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ARTIGO ORIGINAL / ORIGINAL ARTICLE
Fraturas do processo odontóide do áxis.
Revisão de 14 casos
Fractures of the odontoid process of the axis.
Review of 14 cases
Fernando Luiz V. Lauda1
André Rafael Hübner2
Roberto Longarai Daher3
RESUMO
ABSTRACT
Objetivo: avaliar os pacientes com fraturas do processo
odontóide do áxis tratados no período de 1999 a 2004 pelo
Serviço de Cirurgia da Coluna do Instituto de Ortopedia e
Traumatologia de Passo Fundo, Rio Grande do Sul (RS), comparando-os aos dados encontrados na literatura. Métodos: foram analisados 14 prontuários de pacientes com fratura do
processo odontóide decorrente de trauma de alto ou de baixo
impacto; um paciente foi excluído do trabalho por não aderir ao
protocolo de tratamento. Resultados: onze pacientes do sexo
masculino (78,57%) e três do sexo feminino, com idades variando entre 12 e 80 anos (média de 42,85 anos). O tempo de seguimento variou de quatro a 39 meses. As fraturas foram classificadas segundo Anderson e D’Alonzo. Encontraram-se nove
casos de fratura tipo II (64,28%) e cinco casos de fratura tipo III
(35,71%), não havendo caso do tipo I. Das fraturas do tipo II,
cinco casos apresentavam desvio e foram submetidos a tratamento cirúrgico pela técnica de fixação anterior do odontóide
por meio de um parafuso canulado de 4.0mm. Os demais pacientes receberam tratamento de forma conservadora, com halo
gesso e/ou colar tipo Filadélfia. Entre as fraturas do tipo III, um
paciente foi submetido a tratamento cirúrgico e três a tratamento conservador. Conclusão: a consolidação das fraturas
foi obtida em todos os pacientes com retardo de consolidação em dois pacientes tratados conservadoramente. O tempo médio de imobilização diminui nos pacientes tratados
cirurgicamente.
Objective: to evaluate patients with fractures of the axis
odontoid process treated from 1999 to 2004 by the Spine
Surgery Service of Instituto de Ortopedia e Traumatologia de
Passo Fundo, Rio Grande do Sul (RS) and to compare the
obtained data with the literature. Methods: fourteen cases of
patients with fracture of the odontoid process were analyzed
as a consequence of traumas of high or low impact – one patient
was excluded of this study for not following the treatment
protocol. Eleven of the patients were male (78,57%) and three
of them were female, and their ages ranged from twelve to eighty
years old (mean of 42,85 years). The follow-up varied from four
to thirty-nine months. The fractures were classified according
to Anderson and D’Alonzo. Results: it was found nine fracture
cases type II (64,28%), five fracture cases type III (35,71%),
and there was no case of type I. From fractures type II, five cases
presented deviation and were submitted to a surgical treatment
by means of the anterior fixation technique of the odontoid
with a cannulated screw 4.0mm. The other patients were treated
conservatively with halo plaster and/or collar Philadelphia.
Among the fractures of type III, one patient was submitted to a
surgical treatment and three patients to conservative treatment.
Conclusion: the fusion of the fractures was obtained in all
patients, with a delayed union in treated two conservatively.
The average time of immobilization decreased in patients
treated surgically.
DESCRITORES: Processo odontóide/lesões; Fraturas
ósseas/terapia; Fraturas ósseas/cirurgia
KEYWORDS: Odontoid process/injuries; Fractures, bone/
therapy; Fractures, bone/surgery
Trabalho realizado no Instituto de Ortopedia e Traumatologia – IOT – Passo Fundo (RS), Brasil e Hospital Escola São Vicente de Paulo (HESVP) – Passo Fundo (RS),
Brasil.
1
Chefe do Serviço de Cirurgia da Coluna do Instituto de Ortopedia e Traumatologia – IOT – Passo Fundo (RS), Brasil.
Instrutor e cirurgião de coluna do Instituto de Ortopedia e Traumatologia – IOT – Passo Fundo (RS), Brasil; orientador do trabalho.
3
Fellow do serviço de Cirurgia da Coluna do Instituto de Ortopedia e Traumatologia – IOT – Passo Fundo (RS), Brasil.
2
Recebido: 12/04/2006 - Aprovado: 16/08/2006
COLUNA/COLUMNA.
COLUNA/COLUMNA.
