t u r a ) ; «redefinição das n e c e s s i d a d e s m a t e r i a i s e da
capacidade disponível de t r a b a l h o v i v o , do ponto de v i s t a da m e l h o r i a e do
a u m e n t o das condições de d e s e n v o l v i m e n t o de h o m e n s t o t a l m e n t e socializados (prioridade à s d e s p e s a s d e s t i n a d a s à e d u c a ç ã o ) ; « f o r m a s de
democracia política que p e r m i t a m à s g r a n d e s m a s s a s u m p r o c e s s o social
de c o m p r e e n s ã o e t o m a d a de c o n s c i ê n c i a » ; «deslocamento das prioridades
da reprodução: da exploração da natureza pela produção à a d a p t a ç ã o
d e s t a ao ciclo natural, da reprodução a l a r g a d a à reprodução simples, do
a c r é s c i m o de produtividade à m e l h o r i a das condições de trabalho e de
f o r m a ç ã o » ; «restabelecimento da proporcionalidade entre g r a n d e produção (industrial) e pequena produção ( a r t e s a n a l ) ; «cálculo e c o n ó m i c o
com base n u m a n o v a e c o n o m i a do t e m p o » : preferência a o cálculo e m t e m p o
de t r a b a l h o sobre o cálculo e m p r e ç o s » ; «iniciativa individual e v i d a c o m u nitária r e a l : e s t a b e l e c i m e n t o d u m a f o r m a de r e g u l a ç ã o e c o n ó m i c a que
deixe à disposição das u n i d a d e s de b a s e da produção e da v i d a social u m
espaço s u f i c i e n t e m e n t e amplo que lhe p e r m i t a realizar o plano e lhes
g a r a n t a u m a evolução proporcionada da s u a própria e s t r u t u r a » ; «sociedade como a s s o c i a ç ã o de comunas» ( ) .
5 0
A l g u n s d e s t e s a s p e c t o s m e r e c e m u m a a t e n ç ã o m a i s particularizada.
C o m e c e m o s pelo n o v o s e n t i d o a dar à p l a n i f i c a ç ã o : «A planificação t e m
de partir n ã o de u m balanço de t e m p o de trabalho, m a s de u m balanço
de t e m p o social g l o b a l ; de u m o r ç a m e n t o do t e m p o das p e s s o a s para a
( ) BAHRO [1977]-1, p. 382.
(") Id., p. 381.
( ) Id., pp. 382-383.
,s
50
totalidade de e x p r e s s õ e s da s u a v i d a » ( ) . « 0 que é decisivo n e s t e cont e x t o — e que parecerá s e g u r a m e n t e u t o p i a a quem t e m a experiência da
n o s s a planificação e c o n ó m i c a — é a n e c e s s i d a d e duma reserva de força
de trabalho,
duma sobrecapacidade
planificada
de trabalho vivo e m relação ao parque de m á q u i n a s (e de u m a r e s e r v a de m á q u i n a s e de disponibilidades m a t e r i a i s e e n e r g é t i c a s r e l a t i v a m e n t e à p r o d u ç ã o ) . U m a certa
liberdade de m a n o b r a a o nível do fundo do t e m p o de trabalho da e m p r e s a
é a condição e l e m e n t a r que permitirá conferir u m m í n i m o de realidade
à s declarações e n f á t i c a s que v ê e m no h o m e m o "senhor e o centro da
produção". I s t o vale t a m b é m n u m a perspectiva m a i s a f a s t a d a . O livre
d e s e n v o l v i m e n t o da m a s s a dos indivíduos só é possível n u m a sociedade
que pode produzir m a i s do que t e m de produzir e do que produz de f a c t o .
O e x c e d e n t e c o m u n i s t a — que releva a l i á s m u i t o m a i s da e s t r u t u r a social
da produção e das n e c e s s i d a d e s do que da quantidade absoluta de bens
e s e r v i ç o s — é a n t e s de m a i s u m e x c e d e n t e de capacidade de produção,
u m e x c e d e n t e de trabalho vivo potencial, de disposable
time no s e n t i d o
m a i s largo. S ó e s t e e x c e d e n t e pode a s s e g u r a r a cada individuo u m espaço
e m que ele-próprio p o s s a estabelecer, no quadro do trabalho colectivo,
u m a e c o n o m i a pessoal do t e m p o correspondente a o s s e u s projectos» ( ) .
A l i á s , ao s i m p l e s nível da unidade produtiva, «sem u m a m a r g e m e m relação ao plano, a democracia n o seio da e m p r e s a n ã o p a s s a de u m a palavra
v ã para o s operários da produção» ( ) .
5 1
5 Z
5 3
N o plano da f o r m a ç ã o / e d u c a ç ã o , t a m b é m o s o b j e c t i v o s t e r ã o de ser
radicalmente distintos, pois ela deixará de s e r u m meio para ser u m fim.
S e n d o a s s i m , «a o r g a n i z a ç ã o do trabalho t e m de s e r a d a p t a d a à s necessidades da política de educação e não prioritariamente o contrário. Trat a - s e de dar u m n o v o impulso a c t i v o à produção do e x c e d e n t e de consciência, j á e s p o n t a n e a m e n t e posto e m m o v i m e n t o [condição para que o
p r o c e s s o s e inicie — JMP]'. O objectivo deliberado será o de criar u m
e x c e d e n t e de educação que o s i s t e m a produtivo técnico-científico e a s u a
superestrutura n ã o e s t a r á m a i s e m condições de a s s i m i l a r na s u a presente
c o n s t i t u i ç ã o social. D a í partirá o ataque inevitável à a n t i g a d i v i s ã o do
trabalho» ( ) . Invocando Marx, B a h r o s a l i e n t a ser n e c e s s á r i o «que a educação seja organizada de f o r m a a que para t o d o s o s h o m e n s , a s u a
juventude, c h e g a d a ao t e r m o do s e u desenvolvimento, culmine na arte
5 4
( ) BAHRO [19771-2, p. 29.
(") BAHRO [19771-1, p. 392.
(") Id., p. 395.
( ) BAHRO [19771-2, p. 29.
51
M
e n a filosofia e l h e s permita, quer pela v i a do racional quer pela do e m o cional, p a s s a r do m i c r o c o s m o s s u b j e c t i v o a o t o d o » ( ) . N e s t a perspectiva,
o s quatro pilares do s i s t e m a e d u c a t i v o geral, o s únicos para o s quais
«será n e c e s s á r i o u m p r o g r a m a de e n s i n o de conteúdo severo e que obrigará
a u m a apropriação controlada», devem s e r : «a língua (ou l í n g u a s ) , para
dominar o qualitativo, a s m a t e m á t i c a s para dominar o q u a n t i t a t i v o , a
cibernética para dominar o a s p e c t o estrutural do mundo, e o s refinam e n t o s da t é c n i c a para dar u m a f o r m a a r t í s t i c a à e x p r e s s ã o do e u » ( ) .
U m a tal f o r m a ç ã o sólida de base permitirá colocar e m n o v o s t e r m o s o
problema dos e s p e c i a l i s t a s , e das relações p o d e r / s a b e r : « E x i s t e u m a
enorme diferença entre u m h o m e m que é, entre outras coisas, m u i t o especializado n u m a qualquer operação complexa, e o e s t a d o de especialista
elevado ao e s t a t u t o duma f o r m a social de e x i s t ê n c i a » ( " ) • « A m e u ver, o
que importa para o h o m e m c h e g a d o a o limiar do s o c i a l i s m o - c o m u n i s m o
é que a hierarquia funcional ( c u j a s informações e decisões devem, n o
e n t a n t o , circular n o s dois s e n t i d o s ) , indispensável à regulação do proc e s s o social de e x i s t ê n c i a e de trabalho, deixe de t e r n e c e s s a r i a m e n t e o
carácter duma estrutura
social. Compondo-se a h u m a n i d a d e de indivíduos
com capacidades u n i v e r s a i s , o conjunto social terá de cessar, sobre a base
material adquirida, de decalcar a s u a e s t r u t u r a sobre a do s i s t e m a de
t r a t a m e n t o d a s informações, de que utiliza e continuará a utilizar a s
f u n ç õ e s reguladoras. É por e s t a razão que a s u p r e s s ã o da a n t i g a divisão
do trabalho [ n o m e a d a m e n t e , m a s n ã o só, entre trabalho intelectual e
m a n u a l — J M P ] é o t e m a central deste livro. A ú l t i m a "luta de c l a s s e s "
é j u s t a m e n t e a que s e t r a v a e m torno da organização do p r o c e s s o de inf o r m a ç ã o , de c o n h e c i m e n t o e de decisão, e da s u a subordinação a o s indiv í d u o s a s s o c i a d o s enquanto conjunto [ s o c i a l ] » ( ) .
3 5
5 6
5 8
E n f i m , o problema da «organização comunitária», e da s u a articulação social, o que s e insere, entre outros a s p e c t o s , n a problemática
da c e n t r a l i z a ç ã o / d e s c e n t r a l i z a ç ã o . B a h r o começa por observar que o ideal
do «socialismo cooperativo», ou seja, u m a o r g a n i z a ç ã o e c o n ó m i c a e social
f u n d a d a n u m a a s s o c i a ç ã o de c o o p e r a t i v a s o u u n i d a d e s ( n ã o s ó económ i c a s ) a u t o g e r i d a s «só pode ser, no m e l h o r dos casos, u m a f o r m a embrionária de socialismo», que poderá resultar da apropriação pelos trabalhadores dos locais de produção d e i x a d o s por u m c a p i t a l i s m o m u i t o dis-
( )
(=")
(")
( )
55
ss
BAHRO [1977]-1, p. 268.
Id., p. 270.
Id., p. 271.
Id., p. 409.
perso. Ora não é e s s e o c a s o e m p a í s e s de c a p i t a l i s m o avançado, e m e n o s
ainda n o s p a í s e s do s o c i a l i s m o realmente e x i s t e n t e . S e g u n d o ele, a organização e c o n ó m i c a da «nova sociedade», a « a s s o c i a ç ã o geral» de que falou
Marx, n ã o s e reduzirá à coordenação de t a i s c o o p e r a t i v a s de produção.
«Como "reunir" [rassembler]
o corpo social na sua totalidade,
o conjunto
dos indivíduos
para além do processo
de reprodução?
Tal é a
questão
cardinal
da democracia
socialista.
H á que t e r e m conta que a q u e s t ã o
da a u t o g e s t ã o n o seio d u m a sociedade a l t a m e n t e c o m p l e x a n ã o pode
s e r colocada, n e m encontrar resposta, do s i m p l e s ponto de v i s t a particular das c o m u n a s , e m e n o s ainda das u n i d a d e s de produção, m a s que
se t e m sempre de ter presente o carácter global do p r o c e s s o de reprodução» ( ) . N u m a linha que n o s recorda c e r t a s p o s i ç õ e s de Guevara,
n ã o t e m sentido, quando já se a t i n g i u u m c e r t o nível de f o r ç a s produt i v a s e j á s e d o m i n a m a s f o r m a s c o m p l e x a s da s u a g e s t ã o , não tirar
partido disso para avançar no s e n t i d o da apropriação colectiva real desse
potencial p r o d u t i v o : « E m p a í s e s como a R D A ou a Checoslováquia, que
sempre c o n h e c e r a m direcções centralizadas, seria o b v i a m e n t e i n s e n s a t o
retornar agora ao ponto de onde o s j u g o s l a v o s , e n t ã o e c o n o m i c a m e n t e
subdesenvolvidos, partiram e m 1950, e de repetir o s s e u s erros e m l u g a r
de tirar deles a s lições que comportam. (...) Torna-se m a n i f e s t a m e n t e
n e c e s s á r i o combinar
u m a r e g u l a ç ã o do s i s t e m a por c i m a — i n e v i t a v e l m e n t e hierárquico no s i s t e m a de i n f o r m a ç õ e s ( s e m que a hierarquia
t o m e f a t a l m e n t e a f o r m a de u m incontrolável poder de dominação) —
e a s iniciativas económicas, das unidades de base r e l a t i v a m e n t e autónom a s do trabalho colectivo e da vida social (unidades cujo f u n c i o n a m e n t o ,
pelo seu lado, n ã o contribui n e c e s s a r i a m e n t e para a e m a n c i p a ç ã o ) » ( ) .
B a h r o concebe o « c o m u n i s m o avançado» c o m o u m «conjunto subdividido
e m s u j e i t o s c o l e c t i v o s a u t ó n o m o s de diferentes níveis, que conceberão
eles-próprios a s s u a s relações com o t o d o » : « A s s o c i a ç õ e s de indivíduos
n o s a g r u p a m e n t o s e m que p r o s s e g u e m o s i n t e r e s s e s específicos que const i t u e m a s u a v i d a s o c i a l ; a s s o c i a ç ã o d e s t e s a g r u p a m e n t o s especializados
n o s e i o de c o m u n a s que englobam, enquanto unidade territorial complexa,
o s diversos a s p e c t o s da vida s o c i a l ; enfim, a s s o c i a ç ã o de c o m u n a s — elas
t a m b é m r e l a t i v a m e n t e especializadas n o quadro da divisão do trabalho
p r e v i s t a n o p l a n o — n u m a sociedade» ( ) .
5 9
B 0
6 1
( ) BAHRO [1977]-1, p. 410.
í ) Id., p. 411.
( ) Id., p. 412.
M
60
ei
P r e c i s a n d o melhor, «quais s e r ã o a s d e c i s õ e s que u m a sociedade
c o m u n i s t a t o m a r á "centralmente", isto é, a o nível do c o n j u n t o s o c i a l ?
H a v e r á e m primeiro l u g a r que definir o conteúdo e o v o l u m e d a s s u a s
n e c e s s i d a d e s [do c o n j u n t o social — J M P ] do ponto de v i s t a dos v a l o r e s
j á m e n c i o n a d o s e que, e m certa medida, s e r ã o s e g u r a m e n t e s e m p r e sujeit o s a controvérsia. (...) A escolha dos produtos oferecidos não pode n e m
deve — c o n t r a r i a m e n t e à s condições
da produção — s e r d e i x a d a a o s sect o r e s ou e m p r e s a s particulares e depender dos s e u s critérios internos,
quaisquer que s e j a m . A definição da e s t r u t u r a da produção e das s u a s
modificações n ã o releva dos c o l e c t i v o s de produção m a s da
sociedade.
E s t e p o n t o é u m dos m a i s mal compreendidos pelos d e f e n s o r e s da ideia
dos conselhos. O s indivíduos a s s o c i a d o s não d e t e r m i n a m o plano n a s u a
qualidade (...) de produtores
com i n t e r e s s e s específicos, m a s e n q u a n t o
s e r e s s o c i a i s tendo u m a c o m p r e e n s ã o profunda dos i n t e r e s s e s g e r a i s , de
n u m e r o s o s i n t e r e s s e s particulares e dos s e u s i n t e r e s s e s p e s s o a i s , e t e n dendo a integrá-los da m e l h o r m a n e i r a n o s o b j e c t i v o s do Plano. Os interesses dos produtores
são interesses
particulares
entre outros
(...)»( ).
Pela s u a parte, a organização comunal ( t e r r i t o r i a l ) , «deveria s e r a inst â n c i a intermédia de planificação e de direcção», para q u e m «apenas o
r e n d i m e n t o industrial devido à sociedade e determinado e m natureza e
qualidade, e em relação com o input de recursos, seria i m p e r a t i v o ( . . . )
A o s s e u s c o n s e l h o s de d e l e g a d o s eleitos competiria — sob r e s e r v a de
certas r e s t r i ç õ e s — t o m a r a s m e s m a s [o m e s m o tipo de — J M P ] dispos i ç õ e s que o g o v e r n o do país, s a í d o ele-próprio do s i s t e m a de delegados» ( ° ) . O que não impede (daí a l g u m a s daquelas r e s t r i ç õ e s ) que devam
e x i s t i r certas «"formações supraterritoriais" como o s s e c t o r e s da energia,
t r a n s p o r t e s e comunicações, próprias ao conjunto das comunas» ( *).
A l i á s , é-nos recordado que «as c o m u n a s duma sociedade m o d e r n a n ã o
s e r ã o c e r t a m e n t e n u n c a a u t o s u f i c i e n t e s (selfsustaining,
c o m o Marx qualificava a aldeia indiano-asiática pré-colonial), a ponto de equilibrar exact a m e n t e a s u a produção de produtos alimentares, por exemplo, e a s s u a s
próprias n e c e s s i d a d e s , e s t r u t u r a l m e n t e e n o t e m p o . Os f o r n e c i m e n t o s
r e g u l a r e s v e r ã o a s s u a s m o d a l i d a d e s c o n c r e t a s r e g u l a d a s por c o n t r a t o s
directos entre o s ó r g ã o s c o m u n a i s ou entre o s o r g a n i s m o s c o n s u m i d o r e s
e o s produtores. M a s o a b a s t e c i m e n t o g e r a l t e r á de s e r g a r a n t i d o e planificado a nível global (...) P a r a além disso, o s i n v e s t i m e n t o s p e s a d o s ,
62
3
6
( ) BAHRO [1977]-1, p. 413.