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Lauda FLV, Hübner AR, Daher RL
INTRODUÇÃO
As fraturas do processo odontóide correspondem, aproximadamente, a uma média de 5% a 15% das fraturas da
coluna cervical, sendo que, em torno de 25% estão associadas a déficit neurológico e taxa de mortalidade estimada em 5% a 10%1. A real prevalência é controversa, pois,
muitas vezes, tais fraturas estão associadas a trauma seguido de óbito. Outras vezes as fraturas do processo
odontóide apresentam diagnóstico tardio por não terem
sintomatologia importante e também pela ocorrência em
traumas de baixa energia por quedas da própria altura,
principalmente em idosos e nas crianças pela presença
da fise, gerando epifisiólise2-3. O tratamento muitas vezes
é inadequado devido à falha no diagnóstico inicial ocasionando dor, instabilidade e deterioração neurológica.
Varias classificações para fraturas de odontóide já
foram propostas 4. Entretanto, após a classificação de
Anderson e D’Alonzo, tornou-se mais fácil a interpretação e conduta terapêutica mais adequada a cada caso5. A
classificação é baseada no nível anatômico da fratura
que apresenta também valor prognóstico quanto ao índice de pseudo-artrose (Figura 1). Este trabalho tem como
objetivo avaliar os pacientes tratados devido à fratura
do processo odontóide do áxis e comparar aos dados da
literatura.
Figura 1
Tipo I - Fratura oblíqua através da parte superior do odontóide
Tipo II - Fratura da junção do odontóide com o corpo vertebral
Tipo III - Traço de fratura se estende, inferiormente para a porção óssea e sendo realmente uma fratura através do corpo do áxis
MÉTODOS
Esta pesquisa foi realizada no Instituto de Ortopedia e
Traumatologia de Passo Fundo e no Hospital São
Vicente de Paulo - RS, em seu Serviço de Emergência.
Foram avaliados 14 prontuários de pacientes tratados
no serviço, no período de fevereiro de 1999 a setembro
de 2004. A faixa etária esteve entre 12 e 80 anos, média
de 42,85 anos. Houve a prevalência do sexo masculino
em 11 casos (78,57%), o sexo feminino foi encontrado
em três casos.
A investigação deu-se por meio de exame físico, com
ênfase ao exame neurológico, sendo utilizado o índice
de Lucas e Ducker6, para avaliação da força muscular, e
escala de Frankel 7, para avaliação deficiência sensitivomotora. A análise foi realizada por meio de exames de imagem da coluna cervical com radiografias (ântero-posterior,
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perfil e trans oral) bem como por tomografia computadorizada, com reconstrução lateral, e ressonância
nuclear magnética, em alguns casos (28,57%).Para condução da escolha do tratamento os autores basearamse na classificação de Anderson e D’Alonzo 5 para fraturas do processo odontóide. Quanto ao alinhamento das
fraturas, foi considerado como desviado e, portanto,
critério de seleção para tratamento cirúrgico, o deslocamento do processo odontóide maior ou igual a 4 mm em
qualquer direção, conforme Apuzzo et al. 8 e/ou
angulação maior que 10º conforme Clark et al.9, mensurados por um dos autores através de radiografia e/ou
tomografia computadorizada da coluna cervical. Como
protocolo do tratamento conservador, os autores utilizaram imobilização tipo gesso halo torácico ou Minerva,
Fraturas do processo odontóide do áxis. Revisão de 14 casos
por volta de oito a 13 semanas, seguido do uso do colar
Filadélfia, até a presença de sinais de consolidação óssea visualizados em radiografias dinâmicas ou
tomografias computadorizadas da coluna cervical.
Quanto ao tratamento cirúrgico, foi utilizada a técnica de fixação anterior do processo odontóide, optandose pelo uso de um parafuso canulado de 4.0mm segundo a técnica cirúrgica descrita por Nakanishi et al. 10,
seguida por Bohler et al.11. A ilustração a seguir é referente ao caso número 10 (Tabela 1).