(«) Id., p. 415.
( ) Id., id.
K
M
desde que impliquem e f e i t o s sobre o s o b j e c t i v o s e a s condições da produção ao nível supracomunal, s e r ã o do domínio do conjunto social, e deverão ser atribuídos à s comunas, a s quais s e r ã o d o t a d a s de t o d o s o s m e i o s
necessários» ( ) .
F i n a l m e n t e , o problema dos controlos, n o s dois sentidos. «O controlo
sobre o aparelho, sobre a administração,
torna-se a tal ponto u m a s s u n t o
c o m u m a o s delegados [das c o m u n a s ] , e a o s s e u s eleitores de c o m p e t ê n c i a s
g e r a i s que o s e s p e c i a l i s t a s de c o m p e t ê n c i a s particulares nele participarão
eles-próprios n a s u a qualidade de cidadãos (...) [Pelo seu l a d o ] , o controlo exercido sobre os interesses
locais e particulares,
i. e., sobre os das
comunas e sobre os dos grupos constituídos
em torno das diversas
sub-f unções no seio das comunas,
será o m a i s delicado: e s t e controlo, de
carácter social, deverá ser s u f i c i e n t e m e n t e eficaz para e v i t a r que u m
f r a c a s s o faça reaparecer a s i n s t â n c i a s r e p r e s s i v a s do E s t a d o e t o d o o
seu cortejo de planificadores, e s t a t í s t i c o s e relatores. O princípio de solidariedade torna a b s o l u t a m e n t e n e c e s s á r i o que cada comuna, cada grupo
de interesse organizado, consinta u m certo g r a u de esforço n e s s e s e n t i d o
e não u n i c a m e n t e na eventualidade de s i t u a ç õ e s críticas» ( ) .
6 5
G0
P a r a c o m p l e t a r o conjunto de p a r â m e t r o s definidores do s i s t e m a de
Bahro, r e s t a a p e n a s a c r e s c e n t a r a s u a perspectiva «internacionalista»,
de r e s t o n a tradição do p e n s a m e n t o (nem sempre da prática) socialista.
A perspectiva de emancipação
só pode ser, e m ú l t i m a análise, mundial
(daí que B a h r o se refira, por oposição, na caracterização inicial do socialismo realmente e x i s t e n t e , , ao i s o l a m e n t o do aparelho dirigente «dentro
das fronteiras nacionais» — v. p. 246 a c i m a ) . E aqui v e m o s u m paralelismo
inequívoco com a s posições de Guevara, defendidas no discurso de Argel,
quanto à s relações fraternas
a estabelecer entre p a í s e s s o c i a l i s t a s desenvolvidos e «sub-desenvolvidos». D a d o que n ã o referimos e s t e ponto quando
e x p u s e m o s o p e n s a m e n t o do Che, parece oportuno colocar a g o r a lado a
lado o s dois t e x t o s . Guevara ( A r g e l ) : « N ã o pode e x i s t i r socialismo se
n a s c o n s c i ê n c i a s não se operar u m a m u d a n ç a que provoque u m a n o v a
atitude fraternal frente à humanidade, t a n t o no plano individual, na sociedade e m que se constrói ou e s t á construindo o socialismo, c o m o no plano
mundial e m relação a t o d o s os p o v o s que s o f r e m a opressão imperialista.
Cremos que é com e s t e espírito que se deve enfrentar a responsabilidade
da ajuda a o s p a í s e s dependentes, e que não deve falar-se m a i s de desenvolver u m comércio de benefício m ú t u o b a s e a d o nos preços que a lei do
C ) BAHRO [1977]-1, p. 418.
( ) Id., p. 420.
5
M
valor e a s relações i n t e r n a c i o n a i s de troca, desigual, produto da lei do
valor, i m p õ e m a o s p a í s e s a t r a s a d o s (...) Se e s t a b e l e c e m o s e s t e tipo de
relação entre o s dois g r u p o s de nações, d e v e m o s convir que o s p a í s e s
s o c i a l i s t a s são, de certo modo, cúmplices da exploração imperial (...) O s
p a í s e s s o c i a l i s t a s t ê m o dever moral de liquidar a s u a cumplicidade t á c i t a
com o s p a í s e s exploradores do o c i d e n t e » ( ) . B a h r o : « U m a das t a r e f a s
primordiais da revolução cultural n o s p a í s e s d e s e n v o l v i d o s dos dois blocos
consistirá e m suprimir
o critério da lei do valor nas trocas com os países
menos desenvolvidos.
E s t e s países, c o n f r o n t a d o s com a lei do valor, com
a equivalência brutal d a s trocas, e s t ã o condenados a u m a pauperização
que a exploração das m a t é r i a s - p r i m a s faz s u r g i r no horizonte. (...) A solução reside certamente
numa troca calculada segundo um número
idêntico de unidades de trabalho» ( ) . Por o u t r a s palavras, trata-se, n o espírito de ambos, duma inversão
radical n o s i s t e m a de relações e c o n ó m i c a s
i n t e r n a c i o n a i s : de u m a t r a n s f e r ê n c i a de v a l o r dos p a í s e s m e n o s desenvolvidos para o s m a i s desenvolvidos, passar-se-ia a u m a t r a n s f e r ê n c i a
n o s e n t i d o i n v e r s o (aliás, a aceitar a p r o p o s t a de B a h r o , n e m i s s o seria,
pois a s relações s e r i a m equivalentes,
e m t e r m o s de u n i d a d e s de t r a b a l h o ) .
Ê óbvio que u m a tal inversão s e opõe f r o n t a l m e n t e ao s i s t e m a económico
v i g e n t e , e implicaria u m n o v o s i s t e m a de «preços» — o que s ó é concebível colocando a q u e s t ã o e m t e r m o s não-económicos, logo, no plano
político-cultural da «solidariedade activa» real e da emancipação
geral.
D e s n e c e s s á r i o s e t o r n a t a m b é m a c r e s c e n t a r que não é e s s a m e s m a inversão que e s t á no espírito dos m e n t o r e s da c h a m a d a «nova ordem económ i c a internacional», proposta r e f o r m i s t a de a t e n u a ç ã o das m a i s g r i t a n t e s
disparidades de «desenvolvimento», d e s t i n a d a no essencial a reforçar a
p o s i ç ã o das c a m a d a s d i r i g e n t e s dos p a í s e s m e n o s desenvolvidos, a s s e g u r a n d o - l h e s a continuação da «velha ordem» n a s r e s p e c t i v a s sociedades.
c7
6 8
É altura de n o s r e f e r i r m o s a o s t r a b a l h o s da escola h ú n g a r a . N a realidade, c r e m o s que a obra de Bahro, de publicação m a i s recente do que
t o d o s e s s e s trabalhos, e elaborada ao longo dos ú l t i m o s dez anos, incorpora
de f o r m a s i s t e m a t i z a d a e «totalizada» ( o s i n g l e s e s diriam
comprehensive)
g r a n d e parte dos contributos e s s e n c i a i s daqueles i n v e s t i g a d o r e s , que ele
a l i á s m e n c i o n a n a l g u m a s p a s s a g e n s . U m deles a s s i m o reconhece publicamente, n o t e x t o de u m a «carta aberta a Rudolf B a h r o » a propósito
do s e u l i v r o : « N e n h u m m e m b r o do g r u p o de i n t e l e c t u a i s h ú n g a r o s a que
pertenço m e autorizou a falar t a m b é m e m seu nome. Por e s t e m o t i v o
( ) GUEVARA [1965]-1, (espanhol), p. 154.
( ) BAHRO [1977]-1, p. 405.
CT
m
não citarei aqui n e n h u m dos n o m e s n e m das obras em que são
particularmente
evidentes
os paralelismos
com o teu pensamento»
( ) [sublinhado meu — J M P ] .
A c h a m a d a E s c o l a de B u d a p e s t e c o m e ç o u por s e r a s s i m conhecida
a t r a v é s dos t r a b a l h o s de u m grupo de j o v e n s f i l ó s o f o s discípulos de
L u k a c s . P o u c o t e m p o a n t e s da s u a morte, em 1971, é o próprio L u k a c s
que a s s i m define o s o b j e c t i v o s centrais da E s c o l a : « A i n d a que Hegel,
o s e c o n o m i s t a s c l á s s i c o s i n g l e s e s e o s primeiros u t o p i s t a s o t e n h a m ajudado a fundar a s u a problemática, M a r x foi, ele-próprio, u m g é n i o científico, que realizou descobertas r a d i c a l m e n t e n o v a s , de que fez com
s u c e s s o o s princípios m e t o d o l ó g i c o s duradouramente eficazes da invest i g a ç ã o científica. F o i p a r a t e s t a r a eficácia da aplicação de t a i s m é t o d o s
a t o d o s o s g r a n d e s problemas da v i d a social e para o s impor que nasceu,
n o decurso da m i n h a actividade de teórico e de p e d a g o g o , o que s e t e m
c h a m a d o a E s c o l a de B u d a p e s t e » ( ) . E L u k a c s cita, como os m a i s destacados e l e m e n t o s d e s s a E s c o l a , A g n e s Heller, G y õ r g y M a r k u s e Mihali
V a d j a . S e g u n d o outro autor, «na o r i g e m , a E s c o l a de B u d a p e s t e ocupava-se
sobretudo de filosofia. Os s o c i ó l o g o s radicais h ú n g a r o s s o f r e r a m a s u a
influência, contribuindo a s s i m para u m a certa "socialização" da E s c o l a .
Como e s t a escola é sobretudo de carácter ideológico, e como o s s i s t e m a s
de v a l o r e s d e s t e s s o c i ó l o g o s s ã o m u i t o p r ó x i m o s dos da actual E s c o l a ,
pode-se considerá-los como pertencendo à E s c o l a de B u d a p e s t e , que s e
t e r i a a s s i m alargado à Sociologia» ( ) . Os m a i s r e p r e s e n t a t i v o s d e s t e s
s o c i ó l o g o s são Maria M a r k u s e A n d r á s H e g e d i i s ( e s t e ú l t i m o a n t i g o primeiro m i n i s t r o h ú n g a r o e m 1 9 5 5 - 5 6 ) .
69
7 0
7 1
Os g r a n d e s t e m a s de B a h r o encontram-se p r e s e n t e s n a s obras d e s t e s
i n v e s t i g a d o r e s , com diferente incidência s e g u n d o a s próprias direcções
de análise de cada um, m a s representando sempre e s f o r ç o s de aprofund a m e n t o e de descoberta que c o n s t i t u e m sólidos p o n t o s de apoio para a
d i s c u s s ã o e a v a n ç o da problemática que n o s t e m vindo a ocupar. V e j a m o s
apenas alguns exemplos.
a)
E s t r u t u r a de c o n s u m o / n e c e s s i d a d e s — E s t e é u m problema central na obra de Agnes Heller que, entre n u m e r o s a bibliografia,
c o n t a com dois livros sobre o a s s u n t o : «A v i d a quotidiana» e
« A t e o r i a das n e c e s s i d a d e s e m Marx». A p o i a r - n o s - e m o s no seu
("») V A J D A [1978].
(*>) LUKACS [1971], p. 2762.
(") F R A N K E L & MARTIN [1973], p. 2769.
t e x t o «Teoria e prática e m função das n e c e s s i d a d e s h u m a n a s » ,
e m que ela d i s t i n g u e a s «necessidades v i t a i s ou de sobrevivência»,
que «perpetuam a vida, estimulando-a», das « n e c e s s i d a d e s h u m a nas», que s e dirigem «para o b j e c t i v o s t a i s que, n o desejo e n o
esforço para o s atingir, o s e s t i m u l a n t e s n a t u r a i s n ã o t ê m u m
papel directo». Mas, ainda que m e s m o a s p r i m e i r a s t e n h a m
u m a c o m p o n e n t e social, e que o c a p i t a l i s m o s e j a «a primeira
sociedade que condena c l a s s e s s o c i a i s inteiras à luta quotidiana
pela s a t i s f a ç ã o u n i c a m e n t e d a s n e c e s s i d a d e s v i t a i s » , é entre a s
s e g u n d a s que a e s t r u t u r a social determina u m a diferenciação
e s s e n c i a l : a s n e c e s s i d a d e s h u m a n a s não-alienadas
(«o repouso,
a s a c t i v i d a d e s culturais, o s j o g o s de adultos, a m e d i t a ç ã o , a amizade, o amor, o d e s e j o de s e realizar, a n e c e s s i d a d e de é t i c a » )
e a s alienadas
(«o dinheiro, o poder, a p o s s e » ) . O desenvolvim e n t o da sociedade c a p i t a l i s t a caracteriza-se pela d o m i n a ç ã o d a s
n e c e s s i d a d e s alienadas. « N a sociedade b u r g u e s a m o d e r n a (pelo
m e n o s n a E u r o p a e na A m é r i c a ) , a única m u d a n ç a reside n o
f a c t o de que e s t a preponderância s e e s t e n d e a c a m a d a s s o c i a i s
c a d a vez m a i s amplas, incluindo a classe operária». « A s necessid a d e s h u m a n a s n ã o a l i e n a d a s são qualitativas:
o seu a u m e n t o
n ã o é caracterizado por u m a acumulação ilimitada — n o plano
concreto — d e s s a s n e c e s s i d a d e s , m a s pela s u a multiplicação,
pelo seu a l a r g a m e n t o , o que M a r x d e s i g n a v a por "riqueza". (...)
A s n e c e s s i d a d e s h u m a n a s alienadas são, pelo contrário,
quantitativas.
N a prática, a s u a s i m p l e s a c u m u l a ç ã o é ilimitada. O seu
"grau de s a t u r a ç ã o " r a r a m e n t e é atingido. ( . . . ) A ideia que, s o b
e s t e plano, M a r x s e fazia do c o m u n i s m o [era a d e ] u m processo
social ao l o n g o do qual a s n e c e s s i d a d e s v i t a i s e a s n e c e s s i d a d e s
a l i e n a d a s ( q u a n t i t a t i v a s ) s ã o c a d a v e z m a i s d o m i n a d a s pelas
n e c e s s i d a d e s h u m a n a s não-alienadas ( q u a l i t a t i v a s ) » ( ) .
7 2
b)
N o v o «modo de vida» — A. Heller d i s t i n g u e o que c h a m a «revolução social total» dos m o v i m e n t o s de «reforma parcial», de
«reforma geral» ( v i s a n d o t r a n s f o r m a r o c o n j u n t o da sociedade
a t r a v é s de r e f o r m a s parciais) e dos m o v i m e n t o s «políticos revolucionários», de tipo jacobino (conduzidos por u m a elite revolucionária; c o n q u i s t a d o o poder, r e s t r i n g e - s e a b a s e de m a s s a s
e a m a i o r i a retorna a u m «modo de vida» p a s s i v o e não radical-
C)
HELLER [1972], pp. 2798-2799.
2
m e n t e d i f e r e n t e ) . Pelo contrário, a prática da revolução social
t o t a l «é ao m e s m o t e m p o u m a revolução
do modo de
vida.
E quando se t r a t a d u m a revolução do m o d o de vida, a base de
m a s s a s dos m o v i m e n t o s cresce c o n s t a n t e m e n t e . E s t a prática
arrasta c a m a d a s s o c i a i s cada vez m a i s v a s t a s , cujo m o d o de vida
quotidiano habitual s e t r a n s f o r m a e m consequência da s u a participação no m o v i m e n t o . JÊ por isso que a s revoluções do m o d o
de vida, n u m futuro histórico previsível, s e r ã o s e m p r e irreversív e i s . T a i s revoluções do m o d o de vida são, por exemplo, na h i s t ó r i a da E u r o p a , o c r i s t i a n i s m o ou m e s m o t a m b é m , e m certos
países, o R e n a s c i m e n t o . M a s s e d i s s e m o s que a revolução social
t o t a l é sempre t a m b é m u m a revolução do m o d o de vida, não
q u i s e m o s com i s s o afirmar que a s r e v o l u ç õ e s do m o d o de vida
s e j a m sempre revoluções sociais t o t a i s . P e l o contrário, p o d e m o s
t r a n q u i l a m e n t e a f i r m a r que a história, a t é aos n o s s o s dias, ainda
não conheceu u m a revolução do m o d o de vida que t e n h a sido
u m a r e v o l u ç ã o social total, consciente,
englobando tudo n o seio
da sociedade, da vida e c o n ó m i c a à política e à cultura» [sublin h a d o m e u — J M P ] ( ) . A c r e s c e n t a r e m o s , pela n o s s a parte que,
a verificarem-se a s h i p ó t e s e s que f a z e m o s n o 1.° e n s a i o d e s t e trabalho n o que r e s p e i t a à incidência «cultural» do p e n s a m e n t o
sistémico-cibernético, a dar-se u m a autêntica e x p l o s ã o n o domínio da i n f o r m á t i c a (e e m particular da «telemática») aplicada
ao quotidiano d o cidadão c o m u m — o que j á c o m e ç a a verificar-se — e s t a r e m o s m u i t o p r o v a v e l m e n t e n o limiar de u m a
«revolução do m o d o de vida», que levará a l g u m a s décadas a
processar-se, e que e s t a r á longe, ainda e s t á , de s e r u m a «revolução social total». Pelo contrário situar-se-á por inteiro n u m cont e x t o de «subordinação» ( B a h r o ) ou de «alienação» ( H e l l e r ) .
7 3
c)
«Sobreeducação» e divisão do trabalho — E s t a s q u e s t õ e s , t ã o
f u n d a m e n t a i s n a obra de Bahro, t ê m ocupado n u m e r o s o s trabal h o s dos s o c i ó l o g o s Maria Markus e A. Hegediis. N o t e x t o de
que d i s p o m o s d e s t e s i n v e s t i g a d o r e s , eles procuram d e m o n s t r a r
porque é errónea qualquer das concepções que, apoiando-se e m
Marx, t ê m colocado o a c e n t o privilegiado do p r o c e s s o de e m a n cipação, u m a n a redução do t e m p o de trabalho (e c o n c o m i t a n t e
a u m e n t o dos t e m p o s l i v r e s ) , o u t r a e m a l t e r a ç õ e s f u n d a m e n t a i s
(") HELLER [1972], p. 2796.
no domínio do trabalho («humanização» dos p r o c e s s o s e relações
de t r a b a l h o ) . A h i p ó t e s e de que p a r t e m M. Markus e A. H e g e d i i s
é a de que «os m u n d o s dos t e m p o s livres e do trabalho e s t ã o
e s t r e i t a m e n t e l i g a d o s entre si, e que é por consequência impossível proceder a m u d a n ç a s profundas n u m domínio, deixando o
outro intacto» ( ) . S e g u n d o eles, «a experiência e a i n v e s t i g a ç ã o
s o c i o l ó g i c a p r o v a r a m que u m a u m e n t o do "tempo livre", enquanto tal, não muda a maneira de viver das p e s s o a s [de n o v o
a t e m á t i c a do «modo de vida» — J M P } , fornecendo quando m u i t o
a possibilidade de a u m e n t a r a s a c t i v i d a d e s e x i s t e n t e s ou de
introduzir n o v a s que sirvam
para satisfazer
as
necessidades
mais urgentes,
no interior da maneira de viver dada. (...) N o ent a n t o , n a prática, e m quase t o d o s o s países, o t e m p o p a s s a d o , fora
das h o r a s de trabalho "oficial", a g a n h a r dinheiro a u m e n t a t a m bém f o r t e m e n t e » ( ) . Os a u t o r e s r e f e r e m - s e ' à s h o r a s extraordinárias, a o trabalho «complementar» (exercido fora do local de
t r a b a l h o ) , b e m como a o u t r a s f o r m a s de obtenção dum rendim e n t o adicional. N o c a s o da H u n g r i a , verifica-se m e s m o que
«as e m p r e s a s e s t a t a i s e a s c o o p e r a t i v a s esforçam-se não s ó por
m a n t e r u m pessoal m u i t o m a i s i m p o r t a n t e do que seria justificável, m a s surgem
elas-próprias
como compradoras
do
tempo
livre dos seus próprias operários»( ).
Isto tem tudo obviamente
que ver com o f a c t o de que «a procura de t e m p o s livres suplem e n t a r e s é u l t r a p a s s a d a pela procura crescente de b e n s que n ã o
podem ser obtidos por u m grande n ú m e r o de operários, dado o
m o n t a n t e actual do r e n d i m e n t o nacional, ainda que a indústria
produza e s s e s b e n s em quantidades cada vez maiores» ( ) . E s t e
c r e s c i m e n t o do «desejo de aquisição» introduz de n o v o a q u e s t ã o
do carácter insaturável das n e c e s s i d a d e s q u a n t i t a t i v a s , j á a s s s i nalado por B a h r o e A. Heller.
7 4
75
70
7 7
Se p a s s a r m o s a o problema do t e m p o de trabalho, t a m b é m
a « i n v e s t i g a ç ã o sociológica d e m o n s t r o u que a natureza m e s m a
do trabalho — por o u t r a s p a l a v r a s : o l u g a r na divisão do trabalho — determina e m larga m e d i d a a v i d a inteira do h o m e m ,
a s s i m c o m o a m a n e i r a como utiliza o s s e u s t e m p o s livres. A s e s -
( )
( )
V)
(")
7<
,5
MARKUS & HEGEDtíS [1971], pp. 2808-2809.
Id., p. 2809.
Id., p. 2815.
Id., pp. 2811-2812.
t r u t u r a s a c t u a i s da divisão do trabalho c o n t i n u a m a s e r u m
obstáculo importante à realização da a u t o n o m i a humana, no
domínio m e s m o do trabalho. A m a i o r i a dos t r a b a l h a d o r e s efect u a u m trabalho parcelar, privado
de finalidade
do ponto
de
vista social e profissional.
P o r outro lado, os indivíduos
estão
ligados a um ofício concreto e muitas vezes a um emprego
por
toda a vida, praticamente
da infância à reforma.
É a característica m a i s conservadora da organização actual da produção» ( ) .
Ora e s t a ligação «vitalícia» a u m t r a b a l h o específico começa
n o s i s t e m a de e n s i n o , que «reparte a população p e l o s r a m o s
principais da divisão social do trabalho». Os a u t o r e s pensam,
pelo s e u lado, «que é possível desenvolver u m s i s t e m a ligando a
o r g a n i z a ç ã o da produção e a f o r m a ç ã o escolar, s i s t e m a que
n ã o determinaria o lugar do h o m e m n a d i v i s ã o do t r a b a l h o por
toda a vida, m a s lhe permitiria orientar-se c o n s t a n t e m e n t e para
a procura de s i - m e s m o e d a s u a identidade, criando a s possibilidades e o s e s t i m u l a n t e s para que o operário possa mudar de profissão ou de ofício em qualquer momento
da vida (...) A t a r e f a
principal de u m s i s t e m a escolar que dispense u m ensino geral
é educar o homem enquanto ser humano e n ã o enquanto operário
fazendo parte da divisão do t r a b a l h o ; por o u t r a s palavras, e s s a
t a r e f a é a de preparar as pessoas para controlar as suas
próprias
relações sociais e para dirigir o seu destino conscientemente»
( ).
E s t e s i s t e m a de «ensino geral» obrigatório, seria dobrado por u m
s i s t e m a de e n s i n o especializado, desde o nível primário, aberto
a todos, claramente separado do primeiro, dotado de u m a grande
flexibilidade, e com a c e s s o a v á r i o s níveis, s e g u n d o a f o r m a ç ã o
de b a s e e a experiência profissional de cada u m . «O corolário
natural do s i s t e m a proposto é a criação d u m a f o r m a ç ã o s i s t e m a t i c a m e n t e sobre-qualificada, n u m duplo sentido. P o r u m lado,
por u m tal s i s t e m a de formação, a m a i o r i a dos operários atingirá um nível de educação geral mais elevado do que lhes será
n e c e s s á r i o para o trabalho parcelar que p r o v a v e l m e n t e e f e c t u a rão. A o m e s m o tempo, o número de operários a quem a formação
especializada
permitirá ocupar u m a dada profissão será e x c e dentário r e l a t i v a m e n t e a o n ú m e r o necessário. O t e m o r de u m a
f o r m a ç ã o s i s t e m a t i c a m e n t e sobrequalificada, n e s t e sentido, im7 S
79
( ) MARKUS & HEGEDUS [1971], p. 2817.
( ) Id., p. 2823.
,s
7Í
pede u m a atitude crítica face à sociedade e é u m dos o b s t á c u l o s
principais à f u n d a ç ã o d u m a o r g a n i z a ç ã o da produção c o n f o r m e
com o s critérios s o c i a l i s t a s » ( ) . E n f i m , «o s i s t e m a de f o r m a ç ã o
s i s t e m a t i c a m e n t e sobrequalificada acima descrito forneceria
e s t í m u l o s à s p e s s o a s para que e s c o l h e s s e m de f o r m a m a i s independente o s ofícios ou o s e m p r e g o s , e para que u t i l i z a s s e m m a i s
o s s e u s t e m p o s l i v r e s n o s e n t i d o do s e u próprio d e s e n v o l v i m e n t o
e da sua própria realização» ( ) .
8 0
8 1
d)
A organização «comunal» — T a m b é m aqui se verifica u m a g r a n d e
coincidência de p o n t o s de v i s t a entre B a h r o e o s t e ó r i c o s h ú n g a ros, a i n d a que e s t e s coloquem a s q u e s t õ e s p r á t i c a s n u m a f o r m a
m a i s interrogativa. H e l l e r : «A criação duma n o v a e s t r u t u r a de
n e c e s s i d a d e s s ó pode s e r obra de h o m e n s o r g a n i z a d o s e m c o m u nidades» ( ) . N o e n t a n t o , e x i s t e u m certo círculo v i c i o s o :
« ( . . . ) s e m a superação do m o d o de v i d a b u r g u ê s e da e s t r u t u r a
b u r g u e s a (...) a s "necessidades radicais" não s u r g e m (...)
[Mas e n t ã o ] , s e a "necessidade radical" não é v e r d a d e i r a m e n t e
u m a necessidade, a o r g a n i z a ç ã o de t a i s c o m u n i d a d e s poderá t e r
qualquer base para se fundar, u m tal p r o g r a m a n ã o será u t ó pico ? » ( ) . A r e s p o s t a da autora a e s t e aparente i m p a s s e n ã o
será das m a i s convincentes, sobretudo para o s que c o n h e c e m
a s s o c i e d a d e s ocidentais, m a s é por certo a ú n i c a possível,
a
a p o s t a que tem de s e r f e i t a : «Creio que a s condições de u m tal
p r o g r a m a já n a s c e r a m e podem s e r deduzidas do c o m p o r t a m e n t o
de c a m a d a s populares c a d a v e z m a i s v a s t a s . M a s s a s cada v e z
m a i s i m p o r t a n t e s s e n t e m de f a c t o i n s a t i s f a ç ã o , s i t u a m - s e "mal"
n u m universo de n e c e s s i d a d e s q u a n t i t a t i v a s e b u s c a m instintiv a m e n t e u m a f o r m a de vida e m que a s n e c e s s i d a d e s q u a n t i t a t i v a s não f o s s e m d o m i n a n t e s . Q u a n d o n a s s o c i e d a d e s c a p i t a l i s t a s
m a i s industrializadas u m a c a m a d a da j u v e n t u d e (e com frequência a melhor) se desvia do s i s t e m a de v a l o r e s dos p a i s (frigorífico-carro-prestígio s o c i a l ) , quando o s j o v e n s — a i n d a quase
sempre o s m e l h o r e s — a b a n d o n a m e m m a s s a a s universidades,
quando s e expande por toda a parte u m a n o v a f o r m a de f a m í l i a
— a comunidade — , t u d o i s s o indica que a e x i g ê n c i a de t r a n s f o r 8 2
8 3
(">) MARKUS & H E G E D Ú S [1971], p. 2824.
Id., p. 2826.
( ) HELLER [1972], p. 2806.
(*>) Id., id.
8!
m a ç ã o da e s t r u t u r a de n e c e s s i d a d e s j á nasceu» ( ) . T a m b é m
M. M a r k u s e A . H e g e d i i s f o r m u l a m idêntica i n t e r r o g a ç ã o : «Podem
ou não superar-se, e se s i m de que forma, a s t e n d ê n c i a s à "coisificação" d a s sociedades de "consumo de massa", que l i m i t a m
a liberdade do indivíduo, no essencial, à e s c o l h a de "coisas"
e n c o n t r a d a s "prontas", à escolha entre a s diversas m e r c a d o r i a s ?
E poderão ou não s e r criadas f o r m a s de c o m u n i d a d e s que e s t i m u lem o d e s e n v o l v i m e n t o do indivíduo e o orientem para v a l o r e s
de h u m a n i z a ç ã o ? » ( ) . Convém aliás sublinhar que a perspectiva
d e s t e s a u t o r e s é c e r t a m e n t e m a i s utópica e m e n o s elaborada
que a de B a h r o . E n q u a n t o filósofos e sociólogos, a s s u a s t e s e s
s ã o e m grande medida d o m i n a d a s pelo «vício de fundo» que
para eles constitui a relação f a m i l i a r tradicional, e a s s u a s
«comunas» ou «comunidades» são e s s e n c i a l m e n t e u m a contraposição à «família» enquanto núcleo fundamental, de que tudo
parte. A s c o m u n a s territoriais de B a h r o t ê m outro âmbito, como
v i m o s , ainda que ele-próprio não s e j a alheio à problemática
f a m i l i a r e ao que daí decorre. S ó que bem compreende que a
«revolução das relações f a m i l i a r e s / s e x u a i s » é u m processo de
m u i t o l o n g o prazo, talvez a parte m a i s dura do processo global
de revolucionarização da sociedade. M a s é u m a condição do
triunfo da «revolução cultural»: «Ê s o m e n t e ao a t i n g i r a família
que ela poderá modificar pouco a pouco o p r o c e s s o de conjunto
do e s t u d o e do trabalho e, sobre e s t a base, libertar t o d a s a s relações í n t i m a s e públicas dos controlos e x t e r i o r e s que o s envenen a m e atrofiam» ( ) . E a i n d a : «Trabalho, família, escola, t u d o
isto deve ser u l t r a p a s s a d o pelo interior, abolido e a s s u m i d o , e
não s i m p l e s m e n t e destruído. Ê puro s u b j e c t i v i s m o , por exemplo,
querer começar por "suprimir" o c a s a m e n t o e a família, e m lugar
de adaptar a s s u a s condições i n t e r n a s e e x t e r n a s de desenvolv i m e n t o à s n o v a s possibilidades» ( ) .
S 4
8 3
8(1
S 7
V i s t o s o s p o n t o s e s s e n c i a i s do encontro entre a obra de B a h r o e a s da
«nova esquerda» h ú n g a r a , g o s t a r í a m o s a p e n a s de assinalar, no relativo
a e s t a última, dois a s p e c t o s adicionais — u m deles de a l g u m m o d o com-
(")
( )
( )
( )
8!
!8
8I
HELLER [1972], p. 2806.
MARKUS & HEGEDÚS [1970].
BAHRO [1977], p. 276.
Id., id.
p l e m e n t a r do trabalho de B a h r o , u m outro de divergência q u a n t o à prob l e m á t i c a da t r a n s i ç ã o .
O primeiro ponto diz respeito à tipologia diferenciada de desenvolvim e n t o das s o c i e d a d e s da E u r o p a de L e s t e , e s e o c i t a m o s é porque corrobora plenamente o s e n t i d o global do 2.° ensaio deste trabalho, ao opor dois
«modelos» d i s t i n t o s e bem caracterizados naqueles p a í s e s . E s s a tipologia
encontra-se n u m trabalho de M. M a r k u s e A . H e g e d i i s cujo título s i g n i f i c a t i v o é j u s t a m e n t e «Modernisation and A l t e r n a t i v e s of social prog r e s s » ( ) . «"Pelo m e n o s d u a s t e n d ê n c i a s de d e s e n v o l v i m e n t o principais
podem ser o b s e r v a d a s n o s p a í s e s da E u r o p a de Leste, n o que r e s p e i t a à s
ideias sobre o f u t u r o e à s a l t e r n a t i v a s de progresso". O primeiro modelo
exerce u m a f o r t e influência a t r a v é s dos c a n a i s oficiais, é o modelo "estatal". E s t e e x t r a p o l a para o futuro a s e s t r u t u r a s presentes. (...) E s t e
modelo n a s c e u n o período de c r e s c i m e n t o e x t e n s i v o e de penúria de bens.
N o entanto, ele identifica o s o c i a l i s m o com a s f o r m a s e soluções n a s c i d a s
n e s s a época. P o r isso foi particularmente criticado n o s p a í s e s e m que o
c r e s c i m e n t o i n t e n s i v o t o m o u o lugar do c r e s c i m e n t o e x t e n s i v o . (...) A s e g u n d a alternativa, a da "via principal", proclama "directa ou indirectamente, a ideia s e g u n d o a qual o s p a í s e s da E u r o p a de L e s t e devem e s s e n cialmente s e g u i r e m l i n h a s g e r a i s a v i a dos p a í s e s o c i d e n t a i s avançados".