Técnica cirúrgica
O procedimento cirúrgico é realizado com o paciente
instalado em decúbito dorsal, a cabeça permanecendo
reta em extensão, colocando-se um coxim sob os ombros. Devemos manter a cavidade bucal com abertura
máxima utilizando-se suporte radiotransparente. É necessário que a fratura seja reduzida e a irredutibilidade
é contra-indicação absoluta para este método. Como
forma de redução pré-operatória utiliza-se o halocraniano associado à tração esquelética e testamos, por
meio de manobras de flexão-extensão suaves junto ao
controle fluoroscópico, se houve redução passível de tratamento cirúrgico. Caso a redução não seja satisfatória
ela deve ser feita no trans-operatório, utilizando-se
afastador tipo Hohmann pressionando posteriormente
e deslocando a base de C2 em direção ao fragmento
“dente”, associado a manobras de flexão ou extensão
cervical e em seguida introduzindo o fio de Kirschner
centralmente ao dente do áxis fixando-o temporariamente
em posição de redução. Faz-se a abordagem cirúrgica
cervical anterior descrita por Southwick e Robinson 12,
nível de C4-C5, por meio de incisão linear ao bordo ânteromedial do músculo esternocleidomastoideo à direita, chegando-se até o espaço C2-C3, com o uso de dois
afastadores para exposição do campo. Utiliza-se um
intensificador de imagem para visualização da fratura
na posição ântero-posterior e perfil durante o procedimento. Retira-se uma pequena porção do disco C2-C3 e
bordo ântero-inferior do corpo de C2 e, então, o orifício
inicial é feito por meio da colocação de um fio de
Kirschner 1.2mm na porção inferior medial do corpo de
C2, indo em direção à porção póstero-superior do
odontóide. Um segundo fio é passado paralelamente ao
primeiro para evitar rotação do odontóide no eixo do
parafuso e a perda de redução. Sem uso de broca, o fio
de Kirschner central serve como guia para o parafuso.
Em seguida, introduz-se o parafuso canulado autoperfurante com 4,0 mm de espessura e tamanho variável
entre 45 e 55 mm (Figura 2). O ideal é que o parafuso
atinja a camada cortical póstero superior do odontóide.
O fio guia e o fio estabilizador são retirados sendo feito
movimento de flexão e extensão na coluna cervical para
confirmar a estabilidade imediata da fixação. No pósoperatório imediato é utilizado colar Filadélfia até sinais
radiológicos ou tomográficos de consolidação óssea.
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Um paciente (caso 14) apresentando fratura tipo III, com
30 dias de evolução e grande desvio posterior, foi excluído do resultado final do trabalho por não aderir ao
protocolo de tratamento.
RESULTADOS
Quanto ao mecanismo de trauma foram encontrados os
seguintes casos: sete de acidentes de trânsito, cinco de
queda da própria altura, um de queda de altura e um de
queda do cavalo. Quanto a lesões associadas encontraram-se dois casos de parestesia envolvendo membros
superiores (caso 06 e 10), fratura da massa lateral de C2 e
fratura de punho direito (caso 10) e trauma crânio encefálico associada à fratura de úmero esquerdo (caso 13).
Em relação à classificação do tipo de fratura (Figura 1)
foram encontrados nove casos do tipo II (64,28%) e cinco casos do tipo III (35,71%), não havendo caso do tipo
I em nossa série. Dos nove casos de fraturas do tipo II,
constatou-se em cinco casos (55,5%) desvio maior que 4
mm. Nas fraturas do tipo III, apenas um caso apresentou
desvio significativo (caso 14). Houve predomínio do deslocamento posterior da fratura em 50% dos casos.
Quanto à direção do traço, houve predomínio oblíquo
posterior com 64,28% dos casos. Os dados gerais dos
pacientes envolvidos no trabalho estão disponíveis na
Tabela 1. Quanto ao tratamento, dos nove casos de fratura do tipo II, cinco pacientes apresentaram fraturas consideradas instáveis e foram tratados de forma cirúrgica,
com tempo médio de imobilização de 3,5 meses com colar
Filadélfia, note-se como exemplo o caso número 10.
Tração tipo Gardner-Wells foi usada em três pacientes no pré-operatório para a estabilização cervical inicial da fratura. Dos quatro pacientes restantes, três foram
tratados com gesso halo torácico seguido de colar Filadélfia, com tempo médio de imobilização e consolidação
de 5,5 meses (Tabela 2). Um caso (caso 7) apresentava
história de trauma cervical há aproximadamente um ano,
havia suspeita clínica de fratura devido à dor residual,
porém o estudo tomográfico revelou a consolidação da
fratura de odontóide, não havendo, portanto, necessidade de imobilização.
Dos pacientes com fratura do tipo III, mantidos no
trabalho, nenhum caso apresentou desvio significativo, o caso número nove teve indicação cirúrgica pois o
paciente rejeitou o uso do halo-gesso. O tempo de imobilização com colar Filadélfia deste paciente, no período pós-cirúrgico, foi de 2,5 meses. Os outros três pacientes foram submetidos ao tratamento conservador com
tempo médio de imobilização e consolidação de cinco
meses. O período de acompanhamento foi de quatro a
36 meses (média de 17,4 meses). Todos os pacientes
apresentaram melhora dos sintomas locais e retorno da
função e as suas atividades. A consolidação das fraturas foi obtida em todos os casos, porém houve retardo
de consolidação em dois casos tratados conservadoramente (casos 1 e 12).