(...) Os partidários d a "via principal" c o n s i d e r a m o primeiro modelo
como ineficaz e não dinâmico. Consideram o s i n t e r e s s e s do lucro contidos
n o m e r c a d o como a principal força m o t i v a d o r a da produção, logo a única
v i a para o d e s e n v o l v i m e n t o dinâmico. Por consequência, crêem que o
d e s e n v o l v i m e n t o e a s a t i s f a ç ã o das t e n d ê n c i a s "aquisitivas" do h o m e m
é a m a i s importante m o t i v a ç ã o do c o m p o r t a m e n t o económico. [ E n f i m ]
consideram a e x p a n s ã o das relações m e r c a n t i s c o m o o único c a m i n h o
para realizar a descentralização e, a t é certo ponto, para a democratização do poder a d m i n i s t r a t i v o do E s t a d o no controlo da produção.
(...) E s t a a l t e r n a t i v a t e c n o c r á t i c a ou t e c n i c i s t a traz m u i t a s soluções a
problemas que a a l t e r n a t i v a " e s t a t i s t a " t i n h a criado ( . . . ) » ( ) , pelo que
f i n a l m e n t e e x e r c e sobre a s m a s s a s «um forte poder de atracção».
8 8
8 9
J u l g a m o s t e r desenvolvido s u f i c i e n t e m e n t e e s t a distinção ao l o n g o
d e s t e trabalho, m a s n ã o é inútil sublinhar o f a c t o de que a própria «nova
esquerda» h ú n g a r a reconhece
(e não a p e n a s e s p e c i a l i s t a s ocidentais, ainda
que i n s u s p e i t o s ) a e x i s t ê n c i a de dois m o d e l o s bem caracterizados n o s
í ) MARKUS & HEGEDUS [1972].
( ) F R A N K E L & MARTIN [1973], pp. 2779/2781. A s citações contidas nesta
passagem são de MARKUS & HEGEDtíS [1972].
88
89
p a í s e s de L e s t e . E , a propósito, note-se que e m B a h r o tal diferenciação
n ã o s e encontra m a r c a d a com precisão. Ê por i s s o que e s t e contributo
adquire a l g u m a importância, na m e d i d a e m que a c e n t u a o f a c t o de que
t a m b é m o «socialismo de mercado», ainda que diferente,
não c o n s t i t u i r e s p o s t a a o s p r o b l e m a s de e m a n c i p a ç ã o e é a p e n a s u m a outra forma do
«socialismo realmente e x i s t e n t e » .
O s e g u n d o ponto, f u n d a m e n t a l n o plano prático da transição, e port a n t o u m a q u e s t ã o central na análise d a s condições de t r a n s f o r m a ç ã o /
/ r e v o l u ç ã o n a s f o r m a ç õ e s sociais reais, não diz d i r e c t a m e n t e respeito à
n o s s a problemática que é geral (teórica) e s e propõe a identificação de
u m o b j e c t i v o ( o s o c i a l i s m o como projecto).
N e m por isso a podemos
ignorar, q u a n t o m a i s não seja porque t a m b é m a ela n o s r e f e r i m o s ao trat a r a obra de B a h r o , e não terá s i d o por a c a s o que o fizemos. R e f e r i m o - n o s
à e x i s t ê n c i a ou não de u m «motor consciente» do p r o c e s s o de «revolução
cultural», de conquista da « h e g e m o n i a ideológica» (conceito g r a m s c i a n o
r e t o m a d o por B a h r o ) , e bem a s s i m da articulação dos p r o c e s s o s de revolução cultural e revolução política.
J á v i m o s que B a h r o reputa indispensável a e x i s t ê n c i a de u m a «liga
dos c o m u n i s t a s » , organização p o r t a d o r a dos n o v o s v a l o r e s e aspirações
«qualitativas», e m que a própria e s t r u t u r a interna do poder se encontra
invertida. M a s ele refere-se m u i t o m a i s à acção «cultural» demolidora/
/ m o b i l i z a d o r a do que à acção política n o sentido corrente do termo, e
e m particular ao clássico momento
da «conquista do poder»: « E s t a liga,
contra-poder c o n s t r u t i v o m a s de natureza revolucionária, t e m de exercer
a s u a influência sobre o s i s t e m a das f o r ç a s e a organização social, e recordar à hierarquia e s t a t a l o s s e u s limites. O f e n ó m e n o não é p a s s a g e i r o
como n o c a s o do partido [revolucionário de tipo tradicional — J M P ] ,
dure o que durar a f a s e intermediária. O resultado é u m a s i t u a ç ã o de
duplo poder e u m a redução p r o g r e s s i v a do p e s o do E s t a d o . Que o partido
c o m u n i s t a deixe de ser u m partido de g o v e r n o é condição para que o s
c o m u n i s t a s p o s s a m enquanto tais participar nele [ g o v e r n o ] , o que é absol u t a m e n t e indispensável. (...) Ê n e c e s s á r i o ( . . . ) que eles d o m i n e m a s
a c t i v i d a d e s do p r o c e s s o de reprodução, incluindo a s f u n ç õ e s hierárquicas
do s i s t e m a de informação, que só pouco a pouco se t o r n a r ã o puramente
a d m i n i s t r a t i v a s » ( ) . Só e m certo p a s s o B a h r o admite a inevitabilidade
de «conflito a b e r t o » : «Contrariamente a u m golpe de E s t a d o , a revolução
cultural não pode a p a n h a r a sociedade de surpresa. A oposição [neste
9 0
('") BAHRO [1977]-1, p. 340-341.
caso, a L i g a — JMP]' n ã o luta d i r e c t a m e n t e pelo poder, coloca a s u a
a p o s t a n u m c r e s c i m e n t o a l o n g o prazo da s u a influência — que depende
da possibilidade de d i s c u s s ã o livre e pública sobre o s e u p r o g r a m a e de
u m a organização e p r o p a g a n d a próprias. U m a f a s e de conflito aberto
entre ela e o s escribas e f a r i s e u s oficiais é inevitável» ( ) . Trata-se, como
é claro, de u m a «revolução por dentro», progressiva,
m a s conduzida por
u m a «inteligência colectiva», por u m partido organizado, ainda que não
n o s e n t i d o l e n i n i s t a de « v a n g u a r d a iluminada d a s m a s s a s » . Quanto a o s
h ú n g a r o s , podem distinguir-se e m primeira aproximação, sobre e s t a quest ã o «duas posições c o n t r a s t a n t e s : a dos que repropõem u m a relação de
"guia espiritual" entre i n t e l e c t u a i s e m a s s a s e, como Hegediis, c o n s i d e r a m
indispensável o papel de m e d i a ç ã o e i n t e g r a ç ã o dos conflitos s o c i a i s atribuído ao partido único, e a dos que, pelo contrário, como V a j d a e o s s e u s
a m i g o s da E s c o l a de B u d a p e s t e [no s e n t i d o r e s t r i t o — J M P ] , s u g e r e m ,
como única v i a para sair do i m p a s s e burocrático-autoritário e m que
a c t u a l m e n t e se encontram o s p a í s e s de Leste, u m a revitalização da sociedade civil. O e n v o l v i m e n t o de t o d o s n a d i s c u s s ã o i g u a l i t á r i a d a s alternat i v a s e p e r s p e c t i v a s para o futuro deveria dar vida a u m a n o v a Oeffentlichkeit,
i s t o é, u m a esfera pública, a qual, de m a n e i r a m u i t o m a i s incisiva
que a s u a a n t e c e s s o r a burguesa, a t r a v é s n o m e a d a m e n t e da a u t o g e s t ã o ,
da contracultura e de n o v a s f o r m a s de v i d a comunal, deveria dar
l u g a r a u m a d i m e n s ã o de c o m u n i c a ç ã o democrática entre a s m a s s a s ,
criadora de n o v o s valores, n e c e s s i d a d e s e f o r m a s de c o m p o r t a m e n t o » ( ) .
Mais e x p l i c i t a m e n t e , s e g u n d o a s próprias p a l a v r a s de Vajda, «é n e c e s sário ir ao fundo da q u e s t ã o e abandonar a ideia do partido revolucionário.
U m a revolução "guiada" por u m a elite política n ã o pode realizar o socialismo, se para e s t e — e t a m b é m p a r a ti [trata-se de u m a carta dirigida
a B a h r o — J M P ] — é essencial a superação da divisão social entre dirig e n t e s e dirigidos. A ideia c o m u n i s t a do partido é, a o contrário, a cons e r v a ç ã o de tal divisão do trabalho (...) Se, como t u s u s t e n t a s , a divisão
do trabalho social e m intelectual e físico é a raiz principal de t o d a s a s
f o r m a s de exploração e opressão, d e v e m o s t a m b é m abandonar a ideia da
elite revolucionária sob qualquer
forma, para atingir o o b j e c t i v o m a i s
i m p o r t a n t e do socialismo, ou seja, a abolição da divisão social (não obviam e n t e da t é c n i c a ) do trabalho» ( ) . A g n e s Heller, pelo seu lado, exprim e - s e do s e g u i n t e modo, e v i t a n d o a «questão do partido» (ele fala s e m p r e
D 1
9 2
9 3
{<") BAHRO [1977] -2, p. 31.
( ) BOELLA [1978].
{<") V A J D A [1978].
S2
e m t e r m o s de « m o v i m e n t o s o c i a l » ) , m a s n ã o a da «revolução p o l í t i c a » :
« [ P a r a ] o s m o v i m e n t o s revolucionários a f e c t a n d o o conjunto da sociedade (...) a vitória não se s i t u a p o n t u a l m e n t e n o t e m p o ; ela não é nunca
u m a c t o ou u m conjunto de actos, m a s sempre u m processo. E u m processo
tal que s ã o o s próprios h o m e n s — m a s s a s cada v e z m a i s v a s t a s — o s
s e u s portadores. [ E m t a i s m o v i m e n t o s ] , s ã o o s próprios h o m e n s que
t r a n s f o r m a m — no decurso do d e s e n v o l v i m e n t o c o n t í n u o das s u a s object i v a ç õ e s — a s u a e s t r u t u r a de n e c e s s i d a d e s e v a l o r e s ( . . . ) [O problema
e s t á e m q u e ] se t e m de r e e s t r u t u r a r a totalidade d a s n e c e s s i d a d e s e dos
v a l o r e s n u m a sociedade onde a alienação é geral — e i s s o m e s m o quando
a classe operária nela s e s i n t a mal à Vaise — , n u m a sociedade e m que a s
n e c e s s i d a d e s das m a s s a s s ã o a c i m a de t u d o n e c e s s i d a d e s v i t a i s e quant i t a t i v a s . P a r a fazer isso, a revolução política é e v i d e n t e m e n t e necessária,
m a s não é capaz por si s ó de realizar e s s a e s t r u t u r a radicalmente
n o v a » ( ) . E precisa que «a revolução política para M a r x não é realmente
m a i s do que u m a etapa, pois ele opõe a e m a n c i p a ç ã o h u m a n a à s i m p l e s
emancipação política»( ).
9 4
93
Convém ter presente que t o d o s e s t e s t r a b a l h o s v i s a m prioritariam e n t e u m a análise das p e r s p e c t i v a s de t r a n s i ç ã o n a s s o c i e d a d e s do L e s t e
europeu. D e s n e c e s s á r i o se torna dizer que h á t o d a u m a d i s c u s s ã o a
travar, n o u t r a s bases, r e l a t i v a m e n t e à s sociedades ocidentais, em particular aquelas e m que a s i n s t i t u i ç õ e s são f o r m a l m e n t e «democráticas».
U m a boa parte dos a u t o r e s citados, B a h r o desde logo, parecem depositar
e s p e r a n ç a s que r e p u t a m o s t o t a l m e n t e infundadas n o papel «progressista»
(no sentido da «revolução cultural») dos c h a m a d o s partidos «eurocomun i s t a s » , citando d e s i g n a d a m e n t e o s partidos francês, italiano e espanhol.
T e r m i n a m o s aqui a p a n o r â m i c a n a t u r a l m e n t e m u i t o incompleta de
posições c o m u n i s t a s «não-ortodoxas» p r o v e n i e n t e s de p a í s e s de «social i s m o real» (ainda que Cuba, a o t e m p o de Guevara, f o s s e ainda m u i t o
m a i s u m «laboratório revolucionário», s ó m u i t o p o s t e r i o r m e n t e alinhado,
n o essencial, com o s p r o c e s s o s inspirados da E u r o p a de Leste, sobretudo
da U R S S ) . N ã o p o d e m o s f u g i r a o s problemas que equacionam, a i n d a
que p o s s a m o s discutir da viabilidade das soluções que propõem, se e n t e n dermos, como o s s e u s autores, que o «projecto socialista» é o de u m
« s i s t e m a global», e nunca, r e s t r i t a m e n t e , o de u m « s i s t e m a económico».
V e r e m o s , de seguida, a l g u m a s das lições f u n d a m e n t a i s a colher de t a i s
contributos.
( ) HELLER [1972], p. 2804.
(» ) Id., p. 2796.
M
5
3 . È t e m p o de r e t o m a r m o s o n o s s o tema-objectivo, que é f i n a l m e n t e
o da precisa distinção entre u m s i s t e m a económico «mais o u m e n o s socialista» (com relações v a r i á v e i s P l a n o / m e r c a d o , propriedade c o l e c t i v a /
/ p r o p r i e d a d e privada, etc.) e u m s i s t e m a global socialista. A t r a v é s dos
t r a b a l h o s que s u m a r i a m e n t e p a s s á m o s e m r e v i s t a , e independentemente
de e v e n t u a i s o p t i m i s m o s ou «utopismos» que p e n s e m o s c o n t e r e m q u a n t o
à s r e s p e c t i v a s p r o p o s t a s de t r a n s i ç ã o , é f l a g r a n t e a preocupação c o m u m
com a q u e s t ã o da «consciência social», e o realismo c o m u m q u a n t o a o s
problemas que coloca a e x i s t ê n c i a de o r g a n i z a ç õ e s e relações crescentem e n t e c o m p l e x a s à m e d i d a que se intensifica o processo geral de «cresc i m e n t o económico» a s s e n t e n a «industrialização». N ã o é por a c a s o que,
com m a i o r ou m e n o r ênfase, t o d o s p õ e m u m a c e n t o m u i t o explícito n o s
a s p e c t o s de informação, comunicação, educação — e n o s s i s t e m a s de
decisão. N o s t r a b a l h o s cujo ponto de partida é a o b s e r v a ç ã o de s o c i e d a d e s
industrializadas é importante n o t a r a p a t e n t e «deseconomização» de quest õ e s como a divisão do trabalho e de e s t r u t u r a de n e c e s s i d a d e s . Isto é
i n d i s c u t i v e l m e n t e u m retorno àquilo a que s e poderá c h a m a r de «tradição
m a r x i s t a » , para a qual o s o c i a l i s m o r e p r e s e n t a v a u m salto (do reino da
necessidade para o reino da liberdade) civilizacional e n ã o a p e n a s u m a
alteração, por radical que f o s s e , de « s i s t e m a económico». A própria relação de exploração sempre foi para Marx u m a relação de «dominação
social» («O capital é u m a relação social») radicada n a divisão do trabalho, portadora da divisão da sociedade e m c l a s s e s sociais. M u i t a s das
simplificações e c o n o m i c i s t a s , n ã o i n o c e n t e s e m geral, que t ê m sido f e i t a s
da teoria m a r x i s t a fundam-se n u m a a b u s i v a identificação entre relação
social de exploração e t a x a de exploração (relação entre a s h o r a s de t r a balho apropriadas como m a i s - v a l i a — m — e a s h o r a s de trabalho efect u a d a s ou «capital variável» — v ) . Ora sucede, que, por u m lado, Marx
não fazia e s t a rigorosa identificação e, por outro e m a i s importante, ele
e n u n c i a v a e s t e s c o n c e i t o s para o modo de produção capitalista,
em que a
i n s t â n c i a económica é dominante, e e m que p o r t a n t o a relação
económica
de exploração podia de a l g u m m o d o consubstanciar ou sintetizar a relação
social de exploração. N u m s i s t e m a socialista, em que o político-cultural
terá n e c e s s a r i a m e n t e de s e r dominante, é a e s s e nível ( ) que terá de s e
96
(*•) Importante: não se trata aqui de nível «hierárquico» de funções sociais, nem
sequer de um subsistema (ou subsistemas) que, num organigrama do tipo do de Mikhalevsky (v. p. 102 acima), p o s s a ( m ) ser interpretado(s) como de algum modo
agindo do «exterior» sobre o subsistema económico. N a realidade é na totalidade dos
comportamentos (nomeadamente os decisionais), inclusive os que relevam da consciência social individual, que tal dominância se deverá verificar.
efectuar a eliminação das relações de dominação, a e s s e nível que o empen h a m e n t o colectivo terá de s e r d e c i s i v o : a e c o n o m i a t e r á de ser conscientemente
controlada e dirigida, o que não s i g n i f i c a desconhecer a s
balizas que impõe e m u i t o m e n o s o s b l o q u e a m e n t o s que pode determinar
n a própria consciência social. P e l o contrário, s i g n i f i c a j u s t a m e n t e conhecer i s s o m e s m o , e e s s e c o n h e c i m e n t o ser apropriado
pela generalidade
dos indivíduos. A s s i m como o c o n h e c i m e n t o dos f e n ó m e n o s n a t u r a i s n o s
permite dominá-los
e tirar partido deles, s e m que e m m u i t o s a s p e c t o s eles
d e i x e m de determinar a n o s s a e x i s t ê n c i a (o tipo de h a b i t a t , por exemplo,
depende e m g r a n d e parte das condições n a t u r a i s ) , do m e s m o m o d o o
c o n h e c i m e n t o d a s «contraintes» e c o n ó m i c a s ( l i m i t a ç õ e s de recursos, equilíbrios básicos, t e c n o l o g i a s disponíveis, etc.) deverá servir-nos para dominar a e c o n o m i a e fazer dela u m i n s t r u m e n t o de p r o g r e s s o colectivo.
E aqui, como e m t a n t o s o u t r o s c a m p o s e c o m o j á t í n h a m o s s u g e r i d o na
primeira parte d e s t e ensaio, põe-se u m problema de redefinição de conc e i t o s : é a própria ideia de progresso
que t e m de s e r radicalmente alterada
— «De u m m o d o geral, h á que aprender a interpretar a ideia m e s m a de
p r o g r e s s o duma m a n e i r a r a d i c a l m e n t e diferente daquela a que e s t a m o s
h a b i t u a d o s » ( ) . E daí decorre n a t u r a l m e n t e que t o d o s o s t e r m o s contraditórios e n t ã o por n ó s enunciados g a n h e m , t a m b é m eles, u m s e n t i d o novo.
J á v i m o s como B a h r o coloca a questão da planificação e o s l i m i t e s que
i m p õ e / a c e i t a para a a u t o g e s t ã o : a s c o m u n i d a d e s locais ou regionais, a s
u n i d a d e s produtivas, e t c , t e r ã o por objectivo não a m a x i m i z a ç ã o do lucro
o u a s i m p l e s « p r o s p e r i d a d e material» própria (caso da a u t o g e s t ã o j u g o s l a v a ) m a s a emancipação
geral, de que o P l a n o será a expressão
colectiva
e m que, por f o r m a organizada,
t o d o s participam. I s t o pressupõe u m a generalizada a p r e e n s ã o dos m e c a n i s m o s que s u s t e n t a m a totalidade
social,
suportada por u m s i s t e m a de i n f o r m a ç ã o / c o m u n i c a ç ã o e x t r e m a m e n t e
aberto e intersticial, o m e s m o é dizer, pressupõe u m elevado g r a u de
«consciência social» e m que, n a formulação de B a h r o , o s i n t e r e s s e s de
e m a n c i p a ç ã o s e t e n h a m tornado predominantes. Se t o m a r m o s a q u e s t ã o
da democracia, t a m b é m n ã o é difícil compreender que, em t a i s condições,
ela estará u l t r a p a s s a d a . A democracia confundir-se-á com a participação
a c t i v a e d e i x a r á n a t u r a l m e n t e de t e r o s e n t i d o actual de d e m i s s ã o colect i v a p o n t u a d a por periódicos a c t o s eleitoriais e m que o s «representantes
eleitos» f a z e m parte de u m corpo de políticos profissionais o u de n o t á v e i s
locais, cuja acção a p e n a s v i s a a s u a própria s u b s i s t ê n c i a enquanto aparelho
de poder, e l o g i c a m e n t e t a m b é m a s u b s i s t ê n c i a da «organização social»
9 7
(") BAHRO [1977]-1, p. 246.
que l h e s confere e s s a função. E n f i m u m ú l t i m o e x e m p l o de reformulação
de c o n c e i t o s : o da dissociação do poder e do saber. O problema d e i x a r á
claramente de s e equacionar deste modo. D e f a c t o n o s i s t e m a s o c i a l i s t a
o saber científico, o saber técnico, o saber a d m i n i s t r a t i v o , o saber económ i c o não poderão, enquanto tal, g e r a r poder social. Será a i n d a aí a consciência social, o «saber» que t e m por base o c o n h e c i m e n t o da sociedade
e o c o n h e c i m e n t o (participado) dos s e u s o b j e c t i v o s que determinará a
organização do poder que, ele-próprio, perderá o s e n t i d o de poder sobre
a sociedade para adquirir o de poder na sociedade. I s t o será f a c i l i t a d o por
dois e l e m e n t o s f u n d a m e n t a i s : por u m lado, a des-identificação entre
p r o g r e s s o social e p r o g r e s s o técnico-científico-material (ainda que a e s t e
p o s s a ser atribuído
u m papel determinado e controlado como parte do
p r o g r e s s o social) levará a que o s e s p e c i a l i s t a s n e s t e s d o m í n i o s d e i x a r ã o
de ser v i s t o s como o s d e p o s i t á r i o s e o s portadores do p r o g r e s s o social.
P o r outro lado, quer a «sub-planificação» ( B a h r o ) ou planificação a u m
nível de r e c u r s o s inferior a o disponível, quer a sobre-educação ( B a h r o /
/ M a r k u s / H e g e d u s ) , tenderão a diluir a actual f u n ç ã o social d o s especial i s t a s . Com efeito e s s a função, e o poder real daí decorrente, s ã o t a n t o
m a i o r e s quanto m a i s tensa é a sociedade (a sua dinâmica económica,
em particular) o u q u a n t o m a i s profundas a s s u a s crises, o que é compreensível. U m a sociedade em t e n s ã o c o n s t a n t e n a busca de n o v o s produtos, no f o m e n t o de n o v a s n e c e s s i d a d e s / c o n s u m o s , na busca de n o v a s
«oportunidades de i n v e s t i m e n t o » , ou n a p r o s s e c u ç ã o acelerada de n o v o s
a u m e n t o s de produção, n a v e r t i g e m do e s t a b e l e c i m e n t o e do cumprim e n t o de P l a n o s , n a desconfiança p e r m a n e n t e e m relação a o s comportam e n t o s dos s e u s s u j e i t o s e c o n ó m i c o s — e i s o c o n t e x t o ideal para o s u c e s s o ,
o poder, se não o p r e s t í g i o dos técnicos, dos e c o n o m i s t a s , dos administradores, e t a m b é m dos burocratas. O m e s m o sucede n a s sociedades «em
crise», e n ã o é por a c a s o que, e m t a i s f a s e s , é frequente o apelo a o s «tecnocratas» para a s s u m i r e m d i r e c t a m e n t e o poder. Ora j u s t a m e n t e , a sociedade s o c i a l i s t a / c o m u n i s t a será, por definição, u m a sociedade não-tensa,
no
s e n t i d o acima, e e m que a s e v e n t u a i s «crises» t e r ã o a r e s p o s t a colectiva
inerente a o s próprios m e c a n i s m o s de i n f o r m a ç ã o / c o m u n i c a ç ã o / d e c i s ã o .
T a m b é m , por e s t a via, o s e s p e c i a l i s t a s perderão u m a parcela considerável da função decisiva que d e s e m p e n h a m n a s a c t u a i s s o c i e d a d e s industrializadas. É oportuno recordar aqui o dilema e m que s e e n c o n t r a v a
G u e v a r a : ele procurava desenvolver a «consciência social» (o «motor
interno») n u m a sociedade e m e s t a d o de forte tensão produtiva, e m que,
na t e r m i n o l o g i a de B a h r o , ainda n ã o e x i s t i a u m a «consciência excedente»
generalizada. D a í que a s u a preocupação s e polarizasse sobretudo n a indi-
f e r e n ç a perante a s t a r e f a s de produção o u a ela l i g a d a s . D a í que procurasse concentrar
o s e s c a s s o s «especialistas» de que dispunha, e com
i s s o e s t i v e s s e a reforçar o poder de u m a burocracia técnico-partidária.
Atribuir, e m t a i s condições, a s f u n ç õ e s de « m o t o r interno» ao Partido
— e por certo n ã o h a v i a a l t e r n a t i v a — era, f i n a l m e n t e , reproduzir o s m e c a n i s m o s de poder burocrático que s e c o n h e c e m n o s p a í s e s da E u r o p a
de L e s t e . F o i isso, com t o d a a lógica, o que acabou por s e verificar, e é
e s s e p r o v a v e l m e n t e o d e s t i n o inelutável das revoluções a n t i - c a p i t a l i s t a s
e m p a í s e s de b a i x o nível de d e s e n v o l v i m e n t o — o próprio B a h r o o reconhece. Ê a e t a p a da «revolução política» (A. H e l l e r ) , que criará a s condições materiais
para a «revolução social total». M a s deve-se a Guevara,
e n ã o a B a h r o , c o m o e r r a d a m e n t e diz Marcuse n u m dos s e u s ú l t i m o s escritos, o p r i m e i r o p a s s o para a eliminação da distinção tradicional f e i t a pelos
m a r x i s t a s ( e m particular depois de L e n i n e ) entre socialismo
e comunismo como e t a p a s b e m m a r c a d a s de u m p r o c e s s o revolucionário ( ) .
É certo que ele (como F i d e l n a s u a f a s e « g u e v a r i s t a » ) f a l a de e t a p a s ,
e do « c o m u n i s m o » como u m objectivo final e distante, m a s é p a t e n t e e
claramente explícita e m t o d o s o s s e u s t e x t o s a t e s e do d e s e n v o l v i m e n t o
paralelo d a s f o r ç a s p r o d u t i v a s (i. e., da « a c u m u l a ç ã o m a t e r i a l » ) e da
«consciência social», entendida c o m o u m a «ética c o m u n i s t a » a s s e n t e n o s
princípios da solidariedade, da a c ç ã o / c o m u n i c a ç ã o colectivas, da e m a n cipação total (e n ã o só m a t e r i a l ) : « E m r e g i m e s o c i a l i s t a [...] é n e c e s sário acentuar a s u a [do h o m e m ] participação consciente, individual e
colectiva e m t o d o s o s m e c a n i s m o s de direcção e de produção, e ligá-la à
educação t é c n i c a e ideológica, de m o d o a que ele s i n t a q u a n t o e s t e s proc e s s o s s ã o e s t r e i t a m e n t e interdependentes e a s u a p r o g r e s s ã o paralela.
A s s i m , u m a vez quebradas a s c a d e i a s da alienação, ele a t i n g i r á a consciência t o t a l d o seu s e r social, a s u a plena realização enquanto criatura
h u m a n a . I s t o traduzir-se-á c o n c r e t a m e n t e pela r e c o n q u i s t a da s u a n a t u reza própria a t r a v é s do t r a b a l h o liberto e pela e x p r e s s ã o da s u a condição
h u m a n a , a t r a v é s da cultura e da a r t e » ( ) . Onde B a h r o i n o v a não é, p o i s
n e s t e ponto, m a s naquele e m que, como Marcuse t a m b é m assinala, atribui
à consciência social n a s sociedades industrializadas, o papel de «força
9 S
9 9
( ) «Bahro rompe finalmente com a distinção (já há muito convertida em ideologia repressiva) entre socialismo e comunismo: socialismo é comunismo desde o
princípio e vice-versa. Natureza e objectivo da sociedade socialista: o indivíduo total,
o alargamento do reino da liberdade no reino da necessidade, podem (e devem) tornar-se, agora e aqui, objectivos e directrizes da política e da estratégia comunistas»
(MARCUSE [1978]).
(") G U E V A R A [1965]-2, p. 97 (trad. f r a n c ) .
DS
m a t e r i a l da t r a n s f o r m a ç ã o » . I s t o é, e m r e s p o s t a à q u e l e s que s u b l i n h a m
o «idealismo» de pretender de f o r m a v o l u n t a r i s t a «forçar» o a v a n ç o da
consciência social para além daquilo que permitiria o e s t á d i o do desenvolv i m e n t o das f o r ç a s produtivas ( ° ) , B a h r o considera que, e m t a i s sociedades é a própria «tecnologia [que] t e m necessidade de m a s s a s cultivadas e cria paralelamente a s condições n e c e s s á r i a s para o d e s a p a r e c i m e n t o
d o s u b - d e s e n v o l v i m e n t o individual e do e s t a d o de subordinação. T r a t a - s e
de forçar a "sobreprodução" de consciência a f i m de c h e g a r a inverter o
c o n j u n t o dos a c o n t e c i m e n t o s h i s t ó r i c o s p a r a fazer da Ideia u m poder
material decisivo. O que e s t á iminente, e de f a c t o j á começou, é u m a
revolução
cultural no verdadeiro s e n t i d o do t e r m o : uma mudança
radical
nas formas de vida subjectivas
das massas, comparável s o m e n t e a e s s a
outra t r a n s f o r m a ç ã o que, partindo do patriarcado e p a s s a n d o pela d i v i s ã o
vertical do trabalho e do E s t a d o , conduziu à sociedade de c l a s s e s . N o decurso d e s t a s e g u n d a revolução cultural, o h o m e m v a i fundar a s u a e x i s t ê n c i a sobre a s u a consciência, a "mais alta m a n i f e s t a ç ã o da matéria", e
vai concentrar o s s e u s e s f o r ç o s sobre a o r g a n i z a ç ã o social d e s t a n o o s f e r a
[a «esfera» do espírito, da psique — J M P ] a fim de regular, a partir daí,
de u m a n o v a f o r m a a s s u a s relações com a natureza» ( ) . E n o u t r a p a s s a g e m , o m e s m o a u t o r refere-se à consciência social «enquanto noção integ r a n t e da f o r ç a produtiva s u b j e c t i v a da sociedade, logo, enquanto realidade a b s o l u t a m e n t e material, económica ( . . . ) » ( ) . P o r o u t r a s palavras,
n a s sociedades industriais, a subjectividade,
que o s m a r x i s t a s «ortodox o s » a t é e n t ã o sempre consideraram c o m o que u m produto de
condições
objectivas,
podendo sobre elas agir «em retorno», de a l g u m m o d o s e
t o r n a ela-própria
u m a «condição o b j e c t i v a » : s e f o r a m a s «leis objectivas»
da «economia política» que, a partir de u m dado m o m e n t o ,
produziram
u m e x c e d e n t e de consciência que a própria i n f r a e s t r u t u r a e c o n ó m i c a e
o correspondente aparelho de g e s t ã o / p o d e r j á n ã o podem absorver, e s s e
e x c e d e n t e torna-se u m a «força m a t e r i a l objectiva» e m c o n s t a n t e crescim e n t o que entrará n e c e s s a r i a m e n t e e m contradição com u m a organização
10
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1 0 2
(ioo) Guevara, confrontado com este problema, e em posição m a i s vulnerável por
se situar justamente numa sociedade «subdesenvolvida», encontra uma outra resposta:
«Na actual era do imperialismo, a consciência adquire dimensões mundiais. A consciência hoje é o produto do desenvolvimento de todas as forças produtivas à escala
mundial, e bem assim do ensinamento e educação proporcionados às m a s s a s do mundo
inteiro pela União Soviética e pelos outros países socialistas» (GUEVARA [1964]-3,
p. 103).
( ) BAHRO [ 1 9 7 7 M , p. 241.
C ) Id., p. 299.
Wl
02
social ( f o r ç a s p r o d u t i v a s / r e l a ç õ e s de produção) s e m r e s p o s t a para a s
e x i g ê n c i a s «qualitativas» por e s s e processo libertas. I s t o n ã o é de n e n h u m
m o d o u m a s u b v e r s ã o da dialéctica m a r x i s t a . P e l o contrário, pretende s e r
a s u a aplicação à s condições n o v a s que s ã o a s d a s s o c i e d a d e s a l t a m e n t e
industrializadas — condições que n i n g u é m pode a c u s a r M a r x de n ã o ter
podido r i g o r o s a m e n t e prever. N a realidade, e n a linha e x a c t a de Marx,
t r a t a - s e de c o n s t a t a r que t a i s s o c i e d a d e s se põem a si-próprias novos
problemas, porque a s s u a s condições materiais
l h e s p e r m i t e m resolvê-los.
M a s n e m por isso e s t a perspectiva, pela «localização social» onde preferencialmente se f o r m a o «excedente de consciência», d e i x a de pôr e m quest ã o o papel emancipador exclusivo
da «classe operária», cuja libertação
seria, n a t e o r i a original, condição n e c e s s á r i a e suficiente para a libert a ç ã o de todos.