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Figura 2
Abordagem cirúrgica e
colocação do parafuso
TABELA 1 - Dados gerais dos pacientes
Caso
Iniciais
Idade
nome
anos
Sexo
Mecanismo
Classifc.
trauma
Deslocamento
Desvio
Fratura e dir.
Tipo
Tempo
Tempo
tto.
imob.
acomp.
traço
1
L.B
45
M
AC. T
II
SD/OP
Não
Cons
7m
36m
2
C.M
36
M
AC.T
II
P/OP
Sim
Cir
3m
39m
3
C.B.C
67
F
Queda
II
P/OP
Sim
Cir
3,5m
36m
4
T.M.M
66
F
Queda
III
P/OP
Não
Cons
5m
14m
5
E.A.B
29
M
AC.T
III
A/OA
Não
Cons
4m
4m
6
D.B.G
80
F
Queda
II
P/OP
Sim
Cir
3m
4m
7
O.J.B
29
M
Queda
II
SD/H
Não
Cons
-
19m
8
A.T.C
51
M
Queda
II
P/H
Sim
Cir
2m
22m
9
C.E.T
21
M
AC.T
III
SD/OP
Não
Cir
2,5m
19m
10
A.L.R
25
M
AC.T
II
P/OP
Sim
Cir
3m
12m
11
N.J.P
39
M
AC.T
II
A/OA
Não
Cons
5m
8m
12
C.J.G
41
M
AC.T
III
SD/OP
Não
Cons
6m
8m
13
M.P
12
M
Queda
II
A/OA
Não
Cons
4,5m
6m
14
J.D
59
M
Queda
III
P/OP
Sim
-
-
-
Fonte- IOT – Passo Fundo-RS
Legenda: classific= classificação; dir= direção; tto= tratamento; imob= imobilização; acomp= acompanhamento; M= masculino; F= feminino; AC.T= acidente
de trânsito; SD= sem desvio; P= posterior; A= anterior; AO= oblíquo-anterior; OP=oblíquo-posterior; H= horizontal; Cir = cirúrgico; Cons = conservador
Caso 10
Fratura tipo II com desvio
posterior, visualizada através
de tomografia
computadorizada
Visualização do
posicionamento do parafuso
em radiografia ânteroposterior e perfil no
trans-operatório
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Caso 10
Visualização
de sinais de
consolidação
por meio de
radiografias e
de tomografia
computadorizada
Mobilidade e estética após
três meses do tratamento
cirúrgico
TABELA 2 - Correlação tipo de fratura e tratamento X tempo de imobilização e média de idade
Tipo de fratura
Tipo de tratamento
Tempo médio de
Média de idade
imobilização
II
Cirúrgico
3,5 meses
51,8 anos
II
Conservador
5,5 meses
31,2 anos
III
Cirúrgico
2,5 meses
21 anos
III
Conservador
5 meses
45,3 anos
Fonte: IOT - Passo Fundo -RS, Brasil
DISCUSSÃO
O alto grau de morbidade associado ao tratamento da fratura de odontóide fez com que o assunto fosse foco de considerável controvérsia e motivo de pesquisa. O tratamento
das fraturas do processo odontóide depende de vários fatores, que devem ser analisados em conjunto e adaptados
da melhor maneira possível a cada paciente. O tipo de fratura, a idade do paciente, o estado geral, a presença de lesões
associadas, os recursos técnicos disponíveis e a filosofia
de tratamento do cirurgião são os principais parâmetros
sobre os quais a decisão terapêutica deve ser tomada13.
Conforme a literatura, as fraturas do tipo I são lesões muito
raras, sem repercussão sobre a estabilidade do seguimento C1C2 e apresentam bom prognóstico. Devem ser tratadas com uso
de colar ou órtese por três meses, com estudo radiográfico dinâmico para avaliação de instabilidade residual. Deve-se investigar a instabilidade occipto-C1, pois a fratura é freqüentemente
causada por tração do ligamento apical ou alar5,14. Neste trabalho, não foram encontrados pacientes com fratura do tipo I.
O tratamento conservador para as fraturas do tipo II é con-
troverso. Existe consenso de que a redução anatômica e a sua
manutenção, por meio de imobilização rígida, são fundamentais para obtenção da consolidação da fratura15. Deve ser realizado com imobilização do tipo halo veste ou halo gesso, para
neutralizar os movimentos. Como complicações desse método
são citados na literatura: dificuldade em obter e interpretar radiografias, fixação em excesso ou soltura dos pinos, infecção no
ponto de entrada dos pinos, abscesso cerebral, rigidez, dor,
dificuldades quanto à higiene e atividades da vida diária8,16-18.