Isto conduz-nos a u m outro ponto, que pode t a m b é m ferir a s convicç õ e s de m u i t o s m a r x i s t a s s u p o s t a m e n t e o r t o d o x o s . Trata-se da relação
entre consciência social e consciência de classe. L i m i t a r - n o s - e m o s a enunciar a l g u m a s l i n h a s de reflexão, e a l g u m a s implicações que tal r e l a ç ã o /
/ d i s t i n ç ã o comporta. Ê óbvio, aliás, que u m a d i s c u s s ã o aprofundada d e s t a
questão deveria s e r ponto central das preocupações de t o d o s quantos, seja
qual for o seu â n g u l o de observação, procuram contribuir para u m a «teoria do socialismo» enquanto s i s t e m a global em
projecto.
à partida, e m t e r m o s de definição genérica, não c r e m o s s i t u a r - n o s
e m terreno controverso. A l i á s o próprio M a r x utilizou a e x p r e s s ã o «consciência social», inclusive n u m a d a s s u a s m a i s c i t a d a s p a s s a g e n s (do P r e f á c i o à «Crítica da e c o n o m i a p o l í t i c a » ) . A consciência social é o resultado
da apreensão individual
da sociedade enquanto organização, enquanto
estrutura, enquanto relação de f o r ç a s e de i n t e r e s s e s , e b e m a s s i m da
posição do indivíduo dentro d e s s a sociedade — é, na e x p r e s s ã o de Marx,
«a reprodução do concreto [ s o c i a l ] pela via do p e n s a m e n t o » , concreto
e s s e que «aparece n o p e n s a m e n t o c o m o processo de s í n t e s e » , c o m o «totalidade pensada, produto do cérebro pensante, que se apropria do m u n d o
da única m a n e i r a possível» ( ) . E m t e r m o s de pura démarche
intelectual,
de u m a «elevada» consciência social deveria decorrer u m a «consciência
1 0 3
( W 3 ) MARX [1859], p. 350. Segundo Bahro, a consciência social é o potencial
existente em todos os indivíduos, a «energia mental», que, em determinadas
condições,
lhes possibilita a apreensão da sociedade como um todo, m a s que, na maioria deles, se
encontra «absorvida» por actividades reprodutoras da «subalternidade». Daí a necessidade de um partido «cuja autoridade ideológica é directamente função da qualidade
da sua produção intelectual (...) O trabalho do partido consiste num conhecimento
do real, no seu sentido marxista complexo: o conhecimento é um processo global, in-
de classe», isto é, de pertença a u m a dada classe social, c o m o seu posicion a m e n t o e i n t e r e s s e próprios dentro da e s t r u t u r a social, o s quais lhe defin e m o s t e r m o s do conflito e d a s contradições que a opõem a o u t r a (s)
classe (s) o u g r u p o s sociais. D e f a c t o n ã o pode e x i s t i r u m a s ó c l a s s e social,
u m s ó «grupo social» — é u m a e v i d ê n c i a : cada c l a s s e define-se p e l a s difer e n ç a s (de i n t e r e s s e s , de papel n o s i s t e m a produtivo, de condições m a t e r i a i s de e x i s t ê n c i a , etc.) r e l a t i v a m e n t e a o u t r a ( s ) . Mas, ainda n o m e s m o
plano da «via intelectual», é n ã o s ó a d m i s s í v e l c o m o u m f a c t o correntem e n t e verificado, que certos indivíduos s i g a m a partir daí o percurso
inverso e v e n h a m a aderir à s (a identificar-se
com a s ) p o s i ç õ e s e aspiraç õ e s de o u t r a classe o u g r u p o que não a q u e l a ( e ) a que o r i g i n a l m e n t e pert e n c e m , por e x e m p l o e m n o m e da emancipação
geral. N a realidade, s e n d o
embora reconhecido e s t e f a c t o (e c o m o o não seria s e se t r a t a j u s t a m e n t e
do percurso de u m Marx, de u m L e n i n e , e de t a n t o s o u t r o s d i r i g e n t e s revol u c i o n á r i o s ? ) , s e m p r e s e atribuiu o papel de potencial
revolucionário
decisivo
à crescente «aquisição» da consciência de classe a partir da
prática,
ou seja, a partir da v i v ê n c i a concreta de «condições de explorado» por parte, f u n d a m e n t a l m e n t e , do proletariado industrial. O papel
do «partido revolucionário» era j u s t a m e n t e o de despertar e s t a consciência de classe n a s g r a n d e s m a s s a s proletarizadas e, a t r a v é s disso, cumprir
a História,
e m cujo p r o c e s s o inelutável a revolução e s t a v a inscrita. U t i l i zando a t e r m i n o l o g i a de B a h r o , a c l a s s e operária s e r i a o ú n i c o portador
de « i n t e r e s s e s emancipadores», a única em que t a i s i n t e r e s s e s e s t a r i a m
p r e s e n t e s n a consciência social dos s e u s m e m b r o s . Ora é j u s t a m e n t e e s t e
o p o n t o nodal d a s t e s e s de B a h r o e, a n o s s o ver, u m a q u e s t ã o vital a s e r
discutida e a p r o f u n d a d a : se n a s s o c i e d a d e s industriais a s f o r ç a s domin a n t e s puderam, para além de a s s e g u r a r a s a t i s f a ç ã o no essencial das
n e c e s s i d a d e s v i t a i s e de subsistência, a l i m e n t a r u m a t e n s ã o c o n s t a n t e
e m torno d o s « i n t e r e s s e s de c o m p e n s a ç ã o » , a o p o n t o de s e r f u n d a m e n t a l m e n t e n e s t e terreno que se t r a v a m a m a i o r i a das l u t a s sociais ( ) , se,
1 0 4
cluindo a experimentação e a passagem à prática» (BAHRO [1977]-1, p. 342).
A fim de «esmagar a resistência do quotidiano» [dos «interesses de compensação»], é
indispensável desencadear «um processo psicológico, um élan que arrastaria em particular a maioria da juventude para as esferas do ideal político-filosófico. A promessa
de emancipação contida no movimento colectivo deve ser tão irresistível que milhares
de jovens alcançariam uma visão consciente da totalidade social, mesmo da humanidade» (BAHRO [1977]-1, p. 352 — sublinhado meu, J M P ) .
( ) «É o reconhecimento consciente ou não deste facto [de que sem a superação
do modo de vida burguês, não se desenvolvem nas m a s s a s «as necessidades radicais»
— J M P ] , e não a falsificação do ensinamento de Marx, que levou as diferentes ten1M
por o u t r o lado, o p r o l e t a r i a d o i n d u s t r i a l t r a d i c i o n a l n e l a s s e e n c o n t r a e m
indiscutível retracção numérica, se enfim cada vez m a i s a insatisfação,
a f r u s t r a ç ã o , a a l i e n a ç ã o s ã o sentidas
por g r a n d e s m a s s a s e m t e r m o s de
« m o d o de v i d a » , de d i s c r i m i n a ç ã o n a f r u i ç ã o de «bens» q u a l i t a t i v o s , de
m a s s i f i c a ç ã o d o s próprios desejos,
n ã o c o r r e s p o n d e r á a u m c o n c e i t o alar-
g a d o de e x p l o r a ç ã o u m a n o v a c o m p o s i ç ã o d a s f o r ç a s m o t o r a s da e m a n c i p a ç ã o ? S e e x p l o r a ç ã o n ã o é s ó a a p r o p r i a ç ã o p r i v a d a da m a i s - v a l i a , m a s
também
a apropriação
pelas forças
dominantes
do e x c e d e n t e de
c i ê n c i a que decorre d a s p r ó p r i a s c o n d i ç õ e s de p r o d u ç ã o
cons-
(e p a r a B a h r o ,
c o m o p a r a o s h ú n g a r o s , é n e s t e s e n t i d o que s e pode, e deve
f a l a r da e x p l o -
ração nos
),
países
do s o c i a l i s m o
realmente
existentes) (
1 0 5
o
potencial
revolucionário reside em todos aqueles para quem a revolução é muito
mais
do que a s i m p l e s
«apropriação c o l e c t i v a d o s b e n s de
produção».
N e s t a óptica, a c o n s c i ê n c i a de c l a s s e , e m l u g a r de a s c e n d e r a u m a «compreensão
da t o t a l i d a d e
social»
e desencadear
um
élan
revolucionário,
s i t u a r - s e - i a , n a s s o c i e d a d e s i n d u s t r i a i s , n o s l i m i t e s da « e s f e r a da subalternidade», quer levando os explorados a mimar os comportamentos dos
dências do movimento operário, ainda que por vias diversas, a apelar para as necessidades existentes de facto ou em curso de formação no seio da sociedade burguesa; em
primeiro lugar, a apelar para a s necessidades vitais e para a s quantitativas» (HELLER
[1972], p. 2806). Tal facto constitui o já referido «círculo vicioso», para a saída do
qual Bahro avança a sua hipótese da «consciência excedente», e que Marcuse enuncia
do seguinte modo: «A revolução pressupõe u m a ruptura com este poder [o dos interesses de compensação] — ruptura que, pelo seu lado, só pode resultar da revolução!
Este é o "círculo vicioso" que no livro de Bahro aparece com tal densidade e sob diversas formulações. Este é hoje o problema histórico determinante da teoria da revolução»
(MARCUSE [1978]). Este era também, ainda sob outra formulação, um dos problem a s centrais que Gramsci foi o primeiro a tratar (a questão da «hegemonia»), e por
isso Bahro tanto nele se apoia.
( ) Isto t e m que ver com um conceito, que aqui nos limitamos a introduzir sumariamente, embora esteja subjacente a muito do que se disse: o de sociedades dicotómicas. Seria o caso daquelas sociedades em que o grande desenvolvimento das forças
produtivas (produção complexa, tecnologias sofisticadas) dá origem a uma divisão
social do trabalho em que radicalmente se opõem os que sabem dirigir/gerir e os que
apenas sabem/podem executar, decorrendo daí u m a relação de poder que não deriva
da «propriedade privada dos bens de produção». Donde, em tais sociedades, a existência
daquilo a que Bahro chama uma «exploração política». Certos autores húngaros
(Vajda, p. ex.) admitem que uma sociedade dicotómica pode não ser necessariamente
uma sociedade de classes, no sentido marxista tradicional: seria esse justamente o
caso dos países de socialismo real. (Sobre este ponto, v. B A P T I S T A [1975], sobretudo
o seu artigo «Burocracia, sistema político e dinâmica social», naturalmente muito
influenciado pelos trabalhos da escola húngara, já que o seu autor se doutorou em
sociologia em Budapeste).
,05
exploradores, cujo e s t a t u t o social, o s n í v e i s de c o n s u m o , o poder, s e r i a m
colocados como objectivo e aspiração (base ideológica do r e f o r m i s m o ) ,
quer levando-os a reproduzir, n o seio m e s m o dos partidos e o r g a n i z a ç õ e s
«revolucionárias» relações de subalternidade e «menoridade m e n t a l » que
p r e f i g u r a m u m m o d e l o de «sociedade burocrática» do tipo das do socialismo r e a l m e n t e e x i s t e n t e . P a r a além disso, a consciência de c l a s s e que
suporta o s partidos «revolucionários», pelo f a c t o de a s s e n t a r n u m a v i s ã o
e m a n c i p a t ó r i a exclusiva
da c l a s s e operária, excluiria da luta t o d o s o s
« i n t e r e s s e s de emancipação» e x i s t e n t e s na sociedade e m n u m e r o s o s indiv í d u o s de o u t r o s g r u p o s e c l a s s e s , a p e n a s o s a d m i t i n d o na c l á s s i c a p o s i ç ã o
de compagnons
de route, ou enquanto g r u p o s «aliados» m a s subalternos.
O não a t i n g i r u m a «visão social t o t a l » s e r i a (ou t e r i a sido a t é h o j e ) o
obstáculo m a i o r à realização d a s t ã o a p r e g o a d a s «alianças de classe».
S e m f a l a r n a enorme d e s c o n f i a n ç a r e l a t i v a m e n t e a t o d o s o s m o v i m e n t o s
de e m a n c i p a ç ã o não-operários (na s u a «natureza») d a s c h a m a d a s m i n o r i a s s o c i a i s : mulheres, j o v e n s , e c o l o g i s t a s , e t c , e t a m b é m a t e m a s n ã o
e x c l u s i v a m e n t e r e l a c i o n á v e i s com a condição p r o l e t á r i a : o s e x o , a família,
a «marginalidade», etc. N a p e r s p e c t i v a proletária tradicional t o d a s e s t a s
q u e s t õ e s e s t a r i a m a u t o m a t i c a m e n t e solucionadas, ou e m v i a s de solução,
a partir do m o m e n t o e m que a «classe operária», pela m ã o do s e u partido,
t o m a s s e o poder. E isso, saindo j á do c a m p o d a s h i p ó t e s e s para o dos
f a c t o s , a experiência h i s t ó r i c a n ã o o t e m d e m o n s t r a d o .
E n f i m , a t e r m i n a r e s t e ensaio, g o s t a r í a m o s de a p r e s e n t a r u m a
«hipótese gráfica» que de a l g u m modo, ainda que m u i t o g r o s s e i r a m e n t e ,
c o n s u b s t a n c i a o essencial do que p r o c u r á m o s evidenciar n o conjunto dos
t r ê s e n s a i o s que c o n s t i t u e m o p r e s e n t e trabalho. T r a t a - s e m u i t o s i m p l e s m e n t e de visualizar a necessidade,
para u m «projecto socialista», de sair
do e s p a ç o dos s i s t e m a s económicos, do e s p a ç o «quantitativo», para u m
e s p a ç o m u l t i d i m e n s i o n a l e m que o q u a l i t a t i v o , o cultural no m a i s amplo
sentido, adquire u m papel crescente e f i n a l m e n t e d e t e r m i n a n t e . D a d a s
a s l i m i t a ç õ e s de u m a r e p r e s e n t a ç ã o gráfica, n a t u r a l m e n t e que t a n t o o s
p a r â m e t r o s do e s p a ç o económico c o m o a «multidimensionalidade» do
domínio não-económico t i v e r a m que s e r s i n t e t i z a d o s por f o r m a a reduzirem-se à s t r ê s ú n i c a s d i m e n s õ e s dos e i x o s p a s s í v e i s de representação.
A s s i m , e n c o n t r a m o s o s « s i s t e m a s económicos» distribuídos n u m plano
c u j a s d i m e n s õ e s a x i a i s s ã o «a propriedade dos m e i o s de produção» e o
«grau de i n t e r v e n ç ã o do E s t a d o na economia» ( g r o s s e i r a m e n t e identificável c o m o «modo de r e g u l a ç ã o económica», p. ex., a relação-articulação
P l a n o / m e r c a d o ) . O e i x o v e r t i c a l m e d i r á o «grau de participação social
efectiva» n o s p r o c e s s o s decisórios a t o d o s o s níveis, o que é o b v i a m e n t e
z
Eixo OX — «Propriedade dos meios de produção»: de O para D cresce a propriedade «colectiva» e decresce a propriedade «privada». O ponto D
corresponde à propriedade colectiva da totalidade
dos meios de
produção.
Eixo OY — «Intervenção do Estado na economia»: de O para A cresce essa
intervenção. O segmento OB corresponde a diferentes graus de intervenção em «economias de mercado», isto é, em que é o mercado
o regulador económico principal. O segmento B A corresponde a
«economias planificadas», em que ao mercado é atribuído um papel
de maior (B) ou menor (em direcção a A) importância.
Eixo OZ — «Participação social efectiva»: os valores crescentes a partir de O
assinalam o alargamento dessa participação, a todos os níveis,
concomitante com a elevação geral da «consciência social», em
particular com a dominância crescente da sua componente «emancipadora».
A R E A S NOTÁVEIS E ARTICULAÇÃO
POLÍTICA
Á R E A 1 — Sistemas próximos do «mercado livre»: propriedade dos meios
de produção totalmente ou quase totalmente privada, intervenção
mínima do Estado nos mecanismos económicos (ou intervenção
fortemente «liberalizante»). Situam-se aqui os «países exemplares»
da economia de mercado livre, quase todos «subdesenvolvidos»:
Países do Sueste asiático, Chile, etc. Tendencialmente são regimes
políticos ditatoriais.
Nota — A propaganda ideológica que é feita
de uma Coreia do Sul, p. ex., tenderia a incluí-la aqui. N a prática,
trata-se de um projecto fortemente voluntarista e intervencionista
de construção de um «capitalismo monopolista» semelhante ao modelo japonês.
Á R E A 2 — Sistemas de «planificação central»: propriedade dos meios de produção totalmente ou quase totalmente colectiva (ou mesmo estat a l ) , existência de um Plano imperativo centralmente elaborado
e controlado na sua aplicação. Situam-se aqui os países do «socialismo real», com as excepções da Hungria e da Polónia (em que
a maior parte da terra foi descolectivizada). São países de regime
ditatorial
tecno-burocrático.
ÁREA A D J A C E N T E A Á R E A 1 — Sistemas de «capitalismo monopolista»
(industrializados): situam-se aqui (sobretudo numa sub-zona 5)
os países de economia liberal mais desenvolvidos, como os E. U.,
a R. F. A. e o Japão, com economias fortemente concentradas
(grandes empresas monopolistas, muitas delas multinacionais), em
que é reduzida a propriedade estatal dos meios de produção, embora haja uma considerável intervenção dos poderes públicos na
economia. São geralmente paises de regime político «democrático»
m a s com fortes indícios «antidemocráticos»: discriminação política (R. F. A . ) , discriminação racial e de minorias (E. U . ) , leque
político muito estreito, repressão ideológica e social acentuadas.
ÁREA A D J A C E N T E Ã Á R E A 2 — Casos excepcionais no bloco de países do
«socialismo real». Nomeadamente: ponto c — Polónia, pela razão
acima apontada, e ponto 6 — Hungria, onde vigora o sistema «experimental» de «socialismo de mercado». Sistemas políticos autoritários, m a s tendencialmente m a i s atenuados que os da zona 2.
ÃREA 3 — E m particular a sua sub-área compreendida entre os segmentos
OC e BC —• Países mais ou menos próximos do chamado «sistema
de capitalismo monopolista de Estado»: situa-se aqui a generalidade dos países capitalistas industrializados, em que existe um
sector público produtivo importante, implicando quase sempre uma
intervenção considerável do Estado na regulação económica. N a
sub-zona 6 estarão as «soeials-democracias» mais «avançadas»:
Reino Unido, Suécia, Áustria, etc. É a zona das «democracias políticas» europeias típicas.
à R E A 4 — Zona potencial, de que não se conhecem exemplos, m a s teoricamente admissível em situações de
transição.
PONTOS NOTÁVEIS
(para além dos pontos b e c já assinalados)
Pontos a, e a, — corresponderão grosseiramente ao Portugal de antes
do 25 de Abril e da actualidade. A localização de ambos os pontos não nos
satisfaz, o que dá bem a medida do grau de «atipicidade» das situações que
Portugal tem conhecido. De facto o grande intervencionismo do Estado durante o corporativismo português foi, pelo menos até 1968, tudo menos «liberalizante»: talvez devêssemos trazer o ponto a, para muito mais próximo de B.
Quanto à situação actual, optámos por a„ em lugar de aproximar o ponto do
segmento BC, porque efectivamente só se pode falar de intervenção do Estado
na economia na medida em que ela decorre do poder económico do sector
público, não porque exista uma intervenção reguladora deliberada e «estratégica» (e muito menos qualquer esboço de planificação, mesmo indicativa).
O que esta incerteza revela não é mais do que a insuficiência de representação do sistema através de dois únicos parâmetros sintéticos (e também
a instabilidade do «sistema» português).
ponto d — define tentativamente a zona em que se situaria uma Jugoslávia,
m a s também aqui o sistema jugoslavo nos denuncia o carácter
redutor dos parâmetros escolhidos: a distinção propriedade/gestão,
p. ex., não é apreensível através deste gráfico.
SEGMENTOS ORIENTADOS
A traço cheio (rectos) — fenómenos «político-económicos», exemplificativos (excepto no caso português), de discontinuidade: p. ex., uma nacionalização brusca de meios de produção importantes, u m a descolectivização rápida,
uma «reforma económica» introduzindo alterações consideráveis na relação
Plano/mercado, etc.
A traço interrompido (curvos, embora possam ser rectos se a alteração
for brusca ou rápida): representam a saída do plano dos sistemas económicos
em direcção a sociedades crescentemente participadas. Os percursos assinalados estão todos colocados na sequência de um fenómeno político-económico
do tipo anterior, o que será lógico, m a s não necessário.
PONTO
S
Este ponto é o que m a i s padece da representação escolhida. Com efeito
o «sistema socialista», que se supõe representar, é por definição o de uma
sociedade colectivamente regulada e totalmente participada. Mas a sua coordenada A, no eixo OY não corresponde a uma regulação estatal no sentido
corrente: o Estado, no sentido de poder, terá então um sentido radicalmente
distinto, que vai adquirindo justamente à medida que a coordenada vertical
vai aumentando de «valor». E s t a coordenada (a do eixo OZ) altera qualitativamente,
o que não é passível de representação, os próprios conceitos do
«espaço económico». Sem isso, não haverá transição para o socialismo.
a s í n t e s e de n u m e r o s o s p a r â m e t r o s , entre o s quais avulta c o m o determin a n t e o nível de «consciência social» e a capacidade de mobilização
colectiva d e s s a consciência. A própria l e g e n d a do g r á f i c o possibilita a s u a
interpretação, pelo que n o s n ã o a l o n g a m o s sobre ela. I m p o r t a s i m assinalar que, de u m a f o r m a geral, a q u e s t ã o da t r a n s i ç ã o é a de u m a luta entre
a s f o r ç a s «centrípetas», que procuram m a n t e r o s indivíduos e o s g r u p o s /
/ c l a s s e s s o c i a i s n o plano do q u a n t i t a t i v o ( B a h r o diria do « s u b a l t e r n o » ) ,
obrigá-los a u m a d i s p u t a de «coisas» — n e l a s incluído o próprio p o d e r /
/ s a b e r e m i n e n t e m e n t e c o n s e r v a d o r e s e reprodutores da ideologia do «prog r e s s o material» — e a s f o r ç a s «centrífugas» que b u s c a m colocar o s i s t e m a económico ao s e r v i ç o do qualitativo, da emancipação,
do estabelec i m e n t o de relações s o c i a i s r a d i c a l m e n t e diferentes — incluindo u m a n o v a
relação p o d e r / s a b e r , e m que u m e outro adquiram, como já d e t i d a m e n t e
e x p u s e m o s , u m s i g n i f i c a d o t o t a l m e n t e outro. A c r e s c e n t e - s e que a publicidade, n o s s i s t e m a s c a p i t a i s t a s , e a p r o p a g a n d a ideológica, n o s s i s t e m a s
não-capitalistas, s ã o c e r t a m e n t e d u a s das m a i s poderosas a l a v a n c a s de
que s e servem, c o m o «forças centrípetas», a s e l i t e s / c l a s s e s d i r i g e n t e s dos
s i s t e m a s r e a l m e n t e e x i s t e n t e s , o s quais, aliás, c o m o t a m b é m v i m o s , pouco
t ê m que v e r com a «teoria» que deles é produzida. Sublinhe-se enfim que a
luta de c l a s s e s n o s e n t i d o corrente s e p a s s a , e m períodos
normais,
por
inteiro ao nível do plano a que c h a m a m o s dos « s i s t e m a s económicos»,
ainda que dentro de c o n t e x t o s e com i m p l i c a ç õ e s políticas v a r i a d a s pois,
c o m o se sabe, s i s t e m a e c o n ó m i c o e s i s t e m a político se e n c o n t r a m fortem e n t e imbricados. É u m d o s a s p e c t o s e m que o g r á f i c o apresentado é
i n e v i t a v e l m e n t e «redutor», s e b e m que a s u a l e g e n d a assinale c e r t a s articulações r e l a t i v a s a e s t e ponto.
CONCLUSÃO
U m século depois de Marx é ainda nele e no seu m é t o d o que terá de
repousar o essencial da construção do «projecto s o c i a l i s t a / c o m u n i s t a » .
A s u a v i s ã o «globalizante» dos s i s t e m a s s o c i a i s é a ú n i c a que se poderá
opor à frieza tecnocrática do «globalismo s i s t é m i c o » ou do «estrutural i s m o a n t i - h u m a n i s t a » (que de u m M a r x a m p u t a d o s e r e c l a m a ) , o s quais
e s t ã o e m v i a s de refundir não a p e n a s o s conceitos t r a d i c i o n a i s de t o d a s
a s c h a m a d a s «ciências h u m a n a s » m a s , por v i a disso t a m b é m , a s próprias
« e s t r u t u r a s m e n t a i s » das sociedades a l t a m e n t e industrializadas. E n t e n d a m o - n o s : n ã o s e t r a t a de recusar o s c o n t r i b u t o s do p e n s a m e n t o s i s t é m i c o
m o d e r n o e de o c o m b a t e r e m n o m e de u m qualquer r e t r o c e s s o à parcelização do c o n h e c i m e n t o (ou à «sabedoria p o p u l a r » . . . ) . Trata-se, pelo contrário, de levar à s ú l t i m a s consequências a s u a d i m e n s ã o «subversiva»,
s e m o que o s e u «globalismo» f a c i l m e n t e se t r a n s f o r m a r á e m «totalitarismo» c u j o s contornos já são bem a p a r e n t e s n o p r o c e s s o e m m a r c h a
de «telematização» do quotidiano n a s s o c i e d a d e s m a i s industrializadas.
O que e s t á e m c a u s a é apropriarmo-nos
do p e n s a m e n t o s i s t é m i c o c o m o
i n s t r u m e n t o de apreensão da totalidade social, de a p r o f u n d a m e n t o da
«consciência social», de evidenciação da n e c e s s i d a d e lógica da «difusão
do poder» e dos m e c a n i s m o s de f o r m a ç ã o de « c o n s e n s o s colectivos» — e
não deixarmo-nos
apropriar
por e s s e m e s m o « p e n s a m e n t o sistémico»,
pelo poder t o t a l i t á r i o de e s p e c i a l i s t a s de cuja fragilidade ele v e i o a nascer.
Com efeito, o p e n s a m e n t o s i s t é m i c o traduz e m definitivo a impotência
científica ( « e x p l i c a t i v a » ) dos e s p e c i a l i s t a s isolados — seria t r á g i c o restituir-lhes o poder que perderam, permitindo-lhes que o utilizem s o b a
f o r m a de c o l e c t i v o s s e m rosto, ao serviço daqueles que s a l v a r a m no m o m e n t o e m que l h e s destruíram a «racionalidade» e m que f u n d a r a m a s u a
ideologia. S e r i a o triunfo do paradoxo.
A lógica dos s i s t e m a s e s t á de tal m o d o m a i s p r ó x i m a da «forma de
pensar» do h o m e m c o m u m do que a l ó g i c a causal parcelizada, que é razoável a d m i t i r a s u a i m p o r t a n t e contribuição para a c o m p r e e n s ã o individual
dos m e c a n i s m o s sociais, incluindo a s e s t r u t u r a s de d o m i n a ç ã o a que
cada u m (enquanto indivíduo, e enquanto m e m b r o de u m «colectivo»)
s e encontra s u b m e t i d o . E s s a m e s m a lógica o levará a introduzir o i m a g i nário, o afectivo, o «desejo de vida», a s m o t i v a ç õ e s solidárias e igualit á r i a s , c o m o c o m p o n e n t e s vitais de u m s i s t e m a emancipador. E t a m b é m
t o d o s o s que b u s c a m descobrir porque se s e n t e m f r u s t r a d o s e i n s a t i s f e i t o s
n u m m u n d o que cada vez m a i s o s alicia com produtos sempre m a i s
s o f i s t i c a d o s s e apoiarão nela para e n c o n t r a r a s r e s p o s t a s e o s c a m i n h o s
de u m a acção «socialmente consciente». E l e s c h a m a r ã o p o r v e n t u r a social i s t a o u c o m u n i s t a a e s s e «novo» s i s t e m a — que a l g u é m já «imaginara»
u m século a t r á s .
P o r último, last but not the least, a p e n a s u m a s breves l i n h a s dirig i d a s a o s que s e i n t e r r o g u e m sobre a utilidade que e s t e trabalho poderá
t e r p a r a a análise do c a s o p o r t u g u ê s , de que ele s e propunha lançar
a l g u n s alicerces teóricos.
D e s d e l o g o ficar-nos-á a indicação de quão e s t é r e i s (ou mal-intenc i o n a d a s ) s e r ã o a s d i s c u s s õ e s e m t o r n o do « s i s t e m a económico» e v e n t u a l m e n t e « m a i s adequado» a o n o s s o p a í s . É óbvio que t a i s d e b a t e s s e
s i t u a r ã o s e m p r e n o quadro de u m «projecto político» implícito, e que
c o n v é m o b r i g a r a explicitar. I s t o é t a n t o m a i s i m p o r t a n t e quanto P o r t u g a l
é u m p a í s a p e n a s semi-industrializado e m que, c o n t r a r i a m e n t e à s sociedades de que f u n d a m e n t a l m e n t e s e ocupa u m Rudolph B a h r o , s ã o ainda
e s c a s s a s a s condições de f o r m a ç ã o de «consciência excedente». O m e s m o
é dizer, m a i s p r e c i s a m e n t e , que o p r o c e s s o de a c u m u l a ç ã o ainda não ating i u a f a s e e m que a s « n e c e s s i d a d e s básicas» podem s e r s a t i s f e i t a s de
f o r m a g e n e r a l i z a d a e que é p o r t a n t o indispensável identificar que poder
{de que forças sociais)
s e propõe que conduza e controle aquilo a que
c h a m a r í a m o s de «industrialização r e s t a n t e » . E c o n v é m t e r p r e s e n t e que,
e m t a i s sociedades, a «democracia política» de tipo ocidental c o s t u m a
t e r dificuldades e m a s s e g u r a r e s s a tarefa. M a s sucede que, inserida n u m
continente dito «civilizado», p r o f u n d a m e n t e m a r c a d o por influências cult u r a i s dele p r o v e n i e n t e s , t a l sociedade m e i o - d e s e n v o l v i d a e s t á profundam e n t e i m p r e g n a d a dos v a l o r e s / c o m p o r t a m e n t o s das s o c i e d a d e s de «consumo», que a s d e s i g u a l d a d e s e d i s t o r s õ e s i n e r e n t e s ao e s t á d i o em que
s e e n c o n t r a a i n d a m a i s e x a c e r b a m . A c o n t e c e t a m b é m que a «explosão
vivencial» colectiva de 1974-75, a m o r d a ç a d a pelas f o r ç a s políticas que, em
toda a amplitude do leque partidário, a t e m e r a m e lhe apreenderam o
potencial subversivo,
terá t a m b é m d e i x a d o m a r c a s profundas e m m u i t o s
que, d e s m u n i d o s de tudo, conheceram
n a p r á t i c a u m au-delà, u m a pré-figuração de «outro m o d o de vida».
O P o r t u g a l de hoje é, pois, para além do s e u s i m p l e s « e s t á d i o de
d e s e n v o l v i m e n t o » , u m c a d i n h o adormecido, u m «entre-Guevara-e-Bahro»
a o qual m u i t o do que d i s s e m o s pode s e r aplicado, a partir de u m concreto
c o m p l e x o que coloca desafios t e ó r i c o s a que l a m e n t a r e m o s u m dia n ã o t e r
querido ou podido responder. O s o c i a l i s m o e m P o r t u g a l e s t á por pensar.
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PUBLICAÇÕES
EDITADAS
PELO
CENTRO D E ESTUDOS D E ECONOMIA AGRÁRIA
SÉRIE
A:
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Eng.° Agr.° Mário Pereira. 1959. (Esgotada).
2 — T R A B A L H O S P O R T U G U E S E S INÉDITOS
Inventário. 1." volume. 1959. (Esgotado).
SOBRE ECONOMIA
AGRARIA.
3 — C U R S O D E GESTÃO D A E M P R E S A AGRÍCOLA. Sessões de abertura e de
encerramento. 1959. (Esgotado).
4 — A REPARTIÇÃO DO R E N D I M E N T O SOCIAL-AGRÍCOLA. INTRODUÇÃO AO
S E U ESTUDO. Prof. Henrique de Barros. 1960. (Esgotado).
5 — D U A S CONFERÊNCIAS SOBRE D E S E N V O L V I M E N T O
Dr. Bruno Knall. 1961. (Esgotado).
ECONÓMICO.
6 — T É C N I C A S D E PROGRAMAÇÃO LINEAR. S U A APLICAÇÃO AOS PROBLEMAS ECONÓMICOS D A E M P R E S A AGRÍCOLA. Eng.° Agr.» Fernando
Estácio. 1961. (Esgotado).
7 — A REGIÃO A OESTE D A S E R R A DOS CANDEEIROS. Eng.°* Agr. » Carlos
da Silva, Alberto Alarcão e Lopes Cardoso. 1961. (Esgotado).
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8 — CONTABILIDADE AGRÍCOLA
Galvão. 1967. (Esgotado).