Os índices de pseudoartrose variam muito na literatura, entre
10% e 67%19. Vários fatores podem ser indicadores de mau
prognóstico: afastamento dos fragmentos maiores que 4 a 6
mm, desvio posterior, angulação acima de 10°, idade acima de
40-60 anos, suprimento arterial inadequado devido a deslocamento da fratura20, contato limitado entre as partes fraturadas,
tabagismo, tempo prolongado de tração, redução inadequada,
diagnóstico tardio e método de tratamento incorreto9,21.
A osteossíntese do processo odontóide representou um progresso importante no tratamento dessas fraturas, eliminando a
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utilização de grandes órteses, abreviando o período de internação
hospitalar, facilitando a reabilitação e o retorno ao trabalho, além
de reduzir o índice de pseudoartrose13,22. Nas séries publicadas na
literatura em relação a pacientes submetidos à fixação do odontóide
com parafuso para tratamento de fraturas do tipo II e tipo III, a taxa
de fusão foi de 96% (75 a 100%) e apresentaram 6,6% de complicações, sendo a complicação mais comum a saída do parafuso
em 2,6%, seguida da quebra do parafuso em 1,2% e parafuso mal
posicionado em média 1% nessas séries23. Outras séries apontam como possíveis complicações: disfagia, disfonia, hematoma
local, infecção, tetraplegia, perfuração do esôfago24-25.
O tratamento cirúrgico mais usado nas fraturas tipo II é a fixação cervical posterior C1-C2, apresentando altas taxas de fusão
entre 90% e 100%, mas com sacrifício da mobilidade cervical, reduzindo em 50% a rotação cervical e em 10% a flexão-extensão, com
taxas de morbidade de 5 a 19%26-28. Os procedimentos cirúrgicos
de fixação cervical posterior são métodos indiretos de artrodese,
lesando estruturas normais para promover estabilidade, o que
pode aumentar a dor no pós-operatório. Esses procedimentos
podem ser utilizados nos casos em que há uma contra-indicação
para fixação anterior como fraturas com traço oblíquo anterior,
lesão do ligamento transverso-atlantal, fraturas irredutíveis,
osteopenia severa e associação com fraturas do corpo de C215.
Nas fraturas do tipo III o tratamento conservador é o ideal,
pois apresenta um índice de pseudoartrose da ordem de 10% a
15% menor quando comparado às fraturas do tipo II, mas a não
consolidação pode ocorrer, mesmo em fraturas sem desvio inicial;
esse tipo de fratura não deve ser considerado como uma lesão
benigna, devendo ser imobilizada com halo-gesso13,15. As fraturas
com desvio devem ser reduzidas após a aplicação de halo craniano
e tração e, em analogia com as fraturas do tipo II, o tratamento
pode ser conservador com utilização de halo-gesso, osteossíntese
do processo odontóide ou artrodese C1-C213.
Na série em estudo não houve quebra nem saída do parafuso,
porém em um caso (n° 9) o parafuso apresentou, em sua colocação, deformação em torção axial. Houve consolidação em todos
os casos tratados cirurgicamente, independente da faixa etária.
Observou-se, também, a consolidação nos casos tratados conservadoramente, porém o tempo médio de imobilização diminui
nos casos tratados cirurgicamente.
CONCLUSÃO
Não há protocolo definido na literatura quanto à melhor forma de
tratamento para as fraturas do processo odontóide, porém o estudo sugere que o tratamento depende de vários fatores que devem
ser analisados em conjunto e adaptados da melhor maneira possível a cada paciente. Houve consolidação óssea em todos os casos tratados cirurgicamente nesse estudo, independente da faixa
etária. A fixação da fratura reduz o tempo de imobilização. Observou-se, também, a presença de consolidação óssea nos casos
tratados de forma conservadora, porém prolongando o período
de uso de órteses para imobilização. Não encontramos
pseudoartrose em nossa série. Assim, parece-nos que em fraturas
do tipo II com desvio maior que 4 mm e angulação maior que 10° a
fixação poderá diminuir o risco de pseudoartrose ou instabilidade
enquanto que as fraturas do tipo I e tipo III podem ser tratadas
conservadoramente desde que reduzidas e mantidas de forma
adequada.
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Correspondência
Fernando Luiz V. Lauda
Rua Independência, 889.
CEP 99010-041
Passo Fundo, RS.
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