GLOBAL.
2." edição. Eng.°
9 — COOPERAÇÃO AGRÍCOLA. Lições e conferências.
1962.
Agr.°
Amândio
(Esgotado).
10 — L A TECHNIQUE SUIVIE A U PORTUGAL D A N S L'ÉTUDE D E S DIMENSIONS OPTIMALES D E S EXPLOITATIONS AGRICOLES FAMILIALES.
Eng.° A g r . Fernando Estácio. 1962. (Esgotado).
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11 — O MÉTODO DOS MODELOS E A ANÁLISE ECONÓMICA D A EXPLORAÇÃO
AGRÍCOLA. Eng.° A g r . Mário Pereira. 1962. (Esgotado).
0
12 — DESENVOLVIMENTO ECONÓMICO.
rências. 1963. (Esgotado).
PLANEAMENTO
REGIONAL.
Confe-
13 — N Í V E I S D E DESENVOLVIMENTO AGRÍCOLA NO CONTINENTE PORTUGUÊS. Prof. E. de Castro Caldas e Dr. Manuel de Santos Loureiro. 1963.
(Esgotado).
14 — A N A L I S E E P L A N E A M E N T O D A EXPLORAÇÃO AGRÍCOLA. Seminário. 1964.
(Esgotado).
15 — O C A P I T A L - D E - E M P R E S A E M AGRICULTURA. Prof. Henrique de Barros e
Eng.° A g r . Amândio Galvão. 1964. (Esgotado).
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16 — A FUNÇÃO D E PRODUÇÃO D E COBB-DOUGLAS E A A N Á L I S E INTER-REGIONAL D A PRODUÇÃO AGRÍCOLA. Eng.° Agr." José António Girão.
1965. (Esgotado).
17 — O MERCADO DO VINHO EM PORTUGAL. A N A L I S E
Dr. António Monteiro Alves. 1965.
ECONOMÉTRICA.
18 — A CONTRIBUIÇÃO DO SECTOR AGRÍCOLA P A R A O DESENVOLVIMENTO
ECONÓMICO E M PORTUGAL. Dr. António Monteiro Alves e Eng.° Agr.° Fernando Gomes da Silva. 1965.
19 — LIMIARES D E R E N D A B I L I D A D E D A EXPLORAÇÃO AGRÍCOLA N U M A
REGIÃO DO NOROESTE. E n g .
Agr.°» Mário Pereira, Amândio Galvão,
Fernando Estácio e Rogério de Almeida. 1966.
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20 — CRÉDITO AGRÍCOLA. Conferências. Eng.° Agr.°« L. Quartin Graça e M. Pierre
Breton. 1967.
s
21 — O P A P E L D A S COOPERATIVAS N A COMERCIALIZAÇÃO DOS PRODUTOS
AGRÍCOLAS. Seminário. 1967. (Esgotado).
22 — R E G I Õ E S HOMOGÉNEAS NO CONTINENTE PORTUGUÊS. PRIMEIRO
E N S A I O D E DELIMITAÇÃO. Prof. E. de Castro Caldas e Dr. Manuel de Santos
Loureiro. 1966. (Esgotado).
23 — T R A B A L H O S P O R T U G U E S E S INÉDITOS
Inventário. 2.» volume, 1958/1966. 1968.
SOBRE
ECONOMIA
AGRARIA.
24 — O A R R E N D A M E N T O E A P A R C E R I A R U R A I S . ESTUDO COMPARATIVO
D A S LEGISLAÇÕES D E DIVERSOS P A Í S E S . Dr. Afonso de Barros. 1968.
25 — O SISTEMA-DE-PRODUÇAO D A E M P R E S A AGRÍCOLA COMO OBJECTO
D E P L A N E A M E N T O . (Ensaio). Eng." Agr.° Amândio Galvão. 1968. (Esgotado).
26 — T E M P O S D E TRABALHO AGRÍCOLA N U M A REGIÃO DO NOROESTE.
E n g . A g r . J. Silva Lourenço e E n g . Tec.° Agr.° Vítor Manuel Alves. 1968.
(Esgotado).
0
0
0
27 — A N Á L I S E ECONÓMICA DO SECTOR D A CARNE, 1948-1965. Eng."» A g r . "
Fernando Gomes da Silva e Fernando Estácio, Dr. António Monteiro Alves
e Eng. " A g r . " José António Girão e José Manuel Barrocas. 1968. (Esgotado).
0
28 — TEMPOS-PADRÕES D E TRABALHO P A R A A CULTURA A R V E N S E D E
SEQUEIRO NO ALTO ALENTEJO. Eng." Agr. Francisco Caldeira Cary. 1968.
(Esgotado).
0
29 — P R O D U T I V I D A D E S DO TRABALHO E D A TERRA NO CONTINENTE.
Eng. * A g r . " Mário Pereira e Fernando Estácio. 1968. (Esgotado).
0
30 — A N A L I S E D E REGRESSÃO. O ALGORITMO STRAP. E n g . " A g r . "
António Girão e José Manuel Barrocas. 1968. (Esgotado).
José
31 — O CRESCIMENTO REGIONAL E M PORTUGAL. A N A L I S E D A S U A DISTRIBUIÇÃO. Eng.° Agr.° Armando Trigo de Abreu. 1969. (Esgotado).
32 — INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS MODELOS GRAVITACIONAIS. SUA
APLICAÇÃO N A A N Á L I S E REGIONAL. Eng.° Agr.» Raul Dias da Cruz. 1969.
(Esgotado).
33 — CONSUMO PRIVADO E CONSUMO ALIMENTAR EM PORTUGAL. Dr. António Monteiro Alves e E n g . A g r . Fernando Gomes da Silva. 1969. (Esgotado).
0
0
34 — MOBILIDADE GEOGRÁFICA D A POPULAÇÃO D E PORTUGAL (CONTIN E N T E E I L H A S A D J A C E N T E S ) . MIGRAÇÕES I N T E R N A S . 1921-1960. Eng.»
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B E I R A LITORAL. Eng.°» Agr.°» Alfredo Louza Viana e José Manuel Barrocas.
1970. (Esgotado).
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E M P R E S A AGRÍCOLA. E n g . " A g r .
Jean Piel-Desruisseaux e Francisco
Caldeira Cary. 1970.
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37 — E C O N O M I A S D E ESCALA. METEDOLOGIA D A S U A QUANTIFICAÇÃO
A P L I C A D A E S P E C I A L M E N T E AS A D E G A S COOPERATIVAS. Eng.» Agr."
José Gabriel Cavaleiro Proença. 1971.
38 — RELAÇÕES D E PRODUÇÃO E PROGRESSO TÉCNICO NO QUADRO DA
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39 — AMORTIZAÇÃO DOS CAPITAIS
J. Silva Lourenço. 1972.
DA EMPRESA
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Agr."
40 — ASPECTOS R E C E N T E S D A EVOLUÇÃO DO MERCADO DO VINHO EM
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41 — M O D E L O S D E EXPLORAÇÃO P E C U Á R I A N U M A REGIÃO D A BEIRA
LITORAL. Eng.°» A g r . " Rogério Vieira de Almeida, Fernando Brito Soares
e Alfredo Louza Viana. 1973.
42 — TEMPOS-PADRAO D E TRABALHO P A R A A S P R I N C I P A I S CULTURAS
D A LEZÍRIA DO RIBATEJO. Eng.» Agr.» Francisco Caldeira Cary. 1973.
43 — ALIMENTAÇÃO E CONDIÇÕES D E VIDA D E FAMÍLIAS D E TRABALHADORES R U R A I S DO BAIXO ALENTEJO. Eng.» Agr.» Agostinho de Carvalho
e Dr." Maria Leonor Gomes. 1973.
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Carvalho Ribeiro. 19T4.
45 — A L G U N S ELEMENTOS P A R A A CARACTERIZAÇÃO D A ASSIMETRIA
REGIONAL AGRARIA PORTUGUESA. Eng.» Agr.» Mário Pereira. 1974.
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Eng.»» Agr.°" Joaquim da Silva Lourenço e Nuno Siqueira de Carvalho. 1974.
47 — U M MODELO D E LOCALIZAÇÃO E DIMENSIONAMENTO D E I N D U S T R I A S
D E TRANSFORMAÇÃO D E PRODUTOS AGRÍCOLAS. APLICAÇÃO AO CASO
D E A D E G A S COOPERATIVAS N U M A SUB-REGIAO DO DAO. E n g . " Agr.»'
A. J. Cortez de Lobão, F. C. Cary e R. Vieira de Almeida e colaboração dos
Eng.»' Agr.»* A. Sevinate Pinto e Joana C. Palminha. 1974.
48 — A PROGRAMAÇÃO L I N E A R EM AGRICULTURA. METODOLOGIA
P L A N E A M E N T O E A N A L I S E . Eng." Agr." Fernando Estácio. 1975.
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49 — U M MODELO D E A N A L I S E DO DESENVOLVIMENTO DO SECTOR AGRÍCOLA E M PORTUGAL. Eng.»» Agr."" Fernando Estácio, António Cortez de
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~>l — ALIMENTAÇÃO E CONDIÇÕES D E S A Ú D E DE FAMÍLIAS AGRICULTORAS
Í>A SUB-REGIAO VITÍCOLA D E «TORRES». Eng.» Agr." Agostinho de Carvalho,
Prof. G. Jorge Janz, Dr. J. S. Bandeira Costa, Dra. Maria Leonor Gomes, Eng.»
Carlos Gonçalves, Eng.» Agr.» Gabriel Guerreiro Gonçalves, Dr. J. Gonçalo Janz,
Dra. Gabriela S. Pinto, Prof. C. Santos Reis e Eng.» Tec." Agr." José Júlio Carvalho
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Prof. Eugénio de Castro Caldas. 1978.
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Galvão. 1979.
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BRUTO COMO INSTRUMENTO D E A N Á L I S E E DETERMINAÇÃO — E N S A I O
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1979.
58 — N A T U R E Z A DO PROBLEMA AGRÍCOLA EM PORTUGAL (1950-73). U M A
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59 — S I S T E M A S ECONÓMICOS E CONSCIÊNCIA SOCIAL — P A R A UMA TEORIA
DO SOCIALISMO COMO SISTEMA GLOBAL. Eng.» João Martins Pereira. 1980.
SÉRIE
B:
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Fernando Estácio. 1960. (Sep. «Revista Agronómica», Lisboa, 43 (1) 1960).
(Esgotado).
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(Esgotado).
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Eng.» Agr.» J. Silva Lourenço. 1961. (Sep. «Revista Agronómica», Lisboa, 44
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TION D E L E U R S STRUCTURES I N T E R N E S . Prof. Henrique de Barros. 1961.
(Sep. «Revista Agronómica», Lisboa, 44 (4) 1961). (Esgotado).
8 — A CONCENTRAÇÃO D A ACTIVIDADE AGRÍCOLA E A
E M P R E S A R I A L . Eng.» Agr.» António Lopes Cardoso. 1962.
Agronómica», Lisboa, 45 (3) (1962).
INTEGRAÇÃO
(Sep. «Revista
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Barrocas. 1962. (Sep. «Revista Agronómica», Lisboa, 45 (4) 1962). (Esgotado).
10 — IDENTIFICAÇÃO E DELIMITAÇÃO D E U M A «ZONA DIMINUÍDA» NO
CENTRO DO PAIS. Eng.» Agr.» R. Dias da Cruz. 1963. (Sep. «Agros», Lisboa,
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José António Girão. 1965 (Sep. «Revista Agronómica», Lisboa 47 (3/4) 1964).
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13 — A PROGRAMAÇÃO EM NCrMEROS INTEIROS. S U A APLICAÇÃO AOS PROBLEMAS ECONÓMICOS D A EXPLORAÇÃO AGRÍCOLA. Eng.» Agr.» José
Manuel Barrocas. 1966. (Sep. «Revista Agronómica», Lisboa, 48 ( 1 / 2 ) 1965).
(Esgotado).
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Lisboa, 48 (1/2) 1965). (Esgotado).
15 — L E S RECHERCHES S U R I/ORGANISATION D U TRAVAIL. A U PORTUGAL.
Eng.» Agr." Francisco Cary. 1966. (Esgotado).
16 — A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO E A S MAQUINAS AGRÍCOLAS. Eng." Agr."
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19 — IMPORTANCE E T DIFFICULTES SPÉCIFIQUES D E L A RECHERCHE E N
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20 — IMPLICAÇÕES SOCIAIS E ECONÓMICAS D A INTEGRAÇÃO VERTICAL EM
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22 — DOIS CONCEITOS DE GESTÃO AGRÍCOLA. Eng." Agr.» Amândio Galvão. 1970.
23 — E S T U D O D A S POSSIBILIDADES DE RECONVERSÃO AGRÍCOLA N U M A
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Agostinho de Carvalho. 1970. (Sep. «Agros», Lisboa, 52/53 (3-6 e 1-6) 1969/70).
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s
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Lisboa. 1971). (Esgotado).
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38 _ O F U T U R O DEMOGRÁFICO D A LÍNGUA PORTUGUESA NO MUNDO.
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45 — A POLITICA AGRÍCOLA COMUM E S E U FINANCIAMENTO. Eng.» Agr.»
Girão. 1980. (Sep. de «Revista de Ciências», 2, 1977-78).
46 —TIPOLOGIA D A S EXPLORAÇÕES AGRÍCOLAS DA SUB-REGIAO VITÍCOLA
D E «TORRES». Eng.» Agr.» Agostinho de Carvalho e Eng.» Agr.» José Júlio
Ribeiro. 1979.
47 — A REFORMA AGRARIA E MPORTUGAL E O DESENVOLVIMENTO ECONÓMICO E SOCIAL. Dr. Afonso de Barros. 1980. (Sep. «Revista de Ciências
Sociais», 3, Dezembro 1979).
48 — H I S T O R I A D A P R O P R I E D A D E E COMUNIDADE R U R A L : QUESTÕES D E
MÉTODO. Drs. Fátima Brandão e Robert Rowland. 1980. (Sep. de «Análise
Social», vol. XVI (61-62) 1980).
3
SERIE
O:
1 — B O L E T I M BIBLIOGRÁFICO DO CEEA. Trimestral. (Mimeografado).
2 — CURSO D E GESTÃO D A E M P R E S A AGRÍCOLA. Profs. Louis Malassis e Denis
Bergmann. 1960. (Mimeografado). (Esgotado).
3 —OBJECTIVO, E S T R U T U R A
1966/67. 1969.
E
ACTIVIDADES
DO
CEEA.
1965.
Apêndice
4 — ESTUDO SOBRE A ECONOMIA D A EXPLORAÇÃO D E BOVINOS NO NORTE
LITORAL. Eng.° Agr.» Amândio Galvão. 19TO. (Mimeografado). (Esgotado).
5 — A S P E C T O S ECONÓMICOS D A PRODUÇÃO BOVINA N A REGIÃO DO
NOROESTE. Eng." Agr.» Mário Pereira. 1970. (Mimeografado). (Esgotado).
6 — AGRICULTURA D E GRUPO. DADOS RELATIVOS A EXPLORAÇÕES AGRÍCOLAS P O R T U G U E S A S E LEGISLAÇÕES P O R T U G U E S A E F R A N C E S A .
Eng.» Agr.» Agostinho de Carvalho, 1971. (Mimeografado). (Esgotado).
7 — E V O L U Ç Ã O D A S EXPLORAÇÕES DO CENTRO D E GESTÃO AGRÍCOLA
D A B E I R A LITORAL. 1960-1967. Eng.» Agr.» Alfredo Louza Viana. 1971.
(Mimeografado). (Esgotado).
8 — A L G U N S ASPECTOS DO MERCADO D E F R U T A S F R E S C A S NO CONTIN E N T E . Eng.» Agr.» António J. Cortez de Lobão. 1972. (Mimeografado).
9 - - A R R E N D A M E N T O RURAL. Discussão do projecto de Decreto-Lei da Secretaria
de Estado da Agricultura. Proposta alternativa apresentada ao referido projecto.
1975. (Mimeografado).
10 — INQUÉRITO AS EXPLORAÇÕES AGRÍCOLAS DO BAIXO ALENTEJO. Eng.»'
Agr.» Carlos da Silva, Agostinho de Carvalho e Raul Dias da Cruz. 1976.
s
11 — OPERÁRIOS EM DIALOGQ. Entrevistas realizadas por Eng.» Agr.» Raul Dias
da Cruz. 1976. (Esgotado).
12 — VARIAÇÃO D A S MARGENS B R U T A S D A S ACTIVIDADES E E S T A B I L I D A D E
D A S SOLUÇÕES D E A L G U N S MODELOS D E PROGRAMAÇÃO LINEAR. Eng."
Agr.» Rogério V. de Almeida. 1977.